33
lado, um movimento e um processo de interiorização da causalidade e, por outro lado, a
instauração de nova relação com a exterioridade. Assim, a possibilidade da ética encontra-se
na possibilidade de fortalecer o conatus para que se torne causa adequada dos apetites e
imagens do corpo e dos desejos e idéias da alma (p. 64).
Chauí (2005, p. 64), citando a proposição 18 do Livro IV da Ética: “O desejo que
nasce da alegria é mais forte do que o desejo que nasce da tristeza”. Espinosa nos revela que a
alegria e o desejo nascido da alegria (e, portanto, o desejo nascido de todos os afetos de
alegria, como o amor, a amizade, a generosidade, o contentamento, a misericórdia, a
benevolência, a gratidão, a glória) são as paixões mais fortes. E, ainda, que a vida ética
começa, assim, no interior das paixões, pelo fortalecimento das mais fortes e enfraquecimento
das mais fracas, isto é, de todas as formas da tristeza e dos desejos nascidos da tristeza. Uma
tristeza intensa é uma paixão fraca; uma alegria intensa, uma paixão forte, pois fraco e forte se
referem à qualidade do conatus ou da potência de ser e agir, enquanto a intensidade se refere
ao grau dessa potência. À medida que as paixões tristes vão sendo afastadas e as alegres vão
sendo aproximadas, a força do conatus aumenta, de sorte que a alegria e o desejo dela nascido
tendem, pouco a pouco, a diminuir nossa passividade e preparar-nos para a atividade.
Afirma Chauí (2005, p. 65):
O primeiro instante da atividade é sentido como um afeto decisivo: quando, para
nossa alma, pensar e conhecer for sentido como mais forte dos afetos, o mais forte
desejo e a mais forte alegria, um salto qualitativo tem lugar, pois descobrimos a
essência de nossa alma e sua virtude no instante mesmo em que a paixão de pensar
nos lança para a ação de pensar.
Assim, encontramos sentido nas quatro primeiras proposições do Livro Ética: a ética
não é senão o movimento de reflexão, isto é, o movimento de interiorização no qual a alma
interpreta seus afetos e as afecções de seu corpo, destruindo as causas externas imaginárias e
descobrindo o seu corpo como causas reais dos apetites e desejos. A possibilidade da ação
reflexiva da alma encontra-se, portanto, na estrutura da própria afetividade: é o desejo de