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ANUSKA IRENE DE ALENCAR
A cooperação em crianças da rede pública de Natal/RN – Uma abordagem
evolucionista
Tese apresentada à Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, para obtenção do
título de doutora em Psicobiologia.
Orientador: Maria Emília Yamamoto
Natal
2008
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ii
Título: COOPERAÇÃO ENTRE CRIANÇAS DA REDE PÚBLICA DE NATAL/RN
Autor: ANUSKA IRENE DE ALENCAR
Data da defesa: 06 DE MARÇO DE 2008
Banca examinadora
______________________________________
Regina Helena Ferraz Macedo
Universidade de Brasília
______________________________________
André Luis Ribeiro Lacerda
Universidade Federal de Mato Grosso
______________________________________
Maria de Fátima Arruda
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
_____________________________________
José Pinheiro Queiroz
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
______________________________________
Maria Emília Yamamoto
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
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iii
Dedicatória
Dedico esta tese de doutorado a todos os diretores e
professores que permitira minha entrada nas escolas e
salas de aula. E as crianças que alegremente
participaram dos jogos.
iv
AGRADECIMENTOS
Reciprocidade Direta
Em um trabalho sobre cooperação, os agradecimentos não podem ser mera
formalidade. Neste sentido, apresento minha reciprocidade direta. Não tenho certeza
que os abaixo listados terão, com este agradecimento a mesma “utilidade” que tive ao
receber os favores prestados por eles.
À professora Maria Emília Yamamoto, minha orientadora que, de cara, percebeu a
importância desta investigação e me apoiou incondicionalmente em todas as etapas;
Aos pais das crianças que permitiram a participação de seus filhos nos jogos que
realizamos;
Mesmo dedicando esta tese às crianças que participaram dos jogos, não posso deixar
de agradecer diretamente aos sorrisos, bilhetes e beijinhos que recebi e que certamente
motivavam o retorno à escola. Elas foram muito mais do que sujeitos experimentais;
Da mesma forma, aos professores e diretores da escola que se divertiam e partilhavam
comigo segredos de bastidores;
A Danielle Maria de Oliveira Rocha, que me ajudou na coleta de dados e construção
das planilhas. Sem ela, essa etapa do trabalho certamente teria sido mais trabalhosa;
Ao CNPq (524409/96 de M.E.Y.) e FAPERN (01.0009-00/2002), sem cujo auxílio
financeiro não poderia ter se realizado a pesquisa;
A Wallissen Tadashi Hatori (SuperWall), que tem um olho pronto para detectar
erros, ajudando-me a deixar os gráficos uniformes, checando referências e
diagramando esta tese. O mais incrível de tudo é que, na maioria das vezes, eu estava
dormindo;
v
A Álvaro da Costa Batista Guedes, que também possui um olhar pronto para
encontrar erros, conferindo comigo as planilhas das Terras dos comuns e as referências
de alguns dos artigos;
A Luiza Helena Pinheiro Spinelli, que deu uma força na estatística e em outras
coisas mais;
A Altair Alves Lino de Souza por sua consultoria estatística;
A Denise Rego e Lúcia, que sempre topavam tomar uma cerveja comigo em
momentos de desespero... Mas, sem ser injusta com Denise, ressalvo que ela também
concordou em ler os artigos teóricos e fazer sugestões que foram muito bem vindas.
por curiosidade, ela trabalha em uma abordagem oposta à do trabalho (Psicologia
social) e, por isso mesmo, a utilidade da ajuda teve um peso muito alto.
Régina, futura Operadora do Direito, que teve a intenção de ler o trabalho sobre teoria
dos jogos, mas não leu. No entanto, prestou diversos favores;
A Liete Coelho, Arrilton Araújo e Marcílio Souto, que, mesmo sem interação entre
si, faziam uma questão insistente: Quando é a defesa? Certamente essa questão me
motivava a concluir para não ouvir mais essa pergunta que, diga-se de passagem, é
ansiogênica;
A Fívia de Araújo Lopes, que sempre sabia quem eu queria citar. Bastava um e- mail
com alguma característica do trabalho que eu desejava e a referência vinha como uma
mensagem de MSN;
A Renata, pela curiosidade acerca do trabalho, empréstimo de livros e indicação do
professor Gilberto Corso;
vi
Ao Professor Gilberto Corso, que me ajudou a pensar matematicamente o trabalho de
Terra dos comuns;
A Monique, que me emprestou um livro muito útil e citado neste trabalho;
A Jonh Fontenele, que me sugeriu artigos e livros;
A Henkel Cavalcante Huguenig, que construiu o biombo e me fez rir bastante;
A Verônica, que leu e corrigiu comigo algumas parágrafos indecifráveis que eu criava
durante o processo de construção de texto;
À Banca da qualificação (André Luis Ribeiro Lacerda e Fátima Arruda), que
deram valiosas contribuições para a versão final.
vii
Reciprocidade Indireta
Nem todas as pessoas contribuíram diretamente para elaboração desse
trabalho, mas não podem ficar fora da lista das pessoas de boa reputação, pois deram
sua contribuição indireta e, portanto, o agradecimento vai na mesma direção.
Suas contribuições ficaram nas expressões de: Boa sorte!!, Bom dia!!!, Siga
em frente!!, Sucesso!!, Você consegue. Incentivos de muita utilidade.
Então valeu, Kelly Passard, Nívea Lopes, Lula (que não é o presidente), Rochele
Castelo-Branco, Daniele Leal, Suely Gomes, Vanusa Barreira, Ruy Rocha,
Rayane, Adriana Lúcia, Adriana Oliveira, Luiza Cervenca, Fernando Abrahão,
André Lacerda (que não é o da banca), Balbina, Marcelina e Marcel Verduyn,
Edeilson Matias, Teresa Mota, Neuciane Gomes, Fabiola Albuquerque, Daniel
Pessoa, Helderes Peregrino, Carolina Azevedo, Lis Vilaça, Henrique Fontes,
Danilo Gustavo e Aliete Paiva.
E a família?
Ah, isso é seleção de parentesco já está agradecida!
viii
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA .......................................................................................................iii
AGRADECIMENTOS .............................................................................................iv
LISTA DE ILUSTRAÇÕES......................................................................................x
RESUMO .................................................................................................................xii
ABSTRACT............................................................................................................xiii
APRESENTAÇÃO GERAL......................................................................................1
OBJETIVO GERAL..................................................................................................4
1. ARTIGOS TEÓRICOS
1.1. ARTIGO TEORICO I A cooperação em humanos: Uma abordagem
evolucionista...............................................................................................................5
1.2. ARTIGO TEORICO II Teoria dos jogos como metodologia de investigação
científica para a cooperação....................................................................................36
2. ESTUDOS EMPÍRICOS
2.1. ARTIGO EMPÍRICO I Does group size matter? Cheating and cooperation
in Brazilian school children.....................................................................................52
2.2 ARTIGO EMPIRICO II O efeito do sexo e da composição do grupo: um
experimento de bens públicos com crianças da rede pública de Natal/RN...........67
2.3. ARTIGO EMPIRICO III O dilema dos comuns em crianças de escolas
públicas de Natal/RN...............................................................................................83
2.4. ARTIGO EMPIRICO IV Os bastidores da pesquisa: O que acontece por
trás do biombo? Estudos de casos...........................................................................97
3. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
3.1. DISCUSSÃO GERAL.....................................................................................119
3.2. CONCLUSÕES GERAIS...............................................................................125
ix
4. ANEXOS
4.1. Anexo I – GLOSSÁRIO..................................................................................127
4.2. Anexo II – Protocolo experimental dos bens públicos...................................132
4.3. Anexo III – Protocolo experimental da Terra dos comuns...........................134
x
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figure 1. Mean (and SE) donation of candy bars for a public goods fund by children
from public schools in Natal at each of 8 sessions by: A) group size B) sex; C)
information on the number of sessions.................................................................59
Figure 2. Mean (and SE) candy bars received from sharing (return) and from sharing
plus retention (private return) for small and large groups. See text for details.
*p<0.05...............................................................................................................60
Figure 3. Percentage of children from public schools in Natal at each of 8 sessions that
donated no candies (A - free-riders); one candy (B); two candies (C); and three
candies (D - maximum cooperators)....................................................................61
Figura 4. A) Média de doação de 16 grupos de crianças de escolas públicas de
Natal/RN. Os grupos foram divididos em três proporções, sendo três grupos com
proporção maior de meninos (o a 33 % de meninas); onze com proporções
semelhantes de meninos e meninas (34 a 66 % de meninas) e dois com a
proporção maior de meninas (67 a 100 %). B) Diferença entre os sexos em cada
proporção............................................................................................................75
Figura 5 Porcentagem de free riders em crianças de escola pública de Natal/RN A)
Porcentagem de free riders do sexo masculino nas diferentes proporções; B)
porcentagem de free riders do sexo feminino nas diferentes proporções; C)
Porcentagem de máximo cooperadores do sexo masculino; D) Porcentagem de
máximo cooperadores do sexo feminino. ............................................................77
Quadro 1. Matriz hipotética de um jogo do dilema do prisioneiro. A=2 anos de prisão
para cada prisioneiro; B=liberdade para o prisioneiro 1 e 10 anos de prisão para o
prisioneiro 2; C=liberdade para o prisioneiro 2 e 10 anos de prisão para a
prisioneiro 1; D=8 anos de prisão para cada um dos prisioneiros.........................41
Table I. Composition by age and sex of public school children’s groups in Natal, RN,
Brazil. Groups 1-10 were considered large and, 11-6, small. ...............................56
xi
Table II. Spearman’s correlations between group size and mean donation on each
testing day...........................................................................................................61
Tabela III. Composição dos grupos de crianças estudados em escolas públicas de
Natal/RN, com as respectivas proporções entre os sexos. ....................................71
Tabela IV. Porcentagem de free riders por proporção e sexo ao longo das oito sessões
em 16 grupos de crianças de escolas blicas de Natal/RN. Os grupos foram
divididos em três proporções, sendo três grupos com proporção maior de meninos
(o a 33 % de meninas); onze com propoões semelhantes de meninos e meninas
(34 a 66 % de meninas) e dois com a proporção maior de meninas (67 a 100 %).74
Tabela V Porcentagem dos cooperadores máximos por proporção e sexo ao longo
das oito sessões, em 16 grupos de crianças de escolas públicas de Natal/RN. Os
grupos foram divididos em três proporções, sendo três grupos com proporção
maior de meninos (o a 33 % de meninas); onze com proporções semelhantes de
meninos e meninas (34 a 66 % de meninas) e dois com a proporção maior de
meninas (67 a 100 %)..........................................................................................74
Tabela VI. Composição dos grupos de crianças de escolas Municipais de Natal/RN.88
Tabela VII. Composição dos grupos de crianças de escolas Municipais de Natal/RN
em função da duração dos dias de jogos. .............................................................92
Tabela VIII. Taxa de oportunismo do primeiro dia de jogo em relação à duração do
recurso em dias, em escolas municipais de Natal/RN. A taxa de oportunismo da
primeira rodada refere-se à média de apropriões indevidas dos integrantes do
grupo (TO
1rod
); a taxa de oportunismo da segunda rodada (TO
2rod
) . A taxa de
oportunismo média da primeira jogada (primeiro dia) refere-se à taxa média do
grupo no primeiro dia de jogo (TO média); e à taxa média de oportunismo ao
longo das sessões (TO total); o dia da extinção refere-se à sessão em que o recurso
se esgota..............................................................................................................92
xii
RESUMO
A cooperação é um comportamento bastante difundido e estimulado em todas as
culturas. Provavelmente pressões seletivas trouxeram vantagens para indivíduos que
cooperavam, e por essa razão, esse comportamento está presente nas sociedades
humanas. Muito do que se estuda sobre cooperação e seleção natural foi compreendida
utilizando a teoria dos jogos, uma abordagem matemática que ajuda compreender o
conflito e a cooperação. Acreditamos a seleção natural e a teoria dos jogos podem nos
ajudar a compreender esses comportamentos e escrevemos dois artigos teóricos
abordando essa idéia. Verificamos também, que muito dos achados sobre cooperação
foram realizados com adultos. Pelo fato da teoria dos jogos ser eficaz para
compreender esse fenômeno, e decil aplicação e compreensão, utilizamos dois jogos
em crianças de 5 a 11 anos de idade: o jogo da terra dos comuns e o dos bens públicos.
Os achados estão relatados em quatro artigos empíricos. Neles verificamos que as
crianças respondem aos dilemas sociais da teoria dos jogos de forma semelhante aos
adultos. Elas ajustam as jogadas em função do retorno que obtém dos companheiros;
são cooperativas no início e reduzem a cooperação ao longo das sessões; na ausência
de punição o nível de oportunismo aumentou, principalmente nos grupos grandes;
meninos e meninas se comportam de forma diferente na hora de realizar as doões. O
conjunto deste trabalho sugere que a cooperação tem uma base evolutiva em humanos
e que ela está presente desde cedo nos padrões apresentados pelos adultos.
PALAVRAS-CHAVES: Teoria dos jogos, dilema dos comuns, dilema dos bens
públicos e crianças.
xiii
ABSTRACT
Cooperation is a well known behavior and influenced by all cultures. Probably
selective pressures brought advantages to individuals that cooperate, and then this
behavior is current in human societies. Most of it is studied about cooperation and
natural selection was understood by the game theory, a mathematical approach that
helps to understand the conflict and cooperation. We believe that natural selection and
game theory could facilitate understanding these behaviors and two theoretical articles
were written regarding this view. It was also found that most of data about cooperation
was obtained in (with) adults. Since game theory is effective to understand this
phenomenon, and to be used and understood, two games were used with five and
eleven year old children: the common pool and public goods games. The results are
presented in four empirical articles. We found that children respond to social dilemmas
of game theory like the adults do. They adjust their rounds regarding the feedback
obtained of their partners; in the beginning they cooperate and reduce the degree of
cooperation along (throughout) the following session; in the absence of punition the
level of opportunism increased, mainly in larger groups; boys and girls behave
differently when donate. This research suggests that cooperation has an evolutionary
basis in humans and it is present since earlier in the behavioral pattern shown by
adults.
KEYWORDS: game theory, common pool, public goods, children
APRESENTAÇÃO GERAL
Esta seção tem como objetivo expor alguns esclarecimentos para facilitar a
leitura do trabalho: A cooperação em crianças da rede pública de Natal/RN Uma
abordagem evolucionista.
Dividimos o trabalho em quatro seções: a) Artigos teóricos; b) Artigos
empíricos; c) Discussão e conclusão; d) Anexos.
Todos os artigos foram escritos de maneira independente, possuindo cada um
deles suas pprias referências, organizadas de acordo com as regras para redação da
dissertação/tese do Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia.
a) Artigos teóricos
Na primeira seção temos dois artigos teóricos que deram embasamento aos
trabalhos empíricos, o primeiro: A cooperação em humanos – uma abordagem
evolucionista, no qual discutimos a evolução da cooperação entre os humanos,
ontogênese e fatores próximos que modulam a cooperação. A concepção dos trabalhos
empíricos foram feitos a partir de questões relacionadas à teoria evolucionista. No
segundo, Teoria dos jogos como metodologia de investigação científica para a
cooperação em humanos, apresentamos e sugerimos a teoria dos jogos como um bom
modelo metodológico para estudo da cooperação. Esta revisão fundamenta nossa
utilização dos jogos dos bens públicos e terra dos comuns (ou dilema dos comuns)
para investigarmos a cooperação em crianças, descrita nos quatro trabalhos empíricos.
b) Artigos Empíricos
Na segunda seção apresentamos quatro artigos empíricos que foram realizados
utilizando a metodologia da teoria dos jogos com múltiplos jogadores, denominados de
bens públicos e terra dos comuns. A maioria dos trabalhos utilizando essa metodologia
foi realizada com adultos. Os achados sobre cooperação em crianças se dão em função
de estudos sobre juízo moral e comportamento pró-social.
O primeiro artigo empírico foi publicado na Evolution and Human Behaviour,
29 (2008) 4248, em parceria com Siqueira, J.O. e Yamamoto, M.E. O artigo é
2
intitulado: Does group size matter? Cheating and cooperation in Brazilian school
children no qual constatamos através do jogo dos bens públicos que o tamanho do
grupo é um importante preditor do comportamento de cooperação entre crianças. Este
artigo está disponível na formatação da revista no seguinte endereço:
http://www.sciencedirect.com/science/journal/10905138 ou
http://lineu.cb.ufrn.br/psicoevol/sisup/arquivos/arq4784f49c5cec1.pdf
O segundo, intitulado O efeito do sexo e da composição do grupo: um
experimento de bens blicos com crianças da rede pública de Natal/RN,
pretendemos encaminhar para uma revista internacional ainda não definida. Neste
artigo nem a proporção dos sexos, nem o sexo afetam a média de doação. No entanto,
meninos e meninas evoluem de forma diferente ao longo do jogo; os meninos
apresentam uma evolução mais linear, enquanto que as meninas apresentam
inconstância nas suas decisões.
No terceiro artigo, chamado de Dilema dos comuns em crianças de escolas
públicas de Natal/RN, avaliamos o comportamento de crianças diante de um dilema
conhecido como terra dos comuns. Constatamos uma correlação positiva entre o uso
indevido de um recurso (taxa de oportunismo) com o dia da extinção do mesmo e o
tamanho do grupo.
Pretendemos encaminhar esse artigo para uma revista internacional,
provavelmente Evolution and Human Behaviour.
Por fim, no último artigo empírico Os bastidores da pesquisa o que
acontece por detrás do biombo? estudos de caso, apresentamos um relato de
experiências contendo fatos que ocorreram durante o trabalho que nos ajudam a ter
uma melhor compreensão da cooperação. Analisamos estudos de caso para identificar
aspectos que não puderam ser discutidos nos artigos anteriores, em função de termos
utilizado alises quantitativas.
c) Discussão e conclusões
Nessa seção discutimos os quatro artigos empíricos (discussão geral) e
formulamos conclusões gerais acerca dos achados dos mesmos.
3
d) Anexos
Na quarta seção se encontram três anexos. No anexo I construímos um
glossário para facilitar a compreensão dos termos utilizados neste trabalho. Nos anexos
II e III apresentamos as instruções dos jogos.
As tabelas e figuras seguem uma ordem (seqüencial) e não numerada a cada
artigo.
4
OBJETIVO GERAL
Atividades sociais que envolvam cooperação como doar comida, ajudar feridos
em situações de catástrofe, cuidar de crianças aparentadas ou abandonadas, partilhar
conhecimento o ações corriqueiras no nosso dia a dia e constituem de requisitos
importantes na manutenção das relações sociais. Em contrapartida, existem
comportamentos não cooperativos como usufruir uma ação social sem ajudar
(trapacear ou free riding), como é o caso de não pagar a conta de luz e usufruir da
iluminação pública, não entrar na cota do cafezinho e tomá-lo, não retribuir a ajuda de
um amigo. Atos deste tipo o considerados ações negativas para a manutenção das
relações sociais quando são duradouros ou freqüentes. Como as crianças percebem
esses comportamentos? Em eu circunstâncias elas decidem quando devem ou podem
cooperar ou trapacear? Elas resolvem esse conflito como os adultos?
O objetivo do nosso trabalho foi tentar estabelecer quais variáveis seriam as mais
importantes para estabelecer a cooperação entre crianças em jogos de bens públicos e
terra dos comuns. Investigamos para tanto sexo, tamanho de grupo e informação sobre
o número de sessões.
5
1.1. ARTIGO TEÓRICO I A cooperação em humanos: Uma abordagem
evolucionista
Título abreviado
Cooperação em Humanos
Anuska Irene Alencar
Programa de Pós Graduação em Psicobiologia, Departamento de Fisiologia
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil
Correspondência:
Anuska Irene Alencar
Campus Universitário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRAZIL
e-mail: anuskaalencar@yahoo.com.br
6
RESUMO
ões tais como a partilha de comida, proteção e cuidado coletivo de infantes,
proteção do grupo, caça e forrageio comunitário não são exclusivas dos humanos.
Esses comportamentos aparentemente se opõem à idéia de seleção natural. No entanto,
acreditamos que cooperar é perfeitamente compatível com a seleção natural se a
entendermos como um mecanismo por meio do qual os indivíduos podem aumentar
sua capacidade de sobrevivência. Comportamentos desse tipo aparecem desde muito
cedo, e crianças, a partir de dois anos, já podem demonstrá-los. Esta revisão discute as
razões evolutivas para a existência da cooperação em humanos, seu surgimento,
ontogênese e modulação por fatores próximos.
PALAVRAS-CHAVE: cooperação, ontogênese.
ABSTRACT
Actions such as sharing food, children collective care and protection, group protection,
communitarian hunting and harvesting are not exclusively human. Such behaviors are
apparently opposed to natural selection. However, we believe that to cooperation is
perfectly compatible with the natural selection, if we understand it as a mechanism
through out which the individuals can develop their survival and reproductive
capacity. These types of behaviors appear at very early ages, and children from 2 years
old on can already demonstrate collaborative behavior. This review debates the
evolutionary reasons to the existence of human cooperation, its appearing, ontogenesis
and modulation by proximate mechanisms
KEYWORDS: cooperation, ontogenesis.
INTRODUÇÃO
Ser bom e retribuir atos de bondade são ações valorizadas em todas as
sociedades. Embora os valores das trocas e do incentivo sejam diferenciados entre as
culturas, eles são praticados nas mais diversas áreas. Como exemplo, temos as trocas
no comércio (Ridley, 2000); a gratidão pregada nas diversas religiões (McCullough,
Kilpatrick, Emmons & Larson, 2001); os atos de heroísmos extremos como salvar
7
vidas em perigo; a atuação de voluntários em situações de calamidades mundiais
(terremotos e enchentes); cuidar de doentes, de bebês que não são seus filhos, de
idosos; partilhar comida e conhecimentos (Trivers, 1971).
A cooperação é um ato corriqueiro e desejável na vida humana. Pom, por
que teria sido um comportamento selecionado? Como enfatizado por Macedo (2006),
o ato de cooperar implica custos para o executor (como gasto de energia, por exemplo)
e em benefícios gerados para quem recebe a ajuda. Custos e benefícios, do ponto de
vista evolutivo, m um efeito direto sobre a aptidão
1
de um indivíduo (Gaulin &
MacBurney, 2001). Além disso, o fundamento básico da teoria da evolução é a
competição. Nesse sentido esperaríamos que a seleção natural mantivesse os
comportamentos que aumentassem a aptidão, isto é, que trouxessem benefícios
maiores do que seus custos, o que não parece ser o caso da cooperação.
A psicologia evolucionista estuda esse e outros comportamentos, tentando
buscar razões que justifiquem sua manutenção. Pretendemos nesta sessão apontar
razões evolucionistas para a existência de tal comportamento nos humanos (Homo
sapiens sapiens), seu surgimento na filogênese e ontogênese, bem como os fatores
próximos que podem influenciar na cooperação.
A cooperação em animais não humanos
Antes de iniciarmos a discussão sobre o comportamento cooperativo dos
humanos, pretendemos refletir um pouco sobre a existência desse comportamento em
outras espécies. Essa reflexão é importante tendo em vista que na evolução existe uma
continuidade (Darwin, 1859/2005) e que comportamentos cognitivos, emocionais e
morais variam em grau, estando presentes em várias outras espécies além da humana
(Bekoff, 2004). Nesse sentido, o estudo do comportamento animal é fundamental para
a compreensão do comportamento humano (Yamamoto, 2007; Bekoff, 2004).
Bekoff (2004) sugere que a observação do comportamento animal pode evitar
erros de interpretação relativos aos comportamentos cooperativos e moral, pois sem o
referencial filogenético esses comportamentos são freqüentemente considerados como
padrões culturais e não como parte do repertório humano “universal”. Nos humanos, o
1
Capacidade de sobrevivência e reprodução.
8
estudo da moralidade está muitas vezes atrelado a valores religiosos, e isto poderia
estar enviesando as interpretações dos resultados científicos. A perspectiva trazida pela
abordagem evolutiva, que inclui o estudo dos animais, contribui para a redução dessas
implicações.
Ao contrário do que muitos podem pensar, ações do tipo partilhar comida,
proteção e cuidado coletivo de infantes, proteção do grupo, caça e forrageio
comunitário, não o exclusivas dos humanos (ver Macedo, 2007). Indo mais além,
alguns estudos com chimpanzés (Pan troglodytes) sugerem que estes possuem uma
moralidade nos moldes humanos com capacidade de empatia, gratidão, ciúmes, senso
de lealdade, sentimentos de reciprocidade e consolação (De Wall, 2005; Silk et al.,
2005; Mitani & Watts, 2001).
A ocorrência de tais comportamentos sue que os indivíduos dessa espécie
são capazes de reconhecer os membros do grupo e lembrar-se de ações realizadas por
eles, sejam cooperativas ou não. Silk et al. (2005) e Mitani e Watts (2001) sugerem
que de fato é possível, e relatam que chimpanzés mostram essa percepção ao punir
trapaceiros (ou free riders)
2
não cooperando com eles, por exemplo.
Outros primatas, como por exemplo, Saguinus oedipus, também possuem essa
capacidade de retribuir atos cooperativos a quem cooperou anteriormente e punir
trapaceiros (Hauser, Chen, Chen & Chuang, 2003; Cronin, Kurian & Snowdow, 2005).
Mas esses atos de cooperação não são exclusividade dos primatas. Espécies mais
distantes filogeneticamente dos humanos também apresentam tais comportamentos
como, por exemplo, peixes (Taborsky, 1985), aves (Koenig, 1981), e outros
mamíferos, como os morcegos vampiro (Denault & McFarlane, 1995).
Saber que os animais não são tão diferentes dos humanos na questão da
moralidade é muitas vezes chocante. Isso se considerarmos que ser moral é algo
extremamente racional ou calculado e que necessita de um aparato cognitivo
extremamente eficiente para que ocorra. No entanto, a cooperação não é
exclusivamente humana e tem sido registrada em diversos animais (Macedo, 2006).
Além disso, a literatura atual em estudos com humanos têm demonstrado que o
comportamento moral não é fundamentado somente por decisões racionais, mas
2
Indivíduo que usufrui da cooperação do outro sem retribuir.
9
também emocionais (Moll, Oliveira-Souza, Bramati e Grafman, 2002; Koenig, Young,
Adolphs, Tranel, Cushman, Hauser, Damasio, 2007).
Certamente os dois componentes, racionais e emocionais (racionais no sentido
de ser percebida conscientemente ao realizar um ato) estão presentes nos processos
que envolvem a cooperação e foram importantes para a manutenção desse
comportamento.
Uma vez que muitos animais e humanos possuem características semelhantes,
devem existir motivos para a manutenção da cooperação em várias espécies. As
pressões seletivas de viver em grupo proporcionariam vantagens e desvantagens, mas,
certamente, do ponto de vista evolucionista, os benefícios superaram os custos.
A evolução da cooperação em humanos
Para entender melhor a cooperação humana do ponto de vista evolucionista
temos de lembrar que o ambiente onde evoluiu o Homo sapiens – o ambiente ancestral
ou ambiente de adaptação evolutiva não era como o ambiente atual, no qual as
pessoas podem permanecer solitárias por dias, solicitar comida por telefone ou
Internet, manter-se aquecidas e livres de parasitas.
A idéia de como era o ambiente ancestral humano é o resultado de
combinações estatísticas das características dos indivíduos e das propriedades
ambientais que permitiram a sobrevivência e a descendência de um maior número de
indivíduos (Tooby & Cosmides, 1990; Izar, no prelo). Isto implica que determinadas
características funcionais dos indivíduos que foram selecionadas ao longo do passado
evolutivo podem, ou não, ser funcionais no ambiente presente. Qualquer organismo
pode apresentar, hoje, características que não mais conferem fuão reprodutiva e
podem até diminuir suas chances de sobrevivência e reprodução (Izar, no prelo).
No ambiente ancestral, até cerca de 10 mil anos atrás, o alimento era caçado
ou coletado. Conseguir alimento e manter-se sauvel eram atividades custosas que
demandavam tempo e energia, já que os abrigos para fugir de predadores eram difíceis
de encontrar e os riscos de servir de presa eram grandes (Gaulin & MacBurney, 2001).
A psicologia evolucionista propõe que hoje, apesar das vantagens da tecnologia e das
mudanças no ambiente, nosso organismo freqüentemente reage com as características
10
selecionadas naquele ambiente (Gaulin & MacBurney, 2001; Izar, no prelo). Dessa
forma, para entendermos por que cooperamos ou não (trapaceamos), precisamos ter
informações sobre a vida de nossos antepassados.
A cooperação pode ter sido uma característica importante para a manutenção
dos indivíduos naqueles ambientes. As informações sobre como seriam esses
ambientes vêm da arqueologia e das sociedades modernas de caçador-coletores
(Gaulin & MacBurney, 2001).
A arqueologia pode nos fornecer dados sobre a locomoção predominante, o
tipo de alimento mais consumido, estimar o período em que a espécie viveu e suas
características anatômicas. O Homo sapiens, por exemplo, surgiu cerca de 100.000
anos (Leakey, 1997) e os mais antigos fósseis foram encontrados na África (em Omo
Kibbish) e em Israel (Skhul/Qafzeh) e datados em 140 a 100 mil anos (Niewoehner,
2000). O fato dos sseis mais antigos terem sido encontrados na África sugere que o
ambiente ancestral poderia ter sido naquele continente (Neves, Powell & Ozolins,
1999). No entanto, atualmente se pensa que esse ambiente não é um local específico e
sim um ambiente passado no qual a adaptação ocorreu (Izar, no prelo).
o estudo das modernas sociedades de caçadores-coletores pode nos dar
pistas de comportamentos mais específicos, inclusive do comportamento cooperativo e
de trapaça.
Johnson e Earle (2000) sugerem que as sociedades humanas evoluíram a partir
de grupos com fortes laços de parentesco, que eles consideram a forma mais elementar
de sociedade humana. Um grupo típico desse nível teria em torno de 25 indivíduos que
se dividiam em outros pequenos grupos, mas comiam juntos, cooperavam e
partilhavam alimento e outros itens. Os laços sociais eram mantidos com base na
confiança. As competições só existiam em caso de extrema escassez de recursos.
Embora, como regra, não houvesse privilégios para alguns membros da família nem a
ocorrência de free riders no ambiente familiar, o número pequeno de indivíduos
facilitava a fiscalização do comportamento de cada um. Estar em grupo era vantajoso e
seguro. E reconhecer e punir trapaceiros trazia vantagens para os indivíduos que
tinham essa habilidade (Broom, 2006). Desse modo podemos pensar que viver em um
11
grupo com fortes laços de parentesco trouxe algumas vantagens para os indiduos que
assim viviam.
A partir de agora, veremos as vantagens descritas que implicavam um grau de
cooperação entre os indivíduos:
a) diminuição do risco de predação: os humanos passavam seu tempo no
chão e esse fato tornava os indivíduos muito vulneráveis ao risco de predação (Gaulin
& MacBurney, 2001). Treves e Naughton-Treves (1999) sugerem que, mesmo nos
tempos atuais, em regiões nas quais os humanos partilham seu território com animais
selvagens, como em Uganda, por exemplo, o risco de vida causado por grandes
carnívoros (leões e leopardos) é alto. A associação dos indivíduos era fundamental
para manter a vigilância. Além disso, os ataques contra predadores eram mais
eficientes quando executados em grupos. os predadores possuem armas naturais
como garras e dentes que os humanos não possuem, fato que os deixavam ainda mais
vulneráveis. Desse modo, a ação do grupo contra os predadores aumentava as chances
de sobrevivência.
b) aumento da eficiência no forrageio e caça: os humanos m uma dieta
complexa que requer a ingestão de proteínas, fibras, sais minerais e outros itens para a
sobrevivência e nutrição adequada. Um indivíduo solitário teria dificuldades de
conseguir todos os itens. Em grupo era mais fácil conseguir grandes presas e partilhar
os sobressalentes de uma coleta. A partilha de alimentos é um fator comum em várias
sociedades de caçadores-coletores (Bird, Bird, Smith e Kushnick, 2002; Gurven, Hill,
Jakuti, 2004). O fato de partilhar proporcionaria a ampliação dos itens da dieta e
diminuiria os custos de procurá-la. Este tipo de partilha provavelmente já estava
presente entre os humanos no ambiente ancestral.
c) cuidado da prole pelos membros do grupo: o cuidado por parte de
indivíduos parentes ou não dos filhos de outros aumenta as chances de sobrevivência
dos infantes, mantendo as crianças saudáveis, alimentadas e livres de predadores e
parasitas (Trivers, 1971). Sear e Mace (2008), em um artigo de revisão, constataram
que a presença do pai, dos avós, de outros adultos e dos irmãos mais velhos ajudam na
sobrevivência das crianças mais novas. A ausência do pai não é tão fundamental
quanto a das mães, mas pode implicar a morte das crianças, dependendo do ambiente
12
em que eles vivem. A presença das avós não apresenta uma característica universal
para a sobrevivência das crianças, mas não deixa de ter importância para a sua
sobrevivência. Por outro lado, os resultados relativos ao cuidado pelos irmãos são
controvertidos em função de estes serem potenciais competidores pela atenção da e.
No entanto há evidências sugestivas de que a presença dos mais velhos pode aumentar
a sobrevivências dos mais novos.
Essas vantagens aumentam a aptidão dos indivíduos que fazem parte do grupo.
No entanto, para se manter no grupo e usufruir as vantagens há custos, alguns sem
uma relação estreita com a cooperação e outros relacionados a ela. Um exemplo do
primeiro tipo é o aumento da possibilidade de risco de infecção por parasitas. A
proximidade entre os indivíduos e a inexistência de cuidados higiênicos aumentava os
riscos de contágio e doença (Alcock 1989; Gaulin & MacBurney 2001).
Um exemplo do segundo tipo é a competição entre os indivíduos do grupo,
que pode aparecer das mais diversas formas, como disputa por espaço para dormir,
disputa por parceiros ou simplesmente a convivência com free riders e trapaceiros.
Estes últimos são competidores silenciosos. Daí a importância de sua identificação e
punição (Broom, 2006; Cosmides & Tooby, 1992; Kiyonari, Tanida & Yamagichi,
2000; Lowson, 2000, Cosmides, Tooby, Fiddick & Bryant, 2005).
A reputação dos trapaceiros a reprovação social da trapaça pode ter
uma explicação evolutiva. Lembrando que a vida dos nossos ancestrais não era muito
segura e que sobreviver requeria esforço e energia; manter vivos e saudáveis os
trapaceiros significava aumentar consideravelmente os custos do cooperador, tornando
a cooperação mais dispendiosa. Por essa razão, nossos ancestrais desenvolveram
mecanismos que facilitavam seu reconhecimento. Alguns trabalhos sugerem mesmo
que somos capazes de reconhecer os trapaceiros com maior facilidade do que
reconhecemos os indivíduos que cooperam (Cosmides & Tooby, 1992; Kiyonari, et
al., 2000; Lowson, 2002; Cosmides et al., 2005).
Reconhecendo-os, podemos evitar ser explorados por eles, aplicando punições
(Hardin, 1968, 1998) ou aumentando a reputação dos que cooperam (Wedekind, 2000;
Nowak & Sigmund, 1998; Wedekind & Milinski, 2000; Milinski, Semmann &
Krambeck, 2002).
13
d) Paradoxalmente, a cooperação tanto pode trazer vantagens quanto
desvantagens aos indivíduos que cooperam. Ela será vantajosa se os custos forem
inferiores aos benefícios. Discutiremos a seguir algumas das razões apontadas pela
psicologia evolucionista que sugerem possíveis vantagens da cooperação.
Seleção de parentesco
Relembrando que os ancestrais humanos viviam em grupos pequenos com
fortes laços de parentesco (Johnson & Earle, 2000), isto é, que carregavam genes em
comum, Hamilton (1964, citado por Axelrod & Hamilton, 1981) sugere uma
explicação para que a cooperação fosse mantida: a seleção de parentesco.
A seleção de parentesco é um mecanismo por meio do qual um indivíduo
favorece seus parentes genéticos, considerando que as características dos indivíduos
reprodutores são passadas adiante através dos genes. Essa transmissão pode se dar de
forma direta, quando o investimento é na própria prole; ou indireta, quando o
indivíduo não reproduz, mas investe na sobrevivência e/ou reprodução da prole dos
pais, irmãos, primos e outros parentes. O investimento nesse caso pode ser procurar e
partilhar comida, carregar os infantes e proteger-se de predadores e de indivíduos que
não são do grupo, bem como apresentar outros comportamentos que aumentam as
chances de sobrevivência e reprodução dos parentes.
Cooperar, nesses casos, traz benefícios a quem o faz em função da existência
de genes comuns. Isto é, a transmissão de genes para a geração seguinte pode dar-se
também através de indivíduos que não o descendentes diretos, mas que partilham
genes através do parentesco. Um gene que motiva o comportamento altruísta poderia
manter-se na população, via um parente.
A cooperação nos grupos de caçadores-coletores atuais, e provavelmente nos
nossos ancestrais, favorecia a aptidão dos indivíduos de forma indireta, ou seja, em
caso de o indivíduo não reproduzir, ele poderia contribuir para a sobrevivência ou
reprodução dos pais, irmãos, primos e outros parentes e, dessa maneira, aumentar sua
aptidão indireta.
14
O custo da ação do cooperador pode variar em função do gasto energético que
ela acarreta. Por exemplo, procurar alimento em época de escassez de recursos tem um
custo maior do que na época de abundância. Assim, quando os benefícios para o
doador são maiores do que os custos, a seleção natural favorece tal comportamento.
Logo, a seleção depende da relação entre o grau de parentesco entre os indivíduos (r),
os benefícios (b) e, ainda os custos (c) de cada ação. Na operação: rb>c, os benefícios
vezes o grau de parentesco devem ser maiores que os custos.
Entre caçadores-coletores, o alto grau de parentescos contribui para a alta
freqüência de partilhas observadas entre eles. Bird, Bird, Smith e Kushnick (2002)
relatam que 80% da partilha de alimentos entre os Meriam se davam entre os parentes.
Resultados semelhantes foram observados nos Aches (Gurven, Hill & Jakuti, 2004).
Certamente, alimentar o não parente tem alto custo, em função da dificuldade de
aquisição do alimento e da ausência de investimento nos próprios genes, mesmo que
indiretamente.
O alto grau de parentesco traz benefícios óbvios para os indivíduos do grupo,
pois a possibilidade de estar investindo nos seus próprios genes, quando o indivíduo
coopera, é bem maior. No entanto, com a ampliação do tamanho da população, como
ocorreu com o advento da agricultura e a domesticação de animais, a probabilidade de
cooperar com não parentes e até mesmo desconhecidos aumentou muito. Nessas
condições, a explicação da seleção de parentesco é insuficiente para dar conta da
cooperação na sociedade atual. No entanto, ela continuou e continua a ocorrer até os
dias de hoje.
Provavelmente, aquele mecanismo que trouxe vantagens no ambiente
ancestral, quando a espécie humana convivia praticamente apenas com parentes,
permanece ativo no ambiente atual. Entretanto, a estrutura dos grupos mudou, e as
pessoas podem estar respondendo a um ambiente alterado com mecanismos mentais
que ainda estão adaptados às estruturas ancestrais.
15
Altruísmo recíproco
Uma explicação para a manutenção da cooperação, mesmo quando os
indivíduos não são parentes, foi proposta por Trivers (1971) e denominada de
altruísmo recíproco.
No altruísmo recíproco, a cooperação se por meio de um benefício futuro,
dado pelo indivíduo que recebeu o benefício no presente, como no ditado: eu coço as
suas costas se você coçar as minhas.
Trivers (1971) demonstra a viabilidade de esse comportamento ter sido
selecionado, seguindo os mesmos parâmetros da seleção de parentesco: tempo de vida
longo, baixo padrão de dispersão, dependência tua, estabilidade, vida em grupo.
Essas características humanas poderiam levar à necessidade de reciprocidade entre os
indivíduos, independente do parentesco.
Um problema que pode ser experimentado pelo indivíduo que coopera
primeiro é a incerteza de retribuição, pois quem garante que ela virá? Um indivíduo
pode se comportar como free rider ou trapaceiro e dessa forma não haverá retribuição.
Para garantir a retribuição, esses atos são dirigidos a parceiros específicos que, em
função de sua história anterior de retribuição ou de sinais de confiabilidade, são tidos
como parceiros confiáveis. Cooperar sempre sem uma retribuição poderia diminuir a
reciprocidade e a cooperação.
Nesse sentido percebemos que a cooperação não é indiscriminada e a maioria
utiliza uma estratégia denominada de olho-por-olho que implica cooperar primeiro e
em seguida realizar o mesmo ato que o oponente fez na jogada anterior. Essa
conclusão foi pensada em 1984, por Axelrod (Prado, 1999; Ridley, 2000). Axelrod
utilizou estratégias desenvolvidas por vários cientistas e organizou, por meio de
torneios em computador, competições que simulavam as estratégias. O jogo utilizado
foi o Dilema do prisioneiro
3
com interações repetidas. A estratégia olho-por-olho saía
sempre como vencedora e apresentava as seguintes características:
3
É denominado de Dilema do prisioneiro, pois, na versão original, envolve dois prisioneiros que irão
ser submetidos a um interrogatório no qual podem confessar ou denunciar um crime. Se os dois
confessarem (cooperar), eles receberão a mesma pena. Caso um confesse (cooperação) e o outro
denuncie o parceiro (trapaça), o primeiro receberá a maior pena e o outro ficará livre (Kollock, 1998).
16
a) A gentileza, pois nunca trai primeiro;
b) o caráter vingativo, pois nunca deixa passar uma traição sem retaliar
na mesma moeda, no lance seguinte;
c) a generosidade, pois, as uma traição e conseqüente retaliação, se o
oponente passar a se comportar bem, o passado é esquecido e volta a
ocorrer a cooperação;
d) a transparência, pois é uma estratégia simples o suficiente para
permitir ao oponente notar de imediato com que tipo de
comportamento está lidando.
Essa estratégia explica por que cooperamos ou não em caso de interações
repetidas com possibilidade de reencontro, mas em muitas ocasiões na vida moderna
fazemos doações e não sabemos quem a receberá diretamente. Exemplificando,
campanha de doação de sangue ou doação a instituições de caridade. Nesse caso a
reciprocidade seria ainda mais incerta. E, ainda assim, por que cooperamos?
Uma possível explicação diz respeito à reputação adquirida ao cooperar ou
deixar de fazê-lo. Estudos experimentais mostram que, ao adquirir a reputação de bom
doador, um indivíduo atrai cooperação, mesmo que não seja conhecido pelos outros
membros do grupo (Nowak & Sigmund, 1998; Suzuki & Akiyama, 2005; Ohtsuki,
Hauert, Liberman & Nowak, 2006). Esses autores sugerem que temos a tendência a
cooperar com quem tem a fama de bom cooperador, mesmo que nunca tenhamos
estabelecido uma relação direta com ele. Nesse caso, a cooperação seria estimulada
por meio de um mecanismo denominado de altruísmo recíproco, indireto.
Altruísmo recíproco, indireto
No altruísmo recíproco, indireto, como no altruísmo direto, o retorno não é
imediato e a pessoa sequer sabe se receberá algo em troca. No entanto, a retribuição se
dará na frente de um público interessado que identificará o cooperador como tal.
A idéia por trás da reciprocidade indireta é que ajudar alguém ou recusar ajuda
tem um impacto na reputação do indivíduo dentro do grupo ao qual pertence. Uma
17
reputação ruim implica dificuldades em ser ajudado no futuro. E, então, é melhor
ajudar.
Um problema nessa explicação é que nem sempre temos informações perfeitas
sobre os indivíduos com os quais iremos cooperar, mesmo que saibamos que se trata
de indivíduos cooperativos. No entanto, lembrando que, no ambiente ancestral, os
indivíduos eram parentes próximos e, no ambiente moderno, independente do grau de
parentesco, mantemos a resposta moldada no nosso passado evolutivo, então,
cooperamos.
O ato de cooperar, que identificamos anteriormente como oposto à idéia da
seleção natural, de fato não o é. Ao contrário, cooperar é perfeitamente compatível se
for entendido como um mecanismo através do qual os indivíduos podem aumentar sua
aptidão. Isto se através da manutenção de nossos genes em nossos parentes, do
recebimento de um favor diretamente de quem ajudamos em situações anteriores ou
ainda em função da reputação que iremos construir.
Ontogênese e cooperação
Em que momento da ontogênese a cooperação aparece?
O início da cooperação entre crianças é controverso. Diversos estudos
apontam que as crianças são egoístas (Ensenberg & Mussen, 1995). No entanto, o
comportamento cooperativo pode aparecer cedo, aos dois ou três anos (Brownell,
Ramani & Zerwas, 2006), através de ações simples e imitativas; ou a partir dos quatro
anos através de comportamentos mais complexos e altruístas (Benenson, Pascoe &
Radmore, 2007).
Geary (1999) sugere que, principalmente meninas, com dias de nascidas,
importam-se com o sofrimento do outro, o que supõe a noção de empatia presente
desde muito cedo. Este é um sentimento que certamente está presente em todos os
momentos da vida, quando ajudamos alguém.
O desenvolvimento deste sentimento pode ser ampliado pelas vivências e
ainda pelo ingresso no mundo de regras que os adultos propõem. Piaget (1932/1994)
18
sugere que as primeiras noções relativas ao comportamento moral
4
que a criaa
recebe são transmitidas pelos adultos, através de regras (heteronímia). Por volta dos
sete anos, a criança passa a formalizar suas próprias regras e julga um ato como bom
ou ruim baseado em seus próprios conceitos (autonomia). Isto denota um
amadurecimento da noção do que é correto ou não fazer em determinadas ocasiões.
Piaget ainda ressalta que o convívio com outras crianças ajuda a desenvolver o
respeito mútuo e a solidariedade e teria mais força do que as instruções dos adultos.
A evolução do raciocínio na construção da moral e do senso de justiça foi
investigada mais intensamente através dos estudos sobre o julgamento moral
5
(Piaget
(1932/1994), Kohlberg (Citado por Biaggio, 1999) e comportamento pró-social
6
(Ensenberg & Mussen, 1995)..
Piaget (1932/1994), Kohlberg (citado por Biaggio, 1999) e Biaggio (1999)
assinalam a capacidade da criança em fazer julgamento moral através de estágios que
acompanhariam o desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Para ambos a seqüência de
estágios (dois para Piaget e oito para Kohlberg) é a mesma em todas as culturas,
passando de estágios de heteronímia para autonomia (Bee, 1984; Martins & Branco,
2001).
Tanto Piaget quanto Kohlberg proem que a tendência das crianças a se
colocar no lugar do outro, ato que ajuda na cooperação, se daria por volta dos sete (7)
anos (Bee, 1984) e que a reciprocidade é uma tendência espontânea do sujeito nas
relações sociais que envolvem trocas morais. As crianças passariam a ter a noção de
retribuição quando entendessem o princípio da reversibilidade (Kohlberg, 1984 citado
por Krebs, 2000).
Krebs (2000) sugere que os trabalhos de Kohlberg retratam o altruísmo
recíproco direto quando se refere ao estágio dois, no qual o indivíduo pensa: faça
pelos outros o que você gostaria que fizessem com você. O estágio três também estaria
4
Relação entre o que a sociedade impõe que seja certo ou errado e o que se conclui do que lhe é
ensinado.
5
Julgamento que as crianças realizam quando lhes são apresentadas sentenças que incluem atividades
certas ou erradas - a explicação dada pela criança é levada em consideração para a compreensão do seu
raciocínio (Piaget1932/1994).
6
Atos e atitudes cujas conseências, a nível social apresentam uma conotação positiva de
aproximação e colaboração entre os indivíduos, de auxílio e solidariedade e cooperativo (Ensenberg e
Faber, 1998).
19
relacionado à cooperação. Nesse caso, a pessoa se comportaria de modo a receber
aprovação pelo seu ato, fato que parece estar de acordo com os resultados em adultos
de Nowak e Sigmund (1998) e Milinski et al., (2002) sobre as retribuições serem
maiores para sujeitos que cooperam.
Freitas (1999) sugere que os trabalhos de Piaget sobre moralidade
permanecem inacabados pelo fato de não terem tocado no que ela considera um
mistério: o fato de uma pessoa ter condições morais para realizar um ato considerado
ético e não o fazer. Provavelmente outras condições não observadas por Piaget
poderiam estar presentes.
Zarbatany, Hartmann e Gelfand (1985) observaram que crianças mais velhas
(10 anos, numa amostra de crianças de 6 a 10 anos) apresentam maior grau de
generosidade (doação a crianças pobres). No entanto essa generosidade é evidenciada
quando estão em condições de exposição, ou seja: (a) quando os pesquisadores
explicam o objetivo da pesquisa e informam às crianças que irão observá-las
diretamente quando fizerem suas opções; (b) quando, além das instruções anteriores,
afirmam que fazer doações às crianças pobres é bom. Nas condições com menos
informações, as crianças de todas as idades não apresentam diferenças significativas
quanto à generosidade.
Freitas (1999) sugere que Piaget considerava que, independente da reação do
outro, a obrigação (moral) permanecia a mesma e, nesse ponto, podemos assinalar uma
diferença no que se refere à teoria evolucionista. Os achados evolucionistas sugerem
que utilizamos diferentes estratégias em função da resposta do outro (Milinski et al.,
2002; Semmann et al., 2003), de forma a maximizar o ganho (Semmann et al., 2003;
Hauert et al., 2002a, 2002b). Em algumas ocasiões, o ganho da trapaça pode favorecer
os indivíduos e em outros momentos é melhor cooperar com o grupo para aumentar as
vantagens. É possível que mecanismo semelhante ocorra com os indivíduos ainda
jovens no que se refere a agir moralmente ou não.
É importante ressaltar que essas reações não são necessariamente pensadas e
calculadas. Durante o passado evolucionista, o cérebro usava informações derivadas
do ambiente e do próprio organismo a fim de regular funcionalmente o comportamento
e o próprio corpo, reunindo aspectos cognitivos e emocionais. Em muitas ocasiões a
20
resposta é automática, sem necessidade de um julgamento calculado sobre os custos e
benefícios das ações.
Fan (2000) apresentou a crianças uma situão semelhante à do dilema do
prisioneiro e verificou que elas, em sua maioria, cooperavam. Crianças mais velhas
(sete a nove anos) tendiam a cooperar mais do que crianças mais novas – o que
corrobora os achados de Piaget e Kohlberg. Ainda nesse trabalho, ele verificou que a
tendência à reciprocidade é maior nas crianças de seis anos de idade do que nas mais
novas. Quando o reteste foi realizado, dando às crianças a oportunidade de retribuir, a
cooperação aumentou. A cooperação também aumentou nas crianças de todas as
idades quando o pesquisador falou sobre a cooperação antes do jogo. Nessas ocasiões,
poderíamos pensar que houve um aprendizado que aumentou a percepção dos ganhos
em uma situação de jogo, favorecendo o comportamento pró-social.
O aprendizado também pode dar-se no outro sentido, ou seja, aprender a ser
trapaceiro ou free rider. Krause e Harbaugh (2000) verificaram que crianças acima de
oito anos também aprendem a se comportar como free riders, nos jogos de bens
públicos
7
com várias repetições. Nas últimas sessões, o número de free riders
aumentou principalmente entre crianças acima de oito anos. Os autores sugerem que as
mais novas não percebem os ganhos de não cooperar com algo e ganhar alguma coisa,
como pode acontecer nesse tipo de jogo.
O parentesco, tal qual nos adultos, também influencia as crianças na hora de
tomar decisões sobre a partilha. Markovits, Benenson e Kramer (2003) verificaram
que as crianças tendem a partilhar alimentos com seus irmãos, independente de sua
relação de amizade com eles. O mesmo não ocorre quando eles são questionados se
partilhariam alimentos com um colega de sala com quem eles não mantêm uma boa
relação ou com estranhos. Nesses casos, as crianças até partilham com os colegas de
sala se o item em questão não se refere a algo energeticamente importante, ou seja,
algo de alto valor para a sobrevivência. Assim, tais resultados indicam que o
parentesco é um fator importante na hora de partilhar algo que pode ser útil.
7
Jogo no qual os jogadores devem contribuir para um bem comum e o somatório das contribuições é
dividido igualmente entre os jogadores.
21
Partindo do pressuposto de que a cooperação ocorre entre crianças,
questionamos como isso poderia se dar. Nossa perspectiva é de que cooperação mútua
ou recíproca necessita que saibamos da intenção dos outros. A idéia de que temos a
capacidade de atribuir estados mentais para nós mesmos e para os outros é
denominada de teoria da mente (ToM, do inglês Theory of Mind, Caixeta & Caixeta,
2000; Premack & Woodruff, 1978; Heyes, 1998). A partir de que idade as crianças
teriam essa capacidade?
Alguns trabalhos têm sugerido que as crianças desde pequenas têm a tendência
a observar o adulto e reagir às suas ações de modo a construir formas de responder
positivamente às trocas sociais (Carpenter, Akhatar & Tomasello, 1998).
Esses mesmos autores verificaram que crianças de 14 meses têm capacidade
de distinguir atividades intencionais das não intencionais em adultos. Esse mecanismo
certamente ajudará, no futuro, a decidir quanto a cooperar ou não. Outro trabalho
sugere que, no segundo ano de vida, as crianças têm a noção de certo ou errado
verificada através da expressão facial do adulto, que sinaliza aprovação ou reprovação.
Nesse sentido, a criança é capaz de compreender como agir (Herschkowitz, Kagan
& Zilles, 1999).
No terceiro ano elas o capazes de se sensibilizar com a tristeza do outro,
ponto importante para a reciprocidade e, de cinco a seis anos, elas são capazes de
sentir culpa (Kagan, 2000).
As questões apontadas pela teoria da mente o extremamente pertinentes no
estudo da cooperação, pois nos levam a deduzir que as crianças parecem já nascer com
um aparato cognitivo pronto para desenvolverem essas habilidades.
Fatores que interferem na cooperação
Até agora descrevemos a importância da cooperação nos humanos e algumas
explicações evolucionistas para que ela exista nas sociedades modernas.
Apresentaremos a seguir alguns dos mecanismos próximos
8
que nos levam à
cooperação: reputação, parentesco, sexo, tamanho do grupo, informão.
8
Questões relativas a mecanismos imediatos que levam determinada pessoa a determinada ação.
22
a) Sexo
As diferenças entre os sexos nas mais diversas habilidades têm sido apontadas
por inúmeros autores (Cohn, 1991; Geary, 1999; Hyde, 2005; Else-Quest, Hyde,
Goldsmith & Hulle, 2006). No entanto, as diferenças nem sempre estão presentes
(Hyde, 2005; Else-Quest et al., 2006).
No que se refere ao comportamento p-social, os resultados não são muito
consistentes e, quando aparecem diferenças, estas apontam para mais comportamento
pró-social das meninas do que dos meninos (Eisenberg & Mussen, 1995).
Quanto à cooperação (doação, contribuição, partilha ou não destruição de um
ambiente), alguns autores propõem que indivíduos do sexo feminino tendem a
cooperar mais do que aqueles do sexo masculino (Zarbatany et al., 1985; Cohn, 1991;
Cadsby & Maynes, 1998; Markovits et al., 2003; Jeffee & Hyde, 2000); enquanto
outros sugerem que não há diferenças quando a variável é quantidade de doações
(Andreoni & Vesterlund, 2001; Sell, Griffith & Wilson, 1993; Alencar, Siqueira &
Yamamoto, 2008).
Um argumento utilizado na discussão sobre a inconsistência do efeito do sexo
na cooperação se refere à composição das díades ou dos grupos.
Banco e Mettel (1984), em estudo com criaas, verificaram uma relação entre
o mero de ocorrências do comportamento p-social e o sexo de quem é o alvo
desse comportamento. A maioria das interações ocorreu entre indivíduos do mesmo
sexo. Embora elas não tenham observado diferenças entre os sexos na quantidade de
comportamento pró-social, foi verificado um viés em relação ao alvo do
comportamento, ou seja, meninos dirigem mais comportamentos p-sociais para
meninos e meninas mais para meninas.
Outras diferenças também encontradas neste mesmo estudo se referem ao fato
de que episódios de cooperação (não definido pelas autoras) foram significativamente
mais freqüentes entre os meninos do que entre as meninas. Entretanto, as meninas
apresentaram uma maior freqüência na categoria “dar” em relação a objetos que
estavam utilizando na brincadeira do que os meninos (esse comportamento está em
uma categoria chamada: atividades relacionadas a objetos, lugar ou privilégio, que
23
inclui, entre outras coisas, freência de dar para o outro um objeto com o qual está
brincando).
Entre adultos, Anthony e Horne (2003) observaram que há redução da trapaça
e aumento da cooperação em grupos compostos por uma porcentagem maior de
mulheres. Sell (1997) sugere que as tanto mulheres quanto homens cooperam mais
quando estão jogando em grupos formados por uma maioria feminina.
Simpson (2003) argumenta que muitos trabalhos nos quais foram verificadas
diferenças entre os sexos baseiam-se em sentimentos de medo e ganância e esse fato
pode estar influenciando as diferenças, pois, quando há medo e risco envolvidos, o
sexo feminino tende evitar a trapaça e a cooperar mais. Isto é, as mulheres evitam
grandes perdas em jogos competitivos enquanto os homens arriscam mais.
Possivelmente o quanto e o que se ganha podem ser raes para as diferenças
encontradas entre os estudos sobre o comportamento de cooperação entre os sexos.
Sell et al. (1993) investigaram o efeito do tipo de recompensa na cooperação
de homens e mulheres. Eles sugeriram aos participantes da pesquisa que fizessem uma
contribuição para um bem comum e que, dependendo de quanto o grupo doasse, eles
teriam uma recompensa que poderia ser dinheiro ou tempo com um perito (ex: horas
de aula com professor de russo, de dança, de tênis entre outros). Os resultados
mostraram que os homens contribuem mais do que as mulheres quando a recompensa
é tempo gasto com um perito. Pom, quando a recompensa é dinheiro, não houve
diferenças.
Andreoni e Vesterlund (2001) verificaram que a doação a outro participante
do jogo não é afetada pelo sexo do doador. Pom, se é conhecido o quanto o oponente
possui, existem diferenças entre os sexos: se a doação for feita para alguém que tenha
ganhado um acumulado maior do que quem vai doar, as mulheres doam menos. Para
os homens não diferença: suas doações foram semelhantes conhecendo ou não os
ganhos do recipiente
9
.
Os dados ainda não são conclusivos quanto ao efeito do sexo. Tendo em vista
as diferentes metodologias aplicadas, os sexos podem se comportar de forma diversa
para resolver os mesmos problemas. A maneira de apresentar o problema e as
9
Pessoa que recebe a doação.
24
circunstâncias específicas nas quais a cooperação pode dar-se afetam diferentemente o
comportamento de homens e mulheres.
b) Tamanho do grupo
Com base nos atuais caçadores-coletores, podemos supor que, no ambiente
ancestral, os grupos eram pequenos e isso tornava a cooperação mais provável. Com o
crescimento da população, as sociedades aumentaram de tamanho e a reciprocidade foi
reduzida (Johnson e Earle, 2000), Suzuki e Akiyama, (2005).
A redução da reciprocidade em grandes grupos pode dar-se porque, nos grupos
grandes e dispersos, um free rider pode ser extremamente bem sucedido, recebendo os
favores dos indivíduos que ali residem, ou usufruindo um recurso sem contribuir para
sua manutenção. Esse fato pode ser decorrente de que quanto maior o grupo maior a
dificuldade de identificar os trapaceiros. (Dunbar, 1999; Kollock, 1998; Suzuki &
Akiyama, 2005).
Suzuki e Akiyama (2005) sugerem que, nos grandes grupos, o efeito da
reputação, que é um fator importante para a manutenção do altruísmo direto e indireto,
é diluído uma vez que, da mesma forma que temos dificuldade em identificar e punir
os trapaceiros, também não identificamos os indivíduos que cooperam. Logo a
reputação perde seu efeito sinalizador.
Alencar et al. (2008) obtiveram resultados semelhantes em um estudo com
crianças. Em grupos de até sete indivíduos a cooperação foi maior do que em grupo
maiores, provavelmente em função da dificuldade de identificação e punição dos
indivíduos que não cooperam nesses últimos grupos.
c) Informação sobre quem receberá a cooperação
No nosso dia-a-dia, outro fator que interfere no quanto se coopera está no
nível de informação que temos dos indivíduos com os quais nos relacionamos.
Aspectos tais como a possibilidade e a quantidade de vezes que teremos de encontrar
alguém novamente, o sexo, e a reputação (se é bom doador ou não) são pontos
importantes a se considerar.
Clark e Sefton (2001) verificaram que, quando se sabe que há possibilidades
de reencontrar os indivíduos, portanto, possibilidades de trocas futuras, a
25
probabilidade de cooperar é maior. A alta probabilidade de encontros futuros sinaliza
uma probabilidade também maior de reciprocidade àqueles que ajudamos no presente.
Informação sobre o sexo do indivíduo que receberá a cooperação pode
influenciar nos resultados: tanto homens quanto mulheres que sabem que estão
jogando com outras mulheres cooperam mais do que as mulheres e homens que não
sabem o sexo do oponente. Os homens também cooperam menos se sabem que estão
jogando com outros homens.
Informação sobre a reputação, como visto anteriormente, é um fator
importante na cooperação. As trocas podem mudar de padrão se tivermos informação
sobre trocas anteriores do recipiente e favorecer estratégias baseadas em confiança. Se
o doador tem uma reputação ruim, as trocas podem ser afetadas pela redução dos
encontros com esse doador (Nowak & Sigmund, 1998). Em experimentos com o uso
do jogo dos bens blicos, Sell (1997) observou que os jogadores diminuem a
contribuição a um bem público se sabem que o grupo é formado por indivíduos não
cooperativos.
d) Confiança e lealdade
De acordo com Parks (1994) e Cremer (1999), a confiança é o melhor preditor
para a cooperação em jogos dos bens públicos. A percepção do outro como um
cooperador potencial ou não foi investigado por vários autores como Kerr & Kaufman-
Gilliland (1994); Cremer, (1999); Scharlemann, Eckel, Kacelnik & Wilson (2001).
Scharlemann et al. (2001) sugerem que o sorriso pode eliciar a cooperação
entre estranhos. Isso porque, segundo os autores, o sorriso é um fator que induz a
confiança, principalmente entre indivíduos que não se conhecem. Nesse estudo, os
participantes eram convidados a cooperar com pessoas que lhe eram apresentadas
através de fotos. Quando as fotos eram de pessoas sorridentes os sujeitos cooperavam
mais do que quando as fotos eram de pessoas que não estavam sorrindo. Esse dado é
importante, no entanto, como no mundo atual nem sempre estamos vendo com quem
nos relacionamos, eles são válidos apenas em situações em que ocorram interações
diretas.
26
e) As emoções
É impossível imaginar o ser humano sem emoção. Charles Darwin dedicou um
livro ao estudo das emoções nos humanos
10
. Nele, proe que os seres humanos foram
dotados de expressões emocionais que se dão por meio de sorriso, choro, gestos ou
outra expressões, ao longo do processo evolutivo.
Os achados evolucionistas relativos à cooperação sugerem que a decisão
quanto a cooperar, ou não, basicamente é racional, mesmo porque muitos deles
utilizaram metodologias que não implicam a observação das emoções. Esse é o caso
dos estudos que utilizam a teoria dos jogos, uma abordagem que implica racionalidade
para escolher e maximizar os ganhos (Munck, 2000; Aquino, 2008). Da mesma forma,
quando são utilizados computadores e não interações face a face, as decisões parecem
se sustentar basicamente em aspectos racionais (Ex: Nowak & Sigmund, 1998;
Axelrod & Hamilton, 1981).
No entanto, a psicologia evolucionista trabalha com a premissa de que a
emoção e razão não estão divididas e fazem parte do processo mental. Assim, não há
um efeito das emoções sobre a cognição, porque cognição refere-se a todas as
operações do cérebro (Cosmides & Tooby, 2000).
Com o advento da neurociência muitos trabalhos têm demonstrado que as
decisões morais sofrem influência de áreas cerebrais consideradas como estando
relacionadas à emoção (Moll et al., 2002; Koenig et al. 2007). Berthoz, Grèzes,
Armony, Passingham e Dolan (2006) verificaram que a amígdala, um importante
centro vinculado aos processos afetivos e lembranças de situações traumáticas, é
ativada quando os indivíduos escutam histórias nas quais eles próprios são
protagonistas de transgressão das normas sociais. Os autores sugerem que, quando nos
colocamos em situações associadas à transgressão de normas, somos acometidos por
sentimentos de culpa, o que, de certo modo, poderia ser um dos fatores que nos faria
evitar o envolvimento em ações dessa natureza.
Rilling, Gutman, Zeh, Pagnoni, Berns e Kilts (2002) demonstraram que
atividades que envolvem a cooperação mútua estão associadas à ativação de áreas
10
The expression of the emotions in man and animals (A Expressão das Emoções nos Homens e nos
Animais) publicado originalmente em 1872, pela University of Chicago Press.
27
cerebrais ligadas a processos de recompensa (prazer), como o cleo accumbens, o
núcleo caudato e partes do córtex frontal. Em contextos nos quais não havia
cooperação as áreas de recompensa não eram ativadas. Parece, dessa forma, que
cooperar, por si só, faz bem para quem coopera.
Os dois trabalhos citados acima nos sugerem que muito da nossa moralidade
não é necessariamente atributo de reforçadores externos, mas relacionada a fatores que
estariam no próprio indivíduo, tal como sugeriu Piaget (1932/1994).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ser um indivíduo que coopera ou não certamente depende da associação de
diversos fatores tais como a idade, o tamanho do grupo, o sexo dos indivíduos com
quem se irá cooperar e informações que temos sobre eles e ainda se confiamos ou não
em quem estamos ajudando. Esses aspectos, associados ou não, irão nos “indicar” se é
vantajoso cooperar.
É claro que a decisão de cooperar ou trapacear é tomada a partir da análise de
todos os fatores próximos ou finais dos nossos atos, mesmo que sequer calculemos
conscientemente o que será mais vantajoso. Deste modo, as pessoas não deixam de
cooperar porque sabem que só é vantajoso fazê-lo em grupos nos quais todos
cooperem, e que ser trapaceiro no meio de muitos outros trapaceiros não representa
vantagem para ninguém. Simplesmente, no momento de tomar a decisão, fazemo-lo
em função de pressões seletivas do nosso passado evolutivo.
Observando como e por que cooperamos, damo-nos conta de que nossa
moralidade serve, na realidade, a nossos interesses egoístas. Concordando com o que
sugere Cartwright (2000), a moralidade é um meio por meio do qual os indivíduos
tentam induzir o moralismo nos outros em seu próprio interesse.
Analisar a cooperação com base na psicologia evolucionista pode parecer
calculista. No entanto, é importante esclarecer que não falamos aqui de cooperação
com uma conotação moral ou altruísta do ponto de vista ético. Comportamentos que
poderiam ser classificados como altruístas, sob uma ótica filosófica ou jurídica,
tornam-se egoístas quando buscamos suas causalidades mais básicas na filogênese.
28
Além disso, as motivações para tais comportamentos não são aparentes (nem
conscientes) ao indivíduo que se comporta de forma cooperativa ou não.
O modo de vida de nossos ancestrais envolvia a prática freqüente de altruísmo
recíproco e reciprocidade indireta. Tais interações provavelmente ocorreram em
função daquelas marcas na mente humana que favorecem respostas emocionais. Uma
conseqüência disso é que, mesmo nas sociedades modernas, nossas decisões relativas a
trocas sociais são governadas pela emoção tanto quanto pela razão.
Lembramos que a seleção não age sobre nossa consciência, mas, sim, sobre
nossa sobrevivência e reprodução. Quando cooperamos, estamos reagindo
emocionalmente a situações que fariam sentido do ponto de vista adaptativo, no
ambiente ancestral, mas que, na situação atual, apresentam muitas diferenças. Nossos
sentimentos foram projetados, pela seleção natural, para cumprir o objetivo maior de
sobreviver e reproduzir, e somos ainda presas dessas emoções.
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36
1.2. Artigo Teórico II - A teoria dos jogos como metodologia de investigação
científica para a cooperação
Título resumido
Teoria dos jogos
Anuska Irene Alencar
Maria Emília Yamamoto
Programa de Pós Graduação em Psicobiologia, Departamento de Fisiologia
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil
Correspondência:
Anuska Irene Alencar
Campus Universitário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRAZIL
e-mail: anuskaalencar@yahoo.com.br
37
RESUMO
A teoria dos jogos é uma abordagem matemática que estuda formalmente o conflito e a
cooperação. Trata-se de uma teoria científica suficientemente forte para a construção
de conhecimentos nas mais diversas áreas como Economia, Política, Biologia,
Psicologia e Sociologia. Apresentamos, neste artigo, sua aplicação para o estudo da
cooperação em uma perspectiva evolucionista. Acreditamos que essa metodologia
possa auxiliar os pesquisadores na compreensão dos mecanismos que nos levam a
cooperar ou trapacear em nossas interações sociais.
PALAVRAS-CHAVE: Dilema do prisioneiro, Jogo dos bens públicos e Terra dos
comuns.
ABSTRACT
Game Theory is a mathematical approach that analyses formally conflict and
cooperation. It is a scientific approach applicable to the construction of knowledge in
many different areas such as Economy, Politics, Biology, Psychology and Sociology.
We present in this article its application to the study of cooperation from an
evolutionary approach and we believe this methodology can help researchers to
understand the mechanisms that lead us to collaborate or to cheat in our social
interactions.
KEYWORDS: Prisoner’s dilemmas, Public goods game, Common pool.
INTRODUÇÃO
Comumente nos engajamos em atividades sociais que envolvam cooperação
como doar comida, ajudar feridos em situações de catástrofe, cuidar de crianças
aparentadas ou abandonadas, partilhar conhecimento (Trivers, 1971). Esses atos
constituem requisitos importantes na manutenção das relações sociais. Em
contrapartida, existem comportamentos não cooperativos como usufruir uma ação
social sem ajudar (trapacear ou free riding), como é o caso de não pagar a conta de luz
e usufruir da iluminação blica, não entrar na cota do cafezinho e tomá-lo, não
retribuir a ajuda de um amigo. Atos deste tipo são considerados ações negativas para a
manutenção das relações sociais quando o duradouros ou freqüentes.
38
Mas em quais circunstâncias decidimos que devemos ou podemos cooperar ou
trapacear? Essa questão pode gerar um conflito nos indivíduos tendo em vista que a
trapaça pode trazer vantagens para quem a pratica em função de não ter custos
(energéticos ou financeiros), mas ao mesmo tempo pode influenciar negativamente
suas relações sociais. Traz também um prejuízo social, pois aumenta os custos dos
indivíduos que sempre cooperam.
Estudar as relações sociais que envolvem esses comportamentos pode ser muito
útil para compreender as razões pelas quais os indivíduos não cooperam e prevenir os
altos custos que os indivíduos não cooperativos podem trazer.
Uma abordagem matetica que estuda formalmente o conflito e a cooperação é
teoria dos jogos. Os modelos matemáticos propostos pela teoria descrevem interações
competitivas, ou cooperativas, sujeitas a um conjunto de regras, sendo os resultados
das interações decorrentes das estratégias utilizadas pelos jogadores. Uma estratégia é
um plano de ação que descreve as decisões tomadas por um jogador sob quaisquer
circunstâncias e os Jogadores podem ser empresas, pessoas, grupos de pessoas ou de
animais que tomam decisões. De acordo com Fernandes (1995), a teoria dos jogos é
básica para o entendimento de situações em que um indivíduo deve decidir sobre seu
comportamento com base no de outro ou outros indivíduos do grupo.
Munck (2000) sugere que esta é uma abordagem científica suficientemente
forte para a construção de conhecimentos nas mais diversas áreas. Sua utilização não é
restrita a um domínio concreto particular e pode servir como unificador para integrar
pesquisas diversas. Tem sido empregada no estudo de um grande número de temas
fundamentais para a Política Comparada (Munck, 2000), para a Economia (Prado,
1999) Sociologia (Kollock, 1998, Fernandes, 1995) e para a Biologia (Fernandes,
1995).
Foi desenvolvida nos anos 1940 por John Von Neumann e Oskar Morgenstern
e utilizada por muito tempo em modelos microeconômicos (Fernandes, 1995;
Marinho, 2005). A partir da cada de 70, ganhou muito espaço na Biologia
39
(Fernandes, 1995), especialmente na sua vertente evolucionista, e atualmente na
Psicologia evolucionista
11
.
De acordo com Marinho (2005), essa teoria se encaixa perfeitamente nos
estudos evolucionistas, pois sua premissa básica é semelhante à da seleção natural
12
.
Na teoria dos jogos, admite-se que os jogadores tentem maximizar seus ganhos ou
minimizar as perdas. A seleção natural, por sua vez, privilegia os “bons jogadores”. Os
ganhos que cada jogador recebe em um determinado jogo são afetados pela utilidade
que esses ganhos efetivamente têm para cada jogador. D se extrai um conceito
importante da teoria dos jogos: a Teoria da Utilidade. Os bons jogadores, do ponto de
vista da seleção natural, equivalem aos indivíduos mais capazes de sobreviver e
reproduzir em um determinado ambiente.
Um trabalho de Maynard Smith na década de 70 deu um grande impulso para
a introdução da teoria dos jogos na biologia, principalmente no estudo de conflitos em
animais. Nesse trabalho, Smith e Price (1973) criaram o conceito de estratégia
evolutivamente estável, a qual se refere a uma estratégia de resolução de conflitos que,
caso seja adotada pela maioria dos membros de uma população, impede o
aparecimento de uma estratégia “mutante”. Esta é uma estratégia que é diferente
daquela adotada pela maioria do grupo e que, exatamente por essa razão é muito mais
eficiente do que a estratégia do grupo. A partir de modelos matemáticos, esses autores
simularam, em computadores, situações em que várias estratégias estariam envolvidas
(luta ritualizada, ataque mortal e fuga em caso de ataque). Eles observaram que a
estratégia mais eficaz seria iniciar com uma luta ritualizada e atacar caso fosse atacado
(retaliador). Essa estratégia mostrou-se a de maior sucesso permitindo vencer uma
competição sem sofrer danos, pois caso o oponente não mostrasse disposição para a
11
A Psicologia Evolucionista é uma abordagem da psicologia que propõe que a mente humana
funciona por meio de mecanismos psicológicos evoluídos, evocativos do ambiente ancestral no qual
ela evoluiu. Esta abordagem traz uma proposta de solução para uma questão muito debatida, a
dicotomia entre biologia e cultura. (http://lineu.cb.ufrn.br/psicoevol/rede.php acessado em
24/06/2008).
12
Seleção Natural é um processo por meio do qual indivíduos mostram sobrevivência e/ou reprodução
diferencial. Para que a seleção natural ocorra, três condições devem ser satisfeitas: a) a população em
que esse indivíduo se encontra deve mostrar variação genética; b) essa característica, de base genética,
deve ser transmitida através da hereditariedade; c) algumas das variações devem prover vantagens
reprodutivas e/ou de sobrevivência ao seu portador (Yamamoto, 2007).
40
luta, esta era ganha sem que ocorresse o ataque e os custos dele decorrentes, como a
possibilidade de sofrer injúrias. Por outro lado, naqueles poucos casos nos quais o
oponente atacasse, havia a possibilidade de retaliação e de vencer a luta, embora
arcando com os custos do ataque.
Este trabalho propõe a teoria dos jogos como um forte aliado metodológico,
focalizando o pensamento no indivíduo e ressaltando a idéia da seleção natural em que
os indivíduos mais adaptados sobrevivem (Axelrod & Hamilton, 1981; Fernandes,
1995). Em concordância com Fernandes (1995), destacamos que a interdependência
mantida nas interações formalizadas pela teoria dos jogos permite o tratamento
matemático dos conflitos, além do aspecto evolutivo e mantenedor da cooperação
entre indivíduos que, em última análise, agem de forma a maximizar seus ganhos.
Partindo da assertiva desses três últimos autores referidos de que essa teoria
pode ajudar a compreender a questão da cooperação, descreveremos, a seguir, alguns
jogos e sua aplicabilidade para a compreensão desses fenômenos.
a) Jogo com dois jogadores – Dilema do prisioneiro
O mais famoso, dentre os jogos da teoria é o Dilema do Prisioneiro. Recebe esse
nome porquanto, na versão original, publicada pela primeira vem em 1953 por Willian
Poundstone (Marinho, 2005), envolve dois prisioneiros que irão ser submetidos a um
interrogatório durante o qual podem confessar ou denunciar um crime que cometeram
juntos. Os dois jogadores têm a oportunidade de cooperar ou não com o seu parceiro.
Dependendo da escolha, cada um recebe uma recompensa (payoff).
Se os dois cooperarem, ou seja, não acusam o colega nem confessam o crime,
eles receberão a mesma pena. Caso um confesse (cooperação) e o outro denuncie o
parceiro (trapaça), o primeiro receberá a maior pena e o outro ficará livre (Kollock,
1998; Marinho, 2005). O Dilema do Prisioneiro é jogado por dois indivíduos
simultaneamente ou em seqüência, mas sem que um saiba a resposta do outro.
O Quadro 1 apresenta uma matriz de recompensa, na qual os números
representam os anos de prisão que cada jogador terá caso negue a culpa do colega
(cooperação) ou o culpe (trapaça), o que implica negar sua participação no crime.
Neste exemplo hipotético colocamos uma pena máxima de 10 anos. As matrizes, em
41
outros exemplos, poderão ter valores alterados dependendo do objetivo do pesquisador
ou da versão que ele utilize. (Trivers 1971; Kollock, 1998; Marinho, 2005).
Quadro 1. Matriz hipotética de um jogo do Dilema do
prisioneiro. A=2 anos de prisão para cada prisioneiro;
B=liberdade para o prisioneiro 1 e 10 anos de prisão para o
prisioneiro 2; C=liberdade para o prisioneiro 2 e 10 anos de
prisão para a prisioneiro 1; D=8 anos de prisão para cada um dos
prisioneiros.
Prisioneiro 2
Não acusar o
colega nem
confeçar
(coopera)
Acusa o
colega
(trapaceia)
Não acusar o
colega nem
confeçar
(coopera)
A
2
2
C
0
10
Prisioneiro 1
Acusa o colega
(trapaceia)
B
10
0
D
8
8
Observamos que, se ambos negarem a culpa, ambos terão dois anos de prisão
(A); se ambos acusarem um ao outro, ambos terão uma pena de oito anos (D); se um
acusar o colega e o outro não o fizer, o que acusou ficalivre e o outro ficará dez anos
preso (B e C).
Considerando o Prisioneiro 1, a seqüência das melhores decisões seria: B > A >
D > C. Porém, a decisão A implica a cooperação do outro prisioneiro, algo de que o
Prisioneiro 1 não pode estar seguro. Nesse sentido, as decisões B e D garantem os
benefícios, independente de como o outro prisioneiro se comporte. Portanto, trapacear,
em princípio, é a melhor decisão. No entanto, se as interações são repetidas, como em
geral é o caso das nossas relações diárias (reencontramos as mesmas pessoas todos os
42
dias, como no trabalho ou na sala de aula), por exemplo, trapacear nem sempre será
vantajoso. Foi o que verificaram Axelrod e Hamilton (1981).
Axelrod e Hamilton (1981) utilizaram várias estratégias desenvolvidas por
diversos cientistas e organizaram, por meio de torneios em computador, competições
que simulavam diferentes estratégias para o Dilema do Prisioneiro com interações
repetidas. Eles verificaram que as estratégias mais cooperativas foram aquelas que
mostraram melhores resultados, e entre elas a Olho-por-olho foi a que trouxe mais
vantagem para o jogador. Utilizando essa estratégia, os jogadores seguem duas regras:
sempre cooperar da primeira vez e depois fazer exatamente aquilo que o oponente
tiver feito no lance anterior; trapacear se tiver sido trapaceado e cooperar caso tenha
obtido cooperação. Quatro características podem ser identificadas no jogador que usa
esta estratégia:
a) A gentileza, pois nunca trai primeiro;
b) o caráter vingativo, pois nunca deixa passar uma traição sem retaliar
na mesma moeda, no lance seguinte;
c) a generosidade, pois, após uma traição e conseqüente retaliação, se o
oponente passar a se comportar bem, o passado é esquecido e volta a
ocorrer a cooperação;
d) a transparência, pois é uma estratégia simples o suficiente para
permitir ao oponente notar de imediato com que tipo de
comportamento está lidando.
Do ponto de vista da seleção natural essa estratégia é mais vantajosa, pois os
indivíduos envolvidos em atos altruístas teriam mais vantagens do que os não
altruístas. O altruísmo é entendido como definido por (Oliva et al., 2006): ão que
promove a aptidão do recipiente às custas do doador.
O trabalho de Axelrod e Hamilton (1981) traz outro conceito desenvolvido
anos antes por Trivers (1971): o altruísmo recíproco. Trivers não utilizou
empiricamente o Dilema do Prisioneiro, mas, ao propor esse conceito sugere que,
dada a possibilidade de reencontros, a reciprocidade explicaria a manutenção da
cooperação em diversas espécies, a humana entre elas.
43
A reciprocidade é um fator fundamental na evolução dos seres vivos. Ela
permite que convivamos com indivíduos trapaceiros sem que estes usufruam a
nossa cooperação indiscriminada, principalmente quando podemos identificar
diretamente com quem cooperamos. E, se utilizamos a estratégia Olho-por-olho,
provavelmente não seremos explorados pelos trapaceiros. Após o trabalho de
Axelrod e Hamilton vários outros autores investigaram a questão da cooperação sob
o prisma do Dilema do Prisioneiro. Uma questão recorrente no que diz respeito à
cooperação é sua ocorrência sem a possibilidade de reciprocidade direta, ou seja,
fazemos doações sem saber quem recebe o benefício (por exemplo, doamos
sangue ou dinheiro para uma instituição de caridade)?
Uma hipótese para explicar essas ações foi investigada, utilizando o Dilema
do Prisioneiro, por Nowak e Sigmund (1998). Esses autores elaboraram um
experimento em que havia um jogo do Dilema do Prisioneiro e os resultados das
ações dos jogadores eram colocados em uma tela de computador. Foi verificado que
os jogadores mais cooperativos recebiam maior cooperação dos outros jogadores,
mesmo que o beneficiário dessas doações fosse outro jogador. Esses dados sugerem
que temos a tendência a cooperar com quem coopera, mesmo que não tenhamos
oportunidade de encontrar aquela pessoa e receber os benefícios diretamente. A
reputação de bom cooperador facilita uma retribuição indireta. Os autores chamam
esse comportamento de altruísmo recíproco indireto.
Crianças também foram submetidas ao Dilema do Prisioneiro. Fan (2000),
utilizando a estrutura básica desse jogo (os jogadores têm a possibilidade de cooperar
ou trapacear com um colega em interações repetidas), verificou que crianças mais
velhas (sete a nove anos) cooperam mais do que as mais novas. A sua utilização no
estudo do desenvolvimento infantil pode trazer dados interessantes para compreender a
expressividade da cooperação ao longo da ontogênese.
Apesar de útil como metodologia para o estudo das interações sociais, o fato
de o Dilema do Prisioneiro ser jogado apenas por dois jogadores representa uma
limitação, porquanto reflete uma situação artificial ou limitada, tendo em vista que a
maioria das interações diárias é realizada por muitos jogadores e não apenas por dois.
44
No entanto, o raciocínio utilizado nesse jogo pode se expandir para jogos com
múltiplos jogadores e a teoria dos jogos pode auxiliar nessa compreensão.
b) Jogos com múltiplos jogadores
b.1) Jogo dos bens públicos
O Jogo dos Bens Públicos é semelhante ao do Dilema do Prisioneiro, porém
jogado por muitos jogadores. Nele os jogadores adicionam um valor a um bem comum
e, posteriormente, o que for arrecadado será dividido entre todos os participantes. Esse
dilema é vivenciado na vida real quando pagamos impostos ou coletamos dinheiro
para comprar água ou café no trabalho.
Os indivíduos trapaceiros (ou free riders) que podem aparecer nos jogos do
Dilema do Prisioneiro também estarão presentes nesse jogo. Com múltiplos jogadores,
a incidência desses free riders aumenta, o que pode trazer desvantagens para os
cooperadores, que gastam muita energia para manter esses indivíduos com suas
doações. Em populações grandes, torna-se difícil identificar e punir os o
cooperadores (Cartwright, 2000). Portanto, utilizando a metodologia da teoria dos
jogos, podemos entender por que alguns indivíduos se comportam como trapaceiros e
propor maneiras de impedir sua propagação. Também podemos compreender as
circunstâncias que tornam o comportamento de free riding mais vantajoso do que o de
cooperação.
Utilizando o jogo dos bens públicos, Semmann, Krambeck e Milinski (2003) e
Hauert, De Montes, Hofbauer e Sigmund (2002a, 2002b) sugerem: a. trapacear é a
melhor estratégia, no sentido de que o jogador ganha mais; b. pom, para que o
trapaceiro ganhe é preciso que os outros cooperem; c. cooperar só é bom em grupos
em que todos cooperam; d. a cooperação será predominante em grupos pequenos,
desde que o valor recebido não esteja muito abaixo do custo da sua cooperação.
Um exemplo interessante, que ilustra a utilização desse jogo em uma situação
real, foi relatado por Yamamoto, Lacerda e Alencar (no prelo). Eles contam que, em
Mato Grosso, próximo da saída para o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, a
cerca de cinco quilômetros do centro de Cuiabá-MT, localiza-se um grande conjunto
residencial composto de dez quadras com sete blocos de apartamentos cada uma. O
45
condomínio foi construído para a população de baixa renda e, durante muitos anos,
havia uma grande desorganização. Muitos moradores não conseguiam pagar o
financiamento e muito menos as taxas de administração do condomínio (utilizadas
para organização do local e a água consumida nos blocos de apartamentos). A única
conta individual era a da energia elétrica do próprio apartamento.
Analisando essa idéia a partir de uma compreensão do Jogo dos Bens
Públicos, consideramos que a taxa do condomínio seria um investimento para um bem
comum já que, com esse dinheiro, haveria retorno para todos (melhores condições para
os blocos além da água de cada bloco). No entanto, como em todos os modelos de
bens públicos, nem todos pagavam. Havia free riders nesse condomínio.
Assim um conflito de interesses aparece: pagar ou não a taxa? Até que ponto
valeria a pena pagar ou deixar de fa-lo? Quantos pagadores poderiam sustentar o
condomínio? No exemplo citado era constante o corte de água, pois o número de
inadimplentes era alto. Ou seja, o número de free riders era tão alto que tornava a
situação caótica para todos. No entanto, havia água nos reservatórios que qualquer um
poderia pegar. Quem pagava a taxa de condomínio estava pagando por um bem que
todos iriam usufruir e, caso deixasse de pagar, poderia faltar água no bloco para todos
os moradores. Os free riders tornavam-se um grande problema para os adimplentes
(cooperadores).
Dentre as várias quadras desse condomínio, apenas uma conseguiu resolver
esse problema. Quando a água era cortada por falta de pagamento, os moradores
pagantes não permitiam que os indivíduos inadimplentes retirassem água do
reservatório. A ação de discriminar os indivíduos que poderiam retirar água resolveu o
problema do condomínio e o índice de inadimplência caiu progressivamente. Logo a
situação da quadra passou a melhorar, pois não houve mais cortes de água; zeladores e
guardas foram contratados; a guarita, além de remodelada, foi interligada aos
apartamentos por interfone; um muro substituiu a antiga cerca frágil que delimitava o
condomínio e uma quadra de futebol e um playground apareceram como opções de
lazer para crianças e adultos.
O controle dos free riders se deu porque os custos da cooperação estavam muito
altos e, além disso, os trapaceiros eram identificáveis. A teoria dos jogos pode ajudar a
46
solucionar questões desse tipo, atribuindo valores às ações. Certamente o ganho
advindo da utilização da água tinha muita utilidade para os pagantes. Dessa forma,
utilizando a teoria dos jogos, mesmo sem uma matemática complexa, resolveu-se o
problema dessa quadra. É bom lembrar que, geralmente, essas estratégias são usadas
de uma forma “intuitiva”, isto é, as pessoas não fazem as contas para saber como agir.
É como se tivéssemos incorporado ao nosso pensamento um senso de justiça que nos
faz reagir de maneiras que consideramos justas e apropriadas. Para uma discussão
mais ampla ver Yamamoto et al. (no prelo).
Com o exemplo acima, podemos observar que a teoria dos jogos pode ser
apropriada a muitas situações, desde que possamos atribuir valores de utilidade para os
ganhos dos indivíduos que interagem. Pode ser eficaz tanto quando planejada, no caso
de uma aplicação experimental, quanto a partir de observações naturais.
Não é complicado aplicar a metodologia da teoria dos jogos nem mesmo a
crianças, já que, pelo fato de simular situações reais, as regras o perfeitamente
compreensíveis.
Pesquisas de Krause e Harbaugh (2000) e Alencar, Siqueira e Yamamoto
(2008), utilizando crianças como sujeitos experimentais, indicaram que seus
comportamentos são semelhantes aos dos adultos nas contribuições de bens públicos.
Em interações repetidas, os níveis de cooperação são altos no início e reduzem-se ao
longo do tempo. Os free riders tendem a aparecer depois de algumas sessões e, quando
não há punição, a tendência é que mais indivíduos venham a fazê-lo. Por exemplo, no
trabalho de Alencar et al. (2008) eles verificaram que em grupos pequenos a tendência
a cooperar mais tendo em vista que observar o que o outro faz é mais fácil do que em
grupos grandes, logo a possibilidade de chamar a atenção dos indivíduos free riders é
maior.
b.2) Terra dos comuns (ou Dilema dos comuns)
Outro dilema utilizando ltiplos atores é o da Terra dos Comuns, que, ao
contrário do jogo anterior, trata da subtração de um recurso que é comum a todos. Esse
dilema é conhecido por um termo bastante sugestivo: tragédia dos comuns.
47
A concepção da tragédia dos comuns é anterior à formalização da teoria dos
jogos (Marinho, 2005). No entanto, atualmente, tem sido compreendida à luz dessa
teoria. O termo foi exemplificado a partir de uma suposta situação que ocorria na
Europa da Idade Média, onde havia muitas terras sem um dono específico e na qual os
pastores podiam criar seu rebanho livremente. Seria vantajoso, para cada pastor,
sempre aumentar uma cabeça de gado ao seu plantel. Acontece que, se todos agissem
assim, como é a tendência, em pouco tempo o pasto comum estaria super povoado e,
conseqüentemente, logo acabaria, o que provocaria a falta de alimento para o gado de
todos. Aí reside o prejuízo para todos e se configura a tragédia. O conflito consiste em
utilizar ou não o máximo possível do recurso, mesmo que com isso ele venha a ser
esgotado e, no futuro, deixe de estar disponível para todos, os que o utilizaram
adequadamente e aqueles que o utilizaram de forma abusiva (Hardin, 1968).
Embora todos saibam o que pode acontecer com o pasto, a tentação de utilizar
todo o recurso que for possível no momento é muito grande, pois os ganhos são
imediatos. Por outro lado, o resultado da cooperação (controle do número de animais
ou não utilização excessiva do recurso) -se após um longo prazo. Dessa forma, as
pessoas tendem a se comportar de modo a receber uma recompensa imediata, através
da trapaça (utilizando mais do que poderiam). Pense em um pescador de lagostas,
deparando-se com muitas delas na época de defeso. Se não pescar agora, elas não
estarão no mesmo lugar depois. Ele pescaria? Se não o fizer, outra pessoa poderá fa-
lo.
Esse tipo de dilema é bastante comum nos dias atuais. O aquecimento global, a
proteção ao planeta, a economia de água e energia são apenas alguns exemplos. O ar é
respirado por todos, o mar é partilhado por muitos e, durante todo o tempo, deparamo-
nos com dilemas dos comuns.
Algumas condições para produzir um dilema da terra dos comuns são
especificadas por Gardner, Ostrom e Walker (1990):
a) existência de um recurso extenso que é usufruído de forma indevida
por um, em detrimento dos outros membros do grupo;
b) existência de dois ou mais indivíduos interessados no mesmo recurso;
48
c) o recurso existente pode ser renovável quando em condições naturais.
Para evitar a tragédia dos comuns, que ocorre freqüentemente no uso de
recursos naturais renováveis, alguns governos propõem limites para sua utilização e
multa para quem descumprir esses limites. No entanto, segundo Ostrom, Burger, Field,
Norgaarde e Policansky (1999), trata-se de uma forma ingênua de evitar a tragédia dos
comuns. Soluções como essa podem retardar a tragédia, mas não evitá-la justamente
em função das dificuldades de controlar os trapaceiros ou free riders.
Em grandes áreas, como reservas ecológicas, por exemplo, encontrar um
trapaceiro é difícil. Caso possamos encontrá-lo e ele tiver caçado um animal em
extinção ou provocado uma grande queimada ou derrubado uma árvore, aquele item
retirado da terra dos comuns não terá mais seu potencial renovável. A situação das
reservas é complicada e, de acordo com Wakano (2007), à medida que a área do
recurso se amplia, fica mais difícil manter a cooperação, tendo em vista que o
oportunismo pode aparecer sem que ninguém perceba.
Se pensarmos em utilizar a teoria dos jogos para estudarmos o comportamento
de pessoas que usufruem um bem que é comum a todos, devemos nos lembrar de um
princípio sico a teoria da utilidade o qual pressupõe que o comportamento do
indivíduo será aquele que lhe trouxer mais vantagens. Sua aplicabilidade poderá ser
eficiente se calcularmos multas altas para os trapaceiros e altas recompensas para os
que cooperam a ponto de diminuir a vantagem do trapaceiro e aumentar sensivelmente
as vantagens para o indivíduo que ocupa determinadas áreas sem destruí-las.
TEORIA DOS JOGOS COMO METODOLOGIA DE ESTUDO DA COOPERAÇÃO
- CRÍTICAS E DEFESA
Embora seja excelente para o estudo da cooperação, a teoria dos jogos é criticada
por alguns (Munck, 2000). O fato de partir da premissa básica de que cada indivíduo é
um ser racional se que ele irá maximizar seus ganhos, minimizando suas perdas,
mesmo quando esses mesmos ganhos acarretem perdas para outras pessoas? Significa,
49
nesse sentido que racionalmente somos egoístas e que visamos apenas nosso próprio
favorecimento?
Tomando a idéia, pensamos como Aquino (2008) que entender o ser humano
como estritamente racional é irrealista, pois somos também emocionais, mas isso não
invalida a aplicabilidade da teoria, principalmente quando analisada pela psicologia
evolucionista, que entende emoção e razão como um só processo (Cosmides & Tooby,
2000; Oliva et al., 2006). Como argumenta Marinho (2005), não temos dois cérebros:
um emocional e outro racional. A medida em que tomamos uma decisão fazemos isso
sem dicotomia, ou apenas pela rao ou emoção.
A aplicabilidade do método parece-nos bastante eficaz. Muito do que se sabe
hoje sobre evolução da cooperação foi construído utilizando essa metodologia.
Aspectos emocionais podem ser incluídos e investigados. Alguns autores
trabalham com a teoria dos jogos, acrescentando elementos que têm alta relação com a
emoção, como é o caso da confiança, por exemplo (Parks, 1994; Cremer, 1999). Esses
autores observaram que a contribuição para um bem público aumenta se os indivíduos
têm confiança nos outros jogadores. No mesmo sentido, Scharlemann, Eckel, Kacelnik
e Wilson (2001) observaram que o sorriso pode aumentar a cooperação em jogos do
dilema do prisioneiro.
Os exemplos aqui apresentados dão apenas uma idéia das possibilidades da
utilização da teoria dos jogos no estudo da cooperação e do conflito. Inúmeras outras
possibilidades restam para ser testadas. Alguns estudos, como o de Alencar et al.
(2008), citado, e o de Corral-Verdugo & Frías-Armenta (2006), usam estes modelos
em situações mais naturais, e assim conseguem avaliar a ocorrência da cooperação em
situações cotidianas. Esta metodologia certamente provou seu valor. A ampliação de
seu uso depende, em grande parte, da criatividade dos pesquisadores da área.
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52
2.1. ARTIGO EMPIRICO I - Does group size matter? Cheating and cooperation in
Brazilian school children
Trabalho publicado em Evolution and Human Behavior, 29, 42-48
Disponível no formato da revista na página
http://www.sciencedirect.com/science/journal/10905138
ou http://lineu.cb.ufrn.br/psicoevol/sisup/arquivos/arq4784f49c5cec1.pdf
Running title
Children cooperation
Anuska Irene Alencar
1
José de Oliveira Siqueira
2
Maria Emilia Yamamoto
1*
1
Psychobiology Graduate Program, Department of Physiology, Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brazil
2
Department of Business, School of Economics, Business and Accountancy,
University of São Paulo, São Paulo, SP, Brazil
* Corresponding author:
Maria Emília Yamamoto
Campus Universiário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRAZIL
e-mail: emiliayamamoto@gmail.com
53
ABSTRACT
Cooperation between individuals is an important requisite for the maintenance of
social relationships. The purpose of this study was to investigate cooperation in
children in the school environment, where individuals could cooperate or not with
their classmates in a public goods game. We investigated which of the following
variables influenced cooperation in children: sex, group size, and information on the
number of sessions. Group size was the only factor to significantly affect cooperation,
with children in small groups cooperating significantly more than those in large
groups. Both sex and information had no effect on cooperation. We suggest that these
results reflect the fact that in small groups individuals were more efficient in
controlling and retaliating theirs peers than in large groups.
KEYWORDS: free riding, cooperation, children, public goods
INTRODUCTION
Cooperation between individuals is an important requisite for the maintenance
of social relationships. On the other hand, non-cooperative behaviors benefit the
individual at the expense of the group. Therefore, mechanisms that enhance
cooperation and inhibit free-riding are fundamental in human populations. These are
social mechanisms which discourage free riding, such as fees, social disapproval, and
group alienation, or which stimulate cooperation, such as approval, reciprocity, and
praise (Wedekind, 2000; Nowak & Sigmund 1998; Wedekind & Milinski, 1996).
Traditionally, most developmental studies indicate that children behave
selfishly towards unrelated individuals. However, a few studies report the development
of altruistic behavior during childhood. Very young children (2-3 years old) may
display cooperative activities when interacting with peers, involving mainly imitative
games and simple routines (Brownell, Ramani & Zerwas, 2006). Older children
display more complex cooperative actions, and studies using economic games report
small increases in altruistic behaviors with age (Benenson, Pascoe & Radmore, 2007;
Harbaugh, Krause & Liday, 2003), and an average donation in proportion to their
assets that matches the number donated in studies with adults. Benenson et al. (2007)
54
suggest that humans may have, from an early age, biologically based mechanisms that
encourage altruistic acts under appropriate conditions. Which are these conditions and
how do children learn the specific conditions under which they should cooperate or
compete? Socialization practices affect explicit human altruistic and competitive
behaviors, but their impact may be stronger from age 9, as suggested by Benenson et
al. (2007).
Some other variables seem to influence the propensity to cooperate, such as
sex. Results of studies with children are mixed: Harbaugh et al. (2003) report a slight
tendency for girls to behave more prosocially than boys; Banco and Mettel (1984)
suggest that boys cooperate more than girls; Markovits, Benenson and Kramer (2003),
on the other hand, report that girls share their food more than boys do, except between
siblings, when sharing is equivalent for both sexes. In adults, results of economic
games are also mixed: Sell, Griffith and Wilson (1993), Sell (1997) and Andreoni and
Vesterlund (2001) suggest that sex differences may or may not occur depending on the
kind of game being played. However, studies in more naturalistic conditions report
more prosocial behavior in men (Eagly & Crowley, 1986). The controversial results
suggest the need for further investigation.
A second variable is iteration, the repetition of the opportunities to play.
Results of iterative games in adults suggest that individuals are more cooperative in
their first interaction, and decrease it over time (Clark & Sefton, 2001). Fan (2000)
reported the opposite effect in an investigation with children, which showed that, after
repeating a game, cooperation increased. In Fan’s study, disclosure of individual
choices to the group may have facilitated cooperation. He attributed cooperation to
older children (7 and 8 years) suggesting that younger children do not have a complete
understanding of the situation and, therefore, do not change their behavior.
Information regarding the possibility of further cooperation (iteration) may
also influence the willingness to cooperate, insofar as it suggests that there will be
opportunities for reciprocation. The perspective of single interactions, on the other
hand, may favor cheating (Axelrod & Hamilton, 1981).
Group size may also influence cooperation and how much a member of the
group is willing to donate in a public goods game. Larger groups present a control
55
problem, and cheaters may increase their odds in such groups, as the chances of being
caught are minimal (Kollock, 1998). Suzuki and Akiyama (2005) also suggest that
cooperation decreases as group size increases. In natural conditions social exchanges
occur in much larger groups and it would be interesting to test if that relation persists
when groups increase beyond 4 or 5 individuals.
Moreover, most investigations on this subject use computer simulations that
test theoretically a proposed model. Empirical investigations focus mostly on
laboratory studies with adults (Wedekind & Milinski, 1996; Milinski, Semmann, &
Krambeck, 2002). A more naturalistic approach can help to understand the factors that
influence behavior in complex situations.
The purpose of this study was to investigate cooperation in children in the
school environment, where individuals could cooperate or not with their classmates.
Individual choices were undisclosed to the group as a means to ensure a more
spontaneous behavioral expression. More specifically, we investigated which of the
following variables influenced cooperation in children: sex, group size, and
information on the number of sessions. We expected, according to the literature
discussed above, that girls would cooperate more than boys and that increase in group
size and lack of information about the duration of the game would decrease
cooperation. Although a recent revision (Heinrich et al., 2005) reports the absence of
sex differences in altruistic behaviors, from an evolutionary perspective females, more
than males, may benefit from the display of altruism towards nonkin, as it may reduce
the probability of conflict (Benenson et al., 2007). Also, women, more than men, are
reported to value the development of reciprocal relationship with other people (Geary,
1999) which would predict more cooperation in games like these. As to group size, we
expected that as group size increases and the possibility of control over cheaters
decreases, cooperation should decrease in larger groups. Finally, the information on
the repetition of the game would allow for the development of strategies and the
advantage of cooperating in the long term when information was available. Therefore,
we expected that uninformed children would present extreme strategies, such as free
riding, more often than informed children, as the first would not be aware of future
possibilities of cooperation and, therefore, future possibilities of benefiting from it.
56
METHOD
Subjects
Our subjects were 232 children (117 girls and 115 boys) from 5 public schools
in Natal, Brazil. Children from public school in Brazil all come from low SES. Mean
age was 8.7 (1.34) for boys and 8.7 ( 1.18) for girls, the oldest of whom was 11.5
and the youngest 5.5. Each classroom group tested had 5 to 24 children. Division of
the classrooms was accomplished by attributing randomly 5 to 7 children to the small
group and all the remaining to the large group (Table I). In some cases, the total
number of students in the classroom was not large enough to form one small and one
large group. In those cases, we worked with the whole classroom as one large group.
Mean age for the small groups was 8.5 (1.30) and for the large ones 8.7 (1.07). All
the subjects knew each other for at least 2 months prior to the beginning of this study.
Written consent of the parents or legal guardians was obtained before the inclusion of
each child in the study.
Table I. Composition by age and sex of public school children’s groups in Natal, RN, Brazil. Groups
1-10 were considered large and, 11-6, small.
Group
Composition
Group mean age
(and SE)
Mean age (and SE) by group and sex
1 N=17 (=8 =9) 10.8 (± 0.8) ♀ 10.9 (± 0.8) ♂10.7 (± 0.8)
2 N=22 (♀=10 ♂=12) 9.6 (± 0.5) ♀ 9.6 (± 0.5) 9.6 (± 0.5)
3 N=22 (♀=14 ♂=8) 9.1 (± 0.7) ♀ 9.2 (± 0.6) ♂ 9 0.7)
4 N=20 (=12 ♂=8) 8.3 (± 0.7) 7.9 (± 0.6) ♂ 9 0.5)
5 N=24 (=18 ♂=6) 8.6 (± 1.1) ♀ 8.8 (± 1) ♂ 8.3 (± 1.3)
6 N=18 (=7 ♂=11) 7.2 (± 0.8) ♀ 7.3 (± 0.4) 7.1 (± 0.7)
7 N=16 (=2 ♂=14) 7.4 (± 0.5) ♀7.3 (± 0.4) 7.4 (± 0.5)
8 N=24 (=17 ♂=7) 8.7 (± 1) ♀ 8.3 (± 0.6) 9.6 (± 1)
9 N=13 (=3 ♂=10) 8.2 (± 0.6) ♀ 8.2 (± 0.03) 8.2 (± 0.7)
10 N=19 (=9 ♂=10) 7.6 (± 0.6) ♀ 7.5 (± 0.5) 7.6 (± 0.6)
11 N= 7 (=4 ♂= 3) 8.9 (± 0.9) ♀ 8.6 (±0.8) 9.3 ( ±0.7)
12 N=7 (=4 =3) 9.6 (± 0.4) ♀ 9.5 (±0.5) ♂ 9.7 (±0.1)
13 N=7 (=2 =5) 9.3 (± 0.4) ♀ 9.7 (±0.8) ♂ 9.2 (±0.3)
14 N=6 (=3=3) 7.5 (± 0.4) ♀ 7.5 (±0.4) ♂ 7.5 (±0.4)
15 N=6 (=3 =3) 7.4 (± 0.9) ♀ 7.1 (±0.2) ♂ 7.6 (±1.4)
16 N=7 (=4 =3) 7.7 (± 0.1) ♀7.7 (±0.2) ♂ 7.7 (±0.1)
Experimental design
The subjects were asked to participate in a public goods game that allowed
different degrees of cooperation or free-riding, without the knowledge of other group
57
members. Each group played 8 successive sessions, with intervals varying from 1 to 3
days. Each group was classified as either small (between 5 and 7 players) or large (12
or more players).
The game
At the beginning of each session each child received an envelope and 3 candy
bars (7.5 g each). They were then instructed to take these items behind a partition
where they could make a donation to the group in a sealed urn. They could put one,
two, or three candy bars (maximum cooperation) or none (free-riding) into the
envelope, seal it and place it into the urn. Retained candy bars could be stored inside
purses or pockets (retention) to prevent the other children from knowing how many
had been donated. They were also informed that after all the children had taken their
turn behind the partition we would open the envelopes in their presence, and that for
each candy bar donated we would add two more. The total number of bars resulting
from donations, plus those that we added, would be equally shared among all the
children (return).
At the end of the session the number of candy bars each child had was the sum
of two numbers: the number that each child retained for him or herself (retention),
which varied individually, plus the donated candy bars, augmented by those we added
(sharing), which did not vary individually. The resulting amount for each child was the
sharing plus retention (that Harbaugh & Krause, 2000 call marginal private return).
The sharing plus retention would of course be higher for children who retained more
items, since the number resulting from sharing was the same for everyone.
The children were instructed about the rules of the game, which included: the
material they were receiving (the candy bars, the envelope and a name tag); the
procedure of the game; the fact that donations were undisclosed; and, in the case of the
informed group that they would play 8 sessions. In the case of the non-informed group,
this information was withheld. At the final session, all the groups were informed that it
would be the last day of the game.
58
The analyses
Univariate General Linear Model with Repeated Measures (UGLMRM)
analysis using SPSS 13 was used to identify which effects had a statistical influence on
mean donation, as well as on private return, throughout the eight sessions. The model
consisted of 3 main effects (sex, group size, and information about the number of
sessions), their interaction effects up to order 2, and the age as a covariate. We used
Spearman correlations to compare group size and the number of candies donated on
each session.
RESULTS
Group size was the only factor to significantly affect the mean number of
donations (UGLMRM, F
3,221
=33.507, p=0.000, Figure 1A), with small group children
donating significantly more (1.6 candy bars) than those in large groups (0.9 candy
bars). Both sex (UGLMRM, F
3,221
=1.626, p=0.184, Figure 1B) and information
(UGLMRM, F
3,221
=1.401, p=0.243, Figure 1C) had no effect on mean donations.
Mean donation decreased significantly across the sessions. Although this is
true for all conditions pooled, when we analyzed the data by factor, the only
significant difference was once again, for group size, with small groups showing a
slower decrease than large groups (Figure 1A). Both male and female children (Figure
1B) and informed and non-informed groups (Figure 1C) showed statistically similar
decreases in mean donation. The main effect group size was the only variable to affect
cooperation according to Bonferroni’s significance level (UGLMRM, F
1,53
=7.668, p <
0.01), i.e., mean donation throughout the sessions was statistically larger or equal in
small groups when compared to large groups. Since sex and information did not affect
cooperation, all further analysis refers to group size only.
59
Figure 1. Mean (and SE) donation of candy bars for a
public goods fund by children from public schools in
Natal at each of 8 sessions by: A) group size B) sex; C)
information on the number of sessions.
Both sharing and sharing plus retention were significantly larger in small
groups when compared to the large ones (UGLMRM, F
1,226
=51.651, p < 0.001), as
children donated and received more candy bars. Consequently, there were no statistical
differences between sharing and sharing plus retention (private return) for small
groups (Repeated Measures ANOVA, F
1,100
=221.24, P=0.000; Tukey, p=0.9011). On
the other hand, for large groups, most of the candy bars were obtained by retention,
since these children donated less. Accordingly, return was significantly lower than
sharing plus retention (Tukey, p=0.0001, Figure 2).
60
Figure 2. Mean (and SE) candy bars received from sharing (return) and from sharing plus retention
(private return) for small and large groups. See text for details. * p<0.05.
A decrease in mean donation was associated with (i) an increase in the
proportion of children that acted as free riders (no donations, Figure 3A) but also with
(ii) a decrease in the percentage of children that donated 3 candy bars (maximum
cooperators, Figure 3D). Both options were significantly affected by the number of
sessions in both small and large groups. In small groups the proportion of maximum
cooperators declined more slowly than in large groups. However, at the last session,
none of the children, both from large and small groups, donated 3 candy bars. In large
groups, moreover, the proportion of free riders was high from the third session on,
while in small groups’ free riding levels remained very low for most sessions, with the
exception of session 5 when free riding peaked. Partial donation was also different in
small and large groups: in the latter, it decreased to very low levels quickly; in the
former, donation of two candy bars was stable throughout the sessions (with the
exception of session 3), and donation of one candy bar actually increased from session
6 on. On both groups there was a change of strategy: both start the game as maximum
cooperators. However, in large groups there is a shift for free-riding as the most
frequent strategy (Figure 3A and 3D), while in small groups the most frequent strategy
was moderate donation (Figure 3B e 3D).
61
Figure 3. Percentage of children from public schools in Natal at each of 8 sessions
that donated no candies (A - free-riders); one candy (B); two candies (C); and three
candies (D - maximum cooperators).
Significant negative correlations were found between group size and mean
donation on all sessions but the first (Table II).
Table II. Spearman’s correlations between group size and mean
donation on each testing day.
Session
Spearman’s
p
Day 1 -0,063 0.338
Day 2 -0,212 0.004
Day 3 -0,324 0,000
Day 4 -0,324 0,000
Day 5 -0,188 0,012
Day 6 -0,286 0,000
Day 7 -0,329 0,000
Day 8 -0,509 0,000
DISCUSSION
This investigation showed that group size was the key factor in promoting
cooperation among school children. Neither sex nor information about the duration of
the experiment significantly influenced the behavior of the subjects.
Our first hypothesis was that girls would display more prosocial behavior as
they are more empathic from an early age (Geary, 1999) and therefore more
62
responsive to social stimuli. We did observe a slight tendency for girls to behave more
prosocially than boys but that did not achieve statistical significance. Two studies that
reported that girls display more prosocial behavior (Banco & Mettel, 1984; Markovits
et al., 2003) had adults (the researchers) openly watching the children, and this has
probably acted as a powerful social influence, particularly on girls. However, in our
study, we avoided to provide such influences by favoring anonymity. In such
conditions, there is no evolutionary or psychological reason for females to display
greater altruism, as the social consequences of their prosocial behavior are lost
(Benenson et al., 2007).
Prior information on the number of sessions had no effect on cooperation. We
predicted that having the information that the game would be repeated could induce a
long term strategy, which usually favor cooperation, as there are more opportunities
for retribution and retaliation, and more radical strategies, such as free riding, are less
frequent. However, this information may have been discarded, since this group had
been together for some time, and probably had previous alliances and antagonisms. As
a regular classroom, they would also remain together at least for the remainder of the
academic year, so the opportunities for reciprocity were present independent of the
duration of the game. All these variables were likely more relevant to the children than
the duration of the experiment, and reciprocity patterns were probably already
established between the children. Information on the duration of the game could also
favor cooperation through indirect reciprocity. Again, anonymity may have prevented
indirect reciprocity, as it cannot take place when players are not identified.
Despite the precautions and instructions given by the experimenters, the
children tried to monitor the behavior of the group members checking how many
candies the other children were retaining or counting the number of candies at the end
of the session. Incidental observations suggest that vigilance was more efficient in
small groups, since individuals could be more easily controlled and retaliated when
they did not cooperate. Vigilance usually occurred after the session, when we
instructed the children to put away their candies, and other children tried to spot how
many candies they had kept. This could also take place when children left the
classroom for lunch break. In large groups, children did not seem able to monitor or
63
control other children as effectively. Again, incidental observations suggest that in
these groups children were aware of the cooperative behavior of close friends only.
The increase in the number of free riders across the sessions is similar to the results
reported by Clark and Sefton (2001) in adults. This same tendency was observed in
Brazilian undergraduate students (Lopes, pers. com.) in a dictator game, suggesting
that it does not depend on age or educational level.
The model used in this study was that of the public goods game, and was
designed so that cooperative behavior would maximize individual benefits. In other
words, if all children donated the maximum (3 candy bars), the private return (sharing
plus retention) would be maximal. Free riding would be the best choice if there was
only one free rider, as determined by the Nash equilibrium for this type of game (Fort
& Viola, 2004). These calculations are difficult for an adult, let alone children. But,
according to Axelrod & Hamilton (1981), individuals do not have to make calculations
to choose an advantageous strategy. Opting for the less advantageous strategy is
probably related to the more immediate and safer benefits, as opposed to the dubious
return.
Apparently, individuals weigh investment against return. In this game, if all
children acted as maximum cooperators, the private return would be 9 candy bars.
Donations of 1 or 2 items would secure a benefit (the items retained) and would still
yield a return from the public goods. But even this strategy, although used in the first
sessions, did not endure for large groups. In small groups a strategy of moderate
donation developed along the sessions, probably consequent to the behavior of other
children in the group. The fact that this behavior is influenced by some environmental
variables (in this case group size) and not by others (in this case sex and information),
and that children act very much as adults under the same conditions, suggests a
biologically based mechanism that encourages both cooperation as well as cheating
under specific circumstances. Vigilance in small groups and the impossibility of
building a reputation on both small and large groups, given the anonymity of
donations, favored a moderate cooperation in small groups and free riding in large
groups (Benenson et al., 2007). Boyd and Richerson (1988), in accordance with our
results, report that the conditions that allow the evolution of reciprocal cooperation
64
become extremely restrictive as group size increases. The mechanism for such
decrease could include imitation of other players (Hauert, Monte, Hofbauer &
Sigmund, 2002), as free-riding in large groups and moderate donation in small groups.
Children learned, along sessions, which was the best strategy given the
specific conditions of the group they belong, as described above. The lack of trust, or
control, of the cooperative behavior of other group members have probably increased
free-riding in large groups, and moderation in small groups, in response to the
behavior of other members of the group. Studies by Benenson et al. (2007) and Knight
and Kagan (1977) with children from high and low SES conclude that both prosocial
as well as competitive behaviors are different for the two groups. Both studies suggest
that this derives from socialization practices, and represent a modulation of a
biologically based mechanism that encourages altruistic acts, but only under
appropriate conditions. As suggested by Benenson et al. (2007) altruistic and
competitive behaviors cannot be viewed as mutually exclusive. Children learn, as they
age, the specific conditions under which each should be displayed. However, children
from this study were from the same SES, and this could not be, therefore, a significant
variable here. In this study, children adjusted their behavior to that of the group, which
was mainly affected by group size and the conditions of anonymity. These results
stress the plasticity of prosocial behavior in children, and suggest that socialization
practices and favorable conditions can promote cooperation in children.
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67
2.2. ARTIGO EMPIRICO II O efeito do sexo e da composição do grupo: um
experimento de bens públicos com crianças da rede pública de Natal/RN
Título abreviado
Sexo e cooperação
Anuska Irene Alencar¹
Maria Emília Yamamoto¹
*
¹ Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia, Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, Natal, RN, Brasil
* Corresponding author:
Maria Emília Yamamoto
Campus Universitário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRASIL
e-mail: emiliayamamoto@gmail.com
68
RESUMO
A diferença entre os sexos é bastante investigada em relação a diversos
comportamentos. No que diz respeito à cooperação, os resultados são controversos.
Estudos utilizando dilemas sociais com indivíduos adultos sugerem que, em grupos
contendo um maior percentual de mulheres, a cooperação é maior. No entanto, nem
todos os trabalhos apóiam essa idéia. Nosso objetivo é investigar como crianças de 5 a
11 anos se comportam quanto à cooperação e free riding. Dividimos os grupos em
função da proporção de meninas (0 a 33%, 34 a 66% e 67 a 100%). Não observamos
diferenças significativas entre as proporções nem entre meninas e meninos, na média
de doação para um bem público. No entanto a evolução das doações e dos free riders
apresenta-se diferenciada. Os meninos apresentam uma evolução mais uniforme do
que as meninas, aumentando progressivamente a porcentagem de free riding e
diminuição da cooperação máxima. As meninas não apresentam um padrão tão regular
quanto o dos meninos.
PALAVRAS-CHAVE: cooperação entre crianças; bens públicos, free riders,
diferença entre os sexos
ABSTRACT
The difference between sexes is investigated at large in many different behaviors. As
for the cooperation, the results are controversial. Some studies using social dilemmas
with adult individuals suggest that in a group with a larger percentage of women, the
collaboration is larger. However, not all works support this idea. Our goal is to
investigate how children with ages from 5 to 11 behave in terms of collaboration and
free riding. We divided the groups in terms of girls’ proportions (0 to 33%, 34 to 66%
and 67 to 100%). We observed no significant differences between the proportions,
neither between boys or girls, on the average of donation to a public property.
However, the donations evolution and the free riders are different. The boys show a
more uniform evolution than the girls, rising progressively the percentage of free
riding and diminishing the maximum collaboration. The girls do not show such regular
patterns as the boys do.
KEYWORDS: cooperation in children; public goods; free riders; sex differences
69
INTRODUÇÃO
A cooperação entre indivíduos é um requisito importante na manutenção das
relações sociais. Em contrapartida, existem comportamentos não cooperativos que
trazem vantagem ao indivíduo que o realiza, em detrimento do conjunto. Na população
humana é fundamental a existência de mecanismos que estimulem a cooperação e
inibam a não-cooperação ou free riding (usufruir a cooperação do outro sem cooperar).
Esses o mecanismos sociais em forma de penalidades como multas, desaprovação
social, exclusão do grupo entre outros, que desestimulam a não-cooperação; e
aprovações, reciprocidade da cooperação, elogios, ausência de punição e similares, que
estimulam a cooperação (Wedekind, 2000; Nowak & Sigmund, 1998; Wedekind &
Milinski, 2000).
Algumas variáveis são consideradas importantes para a manutenção da
cooperação como tamanho de grupo (Kollock, 1998; Suzuki & Akiyama, 2005;
Alencar, Siqueira &Yamamoto, 2008) sexo dos indivíduos (Cadsby & Maynes, 1998;
Markovits, Benenson & Kramer, 2003) e idade (Fan, 2000).
Eisenberg e Mussen (1995) sugerem que existe uma inconsistência nos
resultados que comparam indivíduos dos dois sexos no que se refere a comportamento
pró-social (ato voluntário e intencional de ajudar os outros). Alguns autores têm
defendido que o sexo feminino é mais propenso à cooperação (Cadsby & Maynes,
1998; Markovits et al., 2003), enquanto outros sugerem que é o masculino (Banco &
Mettel, 1984). Mas há também os que sugerem não haver diferença quando se observa
a contribuição para bens blicos (Andreoni & Vesterlund, 2001; Alencar et al.,
2008).
Controvérsias nos resultados podem se dever ao tipo de metodologia aplicada
pelos pesquisadores, como alerta Simpson (2003). Esse autor sugere que os valores das
matrizes do Dilema do prisioneiro (jogos com dois atores em que ambos têm a opção
de cooperar ou não cooperar) podem favorecer mais um sexo que o outro no que se
refere à cooperação. As mulheres tenderiam a cooperar mais em situões que
envolvem alto risco no caso de não cooperação.
70
Outro argumento utilizado na discussão sobre o efeito do sexo na cooperação,
é a composição dos grupos ou díades de relacionamento. Banco e Mettel (1984)
verificaram que os comportamentos pró-sociais em crianças ocorrem mais entre
indivíduos do mesmo sexo, no entanto não diferença entre meninos e meninas na
quantidade de comportamento p-social. Em casos de jogo de Bens blicos com
adultos, a composição do grupo também pode afetar os resultados (Anthony & Horne,
2003; Sell, Griffith & Wilson, 1993).
Sell et al. (1993) observaram que não diferenças entre homens e mulheres
na contribuição para um bem público. No entanto, um trabalho posterior de Sell (1997)
sugere que tanto as mulheres quanto os homens cooperam mais quando a maioria dos
jogadores é do sexo feminino, muito embora as diferenças não tenham sido
estatisticamente significativas para as mulheres.
Sell et al. (1993) também verificaram que, se a recompensa muda, os dados
também podem mudar. Quando o recurso utilizado era dinheiro, o havia diferença
entre homens e mulheres; em contrapartida, se a recompensa fosse um tempo com um
perito (professor de alguma especialidade como sica, pintura ou outra ngua) os
homens contribuíam significativamente mais que as mulheres e essa diferença era
significativa.
o trabalho de Anthony e Horne (2003) sugere que as mulheres são menos
propensas à trapaça e grupos formados por um percentual maior de mulheres tendem a
ser mais cooperativo. No grupo essa diferença é diluída, e grupos formados por mais
mulheres não são mais cooperativos dos que os formados por maioria de homens.
Andreoni e Vesterlund (2001) observaram que a contribuição a outro jogador
não é, na média, afetada pelo sexo do indivíduo. No entanto, se a quantidade de
recurso que o oponente possui é conhecida, as mulheres doam menos (diminui a
proporção), se sua recompensa for menor do que a recompensa do receptor. Os
homens, por outro lado, aumentam a proporção da doação.
A maioria dos trabalhos utilizando a proporção entre os sexos e teorias dos
jogos (Anthony & Horne, 2003; Sell et al., 1993) foi realizada com indivíduos adultos
e, em muitos dos trabalhos com crianças, a teoria dos jogos não foi o referencial
teórico utilizado (Banco & Mettel, 1984; Markovits, Benenson & Kramer, 2003).
71
Nesse sentido, podemos perguntar se a proporção do sexo e o sexo influenciam a
cooperação e o comportamento de free riding nos jogos de bens públicos entre as
crianças.
MATERIAL E MÉTODO
Sujeitos
Trabalhamos com 233 crianças de 10 salas de aula de cinco escolas públicas
de Natal/RN, sendo 118 meninas e 115 meninos, com idade média de 8,6 anos (1,3),
o mais velho com 11,5 e o mais novo 5,5 anos. Em cada sala, o tamanho do grupo
participante variou de 5 a 24 indivíduos (Tabela III).
Todos os sujeitos tinham, no mínimo, dois meses de convivência na sala de
aula. A participação na pesquisa era condicionada ao conhecimento dos pais sobre sua
realização e a sua assinatura em um termo de livre consentimento esclarecido, no qual
autorizavam a participação dos seus filhos.
Tabela III. Composição dos grupos de crianças estudados em escolas públicas de Natal/RN, com as
respectivas proporções entre os sexos.
Grupo
Composição
Porcentagem
do sexo
feminino
Idade média por
grupo (desvio
pado)
Idade média por grupo e sexo
(desvio padrão)
1 N=17 (♀=8 ♂=9) 34 a 66% 10,8 (± 0,8) ♀ 10,9 (± 0,8) ♀ 8,2 (± 0,03)
2 N=22 (♀ =10 ♂ =12) 34 a 66% 9,6 (± 0,5) ♂ 10,7 (± 0,8) ♂ 8,2 (± 0,7)
3 N=22 (♀ =14 ♂=8) 34 a 66% 9,1 (± 0,7) ♀ 9,6 (± 0,5) ♀ 7,5 (± 0,5)
4 N=20 (♀=12 ♂=8) 34 a 66% 8,3 (± 0,7) ♂ 9,6 (± 0,5) ♂ 7,6 (± 0,6)
5 N=24 (♀=18 ♂=6) 67 a 100% 8,6 (± 1,1) 9,2 (± 0,6) 9,0 (± 0,8)
6 N=18 (♀=7 ♂ =11) 34 a 66% 7,2 (± 0,8) ♂ 9,0 (± 0,7) 8,7 (± 0,9)
7 N=16 (♀=2 ♂ =14) 0 a 33% 7,4 (± 0,5) ♀ 7,9 (± 0,6) 9,5 (± 0,5)
8 N=22 (♀=15 ♂ =7) 67 a 100% 8,7 (± 1,0) ♂ 9,0 (± 0,5) ♂ 9,6 (± 0,05)
9 N=13 (♀=3 ♂ =10) 0 a 33% 8,2 (± 0,6) ♀ 8,8 (± 1,0) 9,7 (± 0,5)
10 N=19 (♀=9 ♂ =10) 34 a 66% 7,6 (± 0,6) ♂ 8,3 (± 1,3) ♂ 9,2 (± 0,3)
11 N=7 (♀=4 ♂=3) 34 a 66% 8,9 (± 0,9) ♀ 7,3 (± 0,4) ♀ 7,3 (± 0,07)
12 N=7 (♀=4 ♂=3 ) 34 a 66% 9,6 (± 0,4) ♂ 7,1 (± 0,7) ♂ 7,6 (± 0,3)
13 N=7 (♀=2 ♂=5) 0 a 33% 9,3 (± 0,4) ♀ 7,3 (± 0,4) ♀ 7,2 (± 0,1)
14 N=6 (♀=3 ♂=3) 34 a 66% 7,4 (± 0,3) ♂ 7,4 (± 0,5) 7,6 (± 1,1)
15 N=6 (♀=3 ♂=3) 34 a 66% 7,4 (± 0,8) ♀ 8,3 (± 0,6) 7,6 (± 0,1)
16 N=7 (♀=4 ♂=3) 34 a 66% 7,7 (± 0,2) ♂ 9,6 (± 1,0) 7,7 (± 0,1)
72
O Jogo
A cada dia, as crianças recebiam um envelope e três wafers com cobertura de
chocolate (7,5 g cada). Os envelopes eram marcados com um número escrito dentro do
envelope, de forma que a criança não pudesse ver que estava sendo monitorada, mas
permitia que o pesquisador identificasse o sexo do jogador.
Em seguida, as crianças eram instruídas a ir para trás de um biombo, onde
fariam ou não uma doação para o grupo. Elas colocavam no envelope um, dois, três
(cooperadores máximos) wafers, ou o envelope vazio (free riders) e depositavam o
envelope em uma urna. Os wafers não doados poderiam ser guardados em estojos,
bolsas ou bolsos para que os colegas não soubessem o quanto cada criança havia
doado.
Depois que todas as crianças passavam pelo biombo, informávamos que
abriríamos os envelopes e, a cada um que tivesse sido doado para o grupo, doaríamos
mais dois (retorno), subseqüentemente, o total seria distribuído por igual para todos os
participantes, independente do quanto haviam doado.
Após as doações, os envelopes eram contados e abertos na frente das crianças.
A abertura dos envelopes era feita de forma diferente, dependendo da quantidade de
wafers contidos no envelope, para termos o conhecimento de o quanto cada criança
havia doado. Fazíamos a doação para o grupo após a abertura de cada envelope.
Depois contávamos o total, dividíamos e distribuímos igualmente entre os
participantes.
Após a distribuição final, permitia-se às crianças revelar o quanto cada um
havia ganhado, caso desejassem.
O máximo de retorno ao doador seria de nove wafers caso todas as crianças
doassem três. No entanto, o ganho individual dependia da retenção (itens não doados)
e poderia ser maior caso a retenção fosse total (três itens).
Análise estatística
Para realizarmos a análise trabalhamos com os dados de duas formas: uma que
chamamos de análise por grupos e outra de análise por sexo.
73
Análise por grupo
Consideramos três tipos de proporção entre os sexos, de forma semelhante ao
trabalho de Anthony e Horne (2003): 1 - de 0 a 33% de meninas; (grupos: 7, 9 e 13); 2
- de 40 a 66% (grupos 1, 2, 3, 4, 6, 10, 11, 12, 14, 15, 16) e 3 - 67 a 100% (grupos 5 e
8) (Tabela III).
Com essa configuração realizamos uma ANOVA para verificar a influência da
proporção e do sexo na média de doação.
Foi realizada também uma ANOVA para verificarmos as diferenças entre as
proporções e o sexo na porcentagem de free riders e cooperadores máximos.
Análise por sexo
A partir das proporções acima, subdividimos, em cada grupo, os meninos e as
meninas para verificar a evolução ao longo dos dias do comportamento de free rider e
de cooperador máximo. Nesse sentido, tínhamos grupos de meninos nas proporções 0
a 33%, 34 a 66% e 67 a 100%, e grupos de meninas nas mesmas proporções.
Realizamos uma MANOVA para verificar as diferenças de free riders e cooperadores
máximos entre as proporções e os dias de jogo.
Em todos os casos o nível de significância foi de 95%.
RESULTADOS
Análise por grupo
A média de doação nos grupos, com as três proporções, demonstrou que
aqueles, com maior proporção de meninos, apresentaram uma média maior de
cooperação do que os grupos compostos por mais meninas. Pom, a diferença não foi
significativa (ANOVA, F
(2, 230)
=1,9099, p=0,15043). A diferença entre os sexos na
média de doação também não foi significativa (ANOVA, F
(1, 231)
=2,0091, p=0,15770)
(Figura 4).
Encontramos indivíduos se comportando como free riders no primeiro dia nos
três grupos, no entanto a freqüência foi baixa (7,73% 14 indivíduos nos 10 grupos) e
não houve diferenças significativas entre os grupos (ANOVA, F
(2,45)
=0,21870,
p=0,80441).
74
Os meninos apresentaram uma porcentagem de free riders maior do que as
meninas em todas as proporções. Essas diferenças apresentam uma forte tendência a
significância (ANOVA, F
(1,44)
= 3,9601, p=0,05256). Nos quarto e sexto dias de jogo
não foram observados meninas se comportando como free riders nos grupos em que a
maioria era de meninos. Novamente, não encontramos diferenças significativas entre
os grupos (ANOVA F
(2, 44)
=,23244, p=0,79356) (Tabela IV).
Tabela IV. Porcentagem de free riders por proporção e sexo ao longo das oito sessões em 16
grupos de crianças de escolas públicas de Natal/RN. Os grupos foram divididos em três
proporções, sendo três grupos com proporção maior de meninos (0 a 33 % de meninas); onze
com proporções semelhantes de meninos e meninas (34 a 66 % de meninas) e dois com a
proporção maior de meninas (67 a 100 %).
Proporção 0 a 39 % 34 a 66 % 67 a 100 %
Dias % % % % % %
1 15,79 12, 12 11,54 6,03 7,69 7,50
2 39,13 20,0 20,0 18,96 15,36 17,87
3 59,09 66,67 34,62 34,38 66,67 34,62
4 45,46 0,0 49,09 53,846 42,86 13,64
5 60,87 20,0 50,0 49,16 81,82 36,0
6 75,0 0,0 68,52 55,23 71,43 65,22
7 70,0 75,0 57,58 68,52 72,73 71,45
8 66,67 50,0 76,19 64,789 100,0 69,56
Tabela V Porcentagem dos cooperadores máximos por proporção e sexo ao longo das oito
sessões, em 16 grupos de crianças de escolas públicas de Natal/RN. Os grupos foram
divididos em três proporções, sendo três grupos com proporção maior de meninos (0 a 33 %
de meninas); onze com proporções semelhantes de meninos e meninas (34 a 66 % de
meninas) e dois com a proporção maior de meninas (67 a 100 %).
Proporção 0 a 39 % 34 a 66 % 67 a 100 %
Dias % % % % % %
1 52,63 60,0 38,8 39,28 38,46 33,33
2 26,1 40,0 12,31 17,24 3,1 32,15
3 31,81 16,0 25,0 21,87 0,0 26,92
4 50,0 60,0 14,55 20,0 0,0 18,18
5 21,74 60,0 2,14 23,72 0,0 20,0
6 12,5 40,0 14,95 20,9 7,69 6,52
7 15,0 16,67 10,17 15,15 0,0 11,54
8 5,56 0,0 6,35 11,26 0,0 13,04
75
Figura 4. A) Média de doação de 16 grupos de crianças de escolas públicas de Natal/RN. Os grupos
foram divididos em três proporções, sendo três grupos com proporção maior de meninos (o a 33 % de
meninas); onze com proporções semelhantes de meninos e meninas (34 a 66 % de meninas) e dois com a
proporção maior de meninas (67 a 100 %). B) Diferença entre os sexos em cada proporção.
A porcentagem de cooperadores máximos foi maior no grupo no qual a
porcentagem de meninas era menor e apresentou uma diferença significativa entre
todas as proporções (ANOVA, F
(2, 44)
=6,2883, p=0,0039). Também encontramos
diferença significativa entre os sexos, com as meninas apresentando uma maior
76
porcentagem desse comportamento do que os meninos (ANOVA, F
(1, 44)
=4,2987,
p=0,04377) (Tabela V).
Análise por sexo
Subdividindo os grupos, verificamos que a evolução do comportamento de
free rider e máximos cooperadores são diferentes entre os meninos e as meninas.
Os meninos apresentam um comportamento de free riding que é mais
consistente (Figura 5A e Tabela IV), sem apresentar diferenças entre as proporções
(MANOVA F
(2,14)
=2,3292, p=0,1339), mas com diferenças ao longo dos dias de jogo
sendo o primeiro dia igual ao segundo e significativamente diferente dos demais
(MANOVA F
(7,14)
=14,555, p=0,00002).
O aparecimento de free riders entre as meninas é mais irregular como
observamos na Figura 5B e Tabela IV. Não observamos diferenças estatísticas quanto
às proporções (MANOVA, F
(2,14)
=1,1206, p=0,35366) e diferenças significativas, ao
longo das sessões, foram verificadas entre o primeiro dia de jogo e os sétimo e
oitavo dias (MANOVA) F
(7, 14)
=4,1463, p=0,01136).
Em relação aos cooperadores máximos, também foi observado um padrão
diferenciado de comportamento entre os sexos. A Figura 5C mostra uma diminuição
uniforme no percentual de cooperadores máximos entre os meninos ao longo dos dias,
com diferenças significativas (MANOVA F
(7,14)
=6,3892, p=0,00165).
O grupo formado pela minoria de meninas (0 a 33%) apresentou o percentual
maior de cooperadores ximos, com diferença significativa em relação a todas as
outras proporções (MANOVA F
(2, 14)
=12,002, p=0,00092).
Entre as meninas, o comportamento é irregular e sem diferenças significativas
ao longo dos dias de jogo. Observamos uma tendência de o oitavo dia apresentar uma
proporção de cooperadores máximos menor que os demais (MANOVA F
(7,14)
=2,6618,
p=0,0563553).
Quando a maioria é de meninas (66 a 100%), a porcentagem de cooperadores
máximos é menor quando comparada às demais proporções (MANOVA F
(2,14)
=4,4154,
p=0,032603) (Figura 5D).
77
Figura 5 – Porcentagem de free riders em crianças de escola pública de Natal/RN A) Porcentagem de
free riders do sexo masculino nas diferentes proporções; B) porcentagem de free riders do sexo
feminino nas diferentes proporções; C) Porcentagem de ximo cooperadores do sexo masculino; D)
Porcentagem de cooperadores máximos do sexo feminino.
DISCUSSÃO
Nossos resultados mostraram que meninos e meninas comportam-se de forma
semelhante no que diz respeito à média de doações. No entanto, os meninos mostram
mais consistência no desempenho dos papéis de cooperadores máximos e free riders
ao longo do jogo do que as meninas, sugerindo que a evolução do padrão de
comportamento ao longo das jogadas é diferente tanto para o sexo quanto para o tipo
de grupo. Os meninos mantêm um padrão ascendente de free riding e descendente de
cooperação máxima, enquanto que o comportamento das meninas parece mais errático.
78
Os meninos estavam mais atentos ao que acontecia com o grupo e competiam
mais ou as meninas também estavam atentas, mas não retaliavam os free riders tanto
quanto os meninos?
No nosso trabalho, não havia pistas sobre a quantidade de doação dos
jogadores nem perigo de retaliação caso eles se comportassem como free riders.
Porém, ao final de cada sessão os envelopes eram abertos na frente deles e, de certa
forma, forneciam uma pista de como estavam participando, em função do número de
wafers nos envelopes. Duas possibilidades podem explicar essas diferenças. A
primeira sugere que os meninos percebiam com mais clareza o que estava acontecendo
com o grupo e reagiam à diminuição da cooperação com uma diminuição equivalente.
A segunda sugere que ambos, meninos e meninas percebiam o que se passava no
grupo, porém as meninas escolheram não retaliar, pelo menos, não de forma
consistente.
Os dados de Piaget (1932/1994) apóiam a segunda hipótese, pois ele verificou
que meninos e meninas reagem de forma diferente quanto à retribuição de um ato de
injustiça. Segundo ele, os meninos retaliam mais a injustiça que sofreram do que as
meninas, e relatam que a maldade ou o golpe deve ser retribuído com a mesma
intensidade ou até com mais vigor. Já as meninas tendem a relatar que devemos
revidar menos do que recebemos. Piaget relata que, quando questionava os meninos
sobre o que deveriam fazer ao receber um soco, eles respondiam: dou dois! E ao
perguntar “e se lhe dão três socos? eles respondiam: dou quatro. Já as meninas
respondiam a primeira questão expondo a necessidade de revidar, porém diziam que
dariam apenas um caso recebessem dou ou três. A explicação delas é que é feio
revidar.
Se observarmos as curvas tanto dos free riders quanto dos cooperadores
máximos das meninas (Figura 5B e 5D), verificamos que elas não revidam com tanta
intensidade quanto os meninos (Figura 5A e 5C).
Simpson (2003), trabalhando com adultos em jogos do Dilema do prisioneiro,
sugere que a diferença entre os sexos, relatada em alguns trabalhos, depende do quanto
se ganha ou se perde (as matrizes de recompensa nos jogos do Dilema do prisioneiro
podem variar dependendo de manipulações do pesquisador). Os sexos se comportavam
79
de forma diferente: quanto maior o risco de perder o investimento mais os homens
trapaceavam. Parece que os meninos do nosso trabalho também trapaceavam mais, no
entanto como retaliação à trapaça dos outros.
Anthony e Horne (2003) relataram que a composição do grupo afetou a
trapaça ou oportunismo em seu estudo. No entanto, nosso trabalho não demonstrou
diferenças significativas quanto ao mero de free riders nem na análise por grupo
nem naquela por sexo. Verificamos, porém, que o mero de cooperadores máximos
era maior nos grupos com menos meninas (0 a 33%) do que nos demais. Elas não
apenas deixavam de revidar o fortemente, como mantinham a cooperação por mais
tempo que os meninos.
A análise por sexo deixou essa tendência mais clara. No grupo no qual a
proporção de meninas era menor, os meninos mantinham um nível mais alto de
cooperação máxima. Isto é, se no grupo havia uma alta porcentagem de cooperadores
máximos, eles não revidavam com tanta intensidade e participavam mais da
cooperação.
Sell et al. (1993) verificaram que as mulheres diminuem suas doações quando
sabem que a maioria dos membros do grupo são mulheres e os homens aumentam suas
doações quando sabem que a maioria é de homens. Fato semelhante aconteceu nos
nossos resultados: o grupo em que a maioria era de mulheres (67 a 100%) a
contribuição foi menor e o grupo em que a minoria era de mulheres (0 a 33%) a
contribuição foi maior.
Diferenças entre os sexos também podem ser devidas a diferenças na
metodologia utilizada, como sugere Simpson (2003). Markovits et al. (2003), por
exemplo, apresentavam uma história para as crianças na qual um cachorro roubava um
sanduíche ou um biscoito de uma colega de sala ou de um irmão e questionavam as
crianças sobre o que fariam com o seu sanduíche ou biscoito dividiria ou comeria
sozinha? As meninas, no geral, afirmavam que dividiriam.
Zarbatany et al (1985) pediram às crianças que fizessem uma doação para
outras crianças carentes. Eles verificaram que as meninas cooperaram mais do que
meninos em todas as idades e observaram que havia diferenças maiores quando elas
estavam em situações nas quais era possível sua identificação (situação em que o
80
pesquisador informava que iria estar presente durante a contribuição vendo o quanto a
criança doaria).
Possivelmente as médias de doação das meninas nos experimentos acima
tenham sido influenciadas pela presença do observador, o que não ocorreu em nosso
trabalho, e pelo alvo das doações. Nos dois casos, outra variável estava presente: a
empatia, que segundo Geary (1999) é maior nas meninas e está presente desde os
primeiros dias de nascimento. No nosso experimento, as doões seriam divididas
entre as próprias criaas e sem nenhuma delas ter sofrido diretamente uma injustiça,
como ter o biscoito ou o sanduíche roubado por um cachorro ou ser mais carente do
que os indivíduos que receberiam a doação.
Os trabalhos acima avaliaram como as crianças se comportam frente a esses
conflitos. O nosso também demonstra uma diferença na forma como as crianças
realizavam seus atos cooperativos (doar o máximo que puderem ou não doar nada).
Diferença não refletida na média, mas aparente na evolução das doações.
Concordamos com Simpson (2003) que as diferenças ou semelhanças entre
sexos no que se refere à cooperação dependem da forma como a metodologia é
estruturada. Outros trabalhos também vêm a apoiar essa idéia (Sell et al., 1993;
Andreoli & Vesterlund, 2001; Zarbatany et al., 1985) e sugerimos que o alvo das
doações também possa ser um fator que interfere nos resultados.
REFERÊNCIA
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Does group size matter?
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Banco, A. U. A. & Mettel, L. (1984). Comportamento pró-social: um estudo com pré-
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81
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Child development, 56, 746-556.
83
2.3. ARTIGO EMPÍRICO III – O dilema dos comuns em crianças de escolas
públicas de Natal/RN
Título abreviado
Crianças e dilema dos comuns
Anuska Irene Alencar¹
Maria Emília Yamamoto¹
*
¹ Programa de s-Graduação em Psicobiologia, Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, Natal, RN, Brasil
* Corresponding author:
Maria Emília Yamamoto
Campus Universitário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRASIL
e-mail: emiliayamamoto@gmail.com
84
RESUMO
Alguns recursos naturais não têm um dono específico e podem ser utilizados por todos
livremente. O uso abusivo do recurso pode levar à sua extinção. Investigamos como
crianças (5 a 11 anos) de escolas blicas de Natal/RN se comportam na presença de
um recurso comum na aplicação de um jogo denominado Terra dos comuns. Esse
poderia durar indefinidamente, se usado de acordo com regras de sustentabilidade que
são informadas às crianças. Investigamos quantos dias o recurso duraria e que fatores
interferem em sua duração. A maioria dos grupos chegou a 4 dias de jogo e não
encontramos correlação entre o dia da extinção do recurso e sexo ou tamanho de
grupo. Encontramos uma correlação positiva entre o uso indevido de um recurso no
primeiro dia de jogo e o dia da extinção do recurso. O tamanho do grupo também teve
uma correlação positiva com a taxa de oportunismo (ou uso indevido do recurso).
PALAVRAS-CHAVE: Terra dos comuns, oportunismo, extinção de um recurso
ABSTRACT
Some natural resources have no specific owner and can be used freely by everyone.
The abusive use of such resource can lead it to extinction. We investigated how
children (ages 5 to 11) from public schools in Natal/ RN - Brazil behave themselves in
the presence of a common resource in the application of a game denominated Terra
dos comuns (veja se é assim mesmo), which last indefinitely if used according to rules
of maintainable development which are informed to them. We investigate how many
days the resource would last and the factors that interfere in its duration. The majority
of the groups came to 4 days playing the game and we couldn’t find a correlation
between the day of the extinction of the resource and the sex or size of the group. We
found a positive correlation between the improper use of the resource in the first day
of the game and the day of the resource collapse. The group size also had a positive
relation with the opportunism rate (or improper use of the resource).
KEYWORDS: Commons pools, opportunism, resource collapse
85
INTRODUÇÃO
Alguns recursos, como os naturais gua, ar, animais, florestas), não têm um
dono específico e podem ser utilizados por todos livremente, ou ter seu uso
regulamentado por leis. Em alguns casos, mesmo quando há leis, é possível utilizá-los
de forma relativamente livre e abusiva, pois a fiscalização é ineficaz ou inexistente.
Caso todos ajam dessa forma, em pouco tempo esses recursos estarão desgastados ou
extintos, como já ocorreu em algumas circunstâncias.
O uso indevido de recursos comuns pode levar a um problema conhecido em
economia como a tragédia dos comuns (Hardin, 1968). Isso se em casos nos quais
seu consumo por um indivíduo reduz a quantidade disponível para os outros
indivíduos do grupo. Esses casos são estudados através do dilema social conhecido
como Dilema da terra dos comuns (Kollock, 1998). Quando investigado através da
teoria dos jogos, o jogador tem que decidir se utiliza um determinado recurso ou não,
sabendo que este pode faltar no futuro; pom, se ele o utilizá-lo, outros indivíduos
poderão fazer uso dele.
Ostrom, Burger, Field, Norgaard e Policansky (1999) sugerem que muitas
sociedades criam regras para a utilização do recurso como limitar o uso individual.
Essa é uma forma ingênua de evitar a tragédia dos comuns, visto que soluções desse
tipo podem retardar a tragédia, mas não evitá-la.
Uma das razões que dificulta a limitação do uso individual dos recursos está
na incerteza da sua quantidade disponível. Alguns deles, como árvores em uma
determinada área de florestas, podem ser contados. No entanto, outros, como água e
peixes, são difíceis de estimar precisamente, bem como o quanto de uso configuraria
sua exploração indevida.
Um trabalho mais recente (Worm, Barbier, Beaumont et at., 2006) sugere que
os peixes poderão acabar no ano 2048 e que é possível evitar tal tragédia utilizando o
que Ostrom et al. (1999) consideraram uma solução ingênua: limitar o montante que
cada um pode pescar. Além disso, dúvidas sobre como calcular a quantidade de
peixes, existente no oceano. Certamente poderíamos pensar que se trata de história de
pescador.
86
A questão da incerteza do recurso foi investigada por Budescu, Rapoport &
Suleiman (1992) Eles argumentam que a incerteza da quantidade do recurso afeta a
forma como as pessoas julgam sua quantidade. Quando o recurso é tido como
abundante, pode ser mais explorado.
A imprecisão dos dados relativos à provável extinção ou à distância entre o
tempo atual e o fim do recurso poderiam ser fatores que colaboram para a ausência de
preservação. No entanto, questionamos se haveria diferenças na pesca, se soubéssemos
precisamente quantos peixes poderiam ser pescados para que eles nunca entrassem em
extinção, ou se economizaríamos mais água em função de tal conhecimento.
Tendo em vista essas questões, um dos objetivos deste trabalho foi verificar
como as crianças se comportam diante de tal dilema quando conhecimento do
limite do recurso e de quanto devem consumir para que ele não entre em extinção
(considerando como extião o momento no qual o recurso não puder mais ser
renovável). Se a questão da incerteza é um fator importante para explicar o uso
abusivo de um recurso, podemos esperar que, sabendo-se com certeza o quanto se
pode utilizar um recurso para que esse se mantenha, ele não entrará em extinção.
Nos trabalhos envolvendo cooperação e teoria de jogos, foi observado que a
reputação do indivíduo que coopera pode favorecê-lo em eventuais possibilidades de
cooperação, por isso tenderíamos a cooperar para mantermos uma boa imagem
(Nowak & Sigmund, 1998; Nowak, Page & Sigmund, 2000; Milinski, Semmann &
Krambeck, 2002). Nossa proposta neste estudo é a de trabalhar sem identificar os que
cooperam e trapaceiam, tendo em vista que, na natureza, interações identificadas
geralmente não o a regra, pois nem sempre fiscais e infratores ocupam o mesmo
lugar no momento da caça ou coleta de um recurso comum.
Outro fator que interfere na cooperação é o tamanho do grupo. Trabalhos com
o Dilema dos bens blicos sugerem que, em grupos pequenos, a cooperação é maior
do que em grupos grandes. Uma possível explicação para isso é que nos grupos
pequenos a fiscalização dos outros membros do grupo se intensifica (Kollock, 1998;
Suzuki & Akiyama, 2005; Alencar, Siqueira & Yamamoto, 2008). Dessa forma,
também avaliaremos essa possibilidade variando o tamanho do grupo.
87
O sexo do indivíduo, de igual forma, tem sido apontado com um fator que
pode interferir na cooperação. A Conferência Internacional da Água e Meio Ambiente
(International Conference on Water and the Environment ICEW, 1992) aponta que
as mulheres teriam um papel importante na preservação desse recurso. também
sugestões de que as mulheres cooperam mais em situações de Dilemas dos bens
públicos e quando há partilha de alimento (Cadsby & Maynes, 1998; Markovits,
Benenson & Kramer, 2003; respectivamente).
MÉTODO
Sujeitos
Trabalhamos com 142 crianças, sendo 77 do sexo feminino e 65 do sexo
masculino, divididas em 18 grupos que variavam de 5 a 18 integrantes (Tabela VI).
O tamanho dos grupos variou ao longo das sessões em função da presença dos
alunos na escola. Todos os sujeitos tinham, no mínimo, dois meses de convivência na
sala de aula.
A participação na pesquisa era condicionada ao conhecimento dos pais sobre
sua realização e a sua assinatura em um termo de livre consentimento esclarecido, no
qual autorizavam a participação dos seus filhos.
As crianças eram matriculadas nas escolas públicas das zonas Oeste e Norte de
Natal, consideradas as mais carentes em termos de recursos financeiros dos seus
moradores, com renda média de três salários mínimos mensais (IBGE, 2000). O
recurso que utilizamos foi wafers de chocolate, de 7,5 g cada.
Procedimento
1. No primeiro dia, à vista das crianças, colocávamos em um recipiente 3 wafers
por criança (Nc x 3) - Nc é o número de crianças no grupo;
2. O recipiente era colocado atrás de um biombo que vedava a visão de todas as
outras pessoas na sala, inclusive das pesquisadoras. Ao lado do recipiente, as
pesquisadoras colocavam um cartão que continham três cores das seis que compunham
os crachás (ver item 4);
88
3. Cada criaa recebia um crachá com uma cor que poderia ser Azul, Laranja,
Vermelho, Verde, Rosa ou Amarelo;
Tabela VI. Composição dos grupos de
crianças de escolas Municipais de
Natal/RN.
Grupo N Composição do grupo
1 7 =0 ♂=7
2 5 =1 ♂=4
3 11 =2 ♂=9
4 12 =6 ♂=6
5 5 =3 ♂=2
6 6 =3 ♂=3
7 5 =2 ♂=3
8 7 =5 ♂=2
9 5 =1 ♂=4
10 5 =5 ♂=0
11 17 ♀=7 ♂=10
12 6 =3 ♂=3
13 8 =4 ♂=4
14 8 =7 ♂=1
15 6 =4 ♂=2
16 5 =2 ♂=3
17 16 ♀=13 ♂=3
18 10 =9 ♂=1
4. Sem que as crianças soubessem, dividíamos os grupos em dois: um para as
crianças que haviam recebido os crachás Azul, Laranja e Vermelho (G1), e outro para
as crianças que haviam recebido os crachás Verde, Rosa e Amarelo (G2). Essa
distribuição se repetia em todas as sessões, mudando as cores, mas mantendo os
mesmos subgrupos;
5. Após receberem os crachás, as criaas eram convidadas a se dirigirem, uma a
uma, para a parte de trás do biombo, local que continha os wafers. Eram então
instruídas a pegar dois wafers somente se a cor do seu crachá fosse igual a uma das
três cores dos cartões que as pesquisadoras colocavam no biombo;
6. Os cartões coloridos sempre eram apresentados para favorecer o G1 na
primeira rodada (Azul, Laranja e Vermelho), de forma que apenas as crianças do
primeiro grupo teriam direito a retirar dois wafers nessa rodada;
7. Quando todas as crianças tivessem ido ao biombo, contávamos os itens e
reiniciávamos o jogo. Dessa vez, as pesquisadoras colocavam cartões que
favoreceriam as crianças do G2 (Verde, Rosa e Amarelo). A contagem feita na frente
89
das crianças, as a primeira rodada, dava um indicativo de quanto ainda restava do
bem comum, o que poderia favorecer ou atrapalhar a cooperação;
8. Todas as crianças passavam duas vezes por dia pelo biombo. Elas não sabiam,
mas todas teriam a cor de seu crachá sorteada no mesmo dia, em momentos diferentes,
um grupo na primeira rodada (G1) e outro na segunda (G2). No final de cada rodada,
contávamos, na frente de todos, os itens restantes;
9. As crianças eram informadas de que seriam adicionados dois wafers para cada
um que sobrasse no recipiente ao final da segunda rodada e que o jogo prosseguiria no
dia seguinte, se restassem wafers;
10. Considerávamos os wafers restantes como um recurso disponível e passível de
reprodução (RDR), aos quais adicionamos mais dois (RDR +2);
11. As crianças eram informadas que, caso algum colega do grupo faltasse a partir
do segundo dia, ninguém poderia pegar os chocolates dele, embora os wafers
estivessem disponíveis no recipiente. No final do jogo, mantínhamos a proposta de
adicionar os dois wafers a cada item restante, mas fazíamos nossos cálculos incluindo
a criança faltosa para observarmos se tinha havido trapaça. Resolvemos manter o
recurso das crianças que faltavam para nos aproximarmos mais de uma situação
natural;
12. No caso de crianças que compareciam após o primeiro dia de jogo,
incluíamos os três wafers que lhes cabiam no início do jogo daquele dia, informando a
todos a adição e explicando as regras aos novatos. Não aceitávamos crianças no grupo,
após o terceiro dia;
13. Embora esse comportamento permitisse a manutenção permanente do jogo, foi
estabelecido um limite máximo de oito dias para tornar a pesquisa economicamente
viável;
14. Caso os indivíduos do grupo se comportassem sempre cumprindo a regra, ou
seja, pegando dois wafers quando sorteados, o recurso se manteria indefinidamente;
15. Caso alguém retirasse do recipiente mais do que dois wafers, seja pegando sem
ser sorteado ou pegando além de dois,o seria penalizado por isso. Isso, porém, faria
com que, no final, o grupo ganhasse menos, pois o recurso disponível para
90
“reprodução” diminuiria e esse fato afetaria o equilíbrio do grupo. Chamamos o
comportamento de tirar itens indevidamente de oportunismo ou trapaça.
Análise dos dados
Avaliamos a duração do jogo em cada grupo e fizemos uma correlação de
Spearman para verificar se havia relação entre o término do recurso (extinção), sexo e
tamanho do grupo.
O sexo foi analisado em função da composição da maioria dos indivíduos do
grupo e, nesse caso, tínhamos três grupos: 1º) com predominância de meninos; 2°)
com predominância de meninas e 3º) com proporção semelhante dos sexos.
Consideramos como pequenos os grupos formados por até oito indivíduos (Nc
≤ 8) e como grandes os grupos acima de nove indivíduos (Nc ≥ 9).
Realizamos também uma correlação entre as variáveis acima e a taxa de
trapaça ou oportunismo (TO). Entendíamos por oportunismo os casos em que as
crianças pegavam mais wafers do que as regras permitiam, fosse quando as cores atrás
do biombo eram diferentes das do crachá – o que lhes vedava o ganho; ou mais de dois
quando as cores coincidiam – o que lhes permitia pegar apenas dois.
A TO era calculada a cada rodada em todos os dias em que houvesse jogo.
Tínhamos então a TO da primeira rodada, da segunda rodada e da média entre as duas
em cada dia de jogo.
A taxa de oportunismo era avaliada em função da diferença entre a quantidade
de itens no recipiente e a quantidade ideal de itens para a manuteão do recurso
indefinidamente.
A quantidade ideal (Qi) variava em função do tamanho do grupo (Nc). Na
primeira ida ao biombo (
1rod
) contávamos quantos wafers restavam. Para manter o
equilíbrio, ou seja, a sustentabilidade do recurso, deveriam restar os três wafers de
cada criança não sorteada na primeira rodada (as que tinham crachás Verde, Rosa e
Amarelo G1), menos dois para cada criança que havia sido sorteada na primeira
rodada (Azul, Vermelho e Laranja). A quantidade ideal, ou seja, o número de wafers
no recipiente para que o jogo continuasse, variava em função do número de crianças
do grupo (Nc).
91
Para calcular a quantidade ideal de itens na primeira rodada, utilizávamos a
seguinte fórmula:
Qi
1rod
=Nwafers 2G1
Onde:
Qi
1rod
representa o número de wafers após a primeira rodada;
N wafers representa o número de wafers colocado no recipiente no primeiro
dia de jogo, ou seja, Nc x 3;
Nc representa o número de crianças no jogo (G1 + G2);
G1 representa o mero de crianças que deveria pegar wafers na primeira
rodada, isto é, aquelas crianças que tinham um crachá de cor compatível com as cores
do cartão colocado atrás do biombo; nesse caso, vermelho, azul e laranja;
G2 representa o número de crianças que deveria pegar os wafers na segunda
rodada. Nesse caso, aquelas crianças que tinham um crachá de cor compatível com as
cores do cartão colocado atrás do biombo, isto é, verde, rosa e amarelo.
A quantidade ideal da segunda rodada era mais cil de calcular. No final da
segunda rodada, deveria sobrar um wafer por criança (Nc) para que o jogo se
mantivesse indefinidamente, pois quando acrescentássemos mais dois, voltaríamos a
ter N wafers - o número inicial de wafers colocado no recipiente (Nc x 3).
De posse do valor da quantidade ideal da primeira e da segunda rodada e a
quantidade real de itens no recipiente nas duas rodadas, calculávamos a TO.
Para obtermos a TO, subtraíamos a quantidade ideal menos a real. Depois
dividíamos pelo Nc. Quanto mais se afastasse de Zero maior seria a TO.
A fórmula era a seguinte:
TO=Qi Qreal /Nc
Onde:
TO é a taxa de oportunismo;
Qi é a quantidade ideal em cada rodada;
Qreal é a quantidade real em cada rodada, ou seja, quanto havia de fato no
recipiente;
Nc é o número de crianças.
92
Calculamos TO a cada rodada e a TO média que se refere à média de
oportunismo de cada grupo durante os dias em que se manteve jogando.
RESULTADOS
Em 12 dos 18 grupos, o recurso se manteve até o terceiro dia; em quatro, até o
sexto dia e, apenas em dois, o recurso durou até a primeira rodada do oitavo dia
(Tabela VII).
Não encontramos correlação entre a duração dos recursos e o tamanho do
grupo (Spearman’s ρ=-0,503, p=0,833) ou a predominância entre os sexos
(Spearman’s ρ =-0,171, p=0,497).
Por outro lado, verificamos uma correlação negativa (Spearman’s ρ=-0,672,
p=0,001) entre a taxa de oportunismo na primeira sessão do jogo (média das primeira e
segunda rodadas, TO média) e o final do recurso (extinção) (Tabela VIII).
Tabela VII. Composição dos grupos de crianças de escolas Municipais
de Natal/RN em função da duração dos dias de jogos.
Duração dos
dias de jogo Nc Predominância Grupo
1 6 Semelhante 12
2 9 Meninos 3
2 5 Meninos 7
2 7 Meninas 8
2 5 Meninos 9
2 17 Meninos 11
2 8 Meninas 14
2 5 Meninos 16
3 6 Semelhante 6
3 6 Meninas 15
3 16 Meninas 17
3 10 Meninas 18
5 12 Meninas 4
4 5 Meninas 5
6 8 Semelhante 13
7 5 Meninas 10
8 7 Meninos 1
8 5 Meninos 2
Uma correlação positiva foi verificada entre tamanho do grupo e a taxa de
oportunismo total (Spearman’s ρ=0,4901, p=0,038).
Tabela VIII. Taxa de oportunismo do primeiro dia de jogo em relação à duração do recurso em dias,
em escolas municipais de Natal/RN. A taxa de oportunismo da primeira rodada refere-se à média de
apropriações indevidas dos integrantes do grupo (TO
1rod
); a taxa de oportunismo da segunda rodada
93
(TO
2rod
) . A taxa de oportunismo média da primeira jogada (primeiro dia) refere-se à taxa dia do
grupo no primeiro dia de jogo (TO média) e à taxa média de oportunismo ao longo das sessões (TO
total); o dia da extinção refere-se à sessão em que o recurso se esgota.
Grupo N Predominância TO
1rod
(G1) TO
2rod
(G2) TO média TO total
Dia da
extinção
12 6 Semelhante 0,17 1,00 0,58 0,58 1
3 9 Meninos 0,00 0,22 0,11 0,11 2
7 5 Meninos 0,18 0,27 0,23 0,23 2
8 7 Meninas 0,71 0,71 0,71 0,71 2
9 5 Meninos 0,57 0,43 0,50 0,50 2
11 17
Meninos 0,00 0,25 0,13 0,25 2
14 8 Meninas 0,38 0,88 0,63 0,63 2
16 5 Meninos 0,40 0,40 0,40 0,38 2
6 6 Semelhante 0,86 0,33 0,58 0,58 3
15 6 Meninas 0,00 0,00 0,00 0,19 3
17 16
Meninas 0,00 0,00 0,00 0,36 3
18 10
Meninas 0,00 0,00 0,00 0,27 3
5 5 Meninas 0,00 0,00 0,00 0.33 4
4 12
Meninas 0,00 0,00 0,00 0,19 5
13 8 Semelhante 0,40 0,00 0,20 1,21 6
10 5 Meninas 0,20 0,20 0,20 0,19 7
1 7 Meninos -0,86 -0,86 -0,86 0,56 8
2 5 Meninos -0,50 -0,50 -0,50 0,59 8
DISCUSSÃO
O conhecimento da quantidade de recurso que cada indivíduo pode consumir
não evitou a extinção dos recursos em crianças de escolas públicas de Natal/RN. Na
maioria dos grupos, o recurso durou até o quarto dia. Esses dados sugerem que limitar
o uso de recursos por indivíduos através de regras, mas sem fiscalização, não é uma
situação eficaz para evitar a extinção de um recurso, como já foi sugerido por Ostrom
et al. (1999).
O conhecimento do número de itens no recipiente pode não ter funcionado
como a certeza da disponibilidade do recurso (dois para cada indivíduo) tendo em vista
que não havia fiscalização para conferir se a criança poderia ou não sair do biombo
com wafers. Nesse sentido, seria mais eficiente para cada criança consumir o seu de
imediato, mesmo que isso significasse o fim do jogo.
A contagem dos itens restantes na primeira rodada funcionava como uma
sinalização de quanto recurso ainda estaria disponível e, embora o oportunista não
fosse identificado, saber que não havia o suficiente para todos pode provocar nos
94
indivíduos, que ainda não consumiram seu item, uma motivação para consumir além
do permitido.
A ausência de fiscalização provavelmente favoreceu o alto nível de
oportunismo em todos os grupos, tendo em vista que a construção de uma imagem
positiva de indivíduos que cooperam foi eliminada pelo anonimato. Esses dados o
sustentados por outros que apontam a reputação como um ponto crucial para a
cooperação (Nowak & Sigmund, 1998; Nowak et al., 2000; Milinski, Semmann e
Krambeck, 2002). Apesar de o oportunista não ser identificado, os grupos com menos
indivíduos puderam observar com mais eficiência quem recebia muitos itens enquanto
que, nos grupos grandes, essa observação era mais difícil.
A variação no tamanho do grupo não foi capaz de prever o tempo que o
recurso durou. Por exemplo, nos seis grupos com cinco indivíduos, os recursos foram
mantidos por períodos de entre um a sete dias; em grupos maiores, com 12 a 17
participantes, o jogo foi mantido por períodos de um a cinco dias. No entanto, o
tamanho do grupo apresentou uma correlação positiva com a taxa de oportunismo total
(TO total).
A variável tamanho do grupo tem sido apontada como um importante fator
para manutenção da cooperação em experimentos dos bens públicos (Kollock, 1998;
Suzuki & Akiyama, 2005, Alencar et al., 2008). A maior vigilância nos pequenos
grupos e a impossibilidade de construir uma reputação nos grupos grandes, dado o
anonimato, favoreceram a cooperação dos indivíduos que estavam nos grupos
pequenos.
Dados de Boyd e Richerson (1988) e Suzuki e Akiyama (2005), de acordo
com nossos resultados, registraram que o altruísmo recíproco e altruísmo recíproco
indireto só são sustentáveis em grupos pequenos. Além disso, Suzuki e Akiyama
(2005) sugerem que a reputação não pode ser um fator importante em grupos grandes
tendo em vista a dificuldade de construí-la.
A ausência de diferenças entre os grupos compostos com a predominância de
um sexo ou de outro corrobora achados indicadores de que a cooperação não é afetada
pelo sexo do indivíduo (Sell, Griffith & Wilson, 1993; Hyde, 2005). Novamente
95
colocamos que o fato de não saber qual o indivíduo age de forma oportunista acentua a
possibilidade de não haver diferenças.
Nosso trabalho representa uma simulação do que pode ocorrer no ambiente
natural, no qual muitos recursos, como a água, estão se exaurindo. Fiscalizações mais
eficientes são necessárias para evitar o risco de extinção desses recursos, caso
contrário, o oportunismo pode se ampliar consideravelmente. Vale a pena destacar, no
entanto, o estudo de Corral-Verdugo e Frías-Armenta (2006). Nele, os autores
mostram que crenças pessoais e comportamentos p-sociais são necessários para
promover o desenvolvimento de uma orientação pró-conservação do ambiente em
populações mexicanas que vivem em ambientes urbanos com escassez de água. Isso
sugere que a abordagem necessária para a promoção da conservação dos recursos
sustentáveis é necessariamente complexa, e deve abranger diversos aspectos da
legislação, fiscalização e educação ambiental. Esse estudo chama a atenção para as
condições que podem favorecer ou dificultar o comportamento de conservação de
recursos escassos e pode ajudar na formulação de políticas de conservação.
REFERÊNCIA
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Ecosystem Services. Science, 314, 787-790.
97
2.4. ARTIGO EMPÍRICO IV Os bastidores da pesquisa: O que acontece por
trás do biombo? Estudos de casos
Título abreviado
Os bastidores da pesquisa
Anuska Irene Alencar¹
Maria Emilia Yamamoto¹
*
1
Programa de Pós- Graduação em Psicobiologia do Departamento de Psicobiologia do
Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
Natal/RN, Brasil
* Correspondência:
Maria Emília Yamamoto
Campus Universitário, Caixa Postal 1511
59078-970 – Natal – RN – BRAZIL
e-mail: emiliayamamoto@gmail.com
98
RESUMO
A cooperação é um comportamento aceito e desejado em todas as sociedades. Estudos
recentes sugerem que as crianças apresentam esse comportamento desde muito cedo.
O presente artigo tem por objetivo relatar e discutir casos de crianças que participaram
de jogos dos Dilemas dos comuns e de Bens públicos em escolas públicas de
Natal/RN. Os casos relatados apresentam particularidades dos atos cooperativos e de
trapaças que não são evidenciadas nas análises quantitativas. Verificamos nos relatos
apresentados pelas crianças estão de acordo com os achados dos trabalhos
quantitativos e que esta análise, mais qualitativa, levanta novas questões para serem
investigadas em crianças, utilizando a metodologia da teoria dos jogos.
PALAVRAS-CHAVE: free riders, cooperação, teoria dos jogos
ABSTRACT
Cooperation is an accepted and desired behavior in all societies. Recent studies
suggest that children show this behavior at a very early age. The present article aims to
report and debate cases of children who participated in the common dilemma games
and in the public goods games in public schools in Natal/RN Brazil. The reported
cases show particularities in the collaboration acts and in cheating acts, which are
evident on the quantity analysis. We verified in the presented reports that they are in
accordance with the ones found in the quantity analysis and that this analysis, more
quality related, rises new questions to be investigated in children, using the theory of
games methodology
Keywords: free riders, cooperation, game theory
99
INTRODUÇÃO
A cooperação é um comportamento extremamente aceito e desejado em todas
as sociedades. Estudos anteriores sugerem que as crianças são egoístas e o
comportamento cooperativo passa por estágios que evoluiriam a partir de maturação
biológica e da interação com o mundo do adulto (Piaget, 1932/1994). Para Piaget, a
partir dos sete anos as crianças têm noção de reciprocidade, fato fundamental para a
manutenção da cooperação em casos de interações repetidas entre as pessoas de um
grupo.
Trabalhos recentes têm sugerido que os comportamentos cooperativos e
morais também são progressivos. No entanto, aparecem muito cedo, por volta dos dois
a três anos, através de ações simples e imitativas (Brownell, Ramani & Zerwas, 2006),
ou aos quatro anos, através de comportamentos mais complexos e altruístas
(Benenson, Pascoe & Radmore, 2007).
Independente da idade em que se inicia esse comportamento, desde cedo os
adultos estimulam as crianças para que se engajem em atividades cooperativas (Piaget,
1932/1994). Não obstante, a estimulação nem sempre é bem sucedida e, algumas
vezes, elas não correspondem, embora tenham maturidade e experiências educativas
que dão condições para a exibição do comportamento cooperativo. O que leva, então,
uma criança a se engajar em atividades cooperativas ou, ao contrário, nas mesmas
condições, a não participar delas?
Freitas (1999), ao discutir essa questão, sugere que o trabalho de Piaget sobre
moralidade não conseguiu respondê-la. Pensamos que, provavelmente, outras
condições não observadas por ele poderiam estar presentes.
Piaget concentrou seu trabalho na análise do juízo moral da criança que
julgava determinadas ações como certas ou erradas. Esse pesquisador considerava a
explicação que ela dava para sua resposta. Nos estágios iniciais (heteronomia) as
crianças consideravam uma ação como correta se esta seguisse a regra dada pelo
adulto. No estágio seguinte (autonomia), a criança avaliava a gravidade da ação, e não
mais o que o adulto dizia ser certo ou errado.
100
Piaget (1932/1994) trabalhou com o estudo de casos individuais e considerava
essa metodologia extremamente elucidativa para o estudo da moralidade. Segundo ele,
um bom número de casos individuais pode nos ajudar a compreender melhor o
processo da cooperação.
Outros trabalhos sobre moralidade surgiram depois de Piaget. Alguns deles
utilizando a teoria dos jogos aplicada a crianças. Essa teoria é o estudo formal do
conflito e da cooperação e utiliza modelos matemáticos que descrevem interações
competitivas, sujeitas a um conjunto de regras. O melhor resultado depende das
interações das estratégias dos jogadores.
Utilizando um dos mais famosos jogos da teoria dos jogos o dilema do
prisioneiro –, Fan (2000) verificou que as crianças, em sua maioria, cooperavam.
Crianças mais velhas (sete a nove anos) tendem a cooperar mais do que crianças mais
novas, o que corrobora os achados de Piaget. Ainda nesse trabalho, Fan verificou que a
tendência à reciprocidade é maior nas crianças de seis anos de idade do que nas mais
novas. Quando o reteste foi realizado, a cooperação aumentou. A cooperação também
aumentou nas criaas de todas as idades quando o pesquisador falou sobre a
cooperação antes do jogo e sobre as vantagens de ser cooperativo. Nessas
circunstâncias, poderíamos pensar que houve um aprendizado que aumentou a
percepção dos ganhos em uma situação de jogo.
Em outro estudo, utilizando a teoria dos jogos, com o jogo dos Bens públicos
de interações repetidas, Krause e Harbaugh (2000) verificaram que crianças acima de
oito anos aprendem a ser free riders, ou seja, a não cooperar e a usufruir a cooperação
do outro. Nesse trabalho, os pesquisadores não falaram sobre as vantagens da
cooperação antes do jogo. Eles sugerem que as crianças mais novas não percebem a
possibilidade de ganhar sem cooperar com algo, como fazem as criaas que se
comportam como free riders.
Os dados encontrados nesses exemplos, utilizando a teoria dos jogos,
corroboram os de Piaget e auxiliam a esclarecer as razões pelas quais uma criança
coopera ou deixa de cooperar, mesmo quando tem idade para fazê-lo. Aparentemente,
o desenvolvimento cognitivo de crianças a partir de sete anos é suficiente para avaliar
se vale a pena cooperar ou não, tal como ocorre com os adultos.
101
Essas investigações, embora de grande importância para a compreensão do
fenômeno da cooperação, apresentam seus resultados, como é de praxe nos trabalhos
científicos, através de médias e outras medidas gerais. Vale ressaltar que alguns
aspectos particulares não são evidenciados.
Os trabalhos de Piaget, por outro lado, não analisam grandes grupos, o que
impede uma alise mais quantitativa. Em função disso, o objetivo deste artigo é
relatar particularidades dos atos cooperativos e de trapaças que não puderam ser
evidenciadas nos resultados quantitativos relatados em jogos de Bens públicos (estudo
empírico 2.1 e 2.2) e Dilema dos comuns (estudo empírico 3.1). Essas particularidades
referem-se a observações ocasionais e comportamentos das crianças que não
constavam do protocolo experimental e que, por isso, não foram avaliados
quantitativamente.
As vivências e situações sussurradas em segredo ou vistas por trás do biombo
podem contribuir para o aprofundamento do tema. E, quem sabe, também para propor
novas metodologias que levem a uma compreensão mais aprofundada desse
comportamento.
MÉTODO
Sujeitos
Analisamos 16 casos de alunos de escolas públicas de Natal/RN, que
participaram de um experimento de Bens blicos. Esses alunos, crianças em grupos
de 7 a 24 indivíduos, eram instruídos a contribuir ou não para um bem comum (estudo
empírico 2.1 e 2.2); ou de um experimento de Tragédia dos comuns, no qual as
crianças, em grupos de 5 a 18 indivíduos, eram instruídas a retirarem wafers de um
bem comum caso fossem sorteadas (estudo empírico 2.3).
Todos os sujeitos tinham, no mínimo, dois meses de convivência na sala de
aula. A participação na pesquisa era condicionada ao conhecimento dos pais sobre sua
realização e assinatura destes em um termo de livre consentimento esclarecido, por
meio do qual autorizavam a participação dos seus filhos.
102
Delineamento experimental
Para o jogo dos bens comuns, as crianças recebiam três wafers e eram
instruídas a fazer doações de um, dois, três ou nenhum deles para o grupo. As doações
eram feitas atrás de um biombo, de maneira a manter o anonimato das doações, e
colocadas em um envelope, que era depois depositado dentro de uma urna. Após a
doação de todas as crianças, as pesquisadoras adicionavam mais dois wafers a cada um
que estivesse no envelope (chamávamos de retorno) e o total era dividido por igual
para todos os membros do grupo, independente das doações individuais. Os wafers não
doados não eram recolhidos, portanto, uma vez que todos iniciavam com três, cada
indivíduo podia terminar com um total diferente do de outros indivíduos, pois
somavam o que nhamos dado (retorno) com os que tinham guardado (a esta soma
chamávamos retorno privado).
Apesar de as doações serem feitas em segredo, os pesquisadores podiam
identificar os doadores sem que esses soubessem (para mais detalhes, ver os estudos
empíricos 2.1 e 2.2).
No experimento do Dilema dos comuns, cada participante recebia um crachá
contendo uma cor dentre seis e três wafers. O montante era colocado em um desito
que ficava atrás de um biombo. Cada participante ia a esse local, duas vezes em uma
sessão e, caso fosse sorteado, poderia pegar dois wafers. Cada participante era
sorteado (dependendo da cor do crachá) em uma das idas ao biombo, entretanto, as
crianças não tinham essa informação. Nesse jogo não podíamos identificar se a criança
tinha cooperado ou trapaceado, mas calculávamos a média de cooperação e trapaça e o
fim do recurso do grupo do qual ela fazia parte (para mais detalhes, veja estudo
empírico 2.3).
Análise
Análise de alguns casos escolhidos pelo significado e importância que
poderiam ter para compreensão da cooperação e trapaça em crianças, utilizando a
metodologia da teoria dos jogos.
103
Nos casos, em que podíamos identificar as doações individuais, verificamos as
realizadas pelas crianças em questão, o ganho individual e o ganho médio do grupo
referente à sessão em que nossa análise ocorreu ou à média do total das sessões (8).
Quando não nos foi possível identificar as doações individuais, mas pudemos
identificar as doações do grupo, fizemos uma média da cooperação e da trapaça do
grupo do qual a criança fazia parte.
Em alguns casos relatados nessa sessão, não tínhamos como identificar os
atores envolvidos.
Todos os nomes dos sujeitos foram alterados para manter a privacidade das
crianças.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O convite
Antes da entrega dos termos de livre consentimento esclarecido, fizemos o
convite para a participação na pesquisa. Falamos que se tratava de um jogo cujas
pedras eram chocolates (wafers) e que ninguém pagaria para jogar. Aproveitamos e
perguntamos: O que é um jogo? Essa questão foi lançada porque muitos adultos que
não têm familiaridade com a teoria dos jogos não entendem o jogo das Terras dos
comuns ou os jogos dos Bens públicos como um jogo.
Surpreendentemente, em uma das turmas, um garotinho de sete anos,
Maurício, disse com ar de quem julgava a pergunta com uma resposta por demais
óbvia: Jogo é um conflito de interesses, porque a gente sempre quer ganhar e os
outros também, ora! É claro que é a resposta correta embora a gente nem sempre
admita. E foi a resposta mais inteligente de todas que ouvimos. Como os adultos, as
crianças falam de jogo de futebol, de damas, mas nunca definem um jogo. E raramente
o associam a situações da vida cotidiana nas quais sempre queremos ganhar.
Trazendo a idéia da teoria dos jogos para as vivências das trocas sociais,
qualquer situação da vida cotidiana que envolva um conflito de interesses pode ser
transformada em um jogo (Munck, 2000). Maurício aparentemente compreendia bem
isso e provavelmente desconhece formalmente a teoria dos jogos.
104
Essa teoria propõe que, de posse do conhecimento do conflito, o pesquisador
possa pontuar as ações daqueles que nele se envolvem. A teoria dos jogos constata que
conflitos de interesse acontecem porque a regra geral é maximizar, prioritariamente, o
ganho individual, conforme esse mesmo autor. Não se trata de uma ação amoral, de se
fazer o bem ou mal”, ou de estar “certo e errado”. Maximizar o ganho é conhecido
como teoria da utilidade a qual pressupõe que os indivíduos trabalham para maximizar
seus ganhos. Do ponto de vista da teoria dos jogos, é o que chamamos de escolha
racional (von Neumann & Morgenstern, 1940/2004).
Manuela (8,8 anos)
No convite para participação da pesquisa, perguntamos à turma se alguém
tinha alergia a chocolate. Em caso positivo, informávamos que a criança não poderia
participar da brincadeira para evitar que adoecesse em função da ingestão dos wafers
(biscoitos que contêm chocolate).
Manuela respondeu que era alérgica a chocolate. No dia de receber os termos
de livre consentimento esclarecido, surpreendeu-nos receber o dela assinado. Quando
questionamos o fato de ela ser alérgica, ela me respondeu que era, mas iria jogar
porque a irmã dela não era e poderia comer os chocolates que ela ganhasse.
O que faz Manuela ter esse desprendimento? Seria a força da seleção de
parentesco (Axelrod & Hamilton, 1981)?
Como a benevolência de Manuela nos proporcionou tamanha admiração, um
dia chegamos bem cedo para falar com a mãe dela, que sempre a deixava na escola, e
questionamos sobre o número de chocolates que Manuela levara para a irmã. A
resposta foi compatível com o que havíamos distribuído na sessão anterior, exceto pela
falta de um chocolate que Manuela tinha dado à professora (nesse dia havíamos
observado a professora recebendo dela um wafer).
Sempre que falamos em cooperação, utilizando a teoria dos jogos e a seleção
natural, pensamos em custos e benefícios, tal como proposto por Axelrod & Hamilton
(1981) e que a cooperação existirá caso os benefícios superem os custos. Essa é
uma regra conhecida como regra de Hamilton, expressa na equação: rb>c, onde:
r=coeficiente de parentesco entre os indivíduos envolvidos na cooperação
b=benefício para o recipiente
105
c=custo para o doador.
De fato, Manuela não tinha custo algum em doar seus chocolates, estava no
momento da aula, não era excluída da turma e ainda era considerada bondosa pela
família e professora. Pensamos em três coisas: (1) O quanto ela se arrisca? (2) Ela doa
tudo ou nada? (3) Ela distribui os ganhos doando mais à professora ou à irmã?
Para responder a essas questões observamos que suas doações eram sempre
um meio termo (ou dois ou um) e ela nunca chegou a doar três wafers. Dessa forma,
ela garantia que sua irmã e a professora ganhariam chocolates quando doava um para o
grupo, e guardava dois: um para irmã e um para a professora. Vale ressaltar que não
conferimos o quanto à professora recebeu dela em cada dia de jogo, apenas supomos o
que ocorreu com base nas observações da evolução de suas doações.
O retorno que dávamos para Manuela era lucro para sua irmã e sua professora.
Na média das oito sessões, ela ganhou 4,0 wafers – a média do grupo era de 4,2.
Acreditamos que essa criança teve um ganho secundário fazendo as doações
para o grupo, para a irmã e para a professora. Enquanto o ganho dos seus colegas era
saborear o wafer, o dela era ser vista como boazinha. Isso foi maquiavelicamente
planejado? Provavelmente não, mas uma longa história de doações e as respectivas
reações das pessoas incentivam nossa generosidade.
Joaquim (6,2 anos)
Enquanto alguns não podiam comer os chocolates e doavam para a irmã e para
a professora ou outros passavam para frente, trocando por um item que os
satisfizessem, Joaquim os guardava para colocar na lancheira do seu aniversário.
Durante esse evento, ele iria partilhar tudo com seus amigos e parentes. Quando lhe
perguntamos se não gostava de chocolates, ele disse que sim, mas que sua lancheira
iria ficar melhor se tivesse chocolate.
Em muitos desses casos que estamos relatando, conseguimos friamente
observar as teorias que se encaixam perfeitamente nos atos de “bondade”. Entretanto,
em outros, não conseguimos conter a emoção o que prejudica a apreensão de
justificativas para tal ato –, não obstante, insistimos.
106
Será que esses atos têm motivação no status, na reputação? Será que Joaquim
pensa como Milinski et al. (2002) e Sell (1997) Nowak & Sigmund (1998); Nowak et
al. (2000) os quais constataram que as pessoas cooperam com quem coopera.
Ter um chocolate na lancheira (lembrança de aniversário) faria dele um garoto
de boa reputação? Será que os ganhos posteriores seriam maiores do que o prazer de
comer seus chocolates? Provavelmente, esses mecanismos são inconscientes e as
crianças não raciocinam friamente sobre os custos e benefícios de seus atos. Todavia,
como discutimos anteriormente (ver seção teórica), a emoção desempenha um papel
importante na ação de todas essas crianças observadas.
João (8,10 anos)
Eu dei três e ganhei dois? Isso é injusto.
A frase de João reflete uma revolta comum no dia-a-dia. Por exemplo,
pagamos impostos e nem sempre usufruímos o que merecemos pelo valor pago porque
alguém deixou de pagar.
No dia do comentário, as todos fazerem a doação e termos adicionados dois
wafers para cada um que estava no envelope, distribuímos cinco para cada criança
(retorno).
A conta que João fez incluía seu investimento (três wafers) e seu lucro (dois
wafers). No segundo dia de jogo ele ficou com cinco chocolates, mas o achou justo,
pois no seu grupo algumas crianças não doaram nada (investimento zero) e ficaram
com oito (lucraram cinco).
Nos dias seguintes, continuou doando três; depois dois; depois um; dois ...
nunca zero. O que o manteve como um cooperador mesmo sabendo que seu retorno
seria abaixo do esperado?
João, de acordo com a teoria do desenvolvimento cognitivo, estaria no terceiro
estágio do desenvolvimento moral de Kohlberg (1984 citado por Krebs, 2000) e no
da autonomia de Piaget. No estágio proposto por Kohlberg, as pessoas se comportam
de modo a receber aprovação pelo seu ato. João tanto poderia estar procurando essa
aprovação, quanto poderia estar agindo como achava que era correto. Para ter a
aprovação, os outros deveriam saber quantos chocolates ele estava doando, o que o
nosso procedimento impedia. Não obstante, informava aos outros o quanto havia
107
doado, o que poderia lhe trazer ganhos secundários como acesso a determinados
brinquedos ou privilégios em algumas brincadeiras. O ganho de um bom cooperador
não necessariamente precisa ser retribuído com o que ele doa. Ele pode receber o favor
com favores de outra natureza.
O resultado do jogo para João não está de acordo com o que Milinski et al.
(2002) previram: que as retribuições são maiores para sujeitos que cooperam.
Provavelmente, pelo fato de as contribuições serem anônimas nos nossos jogos e a
retribuição (soma de todas as doações mais dois wafers para cada um que estava nos
envelopes) não ser dirigida a quem cooperou e sim para o grupo, além de ser
distribuída igualmente entre os participantes, o padrão de contribuições foi diferente
daquele relatado por esse autor.
A insistência de João em se manter como doador pode ter sido influenciada
pelo movimento do grupo, onde se manteve entre a maioria. No primeiro dia de jogo,
seu grupo obteve uma média de ganho de 7,1. O resultado de João esteve abaixo da
média do grupo (ganhou 6,4), a mesma quantidade que mais da metade do grupo. Os
demais jogadores ganharam 7,4. Então, nesse grupo, todas as crianças ganharam 7,4
ou 6,4 wafers.
Ao longo das oito sessões, a média de ganhos foi de 4,8 para cada indivíduo
do grupo. O ganho de João ainda ficou acima da média 5,1 (o maior ganho foi de 5,7 e
o menor de 3,8). Isso porque ele se manteve cooperando, mas guardando alguns
chocolates que, somados àqueles que os pesquisadores retornavam, deixavam sua
média de ganho maior do que o da maioria. Nesse grupo, os indivíduos que chegavam
a ganhar em média 3,8 mantinham uma cooperação alta (três ou dois wafers). Isso
significa que, apesar da queixa sobre a injustiça dos ganhos, João estava controlando
cuidadosamente suas doações. Assim, ao mesmo tempo em que se mantinha como um
colaborador no grupo (doando um ou dois wafers), jamais arriscava reduzir demais
seus ganhos como Mariano, que ganhou menos no grupo (3,4), pois se comportou
como cooperador máximo (três doações) em todas as sessões.
Trabalhos com adultos sugerem que a melhor estratégia em jogos de Bens
públicos, que foi o caso de João, é manter-se cooperando desde que todos cooperem.
Uma alternativa é ser trapaceiro (no sentido de ganhar mais) quando os demais
108
cooperam (Semmann, Krambeck & Milinski, 2003; Hauert, De Montes, Hofbauer &
Sigmund, 2002a, 2002b).
Alguns indivíduos sabem avaliar essas condições melhor do que outros. E
acreditamos que essa avaliação nem sempre é consciente no sentido de que os
indivíduos calculam seus ganhos.
No exemplo abaixo, ilustramos um caso em que há um cálculo pensado pelos
jogadores, provavelmente induzido pelo padrão de doação do grupo, que foi diferente
desse.
Marília (8,5 anos) e Pedro (9 anos completos)
Marília diz enfaticamente: Gente, vamos dar três porque meu pai disse que se
todos derem três, a gente ganha nove.
Marília doou zero desde o primeiro dia embora tenha dito que o pai
recomendara:Doe três para ganhar nove”.
Pedro, que estava em outro grupo, tinha um ar meio malandro e dizia sempre:
Eu vou colocar três.
Ele sempre colocou zero.
O que levou essas crianças a já iniciarem o jogo trapaceando?
Krebs (2000) e Trivers (1971) sugerem que podemos trapacear fazendo com
que os outros pensem que somos indivíduos que cooperam e, assim, recebermos os
benefícios de pessoas benevolentes, pois temos habilidades para isso.
Tanto Marília quanto Pedro perceberam, de início, que trapacear é uma boa
estratégia, desde que os outros não o percebam e não procedam da mesma forma
(Semmann, Krambeck & Milinski, 2003; Hauert, De Montes, Hofbauer & Sigmund,
2002a; Hauert, De Montes, Hofbauer & Sigmund, 2002b). No primeiro dia, eles
ganharam mais do que todos os outros: o ganho de Pedro no primeiro dia de jogo foi
de 7,9 chocolates, enquanto que o grupo ganhou em média 5,8 (sendo o maior 6,9 e o
menor 4,9). Marília ganhou no primeiro dia 7,1 wafers e a média do grupo foi de 6,2
(sendo 4,7 o menor ganho e 6,1 o mais próximo de Marília). O ganho de ambos foi
visivelmente maior, mas quem percebeu? Provavelmente os amigos mais íntimos,
pois eles estavam em um grupo acima de 12 indivíduos.
109
Com o tempo, perceberam que, se os outros procedessem da mesma forma,
eles perderiam. Provavelmente, por essa razão, Marília insistia: Minha gente,
coloquem três”. No grupo de Marília um dos jogadores ganhou o mesmo que ela no
primeiro dia; portanto, ela não foi a única free rider do grupo. Talvez por essa razão
tenha sido muito mais enfática que Pedro.
No grupo de Pedro, o ganho médio dos oito dias de jogo foi 3,6 (sendo o
menor ganho 2,5 e o mais próximo de Pedro 4,2) e o de Pedro foi 4,7. Marília
ganhou em média quatro chocolates e o grupo 3,4 (sendo o menor ganho três e o maior
3,7).
Esses dois free riders foram, em média, os indivíduos que mais ganharam
chocolates dentro dos seus grupos, maximizando seus ganhos à custa da cooperação
dos outros. Outros free riders apareceram ao longo do jogo, mas, para a felicidade de
Pedro e Marília, eles só perceberam a vantagem dessa estratégia mais tarde. No
entanto, os dois não perceberam que eles também perderam. Cada um poderia ter
ganhado nove chocolates por dia, pois de acordo com nosso delineamento
experimental, a cada wafers doado nós adicionávamos mais dois e distribuíamos
igualmente entre todos os participantes, mas nem mesmo no primeiro dia eles tiveram
esse ganho.
Porque somos controlados pelo ganho imediato e não pelo ganho potencial?
Da mesma maneira que ocorre no dilema do prisioneiro, a falta de confiança nos
outros, isto é, a insegurança em relação ao comportamento dos outros membros do
grupo torna a trapaça sempre a melhor estratégia (Parks, 1994; Cremer, 1999). Pedro e
Marília refinaram essa estratégia ao tentar persuadir os outros de que estavam
cooperando e, dessa forma, incentivaram a cooperação dos outros.
As duas Suzanas (9,11 e 10 anos)
Em um grupo pequeno (abaixo de sete indivíduos), no quarto dia, uma das
Suzanas não colocou nada. As crianças perceberam porque ela deixou à vista wafers
que havia retido antes da distribuição dos chocolates doados mais aqueles colocados
pelas pesquisadoras. Após a distribuição, ela ficou com mais do que os outros
membros do grupo, em função do retorno privado. Observando isso, a outra Suzana
110
disse: “Nunca mais faça isso...” No dia seguinte, a turma toda fiscalizou fortemente a
Suzana que havia se comportado como free rider. No dia da fiscalização pesada, ela
saiu do biombo sem wafers (ou, pelo menos, os havia escondido bem, dessa vez) e
ficou apenas com o retorno que as pesquisadoras deram.
Nesse mesmo dia, apareceu no grupo um free rider. Teria Suzana repetido o
ato? Constatamos que não. No entanto, no momento em que fazíamos o registro da
doação longe das crianças, constatamos que o envelope, no qual não havia doação, não
era de Suzana.
Enquanto todos fiscalizavam Suzana, outra pessoa se aproveitou da situação -
Sheyla. Infelizmente, não observamos o movimento do grupo em relação a essa atitude
de Sheyla. Não sabemos se a consideraram trapaceira e criticaram sua atitude como
fizeram com Suzana ou se questionaram Suzana mais uma vez, todavia acreditamos
que, como nós, no primeiro momento, a maioria achou que Suzana havia trapaceado,
já que havia ganhado a reputação de trapaceira.
Talvez nos comportemos assim com indivíduos que o considerados
trapaceiros. Mealey, Daood e Krage (1996) verificaram em adultos que as pessoas com
fama de serem desleais ou criminosas são mais lembradas do que as pessoas
benevolentes. Eles chegaram a essa conclusão mostrando slides com fotos e dizeres
sobre alguma característica dos indivíduos. Entre eles, havia alguns que tinham sido
acusados de assassinato, roubado um colega da escola, praticado grandes roubos e
outras. Dias depois, os participantes eram convidados a rever os slides sem os dizeres:
as pessoas com características mais negativas foram mais lembradas pelos
participantes.
Um mecanismo parecido pode ter funcionado nesse caso tanto para as outras
crianças do grupo como para mim, pois eu também acreditava que Suzana havia
repetido o feito.
Nos grupos pequenos, nos quais todos podem perceber mais facilmente nossas
reações, trapacear pode estragar nossa reputação. Em alguns casos, o grupo vai além e
não permite a trapaça. Quando estamos sendo vigiados passamos a ser mais bonzinhos
do que realmente somos (Zarbatany, Hartmann & Gelfand, 1985), ou podemos nos
aproveitar da fama do outro, como fez Sheyla que não doou nada no dia seguinte e
111
um wafer apenas no último dia. Suzana ainda chegou a doar dois no segundo dia e
depois voltou a ser free rider. É possível que a punição não tenha sido alta o suficiente
para inibir o comportamento de trapaça nos últimos dias de jogo. Porém, o
aparecimento de outra free rider pode ter confundido o grupo, dificultando a
vigilância.
De bobo a rei (7,1 anos)
No jogo dos bens públicos, ele o bobo sempre doou três wafers do primeiro ao
oitavo dia e sempre ouvia o deboche dos colegas. Eles diziam: quem é o idiota que
está doando três?
O ganho do bobo nos oitos dias de jogo foi de 2,9 wafers enquanto que o do
grupo foi em média 4,3. No último dia de jogo ele foi o único doador o grupo. Como
resultado, o grupo ganhou menos de um wafer (0,9) de retorno e ficou com 3,9
(retorno privado) e o bobo ficou com menos de um (0,9).
No último dia, contamos a história dos Bens públicos. Contamos que a maior
parte daquilo que temos pertence a todos e isto só funciona porque muitas pessoas
cooperam para que possamos -lo. Um exemplo é a escola em que eles estudam.
Lembramos-lhes que seus pais não pagam a escola diretamente, mas o fazem quando
pagam algum imposto. Dissemos-lhes que, quando eles riscam a parede ou quebram
alguma das cadeiras, a conta da pintura da parede e do conserto ou compra da nova
cadeira é dividida por todos que pagam impostos.
Dissemos-lhes tamm que, para que haja energia elétrica em suas casas ou
nas ruas, os pais pagam uma taxa destinada a pagar a energia gasta nesses dois lugares.
Além disso, citamos outros casos e eles comentaram, ilustrando com exemplos
próprios. Depois, passamos para o nosso experimento. Dissemos que fizemos o mesmo
que os pais fazem quando pagam uma conta de luz ou IPTU (explicamos o que é o
IPTU).
Todos contribuem para um bem comum – nem todos contribuem com o
mesmo valor, nem todos doam a mesma quantidade de wafers, mas todos recebem o
mesmo.
112
Voltamos para algum dos exemplos que demos ou que eles trouxeram, o da
energia, por exemplo, e questionamos “Se alguém não pagou a conta de luz da casa, o
poste da rua apaga quando a pessoa passa?Eles respondem que não e voltamos ao
nosso exemplo.
Esclarecemos que, se todos tivessem doado o máximo (três wafers), eles
teriam ganhado nove por dia.
No caso desse grupo, lembramos que uma pessoa doou no último dia,
digamos que essa pessoa tenha pagado a conta de luz ou IPTU, no entanto, todos
usufruíram o bem que essa pessoa fez. Nesse momento, o bobo” revelou para todos
ser o doador máximo. O aluno mais inteligente, de acordo com a escola (ganhou o
prêmio de melhor aluno do estabelecimento), levantou e doou do seu montante um
wafer para o bobo. Logo em seguida, todos do grupo fizeram o mesmo. Naquele dia, o
bobo foi o que mais ganhou chocolates (12,9). Um ato digno de aplausos? Parece que,
de alguma forma, o altruísmo recíproco imperou novamente. O bobo foi
recompensado e teve um dia de rei.
Marcelo (8,3 anos)
Marcelo me sussurra em segredo: Professora, eu vou doar zero. Olha depois
para turma e grita: Eu vou ser muito generoso. Por que uma criança de 10 anos já tem
a noção de que ser bom é uma boa idéia? O retorno dele é maior que os demais. E os
outros precisam saber que ele é generoso para que cooperem. Cremer (1999) sugere
que, se há confiança de que os membros do grupo cooperarão, a cooperação dos
demais aumenta e, se Marcelo não doa, ele ganha mais, principalmente se todos
acreditarem que o grupo é cooperador. A confiança reflete a reputação que Marcelo
possui. Como não participávamos do jogo, nem exercíamos censura sobre quem não
cooperava, apenas nós ficávamos sabendo da sua trapaça.
Nem com a professora dizendo o que fazer
Um dos nossos grupos foi eliminado da amostra total porque, sem que
tomássemos conhecimento, a professora mandou as crianças doarem três wafers e
explicou matematicamente que era mais vantajoso doar três. Como crianças
113
obedientes, elas fizeram isso, todavia, criou-se um clima de muita tensão. Elas
pareciam estar com medo e eu não entendia por quê. Aque uma disse: A professora
disse que tínhamos que colocar três.
Ficamos muito constrangidas, porque esse era o último grupo com o qual
iríamos trabalhar e era composto de crianças que apresentavam a menor faixa etária
com a qual havíamos lidado até aquele momento (havia várias crianças de cinco anos
no grupo). Depois tivemos que abrir outro grupo (o de Joaquim) no qual as crianças
eram um pouco mais velhas. Além do mais, isso representou muito mais trabalho para
nós.
Continuamos nas outras sessões com eles (mais cinco) porque já tínhamos dito
que seriam oito encontros. E que havia acontecido uma intromissão que desviara o
intento do trabalho, perguntamos: quem vai saber quanto vocês doaram?
Para nossa surpresa, elas não doaram três nas sessões seguintes. Afinal, era
um grupo grande. Quem saberia quem não doou três?
As crianças desse grupo simplesmente não seguiram as regras propostas pelos
adultos, pelo menos, não no instante em que perceberam que o cumprimento das
regras não poderia ser fiscalizado. Nesse momento, as mesmas pressões que
modularam o comportamento dos outros grupos entraram em funcionamento aqui.
Comentários da diretora de uma escola
Você sabia que estão fazendo comércio com os chocolates?Disse-nos a
diretora de uma escola. Nós perguntamos: Como assim?
Ela nos disse que algumas crianças não gostam de chocolates e fazem trocas
utilizando-os como moeda.
Infelizmente, não tínhamos os nomes das crianças que inteligentemente
utilizaram seus ganhos para trocar por outra coisa que de fato fosse útil para si.
Gostaríamos de saber a evolução de suas doações, o quanto se arriscavam - doavam
tudo ou nada? Não sabemos. O valor dos chocolates havia aumentado em função de
seu valor de troca?
O comércio evolui certamente porque alguém tinha algo que não queria e esse
algo era extremamente desejado por outro. As trocas proporcionadas por esse trabalho
114
não se restringiram apenas a oito sessões, mas ultrapassaram o biombo e o resultado
concreto que tínhamos na urna em que se encontravam os wafers.
Luciano (8,5 anos) a apropriação indevida e a emoção revelada
No trabalho do Dilema dos comuns, como todos os outros, não podemos olhar
o que acontece atrás do biombo. Entretanto, houve uma vez em que olhamos. Nesse
dia, Luciano estava em um dos grupos no qual o recurso havia entrado em extinção
logo no terceiro dia. Na primeira vez, embora devesse ter pegado seus wafers na
segunda rodada, ele pegou na primeira; na segunda, demorou bastante no biombo. As
crianças começaram a gritar: Sai logo desse banheiro que eu quero entrar. Ao
verificarmos se estava tudo bem, notamos que ele tremia com o cartão na mão,
indicando que ele poderia pegar, pois havia a cor azul igual a do seu crachá.
13
Agora,
era hora de pegar os seus chocolates, mas ele os havia pegado. Ele olhou para mim
como se dissesse: e agora? Eu sabia que ele tinha tirado seus dois itens indevidamente
na rodada anterior, mas ele não sabia que eu sabia disso. Eu disse: Se a cor for a do
seu crachá você pode pegar, e ele pegou, mas certamente aquele rostinho demonstrava
vergonha pelo ato.
Talvez Luciano não acreditasse que pudesse ser sorteado e havia garantido
seus dois wafers na primeira rodada. Quando constatou que poderia legitimamente
ganhar, entrou em conflito.
Os dois itens retirados indevidamente do bem comum afetaram a extinção do
recurso nesse grupo. Provavelmente Luciano experimentou um sentimento muito
comum e associado ao comportamento moral, a vergonha. Esse caso nos faz lembrar
que analisar a cooperação com base na seleção natural e na teoria dos jogos faz esses
comportamentos parecerem desprendidos das emoções, mas que, de fato, não o são.
Nem a seleção natural nem a teoria dos jogos preconizam isso.
É importante esclarecer que não falamos aqui do comportamento moral ou
altruísta do ponto de vista ético - nossa abordagem é outra. Comportamentos que
13
As receberem os crachás, as crianças eram convidadas a se dirigirem, uma a uma, para a parte de
trás do biombo, local que continha os wafers. Eram então instruídas a pegar dois wafers somente se a
cor do seu crachá fosse igual a uma das três cores dos cartões que as pesquisadoras colocavam no
biombo.
115
poderiam ser classificados como altruístas, sob uma ótica filosófica ou jurídica,
tornam-se egoístas quando buscamos sua causalidade mais básica. Entretanto, sabemos
que situações de trocas sociais podem facilmente eliciar respostas emocionais, tais
como, culpa, indignação, gratidão e ressentimento. Todos passamos por situações
nas quais algumas dessas emoções assomaram por nos sentirmos injustiçados ou por
considerarmos que tratamos alguém injustamente. É como se tivéssemos um senso de
justiça embutido em nosso cérebro, que reage a situações nas quais detecta a
ocorrência de trapaças.
Estudos recentes das neurociências sugerem que o envolvimento das
emoções em diferentes tipos de dilemas morais e o envolvimento de áreas cerebrais
nessas decisões (Koenig, Young, Adolphs, Tranel, Cushman, Hauser & Damasio,
2007; Rilling, Gutman, Zeh, Pagnoni, Berns, & Kilts, 2002).
A teoria dos jogos, utilizada como método de investigação, pressupõe que os
jogadores sejam racionais e que buscam maiores ganhos com suas escolhas (Munck,
2000; Aquino, 2008). Nesse sentido, muitas das decisões parecem ser desprovidas de
sentimentos quando, de fato, não o são. Esse dado do comportamento de Luciano teria
passado despercebido se o tivéssemos dado uma olhada por trás do biombo. O fato
de a emoção ter sido evidenciada, nesse caso, não implica que os achados anteriores
não sejam importantes, apenas que algo não previsto no protocolo experimental
aconteceu. Porém, esse resultado não planejado apenas confirma aquilo que nossa
análise quantitativa já mostrava: o comportamento de cooperação é modulado por
alguns fatores ambientais, e a trapaça tem mais chances de ocorrer se o trapaceiro não
puder ser descoberto. Com uma ressalva: enganamos os outros, mas, nesse caso, não a
nós mesmos, pois nossas emoções nos denunciam.
Implicações dos achados
As análises dos casos aqui observadas não negam os achados da literatura dos
trabalhos quantitativos, todavia reforçam os trabalhos atuais da neurociência. Estes
sugerem que a moralidade não é um processo puramente racional, envolvendo apenas
habilidades cognitivas e conscientes como propunha Kohlberg (citado por Biaggio,
116
1999), mas que a emoção tem um importante papel nas decisões morais (Ex.: Moll,
Oliveira-Souza, Bramati e Grafman (2002), Koenig, et al., 2007).
Cooperar, em muitos casos, pode trazer uma recompensa pessoal como
sugeriu Rilling et al. (2002). Esses autores demonstraram que ela está associada com a
ativação de áreas cerebrais ligadas a processos de recompensa. Alguns dos atores
descritos neste texto mantinham um prazer em cooperar como Manuela, que não iria
usufruir da recompensa que dávamos (os wafers). Além disso, seu comportamento
provavelmente a transformava, aos olhos dos outros, em alguém bondoso. O aumento
da reputação também foi observado em outros casos (Ex.: Marcelo, Marília e Pedro).
Ao anunciar que era boa, a recompensa poderia aparecer de outras formas, além do
ganho de uma maior quantidade de wafers.
Por fim, este artigo nos leva a sugerir novas questões para serem investigadas
utilizando, em crianças, a metodologia da teoria dos jogos. Por exemplo:
A utilização do método de investigação de Piaget poderia ampliar esses
conhecimentos. Poderíamos perguntar às crianças por que resolveram doar o
quanto doaram;
Investigar se a progressão de free riders sofre influência social, analisando se
essa progressão se dá a partir dos amigos que se sentam próximos aos
primeiros free riders;
Investigar as interações das crianças após cada sessão, como na hora do
intervalo;
Divulgar o quanto cada um doou.
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Child Development, 56, 746-556.
119
3.1. DISCUSSÃO GERAL
A partir dos dados dos quatro estudos empíricos podemos observar um
comportamento semelhante entre os grupos como o declínio no número máximo de
cooperadores, o aumento dos free riders, rápida extinção dos recursos comuns, e
diferenças significativas da cooperação e trapaça em função do tamanho do grupo.
Observamos que os indivíduos tendem a maximizar seus próprios ganhos
mesmo não se tratando de um jogo competitivo. Nas instruções dizemos que não há
ganhadores; ou todo mundo ganha ou todo mundo perde. Mesmo assim parece ter
havido competição entre os jogadores.
As diferenças de ganhos entre jogadores dentro de cada grupo pode ter sido
um fator importante para reavaliação das estratégias decidindo de cooperação. Ainda
quando a decisão era por continuar a cooperar, ainda havia a decisão relativa a quanto
cooperar, pelo menos no caso dos bens blicos.
Pelos resultados apresentados podemos propor que as crianças em sua maioria
utilizam a estratégia olho-por-olho, ou seja, cooperando primeiro e ajustando a jogada
em função das jogadas dos outros. Em todos os grupos que jogaram os bens públicos a
cooperação no primeiro dia foi relativamente alta quando comparada com os dias
seguintes. E nas terras dos comuns, quando a cooperação não foi alta no primeiro dia o
recurso rapidamente se esgotou. Percebemos dessa forma que as crianças ajustam suas
jogadas em função das jogadas dos outros.
Pode haver um ajuste no pensamento das crianças em função dos resultados
dos retornos que provavelmente gera uma regra prática (rule-of-thumb); se alto
manter-se cooperando e se baixo reduzir a cooperação. Cremer (1999) e Kerr e
Kaufman-Gilliland (1994) sugerem que a percepção da eficácia das ações coletivas
pode aumentar a cooperação, pois reduz a desconfiança de ser explorado por outros.
Um retorno alto transmite ao jogador a boa intenção dos seus colegas de jogo; o
contrário pode estimular o comportamento de free riding. Essa questão é reforçada
pelos resultados de Krause e Harbaugh (2000) que verificaram que crianças acima de
oito anos em jogos dos bens públicos com várias repetições aprendem a ser free riders.
120
Isto provavelmente ocorre porque as crianças avaliam que o retorno da ação coletiva
não é tão bom.
Parks e Rumble (2001) observaram em adultos que o conhecimento de que a
exploração é tolerada pode limitar a cooperação. Embora em nossas instruções fosse
dito claramente que cada um poderia fazer a doação que quisesse ou não doar nada e
receberia igualmente o retorno, é possível que algumas crianças ainda apresentassem
certo temor de retaliação caso não doassem ou doassem pouco. Com o tempo
percebendo que não haveria retaliação e que a exploração era bem tolerada, a maioria
fez a opção de não cooperar ou de reduzir a cooperação.
Ao longo das sessões tanto no jogo dos bens públicos como nos jogo das terras
dos comuns as crianças percebem que não retaliação para os não cooperadores,
principalmente nos grupos grandes.
Esse fato pode ser ilustrado no estudo de caso das duas Suzanas (no estudo
empírico 2.4) no qual a Suzana que não doou foi fiscalizada pelos demais membros do
grupo. A pressão foi tão forte que ela aumentou a cooperação no dia da fiscalização,
mas outra colega aproveitou que toda a fiscalização seria realizada em cima de Suzana
e se comportou como free rider, tendo em vista que a reputação negativa havia sido
“conquistada pela sua colega de sala (a Suzana free rider).
A influência da presença de outras pessoas sobre a cooperação foi investigada
por Zarbatany, Hartmann, e Gelfand (1985) que verificaram que ser observado ou
questionado por um adulto sobre a doação aumenta a generosidade das crianças acima
de 10 anos. Embora em nosso trabalho a idade tenha sido considerada como co-
variante, acreditamos que o anonimato afetou a todos, independente da idade.
Comportamento semelhante foi verificado em mulheres adultas com idade de 19 a 36
anos que aumentaram suas contribuões em jogos dos bens públicos quando estavam
sendo observadas (Haley & Fessler, 2005).
Monitorar as ações dos outros pode aumentar a confiança que se tem nos
membros do grupo, pois aumenta a informação sobre o comportamento dos outros. No
entanto, todos devem ser monitorados para que a cooperação permaneça. Cremer
(1999) sugere que se há confiança de que os membros do grupo cooperarão, a
tendência é cooperar mais. Nos nossos jogos não permitimos monitorar o outro no
121
momento da doação. Nesse sentido, provocamos uma diminuição na confiança e
aumentamos a possibilidade de trapaça ou free riding.
Nos momentos imediatamente antes da entrada e da saída do biombo os
indivíduos poderiam monitorar os colegas, pom não controlamos esses fatores em
nossa pesquisa. Acreditamos que a fiscalização foi maior e mais ampla nos grupos
menores, o que acarretou o aumento da cooperação. Nos grupos grandes, a fiscalização
provavelmente ficou restrita aos companheiros mais íntimos. Mais uma vez podemos
nos lembrar do caso das duas Suzanas (grupo pequeno) e comparar com os de Marília
e Pedro (grupo grande): Suzana aumentou a cooperação, Marília e Pedro se
mantiveram como free riders até o último dia, pois era difícil identificá-los como não
cooperadores. Os apelos à cooperação confundiam ainda mais os outros membros do
grupo.
No dia a dia, quando não temos interação face a face ou monitoramento,
podemos reduzir nossa cooperação sem sofrer retaliação. Por exemplo, quando não
levamos nada para uma festa em que é solicitado levar comida ou bebida, jogando lixo
no chão ou pescando a lagosta na época do defeso. Na presença de outros a maioria
das pessoas evita aparecer como não cooperador.
As crianças reconheciam os colegas que não iriam cooperar? De acordo com
Cosmides e Tooby, (1992); Kiyonari, Tanida e Yamagichi, (2000); Lowson, (2002),
Cosmides, Tooby, Fiddick e Bryant, (2005) somos capazes de reconhecer indivíduos
trapaceiros, e esse fato foi importante na nossa história evolutiva, pois o custo de
cooperar com quem não coopera é alto. No entanto, nosso experimento proporcionou
uma facilidade para esses indivíduos que utilizam a estratégia de trapacear porque eles
não eram identificados facilmente, devido à própria situação experimental. Caso
ocorresse a identificação essa era confirmado as o experimento se uma criança
contasse o mero de wafers do trapaceiro (que ficava sempre com mais, pois
guardava os itens não doados) e essa atividade era difícil, pois solicitávamos que as
crianças não revelassem o quanto haviam retido. Mesmo assim, às vezes elas mesmas
se denunciavam. Crianças que testemunhavam a trapaça de outras podem ter reduzido
suas contribuões em função da diminuição da confiaa nos colegas, tal como
propôs Cremer (1999).
122
Os resultados dos retornos podem ter influenciado as contribuições posteriores
dos colegas, pois sinalizavam que os outros não mereciam confiança. Mas o que fazia
com que alguns indivíduos se mantivessem cooperadores?
Scharlemann, Eckel e Kacelnik (2001) sugerem que o sorriso pode eliciar a
cooperação principalmente entre estranhos e Krumhuber, Manstead, Kappas, Cosker,
Marshall e Rosin (2007) verificaram que os indivíduos são capazes de distinguir o
sorriso verdadeiro do artificial e cooperam mais com os sujeitos com sorrisos
verdadeiros. Em nosso trabalho é possível que o sorriso dos indivíduos do grupo agisse
como um sinal para a cooperação. Novamente, nos grupos grandes era difícil
monitorar todos os sorrisos. Além disso, quando se coopera com um bem blico o
indivíduo não coopera com uma pessoa em particular e sim com muitas. No nosso
caso, com no mínimo quatro e no máximo 21 pessoas. Possivelmente, nesses últimos
casos, o valor do sorriso como sinalizador seja reduzido quando comparado com jogos
de dilemas do prisioneiro que têm interações face a face.
As diferenças entre os sexos não foram evidenciadas no que se refere a média
de doação a um bem comum no trabalho que utilizamos bens públicos,. No trabalho
dos dilemas dos comuns não tínhamos como identificar o sexo do jogador, sabíamos
apenas que os grupos eram formados por uma maioria de meninos ou de meninas e
esse fato não afetou o resultado.
Nos bens públicos observamos que o padrão é diferente entre meninos e
meninas. A forma de organizar a cooperação é diferente. Os meninos mantêm
estratégias mais rígidas e as meninas oscilam mais nas suas escolhas. É possível que os
meninos sejam mais vingativos contra os trapaceiros enquanto as meninas o mais
inconstantes ou menos dispostas a punir. Uma possibilidade para tal diferença pode
estar relacionada com a sugestão de Piaget (1932/1994) de que os meninos o mais
vingativos que as meninas e as meninas não revidam com tanta intensidade quando se
sentem injustiçadas.
Em diversos trabalhos que apresentam diferenças entre os sexos na cooperação
entre crianças, o pesquisador estava presente no momento da cooperação (Banco e
Mettel, 1984; Zarbatany et al., 1985 e Markovits et al., 2003). A ausência da vigilância
do pesquisador em nosso trabalho pode ter tido um efeito desinibidor mais forte nos
123
meninos, pois de acordo com Piaget (1932/1994) as meninas apresentam um
sentimento de que devemos ser bons mais do que os meninos.
No ambiente moderno, e provavelmente no ambiente ancestral, as mães
ensinam regras de convivência aos filhos. Indicam o que podem e não podem fazer,
estimulam a partilha de brinquedos e alimentos entre seus irmãos e colegas.
Certamente há um conflito entre o desejo da criança de ter algo e as “ordens” das
mães. Quando eso convivendo sem interferência dos adultos aflora tanto a
cooperação ensinada pelos pais como a cooperação e a trapaça que está inerente a sua
condição de maximizar seus ganhos. A resolução do conflito está na sua emoção.
Embora nos nossos estudos empíricos não tenhamos investigado os
sentimentos morais acerca da doação ou não para o grupo pudemos observar que a
emoção parece mover a decisão das criaas. Isto ficou claro quando se mostravam
aborrecidas por não receber tanto quanto achavam que mereciam, ao se arrepender por
ter tirado um item a mais no dilema dos comuns, ao dissimular a cooperação tentando
induzir a cooperação do outro ou ao se espantar com o resultado de suas ações.
No último dia, quando contávamos o quanto eles poderiam ter ganhado se
todos tivessem cooperado ou se todos tivessem confiado uns nos outros (Cremer,
1999), eles percebiam que o ganho teria sido extremamente maior. Mas as escolhas
não eram racionais, pois se fossem todos deveriam ter seguido as instruções de
Marília: doem três que a gente ganha nove sugestão que nem ela seguiu. Ou as
crianças do grupo que tive que tirar da amostra porque receberam a ordem” da
professora para doar três. Elas racionalmente sabiam que ganhariam mais, no entanto
como confiar que todos os outros cooperariam?
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Parks, C. D. & Rumble, A. C. (2001). Elements of reciprocity and social value
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Zarbatany, L., Hartmann, D. P. & Gelfand, D. M. (1985). Why does children`s
generosity increase with age: susceptibility to experimenter influence or altruism?
Child development, 56, 746-556.
125
3.2. CONCLUSÃO GERAL
Observamos nos artigos estudados que as crianças respondem aos dilemas
sociais da teoria dos jogos de forma semelhante aos adultos. Elas ajustam as
jogadas em função do retorno que obtém dos companheiros;
Nos três artigos aqui apresentados as crianças, em sua maioria, se mostram
cooperativas e utilizam a estratégia olho-por-olho, ou seja, cooperando
primeiro e reavaliando a jogada em função da jogada do outro;
O retorno dado pelas pesquisadoras funciona como sinalização para se manter
ou não cooperando;
A ausência de punição e/ou retaliação pode aumentar o comportamento de free
rider;
O aumento no número de free riders pode se pela redução da confiança
entre os membros do grupo;
A variável que mais afeta a cooperação é o tamanho do grupo provavelmente
pelo fato de não haver retaliação ao trapaceiro tendo em vista a dificuldade de
identificá-lo;
Não observamos diferenças entre os sexos nem da composição dos grupos
com mais meninos ou meninas, provavelmente pelo efeito da não identificão
sobro o quanto cada indivíduo cooperou;
Apesar de não haver diferenças nas médias de doação menino e meninas se
comportam de forma diferente na hora de decidir como cooperar;
126
O fato de saber o número de jogadas não afetou o comportamento das crianças
em relação à cooperação nos jogos dos bens públicos.
127
4.1. Anexo I – GLOSSÁRIO
Adaptação Característica que são preservadas pela seleção natural, apesar das
mudanças ambientais e promove a reprodução (Gaulin & MacBurney, 2001).
Altruísmo recíproco envolve um ato que beneficia o recipiente, com custos para o
doador, mas que, mais tarde, é retribuído (Trivers, 1971).
Altruísmo ação que promove a aptidão do recipiente ás custas do doador (Oliva et al.,
2006).
Altruísmo recíproco indireto envolve um ato que beneficia o recipiente, com custos
para o doador, mas que, mais tarde, é retribuído por outra pessoa e não a que o doador
prestou favor.
Ambiente de adaptação evolutiva ou Ambiente ancestral O ambiente do passado no
qual a adaptação ocorreu.
Aptidão capacidade de sobrevier e reproduzir.
Comportamento moral conjunto de costumes e opiniões que um indivíduo ou um
grupo de indivíduos possuem; conjunto de regras de comportamento consideradas
como universalmente válida (http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx).
Comportamento pró-social designa atos e atitudes cujas conseqüências, a nível social
apresenta uma conotação positiva de aproximação e colaboração entre os indivíduos,
de auxílio e solidariedade (Ensenberg & Faber, 1998).
Cooperação ato ou efeito de cooperar para um fim comum.
(http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx).
128
Dilema do prisioneiro é denominado de dilema do prisioneiro, pois, na versão
original, envolve dois prisioneiros que irão ser submetidos a um interrogatório no qual
podem confessar ou denunciar um crime. Se os dois confessarem (cooperar), eles
receberão a mesma pena. Caso um confesse (cooperação) e o outro denuncie o
parceiro (trapaça), o primeiro receberá a maior pena e o outro ficará livre (Kollock,
1998).
Emão a definição dos dicionários diz que se trata perturbação, abalo moral,
comoção, sentimento intenso. Na psicologia evolucionista entendemos que se trata de
um elemento do processo cognitivo e é inseparável da razão (Cosmides & Tooby,
2000).
Estratégia evolutivamente estável se refere a uma estratégia que caso seja adotada
pela maioria dos membros da população impede que outra estratégia “mutante” venha
a aparecer (Smith & Price, 1973).
Estratégias uma é uma lista das escolhas ótimas para um jogador. Nesta lista estão
previstas todas as possíveis situões que o jogador podeenfrentar. Assim, tendo
uma estratégia, ele saberá o que fazer em qualquer estágio, não importando o que seu
oponente faça nem os resultados dos eventos probabilísticos (http://www.mat.puc-
rio.br/~inicient/3_jogos/index_jogos.htm).
Free riders ver definição de trapaceiros.
Jogada é a maneira segundo a qual o jogo progride de um estágio a outro. Podem ser
alternadas entre os jogadores de uma forma especificada ou ocorrer simultaneamente.
Uma jogada consiste de uma decisão de um dos participantes ou de um resultado de
um evento probabilístico (http://www.mat.puc-
rio.br/~inicient/3_jogos/index_jogos.htm).
Jogadores – pode ser uma empresa, uma pessoa, um grupo de pessoas, animais
tomadores de decisão (http://www.mat.puc-rio.br/~inicient/3_jogos/index_jogos.htm).
129
Jogo dos bens públicos jogo no qual os jogadores devem contribuir para um bem
comum e o resultado das contribuições são divididas igualmente entre os jogadores.
Jogos um jogo é um modelo teórico de conflitos de interesse, e nele estão definidas as
decisões possíveis para cada jogador e os resultados possíveis.
Julgamento moral são construções universais dos agentes humanos que regulam as
suas interações sociais, não se trata de uma reflexão passiva dos fatores externos ou
emoções internas.
Psicologia Evolucionista é uma abordagem propõe que a mente humana funciona
através de mecanismos psicológicos evoluídos evocativos do ambiente ancestral no
qual ela evoluiu. Esta abordagem traz uma proposta de solução para uma questão há
muito debatida, a dicotomia entre biologia e cultura
(http://lineu.cb.ufrn.br/psicoevol/rede.php).
Questões próximas questões relativas a mecanismos imediatos que levam
determinada pessoa a determinada ação.
Racionalidade de acordo com a teoria dos jogos significa a melhor escolha dentre
muitas. Maximização de ganhos.
Reputação opinião pública (favorável ou desfavorável) acerca da alguém; fama
(http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx).
Seleção Natural é um processo através do qual indivíduos mostram sobrevivência
e/ou reprodução diferencial. Para que a seleção natural ocorra três condições devem
ser satisfeitas: a) a população em que esse indivíduo se encontra deve mostrar variação
genética; b) essa característica, de base genética, deve ser transmitida através da
hereditariedade; c) algumas das variações devem prover vantagens reprodutivas e/ou
de sobrevivência ao seu portador (Yamamoto, 2007).
130
Teoria da evolução propõe que as espécies hoje existentes evoluíram a partir da
modificação genética de seus ancestrais, através de alterações graduais e pelo
mecanismo da seleção natural (Yamamoto, 2007).
Teoria da mente é o nome que se à maneira como sentimos e entendemos o
sentimento do outro (Caixeta & Caixeta, 2005).
Teoria da utilidade refere-se aos ganhos que cada jogador recebe em um determinado
jogo e que são afetados pela utilidade que esse ganho efetivamente tem para cada
jogador (Marinho, 2005).
Trapaceiro ou free riders Indivíduo que usufrui da cooperação do outro sem retribuir
(Gaulin & MacBurney, 2001).
REFERÊNCIAS
Caixeta, M. & Caixeta, L. (2005). Teoria da Mente: Aspectos psicológicos,
neurológicos, neuropsicológicos e psiquiátricos.o Paulo: Editora Átomo.
Cosmides, L. & Tooby, J. (2000). Evolutionary psychology and the emotions. In: M.
Lewis & J. M. Havilland-Jones (Orgs.), Handbook of Emotions (2ª ed., pp. 91-115).
New York: Guilford.
Eisenberg, N. & Mussen, P. H. (1995). The roots of prosocial behavior children. 3ª ed.
Cambridge: Cambridge University press.
Gaulin, S. J. C. & MacBurney, D. H. (2001). Psychology: an evolutionary approach.
New Jersey: Prentice Hall.
Kollock, P. (1998). Social dilemmas: The anatomy of cooperation. Annual Review of
Sociology, 24, 183-214.
Marinho, R. (2005). Prática na Teoria. Aplicações da teoria dos jogos e da evolução
aos necios. São Paulo: Saraiva.
131
Oliva, A. D., Otta, E., Ribeiro, F. L., Bussab, V. S. R., Lopes, F. A., Yamamoto, M. E.
& Seidl de Moura, M. L. (2006). Razão, Emoção e Ação em Cena: A Mente Humana
sob um Olhar Evolucionista. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 22, 53-62.
Smith, M. & Price, G. R. (1973). The logic of animal conflict. Nature, 246, 15-18.
Trivers, R. L. (1971). The evolution of reciprocal altruism. The Quarterly Review of
Biology, 46, 35-57.
Yamamoto, M. E. (2007). Percorrendo a história do estudo do comportamento animal:
origens e influência. In: M. E. Yamamoto & G. L. Volpato. (Orgs.), Comportamento
animal (pp. 11-19). Natal: EDUFRN.
132
4.2. Anexo II – Protocolo experimental dos bens públicos
Para que as instruções (em itálico) possam ser as mesmas em todas as idades
deverão ser lidas (ou memorizadas e faladas) pausadamente e apontando para os
objetos quando nos referirmos a eles.
Vocês vão participar de um jogo e para jogá-lo cada um receberá três bis e
um envelope certo?
Nós realizaremos esse jogo hoje, amanhã, depois da manhã, e depois e depois,
a gente vai fazer isso oito vezes. Então começamos hoje e vamos fazer mais sete vezes
(a cada dia que faz vai reduzindo os dias que faltam).
Neste jogo não vai ter um vencedor, ou todos vão ganhar, ou todos vão
perder, certo?
No final deste jogo vocês podem ter mais do que três bis ou menos do que três
bis. Depende de como cada um jogar!
Certo?
Eu vou chamando pelo nome um a um de vocês para ir até aquela urna e
dentro, sem ninguém ver, vocês podem colocar no envelope, um, dois, três ou nenhum
bombom. Podem levar uma bolsa de lápis ou colocar no bolso os que bis que não
quiser doar.
A escolha de quantos colocar é de vocês, nem s nem seus colegas devem
saber da sua escolha. Tá bom?
Depois que decidir se vai colocar no envelope um, dois, três ou deixar o
envelope vazio, vocês colocam o envelope dentro desta caixa que eu chamo de mágica
(mostrar a caixa). Depois vocês vão entender porque eu chamo de caixa mágica.
È muito importante quando colocar o bis no envelope passar cola para que
ele não saia de dentro do envelope (mostrar como faz no primeiro dia e no segundo se
tiver alguém que faltou). Se você não colocar nenhum bis no envelope, também passe
a cola.
Depois que todas as crianças forem na urnas abriremos a caixa e todos os
envelopes
133
Se vocês colocarem um bis no envelope, nós colocaremos mais dois bis na
caixa, certo? Se vocês colocarem dois bis, nós colocaremos mais quatro bis, se vocês
colocarem três bis, nós colocaremos seis na caixa, certo? (sempre mostrando).
Ah! Vamos abrir os envelopes na frente de vocês!
Os bis que ficarem na caixa nós vamos dividir por igual para todos vocês.
Certo? Primeiro a gente vai contar e depois dividir, certo?
Se, por caso, um de vocês colocar um bombom e seu colega colocar dois, três
ou nenhum, todos vocês vão receber por igual depois, certo?
A cada dia nós lemos as mesmas instruções e reduzimos os dias até o último
dia no qual leremos: Hoje é o último dia de jogo.
Vamos agora chamar um por um e entregar o material do jogo, aí os outros
ficam esperando, certo? Vamos chamando pelo nome que a gente já colocou no
cartãozinho, aí o dono do nome levanta a mão e a gente entrega o material! Ta bom?
Quando o primeiro até mais ou menos o for s dizemos à criança que está
com o material se ela entendeu as regras e diz para todos:
Ela poderá doar um, dois, três ou não doar. Se ela doar um quantos eu
coloco? Se ela doar dois quantos eu coloco/ se ela doar três quantos eu coloco? Se ela
não doar quantos eu coloco?
Todo mundo já foi?
Antes de abrir os envelopes contem o número de crianças e o número de
envelopes.
Quando terminar a divisão dizer
E amanhã repetiremos tudo de novo e no último dia agradecer e contar
quantos eles teriam ganhado se tivessem doado três.
134
4.3. Anexo III – Protocolo experimental da Terra dos comuns
Para que as instruções (em itálico) possam ser as mesmas em todas as idades
deverão ser lidas pausadamente e apontando para os objetos quando nos referirmos a
eles.
Vocês participarão de um jogo de sorte!
É um jogo que vo podem ou não ganhar bombons hoje, mas quem não
ganhar hoje, vai ganhar amanhã, aqui nessa caixa tem dois bombons para cada um.
Então quem não tiver sorte hoje, vai ter sorte amanhã.
Este mesmo jogo começa hoje e termina amanhã, depois nós vamos começar
tudo de novo. E depois de novo e de novo. Até jogarmos oito vezes.
A cada dois dias reduziremos o número de vezes, por exemplo no terceiro dia
diremos: ex: Este mesmo jogo será realizado mais seis vezes.
Neste jogo não tem ganhadores nem perdedores, todos ganham se todos
jogarem certo, todos perdem se alguém não jogar certo!
Mas ninguém vai saber quem não jogou certo e ninguém vai saber quem
jogou certo!
Vamos agora distribuir um cartãozinho com o nome de vocês e quando
chamarmos o nome, o dono do nome levanta a mão e a gente entrega o cartãozinho
com seu nome.
O sorteio para saber quem pega bombom hoje será feito pela cor do
cartãozinho que a gente entregar
Você sempre terá este cartãozinho a o ultimo dia de jogo, certo?
Distribuiremos os crachás. Quando terminarmos.
Todos têm o cartãozinho?
Vamos colocar o cartãozinho no pescoço como se fosse um colar?
Eu vou chamar um de cada vez!
Cada vez que um de vocês for lá dentro da urna nós vamos sortear algumas
cores! Ninguém vai ficar sabendo da cor que está lá dentro, só quem estiver lá dentro!
135
Se seu cartãozinho tiver a mesma cor do cartãozinho que eu colocar lá dentro,
você pega dois bombons! Se não tive a mesma cor, vosai sem bombom e espera a
amanhã para pegar seu bombom.
Colocaremos outros crachás com cores da cartela e com cores diferentes para
apresentar com exemplo na medida em que formos dando as explicações
Não precisa mostrar a ninguém se vopegou ou não bombom hoje. Vocês
mostram se quiserem, se não quiserem não mostra. Pode esconder no bolso ou em
algum lugar, ou mostrar para todo mundo. Quem decide é vo!
Quando sair da urna devolve o cartãozinho para a gente. Tá bom?
Se alguém pegar bombom sem ser sorteado, no final do jogo alguns de vocês
ficarão sem bombons.
Se todo mundo pegar bombom no dia certo sempre terá bombom para todos.
Tá bom?
Dúvidas?
Então vamos começar o jogo?
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