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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
NÍVEL DE MESTRADO EM ECONOMIA
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ECONOMIA DO TRABALHO
A SUSTENTABILIDADE DOS ASSENTAMENTOS RURAIS NO
NORDESTE BRASILEIRO: A AÇÃO DO PROJETO DOM HÉLDER
CÂMARA
MARCIO MICELI MACIEL DE SOUSA
JOÃO PESSOA, 2007
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MARCIO MICELI MACIEL DE SOUSA
A SUSTENTABILIDADE DOS ASSENTAMENTOS RURAIS NO
NORDESTE BRASILEIRO: A AÇÃO DO PROJETO DOM HÉLDER
CÂMARA
Dissertação apresentada à Universidade
Federal da Paraíba, para obtenção do título
de Mestre em Economia, junto ao Programa
de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências
Econômicas, área de concentração:
Economia do Trabalho.
Orientador: Ivan Targino Moreira
JOÃO PESSOA, 2008
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A SUSTENTABILIDADE DOS ASSENTAMENTOS RURAIS NO
NORDESTE BRASILEIRO: A AÇÃO DO PROJETO DOM HÉLDER
CÂMARA
Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do
Título de Mestre em Economia em sua forma final pelo
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Economia, nível de mestrado
da Universidade Federal da Paraíba, em 29 de
Maio de 2008.
_____________________________________
Prof(a). Dr(a): SINÉZIO FERNANDES MAIA
Coordenador(a)
Apresentada à Comissão Examinadora, integrada pelos Professores:
__________________________________
Prof. Dr. ANDRÉ LUIZ DE MIRANDA MARTINS
(UFPE)
________________________________
Prof. Dr.LUCIANO MENEZES BEZERRA SAMPAIO
(UFPB)
________________________________
Prof. IVAN TARGINO MOREIRA
Orientador
(UFPB)
JOÃO PESSOA, 2008
Dedico este Trabalho aos meus queridos pais Carlos
Marcio Maciel de Sousa e Maria Lúcia Miceli de Sousa,
meu porto-seguro, a minha querida irmã Caroline Miceli
Maciel de Sousa e a minha amada esposa Fabiana Cristina
de Araújo Santos.
7
AGRADECIMENTO
A Deus por me ter dado saúde e sabedoria para vencer os obstáculos que se colocaram ao
longo do curso;
Aos meus pais Carlos Marcio Maciel de Sousa e Maria Lúcia Miceli de Sousa e a minha irmã
Caroline Miceli Maciel de Sousa por terem acreditado na minha capacidade e por me
incentivarem a terminar este trabalho;
À minha noiva e futura esposa Fabiana Cristina de Araújo Santos, pelo companheirismo,
amor, incentivo e paciência, compartilhando todos os momentos alegres e difíceis ao longo do
curso.
Ao pesquisador, amigo e orientador Prof. Ivan Targino Moreira, pela confiança, paciência e
ensinamentos imprescindíveis à confecção deste trabalho;
Ao pesquisador, amigo e professor Dr. Luciano Menezes Bezerra Sampaio, pelo auxílio e
atenção dispensada na elaboração deste trabalho;
Ao pesquisador, amigo e professor Dr. Luís Henrique Romani de Campos pelo incentivo e
auxílio nos momentos difíceis vivenciados no mestrado.
Ao pesquisador e amigo José Maurício Pereira pelos ensinamentos, incentivos e, por, através
de sua intelectualidade, ter me proporcionado o despertar para o campo da pesquisa.
A todos os professores do PPGE, em especial, à pesquisadora e professora Dra. Elivan Rosas
Ribeiro, pelos ensinamentos e pela amizade.
A todos os colegas do Mestrado, em especial, a Márcia, Tabira, Cássia e Aldous, pelo
companheirismo e pelo apoio nos momentos difíceis que passamos juntos.
À amiga de longa data Isabela Luciana de Araújo Néri.
Às secretárias do PPGE Terezinha Soares Polari e Risomar de Farias Oliveira pela atenção e
profissionalismo.
A Yony Sampaio, Tales Vital e Luciano Sampaio pela permissão para utilização dos dados da
pesquisa.
A todos que colaboraram para a realização e finalização deste trabalho.
É graça divina começar bem. Graça maior persistir na
caminhada certa. Mas graça das graças é não desistir nunca
(Dom Hélder Câmara)
2
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 1 - Evolução do PIB nacional e do agronegócio familiar, e sua respectiva participação
no PIB nacional no período 1995-2005. ................................................................................... 30
Gráfico 2 – Brasil: Participação do PIB familiar no total e o seu respectivo valor,
considerando cada tipo de produção em 2005. ........................................................................ 32
Gráfico 3 – PDHC: Forma de obtenção de água por parte dos assentados nos quatro estados 46
Gráfico 4 – PDHC: Principais atividades realizadas pelos assentados nos quatro estados ...... 48
Gráfico 5 – PDHC: Forma de realização das atividades por parte dos assentados .................. 52
Gráfico 6 – PDHC: Situação da assistência técnica para as principais atividades realizadas
pelos assentados nos quatro estados ......................................................................................... 53
Figura 1 – Brasil: Composição e participação do agronegócio familiar e patronal em 2005 .. 31
Figura 2 – Brasil: PIB total, familiar e patronal do agronegócio, e participação do agronegócio
patronal e familiar segundo os Estados da federação, 2004. .................................................... 33
Figura 3 - Estados contemplados no Projeto Dom Hélder Câmara .......................................... 73
3
LISTA DE TABELAS
Quadro 1 - Variáveis utilizadas no DEA ................................................................................................. 9
Tabela 2 – Brasil: famílias assentadas segundo os mandatos governamentais 1964-2002 ................... 27
Tabela 3 – Estrutura fundiária no Brasil, 2003. ..................................................................................... 29
Tabela 4 – Faixa etária, gênero, cor e estado civil dos assentados nas quatro regiões. ......................... 39
Tabela 5 – PDHC: Origem, nível de esclarecimento e freqüência à escola dos assentados nas quatro
regiões. .................................................................................................................................................. 41
Tabela 6 – PDHC: Material utilizado na parede, no piso e no telhado da casa dos assentados nas quatro
regiões. .................................................................................................................................................. 42
Tabela 7 – PDHC: Destino do esgoto sanitário e do lixo nos assentamentos dos quatro estados ......... 43
Tabela 8 – PDHC: Fonte de iluminação, acesso a água encanada e qualidade da água nos
assentamentos dos quatros estados. ....................................................................................................... 44
Tabela 9 – PDHC: Visita do agente comunitário de saúde e utilização dos métodos contraceptivos nos
assentamentos nos quatro estados. ........................................................................................................ 46
Tabela 10 – PDHC: Principais atividades realizadas pelos assentados nos quatro estados. ................. 48
Tabela 11- PDHC: Situação da assistência técnica para as principais atividades realizadas pelos
assentados nos quatro estados. .............................................................................................................. 55
Tabela 12 – PDHC: Situação vivenciada pelos assentados nos quatro estados no tocante a existência,
demanda e acesso ao Crédito Agrícola. ................................................................................................. 56
Tabela 13- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de adubação e de combate a pragas por
parte dos assentados selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados. ................... 61
Tabela 14- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de irrigação por parte dos assentados
selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados. .................................................... 62
Tabela 15- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de manejo do solo por parte dos assentados
selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados. .................................................... 63
Tabela 16 - Distribuição dos produtores por classes de eficiência técnica............................................ 65
Tabela 17 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo a área do lote ............. 66
Tabela 18 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o número de
trabalhadores no lote. ............................................................................................................................ 67
Tabela 19 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o acesso ao crédito. .... 68
Tabela 20 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o acesso à assistência
técnica. ................................................................................................................................................... 69
Tabela 21 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de irrigação
localizada. .............................................................................................................................................. 69
Tabela 22 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de irrigação
por aspersão. .......................................................................................................................................... 70
Tabela 23 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de irrigação
por sulco. ............................................................................................................................................... 70
Tabela 24 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo o uso de tração animal.
............................................................................................................................................................... 71
Tabela 25 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo o uso de tração
mecânica. ............................................................................................................................................... 72
4
SUMÁRIO
RESUMO.................................................................................................................................................2
ABSTRACT ............................................................................................................................................ 3
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 4
1.1. O Problema ....................................................................................................................................... 5
1.2. Objetivos .......................................................................................................................................... 6
1.3. Composição da dissertação .............................................................................................................. 7
CAPÍTULO II – METODOLOGIA DA PESQUISA ............................................................................. 8
2.1.Variáveis e dados a serem utilizados ................................................................................................. 8
2.2. A Abordagem DEA ........................................................................................................................ 10
CAPÍTULO III – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................ 14
3.1. A discussão clássica da evolução da agricultura familiar ............................................................... 14
3.2. Reforma agrária e agricultura familiar no Brasil ............................................................................ 19
3.2.1 Necessidade da reforma agrária no Brasil: a discussão nos anos 1950 e 1960 ............................ 19
3.2.2. Implementação da política agrária: alguns resultados ................................................................. 26
3.2.3. A agricultura familiar no Brasil ................................................................................................... 29
3.2.4. Os Assentamentos Rurais ............................................................................................................ 34
3.2.5. A sustentabilidade dos Assentamentos Rurais no semi-árido nordestino ................................... 36
CAPÍTULO IV – CONDIÇÕES DE VIDA E ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES ASSENTADOS .......................................................................................................... 37
4.1. Aspectos da população assentada
........................................................................................... 37
4.2. As condições infra-estruturais de habitação e de serviços de saúde ............................................... 42
4.3. A organização da produção ............................................................................................................ 47
4.3.1 A composição da produção .......................................................................................................... 47
4.3.1.1 A produção vegetal .................................................................................................................... 47
4.3.1.2 A produção animal .................................................................................................................... 49
4.3.1.3. O extrativismo vegetal .............................................................................................................. 50
4.3.2. Assistência técnica ...................................................................................................................... 52
4.3.3. Acesso ao crédito......................................................................................................................... 56
4.3.4. Tecnologia: adubação, irrigação e manejo do solo ..................................................................... 60
4.3.4.1. Adubação e combate a pragas .................................................................................................. 60
4.3.4.2. Uso da irrigação ........................................................................................................................ 61
4.3.4.3. Manejo do solo ......................................................................................................................... 63
CAPÍTULO V – GRAU DE EFICIÊNCIA DOS PRODUTORES E A AÇÃO DO PROJETO DOM
HÉLDER CÂMARA ............................................................................................................................. 65
5.1. A eficiência dos produtores: análise do DEA ................................................................................. 65
5.1.1. Eficiência e crédito agrícola ........................................................................................................ 68
5.1.2. Eficiência e assistência técnica .................................................................................................... 68
5.1.3. Eficiência e irrigação localizada .................................................................................................. 69
5.1.4. Eficiência e irrigação por aspersão .............................................................................................. 70
5.1.5. Eficiência e irrigação por sulco ................................................................................................... 70
5.1.6. Eficiência e tração animal ........................................................................................................... 71
5.1.7. Eficiência e tração mecanizada ................................................................................................... 72
5.2. O Projeto Dom Hélder Câmara: uma visão geral ........................................................................... 73
5.3. As ações do Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro Estados ....................................................... 77
5.3.1. Sertão Central Cearense .............................................................................................................. 77
5.3.2. Região do Apodi .......................................................................................................................... 79
5.3.3. Cariri Paraibano ........................................................................................................................... 81
5.3.4. Sertão Sergipano .......................................................................................................................... 83
CAPÍTULO VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 86
CAPÍTULO VII - REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 91
5
RESUMO
Durante muito tempo, o meio rural foi interpretado apenas como um espaço onde se
desenvolviam atividades agrárias. Dentro deste contexto, autores como Marx, Lênin e
Kautsky, vislumbravam que o desenvolvimento do campo encontrava-se vinculado ao
movimento realizado pela agricultura. Para estes três autores, haveria uma tendência de
polarização e conseqüente domínio da grande forma de exploração capitalista sobre a pequena
propriedade, levando-a à extinção. Idéia refutada por Chayanov ao defender que a agricultura
familiar gozava de uma forma de organização peculiar que lhe garantiria a sobrevivência.
Analisando-se, o meio rural em diversos países, atualmente, percebe-se não somente a
existência desta modalidade de agricultura como, em algumas situações, o bom
desenvolvimento de suas atividades. No caso brasileiro, identifica-se uma situação
diferenciada nas condições de desenvolvimento da agricultura familiar entre as cinco regiões.
No Nordeste brasileiro, mais especificamente no semi-árido nordestino, verifica-se que os
assentados encontram-se limitados ao acesso dos recursos produtivos, remetendo-os a uma
baixa qualidade de vida. Diante deste cenário de exclusão social, o Estado lançou o projeto
Dom Hélder Câmara (PDHC), objetivando desfazer os entraves que impedem o bom
funcionamento da produção familiar. O trabalho se propõe a traçar um perfil dos titulares dos
lotes, a situação dos assentamentos rurais e confrontar, as ações realizadas pelo PDHC aos
resultados do modelo de Análise de Envoltória de Dados – DEA com rendimentos variáveis
de escala, utilizado para medir a eficiência de uma amostra composta por 303 assentados. Os
inputs do modelo são: área ocupada com atividades agropecuárias e número de trabalhadores
na parcela, enquanto a renda líquida é o output. Uma vez identificados os produtores
eficientes, foi testada a influência das variáveis: crédito agrícola, assistência técnica, irrigação
localizada, irrigação por aspersão, irrigação por sulco, tração animal e tração mecanizada,
como forma de verificar se as ações realizadas pelo Projeto Dom Hélder Câmara encontram-
se alinhadas aos resultados do modelo.
Palavras-Chaves: Reforma agrária. Assentamentos rurais. Projeto Dom Hélder Câmara.
Eficiência Técnica.
ABSTRACT
For a long time, the countryside has been interpreted as an area where only agricultural
activities were developed. Within this context, authors such as Marx, Lênin and Kautsky,
aiming that the development of the field found itself tied to the movement conducted by
agriculture. For these three authors, there would be a trend of polarization and consequent
domination of the large form of capitalist exploitation over the small property, taking it to
extinction. The idea was refuted by Chayanov, who claimed that the family farming enjoyed a
particular form of organization that would ensure its survival. Looking up the rural areas in
several countries nowadays, we can see not only the existence of this type of agriculture but
also, in some locations, the success of the development of their activities. In Brazil, there has
been a different situation in terms of development of family farming among the five regions.
In the Brazilian northeast, more specifically in the northeastern semi-arid, it appears that the
settlers have been having limited access to productive resources, leaving them to a low quality
of life. In this scenario of social exclusion, the State launched the Project Dom Hélder Câmara
(PDHC), aiming to undo the barriers that have been impeding the good operation of the
family production. The work propose itself to draw a profile of the owners of the lots, the
situation of rural settlements and confront the actions performed by PDHC to the results of
the model of data envelopment analysis – DEA, with variable incomes of scale, used to
measure the efficiency of a sample composed of 303 settlers. The inputs of the model are:
occupied area with farming activities and the number of employees in the plot, while the net
income is the output. Once identified the efficient producers, the influence of the variables
were tested: agricultural credit, technical assistance, specifically located irrigation, sprinkler
irrigation, irrigation by furrow, animal traction and mechanized traction, as a way to verify
that the actions performed by the Project Dom Hélder Câmara are aligned to the results of the
model.
Key-words: Land reform. Rural settlement. Dom Hélder Câmara Project. Technical
Efficiency.
4
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO
A questão agrária no Brasil tem sido foco de debates dentro das ciências sociais há
muitos anos. A elevada concentração fundiária existente no país
1
e o fraco apoio prestado aos
pequenos agricultores por parte do Estado foram e continuam sendo vistos como um
expressivo entrave ao desenvolvimento econômico brasileiro.
Descontentes com a situação vivenciada no campo, vários segmentos da sociedade
passam a se articular em prol da reforma agrária, defendendo este processo democrático como
instrumento de inclusão social e conseqüente melhoria na qualidade de vida das populações
menos abastadas.
As sucessivas tentativas de realização da reforma agrária acabaram enfrentando o
poder da elite latifundiária, que não admitia, de forma alguma, a alteração do status quo. A
expressão mais recente da organização desse segmento social se deu mediante a criação da
União Democrática Ruralista – UDR, com forte atuação no congresso brasileiro, através da
bancada ruralista, por ocasião da constituinte de 1986.
O fracasso das políticas de fixação do homem no campo associado à forma como foi
conduzida a modernização da agricultura brasileira, chamada por Graziano (1997) como a
modernização dolorosa, acabaram acentuando as desigualdades existentes entre a agricultura
patronal e a familiar, projetando dentro do meio rural brasileiro duas vias de desenvolvimento
humano bastante distintas.
Dentro deste contexto, assistiu-se a um intenso êxodo rural que veio a provocar um
inchaço das grandes metrópoles nacionais, alterando significativamente a distribuição
populacional por todo o território brasileiro, sobrecarregando os serviços de saúde, educação e
transporte coletivo e promovendo um considerável défict habitacional nas grandes cidades
(MIRALHA, 2006).
Os assentamentos rurais representam uma realidade recente no contexto da questão
agrária brasileira. A partir da década de 1980, esse processo foi intensificado devido às fortes
pressões dos movimentos sociais, representantes de setores marginalizados do acesso a terra
(SOUSA e PEREIRA, 2004).
O desempenho dos projetos de reforma agrária constitui um tema muito presente na
sociedade e há uma expectativa a respeito do êxito ou do fracasso dos assentamentos.
1
De acordo com o informe de 1993 do Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento, o Brasil
apresentava então a 2ª distribuição fundiária mais desigual do mundo, estando atrás apenas do Paraguai
(MAGALHÂES, 2000).
5
Pesquisa do INCRA/FAO (1998) mostra que parte dos projetos de reforma agrária no
Nordeste encontra dificuldade de alcançar um patamar de sustentabilidade.
Com o intuito de reverter este quadro onde a pobreza rural encontra-se sobressalente, o
Estado brasileiro vem se utilizando de algumas políticas públicas, buscando alternativas
capazes de fomentar um programa de desenvolvimento rural sustentável, no qual estejam
internalizadas a manutenção e a reprodução social das famílias residentes do Nordeste
brasileiro.
Uma dessas iniciativas é o projeto Dom Hélder Câmara que contempla cinco estados
da região Nordeste – Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, o que
totaliza uma população de 13,5 milhões de habitantes, dos quais aproximadamente 50.000
serão envolvidos de forma acumulativa nos seis anos de projeto. De acordo com a última
delimitação do Semi-Árido nordestino, 352.518 Km² encontram-se nesses Estados. (MDA,
2007).
A população envolvida no projeto é de aproximadamente 50 mil pessoas, residentes
em 60 municípios. Trata-se de produtores rurais residentes nos assentamentos localizados no
semi-árido nordestino, de agricultores que vivem nesse entorno, bem como de comunidades
de quilombolas (MDA, 2007).
A pesquisa justifica-se uma vez que a implantação do Projeto Dom Hélder Câmara é
uma iniciativa que, em princípio, atende uma lacuna importante dos Projetos de
Assentamento, relativo ao acompanhamento e a orientação técnica. Desse modo, essa
experiência merece um estudo mais detalhado de suas ações frente a uma situação
desfavorável vivenciada pela agricultura familiar na região, a qual historicamente tem sido
marginalizada, carente de apoio do Estado em relação à infra-estrutura, assistência técnica,
crédito e comercialização.
1.1. O Problema
A forma como o processo de reforma agrária vem sendo conduzido pelo Estado
brasileiro, na região do semi-árido nordestino, tem deixado lacunas para uma melhor
organização dos pequenos produtores residentes nos assentamentos rurais. Embora na
elaboração dos programas de reforma agrária dos diferentes governos desde a Nova
República, esteja contemplado um maior acesso aos serviços de apoio como: o crédito e a
assistência técnica, bem como a superação de velhos gargalos como a infra-estrutura e os
6
estreitos canais de comercialização, a implementação dessa política não tem seguido,
completamente, o padrão pré-estabelecido.
Vários estudos têm constatado que a vida dos trabalhadores assentados tem
apresentado mudanças significativas com a sua situação anterior (NEAD, 2004). Apesar
dessas melhorias, também tem sido objeto de inquietação as dificuldades que tais
trabalhadores têm enfrentado, sobretudo os PAs situados na região semi-árida do Nordeste
(TARGINO e COUTO, 2007). Dentre essas dificuldades é sempre ressaltada a falta ou
ineficiência da assistência técnica e organizacional. Assim, a implantação de programas que
objetivem garantir uma efetiva assistência técnica aos projetos de assentamentos é sempre
bem acolhida por parte dos trabalhadores.
Com base nessas considerações, cabe perguntar se tem havido, efetivamente, uma
melhoria nas condições de vida dos assentados, beneficiados pela assistência prestada pelo
Projeto Dom Hélder Câmara. Esse é, exatamente, o problema a ser investigado nessa
dissertação.
1.2. Objetivos
O objetivo geral deste trabalho é analisar o desenvolvimento do processo de reforma
agrária na região do semi-árido nordestino e a situação vivenciada pelos assentados
contemplados no projeto Dom Hélder Câmara, buscando verificar se as ações realizadas pelo
projeto são capazes de remover os gargalos que limitam o desenvolvimento dos
assentamentos rurais, elevando-as a uma situação de sustentabilidade.
Além desse objetivo geral, a pesquisa também pretende atingir os seguintes objetivos
específicos:
a) Caracterizar os titulares residentes nos assentamentos rurais contemplados no projeto
Dom Hélder Câmara, bem como as condições de infra-estrutura básica e social dos
assentamentos rurais, no tocante à produção, ao acesso aos recursos financeiros e aos
canais de comercialização;
b) Verificar a eficiência técnica dos assentados inseridos no projeto Dom Hélder Câmara
com base na utilização do modelo de Análise de Envoltória de Dados – DEA.
7
c) Analisar as ações realizadas pelo projeto Dom Hélder Câmara face às deficiências
detectadas nos assentamentos rurais pesquisados, como forma de auxiliar na
formulação de políticas públicas.
1.3. Composição da dissertação
Afora esse capítulo introdutório, a dissertação comporta mais cinco capítulos. O
segundo capítulo está dedicado a apresentar a metodologia da pesquisa. O terceiro capítulo
expõe a fundamentação teórica do estudo, estando dividido em duas seções: a primeira
contempla uma discussão acerca da trajetória percorrida pela agricultura familiar,
paralelamente à evolução do sistema capitalista mundial, onde são expostas as visões de
importantes pensadores da questão agrária como: Marx, Lênin, Kautsky e Chayanov, bem
como de autores contemporâneos como Furche, Archeti.e Nakano; a segunda contém uma
breve análise do processo de reforma agrária brasileiro e da situação vivenciada pela
agricultura familiar no país. No quarto capítulo foi realizada uma análise das condições de
vida e da forma de organização da produção dos assentados. O quinto capítulo traz o grau de
eficiência dos produtores e a análise das ações do Projeto Dom Hélder Câmara. O sexto é
dedicado a apresentar a conclusão do trabalho.
8
CAPÍTULO II – METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa contemplou duas vertentes básicas de investigação: a fase do estudo
documental e da seleção, tratamento e utilização dos dados da amostra. Em um primeiro
momento, foi realizada uma revisão da literatura, objetivando o estudo do processo de
reforma agrária e da situação vivenciada pelos assentados na região do semi-árido nordestino,
bem como foi analisada a dimensão do projeto Dom Hélder Câmara e o seu plano de ação.
O Projeto Dom Hélder Câmara é resultado de um acordo de empréstimo firmado, em
outubro de 2000, entre o Organismo de Cooperação das Nações Unidas – FIDA e o governo
Federal, estando vinculado à secretaria de reforma agrária do Ministério do Desenvolvimento
Agrário – MDA.
Em um segundo momento, foi realizada uma caracterização socioeconômica dos
assentados, bem como foram analisadas as ações executadas pelo projeto Dom Hélder
Câmara nas regiões do Sertão Central cearense, no Apodi norte rio grandense, Cariri
paraibano e Sertão sergipano, frente às dificuldades verificadas no semi-árido nordestino.
Finalmente, para estimar a eficiência dos assentados rurais contemplados no projeto
foi utilizada uma função não-paramétrica do tipo DEA, com retornos variáveis de escala,
DEA-V.
Esta ação teve o intuito de identificar as variáveis que influenciam positivamente na
eficiência técnica dos pequenos produtores. Uma vez identificadas essas variáveis, criam-se
condições para a construção de políticas públicas que venham a remover os obstáculos
existentes ao bom desenvolvimento das atividades realizadas pelos assentados, promovendo a
ascensão socioeconômica das famílias.
2.1.Variáveis e dados a serem utilizados
A amostra utilizada na dissertação foi extraída do banco de dados relativo a uma
pesquisa realizada pelo projeto Dom Hélder Câmara, o qual detém informações sobre 838
produtores. Destes, apenas os produtores que vivem nos assentamentos rurais foram
utilizados, ou seja, 587 assentados, ocorrendo o descarte dos produtores que viviam no
entorno dos assentamentos, como também os pertencentes às comunidades quilombolas.
9
A análise dos dados comportou dois momentos: a caracterização dos titulares e dos
aspectos gerais dos assentamentos rurais e a análise de envoltória de dados (DEA) para medir
a eficiência técnica dos assentados.
As características dos assentados e dos assentamentos foram estudadas em três blocos:
a) o primeiro compreende as variáveis utilizadas para traçar uma caracterização da população
assentada: i) características individuais do chefe da família: origem, faixa etária, gênero, raça,
cor, estado civil e nível de esclarecimento; e ii) características domiciliares: tipo de habitação
(material utilizado nas paredes, no piso e no telhado das residências), destino do esgoto
sanitário e do lixo produzido pela família;
b) o segundo congrega as variáveis relativas às condições de infra-estrutura básica e social
dos assentamentos rurais: as formas de obtenção de energia elétrica e do acesso à água nas
residências e nos lotes; a qualidade da água utilizada para consumo doméstico; atendimento
pelos agentes de saúde e os métodos contraceptivos utilizados pelos assentados.
c) o terceiro contempla informações sobre as formas produtivas e o acesso aos serviços de
apoio: as principais atividades realizadas pelos pequenos produtores, a forma como estas
atividades se realizam e o acesso à assistência técnica, ao crédito agrícola, às técnicas de
adubação e às modalidades de irrigação.
Os critérios de seleção para a aplicação do modelo de análise de envoltória de dados
fizeram com que fossem descartados os assentados que não obtiveram produção positiva em
2005, bem como os que não realizaram nenhuma atividade em suas terras e/ou não souberam
informar o tamanho de seus lotes. Com isso, dos 587 pequenos produtores, apenas 303 vieram
a compor a base de dados utilizada no DEA.
Quadro 1 - Variáveis utilizadas no DEA
In
p
uts Out
p
ut
X
1
– Área ocupada com atividades
agropecuárias (ha)
X
2
– Número de trabalhadores na
parcela
Y – Renda líquida dos pequenos
produtores rurais
Segundo Onusic, Casa Nova e Almeida (2007), a compreensão do DEA demanda a
apresentação da nomenclatura usualmente utilizada:
a) Decision Making Units – Representam as unidades decisoras. No caso deste trabalho, os
produtores assentados. No modelo original, a fonte de observação eram escolas. Em seguida
10
foram desenvolvidos estudos para medir a eficiência técnica de: empresas, bancos, lojas,
Universidades.
Em estudos recentes, tentou-se mensurar a eficiência técnica: de produtores de
camarão, conforme artigo de Sampaio e Mariano (2007), de empresas de saneamento básico,
realizado por Sampaio e Sampaio (2007), previsão de insolvência de empresas brasileiras,
conforme estudo de Onusic, Casa Nova e Almeida (2007) e de empresas hidrelétricas
brasileiras, por Sampaio, Ramos e Sampaio (2005).
b) Outputs – Representam as saídas. Neste trabalho, existe apenas uma saída, a renda líquida
dos assentados proveniente das atividades executadas nas parcelas.
c) Inputs – Representam as entradas. No caso deste trabalho, a área ocupada com atividades
agropecuárias em hectares e o número de trabalhadores na parcela.
Para a análise das condições de vida das famílias nos assentamentos pesquisados, fora
considerado apenas um tipo de rendimento, ou seja, a renda proveniente das atividades
agropecuárias realizadas nos lotes dos assentados, ficando de fora a renda obtida pelos
trabalhos realizados fora da parcela, bem como as transferências financeiras como
(aposentadorias, pensões, auxílios alimentação etc).
2.2. A Abordagem DEA
O grau de eficiência dos assentados foi determinado pelo método de análise de
envoltória de dados (data envelopment analysis – DEA)
2
. Neste método, os sistemas de
produção familiares (na maior parte) são considerados unidades de tomada de decisão que são
avaliadas por suas eficiências relativas às unidades identificadas como eficientes e que
compõem a fronteira tecnológica.
Esta metodologia, de acordo com Reinaldo (2002), foi construída para medir o
desempenho de unidades em que os preços de mercado dos insumos e produtos não se
encontravam disponível, constituindo-se, segundo Macedo, Souza, Rosadas e Almeida
(2007), como uma dos mais poderosos métodos para medir a eficiência, tamanho o seu poder
de detalhamento, vindo a funcionar como importante ferramenta gerencial.
2
Segundo Sampaio e Mariano (2007) diversas aplicações podem ser vista em Fried et al. (1993), Banker (1984),
Banker, Charnes e Cooper. (1981, 1984, 1989), Banker e Morey (1986), Charnes, Cooper e Rhodes (1978) e
Farrel (1957).
11
Na visão de Macedo et al (2004) Apud Macedo, Souza, Rosadas e Almeida (2007,
p.8):
O DEA é uma técnica que tem a capacidade de comparar a eficiência de
múltiplas unidades mediante a consideração explícita do uso de suas
múltiplas entradas, na “produção” de múltiplas saídas. A técnica referida, de
acordo com os autores, evita a necessidade de desenvolver “indicador-
padrão”, pois ela pode incorporar múltiplas entradas e saídas, tanto no
numerador como no denominador do cálculo da eficiência, sem a
necessidade de conversão para uma base comum.
O método DEA está inserido na abordagem não-paramétrica, e emprega o método de
programação matemática para estimar modelos de fronteiras de produção e obter os escores
de eficiência. Segundo Sampaio e Sampaio (2007) e Sampaio e Silva (2007), este método é
baseado no trabalho de Farrell (1957), posteriormente popularizado por Charnes, Cooper e
Rhodes (1978).
Para Sampaio e Sampaio (2007, p. 374):
No DEA, as DMUs realizam tarefas similares e se diferenciam pelas
quantidades dos insumos que consomem e dos produtos que resultam.
Supõe-se que o conjunto de possibilidade de produção, como se mencionou
anteriormente deve satisfazer determinadas propriedades, ou seja, não há
suposições sobre a fronteira propriamente dita. O conjunto de produção é
limitado pela fronteira de produção composta por aquelas DMUs que são
eficientes. A determinação das DMUs (decision making units) eficientes é
feita através da resolução, para cada uma delas, de um sistema de equações
lineares definido para mensurar o nível de eficiência de cada DMU.
A metodologia proposta por Charnes, Cooper e Rhodes (1978) Apud Sampaio e Silva
(2007), com retornos constantes de escala, com N DMUs e utilizando I insumos, para
produzir P produtos, calcula para a i-ésima DMU, uma medida de eficiência, com a intenção
de construir uma fronteira não paramétrica capaz de envelopar os dados.
Para cada DMU, é maximizada a razão entre a soma ponderada dos produtos e a soma
ponderada dos insumos, onde u é um vetor Px1 dos pesos associados ao produto e v um vetor
Ix1 dos pesos associados aos insumos. Os valores de u e v são tratados como incógnitas e
calculados de forma a maximizar a eficiência de cada DMU. Para cada DMU é desenvolvido
o seguinte problema:
Max
u,v
(u
t
y
i
/ v
t
x
i
),
Sujeito a (u
t
y
j
/ v
t
x
j
) 1, j = 1,..., N,
12
u 0 e v 0
Para Sampaio e Sampaio (2007), o modelo apresentado acima possui um número
infinito de soluções. Dado que, se (u*, v*) é uma solução do problema, então (αu*, αv*)
também é uma solução possível. Segundo, Sampaio e Silva (2007), esse problema foi
resolvido por Charnes, Cooper e Rhodes (1978), impondo a condição v
t
x
i
= 1. Dessa forma, a
transformação do problema de programação matemática em um problema de programação
linear resulta em:
A forma multiplicativa revela um grande número de restrições, mostrando-se
inadequada para efeitos computacionais. Recorrendo-se a propriedade da dualidade,
disponível na programação linear, o problema pode ser formulado de uma forma equivalente,
todavia com um número menor de restrições (I+P < N+1) (SAMPAIO e SILVA, 2007):
Onde: θ – escore de eficiência; λ – vetor Nx1 de constantes; X – matriz dos insumos (IxN ) e
Y – matriz dos produtos (PxN).
O problema de programação linear é resolvido N vezes, uma para cada DMU. O valor
de θ é o escore de eficiência e deve satisfazer a condição θ 1.
O uso de retornos constantes de escala, quando nem todas as DMUs estão operando na
escala ótima, resulta em medidas de eficiência técnica influenciadas pelas medidas de
eficiência de escala. Nestes casos, a abordagem por retornos variáveis de escala permite a
medição da eficiência técnica sem a interferência da eficiência de escala. A extensão desse
modelo, passando a considerar rendimentos variáveis de escala, foi feita por Banker; Charnes
e Cooper (1984) Apud Sampaio e Silva (2007), adicionando a restrição de convexidade (z
t
λ =
1):
Max
u , v
u
t
y
i
,
sujeito a v
t
x
i
= 1,
u
t
y
j
– v
t
x
j
0, j = 1, ..., N,
Min
θ, λ
θ,
sujeito a Yλ - y
i
0,
θx
i
- Xλ 0,
λ 0.
13
onde: z é um vetor unitário N x 1.
A utilização de retornos constantes de escala, quando nem todas as DMUs estão
operando na escala ótima, apresenta medidas de eficiência técnica influenciadas pelas
medidas de eficiência de escala. Sendo assim, ao mesmo tempo em que a metodologia DEA
estabelece que uma determinada DMU é ineficiente, ela também identifica as DMUs para as
quais esta unidade é ineficiente. Há, então, a determinação de um conjunto de pesos λ o qual
indica a combinação de unidades eficientes para comparação com cada ineficiente e que
representa a proporção de redução (ou aumento) de insumos (ou produtos) que uma unidade
ineficiente poderia proceder para tornar-se eficiente (SAMPAIO e SAMPAIO, 2007).
O modelo DEA-V desenvolvido para analisar a eficiência dos assentados rurais é a
versão dual de minimização de insumos. Este modelo é especificado da seguinte forma:
Minimizar Z
o
(1)
Sujeito a
ojmj
YY
λ
(2)
=
s
i
oojij
ZXX
1
0
λ
(3)
i
λ
= 1 (4)
em que j=1, ..., 303 é o número de produtores ou DMUs (Decision Making Units) na
amostra, m = 1 representa a produção de cada produtor, i = 1....,4 é o número de insumos
incluídos na análise, Z
o
é o escore de eficiência relativa do produtor em análise, λ
j
são os
pesos a serão obtidos na solução do problemas, e que servirão para compor o(s) produtor (es)
de referência para o produtor ineficiente. X
ij
é o nível do i-ésimo insumo sob o j-ésimo
produtor, Y
mj
é o nível do m-ésimo produto sob o j-ésimo produtor, Y
o
é o nível de produto do
produtor ‘o’, e X
o
é o vetor de insumos usado por este produtor. Os escores de eficiência
resultantes variam no intervalo de 0 a 1 com valores mais próximos de 1 indicando melhor
eficiência.
Min
θ, λ
θ,
sujeito a Yλ - y
i
0,
θx
i
- Xλ 0,
z
t
λ = 1,
λ 0
14
CAPÍTULO III – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1. A discussão clássica da evolução da agricultura familiar
Marx (2003), ao apresentar a sua teoria do desenvolvimento, defendeu a ocorrência na
agricultura de um movimento semelhante ao desenvolvido pela atividade industrial, ou seja, a
transformação de uma realidade onde conviviam a pequena e a grande exploração, em um
ambiente de fortalecimento da grande exploração e proletarização da população rural.
Idéia retomada por Kautsky (1980) através do entendimento de que agricultura e
indústria não poderiam dispor da mesma dinâmica de desenvolvimento, apesar de tenderem
para o mesmo fim, a polarização e conseqüente hegemonia de uma única forma de
exploração, projetando ao meio rural a desconstrução da forma tradicional de organização
camponesa
3
.
A transformação gradativa neste modo de produção elevava o grau de dependência do
camponês em relação ao mercado, tornando-o mais vulnerável diante de uma nova realidade
que se colocava e exigia uma quantidade maior de dinheiro para a manutenção e reprodução
familiar.
A obtenção de dinheiro demandava da classe camponesa uma nova postura, baseada
na transformação de seus produtos em mercadorias, as quais teriam os seus preços
determinados pelas variações existentes entre oferta e procura (KAUTSKY, 1980).
A dissolução progressiva do modo camponês “quase independente” para o estruturado
a partir de uma situação de extrema dependência do mercado, contribui mediante a maior
vulnerabilidade e incerteza das suas ações, para um processo de liberação de mão-de-obra
anteriormente ocupada e dedicada ao trabalho familiar, inaugurando um movimento de
proletarização da mão-de-obra no campo.
No seio da relação entre compradores e vendedores surgia a figura do capital
comercial, que segundo Marx (2004), apesar de se apropriar de uma parte do valor gerado
3
A família do camponês da Idade Média possuía uma organização pouco dependente das atividades executadas
fora de seus domínios, recorrendo ao mercado apenas e tão somente para vender o excedente de sua produção e
adquirir produtos como o ferro, utilizado na confecção de utensílios e ferramentas de trabalho (KAUTSKY,
1980).
15
pelo produtor, desenvolvia um papel importante para o aumento da velocidade de rotação do
capital.
O comerciante não se prestava apenas a preencher esta lacuna, pois funcionava, em
especial, nos momentos onde a natureza demonstrava-se inóspita para com o camponês, como
agente de crédito, configurando uma nova e, em alguns casos, duradoura dependência, entre o
camponês e o capital usurário (KAUTSKY, 1980).
Entre os autores clássicos, Kautsky (1980) afirma que o desenvolvimento do
capitalismo desencadearia no campo uma tendência de elevação no número de empresários
capitalistas e proletários, através da destruição da pequena empresa pela grande, dada a
superioridade técnica dessa última.
Para o autor, a exploração agrícola moderna caracteriza-se por dois aspectos
fundamentais: a propriedade fundiária e o caráter mercantil. A utilização do capital seria o
elemento responsável pela superioridade da grande exploração, por possibilitar o acesso à
utilização de construções e obras de engenharia, como a irrigação e drenagem, pela maior
possibilidade de acesso ao crédito, melhores condições das relações com o mercado, além do
uso de tecnologia. A pequena propriedade, por falta de utilização das técnicas avançadas de
cultivo, seria obrigada a exigir maiores esforços dos membros da família, levando-os muitas
vezes à exaustão (PEREIRA, 1989).
A discussão acerca da questão agrária não poderia ser considerada como esgotada no
momento em que fosse definido se a pequena exploração tenderia à extinção ou não,
tornando-se necessário identificar se o capital iria se apoderar da agricultura, revolucionando-
a e subvertendo as antigas formas de produção e de propriedade às novas formas de relação
que iriam surgir (KAUTSKY, 1980 Apud PEREIRA, 1989).
Corroborando com esta idéia de desaparecimento da pequena produção, Lenin (1982),
enxerga-a como uma tendência básica, todavia ressalta que o capitalismo penetra na
agricultura de forma lenta e de diferentes maneiras.
Contrário à idéia defendida pela escola marxista, Chayanov (1981) contesta a teoria
que coloca a supressão da pequena propriedade pela grande exploração capitalista como uma
tendência inevitável, dada a existência de uma dinâmica própria presente na pequena
produção, a qual seria a responsável pela sobrevivência desta modalidade de agricultura ao
longo da evolução do sistema capitalista mundial.
Neste contexto, uma série de autores comentou as formas de resistência demonstradas
pela agricultura familiar que vieram a se contrapor à tese defendida por Kautsky (1980).
16
Nakano (1981), ao observar as tendências demonstradas pela agricultura nos países
desenvolvidos e em desenvolvimento, onde a agricultura familiar era, ainda, elemento
presente e de grande importância no campo, refuta a idéia de Kautsky (1980).
Furche (1983) compartilha da visão apresentada por Nakano (1981), ao identificar
uma expansão da pequena produção nos países da América Latina, o que o faz repensar a
idéia, segundo a qual, a pequena produção encontrar-se-ia em via de desaparecimento em um
curto espaço de tempo.
Na visão de Nakano (1981), a forma como a realidade se apresentava ensejaria uma
forma de análise diferenciada. A não comprovação de que a agricultura familiar estava em
vias de desaparecer, demandaria que as novas categorias de produtores não fossem analisadas
apenas como resquícios de um modo de produção em extinção.
Para Pereira (1989), a produção familiar não depende para a sua existência, nem da
taxa média de lucro nem da renda da terra. A sua dinâmica encontra-se na sobrevivência e
reprodução familiar, mesmo quando situada em países desenvolvidos. Assim sendo, a
produção organizada em bases essencialmente capitalista, deve buscar a elevação da
produtividade do trabalho como forma de competir com a pequena produção.
Furche (1983) ao se apropriar de algumas características apresentadas por Archetti
(1987), quando este caracterizou o pequeno produtor e os elementos que o diferenciam dos
demais atores sociais, estabeleceu alguns traços característicos para esta modalidade agrícola:
i)
Os pequenos produtores incorporam simultaneamente sua dupla dimensão de produtores
e consumidores;
ii)
Desenvolvem seu processo produtivo, tendo em vista a obtenção de bens destinados à
alimentação da família e ao mercado;
iii)
O trabalho se desenvolve em uma parcela de terra, geralmente de tamanho insuficiente e
de baixa qualidade;
iv)
O processo produtivo tem como base a força de trabalho familiar disponível, ou mais
especificamente, o grupo doméstico no sentido amplo; e
v)
A pequena produção articula-se de forma subordinada com setores capitalistas, os quais
extraem parte dos excedentes gerados no processo produtivo, de tal forma que a pequena
produção se encontra impossibilitado de desenvolver processos significativos e persistentes de
acumulação de capital.
Na visão de Chayanov, seguida por autores mais modernos como Kerblay, Thorner e
Harrison (1981), a unidade de produção familiar era regida por princípios particulares de
funcionamento, quando comparada com a grande exploração capitalista, pois a empresa
17
familiar não se utilizava de uma estrutura que se apropriava do trabalho excedente ou
suplementar, sob a forma de mais-valia
4
.
Na economia agrícola familiar, a família equipada com meios de produção,
emprega sua força de trabalho no cultivo da terra, e recebe como resultado
de um ano de trabalho certa quantidade de bens. Uma simples observação da
estrutura interna da unidade de trabalho familiar é suficiente para
compreender que é impossível, sem a categoria salários, impor a esta
estrutura o lucro líquido, a renda e o juro do capital, como categorias
econômicas reais, no sentido capitalista da palavra (CHAYANOV, 1981a,
p.137).
A ausência de extração da mais-valia no processo de produção familiar acaba por
fundir o conceito tradicional entre família e empresa. No que diz respeito à relação com o
trabalho, o produtor familiar apresenta um esforço físico e mental diferenciado em relação ao
produtor capitalista, dado que ele participa efetivamente do planejamento, gestão e execução
de suas atividades
5
(WANDERLEY, 1989).
Dentro de uma lógica de reprodução social, onde uma única atividade acaba sendo
responsável pela subsistência da família e a produção para o mercado, o produtor familiar
percebe que a sua sobrevivência perpassa pela manutenção e, quando possível, expansão dos
meios de produção necessários à realização de suas atividades, conferindo à unidade familiar
um resultado da produção que se caracteriza pela impossibilidade de separação do valor
gerado pelo trabalho, pelo investimento do capital e sob a forma de renda da terra
(WANDERLEY, 1989).
Segundo Chayanov (1981), o planejamento das atividades a serem realizadas pelo
pequeno produtor ocorre a partir da efetuação de um balanço entre o trabalho e o consumo, o
qual é definido pela família diante de uma perspectiva de alcance de um nível de subsistência
desejado que esteja diretamente relacionado ao número de integrantes da família e a sua
composição por faixa etária.
4
A explicação de que o trabalho por ser um processo não poderia ser vendido pelo trabalhador nem tão pouco
adquirido pelo capitalista, serviu de base para a resolução de um antigo problema vivenciado pela economia
política, o qual residia em saber como o valor da mercadoria era gerado. Utilizando-se do método dialético, a que
chamou de materialismo histórico, Marx (2004) descobriu que o valor da mercadoria era gerado pelo trabalho
excedente produzido pelo trabalhador, gratuitamente apropriado pelo capitalista sob a forma de mais-valia.
5
Para Marx (2004), conforme os negócios do capitalista crescem, este se liberta do trabalho manual assumindo a
função de coordenação. Quando seu empreendimento alcança uma dimensão ainda maior, o proprietário dos
meios de produção se ausenta da supervisão direta da produção, entregando-a a um novo tipo de trabalhador
assalariado. Do mesmo modo que um exército conquista a sua disciplina através da implantação de uma
hierarquia de comando, esta grande reunião de trabalhadores a serviço do capital demanda a existência de
oficiais superiores como diretores e gerentes, bem como a de suboficiais como contramestres, inspetores, feitores
e capatazes que durante o processo de trabalho comandam em prol da máxima reprodução do capital.
18
Este grupo familiar camponês inicia-se apenas com duas pessoas, mas acaba sofrendo
alterações em seu tamanho ao longo do tempo, quando vão reproduzindo e gerando filhos.
Durante um período de tempo, quando ainda pequenos, consomem alimentos sendo incapazes
de produzi-los, representando um “peso” para o chefe de família (WANDERLEY, 1989).
Todavia, quando crescem, vão gradativamente se inserindo nas atividades quotidianas,
representando uma elevação no número de braços disponíveis ao cultivo ou a criação de
animais até o momento de alcançarem idade para constituir uma nova família/empresa
(CHAYANOV, 1981).
Para Wanderley (1989), com o passar do tempo, a família camponesa que havia se
formado num período anterior, tende a crescer e tornar-se mais numerosa, promovendo uma
ampliação da força de trabalho disponível a realização das suas atividades, ficando sob a
responsabilidade do chefe de família a realização de avaliações subjetivas com o objetivo de
definição do grau de intensidade da auto-exoploração de sua força de trabalho.
Diante do cenário que se apresenta hoje no meio rural em nível mundial, percebe-se a
permanência da agricultura familiar no campo dos países desenvolvidos e em
desenvolvimento.
Nas economias capitalistas desenvolvidas, esta modalidade de agricultura não só
resiste como apresenta bom desempenho, graças aos serviços de apoio oferecidos pelo Estado
no que diz respeito ao crédito agrícola, a um amplo programa de assistência técnica e acesso
aos recursos produtivos como máquinas e implementos agrícolas, bem como ao alargamento
dos canais de comercialização e à política de garantia de preços promovida, quando
necessária.
Realidade diferente se apresenta no campo dos países periféricos, onde a agricultura
familiar, via de regra, situou-se à margem do processo de modernização. Neste sentido,
verifica-se, no meio rural brasileiro, um processo histórico de “marginalização” da pequena
produção, não obstante a sua permanência.
Todavia, deve-se associar a sua sobrevivência a uma dinâmica própria assumida por
esta modalidade de agricultura, ressaltada nos textos clássicos de Chayanov, vindo a mostrar
o quanto os seus escritos são importantes e atuais para analisar o que vem acontecendo no
meio rural brasileiro.
A não confirmação do movimento apontado por Marx, Lennin e Kautsky, de extinção
da pequena produção, não desvaloriza os textos por eles escritos. Pois mesmo que não tenha
ocorrido o que foi previsto por esses autores, falar em permanência da pequena produção não
significa dizer que ela permanece imutável. Ao contrário, à medida que se intensifica a sua
19
inserção no mercado, podem ser constatadas novas mudanças na sua organização interna.
Nesse particular, a relação entre o pequeno produtor e o atravessador, que ao mesmo tempo
em que realiza uma atividade predatória, ao se apropriar de uma substancial parcela do valor
gerado pelo pequeno produtor, funciona como agente de crédito em algumas situações,
fomentando a compra de sementes e de adubo para a pequena produção. Neste mesmo
sentido, percebe-se a importância das idéias de Marx, que visualizou a submissão da pequena
produção à atividade capitalista, ao criar a categoria submissão formal, a qual ilustra uma
relação de produção que em algumas situações faz o pequeno produtor assumir junto com o
capital o risco de insucesso da lavoura e o conseqüente prejuízo.
3.2. Reforma agrária e agricultura familiar no Brasil
A agricultura familiar possui grande representatividade na agricultura brasileira
(GUILHOTO ET AL, 2007). Todavia, esta grande participação não foi capaz de potencializar
um maior apoio do Estado brasileiro no tocante ao fortalecimento de suas atividades e à
resolução de velhos gargalos como a brutal concentração fundiária existente no país,
impossibilitando a melhoria nas condições de vida da população camponesa.
3.2.1 Necessidade da reforma agrária no Brasil: a discussão nos anos 1950 e 1960
Teóricos como Caio Prado Júnior, Alberto Passos Guimarães e Moisés Vinhas
consideravam a reforma agrária como um elemento imprescindível à melhoria das condições
de vida dos pequenos produtores, desde que estivesse associada ao fortalecimento dos
serviços de apoio às atividades primárias.
Apoiado na tese que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro e a sua conseqüente
penetração no meio rural seriam incapazes de promover uma substancial melhoria nas
condições de vida dos trabalhadores alocados no setor primário, Caio Prado Jr. (1996)
considerou importante o nascimento e a consolidação de um sentimento coletivo, capaz de
criar uma identidade entre os trabalhadores rurais, proporcionando maiores chances de
enfrentamento face ao capital e, uma oportunidade, mesmo que ainda na sua forma
embrionária, de luta pela reforma agrária e conseqüente obtenção da propriedade da terra.
A reivindicação surgia justamente em um momento em que os trabalhadores rurais
assalariados conviviam com longas e cansativas jornadas de trabalho que duravam por vezes
20
dez, onze ou mais horas e não tinham, apesar de tanto esforço, condições de oferecer aos seus
familiares uma vida digna (VINHAS, 1958).
A obtenção de um pedaço de terra seria para os camponeses pobres uma aspiração
imediata, fossem eles parceiros, arrendatários, posseiros, colonos ou pertencentes à outra
modalidade qualquer. Até mesmo entre os assalariados e semi-assalariados existiria este
sentimento de se tornar proprietário, rompendo com a subordinação à agricultura patronal
(VINHAS, 1958).
Na visão de Guimarães (2005), o processo de reforma agrária poderia se desenvolver
no campo de duas maneiras: assumindo um caráter revolucionário ou reformista. O caminho
mais viável se daria através da via revolucionária, todavia sem a utilização da violência
6
. A
revolução comandada pelas classes menos favorecidas teria como objetivo dissolver os laços
feudais presentes no campo, bem como as formas pré-capitalistas ainda existentes, mediante o
estabelecimento de instituições democráticas.
Os setores mais progressistas da sociedade brasileira seriam os responsáveis pelas
reformas de cunho pacífico, capazes de promover uma substancial alteração na forma de
organização da estrutura fundiária nacional, na qual o latifúndio era categoria hegemônica,
considerada por Caio Prado Jr. (2005) como o principal entrave à ascensão social e
econômica das famílias residentes no meio rural brasileiro.
Na contramão desta idéia, Caldeira (1955) defendia a inexistência de latifúndios em
território brasileiro. Tanto o parceiro como o arrendatário não desejaria possuir um pedaço de
terra. Para ele, a única ligação do trabalhador rural com a propriedade seria a venda da sua
força de trabalho. Deste modo, a única contradição existente no espaço rural seria a conquista
por melhores salários e empregos para os trabalhadores, projetando um tipo de luta de classe
no campo idêntico ao percebido na esfera urbana entre o proletariado e a classe burguesa.
Utilizando-se do método da dialética, Caio Prado Jr. (1996) apresenta uma
interpretação para a problemática da reforma agrária, dada à existência de duas classes sociais
de interesses distintos e antagônicos: uma composta pelos latifundiários, responsável pela
escolha e desenvolvimento das atividades no setor primário brasileiro, enquanto a outra,
6
A expropriação do Engenho da Galiléia, em Pernambuco, que resultou na divisão de um latifúndio entre
camponeses, possui caráter burguês, todavia pode ser classificada como uma transformação revolucionária,
mesmo que tenha sido obtida por uma “reforma” concedida pelo Governo, a expropriação não possuiu
característica reformista. Não se fez para conservar as velhas formas de produção existentes; dado que fora
alterada a estrutura da propriedade que de um latifúndio, se transformou num certo número de propriedades
camponesas, resultando em uma mudança nas relações de produção vigentes naquela região (GUIMARÂES,
2005).
21
representada pela massa trabalhadora do campo, incapaz de vislumbrar outra situação que não
fosse a de se colocar à disposição da grande propriedade.
Dentro deste contexto, as relações entre capital e trabalho se davam diante de uma
intensa rigidez, onde a sobrevivência da massa trabalhadora rural estava condicionada
fundamentalmente ao trabalho assalariado. Na visão de Caio Prado Jr. (1996), seria
justamente a flexibilização desta relação, ou seja, a criação de novas formas de trabalho e
ocupação, o fator determinante para melhoria das condições de vida das famílias.
Em oposição à idéia de Prado Jr. (1995), Caldeira (1955) compartilhava a opinião de
que a grande propriedade constituía-se como a “base essencial” da produção agropecuária
brasileira. O latifúndio, a existência de camponeses menos favorecidos economicamente e
socialmente, bem como a presença de uma significativa demanda reprimida por terra no país,
eram elementos fantasiosos criados pela esquerda brasileira.
Nesta época os latifundiários e pessoas ligadas à grande propriedade chegaram a dizer
que a pobreza rural existente no campo não tinha nenhuma relação com a concentração
fundiária, mas sim com a inexistência de serviços de apoio por parte do Estado a estas
populações.
Opinião refutada por Vinhas (1968), que acreditava tornar-se necessário atacar o
problema da pobreza e das privações das classes menos favorecidas na raiz, através de uma
alteração profunda na estrutura fundiária vigente, na qual permaneciam presentes resquícios
de uma época onde a plantation era o modo de produção hegemônico.
Para Vinhas (1968), a reforma agrária representaria uma ação ou um conjunto de
medidas que tinha por finalidade resolver as contradições existentes desde o período colonial
na questão agrária brasileira, como também nas relações sociais e na situação política em um
determinado instante.
Uma maior democratização das terras se mostrava imprescindível à elevação da
economia brasileira a níveis de desenvolvimento semelhantes aos vivenciados pelas
economias centrais. Pois a demanda reprimida por terra, que era de aproximadamente dois
terços da população rural economicamente ativa, funcionava como um entrave ao
desenvolvimento e fortalecimento do mercado interno no momento em que o país vivenciava
um programa de substituição de importações (VINHAS, 1968).
Apropriando-se do exemplo ocorrido na Rússia, apenas como ponto de apoio para a
análise da questão agrária brasileira, por identificar especificidades distintas entre os dois
paises, fundamentalmente a de que o Brasil era, ainda, prejudicado pelas ações nefastas
impostas pelos países imperialistas, enquanto a Rússia anteriormente a 1917, já se encontrava
22
na posição imperialista, Guimarães (2005) constrói a sua teoria, enumerando três formas de
luta de classe existentes no meio rural brasileiro: 1) a luta de todo o movimento campesino
frente a todas as formas de manifestação do imperialismo; 2) a luta do campesinato contra as
remanescentes expressões e sinais de pré-capitalismo; 3) o enfrentamento praticado pelos
assalariados e semi-assalariados rurais para com a classe dominante, onde estariam
contemplados os proprietários dos latifúndios.
Essa três formas essenciais da luta de classe no campo brasileiro não se
acham separadas entre si, mas sim entrelaçadas, como acentuava Lênin, e
embora sejam três frentes diversas, com aspectos peculiares e específicos,
são partes integrantes e inseparáveis do processo de revolução agrária no
Brasil. Assim, a luta de todo o campesinato contra o imperialismo é também
uma luta contra as sobrevivências pré-capitalistas e pela melhoria das
condições de vida dos assalariados (GUIMARÃES, 2005, p. 93).
Nesta época, era quase um consenso para a esquerda brasileira a idéia que o
movimento camponês no Brasil encontrava-se desorganizado, assumindo um papel ainda
incipiente frente ao desafio de se tornar o elemento decisivo na equiparação de forças na luta
de classe.
Como comparar, por exemplo, o grau de desenvolvimento da luta de classes
no campo do Brasil, país de campesinato muito recente, com o daqueles
países onde o campesinato tem uma existência milenar? Pode haver grande
analogia entre o movimento camponês no Brasil, onde os levantes
camponeses se contam nos dedos, e o movimento camponês na Rússia
tsarista, onde até 1905 tinha havido mais de 2.000 levantes camponeses de
importância? Pode haver grande analogia entre o nosso e o movimento
camponês no ocidente da Europa, onde por séculos perduraram as guerras
camponesas? Pode o nosso movimento camponês ser comparado com o da
China, onde as revoltas contra a classe dos latifundiários começaram com a
dinastia dos Chin, no ano de 221 antes de Cristo, foram-se repetindo séculos
afora, passando pela revolta dos Tai-Ping, no século passado, pela revolução
agrária de 1928-1937, até culminar com a vitória de 1949? (GUIMARÃES,
2005, p.101).
Apesar de reconhecer o atraso do movimento camponês brasileiro quando comparado
aos de outros países, uma parte da classe intelectual brasileira reconhecia que a formação e o
amadurecimento de uma classe proletária no campo acabariam fortalecendo o movimento,
ampliando a sua base de atuação, pois ao mesmo tempo em que os trabalhadores se
organizavam e proporcionavam maiores ganhos ao capitalista, sob a forma de trabalhador
coletivo, segundo Marx (2003), organizavam-se e começavam a defender os seus interesses
conjuntamente, fazendo nascer dentro do proletariado um sentido de classe.
Descontentes com o avanço da grande exploração e da situação adversa e injusta
imposta pelo capital no campo, os trabalhadores rurais passam a compartilhar de um sentido
de classe que transborda, inicialmente, em algumas regiões do Nordeste brasileiro, em
23
especial, nos estados da Paraíba e de Pernambuco, capitaneado pelas Ligas Camponesas, cujo
grande expoente e mais ilustre membro foi o advogado Francisco Julião.
A estratégia de fundação de ligas camponesas surgiu por volta de 1945, revelando-se
como uma forma de organização política de camponeses para resistir à expropriação e à
expulsão da terra. Sua origem está associada à recusa ao assalariamento. Elas foram se
disseminando por quase todos os Estados brasileiros através da ação do Partido Comunista
Brasileiro – PCB, do qual eram dependentes. Em 1947, o governo decretou a ilegalidade do
partido e com a repressão generalizada, as ligas foram violentamente reprimidas, muitas vezes
pelos próprios fazendeiros e seus jagunços (FERNANDES, 2000). Em 1954, o PCB criou a
União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas – UTLAB, a qual se organizou em quase
todas as unidades da federação. Com essa forma de organização, o partido pretendia realizar
uma aliança camponesa operária.
O movimento das Ligas Camponesas surgiu em Pernambuco, em 1955. Embora
adotasse esse nome, ele não estava, originalmente, ligado ao Partido Comunista. Resultou da
reação dos moradores e arrendatários do Engenho Galiléia, ao aumento do foro da terra. Foi a
partir dessa iniciativa localizada que as ligas ressurgiram e se disseminaram em outros
Estados do Nordeste, bem como em outras regiões. Em 1962, as ligas realizaram vários
encontros e congressos, fomentando o surgimento de uma consciência nacional em favor da
reforma agrária. A ação das ligas era definida na luta pela reforma agrária radical, para acabar
com o monopólio da terra. Em suas ações, os camponeses resistiam na terra e passaram a
realizar ocupações (ANDRADE, 1986).
O crescimento da luta pela terra dimensionava a questão agrária, colocando a reforma
agrária na ordem do dia. Esse avanço foi acompanhado por disputas pela sua representação. A
UTLAB era controlada pelo Partido Comunista. A Igreja Católica dividida entre dois setores:
o conservador e o progressista. O primeiro, no Rio Grande do Norte, criou o Serviço de
Assistência Técnica e, em Pernambuco, o Serviço de Orientação Rural, bem como no Rio
Grande do Sul, a Frente Agrária Gaúcha. O segundo setor, de cunho mais progressista, era
liderado pela Confederação dos Bispos do Brasil – CNBB, o qual foi responsável pela criação
do Movimento de Educação de Base, que trabalhava com a alfabetização e com a formação
política dos camponeses (FERNANDES, 2000).
O nascimento deste espírito coletivo entre a força de trabalho no campo acaba por
criar o alicerce necessário ao desenvolvimento do sindicalismo rural, abrindo espaço para a
discussão e reivindicação de questões como a luta pela extensão dos “direitos sociais”
24
contidos na promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, em 1943, disponível
apenas aos trabalhadores urbanos.
Segundo Navarro (2001), também compartilharam deste momento de luta por
melhores condições de vida no campo, alguns segmentos sociais apoiados e liderados pela
Igreja Católica e com simpatia a ideologia divulgada pelo antigo Partido Trabalhista
Brasileiro – PTB, principalmente durante o governo do Presidente João Goulart.
A ação do sindicalismo rural brasileiro foi vital para organizar a força de trabalho no
meio rural, especialmente em áreas nordestinas, impedindo a sua dissolução até nos
momentos mais adversos para o movimento como durante os anos em que o país foi
governado pelos militares.
7
O golpe militar, implantado em 1964, representou uma fissura na estratégia
camponesa de buscar alternativas para obtenção de maior poder de barganha na relação
capital/trabalho e denunciar uma injusta legitimação da situação por parte do poder público.
Mesmo diante de um cenário extremamente adverso, a Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura - CONTAG ainda conseguiu exercer certa contestação política.
O primeiro documento confeccionado para promover a reforma agrária foi
desenvolvido justamente nos anos em que os militares comandavam o país. No mandato do
presidente Castelo Branco, foi aprovada pelo Congresso Nacional após algumas emendas
constitucionais, a lei número 5.904.
O Estatuto da Terra, criado em 1964, surgia para controlar o clima de insatisfação
vivenciado no meio rural brasileiro, bem como para administrar o temor do governo e das
elites nacionais da iminente eclosão de uma revolução de caráter camponês (NAVARRO,
2004).
O Estatuto da Terra possuía três vertentes de ação para a agricultura brasileira: a)
estabelecia os fundamentos jurídicos do programa de reforma agrária, fazendo transparecer a
necessidade de alterar uma antiga estrutura fundiária que primava por uma extrema
concentração; b) a criação e aprimoramento de um programa de colonização visando
promover a ocupação das áreas de baixa densidade populacional e; c) a promoção do
desenvolvimento e modernização das atividades agrícolas no país.
Todavia, quando comparados os objetivos propostos pelo programa com os seus
resultados, percebe-se uma ineficiência nas ações promovidas pelo governo brasileiro no
7
A perpetuação desta nova forma de organização social irriga a posterior criação das federações estaduais no
ano de 1963, abrindo caminho para a fundação da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura –
CONTAG (NAVARRO, 2001).
25
combate à concentração fundiária, gerando grande insatisfação por parte das camadas mais
pobres residentes no meio rural, por não ter conseguido alterar o status quo da estrutura
fundiária nacional.
Segundo Medeiros e Leite (1999, p.8):
Foi no III Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais, realizado em 1979,
que se reconheceu publicamente a necessidade de mobilizações e pressões,
envolvendo grandes contingentes, para que essa reivindicação histórica
viesse a se tornar uma possibilidade concreta. Já nesse ano, as
comemorações dos 15 anos do Estatuto da Terra foram marcadas em
diversos pontos do país por manifestações de trabalhadores rurais, em
especial os que vivam em áreas de litígio, que ocuparam ruas e praças
exigindo o cumprimento desta lei.
As manifestações dos trabalhadores rurais se davam em virtude de não ter ocorrido a
democratização das terras, bem como pela agricultura familiar ter ficado à margem do
processo de modernização da agricultura brasileira, ocorrido na década de 1970, quando o
Estado brasileiro constitui-se como elemento preponderante na promoção do desenvolvimento
econômico.
Naquele momento, objetivando promover uma melhor performance das atividades
realizadas no campo, o governo decidiu ampliar as linhas de crédito subsidiadas, fomentando
assim, a ampliação da utilização de insumos modernos por parte dos agricultores em suas
propriedades, como forma de torná-las mais produtivas.
As transformações ocorridas no meio rural deveram-se em grande parte à ampliação
dos investimentos realizados pela esfera pública em instituições governamentais como a
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA e as universidades públicas, as
quais receberam um grande aporte de recursos financeiros para o desenvolvimento de ciência
e tecnologia, bem como fomentaram os programas de extensão rural, promovendo a
modernização das atividades no campo (ALVES, 1988).
Uma análise focalizada no Nordeste brasileiro revela que a modernização das
atividades primárias se concentrou em grande maioria nos grandes e médios proprietários,
modernizando e dinamizando apenas parte da produção agropecuária (PEREIRA, SOUSA e
CAMPOS, 2007).
Historicamente, bloqueada e isolada do acesso aos recursos produtivos, a maioria dos
produtores que executavam suas tarefas com base no trabalho familiar praticava a atividade
agropecuária com baixa produtividade. Inexistiam mecanismos que viessem a garantir a estes
produtores relações de comercialização que lhes permitissem continuar na atividade de forma
mais dinâmica, proporcionando um padrão mínimo a ser usufruído por suas famílias.
26
3.2.2. Implementação da política agrária: alguns resultados
O processo de redemocratização brasileiro serviu para reascender a discussão acerca
da reforma agrária, fazendo emergir novamente na sociedade a intenção de realização de uma
reforma de cunho amplo e desafiador, visando resgatar a dignidade de milhões de pessoas que
viviam abaixo da linha da pobreza (MIRALHA, 2006).
A segunda metade da década de 1980 abriu espaço para a discussão de velhos
problemas fundiários como a concentração de terras e a expropriação da força de trabalho em
relação aos meios de produção por parte do capital. Participando da manifestação popular que
reivindicava liberdade de expressão e uma vida mais democrática, ressurgiam com toda a
força os movimentos responsáveis pelas lutas sociais no campo (NAVARRO, 2004).
O Governo de José Sarney foi o responsável por elaborar o primeiro Plano Nacional
de Reforma Agrária – PNRA e colocá-lo em prática. Contudo, as pressões exercidas pelas
elites nacionais, representadas pelos grandes latifundiários, acabaram minimizando a
dimensão de atuação do plano. Na visão de Miralha (2006), o Brasil deixou escapar uma
excelente oportunidade de realizar a reforma agrária.
Nem mesmo o fato de todos os países desenvolvidos perceberem a importância de
realização da reforma agrária, por entenderem que a concentração de renda era algo
pernicioso para o desenvolvimento de suas economias, encorajou o Estado brasileiro a
desenvolver uma reforma agrária ampla e substancial, capaz de promover uma maior
distribuição de renda no país.
Sobre a constituinte de 1988, Sorj (1998, p.29) foi enfático ao declarar:
[...] procurou-se avançar uma legislação que permitisse expropriação por
interesse social e sumária de terras improdutivas, o que terminou em
fracasso total. As forças conservadoras conseguiram vetar qualquer mudança
relevante na legislação e impuseram uma legislação mais regressiva que a
herdada dos militares.
Segundo Bergamasco e Norder (2003) os entraves ao processo de democratização das
terras brasileiras estiveram apoiados também no campo jurídico e administrativo. No governo
Collor, a legislação agrária foi alterada, tornando-se mais complexa e até mesmo em alguns
pontos contraditória, interrompendo o fluxo da reforma agrária.
Segundo Fernandes (2000), neste período, ocorreu uma forte repressão contra os
movimentos sociais de luta pela terra, a qual não se limitava ao campo jurídico, extrapolando
para o campo da violência, como já havia ocorrido em anos atrás, durante a ditadura militar.
27
Tabela 2 – Brasil: famílias assentadas segundo os mandatos governamentais 1964-2002
Período N.º de Famílias Média anual
1964-1984 - Ditadura Militar 115.000 5.500
1985-1989-Governo Sarney 90.000 18.000
1990-1992- Governo Collor - -
1993-1994- Governo Itamar 12.600 6.300
1995-1998- Governo FHC 280.000 60.000
1999-2002 – Governo FHC 286.370 71.592
Fonte: MDA/ INCRA
A tabela 2 apresenta o número de famílias assentadas pelo Estado brasileiro no
período 1964-2002. Os acanhados números apresentados no período militar deixam claro que
a formulação do Estatuto da Terra teve um viés muito mais político, não contendo nenhum
caráter transformador, funcionando como uma ação que visava arrefecer os ânimos dos
segmentos interessados na reforma agrária.
Os números de famílias assentadas no Governo Sarney, frente às substanciais metas
contidas no I Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado durante o seu mandato,
representaram mais uma fratura no processo de democratização das terras nacionais ao longo
da história. Quando o Plano Nacional de Reforma Agrária foi elaborado, o Estado brasileiro
pretendia assentar 1.400.000 de famílias em cinco anos. Ao final do Governo, foram
assentadas apenas 115.000 famílias, ou seja, apenas 6,5% do previsto.
Quanto ao Governo Collor, verifica-se que o programa de assentamentos foi
praticamente paralisado, não se registrando neste período nenhuma desapropriação por
interesse social. O número de famílias assentadas foi insignificante.
Por causa de tamanha repressão e sem ter perspectiva de fazer a luta pela
terra avançar, os sem-terra voltaram-se para outra dimensão organizativa,
investindo no desenvolvimento do Sistema Cooperativista dos Assentados,
objetivando a criação de cooperativas locais e regionais. Desse modo o
Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra – MST, fundou a Confederação
das Cooperativas de Reforma-Agrária do Brasil – CONCRAB. Esse
fortalecimento da luta promoveu a territorialização do movimento, que a
cada dia contava com o apoio da sociedade (FERNANDES, 2000, p.9).
Nos dois anos seguintes ao afastamento de Collor da presidência da república, por
corrupção, foi desenvolvida pela FAO (1992), uma pesquisa em diversos assentamentos rurais
do país, onde ao final foi gerado um relatório que apresentava as reais condições
socioeconômicas destas iniciativas, ampliando o debate sobre a necessidade de realização de
um modelo que colocasse a agricultura familiar como ator principal.
O Governo Fernando Henrique Cardoso assentou um número interessante de famílias
durante os seus dois mandatos. Todavia, a forma como foi conduzido o processo, ignorando
28
as diferenças regionais e as particularidades locais, associado ao caráter compensatório
assumido em diversas situações, sem qualquer tipo de planejamento, foram apontados por
Fernandes (2000) como substancias limitações do programa.
Os assentamentos rurais não obedeciam nenhum tipo de planejamento, sendo criados
como forma de responder as pressões exercidas pelos movimentos sociais, objetivando
encerrar os conflitos que surgiam pela posse e uso da terra em diversos pontos do país. Uma
vez que estas populações deixavam de ser acampadas para se tornarem assentadas, a falta de
infra-estrutura e apoio do Estado diminuía as possibilidades de ascensão social e econômica
(CANUTO, 2001).
Para Canuto (2001), o esvaziamento do INCRA revelou-se como um ato para forçar as
esferas municipais e estaduais a participarem de forma mais efetiva do processo de reforma
agrária, atendendo as novas demandas por infra-estrutura e serviços existentes nos
assentamentos. A utilização do plano jurídico se deu a partir do estabelecimento de medidas
provisórias punitivas que tornavam ilegais a ocupação das terras por parte dos movimentos
sociais, a qual tinha como sanção a não vistoria destas terras e o impedimento de participação
dos envolvidos nestas ocupações no programa de reforma agrária.
Durante os dois mandatos do governo Fernando Henrique Cardoso, as invasões foram
a forma encontrada pelos movimentos sociais para acelerar o processo de democratização das
terras, aumentando o número de embates entre trabalhadores rurais sem terra e latifundiários.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra – CPT, no primeiro período do governo FHC, foram
assassinados 43 trabalhadores rurais, sendo o caso de Eldorado dos Carajás
8
, no Pará, como
um marco desta violência. No segundo mandato, a situação ficou ainda mais delicada, pois
foram registrados 5.535 conflitos pela posse da terra, com a morte de 227 trabalhadores.
A elevação do problema fundiário funcionou como um catalisador para o surgimento
de novos movimentos sociais. Na verdade, estes novos grupos que passaram a reivindicar a
posse e uso da terra foram reflexos de uma situação extrema de carência por parte das
populações menos abastadas, em um momento onde a estabilização da economia gerava um
custo social elevado, dada a redução dos gastos direcionados à esfera social e a elevação nos
índices de desemprego (FERNANDES, 2000).
8
Em 1996, tropas da polícia militar do Pará mataram dezenove pessoas que participavam de uma enorme
marcha pacífica pela reforma agrária, promovida pelo MST numa estrada do sul do Pará. Mais de dez anos
depois, a justiça ainda não decidiu nada sobre os responsáveis e os envolvidos na operação (NEPOMUCENO,
2007).
29
Durante o esforço de promover no Brasil um legitimo processo de reforma agrária,
ocorreu uma série de desvios que acabaram inibindo a transformação da estrutura fundiária
brasileira e, conseqüentemente, a superação de antigas contradições existentes no campo.
Tabela 3 – Estrutura fundiária no Brasil, 2003.
Categoria por
tamanho de
propriedade (Ha)
Propriedades % das
propriedades
Área Total
(Ha)
% da Área Área média
Até 10 1.338.711 31,6 7.616.113 1,8 5,7
De 10 a 25 1.102.999 26,0 18.985.869 4,5 17,2
De 25 a 50 684.237 16,1 24.141.638 5,7 35,3
De 50 a 100 485.482 11,5 33.630.240 8,0 69,3
De 100 a 500 482.677 11,4 100.216.200 23,8 207,6
De 500 a 1000 75.158 1,8 52.191.003 12,4 694,4
De 1000 a 2000 36.859 0,9 50.932.790 12,1 1.381,8
Mais de 2000 32.264 0,8 132.631.509 31,6 4.110,8
Total 4.238.421 100,0 420.345.382 100,0 99,2
Fonte: Registro do INCRA- Situação em agosto de 2003 (BRASIL, 2005)
A análise da tabela 3 revela que a estrutura fundiária brasileira continua extremamente
concentrada. No estrato que compreende as propriedades com até 10 hectares percebe-se que
estas representam 31,6% do total, no entanto ocupam apenas 1,8% das terras brasileiras,
enquanto os estratos que contemplam 1.000 e mais hectares, quando somados, representam
1,7% das propriedades, ocupando 43,7% das terras existentes.
Esses dados refletem apenas uma faceta da questão agrária brasileira: a existência de
um número muito elevado de propriedades que, a julgar pela definição do módulo rural,
seriam insuficientes para manutenção e subsistência das famílias. A outra dimensão é
exatamente a quantidade de famílias ligadas às atividades rurais sem qualquer acesso à
propriedade da terra. Percebe-se, assim, uma considerável defasagem entre o número de
famílias assentadas pelo governo FHC, em relação à demanda reprimida, a qual, segundo o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) encontrava-se a época em torno de
quatro milhões de famílias.
3.2.3. A agricultura familiar no Brasil
Durante anos, os movimentos sociais rurais se propuseram a romper com a
concentração de terras existentes no país, por acreditar que esta concentração de riqueza
acabava por gerar uma sociedade onde a concentração de renda era bastante visível,
desprovida de justiça social. Entretanto, todo o esforço realizado pelos camponeses e pelas
30
instituições que se sensibilizam pelo problema fundiário não foi suficiente para alterar de
forma substancial a estrutura fundiária brasileira (FERNANDES, 2000).
Segundo Sauer (1998, p.88),
A importância da dimensão econômica da reforma agrária está justamente no
favorecimento do desenvolvimento da agricultura familiar. A
democratização da propriedade fundiária e a conseqüente expansão e
fortalecimento da agricultura é o objetivo que dá sentido econômico à
reforma agrária. Esta democratização é imprescindível para viabilizar e
desenvolver uma agricultura com base no trabalho familiar, portanto, é
necessário uma reforma agrária que ofereça terra aos sem terra e desafogue
os minifúndios, possibilitando que se transformem em agricultores familiares
viáveis.
Gráfico 1 - Evolução do PIB nacional e do agronegócio familiar, e sua respectiva participação
no PIB nacional no período 1995-2005.
Fonte: GUILHOTO et al, 2007.
O gráfico 1 mostra a participação do agronegócio familiar no PIB brasileiro, dado que
em todos os anos do período de 1995-2005 este segmento da agricultura brasileira respondeu
por quase 10% de toda a riqueza gerada no país. Todavia, historicamente, esta
representatividade não foi capaz de despertar no Estado a necessidade de ofertar em maior
quantidade e qualidade os serviços referentes ao fortalecimento da infra-estrutura, crédito
agrícola, a assistência técnica e o apoio à comercialização, bem como o aceso a terra para
milhões de famílias que por não disporem deste fator de produção acabam subordinadas à
agricultura patronal ou migrando para as grandes cidades em busca de emprego.
Durante o período de 2001 a 2003, verifica-se um crescimento exponencial no PIB do
agronegócio familiar, superando a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto Brasileiro.
No ano seguinte, em 2004, todavia, percebe-se uma queda no PIB produzido pela agricultura
31
familiar, tendo este movimento se repetido para o ano de 2005. Segundo Guilhoto (2007), este
retrocesso no setor agrícola familiar se deu por uma série de fatores, podendo ser destacados:
a apreciação do câmbio, que veio penalizar as exportações deste segmento, os problemas
climáticos registrados na região Sul do país e a ausência do Estado na vacinação do rebanho e
conseqüente controle da febre aftosa, que veio a reduzir a demanda mundial por carne
brasileira.
Figura 1 – Brasil: Composição e participação do agronegócio familiar e patronal em 2005
Fonte: Fonte: GUILHOTO et al, 2007.
A figura 1 apresenta o valor do PIB brasileiro em 2005 e a participação do
agronegócio brasileiro, neste mesmo ano, no total da riqueza gerada no país. Decompondo o
que chamamos de agronegócio brasileiro em agronegócio familiar e patronal, percebe-se que
o primeiro apresenta uma menor articulação com a indústria em relação ao segundo, o qual
detém um maior número de complexos agroindustriais.
Produtos como o feijão, o milho, a mandioca e algumas frutas e hortaliças são
importantes para a agricultura familiar, pois integram a dieta das famílias e exigem um menor
grau de processamento para o consumo final. Entretanto, por não serem beneficiados,
32
possuem um menor valor agregado que se reflete muitas vezes em menores lucros para os
pequenos produtores.
Em alguns assentamentos no Brasil, está ocorrendo um estímulo ao processamento da
produção por parte do Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA, visando agregar valor
aos produtos e minimizar o custo com transporte. Atualmente existe dentro do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, uma linha de crédito para
fomentar a implantação de agroindústrias familiares.
Pelo lado do agronegócio patronal, destacam-se os complexos agroindustriais da cana-
de-açúcar, soja, café e algodão, os quais possuem grande dinamismo na agricultura brasileira
e significativa participação na pauta de exportações do país.
As características inerentes a cada sistema produtivo em cada região do país
definem a especialização da produção. Alguns tipos de plantações e criações
dependem de técnicas melhor adaptadas ao perfil familiar, como os produtos
que demandam por maior quantidade de mão-de-obra, enquanto que outros
são desenvolvidos com mais vantagem em grandes propriedades, por
exemplo, quando o uso da mecanização é mais vantajoso. Além disso, as
regiões do Brasil diferem em características físicas (clima, relevo, tipo de
solo) e sociais (época e forma de colonização) que implicam na
heterogeneidade da distribuição de terras e organização social (GUILHOTO,
2007, p.8).
Gráfico 2 – Brasil: Participação do PIB familiar no total e o seu respectivo valor,
considerando cada tipo de produção em 2005.
Fonte: GUILHOTO et al, 2007.
33
No gráfico 2, percebe-se que a grande parte da produção de fumo, mandioca e feijão
é realizada pelo agronegócio familiar, enquanto que a cana-de-açúcar, o café, a soja e o
algodão têm a sua produção concentrada no agronegócio patronal.
No que diz respeito à pecuária, verifica-se uma grande participação do agronegócio
familiar na criação de suínos e na pecuária leiteira, enquanto na pecuária bovina de carne e na
criação de aves o agronegócio patronal possui maior participação.
Figura 2 – Brasil: PIB total, familiar e patronal do agronegócio, e participação do agronegócio
patronal e familiar segundo os Estados da federação, 2004.
Fonte: GUILHOTO et al, 2007.
A figura 2 apresenta o PIB do agronegócio estadual, bem como do agronegócio
estadual patronal e familiar para cada um dos estados que compõem as cinco regiões
brasileiras.
Focalizando a análise na região Sudeste, verifica-se uma pequena participação do
agronegócio estadual familiar no Estado de São Paulo, onde o agronegócio patronal é
extremamente dinâmico, respondendo por cerca de ¼ do PIB da agricultura brasileira. Dentre
os produtos que se destacam neste segmento paulistano estão a cana-de-açúcar, o café e a
fruticultura, em especial, a laranja (GUILHOTO, 2007). Nos outros três Estados que
compõem a região Sudeste a realidade é muito parecida.
34
Já na região Sul, o cenário é um pouco diferente, com grande participação do
agronegócio familiar. Em 2004, o PIB do agronegócio familiar nacional alcançou a marca de
R$181 bilhões, tendo o agronegócio nesta região respondido por 44% deste total, ou seja, R$
80 bilhões, dos quais R$40 bilhões no Estado do Rio Grande do Sul (GUILHOTO, 2007).
O Estado Gaúcho é líder em vários segmentos do agronegócio familiar,
dentre os quais podem ser destacados a produção do fumo (60%), a indústria
tabagista (87%), a produção de trigo (39%), a soja (35%), a indústria de
móveis (61%). No caso da soja, o Estado líder na produção familiar é o
Paraná, com uma participação de 38%, a qual somada à do Rio Grande do
Sul, atinge quase 80% da produção familiar desse grão. No que diz respeito a
pecuária familiar, o Rio Grande do Sul tem o maior PIB individual na
criação de suínos (GUILHOTO, 2007, p.11).
O sucesso no desenvolvimento das atividades realizadas pelos pequenos produtores na
região Sul, deve-se à forma de colonização e à herança cultural de povos europeus
(GUILHOTO, 2007), bem como à condução do processo de modernização da agricultura na
região, que diferentemente do que ocorrera no Nordeste brasileiro, fez com que os pequenos
produtores tivessem acesso às linhas de crédito ofertadas pelo Estado, modernizando, assim,
as atividades por eles realizadas, tornando-os capazes de competir com a agricultura patronal.
No Rio Grande do Sul, muitos assentamentos rurais conseguiram promover a ascensão
social e econômica das famílias assentadas, graças ao apoio recebido do Estado, ao maior
esclarecimento por parte da população residente e ao espírito de cooperação entre os
assentados, além do que, em relação ao crédito agrícola, percebe-se que dentre as cinco
regiões brasileiras, a região Sul é a que mais recebe recursos do PRONAF (SOUSA;
JÚNIOR, 2006).
Voltando a análise para a região Nordeste, observa-se uma menor participação da
agricultura familiar nos Estados de Pernambuco, Bahia, Alagoas e Rio Grande do Norte
quando comparada com o agronegócio patronal, enquanto nos Estados do Ceará, Maranhão,
Paraíba, Piauí e Sergipe existe um maior equilíbrio na composição do PIB do Agronegócio
Estadual.
3.2.4. Os Assentamentos Rurais
Segundo dados do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural – NEAD
(2007), existem no país mais de 7.000 projetos de assentamento e mais de 1 milhão de
famílias assentadas distribuídas nas cinco regiões brasileiras.
35
O acesso à terra possibilita a estes assentados construírem e ocuparem novos espaços
sociais também fora dos assentamentos, com reflexos sobre os centros urbanos dos
municípios onde se localizam. É nesses espaços que se exprime a nova identidade desses
trabalhadores como grupo social, deixando de lado as relações de submissão vivenciadas por
eles quando subordinados ao capital (NEAD, 2004).
As experiências ocorridas desde a intensificação do processo de assentamento de
famílias rurais no Brasil possuem como principal característica a pluralidade, ao englobarem
situações referentes à regularizações fundiárias em terras há anos ocupadas por posseiros;
áreas de conflito gerados pela tentativa de expulsão de trabalhadores que há muito viviam na
terra como “rendeiros” ou “agregados”; áreas improdutivas ocupadas por movimentos sociais
que lutam pela posse e utilização racional da terra, como o MST e o MLT, ou também por
pessoas filiadas aos sindicatos de trabalhadores rurais (NAVARRO, 2001).
Segundo o NEAD (2004, p. 21):
Os beneficiários diretos dos assentamentos são também bastante
diversificados. Do ponto de vista da inserção no processo produtivo,
encontramos posseiros com longa história de ocupação da terra; filhos de
produtores familiares empobrecidos que, sem acesso à terra optaram pela
ocupação para se perpetuarem como produtores independentes; parceiros em
busca de terra própria; pequenos produtores atingidos por obras públicas, em
especial construção de hidrelétricas; seringueiros que passaram a resistir a
desmatamentos que ameaçavam seus modo de vida; assalariados rurais,
muitas vezes completamente integrados ao mercado de trabalho; populações
de periferia urbana, com empregos estáveis, mas dispostos à ocupação;
aposentados que depositaram no acesso à terra a expectativa de um
complemento de renda.
A maioria dos assentados é de origem rural, do próprio município ou dos vizinhos ao
assentamento e já exercia atividade agrícola. Trabalhadoras e trabalhadores rurais que
enfrentavam diferentes situações de sujeição ao trabalho (NEAD, 2004).
É marcante a trajetória de obediência e da falta do exercício em tomar decisões por
parte de alguns produtores assentados, devido à condição anterior de assalariados,
dependentes de ordens emanadas dos chefes que organizavam as tarefas a serem por eles
cumpridas. Hoje, proprietários de parcelas de terra, um grande número de assentados tem
dificuldade em tomar iniciativas em benefício do desenvolvimento dos seus trabalhos
(PEREIRA, 2000).
Diante de uma grande pluralidade observa-se nos assentamentos rurais uma
diferenciação econômica entre os assentados, de modo que a renda monetária que cabe a cada
família apresenta valores diferenciados, devido aos diversos níveis de capacitação, à
36
qualidade da terra e à composição do grupo familiar, ou seja, número de braços para trabalhar
a terra e de dependentes.
A constituição dos assentamentos rurais carrega em si elementos que extravasam a
noção de um último passo diante de uma longa e cansativa trajetória de acesso à terra,
assistida pelos movimentos sociais. Muitas destas novas experiências nascem marcadas pela
ausência de um planejamento inicial criterioso de localização e de mecanismos de apoio,
acumulando situações adversas no que se refere às condições de infra-estrutura, com reflexos
nas suas condições de produção, formas de sociabilidade e estabilidade (MEDEIROS e
LEITE, 1998).
3.2.5. A sustentabilidade dos Assentamentos Rurais no semi-árido nordestino
A formação dos assentamentos rurais no Nordeste pode ser entendida como
conseqüência da grande pressão exercida pelos movimentos sociais em prol da reforma-
agrária, tendo como organização pioneira as Ligas Camponesas, lideradas pelo advogado e
militante Francisco Julião e, posteriormente, pelos diversos movimentos que foram criados
para reivindicar a posse e uso de terras improdutivas.
As pressões exercidas pelos movimentos sociais geralmente ocorrem como resistência
à expulsão da terra e mediante a ocupação de terras que, na visão dos participantes, não estão
cumprindo a sua função social, onde são instalados acampamentos. Em um segundo
momento, cabe ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma-Agrária – INCRA, analisar a
situação da terra e definir se esta se transformará ou não em um assentamento.
A implantação e os resultados obtidos pelos assentados na realização de suas
atividades no semi-árido nordestino muitas vezes não alcançam as expectativas almejadas. Os
fatores que levam a este relativo fracasso são inúmeros: a burocracia na liberação do crédito, a
baixa qualidade da assistência técnica, a deficiência em infra-estrutura, a falta de
planejamento por parte dos assentados, a má qualidade das estradas que ligam os
assentamentos às vias principais, o pequeno apoio à comercialização dos produtos, entre
outros.
Dentro deste contexto, é papel do Estado mediante a confecção e aplicação de políticas
públicas reverter este cenário adverso que se configura, promovendo a geração de emprego e
renda e, conseqüentemente, a ascensão social e econômica das famílias assentadas. Para tanto,
o Estado brasileiro, na figura do Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, resolveu
lançar o Programa Dom Hélder Câmara.
37
CAPÍTULO IV – CONDIÇÕES DE VIDA E ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES ASSENTADOS
Após ter discutido a política agrária brasileira e as características gerais dos Projetos
de Assentamento implantados pelo INCRA, particularmente, dos situados na região semi-
árida do Nordeste, o presente capítulo tem como objeto o detalhamento das condições de vida,
da situação infra-estrutural e da organização da produção nos Projetos de Assentamento
assistidos pelo Projeto Dom Hélder Câmara.
4.1. Aspectos da população assentada
Nesta seção será apresentada a realidade vivenciada pelos assentados residentes nos
assentamentos rurais selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nas regiões do Sertão
Central cearense, do Apodi norte rio grandense, do Cariri paraibano e do Sertão sergipano.
No Sertão Central cearense, foram selecionados: o assentamento Monte Socorro,
situado no município de Pedra Branca; os assentamentos Florestan Fernandes e Conquista da
Liberdade/Marraquetá, em Quixeramobim; o assentamento Renascer/Longar, em Ibicuitinga;
os assentamentos Fazenda Tijuca/Boa Vista e Palmares, localizados no município de
Quixadá; os assentamentos Croatá e Ouro Branco; no município de Choró e; os
assentamentos Boa Água e Jiquí, no município de Banabuiu.
Na região do Apodi no Rio Grande do Norte, foram selecionados: os assentamentos
Lagoa Vermelha e Baixa do Dutra; situados no município de Upanema; o assentamento Nova
Descoberta, em Apodi; o assentamento Bom Futuro, em Campo Grande; o assentamento
Paraná, localizado no município de Itaú; os assentamentos Maravilha e Nova Morada, no
município de Caraúbas e; os assentamentos Santo Antônio e Bonito, no município de
Governador Dix Sept Rosado.
No Cariri paraibano, foram selecionados: os assentamentos Fazenda Santa Catarina,
Picus, Samambaia e Limitão, situados no município de Monteiro; os assentamentos Serrote
Agudo e José Marcolino, em Amparo; o assentamento Novo Mundo, localizado no município
de Camalaú; o assentamento Boa Vista, no município de Coxixola e; os assentamentos Badalo
e Sacramento, em São João do Cariri.
38
Na região do Sertão sergipano, foram selecionados: os assentamentos Luís Carlos
Prestes e Edmilson de Oliveira, em Carira; o assentamento Nossa Senhora de Aparecida,
situado no município de Nossa Senhora da Glória; os assentamentos José Unaldo e Ilha do
Ouro, em Porto da Folha; o assentamento Pioneira, em Poço Redondo e; o assentamento Nova
Esperança, em Garuru.
Nesses diversos compartimentos espaciais contemplados pelo PDHC, observam-se
algumas regularidades na composição etária da população (veja tabela 4), a saber: a) a grande
maioria dos chefes das famílias assentadas está compreendida nos estratos de 26 a 58 anos de
idade; b) a presença de chefes jovens varia nas quatro áreas estudadas, sendo mais marcante
no Ceará e em Sergipe; c) os chefes com idade superior a 60 anos têm um peso importante;
esse dado tem uma conseqüência significativa na renda das famílias, pois são beneficiários da
aposentadoria rural.
No Nordeste brasileiro a renda proveniente de aposentadorias e pensões tem
participação importante nas despesas dos pequenos produtores. Em estudo recente, Kato,
Hamasaki e Moreira (2007) concluíram que a redução na idade para a aposentadoria no meio
rural brasileiro, de 60 para 55 anos no tocante as mulheres e de 65 para 60 anos para os
homens, fez com que uma parcela maior da população tivesse acesso a este benefício,
funcionando como um fator importante para a minimização da pobreza rural na região.
Segundo Delgado (2000), em pesquisa sobre a previdência social rural na região do
Nordeste, verifica-se a presença de 1,7 beneficiados por domicilio no meio rural brasileiro.
Para este pesquisador, o rendimento proveniente das aposentadorias acaba funcionando como
uma espécie de “seguro-agrícola”, sendo uma parcela considerável destes recursos aplicados
no custeio das atividades agropecuárias
9
.
Estabelecendo-se uma visão geral no tocante ao gênero dos assentados contemplados
no projeto Dom Hélder Câmara, percebe-se que a grande maioria é do sexo masculino, ou
seja, 68% dos chefes de família. No Sertão sergipano, esta diferença entre homens e mulheres
se reduz, dado que 44,3% dos entrevistados são do sexo feminino. O número de mulheres
chefes de família nos assentamentos pesquisados demonstra que aos poucos estas vão
ganhando destaque no planejamento das tarefas executadas nas parcelas, bem como na
administração dos recursos financeiros e dos afazeres domésticos.
9
No México, 70% dos agricultores residentes nos antigos ejidos (na maior parte dos casos proprietários de
minifúndios), investem na aquisição de insumos a renda proveniente de transferências finaceiras.
39
Tabela 4 – Faixa etária, gênero, cor e estado civil dos assentados nas quatro regiões.
Faixa Etária CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
15 a 25 anos 20 10 12 7,5 4 4,2 14 10,7 50 8,5
26 a 36 anos 59 29,5 35 21,9 20 20,8 33 25,2 147 25
37 a 47 anos 57 28,5 35 21,9 35 36,5 24 18,3 151 26
48 a 58 anos 42 21,0 51 31,9 19 19,8 44 33,6 156 26,5
59 a 69 anos 18 9,0 24 15,0 10 10,4 15 11,5 67 11
Acima de 70 anos 4 2,0 3 1,9 8 8,3 1 0,8 16 3
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Gênero
Masculino 149 74,5 115 71,9 64 66,7 73 55,7 401 68
Feminino 51 25,5 45 28,1 32 33,3 58 44,3 186 32
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Cor
Branco 45 22,5 50 31,3 35 36,5 22 16,8 152 26
Amarelo - - 2 1,3 - - 1 0,8 3 0,5
Moreno Claro 113 56,5 62 38,8 45 46,9 73 55,7 293 50
Moreno Escuro 38 19,0 39 24,4 15 15,6 34 26,0 126 21,5
Preto 4 2,0 7 4,4 1 1,0 1 0,8 13 2
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Estado Civil
Solteiro 21 10,5 8 5,0 13 13,5 14 10,7 56 9,5
Casado 165 82,5 143 89,4 71 74,0 107 81,4 486 83
Separado 5 2,5 3 1,9 7 7,3 6 4,6 21 3,5
Viúvo 9 4,5 6 3,8 5 5,2 4 3,1 24 4
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
A análise da cor da pele dos assentados revela que na maior parte dos assentamentos
pesquisados os pequenos produtores são moreno-claro e de cor branca. Nos projetos
localizados no Cariri paraibano e na região do Apodi, no Rio Grande do Norte, verifica-se
quase um equilíbrio entre estas duas tonalidades de pele, enquanto nas regiões do Sertão
Central cearense e no Sertão sergipano os assentados moreno claro representam mais da
metade dos entrevistados.
No que diz respeito ao Estado civil dos assentados, percebe-se que nos quatros Estados
predominam os casados. A existência do núcleo familiar revela-se como um importante
esquema para o bom desenvolvimento das atividades realizadas pelos pequenos produtores,
pois se em um primeiro momento os filhos representam um “peso” para o chefe de família,
significando posteriormente, quando adolescentes, um número maior de braços para trabalhar
a terra, conforme postulação de Chayanov (1981), anteriormente discutida.
As famílias e as redes de vizinhança são as bases sobre as quais se constroem relações
de sociabilidade nos assentamentos. De uma forma geral, os lotes dos assentamentos
40
estudados correspondem a unidades de produção familiar. E é fundamentalmente nos lotes
aonde vai se calcar o cotidiano das relações de trabalho e da convivência diária e permanente
da família (NEAD, 2004).
Nos lotes vivem e trabalham pessoas ligadas entre si por relações de parentesco, na
sua grande maioria famílias nucleares, ou seja, que não abrigam outras pessoas além de pai
mãe e filhos (NEAD, 2004).
No atual momento vivido pelo país, os filhos pequenos já não representam um “peso”
tão grande para a família. Muitas vezes funcionam como fonte de renda, mediante o
recebimento de recursos do programa bolsa-família.
Hoje, verifica-se na composição da renda dos pequenos produtores do Nordeste, que a
renda proveniente de transferências financeiras é bastante representativa, superando em
algumas ocasiões a renda proveniente das atividades agrícolas por eles realizadas. Esta
realidade revela que o Estado, em determinados locais, encontra-se mais preocupado em
assistir as famílias menos favorecidas ao invés de promover um efetivo apoio às atividades
praticadas pela agricultura familiar (SOUSA e PEREIRA, 2005).
Na tabela 5, estão contidas informações relativas à origem, ao nível de esclarecimento
e ao nível de freqüência à escola por parte dos assentados selecionados pelo projeto Dom
Hélder Câmara nos quatros Estados. Nos assentamentos do Sertão Central cearense, 58% dos
pequenos produtores residiam no próprio local antes do processo de assentamento, assim
como no Sertão sergipano. Uma grande parcela destes assentados enfrentavam em momento
anterior uma instável inserção no mundo do trabalho rural/agrícola em função do precário
acesso à terra.
Em muitas situações, o fato de um assentado ter conseguido a posse e uso da terra em
um local onde ele já conhece pode se transformar em um fator positivo, vindo facilitar a sua
ascensão social e econômica, pois um maior conhecimento do município, no qual o
assentamento está inserido, bem como das pessoas pode facilitar a sua trajetória enquanto
produtor (NEAD, 2004).
O baixo nível de conhecimento apresentado pelos assentados configura-se como um
fator preocupante. Dos assentamentos localizados nas quatro regiões selecionadas, os
assentados do Cariri paraibano foram os que demonstraram uma melhor escolaridade, pois
64,6% dos pequenos produtores afirmaram saberem ler e escrever. O pior resultado ficou a
cargo dos produtores do Sertão sergipano, onde 45% dos assentados só escrevem o nome.
41
Tabela 5 – PDHC: Origem, nível de esclarecimento e freqüência à escola dos assentados nas
quatro regiões.
Origem
CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Sempre morou na localidade 116 58 71 44,5 44 46 74 56,5 305 52
Morava em outro local 84 42 89 55,5 52 54 57 43,5 282 48
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Nível de esclarecimento
Sabe ler e escrever 107 53,5 74 46,3 62 64,6 43 32,8 286 48,8
Somente consegue ler 18 9,0 69 43,1 11 11,5 29 22,2 127 21,6
Somente escreve o nome 75 37,5 17 10,6 23 24 59 45,0 174 29,6
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Freqüentam a escola
Sim 38 19,0 12 7,5 16 16,7 16 12,2 82 14
Não 162 81,0 148 92,5 80 83,3 115 87,8 505 86
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
O baixo nível de educação funciona como um entrave ao desenvolvimento dos
assentamentos rurais. Muitos produtores não possuem noções de custos e receitas, o que
dificulta o planejamento de suas atividades, bem como não compreendem o que está contido
no contrato no momento que vão demandar crédito junto ao PRONAF nas suas três
modalidades. A falta de esclarecimento muitas vezes inibe o pequeno produtor a reivindicar
os serviços a que eles têm direito (TARGINO, COUTO, 2007).
Nos assentamentos do Nordeste brasileiro, muitos pequenos produtores conseguem o
crédito agrícola, utilizam o dinheiro para fomentar as atividades por eles planejadas, mas
desconhecem os trâmites que o crédito implica. A falta de planejamento, muitas vezes se
transforma em um dos fatores responsáveis pela inadimplência.
A tabela 5 revela o número de assentados que freqüentam a escola. Dos que
responderam ao questionário, 86% afirmaram não estar freqüentando a escola. Esse número é
compreensível tendo em vista a idade avançada dos assentados. Por outro lado, ele é
preocupante, tendo em vista que quase ¾ dos assentados não têm domínio da escrita e da
leitura.
Tentando reverter esse quadro, que é característico da maior parte dos assentamentos
do Norte e do Nordeste, foi criado o PRONERA, que além de combater o analfabetismo entre
os trabalhadores assentados, objetiva, também, desenvolver uma metodologia de ensino
adaptada à realidade dos trabalhadores assentados (INCRA, 2004). Neste sentido, o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST idealiza um projeto educacional que
42
venha a contribuir para a formação de jovens e adultos, dando-lhes além de conhecimento
técnico, uma formação política, que os torne capazes de reivindicar os seus direitos (MST,
1999).
4.2. As condições infra-estruturais de habitação e de serviços de saúde
Na tabela 6, estão contidas informações referentes às casas dos assentados. No Sertão
Central cearense, as residências possuem, em média, 77,1 metros quadrados de área
construída, enquanto no Cariri paraibano este número se reduz para 63,5 metros quadrados e
no Sertão sergipano para 60 metros quadrados. As residências de menor área estão localizadas
na região do Apodi, no Rio Grande do Norte, apresentando 55,5 metros quadrados.
Tabela 6 – PDHC: Material utilizado na parede, no piso e no telhado da casa dos assentados
nas quatro regiões.
Parede CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Alvenaria/Tijolo 185 92,5 157 98 93 97 112 85,5 547 93
Adobe/Barro/Tijolo Cru 9 4,5 2 1,2 2 2 11 8,4 24 4
Taipa com Reboco 3 1,5 1 0,8 1 1 1 0,8 6 1
Taipa sem Reboco 3 1,5 - 0 - 0 7 5,3 10 2
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Piso
Cimento 185 92,5 - - 93 97 116 88,5 394 67
Cerâmica 7 3,5 10 6,0 2 2 10 7,6 29 5
Terra Batida 8 4,0 150 94,0 1 1 5 3,8 164 28
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Telhado
Telha de Barro 191 95,5 145 90,6 93 97 119 90,8 548 93
Laje de Concreto 7 3,5 7 4,4 - 0 12 9,2 26 5
Zinco/Amianto 2 1,0 8 5,0 3 3 - 0 13 2
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
As condições das edificações não são tão precárias. A grande maioria das habitações é
de alvenaria e coberta de telha (veja tabela 6). Esse padrão se repete nas quatro áreas
investigadas. Tal padrão de construção é um indicador importante da elevação da qualidade
de vida dos assentados, inclusive por inibir a presença de vetores de transmissão de doenças, a
exemplo do barbeiro (trypanosoma cruzy).
10
10
Com a chegada do homem e os processos de colonização, em muitos lugares aconteceram desequilíbrios
ecológicos (desmatamentos, queimadas) e os barbeiros foram desalojados, invadindo as habitações rústicas e
pobres dos lavradores. A doença chegou ao homem e aos mamíferos domésticos. Hoje existem pelo menos 12
43
No tocante ao piso das casas dos pequenos produtores, verifica-se que na região do
Apodi no Rio Grande do Norte, 94% das casas ainda possuem o piso de terra batida.
Diferentemente das outras três regiões, onde a maioria das casas dos assentados dispõe de
piso de cimento, o que facilita a limpeza do ambiente. A qualidade das residências ocupadas
pelos assentados tem sido uma das preocupações do Ministério do Desenvolvimento Agrário
– MDA. Dentro deste contexto, existe uma modalidade de crédito do PRONAF, denominada
crédito habitação, que visa fomentar a construção e melhoramento das residências dos
pequenos produtores (INCRA, s.d).
Como os assentados residem em áreas rurais, permanece o problema da coleta do lixo
e do esgoto. A tabela 7 revela o destino do esgoto sanitário e do lixo produzido nos
assentamentos pesquisados. Dos entrevistados nas quatro regiões, 71% declararam despejar o
esgoto sanitário em fossa séptica. Analisando-se o destino do esgoto apenas na região do
Sertão Central cearense e Sertão Sergipano percebe-se que mais de 25% dos assentados
despejam os detritos diretamente no rio. Deve-se ressaltar o pequeno percentual de assentados
que afirmaram canalizar o esgoto em rede geral, reconhecendo que este é um problema que
ocorre não apenas no meio rural brasileiro, dado que apenas um pequeno percentual das
cidades brasileira é saneado.
Tabela 7 – PDHC: Destino do esgoto sanitário e do lixo nos assentamentos dos quatro estados
Esgoto CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Fossa Séptica 143 71,5 139 87 66 68,7 70 53,4 418 71
Céu Aberto/Vala/Rio 54 27,0 14 9 8 8,0 45 34,4 121 20,5
Rede Geral - - 5 3 4 4,3 - - 9 1,5
Fossa Rudimentar 3 1,5 2 1 18 19 16 12,2 39 7
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Lixo
Enterrado 6 3,0 15 9,4 2 2,1 2 1,5 25 4
Coleta - - 12 7,6 1 1,0 14 10,7 27 4,5
Queimado 117 58,5 108 67,5 70 72,9 109 83,2 404 69
Terreno Baldio 77 38,5 25 15,5 23 24,0 6 4,6 131 22,5
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
milhões de pessoas infectadas pelo Trypanosoma cruzi, das quais 5 a 6 milhões no Brasil. Normalmente o
quadro clínico da infecção surge de 5 a 14 dias após a transmissão pelo barbeiro e 30 a 40 dias para infecções
por transfusão sangüínea, mas as manifestações crônicas da doença de Chagas aparecem mais tarde, na vida
adulta mais ou menos de 4 a 6 dias após o contato com o barbeiro pode surgir uma inflamação no local da
entrada do parasito. Quando a infecção se dá no olho ou próximo a ele, o olho pode ficar inchado, sinal
característico da doença, mas pouco freqüente. Quando ocorre na pele dos braços, pernas ou rosto, a lesão inicial
pode se assemelhar a um furúnculo ou a uma mancha avermelhada quase sempre dolorosa. Essas lesões iniciais
freqüentemente são acompanhadas de "ínguas" nas regiões próximas do local de contaminação.
44
A falta de tratamento do esgoto muitas vezes é responsável pela disseminação de
doenças, pois em muitos assentamentos as pessoas consomem a água do mesmo rio onde é
despejado o esgoto sanitário (CEDIPLAC, 2006). A contaminação do rio se revela como uma
agressão ao meio ambiente, indo de encontro à concepção do desenvolvimento humano
sustentável, descrita por Veiga (2006), que defende o desenvolvimento das potencialidades de
uma determinada região sem que haja prejuízo para as gerações futuras.
No tocante ao destino do lixo produzido nos assentamentos, verifica-se que grande
parte dos residentes queima o lixo. Dos assentados entrevistados no Sertão Central cearense,
38,5% disseram depositar o lixo em terreno baldio. Nesse assentamento não foi registrada a
existência de coleta.
Assim como a coleta de esgoto, o tratamento do lixo torna-se fundamental para a
conservação do meio ambiente e a prevenção de doenças. Uma série de materiais jogados na
natureza, como os feitos de plástico, demora um tempo enorme para se desintegrar, como
também a falta de medidas preventivas acaba sobrecarregando os hospitais públicos e
consumindo um número expressivo dos recursos destinados a saúde.
A tabela 8 apresenta informações relativas à fonte de iluminação, ao acesso a água
encanada e à qualidade da água consumida nos assentamentos. Nas quatro regiões estudadas,
a grande maioria dos assentados afirmou obter energia da rede elétrica (85%).
Tabela 8 – PDHC: Fonte de iluminação, acesso a água encanada e qualidade da água nos
assentamentos dos quatros estados.
Iluminação CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Rede Elétrica 184 92,0 160 100 75 78,1 81 61,8 500 85
Energia Solar 12 6,0 - - 16 16,7 38 29,0 66 11
Gerador 2 1,0 - - 2 2,1 7 5,3 11 2,0
Querosene/Óleo 1 0,5 - - - 0 - 0 1 0,2
Outra forma 1 0,5 - - 3 3,1 5 3,8 9 1,8
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Água Encanada
Sim 35 17,5 61 38 48 50 67 51,1 211 36
Não 165 82,5 99 62 48 50 64 48,9 376 64
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Qualidade da Água
Boa 185 92,5 129 81 73 76,0 113 86,3 500 85
Regular 15 7,5 14 8,5 20 20,8 16 12,2 65 11
Ruim - - 17 10,5 3 3,1 2 1,5 22 4
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
45
Os dados mostram que a rede de energia atinge um percentual bastante elevado de
assentados (85%). Destaca-se também o uso de fontes energéticas alternativas,
particularmente a solar (11%). A energia elétrica mostra-se fundamental para a melhor
qualidade de vida dos assentados, bem como para a realização de suas atividades. É
componente importante para a utilização de irrigação, a qual se torna imprescindível em uma
região como o semi-árido nordestino, onde as chuvas são irregulares e os índices
pluviométricos são baixos, bem como para a utilização de equipamentos como a máquina
forrageira para picar o capim a ser oferecido para o gado e aos caprinos e ovinos.
As experiências de sucesso da fruticultura irrigada no Vale do São Francisco e do Vale
do Açu, devido às vantagens comparativas na produção de alguns produtos, como a uva, a
manga e o melão, que chegam a dar duas safras e meia no período de um ano, quando
cultivadas em regime de irrigação pela agricultura patronal (LIMA e MIRANDA, 2001;
MOUTINHO, 2002), comprovam a necessidade de ofertar este tipo de serviço aos assentados
das regiões investigadas como forma de elevar a produtividade das atividades realizadas pelos
pequenos produtores e minimizar o risco de fracasso por questões de ordem climática.
O gráfico 3 apresenta a forma de obtenção de água por parte dos assentados. Os dados
mostram que 26,4% recorrem a rede geral, enquanto 32% possuem água encanada.
No que diz respeito à água encanada, apenas 17,5% dos assentados localizados na
região do Sertão Central cearense declaram ter acesso a este tipo de serviço. O déficit no
acesso é muito grande também nas outras regiões estudadas. A maior parte dos pequenos
produtores armazena a água em cisternas de placa, bem como em barreiros.
11
Dos entrevistados, 14,8% recorrem ao carro-pipa e 34,4% buscam água em poço
artesiano. Da água utilizada para beber, 41,9% declaram beber água coada e 4,8% afirmaram
ingerir este recurso natural sem nenhum tipo de tratamento.
11
A cisterna de placa tem formato cilíndrico e é construída com placas pré-moldadas. As placas de formato
côncavo são acopladas umas às outras até formarem um cilindro. Em seguida elas são amarradas com arame e
rebocadas por dentro e por fora. A dilatação se dá por igual nas placas evitando as rachaduras. A coberta feita de
placas é ajustada à extremidade superior do cilindro impedindo a entrada de impurezas. Esta cisterna pode
armazenar até 50 mil litros de água e abastecer uma família de seis pessoas durante dez meses. Em 1998, o custo
de uma cisterna com capacidade para 15 mil litros era de R$ 632,00 (CAATINGA, S.D, p.8-9). Nos anos 80,
foram criados pequenos reservatórios de água denominados de barreiros. A idéia central deste sistema é captar e
armazenar o máximo de água possível. O barreiro é uma pequena barragem de terra e está formado por três
partes: 1) área de captação, 2) área de armazenamento e 3)área de plantio. (CAATINGA, S.D).
46
Gráfico 3 – PDHC: Forma de obtenção de água por parte dos assentados nos quatro estados
32,0
6,3
34,4
1,0
68,1
23,3
62,5
14,8
1,2
26,4
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
Forma de Obtenção da Água
Percentual
Água Rede Geral
Água Encanada
Água de Poço Amazonas
Poço Artesiano
Água de Nascente
Água Cisterna de Placa
Barragem
Barreiro
Carro-Pipa
Chafariz
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Na tabela 9, são apresentados números relativos ao acesso dos assentados aos serviços
do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Apenas 39% responderam serem
assistidos pelo Programa de Agentes de Saúde. O pior resultado (19,1%) foi na região do
Sertão sergipano.
Tabela 9 – PDHC: Visita do agente comunitário de saúde e utilização dos métodos
contraceptivos nos assentamentos nos quatro estados.
Agente de Saúde CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Sim 75 37,5 92 57,5 37 38,5 25 19,1 229 39
Não 125 62,5 68 42,5 59 61,5 106 80,9 358 61
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Tipo de método
DIU 6 3,0 - 0 1 1,0 2 1,5 9 2
Ligadura/Laqueadura 49 24,5 74 46,3 20 20,8 53 40,5 196 33
Pílula 47 23,5 33 20,7 11 11,5 30 23,9 121 21
Camisinha 11 5,5 4 2,5 5 5,2 5 3,8 25 4
Nenhum 87 43,5 49 30,3 59 61,5 41 31,3 236 40
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Considerando a importância desse programa para a melhoria dos indicadores de
mortalidade infantil (NOVAES, 2002), pode-se inferir que uma maior cobertura do PACS nas
áreas estudadas poderia contribuir de forma decisiva para a melhoria das condições de saúde
da população investigada. Dado que a distância média que os residentes dos assentamentos
precisam recorrer a um posto de saúde é de 9,97 Km, explica-se o elevado percentual dos
47
assentados (85,8%) que disseram recorrer a estratégias alternativas de tratamento: uso das
plantas medicinais encontradas na caatinga (59,5% afirmaram cultivar estas plantas e 49,9%
fazem uso deste tratamento alternativo).
No que se refere aos métodos contraceptivos utilizados pelos assentados, verifica-se
uma predominância nas regiões do Apodi, no Rio Grande do Norte e no Sertão sergipano, da
ligadura/laqueadura, diferentemente das regiões do Sertão Central cearense e no Cariri
paraibano, onde a maioria dos assentados afirmou não utilizar nenhum método contraceptivo.
4.3. A organização da produção
Após ter-se examinado aspectos relativos ao perfil dos trabalhadores assentados e das
condições infra-estruturais de serviços básicos, passa-se, agora, a analisar os principais
aspectos da organização da produção: composição da produção, padrão tecnológico,
assistência técnica e acesso ao crédito.
4.3.1 A composição da produção
A produção dos assentamentos investigados é uma combinação de produção animal e
vegetal. Essa combinação é um mecanismo importante de assegurar um nível de renda
mínima capaz de garantir a unidade produção-consumo que caracteriza a pequena produção
familiar rural (CHAYANOV, 1981). Esse mecanismo permite uma utilização racional dos
recursos disponíveis na unidade produtora (SCHULTZ, 1965).
4.3.1.1 A produção vegetal
A produção vegetal é dominantemente de lavouras tradicionais. Como pode ser
observado no Gráfico 4, os produtos mais cultivados pelos assentados são o feijão e o milho.
Vale lembrar que são culturas tradicionais, possuindo grande participação na dieta diária das
famílias desta região, sendo os excedentes comercializados em feiras-livres, pequenos
comércios da região ou com atravessadores. Estes dois produtos são característicos da
agricultura familiar, dado que esta modalidade da agricultura responde por 59% da produção
nacional de feijão e 43% do milho, conforme o gráfico 2.
48
Gráfico 4 – PDHC: Principais atividades realizadas pelos assentados nos quatro estados
9,7
85,3
3,1
22,5
3,9
84,2
3,7
9,7
6,0
7,2
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
Atividades
Percentual
Algodão
Feijão
Arroz
Leite
Carvão
Milho
Fava
Ovos
Palma
Sorgo
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Esse quadro característico do conjunto das quatro áreas repete-se em cada uma delas.
Como pode ser constatado na tabela 10, as culturas dominantes são o feijão, encontrado entre
74% e 91% dos assentamentos, e o milho, cultivado entre 74% e 89% dos assentamentos,
conforme as áreas investigadas.
Tabela 10 – PDHC: Principais atividades realizadas pelos assentados nos quatro estados.
Atividades CE
(%)
Atividades RN
(%)
Atividades PB
(%)
Atividades SE
(%)
Algodão 18,0 Algodão 13,0 Algodão 7,0 Palma 31,0
Arroz 11,5 Batata 11,0 Melancia 7,0 Capim 5,0
Carvão 8,5 Castanha 17,0 Carvão 15,0 Madeira 5,0
Fava 13,5 Sorgo 30,0 Jerimun 8,0 Jerimun 3,0
Feijoo 91,5 Feijão 91,0 Feijão 74,0 Feijão 74,0
Leite 61,5 Leite 28,0 Leite 6,0 Leite 44,0
Milho 89,0 Milho 76,0 Milho 74,0 Milho 74,0
Ovos 34,0 Ovos 8,0 Ovos 5,0 Ovos 3,0
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
As demais culturas, à exceção do sorgo (30%) no Sertão Central cearense e a palma
(31%) no Sertão Sergipano, são exploradas por menos de 20% dos produtores. Essa
composição apresenta pelo menos dois problemas importantes: a) a falta de diversificação da
produção e; a ausência de produtos com maior cotação no mercado. Diante da constatação do
baixo valor obtido pelos pequenos produtores na venda da maioria dos seus produtos, o
INCRA tem estimulado a formação de agroindústrias nos assentamentos do Nordeste, como
49
forma de agregar valor à produção. Atualmente, existe uma linha de crédito, o PRONAF
agroindústria que tem este propósito.
Um fato interessante de nota é a retomada da cotonicultura por parte de alguns
produtores do Ceará, Rio Grande do Norte e da Paraíba. Depois da disseminação da praga do
bicudo, a produção tinha sido praticamente extinta em toda a zona semi-árida do Nordeste.
Isso representou um golpe importante, pois essa cultura é garantia do fluxo monetário nas
pequenas unidades de produção (MOREIRA e TARGINO, 1997). O desenvolvimento de
novos cultivares por parte da EMBRAPA é o responsável por essa retomada da cultura
(EMBRAPA, s.d).
4.3.1.2 A produção animal
No cenário nacional, a pecuária possui grande participação na produção familiar,
particularmente a caprinocultura, ovinocultura e pecuária bovina de leite. Apenas na produção
de carne bovina o agronegócio patronal encontra-se hegemônico (GUILHOTO et al, 2007).
A importância da pecuária leiteira é refletida no gráfico 4, através do percentual de
assentados (22,5%) que a praticam. Excetuando-se os assentados da região do Cariri
paraibano, em todas as outras regiões, fica patente a importância do leite. No Sertão Central
do Ceará, 61% dos assentados produzem este produto. Observando-se os assentamentos
contemplados no PDHC no Sertão sergipano, percebe-se que o leite é produzido por 44% dos
titulares dos lotes e no Apodi, por 28% dos assentados (veja tabela 10).
Os rebanhos bovinos dos pequenos criadores são constituídos de animais mestiços, os
quais se tornam menos produtivos em relação a animais gerados mediante cruzamentos
genéticos entre matrizes e reprodutores selecionados, verificados na pecuária patronal
(PEREIRA e SOUSA, 2006). A baixa produtividade não é devida exclusivamente à qualidade
dos rebanhos. Problemas relativos à falta de pastagens e a utilização incorreta das técnicas de
vermifugação também contribuem para que isso ocorra. Como forma de garantir a pastagem
do rebanho, os pequenos criadores recorrem ao cultivo do sorgo e da palma forrageira (veja
tabela 10).
Desde 2003, a produção de leite nos assentamentos ganhou um reforço substancial
através do Programa de Aquisição de Alimentos / modalidade leite. A venda do leite para o
Programa tem permitido um fluxo regular de renda para o pequeno produtor, elemento
fundamental para reforçar as condições de sobrevivência da pequena produção familiar rural
(DUQUE, 2007, TARGINO e MOREIRA, 2007). Outro elemento que tem contribuído para a
50
produção animal nos assentamentos é o crédito para investimento do PRONAF. No Cariri
paraibano, essa disponibilidade de crédito tem sido fundamental para a expansão da pecuária
de médio porte (GALVÃO, et al. 2007, TARGINO e MOREIRA, 2007).
Convém lembrar que em depoimentos colhidos junto a trabalhadores assentados, a
criação aparece como uma estratégia de poupança, para enfrentar eventualidades adversas no
futuro. Em situação de aperto, a venda de um animal é o caminho para superá-la (DI
LORENZO, 2007).
4.3.1.3. O extrativismo vegetal
Uma forma de geração de renda que também é explorada é a extração de madeira para
o fabrico de carvão. Embora esse tipo de exploração seja referenciado por apenas 3,9% do
conjunto dos assentados (veja gráfico 1), essa atividade tem sido uma fonte de preocupação
para os organismos que defendem o meio ambiente, tendo em vista a fragilidade do bioma
caatinga. Em algumas regiões da caatinga o processo de desertificação encontra-se acentuado.
Como a extração da lenha é feita sem o manejo correto poderá contribuir para o processo de
desertificação acima mencionado. Segundo Aciolly et al., a lenha é importante fonte de
energia para as empresas situadas no semi-árido nordestino, ocupando 40% de toda a matriz
energética da região, bem como para olarias, casas de farinha, padarias e restaurantes.
(ACIOLLY et al, 2005).
A região não dispõe de tecnologias adequadas e acaba perdendo muita energia no
processo de transformação da lenha. Desmata-se mais para obter carvão. Segundo estimativas
do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD e a Organização das
Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura – FAO, no semi-árido são utilizados sete
metros cúbicos de lenha para gerar um metro cúbico de carvão, quando existem técnicas que
possibilitam que essa proporção alcance dois para um. Essa perda se consolida como uma das
principais ameaças ao bioma caatinga (JUSTE 2003).
O uso e o manejo inadequado dos solos são apontados como as principais causas da
desertificação. O extrativismo mineral e vegetal, bem como o superpastoreio de pastagens
nativas ou cultivadas e o uso agrícola por culturas que expõem o solo aos agentes da erosão
revelam-se como as principais causas para o problema (ACIOLLY et al., 2005).
Conforme os dados da tabela 10, a produção de carvão é praticada por 15% dos
assentados no Cariri paraibano e por 8,5% dos trabalhadores pesquisados do Sertão Central
cearense.
51
Além da limitação da produção, de acordo com o que foi visto acima, um outro fator
que dificulta a ascensão econômica e social das famílias assentadas é a pequena quantidade de
canais de comercialização e a má qualidade das estradas vincinais, o que limita a venda do
produto ao consumidor final, forçando os pequenos produtores a recorrer a atravessadores,
vendendo o seu produto muito abaixo do preço de mercado.
Diante desta relação, recorrendo a Marx (2004) percebe-se que o capital comercial não
tem a capacidade de gerar valor. Na verdade, ele se apropria de uma parte do valor gerado
pelo capital produtivo. Mas ao mesmo tempo em que essa relação parece ser predatória,
diante da realidade vivenciada nos assentamentos rurais no semi-árido nordestino, percebe-se
que o atravessador desempenha um papel importante para o escoamento da produção,
funcionando, em alguns momentos como agente de crédito para os assentados.
Segundo o NEAD (2004) a existência de boas estradas e de transporte coletivo é
primordial para a vida dos assentados no que diz respeito aos aspectos produtivos como a
aquisição de insumos e o escoamento da produção. Em geral, as condições das estradas nos
assentamentos nordestinos não são boas, existindo dificuldade de comunicação com os
entrepostos comerciais, bem como o acesso aos serviços de saúde e educação.
O gráfico 5 apresenta a forma como são exploradas as dez principais atividades dos
assentados nas quatro regiões selecionadas. Entende-se por produção isolada a realização de
uma determinada atividade sem intercalá-la com qualquer outra.
As duas principais culturas, o feijão e o milho, apresentam a maior parcela da sua
produção sendo efetuada de forma isolada. Percebe-se esta mesma característica para a
produção de sorgo e da palma.
Um dado que chama a atenção é a produção de leite ser realizada de forma isolada. Na
pecuária leiteira a utilização de plantios consorciados de lavouras de ciclo curto com
leguminosas de alto valor forrageiro e nitrificante e com cactáceas permite dobrar a produção
de vacas mestiças Holando-Zebu e reduzir seu custo de produção de R$0,25/0,30 para R$0,15
o litro (ABRAMOVAY, 2006).
52
Gráfico 5 – PDHC: Forma de realização das atividades por parte dos assentados
92,4
7,6
100,0
0,0 0,0
100,0
58,1
41,9
41,9
58,1
0,0
100,0
57,7
42,3
0,0
26,2
100,0
73,8
8,0
92,0
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Consorciada
Isolada
Algodão Arroz Carvão Fava Feijão Leite Milho Ovos Palma Sorgo
Atividade/Tipo
Percentual
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
No que se refere ao tipo de produção do arroz, carvão e ovos verifica-se que 100% dos
assentados realizam as suas atividades de forma isolada. Apenas na produção da fava,
percebe-se uma predominância do tipo consorciado, ou seja, o cultivo intercalado com um
outro tipo de cultura.
4.3.2. Assistência técnica
O gráfico 6 apresenta a situação vivenciada pelos assentados no que diz respeito ao
recebimento ou não de assistência técnica para os dez principais produtos por eles produzidos.
Percebe-se que em apenas duas culturas, o algodão e o arroz, o percentual de unidades
assistidas é maior do que o das não assistidas. No caso do feijão e do milho, principais
produtos cultivados, percebe-se que quase 70% dos pequenos produtores não tiveram acesso à
assistência técnica. Chama a atenção o fato dos produtores de carvão não receberem qualquer
tipo de assistência. Como essa atividade é, especialmente, danosa ao meio ambiente, a sua
prática sem qualquer orientação técnica de manuseio da caatinga, potencializa os riscos de
agravo ao bioma.
53
Gráfico 6 – PDHC: Situação da assistência técnica para as principais atividades realizadas
pelos assentados nos quatro estados
33,3
66,7
11,1
88,9
0,0
100,0
27,3
72,7
30,9
69,1
35,6
64,4
32,0
68,0
31,4
68,6
31,0
69,0
36,0
64,0
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não
Algodão Arroz Carvão Fava Feijão Leite Milho Ovos Palma Sorgo
Assistência Técnica
Percentual
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
O número reduzido de pequenos produtores que tiveram acesso a este tipo de serviço
foi uma conseqüência do fraco desempenho da economia brasileira nos três primeiros anos da
década de 1980, pois a elevação da dívida externa a patamares jamais vistos
12
demandou do
Estado uma redução nos gastos públicos, como forma de honrar seus compromissos com os
credores internacionais. Os recursos destinados a alguns programas, como a extensão rural,
passam a ser ofertados em menor proporção quando comparado à década de 1970,
promovendo uma menor intervenção da esfera pública no setor primário.
A partir da primeira metade dos anos 1980, com o agravamento do endividamento do
Estado e elevação da dívida externa do país, assiste-se a uma profunda recessão e o
enfraquecimento da atuação das políticas públicas na agropecuária. A assistência técnica
passou por um desmonte no governo Sarney, com seus orçamentos reduzidos. Em 1990, no
governo Collor, a EMBRATER foi extinta, desencadeando-se então um processo de
esvaziamento do serviço (PEREIRA, SOUSA e CAMPOS, 2007).
12
O elevado endividamento dos países subdesenvolvidos na década de 1980 promoveu uma crise sem
precedentes nas economias periféricas, funcionando como pano de fundo para a implementação de uma reforma
macroeconômica seguindo a cartilha de estabilização e ajuste estrutural impostos pelo Fundo Monetário
Internacional – FMI e pelo Banco Mundial, ocasionando um desmantelamento das instituições do Estado e
promovendo uma redução bastante significativa nos gastos públicos destinados as áreas sociais
(CHOSSUDOVSKY, 1999).
54
Em meados dos anos de 1980, algumas pessoas defendiam que o programa de
assistência técnica conduzido pelo Estado (do INCRA ou de agências estaduais) deveria
definir as escolhas produtivas a serem realizadas pelos assentados. Alguns técnicos mais
radicais defendiam ser um erro assentar pessoas que não tinham um passado ligado ao
desenvolvimento de atividades agrárias (NEAD, 2004).
Durante este período não existia uma política de assentamento clara, mesmo
diante da presença de um documento confeccionado pelo INCRA, o qual
estipulava etapas, processos. Dentro deste contexto, o que se observou
durante a década de 1990 foi um programa descontínuo de prestação de
serviços aos assentados por parte da esfera pública federal. Em alguns
Estados observou-se a realização de uma política de assessoria prestada
pelos departamentos e/ou secretarias dos governos estaduais. Em outros
projetos o trabalho de fornecer assistência técnica ficava a cargo da Emater
(NEAD, 2004, p.211).
A década de 1990 trazia em seu bojo algumas mudanças no meio rural brasileiro que
influenciavam o processo de assistência tecnológica: a expansão repentina dos assentamentos,
a discussão sobre o método mais adequado para esse tipo de serviço e a forma de seleção de
famílias da periferia dos centros urbanos (ALENTEJANO, 1997).
Embora durante todo esse período tenham existido diversos casos de
assentamento assistidos por agências públicas, ou mesmo por entidades não
governamentais, somente a partir da criação do projeto Lumiar em 1996/97,
houve um processo consolidado de assistência técnica voltado
especificamente para os assentamentos, ainda que de forma terceirizada. O
programa tinha como objetivo o repasse de verbas do governo federal a
cooperativas de técnicos credenciadas, indicadas pelos assentados, com um
sistema de comissões estaduais de supervisão envolvendo instituições
públicas e não públicas. Este programa expandiu-se nos últimos anos da
década de 1990, sendo extinto em meados do ano 2000, com a dispensa dos
técnicos que atuavam nos projetos e o cancelamento dos contratos com as
cooperativas, desarticulando em diversos casos um esquema que funcionava
razoavelmente bem (NEAD, 2004, p. 211).
De um modo geral, a assistência técnica no Nordeste encontra-se fragilizada, sem
recursos e sem condições materiais para realizar o papel que desempenhava até os anos 1970,
quando foram criadas a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural -
EMBRATER e suas afiliadas estaduais, as EMATERs. Foi a época do processo de
modernização da agricultura e a missão da assistência técnica era promover a transferência
dos pacotes tecnológicos em articulação com a pesquisa agropecuária (PEREIRA, SOUSA e
CAMPOS, 2007).
55
A assistência técnica deve ser compreendida não apenas para garantir um melhor
desempenho as atividades praticadas pelos assentados, mediante a obtenção de uma maior
produtividade, dado que a presença dos técnicos se torna imprescindível para a elaboração dos
projetos utilizados para captação do crédito (NEAD, 2007).
O padrão da assistência técnica é diferenciado não apenas em relação aos produtos,
mas também em relação às quatro áreas estudadas como pode se observar pelos dados
contidos na tabela 11.
Tabela 11- PDHC: Situação da assistência técnica para as principais atividades realizadas
pelos assentados nos quatro estados.
Atividades CE
(%)
Atividades RN
(%)
Atividades PB
(%)
Atividades SE
(%)
Algodão Algodão Algodão Palma
sim 50 Sim 17 sim 0 sim 31
não 50 Não 83 não 100 não 69
Arroz Batata Melancia Capim
sim 11 sim 14 sim 0 sim 50
não 89 não 86 não 100 não 50
Carvão Castanha Carvão Madeira
sim 14 sim 18 sim 0 sim 0
não 86 não 82 não 100 não 100
Fava Sorgo Jerimun Jerimun
sim 27 sim 30 sim 0 sim 40
não 73 não 70 não 100 não 60
Feijão Feijão Feijão Feijão
sim 37 sim 20 sim 6 sim 49
não 63 não 80 não 94 não 51
Leite Leite Leite Leite
sim 42 sim 10 sim 0 sim 33
não 58 não 90 não 100 não 67
Milho Milho Milho Milho
sim 37 sim 23 sim 8 sim 48
não 63 não 77 não 92 não 52
Ovos Ovos Ovos Ovos
sim 31 sim 30 sim 15 sim 40
não 69 não 70 não 85 não 60
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Embora a deficiência da assistência técnica seja detectada em todas as áreas, o seu
menor nível é encontrado no Cariri Paraibano, área que ostenta as maiores limitações edafo-
climáticas entre as quatro estudadas. O melhor nível de padrão é encontrado na região do
Sertão sergipano, provavelmente, em virtude da ação da CODEVASF.
56
4.3.3. Acesso ao crédito
A tabela 12 revela que uma parcela considerável dos assentados conhece as linhas de
crédito disponíveis pelo governo para o fomento de atividades agropecuárias. Dos
entrevistados, apenas 9,5% afirmaram desconhecer estas linhas nas quatro regiões
selecionadas. No Sertão sergipano 98% dos pequenos produtores revelaram conhecer o
PRONAF.
No tocante à demanda por crédito, verifica-se que no Sertão Central cearense e no
Cariri paraibano, apenas, respectivamente, 29,5% e 50% dos assentados demandaram crédito
agrícola, diferentemente, nas regiões do Apodi e do Sertão sergipano, onde uma parcela
considerável dos pequenos produtores solicitou este tipo de serviço.
Na região do cariri paraibano, um fator negativo foi que aproximadamente metade dos
pequenos produtores teve acesso a este serviço. No restante das regiões pesquisadas, o
percentual de sucesso no que diz respeito a acesso ao crédito superou os 67%. Quase todos os
pequenos produtores afirmaram que o fato de terem se tornado assentados facilitou o acesso a
este tipo de serviço. Segundo o NEAD (2004), a criação dos assentamentos contribuiu
substancialmente para que novos agentes econômicos interagissem com o mercado financeiro,
mesmo diante de uma gama de problemas que comprometem a liberação do crédito.
Tabela 12 – PDHC: Situação vivenciada pelos assentados nos quatro estados no tocante a
existência, demanda e acesso ao Crédito Agrícola.
Existência CE (%) RN (%) PB (%) SE (%) Total (%)
Conhecem 173 86,5 145 90,6 84 86,5 129 98 531 90,5
Não conhecem 27 13,5 15 9,4 12 13,5 2 2 56 9,5
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Demanda
Demandou crédito 59 29,5 126 78,8 48 50 112 86 345 58,7
Não demandou 141 70,5 34 21,2 48 50 19 14 242 41,3
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Acesso
Conseguiram 136 68,0 117 73,1 49 51 109 83,0 411 70
Não Conseguiram 64 32 43 26,9 47 49 22 17 176 30
Total 200 100 160 100 96 100 131 100 587 100
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Dentre eles, a literatura especializada tem elencado como principais entraves:
problemas relacionados com o INCRA, no que diz respeito à documentação do lote e a não
regularização do assentamento, pois é uma exigência dos bancos para a oferta de crédito.
57
Segundo Bittencourt (2003), na área agrícola, em especial entre as populações mais
pobres, o crédito, quando ofertado em conjunto com os demais serviços de apoio, exerce um
papel relevante na geração de emprego e renda. Quando se analisa a questão do crédito para a
agricultura familiar no Brasil, verifica-se que, historicamente, o segmento da população rural
mais pobre vem sofrendo grandes problemas com relação ao acesso a este serviço (SAYAD,
1984).
O governo na tentativa de estabelecer uma política de crédito que viesse atender a
agricultura familiar, historicamente marginalizada, resolveu criar mecanismos que
possibilitassem o aumento da capacidade produtiva, da elevação da renda, e
conseqüentemente a melhoria na qualidade de vida dos pequenos produtores, mediante a
criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF
(GUANZIROLI, 2007).
Desde a sua criação, o programa vem sofrendo modificações, objetivando o
aprimoramento de suas diretrizes e processos operacionais. Atualmente, o PRONAF é
composto por três modalidades: Crédito, Infra-Estrutura e Capacitação, desenvolvendo
treinamentos e oferecendo aos pequenos produtores serviços de extensão rural
13
.
Ainda no caso do PRONAF, percebe-se que existe uma dificuldade de relacionamento
por parte do Estado, através dos agentes responsáveis pela administração dos recursos para
com os integrantes do grupo A (assentados). Segundo o NEAD (2004), muitas vezes a
liberação dos recursos financeiros ocorre após o calendário agrícola em virtude das exigências
com documentação.
Analisando-se o programa, percebe-se que existe uma assimetria na distribuição do
crédito do PRONAF pelas cinco regiões brasileiras. Verifica-se que existe uma grande
concentração de recursos aplicados na região Sul em detrimento das outras regiões, como, por
exemplo, em comparação à região Nordeste. Esta concentra mais da metade de
estabelecimentos familiares no país, no entanto, recebe bem menos recursos em termos
relativos quando comparado aos distribuídos no Sul (SOUSA e JÚNIOR, 2006). Nesse
sentido, existe um desequilíbrio entre a oferta e demanda de crédito, que penaliza a região
Nordeste.
13
Dentre as fontes de abastecimento dos recursos para o PRONAF, destacam-se: Fundos Constitucionais;
Orçamento Geral da União (OGU); Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), Exigibilidades Bancárias (Banco
Central) e Bancos Cooperativos. Estes últimos são os únicos que realizam empréstimos com recursos próprios
aos agricultores. Os outros são Fundos Compulsórios (SILVA; CORRÊA; NEDER, 2006).
58
Quando se analisa o lado da oferta de crédito, verifica-se que vários fatores
diferenciam a região Sul da região Nordeste. Um primeiro aspecto a destacar-se é a presença
de muitas agências bancárias na região Sul, especialmente as do Banco do Brasil e, de um
grande número de cooperativas de crédito. Esta região está sediando os principais sistemas de
crédito cooperativo do Brasil com atuação na área rural - Sicredi, Sicoob e Cresol.
Segundo Bittencourt (2003), na área agrícola, o governo atribuiu aos bancos federais
(em especial ao Banco do Brasil) o papel de fornecer crédito rural. Ao tomar essa atitude, ele
criou um suposto monopólio dos bancos federais nos repasses de algumas fontes de recursos
de crédito. Os bancos aproveitam desta situação cobrando spread, taxas bancárias elevadas e
garantias do governo para a execução de políticas públicas, além de definirem muitas das
regras para a execução destas políticas, a partir de interesses próprios. Esses bancos quando
vão realizar empréstimos levam em consideração os segmentos de maior faixa de renda
(Grupos C, D e E) e maior integração a mercados estáveis da agricultura familiar
(ABRAMOVAY; PIKETTY, 2005).
Quando se analisam os agricultores familiares da região Sul, verifica-se que estes
apresentam maior nível de integração econômica se comparados ao da região Nordeste, pois
existe naquela região uma grande concentração de agroindústrias que mantém contratos com
os produtores familiares sulistas, facilitando e intermediando o acesso aos financiamentos
nesses bancos.
Um outro ponto que leva a uma maior concentração do crédito na região Sul é a
grande participação da agricultura familiar no Valor Bruto da Produção (VPB) daquela
região. Segundo Bittencourt (2003), esta região responde por 50% do VBP da agricultura
familiar, o que mostra que a agricultura familiar sulista é bem estruturada.
Esses fatos explicam o por quê dos bancos preferirem ofertar crédito à agricultores de
uma região mais desenvolvida do que aos de uma região periférica. Em princípio, os bancos
irão ofertar crédito dependendo da probabilidade de estar obtendo um retorno sobre os
empréstimos que eles realizam. Na visão do banco, é mais seguro estar fazendo empréstimos
para uma região (Sul) em que o grau de desenvolvimento é maior, pois as chances de
recebimento também são mais elevadas, ou seja, o risco de inadimplência é menor.
Outro quesito com relação aos bancos é que existe uma falta de interesse da parte
deles em trabalhar com uma clientela de baixa renda, especialmente os agricultores familiares
por não apresentarem um nível de renda regular ao longo do ano. Os agricultores enfrentam
problemas que acabam interferindo em suas rentabilidades, como por exemplo, o risco
59
climático (seca no Nordeste), os altos custos de transações e os preços voláteis. Neste sentido,
esses clientes são classificados pelo banco como pequenos poupadores e correntistas.
Segundo Bittencourt (2003), essa política seletiva dos bancos pode ser constatada por
meio dos limites mínimos exigidos por eles para a realização de poupança e pela cobrança de
taxas mensais para a manutenção de contas correntes. Estas posições que os bancos tomam
estão associadas aos altos custos que enfrentam quando realizam operações de pequeno porte,
principalmente por causa dos riscos associados a elas. Portanto, como o objetivo do banco é
maximizar seu lucro esperado, ele vai querer incorrer em menores riscos possíveis.
Além disso, os bancos ofertam uma maior quantidade de empréstimos para aqueles
agricultores familiares que já eram seus clientes há muito tempo. Pelos dados apresentados
na seção anterior, verificou-se que no período de 2001 a 2004, o grupo C foi o maior receptor
de recursos do PRONAF. De acordo com Belik (2000), esse grupo já era o grande receptor de
recursos desde o início do programa, pois os tomadores de empréstimos deste grupo eram
basicamente agricultores que já eram clientes do Banco do Brasil e, que passaram a valer-se
desta nova linha de crédito em melhores condições financeiras.
Estas posições dos bancos podem estar relacionadas aos problemas informacionais. As
instituições financeiras não têm acesso às informações específicas de cada agente, neste
sentido, quando o banco trabalha com uma clientela já conhecida, ele pode estar diminuindo o
nível de informação assimétrica. Este problema se trata do risco moral, em que o tomador de
empréstimos pode estar aplicando os recursos obtidos em operações mais arriscadas e
posteriormente pode não honrar seus compromissos com o banco. Quando a instituição
financeira toma este tipo de posição está restringido o crédito no mercado financeiro.
Ao se analisar o lado dos demandantes de crédito, verifica-se que existe uma forte
organização social entre os agricultores familiares da região Sul, ao contrário, do que ocorre
com os produtores da região Nordeste, em que existe uma desarticulação e baixa inserção
social. Essa organização associada à assistência técnica estatal que existe ainda nesta região
contribui na elaboração de projetos técnicos mais viáveis e rentáveis. Este fator pode ser
usado para demonstrar que existe outro problema na liberação de recursos que é a questão da
viabilidade econômica dos projetos.
Um problema sério que tem surgido no acesso ao crédito é a inadimplência. Como o
pequeno produtor para ter direito ao crédito tem que ter cumprido as exigências do crédito
anterior, o fato de um número expressivo não ter saldado os seus compromissos com o
empréstimo anterior, impede-o do acesso a novas operações de crédito. No caso do Nordeste,
o número de inadimplentes é elevado por uma série de fatores, podendo ser destacados: a) a
60
irregularidade climática; b) projetos mal elaborados, particularmente, os projetos de
investimento; c) produção restrita a produtos tradicionais com baixo preço de mercado; d)
falta de planejamento da produção etc. (TARGINO e COUTO, 2007).
Por fim, existe a questão das renegociações das dívidas rurais ou os perdões
generalizados dessas dívidas. Segundo Bittencourt (2003), cada nova renegociação é melhor
que a anterior para os tomadores de empréstimos, sendo assim muitos produtores podem
evitar saldar suas dívidas, mesmo tendo recursos suficientes para fazer isso. Este fato
contribui em muito para aumentar a inadimplência no mercado de crédito e isso pode inibir a
participação dos bancos na oferta de crédito rural. Destaca-se que isso pode ser válido tanto
para os grupos de faixa de renda mais baixa, quanto para os de renda mais alta.
Neste contexto, verifica-se que realmente existe o problema de restrição de crédito
dentro do próprio PRONAF. E essa restrição depende, principalmente, da disposição dos
bancos em estarem assumindo ou não riscos e do perfil do tomador de crédito. A identificação
destes problemas pode permitir que se realize futuramente uma estimativa mais precisa sobre
a questão de restrição de crédito no PRONAF, tornando-o um instrumento mais efetivo de
apoio à pequena produção familiar.
4.3.4. Tecnologia: adubação, irrigação e manejo do solo
O padrão tecnológico vigente nas unidades de produção familiar ainda apresenta
deficiências, embora haja uma certa difusão do conhecimento das técnicas produtivas.
Analisam-se aqui três procedimentos tecnógicos (adubação e combate a pragas, irrigação e
manejo de solo), confrontando o nível de conhecimento e o seu uso efetivo.
4.3.4.1. Adubação e combate a pragas
O conhecimento de procedimentos e de tipos de adubação e de combate a pragas é
relativamente bem difundido. Isto é particularmente verdade no caso de utilização de
agrotóxicos. Dos entrevistados, 80,7% já ouviram falar na utilização de adubo químico na
lavoura e 97,4% na utilização de agrotóxico veneno como forma de combater as pragas que
ameaçam a plantação.
61
Tabela 13- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de adubação e de combate a pragas
por parte dos assentados selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados.
Procedimento Conhecimento Uso
Adubação verde 49,7 12,0
Adubação química 80,7 13,7
Inseticida e herbicida 97,6 97,6
Composto orgânico 46,0 46,0
Defensores naturais 64,8 64,8
Esterco 97,9 97,9
Húmus de minhoca 42,2 42,2
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Interessante observar que à exceção da adubação química, os percentuais de
conhecimento e de uso são exatamente os mesmos. O preço dos adubos químicos pode
explicar a sua baixa utilização. O elevado uso de inseticidas é um dado preocupante, uma vez
que esses produtos, provavelmente, são usados sem qualquer acompanhamento técnico. Desse
modo, isso pode implicar em uso e manuseio inadequado dos mesmos, com riscos à saúde dos
consumidores e dos próprios produtores.
Quanto às práticas agro-ecológicas, a sua difusão embora menos pronunciada não é
desprezível. Com efeito, 49,7% dos entrevistados afirmaram já terem ouvido falar da
adubação verde, 46% dos pequenos produtores afirmaram conhecer o composto orgânico,
66,6% a utilização de defensores naturais, caseiros ou agro-ecológicos, 97,9% a utilização de
esterco animal e 42,2% o uso de húmus de minhoca na lavoura. Excetuada a adubação verde
que apenas 12% dos produtores declararam praticá-las, o uso dos demais procedimentos agro-
ecológicos coincide com o nível do seu conhecimento.
Muitas destas técnicas são largamente utilizadas pela agricultura patronal,
principalmente as químicas, o que lhe garante maior produtividade, tornando os seus produtos
mais vistosos e competitivos no mercado. Diferentemente do que ocorre na região Sul, no
Nordeste os pequenos produtores ainda têm pouco acesso a estas técnicas, devido a má
qualidade da assistência técnica e a limitação de recursos para a aquisição de determinados
produtos utilizados para adubar as plantações.
4.3.4.2. Uso da irrigação
Conforme os dados contidos na Tabela 14, também é elevado o nível de conhecimento
das técnicas de irrigação. Dos pequenos produtores selecionados na amostra, 75,6%
declararam conhecer a técnica de irrigação localizada (microasperção ou gotejamento), 91,5%
62
disseram ter ouvido falar da técnica de irrigação por aspersão e 75,5% afirmaram ter
conhecimento da irrigação por sulco.
Tabela 14- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de irrigação por parte dos
assentados selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados.
Procedimento Conhecimento Uso
Irrigação localizada 75,6 4,4
Irrigação por aspersão 91,5 12,1
Irrigação por sulco 73,8 7,5
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
A tabela 14 revela o acesso por parte dos assentados selecionados pelo Projeto Dom
Hélder Câmara às modalidades de irrigação. Dos entrevistados, 4,4% afirmaram utilizar
irrigação localizada (microasperção ou gotejamento).
Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA (s.d.), neste
método, a água é aplicada apenas em uma porção do sistema radicular das plantas, onde a
proporção da área molhada varia de 20 a 80% da área total, sendo aconselhada para locais
onde a quantidade de água disponível para irrigação é escassa. O teor da umidade do solo
pode ser mantido elevado, através de irrigações freqüentes e em pequenas quantidades,
beneficiando culturas que respondem a essa condição, como é o caso do milho, muito
produzido nos assentamentos pesquisados. É um método que possibilita automação total,
demandando menos mão-de-obra na sua operação. Os principais sistemas de irrigação para
esta modalidade são o gotejamento e a micro-aspersão.
Dos assentados, 12,1% declararam utilizar irrigação por aspersão. De acordo com a
EMBRAPA (s.d.), neste método jatos de água são lançados ao ar, caindo sobre a cultura na
forma de chuva. As principais vantagens são: ser de fácil adaptação em relação aos diversos
tipos de solo e topografias; apresenta potencialmente maior eficiência na distribuição da água
e pode ser totalmente automatizado. Dentre as desvantagens estão: o custo de aquisição e
operação é elevado; pode sofrer influência das condições climáticas, como vento e umidade
relativa; a irrigação com água salina pode desgastar mais rapidamente o equipamento e causar
danos a algumas culturas e a salinização do solo (EMBRAPA, s.d.).
Dos pequenos produtores residentes nos assentamentos pesquisados, 7,5% declaram
ter acesso ao método de irrigação por sulco. Este tipo foi muito difundido nos perímetros
irrigados implementados pelo DNOCS no Nordeste. Quando devidamente planejado e
executado, constitui-se no método ideal para os cultivos em fileiras como no caso do algodão
63
(EMBRAPA, s.d.). Apresenta a desvantagem de requerer uma grande disponibilidade de
água.
Sabendo-se que o semi-árido nordestino é uma região de chuvas irregulares e de baixo
índice pluviométrico, percebe-se que o acesso à irrigação por parte dos pequenos produtores
fica muito aquém do desejado. Em regiões de sequeiro o risco para o pequeno produtor vem
se tornando cada vez maior, diante de um cenário onde as variações climáticas, tornam-se
cada vez mais intensas, devido ás agressões impostas ao meio ambiente.
Durante um bom tempo, o semi-árido nordestino fora classificado como uma região
inóspita, com pouca vocação para a agricultura. Todavia, as experiências de sucesso
verificadas em Petrolina com a fruticultura irrigada, sinalizam para a necessidade de expandir
o processo de irrigação para uma gama maior de pequenos produtores, bem como a
transferências de novas tecnologias que venham a elevar a produtividade das atividades
realizadas por este segmento da agricultura nordestina.
4.3.4.3. Manejo do solo
O nível de conhecimento por parte dos pequenos produtores em relação aos tipos de
manejo de solo está retratado nos dados contidos na Tabela 15. Dos entrevistados, 97,9%
conhecem a utilização de queimadas, enquanto 76,4% disseram ter ouvido falar em
reflorestamento e 42,9% na utilização de faixa de proteção com vegetação nativa.
Tabela 15- Nível (%) de conhecimento e uso das técnicas de manejo do solo por parte dos
assentados selecionados pelo Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro estados.
Procedimento Conhecimento Uso
Queimada 97,9 61,7
Reflorestamento 76,4 14,2
Faixa de proteção com vegetação nativa 42,9 5,6
Fonte: Base de Dados do PDHC, 2005.
Quanto às formas de manejo do solo praticadas pelos assentados, constata-se a
permanência da prática da queimada por 61,7% dos entrevistados. Esta prática acaba sendo
perniciosa à terra, causando: a alteração química do solo; a eliminação de alguns predadores
naturais de algumas pragas; a eliminação da cobertura vegetal do solo, o que vem a favorecer
o escorrimento natural da água das chuvas; além de aumentar a emissão da quantidade de
monóxido de carbono e dióxido de carbono na atmosfera, os quais afetam a saúde dos seres
vivos, reduzindo a atividade fotossintética dos vegetais, prejudicando assim, a produtividade
64
de diversas culturas (EMBRAPA, s.d.). As queimadas ainda podem acentuar o processo de
desertificação no semi-árido nordestino.
No tocante ao reflorestamento, apenas 14,2% dos pequenos produtores afirmaram
fazer uso dele. Torna-se importante estimular esta forma de manejo, como o intuito de reduzir
o processo de desertificação vivenciado pela caatinga. O pequeno percentual de assentados
que disseram usar a faixa de proteção com vegetação nativa, também reforça a necessidade de
construção de políticas públicas que contemplem aspectos desta importância.
Após ter traçado o perfil dos produtores assentados, as condições infra-estruturais dos
PAs assistidos pelo PDHC, assim como as principais características da organização da
produção, no próximo capítulo, procura-se discutir o grau de eficiência dos produtores
assistidos e as ações executadas pelo Projeto.
65
CAPÍTULO V – GRAU DE EFICIÊNCIA DOS PRODUTORES E A AÇÃO DO
PROJETO DOM HÉLDER CÂMARA
Este capítulo pretende analisar o grau de eficiência dos produtores assistidos pelo
PDHC, utilizando a metodologia da análise envoltório de dados (DEA). Em seguida,
discutem-se as ações desenvolvidas pelo Projeto Dom Hélder Câmara, buscando-se estudar se
as ações podem contribuir para a superação das dificuldades detectadas.
5.1. A eficiência dos produtores: análise do DEA
Utilizando os dados da amostra escolhida, que contempla 303 assentados, foi aplicada
a metodologia para o modelo de Análise de Envoltória de Dados-DEA, com retornos
variáveis de escala, DEA-V.
A utilização do modelo permite estabelecer uma relação entre as variáveis: área dos
lotes utilizada para a realização de atividades agropecuárias, número de pessoas que
trabalham na parcela e o nível de eficiência técnica dos pequenos produtores.
Tabela 16 - Distribuição dos produtores por classes de eficiência técnica
Classe de eficiência
técnica
Número de produtores
DEA – V
Fr. Absoluta %
0 – 0,2 1 0,3
0,21 – 0,4 56 18,5
0,41 – 0,6 143 47,2
0,61 – 0,8 13 4,3
0,81 – 0,99 5 1,7
1 85 28,1
Total 303 100
Mínima 0,2 -
Média 0,67 -
Máxima 100 -
Fonte: A partir dos resultados da modelagem.
66
Em um momento seguinte, buscou-se identificar a relação existente entre o nível de
eficiência técnica dos assentados em relação ao acesso a: crédito agrícola, assistência técnica,
irrigação localizada, irrigação por aspersão, irrigação por sulco e tração animal e mecanizada.
Com base nos dados contidos na tabela 16, percebe-se que pelo modelo DEA-V, 85
produtores mostraram-se eficientes, ou seja, 28% dos assentados que compõem a amostra.
Esse resultado evidencia o grau de dificuldades em que se encontra a grande maioria dos
produtores assentados, incluídos no campo de atuação do PDHC.
Considerando a distribuição dos produtores eficientes segundo o tamanho dos lotes,
percebe-se que 63,5% dos 85 produtores considerados eficientes possuem lotes de tamanho
entre 0 e 3 hectares. Essa relação mostra-se decrescente à medida que se passa para os estratos
de área mais elevados. No entanto, quando se considera a relação eficiente/assentado por
estrato de área, observa-se uma distribuição em forma de “u”, permanecendo, contudo, os
produtores com até três hectares como os relativamente mais eficientes (veja tabela 17). No
grupo dos ineficientes, a maior parcela encontra-se nos lotes entre 3,1 e 6 hectares,
aparecendo em seguida os produtores que possuem terras de tamanho entre 6,1 e 9,0 hectares.
Tabela 17 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo a área do lote
Área
(hectares)
Assentados (A) Eficientes (B) B/A
%
Nº (%) (%)
0,1 - 3,0 159 52 54 63,5 33,9
3,1 - 6,0 84 28 15 17,6 17,9
6,1 - 9,0 28 9 6 7,0 21,4
9,1 -12 16 5 5 5,9 31,2
Mais de 12 16 5 5 5,9 31,2
Total 303 100 85 100,0 33,00
Fonte: Elaboração do autor.
O tamanho ideal dos lotes dos assentados tem sido alvo de uma discussão há muitos
anos. No Estatuto da Terra foi estabelecido o conceito de módulo rural, que define a
quantidade de terra necessária para garantir o sustento de uma família de quatro pessoas. O
tamanho do módulo rural varia segundo as condições naturais e sócio-econômicas da região
onde se situa o imóvel. Consiste em uma unidade de medida, expressa em hectares, que visa
exprimir a interdependência entre a dimensão, a localização geográfica dos imóveis rurais e a
forma e as condições do seu aproveitamento econômico.
Em regiões como o semi-árido do Nordeste, classificadas como inóspita pela
existência de freqüentes secas, são sugeridos lotes maiores, como forma de “compensar” as
dificuldades impostas pelas condições naturais da região. O resultado encontrado, portanto,
67
não se mostra condizente com essa expectativa. Essa discrepância poderia ser explicada pela
maior intensificação do conteúdo e da quantidade de trabalho nos lotes menores. Tal hipótese,
contudo, não foi verificada quando se investigou o grau de eficiência dos produtores segundo
o número de trabalhadores no lote (veja Tabela 18).
Tabela 18 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o número de
trabalhadores no lote.
Nº de trabalhadores Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
1 trabalhador 81 27 81 95,3 100,0
2 trabalhadores 142 47 3 3,5 2,1
3 trabalhadores 69 23 1 1,2 1,4
4 trabalhadores 7 2 0 - 0
Mais de 4 trabalhadores 4 1 0 - 0
Total 303 100 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Na tabela 18 estão contidas informações relativas à distribuição dos lotes segundo o
número de trabalhadores que participam de sua exploração e o grau de eficiência técnica
calculado pelo modelo DEA-V. Dos 303 lotes, constata-se que a maior parte é explorada por
até três trabalhadores. Em apenas 11 lotes há a presença de quatro ou mais trabalhadores.
Como visto anteriormente, uma das razões para o pequeno número de trabalhadores por lote é
a migração de parte da força de trabalho familiar.
Todos os lotes que possuíam apenas um trabalhador como sendo o responsável pela
realização das atividades foram considerados eficientes. Nos lotes acima de 1 trabalhador,
apenas 3% foram tidos como eficientes. O grande percentual de lotes com mais de um
trabalhador considerados ineficientes vai de encontro à teoria de Chayanov, a qual afirma que
um número maior de braços cultivando a terra promoveria uma melhor condição de vida para
a família e, por isso famílias numerosas deveriam ser estimuladas.
Segundo o NEAD (2004), nos assentamentos localizados no Nordeste brasileiro o
trabalho é predominantemente familiar. Nos assentamentos selecionados no Projeto Dom
Hélder Câmara, a maior parte dos entrevistados afirmou trabalhar somente nos lotes.
Todavia, para o NEAD (2004) existe uma tendência dos assentados afirmarem
trabalhar apenas nos lotes, ou seja, esconderem a participação em outros tipos de trabalho,
pois esta postura é vista com maus olhos pelo INCRA, pela Igreja, pelos movimentos sociais
que lutam pela posse e uso da terra e, até mesmo, pelos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais.
Em seguida, procurou-se identificar quais os principais fatores que afetam a eficiência
dos produtores investigados: crédito, assistência técnica, tipo de irrigação e tipo de tração.
68
5.1.1. Eficiência e crédito agrícola
A tabela 19 apresenta a relação entre o acesso ao crédito agrícola e o grau de eficiência
dos assentados nas quatro regiões estudadas. Dos 303 pequenos produtores, 153 tiveram
acesso ao crédito agrícola. Destes, 32% mostraram-se eficientes e 68% ineficientes. Dos
assentados que não tiveram acesso ao crédito agrícola, apenas 24% mostraram-se eficientes,
enquanto 76% foram classificados como ineficientes.
Tabela 19 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o acesso ao
crédito.
Acesso ao crédito Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 153 50,4 49 57,6 32,0
Não teve acesso 150 49,6 36 42,4 24,0
Total 303 100,0 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Diante dos resultados obtidos pelo DEA-V que mostram que 57,6% dos produtores
eficientes tiveram acesso ao crédito, pode-se inferir que a oferta de crédito agrícola contribui
para uma melhor realização das atividades realizadas pelos assentados. Esta conclusão
corrobora a literatura existente, que considera o crédito um fator de alavancagem do
desenvolvimento econômico de uma determinada região, dado o seu poder de transformar,
quando acompanhado de outros serviços como a assistência técnica e o fortalecimento da
infra-estrutura dos assentamentos e dos canais de comercialização, uma realidade adversa e
extremamente desfavorável, onde as carências sociais se encontram em evidência, modelando
um cenário de combate à pobreza e ascensão socioeconômica da população envolvida.
5.1.2. Eficiência e assistência técnica
A observação da tabela 20 revela que apenas 99 dos 303 pequenos produtores tiveram
acesso a assistência técnica, ou seja, 32,6% da amostra. No entanto, 55,5% deles estão
incluídos na categoria dos eficientes. Por outro lado, apenas 14,7% dos que não tiveram
acesso à assistência técnica foram considerados eficientes na realização de suas atividades.
69
Tabela 20 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V) segundo o acesso à
assistência técnica.
Assistência Técnica Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 99 32,6 55 64,7 55,5
Não teve acesso 204 67,4 30 35,3 14,7
Total 303 100 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Neste contexto, a construção de um amplo programa de assistência técnica, por parte
do Estado, onde a oferta deste serviço ocorra com qualidade e alcance uma parte considerável
da demanda existente no campo, torna-se imprescindível para a promoção da ascensão
econômica dos assentados.
5.1.3. Eficiência e irrigação localizada
Na tabela 21 estão contidos os números relativos à utilização da modalidade irrigação
localizada pelos assentados. Dos 303 pequenos produtores, apenas 10 afirmaram ter usado
irrigação em seus lotes. Destes, 8 estão classificados no grupo dos produtores considerados
eficientes.
Tabela 21 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de
irrigação localizada.
Assistência Técnica Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 10 3,3 8 9,4 80,0
Não teve acesso 293 96,7 77 90,6 26,0
Total 303 100 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Esta grande participação dos que utilizaram irrigação do tipo localizada no estrato dos
eficientes revela a importância deste recurso para o bom desenvolvimento da agricultura e
pecuária praticadas nos assentamentos, em especial, pelo clima presente na região do semi-
árido, onde as chuvas são escassas.
70
5.1.4. Eficiência e irrigação por aspersão
A tabela 22 apresenta a distribuição dos produtores em relação à utilização do método
de irrigação por aspersão. Da amostra selecionada, apenas 34 produtores declararam ter
utilizado irrigação por aspersão durante a realização de suas atividades. Todavia, destes,
35,3% se mostraram eficientes, enquanto dos 269 que não tiveram acesso a esta modalidade
de irrigação, apenas 27% estiveram incluídos no grupo dos produtores considerados
eficientes.
Tabela 22 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de
irrigação por aspersão.
Irrigação por aspersão Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 34 11,3 12 14,0 35,3
Não teve acesso 269 88,7 73 85,9 27,0
Total 303 100 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Assim como na relação entre a eficiência e a modalidade de irrigação localizada, a
utilização de irrigação por aspersão revelou que esta modalidade precisa estar disponível aos
pequenos agricultores, para que estes possam mediante utilização deste recurso fomentar a
elevação da produtividade de suas lavouras e criações.
5.1.5. Eficiência e irrigação por sulco
Tabela 23 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo a prática de
irrigação por sulco.
Irrigação por sulco Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 18 5,9 8 9,4 44,4
Não teve acesso 285 94,1 77 90,6 27,0
Total 303 100,0 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Na tabela 23 estão contidas informações referentes à relação existente entre o acesso a
irrigação por sulco e o alcance da eficiência por parte dos assentados. Dos 303 pequenos
produtores, 18 afirmaram terem irrigado as suas atividades segundo essa modalidade. Desses
18, 44,4% mostraram-se eficientes, enquanto apenas 27% dos que não tiveram acesso a
irrigação por sulco estiveram contemplados no grupo dos que alcançaram a eficiência.
71
O resultado do DEA-V mostrou que assim como as modalidades de irrigação por
gotejamento e aspersão, a irrigação por sulco também contribuiu para que uma parcela maior
dos assentados viesse a ser considerados eficientes em relação aos que não tiveram acesso a
água para irrigar as suas atividades.
A utilização da irrigação mostra-se importante para a ampliação da capacidade de
produção por parte dos assentados residentes nos assentamentos das quatro regiões em
apreço. Em Petrolina, investimentos da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São
Francisco e do Parnaíba – CODEVASF na fruticultura irrigada, que tem permitido a
possibilidade de retirar duas safras e meia por ano de frutas de alto valor comercial, associada
ao tipo de clima verificado na região, que por ser extremamente quente apresenta uma baixa
incidência de doenças (LIMA e MIRANDA, 2001), sinalizam para o quanto os assentados
poderiam melhorar em termos de competitividade se a irrigação fosse disponibilizada em
amplo espectro.
5.1.6. Eficiência e tração animal
Dos 303 assentados contemplados na amostra, 86,8% utilizam tração animal na
realização de suas atividades (veja Tabela 24). O uso de tração animal, no entanto, não é um
fator importante para imprimir eficiência à atividade do produtor familiar, pois a relação entre
produtores eficientes e produtores totais é praticamente a mesma nos dois grupos de controle:
28,5% entre os que tiveram acesso e 25,0% entre os que não tiveram acesso.
Tabela 24 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo o uso de tração
animal.
Tração animal Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 263 86,8 75 88,2 28,5
Não teve acesso 40 13,2 10 11,8 25,0
Total 303 100,0 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Além de meio de transporte, os animais geralmente são utilizados para arar a terra,
facilitando o trabalho durante o plantio. No meio rural do Nordeste, essa prática ainda é
bastante comum na agricultura familiar. Desprovidos dos recursos necessários à aquisição de
um trator, muitos pequenos produtores possuem um cavalo ou um boi para puxar o arado
utilizado para cavar as valas onde serão depositadas as sementes, como forma de facilitar o
72
plantio de uma roça que venha a garantir ao menos a subsistência da família.dos quais 28,5%
fazem parte do grupo dos produtores eficientes.
Atualmente, no Nordeste brasileiro, verifica-se dentro de uma mesma região o
convívio do arcaico e do moderno. Enquanto a agricultura patronal desfruta de modernas
tecnologias para o desenvolvimento de suas atividades na agroindústria canavieira, localizada
na Zona da Mata e na fruticultura irrigada nos Vales do São Francisco, no semi-árido
Pernambucano, e do Açu, no semi-árido norte rio grandense, os pequenos produtores utilizam
técnicas de produção arcaicas, que muitas vezes os remetem a uma situação de
insustentabilidade do ponto de vista econômico.
5.1.7. Eficiência e tração mecanizada
Na tabela 25 estão contidas informações referentes ao nível de acesso por parte da
pequena produção à tração mecanizada. Dos produtores contidos na amostra, verifica-se que
90% não tiveram acesso a este fator de produção.
Tabela 25 – Distribuição dos produtores totais e eficientes (DEA-V), segundo o uso de tração
mecânica.
Tração mecânica Assentados (A) Eficientes (B) B/A
(%)
Nº (%) (%)
Teve acesso 33 10,9 14 16,5 42,4
Não teve acesso 270 89,1 71 83,5 26,3
Total 303 100,0 85 100,0 28,0
Fonte: Elaboração do autor.
Dos 33 que afirmaram ter utilizado um trator para arar a terra, 42,5% estão incluídos
no grupo dos que são considerados eficientes, enquanto apenas 26,2% dos que revelaram não
terem tido acesso a este tipo de serviço ofertado pelo Estado pertencem ao grupo dos que
alcançaram o máximo de eficiência técnica. A utilização de um trator na realização das
atividades é uma das principais demandas da pequena produção no Nordeste brasileiro.
Da análise acima efetuada, fica evidente, de um lado, o pequeno percentual de
produtores considerados eficientes, e, de outro lado, os principais fatores que podem
alavancar o nível de eficiência dos pequenos produtores assentados: acesso ao crédito,
assistência técnica, uso de irrigação e mecanização da produção. Diante disto cabe a pergunta:
como o PDHC tem atuado no sentido de tornar acessíveis tais fatores aos produtores
assentados incluídos na sua área de atuação?
73
5.2. O Projeto Dom Hélder Câmara: uma visão geral
O projeto é fruto de um acordo de empréstimo internacional firmado entre o Estado
brasileiro, representado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA e o Fundo
Monetário Internacional para o Desenvolvimento Agrícola – FIDA, cujo principal objetivo
perpassa pela transformação do semi-árido nordestino diante da concepção do
desenvolvimento humano sustentável
14
, ou seja, promover o desenvolvimento das
potencialidades de uma região sem limitar as potencialidades de gerações futuras.
Constitui-se como uma das vertentes do escopo de políticas públicas nacionais ao
atuar no atendimento de 15.000 famílias participantes do processo de reforma agrária e de
agricultores familiares residentes nesta região, contendo como grande desafio a promoção da
ascensão social e econômica das famílias assistidas pelo programa.
Figura 3 - Estados contemplados no Projeto Dom Hélder Câmara
Fonte: MDA, 2007.
Dentro deste contexto, o projeto Dom Hélder Câmara insere-se nesse espaço
geográfico com o intuito de transformar esta realidade, combatendo a pobreza rural e o
processo de desertificação que se encontra em curso e promovendo o fortalecimento dos
investimentos no setor primário. Esta política pública se justifica por ser essa, a região
14
Uma rica discussão a respeito deste tema encontra-se no livro, intitulado: “Desenvolvimento Sustentável – o
desafio do século XXI”, do economista e professor da Universidade de São Paulo, José Eli da Veiga.
74
detentora do maior contingente de pessoas residentes no campo, cerca de 18 milhões, segundo
o IBGE, das quais 68% desfrutando de condições de pobreza extrema (MDA, 2005).
Os objetivos estratégicos contidos no plano de ação do programa são: 1) elevar o nível
de segurança hídrica das famílias; 2) elevar o nível de segurança alimentar das famílias; 3)
aumentar os níveis de renda das unidades familiares; 4) ampliar a capacidade produtiva e a
geração de emprego e renda; 5) apoiar a diversificação de atividades e culturas; 6) ampliar o
acesso ao crédito e serviços financeiros; 7) promover a ampliação e apoiar ações referentes à
inclusão étnica, objetivando fortalecer a cidadania de populações negras e indígenas; 8)
ampliar as oportunidades de acesso das comunidades aos serviços sociais básicos, de infra-
estrutura e de crédito; 9) ampliar a capacidade tecnológica e de gestão dos agentes produtivos
frente às necessidades de recuperação do ecossistema, contribuindo para a melhoria das
condições de convivência da população para com o semi-árido nordestino; 10) Apoiar o
desenvolvimento de espaços interinstitucionais democráticos para a implementação
participativa de políticas públicas; 11) Fortalecer as práticas organizacionais autônomas e
solidárias; 12) reduzir as desigualdades entre homens e mulheres em suas diferentes idades,
seja na esfera da produção, da reprodução ou da tomada de decisão; 13) estimular, sem
distinção de sexo, a participação direta dos jovens no desenvolvimento local; 14) dinamizar a
consolidação de conhecimentos e práticas sobre as alternativas de convivência com o semi-
árido e; 15) fortalecer a capacidade técnica local (MDA, 2005, p.7).
O alcance dos objetivos propostos pelo plano estratégico dependerá, segundo
Abramovay (2006), do quanto o projeto Dom Hélder Câmara será capaz de afastar as velhas
idéias de que a geração de emprego e renda demanda apenas e tão somente a superação da
situação precária em que se encontra a agricultura e a identificação através das variáveis:
nível de renda, educação, população envolvida com a agricultura e tamanho das terras dos
pequenos agricultores, para selecionar e promover a transferência dos recursos necessários ao
combate à pobreza rural.
Dado que o campo não pode ser considerado um local onde se desenvolvem apenas
atividades agrárias, desfazendo a perfeita relação existente no passado entre o comportamento
do emprego rural e as variações observadas na expansão/retração das áreas plantadas,
pastagens e quantidade produzida, diante do transbordamento de um conjunto de atividades
não-agrícolas – como a prestação de serviços (pessoais, de lazer ou auxiliares das atividades
econômicas), o comércio e a indústria. (GRAZIANO, 1997 b).
Na visão de Abramovay (2006), os investimentos projetados para a execução do
Projeto Dom Hélder Câmara devem estar fundamentados na idéia que a luta de combate e
75
minimização da pobreza rural nos municípios selecionados no semi-árido nordestino perpassa
por um esforço na direção do fortalecimento do empreendedorismo individual e coletivo.
Para Wanderley (1999, p.31):
A capacidade das comunidades para mobilizar recursos e pessoas e organizar
as atividades econômicas está baseada na coordenação e na ação coletiva
entre indivíduos. As organizações econômicas estão formadas por indivíduos
que trabalham de maneira interdependente para produzir bens e serviços; e
as interdependências requerem coordenação para assegurar que atividades
como a mobilização de capital e trabalho, a divisão de tarefas e a
distribuição dos ganhos sejam desenvolvidas recorrentemente.
O estimulo ao empreendedorismo individual e coletivo se faz necessário, após o
resultado de um estudo realizado através de uma parceria entre o Instituto de Pesquisas
Sociais Aplicadas – IPEA e a Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste –
SUDENE, no qual foi identificada uma pequena contribuição do trabalho assalariado na
geração de renda nesta região (ABRAMOVAY, 2006).
Esta pesquisa também foi responsável pela definição dos 18 municípios de maior
dinamismo no semi-árido nordestino, utilizando como critério de análise: a evolução dos
empréstimos bancários durante toda a década de 1990, a elevação da produção agropecuária e
dos rendimentos do trabalho assalariado neste mesmo período.
O estudo se concentrou no emprego assalariado formal do setor privado, analisando os
dados contidos na RAIS. Com toda a limitação imposta à definição dos contornos relativos à
situação do trabalho assalariado (dado que grande parte da força de trabalho encontra-se em
uma situação de informalidade) é interessante observar que, existem nos 18 municípios de
maior dinamismo econômico na região do semi-árido nordestino, uma população de
aproximadamente 2 milhões de pessoas, na qual apenas 28 mil encontram-se no setor privado
e formal da economia, extraindo deste cálculo os empregos oferecidos pelas esferas
municipal, estadual e federal (ABRAMOVAY, 2006).
Segundo Abramovay (2006, p.4):
Mesmo que se projete um horizonte altamente favorável de criação de novos
empregos – o que não parece ser o caso ao menos para os próximos dois
anos no Nordeste e muito menos no semi-árido – é difícil acreditar que a
expansão do trabalho assalariado, fruto do progresso econômico das áreas
mais dinâmicas da região possa contemplar o essencial da necessidade de
geração de emprego e renda para a população vivendo hoje em situação de
pobreza. Por maior que seja o poder da criação de trabalho assalariado em
função do crescimento das atividades mais dinâmicas do semi-árido uma
parte muito importante da geração de renda vai depender antes de tudo do
trabalho autônomo e familiar.
76
Neste contexto, faz-se mister a não repetição de erros passados, observados durante a
confecção das políticas públicas, onde muitas vezes os projetos eram traçados sem a
participação das populações assistidas e se concentravam em atividades agrárias deixando de
fora algumas potencialidades de uma região devem ser prioridade (VEIGA, 2001).
Na visão de Abramovay (2000), as potencialidades de uma região devem ser
exploradas mediante implantação de um sistema de finanças de proximidade, ou seja, a
construção de um sistema financeiro local.
A distância entre o sistema bancário e as necessidades produtivas das populações mais
pobres no meio rural brasileiro é algo evidente, pois o volume de crédito demandado e a
comprovação de determinada quantidade de garantias requeridas pelos bancos para
liberalização dos empréstimos, afetam o comportamento e a distribuição dos tomadores de
empréstimos. Dessa forma, os termos por meio dos quais os créditos serão ofertados, vai
depender dos julgamentos dos bancos sobre a probabilidade de receber os empréstimos
concedidos (DIAS e ABRAMOVAY, 2001).
Tal fato, por sua vez, depende das decisões sobre a posição financeira e as estruturas
de incentivos enfrentadas pelos agentes que irão recebê-los. Assim, esses recursos podem
também levar ao surgimento dos efeitos de seleção e de incentivos adversos
15
.
A esmagadora maioria dos municípios onde será implantado o projeto Dom
Hélder Câmara não possuem nem sequer uma agência bancária, o que cria
um círculo vicioso entre a baixa geração de renda, a baixa capacidade local
de poupança e o fortalecimento dos atores que acabam inibindo as atividades
econômicas inicialmente promissoras (ABRAMOVAY, 2006, p.10).
O sistema de microfinanças, em associação com os programas de transferência de
renda, pode elevar o nível de poupança e dos investimentos locais, desfazendo os
impedimentos às iniciativas econômicas inovadoras. Para Abramovay (2006), a ascensão
econômica e social dos beneficiários do projeto Dom Hélder Câmara irá depender da
mobilização das forças vivas do semi-árido, bem como da reunião dos recursos técnicos e
financeiros necessários a sua execução.
No tocante à assistência técnica, percebe-se que o nível de produtividade da
caprinocultura e da ovinocultura pode triplicar mediante adoção de práticas simples de
15
Nesse contexto, o crédito trata de algo altamente individual e a informação relevante para o fornecimento do
montante é altamente específica, ou seja, as informações dos agentes não estão disponíveis de forma homogênea
para todas as instituições financeiras. Na verdade, os bancos têm uma informação agregada da economia, e,
portanto, eles vão gastar montantes na tentativa de obter informações de tais agentes e muitas vezes essas
despesas serão irrecuperáveis. Portanto, “um emprestador que vem negociando com um tomador de empréstimos
específico por um longo tempo, tem uma base muito mais ampla para interpretar dados relativos às
circunstâncias econômicas atuais do tomador” (STIGLITZ; GREENWALD, 2004, p. 62).
77
alimentação e manejo das pastagens na região do semi-árido nordestino (GUIMARÃES
FILHO, 2000).
A ampliação do número de instituições participantes dos conselhos municipais, como
forma de contemplar as associações comerciais e de representantes das pequenas indústrias e
do comércio local também se mostra essencial dentro da perspectiva do transbordamento das
novas ruralidades, as quais exigem a construção de novas políticas públicas que venham
atender as novas demandas das populações rurais (ABRAMOVAY, 2001).
A forma como se encontra estruturado o serviço de assistência técnica e de crédito
rural também demanda ajustes, haja vista que não tem conseguido funcionar como um
catalisador da geração de emprego e renda no semi-árido nordestino (ABRAMOVAY, 2006).
Nesse sentido, para Abramovay (2006), o Projeto Dom Hélder Câmara tem dois
desafios: o primeiro, diz respeito à criação de um sistema financeiro, baseado no sistema de
finanças de proximidade que venha a atender as demandas dos assentados, enquanto o
segundo perpassa pela construção de um conjunto amplo de transferências de renda para as
famílias pobres, como forma de fomentar os investimentos responsáveis pela geração de
emprego e renda na região do semi-árido nordestino.
5.3. As ações do Projeto Dom Hélder Câmara nos quatro Estados
Na tentativa de reforçar os aspectos positivos da organização da produção nos Projetos
de Assentamentos, bem como superar as dificuldades encontradas pelos pequenos produtores
assentados, o PDHC tem desenvolvido uma série de atividades. De acordo com a metodologia
adotada pelo Projeto Dom Hélder Câmara, as ações realizadas podem ser divididas em seis
grupos: segurança hídrica; segurança alimentar; gestão e organização social; formação,
educação e saúde; gênero, geração e etnia e serviços financeiros. A seguir discute-se o
desenvolvimento das ações em cada um dos espaços pesquisados.
5.3.1. Sertão Central Cearense
Na ação de segurança hídrica, verificou-se a implantação de 1.102 cisternas de placa
pré-moldadas de cimento, utilizando o telhado das residências como área de captação da água.
As cisternas foram construídas pelos pequenos produtores após terem recebido um curso
sobre o manejo de recursos hídricos e terem se qualificado para desempenhar o papel de
78
pedreiro. Esta ação beneficiou 1.012 famílias dentre: assentados, agricultores familiares e
remanescentes de comunidades quilombolas.
Em relação à segurança alimentar, foram realizados 96 eventos, visando a melhoria
das condições de produção e comercialização dos pequenos agricultores, onde estiveram
envolvidas 1.102 famílias.
Os eventos promoveram a realização de intercâmbios entre os produtores, para que os
agricultores compartilhassem experiências. Foram realizados programas de capacitação em
diversas áreas. Foram criadas unidades demonstrativas e implementados projetos produtivos
para as atividades de: caprino-ovinocultura, criação e manejo de galinhas caipiras, estímulo à
produção de alimentos orgânicos, apicultura e manejo da caatinga. Todas estas ações
buscaram uma elevação da produtividade das atividades realizadas pelos pequenos
produtores, bem como a preservação do meio ambiente.
Uma iniciativa importante foi o apoio à feira realizada pelos agricultores familiares em
Quixeramobim. Um dos grandes problemas da pequena produção reside nos estreitos canais
de comercialização existentes, o que faz muitas vezes os pequenos produtores vender os seus
produtos abaixo do preço de mercado.
No tocante à ação de gestão e organização social foram realizados oito eventos, dos
quais participaram 221 famílias, com o intuito de aumentar a participação dos assentados na
formulação, implementação e controle social das políticas públicas, como forma de atender as
demandas por eles solicitadas.
Na ação referente à formação, educação e saúde verificou-se a abertura de 30 novas
turmas visando a alfabetização de jovens e adultos. Esta atitude vem beneficiando 598
pessoas, mediante realização de uma parceria envolvendo instituições como o Ministério da
Educação, o Governo do Estado do Ceará, algumas prefeituras dos municípios selecionados
pelo projeto e uma Organização Não Governamental – ONG.
As ações contempladas no grupo gênero, geração e etnia promoveram 45 eventos
envolvendo 452 famílias de pequenos produtores, com o objetivo de realizar um diagnóstico
sobre as relações de gênero nos assentamentos selecionados. Os encontros serviram também
para estimular e apoiar as trabalhadoras rurais na participação da marcha das margaridas, bem
como para que as mulheres que não possuíssem documento de identificação, como: carteira
de identidade e cadastro de pessoa física viesse a tirá-los. Outra questão tratada durante os
eventos foi a inserção de jovens em atividades realizadas pelo projeto Dom Hélder.
Em relação às ações direcionadas ao sistema financeiro, formou-se um grupo de
trabalho, contemplando técnicos do Banco do Nordeste e representantes dos trabalhadores
79
rurais, para discutir medidas que viessem a agilizar o acesso dos assentados às linhas de
crédito do Governo, bem como foi manifestado por parte da esfera pública apoio à criação de
uma cooperativa de crédito para o Sertão Central cearense, a qual será formada por
agricultores familiares, sendo esta legalizada junto ao Banco Central do Brasil.
5.3.2. Região do Apodi
Nessa região, observa-se a implantação de 168 cisternas de placas pré-moldadas de
cimento com área de captação de telhado e de 25 cisternas de placa pré-moldadas de cimento
com área de captação de calçadão, as quais totalizaram 193 cisternas que vieram a beneficiar
193 famílias de pequenos produtores. Assim como na região do Sertão Central cearense, as
cisternas foram construídas pelos beneficiários, envolvendo capacitações sobre manejo de
recursos hídricos e formação de pedreiros.
Um outro projeto importante, que se encontra em andamento é a construção de 14 km
de adutora, a qual deverá beneficiar 22 comunidades e assentamentos rurais no município de
Caraúbas. Esta ação é fruto de um acordo entre o PDHC, a Companhia de Abastecimento de
Água do Rio Grande do Norte – CAERN, o governo do Rio Grande do Norte, o INCRA e a
prefeitura de Caraúbas.
Ainda em relação à segurança hídrica, está prevista a realização de um projeto para a
implantação de 20 km de adutoras com o intuito de beneficiar 250 famílias, mediante oferta
de água para diversos fins, em 9 assentamentos rurais e 2 comunidades do município de
Governador Dix-Sept Rosado, através de parceria entre o PDHC, a Companhia Brasileira de
Petróleo – PETROBRAS, o governo do Rio Grande do Norte, o INCRA e a prefeitura de Dix-
Sept Rosado.
Analisando-se as ações relacionadas à segurança alimentar verificou-se o apoio a três
grupos de 18 mulheres que atualmente plantam produtos orgânicos e comercializam estes
alimentos na comunidade de Boaguá III, no município de Caraúbas, bem como na
comunidade de Angorrinha, em Governador Dix-Sept Rosado e nos assentamanetos Remédio
e Lagoa Vermelha, localizados, respectivamente, nos municípios de Umarizal e Upanema.
Outra ação importante diz respeito à implantação de 12 unidades experimentais de
manejo da caatinga para fomentar as atividades pastoris nos assentamentos Vila Nova, Moacir
Lucena, Laje do Meio, Paraíso e Nova Descoberta, Tabuleiro Grande e Sítio do Góis, em
Apodi, Lagoa Vermelha em Upanema e os assentamentos Areias, Riachão e Gangorrinhas no
município de Governador Dix-Sept rosado. Neste contexto, duas unidades demonstrativas de
80
manejo da caatinga com finalidade pastoril estão sendo implantadas nos assentamentos Nova
Vida e Palheiros III em Upanema.
Em 7 de dezembro de 2003, foi inaugurada uma unidade de beneficiamento da
castanha, que veio a beneficiar 32 famílias do assentamento Petrolina, em Caraúbas, abrindo
espaço para a exportação do produto, graças a um acordo firmado com a cooperativa de
produtores de Serra do Mel. Esta ação agregou valor a produção da castanha, dado que antes
do beneficiamento, o quilo do produto era vendido entre R$ 0,80 e R$ 1,00, enquanto após o
beneficiamento o quilo passou a ser comercializado a preços entre R$ 8,00 e R$ 12,00,
dependendo da qualidade do produto.
Nesta mesma data, em 7 de dezembro de 2003, foi inaugurada uma unidade de
produção de ração animal (bovinos, caprinos e ovinos), utilizando o pedúnculo do caju,
beneficiando 19 famílias da comunidade Pedra III, localizada no município de Caraúbas.
Diante desta ação, a perspectiva de geração de renda proveniente do negócio é de R$ 50 mil
mensais.
Outras ações interessantes foram a implantação de um projeto de apicultura para um
grupo de mulheres do assentamento Paraíso, no município de Apodi, e a formação de grupos
de interesse com agricultores das principais cadeias produtivas da região, bem como a
liberação dos recursos do programa Compra Antecipada para 584 famílias em 18
assentamentos do território do Apodi, estimados em R$ 577.255 para o plantio de 2.099
hectares de sorgo granífero, graças a uma parceria entre o projeto Dom Hélder Câmara, a
CONAB, o INCRA e a secretaria especial de pesca do Rio Grande do Norte.
No tocante ao crédito agrícola, foram assegurados R$700.000 do PRONAF Infra-
Estrutura e R$250.000 do governo do Rio Grande do Norte para a construção de 14 barragens
com o propósito de perenizar 40 km do rio Umari, o que irá beneficiar 500 famílias das
comunidades rurais dos municípios de Umarizal, Caraúbas, Olho d´água do Borges e Rafael
Gordeiro. A intenção deste projeto é viabilizar a irrigação de 200 hectares na região.
A implantação do projeto Palheiros III é vista como fundamental, pois consiste na
perfuração de poços artesianos beneficiando 73 famílias. Esta ação permitirá a irrigação de 3
hectares de olericultura, 3,5 hectares de fruticultura irrigada, 15 hectares de mamona, 2
hectares de capim elefante. Serão também instaladas 100 colméias. Os recursos investidos
giram em torno de R$ 368.650 graças a um acordo firmado entre a Petrobras e o PDHC.
No tocante à ação relacionada com a organização e gestão social destaca-se a
realização de 134 eventos, voltados para elevar a participação dos assentados, agricultores
81
familiares e remanescentes de comunidades quilombolas na formulação, implementação e
controle de políticas públicas, envolvendo 409 famílias.
Em relação às ações voltadas para formação, educação e saúde, destaca-se a
capacitação de jovens agricultores, como também a formação de 40 jovens filhos e filhas de
agricultores da região, como técnicos agrícolas, através de uma parceria montada entre o
PDHC e a Federação dos Trabalhadores Rurais do Rio Grande do Norte – FETARNE e a
escola agrícola de Jundiaí – RN. Dos 40 jovens selecionados, 32 já estão fazendo parte da
equipe de técnicos e pesquisadores do Estado.
Dentre as ações relacionadas a gênero, geração e etnia, verifica-se: a realização de 272
eventos os quais contaram com a participação de 545 famílias; o apoio a 96 trabalhadoras
rurais na marcha das margaridas; a mobilização de 910 pequenas produtoras na campanha de
documentação das mulheres; inserção de jovens em todas as atividades realizadas pelo projeto
na região; publicação e distribuição de 2.000 exemplares de cartilhas com diagnósticos das
mulheres do território; formação de 29 grupos de mulheres; formação de 4 grupos teatrais de
crianças e adolescentes nos assentamentos Santo Antônio, Riachão, Areias e Monte Alegre II,
no município de Governador Dix-Sept Rosado; realização de um diagnóstico territorial sobre
a situação da juventude rural; circulação de um jornal mensal sobre jovens e a formação de
grupos produtivos de mulheres e jovens para o desenvolvimento de atividades como a
apicultura e a implantação de hortas orgânicas.
No tocante aos serviços financeiros verificou-se a realização de 26 eventos com o
intuito de promover a formação em microcrédito, fundos rotativos e microfinanças,
envolvendo 98 famílias, bem como a sensibilização envolvendo agentes do Banco do
Nordeste e beneficiários do Projeto, visando o atendimento das demandas de serviços
financeiros e a renegociação das dívidas dos PRONAF dos pequenos produtores junto ao
Banco do Nordeste. Ainda no tocante a essas ações, identificou-se a formação de três fundos
rotativos municipais nas 22 áreas de atuação do projeto Dom Hélder Câmara, nos municípios
de Governador Dix-Sept Rosado, Apodi e Caraúbas.
5.3.3. Cariri Paraibano
Nas ações atreladas a segurança hídrica, identifica-se a implantação de duas cisternas
comunitárias de placas pré-moldadas de cimento com área de captação de telhado e de quatro
tanques de pedra comunitários em dois assentamentos, sendo as iniciativas construídas pelos
82
beneficiários, a partir de um curso de capacitação sobre o manejo dos recursos hídricos e
cursos de formação de pedreiros.
Ainda em relação à segurança hídrica: ocorreu um levantamento e um estudo dos
potenciais hídricos nos assentamentos, para fins de implementação de projetos produtivos e
de abastecimento de água para o consumo humano, a realização de 11 eventos de capacitação
em gerenciamento e tratamento de água, como também a realização de sete oficinas de
confecção de bombas de bola de gude, com a construção de 110 bombas em sete
assentamentos da região, manutenção e revitalização de reservatórios de água em dois
assentamentos, quatro treinamentos visando a melhoria de tanques de pedras em dois
assentamentos e a implementação de uma unidade demonstrativa em sistemas de captação e
armazenamento de água para consumo animal.
No tocante as ações de segurança alimentar verifica-se: a construção de 13 barragens
subterrâneas; a implantação de nove unidades demonstrativas de palma forrageira consorciada
em nove hectares; implantação de duas unidades demonstrativas de apicultura e de
barramentos de pedra; implantação de 3 hectares de cercas ecológicas em unidades de palma
forrageira
Ainda em relação às ações de segurança alimentar percebe-se: a implantação de 11
viveiros de mudas com plantas nativas e adaptadas ao semi-árido em sete assentamentos; a
realização de eventos de capacitação em sanidade animal e produção de sal mineral;
instalação de uma unidade demonstrativa de divisão de pasto; três eventos de capacitação
sobre gestão e implantação de bancos de sementes comunitários e três oficinas sobre
armazenamento de sementes e confecção de silos em três assentamentos; implantação e
gestão de banco de estoque e realização de oficina de beneficiamento de frutos nativos;
criação de um ponto de venda em uma feira-livre no município de Soledade para a
comercialização dos produtos da agricultura familiar. Os eventos realizaram intercâmbios,
capacitações, construção de unidades demonstrativas, apicultura, palma forrageira
consorciada e manejo da caatinga.
No tocante as ações relativas à organização e gestão social destacam-se a realização de
sete eventos sobre gestão e organização das associações, visando uma maior integração entre
os agricultores familiares.
Em relação às ações de formação, educação e saúde destacam-se: o programa de
educação no ensino fundamental voltado à convivência com o semi-árido: articulação com
prefeituras e secretarias municipais de educação; mapeamento dos professores de escolas no
83
território do projeto; intercâmbio com professores de escolas municipais e sistematização de
experiências de educação para convivência com o semi-árido.
Ainda neste sentido, verificou-se a realização do primeiro curso de extensão em
desenvolvimento local sustentável com um grupo de 30 alunos constituído de agricultores,
lideranças de sindicatos dos trabalhadores rurais e jovens da área rural, através da
Universidade Camponesa no município de Sumé, em parceria com a UFCG, CIRAD,
CCEPASA, Escola Agrotécnica de Sumé e prefeituras municipais.
Analisando as ações referentes ao gênero, geração e etnia, destacam-se a realização de
eventos e de um diagnóstico acerca das relações de gênero nas comunidades e áreas de
assentamentos na região do Cariri paraibano, bem como a publicação de cartilhas sobre a
temática.
Dentro deste contexto foram realizadas, também, oficinas envolvendo trabalhadoras
rurais de assentamentos e comunidades do território sobre a participação das mulheres nas
organizações comunitárias, bem como foi estimulada a participação das mulheres na marcha
das margaridas e a inserção dos jovens em todos as atividades do Projeto Dom Hélder
Câmara.
No tocante aos serviços financeiros foram realizados eventos de capacitação diante da
perspectiva de criação de cooperativas de crédito, através do sistema ecosol, capacitação em
microfinaças e microcrédito, bem como a construção de projetos de investimentos a serem
realizados em assentamentos.
Dentro desta concepção ocorreram encontros visando aproximar a relação entre os
beneficiários do Projeto e o Banco do Nordeste para facilitar o acesso ao crédito e a
renegociação de dívidas anteriores do PRONAF e a discussão sobre o fundo rotativo
solidário.
5.3.4. Sertão Sergipano
No tocante às ações de segurança hídrica, destacam-se: a implantação de 900 metros
de rede de abastecimento de água, mediante construção de adutora no assentamento Poço
Redondo; a construção de 250 metros de rede de abastecimento d’água no assentamento José
Unaldo de Oliveira, projeto – piloto entre o PDHC, Petrobras, INCRA e PRODEM;
realização de intercâmbio entre os assentados do José Unaldo de Oliveira e do Nova
Esperança a fim de trocarem informações sobre o sistema de abastecimento d´água deste
último; realização de uma oficina de capacitação em elaboração e implantação da rede de
84
gestão dos recursos hídricos do assentamento Pedrinhas e a promoção de um curso de gestão
de água para uso doméstico, nos assentamentos Cachoeirinha e Paulo Freire.
Analisando-se as ações de segurança alimentar verifica-se a implementação de cinco
unidades demonstrativas para o plantio da Palma em regime consorciado com leucena, nos
assentamentos: Bom Jardim, no município de Monte Alegre, Nossa Senhora da Conceição,
em Poço Redondo, Florestan Fernandes, em Canindé de São Francisco e os assentamentos
São Raimundo e Pioneira, em Poço Redondo, beneficiando cerca de 113 famílias.
Visualizando, ainda, as ações relativas à segurança alimentar, verifica-se a construção
de sete unidades demonstrativas para criação do banco de proteínas, a partir da utilização da
leucena nos assentamentos: Bom Jardim e São Raimundo, localizados no município de Monte
Alegre; Canadá, Nossa Senhora da Conceição, Pioneira e Caldeirão, no município de Poço
Redondo, e Quilombo Mocambo, no município de Porto das Folhas, como também a
construção de oito unidades demonstrativas para a produção de sorgo para fabricação de
silagem nos assentamentos: Canadá, Nossa Senhora da Conceição e Pioneira, no município de
Poço Redondo; Florestan Fernandes, em Canindé do São Francisco; São Raimundo, em
Monte Alegre e Nova Esperança, no município de Gararu.
Constatou-se também o apoio ao desenvolvimento de atividades agropecuárias como a
caprinocultura, no assentamento, Florestan Fernandes, a partir da compra de seis animais para
cada assentado, o incentivo a piscicultura, através da construção de três tanques e o estimulo a
realização de uma horta orgânica no assentamento Quilombo Mocambo e na produção de
milho, girassol, amendoim e gergelim.
Em relação às ações vinculadas à capacidade tecnológica e de gestão, verifica-se a
realização de capacitação em manejo de ovinos, nos assentamentos: Quilombo do Mocambo,
Pedrinhas e Jacaré-Curituba, bem como em piscicultura em tanque e rede no assentamento
Nova Esperança.
No assentamento Jacaré-Curituba, verifica-se, ainda, a realização de um curso visando
a capacitação dos assentados na produção e manejo da galinha caipira, como também a visita
técnica à Unidade de Galinha Caipira do Instituto Xingó, em Canindé de São Francisco.
Em relação ao apoio à ovinocultura, promoveu-se a realização de uma visita técnica à
unidade de ovinos do Xingó, da qual participaram assentados da associação Progresso dos
Produtores do Jacaré-Curituba e dos pequenos produtores residentes dos assentamentos
Caldeirão e Quilombo Mocambo. A visita à estação de piscicultura em tanque e rede em
Alagoas, por parte dos produtores do assentamento Nova Esperança também foi verificada,
assim como a realização de capacitação em produção de alimentos orgânicos nos
85
assentamentos: Jacaré-Curituba, José Unaldo de Oliveira, Quilombo do Mocambo e Nova
Esperança.
Ainda visando a realização de capacitação dos assentados, promoveu-se um
intercâmbio sobre produção orgânica diversificada na Ilha do Ferro, no município de Pão de
Açúcar, em Alagoas, a qual contou com assentados dos PA`s: Nova Esperança, José Unaldo
de Oliveira, Quilombo Mocambo, Jacaré-Curituba e técnicos da Cáritas. Outras iniciativas
foram: visitas de intercâmbio à EMBRAPA dos assentados de Cachoeirinha, Paulo Freire e
José Unaldo de Oliveira e a realização de um curso de capacitação em planejamento e gestão
social do projeto de irrigação para os assentados do PA José Unaldo de Oliveira.
Em relação às ações focadas na formação e organização dos produtores rurais,
destaca-se: a realização de um curso para formação e desenvolvimento metodológico e
pedagógico, com ênfase em educação popular, o qual contou com a participação de
instituições como a Cáritas, Federação dos Trabalhadores em Sergipe – FETASE, MMTR,
ADLIS/PR e FEACOM.
As ações relacionadas a geração, gênero e etnia, contemplaram iniciativas de
capacitação em gênero em 13 assentamentos e em comunidades quilombolas atendidas pelo
Projeto Dom Hélder Câmara, a realização de um diagnóstico das relações de gênero no
território do Sertão Sergipano e uma campanha para a obtenção de documentos como carteira
de identidade e cadastro de pessoa física, a qual atendeu 3.300 trabalhadoras rurais.
As ações vinculadas aos serviços financeiros não foram disponibilizadas pelo site do
Projeto Dom Hélder câmara.
Confrontando os resultados do DEA-V com as ações executadas pelo projeto Dom
Hélder Câmara nas quatro regiões selecionadas, percebe-se que o espectro de iniciativas
contempla quase todas as variáveis apontadas como importantes ao alcance da eficiência
técnica por parte dos pequenos produtores. A única exceção é a disponibilidade no serviço de
trator.
Além desses esforços, verifica-se também a preocupação do PDHC no que diz respeito
a melhoria no nível educacional e a capacitação dos assentados. Um fato curioso é que apenas
na região do Apodi, os assentados receberam orientação acerca do manejo da caatinga,
quando o combate ao processo de desertificação é uma das prioridades do projeto. Não há
como deixar de colocar que uma análise mais aprofundada das ações, requereria uma pesquisa
direta, como forma de verificar o que está sendo feito, a qual não pôde ser realizada.
86
CAPÍTULO VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS
A penetração e o conseqüente desenvolvimento do capitalismo no campo não
determinaram o desaparecimento da pequena produção, como previam Marx, Kautsky e
Lênin. Neste sentido, os textos de Chayanov contemplam as razões pelas quais o movimento
de proletarização no campo não veio a absorver toda a mão de obra disponível,
desestruturando a forma de organização camponesa.
A não ocorrência do desaparecimento da produção familiar revelou a existência de
atividades no meio rural que não interessam diretamente ao capital, pois este visualiza, muitas
vezes, em uma parceria junto à pequena produção, algo mais vantajoso.
A permanência da agricultura familiar e a grande participação da população ocupada
no campo dos países periféricos nesta modalidade de agricultura, não fizeram com que as
ações do Estado, sob a forma de políticas públicas, viessem a potencializar o desenvolvimento
da pequena produção, revelando experiências incapazes de minimizar substancialmente a
pobreza no meio rural.
Analisando-se a situação brasileira, percebe-se, que a reforma agrária brasileira
caminha a passos lentos face à magnitude do nosso problema agrário. Entre os fatores
determinantes desta situação destaca-se a falta de vontade política de realizá-la e, em segundo
plano, a carência de uma legislação adequada ao que se pretende transformar.
Há mais de 50 anos, apesar dos esforços de programas e projetos destinados a
democratizar a terra, a estrutura fundiária permanece fortemente concentrada. Na Constituição
de 1988 as forças conservadoras do Congresso Nacional impediram o avanço na direção de se
obter uma legislação que permitisse realizar com maior dinamismo a reforma agrária.
A solução dada aos conflitos sobre a posse e o uso da terra é freqüentemente resolvida
na base da violência, fazendo vítimas, na maioria líderes, trabalhadores, religiosos e
assessores do movimento pela reforma agrária. O julgamento desses crimes se arrasta
lentamente e o número de punidos é irrisório.
Os assentamentos rurais constituem a resposta aos conflitos e originam-se da pressão
dos movimentos sociais e, em poucos casos, de iniciativas locais. Uma característica comum
aos projetos de assentamento é a precariedade da sua infra-estrutura econômica e social. Há
87
projetos, boa parte situada no Nordeste, em que as condições de vida e de trabalho deixam a
desejar, comprometendo a reprodução das famílias ali instaladas.
No entanto, vale ressaltar a situação mais vantajosa das famílias, comparando-se ao
período anterior da sua entrada no projeto. O fato de dispor de terra para produzir a
subsistência e vender algum excedente já diferencia o assentado em relação à sua situação
anterior. Como impacto positivo pode-se considerar ainda que as famílias assentadas são
dotadas de novas condições para a reivindicação.
Nos assentamentos rurais contemplados pelas ações do Projeto Dom Hélder Câmara, a
maior parte dos titulares dos lotes têm entre 26 e 58 anos, pertencem ao gênero masculino e
são moreno-escuro.Verifica-se, também, uma predominância dos casados e dos que já
moravam na localidade, anteriormente à implantação dos PA’s e dos que sabem ler e escrever,
mas não freqüenta a escola.
No tocante à infra-estrutura dos assentamentos pesquisados, constatou-se que as casas
dos titulares não estão no padrão ideal, pois a maior parte delas possui, ainda, os telhados de
barro, registrando-se, também, a presença de residências com paredes e piso de barro.
Em relação ao destino do esgoto, verifica-se que um pequeno percentual dos
assentados despeja-o em rede geral, fazendo com que, muitas vezes, os dejetos sejam jogados
no rio, sem nenhum tipo de tratamento. Deve-se salientar que este é um problema que ocorre
não apenas no meio rural brasileiro, dado que apenas um pequeno percentual das cidades
brasileira é saneado, mas que demanda uma maior atenção por parte das autoridades
responsáveis.
No que diz respeito à situação do lixo, verifica-se a inexistência de uma estrutura de
coleta apropriada, o que faz com que o lixo seja incinerado, enterrado ou jogado em terreno
baldio. Assim como a coleta de esgoto, o tratamento do lixo torna-se fundamental para a
conservação do meio ambiente e a prevenção de doenças. Uma série de materiais jogados na
natureza, como os feitos de plástico, demora um tempo enorme para se desintegrar. Por outro
lado a falta de medidas preventivas acabam sobrecarregando os hospitais públicos e
consumindo um número expressivo dos recursos destinados à saúde.
Ainda observando questões relativas à infra-estrutura básica dos assentamentos,
conclui-se que a iluminação proveniente de rede geral está disponível para a maioria dos
assentados. Porém, em muitos casos trata-se de energia monofásica, não permitindo o seu uso
para irrigação ou mover máquinas mais pesadas do ponto de vista de consumo energético.
Em relação ao acesso a água encanada, verifica-se que apenas um número reduzido
dos pequenos produtores desfruta deste serviço em suas residências. A água consumida nas
88
casas dos assentados foi considerada de boa qualidade. A principal fonte de obtenção deste
recurso sé os barreiros e as cisternas de placa.
Observando-se os aspectos relativos à saúde dos titulares dos lotes, constata-se um
pequeno acesso por parte destes aos serviços de saúde, dada a distância dos assentamentos em
relação aos postos de saúde e à qualidade ruim das estradas vicinais. A visita dos agentes de
saúde à residência dos assentados ocorre raramente, fazendo com que não haja um trabalho de
saúde preventiva e um atendimento eficiente aos doentes.
Diante dos dados relativos à utilização dos métodos contraceptivos por parte dos
proprietários dos lotes, percebe-se a inexistência de um planejamento familiar nos
assentamentos. A realização de laqueadura/ligadura ocorre por opção das mulheres
assentadas.
Dentre os produtos cultivados e comercializados pelos assentados destacam-se o
feijão, o milho e o leite. Estes produtos são característicos da agricultura familiar em todo o
Brasil, possuindo grande participação na cesta de subsistências das famílias mais carentes, as
quais costumam vender os excedentes da sua produção.
No cenário nordestino, a pecuária familiar ainda sofre com a baixa qualidade dos seus
rebanhos e a falta de pastagem. Neste sentido, os pequenos criadores recorrem à palma e ao
sorgo como forma de alimentar o gado.
Um fator que dificulta a ascensão econômica e social das famílias assentadas é a
pequena quantidade de canais de comercialização e a má qualidade das estradas vincinais, o
que limita a venda do produto ao consumidor final, forçando os pequenos produtores a
recorrer a atravessadores, vendendo o seu produto muito abaixo do preço de mercado.
A assistência técnica no semi-árido Nordestino apresentou-se fragilizada. Sem
recursos e sem condições materiais para realizar o papel que desempenhava até os anos 1970,
quando foram criadas a EMBRATER – Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão
Rural e suas afiliadas estaduais, as EMATERs.
A assistência técnica serve não apenas para garantir um melhor desempenho as
atividades praticadas pelos assentados, mediante a obtenção de uma maior produtividade,
como também se torna imprescindível para a elaboração dos projetos utilizados para captação
do crédito.
Uma parcela considerável dos assentados conhece as linhas de crédito disponíveis
pelo governo para o fomento de atividades agropecuárias. Todavia, a quantidade de
assentados que têm acesso a este tipo de serviço ainda é limitada.
89
A literatura especializada tem apontado como principais entraves ao acesso ao crédito
agrícola: problemas relacionados com o INCRA, no que diz respeito à documentação do lote,
a falta de projetos e as exigências dos bancos para a oferta de crédito.
Analisando-se o programa, percebe-se que existe uma assimetria interregional na
distribuição do crédito do PRONAF. Verifica-se que existe uma grande concentração de
recursos aplicados na região Sul em detrimento das outras regiões, como, por exemplo, a
região Nordeste, o que acaba funcionando como um dos entraves que limitam o
desenvolvimento da pequena produção no semi-árido nordestino.
A utilização de técnicas de adubação e irrigação é extremamente limitada, fazendo
com que os assentados não venham a usufruir de uma maior produtividade e um menor risco
na realização das atividades. Neste sentido, as experiências bem-sucedidas da fruticultura
irrigada no semi-árido nordestino, vivenciadas pelo agronegócio patronal, reforçam a
necessidade de disponibilizar estes serviços para a pequena produção.
Analisando-se os resultados do modelo de análise de envoltória de dados – DEA, com
rendimentos crescentes de escala, verifica-se que o maior percentual de produtores eficientes,
encontra-se nas terras menores, contempladas no estrato entre 0,1 e 3 hectares. Em relação ao
número de trabalhadores na parcela, as terras que contavam com um trabalhador, também são
as que contemplam um maior número de produtores eficientes.
O cruzamento do número de produtores eficientes com as variáveis consideradas pela
literatura como responsáveis por um melhor desempenho das atividades praticadas pela
pequena produção, revelou que o acesso: ao crédito agrícola, à assistência técnica, à irrigação,
à tração animal e à tração mecanizada, auxiliam no alcance da eficiência técnica dos
assentados contemplados no PDHC.
As ações executadas pelo projeto Dom Hélder Câmara nos assentamentos do Semi-
Árido nordestino, contempla quase todas as variáveis apontadas como importantes ao alcance
da eficiência técnica por parte dos pequenos produtores. A única exceção é a disponibilidade
no serviço de trator.
Além desses esforços, identifica-se tamm a preocupação do PDHC no que diz
respeito a elevação do nível educacional e a capacitação dos assentados. Um fato curioso é
que apenas na região do Apodi, os assentados receberam orientação acerca do manejo da
caatinga, quando o combate ao processo de desertificação é uma das prioridades do projeto.
As iniciativas revelam a preocupação de fortalecimento de um conjunto de aspectos
relativos a atividades agrárias e não agrícolas, visando o melhor aproveitamento destas por
parte dos pequenos produtores, como forma de promover o desenvolvimento das
90
potencialidades da região sem a interferência no desenvolvimento de gerações futuras,
remetendo-os a uma situação onde a ascensão social e econômica das famílias assentadas
seja algo possível.
91
CAPÍTULO VII - REFERÊNCIAS
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