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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
EMERSON TREVISAN
A FEIRA LIVRE EM IGARASSU: UMA ANÁLISE A PARTIR DOS
DOIS CIRCUITOS DA ECONOMIA; A CONVIVÊNCIA DO
FORMAL E O INFORMAL.
RECIFE
2008
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Livros Grátis
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
EMERSON TREVISAN
A FEIRA LIVRE EM IGARASSU: UMA ANÁLISE A PARTIR DOS
DOIS CIRCUITOS DA ECONOMIA; A CONVIVÊNCIA DO
FORMAL E O INFORMAL.
Dissertação de Mestrado apresentada
ao Programa de Pós-Graduação em
Geografia do Departamento de
Geografia da Universidade Federal de
Pernambuco, para obtenção do grau
de Mestre.
Orientador: Professor Doutor Jan
Bitoun.
RECIFE
2008
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Trevisan, Emerson
A feira livre em Igarassu: uma análise a partir os dois circuitos da
economia; a convivência do formal e o informal / Emerson Trevisan
.
– Recife: O Autor, 2008.
118 folhas : il., fig., fotos, tab.
Dissertação (m
estrado)
Universidade Federal de Pernambuco.
CFCH. Geografia, 2008.
Inclui: bibliografia
1.
Geografia.
2.
Vida suburbana. 3. Urbanismo. 4
.
Feiras livres
Igarassu(PE). 5. Feirantes História. 6. Igarassu(PE) História.
I.
Título.
911
910
CDU (2. ed.)
CDD (22. ed.)
UFPE
BCFCH2008/66
Dedico este trabalho às minhas três
eternas paixões: Sú, Manana e Nati. São
vocês que dão sentido e alegria à minha
vida. Agradeço por fazerem parte deste
momento tão especial de minha
existência.
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Jan Bitoun, pelo auxílio em todas as fases da pesquisa e
pela paciência durante a redação da dissertação.
Ao professor Cláudio Castilho, pelas ponderadas colaborações e conversas
que ajudaram em muito para o entendimento do tema.
À minha esposa, pelo auxílio com a correção do Português; minha fraqueza.
Ao professor e historiador Guilherme Jorge Paes Barreto Neto, pela grande
colaboração com os dados do Município de Igarassu, sem essa cooperação não
seria possível a conclusão dessa pesquisa.
Aos feirantes pela colaboração sempre prestativa e solidária, provando a
hospitalidade e solidariedade do povo nordestino.
Às recepcionistas da biblioteca da CODEPE/FIDEM, que sempre tiveram
presteza e carinho no atendimento.
Aos meus alunos do Ponto Cidadão, pelo incentivo.
Enfim a todos que, de alguma forma colaboraram para minha formação
acadêmica.
Oh Josué eu nunca ví tamanha desgraça
Quanto mais miséria tem, mais urubu ameaça
Peguei o balaio, fui na feira roubar tomate e cebola
Ia passando uma véia, pegou a minha cenoura
Aí minha véia, deixa a cenoura aquí
Com a barriga vazia não consigo dormir
E com o bucho mais cheio comecei a pensar
Que eu me organizando posso desorganizar
Que eu desorganizando posso me organizar
Que eu me organizando posso desorganizar
Chico Science
RESUMO
O presente trabalho tem o objetivo geral de compreender as dinâmicas, no espaço
da Feira Livre de Igarassu, PE, distante 27 km da capital do estado de Pernambuco: Recife.
Entre os objetivos específicos estão: compreender o processo histórico da feira livre de
Igarassu; entender a formatação do espaço da feira livre por meio de suas materialidades e
das ações que garantem o movimento comercial; verificar a posição geográfica de Igarassu
e da feira livre, por meio de ortofotocartas, fotos aéreas e de satélites para entender sua
relação com seu entorno; investigar a importância da feira para seus usuários e
trabalhadores, não no âmbito econômico, mas também no social. Formula-se a hipótese
que as dinâmicas espaciais da Feira Livre ocorrem, em grande parte, devido a sua
localização entre o urbano/ rural. Para atingir os objetivos propostos, foram realizados os
seguintes procedimentos metodológicos: levantamento cartográfico da Cidade de Igarassu e
seu entorno, para a localização da Feira Livre de Igarassu e sua área de influência;
entrevistas com feirantes, por meio de histórias de vida, e com os consumidores por meio de
questionários quantitativos; levantamento quantitativo dos objetos que compõem a estrutura
da feira, da quantidade de feirantes, da quantidade de estabelecimentos comerciários de
serviços no entorno do objeto de estudo, da estimativa de consumidores do município e da
região; levantamento bibliográfico; tratamento e interpretação dos dados. Averiguamos que
a posição geográfica da Feira Livre colabora para diversidade de atividades econômicas e
sociais ocorridas em seu espaço. Ressaltamos a importância deste espaço para a vida
econômica de social do município. Encontramos, na relação entre atividades formais e
informais, uma das condições que garantem ao espaço da feira uma centralidade em
relação a sua região.
Palavras Chave: Feira Livre, Centro Comercial, Igarassu, Pernambuco.
ABSTRACT
The present work has the general objective to understand the dynamic, in the space
of the Free Fair of Igarassu, PE, distant 27 km of the capital of the state of Pernambuco:
Recife. Between the specific objectives they are: to understand the historical process of the
free fair of Igarassu; to understand the formatting of the space of the free fair by means of its
materiality and of the actions that guaranty the commercial movement; to verify the
geographic position of Igarassu and the free fair, by means of ortofotocartas, aerial photos
and of satellites to understand its relation with its surrounding areas; to investigate the
importance of the fair for its users and workers, not only in the economic scope, but also in
the social one. It is formulated hypothesis that the space dynamic of the Free Fair occur, to a
large extent, due its urban localization between the agricultural one. To reach the considered
objectives, the following methodological procedures had been carried through: cartographic
survey of the City of Igarassu and its surrounding areas, for the localization of the Free Fair
of Igarassu and its area of influence; interviews with worker fair, by means of histories of life,
and with the consumers by means of quantitative questionnaires; quantitative survey of the
objects that compose the structure of the fair, of the amount of worker fair, the amount of
establishments commercial employees of services in surrounding areas of the study object,
of the estimate of consumers of the city and the region; bibliographical survey; treatment and
interpretation of the data. We inquire that the geographic position of the Free Fair
collaborates for diversity of occurred economic and social activities in its space. We stand
out the importance of this space for the economic life of social of the city. We find, in the
relation between formal and informal activities, one of the conditions that guaranty to the
space of the fair a center in relation its region.
Keywords: Free fair, Commercial Centre, Igarassu, Pernambuco.
LISTA DE TABELAS
Página
Tabela 01 Produção agrícola municipal 2005.................................................. 25
Tabela 02 Sinopse preliminar do censo demográfico 2000 – Pernambuco.... 36
Tabela 03 Evolução da população do Município de Igarassu– 1970-2007......
40
Tabela 04 Tempo de trabalho dos feirantes nas tarimbas............................... 65
Tabela 05 Tabela dos tipos de boxes e sua quantidade.................................. 69
Tabela 06 Relação dos tipos de boxes quanto ao trabalhador........................ 71
Tabela 07 Relação dos equipamentos urbanos do entorno da feira livre de
Igarassu...........................................................................................
81
Tabela 08 Relação dos equipamentos privados do entorno da feira livre........
82
Tabela 09 Características dos Dois Circuitos da Economia Urbana de
Países Subdesenvolvidos...............................................................
90
Tabela 10 10 maiores PIB das cidades de Pernambuco................................. 97
Tabela 11 Tabela de tendência de local de compra dos consumidores da
feira..................................................................................................
102
Tabela 12 Tabela procedência dos consumidores da feira.............................. 102
LISTA FOTOGRAFIAS
Página
Foto 01 Vista da câmara municipal, dos bairros; vila da Chesf e
Beira-mar 2..............................................................................
26
Foto 02 Veículos de transportes de turistas no sitio histórico de
Igarassu....................................................................................
39
Foto 03 Representação do movimento da feira.................................... 49
Foto 04 Mercado municipal e feira livre de Igarassu 1955....................
51
Foto 05 Largo da feira........................................................................... 52
Foto 06 Foto aérea do sítio histórico de Igarassu 1981........................
53
Foto 07 Foto aérea do sítio histórico de Igarassu 1998........................
54
Foto 08 Foto do centro comercial Dalila vera cruz 1984....................... 56
Foto 09 Foto de uma tarimba na feira livre de Igarassu........................
62
Foto 10 Foto da tarimba de produtos diversos......................................
63
Foto 11 Foto da tarimba com roupas usadas........................................
64
Foto 12 Rua Jerônimo Cavalcante aos sábados.................................. 66
Foto 13 Foto de uma das ruas da feira com ambulantes...................... 67
Foto 14 Foto de boxes na feira livre de Igarassu.................................. 70
Foto 15 Foto do mercado da carne na feira de Igarassu em um
sábado......................................................................................
72
Foto 16 Foto de Box de carne fora do mercado das carnes................. 73
Foto 17 Foto do espaço para comercio de peixes e frutos do mar....... 74
Foto 18 Foto do mercado das farinhas................................................. 75
Foto 19 Foto da feira da sulanca...........................................................
76
Foto 20 Foto aérea do sítio histórico de Igarassu 1981........................ 77
Foto 21 Foto aérea do sítio histórico de Igarassu 1998....................... 80
Foto 22 Foto de um Box na rua das frutas, na feira livre de Igarassu.. 99
LISTA DE IMAGENS
Página
Imagem 01 Estuário do canal de Santa Cruz, Igarassu – PE..................
24
Imagem 02 Ortofotocartas de 1974, da cidade de Igarassu às margens
da BR 101 norte....................................................................
34
Imagem 03 Às ortofotocartas de 1989, da cidade de Igarassu margens
da BR 101 norte....................................................................
35
Imagem 04 Configuração da feira livre de Igarassu................................ 58
Imagem 05 Configuração das tarimbas padrão.......................................
59
Imagem 06 Rede de transporte alternativo de Igarassu..........................
84
Imagem 07 Imagem do fluxo das cidades circunvizinhas e Distritos de
Igarassu................................................................................
104
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 01 Espacialização do Coqueiral e de outras culturas nos
Municípios de Igarassu e Itapissuma – 1995..........................
27
Figura 02 Expansão da mancha urbana................................................. 32
Figura 03 Sistema integrado de transporte urbano da RMR...................
37
Figura 04 Loteamentos existentes em Igarassu perímetro urbano legal
– 2000.....................................................................................
42
Figura 05 Disposição da Tarimbas na Feira Livre de Igarassu............... 62
SUMÁRIO
Página
Resumo.......................................................................................................... 07
Abstract..........................................................................................................
08
Lista de Tabelas..............................................................................................
09
Lista de fotografias......................................................................................... 10
Lista de Imagens.............................................................................................
11
Lista de Figuras.............................................................................................. 12
Lista de Mapas................................................................................................
13
Introdução......................................................................................................
15
Capitulo 1
.
O Espaço Urbano de Igarassu: a fronteira entre o urbano e o
rural.................................................................................................................
20
1.1 - Igarassu, História e Heranças........................................................ 20
1.2 - A expansão da mancha urbana: a Região Metropolitana e seus
Eixos.......................................................................................................
29
1.3 - Igarassu na expansão da mancha urbana da RMR:
transformações e adaptações................................................................
40
Capitulo 2.
A feira livre de Igarassu, características, influências e
importância regional.....................................................................................
45
2.1- Feira no Brasil e no Nordeste..........................................................
45
2.2- Feira de Igarassu no crescimento da mancha urbana e suas
transformações.......................................................................................
50
2.3 - Feira de Igarassu fixos, fluxos e flexíveis....................................... 58
2.3.1- Feira Livre..........................................................................................
59
2.3.2- Os boxes, espaços de diferenciados.................................................
68
2.3.3- Mercado da Carne, Mercado da Farinha e Feira da
Sulanca.................................................................................................
71
2.4- Feira Livre: seu entorno e sua centralidade..............................................
77
Capitulo 3: Os dois circuitos da economia: o formal e o informal em
convivência na feira livre em Igarassu.......................................................
85
3.1- O Espaço Geográfico; uma construção humana............................
85
3.1.1 O circuito Superior....................................................................
91
3.1.2 O Circuito Inferior....................................................................
93
3.2 Os Dois Circuitos e a Feira Livre de Igarassu.................................
95
3.2.1 Feira Livre e o Circuito Superior: o formal no espaço informal
95
3.2.2 Feira Livre e o Circuito Inferior: o espaço informal, instável e
contraditório........................................................................................
97
3.3 A Feira Livre de Igarassu, o Circuito Superior e Circuito Inferior: A
convivência do formal e informal num espaço de lutas..........................
101
Considerações Finais.....................................................................................
106
Referências Bibliográficas..............................................................................
110
Anexos............................................................................................................
115
15
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem origem na observação, que se transformou em
inquietação, de uma cena do cotidiano. Um ambulante comercializando “macaxeira”
na porta de um supermercado. Esta cena era incomum na realidade do autor que
acostumado em seu lugar com os hipermercados, não compreendia de que forma tal
comerciante competia com um agente do capitalismo moderno.
Com esse pano de fundo, essa dissertação tem como objetivo a tentativa de
compreender as dinâmicas sócio-espaciais, bem como a construção do espaço da
Feira Livre de Igarassu –PE.
Constatando o dinamismo presente no espaço da feira livre, busca-se
entender, num determinado contexto histórico e espacial, a relação socioeconômica
que consolidou um lugar de intensas e diversas relações comerciais.
Para um melhor entendimento, procuramos inteirar-nos dos conceitos de
espaço, algo imprescindível para compreender o problema apresentado na
pesquisa, refletindo sobre tais conceituações e sua importância.
Para abordar as instalações físicas da feira e os movimentos dos
consumidores e dos vendedores buscamos em Santos (2006, pag.63) o conceito de
espaço: “O espaço é formado por um conjunto, indissociável, solidário e também
contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados
isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá”. Reconheceu-se,
na seqüência dos momentos históricos: a criação do espaço da feira livre; quais as
forças que atuaram na sua construção; os movimentos de adaptação pelos quais
esta estrutura comercial passou; e as influências da atualidade em sua dinâmica.
16
Indagou-se acerca da importância da modernização da economia para a
transformação do lugar: Como esse processo de modernização da economia urbana
de países subdesenvolvidos operou a divisão do espaço configurando estruturas
comerciais para poucos abastados e outras para muitos com condições precárias de
acesso ao consumo de bens e serviços.
Nesta cisão, surge a criação de subsistemas na forma de circuitos da
economia urbana, em Circuito Superior, cuja principal característica é o capital
intensivo e em Circuito Inferior, estruturado no trabalho intensivo. Esse ligado ao
setor informal da economia, aquele ao setor formal e moderno. Dois subsistemas
dentro de um sistema, no qual todas as formas de trabalho estão integradas, com a
mesma origem: a modernização. Criando um movimento de organização e
reorganização do espaço dos países subdesenvolvidos.
Deste movimento resulta, segundo Santos (2006: pag. 21) “um espaço
descontínuo, instável e igualmente multipolarizado, resultado de uma grande
instabilidade na organização do espaço com repetidos desequilíbrios e
ajustamentos”. Marcado pela diferença na renda da sociedade, gera uma
hierarquização expressa no nível regional; e, na escala local, provoca a coexistência
de atividades de mesma natureza, mas de níveis diferentes, em modos de
organização, uso da tecnologia e do trabalho.
Dessa forma, os resultados dessa modernização no estado de Pernambuco,
e mais precisamente no município de Igarassu, influenciaram no processo de
formação espacial, a depender de como as ações governamentais e privadas
adaptaram-se ao processo de modernização.
17
Nas cadas de 1980 e 1990 a Região Metropolitana de Recife
1
, passa por
processos de reconstrução das diretrizes da expansão
2
desta região, baseados nos
princípios da modernização. Partindo de Recife, núcleo radiador desse processo, e
por meio de eixos de desenvolvimentos, tendo como balizador as estradas que
penetram o território pernambucano. A expansão da mancha urbana vai chegar a
Igarassu pelo eixo Norte, seguindo a BR 101 Norte.
No município de Igarassu, ocorre paralelamente a essas ações uma
reestruturação do espaço urbano da cidade, com obras de infra-estrutura e
incentivos para as indústrias; agentes da modernização. Entre essas obras de
reestruturação, está a construção de uma nova área para a Feira Livre desta cidade.
A feira é tradicionalmente um espaço privilegiado para as relações econômicas e
sociais, especialmente no Nordeste Brasileiro.
Essas transformações, tanto da dinâmica urbana metropolitana quanto do
espaço da feira de Igarassu, provocaram uma reestruturação das atividades
comerciais tais como se desenvolviam em período anterior que procuramos resgatar
com base em documentos e depoimentos.
Para tentar explicar essas transformações, procuramos suporte em
conceitos necessários para a compreensão das transformações do espaço regional
e local: o estudo da localização do Município de Igarassu, em relação ao urbano e
rural; a reestruturação do espaço da Feira Livre de Igarassu, como se deu e qual
seu resultado; as dinâmicas atuais na Feira Livre; e as relações nesse espaço dos
Dois Circuitos da Economia Urbana dos países Subdesenvolvidos. Bem como
1
Capital do Estado de Pernambuco.
2
Plano Diretor da Região Metropolitana do Recife: Metrópole 2010.
18
desenvolvemos no trabalho os seguintes procedimentos metodológicos: a
recontagem dos elementos “fixos” pertencentes ao espaço da feira livre; a realização
de 500 entrevistas com consumidores da feira e 85 com feirantes; pesquisa nos
arquivos da Prefeitura Municipal de Igarassu; levantamento fotográfico do local e seu
entorno; confecção de mapas, figuras e planilhas com os dados recolhidos durante a
pesquisa de campo.
Para uma melhor estruturação do resultado da pesquisa, este estudo foi
dividido em três capítulos.
No primeiro buscamos entender o processo de formação espacial do
Município de Igarassu, ressaltando, nas origens da colonização, especificidades
baseadas no uso da terra pela cultura de cana-de-açúcar e na exploração do meio
litorâneo, mais precisamente dos manguezais e da cultura do coco, planta de origem
asiática que se tornou parte da paisagem cultural do local. Na tentativa de explicar a
influência da posição geográfica na dinâmica da feira livre, originalmente inserida
num contexto rural, identificamos a expansão da mancha urbana da Região
Metropolitana Recife suas formas de penetração no território bem como as
transformações sofridas no decorrer da urbanização parcial do município.
No segundo capítulo, procuramos descrever, com base em fontes
bibliográficas, a evolução das feiras no território brasileiro, mostrando a importância
destas para o Nordeste do país, relatando os tipos de feiras existentes. Resgata-se
a história recente da feira de Igarassu, com base em documentos e depoimentos, e
descrevem-se quais suas atuais instalações físicas, com base em levantamentos de
campo, que revelam constantes transformações e adaptações em seu espaço, mas
também no seu entorno.
19
No capítulo três, buscamos de modo introdutório a futuros aprofundamentos,
nos afastar da empiria, recorrendo ao embasamento teórico, especificamente à
concepção dos Dois Circuitos da Economia de Países Subdesenvolvidos
3
e seus
rebatimentos na produção do espaço. Procuramos identificar as atividades na feira
que se inserem em cada circuito e vislumbrar a inter-relação que se realiza entre os
dois circuitos no espaço da feira livre, que se configura cada vez mais como o
núcleo de um Centro Comercial de alcance médio nos confins urbano/rural da parte
norte da aglomeração metropolitana
3
O Espaço Dividido: Os Dois Circuitos da Economia Urbana dos Países Subdesenvolvidos. São
Paulo: EDUSP, 2004.
20
1. O Espaço Urbano de Igarassu: a fronteira entre o urbano e o
rural.
Neste capítulo, buscaremos abordar a localização do município de Igarassu,
evidenciando as características de um município integrado à mancha urbana da área
metropolitana de Recife, capital do estado de Pernambuco e situado na fronteira
desta área metrópole com a zona rural litorânea norte do estado. Ressalta-se como
estas características influenciam os processos de fixação de sua população neste
espaço, colaborando para a formação da Feira Livre de Igarassu, nosso objeto de
estudo.
1.1 Igarassu, História e Heranças:
Fundado em 1535 o município de Igarassu é citado por alguns historiadores
como o mais antigo núcleo de povoação do país. Não é nossa intenção, nem
pretensão analisar em sua totalidade a história de Igarassu, mas sim fazer alguns
resgates que percebemos relevantes no processo de ocupação e formação do
espaço do atual município. Considerando as colocações acima feitas, o conceito de
espaço que permite a reflexão é aquele formulado por Santos (2006, p. 63), “O
espaço é formado por um conjunto, indissociável, solidário e também contraditório,
de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas
como o quadro único no qual a história se dá”. Então, o espaço é o local onde são
realizadas todas as ações humanas, nele o homem relaciona-se com seus
semelhantes criando o espaço social onde desenvolve as relações sociais, com os
animais selvagens e domésticos, com a natureza em seu próprio tempo.
No processo histórico de ocupação do município de Igarassu, desde a época
da colonização portuguesa, principalmente no Nordeste brasileiro
, a cultura da cana-
21
de-açúcar foi o principal fator de fixação do homem em terras brasileiras, conforme
relata Diegues Junior, (1952, pag. 21) “A colonização do Nordeste começou com a
construção de engenhos. Foi o açúcar o motivo da colonização, isto é, o fator a
prender o elemento humano à terra”. Sendo assim Igarassu é um município, da
região metropolitana do grande Recife em Pernambuco, localizado na micro-região de
Itamaracá, na meso-região de Recife no estado de Pernambuco região Nordeste,
influenciado pelas características socioeconômicas da cultura de cana-de-açúcar.
A cultura de cana-de-açúcar tem como principal característica a exclusividade,
tanto no tocante à necessidade de grandes extensões de terra, quanto no domínio
sobre outras culturas, principalmente as de subsistências. Esta característica vai
marcar a ocupação das terras do litoral Nordestino Brasileiro, com ênfase para os
estados de Pernambuco, Alagoas e Sergipe. Dentre as principais causas desta
invasão no território Nordestino, podemos citar duas que influenciaram as relações
socioeconômicas e ambientais até os presentes dias.
A primeira corresponde à destruição em quase sua totalidade da Mata
Atlântica, para a limpeza da área e o plantio da cana, que no decorrer do processo
histórico vai se ampliando; e também à utilização de madeiras nobres nas
construções de casas, capelas e engenhos, bem como à queima da lenha para a
geração de energia no método de produção do açúcar:
Foi na área de mata onde se implantou a economia agrária como
base do processo de colonização portuguesa no Brasil. O que se
encontrou de floresta ou de mata, pelo colonizador, teve utilização
fundamental para que pudesse fixar-se uma cultura sedentária como
a da cana-de-açúcar. As árvores constituíam, por muitos motivos,
uma necessidade para os engenhos: para lenha das fornalhas, para
edificações casa grande, capela, casa de engenho para o
preparo de certas peças necessárias ao engenho, para o fabrico das
caixas de açúcar. E sua derrubada abria terreno para plantar-se
cana. (DIEGUES JUNIOR, 1952, pag. 27)
22
A segunda corresponde à transformação do modo de produção do açúcar,
passando em fins do culo XIX e início do século XX dos engenhos, base da
ocupação e fixação do homem no Nordeste, para as usinas, acentuando ainda mais
a exclusividade e necessidade de terras para o plantio da cana.
Enquanto os engenhos eram dotados de uma estrutura quase familiar com
casa grande, senzala, casa de colonos; as usinas, um dos primeiros produtos da era
industrial, passam por uma transição de trabalho semi-artesanal, para um processo
industrial, necessitando assim de mais matéria-prima, e para isso de toda a terra
disponível para o plantio da cana.
Esse exclusivismo da monocultura da cana tem reflexos devastadores na vida
da população, que produzia nas terras do entorno dos engenhos, gêneros de
subsistência. Terras estas que foram incorporadas principalmente para plantio e
corte da cana:
O exclusivismo açucareiro relacionou-se intimamente à população
agrária do nordeste; condicionou as linhas de sua formação, as
diretrizes de seu desenvolvimento; condicionou também seu meio de
vida, seu padrão social, suas contingências econômicas. Domínio
quase absoluto desde cedo sujeitou à população da área açucareira
do nordeste, este implemento pela monocultura da cana (Idem 1952,
pag.193).
Com essa transição dos engenhos para as usinas, números crescentes de
famílias de trabalhadores agrícolas passam a viver nas periferias das cidades, tendo
este papel de prestação de serviços, entre eles bancários e administrativos. Nesta
mudança, saem também do campo os senhores de engenho que perdem seu poder
político, que, com o advento das usinas passaram de produtores para
fornecedores de matéria-prima. Bem como o trabalhador rural que nesse processo
torna-se proletário do campo. Com isto ocorre o surgimento, nas periferias das
cidades, das “favelas”, conforme afirma
(ANDRADE, 1988: pag. 559)
:
23
Outro aspecto a ser destacado é o surgimento, a partir da década de
Sessenta, com a proletarização do trabalho rural, de verdadeiras
“favelas” na periferia urbana habitadas por famílias que deixam de
residir em terras dos engenhos, mas que continuam exercendo a
atividade rural, com deslocamentos diários. São os trabalhadores
denominados por analogia aos de condições bastante semelhantes
no Sudeste, de “bóias frias”.
Nessas condições de exclusivismo e segmentação da população, as feiras
têm um papel importante, o em produtos de subsistência e primeira
necessidade, mas também na venda de roupas, chapéus, alpargatas, etc. Trazidos e
comercializados nestes espaços, que também serviam para o contato do homem da
área canavieira com o mundo exterior, tornando-se assim um espaço não de
comércio como de convívio social. Sendo situada em Igarassu, segundo Diegues
Junior (1958) uma das primeiras feiras de gado do nordeste e corroborado por
Barreto Neto
1
que afirma em entrevista: “A feira de gado” em Igarassu era
exatamente onde hoje é o Centro Comercial, que posteriormente foi transferida para
a cidade de Goiana-PE. Fez então a feira o papel de integração entre o campo e a
cidade, fortalecendo assim a urbanização:
Atestando esses fatos, a feira semanal, de grande importância para a
economia urbana dos centros interioranos, tem características bem
peculiares no espaço de estudo. Funcionando como dia e local de
convergência das pessoas e produtos, faz com que este
acontecimento expresse o grau de relações entre campo cidade,
pois é nesse dia geralmente que o habitante rural dirige à cidade em
busca dos serviços que lhe são oferecidos e, em troca, transfere para
a economia urbana a renda gerada no campo. (ANDRADE, 1988:
pag. 555).
Outra característica do município de Igarassu é a presença dos mangues,
pois deles muitos pescadores tiraram e tiram sua alimentação e sustento, e também
da pesca em rios e no mar. Apesar da modesta participação da Região Nordeste e
1
Fonte: Historiador e Museólogo Jorge Guilherme Paes Barreto Neto, diretor do Museu Histórico de
Igarassu.
24
do Estado de Pernambuco
2
na produção pesqueira nacional – 11,7% e 0,5%,
respectivamente, a pesca desempenha importante papel na sobrevivência das
comunidades do Litoral e Zona da Mata Pernambucano, mesmo esta pesquisa, não
levar em conta a pesca para subsistência, mais praticada no Município de Igarassu.
Por ser artesanal, em pequena escala, e originalmente feita em rios e
estuários pelas famílias, serve num primeiro momento para o sustento; porém os
excedentes da pesca e da “cata” de crustáceos o comercializados na feira. Os
manguezais, paisagens naturais destes rios e estuários, no município de Igarassu
fazem parte da área estuarina de Pernambuco que ao todo ocupa uma extensão de
17.372ha, sendo bem caracterizado nas margens do rio são Domingos, que
atravessa o Sítio Histórico do município e nas margens do canal de Santa Cruz que
separa Igarassu da ilha de Itamaracá.
Imagem 01
ESTUÁRIO DO CANAL DE SANTA CRUZ, IGARASSU – PE.
Fonte: Google Earht.
2
Fonte: CPHR: Diagnóstico Socioambiental do Litoral Norte, 2003.
25
Como podemos perceber na imagem 01, o centro urbano de Igarassu está
intrinsecamente ligado aos manguezais, alguns bairros têm seu início literalmente
dentro dos mesmos. Esta proximidade faz desses bairros áreas de comunidades de
pescadores, que vão à busca do sustento nos mangues, criando uma cultura e
dinâmica diferenciada da modernidade, da industrialização e comercio de produtos
de alta tecnologia; tendo seu próprio ritmo de vida, agregando mais diversidade
cultural ao município, diversidade essa refletida na feira.
Integrada a essa paisagem cultural, formada em sua maioria pela cultura da
cana-de-açúcar, (mais adentrada ao continente) e pelos manguezais, (situados nos
estuários), encontramos também o coco, com o esplendor de seus altos coqueiros,
estes com relevância na formação do território do estado de Pernambuco,
representado até em seu hino: “Salve as terras dos altos coqueiros”
3
. O coco
também representa para Igarassu um marcante traço de sua paisagem cultural.
Sendo o terceiro produto agrícola do município, atrás somente da cana-de-açúcar e
mandioca, conforme observamos na tabela 01. Tendo importância econômica e nos
costumes alimentares de sua população.
Tabela 01
PRODUÇÃO AGRÍCOLA MUNICIPAL 2005
Culturas
Áreas
colhidas
(há)
Quantidade
Produzida
(t)
Rendimento
médio.
(Kg/ha)
Valor
(R$ 1.000)
Cana-de-açúcar 7.776
427.680 55.000 16.252
Mandioca 950
12.350 13.000 5.558
Coco-da-baía¹ 1.200
4.200 3.500 1.260
Limão 15
225 15.000 176
Banana 72
554 7.694 133
Abacate 18
360 20.000 108
Mamão 8
152 19.000 76
Abacaxi¹ 6
120 20.000 60
Batata-doce 15
60 4.000 54
Maracujá 3
45 15.000 36
Laranja 20
360 12.000 25
Castanha de caju 35
12 480 12
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal
3
Trecho do Hino de Pernambuco
26
( 1 ) Quantidade produzida em mil frutos e rendimentos médio em frutos por hectare.
Entretanto, é na paisagem de Igarassu que está marcada sua
representatividade. Como podemos observar na foto 02, os coqueirais; mesmo
sendo exóticos à paisagem natural do município de Igarassu, tornaram-se parte
integrante da paisagem cultural, sendo muitas vezes uma “cortina” que esconde a
urbanização da cidade, dando a esta um ar bucólico.
Foto 01
VISTA DA CÂMARA MUNICIPAL, DOS BAIRROS; VILA DA CHESF E BEIRA-MAR 2
Foto: Emerson Trevisan, dezembro de 2007.
O coco representa para Igarassu um importante produto agrícola, que a
produção de coco-da-baía, segundo Vasconcelos (2000), do estado de Pernambuco,
está concentrada na Mesorregião da Mata Pernambucana e Mesorregião
Metropolitana do Recife, respectivamente em 1997, detinham 9,4% e 20,7% da área
plantada no estado.
27
A produção do coco, ao contrário da cana-de-açúcar, é representada por
pequenas propriedades e que utilizavam técnicas rudimentares de cultivo, sem uso
de tecnologia e produção intensiva. Esta característica é um dos motivos que
levaram ao enfraquecimento da cultura do coco-da-baía, no município. E a
urbanização, que encontra resistência na cultura da cana, vai concorrer com áreas
dos coqueirais em seu processo de expansão, pois a cultura do coco está mais
próxima a urbanização e tem menor significado na economia local. Verificamos a
distribuição das áreas das culturas e urbanização no ano 1995, na Fig. 01.
Figura 01
ESPACIALIZAÇÃO DO COQUEIRAL E DE OUTRAS CULTURAS NOS MUNICÍPIOS DE IGARASSU
E ITAPISSUMA – 1995
28
Como podemos observar uma predominância da cultura de cana-de-
açúcar no território do município de Igarassu, bem como da proximidade da cultura
do coco do litoral e dos centros urbanos. Estas características de localização dão ao
município a especificidade de estar na região metropolitana, mas ainda ter ares de
cidade rural. Esta especificidade estará presente na feira, representante maior da
união dos espaços urbano e rural.
29
1.2 A expansão da mancha urbana: a Região Metropolitana e seus Eixos.
Estando marcada por suas especificidades, de cidade pequena como podemos
perceber:
“Igarassu, com suas igrejas, seu convento, seu recolhimento de
mulheres virtuosas, seu suntuoso edifício da Cadeia e da Câmara
era [no século XVIII] um pequeno centro urbano, onde funcionavam
dois curtumes. [...] Como outras cidades nordestinas desprovidas de
indústrias e dependentes da área rural que as cerca, Igarassu
possuía, em 1950, 2.116 habitantes. (ANDRADE, 1977, p. 24).
Mapa 01
FIGURA DO MUNICIPIO DE IGARASSU
Fonte: Secretaria de Planejamento, Meio Ambiente e Patrimônio Histórico.
30
Igarassu
4
apresentou até a década de 1970 uma estagnação em seu
crescimento, em partes devido a sua localização em relação ao núcleo de radiação
da expansão urbana da RMR
5
mostrada na fig. 02, bem como na resistência da
cana-de-açúcar em compartilhar seus espaços:
Houve várias tentativas de planejamento de uma estruturação da RMR
6
.
Esses processos tinham como base a cidade do Recife, capital do estado, e a partir
dali em eixos que seguiram para o norte, sul e oeste pelas antigas estradas de
penetração no território, esses três eixos se desdobra em seis ramos de
desenvolvimento urbano, dois para o norte, dois para o sul e dois para o oeste. Com
a instituição da RMR, segundo o Plano Metrópole 2010
7
, iniciou-se uma fase de
planejamento, apoiada em um modelo de organização espacial dominante na época,
segundo o qual deveria se fundamentar na intensidade de uso do solo. Ocupação
baseada na premissa da criação de nucleações de concentração a partir de
atividades industriais. Esse processo entendia que os órgãos do estado teriam um
rígido controle sobre a organização espacial, na tentativa de homogeneizar a RMR.
Esse planejamento da década de 1970, somente aumentou as diferenças
entre os municípios da região metropolitana do estado de Pernambuco, pois o setor
4
O município de Igarassu encontra-se localizado na micro-região de Itamaracá, da meso-região do
Recife e com acesso pelas rodovias BR 101 Norte e PE-15;
- 83’ 41’’ Latitude Sul - 34º 90’ 63’’
Longitude Oeste; Distante do Recife 28 Km; Área de 306 Km
2
(IBGE 2007); População de 93.748
(IBGE 2007). A palavra Igarassu é de origem tupi e significa: Igara = Canoa; Assu = Grande. A
Cidade, segundo a tradição, foi fundada em 27 de setembro de 1535, após a vitória dos portugueses
sobre os índios Caetés e por ordem do Capitão Afonso Gonçalves que mandou erigir no local da
vitória uma capela votiva consagrada aos Santos Cosme e Damião hoje considerada a mais antiga
do Brasil. Fonte: Instituto Histórico de Igarassu.
5
Região Metropolitana do Recife.
6
A partir da década de 1970 houve em Pernambuco um planejamento em escala metropolitana, de
forma tentacular em ramos de direção: Igarassu estava num dos seis ramos , que a partir de Recife
dirigiam-se dois para direção sul, dois para oeste e dois para o norte; dentre eles o ramo (BR
101norte). Este ramo está consolidado em torno da BR 101 norte.
7
Fonte: Fidem; Plano Diretor da Região Metropolitana do Recife, 1998. Elabora com intenção de
dinamizar as ações econômicas e diminuir as diferenças sociais da RMR.
31
que o baseou foi o industrial, este não teve no estado a importância de estruturação
dos espaços e crescimento econômico e social, como em outros estados.
Baseando-se na expansão da mancha urbana a partir de eixos e SUS ramos
de desenvolvimento; tendo como núcleo radiador a cidade do Recife, conforme
podemos notar na Fig.02 nas direções sul, norte e oeste, estes planos de
desenvolvimento
8
para a RMR tiveram como diretrizes a ocupação urbana do
território por meio das antigas estradas de penetração para o interior do Estado e
para os litorais norte e sul. Dentre elas a BR 101 Norte e a PE 35
9
, tendo passagem
pelo município de Igarassu. Também, constava das diretrizes o tratamento da
descontinuidade e semicontinuidade dos núcleos secundários de povoação da RMR,
prevendo-se ampliar a mancha urbana ao longo dos eixos garantindo a manutenção
de interstícios rurais entre os mesmos.
8
Entre eles o Plano Metrópole 2010, elaborado pela Fidem, Fundação de Desenvolvimento da
Região Metropolitana do Recife.
9
Rodovia estadual que faz a ligação entre os Municípios de Igarassu, Itapissuma e Itamaracá.
32
Figura 02
EXPANSÃO DA MANCHA URBANA
Fonte: Condepe- Fidem: Plano Metrópole 2010
As duplicações; no final da década de 1980 e durante a década de 1990, da
BR 101 Norte e PE 15
10
, melhorando consideravelmente o acesso à RMR Norte, vão
colaborar para a expansão da mancha urbana nos municípios dessa parte da
aglomeração. Outro fator que vem contribuir com essa expansão é, durante as
décadas de1970 e 1980, a construção de conjuntos habitacionais da COHAB; entre
eles Caetés I, II e III em Abreu e Lima; Maranguape 0, I, II e Arthur Lundgren, em
Paulista. Trazendo para estas áreas uma população que formaria a o de obra
para os distritos industriais também criados na mesma época, bem como para os
setores do comércio e serviços de Recife.
10
Rodovia estadual que faz a ligação da Cidade do Recife com os municípios da RMR Norte.
33
Com estas destas mudanças, Igarassu apresentou um bom crescimento
11
, no
caso específico da sede municipal, da ordem de 6,0% ao ano, no período 1970-1980
e de 5,8% ao ano, no período 1980-1991. Funcionando como “zona de
amortecimento” dos fluxos migratórios que se dirigem da Mata Setentrional para o
Núcleo Metropolitano, a partir dessa época, a cidade de Igarassu crescer, a cada
ano, a mancha urbana. Dentre os fatores que contribuem para as elevadas taxas de
crescimento do núcleo urbano de Igarassu
12
, figuram: a) sua proximidade do
mercado de trabalho metropolitano; b) o valor relativamente baixo do solo na
periferia desse núcleo urbano (sobretudo se comparado àquele das áreas correlatas
de Recife, Olinda e Paulista); c) a presença de granjas e sítios em torno da cidade,
gerando oportunidade de emprego para uma parcela da força de trabalho não
qualificada; d) a proximidade do estuário, de onde a população de baixa renda,
mormente a desempregada, retira parte de seu sustento.
De núcleo de povoação histórica; com poucas áreas de povoamento
baseadas na estrutura dos engenhos de cana-de-açúcar, o município vai ganhar um
grande número de loteamentos implantados em seu perímetro urbano, nas décadas
de oitenta e noventa (Loteamentos Encanto Igarassu - 1985; Projeto Verde Teto e
Centro Igarassu, em 1987; Condomínio Santa Cruz - 1993; Padre cero, Frei
Damião, Santa Bárbara, Rumo Leste e Privê Vila Harmonia, em 1994; Cortegada
1996; Parque Igarassu e Nova Holanda, em 1997; Bairro Novo de Monjope 1998,
entre outros).
Como podemos comprovar na imagem 02; os núcleos de povoamento de
Igarassu são localizados às margens da BR 101 Norte, e observamos também que
no começo da década de 1970, época da ortofotocartas, grande parte dos espaços
11
Fonte: IBGE
12
Fonte: Diagnóstico Socioambiental do Litoral Norte, CPRH, 2003.
34
eram usados para a plantação de cana-de-açúcar. Estes situados à esquerda da
imagem e os espaçamentos entre os núcleos de povoação à direita.
Imagem 02
ORTOFOTOCARTA DE 1974, DA CIDADE DE IGARASSU ÀS MARGENS DA BR 101 NORTE
Fonte: Condepe- Fidem; escala: 1:10.000
Se compararmos as imagens 02 e 03 tendo como base norteadora as
margens da BR 101 Norte, notaremos o crescimento acentuado da mancha urbana
e a resistência das plantações de cana-de-açúcar. Mesmo com a tentativa de
criação de um distrito industrial, aproveitando as facilidades do escoamento pela BR
101 norte.
35
Imagem 03
ÀS ORTOFOTOCARTA DE 1989, DA CIDADE DE IGARASSU MARGENS DA BR 101 NORTE
Fonte: Condepe- Fidem; escala : 1:10.000
Concomitante à ocupação planejada do solo urbano; proliferaram, em
Igarassu, as ocupações irregulares efetuadas tanto por meio de invasões em áreas
de antigos e novos loteamentos (Recanto Igarassu, Cortegada, São Vicente e
outros) como em áreas alagadas, margens de rios e estuários.
Estes loteamentos são em sua maioria localizados ou às margens da BR 101
Norte ou da PE 35, reforçando a forma de expansão da mancha urbana através dos
eixos viários. Preenchendo os espaços desde Recife, passando por Paulista, Abreu
e Lima, Igarassu, Itapissuma e Itamaracá.
Outra característica ficou evidenciada no município de Igarassu e vizinhos:
devido à forma de expansão da mancha urbana, bem como sua localização na
fronteira entre o periurbano e rural, foi o surgimento do fenômeno da segunda
36
residência
13
o em Igarassu devido aos vários trabalhadores que se deslocam
em direção ao núcleo irradiador da RMR do Recife, mas também a veranistas que
vão passar férias na cidade de Itamaracá, caracterizada por muitas casas de
veraneio. Como podemos observar na tabela 02, o número das casas particulares
com uso ocasional no município de Itamaracá e consideravelmente superior aos
demais municípios da RMR norte, comprovando a importância desse tipo de habitat
como as residências de veraneio, bem como as residências não ocupadas em
Igarassu que representam 16% das residências localizadas na área urbana do
município, caracterizando a segunda moradia presente na cidade.
Tabela 02
SINOPSE PRELIMINAR DO CENSO DEMOGRÁFICO 2000 – PERNAMBUCO
Domicílios recenseados, por espécie, segundo as Regiões Metropolitanas, os Municípios,
os Distritos que as compõem e a situação do domicílio
Regiões
Metropolitanas,
Municípios,
Distritos
que as
compõem
e situação do
domicílio
Domicílios recenseados
Total
Particulares
Coletivos
Total
Ocupados
Não ocupados
Total
Fechados
Uso
Ocasional
Vagos
Araçoiaba 3 843 3 843 3 405 438 19 51 368 -
Urbana 3 215 3 215 2 859 356 11 36 309 -
Rural 628 628 546 82 8 15 59 -
Igarassu 23 660 23 639 20 226 3 413 69 669 2 675 21
Urbana 21 606 21 595 18 669 2 926 57 463 2 406 11
Rural 2 054 2 044 1 557 487 12 206 269 10
Nova Cruz* 973 971 759 212 2 107 103 2
Urbana 229 229 174 55 1 41 13 -
Rural 744 742 585 157 1 66 90 2
13
“no Brasil, o aparecimento do fenômeno da segunda residência dá-se na década de 1950 sob a
égide do ‘nacional-desenvolvimentismo’ que foi responsável pela implantação da indústria
automobilística, pela ascensão do rodoviarismo como matriz principal dos transportes e pela
emergência de novos estratos sociais médios e urbanos que, aos poucos, começariam a incorporar
entre os seus valores sócio-culturais a ideologia do turismo e do lazer....O veraneio ou o descanso
dos fins de semana se transformaram em valor social cuja satisfação levaria o turismo, de um modo
muitas vezes predatório e desordenado, a regiões acessíveis a grandes centros urbanos do Centro-
Sul, e com atributos ambientais valorizados (zonas costeiras e/ou serranas), (BECKER 1995p. 10).
37
Três Ladeiras* 439 439 371 68 1 26 41 -
Urbana 245 245 228 17 - 4 13 -
Rural 194 194 143 51 1 22 28 -
Ilha de
Itamaracá
12 366 12 353 3 710 8 643 13 7 385 1 245 13
Urbana 11 929 11 919 3 357 8 562 13 7 348 1 201 10
Rural 437 434 353 81 - 37 44 3
Itapissuma 5 524 5 523 4 783 740 3 119 618 1
Urbana 4 514 4 514 3 956 558 3 94 461 -
Rural 1 010 1 009 827 182 - 25 157 1
Fonte: IBGE. Destaque do autor. * Distritos de Igarassu.
Essas características fazem de Igarassu uma cidade de passagem ora para
os trabalhadores que vão do norte da RMR para seus trabalhos em outras regiões
da mesma RMR, ora para veranistas em momentos de lazer. Já que a localização de
Igarassu possibilitou a formação de um entroncamento do transporte metropolitano,
por meio de um terminal do sistema integrado de transporte, obrigando a todos que
usam esse sistema à passagem por Igarassu, aumentando o fluxo de pessoas pela
cidade.
Figura 03
SISTEMA INTEGRADO DE TRANSPORTE URBANO DA RMR.
Fonte: EMTU-PE
38
Podemos observar na figura 03 como os eixos de expansão da RMR
se apóiam num sistema de transporte coletivo metropolitano. A partir do Recife, em
direção aos extremos Sul, Oeste e Norte da RMR, esse sistema vazão ao fluxo
de pessoas indo para o trabalho, e voltando para casa. No corredor Norte, notamos
a rede de transporte urbano da RMR, onde o terminal integrado de Igarassu é o
último ao norte, em relação à cidade do Recife, dando acesso a três municípios que
eram seus distritos e foram emancipados: Itamaracá (1955) Itapissuma (1982),
Araçoiaba (1995).
Corroborando com a particularidade de uma cidade de passagem, e por ser
considerada cidade turística e seu Sítio Histórico ser patrimônio histórico e cultural
14
,
Igarassu recebe um considerável fluxo de turistas que faz o caminho inverso ao dos
trabalhadores. Eles vêm de Recife em direção à Ilha de Itamaracá, um destino
turístico do litoral norte de Pernambuco. Como o acesso à ilha pode ser feito ou
pela PE 35, que passa obrigatoriamente por Igarassu ou por via marítima e que a
cidade tem riquezas históricas e arquitetônicas como a Igreja de Santos Cosme e
Damião
15
, a Pinacoteca do Convento de Santo Antonio
16
entre outros, Igarassu vem
a ser lugar de passagem e parada momentânea dos turistas que vão à Itamaracá.
14
Em 26 de setembro de 1935, graças ao Projeto de Lei do então Deputado Mário Melo, a cidade de
Igarassu é considerada Monumento Público Estadual. No dia 10 de outubro de 1972, visando
proteger e resguardar o rico acervo existente na cidade, o Governo Federal, através do IPHAN,
tombou o conjunto arquitetônico da nucleação histórica, com uma área de 0,4 Km² (396.202 m²).
15
A mais antiga do Brasil: Reza a tradição que os portugueses, após derrotarem os índios Caetés em
sangrenta batalha, ocorrida em 27 de setembro de 1535, graças à intercessão dos santos,
começaram a erguer um templo votivo consagrado aos irmãos gêmeos.
16
Instalado no antigo dormitório dos noviços do convento franciscano de Igarassu, construído em
1705, o Museu Pinacoteca foi criado por iniciativa do Dr. Aírton Carvalho, sendo aberto ao público em
agosto de 1957. Reúne 24 quadros/painéis dos séculos XVII e XVIII, oriundos da Sé de Olinda, Igreja
dos Santos Cosme e Damião e do próprio Convento. São destaques os quatro painéis votivos que
pertencem à matriz de Igarassu. É considerado como um dos mais importantes da América Latina.
39
Foto 02
VEICULOS DE TRANSPORTES DE TURISTAS NO SITIO HISTÓRICO DE IGARASSU
Foto: O autor.
Podemos observar veículos de transportes para turistas, que aguardam os
visitantes, na visitação aos pontos turísticos de Igarassu. Ao termino dessa visita os
mesmos serão levados para a Ilha de Itamaracá, principal destino turístico do Litoral
Norte de Pernambuco.
40
1.3 Igarassu na expansão da mancha urbana da RMR: transformações e
adaptações.
Com o crescimento da RMR, consequentemente o município de Igarassu,
mesmo desordenadamente, acompanhou a evolução e chegada da mancha urbana
em seu território. Como foi dito, até a década de 1970 o município tinha vivido um
tímido crescimento em relação a outros municípios da RMR. Com os planos de
expansão, que passaram a ter mais efetividade por parte dos órgãos
governamentais, Igarassu sofre um incremento em seu crescimento, conforme
podemos notar na tabela 03.
Tabela 03
EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DE IGARASSU – 1970-2007
Ano População
1970 37.584
1980 52.468
1991 68.507
1996 (contagem) 72.930
2000 82.277
2007 93.748
Fonte: IBGE
Percebemos dois fatos importantes, em primeiro; que o crescimento
populacional foi de mais de 140% em aproximadamente duas décadas e meia.
Segundo; que esse crescimento coincide com o período da expansão da RMR,
motivado pelos planos de expansão. Corroborando com esses fatores notaremos
que dois municípios da RMR Norte tiveram crescimento populacional maior que
Igarassu, foram eles: Paulista, com aproximadamente 580% e Abreu e Lima, com
aproximadamente 275%, para o mesmo período. Atentemos que quanto mais
próximo do núcleo de radiação da RMR do Recife, maior a taxa de crescimento.
41
Então para dar conta deste crescimento, o município de Igarassu teve que
adotar medidas para poder absorver essa população, bem como prover a cidade de
equipamentos que suprissem a expansão urbana, dando condições para sua
população sobreviver nessa nova época, correspondendo à transformação da
Igarassu rural em urbana.
Entre as ações tomadas pelas autoridades estaduais e municipais
17
vamos
citar aqui as mais relevantes e que vão culminar com a construção do centro
comercial onde se localiza a feira livre de Igarassu.
Dentre essas obras de estruturação podemos citar a duplicação da BR101
Norte entre Abreu e Lima e Igarassu, colaborando para a melhora do fluxo do
transporte de passageiros e cargas, diminuindo o tempo de viagem entre Recife e
Igarassu. Outra obra viária fundamental para a melhoria dos transportes foi a
duplicação da PE15; que liga as cidades de Olinda, Paulista e vai até a BR101 norte
na altura da cidade de Abreu e Lima, interligando de forma mais intensiva a RMR
norte, pois com a duplicação da PE15 construiu-se também uma via exclusiva para o
transporte urbano, diminuindo sensivelmente o tempo da viagem entre a RMR norte
e a cidade do Recife.
Outras medidas foram as construções de loteamentos e pequenos conjuntos
habitacionais que servem de moradia para as populações mais carentes, esses
conjuntos em sua maioria foram construídos nas periferias da cidade. Estes lugares,
antes de uso agrícola ou de ambiente natural, tornaram-se locais para a instalação
de moradias, pois os terrenos tinham custo baixo. Podemos notar na Fig. 04 que
17
Devemos destacar que as informações acima são baseadas em documentos encontrados do
Museu Histórico de Igarassu e foi sobre as duas gestões do Prefeito Clovis Lacerda nos períodos de
1969 a 1973 e 1977 a 1983, essas duas gestões foram registradas em dois documentos de
prestação de contas pelo então prefeito que foi base de nossa pesquisa, infelizmente os
subseqüentes assim não o fizeram.
42
esses conjuntos ainda seguem às margens da BR 101e PE 35, indo competir por
espaços com as plantações de coqueiros.
Figura 04
LOTEAMENTOS EXISTENTES EM IGARASSU PERÍMETRO URBANO LEGAL - 2000
43
No âmbito municipal entre 1969 a 1983 e 1977 a 1983, Igarassu sofreu uma
grande transformação no que se diz respeito a bases para uma estrutura urbana, por
meio do Projeto CURA
18
. Entre suas ações constam: A pavimentação de ruas; a
ampliação da iluminação pública; a construção de escolas na zona urbana e rural; a
implantação de postos de saúde e a construção e ampliação de dois centros
comerciais, um no distrito de Cruz do Rebouças com 403,60 m² e o centro comercial
da sede do município, com uma área total de 15.150,00 m² e 1.781,50 m², com
espaço para a feira livre de frutas e verduras, para feira de cerâmica e artesanato
em geral, 20 boxes para lojas.
Em entrevista com o Sr Clovis Lacerda Leite (prefeito que implantou o projeto
CURA em Igarassu), em 12/11/2007, este relata que as obras feitas em suas
gestões tinham: A intenção de tirar Igarassu do marasmo e fazer as bases para o
desenvolvimento da Cidade, condicionado o futuro do município a obras que
dessem uma estruturação para a industrialização tardia no município e que
dinamizassem o comércio.
Entre essas obras, o entrevistado destaca uma que “foi uma visão futurista e
desenvolvimentista, que aumentaria o dinamismo econômico da cidade, foi a
transferência da feira livre e construção de um novo espaço para esse comércio”.
18
Projeto do extinto BNH (Banco Nacional de Habitação), que visava estimular a urbanização de
espaços vazios. Em 30 de março de 1973, o Conselho de Administração do BNH pôs em vigor a
Resolução do Conselho de Administração RC 7/73, que dispunha sobre programa de
Complementação Urbana, a ser executado através de Projetos CURA Comunidade Urbana para
Recuperação Acelerada”. Em 6 de junho de 1973 a Diretoria do BNH pôs em vigor a Resolução da
Diretoria - RD 38/73, que aprova normas para financiamento, elaboração e execução de Planos
Plurianuais e Projetos de COMUNIDADE URBANA PARA RECUPERAÇÃO ACELERADA ( CURA) e
outras providências”. Eram objetivos básicos do CURA, entre outros, colocar à disposição das
administrações locais recursos financeiros para ações voltadas à urbanização, contribuir para a
ordenação racional do uso do solo e para a coordenação e integração dos investimentos urbanos.
Também se objetivava promover uma adequada oferta de equipamentos e serviços e aumentar a
oferta de terrenos urbanizados Essa ação se complementava com instrumentos legais de combate à
retenção especulativa de terras urbanas (“vazios urbanos”). (FEST, 2005, PAG. 47,48).
44
Sendo ainda, segundo o próprio Sr. Clovis Lacerda Leite, “uma das obras mais
importantes de suas administrações”.
Essas obras deram sustentação para o dito “desenvolvimentoeconômico e
social do município, sendo a construção da nova feira livre de vital importância não
só por ser um espaço que fornece o alimento de sua população, bem como dinamiza
e mantém economicamente a faixa mais carente dessa população, como
pretendemos mostrar no decorrer dessa pesquisa.
45
2. A feira livre de Igarassu, características, influências e
importância regional.
Neste capitulo, procuraremos mostrar uma pequena evolução histórica das
feiras no Brasil, e principalmente no Nordeste. Situaremos nesse contexto a feira
livre de Igarassu com suas especificidades, características e importância para a
economia e cultural local e regional.
2.1 Feira no Brasil e no Nordeste.
As feiras chegam ao Brasil com os Portugueses, baseadas nas feiras
européias. Constituindo uma inovação em nossas terras, que para o nativo esta
forma de comercio é totalmente estranha, pois estava acostumado à troca
1
. As
primeiras feiras no Brasil são originadas das necessidades da população
colonizadora que aqui chegou para apropriar-se e ocupar imensos espaços
decorrentes da conquista portuguesa; como nossa colonização foi baseada na
exploração, e que uma das primeiras formas de colonização que fez uso do solo foi
a plantação de cana-de-açúcar, já citada por seu exclusivismo, os colonizadores vão
buscar formas de trazer os alimentos e utensílios para esta população.
A primeira referência das feiras no Brasil data de 1548, quando o Rei D. João
III na tentativa de evitar que os colonos se dirigissem às aldeias, ordenou que se
fizesse um dia de feira para que os gentios viessem à cidade comerciar seus
1
De acordo com o viajante quinhentista Jean de Léry, os tupinambá ao comerciarem
com os goitacá procuravam manter uma distância relativa em torno de 100m uns dos outros,
deixando os produtos a serem trocados na metade desta distância. Findo o escambo, também
se rompia a trégua e transposto o limite do local destinado ao encontro, punham-se ao encalço
dos inimigos na tentativa de reaverem as suas mercadorias (LÉRY, 1951, p. 72).
46
produtos e comprar o que necessitassem (MOTT, 1976, p. 83). Partindo do princípio
que os mesmos estavam acostumados a reunir seus artigos de troca na praia
para a posterior negociação, estas feiras acabaram por não se realizar. Por este
motivo não se realizaram feiras na colônia durante os séculos XVI e XVII, não sendo
registrados qualquer ocorrência das mesmas nos documentos oficiais ou relatos de
viajantes (MOTT, 1975, p. 307).
As partir do culo XVII, surgem com mais intensidade as feiras de gado,
que abasteciam as cidades com seus produtos. O gado era trazido da zona rural
onde era engordado e para o futura comercialização nas cidades, destacando-se
que:
No Brasil havia, por esta época, dois tipos de feiras. A Feira de
Mercado, realizada aos sábados para o abastecimento alimentar da
população da cidade e das redondezas e a Feira Franca, realizada
anual ou bi-anualmente destinada à comercialização de bens
regionais como o gado e por isto atraiam grande número de
compradores e vendedores das mais distantes regiões. (negrito do
autor) (PAZERA, 2003. Pag. 26).
Exemplos dessas feiras são: a feira de burros de Sorocaba (SP), a feira de
Santana (BA), Laranjeiras (SE) e Goiana (PE), feira essa que teve origem em
Igarassu, como citamos anteriormente e por coincidência se localizava no mesmo
espaço onde atualmente a feira livre de Igarassu.
No decorrer da história e principalmente durante o processo de
industrialização brasileiro, que ocorreu no território de forma diversa e desigual, as
feiras vão ter diferentes significados conforme sua localização. Podemos verificar a
existência das feiras livres nas grandes cidades, onde:
“A feira Livre consiste em modalidade periódica de comercio
varejista amplamente dispersa pela cidade do Rio de Janeiro,
desempenhando importante papel no abastecimento urbano,
sobretudo no setor alimentar.” (JESSUS 1992)
47
Então as feiras terão conforme sua localização um formato diferenciado, que
pode variar, em sua periodicidade; nas grandes cidades as feiras são diárias, porém
em locais diferentes, em contrapartida as feiras locais das pequenas cidades têm um
mesmo local, com periodicidade de uma vez por semana. Outra distinção que
podemos observar são as feiras regionais, que têm uma abrangência e importância
para certas regiões como, por exemplo, a feira de Campina Grande na Paraíba, feira
de Caruaru em Pernambuco, que traduzem certa centralidade a partir da área de
influência dessas cidades.
No Nordeste encontram-se basicamente dois tipos de feiras: as dos grandes
centros urbanos, como o exemplo da Cidade do Recife
2
, com toda uma estrutura de
comércio regular e as pequenas feiras espalhadas por todo o interior. Estas podem
ser consideradas como remanescentes das feiras tradicionais, onde o agricultor,
artesão e criador se transformam em comerciantes. Neste tipo de feira o
comerciante esporádico vende o que possui em excesso para adquirir os gêneros de
sua necessidade. Este tipo de feira ocorre com mais intensidade nos menores e
mais rústicos povoados, quer do Litoral quer do Sertão. Com base no tipo de região
em que ocorrem é possível se fazer a distinção de dois grupos, conforme a
classificação muito bem estabelecida por Bernardo Issler (ISSLER, 1965, p. 37):
Feiras de Zona de Transição.
Feiras de Zonas Típicas.
As feiras de zona de transição ocorrem nas faixas de transição entre duas
zonas geograficamente diferentes: Zona da Mata-Sertão; Brejo-Agreste. Esta
localização vai possibilitar que produtos característicos de cada área sejam
trocados. Desta forma estas feiras apresentam uma variedade de produtos
2
Feiras Livres do Recife: As feiras livres são administradas pela Companhia de Serviços Urbanos do
Recife (CSURB). São 27 feiras livre, num total de 3.600 bancas em toda a cidade.
48
significativa, que vão desde frutas e legumes até produtos industrializados. Outro
ponto a ser considerado é que, em geral, nestas zonas de transição há o domínio da
pequena e média propriedade, o que propicia condições para que um número maior
de agricultores participe da feira.
As feiras de zonas típicas são as existentes no interior de zonas geográficas
bem definidas. Quando comparadas às das zonas de transição são menores e mais
pobres, resumindo-se a umas poucas barracas com produtos de consumo
indispensável e algumas de artesanato e confecção. Por ser uma zona onde a
pobreza é generalizada, principalmente no Sertão, a presença do produtor como
comerciante quase não se faz notar. Quase todo mundo possui uma roça, mesmo
que bem pequena, ou não possui condição de comprar o que é oferecido na feira.
Catolé do Rocha, no Sertão paraibano, Mamanguape, na Zona da Mata paraibana e
Angicos no Sertão do Rio Grande do Norte, são alguns exemplos deste tipo de feira
(ISSLER, 1965, p.36).
Como poderemos observar a feira de Igarassu, guardada as devidas
proporções e pela sua localização, tem características de diversos formatos de feiras
livres aqui apresentados, mostrando uma especificidade que a torna um misto de
feira livre das grandes cidades e feira regional com sua centralidade.
Porém as feiras são mais que um espaço para a realização de comercio;
caracterizam a formação de um espaço público favorecendo iniciativas individuais,
onde pessoas podem vender e comprar, diversos tipos de produtos, buscarem por
serviços, bem como usá-las como um ponto de encontro, de discussões e diálogos,
um espaço que pode adquirir diversas formas e objetivos, essas características
ficam acentuadas no Nordeste, onde:
49
A feira nordestina não é um simples local de compra e venda de
mercadorias; mais do que isto é o local privilegiado onde se desenvolvem
uma série de relações sociais.. É um fenômeno muito importante na vida
econômica e social do Nordeste brasileiro...”.
(PAZERRA, 1987; pag. 654).
Portanto a feira tem um grande significado na vida do nordestino, pois,
conforme perguntado a um morador de Igarassu, que freqüenta um hipermercado,
espaço criado na modernidade para comercializar todos os tipos de mercadorias,
das frutas e verduras, a moveis e peças para automóveis, o que ele vai fazer,
responde: “Vou fazer feira.” Pois as compras sempre foram feitas na feira.
Foto 03
REPRESENTAÇÃO DO MOVIMENTO DA FEIRA
Foto: Emerson Trevisan, Janeiro de 2008
A figura 05 mostra bem como os espaços da feira permitem iniciativas
individuais, pois nela podemos observar como a compra de produtos pode ser feita
50
informalmente sem a interferência de nenhum ator do estado para “organizar” ou
“padronizar” a forma de comércio, fortalecendo culturalmente a ação de comprar ao
“fazer a feira”. Essa característica da forma de organização do espaço, com ações
não planejadas e moldadas para as diversas situações, faz das feiras espaços
férteis para a flexibilização tanto do espaço como das ações.
2.2 Feira de Igarassu no crescimento da mancha urbana e suas
transformações.
Como foi observada anteriormente, a feira de Igarassu foi uma das
primeiras feiras de gado do território brasileiro, por coincidência, na atual Feira
ocupa o mesmo espaço onde hoje ocorre a feira. Mas, esta feira foi transferida, por
volta de 1785, para a cidade de Goiana-PE, onde se tornou tradicional, porém em
Igarassu ficou a feira de produtos básicos.
Dada a importância de destacar a historia Feira consideramos relevante
apresentá-la, conforme acontecia em 1940, quando ela tem como espaço de suas
atividades o local próximo ao antigo mercado municipal, onde hoje é a Casa da
Cultura. Naquele formato, a feira era semanal sempre aos domingos, próximo da
Praça da Igreja de São Sebastião, como podemos observar na foto 03.
51
Foto 04
MERCADO MUNICIPAL E FEIRA LIVRE DE IGARASSU 1955
Foto: Museu Histórico de Igarassu
Como podemos observar na foto datada do ano de 1955, a feira está
localizada ao lado do antigo mercado público municipal, no largo da Igreja de São
Sebastião, próximo ao rio São domingos que podemos ver na foto 04, notamos
também ao fundo a torre do sino da Igreja de Santos Cosme e Damião, o casario
histórico, o mangue do rio São Domingos próximo do antigo mercado público. Esta
posição do mercado, e conseqüentemente da feira livre, vai acarretar, no final da
década de 1970 e inicio da década de 1980, um problema que averiguamos ter sido
objeto de dois diagnósticos.
Primeiro, com o tombamento do sitio histórico de Igarassu a partir de 1972,
enquanto patrimônio histórico e arquitetônico nacional, o local da antiga feira e
mercado público encontra-se dentro da área de tombamento, impedindo então
qualquer modificação e limitando uma possível expansão das atividades comerciais
52
Foto 05
LARGO DA FEIRA
Foto: Museu Histórico de Igarassu
Segundo, com a implantação em 1973 da Região Metropolitana do Recife -
RMR, planeja-se e efetivamente ocorre um crescimento considerável da população
do município, tornando a área da feira insuficiente para as atividades comerciais, em
tempo que os cuidados com os prédios tombados no entorno foram se
intensificando. Durante a década de oitenta, as preocupações com o meio-ambiente,
ganham força e a proximidade do mangue passa a ser outro fator limitante do
crescimento da feira, justificando também a transferência da mesma para um
espaço maior.
Outro fato relevante para a mudança da feira pode ser percebido na fala do
então prefeito Clovis Lacerda Leite: “A intenção era melhorar as condições da feira e
expandir a cidade para os lados do sitio Taépe, que na época era uma simples
passagem de terra”. Revelando que o objetivo era a criação e expansão de um
centro comercial.
53
Foto 06
FOTO AEREA DO SÍTIO HISTÓRICO DE IGARASSU 1981
Fonte: CONDEPE- FIDEM
Como podemos observar na foto 05, o circulo indicando o antigo local da
feira, nas proximidades do mangue do rio São Domingos, a urbanização mesmo no
centro da cidade ainda não está consolidada. A seta indica o local para onde foi
transferida a mesma, percebemos que a distância de deslocamento não foi tão
significativa..
54
Foto 07
FOTO AEREA DO SÍTIO HISTÓRICO DE IGARASSU 1998
Foto: CONDEPE- FIDEM
Na foto 06, o circulo amarelo representando o antigo local de feira e o
quadrado azul o local atual, podemos notar o nítido crescimento fora do sítio
histórico da área urbana de Igarassu, evidenciando um crescimento populacional,
principalmente em torno do espaço da feira, sinalizando uma possível contribuição
dessa transferência para esse crescimento.
55
A construção do atual espaço da feira foi concluída e inaugurada no final de
1982, porém o se deu a transferência efetiva das atividades, por motivos de troca
de mandato, entre os prefeitos Clovis Lacerda Leite e Jurandir Bezerra Lins, e se
completou no ano seguinte, em 1983. Devido à passagem de mandato, ocorreu
também uma mudança do nome atribuído ao local, substituindo-se o nome de
“Clovis Lacerda Leite” pelo de Dalila de Vera Cruz”, em homenagem a primeira e
única mulher vereadora da cidade.
Essa transferência não se deu de modo pacífico em relação aos feirantes da
época como relata o Sr Antonio Miguel Fernandez, em entrevista no dia 15/12/2007,
um dos poucos remanescentes da antiga feira de Igarassu. Explica que: “As
pessoas mais antigas o queriam vir para cá, tinham medo do novo”. Mostrando
que o processo de transferência não foi aceito de imediato, mas, segundo o próprio:
“Aqui melhorou muito para nós”.
A transferência do local da feira livre e mercado público municipal, para um
espaço maior e organizado, vai trazer uma nova dinâmica para as atividades
comerciais em Igarassu. Pois além de uma nova estrutura, houve a integração de
uma agência da Caixa Econômica Federal, que também foi inaugurada junto com o
prédio do centro comercial e uma agência do Banco do Brasil em suas imediações,
como podemos notar da foto 07
56
Foto 08
FOTO DO CENTRO COMERCIAL DALILA VERA CRUZ 1984
Foto: Jornal de Igarassu ANO I nº4 Abril/1984. Fonte: Museu Histórico de Igarassu.
Como podemos observar a estrutura do novo centro comercial, difere não
pela localização, mas também em tamanho do antigo, alterando a dinâmica social e
comercial em Igarassu e estabelecendo novos costumes em feirantes e
consumidores da cidade.
Sua estrutura passou por várias transformações, logo em 1983 foi agregado o
mercado de carnes, local especifico para o comercio de carnes (gado, porco e
frango), peixes e outros produtos de origem animal, ampliando a oferta dos mesmos.
Outra importante mudança foi referente ao dia da feira, que passou de domingo para
sábado a partir de junho de 1986
3
, o que vinha, segundo matéria do jornal, atender
duas reivindicações dos feirantes: A primeira de cunho religioso, para que os
mesmos pudessem participar da missa dominical, tradicional na Igreja de Santos
Cosme e Damião; a segunda, de cunho financeiro para evitar a concorrência de
outras feiras da região.
Com essa mudança de data, estabeleceu-se uma das especificidades da feira
livre de Igarassu: sua temporalidade. Com a passagem do dia oficial da feira de
3
Fonte: Jornal de Igarassu ano III - nº 6 – Junho/86.
57
domingo para sábado, alguns feirantes com medo de perderem clientes, o
deixaram de “por a banca” também aos domingos, segundo relato do Sr Antonio
Miguel Fernandez: “Alguns não pararam de colocar a banca no domingo e foram
falando para os outros que tinham se dado bem, então um começou, outro também,
e daí começamos a botar todos os dias”. Com esta atitude os feirantes
estabeleceram a permanência como uma das especificidades da feira, que acontece
todos os dias, oficialmente das 06h30min as 18h00min. Isso sem folgas, pois está
funcionando mesmo em feriados sejam eles santos ou comemorativos.
Para ganhar a formatação atual, foram varias obras de adequação e
ampliação, em sua maioria sem registro nos órgãos competentes, sendo agregado
ao desenho técnico da obra a posteriori. Essas obras são de difícil datação, mesmo
pelos que delas participaram e que informaram que não havia um projeto formal.
As últimas obras realizadas, entre o final da década de 1990 e inicio da
década de 2000, consistiram na construção das tarimbas, locais feitos de cimento
armado e cobertura de amianto, que substituíram as barracas de madeiras dando
um local definitivo para a feira livre. Houve a implantação de uma feira da Sulanca
com aproximadamente 240 barracas para a venda de roupas, em um espaço dentro
da feira específico para esta. Passaremos a apresentar e analisar, como o espaço
da feira e seu entorno estão configurados e qual a influencia deste espaço para sua
microrregião, municípios de Itamaracá, Itapissuma e Araçoiaba.
58
2.3 Feira de Igarassu fixos, fluxos e flexíveis.
Imagem 04
CONFIGURAÇÃO DA FEIRA LIVRE DE IGARASSU
Fonte: Secretaria de Planejamento, Meio Ambiente e Patrimônio Histórico.
59
A configuração da feira livre de Igarassu apresenta várias áreas de tipos de
comércios diferentes. Subdividiremos em: feira livre, Box e mercados de carne
farinha e feira da sulanca. Para melhor compreensão e posterior analise, procurando
entender qual a diferença entre a configuração oficial, aquela estabelecida pelos que
produziram seu projeto de uso, e a sua configuração de fato, aquela usada pelos
feirantes, os reais “usadores” desse espaço.
2.3.1 Feira Livre.
A feira livre consiste em tarimbas de concreto armado, com coberturas de
telhas de amianto, que estão fixas nas duas ruas que atravessam o centro
comercial. São no total de 259 tarimbas, para acondicionamento dos produtos para
venda
Imagem 05
CONFIGURAÇÃO DAS TARIMNBAS PADRÃO
Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Agricultura.
60
Podemos observar na figura 05 e foto 08, que uma tarimba é formada por
quatro bancas, retângulos de construções de concreto armado, medindo cada banca
1,00 metros por 2,98 metros, com 1,16 metros de altura. Cada feirante dispõe de um
espaço de quatro bancas e de espaço para circulação, totalizando 17,68 m2.
Podemos observar também que nos dois lados das tarimbas um corredor e no
fundo o local dos boxes, outro espaço para comércio da feira. Estes corredores, que
representam duas ruas, o lugares para a circulação das pessoas, gerando o fluxo
entre os fixos, as tarimbas e os boxes.
Foto 09
FOTO DE UMA TARIMBA NA FEIRA LIVRE DE IGARASSU
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
61
Estas ruas vão de um lado ao outro da feira sendo passagem para pessoas
que vão do centro para o Loteamento Agamenon Magalhães um dos mais povoados
de Igarassu, bem como o inverso, do loteamento para o centro histórico onde fica os
principais órgãos do governo municipal, das prestadoras de serviços blicos
(Compesa, Celpe), sendo passagem quase que obrigatória para centenas de
pessoas diariamente.
Quanto aos tipos de comércio este era o espaço padrão para o comercio de
frutas e verduras, porém com a flexibilidade e falta de controle do poder público
houve uma grande diversificação nos tipos de negócios nas tarimbas, como
podemos notar na figura 06, que representa a distribuição dos tipos de comércios
pelas mesmas
62
Figura 05
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e Dezembro de 2007.
63
Como podemos observar na figura 06, predominância do comércio de
produtos alimentícios perecíveis frutas e verduras, com uma divisão para as frutas
na rua 1 e verduras na rua 2, porém não e difícil ver as duas variedades
consorciadas em algumas tarimbas. Vemos também uma predominância das frutas
em relação aos outros produtos.
Então, temos uma ordem estabelecida principalmente em relação aos tipos de
comércios, que estão nas “tarimbas” organizadas por setores, as frutas em uma rua
bem definida, em outra, as verduras e outros produtos conforme podemos observar
na figura 06, dando a impressão de gôndolas de supermercados, facilitando o
reconhecimento do consumidor que já se acostumou com essa ordem.
Outra observação que nos chama atenção é que há em tarimbas produtos
que deveriam originalmente estar negociados em boxes, tais como, produtos
elétricos e hidráulicos para pequenos consertos, como observamos na foto 09, bem
como produtos importados de baixo valor como bijuterias, brinquedos, armarinhos,
etc.
Foto 10
FOTO DA TARIMBA DE PRODUTOS DIVERSOS
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
64
A parte destinada às roupas usadas é uma feira a parte, que essas
tarimbas nos dias de semana, segunda a sexta feira, estão vazias, entretanto aos
sábados um intenso comércio de produtos de vestuário usados. Estas atividades
têm como consumidoras pessoas de baixo poder aquisitivo, que buscam alternativas
para a compra dos mesmos produtos em lojas como afirma a Sra Maria Antonia em
entrevista dia 14/08/2007: “Aqui os preços são em conta e aque são boazinhas”.
Em pesquisa informal feita pelo autor, notou-se uma diferença em média de 300%
entre preços da feira de roupas usadas em relação a preços de lojas.
Foto 11
FOTO DA TARIMBA COM ROUPAS USADAS
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Foram pesquisados 132 feirantes donos de tarimbas, correspondendo a cerca
de 2/3 do total aproximado que não foi possível obter da Secretaria de
Desenvolvimento Econômico e Agricultura o número total preciso. Dessas tarimbas
todos se declararam donos, não observando-se o uso de empregados.
65
Tabela 04
2007 Tempo de trabalho dos feirantes nas Feira de Igarassu -PE
Tempo Numero
Percentagem
1 a 3 anos 22
16.20%
3 a 5 anos 26
19.11%
5 a 10 anos 63
46.32%
10 a 15 anos 16
11.80%
+ de 15 anos 05
3.71%
Total 132
100%
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Podemos observar na tabela 04, que cerca da metade dos feirantes
(46,32%) que trabalha na feira implantou-se na faixa de de cinco a dez anos. O
segundo grupo ingressou na feira nos últimos cinco anos, somando 35.31%.
Percebemos que houve uma renovação, que a feira tem 24 anos e somente
3.71% tem mais de quinze anos de trabalho. Poderíamos supor que essa renovação
teria vínculo com a estabilização da economia brasileira após sucessivas crises
econômicas mas isso não foi objeto de pesquisa que envolveria a coleta de histórias
de vida dos feirantes.
Em relação à origem dos produtos na feira, mereceu uma atenção especial,
pois, com a localização de Igarassu no limite rural/urbano se pensava que a feira
ainda traria a característica das feiras de interior onde se nota a presença de
pequenos agricultores trazendo suas mercadorias, as sobras de sua produção, para
a venda. Mas, em Igarassu, a maioria dos trabalhadores não da feira livre como
do centro comercial reside em bairros periféricos da cidade.
Com isso o abastecimento de frutas e verduras da feira é proveniente do
CEASA
4
·, localizado na cidade do Recife, que recebe esses alimentos de todo o
estado, da região Nordeste de do país. E segundo relato do Sr Antonio Miguel
Fernandez: “Cada um vai e compra sua mercadoria, às vezes pagamos um frete
4
Centro de Abastecimento Alimentar de Pernambuco.
66
juntos”. Revela-se a falta ou o caráter incipiente de práticas de associativismo ou
cooperativismo entre os feirantes, predominando a competição entre eles.
Porém, não podemos afirmar que o abastecimento seja feito 100% do
CEASA, que segundo Sra. Maria Eunice do Carmo vendedora de frutas e
verduras: “Quando aparece alguém aqui vendendo alguma coisinha como feijão
verde a gente compra pra depois revender”. Portanto, ainda temos pessoas que
plantam em suas pequenas propriedades e vendem seu excedente aos feirantes.
Foto 12
RUA JERÔNIMO CAVALCANTE AOS SÁBADOS.
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007
Outra característica referente à configuração da feira livre é que esta não se
restringe às tarimbas de concreto armado. Como podemos notar na foto 11, da Rua
Jerônimo Cavalcante, que fica no entorno da feira livre, feirantes comercializam suas
mercadorias em pedaços de plásticos e lonas acondicionados no chão. Esta prática
se espacialmente aos sábados ou feriados (principalmente em datas próximas ao
67
pagamento dos aposentados do INSS), quando o fluxo de pessoas aumenta
consideravelmente.
Este fenômeno não é exclusividade do entorno da feira, nos dias mais
movimentados aumenta o numero de ambulantes também no interior da feira,
usando as ruas e calçadas. Bem como os produtos vendidos por estes não se
restringem a produtos alimentícios, podem ser encontrados todos os tipos de
mercadorias, principalmente produtos importados e DVD e CD pirateados.
Foto 13
FOTO DE UMA DAS RUAS DA FEIRA COM AMBULANTES
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Como notamos na foto 12, a flexibilização no espaço da feira livre não se
restringe ao entorno, havendo a presença de vendedores ambulantes e camelos em
todos os locais onde o fluxo de pessoas possa significar oportunidade para o
comércio.
68
2.3.2 Os boxes, espaços de diferenciados.
Os boxes são outro tipo de espaço para a comercialização de produtos,
existentes na feira livre de Igarassu. Diferentes das tarimbas são espaços fechados
e que podem ser fechados, podendo ter dimensões diferenciadas e comercializar
diferentes produtos.
Os boxes surgiram, em número de apenas 20, com o início do centro
comercial em 1983. No decorrer das transformações do centro comercial esse
número cresceu, chegando hoje a mais de 100 boxes. Também mudaram o
tamanho e formato que, como no caso das tarimbas, foram sendo modificados
dependendo da necessidade do comercio: Como, por exemplo, a transformação de
4 boxes em um supermercado, ou a divisão de um Box em duas lojas diferentes.
Esses boxes ficam localizados principalmente nas laterais das ruas das
tarimbas, que estão espalhadas por todo o espaço do centro comercial, formando o
maior e mais complexo setor da feira.
A principal diferença entre as tarimbas e os boxes, não reside no fato de um
ser aberto como um tabuleiro (tarimba) e outro ser mais parecido com um espaço
comercial, ou seja, uma loja (Box). A diferença está na organização destes espaços.
Enquanto as tarimbas m uma organização mais ou menos setorizada, os boxes
não têm nenhum tipo de organização.
As principais características dos boxes são três: A primeira vincula-se aos
tamanhos e formatos diferenciados, podendo variar conforme o comercio nele
instalado, tendo de 3m² em uma loja de jogo do bicho até 2400m² em um
supermercado. A segunda está intrinsecamente ligada à primeira e corresponde à
variedade de comércios e produtos que estes espaços podem oferecer. Pois,
depende do tipo de produto ou de produtos a variação do tamanho dos boxes.
69
Tabela 05
TABELA DOS TIPOS DE BOXES E SUA QUANTIDADE
Relação das atividades comerciais dos Boxes
Tipo de comércios por produtos
Quant.
Açougue 2
Armarinhos 3
Avícola 4
Bar 10
Bebidas 1
Bomboniere 2
Calçados 2
Casa de jogos 6
Condimentos 2
Conserto de roupas 1
Conserto de eletrônicos 1
Farmácia 3
Fechado 12
Foto 1
Fumo 1
Lotérica 1
Material de construção 3
Moveis 1
Ótica 2
Padaria 1
Papelaria 1
Produtos beleza 4
Produtos veterinários/Ração animais domésticos 5
Restaurante 2
Roupas 20
Roupas infantil 2
Secos e molhados 2
Serviços Gráficos/ Lan House 2
Supermercado 1
Tecidos 2
Tintas
1
Total de boxes 101
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Como podemos comprovar na tabela 05, grande variedade de comércios
nos boxes, de produtos alimentícios a prestação de serviços, adaptando o espaço
destes conforme ao produto a ser comercializado configurando a variedade e
tamanhos diferentes de Box, apresentando a miscelânea que é a feira de Igarassu,
tanto em relação à configuração de seu espaço, quanto à variedade de seus
produtos e serviços.
70
Outra característica marcante em relação aos boxes é a falta organização e
setorização, pois é fácil encontrar dois tipos diferentes de produtos lado a lado sem
a ordem observada, por exemplo, nas tarimbas.
Foto 14
FOTO DE BOXES NA FEIRA LIVRE DE IGARASSU
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Como podemos comprovar na foto 13, a não setorização dos comércios nos
boxes permite a vizinhança de uma padaria, com um açougue, uma loja de roupas e
uma de ração para animais domésticos. Demonstra-se que nesse espaço, as
transformações, bem como o tipo de comercio, são determinados pela livre iniciativa
dos comerciantes.
Quanto à proveniência dos produtos comercializados nos boxes, ela varia
muito, podendo incluir a produtos importados por meios não legais, bem como
aparelhos celulares fornecidos por grandes empresas de telecomunicações.
71
Em relação às pessoas que trabalham nos boxes, diferente das tarimbas
onde são os donos que trabalham, podemos notar a presença de mão de obra
contratada. Os boxes em que os donos trabalham são a minoria como mostra a
tabela 06:
Tabela 06
RELAÇÃO
DOS TIPOS DE BOXES QUANTO AO TRABALHADOR
Tipo de trabalhador/ Boxes.
Quantidade
Proprietário 14
Proprietário/empregados 77
Empregados 10
Total 101
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Assim, predomina o trabalho dos empregados nos boxes, geralmente com a
presença do empregador. Estabelece-se o contrato de trabalho no caso das
empresas formais e o trabalho informal no caso das empresas informais.
2.3.3 Mercado da Carne, Mercado da Farinha e Feira da Sulanca
Outros espaços que fazem parte do Centro Comercial/Feira Livre, os
mercados da carne e farinha e a feira da sulanca, compõem com suas atividades a
miscelânea da feira livre de Igarassu. Os dois primeiros, devido às transformações,
sofreram uma desvalorização em seus espaços, estando no momento com seu uso
subaproveitado, como verificaremos a seguir.
O mercado de carnes como já citamos foi a primeira construção agregada ao
centro comercial em 1983, idealizada como um espaço para venda de produtos
animais de diversos tipos, bovinos, suínos e galináceos. Este espaço entrou em
decadência a partir da entrada de supermercados no entorno e no corpo da feira
livre. Hoje este espaço é utilizado aos sábados, dia de maior movimento, e mesmo
assim estando subutilizado.
72
Foto 15
FOTO DO MERCADO DA CARNE NA FEIRA DE IGARASSU EM UM SÁBADO
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Como podemos observar na foto 14, o espaço designado para o mercado da
carne não está sendo aproveitado, havendo somente uma banca em uso no dia da
foto. Esta realidade é constante, como relata o Sr. Roosevelt Carneiro Moura, dono
de um box e também usuário do mercado de carnes em dia de maior movimento, em
entrevista concedida no dia 15/12/2007 “Ninguém vem mais aqui, temos que mudar
de lugar para poder vender ... aqui ficou muito escondido”. Essa afirmação é
corroborada pelo deslocamento de vendedores de carne que se mudaram do
mercado das carnes para boxes próximos à feira livre, como observaremos na foto
15.
Outro fator que contribui para esse esvaziamento foi uma maior fiscalização
da vigilância sanitária, pois antes se podia comprar carne, para revenda, em sítios
próximos, hoje somente é autorizada a compra do produto em estabelecimentos
credenciados pela própria vigilância sanitária. Conforme averiguado, as carnes
73
vendidas na feira de Igarassu provem de frigoríficos da cidade do Paulista e de
Recife.
Foto 16
FOTO DE BOX DE CARNE FORA DO MERCADO DAS CARNES
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Esse deslocamento segundo o próprio Sr. Roosevelt Carneiro Moura, “Nós
viemos atrás dos fregueses”. Pois é a busca das ruas da feira, onde se localiza o
maior fluxo de pessoas, que motivou o deslocamento de vários comércios que antes
tinham um local especifico.
Este fenômeno vai ser observado com varias áreas do comércio dentro da
feira livre, uma readequação dos espaços, abandono de outros e criação e
ocupação de espaços inicialmente não consagrados às atividades que hoje neles
existem.
Outro espaço que caiu em desuso com a chegada dos supermercados, foi o
atribuído ao comercio de peixes e frutos do mar, chegando hoje a não ter uma
74
importância para o andamento das atividades da feira, sendo procurado apenas por
clientes fidelizados com o passar do tempo, como verificamos na foto 16.
Foto 17
FOTO DO ESPAÇO PARA COMERCIO DE PEIXES E FRUTOS DO MAR
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Havia outro espaço de importância nas atividades da feira livre, mas que,
com as transformações socioculturais, está passando por uma reformulação: O
Mercado das Farinhas (foto 17), onde se negociavam produtos relativos á
macaxeira, como farinha de macaxeira, goma de tapioca, beiju. Esses gêneros
alimentícios foram mais importantes na dieta da população da cidade e, aos
poucos, foram sendo substituídos por produtos industrializados; atualmente, o
referido espaço é somente utilizado com maior freqüência aos sábados ou em dias
de maior movimento.
A origem dos produtos tanto no mercado dos peixes como no mercado das
farinhas são respectivamente pequenos pescadores da região e pequenos
75
proprietários de casas de farinhas também da região, e os comerciantes são
proprietários que trabalham nas bancas.
Foto 18
FOTO DO MERCADO DAS FARINHAS
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
Enquanto os espaços acima citados foram perdendo força e importância
econômica na feira livre de Igarassu, outro vem crescendo e ganhando força,
aumentando sua participação nas atividades: A Feira da Sulanca.
A feira da Sulanca tem um espaço especifico para suas atividades, sendo o
ultimo espaço construído na feira livre. Esse espaço mede aproximadamente 800
m², tendo 50 barracas que comercializam roupas de todos os tipos como podemos
observar na foto, sendo o maior setor individual da feira livre. Como nos boxes, o
trabalho mais utilizado na feira da sulanca é o trabalho de empregados.
Quanto aos produtos comercializados na feira da sulanca, podemos
constatar que em sua maioria são provenientes das cidades de Santa Cruz do
Capibaribe, Toritama e Caruaru todas do Agreste Pernambucano. Cidades que se
76
destacam nacionalmente pelo desempenho na atividade da confecção de roupas.
Tendo um espaço especifico para suas atividades a feira da sulanca não concorre
com outras atividades por espaços, como notamos na foto 18.
Foto 19
FOTO DA FEIRA DA SULANCA
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
A configuração do espaço da feira livre de Igarassu foi modificada e adaptada
conforme as necessidades dos feirantes e compradores, criando um espaço
marcado pelos contrastes e pela diversidade. As diversas formas de abastecimento,
trabalho e atividades econômicas tornaram este espaço um campo de iniciativas
individuais e imprevisível. Também, diversidade e flexibilidade estão presentes no
entorno da feira livre, como pretendemos apresentar a seguir, contribuindo para a
formação de um espaço de centralidade não em relação à economia como a
dimensão social e cultural.
77
2.4 Feira Livre: seu entorno e sua centralidade.
Num primeiro momento, cabe uma reflexão sobre a definição do conceito da
centralidade, tema presente nessa pesquisa, que revela a importância do espaço da
feira livre não para o município de Igarassu como também para os municípios da
região mais ao norte da RMR do estado de Pernambuco.
Entre os princípios gerais da centralidade está a regulamentação do número,
tamanho e distribuição dos núcleos de povoamento, que segundo Correa (1989);
baseado nas preposições de Christaller
5
, “grandes, médias e pequenas cidades, e
ainda minúsculos núcleos semi-rurais, são todos considerados como localidades
centrais”. Dando ao espaço urbano uma hierarquia quanto à distribuição das cidades
em relação a suas funções:
Todas as cidades o dotadas de funções centrais, isto é, atividades de
distribuição de bens e serviços para a população externa, residente na
região complementar (hinterlândia, área de mercado, região de influência),
em relação à qual a localidade central tem uma posição central. A
centralidade de um núcleo, por outro lado, refere-se ao seu grau de
importância a partir das funções centrais: maior o número delas, maior a
sua região de influência, maior a população externa atendida pela
localidade central, e maior a sua centralidade. (CORREA, 1989, pag. 21).
Nesta perspectiva, Igarassu, devido a sua localização espacial dentro da
RMR passa a ter um papel de centralidade dentro da microrregião de Itamaracá.
Sendo fornecedora de bens e serviços para essa região, tornando-se então parte de
uma rede urbana.
5
Geógrafo Alemão Walter Chirstaller, no seu livro Central Places in Southern Germany,
formulou uma teoria a partir de um conjunto de pressupostos e princípios em que
demonstrava haver ordem nos padrões do povoamento que observava à sua volta. Procurando
explicar a organização espacial das povoações e das áreas de influência, em particular à sua
localização relativa à dimensão.
78
Quanto à rede urbana, que tem formação na modernidade a partir de uma
dominação dos processos de globalização, em rede, para Castells (1999:497), as
redes constituem "a nova morfologia social de nossas sociedades, e a difusão da
lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos
processos produtivos e de experiência, poder e cultura.”
As redes constituem locais interligados a partir de uma lógica de produção,
transporte e consumo:
Redes são instrumentos para a economia capitalista baseada na inovação,
globalização e concentração descentralizada; para o trabalho, trabalhadores
e empresas voltadas para a flexibilidade e adaptabilidade; para uma cultura
de desconstrução e reconstrução contínuas; para uma política destinada ao
processamento instantâneo de novos valores e humores públicos; e para
uma organização social que vise à suplantação do espaço e invalidação do
tempo. Mas a morfologia da rede também é uma fonte de drástica
reorganização das relações de poder
. (Castells, 1999:497)
Essa drástica reorganização do espaço, podemos observar em Igarassu a
partir da mudança da feira livre do antigo espaço; perto do largo da Igreja de São
Sebastião, para o local atual, às margens da PE 35, é um dos fatores para a
centralidade de Igarassu em relação a sua região. Contribuindo para a expansão da
urbanização, nas imediações do espaço da feira livre, como se observa nas fotos 19
e 20, de 1981 e 1998.
79
Foto 20
FOTO AEREA DO SÍTIO HISTÓRICO DE IGARASSU 1981
Fonte: CODEPE/FIDEM.
80
Foto 21
FOTO AEREA DO SÍTIO HISTÓRICO DE IGARASSU 1998
Fonte: CODEPE/FIDEM.
Este fenômeno ocorreu em função da dinâmica impulsionada pelas novas
instalações da feira livre, que passou a exercer um papel de centralizador das
atividades comerciais do município, somando-se ao crescimento das duas últimas
décadas em toda a RMR, também ocorrido em Igarassu. Fica claro nas duas fotos
aéreas o crescimento da mancha urbana no município de Igarassu, e que esse
crescimento se deu em direção da PE 35, a partir do local onde foi instalada a nova
feira livre.
Com esse crescimento, a feira passa a ter em seu entorno, tendo esse
entorno aproximadamente um raio de 3 km, os principais equipamentos urbanos do
81
município, entendendo como equipamento urbano conforme a norma NBR 9284/86
da Associação Brasileira de Normas Técnicas:
“Equipamento urbano o todos os bens públicos ou privados, de utilidade
pública, destinados à prestação de serviços necessários ao funcionamento
da cidade, implantados mediante autorização do poder público, em espaços
públicos e privados.” (NBR 9284/86)
Esta mesma norma define como categorias dos equipamentos urbanos:
circulação e transporte; cultura e religião; esporte e lazer; infra-estrutura; segurança
pública e proteção; abastecimento; administração pública; assistência social;
educação e saúde. Conforme podemos observar na tabela 07, os principais
equipamentos urbanos estão localizados no entorno da feira livre.
Tabela 07
RELAÇÃO DOS EQUIPAMENTOS URBANOS DO ENTORNO DA FEIRA LIVRE DE
IGARASSU
Equipamen
tos
Quantidade
Hospital 1
Delegacia 1
Prestadoras de serviços públicos 3
Secretarias municipais 5
Praças e parques 2
Integração EMTU 1
Transporte alternativo 4
Escolas 4
Fonte: Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Estão entre esses equipamentos, o único hospital, a delegacia do município, a
agência da prestadora de serviço blico de energia, a agência dos correios, entre
outros. Aumentando a concentração de comércios e prestadoras de serviços no
entorno da feira livre, tendo com isso um numero maior de fluxo de pessoas.
Em relação ao comercio, ficam também no entorno da feira livre, as principais
lojas do município, com os mais variados tipos de comércios, formando um centro
comercial, tendo como centro a feira. Entre esses comércios estão lojas
82
especializadas como, lojas de madeiras, lojas de informáticas, lojas de calçados,
lojas moveis, lojas de departamento, etc. Conforme a tabela 08 relata, no entorno da
feira livre há uma concentração de comércio e serviços, configurando o centro
comercial do município.
Tabela 08
RELAÇÃO DOS EQUIPAMENTOS PRÍVADOS DO ENTORNO DA FEIRA
LIVRE
Equipamento privado Quantidade
Banco 4
Lojas de moveis 8
Lojas de moveis e eletrodomésticos 5
Loja de departamento 4
Loja de madeiras 3
Farmácia 8
Bancas de jornal 2
Lojas de informática 5
Fotos 2
Lojas de produtos de beleza 3
Serviços médicos e odontológicos 4
Serviços de advocacia 3
Serviços gráficos 3
Serviços bancários 2
Lojas de calçados 2
Serviços para automóveis 5
Supermercados 2
Locadoras 4
Serviços de serralheria 2
ONG 2
Bares 10
Padarias 3
Fonte: Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Esta área de concentração concerne também o setor de transporte público,
pois todas as linhas de transporte urbano passam margeando a feira livre de
Igarassu, seja no sentido cidade/subúrbio, seja no sentido subúrbio/cidade. Mesmo
em relação aos municípios vizinhos como Araçoiaba, Itapissuma e Itamaracá, as
linhas dos coletivos de transportes urbanos, que partem do terminal integrado de
83
Igarassu, passam pela PE35, local da feira. Garante-se à feira uma centralidade em
relação ao município, bem como aos municípios vizinhos.
Em relação ao transporte alternativo, notamos vários tipos distintos no
espaço da feira. Um primeiro deve-se aos transportes realizados por automóveis de
pequeno porte, usados por moradores como serviço de taxi, levando individualmente
suas “feiras” em casa; os motoristas ficam na porta dos supermercados oferecendo
seus serviços, não tendo nenhum tipo de organização.
Um segundo, que utiliza também automóveis de pequeno porte, consiste
em lotações para bairros do município que não são atendidos pelo transporte urbano
regular, como é o caso dos bairros de Vila Rural e Alto do Céu. Este caso tem uma
peculiaridade, pois os motoristas desses automóveis têm certa organização, tendo
cada um sua vez de partir. Segundo Sr Ednaldo Guido de Souza em entrevista
concedida em 11/11/2007 “Aqui nós somos organizados, temos registro na prefeitura
e cada um sai na sua vez”; nessa mesma entrevista, ele relatou que cada motorista
faz até oito viagens em dias de semana e doze nos sábados e dias mais
movimentados. As lotações ficam localizados em um “ponto” próximo à feira da
sulanca.
Para outro distrito de Igarassu que não e atendido pelo transporte urbano
regular, o distrito de Três Ladeiras, existe uma linha de ônibus alternativo. Essa linha
tem horários regulares de partida tanto no distrito, quanto no centro da cidade e
segundo relato do Sr Severino de Souza em entrevista concedida em 11/11/2007
“Carregamos de tudo dentro desse ônibus, feiras, bebidas para os armazéns de Três
Ladeiras, material de construção, eletrodoméstico, o que vier nós carregamos, pois
só tem esse mesmo que vai para lá. Esse transporte tem como ponto de parada um
local próximo à feira livre.
84
Imagem 06
REDE DE TRANSPORTE ALTERNATIVO DE IGARASSU
Imagem: Google Earth. Marcas do autor.
Outros meios de transporte alternativos são as chamadas Kombis, transporte
tradicional da RMR, proibida na cidade do Recife, mas presente em toda a RMR.
Como podemos observar na imagem (), as linhas de transporte alternativo partem
todas elas das proximidades da feira livre, reforçando a idéia de uma centralidade
exercida pela mesma. Partindo da feira e formando redes em relação aos municípios
próximos e bairros da cidade.
85
3.0 Os dois circuitos da economia: o formal e o informal em
convivência na feira livre em Igarassu.
Neste capítulo pretendemos trabalhar os conceitos de espaço, bem
como dos dois circuitos da economia de países de subdesenvolvidos segundo
Milton Santos (2006) fazendo uma análise a partir dos resultados do trabalho
de campo realizado nesta pesquisa.
3.1 O Espaço Geográfico; uma construção humana.
Como relatamos nos capítulos anteriores, o espaço da feira livre de
Igarassu vem passando por um processo constante de transformação e
adaptação, segundo contextos históricos que influenciam nessas
transformações e principalmente em suas adaptações. A reflexão sobre o tema
espaço, muito abordado na Geografia, nos é necessária para um melhor
entendimento sobre o tema.
Em primeiro lugar; não é nosso intuito esgotar a discussão sobre o
referido tema. E sim refletir sobre a importância deste para a nossa pesquisa,
que viemos de área do conhecimento diferenciada
1
da Geografia, mesmo
que essa área, o Turismo, dialogue em diversos momentos com a Geografia.
Entendemos o espaço conforme definição abaixo:
O espaço é formado por um conjunto, indissociável, solidário e
também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações,
não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a
história se . No começo a natureza era selvagem, formada por
objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por
objetos fabricados, objetos técnicos, mecanizados e, depois
1
O autor é formado Bacharel em Turismo pela Universidade Estadual de Ponta Grossa.
86
cibernéticos, fazendo com que a natureza artificial tenda a funcionar
como uma máquina. (SANTOS, 2006, pag. 63).
Então, o espaço é o local onde são realizadas todas as ações
humanas, nele o homem relaciona-se com seus semelhantes criando o espaço
social em que desenvolve as relações sociais com os animais selvagens e
domésticos; com a natureza, em seu próprio tempo; e principalmente
transforma e adapta esta conforme suas necessidades e possibilidades. Sendo
ele o ator da construção histórica desse espaço, essas transformações
surgiram, num primeiro momento, pela necessidade de sobrevivência frente à
natureza, porém a partir da construção de um conjunto de técnicas adquiridas
para essa sobrevivência, o espaço se transforma de natural para um espaço
social.
Sendo obra da ação humana, os sistemas de objetos são realizações
humanas, que para tais, surgem de uma necessidade ou desejo. Como por
exemplo, a feira de Igarassu, que por uma necessidade/vontade foi construída
e posteriormente adaptada pelas ações do homem, pois:
Os objetos não têm realidade filosófica, isto é, não nos permitem o
conhecimento, se o vemos separados dos sistemas de ações. Os
sistemas de ações também não se dão sem o sistema de objetos.
Sistema de objetos e sistemas de ações interagem. De um lado, os
sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de
outro lado, o sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se
realiza sobre objetos preexistentes. É assim que o espaço encontra
sua dinâmica e se transforma (SANTOS, 2006.pag.63).
87
Neste processo dialético os espaços ganham forma conforme os
contextos históricos, estando sempre em transformação, numa totalidade
2
em
permanente processo de totalização.
Esse processo depende de diversas relações, sejam elas “horizontais”;
no caso da feira, entende-se por “horizontais” as relações tecidas no cotidiano
entre os feirantes. Também, existem relações “verticais”, entendendo-se por
“verticais” as relações com entes externos à feira como, por exemplo, entre os
feirantes e o poder blico, seus fornecedores e consumidores. Nessas
relações, os feirantes estão também a mercê de fatores externos, que podem
estar longe de sua influência e poder de decisão.
diversos fatores externos que influenciam no processo de criação
do espaço; pois, com a globalização, o local se tornou também global
3
. Não
que todos os espaços estejam inseridos totalmente na globalização,
principalmente no tocante às decisões, porém as influências de decisões
externas podem alterar o andamento do processo interno de decisão e
consequentemente a construção do espaço do lugar, entendendo no lugar:
um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas, firmas e
instituições - cooperação e conflito são a base da vida comum. Porque
cada qual exerce uma ação própria e a vida social se individualiza; e
porque a contigüidade
é
criadora de comunhão, a política se
territorializa, com o confronto entre organização e espontaneidade. O
lugar é
o
quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe
vem solicitações e ordens precisas de ações condicionadas, mas e
2
A noção de Totalidade se pelo pensamento que todas as coisas do universo formam uma
unidade. Cada coisa nada mais é que parte da unidade, do todo, mas a totalidade não é uma
simples soma das partes. As partes que formam a Totalidade não bastam para explicá-la. Ao
contrário, é a Totalidade que explica as partes. A Totalidade B, ou seja, o resultado do
movimento de transformação da Totalidade A, dividi-se novamente em partes. As partes
correspondentes à Totalidade B, já não são as mesmas partes correspondentes à Totalidade
A. (SANTOS, 2006. Pags. 115, 116)
3
Segundo SANTOS (2006, pag. 279):” O fato de que a rede é global e local, uma e múltipla,
estável e dinâmica, faz com que a sua realidade, vista num movimento conjunto, revele a
superposição de vários sistemas lógicos, a mistura de várias racionalidade.”
88
também o teatro insubstituível das paies humanas, responsáveis,
através da ação comunicativa, pelas mais diversas manifestações da
espontaneidade e da criatividade. (SANTOS, 1997: Pag. 258).
Portanto, é no lugar onde o homem realiza suas ações, sofrendo as
conseqüências destas, bem como de outras realizadas por atores remotos ao
seu espaço (lugar). Estas ações, que têm seus encadeamentos
transformadores, surgem normalmente nos países centrais da economia
capitalista e penetram com mais facilidade ou não; dependendo dos objetivos
dessas ações, bem como da resistência do espaço (lugar) periférico, em
aceitá-las ou rejeitá-las.
Contudo, como ressalta SANTOS (2000), a criação da fábula da
globalização tenta passar uma falsa realidade: que a globalização planificaria
as realidades dos espaço/territórios mundiais. O mesmo autor destaca o
contrário: os espaços em países subdesenvolvidos o passaram pelos
mesmos processos que passaram os espaços em países desenvolvidos; ou
seja, o subdesenvolvimento não é uma escala para o desenvolvimento, pois os
países subdesenvolvidos se organizam e reorganizam em função de interesses
distantes e em escala mundial. Portanto:
Descontínuo, instável, o espaço dos países subdesenvolvidos é igual-
mente multipolarizado, ou seja, é submetido e pressionado por
múltiplas influências e polarizações oriundas de diferentes níveis de
decisão. Quanto menor a escala do lugar, mais numerosos são os
impactos, o que dá uma decomposição do tempo à escala local.
Enfim, o espaço dos países subdesenvolvidos é marcado pelas enor-
mes diferenças de renda na sociedade, que se exprimem, no nível
regional, por uma tendência à hierarquização das atividades e, na
escala do lugar, pela coexistência de atividades de mesma natureza,
mas de níveis diferentes. (SANTOS: 2004, PAG.21).
Essas características de descontinuidade e instabilidade dão ao espaço
dos países subdesenvolvidos uma especificidade: as diferenças regionais e
89
locais. Estas diferenças estão no âmbito econômico perpassando para o social,
e se acentuam a partir de ondas de modernizações
4
, que não se aplicam de
modo uniforme, tornando os espaços variáveis e instáveis. Estas
características vão criar, nesses espaços, dois circuitos econômicos da
economia urbana (os circuitos superior e inferior da economia urbana dos
países subdesenvolvidos) que refletirão no processo de organização dos
espaços. Os dois circuitos da economia urbana correspondem à coexistência
de formas de espaços diferenciados, contraditórios e contrastantes; nas
cidades dos países subdesenvolvidos.
Dentre as particularidades que formaram os dois circuitos da economia
urbana, está o processo de modernização e crescimento por meio da
industrialização com freqüência, comandada do exterior. Esse processo tende
a selecionar alguns espaços, onde ocorre maciça aplicação de capital,
acentuando-se assim as diferenças econômicas e sociais entre as regiões
desses países, bem como as diferenças entre quem pode consumir e quem
não pode consumir os produtos dessa modernização.
Os espaços nos países subdesenvolvidos (...) não são atingidos de
um modo maciço pelas forças de transformação (...) as forças de
modernização impostas pelo interior ou exterior são extremamente
seletivas, em suas formas e efeitos (...). Essa seletividade do espaço
ao vel econômico assim como social, é, ao nosso ver a chave da
teoria espacial, (SANTOS in JESUS: 1992, pag. 98).
É a partir da análise dessa seletividade do espaço nos países
subdesenvolvidos, que Milton Santos elabora a reflexão acerca dos Dois
Circuitos Urbanos nos Países Subdesenvolvidos, em 1975. Nessa análise ele
4
Segundo Santos (2004): cada período é caracterizado pela existência de um conjunto
coerente de elementos de ordem econômica, social, política e moral, que constituem um
verdadeiro sistema, cada um desses períodos representa uma modernização, isto é, a
generalização de uma inovação vinda de um período anterior ou da fase imediatamente
precedente.
90
encontra uma divisão no espaço desses países, como uma cisão entre poucos
privilegiados e uma massa de desprovidos:
A existência de uma massa de pessoas com salários muito baixos ou
vivendo de atividades ocasionais, ao lado de uma minoria com rendas
muito elevadas, cria na sociedade urbana uma divisão entre aqueles
que podem ter acesso de maneira permanente aos bens e serviços
oferecidos e aqueles que, tendo as mesmas necessidades, não têm
condições de satisfazê-las. Isso cria ao mesmo tempo diferenças
quantitativas e qualitativas de consumo. Essas diferenças são causa
e efeito da existência, ou seja, da criação ou da manutenção, nessas
cidades, de dois circuitos de produção, distribuição e consumo de
bens e serviços. (SANTOS: 2004, pag. 37).
Esta divisão se por dois circuitos; o circuito superior ou moderno,
que se originou diretamente das modernizações tecnológicas e seus elementos
mais representativos que hoje são os monopólios; o circuito inferior que é
formado por pequenas atividades desenvolvidas pela população pobre, sem ou
nenhum resquício da modernização.
Tabela 09
Características dos Dois Circuitos da Economia Urbana de Países Subdesenvolvidos.
Características
Circuito Superior
Circuito
Inferior
Tecnologia
Capital intensivo
Trabalho intensivo
Organização
Burocracia
Primitiva
Capitais
Importantes
Reduzidos
Emprego
Reduzido
Volumoso
Assalariado
Dominante
Não
-
obrigatório
Estoques
Grande quantidade e/ou alta
qualidade
Pequena quantidade
e baixa
qualidade
Preços
Fixos (em geral)
Submetidos à discussão entre
comprador e vendedor
Crédito
Bancário institucional
Pessoal não institucional.
Margem de lucro
Reduzida
por unidade, mas
importante pelo volume de
negócios
Elevada por unidade, mas
pequena
em relação ao volume de negócios
91
Relações com a Clientela
Impessoais e/com papeis
Diretas, personalizadas
Custos Fixos
Importantes
Desprezíveis
Reutilização dos bens
Nula
Freqüente
Publicidade
Necessária
Nula
Overheard capital
Indispensável
D
ispensável
Ajuda Governamental
Importante
Nula ou quase nula
Dependência direta do
exterior
Grande, atividade voltada
para o exterior
Reduzida ou nula
Fonte: O Espaço Dividido: Os Dois Circuitos da Economia Urbana dos Países
Subdesenvolvidos. São Paulo: EDUSP, 2004.
As principais características dos dois circuitos da economia urbana de
países subdesenvolvidos, encontradas na tabela 09, estão baseadas na
organização e tecnologia. Enquanto o circuito superior está fundamentado na
organização e tecnologia de seus processos, o circuito inferior (movido pela
necessidade da sobrevivência tanto da atividade quanto do humano) necessita
de muita flexibilidade na organização e não tem acesso à tecnologia de última
geração.
3.1.1 O circuito Superior.
O circuito superior, por estar vinculado diretamente à modernização,
tem como característica o apoio legal e governamental em suas atividades.
Entre as empresas ligadas a este circuito constam: a indústria moderna de
exportação; o comércio moderno de lojas de importados; redes de
supermercados e supermercados e as prestadoras de serviços
5
ligados à
5
Saskia Sassen, em as Cidades na Economia Mundial, nos faz compreender como o processo
de globalização desencadeado com mais força após advento da acumulação flexível, colabora
com o crescimento e a difusão espacial do setor de serviços, pois estes, que no Fordismo eram
concentrados nas sedes das grandes corporações nos países centrais do capitalismo, passam
92
produção, tecnologia e informação.
Vinculado ao mercado financeiro o circuito superior tem no capital
intensivo, dispondo de crédito bancário que dão sustentação às suas
atividades, uma de suas principais características. Podendo produzir grande
quantidade com baixos custos, gera o lucro a partir da quantidade, tendo na
produção de seus bens e serviços significativa carga de tecnologia. como
principal preocupação o acúmulo de capital.
Essas indústrias podem ser representadas pelas empresas
multinacionais e conglomerados, que constituem uma rede
6
em torno de sua
produção. Levam seus procedimentos de produção para a rede, voltando esses
procedimentos e condutas para sua produção, disseminando a cultura de sua
organização para a rede.
O núcleo de decisão do circuito superior geralmente é centrado nas
matrizes, em países desenvolvidos. Esta particularidade faz com que as
empresas do circuito superior tenham pouca ligação com o espaço em que
estejam instaladas; pois este espaço nada mais é que um local em que as
condições para o acúmulo de capital são mais favoráveis. Se outro local
oferecer mais vantagens a estrutura pode ser transferida. O espaço local não
assume, então, uma importância vital para as empresas desse circuito.
Entre outras características do circuito superior: referente ao emprego,
a acompanhar a localização das filiais que com a acumulação flexível, podem estar em
qualquer local do mundo.
6
Para Castells em sua trilogia “A Sociedade em Rede”: "As redes são instrumentos para a
economia capitalista baseada na inovação, globalização e concentração descentralizada; para
o trabalho, trabalhadores e empresas voltadas para a flexibilidade e adaptabilidade; para uma
cultura de desconstrução e reconstrução contínuas; para uma política destinada ao
processamento instantâneo de novos valores e humores públicos; e para uma organização
social que vise à suplantação do espaço e invalidação do tempo. Mas a morfologia da rede
também é uma fonte de drástica reorganização das relações de poder”
93
este é reduzido (pela alta tecnologia) e assalariado; as relações com suas
clientelas são impessoais; sua organização é burocrática; não reutiliza os bens;
tem na ajuda governamental um importante fator que cria a infra-estrutura
necessária para sua instalação, bem como os incentivos concedidos; seus
preços são geralmente fixos; utiliza-se de publicidade; a margem de lucro é
reduzida por unidade e importante pela quantidade. O circuito superior
depende direta ou indiretamente do exterior, onde estão suas matrizes
desenvolvendo cada vez mais estratégias em escala globais.
3.1.2 O Circuito Inferior.
Sendo também uma criação da modernidade, o circuito inferior, tece
uma relação diferente com o espaço, com base no fato que os
empreendimentos nesse circuito têm como principal característica o trabalho
intensivo.
Sua organização não é burocrática, pois a busca pela acumulação de
capital não é a principal preocupação:
No circuito superior trata-se de acumular capitais indispensáveis à
continuidade das atividades e à sua renovação em função dos
progressos técnicos. No circuito inferior, a acumulação de capital não
constitui a primeira preocupação ou simplesmente não
preocupação. Trata-se, antes de tudo de sobreviver e assegurar a
vida cotidiana da família, bem como tomar parte, na medida do
possível, de certas formas particulares à vida moderna (idem: pag.
46).
O trabalho, no circuito inferior, em sua maioria está ligado à mão-de-
obra familiar ou, quando empregada, com vínculos empregatícios precários e
flexíveis quanto à remuneração e ao tempo. Ocorrem várias faixas salariais
94
para uma mesma atividade, dependendo do lugar e tamanho da empresa. O
capital, neste circuito, é reduzido; sendo a margem de lucro elevada por
unidade, porém as vendas são em pequenas quantidades. Os preços são
variáveis, que a necessidade de rápido retorno do investimento faz com que
a negociação seja um instrumento da atividade.
Os produtos têm baixa tecnologia ou quando alguma tecnologia,
estes são cópias de produtos originais. Os empreendedores trabalham com
pouco estoque e necessitam vender rapidamente para comprar novos produtos
e proceder a novas vendas, num ciclo de sobrevivência. Possuem pouco ou
nenhum capital de investimento para o desenvolvimento do negócio. pouca
ou nenhuma dependência do exterior, estando o núcleo de decisões próximo
do espaço da realização da atividade ou confundindo-se com ela.
No circuito inferior, ao contrário do superior, mantêm-se relações
enraizadas e privilegiadas com o lugar, pois está interligado com as populações
mais pobres, tanto produtor quanto consumidor. Essas relações estão
diretamente vinculadas à produção do espaço local, ligando a população ao
lugar. Relacionam o homem ao lugar:
Cada homem vale pelo lugar onde está: seu valor como produtor,
consumidor, cidadão, depende de sua localização no território [...] Por
isso a possibilidade de ser mais ou menos cidadão depende, em
larga proporção do ponto do território onde se está. Enquanto um
lugar vem a ser condição de pobreza, um outro lugar poderia, no
mesmo momento histórico facilitar o acesso àqueles bens e serviços
que lhes são teoricamente devidos, mas que de fato, lhes faltam
(destaque do autor). (SANTOS: 1987, pag. 81)
Listamos a seguir outras características do circuito inferior: a
publicidade é nula ou decorrente da visibilidade permitida pela localização; os
custos fixos são desprezíveis; o crédito é pessoal e não institucional;
95
freqüente reutilização dos bens; o salário não obrigatório; a ajuda
governamental nula ou quase nula, tanto em relação à infra-estrutura quanto a
incentivos.
Uma propriedade do circuito inferior; devido à organização
desburocratizada, à baixa taxa de investimento, à mão de obra barata, é a
facilidade de entrada neste. Pois, com pouco recurso, se pode montar uma
banca, na feira livre ou se estabelecer como camelô, negociando até produtos
importados de baixo custo. As atividades econômicas pulverizam-se pelo
grande número destas e de profissionais envolvidos. Porém o número de
saídas do referido circuito é considerável, já que as mesmas características
colaboram para a instabilidade que inviabiliza a continuidade do negócio.
3.2 Os Dois Circuitos e a Feira Livre de Igarassu.
Na feira livre de Igarassu podemos encontrar um espaço onde os dois
circuitos da economia urbana de países subdesenvolvidos podem ser bem
caracterizados. Espaço dividido, em que as diferenças econômicas e sociais
estão evidenciadas nas atividades correspondentes a cada circuito.
3.2.1 Feira Livre e o Circuito Superior: o formal no espaço informal
Como observamos, a criação do espaço da feira livre foi concebido
com o intuito de desenvolver a feira, uma atividade sabidamente informal, que
no seu processo de construção atraiu para o entorno, e mesmo no corpo da
feira livre, comércios formais.
96
Entre esses comércios, podemos citar os supermercados e as grandes
lojas de redes existentes na RMR, tendo como características principais do
circuito superior o capital intensivo e organização burocrática.
As grandes lojas e os supermercados representam um fenômeno em
grande expansão nos países subdesenvolvidos. Sua existência está
ligada à possibilidade de uma demanda mais numerosa e mais
diversificada, assim como nas possibilidades de pagamento em
dinheiro líquido ou segundo formas burocráticas de crédito particulares
a certas firmas comerciais. (SANTOS: 2004, pag.87.)
Outra atividade que está no entorno da feira livre e pertencente ao
circuito superior é a bancária, em que os bancos são o elo entre o setor
financeiro e o setor produtivo, tendo como função o financiamento do comércio
da cidade em ambos os circuitos
7
. Dinamiza a economia por meio da facilidade
de crédito; direto no caso dos empréstimos aos aposentados; e, indireto no
financiamento da compra de bens de consumo e serviços.
Como podemos verificar, os empreendimentos do circuito superior, no
entorno da feira livre, não estão muito numerosos, devido à proximidade da
cidade do Recife núcleo da região metropolitana de Pernambuco. Igarassu não
tem uma economia que justifique maior concentração de atividades do circuito
superior; conforme tabela 10, que indica Igarassu como o nono PIB de
Pernambuco, e sétimo na RMR.
7
No caso do circuito inferior, com Box que usam o sistema de cartão de crédito.
97
Tabela 10
10 MAIORES
PIB
DAS CIDADES DE PERN
A
MBUCO
Municípios
2005
PIB (1.000
R$)
Recife
16.664.468
Jaboatão
4.067.013
Ipojuca
3.505.321
Cabo
2.852.381
Olinda
1.937.881
Caruaru
1.576.557
Petrolina
1.549.823
Paulista
1.140.991
Igarassu
629.163
Garanhuns
5
64.875
Fonte: IBGE
3.2.2 Feira Livre e o Circuito Inferior: o espaço informal, instável e
contraditório.
O circuito inferior tem maior representatividade no espaço da feira,
observadas pelas características apontadas no decorrer dessa pesquisa,
algumas das quais serão resgatadas para melhor compreensão do tema. Entre
elas o trabalho intensivo, pois a maioria dos feirantes são donos de seus
estabelecimentos ou tarimbas e emprega, quando necessário, a mão-de-obra
familiar.
Podemos verificar que a produção do espaço na feira livre é construída
e adaptada por elementos do circuito inferior. Sua concepção foi baseada para
a feira, suas adaptações foram executadas para as atividades ligadas ao
circuito inferior, como o mercado da carne e a feira da sulanca. Atividades
essas ligadas à informalidade, pois a feira e os feirantes constituem um
ambiente e reúnem empreendedores representativos do circuito inferior.
Verificamos uma possível divisão dos atores do circuito inferior, na feira
livre de Igarassu, em três grupos distintos.
98
O primeiro formado pelos donos de tarimbas que têm seu espaço
setorizado, demanda alguma organização, havendo o local de venda das
verduras e o local das frutas, com mão-de-obra do proprietário ou familiar. A
relação com o poder público é rotineira e sem maior implicação econômica;
segundo Sr Antonio Miguel Fernandez: “Só vemos o pessoal da prefeitura aqui
no sábado pela manhã para recolher o taxa de uso do solo”.
O segundo grupo é formado pelos proprietários dos Boxes, que como
os donos de tarimbas têm seu espaço definido, mas sem nenhuma setorização.
Os Boxes se distribuem ao acaso, e não seguem nenhuma padronização
imposta. Quanto ao trabalho podemos afirmar que em sua maioria é realizado
por meio de contratos informais de trabalho. No caso dos Boxes existe uma
nova característica: o uso de cartão de crédito, que era restrito ao grande
comércio e passa a ser utilizado por pequenos comerciantes: cerca de 25%
dos boxes apresentam algum tipo de crédito como demonstra a foto 21, com
a marca de alguns cartões de créditos no alto, à esquerda. Quanto ao
pagamento de tributos esse tipo de espaço opta pelo tributo simplificado: o
simples
8
.
8
Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das
Empresas de Pequeno Porte. Tributo Federal que para empresas com faturamento igual ou
inferior a R$ 120.000,00, que unifica oito impostos: Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ);
Programa de Integração Social (PIS); Contribuição para Financiamento da Seguridade Social -
(COFINS); Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSSL); Contribuições para a Seguridade
Social Patronal (INSS sobre Salários, pró-labores e autônomos);Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI); ICMS - Imposto sobre a Comercialização de Produtos e Serviços; ISS -
Imposto sobre Serviços.
99
,Foto 22
FOTO DE UM BOX NA RUA DAS FRUTAS, NA FEIRA LIVRE DE IGARASSU
Foto: Emerson Trevisan, Dezembro de 2007.
O terceiro grupo corresponde aos vendedores ambulantes, que
representam a flexibilidade máxima, característica do circuito inferior. Sem
espaço ou setor definido, estão livres para buscar um melhor lugar conforme as
condições de vendas. O trabalho é totalmente informal e o negociante não se
fixa a uma mercadoria, pois pode vender roupas hoje e relógios amanhã. As
vendas são feitas com muita negociação, pois o preço pode variar dependendo
da necessidade, que o vendedor ambulante ganha para sua sobrevivência.
Neste mesmo grupo estão os trabalhadores do setor de transporte informal,
pois seguem os mesmo preceitos, mudando de bens de consumo para os
serviços.
Quanto ao crédito, notamos que o circuito inferior trabalha com o “fiado”
100
ou “caderneta”. Constituem modalidades de pagamentos a prazo, baseado na
confiança de alguns feirantes em seus consumidores; aqueles anotam em uma
caderneta o valor das compras e recebem o pagamento no dia mais
conveniente para o consumidor. Esta forma de pagamento garante a
sobrevivência de alguns feirantes, sendo ao mesmo tempo um considerável
risco, pois tem como garantia a “palavra” do consumidor. Não é raro encontrar
feirantes com mais dinheiro a receber que o valor das mercadorias de sua
tarimba.
Nesse ritmo os feirantes buscam a sobrevivência, em uma ordem
próxima, construindo e reconstruindo objetos espaciais (fixos), por meio de
ações de sua própria vontade ou para atender a uma demanda (fluxos). Num
processo de totalidade e totalização, de construção e reconstrução do espaço
da feira livre de Igarassu
101
3.3 A Feira Livre de Igarassu, o Circuito Superior e Circuito Inferior: A
convivência do formal e informal num espaço de lutas.
O espaço em países subdesenvolvidos como afirma Santos (2004),
está dividido em dois circuitos, superior e inferior. Sendo construção da
modernidade; um diretamente (superior) outro pelas diferenças econômicas e
sociais criados pela modernidade (inferior). Estando o inferior numa situação de
dependência do superior.
No que se diz respeito ao espaço da feira livre, observamos uma
integração (essa integração não foi evidenciada o que apareceu foi à
convivência) entre o circuito superior e o circuito inferior, mesmo notando que o
comércio e os serviços componentes do circuito superior de Igarassu não
ultrapassam a escala local.
Essa convivência propicia uma tendência à integração entre os dois
circuitos que se pela via do consumidor, pois o espaço da feira e seu
entorno foi transformado no Centro Comercial de Igarassu, esta inclinação é
confirmada aferindo os dados da pesquisa com 500 consumidores da feira
livre.
Pesquisa realizada entre Maio e Novembro de 2007, sendo aplicados
os questionários no espaço da feira livre de Igarassu, numa média de 25
pessoas por dia. Estas eram escolhidas ao acaso, com o pesquisador
transitando pelas ruas. Esta metodologia foi escolhida na tentativa de não fixar
lugar, poderiam ter pessoas de um mesmo local, pois como mencionado
locais específicos de paradas de transportes para regiões determinadas.
102
Tabela 11
TABELA DE TE
N
D
Ê
NCIA DE LOCAL DE COMP
RA DOS CONSUMIDORES DA FEIR
A
Compra (tendência do local)
Entrevistados
Porcentagem
Feira e Box 30 6%
Supermercados, grandes lojas e Bancos 65 13%
As duas opções acima 405 81%
Total 500 100%
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
A questão apresentada aos consumidores tinha o objetivo de
esclarecer qual o local de compra do consumidor, se ele era motivado a buscar
as lojas, supermercados e bancos (superior) ou os Boxes e tarimbas (inferior).
Um fator relevante é que mesmo com a proximidade de cidades com o circuito
superior mais desenvolvido, as pessoas da região
9
que poderiam optar por
esses grandes centros, ficam em Igarassu.
Tabela 12
TABELA PROCED
Ê
NCIA DOS CONSUMIDORES DA FEIR
A
Local Entrevistados Porcentagem
Araçoiaba 65 13%
Itapissuma 43 8,6%
Itamaracá 16 3,2%
Igarassu urbano 274 54,8%
Igarassu Rural (Distrito de Três Ladeiras) 86 17,2%
Igarassu Rural (Distrito de Nova Cruz) 16 3,2%
Total 500 100%
Fonte: Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre os meses de Março e
Dezembro de 2007.
Fica destacada conforme tabela 12, a utilização de consumidores de
outras localidades, de distritos rurais do município, bem como de cidade
circunvizinhas que correspondem a 45,2% dos consumidores pesquisados, que
tem como referência a feira livre como local de compra.
Fica evidenciado, na pesquisa, que o conjunto de atividades dos dois
circuitos é o responsável pela ida do consumidor à feira. A Sr
ª
. Jussara Maria
9
As pessoas advindas de cidades vizinhas como Itamaracá, Itapissuma e Araçoiaba, ou do
distrito de Três Ladeiras poderiam se deslocar para Recife com o mesmo custo de vir para
Igarassu, pois trata-se de uma integração do transporte coletivo metropolitano.
103
de Souza em entrevista, no dia 18/07/2007 relata que: “Venho pagar uma conta
ou receber o ‘aposento’ e aproveito para fazer a feira [...] compro o grosso no
mercado, mas a charque compro na feira”. Deixa clara, a junção na prática de
consumo dos dois circuitos.
Essa integração é possibilitada pela localização de Igarassu no limite
do urbano/rural, pois as outras cidades que fazem limite urbano/rural foram
desmembradas de Igarassu (Itamaracá, Itapissuma e Araçoiaba), conferindo à
cidade certa centralidade em relação a esse conjunto. Os consumidores
dessas localidades se deslocam para Igarassu com objetivo de fazer a “feira”,
bem como resolver problemas administrativos, nos bancos ou prestadoras de
serviços públicos, bem como no sistema de saúde publico. Esta centralidade se
estende para bairros e distritos mais distantes da cidade, conforme a imagem
07, do fluxo de pessoas das áreas acima citadas para a feira.
104
Imagem 07
IMAGEM
10
DO FLUXO DAS CIDADES CIRCUVIZINHAS E DISTRITOS DE IGARASSU
Fonte: Secretaria de Planejamento, Meio Ambiente e Patrimônio Histórico
Fica evidenciado que na junção dos dois circuitos o espaço da feira livre
se organiza e reorganiza. Num processo de construção do lócus, gerando os
fixos e fluxos pertinentes ao espaço do cotidiano, com seu próprio tempo. Um
10
Manipulação da imagem:
Emerson Trevisan, confecção durante o trabalho de campo entre
os meses de Março e Dezembro de 2007.
105
espaço da vida da população com as inter-relações econômicas, políticas e
sociais, transformando o ato do comprar na cultura do “fazer a feira”.
106
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sem ter a pretensão de esgotar o assunto, e na certeza da necessidade de
um melhor aprofundamento no tema, chegamos a algumas considerações no
decorrer desta pesquisa.
Privilegiamos o enfoque econômico em relação ao espaço de Igarassu, pois
nos pareceu a melhor abordagem para o tema, contudo a visão social esteve
presente permeando e perpassando essa pesquisa.
Numa primeira observação, ainda no começo desta pesquisa, o enfoque
principal era o espaço específico da feira livre com suas tarimbas e Boxes; no
decorrer da investigação, nos deparamos com a necessidade de uma visão mais
ampla e passamos a interpelar o espaço da feira e seu entorno, bem como da
microrregião de Itamaracá.
Com essa nova abordagem surgiu um novo dilema, que a princípio nos
pareceu uma questão semântica: a nomenclatura do lugar; Feira Livre ou Centro
Comercial. Adotamos a primeira por uma questão cultural, em respeito aos
trabalhadores e usuários do local, que usam este nome para mencionar o lugar.
Contudo, mesmo adotando o nome feira livre, observamos que a “feira” é na
verdade o Centro Comercial em Igarassu. Pois a ampla maioria do comércio, das
prestadoras de serviços, sejam elas públicas ou privadas, do setor bancário, do
setor de saúde, do sistema de transporte metropolitano e alternativo e dos serviços
de segurança estão localizados no espaço da feira e em seu entorno.
Podemos afirmar que a centralidade do centro comercial tem vários fatores
que abordamos e agora ratificamos. Em primeiro lugar a localização de Igarassu no
107
limite do urbano/rural, pois a feira, que foi a atividade motriz da constituição do
centro comercial, é o espaço de interação entre o urbano e rural, em que este
apresenta seus produtos e aquele a necessidade de consumo dos artigos
indispensáveis.
Outro fator observado, foi o contexto histórico em relação à cana-de-açúcar,
que de certo modo limitou até o final da década de 1980 o desenvolvimento social e
econômico, devido ao seu exclusivismo. Isto de certa maneira conferiu à Igarassu
uma característica de cidade rural.
Uma importante ação, a nosso ver, foi a construção do novo espaço da Feira
Livre de Igarassu, em um espaço mais amplo e planejado, localizado às margens da
PE 35. Com nova área foi possível o crescimento não da feira como do centro
comercial em seu entorno.
A expansão da mancha urbana da Região Metropolitana de Recife foi
estimulada mesmo se chegou a Igarassu com força menor que em outros municípios
da RMR. Esse fenômeno pode ser explicado pela distância física da cidade e o
núcleo de radiação da RMR: Recife. Durante esse processo, municípios no entorno
de Igarassu e mais distantes na direção norte, foram desmembrados do mesmo:
Itamaracá em 1958, Itapissuma em 1982 e Araçoiaba em 1995, mantendo relações
com a cidade original que se equipou por meio da ampliação e deslocamento do seu
espaço comercial
Outra condição para essa centralidade foi que Igarassu passou a ser um
ponto de passagem para estes municípios com a implantação do terminal integrado
de passageiros da EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos). Sendo
passagem obrigatória da população para outros pontos da RMR. Bem como a
108
passagem de veranistas e turistas para a Ilha de Itamaracá, local de muitas
residências de veraneio e de importância turística até meados da cada de 2000,
mas que preserva a condição de cidade turística
Essas condições dão ao espaço da feira uma localização privilegiada em
relação a sua microrregião; por um lado a presença de consumidores da região mais
ao norte da RMR; por outro lado de turistas, que têm em Igarassu o ponto de
compras mais “moderno” da região.
Em relação ao espaço da feira livre, ocorreram reconstruções por
necessidade da adaptação de seus fixos para melhor atender uma demanda
crescente de novos feirantes, que buscaram nesse espaço trabalho e sobrevivência.
Essas adaptações, em sua maioria, ocorreram à revelia do poder público que, como
constatado em entrevista com feirantes, comparece à feira mais no intuito da
cobrança de impostos devidos e apoio político em época de eleições, do que para
uma reorganização radical do espaço. Ao deixar uma certa liberdade, o poder
público reconhece de fato a importância das práticas informais e pode ter permitido o
desenvolvimento de sucessivas adaptações no contexto da flexibilidade que
caracteriza esse espaço.
No tocante à política, pode notar-se a ausência do assunto nessa pesquisa;
pois, desde o início desta, optamos por não enfocar o assunto. Foi uma estratégia
para não se engajar em disputas que pudessem prejudicar nossas observações;
esta estratégia se revelou válida, que os atores da feira nos forneceram todas as
informações solicitadas, algumas não registradas pelo poder público.
Em relação aos Dois Circuitos da Economia dos Países Subdesenvolvidos,
segundo Santos (2006) podemos notar uma maior pujança do circuito inferior, não
109
podendo ser diferente; porque a economia comercial de Igarassu, ainda não
sustenta um circuito superior forte, mas podemos notar um crescimento de
estabelecimentos vinculados a esse circuito, no município.
O fator que nos chamou a atenção é que a feira é um típico espaço do
circuito inferior, contudo foi o norteador para o surgimento do Centro Comercial, e
mesmo após a chegada de empresas do circuito superior, em aparente concorrência
direta com empreendedores do circuito inferior, esse ainda continua forte.
Porém, o mais importante a nosso ver é que é na junção dos dois circuitos,
em um espaço tão próximo e único na cidade, produz-se um espaço de vital
importância para a vida econômica, social, política e cultural da cidade. É nele que
muitos vão à busca de alimentos mais baratos e em pouca quantidade, vendidos na
feira livre; à busca do emprego formal que está surgindo com o ingresso de
supermercados e lojas de departamentos de redes da RMR; à busca, no caso dos
camelôs, do sustento da família. Esse espaço é privilegiado, instável e contraditório,
nele a vida pulsa numa constante busca pela sobrevivência. É palco das
construções e reconstruções, não um espaço de resistência, mas sim de constantes
adaptações.
Com as considerações acima feitas, fica uma indagação que revela a
relevância da continuidade dos estudos sobre o tema. A variante econômica,
representada em grande parte pela necessidade da busca pelo sustento, tem sobre
a formação e reconstrução do espaço da feira livre uma importância maior que a
variante sociocultural. Essa indagação, e motivação para a continuidade da pesquisa
com um aprofundamento necessário ao tema.
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n06 - Junho/86.
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