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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Flávio Morgado
Confiança na comunicação de informações
econômico-financeiras:
o caso das empresas de autogestão
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Comunicação e
Semiótica, pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, sob a orientação do
Prof. Doutor Rogério da Costa.
São Paulo
2008
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Banca Examinadora
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DEDICATÓRIA
Aos meus queridos pais, José e Maria,
à minha amada esposa Célia, e ao
meu filhão, Pietro.
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Dr. Rogério da Costa, por explicar de forma tão clara temas
espinhosos (incluindo Espinosa), e por ter me apresentado, por meio de sua pesquisa, às
questões que hoje fazem parte desta tese: capital social, inteligência coletiva, redes
sociais e confiança.
À professora Dra. Maria Cristina Sanches Amorim, membro da banca de qualificação,
que continua me orientando, desde o mestrado, pela confiança na capacidade deste autor
de cumprir a tarefa aqui apresentada.
Ao professor Dr. Fernando Antônio de Castro Giorno, membro da banca de
qualificação, pelo aprendizado no dia-a-dia de trabalho, de vários assuntos, muito além
dos acadêmicos.
À professora Dra. Sonia Maria Portella Kruppa, pelo entusiasmo e orientações sobre
Economia Solidária, e pelas portas abertas para interlocutores importantes.
À professora Dra. Clarice Assalim, que fez a revisão deste trabalho, com o mesmo
carinho que tem mostrado nesses muitos anos de amizade.
À professora Dra. Maria Helena Villar e Villar, especialista em formação para
autogestão, com que tenho trabalhado em parceria, e que fez a revisão dos resultados da
pesquisa.
À querida professora de inglês, Svetlana Ponomarenko Lázaro, por esse e outros
abstracts, e por ser um exemplo de dedicação à docência.
Ao Sr. Luigi Humberto Verardo, da ANTEAG, pelas discussões enriquecedoras e
entusiasmadas sobre formação em autogestão.
Ao Sr. José Reitor Rizzardi, assessor jurídico da ANTEAG, pela acolhida em Avaré e
pela forma engajada e compromissada com que trata os marcos legais e a organização
das cooperativas.
À Srta. Maria de Lourdes Roder, presidente e gestora da CooperJeans, em Arandu, São
Paulo, pelos valiosos esclarecimentos sobre a prática da gestão de cooperativas,
incluindo assuntos considerados tabu, como o da confiança nos números do negócio.
Ao Sr. Aguinaldo Luiz de Lima, assessor técnico da UNISOL e membro do NAPES
Núcleo de Ação e Pesquisa em Economia Solidária, da Cáritas, pelos esclarecimentos
sobre a contabilidade de cooperativas.
À Sra. Ana Beatriz Baron Ludvig e à Srta. Renildes Comandolle, da Bruscor, em
Brusque-SC, pela cuidadosa atenção a mim dispensada e pelos valiosos esclarecimentos
sobre o modo de operar da autogestão, de fato.
Aos professores Dr. Elmir de Almeida, Joel Pelissaro, Dra. Maria Helena Villar e Villar,
Dra. Marilena Nakano e Odair de Garcia, do Núcleo de Estudos de Autogestão e
Economia Solidária da Fundação Santo André, pelos momentos de reflexão sobre
modelos de autogestão, sustentabilidade da Economia Solidária e formação em
autogestão, com muito humor.
“O sol é o melhor desinfetante”.
Louis Brandeis (juíz americano,
sobre a necessidade de transparência
no sistema financeiro)
“Nada é tão incapaz de causar uma boa impressão quanto
o comportamento destinado a impressionar”.
Jon Elster (no livro Sour Grapes, sobre a
subversão da racionalidade)
RESUMO
Título: Confiança na comunicação de informações econômico-financeiras: o caso das
empresas de autogestão
Autor: Flávio Morgado
Após os escândalos financeiros ocorridos em 2001, quando a confiança no
mercado financeiro foi questionada, a questão da governança corporativa passou a fazer
parte da agenda dos acionistas e demais envolvidos empresas clientes e fornecedoras,
governo, investidores individuais, fundos de pensão e sociedade em geral
principalmente com as demonstrações financeiras e com a auditoria a que eram
submetidas. As demonstrações financeiras podem ser consideradas sistemas peritos, que
são sistemas de excelência técnica ou competência profissional, sobre os quais não se
conhece e não se pode conferir a maior parte dos fundamentos (códigos de
conhecimento) que regem seu funcionamento. Confia-se, tem-se fé, não tanto em suas
competências, mas na autenticidade do conhecimento perito, baseado na experiência e
na regularidade no funcionamento desses sistemas, além das forças reguladoras, que
visam à proteção dos usuários. O objetivo deste trabalho é estabelecer critérios para a
criação de confiança no processo de comunicação de informações econômico-
financeiras. A pesquisa insere-se no campo da comunicação organizacional. A
metodologia utilizada foi a dos múltiplos estudos de caso, envolvendo os componentes
do processo de comunicação contábil, em empresas de autogestão. O emissor, a
mensagem e o canal foram avaliados quanto à confiabilidade (ser merecedor de
confiança). O receptor foi avaliado quanto à confiança (o ato de confiar). Os resultados
mostraram a importância da transparência na divulgação das informações, aliada a
controles internos efetivos, como requisito para a autogestão e para a democracia
interna. Mostraram também as dificuldades dos trabalhadores em empresas de
autogestão de se apropriarem do conhecimento sobre gestão, comprometendo, assim, a
questão da participação. Outra constatação é que a confiança também é produto do
ambiente institucional da autogestão e da Economia Solidária, que tem a confiança
como princípio.
Palavras-chave: Comunicação, Confiança, Sistemas peritos, Autogestão, Governança
corporativa
ABSTRACT
Title: Trust on the communication of economic and financial information: the case of
self management enterprises.
Author: Flávio Morgado
After the financial scandals which occurred in 2001, when confidence in the
financial market has been questioned, the issue of corporate governance has become
part of the agenda of the shareholders and stakeholders - corporate customers and
suppliers, government and individual investors, pension funds and society in general -
especially with the financial statements and the audit to which they were submitted. The
financial statements can be considered expert systems, which are systems of technical
excellence and professional competence on which we do not know and we can’t give
most of the reasons (codes of knowledge) governing its operation. It’s taken for granted;
there is faith, not so much in their competences, but the authenticity of expert
knowledge, based on experience and regularity in the operation of these systems, in
addition to the regulatory forces, which aim at protecting users. The objective of this
work is to establish criteria for the creation of confidence in the communication process
of economic-financial information. The research is inserted in the field of organizational
communication. The methodology used was that of multiple case studies, involving the
components of the accounting communication process in self management enterprises.
The sender, the message and channel were evaluated for reliability (be worthy of trust).
The receiver was evaluated as to the trust (the act of trust). The results showed the
importance of transparency in the dissemination of information, combined with
effective internal controls as a requirement for self management and for internal
democracy. The also showed the difficulties of workers in self management enterprises,
of knowing about management, undermining thus the question of participation. Another
observation is that trust is also the product of self-management and institutional
environment for Solidarity Economy which has the confidence as a principle.
Key-words: Communication, Trust, Expert systems, Self management, Corporate
Governance
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1 – Mapa conceitual do trabalho ................................................................. 29
Ilustração 2 – Modelo de comunicação de Shannon e Weaver..................................... 59
Ilustração 3 – Modelo de comunicação de Gerbner ..................................................... 61
Ilustração 4 – Modelo de comunicação de Newcomb .................................................. 63
Ilustração 5 – Modelo de Westley e MacLean............................................................. 64
Ilustração 6 - Fatores constitutivos da comunicação (Jakobson) .................................. 65
Ilustração 7 - As funções da comunicação (Jakobson) ................................................. 65
Ilustração 8 – Elementos dos processos em geral......................................................... 68
Ilustração 9 – Processo de comunicação contábil ........................................................ 68
Ilustração 10 – Uma hierarquia de qualidades em Contabilidade (SFAC 2) ................. 74
Ilustração 11 - Modelo de Shannon e Weaver adaptado para autogestão.................... 137
Ilustração 12 – Modelo de Newcomb aplicado às empresas de autogestão................. 138
Ilustração 13 – Modelo de Westley e MacLean adaptado à informação contábil........ 138
Ilustração 14 – Confiabilidade e confiança no processo de comunicação................... 141
Ilustração 15 – Modelo de contabilidade multidimensional ....................................... 145
Ilustração 16 – Fluxo de caixa de uma empresa......................................................... 156
Ilustração 17 - Assembléia da Cooperbrim................................................................ 162
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Tipos de confiança.................................................................................... 35
Quadro 2 – Indicadores Institucionais de Autogestão ................................................ 104
Quadro 3 – Indicadores Comportamentais de Autogestão.......................................... 105
Quadro 4 – Situações relevantes para diferentes estratégias de pesquisa.................... 122
Quadro 5 – Dimensões contábeis e seu conteúdo....................................................... 146
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Quantidade e percentual de EES por unidade da federação/região.............. 94
Tabela 2 – Cálculo de retiradas ................................................................................. 148
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABM / ABC – Activity-Based Management / Activity-Based Costing.
ADR – American Depositary Receipts.
AGO – Assembléia Geral Ordinária
AICPA – The American Institute of Certified Public Accountants
ANTEAG Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de AutoGestão e
Participação Acionária
BOVESPA – Bolsa de Valores de São Paulo
BSC – Balanced ScoreCard.
CAF – Conselho de Administração e Finanças da PUC-SP
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CFC – Conselho Federal de Contabilidade
CRC – Conselho Regional de Contabilidade
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
CMMI – Capability Maturity Model Integration.
COBIT – Control Objectives of Information and Related Technology.
COS – Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP
COSO – Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission.
CRC – Conselho Regional de Contabilidade
CVM – Comissão de Valores Mobiliários.
EDI – Eletronic Data Interchange.
ERP – Enterprise Resource Planning.
Fed – Federal Reserve System
GAAP – Generally Accepted Accounting Principles.
IASB – International Accounting Standards Board.
IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.
IFRS – International Financial Reporting Standard.
IPO – Initial Public Offering.
ITIL Information Technology Infrastructure Library.
MBA – Master in Business Administration
MTE – Ministério do Trabalho e Emprego.
Nasdaq – National Association of Securities Dealers Automated Quotations system.
NBC – Norma Brasileira de Contabilidade
NYSE New York Stock Exchange.
PACS Políticas Alternativas para o Cone Sul, ou, na interpretação da própria entidade
Participação, Autogestão, Cooperação e Solidariedade.
PNQ / ProEsQ – Plano Nacional de Qualificação / Projetos Especiais de Qualificação
VMI – Vendor Managed Inventory.
SEC – Securities and Exchange Commission.
SENAES – Secretaria Nacional de Economia Solidária.
SFAC – Statements of Financial Accounting Concepts.
TCO – Total Cost of Ownership
UNISOL Brasil – União e Solidariedade das Cooperativas e Empreendimentos de
Economia Social do Brasil
SUMÁRIO
APRESENTÃO 19
Relevância do tema 20
Motivação para o trabalho 22
Objetivo do trabalho 24
Método de trabalho 24
Organização do trabalho 27
Mapa conceitual do trabalho 29
PARTE I – CONFIANÇA E COMUNICAÇÃO 31
1. CONFIANÇA 33
1.1. Tipos de confiança e suas características 34
1.2. Vantagens da confiança e da confiabilidade 39
1.3. Falta de confiança 41
1.4. A transparência na divulgação de informações 44
1.5. O contexto mais amplo da confiança 46
1.6. A confiança em sistemas abstratos 47
1.7. Confiança e risco 51
2. O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO 53
2.1. A comunicação humana 53
2.2. Teorias da comunicação 55
2.3. O processo de comunicação de informações econômico-financeiras 67
3. GOVERNANÇA CORPORATIVA 77
3.1. Accountability 78
3.2. Controles e regulamentações 79
3.3. Tecnologia da Informação e governança corporativa 84
PARTE II – ECONOMIA SOLIDÁRIA E AUTOGESTÃO 89
4. ECONOMIA SOLIDÁRIA E AUTOGESTÃO 91
4.1. Economia Solidária 91
4.2. Autogestão 95
4.3. Transparência das informações 97
4.4. Formação em Economia Solidária 100
4.5. Indicadores de autogestão 101
5. CONTABILIDADE NA ECONOMIA SOLIDÁRIA 107
5.1. Contabilidade em cooperativas 107
5.2. Inserção da contabilidade nas empresas de autogestão 112
PARTE III – PESQUISA DE CAMPO, RESULTADOS E PROPOSTAS 119
6. METODOLOGIA DA PESQUISA DE CAMPO 121
6.1. Hipóteses ou premissas do trabalho 123
6.2. Qualidade da pesquisa 124
6.3. Protocolo para o estudo de caso 128
7. RESULTADOS OBTIDOS E PROPOSTAS 135
7.1. Entrevistas e observações 135
7.2. Análise dos modelos de comunicação processuais 137
7.3. O território do emissor 142
7.4. O território do canal e da mensagem 150
7.5. O território do receptor 157
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS 165
REFERÊNCIAS 167
WEBOGRAFIA 175
GLOSSÁRIO 177
ÍNDICE REMISSIVO 180
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIOS DA PESQUISA 182
ANEXO A – TRECHOS DA LEI DO COOPERATIVISMO 185
ANEXO B – OBRIGAÇÕES ADICIONAIS À LEGISLAÇÃO (BOVESPA) 191
19
APRESENTAÇÃO
Após os escândalos financeiros que ocorreram em 2001, envolvendo a Enron e
outras grandes corporações norte-americanas, em que a confiança no mercado
financeiro foi questionada (Carvalho e França, 2002), a governança corporativa passou
a fazer parte da agenda do mundo corporativo acionistas e demais envolvidos, como
empresas clientes e fornecedoras, governo, investidores individuais, fundos de pensão e
sociedade em geral – surgindo a preocupação com a confiança nas demonstrações
financeiras e na auditoria a que eram submetidas.
Segundo Imhoff (2003), no regime de demonstrações financeiras americano,
principalmente devido aos bônus em dinheiro e às opções de compras de ações, dados
aos executivos em função dos resultados contábeis, estes tendem a manipular resultados
financeiros ou atrasar ou esconder notícias ruins.
Demonstrar pode ter o sentido de tirar monstros, finalidade que as
demonstrações financeiras muitas vezes não cumprem, contribuindo, pelo contrário,
para criar mais monstros na imaginação dos que precisam entendê-las para tomar
decisões. Isto porque as demonstrações financeiras se enquadram no grupo dos sistemas
peritos ou abstratos.
Em 2008, os Estados Unidos defrontam-se com mais uma crise séria, em grande
parte devida à falta de fiscalização sobre instrumentos financeiros extremamente
especulativos, e se preparam para o ajuste regulatório mais sério em sete décadas (após
o crash de 1929). Esse ajuste ampliará os poderes do Fed (Banco Central Americano),
apesar da dúvida sobre se leis mais duras teriam impedido a crise atual (Guandalini,
2008, p. 78).
Os sistemas de gestão e de demonstrações financeiras podem ser considerados
sistemas peritos (ou especialistas), que são “sistemas de excelência técnica ou
competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes material e social
em que vivemos hoje” (GIDDENS, 1991, p. 35). Não se conhece e não se pode conferir
a maior parte dos fundamentos (códigos de conhecimento) que regem seu
funcionamento. Porém, confia-se, tem-se fé, não tanto em suas competências, mas na
autenticidade do conhecimento perito.
20
Os sistemas peritos dependem de uma “fé” pragmática, baseada na experiência
que mostra certa regularidade no funcionamento de tais sistemas. Além disso, existem
forças reguladoras que protegem os consumidores, como as agências governamentais, as
associações profissionais, os órgãos de defesa dos consumidores etc., que certificam
profissionais, licenciam máquinas, vigiam a utilização de padrões, ou seja, dão
autenticidade a esses sistemas.
O modo de comunicação das demonstrações financeiras (contas e grupos de
contas, saldos reais e previstos, critérios de classificação, de rateios, notas explicativas
etc.) deve gerar confiança nos públicos a que se destinam.
As empresas de autogestão, estudadas neste trabalho, devido aos pressupostos do
contexto a que pertencem, o da Economia Solidária, deveriam ter mecanismos de
participação dos trabalhadores associados, apoiados por controles internos efetivos e
canais de comunicação transparentes e democráticos, em que a apropriação das técnicas
de gestão fosse uma prática comum.
Relevância do tema
Um exemplo inicial da relevância do tema é a Lei Sarbanes-Oxley, criada em
2002, nos Estados Unidos, como reação aos prejuízos causados pelas fraudes de 2001, e
que visa à governança corporativa, ou seja, dar aos processos de negócio transparência e
segurança contra fraudes. A adequação à lei é obrigatória para todas as companhias
norte-americanas e suas subsidiárias que tenham ações nas bolsas americanas.
Iniciativas como essa também são acompanhadas pela busca de padrões
contábeis, como o US GAAP (Generally Accepted Accounting Principles in the United
States) e o IFRS (International Financial Reporting Standard), que são conjuntos de
pronunciamentos de contabilidade publicados por órgãos da área como o FASB
(Financial Accounting Standards Board) e IASB (International Accounting Standards
Board). No Brasil, o Banco Central e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) estão
normatizando a questão, e estabeleceram que as instituições financeiras e as companhias
abertas deverão apresentar as demonstrações consolidadas de 2010, comparativamente a
2009, seguindo as normas internacionais (RAMON, 2007).
21
Com o crescimento das empresas e a conseqüente complexidade de sua
organização, parece também haver mais necessidade de atender à demanda de
informações por parte de investidores e credores. A liquidez em Bolsa e a inclusão em
níveis diferenciados de governança corporativa também estão positivamente associadas
à quantidade de informações financeiras disponibilizadas pelas empresas” (Mendes da
Silva e Magalhães Filho, 2005), embora, conforme esses autores, contrariando as
expectativas, o retorno anual das ações dessas empresas tenha se revelado
negativamente associado à quantidade de informações disponíveis no website
corporativo.
Um estudo conduzido pela Business Week Magazine (apud PRICE/SAP, 2005b,
p. 4), identificou uma correlação entre governança corporativa e retorno financeiro. Um
estudo correlato da McKinsey (Idem, p. 4) revelou que falhas de conformidade
(compliance) têm impacto negativo nos analistas, investidores e agências
classificadoras, e, por conseqüência, no preço das ações. Esse estudo mostrou que 80%
dos investidores estariam dispostos a pagar um preço maior por ações de empresas com
governança efetiva. Segundo a agência Moody’s (apud PRICE/SAP, 2005b, p. 4),
baixos ratings de crédito são uma das conseqüências de falhas graves nos controles
internos sobre demonstrações financeiras, como, por exemplo, práticas inadequadas de
avaliação de riscos.
Napolitano (2007, p.164) observou que têm feito sucesso, entre os investidores
brasileiros, os fundos de ações socialmente responsáveis, que doam parte de seus
ganhos a projetos sociais e de preservação ambiental, ou aplicam em ações de empresas
com boa governança corporativa. Porém, esses investimentos têm dado retorno apenas
regulares o que mais rendeu no período de novembro de 2006 a outubro de 2007, o
Ethical II, do ABN-Amro, empatou com o Ibovespa (que tem empresas em comum
com esse fundo na carteira), o que também pode revelar uma tendência dos
consumidores de admitir ganhar na dia, mas manter a escolha, como, por exemplo,
pagar mais por produtos de empresas que façam a “compensação de carbono” etc. Em
outro trabalho, Rezende (2006) confirma a hipótese de que a rentabilidade desses
fundos é semelhante aos outros fundos de ações, porém as empresas que integram esses
fundos possuem melhor performance que as empresas que não são consideradas
socialmente responsáveis, segundo os critérios de seleção dos fundos de investimento
socialmente responsáveis.
22
A questão, sempre presente, é a da convivência, em uma economia capitalista,
de empresas com características diferenciadas desta Economia Solidária, Empresas de
Autogestão, Comércio justo, Empresa Verde, Empresa Amiga da Criança, Melhores
Empresas para se Trabalhar etc. e sua atuação no mercado, competitividade e as
possibilidades de uso de soluções mais complexas (reengenharia, terceirização,
offshoring, fusões e aquisições etc).
Motivação para o trabalho
A motivação para o trabalho são as várias experiências do autor com sistemas
informatizados de informações gerenciais e contábeis, com o desafio de gerar, por meio
desses sistemas, relatórios e demonstrativos transparentes, corretos e inteligíveis por
diversos públicos, ou seja, com requisitos de confiabilidade.
Seguem algumas dessas experiências:
Participação no desenvolvimento do Sistema de Gestão da Comunicação
(interna e externa) do Itaú, baseado na implantação, nos moldes do Bank of
America, de um código de divulgação voluntária (voluntary disclosure);
Nesse trabalho foram levantados os conceitos, os termos e o processo de
comunicação interna e externa e foram produzidos um glossário dos termos
usados nas comunicações e um catálogo das comunicações, contendo
emissores, receptores, conteúdo, periodicidade, meio e autoridade;
Participação na elaboração de projeto de pesquisa, visando a um sistema para
gestão de orçamento público por comunidades organizadas, no município de
Mauá. Este projeto, caso fosse aprovado, poderia resultar em uma ferramenta
de grande valia para o conceito de Orçamento Participativo (democracia
baseada na informação);
Desenvolvimento, para o grupo Pirelli, de um módulo de demonstrações
financeiras baseado no conceito de correção integral de balanço, que
permitia um melhor entendimento dos números em regimes de alta inflação;
Participação de um grupo de estudo de Economia Solidária, na Fundação
Santo André, que estudava, entre outros temas, as demonstrações financeiras
de empresas de autogestão, baseado na necessidade de entendimento e
23
transparência dos dados para todos os associados da empresa. Nesta época,
esse autor preparou um módulo sobre Marketing para um MBA (Master in
Business Administration) específico para empresas de autogestão,
coordenado pela ANTEAG Associação Nacional dos Trabalhadores em
Empresas de AutoGestão e Participação Acionária;
Elaboração de dissertação de mestrado, na PUC-SP, sobre o impacto causado
nos funcionários administrativos devido à reengenharia de processos e a
implantação de sistemas ERP, em que a comunicação da mudança era um
fator crítico;
Participação na criação de sistema de custeio por atividade na Fundação
Santo André, visando ao conhecimento dos custos de cada curso ou projeto.
Esse sistema de custeio permite mais transparência para o processo de
comunicação das informações e evita rateios por critérios pouco claros. O
maior conhecimento do processo produtivo (atividades) é um dos ganhos
desse sistema de custeio;
Análise, discussão e elaboração de pareceres sobre criação e reformulação de
cursos de graduação, a partir de projeções de receitas, custos, despesas,
evasão etc., feitos para o CAF (Conselho de Administração e Finanças) da
PUC-SP. Esses pareceres são utilizados para verificação de viabilidade
econômica e para decisões vitais para esses cursos, como o valor da
mensalidade, que devem ser tomadas com números corretos e confiáveis;
Análise de sistemas informatizados para apuração de contas na área de
saúde, nos quais está sempre presente a desconfiança, por parte das fontes
pagadoras (seguradoras, convênios dicos e convênios autogeridos), sobre
os lançamentos feitos pelos operadores (hospitais, médicos, empresas de
diagnósticos etc.);
Ensino de empreendedorismo e sistemas de gestão no Curso de Bacharelado
em Ciência da Computação, da PUC-SP, contendo um módulo sobre
sistemas de informação contábeis, que visa preparar os alunos para
compreender as principais demonstrações financeiras e sua utilidade para a
tomada de decisão.
24
Em todos esses trabalhos, o desafio sempre foi o de utilizar uma linguagem que
criasse confiança nos usuários das informações, de modo a eliminar os monstros criados
na cabeça destes, por terem de lidar com sistemas que eles não dominavam, mas que os
afetava de forma direta e relevante.
Objetivo do trabalho
O objetivo deste trabalho é analisar os modos de geração de confiança no
processo de comunicação de informações econômico-financeiras (balanços, resultados,
fluxos de caixa, orçamentos, planejamento estratégico etc.), feitas pelos produtores
dessas informações (contadores, controllers, gerentes financeiros), para um tipo
específico de usuário, que são os associados, ou cooperados, de empresas de autogestão.
O objeto de estudo será o processo comunicativo dessas informações nas empresas de
autogestão. O objetivo é obter critérios ou uma metodologia para produção e
disseminação de demonstrativos que possam gerar confiança da parte dos receptores e
confiabilidade do processo de comunicação.
A confiabilidade no processo de comunicação daria maior credibilidade ao modo
de operar da Economia Solidária, principalmente à autogestão. A confiança no processo,
por parte dos receptores das informações, propiciaria um ambiente com menores custos
de transação e maiores possibilidades de desenvolvimento.
Método de trabalho
A revisão da literatura contempla os seguintes grupos de referências teóricas:
Sobre confiança, serão utilizadas, principalmente, as seguintes referências:
Robert C. Solomon e Fernando Flores (2002), sobre os fundamentos da
confiança e sobre a criação da confiança autêntica;
Eduardo Gianetti da Fonseca (2003), sobre as modalidades de mal-
entendidos;
25
Francis Fukuyama (1996), sobre a prosperidade gerada nas sociedades
baseadas na confiança;
Richard Sennett (2000), sobre a crise de confiança e do caráter devido ao
capitalismo flexível;
Anthony Giddens (1991), quanto à confiança em sistemas abstratos, ou
sistemas especialistas (peritos), que será visitada devido ao fato de as
demonstrações financeiras poderem ser enquadradas nessa categoria;
Peter Bernstein (1997), sobre o risco e sua relação com a confiança;
Jürgen Habermas (2000) sobre a confiança como uma das características
da modernidade.
Sobre a comunicação verbal (oral e escrita), principalmente quanto ao
processo de comunicação (emissor – receptor – mensagem – código meio),
serão utilizadas as seguintes referências:
Lucia Santaella (2001), sobre as teorias, modelos e âmbitos da pesquisa
em comunicação;
John Fiske (2005), sobre os modelos do processo de comunicação;
Armand e Michele Mattelart (2008), sobre a história das teorias da
comunicação;
Antonio Hohlfeldt, Luiz C. Martino e Vera Veiga França (2001), sobre
conceitos, escolas e tendências da comunicação;
José Maria Dias Filho (2001) e em conjunto com Masayuki Nakagawa
(2007), sobre a compreensibilidade da informação contábil (problemas
de evidenciação), à luz da Teoria Semiótica e da Comunicação;
Sobre governança corporativa, conformidade (compliance) e um ambiente de
negócios mais regulamentado (Lei Sarbanes-Oxley, Novo Mercado da
BOVESPA, ITIL, COBIT etc.), serão utilizadas, principalmente, as seguintes
referências:
26
Publicações das maiores empresas de consultoria e auditoria, como a
PriceWaterhouseCoopers (2008), Deloitte (2003 e 2004) e KPMG Risk
Advisory Services (2008);
Publicações da BOVESPA (2008) sobre veis de governança e o novo
mercado;
Masayuki Nakagawa (2007), sobre accountability (prestação de contas).
Sobre autogestão, que é o modelo administrativo usado pelas empresas da
Economia Solidária, cujas demonstrações devem seguir os pressupostos de
transparência e confiabilidade, serão utilizadas, principalmente, as seguintes
referências:
Edir Antonia de Almeida (2006) e Valdir Michels (1995 e 2000), sobre
as características específicas das finanças e da contabilidade de empresas
de autogestão, cooperativas e da Economia Solidária;
Paul Singer (2000), sobre Economia Solidária no Brasil;
Publicações de entidades de apoio, de pesquisa e de órgãos
governamentais, sobre autogestão e Economia Solidária, como a
ANTEAG Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de
AutoGestão e Participação Acionária (2004, 2005 e 2006), IBASE /
ANTEAG (2004) e MTE / SENAES - Ministério do Trabalho e Emprego
/ Secretaria Nacional de Economia Solidária (2006).
A metodologia de pesquisa será a dos múltiplos estudos de caso, em empresas de
autogestão e entidades de apoio técnico a essas empresas. Ela prevê a formulação
teórica anterior ao trabalho de campo, que será feita mediante a utilização de um
protocolo de estudo de caso.
Serão feitos levantamentos de documentos e entrevistas no território do emissor
de comunicações econômico-financeiras (contadores, administradores financeiros etc.)
para observar a confiabilidade do processo, mediante a utilização de regulamentações e
critérios de evidenciação. Serão também feitas observações no território dos receptores
(usuários) desse tipo de comunicação (associados / cooperados, gestores de outros
setores não financeiros), para observar a imputação de confiança nas informações que
27
recebem, e quanto dessa confiança é devido ao processo de comunicação ou a outros
fatores ligados à constituição da empresa.
As entrevistas com representantes de entidades de apoio técnico à Economia
Solidária, à Autogestão e às Cooperativas serão importantes para captar os problemas
desse tipo de empresa, vistos sob a óptica dos pesquisadores do tema, formadores de
quadros, mediadores políticos etc.
O levantamento será complementado com o aproveitamento de dados
secundários, oriundos de outras pesquisas efetuadas em cooperativas, nas categorias de
análise que mantêm alguma relação com este trabalho, como a participação dos
associados nas decisões, o processo de comunicação, o uso de informações contábeis
etc.
A análise dos levantamentos deste trabalho permitirá a proposição de processos
de comunicação de informações econômico-financeiras que sejam confiáveis e que
gerem confiança nos diversos públicos a que elas se destinam.
Organização do trabalho
Na parte I serão estudados os fundamentos teóricos da confiança, do processo de
comunicação e da governança corporativa, com os seguintes capítulos:
O capítulo 1 tratará da questão da confiança (ato de confiar) e confiabilidade
(ser confiável) e dos processos de construção da confiança autêntica, mais
efetiva que a confiança simples e que a cega. Serão também abordadas as
vantagens da confiança e os problemas da desconfiança para a sociedade e
para as empresas. A teoria dos sistemas abstratos (sistemas peritos) será útil
para entender os mecanismos desse tipo de sistemas para que possa,
posteriormente, ser aplicada às demonstrações financeiras;
O capítulo 2 delimitará o trabalho no campo da comunicação, concentrando-
se na análise do processo de comunicação, nos seus diversos territórios
(emissor, mensagem, meio, receptor), principalmente naqueles em que as
informações econômico-financeiras sejam o objeto;
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O capítulo 3 aprofundará a questão das demonstrações financeiras, dentro do
escopo de governança corporativa, que contém regras aplicáveis,
principalmente a grandes empresas, geralmente multinacionais. Serão
contempladas posteriormente as possibilidades de aplicação dessas regras ao
tipo de empresa desse estudo, de menor porte que estas grandes corporações.
Na parte II, da Economia Solidária e autogestão, serão estudadas as questões
referentes ao objeto de estudo do trabalho, que é o processo de comunicação de
informações econômico-financeiras das empresas de autogestão, com os seguintes
capítulos:
O capítulo 4 tratará de aspectos da Economia Solidária (fundamentos,
autogestão, transparência, formação, indicadores);
O capítulo 5 dará ênfase às finanças e à contabilidade dessas empresas,
principalmente na comunicação das informações produzidas.
A parte III, da pesquisa de campo e dos resultados, detalhará a metodologia de
pesquisa, apresentará os resultados do trabalho de campo e fará propostas para criação
de confiança na comunicação de informações econômico-financeiras, especificamente
para as empresas de autogestão, com os seguintes capítulos:
No capítulo 6, será detalhada a metodologia de pesquisa utilizada (múltiplos
estudos de caso), contendo as hipóteses ou premissas do trabalho, as
unidades escolhidas, os critérios para garantia da qualidade da pesquisa e o
protocolo para o estudo dos casos;
O capítulo 7 analisará o material levantado nos estudos de caso e tecerá
observações quanto à aplicação dos métodos existentes para garantir a
confiabilidade das demonstrações financeiras e a confiança dos usuários
dessas demonstrações. Fará, também, propostas de modificações no processo
de comunicação das empresas de autogestão para criar confiança na
comunicação de informações econômico-financeiras.
29
Mapa conceitual do trabalho
Um mapa conceitual é construído a partir de conceitos (substantivos ou termos
substantivos) e das ligações ou relações entre eles, feitas por meio de verbos ou termos
verbais (NOVAK e GOWIN, 1984). O mapa a seguir evoluiu durante a confecção do
trabalho e foi útil como guia visual do relacionamento de conceitos.
Ilustração 1 – Mapa conceitual do trabalho
Desenvolvido usando o software CMap (IHMC, 2008).
31
PARTE I – CONFIANÇA E COMUNICAÇÃO
Nesta parte serão discutidos diversos aspectos da confiança e da confiabilidade do
processo de comunicação na perspectiva da confiabilidade do emissor, transparência
da mensagem/canal e da construção da confiança do receptor e as práticas de
governança corporativa, adotadas justamente devido à quebra de confiança, em larga
escala, ocorrida no mercado de capitais norte-americano em 2001.
33
1. CONFIANÇA
Este capítulo abordará os tipos de confiança (cega, simples, autêntica) e fará a
distinção entre a confiança (ato de confiar) e confiabilidade (ser confiável). Serão
também abordadas as vantagens da confiança e os problemas da desconfiança para a
sociedade e para as empresas. Será estabelecido, também, um relacionamento entre as
demonstrações financeiras e os sistemas abstratos (ou peritos).
Solomon e Flores (2002) propõem algumas definições do que é e do que não é
confiança:
Confiar é algo que se exerce individualmente; é algo que se constrói, que se
sustenta com nossas promessas, nossos compromissos, nossas emoções e o
sentimento de nossa própria integridade” (Idem, p. 21);
Não é um meio, uma atmosfera, um “lubrificante”, uma “cola social”, um
golpe de sorte para uma ou outra sociedade, ou algum “material” social
misterioso (Idem, p. 21);
Não é algo que tem de existir desde o início, ou que pode ser considerado
como garantida (Idem, p. 21);
Não é meramente dependência, ou previsibilidade, ou o que por vezes se
entende por confiabilidade (Idem, p.21);
Não é um risco. É um alargamento do mundo, não sua diminuição (Idem,
p.31);
Uma vez estabelecida, facilmente recua para o pano de fundo, para um
familiar e, portanto, pouco consistente conjunto de hábitos e práticas. Nesses
casos, se torna visível, de forma retrospectiva, quando é desafiada ou
violada (Idem, p.31);
É um “como fazer” (processo), não um sabe-se que” (crença). É um
“aspecto da cultura e o produto de uma prática, não só questão de psicologia
ou de atitude individual” (Idem, p.32);
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A questão principal não é a confiabilidade (em quem confiar os emissores
de comunicações), mas a confiança (o confiar – ato dos receptores). “A
confiança não só é merecida; precisa ser dada” (Idem, p. 33);
Não é um sentimento, algo que acontece. É um envolvimento com o mundo,
uma prática (Idem).
1.1. Tipos de confiança e suas características
Segundo Solomon e Flores (2002), existem vários tipos de confiança: básica,
simples, cega e autêntica. O quadro a seguir levanta algumas características desses tipos
de confiança:
Tipo de
confiança
Características
Básica
(certa)
É a confiança baseada na familiaridade e tomada como certa
(SOLOMON E FLORES, p. 67).
É relativamente aberta e indiscriminada (Idem, p. 68).
É negativa, no sentido de que é a confiança de que coisas ruins não
acontecerão, porque se vive em um espaço “familiar” (Idem, p. 68).
Simples
(ingênua)
“É uma confiança livre de qualquer senso de possibilidade da
desconfiança, uma confiança na forma da aceitação impensada” (Idem,
p. 97).
É uma confiança básica mesmo quando se está em uma situação
desconhecida ou perigosa (Idem, p. 97).
É a completa ausência de suspeita. Não questiona o merecimento à
confiança do outro, não porque não tenha havido razões para o
questionamento, mas por ingenuidade (Idem, p. 97).
“Pode ser considerada um otimismo focalizado” (Idem, p. 98).
A perda da confiança simples ou o término da transparência ingênua,
não são em si uma tragédia, são um “convite à reflexão e à
compreensão, as premissas da sabedoria” (Idem, p. 100).
35
Cega
(negação)
Rejeita (nega) as evidências da traição ou violação sofrida (Idem, p.
102).
É auto-enganadora (Idem, p. 102).
Simplifica a vida, quando a confiança simples não é mais uma opção
(Idem, p. 103).
Não aceita a possibilidade da desconfiança (Idem, p. 105).
Requer confiança absoluta, incondicional (Idem, p. 105).
“... (como a paranóia, seu oposto) pode ser impressionantemente
articulada, admiravelmente coerente, e em certas ocasiões,
convincente”. Não é por serem estratégias que deixam de ser emoções
(Idem, p. 108).
Autêntica
(construída)
A confiança autêntica não necessita da exclusão da desconfiança. Ao
contrário, abraça as possibilidades de desconfiança e traição como
uma parte essencial da confiança (Idem, p. 21).
É uma confiança plenamente consciente de si mesma,
conhecedora de suas próprias condições e limites, aberta a
novas e até inimagináveis possibilidades, baseada na escolha e na
responsabilidade, e não em operações mecânicas de
previsibilidade, dependência e de rígida obediência às regras
(Idem, p. 95).
Quadro 1 – Tipos de confiança
Fonte: Solomon e Flores (2002).
Independente da definição que se para confiança ou de uma eventual
tipologia, o importante para o contexto deste trabalho é como construir a confiança e,
ainda, como construí-la a partir de uma quebra (traição) de confiança.
A confiança tratada neste trabalho, para a comunicação de informações
econômico-financeiras, é a confiança autêntica. A chave para essa confiança é a ação,
especialmente os compromissos, assumidos e honrados daí se falar em construção,
não em sentimento.
O problema da confiança pode ser, acima de tudo, uma questão de
compreensão, mas tal compreensão é significativa com a busca de uma
prática, de uma rotina do dia-a-dia, de um modo de ser ou, para as
36
organizações ou nações, com a busca do desenvolvimento de instituições de
confiança (SOLOMON e FLORES, 2002:18).
A construção da confiança inicia-se com sua apreciação e compreensão, mas
requer uma prática. Não se pode mecanizar a confiança, ou seja, confundi-la com
garantia e segurança.
Mas a confiança não é uma questão de previsibilidade e expectativas.
Necessariamente envolve interações e relacionamentos (não importa quão
abreviadas). É uma função de nossos compromissos ativos, que por sua vez
podem assumir a forma de reciprocidade. A confiança envolve o fazer, não só
o crer; ação recíproca, não dependência passiva e previsão. A confiança é um
meio de engajamento interpessoal, não um mero cálculo” (Idem, p. 91).
Existem limites para as possibilidades de compreensão. Segundo Fonseca (2003,
p.147), seguindo a idéia de Locke sobre a falibilidade dos leitores, é necessário primeiro
entender o que foi dito ou escrito, para depois se poder discordar ou concordar, pois a
compreensão tem graus variados. Os leitores de uma mesma mensagem ou texto com
freqüência não concordam, e “nem todas as alegações de entendimento podem ser
simultaneamente consideradas verdadeiras”.
A distorção da comunicação pode se dar pelos mal-entendidos, que são “uma
falha espontânea de entendimento ou interpretação das idéias de outra pessoa”, ou seja,
“mal-entendido puro”, e não a comunicação errônea de forma deliberada, que é uma
deturpação (FONSECA, 2003, p. 148).
A confiança (o ato de confiar) é dada pelos receptores e não somente pela
confiabilidade dos emissores. Segundo Fonseca (2003, p. 148):
...os receptores, e não os autores, estabelecem e variam o significado do que
está sendo dito. A interpretação específica que determinada mensagem ou
texto recebe dependerá, em geral, não da intenção e clareza do autor mas
também, e em grande medida, da percepção que se tem quanto às exigências
da vida prática (os problemas da época) e dos interesses, objetivos e
preocupações específicas dos usuários individuais.
Quem transmite a informação, buscando manter sua autoridade e reputação, cria
uma barragem de certezas”, e muitas vezes oculta dos receptores e às vezes ade si
mesmo alguns fatos inconvenientes. Porém, o receptor é, muitas vezes, um cúmplice
do mal-entendido. Ele se faz uma presa fácil, pois adota uma atitude passiva no
intercurso, ou, nas palavras de La Rochefoucaud (apud Fonseca, 2003, p.169): “somos
37
mais preguiçosos na mente do que no corpo”. Assim, o se faz o esforço necessário
para compreender, deixando para outros a tarefa de pensar.
O receptor acredita sinceramente que compreendeu a mensagem passada pelo
emissor, quando de fato não a compreendeu, caindo em uma armadilha preparada por
ele mesmo. Se desconfiar da armadilha, poderá procurar uma saída, estudando mais o
assunto e suspendendo temporariamente a crença. Porém, se não conseguir identificar o
que ocorreu, não procurará uma saída e a sua confiança (ilusória) em sua capacidade de
decodificar e entender a mensagem transmitida o deixa indefeso (FONSECA, 2003, p.
170).
Em muitos casos, o problema da imprecisão da linguagem é atacado com a
criação de termos novos específicos, com a introdução de definições rígidas e a
formalização excessiva da apresentação, que fica desnecessariamente técnica.
Alfred Marshall (apud Fonseca, 2003, p.176) propôs que nunca se desviasse
demais dos termos familiares da vida cotidiana e da linguagem inteligível parra o
público em geral, como forma de lidar com as dificuldades da terminologia econômica e
técnica. As definições confiantes e rígidas que aparecem no início de algumas
apresentações podem induzir o receptor a uma falsa segurança. Nesse caso, o fato de um
contador, com CRC, citando órgãos de controle (CVM, CRC, FASB etc.), usando o
balanço patrimonial como base para explicação dos números da empresa, pode
funcionar como argumento de autoridade, evitando questionamentos e dificultando a
compreensão e a possibilidade da tomada de decisão consciente e conseqüente
construção da confiança.
Uma questão que pode ser um empecilho para a construção da confiança
autêntica é, na concepção de David Hume (apud Fonseca, 2003, p. 103), que “a crença é
mais propriamente um ato da parte sensível, e não da parte cogitativa de nossas
naturezas”.
O que Hume (apud Solomon e Flores, 2002, p. 113) ofereceu à filosofia da
confiança foi apontar, de forma polêmica, “o quanto racionalmente ‘infundadas’ o
nossas mais básicas crenças, aquelas das quais precisamos depender para afirmarmos o
conhecimento do que quer que seja”. Se não segurança da repetição do passado no
futuro, se o se pode depender do julgamento sobre as leis da natureza e das
38
conclusões indutivas da experiência prévia, mesmo em termos de probabilidades, então,
como se pode afirmar saber alguma coisa do mundo?
Em alguns casos, quer-se dar um ar de super-objetividade à comunicação de
informações econômico-financeiras, como se não fosse produto de pessoas da
organização, como se viessem de um sistema que não foi definido pela empresa, embora
com ajuda de consultorias.
Embora as instituições não sejam o mesmo que os indivíduos (a noção de
“face a face” é difícil de aplicar-se às instituições, por exemplo), as
instituições são entidades humanas. Não são apenas criações humanas como
as pontes, os edifícios e as teorias. São completamente humanas no sentido de
serem totalmente constituídas, dirigidas e movidas por ações e decisões de
indivíduos e coletividades humanas (Idem, p. 115).
Como as empresas possuem interesses, mesmo que estritamente econômicos, e
têm um comportamento estratégico, então a elas se pode apelar, com elas se pode
negociar, delas se pode depender (ou não) de cumprirem seus compromissos. O
procedimento interno de tomada de decisão da empresa ou instituição pode descrever as
linhas para essa operação, a capacidade de tomar decisões, em diversos modos. Os
pronunciamentos oficiais da corporação podem não ser nada mais do que a opinião
majoritária dos funcionários (embora essa abordagem ainda seja relativamente rara).
Podem, em contrapartida, ser os pronunciamentos ditatoriais de uma única figura em
sua capacidade como diretor da organização. Ou, como na maioria das corporações, o
procedimento de tomada de decisão pode definir diversas funções diferentes, por meio
de uma hierarquia ou nexos de departamentos, divisões, conselhos e comitês. O
essencial, nas considerações de confiança, é que a corporação pode e deve ser
considerada em termos de responsabilidades humanas. Confiar numa corporação, por
conseguinte, é muito mais como confiar numa pessoa do que depender da natureza ou
de uma máquina, quaisquer que sejam as complicações de se identificarem as relevantes
operações responsáveis. Envolve relacionamentos humanos, não meramente previsões e
controle (Idem, p. 116-118).
Um aspecto importante sobre a criação da confiança é apontado por Granovetter
(apud Jerônimo, 2005, p. 45-46), quando diz que “a confiança é um valor traçado por
normas e culturas sociais, ou seja, é um subproduto da inserção (embeddedness) das
partes que compartilham um norma cultural e social comum”. Assim, a confiança entre
os participantes de um negócio é função não somente das transações em si, mas do
39
ambiente de negócios do qual fazem parte, ou seja, cultura societária, política,
regulação, profissionalização e instituições nacionais”.
Conforme Barney e Hansen (apud Silva et al., 2004, p. 4), a confiança, no
contexto dos arranjos cooperativos interorganizacionais, “é a segurança mútua de que
nenhum agente irá explorar as vulnerabilidades dos demais”. Para esses autores, “a
exploração das vulnerabilidades possui natureza oportunística, uma vez que o
oportunismo pode ser visto como o oposto da confiança”.
1.2. Vantagens da confiança e da confiabilidade
Uma vantagem competitiva que um ambiente de confiança propicia é a
diminuição do custo de transação, que é influenciado pela complexidade da execução
dos negócios, pelas fraudes, pelas desconfianças em relação ao outro e a conseqüente
criação de protocolos, recibos etc. De acordo com Niklas Luhmann (apud Solomon e
Flores, 2002, p. 26), “a confiança é uma maneira de lidarmos com a complexidade de
uma sociedade crescentemente complexa”.
Um exemplo da importância do desenvolvimento da confiança para a
diminuição dos custos de transação está em um dos 14 pontos de Deming para a
qualidade, aplicado com sucesso pelo Japão. Diz o ponto IV:
Cessar a prática de comprar apenas com base no preço. Ao invés disso, deve-
se procurar minimizar o custo total. É preciso desenvolver um fornecedor
único para cada item, num relacionamento de longo prazo fundado na
lealdade e confiança (DEMING, apud MAXIMIANO, 2004, p.193).
Na pesquisa sobre redes de cooperativas do setor agroalimentar no Rio Grande
do Sul, Jerônimo (2005, p. 8) aponta que elas conseguem reduzir os custos de transação,
aumentar as economias de escala, de escopo e de especialização, além de aumentar o
poder de barganha. Conseguem, também, obter “melhoramentos contínuos,
aprendizagem coletiva e a ampliação de mercados”. Para isso, a confiança tem um papel
central, é “condição indispensável não somente para elevar a competitividade, mas à
formação, manutenção e a continuidade do próprio arranjo interorganizacional”.
Outro aspecto positivo para a sociedade é a confiança como pré-condição da
prosperidade. Segundo Fukuyama (1996), as sociedades em que a confiança é alta,
40
destacam-se por seu potencial de formação de parcerias cooperativas bem-sucedidas e
de longo alcance, aumentando o chamado capital social.
Para Costa (2005, p. 239), a noção de capital social, ou capital de
relacionamento, pode ser entendida como:
A capacidade de interação dos indivíduos, seu potencial para interagir com os
que estão a sua volta, com seus parentes, amigos, colegas de trabalho, mas
também com os que estão distantes e que podem ser acessados remotamente.
Capital social significaria aqui a capacidade de os indivíduos produzirem suas
próprias redes, suas próprias comunidades pessoais.
De acordo com Putnam (apud Fernandes, 2002, p. 376), “capital social refere-se
a aspectos da organização social, tais como redes, normas e laços de confiança que
facilitam a coordenação e cooperação para benefícios mútuos. Capital social aumenta os
benefícios de investimento em capital físico e capital humano”. Dentre as 12 variáveis
que Putnam (apud Fernandes, 2002, p. 383) usou para a criação de um índice de
desempenho institucional, três são políticas (estabilidade do gabinete; legislação
reformadora; inovação legislativa), quatro referem-se a políticas de investimentos
(instrumentos de política industrial; capacidade de efetuar gastos na agricultura; gastos
com saneamento local; habitação e desenvolvimento urbano), duas são sobre serviços
(quantidade de creches; quantidade de clínicas familiares) e em três delas o aspecto
principal é a comunicação e a transparência das ações públicas (presteza orçamentária;
serviços estatísticos e de informação; sensibilidade da burocracia).
No caso da transparência e presteza orçamentária, a criação de um orçamento
público é uma construção social complexa, pelo que tem de implicações na vida de cada
um, pelas vantagens das minorias influentes, pela dificuldade de priorizar gastos e
investimentos. Czarniawska-Joerges (1992, p. 221) fala do orçamento como uma
linguagem de consenso e propõe uma análise da retórica e das metáforas utilizadas na
sua elaboração.
Uma das características marcantes da confiança é sua natureza recíproca. “A
maioria das pessoas reage à confiança sendo confiável, tornando ainda mais provável a
confiança” (SOLOMON E FLORES, 2002, p. 60). Também interpretamos as
evidências de modo a confirmarmos haver confiado sabiamente” (Idem, p. 60). Essa
tendência para a confirmação é ainda mais evidente na espiral decrescente da
desconfiança” (Idem, p. 60). Para Nietzsche (apud Solomon e Flores, 2002, p. 61), “o
41
que vemos em uma pessoa, também nela provocamos”. No caso da confiabilidade do
processo de comunicação e da confiança dos receptores das informações econômico-
financeiras, pode-se estabelecer uma espiral positiva de confiança-confiabilidade. Um
exemplo dessa reciprocidade é o modelo de microcrédito do Banco Grameen, que tem
por objetivo a emancipação dos que a ele estão vinculados (YUNUS, 2006).
1.3. Falta de confiança
As alternativas para a confiança são, no dizer de Solomon e Flores (2002, p. 43),
o medo, o controle e o poder. Todos concordam que deve haver mais confiança, que a
desconfiança tem um alto custo e ineficiência. Porém, quando a questão é construir mais
confiança, existem dificuldades como a de achar que não se pode confiar nas pessoas,
que estas devem ser controladas ou ameaçadas. A suposição subjacente é a de que
existe uma natureza humana fixa e que sua essência é o egoísmo. A estratégia prudente,
portanto, determina uma desconfiança generalizada” (Idem, p. 46).
Sennett (2000) enxerga essa crise de confiança como resultado do capitalismo
flexível, que causa o que chama de “corrosão do caráter”, produto de rupturas,
reorganizações, reinvenções ou reengenharias, em que os sobreviventes ficam mais à
espera do próximo golpe do “facão” do que felizes com a vitória sobre os demitidos.
No relato de funcionários que sobreviveram à reorganização ocorrida na IBM no
início da década de 90, havia muito nervosismo e falta de segurança. Agiam como se
“vivessem um tempo emprestado, achando que não haviam sobrevivido por um bom
motivo” (SENNETT, 2000, p. 150). A desconfiança e a atitude defensiva, no lugar do
propósito compartilhado, chegaram quase a destruir o moral em muitas das principais
empresas (SOLOMON E FLORES, 2002, p. 40).
Uma faceta da manipulação e do engodo, apontado por Sennett (2000), é a da
falsa atribuição de autonomia, ou de controle de suas atividades, às categorias
inferiores. É o chamado “flexitempo”, resultando no aumento de controles para os que
estão trabalhando em casa ou em horários não padronizados.
Quando consultores e executivos corporativos falam de empowerment uma
oferta aparente de se negociar o compartilhamento do poder em recompensa à
confiança os funcionários prudentemente reagem com suspeita.
Empowerment em geral significa responsabilidade e culpa sem qualquer
42
autoridade ou autonomia real. E onde a cultura primordial da companhia é
uma de comando e controle, o resultado é desconfiança e cinismo difundidos
(SOLOMON E FLORES, 2002, p. 46).
Outro sentimento marcante dessa crise de confiança é a perda de referências, que
Sennett (2000) chama de deriva, cujos sinais mais tangíveis são a “falta de longo
prazo”, “novas formas de organizar o tempo, sobretudo o tempo do trabalho”, e os
empregos sendo substituídos por “projetos”.
Nos negócios, as pessoas podem não mais sentir compreender suas funções
em suas empresas e podem temer pela segurança de seus empregos mesmo
quando julgam estar fazendo um bom trabalho. A combinação de pressões
competitivas com o temor resulta em baixo moral e baixa eficiência, assim
como num declínio na lealdade e dedicação (SOLOMON E FLORES, 2002,
p. 58).
A questão do poder pode ser compreendida como pura força, por meio da
imposição do medo (ameaças), ou como autoridade, ou como poder legítimo
(merecido). Quando é obtido por pura força resulta em temor e destrutividade. Quando é
legítimo, já possui a confiança embutida nele. Nesse caso, a confiança na competência
do líder, ou na identificação deste com o bem da companhia, ou na compreensão do seu
poder. “Em uma cultura estruturada pelas relações de poder, os compromissos e as
promessas possuem um significado diferente do que possuem num contexto de
confiança mútua”. No contexto das relações de poder, a confiança é um cálculo de
interesse próprio, que junto com a astúcia e a conspiração podem minar uma
organização. Quando a motivação das pessoas é apenas a de evitar a punição por uma
falha, não haverá a cooperação, mas um sentimento de alienação, de não
responsabilidade. Haverá, também, nesse contexto, a perda da criatividade. Até mesmo
o levantamento da possibilidade do fracasso deve ser evitado, havendo a tendência de
mentir ou transferir a culpa quando algo sai errado (SOLOMON E FLORES, 2002, p.
47-51).
Um dos problemas da falta de confiança pode estar nos canais de comunicação.
As reuniões para exposição de informações econômico-financeiras, principalmente
aquelas que têm impacto sobre áreas ou pessoas (orçamento, investimento, bonificações
etc.) podem tornar-se frustrantes e fracassarem em proporcionar oportunidades para
construção de confiança e a solução dos problemas “por meio do tipo de discussão que
desobstrui a veia criativa das pessoas e ao mesmo tempo amplifica seu sentido de
solidariedade” (Idem, p. 19). Os participantes podem esconder suas idéias, abster-se de
43
críticas, para se manifestarem, após a reunião, em outros canais, e por meio de críticas
sarcásticas, fofocas, ataques pessoais e cinismo.
As “políticas de escritório”, com suas turbulências, frustrações e desconfianças,
limitam a capacidade de ação e de comunicação, prejudicando a dedicação ao trabalho,
recorrendo a expedientes mesquinhos, inimizades, sabotagens etc., ou seja, um colapso
da confiança. O próprio combate, desenrolado nos cubículos, acaba por se tornar mais
instigante que a competição pelo mercado na qual a empresa está mergulhada (Idem, p.
24-25).
A desconfiança não é o oposto da confiança, mas sua outra face.
A confiança requer algum grau de entendimento e cooperação mútuos
(mesmo ou especialmente em circunstâncias competitivas). A
desconfiança é adversária, mesmo quando não competitiva. A confiança
sugere o desejo de crer. A desconfiança demanda suspeita. Nesta oposição, a
desconfiança é mais dramática (Idem, p. 55).
A confiança autêntica prevê a possibilidade da desconfiança, sendo impensável
sem esta. Deixou de ser confiança simples. Junto com a desconfiança define a dinâmica
dos relacionamentos. Também não é incondicional. Quase sempre possui limites, cuja
percepção é essencial à confiança. Sempre envolve riscos, pois uma aposta no resultado
pode ser compreendida em face de uma percepção de resultados alternativos (Idem,
p. 55-56). “Os abusos de confiança o demarcam o término da confiança, mas são
parte do processo de confiar” (Idem, p. 33). “Mesmo onde haja confiança, os contratos
são apropriados e amiúde necessários, se não para o cumprimento, então para a
especificação dos compromissos e expectativas” (Idem, p. 39).
Não se pode, também, cair no extremo da desconfiança, que é a paranóia, que é
um estado mental em que se percebem as pessoas como hostis ou conspiradoras. Não
que os paranóicos não possuam inimigos reais. O problema é a perspectiva, por vezes
destruidora, de como as coisas o de fato. Quando transplantada para a vida
organizacional, a atmosfera de paranóia traz desperdício, ineficiência e possível
sabotagem. Uma das versões socialmente admitidas da paranóia é o cinismo em relação
às possibilidades de relacionamentos de confiança, em que uma atitude de desconfiança
é quase obrigatória. Embora o cinismo raramente conduza diretamente à sabotagem, o
desestímulo que ele provoca em geral tem efeito devastador” (Idem, p. 62-63).
44
O cinismo também é alimentado pela hipocrisia cordial, manifestada em atitudes
do tipo: “isso é inútil” ou “a situação não mudará”, tornando-se uma trilha de profecia
autocumprida. As objeções não externadas não contribuem para uma melhora. “Uma
desconfiança não expressa, e também não proporciona, um fórum para a construção da
confiança, porque a construção da confiança requer o conversar sobre confiança” (Idem,
p. 64).
Falar sobre confiança é importante. Nas situações em que impera a desconfiança
as pessoas não falam sobre esse assunto, mas desenvolvem estratégias para lidar com
sua ausência (Idem, p. 38).
A confiança acarreta uma falta de controle, porém significa estabelecer um
relacionamento no qual o controle não mais está em questão. Não
necessidade de tocar-se no assunto da confiança com pessoas ou situações
que podemos controlar por completo (Idem, p. 77).
O trabalho pode contribuir para o aumento da confiança nas empresas
pesquisadas pelo fato de falar de confiança. O chamado “salto da fé”, citado por Søren
Kierkegaard (apud Solomon e Flores, 2002, p.77), torna-se um salto para a confiança,
que pode ser iniciado aprendendo-se a falar dela, e seguindo fazendo promessas e
assumindo compromissos que a requerem, colocando-a em prática e tornando-a
explícita.
1.4. A transparência na divulgação de informações
A transparência pode se dar de diversas formas:
Para o mercado em geral, que pode ser obrigatória nos casos da lei, ou
limitada, por escolha da empresa, apenas à lei, ou pode ser maior que as
exigências legais, como nos casos de voluntary disclosure;
Para os parceiros de negócios, como compromisso ético com clientes e
fornecedores, ou para permitir desenvolvimentos conjuntos, como descrito
em Hammer (2001, p. 235) no caso dos co-clientes (empresas que compram
de um fornecedor comum, e que se unem para obter um relacionamento mais
vantajoso com este, como se fossem uma única empresa de maior porte e
45
maior poder de compra, usando a técnica da agregação de demanda) e dos
co-fornecedores (fornecedores não concorrentes de um mesmo cliente);
Em relação aos funcionários, como forma de facilitar a participação nas
decisões e criar um ambiente de confiança, baseado em informações. Uma
reserva em relação a esta prática pode ser o receio de abrir informações
estratégicas. Um aspecto é a transparência dos números referentes a
resultados. Outro é a divulgação de previsões, estratégias, planos etc. Os
dados do passado recente e do presente podem ser usados pelos
concorrentes, ou por descontentes da própria empresa, como material de
denúncia de eventuais irregularidades existentes na condução do negócio.
Outro exemplo de transparência com parceiros de negócios é a técnica
denominada VMI (Vendor Managed Inventory), na qual os fornecedores gerenciam os
estoques dos clientes as informações de estoque e consumo de produtos específicos
ficam disponíveis e fazem as entregas automaticamente (HAMMER, 2001, p.64).
Trata-se de um modelo baseado em confiança, pois o cliente não pode desconfiar de que
o fornecedor faça uma entrega desnecessária para resolver um problema de caixa.
O fluxo aberto de informações, que é um dos alicerces da inovação no Google,
foi colocado em questão nos últimos tempos. A prática é incomum na maior parte das
grandes empresas, que optam por manter os segredos protegidos, mas no Google, como
forma de todos colaborarem com as inovações, qualquer engenheiro tem acesso a
detalhes de novos projetos. Em outubro de 2007, porém, houve um vazamento inédito
de informações sobre o lançamento de dois produtos: o Open Social, que permite o
acréscimo de ferramentas a softwares de rede social; e o Androiod, sistema operacional
para celulares. Os executivos do Google entenderam que o caso foi mais grave que
apenas um segredo revelado, pois o episódio revelava uma fraqueza na cultura da
chamada “irmandade Google”. Dias depois do vazamento, o vice-presidente de
comunicação da empresa, em uma videoconferência com os funcionários da sede,
solicitou discrição por parte dos funcionários, pois do contrário a cultura da empresa
poderia ser destruída (SANTANA, 2008, p. 26)
46
1.5. O contexto mais amplo da confiança
A confiança pode ser referenciada pelo tempo, época ou contexto vivido pelas
pessoas, pelas empresas e pela sociedade. Será feito, a seguir, um paralelo entre a época
pré-moderna, com a confiança básica (certa), a da modernidade, com a confiança
autêntica, pois baseada no conhecimento e na possibilidade da desconfiança, e a da pós-
modernidade com a perda da confiança, da fé e da certeza.
Alguns autores, como Lyotard (apud Giddens, 1991, p. 12), acreditam que
vivemos a pós-modernidade, que seria o deslocamento das tentativas de fundamentar a
epistemologia, a falta de no progresso planejado humanamente, a evaporação da
grand narrative o “enredo dominante por meio do qual somos inseridos na história
como seres tendo um passado definitivo e um futuro previsível” e na “pluralidade de
reivindicações heterogêneas de conhecimento, na qual a ciência não tem um lugar
privilegiado”.
A pós-modernidade, além da percepção de se estar vivendo um período
nitidamente distinto do passado, apresenta-se como a descoberta de que:
... nada pode ser conhecido com alguma certeza, desde que todos os
fundamentos preexistentes da epistemologia se revelaram sem credibilidade;
que a história’ é destituída de teleologia e conseqüentemente nenhuma
versão de progresso pode ser plausivelmente defendida; e que uma nova
agenda social e política surgiu com a crescente proeminência de
preocupações ecológicas e talvez de novos movimentos sociais em geral
(GIDDENS, 1991, p. 52)
A resposta padrão aos pós-modernos, segundo Giddens (1991, p. 12), é
“demonstrar que uma epistemologia coerente é possível – e que um conhecimento
generalizável sobre a vida social e padrões de desenvolvimento social podem ser
alcançados”, como no “Discurso filosófico da modernidade” de Habermas, que vê a
modernidade como um projeto em andamento, inacabado (Habermas, 2000).
Para Giddens (1991, p. 12), a desorientação é decorrente da sensação de não se
poder obter conhecimento sistemático da organização social, das pessoas terem sido
apanhadas num universo de eventos que não compreendem plenamente e que se
mostram fora de seu controle. Quando isso ocorre, não basta inventar novos termos,
como pós-modernidade ou qualquer outro. Ao invés disso, tem-se de olhar para a
47
natureza da modernidade. Em vez de pós-modernidade, tem-se um período em que as
conseqüências da modernidade estão mais radicalizadas e universalizadas do que antes.
A confiança só pode se situar no projeto moderno, até porque só faz sentido falar
em “projeto” para a modernidade, que a pós-modernidade não pressupõe projetos,
que é uma palavra estranha a ela, não podendo também invocar uma coerência histórica,
que, para Giddens (1991, p. 53), ela declara como impossível. De acordo com Habermas
(2000, p. 7), a idéia de pós-modernidade apresenta-se sob uma forma política
totalmente distinta, isto é, sob a forma anarquista”.
Habermas (2000, p. 12) diz que a modernidade não pode e o quer utilizar
critérios de orientação de outras épocas, tendo de extrair de si mesma a sua
normatividade. Assim, seria suscetível de autocompreensão e da tentativa de
autoafirmação, buscando sua legitimidade, ou direito próprio de época, perante supostas
dívidas culturais para com o legado do cristianismo ou da antiguidade.
1.6. A confiança em sistemas abstratos
Os sistemas peritos (ou especialistas) são “sistemas de excelência técnica ou
competência profissional” (GIDDENS, 1991, p. 35), sobre os quais não se conhece e
não é possível conferir a maior parte dos fundamentos (códigos de conhecimento) que
regem seu funcionamento. Porém, confia-se, tem-se fé, não tanto em suas competências,
mas na autenticidade do conhecimento perito que eles aplicam, algo que não se pode,
em geral, conferir por si mesmo:
Quando saio de minha casa e entro num carro, penetro num cenário que es
completamente permeado por conhecimento perito envolvendo o projeto e
construção de automóveis, estradas, cruzamentos, semáforos e muitos outros
itens. Todos sabem que dirigir um automóvel é uma atividade perigosa,
acarretando o risco de acidente. Ao escolher sair de carro, aceito esse risco,
mas confio na perícia acima mencionada para me garantir de que ele é o mais
minimizado possível (GIDDENS, 1991, p. 35).
Os sistemas peritos dependem de uma “fé” pragmática, baseada na experiência
que mostra certa regularidade no funcionamento de tais sistemas. Além disso, existem
forças reguladoras que protegem os consumidores, como as associações profissionais,
órgãos de defesa dos consumidores etc., que certificam profissionais, licenciam
máquinas, vigiam a utilização de padrões, ou seja, dão autenticidade a esses sistemas. A
confiança é dada, em parte, devido aos mecanismos de proteção (tais como as
48
assinaturas eletrônicas nas transações por cartão de crédito nos computadores), às
referências e reputações e às marcas. (Idem, p. 72).
... geralmente confiamos nos produtos que compramos; sem titubear
arriscamos nossas vidas neles (carros, medicamentos, alimentos embalados,
aviões, para-quedas, cordas de bungee). Confiamos nas pessoas que nos
servem, amiúde sem checarmos suas credenciais. (A maioria de nós alguma
vez examina os diplomas profissionais de nossos médicos ou dentistas? Como
você sabe se a garçonete não cuspiu em sua sopa ou, ao vir da cozinha,
deixou cair no chão seu sanduíche? Quantas pessoas conferem
cuidadosamente as pílulas preparadas pelos farmacêuticos?) (SOLOMON e
FLORES, 2002, p. 38).
Em nosso dia-a-dia, vive-se rodeado de desconhecidos nos quais confia-se
implicitamente, confiamos porque é preciso fazê-lo. (Idem, p. 71). Sem essa confiança,
não haveria negócios, e sem a confiança entre desconhecidos não haveria a economia
global ou sequer uma economia regional (Idem, p. 72).
A despeito de notórios patifes e impostores, nossa atitude em relação à
maioria de nossas transações de negócios é de confiança, misturada com certa
dose de prudência. Se na realidade aceitássemos o alerta “caveat emptor”
(“que o comprador se acautele”)
1
seria difícil até mesmo ser um consumidor
(Idem, p. 39).
Qualquer um que utilize fichas monetárias ou um sistema perito o faz na
presunção de que outros honrem seu valor, no caso do sistema financeiro, e saibam o
que estão fazendo, no caso dos peritos. Nesse caso, a confiança é uma forma de fé, na
qual a segurança é adquirida em resultados prováveis, mais como um compromisso do
que como compreensão.
Um aspecto importante da confiança nos sistemas abstratos é o que Giddens
(1991, p. 84) chama de compromissos com rosto e compromissos sem rosto.
Compromissos “com rosto” se referem a conexões sociais estabelecidas em
circunstâncias de co-presença, chamadas, por Giddens, de relações verdadeiras. Os
compromissos “sem rosto” dizem respeito ao desenvolvimento da em fichas
simbólicas ou sistemas peritos. A interação, na vida social moderna, se dá, na maior
parte do tempo, com pessoas estranhas, não como vindas de fora, representando uma
ameaça, mas apenas uma interação na forma de contatos efêmeros, com um outro que
não conhecemos bem (não-íntimo).
1
O mesmo que: “por sua conta e risco”.
49
Na época em que foi escrito o livro “As conseqüências da modernidade”
(Giddens, 1991), a internet ainda era uma rede utilizada apenas em meios acadêmicos e
militares, embora existissem várias formas de transações via troca de dados entre
empresas (EDI Eletronic Data Interchange), que já necessitavam de mecanismos de
autenticação. Com a intensificação das relações virtuais, propiciada pela internet, a
necessidade de mecanismos de geração de confiança foi também aumentada. Qualquer
pessoa que utiliza os sites de comércio eletrônico quer ter a certeza da segurança em
relação aos dados do seu cartão de crédito, senhas, conteúdo das transações etc.
Algumas empresas, como o eBay, maior empresa de leilões pela internet, com
faturamento anual de US$ 3,27 bilhões em 2004, que opera na Nasdaq e está presente
em 30 países, são basicamente empresas baseadas em confiança. O modelo de negócio
tem, segundo Babini (2005, p. 27), as seguintes características:
Acesso a qualquer pessoa, independente da experiência anterior de negócios
on-line e do porte da transação (mercado aberto);
Negócio feito a qualquer momento e a distância, limitado apenas pelo
alcance atual da Internet e cobertura geográfica da eBay;
Variedade de produtos, de brinquedos a equipamentos para empresas;
Os usuários são a chave do negócio, formando uma grande comunidade, com
laços que ultrapassam a esfera comercial;
Base em uma experiência de compra dinâmica, divertida e original;
Permanência em função da confiança do usuário em um sistema embasado
na interação entre pessoas que não se conhecem.
Todas as transações, mesmo as pequenas, são tarifadas, e cobradas sempre da
parte vendedora. Trata-se de um sistema abstrato, pois os usuários não se conhecem e
não conhecem o sistema, mas confiam que receberão o dinheiro pelo produto que
venderam ou o produto que compraram, sem ter a noção da tecnologia envolvida na
transação (infra-estrutura de rede, protocolos, aplicações, sistemas de pagamento etc.),
na segurança física (firewalls, controle de acesso etc.), na segurança contra a chamada
“engenharia social” (abuso da confiança de funcionários que detêm informações
valiosas, a prática de vasculhar o lixo das empresas etc.) e nos modelos de gestão
destinados a construir confiança (parcerias entre empresas, reuniões presenciais de
50
membros importantes da comunidade, incentivos aos pequenos comerciantes, que
formam uma base leal e estável). A visão da empresa é tornar-se a “primeira opção na
hora de fazer compras, objetivo que aentão apenas uma empresa de tijolo-e-cimento
como o Wal-Mart poderia pleitear” (BABINI, 2005, p. 30).
Um dos mecanismos para que os usuários continuem confiando no sistema,
“baseado na interação entre estranhos”, é o “Fórum de Feedback”, um espaço para
resolver conflitos, receber ajuda e estabelecer vínculos. Podem-se atribuir pontos aos
parceiros comerciais, criando assim uma “reputação” (Idem, p. 31).
A confiabilidade pode ser estabelecida entre indivíduos que se conhecem bem,
sendo o relacionamento de longo prazo a garantia da fidedignidade mútua. a
confiabilidade em sistemas abstratos não pressupõe encontros com um de seus
responsáveis. O contato dos atores leigos com esses sistemas se dá por meio dos
chamados “pontos de acesso”, que são o “terreno comum dos compromissos com rosto
e sem rosto” (Idem, p. 87).
A natureza das instituições modernas é marcada pelo mecanismo de confiança
em sistemas abstratos, principalmente nos sistemas peritos. Com a modernidade
potencializada pela globalização, ninguém pode optar por abandonar totalmente esses
sistemas. O contato com os sistemas peritos é feito nos chamados “pontos de acesso”.
Para os compromissos com rosto nos pontos de acesso, criam-se relações de confiança
exibindo confiabilidade e integridade, como nas deliberações de juízes, no
profissionalismo solene dos médicos, na animação estereotipada da tripulação do avião,
complementando as tecnologias envolvidas e demonstrações estatísticas da segurança
das viagens aéreas. Em algumas relações, nos pontos de acesso, ocorre uma deliberada
separação entre o que é visto pelos leigos e a essência do trabalho profissional, algo
como a divisão entre “palco” e “bastidores”. Isso ocorre pela existência, por mais afiada
que seja a habilidade do perito e o avanço da tecnologia, de elementos do acaso. Nesse
caso, “os peritos pressupõem que os indivíduos leigos se sentirão mais confiantes se não
puderem observar o quão freqüentemente esses elementos entram no desempenho do
perito” (GIDDENS, 1991, p. 87-91). A atitude de confiança, ou falta dela, nos sistemas
abstratos é fortemente influenciada pelas experiências nos pontos de acesso. No caso da
eBay, relatado anteriormente, a empresa funciona como ponto de acesso aos leilões
eletrônicos, intermediando basicamente relações de confiança entre comprador e
vendedor.
51
1.7. Confiança e risco
A confiança, no sentido que será desenvolvido nesse trabalho, está ligada
intimamente ao conhecimento do risco. Confiar é arriscar, e riscos devem ser assumidos
sabiamente (SOLOMON E FLORES, 2002, p. 73). A confiança autêntica é um
pressuposto de modernidade, pois implica a possibilidade de compreensão dos
fenômenos sociais, de gestão, da possibilidade emancipatória da razão.
A história do risco mostra a tentativa de previsão, de quantificar as
possibilidades e probabilidades do futuro, de domar o destino, de lidar de forma racional
com incertezas O próprio conceito de risco aparece na modernidade, pela visão de
mundo o atrelada à fortuna, ao destino, à vontade dos deuses (BERNSTEIN, 1997).
“Um indivíduo que o considera alternativas está numa situação de crença, enquanto
alguém que reconhece essas alternativas e tenta calcular os riscos assim reconhecidos,
engaja-se em confiança” (GIDDENS, 1991, p. 39). A idéia da gestão do risco emerge
apenas quando os indivíduos acreditam ser, até certo ponto, agentes livres
(BERNSTEIN, 1997).
Na história do risco existem alguns exemplos da busca de explicação dos
fenômenos sociais utilizando ferramentas matemáticas. A na realidade do
conhecimento racional e no poder da medição na administração do risco persistiu
através de todo o tumulto da Depressão e da Segunda Guerra Mundial” (BERNSTEIN,
1997, p. 231). Na teoria dos jogos ocorre a tentativa de duas ou mais pessoas de
maximizar sua utilidade simultaneamente, cada uma consciente das ações dos outros.
Essa forma de compreensão traz um novo sentido à incerteza, não mais como um fato
consumado, sem fonte identificada. Para a teoria dos jogos, a verdadeira fonte de
incerteza reside nas intenções dos outros” (Idem, p. 232). Existia ai a “aspiração de
tornar a matemática a mestre triunfante na análise da sociedade, tanto quanto na análise
das ciências naturais” (Idem, p. 237).
53
2. O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO
O objetivo deste capítulo é delimitar o trabalho no campo da comunicação, com
ênfase na análise do processo de comunicação informações econômico-financeiras, nos
seus diversos territórios (emissor, mensagem, canal, receptor).
2.1. A comunicação humana
Comunicação é um conceito com significados muito amplos, que pode envolver
seres humanos, animais, aparelhos técnicos etc., de modo verbal (oral e escrito), visual,
musical etc. No caso da comunicação humana, interesse deste trabalho, Fiske (2005, p.
14) definiu-a como “interação social através de mensagens”.
Toda comunicação envolve signos e códigos. Os signos são artefatos ou atos
que se referem a algo que não são eles próprios, ou seja, são construções
significantes. Os códigos são os sistemas nos quais os signos se organizam e
que determinam a forma como os signos se podem relacionar uns com os
outros. [...] Os signos e códigos são transmitidos ou tornados acessíveis a
outros. Transmitir ou receber signos / códigos / comunicação é a prática das
relações sociais, ou seja, estudar comunicação implica estudar a cultura em
que ela se integra (FISKE, 2005, p. 14).
Para Santaella (2001, p. 19), a interação semiótica tem como característica a
congruência entre a mensagem do emissor e a interpretação do receptor, sendo essa
característica um critério adicional de distinção estabelecido em algumas definições de
comunicação”, conforme a etimologia da palavra sugere, que implica “um repartir
comum de informação”. Para Martino (2001, p.14), “o termo ‘comunicação’ refere-se
ao processo de compartilhar um mesmo objeto de consciência, ele exprime a relação
entre consciências”.
Um critério adicional para se definir comunicação é, segundo Santaella (2001, p.
19), o de intencionalidade, que caracteriza uma atividade voltada para um objetivo. É a
“tentativa consciente do emissor de influenciar o receptor através de uma mensagem,
sendo a resposta do receptor uma reação baseada na hipótese das intenções da parte do
emissor”. A intenção dos emissores de comunicações econômico-financeiras, quando
cuidam da qualidade da informação e apresentam-na em momento oportuno, de forma
clara etc., é mostrar confiabilidade para os receptores, que podem retribuir com a
confiança.
54
As contribuições da ontologia da linguagem, conforme as idéias de John Austin
(apud Amorim, 2001, p. 229) de “com fazer as coisas com palavras” e de Fernando
Flores (apud Amorim, 2001, p. 229), apontam para o importante papel do discernimento
conceitual para a institucionalização da comunicação. A institucionalização da
comunicação é feita por um “conjunto de medidas que providencie como os pedidos e
declarações devem aparecer, observando-se a circularidade entre os níveis
hierárquicos”. As declarações importantes são as que dão ao conhecimento das pessoas
a estratégia da organização, os principais indicadores financeiros e de mercado e as
modificações nos processos ou na estrutura organizacional (linhas de comando). A
circularidade permite que a direção escute os níveis hierárquicos inferiores e
intermediários, resultando na disposição geral de participação de todas as instâncias.
Quanto maior o segredo em torno dos porquês desses temas importantes, que envolvem
a disposição de mudança de condutas pessoais, maior a possibilidade de resistência, pois
é muito difícil o comprometimento com coisas que não se conhece, ou não se entende
ou de que não se participou (AMORIM, 2001, p. 229).
Martinet (1960, apud Santaella, 2001, p. 20) definiu comunicação como a
função central da linguagem, referindo-se à “necessidade que alguém tem de ser
entendido”. Assim, pode-se dizer que, se uma demonstração financeira é emitida e o
destinatário não a compreende, não está existindo comunicação.
De acordo com DeVito (apud Santaella, 2001, p. 21), os princípios da
comunicação humana podem ser definidos como:
É um pacote de signos, pois diferentes tipos de signos concorrem para
compor uma mensagem;
É um processo de ajustamento, pois, embora duas pessoas estejam usando o
mesmo sistema de linguagem, é somente por meio de um processo de
acomodação e ajustamento que a comunicação ocorre;
Envolve conteúdo e dimensões relacionais, pois a comunicação se refere,
simultaneamente, a algo que está fora da relação entre emissor e receptor,
reportando-se à dimensão do conteúdo e da relação comunicativa;
55
As seqüências comunicativas são pontuadas, ou seja, o fluxo da
comunicação é segmentado em pequenos pedaços, alguns chamados de
causas ou estímulos, outros de respostas ou efeitos;
Envolve transações simétricas e complementares, com os indivíduos
espelhando o comportamento um do outro, no caso das simétricas, ou
quando o comportamento de um serve como estímulo para o comportamento
complementar do outro;
É transacional, pois cada pessoa é, simultaneamente, emissor e receptor,
enviando e recebendo mensagens ao mesmo tempo;
É inevitável, porque mesmo não se querendo, as mensagens são mesmo
assim emitidas;
É irreversível, pois não se pode voltar atrás naquilo que foi comunicado;
É irrepetível, pois tudo e todos estão em constante mudança.
Após este panorama, Santaella (2001, p. 22) extrai uma definição ampla e geral
de comunicação como sendo:
a transmissão de qualquer influência de uma parte de um sistema vivo ou
maquinal para uma outra parte, de modo a produzir mudança. O que é
transmitido para produzir influência são mensagens, de modo que a
comunicação está basicamente na capacidade para gerar e consumir
mensagens.
Para DeVito (apud Santaella, 2001, p. 84), os elementos presentes em toda
comunicação humana, seja ela intrapessoal, interpessoal, grupal, pública ou de massa
são: “um ato, realizado por uma ou mais pessoas, de enviar e receber mensagens que
são distorcidas pelo ruído, ocorrem dentro de um contexto, produzem algum efeito e
dão oportunidade à retroalimentação”.
2.2. Teorias da comunicação
Para França (2001, p. 58-59), a teoria da comunicação é caracterizada pela
“heterogeneidade das correntes e concepções que abriga”, de difícil sistematização, não
56
havendo como apresentar de forma orgânica e estruturada um quadro que é
fragmentado e descontínuo”. Cada época se identifica melhor com algum critério.
As classificações mais comuns são:
Esquerda-Direita: quando havia claramente esses dois grandes blocos,
utilizavam-se respectivamente dois grandes paradigmas: o da ordem,
referente à pesquisa americana, de cunho mais “administrativo” e o
paradigma do conflito, de perspectiva crítica, com viés marxista;
Critério disciplinar: sociologia da comunicação; psicologia da comunicação;
comunicação biológica; fundamentos filosóficos da comunicação etc;
Correntes de pensamento: funcionalista (ou positivista); marxista;
estruturalista, com os problemas do leque de concepções (e pseudofiliações),
além das inúmeras tendências derivadas dessas grandes correntes;
Base geográfica: Escolas Americana, Francesa e Latino-Americana. A
vantagem era a contextualização sócio-histórica dos estudos. A desvantagem
era a de encobrir tendências distintas ou de criar uma falsa unificação, por
exemplo, associar a Escola Americana somente à corrente funcionalista,
deixando de fora outras tendências;
Universidades, institutos ou centros de pesquisa: é uma classificação mais
atenta à especificidade de algumas tradições, mas deixa de fora algumas
perspectivas com desenvolvimento mais descentralizado (pulverizado) ou
aos trabalhos ou obra de somente um autor;
Temático: em função da ênfase dada ao objeto (ou processo) da
comunicação, ou seja, da instância de produção (emissor), da recepção, da
técnica (meio ou suporte), da mensagem (discurso).
Santaella (2001, p. 31) agrupa as teorias, modelos e âmbitos da pesquisa em
comunicação em quatro grandes tradições:
A mass communication research e seus desdobramentos: envolve o estudo
dos efeitos dos meios de comunicação de massa, num primeiro momento
considerando a audiência como uma massa amorfa (teoria hipodérmica) e
57
posteriormente pela superação dessa perspectiva, com a abordagem
empírica, ou de persuasão, e pela abordagem funcionalista;
As teorias críticas: envolvem a sociedade como um todo, insurgindo-se
contra as disciplinas setoriais, como as pesquisas específicas em
comunicação, que por serem subordinadas à razão instrumental acabam por
serem mantenedoras da ordem social existente;
Os modelos do processo comunicativo: mais voltados para as especificidades
dos fenômenos comunicativos. São originários da teoria matemática da
informação de Shannon e Weaver, num primeiro momento aplicado apenas
às telecomunicações (transmissão otimizada de mensagens), para depois ser
ampliado e adaptado a outros tipos de comunicação;
As correntes culturológicas e midiáticas: enxergam os meios de
comunicação como componentes de uma dimensão maior, a da cultura,
principalmente com os debates sobre a pós-modernidade.
Esses agrupamentos e tradições são classificações úteis, não significando que na
pesquisa da comunicação de massa não haja a preocupação quanto aos processos
comunicativos, ou quanto aos estudos culturais. Como exemplo, Araújo (2001, p.120)
diz que a pesquisa americana em comunicação de massa, de orientação pragmática, tem
uma grande preocupação com a compreensão do funcionamento dos processos
comunicativos visando otimizar seus resultados.
O trabalho de Fiske (2005, p. 14) reflete o fato de existirem duas escolas
principais no estudo da comunicação. A primeira escola, chamada por ele de processual,
a comunicação como transmissão de mensagens. Estuda o modo como emissores e
receptores codificam e decodificam mensagens, como transmissores usam canais e
meios de comunicação, tendo como decorrência a preocupação com a eficiência e
exatidão. Quando o efeito é diferente ou menor que o pretendido, fala-se em fracasso da
comunicação, recomendando-se a análise do estágio do processo onde a falha ocorreu.
A base dessa escola o as Ciências Sociais (a Psicologia e a Sociologia,
principalmente), centrando-se nos atos de comunicação.
Para a segunda escola, a comunicação é produção e troca de significados,
preocupando-se com o modo como as mensagens ou textos interagem com as pessoas, a
58
fim de produzirem significados, ou seja, preocupa-se com o papel dos textos em uma
cultura. A eficiência comunicativa não é a preocupação dessa escola. As diferenças
culturais entre o emissor e o receptor explicam os mal-entendidos. O principal método
dessa escola é a Semiótica, a ciência dos signos e significados (FISKE, 2005, p. 14).
Cultura tem a ver com “significados compartilhados”. A linguagem é um meio
privilegiado no qual se colocam sentidos nas coisas, no qual o sentido é produzido e
trocado (HALL, 1997, p. 1). A linguagem fornece um modelo geral de como a cultura e
a representação funcionam, especialmente se for utilizada a “abordagem semiótica” e do
papel do discurso. Uma diferença entre as abordagens semiótica e a discursiva é que a
primeira refere-se ao “como” a linguagem produz significados – sua poética –, enquanto
a segunda refere-se aos efeitos e conseqüências da representação – sua política (Idem, p.
6). O sistema de comunicação permite a construção de um universo cognitivo comum, a
partir do qual pedidos, reclamações, declarações e afirmações constituem
especificamente um padrão de conversas para a ação e para novas possibilidades entre
as pessoas.
Para a escola processual, a interação social é o processo pelo qual uma pessoa
se relaciona com outras ou afeta o comportamento, estado de espírito ou reação
emocional de outra e, é claro, vice-versa”. Para a escola da semiótica, a interação social
é aquilo que “constitui o indivíduo como membro de uma cultura ou sociedade
determinadas” (FISKE, 2005, p. 15).
Quanto às mensagens, também divergências entre as escolas. Para a
processual, a mensagem éo que é transmitido pelo processo de comunicação”, sendo a
intenção um fator crucial para decidir se é ou não uma mensagem. Para a escola
semiótica, a mensagem é “uma construção de signos que, pela interação com os
receptores, produzem significados”. uma perda de importância do receptor, sendo a
ênfase dada ao texto e à forma como ele é lido (Idem, p. 15-16).
O território da mensagem é o dado mais palpável do processo comunicativo, ao
qual sempre se tem acesso objetivo. Cabem nesse campo todas as pesquisas sobre
linguagem, discursos e processos sígnicos e as indagações sobre os modos pelos quais
as mensagens são capazes de deflagrar possíveis efeitos de sentido (SANTAELLA,
2001, p. 86).
59
Quanto aos códigos, a escola processual os vê como “meios para codificar e
decodificar”, e a semiótica como “sistemas de significação” (Idem, p. 16).
Neste trabalho a comunicação como processo será o ponto central, embora se
valha também da segunda escola, quando da análise dos significados das demonstrações
financeiras e análise do discurso de apresentação destas.
Uma das primeiras fontes do estudo do processo de comunicação foi o trabalho
de Shannon e Weaver, “Mathematical Theory of Communication”, de 1949 (apud Fiske,
2005, p.19), que via a comunicação como transmissão de mensagens. A preocupação,
principalmente técnica, era a eficácia dos canais, que no caso eram cabos telefônicos e
ondas de rádio, embora os autores afirmassem que sua teoria também seria aplicável à
comunicação humana.
O modelo básico é um processo linear:
Ilustração 2 – Modelo de comunicação de Shannon e Weaver
Fonte: Chandler, 2008.
O modelo original consiste, segundo Chandler (2008), de cinco elementos:
Uma fonte de informação, que produz a mensagem;
Um transmissor, que codifica a mensagem para sinais;
Um canal, para o qual os sinais são adaptados para transmissão;
Um receptor, que decodifica (reconstrói) a mensagem a partir dos sinais
recebidos;
Um destino, aonde a mensagem chega.
Mensa-
gem
Fonte
de ruído
Fonte de
informação
Mensa-
gem
Destino
Sinal
Trans-
missor
Sinal
rece-
bido
Canal
Receptor
60
Um sexto elemento, ruído, é um fator de disfuncionalidade, ou seja, alguma
interferência no sinal trafegando pelo canal (como uma estática em um telefone ou
rádio), que pode fazer com que o sinal recebido seja diferente do enviado.
Shannon e Weaver (apud Fiske, 2005, p. 20) detectaram três níveis de problemas
no estudo da comunicação:
Nível A técnicos: “com que precisão se podem transmitir os símbolos da
comunicação?”;
Nível B semânticos: “com que precisão os símbolos transmitidos
transportam o significado pretendido?”;
Nível C eficácia: “com que eficácia o significado recebido afeta a conduta
da maneira desejada?”.
No modelo de Shannon e Weaver não é considerado o conceito de
retroalimentação (feedback), que é a transmissão da reação do receptor de volta para o
emissor. Esse conceito foi considerado útil pelos estudiosos posteriores, principalmente
nos modelos de orientação cibernética (FISKE, 2005, p. 38).
Se o processo de comunicação não tivesse ruídos (problemas de comunicação), o
feedback, que é uma ação após o conhecimento da mensagem, seria o mais eficiente e
completo (DIAS et al., 2004, p.3).
O modelo processual de Shannon e Weaver sofreu muitas derivações e também
muitas críticas, principalmente pela natureza linear.
A percepção da comunicação apenas nos limites do esquema emissor
mensagem – receptor pode induzir a idéia de que o emissor comanda a
situação e o receptor é um elemento passivo, que escuta apenas aquilo que o
primeiro determinou (AMORIM, 2001, p. 228).
Uma crítica nessa linha é feita por A. e M. Mattelart (2008, p. 60), quando dizem
que a teoria matemática da comunicação “não leva em conta a significação dos sinais,
ou seja, o sentido que lhe atribui o destinatário e a intenção que preside a sua emissão”.
Uma derivação, ainda com esqueleto linear, foi feita por Gerbner (Fiske, 2005,
p. 42), que ampliou o modelo original de modo a torná-lo aplicável a qualquer
comunicação. Traz progressos por relacionar a mensagem com a realidade a que ela se
61
disponibilidade
de seleção do
contexto
disponibilidade
de seleção do
contexto
acesso aos canais
controle dos meios
refere, permitindo o tratamento de questões de percepção e significação, e também por
ver duas dimensões do processo de comunicação, que se alternam: uma perceptiva, ou
receptiva, e outra que é comunicante, ou de meios e controle.
A ilustração a seguir mostra o modelo de Gerbner:
Ilustração 3 – Modelo de comunicação de Gerbner
Fonte: Fiske (2005, p. 42).
Na dimensão horizontal, ou perceptual, o processo começa com um
acontecimento A, “com algo da realidade externa que é percebido por M (e o M tanto
pode ser uma pessoa ou uma máquina, como um microfone ou uma máquina
fotográfica)”. A
1
é a percepção que M tem de A. A relação entre o acontecimento A e a
percepção A
1
envolve uma seleção, pois M não pode, possivelmente, perceber toda a
complexidade de A. Se M for uma máquina, a seleção é determinada pelo seu engenho,
pelas suas capacidades físicas. No entanto, se M for uma pessoa, a seleção é mais
complexa, pois “a percepção humana não é uma simples recepção de estímulos, mas um
A
1
Percep-
ção
M
A
Aconte-
cimento
SA
2
percepção
de afirmação
sobre acon-
tecimento
M
2
S A
forma con-
teúdo
meios de controle
(ou dimensão
comunicante)
dimensão perceptual
62
processo de interação ou negociação”. As pessoas tentam “enquadrar os estímulos
externos em conceitos ou padrões internos do pensamento”. Quando o enquadramento é
feito, percebe-se algo, confere-se um significado ao que é percebido (FISKE, 2005, p.
43).
Um exemplo o os puzzles visuais originados por fotografias de objetos
familiares, mas tiradas de ângulos estranhos, ou num grande plano pouco habitual”. A
fotografia é percebida pelo que é quando ocorre o enquadramento ou
reconhecimento. Até então, a sensação é de frustração e desorientação, pois embora se
vejam os tons e a forma da fotografia, não se consegue ainda percebê-la, pois a
percepção implica um impulso para compreender e organizar. Esse enquadramento é
controlado pela cultura, pois é a experiência cultural que resulta no desenvolvimento de
conceitos internos ou padrões de pensamento (Idem, p. 43).
Na dimensão vertical, dos meios de controle, ou dimensão comunicante, a
percepção A
1
é convertida em um sinal sobre A (círculo SA), ou seja, a mensagem, uma
afirmação sobre o acontecimento. A metade “S” do círculo refere-se à mensagem como
um sinal, à sua forma. A metade “A” refere-se ao seu conteúdo. Encontrar a melhor
forma (S) para um determinado conteúdo é uma das preocupações cruciais para o
comunicador. A questão da seleção é também importante, tanto quanto aos meios e
canais de comunicação, quanto à seleção dos sinais. É importante ressaltar que SA é um
conceito unificado, e não duas áreas que foram reunidas, pois a forma (S) escolhida
afetará a apresentação do conteúdo (A) (Idem, p. 44).
Para Fiske (2005, p. 49), o modelo de Gerbner é apenas um desenvolvimento
imaginativo do de Shannon e Weaver”, definindo a comunicação como transmissão de
mensagens. A escola semiótica problemas no modelo, pois, apesar de levantar a
questão da significação, não se preocupa em saber como o significado é gerado. Além
disso, Gerbner estaria enganado quanto à semelhança dos processos horizontais, pois a
percepção de uma mensagem não seria igual à de um acontecimento. A reação a um
filme, em que o vilão é morto a tiro pelo herói, não é a mesma que a de ser testemunha
do acontecimento na vida real.
63
Alguns modelos processuais são mais indicados para a comunicação de massa,
como o de Lasswell, que propõe o estudo dos vários estágios do processo (Fiske, 2005,
p. 49):
Quem
Diz o quê
Em que canal
A quem
Com que efeito
Trata-se de uma versão verbal do modelo de Shannon e Weaver. A questão do
efeito (ou significação) implica uma mudança observável e mensurável do receptor”,
causada por elementos identificáveis do processo, ou seja, a mudança no codificador, na
mensagem ou no canal pode alterar o efeito.
Outro modelo processual, não linear, mas triangular, é o de Newcomb, que
reflete sobre o papel da comunicação numa sociedade, ou numa relação social, que é o
de manter o equilíbrio dentro do sistema social (FISKE, 2005, p.51).
Ilustração 4 – Modelo de comunicação de Newcomb
Fonte: Fiske (2005, p. 50).
Nesse modelo, A e B são o emissor e o receptor, que podem ser indivíduos, ou o
patronato e o sindicato, ou o governo e o povo. X é parte do ambiente social de A e B.
ABX é um sistema, significando que suas relações internas são interdependentes, ou
seja, se A mudar, B e X também mudarão. Do mesmo modo, se A alterar sua relação
com X, B terá de mudar ou sua relação com X ou com A.
Se A e B são amigos, e se X é algo ou alguém conhecido de ambos, será
importante que A e B tenham atitudes semelhantes relativamente a X. Se
assim for, os sistema estará em equilíbrio. Mas se A gostar de X e B não
gostar, a comunicação entre A e B ficará sob pressão, e isto até que os dois
amigos cheguem a atitudes no geral semelhantes para com X. Quanto mais
X
A
B
64
importante for o lugar que X ocupa no enquadramento social de A e de B,
mais urgente será a sua motivação para partilharem um parecer a seu respeito
(FISKE, 2005, p. 51).
Westley e MacLean fizeram uma adaptação do modelo de Newcomb, visando
especificamente aos mass media e à necessidade social de informação. Trata-se de duas
alterações fundamentais. Uma delas é a introdução de um novo elemento, a função
editorial-comunicativa C, que é o processo de decidir o quê e como comunicar. A outra
foi o alargamento do modelo, fazendo-o retornar à forma anterior, linear e centrada no
processo.
Ilustração 5 – Modelo de Westley e MacLean
Fonte: Fiske (2005, p. 50).
Como exemplo, A pode ser um repórter que envia a história X para C, a redação
do jornal/rádio/tv, que editam a história e a retransmitem para B, o público. X tem uma
natureza multifacetada. Nesse modelo, B perdeu a experiência direta de X. Existem
oportunidades restritas de feedback (-f
BA
, -f
BC
, etc). O equilíbrio de Newcomb foi
rompido, pois A e C agora o dominantes e B está muito mais à mercê deles (Idem,
p.54).
X
1
A
X
2
X
3
X
4
C
B
X
1
X
2
X
3
X
3M
X
X
X
- f
CA
.
.
.
X
4
X
3C
-f
BC
- f
BA
65
O modelo de Jacobson tem semelhanças com os modelos lineares e com os
triangulares, mas, por ele ser um lingüista, interessou-se pelas questões de significação e
estrutura interna da mensagem. Assim, esse modelo preenche a lacuna entre as escolas
processuais e as semióticas.
Esse modelo delineia os fatores constitutivos de um ato de comunicação
(emissor, mensagem, código, contexto, contato e destinatário), que têm de estar
presentes para que a comunicação seja possível, e depois delineia a função de
linguagem associada a cada fator (emotiva ou expressiva, poética, metalingüística,
referencial, fática e conativa).
Ilustração 6 - Fatores constitutivos da comunicação (Jakobson)
Fonte: (FISKE, 2005, p. 55)
Um emissor envia uma mensagem a um destinatário. A mensagem refere-se a
algo que não ela própria (contexto). Outro fator é o contato, que são o canal físico e as
ligações psicológicas entre o emissor e o destinatário. Finalmente, o código, “um
sistema comum de significação pelo qual a mensagem é estruturada” (Idem, p. 55).
Cada um desses fatores determina uma função diferente da linguagem, e em
cada ato de comunicação pode-se encontrar uma hierarquia de funções. Jakobson
propõe um modelo de estrutura idêntica (cada função ocupando o lugar do fator a que
ela se refere).
Ilustração 7 - As funções da comunicação (Jakobson)
Fonte: (FISKE, 2005, p. 55)
Emissor Destinatário
Contexto
Mensagem
Contato
Código
Emotiva Conativa
Poética
Referencial
Fática
Metalingüística
66
A função emotiva descreve a relação do emissor com a mensagem. A
mensagem deve comunicar as emoções, as atitudes, o estatuto, a classe do emissor,
tornando a mensagem pessoal. No outro extremo do processo está a função conativa,
que se refere ao efeito da mensagem no destinatário. A relação da mensagem com a
realidade é descrita pela função referencial, que se torna prioritária na comunicação
objetiva, factual, que se preocupa em ser verdadeira. Essas três funções correspondem
ao ABX de Newcomb (FISKE, 2005, p. 56).
A função fática consiste em manter os canais de comunicação abertos; em
manter a relação entre o emissor e o destinatário, ou seja, em confirmar que a
comunicação ocorra. Relaciona-se, portanto, ao fator contato (FISKE, 2005, p. 56).
A função metalingüística se refere à identificação do código utilizado. Todas as
mensagens devem ter uma função metalingüística explícita ou implícita.
Um maço de cigarros vazio deitado no chão, ou um pedaço de jornal velho
são, normalmente, lixo. Mas se esse maço estiver colado ao jornal, e ambos
estiverem encaixilhados numa moldura pendurada na parede de uma galeria
de arte, tornam-se arte. A moldura desempenha a função metalingüística de
dizer “descodifiquem isto de acordo com significados artísticos”: convida-nos
a procurar proporções e relações estéticas, a vê-los como uma metáfora da
“sociedade do deita-fora”, das pessoas como produtores de lixo (Idem, p. 56).
A função poética consiste na relação da mensagem com ela mesma. É
fundamental para a comunicação estética, mas pode operar também na conversa normal,
contribuindo, por soar agradável, para a fixação da mensagem.
Segundo Jakobson (apud Alzamora, 2002, p. 7), para este modelo, um mesmo
ato de linguagem pode reunir várias funções. A diversidade reside não no monopólio
dessas diversas funções, mas numa diferente ordem hierárquica de funções, que altera a
noção de comunicação como transmissão quantificada de informação e, sob esse
aspecto, o modelo pode ser entendido como uma espécie de superação do modelo de
Shannon-Weaver.
A tradição mais visitada por este trabalho será a do processo comunicativo, em
todos os seus territórios (emissor receptor mensagem código meio) e nas suas
relações.
67
2.3. O processo de comunicação de informações econômico-financeiras
O escopo da investigação é o processo de comunicação de informações
econômico-financeiras, que podem ser as informações operacionais, oriundas de um
tratamento não contábil dos registros de cada transação (relatórios de vendas, compras,
movimentações de estoque etc.) e também o processo contábil, que integra as
informações sobre o negócio.
O processo de comunicação contábil, segundo Moraes, Nagano e Merlo (2004,
p. 3-4), atende a todos os requisitos demonstrados no processo geral de comunicação,
porém com adaptações. O fluxo da comunicação contábil, voltada ao usuário externo,
pode ser abstraído como:
Partindo da ocorrência do Evento Econômico (fonte da informação) o emissor
(contador ou funcionário treinado para isso) codifica a mensagem nesse
primeiro processo a codificação se dá no lançamento da partida dobrada
(débito/crédito) referente ao evento, disponibilizando a mensagem pelo canal
(livros contábeis ou sistemas informatizados) ao receptor (o departamento de
contabilidade). No segundo estágio do processo – Demonstrações Contábeis –
a fonte de informação se torna o departamento de contabilidade, por meio de
seus livros e/ou sistemas, o emissor (nesse caso essencialmente contadores)
codifica a informação novamente para sintetizá-la e a disponibiliza pelo canal
(Demonstrações Contábeis Balanço Patrimonial, Demonstração de
Resultado do Exercício, DOAR, DFC e outras) para o receptor (usuários
dessa informação, normalmente acionistas, investidores e credores).
Atualmente o processo ganhou um terceiro estágio, principalmente em
companhias de capital aberto, sendo conhecido como os Relatórios Anuais
(Annual Reports) onde as demonstrações geradas na codificação anterior se
tornam uma nova fonte de informação e o emissor - podendo tanto ser um
contador como um profissional da área de finanças o qual promove uma
análise textual da situação financeira da empresa.
Este processo é interativo. Os receptores não são passivos: eles agem, tomam
decisões, respondem etc.
Além dos elementos da dimensão funcional dos processos em geral (insumo,
atividade e produto), Bueno (2001) acrescenta outros dois elementos: as referências ou
normas aplicáveis ao processo e a infra-estrutura necessária para sua execução (pessoas,
tecnologia, capital etc.)
68
Ilustração 8 – Elementos dos processos em geral
Fonte: Bueno (2001)
No caso do processo contábil, esses dois outros elementos são as normas que
regem a contabilidade (Princípios Contábeis Geralmente Aceitos, Conselhos Regional e
Federal, Lei das Cooperativas etc.) e a infra-estrutura utilizada (profissionais da própria
empresa ou terceirizados, sistemas contábeis integrados etc.).
Ilustração 9 – Processo de comunicação contábil
As tecnologias necessárias para o tratamento das informações não são, neste
trabalho, consideradas agentes da comunicação, mas meios, não havendo, portanto, a
preocupação com a comunicação no campo da cibernética, até porque, não se pode
relacionar como característica de uma máquina a de ter confiança em algo.
Os sub-processos não envolvendo diretamente seres humanos, como a
disponibilização de bancos de dados com informações financeiras, para consumo de
outros sistemas, são considerados também como interação social, pois a modelagem da
Atividade
Insumo
Referência
Infra-estrutura
Produto
Empresa
Fatos
contábeis
Demonstrações
T
ecnologia da
Informação
Públicos
(receptores)
Tratamento das
informações
(emissor)
retroalimentação
Princípios
contábeis
69
fonte de informações, o protocolo de comunicação e o tipo de uso da informação no
destino são definidos por humanos, embora sejam operados por máquinas.
Para Ilufi (2000, p. 7), que o processo contábil no formato origem-
mensagem-destino, a contabilidade (origem) é a unidade de comunicação, com a
responsabilidade de produzir o que chama de afirmações contábeis (código lingüístico)
para os usuários (destino). Para poder comunicar e não apenas informar, a contabilidade
deve antes determinar o tipo de mensagem necessária ao usuário, relevante e de alta
veracidade.
Quanto à mensagem contábil, Ilufi (2000, p. 7) diz que:
é encontrada ou está contida num mesmo código lingüístico, o que significa
que a mensagem é diferente no momento da emissão dos signos (códigos)
para expressá-la. Para entender uma mensagem contábil, é necessário
primeiro, interpretar (decodificar) os signos que as mensagens contêm.
Portanto, é necessário assinalar que aquilo que é transmitido pela
contabilidade a diversos grupos (gerência, acionistas, credores etc.) é uma
mensagem codificada aguardando uma interpretação precisa pelo destinatário.
Do fato de que em toda mensagem existe a utilização de signos resulta,
portanto, o caráter vantajoso do uso da semiótica no processo de comunicação
contábil, já que com isto se consegue que os códigos utilizados sejam comuns
ao emissor e ao receptor. Lamentavelmente, isto não ocorre com freqüência
na contabilidade, porque os códigos usados estão pensados para aqueles que
dominam a linguagem contábil, o que exclui um grande número de leitores
interessados nos informes contábeis.
A informação contábil é passível de diversos problemas de compreensão e
comunicação. Dentre eles, está o problema da necessidade de conhecimento contábil
prévio, pois os sistemas tradicionais de contabilidade possuem um alto grau de
significado semântico, por meio de tabelas, codificações contábeis e organização da
informação. Pessoas que não possuem esse conhecimento têm sua capacidade de
absorção da informação extremamente reduzida (DUNN e GRABSKI, 2000).
De acordo com Solomon e Flores (2002, p. 18):
O problema da confiança pode ser, acima de tudo, uma questão de
compreensão, mas tal compreensão é significativa com a busca de uma
prática, de uma rotina do dia-a-dia, de um modo de ser ou, para as
organizações ou nações, com a busca do desenvolvimento de instituições de
confiança.
Também no tocante à forma, a contabilidade apresenta problemas de
compreensão. Sistemas de registro baseados em contas e contra-partidas
70
(Débito/Crédito), amplamente utilizados, são apontados como não sendo
semanticamente expressivos, por não refletirem de forma compreensiva os fenômenos
do mundo real (DUNN e GRABSKI, 2000).
Segundo Moraes, Nagano e Merlo (2004, p. 4), os problemas apresentados na
comunicação contábil estão associados a três etapas do processo:
Ruídos: no processo contábil, os problemas de ruído o associados
essencialmente a falhas técnicas referentes ao canal, como, por exemplo,
problemas nos sistemas informatizados;
FeedBack: na contabilidade, existem poucas formas de medir o feedback
sobre a comunicação em si, mesmo com estudos que demonstram a
relevância da informação contábil, principalmente no mercado de capitais,
onde é possível observar a relação informação versus preço. Ainda assim, é
muito difícil verificar quais etapas do processo estão sendo falhas;
Codificação: gerador da maior parte dos problemas de compreensão da
mensagem transmitida pela contabilidade, o problema da codificação recai
sobre a teoria da comunicação (pragmática, semântica e sintaxe). Em grande
parte, o sucesso da codificação está na capacidade do emissor em interpretar
os eventos e codificá-los de uma maneira que o receptor, ao inverter o
processo e decodificar a mensagem, obtenha a mesma interpretação. Para
tanto é necessário que haja a correspondência entre realidade e mensagem, e
que os possíveis significados da mensagem entre o emissor e receptor sejam
os mesmos. Para isso é abordada a semiótica na Contabilidade.
Segundo Cropley (apud Moraes, Nagano e Merlo, 2004), o objetivo da semiótica
é relacionar qual significado um determinado signo uma representação gráfica
(imagem, desenho), ou textual (palavras) é capaz de gerar no agente que o observa.
Decorre daí a importância do estudo da semiótica na contabilidade, principalmente na
codificação, pois, se o emissor quer informar ao receptor, é necessário que utilize um
padrão semiótico comum para a mensagem.
Para Moraes, Nagano e Merlo (2004),
as empresas interpretam os eventos econômicos (semântica) e os registram de
acordo com as normas de contabilidade (sintaxe), codificando os registros
71
contábeis sob a forma das Demonstrações Contábeis (signos) que são
disponibilizadas aos usuários (observadores) e que motivam estes a
realizarem interações com as empresas, auxiliando a sua tomada de decisão
(pragmática).
Porém, os signos nem sempre despertam a mesma percepção em diferentes
observadores, causando falhas na comunicação. Isso pode ocorrer em alguns conceitos
contábeis, como os conceitos de “Justo e Verdadeiro” (conceito internacional de The
True and Fair View”), que podem ser relativos, em função das diferenças semióticas
entre países e também das questões históricas e culturais (CUNNINGHAM, apud
MORAES, NAGANO E MERLO, 2004).
Diferentes grupos de usuários podem apresentar diferentes interpretações de um
mesmo signo. É o caso do ROI (return on investiment), que passou a ser utilizado para
desenvolvimento de políticas internas da empresa, transformando-se de "estimador de
investimentos em um instrumento administrativo de motivação para os administradores
de operações, mostrando que cada divisão poderia influir no resultado global da
companhia” (LABOURET, apud MORAES, NAGANO E MERLO, 2004).
Portanto, a semiótica na contabilidade é de extrema importância para a eficiência
do processo de comunicação.
O problema da comunicação é universal e atinge todas as áreas de
conhecimento humano, principalmente no tocante a compreensibilidade da
informação a ser transmitida. Assim, sendo a Contabilidade uma ciência que
tem por objetivo fundamental prover informação à tomada de decisão em
diversos níveis, tanto interna quanto externamente às instituições, pode ser
vista como ferramenta de gestão e principal linguagem de comunicação dos
fatos econômicos e da influência direta nas atividades empresariais
(MORAES, NAGANO, MERLO: 2004, p. 1).
Mesmo que parte dos Relatórios Anuais seja transmitida no formato textual, não
existe a garantia de compreensão da informação contábil. Pelo contrário, como esses
relatórios são feitos por Contadores, ou por pessoal da área contábil, e direcionados para
usuários com reduzidos conhecimentos contábeis, podem ocorrer falhas no processo de
comunicação (MORAES, NAGANO, MERLO: 2004, p. 2).
A Teoria da Contabilidade como uma Linguagem mostra o papel de cada um
dos três componentes da linguagem (HENDRIKSEN e BREDA, apud MORAES,
NAGANO, MERLO: 2004, p. 3):
72
A Sintaxe estudo da lógica ou gramática da linguagem, detém-se quase
que exclusivamente de aspectos mais técnicos da comunicação, para que
esta possua a estrutura necessária à compreensão;
A Semântica estudo do significado da linguagem, tem por objetivo
observar o significado específico que a informação transmitida gera a
cada um dos receptores, estabelecendo a relação semiótica da
comunicação;
A Pragmática – estudo do efeito da linguagem, costuma ser o foco
principal dos estudos em contabilidade, uma vez que se a informação
contábil desempenha seu papel de informar, o resultado da função
pragmática será observado na resposta do receptor.
Em consonância com a NBC T 1 (CFC, 1995), a informação contábil deve ter os
seguintes atributos:
Confiabilidade: é o atributo “que faz com que o usuário aceite a informação
contábil e a utilize como base de decisões”. Tem como fundamentos a
veracidade (informações sem erros ou vieses, e que sejam elaboradas de
acordo com princípios e normas contábeis), completeza (“compreender todos
os elementos relevantes e significativos sobre o que pretende revelar ou
divulgar”) e pertinência do seu conteúdo (conteúdo de acordo com a
respectiva denominação ou título);
Tempestividade: “a informação contábil deve chegar ao conhecimento do
usuário em tempo hábil, a fim de que este possa utilizá-la para seus fins”,
mantendo-se a periodicidade;
Compreensibilidade: “a informação contábil deve ser exposta da forma mais
compreensível possível ao usuário que se destine”. Presume-se que
o usuário disponha de conhecimentos de Contabilidade e dos negócios e
atividades da entidade, em nível que o habilite ao entendimento das
informações colocadas à sua disposição, desde que se proponha a analisá-las,
pelo tempo e com a profundidade necessários.
A eventual dificuldade ou mesmo a impossibilidade de entendimento
suficiente das informações contábeis por algum usuário jamais será motivo
para a sua não-divulgação.
Trata-se de uma presunção que coloca toda a responsabilidade de
compreensão para o receptor. Porém, o contador deve instruir o usuário
73
sobre as bases do que está sendo comunicado, sob pena de não se viabilizar
uma comunicação eficaz;
Comparabilidade: deve permitir o “conhecimento da evolução de uma
determinada informação ao longo do tempo, numa mesma entidade ou em
diversas entidades, ou a situação destas num momento dado”, visando
conhecer suas posições relativas.
A Teoria da Ação Comunicativa, de Jürgen Habermas, ratifica a confiabilidade e
a compreensibilidade, como atributos necessários para a eficácia do processo de
comunicação. A confiabilidade aparece no discurso de Habermas como um dos
“pressupostos para a existência da situação ideal de diálogo entre os interlocutores”.
(Moreira e Vasconcelos, 2007).
Para Habermas (apud Moreira e Vasconcelos, 2007) a democracia (necessária
em empreendimentos autogestionários) é fundamentada por um discurso constituído por
duas premissas: “o uso de uma linguagem e a compreensão dos interesses mútuos”. Para
que a linguagem seja uma premissa, ela deve ser clara, partilhada e difundida.
Porém, o uso correto das palavras ocorrerá quando for abandonada a razão
instrumental ou estratégica, que visa o máximo domínio e aproveitamento do mundo e
da natureza, e for utilizada a racionalidade comunicativa, que usa o conhecimento de
modo dialógico, visando o entendimento.
De acordo com Moraes (apud Moreira e Vasconcelos, 2007), a Teoria da Ação
Comunicativa, de Habermas, está justificada em quatro níveis de validade, relacionados
a um processo de comunicação eficaz:
Inteligibilidade do que é dito;
Veracidade do que é dito;
Justificação do emissor, por certos direitos sociais ou normas que são
invocadas no uso de idioma”;
Sinceridade no que é dito, sem tentar enganar o receptor. Desse ponto
decorre “uma inspiração ética alicerçada na transparência como um dos
princípios da comunicação”.
74
De acordo Dias Filho (2001), para que a informação contábil seja melhor
aproveitada, são necessárias algumas características sicas, tais como a
comparabilidade, objetividade, compreensibilidade, oportunidade e relação favorável
entre o custo e os benefícios dela esperados.
O diagrama a seguir mostra essas características, com sua utilidade e principais
componentes:
Ilustração 10 – Uma hierarquia de qualidades em Contabilidade (SFAC 2)
Fonte: Dias Filho (2001, p. 17)
Responsáveis pela tomada de decisões e suas
características (por exemplo, entendimento da
informação ou conhecimento prévio)
Usuários de
informações
contábeis
Benefícios > Custos
Compreensibilidade
Utilidade para a tomada de decisões
Relevância
Confiabilidade
Oportunidade
Valor
Preditivo
Valor como
Feedback
Restrição
geral
Qualidades
específicas
a usuários
Principais
qualidades
específicas
a decisões
Comparabilidade
(incluindo
consistência)
Neutralidade
Verificabi-
lidade
Fidelidade de
Representação
Elementos das
qualidades
principais
Materialidade
Limite de
reconhecimento
Qualidades
secundárias e
interdependentes
75
Para Ribeiro, Ribeiro Filho e Fragoso (2003, p. 3), somente a veracidade da base
de dados não é garantia para o êxito do processo de comunicação. É necessário que
esses dados estejam numa linguagem inteligível. Assim, o contador deve fazer um
esforço para que sua intenção de uma melhor comunicação seja percebida pelos
usuários, valendo-se de técnicas complementares de evidenciação, como o uso de
representações gráficas.
Para Smith e Bain (apud Ribeiro, Ribeiro Filho e Fragoso, 2003, p.3-4), os
gráficos ajudam a clarificar a apresentação de dados, a obter mais exatidão e aumentar a
capacidade dos gerentes em tomarem melhores decisões. “Os gráficos que oferecem
comparações ou ilustram tendências são geralmente os mais úteis”.
Mesmo assim, ocorrem dificuldades. Segundo Pereira, Fragoso e Ribeiro Filho
(2004, p. 12), conforme pesquisa com 41 empresas em Florianópolis e Recife, as
principais razões para a o utilização ou subutilização de demonstrativos contábeis
foram:
Informações não totalmente confiáveis;
Informação entregue com atraso (contabilidade terceirizada);
Proprietário da empresa toma as decisões sem utilizar os demonstrativos
contábeis;
Utilização do lucro presumido (falta de incentivo para o registro);
Controles extracontábeis mais eficientes;
Falta de conhecimento para avaliar o conteúdo dos demonstrativos;
Falta de detalhes dos números apresentados;
Os todos alternativos aos demonstrativos contábeis são: Planilhas e Gráficos,
Relatórios de Faturamento, Margem de Lucro, Fluxo de Caixa, Ponto de Equilíbrio,
Mapa de Vendas dos últimos períodos, Controle de notas fiscais, Controle das notas de
estoque etc. Segundo Pereira, Fragoso e Ribeiro Filho (2004, p. 13), a apresentação das
informações contábeis por meio de representações gráficas obteve os seguintes
comentários positivos: mais fácil e simples de compreender e interpretar; mais analítico;
complementa forma usual, mais fácil de comparar resultados etc. Porém, houve quem
dissesse que da forma usual era melhor: as demonstrações ficavam mais específicas; as
análises horizontais e verticais eram mais úteis; são cópias dos balanços, não trazendo
informações novas etc.
76
Para Fuji e Slomski (apud Pereira, Fragoso e Ribeiro Filho, 2004, p. 5), segundo
pesquisas realizadas no Brasil e Estados Unidos, a linguagem contábil e suas
terminologias, notadamente nas notas explicativas, não são suficientemente
compreensíveis aos usuários, possuindo alcance limitado, com efeitos adversos sobre o
processo de análise, interpretação e, conseqüentemente, na otimização de resultados.
Para saber se o processo de comunicação está obtendo êxito, ou seja, se está
reduzindo a incerteza, é necessário determinar a validade da informação contábil, que
não pode ser feita senão medindo o nível de incerteza do usuário entre dois momentos:
antes e depois de receber a mensagem (DIAS FILHO, 2000, p.46).
Para Michels (2000), a informação pode alterar comportamentos. Para que os
associados das cooperativas o se sintam enganados, deve-se mostrar a verdadeira
situação econômica e financeira da sociedade, provocando um relacionamento mais
estreito e emocional, tornando a cooperativa um reflexo da cultura, crença, valores e
normas dos associados. Porém, o estreitamento das relações só é possível se o sistema
de informação contábil for confiável.
A maior parte das pesquisas sobre demonstrações financeiras ainda enxerga a
contabilidade como um fenômeno técnico e neutro, melhor alcançado com
metodologias baseadas na modelagem e previsão das reações do mercado aos padrões e
características do material divulgado. Também persiste a crença na naturalidade dos
mercados, na preeminência dos mecanismos impessoais de preços, e no papel da
contabilidade como um mecanismo independente de comunicação financeira. Ao invés
disso, a contabilidade pode ser concebida como participante da construção social da
realidade (PARKER, 2007, p. 40).
77
3. GOVERNANÇA CORPORATIVA
Neste capítulo, serão abordados aspectos da governança corporativa: a prestação
de contas (accountability), os controles e regulamentações e a tecnologia da informação
necessária para garantir a efetividade dos controles internos e a transparência.
A governança corporativa tem como principal preocupação obter dos acionistas,
da alta administração e do conselho de administração, a aderência (compliance) a
códigos de conduta que contenham mecanismos para reduzir ou eliminar os conflitos de
interesse e as fraudes, e utilizar padrões ou “melhores práticas”, protegendo assim,
também os envolvidos em geral (stakeholders) funcionários, clientes, fornecedores,
bancos, o meio-ambiente e a comunidade. As boas práticas de governança corporativa
estão baseadas em quatro pilares - Equidade, Prestação de Contas, Transparência e
Sustentabilidade Corporativa, e são assuntos obrigatórios para os gestores de uma
empresa (KPMG, 2008, p. 2). “As boas práticas de governança corporativa têm a
finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir
para a sua perenidade” (IBGC, 2008).
O interesse neste tema acentuou-se principalmente após os escândalos
financeiros ocorridos em 2001, envolvendo a Enron, Worldcom e outras empresas, e
que culminou com a aprovação da Lei Sarbanes-Oxley, em 2002, para restabelecer a
confiança no sistema.
A efetiva gestão da conformidade (compliance) requer uma abordagem
abrangente desta, que considere os diversos requisitos dos órgãos reguladores e outros
envolvidos, que contemple os diversos pontos de contato com a gestão operacional e as
várias formas de elaboração e divulgação de relatórios (reporting) necessários para
identificar potenciais sinergias e a utilização cruzada da informação (PRICE/SAP,
2005a, p. 2).
Porém, a implantação da governança corporativa representa altos custos, e as
empresas buscam formas de garantir sua efetividade, eficiência e sustentabilidade.
Espera-se, além da redução do seu custo de implantação e de manutenção, que suporte,
de fato, a empresa, para que esta atinja as demandas dos stakeholders, cujo foco tem
mudado de “ganhos máximos a qualquer custo” para crescimento sustentável e
governança efetiva, gerenciamento de riscos e conformidade (PRICE/SAP, 2005a, p. 3).
78
3.1. Accountability
Para Ijiri (apud Nakagawa, 2007, p. 7), a razão de ser da contabilidade é a
prestação de contas (accountability), que, segundo Nakagawa (2007, p. 7) “surge como
o resultado de um adequado nível de evidenciação”. De acordo com Vasconcelos e
Viana (2002, p.21), a “qualidade da evidenciação torna-se fator de excelência para uma
comunicação eficaz”. Também afirmam que a posse da tecnologia não é suficiente, se a
informação não é compreendida nem compartilhada.
Segundo Dias Filho (2000, p. 40),
... o termo evidenciação permeia as principais reflexões, pois ele se identifica
com os próprios objetivos da contabilidade, caracterizando-se como o meio
pelo qual ela deve cumprir a sua missão, isto é, comunicar aos seus usuários
informações relevantes para orientar decisões.
De acordo com Nakagawa (2007, p. 7), existem duas formas de accountability:
a exógena, decorrente da “necessidade de o Conselho de Administração
fazer a prestação de contas (evidenciação) para a Assembléia Geral
Ordinária dos acionistas e envolvidos (stakeholders)”. A base técnica desta é
a atividade de contabilização, cujo responsável, legal e técnico, é o contador,
e visa “demonstrar a conformidade da empresa às leis que regulam suas
atividades”;
a endógena, decorrente da necessidade de os dirigentes da empresa fazerem a
prestação de contas perante o seu Conselho de Administração. A base
técnica dessa evidenciação, cujos responsáveis são os contadores gerenciais
(controllers), é a contabilidade gerencial, que tem a capacidade de interpretar
e comunicar aos gestores do negócio e envolvidos (stakeholders) os riscos
associados ao negócio, em especial à estimativa dos fluxos de caixa de
futuros negócios.
A transparência com que as empresas disponibilizam informações ao mercado
tem sido reconhecida como um dos principais pilares das boas práticas de governança
(MENDES DA SILVA e MAGALHÃES FILHO, 2005).
79
A transparência é, segundo o IBGC (2008, p. 9):
mais do que a “obrigação de informar”, a Administração deve cultivar o
“desejo de informar”, sabendo que da boa comunicação interna e externa,
particularmente quando espontânea, franca e rápida, resulta um clima de
confiança, tanto internamente, quanto nas relações da empresa com terceiros.
A comunicação não deve restringir-se ao desempenho econômico-financeiro,
mas deve contemplar também os demais fatores (inclusive intangíveis) que
norteiam a ação empresarial e que conduzem à criação de valor.
3.2. Controles e regulamentações
De acordo com o trabalho da PriceWaterhouseCoopers, em conjunto com a
fornecedora de software SAP (PRICE/SAP, 2005a), as empresas estão sujeitas,
atualmente, a quatro tipos de controles e regulamentações: Governança corporativa e
controles internos; Padrões de indústrias; Outros padrões externos e Procedimentos
internos.
Serão abordados os controles e regulamentações que tenham relação com o
trabalho, ou seja, que tenham a ver com risco, confiança, confiabilidade, controles
internos, reputação etc.
Uma das regulamentações mais evidentes dos últimos tempos é a Lei Sarbanes-
Oxley, conhecida também por SOx ou Sarbox. Foi aprovada em 2002, nos Estados
Unidos, com o objetivo de aperfeiçoar os controles internos financeiros e contábeis das
empresas, visando garantir a transparência da gestão, a credibilidade contábil e a
segurança de informações confidenciais, reduzindo as possibilidades de fraudes. Devem
enquadrar-se na lei todas as companhias de capital aberto e suas subsidiárias cujas ações
são negociadas em Bolsas (US-listed companies), incluindo corporações estrangeiras
que negociam ADRs (American Depositary Receipts) naquele país. É composta de
requisitos específicos para governança corporativa e controles internos, tais como
(PRICE/SAP, 2005a):
Manutenção e avaliação regular da efetividade dos controles e
procedimentos para divulgação de informações relevantes, e do relato de
mudanças significativa nesses controles, incluindo qualquer ação corretiva
relativa a deficiências significativas ou falhas graves (Seção 302), e a
80
emissão de um relatório da efetividade dos controles internos sobre
demonstrações financeiras (Seção 404), na forma de:
Documentação dos processos de negócio e processos de controle das
principais atividades da empresa;
Avaliação do design e da efetividade dos controles;
Indentificação, desenvolvimento, implantação e acompanhamento dos
planos de contingência;
Acompanhamento das mudanças nos controles internos.
Divulgação rápida de informações adicionais referentes a mudanças
significativas nas condições financeiras e operacionais (Seção 409), sendo
requeridos:
Identificação do evento e o fluxo de informações, considerando papéis-
chave e responsabilidades;
Alinhamento dos relatórios internos com os requisitos externos por
informações sobre mudanças significativas nas condições financeiras e
operacionais;
Simulação dos efeitos das mudanças esperadas;
Avaliação dos impactos potenciais das mudanças.
Proteção aos informantes (Seção 301)
Anonimato e confidencialidade nos comunicados referentes a problemas
contábeis ou de auditoria;
Recepção, retenção e tratamento de reclamações recebidas pelos
informantes de problemas contábeis ou de auditoria.
A lei prevê ainda outras práticas de governança, como:
Manutenção de uma função de auditoria interna para fornecer à
administração e ao comitê de auditoria avaliações contínuas sobre os
processos de gestão de risco da empresa e o sistema de controle interno;
81
Parecer do auditor independente, em relação à eficácia operacional dos
controles internos;
Penalidades (pesadas multas e prisão) para dirigentes que, por exemplo,
alterarem documentos;
Divulgação da existência ou o de um código de ética e conduta aplicável
aos seus diretores executivos e quaisquer funcionários desempenhando
funções relevantes relacionadas à preparação dos relatórios financeiros.
As empresas m encontrado algumas dificuldades para agir em conformidade
(compliance) com a Seção 404 da Lei Sarbanes-Oxley. Algumas delas subestimaram o
escopo necessário da documentação, avaliação e esforços de teste, bem como os
requisitos de suporte (DELOITTE, 2004).
A certificação dos controles internos exigiu que muitas empresas voltassem a
implantá-los nos seus principais processos operacionais e sistemas de informação e
contratar pessoas para monitorar a eficácia desses controles. Muitos desses controles
foram, num passado recente, eliminados, na onda dos projetos de reengenharia,
downsizing e redução de custos (KPMG, 2008, p. 3).
Para a Deloitte (2003, p. 17), um modelo de confiabilidade nos controles
internos é função das seguintes características:
Desenho e eficácia operacional dos controles;
Extensão da documentação dos controles e procedimentos;
Consciência dos funcionários acerca das atividades de controle
pelas quais são responsáveis;
Monitoramento independente.
A Deloitte (2004) levantou 10 questões referentes a controles internos que estão
exigindo cuidado dos gestores. Para muitas organizações, essas questões indicam
fraquezas em um ou mais dos componentes chaves dos controles internos definidos pelo
Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (COSO), o
padrão que várias empresas adotaram para avaliar a efetividade dos controles internos
sobre relatórios financeiros.
82
As 10 ameaças para a conformidade são:
1. Falta ou deficiência de um programa abrangente de gestão dos controles
internos;
2. Falta de um programa formal de gestão de riscos empresariais;
3. Controles inadequados associados com a existência de transações não-
rotineiras (exceções), complexas ou incomuns;
4. Controle não efetivo da integração pós-fusão/aquisição;
5. Falta de controle efetivo do ambiente de TI;
6. Processo não efetivo de preparação de relatórios financeiros e de divulgação;
7. Falta de controles formais sobre processos de fechamento financeiro;
8. Falta de políticas e procedimentos contábeis correntes, consistentes,
completos e documentados;
9. Inabilidades para avaliar e testar controles sobre processos terceirizados;
10. Compreensão inadequada da diretoria e do comitê de auditoria sobre riscos e
controles;
No Brasil, as exigências de governança corporativa provêm principalmente da
Bovespa, por meio dos Níveis diferenciados de governança 1 e 2 e do Novo Mercado.
Empresas listadas nesses segmentos se comprometem, voluntariamente, com a adoção
de práticas de governança corporativa adicionais em relação ao que é exigido pela
legislação, influenciando positivamente o valor e a liquidez das ações e reduzindo o
custo de captação, devido ao grau de segurança que oferecem, pelos direitos que
concedidos aos acionistas e pela qualidade das informações divulgadas (BOVESPA,
2008).
A adesão ao nível de governança 1 ou 2 depende do grau de compromisso
assumido pela empresa, por meio de seus administradores, conselheiros fiscais e
controladores, com a Bovespa, principalmente quanto à melhoria das informações
prestadas. O anexo B relaciona estas obrigações adicionais.
No nível de governança 2, além das regras aplicáveis ao vel 1, existem
algumas obrigações adicionais, sendo que algumas delas deverão ser aprovados em
83
Assembléias Gerais e incluídas no Estatuto Social da companhia. Destacam-se a
divulgação de demonstrações financeiras de acordo com padrões internacionais (IFRS
ou US GAAP) e a maior proteção aos acionistas não controladores.
A principal inovação do Novo Mercado é a exigência de que o capital social da
companhia seja composto somente por ações ordinárias. Porém, existem outras
obrigações adicionais para as companhias abertas participantes, também listadas no
anexo B.
Comparando-se os Estados Unidos com o Brasil, nota-se que:
Mesmo com algumas diferenças nas boas práticas de governança entre os
dois países é possível notar cada vez mais uma tendência a similaridades.
Muito dificilmente iremos ter uma SOX brasileira, pois diferentemente do
mercado de capitais norte-americano, no qual as regras de governança são
obrigatórias e aplicáveis a todas as empresas abertas, no Brasil as regras
diferenciadas de governança da Bovespa são optativas (KPMG, 2008, p. 3).
Porém, dificilmente um IPO (Initial Public Offering) no Brasil, atualmente, terá
sucesso, se a empresa não optar por se enquadrar ao Nível II, ou ao Novo Mercado da
Bovespa (KPMG, 2007, p. 3).
Existem, também, outras regulamentações relacionadas à governança
corporativa:
CVM 358;
ISO BR 17799.
No Brasil, conforme determina a nova lei 11.638, com a necessidade das
instituições financeiras e das companhias abertas de apresentar as demonstrações
seguindo as normas internacionais, surgem oportunidades de ganhos para as empresas e
para o Brasil, que, segundo Ramon (2008, p. 18), são:
Maior transparência e credibilidade perante os investidores e o mercado
em geral;
Modernização das práticas contábeis para atender às demandas do
mercado;
Redução de custos e maior facilidade na captação de recursos;
Ganhos de eficiência decorrentes da melhor qualidade da informação;
Aprimoramento da governança e dos controles internos;
Eqüidade e facilidade de comparação entre empresas concorrentes;
Facilitação dos processos de fusão e aquisição de empresas;
Melhor preparação da empresa para a hipótese de ser vendida;
Estímulo à qualificação dos profissionais de contabilidade.
84
Para Nakagawa (2007, p. 7), a necessidade de conformidade faz surgir no Brasil
uma oportunidade única para a reengenharia dos processos de educação contábil nas
empresas. Corre-se, porém, o risco de o se verificar mudança significativa no
comportamento ético dos operadores contábeis, devido a uma cultura legalista (code
law) de nossa sociedade.
Conforme Allen (2005, p. 51), a mensagem emanada da Sarbanes-Oxley é clara:
o espírito da lei deve prevalecer sobre a letra da lei. Uma das soluções apresentadas por
ele é a educação dos contadores, no sentido do desenvolvimento da contabilidade e da
auditoria com princípios éticos.
3.3. Tecnologia da Informação e governança corporativa
Para atender às exigências da Lei Sarbanes-Oxley, os sistemas informatizados de
gestão devem, conforme a PRICE/SAP (2005a, p. 5-6), atender os seguintes requisitos
funcionais:
Controle de acesso e configuração para efetuar, em tempo real, acesso
universal a dados de conformidade (compliance), confiabilidade contábil, e
escalabilidade, para múltiplos objetivos e unidades de negócio, sempre que
necessário;
Gerenciamento de dados, especialmente armazenamento centralizado das
bibliotecas de processos de negócios, controle de versão, cópias de
segurança e pendências para o próximo período;
Plataforma de comunicação que inclua um espaço de trabalho colaborativo
para compartilhamento de melhores práticas sobre processos e controles,
além de um portal para submissão anônima de problemas contábeis ou
fraudes;
Captura de atributos-chave para análise (relevância da identificação de
processos, ligação entre informação financeira e controles específicos);
Facilitação de atividades necessárias de conformidade (compliance), como a
avaliação de processos e controles;
85
Integração entre dados mais complexos e demais sistemas, como na relação
entre o sistema de Recursos Humanos e a estrutura organizacional, do
financeiro com o plano de contas, dos módulos operacionais com os
controles de processos, ferramentas para gestão de documentos como
políticas e repositórios de procedimentos, atestados de conformidade ao
código de ética, certificado de independência de diretores etc;
Suporte para fluxos de trabalho (workflow), incluindo a definição de papéis,
controle de datas, limites e disparos de atividades;
Monitoramento e relatórios, incluindo sumários e exceções, de forma
detalhada (mergulho até a transação), para permitir visibilidade sobre
atividades de conformidade (compliance).
Para atender os controles demandados pela SOX, a TI deverá utilizar uma
estrutura de suporte (frameworks) de governança, tais como:
DRI – plano de continuidade de negócios (PCN);
CobiT – governança em TI;
ITIL – gestão de serviços de TI;
CMMI – gestão para o desenvolvimento de software;
ISO 149977 (BS-7799) – gestão de segurança da informação/PSI.
Os sistemas ERP (Enterprise Resource Planning) o uma das ferramentas mais
efetivas para acesso, controle e consistência dos dados que suportam a elaboração de
relatórios gerenciais. Esses sistemas provêem a estrutura necessária para os processos de
negócios e baixam o custo total de propriedade (TCO), por meio integração automática
(PRICE/SAP, 2005a, p. 15).
Porém, a governança permitida pelos sistemas ERP nem sempre é atingida, por
uma série de problemas, apontados por Morgado (2006):
Utilização parcial do ERP: ocorrem muitas “saídas” (desvios) para efetuar
controles paralelos, devido ao não funcionamento de algum módulo do
sistema, ou “porque não houve treinamento adequado, ou porque algum
módulo não foi instalado ou disponibilizado”;
86
Excesso de planilhas eletrônicas: os controles paralelos, na maior parte
efetuados em planilhas eletrônicas, causam dificuldades de
compartilhamento das informações (ilhas de informação). As planilhas são
úteis como ferramenta de simulação ou visualização de informações, devido
ao seu grande potencial de tratamento de dados: tabelas dinâmicas, gráficos,
cenários (what-if) etc. “O problema ocorre quando são usadas para controles
operacionais, pois os resultados destes não estão disponíveis
corporativamente”. A alimentação dos dados nas planilhas é feita, muitas
vezes, pela digitação de dados que já estão no sistema;
Exceções não tratadas pelo sistema: Alguns sistemas ERP não fazem o
tratamento completo de exceções (cancelamentos de notas fiscais, ordens de
serviço, devoluções, fechamentos etc.), causando a necessidade de
intervenções da área de informática, “por meio de programas ‘quebra-galho’
ou por manipulação direta de bases de dados, o que pode causar atrasos no
processo e desvio de função”;
Contabilização inadequada: Quando não se parametrizam corretamente os
lançamentos automáticos, feitos pelo sistema, ocorre a necessidade de
“reconciliações, abertura de movimentos para conferências, lançamentos
manuais etc., atrasando a disponibilidade das informações para decisão”;
Treinamento inadequado: o treinamento dos usuários do sistema
informatizado de gestão é, normalmente, precário. No preço de aquisição do
sistema está incluído, geralmente, um pacote de treinamento para todos os
usuários. Porém, esse treinamento muitas vezes não é dado com uma
metodologia adequada, pois é focado nas funções do sistema, ao invés dos
processos. A rotatividade de pessoal também é um problema, pois o novo
funcionário muitas vezes é treinado, rapidamente, pela pessoa que está
deixando o cargo, ou por autoestudo. A falta de treinamento ou sua
inadequação é um dos principais fatores de aumento no custo total de
propriedade de informática (TCO Total Cost of Ownership). Este termo foi
criado pelo Gartner Group, na década de 90, para designar o total de gastos
com a informática, incluindo-se os custos escondidos, como o de pedir
ajuda ao colega, em vez de chamar o suporte técnico, ou consultar o manual,
ou de recorrer à ajuda eletrônica, causando paradas improdutivas;
87
Problemas na cultura organizacional: Em alguns casos, as mudanças são
necessárias para “romper com padrões de atendimento que não privilegiam o
cliente, para diminuir a desconfiança em relação ao trabalho dos outros, para
destruir os ‘feudos’ gerados pela estrutura departamentalizada. Um problema
cultural sério é o “hábito de o fazer certo na primeira vez, deixando para
depois ou para outros o acerto do problema”;
Inadequação ou inexistência dos manuais de organização: é comum a falta
de “manuais de organização contendo a lógica dos processos, as políticas
utilizadas e a forma correta de uso do sistema informatizado de gestão”.
Um exemplo da busca de tecnologias que facilitem a governança corporativa é o
XBRL. As fraudes contábeis ocorridas nos Estados Unidos mostraram a urgência de
relatórios financeiros corporativos mais efetivos. Os reguladores do mercado, os
investidores e os envolvidos pedem por transparência os dados devem ser
informativos, devem ter credibilidade e devem ser acessíveis. Um caminho promissor
para a questão da acessibilidade é o desenvolvimento do XBRL (eXtensible Business
Reporting Language), que é um padrão internacional, independente de plataforma
tecnológica, que permite a extração, manipulação e troca de dados da Web, oriundos de
uma variedade de softwares aplicativos, e que podem ser baixados diretamente em
planilhas (LESTER, 2007, p. 226-228).
89
PARTE II – ECONOMIA SOLIDÁRIA E AUTOGESTÃO
Nesta parte serão abordados alguns aspectos da Economia Solidária e das empresas de
Autogestão, além da contabilidade e finanças desse tipo de empresa, principalmente das
cooperativas.
91
4. ECONOMIA SOLIDÁRIA E AUTOGESTÃO
Este capítulo tratará dos fundamentos da Economia Solidária e de alguns de seus
aspectos, como a autogestão, a transparência, a formação dos envolvidos e os
indicadores.
4.1. Economia Solidária
No dizer da ANTEAG (2007, p. 26), a Economia Solidária se caracteriza como
uma forma de organização econômica com bases diferenciadas de relacionamento, mais
focada na pessoa que no capital. A expressão dessa diferença é a organização coletiva
da gestão, na qual “as decisões estratégicas devem ser tomadas com a participação do
coletivo de sócios”.
A solidariedade deve ser a base tanto das relações internas quanto das externas.
As relações solidárias no ambiente interno são mais fáceis de serem implantadas,
embora não se dêem espontaneamente, devido à organização do mercado convencional,
orientado a partir de práticas competitivas, dos ganhos individuais. No caso das relações
externas, a solidariedade é buscada por meio do “estabelecimento de redes, articulações
em torno de cadeias produtivas e da criação de sistemas de distribuição” (ANTEAG,
2007, p. 26).
Para o Sistema Nacional de Informações da Economia Solidária (SIES), é “o
conjunto de atividades econômicas – de produção, consumo, poupança e crédito –
organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob forma
coletiva e autogestionária” (MTE / SENAES, 2006, p. 11). A Economia Solidária
surge como modo de produção e distribuição alternativo ao capitalismo, criado e
recriado periodicamente pelos que se encontram (ou temem ficar) marginalizados do
mercado de trabalho” (SINGER, 2000, p. 13).
O Instituto PACS (Políticas Alternativas para o Cone Sul) utiliza sua própria
abreviatura, com outras palavras, para sintetizar os valores principais que orientam suas
atividades. Nessa declaração de valores, PACS se traduz por Participação, Autogestão,
Cooperação e Solidariedade (Quintela e Arruda, 2000). Esses autores chamam esse
conjunto de iniciativas de “economia a partir do coração”. A identificação dos
potenciais e limites da natureza, para que se possa planejar até onde o crescimento
92
econômico pode chegar, impondo-nos limites à nossa propensão para consumir, é
chamada de “economia do suficiente”.
O Brasil dispõe do SIES (Sistema Nacional de Informações em Economia
Solidária), cujos objetivos são (MTE / SENAES, 2006, p. 10):
Constituir uma base nacional de informações em economia solidária com
identificação e caracterização de Empreendimentos Econômicos
Solidários e de Entidades de Apoio, Assessoria e Fomento à Economia
Solidária;
Fortalecer e integrar Empreendimentos Econômicos Solidários em redes e
arranjos produtivos e organizativos nacionais, estaduais e territoriais, por
meio de catálogos de produtos e serviços, visando facilitar processos de
comercialização;
Favorecer a visibilidade da economia solidária, fortalecendo processos
organizativos, de apoio e adesão da sociedade;
Subsidiar processos públicos de reconhecimento da economia solidária;
Subsidiar a formulação de políticas públicas;
Subsidiar a elaboração de marco jurídico adequado à economia solidária;
Facilitar o desenvolvimento de estudos e pesquisas em economia
solidária.
As principais características da Economia Solidária são: cooperação, autogestão,
viabilidade econômica e solidariedade. Os Empreendimentos Econômicos Solidários,
segundo o MTE / SENAES (2006, p. 10), compreendem as organizações:
a) coletivas – organizações suprafamiliares, singulares e complexas, tais
como: associações, cooperativas, empresas autogestionárias, grupos de
produção, clubes de troca, redes e centrais etc;
b) cujos participantes ou sócios (as) são trabalhadores (as) dos meios urbano
e rural que exercem coletivamente a gestão das atividades, assim como a
alocação dos resultados;
c) permanentes, incluindo os empreendimentos que estão em funcionamento
e aqueles que estão em processo de implantação, com o grupo de
participantes constituído e as atividades econômicas definidas;
d) com diversos graus de formalização, prevalecendo a existência real sobre
o registro legal e;
e) que realizam atividades econômicas de produção de bens, de prestação de
serviços, de fundos de crédito (cooperativas de crédito e os fundos
rotativos populares), de comercialização (compra, venda e troca de
insumos, produtos e serviços) e de consumo solidário.
Quanto à organização, tem-se que:
os empreendimentos econômicos solidários estão distribuídos em:
cooperativas, associações, grupos informais e outros (Sociedades Mercantis
etc.). No Brasil, a maior parte dos empreendimentos está organizada sob a
93
forma de associação (54%), seguida dos Grupos Informais (33%) e
Organizações Cooperativas (11%) e outras formas de organização (2%)
(MTE / SENAES, 2006, p. 15).
Quanto ao motivo da criação dos empreendimentos solidários, tem-se:
Alternativa ao desemprego (45%), complemento da renda dos sócios (44%) e
obtenção de maiores ganhos (41%). Dois outros motivos têm destaque:
possibilidade da gestão coletiva da atividade (31%) e condição para acesso a
crédito (29%) (MTE / SENAES, 2006, p. 26).
Quanto à quantidade de participantes, tem-se:
Estão associados nos empreendimentos econômicos solidários mais de 1
milhão e 250 mil homens e mulheres, resultando em uma média de 84
participantes por EES. A este conjunto agrega-se mais 25 mil trabalhadores e
trabalhadoras participantes que, embora não-sócios, possuem algum vínculo
com os EES.
A proporção por gênero é de 36% de mulheres e 64% de homens, embora no
meio exclusivamente urbano a proporção seja mais equilibrada, de 47.4% de mulheres
para 52,6% de homens.
A figura a seguir reflete a abrangência da Economia Solidária no Brasil,
oferecendo uma amostra de sua dimensão e potencialidade de expansão contínua nos
próximos anos.
94
De acordo com o Atlas da Economia Solidária, os empreendimentos estão
distribuídos de acordo com a tabela a seguir:
Tabela 1 – Quantidade e percentual de EES por unidade da federação/região
Fonte: MTE / SENAES (2006, p. 15)
As idéias que sustentam a Economia Solidária, Autogestão, Cooperação e outros
paradigmas não competitivos existem, embora dependam da adoção das pessoas para
não serem apenas utopias, mas possibilidades reais para o desenho de organizações.
Para Morgan (1996, p. 73),
95
Uma perspectiva ecológica que enfatize a colaboração pode fazer uma
importante contribuição sobre como entender a administração das
organizações. À medida que uma teoria de evolução enfatiza a sobrevivência
do mais apto, esta contribui no sentido de fazer da concorrência a regra básica
da vida organizacional. Sob a influência de interpretações mais ecológicas
que enfatizem a “sobrevivência do ajustamento”, a ética da colaboração
recebe muito mais atenção.
4.2. Autogestão
Segundo Bobbio, Matteucci e Pasquino (1997), autogestão pode ser entendida
como um “sistema de organização das atividades sociais, desenvolvidas mediante a
cooperação de várias pessoas (atividades produtivas, serviços, atividades
administrativas)”, no qual as decisões de gestão são tomadas diretamente pelos próprios
participantes. Existem duas determinações essenciais do conceito de Autogestão, a da
”superação da distinção entre quem toma as decisões e que as executa, no que respeita
ao destino dos papéis em cada atividade coletiva organizada com base na divisão do
trabalho” e a da “autonomia decisória de cada unidade de atividade, ou seja, a superação
da interferência de vontades alheias às coletividades concretas na definição do processo
decisório”.
Esta definição tem uma grande importância para a pesquisa, primeiro pela
questão da gestão como atividade técnica, não somente intuitiva e prática, e que
necessitaria de formação específica para ser exercida com competência, ou seja, para
que traga resultados positivos para o empreendimento. Em empreendimentos de
pequeno porte, a contabilidade e o setor fiscal normalmente são terceirizados, o que
exige mais um nível de comunicação entre esses terceiros e os gestores da empresa,
supondo-se que se queira utilizar a informação contábil como base para tomada de
decisão, não apenas para atender exigências fiscais.
Outro aspecto é a autonomia para tomada de decisões, que necessita de
informação de qualidade, compreensível pelos envolvidos e que haja confiança naqueles
que no momento estiverem assumindo o papel de gestores, não de executores.
Nas empresas de autogestão, pode-se ter a necessidade de restabelecer a
confiança, devido a traumas originados da transição de uma empresa falida para a
autogestão. “Restabelecer a confiança significa estabelecer novas estruturas, instaurar
práticas regulares, reinstituir interações” (SOLOMON E FLORES, 2002, p. 81).
96
A divisão de papéis na empresa tende a ser o maior foco de resistência à
mudança, causando um comportamento ambivalente, pois o trabalhador, embora
reconheça e valorize o comportamento cooperativo, tem como referência a divisão do
trabalho anterior, em que era excluído do processo de gestão, quando era empregado
(IBASE/ ANTEAG, 2004, p. 19). No caso das empresas de autogestão, oriundas de
empreendimentos falidos, a cultura cnica herdada daquelas empresas era “marcada
pela fragmentação, concentração de saberes e de poder nas mãos de determinados
grupos e por um sistema de normas e valores de não negociação, são solidariedade, não
cooperação” (NAKANO, 2000, p. 68).
As empresas de autogestão, pelo vínculo com a chamada Economia Solidária,
teriam, a princípio, vantagens competitivas por serem instituídas em um ambiente que
facilita a construção da confiança, pela isonomia dos membros, pela lembrança do
modelo anterior, pela esperança de uma nova maneira de fazer negócios etc. A
diminuição dos custos de transação em sociedades baseadas na confiança relaciona-se
com a constituição das empresas da Economia Solidária.
É importante destacar a distinção feita pela ANTEAG (2005:48-49) entre
Empreendimentos Autogestionários e Empresas Autogestionárias. Empreendimentos
Autogestionários são aqueles constituídos por meio de projetos sociais realizados em
comunidades periféricas, não sendo resultado de uma atividade econômica anterior. As
Empresas de Autogestão são aquelas que nascem da falência de um negócio anterior,
pressupondo-se a existência de uma atividade econômica organizada, que passa a ser
comandada pelos trabalhadores, que eram contratados nesse negócio em regime de
CLT.
As Empresas de Autogestão desempenham atividade industrial, de pequeno,
médio e grande porte, geralmente com mais de 20 trabalhadores, com necessidades em
termos de marco legal diferentes das dos empreendimentos autogestionários, os quais
“geralmente desempenham atividades de serviço ou comércio, como, por exemplo,
coleta de materiais recicláveis, artesanato, alimentação, limpeza, jardinagem, agricultura
urbana, confecção, entre outros” (ANTEAG, 2005, p. 48).
Se o for feita a diferenciação dos tipos de empreendimentos, não se levando
em conta fatores como faturamento, porte econômico, segmento de atuação etc., pode
haver sérios problemas,
97
abrindo a brecha para que empresários comecem a adotar levianamente a
forma de organização da sociedade cooperativa, para ter um tratamento
diferenciado a nível tributário e gozar de outros benefícios, direitos legítimos
conquistados pelos empreendimentos de Economia Solidária (ANTEAG
2005, p. 49).
Quanto à forma jurídica das empresas de autogestão, embora nem todas sejam
cooperativas, estas são as que “apresentam o melhor modelo de organização do trabalho
coletivo autogestionário”. Se forem seguidos os princípios e as regras do
cooperativismo, tem-se um bom referencial para se pensar a autogestão (ANTEAG,
2007, p. 29).
No anexo A, encontram-se trechos da Lei 5764, de 16 de dezembro de 1971, que
define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades
cooperativas, e outras providências, que dizem respeito a este trabalho, ou seja, o
modelo de gestão, obrigações quanto à participação, transparência etc.
Para esta pesquisa serão abordados os empreendimentos autogestionários e as
empresas de autogestão, incluindo as cooperativas. No caso das empresas de autogestão,
com atividade anterior à sua formação, existe também a questão da reconstrução da
confiança.
4.3. Transparência das informações
Um dos princípios da Economia Solidária é a gestão democrática da empresa,
que necessita, para ser efetiva, de transparência das informações sobre o negócio.
A autogestão duma empresa solidária é ou deveria ser totalmente
diferente da gestão capitalista, em primeiro lugar porque os conflitos entre
interesses seccionais devem ser muito menores e em segundo porque podem
ser travados abertamente e resolvidos por negociações em que todos tomam
parte. Numa empresa solidária todas as informações relevantes estão
disponíveis aos interessados. A contabilidade e os demais sistemas de
controle são desenhados para que a transparência impere, de modo que a
participação de todos nas decisões possa acontecer (SINGER, 2000, p. 20).
Essa transparência é também necessária para que a repartição das sobras entre os
cooperados, feita por critérios aprovados após negociações entre todos, seja suportada
por informações corretas e com significado claro para todos os membros.
Os Empreendimentos e Empresas de Autogestão são sociedades que
desempenham atividades econômicas cuja gestão é exercida
98
democraticamente pelos trabalhadores que dela participam. Seus atos
constitutivos devem prever a existência de mecanismos democráticos de
gestão e definição em assembléia de questões como: política de remuneração,
política disciplinar, política de saúde e previdência, formas de organização da
produção e destinação solidária dos resultados. Os princípios
autogestionários, tais como: tomadas de decisão democráticas e coletivas,
transparência administrativa, solidariedade e fraternidade, trabalho mútuo,
valorização das pessoas e cidadania, também devem constar nos atos
constitutivos dos empreendimentos e empresas autogestionários, e não podem
ser alterados ou retirados em mudanças estatutárias posteriores ANTEAG
(2005, p. 48).
Estas são definições e princípios desse tipo de empreendimento. Porém, é uma
prática que deve ser construída, no dia-a-dia, em cada decisão, em cada distribuição de
sobra, em cada crise. Para essa construção é necessário transparência. De acordo
Castoriadis (1983, p. 214),
... decidir é decidir com conhecimento de causa. Não será mais a coletividade
quem decidirá, mesmo se “votar” formalmente, se alguém ou alguns
dispuserem sozinhos das informações e definirem os critérios a partir dos
quais uma decisão é tomada. Isto significa que aqueles que decidem devem
dispor de todas as informações pertinentes. Mas também que eles mesmos
podem definir os critérios a partir dos quais decidem. E que, para fazer isso,
dispõem de uma formação cada vez mais ampla.
No modelo hierárquico de organização, os que estão no comando possuem ou
pretendem possuir o monopólio das informações e da formação ou, no mínimo, o
acesso privilegiado a elas. Numa organização hierárquica, as informações sobem da
base à cúpula e não retornam, nem circulam”, e quando circulam, fazem contra as regras
estabelecidas. Da mesma forma, “todas as decisões descem da cúpula à base, que não
faz outra coisa a não ser executá-las” (CASTORIADIS, 1983, p. 214). Os perfis
autoritários, avessos à transparência e à participação, normalmente escondem e
manipulam informações, buscando que as pessoas saibam o menos possível (AMORIM,
2001, p. 228).
A questão é como decidir sem as informações necessárias para uma boa decisão?
E como se aprende a decidir se o máximo que se faz é executar o que outros decidiram?
Assim, a coletividade torna-se “opaca” porque as informações ficam retidas na cúpula.
Ocorre, também, um grande desperdício, pela falta de informações que os empregados
deveriam saber, e a inventividade e iniciativa, formalmente reservadas para a direção,
também não aparece na base (CASTORIADIS, 1983, p. 214).
99
Os meios / canais de participação e informação tendem, por sua vez, a afrouxar a
divisão do trabalho tradicional, ao permitir a circulação da informação e, desse modo, a
apropriação do processo produtivo pelo conjunto dos trabalhadores. Nesse sentido, é a
existência desses canais que atua na disposição dos trabalhadores para a cooperação e
participação. Uma das hipóteses deste trabalho é justamente que a confiabilidade do
processo de comunicação de informações econômico-financeiras (produção /
transparência) pode contribuir para a construção da confiança nos receptores dessas
informações.
Para a ANTEAG (2007, p. 41), para que se estabeleça, de fato, a autogestão, é
necessário transparência na transmissão das informações, sejam números ou
acontecimentos, transmitidos por meio de canais diversos: boletins, jornais, murais,
radio peão (quando construtiva), atas. São importantes a quantidade de canais, a
qualidade da informação e o preparo daqueles que irão receber as informações. Cursos
de compreensão básica sobre a gestão da cooperativa e de outros temas são muito úteis
para facilitar o acompanhamento por parte dos trabalhadores da situação da empresa. A
apresentação das informações de maneira didática é oportuna, principalmente as
econômico-financeiras, mais polêmicas e de maior interesse. A clareza das informações,
além de necessária,
torna-se, com o tempo, prazerosa ao cooperado, a medida em que facilita a
participação dos demais, possibilitando que todos possam auxiliar o
responsável pela tomada de decisões. Este, por sua vez, sente-se como que
aliviado por não estar com a informação e transmiti-la de modo a afastar
possíveis desconfianças (Idem, p. 41).
Existem algumas condições para que a informação seja transmitida de maneira
eficaz:
Numa empresa autogestionária, nenhuma informação deve ser escondida.
Isto gera desconfiança e pode criar ditadores;
O registro das informações deve ser fiel ao ocorrido;
A informação deve ser transmitida com clareza;
A informação deve chegar a todos com agilidade;
O comunicado deve ser por inteiro e sem insinuações com gestos ou
palavras.
Antes da Assembléia Geral, devem ocorrer reuniões do Conselho de
Administração, do Conselho Fiscal ou dos Grupos de Trabalho (Idem, p. 41).
100
4.4. Formação em Economia Solidária
De acordo com a ANTEAG (2005, p. 24), no desenvolvimento da metodologia
de formação para Economia Solidária, prevista no PNQ/ ProEsQ 2004 (Plano Nacional
de Qualificação / Projetos Especiais de Qualificação), em convênio com Ministério de
Trabalho e Emprego (MTE), através da Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, a
formação pode ocorrer em dois níveis diferentes, de acordo com a demanda e a
realidade da empresa ou empreendimento: Cursos de Sensibilização e Cursos de
Aprofundamento.
Outro recurso formativo, muitas vezes subestimado pelos programas de
formação, mas sempre lembrado pelos trabalhadores, é a realização de
intercâmbio entre trabalhadores de diferentes empresas/ empreendimentos ou
regiões como forma de compartilhar o conhecimento consolidado (ou mesmo
os problemas enfrentados, o que também é formativo) com outras
experiências (ANTEAG, 2005, p. 24).
Os cursos de sensibilização devem trabalhar os conceitos básicos para a
formação em autogestão e Economia Solidária e sensibilizar para a importância do
conhecimento pelos trabalhadores:
de documentos fundamentais (como Estatuto Social, Regimento Interno e
os livros de registro financeiro);
da produção ou serviço prestado e das ferramentas que podem auxiliar a
melhorar esses produtos ou serviços;
do negócio em si, o que implica em [sic] conhecer o mercado, as cadeias
produtivas, as redes articuladas e outros itens semelhantes e a importância
do planejamento como base para o desenvolvimento do negócio;
dos princípios que norteiam a Economia Solidária e seus reflexos na vida
do trabalhador, tanto em âmbito doméstico como no ambiente de trabalho
(importância de cuidar da saúde, o respeito ao meio ambiente, às relações
de gênero, étnicas e familiares, a educação dos filhos, as atitudes frente
ao mercado etc.) (ANTEAG, 2005, p. 24-25).
Os cursos de aprofundamento devem trabalhar a formação, sobretudo no
“desenvolvimento e uso de ferramentas que possam auxiliar a gestão do negócio, e da
produção/ prestação de serviço. A elaboração do Plano de Negócios, de Sistemas de
Qualidade etc. podem ser recursos metodológicos interessantes”. Não se deve, no
entanto, restringir esta formação apenas aos administradores, pois, quanto mais ”os
conhecimentos estejam disseminados entre os trabalhadores, mais harmônicas tendem a
ser as relações dentro da empresa” (ANTEAG, 2005, p. 24).
101
Segundo o Comitê pró Central de Cooperativas Autogestionárias de Economia
Solidária do Rio Grande do Sul (apud Dias e Silva, 2008, p. 4), um dos princípios para
que uma cooperativa seja considerada autogestionária é o da formação integral,
mediante o compromisso dos empreendimentos de proporcionar a qualificação /
formação dos cooperados e dos seus.
As empresas da Economia Solidária requerem o envolvimento de profissionais
com uma outra abordagem de negócio, ou seja, que compreendam a vocação
econômico-social do empreendimento” (Almeida, 2006, p. 4).
Em ANTEAG (2005, p. 20), a questão é caracterizada como sendo:
... uma dificuldade típica da divisão do trabalho, esse tipo de problema,
derivado da contratação de terceiros, pode ser característico da inovação que
a autogestão representa, e que não é parte da formação de profissionais cuja
atuação se em empresas convencionais, segundo as regras convencionais
do mercado, que não tem qualquer interesse em saber como se realiza o
processo de produção ou que qualidade de trabalho está realizada no produto.
Poderíamos acrescentar exemplos das mais diferentes áreas: jurídica,
tecnológica, tributária e contábil em que o profissional contratado acaba
sendo disfuncional para a empresa / empreendimento por desconhecer as
condições que diferenciam a autogestão.
4.5. Indicadores de autogestão
Os indicadores da Autogestão são critérios para tornar objetiva a avaliação das
“situações que revelam o momento do processo de construção da autogestão, em uma
empresa, pelos trabalhadores associados” (ANTEAG, 2005, p. 37).
As relações sociais e políticas, internas e externas das empresas e de seus
sócios fazem parte dos indicadores porque a Autogestão não pode ser
compreendida somente como um processo empresarial, mas como um
processo econômico-social em que homens e mulheres, com toda sua
integralidade, devem participar ativa e coletivamente de todo ele para que
possa se constituir em uma experiência estratégica e emancipadora
(ANTEAG, 2005, p. 37).
Assim, esses indicadores são utilizados para formular um diagnóstico
quantitativo de um momento determinado da empresa, para medir a evolução da
autogestão, comparando-se com outro momento da empresa ou mesmo de outras
empresas. A partir da constatação das causas dos problemas, podem ser definidas as
ações corretivas e para a qualificação dos gestores.
102
A ANTEAG (2005, p. 38), a partir da experiência do acompanhamento e
assessoria prestada aos empreendimentos autogestionários, selecionou 38 indicadores
para a caracterização de uma empresa como autogestionária, agrupados em seis eixos:
1. Participação dos Trabalhadores: os indicadores desse eixo referem-se à
“interferência direta e indireta do conjunto dos sócios na gestão da empresa,
demonstrando seu nível de democratização”.
São eles:
Freqüência de Assembléias Gerais;
Participação nas Assembléias Gerais;
Freqüência de reuniões de trabalhadores;
Participação nas reuniões de trabalhadores;
Freqüência de reuniões do Conselho de Administração;
Participação dos membros do Conselho;
Freqüência de reuniões do Conselho Fiscal;
Participação dos membros do Conselho Fiscal;
Rotatividade da Direção (última eleição);
Construção do Acordo Coletivo Social Interno;
Aplicação do Acordo Coletivo Social Interno.
“Alguns destes indicadores não representam, por si sós, a qualidade da
participação, mas sua ausência representa categoricamente a não participação dos
trabalhadores” (ANTEAG, 2005, p. 38).
2. Transparência Administrativa / Financeira: esses indicadores servem para a
observação dos fatores básicos de transparência do gerenciamento da
empresa, baseado na elaboração e divulgação de informações aos
trabalhadores.
São eles:
Elaboração de balancete mensal;
Divulgação do balancete mensal;
Análise do balancete pelo Conselho Fiscal;
Divulgação do parecer do Conselho Fiscal;
Elaboração de planejamento (administração / produção);
Divulgação atos da administração / produção.
3. Transparência na Distribuição dos Resultados: servem para medir a justa
remuneração do trabalho desenvolvido pelo conjunto dos sócios da empresa.
São eles:
Definição de retiradas;
Remuneração de cargos de direção;
Razão entre a menor e maior retirada.
103
4. Relações Comunitárias: utilizados para avaliar as relações da empresa com
os agentes sociais que podem auxiliar na viabilização do negócio, que não
tenham caráter eminentemente mercantil. Revelam o montante de capital
social da empresa (Fukuyama, 1996).
São eles:
Relação com Governo Estadual;
Relação com a Prefeitura;
Relação com Sindicato da categoria;
Relação com ONGs ou outras entidades civis;
Relação com Movimento Comunitário;
Participação no Orçamento Participativo estadual e/ou municipal;
Participação dos trabalhadores no Orçamento Participativo estadual e/ou
municipal.
5. Atividades Sociais: este eixo é composto das manifestações mais comuns de
integração e respeito pela integralidade das pessoas.
São eles:
Freqüência de festas sociais com os trabalhadores;
Participação dos trabalhadores nas festas;
Participação de familiares dos trabalhadores;
Freqüência de atividades esportivas;
Participação nas atividades esportivas.
6. Quadro Social: este eixo reflete a preocupação com um dos pilares da
autogestão, que é a remuneração do trabalho em detrimento do capital. A não
exploração do trabalho de outros “pode ser avaliada pelo perfil quantitativo e
qualitativo do quadro de associados em relação ao empoderamento dos
trabalhadores que compõem o quadro dos envolvidos no empreendimento”
(ANTEAG, 2005, p. 38).
Os indicadores componentes são:
% de empregados;
% de terceirizados;
Agregação de sócios;
Afastamento de sócios;
% de mulheres na empresa / % de mulheres na direção.
A própria ANTEAG (2005, p. 42) detectou, no entanto, que algumas
informações importantes não estavam sendo avaliadas. Por exemplo, no eixo 3, da
transparência na distribuição dos resultados, no qual não é abordada a questão da
destinação dada às sobras, que pode ter diversos fins, como a distribuição entre os
104
sócios (que pode ser eqüitativa, proporcional ao trabalho realizado ou segundo critérios
que não reflitam a opção de autogestão), investimentos na comunidade, reinvestimento
ou formação de fundos.
No caso deste trabalho, existe uma relação entre os elementos que definem uma
verdadeira empresa de autogestão e a maior facilidade, no caso de indicadores
favoráveis, de construção de confiança por parte dos trabalhadores que são usuários das
informações econômico-financeiras.
Outro conjunto de indicadores, mais voltado para questões comportamentais dos
trabalhadores em empreendimentos autogestionários e empresas de autogestão foi
proposto pelo IBASE, em conjunto com a ANTEAG, e é composto de dois conjuntos:
indicadores institucionais e indicadores comportamentais, cada um com variáveis
específicas.
O quadro a seguir mostra os Indicadores Institucionais de Autogestão:
Indicadores Variáveis
Resultado da mobilização dos trabalhadores.
Apoios externos que não signifiquem dependência ou subordinação.
A escolha do regime cooperativo ou associado.
O começo do
empreendimento
(o “momento
inaugural”)
Desarticulação inicial de funções e papéis.
Obtenção da propriedade de direito (“propriedade coletiva”)
Contribuição diferenciada, não representando desigualdade no direito
de participação (“cada cabeça um voto”).
Decisão dos trabalhadores sobre o destino das sobras ou prejuízos por
ventura existentes.
O regime de
propriedade
Integralização das quotas-partes (no caso das cooperativas).
A divisão de função não significando grandes diferenças na
distribuição de responsabilidades quanto à gestão do empreendimento
(no como, quanto, quando e para quem produzir ou ofertar o serviço).
A divisão de papéis
dentro do
empreendimento
A divisão de funções não implicando grande diferença entre a maior
e menor retirada (média da pesquisa: quatro vezes).
Regularidade dos canais de participação e informação.
Informações de gestão repassadas aos trabalhadores.
Utilização regular de meios de comunicação (boletins, jornais,
programas de rádio etc.).
Capacitação dos trabalhadores em gestão associada (realização de
cursos)
Canais em que trabalhadores de um mesmo setor trocam informações
e definem caminhos a seguir.
Encontros com outras experiências similares.
Existência de encontros preparatórios para as reuniões deliberativas.
Os meios/canais de
participação e
informação
A rotatividade dos cargos diretivos.
Quadro 2 – Indicadores Institucionais de Autogestão
Fonte: IBASE / ANTEAG (2004, p. 18)
105
O quadro a seguir mostra os Indicadores Comportamentais de Autogestão
Variáveis
Indicadores
Fraca Forte
Esperar uma união em que
todos tenham o mesmo
pensamento.
Reconhecer e valorizar a diferença de
opiniões
Evitar a discordância com os
colegas.
Aceitar o conflito como saudável quando
se busca um objeto comum.
Cooperação
Esperar uma colaboração como
“ajuda mutua”, soma de
esforços.
Trocar experiências e informações com os
outros trabalhadores
Efetuar bem as tarefas relativas
à função.
Desenvolver as tarefas a realizar, levando
em conta as necessidades e potencialidades
do empreendimento.
Empenho
Trabalhar mais, dedicar mais
horas no desempenho da
função.
Estar disponível para a interação com os
que desempenham outras funções e para a
aquisição de novos saberes.
Estabelecer as tarefas a realizar
como achar por bem
Atuar na definição das tarefas a serem
cumpridas.
Cumprir o horário de trabalho
que lhe seja mais conveniente.
Cumprir o horário de trabalho acordado
para favorecer o processo de produção.
Liberdade
Estipular a retirada e o destino
das sobras ou prejuízos que lhe
sejam mais satisfatórios.
Estipular retirada e destino das sobras ou
prejuízos, considerando a sustentabilidade
do empreendimento.
Estar presente em reuniões
onde decisões são tomadas.
Tomar posição, expor sua opinião, sua
visão sobre as coisas.
Ficar a par dos que está
acontecendo no
empreendimento.
Fazer circular as informações, ou seja,
assimila-las, produzi-las e repassá-las.
Participação
Assumir posicionamentos
rígidos, pouco flexíveis.
Estar disposto a rever posicionamentos e
assumir novas visões.
Quadro 3 – Indicadores Comportamentais de Autogestão
Fonte: IBASE / ANTEAG (2004, p. 21)
107
5. CONTABILIDADE NA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Este capítulo tratará sobre as finanças e a contabilidade das empresas de
autogestão e de cooperativas, principalmente nas questões da utilidade para a autogestão
e a comunicação das informações produzidas.
Nos empreendimentos da Economia Solidária também é necessária a
contabilidade como instrumento de gestão. Para Almeida (2006, p. 4), “o processo de
autogestão requer a participação cotidiana dos trabalhadores na tomada de decisão, seja
na deliberação da organização do trabalho ou nas decisões de alto nível”.
A contabilidade é uma forma de representação da realidade baseada em aspectos
objetivamente mensuráveis e busca, basicamente, a produção de informações úteis à
tomada de decisão, ao planejamento e ao controle (ANTEAG, 2004).
5.1. Contabilidade em cooperativas
Para compreender a vida financeira de uma cooperativa é necessário
compreender o ato cooperativo (ANTEAG, 2007, p. 42). Do dinheiro que entra
(ingresso), a cooperativa deve reservar uma parte para pagar os dispêndios (equivalente
às despesas no ato não cooperativo). Outra parte deve ir para os fundos como o FATES,
destinado à educação, o de Reserva etc. e para os investimentos. O recurso restante é
para fazer o repasse (chamado de retirada) aos sócios.
É importante que o trabalhador cooperado tenha claro que os ingressos da
cooperativa são de todos os cooperados, assim como também o são os seus
dispêndios. O repasse somente pode ocorrer após a cooperativa haver
garantido o recurso para os dispêndios. Tais conceitos devem orientar a
organização financeira da cooperativa (Idem, p. 42).
É comum o cooperado não compreender que o repasse não seja o mesmo todos
os meses, que dependa da situação financeira da cooperativa, como se “ele ainda fosse
empregado que vende sua força de trabalho a um patrão. Isso ocorre porque as
cooperativas têm dificuldade em tornar clara e participativa a sua vida financeira”
(Idem, p. 43).
108
As sobras, apuradas anualmente, no final do exercício, representam a diferença
entre as provisões mensais para o pagamento dos dispêndios da sociedade e o que de
fato se gastou. “Não é equivalente ao lucro, como muitos pensam” (Idem, p. 42).
As discussões que interessam aos cooperados não são sobre miudezas, são sobre
a criação de fundos, sobre o provisionamento para descanso dos cooperados e a
correspondente fonte de recurso para isto. É necessário que os cooperados
compreendam como os ingressos ocorrem e qual a melhor maneira de administrá-los,
garantindo-se não só a remuneração mensal dos sócios, mas a sustentabilidade do
negócio e, conseqüentemente, as deles próprias (Idem, p. 43).
O desconhecimento da vida financeira de uma cooperativa acaba levando a
atrasos ou endividamentos com fornecedores para pagamento das “retiradas”
ou a equívocos como endividamento da cooperativa” com “retiradas”
atrasadas. Ora, o dinheiro da cooperativa é dinheiro dos cooperados; da
mesma maneira como as dívidas da cooperativa são vidas do cooperado.
Contudo, muitas vezes ainda prevalece a idéia de que as obrigações da
cooperativa nada tem a ver com o cooperado individualmente, assim como
em uma empresa convencional onde as despesas eram responsabilidade do
patrão, assim como a de gerar recursos suficientes para garantir os salários
em dia (Idem, p. 43).
O acompanhamento da vida financeira da cooperativa e a compreensão do
mecanismo de ingresso, dispêndio, repasse e sobras pode ser facilitado se um fluxo de
caixa atualizado, organizado adequadamente para a visualização pelos cooperados, com
boas justificativas, for apresentado periodicamente. “A capacitação nesses conteúdos é
de imenso valor para que se consiga atingir a compreensão e participação dos
cooperados” (ANTEAG, 2007, p. 43).
Um dos problemas com a fiscalização, principalmente do INSS, é o de que os
registros contábeis não refletem os fatos descritos, não sendo possível, pela análise dos
documentos, visualizar o ato cooperativo. Para solucionar esta questão, as cooperativas
devem seguir os preceitos das Normas Brasileiras de Contabilidade, mais precisamente
na NBC T 10.8, específica para estas entidades (ANTEAG, 2007, 89).
Segundo Mem (2008, p. 2), as sociedades cooperativas trabalhavam com um
modelo contábil emprestado das demais sociedades. Agora, com a norma específica,
“além de assumir um modelo contábil próprio, as sociedades cooperativas devem
segregar as operações do ato cooperativo do não cooperativo, quando ocorrer”. Devem
109
também identificar e registrar as operações por atividade (negócio), que, aliás, se torna
muito mais rica em informações para a sociedade que em outros modelos.
Para CRUZ FILHO, apud Silveira et al. (2004, p. 5),
é necessário construir um arquivo de informações contábeis que seja útil tanto
para os usuários de nível técnico quanto para os cooperados tomarem
decisões, pois dessa maneira se formaria um sistema de comunicação entre a
cooperativa e os associados.
De acordo com Mem (2008, p. 6), “a característica fundamental para as
sociedades cooperativas é a evidenciação e transparência na apuração e demonstração
do resultado das atividades entre a cooperativa e o associado”. A demonstração deve ser
feita segregadamente por produtos, serviços e atividades desenvolvidas pela Entidade
Cooperativa”. O grau de detalhamento das operações permite aos associados e demais
usuários identificar facilmente o resultado por atividade. Outra preocupação com a
transparência está no item 10.8.7 da norma, que diz que as demonstrações contábeis
devem ser “complementadas com notas explicativas, inclusive de forma a permitir
comparações com períodos anteriores” (Idem, p. 7).
As cooperativas tiveram de reorganizar seus planos de contas e seus sistemas
contábeis para permitir o tratamento de informações em diferentes níveis e os registros
segregados. Boa parte dos escritórios de contabilidade para os quais a empresa terceiriza
esses serviços não está adequada às exigências da norma. Uma dificuldade adicional é
que grande parte dos atuais softwares de contabilidade “foram concebidos para atender
as empresas mercantis, não estando preparados para os níveis de segregação
demandados pela nova norma contábil das sociedades cooperativas” (MEM, 2008, p.
10).
Quanto à forma de comunicar, a questão é para o contador, que tem dificuldade
de implementar um sistema de informação contábil aplicado a empreendimentos
populares, pois existe a necessidade de adaptação para esta realidade de muito do que se
adota em organizações tradicionais, para adequar as informações à capacidade de
compreensão dos cooperados, visando a transparência. A preocupação não reside
somente na simplificação da informação produzida pela contabilidade, mas com o
entendimento das demandas dos usuários das informações contábeis, para que “a
contabilidade evolua de uma mera prestação de contas para um importante instrumento
de gestão dessas organizações” (DIAS e SILVA, 2008, p. 2).
110
No estudo feito por Dias e Silva (2008, p. 7) com a Cooperativa de Serviços
Gerais COOPSEG, do Município de Belém, observou-se grande parte do seu Sistema
de Gestão foi criado pelos próprios cooperados, para atender às “necessidades de
controle da integralização das quotas-partes, apuração mensal de resultados e controle
de movimentação financeira”. A criação de um sistema de gestão próprio, além do
contábil, pode mostrar a dificuldade de utilização da contabilidade como base para
administração do dia-a-dia.
Nessa cooperativa, por uma questão utilitária, em função da apuração do
resultado financeiro do período, que serve de base para o rateio entre os cooperados,
adotou-se o regime de caixa, que considera as receitas e despesas efetivamente
recebidas e pagas no mês, em vez do regime de competência, no qual prevalece a
ocorrência do fato gerador, ou seja, o momento econômico do evento. Caso fosse
adotado o regime de competência, haveria uma divergência entre o saldo de caixa e o
lucro apurado, levando à decisão de adotar o regime de caixa. Isso dificultou o controle
das contas a pagar, pois as despesas não eram contabilizadas tempestivamente, podendo
ocorrer a distribuição de um saldo que seria necessário para pagar uma conta que já era
conhecida antes da distribuição (DIAS E SILVA, 2008, p. 8-9)
No caso dos cooperados da COOPSEG, havia uma espera ansiosa pela reunião
mensal chamada Assembléia Administrativa, na qual o resultado apurado era divulgado.
É neste momento que observamos a importância que a contabilidade exerce
na vida das pessoas, onde um erro, uma falta de atenção, ou uma imposição
técnica, pode gerar injustiças. É aqui que também constatamos o fato de que a
contabilidade é uma ciência social, visto que ela acompanha e demonstra
relações sociais. (DIAS E SILVA, 2008, p. 9).
No estudo de Silveira et al. (2004), com as pequenas e médias cooperativas da
Zona da Mata Mineira, sobre o uso que faziam do sistema de informação contábil para a
tomada de decisões, revelou-se o baixo grau de participação dos cooperados, pois os
usuários da informação contábil eram os gestores da cooperativa, o Balanço Patrimonial
aparecia como a principal demonstração e o Presidente o principal usuário das
informações. Nesse contexto fica difícil sequer falar em apropriação do conhecimento
financeiro-contábil por esses cooperados.
111
A pesquisa analisou também o perfil do tomador de decisão nas cooperativas,
usuários de informações contábeis, quanto ao nível de escolaridade e tempo de atuação
na função que ocupa na atual cooperativa, uma questão que buscava inferir se um maior
grau de instrução permitia melhor utilização das informações, principalmente as
contábeis, necessárias para o gerenciamento da empresa.
Verificou-se que, das cooperativas pesquisadas, 50% possuíam administradores
com nível superior completo, 37,5 % possuíam ensino médio completo e 12,5%
possuíam ensino fundamental, o que, segundo a observação da pesquisa, facilitaria a
interpretação da realidade que os cercava, capacitando-os a “entender a importância do
uso de informações no processo decisório”. Além disso, 50% das cooperativas não
possuíam gestores com formação acadêmica (SILVEIRA et al., 2004, p. 7).
De acordo com Michels (1995, p. 109), são necessários alguns aprimoramentos
na contabilidade das cooperativas, para que os associados possam, de fato, exercer a
autogestão do empreendimento, quais sejam:
Estruturar as demonstrações financeiras para que possam ser compreendidas
pelos cooperados;
Enriquecer as demonstrações com gráficos e tabelas comparativas;
Utilizar jornais, mantidos pelas cooperativas, para divulgar balancetes
mensais, numa linguagem compreensível pelos cooperados;
Detalhar as informações contábeis em um nível tal, que os principais eventos
econômico-financeiros, aqueles que causam impactos positivos ou negativos
na situação do empreendimento, sejam informados aos associados, bem
como se foram causados por decisões internas da cooperativa ou resultantes
de fatores externos (políticas governamentais, clima, fatores internacionais
etc);
Normatizar as práticas contábeis, por órgão com poder para tanto, ou que
sejam incluídas nos estatutos da cooperativa, de modo a permitir que
demonstrações de diversos exercícios possam ser comparadas;
Aplicar os conceitos referentes à qualidade da informação, para que sejam
adequadas, honestas e totais.
112
5.2. Inserção da contabilidade nas empresas de autogestão
O trabalho de Almeida (2006), sobre a inserção da contabilidade nas empresas
de autogestão, foi feito a partir de estudo de caso da Coopram – Cooperativa de
Produção de Artes Metálicas, com as seguintes variáveis de análise, e suas respectivas
características:
Forma de comunicação: instrumentos de comunicação utilizados pela
entidade para divulgar seus resultados econômicos e financeiros, e a
capacidade destes instrumentos de captar e refletir a complexidade da
autogestão (orçamento elaborado coletivamente, execução e controles
compartilhados etc.);
Conteúdo da informação: pertinência da linguagem da comunicação com os
usuários, principalmente quanto à compreensibilidade e à constatação de um
“baixo grau de educação formal” desses usuários;
Utilidade da informação: importância dada à contabilidade para tomada de
decisões, principalmente nas decisões coletivas;
Apropriação da informação: socialização do conhecimento de gestão, em
oposição ao resguardo desse conhecimento para o grupo gestor. Nessa
dimensão buscou-se compreender as formas de transferência de
conhecimento e as dificuldades na apropriação por parte dos trabalhadores
do conhecimento contábil;
Relação contador-usuário: análise das dificuldades de percepção, por parte
dos contadores, da especificidade da autogestão;
Legislação contábil: dificuldades quanto à captação, por parte da legislação,
das especificidades da autogestão, desde a forma de registro e demonstração
dos fatos econômico-financeiros, até à constituição formal dessas entidades.
As principais hipóteses deste trabalho eram que o aparato contábil não era ainda
apropriado para o segmento, no sentido de não atender satisfatoriamente às demandas
de informação, que também se partiu da hipótese de que os empreendimentos
solidários diferenciam-se dos demais segmentos do mercado, principalmente por sua
dupla natureza: econômica e social.
113
Esta pesquisa foi feita a partir de levantamentos e entrevistas com três grupos de
pessoas: membros da cooperativa (diretoria e cooperados), especialistas no assunto
(vinculados a redes nacionais de fomento e apoio à Economia Solidária) e por
contadores experientes em autogestão.
Observou-se que os resultados financeiros eram apresentados de forma
convencional, pelos instrumentos tradicionais da contabilidade (Balanço Patrimonial e
Demonstração do Resultado do Exercício da cooperativa) e eram disponibilizados nas
Assembléias Gerais Ordinárias (AGO) e afixadas no mural. A formação dos associados
em gestão e leitura de números do negócio não era feita pela contabilidade, mas pela
entidade de apoio, no caso a ANTEAG.
Não era somente a contabilidade que produzia informações econômico-
financeiras. O setor financeiro também produzia um relatório com o fluxo de recursos,
contas a pagar e a receber. Essa duplicidade de fontes de informações se devia ao fato
de a contabilidade ser terceirizada e os movimentos para elaboração dos relatórios
contábeis serem enviados mensalmente, perdendo-se a oportunidade do uso da
informação para tomada de decisões operacionais. A empresa não contava, também,
com um sistema informatizado de apuração de custos, sendo os preços dos produtos
baseados em estimativas e fatores aplicados aos produtos.
Segue uma revisão dos resultados de cada variável de análise da pesquisa de
Almeida (2006), principalmente quanto aos aspectos da confiabilidade do processo de
comunicação e da confiança dos usuários:
Forma de comunicação
Observou-se que os dados estavam acessíveis, mas com pouca compreensão por
parte dos usuários. Pelas declarações, não houve a preocupação em usar instrumentos
que melhorassem a confiabilidade, nem que pudessem criar confiança nos usuários. A
insuficiência do Balanço anual para manter o trabalhador informado e a falta de
compreensibilidade não foi motivo para que aparecesse, em qualquer das falas, a
questão da confiança. A contabilidade gerencial e a contabilidade social, que são
comunicações de outra forma / dimensão, aparecem como carências.
114
Conteúdo da informação
Notou-se que a linguagem utilizada é complicada (não inteligível), causando o
silêncio e desinteresse por parte dos cooperados. A linguagem dos relatórios é, na visão
dos contadores, formal, cnica e codificada mesmo. Sugeriu-se uma linguagem mais
cotidiana, simples e compreensível. Uma das falas é “... não para iludir a gente ...”,
revelando uma ligação entre linguagem incompreensível e confiança (ALMEIDA, 2006,
p. 86).
Utilidade da informação
Nesta dimensão aparece a importância dada à contabilidade para os processos de
gestão, principalmente no processo de tomada de decisões coletivas e na gestão
democrática, indo além da função tradicional de fornecimento de informações apenas
para o fisco e para controle burocrático. Porém, a entidade pesquisada, mesmo tendo
consciência do que seja e da utilidade da contabilidade gerencial, não utilizava a maioria
dos seus recursos.
Iudícibus e Marion (2000, p. 20) dizem que:
em nosso país, em alguns segmentos da nossa economia, principalmente na
pequena empresa, a função do contador foi distorcida (infelizmente), estando
voltada exclusivamente para satisfazer às exigências do fisco.
A questão da utilidade da informação contábil pode ser colocada, então, do
ponto de vista da confiabilidade que pode trazer. Para isso, a informação contábil e,
principalmente o que a antecede, que o os registros corretos, deve fazer parte da
cultura da empresa.
Apropriação da informação
Nesta dimensão encontra-se um dos objetivos do processo de comunicação de
informações contábeis que é a transferência do conhecimento contábil e as dificuldades
encontradas pelos trabalhadores para se apropriar desse conhecimento.
Para isso, torna-se fundamental a existência de um processo de formação que
utilize uma linguagem acessível aos trabalhadores, que use cnicas de educação
115
popular, que sensibilize para a importância da contabilidade, que seja permanente e
estruturado de forma crescente, ou seja, torna-se fundamental uma nova didática. A
linguagem utilizada no empreendimento da pesquisa fazia com que os trabalhadores
tivessem “medo e posição defensiva em relação à contabilidade” (ALMEIDA, 2006, p.
91). Essas dificuldades foram agravadas também pela baixa participação dos
trabalhadores nos cursos promovidos pela entidade de apoio.
Outro problema para a não apropriação da informação contábil é um legado da
cultura predominante nos trabalhadores da segregação entre o pensar (administradores)
e o executar (trabalhadores)
Relação contadorusuário
Observou-se, nesta dimensão, um distanciamento entre os contadores e os
trabalhadores (“abismo”). Os contadores exerciam seu trabalho tradicionalmente
(prioridade para atender ao fisco), não compreendendo bem as especificidades dos
empreendimentos de Economia Solidária. Os trabalhadores, por sua vez, não abordavam
o contador para pedir esclarecimentos sobre a contabilidade, por falta de tempo ou de
interesse.
Uma parte da dificuldade dos contadores é devida à sua formação, que o
prepara para o atendimento de sociedade de pessoas, não prepara para a divulgação,
pesquisa e reflexão do tema e não está aberta a novas tecnologias. Um dos especialistas
aponta para a vocação da universidade, mesmo as que possuem extensão, de produzir
conhecimento para as classes dominantes. As pesquisas mais financiáveis são as
voltadas ao desenvolvimento de tecnologia para o capital (ALMEIDA, 2006, p. 98). De
acordo com Kruppa (2005, p. 22), a escola está isolada da realidade, envolta pela rotina,
sem a “sensibilidade para o movimento da vida, distante dos problemas e das
alternativas que a população cria para sobreviver”. A mesma percepção teve
Muhammad Yunus (2006) quanto à utilidade das aulas de economia que ministrava.
De acordo com Kruppa (2005, p.24),
A profissionalização produz interditos na comunicação. Baseada na divisão
social do trabalho quanto mais o indivíduo especializa-se mais define sua
área de atuação – a sociedade atual perdeu a disponibilidade de ensinar os que
não são do mesmo segmento profissional. Essa divisão do saber legitima que
o engenheiro saiba o que o peão da fábrica não sabe, sem que se pergunte
porque isso ocorre.
116
Notou-se também que, devido à Economia Solidária ser um tema relativamente
recente (15 a 20 anos no Brasil), existe a dificuldade de arregimentar profissionais das
áreas de contabilidade e direito. Esses profissionais não conhecem a demanda existente
e acabam não se especializando nas necessidades específicas desse segmento, com
sistemáticas diferentes das sociedades de capital. Principalmente nas empresas de
pequeno e médio porte, a assessoria contábil e jurídica é terceirizada, contribuindo para
o aumento da distância com os associados.
Na opinião dos trabalhadores entrevistados, os contadores deveriam:
conhecer as técnicas; saber resolver problemas; saber transferir
conhecimento; ter sensibilidade; saber sensibilizar; saber dialogar; ser um
comunicador; ter uma linguagem apropriada aos trabalhadores; disposição
para criar; disposição para ouvir, discutir e aprender (ALMEIDA, 2006, p.
99).
Os cooperados desejavam que um contador da Economia Solidária fosse
paciente e que adotasse uma linguagem simples.
Legislação contábil
A não captação das especificidades da Economia Solidária se aplica à forma de
registro dos eventos econômico-financeiros, às demonstrações contábeis e à constituição
e formalização das entidades. Para estudar essa dimensão, a autora supra citada analisou
a pertinência das legislações gerais e contábeis para cooperativas. A conclusão foi que a
legislação brasileira é atrasada, tendo dificuldade de compreensão do ato cooperativo e
de sua tributação, sendo as cooperativas de produção confundidas com aquelas de
produtores rurais. Além disso, existe o tratamento diferenciado entre grandes e
pequenos empreendimentos (“trata desiguais como iguais”). Não é o caso de eliminação
de obrigações legais, como a elaboração do balanço, mas de simplificá-las. A
simplificação é para melhorar a competitividade.
Outra questão foi a da mensuração da participação de cada trabalhador na
distribuição das sobras. A legislação diz que as sobras serão rateadas ou aplicadas de
acordo com a participação dos trabalhadores na cooperativa. A participação no trabalho
é mais difícil de mensurar. No caso dos empreendimentos urbanos é mais simples
devido à possibilidade de calcular a quantidade de horas que o trabalhador esteve
disponível no empreendimento.
117
As conclusões da autora, a partir do pressuposto da peculiaridade da Economia
Solidária e Autogestão, o a da premência do ajuste da área contábil às reais
necessidades dos empreendimentos solidários, nas seis dimensões estudadas. Com base
nas evidências empíricas torna-se evidente, para a autora a necessidade de:
Uma nova linguagem contábil simples e objetiva, mais próxima à linguagem
coloquial dos trabalhadores;
Novos instrumentos de informação contábil, aderentes às necessidades dos
empreendimentos, e que permitam seu monitoramento e a avaliação das
ações planejadas coletivamente;
Nova atuação dos profissionais da área contábil, pautada pela pesquisa
prática, voltada para a solução de problemas e para a difusão do
conhecimento, voltada para a formação;
Nova formação dos contadores, baseada na realidade brasileira e da classe
trabalhadora, aliada a mais pesquisas;
Nova legislação contábil, que segregue tributariamente os grandes e
pequenos empreendimentos autogestionários.
119
PARTE III – PESQUISA DE CAMPO, RESULTADOS E
PROPOSTAS
Nesta parte será apresentada a metodologia utilizada para a realização da pesquisa de
campo (Múltiplos Estudos de Caso) e será feita a discussão dos resultados obtidos, bem
como a apresentação de algumas propostas para a criação de confiança na comunicação
de informações econômico-financeiras.
121
6. METODOLOGIA DA PESQUISA DE CAMPO
Este capítulo visa mostrar as escolhas metodológicas feitas na pesquisa, na sua
concepção, preparação, execução e análise, visando garantir a validade dos conceitos
utilizados, as validades interna e externa e a confiabilidade do estudo.
Segundo Selltiz et al. (1967:59), os objetivos de uma pesquisa podem ser:
Formuladores ou exploratórios: quando o estudo busca a familiaridade com o
fenômeno ou a obtenção de uma nova compreensão deste, normalmente com
o objetivo de formular mais precisamente um problema de pesquisa ou de
criar novas hipóteses. Referem-se à descoberta de idéias e intuições;
Descritivos: quando visam apresentar de modo preciso as características de
uma situação, de um grupo ou de um indivíduo específico, havendo ou não
hipóteses iniciais sobre a natureza dessas características; podem também
verificar a freqüência com que algo ocorre ou com que se liga a alguma outra
coisa;
Inferenciais: que exigem processos que possibilitem verificar uma hipótese
de relação causal entre variáveis, como os experimentos
Na prática, nem sempre existe uma separação clara desses estudos, podendo uma
pesquisa conter elementos de um ou mais dos objetivos descritos (Idem, p. 60).
Cada estratégia de pesquisa apresenta vantagens e desvantagens próprias em
função do: a) tipo de questão da pesquisa; b) controle sobre eventos comportamentais e
c) foco histórico ou contemporâneo dos fenômenos (YIN, 2001:19).
As relações entre essas três condições e cinco das estratégias muito utilizadas
nas ciências sociais, são mostradas no quadro a seguir:
122
Estratégia Tipo da questão de
pesquisa
Exige controle sobre
eventos
comportamentais?
Focaliza
acontecimentos
contemporâneos?
Experimento Como, por quê? Sim Sim
Levantamento Quem, o que, onde,
quantos, quanto?
Não Sim
Análise de
arquivos
Quem, o que, onde,
quantos, quanto?
Não Sim / Não
Pesquisa
histórica
Como, por quê? Não Não
Estudo de caso Como, por quê? Não Sim
Quadro 4 – Situações relevantes para diferentes estratégias de pesquisa
Fonte: (Yin, 2001, p. 24)
A questão principal desse trabalho é: como construir a confiança no processo de
comunicação de informações econômico-financeiras? Assume, assim, a forma de um
estudo explanatório (como e por quê?), podendo usar como estratégia o experimento, a
pesquisa histórica ou o estudo de caso.
O trabalho examina eventos contemporâneos, o que permite lidar com ampla
variedade de evidências documentos, artefatos, entrevistas e observações. Quanto ao
controle sobre eventos comportamentais, não seria desejável fazer um experimento,
como em um laboratório, para estudar como os usuários das demonstrações financeiras
percebem sua confiabilidade e sobre o entendimento que têm dos seus itens e valores.
Assim, o estudo de caso é a estratégia indicada, por se tratar de acontecimentos
contemporâneos e não ser possível a manipulação de comportamentos relevantes (Yin,
2001, p. 27).
Segundo Benbasat, Goldstein e Mead (apud Bufoni, 2002, p. 4), os estudos de
caso têm as seguintes características:
1. Fenômeno em seu contexto natural;
2. Dados coletados de várias formas;
3. Uma ou poucas entidades (grupos, pessoas ou organizações) examinadas;
4. A complexidade das unidades é estudada intensivamente;
5. Estudos de caso são mais adequados à exploração, classificação e estágio
de desenvolvimento de hipóteses para o processo de construção do
conhecimento;
6. Nenhum controle ou manipulação do experimento está envolvido;
7. O investigador não pode especificar a priori o conjunto de variáveis
dependentes e independentes;
8. Os resultados derivados dependem muito do poder de integração do
investigador;
123
9. Mudanças de escolha do lugar ou do método de coleta dos dados podem
mudar na medida em que surgem novas hipóteses;
10. São úteis em perguntas de pesquisa por que e como, porque lidam com
ligações operacionais a serem seguidas durante um tempo mais que com a
freqüência dos fatos ou sua incidência;
11. O foco em eventos contemporâneos.
Quanto ao delineamento de pesquisa, Selttiz, Wrightsman e Cook (1987)
classificam os estudos de caso nos chamados quase-experimentos
2
, pois, apesar de
também responderem sobre causas e efeitos, são possíveis em situações em que os
experimentos não podem ser realizados. Nos quase-experimentos não a distribuição
aleatória dos sujeitos pelos tratamentos, nem grupos de controle. Não existe, também, a
capacidade de controlar, apenas de observar o que ocorre e a quem.
Um projeto de pesquisa organiza, de forma coerente, quais as questões a serem
estudadas, quais dados serão relevantes para esse estudo, como serão coletados e como
serão analisados os resultados. A ligação entre esses componentes é dada pela
formulação de uma teoria preliminar sobre o tópico de estudo, feita antes de qualquer
coleta de dados (YIN, 2001, p. 49).
6.1. Hipóteses ou premissas do trabalho
A partir do referencial disponível sobre a construção da confiança, o processo de
comunicação, a Economia Solidária e empresas de autogestão, e sobre as questões de
governança corporativa, além da experiência do pesquisador como profissional de
organização e sistemas, trabalhando com a informatização da produção e disseminação
de informações econômico-financeiras, foram definidas as seguintes proposições
teóricas, na forma de hipóteses ou premissas, a serem verificadas:
I A confiabilidade do processo de produção de informações econômico-
financeiras, assegurada por controles internos efetivos, e a transparência do emissor (o
que divulga) e do canal (como divulga) podem contribuir para a construção da
confiança nos receptores dessas informações;
II Empresas de autogestão têm maiores dificuldades operacionais que as
empresas de capital aberto, geralmente de maior porte, para garantir a confiabilidade nas
2 Os outros delineamentos de pesquisa são os experimentos, os levantamentos (surveys) e a observação
participante.
124
demonstrações financeiras e adotar regras de governança corporativa (controles
internos). O registro das informações (escrituração) e a evidenciação contam com
menos apoio da Tecnologia da Informação;
III – Não o utilizadas técnicas alternativas para a comunicação de informações
econômico-financeiras. Os dados comunicados são os tradicionais da contabilidade, sem
uma didática adequada, não específica para empreendimentos à base de confiança. Usa-
se jargão na comunicação, tornando o processo mais um sistema abstrato;
IV O ambiente institucional das empresas de autogestão, baseado em
princípios de solidariedade, transparência, democracia etc, contribui para a criação de
confiança.
O desenvolvimento da teoria facilita o apenas a fase de coleta de dados, mas
também a generalização dos resultados do estudo de caso. A teoria permite a
“generalização analítica”, em vez da “generalização estatística”. Na generalização
estatística, faz-se uma inferência sobre uma população baseada nos dados empíricos
coletados sobre uma amostragem, sendo o grau de certeza dependente principalmente
do tamanho da amostra e da variância. Os resultados dos estudos de caso não podem ser
generalizados estatisticamente, pois os casos não são unidades de amostragem. Os
resultados do estudo de caso são obtidos pela generalização analítica, utilizando-se uma
teoria previamente desenvolvida como modelo, que deve ser comparada com os
resultados empíricos do estudo de caso (YIN, 2001, p. 53).
6.2. Qualidade da pesquisa
Quatro testes são utilizados para julgar a qualidade de estudos de caso (YIN,
2001, p. 55):
Validade do construto;
Validade interna;
Validade externa;
Confiabilidade.
125
a) Validade do construto
Este teste busca estabelecer medidas operacionais corretas para os conceitos que
estão sob estudo, evitando-se a utilização de julgamentos subjetivos para a coleta dos
dados (YIN, 2001, p. 56). São utilizadas três táticas:
Utilização de múltiplas fontes de evidência, para incentivar linhas
convergentes de investigação (YIN, 2001, p. 57). Serão feitas entrevistas
com dirigentes de empresas de autogestão e analisados os controles e
demonstrações financeiras produzidos por estas empresas. Será também
analisado o uso que os receptores fazem da informação recebida;
Encadeamento de evidências, que permite ao leitor do estudo de caso ligar as
questões iniciais aos resultados da pesquisa e às conclusões finais;
Revisão do rascunho do relatório do estudo de caso por alguns informantes-
chave, no caso, pessoas com experiência em autogestão, e que não tenham
participado diretamente da pesquisa, feita algumas semanas antes da entrega
do relatório definitivo. Essa revisão foi feita pela professora Dra. Maria
Helena Villar e Villar, doutora em Educação pela USP, especialista em
formação para autogestão, e que tem trabalhado com a preparação e
divulgação de dados econômico-financeiros para empresas de autogestão.
b) Validade interna
Teste aplicado apenas aos estudos causais (ou explanatórios), que podem estar
ameaçados por efeitos espúrios, quando “o pesquisador conclui, equivocadamente, que
uma relação causal entre x e y sem saber que um terceiro fator z pode, na
verdade, ter causado y” (YIN, 2001, p. 57).
Uma das estratégias é utilizar a lógica de adequação ao padrão, que compara um
padrão fundamentalmente empírico com outro de base prognóstica (ou com várias
outras previsões alternativas). Se os padrões coincidirem, os resultados podem ajudar o
estudo de caso a reforçar sua validade interna. Os padrões podem se relacionar às
variáveis dependentes ou independentes do estudo, ou a ambas (YIN, 2001, p. 136).
126
Um experimento ou um quase-experimento pode possuir inúmeras variáveis
dependentes, ou seja, vários resultados. “Se os valores inicialmente previstos para cada
resultado forem encontrados e, ao mesmo tempo, o se encontrarem padrões
alternativos de valores previstos (incluindo aqueles que derivam de artefatos
metodológicos, ou ameaças à validade), pode-se fazer fortes inferências causais” (YIN,
2001, p. 136).
As variáveis dependentes, derivadas das teorias estudadas são:
Uso de relatórios contábeis e / ou de relatórios operacionais (pré-contábeis)
para a tomada de decisão;
Modo como é feito o acompanhamento da vida financeira da cooperativa.
Existência, ou não, de formação para isso;
Maneira de explicar a situação da empresa nas assembléias;
Uso, ou não, de lançamentos multidimensionais das transações, que permite
visões (perspectivas) múltiplas da informação contábil;
Uso, ou não, da contabilidade gerencial. Existência, ou não, da figura,
mesmo informal, do controller;
Oportunidade das informações geradas (prazos de fechamento de balanços);
Grau de participação dos associados na elaboração de orçamentos;
Existência de rateios no sistema de custeio da empresa. Se os direcionadores
de custo são, ou não, compreendidos pelos envolvidos;
Existência de contas “diversos”, “outros”, “transitórias” ou “a classificar”;
Uso de jargões na comunicação de informações econômico-financeiras;
Constância dos critérios de apresentação dos dados (versus casuísmo).
É possível, no caso das empresas de autogestão, utilizar as variáveis
microssociológicas para análise do capital social, como a sociabilidade, cooperação,
reciprocidade, pró-atividade, confiança, o respeito, as simpatias” (COSTA, 2005, p.
240). Muitos estudos sobre capital social apontam para a necessidade de levantamento
de informações sobre o cotidiano das pessoas como, por exemplo, saber se elas
conversam com seus vizinhos, se recebem telefonemas, se freqüentam clubes, igrejas,
127
escolas, hospitais etc. A existência de empreendimentos da Economia Solidária constitui
um indicador da presença de indivíduos dispostos a associar-se em arranjos dependentes
de confiança.
c) Validade externa
Engloba a possibilidade de generalização das descobertas além do estudo de
caso imediato (Yin, 2001, p. 58), ou seja, se os resultados obtidos nas empresas de
autogestão estudadas podem ser generalizados para outras empresas do tipo, ou até para
empresas em geral.
A generalização não é automática. A teoria deve ser testada por meio da
replicação das descobertas em outros locais, em que se supõe a ocorrência dos mesmos
resultados. Para Yin (2001, p. 69), cada caso deve ser cuidadosamente selecionado de
modo a:
Prever resultados semelhantes (replicações literais); ou
Produzir resultados contrastantes apenas por razões previsíveis (replicações
teóricas).
O desenvolvimento de uma rica estrutura teórica é fundamental para os
procedimentos de replicação. A estrutura precisa expor as condições sob as quais é
provável que se encontre um fenômeno em particular (uma replicação literal), assim
como as condições em que não é provável que se encontre (uma replicação teórica)
(YIN, 2001, p. 69).
As unidades de análise deste trabalho são os processos de comunicação de
informações econômico-financeiras das empresas de autogestão. O estudo poderia ser
em uma única empresa de autogestão (caso único), tendo como unidades incorporadas
os diversos atores (emissores e receptores) e as mensagens (demonstrações financeiras).
Porém, é também interessante verificar em outras empresas como se a produção e
uso dessas demonstrações, bem como com as entidades de assessoria dessas empresas.
Assim, podem ser feitas replicações teóricas em função dos seguintes atributos das
empresas estudadas: porte, tempo de experiência em autogestão, tipo de empresa
128
anterior (no caso de empresa falida assumida pelos ex-funcionários), produção interna
ou terceirizada (escritório de contabilidade) das demonstrações.
d) Confiabilidade
Este teste é utilizado para permitir a um pesquisador que repita os mesmos
procedimentos descritos por um outro anterior a ele, e chegue às mesmas descobertas e
conclusões. “A confiabilidade serve para minimizar os erros e as visões tendenciosas de
um estudo” (YIN, 2001, p. 60).
Para que possa haver a repetição do estudo é necessário documentar os
procedimentos adotados. Sem esta documentação, nem mesmo o próprio pesquisador
poderia repetir seu trabalho. Para que haja confiabilidade, utiliza-se um “protocolo para
o estudo de caso”, que contém o instrumento de pesquisa (questionário) e as regras
gerais para uso do instrumento.
6.3. Protocolo para o estudo de caso
De acordo com Yin (2001), apesar da semelhança entre um questionário e um
protocolo de estudo de caso, as características de ambos são distintas. O protocolo é
mais que apenas um instrumento de levantamento, contendo também os procedimentos
e regras gerais que devem ser seguidas para a correta utilização do instrumento.
Serão feitas observações de documentos e demonstrações financeiras das
empresas de autogestão.
Do mesmo modo, serão feitas entrevistas com administradores financeiros e / ou
contadores das empresas de autogestão e com pessoas ligadas a entidades de apoio a
essas empresas (ANTEAG, NAPES Núcleo de Ação e Pesquisa em Economia
Solidária, Cáritas etc.).
Além disso, serão levantadas, inicialmente, questões sobre o histórico da
empresa e sobre o processo de comunicação em geral. Busca-se, com isso, avaliar o
envolvimento das pessoas da empresa com a Economia Solidária e a autogestão.
129
As questões para as empresas serão agrupadas por temas referentes aos
componentes do processo de comunicação e suas relações: a governança corporativa e o
território do emissor; a transparência na divulgação de informações e as relações entre o
emissor e a mensagem, entre a mensagem e o canal, e entre o canal e o receptor; e a
questão da confiança, que pertence ao território do receptor (quem confia):
1º grupo: Governança corporativa
Trata-se do território do emissor da comunicação. A base teórica para a
formulação dessas questões compreende as características da informação contábil
(relevante, confiável e comparável) do FASB, as exigências de governança corporativa
e a presença de ameaças a esta (Deloitte, 2004), tais como:
Falta ou deficiência de um programa abrangente de gestão dos controles
internos;
Falta de um programa formal de gestão de riscos empresariais;
Controles inadequados associados com a existência de transações não-
rotineiras (exceções), complexas ou incomuns;
Falta de controle efetivo do ambiente de TI;
Processo não efetivo de preparação de relatórios financeiros e de divulgação,
como no caso de relações problemáticas com o escritório de contabilidade
terceirizado;
Falta de controles formais sobre processos de fechamento financeiro;
Falta de políticas e procedimentos contábeis correntes, consistentes,
completos e documentados;
Inabilidades para avaliar e testar controles sobre processos terceirizados;
Compreensão inadequada dos dirigentes e do eventual comitê de auditoria
sobre riscos e controles;
A evidenciação, necessária para a confiabilidade, pode ser prejudicada por
processos inadequados (Morgado, 2006). Algumas questões serão referentes à execução
dos processos de negócio: não padronização, falta de integração, oportunidade das
informações geradas etc.
130
2º grupo: Transparência na divulgação de informações
Trata-se das relações entre o território do emissor com a mensagem, da
mensagem com o canal, e do canal com o receptor, em que se verificarão se todas as
informações relevantes estão disponíveis aos interessados (transparência) e se a
governança é explicitada etc.
Serão incluídas questões baseadas nas formas de accountability (Nakagawa,
2007, p. 7), com as seguintes necessidades de prestação de contas (evidenciação):
Do Conselho de Administração para a Assembléia Geral Ordinária e
envolvidos (stakeholders), para demonstrar a conformidade da empresa às
leis que regulam suas atividades;
Dos dirigentes da empresa e dos controllers perante o seu Conselho de
Administração, sobre os riscos associados ao negócio, em especial à
estimativa dos fluxos de caixa de futuros negócios.
O terceiro eixo do conjunto de indicadores (ANTEAG, 2005) é sobre
transparência, com as seguintes exigências:
Elaboração de balancete mensal;
Divulgação do balancete mensal;
Análise do balancete pelo Conselho Fiscal;
Divulgação do parecer do Conselho Fiscal;
Elaboração de planejamento (administração / produção);
Divulgação atos da administração / produção.
A transparência seria facilitada se as demonstrações contábeis fossem
enriquecidas com gráficos e tabelas comparativas e tivessem um nível de detalhamento
tal que os principais eventos econômico-financeiros, aqueles que causam impactos
positivos ou negativos na situação do empreendimento, fossem mostrados.
Além disso, os responsáveis pela comunicação das informações econômico-
financeiras poderiam ter acesso às melhores formas de apresentação nas entidades de
apoio. A formação para autogestão deveria incluir elementos de didática da Economia
Solidária, materiais de apoio apropriados e cursos a distância.
131
3º grupo: Confiança
Trata-se do território de receptor (quem confia), que pode ter confiança pelas
garantias do processo ou adquiri-la em função da relação com os emissores, também
pertencentes ao núcleo de solidariedade.
No caso das demonstrações como sistemas peritos, a confiança é uma forma de
fé, na qual a segurança é adquirida em resultados prováveis, mais como um
compromisso do que como compreensão. Assim, pode ser que os associados confiem
mais no ambiente em que trabalham, do que propriamente entendam ou se apropriem
dos códigos existentes nas comunicações econômico-financeiras feitas nas assembléias.
No trabalho de Almeida (2006), os receptores consideram a contabilidade útil para gerar
confiança.
A falta de compreensibilidade pode causar a perda da oportunidade do uso da
informação para tomada de decisões operacionais. “Para poder comunicar e não apenas
informar, a contabilidade deve antes determinar o tipo de mensagem necessária ao
usuário, relevante e de alta veracidade” (ILUFI, 2000, p. 7).
O ambiente de confiança facilita não só a comunicação, mas tem menores custos
de transação, ou seja, os “conflitos entre interesses seccionais devem ser muito
menores”. Podem ser travados abertamente e resolvidos por negociações em que todos
tomam parte” (SINGER, 2000, p. 20).
A questão da remuneração (divisão de sobras) pode ser uma questão de
desconfiança. É importante saber se os critérios estão claros para todos e se concordam
com ele.
Uma das estratégias para a criação de confiança é a formação para autogestão
(gestão democrática). Assim, serão verificados os métodos utilizados pelos
empreendimentos para essa formação, como:
Didática específica para educação popular, não técnica.
Cursos de Sensibilização (documentos fundamentais, registros financeiros,
produção, mercado e Economia Solidária) e Cursos de Aprofundamento
(ferramentas de gestão, plano de negócios, sistemas da qualidade)
132
Realização de intercâmbio entre trabalhadores de diferentes empresas/
empreendimentos ou regiões como forma de compartilhar o conhecimento
consolidado
Elaboração do plano de negócios, que além de útil para a gestão, é também
um processo de conhecimento do negócio, conforme Morgado (1999).
Rodízio de funções (obrigatório para muitos empreendimentos), como
estratégia para a gestão democrática, que pode provocar o esforço dos
receptores de conhecer, de se apropriar dos dados para poder assumir novas
funções, incluindo a de emissores dessas comunicações.
Porém, falar de confiança pode ser difícil ou desconfortável. Não falar de
confiança, ou reduzi-la a um mero detalhe em tratados econômicos ou na teoria do jogo,
pode significar uma falta de confiança ou resultar em uma desconfiança continuada.
Falar de confiança é essencial para a construção da confiança (SOLOMON e FLORES,
2002, p. 224).
A pergunta direta traria um viés para a pesquisa, pela retração dos trabalhadores
a uma pergunta que, em alguns casos, poderia expor deficiências institucionais para uma
empresa de autogestão.
No caso de pesquisas envolvendo a percepção dos entrevistados sobre questões
delicadas, envolvendo tabus, como é o caso da confiança, as perguntas podem ser
indiretas, para que se chegue às conclusões a partir de contextos.
Outra forma é como no levantamento que origem ao Guia das Melhores
Empresas para se Trabalhar (Você S/A; EXAME; FIA, 2007p. 16,17), no qual os
funcionários das empresas inscritas, em que mesmo as pequenas têm no mínimo 100
funcionários, são selecionados randomicamente. Isto porque os itens pesquisados são
sobre transparência, benefícios, qualidade da gestão, ambiente de trabalho, avaliação
etc., todos envolvendo a percepção dos funcionários. Essa percepção contribui com 70%
do Índice de Felicidade no Trabalho. O restante é composto por 25% das políticas e
práticas de RH da empresa e 5% da visita do jornalista especializado.
Uma questão importante é que a confiança autêntica o depende da percepção
ou sentimento. Se o trabalhador da empresa de autogestão não se informa sobre o
negócio e sobre a situação da empresa, se não se prepara, por meio de formação
133
específica, para compreender o que é apresentado, se não participa das decisões, seja em
comitês ou assembléias, e responde que confia, seria uma confiança simples, que
acredita nas pessoas que pertencem à Economia Solidária, ou cega, que nega evidências
de abuso de confiança por parte de quem decide. o são os tipos de confiança que
interessam para o trabalho.
Assim, não foram feitas perguntas sobre se os trabalhadores confiavam ou não
nos dados apresentados pelos administradores ou pelos contadores. Ao invés disso,
observou-se se existiam condições, ou contextos, para que a confiança autêntica fosse
criada, como no caso dos problemas do uso da informação para a decisão, que envolvem
o processo de coleta das informações (qualidade), o nível de participação, a
compreensão e a oportunidade das informações.
135
7. RESULTADOS OBTIDOS E PROPOSTAS
A apresentação dos resultados seguirá a lógica do processo de comunicação,
dividido em territórios (emissor, mensagem, canal, receptor) e em suas interações. Serão
também relatadas as sobreposições entre os elementos do processo de comunicação e a
governança corporativa (controles internos e transparência) e com a criação da
confiança.
7.1. Entrevistas e observações
Na pesquisa de campo foram feitas as seguintes entrevistas e observações:
Sr. Luigi Humberto Verardo, assessor técnico da ANTEAG, desde a sua
fundação, em 1996. A ANTEAG é uma entidade de apoio à Economia
Solidária e Autogestão, que também faz pesquisas e publicações na área;
Sr. Aguinaldo Luiz de Lima, contador, mestre em Educação pela USP,
assessor técnico da UNISOL, participa de iniciativas de incentivo e apoio à
constituição de cooperativas populares no NAPES – Núcleo de Ação e
Pesquisa em Economia Solidária, na Cáritas, organismo da Igreja Católica;
Sr. José Reitor Rizzardi, advogado e assessor jurídico da ANTEAG,
defensor de causas ligadas aos marcos legais do cooperativismo, fundador e
primeiro presidente da Cooper Jeans (Cooperativa de Produtores de
Confecções de Avaré);
Srta. Maria de Lourdes Roder, presidente e gestora da Cooper Jeans, em
Arandu, São Paulo, que é uma cooperativa oriunda de problemas com o
negócio anterior, resultando na transferência de operações para a
cooperativa;
Observação do processo produtivo da Cooper Jeans (separação, costura,
acabamento, qualidade etc.), que conta com 56 cooperados (costureiras,
costureiros, técnico de manutenção, faxineiras, seguranças e
administradores) e das informações de produção, registradas em formulários
136
e numa lousa, com giz, e que são compartilhadas pelos trabalhadores e
trabalhadoras. A Cooper Jeans é formada, em sua maioria, por ex-
empregados da empresa de confecção Staroup, que quando fechou as portas
em 1996, foi recuperada pelos trabalhadores, em acordo com a empresa, sob
o formato de cooperativa autogestionária, tendo sido uma das primeiras
empresas a se associar à ANTEAG. A Cooper Jeans chegou a ter 400
cooperados, e após seis anos de existência, devido a divergências internas,
resolveram devolver as instalações que haviam recebido, em comodato, da
Staroup. Um pequeno grupo, no entanto, resolveu continuar com a
cooperativa em Arandu, cidade próxima de Avaré, que abrigava uma filial da
cooperativa, certos de ser a autogestão a melhor opção de trabalho, face à
volta como empregados na própria Staroup, que tinha sido reativada;
Sra. Ana Beatriz Baron Ludvig e Srta. Renildes Comandolle, da Bruscor, de
Brusque-SC, que é uma empresa de autogestão, fundada em 1988, mas não é
cooperativa Industria e Comércio Ltda.), e não tem origem na falência de
um negócio anterior, mas de conjunturas econômicas desfavoráveis
conjugadas com o espírito empreendedor dos associados;
Observação do processo produtivo da Bruscor, que fabrica cordas, cordões,
cadarços, elásticos, fitas etc. e que é operada e administrada pelos 16 sócios
da empresa, não possuindo, via de regra, trabalhadores em regime de CLT.
Observação do caso Cooperbrim, cooperativa de produção no ramo têxtil,
que vem tendo problemas com o Ministério Público do Trabalho quanto à
sua caracterização como cooperativismo autêntico. A Cooperbrim foi
constituída em Julho 2005, por trabalhadores novamente demitidos pela
Staroup e por trabalhadores desempregados de outras empresas, inspirados
naqueles que se mantiveram na Cooper Jeans;
Foram analisadas, ainda, as seguintes pesquisas bibliográficas, que contribuíram
como fontes secundárias, à medida que foram utilizadas informações constantes nessas
pesquisas, mas que não foram tratadas com o enfoque dado neste trabalho:
Cooperativa de Serviços Gerais – COOPSEG, do Município de Belém, sobre
práticas contábeis adotadas (DIAS E SILVA, 2008);
137
Pequenas e médias cooperativas agropecuárias da Zona da Mata Mineira,
sobre o uso da informação contábil para a tomada de decisões relacionadas
ao gerenciamento, controle e desenvolvimento das atividades (SILVEIRA et
al., 2004);
Empreendimentos autogestionários nas cinco regiões do Rio Grande do Sul,
envolvendo 367 trabalhadores(as) de 13 empresas, sobre os aspectos
organizativos / institucionais da empresa de autogestão no comportamento
dos trabalhadores e sobre as eventuais mudanças de comportamento
verificadas (IBASE / ANTEAG, 2004);
Coopram Cooperativa de Produção de Artes Metálicas, sobre a inserção da
contabilidade nas empresas de autogestão (ALMEIDA, 2006).
7.2. Análise dos modelos de comunicação processuais
A análise dos modelos de comunicação processuais permitiu que fossem
redesenhados com os termos e aspectos próprios da comunicação de informações
econômico-financeiras em empresas de autogestão.
Uma adaptação do modelo tradicional de Shannon e Weaver para o tipo de
comunicação e de empresa estudados nesse trabalho tem os seguintes elementos:
Ilustração 11 - Modelo de Shannon e Weaver adaptado para autogestão
O componente “transmissor”, que codifica a mensagem para sinais, e o receptor
que decodifica (reconstrói) a mensagem a partir dos sinais recebidos, não foram
Mensagem
(Informações econômico-financeiras)
Fonte de ruído
(Linguagem contábil,
falta de formação etc.)
Fonte de
informação
(Contador)
Destino
(Usuário)
Canal
(Publicações, reuniões,
assembléias etc.)
138
considerados nesta adaptação por se tratarem de elementos técnicos, que, aliás, eram as
preocupações do modelo original de Shannon e Weaver, antes das inúmeras derivações.
Em outro modelo, o de Newcomb, é necessário o equilíbrio dos envolvidos na
comunicação em relação ao tema comum, que são as informações econômico-
financeiras. Esse equilíbrio pode ser dado pela própria constituição do empreendimento
e pelas garantias do profissional de contabilidade, sujeito à regulamentação.
Ilustração 12 – Modelo de Newcomb aplicado às empresas de autogestão
O modelo de Westley e MacLean (Fiske, 2005, p.50), adaptado à comunicação
de informações econômico-financeiras de empresas de autogestão, pode ser usado não
tanto pelo tratamento do mass media, mas por lidar com a necessidade social de
informação e ter o formato linear e centrado no processo.
A figura a seguir mostra o modelo de Westley e MacLean aplicado à
comunicação contábil:
Ilustração 13 – Modelo de Westley e MacLean adaptado à informação contábil
Informações
econômico-financeiras
Gestão Trabalhadores
X
1
A
X
2
X
3
C
B
X
1
X
2
X
3
X
3M
X
X
- f
CA
X
3C
-f
BC
- f
BA
Função
editorial
-
comunicativa
(contador)
Sistema contábil Fatos contábeis
139
A função editorial-comunicativa, que decide o quê e como comunicar, é
exercida pelo contador, que estabelece o plano de contas, é responsável pela
classificação e lançamento dos fatos contábeis, elabora os demonstrativos e os expõe
nas assembléias e comitês, embora esteja limitado pela regulamentação cada vez mais
exigente e padronizada (evidenciação rigorosa). Na visão desse modelo, o emissor tem
função dominante, estando o receptor à mercê dele. Nas empresas de autogestão deve-se
evitar esse modelo, que poderia trazer prejuízos à participação democrática dos
cooperados.
O modelo de Jacobson (Fiske, 2005, p.55), por incluir as questões de
significação e estrutura interna da mensagem, veio preencher as lacunas entre as escolas
processuais e semióticas.
Neste trabalho, o foco são os fatores constitutivos da comunicação, apontados
por Jakobson (emissor, mensagem, código, contexto, contato e destinatário), que
também delineia a função da linguagem associada a cada fator (emotiva ou expressiva,
poética, metalingüística, referencial, fática e conativa).
Relacionando-se esses fatores ao processo de comunicação de informações
econômico-financeiras, têm-se as seguintes funções da linguagem:
Emotiva: que é a relação do emissor (contador) com a mensagem
(demonstrações financeiras) e é determinada por normas nacionais e
internacionais (FASB, IFRS, CFC etc.), além da regulamentação
profissional. Não parece que esse tipo de mensagem possa ser pessoal, a não
ser pelo entusiasmo do contador pela Ciência Contábil, por ser a linguagem
dos negócios;
Conativa: que se refere ao efeito da mensagem (demonstrações financeiras)
no destinatário (associados, cooperados e outros públicos). O principal efeito
de interesse deste trabalho é a confiança, que é necessária, pois as principais
decisões da empresa são tomadas com base nessas demonstrações, além de
também servirem de base para a remuneração dos associados (distribuição
das sobras);
Referencial: que é a relação da mensagem com a realidade, que é prioritária
no tipo de comunicação abordado neste trabalho, pois deve ser objetiva,
factual, preocupada em ser verdadeira. De fato, a primeira característica da
140
informação contábil, apontada pela Norma Brasileira de Contabilidade NBC
T 1 (CFC, 1995), é a confiabilidade;
Fática: que consiste na manutenção dos canais de comunicação abertos, ou
seja, a manutenção da relação entre o emissor e o destinatário, referindo-se
ao fator contato. É nessa função que opera um dos principais requisitos para
a autogestão, que é a transparência. Tem a ver com a forma como são
tomadas as decisões (assembléias, comitês etc.), com a freqüência que
ocorrem e com a formação dos receptores para compreender a informação;
Metalingüística: que se refere à identificação do código utilizado. O código
em questão é estabelecido pelo método das partidas dobradas, que consiste
no registro das origens (crédito) e destino (débito) dos recursos. Outros
componentes do código são as diversas leis e critérios utilizados para
mensurar os fatos contábeis. Dependendo da utilização de jargões, de valores
excessivamente agregados, de contas do tipo “diversos”, “outros”, a
classificar” etc., pode-se tornar incompreensível a informação;
Poética: que consiste da relação da mensagem com ela mesma. Não é o caso
de se falar em uma estética das demonstrações financeiras, embora apareçam
como obras de arte em alguns relatórios anuais de grandes empresas. Porém,
se forem utilizados gráficos ou metáforas, como a do reservatório para
compreensão do fluxo de caixa, a comunicação pode soar agradável,
facilitando sua compreensão.
A partir dessas entrevistas e observações, e dos modelos de processo de
comunicação estudados, podem-se descrever as questões referentes à confiabilidade e
confiança no processo de comunicação de informações econômico-financeiras de
acordo com a seguinte ilustração:
141
Processo de comunicação de informações econômico-financeiras
Emissor Mensagem e Canal Receptor
Confiabilidade (Governança) Confiança
Controles internos Transparência Construção
Ilustração 14 – Confiabilidade e confiança no processo de comunicação
A confiabilidade (merecer confiança, ser confiável), ou governança, é obtida
mediante controles internos efetivos, regulados por normas contábeis, e da transparência
na comunicação das demonstrações e relatórios (seu conteúdo, forma e freqüência etc.).
Trata-se do território do emissor, do canal e da mensagem.
Empresa
Fatos
contábeis
Demonstrações e
Relatórios
Normas
contábeis
(Conteúdo /
Forma /
Freqüência)
Públicos
Contabilidade
(tratamento da
informação)
retro alimentação
Gestores operacionais
Formação
Confiança
Fatos
operacionais
Compreensão
retro alimentação
Economia Solidária e autogestão
Garantias
Ambiente
institucional
Regras
142
Quanto à confiança (ato de confiar), que é construída no território do receptor, é
resultado das garantias oferecidas pelo processo (normas contábeis utilizadas na
elaboração da mensagem), da percepção do conteúdo, da forma e da freqüência das
demonstrações e relatórios, da compreensão que o receptor possui do conteúdo da
mensagem, potencializada pela formação adquirida, e do ambiente institucional, no caso
da Economia Solidária e da Autogestão, que têm a confiança como princípio.
A análise dos resultados obtidos será feita a partir do quadro anterior, nos
diversos aspectos do processo de comunicação e em outros fatores que podem gerar
confiança nas informações econômico-financeiras.
7.3. O território do emissor
A comunicação de informações econômico-financeiras normalmente está entre a
comunicação de massa (com pouca retroalimentação) e a comunicação pessoal (mais
simétrica, com paridade entre emissor e receptor, muitas vezes buscando entendimento
mútuo). Embora a “massa” receptora da comunicação econômico-financeira das
empresas seja uma assembléia de associados ou acionistas, em algumas situações, como
nas divulgações de fatos relevantes, de interesse do mercado, podem ter grande
repercussão nos comentários econômicos.
As normas contábeis, além de regulamentar o processo de registro contábil,
opera como garantia para a confiabilidade do processo e é também um componente para
que o receptor impute confiança na mensagem recebida. Além disso, a profissão de
contador é regulamentada (registro no CRC Conselho Regional de Contabilidade),
podendo o profissional sofrer punições, e até a cassação do direito de exercer a
profissão, caso não respeite suas normas.
A partir do referencial teórico de governança corporativa, de contabilidade das
empresas de autogestão e do processo de comunicação contábil, confrontados com o
trabalho de campo, foram detectados alguns pré-requisitos para a geração de
demonstrações confiáveis:
Revisão dos processos de negócio e dos controles internos;
Implantação de um Sistema Integrado de Gestão (ERP);
Registro sistemático dos fatos;
143
Custeio por atividade;
Possibilidade de abertura dos números em níveis analíticos suficientes;
Registro multidimensional das transações;
Utilização da contabilidade gerencial;
Certificações.
a) Revisão dos processos de negócio e dos controles internos
Todas as recomendações sobre governança corporativa mostram a
importância do conhecimento dos processos de negócios, por meio do
mapeamento dos processos atuais e da implantação de melhorias resultantes
da revisão dos mesmos. A transparência começa pela padronização dos
processos, dando-lhes condições de repetição, sem que o tratamento de
transações o-rotineiras (exceções), complexas ou incomuns se torne a
regra.
Deve-se aproveitar a revisão dos processos para rever também os controles
internos, que serão usados para prevenir fraudes e como base para planos de
contingência. A atual necessidade de conformidade (compliance) torna-se
uma oportunidade para revisões de processos e controles, além de fomentar a
educação contábil nas empresas.
A revisão de processos pode ser a base para a implantação de fluxos de
trabalho automatizados (workflow), incluindo a definição de papéis, controle
de datas, limites e disparos de atividades.
Na revisão dos processos deve-se atentar para a oportunidade das
informações geradas (prazos de fechamento de balanços).
b) Implantação de um Sistemas Integrado de Gestão (ERP)
Após a revisão dos processos, a empresa está melhor preparada para a
implantação de um sistema integrado de gestão (ERP Enterprise Resource
Planning).
Nesses sistemas não existe, ou é muito pequena, a possibilidade de certos
tipos de lançamentos incorretos, fraudes, sonegações etc., tais como:
espelhamento de notas fiscais (via do cliente com valor maior que a via da
144
contabilidade); contabilidade carimbada (lançamentos diretos no campo
saldo); baixas irregulares de estoque; cópia do sistema em área alternativa
(caixa 2) e consolidação posterior com a parte oficial para que a informação
seja útil para gestão etc. Além disso, as empresas desenvolvedoras desse tipo
de software também estão assumindo responsabilidades perante aos órgãos
de fiscalização no sentido de não propiciar ou facilitar fraudes fiscais. O fato
de a empresa partir, por necessidade de gestão, para aquisição desse tipo de
sistema já a obriga a trabalhar de maneira formal. Isso significa que os
sistemas ERP têm um papel importante na confiabilidade das informações.
Em outras palavras, funcionam como disciplinadores.
Uma idéia que surgiu na conversa com o Sr. Luigi, da ANTEAG, quando foi
mencionado um assunto muito discutido atualmente, que é a terceirização de
processos de negócio (BPO Business Process Outsourcing), foi a de um
tipo de Data Center para abrigar a TI (Tecnologia da Informação) de
cooperativas ou empresas de autogestão, eventualmente com software de
gestão disponível, com a maior parte da contabilização preparada
(parametrizada) para as necessidades específicas das empresas.
c) Registro sistemático dos fatos
A maior dificuldade para a utilização da contabilidade para gestão é a falta
de registros apropriados. A existência de um sistema ERP não garante que
ele será alimentado corretamente. Se houver o registro completo (o que
ocorreu, quando ocorreu, qual a origem do recurso, qual o destino e qual o
valor) será mais fácil derivar a contabilidade desse registro.
O Sr. Aguinaldo, da UNISOL, recomenda o registro e o acompanhamento
cotidiano, mesmo sem a existência de um ERP, do Caixa (movimentações
em dinheiro), da movimentação bancária e das Contas a Pagar e a Receber;
d) Custeio por atividade
Pressupõe a revisão dos processos (conjunto de atividades) para que se
estabeleça o custo de cada atividade, o mais próximo da realidade. É um
fator para criação de confiança, pois necessita do conhecimento de como
cada um dos custos é atribuído para cada atividade. A atribuição é feita por
145
meio dos direcionadores de custo (área utilizada, em metros quadrados;
consumo de energia, água, lubrificantes; horas de supervisão etc.), e não pelo
rateio de custos indiretos.
e) Possibilidade de abertura dos números em níveis analíticos suficientes
As cooperativas, em função da legislação, tiveram de reorganizar seus planos
de contas e seus sistemas contábeis para que pudessem tratar as informações
em diferentes níveis e tivessem seus registros segregados.
Os sistemas do tipo EIS (Executive Information System) permitem a
construção de painéis de indicadores, para que se possa acompanhar os
fatores críticos do empreendimento. Quando se percebe um problema em um
dos indicadores (semáforo com luz vermelha ou amarela), permite-se um
“mergulho” nos dados, até que se chegue na transação que está causando a
distorção.
Devem ser evitados também saldos em contas com nomes como: “diversos”,
“outros”, “transitórias” ou “a classificar”, que podem ser usadas para ocultar
problemas;
f) Registro multidimensional das transações
Consiste em registrar diversos aspectos (dimensões) de cada transação, para
que se possa, futuramente, enxergar a transação por meio dessas dimensões,
conforme a figura a seguir:
Ilustração 15 – Modelo de contabilidade multidimensional
Fonte: Morgado (1999, p. 134).
Grupo de contas
Plano de contas
TRANSAÇÃO
Canais de
compras
Agrupamentos de
produtos
Canais de
vendas
Componentes
de custos
Estrutura
organizacional
146
O conteúdo de cada dimensão é mostrado no quadro a seguir:
Dimensão Conteúdo
Plano de contas Contas de Ativo, Passivo, Patrimônio líquido,
Resultado.
Agrupamento de contas
Novos códigos de contas, além dos códigos
sintéticos do plano oficial, para permitir outros tipos
de demonstrações financeiras (rentabilidade, ganhos
e perdas financeiras, imposto de renda, etc.)
Estrutura organizacional Gerências funcionais, unidades de negócio ou
grupos-
tarefa, projetos, refletindo a estrutura
organizacional.
Canais de venda Mercado interno e externo, atacado e varejo.
Canais de compra Fornecedores nacionais e importações
Agrupamentos de produtos
Catálogos, segmentos de mercado, famílias ou
categorias.
Composição de custos Matéria-prima, mão-de-
obra (direta e indireta) e
despesas gerais (fixas e variáveis).
Quadro 5 – Dimensões contábeis e seu conteúdo
Fonte: Morgado (1999, p. 134).
g) Utilização da contabilidade gerencial
Quando se tem uma base de informações confiável e uma cultura de leitura
de demonstrativos econômico-financeiros, pode-se partir para a elaboração
de uma contabilidade gerencial, que seusada para a tomada de decisão e
para explicar o resultado e a situação patrimonial da empresa.
Na Bruscor, foi contratado um consultor para implantar a contabilidade
gerencial, usando o sistema informatizado atual, que está sub-utilizado.
A participação na elaboração de orçamentos, que é uma prática na Bruscor,
ajuda na implantação da contabilidade gerencial, pois os associados tomam
contato com o problema de explicar o resultado, de construir cenários, de
tomar decisões baseadas em fatos, não só na intuição, e de perceber a
necessidade de informações de qualidade.
h) Certificações
As certificações podem ser da qualidade dos processos (ISSO 9000 etc.), dos
associados (certificações profissionais), para os produtos etc. Podem ser,
147
também, em relação à Economia Solidária e autogestão, nos moldes dos selos de
responsabilidade social, “empresa verde”, “empresa amiga da criança” etc.
Na pesquisa de campo foram levantadas algumas boas práticas e algumas
dificuldades dos gestores e emissores de comunicações no sentido da confiabilidade das
ações e comunicações:
A Cooper Jeans utiliza um relatório de resultados, chamado de orçamento,
contendo o faturamento por cliente, as despesas por tipo, o pagamento de
investimentos, a sobra e o percentual sobre os pontos de referência por
função, usado para a remuneração dos cooperados. Esse relatório é usado
pelos dirigentes e trabalhadores, em várias ocasiões, para discussão dos
resultados no dia-a-dia, como base para planejamento e para explicar a
remuneração;
O contato cotidiano dos trabalhadores da Cooper Jeans com as informações
sobre os negócios da empresa é feito por meio de um mapa de produção,
escrito pelos gestores, com giz, em uma lousa, contendo os detalhes dos
pedidos: características, medidas, volumes, preços negociados, prazos etc.
Os formulários que deram origem às informações escritas no quadro ficam
ao lado, à disposição dos associados;
Existe também um relatório com os itens produzidos, com as medidas de
cada lote e as eventuais diferenças em relação ao padrão esperado, que é
usado para acompanhamento da produção e para fazer o controle de
qualidade dos produtos. As divergências do dia-a-dia são discutidas e
consertadas no mesmo momento. Os problemas mais graves, envolvendo
várias pessoas ou problemas da produção são levados para os comitês de
gestão (mini-assembléias) ou para a assembléia;
O sistema de gestão informatizado da Bruscor não é utilizado para a gestão
completa do estoque. Somente os produtos acabados estão no sistema, com o
respectivo preço de venda. Está sendo feito um levantamento dos processos
visando implantar o controle da matéria prima, dos produtos em processo e
do estoque de produto acabado. Com isso, pretende-se ter mais condições de
148
calcular o custo dos produtos e o ponto de equilíbrio, e de responder se “têm
estoque suficiente para produzir um determinado pedido”.
A remuneração dos cooperados da Cooper Jeans é baseada na Tabela Básica
de Retribuição por Função, que estabelece, para cada função dentro da
cooperativa (costura, mecânica, gestão, faxina, segurança etc.) uma
quantidade de pontos. Dentro de uma mesma função podem existir
diferenças devidas à experiência de cada pessoa (aprendiz, experiente,
especialista etc.). Porém, as diferenças não passam de 4 vezes. A decisão é
tomada em assembléia, considerando o mercado.
A tabela a seguir mostra um exemplo do cálculo da retirada, supondo-se uma
sobra de R$ 8.100,00. O fator a ser aplicado sobre os pontos por função é =
R$ 8.100,00 / 5400 = 1,5 (150%)
Tabela 2 – Cálculo de retiradas
Pessoa Função Pontos da
função
Retirada =
Pontos X fator
A Costureira 1 700 R$ 1.050,00
B Costureira 2 600 R$ 900,00
C Mecânico 850 R$ 1.275,00
D Ajudante 550 R$ 825,00
E Faxineira 500 R$ 750,00
F Supervisor 800 R$ 1.200,00
G Gestor 1400 R$ 2.100,00
Total 5400 R$ 8.100,00
Dentro de cada função existe um padrão de produção, ou seja, um
compromisso de produtividade de acordo com o nível de especialização /
experiência de cada função. O padrão não é imposto, mas é feito por acordo,
discutido em assembléia, entre os cooperados. Se algum dos cooperados o
mostra compromisso com a cooperativa, acaba ficando “sem espaço” para
atuar e acaba pedindo o desligamento.
Na Bruscor optou-se, desde a sua constituição, pela mesma remuneração
para todos os associados;
149
Na Cooper Jeans é feito um controle das horas trabalhadas, por meio de
cartões de ponto. Caso um dos cooperados trabalhe menos horas, seus pontos
de função são diminuídos proporcionalmente, fazendo com que haja um
acréscimo nos pontos dos outros, que, no final das contas, conforme a
explicação utilizada na cooperativa, fizeram o trabalho do que faltou. Se o
cooperado fizer hora extra, seus pontos aumentam, mas a produção também,
pois não se pode compensar perda de produtividade ou retrabalhos com
horas extras, que, nesses casos, por acordo, não seriam pagas. Além disso, o
cartão de ponto serve, principalmente, para planejamento de carga de
trabalho necessária e distribuição das tarefas em função das horas
disponíveis;
No caso da Bruscor, quando a empresa funcionava em dois locais, houve um
problema de atrasos sistemáticos, que foi evidenciado com o estabelecimento
do cartão de ponto. No entanto, mesmo depois da fusão em uma única sede,
a assembléia, não por unanimidade, decidiu que o controle continuaria;
A contabilidade nas empresas pesquisadas é terceirizada. A empresa envia,
no final do s, os documentos (notas fiscais emitidas, notas fiscais de
compra, recibos de pagamentos de despesas, movimentações bancárias etc.)
para o escritório contábil, que faz os lançamentos contábeis (escrituração) e
envia de volta as demonstrações financeiras que serão usadas nas
assembléias e fornecidas a terceiros (bancos e fiscalização).
Caso fosse implantado um sistema integrado de gestão, a contabilidade
terceirizada poderia ter acesso aos lançamentos contábeis, que seriam feitos
automaticamente, pelo sistema, restando apenas o fechamento e alguns
lançamentos de ajuste;
A contabilidade é a melhor forma de enxergar a empresa de forma integrada.
Devido à produção das demonstrações ser, geralmente, terceirizada, ficando
disponíveis para a empresa após o fechamento, as decisões são tomadas
usando relatórios operacionais, do dia-a-dia, que refletem parcialmente a
situação (só as vendas, somente pagamentos ou recebimentos, compras,
movimentações de estoque etc.).
150
Além disso, a manutenção de dois sistemas de controle (operacional e
contábil) acarreta duplicação de esforços e prováveis inconsistências entre as
informações produzidas por sistemas diferentes.
7.4. O território do canal e da mensagem
A linguagem utilizada na comunicação de informações econômico-financeiras
não é somente verbal (oral e escrita). Em um dos grandes momentos do processo
comunicativo nas empresas de autogestão, que é a assembléia dos associados, a
comunicação se também por meio de componentes visuais (desenhos, gráficos etc.),
prática que é fortemente recomendada, pois visa a compreensão.
O Sr. Aguinaldo, da UNISOL, disse que tem refletido sobre a observação do
professor Paul Singer (2000, p. 20) sobre a contabilidade e os demais sistemas de
controle serem desenhados para que a transparência impere, para que possa ocorrer a
participação de todos nas decisões. Qual seria esse desenho? Para este trabalho, é o
desenho que considera cada elemento do processo de comunicação responsável pela
confiabilidade dos relatórios e demonstrações produzidos, incluindo o receptor, a quem
cabe preparar-se para compreender a mensagem, para que possa imputar-lhe confiança.
No caso das empresas de autogestão, a transparência do processo de
comunicação pode se dar de diversas formas:
Para o ambiente em geral, mediante exigências das leis que regulam as
cooperativas. Pode haver também a divulgação voluntária de aspectos da
gestão, que reforcem as idéias de Economia Solidária e Autogestão;
Para os parceiros de negócios, que podem ser, ou não, outras empresas da
Economia Solidária, a título de compromisso ético com clientes e
fornecedores, ou para permitir desenvolvimentos conjuntos e parcerias;
Em relação aos associados, como forma de facilitar a participação nas
decisões e criar um ambiente de confiança, baseado em informações. O uso
do orçamento participativo, apoiado pela tecnologia da informação, pode ser
uma das oportunidades de compartilhamento de informações de gestão.
151
Na pesquisa de campo foram levantadas algumas boas práticas e algumas
dificuldades dos gestores e emissores de comunicações no sentido da transparência:
É necessário que as empresas de autogestão descubram canais de
comunicação eficientes e eficazes, como, por exemplo, os comitês de gestão,
antecipando discussões que seriam travadas na Assembléia Geral, cujo
tempo é muito pequeno para explicar cada item da prestação de contas e para
detalhar cada ação do planejamento estratégico. Assim, melhor seria que os
associados estivessem discutindo cada um desses itens em outros fóruns,
deixando para a Assembléia as discussões finais e a decisão;
No caso da CooperJeans, as assembléias são feitas no horário de trabalho,
para garantir a participação dos cooperados. Além das assembléias, ocorrem,
mais rotineiramente, as plenárias, também com a presença de todos, de
caráter não oficial (não registrado em cartório), indicativa de soluções e
preparatória para as decisões da assembléia (“não se pode deixar tudo para a
assembléia, pois não há tempo, nem fôlego”);
Para o Sr. Aguinaldo, da UNISOL, mesmo com o compromisso da
transparência, não é a qualquer momento que o associado pode ver as
informações da empresa. É necessário respeitar-se o ciclo da informação.
Senão, corre-se o risco de mostrar informações parciais (por exemplo,
somente as receitas, sem os custos envolvidos e outros gastos, fornecendo
uma idéia errada das sobras);
Uma forma de obter participação e gerar confiança é conversando-se, muito,
sobre a gestão, mesmo com a pecha de parecer repetitivo. Tal como nos
processos educativos, conversar, conversar, conversar..., é a forma de criar
um contexto favorável a mais conversas e decisões mais democráticas. A
gestora Lourdes, da Cooper Jeans, tem claro que precisa explicar as decisões
sempre que houver dúvida. No dia-a-dia, todos acabam sabendo dos
problemas. Quando ocorrem perdas todos são informados e discutem o
assunto, pois, “afinal, não é o dinheiro do patrão que foi perdido”;
Um exemplo de desconfiança gerada por desconhecimento e falta de
esclarecimento das informações disponíveis (não basta ter a informação
152
disponível se não existe a compreensão do seu significado). No caso da
Cooper Jeans, o mapa de produção na lousa informa qual o preço de cada
peça de roupa de cada encomenda. O preço da roupa costurada na nota fiscal
da cooperativa é referente ao serviço efetuado (costurar as peças) não
incluindo o tecido. Ao olhar uma nota fiscal de devolução de material, uma
das costureiras espantou-se com o preço da nota, maior que o descrito no
quadro de produção (lousa), e questionou o porquê. Em vez de explicar
para ela, a dirigente Lourdes reuniu todos e explicou o processo, mostrando
que o preço da nota de devolução estava com o valor da roupa, que era maior
que o serviço de costura. Isso faz parte da lógica da transparência
implantada: nada pode ficar na dúvida, pois isso gera mais dúvidas e
desconfianças;
Um cuidado adicional da gestão na Cooper Jeans é explicar até os tipos de
problemas que podem ocorrer na condução dos negócios, para mostrar a
importância da transparência. Se a nota fiscal de venda tivesse um preço de
serviço diferente do registrado no quadro de produção, elas deveriam, sim,
questionar a direção, pois não seria um procedimento normal, que careceria
de explicações;
A Bruscor mantinha um painel com todos os números da empresa
(transparência total) visíveis para os associados e para os que a visitavam.
Nos últimos tempos manteve o acesso apenas para os associados, pois em
alguns casos o era interessante que clientes ou fornecedores tivessem
acesso a certos dados. (Vide o caso do vazamento de informações no
Google, no capítulo 1 - Confiança);
A preocupação da Bruscor com a transparência pode ser observada pela
colocação em discussão para todos os associados das grandes questões que a
empresa enfrenta. Em uma dessas discussões foram apontadas as questões do
capital de giro, das instalações apropriadas e da formação dos associados;
Tanto a Cooper Jeans, como a Bruscor, entendem que o regimento interno da
empresa está em construção. Questões como a marcação ou não do cartão de
ponto, do uso do carro da empresa para um eventual uso particular, emendas
153
de feriados etc., devem ser enfrentadas de forma transparente nas
assembléias.
Uma preocupação com a transparência está no item 10.8.7 da NBC T 10.8,
norma contábil específica para cooperativas, que diz que as demonstrações
contábeis devem ser “complementadas com notas explicativas, inclusive de
forma a permitir comparações com períodos anteriores”.
A eficiência do processo de comunicação é influenciada pela linguagem
utilizada. Os papéis dos componentes da linguagem (Sintaxe, Semântica e Pragmática)
têm relações importantes com os diversos territórios do processo comunicativo. A
sintaxe está relacionada principalmente ao território do emissor, responsável pelos
aspectos técnicos da comunicação, e visa à compreensibilidade da mensagem pelo
receptor. A semântica relaciona-se ao significado específico que a mensagem, e também
o canal, produz nos receptores, estabelecendo a semiótica da comunicação. Por fim, a
pragmática está diretamente ligada ao território do receptor, pois se refere ao efeito da
mensagem neste, que é o foco deste trabalho, pois um desses efeitos é a confiança.
A importância do estudo da semiótica na contabilidade se deve, principalmente,
na questão da codificação, pois para que o emissor informe o receptor é preciso utilizar
um padrão semiótico comum para a mensagem.
Na pesquisa de campo foram levantadas algumas boas práticas e algumas
dificuldades dos gestores e emissores de comunicações no sentido da elaboração de
mensagens compreensíveis:
Por mais que possam ser simplificados os relatórios econômico-financeiros,
eles continuam a lidar com conceitos que não são do dia-a-dia dos
trabalhadores, e talvez nem de gestores de outras áreas operacionais da
empresa. A compreensibilidade deve ser um objetivo, mas a dificuldade
semântica não pode prejudicar a qualidade da evidenciação.
154
O balanço patrimonial é apresentado com os seguintes itens:
ATIVO PASSIVO
Ativo circulante
Realizável a longo prazo
Ativo permanente
Passivo circulante
Exigível a longo prazo
Resultado de exercícios futuros
Patrimônio Líquido
Alguns termos complementares às demonstrações são também de difícil
conceituação, tais como: Depreciação, Provisão para redução a valor de
mercado, Provisão para perdas, Encargos financeiros a apropriar, Ativos
diferidos, Participação em outras sociedades Equivalência, Provisão para
passivos contingentes, Ações em tesouraria etc;
Um dos problemas para explicar os lançamentos a débito e a crédito é a
associação do débito com algo desfavorável e o crédito com algo bom. A
associação é com a conta bancária. O autor tem obtido bons resultados na
didática do ensino de sistemas de informações contábeis para alunos de
Ciência da Computação, explicando os lançamentos a débito e a crédito
como um fluxo, ou seja, um lançamento a crédito representando uma origem
de recursos e um lançamento a débito um destino. Nos cursos para formação
de cooperativas, o Sr. Aguinaldo, da UNISOL, usa a didática da construção
do balanço a partir de registros (lançamentos) de origem e destino dos
recursos, que é melhor do que a explicação tradicional, baseada em débitos e
créditos.
Iudícibus e Marion (2000, p. 35) colocam que o lado do Passivo e do
Patrimônio Líquido representa toda a fonte de recursos, toda a origem de
capital (de terceiros ou próprios). “Nenhum recurso entra na empresa se não
for via Passivo ou Patrimônio Líquido”. O lado do Ativo representa a
aplicação (destino) dos recursos originados no Passivo e Patrimônio Líquido.
Os lançamentos nas contas de Resultado são mais facilmente explicados, não
causando tantas dissonâncias cognitivas, pois os lançamentos a crédito
referem-se às receitas (origem) e os lançamentos a débito são referentes aos
custos e despesas (destino ou uso).
155
Porém, Iudícibus e Marion (2000, p. 35), no livro–texto sobre esse assunto,
“Curso de contabilidade para o contadores”, no capítulo sobre o ciclo
contábil e escrituração, não usam o conceito origem–destino; fornecem
uma tabelinha para mostrar que aumento no Ativo é débito, que diminuição
do Ativo é crédito, que aumento no Passivo e no Patrimônio Líquido é
crédito, e assim por diante;
Os contadores, geralmente de um escritório de contabilidade, têm
dificuldade de adaptar os sistemas contábeis utilizados nas organizações
tradicionais para a realidade da autogestão. Também é difícil adequar as
informações contábeis à capacidade de compreensão dos cooperados,
visando a transparência. A questão não é a de simplificar a informação
produzida pela contabilidade, mas com o entendimento das demandas dos
usuários das informações contábeis, para que “a contabilidade evolua de uma
mera prestação de contas para um importante instrumento de gestão dessas
organizações” (DIAS e SILVA, 2008);
Para o Sr. Reitor, da ANTEAG, as palavras usadas para explicar as
demonstrações financeiras devem ser conformes aos conceitos de
cooperativismo. Assim, deve-se usar sobra em vez de lucro, ingresso em vez
de receita, dispêndio em vez de despesa;
O Sr. Aguinaldo, da UNISOL, observa que fazer um demonstrativo de
resultado pelo regime de caixa, como feito na COOPSEG (Dias e Silva,
2008, p. 7), em vez de por competência, visando facilitar a explicação das
sobras que serão distribuídas (interesse dos associados), traz o perigo de
dificultar o raciocínio em termos de poupança ou reservas.
Um agregado importante do processo de comunicação é a formação dos usuários
da informação econômico-financeira para sua compreensão. Não se pode falar em
confiança autêntica sem esse componente. Ela deve ser incentivada e patrocinada pelos
gestores (emissores de comunicação), pois, no caso das empresas de autogestão, é uma
forma para democratizar a informação. Deve ser cuidada quanto à adequação da
mensagem (sintaxe, semântica e pragmática) e da eficiência dos canais, evitando-se os
ruídos da comunicação. Por fim, no território do receptor, deve contar com a dedicação
156
destes, pois será o meio que terão para se apropriar dos conceitos e conteúdos das
mensagens recebidas. Pessoas que não possuem esse conhecimento têm sua capacidade
de absorção da informação extremamente reduzida.
Recomenda-se uma didática para as demonstrações financeiras que contemple
explicação por meio de desenhos, fluxos, gráficos, e outros recursos para mostrar a
dinâmica dos negócios.
Por exemplo, o conceito de fluxo de caixa de uma empresa pode ser mostrado
por meio da seguinte ilustração:
Ilustração 16 – Fluxo de caixa de uma empresa
Fonte: Barki e Alzogaray (1988, p. 71).
157
Nesse caso, a prosperidade é associada a ter água acima do nível da válvula dos
“dividendos”, para poder vazar por essa saída. Senão, se estiver abaixo, não tem água
para vazar por ai e a empresa não pode distribuir dividendos, nem sobras. O mesmo se
dá com o imposto de renda, a redução de dívidas e o pagamento de juros.
Outro recurso utilizado são as cartilhas, como a “Comunicação e Autogestão”,
elaborada pela ANTEAG, que usam uma linguagem próxima do dia-a-dia dos
trabalhadores, sem, porém, abrir mão dos conceitos envolvidos, contendo temas sobre a
linguagem, a captação e envio de informação, os mecanismos de comunicação, a
desigualdade e acesso à informação, comunicação e poder e sobre comunicação na
empresa.
É recomendável que a formação seja fornecida por entidades independentes, e
não pelos emissores de comunicação ou pelos gestores. Estes devem apoiar e incentivar
os receptores, que têm a obrigação de se apropriar desse conhecimento, para poder
decidir.
7.5. O território do receptor
A retroalimentação, por parte do receptor, é a possibilidade de discussão dos
dados apresentados, que de dá, com possibilidades de desenvolvimento, quando o
receptor se apropriou do conhecimento sobre o conteúdo da mensagem. Além do
receptor, que confia ou o na mensagem e no processo de comunicação, a pesquisa
mostrou que a confiança pode ser gerada em todos os territórios, ou seja, se em todo
processo comunicativo.
Alguns dirigentes de cooperativas e empresas de autogestão o quiseram falar
sobre confiança, com o receio de que a conversa pudesse gerar, nos trabalhadores,
desconfianças infundadas sobre fraudes ou manipulações da administração, ou seja, que
chamasse a atenção para um assunto tabu. Outro receio era o da exposição da
informalidade, que apesar de ser vista por alguns como condição de sobrevivência da
pequena empresa, também é tabu na Economia Solidária, pois esta deveria ter um
diferencial ético em relação às empresas tradicionais. Segundo alguns desses dirigentes,
alguns pesquisadores anteriores também não souberam como lidar com as informações
coletadas ou não deram retorno sobre as conclusões obtidas, deixando a impressão de
abuso de confiança.
158
Fazer uma pergunta direta sobre confiança poderia parecer uma pergunta sobre
desconfiança. Uma pergunta sobre confiança seria uma pergunta sobre o tipo de
confiança simples (ingênua) ou cega (negação). Seria uma pergunta sobre um
sentimento, não sobre um processo, uma construção. Para falar de confiança
pressupondo a desconfiança seria necessária a existência da confiança autêntica.
Assim, no território do receptor, a confiança autêntica, baseada no
conhecimento, foi observada indiretamente, por meio da participação dos trabalhadores
nas decisões e da apropriação das informações comunicadas, conforme segue:
Os cooperados e associados de empresas de autogestão vêem a assembléia
como importante para a transparência e democracia interna. Na COOPSEG,
esperavam ansiosamente pela reunião mensal, chamada Assembléia
Administrativa, na qual o resultado apurado era divulgado. Dada a
importância atribuída à assembléia, a contabilidade não pode cometer erros,
pois tem um grande impacto na vida das pessoas. As assembléias podem ser
consideradas “pontos de acesso” para a complexidade dos números do
negócio. A experiência nesses pontos de acesso influencia fortemente a
atitude de confiança. Assim, o cuidado com a preparação da assembléia, com
a linguagem utilizada, com a transparência dos números e ações, melhora a
relação de confiança;
Para o Sr. José Reitor, da ANTEAG, a hierarquia, como ocorre no
cooperativismo autêntico, é uma hierarquia de produção, existe somente na
atividade, exercida pelos cooperados que supervisionam o processo. Para as
decisões não existe hierarquia, pois na assembléia, cada cooperado tem um
voto. O gerente é da atividade, o presidente é da cooperativa. “Nas
cooperativas sem participação dos cooperados existe a Alta gestão (só a
diretoria sabe e decide) em vez da autogestão”;
No caso da COOPSEG, os principais usuários da informação contábil eram
os gestores da cooperativa, mais especificamente, o presidente. Essa prática
revela o baixo grau de participação dos cooperados, e a dificuldade de
apropriação do conhecimento financeiro-contábil;
159
O “baixo grau de educação formal” dos trabalhadores das empresas de
autogestão pode ser um empecilho para a compreensão de dados econômico-
financeiros. Porém, isso não deve servir de pretexto para que contadores e
dirigentes não proponham o rodízio de funções, para que não utilizem uma
didática específica e para que não sejam transparentes;
A informação contábil aparece como sinônimo de confiança entre os
trabalhadores”, como “instrumento de transparência”, para gerar “confiança
e autonomia” ou para dar a tranqüilidade no trabalho e motivação, como no
caso da Coopram, embora a autora do estudo o tenha incluído essa
dimensão, nem na visão sobre a “realidade esperada”, composta de funções
mais voltadas para a questão da gestão. Em uma das falas comenta-se que
“[...] a principal causa de uma série de problemas na Economia Solidária é a
falta de confiança e a falta de autonomia por conta da falta de informação
[...]” (ALMEIDA, 2006, p. 89);
O processo de comunicação de informações econômico-financeiras está no
contexto institucional da Economia Solidária, com seu principal modelo de
administração que é a autogestão. Esse ambiente pressupõe a democracia, equidade,
transparência etc., que pode ser um elemento para a confiança por parte dos receptores
dessas informações, mesmo que seja uma confiança simples, baseada mais na crença
nas pessoas e na instituição responsável pela comunicação.
Esse contexto é apontado por Granovetter (apud Jerônimo, 2005, p. 45-46) como
importante para a criação da confiança, pois ela é um subproduto da inserção
(embeddedness) das partes que compartilham um norma cultural e social comum, que
no caso são os princípios da Economia Solidária e da Autogestão. Assim, a confiança
dos usuários de informações econômico-financeiras o existe somente em função da
governança corporativa (controles internos efetivos e transparência), mas também do
ambiente que compartilham, ou seja, a mobilização para o início do empreendimento
(“momento inaugural”), o regime de propriedade coletiva, a democracia interna e os
meios e canais de participação e informação.
Na pesquisa de campo foram levantadas alguns aspectos desse contexto,
relacionados à confiança:
160
O Sr. Aguinaldo, da UNISOL, diz que um aspecto central na Economia
Solidária é que ela deve ser competitiva, dentro da Economia Capitalista,
com empresas tradicionais. Se não gerar renda, se não for viável, os
associados terão de procurar uma fonte de renda fora da cooperativa e está
será transformada em algo como um local de convivência, sem
características emancipatórias;
Uma forma de atuação importante para as empresas de autogestão é a
participação nas compras governamentais Para isso, é necessário resolver o
problema da informalidade, típica de pequenas empresas, para não necessitar
de algum tipo de discriminação positiva por conta de ser empresa de
autogestão, Economia Solidária etc. Não querer imposto, como alguns
propõem, é um discurso liberal. O que pode haver são políticas públicas que
incentivem o comércio justo (Sr. Aguinaldo, da UNISOL);
Outra questão é que a distribuição das sobras deveria ser minimizada,
significando que a remuneração dos associados está bem equilibrada (Sr.
Aguinaldo, da UNISOL);
Uma confusão que sempre deve ser superada é a de que o trabalhador
trabalha para a cooperativa, o que é errado. Ela trabalha para ele mesmo. O
dinheiro recebido é do cooperado, não da cooperativa. A cooperativa
administra o trabalho e a despesa é paga com uma parte do trabalho dos
cooperados. (Sr. José Reitor, da ANTEAG);
Existem diversos motivos para uma empresa deixar de ser autogestionária:
Aporte de capital desproporcional às cotas existentes; Contratação
excessiva de mão-de-obra CLT; Multas e problemas trabalhistas decorrentes
do não entendimento, pelas autoridades, dos marcos legais existentes;
No caso das empresas de autogestão, não se imagina uma reestruturação
(reengenharia) capaz de terceirizar associados ou de criar modos de
produção associados à exploração.
Para o Sr. Aguinaldo, da UNISOL, o princípio contábil da Entidade pode
evitar conflitos e desconfianças. Esse princípio diz que o patrimônio da
161
entidade, no caso a cooperativa, não se confunde com o de seus sócios,
proprietários e dirigentes. A aplicação desse princípio evita, por exemplo,
que “cooperados paguem suas contas pessoais com recursos da cooperativa”.
Durante a visita a Avaré para estudar o caso da Cooper Jeans, houve o
contato com um problema legal envolvendo a confiabilidade e a dificuldade
de caracterização do cooperativismo autêntico.
O trabalho de fiscalização das cooperativas fraudulentas, realizado pelo
Ministério Público e pelas DRT´s (Delegacias Regionais do Trabalho) no
Brasil, é de extrema importância para prevenir contra a precarização do
mundo do trabalho isso não como negar. Contudo, é fundamental que
os fiscais e procuradores conheçam e saibam o que é cooperativismo e
economia solidária, senão, não saberão discriminar as cooperativas autênticas
das falsas, cometendo injustiças (ANTEAG, 2008).
O caso em questão é o da Cooperbrim cooperativa de produção do ramo
têxtil, no segmento de confecção de calças jeans, com certa de 70
costureiras, que produz em forma de facção
3
, para diversos clientes,
localizada em Avaré, interior de São Paulo, associada da ANTEAG e
membro do conselho fiscal da entidade.
Em 20 de novembro de 2007, a Cooperbrim foi visitada pelo Ministério
Público do Trabalho, que elaborou um Termo de Depoimento, que foi
utilizado para a abertura de uma Ação Civil Pública contra a cooperativa
(ANTEAG, 2008). A alegação dos procuradores, após uma única visita de
um pouco mais de uma hora, foi que:
... a Cooperbrim era uma cooperativa fraudulenta, que usava regime de
trabalho escravo, em péssimas condições laborais (sem ventilação, sem
banheiro), alegando também que os cooperados sequer conhecem a presidente
e não realizam assembléias, dados que a caracterizariam imediatamente como
uma cooperativa criada para burlar os direitos trabalhistas e precarizar o
trabalho (ANTEAG, 2008).
3
Na produção por facção, os clientes enviam a matéria prima (no caso o tecido) e recebem de
volta o produto acabado (jeans), pagando pela mão-de-obra dos cooperados.
162
A cooperativa vinha se desenvolvendo satisfatoriamente, com muitas
perspectivas de contratos e clientes, pensando, junto com a Cooper-Jeans, na
criação de uma marca própria, até receber a visita dos Procuradores do
Trabalho.
O problema se agravou com a publicação da notícia da Ação, em meados de
dezembro de 2007, por três jornais de grande penetração, com grande
repercussão, pois envolvia a C&A (Rolli, 2007). Após a fiscalização e as
notícias, os clientes ficaram com receio de contratar os serviços da
cooperativa.
A foto a seguir mostra os cooperados da Cooperbrim reunidos em
assembléia com o advogado e assessor jurídico da ANTEAG, Sr. José Reitor
Rizzardi, para tomar conhecimento das medidas judiciais em andamento
(ANTEAG, 2008).
Ilustração 17 - Assembléia da Cooperbrim
O Departamento Jurídico da ANTEAG es buscando a reparação dos
direitos violados de sua associada. No dia 11 de janeiro de 2008, a ANTEAG
convidou o secretário da Secretaria Nacional de Economia Solidária
(SENAES), Paul Singer, para um debate com assessores da ANTEAG e
trabalhadores da Cooper-Jeans e Cooperbrim sobre o caso da Cooperbrim.
Singer se comprometeu a transformar o caso da cooperativa como
163
emblemático para a Economia Solidária, para que não ocorram novos casos
como este.
A solução paliativa foi a abertura de uma empresa tradicional, para que os
cooperados pudessem permanecer no mercado e gerando renda.
165
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este capítulo tece considerações finais e projeta algumas seqüências para o
trabalho.
Uma das conclusões do trabalho, sobre criação de confiança (ato de confiar), que
é uma prerrogativa do receptor, é que ela é resultado dos diversos territórios do processo
de comunicação. No território do emissor, é produto da aplicação das regras de
governança corporativa, principalmente pela existência de controles internos efetivos,
que dão confiabilidade ao processo. No território da mensagem e do canal, a confiança
decorre da transparência na comunicação e da busca da elaboração de mensagens
compreensíveis.
O receptor também é responsável pela confiança que imputa a uma mensagem
recebida. Pode ser confiança não tanto na mensagem, mas em quem a produziu, no caso
de confiar em elementos do ambiente institucional da Economia Solidária e da
autogestão, ou seja, nos princípios de solidariedade, transparência, democracia,
participação etc.
Porém, pode ser também a confiança autêntica, baseada na busca da
compreensão da mensagem, por meio da participação em programas de formação sobre
o conteúdo comunicado, mesmo por iniciativa própria.
Podem-se constatar as dificuldades operacionais para adotar regras de
governança corporativa (controles internos e transparência), de modo a garantir a
confiabilidade das demonstrações financeiras. A tecnologia da informação ainda é sub
ou mal utilizada na escrituração e na evidenciação contábil. Mesmo assim, dentro de
alguns limites, é possível aplicar algumas regras de governança corporativa para as
empresas da Economia Solidária
O processo de comunicação das informações econômico-financeiras ainda é
tradicional, sem uma didática adequada, própria para empreendimentos à base de
confiança. O jargão aparece nos relatórios, tornando o sistema mais abstrato que o
necessário. A terceirização da contabilidade é uma dificuldade adicional, pelo fato de os
escritórios contábeis não fazerem, normalmente, distinção entre as empresas de
autogestão e as tradicionais.
166
As discussões foram predominantemente sobre receptores internos às empresas
de autogestão (associados, cooperados etc). Algumas considerações sobre construção de
confiança servem também para os outros públicos das demonstrações financeiras
(governo, investidores, bancos, clientes, fornecedores, mercado em geral) e poderiam
ser avaliadas em um futuro trabalho.
Podem ser feitos trabalhos na mesma linha deste, em outros tipos de empresas de
autogestão, como em escolas administradas por professores, com cargos eletivos, e que
tenham boas práticas e dificuldades em relação à transparência das informações
econômico-financeiras, e que se defrontem com informações de difícil mensuração,
como o custo por aluno, custo dos cursos etc.
Quanto à confiança em sistemas abstratos, este trabalho pode ser estendido para
a comunicação médico-paciente, que também padece do uso de jargões, além da
complexidade da conta hospitalar e de seu financiamento.
Também se pode usar esse referencial para pesquisar a confiança em outros tipos
de comunicações para o mercado, como os balanços sociais (usado para demonstrar
responsabilidade social da empresa) e balanços de intangíveis (usado para demonstrar
seu capital intelectual). Sobre balanços sociais, várias questões são levantadas por
Oliveira (2004) e que foram contempladas neste trabalho.
Pode-se, também, incluir em algum trabalho de fôlego, como, por exemplo, uma
nova versão do Atlas da Economia Solidária, uma pergunta sobre confiança dos
receptores, nos moldes da edição das “Melhores empresas para se trabalhar”, em que o
foco é o clima organizacional.
O sistema de custeio por atividades (Activity Based Costing) aplicado a
universidades pode ser uma “ferramenta que mostra com clareza e transparência os
custos das atividades e produtos que consomem os recursos da empresa” (SANTOS,
2002, p. 26). Assim, seria interessante para este autor retomar o trabalho de custeio na
Fundação Santo André, agora sob o prisma mais amplo da governança corporativa,
visando os controles internos e a transparência.
Serão bem vindos projetos envolvendo Economia Solidária, autogestão e/ou
transparência na divulgação de informações econômico-financeiras.
167
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GLOSSÁRIO
ABM (Activity-Based Management) Acompanhamento dos custos por atividades,
atribuindo-os para produtos e clientes específicos, permitindo uma alocação de
custos e tomada de decisão mais correta.
ADR (American Depositary Receipts) Recibos de Depósito Americano de ões
de empresas estrangeiras, não negociáveis no país de origem (PEIXOTO, 2008).
Agregação de demanda União de clientes para juntar pedidos para um
determinado fornecedor, visando às vantagens obtidas pelas empresas maiores em
virtude do maior volume de compras.
BSC (Balanced ScoreCard) – Tradução da Missão e da Visão da empresa em
medidas quantificáveis que verificam se a gestão está atingindo os resultados
desejados. As perspectivas são: processos internos; cliente; inovação e crescimento;
financeira.
CMMI (Capability Maturity Model Integration) Modelo de referência com
práticas necessárias para a maturidade em disciplinas específicas, referentes ao
desenvolvimento de software e serviços e aos processos de aquisição e terceirização
de bens e serviços.
COBIT (Control Objectives of Information and Related Technology) Framework
para governança em TI, baseado em métricas para avaliação dos resultados. É usado
para otimizar os investimentos em TI.
COSO (Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission)
Organização voluntária do setor privado dedicada a melhorar a qualidade dos
relatórios financeiros por meio da ética nos negócios, controles internos efetivos e
governança corporativa. Foi formada em 1985 para patrocinar a National
Commission on Fraudulent Financial Reporting, que estudava as causas das fraudes
e desenvolvia recomendações para companhias públicas e seus auditores
independentes, para a SEC e outros órgãos reguladores e também para instituições
educacionais (Disponível em http://www.coso.org/, acesso em 07/04/2008).
CVM (Comissão de Valores Mobiliários) – Órgão que efetua o controle do mercado
de ações no Brasil. Disponível em http://www.cvm.gov.br. Acesso em 12/04/2008.
178
EDI (Eletronic Data Interchange). Troca de dados entre duas entidades por meio
eletrônico (linhas privadas ou Internet), mediante a utilização de um protocolo de
comunicação.
ERP (Enterprise Resource Planning) – Sistemas de software destinados a suportar e
automatizar, de forma integrada, os processos de negócios de uma organização.
Incluem, normalmente, as funções de manufatura, suprimentos, distribuição,
recursos humanos e folha de pagamento, gerenciamento de projetos e finanças.
Normalmente tiveram origem em sistemas de manufatura, mas se estenderam para
outros domínios (ERP de nicho).
GAAP (Generally Accepted Accounting Principles) Princípios contábeis
geralmente aceitos .... US GAAP e IAS GAAP. Veja:
http://www.cosif.com.br/mostra.asp?arquivo=ias-nic-indice
IASB (International Accounting Standards Board) Órgão que estabelece padrões
contábeis. Disponível em http://www.iasb.org. Acesso em 11/04/2008.
IBOVESPA Índice da valorização de uma carteira virtual das ações mais
negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo.
IFRS (International Financial Reporting Standard) – Conjunto de pronunciamentos
de contabilidade internacionais publicados pelo IASB.
ITIL (Information Technology Infrastructure Library) É uma biblioteca de boas
práticas de gestão de serviços de TI, com foco no cliente e alinhamento estratégico
com o negócio da empresa.
NASDAQ (National Association of Securities Dealers Automated Quotations
system) Bolsa eletrônica das empresas de alta tecnologia (eletrônica, informática,
telecomunicações, biotecnologia). Disponível em http://www.nasdaq.com/ . Acesso
em 02/05/2008.
NYSE (New York Stock Exchange) Bolsa de Valores de Nova Iorque. Disponível
em http://www.nyse.com/ . Acesso em 02/05/2008.
Offshoring – Realocação das operações de uma empresa para outro país.
SARBANES-OXLEY (SOX) Lei (Ato) aprovada em 2002, com o objetivo de
aperfeiçoar os controles internos financeiros e contábeis das empresas, visando
179
garantir a transparência da gestão, a credibilidade contábil e a segurança de
informações confidenciais, reduzindo as possibilidades de fraudes.
SEC (Securities and Exchange Commission) – Órgão que efetua o controle do
mercado de ações nos Estados Unidos, protegendo os investidores, mantendo a
eqüidade, a ordem e os mercados eficientes, facilitando assim a formação de capital.
Disponível em http://www.sec.gov. Acesso em 07/04/2008.
Stakeholders Envolvidos com a empresa (funcionários, clientes, fornecedores,
governo, comunidade etc.). Complementar a shareholders (acionistas).
180
ÍNDICE REMISSIVO
accountability. Consulte prestação de contas
ANTEAG, 23, 103, 113, 135, 136, 161
Assembléia, 78, 99, 110, 130, 151, 158, 185, 186, 187, 189
autogestão, 91, 94, 95, 96, 97, 101, 117
formação, 98, 100, 101, 113, 114, 115, 117, 130, 131, 154
indicadores, 104, 105
Bovespa, 82, 83
compliance. Consulte conformidade
comunicação, 53, 54, 55
institucionalização, 54
intencionalidade, 53
princípios, 54
confiabilidade, 24, 26, 33, 34, 36, 41, 50, 53, 79, 81, 84, 99, 113, 114, 122, 129, 140,
141, 142, 144, 150, 161
confiança
autêntica, 35
básica, 34
cega, 35
simples, 34
traição, 35
conformidade, 21, 77, 81, 84, 85
custos de transação, 39, 96, 131
CVM, 20, 83
desconfiança, 23, 34, 35, 40, 41, 42, 43, 44, 46, 87, 99, 131, 132, 151, 158
Economia Solidária, 16, 20, 24, 91, 92, 94, 97, 100, 101, 133, 165
Atlas, 94
confiança, 159
contabilidade, 107, 113, 115, 116, 117
formação, 100, 131
informalidade, 157
Sistema Nacional de Informações em, 92
tipos de profissionais, 101
vantagens competitivas, 96, 160
evidenciação, 75, 78, 109, 129, 130
FASB, 20, 129
GAAP, 20
governança corporativa, 19, 20, 21, 77, 79, 82, 83, 87, 165
IASB, 20
IFRS, 20
mapa conceitual, 29
prestação de contas, 77, 78, 109, 151, 155
processo de comunicação
contábil, 67
modelo de Gerbner, 60
modelo de Jacobson, 65
modelo de Lasswell, 63
modelo de Newcomb, 63
modelo de Shannon e Weaver, 59
181
modelo de Westley e MacLean, 64, 138
risco, 33, 47, 48, 51, 79, 80, 84, 151, 168
ruído, 55, 60, 70
Sarbanes-Oxley, 77, 79, 81, 84
SFAC, 74
sistemas abstratos, 47, 48, 50
sistemas peritos. Consulte sistemas abstratos
transparência, 20, 34, 40, 44, 45, 78, 79, 83, 87, 97, 98, 99, 102, 103, 109, 130, 132,
150, 151, 152, 153, 159, 184
182
APÊNDICE A – Questionários da pesquisa
Questionário tipo 1 Técnicos e assessores de entidades de apoio à
Economia Solidária e empresas de autogestão
Quais as atividades de formação patrocinadas pela entidade de apoio? Quais
metodologias são utilizadas?
Marcos legais?
Indicadores de autogestão?
Quais os tipos de apoio são dados (formação, jurídico, político, redes)?
Gestão e contabilidade não seriam sistemas técnicos, de difícil apropriação
dos conceitos por terceiros, reservados a especialistas?
183
Questionário tipo 2 – Dirigentes de empresas de autogestão
Sobre a empresa e autogestão
Qual o histórico da empresa?
Qual o porte da empresa, quantidade de associados, volume de negócios?
Qual a nota nos indicadores de autogestão da ANTEAG?
Quais os principais concorrentes?
Inserção em redes de produção ou comercialização?
Participa de algum fórum, entidade de classe ou órgão de representação?
Está sujeita a quais legislações?
Qual o seu grau de participação nos processos de autogestão?
Sobre Governança
A contabilidade e/ou o jurídico são terceirizados?
A empresa adota algum padrão adicional para produção das demonstrações
financeiras, além dos exigidos pela legislação fiscal?
Quais são as demonstrações financeiras produzidas e utilizadas pelos
públicos que delas necessitam (bancos, governo, conselho de administração,
membros da empresa não envolvidos com finanças ou contabilidade, órgãos
de classe etc.)?
A empresa produz alguma demonstração financeira não exigida por lei?
Qual seria o gasto na implantação de controles mais efetivos?
Existe documentação de processo? Possui alguma certificação?
Existe o lançamento multidimensional das transações?
Qual o prazo de fechamento de balanços (oportunidade das informações
geradas)?
Qual o grau de participação dos associados na elaboração de orçamentos; e
no acompanhamento?
184
Existem muitos rateios no sistema de custeio da empresa? Quais?
Sistema de gestão é próprio ou é um pacote?
Sobre transparência (evidenciação)
A comunicação voluntária é praticada?
Os princípios contábeis são amplamente divulgados e compreendidos pelos
diversos públicos?
A empresa mantém conjunto de indicadores de negócio (tipo BSC). Divulga
para seus membros?
Sobre confiança
Como é o processo de formação dos trabalhadores, principalmente nos
conteúdos econômico-financeiros? Existe alguma didática específica?
Formação é restrita aos administradores?
185
ANEXO A – Trechos da Lei do Cooperativismo
Este anexo contém trechos da Lei 5764, de 16 de dezembro de 1971, que define a
Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e
outras providências. Esses trechos são os que dizem respeito ao trabalho, ou seja, o modelo
de gestão, obrigações quanto à participação e transparência nas cooperativas.
[...]
Das Sociedades Cooperativas
Art. Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se
obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de
proveito comum, sem objetivo de lucro.
Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica
próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos
associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:
I - adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade
técnica de prestação de serviços;
II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes;
III - limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado,
porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o
cumprimento dos objetivos sociais;
IV - incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;
V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações
de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da
proporcionalidade;
VI - quorum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no
número de associados e não no capital;
VII - retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações
realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral;
VIII - indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e
Social;
IX - neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social;
X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos
empregados da cooperativa;
XI - área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle,
operações e prestação de serviços.
[...]
Do Estatuto Social
Art. 21. O estatuto da cooperativa, além de atender ao disposto no artigo 4º, deverá
indicar:
I - a denominação, sede, prazo de duração, área de ação, objeto da sociedade, fixação do
exercício social e da data do levantamento do balanço geral;
II - os direitos e deveres dos associados, natureza de suas responsabilidades e as
condições de admissão, demissão, eliminação e exclusão e as normas para sua representação nas
assembléias gerais;
186
III - o capital mínimo, o valor da quota-parte, o mínimo de quotas-partes a ser subscrito
pelo associado, o modo de integralização das quotas-partes, bem como as condições de sua
retirada nos casos de demissão, eliminação ou de exclusão do associado;
IV - a forma de devolução das sobras registradas aos associados, ou do rateio das perdas
apuradas por insuficiência de contribuição para cobertura das despesas da sociedade;
V - o modo de administração e fiscalização, estabelecendo os respectivos órgãos, com
definição de suas atribuições, poderes e funcionamento, a representação ativa e passiva da
sociedade em juízo ou fora dele, o prazo do mandato, bem como o processo de substituição dos
administradores e conselheiros fiscais;
VI - as formalidades de convocação das assembléias gerais e a maioria requerida para a
sua instalação e validade de suas deliberações, vedado o direito de voto aos que nelas tiverem
interesse particular sem privá-los da participação nos debates;
VII - os casos de dissolução voluntária da sociedade;
VIII - o modo e o processo de alienação ou oneração de bens imóveis da sociedade;
IX - o modo de reformar o estatuto;
X - o número mínimo de associados.
Dos Livros
Art. 22. A sociedade cooperativa deverá possuir os seguintes livros:
I - de Matrícula;
II - de Atas das Assembléias Gerais;
III - de Atas dos Órgãos de Administração;
IV - de Atas do Conselho Fiscal;
V - de presença dos Associados nas Assembléias Gerais;
VI - outros, fiscais e contábeis, obrigatórios.
[...]
Art. 31. O associado que aceitar e estabelecer relação empregatícia com a cooperativa
perde o direito de votar e ser votado, até que sejam aprovadas as contas do exercício em que ele
deixou o emprego.
[...]
Dos Órgãos Sociais
[...]
Das Assembléias Gerais
Art. 38. A Assembléia Geral dos associados é o órgão supremo da sociedade, dentro dos
limites legais e estatutários, tendo poderes para decidir os negócios relativos ao objeto da
sociedade e tomar as resoluções convenientes ao desenvolvimento e defesa desta, e suas
deliberações vinculam a todos, ainda que ausentes ou discordantes.
[...]
Art. 42. Nas cooperativas singulares, cada associado presente não terá direito a mais de
1 (um) voto, qualquer que seja o número de suas quotas-partes.
[...]
187
Das Assembléias Gerais Ordinárias
Art. 44. A Assembléia Geral Ordinária, que se realizará anualmente nos 3 (três)
primeiros meses após o término do exercício social, deliberará sobre os seguintes assuntos que
deverão constar da ordem do dia:
I - prestação de contas dos órgãos de administração acompanhada de parecer do
Conselho Fiscal, compreendendo:
a) relatório da gestão;
b) balanço;
c) demonstrativo das sobras apuradas ou das perdas decorrentes da insuficiência das
contribuições para cobertura das despesas da sociedade e o parecer do Conselho Fiscal.
II - destinação das sobras apuradas ou rateio das perdas decorrentes da insuficiência das
contribuições para cobertura das despesas da sociedade, deduzindo-se, no primeiro caso as
parcelas para os Fundos Obrigatórios;
III - eleição dos componentes dos órgãos de administração, do Conselho Fiscal e de
outros, quando for o caso;
IV - quando previsto, a fixação do valor dos honorários, gratificações e cédula de
presença dos membros do Conselho de Administração ou da Diretoria e do Conselho Fiscal;
V - quaisquer assuntos de interesse social, excluídos os enumerados no artigo 46.
§ Os membros dos órgãos de administração e fiscalização não poderão participar da
votação das matérias referidas nos itens I e IV deste artigo.
§ À exceção das cooperativas de crédito e das agrícolas mistas com seção de crédito,
a aprovação do relatório, balanço e contas dos órgãos de administração, desonera seus
componentes de responsabilidade, ressalvados os casos de erro, dolo, fraude ou simulação, bem
como a infração da lei ou do estatuto.
Das Assembléias Gerais Extraordinárias
Art. 45. A Assembléia Geral Extraordinária realizar-se-á sempre que necessário e
poderá deliberar sobre qualquer assunto de interesse da sociedade, desde que mencionado no
edital de convocação.
Art. 46. É da competência exclusiva da Assembléia Geral Extraordinária deliberar sobre
os seguintes assuntos:
I - reforma do estatuto;
II - fusão, incorporação ou desmembramento;
III - mudança do objeto da sociedade;
IV - dissolução voluntária da sociedade e nomeação de liquidantes;
V - contas do liquidante.
Parágrafo único. São necessários os votos de 2/3 (dois terços) dos associados presentes,
para tornar válidas as deliberações de que trata este artigo.
Dos Órgãos de Administração
Art. 47. A sociedade será administrada por uma Diretoria ou Conselho de
Administração, composto exclusivamente de associados eleitos pela Assembléia Geral, com
mandato nunca superior a 4 (quatro) anos, sendo obrigatória a renovação de, no nimo, 1/3
(um terço) do Conselho de Administração.
§ 1º O estatuto poderá criar outros órgãos necessários à administração.
188
Art. 48. Os órgãos de administração podem contratar gerentes técnicos ou comerciais,
que não pertençam ao quadro de associados, fixando-lhes as atribuições e salários.
[...]
Art. 51. São inelegíveis, além das pessoas impedidas por lei, os condenados a pena que
vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de
prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato, ou contra a economia popular, a fé pública
ou a propriedade.
Parágrafo único. Não podem compor uma mesma Diretoria ou Conselho de
Administração, os parentes entre si até 2º (segundo) grau, em linha reta ou colateral.
Art. 52. O diretor ou associado que, em qualquer operação, tenha interesse oposto ao da
sociedade, não pode participar das deliberações referentes a essa operação, cumprindo-lhe
acusar o seu impedimento.
Art. 53. Os componentes da Administração e do Conselho fiscal, bem como os
liquidantes, equiparam-se aos administradores das sociedades anônimas para efeito de
responsabilidade criminal.
Art. 54. Sem prejuízo da ação que couber ao associado, a sociedade, por seus diretores,
ou representada pelo associado escolhido em Assembléia Geral, terá direito de ação contra os
administradores, para promover sua responsabilidade.
Art. 55. Os empregados de empresas que sejam eleitos diretores de sociedades
cooperativas pelos mesmos criadas, gozarão das garantias asseguradas aos dirigentes sindicais
pelo artigo 543 da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei n. 5.452, de de maio de
1943).
Do Conselho Fiscal
Art. 56. A administração da sociedade será fiscalizada, assídua e minuciosamente, por
um Conselho Fiscal, constituído de 3 (três) membros efetivos e 3 (três) suplentes, todos
associados eleitos anualmente pela Assembléia Geral, sendo permitida apenas a reeleição de 1/3
(um terço) dos seus componentes.
§ Não podem fazer parte do Conselho Fiscal, além dos inelegíveis enumerados no
artigo 51, os parentes dos diretores até o (segundo) grau, em linha reta ou colateral, bem
como os parentes entre si até esse grau.
§ 2º O associado não pode exercer cumulativamente cargos nos órgãos de administração
e de fiscalização.
Do Sistema Operacional das Cooperativas
Do Ato Cooperativo
Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus
associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a
consecução dos objetivos sociais.
Parágrafo único. O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de
compra e venda de produto ou mercadoria.
189
Das Distribuições de Despesas
Art. 80. As despesas da sociedade serão cobertas pelos associados mediante rateio na
proporção direta da fruição de serviços.
Parágrafo único. A cooperativa poderá, para melhor atender à equanimidade de
cobertura das despesas da sociedade, estabelecer:
I - rateio, em partes iguais, das despesas gerais da sociedade entre todos os associados,
quer tenham ou não, no ano, usufruído dos serviços por ela prestados, conforme definidas no
estatuto;
II - rateio, em razão diretamente proporcional, entre os associados que tenham usufruído
dos serviços durante o ano, das sobras líquidas ou dos prejuízos verificados no balanço do
exercício, excluídas as despesas gerais já atendidas na forma do item anterior.
Art. 81. A cooperativa que tiver adotado o critério de separar as despesas da sociedade e
estabelecido o seu rateio na forma indicada no parágrafo único do artigo anterior deverá levantar
separadamente as despesas gerais.
Dos Prejuízos
Art. 89. Os prejuízos verificados no decorrer do exercício serão cobertos com recursos
provenientes do Fundo de Reserva e, se insuficiente este, mediante rateio, entre os associados,
na razão direta dos serviços usufruídos, ressalvada a opção prevista no parágrafo único do artigo
80.
Do Sistema Trabalhista
Art. 90. Qualquer que seja o tipo de cooperativa, não existe vínculo empregatício entre
ela e seus associados.
Art. 91. As cooperativas igualam-se às demais empresas em relação aos seus
empregados para os fins da legislação trabalhista e previdenciária.
Da Fiscalização e Controle
Art. 92. A fiscalização e o controle das sociedades cooperativas, nos termos desta lei e
dispositivos legais específicos, serão exercidos, de acordo com o objeto de funcionamento, da
seguinte forma:
I - as de crédito e as seções de crédito das agrícolas mistas pelo Banco Central do
Brasil;
II - as de habitação pelo Banco Nacional de Habitação;
III - as demais pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
§ Mediante autorização do Conselho Nacional de Cooperativismo, os órgãos
controladores federais, poderão solicitar, quando julgarem necessário, a colaboração de outros
órgãos administrativos, na execução das atribuições previstas neste artigo.
§ As sociedades cooperativas permitirão quaisquer verificações determinadas pelos
respectivos órgãos de controle, prestando os esclarecimentos que lhes forem solicitados, além de
serem obrigadas a remeter-lhes anualmente a relação dos associados admitidos, demitidos,
eliminados e excluídos no período, cópias de atas, de balanços e dos relatórios do exercício
social e parecer do Conselho Fiscal.
190
Art. 93. O Poder Público, por intermédio da administração central dos órgãos
executivos federais competentes, por iniciativa própria ou solicitação da Assembléia Geral ou
do Conselho Fiscal, intervirá nas cooperativas quando ocorrer um dos seguintes casos:
I - violação contumaz das disposições legais;
II - ameaça de insolvência em virtude de má administração da sociedade;
III - paralisação das atividades sociais por mais de 120 (cento e vinte) dias
consecutivos;
IV - inobservância do artigo 56, § 2º.
[...]
191
ANEXO B – Obrigações adicionais à legislação (Bovespa)
A seguir, são apresentados as obrigações adicionais à legislação, exigidos pela Bovespa
(2008), para os níveis de diferenciados de governança corporativa 1 e 2 e para as empresas do
Novo Mercado.
Implantados em dezembro de 2000 pela Bolsa de Valores de São Paulo BOVESPA,
os Níveis Diferenciados de Governança Corporativa são segmentos especiais de listagem que
foram desenvolvidos com o objetivo de proporcionar um ambiente de negociação que
estimulasse, simultaneamente, o interesse dos investidores e a valorização das companhias.
Empresas listadas nesses segmentos oferecem aos seus acionistas investidores
melhorias nas práticas de governança corporativa que ampliam os direitos societários dos
acionistas minoritários e aumentam a transparência das companhias, com divulgação de maior
volume de informações e de melhor qualidade, facilitando o acompanhamento de sua
performance.
A premissa básica é que a adoção de boas práticas de governança corporativa pelas
companhias confere maior credibilidade ao mercado acionário e, como conseqüência, aumenta a
confiança e a disposição dos investidores em adquirirem as suas ações, pagarem um preço
melhor por elas, reduzindo seu custo de captação.
A adesão das Companhias ao Nível 1 ou ao Nível 2 depende do grau de compromisso
assumido e é formalizada por meio de um contrato, assinado pela BOVESPA, pela Companhia,
seus administradores, conselheiros fiscais e controladores. Ao assinarem o contrato, as partes
acordam em observar o Regulamento de Listagem do segmento específico, que consolida os
requisitos que devem ser atendidos pelas Companhias listadas naquele segmento, além de, no
caso das Companhias Nível 2, adotar a arbitragem para solução de eventuais conflitos
societários.
COMPANHIA NÍVEL 1
As Companhias Nível 1 se comprometem, principalmente, com melhorias na prestação
de informações ao mercado e com a dispersão acionária. Por exemplo, a companhia aberta
listada no Nível 1 tem como obrigações adicionais à legislação:
Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Trimestrais
(ITRs) documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à
BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras
trimestrais – entre outras: demonstrações financeiras consolidadas e a demonstração
dos fluxos de caixa.
Melhoria nas informações relativas a cada exercício social, adicionando às
Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFPs) documento que é enviado pelas
companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que
contém demonstrações financeiras anuais – entre outras, a demonstração dos fluxos
de caixa.
Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Anuais (IANs)
documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA,
disponibilizado ao público e que contém informações corporativas entre outras: a
quantidade e características dos valores mobiliários de emissão da companhia
detidos pelos grupos de acionistas controladores, membros do Conselho de
Administração, diretores e membros do Conselho Fiscal, bem como a evolução
dessas posições.
Realização de reuniões públicas com analistas e investidores, ao menos uma vez por
ano.
192
Apresentação de um calendário anual, do qual conste a programação dos eventos
corporativos, tais como assembléias, divulgação de resultados etc.
Divulgação dos termos dos contratos firmados entre a companhia e partes
relacionadas.
Divulgação, em bases mensais, das negociações de valores mobiliários e derivativos
de emissão da companhia por parte dos acionistas controladores.
Manutenção em circulação de uma parcela mínima de ações, representando 25%
(vinte e cinco por cento) do capital social da companhia.
Quando da realização de distribuições públicas de ações, adoção de mecanismos
que favoreçam a dispersão do capital.
COMPANHIA NÍVEL 2
As Companhias vel 2 se comprometem a cumprir as regras aplicáveis ao Nível 1 e,
adicionalmente, um conjunto mais amplo de práticas de governança relativas aos direitos
societários dos acionistas minoritários. Por exemplo, a companhia aberta listada no Nível 2 tem
como obrigações adicionais à legislação:
Divulgação de demonstrações financeiras de acordo com padrões internacionais
IFRS ou US GAAP.
Conselho de Administração com mínimo de 5 (cinco) membros e mandato
unificado de até 2 (dois) anos, permitida a reeleição. No mínimo, 20% (vinte por
cento) dos membros deverão ser conselheiros independentes.
Direito de voto às ações preferenciais em algumas matérias, tais como,
transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia e aprovação de contratos
entre a companhia e empresas do mesmo grupo sempre que, por força de disposição
legal ou estatutária, sejam deliberados em assembléia geral.
Extensão para todos os acionistas detentores de ações ordinárias das mesmas
condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia e
de, no mínimo, 80% (oitenta por cento) deste valor para os detentores de ações
preferenciais (tag along).
Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em circulação, no
mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento do capital ou
cancelamento do registro de negociação neste Nível;
Adesão à Câmara de Arbitragem do Mercado para resolução de conflitos
societários.
Além de presentes no Regulamento de Listagem, alguns desses compromissos
deverão ser aprovados em Assembléias Gerais e incluídos no Estatuto Social da
companhia.
NOVO MERCADO
O Novo Mercado é um segmento de listagem destinado à negociação de ações emitidas
por companhias que se comprometam, voluntariamente, com a adoção de práticas de
governança corporativa adicionais em relação ao que é exigido pela legislação.
A valorização e a liquidez das ações são influenciadas positivamente pelo grau de
segurança oferecido pelos direitos concedidos aos acionistas e pela qualidade das informações
prestadas pelas companhias. Essa é a premissa básica do Novo Mercado.
A entrada de uma companhia no Novo Mercado ocorre por meio da assinatura de um
contrato e implica a adesão a um conjunto de regras societárias, genericamente chamadas de
"boas práticas de governança corporativa", mais exigentes do que as presentes na legislação
brasileira. Essas regras, consolidadas no Regulamento de Listagem do Novo Mercado, ampliam
os direitos dos acionistas, melhoram a qualidade das informações usualmente prestadas pelas
193
companhias, bem como a dispersão acionária e, ao determinar a resolução dos conflitos
societários por meio de uma Câmara de Arbitragem, oferecem aos investidores a segurança de
uma alternativa mais ágil e especializada.
A principal inovação do Novo Mercado, em relação à legislação, é a exigência de que o
capital social da companhia seja composto somente por ações ordinárias. Porém, esta não é a
única. Por exemplo, a companhia aberta participante do Novo Mercado tem como obrigações
adicionais:
Extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos
controladores quando da venda do controle da companhia (tag along).
Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em circulação, no
mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento do capital ou
cancelamento do registro de negociação no Novo Mercado.
Conselho de Administração com mínimo de 5 (cinco) membros e mandato
unificado de até 2 (dois) anos, permitida a reeleição. No mínimo, 20% (vinte por
cento) dos membros deverão ser conselheiros independentes.
Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Trimestrais
(ITRs) documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à
BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras
trimestrais – entre outras: demonstrações financeiras consolidadas e a demonstração
dos fluxos de caixa.
Melhoria nas informações relativas a cada exercício social, adicionando às
Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFPs) documento que é enviado pelas
companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que
contém demonstrações financeiras anuais – entre outras, a demonstração dos fluxos
de caixa.
Divulgação de demonstrações financeiras de acordo com padrões internacionais
IFRS ou US GAAP.
Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Anuais (IANs)
documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA,
disponibilizado ao público e que contém informações corporativas entre outras: a
quantidade e características dos valores mobiliários de emissão da companhia
detidos pelos grupos de acionistas controladores, membros do Conselho de
Administração, diretores e membros do Conselho Fiscal, bem como a evolução
dessas posições.
Realização de reuniões públicas com analistas e investidores, ao menos uma vez por
ano.
Apresentação de um calendário anual, do qual conste a programação dos eventos
corporativos, tais como assembléias, divulgação de resultados etc.
Divulgação dos termos dos contratos firmados entre a companhia e partes
relacionadas.
Divulgação, em bases mensais, das negociações de valores mobiliários e derivativos
de emissão da companhia por parte dos acionistas controladores.
Manutenção em circulação de uma parcela mínima de ações, representando 25%
(vinte e cinco por cento) do capital social da companhia.
Quando da realização de distribuições públicas de ações, adoção de mecanismos
que favoreçam a dispersão do capital.
Adesão à Câmara de Arbitragem do Mercado para resolução de conflitos
societários.
Além de presentes no Regulamento de Listagem, alguns desses compromissos
deverão ser aprovados em Assembléias Gerais e incluídos no Estatuto Social da
companhia.
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