4.1.1. Cena 01: Kindgdom divided - (Divisão do reino):
LEAR:
Meantime, we shall express our darker purpose22.
Give me the map there. Know, that we have divided
In three our Kingdom; and’ tis our fast intent
To shake all cares and business from our age,
40 Conferring them on younger strengths, while we
Unburthen´d crawl toward death. Our son of Cornwall,
And you, our no less loving son of Albany,
We have this hour a constant will to publish
Our daughters’ several dowers, that future strife
May be prevented now. The princes, France and Burgundy,
Great rivals in our youngest daughter’s love,
Long in our court have made their amorous sojourn,
And here to be answer´d . Tell me, my daughters,
(Since now we will divest us both of rule,
50 Interest of territory, cares of state)
Which of you shall we say doth love us most?
That we our largest bounty may extend
Where nature doth with merit challenge. Gonerill,
Our eldest born, speak first.
(King Lear, Act: I. Scena: I.)
Nesta cena enunciativa Shakespeare apresenta Lear deflagrando o inicio de um
jogo cujo término mudará para sempre a atual situação das coisas e das personagens de
seu mundo. Na verdade, há nesta primeira ação uma revelação que comunica oficialmente
a situação. É um ato enunciativo que deixa para trás qualquer rumor de desconhecimento,
de segredo; é uma eclosão deliberada para todos e, sobretudo para ele. Nesta fala, Lear
informa não só que o jogo está iniciado, mas, sobretudo, informa sobre as regras do jogo,
isto é, as razões e os objetivos de assim proceder: “Entrementes, vamos desvendar nossos
desígnios mais secretos”. A menção de um momento decisivo, de um estado que se deve
estabelecer já informa que todos irão revolver-se a partir do que será instalado.
Desta prenúncia, o rei passa a executar a ação bastante vinculada à sua identidade
(a ser/estar rei), que neste mesmo turno irá se perder, isto é, reconfigurar. Lear assume a
função de rei que é ser o poder: administrar e dividir (distribuição) territórios (terras),
títulos, agrados e desafetos. Ou seja, o rei é o sentido da vida de seus súditos (filhos). No
enunciado: “Tragam-me aquele mapa. Ficai sabendo que dividi nosso reino em três...”
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,
o plural majestático é, de sorte, uma familiar linguagem de que deve responder
discursivamente a partir deste estado de regência dos objetos e dos homens.
Vale salientar que esta ação é partilhada com anterioridade, enquanto partícula
enunciativa e possui, portanto, um aqueduto interdiscursivo quando nas primeiras falas
(enunciados) da peça o conde de Glócester, ao fato da divisão, assim se refere ao ser
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Estamos usando no corpo do texto trechos da edição: (Muthuen & Co LTD, 1972), e a tradução de Pietro
Nassetii (2004) conforme indicado na bibliografia.
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Percebe-se nesta importante passagem da peça a influência na linguagem de Chistopher Marlowe, que já
havia tratado do tema e com a mesma pespectiva em que o mapa respondia ao ato de poder do rei