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ALAÍSE MARIA CARRIJO RAMOS E ANDRADE
BLOG JORNALÍSTICO: a constituição do sujeito jornalista-
blogueiro e do leitor digital
Franca
2008
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ALAÍSE MARIA CARRIJO RAMOS E ANDRADE
BLOG JORNALÍSTICO: a constituição do sujeito jornalista-blogueiro e do
leitor digital
Universidade de Franca
Programa de Pós-Graduação em Lingüística
Franca – 2008
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ALAÍSE MARIA CARRIJO RAMOS E ANDRADE
BLOG JORNALÍSTICO: a constituição do sujeito jornalista-blogueiro e do
leitor digital
Dissertação entregue à Universidade de Franca,
como exigência parcial para a obtenção do título de
Mestre em Lingüística.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina Momesso de
Oliveira.
FRANCA
2008
ALAÍSE MARIA CARRIJO RAMOS E ANDRADE
BLOG JORNALÍSTICOS: a constituição do sujeito jornalista-blogueiro e do leitor digital
Presidente: ____________________________________________
Nome:
Instituição
Titular 1 ____________________________________________
Nome:
Instituição
Titular 2 ____________________________________________
Nome:
Instituição
Franca, _____/_____/_____.
DEDICO a meus pais, Dóris e Cyro; a meus filhos, Mateus e Levi; a
meu marido, Mateus.
AGRADECIMENTOS
A Maria Regina Momesso de Oliveira, minha orientadora,
por toda atenção e paciência durante esta trajetória.
À professora Maria Sílvia Olivi Louzada, que compôs minha
banca de qualificação trazendo sugestões e críticas, algumas
desconcertantes, mas fundamentais para que esta dissertação tenha
chegado ao formato atual.
À professora Marina Célia Mendonça, que também compôs a
banca de qualificação trazendo contribuições preciosas a este
trabalho.
À minha companheira de mestrado Maíra Sueco Maegava
Córdula, que muito me ajudou e acalmou nesta caminhada.
A meu marido e meus filhos, que souberam compreender
pacientemente a falta de tempo e as oscilações de humor.
A meus pais, que me apoiaram e acreditaram neste percurso.
Por último e principalmente a Deus, que permitiu tudo isso e
todos em minha vida.
Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar
diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se
vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir.
Michel Foucault
RESUMO
ANDRADE, Alaíse Maria Carrijo Ramos e. Blog jornalístico: a constituição do sujeito
jornalista-blogueiro e do leitor digital. 2008. 104 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística)
Universidade de Franca, Franca.
Esta dissertação apresenta uma análise de dois weblogs jornalísticos: Verbo Solto de Luis
Weis e Nos bastidores do poder de Josias Souza. O objetivo geral foi refletir sobre as práticas
discursivas, identitárias e de leitura nos blogs jornalísticos em questão. Para tanto, verificamos
quais práticas discursivas e de leitura estão presentes e caracterizamos quais identidades são
assumidas pelos leitores e autores desse suporte neste processo de interlocução. Analisamos
também, no entremeio das práticas citadas, as relações de poder e a ordem do discurso
presentes nos blogs. Partiu-se da hipótese de que, se considerarmos a web como uma “nova”
mídia, e os blogs jornalísticos um de seus dispositivos, por conseguinte, dentro desses
weblogs emergem um sujeito jornalista e um sujeito leitor que se diferem dos da mídia
tradicional e que (re)definem relações discursivas, identitárias e de leitura mais libertárias. A
importância deste trabalho reside no fato de haver poucos estudos a respeito dos blogs
jornalísticos. Ancoramo-nos na perspectiva da Análise de Discurso de linha francesa, cujo
fundador é Michel Pêcheux, que considera o sujeito discursivo em constante processo de
construção a partir de fatores sociais, históricos e ideológicos. Além de Pêcheux, Foucault e
outros autores da área do discurso e das ciências sociais, nosso trabalho ainda tomou como
arcabouço teórico alguns estudiosos que pesquisam a respeito da pós-modernidade, como
Lévy, Bauman e Baudrillard; acerca dos blogs, Orihuela, Lemos e Schittine; das teorias da
comunicação, como Castells e Barbosa e Granado; e quanto às práticas de leitura, Chartier. Os
resultados apontam para a observação de que as novas tecnologias em questão não
determinaram novas identidades, mas sim diferentes modos de identificação do sujeito pós-
moderno.
Palavras-chave: Sujeito; identidade; prática discursiva; weblog; pós-modernidade.
ABSTRACT
ANDRADE, Alaíse Maria Carrijo Ramos e. Blog jornalístico: a constituição do sujeito
jornalista-blogueiro e do leitor digital. 2008. 104 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística)
Universidade de Franca, Franca.
This dissertation presents a analysis of two journalistic weblogs Verbo Solto by Luis Weis and
Nos bastidores do poder by Josias Souza. The main aim was to reflect upon the discourse,
identitary and reading practices found in the mentioned weblogs. In order to do so, we
verified which discourse and reading practices are present and which identities the readers and
authors assume in this text support during this interlocution process. We also analyze the
power relations and the discourse order present in the blogs. Considering the web as a “new”
type of media and the journalistic blogs as one of its mechanisms, our hypothesis is that there
should be a new journalistic subject and a new journalistic reader different from the ones
found in traditional media and who re(define) more freeing discourse, identitary and reading
relations. The importance of this work relies on the fact that there are a few studies about the
journalistic blogs. Our theoretical basis is the Discourse Analysis of the French school, whose
founding scholar was Michel Pêcheux who considers the discourse subject in constant process
of construction regarding social, historical and ideological factors. Besides Pêcheux, Foucault
and other authors in the area of discourse and social science, our work has consider theoretical
principles developed by scholars who research about post-modernity, Lévy, Bauman and
Baudrillard; blogs, Orihuela, Lemos and Schittine; communication theory, Castells and
Barbosa and Granado; and reading practices, Chartier. The results have indicated that the new
technologies at exam did not determine new identities, but different forms of identification of
the post-modern subject.
Keywords: subject, identity, discursive practice, weblog, post-modernity.
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................................................8
ABSTRACT...............................................................................................................................9
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................13
1 DISCURSO, IDENTIDADE E LEITURA: PERSPECTIVAS
TEÓRICAS..............................................................................................................................19
1.1 PRÁTICAS DISCURSIVAS E PRÁTICAS DE LEITURA...........................................24
1.2 AS TÉCNICAS DE SI E A ORDEM DO DISCURSO: FOUCAULT...........................29
2 PÓS-MODERNIDADE E CIBERESPAÇO.................................................................35
2.1 O MUNDO BLOGOSFERA............................................................................................41
2.2 JORNALISMO IMPRESSO E JORNALISMO BLOGUEIRO:
CONGRUÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS.................................................................................45
3 ANÁLISE DOS BLOGS JORNALÍSTICOS..............................................................54
3.1 VERBO SOLTO: UM DISCURSO AUTORITÁRIO ....................................................54
3.2 NOS BASTIDORES DO PODER: ONIPRESENÇA E ONIPOTÊNCIA........................72
3.3 VERBO SOLTO E NOS BASTIDORES DO PODER: UM PARALELO........................83
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................88
GLOSSÁRIO...........................................................................................................................90
REFERÊNCIAS......................................................................................................................93
WEBIBLIOGRAFIA............................................................................................................100
ANEXOS................................................................................................................................102
12
INTRODUÇÃO
When you are interacting with a computer, you are not conversing
with another person. You are exploring another world.
John Walker
13
O advento da Internet trouxe para a humanidade um alargamento de fronteiras
e horizontes comparável ao impacto causado pela invenção das ferrovias, no século XIX,
principalmente no que diz respeito à transmissão e produção de informação. O computador
deixou de ser usado apenas como ferramenta para produzir textos, sons e imagens e tornou-se,
por meio da Internet, um veículo de comunicação, sociabilização e interação entre as pessoas.
Entretanto, o acesso às novas tecnologias ainda é restrito a apenas uma
pequena parcela da população brasileira por vários motivos, sendo o principal deles a questão
econômica. A chegada da Internet não resolveu e provavelmente não resolverá o problema
das desigualdades sociais, culturais e econômicas. Dessa forma, a Internet surge
paralelamente aos problemas citados e exige de seus usuários e leitores uma visão crítica em
razão da avalanche de informações que disponibiliza.
Atualmente uma das grandes preocupações do governo e da sociedade em geral
é com o analfabetismo digital e todas as conseqüências sobre aqueles que estão excluídos da
chamada sociedade da informação e do conhecimento. Dentre todos os problemas atuais em
relação ao acesso às novas tecnologias estão as questões com a linguagem e a interpretação do
que circula em um suporte virtual. Muitos afirmam que a web é nociva, uma vez que estaria
produzindo gerações que não conseguem se concentrar e selecionar informações adequadas,
assim as práticas de leitura seriam superficiais, não atingindo a visão crítica necessária para
uma reflexão da realidade vivida.
Apesar do que foi mencionado, um recente relatório do projeto Evetrack,
realizado pelo Instituto Poynter
1
com a finalidade de observar os hábitos de leitura na
Internet, contraria a idéia de que os internautas são superficiais, inquietos e de que pulam de
uma notícia para outra constantemente, revelando que são leitores mais detalhistas do que os
de jornais impressos, lêem uma porcentagem maior das notícias publicadas e que, depois de
escolherem uma notícia, dois terços dos internautas lêem o texto até o final, contra apenas
50% dos leitores de jornais impressos.
O meio digital, que possibilitou o aparecimento de novos gêneros ligados à
interatividade, nos acesso a “novas”
2
maneiras de ler e escrever e disponibiliza ao homem
1
Ver site: http://www.poynter.org/content/content_view.asp?id=120458.
2
De acordo com Foucault (1996), o novo não está no que é dito, mas no acontecimento à sua volta. A partir do
acontecimento discursivo, produz-se um discurso (re)significado e não um discurso inaugural. Dessa forma,
gostaríamos de esclarecer que o termo “novo” (e seus
derivados), utilizado no decorrer deste trabalho, refere-se a
essa (re)significação do discurso, à singularidade do acontecimento.
14
criar perfis, banco de dados de assuntos diversos, comunidades públicas com os mais variados
fins, informar, ser informado e discutir a respeito de diferentes temas.
Dentro desse viés e no entremeio da contemporaneidade
3
, emergiram e
cresceram em número, importância e popularidade os weblogs, os quais vêm ampliando ainda
mais os limites comunicacionais e informativos e até mesmo quebrando possíveis barreiras
existentes na Internet por causa de seu fácil manuseio.
De forma simplificada, pode dizer-se que o weblog é uma página na rede
digital, atualizada com muita regularidade, organizada cronologicamente e com estilo pessoal,
informal e dialógico
4
. Seu surgimento deu-se em dezembro de 1997, quando o programador
de computadores John Barger publicou seu diário pessoal, no formato de uma homepage
simples.
Conforme a descrição de Barbosa e Granado (2004), na fase inicial do
fenômeno, muitos dos weblogs existentes versavam sobre a tecnologia informática, sendo
seus autores, em grande maioria, programadores e especialistas na área. Mais tarde,
especialmente nos EUA, surgiu um grande conjunto de weblog, como conseqüência dos
ataques de 11 de setembro, que reuniam notícias, informações, pensamentos e comentários
acerca do assunto. Esse tipo de weblogs, o informativo, foi, e talvez ainda seja, considerado
como jornalismo amador, uma vez que seus autores realizam um trabalho de seleção,
filtragem, apresentação e enquadramento da informação semelhante ao dos jornalistas.
Hoje, fala-se sobre vários assuntos na blogosfera e os blogueiros
5
procuram
dividir seus blogs em estilos diferentes – jornalístico, pessoal ou de serviços –, mas, na
verdade, o que ocorre nesse suporte digital, conforme Schittine (2004), é uma mistura de
estilos, ou seja, o fato de um blog ser jornalístico não o impede de possuir um tom subjetivo e
parcial.
Encontramos na web, nos dias atuais, um grande número de weblogs que se
denominam jornalísticos ou desempenham uma função jornalística, como o Nos bastidores do
3
A contemporaneidade é chamada por Bauman (2001) de Modernidade Líquida, por Castells (2003), de Pós-
Modernidade e por Lipovetsky (apud CORACINI, 2006), de Hipermodernidade. Neste trabalho, utilizamos todas
as denominações citadas.
4
O termo destacado deve ser entendido no sentido de comunicação verbal entre pessoas, e não do ponto de vista
discursivo que concebe que qualquer enunciado sobre um objeto se relaciona com enunciados anteriores
produzidos sobre esse objeto.
5
Ainda utilizaremos o termo bloguer(s) para nos referirmos aos autores de blogs, conforme Barbosa e Granado
(2004).
15
poder
6
de Josias de Souza e o Verbo Solto
7
de Luís Weis, que constituem o corpus de análise
desta dissertação.
Os blogs foram selecionados por vários fatores, como audiência, interação
entre o blogueiro-jornalista e seus leitores, visibilidade dentro das mídias, proposição de
criticidade, pelo fato de o bloguer ser jornalista de outro suporte, dentre outros.
De acordo com Orihuela (2006), apesar de a imprensa tradicional, seja ela
impressa ou televisiva, tentar reduzir o fenômeno dos weblogs aos diários virtuais com a
intenção de desacreditá-los, uma vez que eles questionam os valores do jornalismo tradicional
e forçam-no a mudar, os blogs jornalísticos constituem a parcela mais importante do
fenômeno e exercem grande influência social.
Mesmo que criticados por alguns (ORIHUELA, 2006), os blogs jornalísticos
são bem aceitos pelo público leitor que os como um meio democrático e dinâmico de
comunicação, interação e socialização, conseqüentemente e fatalmente, uma “nova” mídia.
Desta vez, uma dia informal e subjetiva que vem de encontro aos thesaurus do jornalismo
tradicional.
Notamos, então, que em conseqüência da Internet surgiram os weblogs
jornalísticos, que representam um espaço no qual, provavelmente, “novas” práticas
discursivas e de leitura e “novas” formas de subjetivação imperam.
Dessa forma, o principal objetivo deste trabalho foi refletir sobre essas práticas
discursivas, identitárias e de leitura em blogs jornalísticos. Analisamos também, no entremeio
dessas práticas, as relações de poder e a ordem do discurso. Os objetivos específicos foram: a)
verificar quais práticas discursivas e de leitura estão presentes nos weblogs e b) caracterizar
quais identidades são assumidas pelos leitores e autores desse suporte neste processo de
interlocução.
Se dentro desse espaço digital emerge uma “nova” mídia representada pelos
blogs jornalísticos, por conseguinte, dentro desses weblogs surgem um sujeito jornalista e um
sujeito leitor que se diferem dos da mídia tradicional e que (re)definem relações discursivas,
identitárias e de leitura. Sendo assim, nosso trabalho se propõe a descrever esse sujeito
jornalista-blogueiro e seu leitor virtual.
A fim de alcançar nossos objetivos, este trabalho foi dividido em três partes.
Na primeira, abordamos a teoria sobre a qual esta dissertação se apóia: a corrente francesa de
6
Ver site: http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br.
7
Ver site: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={3974085D-F6CF-453A-
A8F3-6697C5445A6E}&data=200708.
16
Análise de Discurso. Os teóricos nos quais nos ancoramos são Pêcheux (1990a, 1990b, 1997a,
1997b, 1999, 2006), Foucault (1979, 1989, 1994, 1996, 1997, 2004, 2006a, 2006b e 2007) e
outros que se filiam à linha teórica escolhida. A respeito das práticas de leitura, tomamos
também como base o historiador Roger Chartier (1999, 2001).
Na segunda parte, refletimos acerca da contemporaneidade, do advento da
Internet e dos weblogs jornalísticos em oposição à mídia tradicional impressa. Nesse percurso,
foram consideradas as perspectivas de Bauman (1998, 2001, 2006), Baudrillard (1981), e
Lévy (1993, 1999 e 2005) a respeito da pós-modernidade; Schittine (2004), Orihuela (2006) e
Lemos (2004) no que se refere aos blogs; e Barbosa e Granado (2004) e Castells (2002, 2003)
acerca das teorias da comunicação.
Na terceira e última etapa, apresentamos as análises feitas a partir dos
pressupostos teóricos referidos e dos weblogs jornalísticos selecionados. Destacamos e
analisamos posts e comentários dos blogs relacionados. Na medida do possível, os textos
apreciados referem-se a assuntos recentes
8
. Após o exame de cada blog individualmente,
fizemos um paralelo entre eles a fim de observarmos semelhanças e diferenças, e tirarmos
possíveis conclusões.
Este trabalho justificou-se na medida em que poucos estudos sobre os blogs
jornalísticos, para os quais são atribuídas, por alguns estudiosos, “novas” formas de
expressividade, de comunicação, de sociabilidade e de interação na sociedade.
Diante do exposto, foi necessária uma pesquisa sobre esse “novo” jornalismo
dos weblogs, que não se mostra preocupado com a objetividade e com a imparcialidade do
impresso e promove o discurso do acesso democrático à palavra e da valorização do leitor,
dando espaço para que este participe, embora com restrições, do processo de produção
jornalística como co-autor.
Não podemos negar nem ignorar as mudanças geradas pelo virtual, ou seja, no
suporte em questão a notícia é construída, lida e discutida em tempo real, a interação entre
blogueiro e leitor é intensificada em relação ao impresso, a parcialidade da notícia é assumida,
dentre outras. Consoante Lévy (2005), o suporte virtual propiciou “novas” maneiras de ler,
escrever e olhar o texto
9
, e, conseqüentemente, o discurso, que devem ser analisadas e
discutidas.
8
Gostaríamos de esclarecer que os dados analisados foram coletados de 1º de abril a 15 de setembro de 2007, no
blog Verbo Solto de Luis Weis, e de de abril a 30 de novembro de 2007, no weblog Nos bastidores do poder
de Josias de Souza.
9
Manifestação do discurso, de suas formações discursivas e ideológicas (FOUCAULT, 2007).
17
A respeito do leitor virtual, Castilho
10
afirma em seu weblog que
de
consumidores passivos, os leitores, ouvintes, espectadores e internautas estão ingressando na
categoria de público ativo e muitas vezes incômodo”.
O suporte midiático mudou, o texto ficou mais dinâmico no ciberespaço e a
leitura, segundo Lévy (2005), tornou-se, a partir do hipertexto, uma escrita.
10
CASTILHO, Carlos. Internet gera um novo leitor e novos desafios para o público. Disponível em:
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={25E99C52-601A-402D-9464-
C602B88C8CF1}&data=200702.
18
1 DISCURSO, IDENTIDADE E LEITURA: PERSPECTIVAS TEÓRICAS
É a própria alma que que construir naquilo que se escreve;
todavia, tal como um homem traz no rosto a semelhança natural com
os seus antepassados, assim é bom que se possa aperceber naquilo
que se escreve a filiação dos pensamentos que ficaram gravados na
sua alma. Pelo jogo das leituras escolhidas e da escrita assimiladora,
deve tornar-se possível formar para si próprio uma identidade através
da qual se uma genealogia espiritual inteira. Num mesmo coração
vozes altas, baixas e medianas, timbres de homem e de mulher:
‘Nenhuma voz individual se pode aí distinguir; só o conjunto se impõe
ao ouvido’.
Michel Foucault
19
Antes de nos dedicarmos a apresentar a teoria mestra de nossa dissertação, a
Análise de Discurso de linha francesa
11
, gostaríamos de esclarecer sob que perspectiva ela
concebe o discurso e o sujeito, visto que existem formas distintas de compreendê-los dentro
da história.
A teoria comunicacional de Jakbson entende o discurso como a mensagem a
ser transmitida linearmente a partir do esquema elementar que se constitui de emissor,
receptor, código, referente e mensagem, como se cada um desses elementos fosse separado de
forma estanque e a língua funcionasse como ferramenta que reflete o pensamento e como
suporte eficaz de fluxo de informação.
Diferentemente, para a AD, o discurso não constitui um universo de signos que
serve apenas para comunicar e expressar o pensamento linearmente entre os interlocutores. “A
linguagem enquanto discurso é interação, é um modo de produção social; ela não é neutra,
inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação de ideologia”
(BRANDÃO, 2004, p. 11). Numa visão pecheutiana (1990b), o discurso seria o ponto de
articulação entre a linguagem e a ideologia.
A AD trata do discurso que, etimologicamente, tem em si a idéia de curso, de
percurso, de movimento, permitindo observar o homem falando.
Com relação ao sujeito, é necessário destacar que os princípios teóricos que
norteiam nossa pesquisa não concordam com a noção psicológica de sujeito empiricamente
coincidente consigo mesmo (PÊCHEUX, 1999).
Apesar de a AD sempre ter dado importância ao sujeito em suas análises,
períodos da história em que ele não foi considerado. Na epistemologia clássica, por exemplo,
a língua tinha a função de representar o real, não havendo espaço para a subjetividade.
Na episteme moderna, porém, a língua adquire função demonstrativa e passa a
ter espessura própria. Nessa perspectiva se inscreve Benveniste que, por meio do estudo dos
pronomes, coloca a questão da subjetividade na linguagem. O sujeito passa a ocupar uma
posição privilegiada, e a linguagem torna-se lugar de constituição da subjetividade.
Benveniste (1995) relevo ao papel do sujeito falante no processo de
enunciação, levantando a questão da relação estabelecida entre o locutor, seu enunciado e o
mundo. Ele institui um “eu” (pessoa subjetiva) ascendente a um “tu” (pessoa não-subjetiva).
Na visão do lingüista acima, o sujeito é tido como homogêneo, central e origem do sentido, e
a linguagem, como transparente.
11
De hora em diante, a Análise de Discurso será tomada também como AD.
20
Ao lermos Brandão (2004), verificamos que, apesar de sua grande contribuição
para a Lingüística, a teoria benvenistiana é criticada ao afirmar que a subjetividade se constrói
à medida que se tem capacidade de dizer “eu”. Segundo a autora, tal crítica se torna coerente
porque a subjetividade “é inerente a toda linguagem e sua constituição se mesmo quando
não se enuncia de um ‘eu’” (p. 57).
Vejamos o que Foucault (2007, p. 104) pensa a esse respeito:
Não é preciso, na verdade, reduzir o sujeito do enunciado aos elementos gramaticais
da primeira pessoa que estão presentes no interior da frase: inicialmente, porque o
sujeito do enunciado não está dentro do sintagma lingüístico; em seguida, porque
um enunciado que não comporta primeira pessoa tem, ainda assim, um sujeito;
enfim e sobretudo, todos os enunciados que m uma forma gramatical fixa (quer
seja em primeira ou em segunda pessoa) não tem um único e mesmo tipo de relação
com o sujeito do enunciado.
Considerando a noção de subjetividade acima, a AD desloca o centro das
relações entre os interlocutores para o espaço discursivo criado entre ambos, passa a
considerar o sujeito como disperso, que pode ocupar várias posições no discurso, e
heterogêneo, pois só se constitui como sujeito na interação com o outro.
Uma vez esclarecido o que a AD entende por discurso e sujeito, partimos para
um breve panorama teórico da Análise de Discurso francesa.
Em 1969, surge, na França, a Análise de Discurso de base marxista que
apresenta uma análise do texto considerando suas materialidades discursivas em relação com
a História e suas condições de produção.
Tal teoria, que teve como precursor o filósofo Michel Pêcheux e como marco
inicial o seu livro Análise Automática do Discurso (1969), nasce da articulação entre as
propostas de Saussure (relido por Pêcheux), Marx (relido por Althusser) e Freud (relido por
Lacan) a respeito da língua, da História e do sujeito. Assim, Pêcheux constrói uma teoria de
entremeio que tem como objeto o discurso a partir da releitura dos teóricos citados.
Inicialmente, tomava-se como corpus privilegiado de apreciação os discursos
políticos, mas, atualmente, são variados os gêneros analisados, e toda situação de discurso é
considerada um objeto virtual de análise.
Como Pêcheux (1990a) admite, a AD passou por três épocas que revelam os
embates e as retificações operadas na constituição de seu campo teórico.
No decorrer dessas épocas, houve momentos em que as idéias de Pêcheux
foram contraditórias às de Foucault e momentos em que elas se aproximaram.
21
Em sua primeira época, Pêcheux, influenciado pelo estruturalismo, apresenta
grande preocupação em desenvolver uma metodologia teórica e propõe um programa de
análise automática do discurso na busca de dar conta da exterioridade do texto. A partir das
teses althusserianas sobre os aparelhos ideológicos e o assujeitamento, o teórico concebe o
sujeito como assujeitado, atravessado pela ideologia e pelo inconsciente:
[...] um processo de produção discursiva é concebido como uma máquina
autodeterminada e fechada em si mesma. De tal modo que um sujeito-estrutura
determina os sujeitos como produtores de seus discursos: os sujeitos acreditam que
‘utilizam’ seus discursos quando na verdade são seus ‘servos’ assujeitados, seus
suportes (PÊCHEUX, 1990a, p. 311).
Por meio do excerto, notamos que o discurso se concebe como restrito a um
conjunto fechado de enunciados, sempre parafraseados.
Pêcheux é criticado e questionado a respeito do estatuto do sujeito e do
discurso e em sua justificativa considera que o plano estrutural metodológico da análise
automática teve como efeito o primado do Mesmo sobre o Outro, levando a análise à busca
das invariâncias das paráfrases de enunciados sempre repetidos (GREGOLIN, 2004). Dessa
forma, o filósofo é levado a uma segunda época, momento em que problematiza sua
metodologia, inicia um movimento em direção ao Outro e reinterpreta a noção de formação
discursiva
12
de Foucault (2007) a partir da compreensão de que uma ideologia não pode, de
maneira nenhuma, ser compreendida como um bloco homogêneo:
[...] a noção de formação discursiva tomada de empréstimo a Michel Foucault,
começa a fazer explodir a noção de máquina estrutural fechada na medida em que o
dispositivo da FD esem relação paradoxal com seu ‘exterior’: uma FD não é um
espaço estrutural fechado, pois é constitutivamente ‘invadida’ por elementos que
vêm de outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhes suas
evidências discursivas fundamentais (por exemplo, sob a forma de ‘preconstruídos’
e de ‘discursos transversos’) (PÊCHEUX, 1990a, p. 314).
Nesse segundo momento, Pêcheux elabora a teoria dos dois esquecimentos e
reafirma sua vinculação às teses althusserianas, acentuando o caráter desigual do
assujeitamento e afirmando que os aparelhos ideológicos não só produzem, mas também
alteram as condições de produção.
12
“No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão,
e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir
uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por
convenção, que se trata de uma formação discursiva” (Foucault, 2007, p. 43).
22
A terceira época da Análise de Discurso é marcada pelo afastamento de
Pêcheux de algumas posições que sustentava e pela aproximação com as propostas
foucaultianas e bakhtinianas
13
. Gregolin (2004, p. 153) afirma que ele reordena o projeto
epistemológico a partir de uma desconstrução das bases longamente gestadas desde 1969”.
Nessa fase, Pêcheux revê o conceito de sujeito e passa a considerá-lo não mais
como interpelado por uma ideologia, mas por várias ideologias. O sujeito torna-se
heterogêneo (AUTHIER-REVUZ, 1990), ou seja, várias vozes, vários discursos manifestam-
se na sua fala.
Percebe-se também uma atenuação no assujeitamento em razão do abandono
da noção de formação discursiva como bloco homogêneo e das reformulações de Pêcheux no
que diz respeito à psicanálise. Assim sendo, o discurso é colocado sob o signo da
heterogeneidade, considerando as falhas e as contradições da interpelação ideológica.
A formação discursiva, conseqüentemente, passa a ser considerada no interior
da heterogeneidade e deixa de referir-se a um exterior ideológico, passando a ser buscada na
dispersão dos lugares enunciativos do sujeito.
Surge a preocupação com as relações do intradiscurso
14
com o interdiscurso
15
,
que propõe buscar no “fio do discurso” os vestígios da memória discursiva, e uma nova forma
de leitura passa a ser valorizada: a leitura do arquivo
16
.
Segundo Gregolin (2004), Pêcheux assimila a idéia foucaultiana de leitura
“sem filtro” e é levado à análise da singularidade do acontecimento discursivo e não apenas
de sua estrutura; influenciado pela concepção de Nova história de Foucault, acata a noção de
História como descontinuidade, propondo que as investigações da Análise de Discurso
passem a incidir não somente sobre os textos legitimados ou grandes textos, mas também
sobre os discursos ordinários de circulação cotidiana.
Conforme Pêcheux (2006, p. 53) afirma nessa terceira época, “todo enunciado
é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si mesmo, se deslocar
discursivamente de seu sentido para derivar para outro [...]. É nesse espaço que pretende
13
A partir da leitura que faz de Authier-Revuz, Pêcheux assimila a noção bakhtiniana de heterogeneidade e
interdiscurso.
14
Courtine (apud ORLANDI, 2005, p. 32-33) explica a diferença entre o intradiscurso e o interdiscurso.
Segundo ele, este representa um eixo vertical onde “teríamos todos os dizeres ditos e esquecidos em uma
estratificação de enunciados que, em seu conjunto, representa o dizível”; e aquele, um eixo horizontal, “que seria
o eixo da formulação, isto é, aquilo que estamos dizendo naquele momento dado, em condições dadas”.
15
Ver nota anterior.
16
“O arquivo é, de início, a lei do que pode ser dito, o sistema que rege o aparecimento dos enunciados como
acontecimentos singulares. [...] é o que, na própria raiz do enunciado-acontecimento e no corpo em que se dá,
define, desde o início, o sistema de sua enunciabilidade” (FOUCAULT, 2007, p. 146).
23
trabalhar a Análise do Discurso”. E é a partir dessa perspectiva que compreendemos o termo
“novo” e analisamos nosso corpus.
É importante esclarecer que não pretendemos discutir qual dos teóricos está
com a razão ou se uma teoria é mais correta que a outra, porque, assim como Foucault (2005
apud VEIGA-NETO) afirma, a verdade é uma construção histórica. Entendemos, ainda, que a
AD continua em construção, muitos conceitos ainda são (re)visitados e (re)significados
conforme as condições de produção sócio-histórico-ideológicas e a cultura de cada época.
Além disso, é necessário saber que Pêcheux e Foucault tiveram projetos
epistemológicos distintos. O primeiro buscou construir a Análise de Discurso, mantendo uma
relação muito mais forte com a Lingüística. o projeto foucaultiano não teve como objetivo
imediato construir uma teoria do discurso, suas temáticas envolveram as relações entre os
saberes e os poderes na história ocidental e estiveram voltadas para a construção histórica das
subjetividades. Foucault manteve uma relação mais forte com a História e a Filosofia.
Esse panorama da AD foi feito com o intuito de mostrar que essa teoria do
discurso se encontra baseada em idéias de diferentes estudiosos.
Da mesma forma foi construído nosso trabalho, ou seja, sob o prisma de
diferentes teóricos, como Pêcheux, Foucault e outros que se filiam à teoria escolhida. Apesar
das diferenças teóricas, ativemo-nos em pontos de suas convergências, de seus diálogos,
sendo o principal deles: o sujeito é heterogêneo e constituído por meio da e na linguagem.
Também é preciso mencionar que privilegiamos, em nossas abordagens, a
terceira época da Análise de Discurso em razão do fato de ela ser mais abrangente que as
demais. Suas amarras teóricas foram abertas por Pêcheux e, atualmente, continuam-se
desenvolvendo e ampliando-se por aqueles que assumiram o legado da AD. Logo, os
conceitos articulados e aplicados nesta pesquisa são os frutos da revisão teórico-metodológica
efetuada por Pêcheux a partir de 1980, revisão essa que desenhou um novo caminho para a
Análise de Discurso francesa.
Do precursor Pêcheux, adotamos a noção de sujeito como interpelado por
várias ideologias, heterogêneo, disperso e marcado pela impossibilidade de controle dos
efeitos de sentido de seu dizer. A essa definição, aliamos o conceito de sujeito foucaultiano,
que o concebe como historicamente construído ou produzido no entrecruzamento do discurso,
da sociedade e da história, ou seja, o sujeito não é algo dado, mas está em constante
construção nas práticas discursivas, sociais e em relação ao outro.
24
A respeito do sujeito, Foucault (apud Gregolin, 2004) corrobora que ele (o
sujeito) é interpelado nas relações de produção, de sentido e de poder de uma grande
complexidade. Em outras palavras, o filósofo acredita na constituição do sujeito a partir das
relações históricas, lingüísticas e de poder
17
. Foucault não compreende os sujeitos como
autômatos que aceitam passivamente as determinações do poder e procura analisar as formas
de resistência dentro das relações de poder.
A partir do sujeito da AD, almejamos compreender o sujeito pós-moderno da
blogosfera jornalística. E crendo não ser suficiente para tal compreensão apenas a noção de
sujeito, buscamos em Foucault a proposta de Análise de Discurso como prática, desenvolvida
em sua fase denominada genealógica
18
e que mobiliza outros conceitos, como a ordem
discursiva, por exemplo.
Nesse momento, Foucault (2007, p. 157) procura “definir não os pensamentos,
as representações, as imagens, os temas, as obsessões que se ocultam ou se manifestam nos
discursos, mas os próprios discursos, enquanto práticas que obedecem a regras”.
Após esse breve percurso pela AD e após termos trazido à baila a concepção
de sujeito na qual este estudo se apóia, buscamos, no tópico a seguir, explicar a noção de
prática discursiva e de leitura sobre a qual nos ancoramos.
1.1 PRÁTICAS DISCURSIVAS E PRÁTICAS DE LEITURA
Primeiramente, é preciso compreender a expressão foucaultiana “prática
discursiva”, para somente depois entender a questão da construção da história das
subjetividades, assunto que abordaremos no tópico seguinte.
Partimos da noção de discurso para melhor explicar o conceito de prática
discursiva:
Ele [o discurso] é constituído de um número limitado de enunciados, para os quais
podemos definir um conjunto de condições de existência; é, de parte a parte,
histórico fragmento de história, unidade e descontinuidade na própria história, que
17
Pêcheux não fala em relações de poder, atém-se apenas na questão dos lugares sociais e ideológicos ocupados
pelo sujeito.
18
Foucault procurou desenvolver ao longo de sua vida uma história dos diferentes modos de subjetivação do ser
humano. Essa história compreendeu três fases: a arqueológica, quando estudou os saberes; a genealógica, quando
estudou os poderes, e a última, quando estudou as técnicas de si.
25
coloca o problema de seus próprios limites, de seus cortes, de suas transformações,
dos modos específicos de sua temporalidade (FOUCAULT, 2007, p. 132-133).
A idéia de “prática” é colocada pelo filósofo em conseqüência do modo como
ele pensa o discurso, como conjunto de enunciados, e os enunciados, como performances
verbais em função enunciativa. Ele propõe um estudo que observe o movimento dos
enunciados praticados por sujeitos historicamente situados. Assim, define as práticas
discursivas como “um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no
tempo e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social,
econômica, geográfica ou lingüística as condições de exercício da função enunciativa”
(FOUCAULT, 2007, p. 133).
Foucault (2007) entende tais práticas como objeto de luta, salientando que elas
determinam que nem tudo pode ser dito, ou seja, os discursos são regulados por e submetidos
a uma ordem discursiva. Em A ordem do discurso (1996), Foucault analisa os mecanismos
que possibilitam o controle dos discursos definindo práticas que determinam o que dizer,
quem pode dizer, de que posição pode dizer, em que circunstância pode dizer, etc.
Tudo se passa como se interdições, supressões, fronteiras e limites tivessem sido
dispostos de modo a dominar, ao menos em parte, a grande proliferação do discurso.
De modo que a riqueza fosse aliviada de sua parte mais perigosa e que sua desordem
fosse organizada segundo figuras que esquivassem o mais intolerável. [...] Há, sem
dúvida, em nossa sociedade e, imagino, em todas as outras mas segundo um perfil de
facetas diferentes, uma profunda logofobia, uma espécie de temor surdo desses
acontecimentos, dessa massa de coisas ditas, do surgir de todos esses enunciados
(p.
50).
Ainda consoante o filósofo, existe, nas sociedades, um jogo entre os discursos
que obedecem a regras próprias às praticas discursivas de uma época. Dessa forma, ele traz à
tona a dimensão do acontecimento discursivo, em outras palavras, ele atribui ao discurso não
a noção de “lugar abstrato de encontro entre uma realidade e uma língua, mas um espaço de
confrontos materializados em acontecimentos discursivos” (Gregolin, 2004, p. 134-135).
Na dimensão do acontecimento, o sentido do discurso nunca é o mesmo, mas
muda de acordo com as relações que um enunciado estabelece com os outros enunciados. No
interior de uma formação discursiva, os discursos se negam, se afirmam e se distinguem, mas
nunca se repetem. Da mesma forma pensa Pêcheux (2006) a esse respeito. Para ele o
enunciado é repetível, mas nunca constrói as mesmas significações, pois a enunciação é um
acontecimento que não se repete, ela é “singular”.
26
Neste ponto ainda podemos acrescentar mais uma contribuição de Pêcheux que
nos ajudará a compreender as significações do discurso, ou seja, as suas possíveis leituras. No
texto Ler o arquivo hoje, Pêcheux (1997b) disserta sobre a questão das leituras do arquivo e
argumenta que os “gestos de leitura” variam conforme o arquivo do leitor
19
.
Por meio da noção de discurso como prática podemos analisar ‘quem fala’, ‘o
lugar da fala’ e ‘a posição de quem fala’ a fim de melhor entender a constituição do sujeito
em um novo espaço tecnológico. Conforme a teoria da AD, isso é possível porque existe
um complexo de formações discursivas interligadas, em que o sujeito, ao assumir uma
determinada posição, acaba por inscrever-se em uma delas, estabelecendo, assim, uma relação
de identidade. Segundo Pêcheux (1997a), a formação discursiva é o lugar da constituição do
sentido e da identificação do sujeito.
Considerando que não se trata apenas de um “novo” espaço de escrita, mas
também um “novo” espaço de leitura, ou melhor, não observando a blogosfera somente sob o
prisma do sujeito-blogueiro, mas também sob o prisma do sujeito-leitor, constatamos a
necessidade de analisar também as práticas de leitura na ânsia de detectar como o leitor
constrói sua identidade.
Segundo o historiador Chartier (1999):
A inscrição do texto na tela cria uma distribuição, uma organização, uma
estruturação do texto [...]. O fluxo seqüencial do texto na tela, a continuidade que lhe
é dada, o fato de que suas fronteiras não são mais tão radicalmente visíveis, como no
livro que encerra, no interior de sua encadernação ou de sua capa, o texto que ele
carrega, a possibilidade para o leitor de embaralhar, de entrecruzar, de reunir textos
que são inscritos na mesma memória eletrônica: todos esses traços indicam que a
revolução do livro eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do
escrito assim como nas maneiras de ler (p. 12-13).
Diante do exposto, tomamos consciência da importância de se realizar uma
análise das práticas da leitura na rede digital ou, mais especificamente, nos blogs jornalísticos.
Percebemos que os textos mudam tanto em sua estrutura e organização como na maneira que
estabelecem suas fronteiras, prontificando formas rápidas de acessar outros textos por meio
dos links. Na Internet, o texto torna-se um dinâmico hipertexto que leva a outros hipertextos
em uma imensa rede de nós conectados entre si, permitindo que a leitura se torne uma
hiperleitura, ou ainda, uma escrita, segundo Lévy (2005).
19
“É esta relação entre língua como sistema sintático intrinsecamente passível de jogo, e a discursividade como
inscrição de efeitos lingüísticos materiais na história, que constitui o central de um trabalho de leitura de
arquivo” (Pêcheux, 1997b, p. 63).
27
Quando se começa a ler uma notícia em um blog, é possível afirmar que nem o
texto nem a leitura se encerram ali
20
, pois o leitor pode clicar em um dos hiperlinks do texto
do blog e ir a um outro texto, continuando, assim, a construção de seu texto e de sua leitura a
partir desse outro universo que, com certeza, o levará a muitos outros. Assim, a leitura e o
texto só terminam quando o leitor parar de navegar pela rede e desligar o seu computador.
A respeito das práticas da leitura, Chartier (2001) afirma que elas sofrem
alterações na história conforme vários fatores como: o acesso à leitura; as habilidades ou
competências lexicais que variam, por exemplo, entre a leitura silenciosa e oral, e a leitura
da letra de forma e da letra cursiva; o estilo da leitura que determina a relação entre leitor e
objeto lido; a produção dos textos, ou seja, a partir dos dispositivos textuais da escrita que o
autor utiliza para impor um protocolo de leitura; e a produção dos livros, momento em que o
editor, por meio de uma maquinaria tipográfica, pode sugerir leituras diferentes de um mesmo
texto a partir da sua impressão.
Notamos, então, que as leituras dependem tanto do leitor de suas habilidades
e competências, da forma como ele se apropria do objeto lido –, como do autor, do editor e do
conjunto dos condicionamentos, das convenções e dos códigos que se imprimem no texto.
A respeito da leitura, Pêcheux (1990b) afirma que devemos partir das
condições de produção do discurso. Consoante o lingüista, é necessário observar não o
contexto comunicacional e situacional, mas ir além, permear nos meandros do social, do
ideológico e da historicidade que atravessam e alinhavam o discurso. É a partir dessa
perspectiva que concebemos a leitura.
Orlandi (2006), assim como Chartier, afirma que toda leitura tem sua história.
“Leituras que são possíveis, para um mesmo texto, em certas épocas não o foram em outras e
leituras que não são possíveis hoje o serão no futuro” (p. 86). Ainda de acordo com a
pesquisadora, podemos dizer que leituras previstas para um texto, uma vez que os sentidos
se sedimentam conforme as condições em que são produzidos, e leituras imprevistas,
resultantes também do contexto sócio-histórico. Em outras palavras, existe a possibilidade de
se ler um texto de várias maneiras, de se estabelecer múltiplos sentidos para uma mesma
enunciação, o que caracteriza a polissemia
21
. Todavia, ainda consoante a mesma autora, não
se deve desconsiderar a força do mesmo, da paráfrase
22
na linguagem.
20
Embora saibamos que no impresso isso também possa ocorrer, gostaríamos de salientar que no eletrônico o
acesso a outros textos é mais dinâmico e fácil, além de poder ser realizado em um curto espaço de tempo.
21
Polissemia: multiplicidade de sentidos.
22
Paráfrase: permanência do mesmo sentido sob formas diferentes.
28
Orlandi (2006), ao considerar os diferentes modos de funcionamento do
discurso, tomando como referência elementos constitutivos de suas condições de produção e
sua relação com o modo de produção de sentidos, distingue três tipos de discurso: o
autoritário, o polêmico e o lúdico. No primeiro, a polissemia é contida; no segundo, ela é
controlada e existe uma relação tensa de disputa pelos sentidos; no terceiro e último, a
polissemia está aberta
23
.
Gostaríamos de esclarecer que não defendemos a idéia de que um discurso seja
puramente autoritário, polêmico ou lúdico, mas acreditamos que um tipo de discurso possa
prevalecer sobre os demais em um texto. Também não descartamos a possibilidade de
ocorrência de um outro tipo de discurso, diferente dos colocados pela autora acima.
A seguir, Chartier (1999) define o que entende por leitura:
A leitura é sempre apropriação, invenção, produção de significados. Segundo a bela
imagem de Michel de Certeau, o leitor é um caçador que percorre terras alheias.
Aprendido pela leitura, o texto não tem de modo algum ou ao menos totalmente
o sentido que lhe atribui seu autor, seu editor ou seus comentadores. Toda história da
leitura supõe, em seu princípio, esta liberdade do leitor que desloca e subverte aquilo
que o livro lhe pretende impor. Mas esta liberdade leitora não é jamais absoluta. Ela
é cercada por limitações derivadas das capacidades, convenções e hábitos que
caracterizam, em suas diferenças, as práticas de leitura. Os gestos mudam segundo
os tempos e lugares, os objetos lidos e as razões de ler. Novas atitudes são
inventadas, outras se extinguem (p. 77).
A partir da definição colocada, percebemos que o historiador, assim como a
AD, não concebe a leitura como algo livre. Como foi dito, ele reconhece a historicidade da
leitura, em que ora os sentidos permanecem, ora são multiplicados ou “produzidos”
(CHARTIER, 1999).
Uma vez esclarecido o que entendemos por leitura, pretendemos agora esboçar
como ela ocorre dentro da blogosfera, ou seja, como as práticas da leitura podem ser
observadas no texto eletrônico, como elas se modificam em relação à sua história.
Chartier (1999) acredita que, a partir do século XVIII, a história das leituras é
também uma história da liberdade na leitura, ou seja, ela vem-se tornando cada vez mais livre
e desordenada. “É no século XVIII que as imagens representam o leitor na natureza, o leitor
23
“O tipo autoritário é o que tende para a paráfrase (o Mesmo) e em que se procura conter a reversibilidade [...]
em que a polissemia é contida (procura-se impor um sentido) [...] O discurso polêmico é o que apresenta um
equilíbrio tenso entre polissemia e paráfrase, [...] havendo assim possibilidade de mais de um sentido: a
polissemia é controlada. O discurso lúdico [...] é aquele que tende para a total polissemia. [...] O exagero do
discurso autoritário é a ordem do sentido militar, o do polêmico é a injúria e o exagero do lúdico é o non sense.
Em nossa forma de sociedade atual, o discurso autoritário é dominante, o polêmico é possível e o lúdico é
ruptura” (ORLANDI, 2006, p. 24-25).
29
que andando, que na cama” (p. 78). Anteriormente a esse período, o leitor era
representado pela iconografia como aquele que no interior de um gabinete, em um espaço
retirado e privado, sentado e com poucas possibilidades de mobilidade em função dos
suportes de leitura da época.
Em relação ao texto eletrônico, observamos que o leitor tem uma sensação de
liberdade proporcionada por processos antagônicos que o distanciam e o aproximam do objeto
da leitura: a tela funciona como o ponto de chegada ou limite que separa o texto do corpo, não
possibilitando um contato corporal e determinando uma relação de distância entre o leitor e o
escrito; ao mesmo tempo, esse novo suporte permite usos, manuseios e intervenções, desse
mesmo leitor, infinitamente mais numerosos e mais livres do que qualquer uma das formas
anteriores da escrita, ou seja, o leitor fica tão próximo do texto que pode intervir nele sem
deixar “rastros” (LYONS, 1999).
No entanto, não podemos nos esquecer de que apesar de o texto eletrônico
fazer parte dessa história de liberdade das leituras, ele também recupera práticas da leitura
anteriores ao século XVIII, ou seja, para se ler um texto eletrônico é preciso estar sentado em
frente à tela, em um lugar apropriado e específico – não necessariamente um gabinete –, onde
se possa ter acesso a um computador conectado ou não à Internet. Conforme Chartier (1999,
p. 16), a leitura do eletrônico “junta, e de um modo que ainda se deveria estudar, técnicas,
posturas, possibilidades que, na longa história da transmissão do escrito, permaneciam
separadas”.
1.2 AS TÉCNICAS DE SI E A ORDEM DO DISCURSO: FOUCAULT
Desde o século V a.C., na filosofia greco-romana, o tema de “si” era tratado
entre os homens. O “cuidado de si” (epimélia heautoû) era designado como regra de conduta
da vida social e pessoal e fundamento da arte de viver; e o conhecimento de si (“conhece-te a
ti mesmo” / gnôthi seautón) funcionava como um princípio délfico, sendo o objeto da busca
do cuidado de si (Foucault, 1994).
Observa-se, assim, que herdamos de nossos antepassados essa preocupação
voltada para “si”, para a subjetividade, uma vez que a utilização das “técnicas de si teve
início na Antiguidade romana e continua até hoje.
30
Várias foram as maneiras encontradas pelos povos de “cuidado” e “técnica de
si” que funcionaram como condição indispensável para adquirir a verdade. Podemos citar a
escrita dos hypomnematas e das correspondências entre os greco-romanos; a cultura do
silêncio aliada à arte da escuta, à meditação e à abstinência entre os estóicos; a interpretação
dos sonhos e o exame de consciência ligado à purificação entre os pitagóricos; a confissão
dentro da espiritualidade cristã, entre outras.
Foucault (1997, p. 109) define essas cnicas como “procedimentos, que, sem
dúvida, existem em toda civilização, pressupostos ou prescritos aos indivíduos para fixar sua
identidade, mantê-la ou transformá-la em função de determinados fins, e isso graças às
relações de domínio de si sobre si ou de conhecimento de si por si”.
Dessa forma, podemos dizer, com base no filósofo, que a história do “cuidado”
e das “técnicas de si” seria uma forma de fazer a história da subjetividade por meio do
empreendimento e das transformações, na nossa cultura, das relações consigo mesmo. Em
outras palavras, é pertinente afirmar que, para que se descubra como um indivíduo fixou sua
identidade, é preciso observar sua maneira de ser, suas atitudes e suas reflexões sobre os
modos de vida, sobre as escolhas de existência e sobre o modo de regular sua conduta e de
determinar para si mesmo fins e meios, enfim, suas práticas.
Nos dias atuais, é possível perceber essa necessidade do homem de fixar uma
identidade para si próprio, ou ainda, como diria Bauman (2006), de estabelecer-se como
indivíduo, de “ser o verdadeiro eu”:
Hoje em dia, ‘individualidade’ significa em primeiro lugar a autonomia da pessoa, a
qual, por sua vez, é percebida simultaneamente como direito e dever. Antes de
qualquer outra coisa, a afirmação ‘Eu sou um indivíduo’ significa que sou
responsável por meus méritos e meus fracassos (p. 30-31).
Ainda de acordo com Bauman (2006, p. 28), é possível encontrar vários
“auxílios” que nos guiam nessa busca “dos nossos autênticos ‘eus’”, da nossa individualidade.
Em outras palavras, podemos dizer que diversas são as “técnicas de si” disponibilizadas,
contemporaneamente, que nos permitem buscar uma identidade, a constituição do sujeito. A
título de exemplo, podemos citar aquelas proporcionadas pelas novas tecnologias, como o
orkut, as salas de bate-papo, os blogs – nosso corpus de análise –, entre outras.
Dentre as “tecnologias de si” criadas na Antiguidade, a que mais se aproxima
dos blogs é o hypomnemata. Antes de esclarecermos em que pontos tais técnicas se
assemelham, esboçaremos a definição da “técnica de si” greco-romana e também,
31
posteriormente, cristã. Conforme Foucault (2006a, p. 135), os hypomnematas “constituíam
uma memória material das coisas lidas, ouvidas ou pensadas; ofereciam-nas, assim, qual
tesouro acumulado, à releitura e à meditação ulterior”. Eles funcionavam como veículo
importante na subjetivação do discurso, não constituindo uma narrativa de si mesmo, mas
algo que reúne, unifica e subjetiva o que se pode ler, ouvir e viver, ou seja, o já dito
fragmentário e escolhido, para a constituição do ser. A esse respeito, o mesmo filósofo,
referindo-se a Sêneca, resume bem o conceito do hypomnemata: “o escritor constitui a sua
própria identidade mediante essa recoleção das coisas ditas” (p. 143-144).
A escrita de si dos greco-romanos era endereçada aos mestres, e a escrita de si
dos cristãos, aos sacerdotes. No primeiro caso, o mestre representava um administrador
racional dos conflitos do “eu”, alguém que avaliava as faltas comuns e reativava as regras de
conduta que era preciso ter presentes no espírito. no segundo caso, o sacerdote
configurava-se como um julgador, ou seja, aquele que podia dar a penitência e aliviar as
culpas.
Nos blogs jornalísticos não existe nem a figura do mestre nem a figura do
sacerdote, mas a escrita coloca-se sob o olhar do outro, que pode exercer função de mestre, de
sacerdote ou outras, como de juiz, por exemplo.
Para o filósofo francês, a escrita de si tem uma relação de complementaridade
que atenua o sentimento de solidão e permite dar o que se viu ou pensou a um outro olhar.
Além de ter descrito as “técnicas de si”, Foucault também descreveu os
procedimentos, princípios ou mecanismos de controle do discurso no livro A Ordem do
Discurso (1996).
[...] suponho que em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo
controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de
procedimentos que m por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu
acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade (FOUCAULT,
1996, p. 9).
A partir dessa fala, o filósofo inicia sua classificação dos mecanismos de
controle do discurso. Ele os divide em três grandes grupos: os princípios de exclusão, que
concernem a parte do discurso que põe em jogo o poder e o desejo e exercem-se do exterior;
os princípios internos, cujos discursos, eles mesmos, exercem seu próprio controle; e os
princípios de sujeição ou rarefação do discurso, os quais selecionam os sujeitos que falam
impondo regras aos indivíduos e não permitindo que todos tenham acesso ao discurso.
32
Cada um desses grupos se subdivide em procedimentos distintos. O primeiro
engloba os mecanismos denominados: interdição, por meio do qual fica estabelecido que “[...]
não se pode falar tudo em qualquer circunstância, [...] qualquer um, enfim, não pode falar
qualquer coisa (FOUCAULT, 1996, p. 9); separação/rejeição, que censura alguns discursos e
valoriza outros; e vontade de verdade, a qual atravessa os dois outros mecanismos referidos e
é, de acordo com Foucault (1996), o tipo de separação historicamente construída que rege
nossa vontade de saber.
Tanto a vontade de verdade como os outros sistemas de exclusão se apóiam
sobre um suporte institucional e são reconduzidos pelo modo como o saber é aplicado,
valorizado, distribuído e atribuído em uma sociedade a fim de exercer uma espécie de
pressão, um poder de coerção sobre os outros discursos.
No segundo grande grupo mencionado, cujos procedimentos funcionam “a
título de princípios de classificação, de ordenação, [...] como se se tratasse, desta vez, de
submeter outra dimensão do discurso: a do acontecimento e de acaso” (FOUCAULT, 1996, p.
21), encontramos o comentário, que permite construir novos discursos ao mesmo tempo em
que diz apenas “o que estava articulado silenciosamente no texto primeiro” (p. 25),
controlando, assim, o acaso do discurso pelo jogo de uma identidade que teria a forma da
repetição e do mesmo; o autor, como princípio de agrupamento do discurso, origem de suas
significações e foco de sua coerência; e a disciplina, como um saber construído que não se
liga a um inventor, está à disposição de quem quer, permite formulações novas, inscreve-se
em um certo horizonte teórico e encontra-se “no verdadeiro”.
O terceiro e último grupo permite o controle dos discursos e seleciona os
sujeitos que falam, determinando que ninguém entrará na ordem do discurso se não satisfizer
a certas exigências. Ele engloba os seguintes mecanismos: ritual, que define a qualificação, os
gestos, o comportamento dos indivíduos que falam, a circunstância e todo o conjunto de
signos que acompanha o discurso; sociedades de discurso, cuja função é preservar ou produzir
discursos dentro de um espaço fechado e sob regras restritas; doutrina, que liga os indivíduos
a certas enunciações e lhes proíbe todas as outras, determinando a sujeição dos sujeitos que
falam aos discursos e dos discursos ao grupo de indivíduos que falam; e apropriação social do
discurso.
Diante de todos esses procedimentos de controle do discurso, torna-se coerente
a colocação de Foucault (1996) de que em nossa sociedade esconde-se uma espécie de “temor
surdo” do discurso, por isso tenta-se controlar sua proliferação e seus efeitos de sentido:
33
[...] parece-me que sob esta aparente veneração do discurso, sob esta aparente
logofilia, esconde-se uma espécie de temor. Tudo se passa como se interdições,
supressões, fronteiras e limites tivessem sido dispostos de modo a dominar, ao
menos em parte, a grande proliferação do discurso ( p. 50).
Após termos apresentado, nessa primeira parte do trabalho, os pressupostos
teóricos sobre os quais nossa dissertação se apóia: a noção de sujeito discursivo, de prática
discursiva e de leitura, de ordem do discurso, das técnicas de si, entre outras, buscamos expor
e discutir, no próximo capítulo, assuntos relativos à contemporaneidade, às novas tecnologias
e aos weblogs jornalísticos.
34
2 PÓS-MODERNIDADE E CIBERESPAÇO
Agora, aqui, veja, é preciso correr o máximo que você puder para
permanecer no mesmo lugar. Se quiser ir a algum outro lugar, deve
correr pelo menos duas vezes mais depressa do que isso!
Lewis Carroll
35
Vivemos hoje na atmosfera do “medo ambiente”, segundo Marcus Doel e
David Clarke (apud BAUMAN, 1998), frente à nova desordem do mundo onde prevalece a
irracionalidade e a cegueira moral da competição de mercado, a desatada liberdade concedida
ao capital, o despedaçamento das redes de segurança socialmente tecidas, o repúdio a todas as
razões não econômicas e o dominante espírito de consumismo para satisfazer não às
necessidades, mas aos desejos.
Ao contrário do que a modernidade clássica almejou, segurança, ordem e
sistematicidade social excessiva, que gerou a escassez da liberdade, a pós-modernidade
encontra-se seduzida por propostas de aventura que oferecem opções abertas e livres, nas
quais poucas coisas devem ser predeterminadas e irrevogáveis.
De acordo com Lemos (2004), a idéia de pós-modernidade, que aparece na
segunda metade do culo XX com o advento da sociedade de consumo e dos mass media,
está associada à queda das grandes ideologias modernas e de idéias centrais como história,
razão e progresso. Modos de ser, pensar, agir e fabular se encontram abalados em meio à
realidade vigente na qual metáforas diversas, como pós-modernidade (CASTELLS, 2003) e
hipermodernidade (LIPOVETSKY apud CORACINI, 2006), florescem para representar e
descrever as transformações desse momento contemporâneo.
Conforme Coracini (2006, p. 134):
[...] todos os termos utilizados [...] embora tragam em seu bojo diferentes olhares
sobre o mundo contemporâneo, atestam que algo resta da modernidade, já que ela se
acha, inclusive, presente na própria nomenclatura modificada por um prefixo (hiper,
super, pós) ou por um adjetivo (tardia, dentre outros).
A respeito dessas denominações, a autora ainda afirma que se trata “de uma
perspectiva, de um olhar que vê a realidade contemporânea atravessada pelo mesmo e pelo
diferente, pela racionalidade e, ao mesmo tempo, pela fragmentação, dispersão
(heterogeneidade) de tudo e de todos” (p. 134). Lipovetsky (apud CORACINI, 2006) acredita
que os tempos hipermodernos se caracterizam pela emergência das contradições, pelo
imbricamento entre a vontade de liberdade e o aumento da vigilância.
Foucault (apud BAUMAN, 2001) utiliza o projeto do Panóptico de Jeremy
Bentham como arquimetáfora do poder moderno, em que poucos (os administradores) vigiam
muitos (os internos), organizada e coordenadamente. Os administradores tinham o poder do
domínio do tempo e imobilizavam os subordinados no espaço. Com o advento da pós-
modernidade ou segunda modernidade (BAUMAN, 2001), o poder pode se mover com a
36
velocidade do sinal eletrônico (o celular, por exemplo), tornou-se extraterritorial e não mais
desacelerado pela resistência do espaço. Dessa forma, os detentores do poder tiveram a
oportunidade de livrarem-se das desvantagens da técnica de poder do Panóptico.
Segundo Bauman (2001), estamos na era do pós-panóptico, em outras palavras,
um indivíduo se controlado por uma multiplicidade de olhares. A vigilância ocorre de
forma imperceptível e subliminar. Estamos submetidos à vigilância na nossa privacidade
“pela Internet, pelas câmeras instaladas nas lojas, nos edifícios, nos elevadores, nas máquinas
eletrônicas dos bancos, nos supermercados [...], embora, no discurso, tudo isso tenha o
objetivo de nos proteger de roubos, assaltos, incômodos” (CORACINI, 2006, p. 137).
De acordo com Castells (2003), com o advento dessa nova era, o discurso da
liberdade de expressão pode se difundir através do planeta sem necessitar da mídia de massa,
visto que muitos interagem com muitos. A world wide web (www) possibilita a divulgação de
mensagens políticas, a comunicação por e-mails, chats e salas de bate-papo, a transmissão de
idéias, a busca de informação e ainda possui uma memória gigantesca.
Em um de seus livros, o sociólogo Bauman (2001) faz uma interessante
reflexão sobre essa modernidade contemporânea e cria uma metáfora para melhor definir o
estado em que o mundo atual se encontra: modernidade quida, ou seja, ele compara a
contemporaneidade com a matéria líquida e conclui que a sociedade do século XXI está
impregnada de propriedades pertencentes aos líquidos, como fluidez, difusão, mobilidade e
aparente leveza.
Dessa forma, viver nesse momento significa abandonar toda esperança de
totalidade e estaticidade, aderir ao movimento, à busca obsessiva e sempre incompleta da
modernização e adaptar-se a uma sociedade difusa, na qual aqueles que não conseguem
participar desse pós-moderno jogo consumista são tachados de consumidores falhos
(BAUMAN, 1998).
Um número crescente de homens e mulheres pós-modernos delicia-se na busca
de novas e ainda não apreciadas experiências, o que confirma que é impossível permanecer
fixo na contemporaneidade:
[...] a modernidade é a impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa
estar em movimento. Não se resolve necessariamente estar em movimento como
não se resolve ser moderno. É-se colocado em movimento ao se ser lançado na
espécie de mundo dilacerado entre a beleza da visão e a feiúra da realidade –
realidade que se enfeiou pela beleza da visão. Nesse mundo, todos os habitantes são
nômades, mas nômades que perambulam a fim de se fixar. Além da curva, existe,
deve existir, tem de existir uma terra hospitaleira em que se fixar, mas depois de
37
cada curva surgem novas curvas, com novas frustrações e novas esperanças ainda
não destroçadas (BAUMAN, 1998, p. 92).
Percebe-se por meio da citação que o eixo da vida pós-moderna não é fazer a
identidade deter-se e tornar-se firme, mas evitar que ela se fixe.
Como fruto dessa circunstância que prima pela liberdade e modernização
nasceu a Internet, o primeiro meio de comunicação que permite a interação de muitos com
muitos, num momento escolhido e em escala global. Em outras palavras, ela representa uma
nova tecnologia de comunicação mediada pelo computador e veio justamente atender às
necessidades da sociedade pós-moderna: liberdade, movimento e constante modernização.
Embora a Internet tenha começado na mente dos cientistas da comunicação na
década de 1960, uma rede de comunicação via computador tivesse sido formada em 1969, foi
somente em 1995 que ela irrompeu para os empresários e a sociedade mundial em geral (o
que não significa que todos tenham acesso à Internet).
Antes de prosseguirmos com nosso trabalho, gostaríamos de esclarecer que os
autores que discutem questões acerca das novas tecnologias se dividem entre os tecnófilos,
que acreditam que a cultural digital proporciona e proporcionará grandes avanços nas relações
humanas, como Lévy e Lemos; e os tecnófobos, que apontam a cultura digital como
destruidora de valores éticos e morais, como elitista, autoritária e desumana. Todavia,
optamos por não defender nenhuma dessas visões em nossa pesquisa. Acreditamos apenas que
as novas tecnologias provocaram e ainda provocam mudanças significativas na relação
estabelecida entre os sujeitos e os discursos.
A respeito da Internet, Castells (2003, p. 225) assegura que:
[...] como a comunicação é a essência da atividade humana, todos os domínios da
vida social estão sendo modificados pelos usos disseminados da Internet [...]. Uma
nova forma social, a sociedade em rede, está se constituindo em torno do planeta,
embora sob uma
diversidade de formas e com consideráveis diferenças em suas
conseqüências para a vida das pessoas, dependendo de história, cultura e
instituições.
No mundo digital, o espaço pode ser atravessado, literalmente, em instantes,
cancelando, assim, a diferença entre “longe” e “aqui”. O espaço físico é diluído e comprimido
na fronteira eletrônica digital, criando, juntamente com a instantaneidade do tempo, uma
contradição entre o imobilismo da casa e o nomadismo proporcionado pelas novas
tecnologias, que permitem que o usuário esteja em vários lugares se conectado à rede. Castells
38
(2003) nomeia essa potencialidade da rede de ubiqüidade e afirma que nenhum outro suporte
ofereceu tal possibilidade.
A respeito da Internet, ainda destacamos que ela altera os hábitos de seus
usuários, uma vez que torna possível fazer compras, ir ao correio e ao banco sem se levantar
do assento frente ao computador. Essa atividade, exercida à distância e por meio de poucos
movimentos, vem trazendo mudanças na forma como o sujeito constitui sua identidade:
Ora, toda essa atividade, exercida à distância numa espécie de imobilidade, que se
age sem se locomover, se faz sem se mexer a não ser os dedos sobre o teclado ou
sobre o mouse, imobilidade atrofiante, não apenas porque impede a mobilidade
física dos membros, mas porque estabelece uma relação à distância com o outro que
não se vê, não se ouve, com quem não se fala, não se estabelece laço social algum
[...] Nesse sentido, essa imobilidade, que acomoda e transforma, inevitavelmente, o
corpo e a mente, traz e já está trazendo, ainda que não o tenhamos percebido
mudanças para a constituição identitária do sujeito (CORACINI, 2006, p. 140-141).
Consoante Lemos (2004, p. 156), entender a realidade virtual significa
considerar dois elementos fundamentais da telepresença: a idéia de imersão e de navegação.
Segundo o sociólogo:
[...] a imersão nos permite que tenhamos o sentimento de estarmos dentro de um
universo. a navegação é a sensação de nos deslocar, de poder olhar a partir de
outras perspectivas, de tocar e mesmo mudar o curso dos acontecimentos. A
navegação é o trajeto pelo fluxo da informação.
Em outras palavras, estar conectado à rede digital é o mesmo que estar imerso
em outra realidade a realidade virtual e em constante movimento ou fluxo proporcionado
pela navegação, que é de outra ordem, ou seja, navega-se na rede sem uma rota segura e
linearmente traçada; sabe-se, talvez, a origem, mas não se sabe aonde se vai chegar diante do
emaranhado de nós ligados por conexões entre palavras e links na rede.
A rede eletrônica, assim como O livro de areia de Borges
24
,
é um dinâmico
hipertexto com estranhas particularidades e que guarda em si uma estrutura sem começo ou
fim definidos. É algo movediço que a cada abertura de páginas se transforma, desaparece ou
recria.
Schittine (2004) observa que no computador o homem se fecha para as relações
presenciais para se abrir num plano virtual, no qual irá comunicar-se com pessoas reais,
24
BORGES, Jorge Luis. O livro de areia. In: Obras completas, Tomo III. Rio de Janeiro: Globo, 2000.
39
porém distantes fisicamente. A opacidade da tela permite àquele que escreve se expor sem se
identificar. O monitor representa uma janela blindada.
A esse respeito, Coracini (2006) acrescenta que a Internet afasta e aproxima as
pessoas ao mesmo tempo, transformando os relacionamentos, que perdem o calor humano do
contato físico e do olhar e dão lugar à frieza da distância e do invisível.
Todavia, as novas tecnologias não proporcionaram apenas a desmaterialização
espacial e a instantaneidade temporal; elas, associando à cultura contemporânea novas
realidades, possibilitaram ao homem do século XX e XXI a convivência efetiva com o
ciberespaço, a simulação e os processos de virtualização.
A expressão ciberespaço foi cunhada, nos Estados Unidos, pelo escritor
cyberpunk de ficção científica Willian Gibson, em 1984, que o definiu como um espaço não-
físico ou territorial composto por um conjunto de redes de computadores através das quais
todas as informações circulam.
Após essa definição, várias outras foram criadas por pesquisadores das novas
tecnologias, a maioria delas demonstrando que o ciberespaço representa uma passagem.
Lemos (2004, p. 132) o entende “como um rito de passagem da era industrial à pós-industrial,
da modernidade dos átomos à pós-modernidade dos bits [...] de um social marcado pelo
indivíduo autônomo e isolado ao coletivo tribal e digital”.
Uma outra realidade com a qual o homem atual convive é a simulação.
Segundo Baubrillard (1981), o que sobrevive no mundo midiático, enquadrando-se aqui a
Internet, não é o real, mas o simulacro do real, ou seja, o digital é um simulador do mundo
real e cria no internauta a sensação de que ele é um sujeito onipotente e onipresente, pois pode
vigiar, espiar, entrar e sair da Internet sem ser percebido. Para Baudrillard, o ciberespaço
permite simulações de interação e não verdadeiras interações. O internauta não acessa
narrativas da história real, mas apenas o simulacro de algo ao mesmo tempo distante e
próximo no espaço e no tempo.
Com relação aos processos de virtualização é preciso destacar que eles não
surgiram em conseqüência da Internet. Na realidade, o termo virtual e seus derivados apenas
passaram a ser mais utilizados e difundidos após a disseminação do uso da rede, o que
significa que eles existiam antes. A partir disso, é imprescindível que se compreenda o que
é virtual.
Pierre-Lévy (2005), em seu livro O que é o virtual, colabora de modo efetivo
para que se entenda melhor o que tal termo significa. O autor do livro afirma que virtual não
40
se opõe a real, mas sim a atual. E a partir do livro Atlas de Michel Serres, compreende o tema
do virtual como “não-presença”, concluindo, dessa forma, que a imaginação, a memória e o
conhecimento são exemplos de virtualização que fazem com que o homem abandone a idéia
de presença muito antes da informatização e das redes digitais.
Quando uma pessoa, uma coletividade, um ato, uma informação se virtualizam, eles
se tornam “não-presentes”, se desterritorializam. Uma espécie de desengate os
separa do espaço sico ou geográfico ordinários e da temporalidade do relógio e do
calendário. É verdade que não são totalmente independentes do espaço-tempo de
referência, mas uma vez que devem sempre se inserir em suportes físicos e se
atualizar aqui e alhures, agora ou mais tarde (LÉVY, 1996, p. 21).
Ainda de acordo com o estudioso, o texto pode ser entendido como uma
entidade virtual, independente de suporte específico, que se atualiza a cada leitura ou
interpretação.
Também é necessário e possível notar que a Internet possui um efeito negativo
potencial, trata-se do sentimento pessoal de perda de controle, de aceleração de nossas vidas,
de uma corrida interminável rumo a metas desconhecidas. “Homens e mulheres procuram
grupos de que possam fazer parte, com certeza e para sempre, num mundo em que tudo o
mais se desloca e muda, em que nada mais é certo” (HOBSBAWN apud BAUMAN, 2001, p.
196).
Ao pensarmos o sujeito s-moderno, percebemos que ele experimenta a
virtualidade e vaga entre o real, o imaginário e o virtual, deixando abalada a idéia de
concretude e “realidade”. Oliveira (2006, p. 143-144) afirma:
O sujeito pós-moderno experimenta na virtualidade a instalação de uma linha tênue
entre o real, o imaginário e o virtual. Abala-se a idéia de concretude e de
“realidade”, pois o sujeito encontra-se no mundo de Alice: tem um mundo
maravilhoso aos seus pés, porém não consegue tocá-lo. Mas esse mundo consegue
modificá-lo enquanto ser e oferece-lhe a ‘ilusão da onipotência e da onipresença’, a
sensação de poder ser quem quiser.
Antes de passarmos para o tópico seguinte, destacamos ainda que a Internet e
os weblogs jornalísticos podem ser considerados como dispositivos da cibermídia (ARAÚJO,
2005).
Conforme a autora, que se apóia nas idéias de McLuhan, a cibermídia é o
“conjunto de mídias digitais em ambientes cíbridos
25
fixos ou móveis” (p. 192), incluindo
25
Cíbrido: ambiente pautado e cindido por interconexões on e off-line.
41
todas as interfaces internas e externas que permitem conexão, como os computadores fixos e
móveis, os palmtops e os celulares.
A partir de uma comparação que faz entre a estrutura de rizoma
26
, proposta por
Deleuze e Guatari (1995), com a estrutura da rede, Araújo (2005) percebe que a cibermídia
toma a forma de uma cidade digital. Não uma cidade simplesmente, mas uma hipertrópole.
Isso tudo porque o conteúdo oferecido nos diferentes espaços virtuais pode ser comparado
com os espaços de uma cidade: podemos fazer compras, serviço de bancos, conhecer pessoas,
manter relações sociais, visitar lugares, dentre inúmeras outras possibilidades. Assim, essa
suposta hipertrópole digital acaba por substituir, para muitos, a cidade real.
Diante do exposto no texto acima, é possível perceber, na contemporaneidade,
que nos deparamos com um sujeito em constante fluxo que, por meio de simulacros do real,
busca se constituir como um ser livre, original e dono de seu discurso. Entretanto, conforme
foi mencionado anteriormente, devemos considerar, ao observar a constituição identitária
desse sujeito, que seus hábitos foram alterados, que a distância modificou sua forma de
relacionar-se com o outro, que a vigilância “dos corpos” se intensificou e que, assim como a
AD defende, o sujeito não é livre nem original.
2.1 O MUNDO BLOGOSFERA
Da inquietude da pós-modernidade emergiu um suporte capaz de representar
toda movimentação e vontade de liberdade de uma época: a Internet; e dela derivaram e ainda
derivam rios gêneros que buscam representar de modo específico cada necessidade da
sociedade em rede. Dessa forma surgiu o e-mail, o chat, a sala de bate-papo, o weblog, entre
outros.
Apesar de todos os gêneros citados apresentarem características interessantes e
singulares de serem observadas, dedicamo-nos a analisar os weblogs pelo fato de eles terem
aberto o terreno para o discurso da democratização do acesso à palavra, ao espaço público e
ao enriquecimento da conversação social. Além disso, intensificaram uma prática, que vinha
sendo realizada pela televisão e pelo rádio, mais parcial e subjetiva do trabalho com a
informação.
26
Rizoma: estrutura que não tem pontos fixos, não segue caminhos determinados e não apresenta um centro fixo.
42
O termo weblog, ou blog, como são conhecidos, é derivado da junção das
palavras inglesas web (palavra que designa o ambiente da Internet) e log (diário de bordo).
Possui formato semelhante ao de uma webpage, porém com maior agilidade e fácil
atualização.
Segundo Schittine (2004), num primeiro momento, os weblogs foram criados
com o perfil de um diário íntimo de bordo, ou seja, com escrita personalizada, informal e
subjetiva. Já Barbosa e Granado (2004) defendem que, na fase inicial do fenômeno, muitos
dos weblogs existentes discutiam sobre a tecnologia informática.
Em nossas pesquisas, verificamos que os blogs têm aumentado de forma
significativa. Segundo um relatório do site especializado Technorati
27
publicado pelo
fundador da empresa, David L. Sifry, em novembro de 2006, são criados 175 mil blogs a cada
dia e a atualização dos blogueiros ultrapassa a casa de 1,6 milhão de posts por dia, o
equivalente a 18 atualizações por segundo. O rastreamento da Technorati constatou, até o
momento, a existência de 6,2 milhões de blogs no mundo todo, número esse que dobra a cada
230 dias aproximadamente.
Encontramos, hoje, blogs que funcionam como complemento de jornais
impressos, como boletim informativo de empresas, como páginas de marketing político,
pessoal ou empresarial, como página de divulgação de trabalhos científicos, como veículo de
humor e entretenimento e ainda como suporte educativo, ou seja, os weblogs vêm sendo
usados por vários segmentos da sociedade. Assim também observa Orihuela
28
(2006, p. 65-
66), el weblog es susceptible de ser utilizado como vehículo de expressión en diversos
géneros que ván desde el diário personal autobiográfico, hasta los weblogs profesionales
temáticos orientados a nichos de mercado específicos”.
As razões que levam uma pessoa a montar e escrever um blog são comuns às
outras formas de escrita pública, como a necessidade de expressão, o desejo de dividir saberes
e interagir em comunidade, a busca de reconhecimento, a participação política, a defesa de
interesses, a busca de benefícios econômicos ou até mesmo a simples necessidade de se expor
publicamente.
A respeito dos blogs, a idéia de diário pessoal é a que comanda, mas essa
versão intimista constitui apenas uma das modalidades dos weblogs (SCHITTINE, 2004). Os
blogs mais reconhecidos são os temáticos e não os autobiográficos. Ainda que aqueles
27
Ver site: http://www.technorati.com/.
28
José Luis Orihuela: professor universitário, jornalista, conferencista e blogueiro, autor do weblog
eCuaderno.
43
apresentem anotações pessoais, estão centrados em temas de interesse público e sobre os
quais os autores têm algum tipo de competência.
Uma das tradições da comunidade blogueira é a utilização constante do link,
recurso esse que permite informar fontes, indicar caminhos e partilhar descobertas. Nessa
comunidade, linkar corresponde ao modo correto de reconhecer o trabalho dos demais, de
respeitá-los e de construir uma conversa comunitária, ou seja, a blogosfera.
Segundo explicações do Technorati
29
, o estabelecimento de links entre os blogs
representa um “voto de atenção” de um autor para outro. A soma crescente e espontânea dos
links acaba por conferir mais “autoridade” na blogosfera, contribuindo para ampliar o público
e a repercussão do trabalho de cada blogueiro.
Outra faceta interessante dessa “nova” esfera de criação e de expressão é o
comentário, que surgiu nessa comunidade virtual apenas em 2004, abrindo um espaço de
diálogo entre o autor do blog e seus leitores e funcionando como uma fonte de
enriquecimento, atualização e contraste das histórias publicadas, um lugar de debate e
polêmica e também um meio pelo qual novos blogueiros se dão a conhecer. Todavia, é
preciso esclarecer que muitos weblogs têm optado por moderar os comentários a fim de
conservar a qualidade das conversas, posto que podem ocorrer insultos e ofensas nesse
espaço, e de banir os spaners
30
e os trols
31
.
Em uma das publicações do blog Código Aberto
32
, Castilho expõe a questão
sobre a implementação de um código de conduta para os blogs, o qual teria como principal
função punir os comentários que apelam para a baixaria, as agressões e para a difamação. O
autor deixa bem claro, porém, que essa é uma situação complexa, de difícil consenso e
defende que o blogueiro deve ter autonomia para decidir o que considera aceitável ou
inaceitável em seu weblog.
Barbosa e Granado (2004) afirmam que muitos bloguers questionam-se sobre
como lidar com os comentários perversos e concluem o mesmo que Castilho.
Ainda a respeito dos weblogs é importante destacar que eles, como dispositivo
da cibermídia, somam características de vários outros meios provenientes da rede (chats, e-
mails, salas de bate-papo, jornalismo on-line, etc.). Com um olhar acurado podemos notar que
29
Ver site: http://www.technorati.com/.
30
Spam: comentário automático ou manual postado com a finalidade de incluir link ou site comercial no blog.
31
Trol: autor de comentário agressivo.
32
CASTILHO, Carlos. A polêmica sobre a necessidade de um código de conduta para os blogs. Disponível em:
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={F64F220E-885E-48E1-B1F9-
A942C24DDA22}&data=200704.
44
os blogs facilitam a publicação e distribuição de informação e opinião, geram comunidades
virtuais e potencializam a interação social por meio dos comentários deixados pelos leitores.
Conforme Barbosa e Granado (2004, p. 12):
Os weblogs congregam as principais características da Internet. São utilizados para
comunicar, como o correio electrônico [sic.]; permitem discutir e analisar assuntos, à
semelhança dos fóruns de discussão; possibilitam o contacto[sic.] entre pessoas
distantes que partilham idéias e objectivos [sic.] comuns, como os chats; e são
facilmente acedidos através da World Wide Web. A acrescer a tudo isto está o facto
[sic.] de poderem ser criados e mantidos mesmo por quem tem pouco ou nenhum
conhecimento de programação para a Web.
Além das características citadas, Orihuela (2006) considera os weblogs como
um gigantesco arquivo que opera como memória da web; um filtro social de opiniões e
notícias, uma vez que possibilitam saber como os cidadãos que têm acesso à rede recebem a
notícia; e um sistema de controle e crítica das mídias tradicionais, considerando que as
contradições, os erros e as manipulações desses meios são o assunto preferido dos blogueiros.
Neste ponto do seu livro, o autor chega a afirmar que os weblogs representam o quinto poder,
um contrapeso aos poderes executivo, legislativo e judiciário e, especialmente, à imprensa.
La blogosfera tiene una función mediática de primer orden y se está convertiendo en un
quinto poder, especialmente sensible a los errores y manipulaciones de los medios
tradicionales”(p. 157).
Podemos interpretar a afirmação do autor sob duas perspectivas: como
entusiasmada e inusitada, se observarmos que a desigualdade social é imensa e poucos têm
acesso à Internet no país (aproximadamente 9% da população); e como viável se
considerarmos o acelerado crescimento e a relevância dos blogs como mídia digital.
Com certeza muito ainda poderia ser dito a respeito da blogosfera, pois se trata
de um assunto atual e que possibilita inúmeras discussões. Todavia, o nosso intuito, nesse
tópico, não é esgotar o tema em todas as suas abordagens, mas sim descrevê-lo, demonstrar
sua relevância nos dias contemporâneos e salientar que esse mundo blogosfera vem sendo
usado como uma mídia digital que carrega consigo “novas” particularidades. Tendo cumprido
nossa meta, vamos agora nos dedicar a observar e comentar a relação entre o jornalismo
digital dos weblogs e o jornalismo tradicional impresso.
45
2.2 JORNALISMO IMPRESSO E JORNALISMO BLOGUEIRO: CONGRUÊNCIAS
E DISPARIDADES
A história da imprensa moderna começa no século XV, mais precisamente no
ano de 1440, com a invenção da prensa móvel por Johannes Guttenberg, que tinha por
finalidade aperfeiçoar a técnica de reprodução de textos por meio do uso dos tipos móveis.
Somente a partir do século XVIII, essa tecnologia foi usada para imprimir
jornais, até então os únicos veículos jornalísticos existentes.
Em razão da censura e da proibição de tipografias impostas pela corte
portuguesa, o Brasil demora a conhecer a imprensa, somente introduzida no nosso país com a
chegada de D. João VI. Apenas em 1808 surgem os dois primeiros jornais brasileiros: o
Correio Brasiliense, com publicação em Londres, e a Gazeta do Rio de Janeiro, produzida
pela corte.
De acordo com Sodré (1983), tal proibição e censura à imprensa se devem ao
fato de a regra geral da imprensa de então não ser o que se conhece hoje como noticiário, e
sim como doutrinário, ou seja, fazia-se propaganda ideológica capaz de alterar a opinião
pública. Todavia, a censura à imprensa acabou em 1827. Com o advento do império, o
período de turbulência política cessou e o jornalismo brasileiro entrou numa fase cultural,
abrigando homens de letras em centenas de publicações literárias e acadêmicas.
O ano de 1861 representa um marco para a imprensa, pois foi a partir desse ano
e com o início da Guerra Civil dos EUA que surgiram inovações técnicas e novas condições
de trabalho: o telégrafo é utilizado na transmissão de informações a longa distância e
repórteres e fotógrafos recebem credenciais para cobrir o conflito. Nesse mesmo período,
aparecem também novidades técnicas de impressão como o linótipo
33
.
De meados do século XX em diante, os jornais passam a ser também
radiodifundidos e teledifundidos e, com o advento de World Wide Web (www), surgem os
jornais on-line. Assim, o fim do século XX assiste a uma revolução nas tecnologias de
comunicação e informação que levou à formação de uma mídia com alcance global.
Aliando tal revolução às características pós-modernas, obtemos uma sociedade
que promove e acata o consumo desenfreado de notícias e informações e que, de acordo com
33
Linótipo: tecnologia de composição de página com uso de tipos de chumbo fundidos para gerar linhas
inteiras de texto. Inventado em 1889 por Otto Merganthaler (SILVA, 2005,
http://www.falcaodominho.pt/jornal/index.php?=fm_news.php?nid=763).
46
Oliveira (2005), marginaliza aquele que não tem o saber e o poder de acessar a Internet, não
interage com seus pares na web e não tem um endereço eletrônico.
Foi em 1992 que, no Brasil, chegaram os canais internacionais de TV por
assinatura, a TV a cabo e a Internet comercial, ocorrências que possibilitaram a transmissão
ao vivo do maior atentado terrorista da história em 11 de setembro de 2001.
É preciso que se esclareça que tal atentado apenas acarretou a repercussão dos
blogs, mas o que realmente tornou possível que os weblogs, principalmente os jornalísticos, se
instituíssem como uma mídia, foram as exigências da vida moderna, cuja disponibilidade de
tempo é cada vez menor, inclusive para a leitura, aliada à crise da comunicação impressa
desencadeada pelas diversas mídias on-line e não apenas pelos blogs jornalísticos.
Alguns fatores influenciaram avidamente a crise da mídia impressa tradicional,
como o seu custo elevado em detrimento da gratuidade de acesso aos blogs.
Segundo um estudioso da área, Souza (2004), as vantagens oferecidas pela
mídia on-line são inúmeras e atrativas: a Internet possibilita o uso de todos os recursos
multimídia, ou seja, os weblogs permitem a “convivência de múltiplas semioses, a exemplo de
textos escritos, de imagens e de som” (KOMESU, 2005, p. 111); os blogs permitem ao
usuário traçar o seu próprio caminho de informação por meio dos hiperlinks que facilitam a
leitura não-linear; a facilidade de utilização do comentário e a velocidade de transferência das
mensagens promovem um feedback muito mais eficaz que as antigas cartas à redação; os
“furos” jornalísticos tornam-se utópicos para os jornais impressos, uma vez que são
antecipados não somente pelos weblogs, mas pelas demais mídias que trabalham com a
instantaneidade da notícia; a sensação de liberdade gerada pela blogosfera é amplificada, visto
que se cria a ilusão de que tudo pode ser dito na rede por causa da liberação de quem fala e de
que posição fala.
Indubitavelmente outras vantagens da blogosfera poderiam ser mencionadas,
mas gostaríamos aqui de colocar a seguinte questão: Será que os jornais impressos estão com
os dias contados?
Provavelmente não, mas é fato que estão passando por muitas mudanças e que
perderam grande parte do prestígio de que gozavam no início do século XX.
Na realidade, a mídia digital, mais especificamente o blog, não surgiu para
substituir a mídia tradicional. Ela surgiu com o avanço das novas tecnologias da informação e
do conhecimento, que fizeram com que a interação e a comunicação entre as pessoas
sofressem várias alterações. Dessa forma, não se trata de um processo de substituição, mas de
47
complementaridade, ou seja, ambas têm funções complementares e estão condenadas a se
entenderem e conviverem em um espaço comunicativo que mudou para sempre, posto que é
praticamente impossível anular e apagar tudo o que a Internet proporcionou.
Consoante Orihuela (2006), a “velha mídia” deve aprender com a “nova mídia”
a dialogar com o público leitor, a assumir um ponto de vista mais pessoal da notícia, a
diversificar as fontes e a lidar melhor com os erros que comete. Para o autor, a mídia
tradicional está fadada a mudar, pois muitos leitores preferem a subjetividade e a parcialidade
assumida dos blogueiros à falsa objetividade e imparcialidade da grande imprensa tradicional.
A questão levantada acima é audaciosa e faz com que especialistas da área
manifestem-se a esse respeito. Frias
34
(1997) questiona sobre o futuro do jornalismo de papel
e tinta em um mercado cada vez mais eletrônico e computadorizado e diz acreditar que um dia
o jornal eletrônico substituirá o impresso. Mesquita
35
(1997, p. 62) corrobora que embora
esses meios (digitais) ainda não atinjam o público que o jornal atinge, este irá passar por uma
transformação profunda e dramática, mesmo que não desapareça. Mas não acredito que o
jornal continue sobrevivendo nos próximos 50 anos”.
Segundo pesquisas anunciadas por Noblat (2003), o consumo de jornais
reduziu quase 12% no Brasil, e o público jovem e adolescente não se interessa pelos jornais
diários, fato este que pode ocasionar uma queda maior na circulação dos jornais futuramente.
Souza (2004) alerta que talvez seja hora de o jornalismo impresso tradicional
mudar e aceitar a informação como produto que deve ser aprofundado, interpretado,
analisado, contextualizado e depois disponibilizado ao leitor, aumentando, assim, a
credibilidade do veículo midiático. Ou seja, a notícia do impresso não será inédita como a dos
blogs jornalísticos e dos jornais on-line, mas será completa, precisa, confiável e possibilitará
inovações e maior liberdade de expressão.
A esse respeito foram levantadas algumas reflexões no blog Código Aberto
36
.
Castilho afirma que a notícia em si não tem tanta importância, pois o que vale é o contexto em
que ela teve ou terá lugar. Segundo o autor do blog, cabe ao repórter a transformação de dados
e informações em conhecimentos estruturados.
Dizard Jr. (2000) acredita que:
34
Luis Frias: empresário e diretor-presidente da Empresa Folha da Manhã S/A.
35
Rodrigo Mesquita: empresário e diretor da Agência Estado.
36
CASTILHO, Carlos. O jornalismo entre a notícia e o conhecimento. Disponível
em:<http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={8A4CDC68-4D2E-4C49-83CB-
4AA3F37F581B}&data=200704
>.
Acesso em: 25 abr. 2007.
48
[...] os sobreviventes serão as organizações que se adaptarem às realidades
tecnológicas e econômicas em transformação. Os perdedores serão os dinossauros
empresariais, grandes e pequenos, que não podem ou não querem mudar todos
candidatos a fusões, aquisições ou simplesmente à falência (p. 22).
Diante dessas reflexões acerca da pergunta proposta, concluímos que o
jornalismo tradicional impresso precisa passar por mudanças a fim de atrair leitores, porém
nada podemos afirmar sobre seu fim, essa é uma indagação que se encontra sem resposta
certa.
É sabido que o jornalismo tradicional brasileiro obedece aos princípios da
objetividade e da imparcialidade, cumpre um código de ética e classifica-se de acordo com a
função desempenhada junto ao público leitor: informar ou opinar.
Segundo Melo (2003), os gêneros que correspondem ao universo da
informação se estruturam a partir de um referencial exterior à instituição jornalística, sua
expressão depende diretamente da eclosão e evolução dos acontecimentos, sendo o jornalista
um vigia que registra os fatos e transmite-os à sociedade, explicando e relacionando as
informações. os gêneros que se agrupam na área da opinião têm a estrutura da mensagem
co-determinada por variáveis controladas pela instituição jornalística. Eles oferecem a versão
dos fatos: os jornalistas expõem suas próprias opiniões sobre o que lêem, ouvem ou vêem a
fim de formar a opinião do leitor.
Nos blogs jornalísticos não é possível observar uma classificação de categorias
como se no jornalismo impresso. Aparentemente, não uma preocupação com as regras
do jornalismo, nem mesmo quando os blogs pertencem a jornalistas ligados a alguma
instituição, como é o caso do blog do Josias
37
, ligado à Folha de São Paulo, e o do Blog do
Noblat
38
, ligado a O Estadão. Os textos não podem ser categorizados como informativos ou
opinativos. O que ocorre é uma mistura de categorias, pois o jornalista-blogueiro, ao mesmo
tempo em que informa, interpreta a notícia, relaciona-a a outros fatos e imprime no e-texto
sua opinião, sua subjetividade. O discurso jornalístico que se encontrava, até então, na ordem
do dizer da neutralidade e da objetividade, tendo como função informar ou formar opinião,
entra em choque com um discurso subjetivo e parcial.
Em relação aos procedimentos de controle do discurso tanto do jornal impresso
quanto dos cibertextos dos weblogs em questão, podemos perceber que eles se diferem, pois,
nos weblogs, o editor coincide com o blogueiro e a seleção das informações não obedece a
37
Ver site: http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br.
38
Ver site.
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/
.
49
uma hierarquia editorial tão rígida como a do impresso. O blogueiro se pauta pela atualidade,
pelo imediatismo da informação e pelos posts de seus leitores, o que amplia a sensação de
liberdade do jornalista.
De acordo com a pesquisadora Alessandra Aldé
39
(apud HAAG, 2006, p. 3-4)
em entrevista para revista Fapesp:
Ao contrário da edição de um diário, cujas matérias vão sendo modificadas ao longo
do dia, sendo mesmo descartadas antes de chegar ao leitor, no jornalismo on-line o
processo de apuração, reportagem e checagem dos fatos acontece em tempo real e é
acompanhado pelos leitores que têm acesso a uma variedade maior de informações
fragmentadas e fontes alternativas.
O jornalismo impresso não conta com essa possibilidade e, além disso, tem
uma pauta a seguir, a qual determina “não apenas um elenco de temas ou assuntos a serem
observados pelos jornalistas, mas uma indicação dos ângulos através dos quais os
acontecimentos devem ser observados e relatados” (MELO, 2003, p. 78).
Ao considerar a vantagem intrínseca de o blog poder ser atualizado a qualquer
momento, funcionando como um plantão de notícias e cobrindo qualquer furo”, pode-se
imaginar que ele chega a servir de pauta para o jornal impresso. É o que afirma Drezner
40
em
reportagem à revista Fapesp de agosto/2006: “Os blogs são lidos como um barômetro de
interesse num dado tema. Se os leitores-escritores do blog se concentram em algo, isso, com
certeza, interessará à mídia, que será afetada pelo consenso, da mesma forma que a opinião
pública é afetada pela mídia” (apud HAAG, 2006, p. 3).
Esse novo meio eletrônico de fazer jornalismo resgatou a exercitação do “faro”
dos repórteres blogueiros, que saem a campo para descobrir notícias. O contrário do que
acontece no jornal de tinta e papel. Consoante Melo (2003, p. 78), “hoje, essa ação criativa
dos repórteres está bastante limitada, pois o seu trabalho diário se orienta pelas prescrições do
pauteiro”.
Oliveira (2006, p. 136) assevera que o aparecimento dos weblogs jornalísticos
ocasionou a quebra do paradigma da forma como o sujeito-jornalista lidava com as
informações. Tornou-se opaco e imperceptível o processo político que controlava o dizer do
jornalista e tudo mais que era vinculado na mídia tradicional.
39
Pesquisadora do Iuperj e professora da Uerj, uma das poucas pesquisadoras acadêmicas a se debruçar sobre o
fenômeno dos blogs, em especial os de opinião.
40
Professor de jornalismo da New York University.
50
Também é interessante que ressaltemos a atenção dada ao leitor nos blogs
jornalísticos. Diferentemente do que ocorre no ciberespaço, no impresso não é dada muita
abertura ao leitor, o qual participa do processo jornalístico por meio de cartas que são
selecionadas de acordo com o interesse do veículo de informação e também em detrimento do
reduzido espaço físico reservado a elas. Melo (2003) não concorda com a pouca atenção
dispensada ao leitor dentro do jornalismo de papel e tinta:
O leitor deveria constituir o principal foco de atenção daqueles que produzem
informação de atualidade para a imprensa. Afinal de contas, é em função dele que os
repórteres observam os fatos, que os redatores escrevem matéria, que os editores
decidem o que divulgar. O leitor representa o outro lo da totalidade jornalística
[...].Deveria ser. Mas não é. Pois o jornalismo se organizou e persiste sendo um
processo de transmissão de informações
.
Seu fluxo é unidirecional (p. 172-173).
Talvez este seja um dos motivos das persistentes críticas sofridas hoje pela
mídia impressa: o leitor não participa ativamente do processo de produção jornalística,
entre o editor e o leitor uma barreira que deve ser rompida. Essa barreira foi criada, em parte,
pela editorialização da mídia impressa, tanto dos jornais quanto das revistas, e vem sendo
criticada com freqüência por leitores de weblogs e jornalistas-blogueiros que não aderiram à
editorialização da mídia de papel e tinta. Abaixo seguem alguns exemplos:
O fato de uma publicação jornalística ter uma opinião, porém, não justifica dar as
costas às notícias importantes que nela não se encaixem. Também acho complicado
editorializar o material. (Ainda sou daqueles antiquados que acreditam na diferença
entre interpretação/análise e editorialização). Não acredito que isso "manipule
mentes influenciáveis". Mas, por qualquer medida razoável, é mau jornalismo
(SOARES, 2006,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=403IMQ001, grifo do
autor).
Marco Costa Costa , São Caetano do Sul-SP - T.P.A
A CartaCapital [sic.], a Veja, IstoÉ [sic.], Época, entre outras, não m o direito de
defender este ou aquele governo. Isto cheira conluio político com interesses
financeiros dos mais sórdidos. Uma imprensa livre e democratica [sic] não pode
andar de braços dados com o sistema vigente. O papel da imprensa democratica [sic]
é sempre defender os interesses do povo brasileiro. Quanto aos estudantes que
queimaram a revista Veja, o vejo nesta atitude falta da famigerada democracia.
Quando não se concorda com alguma coisa que vai de encontro com os interesses do
povo, nada mais justo que tomar atitudes desta natureza, porque isto chama-se
democracia de livre emanifestação [sic.]. Como sempre, a imprensa neste caso se
acha a dona da verdade (SOARES, 2006,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=403IMQ001 ).
51
Com o advento do blogs jornalísticos, notamos que foi possível romper parte
da barreira citada, pois houve uma transformação no processo jornalístico por meio de uma
prática que possibilita ao leitor ter uma participação maior, e os comentários indesejáveis,
quando são rechaçados, podem aparecer em outro blog, não havendo como controlar o dizer
do leitor. Melo (2003) acredita que romper essa barreira constitui um desafio para o
jornalismo impresso:
Romper a barreira que separa editor e leitor, produtor e receptor tem sido um desafio
para quantos pretendem que o processo jornalístico deixe de ser meramente
informativo (unidirecional) e se converta numa prática comunicativa (bidirecional)
(p. 173).
Dentro dessas condições de escrita e leitura, é aceitável chamar o leitor de
escrileitor
41
(OLIVEIRA, 2006) ou co-autor, uma vez que a autoria do texto é compartilhada.
Ainda é importante lembrar que tudo acontece em tempo real dentro do
ciberespaço, diferentemente do jornal impresso. “O imediatismo e a interação em tempo real,
nesse discurso emergente, são características que deixam o cibertexto muito mais atrativo para
o leitor e escritor” (OLIVEIRA, 2006, p. 137-138).
Como afirma Rosen
42
(apud HAAG, 2006, p. 3):
[...] a hegemonia do jornalismo como o guardião das notícias está ameaçada, não por
novas tecnologias ou por rivais, como se imaginava até então, mas potencialmente,
pelo público a que ele deveria servir: o leitor, transformado em escritor, jornalista e
editor.
Diante do exposto, compreendemos que as novas tecnologias possibilitaram
alterações nas relações entre os sujeitos e os discursos. Como mencionamos, os hábitos dos
usuários e a noção espaço-temporal mudaram, permitindo ao sujeito contemporâneo conviver
41
“Preferimos utilizar o termo escrileitor, por entendermos que esta é uma das características que define umas
das diferenças entre o leitor do impresso do leitor digital. Ressalve-se que no impresso o escrileitor existia
quando colocava suas marcas no texto do outro, mas isto não ocorria da mesma forma como acontece hoje.
Na leitura do jornal impresso, diferentemente da leitura de um livro, o máximo que o leitor faz é apenas
circular ou rabiscar ou escrever nas extremidades do jornal, mas quase sempre como apontamento e não como
co-autor do texto inscrito. Tal possibilidade é marcada pelo espaço de tempo que esse leitor tem para escrever
em outro suporte, para que se insira no processo da escritura juntamente com o autor da notícia.
Além disso, é necessário passar por um crivo do editor para que sua escrita esteja presente na próxima edição
do jornal. O espaço do leitor no jornal impresso é delimitado. No caso do blog a escrita do leitor aparece
conjuntamente com o post do jornalista-blogueiro e ele pode instantaneamente modificar o efeito de sentido do
texto do outro.
Há outros termos utilizados para o leitor digital tais como: leitor-navegador (MARINHO); hiperleitor (KOCH)
e navegador (LÉVY)” (OLIVEIRA, 2006, p. 137).
42
Professor de jornalismo da New York University.
52
com “novas” realidades. Consoante Coracini (2006, p. 140), as atividades exercidas e os
relacionamentos estabelecidos no virtual, ambos a distância e numa espécie de imobilidade,
acomodam e transformam o corpo e a mente dos usuários, trazendo mudanças para a
constituição da identidade do sujeito.
Os weblogs jornalísticos surgem com um discurso de liberdade, ou seja, com o
discurso de que promoverão o acesso livre e democrático à palavra tanto para o bloguer
quanto para o leitor.
Em decorrência disso, torna-se possível acreditar na existência de uma
(re)defínição do profissional jornalista, que tem o papel de informar e interpretar
acontecimentos, relacionar fatos a fim de gerar uma comunidade, dominar as técnicas da
multimídia, ser veloz e possuir uma escrita atrativa; de um “novo” leitor, o leitor-escritor; e de
“novas” formas de subjetivação, ou seja, “novas” identidades.
53
3 ANÁLISE DOS BLOGS JORNALÍSTICOS
Carteiros do texto, viajamos de uma margem à outra do espaço do
sentido valendo-nos de um sistema de endereçamento e de indicação
que o autor, o editor, o tipógrafo balizaram. Mas, podemos
desobedecer às instruções, tomar caminhos transversais, produzir
dobras interditas, estabelecer redes secretas, clandestinas, fazer
emergir outras geografias semânticas.
Pierre Lévy
54
Nesta etapa, almejamos cumprir o que foi proposto como objetivo desse
trabalho, ou seja, refletir acerca das práticas de leitura, discursivas e identitárias nos weblogs
jornalísticos de Luis Weis (ANEXO 1) e Josias de Souza (ANEXO 2). Procuramos também
observar as relações de poder recorrentes nesse espaço virtual.
Para tanto, foi feita uma análise dos blogs escolhidos. Valorizamos em nossas
colocações tanto a estrutura e a organização do corpus como a linguagem. Ainda é preciso
destacar que analisamos não apenas a linguagem verbal, mas também a linguagem não verbal,
como fotos e figuras, visto que a teoria adotada permite tal abertura.
Discutimos os discursos e as práticas de leitura presentes em cada weblog, bem
como as identidades assumidas pelo sujeito blogueiro e pelo sujeito leitor dentro do mundo
blogosfera selecionado.
3.1 VERBO SOLTO: UM DISCURSO AUTORITÁRIO
O blog Verbo Solto
43
encontra-se localizado no site do Observatório da
Imprensa (OI)
44
. Nascido na web em abril de 1996, o OI é uma iniciativa do Projor – Instituto
para o Desenvolvimento do Jornalismo e projeto original do Laboratório de Estudos
Avançados em Jornalismo (Labjor) –, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Conforme o site informa
45
, “o OI tem equipe responsável, mas não tem ‘dono’”.
Define-se como uma entidade civil, não-governamental, não-corporativa e não-
partidária que objetiva acompanhar, junto com outras organizações da sociedade civil, o
desempenho da mídia brasileira. Funciona como um fórum permanente onde os usuários da
mídia leitores, ouvintes, telespectadores e internautas –, organizados em associações
desvinculadas do estabelecimento jornalístico, podem manifestar-se e participar ativamente de
um processo no qual, até há pouco tempo, desempenhavam o papel de “agentes passivos”
46
.
43
Ver site: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={3974085D-F6CF-453A-
A8F3-6697C5445A6E}&data=200708.
44
De hora em diante, o Observatório da Imprensa será tomado também como OI. Ver site:
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/.
45
Ver site
:
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/modo.htm
.
46
Embora os termos destacados pareçam contraditórios, é assim que eles são empregados pelo site em questão,
ou seja, esse é o modo como o site se define. Porém, é sabido que o leitor participava antes do processo de
produção jornalística por meio de cartas. A diferença é que, no impresso, essa participação do leitor era reduzida
e selecionada a um espaço pequeno dentro do jornal ou revista.
55
Além de sua presença na web, o Observatório da Imprensa também possui
uma versão televisiva, desde 1998, e uma radiofônica, desde 2005. As duas versões estão
contidas no site.
Em todas as páginas acessadas no OI, encontramos uma propaganda de seu
provedor: a IG; e os símbolos das marcas que apóiam ou patrocinam a iniciativa do
Observatório: Ford Foundation, Fiat, Embraer, entre outras. Além disso, temos o slogan de
apresentação e representação do site: o desenho de um olho, de cuja pupila sai uma linha azul
claro que divide duas frases, na parte superior o título do jornal Observatório da Imprensa, na
parte inferior o slogan: “Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”.
É notório que o próprio slogan traz o pressuposto de que o leitor da mídia
passará de passivo, antes de ler o OI, a ativo
47
, depois de participar e ler o OI. Assim, o
Observatório da Imprensa se reveste do papel de mediador do saber e do poder de ler de
forma diferenciada de todos os outros suportes e veículos midiáticos, como podemos
visualizar abaixo:
Fonte:http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=2&id={3974
085D-F6CF-453A-A8F3-6697C5445A6E}&data=200708.
A respeito das relações de poder, Foucault (2004, p. 276) argumenta que:
[...] nas relações humanas, quaisquer que sejam elas quer se trate de comunicar
verbalmente, como fazemos agora, ou se trate de relações amorosas, institucionais
ou econômicas –, o poder está sempre presente: quero dizer, a relação em que cada
um procura dirigir a conduta do outro.
Ancorados na fala do filósofo, notamos, no slogan supracitado, a instauração
de uma relação de poder por parte do OI ao inferir, por meio da frase manifestada, que tem o
potencial de modificar a visão dos usuários da mídia, transformando-os em leitores críticos e
reflexivos.
Mesmo que o Observatório não consiga realizar a façanha de transformar seus
leitores, é assim que ele quer ser visto, essa é a imagem que ele deseja que seus leitores
tenham, uma vez que ela produzirá efeitos de sentido favoráveis em seus visitantes virtuais,
47
Ver nota 46.
56
podendo torná-los usuários assíduos do site. Dessa forma, é coerente afirmar, com base em
Pêcheux (1990b), que o Observatório, de certa forma, antecipa o possível sentido que o
‘outro’poderá atribuir ao que ele publica. Segundo a teoria das Formações Imaginárias do
mesmo autor (1990b), esse mecanismo denominado antecipação regula a argumentação de tal
forma que o sujeito produz o seu dizer conforme o efeito que pensa produzir em seu ouvinte.
O site ainda se compõe das opções: seções dividida em vários itens com seus
respectivos colaboradores –, e blogs. Dentre esses blogs, encontra-se o Verbo Solto de Luiz
Weis analisado na seqüência.
Conforme informações fornecidas pelo OI, gostaríamos de salientar que o blog,
nem mesmo o site em que ele se encontra, não está vinculado a nenhum jornal ou empresa
como acontece com o weblog Nos bastidores do poder de Josias de Souza, que será analisado
mais adiante. Apesar de o site receber patrocínios, ele não visa a lucros.
O bloguer e jornalista Luiz Weis constrói seu blog de forma simples, não
divide ou classifica seus textos, apenas os mantém em ordem cronológica, atualiza seu espaço
regularmente e escreve com subjetividade e parcialidade.
Pelo fato de o weblog se encontrar em um site cuja proposta é acompanhar o
desempenho da dia brasileira, não podemos afirmar que ele discuta algum tema em
especial. Na realidade, ele aborda os assuntos discutidos pelos principais jornais, procurando
nortear seus temas na atualidade dos acontecimentos do cotidiano social, econômico e
político. A apresentação e opinião do jornalista blogueiro é mais ampla ou restrita
dependendo dos ‘interesses’ ou do OI ou das próprias filiações político-ideológicas do
jornalista-blogueiro.
A falta de discussão faz com que alguns internautas classifiquem o blog como
uma forma de reprodução do dizer da dia, como podemos observar na indignação de um
dos leitores do weblog
48
a seguir:
douglas puodzius, pesquisador (são paulo/SP) Enviado em 15/1/2008 às
11:38:44 AM
O assunto é interessante. Este blog já se tornou mais um espaço da imprensa.
repercute apenas, não discute. É pautado por ela e não pelo interesse em observá-la.
48
Intentamos esclarecer nesta nota que, embora a coleta de dados para análise do blog em questão tenha sido
feita a15 de mês de setembro, decidimos incorporar o exemplo citado, visto que ele traz à tona uma discussão
que, até o momento em que encerramos nossa coleta, não havia sido levantada dentro do suporte. Além disso, ele
(o exemplo) traz uma resposta ao leitor assinada pelo OI e não pelo bloguer. Ainda gostaríamos de explanar que,
quando selecionamos tal exemplo, observamos que o blogueiro responsável pelo Verbo Solto havia realizado
algumas modificações na composição de seu suporte, as quais não foram analisadas neste trabalho por não haver
tempo hábil.
57
Aqui também é o lugar dos observadores piratas. Olham certas coisas com seus
olhos de lunetas e outras com seus olhos de tapa olho, repetem o que seu papagaio
mandar e não tem apenas a perna de pau, como a cara tambem [sic.]. Tem [sic.]
preocupações seletivas, dependendo do que ou o que esteja em jogo mostrarão
indgnações [sic.] inconsolaveis [sic], dependendo, nem mesmo um suspiro. Isso é o
que vejo agora. Um desembargador profere uma setença [sic.] proibindo o gov.
requião [sic.] de falar. Ele, o meretrissimo [sic.], não avalia o mérito do que falou,
porque senão o teria condenado pelo q disse, mas condena o futuro: Não pode falar.
É uma censura prévia e absurda. E nenhuma linha sobre o caso neste blog. Um
pouco daquela mesmo indgnação [sic.], daqueles mesmos discursos defendendo a
midia [sic.], a liberdade de expressão, quando alguem [sic.], em processo justo,
ganha causas contra inverdades publicadas pela imprensa. É isso aí... (mascando
fumo) Bservatóriu [sic.] da imprensa, brazileru [sic.](cospe)...
Nota do OI: O atento leitor já deve ter notado que o Observatório não se resume ao
blog Verbo Solto. Veja notas sobre o caso MP vs. Requião nas seções Caderno da
Cidadania e Entre Aspas da edição 467 e no Circo da Notícia, edição 468. Boa
leitura (WEIS, http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3).
A resposta ao dizer do internauta é dada de forma indireta, pois a nota-resposta
é assinada pelo OI e não por Weis. É um retorno de esquiva que produz, a partir da
adjetivação positiva atribuída ao leitor, ou seja, a partir de uma linguagem diferente da do
internauta, mas que na realidade é uma estratégia discursiva por meio da ironia, o efeito de
refinamento do jornal no trato com o outro (interlocutor). Ao mesmo tempo, cria-se a seguinte
imagem inversa: leitor desatento, para os internautas; e veículo de comunicação atento a tudo
o que acontece e a todos, para o weblog.
A esquiva se pelo fato de o OI desviar a principal queixa feita ao blog para
outros dispositivos dentro do site, os quais trataram da questão discutida no comentário sob
outros pontos de vista; todavia, a reclamação foi feita diretamente ao blog. Percebemos, então,
que a queixa foi silenciada e a aparência de um blog que faz com que o leitor leia a dia de
forma diferente pode permanecer sem problemas, mesmo que isso não ocorra da forma como
o slogan promete.
Percebemos ainda no Verbo Solto a ausência de preocupação com o furo
jornalístico e com o imediatismo da informação e a tentativa de mostrar que uma notícia pode
apresentar várias versões de acordo com o jornal que a divulga ou a silencia.
A contenda mostrada é um exemplo de que a leitura não é algo dado, ou seja,
não é decodificação, mas sim um processo, e de que a escrita do jornalista-blogueiro
representa apenas a leitura oferecida pelo blog em análise, o qual pretende mostrar-se como
crítico dos fatos e dos acontecimentos, além de formador de opinião e de leitores críticos da
mídia.
58
A perspectiva de Chartier (1999) corrobora a concepção de leitura como
processo que envolve o histórico, o social, o ideológico e o cultural, pois, de acordo com o
historiador, cada leitura é sempre apropriação, invenção, produção de significados em um
dado momento.
Segundo a teoria do discurso adotada neste trabalho, existem várias maneiras
de ler um discurso e cada leitura deve ser entendida como um gesto de leitura. A esse respeito
Coracini (2002, p. 16) afirma:
Quando falamos de diferentes leituras, referimo-nos não apenas à leitura realizada
por cada indivíduo em particular, mas aos diferentes momentos de sua vida: na
verdade, o sentido de um texto, por ser produzido por um sujeito em constante
mutação, não pode jamais ser o mesmo.
Coracini (2002), da mesma forma que Chartier (1999), também defende a
noção de leitura enquanto processo. Conforme a lingüista (2002, p. 15), o ato de ler é como
um “processo discursivo no qual se inserem os sujeitos produtores de sentido o autor e o
leitor –, ambos sócio-historicamente determinados e ideologicamente constituídos”.
Dessa forma, podemos dizer, em relação ao exemplo citado anteriormente, que
tanto a leitura do internauta quanto a do blogueiro são possíveis consoante as condições de
produção vivenciadas por esses sujeitos discursivos.
Weis procura ocupar o papel de atento mediador que tem como principal
objetivo levantar discussões acerca dos assuntos que estão na mídia, dando destaque para o
que os jornais mais conhecidos publicaram, relacionando o que foi noticiado e criticando ou
elogiando tais notícias.
A partir do que foi colocado no parágrafo anterior e da proposta de
funcionamento do OI, gostaríamos de abrir parênteses e demonstrar a analogia que
percebemos entre algumas práticas do blogueiro e algumas práticas do ombudsman. Segundo
Mendes
49
:
O ombudsman desempenha várias funções no veículo de comunicação em que
trabalha. Ele é ouvidor, crítico interno, colunista e analista da mídia.[...] Outra
função importante do ombudsman é a redação de um boletim interno diário. Nele
são feitas críticas à edição do dia anterior, além de comparações com outros
concorrentes. O objetivo da crítica é melhorar a qualidade do jornal ou da
programação de rádio e TV. [...] Além disso, os ombudsmen de imprensa costumam
[...] ter um programa para fazer análise dos meios de comunicação.
49
Jairo Farias Mendes é ombudsman e autor do livro O Ombudsman e o Leitor. Ver site:
http://www.ombudsmaneoleitor.jor.br/template&ombudsman=secao=1.php.
59
Notamos, com base na definição de Mendes, que o ombudsman também
representa um papel de mediador entre a mídia e o leitor. Além disso, ele também é crítico e
analista. Entretanto, como crítico, o ombudsman tem o objetivo de melhorar a qualidade do
jornal e o blogueiro do Verbo Solto tem o objetivo de agir sobre os leitores, transformando-os
também em críticos
50
; como analista, o ombudsman faz análises que consideram todos os
meios de comunicação, e o bloguer do OI analisa mais intensamente a dia impressa. Dessa
forma, podemos pensar o blogueiro como um ombudsman (re)significado, um ombudsman na
versão virtual. Feita nossa observação, voltamos para análise do blog.
Constata-se, claramente, que o sujeito jornalista-blogueiro se constitui a partir
de várias outras vozes, ou seja, é um eu’ que constrói sua identidade na alteridade
51
, assim
como a AD defende.
Ancorando-nos nas propostas de Jacqueline Authier (1990) a respeito da
heterogeneidade do sujeito, as quais muito colaboraram no momento de reconstrução da AD,
ou seja, em sua terceira fase, torna-se possível compreender, no exemplo abaixo, a
constituição do sujeito blogueiro em questão.
O noticiário de hoje no Estado e na Folha parece levar às cordas a versão de que os
pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux Ortiz e Erislandy Lara Zantaya
abandonaram a delegação de seu país ao Pan para fugir de Cuba, foram capturados
pela Polícia Federal e repatriados a toque de caixa [...]
No Globo de hoje se que a organização internacional Human Rights Watch, de
defesa de direitos humanos, pediu uma investigação profunda [...]
Agora vejam só. Pode haver órgãos brasileiros de mídia tão hostis à ditadura
castrista quanto o Estado. Porém não mais do que este. Era de esperar, portanto, que
o jornalão fizesse um escândalo com o caso. Sintomaticamente, talvez, o trata com
discrição e até hoje é o único dos três grandes diários a não sair com um editorial
sobre o episódio.
Como se diz, nem tudo que parece é. (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id={7BC22B03-C80F-4E23-
B053-E9592FA20FA8}&id_blog=3).
No trecho, observa-se o aparecimento de um discurso “outro” no próprio
discurso, colocando em evidência as rupturas no “fio do discurso” (AUTHIER-REVUZ,
1990). Esse discurso “outro” seria o da Folha, o de O Globo e o de O Estado de São Paulo.
Também é possível analisar essa prática de Weis sob outro prisma, ou seja, o
fato de esse sujeito discursivo constituir-se, na maior parte das vezes, por meio da
50
Ver proposta do OI mencionada anteriormente neste trabalho.
51
“Presença do discurso do outro como discurso de um outro e/ou discurso do Outro” (GREGOLIN, 2004, p.
157).
60
heterogeneidade mostrada marcada
52
, pode ser entendido, com base na teoria de Foucault
(1996), como um mecanismo de controle instituído de forma a dominar a proliferação dos
discursos.
Na realidade, verificamos a utilização de três desses procedimentos
foucaultianos. Melhor explicando, o sujeito jornalista-blogueiro, motivado pela vontade de
verdade, tenta opor o verdadeiro ao falso, fazendo uma segregação entre os discursos
jornalísticos confiáveis e os não confiáveis, entre os melhores e os piores. Por isso o blogueiro
cita várias fontes discursivas, estabelece paralelos entre as mesmas, critica-as ou não,
construindo, assim, o seu discurso.
o que pensar a disparidade de tratamento nos três diários nacionais à
manifestação do Cansei, ontem, em São Paulo.
O Globo a relegou ao canto direito de uma página par - uma espécie de fundo de
quintal no espaço ocupado nos jornais pelo noticiário [...].
O Estado foi mais generoso com os cansados. Deu-lhes a metade superior de uma
página [...]
A Folha, por fim, aparentemente estendeu tapete vermelho aos cansados: chamada
com foto na primeira página [...] (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id={8A72AC63-530A-
4C8A-BBA0-5BA12D022263}&id_blog=3).
Além do mecanismo de segregação que é considerado como externo ao
discurso, o jornalista ainda utiliza dois mecanismos internos ao discurso: o comentário e a
disciplina. Segundo Foucault (1996, p. 25), o primeiro possibilita “dizer pela primeira vez
aquilo que, entretanto, já havia sido dito e repetir incansavelmente aquilo que, no entanto, não
havia jamais sido dito”. Em outras palavras, esse mecanismo exerce controle sobre o acaso do
aparecimento do discurso, restringindo aqueles que serão preservados em uma cultura e
aqueles que serão esquecidos. No exemplo acima, podemos verificar que Weis, ironicamente,
condena o discurso dos jornais O Globo e Folha de São Paulo esses são os discursos que
devem ser esquecidos. Ao mesmo tempo, percebemos que o bloguer defende o discurso de O
Estado e tenta preservá-lo.
Como havíamos colocado, o responsável pelo weblog recorre também ao
procedimento denominado disciplina ao buscar delimitar o que se pode dizer no interior do
jornalismo a respeito do tema discutido em seu post
53
.
52
Authier-Revuz (1990), sob influência do dialogismo bakhtiniano, faz um estudo sobre as
heterogeneidades constitutiva, mostrada e mostrada marcada.
53
Tema: o movimento “cansei” em oposição à atual situação política do país.
61
A partir dos exemplos destacados, é notável que Weis rebate tanto o discurso
da Folha quanto o de O Globo e acata o discurso de O Estado. Tal prática demonstra, embora
o jornalista não confesse
54
, que o sujeito em análise assume uma posição discursiva e nega as
demais. Sendo ele um jornalista de O Estado, torna-se compreensível essa atitude. Com base
na AD, corroboramos que o sujeito em questão, ao assumir tal posição, inscreve-se dentro da
formação discursiva do jornal O Estado de São Paulo. E é a partir dela que se a
constituição dos sentidos dos discursos do bloguer e do próprio sujeito blogueiro.
Ao desviar o olhar dos textos de Weis para a sua página virtual como um todo,
encontramos outras práticas discursivas do blogueiro que ainda merecem atenção.
Na lateral de todas as páginas do dispositivo cibermidiático em análise, é
possível observar o modo como Weis procura construir sua identidade frente ao seu leitor.
Encontramos, lá, dentro de um quadro, uma foto do autor do blog acompanhada de uma farta
descrição de sua vida profissional (ANEXO 3). Na foto, o bloguer mostra-se com uma feição
intelectual e séria. Seu olhar transmite reflexão, produzindo um efeito de sentido que pode ser
traduzido como seriedade e comprometimento com o trabalho que desenvolve no OI.
A descrição mencionada reforça a imagem transmitida pela foto e ainda
acrescenta ao jornalista-blogueiro duas qualidades: experiência e competência, pois nela
constam os cargos e ainda ocupados por Weis, os livros que organizou e os que escreveu e
o destaque de um prêmio que recebeu como jornalista.
Percebemos que o autor do Verbo Solto projeta ali, na sua descrição, a imagem
que ele gostaria de ter perante o seu público leitor, definindo, assim, seu lugar enunciativo. Ou
melhor, o sujeito Weis enuncia como um jornalista pós-graduado, que ocupou cargos em
empresas conhecidas, escreveu e organizou livros e recebeu um prêmio em função de seu
trabalho. Esse é o lugar discursivo assumido pelo sujeito em questão e é a partir dessa posição
que seu discurso deve ser compreendido. Consoante a Análise de Discurso, tal colocação se
justifica, pois os sentidos das palavras não estão nelas mesmas, mas são determinados pelas
posições ideológicas colocadas em jogo no processo discursivo.
54
Provavelmente, essa filiação ao discurso de O Estado se dá inconscientemente, o que é sustentado pela AD
com base nos estudos psicanalíticos de Freud.
62
O fato de o responsável pelo weblog Verbo Solto não querer
55
ser visto
simplesmente como um blogueiro, mas sim como um jornalista competente e experiente,
leva-nos a duas observações.
A primeira é que o sujeito em questão se coloca em uma posição de destaque:
como detentor de um saber, logo, de poder. Afirmação essa que é possível a partir da
seguinte fala de Foucault (1989, p. 29): “poder e saber estão diretamente implicados; que não
relação de poder sem constituição correlata de um campo de saber, nem saber que não
suponha e não constitua ao mesmo tempo relações de poder”.
Como detentor de saber
56
, Weis busca garantir a credibilidade de seu weblog.
Possivelmente, o sujeito movido pela vontade de verdade, utilizou-se desse mecanismo de
controle do discurso foucaultiano com o intento de se fazer crer. Esse é, certamente, o efeito
de sentido desejado pelo autor.
A segunda observação que gostaríamos de destacar é a forma como o
jornalista-blogueiro se coloca para seus leitores virtuais, a qual pode determinar ou influenciar
o modo como eles comentam no blog. Isso, obviamente, se os usuários lerem o weblog como
um todo e não apenas os textos postados por seu responsável.
Essa possibilidade de influência no retorno dos freqüentadores do blog foi
levantada porque notamos que os comentários ali encontrados revelam certa preocupação do
leitor com o vocabulário e com a estrutura de seus textos, que são em sua maioria bem
construídos e organizados, escritos em linguagem informal, sem emoticons
57
, onomatopéias
ou abreviações. Em outras palavras, não se usa o Internetês
58
.
Corriqueiramente, esquece-se
de algum acento, sinal de pontuação ou alguma concordância verbal, faltas comuns em textos
que não passam por correções e não são relidos.
Dessa forma, o modo como os comentários são elaborados, apesar de o se
apresentarem em estilo formal o que seria incompatível com perfil da blogosfera –, nos faz
55
Gostaríamos de salientar que, embora tenhamos mencionado algumas intenções e desejos do sujeito blogueiro,
compreendemos, com base na AD, que ele não tem controle sobre os efeitos de sentido do seu discurso, aliás,
nenhum sujeito discursivo tem, visto que a evidência do sentido é uma ilusão. Destacamos essas possíveis
intenções porque esse foi o efeito de sentido que o discurso do bloguer produziu em nós.
56
Saber este que foi adquirido pelas práticas do bloguer, ou seja, pelo exercício de sua profissão, por suas
publicações e pelo prêmio que recebeu, segundo o próprio blogueiro.
57
Emoticons ou carinhas são desenhos que podem ser usados para expressar sentimentos e estados de espírito de
forma sintética e divertida (UOL JOGOS, http://forum.jogos.uol.com.br/faq.php).
58
O Internetês é uma linguagem surgida no ambiente da Internet baseada na simplificação informal da escrita,
com o objetivo principal de agilizar a digitação. Consiste numa codificação que utiliza caracteres alfanuméricos
(LEONEL, http:// www.acessa.com/informatica/arquivo/galeraweb/2006/01/18-Internet/).
63
perceber que o leitor teve um certo cuidado com a escrita, fato que nem sempre pode ser
constatado no blog de Josias, como veremos no tópico a seguir.
Gonçalo Osório, Professor (Jundiaí/SP) Enviado em 8/8/2007 às 11:42:33 PM
Participei de campanhas internacionais para não deixar que uma cidadã brasileira
continuasse numa masmorra durante a ditadura uruguaia. Participei de campanhas
internacionais por Flavio [sic.] Tavares. Seu colega, Weis. Vo lembra? Devia
lembrar. Causa-me nojo e vergonha o que aconteceu com os cubanos. Mais nojo e
mais vergonha ainda causa-me ver esse tipo de comentário, muitos publicados aqui,
sempre tentando proteger e justificar o injustificável. Sua geração, Weis, sacrificou-
se para isso? Para esse tipo de proto-fascismo denegrir o adversário político,
defender a mentira oficial, aninhar-se no aparelho do Estado? Você, Weis, é
veterano o suficiente para saber do que se trata o ovo da serpente. Infelizmente, são
tempos negros os que vivemos no Brasil, hoje. E boa parte de quem ataca quem
apenas diz o que está acontecendo o que a imprensa faz, em sua enorme maioria)
é a grande prova disso (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id={7BC22B03-C80F-4E23-
B053-E9592FA20FA8}&id_blog=3).
José Ribamar, operário (Feira de Santana/BA) Enviado em 9/8/2007 às 1:23:19
AM
NOSSA! O índice da LOUCURA da mídia conservadora (e golpista) está
chegando a níveis alarmantes! VÃO ARRUMAR OQUE [sic.] FAZER BANDO DE
DESOCUPADOS!JUNTAR [sic.] SUAS FORÇAS NO CRIANÇA ESPERANÇA
SERIA UMA "BOA", uma das poucas coisas boas que a mídia golpista faz!
(Obviamente porque é auditoriado pela UNESCO). COLOCAR A SERIEDADE DO
TRABALHO DA POLÍCIA FEDERAL EM DÚVIDA? OS TRABALHOS DA PF
NÃO SÃO FISCALIZADOS PELOS ORGÃOS COMPETENTES? ESTAMOS A
VOLTAS COM O DOI-CODE? FAÇA-ME O FAVOR SRS. JORNALISTAS!
PEÇO MAIS PROFISSIONALISMO EM SUAS REPORTAGENS E MENOS
GANANCIA [sic.] PELO FURO JORNALISTICO [sic.]! (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id={7BC22B03-C80F-4E23-
B053-E9592FA20FA8}&id_blog=3).
Os trechos acima foram copiados do blog sem nenhuma alteração (assim como
os demais exemplos utilizados em todo trabalho). No primeiro, é possível observar uma
linguagem informal e sem erros gramaticais, em outras palavras, perceber-se um certo
cuidado do sujeito discursivo com a língua, ele não foi influenciado pelo Internetês e
mostrou-se fiel ao lugar enunciativo que ocupa profissionalmente, professor.
No segundo exemplo, verificamos uma linguagem informal acompanhada de
erros de acentuação (conforme a norma padrão culta da Língua Portuguesa), da falta de
espaçamento entre algumas palavras e de marcas textuais da oralidade. Os erros de
acentuação, ou melhor, a ausência de alguns desses sinais pode produzir três efeitos de
sentido: distração, descaso com a língua e falta de conhecimento lingüístico. Descartamos as
duas últimas hipóteses porque tal prática ocorre somente no fim do comentário, o que nos leva
a perceber que o escrileitor se distraiu ou não se preocupou em rever seu texto. O uso da letra
64
maiúscula e do ponto de exclamação, ambos em excesso (essas são as marcas da oralidade),
produz o efeito de sentido de que o enunciador tenta enfatizar certas palavras, expressões e
frases. Tal uso é comum no meio digital, podendo representar uma tentativa de simular o real
dentro do virtual, de aproximá-los.
No Verbo Solto, o sujeito blogueiro ainda faz uso de práticas que merecem
apreço. Ele mantém um aviso esclarecendo que seleciona os comentários antes de publicá-los
no weblog: “Os comentários serão selecionados para publicação. Serão desconsideradas as
mensagens ofensivas, anônimas, que contenham termos de baixo calão, incitem à violência e
aquelas cujos autores o possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos” (WEIS,
2007)
59
.
Esse recado supracitado aparece, em negrito, após cada texto publicado por
Weis, logo acima do ícone ‘comentar’ e esclarece quais mensagens não são aceitas nessa
cibermídia sob análise.
A localização desse aviso e seu realce por causa do negrito colaboram para que
todos os leitores que tenham a intenção de comentar o texto do bloguer leiam antes o recado e
fiquem cientes de que suas mensagens poderão ser barradas.
Ancorando-nos em Foucault (1996, p. 9) no que diz respeito à ordem
discursiva, atentamos que esse aviso funciona como mais uma tentativa de dominar a
proliferação dos discursos, ou seja, o sujeito utiliza-se de um princípio de exclusão
denominado interdição. Esse princípio foucaultiano determina “que não se tem o direito de
dizer tudo”, pois algumas palavras são proibidas. Nesse caso, as palavras proibidas são
determinadas e interditadas pelo blogueiro.
Refletindo acerca desse mecanismo utilizado pelo responsável do weblog,
levantamos a possibilidade de que sua utilização tenha ocorrido pelo fato de Weis não querer
que sua cibermídia caia na vulgaridade ou apóie-se em afirmações levianas. Provavelmente, o
blogueiro anseia por comentários respeitosos e éticos, entretanto acreditar que esse seja o
único efeito de sentido desejado por Weis seria ingenuidade.
Indubitavelmente, ele busca por meio da prática usada produzir um efeito de
credibilidade em seu leitor, foco maior de seu trabalho. Em outras palavras, ele almeja
60
que o
usuário de seu blog acredite na seriedade do suporte.
59
Ver site: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&id={671EB2D2-A594-465C-
881E-748E8B8506CD}&data=200709.
60
Ver nota 55.
65
Ainda a respeito da mesma prática, gostaríamos de expor que ela é utilizada
somente neste blog dentro do OI, fazendo-nos pensar que o responsável pelo Verbo Solto
coloca-se no lugar de dono dele, capaz de controlar os discursos que ali circulam e circularão
e seus efeitos de sentido. Considerando a AD e a teoria dos dois esquecimentos de Pêcheux
(1997a), verificamos que esse sujeito discursivo (assim como todos os sujeitos discursivos)
tem a ilusão de que controla o seu dizer, como se os sentidos se constituíssem nele, todavia
esquece-se de que as palavras não são suas e de que os sentidos são determinados não por sua
vontade, mas pelo modo como se inscrevem na língua e na história. Assim, apenas parte do
dizível é acessível ao sujeito, uma vez que até mesmo o que ele não diz significa em suas
palavras.
Não poderíamos deixar de comentar acerca dos títulos que Weis a suas
publicações virtuais, que à semelhança das manchetes dos jornais impressos são
insinuadores e chamativos, despertando curiosidade no leitor. Eis alguns exemplos: “O ‘trem
da alegria’ visto de dois lados” (15/8/2007)
,
Catando pêlo em ovo” (14/8/2007), “Mais
versões no ringue e um leitão no fim” (9/8/2007)
61
.
Carregados de implícitos, esses títulos são compreendidos após uma leitura
completa dos textos que os seguem. Muitas vezes sarcásticos e irônicos, representam o
ponto de vista do blogueiro.
Talvez pudéssemos afirmar que o modo como Weis elabora o título de suas
postagens produz um efeito de sentido em seus leitores: o de despertar a curiosidade e a
vontade de ler o texto.
Outra prática relevante a ser discutida é a forma como Weis interage com seus
leitores. Raramente ele responde aos comentários deixados no blog, quando o faz é porque se
sentiu incompreendido e não quando alguém o interroga. Em outras palavras, ele não
responde aos comentários, mas sim os comenta de forma arrogante, não conferindo ao leitor o
direito de compreender o texto postado conforme sua história de leitura. Constatamos ainda
que, por vezes, o retorno aos comentários dos internautas vem assinado pelo Observatório da
Imprensa e não pelo bloguer
62
. Considerando que o blog constitui um espaço que está sob a
responsabilidade de Weis, é coerente concluir que, embora a assinatura não seja dele, tudo
que é postado nessa cibermídia passa por sua supervisão e é endossado por ele. Dessa forma,
61
Ver site: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&id={90401A5D-7404-4F40-
B8A1-29366628F610}&data=200708.
62
Ver exemplo na página 56-57.
66
fica claro que o blogueiro é atravessado pelo discurso do OI, visto que ele (o bloguer) o
endossa e o reproduz.
Vejamos, agora, alguns exemplos de comentários assinados por Weis:
O leitor não sabe o que diz ou não leu o que escrevi. Que "cega devoção" teria eu
pelo que no meu texto chamo de ditadura? Haja! (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=05&mes=8
&ano=2007).
A bem da verdade: não é sobre o que leitor escreveu que eu refleti na nota, mas
sobre a qualidade da carta de um leitor de um jornal americano (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=05&mes=8&
ano=2007.
A partir das amostras colocadas, torna-se possível aferir que o sujeito
jornalista-blogueiro é quem escolhe a mídia a ser criticada, se é um jornal ou uma revista, por
exemplo. Ele não se considera como uma mídia passível de crítica e condena aquelas que a
ele são dirigidas, agindo de forma prepotente e colocando-se acima das outras mídias.
Verificamos que o blogueiro tem uma atitude paradoxal em relação à leitura,
ou seja, quando ele é o sujeito da leitura, ler significa produzir sentidos, desvendar as
virtualidades significantes do texto, compreender o interdiscurso; todavia, quando ele é o
sujeito a ser lido, ler significa encontrar o sentido desejado pelo autor do texto, com toda a
imediatez e transparência, sem resistência nem desvio.
Embora o jornalista não barre os comentários com os quais não concorda, ele
os recrimina e os julga como inapropriados. Mais uma vez, o blogueiro assume a posse do
blog e tenta controlar os discursos ali produzidos.
Após termos apresentado e refletido acerca das práticas discursivas observadas
no weblog Verbo Solto, gostaríamos de retomá-las com o intento de discutir sobre a
constituição do sujeito jornalista.
Assim como destacamos no início desta pesquisa, deve-se tentar buscar
compreender o sujeito por meio de suas práticas a fim de se poder analisar ‘quem fala’, ‘o
lugar da fala’ e ‘a posição do sujeito’ (FOUCAULT, 2007).
Dessa forma, percebemos que o sujeito analisado, motivado pela vontade de
verdade e impregnado por uma logofobia do discurso, tenta, a todo instante, fazer-se crer por
meio de suas práticas discursivas, ou melhor, por meio da posição discursiva que enuncia e da
tentativa de controlar os discursos que circulam no seu blog.
67
Conforme já foi citado anteriormente (FOUCAULT, 1997), é a partir das
atitudes, das reflexões, das condutas, das escolhas, enfim das práticas do sujeito que se
descobre como ele fixou sua identidade. Sendo assim, podemos concluir que o sujeito
blogueiro Weis fixa sua identidade como um sujeito detentor de saber e de poder, que ocupa
um lugar discursivo almejado por qualquer profissional do jornalismo, qual seja: de um
indivíduo formado, ligado à academia e à pesquisa, qualificado e reconhecido dentro do
mercado de trabalho; de um excelente profissional, congratulado pela sociedade e pelo
próprio mercado. Ao mesmo tempo, percebemos um sujeito fragmentado e heterogêneo que
espera de seus interlocutores o reconhecimento e o respeito em relação a seus títulos e
posições alcançadas. Quando isso não ocorre, mostra-se como rebelde, irônico e prepotente,
demonstrando, assim, sua insegurança.
Ainda podemos destacar a incompletude desse sujeito blogueiro que opta por
um suporte no qual possa receber o retorno e o reconhecimento de seus leitores. Sob esse viés,
é possível compreender o blog como uma técnica de si, como a forma encontrada para se
adquirir a verdade e o domínio de si. Segundo Foucault (1997), o cuidado de si funciona
como condição indispensável para se alcançar a verdade sobre si.
Ao analisar o blog, verificamos sua semelhança à antiga técnica de si
denominada hypomnemata, descrita pelo filósofo (2006a) como uma memória material do que
foi lido, ouvido ou pensado e que deve ser relida e meditada posteriormente, colaborando para
a subjetivação do discurso. Em outras palavras, é possível afirmar que esse escrito contribui
para a constituição da identidade do ser mediante a “recoleção de coisas ditas”, ou seja,
mediante o seu próprio discurso e sua prática, e mediante o outro. Percebemos também que,
ao se endereçar ao outro, o jornalista não espera nem aceita que esse lhe retorne assumindo a
posição de mestre ou de sacerdote como acontecia na Antiguidade, ou melhor, Weis não
tolera que o outro o reprima, julgue-o ou critique-o.
Ao contrário, se compararmos os weblogs aos hypomnematas, apreendemos
que é o bloguer quem exerce a função de mestre, conforme a cultura greco-romana, ou de
sacerdote, consoante o cristianismo, uma vez que ele administra conflitos – sejam eles sociais,
políticos ou de um ‘eu’ discursivo –, julga e reativa regras de conduta.
Desta vez blogues [sic.] e jornais fizeram a lição de casa, não se limitando ao "ora,
onde se viu", depois que o presidente Lula disse na reunião do seu conselho
politico [sic.], na quinta-feira, que esteve tão desinformado da crise aérea quanto
uma pessoa com câncer que, ao descobrir que tem um tumor, a metástase já tomou
conta do seu organismo.
68
Lula foi ainda mais específico: disse que os problemas do sistema de aviação civil
não foram debatidos em nenhuma das cinco campanhas presidenciais de que
participou.
Alguém poderia objetar que, na quinta campanha, ele era já presidente da República
fazia mais de três anos, mas isso deixou de ser o principal depois da revelação que
começou a circular ontem na blogosfera e está nos jornais de hoje, com o merecido
destaque (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=04&mes=8
&ano=2007).
Comentário do Autor
A jornalista citada era já editora da coluna Painel quando fez a entrevista que
desencadeou a crise do mensalão. E não evidência de que ela "serve" a este ou
aquele grupo. Repito pela enésima vez: todos temos direitos às próprias opiniões,
mas não a fatos próprios (WEIS, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=29&mes=8
&ano=2007).
No primeiro exemplo, examinamos que Weis procura administrar um conflito
de ordem política. Ao pensarmos o blog com uma técnica de si, percebemos que ele (o
bloguer) assume a posição discursiva de mestre, coloca-se contrário à atitude do atual
presidente e tenta orientar e direcionar a leitura de seu discípulo-leitor conforme a sua leitura.
De acordo com o discurso instituído e conforme as palavras utilizadas, é possível acrescentar
que o blogueiro fez a ‘lição de casa’ ao criticar a fala do presidente Lula, assim como os
demais bloguers e jornais referidos no texto.
no segundo recorte, observamos que o conflito administrado é da ordem do
‘eu’ discursivo, ou seja, do leitor-discípulo. Mais uma vez a verdade sobre o sujeito blogueiro
é depreendida, qual seja: de advogado ou defensor da mídia. Verificamos que o sujeito
responsável pelo suporte cibermidiático revela uma identidade contraditória, posto que a nota-
resposta, ao mesmo em que proclama o respeito à opinião de outrem, não a respeita. Na
réplica acima, constatamos que o bloguer se dirige a seu leitor como se ele fosse um discípulo
para o qual sugere regras de conduta, assim como os sacerdotes e mestres da Antiguidade.
Embora tenhamos mencionado algumas vezes questões acerca dos leitores
do Verbo Solto, ainda não nos dedicamos a compreendê-los e analisá-los especificamente
como fizemos com o responsável pelo weblog em questão. Dessa forma, teceremos alguns
parágrafos a respeito da leitura e dos leitores desse suporte, analisando, assim, suas práticas e
considerando que elas variam dentro da história (CHARTIER, 2001).
Percebemos no Verbo Solto uma variação entre os comentários, nos quais ora o
leitor instaura um discurso parafrástico que, segundo Orlandi (2006), é decorrente de um
69
discurso autoritário –, ora ele instaura um discurso polêmico – que, consoante a mesma
autora, origina-se de um discurso também polêmico
63
.
Marco Antônio Leite, TPA (SCS/SP) Enviado em 23/9/2007 às 12:37:31 PM
Não é a imprensa que é contra ou persegue o governo Lulla [sic.], é o Lulla [sic.]
que dá motivo e, também, é contra a imprensa nacional. A imprensa livre sempre vai
estar procurando pelo em ovo, mas no caso desse governo imprensa achou um
verdadeiro matagal, no qual saiu todos os tipos de malandros, marginais e corruptos.
Esses anos de governo Lulla [sic.] nada foi feito de concreto para reverter o quadro
de desemprego generalizado, povo cada vez mais doente, aumentou espantosamente
o número de sem-casa, sem-terra, bem como os sem-nada na vida. Na realidade o
senhor Lulla [sic.] vem governando para a escol atual, não vemos banqueiros,
empresários nacional/internacional reclamando de algo de errado que esse governo
tenha feito contra os seus interesses. Ainda existe [sic.] pessoas que se ilude [sic.]
com às [sic.] bolsas esmolas que ele distribui, às quais são financiadas com o
dinheiro daqueles que contribuem com o fisco. Esses são alguns motivos que o Lulla
[sic.] tem dado para que a imprensa faça criticas [sic.] contundentes (Weis, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=21&mes=9
&ano=2007).
No exemplo acima, observamos que o leitor reproduz o discurso do blogueiro
ao afirmar que a imprensa nacional critica Lula porque ele motivos, negando, assim,
uma possível perseguição política ou partidária. Dentre os quarenta e cinco comentários feitos
a partir do post “Lula louva a imprensa a estrangeira”, apenas o citado acima é totalmente
conivente com o discurso de Weis. Destacamos, ainda, que esse foi um dos últimos
comentários postados, o que possibilita pensar que seu responsável tenha lido todos os demais
recados antes de enviar o seu ao blog. Tal fato nos leva a concluir que não se trata de uma
leitura ingênua, cujo responsável é um cidadão desinformado; percebemos que o leitor assume
uma posição de sujeito defensor da imprensa nacional assim como Weis em seu post.
Notamos, ainda, que o internauta em questão assume uma outra posição discursiva, ele é
contrário às práticas do atual presidente. Basta observar as recorrentes críticas feitas a Lula e a
forma como o leitor-comentarista se refere ao presidente: ‘Lulla’, em analogia ao presidente
Collor. Tal nomeação traz à tona todos os acontecimentos referentes ao período em que Collor
foi o presidente do Brasil, como o esquema de corrupção, a cobrança de propina e o
impeachment. Dessa forma, é possível dizer que o leitor relaciona tais acontecimentos ao
governo de Lula, talvez até mesmo pensando na possibilidade do um impeachment.
Além desse discurso parafrástico exemplificado, verificamos discursos
polissêmicos a partir do mesmo assunto abordado pelo blogueiro, os quais ocorreram com
maior incidência.
63
Ver nota 23.
70
EDUARDO PEIXOTO ARAUJO Peixoto, Advogado (São Luís/MA) Enviado
em 22/9/2007 às 12:23:38 PM
Não sou fã do Lula e acho que tanto ele quanto o PT, frustraram muitos seguimentos
da sociedade, sobretudo do quando se fala em políticas sociais sérias. Contudo, é
perceptível que existe nessa "imprensa" brasileira uma má-fé escancarada quando o
assunto é governo federal e suas politicas [sic.], tal se dá, pela falta de sintonia que
essa gente tem com o Brasil e as escolhas do seu povo (boas ou ruins). Esclareço,
que muito tempo essa "imprensa" não é mais vista como imparcial e informativa,
pois está reduzia uma mídia partidária de uma "voz só", que sabe zombar da
inteligência do povo brasileiro (Weis, 2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=21&mes=9
&ano=2007.
Alexandra Garcia, psicologa (São Paulo/SP) Enviado em 22/9/2007 às 4:28:09
PM
O presidente espelhou a realidade. No que diz respeito à economia a imprensa
estrangeira tem dado mais destaques positivos do que negativos para este governo,
enquanto a imprensa nacional, está ai [sic.] a Mirian Leitão, o Bom Dia Brasil e a
CBN inteira para quem quiser constatar, preferem destacar os aspectos negativos. Se
fizessem o mesmo em relação ao governo de São Paulo, nas mãos do PSDB desde a
era Montoro, ainda lá. Mas a preferência pela critica [sic.] sistemática e
negativista contra o governo Lula é tão notória, que um cego não percebe (Weis,
2007,
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&dia=21&mes=9
&ano=2007.
Nos dois comentários supracitados, constatamos a instauração de um discurso
polêmico, que critica o discurso do sujeito blogueiro. No primeiro, o sujeito discursivo
posiciona-se contrariamente às práticas da mídia nacional e àqueles que a defendem, no caso,
Weis. Já no segundo exemplo, organiza-se um discurso de crítica à imprensa brasileira e de
defesa ao presidente Lula, ou seja, o sujeito leitor é partidário.
Diante dos dois comentários, apreendemos que o usuário da cibermídia não
acatou o discurso do blogueiro.
Conforme a AD e Chartier (1999), é perfeitamente possível um discurso dar
origem a vários outros discursos, visto que os sujeitos leitores possuem cada um a sua história
de leitura própria. Conforme Orlandi (2006), leituras previstas para um texto, as
parafrásticas, e leituras imprevistas, as polissêmicas, resultantes do contexto sócio-
histórico-ideológico em que o sujeito leitor se inscreve.
Em nossa análise relacionada ao post “Lula louva a imprensa a estrangeira”,
examinamos que houve uma inversão de papéis entre o sujeito blogueiro e seus leitores, ou
melhor, verificamos que, contrariamente à proposta do OI, Weis assume a posição de
jornalista partidário e defensor da mídia, e seus leitores virtuais, de observadores da imprensa.
Sendo assim, mais uma vez constatamos um descumprimento às normas que deveriam
orientar a blogosfera. Primeiro, quando o bloguer determina que selecionará os comentários
71
antes de editá-los no weblog, indo de encontro ao discurso difundido na comunidade
blogueira de acesso democrático à palavra e à comunicação social; e segundo, quando
defende a mídia.
Considerando o exposto, verificamos que o sujeito blogueiro constitui-se
também por meio de práticas similares às do jornalismo tradicional impresso. Não se pode
dizer que as práticas sejam coincidentes, visto que o suporte virtual possibilita uma
(re)elaboração e uma camuflagem delas; todavia, elas instauram também um discurso
autoritário, que procura dominar a proliferação dos discursos. Esse dispositivo cibermidiático,
ou seja, o Verbo Solto, apresentou como proposta ser fiel à realidade dos fatos – seja ao relatá-
los, seja ao analisá-los –, mas se mostra partidário.
Dessa forma, é possível verificar que o ethos do jornalista-blogueiro não muda
em relação ao ethos do jornalista tradicional do impresso.
Antes de explicarmos nossa afirmação, gostaríamos de definir o termo ethos,
consoante Charaudeau e Maingueneau (2006, p. 220):
Ethos - termo emprestado da retórica antiga, o ethos designa a imagem de si que o
locutor constrói em seu discurso para exercer uma
influência sobre seu alocutário.
Essa noção foi retomada em ciências da linguagem e, principalmente, em Análise de
Discurso no que se refere às modalidades verbais da apresentação de si na interação
verbal. O "ethos" faz parte, como o "logos" e o "pathos", da trilogia aristotélica dos
meios de prova. Adquire em Aristóteles um duplo sentido: por um lado designa as
virtudes morais que garantem credibilidade ao orador, tais quais a prudência, a
virtude e a benevolência; por outro, comporta uma dimensão social, na medida em
que o orador convence ao se exprimir de modo apropriado a seu caráter e a seu tipo
social. Nos dois casos trata-se da imagem de si que o orador produz em seu discurso,
e não de sua pessoa real.
Verifica-se que o ethos é voltado ao mesmo tempo para si e para o outro. Ele é
uma construção de si para que o outro adira, siga, identifique-se a este ser.
Traquina (apud OLIVEIRA, 2005) resume bem o ethos jornalístico
contemporâneo tradicional ao explicitar que o jornalismo é o próprio veículo de comunicação
para equipar os cidadãos com instrumentos vitais para o exercício dos seus direitos e a
expressão de suas preocupações. O autor, ao descrever o ethos jornalístico, esclarece a partir
de que idéia ele se constrói: como indispensável à vida dos cidadãos.
O jornalista deve construir essa imagem de si em seu discurso para exercer
influência sobre o seu leitor. Sendo assim, ele constitui-se como sujeito detentor da verdade e
do saber por meio de um discurso autoritário.
72
Voltando nossa atenção ao jornalista-blogueiro, constatamos que ele constrói
seu ethos jornalístico analogamente ao jornalista do impresso. Em outras palavras, o discurso
autoritário se faz presente nesse blog, porém ele emerge de forma discreta, mascarado pelas
práticas discursivas já analisadas.
3.2 NOS BASTIDORES DO PODER: ONIPRESENÇA E ONIPOTÊNCIA
O blog Nos bastidores do poder
64
integra o site da Folha OnLine e versa
principalmente sobre assuntos relacionados à política. Seu responsável é o jornalista Josias de
Souza que também é colunista do jornal impresso Folha de São Paulo. Esta última
informação consta na página inicial do blog ao lado de sua foto e de sua idade.
Na foto referida, Josias mostra-se sorrindo, o que produz o efeito de sentido de
alegria e descontração, conseqüentemente de uma pessoa que se encontra à vontade no lugar
que ocupa. Compreendemos essa prática discursiva como a forma encontrada pelo blogueiro
de dar boas vindas a seu público leitor, ou seja, ele, como bom anfitrião, recebe seu hóspede
virtual com um sorriso nos lábios.
Na parte superior da página do suporte, sob o nome de Josias de Souza e sob o
título do blog, encontramos uma imagem crepuscular, um tanto avermelhada e vultosa, que
representa o Palácio do Planalto de Brasília.
Fonte: http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/.
Essa imagem, aliada ao título do blog, possibilita-nos pensar que Josias fala de
um lugar que permite a ele ver tudo o que acontece no interior, nos bastidores do planalto; que
ele tem acesso ao que nós, seu público, não temos, ou seja, Josias se coloca em um lugar
privilegiado, em uma posição de sujeito onipotente e onipresente da qual vê, com clareza,
aquilo que os cidadãos comuns só vêem de forma embaçada e crepuscular, criando o efeito de
64
Ver site: http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br.
73
sentido de que no blog se encontram as informações mais secretas e censuradas. Notamos, por
conseguinte, que o blogueiro se inscreve em uma posição detentora de saber e de poder ao
mesmo tempo em que tem em suas mãos uma cibermídia que funciona como uma tecnologia
de si.
O blog possui uma página inicial, contendo todas as notícias postadas, que se
subdivide de acordo com o modo com que Josias classifica seus textos. Essa subdivisão
compreende colunas, reportagens, entrevistas e secos e molhados. Também é importante
acrescentar que existe uma seção denominada regras’
(ANEXO 4), espaço onde fica claro
que os comentários dos leitores são moderados antes de serem editados na página do weblog.
Essas regras determinam que não são aceitos os comentários que transgridem qualquer lei
vigente no país, que podem ser interpretados como preconceituosos, caluniosos ou grosseiros,
que têm cunho comercial, que caracterizam prática de spam, que são anônimos ou que estão
fora do contexto do blog. Ou seja, várias são as formas de proibir a edição de um comentário
no weblog, o que não significa que esses comentários não sejam feitos, eles apenas não são
divulgados.
Sabemos que, de certa forma, o mesmo ocorre no meio impresso com as cartas
do leitor, porém de forma mais rigorosa em razão do problema do espaço físico do jornal
impresso. Tal ocorrência acarreta uma aproximação entre o jornalista tradicional e o
jornalista-blogueiro, levando-nos a desconfiar da presença de um “novo” velho jornalista, em
outras palavras, o suporte mudou, mas a prática discursiva em questão permaneceu
camuflada. O discurso autoritário que procura sempre controlar a polissemia discursiva é
ainda forte nessa cibermídia em análise.
Com base em Foucault (1996), percebemos ser possível pensar essas ‘regras’
do blog como um mecanismo de controle do discurso de rarefação, ou seja, como um
procedimento que restringe os sujeitos que falam e determina que nem todas as regiões do
discurso são penetráveis. Dentre os sistemas de restrição formulados por Foucault (1996, p.
39), destacamos o ‘ritual’ para classificarmos essa seção do blog de Josias, visto que ele
“determina para os sujeitos que falam, ao mesmo tempo, propriedades singulares e papéis
preestabelecidos”.
Ao utilizar-se desse mecanismo de controle, o blogueiro impede que vários
comentários sejam lidos e divulgados na rede, ao mesmo tempo em que tenta barrar as
diversas possibilidades de leitura do seu texto. Em outras palavras, o jornalista, atravessado
74
pelo esquecimento número dois
65
de Pêcheux (1997a), busca por meio de um procedimento de
rarefação que os sentidos do seu discurso sejam mantidos e que certos discursos permaneçam
impenetráveis.
É possível interpretar essas regras para os comentários como uma brecha, uma
pista deixada pelo blogueiro de uma tentativa de manter a circulação dos mesmos discursos
dentro do seu suporte, o que denuncia a ilusão de liberdade dentro da Internet, tanto do leitor
quanto do bloguer.
Podemos falar em “liberdade” discursiva do leitor apenas em relação à forma
como o texto digital é apresentado, ou seja, a escolha do vocabulário, da linguagem e da
ordem estética. Nos exemplos abaixo, essas observações tornam-se mais visíveis:
[Marvado Bento] [Duque de Caxias / RJ]
ALELUIA, ALELUIA! O STF acordou! Agora a coisa vai! Será que vai mesmo? Se
os tribunais de estâncias superiores e das demais, se o povo e os políticos decentes
que nos restaram (entre estes, Jefferson Péres [sic.], Eduardo Suplicy, Pedro Simon,
Luciana Genro, Fernando Gabeira e alguns poucos outros) se unirem objetivando
reduzir a, apenas, 50% a corrupção no atual governo, certamente o Brasil vai
alavancar sua economia, para se tornar uma das mais punjantes da América Latrina
[sic.], deixando na rabeira, bem na rabeira, o nosso concorrente mais próximo: o
Haiti. Vamos gente! Basta reduzir a corrupção a 50% do que é atualmente, para
ficar bom demais! 22/06/2007 16:11 (SOUZA, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
[preludio] [taubaté,sp,brasil]
...zé [sic.] genuino [sic.] na chefia do pt [sic.] é como a rainha da inglaterra [sic.],
reina mas não governa...lembram???...quando o negócio ficou feio culpou o delubio
[sic.] e caiu fora...e pensar que concorreu a ser governador de spaulo
[sic.]...BARBARIDADE!!!! 22/06/2007 10:07 (SOUZA, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
Nos dois comentários colocados constatamos o uso da linguagem informal, da
letra minúscula em alguns substantivos próprios e uma tentativa de aproximar o texto escrito
da fala. A terceira constatação justifica-se pelo uso das maiúsculas em alguns vocábulos, que
produz o efeito de sentido de realce ou de grito, e pelo excesso de pontuação. Percebemos,
então, uma “liberdade” de estilo, de vocabulário e de linguagem, liberdade essa que é barrada
quando infringe qualquer uma das regras do suporte virtual em relação ao conteúdo, ou seja,
em relação à produção de efeito de sentidos do que foi dito.
O weblog Nos bastidores do poder funciona como um complemento das
notícias do jornal impresso Folha de São Paulo. Nesse espaço, Josias analisa as notícias
65
Este esquecimento cria a ilusão de que o pensamento tem uma relação direta com a linguagem e o mundo.
75
advindas da Folha sob o seu ponto de vista, mas, considerando que o responsável pelo blog
trabalha para a Folha, é pertinente afirmar que ele reproduz o discurso do jornal, que é sua
ordem discursiva primeira.
O conceito de formação discursiva da AD é fundamental para a compreensão
da colocação acima, pois é pela referência à formação discursiva que podemos apreender os
diferentes sentidos das palavras. Vale ainda lembrar que esses sentidos mudam conforme a
posição ocupada por aqueles que enunciam. Em outras palavras, os sujeitos se constituem pela
interpelação que ocorre porque estão inscritos em uma formação discursiva, a qual determina
o que pode e deve ser dito.
Sendo assim, a formação discursiva do jornal é condição para a constituição do
sujeito Josias e dos sentidos de seus textos, visto que ele ocupa, no caso do weblog, a posição
de blogueiro da Folha Online e ela está vinculada ao jornal impresso.
Os textos do blog são constantemente entrecortados por links que dão acesso,
na maioria das vezes, a reportagens da Folha:
Para os governistas, as explicações de Renan acomodam uma pedra sobre as
acusações que o assediam. (Josias, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-11-18_2007-11-24.html).
Nesta segunda-feira (28), antes que se soubesse que Renan mencionara o nome de
Dilma em diálogo com o funcionário da Caixa, a chefe da Casa Civil desmereceu o
conteúdo de um outro grampo que compõe o inquérito. (Josias, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-11-18_2007-11-24.html).
Por meio desses links, que funcionam como mecanismos de controle do
discurso, Josias parece tentar controlar os efeitos de sentido produzidos por seus textos.
Segundo Foucault (1996), esse procedimento exterior da ordem do discurso é denominado
vontade de verdade e coloca em jogo o poder. Para o filósofo, essa vontade de verdade que
atravessou tantos séculos da história, desde os poetas gregos do século VI, apoiada em um
suporte institucional, tende a exercer sobre os outros discursos uma pressão, um poder de
coerção.
Assim, o blogueiro delimita o seu discurso, ou seja, os efeitos de sentido do seu
discurso, ao mesmo tempo em que confere a ele um poder ao apoiar-se, na maior parte das
vezes, na instituição Folha de São Paulo.
Notamos, dessa forma, que o responsável pelo blog não é um sujeito
individual, mas um sujeito apreendido em um espaço coletivo, cuja posição é constitutiva do
76
seu dizer. Logo, a voz desse sujeito blogueiro revela um lugar social e expressa outras vozes
que integram essa realidade sócio-histórico-ideológica. Temos um sujeito que se constitui por
meio do discurso do outro, que busca sua identidade a partir de vozes outras. Nesse caso, não
apenas a partir da Folha, mas também a partir do leitor digital que deixa ali no blog os seus
comentários.
O blogueiro-jornalista constrói seu espaço organizada e diariamente, com
textos subjetivos e parciais. Muitas vezes, o caráter informativo da notícia se perde,
considerando a notícia como o “relato de uma informação” (LUSTOSA, 1996). É importante
destacar que Josias, no início de cada matéria, faz uso ou de uma foto ou de uma caricatura ou
de qualquer outra figura escolhida por ele. Essas imagens, que ora servem para ilustrar a
notícia, ora servem para ironizá-la ou criticá-la, demonstram, ao lado dos textos, a posição
assumida pelo jornalista-blogueiro que gira em torno da tônica da informalidade e da
subjetividade.
Ao contrário de Weis que não utiliza imagens e outras linguagens como a de
vídeo, por exemplo, Josias explora ao máximo os sons, as figuras e a escrita, logo seu blog
constitui-se em um grande hipertexto sincrético. Tudo isso corrobora para deixar o espaço do
weblog o mais próximo possível da realidade cotidiana. Assim, o jornalista pode explorar
grande parte dos órgãos sensoriais simultaneamente, ajudando a dispersar e a ressaltar o
conteúdo que desejado.
No Congresso, a 'polêmica' consola a 'encrenca'
Lula Marques/Folha
Deu-se na tarde desta quarta-feira (30). O deputado Clodovil “polêmica” Hernandez
(PTC-SP) fez questão de cruzar os salões que separam a mara do Senado, para
prestar solidariedade ao senador Renan “encrenca” Calheiros. Cochicharam longe
dos jornalistas. Não se sabe o que um segredou ao outro. Suspeita-se que Clodovil
tenha dito algo assim: "Meu bem, eu avisei. As mulheres ficaram muito vulgares.
Trabalham deitadas e descansam em pé" (SOUZA, 2007,
http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br
).
77
Senado aprova (!!) auto-reajuste dos congressistas
Os senadores aprovaram na tarde desta quarta-feira (30) o aumento de seus próprios
salários em 28,5%. A engorda de contracheques já havia sido referendada pela
Câmara (SOUZA, 2007, http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br).
No primeiro recorte, percebemos, no título da notícia, o tom irônico e cínico
de Josias ao se referir ao deputado Clodovil e ao senador Renan Calheiros por meio dos
vocábulos ‘polêmica’ e ‘encrenca’, respectivamente. A partir do título, constatamos ainda que
o bloguer revela o lugar discursivo de que fala, ou seja, ele não concorda com as atitudes
dos políticos em destaque. Em relação à foto colocada, verificamos que ela tanto ilustra o fato
como serve para chamar a atenção do leitor e atrai-lo, pois, na época em que o blogueiro
postou o exemplo, falava-se muito a respeito de ambos os políticos na mídia, ou melhor,
criticava-se.
no segundo exemplo, é notável que Josias não utilizou uma fotografia como
estratégia discursiva para atrair o seu leitor, mas a figura de um homem com uma grande nota
de dinheiro em uma das mãos. Ao lermos o título e o texto que o segue, podemos
compreender que tal homem representa os congressistas que, na ocasião, tiveram uma
‘engorda’ salarial. É possível dizer que Josias, por meio de uma estratégia discursiva
metafórica, ilustra uma situação real e produz o efeito de sentido da veracidade da corrupção
política, do governar para o bem próprio (nos caso dos congressistas) e do desperdício de
dinheiro dos cofres públicos. Ainda com relação à figura do segundo trecho, gostaríamos de
corroborar que, em virtude de ela ter sido usada metaforicamente, ela pode suscitar uma maior
variedade de sentidos, visto que ela não ilustra um político ou pessoa determinada como a
fotografia.
Os exemplos acima ainda confirmam que o responsável pelo blog não se pauta
pela objetividade e neutralidade da notícia, pois, até na escolha das imagens que acompanham
as notícias, percebemos a subjetividade do blogueiro.
Nessa “nova” mídia digital, o sujeito jornalista se afasta dos rigores formais do
impresso e conquista a sensação de que é dono do seu discurso, sem perceber que é
interpelado pela instituição para a qual trabalha. De certa forma, podemos dizer que esse
78
“novo” veículo de informação e conhecimento amplia a sensação de liberdade tão desejada na
pós-modernidade e aproxima o jornalista-blogueiro de seu leitor.
Ao refletirmos acerca dessa suposta aproximação entre jornalista e leitor na
rede, examinamos que ela ocorre não apenas em função da informalidade e da subjetividade,
referidas, e do sorriso de boas vindas dirigido a seu leitor virtual, mas também em função
do caráter dialógico dos textos do bloguer.
O repórter seria mal educado com o leitor que professa dogmaticamente a fé católica
se não iniciasse o artigo com um aviso: interrompa imediatamente a leitura. Feito o
alerta, vai um esclarecimento aos que continuam com o olho pregado no texto: o que
se pretende aqui é fazer uma defesa de Deus, contra a pregação moralista do papa,
seu pretenso representante nesta Terra de tantos diabos (SOUZA, 2007,
http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br).
Constatamos, no início do recorte, que o blogueiro instaura uma conversa
com seu leitor, alertando-o sobre o conteúdo da notícia e sobre uma possível necessidade de
interrupção da leitura. É plausível entender esse aviso deixado pelo bloguer como uma
tentativa de aproximação do seu leitor virtual, em outras palavras, esse é o efeito de sentido
que tal recado produz. Gostaríamos de destacar a importância desse clima de conversa dentro
da blogosfera, pois o sucesso de um blog depende de sua audiência, ou seja, do retorno dos
leitores.
Repetidas vezes mencionamos que Josias inscreve-se a si mesmo em uma
posição de poder: na maneira como nomeia e representa o seu blog, na moderação dos
comentários e no uso dos links. Considerando essa observação, gostaríamos de refletir um
pouco acerca das relações de poder que ocorrem no blog, a respeito das quais Foucault (2004,
p. 284) afirma acreditar que “não pode haver sociedade sem relações de poder, se elas forem
entendidas como estratégias através das quais os indivíduos tentam conduzir, determinar a
conduta dos outros
”.
Observamos, dessa forma, que Josias, na tentativa de agir sobre os outros (os
leitores virtuais), utiliza-se de práticas de controle do discurso, como a seleção dos
comentários e a utilização dos links na busca de delimitar a produção dos sentidos, que
almejam uma ordem discursiva. Ao mesmo tempo, ele se coloca em uma posição privilegiada
que detém um saber pois se encontra nos bastidores da política do país e sabe de tudo que
acontece nesse meio –, e um poder (como foi descrito acima).
A respeito das relações de poder, Foucault (1979) acrescenta que elas abrem
brechas para a resistência, uma vez que não compreende os indivíduos como autômatos que
79
aceitam passivamente todas as determinações do poder; assim, onde há poder, resistência e
embate. O filósofo também considera que o indivíduo se transforma em sujeito a partir de
uma forma de poder ou de uma forma de resistência, ou seja, para Foucault (1979), é por meio
das lutas pelo poder que os sujeitos se constituem, os sujeitos lutam porque buscam uma
identidade.
Diante do exposto no parágrafo acima, é pertinente aferirmos que os blogs
talvez possam ser compreendidos como um tipo de resistência a uma ordem discursiva
estabelecida, por exemplo, a do jornalismo tradicional impresso.
Os blogs jornalísticos propõem estabelecer uma ordem do discurso mais
democrática em que a liberdade de expressão é de grande importância. Porém, mergulhados
nessa ilusória áurea, cercam-se de práticas que delimitam tanto a escrita quanto a leitura.
Tendo demonstrado a forma por meio da qual a escrita é controlada na
blogosfera, gostaríamos de observar o que ocorre do outro lado, ou seja, como o leitor virtual
compreende as práticas discursivas do bloguer, se ele (o leitor) percebe essa tentativa de
controle dos discursos no weblog em questão. Em outras palavras, pretendemos examinar as
práticas de leitura Nos bastidores do poder.
Constatamos em nossas análises que três práticas de leitura aparecem com
maior freqüência no blog de Josias: a parafrástica, a de partilha de informação e a polêmica.
Na primeira, o leitor apenas retoma, ou seja, repete o que foi dito pelo blogueiro; na segunda,
o usuário desse dispositivo cibermidático acrescenta mais informação ao que foi
informado; na terceira e última prática, o leitor polemiza o discurso instaurado por Josias.
Averiguamos que a primeira prática mencionada, a parafrástica, ocorre com
maior incidência e revela que o leitor, além de concordar com o blogueiro, não consegue
ponderar que a notícia lida representa somente uma leitura dos fatos feita pelo jornalista e não
uma verdade absoluta e incontestável. O leitor constrói a sua leitura a partir da leitura feita
pelo responsável do blog, como se tivesse encontrado o sentido desejado pelo autor do texto.
Assim, tal ato torna-se pura decodificação e reprodução do sentido.
Todavia, segundo Chartier (2001, p. 78), o ato de ler não se resume ao que foi
colocado. Para o historiador, é preciso:
[...] dar à leitura o estatuto de uma prática criadora, inventiva, produtora, e não
anulá-la no texto lido, como se o sentido desejado por seu autor devesse inscrever-se
com toda a imediatez e transparência, sem resistência nem desvio, no espírito de
seus leitores. Em seguida, pensar que os atos de leitura que dão aos textos
significações
plurais e veis, situam-se no encontro de maneiras de ler, coletivas
80
ou individuais, herdadas ou inovadoras, íntimas ou públicas e de protocolos de
leitura depositados no objeto lido, não somente pelo autor que indica a justa
compreensão de seu texto, mas também pelo impressor que compõe as formas
tipográficas, seja com um objetivo explícito, seja inconscientemente, em
conformidade com os hábitos de seu tempo.
Apesar de no objeto de análise autor e impressor coincidirem, percebemos, à
luz de Chartier (2001), que, para compreender um texto, é preciso ir além, é preciso
mergulhar na sua materialidade a fim de produzir leituras. Assim como a teoria da AD,
Chartier (2001) não acredita na transparência e imanência do sentido.
Com o intento de ilustrar essa prática de leitura observada no blog,
selecionamos os seguintes exemplos:
[ARMANDO TEIXEIRA] [nt] [Juiz de Fora/MG/Brasil]
Pelos comentários observamos que a maioria das pessoa [sic.] bem informadas
desejam uma limpeza geral nos políticos, porém, pela pesquisa verifica-se que cada
vez mais El Rei D. Lulla I e único continua imbatível. A política de nomeações e o
assistencialismo continua [sic.] forte [sic.] no país. A maioria dos brasileiros querem
moleza e são pessimamente informados. Poucos tem [sic.] acesso aos blogs e bons
jornais. A corrupção e os desmandos campeia [sic.] livremente e a justiça não pune
ninguém. resolvi em[sic.] não votar em nenhum candidato. De agora em diante
vou anular meu voto. Esse bando não ganha mais emprego com meu voto. E para
culminar estou lançando VAVÁ 2010. o LAMBARI NA PRESIDÊNCIA. É PRA
ESCULHAMBAR DE VEZ COM ESSE PAÍS.24/06/2007 09:54 (SOUZA, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
[Osvaldo] [Sorocaba -SP]
Caro Josias,muito [sic.] bom o seu artigo a despeito do que aconteceu no verão
passado...por tudo isso os senadores nao [sic.] querem perder nada pois sabem que o
Renan fez saber aos seus pares que sabe o que eles fizeram no verão
passado.24/06/2007 18:38 (SOUZA, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
[Benhur Antonio Bacega] [Foz do Iguaçu PR BR]
Josias. A contundência do teu texto pode parecer agressiva e desrespeitosa para com
o Senado. Mas, não o é, ela se torna até suave, em face dos absurdos que m
ocorrendo por lá. Veja, pois, aonde chegamos! Estamos no ponto em que tudo o que
é dito contra esse Poder é válido. Pelo menos o setor de que fazes parte, a Imprensa,
ainda mantém a trincheira ativa, pois o povo brasileiro... Cordialmente.24/06/2007
12:39 (SOUZA, 2007, http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-
17_2007-06-23.html).
Os comentários citados, que são elogios a Josias, apenas reproduzem o que o
blogueiro havia dito, não acrescentando nenhuma “nova” significação aos discursos
presentes. Verificamos, na escrita desses comentários, marcas de um discurso parafrástico,
reprodutor das mesmas formações discursivas do blogueiro jornalista.
No primeiro exemplo, o leitor chega a classificar os blogs como uma boa fonte
de informação, endossando a credibilidade deles.
81
A partir desse gesto de leitura, observamos que esse leitor específico
compreende o blogueiro-jornalista como um sujeito detentor da verdade, do saber e do poder,
sem perceber que Josias constrói mecanismos que buscam controlar os efeitos de sentido de
seus e-textos. Entretanto, o sujeito blogueiro não é a fonte, a origem do seu discurso até
porque à luz da AD nenhum discurso é original –, mas sim um indivíduo interpelado em
sujeito por várias ideologias.
Vamos agora nos direcionar para uma outra prática de leitura observada no Nos
bastidores do poder. Como mencionamos anteriormente, leitores que também ajudam a
informar, ou seja, além de eles lerem o e-texto, acrescentam informações a ele, tornam-se,
desse modo, co-autores do blog.
[Marta manda, Mercadante goza] [SP SP BR ROBERTO]
Mantega: crise aérea é sinal de prosperidade O ministro da Fazenda, Guido
Mantega, negou, nesta quinta-feira, que haja um "caos aéreo" no Brasil. Os atrasos e
cancelamentos de vôos nos aeroportos são, segundo ele, "parte do preço do sucesso
da economia". O ministro acredita que o motivo dos atrasos é o "aumento do fluxo
de tráfego por causa da prosperidade do País". 21/06/2007 18:06 (Josias, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
Notamos, no exemplo, que o leitor constrói o seu comentário como se estivesse
produzindo uma notícia. Ele não é apenas um leitor passivo, mas é ativo e colaborativo no
sentido de tanto imprimir sua escrita como o estatuto de co-autoria deste texto. Logo,
justifica-se o nome de escrileitor para os leitores digitais, que são diferentes dos do impresso,
uma vez que eles não tinham a oportunidade de interagir ou de colaborar com o jornalista em
tempo real. Segundo Oliveira (2006), esse compartilhar de autoria é comum dentro da
blogosfera, a cada post recebido pelo blog verifica-se que o leitor é, na realidade, um
escrileitor.
Ainda a partir do comentário acima, é coerente corroborar que o leitor
compreende a blogosfera como um ambiente democrático de acesso à palavra, onde se pode
disseminar informação sem que haja necessidade de ser jornalista. Talvez seja possível
estabelecer aqui uma relação com a pesquisadora Schittine (2004), que considera a blogosfera
como um espaço onde aspirantes a jornalistas tentam se tornar conhecidos.
Neste ponto destacamos que o responsável pelo comentário assume o ethos de
jornalista. Basta observar a forma como ele constrói o seu texto informativo, em tom
autoritário e procurando ser objetivo e imparcial.
82
No entremeio desses comentários que colaboram com a informação,
encontramos formas diferentes de leitura, pois aqueles que informam com o intuito de
reafirmar o discurso do blogueiro (como o post acima) e os que informam com o objetivo
de comprometer a credibilidade do weblog (como nos exemplos abaixo).
[Marco] [São Paulo]
Está correto a afirmação do Luiz Marques, era isso mesmo. Eu com 33 anos de
aviação, + 20.000 mil horas de vôo como piloto em comando (comandante), nunca
vi uma "orquestração" tão bem feita e os anti lulas [sic.], querendo botar a culpa no
Governo. A imprensa ainda tem a Cara de Pau [sic.], mostrar um video [sic.] de um
avião cruzando com outro. Eu mostro quatro aviões simultaneamente cruzando um
fixo aeronáutico ( e não teve colisão)...piada mesmo. O acidente da GOL foi uma
fatalidade, mas a imprensa "patriota" brasileira esqueceu um acidente similiar [sic.]
que ocorreu nos us da Suiça [sic.]. (Um Aeroflot com um DHL) e ali não sobrou
nenhum avião para contar a história. Estavam sobrevoando o território suiço [sic.].
(com uma pontualidade britanica [sic.]).......e ai. [sic.]............a culpa é do Governo
LULA........Sugiro nos próximos dois anos, que comprem passagens rodoviarias
[sic.], ou então façam como a elite branca brasileira, comprem um jatinho..............é
muita bobagem mesmo. FUI. 21/06/2007 21:53 (Josias, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
[Luis Marques] [São Paulo-Capital]
Essa é a maior crise inventada e insuflada pela mídia em todos os tempos, como
nunca antes na história desse país... a pelo menos 15 anos, ou mais, desde a época da
transbrasil vou de CGH para NVT no final da tarde 1 vez por mês, e o atraso médio
deste vôo sempre foi de 2 horas, hora por excesso de trafego [sic.], hora por chuva,
hora por isso, hora por aquilo... porém nunca antes na história deste país a mídia se
preocupou, agora para fazerem pressão sobre o governo e aliviarem para a tucanada
inventaram o apagão aéreo, esse apagão dura uns 20 anos e a mídia não tinha
visto... 21/06/2007 18:19 (Josias, 2007,
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html).
Em ambos os casos (seja nos comentários que apenas informam, seja naqueles
que informam e criticam o autor do blog), compreendemos que os escrileitores têm acesso a
outros veículos de informação além do blog e constituem-se como leitores a partir de várias
fontes. Porém, no primeiro caso, percebe-se uma leitura parafrástica, sem vestígios de que o
leitor tenha notado que Josias pretende construir seu texto de forma a controlar os efeitos de
sentido por ele produzidos. no segundo exemplo, encontramos um leitor polêmico, que lê a
notícia como uma verdade questionável e que deve ser ponderada antes de ser ingerida e
digerida pelo leitor. Essa prática de leitura em questão coloca em xeque o saber e,
conseqüentemente, o poder que Josias tenta impor a seu blog. Em outras palavras, podemos
corroborar que o leitor faz a sua leitura própria dos acontecimentos, pois, ao construir um
texto não parafrástico, mas polissêmico, o leitor apresenta um contradiscurso, instaura uma
relação de forças e o discurso polêmico no espaço do blog.
83
Constatamos, que para esse leitor, o sentido não é transparente nem imanente,
assim como para Chartier (2001) e para a teoria da AD.
Não poderíamos deixar de abordar um fato que observamos no segundo
exemplo supracitado, no comentário de Luis Marques. É notável que esse leitor em questão
repete duas vezes a seguinte frase comumente proferida pelo presidente Lula em seus
pronunciamentos públicos: “nunca antes na história desse país”. Luis Marques, em seu
comentário, instaura um contradiscurso, mostrando-se favorável ao atual governo, visto que
recupera o discurso do governante Lula, e contrário ao que Josias defende.
Essa prática de leitura que ao mesmo tempo informa e polemiza refere-se à
terceira prática que mencionamos nos parágrafos acima, porém acontece de ela aparecer
apenas polemizando o e-texto do blogueiro, sem acrescentar a ele nenhuma informação.
Ainda em relação a essa prática terceira, é importante a seguinte colocação: o
escrileitor produziu sua leitura a partir de diferentes posições, ou seja, ele não apenas se
colocou como um observador dos fatos ou leitor das notícias, mas ele assumiu um outro lugar
discursivo ao analisar os fatos de uma outra perspectiva. No primeiro exemplo, sob a posição
de comandante e, no segundo, sob a posição de um passageiro de longa data. Dessa forma,
notamos a impossibilidade de caracterizar o sujeito leitor virtual como um sujeito único.
Depreendemos que ele é um sujeito disperso e fragmentado em busca de uma verdade, de um
saber a fim de que possa construir uma identidade, que, como vimos, não será única e nem
permanente, pois, conforme vimos anteriormente, as práticas de leitura mudam no decorrer da
história em função de vários motivos já citados nesse trabalho. Elas mudam porque os sujeitos
leitores mudam e “novas” identidades são construídas.
3.4 VERBO SOLTO E NOS BASTIDORES DO PODER: UM PARALELO
Antes de tecermos nossas considerações finais, gostaríamos de expor as
semelhanças e as diferenças observadas entre os dois weblogs analisados.
Verbo Solto e Nos bastidores do poder se assemelham ao selecionarem os
comentários a serem editados nos blogs. Ambos os sujeitos blogueiros demonstram uma
“logofobia” do discurso e tentam dominar a proliferação dos mesmos, todavia utilizam-se de
práticas diferentes: Weis mantém um realçado aviso informando que não acatará todos os
84
comentários; Josias, diferentemente, comunica que moderará o retorno dos leitores por meio
de uma seção de seu blog denominada ‘regras’, ou seja, os leitores descobrem que Josias
seleciona os comentários se acessarem o link da seção ‘regras’. A partir do exposto,
percebemos que o segundo bloguer camufla sua prática discursiva autoritária, produzindo a
sensação de uma maior liberdade de leitura em seu suporte.
O fato de os dois blogueiros censurarem alguns comentários por meio de
práticas díspares produz efeitos de sentido também díspares em seus leitores virtuais, em
outras palavras, acarreta diferentes práticas de leitura nos weblogs. Percebemos que os
comentários feitos no Nos bastidores do poder são, na maioria das vezes, parafrásticos, os
do Verbo Solto são mais polêmicos e polissêmicos. Talvez seja possível dizer que os leitores
se sentem incomodados ao se certificarem de que não são livres, por isso produzem um
discurso mais aguçado no blog de Weis; acuados, os leitores lançam o contradiscurso. No
suporte virtual de Josias, observamos um número menor de usuários que percebem que o
bloguer institui uma relação de poder e tenta dominar a proliferação dos sentidos nesse
ciberespaço, sendo assim, os leitores, ilusoriamente livres, reproduzem o discurso do
blogueiro com maior freqüência.
Verificamos que o controle subliminar sobre os corpos, característico do pós-
panóptico que, segundo Bauman (2001), representa a técnica de poder, de controle e de
vigilância da pós-modernidade –, não incomoda tanto os usuários da cibermídia de Josias e
ainda coopera na manutenção de um clima amigável no weblog.
Existem ainda três práticas discursivas que diferenciam os blogs analisados e
colaboram na produção de diferentes práticas de leitura: o retorno aos comentários dos
leitores, a utilização de fotos, de caricaturas ou de outras figuras nos posts e a foto colocada
por cada blogueiro no suporte.
Weis costuma responder aos comentários que recebe com maior freqüência que
Josias, aliás, o último quase nunca o faz. A esse respeito, conforme a análise, observamos que
o blogueiro do OI retorna aos comentários quando se sente incompreendido e de forma
arrogante, o que provavelmente e mais uma vez incomoda seus leitores e suscita leituras
polêmicas.
O fato de o bloguer de Nos bastidores do poder não responder a seus leitores
ocasiona um duplo efeito de sentido: de indiferença e de compreensão por parte o blogueiro.
Ambos os efeitos de sentido parecem não incomodar o leitor, contribuindo para que ele
acredite na proposta de liberdade oriunda da blogosfera e não perceba a relação de forças
85
estabelecida por Josias em seu blog. Notamos, então, que o blogueiro mascara, novamente, o
tom autoritário de seu discurso jornalístico, deixando transparecer o ethos do jornalista
tradicional do impresso.
Como foi colocado, verificamos outra distinção entre os suportes
examinados, a forma como cada bloguer compõe suas postagens. Josias assiduamente utiliza
fotos, figuras com animação ou não, caricaturas ou qualquer outro tipo de imagem na
composição de seus textos. Tais imagens ajudam na compreensão dos discursos que
perpassam os textos do blogueiro, ou seja, complementam seus textos e seus discursos; elas
ainda ilustram o suporte midiático e tornam a visita a ele mais agradável, divertida e lúdica.
Podemos dizer que Josias utiliza-se de um discurso aparentemente lúdico, repleto de cores,
ironias e cinismos que muitas vezes leva ao riso, para instituir o seu discurso autoritário e
político de forma subliminar.
Diferentemente, no Verbo Solto, não encontramos nenhum tipo de ilustração,
pois Weis produz o seu discurso apenas a partir da linguagem escrita. No entanto, isso não
significa que o blogueiro do OI não possui também um discurso autoritário. Conforme vimos
na análise, ele apenas faz uso de outras práticas discursivas, como, por exemplo, a sua
descrição profissional.
A foto utilizada pelos blogueiros representa outra desigualdade averiguada
entre eles. Considerando que, por meio dessa foto, cada um dos bloguers se constitui perante
seus leitores, podemos dizer que Josias, ao fazer uso de uma fotografia em que se mostra
sorridente e receptivo, constrói uma imagem de si mais agradável a seus usuários do que a
imagem de si construída por Weis, visto que o último faz uso de uma fotografia na qual se
mostra mais sério e observador. O responsável por Nos bastidores do poder, mais uma vez,
vale-se de uma prática discursiva que mascara o seu discurso de jornalista tradicional.
Percebemos que ambos os bloguers possuem um discurso autoritário
subliminar, todavia eles camuflam esse discurso por meios de diferentes práticas. Josias, ao
valer-se da ludicidade, institui o seu discurso autoritário de forma mais tênue e sutil, torna a
leitura de seu blog mais divertida e parafrástica e atrai mais leitores que Weis, cujas práticas
são menos discretas e instigam leituras mais polêmicas.
A partir de Foucault (2007), que argumenta que o sujeito se constitui por meio
de suas práticas discursivas, compreendemos não poder classificar o sujeito blogueiro
igualitariamente, visto que eles se constituem diferentemente.
86
Diante do paralelo exposto, foi possível observar que as práticas discursivas
divergem na blogosfera e podem influenciar e direcionar as práticas de leitura; que, assim
como não existe uma identidade homogênea e definida entre os blogueiros, não existe
também entre os leitores virtuais; que os mecanismos de controle podem ser camuflados em
maior ou menor intensidade; enfim, que a liberdade, nessa cibermídia, é produto e efeito de
sentido das práticas discursivas dos sujeitos blogueiros, ou seja, ela é ilusória.
54
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vivendo se aprende; mas o que se aprende mais é só a fazer outras
maiores perguntas.
Guimarães Rosa
88
Diferentemente do que se pensava, os weblogs não possibilitaram a emergência
de uma nova identidade para o jornalista. Na verdade, houve uma mudança no que diz
respeito à maneira como o jornalista se inscreve no texto, ao tamanho da notícia, ao uso de
figuras, à abertura que se aos leitores, ou seja, várias práticas discursivas sofreram
alterações tornando possível camuflar o discurso autoritário do jornalista-blogueiro.
Conforme trouxemos à baila em nossas análises, os bloguers Josias de Souza e
Luis Weis constituem-se por meio de práticas discursivas que revelam um sujeito detentor da
verdade, do saber e do poder, embora isso não seja tão transparente e perceptível em seus
blogs. Por meio de práticas dispares ou seja, cada qual com seu modo de moderar os
comentários recebidos, com sua maneira de se constituir perante o público, com sua forma de
responder aos comentários de seus leitores e com seu estilo de compor a notícia (usando
figuras ou não) –, ambos os blogueiros mantêm inalterado o ethos do jornalista, ou seja,
continuam construindo a imagem de que são indispensáveis à vida dos cidadãos.
Observamos ainda que nem todos os usuários dessa cibermídia conseguem
perceber o mascarado tom autoritário do jornalista-blogueiro.
No Verbo Solto pudemos verificar que o discurso autoritário emerge quando
Weis se descreve profissionalmente, confessa que censurará alguns comentários, responde aos
comentários de seus leitores e vale-se de mecanismos de controle do discurso a fim de
dominar a proliferação dos mesmos. no outro weblog apreciado, notamos o tom arrogante
do blogueiro quando ele nome à sua cibermídia, quando descobrimos a existência das
regras que regem seu ciberespaço e quando percebemos que o discurso lúdico é apenas
aparente.
Em Nos bastidores do poder constatamos, ainda, que Josias, por meio de
práticas discursivas mais sutis e discretas, alcança uma maior eficácia de seu discurso
autoritário, visto que a maior parte dos leitores não consegue percebê-lo no entremeio da
ludicidade. Consoante as práticas de leitura examinadas, ao ser mais tênue que Weis, Josias
consegue uma maior aceitabilidade de seu weblog.
Ao buscarmos compreender esse sujeito pós-moderno a partir de Foucault
(2007), ou seja, ao considerarmos que o sujeito não é algo dado, mas está em constante
construção nas práticas discursivas e em relação ao outro, percebemos que o sujeito analisado,
impulsionado pela vontade de verdade e invadido por um medo do discurso, tenta,
constantemente, fazer-se crer e dominar os sentidos de suas palavras.
89
Ainda com base em Foucault (1997), que afirma que o sujeito fixa sua
identidade a partir de suas atitudes, reflexões, condutas, escolhas, enfim de suas práticas, é
possível concluir que os sujeitos em questão fixam sua identidade como detentores de saber e
de poder. Ao mesmo tempo, percebemos sujeitos heterogêneos que buscam credibilidade a
todo instante em seu ciberespaço, demonstrando, assim, insegurança.
Destacamos também a incompletude desse sujeito pós-moderno ao eleger um
suporte em que possa receber o retorno de seus leitores. Sob esse prisma, entendemos o blog
como uma técnica de si, como a forma encontrada para se adquirir a verdade.
À semelhança da antiga técnica de si denominada hypomnemata, a
contemporânea cibermídia, ou seja, os weblogs se constroem. A relação entre o
mestre/blogueiro e seu discípulo/leitor ainda permanece após séculos, a necessidade do outro
no direcionamento da conduta e na administração dos conflitos ainda continua. Em outras
palavras, notamos que ambos os bloguers constituem sua identidade mediante o seu próprio
discurso e o outro.
O constante movimento da sociedade pós-moderna, que mais parece um caos,
não permite a muitos observar a ordem estabelecida, isto é, o controle subliminar sobre os
corpos. O discurso difundido na blogosfera de que os blogs possibilitariam o acesso
democrático à palavra e o intenso fluxo de informação ocasionado por esse dispositivo
cibermidiático permitiram a criação de um clima libertário. Todavia, assim como na vida real,
na realidade digital a ordem discursiva também é vivenciada: “não se pode dizer o que quiser,
do lugar que preferir, sem se ter que entrar na ordem discursiva” (OLIVEIRA, 2006, p. 144).
O discurso de liberdade promovido pelas novas tecnologias contaminou os
blogueiros, que parecem acreditar terem criado um “novo” jornalismo em resistência à ordem
estabelecida pelo jornalismo impresso tradicional, e seus leitores, que muitas vezes crêem
poder fazer suas leituras e comentários livremente; ambos iludidos, raramente percebem a
ordem estabelecida em meio ao caos.
Diante do exposto, podemos afirmar que o sujeito contemporâneo examinado,
seja ele o jornalista-blogueiro ou o leitor digital, não é novo nem velho, mas o resultado da
época que vivencia, ou seja, a modernidade líquida (BAUMAN, 2001). Não é possível
observar uma nova e singular identidade, mas “novas” identificações.
90
GLOSSÁRIO
B
Blog
Forma abreviada de weblog.
Blogueiro
Pessoa responsável pela atualização e manutenção de um blog, ou seja, o seu autor.
Bloguer
Em espanhol, autor de um blog. Termo utilizado por Orihuela (2006).
Blogosfera
O universo e a cultura dos weblogs. Comunidade de blogs.
Browser (pesquisador)
Programa que permite o acesso a páginas na web.
C
Chat
Bate-papo on-line, comunicação simultânea, síncrona, por meio de texto e/ou voz, de dois ou
mais usuários em uma mesma conversa ou debate. Ocorre em ambientes especiais na Internet,
também chamados de "salas", que permitem conexão de várias pessoas em uma mesma
conversação.
Cibercultura
A cibercultura é a cultura contemporânea em sua interface com as novas tecnologias de
comunicação e informação, ela está ligada às diversas influências que essas tecnologias
exercem sobre as formas de sociabilidade contemporâneas, influenciando o trabalho, a
educação, o lazer, o comércio, etc. Todas as áreas da cultura contemporâneas estão sendo
reconfiguradas com a emergência da cibercultura.
Fonte: André Lemos: http://ww.magnet.com.br/bits/especiais/2003/11/0001/#topo.
Ciberespaço
O termo foi criado pelo escritor William Gibson e inspirado no estado de transe em que ficam
os aficcionados de videogame durante uma partida. A palavra foi utilizada pela primeira vez
no livro Neuromancer, de 1984, e adotada desde então pelos usuários da Internet como
sinônimo de rede. Mundo virtual, onde transitam as mais diferentes formas de informação e
onde as pessoas que fazem parte da sociedade da informação se relacionam virtualmente, por
meios eletrônicos.
Cibermídia
Conjunto de mídias digitais existentes.
91
Comunidade virtual
Grupos de pessoas que se interligam entre si por meio de uma complexa rede informática (que
obedece a uma estrutura rizomática, na qual não se identifica um princípio nem um fim), e
não por intermédio de laços circunscritos aos limites de um espaço físico.
H
Hiperlink
Ver link.
Hipertexto
Um hipertexto é um tipo de documento que permite leitura não linear onde o leitor dispõe de
flexibilidade para escolher sua própria seqüência, de acordo com seu interesse ou necessidade.
Como o próprio nome diz, é algo que está numa posição superior à do texto, que vai além do
texto. Dentro do hipertexto existem vários links, que permitem tecer o caminho para outras
janelas, conectando algumas expressões com novos textos, fazendo com que estes se
distanciem da linearidade da página e se pareçam mais com uma rede. Na Internet, cada site é
um hipertexto. Clicando em certas palavras vamos para novos trechos, e vamos construindo,
nós mesmos, uma espécie de texto. Fonte:
http://www.revistaconecta.com/destaque/edicao04.htm#1.
L
Link
Elo, cadeia, interligação. Ligações do hipertexto. Palavras, frases ou imagens que uma vez
selecionadas ordenam ao browser o acesso a outras partes do mesmo texto ou ainda a outros
documentos da rede.
O
On-Line
Diz-se que um computador ou outro equipamento está on-line quando está conectado a
Internet ou está pronto para receber informações de outro ponto na rede.
P
Post
Postagem, atualização de um blog.
S
Sociabilidade
Do Latim sociabile, sociável; s. f., qualidade do que é sociável; tendência, propensão para a
vida em sociedade; urbanidade. Conjunto de inter-relações estabelecidas entre os actores
sociais. Segundo Baechler (apud MARCELO, 2001), o conceito de sociabilidade pode ser
definido como “a capacidade humana de estabelecer redes através das quais as unidades de
actividades, individuais ou colectivas, fazem circular as informações que exprimem os seus
interesses, gostos, paixões, opiniões”.
Sociabilização
Derivação fem. sing. de sociabilizar; ato ou efeito de tornar sociável.
Socialização
Ato ou efeito de socializar; processo de transmissão cultural dinâmico e perpétuo por meio do
qual os indivíduos aprendem a tornar-se membros da sociedade.
92
W
Weblog
Página pessoal na Internet atualizada com muita regularidade e organizada cronologicamente.
Webpage
Página na web.
WWW (World Wide Web)
Conjunto de informação disponível na Internet e à qual podemos aceder por meio das páginas
web, ligadas entre si por hiperligações.
93
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WEIS, Luís. Verbo Solto. Disponível
em:<http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3>. Acesso de abr. a
07 nov. 2007.
102
ANEXOS
ANEXO 1
Fonte: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp?id_blog=3&id={CDFC6CA8-C98A-454F-AD8C-
F353E01882AE}&data=200708.
ANEXO 2
103
Fonte: http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007-06-17_2007-06-23.html.
ANEXO 3
Luís Weis
Jornalista, pós-graduado em Ciências Sociais pela USP, onde lecionou Sociologia da
Comunicação. Escreve no Observatório da Imprensa e no jornal "O Estado de S.Paulo". Entre
outras atividades, foi redator-chefe das revistas "Superinteressante" e "IstoÉ", editor-
assistente da "Veja", editor político e apresentador do programa "Perspectiva" da TV Cultura,
104
editor nacional da "Visão" e editor de assuntos especiais da "Realidade". É autor, com Maria
Hermínia Tavares de Almeida, de "Carro-zero e pau-de-arara: o cotidiano da oposição de
classe média ao regime militar, in "História da Vida Privada no Brasil", Lilia Moritz
Schwarcz (org.), 1998, e do perfil político de Vladimir Herzog (sem título), in "Vlado
Retrato da morte de um homem e de uma época, Paulo Markun (org.), 1985. Recebeu o
Prêmio Esso de Jornalismo Científico, em 1990.
ANEXO 4
O espaço de comentários do blog pode ser moderado. Não serão aceitas as seguintes
mensagens:
1. Que violem qualquer norma vigente no Brasil, seja municipal, estadual ou federal;
2. Com conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a
qualquer ilegalidade, ou que desrespeite a privacidade alheia;
3. Com conteúdo que possa ser interpretado como de caráter preconceituoso ou
discriminatório a pessoa ou grupo de pessoas;
4. Com linguagem grosseira, obscena e/ou pornográfica;
5. De cunho comercial e/ou pertencentes a correntes ou pirâmides de qualquer espécie;
6. Que caracterizem prática de spam;
7. Anônimas ou assinadas com e-mail falso;
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