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RBGO - v. 26, nº 9, 2004
de Sampson
4
, que aponta a presença de células
endometriais viáveis no fluxo menstrual retrógra-
do como causador das lesões. No entanto, pratica-
mente 90% das mulheres têm trompas pérvias e
apresentam fluxo menstrual retrógrado
7
e a maio-
ria não apresentará endometriose. Há também a
teoria da metaplasia celômica
8
e, mais recente-
mente, a teoria imunológica
9-11
. Hoje se acredita
na confluência destas teorias para a explicação da
etiopatogenia da endometriose. Haveria realmen-
te fluxo menstrual retrógrado associado a predispo-
sição imunológica no microambiente peritoneal
que facilitaria o implante de células endometriais
viáveis e com potencial para implantação.
A complexidade na sua fisiopatologia e a
heterogeneidade da doença em humanos faz da
endometriose uma das doenças mais estudadas
da atualidade. Para facilitar estes estudos alguns
modelos experimentais vêm sendo propostos. O
achado de endometriose espontânea em 25% de
animais primatas não humanos
12
com histologia
e localização semelhantes às encontradas em
humanos
3,13-15
levou à utilização destes animais
como modelo experimental, porém sua utilização
vem sendo progressivamente reduzida devido às
dificuldades éticas e pela heterogeneidade das le-
sões. As ratas seriam modelos experimentais bem
mais acessíveis com lesões homogêneas e mane-
jo fácil
16
,
mas o pequeno porte do animal dificulta
a abordagem cirúrgica com material laparoscópi-
co. Assim, a utilização de coelhas passa a ser boa
opção de modelo experimental, pois apresenta bai-
xo índice de infecção, sem necessidade, portanto,
de utilização de antibióticos
17
. O porte do animal
facilita o acesso por vídeo-laparoscopia se compa-
rado com ratas, e a ausência de ciclo estral dis-
pensa a necessidade de programação dos procedi-
mentos de acordo com a fase do ciclo do animal.
Além disso, apresentam lesões homogêneas, ge-
ralmente massas sólidas hemorrágicas, facilmen-
te obtidas por meio de autotransplante de fragmen-
tos endometriais ou abertura e exposição da cavi-
dade endometrial
18
. A opção pela técnica cirúrgi-
ca de colocação do implante na parede abdominal
foi feita pela necessidade de visualização fácil da
lesão à laparoscopia.
A padronização e validação de técnica facil-
mente reprodutível tornam-se extremamente im-
portantes para o desenvolvimento deste tipo de
pesquisa, permitindo simular novas propostas
diagnósticas e terapêuticas para a abordagem des-
ta doença. Não encontramos na literatura nenhu-
ma descrição de modelo experimental para endo-
metriose em coelhas com seguimento evolutivo
das lesões utilizando-se da técnica laparoscópica
e acreditamos ser este um modelo prático, que
permitiria caracterizar e documentar as lesões
induzidas com baixas taxas de aderências pélvicas
por ser método pouco invasivo. A proposta deste
estudo é de produzir lesões endometrióticas com
o emprego de laparotomia e realizar o seguimento
evolutivo da lesão por videolaparoscopia e estudo
histológico comparativo das lesões com quatro e
oito semanas após o implante.
Materiais e Métodos
Trata-se de estudo experimental realizado
no setor de cirurgia experimental do Hospital das
Clínicas do Departamento de Cirurgia e Anatomia
e no Departamento de Patologia da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo. Foram utilizadas 30 coelhas adultas Nova
Zelândia, fêmeas, virgens, com peso aproximado
de 2,5 kg. As coelhas foram mantidas em gaiolas
apropriadas sob controle de temperatura, umida-
de e luminosidade do ambiente por três dias an-
tes da indução cirúrgica das lesões, alimentadas
com água e ração ad libitum. As coelhas eram pe-
sadas no dia do procedimento inicial.
Todas foram submetidas a laparotomia para
indução da lesão de endometriose, após anestesia
geral endovenosa com 3 mL de tionembutal as-
sociado a 1 mL de xilestasina. Procedeu-se à
tricotomia da parede abdominal dos animais, se-
guida dos cuidados de anti-sepsia. As luvas de
látex foram lavadas com soro fisiológico 0,9%
exaustivamente para redução da formação de
aderências e o mesmo pesquisador realizou to-
dos os procedimentos.
A abertura da cavidade pélvica foi realizada
com incisão longitudinal mediana de aproxima-
damente 2 cm, iniciando 2 cm cranialmente ao
púbis do animal. Posteriormente foi ressecado
segmento de cerca de 4 cm do corno uterino direi-
to, seguido de seu fechamento. A porção uterina
ressecada foi imersa em soro fisiológico 0,9% a
4ºC por cerca de 2 minutos e então incisada lon-
gitudinalmente, sendo retirado fragmento de 5 por
5 mm. Este fragmento de tecido endometrial foi
suturado ao peritônio próximo ao trato reprodutivo
da coelha, utilizando-se fio Vicryl 6.0, com a face
endometrial livre voltada para a cavidade abdomi-
nal, com posterior fechamento da incisão cirúrgi-
ca abdominal. Nenhuma suplementação hormonal
foi administrada antes ou após a laparotomia.
As coelhas foram divididas em dois grupos,
sendo o primeiro denominado grupo 8 semanas,
constituído de 15 animais, que foram submetidos
a laparoscopia diagnóstica para pesquisa de lesões
de endometriose, documentação da lesão por meio
de vídeo e medida da lesão após oito semanas de
sua indução. O outro grupo, chamado grupo 4 se-
manas, também composto de 15 animais, foi sub-
metido aos mesmos procedimentos porém somen-
te após quatro semanas de seguimento. A
EndometrioseSilva et al