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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
MARCIANO KAPPAUN
A PRÁXIS SOCIAL DA IGREJA:
ANÁLISE DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA BATISTA
INDEPENDENTE NO CONTEXTO BRASILEIRO
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2007
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MARCIANO KAPPAUN
A PRÁXIS SOCIAL DA IGREJA:
ANÁLISE DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA BATISTA
INDEPENDENTE NO CONTEXTO BRASILEIRO
Dissertação apresentada no Programa de
Pós-Graduação em Ciências da Religião,
da Universidade Metodista de São Paulo,
em cumprimento parcial às exigências
para obtenção do grau de Mestre.
Orientador:
Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2007
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FICHA CATALOGRÁFICA
Kappaun, Marciano
A práxis social da Igreja : análise das práticas sociais da Igreja Batista
Independente no contexto brasileiro. São Bernardo do Campo, 2007.
190 p.
Dissertação (Mestrado)
Universidade Metodista de São Paulo, Faculdade
de Filosofia e Ciências da Religião, curso de Pós-
Graduação em Ciências da
Religião.
Orientação de : Geoval Jacinto da Silva
1. Práxis (Teologia) 2. Terceiro setor 3. Igreja problemas sociais 4. Fé
(Teologia cristã) 5. Cidadania 6. Igreja Batista I. Título.
CDD 286.181
4
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________________________________
Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva Presidente
____________________________________________________________________
Prof. Dr. Clovis Pinto de Castro
____________________________________________________________________
Prof. Dr. Almiro Schulz
5
AGRADECIMENTOS
Ao Conselho Nacional de Pesquisa Científica CNPq, pela concessão da
bolsa de estudos, sem a qual não seria possível realizar esta pesquisa.
Ao Instituto Ecumênico de Pós-Graduação IEPG, pela concessão de bolsa
de estudos e de recursos para participar de eventos acadêmicos.
Ao professor Prof. Dr. Clovis Pinto de Castro, que me apoiou nesta
caminhada e contribuiu com sua fé cidadã para a pesquisa e a minha formação.
À Universidade Metodista de São Paulo, casa que me acolheu de braços
abertos, proporcionando condições favoráveis de aprendizado.
Ao corpo docente, funcionários e colegas do Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Religião, pelo convívio estimulante e pela contribuição na minha
formação acadêmica.
Meu reconhecimento especial ao Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva, pela
dedicação paciente na orientação desta pesquisa, pela amizade e apoio constante.
A Léia Alves de Souza, amiga e cooperadora fundamental desde o início da
minha caminhada no Programa de Pós-Graduação.
A FEPAS e CIBI, pela abertura dos seus arquivos para a realização desta
pesquisa e por todo apoio de sua equipe de colaboradores.
A minha família, irmãos, cunhada, sobrinhos, em especial aos meus pais Luiz
Carlos e Clair Maria Kappaun, pelo apoio e solidariedade constante.
Agradeço especialmente a minha esposa Renata Gontijo Kappaun, pela
cumplicidade vivida no cotidiano da vida conjugal.
6
DEDICATÓRIA
Aos cidadãos comuns,
que se inscrevem na trajetória das lutas por um mundo melhor,
sujeitos históricos das sociedades do passado e do presente, que contribuem
para a construção de uma sociedade mais solidária e justa, onde caibam todos.
7
KAPPAUN, Marciano. A práxis social da Igreja: análise das práticas sociais da
Igreja Batista Independente no contexto brasileiro. Dissertação de Mestrado do
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de
São Paulo, São Bernardo do Campo, 2007, 190 p.
SINOPSE
No mundo globalizado vivenciamos o agravamento das questões sociais
relacionadas às concepções do mercado neoliberal, do Estado mínimo, da
privatização dos serviços públicos e, as organizações não-governamentais e o
advento do chamado Terceiro Setor. Esta pesquisa contempla uma análise do
fenômeno religioso, referente à inserção pública da Igreja por meio das práticas
sociais institucionalizadas vinculadas as suas organizações neste contexto social, na
perspectiva de enfrentamento dos problemas sociais. No desenvolvimento da
pesquisa utilizamos o método histórico para descrever e analisar a inserção pública
da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro, a partir do estudo de
documentos relacionados às primeiras iniciativas e o desenvolvimento das práticas
sociais desta Igreja no contexto brasileiro. Com a descrição analítica deste fenômeno
verifica-se a incidência de práticas de transformação social, caracterizando-se como
práxis social e, ainda, elementos que contribuem para o exercício da cidadania estão
no bojo das práticas sociais da Igreja. A pesquisa apresenta a análise das práticas
sociais da Igreja, na perspectiva da interdisciplinaridade, apontando elementos que
influenciaram as transformações sociais nos últimos anos e relaciona a contribuição
da práxis social para o exercício da fé cidadã.
PALAVRAS CHAVE: práxis social, Igreja, instituições, fé cidadã, transformação
social.
8
KAPPAUN, Marciano. The social praxis of the church: an analysis of the social
practices of the Independent Baptist Church in the Brazilian context. Masters
Dissertation, Graduate School of Religion, the Methodist University of São Paulo,
São Bernardo do Campo, 2007, 190 p.
ABSTRACT
In a globalized world we have experienced the increasing complexity of
social questions related to concepts of market, the minimum impact of the State, the
advent of the so-called Third Sector, and the privatization of public services in light
of non-governmental organizations. This research contemplates an analysis of the
religious phenomenon related to this process, and seeks to understand the public
insertion of the Church in terms of its institutional social practices via its relevant
social organizations, specifically in terms of dealing with social problems. The
research uses historical method in order to describe and analyze the public insertion
of the Independent Baptist Church in the Brazilian context, based on the study of
documents related to the first initiatives and the development of the social practices
of the Church. By means of the descriptive analysis of this phenomenon we can
verify the incidence of practices of social transformation, characterized by social
praxis, and elements that reinforce the exercise of citizenship in the midst of the
social practices of the Church, which are analyzed via the perspective of a social
faith. The research presents an analysis of the social practices of the Church in
dialogue with the elements that influence social transformations in recent years, and
relates the contribution of social praxis to the exercise of a social faith.
KEY-WORDS: social praxis, Church, institutions, social faith, social
transformation.
9
ABREVIATURAS
APB Apadrinhamento Brasileiro
APS Apadrinhamento Sueco
CIEBIB Convenção das Igrejas Evangélicas Batistas Independentes do Brasil
CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CIBI Convenção das Igrejas Batistas Independentes
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
FEPAS Federação das Entidades e Projetos Assistenciais
ONGs Organizações Não-Governamentais
OSIPS Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
SGDCA Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente
LT Luz nas Trevas
SUS Sistema Único de Saúde
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
SUMÁRIO
ABREVIATURAS
INTRODUÇÃO.....................................................................................................12
CAPÍTULO 1
EPISTEMOLOGIA DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA A PARTIR
DE UMA CONCEPÇÃO INTERDISCIPLINAR..............................................20
1.1. A HISTORIOGRAFIA DAS PRÁTICAS SOCIAIS: A OPERAÇÃO HISTORIOGRÁFICA
DE MICHEL DE CERTEAU .......................................................................................23
1.2. EPISTEMOLOGIA DA PRÁXIS SOCIAL ...............................................................27
1.2.1. O conceito de prática no cotidiano ........................................................27
1.2.2. A prática como fundamento formativo da práxis ....................................29
1.2.3. A práxis social como atividade humana de transformação .....................32
1.3. EPISTEMOLOGIA DA PRÁXIS CRISTÃ ...............................................................36
1.3.1. A práxis cristã no cotidiano .................................................................. 37
1.3.2. Missão profética do anúncio e denúncia martyría ...............................42
1.3.3. A fraternidade solidária cristã koinonia................................................45
1.3.4. A celebração da vida no cotidiano liturgia ...........................................47
1.3.5. Compromisso da práxis libertadora diakonia.......................................49
1.4. PRÁXIS CRISTÃ E O EXERCÍCIO DA FÉ CIDADÃ: ELEMENTOS FUNDAMENTAIS
DA PASTORAL DA CIDADANIA .................................................................................51
1.4.1. A esfera da ação humana no cotidiano............................................. 54
1.4.2. A formação do cidadão crítico e sujeito histórico................................ 56
1.4.3. A construção coletiva do poder local................................................ 57
1.4.4. O paradigma missionário do shalom................................................ 58
1.5. DIÁLOGO INTERDISCIPLINAR NA DEFINIÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO
PARA ANÁLISE DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA: POSSIBILIDADES E LIMITES....61
1.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO........................................ 64
CAPÍTULO 2
A IMPLANTAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA MISSÃO BATISTA
SUECA NO BRASIL A PARTIR DO RIO GRANDE DO SUL ....................65
2.1. A MISSÃO BATISTA SUECA E A RELAÇÃO COM O MOVIMENTO
MISSIONÁRIO PROTESTANTE LATINO-AMERICANO ..............................................67
2.2. OS SUECOS A CAMINHO DO BRASIL: RETROSPECTO DA IMIGRAÇÃO
SUECA ENTRE 1819 E 1970 ..................................................................................71
2.3. PRIMÓRDIOS DA ATIVIDADE MISSIONÁRIA BATISTA SUECA NA
VILA GUARANY ......................................................................................................79
2.4. A IMPLANTAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO ESCOLAR SUECA E A IDENTIFICAÇÃO
COM AS QUESTÕES SOCIAIS .................................................................................87
2.5. A ORGANIZAÇÃO E EXPANSÃO DA IGREJA BATISTA INDEPENDENTE
NO BRASIL ..............................................................................................................99
2.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO ...........................................104
CAPÍTULO 3
ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA
BATISTA INDEPENDENTE NO CONTEXTO BRASILEIRO ..................... 107
3.1. O CONTEXTO DAS RELAÇÕES SOCIAIS NO MUNDO GLOBALIZADO ................. 108
3.2. PRIMEIRAS INICIATIVAS DE INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA: AS PRÁTICAS
SOCIAIS DOS MISSIONÁRIOS SUECOS E LIDERANÇAS BRASILEIRAS LOCAIS ..........118
3.3. AMPLIAÇÃO NACIONAL DA INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA: AS PRÁTICAS
SOCIAIS A PARTIR DA CRIAÇÃO DO DEPARTAMENTO DE AÇÃO SOCIAL ................132
3.4. NOVA ABORDAGEM METODOLÓGICA DE INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA:
AS PRÁTICAS SOCIAIS A PARTIR DA FUNDAÇÃO DA FEDERAÇÃO DAS ENTIDADES
E PROJETOS ASSISTENCIAIS .................................................................................138
3.5. A PRÁXIS SOCIAL DA IGREJA E O EXERCÍCIO DA FÉ CIDADÃ NA CONSTRUÇÃO DE
UM MUNDO ONDE CAIBAM TODOS: A DINÂMICA ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO...153
3.5.1. Práxis Educacional para a formação do sujeito cidadão ...........................155
3.5.2. Desenvolvimento sustentável e o poder local como alternativas
democráticas para o desenvolvimento humano.........................................160
3.5.3. A práxis social na formação das redes de cooperação: compartilhar
experiências com as novas gerações ................................................................163
3.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO ...........................................167
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................169
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................176
ANEXOS ..............................................................................................................188
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa realiza a descrição e análise das práticas sociais da Igreja
Batista Independente, que foi implantada no Brasil no ano de 1912, por meio das
atividades missionárias da Missão Batista Sueca, no interior do Rio Grande do Sul.
Sua preocupação está voltada para as questões sociais no contexto brasileiro,
considerando o processo da globalização,
1
a forma predatória do emprego do capital
no sistema de produção de riquezas, que não permite a participação da maior parcela
da população nos resultados do progresso econômico mundial. Diante disso, essa
parcela majoritária da população sofre com a má distribuição de renda e não possui
acesso aos bens e mercadorias básicas, indispensáveis para a subsistência humana.
Em conseqüência desse processo globalizante e excludente, as crianças,
adolescentes, jovens e idosos que representam a maior parcela da população
brasileira, e também a mais afetada neste processo é impossibilitada de ter o acesso
às condições mínimas de dignidade, engrossando diariamente o crescimento daquilo
que Assmann denomina como “massa sobrante”.
2
Para o mercado, essa massa sobrante, ao contrário do escravo, não possui
valor econômico em si mesma; por esta razão, é apenas uma multidão de “seres
1
Sobre a relação entre o fenômeno da globalização e a missão da Igreja ver: SILVA, G. J.. O Processo
de globalização e a missão Implicações bíblico-teológicas e pastorais. In: Culturas e
Cristianismo. São Paulo: Loyola, 1999; a respeito deste fenômeno com cultura, pós-modernidade e
identidade ver: FEA THERSTONE, M. O Desmanche da Cultura. Globalização, Pós-Modernismo
e Identidade. São Paulo: Studio Nobel, 1997 e; ainda, sobre a relação com a política e cidadania
ver: GÓMEZ, José Maria. Política e democracia em tempos de globalização. Petrópolis/Buenos
Aires/Rio de Janeiro: Vozes/CLASCO/Laboratório de Políticas Públicas, 2000; VIEIRA, Liszt.
Cidadania e globalização. Rio de Janeiro: Record, 1997.
2
ASSMANN, Hugo. Crítica à Lógica da Exclusão: ensaios sobre a economia e teologia. São Paulo:
Paulus, 1994, p. 5.
humanos descartáveis”.
3
Para Konder, esta desvaloração do ser humano relaciona-se
com “a distorção ideológica mais eficientemente perversa do modo de produção
capitalista é alcançado através da redução da força humana de trabalho a
mercadoria
4
, onde somente aqueles que estão inseridos no mercado de trabalho é
que possuem um determinado valor, porém, apenas como mercadoria. Esta valoração
do ser humano como mercadoria demonstra a insensibilidade do mercado diante das
vidas humanas.
Trata-se de uma lógica em que o mercado é absolutizado, por meio da qual,
rapidamente, a opressão e a exploração, referem-se apenas à marginalização dos
indivíduos em relação ao mercado. Para Giulio Girardi, esta interpretação
conquistadora e dominadora do mercado, pressupõe o direito da conquista e da
colonização, negando o direito dos povos, que são classificados como: primitivos,
selvagens e inferiores. Segundo ele, esta visão precisa e deve ser contraposta pelo
direito da autodeterminação solidária, e re-fundar a esperança dos povos na
construção de um mundo diferente.
5
No Brasil, a complexidade da exclusão social tem sido expressa no aumento
da pobreza, do desemprego, da violência e das desigualdades sociais. Em estudo
recente, Pochmann apresenta um quadro da realidade brasileira, comparando os
dados atuais com os dos últimos 40 anos, para definir o nível de exclusão social.
6
Os
3
De acordo com Assmann, existem cerca de 196 milhões de latino-americanos que vivem na pobreza
e correspondem a 45% da população global, a metade da qual “vegeta em situação de indigência e
miséria extremas”, sub-nutridos, empobrecidos e miseráveis. Op. Cit., ASSMANN, Hugo, pp. 5-6.
4
KONDER, Leandro. O futuro da filosofia da práxis: o pensamento de Marx no século XXI. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1992, p. 10.
5
GIRARDI, Giulio. Desenvolvimento Local Sustentável, Poder Local Alternativo e Refundação da
Esperança. In: PIXLEY, Jorge (Coord.). Por um mundo diferente: alternativas para o mercado
global. São Paulo: Vozes, 2005, p. 101.
6
Esses parâmetros foram analisados para medir o nível de exclusão social no Brasil, foram baseados
nos índices do IBGE e do SUS (para taxas de homicídios), cf. POCHMANN, Marcio, AMORIM,
resultados apontam para o aumento da exclusão social no Brasil. Na década de 60,
era de 49,3% proporcional a uma população de 69,7 milhões de habitantes, mas
apesar da redução do índice, o quadro brasileiro não é apenas preocupante, como
também é um dos quadros mais sérios em relação à distribuição de renda no mundo,
que no ano de 2000 era de 47,3% em relação a uma população de 170 milhões.
7
Com a despolitização do espaço público, implementada na sociedade de
massa e de consumo, verifica-se o empobrecimento da política e da mobilização
social em torno dos interesses comuns, dificultando o enfrentamento dos problemas
sociais no mundo contemporâneo. Por outro lado, essa despolitização tem
contribuído para a manutenção do status quo social, manipulada pelos interesses das
elites e do capital financeiro, enfraquecendo a atuação do Estado frente aos
problemas sociais, que, por sua vez, transfere esta responsabilidade para a sociedade
civil. Na década de 90, quando ocorreram mudanças no modelo de associativismo
em todo o mundo, a sociedade civil precisou mobilizar-se, por meio dos movimentos
sociais e das Organizações Não-Governamentais (ONGs), para enfrentar os
problemas sociais, que se tornaram um dos grandes atores sociais.
A transferência dos serviços públicos para a sociedade civil, por intermédio
das ONGs, traz à tona um outro elemento que é responsável pela ideologia e
implementação das atividades nessas instituições, o chamado Terceiro Setor. Apesar
das divergências conceituais a respeito do Terceiro Setor
8
, este tem representado um
Ricardo (orgs.) Atlas da exclusão social: dinâmica e manifestação territorial. Vol. 1. São Paulo:
Cortez, 2004. Veja também outros estudos relacionados com a exclusão social, como CAMPOS,
André (org.) Atlas da exclusão social: dinâmica e manifestação territorial. Vol. 2. São Paulo:
Cortez, 2004; POCHMANN, Marcio (org.) Atlas da exclusão social: os ricos no Brasil. Vol. 3. São
Paulo: Cortez, 2004; Atlas da exclusão social: a exclusão no mundo. Vol. 4. São Paulo: Cortez,
2004.
7
PASQUATTO, Jô. Pesquisa mostra aumento do índice de exclusão social no Brasil. In: Estadão, 23
de mai. 2003. Disponível em http://www.estadao.com.br/agestado/noticias/2003/mai/20/157.htm.
8
Sobre a fundamentação do chamado Terceiro Setor, veja MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e a
fenômeno de proporções mundiais e tem incorporado as ações referentes ao
enfrentamento das questões sociais, por meio de ações organizadas da sociedade civil
e das empresas no mundo contemporâneo.
Essa nova metodologia de intervenção social resume uma tendência
neoliberal, que impõe o Estado mínimo como condição para o desenvolvimento
econômico e a organização eficiente da sociedade civil para a manutenção desse
desenvolvimento e a eficiência do Estado.
9
No Terceiro Setor ocorre o oferecimento mais eficiente de serviços à
população por intermédio das ONGs, os quais não são oferecidos pelo Estado, em
razão da sua condição mínima. Por outro lado, é o mercado que investe no Terceiro
Setor por meio de incentivos de isenções fiscais e financia estas organizações,
oferecendo serviços para grande parcela da população excluída dos meios de
produção e consumo.
A ação das empresas no Terceiro Setor vem permitindo a mobilização e a
atuação da sociedade civil, no enfrentamento de problemas sociais imediatos em todo
o país, por intermédio das ONGs. Porém, ao mesmo tempo em que amenizam
algumas situações localizadas e imediatas, também promovem a privatização dos
serviços públicos de responsabilidade do Estado, e reproduzem em suas práticas
sociais a mesma lógica do modelo econômico neoliberal, que é um dos responsáveis
pela produção da exclusão social no Brasil e no mundo.
questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002;
FERNANDES, Rubens Cesar. Privado porém público: Terceiro Setor na América Latina. Rio de
Janeiro: Relume Dumará, 1994; GOHN, Maria da Glória. O novo associativismo e o terceiro setor.
In: Serviço social e sociedade, Ano XIX, n. 58, nov. 1998. No que se refere a regulamentação,
registros e obrigações legais, financiamento de projetos sociais e legislação aplicável ao Terceiro
Setor, veja SZAZI, Eduardo. Terceiro Setor e regulação no Brasil. São Paulo: Peirópolis, 2000.
9
Ver uma contribuição importante a respeito da relação entre competência e solidariedade, na
compreensão do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Banco Interamericano de
Desenvolvimento; ASSMANN, Hugo, MO SUNG, Jung. Competência e sensibilidade solidária.
Petrópolis: Vozes, 2000, pp. 53-56.
O fenômeno da privatização dos serviços públicos, ocorrido na década de 90,
tem relação com a nova forma de organização e mobilização social, representada
pelas ONGs, no advento do Terceiro Setor. Por outro lado, o surgimento destes foi
provocado pelo fenômeno da globalização e da hegemonia do modelo econômico
neoliberal. Estas questões nos levam ao questionamento da inserção pública da Igreja
por meio das práticas sociais, no tocante a sua possibilidade de instaurar o novo no
espaço público, em especial, quando esta práxis cristã tem como elemento
fundamental a característica de transformação do homem (como ser social) e do
mundo em que vive (a sociedade).
Portanto, nos parece necessário provocar a reflexão a respeito do papel da
Igreja neste processo de privatização dos serviços públicos, em princípio, de
responsabilidade do Estado? Se estas práticas sociais têm sido transformadoras ou
têm contribuído para a manutenção do modelo neoliberal excludente? Que tipos de
práticas sociais contribuem para o enfrentamento dos problemas sociais, e em que
medida as práticas sociais da Igreja tem contribuído para a transformação da
realidade social?
Essas inquietações motivaram a descrição e a análise da estratégia de inserção
pública da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro, por intermédio das
práticas sociais desenvolvidas no interior das suas instituições, que estabelecemos
duas hipóteses passíveis de verificação no decorrer da pesquisa: 1°As práticas sociais
da Igreja Batista Independente podem ser consideradas práxis social por objetivarem
a transformação da sociedade e, 2° Estas práticas sociais se conformam com o
conteúdo do Reino de Deus e com o exercício da cidadania.
10
10
A cidadania é compreendida nesta pesquisa como atributo do cidadão, como forma de participação
da vida pública e privada, com a prerrogativa de direitos e deveres. A cidadania plena diz respeito
Por se tratar de uma pesquisa em Ciências da Religião, este trabalho se
caracteriza pela interdisciplinaridade, que pretende construir um todo coerente a
partir das contribuições das Ciências Humanas e da Teologia Prática. Realizamos a
verificação das hipóteses a partir da descrição analítica do fenômeno religioso,
referente à inserção pública da Igreja Batista Independente, circunscrita nas ações de
suas instituições no contexto brasileiro.
Neste esforço, foi utilizado o método historiográfico de Michel de Certeau,
com sua contribuição crítica na classificação e no tratamento das fontes (documentos
e bibliografias) e na relação que faz entre o lugar de produção da história, com uma
prática que está relacionada aos métodos científicos empregados na pesquisa do
fenômeno e no exercício da compilação de um texto.
11
Por outro lado, a Teologia Prática de Casiano Floristán, na sua compreensão
de teoria geral da ação cristã, nos forneceu o referencial da práxis cristã, referindo-se
às práticas cotidianas dos cristãos com a ênfase na ação transformadora. Para
Floristan, existem elementos fundamentais que caracterizam a práxis cristã. Segundo
ele, a práxis precisa ser uma ação criadora, reflexiva, libertadora e radical.
12
Neste sentido de ação humana transformadora, a práxis social, compreendida
a partir da Filosofia da Práxis como atividade capaz de levar à transformação da
realidade social, ou seja, como atividade política, contribui para analisar o nível de
diálogo entre a Igreja, a sociedade civil e o Estado.
ao exercício dos deveres do cidadão e do gozo pleno dos seus direitos. Portanto, nossa perspectiva
de cidadania, se refere a uma perspectiva emancipatória do sujeito cidadão. Veja a descrição de
Pedro Demo a respeito da cidadania em DEMO, Pedro. Cidadania tutelada e cidadania assistida.
Campinas: Ed. Autores Associados, 1995, p. 1. Para uma compreensão histórica no contexto
brasileiro ver CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
11
A principal contribuição de Certeau para a historiografia contemporânea, refere-se a sua célebre
obra A escrita da história, utilizada como referência nesta pesquisa das práticas sociais da Igreja.
12
Nossa referência é a monumental obra de Teologia Práctica: teoría y praxis de la acción pastoral
de Floristán.
Considerando a pluralidade religiosa no contexto brasileiro, esta pesquisa
busca apontar caminhos à práxis social da Igreja, a partir da compreensão de uma
dimensão pública da fé cristã, entendida por Castro como fé cidadã “que motiva e
mobiliza a ação dos cristãos na esfera pública”.
13
Esse diálogo interdisciplinar entre
a fé e a cidadania contempla uma atualização da práxis cristã, na qual a fé é
ressignificada à luz da dimensão pública da Igreja.
Os resultados obtidos com a presente pesquisa a respeito das práticas sociais
da Igreja Batista Independente está estruturada em três capítulos. No primeiro
capítulo, apresentam-se os referenciais teóricos que permearam o desenvolvimento
deste trabalho, onde trata-se das definições dos termos da pesquisa, da delimitação
do tema/problema e busca-se estabelecer um diálogo a partir das contribuições da
historiografia, da filosofia da práxis, da teologia prática e da pastoral da cidadania.
Na segunda parte da pesquisa, será apresentada a descrição analítica do lugar
de origem das práticas sociais da Igreja. Descrevendo a relação da Missão Batista
Sueca no interior do Brasil com o protestantismo latino-americano e com os
imigrantes suecos no Rio Grande do Sul, onde localiza-se historicamente sua
identificação com as questões sociais, apresenta-se um breve retrospecto desde a
implantação até a organização da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro.
No terceiro capítulo, buscou-se realizar a análise do desenvolvimento das
práticas sociais da Igreja, apresentando o contexto das relações sociais no mundo
globalizado, aprofundando a análise na primeira fase de inserção pública da Igreja
por meio de ações isoladas dos missionários e lideranças locais. Passa-se para a
segunda fase de desenvolvimento dessas práticas sociais, com a ampliação
13
CASTRO, Clovis Pinto de. Por uma fé cidadã a dimensão pública da Igreja. São Paulo/São
Bernardo do Campo: Loyola/ UMESP, 2000, p. 15.
denominacional e nacional, até chegar ao desenvolvimento atual, que buscado
ampliar suas ações para superar o simples assistencialismo por meio da ação social.
Por fim, relaciona-se a práxis social da Igreja com a sua contribuição para o exercício
da fé cidadã.
Os documentos e a bibliografia utilizados possibilitaram a elaboração desta
pesquisa e o cumprimento de seu objetivo; no entanto, esta não pretendeu esgotar o
assunto, mas procurou possibilitar um olhar diferenciado das práticas sociais da
Igreja na perspectiva da práxis social e do exercício da fé cidadã. Há, portanto, ainda
outras possibilidades para a realização de novas pesquisas em torno deste tema.
CAPÍTULO 1
EPISTEMOLOGIA DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA A
PARTIR DE UMA CONCEPÇÃO INTERDISCIPLINAR
A presente pesquisa das práticas sociais da Igreja Batista Independente no
contexto brasileiro está alinhada com a área da Práxis Religiosa e Sociedade, no
campo das Ciências da Religião, que, por sua vez, tem como objeto de estudo o
fenômeno religioso. Neste sentido, buscou-se abordar o fenômeno na perspectiva da
práxis religiosa, analisando as estratégias de inserção da Igreja na sociedade, ou seja,
focando a análise na “ (...) ação das instituições e dos movimentos eclesiais na
sociedade”.
14
O objeto desta pesquisa é o fenômeno religioso, que se coloca diante de nós
impondo limites para sua compreensão, por se tratar de “um entrelaçamento
concreto, historicamente dado, entre determinadas ‘individualidades’ religiosas com
14
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião: mestrado e doutorado. Universidade
Metodista de São Paulo, 2004, p. 16.
sua particular lógica e estrutura e determinados contextos histórico-sociais.
15
Após
a realização do estudo analítico, é função do pesquisador buscar compreender o
fenômeno específico e reconstruí-lo a partir desta “trama subjacente.
16
É nesta
perspectiva de complexidade que se apresenta o estudo do fenômeno religioso no
mundo contemporâneo.
Inicia-se a exposição da pesquisa sobre as práticas sociais da Igreja por meio
de alguns apontamentos a respeito do referencial teórico. Analisando a literatura
publicada a respeito do tema, pode-se verificar a adequação do referencial teórico,
que objetivará “ (...) traçar um quadro teórico e fará a estruturação conceitual que
dará sustentação ao desenvolvimento da pesquisa.
17
É a partir deste quadro de
referências que será determinado o estado do atual desenvolvimento da pesquisa
sobre o tema das práticas sociais e, ainda, “ (...) quais as lacunas existentes e onde se
encontram os principais entraves teóricos ou metodológicos”
18
, para que se possa
desenvolver analiticamente e discutir os resultados da pesquisa sobre as práticas
sociais da Igreja.
19
A exposição dos referenciais permitirá uma “compilação crítica e
retrospectiva de várias publicações, o estágio de desenvolvimento do tema da
15
FLORIANO, Giovanni, PRANDI, Carlo. As ciências das religiões. São Paulo: Paulus, 1999, p. 20.
16
Ibidem.
17
SILVA, Edna Lucia da. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. Florianópolis:
Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001, p. 37.
18
Ibidem.
19
De acordo com Silva, os “resultados (análise e discussão) descrevem analiticamente os dados
levantados, por uma exposição sobre o que foi observado e desenvolvido na pesquisa. A descrição
pode ter o apoio de recursos estatísticos, tabelas e gráficos, elaborados no decorrer da tabulação dos
dados. Na análise e discussão, os resultados estabelecem as relações entre os dados obtidos, o
problema da pesquisa e o embasamento teórico dado na revisão da literatura. Os resultados podem
estar divididos por tópicos com títulos logicamente formulados”; Op. Cit., SILVA, Edna Lucia da,
p. 94.
pesquisa”
20
, e fornecerá elementos para estabelecer um referencial teórico que
suporte o desenvolvimento desta pesquisa.
É necessário afirmarmos, desde o início, que o referencial apropriado para a
pesquisa das práticas sociais da Igreja, indiscutivelmente, precisa possuir a
característica interdisciplinar, que possibilite uma visão ampla do tema e o diálogo
entre as Ciências Humanas. Esta característica é fundamental para a leitura adequada
do fenômeno religioso em seu contexto social específico. De acordo com Leonildo S.
Campos, a realidade é uma arena na qual atuam forças multiformes que apresentam
relativa desordem, diversidade e incerteza; por esta razão, o autor afirma que, com
relação à realidade ou realidades, é necessária uma compreensão que resgate
(...) tanto a dimensão flexível como global dos fenômenos religiosos,
valorizando-se a policausalidade, levando em consideração os
condicionamentos filogenéticos e ontogenéticos, enfatizando o equilíbrio
social como algo dinâmico, resultante de desequilíbrios localizados e
transitórios, provenientes de origens endógenas e exógenas de uma
determinada sociedade.
21
É necessário que haja um diálogo entre as Ciências da Religião e as Ciências
Humanas como será visto no decorrer da exposição com a meta de promover a
interface entre os referenciais teóricos, para contribuir no enriquecimento da
pesquisa.
Nesse sentido, propõe-se a investigação a partir das contribuições de alguns
autores importantes: a compreensão do método historiográfico de Michel de Certeau,
da filosofia da práxis/política de Adolfo Sánchez Vázquez, da teologia prática de
Casiano Floristán e, também, a contribuição de Clovis Pinto de Castro a respeito da
20
Op. Cit., SILVA, Edna Lucia da, p. 93.
21
CAMPOS, Leonildo Silveira. Estudo do pentecostalismo diante das mudanças de paradigmas em
Ciências da Religião. In: Novos paradigmas. Série Ensaios de Pós-Graduação/Ciências da Religião,
Ano I, n. 1, nov. 1995, p. 36.
sua concepção de fé cidadã.
22
Neste capítulo inicial, o objetivo é apresentar os métodos
23
que serão
utilizados na pesquisa de forma interdisciplinar, para realizar-se a descrição das
práticas sociais da Igreja, e os procedimentos empregados para a análise crítica da
estratégia de inserção pública da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro.
1.1. A HISTORIOGRAFIA DAS PRÁTICAS SOCIAIS: A OPERAÇÃO HISTORIOGRÁFICA DE
MICHEL DE CERTEAU
Para a realização da pesquisa sobre as práticas sociais da Igreja, é necessário
esclarecer a conceituação a respeito da história e da historiografia. Por esta razão,
lançar-se-á mão da compreensão de Michel de Certeau, que afirma que o “fazer
história”, está ligado a uma operação que relaciona um lugar, uma prática e uma
escrita.
Isto implica em substituir o fazer historiográfico pelo dado histórico,
transformando “ (...) a pesquisa de um sentido desvendado pela realidade observada,
22
As obras que servirão de referência para a descrição, sistematização e análise, sobre o tema das
práticas sociais da Igreja, correspondem respectivamente a: A escrita da história, Filosofia da
práxis, Teologia Práctica: teoría y praxis de la acción pastoral e a obra Por uma fé cida a
dimensão pública da Igreja.
23
Decidiu-se utilizar métodos, seguindo a orientação interdisciplinar e do pensamento complexo,
compreendendo que “ (...) a ciência não é fruto de um roteiro de criação totalmente previsível.
Portanto, não há apenas uma maneira de raciocínio capaz de dar conta do complexo mundo das
investigações científicas. O ideal seria (...) empregar métodos, e não um método em particular, que
ampliem as possibilidades de análise e obtenção de respostas para o problema proposto na
pesquisa, Op. Cit., SILVA, Edna Lucia da, p. 28.
em análise das opções ou das organizações de sentido implicadas por operações
interpretativas.
24
Tal noção, por sua vez, não poderá ser apreendida como um conhecimento
particular extraído da realidade ou acrescentado a ela, justamente porque
todo “fato histórico” resulta de uma práxis, porque ela já é o signo de um
ato e, portanto, a afirmação de um sentido. Este resulta dos procedimentos
que permitiram articular um modo de compreensão num discurso de
“fatos”.
25
A explicação do passado marca a distinção do aparelho explicativo presente,
em relação ao material explicado, como os documentos relativos ao passado,
sistematizando as práticas, com técnicas que permitem administrar a complexidade
do presente.
Além da curiosidade do pesquisador acerca do passado, a combinação em um
mesmo texto, com o objetivo de fazer dele “simultaneamente a ‘redução’ científica e
a metaforização narrativa das estratégias de poder próprias de uma atualidade”
26
,
onde o real inscrito no discurso historiográfico advém, e é, determinado por um
lugar, portanto, o discurso deve estar ligado a sua produção, assim como a “práxis
política, econômica ou religiosa, que muda as sociedades e que, num momento dado,
torna possível tal ou qual tipo de compreensão científica.
27
Outra característica importante da pesquisa historiográfica, diz respeito ao
desaparecimento do período no qual ocorreram certas práticas no passado. Esta
24
CERTEAU, Michel. Práticas históricas e práxis social. In: A escrita da história. Forense
Universitária: Rio de Janeiro, 2002, p.41.
25
Ibidem.
26
A organização deste texto ocorre, de acordo com Certeau, pela “reunião dos documentos à redação
do livro, a prática histórica é inteiramente relativa à estrutura da sociedade”; Op. Cit. CERTEAU,
Michel, pp. 21 e 74.
27
Ibidem.
relação com o período que neste trabalho referir-se-á às práticas sociais da Igreja
de acordo com Certeau, promove um distanciamento que contribui para uma
tal lucidez, mas esta compreensão, pretensamente ‘melhor’, que de agora
em diante é a nossa, se refere ao fato de estarmos deslocados: nossa
situação nos permite conhecer a deles de outra maneira que eles a
puderam conhecer.
28
Sendo assim, é preciso buscar perceber que acontecimentos e/ou mutações
sociais e políticas tornam possível “um novo olhar científico [que] é, justamente, um
dos indícios através do qual se exprime ou se demarca um ‘acontecimento’.
29
Este novo olhar científico, segundo Certeau, permite compreender a operação
historiográfica como teoria articulada com as práticas, que se orientam na direção de
uma teoria aberta às práticas sociais, mas que também organiza-se em torno de
procedimentos “próprios de uma disciplina.
30
Para compreender a história como
operação, é preciso estabelecer uma combinação que relaciona
um lugar (um recrutamento, um meio, uma profissão, etc.),
procedimentos de análise (uma disciplina) e a construção de um texto
(uma literatura). É admitir que ela faz parte da realidade da qual trata, e
que essa realidade pode ser apropriada ‘enquanto atividade humana’,
‘enquanto prática’.
31
Portanto, a operação historiográfica refere-se à combinação entre o lugar
social, as práticas “científicas”
32
e uma escrita, que analisará as premissas
concernentes a um “discurso que não fala”, e buscará delinear as “leis silenciosas”,
28
Para Certeau “uma mudança da sociedade permite ao historiador um afastamento com relação
aquilo que se torna, globalmente um passado.” Op. Cit. CERTEAU, Michel, pp. 44 e 75
29
De acordo com nota explicativa a respeito da historiografia do século XX; Op. Cit. CERTEAU,
Michel, p. 63.
30
Ibid., p. 66.
31
Certeau e Vázquez fazem referência a Tese I, ao comentar o conceito de prática. Op. Cit.,
CERTEAU, Michel, p. 66; Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez, p.185; Cf. MARX, Karl.
Teses (I) Sobre Feuerbach 1845.
Disponível em www.marxists.org/portugues/marx/1845/tesefeuer.htm.
32
Conforme nota Certeau “o termo científica, bastante suspeito no conjunto das ‘ciências humanas’ na
medida em que remeteria a leis. Pode-se, entretanto, definir com este termo a possibilidade de
estabelecer um conjunto de regras que permitam ‘controlar’ operações destinadas à produção de
objetos determinados.” Op. Cit., CERTEAU, Michel, nota 5, p. 109.
as quais organizam o espaço produzido como texto.
Certeau afirma que é necessário perceber que a escrita histórica é construída
em “função de uma instituição cuja organização parece inverter: com efeito, obedece
a regras próprias que exigem ser examinadas por elas mesmas.
33
É impossível
realizar a análise do discurso histórico independente da instituição “em função da
qual ele se organiza silenciosamente.
34
E o texto histórico, de forma mais genérica,
“enuncia uma operação que se situa num conjunto de práticas”.
35
Este aspecto é o
primeiro e mais essencial para a pesquisa científica.
Neste sentido, a pesquisa científica faz surgir diferenças por meio das quais se
concebe objetos “ (...) que têm a forma de sua prática: eles lhe fornecem o meio de
fazer aparecer diferenças relativas às comunidades ou às unidades das quais parte a
análise”.
36
Portanto, para a operação historiográfica das práticas sociais da Igreja Batista
Independente no contexto brasileiro, verificar-se-á o lugar de produção de tais
práticas, a partir do exercício interdisciplinar, a fim de produzir um texto que
represente a interpretação dessas práticas sociais do passado para o tempo presente.
33
Op. Cit., CERTEAU, Michel, p. 66.
34
Ibid., p. 71.
35
Ibid., p. 72.
36
Ibid., p. 87.
1.2. EPISTEMOLOGIA DA PRÁXIS SOCIAL
A expressão epistemologia, foi utilizada para fazer referência a uma reflexão
sistemática e metodológica a respeito da práxis social, que por sua vez, busca nutrir-
se dos movimentos culturais, políticos e sociais, na busca de um aprofundamento
metodológico
37
, que é imprescindível para o avanço da pesquisa científica.
Serão apresentados os fundamentos da atividade humana, caracterizado pela
vida cotidiana ou vida prática, demonstrando a sua importância no desenvolvimento
do conceito da práxis social como atividade humana dirigida ao ser social de outros
indivíduos, segundo a filosofia da práxis.
1.2.1. O conceito de prática no cotidiano
É no cotidiano que o indivíduo desenvolve suas práticas sociais e também
estabelece relações com o mundo social. O homem prático, na vida cotidiana, possui
atitudes práticas. Em geral, suas ações dissociam o pensar do agir; a teoria da prática,
neste sentido, a atividade teórica, reflexiva, apresenta-se como atividade “ (...) in-
prática, isto é, improdutiva ou inútil por excelência se lhe torna estranha; não
reconhece nela o que ele considera como seu verdadeiro ser, seu ser prático-
37
MALDONADO, Efendy. Práxis reflexiva comunicacional e configurações sociais
transformadoras. INTERCOM Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da
Comunicação. XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Belo Horizonte/MG,
2003, p. 7. Disponível em: www.intercom.org.br/papers/congresso2003. Consultado em 14 dez.
2006.
utilitário”.
38
De acordo com Karl Marx, “toda a vida é essencialmente prática”
39
, ou seja,
supera o sentido prático-utilitarista. Ela possui uma capacidade auto-suficiente, com
o poder de abrir caminho por si mesma, sem necessitar de nenhum apoio estranho a
ela, como uma teoria, para que “lhe desembarace o caminho”.
40
O ser humano prático, de consciência comum, habita em um mundo cotidiano
que lhe impõe uma dinâmica de necessidades, objetos e atos práticos como sendo
algo natural. A prática é, então, habitualmente, aquilo que nos convém, que está de
acordo com os nossos interesses, inclusive os mais egoístas, ou seja, a vida cotidiana
do homem comum, na sociedade em que vivemos, “está repleta de homens práticos
ou de atos práticos desse gênero.
41
A atividade prática do ser humano não é, por sua vez, apenas contemplativa
ou passiva, mas, é por tratar-se de (...) sujeitos ou agentes de certos atos que
produzem efeitos, que têm resultados concretos, tangíveis, que denominamos
justamente de práticos.
42
O termo prático, de acordo com Vázquez, é recorrente da linguagem comum,
e que muitas vezes significa a atividade humana prática em sentido “ (...) utilitário e
pejorativo de expressões como as seguintes: ‘homem prático’, ‘resultados práticos’,
‘profissão muito prática’.
43
É preciso lembrar que a utilização, pelo senso comum,
38
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 14.
39
Apud. MARX, Karl. Teses sobre Feuerbach, p. 635. Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977),
p. 13.
40
Op. Cit. VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 14.
41
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia e circunstâncias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2002, p. 147.
42
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (2002), p. 147.
43
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 4.
do vocábulo prática, fez com que este possuísse uma ligação utilitarista-pragmática,
justamente em relação à alienação humana da sua própria consciência crítica. O
trabalho humano constitui uma das formas de atividade na qual se encontram
exemplarmente os elementos de uma prática humana, onde o produto material do
trabalho é transformado de acordo com um projeto, ou determinado a um fim.
44
Na busca da elaboração de um conceito filosófico sobre a atividade prática do
homem, Vázquez afirma que é preciso libertar-se dessa relação com a linguagem
corrente que cerca o vocábulo prática. Por esta razão, ele passa a empregar a palavra
práxis, porque a considera não vinculada diretamente ao termo prática.
1.2.2. A prática como fundamento formativo da práxis
A compreensão do termo prática, não deve acontecer apenas no sentido
instrumental e egoísta do ser humano, mas o vocábulo também deve ser
compreendido como a atividade humana relacionada com uma determinada
realidade, na qual opera um duplo movimento de transformação, a saber: do mundo,
que é modificado pela atividade humana, e do seu conhecimento deste mundo que é
modificado, e, ainda, das suas relações de alteridade com outros humanos.
É neste sentido que a história da atividade humana apresenta a transformação
da “natureza mediante sua práxis produtiva e que, em consonância com esta,
44
Neste sentido Vázquez parafraseia Marx para afirmar que “(...) o produto material requer a
existência prévia de um produto ideal na consciência, e é justamente este caráter consciente,
adequado a um fim, que dá ao trabalho seu caráter propriamente humano e o distingue de qualquer
atividade animal”, Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (2002), p. 149.
transformou também suas próprias relações sociais. A história tem sido realmente um
processo prático total levado a cabo pelos homens.
45
É importante notar que o ser humano contemporâneo tem vivido em busca
perene da realização imediata dos seus desejos e necessidades, ou seja, da prática
humana imediatista:
as atividades artísticas e a política, particularmente a revolucionária, são
improdutivas ou impráticas por excelência, de vez que postas em relação
com os interesses imediatos, pessoais, carecem de utilidade, pois seus atos
só produzem, num caso, prazer estético, e, no outro, fome, miséria e
perseguições.
46
As conseqüências do imediatismo na prática demonstram a visão
individualista da atividade do ser humano comum a nossa época, além do total
descompromisso com as conseqüências de tal prática; também não consegue
compreender em que medida, com seus atos, ele contribui para escrever a
história humana como processo de formação e auto-criação do homem
nem pode compreender até que grau a práxis necessita da teoria, ou até
que ponto sua atividade prática se insere numa práxis humana social, o
que faz com que seus atos individuais influam nos dos demais, assim
como, por sua vez, os destes se reflitam em sua própria atividade.
47
O ser humano comum “considera a si mesmo como o verdadeiro homem
prático; é ele que vive e age praticamente
48
, desta forma prática de ver o mundo e
de perceber-se nele, o homem prático reconhece a existência das coisas em si e a sua
significação prática para satisfazer as suas necessidades do cotidiano. No entanto,
esta significação não é resultado das práticas humanas que conferem sentido aos
45
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 325.
46
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 13.
47
O autor apresenta também a despolitização que cria “um imenso vazio nas consciências, vazio que
só pode ser útil á classe dominante, que recheia as consciências com atos, preconceitos, hábitos e
lugares-comuns e preocupações que, enfim, contribuem fortemente para manter a ordem social
vigente. O apoliticismo de grandes setores da sociedade os exclui da participação consciente na
solução dos problemas econômicos, políticos e sociais fundamentais e, com isso, fica
desembarcado o caminho para que uma minoria se encarregue dessas tarefas de acordo com os seus
interesses particulares de grupo e de classe.”; Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), pp.
12-13 e 15.
48
Ibid., p. 11.
objetos ou coisas, antes, estas práticas possuem em si um significado imanente.
Portanto, na compreensão do homem comum, “o mundo prático para consciência
comum é um mundo de coisas e significações em si.
49
Para Vázquez, é a prática que irá determinar e fundamentar o conhecimento,
justamente porque este é conhecimento do mundo já transformado por sua atividade
material, no qual “os objetos se inscrevem em certa relação com o homem”
50
, ou
seja, na “ (...) medida em que o desenvolvimento deste não é um processo meramente
intrateórico, que se produza por uma exigência puramente interna da teoria, a não ser
como solução de problemas propostos pela prática social.
51
Quando se fala em uma crítica do que existe, do conhecimento da realidade a
ser transformada e do projeto de emancipação do homem como unidade indissolúvel,
compreende-se que estes são articulados pela “práxis como atividade real voltada
para um fim”.
52
Portanto, o problema teórico fundamental é “o problema prático da
transformação do mundo humano, social, ou seja, o da autoprodução ou realização
do homem, em um contexto histórico social que ocorre na e pela práxis.
53
Nessa definição do homem como ser essencialmente prático, “como ser que
transforma uma determinada realidade e produz uma nova realidade ao mesmo
tempo em que transforma e produz uma nova realidade humana, a história do homem
nada mais é do que a história da práxis.
54
49
Ibidem.
50
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (2002), p. 152.
51
Ibid., p. 153.
52
Ibid., pp.167-168.
53
Ibid., p. 168.
54
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 325.
1.2.3. A práxis social como atividade humana de transformação
Como já foi dito, a atividade prática do homem comum ocorre na vida
cotidiana de um mundo prático, onde os objetos possuem significados intrínsecos a
eles mesmos, independentemente da atividade humana. Passa-se agora a verificar a
relação da prática humana com a práxis.
Para compreender o significado atual do vocábulo práxis, é preciso buscar sua
definição na história. Na Grécia antiga, a práxis (pra,zij) significava a ação que
possui um fim em si mesma, que para Vázquez, “não cria ou produz um objeto alheio
ao agente ou a sua atividade”.
55
O autor lembra que, para Aristóteles, a práxis é ação
moral, por não gerar nada fora de si mesma. Por outro lado, produzir um objeto que
venha a existir fora de si mesmo, como, por exemplo, a obra de um artesão, não pode
ser práxis. Para este tipo de atividade humana, que é exterior ao sujeito, -se o nome
de poiéses (poihsij), que possui o sentido literal de produzir ou fabricar algo.
Ainda, na Grécia antiga a atividade física ou prática era considerada uma
obrigação dos escravos, que cumpriam as atividades práticas do cotidiano,
envolvidos na manutenção da casa, na produção de objetos e no cultivo de alimentos.
Tudo isso era considerado pela sociedade grega como prática, enquanto a atividade
política, das preocupações com as questões pertinentes ao andamento e
direcionamento da vida pública, ficava a cargo dos homens livres. Para Platão, é o
“Estado que se conforma à idéia, e em Aristóteles a política é arte de organizar a vida
55
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), pp. 4-5
da comunidade, da polis, para criar condições de vida contemplativa, que é a
autenticamente humana.
56
De acordo com Vázquez, a sociedade grega exaltava a vida teórica e
desprezava a prática produtiva; isto reforçava “a divisão social do trabalho e de
classe na sociedade escravista, e correspondem inteiramente aos interesses da classe
dominante”
57
, sustentando o status quo daquela sociedade.
A práxis, como categoria central da filosofia, é uma interpretação do mundo
e, ao mesmo tempo, orienta à transformação deste mundo, já que, por revelar
teoricamente o que a práxis é, [a filosofia da práxis] marca as condições que tornam
possível a passagem da teoria à prática e assegura a íntima unidade entre uma e
outra”.
58
Esta compreensão da práxis se revela a partir do marxismo.
A práxis, como atividade real, objetiva e material do ser humano, só pode ser
em e pela práxis, na condição do homem como ser social prático que supera a
perspectiva da consciência do senso comum para uma consciência da práxis. Na vida
prática cotidiana, a essência não é manifestada de forma direta e imediata, antes, a
atividade prática oculta esta essência.
É preciso perceber que este homem comum é um ser social e histórico, que
encontra-se imbricado numa rede de relações sociais e enraizado num
determinado terreno histórico. Sua própria cotidianidade está
condicionada histórica e socialmente, e o mesmo se pode dizer da visão
que tem da própria atividade prática.
59
Por esta razão, para se chegar à compreensão da teoria da práxis é necessária
a superação do senso comum, dos preconceitos, dos hábitos mentais e dos lugares
56
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (2002), p. 154.
57
Ibidem.
58
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 6.
59
Ibid., p. 9.
comuns; é preciso uma “superação do ponto de vista espontâneo ou instintivo
adotado pela consciência comum do proletariado. Daí a necessidade determinada
ao mesmo tempo por motivos teóricos e práticos de contrapor uma clara
compreensão da práxis à sua concepção ingênua ou espontânea.
60
A função da
consciência da práxis se constitui em integrar de forma mais elevada a unidade do
pensamento e da ação humana, de acordo com finalidades que existem apenas no
homem e são produtos da sua consciência.
A respeito da atividade humana transformadora do mundo, Vázquez afirma
que:
somente quando a prática produtiva material e a prática social
revolucionária alcançam certo nível na própria realidade é que se dão as
condições para que se possa captar a prática, em toda a sua significação
social e humana, e em toda a sua universalidade, riqueza e essencialidade,
como atividade humana transformadora do mundo.
61
É este processo histórico, para a significação da práxis humana e social
transformadora, que torna-se o foco a partir deste momento, para que haja um
aprofundamento a respeito da compreensão da práxis social como atividade humana
dirigida à transformação social.
Como já foi visto anteriormente, há várias formas de práxis, por isso, é
importante lembrar algumas não citadas até aqui, como: a produtiva, a artística, a
científica, a material e a revolucionária (ou social). Para Vázquez, estas práxis são
formas particulares e concretas da práxis total humana, na qual o homem, como ser
social e consciente, humaniza o mundo e a si mesmo. A escolha metodológica pela
práxis social não é, em hipótese alguma, uma redução das outras formas de práxis,
mas é a qualificação necessária pela qual examinar-se-ão as práticas sociais da Igreja.
60
Ibidem.
61
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (2002), p. 157.
Uma definição inicial para a práxis social é a atividade do ser humano que o
torna, ao mesmo tempo, sujeito e objeto da mesma, e dentro desta atividade “cabem
os diversos atos orientados no sentido de tal transformação como ser social, e, por
isso, destinados a mudar suas relações econômicas, políticas e sociais.
62
Neste
sentido, quando a atividade humana é dirigida a um grupo ou classes sociais,
(...) e inclusive a sociedade inteira, ela pode ser denominada práxis social,
ainda que num sentido amplo toda a prática (inclusive aquela que tem por
objeto direto com a natureza) se revista de um caráter social, já que o
homem só pode levá-la a cabo contraindo determinadas relações sociais
(relações de produção na práxis produtiva) e, além disso, porque a
modificação prática do objeto não humano se traduz, por usa vez, numa
transformação do homem com ser social.
63
A práxis social, em sentido stricto senso, é a “atividade de grupos ou classes
sociais que leva a transformar a organização e direção da sociedade, ou a realizar
certas mudanças mediante a atividade do Estado. Essa forma de práxis é justamente a
atividade política”
64
que, por sua vez, tem na práxis revolucionária sua etapa
superior de transformação real da sociedade.
Vázquez nos apresenta os traços que distinguem a práxis como práxis
criadora, a saber: “a) unidade indissolúvel, no processo prático, do interior e o
exterior, do subjetivo ao objetivo; b) indeterminação e imprevisibilidade do processo
e do resultado; c) unicidade e irrepetibilidade do produto”.
65
Estes elementos são
fundamentais para a práxis social.
Por fim, a práxis social é a práxis intencional da vida social, o que significa
que ela é capaz de produzir uma nova realidade política, econômica e social. Neste
sentido, há uma compreensão da práxis intencional (individual e coletiva), quando
ela estiver ligada a um projeto individual ou plural. Esta práxis, por sua vez, é
62
Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 200.
63
Ibidem.
64
Ibid., pp. 200-1
65
Ibid., p. 251.
aplicada e avaliada por sua objetivação prática, ou seja, ela é avaliada a partir dos
seus resultados.
66
É precisamente nesta perspectiva da práxis social, objetivada na
vida social, que será feita a crítica das práticas sociais da Igreja.
67
1.3. EPISTEMOLOGIA DA PRÁXIS CRISTÃ
No século XIX, Friedrich D. E. Schleiermacher (1768-1834) deu início aos
estudos em Teologia Prática, organizando a disciplina em duas áreas: no governo da
Igreja ou administração eclesiástica e no serviço da Igreja.
68
Nas palavras de
Floristán, “Schleiermacher sustentou que a teologia é verdadeira ciência a serviço da
‘conduta’ ou ‘direção’ da Igreja”
69
. Neste sentido, Schleiermacher afirmava que a
teologia prática se preocupava mais com as questões concernentes aos “pequenos
detalhes da fé”, do que com as questões que realmente importavam.
Por outro lado, a teologia prática como ciência positivaé assim mesmo um
66
Ibid., pp. 324-325.
67
As práticas sociais da Igreja podem ser compreendidas como atividade prática, com a qual “(...) os
homens destruíram e criaram novos sistemas sociais; com sua práxis produtiva criaram as
condições para que desaparecessem sucessivamente diversas formações econômico-sociais
escravista, feudal ou capitalista e com sua práxis social protestos, rebeliões ou revoluções
contribuíram para a abolição das relações sociais capitalistas e para a derrocada do velho sistema
colonial.”, Op. Cit., VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez (1977), p. 326.
68
Veja também SCHWALM, Mauro Alberto. Schleiermacher e os fundamentos da teologia prática:
apontamentos de uma leitura em perspectiva. Série Ensaios e Monografias do Instituto Ecumênico
de Pós-Graduação (IEPG) da Escola Superior de Teologia de São Leopoldo (EST). São Leopoldo:
Ed. Sinodal, 1994; TILLICH, Paul. Perspectivas da teologia protestante do século XIX e XX. São
Paulo: ASTE, 1999; HANSEN, Guillermo (ed.) Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher reseñas
desde América Latina. Secretaría de Publicaciones del Instituto Univestario ISEDET. Buenos
Aires: ISEDET, 2002.
69
FLORISTÁN, Casiano. Teologia práctica: teoría y praxis de la acción pastoral. Ediciones Sígeme:
Salamanca, 2002, p. 104.
serviço; serviço para ciência, mas ciência ordenada a uma ação responsável ou
disciplina que culmina em um saber prático”.
70
Portanto, a teologia prática é para
Schleiermacher, a “teoria do serviço eclesial na comunidade cristã local ou teoria da
responsabilidade eclesial a respeito das ações da Igreja na sociedade”.
71
A teologia prática como disciplina, desenvolveu-se muito desde
Schleiermacher. Por esta razão, é necessário apresentar os avanços históricos desta
disciplina, que irão contribuir para a análise das práticas sociais da Igreja.
1.3.1. A práxis cristã no cotidiano
A partir da relação de interdisciplinaridade, na qual se inscreve o tema das
práticas sociais da Igreja, vista no item anterior, passa-se agora ao referencial teórico
ligado às Ciências da Religião e, mais especificamente, à dinâmica da Práxis
Religiosa e Sociedade.
Na compreensão de Norbert Mette, a Teologia Prática é caracterizada “ (...)
por seu sentido indutivo, o uso de métodos empíricos, a orientação interdisciplinar e
a capacidade de incidência prática”
72
, portanto, constitui-se na “ciência da ação no
interior de uma teologia concebida como ciência prática”.
73
Nesta mesma
perspectiva, Krause e Zerfass compreendem a Teologia Pastoral “como ciência da
70
Apud. MARLÉ, R. Le projet de théologie pratique. Paris, 1979, p. 55.
71
Apud. KAEMPF, B. La théologie pratique selon D. F. Schleiermacher. In: RETMOND-J, B. E
SOORDET, M. La théologie pratique. Paris, 1993, pp. 32-41.
72
Apud. METTE, Norbert. Theorie der praxis. Wissenchaftgeschichtliche und methodologische
Untersuchungen zur Theorie-Praxis-Problematik innerhalb der Praktischen Theologie, Düsseldorf,
1978, 342; id., Praktische Theologie als Handlungswisssenchaft. Begriff und Problematik:
Diakonia 10 (1979), pp. 190-203. In. Op. Cit., FLORISTÁN, Casiano, p. 166.
73
Ibidem.
ação, cujo ponto de partida é a práxis dos cristãos e da Igreja”
74
, portanto, segue o
referencial da atividade humana como práxis. Para Floristán, “ (...) a teologia
basicamente referida à práxis transformadora da realidade será, a nosso entender,
teologia prática.
75
A Práxis Religiosa, na condição de um saber localizado como teoria geral da
ação, ciência da ação a partir da práxis cristã, precisa considerar três elementos
fundamentais: 1) a tradição cristã; 2) a situação presente assumida e 3) a motivação
da ação. Considerando seu caráter interdisciplinar, que busca incidir nas práticas, é
imprescindível a verificação da teoria na prática, e a prática deve ser transcendida
pela teoria.
Para as Teologias Política e da Libertação, a “ (...) práxis cristã e a
experiência da fé possuem uma relação estreita com o contexto social, político,
econômico e cultural.
76
Desta forma, chega-se a um círculo hermenêutico, que
caracteriza uma “leitura da situação e da práxis histórica da libertação à luz da
palavra e releitura da palavra de Deus (ou da fé ou do evangelho) a partir da dita
situação e da dita práxis.
77
Gustavo Gutiérrez entende que a Teologia da Libertação
é “reflexão crítica da práxis histórica à luz da palavra [ou] reflexão crítica em e sobre
a práxis histórica em confrontação com a palavra do Senhor vivida e aceita na fé”.
78
Nesse campo do cotidiano da fé cristã, Clodovis Boff afirma que “ (...) a
elaboração coletiva da fé se faz mediante distintas formas de expressões e
74
Apud. , p. 166; cf. R. Zerfass, Praktische theologie als handlungswissenschaft, In: F. Klostermann-
R. R. Zerfass (eds.) Praktische theologie heute. Munich: Maguncua, 1974, 164-177; Op. Cit.,
FLORISTÁN, Casiano, p. 166.
75
Ibid., p. 162.
76
Ibid., p. 156.
77
Ibid., p. 160.
78
Apud. GUTIÉRREZ, Gustavo. Mirar lejos. In: Teologia da Liberación. Salamanca, 1990. Op. Cit.,
FLORISTÁN, Casiano, pp. 160-1.
comunicações do sujeito epistemológico da teologia, que é a própria comunidade”.
79
Desta forma, o modelo de revisão de vida assemelha-se com tal elaboração coletiva,
por levar em consideração: a) mediação sócio analítica, b) mediação hermenêutica e
c) mediação prática.
80
Neste sentido, a práxis religiosa, pautada na tradição bíblico-profética, tem a
função de denunciar a corrupção dos sistemas no mundo, de anunciar “o futuro da
humanidade reconciliada”
81
e, também configura-se na “teoria crítica da sociedade
[que] ajuda a elaborar o discurso profético. A teologia prática intenta verificar a ação
da Igreja na sociedade.
82
Para J. Audinet, o papel da práxis religiosa não é apenas examinar como é
aplicado um saber teológico, mas sim, o porquê se aplica determinado saber. Sua
finalidade é “ (...) dar conta da fé e do Deus que ela confessa no contexto de práticas
sociais e culturais contemporâneas”.
83
Esta concepção da práxis religiosa favorece
uma aproximação com a historiografia de Michel de Certeau, na qual as práticas
sociais do cotidiano se apresentam especificamente em um determinado lugar de
produção.
Para M. Lefebvre, a práxis religiosa busca sistematizar o dado empírico, e se
apóia nos conhecimentos e metodologias das “ciências modernas centradas na práxis
79
Apud. BOFF, Clodovis. Fisionomía de las comunidades eclesiales de base. Concilium, 164 (1981)
97. In: Op. Cit., FLORISTÁN, Casiano, p. 162.
80
Floristán apresenta a revisão de vida como “1) A análise da realidade, a partir das questões que
suscitam os membros da comunidade, ajudados por um analista social (mediação sócio-analítica);
2) A confrontação com a palavra de Deus da situação social analisada (mediação hermenêutica); e
3) a diretrizes para a ação, surgidas ao comparar a situação concreta com o evangelho meditado
(mediação prática)”, Op. Cit., FLORISTÁN, Casiano, p. 162.
81
Ibid., p. 167.
82
Ibidem.
83
Apud. AUDINET, J. Saisie et compréhension de l’action religieuse. In: VIAU, M. E BRODEUR,
R. (ed). Les études pastorales: une discipline scientifique? Quebec, 1987, Op. Cit., FLORISTÁN,
Casiano, p. 167.
[onde] a interdisciplinaridade exige que não se tome as ciências humanas como
meras ‘criadas’ da teologia, e completa dizendo que o método interdisciplinar
exige um verdadeiro espírito de colaboração.
84
É a partir da compreensão interdisciplinar que Floristán afirma que a
valorização da práxis, como categoria central na Teologia Política, contribui para o
estudo da “ (...) interdependência entre a teoria e práxis e reconhece que a prática não
é mera aplicação de uma verdade prévia, senão lugar de verificação e princípio de
interpretação
85
. Também, o pensamento e a ação pastoral devem submeter-se à
crítica das teorias político-econômicas; desta forma, a práxis é “ação ou atividade
prática econômico-social com um efeito de transformação.
86
Neste aspecto da práxis transformadora, lembramos que a ação cristã ou
práxis cristã “atualiza a práxis de Jesus frente a implantação do Reino de Deus
87
na
sociedade, mediante a construção do povo de Deus em estado de comunidade
cristã.
88
Portanto, a práxis de Jesus é referência fundamental para a práxis cristã,
que é propriamente uma práxis humana.
Ao considerar a importância dessa atualização da práxis de Jesus, torna-se
indispensável expor, mesmo que resumidamente, a fundamentação do tríplice ofício
de Cristo como profeta, sacerdote e rei que, de acordo com Floristán, representa
freqüentemente um meio de análise da missão de Cristo, dos apóstolos e da Igreja.
84
Idem, p. 168.
85
Idem, p. 165.
86
Floristán se refere aqui a apropriação de Marx frente ao materialismo abstrato de Feuerbach e ao
idealismo de Hegel, conforme Op. Cit. FLORISTÁN, Casiano, p. 176.
87
O Reino de Deus aqui, tem a perspectiva apresentada por Castro, a partir da compreensão da reserva
escatológica de Jürgen Moltmann e na perspectiva mais específica do Reino do Shalom, que é o
resultado da justiça e da “restauração de um mundo bom criado e restaurado por Deus”. Que tem o
compromisso de não apenas promover a paz, mas também pela prática da justiça e direito na
sociedade. Ver também MOTMANN, Jürgen. Teologia da esperança: estudos sobre os
fundamentos e as conseqüências de uma escatolgia cristã. São Paulo: Editora Herder, 1971.
88
Ibid., p. 199.
De acordo com Favale, atribuir esta tríplice dimensão ao ministério ou missão
de Cristo significa dizer que “ (...) a sua missão salvífica, tem a mais concreta
expressão na alegoria ou imagem joanica do bom pastor (Jo 10)”.
89
A partir destes
pressupostos é que a Eclesiologia, como disciplina, irá desenvolver a doutrina do
magisterium, ministerium e regimen, fundamentados no tríplice ofício de Cristo.
A partir destas considerações, Floristán lembra que Cristo aparece como
mestre e doutor na dimensão profética, como sacerdote ou sacrificador na dimensão
cultural e como rei e pastor na dimensão de regente, e conclui afirmando que,
atualmente, este tríplice ofício de Cristo tem sido entendido pela Igreja como funções
pastorais, a saber: 1) a função profética do anúncio do evangelho, 2) a função
litúrgica marcada pela celebração do culto e 3) a função caritativa com o serviço
libertador.
90
Após apresentar o desenvolvimento do conceito do tríplice ofício de Cristo na
visão da teologia patrística, na evolução teológica do termo, Floristán apresenta a
estruturação atual do tríplice ofício na dimensão da ação pastoral ou, conforme está
sendo apresentado aqui, na práxis cristã contemporânea.
Iniciando por Friederich W. Schleiermacher, passando por Karl Rahner, V.
Schurr, D. Borobio e outros, Floristán apresenta a ampliação do tríplice ofício, no
qual a pastoral litúrgica começa a possuir uma distinção entre evangelização e o
ensino na Igreja, e a dimensão comunitária e de serviço da Igreja no mundo.
91
Alberich assinala que são quatro as formas fundamentais da presença da
89
Apud. FAVALE, A. El ministério presbiteral: aspectos doctrinales, pastorales y espirituales.
Madri: 1989, p. 30. In: Op. Cit., FLORISTÁN, Casiano, p. 200.
90
Neste sentido das atribuições de Cristo, Floristán afirma que F. Prat assinala “ (...) que Cristo
aparece como rei nos sinóticos, profeta em João e sacerdote na carta aos Hebreus”, Op. Cit.,
FLORISTÁN, Casiano, pp. 199-201.
91
Ibid., pp. 202-11.
Igreja no mundo, a saber: a diaconía, a koinonía, o kerígma e a liturgia, onde a
(...) Igreja se apresenta no mundo com o lugar por excelência do serviço,
da fraternidade, do significado, da festa, em correspondência com quatro
categorias antropológicas na base: o pensamento, a ação, a relação e a
celebração. São modos equivalentes de sublinhar a complementaridade e
o significado destas quatro formas de ser no mundo signo eclesial do
Reino.
92
Neste sentido, segundo as definições de Alberich, citadas por Floristán, há
quatro âmbitos da Teologia Prática ou da teoria da práxis cristã na sociedade,
representada pelas ações das instituições e pelos movimentos eclesiais, conforme a
presente linha de pesquisa, na área das Ciências da Religião. Serão apresentados
estes âmbitos da práxis cristã, de acordo com a sistematização de Floristán, que as
define como: a missão profética ou pastoral da palavra martyría; a fraternidade
vivida ou pastoral comunitária koinonía; a vida sacramental ou pastoral litúrgica
leitourgía e o compromisso libertador ou pastoral social diakonía.
93
1.3.2. Missão profética do anúncio e denúncia martyría
O ponto central da mensagem kerigmática neotestamentária, ou seja, da
proclamação, para Floristán, é o advento do Reino de Deus ou, em outras palavras, a
missão da Igreja relaciona-se com o anúncio e o estabelecimento dos sinais do Reino
de Deus, no qual a práxis cristã desempenha um duplo papel na dimensão da Igreja e
do mundo.
94
Na formulação da missão da Igreja ocorre este duplo movimento. Enquanto o
92
Apud. ALBERICH, E. Catequesis y práxis eclesial. Madri, 1983, pp. 22-25.
93
A respeito destas formas fundamentais de presença da Igreja no mundo, é preciso lembrar que
existem outras dimensões, tais como a dimensão educacional e da saúde, que são relevantes para a
relação entre a Igreja e a sociedade no processo de desenvolvimento histórico.
94
FLORISTÁN, Casiano e TAMOYO, Juan-Jose. Conceptos fundamentales de pastoral. Ediciones
Cristanad: Madri, 1983, p. 543.
primeiro é intra-eclesiástico e busca o aprofundamento do compromisso dos fiéis em
relação ao seu testemunho no mundo, ou seja, no âmbito privado da fé cristã, por
outro lado, o simples fato de enunciar estas duas dimensões da missão da Igreja, faz
com que esta se desloque para fora do campo eclesiástico, mais especificamente para
o mundo ou esfera pública.
Como serviço da palavra e fé teologal, Floristán afirma que a martyría é o
aspecto profético, fundado como um dos elementos do tríplice ofício de Cristo, e sua
finalidade é “despertar a fé, desentranhar o sentido de Deus e revelar o horizonte
cristão de projeto humano [que por sua vez] inclui a evangelização, o ensino e a
interpretação teológica.
95
Num primeiro momento, a “ (...) práxis cristã é a proclamação, com atos e
palavras, do evangelho do reino aos pobres e, a partir da justiça com os pobres, a
todos os homens, com um propósito de conversão ao evangelho e ao seu mensageiro
Jesus Cristo.
96
Desta forma:
a evangelização deve ser testemunho e profissão de fé na experiência
humana, signo de interpretação espiritual, manifestação do sentido da
humanidade e anúncio explícito da obra de Jesus Cristo, revelador do
Deus cristão.
97
Esse primeiro momento se realiza com o objetivo de proclamar a experiência
de fé, da práxis cristã na experiência humana do cotidiano, com a intenção última de
explicitar a obra redentora de Cristo e do Deus que ele revela por meio da sua obra.
Em um segundo momento, a missão profética da Igreja se preocupa com a
elaboração de uma teoria e prática cristã, relacionada com o processo de
aprofundamento da fé cristã no cotidiano da mesma. Neste sentido, o ensino no
95
Op. Cit. FLORISTÁN, Casiano, p. 211.
96
Ibidem.
97
Ibidem.
interior da Igreja tem como meta
(...) explicitar o sentido oferecido pela revelação com uma interpretação
atual; ensinar os pontos essenciais da fé em sua história, conteúdos e
atualidade; educar popularmente a vigência da fé e dos sacramentos e
contribuir para a atualização do discurso cristão.
98
Assim, na práxis cristã, a missão profética tem um papel fundamental no
desenvolvimento interno da comunidade cristã que, por sua vez, é atualizada com a
contextualização da sociedade contemporânea e do mundo cotidiano das práticas,
onde a reflexão teológica representa um “pólo crítico e profético do discernimento,
onde se ilumina a vida à luz do sentido cristão oferecido por Jesus... é a chamada
conversão e transfiguração constantes”, que deve “analisar criticamente a vida dos
cristãos e da Igreja, iluminar o cotidiano e confrontar a fé com a cultura, a técnica, a
ciência, etc.
99
Falando especificamente a respeito da Teologia da Libertação, Floristán nos
apresenta três virtudes teologais: a profecia, a esperança e a caridade, onde a fé
possui a dimensão de “memória crítica e subversiva de Jesus (...) frente a todo
sistema que pretende estabelecer-se enclausurado sobre si mesmo”.
100
É também,
neste sentido, que se desenvolve a práxis cristã. E ainda, a esperança é
como expectação do futuro, confiança ativa nas promessas de Deus e
ponto de partida na transformação do mundo; e a caridade como práxis do
Espírito modificador de todo o dado (a realidade atual injusta) em busca
permanente de uma nova sociedade justa .
101
A missão profética da práxis cristã é acompanhada pela esperança e o amor
provenientes da fé em Deus, que ofereceu a própria vida como sacrifício vivo por seu
povo, a saber, o sacrifício oferecido por Cristo na cruz do calvário. Este sacrifício
apresenta uma missão, lembrada constantemente no matiz protestante do
98
Ibidem.
99
Ibidem.
100
Ibid., p. 163.
101
Ibidem.
cristianismo, do qual é parte integrante o objeto de estudo deste trabalho, a Igreja
Batista Independente, com a menção do famoso texto do grande comissionamento da
Igreja ao mundo, no evangelho de Mateus.
É nesta dimensão da missão profética da Igreja
102
, e reflexiva da teologia
prática, que relaciona-se o conteúdo da fé cristã evangélica com a cultura e as
ciências em geral, que se apresenta como um dos elementos indispensáveis e
indissociáveis para a análise das práticas sociais da Igreja de forma interdisciplinar.
1.3.3. A fraternidade solidária cristã koinonia
No mundo contemporâneo há, claramente, uma desarticulação do indivíduo
em relação aos grupos sociais, no que se refere às questões da coletividade humana.
Dentre os elementos que estão na raiz desta crise da convivência humana
comunitária, destacam-se: o processo de privatização das questões públicas por
políticas neoliberais, a violência urbana que desloca o espaço de convivência pública
mais ampla para um espaço de convivência privado e restrito, a despolitização do
cidadão, o esvaziamento do espaço público, etc.
Além disso, problemas de ordem social como a exclusão, o individualismo
102
Sobre a missão da Igreja veja também: BOSCH, David J.. Missão transformadora. São Leopoldo:
Sinodal, 2002; LONGUINI NETO, L. O Novo Rosto da Missão. Viçosa: Ultimato, 2002; BLAUW,
J. A Natureza Missionária da Igreja. São Paulo: ASTE, 1966; COMBLIN, Jose. Teologia da
Missão. Petrópolis: Vozes, 1980. COSTAS, O. Compromisso y Misión. Colección CELEP, Caribe:
1979; La Iglesia y su Misión Evangelizadora. Buenos Aires: La Aurora, 1971; Evangelización
Contextual Fundamentos Teológicos y Pastorales. San José: SBL, 1986; EKSTRÖM, Bertil.
História de Missões. Campinas: CEMIBI, 1993; STEUERNAGEL, V. (ed.) A Serviço do Reino -
Um Compêndio sobre a Missão Integral da Igreja. Belo Horizonte: Missão Editora, 1992 e A
Missão da Igreja - Uma Visão Panorâmica sobre os Desafios e Propostas de Missão para a Igreja
na Antevéspera do Terceiro Milênio. Belo Horizonte: Missão Editora, 1994; ESCOBAR, Samuel.
Desafios da Igreja na América Latina: história, estratégia e teologia de missões. Viçosa: Ultimato,
1997.
exacerbado, o mercado global/total, assolam as sociedades contemporâneas, o que
torna urgente o debate das questões a respeito do tema da solidariedade humana.
É de extrema importância, para a sociedade contemporânea, enriquecer o
debate e buscar aprofundar as questões a respeito de uma fraternidade solidária.
Portanto, passa-se a apresentar agora aspectos dentro da perspectiva da práxis cristã,
que é outro elemento indispensável para a análise das práticas sociais da Igreja.
A koinonia, no contexto da comunidade cristã, possui um elemento central,
onde Cristo é o mestre que ministra aos fiéis ou crentes, que se reúnem em
comunhão mediante a instituição primária da comunidade cristã. Se
reúnem em assembléia para conhecer experimentalmente a sabedoria de
Deus e poder confrontá-la com todos os problemas do processo humano
histórico, com objetivo de construir uma nova fraternidade.
103
Desta forma, o desafio da comunhão entre os cristãos é construir, não apenas
as bases de uma nova fraternidade, mas buscar instituir neste processo uma nova
sociedade pautada na solidariedade. Floristán afirma que a koinonia, como serviço, é
compreendida na sua dimensão ad intra, em outras palavras, possui a característica
de desvelar o mistério da comunhão entre os cristãos, revelando a paternidade e o
cuidado de Deus para com o homem.
O processo de construção dessa nova sociedade se dá na missão da Igreja por
meio da evangelização, que busca anunciar a salvação de Deus à humanidade,
consumada na vida e no ministério de Cristo. Para que haja eficácia na
evangelização, segundo Floristán, é necessário aceitar como sujeito coletivo a
obediência a Cristo, como autor e consumador da fé, e ainda como
(...) sua obediência e as exigências libertadoras da palavra de Deus a
partir da experiência cristã no Espírito Santo; denunciar profeticamente
qualquer situação real de opressão, experimentando na própria carne as
misérias do povo, e a anunciar a plena liberdade e o reino de justiça
prometido por Deus, abrindo vias contínuas de reforma e de mudança ou
103
Ibid., p. 212.
de conversão.
104
Esta compreensão de obediência a Deus a partir da experiência do fiel
representa um fundamento da práxis cristã, que se baseia na obediência a Cristo e,
em especial, à escola profética da qual ele faz parte e que, por sua vez, a supera com
a consolidação do plano divino de salvação humana, orquestrado e levado a cabo
pelo próprio Cristo. Ele não é apenas mais um profeta, mas é aquele que vem para
anunciar a chegada do Reino de Deus, de um reino solidário, de amor e de justiça.
É importante não esquecer que a obediência do fiel a Deus faz com que esse
traga consigo a prática da denúncia profética diante das situações de opressão, a
favor do mais fraco, do necessitado, do empobrecido.
A fraternidade solidária precisa ser vivenciada no cotidiano do fiel, de forma
a alcançar as pessoas, nas mais variadas situações do dia-a-dia, buscando superar os
obstáculos que limitam a experiência de fé, para se tornar práxis cristã de
fraternidade solidária.
1.3.4. A celebração da vida no cotidiano liturgia
A liturgia serve fundamentalmente para a celebração do culto cristão, como
“serviço de esperança [onde] Jesus aparece como sacerdote da Nova Aliança. Essa
função também é conhecida como função doxología.
105
Para Floristán, a liturgia é
algo que se faz, ou seja, é práxis simbólica cristã da assembléia, reunião no
104
Ibidem.
105
Ibidem.
momento dado da comunidade dos crentes.
106
Esta compreensão da liturgia como algo que se faz, apresenta a práxis
litúrgica, no caminho do culto cristão, como um elemento fundamental para ligar as
crenças em um ritual sagrado, ordenado pelos símbolos cristãos da eucaristia e do
kerigma, das boas novas do Reino de Deus em Cristo.
É na celebração que os fiéis reanimam sua fé no Cristo do evangelho, na
esperança do seu Reino de justiça e paz. É no culto cristão que se ritualiza o
cotidiano da fé, ao mesmo tempo, em uma dimensão pessoal e comunitária.
A liturgia possui o papel de organizar a celebração cristã, que se realiza
comunitariamente, afirmando-se como umaação simbólica atualizadora da práxis
pascal de Jesus o Cristo, que compreende toda a ação libertadora de Jesus (ou sua
causa) até sua morte, sem esquecer a ação de Deus na ressurreição e doação do
Espírito”.
107
Portanto, a liturgia é práxis cristã que integra toda a ação libertadora de
Cristo, que se constitui na sua vida (ministério), morte (sacrifício) e ressurreição
(consumação/glorificação) do plano salvífico, juntamente com a presença dos
carismas do Espírito Santo. Neste sentido,
a assembléia litúrgica, como cristalização da comunidade cristã,
rememora o passado e participa o futuro religiosamente mediante a
Escritura [que, por sua vez,] se proclamou desde o princípio como palavra
sagrada na assembléia mediante uma práxis litúrgica comunitária.
108
Verifica-se aqui, o papel central da escritura na práxis litúrgica. Para Floristán,
existem quatro dimensões litúrgicas: 1) histórica ou história da salvação; 3) profética;
4) social e mística ou espiritualidade cristã. É correto afirmar que estas quatro
106
Ibidem.
107
Ibidem.
108
Ibid., p. 547.
dimensões são importantes para a celebração da vida litúrgica da Igreja e, de forma
especial, a dimensão profética e social são as duas dimensões litúrgicas fundamentais
para o anúncio e denúncia, tanto para a comunidade eclesiástica como para o mundo
contemporâneo. É o anúncio da salvação e redenção do homem e de toda a natureza,
que é acompanhada da denúncia das estruturas que geram as injustiças sociais e
degradação do ser humano.
1.3.5. Compromisso da práxis libertadora diakonia
Este quarto e último âmbito, diz respeito a um elemento que é crucial para a
análise das práticas sociais da Igreja, justamente por ser intrínseco à função ad extra
da práxis cristã, a diakonia.
Como característica fundamental, temos que “ (...) revela o mistério da
edificação do Reino fora das fronteiras da Igreja, por uma sociedade mais humana, a
saber, mais justa e livre. Jesus aparece como primogênito da nova criação”.
109
Em
outras palavras, a práxis de Jesus é paradigmática para a construção da nova
sociedade mais humana, justa e livre.
Floristán afirma que esta práxis cristã corresponde à amplitude do
(...) exercício da existência no mundo. Todos os conhecimentos e técnicas
estão ao serviço da transformação da realidade ou libertação, mediante a
práxis da justiça. Aqui se luta contra toda opressão, dominação ou
dependência frente a criação de uma nova sociedade.
110
Neste âmbito da práxis cristã, busca-se o enfrentamento mais amplo dos
elementos opressores da sociedade, dos instrumentos de dominação, em busca da
109
Ibid., p. 213.
110
Ibidem.
libertação integral do ser humano, para a construção da sociedade nova e do homem
novo.
Para Kjell Nordstokke, apesar do tema da diakonia estar muito à margem de
formulações teológicas próprias, normalmente distribuídas junto a outras áreas
teológicas e, ligada muitas vezes no passado com o assistencialismo, nos últimos 30
anos, tem ocorrido que “a experiência latino-americana tem provocado uma reflexão
mais persistente sobre a relação entre fé e sociedade e uma busca de ação para mudar
e transformar situações de miséria e injustiça.
111
Neste sentido, a perspectiva da diakonia no contexto brasileiro está ligada a
experiências que estão enraizadas “na luta do povo humilde, identificado com as
iniciativas para resgatar a dignidade humana e construir a cidadania numa sociedade
de conflitos profundos”.
112
Portanto, a diakonia se dá partir de uma perspectiva
eclesiástica, onde a prática diaconal é marcada pela experiência da “comunidade e
tem a sua lógica enraizada naquilo que a Igreja é, vive e espera”.
113
Para Nordstokke, há três linhas específicas de compreensão do termo
diakonia, a saber: 1) ação social a partir da motivação cristã; 2) uma forma específica
do ministério eclesiástico; 3) é um princípio fundamental da Igreja. A primeira
perspectiva de compreensão do termo diakonia, diz respeito à responsabilidade
individual e comunitária do fiel como expressão de obediência a fé; a segunda forma
relaciona a diakonia a um eventual departamento do ministério pastoral; e na terceira
forma, a diakonia faz parte da reflexão sistemática-teológica e também como
dimensão essencial da própria natureza da Igreja. A intenção de Nordstokke é
111
NORDSTOKKE, Kjell. Diaconia. In: SCHNEIDER-HARPPRECHT, Christoph. Teologia prática
no contexto da América Latina. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 271.
112
Op. Cit., NORDSTOKKE, Kjell, p. 268.
113
Ibid., p. 271.
demonstrar que a compreensão mais ampla da diakonia é unívoca em todo o Novo
Testamento que, por sua vez, é testemunha da diversidade da Igreja que ainda
caminha para um processo de institucionalização.
Para Floristán, a diakonia é exatamente a “missão da Igreja no horizonte do
reino de Deus, como seguimento de Cristo a partir do evangelho, que é chegada de
Deus e libertação da escravidão e do pecado, é dizer, boa notícia aos pobres”.
114
Ela
busca
superar as necessidades humanas, ainda as mais desesperadas, e intenta
eliminar todas as barreiras de um mundo cujos pilares fundamentais se
chamam justiça econômica, solidariedade social, liberdade política,
tolerância de idéias e humanitarismo.
115
Portanto, a diakonia é a atividade do fiel e da Igreja que se dá a partir da
identidade cristã, diante de um contexto de sofrimento e injustiça com a finalidade de
transformá-lo. Este é o elemento fundamental presente na práxis cristã,
assemelhando-se à função da práxis social da Igreja, conceito que será aprofundado
no decorrer desta pesquisa.
1.4. PRÁXIS CRISTÃ E O EXERCÍCIO DA FÉ CIDADÃ: ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA
PASTORAL DA CIDADANIA
Atualmente, uma importante contribuição para a análise das práticas sociais
da Igreja diz respeito à práxis cristã, à luz da compreensão da fé e da cidadania.
114
FLORISTÁN, Casiano. Servício diakonia. In: Teoloía práctica: teoría y praxis de la acción
pastoral, p. 709.
115
Ibid., pp. 709-10.
Castro desenvolve um rico diálogo entre a filosofia política e a pastoral, buscando
aproximar estes conceitos, nos quais “ (...) o paradigma de cidadania torna-se
referência valiosa para a elaboração de uma teologia e de uma pastoral que ajude os
cristãos a viverem a fé cristã em suas múltiplas dimensões.
116
Para possibilitar a vivência cotidiana dessas múltiplas dimensões da fé cristã,
Castro afirma que a
(...) desprivatização da fé representa um dos maiores desafios para
aqueles que crêem na relevância do cristianismo para o estabelecimento
de um mundo público mais democrático e, conseqüentemente, com maior
justiça social.
117
Essa desprivatização da fé é fundamental para a inserção do fiel (e da Igreja) no
espaço público, e de extrema importância para a pesquisa das práticas sociais da
Igreja. Por outro lado, o fiel está inserido no contexto social contemporâneo, onde há
(...) um sentimento generalizado de insegurança, de descontinuidade
histórica, de desconfiança com relação ao futuro. É um mundo mais
pluralista e eclético, em que convivem várias culturas e religiosidades
diferentes. É um contexto fragmentado, sem tradições, marcado pelo
subjetivismo. Neste contexto, o mais importante é viver hedonisticamente
o presente, a experiência imediata, sem passado e sem futuro.
118
Estes elementos não contribuem para o exercício da cidadania plena, e nem mesmo
para o exercício da fé cidadã.
Em diálogo com a filosofia de Hannah Arendt, Castro afirma que a fé está
“aprisionada à sua dimensão íntima e, como decorrência natural da decepção do ser
humano moderno com o espaço público, há uma propensão de circunscrever-se ao
âmbito da vida privada.
119
Por esta razão, é necessário que o exercício
interdisciplinar da Teologia Prática contribua para a ressignificação da fé no espaço
público, por meio do paradigma da cidadania. Neste sentido, Castro nos apresenta a
116
Op. Cit., CASTRO, Clovis Pinto de, p. 107.
117
Ibidem.
118
Ibid., p. 108.
119
Ibid., p. 109.
fé sob três aspectos: 1) como crença, 2) como confiança e, 3) como ação, e afirma
que a sua análise da fé dar-se-á sob o seu terceiro aspecto, “ (...) como ação, mas
ação que não deixa de incluir, em sua expressão, os demais aspectos.
120
A fé, como ação à luz da cidadania, configura-se como fé cidadã, que, por sua
vez, é compreendida por Castro como a
fé vista na perspectiva da ação, como fé participativa, que ativa a
consciência ética do cristão, abrindo-lhe a possibilidade de inserção
(testemunho) no espaço público, podendo assim expressar sua
singularidade na pluralidade. É capaz de produzir milagres, não apenas
transcendentais, mas como ‘interrupções de uma série qualquer de
acontecimentos, de algum processo automático, em cujo contexto
constituam o absolutamente inesperado’. O milagre para Arendt, é a
capacidade humana de iniciar algo novo pela ação que interrompe os
processos automatizados.
121
Portanto, a fé cidadã é a ação humana singular, expressa no espaço público
plural e capaz de instaurar algo novo.
122
Neste contexto, o sujeito da fé cidadã
encontra-se como sujeito histórico da práxis cristã, cuja palavra e ação se manifestam
no espaço público, com a intenção de instaurar o novo nas relações sociais, buscando
superar processos sociais injustos e excludentes.
A fé cidadã representa, aqui, o instrumento próprio para a inserção dos
cristãos no espaço público da pluralidade das ações humanas, para se constituir por
meio da palavra e da ação, e promover “os milagres que gestarão um mundo
novo.
123
Nesse sentido, conclui Castro, o “exercício da cidadania, enquanto
mediadora na relação entre a vida pública e privada, é um espaço singular para a
120
Ibidem.
121
Op. Cit., CASTRO, Clovis Pinto de, pp. 109-10.
122
A respeito da ação, Castro fundamenta-se na compreensão de Arendt, afirmando que esta chama “
(...) à existência o que antes não existia mediante palavras e atos. Portanto, a ação pressupõe o
mundo público (esfera da pluralidade) como espaço de expressão das singularidades.”, Op. Cit.,
CASTRO, Clovis Pinto de, p. 110. E ainda para Arendt a “pluralidade humana é a condição básica
da ação e do discurso, tem o duplo aspecto de igualdade e diferença”. Cf. ARENDT, Hannah.
Condição humana, p. 188.
123
Op. Cit., CASTRO, Clovis Pinto de, p. 110.
concretização da fé cidadã”.
124
Vejamos alguns dos elementos indispensáveis para o exercício da fé cidadã
que, segundo Castro, corresponde à pastoral da cidadania que, por sua vez,
representa esta inserção da Igreja intimamente ligada ao conceito do Reino de Deus:
1) a esfera da ação; 2) a formação do sujeito cidadão; 3) a esfera do poder local
democrático; 4) paradigma missionário do shalom.
A pastoral da cidadania, nas palavras de Castro:
(...) deve viabilizar a discussão para se estabelecerem os fundamentos e
referenciais norteadores da ação da Igreja no espaço público. Ela precisa
ser fecunda, permanentemente, por uma teologia que incorpore a
cidadania como categoria hermenêutica. Pastoral e cidadania são
categorias que se entrecruzam no exercício da fé cidadã.
125
1.4.1. A esfera da ação humana no cotidiano
A fé cidadã é ação humana que se manifesta no espaço público, como já foi
visto. Tal espaço é compreendido, a partir da filosofia de Arendt, como o espaço da
palavra e da ação, que é o locus onde é possível instaurar o novo. Desta forma, a fé
cidadã busca a práxis social da Igreja, mais efetivamente, no espaço público. Neste
sentido, de acordo com Castro, a “ação constitui a essência da atividade política.
Ação, nesse contexto, é entendida como o agir que possibilita a instauração do novo
no espaço público.
126
O grande desafio para vivenciar a fé cristã no cotidiano dá-se, justamente, em
razão de sua amplitude, quando se leva em consideração o significado de “ (...)
124
Ibidem.
125
Ibid., p. 111.
126
Idid., p. 113.
palavras como: doação, serviço, compromisso, sacrifício, cruz, solidariedade, entre
outras, que indicam a vivência de uma espiritualidade encarnada e com uma
dimensão pública”.
127
Estes termos norteiam a práxis cristã, e sem estes elementos
não há possibilidade de instauração de algo novo na sociedade.
Outra questão importante, no tocante à esfera da ação humana no espaço
público, diz respeito à diferenciação apresentada por Castro entre o poder e a força.
Para ele, o poder emerge do espaço público, juntamente com o debate dos negócios
humanos, enquanto a força é intrínseca à característica do homem isolado, que
implica na necessidade de domínio sobre outros (impotência). Esse domínio é
mantido pelo uso da força”.
128
Com o uso da força, ao invés do poder, no espaço público, tolhe-se a
liberdade do ser humano e favorece-se a manipulação do cidadão, em benefício de
interesses individualistas, daqueles que oprimem pela força. Castro afirma que há
uma “ (...) íntima ligação entre liberdade e ação”, na qual “ (...) as pessoas não
adquirem a liberdade para depois agir, ao contrário, ao agirem instauram o espaço de
liberdade.
129
Portanto, a fé cidadã deve incorporar na sua vivência a dimensão do poder,
constituído no diálogo plural da esfera pública, assumindo posições que venham
contribuir para instaurar a nova sociedade, pautada no exercício pleno da cidadania e
da fé cristã.
127
Ibid., p. 107.
128
Ibid., p. 113.
129
Ibid., p. 114.
1.4.2. A formação do cidadão crítico e sujeito histórico
O conceito atual de cidadania e da formação cidadã é bastante recente. Por
esta razão, é necessário que se produzam esforços coletivos para a popularização
daquilo que se compreende como cidadania e, ao mesmo tempo, quais são as
instâncias de atuação do cidadão.
Neste sentido, a pastoral da cidadania busca estabelecer os fundamentos para
a conceituação e a atuação da fé cidadã, no contexto social e cultural contemporâneo,
na sua perspectiva pedagógica. Na sua dimensão ad intra, a fé cidadã integra o
conceito de cidadania e a fé cristã, e possibilita a formação crítica do cristão por
meio do ensino do evangelho e da práxis de Cristo; na sua dimensão ad extra, busca
ampliar os conhecimentos a respeito do pleno exercício da cidadania. Nas palavras
de Castro: a “pastoral da cidadania constitui-se num processo contínuo de formação
do sujeito cidadão visando o fortalecimento da democracia e à novidade do Reino de
Deus.
130
Para Castro, “a pastoral da cidadania deve repropor a questão da liberdade na
esfera da política”
131
, o seu papel é “ (...) educar para uma nova liberdade
liberdade de ação”.
132
Em razão do homem não existir de forma isolada no mundo,
mas de relacionar-se com o mundo a partir de seus interesses comuns, Castro afirma
que “a liberdade de ação reclama a consciência da pluralidade [onde] as pessoas
compartilham suas preocupações e expectativas comuns”.
133
130
Ibid., p. 115.
131
Ibidem.
132
Ibidem
133
Ibidem
Os ensinamentos cristãos, a respeito do seu testemunho no mundo, como sal
da terra, luz do mundo, fermento em meio à massa, são lembrados por Castro como
ensinamentos que reforçam a característica da fé cidadã, que deve ser vivida na
dimensão do espaço público e não apenas no âmbito privado.
Castro conclui, afirmando que estas funções realizam um movimento
dinâmico de aprendizagem, no qual “sensibilização, conscientização, motivação e
capacitação.
134
1.4.3. A construção coletiva do poder local
A questão do poder, como construção coletiva que se dá no espaço público é,
por sua vez, outra característica fundamental para o exercício pleno da cidadania e da
fé cidadã. Neste sentido, por meio dos debates a respeito dos interesses comuns é que
se organizam, e constituem, o poder democrático e popular, o que, para Castro, é o
fortalecimento do poder local e, naturalmente, do processo democrático.
O espaço público do poder local pode ajudar a garantir a construção de
uma cultura democrática. O espaço local é lócus privilegiado de
aprendizagem política e de formação do sujeito cidadão.
135
É a partir da organização política, local e popular, que é gerado o aprendizado
político e da cidadania, quando ocorre a formação do sujeito cidadão responsável e
compromissado com a construção de uma sociedade democrática, pautada no
exercício pleno da cidadania.
Castro lembra que, diante de novas condições existenciais da cultura
contemporânea, é exigido um esforço da pastoral da cidadania, por meio de
134
Ibid., p. 112.
135
Ibid., p. 116.
(...) um trabalho de sensibilização e conscientização dos cristãos no
sentido de ajudá-los a perceber a realidade das cidades com outros olhos e
a descobrir a relevância do exercício de uma fé cidadã para consolidação
de uma democracia não só política, mas com ética, justiça e igualdade
social.
136
Para Castro, a pastoral da cidadania é uma das forças do poder local, e tem
condições de garantir mobilização e articulação popular permanente entre cristãos e
não cristãos, promovendo a cidadania ativa e emancipada, atuando como parceira na
democratização do poder local.
137
Este âmbito do poder local exige, da fé cidadã, um exercício contínuo de
diálogo na pluralidade do espaço público, que busca estabelecer “uma comunidade
capaz de reverter o quadro de exclusão e marginalização presente na realidade da
maioria das cidades brasileiras”.
138
Apreender a cultura local, as relações de poder e a organização político-social
dentro das particularidades de cada cidade é o papel da pastoral da cidadania, para
que seja possível articular a fé cidadã no espaço público, local e complexo,
promovendo a sensibilização e a conscientização da população para a
democratização da política e do poder local.
1.4.4. O paradigma missionário do shalom
A paz, ou paradigma missionário, do shalom, é o resultado da justiça e da
“restauração de um mundo bom criado e restaurado por Deus.
139
Este elemento da
fé cidadã caracteriza a habitação humana, o mundo, como lugar bom, criado por
136
Ibid., p. 118.
137
Ibid., pp. 118-19.
138
Ibid., p. 119.
139
Ibid., p. 120.
Deus, e apresenta ao fiel o desafio e a possibilidade de restauração deste mundo,
segundo o
(...) seu propósito de restauração, [onde] Deus vocaciona
permanentemente, pessoas justas e íntegras; homens e mulheres
compromissados com a justiça e o direito, na tentativa de (re) ordenar o
mundo, ou seja, testemunhar no presente eon, numa tensão (eschaton),
como resultado de uma nova aliança, uma aliança de paz (shalom).
140
Percebe-se a importância da compreensão do paradigma missionário do
shalom, exatamente porque ele não se restringe apenas a promover a paz, mas
também a promover a justiça e o direito no mundo, a partir do exercício da fé cidadã.
Neste sentido, Castro afirma que “viver a fé cidadã é viver na perspectiva do shalom,
que é implementado pela prática da justiça (mishpat e sedaqah)”.
141
Assim, a perspectiva de ação da fé cidadã deve possuir a dimensão presente,
apresentando a necessidade imediata de agir e, ao mesmo tempo, estas ações ou
práxis cristã, devem possuir uma perspectiva futura, onde realizar-se-ão plenamente.
Para Guillermo Cook, a esperança que mobiliza o cristão é concreta, como esperança
“(...) do reinado futuro, e também presente, de Jesus Cristo, Filho de Deus e filho do
homem
142
; por outro lado, a esperança cristã não é um sentimento individualista ou
egoísta, mas “é solidária na sua amplitude, pois sua intenção alcança toda a Igreja e a
toda humanidade. É também solidária na sua especificidade porque, na prática,
envolve unicamente os que estão comprometidos com o projeto divino do Reino.
143
Este projeto divino se refere ao ministério reconciliador de Cristo, que
segundo Cook, implicou na “ (...) aceitação do marginalizado e alienado, a
140
Ibidem.
141
Ibidem.
142
COOK, Guillermo. Hacia una Esperanza Solidaria en la Misión Evangelizadora. In: Revista
Pastoralia n. 19, dic. 1987, Año 9, p. 2. Disponível em
www.igrejadairmandade.org.br/pastoralia.htm. Consultado em 20 nov. 2006.
143
Ibidem.
confrontação direta com as forças do mal da vida com a morte e seu resultado foi
o shalom: libertação, reconciliação e redenção integral.
144
Esta perspectiva da
integralidade do ser humano, alvo da redenção divina, é fundamental para definir as
práticas sociais da Igreja no presente e no futuro, tendo em vista estes elementos do
shalom.
A respeito da esperança escatológica, Castro cita Boff que, por sua vez,
afirma que “a esperança escatológica, a Igreja [deve seguir] desfraldando também a
bandeira da esperança histórica (...) a história permanece aberta ao projeto divino e à
invenção humana (...) é possível sonhar um mundo diferente”.
145
Portanto, o desafio da pastoral da cidadania, a partir do paradigma
missionário do shalom, é de
fomentar uma teologia e uma espiritualidade alicerçada numa
compreensão mais ampla de justiça. Uma espiritualidade que saiba
conjugar objetividade e subjetividade, singularidade e pluralidade,
privado e público, oração e ação. Uma espiritualidade que incorpore o
mundo público.
146
Para o exercício da fé cidadã, é indispensável o compromisso com esse
paradigma missionário e, ainda, que por meio de uma nova espiritualidade, seja
incorporado o mundo público, como espaço legítimo para sua vivência e de
influência, para se restaurar o mundo bom criado por Deus.
144
Ibid., p. 5.
145
BOFF, Clodovis. Uma Igreja para o próximo milênio. São Paulo: Paulus, 1998, p. 32, cf. Op. Cit.,
CASTRO, Clovis Pinto de, p. 121.
146
Ibidem.
1.5. DIÁLOGO INTERDISCIPLINAR NA DEFINIÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO PARA
ANÁLISE DAS PRÁTICAS SOCIAIS DA IGREJA: POSSIBILIDADES E LIMITES
Como já foi dito, a pesquisa em Ciências da Religião possui um caráter
interdisciplinar, que visa o diálogo entre os referenciais teóricos descritivos e
analíticos. Neste sentido, o presente trabalho realiza um diálogo entre os referenciais
apresentados, possibilitando a interface entre os mesmos, com vistas à análise do
fenômeno religioso.
Entende-se que a pesquisa possui uma característica questionadora,
sistemática, crítica e criativa que, nas palavras de Pedro Demo, é tudo isso, mais a
intervenção competente na realidade, ou o diálogo crítico permanente com a
realidade em sentido teórico e prático.
147
Tem-se como princípio que esses referenciais servirão para estabelecer um
marco ou quadro teórico, que “constitui o universo de princípios, categorias e
conceitos, formando sistematicamente um conjunto logicamente coerente, dentro do
qual o trabalho do pesquisador se fundamenta e se desenvolve.
148
Sendo assim,
apresentam-se os pontos comuns entre os referenciais, que contribuíram para a
descrição e análise crítica das práticas sociais da Igreja.
O fio condutor entre a historiografia, a práxis social, a práxis cristã e a fé
cidadã é exatamente a perspectiva interdisciplinar, utilizada pelos referenciais
147
DEMO, Pedro. Pesquisa e construção de conhecimento. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996, p.
34.
148
SEVERINO, Joaquim A.. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2000, p. 162.
escolhidos na execução das suas pesquisas. Este elemento fundamental constituiu
uma das bases de integração entre os autores e as obras citadas nesta pesquisa.
Uma das características fundamentais, que irão permear a pesquisa das
práticas sociais da Igreja, diz respeito à orientação de Certeau com relação ao diálogo
existente entre o lugar de produção das práticas sociais (passado), com uma prática
ou atividade que se utiliza de métodos para realizar a leitura desta prática no passado,
com a escrita de um texto, que visa a compreensão de um fenômeno de uma
sociedade passada, buscando escrever a história no presente por meio dessa
operação.
A respeito da diferença conceitual entre a prática social e a práxis social, a
contribuição da filosofia da práxis de Vázquez é fundamental. Além disso, a
compreensão de práxis social serve como paradigma que caracteriza a potencialidade
da ação cristã como atividade que possui intenção de transformação da realidade
social. Esta característica é fundamental para a práxis cristã no cotidiano e é
potencializada por meio das práticas sociais da Igreja, por focar problemas sociais
reais e buscar promover enfrentamento dos mesmos, com vistas à transformação de
tal realidade.
Na teologia prática, destacam-se os subsídios para a análise paradigmática das
práticas sociais da Igreja, a compreensão de Floristán referente à práxis cristã como
práxis humana, que possui quatro características fundamentais: 1) é ação criadora,
pois exige um elevado nível de consciência crítica e de criatividade; 2) é ação
reflexiva, não mera prática, mas é preciso um alto grau de reflexão; 3) é ação
libertadora, ou seja, o fim desta ação deve resultar em uma nova realidade, mais
humana e livre; e 4) é ação radical, objetiva transformar as bases econômicas,
políticas e sociais para construir uma sociedade nova.
149
O diálogo entre a fé e a cidadania é um dos estudos mais atuais a respeito da
dimensão pública da Igreja. Também a concepção de Castro a respeito da fé cidadã,
como práxis cristã que atualiza a fé no espaço público e que possui a capacidade de
instaurar a nova sociedade. A dimensão da reconstrução do mundo bom criado por
Deus, estabelecido a partir da justiça e do direito, o Reino do Shalom, é o paradigma
missionário para a fé cidadã, sob a perspectiva da vivência da mesma; este é o
desafio para a construção da nova sociedade.
Esses elementos proporcionam a construção de um referencial teórico
adequado para realizar a descrição analítica dos fundamentos e do desenvolvimento
das práticas sociais da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro, com o
propósito de compreender em que sentido estas práticas se desenvolveram na
perspectiva da transformação social.
Este diálogo interdisciplinar entre os referenciais teóricos constitui a
epistemologia das práticas sociais da Igreja, sob as quais serão descritas e analisadas
as práticas sociais da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro.
149
Op. Cit., FLORISTÁN, Casiano, pp. 181-182.
1.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO
A importância de apresentar os referenciais deste trabalho está no fato de que
se trata de uma pesquisa realizada na área das Ciências da Religião, que dialoga
interdisciplinarmente com as Ciências Humanas. Além disto, pareceu indispensável
expor a compreensão mais clara a respeito dos métodos a serem empregados, tanto
na coleta e sistematização dos documentos, quanto na descrição e análise do
fenômeno das práticas sociais da Igreja.
Buscou-se demonstrar, neste capítulo, as reflexões conceituais a respeito do
tema da pesquisa, e os referenciais foram escolhidos na tentativa de que pudessem
fornecer um instrumental de análise crítica das práticas sociais da Igreja, por meio de
um diálogo interdisciplinar. Portanto, no próximo capítulo verificar-se-á a estratégia
de inserção pública da Missão Batista Sueca, a partir da imigração sueca para o
Brasil no interior do Rio Grande do Sul, sua identificação com as questões sociais e
seu desenvolvimento como instituição religiosa no contexto brasileiro.
CAPÍTULO 2
A IMPLANTAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA MISSÃO
BATISTA SUECA NO BRASIL A PARTIR DO RIO GRANDE DO
SUL
O passado é uma reconstituição das sociedades e dos seres humanos de
outrora por homens e para homens engajados na trama das sociedades
humanas de hoje.
Lucien Febvre
O objetivo deste capítulo é realizar a exposição documental relacionada à
implantação e ao desenvolvimento do empreendimento missionário Batista sueco no
Rio Grande do Sul e sua expansão no território nacional, e analisar sua estratégia de
inserção na sociedade brasileira.
A primeira parte desta pesquisa das práticas sociais da Igreja viabiliza-se
por meio da operação historiográfica que, na compreensão de Certeau, articula um
lugar de produção a partir do qual “se instauram os métodos, (...) se delineia uma
topografia de interesses, que os documentos e as questões, que lhe serão propostas,
se organizam”.
150
Portanto, é a partir do lugar de produção das práticas sociais da
Igreja Batista Independente que se realiza a análise dos documentos para a
construção do texto.
O desafio da pesquisa a respeito das práticas sociais da Igreja é articular
um lugar de produção do passado ao mundo contemporâneo, onde se localizam e se
mobilizam os interesses socioculturais e político-econômicos que norteiam a
pesquisa.
151
Portanto, segundo Lucien Lebvre, a operação historiográfica tem como
meta reconstituir as práticas sociais da Igreja Batista Independente do passado para a
sociedade humana do presente.
Neste sentido, Certeau afirma que, na ação que faz história, como operação
historiográfica, é preciso levar em consideração um enraizamento do discurso, que
(...) hoje, não pode ser desligado de sua produção, tampouco o pode ser a
práxis política, econômica ou religiosa, que muda as sociedades e que,
num momento dado, torna possível tal ou qual tipo de compreensão
científica.
152
Desta forma, o tema das práticas sociais da Igreja Batista Independente possui
uma preocupação fundamental, a saber: produzir um texto que compreenda
determinado momento histórico e local de produção, que deve ser compreendido a
rigor, como práxis política, econômica e religiosa do próprio sujeito religioso.
150
Op. Cit., CERTEAU, Michel, p. 67.
151
Para Certeau “Menos do que as intenções pessoais, então, as localizações sócio-culturais
mobilizam o interesse e o tipo de pesquisa”, Ibid., p. 42.
152
Ibid., p. 41.
2.1. A MISSÃO BATISTA SUECA E A RELAÇÃO COM O MOVIMENTO MISSIONÁRIO
PROTESTANTE LATINO-AMERICANO
Comissionar homens, mulheres e famílias inteiras com o objetivo de levar a
mensagem do Evangelho a todas as nações, sob o fundamento neotestamentário da
Grande Comissão, pela qual todos os cristãos têm o compromisso de irem “ (...) até
os confins da terra”.
153
Esta pode ser a síntese da mentalidade do movimento
missionário expansionista protestante do início do século 20, cujo marco inicial é o
Congresso Mundial de Missões realizado na cidade de Edimburgo, Escócia, no ano
de 1910.
Nesse evento, entre outros temas, divergiu-se a respeito da compreensão dos
novos campos missionários no mundo. Esta divergência se deu principalmente entre
as agências missionárias americanas e inglesas. Os primeiros acreditavam que,
apesar da presença católica na América Latina, o evento deveria reconhecer que o
continente é campo legítimo para a ação missionária protestante, e o segundo grupo,
representado por Igrejas protestantes históricas, em especial a Igreja Anglicana,
entendia que não deveria haver uma nova representação do “cristianismo protestante,
onde já havia alguma influência de outra igreja”.
154
Essa divergência fez com que
alguns delegados presentes, em especial, os norte-americanos e canadenses, se
reunissem para procurar contrapor essa idéia, por acreditar que o catolicismo era uma
153
De acordo com o Evangelho segundo Mateus, capítulo 28, verso 19, “Ide, portanto, e fazei que
todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e
ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei”, cf. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus,
1985.
154
PIEDRA, Arturo. Evangelizción protestante en América Latina: análisis de las razones que
justificaron y promovieron la expansión protestante 1830-1960. Tomo I. Quito: Departamento de
Comunicaciones del Consejo Lainoamericano de Iglesias - CLAI, 2000, p. 114.
representação deturpada do cristianismo.
O resultado da controvérsia foi que a América Latina acabou recebendo forte
influência missionária protestante, a partir das empresas missionárias norte-
americanas, que não possuíam relação com o movimento ecumênico. Estas empresas
missionárias estavam “ (...) baseadas sobre tudo em igrejas independentes nos países
que enviavam missionários e estes necessitavam ampliar sua visão e aprofundar sua
compreensão da história e da cultura da América Latina.
155
Posteriormente, organizou-se a Conferência de Missões Estrangeiras na
América do Norte, que foi favorável à realização de atividades missionárias
protestantes na América Latina. Este evento convocou a consulta sobre o trabalho
protestante no continente, e foi realizado na cidade de Nova Iorque, em março de
1913.
Nesse ano, é formado o Comitê de Cooperação Latino-Americano (CCLA),
presidido por Roberto Speer, que se reúne “ (...) com representantes de organizações
missionárias que trabalhavam no México”
156
, na cidade de Cincinatti, Ohio. Além de
discutir os problemas oriundos da revolução mexicana, o Comitê recomendou
eliminar os esforços missionários duplicados, dos vários grupos religiosos neste país
e, ainda, designou regiões específicas para a atuação de cada grupo missionário de
acordo com a sua influência e aceitação local. Para Kessler e Nelson, este fenômeno
ocorrerá repetidas vezes posteriormente em outros países latino-americanos, com
alguma variação.
O Comitê de Cooperação Latino-Americano organiza, então, o Congresso de
155
KESSLER, Juan e NELSON, Wilton M. Panamá 1916 y su impacto sobre el protestantismo
latinoamericano. In.: Oaxtepec 1978: Unidad y Mision en America Latina. San José: Comite
Editorial del CLAI: Consejo Latinoamericano de Iglesias (En Formación), 1980, p. 12.
156
Ibid., p. 11.
Ação Cristã do Panamá, com data marcada entre os dias 10 e 20 de fevereiro de
1916.
157
Desde a abertura do Canal em 1914, este país havia se tornado a
“encruzilhada do mundo”; segundo os organizadores, esta foi a razão da escolha do
Panamá para sediar o evento.
158
Os participantes do Congresso eram, na maioria,
missionários e executivos de empresas missionárias que vinham de países de fora da
América Latina.
159
O convite do Congresso foi redigido de forma aberta a todos os cristãos
interessados em dialogar a respeito da atividade missionária na América Latina, e foi
feito conforme segue:
Todas as comunhões ou organizações que aceitam a Jesus Cristo como
Divino Salvador e Senhor, e as Sagradas Escrituras do Antigo e do Novo
Testamento como Palavra de Deus revelada, e cujo propósito é fazer que
a vontade de Cristo prevaleça na América Latina, estão cordialmente
convidados a participar no Congresso do Panamá e serão bem vindos de
coração.
160
As reações foram diversas. Enquanto o Bispo do Panamá rejeitou o convite,
há o relato de um delegado protestante do Chile que, ao retornar ao seu país, foi
recebido pelo Bispo católico com as seguintes palavras: Nós não podemos
completar a tarefa sozinhos. Além disso, temos perdido a influência sobre o povo. Se
vocês podem proporcionar alguma inspiração para nosso povo, então, pelo menos eu
estaria muito contente de ajudar com parte de nosso trabalho”.
161
157
Para Jean-Pierre Bastian este congresso foi “o congresso das sociedades missionárias que
trabalhavam na América Latina”, cf. BASTIAN, Jean-Pierre. História del protestantismo em
América Latina. México: Centro de Conunicación Cultural CUPSA, A.C., 1990, p 159.
158
Op. Cit., KESSLER, Juan e NELSON, Wilton M., p. 12.
159
Os totais deste congresso foram: 481 pessoas participaram como ouvintes, 230 eram delegados
oficiais, 74 convidados oficiais e 177 foi o número de freqüência diária do Congresso. Ainda 159
vieram dos EUA, Grã-bretanha, Canadá, Espanha e Itália, 145 vieram de 18 países da América
Latina, porém destes últimos, apenas 21 destes eram latino-americanos de nascimento, cf. Op. Cit.,
KESSLER, Juan e NELSON, Wilton M., p. 14.
160
Oaxtepec 1978: Unidad y Mision en America Latina. San José: Comite Editorial del CLAI:
Consejo Latinoamericano de Iglesias (En Formación), 1980, p. 15.
161
Op. Cit. KESSLER, Juan e NELSON, Wilton M., p. 16.
Após a realização do Congresso de Ação Cristã do Panamá, foi deflagrada
uma série de outros encontros, conferências regionais e continentais, que se
realizaram por toda América Latina. Estes eventos marcaram “ (...) o progresso da
obra e refletem tanto a necessidade como o desejo apaixonado de um número cada
vez maior de protestantes pela unidade e missão”.
162
Com este pano de fundo, do Movimento Missionário Protestante Latino-
Americano, pode-se então localizar a chegada da Missão Batista Sueca ao Brasil, que
ocorre paralelamente aos eventos de Edimburgo e Panamá, no ano de 1912.
Apesar da Örebromissionen (Associação Missionária de Örebro)
163
parecer
estar, de certa forma, influenciada pela visão européia de expansão missionária em
direção ao oriente, é importante perceber que a influência do movimento avivalista
da América do Norte é um elemento fundamental para o envio de missionários para o
mundo.
A partir da experiência pessoal do pastor batista John Ongman, a Associação
Missionária de Örebro tem em vista a atividade missionária sob frentes de trabalho:
1) local: entre igrejas suecas; 2) regional: entre países vizinhos e, por fim, 3)
transcultural: caracterizada naquele momento pela China, Índia e África. O Brasil
tornou-se um destes alvos de missão apenas em 1912, com a segunda tentativa de
162
COSTAS, Orlando E. e GARCIA, Ana L. de, Oaxtepec 1978: Unidad y Mision en America Latina.
San José: Comite Editorial del CLAI: Consejo Latinoamericano de Iglesias (En Formación), 1980,
p. ii.
163
A Örebro Missiosförening foi organizada por 25 membros da Igreja Batista de Örebro. No ano de
1892 passou a se chamar Örebromissionen e, atualmente, é conhecida como Interact. Esta Junta “
‘é simplesmente um órgão para manter o trabalho evangélico na Pátria e no estrangeiro, dando
prioridade aos países vizinhos.’ As Igrejas que geralmente cooperam com [ela] ou que nela têm um
órgão mediador para sua missão no estrangeiro são, via de regra, Igrejas Batistas Independentes”.
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 13, cf. BOSTRÖM, Joel. Junta Missionária de Örebro, Suécia. Luz
nas Trevas. Santa Maria, Ano XXXV, dezembro de 1961. Edição Comemorativa, pp. 6-7. As
Igrejas independentes compreendem aquelas que não são mantidas pelo Estado sueco, como foi o
caso da Igreja Luterana até o ano de 2000. cf. JONSSON, Lars-Erik. A história da Missão de
Örebro/Suécia. In. História dos Batistas Independentes apostilado. Seminário Teológico Batista
Independente: Campinas, 2003, p. 1.
implantação da atividade missionária sueca no país, com a chegada do missionário
sueco Erik Jansson.
Ao comemorar o cinqüentenário da presença da Missão Batista Sueca no
Brasil, o secretário executivo Joel Boström, da então conhecida Örebromissionen,
afirmou que, desde o início da atividade missionária na Índia, em 1908, atuavam no
país 20 missionários; na República do Congo e na República da África Central, onde
o trabalho teve início em 1919, eram mantidos 66 missionários; 3 missionários
atuaram na Estônia no período de 1923 à 1935; no Japão iniciaram as atividades em
1950 e eram mantidos 17 missionários, 3 missionários no Nepal desde 1954 e 4
missionários no Paquistão a partir de 1958. Boström afirmou que, na década de 60, a
Associação Missionária de Örebro mantinha 146 missionários em 6 países, deste
total, 42 atuavam no Brasil.
164
2.2. OS SUECOS A CAMINHO DO BRASIL: RETROSPECTO DA IMIGRAÇÃO SUECA
ENTRE 1819 E 1970
Os motivos pelos quais os imigrantes europeus vieram às terras brasileiras,
relacionavam-se com o processo de industrialização e substituição da mão-de-obra
humana por máquinas na Europa. Uma história de lutas, de miséria, de esperança e
fé. A vinda para o continente americano era a possibilidade de construir um mundo
melhor para os imigrantes e seus descendentes.
164
Op. Cit., BÖSTROM, Joel, pp. 6-7.
Com o ideal da república democrática, foi “ (...) aprovada a Constituição em
1891 dos Estados Unidos do Brasil (...) se introduz o sistema salarial e o país se
dirigiria à Europa para conseguir bons trabalhadores. Eles deviam desenvolver a
nova economia”.
165
Neste período, inicia-se o novo processo de exploração de mão-
de-obra no país, no qual o imigrante europeu desempenhou um papel de extrema
importância para o desenvolvimento econômico do Brasil.
A nova lei de imigração, editada em 1890, proibia a imigração de africanos e
asiáticos, porém, aos candidatos europeus que desejassem vir para o Brasil, oferecia-
se: viagem gratuita, atendimento médico e auxílio para subsistência, estabelecimento
nas colônias de acordo com a sua preferência, poderiam adquirir lotes de 15 hectares,
receberem subsídios nos primeiros nove meses e possuir título provisório da
propriedade.
166
Em contrapartida, o governo brasileiro exigia que fossem famílias de
agricultores e operários solteiros, entre 18 e 50 anos, saudáveis e sem antecedentes
criminais. Por razões políticas e econômicas, os imigrantes europeus foram
destinados para duas regiões específicas nas terras brasileiras, de acordo com Flodell
Os destinos específicos no Brasil foram os distritos do café em São Paulo,
além dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Nesse
último estado fundaram-se colônias ao redor de Guarani das Missões no
noroeste, as margens do rio Uruguai, onde pensavam construir a Nova
Suécia.
167
No Sudeste, os imigrantes supriram a carência de mão-de-obra no ciclo da
produção agrícola, onde foram empregados imigrantes de várias etnias nas
plantações de café e cana-de-açúcar. De acordo com Graham e Buarque de Holanda,
165
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 32.
166
Cf. a transcrição de FLODELL, Sven Arne, p. 33.
167
Ibidem.
São Paulo recebeu cerca de 400 mil imigrantes europeus até o ano de 1920.
168
No ano de 1810, já havia chegado ao Brasil (São Paulo) um grupo de suecos
de uma empresa sueca-brasileira; porém, de acordo com Flodell, os suecos eram
apenas um pequeno grupo em relação à massa de imigrantes europeus.
Desembarcaram no Brasil cerca de 250 mil alemães, 1,5 milhões de italianos e 1
milhão de portugueses. Além destes, também “ (...) outros grupos importantes foram
os espanhóis e poloneses. No total chegaram aproximadamente 5 milhões durante os
anos de 1875-1960.
169
A região sul se apresentava como um local de difícil adaptação, com matas
fechadas e um terreno bastante acidentado. Isto dificultava o acesso e o deslocamento
nas localidades do interior, sendo um desafio a ser transposto. O clima frio de
invernos rigorosos também era obstáculo para a colonização nesta região.
O recrutador de mão-de-obra européia, Johan Dann, foi o responsável pela
divulgação das terras brasileiras na Suécia e na Alemanha. A propaganda de
colonização destas terras foi direcionada ao imigrante europeu, justamente porque o
governo brasileiro acreditava que esses teriam melhor adaptação ao clima e geografia
da região Sul e, conseqüentemente, sucesso no empreendimento da colonização.
Diante das adversidades vividas por muitos suecos, naqueles anos de miséria
e conflitos na Suécia, e de farta publicidade a respeito de uma vida melhor na
América, convenceram-se de que não adiantava esperar mais por uma solução da
pátria-mãe, e decidiram buscar melhores condições de vida no Brasil. Flodell destaca
outro fator importante na decisão para emigrar:
168
Apud, GRAHAM, HOLANDA, Sérgio Buarque, cf. TORNQUIST, Carin, Os imigrantes suecos -
apêndice-resumo de FRIBORG, Göran, Brasliliensvenskarna, Emigrantinstutets Skriftserie, n. 5,
1988, p. 129.
169
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne., p. 25.
A amargura contra a sociedade sueca era muitas vezes a razão para
emigrar. Quando a imprensa começou a publicar artigos sobre a
imigração para o Brasil, a queda do Imperador e a política generosa aos
imigrantes, os operários entendiam que a liberdade vinha do outro lado do
Atlântico.
170
Um importante jornal sueco, fundado em 1885 por August ‘Maestro’ Palm
(1849-1922), o diário Socialdemokraten (Social Democrata), que foi dirigido pelo
importante líder dos trabalhadores Hjalmar Branting (1860-1925), foi o responsável
pela difusão de várias idéias políticas e sociais no país. Sua crítica social ecoava por
todo o país entre intelectuais e operários e, no ano de 1896, Branting foi eleito
deputado.
Flodell lembra que os idealizadores desse jornal compreendiam que a vida em
sociedade se dava pela luta de classes e o interesse pelo poder. Porém, esta sociedade
carecia de igualdade e justiça entre patrões e operários, homens e mulheres, e ainda
defendiam uma “ (...) rebelião contra autoridades religiosas, políticas e culturais, a
firme fé no desenvolvimento e no futuro”.
171
Com a realização da assembléia, em 15 de março de 1891, ficaram resolvidas
as razões pelas quais estavam emigrando os suecos para o Brasil, como segue:
A causa da emigração se deve as injustiças sociais. O poder que detém a
classe que arrebata os direitos dos trabalhadores: de tomar parte para
resolver a situação social que dificulta sua existência e os que satisfazem
sua necessidade intelectual.
172
Após a aprovação pela assembléia em favor da emigração, nos dias 19 e 24 de maio
do ano de 1891, dois grandes grupos de emigrantes suecos viajam para o Brasil. Essa
notícia foi publicada no Social Democrata e lembra de fazer menção, da presença do
comissário da polícia local, o senhor Sjögren. Também o jornal sueco Dagens
Nyheter publica um artigo detalhado da despedida dos 200 emigrantes para o Brasil,
170
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, pp. 34-35.
171
Ibid., p. 34.
172
Ibid., pp. 35-36.
trajando roupas de festa, onde se fez presente aproximadamente 10 mil suecos, que
se despediram daqueles que vão em “ (...) busca da sorte que não encontraram aqui,
em Estocolmo.
173
Um exemplo do tipo de publicidade que o governo brasileiro difundia pelos
jornais e panfletos na Suécia, declara que
O Brasil é um país livre, totalmente livre. O emigrante europeu, oprimido
pela canga militar e religiosa, encontra, quando desembarca, as idéias de
liberdade modernas já plenamente realizadas, ao mesmo tempo em que é
calorosamente recebido na nova pátria. No Brasil ele pode viver de
acordo com a própria vontade sob as proteções de leis tolerantes e
costumes agradáveis, independentemente se ele quer manter a
nacionalidade original ou preferir se naturalizar brasileiro. Ninguém se
surpreenda quando um filho de emigrantes pobres ascenderem aos cargos
mais altos na nova pátria.
174
Podemos afirmar que, com tantas dificuldades enfrentadas pelos suecos em
relação ao processo de industrialização e de seus reflexos nas relações de produção,
culminando na deterioração do tecido social e no aumento da miséria, as promessas
pareciam como que “caídas do céu”. De fato, eram grandiosas aos olhos dos
emigrantes; por outro lado, o Brasil estava muito longe de cumprir tais promessas e
de tornar-se uma nação republicana e democrática.
Durante o período das imigrações européias, Flodell lembra que se
transportaram muitas “esperanças e ambiciosos sonhos de viver em liberdade e
enriquecer”
175
e, também, havia o pensamento de construir na América novas
sociedades, onde, finalmente, fosse possível viver sob um regime de igualdade.
De acordo com Göran Friborg
176
, em sua obra a respeito da emigração sueca
173
Ibid., p. 37.
174
Extraído do folheto de propaganda publicado pelo escritório de emigração brasileira na Suécia, cf.
EKSTRÖM, Leif Arthur. Bön, Sinnrock & Kaffekvarn (A oração, a roca e o moedor de café): os
vikings descobrem a América do Sul. 2005. Monografia (Centro de Linguagem e Comunicação)
Faculdade de Jornalismo PUCCAMP, Campinas, p. 47.
175
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 15.
176
FRIBORG, Göran, Brasliliensvenskarna, Emigrantinstutets Skriftserie, n. 5, 1988, 132 p.
para o Brasil, chegaram ao país 8.335 mil
177
suecos entre os anos de 1819 e 1970.
Em meados de 1860, período conhecido como os anos de miséria na Suécia (1868-
1873), a emigração foi marcada majoritariamente por candidatos jovens e
solteiros.
178
Porém, o governo brasileiro tinha interesse “ (...) em promover a vinda
de famílias”
179
; neste período ocorre a primeira fase da imigração sueca para o
Brasil. O sugestivo título dado por Flodell, “a expedição de Dann”
180
, demonstra a
importância e o êxito que teve o recrutador Dann na Suécia.
Uma propaganda veiculada no jornal sueco Fäderneslandet sob o título Para
longe da Suécia! Vamos ao Brasil!
181
, no dia 24 de abril de 1891, remonta o
segundo período da emigração sueca para o país. Os anos de 1866-1891 são
marcados pelo grande número de imigrantes que chegam ao Brasil. Friborg afirma
que a crise econômica na Suécia, em especial, das “ (...) indústrias de extração de
minério de ferro e serrarias”
182
da região Norte do país, é a razão do grande número
de imigrantes. Neste período, a Suécia é marcada por dificuldades sociais e por
conflitos gerados com o surgimento dos sindicatos no país.
A propaganda do jornal sueco é sintomática e representa também o
desapontamento de muitos suecos em relação à pátria. Enfrentando dificuldades de
sobrevivência na terra natal, não foi difícil recrutar grande número de emigrantes
para a América. Estes imigrantes suecos participam da colonização da Linha Dona
177
Op. Cit., TORNQUIST, Carin, p. 127.
178
A propaganda do governo brasileiro na imprensa sueca remonta a primavera de 1891, apresentando
novos atrativos para imigração ao país, de acordo com Flodell “(...) Brasil, emigración, fiebre
brasileña. Alrededor de dos mil suecos aprovecharam los viajes gratis a Brasil”, cf. Op. Cit.
FLODELL, Sven Arne, p. 26.
179
Op. Cit., TORNQUIST, Ingrid M., TORNQUIST, Guido A., p. 13.
180
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 25.
181
Bort fran Sverge! Till Brsilien! Chamada ilustrada no jornal Fäderneslandet, 29 de abril de 1891,
Suécia, Op. Cit. EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 32.
182
Apud, FRIBORG, Göran, Op. Cit. TORNQUIST, Ingrid M., TORNQUIST, Guido A., pp. 13-14.
Otília e da Vila Guarany.
183
Nesta segunda localidade, entre imigrantes suecos e
alemães, é estabelecida a primeira atividade da Missão Batista Sueca no Brasil.
Apesar da grande propaganda do governo brasileiro na imprensa sueca, no
ano de 1891 já ecoavam advertências em relação às condições de vida no novo
mundo, que
(...) muitos têm regressado do Brasil com suas esperanças frustradas, em
parte porque o governo não tem cumprido as promessas que havia feito
aos europeus. Em geral tratam de seduzir os emigrantes para substituir a
mão-de-obra perdida pela abolição da escravatura.
184
As advertências serão confirmadas no terceiro e último período da imigração
sueca para o Brasil, ocorrida entre os anos de 1909 e 1911, marcada por grande
fracasso. Cerca de 600 imigrantes, de um total de 756, pedem ajuda ao governo
sueco para retornarem ao país de origem.
185
Em janeiro de 1912, o governo sueco
(...) decidiu pela repatriação dos imigrantes, oferecendo a viagem de volta à
pátria”.
186
Em razão deste fracasso, o período foi marcado por grande debate na
Suécia a respeito da imigração e seus riscos.
As dificuldades enfrentadas pelos imigrantes deste período, de acordo com
Tornquist, deram-se em razão do número superior de imigrantes esperado pelo
governo brasileiro, e a vinda de operários e mineiros, enquanto a necessidade
brasileira para a colonização das terras da região Sul era de trabalhadores rurais. A
maioria destes imigrantes suecos foram designados para a Vila Guarany e para
Erechim.
187
183
Atualmente, correspondem respectivamente ao município de Santo Ângelo e Guarani das Missões,
na Região Noroeste do Rio Grande do Sul. Op. Cit. TORNQUIST, Carin; Op. Cit. TORNQUIST,
Ingrid M., TORNQUIST, Guido A., p. 14.
184
Apud. Enciclopédia Nordisk Familjebok. Edição de 1905, p. 26.
185
Op. Cit. TORNQUIST, Ingrid M., TORNQUIST, Guido A., p. 14.
186
Op. Cit., TORNQUIST, Carin, p. 128.
187
Op. Cit., TORNQUIST, Ingrid M., TORNQUIST, Guido A., p. 14.
De acordo com Ekström, esta localidade foi atingida por grande enchente, em
outubro de 1891, uma das causas do fracasso da maioria dos imigrantes suecos na
Vila Guarany: perderam toda a plantação e os bens que possuíam. Nesta ocasião, os
suecos buscaram ajuda do governo brasileiro, que não lhes deu resposta alguma; por
esta razão, decidiram buscar ajuda com o primeiro ministro sueco Karl Staaf, que
acaba enviando “ (...) o cônsul, Axel Paulin, para visitar a região e este recomendou a
repatriação dos suecos”.
188
Cerca de 300 imigrantes do Brasil e 200 da Argentina
retornaram a Suécia.
189
Ao analisar o fracasso da imigração dos suecos para o Brasil, Flodell afirma
que a culpa é da imprensa operária, ou seja, dos jornais Socialdemokraten e o
Norrskensflamman, juntamente com os partidos e grêmios que fomentaram a
imigração. Segundo ele, os textos que haviam sido publicados em favor da imigração
confirmavam este incentivo.
As regiões de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande
do Sul receberam a maioria dos imigrantes suecos. No sul, foram fundadas colônias
na região de Ijuí, sendo a Vila Guarany a localidade onde se iniciou a atividade
missionária sueca no Brasil.
A inserção dos imigrantes suecos no Brasil, em especial na região Sul, deu-se,
principalmente, em razão da metodologia de ocupação do território conhecido por
colônias novas.
190
Neste processo, a imigração européia desempenhou “ (...)
importante papel no processo de diversificação da agricultura e no processo de
188
Op. Cit. EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 54.
189
Para ver as correspondências enviadas a autoridades suecas, veja FLODELL, Sven Arne, pp. 61-
67.
190
De acordo com Lazzarotto, esta nova etapa da colonização se deu a partir das colônias novas, como
eram conhecidas no Rio Grande do Sul, a partir da fundação de Ijuí em 19 de outubro de 1890,
enquanto que a primeira leva de imigrantes no estado, datada de 1875, era conhecida como colônias
velhas. LAZZAROTTO, Danilo. História de Ijuí. Ijuí: Ed. Unijuí, 2002, p. 61.
urbanização e de industrialização, tendo influenciado, em grande parte, a arquitetura
das cidades e, em suma, a paisagem físico-social brasileira”.
191
Neste sentido, nos lembra Marques que os imigrantes de várias etnias
contribuíram a partir das suas formas organizativas, como
fruto de um complexo de fatores, em que as relações e contradições
próprias de uma economia mercantil baseada na pequena produção
agrícola e no trabalho em regime familiar, estão associadas a um esforço
de preservação da identidade ética e religiosa, como base de sustentação
ideológica dos grupos dispersos pelas linhas coloniais e sob a forma de
tradições culturais próprias: língua, religião e organização sociocultural
(capelas, escolas, associações étnico-culturais, clubes de lazer e
esporte).
192
É largamente reconhecida a influência da imigração européia na formação
sócio-cultural e econômica do país, além de trazer em sua bagagem uma história de
lutas e de esperança para construir uma vida melhor na nova sociedade multicultural.
Neste amplo contexto da imigração européia, inserem-se os imigrantes suecos e a
Missão Batista Sueca no Brasil.
2.3. PRIMÓRDIOS DA ATIVIDADE MISSIONÁRIA BATISTA SUECA NA VILA GUARANY
Ao realizar a descrição e análise dos primórdios da atividade missionária
Batista Sueca na Vila Guarany, identifica-se o lugar, o ponto inicial e fundante das
atividades missionárias suecas no Brasil. Como nos lembra Certeau,
a historiografia tende a provar que o lugar onde ela se produz é capaz de
compreender o passado: estranho procedimento, que apresenta a morte,
191
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍTICA - IBGE. A contribuição Alemã
para formação da cultura brasileira. Disponível em http://www.ibge.gov.br. Acesso em: 13 jul.
2006.
192
MARQUES, Mario Osório (Ed.), Etnias diferenciadas na formação de Ijuí, p. 11 e Universidade
emergente: o ensino superior brasileiro em Ijuí (RS) de 1957 a 1983. Ijuí: Fidene, 1985, p. 22.
corte sempre repetido no discurso, e que nega a perda, fingindo no
presente o privilégio de recapitular o passado num saber. Trabalho da
morte e trabalho contra a morte.
193
Neste sentido de recapitular o passado num saber, passamos a apresentar a
fase germinal do projeto missionário dos batistas suecos no Brasil, na tentativa de
apreender suas motivações e apresentar os desdobramentos que seguirão no
empreendimento da escrita de um texto, que depende de
(...) encontrar a morte que habita este lugar, manifestá-la por uma
representação das relações com seu outro, e combatê-la através do
trabalho de dominar intelectualmente a articulação de um querer
particular com forças atuais.
194
É especialmente necessária, para esta manifestação, a relação de alteridade,
de um com o outro, no sentido de situar os eventos do passado que possibilitaram a
implementação da atividade missionária dos batistas suecos, em relação à
compreensão do presente.
Um dos elementos fundamentais da atividade missionária dos batistas suecos,
como já foi dito, está intimamente ligado à presença de imigrantes suecos no Brasil,
e em especial, na região Noroeste do Rio Grande do Sul. A política de colonização e
as dificuldades enfrentadas na Suécia estimularam a vinda dos descendentes dos
vikings ao continente americano. Foi pela necessidade de sobrevivência e o sonho de
construir uma sociedade melhor para seus filhos, que os suecos se deslocaram rumo
ao Brasil, trazendo consigo seus costumes, sua língua e sua religião.
No período em que ocorre a segunda fase da imigração sueca para o Brasil,
no ano de 1892
195
, um imigrante sueco residente na cidade de São Paulo, chamado
John Asblon, fez contatos com algumas organizações missionárias, pedindo que
193
Op. Cit. CERTEAU, Michel, p. 17.
194
Ibid., p. 22.
195
Veja tópico sobre Os suecos a caminho do Brasil: retrospecto da imigração sueca entre 1819 e
1970.
enviassem ao Brasil um pastor ou missionário sueco. Uma destas cartas foi enviada a
Evangeliska Fosterlandsstiftelsen (Fundação Evangélica em prol da Terra Natal),
ligada à Igreja Luterana Sueca, da qual Asblon foi membro antes de emigrar ao
Brasil, porém, não obteve resposta alguma. Ekström lembra que houve um outro
contato com o Exército da Salvação
196
, que orientou Asblon a “ (...) se dirigir ao
escritório da organização na Argentina”.
197
Não se tem notícias se ele obteve
resposta ou se tenha feito algum contato com esse escritório latino-americano.
No mesmo ano, por intermédio de um jornal sueco, Asblon toma
conhecimento da existência da Associação Missionária de Örebro, que fora fundada
naquele ano e estava sob a direção do pastor John Ongman, com o qual fez contato,
solicitando o envio de um missionário para o Brasil.
Nesta ocasião, o jovem estudante de teologia da Escola Missionária de
Örebro
198
, Adolf Larsson, se candidatou para vir ao Brasil. Ele é aprovado pela
Associação Missionária e dirige-se ao Brasil, com destino à cidade de São Paulo.
Porém, ao chegar à cidade do Rio de Janeiro, no início do ano de 1894, é convidado
por um missionário americano para acompanhá-lo na distribuição de literatura por
alguns dias. Nesta escala de curta duração na cidade, Larsson coopera com a
evangelização, distribuindo literatura cristã no porto, onde contrai febre amarela e
196
Surgiu na Inglaterra no ano de 1865, contribuindo para o enfrentamento dos problemas sociais
oriundos da Revolução Industrial “ (...) os primeiros salvacionistas lançaram-se na luta para aliviar
a humanidade sofrida, tendo essa visão holística do ser humano como um todo complexo e
indivisível. Assim é que, desde cedo, o "slogan": "sopa, sabão e salvação" tornou-se um marco do
Exército, que abalou as estruturas e os métodos das igrejas da Inglaterra naquele período”, este
movimento chega ao Brasil no ano de 1922 e identifica sua missão com a "Assistência e Promoção
Social Exército de Salvação é identificar problemas sociais, assistir e promover, sem distinção, o
ser humano, em nome de Jesus". Consultado em 16 jan. 2007. Disponível
em http://www.aproses.org.br.
197
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 60.
198
“A história da Escola Missionária de Örebro está relacionada como os grandes avivamentos que,
entre os anos de 1890 e 1907, atingiram a Suécia, especialmente Örebro (...) a 15 de setembro de
1908, as dependências da Igreja Filadélfia servem para a aula inaugural dessa abençoada escola e
Ongman é eleito seu diretor”. E Deus fez crescer: Jubileu de Prata da Convenção das Igrejas
Batistas Independentes. Campinas: Imprensa Batista, 1977, p. 13.
vem a falecer semanas depois na cidade de São Paulo.
199
Dezoito anos mais tarde, no ano de 1910, é a vez de Carl Gustav
Andersson
200
, imigrante sueco que vivia em uma das Colônias Novas, conhecida
como Vila Guarany, no Rio Grande do Sul. Em sua carta ao jornalista Edelberg, da
Svenska Tribunen (Tribuna Sueca), jornal da cidade de Örebro, Suécia, apresenta a
situação dos imigrantes suecos naquela localidade e pede que seja enviado um
missionário para apoiá-los nas terras brasileiras.
201
A carta de Andersson foi publicada com a manchete “Um grito macedônio”,
no dia 29 de março de 1911, fazendo referência ao episódio da visão do apóstolo
Paulo, relatado no livro de Atos dos Apóstolos, capítulo 16, verso 9: “Vem para
Macedônia e ajuda-nos!”.
202
Entre outras coisas, Andersson faz menção dos poucos
obstáculos para um missionário chegar até o Brasil em relação à África e à Índia, que
possuíam várias doenças e animais selvagens, além disso, ele menciona a visita do
pastor Frederik Franssen, da Igreja da Aliança Sueca, que se compadeceu com a
situação dos imigrantes e prometeu o envio de um missionário. No entanto, Franssen
falece nos Estados Unidos da América antes de voltar à Suécia.
203
O pedido de Andersson chega ao conhecimento da Associação Missionária de
199
JANSSON, Erik. Under Söders Kors. Vol. 1. Ed. Örebro Missionförenings Förlag: Motala, 1941,
p. 29; EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 60; Op. Cit., E Deus fez crescer, pp. 16-17.
200
“Gustavo Andersson, como era mais conhecido, viu a luz do dia 29 de julho de 1855, num belo
verão sueco, em Vastergötland, sendo batizado em Estocolmo aos 28 anos de idade. Em 1891
Gustavo imigrou para o Brasil, vindo radicar-se na Colônia Guarani, naquele tempo pertencente ao
município de São Luiz Gonzaga, Rio Grande do Sul, onde viviam várias famílias suecas”; cf.
MENDES, Martinho. Origem dos Batistas Independentes. Luz nas Trevas, 10 de fev. 1962. Edição
Comemorativa, p. 11.
201
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 92.
202
Op. Cit., JANSSON, Erik, pp. 23-24.
203
ANEXO A - Correspondência de Anders Gustav Andersson envida a Tribuna Sueca.
Örebro, a qual aprova o envio de um missionário para o Brasil.
204
Na condição de
fundador e dirigente da Escola Missionária de Örebro, John Ongman tinha a
responsabilidade de encontrar um candidato para o Brasil e os recursos financeiros
para custear o seu envio e sustento.
Neste período, a China estava aberta para o trabalho de missionários
estrangeiros e, na Escola Missionária de Örebro, o sueco Erik Jansson, natural de
Gagnef, estava a um ano da conclusão dos seus estudos teológicos e tinha um único
objetivo: ser missionário na China. No dia 27 de outubro de 1911, Jansson procura o
pastor Ongman em seu escritório para comunicar-lhe a sua decisão de ir para a China
como missionário. Após ouvi-lo com muita atenção, Ongman declara: “Irmão Erik,
você irá ao Brasil”.
205
Por muitos anos, Jansson preparara-se para atuar como missionário na China.
A notícia, sem dúvida alguma, causou-lhe espanto e inquietação, apesar de não fazê-
lo mudar suas convicções. Após ter lido a carta do Brasil, Jansson devolve a carta a
Ongman e responde: “Eu irei à China”.
206
Após um período de crise, Jansson muda de idéia e aceita o desafio de vir ao
Brasil, alterando radicalmente o seu projeto missionário para atender ao pedido de
Ongman. Segundo ele, após passar por uma “crise espiritual”, teve uma experiência
religiosa que o fez mudar de idéia e aceitar o desafio como direção divina.
207
Sua decisão, um ano antes de ser designado ao campo missionário, poderia
possibilitar os preparativos da Associação Missionária de Örebro, para financiar a
204
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 16.
205
Ibid., p. 18.
206
Ibidem.
207
ANEXO B Relato de Erik Jansson sobre a viajem ao Brasil.
vinda do jovem missionário ao Brasil. No entanto, esta instituição passava por
dificuldades financeiras e, na primavera de 1912, Jansson embarca para o Brasil, sem
nenhuma garantia de que teria algum apoio financeiro da Junta Missionária de
Örebro ou de qualquer outra fonte. Ao ser questionado por Jansson a respeito do seu
sustento, Ongman declarou: “Irmão, tu terás que ir pela fé (...) tudo o que estiver ao
nosso alcance faremos e oraremos por ti”
208
.
Ainda na Suécia, às vésperas do embarque para o Brasil, Jansson recebe uma
carta de Andersson informando que os suecos da Vila Guarany estavam regressando
à Suécia; porém, neste momento, o missionário já estava decidido: “ (...) vou de
qualquer maneira porque seguramente haverá outras pessoas para pregar o
Evangelho”.
209
O jovem missionário sueco chega à cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do
Sul, no dia 15 de junho de 1912, onde permanece hospedado na residência do pastor
Alberto L. Duston. Jansson busca ambientar-se, participando dos cultos da Igreja
Batista Brasileira e realizando visitas às famílias suecas estabelecidas na cidade.
210
De acordo com Flodell, após este período de estudos e adaptação na cidade de
Porto Alegre, Erik Jansson “ (...) viaja como os primeiros imigrantes através de Santa
Maria, Passo Fundo e Cruz Alta, até Ijuí. Ali permaneceu um tempo congregando
quarenta suecos aos domingos”.
211
O missionário foi calorosamente acolhido na sua
passagem pelas colônias suecas.
No período de deslocamento e contato com os suecos que encontrava pelo
208
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 19.
209
Op. Cit., JANSSON, Erik, p. 43; Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 63; Op. Cit., FLODELL,
Sven Arne, pp. 91-101.
210
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 19.
211
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 93.
caminho, o missionário Jansson adquiria experiência, até chegar a Vila Guarany no
dia 12 de setembro de 1912. De acordo com Ekström, três dias depois o missionário
inicia suas atividades, realizando o primeiro culto na casa da família Andersson.
Aproximadamente dois anos mais tarde, no dia 7 de janeiro de 1914
212
,
acontece o primeiro batismo na Vila Guarany e, no dia 6 de setembro desse ano, é
estabelecido o marco inicial dos Batistas Independentes no Brasil. De acordo com
Persson, as pessoas batizadas eram suecas e membros de uma família luterana que
recebera a visita do missionário
213
; logo após o batismo, foi fundada a primeira
Igreja Batista Sueca no Brasil.
214
Sobre este evento, o missionário Jansson declara:
Do ponto de vista humano não foi grande coisa, mas espiritualmente foi
algo magno. Além do mais, Gustav Andersson tinha certificado de
batismo da igreja de Estocolmo. Em uma reunião posterior demos a ele as
boas vindas a congregação. Desta maneira foi organizada a primeira
congregação no Brasil.
215
O missionário também lembra que, na Vila Ijuhy, há receptividade em relação
à mensagem do evangelho e, por esta razão, solicita outro missionário para aquela
localidade, afirmando que
Os suecos de Ijuí se mostram muito contentes com nossa visita. Eles
recebem bem o missionário Carl Svensson com alegria. Sempre me
disseram que se algum irmão viesse, por favor, que o enviassem a sua
colônia. Que nos esqueçamos deles. Em Ijuí gozamos de um tempo de
colheita espiritual.
216
No dia 8 de junho de 1914, o missionário Jansson vai à cidade de Buenos
Aires, na Argentina, para encontrar os missionários que vêm reforçar o trabalho da
212
JONSSON, Lars-Erik. O trabalho em Guarany. In: História dos Batistas Independentes
apostilado. Seminário Teológico Batista Independente: Campinas, 2003, p. 8.
213
PERSSON, Alfredo M. Papai me disse que naquele tempo era assim. Luz nas Trevas. Santa Maria,
Ano XXXV, n. 12, dezembro de 1961. Edição Comemorativa, p. 4.
214
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 19; Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 94.
215
Ibidem.
216
Ibidem.
missão batista sueca no Brasil: sua noiva Anna Malm
217
e Carl Elof Svensson
218
,
que chegam para cooperar com a atividade missionária na Vila Guarany e Ijuhy.
Neste mesmo ano, é inaugurada a capela Batista da Vila Guarany, construída com a
colaboração dos batistas alemães e russos.
No ano seguinte, Svensson realiza o batismo de sete suecos. Nesta ocasião é
fundada a Igreja Batista Independente de Ijuí, em janeiro de 1915.
219
No ano
seguinte, chegam à região os missionários Carlos O. Welander e, logo após, os
irmãos Carlos e Estela Sundbeck e Ester Matensson.
220
O princípio das atividades da missão batista sueca no Brasil ocorreu
especificamente na Vila Guarany e Vila Ijuhy, estas localidades estão situadas na
região Noroeste do Rio Grande Sul.
Alfredo Persson faz um relato de como era a rotina do missionário Jansson
naqueles anos, a partir da experiência do seu pai que, por várias vezes, acompanhou
o missionário em viagens:
O sol desaparece atrás dos azulados montes de nossas serras. A noite vem
amena e fresca (...) o pastor contempla o firmamento, canta, ora, depois
dorme. Tendo por cama o pelego, o arreio por travesseiro, a capa por
cobertura e por teto o céu estrelado (...) Na solidão dos campos, há uma
choupana, coberta de palha de milho e paredes de pau a pique. Chega o
andante! É quase meia noite. Os cachorros o cercam, bate palmas e dá o:
“ôde casa!”; pede pousada. Entrega o pingo; o patrão e o hospede tomam
217
Nascida na Suécia no dia 28 de maio de 1886, converteu-se em 1903. Estudou na Escola
Missionária de Örebro/Suécia, vindo para o Brasil em 1914, casou-se com Erik Jansson no dia 26
de junho do mesmo ano, com quem atuou ministerialmente. cf. SOCIEDADE MISSIONÁRIA
BATISTA INDEPENDENTE. Biografias dos Missionários e Pastores, p. 1.
218
Nascido na Suécia no dia 1 de setembro de 1884, converteu-se em 1903 e foi batizado em 13 de
maio deste ano. Estudou por dois anos na Escola Missionária de Örebro, Suécia, vindo para o
Brasil em 1914, atuou principalmente na cidade de Ijuí até o ano de 1921. Svensson tem algumas
dificuldades com a Missão Batista Sueca ou Jansson e, acaba se desligando do trabalho sueco para
atuar na CBB no estado do Espírito Santo, onde ele foi o pioneiro deste trabalho. Ele faleceu no dia
7 de setembro de 1952. cf. SOCIEDADE MISSIONÁRIA BATISTA INDEPENDENTE.
Biografias dos Missionários e Pastores, p. 2.
219
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 95.
220
Op. Cit.; E Deus fez crescer, p. 20.
chimarrão; a dona da casa depena a galinha e soca arroz no pilão.
221
Esta descrição é muito peculiar no interior do Brasil, em especial, no Rio
Grande do Sul, e a hospitalidade do gaúcho é conhecida por todos, sendo um dos
seus traços fundamentais. Representado aqui, no ritual salutar de beber o chimarrão,
bebida quente à base de erva mate (ilex paraguarienses), e compartilhado com o
visitante na mesma cuia recipiente feito à base de porungo ou cabaça
simbolizando a integração do homem simples da terra com o viajante que cavalga
sobre o pampa gaúcho.
Esta prática gaúcha é descrita na música, nos costumes e na cultura como um
traço fundamental da própria essência do gaúcho, retratado na letra da música
regional dos irmãos Ramil: “ (...) puxa um banco e senta que tá na hora do
chimarrão, é o sabor do pampa de boca em boca, de mão em mão... vem aquece a
güela que te lava a alma e o coração.
222
2.4. A IMPLANTAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO ESCOLAR SUECA E A IDENTIFICAÇÃO COM
AS QUESTÕES SOCIAIS
Um problema fundamental enfrentado pelos imigrantes europeus relacionava-
se com as propagandas do governo brasileiro, que prometiam infra-estruturas
inexistentes no interior do país, onde foram vendidas as terras e instaladas milhares
221
Op. Cit., PERSSON, Alfredo M., p. 4.
222
RAMIL, Kleiton, RAMIL, Kledir. “Roda de chimarrão”. Álbum Millennium. Polygram, 1998,
faixa n. 18.
de famílias de imigrantes.
Flodell lembra a situação dos imigrantes no final do século 19, na qual
(...) a pobreza e a desocupação haviam obrigado a buscarem outra terra. O
socialismo na Suécia havia transformado a sociedade lutando por justiça
social. Se manifestava contra a igreja e a monarquia e ainda o faz,
apesar de funcionarem mais ligadas do que nunca. A igreja pregava
contra o socialismo ateu. Mas algo havia ocorrido. Com o passar dos anos
aproximaram-se um do outro. E o povo mesmo tem influenciado o
desenvolvimento.
223
A influência da visão socialista na Igreja é um fenômeno que ocorrerá
posteriormente à imigração dos suecos para o Brasil. De qualquer forma, a promessa
de um novo mundo que possibilitaria a construção de uma sociedade livre, mais justa
e fraterna coisa que não havia sido possível na pátria que ficava para trás foi, sem
dúvida, um grande atrativo para milhares de famílias, jovens e idosos, trazidos pelos
navios até a América.
Porém, a realidade das Colônias Novas no Rio Grande do Sul, para onde se
dirigiram a maioria dos suecos, era muito diferente do que esperavam os imigrantes.
Por um lado, havia abundância de recursos naturais: “clima subtropical, regido por
massas de ar tropicais e polares”
224
, grandes matas nativas, riquezas hidrográficas e
solo fértil. De acordo com a narrativa do padre Cuber, “a terra, na sua maior parte, é
muito fértil e retribui generosamente toda a sorte de plantações; em lugar algum falta
água, porque são raros os lotes sem vertentes ou arroios”.
225
Por outro lado, a infra-
estrutura viária, o saneamento, a educação e o apoio do governo brasileiro na
província sul-rio-grandense e aos imigrantes era pouco consistente.
Combinado a estes fatores, acrescenta-se a baixa, e até nenhuma, escolaridade
223
Op. Cit. FLODELL, Sven Arne, p. 212.
224
Apud. STRATHLER, Arthur, pp. 35 e 38. In. LAZZAROTTO, Danilo. História de Ijuí. Ijuí: Ed.
Unijuí, 2002, p. 16.
225
Apud. CUBER, Pe Antoni. Nas margens do rio Uruguai. Ijuí: Museu Antropológico Diretor
Pestana, 1975. In: COLLING, A. M., RISTOW, B. A. O ensino em Ijuí: do barracão à cidade
universitária. Ijuí: Ed. Unijuí, p. 29.
dos imigrantes que chegaram ao Brasil que, com o passar do tempo e o nascimento
dos filhos, viram sua situação se tornar ainda mais precária. A insuficiência de
escolas para todos e as limitações em relação à língua portuguesa, reduziam muito as
chances de acesso à escola, para a formação adequada dos novos cidadãos
brasileiros.
Desde o Império, a educação no Brasil era obrigação do Estado. De acordo
com Colling e Ristow, “ (...) o que se discutia era se este deveria ser voltado para a
religião ou a para vida prática”.
226
Para as pesquisadoras, mesmo após a
proclamação da República, a educação pública ainda era uma questão preocupante.
Essas pesquisadoras lembram que uma das questões debatidas dizia respeito à
obrigatoriedade da freqüência escolar e a profissionalização dos professores que, a
partir da reforma do primário (equivalente ao ensino fundamental), amparada pelo
decreto de fevereiro de 1897, “ (...) guiou-se pela garantia da estabilidade e aptidão
moral do professorado, pela fiscalização severa e permanente, pela laicidade,
liberdade e gratuidade no ensino, seguindo os moldes positivistas que orientavam a
ação do governo gaúcho”.
227
Apesar de estar assegurada por lei, a educação pública ainda teria longo
caminho a percorrer. Como em qualquer regime político, a manutenção do poder é
sempre tema de extrema importância e relevância para quem o detém. E foi com esta
preocupação a manutenção do poder que o governo sul-rio-grandense buscou
formar as elites do Estado criando a Escola de Engenharia em 1896.
Por outro lado, para que se alcançasse o progresso esperado, havia a
necessidade de instituições destinadas à formação profissionalizante e técnica, que
226
Op. Cit., COLLING, A. M., RISTOW, B. A., p. 17.
227
Ibidem.
“(...) habilitava ao trabalho organizado e de bom nível, as classes subalternas”.
228
Neste sentido, é criada a Faculdade de Farmácia (1895), a Escola de Partos (1895) e
a Faculdade Livre de Medicina e Farmácia (1898), por influência da visão positivista
do governo do Estado.
229
Ainda em relação à manutenção do poder por intermédio da educação,
Bourdieu nos lembra que
Segue-se que a construção do Estado está em pé de igualdade com a
construção do campo do poder, entendido como espaço de jogo no
interior do qual os detentores de capital (de diferentes tipos) lutam
particularmente pelo poder sobre o Estado, isto é, sobre o capital estatal
que assegura o poder sobre os diferentes tipos de capital e sobre sua
reprodução (notadamente por meio da instituição escolas).
230
Essa construção do campo de poder representa o embate das forças no campo social
e político, na esfera pública pelo domínio do Estado e do capital educacional e social.
A construção de uma sociedade dá-se no espaço público. Para Bourdieu, este
espaço é o campo de forças e campo de lutas, no qual seus “agentes se enfrentam,
com meios e fins diferenciados conforme sua posição na estrutura do campo de
forças, contribuindo assim para a conservação ou a transformação de sua
estrutura.
231
Bourdieu compreende que estes campos são exatamente “o motor da
mudança (...) essas lutas que visam a conservar ou a transformar a relação de forças
instituída no campo de produção têm, evidentemente, o efeito de conservar, ou de
transformar, a estrutura do campo das forças que são instrumentos e alvos nessas
lutas.
232
228
Ibid., p. 19.
229
A ideologia republicana e positivista permanece gravada na bandeira do Brasil sob a insígnia de
“Ordem e Progresso”.
230
BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996, pp. 99-
100.
231
Op. Cit., BOURDIEU, Pierre, p. 50.
232
Ibid., p. 63.
Logo após atenderem as necessidades básicas de moradia e alimentação, de
acordo com Colling e Ristow, os imigrantes buscaram estabelecer em sua nova
comunidade o espaço destinado à vida espiritual e educacional: a Igreja. Esta é um
dos núcleos centrais, e de fundamental importância que, conjugado às condições
materiais, acompanhará todo o desenvolvimento e organização social das Colônias
Novas. A este respeito, Colling e Ristow concluem que
No Rio Grande do Sul havia uma característica marcante na formação das
comunidades coloniais do interior. Suas bases culturais e sociais
fundamentavam-se em torno da igreja e da escola. Quase todos os grupos
étnicos tinham essa prática (...) A organização religiosa de uma
comunidade, sempre vinha acompanhada da implantação da instrução
escolar.
233
A solução para a questão educacional na região Noroeste do Rio Grande do
Sul, começa a partir do ano de 1893, com a chegada do professor Roberto Roeber
vindo da Alemanha, que inicia suas atividades na primeira escola particular.
Posteriormente, ele se torna “ (...) professor da primeira escola pública (1896), que
mais tarde tornou-se o Colégio Elementar e, hoje, Escola Estadual de 1° Grau Rui
Barbosa (...)”.
234
Este é o primeiro registro de um empreendimento educacional na
região da Vila Ijuhy.
Outra iniciativa educacional ocorre no dia 1 de fevereiro de 1899, em uma
localidade denominada Linha 10 Leste, um distrito da Vila Ijuhy, que fora idealizada
em uma parceria do professor André Gailis com o pastor Jahmis Inkis, da Igreja
Batista Leta, que por sua vez, cedeu as dependências da Igreja para abrigar as
atividades da “Aula Letta”
235
, como era conhecida.
Esta foi a primeira escola leta do Rio Grande do Sul, dirigida por professores
233
Op. Cit., COLLING, A. M., RISTOW, B. A., p. 41.
234
Op. Cit., LAZZAROTTO, Danilo, p. 59.
235
Atualmente é denominada Escola Municipal André Gailis, homenagem ao imigrante leto que foi
seu primeiro professor. Op. Cit., COLLING, A. M., RISTOW, B. A., p. 49.
letos durante o período de 40 anos. Foi pioneira ao introduzir no currículo, desde o
primeiro ano, o ensino em língua portuguesa, além da língua leta e alemã. Sua
história revela uma íntima ligação “ (...) à Igreja, comprovando a proximidade da
educação, religião e cultura nas comunidades do interior”.
236
Também no ano de 1899, a Comunidade Evangélica de Confissão Luterana
funda a sua escola paroquial, dirigida pelo professor Max Trauning. De acordo com
Lazzaroto, a escola teve continuidade “ (...) pelo primeiro pároco da comunidade,
pastor Hermann Rosenfeldt, seguido (1908) com o professor Henrique Siedeberg. A
escola é o atual Colégio Evangélico Augusto Pestana (CEAP)”.
237
Em viagem ao Brasil no ano de 1907, para sondar novos campos para a
atuação missionária na América do Sul, o pastor Fredrik Fransson, ligado à Igreja da
Aliança Sueca, visita as colônias suecas em Barão do Triunfo, Vila Ijuhy e Vila
Guarany. De acordo com Ekström, após ter contato com a realidade dos colonos
suecos, o pastor batista faz o primeiro relato conhecido sobre a situação dos
imigrantes suecos no Brasil.
Fransson relata que, durante o período em que esteve ocupado entre
brasileiros e alemães, fora surpreendido com a existência de colônias suecas no
Brasil. Nas palavras dele, “ (...) as informações que me foram dadas diziam que eram
todos socialistas e ateus; que tinham deixado a Suécia para se verem livres do Estado
e da Igreja”.
238
Nestas visitas, ele constata que, de fato, alguns destes eram realmente ateus,
mas a maioria havia recebido formação cristã na Igreja evangélica na Suécia e, há
236
Ibid., p. 50.
237
Op. Cit., LAZZAROTTO, Danilo, p. 60.
238
Apud, FRANSSON, Frederik, Carta à direção da Igreja da Aliança Sueca, em 14 de dezembro de
1907, Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 60.
muito tempo estavam sem receber nenhum cuidado pastoral. Fransson observa que
os imigrantes suecos
estavam há 17 anos sem a pregação da Palavra e agora estavam
espiritualmente fracos, (...) fiquei profundamente comovido de ver filhos
de suecos e jovens de 15-20 anos, que nem sequer sabem ler e escrever,
não tiveram nenhuma catequese, quase nunca viram uma Bíblia e não têm
nenhum conhecimento sobre o seu conteúdo.
239
Durante estas visitas às colônias suecas, o pastor propõe o envio de uma
professora da Suécia, com o objetivo de implantar escolas para os filhos dos
imigrantes, para ensinar a cultura e o idioma sueco. Esta proposta é amplamente
aceita pelos colonos
240
, porém, apesar da mútua motivação, o Brasil continuaria sem
a presença missionária batista sueca e sem a escola sueca. Em agosto de 1908, falece
nos Estados Unidos o pastor Fransson e, para Ekström, “ (...) morreu também,
aparentemente, a preocupação com os colonos suecos”
241
no Brasil.
Por outro lado, Flodell apresenta um relato das memórias do imigrante sueco
Evald Olsson (1916-2000), Suecos en la selva, onde ele afirma que “ (...) os suecos
de Porto Lucena estavam muito preocupados com o ensino de seus filhos”
242
e,
ainda, apresenta um boletim escolar de 25 de abril de 1898, assinado pelo professor
Henrik Olsson.
243
De acordo com as memórias de Evald, foi o professor que se
ofereceu para ensinar as disciplinas de leitura, escrita e matemática.
Considerando que a chegada de Henrik Olsson ao Brasil se dá no ano de
1891, período que remonta a segunda fase da imigração sueca (1866-1891), e o fato
de constar no registro escolar a localidade da Vila Guarany, pode-se afirmar, com
bastante segurança, que Olsson foi o primeiro professor sueco a ensinar na Vila
239
Ibidem.
240
Ibid., p. 61.
241
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 61.
242
Op.cit., FLODELL, Sven Arne, p. 78.
243
ANEXO C Registro Escolar de John Albin Olsson.
Guarany. A primeira aula ministrada pelo missionário sueco Erik Jansson acontece
provavelmente entre dias 26 de fevereiro e 26 de maio de 1913, período em que ele
relata o início das atividades da Escola Sueca em sua primeira fase.
244
Com a chegada do missionário Erik Jansson na Vila Guarany, em 12 de
setembro de 1912, ocorre uma intensa atividade missionária. Já com alguma
experiência acumulada por meio de contato com outras comunidades suecas no
Brasil, o missionário vai de encontro ao anseio da comunidade e prioriza a educação
das crianças e jovens, na tentativa de superar as dificuldades impostas pela realidade
social da Vila Guarany.
No ano seguinte, o missionário toma a decisão de iniciar uma escola para
suecos, buscando atender a demanda local que, no início, de acordo com Ekström,
“(...) as aulas eram ministradas no quarto que Jansson alugava na casa dos
Andersson”.
245
Por outro lado, esta escola acabou atraindo a atenção de outras etnias
da região e “ (...) no primeiro semestre letivo eram 27 alunos matriculados. Para o
segundo semestre: 34. Jansson teve que alugar uma sala maior para abrigar os alunos.
No ano seguinte já eram 40”
246
alunos ao todo.
Diante da falta de recursos financeiros para custear o empreendimento
educacional, e sem subsídio do Estado, “os pais formaram uma comissão para
custear os materiais escolares”.
247
Assim, no dia primeiro de abril de 1918, surge a
Svenska Skolföreningen (Associação Escolar Sueca); no mesmo ano, a escola é
244
De acordo com estas cartas enviadas para John Ongman, Örebro, Suécia, no mês de fevereiro
Jansson faz o pedido de materiais didáticos da Suécia para iniciar as atividades educacionais e na
carta seguinte, comunica o início das atividades com um número de 27 alunos.
245
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 72.
246
Ibid., pp. 72-73.
247
De acordo com Flodell, também na região do Alto Uruguai por influência de Jansson, foi fundada
em Porto Lucena uma associação de ensino em 1920. Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 95.
reconhecida pelo estado do Rio Grande do Sul, passando a receber subsídio mensal e,
no ano de “ (...) 1922 o Conselho Nacional Sueco no Exterior o enviaria uma
pequena ajuda”.
248
Os estatutos da nova organização se resumiam em:
1º Reunir todos os suecos residentes no local para um trabalho em prol da
Escola Sueca.
2° Apoiar economicamente a Escola no que se refere ao ensino, à
ginástica e aos trabalhos manuais, etc.
3° Agir em prol da formação geral através de palestras, cânticos e cursos
escolares.
4° Fazer com que, ao lado do idioma português, o sueco seja língua
obrigatória no ensino da Escola.
5° Criar uma biblioteca.
249
Ekström comenta que elevar o nível intelectual dos colonos; quebrar o
isolamento em que viviam longe da Suécia, da cultura sueca -; e combater o
alcoolismo cada vez mais freqüente entre os colonos”
250
, eram os principais
objetivos da Associação Sueca da Vila Guarany.
Logo após a fundação da primeira Igreja Batista Sueca no Brasil, em 6 de
setembro de 1914, e o início das atividades da Escola Sueca, Flodell lembra que
havia sido fundada uma outra associação de suecos na Vila Guarany, que
fundaram um Clube Sueco, quando Erik Jansson já havia fundado sua
escola e sua congregação batista. Aos domingos enviavam seus filhos a
escola dominical e tanto ali como na escola utilizavam três idiomas:
sueco, alemão e português. Como temos visto, somente um punhado de
pessoas se tornou membro da Igreja Batista; mas tampouco havia naquele
momento uma igreja luterana. Um descendente de Olof Nilsson diria no
seu relato familiar: “Eu não mudei de religião por ter medo de me afogar
no batismo, que era feito no rio Comandari, no lugar mais fundo”.
251
De acordo com Flodell, a maioria das famílias suecas pertencia à Igreja
Evangélica de Confissão Luterana, e isto poderia ser um indício da baixa adesão à
Igreja Batista Sueca nesta comunidade.
248
Ibid., p. 95.
249
Ata de Fundação da Associação “Svenska Skolföreningen”, 1918, p. 3; Op. Cit., EKSTRÖM, Leif
Arthur, pp. 73-74.
250
Ibidem.
251
Op. Cit., FLODELL, Sven Arne, p. 99.
Outra questão que trazia muita preocupação para a população da Vila
Guarany, era a saúde pública. Até o ano de 1920, segundo Ekström, “ (...) não havia
nenhum médico... Curandeiros, benzedeiras e charlatões eram comuns e muitos os
consultavam quando necessário.
252
Jansson orientava a população para procurar ajuda na Vila Ijuhy, que possuía
melhor infra-estrutura, porém, como as dificuldades de locomoção eram grandes, a
distância de dois dias de viagem acabava favorecendo o curandeirismo. Ao registrar
suas memórias, Jansson lembra que chegou a fazer pequenas cirurgias, sem entrar em
detalhes, afirmando que não possuía nenhuma formação médica e que (...) os
pacientes têm um pouco de medo da minha faca, mas para a necessidade não existe
lei”.
253
Somente com a chegada de Ana Malm, em 1914, os habitantes da Vila
Guarany puderam receber um atendimento de saúde básico. Além da sua formação
teológica, Ana tinha formação de enfermagem e era parteira. Ekström cita um relato
de Edy Muxfeldt, que comprova a atividade da missionária sueca na área da saúde,
afirmando “ (...) que os três irmãos mais velhos nasceram sob os cuidados de Ana em
Guarani”.
254
Uma última questão diz respeito a uma das mazelas sociais que até os dias de
hoje representa um grande desafio para a sociedade: o alcoolismo. Este é um grande
inimigo que atacava de forma generalizada os imigrantes no Brasil. Por várias
razões, estes se entregavam as bebidas fortes, mais especificamente por questões
relacionadas à imigração, a distância da pátria-mãe, os amigos e parentes e as
252
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 75.
253
JANSSON, Erik. Under Söders Kors. Vol. 1. Ed. Örebro Missionförenings Förlag: Motala, 1941,
p. 28.
254
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 76.
dificuldades enfrentadas para a adaptação nas colônias.
Na tentativa de reverter este quadro, que gerava uma série de problemas
sociais, o missionário “Jansson decide fundar uma organização de combate ao álcool.
Na constituição, no dia 22 de junho de 1914, havia 19 membros. No final do mesmo
ano já eram 40”
255
. Esta organização foi de pouca duração, porém, mesmo não
conseguindo eliminar totalmente o problema do alcoolismo do seio da comunidade
sueca, segundo Ekström ela “ (...) contribuiu para que os colonos, agora sóbrios,
aprendessem a organizar melhor a cultura e o cuidado das fazendas”.
256
O problema dos vícios, de forma geral, é combatido sistematicamente pelos
Batistas Independentes por muitos anos. Prova disto são as várias publicações no
Jornal Luz nas Trevas, o periódico mensal e órgão oficial da denominação desde
1927, e outras publicações que combatem o consumo de álcool. Só para citar um
exemplo, Santos, em um artigo da revista acadêmica, publicado em 1933, trata das
doutrinas da Igreja Batista Independente, afirma que a Igreja
estimula os homens à prática da abstenção das bebidas alcoólicas, do
fumo e dos narcóticos; combate o jogo e os vícios condenando os filmes
de baixo padrão de moral e de decência, como estimuladores da
depravação e da corrupção de costumes.
257
Já na década de 30
258
, são ampliadas as atividades sociais da Missão Batista
Sueca no Brasil, com a criação de um orfanato feminino e um asilo. A Igreja
Evangélica Betel de Porto Alegre, funda, no dia 13 de maio de 1930, o Orfanato
255
Ibid., pp. 76-77.
256
Ibidem.
257
SANTOS, Alcides. Síntese histórica das Igrejas Evangélicas de Santa Maria. In: Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de Santa Maria, Ano II, n. 2, Santa Maria: 1963/64, p. 120, ver
também JANSSON, Erik. Os effeitos do uso de bebidas alcoolicas. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 66,
Ano VII, fevereiro de 1933, p. 211; em relação ao cinema ver M. P. S. Que ganhas no cinema? Luz
nas Trevas. Pelotas, n. 60, Ano VI, agosto de 1932, p. 122; jogos ver Não deve jogar. Luz nas
Trevas. Pelotas, n. 69, Ano VII, junho de 1933, p. 266.
258
De acordo com Jonsson, “Por causa do movimento comunista e a desconfiança para com
estrangeiros, os membros desta igreja foram para Argentina e a igreja foi dissolvida em 1930”. Op.
Cit., JONSSON, Lars-Erik, p. 9.
Feminino Evangélico Betel, uma “ (...) instituição de caráter filantrópico e
assistencial [para abrigar] indistinta e gratuitamente meninas desamparadas,
especialmente órfãs”.
259
A Igreja Batista Betel da cidade de Esteio, fica diante de uma situação de
extrema carência da irmã Antonia da Silva, que está desamparada. Por esta razão, a
Igreja a acolhe em suas dependências, e nesta ocasião surge a idéia de criar o Asilo
Betel. No ano de 1949, iniciam-se as atividades do Asilo Betel, com o objetivo de
amparar os idosos e (...) proporcionar aos velhinhos internados, o máximo de
conforto e carinho cristão”.
260
Considerando tudo que foi dito até aqui, constata-se que desde o princípio das
atividades da Missão Batista Sueca no contexto brasileiro, há uma forte identificação
com as questões sociais, em especial pela educação e saúde. Esta identificação se
reflete na organização das instituições que pudessem suprir, de alguma forma, estas
demandas sociais da época. O desenvolvimento e o detalhamento das práticas sociais
realizadas por missionários e pastores locais serão apresentados,
pormenorizadamente, no terceiro capítulo desta pesquisa.
259
SPOHRE, Lisen Helena. Orfanato feminino. Luz nas Trevas. Santa Maria, dezembro de 1961.
Edição Comemorativa, p. 22.
260
Um lar para velhice. Luz nas Trevas. Santa Maria, dezembro de 1961. Edição Comemorativa, p.
22.
2.5. A ORGANIZAÇÃO E EXPANSÃO DA IGREJA BATISTA INDEPENDENTE NO BRASIL
Apesar das atividades missionárias da Missão Batista Sueca no Brasil terem
começado na Vila Guarany, é na Vila Ijuhy onde há maior aceitação e adesão de
novos fiéis. Esta colônia fora fundada no dia 19 de outubro de 1890 “ (...) sob a
orientação da Comissão de Terras”
261
e, no ano de 1912, é emancipada, sendo o seu
dirigente o engenheiro Augusto Pestana.
O missionário Carl Elof Svensson foi enviado para lá em junho de 1914, a
pedido de Jansson, para desenvolver suas atividades de missionário. No dia 3 de
janeiro de 1915, Svensson e mais sete suecos fundaram a Igreja Batista Independente
na Vila Ijuhy. Cinco anos mais tarde, haviam se filiado à Igreja, através do batismo,
53 pessoas que, de acordo com Ekström, eram na maioria imigrantes suecos, alguns
poloneses, alemães e também brasileiros.
A história do atual município de Ijuí e a atividade missionária sueca no Brasil
possuem uma íntima relação. Além de abrigar um grupo considerável de famílias
suecas, Ijuí também é o local onde se amplia com rapidez a atividade missionária
Batista Sueca no Brasil.
No ano de 1919, é fundada a Convenção Evangélica Batista Sul-Rio-
Grandense, que tem como meta
promover em harmonia com a Sociedade Missionária de Örebro, Suécia,
os interesses gerais do trabalho evangélico no Rio Grande do Sul, ligar as
igrejas Batistas a um trabalho ativo, estimular a prosperidade das igrejas
em particular, orientar quanto à fé e à doutrina Batista, dar
aconselhamento e orientar quanto à boa comunhão de uma igreja para
261
MARQUES, Mario Osório (Ed.), Etnias diferenciadas na formação de Ijuí. Ijuí: Ed. Unijuí, p. 15.
100
com a outra.
262
Esta Convenção não chega a ser uma instituição de caráter deliberativo, antes,
realizava assembléias anuais com objetivo educacional, com as Escolas Bíblicas, e de
edificação espiritual das igrejas participantes. Uma das razões que explicam esta
perspectiva das assembléias é a predominância do poder nas mãos dos missionários
suecos, justamente porque estes “ (...) consideravam que a realização de Escolas
Bíblicas para os obreiros nacionais era um fator significativo à consolidação do
trabalho das igrejas surgidas na fase pioneira”.
263
As atividades missionárias da Missão Batista Sueca já contava com a
cooperação de obreiros nacionais e estava se desenvolvendo bem. Por outro lado, sua
atuação estava restrita ao Estado do Rio Grande do Sul, contando com cerca de 20
igrejas e algumas congregações.
No ano de 1938, ao aproximar-se do encontro anual, “ (...) os missionários
sentem haver chegado o momento de confiar maiores atribuições aos obreiros
nacionais”.
264
A justificativa se deu em razão da ampliação da atividade missionária
e, mais ainda, da inquietação dos obreiros nacionais, que entendiam que havia
necessidade de mais autonomia, considerando que os recursos financeiros e
deliberativos estavam centralizados nas mãos dos missionários suecos.
265
Astrogildo Marques Pacheco e Francisco da Silva são eleitos,
respectivamente, presidente e secretário da Convenção Evangélica Batista Sul-Rio-
262
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 21.
263
Ibidem.
264
Ibid., p. 22.
265
No Concílio Missionário realizado em 24 de abril de 1940, é aprovada a fundação da Sociedade
Missionária Sul-Rio-Grandense, que nasce com a missão de concentrar esforços e recursos para a
evangelização no estado, cuja finalidade era “ (...) a difusão da Palavra de Deus, cuidar da obra
assistencial e educacional e congregar todos os missionários batistas independentes com residência
no Brasil”. Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 20.
101
Grandense. Durante a gestão dos líderes brasileiros, buscou-se implementar uma
ampliação da organização jurídica e reestruturar suas atividades com o objetivo de
obter mais resultados e cooperação no trabalho missionário. No entanto, esses planos
não se concretizam, e, já no ano seguinte, o controle da direção da Convenção volta
para os missionários suecos.
Somente a partir do ano de 1951 é que se instaura um processo de mudanças
para a Convenção Evangélica Batista Sul-Rio-Grandense. As Igrejas e obreiros
nacionais são estimulados, por correspondências dos obreiros nacionais Pedro
Falcão, Noé Valêncio da Silva e Astrogildo Marques Pacheco, e afirmam a
necessidade de se consolidar uma Convenção de fato e de direito.
Este movimento se dá basicamente por dois fatores fundamentais,
relacionados com a própria sobrevivência das Igrejas Batistas Independentes. O
primeiro fator estava relacionado à perspectiva expansionista da própria Missão
Batista Sueca que lançou o fundamento destas Igrejas. Assim como outras Igrejas
protestantes de missão, as Igrejas Batistas Independentes brasileiras também
possuíam essa característica fundamental.
Neste sentido, todas as ações relacionadas à atividade missionária, dependiam
do aval e do apoio dos missionários suecos, aí então surge o segundo fator, que diz
respeito ao financiamento das atividades missionárias e da sustentabilidade das
próprias Igrejas, que eram mantidas até aquele momento com recursos financeiros da
Sociedade Missionária de Örebro, Suécia.
266
Após 40 anos de atividade missionária dos Batistas Suecos no Brasil, é
realizada, nos dias 21 a 24 de fevereiro na cidade de Ijuí, no Rio Grande do Sul, o
266
Ibid., pp. 22-23.
102
encontro anual das Igrejas Batistas Independentes. Na sessão preliminar da
Assembléia Anual, presidida pelo pastor Pedro Falcão, “ (...) iniciou-se os debates
sobre a necessidade de organizar a Convenção numa ação de maior amplitude e unir
as igrejas num órgão para um trabalho mais eficiente para a evangelização”.
267
Este
era, com certeza, o grande tema desta Assembléia. O debate se delongou, ficando a
resolução adiada para a próxima sessão.
No dia seguinte, após alguns debates e esclarecimentos, o plenário decidiu
que a votação deveria ser aberta, sendo votado o tema para a criação de uma
Convenção, que foi aprovado pela maioria. Estava fundada a Convenção das Igrejas
Evangélicas Batistas Independentes do Brasil (CIEBIB).
268
No entanto, “ (...) os
missionários suecos se abstiveram de votar, com exceção do missionário Arne
Johnsson que votou a favor.
269
De acordo com o relato do obreiro nacional e presidente eleito nesta ocasião,
o pastor Pedro Falcão, no dia 22 de fevereiro foram discutidos
(...) os assuntos num verdadeiro espírito de democracia. Foi num
ambiente assim que, por proposta final do irmão Alcides G. dos Santos e
por grande maioria de votos foi criada a Convenção das Igrejas
Evangélicas Batistas Independentes do Brasil. Nesta mesma tarde tratou-
se da abertura imediata de um trabalho, em Santa Rosa, primeiro campo
de atividades da Convenção. Resolveu-se ainda sobre a reabertura do
trabalho em Jaguarão. E como uma das grandes resoluções dessa magna
assembléia foi votada a criação do Instituto Bíblico para o preparo de
futuros obreiros, sendo escolhido como reitor o missionário Nils M.
Angelin, o qual com grande eficiência vem dirigindo a nossa “escola de
profetas”.
270
Este foi, com certeza, um grande marco para o início da nacionalização das
267
Ibid., p. 1.
268
FALCÃO, Pedro. Como foi a primeira Assembléia Geral da CIEBIB. Luz nas Trevas. Santa Maria,
n. 12, Ano XXXV, dezembro de 1961. Edição Comemorativa, p. 7.
269
Ibid., p. 1.
270
Ibid., p. 7.
103
atividades missionárias e de uma grande parceria entre a CIEBIB
271
e a Sociedade
Missionária de Örebro. Essas decisões tiveram um papel importante no
fortalecimento e coesão das Igrejas Batistas Independentes estabelecidas no Brasil.
Nessa ocasião, faziam parte desta irmandade de Igrejas Batistas
Independentes 22 igrejas no Estado do Rio Grande do Sul, 2 igrejas no Estado de
Santa Catarina e 4 igrejas no Estado de São Paulo. As Igrejas estavam assim
distribuídas, no Estado de São Paulo: Campinas, Jundiaí, São Paulo, Santos e
Sorocaba; no Estado do Paraná: Curitiba, Harmonia (Monte Alegre), Ponta Grossa,
Nova Santa Rosa, Nova Sarandi e Rolândia; no Estado de Santa Catarina: Criciúma e
Joaçaba e, por fim, no Estado do Rio Grande do Sul: Bajé, Cangussu, Carazinho,
Cruz Alta, Esteio, Ijuí, Jaguarão, Novo Hamburgo, Pedro Osório, Passo Fundo,
Pelotas, Porto Alegre, Rio Grande, São Leopoldo, Santa Rosa, São Gabriel, Santa
Maria, Santa Cruz do Sul e Tucunduva.
272
Nesta ocasião, já estavam organizados o Instituto Bíblico de Ijuí, no Rio
Grande do Sul, e o Jornal Luz nas Trevas, de 1927. No total de 37 obreiros
envolvidos com as atividades missionária no Brasil, 29 atuavam no Rio Grande do
Sul, 2 em Santa Catarina e 7 no Estado de São Paulo.
273
O município de Ijuí comemorava 40 anos de emancipação no ano de 1952, e
possuía uma população aproximada de 52.160 habitantes, com apenas 10.060
271
No ano de 1966, na cidade de Ijuí por resolução plenária, a organização que congrega as Igrejas
passa a denominada Convenção das Igrejas Batistas Independentes CIBI. Op. Cit., E Deus fez
crescer, pp. 23-24.
272
Cinqüenta anos de Missão no Brasil (...) e dez anos de Evangelização Pátria (...). Luz nas Trevas.
Santa Maria, dezembro de 1961. Edição Comemorativa, p. 22.
273
Cf. informações do Boletim n. 1 da Convenção das Igrejas Evangélicas Batistas Independentes do
Brasil, 1954, pp. 5-7.
104
habitantes residentes na cidade.
274
Percebe-se neste período como era comum, em
todo o território nacional, a maioria da população concentrar-se na área rural e a
economia estar pautada na pecuária e na agricultura.
No ano de 1962, ao comemorar cinqüenta anos da presença missionária dos
Batistas Suecos no Brasil, e dez anos da organização da CIEBIB, de acordo com o
pastor Martinho Mendes, havia
(...) 39 igrejas com mais de cinco mil membros comungantes, mais de 60
pastores e missionários, um dos melhores jornais evangélicos do Brasil,
revistas para Escola Dominical, uma Casa Editora, instituições de
assistência social, educacionais, constituem as colunas fortes na estrutura
da universal Igreja de Deus, zelando sem reservas pelas doutrinas
bíblicas, pela pureza moral e elevação de espiritualidade cristã.
275
Atualmente, o empreendimento missionário Batista Sueco no Brasil já não é
mais de predominância dos suecos, mas congrega a matiz do povo brasileiro em
todos os Estados da Federação. A Convenção das Igrejas Batistas Independentes, de
acordo com o último senso denominacional, é representada por “ (...) 450 igrejas e
aproximadamente 65 mil membros e está presente em todo território nacional”
276
.
2.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO
Ao iniciar sua atividade missionária no Brasil, a Missão Batista Sueca se
depara com uma série de problemas sociais, que vão muito além das questões ligadas
274
Cf. Ata das Sessões da Convenção das Igrejas Evangélicas Batistas Independentes do Brasil,
realizada na cidade de Ijuí, dias 22 a 24 de fevereiro de 1954, p. 1.
275
Op. Cit., MENDES, Martinho, p. 11.
276
Op. Cit., EKSTRÖM, Leif Arthur, p. 19.
105
à implantação de Igrejas no território brasileiro. Sem dúvida, estas questões
permearam a estratégia de implantação da missão e da sua inserção pública no
referido contexto social entre os brasileiros mas, principalmente, entre os imigrantes
europeus que constituíram as Colônias Novas no Estado do Rio Grande do Sul.
Este dado caracteriza um protestantismo de missão, preocupado inicialmente
em atender os imigrantes suecos, os quais haviam solicitado ajuda para se manterem
próximos da sua fé e, ao mesmo tempo, manter seu vínculo com a terra natal, da qual
haviam saído dadas as difíceis condições de sobrevivência, e na esperança de
construir um mundo melhor no Brasil.
A identificação da Missão Batista Sueca com as questões sociais nasce no
país de origem, que negara melhores condições de vida para suas filhas e filhos, os
cidadãos suecos que emigraram para o continente americano. O movimento sindical,
com a mobilização operária e o desejo popular de construção de uma nação
socialista, alimentaram as esperanças dos imigrantes no Brasil. Este projeto não se
concretizou aqui. Antes, os imigrantes suecos, juntamente com as outras etnias,
precisaram aqui se organizar e lutar, para que pelo menos fosse possível gerar as
condições mínimas de sobrevivência para suas famílias.
O Brasil representava um sonho frustrado. A superação desse cenário
desesperançado se deu por meio de muito trabalho, sacrifício de vidas e esperança de
um futuro melhor e digno. Foi em torno da religião e, no caso dos suecos, do
protestantismo, que se organizaram, reconstruíram suas vidas e contribuíram de
forma significativa para a construção da sociedade brasileira, onde também
implantaram a Igreja Batista Independente.
Portanto, no próximo capítulo, tratar-se-á mais especificamente do fenômeno
das práticas sociais no interior dessa Igreja, realizando uma exposição analítica das
106
práticas sociais institucionalizadas, os períodos históricos em que se realizaram e a
sua estratégia de inserção na sociedade.
107
CAPÍTULO 3
ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DAS PRÁTICAS SOCIAIS
DA IGREJA BATISTA INDEPENDENTE NO CONTEXTO
BRASILEIRO
Trabalhada na prática, a fé é decisiva; “a doutrina” tem então
significado secundário. O que o homem considera como fé e como
religião tem que converter-se sempre em uma ação prática. É nesse
espírito que os homens podem encontrar paciência e amor.
Sven Arne Flodell
A implantação da Igreja Batista Independente a partir do Rio Grande do Sul,
descrita anteriormente, expandiu-se por todo o território nacional, inserindo-se nas
mais variadas comunidades e municípios brasileiros, em capitais e no interior. A
partir de agora, a tarefa passa a ser aprofundar a questão do desenvolvimento
específico das práticas sociais da Igreja, que serão analisadas a partir do marco
teórico da pesquisa descrito no capítulo primeiro apresentando os resultados
desta descrição analítica no final do capítulo.
Porém, é necessário situar as práticas sociais da Igreja no contexto social
contemporâneo, para que seja possível realizar uma abordagem crítica na descrição
108
da inserção pública da Igreja, tendo como ponto de partida as modificações do
associativismo popular das décadas de 70 e 80, para uma nova dinâmica de
articulação político-social, as Organizações Não-Governamentais.
3.1. O CONTEXTO DAS RELAÇÕES SOCIAIS NO MUNDO GLOBALIZADO
As sociedades contemporâneas em especial a sociedade brasileira estão
diante de questões sociais que encerram os problemas relacionados a participação
democrática, a organização da sociedade civil, o enfrentamento da fome, da violência
urbana, do desemprego, da exclusão social etc., que demandam o posicionamento
político do cidadão comum, como sujeito histórico de transformação social.
Nas décadas de 70 e 80, período pós-ditadura militar no Brasil
277
, os
movimentos sociais se apresentavam diante do Estado como organismos da
sociedade civil, capazes de mobilizar esforços em torno do processo de
democratização nacional, que resultou na elaboração da Constituição Federal de
1988.
278
Esses movimentos sociais, para Maria da Glória Gohn, constituíram-se como
277
De acordo com Gohn, foi decisiva a participação das ONGs para o fim da ditadura militar.
Segundo ela, “no Brasil, nos anos 70-80, as ONGs cidadãs estiveram por detrás da maioria dos
movimentos sociais populares urbanos que delinearam um cenário de participação na sociedade
civil, trazendo para a cena pública novos personagens, contribuindo decisivamente para a queda do
regime militar e para transição democrática do país.” GOHN, Maria da Glória. O novo
associativismo e o terceiro setor. In: Serviço social e sociedade, Ano XIX, n. 58, nov. 1998, p. 14.
278
Neste sentido, o “próprio poder público passou a estimular a participação popular em órgãos
colegiados, muitos deles criados a partir das exigências constitucionais; outros, ainda, decorrentes
da vontade política de governantes com propostas de governo democráticas, como os orçamentos
participativos utilizados como instrumento de gestão.” Op. Cit., GOHN, Maria da Glória, p. 10.
109
“elemento crucial não apenas para a consolidação do processo democrático das
estruturas locais, mas também para garantir a própria existência deste processo no
plano mais geral da nação.
279
No entanto, a autora lembra também que as “formas,
modos de manifestação e o modo de mobilização das pessoas se transformam”
280
, a
partir de novas configurações político-econômicas, sócio-culturais e religiosas.
Para Gohn, é a partir das transformações da década de 80 que a sociedade
civil se estruturou, com
ações a partir de redes sociais compostas por atores coletivos
remanescentes de alguns movimentos sociais dos anos 80, ONGs
(Organizações não-governamentais) de variados tipos, entidades de classe
que apóiam os setores populares, departamentos específicos das
universidades e de alguns órgãos públicos que desenvolvem trabalhos em
parceira com entidades populares, voltados para a população, pequenas
empresas organizadas sob a forma de cooperativas, etc.
281
Um novo modelo de associativismo surge, diferentemente da militância dos
movimentos populares das décadas de 70 e 80, mas ainda resistem as formas antigas
de “mobilização e protestos de massa ou, em tristes casos, como práticas clientelistas
e corporativas, estimuladas por grandes programas dos próprios órgãos públicos”.
282
As ONGs, como novas representações populares, contribuíram para a alteração das
relações de enfrentamento das questões sociais da sociedade civil frente ao Estado.
A contribuição das ONGs foi indispensável, possibilitando a reconstrução do
conceito e de um novo significado para a sociedade civil, mais para os direitos dos
279
Op. Cit., GOHN, Maria da Glória, p. 10.
280
Op. Cit., GOHN, Maria da Glória, p. 10.
281
O novo associativismo, a partir das ONGs e Terceiro Setor, contribuíram para criar “novos espaços
[que] assumiram outros sentidos, quer pela composição do grupo e da proposta política de alguns
setores que ascenderam ao poder pelo voto caso de algumas prefeituras e governos estaduais ,
quer pela conjuntura macro-econômica que desativou áreas de intervenção direta do Estado e
deslocou os incentivos para programas de parceria com entidades locais; quer para contra-restar
outras forças políticas aliadas às elites conservadoras, que tentam abocanhar verbas e posições de
comando nestes programas nacionais mais amplos, apresentados aos organismos financiadores
internacionais como ‘políticas sociais de combate ao desemprego’.” Op. Cit., GOHN, Maria da
Glória, pp. 10 e 12.
282
Ibidem.
110
grupos e coletivos do que propriamente para os direitos do indivíduo sentido
originário do liberalismo.
Gohn afirma que, atualmente, as ONGs adquiriram autonomia, e “constituem
um universo próprio no cenário organizativo, com inúmeras formas de expressão e
espectros ideológico-político”
283
, ampliando suas ações a partir dos conceitos de
gestão empresarial, e “autodenominam-se cidadãs, por se apresentarem como sendo
sem fins lucrativos, atuam em áreas de problemas sociais cruciais como meninos e
meninas em situação de risco, meio ambiente, alfabetização, direitos humanos etc.
284
Apesar das ONGs atuarem no espaço público, elas se caracterizam como
instituições privadas, porém, públicas
285
, caracterizando o seu financiamento e
interesse privado, em relação a sua atuação no oferecimento de serviços públicos à
sociedade civil carente. O investimento em programas de combate efetivo da miséria
e da exclusão social, de acordo com Rico,
“obriga” o Estado a estabelecer parcerias com a sociedade civil. A
escassez de recursos faz parte de um cenário que praticamente coloca a
responsabilidade civil do cidadão e do empresário como indispensáveis ao
enfrentamento da questão social.
286
Essa relação público/privado
287
das ONGs, para Ichope, se refere a ações
283
Ibid., p. 13.
284
Ibid., p. 14.
285
Sobre a compreensão do âmbito do financiamento das ONGs no chamado terceiro setor, ver
FERNANDES, Rubens Cesar. Privado porém público: Terceiro Setor na América Latina. Rio de
Janeiro: Relume Dumará, 1994; GIANNOTTI, José Arthur. “O público e o privado”. Folha de São
Paulo. São Paulo, 2 abr. 1995; LUNA, Elba (compiladora). Fondos privados, fines publicos el
empresario y la iniciativa social em America Latina. Buenos Aires: Espacio Editorial, 1995.
286
RICO, Elizabeth de Melo. O empresariado, a filantropia e a questão social. In: Serviço social e
sociedade, Ano XIX, n. 58, nov. 1998, p. 31.
287
O debate contemporâneo a respeito da relação entre o interesse público e privado, entre Estado e
mercado, sociedade civil e grupos corporativistas, tem se definido pela complexidade. Verifica-se a
abrangência dos interesses políticos, econômicos e sociais, onde a presença do Estado limita-se em
oferecer serviços mínimos a população, em razão da pressão do mercado e parte da sociedade civil
organizada, muitas vezes, a elite defendendo seus próprios interesses e, por outro lado, a
privatização de serviços que seriam públicos como educação, saúde, saneamento... passam por
licitações e privatizações, para que sejam administradas pela iniciativa privada e se realize a
manutenção dos postos de trabalho mantidos por estas empresas. Esta relação faz com que o Estado
111
realizadas sob o “ (...) ponto de vista do Segundo Setor, o mercado, designando o
conjunto de ações que acontece no interior do Terceiro Setor aquele que é público,
porém privado.
288
Desta forma, afirma Gohn, estas organizações
criam e desenvolvem frentes de trabalho em espaços públicos não-estatal,
algumas nasceram por iniciativas de empresários privados, e muitas delas
se apresentam juridicamente como Organizações Não-Governamentais de
Desenvolvimento Social (ONGDS) ou, mais genericamente, terceiro
setor.
289
A autora afirma que esse fato ampliou um novo espaço de participação em
nível do poder local, porém, este novo espaço é pouco ou nada politizado. Este é um
dos problemas fundamentais deste tipo de organização que atua no Terceiro Setor.
Em relação à inserção crítica do cidadão em ações do Terceiro Setor,
Montaño faz críticas severas a respeito em especial no que se refere à conceituação
do chamado Terceiro Setor e afirma que:
O ator do “terceiro setor”, voluntário ou não, tende a comportar-se desta
maneira, ocupando-se em atividades dentro de um sistema considerado
como já dado e imutável. Tende a preocupar-se e agir de forma imediata
sem crítica, sem visar a transformação, apenas algumas mudanças
imediatas, localizadas, que respondam às suas carências diretas.
290
O imediatismo das ações relacionadas ao enfrentamento das questões sociais
no Terceiro Setor, para Montaño, se constitui como função social:
agir de modo desarticulado, imediato, direto, nos ‘problemas’ singulares,
numa realidade destotalizada, deseconomizada, despolitizada, imutável,
sem história. Este agente deixa de ser sujeito, passa a se materializar num
sistema supra-histórico. Já não se faz a (nem se pensa na) história, mas
apenas em estórias, singulares e cotidianas.
291
Montaño lembra que o ano de 2001 foi dedicado internacionalmente como o
mantenha-se mínimo e, também, torna-se o provedor para a manutenção das empresas privadas.
Esta é apenas uma, das várias questões relevantes a respeito das relações entre público e privado.
Ver FERNANDES, Rubens Cesar. Privado porém público: Terceiro Setor na América Latina. Rio
de Janeiro: Relume Dumará, 1994.
288
ICHOPE, Evelyn. In: GIFE. Terceiro Setor desenvolvimento social sustentado. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1997, I e II.
289
Op. Cit., GOHN, Maria da Glória, p. 14.
290
MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e a questão social: crítica ao padrão emergente de
intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002, p. 243.
291
Ibidem.
112
ano do voluntariado, no qual foi “ (...) induzido a crer que sua atividade é criadora;
porém ele apenas manipula, ocupa-se, preocupa-se com o já existente [esse] mundo
objetivo e sensivelmente prático se dissolveu, se transformou em mundo dos
significados traçados pela subjetividade humana.
292
Nesse sentido, o voluntário do
Terceiro Setor possui uma prática reprodutora que não cria algo novo.
Esse tipo de engajamento do cidadão não contribui para a construção da nova
sociedade por compreender o mundo como algo dado e imutável mas apóia o
projeto político neoliberal, no qual as atividades desenvolvidas no Terceiro Setor se
tornam instrumentos para reprodução do capital.
293
Por meio deste tipo de inserção, em resposta às questões sociais geradas pelo
modelo excludente do mercado total, Montaño afirma que “na verdade, ele [cidadão]
é que é instrumentalizado, manipulado, refuncionalizado para a reprodução do
sistema que não conhece e considera como dado, estruturalmente inalterável”.
294
A descentralização administrativa, a privatização e a transferência das
respostas às seqüelas sociais para o Terceiro Setor é, para Montaño, a forma
declarada da instrumentalização do projeto neoliberal de desresponsabilização estatal
nas respostas às demandas sociais, para consolidar o Estado mínimo não
intervencionista. Para Rico, esse contexto neoliberal é explicado justamente por:
ressuscitar o liberalismo econômico, onde o Estado tem um papel
diminuto, enxuto, para enfrentar os dilemas das questões sociais postas e,
portanto, necessita das parcerias com o mercado e com a sociedade civil
para viabilizar programas de enfrentamento à exclusão social.
295
No entanto, é preciso lembrar que está intrínseco a este projeto neoliberal,
292
Ibid., p. 242.
293
De acordo com Rico, este modelo neoliberal só é possível “se houver ‘colaboração do Estado. O
capitalismo não se consolida sem a ajuda dos recursos públicos, seja mediante o ‘fundo público’ ou
a ‘fundo perdido’.” Op. Cit., RICO, Elizabeth de Melo, p. 30.
294
Op. Cit., MONTAÑO, Carlos, p. 243.
295
Op. Cit., RICO, Elizabeth de Melo, p. 30.
113
segundo a autora, “o desemprego, o sucateamento da mão-de-obra. Aí reside uma
grande contradição”
296
do próprio modelo, onde ele mesmo é o gerador dos
problemas sociais e, a mesmo tempo, se apresenta como solução para estes.
No processo de globalização, os recursos públicos gerados pela arrecadação
de impostos, são colocados à disposição e a serviço do “desenvolvimento econômico
como um todo; independentemente de favorecer esta ou aquela classe social.
297
Ou
seja, estes recursos públicos acabam sendo utilizados no financiamento das ONGs
em parceria com o Estado, para que cada instituição desenvolva as políticas públicas
a partir da sua própria ideologia.
Outro elemento importante relacionado às ONGs e ao Terceiro Setor, diz
respeito ao crescimento destes no cenário global. Para Gohn, este crescimento das
ONGs tem configuração estratégica para a economia. Como prova desse novo
mercado, a autora cita Drucker
298
, que denomina essa nova área de economia social
como o segmento econômico que mais cresceu nos últimos anos e, também,
mais movimentou recursos, gerou empregos, e foi o mais lucrativo na
economia norte-americana nos últimos vinte anos. Fundações e
associações são criadas para promover o desenvolvimento econômico
local, impedir a degradação ambiental, defender os direitos civis e agir em
áreas onde a atuação do Estado é incipiente, como em relação aos idosos,
problemática da mulher, dos índios, dos negros etc., ou é de triste
memória como a das crianças nas ruas em situação de risco, em países
como o Brasil.
299
Na análise da responsabilidade social empresarial
300
, Rico apresenta números
296
Ibidem.
297
Ibidem.
298
DRUCKER, Peter. Administração de organizações sem fins lucrativos. São Paulo: Pioneira/Fund.
Vanzolini, 1991.
299
Op. Cit., GOHN, Maria da Glória, p. 16.
300
A responsabilidade social tem sido compreendida de diversas formas no contexto empresarial e na
sociedade civil. Apesar disso, há um grande consenso que este conceito vai além das preocupações
de maximizar dos resultados financeiros aos acionistas das empresas, atentando também às
preocupações ligadas a uma conduta ético/legal, ecológica, filantrópica e sustentável, como uma
contribuição positiva da empresa para sociedade civil. Citamos aqui a definição do Instituto Ethos
114
representativos dos investimentos no Terceiro Setor no mundo, que comprovam a
tese de Drucker a respeito da chamada economia social. Ela demonstra que nos
Estados Unidos, no ano de 1996, os investimentos em instituições sem fins lucrativos
representaram 140 bilhões de dólares, além de empregar cerca de 9% da mão-de-obra
no país, representando um promissor mercado de trabalho. Também na Alemanha,
este investimento para a solução de problemas sociais, ONGs e Fundações
Empresariais, representam 5% do total de empregos no país, e na França
correspondem a 6% da mão-de-obra empregada. No Brasil foi investido, no
chamado Terceiro Setor, aproximadamente 10,9 bilhões de reais. De acordo com
Landin, no ano de 1995 estes investimentos chegaram à casa de 1,5% do PIB
brasileiro
301
, dos quais, 61% foram gerados pelas próprias instituições, 12%
correspondem aos recursos estatais e 26,1% se referem as doações de bens, moeda
corrente, doação do trabalho de voluntários.
302
Para Rico, estes dados demonstram
de Responsabilidade Social, que possui uma ampla divulgação no contexto brasileiro: a
“responsabilidade social foca a cadeia de negócios da empresa e engloba preocupações com o
público maior (acionistas, funcionários, prestadores de serviço, fornecedores, consumidores,
comunidade, governo e meio ambiente), cujas demandas e necessidade a empresa deve buscar
entender e incorporar em seus negócios. Assim, a Responsabilidade Social trata diretamente dos
negócios da empresa e como ela os conduz”, cf. INSTITUTO ETHOS DE EMPRESAS E
RESPONSABILIDADE SOCIAL. Responsabilidade Social das Empresas: a contribuição das
universidades. São Paulo: Peirópolis, 2002. Ver também, BORGER, Fernanda Gabriela.
Responsabilidade social: efeitos da atuação social na dinâmica empresarial. Tese de Doutorado da
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, 2001;
SOBREIRA, Rocilde Rodrigues. A preservação do Cerrado no contexto da responsabilidade
social das organizações: o caso do Instituto do Trópico Subúmido da Universidade Católica de
Goiás. Dissertação de Mestrado da Universidade Federal de Santa Catarina, 2002; ASHLEY,
Patrícia A . [org] et. al. Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Saraiva, 2002;
OLIVEIRA NETO, Valdemar. Responsabilidade social no Brasil e no mundo. Revista Mercado
Global. n. 107, p.51-54, jun. 2000; GALLEAZZO, Alan. Responsabilidade social e as empresas
brasileiras. Disponível em: http://www.crppr.org.br/artigos/03.htm. Acesso em 10 mar. 2007.
301
Szazi afirma que os investimentos no Terceiro Setor nos Estados Unidos, representam 6,3% do
PIB, onde seus ativos são da ordem de 670 bilhões de dólares. Op. Cit. SZAZI, Eduardo, p. 21.
302
Cf. LANDIN, Leilah, BERES, Neide. Ocupações, despesas e recursos: as organizações sem fins
lucrativos no Brasil. Rio de Janeiro: Nau, 1999, p. 47. Um dos fenômenos que contribuem para
esse crescimento de investimento está ligado ao grande número de fundações empresariais que tem
surgido nos últimos anos e, recebido doações de grandes empresas como a Microsoft, do bilionário
norte-americano Bill Gates. A Fundação Bill e Melinda Gates (Bill & Melinda Gates Foundation),
iniciou suas atividades em 2000 com uma doação de Gates no valor de 5 bilhões de dólares.
115
que o Terceiro Setor “é um novo mercado de trabalho
303
.
Citando Oliveira, para referir-se à necessidade da reprodução do capital, Rico
conclui que “a reprodução do capital e da força de trabalho continua a ser função dos
Estados nacionais que continuam, também, a contribuir para o fundo público
‘internacional’”
304
, que impedem os investimentos em programas locais para o
enfrentamento dos problemas sociais.
Ao analisar as práticas sociais da Igreja é preciso levar em consideração e
compreendê-la paralelamente aos fenômenos da exclusão social, do advento do
Terceiro Setor, do projeto econômico neoliberal e dos movimentos da sociedade civil
contemporânea no contexto de globalização.
As críticas de Montaño, Rico e Gohn referentes ao chamado Terceiro Setor,
são válidas porque apontam para um desvelamento da ideologia do modelo
econômico neoliberal e as fragilidades concernentes às atividades das ONGs, no
tocante ao enfrentamento das questões sociais, o Estado e o mercado.
Por outro lado, é preciso que seja feito justiça às instituições que atualmente
estão ligadas ao Terceiro Setor, mas que por muitos anos, bem antes do advento
deste fenômeno global, já possuíam uma atuação efetiva ante os problemas sociais.
Refiro-me especificamente às instituições religiosas, que muito provavelmente,
desde a fundação das religiões, tiveram a preocupação de atender os necessitados,
desamparados e excluídos socialmente. De uma forma geral, a Igreja sempre teve sua
inserção pública de uma forma mais proselitista e assistencialista por um período
303
Op. Cit. RICO, Elizabeth de Melo, pp. 36-37. De acordo com a divulgação do governo federal “a
Rede de Informações do Terceiro Setor, em 1999, já havia 250 mil OSCIPs, empregando mais de
1,5 milhão de pessoas, além de muitos voluntários.” PROGRAMA TRANSPARÊNCIA. Resultado
de Programa de 2005 - Reconhecimento de Utilidade Pública. Consultado em 15 jan. 2007.
Disponível em http://www.mj.gov.br/transparencia/Resultado_Programas/prog_014_link.htm.
304
OLIVEIRA, Francisco de. “O surgimento do antivalor”. In: Estudos do Sebrap. São Paulo, n. 22,
out. 1989, p. 9.
116
remoto, mas também, com as mudanças ocorridas no decorrer dos séculos, ela
persiste em ser uma voz profética em meio às injustiças, desigualdades e à exclusão
social.
Diante dos desafios da sociedade contemporânea, a Igreja Batista
Independente entende que são necessárias ações diversificadas e a “implementação
de uma nova visão metodológica, sempre aberta aos ajustes necessários à realidade e
conjuntura social
305
. Percebe-se que esta inserção pública da Igreja, por meio das
práticas sociais, ocorre em três momentos distintos.
O primeiro período está localizado nas atividades dos missionários batistas
suecos, pastores brasileiros e membros das comunidades locais, que elaboraram suas
estratégias de inserção e atuação isoladamente (1912-1974).
306
Uma característica
fundamental deste período é a iniciativa individual que, em razão do dinamismo das
relações humanas, acaba envolvendo também a comunidade religiosa local em prol
das práticas sociais.
No segundo período, a estratégia de inserção pública da Igreja passa a ter
dimensão denominacional e nacional (1974-1986). Implica em um novo
direcionamento das práticas sociais, cujo principal responsável é a figura do técnico
social, notavelmente inserido nesse contexto batista independente, que tem o desafio
de tornar a inserção pública da Igreja por meio das práticas sociais desenvolvida
e ampliada nacionalmente. As assistentes sociais ligadas à Igreja Batista
Independente é que irão coordenar e implementar novas metodologias para o
desenvolvimento das práticas sociais no contexto brasileiro.
305
SCHULZ, Almiro (coord.). Histórico. FEPAS: Campinas, 1998, p. 4.
306
Devido à extensão do período de análise, é necessário dizer que o mesmo não corresponde às
mudanças que ocorrem no contexto brasileiro e mundial, em razão das duas grandes guerras e da
expansão do modelo econômico neoliberal. Antes, este período diz respeito a uma característica
fundamental de inserção pública da Igreja Batista Independente, que se deu por meio da filantropia.
117
O terceiro período é construído sobre os fundamentos estabelecidos no
período anterior. Diante das demandas nacionais e internacionais de cooperação e
financiamento para instituições voltadas às práticas sociais da Igreja, houve a
necessidade de fundar a Federação das Entidades e Projetos Assistenciais FEPAS
(1986).
307
Esta instituição se torna responsável pela organização, articulação e
efetivação das práticas sociais da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro,
a partir de ações que pudessem contribuir para a otimização de recursos materiais e
humanos.
308
Neste período, é estabelecida uma profunda marca acerca das práticas sociais
da Igreja, principalmente, no tocante à conscientização e à capacitação das pessoas
envolvidas na efetivação das práticas sociais, tendo como ênfase uma “1) consciência
bem clara de nossa responsabilidade social; 2) consciência da realidade atual do
local; 3) reflexão contínua, com relação à nossa atuação; 4) conhecer os métodos de
trabalho e 5) delimitar o nosso envolvimento em: a) ação social por amor ao próximo
e b) ação social como meio para o evangelismo.
309
307
Esse período é marcado pela conscientização e profissionalização que devem existir para dar início
a um trabalho social: “(1) Consciência bem clara de nossa responsabilidade social; (2) Consciência
da realidade atual do local; (3) Reflexão contínua, com relação à nossa atuação; (4) Conhecer os
métodos de trabalho e (5) Delimitar o nosso envolvimento em: a) Ação social por amor ao próximo
e b) Ação social como meio para o evangelismo.” Op. Cit., SCHULZ, Almiro, p. 3.
308
Esta federação nasce, de acordo o registro da Ata de fundação, “Aos três dias de agosto de 1986,
reuniram-se nas dependências do Seminário Teológico Batista Independente em Campinas, Estado
de São Paulo, os membros da Diretoria do Departamento de Assistência Social (DAS) da
Convenção das Igrejas Batistas Independentes (CIBI), para deliberar sobre a fundação de uma
federação que agregue todas entidades de assistência social que atuam no âmbito da CIBI.”
DEPARTAMENTO DE ASSITÊNCIA SOCIAL. Ata da Reunião de Fundação. Campinas, 30 de
setembro de 1986.
309
Op. Cit., SCHULZ, Almiro, p. 3.
118
3.2. PRIMEIRAS INICIATIVAS DE INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA: AS PRÁTICAS
SOCIAIS DOS MISSIONÁRIOS SUECOS E LIDERANÇAS BRASILEIRAS LOCAIS
A partir das hipóteses estabelecidas nesta pesquisa, que foram “colocadas
como respostas plausíveis e provisórias para o problema de pesquisa (...) são
provisórias porque poderão ser confirmadas ou refutadas com o desenvolvimento da
pesquisa”
310
, a respeito das práticas sociais da Igreja Batista Independente no
contexto brasileiro, passa-se à exposição dos resultados. Lembrando que haviam sido
estabelecidas duas hipóteses, a saber:
Primeira hipótese:
As práticas sociais da Igreja Batista Independente podem ser consideradas
práxis social por objetivarem a transformação da sociedade.
Segunda hipótese:
Estas práticas sociais se conformam com o conteúdo do Reino de Deus e com
o exercício da cidadania.
As dificuldades relacionadas ao contexto social brasileiro, nas primeiras
décadas do século 20, apresentavam-se como um grande desafio para a Igreja
Protestante. Na inserção pública da Missão Batista Sueca no Brasil, os missionários
eram confrontados com uma realidade desconcertante e com desafios sociais
aparentemente intransponíveis.
Esta primeira fase de inserção pública da Igreja se deu ainda no período de
gestação e implantação das primeiras igrejas, com a chegada e instalação dos
primeiros missionários suecos no Estado do Rio Grande do Sul. Seu marco inicial é o
310
Op. Cit., SILVA, Edna Lucia da, p. 82.
119
ano de 1912, quando chega o missionário sueco Erik Jansson, e se estende até o ano
de 1974.
Logo no início das atividades do missionário, as condições sociais da
população da Vila Guarany
311
se impuseram e demandaram ações que pudessem
pelo menos amenizar o sofrimento e as dificuldades enfrentadas pelas famílias que lá
viviam. Uma alternativa para a solução dos problemas sociais foi a implantação da
Escola Sueca, para atender os filhos dos imigrantes suecos que não sabiam ler,
escrever ou realizar operações básicas de matemática. A escola desenvolveu suas
atividades paralelamente às atividades da Igreja.
No dia 3 de janeiro de 1913, Jansson envia uma carta para John Ongman na
Suécia, informando-o das atividades, e relata que entre os imigrantes ali residentes,
levantou-se o equivalente a 150 mil réis, destinados à aquisição de um terreno para
construir uma Igreja e uma Escola.
312
Esta propriedade tinha como objetivo oportunizar melhores condições
materiais para a realização das atividades religiosas e educacionais, além disso, a
comunidade local enfrentava carência espiritual e organizacional, e os imigrantes
suecos eram desarticulados na Vila Guarany.
A aquisição do terreno foi apenas um passo. Outras dificuldades estavam à
frente desse empreendimento e faltava praticamente toda a infra-estrutura,
311
Esta vila situa-se na região do Alto Uruguai, noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Foi
colonizada no ano de 1891 e, mais tarde chamou-se Colônia Guarani. No ano de 1919 torna-se
distrito de São Luiz Gonzaga. O Decreto n. 7199 de 31 de março de 1938, a localidade é elevada à
vila como todas as sedes de Distrito. Depois da consulta plebiscitária, emancipou-se Guarani das
Missões em 31 de janeiro de 1959, com os territórios de Guarani das Missões. Estas informações
estão disponíveis em http://nutep.ea.ufrgs.br/munisRS/mun189.htm.
312
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman. Vila Guarany, Rio Grande do Sul, 3 de janeiro
de 1913. Em carta posterior, Jansson afirma que conseguiram levantar no final, um montante de
153 mil réis com o qual adquiriram um terreno na Vila Guarany, para construirem a Igreja e a
Escola.
120
principalmente para iniciar a Escola. Sendo assim, Jansson enviou outra
correspondência à Súecia, solicitando materiais didáticos, de acordo com as
seguintes especificações:
(...) 25 exemplares do livro ABC de Olof Resenberg, 15 exemplares do
livro de matemática de A. Berg, 20 exemplares do livro História Bíblica
de Axel Blomkvist, 15 exemplares de Ciências de P.E. Persson. Eu agora
aluguei a casa na cidade de Guarany, como citei em minha carta anterior.
O aluguel custa 30 mil réis por mês. Assim em posso cuidar melhor do
trabalho. Vou começar a escola assim que eu tiver tudo arrumado.
313
Jansson vivia em um quarto cedido, na casa de Anders Gustav Andersson
autor da carta enviada publicada na Tribuna Sueca –, e o local não era adequado para
funcionar como sala de aula. Na segunda carta para Ongman, Jansson diz que alugou
um imóvel e que, segundo ele, era necessário ter um espaço mais adequado para o
funcionamento da Escola, onde ele poderia “cuidar melhor do trabalho”.
314
Nesta correspondência, Jansson fala a respeito da construção, afirma que já
haviam levantado a estrutura principal do prédio e ele havia conseguido um telhado
que “se não chover serve”, mas ainda, diz que precisa de ajuda financeira no valor de
300 coroas suecas para finalizar a obra. Afirma que não recebeu o dinheiro dos
Estados Unidos, mas agradece a Deus pela aquisição do terreno.
315
Os pedidos de recursos financeiros nas correspondências de Jansson para
Ongman eram constantes, por serem escassos entre os imigrantes suecos e por falta
de recursos para o sustento pessoal do missionário. Apesar das dificuldades
financeiras, o empreendimento missionário na Vila Guarany avança. Na terceira
carta enviada à Suécia no dia 26 de maio de 1913, Jansson relata:
313
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman. Vila Guarany, Rio Grande do Sul, 26 de
fevereiro de 1913.
314
Ibidem.
315
Esta propriedade, depois de muitos anos, será vendida em razão do final das atividades
missionárias, na atual cidade de Guarani das Missões.
121
Tenho 27 crianças na escola e muitos outros gostariam de vir. Eu vou
tentar receber trinta. Tenho algumas crianças brasileiras aqui também,
mesmo que hoje haja duas escolas públicas aqui.
316
Superadas algumas dificuldades iniciais, a atividade educacional tem seu
início com o atendimento dos filhos dos imigrantes suecos, alemães, poloneses e
brasileiros. Neste empreendimento educacional, Jansson precisa contextualizar o
ensino da cultura e costumes suecos para a cultura brasileira em formação,
principalmente, pela presença de várias etnias nas Colônias Novas.
A inserção de estudantes de outras etnias e, em especial, dos estudantes
brasileiros, favoreceu na contextualização, por causa da necessidade de se utilizar a
língua portuguesa. Esse fator contribuiu para a diminuição das barreiras lingüísticas e
culturais do missionário. O desenvolvimento da Escola Sueca demonstra que o
missionário Jansson teve considerável êxito no seu empreendimento educacional,
justamente por contar com o apoio da comunidade local, que contribuiu para o
sustento financeiro da escola, bem como do próprio missionário.
Com o passar dos meses, a Escola de Jansson avança. No mês de junho, ele
informa Ongman que “agora temos 34 crianças”.
317
Um avanço significativo após o
primeiro semestre de atividades, que supera a expectativa inicial, que pretendia
receber apenas 30 estudantes. Ele também informa que recebeu as 300 coroas para
comprar as tábuas e fechar as paredes da capela/escola, mas afirma que ainda não
haviam conseguido concluir a obra. É provável que o tempo de chuvas constantes e o
rigoroso frio gaúcho, peculiar daquela região, impediram a aplicação imediata dos
recursos e, somente no mês de setembro foram adquiridas as tábuas e, então, foi
316
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman. Vila Guarany, Rio Grande do Sul, 26 de maio
de 1913.
317
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman. Vila Guarany, Rio Grande do Sul, 17 de junho
de 1913.
1
concluída a obra.
318
Além das necessidades educacionais da Vila Guarany, havia também um
problema de saúde pública, que causava vários males individuais e coletivos entre as
famílias das várias etnias: o alcoolismo. O consumo excessivo de álcool foi
combatido desde o início das atividades do missionário sueco e, praticamente, por
todo o tempo de atuação de Jansson no Brasil. Eram visíveis os efeitos das bebidas
alcoólicas na vida dos imigrantes, em especial no consumo de cachaça. Além dos
sintomas de depressão e frustração diante das dificuldades enfrentadas para a
sobrevivência, para muitos suecos o alcoolismo passou a ser uma possibilidade de
alívio daquela realidade, enquanto isso, os problemas se multiplicavam.
O combate ao consumo de álcool foi, por muitos anos, uma das bandeiras do
protestantismo latino-americano, que a usava freqüentemente com muita firmeza. É
possível verificar este posicionamento em algumas publicações, como na nota do
Jornal Batista da Convenção Batista Brasileira
319
veiculada também no jornal Luz
nas Trevas que afirmava: “ALCOOL-BEBIDA [grifo do autor] é o maior inimigo da
humanidade e o melhor aliado de Satanás. É de todo impróprio, pois, ao crente usá-
lo, fabricá-lo ou vendê-lo”.
320
Havia o problema do consumo excessivo de álcool
entre os imigrantes, porém, muitos deles produziam bebidas alcoólicas para o
consumo e, para alguns, era um meio de sobrevivência. Também Jansson escreve no
jornal Luz nas Trevas, orientando os homens a evitarem o consumo de bebidas
alcoólicas.
321
318
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman. Vila Guarany, Rio Grande do Sul, 16 de
setembro de 1913.
319
O jornal Batista é um periódico da Convenção Batista Brasileira, veja
http://www.batistas.org.br/ojb.
320
Cf. nota do jornal Luz nas Trevas. Pelotas, n. 57, Ano VI, maio de 1932, p. 83.
321
JANSSON, Erik. Os effeitos do uso de bebidas alcoolicas. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 66, Ano VII,
123
É importante ressaltar que as práticas sociais da Igreja, nesse período, se
deram em virtude da missão da Igreja em transmitir o conteúdo do Evangelho à
comunidade da Vila Guarany, e também apoiar a comunidade local, não apenas os
imigrantes suecos. O apoio aconteceu por meio de práticas sociais voltadas para
saúde, educação, combate ao alcoolismo e, ainda, realizando atividades culturais,
contribuindo para o desenvolvimento local.
Estas práticas sociais, situadas na base da colonização sueca e entre outras
etnias, de acordo com Marques, possuíam a
especificidade, tanto de suas formas organizativas de suas manifestações
socioculturais, é fruto de um complexo de fatores, em que as relações e
contradições próprias de uma economia mercantil baseada na pequena
produção agrícola e no trabalho em regime familiar, estão associadas a
um esforço de preservação da identidade ética e religiosa, como base de
sustentação ideológica dos grupos dispersos pelas linhas coloniais e sob a
forma de tradições culturais próprias: língua, religião e organização
sociocultural (capelas, escolas, associações étnico-culturais, clubes de
lazer e esporte).
322
Nota-se a importância da religião como elemento fundamental para
organização da vida social, e como a Missão Batista Sueca consegue obter certo
sucesso na sua inserção pública, contribuindo para certo ordenamento social e
político na Vila Guarany, justamente por sua capacidade mobilizadora de esforços, e
também contribui dando sentido à existência daquela população.
323
A partir da década de 30, houve significativo avanço na inserção pública da
Igreja Batista Independente, com a ampliação de suas práticas sociais por intermédio
de várias instituições que surgiram a partir de iniciativas das Igrejas locais, que
acabam ultrapassando as fronteiras do Rio Grande do Sul, chegando a São Paulo e
feveiro de 1933, p. 211.
322
MARQUES, Mario Osório, Universidade emergente: o ensino superior brasileiro em Ijuí (RS) de
1957 a 1983, p. 22. In. MARQUES, Mario Osório (Ed.), Etnias diferenciadas na formação de Ijuí,
Ijuí: Fidene, 1985, p. 11.
323
A Escola Sueca da Vila Guarany permanecerá em funcionamento até o ano de 1924. A maioria dos
missionários suecos passou um período cooperando com a obra missionária na Vila Guarany com
Ana e Erik Jansson.
124
Santa Catarina. Porém, acaba prevalecendo a marcante presença batista independente
no Estado do Rio Grande do Sul, que é acompanhada pelo crescimento das Igrejas
locais em vários municípios do Estado.
324
Em 1930, a Igreja Batista Betel, localizada na cidade de Porto Alegre, busca
contribuir para o enfrentamento dos problemas sociais da capital gaúcha. Com a
iniciativa da missionária sueca Lisa Alm, surge o Orfanato Feminino Evangélico
Betel, apoiado pelo missionário Carlos O. Welander, o pastor brasileiro Astrogildo
Marques Pacheco
325
e alguns membros da Igreja local.
O orfanato serviu à sociedade porto-alegrense, pelo seu “caráter filantrópico e
assistencial tem abrigado indistinta e gratuitamente meninas desamparadas,
especialmente órfãs.
326
A Sociedade Missionária de Örebro cooperou na aquisição
da sede própria:
no seu grande interesse não só pela obra de evangelização como também
pela assistência social, não hesita em atender favoravelmente o pedido
que a Igreja Betel de Porto Alegre, juntamente com a direção do Lar (...)
passando, assim, a ter o Lar condições satisfatórias para atender as
internas.
327
Além dos recursos financeiros da Suécia, a instituição foi mantida por ofertas
voluntárias da Igreja, instituições privadas e governamentais, mas também por vários
contribuintes individuais da sociedade civil. Alm publicava, periodicamente, o
relatório das contribuições ao orfanato, no jornal Luz nas Trevas, e de acordo com as
324
Em o Lar Feminino Filadélfia (1968) na cidade de Jundiaí, SP e a Sociedade Beneficente Bom
Samaritano (1954), na cidade de Xanxerê, SC. No Rio Grande do Sul foram criados a Sociedade
Beneficente Evangélica de Frederico Westphalen, o Centro Social Filadélfia (1967) em Pelotas, a
Associação Beneficente O Bom Samaritano (1964) em Cachoeirinha, a Sociedade Beneficente
Paulo de Tarso (1962) na cidade de Novo Hamburgo e a Escola Paulo de Tarso (1962) na cidade de
Santa Maria.
325
Astrogildo Marques Pacheco nasceu na cidade de Porto Alegre a 12 de janeiro de 1902. Converteu-
se em 1922 e foi batizado no ano seguinte. Depois de ter trabalhado como obreiro leigo durante
alguns anos, foi chamado pela Igreja Evangélica Betel de Porto Alegre, em 1930, cf. SOCIEDADE
MISSIONÁRIA BATISTA INDEPENDENTE. Biografias de Missionários e Pastores, p. 20.
326
SPOHRE, Lisen Helena. Orfanato feminino. Luz nas Trevas. Santa Maria, dezembro de 1961.
Edição Comemorativa, p. 22. Veja também E Deus Fez Crescer, pp. 85-86.
327
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 85.
125
suas próprias palavras:
Além dessas offertas em dinheiro temos recebido durante o mez de
dezembro, e especialmente para Natal, muitos presentes de todas as
qualidades. Assim ganhamos brinquedos de tres bazares, fazenda e meias
da Casa Tchmeidel, 2 p. sandalhas da Casa Seabra, vestidos, aventaes e
12 bonecas do Collegio Bapt. E da Egr. Bapt. Rua Hoffmann, uma torta e
doce de D. Hanna Krug, doce da Sra. Muller e mel, chmir, verdura e doce
de diversas pessoas. Em verdade gosamos tanta alegria e tantas bençams
de Deus, porque d’Elle vem toda a boa dádiva, e por isso da-lo-emos
louvar para sempre.
328
Parece que a instituição recebia amplo apoio da comunidade local, quando
verificamos os variados tipos de contribuições, doados por instituições, da Igreja e da
população em geral. A sociedade civil é mobilizada e contribui para a manutenção e
o desenvolvimento dessa instituição, destinada às meninas órfãs da grande Porto
Alegre. Apesar do amplo apoio da Igreja e da sociedade civil, a instituição sempre
passou por dificuldades financeiras para conseguir manter o atendimento às meninas
órfãs. Em novembro de 1932, Carlos Sphore faz um apelo aos leitores do jornal Luz
nas Trevas, na tentativa de conseguir maior adesão às ofertas destinadas ao sustento
do orfanato
329
, onde lembra o conceito de religião contido na Epístola Católica de
Tiago, e afirma que:
“A religião pura e immaculada para com Deus, o Pae, é esta: Visitar os
orphãos e as viuvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do
mundo”, (Thiago 1:27). “Visitar” não só quer dizer: ir a casa do
necessitado, bater a porta e perguntar pela saude delle e estima-lo
felicidades; mas tambem ajudar com que possivel fôr, (Vede Thiago
2:15,16).
330
Esta postura prática diante das questões sociais, precisa superar a simples
retórica a respeito do tema. A reflexão de Sphore é fundamental para compreender a
328
ALM, Lisa. Contribuição para o Orfhanato Evangélico Bethel. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 55, Ano
VI, março de 1932, p. 43.
329
Nas reuniões da Convenção Baptista Rio-Grandense, até o ano de 1952, havia dois objetivos bem
conhecidos: a edificação espiritual dos cristãos e a cooperação das igrejas locais para novos
empreendimentos missionários e para manutenção das instituições filantrópicas. Os convencionais
eram incentivados “ (...) como de costume a Convenção recomendou as egrejas de levantar duas
offertas durante o anno em prol do seu orgão, ‘Luz-nas-Trevas’. Outrosim, recomendou ás de fazer
o mesmo pelo orphanato ‘Bethel’(...)”;cf. Echos da Convenção. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 66, Ano
VII, maio de 1933, p. 223.
330
SPOHRE, Carlos. Um appello. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 62, Ano VI, novembro de 1932, p. 155.
126
necessidade de engajamento dos cristãos, em relação às questões sociais. Os
resultados poderiam ser verificados, através dos relatórios do orfanato publicados
freqüentemente no Luz nas Trevas, com uma adesão considerável de indivíduos e
outras instituições que contribuíram com o sustento do orfanato.
O artigo também apresenta orientações a respeito do uso adequado do
dinheiro, e faz oposição a atividades consideradas “mundanas”, como sendo
inapropriadas aos fiéis:
Alcool, fumo, cinema, bailes, jogos e muitas outras cousas semelhantes
pertencem “a corrupção do mundo. No entanto, ha tantos hoje em dia
que naquellas ‘cisternas rotas’ (Vede Jer. 2:13) gastam o seu dinheiro
com o qual poderiam e deveriam alegrar orphãos e viuvas necessitadas.
Mas não aprenderam que ‘bemaventurada cousa é dar’ aos pobres.
Amigo, aqui na cidade ha muitos que olham á nós para receber de nós
uma mão auxiliar. Quereis-nos ajudar? Frequentemente vêm ajudar?
Frequentemente vêm pessoas, pedindo-nos o favor de aceitar uma creança
que não tem amparo na vida (...) somos obrigados a responder: não
podemos! Isto por faltar-nos recursos.
331
A mordomia cristã disciplina conhecida entre os cristãos lembra que se
deve fazer bom uso dos recursos financeiros, administrando adequadamente os
recursos como um todo e evitar o desperdício. Aplicar parte dos recursos individuais
para socorrer os necessitados é, de acordo com Sphore, administrar com zelo os
recursos materiais, justamente porque este recurso também coopera com o projeto
missionário de evangelização, fundamento de atuação da instituição para as práticas
sociais da Igreja pautadas pelo evangelho. Visão ampliada ainda, para além do amor
e graça divina, onde o fiel precisa exercitar sua fé a fim de demonstrar a justiça e a
331
Op.Cit., SPOHRE, Carlos, p. 155. A respeito do uso de recursos financeiros, afirma Torrey:
“‘Porém o meu Deus, segundo as suas riquezas, supprirá todas as vossas necessidades em gloria
por Christo Jesus’. Mas esta promessa foi dada a crentes, que mais do que todos os outros tinham
se salientado por um dar generoso e repetido (v. 14-18). Naturalmente não devemos nos limitar ao
darmos somente á missão estrangeira. Devemos contribuir para a obra da nossa egreja e para o
trabalho social das nossas cidades. Empregaremos todas as nossas opportunidades para fazer bem a
todos, mas principalmente aos domésticos da fé (Gl 6:10). TORREY, Dr. R. A. A missão
estrangeira. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 67, Ano VII, abril de 1933. O segredo do progresso na vida
cristã, pp. 233-234.
127
santidade, conforme afirma Lisen Helena Sphore, “a vida christã não consiste
sómente em amor e graça divina, mas também em justiça e santidade”.
332
O Orfanato Feminino Evangélico Betel cuidava da formação das meninas,
mantendo um curso primário e cursos de trabalhos manuais e de culinária.
Comprometia-se com o bem-estar e a preparação das meninas para a vida em
sociedade, mas também com a formação cristã, como demonstrado nas palavras de
Lisen H. Sphore: “nossa esperança é que cada uma venha a ser boa e dedicada dona
de casa e que em primeiro lugar conheça o Caminho da salvação.
333
Isto deve ser
considerado algo importante, já que o orfanato possui orientação protestante, na qual
baseia a formulação do seu programa educacional, onde os elementos da fé
evangélica estão intrinsecamente ligados a sua forma de inserção e atuação social. A
fé é o motor das práticas sociais realizadas no interior da instituição.
O serviço era oferecido às meninas até completarem 18 anos, e de acordo
com Alm, o orfanato chegou a receber 50 meninas durante os primeiros dez anos de
funcionamento (1930-1940). No entanto, a metade delas recebeu abrigo apenas
temporariamente e, no final deste período, “ (...) permanecem 25 e, graças ao nosso
Deus, não precisamos registrar nenhuma morte.
334
Em primeiro de setembro do ano de 1945, o orfanato é transferido para uma
propriedade mais ampla, na cidade de Pelotas, e nesta ocasião atendia 21 meninas.
335
Até o ano de 1995, manteve suas atividades com “ (...) uma escola primária um
curso de trabalhos manuais e informações práticas sobre arte culinária. Através
332
WELANDER, Carlos O. “Temor do Senhor”. Luz nas Trevas. Pelotas, n. 56, Ano VI, abril de
1932, pp. 46-47.
333
Op. Cit., SPOHRE, Lisen Helena, p. 22.
334
ALM, Lisa. Estatística. In. Relatório do 10° Aniversário do Orfanato Feminino Evangélico Betel.
Porto Alegre, 1940, p. 4.
335
Op. Cit., SPOHRE, Lisen Helena, p. 22.
128
destes cursos, as meninas se tornam aptas para a vida fora da Instituição
336
. Porém,
diante das mudanças socioeconômicas, houve a necessidade de adequar novos
programas direcionados à comunidade, à criança e ao adolescente. Passou a se
chamar Centro Social e Cultural Evangélico Betel,
atuando com Educação Infantil
com uma Pré-Escola. Entre 2001 e 2006, tem oferecido serviços educacionais a 411
crianças.
337
Quase duas décadas mais tarde, da fundação do Orfanato Feminino
Evangélico Betel de Porto Alegre, ocorre outra iniciativa por parte dos membros da
Igreja Evangélica Betel de Esteio e do pastor João Batista da Silva, e é fundada a
Sociedade Beneficente Evangélica Betel, no ano de 1949, com um programa voltado
ao atendimento de idosos.
No dia 12 de fevereiro do ano de 1956, é inaugurada a sede da Sociedade
Beneficente Betel de Esteio, com instalações adequadas e o prédio construído
(...) de alvenaria, construção modernista, é uma obra que por si só fala da
preocupação dos dirigentes do Asilo em proporcionar aos velhinhos
internados, o máximo de conforto e carinho cristão. O trabalho de amparo
está sendo executado pela Igreja Betel de Esteio é por todos os lados
digno de louvores.
338
No mesmo ano, no dia 10 de setembro, a sociedade recebe o reconhecimento
do governo local como instituição de utilidade pública.
No ano de 1961, a instituição recebe um menino desamparado que havia
chegado à Igreja Evangélica Betel, sendo este o primeiro dentre muitos meninos
antendidos na instituição. No início do ano de 1973, eram atendidos “29 meninos (27
336
Op. Cit. E Deus fez crescer, p. 85.
337
F. FILHO, Almir de Oliveira. Quadro de atendimento das Instituições da Federação das Entidades
e Projetos Assistenciais. In. CONGRESSO DE AÇÃO SOCIAL - Redes Sociais uma nova
estratégia para o desenvolvimento. Anais. Araçariguama/SP, 2006, p. 32; Op. Cit., SCHULZ,
Almiro, p. 31; FEPAS. Entidades Federadas quadro geral de 2006. Campinas, 2006, p. 13.
338
Um lar para velhice. Luz nas Trevas, dez. de 1961. Edição Comemorativa, p. 22.
129
internos e 2 semi-internos)”.
339
Em razão desta nova demanda, houve a necessidade
de ampliar as instalações da instituição, que por sua vez, foi inaugurada no dia 21 de
janeiro de 1975. Constituía-se de um prédio de:
3 pisos e amplas instalações para acomodar 80 meninos, o novo prédio
possui ainda um apartamento para governanta, dependências para
hóspedes, salão nobre, biblioteca, gabinete médico-dentário, cozinha,
refeitório e demais dependências administrativas.
340
A Sociedade Evangélica Betel de Esteio estabeleceu parcerias públicas e
privadas, importantes para a manutenção dos serviços oferecidos à sociedade. Citam-
se alguns dos parceiros, como a Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor, a
Legião Brasileira e Assistência, a Secretaria do Trabalho e Ação Social, Visão
Mundial, prefeitura municipal de Esteio, Diaconia, Örebromissionen e, ainda,
contribuintes particulares. Um bom exemplo destas parcerias foi a implantação de
uma marcenaria:
No início de 1976, graças a recursos provinientes da ‘Lutherjaelpen’ e do
editor Harry Lindquist, é montada a moderna marcenaria com maquinário
novo, visando a profissionalização de meninos e o suprimento dos móveis
e utensílios para toda a obra.
341
Também em parceria com a Örebromissionen, a instituição é apoiada com o trabalho
do missionário Heiz Voss que, a partir de 1973, atuou em tempo integral na
instituição. No ano de 1977, a instituição estava instalada em uma área de doze mil
metros quadrados e atendia 80 idosos e 35 meninos.
No transcorrer dos anos, a Sociedade Beneficente Betel de Esteio passou por
uma reorganização no seu programa inicial de atendimento, tendo implantado um
internato para crianças e adolescentes, e uma creche. Além disso, continuou a
339
KÜHNRICH, Günter. Relatório de Atividades do Exercício de 1973. SOCIEDADE
BENEFICENTE EVANGÉLICA BETEL: Esteio, p. 3. No ano de 1962 são construídas casas para
a instalação dos anciões e também para meninos. Neste período, a instituição está sob a direção
dos missionários Yna e Folke Engelbertsson.
340
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 80.
341
Ibid., pp. 80-81.
130
oferecer serviços para 100 idosos em regime interno, no ano de 1998. Também
passou a oferecer serviços à comunidade local, ampliando sua atuação social e
utilizando melhor o seu espaço físico. Nesta fase, a responsabilidade no
enfrentamento dos problemas sociais é compartilhada com a sociedade civil e o
Estado, no que se refere à formação das crianças e adolescentes, como afirma
Kühnrich:
Todos os meninos freqüentaram regularmente as escolas públicas do
Estado, sendo que 4 fizeram cursos de profissionalização no Senai.
Somos contrários ao confinamento de menores, ou seja, quando a própria
instituição se propõe a educar e profissionalizar os seus menores.
342
A participação do menor no contexto de convívio social mais amplo
proporcionava melhor assimilação e preparação para a vida fora da instituição. Em
sua declaração, a proposta de compartilhamento da responsabilidade da instituição
com a sociedade civil ampliou a rede de relações da instituição e das crianças e
adolescentes atendidas por ela, além de diferenciá-la em relação às outras instituições
que atuavam apenas em regime interno.
Outra iniciativa de inserção pública da Igreja dá-se no ano de 1951, com as
“primeiras sondagens para abertura de um trabalho entre os índios Caingangues,
foram feitas em 1951 pelos missionários Arne Joahsson e Thorsten Sjösteth”
343
que,
no ano de 1956, inicia-se na localidade indígena de Chapecó, SC. De acordo com o
relatório de atividades publicado no jornal Luz nas Trevas, o trabalho social
desenvolveu-se, sendo criadas escolas de alfabetização para as crianças,
clínicas médicas e posteriormente um orfanato indígena, que se encontra
em pleno funcionamento, sob a direção da irmã Alda Lelis. Além da obra
assistencial, existe uma Igreja indígena, com mais de 20 membros [desde]
1960.
344
342
Op. Cit., KÜHNRICH, Günter, p. 3.
343
A obra missionária entre os índios Caingangues. Luz nas Trevas, dez. de 1961. Edição
Comemorativa, p. 22.
344
Ibidem.
131
Esta atividade sofreu algumas alterações e foi transferida para a cidade de
Xanxerê, em março de 1955, quando é inaugurada a primeira escola indígena, com
25 crianças matriculadas. Quatro anos mais tarde, no dia 10 de agosto de 1959, foi
“inaugurado o Lar ‘O Bom Samaritano’, para dar assistência principalmente as
crianças indígenas, doentes e desamparados”
345
, posteriormente, é aberto também
para o atendimento de outras etnias. Em razão das dificuldades de deslocamento das
crianças,
os líderes do orfanato solicitam junto às autoridades a criação de um
ginásio Estadual nas proximidades do estabelecimento e são atendidos. O
governo instala um ginásio na Vila de Samburá, situado a dois
quilômetros do Lar ‘O Bom Samaritano’. O alvo dos irmãos missionários
que trabalham com essas meninas necessitadas não é somente o de suprir
as suas necessidades materiais, mas especialmente levá-las a conhecer a
Cristo como Salvador e promover a integração na sociedade.
346
A interloculação com o poder público e a sociedade civil, demonstra uma
preocupação fundamental e o compromisso da instituição com a educação das
gerações futuras, estabelecendo parcerias importantes para o enfrentamento dos
problemas sociais locais.
Após um longo período de atendimento à população local, ocorreu uma
reestruturação, e a instituição mudou para uma área mais próxima à cidade, tendo
sido re-inaugurada no início de 1994. O projeto manteve o abrigo, além de um
Núcleo de Apoio Escolar, atividades complementares à escola e iniciação à
profissionalização.
Com a ampliação das práticas sociais da Igreja desenvolvidas inicialmente
por missionários e lideranças brasileiras locais as ações individuais e isoladas
permanecem, porém, ocorre um movimento de organização em ações coletivas e
345
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 83. Também chegam para cooperar como a atividade entre os
indígenas, no ano de 1954, os missionários Regina e Arne Johnsson.
346
Ibid., pp. 83-84.
132
instituicionais que, por sua vez, acabam tornando-se expressão da inserção pública da
Igreja. Por outro lado, o desafio da conscientização e da mobilização dos recursos
materiais e humanos, se mantém em uma constante às Igrejas protestantes, mas
também para a sociedade contemporânea, que busca superar a escassez dos recursos
para o enfrentamento dos problemas sociais.
3.3. AMPLIAÇÃO NACIONAL DA INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA: AS PRÁTICAS
SOCIAIS A PARTIR DA CRIAÇÃO DO DEPARTAMENTO DE AÇÃO SOCIAL
O segundo período de desenvolvimento das práticas sociais da Igreja é
marcado pela organização do Departamento de Ação Social (DAS), em 1974.
347
Este
departamento teve como meta buscar a consolidação de uma estratégia de inserção
pública da Igreja, em uma dimensão denominacional e nacional das práticas sociais
(1974-1986).
A visão ampliada para este tipo de inserção pública da Igreja deu-se por um
fato notável: a inserção de um elemento fundamental para o desenvolvimento mais
amplo das práticas sociais no território nacional, que é o trabalho de assistentes
sociais na coordenação e implementação das práticas sociais. Este fator contribuiu
para o amadurecimento das práticas sociais da Igreja Batista Independente, na
perspectiva de
347
O DAS integrou os projetos sociais ligados à Igreja, “dando caráter denominacional e nacional [de]
1974 e 1986, no decorrer do processo histórico do País e do trabalho social do DAS, ampliou-se a
ação, diante de novas demandas e visão sobre a atuação social”, e este período é marcado por ações
fundamentalmente assistenciais; Op. Cit., SCHULZ, Almiro, p. 3.
133
atuar permanentemente pelo Departamento junto às Igrejas, junto às
Instituições Assistenciais com nossa presença denominacional no País, e
em nível central, na elaboração de projetos pedidos de captação de
recursos, na orientação técnico-bibliográfica às igrejas e instituições, e no
relacionamento com órgãos governamentais e instituições estrangeiras.
348
Em especial, a relação com as instituições internacionais que já eram parceiras da
Igreja Batista Independente: SIDA
349
e Örebromissionen.
No decorrer dos anos, foram aprimoradas as práticas sociais da Igreja,
principalmente no tocante à orientação técnica, e no de 1984, na 28° Assembléia
Geral Anual da Igreja, é apresentado pela diretora e assistente social do DAS, Otildes
Maria Michel Duarte, uma nova proposta para o departamento,
visando uma ampla atuação desse órgão na denominação, especialmente
traçando diretrizes básicas para a ação social em 1984, que em síntese
são: I) Estratégia: implantar a execução direta, dimensionar a supervisão e
assessoria, articular recursos de instituições governamentais, a fim de
reduzir gastos (...) Na área de diretrizes básicas resume-se: minimizar o
atendimento institucionalizado, maximizar o engajamento da comunidade
no desenvolvimento de projetos comunitários, propiciar a supervisão em
seus vários níveis.
350
Dá-se início a uma perspectiva de ação social e busca-se ampliar as práticas
sociais ligadas ao desenvolvimento comunitário e participativo. Conforme afirma
Duarte, as prioridades são: 1) atendimento a menores através de creches ou grupos
espontâneos; 2) ação comunitária; 3) palestras de conscientização; 4) treinamento de
pessoal em todos os níveis; 5) supervisão e assessoria.
351
Além desses elementos citados, o DAS também iniciou uma discussão em
torno de um dos temas mais delicados para a denominação, referente à autonomia do
348
Ata das deliberações tomadas nas reuniões da comissão Executiva da CIBI, nos dias 16 a 21 de
janeiro de 1979, por ocasião da XXVIII Assembléia Geral Anual da CIBI, Porto Alegre, RS.
349
Esta é a sigla do órgão de cooperação internacional do governo sueco, Swedish International
Devolupment Cooperation Agency SIDA. Ver www.sida.org.
350
Ata n. 7 dos trabalhos da XXVIII Assembléia Geral Anual da CIBI, 24 a 29 de janeiro de 1984,
Viamão, RS.
351
Esta perspectiva de avaliação das instituições e das práticas sociais desenvolvidas no seu interior é
uma perspectiva que tem sido amplamente discutida atualmente, na tentativa de que as instituições
desenvolvam suas atividades com o máximo de transparência.
134
departamento, que defendia a necessidade de possuir uma “estrutura jurídica que
permita autonomia administrativa e financeira”
352
. Esta autonomia se legitimava,
justamente pela dificuldade de operacionalização do departamento para articular-se
em torno de 14 instituições ligadas às igrejas locais no território nacional. Em várias
correspondências trocadas entre o DAS e o centro administrativo da Igreja
353
,
verifica-se que os repasses de verbas às instituições eram orientados pelo
departamento, porém, quem realizava a remessa dos recursos financeiros originário
da Igreja e governo sueco, era o centro administrativo da Igreja.
Tal autonomia só possível mais tarde; mesmo assim, não se deu de forma
natural, mas foi pressionada por um processo instaurado a partir das suas parceiras
suecas (Igreja e SIDA) e das modificações referentes ao modelo de intervenção no
contexto social brasileiro.
354
Na próxima fase de desenvolvimento das práticas
sociais da Igreja, isto ficará mais evidente; por hora, importa-nos evidenciar que a
inserção das assistentes sociais no DAS, deflagrou uma nova perspectiva de reflexão
em torno do tema da profissionalização das pessoas envolvidas diretamente na
prestação de serviços nas instituições ligadas à Igreja.
355
De acordo com as estatísticas da Igreja Batista Independente, no ano de 1984
352
Cf. Ata n. 7 dos trabalhos da XXVIII Assembléia Geral Anual da CIBI, 24 a 29 de janeiro de 1984,
Viamão, RS.
353
Ver ANEXO D Correspondência do Centro Administrativo para DAS.
354
Um exemplo disso são as diretrizes de cooperação da SIDA que podem ser consultados em: La
política de Asdi para la sociedad civil. EL DEPARTAMENTO DE COOPERACIÓN CON
ORGANIZACIONES NO-GUBERNAMENTALES Y ASISTENCIA HUMANITARIA &
MANEJO DE CONFLICTOS. Suécia, abril de 2004. Disponível em www.asdi.org.
355
Os conflitos referentes à autonomia do DAS em relação a cúpula da Igreja e, juntamente com a
inserção de profissionais da área social no departamento, foram fundamentais para uma atualização
do modelo de intervenção social da Igreja por meio das práticas sociais. Ocorreu neste período uma
abertura às reflexões contemporâneas da relação entre a Igreja e a sociedade, e também, das
adequações legais destas instituições e da profissionalização de pessoal. É preciso deixar claro, que
por muito tempo, as reflexões e os debates críticos mais amplos a respeito da inserção pública da
Igreja, se deu no âmbito de um grupo de profissionais envolvidos diretamente neste processo de
organização e ampliação da presença da Igreja no espaço público.
135
eram 25.024 membros, 167 Igrejas, das quais 16 desenvolviam suas práticas sociais a
partir das ações institucionalizadas nos seguintes totais: 5 creches, 6 orfanatos, 4
asilos e 7 ambulatórios médicos e, ainda, “ (...) quase todas as Igrejas têm um sistema
de distribuição de alimentos e roupas para pessoas necessitadas. Há também ajuda
em construção de residências em ocasiões especiais, em casos de emergência.
356
Quase 10% das igrejas naquele ano, desenvolviam suas práticas sociais
vinculadas aos próprios projetos, além das ações individuais que sempre são difíceis
de mensurar e, ainda, das práticas caracteristicamente assistencialistas, como doação
de alimentos e roupas diretamente nas próprias igrejas.
357
No relatório, são citados
como cooperadores no financiamento das práticas sociais desenvolvidas pela Igreja
Batista Independente, a Örebromissionen e o povo sueco, demonstrando mais uma
vez a forte relação entre a Igreja brasileira e a Igreja e o povo sueco.
Para exemplificar esse momento, pode-se verificar um documento produzido
pela Igreja Batista Independente a respeito das suas atividades no território nacional,
onde se declara que
a fé sem as obras é morta, por esse motivo, várias igrejas integradas à
CIBI, paralelamente com sua missão primordia que é a evangelização,
vêm-se conscientizando que, ajudar socialmente aos necessitados, é algo
estreitamente vinculado à sua linha de ação. “O que fizestes a um destes
pequeninos, a mim o fizestes”.
358
356
CONVENÇÃO DAS IGREJAS BATISTAS INDEPENDENTES. Dados estatísticos ano base
1984. Coordenação e Produção da Secretaria da Convenção: Campinas, 1984. Sobre a integração
do projeto social e as famílias, ver SCHULZ, Neiliana A. B. Orientações sobre creche. In: Projeto
Informação. FEPAS: Campinas, 1986; a respeito de orientações sobre alimentação foi desenvolvida
uma cartilha para ser utilizada nas igrejas e instituições: MARIANO, Ana Fátima da Silva,
SCHULZ, Neiliana Araújo Bezerra. Orientações gerais sobre alimentação. DEPARTAMENTO
DE ASSISTENCIA SOCIAL: Campinas, 1984.
357
Apenas como exemplo de assistencialismo, citamos um caso da Bahia: “ (...) estive em Salvador e
consegui inscrever as Igrejas de Vitória da Conquista e Candiba como ‘Agências Distribuidoras de
Alimentos’, ajudando assim 48 famílias necessitadas em cada Igreja (...) Neste novo ano vamos
organizar nos fundos da Igreja um curso de alfabetização diurno e noturno sob a direção da Profa.
Isa Marques Silva, atual professora do Ginásio Batista e da Escola Normal de Vitória da
Conquista”. Relatório das Igrejas Batistas Independentes “Filadélfia” no Estado da Bahia, 1965,
pp. 2-3.
358
Op. Cit., E Deus fez crescer, p. 86.
136
Nesta perspectiva da linha de ação, percebe-se a estreita relação entre a
missão evangelizadora e a conscientização da Igreja a respeito da sua atuação na
sociedade, e apresenta uma visão clara de uma fé prática e dinâmica, que não se
isenta do compromisso com o próximo mais necessitado. Porém, é necessário afirmar
que toda tentativa de mudança de mentalidade e de conduta, dá-se por meio de um
processo muitas vezes longo e demorado, e que dificilmente consegue abranger a
totalidade do grupo social e/ou religioso. No contexto Batista Independente estas
mudanças ocorrem paulatinamente, na tentativa de se ampliar esta nova perspectiva
de inserção da Igreja no espaço público.
Desta forma, surge nas dependências da própria Igreja, a primeira instituição
social deste segundo período. O Centro Social Ebenézer de Bayeux, PB, inicia suas
atividades em 1980. Localizado em um bairro pobre na região metropolitana de João
Pessoa, foi ampliando sua atuação aos poucos e, em 1998, atendia crianças,
adolescentes e a comunidade local, com programas de pré-escola, ensino
fundamental e médio e, ainda, oferecendo educação inclusiva para pessoas
portadoras de necessidades especiais, além de um posto de saúde e de vacinação.
O Centro Social Ebenézer atende cerca de 1.200 estudantes e é, com certeza,
uma escola de referência no município de João Pessoa, atendendo a população da
periferia com um programa educacional de qualidade. Por meio destas práticas
sociais, a Igreja Batista Independente tem contribuído na perspectiva de educar para
cidadania, buscando cumprir com a sua missão para instaurar o novo naquela
comunidade. Apesar disso, é preciso lembrar que sempre há grandes obstáculos e
dificuldades a serem superadas por instituições deste porte. O contexto social no qual
operam está, via de regra, entre os limites e as possibilidades no que se refere à
137
transformação do contexto social local, que nem sempre conseguem ser superados
com a eficácia desejada por essas instituições.
No Alto Solimões, próximo à fronteira com o Peru, é implantado na cidade de
Benjamin Constant, no Estado da Amazônia, no ano de 1984, o Centro Social Batista
Independente. Este projeto social buscou implantar vários programas e, no ano de
1998, atendia cerca de 550 crianças da pré-escola até a 4ª série do ensino
fundamental.
Esta instituição é a mais importante prestadora de serviços educacionais do
município de Benjamin Constant, e tem contribuído desde a década de 80, para a
alfabetização das novas gerações daquela localidade. Atualmente, o Centro Social
Batista Independente atende 1310 crianças, adolescentes e jovens, por meio dos seus
programas educacionais.
O Centro Social Filadélfia da cidade de Fortaleza, no Ceará, nasce junto à
Igreja no ano de 1985, para atender crianças e adolescentes com Pré-Escola e Ensino
Fundamental. Tem capacidade para atender 550 crianças/adolescentes e oferece
cursos de informática para os estudantes e a comunidade. Também no mesmo ano, é
implantada após a construção de salas para o atendimento junto à Igreja a
Associação Beneficente Batista Independente de Francisco Morato, SP. Atuando
com programas de Pré-Escola, atendia no ano de 1998, 50 crianças.
Além dessas instituições descritas acima, surgiram outras nas mais variadas
regiões do país. Porém, todas tinham o objetivo de ampliar a sua participação na
sociedade, buscando influenciá-la por meio do evangelho na construção de uma
sociedade melhor, pautada nos valores do Reino de Deus.
138
3.4. NOVA ABORDAGEM METODOLÓGICA DE INSERÇÃO PÚBLICA DA IGREJA: AS
PRÁTICAS SOCIAIS A PARTIR DA FUNDAÇÃO DA FEDERAÇÃO DAS ENTIDADES E
PROJETOS ASSISTENCIAIS
Após a ampliação nacional das práticas sociais da Igreja, por intermédio do
Departamento de Ação Social, ocorrem modificações significativas na inserção
pública da Igreja, com a atualização de acordo com as novas demandas sociais e das
políticas públicas.
Esta nova fase é marcada pela conscientização dos indivíduos pautada na
cidadania, a partir da “ (...) tomada do conhecimento de que somos sujeitos, fazemos
e refazemos o mundo, e temos um compromisso, uma responsabilidade, pelo que
existe e pelo que pode surgir”.
359
Este nível de conscientização cidadã em relação às
questões sociais é caracterizado pela: “1) Inserção crítica na história, 2) Uma posição
utópica frente ao mundo, 3) Não existir fora da práxis
360
e 4) Uma posição profética,
que denuncia e anuncia.
361
Desta forma, o fiel deve inserir-se em um processo
contínuo, que levará à transformação social e à construção de um mundo mais
humano pautado na justiça e na solidariedade.
Em uma pesquisa recente a respeito da ação social evangélica, realizada nas
regiões metropolitanas de Campinas, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, Conrado
afirma que a ação social é definida “em três categorias distintas para se referir à ação
359
Diretrizes Básicas para Ação Social: proposta de projeto. Departamento de Ação Social:
Campinas, 1984, p. 4.
360
Aqui a práxis é empregada como atividade humana crítica e reflexiva.
361
Idem, p. 8. Para que esta inserção gere transformação, de acordo com Schulz, precisa passar por
três níveis de conscientização social: 1) factual, 2) causal, 3) compromisso ou de responsabilidade,
SCHULZ, Almiro. Conscientização social. In: II Encontro de estudo e planejamento da FEPAS.
Campinas, 15 abr. 97, pp. 1-2.
139
social: 1) assistência social; 2) serviço social; 3) ação social.
362
O socorro
emergencial em situações de carência é compreendido como assistência social. Esse
tipo de prática não atua sobre as estruturas geradoras dos problemas sociais. O
serviço social é uma prática ligada a atividades de formação profissional e geração de
renda. Com o objetivo de reduzir e até eliminar as causas estruturais que “geram
desigualdade social e as mais profundas necessidades humanas”
363
, inclusive buscar
a justiça por meio de uma atuação política com vistas à transformação,-se a
compreensão de ação social.
As práticas sociais da Igreja devem ser amplas, na perspectiva de ultrapassar
o assistencialismo paternalista e clientelista, a partir de uma ação participativa e
educativa, privilegiando o indivíduo como o sujeito que contribui para a solução dos
problemas sociais, tornando-se cidadão.
A análise histórica, na perspectiva de ressignificação da fé no espaço público,
por meio do paradigma da cidadania, busca apontar caminhos para as práticas sociais
da Igreja, fundamentadas na práxis social como atividade que leva a transformação
do ser humano e da organização social.
A delimitação desta análise se dá a partir das práticas sociais da Igreja Batista
Independente no contexto brasileiro, em sua perspectiva ad extra, de inserção da
362
Neste sentido, afirma Conrado que, a particular “importância para este envolvimento dos
evangélicos em iniciativas sociais foi um contexto de acentuado interesse no tema da ética política,
da cidadania e da participação da sociedade na solução dos persistentes e agravantes problemas
sociais do país como a violência e a fome. O Movimento pela Ética na Política, a Campanha da
Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida, conhecida como Campanha do Betinho, e o
Movimento Viva Rio foram momentos de significativa participação das igrejas e dos evangélicos
em geral. A ressignificação das práticas tradicionais de ajuda, caridade e doações por parte da
Campanha deram um grande impulso para a formação de comitês e iniciativas locais por parte dos
evangélicos”, cf. CONRADO, Flávio César (coord), Ação social evangélica: projetos sociais das
regiões metropolitanas de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Campinas. Rio de Janeiro: ISER, 2005,
pp. 8 e 15.
363
Op. Cit., CONRADO, Flávio César, p. 8; LESSA, Hélcio da Silva, Ação Social Cristã. Rio de
Janeiro: Movimento Diretriz, 1966; Evangelização e Responsabilidade Social. SÉRIE
LAUSANNE. São Paulo/ Belo Horizonte: ABU Editora/Visão Mundial, 1982.
140
Igreja na sociedade, como práxis cristã orientada à transformação social. Essa
perspectiva de transformação abrange as práticas sociais da Igreja, como afirma
Nívea Falcão:
Semeemos nossa oferta de amor, participando na transformação de vidas,
como padrinhos e madrinhas. Onde estamos semeando? Qual será o
futuro destas crianças? Com a nossa ajuda, com certeza, o futuro será
melhor do que seria se permanecessem na marginalidade. Vamos
acompanhá-los?
364
Verifica-se uma chamada à participação e à cooperação dos fiéis neste projeto
de transformação. O Apadrinhamento Brasileiro (APB) é um dos instrumentos
catalizadores dessa proposta. Funciona a partir da adesão de pessoas que contribuem
financeiramente para manter crianças nas instituições ligadas às igrejas locais em
todo o país.
O projeto de APB é um dos protagonismos ligados à nova metodologia de
inserção pública da Igreja. Tem contribuído especialmente para o engajamento de
muitos fiéis que, no passado, contribuíam de forma esporádica como verificou-se
nos relatos do Lar Evangélico Betel e ainda, consegue a adesão de novos
contribuintes. Essa iniciativa de mobilização nacional em prol das crianças
brasileiras, contribui para a manutenção dos serviços voltados à criança e ao
adolescente. O APB tem demonstrado ser uma forma eficiente de captar recursos
financeiros, e também, tem sido capaz de fomentar novas práticas sociais que
extrapolam os locais onde esses recursos estão sendo empregados.
364
FALCÃO, Nívea. Apadrinhamento Brasileiro Comunica - ABC. Boletim n. 16, Ano 5, 1° trimestre
de 2006. FEPAS: Campinas, 2006. Medeiros apresenta o funcionamento do APB: “A pessoa
interessada em participar do programa, recebe informações sobre o programa (entidade/criança)
estabelecendo um vínculo através de um compromisso de contribuir mensalmente com o valor de
R$ 20,00 [e recebe informações] com foto de um grupo de crianças, para as quais está
contribuindo”, cf. MEDEIROS, Philemon. Projeto de Apadrinhamento Brasileiro: esclarecimento
do seu funcionamento no contexto social e financeiro da entidade. FEPAS: Campinas, 1998. Ver
ANEXO E Folder do Apadrinhamento Brasileiro.
141
Verifica-se que o engajamento por meio do APB, permeia a consciência do
fiel no sentido de promover e elevar o nível de conscientização e de
comprometimento em relação ao enfrentamento dos problemas sociais e a
transformação da sociedade, possibilitando algumas ações descentralizadas mais
próximas dos padrinhos contribuintes, favorecendo o seu compromisso com as
mudanças sociais na sua própria comunidade, contribuindo para a multiplicação de
esforços para erradicar o analfabetismo, a miséria e o desamparo da criança e do
adolescente no contexto local, regional e nacional.
365
Essa conscientização dá-se por meio de boletins informativos, que buscam
apresentar um pouco dos resultados dessas práticas sociais da Igreja. Para darmos um
exemplo, citamos o caso de um menino chamado Richard, que participou das
atividades da Associação Beneficente Direito de Ser, na cidade de Campinas, SP.
Ingressou na instituição com 10 anos de idade e, atualmente, é um dos monitores da
instituição, além de ter recebido prêmios municipais em reconhecimento do seu
talento nas artes, que foi potencializado a partir das atividades do projeto social, em
um dos bairros mais violentos na periferia de Campinas.
366
A partir de exemplos de
transformação da realidade das crianças ligadas às instituições, há uma resposta às
questões sociais locais e a valorização de práticas sociais fundamentadas em uma
ação transformadora, ou seja, uma práxis cristã.
Como vimos no capítulo anterior, com a implantação e o desenvolvimento da
Missão Batista Sueca no Brasil, verifica-se que havia uma relação de dependência
financeira das Igrejas brasileiras para com a Sociedade Missionária de Örebro. Um
365
Apesar do APB estar ligado diretamente à captação de recursos financeiros, não seria prudente
afirmar que o mesmo, é apenas mais uma prática assistencialista ou uma forma mais eficaz de
gestão para captar recursos. Antes, esta iniciativa tende a conscientizar o fiel no sentido de uma
inserção pública menos contemplativa e mais ativa, que por sua vez, insere-o como cidadão
consciente e multiplicador de práticas que tendem a transformação da realidade social local.
366
Ibidem.
142
dos principais problemas que enfrentavam as instituições dos primeiros dois
períodos, dizia respeito ao repasse de verbas que chegavam da Suécia. Por haver esta
intrínseca relação entre a missão evangelizadora e as práticas sociais, por muitas
vezes, os fundos serviam mais a um propósito do que a outro.
367
Esta situação
perdurou por muito tempo, porém, as mudanças em relação às regras dos
financiadores das atividades desenvolvidas no Brasil, provocaram um ajuste.
Por muito tempo, as práticas sociais da Igreja Batista Independente deram- se
com o financiamento do governo e das Igrejas da Suécia. É importante lembrar que
esta relação foi mantida, com a criação da FEPAS, que se constituiu como associação
civil de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter beneficente e educacional, que
reúne pessoas físicas e jurídicas envolvidas na área de assistência e promoção
social”.
368
Desta forma, a FEPAS é a ponte entre os recursos financeiros oriundos da
Suécia e da Igreja sueca por intermédio do Programa Pão para Irmãos e as
instituições ligadas à Igreja Batista Independente no contexto brasileiro.
Por outro lado, é preciso lembrar que, no decorrer da pesquisa, muitas
questões a respeito deste tema foram surgindo, no que se refere a esta fase de
desenvolvimento das práticas sociais da Igreja. Porém, contata-se que estas
informações existem apenas em forma de tradição oral, não estando documentadas
nem mesmo nas atas das reuniões. Isto não as torna menos importantes. São muitas
memórias e relatos, daqueles que estiveram direta e indiretamente ligados aos
367
Este conflito de interesses não é exclusividade da Igreja Batista Independente, antes, no processo
histórico de nacionalização das Igrejas das várias denominações protestantes, houve uma série de
conflitos de mando e desmando e, ainda, em relação a quem administraria melhor os recursos que
chegavam ao Brasil, por meio das agências de cooperações missionárias internacionais, ligadas aos
países de origem destas missões. Neste contexto, por muitas vezes houve a primazia da
evangelização em relação às práticas sociais. Este fato conduziu as lideranças da Igreja a um debate
que perdurou por vários anos e nem sempre foi possível encontrar o equilíbrio entre estas duas
tarefas. Para exemplificar este conflito e a relação de dependência das práticas sociais em relação à
evangelização, veja o ANEXO F Orçamento para 1978.
368
Op. Cit., SCHULZ, Almiro, p. 7.
143
conflitos de interesses econômicos das lideranças eclesiásticas. Neste sentido, é
digno de nota afirmar que, por muitas vezes, os documentos mais ocultam do que
revelam os conflitos e debates no interior da Igreja.
369
É importante salientar que a transição da gestão dos recursos financeiros do
centro administrativo da Igreja para a FEPAS, não se deu de forma natural e pacífica.
Antes, foi estabelecida a partir de debates acalorados e posicionamentos divergentes,
principalmente entre as lideranças dos setores da Igreja, que por muitas vezes como
em qualquer outro tipo de instituição , buscavam a manutenção do poder mantendo
o monopólio dos recursos financeiros e materiais em suas mãos.
Dos problemas de câmbio ao método de inserção pública, ocorreram impasses
no interior da Igreja. Por vezes, questionou-se o que se faria com uma possível e
real diferença de câmbio, da conversão de coroas suecas para dólar americano e,
posteriormente para moeda nacional que foram muitas, no decorrer deste período.
Em outros momentos, questionava-se o tipo de diálogo e de inserção pública da
Igreja, no tocante aos limites e possibilidades desta em realizar a sua tarefa,
mantendo-se doutrinariamente “pura” e não secularizada, possibilitando e
viabilizando parcerias com alguns grupos da sociedade e, por outro lado, delimitando
os tipos de parceiros que poderiam contribuir para o enfrentamento dos problemas
sociais no contexto local e brasileiro.
A partir desses apontamentos, verifica-se que os conflitos foram diversos. No
entanto, é notório que as instituições estatais, sociais e religiosas sempre convivem
com os conflitos em torno do poder e do dinheiro. É notório que no contexto
369
Depois de um período de institucionalização da Igreja, decidiu-se evitar que as controvérsias e
debates das reuniões e assembléias, fossem transcritos para as atas oficiais. Por esta razão,
passaram a ser transcritas apenas as decisões. Esta prática vai além do contexto Batista
Independente e, ainda, do contexto religioso. Parece óbvio, evitar quaisquer tipos de
constrangimentos e questionamentos futuros, em razão dos posicionamentos do passado.
144
brasileiro e mundial, o domínio dos recursos financeiros e materiais promovem e
sustentam o poder. Em relação à instituição objeto desta pesquisa, não foi diferente.
Por se caracterizar como uma federação que congrega várias ONGs, a FEPAS
busca estabelecer parcerias para desenvolver projetos de acordo com a sua missão
370
,
tais como:
a Convenção das Igrejas Batistas Independentes seu associado
mantenedor, Convenções Regionais, Igreja em nível local,
Entidades/Projetos Federados e juridicamente constituídas, InterAct uma
organização sueca com escritório para América Latina em Campinas,
Instituições congêneres como ONGs, pessoas físicas, órgãos Públicos e
Conselhos de acordo com a legislação Federal e Municipal.
371
As parcerias, obviamente, se relacionam com a viabilização do cumprimento
da sua missão como instituição cristã e sem fins lucrativos:
a promoção humana, a assistência e o bem estar social, contribuindo para
a prevenção e solução de problemas sociais, sem distinção de
nacionalidade, condição social, raça ou credo político religioso. Visa e se
identifica com a luta pela construção da cidadania e dignidade, como um
direito de todos.
372
Estes elementos são fundamentais para compreender a diferença existente
entre as práticas sociais que se desenvolveram no interior da Igreja Batista
Independente, antes e depois da fundação e desenvolvimento das mesmas, por
intermédio da equipe da FEPAS. Além disso, os elementos que relacionam as práticas
sociais com a promoção humana, a contribuição na solução de problemas sociais e a
identificação com a luta por uma cidadania plena, contribuem para a perspectiva da
práxis social.
Na missão da FEPAS existem elementos que aproximam as práticas sociais da
Igreja ao conceito da fé cidadã, ao afirmar que os seus princípios para execução da
missão são:
370
ANEXO G Missão da FEPAS.
371
Ibidem.
372
Ibidem.
145
a compaixão e o amor de Deus Revelado, pelo resgate e libertação
integral do homem; a manifestação e realização da espiritualidade na
dimensão do outro e em especial, em relação ao sofrido e a denúncia e o
anúncio integrados entre teoria e prática, como atitude profética.
373
Estes elementos coadunam com o compromisso da fé cidadã em anunciar
profeticamente o Reino do Shalom, na perspectiva de libertação integral do ser
humano, contribuindo para a verificação da práxis social da Igreja no interior das
práticas sociais da Igreja Batista Independente.
Conjuntamente a este movimento de mobilização e conscientização da
terceira fase de desenvolvimento das práticas sociais da Igreja, ocorreu a implantação
de um projeto chamado Informação, com características altamente reflexivas e
críticas em relação à inserção pública da Igreja. Seus objetivos eram: 1) viabilizar a
formação de recursos humanos e matérias para apoiar projetos e instituições sociais
ligadas à Igreja; 2) oportunizar a supervisão e orientação dos projetos e instituições
sócias ligadas à Igreja; 3) promover a orientação e a conscientização nas
comunidades; 4) integrar a atividade social e a Igreja local e 5) produzir material
formativo e informativo.
374
Esse projeto dinamizou toda a estrutura de atuação das
práticas sociais da Igreja, e constituiu uma base sólida para o desenvolvimento social
no interior da Igreja Batista Independente, que repercutiu na criação de 35 projetos e
instituições em todo o país, entre os anos de 1987 e 1992.
Durante os 10 anos de desenvolvimento do Projeto Informação, houve uma
grande produção a respeito da inserção pública da Igreja por meio das práticas
sociais. De acordo com o levantamento realizado junto aos arquivos do periódico
mensal Luz nas Trevas, foram publicados mais de 50 artigos, que abordavam os mais
variados temas a respeito da relação entre a Igreja e a sociedade. Esses artigos
373
Ibid., p. 8.
374
FEPAS. Projeto informação. Campinas, 1992, p. 1.
146
contribuíram para a conscientização e a formação crítica dos fiéis a respeito das
práticas sociais da Igreja.
375
Um outro elemento significativo para as práticas sociais da Igreja diz respeito
à orientação teológica da Missão Integral, que contribuiu para a “conformação de
concepções e práticas de ação social”
376
diante das questões sociais. O Congresso
Internacional de Evangelização Mundial, realizado na cidade de Lausanne, Suíça, foi
uma alternativa ao movimento ecumênico do Conselho Mundial de Igrejas, o qual
abriu diálogo com a Igreja Católica, coisa inadmissível para grande parte dos
protestantes.
Nesse terceiro período de desenvolvimento das práticas sociais da Igreja
Batista Independente, ocorre uma ampla atenção às crianças e aos adolescentes,
gerando novas inserções da Igreja, com a abertura de creches, pré-escolas, escolas e
projetos ligados à capacitação profissional e ao desenvolvimento local.
377
Vejamos
375
Alguns temas publicados foram: a Conscientização Social (1987), A Igreja Evangélica e a sua
consciência social (1988), Fundamentos para a Ação Social da Igreja (1988), Atuação Social da
Igreja em Favela (1989), Criança de Rua: miséria que desafia a igreja (1991), Igreja de Cristo e
Miséria Urbana (1991), Direitos Humanos I (1996) e Indivíduo e/ou Sociedade (1997).
Infelizmente, não será possível aprofundarmos o conteúdo destas publicações em razão da
delimitação desta pesquisa.
376
Op. Cit., CONRADO, Flávio César, p. 14. Para compreender melhor a visão da Missão Integral,
verificar a Série Lausanne que são Relatórios sobre consulta sobre evangelização de cristãos
nominais entre católicos e protestantes realizada em Pattaya, Tailândia, de 16 a 27 jun. 1980:
Evangelização e responsabilidade social (1982); Chamam-se cristãos: a evangelização dos povos
tradicionalmente cristãos (1984); O evangelho e o homem secularizado (1985); Testemunho
cristão entre os muçulmanos (1984); Tive fome: um desafio a ser a Deus no mundo (1984);
Evangelho e cultura; e ainda, um comentário a respeito do documento conhecido como “Pacto de
Lausanne”, STOTT, John R. S. Exposição do Pacto de Lausanne. São Paulo/Belo Horizonte: ABU
Editora e Visão Mundial, 1984.
377
Apresentamos quatro áreas prioritárias de enfrentamento dos problemas sociais: 1) crianças e
adolescentes, 2) atendimento comunitário, 3) terceira idade, e 4) projetos especiais, as quais estão
alinhadas a linha de atuação do Conselho Nacional de Assistência Social CNAS do governo
federal brasileiro. A adequação às áreas consideradas prioritárias pelo governo brasileiro, favorece
as instituições que buscam recursos do governo, estabelecendo parcerias importantes com o próprio
Estado nos níveis municipal, estadual e nacional. O CNAS “é um órgão deliberativo criado pela Lei
Orgânica de Assistência Social - LOAS (Lei n. 8.742, de 1993), vinculado ao Ministério da
Assistência e Promoção Social, que possui, dentre suas atribuições legais, a competência para
conceder Registro e Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (também conhecido
como Certificado de Filantropia ou CEAS).”, cf. CONSELHO NACIONAL DE ASSISTÊNCIA
147
apenas, alguns exemplos desta nova perspectiva de atuação da Igreja no espaço
público, que foram selecionados das fontes primárias, a partir do seu grau de
relevância no contexto global e local.
Uma experiência importante de prática social educacional ocorreu na região
Norte do Brasil, por onde se expandiu também a Igreja Batista Independente. No ano
de 1989, foi implantado o Centro Educacional Batista Independente de Altamira, PA,
destinado ao atendimento de crianças de a 0 a 3 anos de idade. Esta creche conta com
o apoio do programa APB. Altamira é uma das cidades mais importantes da região,
com acesso pelo Rio Xingu, pela estrada Transamazônica e também por um
aeroporto.
No ano de 1998, estava em fase de implantação um projeto escola para o
Ensino Fundamental e, atualmente, oferece serviços à comunidade de Altamira em
convênio com o governo municipal, com: Educação Infantil por meio de Creche e
Pré-Escola e Ensino Fundamental. É importante verificar que a parceria com o
governo local promoveu a ampliação dos atendimentos na instituição. O número de
atendimentos era de 65 em 2001, passando para 743 no ano de 2006.
378
O Centro Educacional Batista Independente de Altamira é uma referência na
prestação de serviços educacionais para a comunidade local. Por meio desta
instituição, a Igreja local tem se inserido no espaço público, com a intenção de
promover a inclusão social e construir uma sociedade mais justa, educando para a
cidadania.
Outra experiência vem de uma instituição implantada entre os anos de 1989 e
1991, com a missão de prover água, realizar atividades sócio-educativas e de
SOCIAL. Balanço da filantropia no Brasil. Disponível em
www.assistenciasocial.gov.br/iframe/cnas/cnas.htm. Acesso em: 10 mar. 2004.
378
Op. Cit., F. FILHO, Almir de Oliveira, p. 3.
148
organização comunitária é o Projeto de Desenvolvimento Comunitário de Cafarnaum
e Molungú do Morro, BA. Com este projeto foram perfurados 36 poços artesianos
distribuídos entre 42 comunidades dos dois Municípios, e organizadas 11
Associações Comunitárias a partir da formação de agentes de saúde.
379
Também o Centro Social Evangélico Noemí de São José do Egito, PE, que
inicia suas atividades no ano de 1994, está voltado ao atendimento de crianças e
adolescentes, e também à Assistência Emergencial. Atuou entre os anos 1994 e 1996,
com projeto de desenvolvimento comunitário. O programa visou provisão de água
para os povoados, perfuração de 12 poços artesianos e de 92 poços amazonas,
atividades sócio-educativas e de organização comunitária. No decorrer do projeto,
houve a ampliação para um programa de Geração de Emprego e Renda
Complementar.
380
Os projetos de desenvolvimento comunitário trazem, em seu bojo de atuação,
dois problemas fundamentais relacionados ao enfrentamento das situações de
pobreza. O primeiro diz respeito à própria região e clima, que é a carência de água
potável para a própria sobrevivência. O segundo diz respeito ao analfabetismo que
assola grande parte da população daquela região. Esse tipo de projeto é de
fundamental importância para que se criem condições materiais para o
desenvolvimento local sustentável.
Sem infra-estrutura necessária acompanhada de educação, as possibilidades
de organização comunitária em torno dos interesses comuns e da reivindicação do
exercício da cidadania, diminuem muito e tornam-se ineficazes. Esta perspectiva de
inserção pública da Igreja precisa comportar, necessariamente, como afirma Castro,
379
Op. Cit., SCHULZ, Almiro, p. 24.
380
Ibid., p. 20.
149
um movimento dinâmico de aprendizagem de sensibilização, conscientização,
motivação e capacitação do sujeito cidadão.
381
Na perspectiva de criar condições favoráveis para o desenvolvimento da
criança e do adolescente, nasce na região do rio São Francisco a Associação Bom
Samaritano, na cidade de Barra de São Francisco, ES. O início das atividades se deu
no ano de 1989, para atender crianças e adolescentes do sexo feminino, com o
programa de Casa Abrigo. Em 1998, atendia 60 crianças e adolescentes com Núcleo
de Apoio Escolar e oficinas de iniciação à profissionalização e de atividades
culturais.
382
Atualmente, continua com esses projetos e atende 146 crianças e
adolescentes.
383
Criado para atuar especificamente no contexto local, o Centro de Ação Social
e Desenvolvimento Comunitário de Cachoeira, BA, foi fundado em 1991. O centro
iniciou suas atividades oferecendo dois programas: um voltado para o socorro
emergencial da comunidade, e outro como Núcleo de Apoio Escolar. Ficou inativo
por alguns anos, mas reiniciou suas atividades com a aquisição de um terreno onde
edificou sua sede própria, para continuar o atendimento de crianças e adolescentes,
com programa de Educação Infantil, Pré-Escola, Ensino Fundamental até a 4ª série e
aulas de Informática.
384
O Centro de Ação Social e Desenvolvimento Comunitário de Cachoeira, entre
os anos de 2001 a 2005, atendeu em média 436 crianças e adolescentes, no entanto, o
número de atendimento caiu para as atuais 264 crianças e adolescentes.
385
Apesar
381
Op. Cit., CASTRO, Clovis Pinto de, p. 112.
382
Op. Cit. SCHULZ, Almiro, p. 25.
383
Op. Cit., F. FILHO, Almir de Oliveira, p. 5.
384
Op. Cit. SILVA, Cristiane Aparecida, p. 4.
385
Op. Cit. F. FILHO, Almir de Oliveira, p. 13; Op. Cit. SCHULZ, Almiro, p. 23.
150
desta redução considerável nos atendimentos e dos problemas enfrentados pela
instituição, seus serviços são de referência no atendimento educacional no município
de Cachoeira na Bahia.
Diante das demandas sociais de uma Igreja localizada na periferia de São
Paulo, capital, a Igreja Batista Independente de Patriarca implantou, em 1991, a
Associação Beneficente Filadélfia de Patriarca, SP. Na tentativa de responder a estas
demandas, a Igreja adaptou seu espaço físico e, com os recursos da instituição,
adquiriu um outro espaço para viabilizar o seu programa de Casa Abrigo. Após a
experiência com uma cooperativa para a comunidade, hoje desenvolve um programa
voltado para crianças e adolescentes e para o desenvolvimento comunitário. Mantém
uma Casa Abrigo, Educação Infantil: Creche e Pré-Escola, Núcleo de Apoio Escolar,
oficinas de iniciação à profissionalização e Terceira Idade.
386
Plantada no “Berço da cultura paraibana”, a cidade de Cajazeiras está
“encravada no alto sertão da Paraíba (...) região semi-árida e polígono das secas
nordestinas”
387
; com a proposta de oferecer atendimento às crianças desta
localidade, foi implantado no ano de 1992, o Centro Social Evangélico Débora. Mais
um projeto que foi alocado junto ao espaço físico da Igreja.
Esta instituição tem como missão “educar crianças, jovens e adolescentes nos
princípios da ética e da fé cristã, preparando-os para uma sociedade melhor e mais
justa
388
. Pautada na sua missão, que explicita seu compromisso com o evangelho e
com a construção de uma sociedade mais justa por meio da educação, essa instituição
desenvolve suas práticas sociais perseguindo tal meta, a partir da sua atuação na
386
Op. Cit. Cristiane Aparecida, p. 10.
387
FALCÃO, Nívea. Apadrinhamento Brasileiro Comunica - ABC. Boletim n. 14, Ano 4, 2° trimestre
de 2005. Federação das Entidades e Projetos Assistenciais: Campinas, 2005.
388
Ibidem.
151
comunidade local. Com o passar do tempo, ocorreram melhorias no seu espaço
físico, para atender melhor as 50 crianças com o programa de Educação Infantil, Pré-
Escola e Complemento Nutricional.
389
Porém, houve uma diminuição no
atendimento entre os anos de 2001 a 2006 e, apesar de contar com o financiamento
do APB, a instituição atendeu no último ano apenas 25 crianças.
390
Entre os anos de 1992 e 1994, o Projeto Berseba de Juarez Távora, PB, atuou
vinculado à Sociedade Beneficente de Campina Grande, sob a bandeira do
desenvolvimento comunitário. Este projeto consistiu na melhoria e provisão de água,
por intermédio de uma adutora, além da organização comunitária e de atividades
sócio-educativas e saúde preventiva.
391
Outra instituição voltada para as práticas sociais ligadas ao trabalho
comunitário foi o Centro Social Canaã de Bayeux, PB. Fundado em 1992, junto a
uma comunidade de pescadores, visa atender, em especial, as mulheres e seus filhos,
com o curso de corte e costura e o Núcleo de Apoio Escolar. Atualmente, está
edificando seu espaço físico junto à Igreja e oferece, além dos serviços citados,
cursos de manicura e artesanato. Também atende cerca de 20 crianças, que recebem
“(...) iniciação à alfabetização, reforço escolar, ensino religioso”.
392
De acordo com
os objetivos do Centro Social Canaã, a instituição quer “investir na criança de hoje
para mudar sua realidade futura e, na família, para mudar o quadro social atual”, e
ainda, “reduzir o risco pessoal e social das crianças assistidas; dar às famílias
389
Op. Cit. Cristiane Aparecida, p. 7.
390
Op. Cit. F. FILHO, Almir de Oliveira, p. 15.
391
Op. Cit. SCHULZ, Almiro, p. 19.
392
FALCÃO, Nívea. Apadrinhamento Brasileiro Comunica - ABC. Boletim n. 15, Ano 4, 3° trimestre
de 2005. Federação das Entidades e Projetos Assistenciais: Campinas, 2005.
152
condições de melhorar a renda familiar, através dos cursos ministrados; desenvolver
outras atividades junto à população, com medidas sócio-educativas.
393
Na região das grandes festas típicas, do turismo, da indústria e da
agroindústria, no norte do Estado de Santa Catarina foi fundada a Sociedade
Beneficente Arnold Hadlich de Blumenau. Este projeto teve início com a construção
de um prédio em 1993, para atender crianças e adolescentes. Com a conclusão das
obras e o espaço físico pronto, deram início às atividades em 1997. Atualmente, é
mantida a creche com capacidade para 100 crianças, com espaço para ampliação de
outros programas e atendimento atual de 89 crianças.
394
Essa instituição nasceu em um bairro operário de Blumenau, que
posteriormente desenvolveu-se. Hoje, o bairro possui ótima infra-estrutura, houve
melhoria nas condições de vida da população, além do crescimento da renda dos
moradores dessa comunidade.
Por esta razão, a direção da creche iniciou a cobrança do serviço que antes
oferecia gratuitamente à população, com a intenção de continuar servindo a parcela
da comunidade mais carente. Segundo a direção da creche, aqueles que podem pagar
devem contribuir com aqueles que não podem pagar, mas que também precisam do
serviço da creche. Parece-nos que esta decisão constitui uma das formas de aplicação
do princípio de justiça social.
393
Ibidem. Ver também o ANEXO H Distribuição das instituições no território nacional.
394
Op. Cit. F. FILHO, Almir de Oliveira, p. 10.
153
3.5. A PRÁXIS SOCIAL DA IGREJA E O EXERCÍCIO DA FÉ CIDADÃ NA CONSTRUÇÃO DE
UM MUNDO ONDE CAIBAM TODOS: A DINÂMICA ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO
Durante todo o capítulo buscamos descrever criticamente os caminhos
percorridos na inserção pública da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro,
por intermédio das práticas sociais. Expusemos a inter-relação do tema em relação às
mudanças no associativismo popular com o advento das ONGs e o Terceiro Setor, e
suas inconsistências em relação ao enfrentamento dos problemas sociais gerados pelo
mercado que, por outro lado, é um dos principais investidores das ONGs.
Por meio da análise documental das práticas sociais da Igreja, verificamos
que algumas destas práticas se caracterizam como ação de transformação social e,
por esta razão, podemos defini-las como práxis social da Igreja. Esta característica
das práticas sociais da Igreja contribui para a compreensão positiva do mundo como
local construído no espaço público, pelo exercício da fé cidadã.
Tendo como subsídio a descrição crítica das práticas sociais da Igreja Batista
Independente, buscaremos verificar nossa hipótese, analisando as práticas sociais da
Igreja em relação ao conteúdo do Reino de Deus, na perspectiva do shalom, que
resulta da prática da justiça e restauração do mundo que foi criado e sustentado por
Deus. Além disso, procuraremos verificar em que medida essas práticas
proporcionam o exercício da fé cidadã.
Esta perspectiva de análise quer apresentar a contribuição da práxis social da
Igreja para o exercício da fé cidadã, na construção de um mundo onde caibam todos.
Compreendemos que o mundo atual não é imutável, ao contrário, a estrutura social,
política, cultural e religiosa é estrutura mutável, e sua transformação pode ser
154
conseguida por meio da atividade humana, caracterizada neste trabalho como práxis
social.
Na construção social desse novo mundo onde atuam interesses públicos e
privados, a práxis social precisa se fundamentar no conteúdo do Reino de Deus,
contribuindo para a superação do simples interesse privado do cidadão, para uma
preocupação com as questões ligadas a coletividade, o bem comum, a dignidade
humana, a construção popular do poder político e o exercício da cidadania.
Esta dinâmica do público e privado apresentado anteriormente nas relações
entre o Estado, mercado e Terceiro Setor revela-se na práxis social da Igreja Batista
Independente, quando consideramos que muitos recursos alocados no enfrentamento
das questões sociais advêm de setores da sociedade civil, do Estado e da própria
Igreja. Por um lado, há os recursos privados dos fiéis, que contribuem de várias
formas com a manutenção das instituições sociais; por outro lado, há os recursos
públicos que financiam a práxis social da Igreja, por meio das parcerias
público/privadas, entre o Estado e a instituição, como vimos anteriormente.
Na compreensão das suas linhas de atuação definidas no plano trienal de 1998
a 2001, a FEPAS, que é a responsável pela articulação das instituições ligadas às
Igrejas locais, focalizou sua atuação em seis níveis: 1) assessoria aos projetos e
entidades; 2) capacitação, formação e auxílio na gestão; 3) assessoria a comunidades
e movimentos populares; 4) potencialização de ações sociais na igreja; 5)
participação nos espaços organizados da sociedade civil e 6) implementação e
consolidação de parcerias.
395
395
Op. Cit. SCHULZ, Almiro, pp. 10-12. Neste período foram definidas quatro áreas preferenciais de
ação das instituições ligadas a Igreja: 1) Crianças e adolescentes; 2) Projetos de atendimento as
comunidades; 3) Terceira Idade e 4) Projetos especiais: bolsas de estudo, socorro emergencial e
apadrinhamento brasileiro. Estas áreas prioritárias vigoraram até o ano de 2006, quando no
155
Percebe-se que é uma federação que persegue metas e resultados na sua
atuação social e, por ser uma instituição ligada à Igreja, procura desenvolver suas
atividades mobilizando esforços dentro da própria instituição religiosa. Por meio de
assessoria, busca estabelecer redes que comportem seus projetos e sejam
suficientemente arrojadas, para construir outras parcerias na sociedade civil.
Portanto, a partir da descrição das atividades das instituições ligadas às
Igrejas locais, que possuem uma característica de práxis social, passamos a
apresentar três níveis fundamentais de práxis social que contribuem para o exercício
da fé cidadã na esfera pública da Igreja.
3.5.1. Práxis Educacional para a formação do sujeito cidadão
No desenvolvimento de uma práxis social voltada para a formação crítica do
sujeito cidadão, verifica-se que há uma perspectiva de ação transformadora no
interior das instituições ligadas à Igreja Batista Independente. Essas atividades
orientadas à formação cidadã, estão focadas nas diretrizes do Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA)
396
que, por sua vez, as fundamenta teórica e juridicamente,
além do marco legal, no qual a meta das instituições é oferecer o melhor atendimento
à criança e ao adolescente, na perspectiva de uma práxis educacional.
A Constituição Federal, no artigo 227, responsabiliza a família, a sociedade e
o Estado, afirmando que estes devem
Congresso de Ação Social do mesmo ano, foi divulgada a nova divisão das áreas, que para o
próximo triênio, passam a ser três níveis de desenvolvimento social local. Cf. CONGRESSO DE
AÇÃO SOCIAL - Redes Sociais uma nova estratégia para o desenvolvimento. Araçariguama, 28
nov. a 2 dez. 2006.
396
Estatuto da criança e do adolescente, de acordo com a Lei n. 8.069, de 13 jul. 1990, cf.
Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 17ª Ed.
São Paulo: Saraiva, 1997, p. 115.
156
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
397
Este aspecto da lei engloba o compromisso e a responsabilidade das
instituições da sociedade civil, no oferecimento de condições favoráveis para o
desenvolvimento da criança e do adolescente, no sentido de promover a formação do
cidadão.
Uma das instituições que contribuem com a práxis educacional da Igreja é a
Creche Batista Independente de Altamira, PA, que atende 59 crianças em seu
programa de Educação Infantil, que participam do programa de apadrinhamento
sueco.
398
Esta instituição desenvolve atividades educacionais desde a creche até o
curso médio, e destaca-se pela qualidade dos serviços prestados à população e pelas
parcerias públicas. Em 2001, realizava 65 atendimentos, passando para 743
atendimentos entre crianças e adolescentes no ano de 2006. Essa instituição é uma
referência educacional na cidade de Altamira, além de contribuir para o
desenvolvimento comunitário por meio de programas educacionais.
A parceria municipal foi celebrada em 2004 e resultou na ampliação dos
atendimentos. A instituição educacional ligada à Igreja Batista Independente em
Altamira demonstra sua presença marcante no espaço público e, como resultado
dessa articulação, consegue realizar a parceria com o governo local e desenvolver sua
práxis educacional ampliando os serviços à população do município.
399
397
Artigo 227 Da família, da criança, do adolescente e do idoso. In: Constituição da República
Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 17ª Ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p.
116.
398
ANEXO I Folder do Apadrinhamento Sueco “Pão para Irmãos”.
399
Ainda fazem parte do Núcleo de Educação Infantil, oferecendo serviços de creche: a Creche
Arnold Hadlich ligada Sociedade Beneficente Arnold Hadlich de Blumenau, SC, a Creche
Cantinho do Amor ligada ao Departamento de Assistência Social da Igreja Batista Independente de
157
Por outro lado, a municipalização do Centro Educacional Batista
Independente traz consigo novos desafios no tocante à inserção pública da Igreja. Ao
mesmo tempo em que a escola amplia o seu atendimento à população em parceria
com o governo municipal, é importante lembrar que as novas leis a respeito da
municipalização da educação, faz com que as prefeituras se comprometam mais com
a construção de escolas, a fim de ampliar, cada vez mais, o atendimento à população,
justamente porque o repasse de verba ocorrerá de acordo com a quantidade de
atendimentos.
Por esta razão, a cidade de Altamira caminha na construção de duas escolas
públicas, que ocasionará o fim da parceria com o Centro Educacional Batista
Independente, e ainda, com a transferência dos alunos para essas escolas. Por um
lado, isto representa a missão cumprida da Igreja, no que se refere a promover o
acesso à educação pública, onde suas ações construíram tal parceria. Por outro lado,
há uma necessidade urgente da instituição repensar a sua forma de intervenção
social, já que nesse processo de municipalização certamente acarretará em uma
escassez de recursos financeiros para manter a escola e o esvaziamento das salas de
aula em razão das transferências. Além do mais, parece-nos claro que as instituições
ligadas ao enfrentamento dos problemas sociais precisam trabalhar arduamente, para
que a sua mobilização e articulação política contribua, em definitivo, com o acesso
aos direitos fundamentais do cidadão, em especial aos empobrecidos. Este processo
exige militância constante junto aos cidadãos no tocante à conscientização dos seus
direitos e deveres, mobilizando os esforços em torno de interesses comuns, na busca
da efetivação dos mesmos no espaço público e democrático.
Telêmaco Borba/PR, a Creche John Ongman da Sociedade Beneficente Evangélica de Frederico
Westphalen/RS e a Creche Batista Independente da Associação Batista Independente Calvário de
Cruz das Almas/BA. Op. Cit., SCHULZ, Almiro, pp. 11-13.
158
Este fenômeno é importante para compreendermos que as ONGs, além de
serem instituições que atuam no limite de atuação do Estado, onde existem muitas
carências econômicas, sociais e culturais, também precisam estar na vanguarda das
práticas sociais, oferecendo serviços relevantes para as comunidades locais.
É de fundamental importância concentrar esforços no que se refere à
formação do cidadão crítico, consciente e ativo na sociedade, ampliando as práticas
cidadãs e políticas no espaço público ou, em outras palavras, educar para elevar o
nível de consciência do cidadão comum, para que este atue como sujeito histórico no
contexto social contemporâneo.
Com a parceria da FEPAS e uma grande rede de cooperação social
400
, a
Associação Beneficente Direito de Ser de Campinas, SP, além de atender 75 crianças
de 7 a 14 anos na periferia de Campinas, no Bairro São Marcos considerado um
dos mais violentos do município –, tem desenvolvido atividades junto a 95 famílias
no bairro e arredores.
Esta instituição nasce com um grande desafio e ousadia: servir de modelo de
intervenção social no município e, também, para as outras instituições ligadas à
FEPAS. Fundada na década de 90, atualmente desenvolve atividades que colocaram a
instituição como protagonista de práticas sociais de referência que,
tem participado da construção e na definição da política pública para o
municipal para o atendimento de crianças e adolescentes, o programa com
famílias que é tido como referência e a construção do Sistema de
Gerenciamento de Sistemas Sociais (SGPS), tecnologia social
400
Na rede de convênios e financiadores das atividades da instituição participam além da FEPAS, a
Federação das Entidades Assistenciais de Campinas (FEAC); a instituição possui Certificado de
Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS); o Certificado de Entidade Beneficente de
Assistência Social (CEBAS); o Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
(FMDCA); Estes convênios favorecem a captação de recursos para a instituição, que recebe um co-
financiamento com a Secretaria Municipal de Cidadania, Trabalho, Assistência e Inclusão Social
(SMCTAIS), com FEPAS e da FEAC, do FMDCA (1% e 6% do IR), recursos de empresas e doações de
sócios contribuintes (pessoa física).
159
desenvolvida pela instituição com apoio da FEPAS que está sendo
utilizado por 40 entidades.
401
Em virtude deste protagonismo social do Direito de Ser, suas ações têm se
multiplicado por meio de outras instituições, como se verifica com o programa de
tecnologia social desenvolvida pela instituição.
O Centro Social Filadélfia de Fortaleza, CE, é outra instituição que tem
oferecido à comunidade do Bairro Parque Dois Irmãos, curso de iniciação à
profissionalização, atendendo, entre os anos de 2001-2006, cerca de 440 pessoas. No
total das suas práticas sociais, atuando conjuntamente com o governo municipal e a
Compassion, desenvolve atividades de Educação Infantil, Ensino Fundamental,
Núcleo de Apoio Escolar, Educação de Jovens e Adultos e mutirão para a construção
de casas.
402
Uma última instituição voltada a práticas sociais, tendo como alvo crianças e
adolescentes, está no centro de um debate contemporâneo relacionado à inclusão
social de portadores de necessidades especiais, regulamentado por lei federal.
403
O
contexto batista independente atual possui uma instituição voltada a esse público
específico, o Centro Social Ebenézer de Bayeux, PB.
Desenvolvendo suas práticas sociais ligadas à igreja local, a instituição tem
como parceiros a Compassion, a Prefeitura Municipal e a Secretaria de Assistência
Social, e está localizada na região metropolitana de Fortaleza, com cerca de 90 mil
habitantes, atuando principalmente na área da educação infantil, Ensino
401
F. FILHO, Almir de Oliveira. Relatório de Atividades: exercício de 2005. FEPAS: Campinas,
2005, p. 4.
402
Também desenvolvem atividades de iniciação profissional o Centro Social Bálsamo de Fortaleza,
CE, a Associação Beneficente o Bom Samaritano da Barra de São Francisco, ES, a Associação
Beneficente Filadélfia de Patriarca, SP, o Centro Social Batista Independente de Maceió, AL e o
Centro Social Betel de Maceió, AL.
403
Lei Federal nº 7.853, de 24 de outubro de 1989. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/LEIS/L7853.htm.
160
Fundamental, Ensino Médio e Educação Especial, com um total de 1140
atendimentos no ano de 2006, dos quais 102 foram dirigidos à portadores de
necessidades especiais (surdez, física, mental leve, autismo).
Com o intuito de contribuir para a melhor inclusão destas crianças, é
oferecido pelo governo municipal curso de libras para as famílias, sendo que o
espaço físico é adaptado para facilitar o acesso, e ainda, o estudante portador de
necessidades especiais participa das aulas juntamente com os outros alunos. Este tipo
de práxis social é referência em toda a região Nordeste.
404
3.5.2. Desenvolvimento sustentável e poder local como
alternativas democráticas para o desenvolvimento humano
Um dos temas mais discutidos na atualidade diz respeito ao desenvolvimento
sustentável, que está intimamente ligado à manutenção da vida no planeta,
procurando formas diferenciadas de manejo do meio ambiente, para que o ser
humano possa extrair da natureza sem destruí-la os elementos para a manutenção
da vida.
muitos teóricos e militantes ligados a esta temática. Ambientalistas,
líderes comunitários, população indígena, religiosos, políticos, etc, têm debatido se
essa não seria a alternativa para equacionar o déficit na distribuição de renda e
desenvolvimento humano, decorrente do modelo atual de mercado global.
404
F. FILHO, Almir de Oliveira. Relatório Social do Centro Social Ebenezer. FEPAS: Campinas,
2005, p. 3.
161
Diante de tal modelo é fundamental e urgente construir uma ponte que seja
uma alternativa ao desenvolvimento neoliberal, contrapondo o ponto de vista da
cultura dominante, com o papel dos/as oprimidos/as, tomados/as como sujeitos, e um
povo que “se alça para a consciência e a dignidade de sujeito histórico”
405
. Esta
escolha não é apenas eticamente mais justa, de acordo com Girardi, mas é também a
“culturalmente mais válida e fecunda”
406
, por serem eles os maiores interessados em
desmascarar as mentiras que “acobertam a violência do sistema”, e fazer com que
triunfe a verdade na construção de um mundo melhor.
Isto significa reconhecer a capacidade moral, intelectual e política dos
indivíduos para exercerem os seus direitos. Esta é uma opção participativa e
libertadora, nas palavras de Girardi: “o ponto de vista do oprimido chega a ser
alternativo, quando ele se dá conta de sua condição e de seu caráter injusto, toma
consciência de seus direitos e capacidades, se mobiliza e organiza em busca de
alternativas”.
407
Nesse processo da construção de alternativas ao modelo neoliberal, as
mulheres têm seu papel valorizado, em razão do seu protagonismo que se impõe
“como fundamental para a elaboração e realização de um projeto de alternativa não
violenta”.
408
Qualquer alternativa para um mundo diferente do atual, refundado na
405
Op. Cit., GIRARDI, Giulio, p. 96. Sobre o desenvolvimento sustentável ver também SCHULZ,
Almiro. Desenvolvimento comunitário referencial/fundamentação teórica. In: II Congresso
Brasileiro de Missões modelos missionários brasileiros para o século XXI, 9 a 13 de nov. 1998,
pp. 148-154; ASHOKA Empreendedores Sociais e Mckinsey & Company, Inc. Empreendimentos
sociais sustentáveis: como elaborar planos de negócio para organizações sociais. São Paulo:
Peirópolis, 2001; MINISTÉRIO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME.
Disponível em www.desenvolvimentosocial.gov.br.
406
Ibidem.
407
Ibid., p. 97.
408
Ibid., p. 97.
162
esperança e na solidariedade, indiscutivelmente precisa buscar construir uma nova
sociedade pautada na não-violência.
Para Girardi, verifica-se que existem protagonismos alternativos nas áreas
periféricas do sistema neoliberal, que se destacam na luta pela sobrevivência,
experimentando, inovando e animando uma economia informal, na busca de uma
economia com o mercado, mais solidária, uma economia de comunhão.
409
Um dos aspectos fundamentais de um projeto de desenvolvimento local
sustentável é uma estrutura econômica, política e de poder descentralizados, para que
possam multiplicar-se as iniciativas locais e a participação popular. As estruturas
descentralizadas contribuem para a distribuição do poder, constituindo-se em poderes
locais, compartilhado e não centralizado, o que possibilita que setores populares mais
amplos possam apropriar-se do poder, utilizando esses espaços e transformando-os
em espaços de autonomia e de contra poder político, econômico e social.
Buscar alternativas democráticas, que possibilitem a participação e a tomada
de decisões pelo cidadão para construir uma sociedade nova, a partir da criação de
espaços de autonomia e de contra poder popular é, sem dúvida, um grande desafio
para as instituições ligadas à Igreja, como também para as ONGs, que atuem nesta
área do desenvolvimento sustentável, não em uma perspectiva reacionária, não
crítica como sustentáculo do neoliberalismo, como afirma Montaño, mas em
perspectiva de participação cidadã, democrática e solidária. É possível verificar essa
preocupação presente, na realização do II Encontro de Estudo e Planejamento da
FEPAS:
409
Lembramos aqui, o movimento Fokolar, surgido na Itália e disseminado por seu modelo de
economia de comunhão em todo mundo, em especial no Brasil. Ver LUBICH, Chiara. Economia
de Comunhão - história e profecia. Editora Cidade Nova, 2004; PINTO, Mario Couto Soares.
Economia de comunhão empresas para um capitalismo transformado. Ed. FGV: São Paulo, 2006.
163
A participação solidária, a comunicação e a responsabilidade conjunta é
que anima uma comunidade na luta pela superação de seus problemas
fundamentais. Não adianta somente trazermos respostas “pré-fabricadas”,
mas sim elaborar respostas junto com a comunidade.
410
Este desafio é uma constante desde o início da terceira fase de desenvolvimento das
práticas sociais da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro.
Vale lembrar que “o desenvolvimento sustentável é parte de todo um projeto
de civilização alternativa, fundada no direito da autoderminação solidária dos povos,
em contraposição à civilização fundada no direito do livre mercado”.
411
A proposta de um projeto alternativo popular é um processo que deve ser
orientado à inversão de uma tendência histórica, o que exige uma práxis social em
uma perspectiva estratégica, que esteja voltada à promoção de mudanças estruturais,
articulada com o exercício da cidadania no espaço público plural. É um processo que
não pressupõe um modelo acabado de sociedade, mas que pretende construí-la de
forma participativa, ou seja, uma alternativa que corresponda às aspirações das
maiorias populares.
3.5.3. A práxis social na formação das redes de cooperação:
compartilhar experiências com as novas gerações
Este conceito tem sido utilizado a partir da compreensão da expressão latina
retis, como um “entrelaçamento de fios com aberturas regulares que formam uma
espécie de tecido... malha e estrutura reticulada, a palavra rede foi ganhando novos
410
Responsabilidade Social. In: II Encontro de estudo e planejamento da FEPAS. Campinas, 15 abr.
97.
411
Ibid., p. 127.
164
significados ao longo dos tempos”.
412
É um conceito que tem sido difundido
principalmente através das práticas sociais de ONGs. Silva apresenta o conceito de
rede “enquanto sistema de laços realimentados”
413
e, a este respeito, chama a
atenção para o “advento do terceiro setor e a utilização intelectual e a própria prática
do trabalho em rede”.
414
Para ele, as realidades das redes e do Terceiro Setor estão
intrinsecamente relacionadas, onde o segundo se caracteriza essencialmente como
uma gigantesca teia de inter-conexões.
Uma grande teia de relações e inter-relações, tem sido um elemento
fundamental para a manutenção e a própria existência das ONGs. No contexto da
práxis social desenvolvida no interior das instituições ligadas à Igreja Batista
Independente, verifica-se esse conceito de redes sociais em algumas instituições,
como a Associação Beneficente Direito de Ser em Campinas, Centro Social
Ebenézer em Bayeux e o Centro de Ação Social e Desenvolvimento Comunitário em
Cachoeira.
Por outro lado, muitas instituições ainda não conseguiram estabelecer sua
rede de cooperação de forma eficaz e, por esta razão, algumas dessas instituições
chegam a passar por sérias dificuldades na manutenção de suas atividades e da
própria instituição. O isolamento da instituição na prestação de serviços de interesse
social amplia as dificuldades de qualquer ONG. Buscar criar e/ou ampliar sua rede
de cooperação entre os órgãos públicos e privados, e envolver a comunidade local
412
SILVA, Anônio Carlos, O que são redes? Consultado em 14 set. 2004. Disponível em
http://www.rits.apc.org/redes_teste/rd_oqredes.cfm. Sobre o tema das redes ver também
MARTINS, Paulo Haus. Institutos, Fundações, ONGs, OSCIPS e Filantrópicas. Rede de
Informação do Terceiro Setor - RITS: Março, 2002; Rede de Informações do Terceiro Setor
RITS. Disponível em www.rits.org.br; sobre uma reflexão mais ampla a respeito da sociedade em
redes ver CASTELLS, Manuel. A era da informação: economia, sociedade e Cultura, Vol. 1. A
sociedade em redes. São Paulo, Paz e Terra, 1999.
413
Ibidem.
414
Ibidem.
165
nas atividades sociais deve ser uma meta constante, para evitar o isolamento e a
ineficácia da sua atuação social.
Nas instituições em cujas atividades constata-se a práxis social como
elemento fundamental das suas atividades, verifica-se mais claramente a
preocupação das pessoas envolvidas, a preocupação de ampliar os espaços onde a
atuação da instituição é conhecida. Procura-se a participação da população local e do
poder público nas atividades desenvolvidas, e ainda, conscientizar e ampliar o
processo de participação popular mais amplo da sociedade civil e Estado, como
grandes parceiros no desenvolvimento e no oferecimento de serviços à população
local.
Esse tipo de práxis social, que publiciza seus projetos e busca maior
conscientização social da sociedade civil e do poder público local, tende a ampliar a
rede de inter-relações das instituições sociais, com o objetivo inicial de compartilhar
experiências locais, que podem ser multiplicadas em outros espaços de articulação
das redes. Por outro lado, a meta dessas redes sócias é o compartilhamento das
responsabilidades referentes aos enfrentamentos dos problemas sociais, em um
diálogo enriquecedor com as instituições e os atores da sociedade civil.
Constituir-se parte de uma rede social, contribuindo para a democratização de
conhecimentos, técnicas e metodologias, além de participar dos resultados desse
processo através do apoio de recursos humanos e materiais, possibilita a
profissionalização, a conscientização e a ampliação das ações por meio de uma
práxis social coordenada em redes de cooperação.
Nesse sentido, a práxis social da Igreja Batista Independente pode constituir-
se como elemento transformador das ações de uma rede social de cooperação, por
meio da inserção dos valores do Reino de Deus, do seu compromisso com a
166
libertação integral do ser humano, na luta pela humanização das relações políticas,
econômicas e sociais.
Para que haja transformação da realidade social, a práxis social da Igreja,
independentemente de qual seja a sua área de atuação, precisa ter como
características fundamentais a práxis educacional para a formação do sujeito cidadão,
educando para uma participação mais efetiva do cidadão na esfera pública. Também
é necessário que estas ações comportem uma visão de desenvolvimento sustentável,
na perspectiva de promover o compartilhamento do poder local, criando alternativas
para o desenvolvimento humano integral. E, por fim, a construção de uma sociedade
nova, na era da globalização, em meio a uma sociedade tecnológica, precisa
caminhar na formação de redes sociais de cooperação e democratização de
conhecimentos.
Para Silveira e Bocayuva, as redes sociais horizontais são de extrema
importância para
a construção de uma nova esfera pública, em uma de suas manifestações
mais completas, está no desenho e implementação de agendas de
desenvolvimento local. Em processos dessa natureza, atores sociais
articulam iniciativas, operam num plano temporal planejado sobre temas
e questões escolhidas, monitoram, avaliam e redefinem suas ações, sendo
impossível que, neste esforço coletivo e heterogêneo, a diversidade se
perca ou o conflito deixe de atuar, junto com o consenso mínimo que
alimenta a continuidade das interlocuções.
415
O caminho para a instauração de uma nova sociedade, por meio da práxis
social da Igreja, precisa necessariamente conter ações que contemplem esses três
eixos fundamentais para o desenvolvimento e ampliação da práxis social, como
elemento capaz de gestar a nova sociedade, pautada na justiça social e na
415
SILVEIRA, Caio Márcio, BOCAYUVA, Cunca. Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável
Enfoque Estratégico e Construção de Indicadores. Consultado 29 mai. 2006. Disponível em
http://www.iets.org.br/biblioteca/Desenvolvimento_local_integrado_e_sustentavel.pdf.
167
solidariedade, em um mundo onde a pluralidade étnica, cultural e religiosa possa ser
uma realidade vivenciada no cotidiano das relações humanas.
3.6. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DESTE CAPÍTULO
Este capítulo contemplou a análise do desenvolvimento das práticas sociais
da Igreja Batista Independente no contexto brasileiro, apresentado a partir de três
fases distintas da inserção da Igreja no espaço público por meio das práticas sociais.
Verificou-se que o contexto social no qual se dá a inserção da Igreja é complexo. O
processo de globalização e a ampliação do capital financeiro são alguns dos
problemas fundamentais, que as instituições sociais ligadas à Igreja precisam
enfrentar no cotidiano da sua atuação social.
Esse processo globalizante tem influenciado as economias e os Estados
nacionais, gerando o encolhimento do Estado e o surgimento do Terceiro Setor que,
por sua vez, passa a articular ações por meio das ONGs em uma nova dinâmica
social a partir da década de 90.
Neste contexto atual, onde ocorrem as práticas sociais da Igreja Batista
Independente, de acordo com a primeira hipótese enunciada neste capítulo, verifica-
se a existência de práticas sociais no interior das instituições, que se caracterizam
como práticas transformadoras que, nos termos desta pesquisa, são definidas como
práxis social.
168
Também, de acordo com a segunda hipótese enunciada, ficaram evidentes a
partir da descrição das práticas sociais mais relevantes no contexto brasileiro da
Igreja Batista Independente, três âmbitos da práxis social que se conformam com o
conteúdo do Reino de Deus e contribuem para o exercício da fé cidadã.
A práxis educacional, o desenvolvimento local sustentável com
compartilhamento do poder local e a formação de redes sociais de cooperação,
constituem os três âmbitos da práxis social, identificados como elementos
fundamentais na descrição das práticas sociais da Igreja Batista Independente no
contexto brasileiro.
169
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante o desenvolvimento da pesquisa referente às práticas sociais da Igreja
Batista Independente no contexto brasileiro, verificou-se a identificação desta
instituição religiosa com as questões sociais, e também os desafios e as dificuldades
enfrentadas no contexto local para a viabilização da sua estratégia de inserção
pública por meio dessas práticas.
No decorrer da implantação e desenvolvimento do projeto missionário batista
sueco no interior do Brasil, constataram-se as primeiras iniciativas de inserção
pública da Igreja por meio das práticas sociais, por iniciativa dos/as missionários/as,
dos líderes e membros das Igrejas locais que haviam sido implantadas. Neste
processo histórico, ocorre também a ampliação das práticas sociais regionalizadas,
que passam a abranger o contexto brasileiro já como uma estratégia denominacional
de ampliação nacional.
Nestas duas fases de atuação social da Igreja, já encontra-se instaurada nas
práticas sociais uma perspectiva de ação transformadora, porém, as características de
intervenção social dessa época no contexto brasileiro, ainda esboçam ações de cunho
assistencialista. Nota-se, porém, que as práticas educativas, em especial, manifestam
essa perspectiva transformadora, promovendo de alguma maneira a transformação da
realidade daqueles que são objeto das práticas sociais da Igreja Batista Independente,
no contexto local.
Já na década de 80, é deflagrada uma nova fase das práticas sociais da Igreja,
instaurada por mudanças societárias e uma nova metodologia de intervenção social,
170
focalizando esforços não apenas pautados no assistencialismo, mas busca-se
implantar a ação social como modelo de promoção humana. É também nesta fase que
a articulação entre as práticas sociais e a religião torna-se mais evidente e
transformadora. Todo o desenvolvimento desta terceira fase foi pautado em uma
visão de missão integral da Igreja, e na conscientização, profissionalização e
treinamento de novos agentes sociais no interior das instituições e das igrejas locais,
em todo o território nacional. Estas mudanças se deram a partir de uma maturidade
da intervenção social da Igreja, e também em razão da inserção de profissionais da
área social, que tiveram um papel fundamental e enriqueceram o conhecimento da
Igreja em relação às possibilidades e os desafios da presença desta na sociedade.
A partir dos conhecimentos disponíveis a respeito das práticas sociais da
Igreja Batista Independente no contexto brasileiro, buscou-se verificar a validade das
hipóteses levantadas, por meio das quais constatou-se que, nas instituições ligadas à
Igreja, ocorrem práticas que podem ser consideradas práxis social, por objetivarem a
transformação da sociedade. E também, pode-se constatar que essa práxis social
conforma-se com o conteúdo do Reino de Deus e com o exercício da cidadania,
portanto, foi demonstrada a validade das hipóteses e o cumprimento dos objetivos
desta pesquisa.
É preciso registrar que esta pesquisa não teve a pretensão de resolver todas as
questões que envolvem o fenômeno das práticas sociais da Igreja Batista
Independente, em sua inserção pública por meio da práxis social, antes, houve a
preocupação de descrever e analisar esse fenômeno, a partir da perspectiva
interdisciplinar das Ciências da Religião, na tentativa de lançar luzes a sua
compreensão.
Neste sentido, procurou-se apontar caminhos e gerar a reflexão a respeito do
171
tema das práticas sociais da Igreja, a partir da experiência da Igreja Batista
Independente no contexto brasileiro, onde verifica-se algumas possibilidades e
desafios nas estratégias de inserção pública da Igreja.
Elaborar programas focados na práxis social em um contexto de pluralidade
cultural, política e religiosa é um dos grandes desafios da Igreja no enfrentamento da
pobreza, da exclusão social, da falta de sentido dos indivíduos e da coletividade.
Outro desafio da Igreja é de inserir-se no espaço público por meio da práxis
social e do exercício da fé cidadã de forma propositiva, ou seja, é necessário que ela
procure fomentar o debate a respeito da justiça social, da cidadania e da
solidariedade. Esta perspectiva de inscrever-se em um debate atual e constante em
vários contextos sociais possibilitará o enriquecimento do debate no espaço público,
ampliando o compromisso da Igreja com as mudanças políticas, econômicas e
sociais.
Percebe-se que os problemas sociais não são facilmente solucionados, em
razão da lógica excludente do mercado. Um dos problemas fundamentais relaciona-
se à perspectiva do consumo de bens e de mercadorias, no qual o individuo é
valorizado pelo tipo de mercadoria que consome e não por seu valor como ser
humano. Neste ponto, é preciso que a práxis social da Igreja busque contrapor os
valores da sociedade de consumo, justamente porque esta mentalidade tem sido a
responsável por reafirmar os valores de mercado, em detrimento de uma valorização
do ser humano.
Por intermédio das práticas sociais da Igreja, é possível a construção de novos
sentidos, que apresentem ao indivíduo a possibilidade de ser reconhecido por meio
da graça e do amor divino, pela comunidade cristã, pela família e grupo social, a
partir de valores intrínsecos a sua própria natureza de criação divina. Esta perspectiva
172
de reconhecimento social precisa ser implementada no interior das instituições
ligadas à Igreja, e precisa ser ampliada nas próprias comunidades religiosas, para que
essa valorização do ser humano, pautada na mensagem do Reino de Deus, faça-se
presente no contexto plural das ações da Igreja.
O meio ambiente ainda é um tema pouco discutido e valorizado no interior
das instituições religiosas. Portanto, é imprescindível ampliar-se o debate, além de
haver um posicionamento a favor do meio ambiente, que é a casa comum de todos
nós. Atualmente, não é possível viver neste mundo pensando que os recursos naturais
são infinitos, ou acreditando que a forma como vivemos está em perfeita harmonia
com a natureza. Verifica-se que o mundo atual vive um desequilíbrio nas estações e
nos climas que não é natural, mas antes, é conseqüência do sistema de produção
industrial, que tem valorizado o meio ambiente apenas por seu valor econômico.
É necessário haver uma práxis social voltada para a ecologia, ou em outras
palavras, uma práxis ecológica, para frear as estatísticas de destruição dos
ecossistemas globais. Além de engrossar as fileiras na preservação do meio
ambiente, é necessário resgatar uma característica fundamental, retirada do
Pentateuco, o qual apresenta ao ser humano a incumbência divina de cuidar da
natureza criada e cultivá-la para sua sobrevivência, e não para o enriquecimento por
meio dela.
Nesta mesma linha de práxis ecológica está o desenvolvimento local
sustentável, como alternativa ao modelo atual de desenvolvimento. Enquanto existem
ações voltadas para ampliação e domínio do modelo neoliberal, a partir de redes de
cooperação, que não contribuem para a instauração da nova sociedade, a práxis
social tem o desafio de contrapor esta proposta de um mercado salvador do mundo,
com propostas e parcerias que caminham na via alternativa do desenvolvimento local
173
sustentável.
Essa linha de atuação social da Igreja pode contribuir para o uso mais
coerente do meio ambiente, com atividades em meio a pequenos lavradores, hortas
comunitárias, cooperativas de reciclagem, além de ampliar a perspectiva de
responsabilidade individual em relação ao meio ambiente. Projetos de
desenvolvimento local podem contribuir fundamentalmente para a construção de
uma nova sociedade pautada no manejo adequado dos recursos naturais, na justiça
social e na solidariedade, além de ampliar a participação popular nos processos
decisórios e na atribuição de responsabilidades em nível local.
O desafio de fomentar ações concretas para a erradicação dos condicionantes
da exclusão social e da pobreza no âmbito local, buscando construir redes que se
inter-relacionem local e regionalmente, para promover o desenvolvimento local
sustentável, deve ser uma das metas da práxis social da Igreja.
Também construir redes solidárias que não estejam alinhadas com os
interesses do grande capital, por meio de práticas que realimentem o sistema que é
por natureza excludente, e não servir aos interesses político-partidários e/ou
plataformas de governos interessados apenas na manutenção do poder e da estrutura
social, com práticas meramente assistencialistas. Antes, o desafio para a práxis social
da Igreja é ampliar, cada vez mais, ações que venham promover a cidadania, os
valores comunitários, a geração de renda alternativa, buscando apoiar idéias e
projetos que venham contribuir com uma economia solidária e mais justa, que traga
benefícios à comunidade local, promovendo o desenvolvimento sustentável.
Outro elemento importante, quando tratamos da práxis social da Igreja, diz
respeito à perspectiva final dessas atividades. Verifica-se que, em geral, as ONGs se
configuram como prestadoras dos mais variados tipos de serviços à população
174
empobrecida, porém, deve-se distinguir as instituições religiosas das empresariais.
As empresas, na maioria dos casos, atuam na manutenção da estrutura
econômica e de poder, principalmente, porque há o interesse econômico por trás de
supostos interesses humanísticos. Como verificou-se anteriormente, muitas ONGs
empresarias não possuem em sua perspectiva de atuação, ações voltadas para a
formação do cidadão crítico, antes, sua perspectiva de ação tem a ver com a
necessidade de mão-de-obra especializada para a manutenção dos meios de
produção.
Esta forma de captação de recursos humanos para a ampliação da produção,
-se no Terceiro Setor a baixo custo financeiro, justamente porque os investimentos
financeiros neste segmento são compensados pela isenção de impostos pagos ao
Estado, o que acaba por contribuir diretamente na redução do custo empresarial.
Por muitas vezes, a única obra social realizada pelo empresariado,
corresponde a mais um empreendimento econômico, voltado à geração de lucros
com a divulgação de suas empresas, marcas e produtos que tendem a ser
compreendidas, pela massificação deste tipo de propaganda empresarial, como
empresas cidadãs, de responsabilidade empresarial que produziriam mercadorias
compreendidas como politicamente corretas.
A práxis social da Igreja possui uma outra meta final. Nem sempre se
consegue superar os indicadores de exclusão social nem a intervenção empresarial
com tanto sucesso; porém, sua meta é a transformação do indivíduo e da sociedade.
Suas atividades em geral, não possuem nenhum interesse em produzir produtos com
selo de responsabilidade social ou de ampliar a visibilidade de suas marcas em
produtos de consumo. Sua preocupação fundamenta-se na elevação do nível de
consciência cidadã e na ampliação dos valores do Reino de Deus. É bastante claro
175
que a Igreja identifica sua missão evangelizadora com sua atuação social, não
fazendo distinção entre essas duas ações. Para ela, os sinais do Reino de Deus
precisam ser manifestos por meio da práxis social das instituições sociais ligadas a
ela, promovendo transformação por meio do exercício da justiça social, da cidadania
e da solidariedade.
Os desafios da práxis social da Igreja são muitos, porém, com sua força de
conscientização, de mobilização, de articulação interna (Igreja) e no espaço público
na interface da cidadania, pautadas nos valores do Reino de Deus e no exercício da fé
cidadã, há um horizonte de esperança para a construção de uma nova sociedade onde
caibam todos.
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2005.
_____. Apadrinhamento Brasileiro Comunica - ABC. Boletim n. 16, Ano 5, 1°
trimestre de 2006. Federação das Entidades e Projetos Assistenciais: Campinas,
2006.
F. FILHO, Almir de Oliveira. Quadro de atendimento das Instituições da Federação
das Entidades e Projetos Assistenciais. In. CONGRESSO DE AÇÃO SOCIAL
- Redes Sociais uma nova estratégia para o desenvolvimento. Anais.
Araçariguama/SP, 2006.
____. Relatório de Atividades: exercício de 2005. FEPAS: Campinas, 2005.
____. Relatório Social do Centro Social Ebenezer. FEPAS: Campinas, 2005.
FRANSSON, Frederik, Carta à direção da Igreja da Aliança Sueca, em 14 de
dezembro de 1907.
JANSSON, Erik. Correspondência a John Ongman Örebro/Suécia. Vila
Guarany/Rio Grande do Sul, 3 de janeiro de 1913.
____. Correspondência a John Ongman Örebro/Suécia. Vila Guarany/Rio Grande
do Sul, 26 de fevereiro de 1913.
____. Correspondência a John Ongman Örebro/Suécia. Vila Guarany/Rio Grande
do Sul, 26 de maio de 1913.
____. Correspondência a John Ongman Örebro/Suécia. Vila Guarany/Rio Grande
do Sul, 17 de junho de 1913.
____. Correspondência a John Ongman Örebro/Suécia. Vila Guarany/Rio Grande
do Sul, 16 de setembro de 1913.
JONSSON, Lars-Erik. A história da Missão de Örebro/Suécia. In. História dos
Batistas Independentes apostilado. Seminário Teológico Batista
Independente: Campinas, 2003.
KÜHNRICH, Günter. Relatório de Atividades do Exercício de 1973. SOCIEDADE
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gerais sobre alimentação. DEPARTAMENTO DE ASSISTENCIA SOCIAL:
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MEDEIROS, Philemon. Projeto de Apadrinhamento Brasileiro: esclarecimento do
seu funcionamento no contexto social e financeiro da entidade. FEPAS:
Campinas, 1998.
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doutorado. Universidade Metodista de São Paulo, 2004.
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Missionários e Pastores.
OUTROS
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Brasil. Disponível em www.assistenciasocial.gov.br/iframe/cnas/cnas.htm.
Acesso em: 10 mar. 2004.
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Ed. Abril, 2002.
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COOPERACIÓN CON ORGANIZACIONES NO-GUBERNAMENTALES Y
ASISTENCIA HUMANITARIA & MANEJO DE CONFLICTOS. Suécia,
abril de 2004. Disponível em www.asdi.org.
Lei Federal nº 7.853, de 24 de outubro de 1989. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/LEIS/L7853.htm.
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públicos. Série desenvolvimento institucional. São Paulo: ABONG, Peirópolis,
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MINISTÉRIO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME.
Disponível em www.desenvolvimentosocial.gov.br.
RAMIL, Kleiton, RAMIL, Kledir. “Roda de chimarrão”. Álbum Millennium.
Polygram, 1998, faixa n. 18.
REDE DE INFORMAÇÃO DO TERCEIRO SETOR RITS. Disponível em
www.rits.org.br.
188
ANEXOS
Abaixo, relacionamos os anexos com o objetivo de fornecer alguns
documentos para contribuir na fundamentação da pesquisa, e promover uma
compreensão mais clara a respeito dos temas com os quais estão relacionados.
ANEXO A CORRESPONDÊNCIA DE ANDERS G. ANDERSSON ENVIADA À
TRIBUNA SUECA
ANEXO B REGISTRO ESCOLAR DE JOHN ALBIN OLSSON
ANEXO C CORRESPONDÊNCIA DO CENTRO ADMINISTRATIVO PARA O DAS
ANEXO D FOLDER DO APADRINHAMENTO BRASILEIRO
ANEXO E ORÇAMENTO PARA 1978
ANEXO F MISSÃO DA FEPAS
ANEXO G DISTRIBUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES NO TERRITÓRIO NACIONAL
ANEXO H FOLDER DO APADRINHAMENTO SUECO
189
ANEXO A
CORRESPONDÊNCIA DE ANDERS G. ANDERSSON ENVIADA À TRIBUNA SUECA
Muitos suecos querem saber se vocês aí em Örebro não podem enviar um
missionário até nós. Não temos líder que fala o Evangelho. Quando viemos para cá
há 19 anos, muitos eram crentes, mas agora não são mais nada. Por isso, as
crianças são criadas em trevas e paganismo. Cremos que, se alguém viesse até aqui
e começasse um trabalho espiritual, o Senhor despertaria seu povo novamente.
Vemos nos jornal que vocês enviam missionários para lugares muito mais selvagens
do que o Brasil, como a Índia e a África. Queridos amigos, quando pensarem em
enviar testemunhas do Evangelho, não esqueçam do Brasil. Vamos recebê-los e fazer
tudo o que pudermos por eles. Não é muito arriscado viajar para cá. O clima é bom.
Não há pestes ou animais perigosos. Por isso, cremos que se alguém quiser vir para
cá trabalhar para o Senhor, se sentirá muito bem entre nós. Há três anos, no mês de
dezembro, recebemos a visita do missionário Fransson, cuja morte vimos noticiada
pouco depois neste jornal. Ele gostou muito deste lugar e disse que mandaria um
pregador para cá. Ele nos prometeu que escreveria sobre o assunto, mas a morte
interveio. Se Fransson tivesse ficado vivo, creio que teríamos um mensageiro do
Evangelho aqui agora.
Anders Gustav Andersson
190
ANEXO B
REGISTRO ESCOLAR DE JOHN ALBIN OLSSON
CLASSIFICAÇÃO Nr. 3
John Albin Olsson
Leitura aprovado
Escrita aprovado com louvor
Matemática aprovado com louvor
(as quatro operações de cálculo, primário)
Canto aprovado
Ginástica aprovado com louvor
Cálculo mental aprovado com louvor
Du
rante o tempo escolar tem mostrado um trabalho notável e uma
conduta muito boa. Isto se comunica através destas notas.
Henrik Ollson
Professor
Colônia Guarany, 25 de abril de 1898.
191
ANEXO C
CORRESPONDÊNCIA DO CENTRO ADMINISTRATIVO PARA DAS
192
193
ANEXO D
FOLDER DO APADRINHAMENTO BRASILEIRO
194
195
ANEXO E
ORÇAMENTO PARA 1978
FONTE: Ata das reuniões da Comissão Executiva da CIBI. Campinas, 15 a 17 de jul. de 1977.
196
ANEXO F
MISSÃO DA FEPAS
A FEPAS tem como missão a promoção humana, a assistência e
o bem estar social, contribuindo para a prevenção e solução de
problemas sociais, sem distinção de nacionalidade, condição social,
raça ou credo político religioso. Visa e se identifica com a luta pela
construção da cidadania e dignidade, como um direito de todos.
A visão e execução de sua missão se afirmam e se fundamentam
em princípios cristãos e humanísticos.
O princípio de justiça, eqüidade e solidariedade como
forma do relacionamento entre as pessoas.
Recursos, poder e saber (economia, política, ciência) para
bem de todos.
A potencialidade humana para a autonomia e sua
emancipação.
A compaixão e o amor de Deus Revelado, pelo resgate e
libertação integral do homem.
Manifestação e realização da espiritualidade na dimensão
do outro e em especial, em relação ao sofrido.
A denúncia e o anúncio integrados entre teoria e prática,
como atitude profética.
Fonte: SCHULZ, Almiro. Histórico. FEPAS: Campinas, 1998, p. 8.
197
ANEXO G
DISTRIBUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES NO TERRITÓRIO NACIONAL
REGIÃO NORTE
01 - Centro Social Batista Independente Benjamin Constant, AM.
02 - Centro Educacional Batista Independente Altamira, PA.
03 - Centro Educacional Cordeirinhos Manaus, AM.
REGIÃO CENTRO OESTE
198
04 - Associação Beneficente Batista Independente Creche Raio de Sol Ceilândia, DF.
05 - Projeto Apoio Escolar Goiânia, GO.
REGIÃO NORDESTE
06 - Centro Social Filadélfia Fortaleza, CE.
07 - Centro Social Bom Samaritano Natal, RN.
08 - Centro Social Ebenézer Bayeux, PB.
09 - Centro Social Rosa de Sarom Bayeux, PB.
10 - Centro Social Canãa Bayeux, PB.
11 - Centro Social Getsêmani Santa Rita, PB.
12 - Sociedade Beneficente Betel Núcleo Betel Campina Grande, PB.
13 - Projeto Berseba Juarez Távora, PB.
14 - Granja Betel Lagoa Nova, PB.
15 - Centro Social Evangélico Débora Cajazeiras, PB.
16 - Centro Social Evangélico Dorcas Patos, PB.
17 - Centro Social Evangélico Noemí São José do Egito, PE.
18 - Sociedade Beneficente Betel Jaboatão dos Guararapes, PE.
19 - Centro Social Batista Independente Maceió, AL.
20 - Centro Social Batista Independente Satuba, AL.
21 - Sociedade Beneficente Filadélfia Feira de Santana, BA.
22 - Centro Comunitário Batista Independente Feira de Santana, BA.
23 - Associação Beneficente da 1ª Igreja Batista Independente São Félix, BA.
199
24 - Centro de Ação Social e Desenvolvimento Comunitário Cachoeira, BA.
25 - Projeto de Desenvolvimento Comunitário Cafarnaum e Molungú do Morro,
BA.
26 - Escola Agrícola Comunitária Cafarnaum, BA.
27 - Centro Social Filadélfia Vitória da Conquista, BA.
28 - Associação Beneficente Batista Independente Aracatu, BA.
29 - Projeto Alfabetização de Adultos Caitité, BA.
30 - Associação Batista Independente Calvário Cruz das Almas, BA.
REGIÃO SUDESTE
31 - Associação o Bom Samaritano Barra de São Francisco, ES.
32 - Associação Beneficente Luiza Rosa de Oliveira Nilópolis, RJ.
33 - Associação Beneficente Filadélfia Patriarca, SP.
34 - Associação Shalom Birigui, SP.
35 - Associação Beneficente Salém Campinas, SP.
36 - Lar Feminino Filadélfia Jundiaí, SP.
37 - Associação Beneficente Batista Independente Francisco Morato, SP.
38 - Posto de Saúde Franco da Rocha, SP.
39 - Associação Beneficente Direito de Ser Campinas, SP.
200
REGIÃO SUL
40 - Departamento de Assistência Social da Igreja Batista Independente Betel
Telêmaco Borba, PR.
41 - Sociedade Beneficente Bom Samaritano Xanxerê, SC.
42 - Sociedade Beneficente Arnold Hadlich Blumenau, RS.
43 - Sociedade Beneficente Evangélica Frederico Westphalen, RS.
44 - Associação de Vacas Leiteiras Novo Machado, RS.
45 - Sociedade Beneficente União da Boa Vontade Cachoeira do Sul, RS.
46 - Escola Paulo de Tarso Santa Maria, RS.
47 - Sociedade Beneficente Batista Independente Santa Cruz do Sul, RS.
48 - Sociedade Beneficente Paulo de Tarso Novo Hamburgo, RS.
49 - Sociedade Beneficente Evangélica Betel Esteio, RS.
50 - Associação Beneficente “o Bom Samaritano” Cachoerinha, RS.
51 - Centro Social e Cultural Evangélico Betel Pelotas, RS.
52 - Centro Social Filadélfia Pelotas, RS.
FONTE: Federação das Entidades e Projetos Assistenciais.
201
ANEXO H
FOLDER DO APADRINHAMENTO SUECO
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo