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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
LUIZA REIS TEIXEIRA
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA:
UMA ANÁLISE DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS EM SALVADOR
Salvador
2006
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LUIZA REIS TEIXEIRA
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA:
UMA ANÁLISE DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS EM SALVADOR
Dissertação apresentada ao Núcleo de Pós-Graduação em
Administração, Escola de Administração, Universidade
Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do
grau de Mestre em Administração.
Orientador: Prof. Dr. Carlos R. S. Milani
Salvador
2006
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Biblioteca da Escola de Administração da UFBA
T266 Teixeira, Luiza Reis
A ideologia política na economia solidária / Luiza Reis Teixeira.
- 2006.
233 f.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Sanchez Milani
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia. Escola de
Administração, 2006.
1. Economia solidária – Salvador (BA). 2. Economia solidária – Filosofia -
Salvador (BA). I. Universidade Federal da Bahia. Escola de Administração. II.
Milani, Carlos Roberto Sanchez. III. Título.
CDD –334
20.ed.
TERMO DE APROOVAÇÃO
LUIZA REIS TEIXEIRA
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA:
UMA ANÁLISE DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS EM SALVADOR
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre
em Administração, Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca
examinadora:
Carlos Roberto Sanchez Milani _________________________________________________
Doutor em Eco-Desenvolvimento, École dês Hautes em Sciences Sociales, FR Institut dês
Estudes Politiques, Paris
Ruthy Nadia Laniado _________________________________________________________
Doutora em Ciência Política, Universidade Essex, Inglaterra
Genauto França Filho _________________________________________________________
Doutor em Sociologia, Universidade de Paris VII, França
Salvador, 23 de novembro de 2006.
A
Beth, mãe querida, pelo apoio, carinho e dedicação.
Xico, pai querido, por ter estado presente em momentos importantes da minha vida.
AGRADECIMENTOS
À minha família, meu centro de equilíbrio e coragem.
Aos meus amigos Caranguejos, sempre mostrando a força de uma amizade.
Ao BanSol e aos Bansolinos pelo compartilhamento de um projeto de mundo melhor.
A Carlos Sanchez Milani pela orientação atenciosa e criteriosa, fundamental para meu
desenvolvimento e amadurecimento intelectual, profissional e pessoal.
Ao Núcleo de Pós-Graduação em Administração (NPGA), da UFBA, pelo apoio, infra-
estrutura e qualidade de professores e funcionários de forma diferenciada, sempre prestativos
e atenciosos – um cuidado especial – com cada um dos estudantes do programa.
Ao Núcleo de Estudos de Organizações e Poderes Locais (NEPOL), pela iniciação na
pesquisa científica, além da crença e valorização do meu trabalho.
Aos empreendimentos econômicos solidários entrevistados, pela contribuição e confiança na
pesquisa desenvolvida, e por terem aberto o espaço de suas organizações de forma tão cordial.
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Muito obrigada, de coração, por contribuírem para este passo tão importante na minha vida,
uma experiência de crescimento intelectual, pessoal e profissional.
Com a economia solidária seria tudo mais
solidário, mais coletivo. Um continente, um país,
um estado. Um colaboraria mais com a
necessidade do outro. Porque é uma forma de se
unir para ajudar de forma moral – humanizaria
mais as relações. Os que têm mais ajudariam os
que têm menos, sem exploração. O mundo seria
muito mais coeso.
(AMEV, 2006)
RESUMO
Esta dissertação tem como objetivo principal pesquisar a ideologia política na economia
solidária. Para alcançar os objetivos do trabalho, investiga-se qualitativamente, através de
entrevistas semi-estruturadas, o discurso dos atores participantes de empreendimentos
econômicos solidários em Salvador. Busca-se averiguar se há, nos discursos destes atores,
indícios da difusão e realização de uma nova concepção do mundo alternativa ao capitalismo,
e se ela é equivalente à concepção de mundo da economia solidária - um modo alternativo de
produção ao modo capitalista, geralmente estruturado a partir de uma economia com trocas
fundamentadas na solidariedade e na propriedade coletiva dos meios de produção. Como
referencial teórico, parte-se da teoria gramsciana a respeito da sociedade civil, como campo
da superestrutura onde pode ocorrer a transformação ideológica (intelectual e moral) da
sociedade. Considera-se, também, o pressuposto de que a direção ideológica é conquistada
antes da conquista do poder, e que há uma busca por um consenso a respeito de aspectos
práticos e teóricos da economia solidária. As conclusões do trabalho apontam para uma falta
de consenso e clareza no discurso dos atores no que diz respeito à definição e à delimitação da
economia solidária, ainda que possam compartilhar de uma utopia de transformação social a
ser promovida a partir da economia solidária.
ABSTRACT
The main objective of this work is the research of the political ideology involved in Solidary
Economy. In order to pursue these objectives, the discourse of the main solidary economy
enterprise participant actors in Salvador was investigated qualitatively, through semi-
structured interviews. The idea was to verify whether there is, in these actors’ discourse, hints
as to the diffusion and rise of a new concept of a world alternative to capitalism, and whether
this is equivalent to the world viewed from the standpoint of view of solidary economy – an
alternative way to production in capitalism, generally structured within an economy where
exchanges are grounded on solidarity and collective property of production. As a theoretical
framework, the point of departure was the gramscian theory on civil society, understood as a
space where ideological transformation (intellectual and moral) may occur, away from the
dominant class ideological influence. The presupposition that ideological direction is obtained
before the attainment of power was also considered, as well as the understanding that there is
a search towards consensus about the practical and theoretical aspects of solidary economy.
The conclusion points out the lack of consistency in the actors’ discourse related to the
definition and delimitation of solidary economy, even though actors share the utopia of social
transformation based on solidary economy.
LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS
Figura 1 - Composição da economia solidária 113
Gráfico 1 - Distribuição temporal dos empreendimentos econômicos
solidários em Salvador 127
Gráfico 2 - Quantidade de pessoas participantes dos empreendimentos
entrevistados 133
Gráfico 3 - Origem dos parceiros 136
Gráfico 4 - Produção dos empreendimentos entrevistados 145
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Campo conceitual da economia solidária 90
Quadro 2 - Breve cronologia dos principais acontecimentos na economia
solidária no Brasil 106
Quadro 3 - Elementos internos e externos para a análise do movimento
de economia solidária no Brasil 108
Quadro 4 - Caracterização dos empreendimentos associativos 124
Quadro 5 - Dados gerais dos empreendimentos 132
Quadro 6 - As noções no entendimento da economia solidária 140
Quadro 7 - Objetivos e resultados dos empreendimentos 142
Quadro 8 - Organização da produção nos empreendimentos 146
Quadro 9 - Responsabilidade pela produção e tomada de decisão 148
Quadro 10 - Conscientização de outras pessoas 149
Quadro 11 - Qualidade das relações empreendimentos x comunidades 152
Quadro 12 - Visão da sociedade na economia solidária 153
Quadro 13 - Expectativas do Estado 156
Quadro 14 - Estado ideal 157
Quadro 15 - Mudanças que a economia solidária pode trazer 158
Quadro 16 - Superação das desigualdades sociais 159
Quadro 17 - Concepção do ideário dos empreendimentos 161
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADS Agência de Desenvolvimento Solidário
APL Arranjo Produtivo Local
BanSol Associação de Fomento à Economia Solidária
CECOM Centro Comunitário Vasco da Gama
CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica
CESE Coordenadoria Ecumênica de Serviços
CIAGS Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social
CNBB Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
CUT Central Única dos Trabalhadores
IAAP Instituto Afrânio Afonso Pereira
ITCP Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares
FAPESB Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado da Bahia
FASE Federação de Órgão para Assistência Social e Educacional
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
OCEB Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado da Bahia
SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas
SECOMP Secretaria Estadual de Combate a Pobreza
SENAES Secretaria Nacional de Economia Solidária
UNEB Universidade do Estado da Bahia
SEI Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 15
1.1. PROBLEMÁTICA: SOCIEDADE CIVIL E ECONOMIA SOLIDÁRIA 17
1.2. OBJETO DE ESTUDO 25
1.3. A PESQUISA 27
1.4. ESCOLHAS TEÓRICAS E METODOLÓGICAS 29
2. A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA
CATEGORIA CONCEITUAL 32
2.1. HISTÓRICO DO CONCEITO DE SOCIEDADE CIVIL 37
2.2. SOCIEDADE CIVIL EM AÇÃO: MOVIMENTOS SOCIAIS 54
2.3. IDEOLOGIA NOS MOVIMENTOS DA SOCIEDADE CIVIL 64
2.4. A INOVAÇÃO GRAMSCIANA NO PENSAMENTO MARXISTA 70
2.5. PRINCIPAIS CONCEITOS - IDEOLOGIA E SOCIEDADE
CIVIL EM GRAMSCI 74
2.6. O PAPEL TRANSFORMADOR DA SOCIEDADE CIVIL 81
3. TEORIAS E PRÁTICAS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA:
EMPREENDIMENTOS NO BRASIL E NA BAHIA 85
3.1. TEORIZAÇÃO ACERCA DA ECONOMIA SOLIDÁRIA 86
3.2. ECONOMIA SOLIDÁRIA: RENASCIMENTO DO COOPERATIVISMO 93
3.3. ANÁLISE DO MOVIMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL 107
4. ANÁLISE EMPÍRICA: A IDEOLOGIA POLÍTICA NA
ECONOMIA SOLIDÁRIA 121
4.1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 121
4.1.1. Metodologia Experimental 127
4.1.2. Metodologia Analítica 130
4.2. ANÁLISE DOS DADOS 129
5. CONCLUSÃO 162
REFERÊNCIAS 171
APÊNDICE A 178
APÊNDICE B 181
APÊNDICE C 186
APÊNDICE D 189
APÊNDICE E 190
APÊNDICE F 196
APÊNDICE G 200
APÊNDICE H 204
APÊNDICE I 208
APÊNDICE J 215
APÊNDICE K 219
APÊNDICE L 225
APÊNDICE M 228
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
15
1. INTRODUÇÃO
Esta dissertação tem por objetivo apresentar, em linhas gerais, as conclusões de
uma pesquisa que busca analisar a ideologia política presente nos empreendimentos de
economia solidária. A pesquisa vincula-se ao Núcleo de Estudos sobre Poder e Organizações
Locais – NEPOL, sendo realizada no âmbito do Núcleo de Pós-Graduação em Administração
da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia – NPGA/EAUFBA, com o
apoio do CNPq. Ao final da pesquisa, procura-se responder a questões que surgiram ao longo
da experiência vivida pela própria pesquisadora no desenvolvimento de uma organização de
economia solidária, vinculada à EAUFBA, o BanSol – Associação de Fomento à Economia
Solidária
1
.
Na primeira parte da dissertação, estabelecemos um panorama histórico e sócio-
político do conceito de sociedade civil, analisando as diferentes expressões políticas da
realidade social que ele representa, assim como o vasto campo de atuação que as organizações
da sociedade civil englobam. Isso é fundamental porque a economia solidária surge em meio
a este contexto. Apresentamos uma síntese histórica da sociedade civil na América Latina e
dos movimentos sociais no Brasil, com o objetivo de estabelecer uma relação com o conceito
de ideologia, uma das categorias de análise centrais deste trabalho. Há, a seguir, uma análise
1
O BanSol é uma Associação autogestionária criada em 2001, inserida na Universidade Federal da Bahia
(UFBA), composta de forma multidisciplinar por estudantes, professores e profissionais que têm como objetivo
fomentar a Economia Solidária na região metropolitana de Salvador - Bahia. A sua missão é exercitar e difundir
a economia solidária, através da vivência e do apoio à construção de empreendimentos e de saberes para um
mundo socialmente justo e sustentável.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
16
interpretativa dos conceitos de ideologia e sociedade civil em Gramsci, em que, novamente,
são estabelecidos nexos com o objeto empírico deste trabalho investigativo – a ideologia
política em organizações de economia solidária.
Vale ressaltar que os conceitos desenvolvidos por Gramsci desempenham um
papel de fundamental relevância neste trabalho, uma vez que a sociedade civil – com a
capacidade de organização de discursos - é a esfera em que surge e está contextualizado o
objeto empírico; além disso, a ideologia é a concepção de mundo e o projeto político (dotado
de intencionalidade) presente nas manifestações coletivas das organizações da sociedade civil,
constituindo-se na principal categoria conceitual a ser analisada no repertório discursivo dos
empreendimentos de economia solidária.
A segunda parte da dissertação retrata, brevemente, a teorização acerca da
economia solidária, visando a discutir a evolução do debate sobre esta temática e seu reflexo
no atual momento de organização do movimento. Em seguida, são analisadas as origens
históricas do movimento partindo do pressuposto de que a economia solidária seria um
renascimento do cooperativismo do século XIX. Posteriormente, o movimento da economia
solidária no Brasil e na Bahia é analisado à luz da proposta metodológica para análise e a
contextualização dos movimentos sociais lançada por Gohn (2002).
Na última parte da dissertação, além da explicitação dos procedimentos
metodológicos do trabalho empírico, são apresentadas as organizações que fazem parte da
amostra investigada e as análises desenvolvidas em relação ao perfil e o ideário destas
organizações. No último capítulo, de conclusão, são relacionados os resultados obtidos a
partir da análise dos dados empíricos com os pressupostos teóricos deste trabalho, no contexto
da produção acadêmica e da literatura sobre sociedade civil e economia solidária no Brasil.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
17
1.1. PROBLEMÁTICA: SOCIEDADE CIVIL E ECONOMIA SOLIDÁRIA
O processo de internacionalização dos estudos sobre organizações sem fins
lucrativos, ocorrido na década de 90, trouxe a emergência do termo “Terceiro Setor” em
diferentes contextos nacionais, para se referir a ações ocorridas na esfera da sociedade civil.
No caso do Brasil, Fernandes (1994) definiu o terceiro setor como a produção de bens
públicos, a exemplo da conscientização para os direitos da cidadania, a prevenção de doenças
transmissíveis ou a organização de ligas esportivas. Para Falconer (1999), este é o termo que
vem encontrando maior aceitação para designar o conjunto de iniciativas provenientes da
sociedade. Existem, além deste termo, outras expressões usadas no Brasil, como:
organizações não-governamental, organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos,
filantrópicas, sociais, solidárias, independentes, caridosas, de base, associativas, entre outros.
No entanto, há uma clara confusão ao considerar todos estes termos como sinônimos. Para
efeito de análise, estabelecemos, como ponto de partida deste trabalho, uma distinção entre os
termos “terceiro setor” e “organizações não-governamentais” em relação ao conceito de
sociedade civil.
O termo terceiro setor surge nos Estados Unidos, com a tradição de um nonprofit
sector firmemente enraizada. Os primeiros estudos nesta área datam de 1960; no entanto, foi
na década de noventa que a maior parte da produção hoje disponível se desenvolveu
sobremaneira, e teve alguma atenção de autores do chamado mainstream da Administração,
como Philip Kotler e mesmo de Peter Drucker, que é tido como um dos pais das teorias da
Administração moderna (FALCONER, 1999). Alves (2002) ressalta que o John Hopkins
Nonprofit Sector Project foi responsável pela divulgação do termo em diversos países do
mundo, através de pesquisas desenvolvidas sobre o tema em países com realidades distintas,
desde o Paquistão até a Coréia do Sul:
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
18
(...) deve-se ao John Hopkins Nonprofit Sector Project o ‘renascimento’ do termo
‘Terceiro Setor’ ou, pelo menos, a divulgação uniforme da expressão para todo o
mundo. (ALVES, 2002, p. 6)
O presente estudo considera a posição de França (2001, p. 52) que afirma “que o
termo terceiro setor é herdeiro de uma tradição anglo-saxônica impregnada pela idéia de
filantropia”. O autor ainda compara o termo a uma ponta de iceberg, muito pouco amplo para
a diversidade de experiências não-governamentais e não-mercantis na América Latina. Outro
autor cujo posicionamento sobre o assunto compartilhamos é Montano (2003): ao abordar o
termo, ele parte de uma análise do processo de reestruturação do capital após a década de 70,
quando se passa a seguir orientações neoliberais de flexibilização dos mercados, das relações
de trabalho, da produção, do investimento financeiro e do afastamento do Estado de suas
responsabilidades sociais. Para ele, o “Terceiro Setor” – também utilizado entre aspas em sua
obra – é um conceito ideológico portador da função de encobrir e desarticular o real, pois tem
sua origem ligada tanto a visões segmentadoras da realidade social, quanto apresenta uma
forte funcionalidade com o atual processo de reestruturação do capital, particularmente no que
refere ao afastamento do Estado das suas responsabilidades de respostas às seqüelas da
questão social.
Assim como o termo “Terceiro Setor”, o conceito de sociedade civil tem sido
amplamente disseminado nos dias de hoje. Segundo Nogueira (2003), seja no nível do senso
comum, da linguagem da mídia, ou do imaginário político das sociedades contemporâneas, o
conceito de sociedade civil, é um dos conceitos da teoria social contemporânea que mais gera
controvérsias, além de ter perdido a precisão, uma vez que é empregado pelas mais variadas
correntes político-filosóficas, que muitas vezes utilizam a mesma palavra referindo-se a
fenômenos distintos.
No entanto, o conceito de sociedade civil surge muito antes da terminologia do
terceiro setor, com a pólis grega, no sistema democrático lá praticado. Muito do debate
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
19
existente entre democracia e sociedade tem origem na Grécia clássica do século V a.C. e seu
escopo é bastante mais amplo, complexo e contraditório. O conceito de sociedade civil foi
desenvolvido por Aristóteles, sob o termo Politike koinonia
2
, posteriormente traduzido como
respublica ou também societas civilis em latim. No entanto, com a revolução industrial há o
desenvolvimento de um novo padrão de relacionamento entre a sociedade civil sociedade
política, o que será aprofundado no segundo capítulo desta dissertação.
O conceito de sociedade civil a ser explorado nesta dissertação corresponde ao
modelo desenvolvido por Gramsci, ao qual este trabalho se filia epistemológica e
teoricamente. Gramsci parte do conceito de Marx, mas inova ao considerá-la no momento da
superestrutura, ao invés da estrutura. Para Gramsci, a sociedade civil compreende, não apenas
todo o conjunto das relações materiais, como em Marx, mas todo o conjunto das relações
ideológico-culturais e todo o conjunto da vida espiritual e intelectual, diferente de Marx, que
considera a sociedade civil todo o conjunto da vida comercial e industrial. Para Gramsci, a
sociedade civil é, ao mesmo tempo, o momento ativo, referente à dicotomia necessidade e
liberdade, e momento positivo, referente à força e consenso (BOBBIO, 1986).
Gramsci fala também em hegemonia como controle ideológico da classe
dominante. Para ele, a Igreja na Idade Média, por exemplo, funcionava como a sociedade
civil, já que era o aparelho de hegemonia do grupo dirigente.
Podem ser fixados, por enquanto, dois grandes planos superestruturais: o que pode
ser chamado de ‘sociedade civil’, ou seja, o conjunto de organismos habitualmente
ditos privados, e o da sociedade política ou Estado. E eles correspondem à função de
hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade; é a do domínio
direto ou de comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico (GRAMSCI,
p. 33 – trecho dos Cadernos do Cárcere, apud BOBBIO, 1982).
A atribuição de um papel transformador à sociedade civil por Gramsci teve
bastante impacto nas teorias de sociedade civil que seguiram posteriormente. Gramsci está
sempre presente nos discursos dos mais diversos interlocutores que falam de sociedade civil
2
Politike koinonia significa sociedade política ou comunidade.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
20
nos dias de hoje, embora não haja uma interpretação única e consensual do termo
(NOGUEIRA, 2003). Os autores consultados neste trabalho sobre o tema da sociedade civil
(COHEN, 2003; COHEN e ARATO, 1992; NOGUEIRA, 2003; TEIXEIRA, 2002;
WHITEHEAD, 1999) partem do conceito de Gramsci, ou fazem referência a ele.
Adotamos o pressuposto de que sociedade civil em Gramsci é um conceito
complexo e sofisticado, muito útil para entender a realidade contemporânea. Além de ser um
conceito, a sociedade civil, como ressalta Nogueira (2003), encerra em Gramsci um projeto
político que tem a possibilidade de transformar a sociedade. Existe neste conceito uma razão
marcada pela idéia de intencionalidade, que nos parece fundamental epistemológica e
metodologicamente. Para Elenaldo Teixeira (2002), Gramsci é o autor que apresenta os
elementos básicos para a compreensão atual da sociedade civil, uma vez que ela representa o
conjunto de organizações que elaboram e difundem as ideologias que são hegemônicas entre
as classes.
As constantes crises por que o sistema capitalista vem passando contribuem para o
aumento das desigualdades sociais, e, conseqüentemente, para a deteriorização das condições
de vida da maioria da população mundial. Somam-se a este cenário as transformações
econômicas que vêm ocorrendo no plano global, com as mudanças tecnológicas e a
incorporação de um novo padrão produtivo pelas empresas, que se baseia na flexibilização do
trabalho, na segmentação de cadeias produtivas por áreas geográficas, na acirrada
competitividade mundial entre as empresas na busca de produtividade e eficácia que
ultrapassam as fronteiras do Estado-nação. Todo este processo afeta as economias nacionais,
que, em sua maioria, vêm implementando reformas liberalizantes e desregulando os
mercados, o que leva a uma redução do papel do Estado, tanto nas atividades econômicas,
como no financiamento e na promoção de políticas sociais, além de gerar crise social derivada
do desemprego (SANTOS JUNIOR, 2001).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
21
Os Estados são constrangidos a deixar de lado as práticas de welfare, e as
empresas vêm se tornando, ainda mais, insuficientes para atender às demandas de uma grande
massa excluída do trabalho formal. Tanto o Mercado como o Estado não têm se mostrado
eficazes, pelos seus mecanismos econômicos e redistributivos tradicionais, de equacionar o
problema das desigualdades sociais em países como o Brasil, o que vem a fortalecer ideais de
transformação social, que muitas vezes se baseiam na transformação do sistema. O crescente
desemprego e as transformações na qualidade do trabalho, marcas da era global, têm
deslocado, cada vez mais, parte dos indivíduos para formas alternativas de ocupação. A
discussão acerca de novas alternativas ao modelo vigente ganha força no discurso acadêmico
e dos movimentos sociais (SEI, 2004).
Como exemplo destas alternativas ao modelo econômico vigente, podemos citar
os movimentos associativistas que, desde o século XIX, traduziram o surgimento de uma
tipologia de experiências que nasceram do seio da sociedade civil, sob a égide dos
mecanismos de reciprocidade e do voluntarismo, que não possuíam fins lucrativos e que
pretendiam trabalhar para a eliminação da exclusão social e por uma cultura da solidariedade.
As primeiras experiências de economia solidária na Europa foram também denominadas de
socialismo utópico, e geraram um debate político sobre as condições do agir econômico.
Havia uma recusa das pessoas envolvidas no movimento associativista e cooperativista na
Europa do século XIX em reconhecer a autonomia apenas do aspecto econômico, em
detrimento dos outros aspectos, haja vista os aspectos, social, político e cultural, entre outros.
O ideal de transformação social, no entanto, não passava pela tomada do poder político via
aparelho do Estado, mas pela construção de uma nova hegemonia (FRANÇA, 2001). A
economia solidária, segundo a interpretação adotada nesta dissertação, surge neste contexto,
tornando-se um movimento que produz uma racionalidade oposta àquela que orienta o
capitalismo, ou seja, privilegia-se a cooperação em detrimento da competição.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
22
No entanto, entre os autores que estudam o tema (SOUZA SANTOS, 2002;
SINGER, 2001; FRANÇA e LAVILLE, 2004; CATTANI, 2003; GAIGER, 2001) existem
interpretações diferenciadas da economia solidária, partindo de distintas correntes
econômicas, sociológicas e/ou filosóficas. Como em muitos campos da teoria social e
econômica, são adotados diferentes conceitos, levando a um importante debate em torno do
campo conceitual da economia solidária no Brasil e no mundo.
É necessário analisar que a diversidade nas teorizações acerca da economia
solidária difere da conceituação de sociedade civil descrita anteriormente, uma vez que ela
não apresenta uma longa trajetória de estudos, nem tem origens no período grego clássico. O
conceito de economia solidária passa a ser discutido, sob esta denominação, a partir da década
de 1980 (LECHAT, 2002), mesmo tendo sua origem atribuída ao movimento cooperativista
de Rochdale na Inglaterra ou às Associações de Ajuda Mútua na França no século XIX. As
denominações e conceituações acerca da economia solidária, são na maioria das vezes,
diferentes entre si por partirem de realidades sociais e experiências distintas. Contudo, as
características destas experiências possuem um núcleo comum: a idéia da solidariedade
substituindo o individualismo competitivo característico do comportamento econômico
padrão nas sociedades capitalistas. Percebe-se, então, que, em nome desse denominador
comum de natureza política e militante, há um esforço por parte dos diferentes intelectuais do
campo a fim de estabelecer diálogos teóricos e metodológicos que permitam alinhar
minimamente os contornos conceituais da temática.
Entre as diferentes denominações atribuídas à economia solidária temos:
economia popular, economia do trabalho, economia popular e solidária, socioeconomia
solidária, entre outros. Estas denominações, todavia, retratam experiências baseadas na
organização cooperativa ou associativa, de caráter democrático, com a característica da
solidariedade perpassando todas elas. Entre as organizações que fazem parte do campo da
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
23
economia solidária, também conhecidas como empreendimentos econômicos solidários, é
possível citar iniciativas como as associações e cooperativas de trabalhadores rurais e
urbanos, produtores de bens e serviços, centrais de comercialização, empresas
autogestionárias, cooperativas de crédito, clubes de trocas e as organizações que atuam no
campo do chamado comércio justo.
Não obstante, não exploraremos as diferenças conceituais que, conforme relatado,
figuram no campo conceitual da economia solidária. Conceituaremos, no entanto, a filiação
teórica deste trabalho, seguindo uma linha de pensamento em que a economia solidária é
definida como um modo alternativo de produção, que caminha com a sociedade mercantil
(SINGER, 2001), e que este modelo econômico encontraria correspondência nas formas
diversas de produção associativa em que se destacam as cooperativas e as associações. Isto
porque uma das categorias de análise deste trabalho é o conceito de sociedade civil
gramsciana, dotada de autonomia para o desenvolvimento de novas ideologias que podem
contestar a ideologia hegemônica, qual seja, a do modo de produção capitalista atual.
Enfim, o conceito adotado de economia solidária é de Paul Singer (2003), em
documento divulgado pela SENAES, em que apresenta a economia solidária como:
(...) o conjunto de atividades econômicas – de produção, distribuição, consumo,
poupança e crédito – organizadas sob a forma de autogestão, isto é, pela propriedade
coletiva do capital e participação democrática (cada cabeça um voto) nas decisões
dos membros da entidade promotora da atividade. (SINGER: 2003, p. 5)
O autor pondera que esta é a forma mais breve de definir a economia solidária, e
não esgota a caracterização detalhada da mesma. Essas atividades, em seu conjunto, compõem
uma economia dos setores populares, que envolvem, de modo disperso e fragmentado, um
fluxo considerável de produtos, serviços e modalidades diversas de trocas e mercados (SEI,
2004).
No País, o governo federal já acena com políticas públicas de fomento a
empreendimentos solidários com o desenvolvimento de ações sitemáticas da Secretaria
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
24
Nacional de Economia Solidária - SENAES
3
, criada em 2003, como a I Conferência Nacional
de Economia Solidária, ocorrida em junho de 2006, e a criação do SIES – Sistema Nacional
de Informações em Economia Solidária, que publicou o Atlas da Economia Solidária no
Brasil, contendo um amplo mapeamento censitário dos empreendimentos de economia
solidária no Brasil.
O fomento à economia solidária vem sendo desenvolvido também por diversas
instituições, chamadas de entidades de apoio, tais como: universidades, sindicatos, entidades
religiosas, ONG’s, etc. (SINGER, 2002). Dois exemplos entidade de apoio vinculadas às
universidades são: a rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares – ITCP’s
4
e
o BanSol (Associação de Fomento à Economia Solidária) da Escola de Administração da
Universidade Federal da Bahia – UFBA. A Agência de Desenvolvimento Solidário - ADS,
filiada à Central Única dos Trabalhadores – CUT, mobiliza sindicatos para apoiarem
empreendimentos solidários e se empenha na construção de uma rede de crédito solidário. O
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST organiza os assentamentos sob a
forma de cooperativas. Outras instituições que merecem ser citadas são: a Cáritas (da
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB), a FASE do Rio de Janeiro, a ATC em
São Paulo, prefeituras (Blumenau, Porto Alegre, Santo André, etc.), o Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC (SINGER, 2003).
O apoio acontece efetivamente através de capacitação, assistência técnica,
trabalho voluntário, micro crédito, ou até mesmo por doações a fundo perdido. Os dados
demonstram que estes empreendimentos estão se multiplicando, não havendo ainda números
consolidados sobre seu tamanho e importância econômica (SINGER, 2003).
3
Mais informações sobre o processo de constituição da SENAES no site
www.tem.gov.br/economiasolidaria/default.asp.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
25
1.2. OBJETO DE ESTUDO
A economia solidária aparece na sociedade brasileira, em especial, como uma
alternativa de geração de renda e de inclusão social. Devido ao grave contexto de desemprego
do país, as experiências de economia solidária têm tido um grande crescimento quantitativo
ao longo dos últimos anos. Em Salvador, por exemplo, registra-se um boom no surgimento de
empreendimentos econômicos solidários no período que vai de 2000 a 2004, quando são
fundados 22 empreendimentos no município. Os empreendimentos solidários surgem, em
geral, a partir da assessoria de diversas instituições de fomento, como uma alternativa ao
desemprego e à precarização do trabalho. Recebem apoio de diversas instituições de fomento
à economia solidária, cooperação esta que tem propiciado a difusão destes ideais no Brasil.
Como no presente trabalho, analisa-se a ideologia dos empreendimentos
econômicos solidários, utiliza-se a teoria de Gramsci a respeito da ação política a fim de
qualificar o sentido de ideologia política:
(...) a atividade humana central, o meio através do qual a consciência individual é
colocada em contato com o mundo sócil e material, em todas as suas formas
(CARNOY, 1986, p. 89).
A análise tem como foco a qualificação do discurso e da percepção dos atores
envolvidos com a economia solidária. Pretendemos chegar a conclusões acerca do caráter
hegemônico ou contra-hegemônico apresentado no discurso. O discurso hegemônico é
caracterizado pelo predomínio ideológico dos valores e normas burguesas (classes
dominantes), que são os predominantes na economia do sistema capitalista, com base em
trocas mercantis, dominação do econômico sobre o social, entre outros aspectos que
analisamos a posteriori nesta dissertação. Pretendemos investigar se há no discurso a difusão
e realização de uma nova concepção do mundo (BOBBIO, 1986), verificando se esta é, na
4
Existem 18 ITCP´s espalhadas pelas universidades do País em 11 Estados da federação (MG, SP, RJ, BA, PE,
AM, RN, RS, CE, PR e SC). Estas instituições possuem uma rede para troca de informações, ver site:
http://www.itcp.coppe.ufrj.br/.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
26
prática, a concepção de mundo da economia solidária (uma economia com trocas baseadas na
solidariedade, a propriedade coletiva dos meios de produção, entre outros).
A questão norteadora desta dissertação parte da constatação da inexistência de
estudos empíricos voltados para a análise dos marcos referenciais estratégicos fundamentais
que designam a identidade dos movimentos sociais de economia solidária. Não é possível
afirmar que as pessoas que integram as organizações do campo da economia solidária
partilham o mesmo discurso presente no meio acadêmico. Portanto, questiona-se: qual a visão
de mundo que dá sentido e direção ao movimento; qual a sua força efetiva na história; e qual a
sua capacidade de mobilização política. Será o discurso dos integrantes dos empreendimentos
econômicos solidários voltados para uma concepção da economia solidária enquanto modo de
produção alternativo ao modelo hegemônico? Haveria, no discurso deste atores, uma
concepção ampla e abrangente de transformação do modo de produção capitalista?
O primeiro pressuposto do trabalho está aportado na teoria gramsciana a respeito
da sociedade civil. A sociedade civil é tida como um campo onde pode ocorrer a
transformação ideológica (intelectual e moral), a partir do afastamento da influência
ideológica da classe dominante, ou seja, no desenvolvimento de uma atitude crítica que
permita às classes dominadas romper com a unidade estabelecida pela ideologia tradicional.
Portanto, assumimos que há, na sociedade civil, a possibilidade de surgimento de ideologias
que possam ser contrapostas à ideologia dominante (contra-hegemônica). Com isso,
pretendemos investigar se a ideologia do movimento de economia solidária representa um
rompimento com a ideologia dominante.
O segundo pressuposto do trabalho está na concepção, também fundamentada na
teoria gramsciana, de que a direção ideológica é conquistada antes da conquista do poder. A
conquista da direção ideológica assume uma condição essencial para a conquista do poder,
que deve seguir a seguinte ordem: 1. rompimento com a ideologia dominante; 2. elaboração
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
27
da concepção de mundo do grupo dominando; 3. organização e autonomia do grupo
dominado; 4. conquista do poder (domínio) político pelo grupo dominado; 5. exercício e
difusão da nova hegemonia (concepção de mundo) na sociedade. A partir deste pressuposto,
pretende-se investigar se os atores da economia solidária apresentam a característica de
propor e lutar por uma transformação efetiva do modo de produção capitalista, ou seja, se a
sua ideologia política se contrapõe à ideologia do capitalismo.
O terceiro pressuposto parte da idéia de que, assim como no debate conceitual há
uma busca por um consenso a respeito de aspectos práticos e teóricos da economia solidária,
no discurso dos atores da economia solidária há dissenso sobre a sua ideologia política. Com
isso, acredita-se que os resultados da investigação não apontarão para uma única ideologia, de
natureza unitária, no campo da economia solidária.
1.3. A PESQUISA
A economia solidária apresenta-se como uma proposta alternativa para o combate
dos efeitos do capitalismo e tem ganho espaço no cenário brasileiro e mundial, o que é
comprovado pela ampliação da discussão do tema, pelo crescente número de organizações
envolvidas com a temática da economia solidária, seja na implementação de projetos ou no
fomento. Um grande número de grupos têm desenvolvido o debate e a experimentação de
projetos de economia solidária: desde setores de Igreja, organizações da sociedade civil,
movimentos sociais urbanos e rurais, até sindicatos e centrais sindicais, passando ainda por
pesquisadores, intelectuais, militantes socialistas, entre outros. Não se trata, apenas, de uma
reação ao agravamento do desemprego e da pobreza. Na realidade, estamos vivendo, no
Brasil, e em outras partes do planeta, o que Milton Santos (2000) identificou como sendo uma
"nova divisão do trabalho", cujo parâmetro é a “manutenção da vida”. Este processo, segundo
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
28
o autor, vem "dos de baixo", não só dos "pobres", como também "dos indivíduos liberados,
[vem] do pensamento livre que foge do pensamento único (...) da racionalidade dominante".
Portanto, o presente trabalho também justifica-se por explorar um campo ainda
não suficientemente analisado no que se refere à economia solidária – o seu aspecto político.
Há uma tendência, na literatura, em enfatizar os aspectos econômicos, sociais e até culturais,
relegando o aspecto da capacidade de mobilização política a um segundo plano. Acredita-se
que a análise realizada no trabalho, por estar baseada no referencial teórico de Gramsci, não
incorre em dois riscos fundamentais na determinação da totalidade social: o economicismo
(mudanças acontecendo no plano econômico, apenas) e o voluntarismo (mudanças sendo
realizadas no plano da sociedade civil). Acredita-se nesta dissertação, que a análise da
dimensão política da economia solidária é fundamental para a sua futura projeção teórica e
metodológica.
Ainda é possível ressaltar a experiência pessoal da autora, que se envolveu em um
projeto de construção de uma Associação de Fomento à Economia Solidária – o BanSol e, a
partir daí, teve aguçado seu interesse científico pelo funcionamento deste campo. No entanto,
o campo da gestão social, que de regra engloba, nas escolas de administração, estudos sobre a
sociedade civil e a economia solidária, é tradicionalmente muito pouco explorado. Os estudos
em Administração voltam seu foco mormente para organizações privadas e públicas
governamentais. A possibilidade de participar da pesquisa orientada pela professora doutora
Maria Suzana Moura e desenvolvida com apoio do CNPq, intitulada “A gestão de
empreendimentos solidários”, enquanto bolsista de iniciação científica também foi um
incentivador desta exploração mais profunda no campo da economia solidária.
A discussão sobre a ideologia na sociedade civil, também, apresenta-se como uma
justificativa para o desenvolvimento deste trabalho de investigação. Podemos dizer que, desde
a redemocratização do Brasil, o número e a influência de organizações e ações no campo da
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
29
sociedade civil vêm aumentando sensivelmente. Esse fenômeno tem acarretado uma série de
discussões, debates e especulações sobre o papel da sociedade civil para a superação do
modelo de sociedade desigual e competitiva existente. Há, então, uma necessidade de
aprofundar a compreensão deste fenômeno, tendo em vista a diversidade de objetivos e da
interpretação do papel das organizações da sociedade civil na literatura atual.
Assim sendo, o objetivo geral deste trabalho é identificar se os atores dos
empreendimentos econômicos solidários, surgidos em Salvador entre os anos de 2000 e 2004,
interpretam a economia solidária como um modelo alternativo ao capitalismo, apontando para
a superação do modelo de sociedade existente.
O primeiro objetivo específico é verificar, através de fontes bibliográficas, a
formação e o desenvolvimento da economia solidária no Brasil. O segundo objetivo
específico é delinear um perfil dos empreendimentos econômicos solidários em Salvador.
1.4. ESCOLHAS TEÓRICAS E METODOLÓGICAS
Os fundamentos teóricos deste trabalho têm por base o pensamento de Gramsci,
com destaque para os conceitos de ideologia e sociedade civil. A palavra Ideologia tem sido
muito empregada, tanto na linguagem política prática, como na linguagem filosófica,
sociológica e político científica. No entanto, o termo ideologia não teve o mesmo uso ao
longo do tempo. A partir da teoria desenvolvida por Marx em sua obra A Ideologia Alemã,
surge uma distinção entre o significado usado, até então, para este conceito.
O Dicionário de Política (BOBBIO, 1998) estabelece uma distinção entre o
significado forte e o significado fraco de ideologia. Para os autores deste dicionário, o
sentido fraco, em linhas gerais, envolve um conjunto de idéias e de valores referentes à ordem
pública e tem como função orientar os comportamentos políticos coletivos. Já o significado
forte, tem origem no conceito de ideologia de Marx, que é entendido como a falsa
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
30
consciência das relações de domínio entre as classes. Enquanto no significado fraco, a
ideologia é um conceito neutro, que prescinde do caráter eventual e mistificante das crenças
políticas, no significado forte, a ideologia é um conceito negativo que denota precisamente o
caráter mistificante de falsa consciência de uma crença política (BOBBIO, 1998).
Tendo em vista as diferentes acepções do termo de ideologia, destacamos aqui
que não há, na obra de Antonio Gramsci, uma teoria sistemática da ideologia, ou seja, ela não
está evidenciada em seus escritos. Gramsci não chega nem mesmo a utilizar o termo nos
Cadernos do Cárcere, mas emprega outros correlatos como: “filosofias”, “concepções de
mundo” e “formas de consciência”, entre outros. No entanto, há a compreensão, a partir da
interpretação da obra gramciana, de que a ideologia deve ser estudada como uma
superestrutura, e, para entender o “complexo” estrutura/superestrutura, deve-se entender
outros conceitos interligados, que formam a sua base como: hegemonia, sociedade civil,
Estado, partido e intelectuais (HALL e outros, 1983). Neste trabalho, o principal conceito a
ser usado, além do de ideologia, é o de sociedade civil.
O conceito de ideologia ocupa uma posição de extrema importância, apenas
subordinado-se às “concepções políticas em torno das quais o pensamento de Gramsci está
orientado” (HALL e outros, 1983, p. 60). Para Gramsci:
(...) as ideologias não são julgadas segundo um critério de verdade e falsidade, mas
segundo sua função e eficiência em aglutinar classes e frações de classe em posições
de domínio e subordinação (HALL e outros, 1983, p. 63).
Do ponto de vista metodológico, a presente pesquisa tem evidente caráter
qualitativo, buscando trabalhar com fontes secundárias e primárias na análise desenvolvida. A
pesquisa empírica, apresentada no capítulo 4, volta-se para a investigação do universo dos
empreendimentos econômicos solidários surgidos em Salvador, entre os anos de 2000 e 2004.
Opta-se por uma pesquisa qualitativa porquanto realiza-se uma análise dos discursos e das
percepções de integrantes da amostra especificada. Através de um roteiro de entrevista semi-
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 1 – INTRODUÇÃO
Luiza Reis Teixeira
31
estruturado, discutido no capítulo 4, objetiva-se o levantamento de dados que permitam
chegar a conclusões acerca da ideologia política presente no seio dos empreendimentos do
movimento de economia solidária.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
32
2. A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Neste capítulo, estabelecemos um panorama histórico e sócio-político do conceito
de sociedade civil, passando pela sua caracterização na América Latina e no Brasil. Em
seguida, fazemos uma análise interpretativa dos conceitos de ideologia e sociedade civil,
desenvolvidos por Gramsci, principalmente, com o objetivo de estabelecer relações com o
objeto empírico deste trabalho investigativoa ideologia política em organizações de
economia solidária.
Os conceitos desenvolvidos por Gramsci desempenham um papel de fundamental
relevância neste trabalho, uma vez que a sociedade civil – com a capacidade de organização
de discursos - é a esfera em que surge e em que está contextualizado o objeto empírico; além
disso, a ideologia é a concepção de mundo presente em todas as manifestações teóricas e
coletivas, constituindo-se na principal categoria conceitual a ser analisada no repertório
discursivo das organizações de economia solidária. Também será abordado, ao final, o
potencial transformador da sociedade civil gramsciana nos dias de hoje.
Primeiramente, cabe justificar a escolha conceitual do uso de sociedade civil, uma
vez que há uma crescente tendência na literatura nacional e internacional (FALCONER, 1999;
FERNANDES, 1995; FERNANDES, 2003; LANDIM, 1998) em utilizar diferentes termos,
tais como terceiro setor (principalmente), organização não-governamental e sem fins
lucrativos (para referir-se às ONGs), filantrópicas (mais utilizado para fundações), sociais,
solidárias, independentes, assitenciais, de base, associativas, etc. (FALCONER, 1999). Tais
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
33
termos designam o conjunto de práticas, crenças, relações sociais e alianças institucionais
particulares que ocorrem no âmbito da sociedade civil. Vale ressaltar que autores como Alves
(2002) e França (2001) destacam que o uso de cada um desses termos pode variar de acordo
com os contextos específicos da realidade de surgimento de cada um, muito embora, na
maioria das vezes, sejam usados indiscriminadamente como se fossem sinônimos.
O termo que mais tem sido utilizado na literatura, e conseqüentemente tem tido
maior divulgação na mídia ou em manuais de organismos internacionais, é o de “Terceiro
Setor”. As principais publicações consultadas sobre o assunto no Brasil (FERNANDES,
1995; LANDIM, 1998; FALCONER, 1999) creditam a disseminação deste termo ao processo
de internacionalização dos estudos sobre organizações não lucrativas e voluntárias, ocorrido a
partir da década de 90.
No entanto, as definições encontradas para este termo na literatura brasileira são
muito amplas e tendem a relegar o conceito de sociedade civil. Fernandes (1994) definiu o
“Terceiro Setor” como o setor responsável pela produção de bens públicos, a exemplo da
conscientização para os direitos da cidadania, a prevenção de doenças transmissíveis ou a
organização de ligas esportivas. Para Falconer (1999), este é o termo que vem encontrando
maior aceitação para designar o conjunto de iniciativas provenientes da sociedade civil. É
bem verdade que o autor não explicita em que meios (escolas do pensamento, imprensa,
grupos disciplinares) se dá este processo de aceitação a que se refere. Landim (1998), por sua
vez, apesar de não aprofundar seus estudos no conceito de “Terceiro Setor”, ao descrever a
história das ONGs – organizações privadas de sentido público – afirma, em uma breve
observação, que o debate sobre o “controverso” terceiro espaço, é importado para o Brasil na
década de 90, e que, neste debate, a idéia de sociedade civil estava relacionada à redefinição
do papel do Estado, conforme o trecho transcrito a seguir:
(...) como se sabe, sobre o pano de fundo de questões como a redefinição do papel
do Estado e a predominância da lógica do mercado, a crise do socialismo real e das
ideologias, a descrença nas instituições representativas tradicionais, etc. (LANDIM,
1998, p. 235).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
34
Cabe, aqui, uma breve contextualização da citada “importação” do termo. Qual
seria a origem do termo “Terceiro Setor”? Ele surge nos Estados Unidos, que tem a tradição
de um nonprofit sector
1
firmemente enraizada, que já chamara a atenção de Tocqueville, ao
publicar no século XIX, “A democracia na América”. Os primeiros estudos nesta área datam
de 1960; no entanto, foi na década de noventa que a maior parte da produção existente se
desenvolveu, chegando a alcançar alguma atenção de autores do chamado mainstream da
Administração, como Philip Kotler e mesmo Peter Drucker, que é tido como um dos pais das
teorias da Administração moderna (FALCONER, 1999).
Alves (2002) relata as primeiras obras que retrataram o termo: The Untapped
Potential of the ‘Third Sector, de Amitai Etzioni, artigo publicado em 1972 na revista
Business and Society Review, defendendo uma mudança de orientação da política social do
governo Nixon que, em sua opinião, ao invés de privilegiar o setor lucrativo na provisão de
serviços sociais, deveria incentivar a criação e o fomento de organizações privadas sem fins
lucrativos para tanto; The Third Sector: new tactics for a responsive society, de Theodore
Levitt publicado em 1973; Giving in America: toward a stronger voluntary sector, livro
publicado pela Comission on Private Philanthropy and Public Needs, em 1975; The
Endangered Sector, de 1979; e The Third Sector: keystone of a caring society, de 1980, sendo
estes dois últimos livros de Waldemar Nielsen.
No entanto, Alves (2002) ressalta que o John Hopkins Nonprofit Sector Project
foi responsável pela divulgação do termo em diversos países do mundo, através de pesquisas
desenvolvidas sobre o tema em países com realidades distintas, desde o Paquistão, a África do
Sul, à Coréia do Sul:
(...) deve-se ao John Hopkins Nonprofit Sector Project o ‘renascimento’ do termo
‘Terceiro Setor’ ou, pelo menos, a divulgação uniforme da expressão para todo o
mundo (ALVES, 2002, p. 6).
1
Non profit sector: setor não lucrativo.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
35
No Brasil, a trajetória dos estudos sobre o “Terceiro Setor” não foi diferente,
muito embora o crescimento das publicações sobre o tema tenha ocorrido na década de 90.
Aqui, eles não surgem no bojo da chamada crise do Estado-providência, mas no momento de
integração da economia do país ao mercado da globalização sob controle dos programas de
ajuste estrutural. O que há de coincidente entre os anos 70 nos Estados Unidos e o Brasil dos
anos 90 pode ser resumido à necessidade, por razões diferentes nos dois contextos históricos,
de reconsiderar o papel do Estado na economia e na sociedade.
Em 2004, foi publicado um estudo por Edson Sadao Izuka e Hironobu Sano
(2004) no encontro da ANPAD, Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Administração, que visava a analisar a produção acadêmica na área do Terceiro Setor, a partir
de uma revisão dos artigos publicados no mesmo encontro entre os anos de 1990 a 2002,
tendo em vista que a área da Administração seria predominante nos estudos sobre o tema,
concentrando 43,8% das publicações registradas no sistema PROSSIGA do CNPq, seguida
pela área da Ciência Política com 13,2% e Sociologia com 12,4% das publicações (IZUKA e
SANO, 2002 apud ALVES, 2004). Este estudo fez alguns levantamentos interessantes. Entre
eles, que os primeiros esforços acadêmicos para compreensão da temática do “Terceiro Setor”
datam de 1994, com a inauguração de centros de estudo da temática nas principais instituições
de ensino superior no âmbito de cursos de administração e negócios, a exemplo do Centro de
Estudos do Terceiro Setor (CETSFGV/EAESP), criado em 1994; o Núcleo Interdisciplinar de
Pesquisas e Estudos sobre Terceiro Setor (NIPETS-UFRGS), criado em 1997; o Centro de
Empreendedorismo Social e Administração do Terceiro Setor (CEATS–USP), criado em
1998; o Núcleo de Estudos em Administração do Terceiro Setor (NEATS-PUC/SP), criado
em 1998, entre outros. Outras iniciativas relacionadas ao Terceiro Setor também são lançadas
neste período: o GIFE, Grupo de Institutos, Fundações e Empresas, criado em 1995; o Prêmio
FENEAD de projetos sociais para estudantes de administração lançado em 1996; o Instituto
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
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Ethos de Responsabilidade Social criado em 1998. No entanto, mesmo com a criação destes
centros, apenas no ano de 1997
2
há a publicação de cinco artigos sobre o tema no encontro da
ANPAD, totalizando 37 até o ano de 2003, correspondendo a 1,1% dos artigos publicados no
encontro (IZUKA e SANO, 2004).
Na Bahia, desenvolveu-se um programa específico para a área de gestão social a
partir de 2001, culminando com a fundação do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e
Gestão Social (CIAGS). Este Centro nasceu da demanda dos gestores sociais participantes do
Programa ONG Forte
3
, para a existência de um espaço na Universidade que pudesse prestar
assessoria a organizações atuantes no campo social. Dessa forma, em 2003 o CIAGS abriu “as
portas” com títulos bibliográficos sobre a temática (gestão social, economia solidária,
cooperativismo, tecnologias sociais, responsabilidade social, gestão ambiental, etc),
computadores com acesso a Internet para realização de pesquisa em bases de dados, e uma
equipe de apoio.
Os autores deste estudo também registraram que o aumento de iniciativas e
pesquisas sobre a temática em questão não garante a construção de um consenso sobre o
assunto, uma vez que “não há uma clareza sobre os conceitos utilizados” (IZUKA e SANO,
2004, p. 2). Para eles, há uma lacuna no que se refere à reflexão teórica e crítica do assunto,
uma vez que os artigos voltam-se para a chamada profissionalização do “Terceiro Setor”, ou
para a razão instrumental, o que é tido como algo contraditório para um campo que tem como
objetivo transformar a realidade social. Ainda no conjunto de críticas ao estado da arte das
publicações sobre o chamado “Terceiro Setor”, vale ressaltar o fato de ele ser tratado como
algo novo e a falta de diálogo com os campos da Ciência Política e Administração Pública,
como mostra um dos questionamentos finais do artigo: “em que medida os acadêmicos
2
Antes de 1997 não foi registrado nenhum artigo publicado sobre a temática do Terceiro Setor.
3
Programa em parceria com a Secretaria de Combate a Pobreza do governo do estado da Bahia, que contava
com um curso de extensão em gestão social, oferecido a 30 alunos e 150 gestores sociais da Região
Metropolitana da Salvador, seguida da residência social, em que os alunos faziam um estágio nas organizações
envolvidas.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
37
dedicados à temática do Terceiro Setor estão negligenciando uma análise mais crítica sobre o
governo, mercado e a própria sociedade civil?” (IZUKA e SANO, 2004, p. 12).
Por conseguinte, a presente dissertação segue um caminho teórico condizente com
o questionamento citado e assume uma postura crítica, também partilhada por França (2001,
p. 52) que afirma “que o termo terceiro setor é herdeiro de uma tradição anglo-saxônica
impregnada pela idéia de filantropia”. O autor ainda compara o termo a uma ponta de iceberg,
muito pouco amplo para a diversidade de experiências não-governamentais e não-mercantis
na América Latina. Outro autor cujo posicionamento sobre o assunto compartilhamos é
Montano (2003): ao abordar o termo, ele parte de uma análise do processo de reestruturação
do capital após a década de 70, quando se passa a seguir orientações neoliberais de
flexibilização dos mercados, das relações de trabalho, da produção, do investimento
financeiro e do afastamento do Estado de suas responsabilidades sociais. Para ele, o “Terceiro
Setor” – também utilizado entre aspas em sua obra – é um conceito ideológico portador da
função de encobrir e desarticular o real, pois tem sua origem ligada tanto a visões
segmentadoras da realidade social, quanto apresenta uma forte funcionalidade com o atual
processo de reestruturação do capital, particularmente no que refere ao afastamento do Estado
das suas responsabilidades de respostas às seqüelas da questão social.
Tendo em vista que o campo conceitual, semântico e político que envolve ações
estratégicas e expressões simbólicas do chamado “Terceiro Setor” parece estar em disputa
conceitual, resulta-nos a necessidade a nosso ver imperiosa de revermos, neste capítulo, as
bases conceituais para o uso da categoria de sociedade civil.
2.1. HISTÓRICO DO CONCEITO DE SOCIEDADE CIVIL
Assim como o termo “Terceiro Setor”, o conceito de sociedade civil tem sido
amplamente disseminado nos dias de hoje. Seja no nível do senso comum, da linguagem da
mídia, ou do imaginário político das sociedades contemporâneas, a sociedade civil, segundo
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
38
Nogueira (2003), é um dos conceitos da teoria social contemporânea que mais gera
controvérsias, além de ter perdido a precisão, uma vez que é empregado pelas mais variadas
correntes político-filosóficas, que muitas vezes utilizam a mesma palavra referindo-se a
sentidos distintos.
A sociedade civil serve para que se faça oposição ao capitalismo e para que se
delineiem estratégias de convivência com o mercado, para que se proponham
programas democráticos radicais e para que se legitimem propostas de reforma
gerencial no campo das políticas públicas. Busca-se apoio na idéia tanto para
projetar um Estado efetivamente democrático como para se atacar todo e qualquer
Estado. É em nome da sociedade civil que muitas pessoas questionam o excessivo
poder governamental ou as interferências e regulamentações feitas pelo aparelho de
Estado. Apela-se para a sociedade civil com o propósito de recompor as “virtudes
cívicas” inerentes à tradição comunitária atormentada pelo mundo moderno, assim
como é para ela que se remetem os que pregam o retorno dos bons modos e dos bons
valores. É em seu nome que se combate o neoliberalismo e se busca delinear uma
estratégia em favor de uma outra globalização, mas é também com base nela que se
faz o elogio da atual fase histórica e se minimizam os efeitos das políticas
neoliberais. Muitos governos falam de sociedade civil para legitimar programas de
ajuste fiscal, tanto quanto para emprestar uma retórica modernizada para as mesmas
políticas de sempre, assim como outros tantos governos progressistas buscam
sintonizar suas decisões e sua retórica com as expectativas da sociedade civil. Em
suma, o apelo a essa figura conceitual serve tanto para que se defenda a autonomia
dos cidadãos e a recomposição do comunitarismo perdido, como para que se
justifiquem programas de ajuste e desestatização, nos quais a sociedade civil é
chamada para compartilhar encargos até então eminentemente estatais
(NOGUEIRA, 2003, p. 186).
Para Cohen e Arato (1992) os modelos políticos que usam o conceito de sociedade
civil atualmente são contraditórios entre si e pobres em categorias. Além disso, os mesmos
autores alegam que suas ligações com a tradição histórica de pensamento ao qual se vinculam
tais modelos não são claras e muitas vezes até, inexploradas, deixando lacunas no que tange à
adaptação para a sociedade moderna.
Antes de iniciar o histórico de sociedade civil, cabe uma breve explicação sobre a
grande dicotomia que a categoria de sociedade civil consubstancia com a de Estado. Para
Bobbio (2001), as grandes dicotomias servem para delimitar, representar e ordenar o campo
das investigações, a exemplo de alguns conceitos das ciências sociais, tais como, paz/guerra,
democracia/autocracia e sociedade/comunidade. Para o filósofo italiano, uma grande
dicotomia tem as seguintes características:
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
39
a) tem a capacidade de dividir um universo em duas esferas – “o ente
compreendido na primeira não pode ser contemporaneamente compreendido na segunda” (p.
13);
b) tem a capacidade de:
(...) estabelecer uma divisão que é ao mesmo tempo total, enquanto todos os entes
aos quais atualmente e potencialmente a disciplina se refere devem nela ter lugar, e
principal, enquanto tende a fazer convergir em sua direção outras dicotomias que se
tornam, em relação a ela, secundárias (BOBBIO, 2001, p. 13 e 14).
A definição de sociedade civil tem sido feita ao longo dos anos através da negação
da definição de Estado, ou seja, a sua definição está na “esfera das relações sociais não
delimitadas pelo Estado” (BOBBIO, 2001, p. 33), o que lhe confere um caráter negativo, ou
seja, de negação ao Estado. Portanto, para o entendimento do conceito de sociedade civil, é
preciso saber qual a delimitação do conceito de Estado adotado. Em linhas gerais, é possível
delimitar o que Bobbio (2001) denominou de acepções para o entendimento do conceito com
base na identificação do conceito de sociedade civil em sua relação com o Estado. O conceito
de sociedade civil pode, por exemplo, ser equivalente ao conceito de Estado, se estivermos
nos referindo ao primeiro conceito desenvolvido por Aristóteles na antiguidade, conforme
veremos no parágrafo seguinte. Se estivermos falando da tradição jusnaturalista, veremos que
a concepção da sociedade civil representa um momento pré-estatal, uma vez que as teorias
são desenvolvidas tomando como ponto de partida uma fase anterior à criação do Estado, o
“estado de natureza”. Já em Hegel e Marx, malgrado as diferenças entre os conceitos
desenvolvidos pelos dois autores, é possível constatar que o conceito de sociedade civil
apresenta uma acepção anti-estatal, uma vez que pela primeira vez o conceito aparece como
sendo independente do Estado. Em Gramsci, como veremos em detalhe a seguir, o conceito
de sociedade civil apresenta uma acepção pós-estatal, uma vez que representa uma esfera
dotada de ideologia e capaz de interferir através da obtenção de hegemonia, na estrutura do
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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Estado (BOBBIO, 1982; ANDION e SERVA, 2004). A seguir veremos detalhadamente os
principais autores que desenvolveram conceitos de sociedade civil.
Em sua origem, o conceito de sociedade civil começa a ser desenvolvido na
Antigüidade com o pensador grego Aristóteles, o que afasta a possibilidade do conceito ser
refrenciado como algo novo, mesmo tendo em vista seus diferentes usos e interpretações nos
dias de hoje. O que se pretende esclarecer aqui é que, por mais que existam diversos usos do
conceito – para embasar diferentes correntes filosóficas, eles têm raízes em uma tradição de
pensamento que se iniciou com as primeiras teorizações acerca do funcionamento da
sociedade política. A historização do termo tem por objetivo esclarecer a sua evolução, como
ela reflete os usos que encontramos nos dias de hoje, e por fim, determinar o nosso
posicionamento conceitual neste trabalho. Para Cohen e Arato (1992) a historização do
conceito pode ajudar a aprofundar o entendimento dos modelos conceituais relevantes em uso
na atualidade, além de corroborar a distinção entre conceitos pré-modernos e modernos, o que
ajuda a reconhecer discursos incoerentes com a configuração da sociedade civil moderna.
Partiremos então, do conceito de sociedade civil desenvolvido por Aristóteles, de
Politike koinonia
4
, que foi posteriormente traduzido como respublica ou também societas
civilis em latim; contudo ressaltamos que é preciso ser criterioso em sua reutilização na
configuração da sociedade civil no Estado moderno. O autor Koselleck (1992), por exemplo,
argumenta que cada palavra remete a um sentido, que por sua vez indica um conteúdo. Para
ele a palavra pode permanecer a mesma, mas o conteúdo por ela designado pode ser alterado
substancialmente, a depender do momento em que o termo é empregado.
O que portanto é uma societas civilis depende do momento em que o termo é
empregado, se no primeiro ou quarto século depois de Cristo. Isto significa assumir
sua variação temporal, por isso mesmo histórica, donde seu caráter único (einmalig)
articulado ao momento de sua utilização (KOSELLECK, 1992, p. 5).
4
Politike koinonia significa sociedade política ou comunidade.
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41
Aristóteles, ao formular o conceito de Politike koinonia, partia da experiência da
realidade da polis grega e de sua comunidade de cidadãos na Atenas do século V antes de
Cristo. A definição de sociedade civil em Aristóteles correspondia a uma comunidade ética e
política de cidadãos livres e iguais sobre um sistema de regras legalmente definidos. Contudo,
o significado de sociedade civil na Antigüidade, e mais especificamente na realidade Grega,
era permeado de algumas distinções que não fazem mais sentido no modelo de sociedade
moderna. Entre as distinções no funcionamento da sociedade Grega para a sociedade
Moderna, podemos citar a ausência de distinção entre Estado e sociedade (polis e oikos), uma
vez que o oikos (famílias) era tido como uma categoria residual, um pano de fundo da polis. O
oikos era uma entidade não reconhecida legalmente, e regulada por regras despóticas. Além
do oikos, havia o conceito de koinonia (comunidade) representando todas as formas de
associação, ou seja, havia uma distinção sobre os tipos de regulação a serem pensados de
acordo com os conceitos de sociedade e comunidade
5
. A noção de Politike koinonia, no
entanto, já trazia elementos da sociedade civil moderna, tais como, a pluralidade de formas de
interação, associação e vida em grupo (COHEN e ARATO, 1992).
É importante reconhecer que Aristóteles inicia uma tradição na filosofia política, e
que sua teoria sobre sociedade civil tem grande influência para os pensadores que
continuaram a teorizar sobre o tema no decorrer do tempo. Primeiramente, vale citar os
romanos, que, como foi explicitado anteriormente, fizeram a tradução do termo para o latim, e
adaptaram a teoria para a realidade romana. Em seguida, podemos citar os pensadores da
época medieval, a exemplo de William de Moerbeke, Leonardo Bruni, que fizeram traduções
de Aristóteles, além de Alberto Magno e Thomas de Aquino, que viveram em uma época de
difícil adaptação do termo no sentido original, uma vez que as cidades-estado medievais não
5
A distinção entre sociedade (Gesellschaft) e comunidade (Gemeinschaft) é retomada pelo sociólogo alemão
Ferdinand Tönnies, no século XIX. Na comunidade, as formas de organização social são reguladas por uma
solidariedade natural ou espontânea, sob a ótica de objetivos comuns. A sociedade (moderna) é fundada na razão
e na utilidade da relação social (TONNIES, 1944).
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contavam com esta categoria de pessoas organizadas de forma coletiva para consecução de
objetivos predeterminados, salvo as cidades-estado italianas, que tinham uma soberania maior
– premissa para o funcionamento da sociedade civil grega. Contudo, o uso do conceito grego
de sociedade - societas civilis res publica, apesar de distância do sentido original, foi utilizado
na época medieval para referir-se às unidades de soberania, aos reinos medievais e aos
impérios. Outro uso do termo também adotado na sociedade medieval foi para designar o
estado dual característico do feudalismo, em que sociedade civil ou política era formada pelo
príncipe em contraposição ao povo ou nação (COHEN e ARATO, 1992).
O desenvolvimento do absolutismo é tido como um divisor de águas entre o
significado de sociedade civil tradicional e moderno. Primeiramente, porque houve a evolução
da autoridade, que deixou de ser fragmentada entre senhores feudais e igreja, como no
feudalismo clássico passando para o príncipe monopolista que possuía legitimidade para o uso
da violência. Outro fator transformador do conceito de sociedade civil no período de transição
da sociedade medieval para sociedade moderna foi a manutenção da sociedade estamental do
feudalismo, que passou a coexistir com novas formas de organização social surgidas no
período de transição para o sistema capitalista, mormente como a classe burguesa e a religião
protestante. A novidade é que as novas formas de organização social passam a fazer oposição
ao Estado, algo que até então não existia. (COHEN e ARATO, 1992).
É nesta fase de transição entre o medievo e o moderno que começam a ser
delineadas as principais teorias sobre sociedade civil e o Estado. Bobbio (1982) divide as
teorias e autores de sociedade civil moderna em cinco grandes correntes: teorias realistas,
jusnaturalistas, filosofia do direito de Hegel, teoria marxista e teoria gramsciana, conforme
veremos a seguir.
Cronologicamente, a primeira grande corrente de pensamento corresponde às
teorias realistas, que tem início com Maquiavel, e vai até os primeiros teóricos do Estado.
Nesta corrente, o Estado é descrito tal como está configurado, e não há a tentativa de
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descrição de um Estado idealizado. Maquiavel viveu no século XVI e é considerado o
primeiro pensador do Estado Moderno. Ele viveu durante o momento de transição do
feudalismo para a formação do Estado-nação na Itália, país marcado por uma grande
fragmentação e dificuldade em se constituir em Estado Nacional, diferente de outros países
europeus, como a França, Inglaterra, Espanha e Portugal. Seus escritos partiam de sua
experiência política e descreviam os meios que um monarca absolutista devia seguir para
conquistar o poder e conservá-lo. A força centralizadora do Estado era tida como algo de
primaz importância. Baseado nas teorias do direito divino dos reis e no correspondente dever
da obediência passiva, a sociedade civil em Maquiavel tem um papel de obediência e servidão
aos monarcas (CROSSMAN, 1986).
Maquiavel, em seu livro “O Príncipe”, descreve as relações que o Príncipe deve
manter com duas categorias distintas da sociedade: o povo e os magnatas. Ele descreve que
nas cidades existem duas forças contrárias: a primeira seria o fato de o povo não desejar ser
dominado ou oprimido pelos grandes, ao passo que a segunda corresponderia ao desejo dos
grandes em dominar e oprimir o povo. E destas duas forças opostas surge, nas cidades ou o
principado, ou a liberdade ou a anarquia. Ele considera as mais diversas possibilidades com
que um monarca pode se defrontar ao chegar ao poder, tendo o povo e os magnatas a seu
favor e/ou contra. E descreve como agir nas mais diversas combinações: com o povo contra e
os magnatas a favor, com o povo a favor e os magnatas contra, e assim por diante. Diz que ter
os magnatas a favor é bom para o Príncipe, pois são bons conselheiros, e que se deve evitar
qualquer forma de revolta do povo. Maquiavel, assim, segue descrevendo como fazer para ter
o apoio dessas duas categorias da sociedade (MAQUIAVEL, 1967). Apesar da servidão e
obediência que caracterizam a sociedade em sua relação com o monarca, já é possível, nos
escritos do filósofo florentino, distingui-la da sociedade política.
A segunda corrente descrita por Bobbio (1982) é das teorias jusnaturalistas, da
qual fazem parte Hobbes, Locke, Rousseau e Kant como os principais teóricos. Nesta
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corrente, há a proposição de modelos ideais de Estado, que delineiam como o Estado deveria
ser para alcançar o próprio fim, o que Bobbio (1999) vai chamar de sociedade civil pré-
Estatal, uma vez que se acredita que antes da criação do Estado existia o “estado de natureza”,
onde os indivíduos associavam-se para a satisfação de interesses variados. O estado de
natureza era tido como um estado primitivo da humanidade em que o homem vivia sem outras
leis a não ser as normas naturais. Na sociedade de natureza, onde o homem egoísta era o
principal sujeito, havia a predominância da competição entre os indivíduos. Ao estado de
natureza restava, portanto, a instituição de um poder comum para garantir à sociedade bens
fundamentais como paz, liberdade, segurança, que estariam sempre ameaçados no Estado de
natureza (BOBBIO, 1998).
Outra característica comum aos clássicos jusnaturalistas é a contraposição feita
entre sociedade civil (societas civilis) e sociedade natural (societas naturalis), que aparece
como sinônimo de sociedade política, derivada de civitas e polis, ou seja, de Estado. Portanto,
ainda sobre os jusnaturalistas, Bobbio (1982) afirma:
O Estado pré-estatal ou natural não é um estado a-social, ou seja, de guerra perpétua,
mas uma primeira forma de estado social, caracterizado pela predominância de
relações sociais reguladas por leis naturais (...) (BOBBIO, 1982, p. 27).
A teoria desenvolvida por Hobbes é considerada uma teoria aristocrática, uma vez
que ele não tinha o mesmo perfil de Maquiavel com experiência na atuação política. Ele
professava um materialismo mecanicista, pois considerava que a natureza do homem seria
composta de razão e paixão, e a força que move os seres humanos seria a paixão. Ele
considerava que o homem é o campo de batalha de suas contraditórias paixões e que por isso
o homem estaria em perene estado de guerra. Para por fim a este conflito, a razão poderia
elaborar regras de comportamento, as leis da natureza. Em sua concepção, portanto, o Estado,
e não a sociedade, surge através de um contrato social, em que cada indivíduo renuncia a seus
direitos de defesa própria em favor do Estado, que deve ser pleno e onipotente. O soberano,
por sua vez, precisa colocar-se acima da lei e ser a sua fonte, deve manter o controle das
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forças armadas, ter poder sobre toda a propriedade, controlar a opinião pública e ter igreja
como sua subordinada. Para ele, a sociedade nasceria com a formação do Estado, que teria à
frente um soberano, o Leviatã (CROSSMAN, 1986).
Para Cohen e Arato (1992), Hobbes deixa de retratar a noção de sociedade civil
em sua teoria, o que vem de encontro com Whitehead (1999); este esclarece que, ao citar o
termo sociedade civil em sua obra, Hobbes referia-se ao conceito de cidade ou união, uma vez
que não deveria haver multiplicidade de vontades, já que os cidadãos haviam aberto mão de
suas vontades individuais em prol de uma vontade coletiva, para a manutenção da paz e
defesa comum. Para Hobbes, a criação de uma sociedade civil não iria abolir os medos e
perigos existentes no “estado de natureza”, pois mesmo que tais perigos fossem superados
haveria sempre o risco de regressão para uma comunidade não social, e por este motivo o
construto artificial representado pela sociedade civil continuaria existindo (WHITEHEAD,
1999).
Locke, por sua vez, apresenta um perfil diferente de Hobbes (por ter sido um
homem de negócios) e de Maquiavel (pois escreveu sob a ótica burguesa). Ele acreditava no
homem livre e igual vivendo em estado de natureza, mas que o contrato social realizaria a
passagem do estado de natureza para o estado civil. A propriedade é considerada em sua
teoria um direito natural do indivíduo que não poderia ser violada pelo Estado, assim como o
trabalho é considerado o fundamento da propriedade. O objetivo principal da união e
submissão dos homens aos governos é a manutenção de sua propriedade. Locke, além de ter
sido o primeiro autor da corrente que veio a ser chamada de liberal, defendeu a democracia,
porquanto para ele o governo deveria ser escolhido pela maioria. Locke pensava na
organização do governo em três poderes: o legislativo – escolhido pela maioria e superior aos
demais, o poder executivo e o poder federativo (CROSSMAN, 1986). Locke foi, portanto, o
primeiro autor a estabelecer uma distinção entre a sociedade civil e a sociedade política do
Estado (COHEN e ARATO, 1992).
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A teoria de Emmanuel Kant aproxima-se muito da concepção de Locke, o que faz
com que Bobbio (1982), por exemplo, faça referência ao modelo Locke-Kant. Kant reafirma a
separação entre sociedade civil e Estado, e a propriedade, direito da sociedade civil em que o
Estado não deve interferir, mas garantir o livre exercício (NUNES, 2000). Kant destacou-se
bastante, tendo grande influência ainda nos dia de hoje ao idealizar a sociedade civil
universal, baseada em direitos humanos universais (COHEN e ARATO, 1992).
Embora Kant afirme a soberania do povo, o sufrágio universal de sua teoria acaba
sendo um pouco restrito, uma vez que distingue os cidadãos em duas categorias: os
independentes (proprietários) e os não independentes, que não deveriam ter direito de voto, ou
de serem eleitos. Convém, no entanto, destacar, mais uma vez, a importância do
universalismo na sociedade desenvolvido por Kant, haja vista a sua influência sobre autores
contemporâneos, por exemplo, David Held que concebe o conceito de cidadania cosmopolita
com nítida inspiração kantiana (HELD, 1997).
Rousseau segue uma linha que faz oposição ao racionalismo característico de sua
época, como nos autores já citados. Para ele, a sociedade civil não é uma construção ideal,
mas uma realidade. Sua concepção de estado de natureza também difere bastante, uma vez
que o homem no estado de natureza estaria sem moralidade, mas também sem maldade. Para
ele, o homem teria sido corrompido pela propriedade, uma vez que esta introduzira a
desigualdade e a diferenciação entre o rico e o pobre (CARNOY, 1988).
O primeiro homem que após cercar um pedaço de terra, se lembrou de dizer: isto é
meu, e encontrou pessoas simples o bastante para acreditarem nele, foi o verdadeiro
fundador da sociedade civil. Quantos crimes, quantas guerras, quantos assassinatos,
quantas desgraças e horrores teria poupado para espécie humana aquele que
arrancando as estacas ou atulhando o fosso, tivesse gritado aos seus semelhantes:
guardai-vos de ouvir este impostar; estais perdidos se vos esqueceis de que os frutos
da terra pertencem igualmente a todos nós, e de que a própria terra é de ninguém!
(ROUSSEAU, 1987, p. 211-212 apud CARNOY, 1988, p. 31).
Para Rousseau, a formação da sociedade civil foi produto da voracidade do
homem que percebeu as vantagens que alguns poderiam ter com a propriedade, que teve como
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conseqüência a devastação das florestas para dar lugar a campos de colheitas, à escravidão e à
miséria. A formação da sociedade civil teria tido como objetivo a proteção dos direitos dos
ricos, que estariam preocupados em assegurar a posição de classe dominante. Rousseau não
era a favor do laissez faire, pois acreditava que o Estado deveria interferir na sociedade para
garantir a igualdade social. Ele ainda defendeu a soberania do povo, com limites para o
exercício do poder do Estado (CARNOY, 1988).
A terceira corrente sinalizada por Bobbio (1982) é a filosofia do direito,
desenvolvida por Hegel, também denominada de movimento histórico real. Esta é considerada
uma teoria pré-marxista, pois foi o ponto de partida para dois conceitos marxistas distintos de
sociedade civil: o do próprio Marx e o de Gramsci. Para Cohen e Arato (1992) Hegel é um
autor muito representativo, primeiro pelo caráter sintético do seu trabalho e segundo porque
ele foi o primeiro e também o autor que teve maior êxito ao desenvolver uma teoria sobre
sociedade civil altamente diferenciada e de ordem social complexa. A teoria elaborada por
Hegel é tida como um esquema prescritivo e descritivo, ao articular a concepção herdada da
tradição aristotélica republicana baseada nos pilares da vida ética e liberdade pública, com o
conceito de liberdade do indivíduo moderno. Para o conceito de liberdade, Hegel aproveitou a
tradição da lei natural e universalidade de Kant, estabeleceu a distinção entre sociedade civil e
Estado, estabelecendo interpenetração entre eles, além de definir que a sociedade civil era o
lugar da civilização material (COHEN e ARATO, 1992).
O conceito desenvolvido por Hegel pode ser visto por dois ângulos diferentes em
relação ao conceito posteriormente desenvolvido por Marx. Ele pode ser considerado mais
amplo, pois não inclui apenas a esfera das relações econômicas e a formação de classes, mas
também a administração da justiça e o ordenamento administrativo e corporativo. Outrossim,
pode também ser considerado mais restrito, porque a sociedade civil constitui o momento
intermediário entre família e Estado, não incluindo, portanto, todas as relações e instituições
pré-estatais.
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Na teoria hegeliana, a racionalidade do Estado é uma realidade, um evento na
história, mas não um ideal. Hegel, em sua teoria, quebra com a tradição jusnaturalista, uma
vez que o Estado é considerado uma conservação e superação da sociedade pré-estatal,
portanto, um modelo novo, ou seja, não é um aperfeiçoamento como em Locke e Kant, nem
uma negação absoluta, como em Hobbes e Rousseau, mas uma alternativa. Hegel acredita nos
princípios da liberdade natural e do Estado de direito.
A sociedade civil hegeliana é considerada “a diferença que se interpõe entre a
família e o Estado” (HEGEL, 1991, apud ALVES, 2004, p. 145). Hegel também enfatiza o
papel das corporações na disseminação do sentido de comunidade entre os indivíduos. Outro
autor que segue esta linha de pensamento, Keane (1998), define sociedade civil como:
Uma categoria típica ideal (um tipo ideal no sentido de Max Weber) que descreve e
vislumbra um conjunto complexo e dinâmico de instituições não-governamentais
protegidas juridicamente, que tendem a ser não-violentas, auto-organizadoras, auto-
reflexivas, e permanentemente em tensão entre si e entre as instituições de Estado
que ‘enquadram’, restringem e permitem suas atividades (KEANE, 1998, p. 6, apud
ALVES, 2004)
A racionalização do Estado é um modelo dicotômico que contrapõe “o Estado
enquanto momento positivo à sociedade pré-estatal ou anti-estatal, degradada a momento
negativo” (BOBBIO, 1982, p.20). Pode-se dizer que “o Estado hegeliano contém a sociedade
civil” (BOBBIO, 1982, p. 21). Em Hegel, a sociedade civil é a historização do estado de
natureza. A sociedade civil é como uma sociedade pré-política, ou seja, “a fase da sociedade
humana que até então era chamada de sociedade natural” (BOBBIO, 1982, p. 28).
A quarta corrente retratada é o modelo de Marx e Engels, em que o Estado não é
a superação da sociedade civil, mas reflexo dela. Marx parte da teoria desenvolvida por Hegel
e preserva seu arcabouço conceitual; contudo, em sua interpretação o conceito de sociedade
civil acaba sendo reduzido à esfera das relações econômicas, quando o sentido atribuído por
Hegel à sociedade civil é mais amplo, abrangendo também a regulamentação externa estatal
dessas relações (BOBBIO, 1998).
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Outro autor que também descreve sobre as diferenças entre a teoria hegeliana e a
marxista é Coutinho (1987). O autor toma como ponto de partida o jovem Marx, que tem nos
seus primeiros estudos sistemáticos o exame da temática do Estado moderno. Marx toma o
postulado de Hegel, segundo o qual o mundo da sociedade civil seria o reino dos indivíduos
atomizados e particularistas, mas vai além de Hegel mostrando o caráter puramente formal
dessa universalidade. Para ele o homem da sociedade moderna está dividido em sua própria
vida real entre interesses privados e particularistas, e como conseqüência o Estado apenas
aparenta ser o representante do interesse geral, o que não passa de uma máscara para ocultar a
dominação de uma casta burocrática que defende apenas os seus próprios interesses. Emerge
então a idéia do Estado de classe, como uma entidade particular, que em nome de um suposto
interesse universal, defende os interesses comuns de uma classe particular. E este Estado de
classe despolitiza a sociedade para se realizar enquanto Estado. Assim, é uma condição de
funcionamento do Estado o fato que a política seja uma esfera “restrita”. Com isso, Marx faz
uma crítica à noção hegeliana da burocracia como classe universal e do Estado como
encarnação da razão universal (COUTINHO, 1987).
Para Marx, a sociedade civil é dividida em interesses particularistas e
reciprocamente antagônicos, o que resulta na divisão da sociedade em classes antagônicas:
proprietários dos meios de produção (burgueses) e trabalhadores que possuem capacidade de
trabalho (proletários). Portanto, a garantia da propriedade pelo Estado nada mais é do que
assegurar a reprodução da sociedade em classes, conservando a dominação dos proprietários
sobre os proletariados, a defesa dos interesses comuns de uma classe particular. A garantia
dos interesses da burguesia ocorre, pois o Estado assume o monopólio da representação “de
tudo que é comum (universal) numa sociedade dividida em classes” (COUTINHO, 1987, p.
24). Isto quer dizer que o Estado despolitiza a sociedade, condição necessária para existência
para funcionamento do Estado.
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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Marx, então, define a sociedade civil como algo que engloba toda a vida social
pré-estatal, o que quer dizer que ela representa o momento ou a esfera do desenvolvimento
das relações econômicas anterior ao momento político. O autor refere-se a sociedade civil
como o momento das relações econômicas, formando a antítese sociedade-Estado, que, por
sua vez, apresenta a antítese fundamental do sistema capitalista: estrutura/superestrutura. A
estrutura para Marx representa a esfera econômica, o conjunto das relações de produção, que
é primário e subordinante da base real sobre a qual se eleva a superestrutura. A superestrutura
representa a esfera jurídica e política, que aparece como um momento secundário e
subordinado aos interesses da burguesia que determina a consciência social do proletariado
(BOBBIO, 1982).
Outra característica da teoria marxista, que é uma conseqüência da exploração da
classe dominada (proletariado) pela classe dominante (burguesia), é a presença da luta de
classes na sociedade, como conflito bipolar e “simplificado” entre burgueses e proletários
(COUTINHO, 1987). Na teoria marxista, as características autodissolutivas da sociedade civil
deram origem a uma teoria dialética do progresso revolucionário, em que a burguesia seria
inevitavelmente substituída por uma versão socialista mais avançada. Conseqüentemente há
uma relação antagônica entre sociedade civil e democracia política e não haveria espaço para
existência da democracia antes da revolução socialista (WHITEHEAD, 1999).
A quinta corrente retratada por Bobbio (1982) corresponde ao modelo
desenvolvido por Gramsci, ao qual este trabalho se filia epistemológica e teoricamente. Neste
modelo, o Estado:
(...) não é um fim em si mesmo, mas um aparelho, um instrumento; é o representante
não de interesses universais, mas particulares; não é uma entidade superposta à
sociedade subjacente, mas é condicionado por essa e, portanto, a essa subordinado,
não é uma instituição permanente, mas transitória, destinada a desaparecer com a
transformação da sociedade (BOBBIO, 1982, p. 23).
Na interpretação desenvolvida por Bobbio (1982) a respeito de Gramsci, a
sociedade civil representa um momento positivo e o Estado um momento negativo. Gramsci
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parte do conceito de Marx, mas inova ao considerá-la o momento da superestrutura, ao invés
da estrutura. O conceito de sociedade civil em Gramsci deriva de Hegel e não de Marx, o que
não nega o marxismo em Gramsci. Bobbio (1982) considera que este é o único ponto que
distingue os dois pensadores, uma vez que a sociedade civil compreende não apenas todo o
conjunto das relações materiais (como em Marx), mas todo o conjunto das relações
ideológicos-culturais e todo o conjunto da vida espiritual e intelectual, e não todo o conjunto
da vida comercial e industrial (como em Marx). Uma das citações mais utilizadas por autores
que estudam os escritos de Gramsci, retirado de um trecho dos Cadernos do Cárcere (com
diversas publicações e edições) para definição do seu conceito corrobora o que já foi dito:
Podem ser fixados, por enquanto, dois grandes planos superestruturais: o que pode
ser chamado de ‘sociedade civil’, ou seja, o conjunto de organismos habitualmente
ditos privados, e o da sociedade política ou Estado. E eles correspondem à função de
hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade; é a do domínio
direto ou de comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico
Há, na teoria de Gramsci sobre a sociedade civil, uma ampliação da teoria
desenvolvida por Marx, uma vez que a sociedade civil deixa de representar apenas a esfera
das relações econômicas, ou o momento da estrutura. Ao fixar a sociedade civil no plano da
superestrutura e apontar que a ideologia hegemônica da burguesia é garantida através não
apenas do aparelho coercitivo do Estado, mas também por meio do que foi chamado de
aparelhos de manutenção da hegemonia (incluindo outras instituições, tais como os jornais, a
Igreja e a escola). Gramsci sinaliza a possibilidade de mudança da ideologia dominante
começando no plano da sociedade civil, mas também passando pelo Estado. Esta
característica teve bastante impacto nas teorias de sociedade civil que se seguiram
posteriormente, já que a organização da sociedade civil e a divulgação de sua ideologia
poderiam, segundo Gramsci, ter um papel transformador da sociedade e do sistema
econômico vigente.
De acordo com Nogueira (2003), Gramsci está sempre presente nos discursos dos
mais diversos interlocutores que falam de sociedade civil nos dias de hoje, embora não haja
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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uma interpretação única e consensual de seu pensamento. Isso é comprovado ao constatar-se
que os autores consultados neste trabalho sobre o tema da sociedade civil (COHEN, 2003;
COHEN e ARATO, 1992; NOGUEIRA, 2003; TEIXEIRA, 2002; WHITEHEAD, 1999)
partem do conceito de Gramsci, ou fazem referência a ele. Ainda concordando com Nogueira
(2003), adotamos o pressuposto de que sociedade civil em Gramsci é um conceito complexo e
sofisticado, muito útil para entender a realidade contemporânea. Além de ser um conceito, a
sociedade civil, como ressalta Nogueira (2003), é em Gramsci um projeto político que tem a
possibilidade de transformar a sociedade. Para Teixeira (2002), Gramsci é o autor que
apresenta os elementos básicos para a compreensão atual da sociedade civil, uma vez que ela
representa o conjunto de organizações que elaboram e difundem as ideologias que são
hegemônicas entre as classes.
Antes de finalizar a evolução histórica do conceito de sociedade civil, vale
destacar e situar o debate atual sobre o tema. Segundo Cohen (2003), o debate sobre a
sociedade civil globalizou-se, uma vez que políticos, acadêmicos e ativistas em todo o mundo
utilizam-na para os mais variados assuntos desde associações voluntárias e organizações sem
fins lucrativos até redes mundiais, empreendimentos cívicos, grupos de defesa dos direitos
humanos, organizações não-governamentais e movimentos sociais transnacionais. Segundo a
autora, a principal contribuição do século XXI para o conceito é a idéia de uma sociedade
civil mundial ou transnacional. O discurso da sociedade civil a situa como elemento essencial
para a democracia, para o processo de democratização e como a fonte principal da
solidariedade e da integração social. Contudo, agora o discurso não é centrado na mudança do
Estado, que também não é mais o alvo da democratização e da integração; agora fala-se na
democratização da ordem mundial emergente (COHEN, 2003).
Teixeira (2002) distingue duas vertentes interpretativas de estudos atuais sobre
sociedade civil, a enfática e a moderada. A primeira vertente concentra autores
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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53
comunitaristas, alguns habermasianos e novos frankfurtianos, que concebem a sociedade
civil:
(...) como uma rede de associações autônomas, com interesses comuns, que devem
exercer um controle sobre o Estado, utilizando-se para isso de meios não só
institucionais, como não convencionais (TEIXEIRA, 2002, p. 42).
Já para a segunda vertente, a moderada, acredita-se que a sociedade civil:
(...) seria constituída de cidadãos e instituições dotados de virtudes cívicas, cujo
desenvolvimento exigiria o mercado como princípio ordenador e a ordem liberal-
democrática como seu substrato (TEIXEIRA, 2002, p. 42).
Entre os autores contemporâneos, gostaríamos de destacar o trabalho
desenvolvido por Jean Cohen e Andrew Arato (1992), em sua obra Civil Society and Political
Theory, também citado em Alves (2002), Nogueira (2003), Teixeira (2002) e Whitehead
(1999). A sociedade civil é definida pelos mesmos como “a esfera da interação social entre
economia e Estado, composta acima de tudo da esfera íntima (especialmente da família), da
esfera das associações (especialmente as associações voluntárias), movimentos sociais e
algumas formas de comunicação pública” (p. ix, prefácio). Cohen (2003, p 423) aprofunda um
pouco mais o conceito quando define sociedade civil “como uma esfera de interação social
diferenciada da economia e do Estado, composta de três parâmetros analiticamente distintos:
pluralidade, publicidade e privacidade”.
Após traçar este panorama geral sobre a evolução do conceito de sociedade civil
até os dias de hoje, dedicaremo-nos à brevíssima descrição do contexto da sociedade civil na
América Latina e no Brasil. Pretendemos, assim, apresentar o contexto geral no qual os
estudos sobre a sociedade civil brasileira se desenvolveram, que são analisados na etapa
seguinte deste capítulo.
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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54
2.2. SOCIEDADE CIVIL EM AÇÃO: MOVIMENTOS SOCIAIS
Falar da sociedade civil na América Latina e Brasil é remeter-se à sua forma de
organização ao longo dos anos. Apesar de serem inúmeros e múltiplos no seio da sociedade
civil, os movimentos sociais representam uma das formas historicamente mais expressivas de
sua organização. Cabe, portanto, definir o conceito adotado para movimento social:
Movimentos sociais são ações sociopolíticas construídas por atores sociais coletivos
pertencentes a diferentes classes e camadas sociais, articuladas em certos cenários da
conjuntura socioeconômica e política de um país, criando um campo político de
força social na sociedade civil (GOHN, 2002, p. 251).
Gohn (2002) vai além de sua definição explicando a origem destas ações e o fato
delas criarem uma identidade coletiva para o grupo, como pode ser notado no trecho
selecionado abaixo:
As ações se estruturam a partir de repertórios criados sobre temas e problemas em
conflitos, litígios e disputas vivenciados pelo grupo na sociedade. As ações
desenvolvem um processo social e político-cultural que cria uma identidade coletiva
para o movimento, a partir dos interesses em comum (GOHN, 2002, p. 251).
Para manter a identidade coletiva, é necessário haver solidariedade, construída
através dos valores culturais e políticos que o grupo compartilha em espaços que são
coletivos, mas não necessariamente institucionalizados. Outro fator importante atribuído aos
movimentos sociais pela autora é a contribuição que eles dão ao desenvolvimento e à
transformação da sociedade civil e da sociedade política, uma vez que eles atuam direta ou
indiretamente nas esferas públicas e privadas. Conforme a citação exemplifica:
Estas contribuições são observadas quando se realizam análises de períodos de
média ou longa duração histórica, nos quais se observam os ciclos de protestos
delineados. Os movimentos participam portanto da mudança social histórica de um
país e o caráter das transformações geradas poderá ser tanto progressista como
conservador ou reacionário, dependendo das forças sociopolíticas a que estão
articulados, em suas densas redes; e dos projetos políticos que constroem com suas
ações. Eles têm como base de suporte entidades e organizações da sociedade civil e
política com agendas de atuação construídas ao redor de demandas sócio-
econômicas ou político-culturais que abrangem as problemáticas conflituosas da
sociedade onde atuam (GOHN, 2002, p. 251 e 252).
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55
Para Alvarez e outros (2000), é importante ressaltar que todos os movimentos
sociais põem em prática uma política cultural, independente de serem novos ou velhos
6
, uma
vez que suas identidades e estratégias estariam inevitavelmente vinculadas à cultura. As
políticas culturais seriam postas em prática pelos movimentos na intervenção em debates
políticos, na tentativa de dar novas significações às interpretações culturais na política
dominante, ou mesmo ao desafiar práticas políticas estabelecidas. Para as autoras, há sempre
uma busca implícita ou explícita, na redefinição do poder social, e conseqüentemente, da
cultura política dominante.
Ao falar nos movimentos sociais na América Latina, vale citar que a literatura
consultada (DAGNINO, 1989; FONTES, 1999; GOHN, 2002; ALVAREZ, 2000) é bastante
crítica em relação à produção do conhecimento, uma vez que, se acredita que quase não houve
uma distinção das especificidades históricas entre América Latina e Europa como ponto de
partida para as análises e elaboração de categorias teóricas condizentes com a realidade
regional.
Para Alvarez e outros (2000), por exemplo, a cultura política
7
nos movimentos
sociais da América Latina foi influenciada por princípios da cultura política dominante no
Ocidente – América do Norte e Europa – caracterizada como racionalista, universalista e
individualista, com algumas diferenças advindas da combinação com outros princípios que
tinham objetivo de manter a exclusão social e política e controlar a definição do espaço
político. Fontes (1999) acredita que se instaurou nos países latino-americanos uma política de
repetição que denominava as teorias e as práticas de um conjunto de formas de ação coletiva
que eram rapidamente conceituadas e mobilizadas de “movimentos sociais”. Além disso, ele
6
Esta caracterização dos movimentos sociais, enquanto novos ou velhos, vem da literatura que definiu que os
novos movimentos sociais seriam aqueles para os quais a identidade seria importante, houvesse um engajamento
em novas formas de fazer política, ou se buscassem novas formas de sociabilidade, a exemplo dos movimentos
indígenas, étnicos, ecológicos, femininos, homossexuais e de direitos humanos.
7
Alvarez (2000, p. 25) define cultura política como: “a construção social particular em cada sociedade do que
conta como ‘político’”.
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aponta um esforço em dialogar com teorias desenvolvidas no capitalismo avançado, pelo fato
de existirem questões urgentes advindas da vigência da ditadura e do desenvolvimento do
movimento operário tradicional como gerador de uma ampla literatura que:
(...) estimulou e assessorou uma efervescência organizativa que tiveram um duplo
efeito: primeiro, o de colocar os movimentos na linha sucessória da classe operária
como sujeito da mudança histórica; segundo, o de potencializar o efeito
demonstração da linguagem e dos repertórios de ação dos movimentos do Norte,
generalizando a forma movimento social para contextos muito mais amplos do que
aqueles em que se desenvolviam no mundo do capitalismo avançado (FONTES,
1999, p 13 e14)
As principais características que influenciam na consolidação da sociedade civil
na América Latina são, primeiramente, o passado colonial, escravocrata ou de servidão
indígena, baseado na monocultura ou exploração intensiva de recursos naturais. Em segundo,
lembra-se o fato de o Estado nacional ter sempre sido resultado de lutas internas,
representando os interesses econômicos das elites, subordinados ao grande capital
internacional. Outra característica do modelo de funcionamento do Estado foi a relação
autoritária estabelecida com a sociedade civil, que influenciou de maneira crucial as regras de
civilidade e cidadania nestas sociedades, dando a elas uma “feição particular” (GOHN, 2002,
p. 224).
Desde o século XIX há na América Latina uma concepção oligárquica da política,
que foi transferida para as práticas sociais e políticas do latifúndio, em que os poderes pessoal,
social e político eram superpostos e vistos como parte de uma única realidade. Fato este que
foi responsável por ocasionar a falta de diferenciação entre o público e o privado, ou seja, a
apropriação do público pelo privado, e vice-versa, tornando relações de favor, personalismo,
clientelismo e paternalismo práticas políticas comuns. E em conseqüência disso, grupos
subalternos passaram a ver a política como algo das elites, ou seja, há um distanciamento da
sociedade civil com a política, e uma natural falta de mobilização marca a sociedade civil na
América Latina até os anos de luta contra os regimes autoritários nas décadas de 60 e 70
(ALVAREZ et al, 2000).
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De forma geral, até os anos 30, os regimes políticos da América Latina eram fruto
de uma aliança entre as oligarquias rurais com apoio de setores do clero tradicional católico.
Esta época é conhecida como coronelismo, e tem como características o clientelismo, a
política de troca de favores, e proteções fornecidas por políticos (coronéis) locais. A partir da
década de 30, começa a haver um deslocamento do eixo de desenvolvimento econômico para
processos urbano-industriais de substituição das importações, utilizando mão-de-obra
migrante. Nesta época ocorreram reformas político-administrativas nos Estados para que estes
tivessem capacidade de regulamentar os conflitos sociais e desenvolver estruturas de suporte
para o desenvolvimento de um plano embrionário nacional de desenvolvimento, formado por
legislações trabalhistas, sistemas previdenciários, criação ou expansão de rede de escolas
primárias e do sistema de escolas, entre outros.
A partir do final da Segunda Guerra, com a urbanização, a industrialização, e o
crescimento das massas populares – que não podiam mais ser ignoradas, surgem os governos
políticos populistas na cena latino-americana. Nesta época, as massas populares ascenderam à
cena social através do voto universal e de sua crescente presença nos meios urbanos. Esta
época também foi marcada por:
reformas constitucionais e administrativas, intensa disputa político-partidária entre
dezenas de partidos políticos, políticas sindicais atreladas aos governos, surgimento
de movimentos de base, em âmbito de bairros, e do trabalho da igreja (GOHN, 2002,
p. 225).
No entanto, os governos populistas, comandados pelas elites latino-americanas,
criaram mecanismos para que a participação popular se desse de forma subordinada, através
de relações personalizadas com os líderes políticos. Nesta época se falava na ‘irracionalidade
das massas’ e o Estado passou a ser visto como o responsável pela organização e até criação
da sociedade civil. Esta centralidade na concepção do Estado, que tomou conta do
pensamento político foi denominada de estadolatria (ALVAREZ et al, 2000).
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Esta linha evolutiva formada pelo passado colonial-imperial, seguida da república
dos coronéis, e por fim, a presença dos líderes populistas, culminou com o desenvolvimento
de uma cultura política na sociedade latino-americana em que as relações sociais entre os
cidadãos e o Estado são naturalizadas, ou seja, há uma relação de dominação expressa em
termos de clientelismo e paternalismo. Relação esta que passa a ser a norma geral, e é vista
como natural pela própria população, o que acaba sendo um entrave para a criação de espaços
livre, democráticos ou a consolidação e o aprofundamento de períodos de democratização
(GOHN, 2002).
A partir dos anos 60, como uma tentativa de impedir a radicalização do populismo
e a aproximação com alternativas socialistas, surgem os regimes militares autoritários em
praticamente toda a América Latina, caracterizados pela aliança com o capital internacional,
levando a mudanças no modelo econômico que passou com base no tripé empresário nacional
(urbano e industrial), capital internacional e regimes militares. A ideologia predominante era a
segurança nacional associada ao desenvolvimento (IANNI, 1975 apud GOHN, 2002). O
autoritarismo político levou ao que era uma exclusão política da população, ou uma
eliminação política garantida através da repressão estatal e violência sistemática. O
autoritarismo social, portanto, enraizou-se na cultura política latino-americana influenciando a
mobilização da sociedade civil (ALVAREZ et al, 2000).
Os anos 70 e 80 foram períodos de redemocratização, marcados pela mobilização
e pressão da sociedade civil e política. Os movimentos sociais cresceram e ganharam
visibilidade, fomentando uma nova cultura política baseada em uma “visão de direitos sociais
coletivos e da cidadania coletiva de grupos sociais oprimidos e/ou discriminados” (GOHN,
2002, p. 226).
Nos anos 90, com a globalização, há uma alteração no panorama do capitalismo
nos países ocidentais, uma vez que ocorre uma série de mudanças, tais como: uma nova
redivisão internacional do trabalho; as fronteiras nacionais são relativizadas na economia
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mundial e a produção industrial passa a ser feita de forma fragmentada, com vantagens fiscais
e econômicas propícias à acumulação; um declínio da economia formal e ascensão da
economia informal, com a perda de poder dos sindicatos e o crescimento do desemprego
estrutural, tanto nos países do chamado Terceiro Mundo – onde ele sempre existiu – como nos
países do chamado Primeiro Mundo. Há uma transformação no mundo do trabalho, com as
reengenharias nas empresas privadas e públicas que causaram demissões em massa, e
alteração das rotinas de trabalho com a priorização dos trabalhadores multiespecializados em
substituição aos especializados, transformando as hierarquias de trabalho e passando a
responsabilidade para o trabalhador (GOHN, 2002).
Os estudos sobre os movimentos sociais no Brasil têm recebido algumas críticas
ao longo dos anos, pois, assim como para a realidade da América Latina, considera-se que há
importante lacuna de referenciais teóricos que contemplem a realidade brasileira, além de
serem realizadas muitas descrições sem análises. Gohn (2002) acredita que há a necessidade
de elaborar esquemas explicativos com as especificidades brasileiras e que o uso de
referenciais teóricos elaborados para outras realidades socioeconômicas e político-culturais
deve ser visto com mais atenção.
Os primeiros estudos sobre os movimentos sociais urbanos na década de
cinqüenta tinham uma filiação teórica a Jordi Borja e Manuel Castells. No final dos anos 70, o
foco voltou-se para os novos movimentos sociais, e se verificou uma nova caracterização dos
movimentos, pois havia uma diferenciação entre as práticas sociais e um novo estilo de
organizar a comunidade local. Nesta fase a categoria básica enfatizada foi a da autonomia. No
entanto, os fundamentos sobre a questão da autonomia não eram muito claros, utilizando-se
de matrizes do socialismo libertário e do anarquismo, que acabaram por levar a concepções
contraditórias, uma vez que essa leitura “não se coadunava com as diretrizes gerais das
análises sobre os movimentos” (GOHN, 2002, p. 282).
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A sociedade civil brasileira, a partir de finais dos anos 60, durante o regime
militar, experimenta um significativo ressurgimento, que tem como eixo a oposição ao regime
militar e, por isso, é considerada por alguns autores como o ponto de fundação efetiva da
sociedade civil no Brasil (AVRITZER, 1999 apud Dagnino, 2002). É a partir da década de 70,
porém, que a sociedade civil se unifica no combate ao autoritarismo do Estado. Dagnino
(2002) lembra que a sociedade civil teve uma visão homogeneizada durante a ditadura, o que
deixou de existir com a volta às instituições democráticas. Outro autor que destaca o poder
articulatório da sociedade civil no período da ditadura é Teixeira (2002), argumentando que
ela exerceu um importante papel na resistência ao poder autoritário e na organização das
comunidades de base.
Fontes (1999) nos lembra de quatro aspectos que podem ser destacados como
definidores dos movimentos sociais no país, a partir da década de 70: o avanço do capitalismo
e a crise pós-milagre, o regime autoritário e o início da abertura política, a crise e a busca de
uma nova presença tanto da Igreja pós-Concílio Vaticano II, como da esquerda e do
sindicalismo e os referenciais teóricos para abordagem dos movimentos sociais.
Nesta época, surgiu uma grande variedade de movimentos sociais através de um
longo processo que foi controlado pelas elites sociais, tais como organizações de direitos
humanos, movimentos urbanos que lutavam por serviços públicos, Comunidades Eclesiais de
Base ligadas à Igreja Católica, movimentos de mulheres, de negros, entre outros. Esses
movimentos contribuíram para que o processo de liberalização política acontecesse de forma
lenta, gradual e segura, e foi além dos limites imaginados pelo regime militar e seus aliados.
Os movimentos articularam-se de forma a construir uma oposição política à ditadura, e
ocuparam de forma criativa o pouco espaço político que restou depois de todas as restrições à
participação e representação impostas pelo regime militar. Outra iniciativa dos movimentos
sociais foi a criação de novos espaços públicos, onde os excluídos (social, política e
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culturalmente) pudessem expressar suas identidades, necessidades, interesses, e desafiar o
autoritarismo, na política e na sociedade (DAGNINO, 1999).
Nos anos 80, as mudanças ocorridas na conjuntura sociopolítica e o conseqüente
surgimento de inúmeros movimentos e formas organizativas populares impactam nas análises
sobre os movimentos sociais. Embora o referencial marxista, com enfoque na análise das
contradições sociais, ainda predominasse, começou a haver uma crítica a este modelo de
análise. Passaram a ser abordados conceitos e noções bastante utilizadas na antropologia,
como identidade, e na educação popular, como pedagogia da participação. Outros estudiosos e
filósofos europeus passaram a influenciar os estudos, também a partir dos anos 80, tais como
Foucault, Castoriadis, Deleuze, Mellucci, Touraine, entre outros. Com esta influência, tornou-
se comum “pesquisar a identidade dos movimentos, ouvir suas falas, captar suas práticas
cotidianas” (GOHN, 2002, p. 279), deixando de lado as contradições da sociedade como
centro exclusivo das investigações.
Nos anos 80, também houve a emergência de movimentos sociais não
exclusivamente populares, tais como os movimentos de mulheres, ecológicos, negros e dos
índios. A emergência destes movimentos traz à tona novos repertórios de demandas baseados
na igualdade, na diferença e na liberdade, além de uma divisão paradigmática nas
interpretações das ações, que passaram a seguir uma abordagem culturalista, em
contraposição à marxista, com foco central na identidade dos novos atores políticos. O dilema
entre as correntes européias e norte-americanas no campo dos Novos Movimentos Sociais em
relação ao seu significado e se expressavam construção de identidades – europeus – ou
estratégias políticas para obtenção de bens – norte-americanos – não se fez presente entre os
pesquisadores brasileiros. No Brasil, a questão central era a ênfase nas mudanças
socioculturais ou as transformações políticas que os movimentos poderiam gerar (GOHN,
2002).
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Alguns autores consideram que o fim da ditadura é marcado por um esfriamento
ou uma desmobilização da sociedade civil. Teixeira (2002) considera que há um ceticismo
nos analistas políticos, e cita alguns autores, entre eles, O’Donnell (1991 apud TEIXEIRA,
2002) com a sua definição de democracia delegativa, em que a sociedade civil torna-se um
espectador ao participar da democracia apenas no momento da eleição, e Santos (1993 apud
TEIXEIRA, 2002) que considera a existência de um hobbesianismo social, onde a massa
atomizada é incapaz de participar, além de Da Matta (1987, 1992 apud TEIXEIRA, 2002) que
ressalta o clientelismo, o nepotismo e o “jeitinho” como características de desmobilização da
sociedade civil brasileira. No entanto, tanto Gohn (2002), como Dagnino (1999) e Teixeira
(2002) partilham da idéia de que, ao contrário dos autores citados anteriormente, a década de
80 foi muito marcante para os movimentos sociais. Neste momento, eles protagonizaram
diversos dos movimentos pela redemocratização, destacando-se o movimento das Diretas-Já e
o movimento pela Nova Constituinte.
O decorrer da década de 80 marca a decepção da sociedade civil com a política,
uma vez que as suas demandas (sobretudo na perspectiva das camadas populares e médias)
não foram atendidas. Gohn (2002) acredita que foi uma década em que os movimentos
“passaram, no plano da atuação concreta e no plano das análises deles feitas, da fase do
otimismo para a perplexidade e, depois, para a descrença” (GOHN, 2002, p. 285). Quatro
mudanças ocorridas nesta década em relação ao estudo dos movimentos sociais são
destacadas por Fontes (1999): a primeira delas é a identificação da inadequação das teorias
utilizadas na década anterior, uma vez que elas não englobavam as novas problemáticas,
como a questão urbana; a segunda é a identificação do Estado como propulsor dos
movimentos sociais; a terceira foi o significado político atribuído aos movimentos sociais,
quando passou-se a considerar os movimentos com capacidade de construir identidade
política e possuir autonomia em relação ao sistema político partidário, o que levou a uma
nova forma de atuação dos movimentos, que focaram-se mais em fazer parte do jogo
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institucional; e a quarta mudança refere-se a presença de agentes externos influenciando a
formação da identidade e o repertório de ação destes, em contraposição à autonomia, a
relevância do saber popular e a espontaneidade dos movimentos nas décadas anteriores.
O final dos anos 80 marca também a chegada do Partido dos Trabalhadores a
diversas prefeituras, e com isso, uma redefinição das posturas políticas. Os movimentos
sociais passam a se preocupar com a capacitação de seus quadros para a atuação nas políticas
públicas locais. Nesta época houve muitos estudos e seminários sobre o poder local (GOHN,
2002).
Do ponto de vista da produção de conhecimento sobre os movimentos sociais, o
‘novo’ deste último período deve ser visto numa dupla dimensão: como construtor
de espaços de cidadania, com as novas leis que se estabeleceram no país e com a
reviravolta teórica que passa a ocorrer no plano das análises (GOHN, 2002, p. 287).
Os autores Teixeira (2002) e Dagnino (1999, 2002) têm como eixo orientador de
seus estudos a questão da construção de espaços de cidadania. Estes tipos de estudos são
reorientadores das ciências sociais como um todo, uma vez que utilizam novas categorias de
análise, em detrimento das categorias macro explicativas anteriores.
A dicotomia do público e privado, a questão da cidadania, a cultura política presente
nos espaços associativos, a importância das experiências cotidianas etc., ganharam
destaque, em lugar das categorias macro explicativas anteriores (GOHN, 2002, p.
287).
A categoria da autonomia, que foi de suma importância nos anos 70, deixa de ser
uma questão central e vai progressivamente desaparecendo dos discursos dos movimentos e
pesquisadores, uma vez que, com a redemocratização do país, os movimentos foram
convidados a participar de mesas, câmaras e conselhos de negociações, e o Estado deixa de
ser um adversário, mas um interlocutor (GOHN, 2002).
Nos anos 90, as análises voltam-se para as categorias da cidadania coletiva e
exclusão social. A categoria da cidadania já estava presente na década anterior, mas passa a
ser vista em termos coletivos de participação social, através de grupos que voltam a sua
atuação para uma participação qualificada, garantida por lei. O viés social e econômico da
cidadania começa a ocupar o centro dos debates, sendo que a demanda de participação dos
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processos decisórios em matéria de políticas públicas visa a politizar as relações entre
cidadania política e cidadania social (MILANI, 2005).
Outra categoria, a de exclusão social, passa a ser central em função da degradação
das condições socioeconômicas que acaba tendo conseqüências como a violência
generalizada, desagregação do poder policial, surgimento de estruturas de poder paralelo,
entre outros fatores. Contudo, a queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética, com o
conseqüente abandono dos marxistas e suas teorias macroestruturais com sujeitos históricos
predeterminados, leva o discurso dos excluídos a voltar-se para os “novos atores sociais” –
mulheres, jovens, negros, índios. Os principais autores que influenciaram os pesquisadores
brasileiros nas categorias descritas anteriormente são Touraine, Dahrendorf, Habermas, Offe,
Mellucci, Przeworski e Arato (GOHN, 2002).
O curioso é que o uso dos autores acima mencionados foi uma novidade no Brasil
dos anos 90, muito embora eles tivessem suas produções datadas de antes desta década. A
explicação apresentada para este fato é que, durante a hegemonia das teorias marxistas, os
autores mencionados já apresentavam críticas às explicações totalizantes. A variação na visão
dos analistas brasileiros ocorre com a transformação da conjuntura política a partir do final
dos anos 80, quando mudam profundamente os elementos do contexto internacional e as
relações dos movimentos sociais com o Estado no Brasil.
2.3. IDEOLOGIA NOS MOVIMENTOS DA SOCIEDADE CIVIL
Antes de entrar propriamente no tema da ideologia nos movimentos da sociedade
civil, cabe uma breve contextualização nas transformações econômicas ocorridas no cenário
internacional e nacional. Primeiramente, cabe destacar as mudanças nas formas de gerir o
sistema socioeconômico trazidas com a globalização. Para Gohn (2002), há uma mistura de
sistemas anteriores com coisas novas, como é o caso da primazia do mercado sobre o Estado,
um princípio liberal, mas com a diferença de se tratar de um mercado oligopolizado que segue
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regras que estimulam ou retraem a economia formal ou informal, a depender dos interesses da
lucratividade. Outra mudança advinda da globalização é a primazia do mercado especulativo
financeiro sobre o processo produtivo (economia real), com a migração de capitais para os
setores de maior lucratividade sem compromisso com os processos de desenvolvimento da
nação.
A globalização não envolve apenas a competição por oportunidades de mercado e
por taxas elevadas e constantes de crescimento econômico; tampouco pode ser definida,
simplesmente, como o aumento exponencial dos investimentos propiciados pela crescente
liberalização do comércio internacional e pela desregulamentação financeira mundial. A
globalização tem evoluído também na direção de uma luta social e política por novos valores
culturais e preferências individuais (MILANI e LANIADO, 2006). O sistema econômico
global contemporâneo otimiza exacerbadamente os valores e critérios relativos ao
desempenho, à competitividade, à eficiência e à produtividade. O bom desempenho
econômico define, atualmente, o novo locus de pertencimento dos sujeitos globais, que
trabalham cada vez mais com base em responsabilidades imediatas implementadas
preferentemente a custos sempre decrescentes. A hipervalorização do desempenho econômico
nas atividades humanas em geral, encontrada em discursos de muitos atores econômicos
globais, tem implicações diretas para a vida democrática. Isto porque, conforme este
entendimento, as negociações políticas também devem seguir o mesmo padrão de eficiência e,
conseqüentemente, remetem à mesma programação do mercado; supõem que não deve haver
espaço para dúvidas ou ambigüidades e tampouco para deliberações de longa duração na
sociedade de risco global, que dá prioridade ao curto prazo e ao tempo imediato (MILANI e
LANIADO, 2006).
Este redirecionamento econômico global tem conseqüências profundas sobre a
organização do sistema mundial (DUPAS, 2001; RIST, 1996 apud MILANI e LANIADO,
2006); afeta, igualmente, o desenvolvimento das redes, organizações e movimentos sociais.
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Como afirmaram Della Porta e Tarrow (2005), há dois processos subjacentes à globalização: a
internacionalização da política por meio da emergência de atores, redes e instituições
transnacionais, assim como a integração econômica produzida pela voracidade do crescimento
do comércio internacional, da mídia e da integração financeira. Nesse sentido, a globalização
em si mesma favorece a expressão da contestação internacional criando estruturas de
oportunidades e também circunstâncias políticas para a ação de movimentos anti-globalização
e dos movimentos alternativos à globalização (TARROW, 1998 apud MILANI e LANIADO,
2006). Ela (re)produz desigualdades sociais e econômicas entre (e dentro dos) Estados.
Graças a um complexo sistema de redes tecnológicas, a globalização facilita a
intercomunicação rápida e imediata (um novo tempo) que escapa, ademais, ao controle rígido
do Estado-nação (um novo território) (MILANI e LANIADO, 2006).
Por isso, ao falar do cenário nacional, temos que ter em vista a influência dos
efeitos da globalização. A década de 90 é marcada por uma grande crise econômica e a
diminuição de empregos na economia formal, com a conseqüente migração para a economia
informal e para a chamada economia popular
8
. As políticas econômicas muitas vezes dão
suporte à economia informal e há uma crescente fragmentação e pulverização das atividades
produtivas e das relações sociais em geral. As ONGs vão ocupando cada vez mais espaço ao
oferecer serviços públicos para a população, uma vez que a capacidade do Estado de atender
aos serviços básicos diminui a cada dia. Há um visível aumento de pessoas abaixo da linha
mínima de sobrevivência, como sem-tetos e crianças de rua, o que aumenta significativamente
a violência urbana, aumentando o medo e a incerteza, mesmo com a estabilização da moeda
local (GOHN, 2002).
Ao falar em globalização também é preciso estar atento ao conteúdo ideológico
que está por trás do conceito. Milani (2000 e 2004) alerta sobre as possíveis distorções que
8
Aprofundaremos mais sobre o tema da economia popular no Capítulo 3
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
67
surgem com certa freqüência nas análises sobre a globalização. A primeira é o não
estabelecimento de uma distinção entre a descrição da realidade do que seria a globalização
através de prescrições e normas, e de como a globalização deveria ser. Outra tendência a por
em evidência, quase que exclusivamente, suas dimensões econômica e financeira, deixando
de lado as dimensões sociais, espaciais e culturais, suas origens históricas, ideológicas e
políticas. A terceira distorção seria a tendência em juntar o “político” com o “governamental”,
assim como o “econômico” com o “mercadológico”. A partir destas distinções é possível falar
em globalização hegemônica e contra-hegemônica.
A globalização hegemônica pode ser descrita como um movimento econômico,
cultural e político que, tendo inciado em princípios dos anos 1990, visa a defender
uma concepção economicista das relações humanas e do bem público. Busca
restringir o bem público a um serviço de mercado regido pela lei da oferta e da
procura; visa a limitar a esfera social dentro da esfera econômica. É hegemônica a
globalização que defende tais postulados de maneira dominante, sem questioná-los
ou criticá-los sob a perspectiva de diferentes contextos culturais e históricos
(MILANI, 2000, s/p).
Já a globalização contra-hegemônica é definida como:
(...) o movimento de idéias e ações políticas e econômicas que repõem em discussão
o caráter absoluto dos postulados da globalização hegemônica. Suas palavras de
ordem são a contestação, o questionamento, a mobilização social e política, a
solidariedade, assim como a democratização dos processos de tomada de decisão (..)
São ilustrações de temas e espaços políticos alternativos da globalização contra-
hegemônica o Forum Social Mundial de Porto Alegre, a taxa Tobim, a regulação
política dos fluxos financeiros, o fim dos paraísos fiscais, o controle democrático
dos sistemas de gestão das bolsas de valores, a responsabilidade social das empresas,
a economia solidária (MILANI, 2000, s/p).
Muitos atores políticos, movimentos sociais, pensadores e redes internacionais
compartilham os valores e as ideologias da globalização contra-hegemônica, tais como Via
Campesina (América Latina), MST (Brasil), Greepeace (internacional), Barefoot College
(Índia), Noam Chomski (EUA), Immanuel Wallerstein (EUA), François Chesnais (França),
Vandana Shiva (Índia), Walden Bello (Filipinas), Aminata Traoré (Mali), entre muitos outros.
No entanto, é evidente que o pensamento em torno da sociedade civil e suas funções na
sociedade está longe de ser homogêneo. Suas formas de ação variam do protesto de rua
(Seattle-1999 foi um exemplo), ao boicote e à violência no âmbito de conferências
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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68
intergovernamentais (Gênova), até formas mais organizadas e pacíficas de encontros mundiais
alternativos (Fòrum Social Mundial).
Os movimentos sociais são considerados ações sociopolíticas, como o conceito
citado anteriormente explicita, e a ideologia o conjunto de crenças, valores e ideais que
fundamentam suas reivindicações (GOHN, 2002). Muitos autores tendem a dizer que as
utopias deixaram de existir com a queda do bloco comunista, mas esquecem que a ideologia é
um elemento presente em todo movimento social. As ideologias funcionam como marcos
estratégicos de fundamental importância para a criação da identidade dos movimentos.
Gohn (2002) defende que o debate sobre o papel da ideologia no mundo não
desapareceu, uma vez que:
(...) todo movimento está articulado a um conjunto de crenças e representações e são
elas que dão suportes a suas estratégias e desenham seus projetos político-
ideológicos. Não se trata da vertente marxista ortodoxa que vê a ideologia como
mistificação da realidade mas sim da vertente marxista gramsciana que trata a
ideologia no campo das práticas sociais, como conjunto de idéias que dão suporte a
projetos estratégicos de mudança da ordem das coisas na realidade social (GOHN,
2002, p. 235)
Historicamente a ideologia tem implicações na humanidade. Wood (1999) vê a
ideologia como “uma crônica da destruição humana cometida por indivíduos com doutrinas
ideológicas diferentes” (WOOD, 1999, p. 605). Ele ressalta, então, que os grandes conflitos
dos últimos séculos foram provocados por diferenças ideológicas, como nas revoluções
americana, francesa e bolchevique. Nos dias atuais, os conflitos ideológicos também foram
fonte de guerras e rupturas econômicas, além da justificação para violência regional e
internacional.
A ideologia é um aspecto psicológico poderoso, porém pouco compreendido, com
implicações tanto sociológicas e interpessoais quanto políticas e internacionais
(WOOD, 1999, p. 605).
Wood (1999) ainda destaca diferentes concepções de mundo das pessoas e afirma
que todos são possuídos e orientados por ideologias “radicalmente” diferentes e faz uma
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69
tentativa de diferenciar alguns conceitos que são utilizados indistintamente como sinônimos
de ideologia:
1. Crença - convicção aparente racional do que é verdadeiro e falso, referindo-se ao que
existe, de fato;
2. Valor - algo semelhante a uma convicção emocional sobre o que é bom e o que é mau,
envolvendo juízo de valor;
3. Atitude - aprovação ou acordo, ou desaprovação ou desacordo, em relação a um objeto,
fato ou possibilidade exteriores;
4. Ideologia – conceito distinto de todos os anteriores, uma vez que significa um amplo
sistema que organiza e dá sentido à vida das pessoas. “Uma doutrina sistemática da vida
humana; uma ideologia proporciona uma orientação (um fim) e especifica os
comportamentos adequados (os meios) para atingir este fim” (WOOD, 1999, p. 606).
Partindo da premissa de que os movimentos sociais são processos político-sociais,
concordamos com a afirmação de que constituem “expressões de poder da sociedade civil, e
sua existência, independe do tipo de suas demandas, sempre se desenvolve num contexto de
correlação de força social” (GOHN, 2002, p. 251). Neste trabalho, temos como pressuposto
que a sociedade civil é um espaço para criação de novas ideologias, as quais podem assumir
um caráter de contra-hegemonia à ideologia dominante, caracterizada por quase-exclusivos e
excessivos pesos dados ao mercado onipresente, produtivo, eficientista e pretensamente
regulador das relações sociais na sua totalidade:
Uma vez considerado o movimento da sociedade civil como o momento através do
qual se realiza a passagem da necessidade à liberdade, as ideologias – das quais a
sociedade civil é sede histórica – são vistas não mais apenas como justificação
póstuma de um poder cuja formação histórica depende das condições materiais, mas
como forças formadoras e criadoras de nova história, colaboradas na formação de
um poder que se vai constituindo e não tanto como justificadoras de um poder já
constituído (BOBBIO, 2002, p.41)
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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70
2.4. A INOVAÇÃO GRAMSCIANA NO PENSAMENTO MARXISTA
Gramsci é um pensador marxista por excelência. Para Carnoy (1994, p. 89)
Gramsci desenvolveu uma “ciência marxista da ação política”, uma vez que Marx não teria
desenvolvido uma teoria de política tão abrangente e compreensível quanto sua análise da
economia política. Gramsci viveu em uma época em que a teoria marxista já tinha atingido
alto nível de desenvolvimento e o bloco comunista estava em formação. O partido socialista já
existia na Itália, muito embora pouco representasse as idéias de Marx
9
. A revolução
comunista russa acontecia de forma quase que concomitante com a expansão do nazi-facismo.
Todos estes elementos explicam o fato da teoria desenvolvida por Gramsci ter um caráter
mais estratégica e voltada para a ação, ou seja, repleta de reflexões acerca de como atingir o
socialismo considerando o contexto vivido por ele, o que Carnoy (1994, p. 90) chamou de:
“uma estratégia para a derrubada do Estado burguês e a construção do socialismo”.
É possível ainda estabelecer outras distinções entre as teorias de Marx e Gramsci.
Cerroni (1977), por exemplo, estabelece diferenças entre os métodos de pesquisa dos dois
autores e de Weber. Enquanto Marx teria desenvolvido as bases para a configuração científica
das categorias histórico-sociais – o socialismo científico, e Weber uma visão idealista da
política baseada nos tipos ideais, Gramsci teria sido um reagente crítico de ambos os autores,
desenvolvendo uma teoria da cultura, baseada na teoria da hegemonia, na relação entre cultura
e política, e na teoria da universalização humana.
Badaloni (1977) ao falar sobre a teoria gramsciana da ideologia estabelece a
hipótese de que Gramsci teria modificado o estatuto teórico de algumas categorias
desenvolvidas por Marx, quando passa a considerar a capacidade articulatória da sociedade
civil. Para o autor, este fato lhe confere um status de atualizador da teoria marxista, pois
9
O partido comunista seria fundado na Itália, em 1921, por Gramsci e outros políticos, como uma ruptura do
Partido Socialista Italiano.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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71
Gramsci viveu em um contexto social que diferia do contexto descrito por Marx, ou seja,
Gramsci teria desenvolvido sua teoria da sociedade civil a partir de outro ponto de vista.
É possível afirmar que a diferença citada no parágrafo anterior é a que mais se
repete na comparação entre Marx e Gramsci. Autores como Coutinho (1981), Portelli (1970),
Bobbio (1982), Carnoy (1994) analisam como a concepção de Estado e Sociedade Civil é
distinta em Marx e Gramsci. Vale ressaltar, no entanto que os autores citados não partilham
da mesma interpretação destes conceitos, com destaque para o grande debate teórico entre
Bobbio e Coutinho, em que Coutinho (1981) afirma que Bobbio chega a uma falsa conclusão
ao supor que a alteração no conceito de sociedade civil feita por Gramsci o leve a retirar da
infra-estrutura a centralidade da transformação social. Isto quer dizer que, para Bobbio,
Gramsci acredita na transformação social apenas no plano ideológico, relegando o plano
econômico. No que Coutinho (1981) discorda, pois faria de Gramsci um idealista na teoria
social, pois ele estaria situando o elemento determinante do processo histórico na
superestrutura política e não na base econômica. Montano (2003), no entanto, esclarece este
debate teórico ao afirmar que a sociedade civil, pertence ao momento superestrutural ao lado
da sociedade política, e que o político não tem primazia sobre o econômico.
Passando para o tema da transformação social, também intimamente ligado com a
capacidade de organização e direção através dos aparelhos privados de hegemonia, Carvalho
(1986) ressalta que, na Ciência Social e no pensamento marxista, existem diferentes
concepções do processo de transformação do social, que são determinadas pela forma com
que se compreende a totalidade social. Marx com sua teoria mudou radicalmente a
perspectiva de análise da totalidade social ao concebê-la enquanto uma totalidade orgânica, ou
seja, o conjunto da infra-estrutura e da superestrutura determinada pela base econômica. Para
ele o processo da vida social, política e espiritual seria determinado pelo modo de produção
da vida material. No entanto, no desenvolvimento do pensamento marxista, verificou-se uma
dificuldade de apreensão da dialética entre o econômico e o político, ou seja, uma dificuldade
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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de perceber e trabalhar teoricamente a relação entre infra-estrutura e superestrutura, o que
levou ao desenvolvimento de um tratamento destas duas esferas (econômica e político-
ideológico) de forma autônoma, isolada e absoluta. Com isso, a determinação da totalidade
social tende a incorrer em dois riscos fundamentais: o economicismo e o voluntarismo. O
economicismo reduz o processo de transformação social a um processo que se dá no campo
econômico, diluindo, e até mesmo negando nas suas formas mais extremadas, a eficácia
própria do político-ideológico na práxis transformadora. Já o voluntarismo tende a conceber
a transformação social como um processo que se dá no domínio político ideológico,
independentemente das condições objetivas no nível da base econômica (CARVALHO,
1986).
Gramsci, por sua vez, tornou-se um marco na análise das transformações do modo
de produção capitalista, por, mesmo sendo um marxista, ter uma concepção abrangente da
transformação social como um processo que se efetiva na relação dialética do econômico com
o político-ideológico. Em sua concepção, a transformação social é um processo global que se
faz simultaneamente no terreno econômico e ideológico através da luta política, sendo na
atividade política, enquanto atividade que faz o nexo orgânico entre o econômico e o
ideológico, que se desenvolve a ação transformadora das relações sociais (CARVALHO,
1986).
A transformação social através da revolução é tida como um processo que se dá
na dialética destruição/construção, ou seja, destruição da sociedade burguesa e construção de
uma nova sociedade, através de uma profunda mudança na estrutura econômica e política, e
na maneira de pensar dos homens. Isso amplia o domínio da política, que passa a englobar
mais que o domínio econômico, mas também os domínios cultural e ideológico. Para Gramsci
a infra-estrutura e as superestruturas formam um bloco histórico e numa relação orgânica, as
forças materiais são o conteúdo e as ideologias são a forma, não se podendo desvincular
histórica e teoricamente o conteúdo da forma. Este conceito de bloco histórico faz uma crítica
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ao idealismo e ao determinismo econômico, pois em toda sua ação, Gramsci procura entender
como se expressa a ação do ideológico e do político dentro do modo de produção e qual a sua
eficácia na manutenção ou conservação das relações sociais. O ponto de partida da teoria
gramsciana é o questionamento que o próprio autor se faz a respeito da grande resistência da
estrutura nos processos de crise, o que o leva a um exame específico da superestrutura,
configurando a sua tese da eficácia e da relativa autonomia do político-ideológico. A partir daí
há o desenvolvimento dos principais conceitos, que estão relacionados à superestrutura do
bloco histórico: ideologia e Estado, sociedade civil e sociedade política, enquanto conjunto
complexo e orgânico (CARVALHO, 1986).
Os principais conceitos desenvolvidos por Gramsci baseiam-se no
aprofundamento do entendimento sobre o “complexo” estrutura/superestrutura. São eles:
hegemonia, sociedade civil, Estado, partido e intelectuais (HALL et alli, 1983). A
compreensão gramsciana das noções de estrutura e superestrutura difere das de Marx, uma
vez que Gramsci procura se afastar dos fundamentos economicistas e idealistas, o que o leva a
uma sistematização da práxis da transformação social em sua obra. Para Gramsci há uma
relação dialética ente estrutura e superestrutura, ou seja, entre o político e o ideológico.
Contudo, ele incide a sua reflexão na superestrutura, que é formada pela ideologia e Estado,
sociedade civil e sociedade política. O objetivo da centralidade na reflexão sobre a
superestrutura é entender como se expressa a ação do ideológico e do político dentro do modo
de produção (econômico) e qual a sua eficácia na manutenção ou conservação das relações
sociais para, a partir desse entendimento, redefinir as estratégias no processo de luta pela
transformação do social (CARVALHO, 1986).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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2.5. PRINCIPAIS CONCEITOS - IDEOLOGIA E SOCIEDADE CIVIL EM GRAMSCI
Ao falar em sociedade civil, vale ressaltar, mais uma vez que trataremos também
do conceito de Estado. Gramsci, em sua obra, vai além ao estabelecer mais que uma teoria
ampliada do Estado, uma vez que ele é o primeiro autor a falar nos aparelhos privados de
hegemonia e a estabelecer duas esferas essenciais no interior das superestruturas – a sociedade
civil e a sociedade política (COUTINHO, 1981). O Estado é visto como um instrumento
essencial para a expansão do poder da classe dominante; é considerado uma força repressiva
(sociedade política) que mantém os grupos subordinados fracos e desorganizados, e a
hegemonia é garantida “pela couraça da coerção” (CARNOY, 1998, p. 98). A hegemonia é
definida como uma expressão da Sociedade Civil e do Estado, não desconsiderando, no
entanto, uma grande autonomia dos aparelhos hegemônicos privados frente ao Estado.
Uma maneira prática para compreensão do conceito de sociedade civil é imaginá-
lo como uma esfera intermediária que inclui aspectos da estrutura e da superestrutura.
Gramsci é considerado o autor que pela primeira vez inclui no conceito de sociedade civil as
associações, as organizações, os partidos políticos, a imprensa, a família, uma vez que
combinam funções ideológicas e econômicas. Para ele o bloco dominante precisa subordinar
as outras classes ao processo produtivo, não apenas através de decretos, mas mediante uma
constante transformação de costumes e valores morais na sociedade civil. A sociedade civil
também é tida como o terreno sobre o qual as classes brigam pelo poder, seja ele econômico,
político, ou ideológico (HALL e outros, 1983).
A sociedade civil também pode ser vista como a esfera em que há o domínio da
ideologia, ou seja, “o conjunto das organizações por meio das quais se elabora e difunde a
ideologia (...)” (CARVALHO, 1986, p. 35). Outro fator diferencial do conceito elaborado por
Gramsci é que, além de conter o conteúdo ético do Estado, a sociedade civil também é tida
como um lugar de transição dos impulsos hegemônicos; isto quer dizer que ela é dotada da
possibilidade de desenvolvimento de uma nova ideologia hegemônica: “A hegemonia de uma
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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classe inclui necessariamente a luta no domínio da ideologia, ou seja, a sociedade civil é um
lugar decisivo no exercício da hegemonia” (CARVALHO, 1986, p. 35).
O conceito de sociedade civil é tido como o ponto de partida para o entendimento
da Teoria Ampliada do Estado. Distinguindo-se de Marx – para quem a sociedade civil
compreende a base econômica, ou para fins didáticos, todo o conjunto da vida comercial e
industrial, ou ainda todo o conjunto das relações materiais, Gramsci foi além, e considerou a
sociedade civil como o conjunto das relações ideológico–culturais e intelectuais. Gramsci
situa então, a sociedade civil no momento superestrutural, o complexo das relações
ideológicas e culturais; a vida espiritual e intelectual. Afirma que a superestrutura é o
momento que uma determinada classe toma “consciência da necessidade”, “necessidade” esta
que caracteriza as condições objetivas vividas pelo sujeito. É só através do reconhecimento
das condições objetivas que o sujeito ativo da história se torna livre e se põe em condições de
poder transformar a realidade. O momento superestrutural, enquanto momento da liberdade, é
entendido como “consciência da necessidade”, ou seja, das condições materiais. As ideologias
são vistas não mais como justificação póstuma de um poder cuja formação histórica depende
das questões materiais, mas como forças que têm a possibilidade de formar e criar uma nova
história, colaborando para a formação de um poder que vai se constituindo e não tanto como
justificadora de um poder constituído.
Para Gramsci, o Estado é dividido em dois segmentos: sociedade política (que
compreende os aparelhos de coerção sob o controle das burocracias executivas e policial-
militar) e sociedade civil (que é o conjunto de organizações responsáveis pela elaboração e/ou
difusão de ideologias e compreende o sistema escolar, as igrejas, os partidos políticos, os
sindicatos, os meios de comunicação, etc.).
O Estado é, então, incorporado pela hegemonia da classe dominante, a burguesia,
que tinha se constituído como um organismo de movimento contínuo capaz de absorver e
transformar culturalmente a sociedade inteira. O Estado impõe as leis burguesas, como se
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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houvesse apenas uma classe e uma sociedade, incorporando assim, a classe operária que fica
sem consciência de sua posição de classe no desenvolvimento global da burguesia. A
hegemonia e a função hegemônica do Estado emanam da natureza da burguesia como uma
classe ideologicamente abrangente e de sua posição específica de poder econômico na
sociedade capitalista. O desenvolvimento burguês não se faz apenas através do
desenvolvimento das forças de produção, mas através da hegemonia na arena da consciência
(COUTINHO, 1981).
Gramsci também parte da noção de Marx sobre a hegemonia burguesa na
sociedade civil, que significava o predomínio ideológico dos valores e normas burguesas
sobre as classes subalternas. Mas Gramsci vai além de Marx, Engels, Lênin e Trotski ao
considerar que o Estado incluía a hegemonia burguesa na superestrutura, atribuindo a ele a
função de promover um conceito burguês único da realidade e um papel mais extenso na
perpetuação das classes (CARNOY, 1994). E a explicação para o consentimento da
hegemonia das classes dominantes pelas subalternas estava no poder da consciência e da
ideologia em forma de uma auto-organização de sociedade civil e em todos os aparelhos
hegemônicos. O conceito gramciano de hegemonia tem dois significados principais: o
primeiro é um processo na sociedade civil pelo qual uma parte da classe dominante exerce o
controle, através de sua liderança moral e intelectual, sobre outras frações aliadas da classe
dominante; já o segundo envolve a relação entre as classes dominantes e as dominadas, que:
Compreende as tentativas bem sucedidas da classe dominante em usar sua liderança
política, moral e intelectual para impor sua visão de mundo como inteiramente
abrangente e universal, e para moldar os interesses e as necessidades dos grupos
subordinados (CARNOY, 1983, p. 95).
A hegemonia não é vista como uma força coesiva, mas sim plena de contradições
e sujeita ao conflito. As instituições hegemônicas estão imbuídas de um conteúdo político,
que corresponde à tentativa das classes dominantes de expandir sua capacidade para
reproduzir seu controle sobre o desenvolvimento da sociedade.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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A burguesia, através do Estado, tenta uma estratégia de revolução passiva sempre
que sua hegemonia é ameaçada, ou sempre que sua superestrutura política não consegue lidar
com a necessidade de expandir as forças de produção. O Estado do bem-estar, por exemplo,
corresponderia a um tipo de revolução passiva. Gramsci procura buscar uma estratégia de
transformação da hegemonia capitalista, uma forma viável das classes subordinadas
superarem a hegemonia da classe dominada. Para tal, ele considera os seguintes aspectos: 1. o
conceito de crise de hegemonia, derivado em parte da análise de Marx no Dezoito Brumário;
2. o conceito de “guerra de posição” em contraposição à “guerra de movimento”; e 3. o papel
dos intelectuais. Os aspectos surgem da concepção gramsciana da superestrutura como
detentora do papel principal na expansão e na dominação da burguesia dominante (CARNOY,
1994).
Gramsci acreditava que a “mudança” não poderia acontecer de “cima para baixo”.
O socialismo só aconteceria de uma forma gradual e com a mobilização da sociedade civil, já
que ela tem a possibilidade de difusão de novas ideologias. Esse trabalho deveria ser feito
“transformando” a ideologia das massas. É a chamada crise da hegemonia, sendo possível,
apenas, nas sociedades mais complexas, com alto grau de participação política organizada.
Daí, o grande papel atribuído aos intelectuais, conceito este que não será aprofundado neste
trabalho, mas que pode assim ser resumido:
Sobre o papel dos intelectuais, desde o império romano até a era industrial,
Gramsci induziu uma tipologia que ainda hoje é objeto de discussão nas ciências sociais.
Gramsci atribui como papel do intelectual dar direção política e também, direção ideológica
às classes subalternas, que sem uma nova cultura, não deixariam de viver, passivamente, a
hegemonia das velhas classes dominantes. O papel do intelectual funde-se, então, com o
Moderno Príncipe, que deve levar à criação de uma nova cultura, que terá a função de criar as
condições para o surgimento da hegemonia das classes subalternas, garantindo, assim, sua
vitória na guerra de posições. Sem esta hegemonia, as massas não poderão se elevar à
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Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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condição de classes dirigentes. Daí, a importância, também, do intelectual na construção do
partido político.
Gramsci faz a distinção entre dois tipos de intelectuais. De um lado, os orgânicos,
cujo papel é fornecer cimento ideológico aos estratos dominantes: por exemplo, o economista
liberal que sanciona a hegemonia dos grupos financeiros na gestão do estado, e é capaz de
discorrer sobre o caráter "natural" da máquina a que serve. De outro lado, soldando o passado
no presente, os tradicionais ou "eclesiásticos" que, não estando diretamente ligados à
produção material, garantem a continuidade e a hierarquia de instituições de fundo
estamental: a Igreja, as universidades, os tribunais, com seus mandarins e burocratas. A
distância entre estes últimos e o mundo da produção cria neles a ilusão, que Gramsci chama
utópica, de serem autônomos em relação à máquina econômica vigente: é a veleidade da
"autoposição" comum entre acadêmicos, juristas e burocratas.
Para Gramsci, os intelectuais falham ao se restringirem às suas bases acadêmicas,
sem de fato conhecer as massas e sua cultura, por isso, são incapazes de apreender as reais
necessidades da população. Dessa forma, criam, apenas, culturas superficiais, e tornam quase
impossível à massa o conhecimento de sua real condição política e a aceitação de uma nova
ideologia.
Ao aprofundar a noção de ideologia desenvolvida por Gramsci, é importante
ressaltar a conexão que esta tem com o conceito de sociedade civil, Estado (também
entendido como sociedade política) e hegemonia, o que torna difícil citar um sem citar o
outro. Segundo Hall (1983), por exemplo, não há uma teoria sistemática da ideologia na obra
de Antonio Gramsci e, portanto, ela deve ser estudada como uma superestrutura. Contudo, o
conceito de ideologia ocupa uma posição de extrema importância quando subordinado às
“concepções políticas em torno das quais o pensamento de Gramsci está orientado” (HALL e
outros, 1983, p. 60)
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
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Para Cerqueira Filho (1988) a ideologia é definida em Gramsci como uma
concepção de mundo que se faz presente em todas as manifestações teóricas e coletivas.
Através da ideologia é possível também identificar o modo de pensar e agir compartilhado por
determinado grupo social. A ideologia pode ser chamada de histórica caso ela responda a
problemas colocados por uma realidade social e seja vivida conjuntamente por um grupo
social. A função da ideologia histórica é dar unidade ao bloco histórico, que é composto por
classes sociais ou grupos sociais opostos na esfera estrutural da sociedade.
Mais uma vez, vale citar o caráter inovador da conceituação de sociedade civil de
Gramsci, uma vez que a considera como o domínio da ideologia, o que significa o conjunto
das organizações por meio das quais se elabora e difunde a ideologia. A mais citada definição
de sociedade civil de Gramsci, extraída de seu texto “Os intelectuais e a organização da
cultura”, diz que a sociedade civil representa: “o conjunto dos organismos chamados
comumente de privados [que] correspondem à função de hegemonia em toda sociedade”. Para
Gramsci, as relações entre as classes sociais não se limitam ao terreno da produção
econômica, mas também se desenvolvem no terreno ideológico. Portanto, a sociedade civil é
tida como um lugar de transição dos impulsos hegemônicos (CARVALHO, 1983).
Fica claro que a ideologia perpassa o conceito de sociedade civil e hegemonia,
uma vez que o domínio da ideologia não é meramente um campo reflexo da economia; o
domínio ideológico, embora determinado pelo econômico, configura um campo ativo que tem
dinamismo próprio, interferindo na construção do processo hegemônico. E a hegemonia de
uma classe inclui necessariamente a luta no domínio da ideologia, ou seja, a sociedade civil é
um lugar decisivo no exercício da hegemonia, além de ser o espaço das lutas de classes
(CARVALHO, 1983).
A palavra ideologia muitas vezes é substituída pela expressão “domínio moral e
intelectual”, e sua concepção é ampla e abrangente. A ideologia é uma concepção do mundo
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que se manifesta em todos os domínios da vida social e está presente em todos os níveis da
sociedade, como na arte, no direito, na atividade econômica, e em todas as manifestações da
vida individual e coletiva. Gramsci inclui na ideologia as atividades do grupo social dirigente
que parecem menos ideológicas, particularmente as ciências.
A ideologia também compreende uma consciência e uma ética ou normas de
conduta que se difundem em todas as camadas sociais, mantendo coeso o bloco histórico,
embora ela seja assimilada de forma diferente em cada extrato de camada social. Gramsci
acredita que a ideologia assume formas distintas com níveis diferentes de complexidade
correspondentes aos níveis de elaboração das diversas camadas sociais em razão das suas
condições objetivas de vida, o que ele denomina de graus qualitativos, que são diversos, desde
o mais coerente e menos complexo ao menos coerente e mais complexo (CARVALHO,
1983).
Os graus que a ideologia pode alcançar são: a filosofia - o estágio mais elaborado
da concepção de mundo, pois possui o maior grau de coerência, ou seja apresenta mais
nitidamente as características da ideologia; senso comum - traços difusos de certa época e de
um meio popular; religião - religiões contemporâneas, mais crenças passadas, supertições e
etc.; e folclore - nível mais baixo do bloco ideológico, é uma concepção de mundo primitiva e
incoerente (PORTELLI, 1970).
Gramsci acredita que a ideologia penetra toda a sociedade, tanto na perspectiva
horizontal dos diferentes domínios da vida social, como na perspectiva vertical das diversas
classes que constituem a sociedade. Ela tem uma influência decisiva na manutenção,
reprodução ou transformação das relações sociais, constituindo-se uma força efetiva na
história. Para estudar a ideologia, é necessário estudar as relações sociais, as classes sociais e
as relações que mantém entre si, a formação de sua consciência, o nível de sua organização e
sua luta. A ideologia só constitui uma força efetiva enquanto concepção de mundo de uma
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
81
classe, que são as ideologias historicamente orgânicas, necessárias a uma determinada
estrutura. No entanto, há ideologias que são arbitrárias, fruto do desejo e da criação de
indivíduos, sem nenhum sentido histórico. Portanto, a verdade de uma ideologia está na
capacidade de mobilização política; o julgamento das ideologias não se dá segundo um
critério de verdade e falsidade, mas segundo sua função e eficiência em aglutinar classes e
frações de classe (CARVALHO, 1983).
Para a burguesia a ação ideológica é importante para a reprodução e manutenção
das relações de dominação; já para a classe dominada, a ação ideológica é decisiva no seu
projeto de libertação desde que, no interior do bloco histórico, existam as condições objetivas
de transformação, ou seja, a possibilidade de iniciar a construção de sua hegemonia ainda na
sociedade capitalista. De forma geral deve haver uma eficácia da ideologia dominante, uma
vez que há a passividade dos dominados, na medida em que a massa dominada absorve o
pensamento dominante que lhe é imposto de diferentes formas e por diferentes meios, dando-
se, então, o divórcio entre a vida e o pensamento dos dominados, o que impede a organização
das massas como força efetiva de enfrentamento das classes dominantes (CARVALHO,
1983).
2.6. O PAPEL TRANSFORMADOR DA SOCIEDADE CIVIL
A partir da década de 70, principalmente após uma ruptura com o estruturalismo
marxista e com o impacto da escola de Frankfurt com a análise dos meios de comunicação de
massa e as teorias reproducionistas da educação, o casamento entre os conceitos de ideologia
e Estado, passou a explicar de maneira mais satisfatória o que ocorria na dinâmica da
sociedade (ALVAREZ et all, 2000). A discussão em torno das idéias de Gramsci trouxe à
tona o debate em torno da crítica ao reducionismo econômico.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
82
Essa crítica afirma uma imbricação profunda entre cultura, política e economia e
estabelece uma equivalência entre forças materiais e elementos culturais dentro de
uma visão integrada da sociedade como um todo (ALVAREZ et all, 2000, p. 66).
No entanto, a compreensão dos conceitos elaborados por Gramsci não é
homogênea, havendo algumas correntes de interpretações com algumas diferenças entre si.
Segundo Nogueira (2003), há uma tradição associada a Gramsci - a tradição marxista - que
interpreta a sociedade civil como uma “parte orgânica” do Estado, dotado de especificidade,
mas somente compreensível se integrado a uma totalidade histórico-social. As correntes mais
recentes, desvinculadas da tradição marxista, retratam a sociedade civil como uma esfera
separada do Estado e da economia, caracterizada pelo potencial criativo e contestador,
desempenhando um papel de operacionalização de iniciativas e movimentos não
comprometidos com as instituições políticas e as organizações de classe. Nesta corrente a
sociedade civil, diferente de sua conceituação marxista em que era tida como palco de lutas
políticas e empenhos hegemônicos, passa a ter sua imagem vista como um “recurso gerencial
– um arranjo societal destinado a viabilizar tipos específicos de políticas públicas” (p. 187),
ou ainda um “fator de reconstrução ética e dialógica da vida social” (p. 187). Nesta linha de
pensamento há um abandono do sentido marxista do conceito, passando para a perspectiva
liberal-democrática como referência principal para análise de Gramsci.
Para Coutinho (1981) Bobbio é um dos autores que divulgam esta interpretação
equivocada do conceito de sociedade civil elaborado por Gramsci, dando margem a
interpretações liberais, objetivando justificar o papel que se espera que a sociedade civil
assuma nos governos de projeto neo-liberal. Montano (2003), que, em sua obra, faz uma
crítica ao uso do termo “Terceiro Setor”, por sua vez, elabora um resumo - contrastando
Bobbio e Coutinho - das principais idéias referentes ao assunto. Para ele, as principais
distorções a que a interpretação equivocada do conceito de Gramsci pode levar são: o fato de
estabelecer uma distinção entre as esferas da sociedade civil, sociedade política e base
econômica, fundamento para a segmentação da sociedade em três esferas autônomas entre si,
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
83
ou seja, a setorialização tripartite da sociedade – primeiro, segundo e terceiro setor; a outra
interpretação equivocada, também atribuída a Bobbio parte do fato da consideração do
momento político como determinante da transformação social, relegando à esfera econômica
um papel secundário, o que acaba por deixar de lado a noção da totalidade social presente em
Gramsci. Nesta interpretação, que vai de encontro com o pensamento de Nogueira (2003), a
sociedade civil é desprovida dos interesses e conflitos das classes sociais.
Assim sendo, o uso da noção de “sociedade civil” como um “terceiro setor”
(autonomizado dos outros dois “setores” e desgarrado da totalidade social) deriva
antes do conceito do positivismo, do liberalismo vulgar, do funcionalismo, do
estruturalismo, do sistemismo, e das correntes que segmentam a realidade social em
esferas/setores autônomos (MONTANO, 2003, p. 128).
Em meio a este debate conceitual, este trabalho apresenta sua análise sobre o
conceito de sociedade civil e do papel transformador que ela pode ter. Para Nogueira (2003) é
possível pensar no desenvolvimento da sociedade civil a partir de quatro prismas de
influência. O primeiro corresponde a complexificação, diferenciação e fragmentação das
sociedades contemporâneas, que ficaram mais diversificadas e individualizadas com o
desenvolvimento capitalista das últimas décadas. Nesta sociedade, a classe operária – “grande
sujeito histórico da modernidade capitalista” (p. 187) e “vetor de unificação social” (p. 187) –
tem sua importância diminuída, dando espaço a novos sujeitos que nem sempre buscam a
unificação em suas ações. O segundo prisma para análise da sociedade relaciona-se com a
integração econômica que o mundo passa em que redes de comunicação e informação
relativizam o poder dos Estados nacionais. Neste ponto de vista a sociedade ganha mais
transparência e autonomia em sua relação com o político, pela possibilidade das sociedades
estarem mais em contato umas com as outras, o que não diminui as desigualdades sociais,
nem a ameaça da perda de autonomia e originalidade das culturais nacionais. O terceiro
ponto de vista tem como influência a recomposição do conceito de sociedade civil
impulsionada pela crise da democracia representativa e pelas transformações socioculturais
associadas à globalização, com destaque para o protagonismo adquirido pelos meios de
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 2 – A SOCIEDADE CIVIL: USOS E ABUSOS DE UMA CATEGORIA CONCEITUAL
Luiza Reis Teixeira
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comunicação, que alterou a esfera do político, tornando-a mais midiática e menos controlada
pelos tradicionais operadores políticos. O que leva a uma transformação nas estratégias para
produção do consenso, de formação de culturas e construção de hegemonias.
Com a força adquirida pelo projeto neoliberal e o aprisionamento dos Estados
nacionais (e de seus governos) na jaula da globalização, o modo predominante de
produção de consenso acabou por travar a formação e o desenvolvimento de formas
mais politizadas de consciência, em benefício de formas econômico-corporativas e
da expansão de atitudes mentais consumistas, individualistas, medíocres,
indiferentes à vida comum (NOGUEIRA, 2003, p. 188).
Ainda sobre este prisma, é possível afirmar que este movimento trouxe impactos
negativos quanto ao funcionamento e a identidade dos partidos políticos de esquerda, uma vez
que já não era possível reproduzir os sujeitos sociais “clássicos” e as grandes utopias políticas
perdiam espaço. O que levou à reprodução “de organizações e movimentos autônomos em
relação à esfera imediatamente política e a causas de natureza ‘classista’” (NOGUEIRA, p.
188). Pode-se dizer que a disseminação desses movimentos e organizações congestionaram a
sociedade civil, passando a ser confundidos com ela.
De espaço dedicado à articulação política dos interesses de classe – de terreno para a
afirmação de projetos de hegemonia –, a sociedade civil se reduziu a um
acampamento de movimentos. Ganhou-se em termos de organização dos interesses e
mesmo de ativação democrática, mas perdeu-se em termos de unidade política
(NOGUEIRA, 2003, p. 188).
No quarto prisma de análise há a redescoberta da sociedade civil, através da
expansão da cultura democrática e da cultura participativa, com o conseqüente impulso do
ativismo comunitário e dos chamados movimentos sociais. Este prisma de análise expandiu-se
com fim dos regimes ditatoriais na América do Sul e do fim sistema socialista do Leste
europeu, ambos marcados por uma crise do Estado e dos padrões societais vigentes. Portanto,
acredita-se em uma sociedade civil engajada em movimentos que buscam a tradução de suas
agendas em políticas públicas, na expansão das fronteiras da política institucional e na luta
pela redefinição do sentido convencional de cidadania, representação política e participação.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
85
3. TEORIAS E PRÁTICAS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA: EMPREENDIMENTOS
NO BRASIL E NA BAHIA
Este capítulo tem três objetivos: o primeiro é retratar brevemente a teorização
acerca da economia solidária, visando a discutir a evolução do debate acerca da temática da
economia solidária e seu reflexo no atual momento de organização do movimento; o segundo,
analisar as suas origens históricas partindo do pressuposto de que a economia solidária seria
um renascimento do cooperativismo do século XIX; em terceiro e último lugar, visa a analisar
o movimento da economia solidária no Brasil e na Bahia. Esses três objetivos devem permitir-
nos levantar fundamentos sobre o principal questionamento deste trabalho em torno do
projeto sóciopolítico da economia solidária.
Vale ressaltar que por projeto sociopolítico entendemos a visão de mundo que dá
sentido e direção ao movimento (GOHN, 2002). A respeito desta questão concordamos com
Gohn (2002, p. 261) que acredita que, embora não haja “um projeto para o movimento ou do
movimento, para a sociedade, em relação ao conteúdo intrínseco da problemática que o
constitui”, haverá uma visão de mundo oriunda das assessorias ou lideranças que dá sentido e
direção ao movimento, ou mesmo um paradigma ideológico construído fora do movimento
alimentando sua atuação.
Gohn (2002) também acredita que, quando o movimento não possui um projeto
próprio, ele acaba tendo uma atuação sem foco, muitas vezes agindo segundo diretrizes de
partidos, sindicatos ou igrejas. É possível reconhecer o projeto de um movimento a partir de
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
86
seu estudo como um todo, isto é, analisando suas diversas categorias, estruturas e sentidos de
permanência que emprestam caráter de ordem ao cenário em que os empreendimentos se
desenvolvem. Vale ressaltar também que o projeto sociopolítico de um movimento não
corresponde a projetos formais, desenhados a partir da demonstração de etapas para a
resolução de um problema. A autora também pondera que o projeto sociopolítico ou cultural
de um movimento social é uma questão polêmica, uma vez que se acredita em sua possível
morte na era neoliberal. A análise do projeto sociopolítico da economia solidária tem estreita
relação com a teoria de Gramsci sobre a práxis transformadora de superação econômica e
ideológica do modo de produção dominante por meio de movimentos que partem da
sociedade civil, como analisamos no capítulo anterior. É por isso que, no terceiro ponto deste
capítulo, dedicado à análise do movimento da economia solidária no Brasil e na Bahia,
lançamos mão da proposta teórico-metodológica elaborada por Gohn (2002).
3.1. TEORIZAÇÃO ACERCA DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
A temática da economia solidária tem conquistado uma visibilidade crescente nos
últimos anos. No meio acadêmico, diferentes áreas do conhecimento, tais como economia,
sociologia e administração, publicam estudos sobre o tema (FRANÇA, 2002). Além do
interesse da academia, é possível verificar que diferentes atores da sociedade civil têm
participado do movimento da economia solidária. Integram o movimento da economia
solidária atores com uma trajetória anterior ao próprio movimento, mas que fizeram a opção
pela economia solidária. Entre eles podemos destacar o Movimento dos Sem-terra, a Agência
de Desenvolvimento Solidário (ADS), vinculada à Central Única dos Trabalhadores (CUT),
entre outros. Várias hipóteses podem explicar esse fenômeno, por exemplo, o efeito de moda
associado ao tema da economia solidária ou a institucionalização da temática no âmbito do
governo Lula; no entanto, acreditamos que os envolvidos no movimento vêem nele ideais de
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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transformação social, baseados na transformação do sistema, ou seja, uma alternativa de
regulação da sociedade para exclusão dos efeitos nocivos do capitalismo.
Pode-se dizer que há um grande debate em torno do campo conceitual da
economia solidária no Brasil e no mundo. Os autores (SOUZA SANTOS, 2002; SINGER,
2001; FRANÇA e LAVILLE, 2004; CATTANI, 2003; GAIGER, 2001) que estudam o tema
fazem interpretações diferenciadas da temática, partindo de distintas correntes econômicas,
sociológicas e/ou filosóficas, assim como adotam conceitos e denominações diferenciados
para referirem-se ao que, supostamente, seria o mesmo fenômeno empírico. No entanto, a
diversidade nas teorizações acerca da economia solidária não é originada em sua longa
trajetória de estudos, como no caso do conceito de sociedade civil (retratado no capítulo
anterior), cujas origens remontam ao período grego clássico. O conceito de economia
solidária passa a ser discutido, sob esta denominação, a partir da década de 1980 (LECHAT,
2002), mesmo tendo sua origem atribuída ao movimento cooperativista de Rochdale na
Inglaterra do século XIX, ou às Associações de Ajuda Mútua na França no mesmo século. Na
verdade, as denominações e conceituações na maioria das vezes são diferentes por partirem de
realidades sociais e experiências distintas. Contudo, as características destas experiências
possuem um núcleo comum, qual seja: o individualismo competitivo característico do
comportamento econômico padrão nas sociedades capitalistas é substituído pela idéia da
solidariedade. É provável que, em nome desse denominador comum de natureza política e
militante, os diferentes intelectuais do campo façam um esforço a fim de estabelecer diálogos
teóricos e metodológicos com o objetivo de alinhar minimamente os contornos conceituais da
temática.
A ampla divulgação do tema da economia solidária tem suscitado diversas
controvérsias e indagações. O próprio termo já apresenta inúmeros sinônimos para a definição
do mesmo fenômeno, tais como: economia solidária, economia popular, economia do
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
88
trabalho, economia popular e solidária e socioeconomia solidária. Todos estes sinônimos
retratam experiências baseadas na organização cooperativa ou associativa, de caráter
democrático e fundamentada no princípio da solidariedade. Conforme atesta a pesquisa
realizada em 2004 pela Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia ao falar
no conjunto das experiências pesquisadas:
(...) referem-se às diferentes formas de organização coletiva de trabalhadores
voltadas para a geração de trabalho e renda, tendo, entre os seus traços
característicos, a gestão autônoma, participativa e democrática, o compromisso com
a auto-sustentabilidade e a busca do desenvolvimento humano integral. (SEI, 2004,
p. 12).
Portanto, entre as organizações que fazem parte do campo da economia solidária,
também conhecidas como empreendimentos econômicos solidários, podemos citar iniciativas
como as associações e cooperativas de trabalhadores rurais e urbanos, produtores de bens e
serviços, centrais de comercialização, empresas autogestionárias, cooperativas de crédito,
clubes de trocas e as organizações atuando no campo do chamado comércio justo.
Gaiger (2000), por exemplo, acredita que o conceito de economia solidária
carrega algo de projeção que manifesta um ideal a ser alcançado, pois reflete o esforço de
sistematização e elaboração teórica, e de desejo, expressando utopias. Isso significa que há,
primeiramente, uma idealização e uma prefiguração do que seria uma economia solidária,
para depois, trabalhar o seu sentido. Trata-se de um conjunto de teorias normativas, visto que
é possível enxergar no conceito que cada um procura, deseja ou projeta os valores e práticas
que os autores acreditam que devem permear um modelo de economia e sociedade a serem
construídas. Vale ressaltar, portanto, que se trata de conceitos que estão em construção,
freqüentemente e, em alguns casos, marcadamente inscritos na subjetividade de seus autores.
Outro exemplo concreto deste processo de falta de consenso conceitual versus o
esforço empreendido para um alinhamento conceitual está registrado na obra organizada em
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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uma coletânea de artigos por Cattani (2003), classificada por ele mesmo como “plural”, em
que são definidos quarenta verbetes que compõem o campo de discurso da economia solidária
– Associativismo, Cadeias Produtivas Solidárias, Capital Social, Desenvolvimento Local,
Economia da Dádiva, Economia do Trabalho, Economia Moral, Economia Popular,
Identidade e Trabalho Autogestionário, Socialismo Autogestionário, Solidariedade, Trabalho
Emancipado, Utopia, entre outros - a partir de uma estrutura básica contendo os seguintes
aspectos: definição sintética, gênese e desenvolvimento histórico do conceito, controvérsias,
atualidade e validade do conceito. A introdução da obra já anuncia que seu objetivo é
“clarificar e precisar conceitos e teorias relacionados aos processos alternativos à economia
capitalista” (p. 13), e que “não se hesitou em destacar as controvérsias, impasses e mesmo as
contradições existentes” (p. 14). Ou seja, uma identificação comum entre os autores ao
fazerem parte de um movimento alternativo à economia capitalista - “um importante e sólido
movimento de construção de um mundo melhor” (p. 11), mas há também o reconhecimento
de que não há um consenso conceitual entre eles, uma vez que há uma grande variedade de
conceitos que se baseiam, tanto em experiências concretas, como em dimensões abstratas,
quer sejam projetos, valores ou percepções distintas.
Esse livro constitui-se em mais uma tentativa de organização do arcabouço teórico
da economia solidária através do refinamento de seus conceitos teóricos e do estabelecimento
de diálogo entre várias teorias. A necessidade de construção de conceitos e teorias com o
objetivo de conhecer e apropriar-se corretamente da natureza e potencialidades destes
fenômenos é ressaltada pelo seu organizador. A leitura das definições de verbetes tais como
economia solidária, socioeconomia solidária, economia do trabalho e economia popular, como
indicamos a seguir, corrobora o que já foi dito a respeito da ampla variedade de contextos de
origem e desenvolvimento, além das diferentes filiações teóricas que cada um deles pode
representar.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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Verbete / Autor Conceito
Economia Solidária
Paul Singer
Economia solidária é hoje um conceito amplamente utilizado dos dois
lados do Atlântico, com acepções variadas, mas que giram todas ao redor
da idéia da solidariedade, em contraste com o individualismo competitivo
que caracteriza o comportamento econômico padrão nas sociedades
capitalistas (p. 116).
Socioeconomia Solidária
Marcos Arruda
O termo socioeconomia solidária equivale à economia solidária, tendo
como única diferença a ênfase no sentido social que deve ter a verdadeira
economia – aquela que é fiel ao seu sentido etimológico gestão,
cuidado da casa e, por conseqüência, dos que nela habitam (p. 232).
Economia do Trabalho
José Luis Coraggio
A economia do trabalho pode ser cabalmente compreendida somente
quando em contraponto com a economia do capital; pois é, como outras
propostas a serem tratadas nesta obra, uma possibilidade a ser
desenvolvida a partir de contradições no seio do sistema capitalista, hoje
em transição incerta a outro sistema-mundo (p. 88).
Economia Popular
Ana Mercedes Sarria Icaza e Lia
Tiriba
Entende-se por economia popular o conjunto de atividades econômicas e
práticas desenvolvidas pelos setores populares no sentido de garantir,
com a utilização de sua própria força de trabalho e dos recursos
disponíveis, a satisfação de necessidades básicas, tanto materiais como
imateriais (p. 101).
Quadro 1 – Campo Conceitual da Economia Solidária
Fonte: elaboração própria a partir de Cattani, 2003.
O conceito de economia solidária tende a ser o mais abrangente, englobando os
outros conceitos apresentados. Para Motta (2004), a expressão “economia solidária"
possibilita a união de diversos tipos de experiência em um único campo de idéias, além do
agrupamento de diversas entidades, instituições e pessoas em torno de objetivos comuns. A
autora ainda ressalta que muitos empreendimentos e idéias que surgiram numa época anterior
a esta denominação passaram a ser reconhecidos a posteriori como pertencentes ao mundo da
economia solidária.
O termo reorganiza uma variedade de idéias, conceitos, ao mesmo tempo que se
constrói a partir deles. Pode-se dizer que o que a ES traz de original é justamente
uma forma particular de organizar elementos já existentes, como as experiências de
educação popular, a ação da Igreja católica junto a comunidades, as propostas de
empresas autogeridas, o cooperativismo, etc. (MOTTA, 2004, p. 64).
Nota-se aí mais uma tentativa de unificação do conjunto das iniciativas da
economia solidária. Gaiger (2004), ao comparar o termo economia solidária com economia
popular e solidária reafirma o seu posicionamento em relação à utilização do conceito de
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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economia solidária, pelo fato de ele ser mais abrangente e abarcar todas as outras formas não
populares de solidarismo econômico, uma vez que as atividades econômicas solidárias não
estão restritas à base popular, mas também envolvem outros setores e classes sociais. Para ele,
o termo economia popular e solidária tem uma abrangência menor, designando apenas as
expressões populares da economia solidária, o que empobrece o fenômeno, pois não
compreende o escopo de toda a variedade de experiências desenvolvidas.
Os autores da economia solidária (FRANÇA, 2001; GAIGER, 2004; LECHAT,
2002) diferenciam o marco teórico do Terceiro Setor e da economia solidária, uma vez que as
organizações identificadas como pertencentes ao Terceiro Setor têm características
diferenciadas daquelas identificadas com a economia solidária: a economia solidária tem a
característica de ser expressão da democratização da economia (GAIGER, 2004), ao passo
que o Terceiro Setor é sempre identificado com uma tradição filantrópica anglo-saxônica
(FRANÇA, 2001).
Outra distinção necessária é entre a compreensão latino-americana da economia
solidária em relação à conceituação européia. A tradição européia é mais antiga e tem uma
tradição da economia social que surge com o movimento operário associativista na Europa, no
século XIX, onde várias experiências solidárias inspiradas nos ideários da ajuda mútua
(mutualismo), da cooperação e da associação emergiram. Estas experiências tiveram, desde o
princípio, um caráter de contestação à utopia do mercado auto-regulado e à autonomia do
aspecto econômico sobre as outras dimensões da vida (social, político, cultural). As
experiências da economia social também foram conhecidas como socialismo utópico, pois
tinham um ideal de transformação social, sem a tomada do poder político via aparelho do
Estado, mas sim pela construção de uma nova hegemonia, através da multiplicação das
experiências (FRANÇA, 2001).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
92
Não figura entre os objetivos desta dissertação, entretanto, aprofundar as
diferenças de cada um desses conceitos relacionados ao campo da economia solidária, ou
mesmo explicar como as diferentes filiações teóricas podem influenciar o tema, uma vez que
o próprio movimento de economia solidária está, ainda atualmente, na busca de um consenso.
Cabe, portanto, explicitar que a filiação teórica deste trabalho seguirá uma linha de
pensamento em que a economia solidária é definida como um modo de produção alternativo
ao capitalismo, diferentemente do pensamento que considera a economia solidária como uma
outra forma de regulação da sociedade que se articula com o Estado e com o mercado apesar
de não estar subordinado a estes. Isto porque uma das categorias de análise deste trabalho é o
conceito de sociedade civil gramsciana, dotada de autonomia para o desenvolvimento de
novas ideologias que podem contestar a ideologia hegemônica, qual seja a do modo de
produção capitalista atual.
Singer (2002 e 2003) percebe a economia solidária como um fenômeno
econômico e a reconhece como um modo alternativo de produção, que caminha com a
sociedade mercantil. O seu crescimento é atribuído às crises sociais que a competição cega
dos capitais privados ocasiona periodicamente em cada país. Singer (2004 apud FRANÇA e
LAVILLE, 2004) fala de sua inspiração marxista e de como o capitalismo - modo de
produção dominante - não consegue abranger a totalidade das economias contemporâneas. A
diferença que se pretende estabelecer é que a economia solidária não será interpretada
enquanto um caminho de desenvolvimento local em bases solidárias e em convivência com a
sociedade mercantil, mas como um novo modelo de regulação econômica das relações de
produção.
Contudo, embora o conceito de economia solidária adotado pelo Sistema Nacional
de Informações para Economia Solidária (SIES) vinculado à SENAES seja mais amplo – uma
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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espécie de conceito guarda-chuva e consensualista – e abranja uma gama maior de definições
acerca do fenômeno, esta dissertação adotará uma definição mais particular.
No âmbito do SIES a Economia Solidária é compreendida como o conjunto de
atividades econômicas – de produção, distribuição, consumo, poupança e crédito –
organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob a
forma coletiva e autogestionária.
Neste conjunto de atividades e formas de organização destacam-se quatro
importantes características: cooperação, autogestão, viabilidade econômica e
solidariedade. É necessário perceber que essas características, embora sejam
complementares e nunca funcionem isoladamente, podem ser observadas e
compreendidas objetivamente como categorias analíticas diferentes, mas sempre
presentes na Economia Solidária (SIES, 2006).
O conceito aqui adotado de economia solidária é o seguinte:
(...) o conjunto de atividades econômicas – de produção, distribuição, consumo,
poupança e crédito – organizadas sob a forma de autogestão, isto é, pela propriedade
coletiva do capital e participação democrática (cada cabeça um voto) nas decisões
dos membros da entidade promotora da atividade. (SINGER: 2003, p. 5)
Além dos empreendimentos de economia solidária, é possível destacar o papel das
entidades de apoio, assessorias ou fomento que “desenvolvem ações nas várias modalidades
de apoio direto junto aos empreendimentos econômicos solidários” (SIES, 2006). Estas ações
podem ser bastante variadas, envolvendo capacitação, assessoria, incubação, assistência
técnica e organizativa e acompanhamento.
3.2. ECONOMIA SOLIDÁRIA: RENASCIMENTO DO COOPERATIVISMO
Para Singer (2002) a economia solidária surge a partir da reação da classe operária
e a sua conseqüente organização em um movimento de crítica às contradições do capitalismo.
Singer (1998) explica que o fim da Idade Média é marcado pela ascensão das forças
produtivas que estavam estagnadas pela auto-suficiência feudal e pelo renascimento do
comércio entre o Ocidente e Oriente. O renascimento comercial, por sua vez, levou ao
crescimento das cidades e ao desenvolvimento da burguesia como classe social ascendente.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
94
No entanto, o capitalismo passa a ser legalmente reconhecido apenas em 1688, com a
Revolução Gloriosa na Inglaterra, quando houve a conquista de um governo livre, com “a
proposta da livre competição, da liberdade de iniciativa, da retirada da intervenção estatal dos
mercados” (p. 30) – trata-se do início do liberalismo. E mesmo assim, antes da Revolução
Industrial, o capital mercantil que já tinha se desenvolvido, ainda não ocupava uma posição
dominante, ou seja, a produção simples de mercadoria
1
ainda era predominante. Foi no último
quartel do século XVIII, com a Revolução Industrial e os avanços na produção que vieram a
partir dela, que a indústria se configurou de tal forma que a produção simples de mercadorias
deixou de ser viável, uma vez que as novas forças produtivas (o sistema fabril, as linhas
férreas, entre outros) não poderiam se adequar ao sistema antigo de produção. O capitalismo
se mostrou, então, capaz de produzir riquezas numa escala muito maior e sem precedentes,
ganhando aos poucos espaço até se tornar o modo hegemônico de produção. À expansão do
capitalismo também seguiu-se a aliança da pressão exercida pelos produtores artesanais rurais
e urbanos que exigiam respeito pelos seus direitos de livre produção, somada ao
aproveitamento de uma vasta população que havia sido liberada dos campos com o declínio
da produção feudal.
A partir das regras que protegiam o antigo regime de produção, o capitalismo teve o
caminho livre para se tornar o modo hegemônico de produção. Era preciso, portanto,
iniciar imediatamente a formulação de novas regras que protegessem a nova
hegemonia. A base ideológica destas regras só podia ser o laissez-faire. É aí que a
revolução capitalista revela o seu aspecto mais revolucionário. Instituiu-se o
individualismo, a supremacia da relação monetária (o cash-nexus, como dizem os
“americanos”), o predomínio do auto-interesse, sendo a solidariedade social relegada
ao âmbito privado e íntimo da religião (SINGER, 1998, P. 62).
O fim do século XVIII é, portanto, marcado pela expansão do capitalismo:
imposição da livre concorrência e, conseqüente, estímulo do progresso técnico que passou a
criar conjuntos produtivos cada vez mais vastos; a substituição da produção artesanal e
1
Por “produção simples de mercadoria” quer-se afirmar “produção camponesa familiar realizada no campo e
produção artesanal corporativa realizada nas cidades”.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
95
manufatureira pela maquinofatura e pelo trabalho assalariado em fábricas e grandes redes de
transporte e comunicação. A maquinofatura e a subseqüente especialização do trabalho levou
a uma homogeneização dos trabalhadores, que deixaram de ter o controle sobre suas
produções. Enquanto eram artesãos, os trabalhadores tinham o controle de seu produto final, o
que deixa de existir com a expansão do trabalho assalariado.
Não há dúvida que a revolução capitalista inaugurou um processo contínuo de
expropriação dos conhecimentos técnicos dos trabalhadores qualificados, o que
acabou resultando na homogeneização crescente da classe operária (SINGER, 1998,
p. 68)
.
O capitalismo em sua fase de expansão passa a ser marcado por uma lógica cada
vez mais concentradora, impulsionada por grandes empresas industriais. O mercado
consumidor era limitado e girava em torno do consumo de alto luxo das elites. As classes
sociais passaram a ser divididas entre o pólo da alta burguesia e o pólo do proletariado. As
reações da classe operária eram marcadas por enfrentamentos de extrema violência: revoltas
operárias radicais de um lado e repressão sem concessões de outro. O crescimento do capital
era impulsionado pela expansão do Império Britânico (Pax britannica), e mercados
periféricos e coloniais eram abertos à força de canhões e baionetas (CATTANI, 2004).
As reações da classe operária ao avanço do modo de produção capitalista, que
causou o empobrecimento dos artesãos e teve origem na difusão das máquinas e a
organização fabril da produção, são classificadas em três níveis (SINGER, 1998):
1. A oposição ao industrialismo e defesa dos direitos adquiridos no antigo regime
feudal: neste nível de reação a classe operária se unia em prol dos direitos
existentes antes da institucionalização dos postulados da doutrina liberal, que na
verdade eram privilégios monopolistas de produção, uma vez que os mercados
eram regulados pelas autoridades com a finalidade de manter os interesses
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
96
estabelecidos. No entanto, esta reação não foi vitoriosa, pois não foi possível frear
a Revolução Industrial que estava em curso;
2. Lutas pela democracia baseadas nos ideais da Revolução Francesa: neste caso, os
trabalhadores se uniam para lutar contra o uso de máquinas, pois se sentiam
ameaçados pela fome e miséria. As lutas eram violentas e as organizações
operárias clandestinas, uma vez que os sindicatos estavam proibidos. É possível
destacar o movimento luddista, como o único movimento que “assumiu
proporções regionais e características de organização” (SINGER, 1998, p. 69);
3. Por fim podemos citar a forma de reação operária que vamos aprofundar neste
capítulo: o desenvolvimento de “formas próprias, potencialmente anticapitalistas
de organização social – o sindicalismo – e de organização da produção e
distribuição – o cooperativismo” (p. 68). Estas reações da classe operária foram
protagonizadas, num primeiro momento, por trabalhadores qualificados, ideólogos,
líderes políticos, sindicais e cooperadores.
Para explicar a origem da economia solidária, portanto, autores como Singer
(2002), Sousa Santos (2002), Gaiger (2000), Moura e outros (2004), entre outros, traçam um
paralelo entre as condições vividas pelos trabalhadores europeus no fim do século XVIII e
começo do século XIX com os trabalhadores brasileiros nos anos 1980 e, principalmente, nos
anos 1990. Por isso, o movimento que existe na atualidade é visto como tendo raízes na
Europa há quase dois séculos. E, como no passado as soluções buscadas pelos trabalhadores
também estavam ligadas à cooperação, atribui-se o mesmo nome às práticas contemporâneas
e àquelas mais antigas. Isso quer dizer que as práticas e idéias defendidas no século XIX
recebem hoje o nome de “economia solidária”, apesar de não terem sido assim reconhecidas e
batizadas em sua concepção (MOTTA, 2004).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
97
Portanto, o movimento de reação operária ao capitalismo através da organização
da produção e distribuição – o cooperativismo – inicia-se a partir da idealização do industrial
Robert Owen (1770-1858), um dos precursores do cooperativismo, que propôs a utilização
das forças produtivas proporcionadas pelas máquinas com o objetivo de acabar com a miséria
e garantir a todos os trabalhadores uma vida digna (SINGER, 1998). Owen também foi um
ativo defensor da união das classes trabalhadora em nível nacional e internacional, além de
defender um movimento denominado Novo Mundo Moral, em favor da construção de um
novo mundo através de colônias ou comunidades cooperativas (CANÇADO, 2004).
Robert Owen era proprietário e gerente de um complexo têxtil de grande porte em
New Lamark, e era conhecido como um filantropo, pois acreditava e colocava em prática um
pensamento em que o capital investido deveria ter um lucro limitado e o excedente deveria ser
investido a favor dos trabalhadores. Com base em sua filosofia, Owen decidiu limitar as
jornadas de trabalho, proibiu o emprego de crianças e aumentou os salários, o que
incrementou a sua produtividade (SINGER, 1998).
Em 1817, Owen apresenta uma proposta de combate à grande depressão que
assolou a Europa após as guerras encerradas em 1815. Owen desenvolveu um plano de ganho
e gasto no consumo para a ampliação do mercado, como uma forma de reinserção dos
trabalhadores. No entanto, o plano de combate à pobreza apresentado por Owen ao governo
britânico, baseado na construção de Aldeias Cooperativas para subsistência, não foi
implementado, apesar de o plano de custos ser minucioso e demonstrar a desnecessidade da
continuidade dos subsídios oferecidos pelo governo ao longo do tempo. Este plano seguiu o
mesmo raciocínio econômico (política de pleno emprego para aumento da demanda efetiva)
do programa elaborado por Keynes e implementado na crise de 1930. Acredita-se que o
motivo do plano de Owen não ter sido implementado foi o fato de buscar romper com o
sistema social e extinguir a empresa lucrativa capitalista (SINGER, 2002).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
98
Mas quanto mais Owen explicava o seu ‘plano’, mais claro se tornava que ele estava
propondo não simplesmente um meio de baratear a subsistência dos pobres, mas
uma mudança completa do sistema social e a abolição da empresa capitalista voltada
ao lucro (COLE, 1944, p. 20 apud SINGER, 1998, p. 71).
Com isso, Owen partiu para os Estados Unidos onde fundou, em 1825, a primeira
Aldeia Cooperativa, considerada uma colônia de caráter comunista (CANÇADO, 2004), mas
que não teve muito êxito, fazendo com que Owen logo retornasse à Inglaterra. Contudo, a
partir dos anos 1820 houve uma ascensão do owenismo entre a classe operária britânica,
potencializada pela estagnação da economia inglesa nas décadas seguintes ao fim das guerras
de 1815 (SINGER, 1998).
A partir de 1820, a classe operária britânica, a primeira a se defrontar com uma
revolução capitalista, abandona a luta contra a o progresso técnico e passa a se
engajar em outra utopia, a de construção de um novo mundo à base das novas forças
produtivas mas em que a cooperação e igualdade tomem o lugar da competição e da
exploração (SINGER, 1998, p. 73)
Neste período o movimento sindicalista também cresceu desencadeado pela
revogação dos Combination Acts. Legislação esta que proibia qualquer organização de
trabalhadores e inviabilizou a existência de muitos sindicatos. Em 1824, com a sua revogação,
o sindicalismo ganhou novo impulso (SINGER, 2002).
A revogação do Combination Acts propiciou o ressurgimento com muito vigor dos
sindicatos, muitos dos quais tinham sido esmagados pela repressão, enquanto outros
haviam mergulhado na clandestinidade (SINGER, 1998, p. 79).
O movimento sindicalista iniciou, então, uma série de lutas para na busca de um
amparo institucional por parte do Estado, seja pela obtenção de uma legislação trabalhista,
seja pela legalização dos sindicatos operários, ou ainda por meio da realização de greves. O
movimento operário iniciou aí lutas que até os dias de hoje fazem parte do seu repertório de
conquistas. O movimento sindicalista ressurgido após a revogação dos Combination Acts
passou a ser influenciado por ideais owenistas de união da classe operária para a proteção
mútua e criação de um novo sistema social. A criação da Associação Nacional para a Proteção
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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do Trabalho no Reino Unido em 1930, idealizada pelo líder sindical John Doherty, corrobora
o que foi dito (SINGER, 1998).
A primeira cooperativa surgida, com existência documentada, data do ano de
1760, e foi formada por trabalhadores de estaleiros que fundaram moinhos de cereais em
bases cooperativas para eliminar a intermediação feita pelos moleiros que cobravam altos
preços para o processamento do trigo. Antes ainda da virada do século há o registro do
surgimento de outras cooperativas atribuídas a um provável desdobramento lógico das
atividades das uniões de trabalhadores existentes e formadas por trabalhadores qualificados
(SINGER, 1998). Como no século passado as idéias owenistas ainda não haviam sido
difundidas, o surgimento da primeira cooperativa com inspiração nas idéias de Owen é
registrada apenas em 1820. Criada por George Mudie entre profissionais do ramo do
jornalismo, a cooperativa publicou o primeiro jornal cooperativo, o The Economist. A
cooperativa não durou muito tempo e fechou em 1827, mas o cooperativismo vivia um
momento de ascensão no seio da classe trabalhadora (SINGER, 2002).
O ano de 1833 foi o auge das cooperativas operárias, bem como o ano em que
Owen voltou a assumir a liderança da militância sindical, propondo a criação da Grande
União Nacional Moral das Classes Produtivas do Reino Unido, em substituição a Associação
Nacional para a Proteção do Trabalho criada anteriormente por Doherty. O objetivo da União
era tomar toda a indústria do país através de delegados de cada ofício organizado, em base de
uniões paroquiais, distritais e provinciais. Esta atitude já demonstrava como o cooperativismo,
“em seu berço ainda, já se arvorava como modo de produção alternativo ao capitalismo”
(SINGER, 2002, p. 33). No entanto, a reação dos patrões veio em forma de repressão política
por parte do executivo e do judiciário, trazendo à tona um confronto de classes de natureza
política e econômica. Os empregados sindicalizados passaram a ser demitidos e, apesar da
tentativa de organização dos trabalhadores em cooperativas, o movimento foi esvaziado e os
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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100
trabalhadores foram sendo obrigados a abandonar os sindicatos. Essa primeira fase da
Economia Solidária é denominada de “cooperativismo revolucionário”. Singer (2002) acredita
que Marx e Engels tiveram papel de inspiradores de forma direta nesta fase do
cooperativismo.
O movimento operário britânico passou então, por um período de letargia até a
fundação, em 1944, de uma sociedade cooperativa, a Society of Equitable Pioneers, em
Manchester na Inglaterra. Para Singer (1998 e 2002), a Cooperativa dos Probos Pioneiros
Eqüitativos de Rochdale inaugura uma nova fase do cooperativismo, já para Cançado (2004)
ela é tida como a primeira cooperativa a existir, por ter sistematizado seus princípios e valores
em seu estatuto. A experiência se deu como uma cooperativa de consumo
2
, era formada por
28 operários (27 homens e uma mulher) qualificados de diversos ofícios, e entre seus
objetivos estava não apenas a compra de alimentos puros a preços justos, mas também “a
educação dos membros e familiares, o acesso à moradia e ao trabalho (através da compra de
terra e fábricas) para os desempregados e os mal remunerados” (CANÇADO, 2004, p. 30),
além do estabelecimento de uma colônia cooperativa auto-suficiente (CANÇADO, 2004).
Segundo Cançado (2004) alguns dos fundadores da Cooperativa de Rochdale já
haviam participado de outras organizações cooperativas, e aderiram à corrente cooperativista
moderada de O‘Connor, irlandês que era um crítico de Owen e dos owenistas, pois os
considerava utópicos, uma vez que não conseguiam melhorar as condições do trabalhador
efetivamente. Cançado (2004) ainda ressalta a experiência anterior de muitos dos pioneiros de
Rochdale que participavam de movimentos em prol da melhoria das condições de trabalho, o
que proporcionou um maior amadurecimento das idéias cooperativas na constituição da
cooperativa de Rochdale.
2
Tipo de cooperativa que tem como objetivo central fornecer produtos em melhores condições de preço, prazo e
qualidade.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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101
A maioria dos princípios adotados em Rochdale tornaram-se os princípios do
cooperativismo mundial até os nossos dias, fornecendo os princípios de igualdade e
democracia considerados como base do cooperativismo “autêntico”, muito embora alguns já
estejam obsoletos e não façam mais sentido. Eles são: a) Direito de voto à todos os membros
da cooperativa; b) Qualquer pessoa que quisesse aderir à cooperativa poderia; c) Seria paga
uma taxa de juros fixa sobre o capital emprestado; d) As sobras seriam divididas igualmente
entre os membros; e) As vendas seriam feitas à vista; f) Os produtos vendidos seriam sempre
puros; g) A cooperativa se empenharia na educação da cooperativa; h) A cooperativa não se
envolveria em questões religiosas e políticas (SINGER, 2002).
O êxito de Rochdale proporcionou uma grande expansão do cooperativismo, em
sua forma moderna, na Grã-Bretanha (SINGER, 2002). Em 1881, o número de associados a
cooperativas chegava a 547 mil e, em 1900, já eram 1.707 milhão na Grã-Bretanha, com
1.186 membros, movimentando 34.746 libras. Esta expansão é creditada às inovações trazidas
pelas cooperativas ao comércio varejista e atacadista (formação de redes de consumo e
cadeias completas de produção). Isto fez com que o cooperativismo de consumo dominasse o
mercado varejista e atacadista britânico e em outros países. A vantagem inicial do
cooperativismo de consumo era o mercado assegurado, uma vez que era possível ter o
cadastro de todos os clientes (SINGER, 2002).
O cooperativismo de crédito é o segundo tipo, em ordem cronológica, nascido
também a partir da Cooperativa de Rochdale, que passou a fazer depósitos para os seus
associados com uma taxa de juros fixa, mas sem a possibilidade de realizar empréstimos. As
cooperativas de crédito, de fato, surgiram na Alemanha, fundadas por dois homens públicos
(Herman Schulze e Friedrich Wilhelm Raiffeisen) que se sensibilizaram com a perda de safra
de diversos agricultores depois de um rígido inverno. Elas funcionavam a partir do princípio
de responsabilidade ilimitada (um por todos e todos por um), os empréstimos eram destinados
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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102
ao financiamento de investimentos produtivos, e a garantia era, basicamente, assegurada pelo
caráter dos membros. Estas características fizeram com que este tipo de cooperativa passasse
a ser reconhecida como “Banco do Povo”. Outra variação do cooperativismo de crédito foi
desenvolvido na Itália - embora com algumas variações – fundado por Luzzatti, que estudou o
cooperativismo na Alemanha (SINGER, 2002).
Além das cooperativas operárias que se formavam, havia as sociedades de
propaganda owenista que tinham como objetivo fundar Aldeias Cooperativas para organizar
de forma integrada produção e consumo. Owen e outros socialistas da época rejeitavam o
comércio visando o lucro, o que consideravam parasitário, impulsionando os clubes de troca
na época, em que os cooperadores poderiam trocar os seus produtos através de moeda própria
equivalente a horas trabalhadas e avaliadas por um comitê formado por profissionais de cada
ramo.
Outro autor que contribuiu para os fundamentos da Economia Solidária era
francês: Charles Fourier. Ele não chegou a ser um homem de ação como Owen, sendo suas
idéias mais próximas ao anarquismo. A idéia central de Fourier era que a sociedade fosse
organizada de uma forma que todas as paixões humanas pudessem produzir uma harmonia
universal. O objetivo da organização imaginada por Fourier era que o trabalho fosse
disponível e atraente para todos, e com isso haveria um enorme aumento na produtividade e
na produção. A idéia era formar uma comunidade, o falanstério, não-coletivista, com a
preservação da propriedade privada e a liberdade individual de mudar de trabalho, com a
propriedade coletiva dos meios de produção, mas com a repartição do trabalho a partir de
cotas específicas pelo trabalho, capital investido e pelo talento. Nesta organização social, as
preferências individuais (de consumo e de trabalho) deveriam ser preservadas. Também as
ações deveriam dar rendimento maior para as pessoas que possuíssem menos, e uma renda
mínima deveria ser distribuída a todos, mesmo aos que não trabalhassem (SINGER, 2002).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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103
O sistema pensado por Fourier é considerado uma variedade do socialismo de
mercado, com a liberdade individual com a livre escolha dos trabalhos, que, por sua vez, são
organizados em equipes e na propriedade por ações dos meios de produção. Esta concepção,
chamada de escola associativa, foi bastante difundida na França até 1848, às vésperas da
revolução (SINGER, 2002).
É possível afirmar que o cooperativismo expandiu-se por toda Europa continental
durante o século XVIII. Além da Inglaterra, na Alemanha foram criadas as cooperativas de
crédito, enquanto na França os Falanstérios - comunidades para centenas de famílias onde
seria promovida a abundância e a igualdade. O cooperativismo também se espalhou por outras
partes da Europa, chegando à Suíça (1851), Itália (1864), Dinamarca (1866), Noruega (1885),
Suécia (1899), entre outros. O desenvolvimento do cooperativismo nestes países tomou
grande importância econômica (CANÇADO, 2004).
Após um grande período de expansão, em que se pensava na realização do
socialismo através da Republica Cooperativista e o cooperativismo de consumo seria uma
economia nacional, o cooperativismo entra em declínio. Em 1916, nos Estados Unidos surge a
loja de departamentos, que revolucionou o mercado varejista americano, reduzindo os custos
de intermediação entre compradores e vendedores, aliado ao investimento massivo em
propaganda, gerando uma maior comodidade aos consumidores. Isto fez com que as
cooperativas de consumo deixassem de ter a vantagem competitiva de antes, entrando em
processo de decadência (SINGER, 2002).
Estas inovações reduziram profundamente o custo intermediação, mas não eram
aplicáveis pelas cooperativas de consumo, que eram entidades comunitárias,
formadas por vizinhos de bairro e que vendiam apenas a sócios. Repugnava aos
cooperadores a concorrência, o recurso à propaganda comercial visando ao lucro e a
massificação (SINGER, 2002, p. 55).
Em quarenta anos as cooperativas de consumo na Grã-Bretanha caíram de mil
para cinqüenta. Em outros países, tais como Alemanha e Áustria, o declínio seguiu o mesmo
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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curso. Em alguns países como a Suécia, algumas alternativas, como a criação do auto-serviço,
supermercados e congelados, foram adotadas na tentativa de contornar a crise. A trajetória do
cooperativismo de crédito não é diferente do cooperativismo de consumo, ou seja, acaba
entrando em declínio após o período de expansão, pois passa a enfrentar a concorrência de
intermediários financeiros privados e públicos (SINGER, 2002).
Outros fatores que modificaram a estrutura do sistema capitalista devem ser
considerados na análise do cooperativismo. É possível afirmar que após a primeira guerra o
capitalismo entra em seu segundo modelo de expansão: com o crescimento da presença do
Estado na economia que passa a regular o mercado, promover investimentos, e desenvolver
políticas sociais compensatórias nas áreas de educação, saúde, habitação e transporte,
impulsionado pelas políticas keynesianas; a consolidação do movimento operário, através do
funcionamento dos sindicatos, da construção dos partidos trabalhistas e social-democratas,
promovendo a ampliação de direitos sociais para um número crescente de pessoas
(CATTANI, 2004).
Durante um tempo houve a inclusão de um número grande de pessoas à esfera
social. Entre 1945 e início dos anos 70, o capitalismo atravessou o maior crescimento
econômico da sua história. São os chamados anos dourados, durante os quais, nas economias
norte-ocidentais, a qualidade de vida de milhões de trabalhadores aumentou como jamais fora
visto. Esta também foi a fase de desenvolvimento sem precedentes do Estado de Bem Estar.
No entanto, esta expansão chegou ao seu limite e revelou-se insuficiente para atender às
demandas ampliadas dos agentes econômicos (CATTANI, 2004). No decorrer dos anos 70, já
se comentava no meio acadêmico e nos âmbitos políticos acerca da chamada crise do
“Welfare state”. Nos anos 1980, iniciou-se nova etapa no processo de expansão do
capitalismo na era da globalização: como uma tentativa de alcançar novamente o crescimento
econômico além das fronteiras do Estado-Nação, entraram em cena as políticas neoliberais.
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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105
Muito embora não haja um conceito homogêneo a respeito do termo economia
solidária, o seu aparecimento – ou reaparecimento -, a partir do século XX, é sempre
relacionado na literatura como uma resposta ao desemprego e a exclusão social,
conseqüências das crises, ou limitações do sistema capitalista. O surgimento da economia
solidária aparece então como uma alternativa de resposta ao aumento das desigualdades
sociais e a conseqüente deteriorização das condições de vida da maioria da população
mundial. As estatísticas da desigualdade também figuram em boa parte dos trabalhos sobre o
tema.
Com a crise do Welfare State, iniciada nos anos 70, e com os efeitos provocados
pelo domínio das políticas neoliberais, principalmente na década de 1990, ocorre o que é
chamado de ressurgimento da economia solidária. Citando o Brasil como exemplo, aonde o
Estado de bem estar social evidentemente nunca se desenvolvera como nos países centrais ou
nem mesmo como em alguns países vizinhos (o caso da Argentina é o mais evidente), nesta
época houve o crescimento do desemprego e a chamada reestruturação produtiva, que levaram
à marginalização e exclusão de uma grande massa de trabalhadores que passaram a buscar
outras formas de produzir e garantir trabalho e renda. Não apenas no Brasil, mas em outros
países da América Latina, a economia solidária surge como fruto do desemprego e da
exclusão. Ou Os Estados, que são constrangidos a deixar de lado as práticas incipientes de
Welfare, apresentam as empresas como parceiras no combate às desigualdades; as empresas
vêm-se tornando, ainda mais, incapazes de atender às demandas de uma grande massa
excluída do trabalho formal. Tanto o Mercado como o Estado não têm se mostrado eficazes,
pelos seus mecanismos econômicos e redistributivos tradicionais, de equacionar o problema
das desigualdades sociais em países como o Brasil, o que vem a fortalecer ideais de
transformação social. O crescente desemprego estrutural e as transformações na qualidade do
trabalho, marcas da era global, têm deslocado, cada vez mais, parte dos indivíduos para
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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106
formas alternativas de ocupação. A discussão acerca de novas alternativas ao modelo vigente
ganha força (SEI, 2004).
Nesse contexto, desde 1994 é possível verificar uma série de acontecimentos
relacionados à economia solidária. Eles estão ilustrados no Quadro 2, a seguir:
1994 Criação da Anteag
1995
Criação da primeira Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP - COPPE -
UFRJ)
jun Artigo de Singer na Folha de São Paulo (“Economia solidária contra o desemprego”)
1996
out/nov Eleições Municipais
Criação da ADS – CUT
Filiação da Rede Universitária de ITCPs à Unitrabalho
1998
out/nov Eleições Presidencial e Estaduais - Olívio Dutra eleito governador do RS
Publicação do livro “Economia Solidária no Brasil” organizado por Paul Singer e André
Ricardo de Souza
2000
jun Criação da Rede Brasileira de Socioeconomia Solidária (RBSES)
2001 jan I Fórum Social Mundial em Porto Alegre, RS
Criação da Rede de Gestores Públicos em Economia Solidária
Publicação do livro “Introdução à Economia Solidária” de Paul Singer
jan II Fórum Social Mundial
2002
out
I Plenária Nacional de Economia Solidária em São Paulo (elaboração da “Carta ao
Governo Lula”)
Eleições estaduais e presidencial
Eleição de Lula para presidente
jan
III Fórum Social Mundial
Publicação do livro “A Outra Economia” (lançamento durante o III FSM)
II Plenária Nacional de Economia Solidária (durante o II FSM)
Anúncio Público da criação da SENAES (durante o II Plenária Nacional de Economia
Solidária) e de Singer como seu titular
mai Plenária Estadual de Economia Solidária do Rio de Janeiro
2003
jun
Posse de Singer como titular da SENAES
III Plenária Nacional de Economia Solidária
Criação do Fórum Brasileiro de Economia Solidária (durante a III Plenária Nacional)
2004
Criação dos Fóruns estaduais de economia solidária
Desenvolvimento da pesquisa Empreendimentos Solidários na Região Metropolitana de
Salvador e no Litoral Norte da Bahia pela Superintendência de Estudos Econômicos da
Bahia
2005 Mapeamento dos empreendimentos econômicos solidários no Brasil
2006 jun
I Conferência Nacional de Economia Solidária
Lançamento do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária
Lançamento do Atlas da Economia Solidária no Brasil
Quadro 2 - Breve cronologia dos principais acontecimentos na Economia Solidária no Brasil
Fonte: adaptação de MOTTA, 2004
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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107
A seguir, veremos mais detalhadamente a evolução da economia solidária no
Brasil e na Bahia, a partir de uma análise de seus principais elementos internos e externos.
3.3. ANÁLISE DO MOVIMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL
Como afirmamos anteriormente, a fim de analisar o movimento da economia
solidária no Brasil e na Bahia, seguiremos o modelo proposto por Gohn (2002). Neste
modelo, primeiramente, é preciso considerar os ângulos internos e externos do movimento.
Para a autora, estes dois ângulos estariam conectados de forma complementar, como se um
fosse a face do outro, formando uma totalidade do grupo. Em seguida, devem-se analisar a
partir dos dois ângulos os elementos e categorias básicas do movimento. Os elementos
internos – demandas e reivindicações e repertórios de ações coletivas – geram a composição
social e as articulações dos movimentos sociais. As articulações, por sua vez, ao serem
analisadas em seu nível interno, levam-nos à ideologia, ao projeto, à organização e às práticas
do movimento, enquanto que, no nível externo – que nos diz como o movimento se projeta
para o mundo exterior, devem ser considerados o contexto do cenário sociopolítico e cultural
em que se insere o movimento, os opositores, as articulações e redes externas, além das
relações que o movimento estabelece com o mundo externo, seja o Estado, a sociedade civil
ou o mercado.
Focaremos os elementos internos de análise da economia solidária, assim como
sua articulação interna, uma vez que é no nível interno de articulação do movimento da
economia solidária que encontraremos as primeiras pistas para responder o principal
questionamento deste trabalho: qual o projeto político (ideologia) da economia solidária?
Vale ressaltar que a noção de projeto político presente no modelo teórico-metodológico
utilizado é referente à noção de ideologia em Gramsci - concepção de mundo que se faz
presente em todas as manifestações teóricas e coletivas, em que é possível identificar o modo
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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108
de pensar e agir compartilhado por determinado grupo social. No entanto, para a autora a
ideologia representa algo maior, “marcos referenciais estratégicos fundamentais para criar a
identidade dos movimentos” (GOHN, 2002, p. 258), podendo ser captada por meio da análise
dos discursos e mensagens dos líderes, assim como através da produção material e simbólica
do movimento. Portanto, o projeto político entendido enquanto a visão de mundo que dá
sentido e direção ao movimento será a principal categoria analítica neste capítulo do trabalho.
A seguir, veremos no Quadro 3 as categorias de elementos e articulações internas analisadas
no movimento da economia solidária.
DEMANDAS E
REPERTÓRIOS DA
AÇÃO COLETIVA
Demanda: carência não atendida; busca suprir lacunas ou necessidades
Repertório: produto elaborado a partir da agregação das demandas pela ação
coletiva, traduzido em reivindicação mediatizada pelo conteúdo político-
ideológico do projeto do movimento
COMPOSIÇÃO
Origem social dos seus participantes - classes e camadas sociais
PRINCÍPIO
ARTICULATÓRIO
INTERNO
Relações entre base, liderança e assessoria
ORGANIZAÇÃO
Informal ou formal; ligado à institucionalização
PRÁTICAS
Ações diretas; discursos
Práticas organizadas: formais - reuniões, assembléias, petições burocráticas,
abaixo-assinados, congressos, eventos, greves; informais - acampamentos,
teatro, encenação, invasões
Práticas não organizadas: atos de sublevação, insurreições populares
ELEMENTOS E ARTICULAÇÕES
INTERNOS
PROJETO
Visão de mundo que dá sentido e direção ao movimento
Quadro 3 - Elementos internos e externos para a análise do movimento de economia solidária no
Brasil
Fonte: Elaboração própria, a partir de Gohn (2002)
As demandas estão relacionadas a uma carência não atendida, quer seja de ordem
econômica, política, social e cultural, ou até mesmo para responder os projetos de uma utopia.
Quando as demandas partem das carências, elas buscam suprir determinadas lacunas ou
necessidades; contudo, quando elas partem de uma utopia, existe um ideal a ser atingido, que
é uma reinvenção da realidade. As utopias geram “ideologias, movimentos e novos valores”
(GOHN, p. 256). Os repertórios da ação coletiva são os produtos elaborados a partir da
agregação das demandas pela ação coletiva traduzido em reivindicação, desenvolvida a partir
do conteúdo político-ideológico do projeto do movimento.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
109
O nascimento da economia solidária no Brasil é sempre relacionado à crise social
das décadas de 1980 e 90 que provocou o desemprego em massa acentuando a exclusão social
de muitos brasileiros. Portanto, é possível afirmar que a demanda inicial do movimento foi
criar uma alternativa ao desemprego e à exclusão social. Um fato que também atesta a
demanda do movimento ser o combate ao desemprego é o exemplo da SENAES; outras
iniciativas de inclusão da economia solidária na esfera pública em governos locais também
estão associadas à Pasta do Trabalho. Olhando a partir da perspectiva dos empreendimentos
econômicos solidários, também é possível afirmar que a principal motivação é uma alternativa
de renda.
No Brasil, o novo solidarismo popular se expressa no ideário e na prática de um
número crescente de empreendimentos econômicos criados por trabalhadores
impelidos pela falta de alternativas de subsistência ou motivados pela força de suas
convicções (GAIGER apud FRANÇA et al, 2006).
No entanto, é possível enxergar também um quê de utopia no movimento da
economia solidária, uma vez que se imagina a economia solidária como “outro modo de
produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o
direito à liberdade individual” (SINGER, 2002, p. 10). E como uma utopia que pretende ser
uma reinvenção da realidade, a economia solidária pretende contemplar em seu projeto
“aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais a serem observados” (NUNES, 2002, p.
61). Nesse mesmo sentido vai o pensamento de Patrick Viveret, filósofo francês que tem
muita influência nos movimentos sociais no Brasil
3
.
No relatório do GT (Grupo de Trabalho) sobre economia solidária do II Fórum
Social Mundial em 2002, considerado o primeiro evento onde diversos agentes de vários tipos
de organizações e indivíduos começaram a dar forma ao grupo de discussão sobre economia
3
O livro Reconsiderar a Riqueza publicado pela Editora da Universidade de Brasília (EDU), é a primeira obra
do francês Patrick Viveret publicado no Brasil. Mais informações disponíveis em:
http://www.unb.br/acs/unbagencia/ag0806-32.htm
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
110
solidária, que a partir daí se expandiu - frente ao cenário nacional e internacional - o
questionamento acerca da possibilidade da economia solidária representar uma alternativa
pós-capitalista de organizar a sociedade já estava presente. Ao questionamento sobre o fato da
economia solidária estar orientada apenas a solucionar os problemas sociais gerados pela
globalização neoliberal, ou se ela teria a vocação de constituir o fundamento de uma
globalização humanizadora, um desenvolvimento sustentável, socialmente justo e voltado
para a satisfação das necessidades básicas todos os cidadãos, já apresentou uma divisão de
opiniões: mesmo que alguns pudessem considerar a economia solidária um projeto para os
excluídos do mercado de trabalho capitalista, outros afirmam que a proposta tem o potencial
de tornar-se uma alternativa pós-capitalista de organização “do consumo, da produção, do
comércio e das finanças a nível local, nacional e global, substrato de um novo paradigma de
valores, de relações e de práxis educativa, cultural e interpessoal” (BOCAYUVA, 2002, p.
11).
Moura e Meira (2002), ao definirem a economia solidária, a partir de uma síntese
do que dizem diversos autores (FRANÇA, 1999; SINGER, 2000; VAINER, 2000; ARRUDA
e BOFF, 2000; ARRUDA 1996; CORAGGIO, 2000; RAZETTO, 1997 apud MOURA e
MEIRA, 2002), chegam a um conceito que muito se aproxima da idéia que tento levantar aqui
de que a economia solidária tem como demanda inicial o combate ao desemprego, mas que se
mostra também como uma utopia, uma vez que tem um ideal de transformação do modo de
produção capitalista, num plano econômico, social, cultural e político.
A partir de diversos autores que vem trabalhando sobre o tema, podemos dizer que
os termos sintetizam uma diversidade de experiências organizacionais de caráter
econômico, baseadas em novas e antigas formas de solidariedade; seja numa
perspectiva de busca de alternativa de emprego, seja numa perspectiva de construção
de modelo alternativo ou diferenciado do capitalismo ou simplesmente enquanto
utopia experimental de novas formas de sociabilidade e de vivências de valores
relacionados com o modo de ser cuidado (MOURA e MEIRA, 2002, p. 2).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
111
As primeiras experiências de economia solidária surgidas no Brasil datam da
década de 80, e tem como precursor o projeto intitulado PACS – Projetos Alternativos
Comunitários – desenvolvido pela Cáritas, entidade ligada à Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil (CNBB), com objetivo de gerar trabalho e renda de forma associada para moradores
pobres em zonas urbanas e rurais. Outra experiência que teve início na década de 80, mas foi
fundada efetivamente em 1991, a partir da tomada da massa falida de empresas pelos
trabalhadores, foi a Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e
Participação Acionária – ANTEAG. Ainda é possível citar o MST que passou a promover,
desde 1989, a agricultura cooperativa em seus assentamentos e criou o Sistema Cooperativista
dos Assentados. É possível citar também a criação da rede de Incubadoras Tecnológicas de
Cooperativas Populares – ITCP´s - em 1999 dentro das universidades com o objetivo de
incubar grupos para a formação de cooperativas ou produção associativa. A Agência de
Desenvolvimento Comunitário – ADS – criada em 1999 pela Central Única dos
Trabalhadores – CUT – em parceria com a Unitrabalho e o Departamento Brasileiro
Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos – Dieese – também é vista como
uma das iniciativas pioneiras de economia solidária criadas no Brasil (SINGER, 2002). Na
Bahia as primeiras experiências de economia solidária estão vinculadas aos grupos formados
a partir de 2001 pela ITCP da Universidade Estadual da Bahia.
Os repertórios ou reivindicações do movimento da economia solidária sempre
estiveram relacionados aos seguintes aspectos:
motivações de justiça e solidariedade em todas as atividades implementadas e
vividas coletivamente, tanto nas de produzir e consumir bens e serviços, como nas
de distribuí-los e comercializá-los;
referências de êxito distintas daquelas do capitalismo, já que a reciprocidade
e a fraternidade nas relações interpessoais são almejadas;
processos de autogestão e autonomia, implicando lógicas de participação e
estímulo ao engajamento;
criatividade e soluções alternativas face aos problemas e negócios
implementados, visando à inovação tecnológica, gerencial e de relações humanas;
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
112
preocupação com o meio ambiente e com um progresso sustentável para a
geração seguinte, preservando os meios naturais hoje existentes (NUNES, 2002, p.
60).
No entanto, a organização do movimento – elemento que será retratado com mais
detalhe posteriormente – iniciou um processo de ampla discussão do repertório de ação da
economia solidária, iniciado com as Conferências Estaduais de Economia Solidária, chegando
ao ápice em junho de 2006 na I Conferência Nacional de Economia Solidária – I Conaes.
Com o objetivo de ser um espaço de debate dos governos, nas três esferas e com diversos
setores da sociedade civil brasileira, a I Conaes elaborou um elenco de propostas para a
Economia Solidária através da elaboração de um Documento Base com o conjunto das
propostas elaboradas pelos eixos temáticos da conferência. Além da I Conaes, há o Fórum
Brasileiro de Economia Solidária formado pela articulação de três segmentos do movimento
de economia solidária (empreendimentos solidários, entidades de assessoria e fomento, além
de gestores públicos) que mantém constante a discussão das reivindicações da economia
solidária através de seus Grupos de Trabalho (GT's) - Mapeamento, Finanças Solidárias,
Marco Legal, Comunicação, Políticas Públicas, Relações Internacionais e Produção,
Comercialização e Consumo.
De acordo com Gohn (2002), a composição de um movimento social pode ser
vista sob o ângulo da origem social de seus participantes, pelas classes e camadas sociais que
participam, ou pelo princípio articulatório que aglutina os participantes. A composição de
segmentos sociais da economia solidária é muito ampla, agregando desde os
empreendimentos econômicos solidários até universidades e secretarias de governo, além das
redes de trocas. Para melhor visualização do campo da economia solidária no Brasil,
analisaremos a figura 1 desenvolvida por França (2006) e também publicada no Atlas da
Economia Solidária no Brasil (SIES, 2006).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
113
Figura 1 - Composição da economia solidária
Fonte: Mapa da Economia Solidária no Brasil (SIES, 2006)
A partir desta figura, é possível distinguir quatro níveis de atores no campo da
economia solidária, agrupados por aproximação do papel desempenhado.
Os empreendimentos econômicos solidários representam o nível da economia
solidária em que as relações econômicas ocorrem, o nível da estrutura. Eles representam uma
forma de expressão da economia solidária podendo assumir formato de cooperativa, empresa
autogestionária, rede e outras formas de associação para produção e/ou aquisição de produtos
e serviços (MOURA e MEIRA, 2002). São diferentes dos projetos comunitários voltados à
sobrevivência e à subsistência de grupos populares, uma vez que, o alcance da viabilidade
econômica é feito através da acumulação, crescimento e desenvolvimento de uma nova
racionalidade econômica, que é uma síntese original do espírito empresarial com o espírito
solidário (GAIGER, 1996). As características básicas dos empreendimentos são: pluralidade
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
114
de princípios econômicos, autonomia institucional, democratização dos processos decisórios,
sociabilidade comunitário-pública e finalidade multidimensional (FRANÇA FILHO, 2001).
Outra característica dos empreendimentos é a inserção cidadã, uma vez que eles devem
promover o respeito ao consumidor e ao meio ambiente e participação ativa na comunidade
em que está inserido (AZEVEDO e BANDEIRA, 2003).
Os empreendimentos econômicos solidários podem ser organizações de finanças
solidárias, também conhecidas como bancos populares, que são, muitas vezes, cooperativas
de crédito voltadas para o microcrédito para pequenas iniciativas de organizações coletivas
populares. Estas iniciativas, em geral, contam com apoios institucionais, seja por parte do
poder público, ou de organizações da própria sociedade civil (FRANÇA, 2006). Há também
uma distinção neste tipo de organização, que pode ser voltada para fundos rotativos solidários
ou bancos comunitários. Um caso de banco comunitário de grande destaque no Brasil e que
tem sido inspirador de outras iniciativas neste ramo é o caso do Banco Palmas no Ceará.
Os empreendimentos econômicos solidários também podem assumir a forma de
empresas autogestionárias. Para França (2006), as empresas autogestionárias são um tipo de
cooperativa popular; Atlas da Economia Solidária (2006) as distingue das cooperativas
populares. Talvez o motivo desta distinção esteja nas características diferenciadas que elas
apresentam, uma vez que são empresas falidas ou em via de falência aproveitadas pelos seus
trabalhadores, e contam com tecnologias herdadas das empresas antecessoras, um capital
maior que as cooperativas populares, em geral, e tecnologias já foram desenvolvidas
anteriormente. A Anteag – Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de
Autogestão e Participação Acionária - tem sido o caso de maior reconhecimento no Brasil,
pelo seu caráter pioneiro e pela grande quantidade de cooperativas que apóia. Iniciado em
1991, após a falência da empresa calçadista Makerli, de Franca (SP), o movimento apóia
atualmente centenas de cooperativas em todo Brasil. Outra entidade que também desenvolve
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Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
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115
um trabalho de apoio à transformação de empresas em crise em cooperativas populares é a
União e Solidariedade das Cooperativas do Estado de São Paulo – UNISOL.
O cooperativismo popular é o tipo mais emblemático de empreendimentos
econômicos solidários, uma vez que, além de ser o tipo em que se encontra a maior parte dos
casos no Brasil, toda a origem da economia solidária remete às concepções cooperativistas do
século XIX. Eles podem incluir cooperativas de produção, prestação de serviço ou consumo,
variando sempre em grau de estruturação. As cooperativas populares, no entanto, são
marcadas por um alto nível de instabilidade proveniente normalmente das condições precárias
de desenvolvimento destas iniciativas, o que reflete as condições de vida das pessoas
envolvidas (FRANÇA, 2006). Na Bahia, a maior parte dos empreendimentos econômicos
solidários são cooperativas populares, que na maioria das vezes não consegue obter a
sustentabilidade desejada – uma renda ao final do mês.
As redes de empreendimentos constituem outro tipo de empreendimentos
econômicos solidários, estando voltadas para a troca de bens e serviços entre si, o que, na
maioria das vezes, garante a sustentabilidade dos empreendimentos, já que a comercialização
tende a ser o principal entrave para sua sobrevivência.
O quarto tipo de empreendimentos econômicos solidários são as associações, os
clubes de trocas, grupos informais. As associações podem ser filantrópicas, de moradores, de
defesa da vida, culturais, desportivas ou sociais, de classe, e de trabalho, o que lhes confere
um caráter mais amplo quando comparadas às cooperativas (CATTANI, 2003). Muito
embora, dependendo do tipo – de trabalho ou de moradores – assuma características similares
às cooperativas populares. Os clubes de trocas são sistemas de trocas locais composto por
produtores e consumidores com o objetivo de trocar bens e serviços sem recorrer a uma lógica
mercantil, adotando, na maioria das vezes, uma moeda social. Os grupos informais também se
aproximam das cooperativas populares em sua forma de funcionamento, mas eles estão num
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
116
estágio anterior no que se refere a legislação, ou seja, são grupos que seguem a lógica da
economia solidária na produção, mas que não estão constituídos enquanto cooperativas.
As entidades de apoio e fomento desempenham um papel importante na
estruturação do campo da economia solidária. Entre elas destacam-se a Cáritas e as Pastorais,
as Universidades e as Incubadoras (redes de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas), o
movimento sindical (ADS/CUT) e as ONG´s como a FASE, o IBASE, o PACS e a IMS.
Entre elas, a Cáritas foi pioneira no movimento da economia solidária ao desenvolver o PACs
– Projeto Alternativo Solidário – que apoiou uma série de pequenos projetos em todo Brasil,
como foi citado anteriormente. As entidades de apoio têm um grande papel no que tange o
fomento da economia solidária, muitas desenvolvem dinâmicas de formação de grupos para o
trabalho com a economia solidária, além de prestarem apoio financeiro e na gestão de
empreendimentos já formados.
O campo da economia solidária no Brasil ainda conta com as ligas ou uniões,
como a ANTEAG, UNISOL, UNICAFES, ANCOSOL, COCRAB e MST; com o Fórum
Brasileiro de Economia Solidária, composto pelos Fóruns Estaduais de Economia Solidária,
a rede de gestores públicos, e a FACES do Brasil, e a rede de Socioeconomia Solidária; além
das instâncias governamentais, com o governo federal através do Ministério do Trabalho e
da SENAES, além de iniciativas de governos municipais e estaduais.
Para Gohn (2002), o princípio articulatório interno é definido a partir das
relações entre três elementos fundamentais para a composição de um movimento: as bases
demandatárias, as lideranças e as assessorias. As relações entre estes três elementos
definiriam o quão democrático o movimento é. As bases de demanda da economia solidária
são os empreendimentos econômicos solidários, uma vez que deles fazem parte as
organizações que operam a economia solidária. As assessorias são as entidades de apoio e
fomento e as ligas ou uniões. As lideranças, por sua vez, não são facilmente identificadas,
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
117
pois o movimento é organizado através de uma estrutura de democracia representativa,
funcionando através de fóruns e conferências estaduais e nacionais, e não há um cargo de
diretor, superintendente ou coordenador. No entanto, é possível destacar a figura de Paul
Singer como uma liderança representativa e carismática dentro do movimento, uma vez que
ele, além de ter sido o primeiro autor a usar o termo economia solidária no Brasil (MOTTA,
2004), tem sido responsável pela divulgação do tema no Brasil, seja por suas inúmeras
publicações, ou pelo fato de ser o Secretário Nacional de Economia Solidária desde a criação
da Secretaria em 2003. Ainda podemos citar o Fórum Brasileiro de Economia Solidária que
funciona como uma espécie de misto dos três elementos - base de demanda, assessoria e
liderança - uma vez que desempenha um papel de articulação entre os empreendimentos
solidários, as entidades de assessoria e fomento, e os gestores públicos. Existem conflitos nas
relações entre os três elementos, mas a estrutura do movimento permite que os conflitos
tenham um espaço para debate e exposição de idéias de forma democrática.
A organização do movimento de economia solidária, apesar do seu pouco tempo
de existência é formal, assim como suas práticas. O Fórum Brasileiro de Economia Solidária
é a instancia nacional que formaliza a organização do movimento, uma vez que, conforme
citado anteriormente, sua função é de articulação entre os empreendimentos solidários, as
entidades de assessoria e a rede de gestores públicos. A sua principal instância de decisão é a
Coordenação Nacional, formada pelos representantes das entidades e redes nacionais de
fomento, além de três representantes por estado, apenas nos estados em que há um Fórum ou
uma Rede Estadual de Economia Solidária. Dos três representantes por estado, dois devem ser
empreendedores e um assessor ou gestor público. A Coordenação Nacional se reúne duas
vezes ao ano (FBES, 2006).
Para a gestão do Fórum e interlocução com outros movimentos e com o governo
federal, há a Coordenação Executiva Nacional, composta por treze pessoas, sendo sete
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
118
representantes de empreendimentos – distribuídos numa proporção territorial, cinco
representantes das Entidades e Redes Nacionais de fomento à economia solidária, e um
representante da Rede Nacional de Gestores Públicos. Ainda dentro da estrutura do FBES
existe uma secretaria executiva com o papel de dar suporte aos trabalhos do FBES, e
estabelecer a comunicação entre as instâncias, assim como operacionalizar reuniões e eventos.
Existem também os Grupos de Trabalho (GT’s) formados de acordo com as ações
e demandas do movimento de economia solidária. A natureza dos GT’s é de cunho técnico e
operacional, e sua composição é feita por membros da Coordenação Nacional e entidades ou
especialistas com conhecimento reconhecido no tema, indicados pela Coordenação Nacional,
além de indicações da Secretaria Nacional de Economia Solidária, ou seja, os GT’s
apresentam um caráter misto, formados por governo e sociedade. Entre as atividades dos
grupos estão a submissão do cronograma de atividades e relatório final à Comissão de
Acompanhamento, que transmite para a Coordenação Nacional. Os GTs devem aprofundar
debates levantados pela Coordenação Nacional do FBES e/ou SENAES, elaborar propostas de
ação e, eventualmente, contribuir com a execução das ações propostas. Os GT’s são:
Mapeamento, Finanças Solidárias, Marco Legal, Comunicação, Políticas Públicas, Relações
Internacionais e Produção, Comercialização e Consumo (FBES, 2006).
Após esta descrição do funcionamento do FBES, fica mais fácil de entender que
as práticas do movimento de economia solidária são organizadas e formais, uma vez que
seguem uma agenda nacional, além da discussão e registro de propostas para o
desenvolvimento do movimento no Brasil. Algumas das práticas do movimento são: fóruns
estaduais e nacionais organizados periodicamente, site institucional do FBES com divulgação
mensal de boletim eletrônico para os associados, eventos e encontros estaduais e nacionais
para troca de experiências e discussão de artigos científicos sobre o tema.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 3 – A ECONOMIA SOLIDÁRIA E OS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
119
A discussão sobre o projeto político da economia solidária, categoria de análise
central deste trabalho é aspecto de crescente relevância no movimento de economia solidária.
Atualmente há uma preocupação na formação política dos atores da economia solidária. A
literatura não é unânime, mas há um posicionamento da economia solidária enquanto projeto
de construção de outra economia, uma economia alternativa ao capitalismo.
Para Singer (2002, p. 10), a economia solidária representa “outro modo de
produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o
direito à liberdade individual”. Já para Quijano (apud SOUSA SANTOS, 2002, p. 497):
(...) não se trata de um ‘modo de produção’ alternativo, mas de organizações ‘não
capitalistas’ aptas a pertencerem a um ‘mercado globalizado, isto é, organizações
que se situam mais como alternativas ao desemprego e à pobreza do que como
alternativas ao próprio capitalismo.
Para Gaiger (2004), a análise deve ser cautelosa, pois o conceito de modo de
produção refere-se também a um determinado grau de desenvolvimento das forças produtivas,
e que, de fato, em todos os empreendimentos solidários não há mudanças profundas na base
técnica do seu processo produtivo em relação à das fábricas capitalistas, mas suas principais
diferenças residem em novas relações de trabalho. O autor conclui, então, que a economia
solidária constituiria uma nova forma social de produção, contrária à forma social de
produção assalariada, e não um modo de produção distinto. Caso o desempenho desta nova
forma social venha se mostrar superior, ela deverá levar a um novo desenvolvimento da base
material e, portanto, um novo modo de produção.
Como as teorizações a esse respeito estão longe de atingir o consenso, procuramos
desenvolver uma análise empírica acerca do pensamento dos atores da economia solidária no
campo da ideologia, conforme será descrito no próximo capítulo.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
121
4. ANÁLISE EMPÍRICA: A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
4.1.PROCEDIMENTOS
METODOLÓGICOS
O trabalho de investigação empírica do universo das organizações de economia
solidária em Salvador foi realizado através de uma pesquisa qualitativa (análise dos discursos
e das percepções dos atores). A escolha da pesquisa qualitativa deu-se pela natureza
investigativa do trabalho, que tem, como objetivo principal, levantar dados que permitam
chegar a conclusões acerca da ideologia política que permeia o conjunto das organizações do
movimento de economia solidária. Por meio da abordagem qualitativa é possível ao
pesquisador realçar os valores, as crenças, as representações, as opiniões, atitudes, além de
permitir-lhe compreender os fenômenos caracterizados por um alto grau de complexidade
interna do fenômeno pesquisado.
Uma crítica constante à abordagem qualitativa diz respeito ao rigor do método
utilizado, ou seja, à problemática da verificação de seus dados. Em outras palavras, os seus
critérios de cientificidade são questionados, sobretudo pelos tenores de uma ciência positivista
de inspiração newtoniana. Mas de que critérios de cientificidade estamos falando? Segundo
Demo (1986), os critérios internos são: Coerência - discurso logicamente construído;
Consistência - qualidade argumentativa do discurso; Originalidade - contribuição do
conhecimento; Objetivação - abordagem teórico-metodológica de aproximação da realidade.
Para o mesmo autor, há, também, um critério externo de cientificidade: a intersubjetividade,
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
122
ou seja, “a ingerência da opinião dominante dos cientistas de determinada época e lugar de
demarcação científica.” (p.17).
Ao olhar para o campo de análise da presente dissertação - a economia solidária,
deparamo-nos com um amplo movimento caracterizado por diversos tipos de arranjos
organizacionais, como descrito no capítulo anterior. Devido à grande amplitude deste campo
de análise, são necessários alguns recortes, não apenas temporais e geográficos, como também
em relação ao próprio movimento de economia solidária.
Dentro do movimento de economia solidária, a decisão foi analisar os
empreendimentos econômicos populares, uma vez que estes se encontram no nível mais
operacional da economia solidária. O recorte geográfico foi o município de Salvador. Fez-se
uma opção pelas organizações surgidas entre 2000 e 2004. O processo de delimitação deste
universo de análise passou por diversas etapas até chegar a este formato final.
O primeiro passo para definição do universo a ser pesquisado foi uma consulta ao
mapeamento de empreendimentos solidários, denominado Empreendimentos solidários na
Região Metropolitana de Salvador e no Litoral Norte da Bahia
1
, publicado pela SEI, em
2004. A consulta a esta pesquisa foi fundamental no processo de delimitação do universo a ser
investigado, porquanto, até 2006, este era o único documento sistematizando as organizações
de economia solidária em Salvador. Esta pesquisa foi resultado da articulação entre diferentes
atores da economia solidária, durante os primeiros encontros da rede de economia solidária
que objetivavam a constituição do Fórum Baiano de Economia Solidária, no primeiro
semestre de 2003. Desde o princípio dos encontros da rede de economia solidária, já se
expressava a idéia do mapeamento dos empreendimentos solidários na Bahia.
A pesquisa contou com a articulação de diversas entidades, tais como
Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), Centro Ecumênico de Apoio ao
1
SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA. Empreendimentos
solidários na Região Metropolitana de Salvador e no Litoral Norte da Bahia. Salvador: SEI, 2004.
Disponível em http://www.sei.ba.gov.br/publicacoes/bahia_analise/sep/index_sep.php
. Acesso em: 21 jun. 2005.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
123
Desenvolvimento (CEADe), Cáritas Brasileira, PANGEA, ITCP (UNEB), BANSOL
(UFBA), UCSAL, UNIFACS, SEBRAE, Companhia de Ação Regional (CAR), Secretaria de
Cultura e Turismo (STC), Fundação Luis Eduardo Magalhães, EMBRAPA, Prefeitura
Municipal de Catu, Prefeitura Municipal de Alagoinhas, Centro de Referência Integral de
Adolescentes (CRIA), Bando de Teatro Olodum – Teatro Vila Velha. Seu objetivo foi
contribuir para o entendimento das formas associativas de organização do trabalho, em
crescimento acelerado no território brasileiro, não retratando apenas organizações de
economia solidária, e mapeando também organizações culturais.
A pesquisa da SEI abrangeu apenas um recorte da região mais próxima a Salvador
(Região Metropolitana e Litoral Norte), pois havia uma preocupação em produzir uma
metodologia experimental para um posterior aperfeiçoamento, com o objetivo de chegar a
uma metodologia adequada que pudesse servir de suporte para a realização de novos
levantamentos em outras regiões do estado. O ponto de partida para a localização e
identificação do maior número possível de empreendimentos foi a elaboração de uma
listagem preliminar com o nome, endereço, telefone e pessoa para contato. Utilizou-se, como
caminho para a construção da listagem, a identificação prévia das instituições que, pelas
características do trabalho, já houvessem realizado, apoiado ou tido informações sobre os
empreendimentos da economia solidária. Os integrantes do Fórum Baiano de Economia
Solidária também auxiliaram na construção desta primeira listagem. A pesquisa de campo foi
realizada durante o mês de julho de 2003, após a consolidação da referida listagem por
municípios da Região Metropolitana de Salvador – RMS.
Ao final desta pesquisa, chegou-se ao total de 38 empreendimentos de economia
solidária em operação ou em fase de implantação. Destes 38 empreendimentos, 18 estariam
organizados sob a forma de associação, 17 sob a forma de cooperativa, haveria dois grupos
informais e uma ONG. Diferentes modalidades de trabalho associativo na produção de bens
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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124
ou serviços foram identificadas, sendo eles: I) produção individual e venda coletiva; II)
produção coletiva e venda individual; III) produção e venda coletivas; IV) produção e venda
individual com o uso de um equipamento coletivo; V) compra coletiva de matéria-prima para
produção individual; VI) produção para o autoconsumo; e VII) obtenção de clientes para os
associados. Nesta pesquisa, ainda, foi verificado que a principal motivação para a organização
dos empreendimentos associativos seria o agravamento do desemprego, seguido do desejo de
desenvolver uma atividade na qual “todos são donos”, além de obter maiores ganhos através
dessa forma de trabalho. Algumas outras constatações da pesquisa da SEI (2004) seguem no
Quadro 4, abaixo:
Origem dos recursos
A origem dos recursos é, em sua maior parte, dos próprios associados ou depende de
doações realizadas pelo governo, ONGs, igrejas, etc. A longa demora na obtenção dos
recursos necessários ao início da atividade certamente dilui a capacidade do grupo se
manter coeso.
Quantidade de
associados
Os empreendimentos entrevistados reúnem um total de 3.936 associados. No entanto,
uma única cooperativa de crédito agrega 1.994 sócios, diferenciando-se da maior
parte dos empreendimentos que, no máximo, tem até 40 sócios.
Distribuição por
empreendimento
Além desta cooperativa de crédito, apenas mais dois empreendimentos contam com
mais de 100 sócios: a Cooperativa de Trabalho do Setor Energético da Bahia, com
130 e a Central de Comercialização do Litoral Norte da Bahia, que agrupa cerca de 20
associações de agricultores familiares, totalizando cerca de 600 sócios.
Distribuição por
gênero
As mulheres representam 36% do total de associados, com um nítido predomínio nas
seguintes atividades: confecções (100%); produção de medicamentos fitoterápicos
(97%); produção e venda de artesanato (68%); produção de alimentos (63%) e coleta
e processamento de material reciclável (60%).
Distribuição etária
Considerando-se o conjunto dos empreendimentos, as pessoas com menos de 30 anos
de idade correspondem a 28% do total de associados. Deve-se observar que a
atividade de coleta e processamento de material reciclável é a única que apresenta um
maior percentual de sócios com menos de 30 anos de idade (61%).
Gestão
Quase todos os grupos designam pessoas para as tarefas de administração, as quais,
em sua maior parte, não recebem nenhuma remuneração por este trabalho específico.
O uso de registros e anotações, entretanto, não se constitui numa prática corrente
entre os grupos. Apesar disso, em quase todos eles existe a prática de se realizar uma
prestação de contas para o conjunto dos associados.
Valores democráticos
Todos os grupos exercitam, de alguma forma, princípios democráticos de
participação, sendo que, na maior parte, houve uma renovação das coordenações ou
diretorias através do voto dos associados.
Resultado
Pouco mais de um terço dos empreendimentos que estão operando conseguem um
resultado econômico que permite pagar as despesas e obter uma sobra. Cruzando-se
os dados referentes ao resultado econômico com a evolução do número de sócios,
percebe-se que os grupos em que cresceu o número de sócios são aqueles que
obtiveram sobras.
Quadro 4 – Caracterização dos empreendimentos associativos
Fonte: elaboração própria, a partir de SEI (2004)
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
125
O mapeamento não abrangia apenas a Região Metropolitana de Salvador (RMS),
mas, também, a região do Litoral Norte da Bahia, e mapeava não apenas os empreendimentos
solidários, como também os empreendimentos associativos voltados à produção de bens e
serviços simbólicos, denominados, na pesquisa, de grupos culturais. Portanto, foi necessário
fazer uma separação entre os empreendimentos solidários e culturais e entre os
empreendimentos existentes na RMS e Litoral Norte. Por fim, chegou-se ao total de 19
empreendimentos, entre eles 12 cooperativas, 5 associações e 2 classificados como “outros
grupos”. Para um maior aprofundamento, vide o Apêndice A, referente aos empreendimentos
listados neste momento da pesquisa.
Como a totalidade dos empreendimentos solidários na RMS era de 19, optou-se
por entrevistar todo o universo de empreendimentos. Foi elaborado, então, o primeiro roteiro
de entrevista, que deveria ser aplicado a um ou mais integrantes das organizações. Em
seguida, o teste do roteiro de entrevista foi validado, para possíveis ajustes de questões que
não obtivessem as respostas desejadas, ou mesmo para adicionar questões que não houvessem
entrado na primeira versão. Para tanto, foram escolhidas duas organizações, de forma
aleatória, para realização do teste: uma associação e uma cooperativa. A entrevista foi
realizada no dia 24 de setembro de 2005, momento em que se pôde constatar, já nesta fase, a
primeira dificuldade a ser enfrentada no processo de coleta de dados: o pouco conhecimento
das organizações sorteadas em relação ao tema da pesquisa – a ideologia política na economia
solidária. A segunda dificuldade enfrentada no processo de coleta de dados aconteceu quando
se tentou contatar os 17 empreendimentos restantes na lista, vez que a maior parte dos
números de contato estava desatualizada.
No entanto, durante a terceira entrevista, junto à COOPERTANE, a entrevistada,
fez o relato de que a pesquisa da SEI de 2004 estaria defasada em relação ao número de
empreendimentos presentes, e estaria equivocada em relação à qualificação dos mesmos como
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
126
de economia solidária. A entrevistada afirmou que o número de empreendimentos presentes
no mapeamento era menor do que o número real, e que alguns empreendimentos não seriam
de economia solidária, o que estava em concordância com a percepção inicial da pesquisadora
(que já havia observado o pouco conhecimento sobre o tema de pesquisa no momento das
duas primeiras entrevistas de teste). A entrevistada (que fazia parte da equipe do Mapeamento
Nacional de Economia Solidária, promovido pela Secretaria Nacional de Economia Solidária)
também relatou dificuldade no contato dos empreendimentos através das informações
contidas na pesquisa de 2004. As notícias de participantes da I Feira Baiana de Economia
Solidária (de 2 a 5 de dezembro de 2005, em Salvador), também confirmavam as informações
prestadas pela entrevistada: o número de empreendimentos reais seria muito maior do que o
registrado no mapeamento de 2004. O número de empreendimentos de economia solidária,
segundo relato de alguns participantes da feira (que por sua vez, contava com 150
empreendimentos de economia solidária da Bahia), seria de algo em torno de 2.000
empreendimentos na Bahia.
A partir deste momento, a pesquisadora adotou a estratégia de aguardar a
finalização do novo mapeamento que estava sendo realizado em Salvador, para, então, fazer
uma nova delimitação atualizada do universo a ser investigado. Em janeiro de 2006, foi
possível o acesso aos questionários do mapeamento de economia solidária aplicados na Bahia,
que não estavam separados por municípios, mas por região (eg. RMS, Recôncavo, etc.), a
partir do que se elaborou uma nova listagem dos empreendimentos econômicos solidários em
Salvador (Apêndice B). No entanto, o número de empreendimentos, que na pesquisa de 2004
era de 19 incluindo a RMS, em 2006 passou para 51 empreendimentos apenas no município
de Salvador. Tendo em vista as limitações da pesquisa, constatou-se que seria necessário fazer
um recorte temporal no universo a ser investigado. Dividiu-se, então, as organizações por ano
de fundação, chegando à distribuição exposta no Gráfico 1:
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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127
3
1
2
0
7
32
6
0 5 10 15 20 25 30 35
1975-1979
1980-1984
1985-1989
1990-1994
1995-1999
2000-2004
2005-2006
Período
Quantidade
Gráfico 1 – Distribuição temporal dos empreendimentos econômicos solidários em Salvador
Fonte: Elaboração própria, a partir de questionários do Mapeamento Nacional de Economia
Solidária aplicados na Bahia em 2005.
O intervalo escolhido para pesquisa foi entre o ano de 2000 a 2004, uma vez que,
entre estes anos registrou-se mais de 60% de surgimento das organizações de economia
solidária em Salvador. Acredita-se que o registro do surgimento de um grande número de
organizações neste intervalo deve-se ao fato de terem ocorrido uma série de eventos
importantes na trajetória do movimento de economia solidária no Brasil, entre os quais o I
Fórum Social Mundial, em 2001, onde houve o grupo de trabalho de economia solidária que
agregou e articulou muitos atores de economia solidária, além do surgimento da Secretaria
Nacional de Economia Solidária, em 2003. Com estes dados em mãos, elaborou-se então, uma
nova listagem com a delimitação das organizações a serem investigadas (Apêndice C).
4.1.1. Metodologia Experimental
A partir do delineamento acima relatado, portanto, a amostra contava com 32
empreendimentos, entre elas 18 cooperativas, 5 associações, 3 grupos de produção coletiva, 3
grupos de produção individual, 2 projetos de cooperativa e 1 ONG (Apêndice C). As
organizações estavam distribuídas entre os mais variados bairros de Salvador, sendo a maioria
deles em bairros periféricos como Uruguai, Plataforma, Pau da Lima, Cajazeiras, entre outros
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
128
– todos bairros menos favorecidos do ponto de vista econômico e social. Apenas duas
organizações encontravam-se em um bairro considerado nobre em Salvador, o caso da única
ONG mapeada e do projeto de cooperativa a ela vinculado. As informações coletadas sobre as
organizações, até então, no entanto, não davam pistas sobre o número de pessoas envolvidas
em cada uma delas, diferentemente da primeira listagem de empreendimentos (Apêndice A).
A metodologia para a coleta da amostra investigada foi a observação
experimental. A técnica de coleta de dados, como explicitado anteriormente, foi a entrevista
com um roteiro semi-estruturado, aperfeiçoado de sua primeira versão testada e aplicada em
2005. O segundo roteiro de entrevista desenvolvido, mais objetivo, evitou algumas perguntas
que não levantariam dados de interesse para a pesquisa, tais como a situação normativa e
legislação pertinente, chegando-se, assim, a uma versão mais enxuta
2
.
As entrevistas, efetivamente, foram realizadas em 17 empreendimentos no
período entre 29 de julho e 8 de agosto de 2006, com uma ou mais pessoas do
empreendimento. Dos 32 empreendimentos listados, 5 não foram contatados, por
apresentarem números telefônicos inexistentes ou desatualizados, não sendo possível obter
contato por outros meios. Outros 5 empreendimentos também não deram entrevistas por
motivos variados: uma cooperativa que faliu e os cooperados atualmente apenas pagam o
empréstimo feito; outra cooperativa, por motivo de uma experiência anterior mal sucedida,
tomou a decisão de não participar de pesquisas de alunos; em outro empreendimento de
produção individual, em que ocorreu a primeira má recepção da pesquisa, em que a pessoa
responsável se recusou a contribuir para a entrevista, alegando não ter disponibilidade de
tempo e solicitou para não ser contatada novamente. Outros 5 empreendimentos contatados
até se mostraram interessadas em contribuir com a pesquisa, mas não foi possível realizar as
entrevistas pela indisponibilidade de tempo das próprias organizações. Em um
2
Para a visualização detalhada do roteiro de entrevista aplicado, vide Apêndice D.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
129
empreendimento, por exemplo, a entrevistadora compareceu à organização para a entrevista,
mas a pessoa que a receberia teve um imprevisto e ausentou-se, sem antes conceder a
entrevista. Houve ainda 2 empreendimentos que mostraram interesse em conceder a
entrevista, mas que, antes, precisavam contatar o grupo para uma tomar uma decisão coletiva,
que seria informada, posteriormente, à entrevistadora, o que acabou não ocorrendo
3
.
Como se pode depreender a partir das investidas iniciais acima relatadas, as
condições de coleta da amostra não foram sempre as mais favoráveis possíveis. Em alguns
empreendimentos, além de haver muito ruído, as pessoas não interrompiam o trabalho para
conceder a entrevista. Três entrevistas, por exemplo, foram realizadas durante uma reunião do
Fórum de Cooperativas Populares. Também, é possível citar o caso em que o diretor da ONG
que administra um projeto de cooperativa se opôs à entrevista, alegando, depois de ter lido o
roteiro de entrevista, que os participantes do projeto não saberiam responder às perguntas
propostas. O diretor também informou à entrevistadora dos problemas administrativos em
relação ao cumprimento de metas que o projeto da cooperativa estaria passando, e questionou
o que a pesquisa em questão traria de benefício para a melhoria da situação do grupo. Esta
entrevista foi realizada depois que a entrevistadora conseguiu convencer o dirigente da ONG
do caráter experimental da pesquisa, e que o retorno seria em informação para os grupos.
Houve, também, algumas vezes, a dificuldade de acesso ao local de
funcionamento das organizações, como no caso da organização localizada no bairro de Nova
Constituinte, um local afastado, com difícil acesso – dificuldade esta agravada pelo fato de a
pessoa contatada ter tido dificuldade de explicar a melhor forma de acesso à associação. Esta
foi uma das entrevistas não realizadas, pois mesmo com toda dificuldade de acesso, a pessoa
contatada não pôde conceder a entrevista no dia marcado por estar ocupada com outros
3
O principal instrumento utilizado para a obtenção das entrevistas foi um gravador de voz digital – Olympus
Digital Voice Recorder W-10, o que possibilitou o armazenamento de todas as entrevistas em meio digital. Além
disso, foi utilizada uma câmera fotográfica digital – Panasonic DMC-LS1, para o registro das organizações, das
pessoas entrevistadas e algumas vezes da produção. Veja as fotos dos empreendimentos no Apêndice M.
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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130
afazeres, já que este era seu único dia de folga semanal. Contudo, no geral, vale o registro, de
que, na maior parte dos empreendimentos que concederam a entrevista, houve receptividade e
interesse, não apenas em contribuir com a pesquisa, mas também com o seu desenvolvimento.
Muitos dos entrevistados manifestaram interesse em saber os resultados da pesquisa, em
assistir a defesa do trabalho, e até mesmo, em receber alguma forma de sistematização do
estudo.
4.1.2. Metodologia Analítica
Conforme explicitado, os dados utilizados para as análises neste trabalho
originaram-se de entrevistas, que é um tipo de interação mais planejada do que a conversa
espontânea, em que o entrevistador manipula perguntas, construindo uma espinha dorsal
exploratória em torno de um conteúdo comum ou seqüência tópica. Isto quer dizer que o texto
conversacional está dividido em fragmentos que dizem respeito a um conteúdo especifico
entrelaçado por uma estrutura formada primeiramente, por um TEMA - uma unidade de nível
mais alto, que é formada por TÓPICOS - que reúnem pontos convergentes a um determinado
assunto, e que, por sua vez, se estruturam em termos de SUBTÓPICOS - módulos
conversacionais.
Neste sentido, o TÓPICO DISCURSIVO funciona como um conjunto de
enunciados que pressupõe, em sua própria constituição, a convergência de diversos referentes
explícitos de um assunto em pauta, e a seqüencialidade de argumentos de importância
gradativamente relativa (os SUBTÓPICOS) que, em conjunto, proporcionam a coerência
necessária ao entendimento dos conteúdos (VAN DIJK 1985, KOCK 1992, FAVERO 1993).
Assim, na análise dos dados coletados para esta dissertação, o PERFIL DA
ORGANIZAÇÃO e o IDEÁRIO são os TEMAS, que formam as duas partes principais do
Roteiro de Entrevistas (vide Apêndice F). Os TÓPICOS, nas análises, são os itens constantes
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131
do Roteiro de Entrevistas, e na primeira parte são formados por: Caracterização da
Organização, Histórico, Articulação institucional e fontes de financiamento (parceiros),
Consciência sobre participação em empreendimento solidário, Objetivos da
Organização, Organização, estrutura e relações; e na segunda parte: Concepção de
sociedade, Concepção de Estado, Concepção de mudança e processo da práxis
transformadora. Os SUBTÓPICOS, por sua vez, referem-se às respostas a cada uma das
perguntas numeradas constantes de cada Tópico, conforme explicitado no Roteiro de
Entrevistas, como demonstra o exemplo abaixo:
PRIMEIRA PARTE - PERFIL DA ORGANIZAÇÃO: (TEMA)
1. Caracterização da Organização: (TÓPICO)
1.1. Quantas pessoas fazem parte da organização? (SUBTÓPICO)
1.2. Distribuição etária e de gênero (SUBTÓPICO)
Os dados coletados foram, assim, organizados e tabulados em forma de quadros,
registrando as respostas dadas às entrevistas, de acordo com cada TÓPICO e os
SUBTÓPICOS correspondentes. Isto quer dizer que, partindo do exemplo acima, para o
primeiro TÓPICO - Caracterização da Organização - foi organizado um quadro contendo
os SUBTÓPICOS relacionados à quantidade de pessoas que fazem parte da organização,
e à distribuição etária e de gênero. Desta forma, no processo de tabulação, foram elaborados
treze quadros contendo as falas dos entrevistados. Para a análise das tabulações será,
primeiramente, percorrido o TEMA que se refere ao PERFIL DA ORGANIZAÇÃO, onde
seis quadros e três gráficos fornecerão dados para a descrição dos perfis das organizações,
através da comparação das semelhanças e diferenças entre elas. Em seguida, serão analisados
os sete quadros que se referem ao outro TEMA - IDEÁRIO DAS ORGANIZAÇÕES,
quando serão feitas considerações em busca de responder à pergunta central do trabalho em
torno da ideologia política que permeia a economia solidária.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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132
4.2. ANÁLISE DOS DADOS
Ao investigar o Perfil das Organizações, o primeiro tópico foi a sua
caracterização, com os subtópicos quantidade de pessoas, distribuição etária e de gênero,
conforme atesta o Quadro 5.
NOME QUANTIDADE DE PESSOAS
DISTRIBUIÇÃO DE GÊNERO
E ETÁRIA
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
7 pessoas, embora já tenham
participado do projeto 22
pessoas, que saíram por falta de
financiamento
Mulheres com idade entre 20 e
45 anos
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
17 pessoas Mulheres com idade entre 20 a
70 anos
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
14 pessoas Mulheres com idade entre 27 e
55 anos
Brinquedos Inteligentes
10 Pessoas Apenas uma mulher. O grupo
tem idade entre 17 e 34 anos
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
5 pessoas, embora já tenham
participado 17 pessoas, que
saíram por falta de “lucro”
Mulheres com idade entre 40 e
50 anos
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
5 pessoas, embora já tenham
participado 25, que por falta de
retorno financeiro, saíram
Mulheres com idade entre 20 e
46
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
24 pessoas (em documento), mas
apenas 20 atuando
Mulheres com idade entre 20 e
60 anos (houve a participação de
1 homem,que logo saiu)
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
15 pessoas 1 homem e 14 mulheres com
idade entre 19 e 52 anos.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens Artesãos
21 pessoas (a entrevistada não
deu muita certeza)
3 homens e o restante de mulher
com idade entre 17 a 20 e
poucos anos
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
25 pessoas, mas que participam
ativamente 16 pessoas
4 homens e o restante mulher,
com idade entre 18 a 50 anos
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
23 pessoas, mas no momento
contam com 12 componentes
Mulheres com idade entre 30 a
63 anos
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e Trabalho
de Artigos Têxteis
10 pessoas freqüentando 90% de mulheres, com idade
entre 18 a 55 anos
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
4 pessoas ajudam “A maioria é mulher, mas tem
um rapazinho que de vez em
quando ajuda”. A idade varia
entre 30 e 57 anos.
Grupo de Amigos Artesãos
25 pessoas, mais ou menos (o
grupo está se refazendo)
“No momento só tem mulher”,
apesar de quando o grupo ter
sido criado haver alguns
homens, que logo saíram por
não se adaptarem bem ao
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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133
artesanato. A idade varia dos
20, até 40, 50, mas “a maioria
é de gente mais maduro”.
Grupo Raio de Sol
4 pessoas permanentes mais a
ajuda de outros colaboradores,
que são pessoas que já
trabalharam conosco e são
convidadas quando precisamos
de ajuda.
Mulheres com idade entre 38 e
57 anos.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de Preservação
Ambiental e desenvolvimento
Sustentável
Não respondeu. A idade entre os participantes
dos 5 projetos da ONG varia
entre 10 anos a te a faixa adulta.
A pergunta em relação ao gênero
não foi respondida.
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
25 pessoas 13 mulheres e 12 homens com
idade entre 18 e 49 anos.
Quadro 5 - Dados gerais dos empreendimentos.
Fonte: elaboração própria
Os 17 empreendimentos pesquisados contam com um número igual ou inferior a
25 pessoas participando ativamente do seu cotidiano. No entanto, apenas 7 empreendimentos
contam com um número entre 21 e 25 pessoas, e quatro contam com um número entre 1 e 5
pessoas, como mostra o Gráfico 2. Em relação ao número de pessoas, 7 empreendimentos
relataram uma diminuição no número de participantes ao longo dos anos, devido à falta de
remuneração imediata.
4
3
2
1
7
de 1 a 5 pessoas
de 6 a 10 pessoas
de 11 a 15 pessoas
de 16 a 20 pessoas
de 21 a 25 pessoas
Gráfico 2 – Quantidade de pessoas participantes dos empreendimentos entrevistados.
Fonte: elaboração própria.
Quanto à distribuição de gênero, os empreendimentos são predominantemente
formados por mulheres. Apenas 7 empreendimentos registraram a presença de homens, sendo
que em apenas um a predominância é de homens. Como a maioria é de produção de
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134
artesanato, ou costura, foi relatado que os homens não se adaptam bem a este tipo de trabalho.
Os empreendimentos registram grande variação de idade, entre 18 e 60 anos em boa parte
deles.
O histórico dos empreendimentos entrevistados é similar na maior parte dos
casos. Doze dos tiveram sua origem vinculada a um curso de cooperativismo ou
empreendedorismo tomado pelo grupo com o apoio de uma instituição externa. Entre estas
instituições podemos citar as ONG’s Cidade Mãe, Pangea, Paciência Viva, Visão Mundial e o
Projeto Axé, a ITCP, o CECOM, a UNIFACS, o SEBRAE e a CONDER (para maior
aprofundamento vide o Quadro de Origem dos Empreendimentos, no Apêndice E). Foi
verificado que apenas os empreendimentos individuais e o caso de uma associação (na qual a
pessoa já participava de outra cooperativa) têm sua origem em uma iniciativa individual. É
possível concluir, então, que há atualmente uma série de organizações fomentando a formação
de cooperativas através da oferta de cursos, o que vai de encontro com o próprio mapa do
campo da economia solidária (SIES, 2006) no Brasil (vide a Figura 1 – Composição da
Economia Solidária, no capítulo 3, pág. 114). Assim como o verificado na pesquisa, o mapa
destaca uma série de entidades, como algumas ONGs, universidades, incubadoras,
movimentos sindicais, entre outras. No entanto, é preciso verificar a qualidade da relação
estabelecida entre os empreendimentos e estas entidades de fomento. Como estarão
estabelecidas as relações entre entidades e empreendimentos? Será que os empreendimentos
apresentam autonomia em relação às entidades? Estas questões serão aprofundadas no tópico
que se refere à estrutura, organização e relações dos empreendimentos. De acordo com o
depoimento, a organização teve apoio de algumas entidades de apoio:
(o grupo) Teve início em 04 de Junho de 2002. Surgiu através do apadrinhamento da
visão mundial, pois quase todas as mulheres daqui têm um filho que é apadrinhado
pela Visão Mundial e a SECOMP dava muita contribuição para as mães desses
filhos apadrinhados. Depois, ao invés de estar dando cesta básica e remédios, eles
resolveram criar grupos, onde cada uma tivesse a oportunidade de ter um meio que
gerasse uma renda. Primeiro, criou-se o grupo dos artesãos, depois um pequeno
grupo de costureiras, e seis meses depois, tomamos a decisão de fazer uma
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Luiza Reis Teixeira
135
cooperativa, através de uma pessoa do SEBRAE que nos deu um curso de
cooperativismo. (COOPERCORTE, 2006)
As motivações para o início dos empreendimentos são relacionadas à falta de
emprego e dificuldade de colocação no mercado de trabalho, alegado pelo fato de serem
mulheres e não terem qualificação suficiente. Foi atribuído também à dificuldade de
colocação no mercado de trabalho a idade avançada, a origem de bairros pobres e a questão da
discriminação pelo fato delas serem negras. O cooperativismo é visto então como a
possibilidade de poder desenvolver uma atividade e conseguir uma remuneração, muito
embora, haja a consciência que a remuneração vem apenas depois de um tempo – quando
vem, o que é possível constatar nos depoimentos dos entrevistados:
A maioria do pessoal não tinha emprego fixo, e estes grupos, estas coisas é um meio
de garantir uma rendinha (GRUPO DE AMIGOS ARTESÃOS, 2006).
A motivação é ter um trabalho nosso. Ao invés de ficar desocupada em casa, a gente
tem algo que nós fazemos. Tem muita gente aí que não tem o que fazer.
(COOMARTES, 2006).
Necessidade nossa, pois somos mulheres em idade avançada, com dificuldade de
conseguir um emprego, até pelo nosso conhecimento, da capacitação da gente
mesmo. Então a gente ficou unida e buscou juntas um maior conhecimento. Passar o
aprendizado também (...). No momento, estamos todas voluntárias sem remuneração
nenhuma. É muito pouco, só para manter (COOPERATIVA RAÍZES DO POVO
DE ISRAEL).
O tópico articulação institucional e fontes de financiamento (parceiros)
apresenta quem são os parceiros e financiadores dos empreendimentos e como eles estão
organizados em redes e fóruns. A grande maioria das entidades parceiras dos
empreendimentos são as mesmas que apoiaram seu surgimento. A origem dos parceiros,
conforme sua finalidade, segue a seguinte distribuição, conforme o Gráfico 3.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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136
8
11
16
12
Poder Público
Parceiras Privadas
Sociedade Civil
Redes e Fóruns
Gráfico 3 – Origem dos parceiros
Fonte: elaboração própria
A constatação inicial é que a maioria absoluta dos empreendimentos – exceto um
- relaciona-se com organizações da sociedade civil. O CESE e a ITCP da UNEB são as
entidades que mais - três vezes - aparecem como parceiras dos empreendimentos, sendo que o
primeiro está sempre apoiando projetos de financiamentos, e o segundo surge como promotor
do processo de incubação dos grupos, conforme atesta um dos entrevistados:
Temos uma relação muito boa com a ITCP. Ela é como a mãe da gente que
acompanhou todo o processo, que acompanhou o estudo de viabilidade, a assessoria
(COOPERART, 2006).
Outras entidades da sociedade civil que aparecem como parceiras dos
empreendimentos são: a ONG Vida Brasil – que apóia o Fórum de Cooperativas e coordenou
o Mapeamento Nacional de Economia Solidária na Bahia; o CECOM e Clube de Mães do
CECOM – que apoiaram e incentivaram a formação de dois grupos, além de prestar
acompanhamento às atividades, e ter como dois de seus assistentes sociais como pessoas de
referência nestes grupos; o PANGEA – que realiza a administração de uma das cooperativas;
a Visão Mundial – que organiza o banco comunitário que concede empréstimos a um dos
grupos; a Igreja Católica e Batista – que cedeu espaço físico, e apoiou as atividades de dois
grupos; a OCEB – que dá orientações para a legalização de uma das cooperativas; o Projeto
Axé – que organizou o curso inicial que agregou o grupo que formou uma das cooperativas; a
Universidade Católica – que ofertou cursos de cooperativismo para dois grupos; as
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137
associações de moradores do Uruguai e da Federação que apóiam as atividades de duas
cooperativas; entre outras entidades que tiveram menor participação nas parcerias com os
empreendimentos entrevistados.
Entre as parcerias com o poder público, é possível citar Secretaria Estadual de
Combate a Pobreza – SECOMP, como financiadora de projetos para os empreendimentos; a
Fábrica do carnaval – um projeto da prefeitura com articulação do SEMPRE, SEBRAE, e
outros, que cedeu espaço para algumas organizações venderem e exporem seus produtos
durante o período de um mês; a Universidade Federal da Bahia – que apoiou as atividades de
algumas cooperativas através do BanSol; a SETRAS – que fez o empréstimo de máquinas de
costura para uma cooperativa; o Centro Social Urbano do bairro da Federação– que cedeu o
espaço para ser o local de produção de uma das cooperativas, entre outras.
Já entre as parcerias privadas, as mais comuns são as doações de pessoas físicas,
que podem ser de fora da cooperativa, como o caso de uma apresentadora de programa da TV
local que apoiou o trabalho de uma cooperativa através da sua divulgação, ou de dentro da
própria cooperativa, como em uma associação que uma das associadas cedeu parte de sua casa
para ser a sede da associação. A Petrobrás também apoiou quatro dos empreendimentos
através de projetos enviados, sendo que em uma cooperativa o apoio foi apenas para dois
projetos de capacitação – “são projetos muito pequenos mesmo” (COOPERART, 2006) – na
outra cooperativa apoiada o projeto já contemplava a compra de equipamentos, recrutamento
de pessoal, compra de fardamento e bolsa auxílio, e nas outras duas não foi detalhado como
ocorria a parceria. Ainda podemos destacar a Unifacs que idealizou, elaborou e pôs em prática
o projeto de uma das cooperativas através da contratação informal de uma pessoa para formar
o grupo da cooperativa, em que seriam concedidas as cantinas de seus prédios de aula para a
cooperativa explorar, além de ter cedido um ponto de venda de mercadorias para uma das
associações, e a Faculdade Ruy Barbosa e o Colégio Anglo Brasileiro que apóiam dois dos
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
138
empreendimentos através da doação de material para reciclagem e material para um projeto de
formação de atletas em beach soccer. O SEBRAE também aparece como um dos parceiros,
muito embora não seja totalmente privado – uma espécie de misto entre o privado e o público
– através da oferta dos mais diversos cursos de capacitação em três dos empreendimentos.
Para maior aprofundamento vide o Apêndice F com o Quadro de articulações dos
empreendimentos.
As parcerias têm um papel muito importante para os empreendimentos de
economia solidária, devido às diversas necessidades que eles enfrentam. Foi possível perceber
com as entrevistas que os parceiros são fundamentais em diversas etapas do desenvolvimento
dos empreendimentos. Alguns parceiros, como a Unifacs, aparecem como responsáveis pela
formação da cooperativa (COOPAED). Já o SEBRAE, que, em geral, tem uma parceria mais
pontual, aparece como um parceiro fundamental para a capacitação dos empreendimentos. As
igrejas Católica e Batista aparecem como não apenas idealizadoras, mas também conselheiras
e apoiadoras financeiras quando necessário. A ITCP, por sua vez, apresenta um papel
fundamental para a incubação de alguns grupos, que muitas vezes têm dificuldades na
definição de seu ramo de produção.
No entanto, é preciso cautela ao analisar as entidades de apoio, pois o papel de
suporte pode gerar uma dependência nos empreendimentos que podem deixar de funcionar de
forma autônoma sem a presença dos parceiros. No entanto, não figura nos objetivos deste
trabalho aprofundar esta análise; por isso, apresentamos apenas essa rápida abordagem de
forma descritiva.
O quarto tópico em relação ao perfil das organizações é a consciência sobre
participação em empreendimento solidário, isto é, se o empreendimento se considera de
economia solidária e a compreensão a respeito do que seja a economia solidária. À primeira
pergunta deste tópico – se o empreendimento considerava que era de economia solidária –
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
139
houve uma resposta negativa, mesmo o empreendimento constando no mapeamento nacional
de economia solidária. Com a explicitação do entrevistado de que o trabalho não seria nem
cooperativo ou associativo, ou mesmo de economia solidária, deste tópico em diante,
deixaremos de analisar as respostas deste empreendimento, salvo exceções quando quisermos
comparar suas respostas para contrastar com as respostas dos outros empreendimentos.
A gente trabalha assim: a gente procura, de alguma forma, não repetir o que o
mercado faz, mas é difícil. Os salários não podem ser muitos altos se não tem como
pagar, mas, assim, a gente tem uma certa liberdade no ambiente de trabalho, não
tem? Não um ambiente totalmente rígido, mas eu não sei, não é economia
solidária, é mais uma empresa convencional. É um grupo de artesãos. Vocês
trabalham de forma cooperativa? Não, na verdade a galera ganha salário
(BRINQUEDOS INTELIGENTES, 2006)
Em três das entrevistas, as pessoas demonstraram dúvida em relação à
compreensão do que seria a economia solidária, conforme o depoimento destes entrevistados:
Você quer saber se a gente tem algum programa social, é? Isto que é “economia
solidária”? Esta solidariedade que você está se referindo é internamente ou pra
comunidade? (Economia solidária) é uma ajuda mútua, né? (...) Entre a gente, a
gente é solidário, porque a gente está cooperando e se ajudando. Mas, pra
comunidade, ainda não (ASCOSI, 2006).
Como assim? Na venda? Eu produzo em casa e as pessoas que me ajudam têm uma
remuneração em cima da venda, de acordo com o que vende. Tanto pelo valor do
material, como pelo valor da venda. Falar a verdade? Eu não sei o que é economia
solidária. É quando recebe ajuda de uma parte? Ah, é bom. Porque uma pessoa não
pode trabalhar só. Porque o trabalho com estes bonequinhos exige muito, então a
solidariedade é das pessoas que estão me ajudando. Estão ajudando na produção.
Então é um trabalho em conjunto (EDNA BATISTA NASCIMENTO, 2006).
Isso aí precisa vê o que é economia solidária. O que é economia solidária? É quando
você participa com outro? Então eu creio que sim, nós ajudamos (a entrevistada se
referiu ao grupo internamente e com outros grupos) (GRUPO RAIO DE SOL,
2006).
Houve também um caso em que o entrevistado afirmou que seu empreendimento
seria de economia solidária, mas seu entendimento sobre o conceito não era apropriado para
referir-se ao movimento. Para este entrevistado, aparentemente, o fato de administrar o
projeto de formação de uma cooperativa de coleta seletiva voltado para pessoas fora do
mercado de trabalho justificaria para a organização ser um empreendimento econômico
solidário. No entanto, a autogestão que se constitui em um dos pilares da economia solidária
parece ter sido esquecida pelo entrevistado, pelo menos na sua relação com a cooperativa em
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
140
formação. Esta organização poderia estar classificada como entidade de apoio e fomento, mas
não deveria constar no mapeamento como um empreendimento econômico solidário. Pelo
exposto tomou-se a decisão, também, de não considerar as respostas desta organização nos
próximos tópicos a serem analisados.
Nós nos consideramos (de economia solidária) pelo seguinte: nós temos projetos que
são orientados para o desenvolvimento de pessoas e um deles é um projeto que gera
renda, que é o Projeto Ação Reciclar. E hoje ele é um projeto que é administrado da
seguinte forma: é um projeto que desde o princípio, tudo que é coletado é dividido
igualitariamente e, hoje, além da participação neste rateio, há uma bolsa, oferecida
pela SECOMP, pelo período de 6 meses. Então, eles têm a bolsa e a participação no
rateio. Então, é um projeto que congrega pessoas que estão fora do mercado de
trabalho, que, provavelmente, não teriam a oportunidade de ter renda e, hoje, estão
tendo esta oportunidade, de melhorar a qualidade de vida com a coleta seletiva (...).
Eu não sei dizer como funciona o trabalho com outras cooperativas. Hoje eu digo
que a ONG é administradora do Projeto Ação Reciclar (ONG Paciência Viva)
Mesmo nas organizações que se autodenominaram como sendo organizações de
economia solidária, a compreensão do sentido de economia solidária se mostrou muito
diversa. Vale à pena um aprofundamento maior desta questão tanto no Apêndice G, como no
Quadro 6 que segue:
ENTENDIMENTO CONCEPÇÃO DE ECONOMIA SOLIDÁRIA
“A economia solidária é muito mais do que o econômico, do que o dinheiro
(...) Seria hipocrisia da minha parte dizer que a gente não se preocupa com o
dinheiro, até porque a gente precisa dele para comer (...). Quando você vê seu
orgulho de estar participando, seu orgulho de estar fazendo aquilo, você
percebe que, na economia solidária, a palavra economia não vem em primeiro.
Então, você percebe que há mais ênfase na palavra solidária do que economia
(...)”.
“Sim, um vai ajudando o outro. A gente ainda está aprendendo o que é
economia solidária”
“Eu acredito que sim, porque a gente está buscando, está correndo atrás,
através da união das mulheres, e é uma coisa bonita. Para algumas, é como se
fosse uma terapia. Isso é positivo”
Noção relacionada a fazer
parte de um
empreendimento coletivo
“Eu acho que sim (em relação a ser de economia solidária), porque se a gente
busca uma economia em conjunto. A palavra ta dizendo, solidária (...)”.
“Muitas coisas (na associação) são doadas e fazemos baixo custo, muitas coisas
são reaproveitadas, uma é solidária com a outra ensinando com seus
conhecimentos. Trabalhar na economia solidária é bom, mas, quando a gente
vai competir com o mercado, a gente fica pra trás”.
Noção relacionada com a
aprendizagem e prestação
de serviços comunitários
“Eu acho, porque é um projeto que ajuda as pessoas da comunidade. Através
disso aí já é alguma coisa, né?”
“Você quer saber se a gente tem algum programa social, é? Isto que é
“economia solidária”? Esta solidariedade que você está se referindo
internamente ou pra comunidade? (Economia solidária) é uma ajuda mútua,
né? Entre a gente, a gente é solidário, porque a gente está cooperando e se
ajudando. Mas, pra comunidade, ainda não”.
Noção de economia
solidária como ser solidário
e ter união
“O que é economia solidária? É quando você participa com outro? Então eu
creio que sim, nós ajudamos”.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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141
“Os envolvidos precisam ter persistência, união, que às vezes não tem (...). É
um trabalho de união e de persistência. Mas, que tem tudo pra dar resultado,
tem”.
“Eu considero (de economia solidária), porque é um trabalho de integração, que
busca unir as pessoas no trabalho. Porque, se você faz uma bolsa, e eu faço
outra, aí, vai integrando as coisas e funcionam melhor. Dois é mais do que um”.
“A diferença de um empreendimento solidário para o capitalismo é a
organização, da forma em que ele é gerido, então eu costumo dizer que a
economia solidária trouxe a gente para uma espécie de gestão diferente. Só que
uma gestão diferente tem muitos conflitos, porque as pessoas não estão
acostumadas a projetos dessa forma, então se você habituasse a tudo ser de todo
mundo, a ter um grande comprometimento, a questão do financeiro que retorna
muito, (...) é característica de economia solidária, não pensa só no capital,
precisa dele pra sobreviver, mas pra não perder. A questão, também, é de
respeitar o individuo, nem todo mundo é igual e não aprende a ser igual”.
“...Eu acho que sim... Um trabalho cooperativo com divisão de tudo igual. A
gente aprende muito aqui”.
“A economia solidária pra mim, é conseguir construir, dentro do
cooperativismo, uma cooperativa viável, com administração auto gestionária
estável, onde haja a percepção que dentro do ambiente de trabalho, a gente
consiga ter uma relação harmoniosa, uma compreensão múltipla de ajuda”.
Noção relacionada ao
cooperativismo e autogestão
“Então eu acredito que o cooperativismo é o trabalho do século porque não tem
emprego. Hoje em dia isso é muito grande (o desemprego). Agora é um trabalho
de persistência”.
Noção de uma solução para
o desemprego
“Esta é a única solução. Como não existe emprego pra todo mundo e as
empresas não contratam pessoas sem formação, as pessoas da comunidade
acabam buscando o artesanato e a costura, assim entramos em contato com
essas pessoas pra entrarem no grupo e terem um meio melhor de vida”.
Noção do funcionamento da
economia em rede
“Estar junto, buscando melhorias para as pessoas, para as cooperativas.
Trabalhando junto, em rede. É muito importante, porque cada grupo coloca o
que pensa, um ajuda o outro, dá opinião. É muito importante a economia
solidária”.
Quadro 6 – As noções no entendimento da economia solidária.
Fonte: elaboração própria.
As seis noções relacionadas a partir da análise do entendimento dos entrevistados
acerca da economia solidária se aproximam das quatro características da economia solidária
definidas no Atlas da Economia Solidária no Brasil (2006): cooperação, solidariedade,
autogestão e atividade econômica. Primeiramente as noções relacionadas a fazer parte de um
empreendimento coletivo, a aprendizagem e prestação de serviços comunitários e a
noção de economia solidária como ser solidário e ter união, estão muito próximas à
característica da solidariedade, que remete a uma preocupação com a melhoria da qualidade
de vida em geral, seja com os participantes dos empreendimentos, ou com sua comunidade. A
noção relacionada ao cooperativismo e autogestão pode ser diretamente relacionada às
características da cooperação e autogestão, assim como as noções da economia solidária como
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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142
uma solução para o desemprego e do funcionamento da economia em rede se aproximam
da característica de atividade econômica uma vez que há a preocupação com a geração de
renda para os envolvidos e a busca do trabalho em rede, seja pela comercialização de
mercadorias ou pelo fortalecimento do movimento.
No tópico a respeito dos objetivos da organização, buscava-se descobrir,
primeiramente, os objetivos e resultados almejados pelos empreendimentos, e se eles haviam
decidido seus objetivos com autonomia, ou eles haviam sido decididos por algum ator externo
ao empreendimento. A autogestão é caracterizada pela decisão e direção coletiva do
empreendimento; portanto, quando não há autonomia nas decisões dos objetivos, é possível
deduzir que a autogestão não está sendo aplicada de forma plena. Neste caso, verifica-se uma
incongruência da teoria com a prática da economia solidária.
Quando perguntados sobre objetivos e resultados, apenas cinco dos
empreendimentos analisados fizeram uma diferenciação entre os dois. Contudo, mesmo os
que diferenciaram objetivos de resultados deram respostas muitas vezes iguais entre os dois.
A seguir, no Quadro 7, segue os objetivos e resultados dos empreendimentos e quantas vezes
eles foram ditos pelos empreendimentos. Para maiores esclarecimentos, vide o Quadro de
Objetivos dos Empreendimentos no Apêndice H.
OBJETIVOS E RESULTADOS QNT
Agregar novos membros 4
Aumento nas vendas 2
Capacitação externa 2
Capacitação interna 3
Crescer 3
Dar continuidade ao empreendimento 1
Educação 1
Entrar no mercado (conseguir clientes) 2
Espaço físico 2
Exportar 5
Fazer da cooperativa um emprego 1
Fazer registro 1
Formação política, e emocional 1
Melhorar a auto-estima 2
Multiplicar 1
Organização e desenvolvimento da comunidade 2
Pagar direito trabalhista e plano de saúde 1
Ponto de venda 3
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Gerar trabalho e renda / Gerar lucro /
Participação no lucro
10
Renovar financiamento 1
Um espaço para o artesão expor seu trabalho
(organizado pelo governo)
1
Quadro 7 – Objetivos e Resultados dos Empreendimentos
Fonte: elaboração própria
O item gerar trabalho e renda / gerar lucro / participação nos dividendos,
mencionado por dez empreendimentos, demonstra que a principal preocupação dos grupos é
financeira, até porque muitos grupos, apesar de estarem em funcionamento há algum tempo,
ainda não conseguem ter resultados financeiros. No entanto, vale ressaltar que a utilização de
termos como o lucro – ocorrido uma vez, demonstra um afastamento da terminologia
utilizada no cooperativismo, ao invés de lucro, utiliza-se sobra – valor que é dividido entre os
cooperados equivalente à remuneração nas empresas tradicionais. O segundo objetivo mais
repetido – exportar, citado por cinco empreendimentos, é visto como uma forma de agregar
valor ao produto, e portanto, uma forma dos empreendimentos conseguirem obter uma maior
remuneração e, conseqüentemente, gerar renda para seus membros. O objetivo de agregar
novos membros, citado por quatro empreendimentos, é um reflexo do esvaziamento que
ocorreu em boa parte dos grupos ao longo dos anos, motivado pela falta de um retorno
financeiro. Há uma cooperativa, por exemplo, que informou que alguns de seus integrantes
estão envolvidos em outros empregos – com carteira assinada. É bastante recorrente nas falas
dos entrevistados que os novos cooperados devem entender que o retorno financeiro não é
imediato. A capacitação interna e externa, a educação e a organização e o
desenvolvimento comunitário também acabam sendo recorrentes na fala dos representantes
de oito empreendimentos. Com isso, nota-se que as organizações demonstram alguma
preocupação com o desenvolvimento de atividades voltadas para as comunidades em que
estão inseridas, salvo algumas exceções – aspecto que será mais explorado quando tratarmos a
concepção de sociedade. Os outros objetivos demonstram uma preocupação na estruturação
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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(fazer registro, conseguir um espaço físico e/ou ponto de venda) e sustentabilidade (dar
continuidade ao empreendimento, renovar financiamento, entrar no mercado, aumento
nas vendas, crescimento, fazer da cooperativa um emprego, pagar direitos trabalhistas e
plano de saúde) dos empreendimentos, como também uma preocupação com o crescimento
individual dos participantes (formação política, e emocional, melhorar a auto-estima).
O tópico relacionado à organização, relações e estrutura dos empreendimentos
buscou verificar, primeiramente, que produtos estão sendo produzidos por estas organizações
e como a produção está estruturada. A organização da produção expõe se os trabalhadores
estão agindo de maneira mecanicamente, obedecendo a um superior, ou se estão tendo
consciência do que é e como é produzido. Em seguida, buscou-se neste tópico, verificar se a
responsabilidade da produção é compartilhada por todos ou recai sobre uma pessoa e como
são tomadas as decisões, novamente, se pela coletividade ou por um líder ou atores externos.
Por fim, buscou-se investigar se os empreendimentos apresentam uma preocupação em
conscientizar outras pessoas do trabalho que desenvolvem.
Seis dos empreendimentos fazem serviço de costura em geral, produzindo artigos
como colcha de retalhos, fardamentos industriais, almofadas, tapetes, crochê, peso de porta,
toalha de prato, entre outros. Dois dos empreendimentos relataram que também fazem serviço
de conserto a preços mais baixos para a comunidade. Outra característica apresentada por dois
dos empreendimentos é a produção de fardamentos industriais através de intermediário, que é
contratado por uma empresa maior, e ao contratá-las fornece toda a matéria-prima para a
produção, desde o tecido cortado às linhas que serão utilizadas. Este tipo de serviço é feito,
pois os empreendimentos não possuem caixa para compra suas próprias matérias-prima para a
produção. O segundo produto que aparece é o artesanato em três empreendimentos, seguido
pela produção de artigos em couro, tecelagem, coleta seletiva e alimentação, que aparecem
apenas uma vez. A cooperativa que produz artigos em couro não está produzindo no
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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145
momento, e já está sendo discutido internamente a possibilidade de passar a produzir outro
tipo de modelo. Veja a divisão das atividades no Gráfico 4, ou mais detalhadamente no
Apêndice I.
6
3
1
1
1
1
costura em geral
artesanato
artigos em couro
alimentação
tecelagem
coleta seletiva
Gráfico 4 – Produção dos Empreendimentos entrevistados
Fonte: elaboração própria
A organização em grande parte dos empreendimentos ocorre de forma aleatória,
ou seja, dificilmente há uma programação do que será produzido. O que acaba ocorrendo é
que a produção vai sendo feita de acordo com encomendas ou com a demanda de vendas, no
caso dos empreendimentos que comercializam seus produtos. A divisão da produção segue
critérios de afinidade e das pessoas que melhor desempenham a função. No geral, percebe-se
que a produção é feita de forma coletiva, com a cooperação entre os integrantes dos
empreendimentos, salvo dois casos: o caso de um empreendimento individual, em que a
proprietária organiza a produção; e o caso do grupo, em que há uma pessoa externa
organizando a produção. Vale citar também o caso único da cooperativa que está estruturada
em núcleos de produção, com gerentes para cada núcleo que organizam a produção dentro
deles. Este foi o único caso entre os empreendimentos pesquisados com este formato
organizacional. O detalhamento sobre a organização da produção segue no Quadro 8,
podendo ser mais aprofundada no Apêndice I.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO NOS EMPREENDIMENTOS
Ausência de cronograma de produção
Cada pessoa desempenha uma função de acordo com a sua vontade, habilidade e/ou urgência na entrega de
encomendas
A produção é realizada em dois dias da semana durante um turno
A organização é aleatória
Algumas coisas são feitas fora da associação, mas com o material de lá
Há um processo de aprendizagem na produção
A produção é feita sob encomenda - o contratante dá o material
A produção é dividida de acordo com o que cada uma faz melhor.
A organização da produção se dá com base na decisão coletiva do que será produzido
Divisão do trabalho por afinidade do que cada uma faz
A massa (que é feita por uma) é distribuída junto com a matéria-prima (búzios)
Cada cooperada faz uma quantidade indeterminada de peças.
A produção é feita por todas (“todo mundo se interessa em fazer tudo”)
Organizada de forma bem aleatória
A produção é feita nas cantinas da UNIFACS
Toda produção é feita no dia que será consumida
Nas cantinas há uma pessoa responsável pela produção, o resto apóia a venda
Há duas pessoas responsáveis pela compra dos materiais e uma pelo financeiro (caixas e fluxo do financeiro)
que presta conta na assembléia.
A cooperativa é dividida em 5 núcleos de produção: bambu, bijuteria, papel reciclado, artigos de papel e
luminária.
Cada núcleo organiza a sua produção de acordo com as suas metas, que são determinadas pelo gerente do núcleo
O gerente passa as metas para o resto do grupo, além de fazer a comunicação entre os núcleos
Há a possibilidade de mudar de núcleo
A produção de fato ainda não ocorre
A encomenda é dividida por todas
Cada uma desempenha uma função de acordo com a habilidade em determinado trabalho
A produção é feita de acordo com a demanda ou com o tipo de peça que tiver em menor quantidade
A produção é dividia aleatoriamente entre o grupo, pois todos fazem tudo.
Há a preocupação de variar o modelo, a técnica e o design para as peças não ficarem iguais.
A produção é feita de acordo com as encomendas e demanda de venda
A produção é feita em etapas, pelas partes dos bonequinhos
Cada pessoa fica com uma parte, mas a maioria passa pela supervisão da proprietária, que organiza a produção.
Uma pessoa externa ao grupo organiza o trabalho - “Aí quem quer bordar ela dá uma parte do trabalho, quem
quer fazer crochê ela dá outra parte
Todas participam igualmente de todas as fases da produção.
A cooperativa é dividida em grupos que seguem um roteiro pré-estabelecido de coleta
A coleta é feita em carros que não são muito práticos, são pesados e difíceis de manejar.
Quadro 8 – Organização da produção nos empreendimentos
Fonte: elaboração própria
Dos 14 empreendimentos que realizam produção e estão sendo analisados neste
tópico, oito afirmaram que a responsabilidade da produção é de todos do grupo, enquanto em
três outros empreendimentos a responsabilidade pela produção é delegada a uma pessoa.
Dentre estes três casos há a cooperativa que apresenta o formato organizacional em núcleos,
onde o gerente acaba sendo o responsável pela produção. O outro caso é do empreendimento
individual, onde a proprietária é responsável pela produção. O terceiro caso é o grupo que tem
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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uma pessoa externa organizando e responsabilizando-se pela produção. Ainda há o caso de
três empreendimentos que alternam a responsabilidade pela produção entre duas ou mais
pessoas, por motivos como a melhor qualificação destas pessoas, ou por questões logísticas de
organização da produção.
A tomada de decisões nos empreendimentos acaba seguindo o mesmo curso da
responsabilidade pela produção: nos empreendimentos em que a responsabilidade é do
coletivo, a tomada de decisão é também coletiva, embora o inverso não seja verdade para
todos os casos. Nos três casos primeiros casos citados o processo de tomada de decisão só fica
claro quando nos referimos ao empreendimento individual: há uma proprietária do
empreendimento que é responsável pela produção e toma as decisões apenas consultando a
disponibilidade do grupo. Contudo, nos outros dois grupos, não fica claro como o processo de
tomada de decisão ocorre. Na entrevista à cooperativa dividida em núcleos de produção, a
entrevistada afirma que é preciso haver uma conversa para a tomada de decisão, mas não
especifica com quem é esta conversa, se entre todos os membros da cooperativa, ou não, ou
mesmo se esta “conversa” é uma prática comum no grupo ou se ocorre com freqüência. No
outro caso, em que o grupo tem a produção organizada e coordenada por uma pessoa externa,
a resposta da entrevistada refere-se à decisão coletiva como uma prática recentemente
implementada; fica a dúvida se a decisão coletiva já é uma prática efetiva no grupo. Outro
empreendimento que não registra a responsabilidade pela produção e a tomada de decisão
coletiva é uma associação em que os cargos de diretoria, que são rotativos, exercem esta
função. Vale destacar ainda duas cooperativas que a responsabilidade da produção não é
coletiva, mas a tomada de decisão é. A seguir veja o Quadro 9, em que as decisões que não
são coletivas estão destacadas.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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RESPONSABILIDADE PELA PRODUÇÃO TOMADA DE DECISÃO
Todas, mas uma pessoa tem a representatividade e
faz a coordenação.
Tudo (bem enfático) é decidido por todas. Nenhuma
decisão é tomada sem a participação de todas.
(percebe-se certa dependência do grupo pela
coordenadora).
Alternada entre duas pessoas e uma pessoa
responsável pelo controle de qualidade.
As decisões são tomadas pela administração geral,
que é rotativa.
Todas. As decisões são tomadas pela maioria com todas
envolvidas no processo.
Todas - Cada cooperada é responsável por uma parte
da produção.
A decisão é coletiva e consensuada.
Todas - a responsabilidade é dividida. A decisão é baseada num consenso entre todas - “Se
todas toparem a gente se divide e faz”.
Todas - “A gente coloca que cooperativa não tem
dono. Cooperativa é um grupo de cooperado. Então
todo mundo tem que ter responsabilidade”.
As decisões são tomadas pelo grupo, que algumas
vezes contam com o apoio do padre da paróquia - uma
figura muito importante para esta cooperativa.
Há uma chefa de produção por cantina
(responsável pela produção na cantina que atua),
mas as outras pessoas ajudam o que dilui a
responsabilidade.
As decisões são tomadas nas assembléias
Uma pessoa - Gerente do núcleo. As idéias podem ser levantadas nos núcleos, então há
uma conversa (entre quem? provavelmente com a
ONG apoiadora, o que não foi especificado).
Não há produção Em reunião.
Duas cooperadas são responsáveis pela produção –
elas controlam a produção, pois têm habilidade de
produzir qualquer peça.
Tudo é decidido em assembléia.
Todos As decisões são tomadas em reuniões.
Uma pessoa - A responsabilidade pela produção é da
proprietária.
As decisões são tomadas pela proprietária que
consulta a disponibilidade das outras pessoas
Uma pessoa externa - a assistente social, embora haja
funções executivas no grupo
Há pouco tempo as decisões passaram a ser tomadas
em assembléia - “Agora é assim, tudo é na base da
assembléia. Porque se é um grupo não pode uma
pessoa decidir sozinha, tem que ter a opinião de todos.
É até por votação”
Todas são responsáveis pela produção As decisões são tomadas em grupo.
Todos são responsáveis. Decisões são coletivas - apoio da ONG Paciência Viva
(que administra a cooperativa e faz todo o trabalho de
articulação, capacitação, recrutamento e gestão de
recursos)
Quadro 9 – Responsabilidade pela produção e tomada de decisão
Fonte: elaboração própria
Quando perguntados se há o desejo de conscientizar de alguma forma outras
pessoas acerca dos desafios da economia solidária, apenas um dos empreendimentos
entrevistados afirma que não há uma preocupação na conscientização de outras pessoas no
momento, enquanto os outros manifestam o desejo de conscientizar outras pessoas. As formas
de conscientização das pessoas podem ser para o trabalho cooperativo, através do próprio
trabalho, através da oferta de cursos e serviços para a comunidade, através da inclusão
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
149
de novos cooperados, e outras formas, tais como para valorização do trabalho do
artesão, e para a reciclagem. Vale notar que não há registros de empreendimentos que
queiram conscientizar as pessoas para a utopia da economia solidária. Contudo,
aprofundaremos este assunto mais adiante.
CONSCIENTIZAÇÃO
Conscientização para o trabalho cooperativo.
Conscientizar a comunidade para a alternativa do cooperativismo (solução para o
desemprego) - “Então eu acho que dá pra conscientizar, mas é difícil, porque quando
o pessoal começa a trabalhar e não vê o lucro imediato, não é fácil (...) O
cooperativismo é um trabalho de paciência, como a educação”.
Conscientização
para o trabalho
cooperativo.
Conscientizar pela inclusão no trabalho cooperativo. “A gente sonha em chegar a 200
pessoas. A gente sonha em fazer camisas. A gente quer botar a juventude para
participar. A gente sonha muito!”
Conscientização pela “forma como a gente faz as coisas. As pessoas precisam
acreditar que elas podem fazer”.
Conscientização através do próprio trabalho.
Conscientização
através do próprio
trabalho
Conscientização através do próprio trabalho (artesanato) que retrata cenas de impacto
social (menino de rua, menino cheirando cola - um retrato da sociedade).
Conscientização através da oferta de cursos para a comunidade
Conscientizar através de cursos para a comunidade transmitindo o que foi aprendido
por eles
Conscientização
através da oferta de
cursos e serviços para
a comunidade
Conscientizar a comunidade para cidadania - através da oferta de uma série de
serviços de apoio na comunidade.
Conscientizar através da inclusão de novos cooperados.
Conscientização
através da inclusão
de novos cooperados
Conscientização pelo processo de inclusão novas pessoas na cooperativa.
Conscientização para a valorização do trabalho do artesão.
Outras formas de
conscientização
Conscientizar para a reciclagem. “Esse é o nosso objetivo: que as pessoas separem os
materiais”.
Não conscientização
Não há uma preocupação na conscientização de outras pessoas no momento.
Quadro 10 – Conscientização de outras pessoas
Fonte: elaboração própria.
Após percorrer todos os tópicos do tema relacionado ao Perfil dos
Empreendimentos, é possível traçar um perfil global dos empreendimentos solidários de
Salvador surgidos entre o ano de 2000 a 2004:
Os empreendimentos têm em média entre 20 a 25 pessoas;
A maioria dos empreendimentos é formado por mulheres com idade entre 18 e
60 anos;
O surgimento está relacionado com algum curso tomado pelo grupo oferecido
por alguma instituição;
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
150
Há o apoio financeiro externo para a formação e início da produção nos
grupos;
As articulações são mais comuns com as organizações da sociedade civil, e há
muitas instituições que apóiam através da oferta de cursos. As instituições que
mais no desenvolvimento e financiamento dos empreendimentos são a ITCP da
UNEB e a CESE;
A maior parte dos empreendimentos participa de redes e fóruns, sendo mais
comum a participação no Fórum de Economia Solidária e no Fórum de
Cooperativas Populares – fruto da articulação dos próprios empreendimentos;
Os empreendimentos consideram ser de economia solidária, mas não há um
consensual quanto ao conceito. Ao descreverem a economia solidária,
ressaltam aspectos particulares, como ser solidário e ter união, fazer parte de
um empreendimento coletivo, ou mesmo a aprendizagem e a prestação de
serviços comunitários, que mais fazem sentido em suas realidades;
Os objetivos dos empreendimentos são voltados para a geração de trabalho e
renda, ainda que muitos tenham objetivos ligados a sua estruturação e
sustentabilidade;
A maior parte dos empreendimentos trabalha com costura geral e artesanato e a
produção é organizada de forma aleatória, seja por encomendas ou por
demanda de venda. No geral, as pessoas desempenham sua função de acordo
com sua habilidade ou afinidade pelo trabalho;
A responsabilidade pela produção e pela tomada de decisões é do grupo;
Há uma preocupação em conscientizar outras pessoas, seja através do trabalho
cooperativo, seja através da divulgação do seu próprio trabalho, embora não
seja citada a conscientização para a economia solidária.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
151
Antes de passarmos para a análise do próximo tema, esclarecemos que após uma
descrição muito diversa do perfil dos empreendimentos de economia solidária, não mais
analisaremos os dados do empreendimento individual, que continuou a ser analisado, após a
exclusão do outro empreendimento individual que afirmou não ser de economia solidária, e da
ONG que demonstrou desconhecer o tema da economia solidária. O empreendimento em
questão não foi desconsiderado anteriormente porque, diferentemente dos outros dois
empreendimentos desconsiderados para análise anteriormente, este empreendimento havia
mostrado uma compreensão acerca do conceito de economia solidária. No entanto, no
decorrer da análise, percebemos que as suas características distanciam-se das características
dos empreendimentos econômicos solidários, pois ele não se baseia no trabalho cooperativo,
ou mesmo apresenta a característica da autogestão.
Passaremos agora para a análise do próximo tema global, que se refere ao ideário
dos empreendimentos, cujo primeiro tópico é a concepção de sociedade. Pretendemos neste
tópico verificar a idealização de sociedade que os empreendimentos apresentam, a fim de
saber se ela passa pela noção do desenvolvimento comunitário. Já foi possível verificar que
muitos dos empreendimentos afirmam ter uma preocupação com a comunidade. Apenas três
empreendimentos afirmaram não ter nenhum tipo de relação com a comunidade. Outros três
afirmaram que, mesmo não havendo uma ação ou atividade estabelecida, o relacionamento
com a comunidade existe, seja ele pelo relacionamento dos componentes do grupo com a
comunidade, ou sendo o empreendimento conhecido pela comunidade, ou ainda havendo a
prestação de serviços a baixo custo pela comunidade. Há ainda um empreendimento que está
em processo de seleção de novos membros da comunidade. Já os empreendimentos que
afirmaram ter relacionamento com a comunidade quando perguntados a natureza deste
relacionamento, citaram a proximidade e o diálogo com a associação de moradores do bairro,
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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152
e o desenvolvimento de feiras na comunidade para a venda dos produtos. Para maiores
detalhes, vide o Quadro 11, com maior aprofundamento no Apêndice J.
QUALIDADE RELAÇÃO COM A COMUNIDADE
A comunidade só sabe que existe. A gente faz parte do bairro, mas a gente
pretende, quando mudar de espaço dar cursos para a comunidade”.
Estamos paradas porque os cursos não estão acontecendo”.
Não há o
desenvolvimento de
ações para a
comunidade
O bairro está conhecendo a cooperativa agora, porque a sede anterior era escondida
e não era em um local visível”.
Não há o desenvolvimento de nenhuma atividade para a comunidade, mas as
mulheres da cooperativa são integradas com a comunidade (participam da
associação de bairro e sabem o que acontece).
Não há o desenvolvimento de ações para a comunidade, embora as pessoas tenham
conhecimento do empreendimento“Pessoas da comunidade já vieram procurar
emprego aqui algumas vezes”.
Não há o desenvolvimento de ações para a comunidade, embora haja um projeto de
financiamento aprovado que irá integrar novos membros prioritariamente da
comunidade à cooperativa – “A gente não tem afinidade nenhuma com a
comunidade local. Isso até criou um constrangimento, por que como é que existe
uma cooperativa dentro da comunidade que nem a associação de bairro sabia? Isso
eles ficaram um pouco chateados. Mas agora nossa relação com eles está mais
próxima. Porque com este trabalho da FAPESB a gente vai incluir pessoas da
comunidade pra estar aqui junto conosco”.
Não há o desenvolvimento de ações para a comunidade, embora haja uma relação
na prestação de serviços – “A única coisa que tem com a comunidade é conserto.
Fazer bainha, colocar zíper... Como é um bairro pobre a gente cobra um preço
barato”.
Há alguma relação
com a comunidade
Não há o desenvolvimento de ações para a comunidade, a não ser através da coleta
que é um trabalho de conscientização.
A cooperativa está dentro da associação de moradores do bairro.
Há o desenvolvimento de atividades para a comunidade - ações na área de saúde,
capacitação e divulgação da associação na comunidade, mas este ano não tem
acontecido muito (este empreendimento estava com apresentação marcada para a
comunidade do projeto para divulgar as ações desenvolvidas).
Há o desenvolvimento de feiras para venda dos produtos na comunidade – “É um
relacionamento bom porque a gente ta na área da paróquia. Tudo que a gente faz é
ali. Fazemos feirinha da gente mesmo e bota a feirinha ali no largo mesmo. Nós não
temos dificuldade de vender nosso produto”.
Há o desenvolvimento de trabalhos na associação do bairro e no terreiro de
candomblé do bairro, embora a entrevistada não tenha especificado a natureza do
trabalho, apenas o desejo de fazer um curso para transmitir o aprendizado para a
comunidade.
Há um diálogo permanente entre a cooperativa e as associações do bairro, que
para o entrevistado têm muita representatividade na comunidade – “Boa parte das
pessoas que participam da cooperativa participam de associações. Então as
associações hoje têm muita representatividade na comunidade. Então a gente tá
sempre dialogando com a comunidade. Qualquer coisa que se precise viabilizar a
associação é procurada”.
Relações entre
empreendimentos e
comunidade
Há o desenvolvimento de feiras para venda dos produtos na comunidade. “Quase
todo mundo que é do grupo é da comunidade. E a comunidade é mobilizada quando
tem feira. E na feira as pessoas vêm comprar, quer dizer, algumas pessoas”.
Quadro 11 – Qualidade das relações empreendimentos x comunidades
Fonte: elaboração própria
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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153
Quando perguntados sobre a sociedade que a economia solidária busca, oito
empreendimentos falam na sociedade sem desemprego, com igualdade de direitos e
oportunidade, e justiça e eqüidade social. Apenas um empreendimento fala no
cooperativismo como caminho para a sociedade, enquanto os outros falam em uma sociedade
unida com divisão de tudo por todos, uma sociedade de apoio e numa sociedade com um
modelo de economia baseado no ser humano e sem competição. Veja o Quadro 12 com o
detalhamento das concepções apresentadas pelos empreendimentos.
SOCIEDADE BUSCADA PELA ECOSOL
Sociedade solidária e com igualdade de direitos para todos –“Eu imagino que esta
rede de solidariedade deveria ser para todo mundo. Eu busco a solidariedade, mas tem
gente que ainda está sem buscar. Todos deviam procurar melhorar suas vidas através
da economia solidária, porque a sociedade precisa disso. Igualdade para todos. Se é de
direito que seja para todos”.
Sociedade com igualdade de oportunidades para todos - Dando mais oportunidades
para as pessoas. Porque hoje a gente não tem tanta oportunidade como a gente queria
ter. Principalmente o jovem. A gente vai no mercado e não é bem recebido. A gente
não consegue emprego fácil.
Sociedade com mais justiça social
Sociedade sem desemprego e com igualdade de oportunidade para todos – “Uma
sociedade que todo mundo tivesse seu emprego, sua casa própria, tivesse acesso a lazer
e a saúde, ou seja, a todos os direitos básicos”.
Sociedade com mais justiça e equidade social – “Ajudando as pessoas que passam
necessidades a enxergarem que é possível sair desta situação e lutar”.
Sociedade sem desemprego e com equidade social – “Uma sociedade que não tenha
falta de emprego, em que todo mundo seja igual a todo mundo”.
Sociedade sem desemprego – “Uma sociedade com trabalho para todos”.
Sociedade sem
desemprego, com
igualdade de
direitos e
oportunidade, e
justiça e equidade
social
Sociedade com a busca da melhoria de vida para o povo - “Quando você se envolve
com economia solidária você não está buscando só o cooperativismo, o associativismo,
a economia solidária, (...) mas você também está buscando a melhoria da sociedade do
povo, da classe excluída”.
Sociedade unificada com divisão de tudo por todos – “Todo mundo trabalhando,
dividindo tudo. Todo mundo unificado”.
Sociedade unida
com divisão de
tudo por todos
Sociedade unida – “Uma sociedade mais unida, mais irmã. Eu acho que a economia
solidária valoriza mais a união. Porque tudo que a gente dá as mãos pra trabalhar
juntos é uma valorização da gente mesmo”
Cooperativismo
enquanto caminho
para a sociedade
Cooperativismo enquanto caminho para a sociedade - “O que pode fazer é procurar
conscientizar as pessoas que existem trabalhos que se preocupa com a cooperação de
todo mundo”.
Sociedade de Apoio
Sociedade de apoio - A sociedade ideal seria de apoio, que acredita. Porque para fazer
um trabalho de economia solidária é preciso credibilidade. Nas reuniões de economia
solidária nem todo mundo vai. (...) O ideal seria isso, que as pessoas tivessem mais
compromisso, acreditassem, e também assim... a capacitação, a educação, entendeu?
Porque nem todo mundo compreende que aquilo é bom.
Sociedade com um
modelo de
economia baseado
no ser humano sem
competição
Sociedade com um modelo de economia baseado no ser humano sem competição – “O
que a economia solidária propõe é muito difícil, quer um modelo de economia baseada
no ser humano (...) A gente foi criado na competição e o que a economia solidária
preza é tirar a competição para você trabalhar igual”.
Quadro 12 – Visão da sociedade na economia solidária
Fonte: elaboração própria
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Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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Em relação à concepção de Estado, o objetivo era saber como os
empreendimentos esperam que o Estado atue, além do Estado que se busca com a economia
solidária, além do envolvimento dos grupos com manifestações políticas, partidos políticos e
apoio a candidatos. O tema da política aparece como um tema pouco discutido internamente,
ou mesmo comum e freqüente no seio dos empreendimentos, uma vez que, apenas três
empreendimentos afirmaram participar de manifestações políticas (o Grito dos Excluídos;
Campanha da Primavera do CESE pela paz; manifestações de Agricultura Familiar;
manifestações pela moradia e pela união; movimentos dos Sem-Terra e dos Sem-Teto),
enquanto os outros afirmaram que política deveria ficar fora da organização, ou mesmo que
nunca participaram de manifestações políticas e nunca viriam a participar. Apenas em relação
a um empreendimento obteve-se a informação de que era necessário conceber um
envolvimento maior da cooperativa com a política.
(...) tem muitas pessoas que não se envolvem com política, apesar da gente já estar
conseguindo mostrar que é necessário estar envolvido com o que acontece
politicamente na sociedade. Mas o trabalho de envolvimento político vem
acontecendo de forma lenta. A gente faz discussões (...) (COOPERART, 2006)
Uma das respostas afirmativas em relação à participação em manifestações
políticas, foi uma resposta individual, o que não nos permitiu uma conclusão sobre como o
assunto da política é tratado dentro do grupo.
Eu não sei dizer do grupo porque eu participo de tudo quanto aparece: é greve, é
tudo – eu tô dentro! Primeiro porque eu sou alfabetizadora. Alfabetizo pela CUT e
pela Associação de Cegos. E a CUT você sabe que é mobilizadora de movimentos
populares (GRUPO DE AMIGOS ARTESÃOS, 2006).
No que diz respeito ao apoio a partidos e/ou candidatos políticos, apenas três
entrevistados afirmaram que seus empreendimentos apoiavam. Dois empreendimentos
afirmaram acreditar no modelo de um partido político, enquanto apenas um empreendimento,
relatou que apoiaria um candidato nas eleições de 2006 pelo fato dele os ter sempre apoiado e
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
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tratado com dignidade: “Ele sempre falou comigo, nunca deixou de falar. Eu estivesse vestida
como estivesse” (COOPERTEXTIL, 2006). Novamente houve uma resposta que não retratou
o empreendimento, mas o apoio de um indivíduo do grupo, conforme o depoimento a seguir:
Apoio desde que tem que analisar ele como pessoa (o candidato). Agora estou com
o (partido), pois admiro o trabalho dele, pois ele criou muita coisa pra melhorar a
vida da população pobre. E ele está sendo muito perseguido por conta disso, né? (...)
(GRUPO DE AMIGOS ARTESÃOS, 2006).
A maior parte dos empreendimentos afirma que a razão para eles não apoiarem
partidos políticos ou candidatos é a possibilidade de ser transformado em uma propaganda
política para o candidato. Evitam esse contato para não incorrer no conhecido hábito “promete
e não cumpre” do político brasileiro, como eles próprios lembram:
Aqui a gente nunca se aproximou de política partidária. Chegamos a apoiar
candidatos, mas eles prometeram e não cumpriram. Mas a gente procura não se
envolver com política partidária porque a comunidade cobra. Então, a gente fez uma
carta dizendo que não apoiaríamos mais políticos (COMUFE, 2006).
Não, a cooperativa não (apóia candidatos). Dentro da cooperativa que é o lugar da
gente trabalhar juntas, que é o local da gente caminhar juntas, a gente não apóia
candidatos (COOPERATIVA RAÍZES DO POVO DE ISRAEL, 2006).
A gente apoiou, mas não teve uma boa experiência (prometeu e não cumpriu). Então
hoje a gente não apóia, nem fala mais sobre o assunto (AMAC, 2006).
Os empreendimentos também apresentam a mesma reação de desconfiança e
descrença quando perguntados sobre as expectativas em relação ao Estado. No entanto, as
respostas se agrupam em três grandes grupos: três empreendimentos esperam pouco, ou não
sabem o que esperar do Estado, seis empreendimentos esperam apoio na estruturação do
empreendimento e reconhecimento pelo trabalho realizado e quatro empreendimentos
esperam um tratamento diferenciado às cooperativas e associações, através da criação de
políticas públicas para os empreendimentos (vide o Quadro 13 para um maior
aprofundamento).
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
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EXPECTATIVAS DO ESTADO
Não espera muito do Estado – “Quase nada”.
Não espera muita coisa – “Eu não espero muita coisa, sempre está mudando, você fica
naquela expectativa (...)”.
Espera pouco do
Estado, ou não
sabe o que
esperar
Não sabe o que esperar – “Não sei. É difícil imaginar”
Apoio na estruturação do empreendimento e reconhecimento do trabalho realizado
“O Governo poderia ajudar mais, porque é um trabalho que é muito esforçado. Não
reconhecimento da importância do nosso trabalho, porque a gente faz essa coleta
(seletiva)”.
Apoio na estruturação do empreendimento – “Queremos matéria prima, capital de giro
(...) Com o capital de giro melhoraria muito”.
Apoio na estruturação do empreendimento – “Era pra eles (os governantes) abraçarem a
causa e não deixar morrer, mas nós estamos nos segurando para não parar. Então eu
acho que dentro do espaço do governo nós já aparecemos na televisão várias vezes. Era
pra tanto o governo do estado, como a prefeitura virem ver como está a cooperativa.
Perguntar o que está faltando, reunir as mulheres e dar uma injeção de ânimo. Porque
recursos têm”.
Apoio na estruturação do empreendimento – “Que eles se conscientizem desse trabalho
de economia solidária e apóiem as cooperativas populares”.
Apoio na estruturação do empreendimento tratamento diferenciado às cooperativas e
associações – “A gente está batalhando, suando e o governo não trata as cooperativas e
associações de forma diferenciada. Eles vêem as cooperativas como uma empresa
privada e aqui é totalmente diferente. A gente é humilde está começando um trabalho,
produzir para manter sua família”.
Apoio na
estruturação do
empreendimento
e reconhecimento
pelo trabalho
realizado
Reconhecimento - A gente espera ser reconhecido
Tratamento diferenciado às cooperativas e associações – “O governo devia
acompanhar de perto a produção das comunidades. Porque as comunidades produzem,
mas não conseguem competir com a indústria, ainda mais com os impostos”.
Criação de políticas públicas para os empreendimentos e diminuição de taxas e
impostos – “Queremos políticas públicas (...)”.
Criação de políticas públicas para os empreendimentos – “Espera que sejam criadas
políticas púbicas para nos ajudar a viver neste capitalismo selvagem. E a partir daí
combater o capitalismo selvagem e ampliar o modelo da economia solidária”.
Tratamento
diferenciado às
cooperativas e
associações –
criação de
políticas públicas
para os
empreendimentos
Diminuição de taxas e impostos.
Melhores
governantes
A melhoria do Estado através de melhores governantes - “Que o Estado melhore. Que
venham governantes responsáveis e que se dediquem e que amem o estado”.
Quadro 13 – Expectativas do Estado
Fonte: elaboração própria.
Assim como foi perguntado qual seria a sociedade buscada pela economia
solidária, perguntou-se o mesmo em relação à concepção de Estado. As respostas dadas pelos
empreendimentos, no entanto, não apontam para um novo modelo de Estado, mas para um
Estado incentivador da economia solidária e das pessoas. Uma das respostas, por exemplo,
fala que já vivemos em um Estado ideal – o estado democrático, sendo que não há o
cumprimento das garantias constitucionais, portanto, que o ideal seria a aplicação das leis.
Apenas uma resposta fala em um Estado menos capitalista, contudo, não há a explicação de
como ele funcionaria. Outros entrevistados apontaram para um Estado provedor dos direitos
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
157
básicos, um Estado sem corrupção e mais humano (sic). Ainda há o caso de uma resposta
relacionada aos governantes – que deveriam cumprir as promessas de campanha – e um
empreendimento que afirmou não saber como seria este Estado ideal (vide as respostas dos
empreendimentos no Quadro 14, ou mais aprofundadamente no Apêndice K).
ESTADO IDEAL
Daria oportunidades para todos, principalmente para nós que somos cooperativas e
não temos condições de ficar pagando as coisas”.
Acho que se começasse a ter as leis (voltadas para economia solidária), (...) nós
somos 1098 empreendimentos comprovado (na Bahia) (...) Se não fosse a economia
solidária hoje estaria desempregada”.
Estado incentivador
da economia solidária
Estado incentivador da economia solidária e preocupado com os pobres – “Os
políticos que realmente se voltassem para a população. Porque hoje eles querem
beneficiar mais os bairros nobres do que a periferia. Hoje seria melhor um prefeito que
voltasse mais para o lado pobre da periferia. O Estado deveria tomar a iniciativa de
criar uma cooperativa em cada bairro pobre, e assim, cada pessoa teria uma
remuneração”.
Ajudando as pessoas”.
Dando incentivo pra pessoas começar. Incentivar mesmo”.
Estado incentivador
“Que dá patrocínio para gente e para comunidade. Porque a gente não vai ficar só
coletando, coletando, a gente também precisa de um ponto para vender alguma coisa,
para fazer alguma coisa, para mostrar”.
Estado provedor dos
direitos básicos
Seria um governo bom, dando acesso a saúde, a lazer, a alimentação. Tendo acesso a
cidadania, tudo que tem direito”.
Estado sem
corrupção
Da verdade. É difícil...”
Estado mais humano
O estado deveria ser mais humano. Eles estão de passagem. O povo bota eles lá
porque querem melhorias. Deveria se ter um pensamento no todo. A melhoria de vida
para todos”
Estado como está,
mas cumprindo a
constituição
Dentro do estatuto brasileiro (constituição) já seria ideal. Basta por em prática.
Porque a gente já vive em um país democrático. Falta vontade política das pessoas,
então falta é vontade”.
Estado menos
capitalista
Menos capitalista”.
Governantes
comprometidos com
as promessas de
campanha
“O estado precisava tomar conta (do bairro). Eles deveriam ter compromisso. Os
compromissos firmados depois da época eleitoral não saem do papel, a realidade é
esta”.
Não sabe
Ainda não parei para imaginar”.
Quadro 14 – Estado ideal
Fonte: elaboração própria
O último tópico investigado em relação ao ideário dos empreendimentos foi
relativo à concepção de transformação social, em que se buscou conhecer as crenças que
orientam os indivíduos sobre as mudanças que a economia solidária poderia produzir, e de
que forma as desigualdades sociais poderiam ser combatidas e superadas e o que eles estariam
fazendo nesse sentido. Em três empreendimentos há a idéia de que a economia solidária já
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
158
está trazendo mudanças para a sociedade, através da diminuição do desemprego e melhoria da
auto-estima das pessoas envolvidas e através da conscientização para organização política das
pessoas. Além disso, três outros indivíduos afirmaram que a economia solidária seria capaz de
tornar o mundo mais solidário (unido, coeso) e mais cooperativo, sem precisar como. Outros
dois falaram na possibilidade de a economia solidária aumentar a comercialização dos
produtos dos empreendimentos (vide as respostas dos empreendimentos no Quadro 15 e, para
um maior aprofundamento, vide o Apêndice L). Vale ressaltar que apenas dez respostas
foram analisadas, uma vez que três indivíduos não responderam e um teve uma resposta que
não pôde ser analisada.
ECONOMIA SOLIDÁRIA E MUDANÇAS
“Com a economia solidária seria tudo mais solidário, mais coletivo. Um continente, um país,
um estado. Um colaboraria mais com a necessidade do outro. Porque é uma forma de se unir
para ajudar de forma moral – humanizaria mais as relações. Os que têm mais ajudariam os
que têm de menos, sem exploração. O mundo seria muito mais coeso”.
União, porque a economia solidária significa todos unidos. A gente devia se unir para uma
mesma língua”
Um mundo mais
solidário e
cooperativo
“A união das pessoas, a solidariedade”.
Pode, se o nome já está dizendo economia solidária. Atuando no apoio. Trazer pessoas que
não tem emprego e ficam paradas”.
Ela poderia ajudar muito a diminuir o desemprego. Porque a cooperativa, por exemplo, as
pessoas entraram, mas foram saindo até ficarem 16 pessoas. Só que se todas estas pessoas
fossem orientadas e recebessem um rendimento a cada mês e tivessem uma previdência isto
estaria gerando renda sim (...) Então é uma coisa que pode levantar a auto-estima das
pessoas, porque todo mundo quer trabalhar para ganhar dinheiro, mesmo que seja
pouquinho. E por que trabalhar cada um fazendo uma coisa isolada? Porque nós não temos a
referência solidária?”.
Mudar a auto-estima das pessoas e dar trabalho às pessoas que não conseguem”.
Diminuição do
desemprego e
melhoria da
auto-estima
Melhoria da auto-estima (valorização do ser humano) – “Já trouxe. Muitas pessoas hoje têm
aqui uma autonomia maior. Saber discutir as coisas do seu ponto de vista. Olham as pessoas
de igual, não têm aquela coisa de se sentir inferior. Muita gente chegou aqui caladinho sem
abrir a boca e hoje já joga duro na produção, nas reuniões. Então você vê o crescimento das
pessoas. A economia solidária traz a valorização do ser humano”.
A economia solidária já vem apontando algumas mudanças. Só a gente conseguir reunir
um público com este aí (do Fórum de Cooperativas Populares), que é um público que não
tinha noção, que não sabia se reunir, que a forma de organização era nenhuma. E hoje já
começa a se organizar. Então a economia solidária já está de parabéns por ter conseguido
este espaço de forma de organização. Agora é uma luta muito árdua e dura. A gente tem que
lutar pra conseguir mais autonomia”.
Conscientização
para
organização
política das
pessoas
A economia solidária tem trabalhado no sentido de conscientizar as pessoas e lutar por um
Brasil melhor. Uma melhor condição de vida. Tem buscado muito esclarecer a mente das
pessoas”.
Comercialização
dos produtos
Esperamos que com nosso trabalho possamos vender nossos produtos, pois não adianta
produzir e ficar com o produto em casa, então que se torne realidade não só para o nosso
empreendimento, mas também para as pessoas que fazem sua mercadoria em casa terem um
lugarzinho para vender”.
Quadro 15 – Mudanças que a economia solidária pode trazer
Fonte: elaboração própria
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Ao serem perguntados como as desigualdades sociais poderiam ser combatidas e
superadas e o que estariam fazendo para isso, nenhum empreendimento respondeu
especificamente o que estaria fazendo para mudar a situação vigente, embora tenham descrito
como poderia ocorrer a mudança. Cinco afirmaram que as desigualdades e diferenças sociais
seriam superadas através da educação e conscientização das pessoas, e um declarou que a
conscientização deveria ser individual. Os entrevistados, no entanto, muitas vezes não fazem
referência à educação formal, mas a capacitações e formações que levariam a uma mudança
na consciência de cada um. Outros três acreditam na superação através da igualdade de
oportunidades para todos, mas a referência de oportunidade acaba sendo o emprego. Ainda há
três que crêem na superação das desigualdades sociais através da união e valorização do
outro, da cooperação e de vontade política (vide os depoimentos dos empreendimentos no
Quadro 16).
DESIGUALDADES E DIFERENÇAS SOCIAIS
“Com educação. Trazer mais emprego, gerar mais renda, porque ainda está muito
deficiente”.
Primeiro de tudo a educação. Porque no momento que você tem conhecimento, que
você tem sabedoria, você sabe lutar pelos seus direitos, você pode lutar pelas
melhorias. Então a princípio de tudo seria a educação”.
Êta! Aí é complicado... Mas eu acho que tem que partir de formação. Com bastante
formação e informação a gente pode aprender. A gente tem que olhar para o ser
humano. O ser humano não é máquina. Se eu não estou me sentindo bem eu não vou
produzir bem. Não adianta me colocar para fazer uma torta hoje se eu não estiver bem,
vai sair uma porcaria! Então é a formação. Investir na capacitação humana”.
“Através de muitos seminários, trabalho. Acho que é muita conscientização mesmo.
Os seminários devem ter muita gente porque uma pessoa só é difícil. E quando tem
muita gente é mais fácil fazer as pessoas abraçarem a causa”.
Superação através da
educação e
conscientização das
pessoas
“Com a ação partindo de nós mesmos. Nas ações que a gente faz aqui muda a vida das
pessoas. A gente ensina, divulga os órgãos públicos (...) Hoje eu vejo um grãozinho de
melhora: mulheres na sala de aula, universidade para todos (referência ao programa do
governo federal). A gente tenta mudar a consciência das pessoas. A gente faz ações,
intervêm, explica, cobra”.
Superação através da
conscientização
individual
“Depende da consciência de cada um. Em alguns encontros de economia solidária,
você vê alguns cooperados agindo com deslealdade com o outro. Então eu acho que
economia solidária não vem de formação, mas da natureza de consciência de cada um
(...) Não é uma coisa como uma escola que você estuda, se forma, faz vestibular... É
mais da pessoa ter consciência mesmo”.
“Dando oportunidades a todos. Quando você tem oportunidade de trabalhar é mais
fácil”.
Se todo mundo tivesse um meio para trabalhar, ter seu dinheiro, sua casa própria
então seria diferente”.
Superação através da
igualdade de
oportunidades
Quando a gente coloca uma mãe, um jovem para aprender a tecelagem, a gente tira
uma pessoa da rua. Dando oportunidade aos jovens – que estão desempregados – para
que eles tenham experiência”.
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Superação através da
união e valorização
do outro
O caminho é este: a união, o respeito mútuo. Porque na economia solidária a gente
aprende a se respeitar e com este respeito e com esta união a gente aprende a se
valorizar. E quando a gente se valoriza é muito bom. Porque não adianta a gente
esperar os outros valorizarem a gente, porque quando a gente se valoriza os outros
valorizam também”.
Superação através da
cooperação
Com as pessoas querendo ajudar mais umas as outras. Quando a gente se ajuda é
melhor porque não tem emprego lá fora. Eu preferia ter um emprego lá fora porque
paga INSS, assina carteira, mas não tem. Então a gente tem que se ajudar”.
Superação através da
vontade política
As desigualdades sociais acontecem na medida que há vontade política. Se tiver
vontade política de estar combatendo as desigualdades sociais, porque a gente mora
em um país que é altamente rico, a gente consegue superar. Falta vontade política”.
Quadro 16 – Superação das desigualdades sociais
Fonte: elaboração própria
Após a análise dos três tópicos do ideário dos empreendimentos - sociedade,
Estado e transformação – podemos traçar um panorama geral de uma visão de mundo dos
empreendimentos de economia solidária analisados. Em relação à sociedade pode-se perceber
que a preocupação principal é o desemprego, a falta de igualdade de oportunidades e a
ausência de equidade social. No entanto, a eliminação destes problemas não leva,
necessariamente a um novo modo de produção, uma vez que há os que pensam no capitalismo
com mais distribuição. Contudo, as outras concepções de sociedade apresentadas se
aproximam do paradigma socialista - sociedade unida com divisão de tudo por todos, ou
mesmo da origem da economia solidária, que aponta o cooperativismo enquanto caminho para
a sociedade. As concepções de uma sociedade de apoio, ou da sociedade com um modelo de
economia baseado no ser humano sem competição acabam sendo muito difíceis de imaginar
como funcionariam num nível mais prático.
A concepção do Estado como incentivador da economia solidária demonstra a
crença dos empreendimentos no apoio do Estado para a efetivação da economia solidária. Isso
é muito provavelmente reflexo de políticas públicas estaduais, municipais e de âmbito federal
que se tornaram uma realidade no Brasil no campo da economia solidária. Mais uma vez,
algumas concepções não nos levaram a um modelo de Estado que rompe com o atual, como é
o caso das concepções do Estado como provedor de direitos básicos, ou sem corrupção.
Apenas um empreendimento fez uma crítica ao modo capitalista de produção ao definir o
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 4 – ANÁLISE EMPÍRICA E IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Luiza Reis Teixeira
161
Estado ideal para a economia solidária. A concepção de um Estado mais humano, novamente,
deixa-nos sem uma noção exata de sua formação.
A transformação social, por sua vez, apresenta como principal concepção a
conscientização e a educação das pessoas como chave para mudança. A conscientização das
pessoas vai de encontro à premissa da pesquisa, segundo a qual a transformação social ocorre
a partir da organização da sociedade civil. A igualdade de oportunidades também aparece para
os empreendimentos como um fator chave de transformação social, mas não necessariamente
aponta para um rompimento com o modelo vigente. O cooperativismo é novamente
mencionado, agora como concepção de mudança. O Quadro 17 analisa todos estes elementos.
DIMENSÃO CONCEPÇÃO
Sociedade sem desemprego, com igualdade de direitos e oportunidade, e justiça e
equidade social
Sociedade unida com divisão de tudo por todos
Cooperativismo enquanto caminho para a sociedade
Sociedade de Apoio
I.
SOCIEDADE
Sociedade com um modelo de economia baseado no ser humano sem competição
Estado incentivador da economia solidária
Estado incentivador
Estado provedor dos direitos básicos
Estado sem corrupção
Estado mais humano
Estado como está, mas cumprindo a constituição
II.
ESTADO
Estado menos capitalista
Superação através da educação e conscientização das pessoas
Superação através da conscientização individual
Superação através da igualdade de oportunidades
Superação através da união e valorização do outro
Superação através da cooperação
III.
MUDANÇA /
TRANSFORMAÇÃO
Superação através da vontade política
Quadro 17 – Concepção do ideário dos empreendimentos
Fonte: elaboração própria
No próximo capítulo, a título de conclusão, os resultados obtidos serão analisados
à luz da literatura acerca da sociedade civil e da economia solidária, além de serem
relacionados com os pressupostos da pesquisa e a pergunta de partida.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
162
5. CONCLUSÃO
O trabalho investigativo desta dissertação visou a identificar se os atores sociais
integrantes de empreendimentos econômicos solidários de Salvador vêem a economia
solidária como um modelo alternativo ao capitalismo, apontando para a superação do modelo
de sociedade existente. A questão norteadora do trabalho buscou investigar os marcos
referenciais políticos e estratégicos fundamentais que designam a ideologia e a identidade do
movimento de economia solidária. No decorrer do trabalho, tentou-se esclarecer o discurso
acadêmico presente no campo da economia solidária e sua relação com o discurso e as
percepções dos integrantes dos empreendimentos econômicos solidários. Buscou-se levantar
dados que dessem subsídios para entender a visão de mundo que dá sentido e direção ao
movimento, assim como a força do movimento na história e sua capacidade de mobilização
política.
Primeiramente, assumimos o pressuposto de ser a sociedade civil um campo
dotado de ideologias, em que há espaço para a ocorrência de uma transformação ideológica
(intelectual e moral). Esta transformação ocorre a partir da disputa entre ideologias, em que a
ideologia da classe dominante pode ser afastada, através do desenvolvimento de uma atitude
crítica que permita às classes dominadas romper com a unidade estabelecida pela ideologia
tradicional. Este pressuposto, atualmente trabalhado por vários autores na ciência social
brasileira e latino-americana (DAGNINO, 2002; DAGNINO e outros, 2006), tem sua fonte
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
163
teórica em Gramsci e relaciona-se com a teorização da economia solidária que a retrata como
modo de produção alternativo ao capitalismo. Ou seja, assumimos que a sociedade civil é o
espaço onde há a possibilidade do surgimento de ideologias que possam ser contrapostas à
ideologia dominante, enquanto projeto político, como no caso da economia solidária.
Em seguida, assumimos que a direção ideológica é conquistada antes da conquista
do poder. Com isso, entendemos que a economia solidária rompe com a ideologia dominante,
elaborando a sua concepção de mundo, para, a seguir, organizar-se de acordo com uma
ideologia própria, pretendendo, por fim, conquistar o domínio político e difundir uma nova
concepção de mundo (hegemonia) na sociedade. Com este pressuposto, tentamos entender se
e como os atores da economia solidária organizam seus repertórios de ação política e sua luta
na busca da transformação social.
Tivemos como pressuposto, também, o entendimento de que, assim como no
campo conceitual, o campo do discurso dos atores da economia solidária também apresenta
uma falta de consenso a respeito de sua ideologia política do movimento. Isso foi constatado
com a pesquisa empírica no momento em que se verificaram diversos entendimentos, não
apenas sobre a economia solidária, mas como sobre as atividades nela praticadas, sobre sua
concepção ideal de Estado e sociedade, assim como a visão sobre a transformação social.
Com base nesses pressupostos, e a fim de chegarmos aos nossos resultados,
percorremos um longo caminho, passando por etapas de investigação bibliográfica e empírica.
Primeiramente, partiu-se para a investigação das origens do conceito de sociedade civil e todo
o percurso percorrido, desde o século V a. C., com Aristóteles, até o conceito desenvolvido
por Gramsci, vicinal para este trabalho. Definimos, portanto, a sociedade civil como lugar de
transição dos impulsos hegemônicos. A ideologia, por sua vez, outro conceito central do
trabalho, foi considerada como um fator de decisiva centralidade no processo hegemônico.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
164
Em seguida apresentamos a teorização acerca da economia solidária e
historicizamos seu surgimento no cooperativismo do século XIX, contextualizando assim seu
surgimento a partir de uma grande crise social e econômica vivenciada pelos países
“marginais”. Também realizamos uma análise do movimento da economia solidária no Brasil
e na Bahia levantando alguns de seus elementos e categorias básicas.
Após a discussão teórica sobre os conceitos de sociedade civil e economia
solidária, partimos para investigação empírica no município de Salvador. Escolhemos, dentro
do campo da economia solidária (vide Figura 1), os empreendimentos econômicos solidários.
A razão da escolha baseou-se no fato de haver, neste tipo organizacional, o sentido do nível
mais prático e operacional da economia solidária. São nos empreendimentos coletivos
solidários que estão as pessoas que foram excluídas do mercado de trabalho, seja pela sua
classe social (pessoas oriundas de bairros menos favorecidos sócio-economicamente, sem
educação formal, com formação deficitária, etc.), seja pela sua idade (ou pessoas consideradas
muito velhas para o mercado de trabalho, ou pessoas sem experiência), seja pelo seu sexo
(mulheres que não encontram empregos), seja pela cor de sua pele (fator complexificador da
exclusão no caso particular do recôncavo baiano).
Estas pessoas fazem parte de organizações em que o trabalho mensal muitas vezes
não é remunerado, pois os grupos ainda não conseguiram alcançar a sustentabilidade. Muitas
destas organizações surgem através de processos de incubação, projetos elaborados por atores
externos, ou financiamentos por organizações da sociedade civil ou do Estado
1
. As entidades
de apoio, muitas vezes relacionadas a universidades ou mais próximas ao conhecimento
formal e acadêmico, constroem discursos mais estruturados bastante próximos do discurso
teórico sobre economia solidária. Os empreendimentos têm seus discursos influenciados pelas
entidades de apoio e, em alguns casos, têm suas funções executivas de gestão igualmente
1
Não se registrou na pesquisa empírica a ocorrência de empreendimentos que tiveram início a partir da
articulação com o setor privado.
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
165
apoiadas pelas entidades de fomento. A partir daí, é possível depreender que esta seja uma das
causas da dificuldade apresentada, por alguns empreendimentos, no próprio entendimento
acerca da economia solidária. A pergunta sobre o entendimento da economia solidária, em
algumas organizações, gerou questionamentos e dúvidas nos entrevistados, como neste
depoimento:Você quer saber se a gente tem algum programa social, é? Isto que é ‘economia
solidária’?” (Depoimento de um dos empreendimentos).
Registrou-se, no processo de delimitação do universo que foi investigado, uma
grande dificuldade em encontrar uma fonte sistematizada com informações censitárias dos
empreendimentos econômicos em Salvador. Mesmo quando se encontrou a pesquisa da SEI
realizada no ano de 2003, ela já se encontrava desatualizada, pois contava com
empreendimentos que não existiam mais ou que não se identificavam como sendo do campo
da economia solidária. A segunda fonte encontrada foi acessada mesmo antes de sua
publicação, haja vista a urgência no cumprimento do cronograma desta pesquisa. Mesmo
depois de sua publicação, o acesso aos empreendimentos do município de Salvador não seria
possível, pois as informações publicadas não se referem às particularidades do municípios,
mas de estados e regiões. Contudo, essa lacuna informacional não pode ser verificada a
respeito das entidades de apoio, que desde a primeira pesquisa têm seus dados atualizados.
Este fato corrobora a primeira impressão do universo pesquisado registrado no parágrafo
acima, em que se afirma haver uma maior estruturação do discurso e da própria gestão nas
entidades de apoio. Ou seja, o mesmo se aplica quando se trata da sistematização das
informações das próprias organizações. No entanto, este fato nos causa estranheza, uma vez
que se acredita que os empreendimentos solidários, por realizarem a base material da
economia solidária, deveriam apresentar uma maior estruturação no seu discurso.
Em relação ao perfil dos empreendimentos solidários, pudemos constatar que são
formados por pequenos grupos de pessoas, com no máximo 27 integrantes. Percebeu-se
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
166
também a dificuldade de alguns empreendimentos em manterem um número regular e
freqüente de pessoas, uma vez que a rotatividade e a mobilidade dos integrantes é muito
grande. A dificuldade em manter o número de pessoas tem sua origem na falta de
remuneração financeira, além do fato de não ser um trabalho formal de carteira assinada, o
que muitos integrantes almejam. Um dos entrevistados, integrante de um grupo que não
possui produção, apesar do fato de estar articulado ao Fórum de Cooperativa Popular, relatou
que muitos dos cooperados não podem mais dedicar suficiente atenção ao empreendimento,
pois estão atuando em empregos com remuneração fixa e carteira assinada. Ou seja, mesmo
acreditando que o trabalho na economia solidária apresenta algumas vantagens em relação ao
trabalho formal, como o trabalho cooperativo e as decisões tomadas com base no consenso, a
preferência pelo emprego tradicional tende ainda a persistir. Outro exemplo a ser citado é o da
associação de costureiras formada a partir de um curso em que metade do grupo conseguiu
emprego em fábricas de costura, e a outra metade, que não obteve um emprego formal,
constituiu a associação. Com estes exemplos, não é possível afirmar que há uma opção
deliberada pela economia solidária, mas que os empreendimentos são muitas vezes a única
opção de ocupação alternativa para os seus integrantes.
Ao falar na distribuição de gênero, partindo da constatação evidente de que a
exclusão da mulher é mais exacerbada que a do homem no mercado formal (menos postos,
setores específicos, salários mais baixos), o seu envolvimento em empreendimentos solidários
acaba sendo uma forma de trabalhar a auto-estima e de geração de uma renda mínima
alternativa. Em muitos casos, mesmo não alcançando uma renda mensal, muitas mulheres
sentem-se satisfeitas por estarem envolvidas em algo que é construído por elas próprias.
O envolvimento em redes é outro fator que influi na percepção política dos
empreendimentos. Em Salvador, houve a criação, pioneira, de um fórum de cooperativas
populares a partir de uma iniciativa e articulação dos próprios empreendimentos. Esta
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
167
iniciativa surgiu a partir do envolvimento de algumas cooperativas no processo de incubação
realizado pela ITCP da UNEB. O pioneirismo deste fato está na organização que partiu dos
próprios empreendimentos, já que as redes de economia solidária existentes sempre foram
organizadas a partir de organizações que não podem ser classificadas enquanto
empreendimentos econômicos solidários.
Na maior parte dos empreendimentos não há, no discurso e na percepção dos
atores, a presença de uma linguagem administrativa no que se refere aos objetivos e
resultados; não há tampouco organização da produção. Apenas em um empreendimento
registrou-se a preocupação com a eficiência do empreendimento. Os objetivos dos
empreendimentos, segundo os resultados alcançados, estão sempre voltados para alguma
forma de geração de renda e manutenção da sustentabilidade (raramente alcançada). Em todos
os empreendimentos analisados percebe-se a existência de uma certa dificuldade financeira
em sua manutenção. Mesmo havendo o reconhecimento da dificuldade na manutenção do
empreendimento, há o reconhecimento que este é um trabalho em que os resultados são
alcançados em longo prazo, e que o principal é a organização da ação coletiva. Muitos grupos
mencionaram a dimensão do aprendizado como um aspecto importante da participação em um
empreendimento solidário, o que é comprovado na quantidade expressiva de relatos
demonstrando uma preocupação em relacionar-se com a comunidade por meio da oferta de
cursos.
No nível da responsabilização pela produção, percebe-se um nível de consciência
quase que homogêneo (salvo em três casos) no que tange à divisão não apenas da
responsabilidade, como também das decisões tomadas coletivamente. Isto demonstra que,
mesmo com diferentes entendimentos sobre economia solidária, a noção de ação coletiva faz-
se presente na maior parte dos grupos. A conscientização de outras pessoas é, na maior parte
das vezes, relacionada à necessidade de divulgação do próprio trabalho. Ainda que a
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Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
168
conscientização não tenha sido citada pelos empreendimentos analisados, acreditamos que a
divulgação de um trabalho ou um projeto no campo da economia solidária contribui para a
difusão do movimento como um todo.
Apesar do perfil das organizações apresentarem características que correspondem
aos critérios trabalhados nos discursos teóricos, o mesmo não é possível afirmar quanto ao
ideário. Nota-se, de fato, que há um afastamento entre o discurso teórico e as percepções dos
atores dos empreendimentos, cujo conceito de economia solidária, por exemplo, não apresenta
a mesma abrangência e escopo (como um modo de produção). As conceituações ali
encontradas representam noções relacionadas com o empreendimento coletivo, o
cooperativismo e a autogestão, a solidariedade e a união, além do funcionamento da economia
em rede.
Ao expressar um modelo de sociedade, ao invés de respostas relacionadas a uma
idealização da sociedade com bases solidárias (ou seja, o funcionamento deste modelo
alternativo de superação de uma sociedade capitalista), há a expressão de uma preocupação,
por parte dos empreendimentos, em acabar com os problemas sociais, como o desemprego, a
falta de igualdade de oportunidades e a ausência de equidade social. Não há uma expressão
manifesta em um objetivo claro de alcançar um novo modo de produção. Há algumas
concepções que se aproximam do paradigma socialista, da sociedade unida com divisão de
tudo por todos, ou mesmo da origem da economia solidária apontando o cooperativismo
enquanto caminho para a sociedade. Estas concepções se aproximam do discurso teórico da
economia solidária, já que para Singer (2000) a economia solidária seria um modelo socialista
de organização da produção.
Na teoria gramsciana, o Estado é transformado com a difusão de uma nova
hegemonia. Portanto, não há uma oposição entre sociedade civil e a figura do Estado; a
sociedade civil e a sociedade política integram o que Gramsci chamou de teoria ampliada do
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
169
Estado. Nos discursos dos empreendimentos econômicos solidários analisados, essa oposição
tampouco ocorre, uma vez que a maioria apresenta uma idealização do Estado como
incentivador da economia solidária. Muito provavelmente, este desejo é incentivado pela
observação das políticas públicas voltadas para a economia solidária nos âmbitos estaduais,
municipais e federal. No entanto, algumas concepções nos levam a um modelo de Estado
como provedor de direitos básicos, ou sem corrupção. Estas concepções, na verdade não
apontam para a aclamada forma alternativa, pois apenas se referem a uma operacionalização
sem distorções do atual modelo vigente. A crítica ao modo capitalista de produção, ao definir
o Estado ideal para a economia solidária, foi feita apenas por um empreendimento.
No nível da transformação social, há uma clara aproximação do modelo proposto
por Gramsci, uma vez que se acredita que sua principal fonte é a conscientização e a educação
das pessoas. Assim como para Gramsci, o discurso teórico (no campo da economia solidária e
na teoria dos movimentos sociais) argumenta que é preciso conscientizar as pessoas através da
difusão de uma nova ideologia na sociedade civil, para que ela um dia conquiste o status de
hegemônica. No entanto, não há um consenso acerca de como esta transformação social pode
ocorrer, nem se a conscientização pode ser levada ao outro, ou se ela é definitiva.
É evidente que, para se pensar a transformação no caso particular da Bahia, não se
pode negligenciar fatores relacionados à
manutenção de velhas estruturas sociais e institucionais
que deixam em suspenso a relação política de cidadania com o Estado. Ou seja, como lembra Milani
(2006), a participação política dos cidadãos e o desenvolvimento de uma democracia participativa se
confrontam com as contradições de uma história contemporânea marcada, inter alia, por práticas
clientelistas, uma concepção patrimonialista do bem público, uma idéia individual do poder fomentada
pelo Carlismo, o formalismo institucional, a falta de transparência do setor público governamental,
uma fraca tradição de apoio às infra-estruturas cívicas, a ausência generalizada de espaços públicos de
deliberação democrática, mas igualmente pela presença de fatores de ordem cultural e religiosa que
muito influenciam as relações entre o Estado e a sociedade. Esse caldo de cultura política e as
A IDEOLOGIA POLÍTICA NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Cap 5 – CONCLUSÃO
Luiza Reis Teixeira
170
características que embasam o debate democrático na Bahia têm claras repercussões na forma como se
organiza o discurso político dos empreendimentos de economia solidária.
Com isso, concluímos que há uma estruturação comum entre os empreendimentos
econômicos solidários, seja na forma como se deu seu surgimento, seja na quantidade e
distribuição etária dos seus membros, seja através da organização da produção e do processo
de tomada de decisão. Contudo, o ideal da economia solidária enquanto modo alternativo de
produção não é manifesto nos empreendimentos, muito embora, se acredite que a mudança
deve ocorrer através da conscientização das pessoas. Portanto, o afastamento da influência
ideológica da classe dominante para o rompimento com a unidade da ideologia tradicional
ainda tende a ter longo percurso pela frente.
É importante assinalar que houve limitações inerentes à condução da presente
pesquisa (pequeno escopo de empreendimentos pesquisados, questões financeiras e temporais
na execução do projeto), restrições nos levam a crer que a ampliação desta pesquisa para um
número maior de empreendimentos possa trazer resultados mais abrangentes sobre as razões
que embasam as conclusões a que chegamos. Considera-se, igualmente, que é forte a
possibilidade de a ideologia dos empreendimentos de economia solidária, como assinalamos
acima, ser diretamente influenciada por fatores regionais no que se refere à cultura política e
ao fazer política na Bahia. Neste projeto, este aspecto tampouco foi devidamente aprofundado
para averiguar correlações analíticas. Ficam, para futuras investigações científicas, essas duas
pistas teórico-metodológicas que podem ser desenvolvidas com vistas a aumentar a
compreensão do movimento de economia solidária na Bahia.
171
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178
Apêndice A
Quadro de Empreendimentos Solidários na RMS
Pesquisa SEI 2004
Salvador, Camaçari, Candeias, Itaparica, Lauro de Freitas, São Francisco do Conde, Simões
Filho e Vera Cruz, Dias D´Avila, Madre de Deus
Cooperativas Populares
Nome
No
Sócios
Endereço e telefone Atividade desenvolvida
1. Cooperativa
Múltipla União Popular
dos Trabalhadores de
Tancredo Neves
27
Endereço: Rua Cristiane, no 176-E,
Tancredo Neves. Salvador-BA.
Tel: 71-3462-1289
Coleta e reciclagem de papel
para a produção de prota-
retratos, caixas, agendas,
blocos, etc.
2. Cooperativa Ação
Reciclar
18
Endereço: Rua Alto da Sereia, Tv.
Aiocá, no 10, Rio Vermelho. Salvador-
BA.
Tel: 71-3237-4614
E-mail: lumana.sales@bol.com.br
Coleta de papel, plástico,
alumínio, ferro, vidro para
reciclagem.
3. Cooperativa de
Catadores, Agentes
Ecológicos de Canabrava
50
Endereço: Rua São José, no 4, São
Marcos. Salvador-BA. CEP: 41253
Tel: 71-3366-1710 /4661
Coleta, triagem e prensagem de
papel, metal, plástico e vidro
para reciclagem.
4. Cooperativa de
Coleta Seletiva,
Processamento de
Plástico e Proteção
Ambiental
25
Endereço: Rua Luís Maria, no 10,
Baixa do Fiscal. Salvador-BA. CEP:
40410-540
Tel: 71-3313-5542
E-mail: -
Coleta, triagem e prensagem de
plástico para reciclagem.
Trabalho de conscientização
ambiental.
5. Centro de
desenvolvimento
Sóciocomunitário-IDE
15
Endereço: Fazenda Grande III, Qb-B,
Caminho 21-A, Cajazeiras. Salvador-
BA. CEP: 41340-030
Tel: 71-3305-5142
/
Coleta e triagem de material
reciclável. Trabalho de
educação ambiental.
6. Cooperativa de
Materiais Recicláveis e
Prestação de Serviços
22
Endereço: Rua José Nunes de matos,
no 233, Centro. Camaçari-BA. CEP:
42800-070
Tel: 71-627-3526 / 622-3130
Coleta, triagem e prensagem de
material reciclável
7. Grupo Pró-
cooperativa de
costureiras
23
Endereço: Praça Lorde Cockrane, s/n,
Garibaldi. Salvador-BA.
Tel: 71-3135-3777
E-mail: -
Produção de fardamento para
escolas, empresas, etc.
179
8. Cooperativa de
confecções da
Comunidade de
Plataforma
26
Endereço: Rua Parque São
Bartolomeu, no 3, Plataforma.
Salvador-BA. CEP: 40717-146.
Tel: 71-3218-3624
Produção de confecções para
empresas e venda em loja
própria
9. Cooperativa
Múltiplas Fontes de
Engomadeira
11
Endereço: Rua São Tomé, Tv. José
Sampaio, no 3, Engomadeira.
Salvador-BA. CEP: 41200-290
Tel: 71-3257-7990 / 3387-5920
Produção de pães, doces e
salgados. Fornecimento para
eventos.
10. Cooperativa de
Pescadores de Camaçari
20
Endereço: Rua Direita de Juá, no 27.
Camaçari-BA.
Tel: 71-672-2459 / 1324 / 623-2451
E-mail:
coopescamaç[email protected]
Pesca coletiva e venda
individual.
11. Grupo Pró-
cooperativa de Produção
Artesanal de Cajazeiras
15
Endereço: Rua B, 1
a
Etapa, Castelo
Branco. Salvador-BA. CEP: 41320-
000.
Tel: 71-9153-7829
E-mail: -
Produção de sandálias, bolsas,
cintos, bijuteria etc.
12. Cooperativa de
Trabalho do Setor
Energético da Bahia
130
Endereço: Rua JJ Seabra, no 441, sala
01, Sete Portas. Salvador-BA.
CEP:40025-530.
Tel: ?
E-mail:
Fornecimento de serviços para
o setor elétrico.
Associações
Nome
No
Sócios
Endereço e telefone Atividade desenvolvida
13. Associação de
Doceiras, Cozinheiras e
Confeiteiras de
itapagipe
8
Endereço: Itapagipe. Salvador-BA
Tel: 71-3398-5736
E-mail:
Produção de doces, salgados,
mingaus, caldos, acarajé e
comidas típicas baianas.
Fornecimento de pratos para
eventos.
14. Sociedade de
Artesãos de Alagados
74
Endereço: Rua Rezende Costa, no 6,
Jardim Cruzeiro. Salvador-BA. CEP:
40430-000
Tel: 71-3314-7962 / 3387-7120
E-mail: lumana.sales@bol.com.br
Promoção de cursos de
artesanato para a comunidade
local. Vanda de produtos
culinários.
15. Associação de
Educação e Saúde
Botica da Terra
70
Endereço: Rua João de deus, no 8,
Pelourinho. Salvador-BA.
Tel: 71-3322-7209
E-mail: -
Produção de medicamentos
fitoterápicos para comunidades
carentes.
16. Associação dos
Trabalhadores Rurais,
Artesãos e Marisqueiros
de Praia Grande
50
Endereço: Rua do Major, s/n, Ilha de
Maré. Salvador-BA.
Tel: 71-3497-2010
E-mail: -
Venda da produção dos
associados (pesca e artesanato)
para a comunidade local.
17. Associação dos
Artesãos da Coca,
Dendê e Cipó da Estrada
do Coco
29
Endereço: Estrada do Coco, km 09.
Lauro de Freitas-BA.
Tel: ?
E-mail: -
Compra coletiva de material
para a produção de móveis de
junco produzido pelos
associados.
180
Outros Grupos
Nome
No
Sócios
Endereço e telefone Atividade desenvolvida
18. Artesanato em
Grupo Itapagipe
11
Endereço: Rua do Soares, no 14,
Ribeira. Salvador-BA. CEP: 40420-
170.
Tel: 71-3316-5447
E-mail: -
Artesanato feito com retalhos.
Venda em feiras, shoppings e
sob encomenda.
19. Grupo de produção
Artesanal de renda
Renascença
60
Endereço: Praça 15 de Novembro, s/n,
Terreiro de Jesus, Igreja de São
Pedro dos Clárigos. Salvador-BA.
CEP: 40020-210
Tel: 71-3321-2669
E-mail: -
Produtos de renda em
renascença.
Fonte: elaboração própria, a partir de SEI (2004)
181
Apêndice B
Empreendimentos Solidários em Salvador
Mapeamento SENAES 2006
NOME ENDEREÇO E TELEFONE ANO DE INÍCIO
1. COOPERFAZ – Cooperativa
de Catadores e Reciclagem de
Resíduos Sólidos e Agentes
Ambientalistas do Bairro da
Paz
Endereço: Rua da Resistência, no 84, Bairro da Paz
Tel: 9902-2882 / 9931-6842
Pessoa de contato: Otacílio, Domingos, Lara
1999
2. PANTI – Associação Cultural
da Ladeira João de Deus
Endereço: Rua Coronel João de Deus, no 83, Bairro
da Paz
Tel: 3261-1160 / 3203-6972
Pessoa de contato: Dona Maria
2002
3. COOPERCONFEC –
Cooperativa de Confecção da
Comunidade de Plataforma
Endereço: Rua Parque São Bartolomeu, no 3,
Plataforma
Tel: 3218-3624
Pessoa de contato: Edna Maria
1998
4. ASEBT – Associação de
Educação e Saúde Botica da
Terra
Endereço: Rua João de deus, no 8, Pelourinho.
Salvador-BA.
Tel: 71-3322-7209
2005
5. COOPREDICooperativa
dos Trabalhadores da
Construção, Manutenção e
Reformas Prediais
Endereço: Rua Rui Barbosa, Ed. Rui Barbosa, no 4,
sala 302
Tel: 3398-0761
Pessoa de contato: Achon
2001
6. COOMARTES –
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
Endereço: Rua Tertuliano Reis, s/n. Plataforma
Tel: 3401-8336 (Vilma)
E-mail: jocinelia10@bol.com.br
Pessoa de contato: Jocinélia
2002
7. COOPERTEXTIL –
Cooperativa Mista de
Produção e Trabalho de
Artigos Têxteis
Endereço: Rua São Francisco, s/n. Centro Histórico
Tel: 8139-5952 (Ricardo) / 3233-9835 (Angelina)
2003
8. ASCOSI – Associação de
Costureiras de Itapagipe
Endereço: Rua Régis Pacheco, no 225. Uruguai
Tel: 3312-7119 (Marlene) / 3391-6365 (Ana Maria)
2000
9. Edna Batista Nascimento –
Edna Bonequinhos de Jornal
Endereço: Rua do Uruguai, no 284. Uruguai
Tel: 3207-2111
Pessoa de contato: Edna
2000
10. AMAC – Pró-Cooperativa
Múltipla das Artesãs de
Cajazeiras
Endereço: Cajazeiras 11, cam. 32, no 8. Cajazeiras
Tel: 8807-8146 / 3309-5705
E-mail: susanesilva1@hotmail.com
2004
182
Pessoa de contato: Susane Silva
11. CMVV / COOPAVV –
Associação Clube de Mães de
Vila Verde
Endereço: Km 13, Conjunto Vila Verde, q. 14, no 16.
Estrada Velha do Aeroporto
Tel: 3251-1253
Pessoa de contato: Ada
1995
12. ASPABAssociação dos
Produtores de Artesanatos da
Bahia
Endereço: Rua Praia Timbau, no 9, qd. F. Stella
Maris
Tel: 3374-0421 / 9962-0779
E-mail: www.aspab.org.br
Pessoa de contato: Jacira
1997
13. COOFE - Cooperativa
Múltipla Fontes de
Engomadeira
Endereço: Rua São Tomé, Tv. José Sampaio, no 3,
Engomadeira. Salvador
Tel: 3257-7990 / 3387-5920
2000
14. ANEC – Associação Nery
Costa
Endereço: Rua 11 de Agosto, no 28. Vasco da Gama
1989
15. Mulheres de Luz – Clube de
Mães, Creches e Escola Nossa
Senhora da Luz
Endereço: 3ª Travessa Paulo Afonso, no 7.
Pernambués
Tel: 3450-9294 (Luciene)
2003
16. COOPAED – Cooperativa
Múltipla de Produção de
Alimentos e Engenho Doce
Endereço: Rua Apolinário Santana. Engenho Velho
da Federação
Tel: 88073334-6414
Pessoa de contato: Kátia
2004
17. Projeto Ação Reciclar - Ong
Paciência Viva
Endereço: Rua Prudente de Morais, n 65. Rio
Vermelho
Tel: 3334-0676 / 9132-6169 (Neandro e Paula)
Pessoa de contato: Nilda, Ana Cláudia
2000
18. COOPIZ – Cooperativa
Múltipla de Pizzas e Sorvetes
Endereço: Travessa da União, no 1. Mata Escura
Tel: 8145-1194 / 3306-4411
Pessoa de contato: Rafael, José
2004
19. SAAS – Associação dos
Artesãos de Alagados
Endereço: Rua Rezende Costa, Q. 18, no 6. Jardim
Cruzeiro
Tel: 3312-7637 / 3315-8721
Pessoa de contato: Zuleide
1983
20. Grupo Raio de Sol
Endereço: Rua São Carlos, no 5. Santa Luzia do
Lobato
Tel: 3208-1916 (Marta)
2002
21. ARM Produções – Ana Rita
e Manuela Produções em
Crochê e Ponto de Cruz
Endereço: Rua Silveia Pereira, no 157. Uruguai
Tel: 3313-6607 / 9163-6488 (Ana Cristina)
Pessoa de contato: Anália
1997
22. ABBORI – Associação
Baiana de Bordadeiras e
Rendeiras de Itapagipe
Endereço: Travessa Polivalente, no 11, 2º andar.
Uruguai
Tel: 3315-8659
2003
183
Pessoa de contato: Elinete Lázaro, Margarida
23. Quebra Cabeça e
Brinquedos Inteligentes
Endereço: Rua dos ..., no 123. Santo Antônio
Tel: 3241-8999 / 8872-5130 (Robson) / 8816-8894
(Carolina)
Pessoa de contato: Luís Fernando
2001
24. COOPERTANE -
Cooperativa Múltipla União
Popular dos Trabalhadores de
Tancredo Neves
Endereço: Rua Cristiane, no 176-E. Tancredo Neves
Tel: 3462-1316
Pessoa: Luciene, Magda
2000
25. COOPARTES – Cooperativa
de Jovens Artesãos do Vale de
Pituaçú
Endereço: Rua Dr. Artur Gonsales, no 168. Pau da
Lima
Tel: 8839-4594
Pessoa de contato: Messias
2002
26. AMEV – Associação de
Mulheres do Engenho Velho
da Federação
Endereço: Rua Coronel João de Deus. Engenho Velho
da Federação
Tel: 3261-3340 / 3203-7075
E-mail: gmartesanatocom[email protected]
Pessoa de contato: Marilene
2001
27. COOPERPRIMA –
Cooperativa 1º de Maio
Endereço: Rua Nova Esperança, no 75. São João do
Cabrito. Plataforma
Tel: 3398-8361 / 9139-7075
Pessoa de contato: Idelson
2005
28. COOPERART –
Cooperativa de Representação
e Serviço
Endereço: Rua B, s/n. Castelo Branco
Tel: 32153091 / 9936-3486
Pessoa de contato: Raimundo
2001
29. COOPESBAS – Cooperativa
de Pescadores Baía de Todos
os Santos
Endereço: Rua Sá de Oliveira, no 20, São João do
Cabrito - Plataforma
Tel: 3398-0144
Pessoa de contato: José Rafael, Raimundo, Carlito,
Marcos Paulo
2003
30. COOPERCORTE -
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
Endereço: Rua Alto d Bola, no 15. Federação
Tel: 3235-3819
Pessoa de contato: Diva Celestino
2003
31. Sociedade 1º de Maio
Endereço: Rua Nova Esperança, no 1, São João do
Cabrito - Plataforma
Tel: 8839-4594
E-mail: primeirodemaio@uol.com.br
Pessoa de contato: Idelson Moreira
1977
32. COMONAL – Cooperativa
de Habitação Produção e
Serviço
Endereço: Rua Nordeste, Loteamento Araçás 1, no 7.
São João do Cabrito - Plataforma
Tel: 3401-0387 (Genilson) / 3401-3217 (João Carlos)
,
1996
184
33. COOPART – Cooperativa de
Artesãos de Cajazeiras V
Endereço: Quadra 5, Caminho 2, no 3. Cajazeiras V
Tel: 3395-3225
Pessoa de contato: Antônia Maria, Antônia Brandão,
Maria Angélica
2004
34. Cooperativa Raízes Povo de
Israel
Endereço: Rua Santa Terezinha, na Igreja Sagrado
Coração de Jesus, s/n. Alto do Cabrito
Tel: 3211-7147 (Maria da Glória) / 3392-0958 (Iraci)
E-mail: [email protected]m.br
2004
35. COOPERTRAC -
Cooperativa de Trabalhadores
Cegos
Endereço: ITCP – UNEB (Campus Cabula), Salvador
– BA.
Tel: 9602-2550 (Antônio)
2003
36. Associação Cultural
Religiosa Beneficente Guia
de Luz Caboclo Jequiriçá
Endereço: Rua Manuel Velho, no 1. Fazenda Garcia
Tel: 3263-0562
Pessoa de contato: Jaciara
1978
37. CAMAPET - Cooperativa de
Coleta Seletiva,
Processamento de Plástico e
Proteção Ambiental
Endereço: Rua Luís Maria, s/n, Baixa do Fiscal
Tel: 3313-5542 (5512) / 3312-7903
Pessoa de contato: Joilson
1999
38. Projeto Recicla Cajazeiras
Endereço: Quadra B, Casa 1A. Fazenda Grande III -
Cajazeiras
Tel: 3305-5407
Pessoa de contato: Waldir Coutinho
2002
39. COLIBRIS – Cooperativa
Mista dos Produtores em
Corte e Costura, Artesãos em
Couro, Material de Linhaça,
Bijuteria, Artesanato,
Instrumentos Musicais e
Serigrafia
Endereço: Rua da Resistência, no 136 A. Bairro da
Paz
Tel: 3368-2609 (Franklin)
Pessoa de contato: José Djalma dos Santos
2005
(maio)
40. Associação Cultural de
Capoeira Grupo Anjos de
Angola
Endereço: Rua Alto do Sossego, no 163. Bairro da
Paz
Tel: 3367-4776
Pessoa de contato: Marise, Edson
1975
41. Cooperativa de Beiju
Recheados Chega Mais
Endereço: Rua Leste, no 46 E. São Marcos
Tel: 3393-2284 / 9169-8226 (José Walter) / 3212-5387
(Suzana) / 3276-1758 (Samuel)
E-mail: lico19bbg@yahoo.com.br
Pessoa de contato: José Walter
2005
(agosto)
42. AD – Cooperativa Afrodance Endereço: Rua Alto do Sossego, no 163. Bairro da
Paz
Tel: 3367-4776
Pessoa de contato: Edsno Rodrigues
2002
43. Projeto Buscando
Cidadania
Endereço: Rua do Amparo, no 273. Lobato
Tel: 3239-0777 / 9999-8390 (Eliel) / 9982-7309 (Jorge
2005
(janeiro)
185
Raimundo) / 9172-4186 (Cátia)
E-mail: aanor2005@hotmail.com
44. COMUFECooperativa de
Mulheres da Federação
Endereço: Ladeira Abelardo, Centro Social Urbano,
s/n. Federação
Tel: 3247-8056 (8856) / 9158-7052 / 3245-7060
Pessoa de contato: Sandra Tereza de Freitas,
Cremilda
2004
(junho)
45. DAT – Daniela, Teresa e Ana Endereço: Rua Arnaldo Francelino, no 3. Itapoã
Tel: 3249-1068 / 3375-7582 (Ana Lúcia)
Pessoa de contato: Teresa
2001
46. Grupo de Artesãs do Bairro
da Paz
Endereço: Rua Presidente Dutra, no 239. Bairro da
Paz
Tel: 3367-4474
Pessoa de contato: Eliana
2005
47. Conselho Comunitário do
Bairro e Distrito de Pirajá
Endereço: Rua General Labatur, no 17, Subsolo.
Pirajá
Tel: 3246-1581 / 3391-0962 (Berenice) / 3392-7444
(Ednaldo)
Pessoa de contato: Raimundo
1987
48. GAA – Grupo Amigos
Artesãos
Endereço: Praça Lord Cochrane, s/n. Garibaldi
Tel: 3237-6711
E-mail: www.cecon.org.br
Pessoa de contato: Iara Maria
2002
49. COOPAFROCooperativa
de Costureiras e Artesãs do
Pau Miúdo
Endereço: Rua dos Pirineus, no 8. Pau Miúdo
Tel: 8118-5342
Pessoa de contato: Ana Maria
2002
50. Associação Clube das Mães
Nova Constituinte
Endereço: Rua Waldir Purês, no 11 E. Nova
Constituinte – Peri-peri
Tel: 3407-4590
Pessoa de contato: Jacira, Eliete
2004
51. Paciência Viva - Centro
Brasileiro de Preservação
Ambiental e Desenvolvimento
Sustentável
Endereço: Rua Prudente de Morais, n 65. Rio
Vermelho
Tel: 3334-0676 / 9132-6169 (Neandro e Paula)
Pessoa de contato: Nilda, Ana Cláudia
2000
Fonte: Elaboração própria, a partir de questionários do mapeamento nacional de economia solidária na Bahia
186
Apêndice C
Quadro de Empreendimentos Solidários Entrevistados
Surgidos entre 2000 e 2004
NOME ENDEREÇO E TELEFONE ANO DE INÍCIO
1. PANTI – Associação Cultural
da Ladeira João de Deus
Endereço: Rua Coronel João de Deus, no 83,
Federação
Tel: 3261-1160 / 3203-6972
,
Pessoa de contato: Dona Maria
2002
2. COOPREDICooperativa
dos Trabalhadores da
Construção, Manutenção e
Reformas Prediais
Endereço: Rua Rui Barbosa, Ed. Rui Barbosa, no 4,
sala 302
Tel: 3398-0761
Pessoa de contato: Achon
2001
3. COOMARTES –
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
Endereço: Rua Tertuliano Reis, s/n. Plataforma
Tel: 3401-8336 (Vilma)
E-mail: jocinelia10@bol.com.br
Pessoa de contato: Jocinélia
2002
4. COOPERTEXTIL –
Cooperativa Mista de
Produção e Trabalho de
Artigos Têxteis
Endereço: Rua São Francisco, s/n. Centro Histórico
Tel: 8139-5952 (Ricardo) / 3233-9835 (Angelina)
2003
5. ASCOSI – Associação de
Costureiras de Itapagipe
Endereço: Rua Régis Pacheco, no 225. Uruguai
Tel: 3312-7119 (Marlene) / 3391-6365 (Ana Maria)
2000
6. Edna Batista Nascimento –
Edna Bonequinhos de Jornal
Endereço: Rua do Uruguai, no 284. Uruguai
Tel: 3207-2111
E-mail: [email protected]m.br
Pessoa de contato: Edna
2000
7. AMAC – Pró-Cooperativa
Múltipla das Artesãs de
Cajazeiras
Endereço: Cajazeiras 11, cam. 32, no 8. Cajazeiras
Tel: 8807-8146 / 3309-5705
E-mail: susanesilva1@hotmail.com
Pessoa de contato: Susane Silva
2004
8. COOFE - Cooperativa
Múltipla Fontes de
Engomadeira
Endereço: Rua São Tomé, Tv. José Sampaio, no 3,
Engomadeira. Salvador
Tel: 3257-7990 / 3387-5920
2000
9. Mulheres de Luz – Clube de
Mães, Creches e Escola Nossa
Senhora da Luz
Endereço: 3ª Travessa Paulo Afonso, no 7.
Pernambués
Tel: 3450-9294 (Luciene)
2003
10. COOPAED – Cooperativa
Múltipla de Produção de
Alimentos e Engenho Doce
Endereço: Rua Apolinário Santana. Engenho Velho
da Federação
Tel: 88073334-6414
Pessoa de contato: Kátia
2004
187
11. Projeto Ação Reciclar - Ong
Paciência Viva
Endereço: Rua Prudente de Morais, n 65. Rio
Vermelho
Tel: 3334-0676 / 9132-6169 (Neandro e Paula)
Pessoa de contato: Nilda, Ana Cláudia
2000
12. COOPIZ – Cooperativa
Múltipla de Pizzas e Sorvetes
Endereço: Travessa da União, no 1. Mata Escura
Tel: 8145-1194 / 3306-4411
Pessoa de contato: Rafael, José
2004
13. Grupo Raio de Sol
Endereço: Rua São Carlos, no 5. Santa Luzia do
Lobato
Tel: 3208-1916 (Marta)
2002
14. ABBORI – Associação
Baiana de Bordadeiras e
Rendeiras de Itapagipe
Endereço: Travessa Polivalente, no 11, 2º andar.
Uruguai
Tel: 3315-8659
Pessoa de contato: Elinete Lázaro, Margarida
2003
15. Quebra Cabeça e
Brinquedos Inteligentes
Endereço: Rua dos ..., no 123. Santo Antônio
Tel: 3241-8999 / 8872-5130 (Robson) / 8816-8894
(Carolina)
Pessoa de contato: Luís Fernando
2001
16. COOPERTANE -
Cooperativa Múltipla União
Popular dos Trabalhadores de
Tancredo Neves
Endereço: Rua Cristiane, no 176-E. Tancredo Neves
Tel: 3462-1316
Pessoa: Luciene, Magda
2000
17. COOPARTES – Cooperativa
de Jovens Artesãos do Vale de
Pituaçú
Endereço: Rua Dr. Artur Gonsales, no 168. Pau da
Lima
Tel: 8839-4594
Pessoa de contato: Messias
2002
18. AMEV – Associação de
Mulheres do Engenho Velho
da Federação
Endereço: Rua Coronel João de Deus. Engenho Velho
da Federação
Tel: 3261-3340 / 3203-7075
E-mail: gmartesanatocom[email protected]
Pessoa de contato: Marilene
2001
19. COOPERART –
Cooperativa de Representação
e Serviço
Endereço: Rua B, s/n. Castelo Branco
Tel: 32153091 / 9936-3486
Pessoa de contato: Raimundo
2001
20. COOPESBAS – Cooperativa
de Pescadores Baía de Todos
os Santos
Endereço: Rua Sá de Oliveira, no 20, São João do
Cabrito - Plataforma
Tel: 3398-0144
Pessoa de contato: José Rafael, Raimundo, Carlito,
Marcos Paulo
2003
21. COOPERCORTE -
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
Endereço: Rua Alto d Bola, no 15. Federação
Tel: 3235-3819
Pessoa de contato: Diva Celestino
2003
188
22. COOPART – Cooperativa de
Artesãos de Cajazeiras V
Endereço: Quadra 5, Caminho 2, no 3. Cajazeiras V
Tel: 3395-3225
Pessoa de contato: Antônia Maria, Antônia Brandão,
Maria Angélica
2004
23. Cooperativa Raízes Povo de
Israel
Endereço: Rua Santa Terezinha, na Igreja Sagrado
Coração de Jesus, s/n. Alto do Cabrito
Tel: 3211-7147 (Maria da Glória) / 3392-0958 (Iraci)
E-mail: [email protected]m.br
2004
24. COOPERTRAC -
Cooperativa de Trabalhadores
Cegos
Endereço: ITCP – UNEB (Campus Cabula), Salvador
– BA.
Tel: 9602-2550 (Antônio)
2003
25. Projeto Recicla Cajazeiras
Endereço: Quadra B, Casa 1A. Fazenda Grande III -
Cajazeiras
Tel: 3305-5407
Pessoa de contato: Waldir Coutinho
2002
26. AD – Cooperativa Afrodance Endereço: Rua Alto do Sossego, no 163. Bairro da
Paz
Tel: 3367-4776
Pessoa de contato: Edsno Rodrigues
2002
27. COMUFECooperativa de
Mulheres da Federação
Endereço: Ladeira Abelardo, Centro Social Urbano,
s/n. Federação
Tel: 3247-8056 (8856) / 9158-7052 / 3245-7060
Pessoa de contato: Sandra Tereza de Freitas,
Cremilda
2004
(junho)
28. DAT – Daniela, Teresa e Ana Endereço: Rua Arnaldo Francelino, no 3. Itapoã
Tel: 3249-1068 / 3375-7582 (Ana Lúcia)
Pessoa de contato: Teresa
2001
29. GAA – Grupo Amigos
Artesãos
Endereço: Praça Lord Cochrane, s/n. Garibaldi
Tel: 3237-6711
E-mail: www.cecon.org.br
Pessoa de contato: Iara Maria
2002
30. COOPAFROCooperativa
de Costureiras e Artesãs do
Pau Miúdo
Endereço: Rua dos Pirineus, no 8. Pau Miúdo
Tel: 8118-5342
Pessoa de contato: Ana Maria
2002
31. Associação Clube das Mães
Nova Constituinte
Endereço: Rua Waldir Purês, no 11 E. Nova
Constituinte – Peri-peri
Tel: 3407-4590
Pessoa de contato: Jacira, Eliete
2004
32. ONG Paciência Viva -
Centro Brasileiro de
Preservação Ambiental e
Desenvolvimento Sustentável
Endereço: Rua Prudente de Morais, n 65. Rio
Vermelho
Tel: 3334-0676 / 9132-6169 (Neandro e Paula)
Pessoa de contato: Nilda, Ana Cláudia
2000
189
Apêndice D
ROTEIRO DE ENTREVISTA
PRIMEIRA PARTE - PERFIL DO EMPREENDIMENTO:
1. Caracterização da Organização:
1.1. Quantas pessoas fazem parte da organização?
1.2. Distribuição etária e de gênero
2. Histórico:
2.1. Data de início das atividades
2.2. Por que e como surgiu a Organização: o que embasou a sua criação?
2.3. Quais foram as motivações (individuais, culturais, políticas)?
3. Articulação institucional e fontes de financiamento (parceiros):
3.1. Papel do poder público (União, Estado e Município)
3.2. Parceria com organizações não governamentais e sociedade civil
3.3. Financiadores privados envolvidos (nacionais e internacionais)
3.4. Redes de colaboração e participação em fóruns
4. Consciência sobre participação em empreendimento solidário
4.1. Vocês se consideram uma organização de economia solidária?
4.2. Como é o trabalho na economia solidária? (entendimento sobre economia solidária)
5. Objetivos da Organização:
5.1. Quais os objetivos da organização?
5.2. Como se deu o processo de decisão dos objetivos?
5.3. Quais são os resultados esperados?
5.4. Quem os decidiu?
6. Organização, estrutura e relações:
6.1. O que é produzido e como a produção é organizada?
6.2. Como é dividida a responsabilidade pela produção?
6.3. Como é o processo de tomada de decisão na organização?
6.4. Vocês pretendem conscientizar outras pessoas com suas ações?
SEGUNDA PARTE – IDEÁRIO:
1. Concepção de sociedade
1.1. Como vocês se relacionam com a comunidade local?
1. Que sociedade a economia solidária busca?
2. Concepção de Estado
2.1. O que vocês esperam do Estado?
2.2. Como seria o Estado ideal para a economia solidária?
2.3. Vocês participam de manifestações políticas? Quais?
2.4. Vocês apóiam candidatos em eleições ou partido políticos? Quais? Por que?
3. Concepção de mudança e processo da práxis transformadora
3.1. Que mudanças a economia solidária pode trazer?
3.2. Como vocês acreditam que podem ser combatidas e superadas as desigualdades sociais e o que vocês
têm feito para isso?
190
Apêndice E
QUADRO DE ORIGEM DOS EMPREENDIMENTOS
ORGANIZAÇÃO ORIGEM
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
A primeira reunião foi em agosto de 2005, promovida pela atual
coordenadora da cooperativa. Nesta época, ela já participava do grupo
Casa do Sol (organização fundada por um padre em Cajazeiras) e lá via
muitas mulheres sem ocupação ou dependendo dos maridos. Ela
participou de um encontro da rede sócio-economia solidária, no Espírito
Santo, onde conheceu e observou o trabalho de outras cooperativas, e,
então, teve a idéia de montar uma cooperativa de bordados. A partir daí,
ela resolveu organizar uma reunião convidando as pessoas que estavam
neste meio, seja da organização ou da associação do bairro. “Depois de
muita luta e de muita correria” elas conseguiram aprovar um projeto de
financiamento - matéria-prima e produção - na CESE e o espaço físico - a
casa cedida por uma das cooperadas.
AMEV
Associação das Mulheres
do Engenho Velho da
Federação
O grupo começou dentro da associação de moradores da comunidade do
Engenho Velho. Veio um projeto de geração de emprego e renda, mas só
tinha homem, e eu (líder), como já era conhecida na comunidade pelos
movimentos populares, surgiu a idéia de eu cuidar do projeto de emprego e
renda. Só que lá, conseguimos o projeto, mostramos a capacidade das
mulheres, eram mais homens do que mulheres e começaram a criar
empecilhos, pois eram muitas mulheres juntas, coisa que não existia na
comunidade, muitas mulheres participando nas associações. Quando surgiu
o projeto, já tinha empreendimento que veio através do fórum de combate
à violência, e eles criando muita dificuldade para a gente. Mas ainda
conseguimos criar muitas peças de artesanato. Quando o dinheiro começou
a entrar e as mulheres querendo saber de tudo passo a passo, a coisa
começou a dar errado. Os homens queriam que o controle ficasse nas mãos
dos homens. Então, na época, três mulheres saíram e alugaram um espaço.
Mas sentimos necessidade de melhorar e mudamos. Hoje, estamos já com
cinco anos, já temos estatuto, é registrado, tem CNPJ. Vemos a
necessidade de gerar emprego e renda pra comunidade, para todos
aprenderem um oficio. O Fórum de Combate à Violência continua nos
acompanhando. Fizemos parceria com a Católica e com a UFBA. Com
tanto apoio, a cooperativa cresceu sem precisarmos do dinheiro público,
que muitas vezes é jogado fora.
ASCOSI
Associação de
Costureiras de Itapagipe
5 anos de formada, mas 3 anos registrada como associação
A gente começou com um curso de costureira na Cidade Mãe (ONG), e,
depois do curso, algumas pessoas (elas falam em quem podia, para se
referir às mais jovens) foram trabalhar em fábrica e outras pessoas, que
tinham idade avançada que a fábrica não aceitava, que estava fora do
mercado, se reuniu, e tomou um curso de capacitação para formar uma
cooperativa, um grupo de mulheres, no SENAI. Aí, depois destas reuniões,
foi mais de um ano de reuniões, a gente fez um projeto (para a SECOMP,
com assessoria de uma professora da Católica) para conseguir as máquinas,
e conseguimos as máquinas. Depois de um tempo, a gente conseguiu um
espaço na associação lá no Lobato, e aí, a gente começou a costurar.
Formamos uma associação. As máquinas foram doadas pela SECOMP.
As motivações (individuais, culturais, políticas) foram estarem fora do
mercado de trabalho.
Brinquedos Inteligentes
Luiz F: Poxa, tem 4 anos?
Luíza: Em 2002.
Tarcis: Nessa faixa.
Luiz F: É mais ou menos
Luiza : em 2001?
Luiz F: É foi quando eu cheguei aqui.
191
Tarcis: é foi quando começou a vender nas praias
Luíza: Por que e como surgiu a Organização: o que embasou a sua
criação?
Luiz F: Eu estava no Rio de janeiro e comecei a colecionar brinquedo de
metal, quebra-cabeças chineses, aí chegou aqui, rolou de fazer brinquedos de
madeira. Aí, começou a pesquisar e juntou vários... assim... mais de cem
jogos. A gente faz... assim... os brinquedos, são brinquedos do mundo todo.
Esse é do Nepal; China; África, França.
Luíza: Quais foram as motivações (individuais, culturais, políticas)?
Luiz F: Priimeiro, o gosto, pessoal. Então, acho que foi uma inclinação
pessoal mesmo e cada um tem função, mas todo mundo conhece todas as
etapas do processo. Começou com essa coleção, aí a gente ampliou e
percebeu que ninguém fazia o que a gente faz, a gente trabalha,
exclusivamente, com álgebra e matemática.
COMUFE
Cooperativa de Mulheres
da Federação
Faz 2 anos em agosto. Nós começamos pela falta de trabalho. Todo mundo
estava sem trabalho e aí pensamos no cooperativismo ou associativismo,
porque todo mundo se junta, se une e trabalha e reparte os rendimentos
igual. Aí, procuramos uma pessoa conhecida e buscamos um curso de
associativismo e ficamos nos reunindo duas vezes na semana lá no centro
(Centro Social Urbano). O espaço físico utilizado era do centro.
Começamos a produzir através de retalhos, pois o projeto da gente era Arte
em Pedaços, um trabalho com retalhos. Arranjamos uma costureira que
tinha mais experiência, ela ia cortando... E começamos a vender assim.
Cada uma vendia um pouco. E depois o que vendia, o rateio total, a gente
dividia em iguais.
A motivação maior é a associação do bairro, que eu sou diretora. Então,
dentro da programação anual da associação, todos os anos, a gente procura
uma coisa nova. E a função muito preocupante era o trabalho e renda,
porque hoje não tem emprego. Então, a motivação vem daí. A gente tem
que arranjar um meio de trabalhar... E a gente não vê o espírito
cooperativista dos adolescentes, pois eles tomaram um curso de sabão,
perfume, no colégio Antônio Carlos Magalhães, pois era, ERA para eles
montarem uma cooperativa, mas o curso ficou pela metade, parou. Eles
não continuaram com o trabalho voluntário e o curso parou. E agora, tem a
cooperativa de catadores de papel, que a gente está tentando implementar
para dar uma ocupação aos jovens. Então, é um trabalho que a associação
tem de estar criando ações para melhorar a qualidade de vida dentro da
comunidade. A motivação maior foi esta.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
A gente começou a partir de um projeto de financiamento aprovado pela
CESE. A gente comprou material com o dinheiro. A casa foi doada por um
grupo de 4 mulheres que desenvolvem trabalho comunitário (elas não
especificam o registro legal deste grupo de mulheres). A cooperativa
surgiu através de um encontro da associação de bairro com o objetivo de
formar um grupo para geração de renda. A gente percebeu que deveria
fazer algo que não tivesse muita gente fazendo. Então a gente foi procurar
uma coisa que a gente fizesse e fosse diferente. Então a gente foi
pesquisando e pensou em desenvolver um trabalho com o marisco, que é
abundante aqui. O que divulga a cultura do próprio subúrbio.
A motivação é ter um trabalho nosso. Ao invés de ficar desocupada em
casa, a gente tem algo que nós fazemos. Tem muita gente aí que não tem o
que fazer.
Cooperativa Raízes do
Povo de Israel
Faz dois anos. Nós começamos no dia 7 de maio de 2004. Fez dois anos
agora.
A gente começou nestas andanças, visitando outras cooperativas, junto com
a União pela Moradia Popular. E fomos convidando outras pessoas, com o
testemunho divino e com o apoio do padre da paróquia e das irmãs. Com o
apoio do padre logo conseguimos um espaço e tomamos o curso de
cooperativismo, com o apoio de uma ONG que estava lá no bairro na época.
Pegamos nossas máquinas de dentro de casa, conseguimos os retalhos com
as pessoas e em fábricas e começamos a fazer bolsas, sacolas... E
192
começamos a produzir devagarzinho. E fomos participando de duas feiras: a
feira da caridade da Diocese e a feira de economia solidária pelo fórum de
cooperativas.
Motivações: Necessidade nossa, pois somos mulheres em idade avançada,
com dificuldade de conseguir um emprego, até pelo nosso conhecimento, da
capacitação da gente mesmo. Então a gente ficou unida e buscou juntas um
maior conhecimento, passar o aprendizado também. Futuramente, se a nossa
cooperativa ficar lá no fundo, a gente pode buscar ajuda pra conseguir
chegar lá. No momento, estamos todas voluntárias sem remuneração
nenhuma. É muito pouco, só para manter
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
Em 5 de janeiro de 2004, no outro prédio, do lado da UNIFACS mesmo,
porque a comunidade do Engenho Velho tinha uma preocupação com
geração de renda, mas não a comunidade, porque seria muito grande, grupos
isolados, em um dos terreiros, porque são 31 terreiros, em um dos terreiros
de candomblé tinha uma preocupação maior: se preocupava muito em dar
cursos, curso de manicure, de emborrachado, de informática, para poder o
pessoal sair com uma renda, algo que trouxesse dinheiro com mais
facilidade. Que era a mãe de santo, Mãe Rosa, hoje ela é falecida. Então,
essa mãe de santo que tinha uma preocupação maior. Então, quando a
UNIFACS procurou alguém da comunidade, encontrou essa pessoa no
terreiro, mas, aí, a gente sabia que essa proposta era muito boa, mas
demoraria muito para dar retorno financeiro. Então, Nara me pediu para
acompanhar o pessoal da UNIFACS para vê se alguém da comunidade se
interessava em participar do projeto, mas sabendo que não ia receber o
dinheiro rápido. Assim começou. Receber esse dinheiro mesmo só foi no
mês de janeiro do final do passado para cá. Dos fundadores mesmo só tem
eu e Valdete, mas todos os outros não mais ficaram, por causa da dificuldade
de retorno imediato: as famílias dependem muito desse dinheiro e não
recebia.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens
Artesãos
a entrevistada não soube precisar quando, mas veio de um processo de
curso, depois de formação de grupo e acabou formando a cooperativa.
Começou com um curso de empreendedorismo oferecido pelo Pangea e
formou a cooperativa de artesanato.
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
Surgiu em 2000 como Grupo Pró Cooperativa de Cajazeiras. Desde a data
de surgimento o grupo já passou por vários momentos. Inicialmente eles
pensaram em trabalhar com a produção de alimentos – quentinhas.
Depois de um trabalho de estudo de viabilidade com a ITCP, de dois anos
pra cá, eles verificaram que boa parte do grupo não se identificava com a
produção de alimentos. Então algumas pessoas se manifestaram e falaram
que tinham habilidades para fazer artesanato, produção com couro. Eles
passaram por um processo de incubação com a ITCP da UNEB. Após esta
definição, eles entraram no processo de fazer estudos de viabilidade e
capacitação, novamente, para o trabalho com couro. Mas, há uma crença
que o processo de formação de cooperativas populares seja lento, por
conta das necessidades do grupo. A cooperativa passou por muitos
“processos” (capacitações com diversas entidades, como a ITCP, a ADS,
Vida Brasil, BanSol), em diversas áreas como informática,
comercialização. Com isso, boa parte do grupo arrumou emprego e, hoje,
boa parte do grupo participa da cooperativa, mas tem um emprego fixo.
Atualmente, 11 pessoas do grupo já trabalham com carteira assinada e
“tem que dar expediente”. Mesmo assim, o grupo vem sendo mantido. A
aproximação do grupo com a ITCP foi através de um seminário realizado
em Cajazeiras, de geração de emprego e renda, organizado pela Câmara
de Vereadores, que tinha, na época, como presidente Gedel Vieira Lima.
Deste seminário, percebeu-se a necessidade de criar uma cooperativa em
Cajazeiras e, então, criou-se uma comissão (pequena), na intenção de
montar esta cooperativa. A partir daí, a ITCP e o Instituto Integrar
fizeram um seminário de cooperativismo, onde foi criada esta cooperativa,
que, na época, chamava-se COOPERCAJ (Cooperativa de Cajazeiras).
Mas a cooperativa não decolou no decorrer do tempo, porque existiam
193
pessoas que não estavam precisando formar uma cooperativa. Era um
grupo formado por pessoas que tinham seus empregos, muitas vezes até
ligados ao setor público (como Embasa, e secretarias da prefeitura). Isto
criou um certo desentendimento. Então, a ITCP desenvolveu um novo
seminário de cooperativismo como objetivo de resgatar as pessoas
realmente envolvidas na cooperativa. Esta fase foi quando o entrevistado e
outras pessoas que até hoje fazem parte da cooperativa entraram. Neste
seminário, participaram umas 50 pessoas, mas a antiga COOPERCAJ se
diluiu totalmente, ficando apenas as pessoas que dariam seguimento ao
empreendimento (5 pessoas apenas). Com estas 5 pessoas, foi criado o
grupo pró-cooperativa, que passou a ser efetivamente incubado pela
ITCP. Depois, começou o processo para agregação de novas pessoas,
sempre com o acompanhamento da ITCP.
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma
Realidade Diferente
Teve início em Quatro de Junho de 2002. Surgiu através do apadrinhamento
da visão mundial, pois quase todas as mulheres daqui têm um filho que é
apadrinhado pela Visão Mundial e a SECOMP dava muita contribuição para
as mães desses filhos apadrinhados. Depois, ao invés de estar dando cesta
básica e remédios, eles resolveram criar grupos, onde cada uma tivesse a
oportunidade de ter um meio que gerasse uma renda. Primeiro, criou-se o
grupo dos artesãos, depois um pequeno grupo de costureiras, e seis meses
depois, tomamos a decisão de fazer uma cooperativa, através de uma pessoa
de Recife-Pe que nos deu um curso de cooperativismo. E, depois, passamos
a procurar mulheres que quisessem fazer parte do grupo, onde chegou a 23
mulheres no momento da fundação no dia 22 de agosto de 2003. Logo
depois, em dezembro, tomamos um curso básico de Corte e Costura
Industrial. Quando foi em Agosto de 2004, a visão mundial resolveu alugar
um espaço para que a gente passasse a produzir. De lá pra cá, caminhamos
com muita dificuldade, tanto que não somos mais 23 e sim 12, pois nem
todas conseguiram trabalhar sem receber dinheiro, pois precisavam levar
dinheiro para dentro de casa. Assim, saíram e foram atrás de trabalho que
desse um retorno financeiro, como serviço geral, outras como domésticas.
A motivação era a esperança que todas tinham de crescer e de um dia termos
os nossos próprios salários. Por enquanto, ainda não temos, mas ainda temos
a esperança.
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e
Trabalho de Artigos
Têxteis
Fez 4 anos (2002) dia 30 de julho. A cooperativa iniciou com o curso
oferecido pela prefeitura com o Projeto Axé. Esta proposta é das mães do
Projeto Axé que tem algum filho vinculado ao PET. Então, como a maioria
das mães tinha pouca renda, elas levaram o projeto ao Projeto Axé como
uma possibilidade de gerar renda, pois um dia, o PET iria terminar. Aí, o
projeto foi levado para a prefeitura e o Dr. Raimundo Caíres, que na época
era secretário (SETRADS) – e hoje é candidato – enviou para o presidente e
foi aceito. No projeto inicial, eram teares pequenos de prego, mas como ele
conhecia Rosa Alice, que é artista plástica e sabe tecelagem, o projeto
mudou para estes teares. A cooperativa foi formada em 2003, o curso que foi
antes .
Geração de trabalho e renda. Porque as pessoas precisavam trabalhar para
sustentar a família. Teve também a motivação de não deixar a tecelagem
morrer (este é um projeto deles de passar para outras pessoas).
Edna Batista
Nascimento
Bonequinhos de Jornal
Tem uns dez anos que eu venho fazendo. (a entrevistadora questiona que,
no seu roteiro, consta que ela começou em 2000) Tem aí que eu comecei
em 2000? Eu fazia antes, mas em 2000 que eu comecei a por gente para
ajudar. Os bonequinhos de jornal foi um trabalho que eu criei, então, assim,
sempre eu fazia sozinha. Depois, foi aumentando a procura, então houve
necessidade de botar pessoas pra ajudar. (não é uma organização coletiva,
mas um artesanato desenvolvido por Edna, pois quando a entrevistadora
pergunta quando vocês começaram, ela afirma que é um trabalho
individual). Antes dava pra eu fazer sozinha, mas depois foi aumentando e
eu tive que ir chamando uma pessoa, depois outra pessoa. Mas o trabalho é
muito minucioso e nem todo mundo tem paciência de fazer. Então tem que
ser pessoas que tem paciência de fazer o trabalho. Quando você decidiu
194
chamar gente para ajudar? Como foi este processo? Eu sempre gostei de
arte, sempre gostei de fazer alguma coisa. Mas não podia fazer antes, porque
não tinha tempo. Estava criando meus filhos, porque eu tenho seis filhos.
Depois que eles cresceram, eu resolvi botar em prática o que eu já tinha em
mente. Todo trabalho que eu faço com eles (os bonequinhos) é voltado para
o social (...). Eu que criei o trabalho, eu resolvi fazer. Comecei tentando com
garrafa PET, estas coisas, depois foi me dando mais idéias de trabalhar com
aproveitamento de materiais e comecei a fazer com jornal. Jornal, cola... O
que te motivou a fazer? Pra dizer a verdade é a vivência. Foi a infância que
eu não tive. Foi o cotidiano. É a vida. Tenho funeral... Cadeira de rodas,
crianças brincando de pular corda, criança com o bambolê (...) Faço até
menino de rua cheirando cola (Edna passa a descrever o que seus
bonequinhos representam – cenas do cotidiano). Não tá tudo aqui. Porque
tem uns lá na associação no Pelourinho. Porque, agora, tem uma associação
lá no Pelourinho que eu me associei, que é uma loja onde as mulheres
artesãs colocam seu trabalho. É uma associação cultural e tem muitos
trabalhos lá (Culturarte).
Grupo de Amigos
Artesãos
O grupo está em processo de se registrar, pois antes eles funcionavam, mas
não eram registrados. O grupo está se reunindo toda segunda e quinta, se
preparando para exportar, trabalhando na confecção de bonecos e
camisetas. 2002 (meio em dúvida).
Ela disse que ia levar o histórico para a entrevista, mas acabou
esquecendo e não sabe muito sobre o histórico.
A maioria do pessoal não tinha emprego fixo, e estes grupos, estas coisas é
um meio de garantir uma rendinha. As pessoas que fazem artesanato,
quando vão numa escola, por exemplo, alguém acaba vendo e se
interessando. Eu, no meu caso, por exemplo, eu faço bolsa, coisa de
tricozinho, sempre acabo vendendo para o pessoal onde eu ... do teatro, do
fórum (não especifica que teatro e que fórum) – dimensão individual
Foi uma história longa. A partir do clube de mães – porque todo mundo faz
parte do clube na CECOM – Tinha também André, que trabalhava aqui no
CECOM, tinha também Isabela, assistente social. André foi o maior
incentivador do grupo. Incentivou mesmo, na questão das barracas, é tanto
que quando ele saiu, o grupo ficou meio abalado. Porque, também, muitas
coisas aconteciam e a gente não ficava sabendo, como as reuniões de
economia solidária, que a gente sabia através de André. A gente sentiu
muita falta de André. Aí levou um tempo sem se reunir direito, mas agora
tá tendo atividade, na segunda e quinta-feira. (Retomando a pergunta de
como havia surgido)
Grupo Raio de Sol
Nós começamos no 1º de julho de 2003. Foi aquele projeto Bom Viver, a
CONDER construiu aí uma sala, cobriu com forro, se conseguiu esse
negócio do espaço e aí, agora que sobrou, eles investiram aqui, no povo do
bairro. Hoje tá alugado pela prefeitura, cobram o olho da sogra. Eu não faço
parte do bairro, sou a única que não mora aqui, mas fui convidada devido a
minha experiência no trabalho. Então, uma hora estava assim, recém
formada em corte, aquela formatura do programa rapidinho de três meses, eu
não, fui formada em corte com dois anos. Pela minha idade você vê, que há
18 anos o curso não era como é hoje, né? Trabalhei na Mesbla, trabalhei na
Shirley, sempre com experiência industrial, por isso que me convidaram. E
outra é que participava, assim, de curso de corte, e eu, como tinha tido um
derrame, precisava fazer fisioterapia. Minha cunhada ligou, falou com o
povo, eles me aceitaram e eu vim fazer curso de aproveitamento de tecidos
com elas e aí gostaram. Como eu era costureira, minhas peças saiam todas
ajeitadinha, aí, na hora de formar aqui, me convidaram. Então eu sou a única
que não sou do bairro.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de
Preservação Ambiental e
desenvolvimento
Sustentável
A ONG foi fundada em 16 de agosto de 2000. A ONG foi desenvolvida a
partir do projeto de esporte e educação na praia da Paciência, com a
preocupação de recuperação da praia da Paciência (projeto SOS Paciência).
Hoje, o Projeto Futebol e Cidadania Viva continua, com o apoio do colégio
Anglo Brasileiro, que doa material de treinamento, e a gente mantém cerca
195
de 70 crianças e adolescentes na praia da Paciência, desenvolvendo trabalho
com futebol de areia. Os fundadores da ONG são ex-atletas e moradores do
Rio Vermelho que freqüentavam e ainda freqüentam a praia da Paciência e
sempre tiveram uma ligação muito forte com a região por conta do esporte.
Os atletas resolveram se organizar dentro de uma ONG, desenvolvendo um
trabalho com o esporte, envolvendo a comunidade.
(Comunidades: o Alto da Sereia, Alto da Alegria.)
Projeto Cooperativa
Ação Reciclar
E/F: A gente veio de um projeto de lá do Alto da Sereia, não tinha nada do
que tem aqui hoje, não tinha prensa, fazia os parros na forma de
geladeira, mas hoje não. Hoje está mais estável para gente.
Luiza: Foi quando isso, lá no Alto da Sereia, foi em 2001? Você é ?
R: Eugênia. Foi.
Luiza: Por que e como surgiu a Organização: o que embasou a sua
criação?
E/F: Eu não pude participar do inicio.
Eugenia: Tinha uma quantidade de pessoas desempregada. Aí, Nilda, que é
a coordenadora do projeto, tinha uma pessoa que chamou a gente para
uma reunião, e juntou um grupo de 5 pessoas.
Apêndice F
QUADRO DE ARTICULAÇÕES DOS EMPREENDIMENTOS
196
NOME PODER PÚBLICO PARCERIAS PRIVADAS SOCIEDADE CIVIL REDES E FÓRUNS
AMAC
Cooperativa Multipla das
Artesãs de Cajazeiras
-
Doação de pessoa física -
uma cooperada doou sua casa
para ser o local de
funcionamento da cooperativa
CESE – projeto de
financiamento (compra de
matéria-prima e
financiamento da produção);
ITCP UNEB – processo de
incubação, determinação de
produto;
Associação de Bairro de
Cajazeiras V – apoio nas
atividades
Grupo Casa do Sol – apoio
nas atividades
Fórum de Cooperativas
Populares
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
Fábrica do carnaval
projeto da prefeitura
articulando Sempre, Sebrae,
entre outros (durante 1 mês foi
cedido um espaço para
algumas organizações
venderem e exporem seus
produtos);
Estão iniciando uma parceria
com o governo do Estado
através de um projeto para
formação de comunidades
Doação de pessoas físicas -
uma médica apóia a
associação realizando exames
preventivos na comunidade;
doação de retalhos para a
produção por armarinhos e
fábricas de roupa
UNIFACS - ponto de venda
em um dos prédios da
universidade para
comercialização do artesanato
Universidade Católica
aulas para a comunidade
ITCP CEFET – processo
de incubação.
Fórum Baiano de Economia
Solidária
Fórum de Combate a
Violência (Abrace a vida)
encaminhamento de pessoas
em situação de risco e doação
de materiais
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
SECOMP - Doação das
máquinas de costura a partir
da apresentação de projeto
Fábrica do Carnaval -
projeto da prefeitura
articulando Sempre, Sebrae,
entre outros;
APL Uruguai - processo de
inclusão no Arranjo Produtivo
Local do governo do estado
-
CESE – projeto de
financiamento incluindo o
pagamento do aluguel do
espaço por 1 ano, aquisição de
alguns equipamentos e
manutenção de máquinas
Fórum entre a prefeitura,
DECA e SEBRAE para
discussão de problemas, cursos
(não ficou muito claro a
natureza deste fórum na
entrevista)
Brinquedos Inteligentes - -
Universidades (Federal,
Católica, Jorge Amado, e
outras de fora) – convites para
participação em congressos,
simpósios, palestras, cursos e
encontros nas áreas de
psicologia, matemática,
filosofia, computação (todas as
áreas que estão relacionadas
com pensamento lógico de
alguma forma)
-
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
Centro Social Urbano
utilização do espaço físico
SETRAS – empréstimo das
máquinas de costura
Doação de pessoa física
ajuda pontual não
especificada (provavelmente
de divulgação da
organização) da
apresentadora de um
programa de TV local
Associação dos Moradores
da Federação parcerias em
diversas ações
Fórum Baiano de Economia
Solidária
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
-
SEBRAE - curso de
cooperativismo
CESE – projeto aprovado
para reforma e compra de
matéria-prima
Fórum de Economia Solidária
Fórum de Cooperativas
Populares
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
--
Igreja espaço físico cedido,
e apoio nas atividades
OCEB – orientações para a
legalização
Fórum de Cooperativas
Populares
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
-
UNIFACS – idealização e
elaboração do projeto da
cooperativa para geração de
renda, contratação informal
de uma pessoa para formar o
grupo da cooperativa,
concessão das cantinas para a
cooperativa explorar
Petrobrás projeto
(enviado pela UNIFACS)
para compra dos
equipamentos, recrutamento
de pessoal, compra de
fardamento e bolsa auxílio
Vida Brasil – trabalho dos
integrantes no mapeamento de
economia solidária
Rede de Agricultura
Familiar
Fórum de Economia
Solidária
Fórum de Cooperativas
Populares
197
COOPARTES
Cooperativa de Jovens
Artesãos
--
PANGEA – Realizam a
administração da cooperativa
-
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
SEMU e SETRAS (do
município) – “há um diálogo
saudável estabelecido”
Petrobrás 2 projetos de
capacitação foram
contemplados (“são projetos
muito pequenos mesmo”).
Vida Brasil – “sempre ajuda”
com apoio, capacitação,
cedendo espaço físico
ITCP UNEB – processo de
incubação (“relação muito boa
com a ITCP. A mãe da gente
que acompanhou todo o
processo, que acompanhou o
estudo de viabilidade, a
assessoria”).
União pela Moradia Popular
capacitação
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
-
Petrobras - projeto para
pequenas e micros empresas
SEBRAE – cursos na área de
costura para todas as 23
mulheres durante dois meses
ITCP UNEB -
acompanhamento da
cooperativa, oferta de curso de
capacitação, e financiamento
CECOM – formação do
grupo e acompanhamento das
atividades
Fórum de Economia Solidária
Fórum de Cooperativas
Populares
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e
Trabalho de Artigos Têxteis
SECOMP – (?)
Prefeitura –oferta de cursos
de acordo com a necessidade
da cooperativa
SEBRAE – cursos, como
empreendedorismo,
associativismo,
cooperativismo, contabilidade
Projeto Axé – curso inicial
que agregou o grupo que
formou a cooperativa
FAPESB projeto de
aperfeiçoamento, design,
vendas e inclusão de novas
pessoas
Fórum de Economia Solidária
Fórum de Cooperativas
Populares
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
- -
CULTURARTE
associação que vende os
produtos mediante o
pagamento de uma quantia
mensal
Associação de Moradores
do Uruguai venda de
produtos
-
198
Grupo de Amigos Artesãos
-
Petrobras - não é
especificada a forma de ajuda
Clube de Mães do CECOM
agregação do grupo, atividades
emocionais e cursos de
artesanato (bolsa, pintura,
bordado)
Visão Mundial
participação no banco
comunitário (“No banco
comunitário você poupa para
poder comprar material para
fazer artesanato”)
Igreja Batista – local de
encontro do grupo
Fórum de Economia Solidária
Fórum de Casa e Habitação
Fórum de DEC
(Desenvolvimento Econômico)
– ligado ao banco comunitário,
que apóia o desenvolvimento
do grupo
Grupo Raio de Sol
CONDER - curso de costura
e orientações quando há
necessidade, tipo dúvida em
relação a uma decisão
Governo do Estado
participação no APL do
Uruguai
---
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de
Preservação Ambiental e
desenvolvimento Sustentável
SECOMP – convênio através
do projeto Ação Reciclar,
visando a coleta seletiva no Rio
Vermelho
Colégio Anglo Brasileiro
doação de material para o
projeto de futebol de praia
IAAP - projeto na área de
vídeo (Imagem Viva), oferta de
curso de edição não linear
digital – para 10 jovens de
baixa renda
ONG Mages - parte de
educação ambiental do projeto
Ação Reciclar
-
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
SECOMP – financiamento
do projeto da cooperativa
Faculdade Ruy Barbosa
doação de material para a
coleta
Biscoito Tupi - aula de
nutrição
Universidade Federal e
UCSAL - curso de
cooperativismo -
199
200
Apêndice G
QUADRO SOBRE CONSCIÊNCIA NA PARTICIPAÇÃO DE EMPREENDIMENTO
SOLIDÁRIO
NOME CONCEPÇÃO
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
Sim (enfático). As pessoas que permaneceram, até hoje, na cooperativa são as
que realmente tem um espírito cooperativista. Que não estão apenas visando o
lucro. Porque muitas pessoas dizem que é só reunião, reunião e, no final, não
tem nada ($$$). Nada que fala é o dinheiro que não entrava. Nós 7 que
continuamos somos as que têm um espírito solidário, de não estar apenas
preocupadas com a renda, mas com o trabalho coletivo, a união, a amizade.
Por exemplo, quando uma não vai para a cooperativa fica aquela coisa quase
sem sal... (gera um desanimo geral). Eu já estou neste processo de trabalho
cooperativo há 5 anos, mas pra elas é tudo novo (...)
(a entrevistada fala um pouco da reação das outras cooperadas ao trabalho
cooperativo e como elas se envolvem a cada dia com o cooperativismo,
sempre muito influenciado pela entrevistada).
A economia solidária é muito mais do que o econômico, do que o dinheiro. A
economia solidária... Seria hipocrisia da minha parte dizer que a gente não se
preocupa com o dinheiro, até porque a gente precisa dele para comer. Mas
quando você realmente tem aquela coisa de querer dar certo, de crescer, de
estar participando, de estar lutando por um objetivo (...). Quando você ver seu
orgulho de estar participando, seu orgulho de estar fazendo aquilo, você
percebe que, na economia solidária, a palavra “economia” não vem em
primeiro. Então, você percebe que há mais ênfase na palavra “solidária” do
que “economia” (...).
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
Vocês se consideram uma organização de economia solidária? (muito
relacionado com o fazer trabalho social).
Sim. Pois muitas coisas são doadas e fazemos baixo custo, muitas coisas são
reaproveitadas, uma é solidária com a outra ensinando com seus conhecimentos.
Como é o trabalho na economia solidária? (entendimento sobre economia
solidária)
Trabalhar na economia solidária é bom, mas, quando a gente vai competir com
o mercado, a gente fica pra trás.
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
Vocês se consideram uma organização de economia solidária? (elas não
conseguem compreender bem o conceito).
Você quer saber se a gente tem algum programa social, é? Isto que é
“economia solidária”? Esta solidariedade que você está se referindo
internamente ou pra comunidade? (Economia solidária) é uma ajuda mútua,
né?
O que vocês consideram que é a economia solidária? Algo pra fora ou pra
dentro?
Entre a gente, a gente é solidário, porque a gente está cooperando e se
ajudando. Mas, pra comunidade, ainda não. (não consegui entender bem as
razões, mas provavelmente porque elas não desenvolvem nenhuma ação em
comunidade).
(A entrevistadora acabou não perguntando sobre como era o trabalho na
economia solidária devido à dificuldade no próprio entendimento sobre
economia solidária)
Brinquedos Inteligentes
Luiza: Vocês se consideram uma organização de economia solidária?
Luiz F: Em que sentido?
Luiza: Todo o entendimento do seja economia solidária.
Luiz F: Então, nós nunca tivemos esse tipo de discussão. Pra você, o que é
economia solidária?
Luiz F: A gente trabalha assim: a gente procura, de alguma forma, não repetir o
que o mercado faz, mas é difícil. Os salários não podem ser muitos altos se não
tem como pagar, mas, assim, a gente tem uma certa liberdade no ambiente de
trabalho, não tem? Não um ambiente totalmente rígido, mas eu não sei, não é
201
economia solidária, é mais uma empresa convencional. É um grupo de artesãos.
Luiza: Vocês trabalham de forma cooperativa?
Luiz F: Não, na verdade a galera ganha salário.
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
Eu acho que sim, porque se a gente busca uma economia em conjunto. A
palavra ta dizendo, solidária. Agora, o que acontece, eu vou te falar o que está
acontecendo com a COMUFE agora. Aquele espaço, lá no Centro Urbano, que
a sala é a mesma sala do pré-vestibular, era pra gente trabalhar com a costura.
É um espaço que está sendo visitado por qualquer pessoa à noite e está vindo
gente de fora, usuários de drogas. Aí, cortaram as salas. Aí, o que eu fiz? Eu
garrei as máquinas todas e trouxe de lá pra cá, pra casa. Inclusive, uma
assistente social que é da SETRAS, alguém ligou para lá e disse que eu trouxe
as máquinas pra cá. Aí, ela veio me procurar e disse que era patrimônio do
Estado e disse que eu não podia tirar do espaço público para trazer para uma
residência que é particular. Aí, eu disse a ela: eu trouxe e não vou tirar porque,
aqui, está mais seguro do que lá. Lá, já foi roubado televisor, já foi roubado
computador do próprio Centro Social Urbano. E eu assinei um documento
como liderança comunitária responsável por estas máquinas. Se sumir aqui,
dentro da minha casa, eu tenho como responder. E, lá, como é que eu
respondo? Aí, eu trouxe pra cá e o que é que fez. Eu fiz um documento e cada
costureira levou uma máquina para casa, e a gente distribui os trabalhos assim:
cada uma leva uma quantidade de trabalho, presta contas e a gente tá
participando de feiras. Ano passado, nós fomos pra São Paulo, para economia
solidária, no início deste ano quer dizer, com a organização da Vida Brasil. E
três, quatro pessoas de lá da economia solidária, do fórum, ficou responsável.
Dezembro do ano passado, nós participamos (da feira) lá no Terreiro de Jesus,
também com patrocínio da Vida Brasil. Participamos pela enciclopédia da
cidade com... Mercado Cultural, lá na Universidade Católica, com outras
economias também, com outras instituições, outras cooperativas. Então,
sempre que tem alguma coisa, nós participamos. Nós vamos trabalhar no mês
de agosto todo para fazer encontros no final de linha, para não deixar o projeto
morrer. Porque as coisas da cooperativa (as roupas) está aqui naquele depósito
que eu vou te mostrar daqui a pouco. As máquinas, algumas estão aqui, as
outras, uma tá com Maíra, outra com Cremilda, outra com Lívia e outra com
Rita. Sem contar que tem mais duas pessoas que são novas que tem um
artesanato legal aí, próprio. Os retalhos estão todos aqui dentro da minha laje e
ainda tem lá no centro um armário cheio de retalhos. E a gente vem
trabalhando assim, fazendo tudo para não morrer o projeto.
Como é o trabalho na economia solidária? (entendimento sobre economia
solidária).
Bom, o trabalho da economia solidária ... eu acho que hoje, se tivesse, assim,
um pouco de apoio dos poderes públicos, menos burocracia nas
documentações, porque assim, a gente não tá documentado legalmente. O
documento que a gente usa aqui, por exemplo, em algumas pronto-entregas
que eu ofício pedindo retalhos, eu levei o ofício com o documento da
associação de moradores que é legal. Mas a cooperativa não é legal. Com a
associação, a nova legislação permite o trabalho com educação, com produção,
então, ela pode legitimar a cooperativa. Mas não tem um documento que vise à
cooperativa.
Então eu acredito que o cooperativismo é o trabalho do século porque não tem
emprego. Hoje em dia isso é muito grande (o desemprego). Agora é um
trabalho de persistência. Os envolvidos precisam ter persistência, união, que às
vezes não tem. Quando tem aquele líder que retoma, que quer passar as coisas,
que exige, então tem uns que não aceitam. Então, é um trabalho de união e de
persistência. Mas, que tem tudo pra dar resultado, tem.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
Sim, um vai ajudando o outro. A gente ainda está aprendendo o que é economia
solidária
Cooperativa Raízes do Povo
de Israel
Eu acredito que sim, porque a gente está buscando, está correndo atrás, através
da união das mulheres, e é uma coisa bonita. Para algumas, é como se fosse uma
202
terapia. Isso é positivo
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
Sim, A diferença de um empreendimento solidário para o capitalismo é a
organização, da forma em que ele é gerido, então eu costumo dizer que a
economia solidária trouxe a gente para uma espécie de gestão diferente. Só que
uma gestão diferente tem muitos conflitos, porque não estão acostumadas a
projetos dessa forma, então se você habituasse a tudo ser de todo mundo, a ter
um grande comprometimento, a questão do financeiro que retorna muito, recebe
500 R$, mas a produção não teve nada, então como é nosso, a gente abre mão
de receber pra comprar matéria-prima, então é característica de economia
solidária, não pensa só no capital, precisa dele pra sobreviver, mas pra não
perder. A questão, também, é de respeitar o individuo, nem todo mundo é igual
e não aprende a ser igual. Então, procurar muito é respeitar isso, se a pessoa tem
seu tempo de aprender, se bem ela seguiu seu tempo, no capital não. Se ela tem
25 anos, ela não é mais aceita no mercado de trabalho, pra ele não tem mais
serventia nenhuma, pra gente, o que vale é que a pessoa sabe fazer, porque ela
tem o que produzir, não importa a idade.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens
Artesãos
...Eu acho que sim... Um trabalho cooperativo com divisão de tudo igual. A
gente aprende muito aqui. A gente funciona em núcleos e cada um pode passar
por todos os núcleos. Tem núcleo de fazer papel, bijuteria, trabalho com bambu.
Existem os coordenadores dos núcleos, mas cada um pode ficar no núcleo que
tem mais afinidade
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
A economia solidária tem uma diversidade muito grande e não se refere apenas
ao trabalho com cooperativas. Tem empresários que poderiam inserir suas
empresas dentro do processo da economia solidária. A economia solidária pra
mim, é conseguir construir, dentro do cooperativismo, uma cooperativa viável,
com administração auto gestionária estável, onde haja a percepção que dentro
do ambiente de trabalho, a gente consiga ter uma relação harmoniosa, uma
compreensão múltipla de ajuda.
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
É um trabalho que esta crescendo. Ainda na semana passada, quarta e quinta,
tivemos um seminário só com os empreendimentos da Visão Mundial.
Inclusive, vieram pessoas de grupos de Valença para ter essa discussão sobre a
economia solidária. Ouvimos a proposta e espalhamos pelo bairro, procurando
pessoas que queiram se engajar na luta da economia solidária.
Esta é a única solução. Como não existe emprego pra todo mundo e as empresas
não contratam pessoas sem formação, as pessoas da comunidade acabam
buscando o artesanato e a costura, assim entramos em contato com essas
pessoas pra entrarem no grupo e terem um meio melhor de vida.
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e
Trabalho de Artigos Têxteis
Eu acredito que o grupo faz parte do contexto de economia solidária. Estar
junto, buscando melhorias para as pessoas, para as cooperativas. Trabalhando
junto, em rede. É muito importante, porque cada grupo coloca o que pensa, um
ajuda o outro, dá opinião. É muito importante a economia solidária
(eles atribuem grande importância, mas tem dificuldades de definir o que é).
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
Como assim? Na venda? Eu produzo em casa e as pessoas que me ajudam tem
uma remuneração em cima da venda, de acordo com o que vende. Tanto pelo
valor do material, como pelo valor da venda. Falar a verdade? Eu não sei o que
é economia solidária. É quando recebe ajuda de uma parte? Ah, é bom. Porque
uma pessoa não pode trabalhar só. Porque o trabalho com estes bonequinhos
exige muito, então a solidariedade é das pessoas que estão me ajudando. Estão
ajudando na produção. Então é um trabalho em conjunto.
(após ser esclarecida, ela demonstra que há um trabalho coletivo, mas será que
isso é necessário para caracterizar um empreendimento solidário?).
Grupo de Amigos Artesãos
É também, né? Eu considero, porque é um trabalho de integração, que busca
unir as pessoas no trabalho. Porque, se você faz uma bolsa, e eu faço outra, aí,
vai integrando as coisas e funciona melhor. Dois é mais do que um.
Grupo Raio de Sol
Isso aí precisa vê o que é economia solidária. O que é economia solidária? É
quando você participa com outro? Então eu creio que sim, nós ajudamos. Esse
grupo mesmo aí (referência a ASCOSI) está com dificuldade de encontrar
serviço, nós temos conhecimento demais, passamos pra elas, tem o povo do
bairro, que quando precisa de aprender, a gente treina na máquina. Agora, não
dá para encher isso aqui de gente, um ou dois é possível. Ah! o trabalho, o
203
trabalho, não tem.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de
Preservação Ambiental e
desenvolvimento Sustentável
Sim, nós temos um projeto hoje orientado em regime de cooperativa
(Isso não justifica).
Nós nos consideramos pelo seguinte: nós temos projetos que são orientados
para o desenvolvimento de pessoas e um deles é um projeto que gera renda, que
é o Projeto Ação Reciclar. E hoje ele é um projeto que é administrado da
seguinte forma: é um projeto que desde o princípio, tudo que é coletado é
dividido igualitariamente e, hoje, além da participação neste rateio, há uma
bolsa, oferecida pela SECOMP, pelo período de 6 meses. Então, eles têm a
bolsa e a participação no rateio. Então, é um projeto que congrega pessoas que
estão fora do mercado de trabalho, que, provavelmente, não teriam a
oportunidade de ter renda e, hoje, estão tendo esta oportunidade, de melhorar a
qualidade de vida com a coleta seletiva
(o discurso lembra o filme Quanto vale ou é por quilo, como se eles fossem os
redentores destas pobres pessoas!).
Bom, nós hoje temos a área de coleta do Rio Vermelho, Ondina...
(descrição de como é feita a coleta e não do trabalho cooperativo em si)
Eu não sei dizer como funciona o trabalho com outras cooperativas. Hoje eu
digo que a ONG é administradora do Projeto Ação Reciclar
(mas, as cooperativas deveriam ser marcadas pela autogestão!).
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
Vocês se consideram uma organização de economia solidária?
E/F: Eu acho, porque é um projeto que ajuda as pessoas da comunidade.
Através disso aí já é alguma coisa né.
204
Apêndice H
QUADRO DE OBJETIVOS DOS EMPREENDIMENTOS
NOME OBJETIVOS E RESULTADOS PROCESSO DE DECISÃO
AMAC
Cooperativa
Múltipla das Artesãs
de Cajazeiras
Hoje, era a nossa sede, que a gente já tem.
Os móveis, como um armário para arrumar
as coisas. E agora a gente quer capacitar
para a feira (...). Agregar novos membros
na cooperativa. Fazer um projeto para dar
continuidade do financiamento da CESE.
Buscar parcerias para entrar no mercado
internacional, tendo em vista a Libero
Italiana.
RESPONSÁVEL PELO
PROCESSO
O grupo, após um certo
amadurecimento (como a
redação do projeto pra CESE,
em que eles tiveram que por no
papel o que queriam).
Mas foi uma decisão em
conjunto, todo mundo
participou. Mesmo aquela mais
calada, a gente perguntou,
futucou e todo mundo
participou.
AMEV
Associação das
Mulheres do
Engenho Velho da
Federação
OBJETIVOS
Renda – ganhar dinheiro.
RESULTADOS
A organização da comunidade, que ela
possa brigar e melhorar a qualidade de
vida. Saber que, com oportunidades, a
gente melhora a auto-estima, porque uma
pessoa sem trabalho não é nada. Todos
precisam de oportunidades. O brasileiro
não é preguiçoso, só precisa de
oportunidade. O importante é que cada
mulher consiga resgatar sua dignidade,
exercer sua cidadania e conseguir ser
respeitada dentro e fora da comunidade.
Quem não estuda é enganado.
Elas citam o caso de uma das entrevistadas
presentes que teve a oportunidade de
estudar a partir de um dos projetos da
Associação.
As decisões são centralizadas na
diretoria, apesar de existir um
processo de consulta por
assembléia.
ASCOSI
Associação de
Costureiras de
Itapagipe
OBJETIVO
Gerar lucro (lucro em associação???) e
melhorar a qualidade de vida. (Elas não
conseguem empregos em outros postos de
trabalho e precisam de alguma
remuneração. O mercado não contrata
alegando que com 30 anos a pessoa já está
velha.)
RESULTADOS
Montar uma loja para poder vender os
produtos
O processo de decisão dos
objetivos deu- se através de
reuniões, participação em
cursos.
Brinquedos
Inteligentes
OBJETIVOS
Luiz F: A economia solidária. O objetivo é
poder. É porque a gente está se estruturando,
tá começando. Então, a gente pretende se
estabilizar, porque a gente sabe que quase
ninguém faz isso no Brasil. No terceiro
mundo, existe um mercado gigantesco, mas a
gente não tem acesso a ele e a gente tá
começando a dialogar, cada vez mais, com
parceiros importantes para ter acesso, e a
idéia, basicamente, é essa, o dia em que cada
um de nó possa viver dignamente com o seu
Luiz F: Eu que tomo decisões
por enquanto, infelizmente.
205
próprio trabalho sem ter que ter patrão.
RESULTADOS
Luiz F: é viver dignamente, no Brasil já é
um processo.
COMUFE
Cooperativa de
Mulheres da
Federação
Agora? Olha, agora, o principal de tudo que
a gente vem lutando é um espaço físico,
para que ela se consolide. Porque o objetivo
principal seria gerar trabalho e renda e não
matar um projeto. Porque eu acho muito
ruim, mesmo que a gente trabalhe assim
devagar, guardando as coisas, construindo e
guardando. Mas a gente não está matando
um sonho, um objetivo, está construindo
metas. E a meta é que a gente fique todas
juntas. O resultado é financeiro, né? O
objetivo é financeiro e o resultado tem que
ser financeiro.
Todas não. Tanto é que teve
gente que saiu com curso de
costura industrial para ir fazer
trabalho doméstico. Não
desmerecendo o trabalho
doméstico. Mas o mercado
precisa de costureira e, aí, uma
pessoa que toma um curso... e o
curso foi caro. Inclusive, foi
patrocinado pela secretaria (?),
porque nós enviamos uma carta
pedindo este apoio. O curso
custou 450 reais por pessoa,
mais o lanche e o transporte.
Quer dizer, a pessoa se
capacita, tá com tudo na mão,
tem as ferramentas, e não tem
paciência, porque, se tivesse
um pouquinho mais de força de
vontade, elas iam construindo,
cada uma pegava um pouco,
vendia, virava sacoleira. Mas
nem todas têm. Dinamismo e
persistência dependem de cada
pessoa também. Às vezes eu tô
caindo e levantando, mas isso
tá dentro de mim, na minha
criação e no meu jeito de ser,
mas eu não posso colocar isso
na cabeça de cada uma.
Mas aqui tem o caso de Maria,
que é uma semi-analfabeta e
ela não desiste de jeito nenhum
da cooperativa. Agora ela foi
buscar um negócio de uma
invasão que tem ali. E naquela
invasão fez amizade e o povo
veio chamar a gente para a
associação. E separou um
terreno muito grande, frente de
rua, para ser a sede da
associação. E ela fala que ali
nós vamos botar a cooperativa
ali. Que nós vamos vender e
que vai ser o trabalho. Tem
Nalva que é a costureira que
deu todo apoio...
COOMARTES
Cooperativa de
Mulheres Artesãs do
Subúrbio de
Plataforma
O nosso objetivo é ver isso aqui cheio.
Conseguir vender e oferecer cursos para a
comunidade Somar; ter um retorno pelo que
a gente faz e vende. Conseguir
comercializar, ter uma loja em um shopping.
A gente já dava cursos, mas teve
que parar. Agora a gente quer ter
dinheiro para continuar.
Cooperativa Raízes
do Povo de Israel
A nossa busca é levantar a auto-estima e,
quem sabe, futuramente, tirar uma pequena
renda.
Em comunidade
COPAED OBJETIVOS
A UNIFACS conseguiu para
206
Cooperativa
Múltipla de
Produção de
Alimentos e
Engenho Doce
São muitos, mas o principal é gerar rendas
para as pessoas, com o modo de lidar de ser
dos trabalhadores, prazer mesmo da
comunidade do Engenho Velho, nesses anos
que já levou. E outra, mostrar que, no
Engenho Velho, tem muita gente boa que
produz muito.
RESULTADOS
A nossa meta, na parte financeira, é se
registrar, porque não é registrada ainda, e
que consiga tirar daqui nosso sustento.
Porque algumas pessoas têm outras fontes de
renda que ajuda a complementar, não dá para
tirar daqui o salário todos os meses. Precisa
disso, para pagar o INSS que ainda não paga,
plano de saúde para as pessoas que precisam
disso, a gente precisa muito de formação, no
geral, formação política, formação
emocional, a gente precisa disso.
gente. Teve no ano passado uma
assessoria, serviço de estagiário,
porque o nosso estatuto, o
regimento interno, mas foi um
curso muito extenso, quase um
ano de curso, tá tudo muito bem
traçado, mas tem discussões foi
com o grupo. Nossa gestão é por
comissão, não tem presidência,
comissão. Na reunião, é dito,
primeiro, como foi o trabalho da
semana passada, o que faltou, o
que precisa melhorar.
COOPARTES
Cooperativa de
Jovens Artesãos
A gente tá se equilibrando agora. Então,
agora é entrar no mercado, porque a gente
não tem cliente.
Fazer da cooperativa um emprego. Porque
a gente não tem emprego no mercado.
Porque vem de colégio público, é negra, de
bairro pobre então não é fácil conseguir
emprego.
Em grupo.
COOPERART
Cooperativa
Múltipla de Artesãos
(nome fantasia)
OBJETIVOS
O objetivo geral da cooperativa é estar
promovendo trabalho e renda. O objetivo
específico é estar capacitando também,
porque para produzir mais é preciso ter
pessoas capacitadas. O objetivo da
COOPERART é, então, estar produzindo,
capacitando e multiplicando.
RESULTADOS
Que as pessoas participem e gere trabalho e
renda. Além da preocupação com a
juventude, através da capacitação de jovens
que estão em situação de risco
(criminalidade, drogas), uma vez que muitas
vezes os pais não conseguem passar isto para
os filhos. Há uma preocupação com os
jovens da comunidade (Metade do grupo é
de Cajazeiras e metade de Castelo Branco).
Este processo foi um processo
longo, pois a cooperativa ainda
está em processo de decolagem.
Então, são discussões que vem
ao longo de 6 anos. Tivemos
muita discussão, muito
desentendimento. Por este grupo,
já passaram, exatamente, 176
pessoas, pois a rotatividade é
muito alta.
COOPERCORTE
Cooperativa de
Mulheres
Costurando uma
Realidade Diferente
O objetivo é crescer, buscando pessoas que
queiram fazer parte dessa cooperativa para
trabalhar e crescer junto conosco.
O resultado é termos os nossos salários, que
nosso empreendimento cresça e seja
divulgado não só na Bahia, mas também no
Brasil e, quem sabe, no exterior.
Isso foi discutido com nossas
parcerias
COOPERTEXTIL
Múltipla de
Produção e Trabalho
de Artigos Têxteis
O principal objetivo é colocar pessoas novas
e qualificá-las para que elas possam trabalhar
junto com a gente. A gente sonha em
exportar.
A gente tomou cursos de redes
associativas e viu que pra a gente
dar continuidade ao nosso
trabalho,a gente tem que agregar
novas pessoas.
Edna Batista
Nascimento
Bonequinhos de
Eu tracei objetivos, mas até agora não
consegui alcançar. Eu gostaria de ter um
local pra trabalhar. Porque eu trabalho lá em
(Foi você mesma que decidiu?)
É. Era aqui em baixo, mas estava
impossível, pequeno demais.
207
Jornal cima em um cômodo que é muito pequeno.
Eu espero aumentar as vendas e ter um lugar
para colocar. Porque o artesão não tem lugar,
apesar da arte ser a arte local, o artesão não
tem lugar. Uma coisa que eu gostaria é que o
governo, já que a gente paga imposto, já que
a gente tem direito às coisas, que a gente
tivesse um lugar, um espaço para o artesão
expor seu trabalho. Porque não tem. Se
tivesse, eu pagaria uma porcentagem, mas
não tem. Eu faço um trabalho com muita
dificuldade aqui em cima, pago para vender,
mas não tenho lugar para expor.
Estava muito atrapalhado.
Dentro de casa, maior bagunça.
Caixa pra um lado para o outro...
Grupo de Amigos
Artesãos
O objetivo é crescer e exportar. Porque se
você exporta, vai render dinheiro para o
grupo e para o cliente também, não é isso?
Desde que o grupo foi criado o
objetivo era este (será que foi
determinado por alguém de
fora?) e cada um vai se
descobrindo, vai tendo a
necessidade de ampliar a mente,
a visão. A partir daí.
(estranho!?).
Grupo Raio de Sol
OBJETIVO
Olha o meu, o meu objetivo é uma coisa...
é... ter minha saúde, tô tentando ajudar a
família em casa, é poder ajudar o marido,
todo mundo quer ajudar o marido. É isso.
Esse é o objetivo, melhorar a renda
familiar. Nós temos três anos e ainda não
conseguimos alcançar o objetivo.
Resultados
Agora, conseguimos 4 máquinas, o
dinheiro que nós juntamos é para pagar as
máquinas. Então, não sai quase nada pra
gente. Estamos esperando alcançar. No
futuro, assim que a gente acabar de pagar
essas máquinas, vamos ter uma
participação no lucro.
ONG Paciência
Viva
Centro Brasileiro de
Preservação
Ambiental e
desenvolvimento
Sustentável
Não foi perguntado. Não foi perguntado.
Projeto
Cooperativa Ação
Reciclar
É ter certeza que isso aqui cresça Tivemos várias reuniões.
208
Apêndice I
ORGANIZAÇÃO, ESTRUTURA E RELAÇÕES DAS ORGANIZAÇÕES
NOME
PRODUTOS E
ORGANIZAÇÃO DA
PRODUÇÃO
RESPONSABILIDADE TOMADA DE DECISÃO CONSCIENTIZAÇÃO
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
PRODUTOS
colchas de retalho
ORGANIZAÇÃO
Não há um cronograma muito
específico de produção, cada
pessoa desempenha uma
função de acordo com a sua
vontade, habilidade e/ou
urgência na entrega de
encomendas.
“A organiza ção é feita em
partes, porque se agente
decidir você vai ficar com
isso e você vai ficar com isso,
nunca sai. Já tentamos fazer
isso e nunca saiu. Hoje eu
chego, e falo vou trabalhar na
reta... (tipo de máquina de
costura)”
A responsabilidade pela
produção é de todas, mas a
representatividade e
coordenação é feita por uma
pessoa.
Tudo (bem enfático) é
decidido por todas. Nenhuma
decisão é tomada sem a
participação de todas.
No entanto, percebe -se certa
dependência do grupo pela
entrevistada, que como ela
mesma já disse cumpre uma
função de coordenadora e
representante do grupo. Há
um exemplo citado em que
como a coordenadora não
poderia acompanhar o grupo
na compra de uma máquina,
a compra quase não foi feita.
Por insistência da
coordenadora, e compra foi
feita pelas outras cooperadas
com sucesso.
A cooperativa pretende
conscientizar outras pessoas
para o trabalho cooperativo.
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
PRODUTOS
Camisas, cartões, almofadas,
tapetes, “amarradinhos”,
crochê, pe so de porta,
bijuterias, toalha de prato
(artesanatos diversos que as
cooperadas produzem de
acordo com o que sabem)
ORGANIZAÇÃO
A produção é realizada em
dois dias da semana durante
um turno. Nos outros dias as
cooperadas têm formação
A responsabilidade pela
produção é alternada entre
duas p essoas, de acordo com
o dia. Ainda há uma pessoa
responsável pelo controle de
qualidade. As cooperadas
ressaltam ainda que uma
pessoa organiza e motiva a
produção.
As decisões são tomadas pela
administração geral, que é
rotativa.
Há uma grande preocupação da
associação em conscientizar a
comunidade em que elas vivem
através da oferta de uma série
de serviços de apoio na
comunidade.
209
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
PRODUTOS
Fardamento de empresa,
escolar (costura de roupas em
geral)
ORGANIZAÇÃO
A produção é feita sob
encomenda, mas o contratante
deve dar o material para que
elas apenas costurem, pois
elas não têm caixa para
compra de material. A
produção é dividida de acordo
com o que cada uma faz
melhor.
A responsabilidade pela
produção é de todas.
Como é o processo de tomada
de decisão na organização?
As decisões são tomadas pela
maioria com todas envolvidas
no processo.
Não há uma preocupação na
conscientização de outras
pessoas no momento. A
prioridade é conseguir a
sustentabilidade da associação
no momento.
Brinquedos Inteligentes
PRODUTOS
Jogos de lógica utilizando
materiais como madeira,
barbante, bola de gude, entre
outros.
ORGANIZAÇÃO
A produção é em série, uma
vez que a produção por
unidade não é financeiramente
viável. A depender da d emanda
do mês, que oscila muito, são
produzidas entre 50 a 100
unidades de um jogo. Cada
pessoa tem uma função
especifica na produção: um
marceneiro que resolve os
A responsabilidade pela
produção é do proprietário (não
é uma cooperativa), uma vez
que ele é o idealizador do
negócioeéapessoa que
administra a fábrica, a loja (no
Shopping Barra), além de
participar de reuniões, fazer
visitas a escolas, dar cursos e
palestras.
A tomada de decisões é feita
pela mesma pessoa que tem a
responsabilidade pela
produção.
Sim, eles pretendem
conscientizar outras pessoas
com a produção e divulgação
dos jogos, pois é um trabalho
que está voltado para o plano
educacional. Os jogos são
como instrumentos que
auxiliam o aprender a pensar
matematicamente para poder
dialogar com a modernidade,
que, por sua vez, está amparada
em tecnologia, em aritmética e
matemática.
pelo SEBRAE. A organização
é aleatória. Algumas coisas são
feitas fora da associação, mas
com o material de lá. Há
sempre um processo de
aprendizagem na produção que
é ressaltado pelas cooperadas.
“Uma ensina a outra”.
210
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
PRODUTOS
Roupas, colchas de retalhos,
tapetes, bolsas
ORGANIZAÇÃO
A organização da produção se
dá com base na decisão
coletiva do que será
produzido e a conseqüente
divisão do trabalho por
afinidade do que cada uma
faz melhor (“Bem a gente
quando se encontra decide o
que vai fazer, aí aquela que
trabalha melhor com roupa
faz a roupa, aquela que
trabalha melhor com retalho
faz o retalho”).
Cada cooperada se
responsabiliza por uma parte
da produção.
A decisão é coletiva e
consensuada.
Há uma preocupação em
conscientizar as pessoas da
comunidade no sentido de
mostrar a alternativa do
cooperativismo como uma
solução para o desemprego,
muito embora sejam apontadas
dificuldades para as pessoas
encararem esta alternativa.
“Então eu acho que dá pra
conscientizar, mas é difícil,
porque quando o pessoal
começa a trabalhar e não vê o
lucro imediato, não é fácil (...)
O cooperativismo é um
trabalho de paciência, como a
educação”.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
PRODUTOS
Artesanato com búzios
ORGANIZAÇÃO
A massa (que é feita por uma)
é distribuída junto com a
matéria-prima (búzios) e cada
cooperada faz uma quantidade
indeterminada de peças.
Todo mundo é responsável, a
responsabilidade é dividida.
A decisão é baseada num
consenso entre todas, baseado
nas possibilidades de cada uma
produzir. “Se todas toparem a
gente se divide e faz. Depois a
gente vê quem fez o que, ou
quem não conseguiu fazer e
conversa (...)”
“A gente pretende
conscientizar outras pessoas
pela forma como a gente faz as
coisas. As pessoas precisam
acreditar que elas podem
fazer”.
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
PRODUTOS
Bolsas e costura em geral
ORGANIZAÇÃO
A produção é feita p or todas
(“todo mundo se interessa em
Todas têm a responsabilidade
pela produção. “A gente coloca
que cooperativa não tem dono.
Cooperativa é um grupo de
cooperado. Então todo mundo
As decisões são tomadas pelo
grupo, que algumas vezes
contam com o apoio do padre
da paróquia (o padre é uma
figura muito importante para
A cooperativa pretende
conscientizar outras pessoas
pela inclusão no trabalho
cooperativo. “ A gente sonha
em chegar a 200 pessoas. A
trabalham com a lixa e
colagem, um trabalho
minucioso, exigindo muita
repetição.
problemas e usa a
escabrejadeira para cortar a
madeira; outro dá o
acabamento nos brinquedos ,
fazendo os furos; outros dois
211
fazer tudo”) e organizada de
forma bem aleatória.
tem que ter responsabilidade”. esta cooperativa). gente sonha em fazer camisas.
A gente quer botar a juventude
para participar. A gente sonha
muito!”
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
PRODUTOS
Pão e derivados, salgados de
forno, sopa, almoço, buffet
para festa, bolo, doce, suco,
comida baiana, comidas
típicas – “tudo que for ligado
a alimentação”
ORGANIZAÇÃO
A produção é feita nas
diversas cantinas da
UNIFACS que a cooperativa
funciona. Toda produção é
feita no dia que será
consumida (“É feito tudo no
dia, no máximo na tarde de
hoje pra manhã”). Nas
cantinas há uma pessoa
responsável pela produção, o
resto apóia a venda. Há duas
pessoas responsáveis pela
compra dos materiais e uma
pelo financeiro (caixas e
fluxo do financeiro) que
presta conta na assembléia.
Há uma pessoa que é chefa de
produção, e essa pessoa fica
responsável pela produção na
cantina, mas de certa forma as
outras pessoas ajudam, então
a responsabilidade é diluída.
As decisões são tomadas nas
assembléias, mas se hav endo
necessidade, são tomadas
decisões fora da assembléia.
A cooperativa pretende
conscientizar outras pessoas
através de cursos para a
comunidade transmitindo o
que foi aprendido por eles.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens
Artesãos
PRODUTOS
Artigos de bambu, bijuteria,
papel reciclado e artefatos,
luminárias
ORGANIZAÇÃO
A cooperativa é dividida em 5
núcleos de produção: bambu,
bijuteria, papel reciclado,
artigos de papel e luminária.
Cada núcleo organiza a sua
produção de acordo com as
A responsabilidade pela
produção é do gerente do
núcleo.
As idéias podem ser levantadas
nos núcleos, então há uma
conversa (provavelmente com
o pessoal do Pangea, apesar
dela não ter especificado).
Então o procedimento é sempre
sentar e conversar em seus
núcleos. A impressão é que as
decisões não são tomadas por
eles, mas pelo Pangea.
Eles pensam em conscientizar
outra pessoas através do
próprio trabalho que fazem.
212
suas metas, que são
determinadas pelo gerente do
núcleo. Este gerente passa as
metas para o resto do grupo,
além de fazer a comunicação
entre os núcleos. Há a
possibilidade de mudar de
núcleo
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
PRODUTOS
Artigos em couro (bolsas,
cintos, sandálias de couro e
capas de couro para garrafas)
ORGANIZAÇÃO
A produção de fato ainda não
ocorre. Tudo que eles
produziram até hoje foi durante
as capacitações e ainda não há
a comercialização. Eles ainda
estão vendo a viabilidade desta
produção. Algumas pessoas da
cooperativa já estão querendo
mudar a produção da
cooperativa.
Não há produção Em reunião. Há na cooperativa a decisão de
conscientizar outras pessoas. A
conscientização passa pelo
processo de incluisão novas
pessoas na cooperativa.
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
PRODUTOS
Fardamento industrial
(priritariamente), cama, mesa,
banho e vestuário
ORGANIZAÇÃO
Quando recebemos uma grande
encomenda dividimos por
todas. Dividimos por
habilidade em determinado
trabalho
Duas cooperadas são
responsáveis pela produção,
pois elas têm a habi lidade de
produzir qualquer peça, então
são elas que controlam a
produção.
Tudo é decidido em
assembléia.
A conscientização das pessoas
é através da oferta de cursos
para a comunidade. A
cooperativa já teve uma
experiência não muito bem
sucedida com jovens e agora
estão repetindo a experiência
com apoio da Petrobrás, com
mulheres acima de 30 anos.
PRODUTOS
Jogos americanos, caminhos
de mesas, almofadas, tapetes,
panos da costa, painéis, toalha
de lavabo, manta para sofá,
feitos de algodão, palha de
uricuri, piaçava e rami.
Todos são responsáveis pela
produção.
As decisões são tomadas em
reuniões.
A cooperativa manifestou a
preocupação em conscientizar
outras pessoas, mas não disse
como, apesar deles terem um
projeto de inclusão de novos
cooperados, o que é tido como
uma forma de conscientização.
213
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e
Trabalho de Artigos Têxteis
ORGANIZAÇÃO
A produção é feita de acordo
com a demanda ou com o tipo
de peça que tiver em menor
quantidade. A produção é
dividia aleatoriamente entre o
grupo, pois todos fazem tudo.
Há a preocupação de variar o
modelo, a técnica e o design
para as peças não ficarem
iguais.
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
PRODUTOS
Bonequinhos de jornal
ORGANIZAÇÃO
A produção é feita de acordo
com as encomendas e demanda
de venda. A produção é feita
em etapas, pelas partes dos
bonequinhos. Cada pessoa fica
com uma parte, mas a maioria
passa pela supervisão da
proprietária, que organiza a
produção.
A responsabilidade pela
produção é da proprietária.
As decisões são tomadas pela
proprietária que consulta a
disponibilidade das outras
pessoas. “Eu pergunto assim: ô
gente tem uma encomenda aí,
dá pra fazer? Se todo mundo
disser que dá, pega, se disser
que não dá, não pega”.
A conscientização está no
próprio trabal ho que retrata
cenas do nosso cotidiano, como
menino de rua, menino
cheirando cola - um retrato da
sociedade. O objetivo é chamar
a atenção que a realidade no
país é esta.
Grupo de Amigos Artesãos
PRODUTOS
Bolsas, bonecas, pinturas e
camisetas
ORGANIZAÇÃO
Há uma pessoa, que não faz
parte do grupo, à frente do
trabalho: “Aí quem quer bordar
ela dá uma parte do trabalho,
quem quer fazer crochê ela dá
outra parte”. No entanto, não
fica muito claro quem é esta
pessoa e o motivo dela estar
no grupo: “Olha eu não sei
porque ela veio pra aqui agora.
Ela é novata”. Mas ela é de
Isabela – assistente social,
coordenadora de DEC e
envolvida com muitas outras
coisas no CECOM fica com a
responsabilidade. Há algumas
funções executivas no grupo
(“eu mesma sou secretária, tem
tesoureira, tem presidente, e
tem a pessoa se responsabiliza
pelo material, em distribuir
para a gente), mas a
responsabilidade é de uma
pessoa externa.
De acordo com a entrevistada
agora as decisões são tomadas
em assembléia (“Agora é
assim, tudo é na base da
assembléia. Porque se é um
grupo não pode uma pessoa
decidir sozinha, tem que ter a
opinião de todos. É até por
votação. Agora mesmo teve
eleição”).
O grupo pretende conscientizar
as outras pessoas para a
valorização do trabalho do
artesão.
onde?Ela é do grupo? “Não ela
é de fora, ela veio para orientar
o grupo. Eu não sei por quê.
Ela tinha uma fábrica de
bolsas”.
Grupo Raio de Sol
PRODUTOS
confecção de roupas
(fardamento) , além de
concertos para a comunidade
ORGANIZAÇÃO
Todas participam da
igualmente de todas as fases
da produção.
Todas são responsáveis pela
produção. “Quando começou
aqui eu era a coordenadora,
tinha gerente, tinha tudo, mas
depois o grupo ficou pequeno
e aí todo mundo faz tudo,
então não tem ninguém mais
responsável ou men os, aqui
todo mundo opina”.
As decisões são tomadas em
grupo.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de
Preservação Ambiental e
desenvolvimento Sustentável
Não há produção
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
PRODUTOS
Coleta de material reciclável
ORGANIZAÇÃO
A cooperativa é dividida em
grupos que seguem um
roteiro pré -estabelecido de
coleta. A coleta é feita em
carros que não são muito
práticos, são pesados e
difíceis de manejar.
Todos são responsáveis. As decisões são coletivas,
com o apoio da ONG
Paciência Viva, que
administra a cooperativa e faz
todo o trabalho de
articulação, capacitação,
recrutamento e gestão de
recursos. “A gente conversa
para acertar, cada qual com
seu cada qual.”
Eles têm como objetivo
conscientizar outras pessoas
para a reciclagem . “Esse é o
nosso objetivo: que as
pessoas separem os materiais.
Já tem pessoas que já estão
cientes, que separam o
material. A gente passa com o
carro e já tem lá separado”.
214
215
Apêndice J
CONCEPÇÃO DE SOCIEDADE
NOME
RELAÇÃO COM A
COMUNIDADE
SOCIEDADE BUSCADA
PELA ECOSOL
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
Não há o desenvolvimento de
nenhuma atividade para a
comunidade.As mulheres da
cooperativa são integradas com a
comunidade (participam da
associação de bairro e sabem o
que acontece), mas não há o
desenvolvimento de nenhuma
ação voltada diretamente para a
comunidade. “As mulheres
sabem de tudo que se passa na
comunidade, até porque a
maioria faz parte de grupo de
igreja...”.
A economia solidária está mais
voltada para a casse
trabalhadora, o povo mesmo.
Aquelas pessoas que você vê que
realmente precisam. Que
precisam de uma colcha, que
precisam ver o que é ser cidadão.
As pessoas acabam tornando-se
mais cidadãs porque vão se
envolvendo em outras questões
(como movimento de políticas
públicas de mulheres, a busca
por casas populares) quando
estão no movimento. “Quando
você se envolve com economia
solidária você não está buscando
só o cooperativismo, o
associativismo, a economia
solidária, (...) mas você também
está buscando a melhoria da
sociedade do povo, da classe
excluída.”
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
Há o desenvolvimento de
atividades para a comunidade,
mas este ano não tem acontecido
muito. A AMEV parou um
pouco este ano de se relacionar,
mas sempre há ações na área de
saúde, capacitação e divulgação
da associação na comunidade.
No entanto, este ano está mais
voltado para a produção. Elas
estão com uma apresentação
marcada para a comunidade do
projeto da associação com o
objetivo de divulgar as ações
desenvolvidas.
Eu imagino que esta rede de
solidariedade deveria ser para
todo mundo. Eu busco a
solidariedade, mas tem gente que
ainda está sem buscar. Todos
deviam procurar melhorar suas
vidas através da economia
solidária, porque a sociedade
precisa disso. Igualdade para
todos. Se é de direito que seja
para todos. Eu tenho direito a
educação e não tenho uma escola
descente no meu bairro, a mesma
coisa com a saúde e a moradia.
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
Não há o desenvolvimento de
ações para a comunidade. A
comunidade só sabe que existe.
A gente faz parte do bairro, mas
a gente pretende, quando mudar
de espaço dar cursos para a
comunidade
Uma sociedade com trabalho
para todos. (não responderam)
Brinquedos Inteligentes
Não há o desenvolvimento de
ações para a comunidade. Têm,
os guris pegam todas as minhas
bolinhas de gude. Quase todos
os guris da rua sabem usar
alguns brinquedos, mas nunca
foi feito um projeto mesmo.
Anárquica, sem governo.
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Nós atuamos com a associação
de moradores da Federação e a
A sociedade ideal seria de apoio,
que acredita. Porque para fazer
216
Federação COMUFE está dentro da
associação. Eu acho que se
tivesse um espaço físico seria
melhor.
um trabalho de economia
solidária é preciso credibilidade.
Nas reuniões de economia
solidária nem todo mundo vai.
Aquela feira de economia
solidária não foi um sucesso?
o pessoal, os gestores, se batem
para marcar uma reunião e
poucos vão. As pessoas aderem
na fome e aí não vão. Então o
ideal seria isso, que as pessoas
tivessem mais compromisso,
acreditassem, e também assim, a
capacitação a educação,
entendeu? Porque nem todo
mundo compreende que aquilo é
bom. Então é você bater numa
tecla que precisava de mais
apoio dos meios de
comunicação. Não adianta eu
tomar vários cursos e tentar
passar para o pessoal, se eu não
tenho a credibilidade de uma
pessoa que vem de fora.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
Estamos paradas porque os
cursos não estão acontecendo.
Todo mundo trabalhando,
dividindo tudo. Todo mundo
unificado
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
É um relacionamento bom
porque a gente ta na área da
paróquia. Tudo que a gente faz é
ali. Fazemos feirinha da gente
mesmo e bota a feirinha ali no
largo mesmo. Nós não temos
dificuldade de vender nosso
produto
Uma sociedade mais unida, mais
irmã. Eu acho que a economia
solidária valoriza mais a união.
Porque tudo que a gente dá as
mãos pra trabalhar juntos é uma
valorização da gente mesmo
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
A gente tem um trabalho na
associação aqui do bairro, têm
várias, e também do terreiro, de
fazer um curso do que a gente
aprendeu na comunidade, o caso
da COOPAED hoje, como
trabalha na UNIFACS, tem
muitos alunos lá, a demanda é
muito grande, então a gente não
consegue dá conta.
Essa ta difícil, porque a gente
nasceu no capitalismo e vive no
capitalismo. O que a economia
solidária propõe é muito difícil,
quer um modelo de economia
baseada no ser humano e para
um empreendimento, para gente
que é empreendimento a
economia solidária é muito
difícil, a gente foi criado na
competição e o que a economia
solidária preza é tirar a
competição para você trabalhar
igual. Então para ser da
economia solidária é preciso
trabalho primeiro eu mesma, eu
não posso ta pregando uma coisa
que não vive em isso. Então a
gente pode dizer que quer
contrapor o capitalismo, mas
quando chega perto para depois
vê de que forma pode mudar. A
gente queria mudar isso, mas não
tem como mudar, o difícil é
217
viver daqui de dentro. Como a
necessidade financeira é muito
alta, aí pega uma demanda muito
grande, claro que vai ser pesado,
mas não tem a consciência
dividir com os outros.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens Artesãos
O bairro está conhecendo a
cooperativa agora, porque a sede
anterior era escondida e não era
em um local visível. Agora eles
estão mais visíveis e o pessoal já
conhece o trabalho.
Dando mais oportunidades para
as pessoas. Porque hoje a gente
não tem tanta oportunidade
como a gente queria ter.
Principalmente o jovem. A gente
vai no mercado e não é bem
recebido. A gente não consegue
emprego fácil.
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
Boa parte das pessoas que
participam da cooperativa
participam de associações. Então
as associações hoje têm muita
representatividade na
comunidade. Então a gente tá
sempre dialogando com a
comunidade. Qualquer coisa que
se precise viabilizar a associação
é procurada
A sociedade mais justa
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
Relacionamos-nos muito bem
com a comunidade da fazenda
Garcia. Pessoas da comunidade
já vieram procurar emprego aqui
algumas vezes.
Uma sociedade que todo mundo
tivesse seu emprego, sua casa
própria, tivesse acesso a lazer e a
saúde, ou seja, a todos os
direitos básicos.
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e Trabalho
de Artigos Têxteis
A gente não tem afinidade
nenhuma com a comunidade
local. Isso até criou um
constrangimento, por que como
é que existe uma cooperativa
dentro da comunidade que nem a
associação de bairro sabia? Isso
eles ficaram um pouco
chateados. Mas agora nossa
relação com eles está mais
próxima. Porque com este
trabalho da FAPESB a gente vai
incluir pessoas da comunidade
pra estar aqui junto conosco.
Nesta cooperativa, cada um vem
de um bairro diferente e só se
encontraram no momento de
formação da cooperativa.
Ajudando as pessoas que passam
necessidades a enxergarem que é
possível sair desta situação e
lutar. Uma sociedade mais justa
e mais igual
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
As pessoas do bairro não
conhecem meu trabalho. Meu
trabalho é mais conhecido lá
fora. Eu exporto também. Às
vezes eu até tento botar uma
peça ou outra para vender aqui
no bairro, mas não dá. O poder
aquisitivo é muito baixo. Quem
compra arte geralmente está com
a barriga cheia. E aqui no bairro
o poder aquisitivo é pouco e as
pessoas não vão querer nem
poder dar 10 reais num
Eu pensaria numa sociedade
onde não existisse o dinheiro. Se
existe amor não precisa dinheiro.
Porque produzia, plantava e
passava pra você. Você fazia
outra coisa e passava pra mim.
Você fazia outra coisa e passava
para alguém que não tinha.
Existia o dar, a cota. Não
existiria dinheiro. Existiria amor.
O problema hoje é o dinheiro
218
bonequinho porque precisam
comer. Eno quem compra arte
está com a barriga cheia. Não é a
realidade do nosso bairro.
Grupo de Amigos Artesãos
Quase todo mundo que é do
grupo é da comunidade. E a
comunidade é mobilizada
quando tem feira. E na feira as
pessoas vêm comprar, quer
dizer, algumas pessoas. A
mobilização restringe-se à feira,
ou seja às vendas.
Eu acho que não existe
sociedade perfeita. Sempre que
tem 99 de acerto falta 10 pra
completar o 100. Ninguém
nunca faz 100. Mas o que pode
fazer é procurar conscientizar as
pessoas que existem trabalhos
que se preocupa com a
cooperação de todo mundo A
resposta aponta para o
cooperativismo enquanto
caminho para a sociedade.
Grupo Raio de Sol
A única coisa que tem com a
comunidade é conserto. Fazer
bainha, colocar zíper... Como é
um bairro pobre a gente cobra
um preço barato.
Eu queria um espaço nosso e
maior onde pudesse
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de Preservação
Ambiental e desenvolvimento
Sustentável
NÃO FOI PERGUNTADO NÃO FOI PERGUNTADO
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
A cooperativa não tem um
trabalho desenvolvido com a
comunidade, a não ser através
da coleta que é um trabalho de
conscientização. Fica até mais
fácil pra gente assim que já
mora, eu moro em Ondina, aí o
pessoal já conhece, conversa.
Uma sociedade que não tenha
falta de emprego, em que todo
mundo seja igual a todo mundo.
219
Apêndice K
CONCEPÇÃO DE ESTADO
NOME
EXPECTATIVAS DO
ESTADO
ESTADO IDEAL
PARTICIPAÇÃO EM
MANIFESTAÇÕES
POLÍTICAS
APOIO A CNADIDATOS
E/OU PARTIDOS
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
Não se pode esperar muito do
Estado. Quase nada. Porque até
hoje a gente vê que a economia
solidária ficou mais forte depois
do governo Lula, com a criação
da secretaria (SENAES).
Os políticos que realmente se
voltassem para a população.
Porque hoje eles querem
beneficiar mais os bairros
nobres do que a periferia. Hoje
seria melhor um prefeito que
voltasse mais para o lado pobre
da periferia. O Estado deveria
tomar a iniciativa de criar uma
cooperativa em cada bairro
pobre, e assim, cada pessoa teria
uma remuneração.
Grito dos Excluídos A gente apoiou, mas não teve
uma boa experiência (prometeu
e não cumpriu). Então hoje a
gente não apóia, nem fala mais
sobre o assunto.
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
O governo devia acompanhar de
perto a produção das
comunidades. Porque as
comunidades produzem, mas
não conseguem competir com a
indústria, ainda mais com os
impostos. Que ele dê o que ele
recebe da gente. Que ele faça a
parte dele. Nós pagamos e temos
direito de receber. Mas a gente
também tem que fazer a nossa
parte. Tem muitos outros bairros
que precisam de intervenção. A
minha preocupação é com outras
comunidades. Muitas vezes
acontecem trabalhos sérios dos
governos, mas não há
continuidade.
O estado deveria ser mais
humano. Eles estão de
passagem. O povo bota eles lá
porque querem melhorias.
Deveria se ter um pensamento
no todo. A melhoria de vida
para todos
Política fica do lado de fora da
associação.
Não. Os políticos não
convencem. Sem eles é possível
ter mais autonomia.
220
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
Nós não tivemos nenhum
benefício do estado (referencia
ao governos do estado), mas nós
não sabemos como chegar até lá.
(uma lembra que a SECOMP é
do governo do estado, então elas
entram numa discussão voltada
para as necessidades imediatas).
Queremos matéria prima, capital
de giro. “Com o capital de giro
melhoraria muito”.
(Não foi perguntado) Não Não, por enquanto ainda não.
Brinquedos Inteligentes
Que ele se retire e deixe de
incomodar. Nunca tivemos
apoio do Estado. Nossas
máquinas foram compradas
quase todas com o trabalho. Eu
fazia o brinquedo com a
máquina dos outros ia para
praia, milhares de quilômetros lá
na praia, no sol, vendia os
brinquedo, juntando de
pouquinho em pouquinho.
Pequenos núcleos auto-
gestionário que não demandasse
uma estrutura hierarquizada,
verticalizada.
Não temos participado, não. Sei
lá, cada um por si, eu simpatizo
com o movimento dos sem
terra, dos sem teto, do green
peace, com várias linhas de
pensamento, mas cada um em
uma área.
Nada para eles, eu não voto.
Não, não delego a ninguém,
nem vou lá.
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
Eu não acredito muito assim em
muita propaganda e pouca ação.
Porque o exemplo de um grupo
como o nosso que estamos
dentro do espaço físico do
estado. Era pra eles abraçarem a
causa e não deixar morrer, mas
nós estamos nos segurando para
não parar. Então eu acho que
dentro do espaço do governo nós
já aparecemos na televisão
várias vezes. Era pra tanto o
governo do estado, como a
prefeitura virem ver como está a
cooperativa. Perguntar o que
está faltando, reunir as mulheres
e dar uma injeção de ânimo.
Porque recursos têm. Então eu
não acredito no estado. Pode ser
Comprometido, porque eu vou
lhe dizer uma coisa: Este bairro
aqui que nós moramos, este
trabalho com os meninos que
foram para o colégio ACM, eles
fizeram um trabalho com os
professores de cursos
profissionalizantes. E trouxeram
aqui para associação para nós
matricularmos os meninos. Nós
os incentivamos a participar e
plantamos neles a esperança da
fundação desta cooperativa. De
repente o projeto foi
interrompido. Até hoje quando
os meninos me encontram
perguntam se não vai ter a
cooperativa. Agora acontece que
estes jovens ficam aqui no
Aqui a gente nunca se
aproximou de política
partidária. Chegamos a apoiar
candidatos, mas eles
prometeram e não cumpriram.
Mas a gente procura não se
envolver com política partidária
porque a comunidade cobra.
Então, a gente fez uma carta
dizendo que não apoiaríamos
mais políticos.
Sim. Um candidato que: O
único que nos deu nossos
documentos organizados (da
associação) não prometeu nada
e também não cobrou nada, mas
entregou tudo certinho. Agora
este candidato virou uma
referencia pra mim. Ele também
ajudou a vice-presidente da
associação quando ela teve uma
depressão. Contradição entre as
duas respostas.
221
até que eu esteja errada, que seja
ignorância, mas se a gente
quiser dar certo vai ser pelo
nosso esforço. Inclusive nós
estivemos a um mês atrás na
SECOMP para buscar apoio. E a
moça disse que estava tudo
parado por conta da política,
mas ela me deu um disquete
com tudo que precisa de
documento que eles ajudam com
máquinas, com material, com
tudo. Ela me deu seis meses para
eu voltar.
bairro ociosos. Aqui tem vários
pontos de drogas e o traficante
acaba tomando conta. Então o
estado precisava tomar conta.
Eles deveriam ter compromisso.
Os compromissos firmados
depois da época eleitoral não
saem do papel, a realidade é
esta.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
A gente espera ser reconhecido Daria oportunidades para todos,
principalmente para nós que
somos cooperativas e não temos
condições de ficar pagando as
coisas.
Não Não
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
Não sei. É difícil imaginar Da verdade. É difícil... NÃO Não, a cooperativa não. Dentro
da cooperativa que é o lugar da
gente trabalhar juntas, que é o
local da gente caminhar juntas,
a gente não apóia candidatos.
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
Queremos políticas públicas.
Teve essa conferencia até para o
projeto de lei, por exemplo: a
gente precisa registrar, a gente
precisa de um nome, já se deu
entrada, mas com o processo
avulso não se registrou ainda, o
processo... já ta caminhando,
tem os impostos que dificultam
a venda de mercadorias
Acho que se começasse a ter as
leis, porque é sempre referencia
uma feira de economia solidária
de maneira exata. Quando se
quer uma coisa e saber onde
encontrar, nós somo 1098
empreendimentos comprovado e
já tem muita coisa pronta. Se
não fosse a economia solidária
hoje estaria desempregada.
Sim. Sem terra; Sem teto; pela
moradia; pela união; Campanha
da Primavera do CESE pela
paz; Agricultura Familiar.
É livre a escolha, mas pra gente
um modelo é PT. Porque a
gente percebe que este modelo
trouxe mudanças.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens Artesãos
Diminuição de taxas e impostos. Ajudando as pessoas Não Não
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
Espera que sejam criadas
políticas púbicas para nos ajudar
Dentro do estatuto brasileiro
(constituição) já seria ideal.
Não. Porque tem muitas pessoas
que não se envolvem com
Apóia o PT
222
a viver neste capitalismo
selvagem. E a partir daí
combater o capitalismo
selvagem e ampliar o modelo da
economia solidária.
Basta por em prática. Porque a
gente já vive em um país
democrático. Falta vontade
política das pessoas, então falta
é vontade.
política, apesar da gente já estar
conseguindo mostrar que é
necessário estar envolvido com
o que acontece politicamente na
sociedade. Mas o trabalho de
envolvimento político vem
acontecendo de forma lenta. A
gente faz discussões...
COOPERCORTE
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
Que eles se conscientizem desse
trabalho de economia solidária e
apóiem as cooperativas
populares.
Menos capitalista. NÃO NÃO
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e
Trabalho de Artigos Têxteis
Eu acredito que eles podem nos
ajudar quando eles querem, não
é só em época de eleição. Eles
têm como ajudar a gente. Por
exemplo, um espaço que a gente
possa vender, tirar esta multa
enorme que a gente tem (a multa
foi dada pela receita federal em
cima de um material que veio de
outro estado porque na época a
inscrição deles estava cancelada
e eles não sabiam). A gente está
batalhando, suando e o governo
não trata as cooperativas e
associações de forma
diferenciada. Eles vêem as
cooperativas como uma empresa
privada e aqui é totalmente
diferente. A gente é humilde
está começando um trabalho,
Dando incentivo pra pessoas
começar. Incentivar mesmo.
Não A gente vai começar a apoiar
nesta eleição agora, porque
desde o princípio este candidato
nos apóia. Ele sempre falou
comigo, nunca deixou de falar
eu estivesse vestida como
estivesse.
produzir para manter sua
família. A gente ta começando
já com uma multa. Poderia abrir
mais espaço para o artesanato. E
o artesanato precisa de ajuda. A
maior necessidade dos
empreendimentos é na
comercialização.
223
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
Do Estado, dos governantes?
Cada vez pior. Eles querem...
haja dinheiro! Cada qual só quer
pegar sua fatia. E pobre tem que
existir. Ninguém nunca diga que
este político que vai entrar vai
acabar com a pobreza, blá, blá,
blá... Não vai acabar coisa
nenhuma. Nunca vai acabar!
Você já pensou se deixasse de
existir miséria, se deixasse de
existir pobre? O que eles iam
fazer? Na próxima eleição não ia
ter aquele buraco, não ia ter
aquela casa, não ia ter gente
desdentada falando na televisão
que ta precisando de comida, de
casa, de moradia. Você já
imaginou se tivesse tudo
bonitinho? Então eu acho que
sempre vai existir miséria, e as
pessoas sempre bobas indo lá
botando seu voto, votando,
acreditando...
Seria um governo bom, dando
acesso a saúde, a lazer, a
alimentação. Tendo acesso a
cidadania, tudo que tem direito.
Não Não. Eu não acredito. Eles não
dão crédito. Não dão
credibilidade. Eu votei em Lula
acreditando nas palavras dele,
tão boas no horário político.
Depois que é eleito, que está lá
adiante com o dinheiro no ele
esquece o resto.
Grupo de Amigos Artesãos
Que o Estado melhore. Que
venham governantes
responsáveis e que se dediquem
e que amem o estado. Porque se
um governante não ama o lugar
que vive, o estado que nasceu,
eu acho que não funciona
também. Você vê ACM, apesar
do pessoal fala muito dele, eu
acho que ele ama a Bahia. Você
vê até a roupa dele tem que ter
as cores da Bahia.
O Estado deveria ter menos
violência e mais trabalho para as
pessoas. As pessoas que agem
de forma agressiva e violenta é
porque não tem ocupação nem
apoio. Você pode ver a polícia
que deveria dar apoio e
segurança. Você vê que a polícia
quando aborda uma pessoa e
pede um documento, enquanto a
pessoa pega já vai batendo. Isso
tudo é um meio de denegrir a
sociedade.
Eu não sei dizer do grupo
porque eu participo de tudo
quanto aparece, é greve, é tudo
– eu to dentro! Primeiro porque
eu sou alfabetizadora.
Alfabetizo pela CUT e pela
Associação de Cegos.EaCUT
você sabe que é mobilizadora de
movimentos populares.
Apoio desde que tem que
analisar ele como pessoa. Agora
estou com o PT, pois admiro o
trabalho dele, pois ele criou
muita coisa pra melhorar a vida
da população pobre. E ele está
sendo muito perseguido por
conta disso, né? (...) As
respostas foram muito
individuais..
224
Grupo Raio de Sol
Eu não espero muita coisa,
sempre está mudando, você fica
naquela expectativa, agora
mesmo estava um prefeito...
cada dia você vê uma
reclamação e eu não vejo
dedicação...
Ainda não parei para imaginar Não. Nunca participamos,
nunca iremos participar.
Teve um candidato para
vereador que apoiamos, mas ele
não ganhou. Teve outro, mas
esse foi embora.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de Preservação
Ambiental e desenvolvimento
Sustentável
NÃO FOI PERGUNTADO
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
O Governo poderia ajudar mais,
porque é um trabalho que é
muito esforçado. Não há
reconhecimento da importância
do nosso trabalho, porque a
gente faz essa coleta. Imagine se
a gente não fizesse, como seria
daqui a 20 anos, com esse
material todo na rua, as
enchentes... Todo esse material é
coletado da rua para evitar que
encha os bueiros, até porque isso
trás renda pára gente da
comunidade.
Que dá patrocínio para gente e
para comunidade. Porque a
gente não vai ficar só coletando,
coletando, a gente também
precisa de um ponto para vender
alguma coisa, pára fazer alguma
coisa, para mostrar.
NÃO Não. A gente estava apoiando
um candidato acho que para
prefeito, mas ele não ganhou,
eles nos prometeu um terreno,
mas perdeu.Porque aqui é
alugado.
225
Apêndice L
CONCEPÇÃO DE TRANSFORMAÇÃO
NOME
ECONOMIA SOLIDÁRIA E
MUDANÇAS
DESIGUALDADES E DIFERENÇAS
SOCIAIS
AMAC
Cooperativa Múltipla das
Artesãs de Cajazeiras
Com a economia solidária seria
tudo mais solidário, mais
coletivo. Um continente, um
país, um estado. Um colaboraria
mais com a necessidade do
outro. Porque é uma forma de se
unir para ajudar de forma moral
– humanizaria mais as relações.
Os que têm mais ajudariam os
que têm de menos, sem
exploração. O mundo seria
muito mais coeso.
Depende da consciência de cada um. Em
alguns encontros de economia solidária,
você vê alguns cooperados agindo com
deslealdade com o outro. Então eu acho
que economia solidária não vem de
formação, mas da natureza de
consciência de cada um. Não adianta
você dizer como deve ser se a pessoa não
assume aquilo ali pra ela. Se ela assume:
eu estou sendo individual, eu fui
preconceituosa. Não é uma coisa como
uma escola que você estuda, se forma,
faz vestibular... É mais da pessoa ter
consciência mesmo.
AMEV
Associação das Mulheres do
Engenho Velho da Federação
Com a ação partindo de nós mesmos.
Nas ações que a gente faz aqui muda a
vida das pessoas. A gente ensina,
divulga os órgãos públicos. Melhorar é a
gente fazendo a nossa parte porque eu
corro atrás do social há muito tempo.
Hoje eu vejo um grãozinho de melhora –
mulheres na sala de aula, universidade
para todos. A gente tenta mudar a
consciência das pessoas. A gente faz
ações, intervem, explica, cobra. O
serviço de coleta de lixo aqui é melhor
do que a Barra de tanto a gente cobrar.
ASCOSI
Associação de Costureiras de
Itapagipe
Pode, se o nome já está dizendo
economia solidária. Atuando no
apoio. Trazer pessoas que não
tem emprego e ficam paradas.
(elas falam que a APL pode
ajudar também).
Com educação. Trazer mais emprego,
gerar ais renda, porque ainda está muito
deficiente
Brinquedos Inteligentes
Humanizar as relações
comerciais. As relações
comerciais são obrigatórias, não
dá para viver sem comercializar.
Mas é possível humanizar, tornar
mais ético, mais moral, porque ta
foda.
A gente tem contribuído para que o
brasileiro possa pensar melhor, a
revolução é educacional, se houvesse
educação não haveria um estado como o
que existe hoje. A gente contribui assim,
mas como eu acho que é duro para
resolver então só a boa e velha
revolução.
COMUFE
Cooperativa de Mulheres da
Federação
Ela poderia ajudar muito a
diminuir o desemprego. Porque a
cooperativa, por exemplo, as
pessoas entraram, mas foram
saindo até ficarem 16 pessoas.
Só que se todas estas pessoas
fossem orientadas e recebessem
um rendimento a cada mês e
tivessem uma previdência isto
estaria gerando renda sim. Os
produtos que a gente vende todo
mundo gosta. Quem não gosta
Primeiro de tudo a educação. Porque no
momento que você tem conhecimento,
que você tem sabedoria, você sabe lutar
pelos seus direitos, você pode lutar pelas
melhoras. Então a princípio de tudo seria
a educação. Porque por mais que se fale
assim “a reparação do negro”... eu já
estou até fugindo da cooperativa, mas
um assunto puxa o outro... Vestibular
comunitário...
226
de uma bolsa? Então é uma coisa
que pode levantar a auto-estima
das pessoas, porque todo mundo
quer trabalhar para ganhar
dinheiro, mesmo que seja
pouquinho. E por que trabalhar
cada um fazendo uma coisa
isolada? Porque nós não temos a
referência solidária.
COOMARTES
Cooperativa de Mulheres
Artesãs do Subúrbio de
Plataforma
União, porque a economia
solidária significa todos unidos.
A gente devia se unir para uma
mesma língua
Dando oportunidades a todos. Quando
você tem oportunidade de trabalhar é
mais fácil
Cooperativa Raízes do Povo de
Israel
Mudar a auto-estima das pessoas
e dar trabalho as pessoas que não
conseguem.
O caminho é este: a união, o respeito
mútuo. Porque na economia solidária a
gente aprende a se respeitar e com este
respeito e com esta união a gente
aprende a se valorizar. E quando a gente
se valoriza é muito bom. Porque não
adianta a gente esperar os outros
valorizarem a gente, porque quando a
gente se valoriza os outros valorizam
também.
COPAED
Cooperativa Múltipla de
Produção de Alimentos e
Engenho Doce
Já trouxe. Pra gente da
COOPAED já trouxe. Muitas
pessoas hoje têm aqui uma
autonomia maior. Sabe discutir
as coisas do seu ponto de vista.
Olham as pessoas de igual, não
tem aquela coisa de se sentir
inferior. Muita gente chegou
aqui caladinho sem abrir a boca
e hoje já joga duro na produção,
nas reuniões. Então você vê o
crescimento das pessoas. A
economia solidária traz a
valorização do ser humano.
Êta! Aí é complicado... Mas eu acho que
tem que partir de formação. Com
bastante formação e informação a gente
pode aprender. A gente tem que olhar
para o ser humano. O ser humano não é
máquina. Se eu não estou me sentindo
bem eu não vou produzir bem. Não
adianta me colocar para fazer uma torta
hoje se eu não estiver bem, vai sair uma
porcaria! Então é a formação. Investir na
capacitação humana.
COOPARTES
Cooperativa de Jovens Artesãos
Com as pessoas querendo ajudar mais
umas as outras. Quando a gente se ajuda
é melhor porque não tem emprego lá
fora. Eu preferia ter um emprego lá fora
porque paga INSS, assina carteira, mas
não tem. Então a gente tem que se
ajudar.
COOPERART
Cooperativa Múltipla de
Artesãos (nome fantasia)
A economia solidária já vem
apontando algumas mudanças.
Só a gente conseguir reunir um
publico com este aí, que é um
publico que não tinha noção, que
não sabia se reunir, que a forma
de organização era nenhuma. E
hoje já começa a se organizar.
Então a economia solidária já
está de parabéns por Ter
conseguido este espaço de forma
de organização. Agora é uma
luta muito árdua e dura. A gente
tem que lutar pra conseguir mais
autonomia
As desigualdades sociais acontecem na
medida que há vontade política. Se tiver
vontade política de estar combatendo as
desigualdades sociais, porque a gente
mora em um país que é altamente rico, a
gente consegue superar. Falta vontade
política. Sim, a gente percebe que as
pessoas vão mudando.
COOPERCORTE
Esperamos que com nosso Se todo mundo tivesse um meio para
227
Cooperativa de Mulheres
Costurando uma Realidade
Diferente
trabalho possamos vender nossos
produtos, pois não adianta
produzir e ficar com o produto
em casa, então que se torne
realidade não só para o nosso
empreendimento, mas também
para as pessoas que fazem sua
mercadoria em casa terem um
lugarzinho para vender.
trabalhar, ter seu dinheiro, sua casa
própria então seria diferente.
COOPERTEXTIL
Múltipla de Produção e Trabalho
de Artigos Têxteis
a união das pessoas, a
solidariedade
Quando a gente coloca uma mãe, um
jovem para aprender a tecelagem, a
gente tira uma pessoa da rua. Dando
oportunidade aos jovens – que estão
desempregados – para que ele tenha
experiência. O amor entre as pessoas.
Mais emprego, mais casa, moradia.
Edna Batista Nascimento
Bonequinhos de Jornal
Que mudança? Se todas as
pessoas se juntarem, se
arregaçassem as mangas e
resolvessem fazer acontecer. Se
todo mundo lutasse em um
pensamento só... mas não quer...
Nunca pode ser superada. Se acabasse
era bom, mas não acaba não. Daí pra
pior. Infelizmente.
Grupo de Amigos Artesãos
A economia solidária tem
trabalhado no sentido de
conscientizar as pessoas e lutar
por um Brasil melhor. Uma
melhor condição de vida. Tem
buscado muito esclarecer a
mente das pessoas.
Através de muitos seminários, trabalho.
Acho que é muita conscientização
mesmo. Os seminários devem ter muita
gente porque uma pessoa só é difícil. E
quando tem muita gente é mais fácil
fazer as pessoas abraçarem a causa
Grupo Raio de Sol
Não respondeu. Não respondeu.
ONG Paciência Viva
Centro Brasileiro de Preservação
Ambiental e desenvolvimento
Sustentável
Eu acredito que esta é uma
forma de organização do
trabalho mais útil.
Não respondeu.
Projeto Cooperativa Ação
Reciclar
Que venha mais verba, então a
economia poderia vim de bom
tamanho.
Acho que ele (ele quem? O governo?)
não tem uma visão completa do que é o
Ação Reciclar, (se tivesse) não sofreria
tanta discriminação, porque se eles
tivesse uma visão completa ele passaria a
nos ajudar (o entrevistado não especifica
quem é ‘eles’).
228
Apêndice M
Fotos dos Empreendimentos Entrevistados
AMAC – Suzane (bermuda laranja) na reunião do Fórum de Cooperativas Populares
AMEV – Produção de camisas e Quadro com vantagens e desvantagens do associativismo
ASCOSI – Associadas entre as máquinas de costura e agenda de registro das atividades
229
Brinquedos Inteligentes – Luiz Fernando demonstrando um dos jogos produzidos e oficina
de produção
COMUFE – Máquina de costura e armazenamento de retalhos na casa de uma das
cooperadas
COMUFE - Tapete feito de retalhos e vista do local de produção (casa de uma das
cooperadas)
230
COOMARTES – Cooperadas com material de produção e Artesanato de Búzios
Cooperativa Raízes do Povo de Israel – Maria da Glória (entrevistada) e Maria da Glória na
reunião do Fórum de Cooperativas Populares
COOPAED – Uma das cooperadas na produção e salgados a venda na cantina da UNIFACS
231
COOPERART – Raimundo (entrevistado) em reunião do Fórum de Cooperativas Populares
COOPERCORTE – Cooperadas em processo de produção e vista do espaço utilizado como
escritório e ponto de venda
COOPERTEXTIL – Ricardo (um dos entrevistados) com o galpão de produção ao fundo e
peça em processo de produção
232
Edna Bonequinhos de Jornal – Edna (artesã) com os bonequinhos de jornal e bonequinhos
de jornal em detalhes
Grupo de Amigos Artesãos – Iara (entrevistada) e alguns dos produtos comercializados pelo
grupo
233
Projeto Cooperativa Ação Reciclar – Alguns agentes de coleta (futuros cooperados) e
galpão de armazenamento de material coletado
Projeto Cooperativa Ação Reciclar – Fotos do galpão de armazenamento de material
coletado
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