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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
NÍVEL MESTRADO
Alexandre Souza Perucia
TÍTULO:
Estratégias Colaborativas na Indústria Brasileira de Jogos Eletrônicos
São Leopoldo
2008
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2
Alexandre Souza Perucia
TÍTULO:
Estratégias Colaborativas na Indústria Brasileira de Jogos Eletrônicos
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Administração da Universidade
do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) como
requisito parcial para para obtenção do título de
Mestre em Administração.
Orientador: Professor Doutor Alsones Balestrin
São Leopoldo
2008
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3
Ficha Catalográfica
Catalogação na Publicação:
Bibliotecária Camila Rodrigues Quaresma - CRB 10/1790
P471e Perucia, Alexandre Souza
Estratégias colaborativas na indústria brasileira de jogos
eletrônicos / por Alexandre Souza Perucia. 2008.
193 f. : il. ; 30cm.
Dissertação (mestrado) Universidade do Vale do Rio dos
Sinos, Programa de Pós-Graduação em Administração, 2008.
“Orientação: Prof. Dr. Alsones Balestrin, Ciências
Econômicas”.
1. Jogo eletrônico 2. Videogame. 3. Estratégia colaborativa. 4.
Administração - Empresa - Tecnologia - Informação. 5. Relação
interorganizacional. I. Título.
CDU 004:794
4
Alexandre Souza Perucia
TÍTULO:
Estratégias Colaborativas na Indústria Brasileira de Jogos Eletrônicos
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Administração da Universidade
do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) como
requisito parcial para para obtenção do título de
Mestre em Administração.
Aprovado em de 2008
BANCA EXAMINADORA
Professor Doutor Charles Kirschbaum Centro Universitário da Fei - SP
Professor Doutor Ely Laureano Paiva Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Professor Doutor Achyles Barcelos da Costa Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Orientador: Professor Doutor Alsones Balestrin
Visto e permitida a impressão
São Leopoldo,
Prof. Dr. Ely Laureano Paiva
Coordenador Executivo do PPG em Administração
5
Dedico este estudo à minha família,
símbolo de perseverança, e aos pioneiros,
exemplos de ousadia e coragem.
6
AGRADECIMENTOS
Este trabalho só foi possível graças ao apoio de diversas pessoas. Gostaria de transmitir
meus sinceros agradecimentos...
...à minha família, pelo apoio incondicional e pela confiança ao longo deste trabalho;
...ao meu orientador, Professor Balestrin, e ao PPGA da UNISINOS, pelo apoio aos meus
interesses de pesquisa. Obrigado pela confiança, pelos conselhos, idéias e envolvimento neste
trabalho;
...a todos os demais colegas acadêmicos, amigos e professores que enriqueceram meu
aprendizado e de uma forma ou outra contribuíram com opiniões, críticas e questionamentos
sobre esta pesquisa;
...à CAPES pelo apoio financeiro, que viabilizou a realização deste estudo;
...ao presidente da Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games
(ABRAGAMES), André Penha, que fortemente apoiou a pesquisa;
...às empresas da ABRAGAMES pela receptividade e participação;
...à Vanessa Meyer pelo apoio e pelas ricas ilustrações ao longo deste texto.
7
“Sob diferentes sistemas organizacionais e por intermédio de
expressões culturais diversas, todas elas se baseiam em redes. As redes
são e serão os componentes fundamentais das organizações. E são
capazes de formar-se e expandir-se por todas as avenidas e becos da
economia global porque contam com o poder da informação propiciado
pelo novo paradigma tecnológico.”
(Manuel Castells)
8
RESUMO
A presente dissertação foi desenvolvida a partir dos conceitos de estratégias colaborativas, tendo
como campo empírico de análise a indústria brasileira de jogos eletrônicos. O objetivo central do
estudo foi identificar em que atividades as estratégias colaborativas são implementadas entre as
empresas que desenvolvem jogos, baseando-se nas orientações da Matriz CPC (CHILD et al.,
2005). A pesquisa empírica foi conduzida junto às empresas da Associação Brasileira de
Desenvolvedoras de Games (ABRAGAMES), e a coleta de dados ocorreu em duas etapas: um
levantamento quantitativo, que identificou 22 empresas da ABRAGAMES, e entrevistas
realizadas em profundidade em nove empresas. Os resultados mostram uma tendência das
empresas de promover a internalização das atividades de produção de um jogo. Entretanto,
identificaram-se estratégias colaborativas em Edição, Criação e Desenvolvimento que trouxeram
ganhos de flexibilidade, ganhos no desenvolvimento de novos produtos, co-especialização,
ganhos de escala e de aprendizado, bem como ganhos relacionados à melhoria de processos e de
redução de incertezas.
Palavras-chave: jogos eletrônicos; videogames; relações interorganizacionais; estratégias
colaborativas.
9
ABSTRACT
This study was developed based on the concepts of collaborative strategies having, as the
empirical field of analysis, the Brazilian electronic games industry. The main goal of this study
was to identify in which activities collaborative strategies are present among game developers,
based on the orientation of the CPC Matrix (CHILD et al., 2005). The empirical research was
conducted with companies belonging to the Brazilian Game Developers Association
(ABRAGAMES) and data was collected in two phases: a quantitative survey which gathered
information from 22 ABRAGAMES associated companies, and interviews conducted with nine
companies. The results show the tendency towards the internalization, by the companies, of most
activities needed for games development. However collaborative strategies were identified in
Publishing, Art creation and Development activities. These strategies provided developers with
better flexibility to face environmental instability, collective rents with joint new product
development, co-specialization, economies of scale, mutual learning as well as process
improvement and reduction of uncertainty.
Keywords: electronic games; videogames; interorganizational relationships; collaborative
strategies.
10
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 MODELO DE REDE AUTOCOORDENADA......................................................................... 39
FIGURA 2 REDE COORDENADA POR UMA EMPRESA LÍDER. ........................................................... 40
FIGURA 3 REDE COORDENADA POR UM NÚCLEO ADMINISTRATIVO . ............................................. 41
FIGURA 4 MAPA DE ORIENTAÇÃO CONCEITUAL DAS REDES. ........................................................ 47
FIGURA 5 EVOLUÇÃO DA INOVAÇÃO FECHADA PARA A INOVA ÇÃO ABERTA................................. 56
FIGURA 6 MATRIZ CPC. .............................................................................................................. 64
FIGURA 7 ESQUEMA CONCEITUAL PARA ANÁLISE DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS................ 66
FIGURA 8 FASES DA PESQUISA. .................................................................................................... 67
FIGURA 9 PÁGINA INICIAL DO QUESTIONÁRIO ELETRÔNICO. ........................................................ 71
FIGURA 10 ATIVIDADES ENVOLVIDAS NA PRODUÇÃO DE JOGOS. ................................................. 89
FIGURA 11 CADEIA DE VALOR DOS JOGOS ELETRÔNICOS ............................................................. 91
FIGURA 12 POTENCIAL DE CRESCIMENTO DOS JOGOS ON -LINE. .................................................... 94
FIGURA 13 ATIVIDADES OFERECIDAS NA INDÚSTRIA. ................................................................102
FIGURA 14 INTERNALIZAÇÃO E TERCEIRIZAÇÃO DAS ATIVIDADES.............................................103
FIGURA 15 MOTIVOS PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO...............................................................107
FIGURA 16 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE MÃO-DE-OBRA..............................................112
FIGURA 17 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE INFORMAÇÕES...............................................113
FIGURA 18 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE OPÇÕES DE FINANCIAMENTO.........................114
FIGURA 19 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE INTERAÇÃO ENTRE EMPRESAS.......................115
FIGURA 20 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE OPORTUNIDADES NO BRASIL.........................115
FIGURA 21 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE DIFUSÃO DE PRÁTICAS. .................................116
FIGURA 22 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE PUBLICAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO.......................117
FIGURA 23 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE ACESSO A DIFERENTES PLATAFORMAS..........117
FIGURA 24 FREQUÊNCIA DE OBSERVAÇÕES POR PONTO. ............................................................119
FIGURA 25 BARREIRAS CITADAS PELOS EMPRESÁRIOS...............................................................119
FIGURA 26 AÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA..................................................121
FIGURA 27 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE PUBLICAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO...............................143
FIGURA 28 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE DESENVOLVIMENTO CONJUNTO DE PRODUTO. ......149
FIGURA 29 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE REDE DE FORNECEDORES QUALIFICADOS..............154
11
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 ANTECEDENTES DA COOPERAÇÃO ENTRE INDIVÍDUOS................................................ 30
QUADRO 2 ANTECEDENTES DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS ENTRE ORGANIZAÇÕES. ........... 35
QUADRO 3 CONFIGURAÇÕES DE GOVERNANÇA DAS CADEIAS GLOBAIS........................................ 62
QUADRO 4 VARIÁVEIS EXPLORADAS E FONTE DE EVIDÊNCIAS..................................................... 69
QUADRO 5 RESUMO DAS PRINCIPAIS PLATAFORMAS NA HISTÓRIA DOS JOGOS ELETRÔNICOS....... 83
QUADRO 6 TIPOS DE PLATAFORMAS DE JOGOS............................................................................. 85
QUADRO 7 OUTRAS APLICAÇÕES DOS JOGOS ELETRÔNICOS......................................................... 87
QUADRO 8 CADEIA DE VALOR DOS JOGOS NO BRASIL.................................................................. 96
QUADRO 9 - POSICIONAMENTO, SEGMENTO E ATIVIDADES DAS EMPRESAS ENTREVISTADAS........123
QUADRO 10 - IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DAS ATIVIDADES........................................................130
QUADRO 11 NÍVEL DE COMPETÊNCIA NAS ATIVIDADES. ............................................................132
QUADRO 12 ESTRATÉGIAS ADOTADAS NA INDÚSTRIA................................................................135
12
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DAS DESENVOLVEDORAS DE JOGOS. ............................... 99
TABELA 2 PERFIL TÍPICO DE UMA DESENVOLVEDORA BRASILEIRA DE JOGOS............................... 99
TABELA 3 INFORMAÇÕES DE FATURAMENTO.............................................................................100
TABELA 4 ATIVIDADES EXERCIDAS PELAS EMPRESAS................................................................101
TABELA 5 PRODUTOS E SERVIÇOS OFERECIDOS..........................................................................104
TABELA 6 PLATAFORMAS E MÍDIAS DE JOGOS ATENDIDAS.........................................................104
TABELA 7 PERCENTUAL DE RECEITA GERADA POR PLATAFORMA...............................................105
TABELA 8 ATIVIDADES OFERECIDAS EM NÍVEL INTERNACIONAL. ..............................................106
TABELA 9 DESTINOS DAS EXPORTAÇÕES. ..................................................................................106
TABELA 10 IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DAS ATIVIDADES........................................................109
TABELA 11 NÍVEL DE COMPETÊNCIA NAS ATIVIDADES. .............................................................110
TABELA 12 DECISÃO ESTRATÉGICA COM BASE NA MATRIZ CPC...............................................111
TABELA 13 PRODUTOS E SERVIÇOS OFERECIDOS PELAS EMPRESAS ENTREVISTADAS.................124
13
LISTA DE ABREVIATURAS
ABRAGAMES Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games.
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
DFC DFC Intelligence: Expert Video Game and Entertainment Industry Research.
DOE U.S. Department of Energy.
ESA Entertainment Software Association.
ESRB Entertainment Software Rating Board.
FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
FINEP Financiadora de Estudos e Projetos.
IGDA International Game Developers Association.
MC Ministério da Cultura.
MCT Ministério da Ciência e Tecnologia.
MIT Massachusetts Institute of Technology.
MMC Monopolies and Mergers Commission.
MMOG Massively multiplayer online game.
NEC Nippon Electric Company
NES Nintendo Entertainment System.
PWC PricewaterhouseCoopers.
PDP-1 Programmed Data Processor-1.
SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial.
SNK Shin Nihon Kikaku, fabricante de hardware e software para jogos.
SOFTEX Sociedade para Promoção da Excelência do Software Brasileiro.
VCS Video Computer System.
14
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................................................................16
1.1 PROBLEMÁTICA .................................................................................................................................................................18
1.2 OBJETIVO GERAL...............................................................................................................................................................19
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS................................................................................................................................................20
1.4 JUSTIFICATIVA ....................................................................................................................................................................20
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................................................................................23
2.1 ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS ...............................................................................................................................23
2.1.1 ANTECEDENTES....................................................................................................................................................................27
2.1.1.1 PRINCÍPIOS DA COOPERA ÇÃO ENTRE INDIVÍDUOS .................................................................................................................27
2.1.1.2 A EMERGÊNCIA DA COOPERAÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÕES.....................................................................................................30
2.1.2 FORMAS DE GESTÃO............................................................................................................................................................36
2.1.2.1 TIPOLOGIA DE REDES...........................................................................................................................................................37
2.1.2.2 MECANISMOS DE COORDENAÇÃO E NÍVEL DE FORMALIZAÇÃO ..............................................................................................42
2.1.3 RESULTADOS........................................................................................................................................................................47
2.1.3.1 GANHO DE PERFORMANCE, FLEXIBILIDADE E MELHORIA DE PROCESSOS...............................................................................48
2.1.3.2 ATIVOS RELACIONAIS, COMPLEMENTARIDADE E ECONOMIAS DE ESCALA.............................................................................49
2.1.3.3 APRENDIZAGEM E COMPARTILHAMENTO DE CONHECIMENTO ...............................................................................................52
2.1.3.4 GERAÇÃO DE INOVAÇÃO ......................................................................................................................................................54
2.2 DECISÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO DE ESTRATÉGIAS COLABORATIVA S................................................58
2.2.1 O PAPEL DOS CUSTOS DE TRANSAÇÃO FRENTE ÀS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS...................................................58
2.2.2 ESQUEMA DE DECISÃO DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS.........................................................................................60
2.3 ESQUEMA CONCEITUAL.................................................................................................................................................65
3 METODOLOGIA DE PESQUISA.....................................................................................................................................67
3.1 DESENVOLVIMENTO CONCEITUAL E METODOLÓGICO..................................................................................68
3.2 COLETA DE DADOS ...........................................................................................................................................................70
3.2.1 ETAPA QUANTITATIVA........................................................................................................................................................70
3.2.2 ETAPA QUALITATIVA...........................................................................................................................................................72
3.3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS .................................................................................................73
3.4 DESENVOLVIMENTO DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................74
4 A INDÚSTRIA DE JOGOS ELETRÔNICOS.................................................................................................................75
4.1 HISTÓRICO ............................................................................................................................................................................76
4.2 PLATAFORMAS, GÊNEROS E APLICAÇÕES .............................................................................................................85
4.3 PROCESSO DE PRODUÇÃO.............................................................................................................................................88
15
4.4 A CADEIA DE VALOR.......................................................................................................................................................90
4.5 O MERCADO DE JOGOS ELETRÔNICOS NO MUNDO...........................................................................................92
4.6 O MERCADO DE JOGOS ELETRÔNICOS NO BRASIL............................................................................................96
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS................................................................................................98
5.1 RESULTADOS DA ANÁLISE QUANTITATIVA .........................................................................................................98
5.1.1 DADOS GERAIS DAS EMPRESAS ..........................................................................................................................................98
5.1.2 ATIVIDADES REALIZADAS PELAS EMPRESAS..................................................................................................................101
5.1.2.1 ATIVIDADES, SERVIÇOS E PLATAFORMAS DE JOGOS............................................................................................................101
5.1.2.2 ATUAÇÃO INTERNACIONAL DAS DESENVOLVEDORAS DE JOGOS..........................................................................................106
5.1.3 DECISÕES ESTRATÉGICAS NA INDÚSTRIA.......................................................................................................................108
5.1.4 PERCEPÇÕES DOS EMPRESÁRIOS A RESPEITO DA INDÚSTRIA.......................................................................................111
5.1.4.1 FATORES DE IMPACTO NA INDÚSTRIA .................................................................................................................................112
5.1.4.2 DESAFIOS DA INDÚSTRIA BRASILEIRA DE JOGOS ELETRÔNICOS...........................................................................................118
5.2 RES ULTADOS DA ANÁLISE QUALITATIVA ..........................................................................................................122
5.2.1 CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA COM BASE NAS EMPRESAS ENTREVISTADAS.......................................................123
5.2.2 CARACTERIZAÇÃO DAS DECISÕES ESTRATÉGICAS........................................................................................................128
5.2.3 ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS IDENTIFICADAS...........................................................................................................141
6 IMPLICAÇÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................................156
6.1 QUANTO À CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA.................................................................................................156
6.2 QUANTO À PARTICIPAÇÃ O INTERNACIONAL DAS EMPRESAS..................................................................159
6.3 QUANTO ÀS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS...................................................................................................160
6.4 QUANTO ÀS CONTRIBUIÇÕES E IMPLICAÇÕES DA PESQUISA ...................................................................163
6.5 LIMITAÇÕES DO ESTUDO E OBSERVAÇÕES FINA IS ........................................................................................166
REFERÊNCIAS.........................................................................................................................................................................169
APÊNDICE A QUESTIONÁRIO ELETRÔNICO APLICADO NA INTERNET ..............................................180
APÊNDICE B ROTEIRO PARA AS ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE..................................................191
ANEXO A LISTA DAS EMPRESAS PARTICIPANTES DA PESQUISA ...........................................................193
16
1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação busca identificar e compreender as estratégias colaborativas
existentes entre os atores da indústria de jogos eletrônicos no Brasil, em especial entre as
empresas que desenvolvem jogos eletrônicos (desenvolvedoras). Por estratégias colaborativas
entende-se uma perspectiva alternativa aos pressupostos tradicionais da estratégia baseada na
competição individualista. Nessa nova perspectiva, defendida por autores como Jarillo (1988),
Human & Provan (1997) e Dyer & Singh (1998), as empresas podem identificar na cooperação
uma forma de maximizar suas vantagens competitivas no mercado através da mobilização
coletiva de ações e de recursos orientados ao alcance de objetivos comuns.
Tal perspectiva estratégica torna-se relevante face à dinâmica da indústria de jogos
eletrônicos. Essa indústria é caracterizada pela sua orientação internacional e pelo intensivo uso
de tecnologia da informação. A facilidade de comunicação introduzida pela internet faz com que
os atores do mercado de jogos se beneficiem do acesso às informações, ferramentas e serviços
(SOFTEX, 2005). Isso vem permitindo a desverticalização da cadeia de valor em direção a um
modelo de empresas horizontais, organizadas em nível global (GRANTHAM & KAPLINSKY,
2005) e voltadas às suas competências centrais (SOFTEX, 2005). Esse contexto tende a provocar
forte dependência entre diferentes atores da indústria, demandando dos mesmos a capacidade
relacional para estruturar estratégias baseadas na cooperação junto a uma rede de parceiros
(JARILLO, 1988; POWELL, 1998).
A idéia basilar dessa estratégia em rede, referida neste texto pela expressão “estratégias
colaborativas”, vai de encontro à crescente dificuldade de a empresa, isoladamente, concentrar as
competências necessárias para alcançar competitividade no mercado. Child et al. (2005) destacam
que as estratégias colaborativas permitem à empresa concentrar-se nas atividades mais
importantes, contribuindo para que a organização faça melhor uso de seus recursos internos e
assim eleve seu desempenho. Além disso, com a competição em nível global e influenciada por
transformações tecnológicas (JARILLO, 1993), as organizações se deparam com a crescente
instabilidade ambiental (ASTLEY, 1984), tendo que se tornar flexíveis e adaptáveis, ações que
não são facilmente suportadas pelas estratégias de governança baseadas em hierarquia ou
mercado (CASTELLS, 1999).
17
Assim, a organização pode obter vantagens a partir da sua capacidade de articular
estratégias colaborativas com inúmeros atores à sua volta, na busca de empreendimentos com
objetivos comuns, densamente inter-relacionados, e que preservam a individualidade de cada
participante, coordenados para desenvolver e manter ganhos competitivos coletivos. Essas ações
tendem a provocar uma estrutura inteorganizacional constante em alternância de papéis
(FLEURY & FLEURY, 2006), caracterizada por vários atores ligados por múltiplas e complexas
conexões que diferem do conceito tradicional de cadeia de valor e que acabam por constituir uma
verdadeira rede interorganizacional (NORMANN & RAMIREZ, 2000; TODEVA, 2006).
Considerando esse contexo, a presente dissertação propõe a investigação das estratégias
colaborativas na indústria brasileira de jogos eletrônicos, através da utilização de um esquema
conceitual de análise baseado nos estudos das teorias organizacionais, orientando-se pela área de
gestão de redes e relações interorganizacionais. Através desse esquema conceitual, procura-se
identificar a existência das estratégias colaborativas entre as empresas da indústria, as condições
para o surgimento e manutenção dessas estratégias, bem como os ganhos coletivos atingidos.
Espera-se contribuir com uma caracterização da indústria brasileira de jogos eletrônicos,
no que se refere à sua estrutura, aos atores mais importantes envolvidos, suas atividades e
competências, bem como às estratégias colaborativas utilizadas. Deseja-se também que este
estudo estimule novas pesquisas, que permitam maior competitividade à indústria brasileira de
jogos eletrônicos. Por fim, almeja-se que os resultados aqui obtidos possam servir de estímulo a
ações públicas para o fortalecimento da indústria, tais como o melhor planejamento de políticas
que incentivem a interação entre empresas nacionais, e também destas com empresas
internacionais, na busca de maiores ganhos competitivos.
A primeira parte da dissertação segue com a descrição da problemática, que conduz à
questão desta pesquisa, seguida dos objetivos gerais e específicos. Posteriormente, é apresentada
a justificativa da pesquisa, descrevendo-se a relevância do tema estudado. Na segunda parte do
trabalho, dá-se ênfase ao referencial teórico, sendo apresentado ao final do mesmo o esquema
conceitual de análise das estratégias colaborativas que orientará as etapas de coleta e análise dos
dados. Na terceira parte, apresenta-se a metodologia a ser seguida para a execução da pesquisa. A
quarta parte é dedicada a um levantamento sobre a indústria de jogos, enfocando seus principais
aspectos. A quinta parte da dissertação é dedicada à apresentação e análise dos resultados
oriundos da etapa de coleta de dados. Na sexta parte são desenvolvidas as implicações e
18
considerações finais da pesquisa. Por último, são apresentados o referencial bibliográfico, os
apêndices e os anexos.
1.1 PROBLEMÁTICA
A indústria de jogos eletrônicos se destaca no cenário internacional como um dos
segmentos mais dinâmicos do setor de tecnologias da informação, gerando impacto de dimensões
culturais, econômicas e contribuindo para o emprego de recursos humanos com alta qualificação
(SOFTEX, 2005). Essa indústria está inserida em um mercado mundial cujas cifras atingem
US$ 33 bilhões anuais (DFC, 2007a). Só nos Estados Unidos (EUA) a venda de jogos atinge US$
9.5 bilhões anuais (NPD, 2008).
Embora o mercado mundial de jogos movimente uma indústria de dezenas de bilhões de
dólares, no Brasil ele é incipiente e caracterizado por problemas estruturais tais como: baixa
renda da população, menor acesso da mesma à tecnologia, e pirataria. O mercado brasileiro é
estimado em algo próximo a 100 milhões de reais, mesmo com os elevados índices de
falsificação dos jogos (ABRAGAMES, 2004; SOFTEX, 2005).
Tais problemas criam barreiras que prejudicam o desenvolvimento da indústria brasileira
de jogos eletrônicos. As empresas brasileiras, especialmente aquelas focadas no desenvolvimento
de jogos, encontram grandes dificuldades para se estabelecerem, dificuldades estas
principalmente relacionadas à falta de acesso aos canais de distribuição, normalmente
controlados por atores orientados aos mercados mais estabelecidos, como o americano. Isso gera
um direcionamento, por parte das empresas, para os mercados externos que são de intensa
competição, o que contribui para uma participação modesta das empresas brasileiras em relação
ao valor do mercado nacional. De acordo com a SOFTEX (2005), estima-se que apenas 25% do
mercado brasileiro sejam atendidos por jogos nacionais, concebidos e desenvolvidos por
empresas brasileiras. O restante do mercado é atendido por grandes empresas internacionais que
utilizam uma rede mundial de comercialização e controlam os principais canais de distribuição.
Se, por um lado, a indústria brasileira de jogos encontra-se fragilizada, por outro ela
consiste em uma das indústrias criativas de elevado potencial de crescimento na nova economia.
19
Esse mercado é caracterizado pelo alto valor agregado aos produtos e serviços, pela criatividade e
tecnologia, cujos apelos, perspectivas e oportunidades encorajam uma mobilização ampla por
parte de diversos atores institucionais e econômicos. Destacam-se diversas iniciativas tais como
fomento à pesquisa e desenvolvimento tecnológico na área de jogos, criação de incubadoras
empresariais, e cursos de graduação e especialização para formação de mão-de-obra altamente
qualificada (SOFTEX, 2005).
Sendo a criação de jogos uma atividade fortemente caracterizada pelo desenvolvimento de
software, tais ações conformam com as prioridades governamentais estabelecidas pela Política
Nacional de Informática, que visam estratégias de desenvolvimento baseadas na complexa
química entre capital humano, tecnologia e flexibilidade institucional (MCT, 2006). Assim,
diante da relevância desse segmento econômico, sugere-se a necessidade de um maior
diagnóstico e conhecimento de suas características, visando implementar estratégias para sua
maior competitividade.
Um foco teórico que poderá sinalizar ações de fortalecimento dessa indústria vem do
campo das estratégias colaborativas. Autores como Jarillo (1988), Human & Provan (1997), Dyer
& Singh (1998), Gulati et al. (2000), e Child et al. (2005) sugerem que as empresas poderão
alcançar maior competitividade ao promoverem uma série de relações de cooperação de forma a
complementarem seus recursos com outros atores do mercado. A identificação das estratégias
colaborativas existentes dentro da indústria brasileira de jogos poderá fortalecer ações que
auxiliem as empresas brasileiras a ampliar suas fronteiras de atuação competitiva. Para tanto, esta
pesquisa busca centrar-se nas seguintes questões: como está estruturada a indústria brasileira
de jogos eletrônicos, e em que atividades ocorrem estratégias colaborativas entre as
empresas participantes?
1.2 OBJETIVO GERAL
A partir da problemática exposta, o objetivo geral da pesquisa é compreender como está
estruturada a indústria brasileira de jogos eletrônicos e identificar em que atividades ocorrem
20
estratégias colaborativas, entre as empresas, que possam contribuir para o aumento da
competitividade do setor.
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
De forma complementar ao objetivo geral, apresentam-se alguns objetivos que serão
alcançados no decorrer da pesquisa:
a) Realizar um levantamento das principais empresas brasileiras de desenvo lvimento de
jogos, suas atividades e estratégias de governança, permitindo assim um mapeamento
da indústria de jogos eletrônicos do Brasil.
b) Identificar o nível de internacionalização das empresas brasileiras de jogos
eletrônicos.
c) Identificar ações e projetos de cooperação que já estão sendo desenvolvidos entre as
empresas da indústria.
d) Apresentar proposições que auxiliem os gestores e que orientem políticas para o
fortalecimento da competitividade da indústria brasileira de jogos eletrônicos.
1.4 JUSTIFICATIVA
O atual cenário econômico e o impacto das transformações tecnológicas (JARILLO,
1993) têm estimulado a globalização das atividades em vários setores, intensificando o
relacionamento entre diferentes organizações que buscam maior competitividade e diluição dos
riscos de suas operações em nível internacional. Nesse aspecto, é imperativa a capacidade de
flexibilização e de adaptação das organizações, bem como a compreensão de qual modelo de
coordenação das atividades econômicas será adotado pela empresa hierarquia ou mercado
(WILLIAMSON, 1975).
21
Para Jarillo (1988), além desses dois modelos clássicos de produzir ou comprar, existe
uma terceira forma de organização das atividades econômicas denominada de estratégia em rede.
A idéia basilar da estratégia em rede refere-se à crescente dificuldade de a empresa,
isoladamente, concentrar as competências necessárias para alcançar competitividade no mercado.
Dessa forma, as estratégias colaborativas buscam desenvolver empreendimentos com objetivos
comuns, densamente inter-relacionados, coordenados para desenvolver e manter ganhos
competitivos coletivos, sem que cada participante venha a perder sua individualidade.
A ampla possibilidade de ganhos por meio de relacionamentos colaborativos tem tornado
o tema de especial relevância no meio acadêmico. Estudos como o de Todeva (2006) destacam
que as estratégias colaborativas constituem estruturas de relacionamento social que facilitam as
relações e trocas entre indivíduos e atores de negócios, tornando-se importantes fontes de
aquisição, desenvolvimento e compartilhamento de conhecimento. Ademais, Castells (1999)
identifica as estratégias colaborativas como um modelo organizacional eficiente frente a
ambientes extremamente competitivos e dinâmicos. Para o autor, esse dinamismo se origina de
um novo contexto econômico, caracterizado pela alta competição e agilidade organizacional, em
nível internacional, cujas bases se sustentam sobre o pilar tecnológico e a nova sociedade da
informação.
No que tange à tecnologia, verifica-se melhorias contínuas nos processos de informação,
transportes e sistemas de gerenciamento que, cada vez mais evoluídos, tendem a determinam
novos patamares de performance organizacional (JARILLO, 1993). Dessa forma, as empresas se
deparam com o desafio de constante e rapidamente aumentar sua competitividade no mercado,
desafio esse que torna mais evidente as limitações das organizações para manter e desenvolver
todas as competências necessárias ao seu negócio. Como conseqüência, as organizações buscam
desenvolver relacionamentos com outros parceiros, o que provoca a alteração do panorama
puramente competitivo para um ambiente caracterizado por ações de cooperação e competição.
Tais ações ocorrem em níveis doméstico e internacional, e constituem estruturas organizacionais
mais ágeis e flexíveis para o enfrentamento do não-determinismo ambiental, característico da
economia informacional (CASTELLS, 1999).
Além de as estratégias colaborativas se apresentarem com maior proeminência, em
decorrência da inadequação dos modelos de hierarquia e de mercado, elas também estimulam a
orientação das organizações para suas competências centrais. Assim como referido por Child et
22
al. (2005), as estratégias colaborativas formam uma rede de parceiros que permite à empresa
concentrar-se nas atividades mais estratégicas, contribuindo para que a organização faça melhor
uso de seus recursos internos e assim eleve seu desempenho no mercado.
Embora os estudos acerca das redes em contextos industriais tenham recebido pouca
atenção acadêmica (EBERS & JARILLO, 1998), já é possível identificar o crescimento dos
estudos sobre o tema. Livros de negócios de grande vendagem, que mostram as transformações
sócio-econômicas dos últimos anos, têm abordado a ascensão das redes de empresas e demais
formas de relacionamentos colaborativos. Da mesma forma, percebe-se a crescente divulgação de
trabalhos científicos, em congressos e revistas nacionais e internacionais, voltados aos estudos da
cooperação em redes interorganizacionais, revelando a emergente preocupação acadêmica com o
fenômeno em diversos campos do conhecimento (BRASS et al., 2004). Cita-se como exemplo o
trabalho de Oliver & Ebers (1998) que identificou mais de 150 artigos sobre redes
interorganizacionais, publicados em quatro perdicos internacionais de alto impacto científico,
abordando tópicos como redes socias, custos de transação, estratégia, poder e controle, e
economia institucional.
Ao mesmo tempo em que as estratégias colaborativas apresentam relevância acadêmica, a
indústria de jogos eletrônicos revela-se como um campo empírico, cujas bases caracterizam
sobremaneira a dinâmica da nova economia informacional. Além de sua importância econômica,
essa indústria faz uso de uma complexa combinação de criatividade, tecnologia digital e
entretenimento (AOYAMA & IZUSHI, 2003), tornando-se um setor intensivo no uso da
informação (SOFTEX, 2005). Por conseqüência, a internet torna-se um meio vital de
comunicação para a indústria, interligando organizações e facilitando o fluxo de transações em
nível global (GRANTHAM & KAPLINSKY, 2005). Essa realidade estimula o intenso
relacionamento entre empresas, criando espaço para o uso da cooperação como forma de
competição no mercado.
Em decorrência da escassa literatura acadêmica sobre a indústria de jogos eletrônicos
(JOHNS, 2006), torna-se pertinente a realização de um levantamento sobre a mesma, abordando
os principais aspectos que norteiam seu funcionamento. Isso será realizado no capítulo 4 deste
estudo. O texto segue com a fundamentação teórica utilizada para a realização da pesquisa.
23
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para entender como as organizações estabelecem estratégias colaborativas, esta pesquisa
utiliza-se de um esquema conceitual de análise, com base nos estudos das teorias organizacionais
e de gestão de redes e relações interorganizacionais. Dentro desse universo, autores como Jarillo
(1988), Human & Provan (1997), Dyer & Singh (1998), Gulati et al. (2000), e Child et al. (2005)
sugerem que as empresas poderão alcançar maior competitividade ao promoverem uma série de
relações de cooperação de forma a complementar seus recursos com outros atores do mercado.
Assim, este capítulo fica organizado em duas partes. A primeira desenvolve os antecedentes, as
formas de gestão, e os resultados das estratégias colaborativas. A segunda parte apresenta o
esquema conceitual, baseado nas teorias apresentadas. Esse esquema norteará a investigação
empírica, assim como o processo de análise dos resultados da pesquisa.
2.1 ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS
A idéia de estratégias colaborativas, assim como a maior parte dos estudos sobre
cooperação interorganizacional na ciência administrativa, emergiu com maior vigor a partir da
década de 80. Os estudos de Astley (1984) e de Astley e Fombrun (1983) foram fundamentais
para consolidar o conceito de estratégias colaborativas na época. A maior contribuição desses
estudos está na compreensão de que as estratégias das empresas não precisam estar limitadas a
relacionamentos competitivos no ambiente, havendo inúmeras possibilidades para o
desenvolvimento de ações de cooperação de curta e longa duração.
Tais ações passaram a tomar forma a partir do processo de globalização (TODEVA, 2006)
e das evoluções tecnológicas, em especial das tecnologias de informação (JARILLO, 1993;
CASTELLS, 1999). Esse contexto não apenas promoveu a ascensão da performance das
empresas, mas também intensificou a competição internacional, criando um ambiente com alto
nível de incerteza e provocando a reorganização das atividades e das estratégias das organizações
(TODEVA, 2006).
24
Para Todeva (2006), a competição passou a crescer em nível global a partir das políticas
de desregulamentação e da abertura de mercado, que acabaram estimulando a internacionalização
de atividades das empresas. Como conseqüência, ocorreu a transferência de etapas de produção
dos países desenvolvidos para os países com mão-de-obra mais barata, o que fez com que as
empresas estabelecessem filiais nessas regiões. Também contribuiu para o processo o fenômeno
de downsizing, provocando a externalização de custos das organizações na forma de contratação
de suas atividades no mercado. Essa dinâmica fez com que as empresas, ao contrário de manter
uma relação estática e linear com outras firmas, passassem a estar conectadas a uma constelação
dinâmica de organizações, constituindo relações de caráter vertical ou horizontal. Assim redefine-
se o conceito tradicional de cadeia de valor, não se tratando mais de um fluxo linear de recursos
entre atores, mas sim de um complexo interorganizacional, melhor descrito como uma rede de
negócios.
Em decorrência do acesso a novos mercados e a novos sistemas de negócios, o nível de
incerteza cresceu consideravelmente, o que estimulou as empresas a estabelecerem alianças
estratégicas nos seus principais mercados. Esse processo de constante relacionamento entre as
organizações passou a criar novas perspectivas do ponto de vista estratégico, estimulando a
formação de redes de empresas e outras estratégias colaborativas que procuram enfrentar a
competição global através de uma estrutura organizacional flexível (TODEVA, 2006). Essas
estratégias passaram a promover a união de empresas concorrentes, que começaram a enxergar a
competição sob um novo olhar (LORENZONI & BADEN-FULLER, 1995). A nova percepção
enxerga as relações econômicas como um processo de co-opetição, onde dois concorrentes,
juntos, percebem adquirir melhores condições cooperando para competir com um terceiro
concorrente (BRASS et al, 2004).
Além de um processo de globalização pautado por questões governamentais, tem-se
relevante influência da evolução tecnológica no desenho do cenário econômico contemporâneo.
Nesse aspecto, Jarillo (1993) destaca que as acumulações tecnológicas geram aperfeiçoamento
constante nos processos de informação, transportes e sistemas de gerenciamento, o que provoca
taxas exponenciais de crescimento nos mais diversos tipos de atividade. Essa evolução de
performance redunda, geralmente, em uma considerável queda de preços e uma pressão constante
para se produzir mais rapidamente e de maneira inovadora. Na prática, isso exige, em muitos
casos, a entrega de produtos e serviços de melhor qualidade, com custos cada vez mais baixos,
25
flexibilidade e velocidade de entrega cada vez maiores. Diante dessas demandas, as empresas
acabam por reconhecer que isoladamente não são capazes de construir uma posição competitiva,
optando por estratégias baseadas em colaboração com outras organizações.
Embora as tecnologias, de um modo geral, tenham contribuído para a competição global,
foram as tecnologias da informação que amplificaram esse cenário em praticamente todo o
mundo. Na definição de Castells (1999), o cenário atual é caracterizado pela economia
informacional, na qual as organizações tornam-se pertencentes a um complexo arranjo
interorganizacional potencializado pela troca de informações. Com a grande difusão da internet e
de conexões de banda larga, intra e extranets, empresas de todos os portes relacionam-se com
facilidade, interatividade e flexibilidade, o que facilita enormemente o estabelecimento de
relacionamentos organizacionais em forma de rede de empresas em qualquer parte do mundo.
Dentro dessa rede, novas oportunidades são criadas constantemente. As empresas adquirem
novos conhecimentos, passam a processar suas informações com maior eficiência e adaptam-se
melhor à geometria variável da economia global, tornando difícil a sobrevivência das empresas
que optam por competir individualmente.
Os impactos decorrentes da economia informacional não atingem somente as empresas
diretamente envolvidas com tecnologias da informação, mas também empresas intensivas em
conhecimento, cujas informações quando formalizadas tendem a ser facilmente disseminadas de
forma digital pela rede (ZYSMAN, 2003). Enquanto as tecnologias promovem o
compartilhamento de conhecimento entre as empresas de uma rede, ela também permite a fácil
difusão de informações proprietárias para além das fronteiras organizacionais. Assim, o controle
sobre o processo de inovação torna-se complexo, o que faz com a verticalização das atividades de
P&D por parte das empresas não seja mais uma estratégia eficaz. Nesse aspecto, Chesbrough
(2003) destaca a trasformação dos processos de desenvolvimento em ambientes típicos de
inovação, em função dos novos desafios do mercado. O que o autor chama de era da Inovação
Aberta ou Open Innovation sugere um processo de desverticalização, passando de um modelo
tradicional de inovação fechada, para um novo modelo de inovação aberta. Nesse modelo, mais
importante do que controlar todo o processo de inovação é buscar constantemente novos
conhecimentos e idéias externas para a geração de inovação.
26
Em um cenário caracterizado pela globalização das atividades empresariais, tecnologias
da informação, e difusão do conhecimento e oportunidades de inovação, aponta-se que as
estratégias colaborativas parecem melhor se adaptar à dinâmica competitiva da nova economia se
comparadas aos modelos tradicionais da empresa vertical (hierarquia) e de compra no mercado
(mercado) (CASTELLS, 1999). Segundo Jarillo (1993), as estratégias organizacionais podem ser
comparadas a um processo darwiniano, em que novas formas surgem e algumas são claramente
superiores, contribuindo para a extinção dos modelos mais frágeis.
O princípio da empresa vertical é o de controlar a maior parte das atividades, desde a
matéria prima até a entrega ao consumidor. Isso incorre em uma difícil coordenação de tempo e
custo (JARILLO, 1993). Devido à imprevisibilidade da demanda, aos mercados mundialmente
diversificados e às transformações tecnológicas, a empresa vertical encontra dificuldades frente à
nova economia informacional. A rigidez das culturas corporativas tradicionais é vista por Castells
(1999) como o obstáculo mais importante na adaptação da empresa vertical às exigências da
flexibilidade da economia global.
Já o modelo de mercado enfrenta desafios distintos. A governança pelo mercado
(WILLIAMSON, 1975), baseia-se na contratação no mercado da maior parte das atividades
necessárias à organização. A fonte de competitividade está situada na coordenação das
atividades. Entretanto, a dependência de fornecedores põe em risco a organização quanto aos
prazos de entrega e a necessidades de compras em volume. Também é observada a perda de
contato com o cliente final das soluções contratadas, e o menor conhecimento das tecnologias
subjacentes (JARILLO, 1993). Esses fatores tendem a gerar elevados custos transacionais para as
organizações (WILLIAMSON, 1975).
Enquanto que a empresa vertical se defronta com a falta de flexibilidade, na relação com o
mercado ela carece de um entrosamento mais intenso e de longo prazo com o fornecedor. Assim,
a estratégia colaborativa busca suprir os pontos fracos de ambos os modelos, trazendo maior
flexibilidade à estrutura organizacional e relações de longo prazo entre os parceiros, favorecendo
trocas que vão além de acordos puramente contratuais (JARILLO, 1993).
Visto a relevância das estratégias colaborativas, torna-se necessário compreender como
elas ocorrem entre as organizações. A partir dos estudos de autores como Grandori & Soda
(1995), Brass et al. (2004) e Oliver & Ebers (1998), observa-se que a análise das estratégias
colaborativas constitui-se de três etapas: antecedentes, resultados e formas de gestão que ligam os
27
antecedentes aos resultados. Os antecedentes se referem aos fatores que estimulam as relações de
cooperação entre as organizações e, por assim dizer, a deliberação de estratégias colaborativas.
Os resultados se referem aos ganhos coletivos que podem ser obtidos a partir das estratégias
colaborativas. Por fim, entende-se por formas de gestão a combinação de diferentes tipologias de
redes e mecanismos de coordenação existentes para que a estratégia colaborativa possa ser
executada satisfatoriamente. Nas seções a seguir essas etapas serão exploradas de forma mais
detalhada.
2.1.1 ANTECEDENTES
A compreensão dos antecedentes das estratégias colaborativas pode ser desenvolvida a
partir dos olhares teóricos da economia e da sociologia (POWELL, 1998; GRANDORI &
CACCIATORI, 2006), tendo com alvo indivíduos e organizações (BRASS et al., 2004;
TODEVA, 2006; MARCON & MOINET, 2001). Embora os estudos organizacionais tenham
como ênfase a organização ou empresa, é importante observar primeiramente a influência
exercida pelas motivações da cooperação entre indivíduos sobre a emergência da cooperação
entre empresas, conforme indicam os estudos de Brass et al. (2004) e Barnard (1979). As
empresas são constituídas e operadas por pessoas e estabelecem relações com outras, que podem
ser o reflexo da colaboração entre indivíduos (BRASS et al., 2004).
2.1.1.1 PRINCÍPIOS DA COOPERAÇÃO ENTRE INDIVÍDUOS
Sob o ponto de vista da economia, a maior parte dos estudos descreve a emergência da
cooperação essencialmente a partir do auto-interesse dos atores envolvidos (OLSON, 1999;
AXELROD, 1990) e que se mantém através da intervenção de uma autoridade central. Nesse
aspecto, considera-se o mundo como palco de indivíduos “egoístas” em busca de seus objetivos
próprios. Com esse cenário, seria possível surgir cooperação sem considerar uma autoridade
28
central ou outros meios coercitivos? Em busca de uma resposta, Axelrod (1990) utilizou-se da
teoria matemática dos jogos para simular diferentes situações de cooperação e oportunismo entre
jogadores, na tentativa de identificar em que situações os membros concordariam em colaborar
uns com os outros. O jogo chamado “Dilema do prisioneiro” propõe a dois jogadores as opções
de cooperar ou não cooperar entre si.
O que se observa a partir dessa experiência é o fenômeno da reciprocidade. Os jogadores
experimentam as diferentes estratégias do jogo e avaliam os resultados obtidos. Eles percebem
que as opções motivadas pelo auto-interesse acabam trazendo o pior resultado para ambos, uma
vez que a reciprocidade é válida também nesse caso, e assim passam a experimentar ações de
cooperação na espera de que venham receber algo em troca. Assim, o experimento de Axelrod
(1990) identifica a reciprocidade como um importante elemento que antecede uma estratégia de
cooperação. O conceito do jogo é aplicável tanto a indivíduos quanto a organizações, entretanto,
como o próprio autor sugere, existem restrições nessa análise que impedem uma avaliação mais
ampla quanto a outros antecedentes importantes. Todos os atores devem dispor das mesmas
estratégias disponíveis e não terem consciência a respeito da escolha estratégica dos demais
atores. Ademais, não há mudança nos valores ganhos ao longo das rodadas e as escolhas
estratégicas afetam unicamente os dois jogadores envolvidos.
Com uma visão alternativa, Barnard (1979) defende que a emergência da cooperação
entre indivíduos e organizações tem como pilares aspectos motivacionais, fisiológicos e sociais.
A existência de um propósito comum entre indivíduos e uma limitação intransponível a partir de
uma ação solitária são fatores suficientes para a emergência de um comportamento cooperativo.
Segundo o autor, se é possível discriminar uma limitação física que pode ser superada pelo
próprio esforço pessoal, então não haverá incentivos para cooperação. Entretanto, quando é
possível discriminar essa limitação física e perceber a impossibilidade de superação individual, o
que o autor chama de limitação cooperativa, então surge a motivação para cooperar e dá-se início
ao sistema cooperativo.
Para que esse sistema funcione, é necessário que ele seja eficiente e efetivo. Um sistema
cooperativo defende um objetivo comum de um grupo, mas também os interesses individuais de
cada participante. Assim, na concepção de Barnard (1979) a eficiência refere-se à satisfação das
motivações de cada membro, e a efetividade refere-se ao sucesso obtido frente ao objetivo
comum existente no sistema cooperativo. Com base no estudo do autor, percebe-se a existência
29
de um esforço conjunto dos atores envolvidos na busca de um objetivo comum, o que adiciona
um novo ângulo de análise ao lado do pressuposto da ação puramente baseada em interesses
individuais para a emergência da cooperação.
Ampliando o entendimento acerca de outros possíveis antecedentes, verifica-se em Brass
et al. (2004) importantes fatores que influenciam a formação de redes de cooperação entre
indivíduos: a) similaridade do ator, b) personalidade, c) proximidade e estrutura organizacional, e
d) fatores ambientais.
a) Similaridade do ator: o autor identifica a tendência de indivíduos estabelecerem
relacionamentos cooperativos com base em similaridades sociais e culturais, visto que
esses aspectos aumentam a previsibilidade comportamental dos parceiros, o que
encoraja confiança mútua e reciprocidade. A personalidade é uma característica típica
dos membros com alto nível de centralidade em uma rede. Esses membros possuem
comportamento equilibrado, bom relacionamento com os demais membros, além de
capacidade de intermediar conflitos entre parceiros.
b) Personalidade: a destacada personalidade de um indivíduo pode catalizar ações de
cooperação a partir de princípios normativos. Líderes carismáticos podem provocar
entre os membros a expectativa de um padrão de comportamento em favor da
cooperação.
c) Proximidade e estrutura organizacional: também influem na emergência da
cooperação a proximidade dos indivíduos e a estrutura organizacional. O fluxo de
atividades e tarefas, horários de trabalho, estrutura física e níveis de hierarquia, por
sua vez, impactam diretamente na riqueza de interação possível entre os membros e os
diferentes departamentos. Estruturas organizacionais horizontais, com equipes
fisicamente próximas, tendem a incentivar a cooperação entre os membros.
d) Fatores ambientais: aspectos culturais de uma nação podem influenciar na emergência
da cooperação. Observa-se, por exemplo, a tendência de trabalhadores japoneses
estabelecerem fortes relações com outros membros, enquanto que franceses preferem
ligações mais frágeis. Nesse exemplo percebe-se um contraste entre uma cultura que
valoriza a tomada conjunta de decisões e outra que cultiva a individualidade na
profissão.
30
Assim, as percepções dos autores, quanto aos antecedentes da cooperação entre
indivíduos, podem ser sumarizadas de acordo com o quadro abaixo (QUADRO 1).
Antecedentes Descrição
Reciprocidade
A cooperação surge a partir de um número indefinido
de interações entre atores com interesses individuais.
Estes identificam que a cooperação traz melhores
resultados a longo prazo do que a ação oportunística.
Limitação física e objetivo comum
A cooperação emerge frente a um objetivo comum,
impossível de ser alcançado individualmente.
Similaridade do ator
A cooperação se desenvolve junto a indivíduos social e
culturalmente similares.
Personalidade
A cooperação surge a partir de memb ros com grande
capacidade relacional e de referência para o
comportamento dos membros.
Proximidade e estrutura organizacional
A cooperação emerge em estruturas organizacionais
horizontais, de baixa hierarquia e com proximidade
física entre os membros.
Fatores ambientais
A cultura propícia aos fortes relacionamentos sociais
favorece a emergência da cooperação.
QUADRO 1 ANTECEDENTES DA COOPERAÇÃO ENTRE INDIVÍDUOS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor com base em Barnard (1979), Axelrod (1990), e Brass et al. (2004).
Muitos dos princípios que envolvem relações de cooperação entre pessoas são os mesmos
que compõem as estratégias colaborativas entre as organizações (BRASS et al., 2004), fator
relevante para o melhor entendimento da seção apresentada a seguir.
2.1.1.2 A EMERGÊNCIA DA COOPERAÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÕES
Os antecedentes das estratégias colaborativas têm sido analisados com diferentes ênfases.
Quando se trata de antecedentes econômicos, a ênfase é dada em economias de escala, de escopo,
economias de especialização, de experiência e redução dos custos de governança. Já os
antecedentes sociológicos concentram-se em fatores como dependência e assimetria de recursos,
controle sobre informações, legitimidade, questões institucionais, normas e regras (GRANDORI
& SODA, 1995).
Segundo Perrow (1992), apesar de os estudos abordarem os antecedentes sob diversos
ângulos, eles ainda carecem de maior capacidade de explicação para a emergência das estratégias
colaborativas baseadas em redes de pequenas empresas. Três fatores são destacados como
31
influentes na formação de redes de pequenas empresas, carecendo de maior investigação: as
economias de escala obtidas através das redes, a possibilidade de cooperar com competidores
(co-opetição), e o impacto institucional no estimulo à formação de redes de cooperação em uma
região ou indústria.
Apesar das restrições citadas, autores como Grandori & Soda (1995), Ebers (1997), Brass
et al. (2004) e Oliver (1990) trouxeram importantes contribuições para o entendimento da
emergência das estratégias colaborativas. No estudo de Grandori & Soda (1995), cinco variáveis
são definidas como influentes no estabelecimento de arranjos cooperativos entre empresas: nível
de diferenciação entre empresas, intensidade da interdependência entre os atores, número de
firmas que requerem coordenação e flexibilidade organizacional.
O nível de diferenciação entre as empresas abrange um conceito amplo, que vai desde a
diferença de orientação estratégica até a distância psicológica das organizações. A autora
identifica que as diferenças intensificadas entre empresas aumentam consideravelmente os custos
de coordenação em modelos de hierarquia, provocando a desintegração. O modelo em rede surge
como a alternativa viável para preservar o nível de trocas e complementaridade entre as
empresas, sem comprometer a independência dos recursos de cada uma.
Outro antecedente é a intensidade de interdependência entre os atores. É importante que
os recursos de um ator sejam efetivamente relevantes e complementares para o outro e vice-versa.
O grande número de empresas interdependentes que requerem coordenação pode também ser um
preditor de formação das estratégias colaborativas. Segundo a autora, as estruturas hierárquicas
têm enfrentado limitações para coordenar uma grande quantidade de empresas, sendo substituídas
por uma organização central de coordenação da rede. Nesse contexto a complexidade das
atividades interdependentes, incuindo a assimetria de recursos por parte das firmas, também
desempenha importante papel na formação de arranjos cooperativos. Aqui, destacam-se
principalmente atividades intensivas em conhecimento, em que os parceiros possuem diferentes
competências e se mobilizam para estabelecer uma relação de troca e complementaridade. Nesse
aspecto, Powell (1998) destaca que o conhecimento tipicamente sofisticado é tácito por natureza,
e é um resultado indissociável da mistura de design, processos e outras especializações que não
são facilmente transferidos por meio de licença ou compra. Assim, as empresas tendem a
estabelecer trabalhos conjuntos como forma de rapidamente terem acesso a novas informações,
compartilharem conhecimento e aprenderem. Por fim, Grandori & Soda (1995) destacam a
32
flexibilidade organizacional obtida com a rede. As empresas buscam meios para rapidamente
proverem novos produtos e serviços, mas também para adaptarem sua estrutura interna de forma
ágil às incertezas do ambiente.
Para Ebers (1997) os antecedentes são analisados no nível do ator, da relação deste ator
previamente estabelecida com outros atores, e da relação estabelecida com o nível institucional.
Quando se trata do ator, a posição da organização na rede pode ser crucial para a formação de
novas relações com outros atores que queiram se beneficiar daquela posição. A dependência em
conhecimento e pesquisa pode também estimular a formação de redes, nas quais, segundo o
autor, são melhor desenvolvidas as atividades de inovação.
No que tange às relações pré-existentes do ator, considera-se seu envolvimento e
associações locais de negócios, clubes esportivos e outras redes sociais. Dentro desse entorno, há
propensão de relações desenvolvidas com base na confiança, o que provoca articulações entre
parceiros não necessariamente formalizadas (contratuais).
Outro tipo de antecedente é de cunho institucional. As empresas tendem a estabelecer
estratégias cooperativas beneficiadas por políticas, leis e outras condições favoráveis da região ou
da indústria. Elas também influenciam a cultura da região, mais ou menos propensa a encorajar o
relacionamento entre as empresas.
No estudo de Brass et al. (2004) são destacados essencialmente cinco antecedentes:
aprendizagem; confiança; normas e monitoramento; equidade e; contexto. Quanto à
aprendizagem, o autor observa que empresas com maior experiência em se relacionar com outros
atores tendem a formar redes mais efetivas para a aprendizagem, tendo ela um posicionamento
dominante. Há uma crescente capacidade de troca e aquisição de novos conhecimentos, que vai
se tornando gradativamente mais atrativa para outros parceiros. Essa idéia é suportada por Powell
(1998), propondo que empresas de Biotecnologia, intensivas em conhecimento, obtém maiores
benefícios com base na cooperação em redes, a partir de uma boa capacidade de comunicação e
relacionamento com outras organizações.
No que se refere à confiança, o autor destaca a que as empresas tendem a investir na
cooperação, sabendo da capacidade de seus parceiros e tendo um histórico positivo de relações
anteriores. As normas e monitoramento estimulam a previsibilidade do comportamento desejável,
reduzindo as incertezas, além de favorecerem a reciprocidade. Isso encoraja a aproximação de
novos membros e cria uma barreira contra a ação de oportunistas. A equidade identifica a maior
33
emergência da cooperação entre empresas com condições equilibradas de troca, dentro do mesmo
conceito de Grandori & Soda (1995). Por fim, o contexto é o antecedente que considera razões
históricas, institucionais e culturais na formação das estratégias colaborativas, dentro da mesma
visão trabalhada por Ebers (1997), quando se refere à análise dos antecedentes em nível
institucional.
Um estudo mais amplo a respeito dos antecedentes das estratégias colaborativas foi
desenvolvido por Oliver (1990). A partir da integração de diversos estudos da literatura de
relações inteorganizacionais que datam de 1960 a 1990, a autora identificou seis antecedentes
principais, de maior amplitude, e que comportam definições mais pontuais de outros autores:
necessidade, assimetria, reciprocidade, eficiência, estabilidade e legitimidade.
O antecedente de necessidade identifica conexões estabelecidas entre as organizações de
forma voluntária ou obrigatória. Esse antecedente amplia o entendimento das visões de Brass et
al. (2004) e Ebers (1997) a respeito do impacto do ambiente institucional na emergência da
cooperação entre as organizações (políticas, cultura, etc.). Oliver (1990) acrescenta o impacto
institucional na forma de relações de cooperação não-voluntárias como consequência de
requerimentos legais e regulatórios. Por exemplo, programas governamentais de fomento a certas
indústrias podem requerer o desenvolvimento compartilhado de projetos entre organizações,
provocando a necessidade de uma relação de troca mais intensa. Por outro lado o antecedente de
necessidade pode se manifestar de forma voluntária quando existe uma dependência clara de
recursos entre as organizações ou mecanismos eficazes de trocas entre as mesmas. A autora
destaca que a obrigatoriedade ou não de uma relação de cooperação influencia diretamente na
forma da rede resultante.
O segundo antecedente abordado é a assimetria que surge a partir da oportunidade de se
constituir uma estratégia colaborativa entre organizações como forma exercer poder e controle
sobre recursos importantes que estão em posse de outra organização. Um exemplo é a associação
de empresas pertencentes a um mesmo segmento com finalidade de exercício de lobby sobre
agências reguladoras do mercado. Ebers e Jarillo (1998) realçam essa visão destacando que redes
não são formadas apenas por fatores ambientais e determinísticos mas por um exercício
deliberado de poder, formulando redes interorganizacionais que intensificam relações verticais e
inviabilizam arranjos horizontais.
34
A reciprocidade é outro antecedente que estimula a formação das relações de cooperação.
A experiência, em termos de trocas favoráveis e sem relação de dominação entre empresas, cria
uma relação próxima e constante entre as mesmas. Nesse aspecto, Brass et al. (2004) sugerem
que normas a respeito da conduta esperada pelos membros sejam constituídas ao longo dessas
experiências positivas de troca, minimizando ações oportunistas. Da mesma forma, Lorenzoni &
Baden-Fuller (1995) destacam que o processo de reciprocidade alimenta a confiança entre os
parceiros; dimensão esta importante para a formação de relações de cooperação entre as
organizações (SYDOW, 2000).
A eficiência é identificada como quarto antecedente, e é orientada ao ambiente interno da
organização. As empresas buscam no trabalho cooperativo a possibilidade de reduzirem seus
custos transacionais, aumentarem a escala e aprimorarem sua performance. Alinhados a esses
fatores, Powell (1998) acrescenta o estabelecimento de propriedades e a coordenação de
mecanismos de transferência e ajustes contratuais. Grandori & Soda (1995), por sua vez, tomam
como exemplo a flexibilidade, através da qual a empresa se torna ágil para a geração de novos
produtos, como de novos arranjos organizacionais.
O antecedente de estabilidade surge da necessidade de as organizações lidarem com as
incertezas do ambiente, aliando-se a parceiros que lhes dão maior probabilidade de garantir o
fluxo de atividades e recursos necessários. O desenvolvimento e introdução conjunta de novos
produtos visando a diluição de riscos é um exemplo prático de tal antecedente. Para a autora, a
busca por estabilidade pode, isoladamente ou em conjunto com outros antecedentes, justificar a
formação de estratégias colaborativas.
A legitimidade surge como último antecedente e justifica a formação de estratégias
colaborativas baseadas na busca de respaldo, prestígio ou credibilidade. Nesse aspecto, Lorenzoni
& Baden-Fuller (1995) destacam a presença de marcas fortes, como a Nike, que conseguem
constituir redes estratégicas de produção mobilizando uma grande quantidade de pequenas
empresas motivadas a trabalhar junto a um grande ator do mercado.
As contribuições dos autores quanto aos antecedentes das estratégias colaborativas são
sumarizadas no quadro abaixo, unificando os conceitos similares em torno dos antecedentes
definidos por Oliver (1990) (QUADRO 2).
35
Tipo de antecedente Razões para cooperação entre organizações
Voluntário
Dependência de recursos e mecanismos de troca
(OLIVER, 1990), e dependência da posição de um ator
na rede e de conhecimento para atividades de inovação
(EBERS, 1997). Intensidade e equidade de
interdependência dos atores (GRANDORI & SODA,
1995; BRASS et al., 2004).
Necessidade
Induzido
Cooperação para atender a requerimentos e
conformidades (OLIVER, 1990).
Assimetria
Aumento do poder e controle sobre recursos
importantes em posse de outra organização (OLIVER,
1990).
Reciprocidade
Histórico de trocas favoráveis entre organizações
(OLIVER, 1990; BRASS et. Al, 2004);
relacionamentos em redes sociais e organizacionais
com base em confiança (EBERS, 1997; LORENZONI
& BADEN-FULLER, 1995; SYDOW, 2000);
capacidade relacional da organização (BRASS et al.,
2004; POWELL, 1998).
Eficiência
Redução de custos transacionais; aumento de escala e
performance (OLIVER, 1990). Redução de custos,
melhoria de coordenação, complexidade de atividades
interdependentes, flexibilidade organizacional
(GRANDORI & SODA , 1995). Compartilhamento de
conhecimento e aprendizagem (BRASS et al., 2004;
POWELL, 1998).
Estabilidade
Enfrentamento das incertezas do ambiente (OLIVER,
1990; POWELL, 1998), garantindo fluxo de atividades
e recursos, compartilhando risco (OLIVER, 1990).
Legitimidade
Busca de prestígio, reconhecimento e credibilidade
(OLIVER, 1990), trabalho junto a marcas fortes e
atores estabelecidos no mercado (LORENZONI &
BADEN-FULLER, 1995).
Institucional
Cooperação voluntária com base em benefícios legais,
políticas de fomento a indústria (EBERS, 1997),
fatores históricos e culturais de uma região (BRASS et
al., 2004).
QUADRO 2 ANTECEDENTES DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS ENTRE ORGANIZAÇÕES .
Fonte: adaptado de Oliver (2000).
Observa-se que os diferentes antecedentes apontados por Oliver (1990) conseguem
comportar razoavelmente as contribuições dos demais autores. Entretanto algumas distinções são
necessárias. Primeiro, o antecedente de necessidade abrange ações voluntárias e induzidas, esta
última para abordar as ações de cooperação criadas para atender conformidades legais e sanções
de caráter institucional (OLIVER, 1990). Essa distinção é importante pois as contribuições dos
demais autores sugerem que os antecedentes institucionais estimulam, e não forçam, a
cooperação entre as organizações. Assim foi introduzido ao sumário o antecedente de Instituição
36
que aborda essas contribuições. Com uma visão abrangente dos diferentes antecedentes, o
próximo passo nesta pesquisa é a análise das formas de gestão que desenvolvem e sustentam as
estratégias colaborativas.
2.1.2 FORMAS DE GESTÃO
Visto a existência de antecedentes que estimulem as estratégias colaborativas, tem-se em
seguida o desafio de configurar e manter essas estratégias. Estudos como os de Oliver & Ebers
(1998) destacam a existência de diferentes formas de gestão que conectam antecedentes aos
resultados das estratégias colaborativas, e que são importantes para a manutenção das relações
interorganizacionais. Essas formas de gestão, dentro da visão de Todeva (2006), compreendem
diferentes alternativas de coordenar um complexo de conexões, recursos e atividades
compartilhados visando facilitar as relações e trocas entre indivíduos e atores de negócios. Logo,
qual a forma mais adequada de se construir uma estratégia colaborativa bem sucedida?
Seguindo o raciocínio baseado no conceito de Barnard (1979), pode-se dizer que a
estratégia colaborativa precisa ser efetiva e eficiente, e fazer com que o benefício oferecido por
ela seja maior para a organização participante do que seria caso ela tentasse obter o mesmo ganho
sozinha. Nesse aspecto, Jarillo (1988) destaca que uma rede de parceiros só se sustenta se
efetivamente oferece performance superior aos membros e se sua estrutura e mecanismos de troca
são considerados justos.
Para compreender a gestão de estratégias colaborativas efetivas e eficientes, buscou-se
nos estudos de autores como Provan & Kenis (2003), Grandori & Soda (1995) e Marcon &
Moinet (2001) diferentes dimensões de análise para investigação da coordenação das redes
interorganizacionais. Segundo Provan e Kenis (2003), a gestão das redes é analisada a partir de
duas abordagens: a configuração dos atores e suas conexões, caracterizando relações verticais ou
horizontais, e os conjuntos de normas e regras entre eles. Essas diferentes normas e regras são
referenciadas por Grandori & Soda (1995) como mecanismos de coordenação da rede, pois são
rotinas que permitem regular as trocas entre os membros da rede e fomentar a vantagem coletiva
da estratégia colaborativa.
37
Marcon & Moinet (2001), a exemplo de Provan & Kenis (2003), destacam em seu mapa
de orientação conceitual das redes um espectro de configurações cujos pólos representam
relações de hierarquia ou horizontalidade. Os autores também acrescentam uma nova dimensão à
gestão das redes, que se refere ao nível de formalização das relações (se os mecanismos de troca
são informais e baseados na confiança, ou formais e contratualizados). Assim, optou-se por
dividir esta seção em duas partes principais. A primeira trata das diferentes configurações em
rede, referidas aqui como tipologia de redes, identificando a forma como os atores estão
conectados e as características de horizontalidade ou verticalidade da relação. Na segunda parte,
verificam-se os mecanismos de coordenação e o nível de formalização da rede.
2.1.2.1 TIPOLOGIA DE REDES
Considera-se como tipologias de rede, os arranjos que consistem na relação de cooperação
entre duas ou mais organizações, tais como as ilustradas nos estudos de estratégias colaborativas
em relações diádicas para geração de ganhos relacionais (DYER & SINGH, 1998), de redes
estratégicas (JARILLO, 1993), centros estratégicos (LORENZONI & BADEN-FULLER, 1995) e
redes de negócios (TODEVA, 2006; GRANDORI & CACCIATORI, 2006). As diferentes formas
de rede são apresentadas por autores tais como Todeva (2006), Castells (1999), Grandori & Soda
(1995) e Provan & Kenis (2003). Em Todeva (2006) destacam-se redes de pequenas empresas e
empreendedores, redes de negócios familiares, redes chinesas, japonesas e koreanas, redes de
suprimentos da cadeia de valor, redes corporativas, de alianças tecnológicas e redes de
comunicação. A autora procura organizar as diferentes formas de redes a partir do perfil das
organizações envolvidas, suas relações hierárquicas e o conteúdo característico de seus
mecanismos de interação.
Castells (1999) destaca exemplos como as redes multidirecionais posta em prática por
empresas de pequeno e médio porte, as redes de licenciamento e produção sob controle de uma
grande empresa, as alianças estratégicas ligadas principalmente à tecnologia, e redes globais de
pequenas empresas, potencializadas pela tecnologia da informação. Dentro de uma abordagem
similar à de Todeva (2006), o autor procura definir as diferentes formas de rede a partir da
38
caracterização de diferentes atores, relações verticais e horizontais e mecanismos de coordenação
sociais e econômicas.
Já Grandori e Soda (1995) organizam as diferentes formas de redes em três grandes
classificações: redes sociais, burocráticas e de propriedade, podendo essas serem simétricas ou
assimétricas. A relação simétrica é caracterizada pela horizontalidade e o equilíbrio de
negociação entre atores na rede, enquanto que a relação assimétrica denota uma coordenação de
natureza hierárquica. As autoras consideram que a gestão da rede se utiliza de um conjunto
específico de mecanismos de coordenação, podendo ser caracterizada pela presença de contrato
ou pela informalidade através de confiança.
As contribuições desses e de outros autores corroboram a observação de Provan & Kenis
(2003) de que a literatura das relações inteorganizacionais sobre gestão das redes dá grande
ênfase às características socais e econômicas que permeiam a coordenação entre autores,
dedicando pouca atenção a estudos que procuram compreender a gestão da rede a partir de uma
perspectiva mais analítica. Assim, buscando preencher essa lacuna, Provan & Kenis (2003)
desenvolveram, a partir das diversas formas de organização em rede, três tipos que caracterizam
as conexões e a relação de verticalidade ou horizontalidade entre os atores. A vantagem dessa
abordagem é a caracterização de uma topologia básica, cujas formas de rede, puras ou
combinadas, são capazes de representar diversos negócios organizados em rede, abstraindo a
complexidade dos mecanismos associados. Os tipos de redes propostos por Provan & Kenis
(2003) são chamados rede autocoordenada, rede coordenada por uma empresa líder e rede
coordenada por um núcleo administrativo.
A rede autocoordenada é caracterizada por uma relação horizontal e simétrica de poder,
constituindo conexões fortes entre os diferentes atores (FIGURA 1). Essa rede representa atores
que trabalham coletivamente, mas sem utilizar uma estrutura única e formal de coordenação, que
se faz presente em cada um dos membros participantes. As formas de coordenação dentro desses
ambientes normalmente são realizadas através de encontros regulares de representantes da rede,
ou através de trocas informais entre membros das organizações.
39
FIGURA 1 MODELO DE REDE AUTOCOORDENADA.
Fonte: Provan & Kenis (2003).
Como uma rede onde todos os membros têm equilíbrio de poder, torna-se característica da
rede autocoordenada bem sucedida uma forte interdependência entre os atores. Em detrimento da
agenda e de interesses específicos de cada membro, uma rede autocoordenada pode facilmente se
tornar insustentável se contiver muitos atores. Assim, verifica-se que esse modelo de rede em
geral se mostra eficiente quando gerido por poucos membros que possuam capacidades e recursos
complementares.
Exemplos da literatura que ilustram o modelo de rede autocoordenada são as redes de
pequenas empresas (TODEVA, 2006; PERROW, 1992, CASTELLS, 1999). Trata-se de arranjos
interorganizacionais multidirecionais e com relações horizontais de coordenação. Esses arranjos
são caracterizados pela heterogeneidade das empresas, pela coordenação baseada no papel e na
capacidade de cada organização, e apresentando mecanismo de trocas sociais que minimiza a
presença do contrato nas transações.
O segundo tipo proposto é o da rede coordenada por uma empresa líder (FIGURA 2). A
forma típica aqui é de uma relação mais vertical, similar a do tipo comprador-fornecedor,
especialmente quando há uma única empresa grande responsável pela coordenação e pelo
desenvolvimento da rede. Nesse modelo, várias empresas menores fornecem os serviços
necessários à empresa líder.
40
FIGURA 2 REDE COORDENADA POR UMA EMPRESA LÍDER.
Fonte: Provan & Kennis (2003).
Entretanto há uma diferenciação com relação às formas tradicionais de compra e
fornecimento. A empresa líder promove laços fortes com seus fornecedores e estimula a
integração entre os mesmos, fornecendo mecanismos que facilitam o fluxo de recursos e
competências ao longo da rede, potencializando o trabalho de todos em prol do objetivo da rede.
Por ser normalmente coordenada por uma grande empresa, forte em recursos e processos, a
complexidade da informalidade da rede autocoordenada pode ser facilmente contornada,
permitindo assim a coordenação de um grande número de membros. Entretanto, há uma
desvantagem nesse modelo: uma empresa líder pode facilmente dominar os membros da rede
forçando suas ações a convergirem com sua agenda, podendo provocar a perda de interesse por
parte dos membros quanto aos objetivos estabelecidos. Assim, acredita-se ser importante para a
viabilidade da rede que as pequenas empresas sejam altamente dependentes da empresa líder, em
termos de recursos e legitimidade.
Um exemplo que ilustra esse modelo é a rede de fornecedores da Toyota, que promove o
compartilhamento de conhecimento e a qualificação dos membros da rede através de fóruns de
discussão, consultorias da empresa líder para transferência de informações, e equipes voluntárias
de trabalho entre os próprios fornecedores (DYER & NOBEOKA, 2000). Outro exemplo ocorre
no desenvolvimento de jogos eletrônicos por parte da Nintendo, que detém alta tecnologia em
uma plataforma para a execução de jogos. Apesar de produzir internamente alguns títulos, a
Nintendo coordena a maior parte da produção do conteúdo junto a sua rede de desenvolvedoras,
compartilhando novos conhecimentos e tecnologias que só são acessíveis aos membros da rede, e
41
estimulando exploração de propostas de jogos inovadores em cima de suas tecnologias
(LORENZONI & BADEN-FULLER, 1995).
O terceiro tipo de rede, proposto por Provan & Kenis (2003), refere-se à rede coordenada
por um núcleo administrativo (FIGURA 3), que se apresenta como alternativa à possível
ineficiência do tipo autocoordenado e ao problema da dominância da empresa líder. O núcleo
administrativo tem como objetivo focar-se somente na coordenação da rede, sendo uma
organização neutra e sem fins lucrativos perante os demais membros. Essa forma tem-se
mostrado como uma eficiente solução para a complexa gestão entre inúmeros membros de redes
autocoordenadas e também para organizações líderes que não gerenciam efetivamente ambos os
processos de coordenação e produção. O núcleo administrativo pode ser representado por apenas
um integrante, intermediador ou representante, também chamado de catalisador (EBERS, 1997),
capaz de conectar a rede a novas oportunidades de negócios. Também poder ser representado por
estruturas formais de diretores executando ações de diálogo institucional na busca de maior
captação de fundos e benefícios fiscais.
Os autores acreditam que esse tipo de rede tenda a demonstrar eficiência quando os
requerimentos de coordenação satisfazem três condições: o número de participantes da rede é
grande, a colaboração e envolvimento entre os membros é um objetivo chave da rede, e a gestão
das relações externas à rede (captação de investidores, negociações com órgãos reguladores, etc.)
é altamente complexa.
FIGURA 3 REDE COORDENADA POR UM NÚCLEO ADMINISTRATIVO.
Fonte: Provan & Kenis (2003).
42
Um exemplo da literatura que ilustra essa forma de rede vem de Verschoore (2006),
referido como redes de cooperação. Nessas redes, pequenas empresas similares em atividades
trabalham de forma cooperativa, sob a coordenação de uma administração responsável por
desenvolver a marca da rede. Essa administração também é responsável por procedimentos de
gestão junto aos membros, e pela articulação de ações em nome da rede visando benefícios como,
entre outros, o maior poder de mercado e ganhos de escala.
A tipologia sugerida por Provan & Kenis (2003) tem um aspecto importante que é a
possibilidade de combinação das diferentes configurações. É possível caracterizar novos negócios
em redes combinando, por exemplo, um tipo baseado em empresa líder com outro baseado em
um núcleo administrativo, gerando assim uma forma híbrida. Podem ser citadas como exemplo
dessa combinação as keiretsu japonesas, descritas por Todeva (2006) como complexos de redes
de pequenos fornecedores gerenciados por grandes organizações, que são representadas por uma
estrutura administrativa de membros-chave dos grandes e pequenos atores. Essa estrutura articula
ações junto a grandes instituições financeiras que potencializam o desenvolvimento de negócios
na rede.
Uma maior compreensão quanto à caracterização dos diferentes negócios organizados em
rede poderá ser adquirida a partir do entendimento dos mecanismos de coordenação. Esses
mecanismos podem auxiliar na constituição da gestão mais adequada de acordo com o negócio
almejado, baseado em seus níveis de troca sociais, econômicas, formais e informais
(GRANDORI & SODA, 1995).
2.1.2.2 MECANISMOS DE COORDENAÇÃO E NÍVEL DE FORMALIZAÇÃO
Diferentes estratégias de gestão das redes fazem uso de uma combinação específica de
certos mecanismos de coordenação, conduzidos de acordo com o nível de formalização do
relacionamento entre parceiros. Primeiramente, serão aqui apresentados os diferentes
mecanismos de coordenação e, logo a seguir, serão tratados os aspectos de formalidade das
relações, em termos de confiança e contrato.
43
Segundo Grandori & Soda (1995) há uma série de estudos sobre relações
interorganizacionais que tratam dos aspectos de coordenação das redes. Visando sistematizar
essas contribuições, os autores propuseram a organização dos diversos mecanismos de
coordenação em 10 tipos: a) comunicação, decisão e negociação; b) coordenação e controle
social; c) integração interunidade; d) equipe comum de coordenação; e) hierarquia e autoridade;
f) sistemas de controle e planejamento; g) sistemas de incentivo; h) sistemas de seleção; i)
sistemas de informação e j) suporte público e infra-estrutura. Assim, utiliza-se a classificação de
Grandori & Soda (1995) como norteador para organizar as suas contribuição e a dos demais
autores.
a) Comunicação, decisão e negociação: esse mecanismo está presente em praticamente
todas as formas de redes e compreende práticas de discussões, escolhas e acordos
entre membros das organizações. Como exemplo, Perrow (1992) identifica nas redes
de pequenas empresas encontros onde são compartilhadas e discutidas informações
sobre mercado, tecnologias e lucratividade. As empresas desenvolvem maior
intimidade e sentem-se a vontade para auxiliarem umas as outras. A proximidade na
forma de encontros, fóruns e grupos de aprendizados são fundamentais para o
compartilhamento de conhecimento tácito (CORNO et al., 1999; DYER &
NOBEOKA, 2000). Essas práticas podem ocorrer de forma esporádica; porém, uma
rede de longo prazo tende a tomar forma quando há inúmeras interações entre os
atores (GRANDORI & SODA, 1995). Axelrod (1990) verifica que repetidas sessões
de negociação contribuem para que os participantes da transação identifiquem a
superioridade do benefício coletivo. Assim, passam a agir reciprocamente,
fortalecendo a estratégia colaborativa e inibindo ações oportunistas.
b) Coordenação e controle social: esse mecanismo social estimula a manutenção das
redes com base em um controle regido por normas e pela reputação dos parceiros.
Para Ebers (1997) a rede estimula repetidas transações, fazendo com que o histórico
de relacionamentos tenha grande impacto no comportamento dos autores. Esse
mecanismo está diretamente relacionado com a reciprocidade entre os atores (BRASS
et al., 2004) e pode contribuir para a emergência da confiança na rede (GRANDORI
& SODA, 1995).
44
c) Integração interunidade: representa o desenho de uma rede onde atividades
necessárias a uma empresa podem ser coordenadas por profissionais de outra,
especializada na tafefa. Cita-se como exemplo gerentes de produtos de fornecedores
especializados que coordenam, junto com a grande empresa compradora, o
desenvolvimento de novos produtos. Essa é uma característica que diferencia as redes
dos modelos tradicionais de contratação e compra no mercado.
d) Equipe comum de coordenação: trata-se de um grupo criado para coordenar atividades
que envolvam muitos parceiros e grande quantidade de informação a ser
compartilhada. É o exemplo encontrado em franquias e também em alianças e
consórcios empresariais. Outro exemplo para este mecanismo é o intermediário
(TODEVA, 2006), referido como catalizador por Ebers (1997). Esse profissional
facilita a interação entre diferentes redes, sintetiza a complexidade das informações
envolvidas e potencializa geração de novos negócios, gerando confiança entre os
parceiros. Tal mecanismo não é recomendado para acordos limitados de cooperação
como ocorre em indústrias de alta tecnologia. Nesse caso, a negociação direta entre
parceiros se mostra mais eficiente (GRANDORI & SODA, 1995).
e) Hierarquia e autoridade: hierarquia é uma estratégia que pode ser utilizada como
complemento a outros mecanismos mais horizontais necessários à rede, especialmente
em redes institucionalmente complexas. Esse mecanismo compreende ações de
supervisão hierárquica, planejamento formal e sistemas de informação capazes de
padronizar diversos processos de programação, treinamento e contabilidad,e provendo
a organização controladora de forte capacidade instrumental. Em Jarillo (1993) pode-
se tomar como exemplo a rede de franquias do McDonald’s, que segue um processo
rigoroso de condução dos seus negócios, respeitando padrões como marca, estrutura
física, atendimento e finanças.
f) Sistemas de controle e planejamento: são sistemas focados no monitoramento de
indicadores de desempenho e resultados. Acredita-se que esses sistemas sejam mais
efetivos que os de hierarquia e autoridade por não serem orientados à detecção de
inconformidade comportamental, mas sim ao atingimento pragmático de metas.
g) Sistemas de incentivo: é um mecanismo voltado à coordenação de atividades
informacionalmente complexas. Trata-se do estabelecimento de termos inseridos em
45
contextos de alto nível de incerteza, como ganhos sobre os lucros, direitos de
propriedade e exploração comercial. Como essa realidade é bastante propícia a ações
oportunistas, normalmente esse mecanismo é operado através de contrato. Para
Grandori & Cacciatori (2006), esse é o caso típico de empresas orientadas à inovação,
cujas alianças definem a propriedade sobre os ganhos auferidos em decorrência de
potenciais conflitos e imprevisibilidade quanto aos possíveis resultados.
h) Sistemas de seleção: são sistemas que visam maximizar as chances de uma boa
coordenação da rede, a partir da seleção de parceiros com preditores comportamentais
relevantes para cooperação. Nesse aspecto, Lorenzoni & Baden-Fuller (1995) ilustram
a forma como a empresa líder dos centros estratégicos seleciona seus fornecedores.
Verificam-se as capacidades complementares dos parceiros com relação à rede, se o
seu perfil sugere ou não competição com os demais membros, a compatibilidade de
seus processos de gerência com os da rede e suas perspectivas com relação a sua
participação.
i) Sistemas de informação: são importantes mecanismos de coordenação para estabelecer
redução de custo transacional e coordenar redes dispersas. É possível estabelecer
mecanismos de coordenação baseados unicamente em tecnologia, sem intervenção
humana. Um exemplo são as redes de negócios baseadas em comunicação (TODEVA,
2006) com transações realizadas digitalmente, inclusive através de internet, onde os
parâmetros de troca de informações e operações para certas transações são
processados automaticamente. Assim é possível o estabelecimento de uma interação
remota na rede com um processo de coordenação essencialmente tecnológico.
j) Suporte público e infra-estrutura: representa agências voltadas ao estímulo da
cooperação, que seria muito benéfica mas difícil de ocorrer. É uma situação comum
em atividades típicas de inovação onde os investimentos necessários são muito altos e
o controle sobre a apropriabilidade dos benefícios é muito baixo.
Os mecanismos de coordenação variam de acordo com o nível de formalização da relação
entre parceiros. Relações mais informais baseiam-se na confiança, uma dimensão essencial para a
existência da cooperação inter firma (GRANDORI & SODA, 1995; JARILLO, 1988). Já os
relacionamentos formais são pautados principalmente na forma de contrato (GRANDORI &
CACCIATORI, 2006; MARCON & MOINET, 2001).
46
A confiança, segundo Locke (2001), representa a disposição de um indivíduo, mesmo em
situações de informação incompleta e de risco de oportunismo, em acreditar que outrem não
tirará proveito dessa oportunidade. As redes interorganizacionais são naturalmente imbuídas de
valor social (RING, 1997), estimulando os atores a interagir, criando relações de reciprocidade
que dão emergência à confiança (GRANDORI & SODA, 1995). Nesse momento os atores
passam a ser afetados por aspectos normativos da rede, ligados a sua reputação e histórico de
relacionamentos anteriores com os parceiros, o que os influencia a ter um comportamento
esperado. Assim, as redes tendem a desenvolver a confiança e são bastante eficazes para lidar
com o problema da racionalidade limitada, minimizando as fragilidades que o contrato apresenta
para com esse aspecto (RING, 1997; JARILLO; 1988; LORENZONI & BADEN-FULLER,
1995).
O contrato constitui-se em uma forma de se buscar mitigar os riscos relacionais
(WOOLTHUIS et al., 2005), abordando aspectos de obrigatoriedade dos atores em termos de
comportamentos e procedimentos, bem como incentivos de margens de ganhos e direitos de
propriedade (GRANDORI & CACCIATORI, 2006). Mesmo que o contrato se faça presente em
uma rede, percebe-se que sua eficácia dependende necessariamente da existência de uma relação
de confiança, principalmente quando há uma dependência assimétrica entre os parceiros
(WOOLTHUIS et al., 2005). Entretanto, o contrato torna-se essencial em ambientes de inovação
com altos níveis de incerteza e incentivo ao oportunismo. Assim, o caminho mais eficaz para
coordenação parece uma solução baseada em relação contratual e extracontratual (GRANDORI
& CACCIATORI, 2006), através da qual a confiança se encarrega dos aspectos comportamentais
difíceis de serem previstos, e o contrato define elementos específicos da incerteza dos resultados,
como percentuais sobre ganhos e propriedade.
Embora confiança e contrato sejam citados na literatura como mecanismos de
coordenação (WOOLTHUIS et al., 2005), no escopo desse estudo adota-se a idéia de Grandori &
Soda (1995), que consideram contrato e confiança elementos que influenciam os mecanismos da
rede, não sendo necessariamente mecanismos per se, mas sim indicadores do nível de
formalização do relacionameto.
Dessa forma, investigadas as configurações de uma rede interorganizacional, seus
mecanismos de coordenação e nível de formalização, torna-se possível classificar as diferentes
estratégias colaborativas a partir do uso do mapa de orientação conceitual das redes (FIGURA 4).
47
FIGURA 4 MAPA DE ORIENTAÇÃO CONCEITUAL DAS REDES.
Fonte: adaptado de Provan & Kenis (2003) e Marcon & Moinet (2001).
A dimensão horizontal do mapa define o nível de formalização da relação entre parceiros.
Na dimensão vertical, tem-se a configuração dos atores e as direções de suas conexões, que
denunciam uma relação com maior ou menor nível de hierarquia. Assim completa-se a análise da
gestão das estratégias colaborativas que liga antecedentes aos resultados das estratégias
colaborativas.
Com a compreensão dos antecedentes da formação das estratégias colaborativas, somada
ao entendimento das possibilidades de gestão dessas estratégias, passa-se então à análise dos seus
possíveis resultados.
2.1.3 RESULTADOS
As estratégias colaborativas tornam-se um meio de as empresas alcançarem
competitividade nos mercados através de complexo ordenamento de relacionamentos baseado na
cooperação que promove ganhos coletivos (BALESTRIN & VARGAS, 2004). A partir da
48
revisão da literatura que aborda os resultados das estratégias colaborativas, sugere-se a
organização dos mesmos em quatro grupos: a) ganho de performance, flexibilidade e melhoria de
processos; b) ativos relacionais, complementaridade e economias de escala; c) aprendizagem e
compartilhamento de conhecimento e d) geração de inovação. A seguir cada grupo é apresentado
em maiores detalhes, agregando a contribuição dos diferentes autores relacionados.
2.1.3.1 GANHO DE PERFORMANCE, FLEXIBILIDADE E MELHORIA DE PROCESSOS
As empresas organizadas em rede tornam-se mais ágeis e flexíveis em decorrência de suas
estruturas de relacionamentos cooperativos, que promovem intensa troca de informações e
recursos (TODEVA, 2006). Além disso, pela confiança intrínseca ao processo, essas relações
contribuem para uma eficiente coordenação, que prioriza transações menos contratualizadas
(DYER & SINGH, 1998).
Esse fluxo intenso de informações e de recursos na rede contribui decisivamente para a
redução de incerteza nas relações (EBERS & JARILLO, 1998), visto a necessidade natural de os
atores interagirem e criarem uma relação de reciprocidade. Dessa forma, pela forte proximidade
interoganizacional, os atores tendem a assimilar melhores formas de realizar o seu trabalho,
seguir conselhos de colegas e ser persuasivos na proposição de suas idéias. Esse processo pode
provocar imitação, o que leva as melhores práticas de negócios para toda a rede (BRASS et al.,
2004). Isso pode ocorrer de forma planejada, como reuniões de trocas de informações de mercado
e negócios (PERROW, 1992), mas também através de ações informais e até inconscientes, em
decorrência da confiança gerada entre os membros (BRASS et al., 2004).
Além desse processo eficiente de difusão de práticas, identifica-se ganhos de performance
financeira e de legitimidade, como apresentados em Human & Provan (1997). Fazer parte de uma
rede de negócios proporciona acesso a inúmeros contatos e oportunidades que podem ser
tangibilizados em resultados de curto prazo para um membro da rede. Ganhos de longo prazo são
vistos como aqueles decorrentes de trocas entre membros e melhoria geral de processos e
negócios. Fazer parte de uma rede de empresas traz a credibilidade ao negócio, potencializando
novas oportunidades. A flexibilidade também é um ponto observado por Brass et al. (2004), que
49
mostra ser possível às empresas realizarem o valor de suas competências internas conectando-se a
outros membros da rede, sem necessidade de realmente quererem absorver novas competências.
Essa flexibilidade também se tangibiliza pela redução de incertezas relacionadas ao dinamismo
ambiental (ASTLEY, 1984), vista a ágil conexão que a organização pode estabelecer com
parceiros complementares, podendo, assim, melhor absorver o choque de novas demandas
(TODEVA, 2006).
Do ponto de vista da coordenação da rede, observa-se que as estratégias colaborativas
promovem uma organização mais eficiente em detrimento de redução de custos contratuais,
(RING, 1997) em função de maior confiança (DYER & SINGH, 1998), e também da melhora
dos processos de coordenação (EBERS e JARILLO, 1998). A reputação dos membros tende a
mitigar ações oportunistas e assim encorajar a confiança interorganizacional, o que facilita a
formação de alianças (GULATI et al., 2000) e contribui para o aumento dos lucros relacionais,
com base em uma gestão efetiva (DYER & SINGH, 1998).
As estratégias colaborativas não estimulam somente a proximidade e a confiança entre os
atores, mas também incentiva uma relação de menor formalidade, estimulando a construção de
valor conjunto através do aperfeiçoamento de seus mecanismos e processos de coordenação.
Ebers e Jarillo (1998) enfatizam que as estratégias colaborativas oferecem a oportunidade de
aprendizado mútuo, que leva os parceiros a suportar melhor o processo de desenvolvimento de
novos produtos e serviços. A eficiência e ganhos conseqüentes do aperfeiçoamento desses
processos provoca uma interdependência economicamente competitiva entre os parceiros. Isso
também encoraja as empresas a proporem meios de coordenação mais informais e mais ágeis
como uma forma de se obter competitividade em relação às empresas não posicionadas na rede,
que fariam uso de uma coordenação naturalmente mais contratual.
2.1.3.2 ATIVOS RELACIONAIS, COMPLEMENTARIDADE E ECONOMIAS DE ESCALA
Observa-se que as estratégias desenhadas através de relações interorganizacionais tendem
a maximizar as possibilidades de ganhos competitivos a partir da criação de ativos relacionais.
Esses ativos representam recursos como acesso à capital, informações proprietárias, estruturas
50
físicas de trabalho, recursos físicos e capital humano (DYER & SINGH, 1998). Tais recursos são
conseqüentes da relação entre diversos parceiros com capacidades específicas, resultado de
complexa interação social e organizacional de difícil imitação.
Gulati et al. (2000) identificam que os ativos relacionais, por serem indivisíveis e por não
serem prontamente substituíveis, são capazes de prover aos parceiros grande vantagem
competitiva. A especificidade dos ativos relaciona is gerados na rede é potencializada, segundo os
autores, por três estruturas: a configuração da rede, os membros participantes, e a natureza das
relações existentes entre a organização focal e os demais parceiros. A configuração da rede
representa por si só é uma estrutura de complexa interação interorganizacional, de difícil
imitação, em função das diferentes conexões que alternam relações fortes e fracas entre parceiros
e também aos níveis de fluxo de informação.
Os autores identificam que uma empresa focal pode obter superior vantagem competitiva
em função da configuração de suas conexões com outros parceiros, combinando ligações fortes,
em que se objetiva a intensidade de trocas transacionais, com elos fracos para produção de
informações não redundantes que auxiliem na oxigenação e agilidade da rede. Os membros
participantes naturalmente possuem uma organização interna peculiar.Quando uma empresa focal
estabelece processos criteriosos de seleção dos membros, a rede resultante terá uma combinação
especializada de competências e recursos atrelados a uma estratégia específica da empresa líder.
Assim, o conjunto de membros participantes acaba por se constituir em um ativo relacional de
difícil imitação. Por fim, a natureza da relação entre as empresas da rede define possibilidades
particulares de interação. Os autores destacam que características como reputação e histórico das
empresas estabelecem níveis de negociação e trabalhos conjuntos em uma rede. Essas
características são também complexas e difíceis de serem replicadas por outras alianças.
Visto à especificidade dos ganhos atrelados à relação entre as empresas, pode-se
identificar um outro resultado que consitui vantagem competitiva e relacional: a dependência da
trajetória. Gulati et al. (2000) e Dyer & Singh (1998) descrevem essa dependência na forma de
novos negócios construídos com base nos recursos obtidos conjuntamente em interações
anteriores. Essa realidade impõe aos concorrentes externos à rede a necessidade de contemplar
primeiro aquelas estruturas anteriormente desenvolvidas, para depois pensarem em concorrer
diretamente com esses novos negócios. É importante de fato que as relações de parceria sejam
51
duráveis o suficiente para que as empresas constituam vantagens competitivas que são
dificilmente substituíveis no mercado.
Nesse aspecto Dyer & Singh (1998) destacam duas condições necessárias: primeiro, a
parceria deve constituir salvaguardas e tempo de duração suficientes para que os parceiros
acreditem que a exploração substancial dos ganhos seja viável naquele período. E, em segundo
lugar, os parceiros devem encorajar um grande número de interações, buscando o aumento de
ganhos de escala, o que encoraja o incremento de processos de produção mais eficientes entre
parceiros e, por conseqüência, gera o aumento dos ganhos coletivos.
Além dos ativos relacionais, há um importante resultado que contribui para os ganhos
coletivos dos parceiros: a complementaridade de recursos. Autores como Ebers e Jarillo (1998),
por exemplo, destacam que, com a adoção de estratégias colaborativas, uma empresa consegue
alcançar e sustentar diferenciais competitivos a partir das vantagens como a co-especialidade.
Nesse resultado, as empresas participantes tornam-se lucrativas em novos nichos de produtos e
mercados, em função da junção de competências distintas mas complementares. Um exemplo é a
constituição de alianças entre empresas de alta tecnologia com objetivo de acelerar descobertas a
partir da união de diferentes conhecimentos e competências técnicas (POWELL, 1998). Nesse
aspecto é desejável que essa complementaridade provoque ganhos indivisíveis, difíceis de serem
adquiridos em mercados secundários,. Dessa forma a interdependência estimula a cooperação e a
lealdade entre os parceiros (DYER & SINGH, 1998; GULATI et al., 2000).
Em função da construção de vantagens como ativos relacionais e ganhos de
complementaridade de recursos, é natural a tendência de as organizações aprimorarem seus
processos coletivos de produção (DYER & SINGH, 1998). Uma conseqüência provável disso é o
ganho de escala nos produtos e serviços gerados. Ebers e Jarillo (1998) identificam ganhos de
economias de escala a partir de investimentos conjuntos dos parceiros que podem, de forma mais
ágil, engajar-se em novos projetos e desenvolvimentos de produtos. Além do benefício atrelado à
produção, identificam-se ganhos de escala na aquisição de novos produtos e serviços. Em
Verschoore (2004) verifica-se que as estratégias colaborativas possibilitam aos membros um
maior poder de mercado, negociando melhores preços em suas compras e também melhores
prazos de pagamento.
52
2.1.3.3 APRENDIZAGEM E COMPARTILHAMENTO DE CONHECIMENTO
As estratégias colaborativas têm sido desenhadas como importantes fontes de
aprendizagem e compartilhamento de conhecimento (TODEVA, 2006). A estrutura
organizacional em rede vem sendo explorada em especial nas indústrias intensivas em
conhecimento, entre empresas que buscam rapidamente novas descobertas e ganhos econômicos
de exploração sobre as mesmas (POWELL, 1998; LORENZONI & BADEN-FULLER, 1995).
Uma das possíveis explicações para essa estratégia, em detrimento das organizações de mercado
e de integração vertical, pode ser dada em função de dois fatores: o primeiro diz respeito à
natureza temporal e de inovação das indústrias intensivas em conhecimento, que requerem
sucessivas novas descobertas (LORENZONI & BADEN-FULLER, 1995). O segundo fator diz
respeito à complexidade transacional das atividades de P&D, que requer forte cooperação intra e
inter firma (TODEVA, 2006).
Segundo Ebers e Jarillo (1998), as estratégias colaborativas comportam eficazmente esses
dois fatores, pois oferecem flexibilidade para as organizações se conectarem rapidamente a
diferentes atores, promovendo acesso a novos recursos. Ademais, a organização em rede dispõe,
além dos mecanismos contratuais, aqueles que estimulam a cooperação, tais como reciprocidade,
confiança e influência mútua entre os parceiros (MUTHUSAMY & WHITE, 2005). A rede
sugere uma obrigação moral em contribuir com o parceiro, estimula a confiança com base em
conhecimentos e habilidades dos membros, e permite uma maior aproximação entre as empresas
e uma percepção mais clara por parte dos parceiros sobre o impacto de suas participações nos
resultados dos outros. Dessa forma, a tendência é que as empresas constituam ações conjuntas
freqüentes, aumentando a necessidade de coordenação interorganizacional, propiciando
oportunidade para novos aprendizados e compatilhamento de conhecimento.
Assim, pode-se dizer que o processo de aprendizagem e compartilhamento de
conhecimento se torna mais eficaz em uma estrutura que congrega o procurement típico do
mercado com a proximidade e a intensidade de interação social, características dos modelos de
integração vertical. Esse discurso dual, que integra a busca por novas fontes de conhecimento e a
construção de intimidade para ação conjunta, parece ser identificado no estudo de Holmqvist
53
(2003) como etapas distintas do processo de aprendizagem. O autor identifica que a organização
em rede provoca, em um primeiro contato, o confronto e a combinação de experiências
individuais das organizações, ampliando suas visões quanto a novas possibilidades de negócios e
desenvolvimento de novos produtos e serviços. Esse momento de inovação do processo de
aprendizagem é referido como exploration. Em detrimento do aprofundamento da relação
conjunta, as empresas passam para uma etapa em que prevalece a confiabilidade em vez da
variedade. Então elas passam a se focar na exploração e refinamento daquele aprendizado
desenvolvido no início da parceiria, o que é chamado de exploitation.
Observa-se portanto que a rede oferece oportunidade para o aprendizado conjunto de
novos negócios e, ao mesmo tempo, proporciona o aprimoramento de seus processos internos em
função das novas descobertas. Entretanto esses benefícios requerem a estruturação de
mecanismos adequados para que o fluxo de interação social e de conhecimento realmente
permeie a rede. Alguns dos fatores que justificam a aplicação desses mecanismos dizem respeito
à dificuldade de enga jar eficientemente parceiros em uma rede de aprendizagem e
compartilhamento de conhecimento.
Segundo Dyer & Nobeoka (2000), as empresas detentoras de conhecimento proprietário
em geral são resistentes em compartilhar o conhecimento para evitar spillovers. Além disso, há o
problema de empresas que absorvem benefícios da rede mas não retribuem (os chamados free
riders), e os custos para procurar e compartilhar diferentes tipos de conhecimento. Há também o
problema de parte do conhecimento necessário à rede ser de caráter tácito e sistêmico, o que torna
o processo de disseminação do mesmo mais complexo (DYER & SINGH, 1998; BHAGAT et al.,
2002) especialmente quando o número de parceiros é grande (DYER & NOBEOKA, 2000).
Frente a esses desafios, a rede interorganizacional é vista como a estrutura mais eficaz
para prover os mecanismos que regulam a aprendizagem e o compartilhamento de conhecimento
entre os membros. Parceiros tendem a compartilhar informações na rede se sua participação
dentro do grupo provê ganhos claros (DYER & NOBEOKA, 2000). O benefício da estratégia
cooperativa naturalmete estimula a reciprocidade, que acaba por criar uma barreira a estratégias
oportunistas (AXELROD, 1990) que, por conseguinte, dificulta ações de free riders que podem
também sofrer sanções da organização que lidera a rede (DYER & NOBEOKA, 2000). O autor
destaca que outro fator importante é a capacidade de as redes fomentarem a comunicação lateral
entre parceiros, fazendo com que a rede como um todo se constitua de laços fortes e fracos ao
54
longo dos parceiros. Essa estrutura pode ser representada por diferentes níveis de troca de
informações, aprendizado e conhecimento, como se identifica nos distritos industriais japoneses
(CORNO et al., 1999).
Um exemplo é a rede de fornecedores da Toyota, que promove o compartilhamento de
conhecimento através de mecanismos de interação social e todos os níveis da rede. Os fóruns de
fornecedores promovem a discussão das melhores práticas de negócios, e as divisões de
consultoria transferem informação da Toyota para a rede de parceiros. Equipes voluntárias de
trabalho promovem atividades cooperativas entre os próprios fornecedores (DYER &
NOBEOKA, 2000). As conexões estabelecidas em forma de rede permitem uma comunicação
multifacetada, que encoraja trocas informais e promove um ambiente para o contato, o diálogo, a
sistematização e o exercício do conhecimento presente entre os membros (CORNO et al., 1999).
Tal estrutura organizacional é mencionada por Dyer & Singh (1998) como fundamental para que
os parceiros ampliem sua capacidade absortiva e desenvolvam uma base comum de
conhecimento e de rotinas.
2.1.3.4 GERAÇÃO DE INOVAÇÃO
As organizações em rede que consituem as estratégias colaborativas são consideradas
como mais eficazes para o desenvolvimento de atividades orientadas à inovação. Percebe-se pela
contribuição dos autores que as redes oferecem acesso mais eficiente a recursos, competências e
compartilhamento de conhecimento. Também se identifica que a organização em rede
potencializa estratégias mais competitivas de inovação, além de permitir uma melhor gestão
sobre a capitalização da inovação nos mercados.
As estratégias colaborativas propiciam uma forma eficiente de transferir, coordenar e
converter diferentes fontes de recursos, tais como competência e conhecimento, em produtos
inovadores (CIOCCARELLI et al., 2003). O acesso a esses recursos é potencializado pela
presença de múltiplas conexões entre atores cuja proximidade estimula o compartilhamento de
conhecimento voltado a novas idéias (HAGE & HOLLINGSWORTH, 2000) e o investimento
conjunto em pesquisa e desenvolvimento (P&D) na rede (BRASS et al., 2004). A geração de
55
inovação através desses investimentos conjuntos é maximizada especialmente pela possibilidade
de se combinar elos fortes e fracos na rede, o que permite respectivamente aperfeiçoar
capacidades já desenvolvidas com parcerias maduras (exploitation) e adquirir capacidades
completamente novas (exploration), conectando-se a novos negócios e parceiros com inédita
combinação de experiências (HOLMQVIST, 2003; CIOCCARELLI et al., 2003; BRASS et al.,
2004).
Assim a conectividade entre atores, incluindo laços laterais de comunicação não ligados a
uma empresa líder (DYER & NOBEOKA, 2000), torna-se importante requisito para que a rede
promova um fluxo intenso de informação. Tal intensidade de conexão interorganizacional é para
Hage & Hollingsworth (2000) um elemento essencial para potencializar a inovação, em especial
aquelas de natureza radical. Isso ocorre basicamente porque as múltiplas conexões entre atores
não vinculadas a limitações hierárquicas encorajam fortemente o contato informal (DYER &
NOBEOKA, 2000), o que promove a disseminação de conhecimento tácito, crítico para a
inovação (HAGE & HOLLINGSWORTH, 2000).
Além dos benefícios inerentes à estrutura em rede, é importante notar em maior
profundidade o apoio que essa forma de organização exerce para as estratégias de inovação, visto
os requerimentos de tais estratégias. Nesse aspecto Rothwell (1995) destaca que as estratégias
bem sucedidas de inovação se caracterizam por ações, tais como forte comunicação interna e
externa da organização, visão orientada ao mercado, e constante acesso a recursos científicos e
tecnológicos. Esses requerimentos estão diretamente ligados ao novo paradigma de inovação que
evoluiu a partir de modelos focados na introdução de descobertas (push) ou na necessidade de
mercado (pull). Esse novo paradigma representa um modelo mais ágil de inovação que integra
simultaneamente diversas competências e atores (como por exemplo P&D, marketing e clientes)
desde o início do processo de inovação.
Tal dinâmica tem proporcionado maior velocidade de lançamento de novos produtos, que
rapidamente tangibilizam as descobertas; fator essencial para a eficiente monetização da inovação
(CHESBROUGH, 2003). Entretanto, essa realidade demanda flexibilidade e agilidade para
estabelecer um fluxo de informações intenso com diferentes atores. Assim, Rothwell (1995)
destaca as organizações em rede como a melhor forma de apoiar a inovação, provendo um
ambiente flexível e abrangente, que envolve especialistas, sistemas tecnológicos de informação,
gestão horizontal, além de alianças de longa duração. A longa duração dos relacionamentos é
56
vista por Rothwell (1995) como chave para potencializar diferenciais que sustentam uma
estratégia competitiva em inovação. Podem-se citar como exemplos as estratégias com base em
acumulação (dependência de trajetória) e economias de tecnologia que são de difícil substituição
(DYER & SINGH, 1998; GULATI et al., 2000). Novos produtos gerados reaproveitam a base
tecnológica existente, fruto de um complexo de decisões interorganizacionais em interações
anteriores.
Além de prover estrutura para uma forte comunicação entre atores e pontencializar um
ambiente dinâmico e ágil de inovação, as redes têm demonstrado serem uma eficiente forma de
organização para potencializar ganhos sobre a inovação. Tradicionalmente empresas com
conhecimento proprietário tendem a não se envolver em atividades cooperativas, preferindo
desenvolver suas descobertas internamente. Isso se deve ao receio de a organização ver seus
diferenciais absorvidos (spillovers) por outras organizações ou empreendimentos (DYER &
NOBEOKA, 2000). Assim, Chesbrough (2003) associa o histórico da inovação a um processo
fechado no qual a empresa realiza pesquisas com sua própria equipe de cientistas, desenvolve
internamente os produtos e comercializa suas descobertas.
Embora competitivo no passado, o modelo de inovação fechada sofre restrições face à
nova dinâmica de mobilidade do conhecimento. Essa mobilidade ocorre devido à grande
capacidade de comunicação provida pelas tecnologias de informação e também pela
disponibilidade de capital de risco, que encorajam especialistas a capitalizarem inovação através
de seus próprios negócios.
FIGURA 5 EVOLUÇÃO DA INOVAÇÃO FECHADA PARA A INOVAÇÃO ABERTA.
Fonte: Chesbrough (2003).
57
Essa nova dinâmica ainda provoca maior competição nos mercados, fazendo com que as
vantagens da inovação rapidamente se diluam, sendo portanto necessário o constante lançamento
de novos produtos (CIOCCARELLI et al., 2003). Ou seja, rapidez na geração de inovação se
torna crítica, desencorajando a competição autosuficiente por meio de inovação fechada e
estimulando as empresas a gerarem novos produtos estabelecendo relações com outros parceiros
através de um modelo de inovação aberta (FIGURA 5).
Para Chesbrough (2003) a mobilidade de conhecimento, bem como velocidade
demandada pela inovação competitiva, faz com que as organizações tenham que romper suas
fronteiras para desenvolverem suas descobertas eficientemente. Essa evolução sugere que as
organizações em forma de rede melhor potencializam as chances de transformação de
descobertas em inovação e resultados econômicos. Isso porque em um modelo de inovação
fechada, onde o processo de pesquisa e desenvolvimento ocorre internamente, uma única
empresa pode ser incapaz de identificar o potencial de uma descoberta, até pela sua própria
inabilidade, abandonando o projeto.
Já em uma estrutura de inovação aberta, esse potencial pode ser avaliado a partir de
diversos atores, combinando diferentes experiências, perspectivas e tecnologias, maximizando as
chances de novos produtos e inclusive de novos nichos de mercado. Novas idéias, tecnologias e
propriedades intelectuais, antes exclusivamente em posse da organização criadora, passam a ser
disponiblizadas na rede, permitindo que diversos atores possam explorar e revelar suas condições
de inovação. Dessa forma, os ganhos passam a ser coletivos, geridos a partir de direitos de
receitas sobre os resultados econômicos auferidos pela empresa proprietária e pelos demais atores
envolvidos na exploração dessas inovações.
Percebe-se que resultados tais como inovação, aprendizado e flexibilidade organizacional
são potencializados pelas estratégias colaborativas. Atingir tais resultados depende de um
processo cuidadoso de decisão estratégica que não só considera as organizações em rede, mas
também os benefícios e restrições dos modelos de governança tradicionais. Esse tema é tratado na
seção a seguir.
58
2.2 DECISÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO DE ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS
Mesmo com os benefícios apresentados a partir das estratégias colaborativas, é relevante
investigar sua adoção em meio às formas tradicionais de organização das atividades econômicas,
ou seja, hierarquia e mercado (WILLIAMSON, 1975). Isso porque nenhuma empresa
efetivamente opera todas as suas atividades utilizando apenas uma forma de governança
(JARILLO, 1993). A dinâmica da nova economia é caracterizada por relações
interorganizacionais que mesclam estratégias, ora de cooperação, ora de competição
(NALEBUFF & BRANDENBURGER, 1989; CASTELLS, 1999), sugerindo um processo de
decisão estratégica que inclua, além das opções de produzir ou contratar, a alternativa de
cooperar através das redes. Nesta seção apresentam-se contribuições que ajudam a elucidar tais
fatores para melhor compreender quando utilizar as estratégias colaborativas.
2.2.1 O PAPEL DOS CUSTOS DE TRANSAÇÃO FRENTE ÀS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS
A teoria dos custos de transação tem sido amplamente utilizada para explicar porque as
empresas optam por produzir internamente ou estabelecer relações de mercado, tendo como foco
identificar em qual modelo a transação pode ser realizada com menor custo (WILLIAMSON,
1975). Geyskens et al. (2006) puderam identificar, em um estudo que analisa 200 artigos
abordando diferentes narrativas da teoria dos custos de transação, as dimensões transacionais que
norteiam os principais modelos de governança. Observa-se nesse estudo que os custos de
transação normalmente sugerem uma organização hierárquica ou de mercado, tendo por base a
especificidade dos ativos, nível de incerteza e frequência das transações.
A especificidade dos ativos representa o grau de complexidade e interdependência
organizacional necessária para a realização da transação. Ativos altamente específicos
dificilmente podem ser obtidos fora da relação entre os parceiros envolvidos na transação. Em
relações de mercado isso pode levar à ação oportunista, o que acaba por provocar a necessidade
59
de se estabelecer salvaguardas na relação. Sendo assim, a teoria sugere a internalização como
melhor forma de governança.
O nível de incerteza está relacionado à imprevisibilidade ambiental. Se for difícil prever e
especificar previamente em contratos condições e ganhos atrelados à transação, então o nível de
incerteza é alto. Constantes reajustes contratuais em decorrência das mudanças ambientais
tendem a encarecer a operação, desencorajando uma relação de mercado em favor da hierarquia.
Entretanto, quando a dimensão de incerteza é avaliada em maior profundidade podem-se perceber
exceções. Os autores identificam que embora níveis de incerteza relacionados ao volume de
recursos e comportamento encoragem a internalização, o alto nível de incerteza tecnológica pode
incentivar uma relação de mercado, visto a maior velocidade com a qual a empresa pode atualizar
suas tecnologias e sistemas.
Por fim, a freqüência transacional refere-se à duração e número de interações necessárias
para a realização da operação. Segundo a teoria, se a freqüência transacional é alta, os custos de
coordenação tendem a ser maiores. Nesse caso, observa-se que tais custos são mais facilmente
recuperados quando a coordenação é realizada internamente, sugerindo a hierarquia como melhor
modelo de governança.
Embora a teoria dos custos de transação tenha enfatizado principalmente os modelos de
hierarquia e mercado, é importante notar que Geyskens et al. (2006) e outros autores percebem a
possibilidade de a teoria auxiliar a elucidar alguns aspectos das estratégias de governança baseada
em cooperação. No estudo de Geyskens et al. (2006), através de uma meta-análise de vários
artigos sobre custo de transação, os autores organizaram investigações empíricas envolvendo
decisões estratégicas entre modelos de hierarquia e mercado, e entre modelos de alianças e
mercado. Foi possível consistentemente identificar que a formação de alianças, em detrimento
das relações de mercado, se explica a partir da dimensão da especificidade dos ativos.
Tal situação ocorre quando a organização se depara com problemas de salvaguardas sobre
ativos muito específicos, o que encoraja uma relação mais próxima, evitando acordos puramente
contratuais. Um exemplo empírico que apóia essa idéia vem de Balestrin & Arbage (2007), que
utilizam a teoria dos custos de transação para identificar as motivações de empresas de base
tecnológica francesas para serem membros do parque tecnológico Futuroscope. Os participantes
reconhecem os benefícios oriundos da reputação oferecidos pelo parque, o que se configura como
60
um ativo específico que traz legitimidade e reconhecimento da marca, e impacta diretamente nos
custos de transação das empresas.
Além da especificidade dos ativos, os autores identificam na cooperação uma forma de
reduzir os custos relacionados à incerteza ambiental (GEYSKENS et al., 2006), especialmente no
que tange ao processo de racionalidade limitada. Isso ocorre pela facilidade de os membros
compartilharem informações técnicas e de mercado, ampliando suas visões e antecipando
possíveis oportunidades e barreiras. A idéia de que a organização em rede é adotada como forma
de reduzir custos de transação relacionados com a incerteza ambiental é reforçada por Jarillo
(1988). O autor identifica na rede uma forma de se diminuir custos atrelados ao comportamento
oportunista em decorrência da maior geração de ativos específicos, ganhos conjuntos,
compartilhamento de informações e freqüentes interações.
Assim, quando se verifica os custos de transação para a explicação de modelos de
governança relacional, percebe-se um novo leque de influentes, tais como aquisição de
competências e conhecimento, para os quais a teoria não oferece abrangente explicação. Assim
buscam-se outras contribuições que auxiliem a preencher essas lacunas.
2.2.2 ESQUEMA DE DECISÃO DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS
Com o processo de forte internacionalização das atividades organizacionais, a partir dos
anos 80 (TODEVA, 2006), e a constituição de redes interorganizacionais de produção global
(CASTELLS, 1999; GEREFFI et al., 2005; FLEURY & FLEURY, 2006), as relações puramente
competitivas de hierarquia e mercado deram espaço para a consolidação de um terceiro modelo
de governança baseado na cooperação (JARILLO, 1993). Através da constituição de mercados
globais, potencializado pelas tecnologias de informação, as empresas passaram a encontrar
grande facilidade de comunicação, podendo rapidamente estabelecer relações com outras
empresas, ora competindo, ora cooperando (CASTELLS, 1999). Dessa forma, o processo de
decisão estratégica, frente a opções competitivas de hierarquia e mercado ou colaborativas
baseadas na cooperação, passou a ganhar evidência acadêmica, sendo um importante requisito
para o aumento da performance organizacional (CHILD et al., 2005).
61
Um dos estudos que explorou essa dinâmica foi introduzido por Nalebuff &
Brandenburger (1989) nos anos 90. Os autores trouxeram o conceito de co-opetição, segundo o
qual a estratégia das organizações deveria ser constituída por uma combinação de estratégias
competitivas e colaborativas. Esse equilíbrio é necessário, pois ao adotarem um comportamento
individualista e exclusivamente competitivo, as empresas poderiam sofrer fortes perdas, tal como
ocorrem nas guerras de preços. Por outro lado, a visão puramente baseada na cooperação poderia
abrir espaço para ações de competidores oportunistas, como, por exemplo, o roubo de segredos
industriais. Como solução, a empresa deveria ser capaz de diferenciar claramente, com base em
seu posicionamento de mercado e seus produtos, quais empresas seriam complementadoras e
quais seriam concorrentes.
Com base na teoria dos jogos, os autores descrevem que uma vez identificado um
complementador, a estratégia a ser adotada é a colaborativa, já que aumentando os resultados
dele, conseqüentemente a empresa aumenta seus próprios ganhos (jogo de soma um). Um
exemplo é a relação desenvolvida entre fabricantes de videogames e desenvolvedoras de jogos. O
sucesso do videogame é potencializado por bons jogos que popularizam uma plataforma, logo
fabricante e desenvolvedoras ganham quando cooperam.
Já um competidor diminui o ganho da empresa, pois sua ação prioriza o interesse
individual e não o benefício coletivo; logo a empresa deve adotar uma estratégia competitiva
onde haverá um vencedor (jogo de soma zero). Um exemplo são as relações puramente
contratuais de compra e venda, onde uma empresa busca o máximo de lucro enquanto outra o
menor preço possível de aquisição.
O conceito de co-opetição contribuiu para a importância de uma visão sistêmica no
processo de decisão estratégica, no qual as organizações não desempenham papéis fixos na
cadeia, podendo ser rivais ou aliadas a qualquer momento. Entretanto esse modelo ainda não
propunha determinantes específicos de análise (tais como natureza da transação, competência ou
atividade) que auxiliassem mais pragmaticamente a definir com quem cooperar ou com quem
competir.
Visando compreender o estabelecimento de estratégias competitivas e colaborativas com
base em dimensões específicas de análise, Gereffi et al. (2005) propôs um mapa das diferentes
configurações de governança das cadeias globais de acordo com o nível de poder e a capacidade
de coordenação entre os atores. Assim o estudo compôs um espectro de relações
62
interorganizacionais cujos pólos são representados por relações de mercado e organização
vertical (nota-se aqui que os autores consideram a forma de governança baseada na cooperação
como um modelo híbrido situado entre mercado e hierarquia). Desse modo, o estudo propõe
cinco diferentes configurações, destacando condições a partir das quais elas ocorrem: de
mercado, modular, relacional, cativo e hierárquico (QUADRO 3).
Tipos de
governança
Condições
Complexidade
da transação
Habilidade de
codificação da
informação
Capacidade
do
fornecedor
Assimetria
de poder,
nível de
coordenaç
ão
De mercado
Menor compromisso, baixo
custo de mudança,
interações curtas e
repetitivas.
Baixa Alta Alta
Modular
Uma empresa líder junto a
fornecedores capacitados.
Produtos que requerem
especificações.
Alta Alta Alta
Relacional
Mútua dependência, na
forma de aliança. Alto
comprometimento e custo
de mudança.
Alta Baixa Alta
Cativo
Pequenos fornecedores
dependentes de grandes
compradores. Alto nível de
monitoramento e controle.
Alta Alta Baixa
Hierarquia Empresa verticalizada Alta Baixa Baixa
Baixa
Alta
QUADRO 3 CONFIGURAÇÕES DE GOVERNANÇA DAS CADEIAS GLOBAIS.
Fonte: Gereffi et al. (2005).
Três determinantes são essenciais para caracterizar o nível de configuração da cadeia:
complexidade da transação, capacidade de codificação de informação e capacidade dos
fornecedores. Quanto mais complexa a transação, maior o envolvimento das empresas, logo o
nível de coordenação tende a aumentar, descartando relações de mercado. A habilidade de
codificação define o quão viável é comunicar a informação por meios explícitos. Se a codificação
é difícil, como nos casos onde o conhecimento é tipicamente tácito, a interação entre
profissionais tende a ser mais próxima, o que sugere configurações como aliança ou hierarquia.
Por fim, a capacidade do fornecedor tende a influenciar o nível de coordenação da cadeia. Se os
fornecedores são pouco qualificados, a configuração da governança tende a sugerir uma relação
mais hierárquica, dada a necessidade de constantemente monitorar e garantir a qualidade do
fornecimento.
63
A aborgagem de Gereffi et al. (2005) permite caracterizar cadeias globais de diferentes
indústrias a partir de determinantes específicos, que contribuem para a definição de uma
estratégia competitiva ou colaborativa. Enquanto que o estudo auxilia na compreensão dos
aspectos subjacentes à decisão estratégica, ele pouco abrange outra conseqüência do processo co-
opetitivo, abordado por Nalebuff & Brandenburger (1989), que é a alternância de papéis dos
atores e, por conseguinte, a constante alteração da cadeia resultante. Tal fenômeno é percebido
quando autores como Gulati et al. (2000) e Holmqvist (2003) destacam o alto nível de mudanças
nas conexões entre empresas de indústrias intensivas em conhecimento. As corridas de
aprendizagem sugerem que as organizações busquem constantemente se conectar a elos fracos
(como novas organizações) da rede, maximizando a produção de informações não-redundantes,
essenciais para o processo de inovação.
O novo cenário competitivo sugere novas formas de análise das decisões estratégicas que
ampliam as fronteiras, definidas pelas análises baseadas em cadeia de valor. É possível identificar
que a grande capacidade de conectividade e mobilidade das relações interorganizacionais torna a
rede uma estrutura em constante mutação, o que faz com que seja muito difícil analisar
longitudinalmente as decisões estratégicas quanto aos modelos de governança das relações. Para
Todeva (2006) a economia em rede faz com que a os executivos da empresa tenha que avaliar o
mercado não como uma cadeia, mas como uma rede de recursos, que pode alimentar as
atividades necessárias à cadeia de valor da organização através de diferentes modelos de
governança.
Um dos esquemas conceituais que facilitam as decisões estratégicas enfatizando cada
atividade da organização foi proposto por Child et al. (2005). A Matriz CPC (FIGURA 6) auxilia
os gestores em determinar a maneira mais adequada de conduzir suas atividades produtivas e
tomar as decisões de comprar do mercado, produzir internamente ou cooperar com um parceiro.
Para tanto, ela combina nos seus dois eixos a importância estratégica de uma determinada
atividade, e a competência da empresa em relação aos demais produtores interessados em realizar
tal atividade.
64
FIGURA 6 MATRIZ CPC.
Fonte: adaptado de Child et al. (2005).
A lógica da Matriz CPC centra-se no fato de que mesmo as maiores empresas não podem
mais executar todas as atividades produtivas internamente, necessitando optar por quais
atividades devem realizar. Como se pode notar, a empresa possui três diferentes possibilidades de
decisão em relação a uma determinada atividade produtiva: ou ela a adquire no mercado, ou ela
produz internamente, ou ela se alia com outras empresas para executá-la colaborativamente. As
duas primeiras escolhas representam estratégias individualistas, e a última representa a opção da
estratégia colaborativa. As dimensões que afetam sua decisão são: a importância estratégica da
atividade e a sua competência em realizá-la, quando comparada às demais empresas produtoras.
Seguindo a orientação da Matriz CPC, se uma determinada atividade possui uma baixa
importância estratégica para os negócios da empresa, a opção mais adequada, independentemente
da competência da empresa para realizá-la, é adquirir do melhor fornecedor possível. Esses são
os exemplos de atividades como limpeza, segurança e alimentação dos funcionários, para as quais
existem diversos prestadores de serviços especializados. Por outro lado, se determinada atividade
possui uma média ou alta importância estratégica para a empresa, as decisões tornam-se mais
complexas. Caso a empresa tenha uma competência entre média e alta na execução da atividade,
a melhor opção será realizá-la, utilizando-se das competências internas e transformando-as em
um dos seus diferenciais competitivos.
65
Contudo, observa-se com maior freqüência que as empresas não possuem todas as
competências para a execução de grande parte das atividades com média e alta importância
estratégica. Nesses casos em que as atividades são estrategicamente importantes para a empresa e
ela não consegue desenvolvê-las com a necessária competência, a melhor opção é recorrer à
colaboração com parceiros que possam contribuir com conhecimentos para a empresa
complementar suas competências. Na medida em que o ambiente torna-se cada vez mais
dinâmico, há uma crescente tendência de as empresas terem ainda maiores dificuldades em
realizar individualmente as atividades de maior importância estratégica, buscando alcançar tais
soluções por meio de estratégias colaborativas.
2.3 ESQUEMA CONCEITUAL
Como descrito ao longo deste referencial teórico, a análise das estratégias colaborativas
compreendem três momentos: antecedentes, formas de gestão e resultados. Os antecedentes
procuram identificar as razões para as organizações optarem pela cooperação. As formas de
gestão abrangem a configuração da rede interorganizacional, os mecanismos de coordenação e
seu nível de formalização. Os resultados identificam as vantagens competitivas e os benefícios
coletivos obtidos a partir da execução das estratégias colaborativas. A partir desses elementos, é
construído o esquema conceitual para a análise das estratégias colaborativas (FIGURA 7).
Conforme mostra o esquema, a indústria brasileira está situada dentro de um contexto
caracterizado pela competição global, estimulando a especialização das empresas, na cadeia de
valor dos jogos, através do intenso relacionamento entre parceiros. Esse cenário terá impacto na
forma como as empresas da indústria tomam suas decisões estratégicas. Assim, utiliza-se a
Matriz CPC (CHILD et al., 2005) para investigar se as atividades do mercado de jogos são
conduzidas através de produção interna (hierarquia), compra (mercado) ou cooperação (estratégia
colaborativa).
66
FIGURA 7 ESQUEMA CONCEITUAL PARA ANÁLISE DAS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Uma vez identificada a opção pela estratégia colaborativa na indústria, passa-se então à
observação dos antecedentes (pessoais ou organizacionais) envolvidos. Em seguida, observa-se
como a estratégia é implementada, em termos da configuração da rede (PROVAN & KENIS,
2003), dos mecanismos de coordenação que regulam as trocas entre os parceiros (GRANDORI &
SODA, 2005), e do nível de formalização das relações (MARCON & MOINET, 2001). Por fim,
verificam-se os resultados atingidos, classificando-os de acordo com as definições dos autores,
tais como flexibilidade e ativos relacionais (DYER & SINGH, 1998), economias de escala
(EBERS & JARILLO, 1998), aprendizagem (DYER & NOBEOKA, 2000) e geração de inovação
(CIOCCARELLI et al., 2003).
Após desenvolver o referencial teórico e construir o esquema conceitual de análise das
estratégias colaborativas, este estudo apresenta a metodologia utilizada para a pesquisa. Na
seqüência são apresentadas a indústria de jogos eletrônicos, as análises dos resultados da etapa de
coleta de dados e as considerações finais da pesquisa, abordando suas implicações.
67
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
O objetivo geral desta pesquisa é compreender como está estruturada a indústria brasileira
de jogos eletrônicos e identificar em que atividades ocorrem estratégias colaborativas, entre as
empresas, que possam contribuir para o aumento da competitividade do setor.
A presente pesquisa consiste em um estudo de caso da indústria brasileira de jogos
eletrônicos, tendo como foco as empresas desenvolvedoras de jogos. Essa indústria é formada por
aproximadamente 60 empresas, concentradas nos estados do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro,
Pernambuco, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraíba e Sergipe (ABRAGAMES, 2005).
FIGURA 8 FASES DA PESQUISA.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Para o levantamento das evidências empíricas, utiliza-se uma triangulação de técnicas de
coleta de dados (YIN, 2001) realizada em duas etapas quantitativa e qualitativa. A FIGURA 8
apresenta em maiores detalhes as fases da pesquisa que são explicadas nas seções seguintes.
68
3.1 DESENVOLVIMENTO CONCEITUAL E METODOLÓGICO
Na fase de desenvolvimento conceitual e metodológico são elaborados a questão de
pesquisa, os objetivos gerais e específicos do estudo, e a metodologia, onde se apresenta a
definição da unidade de análise, a coleta e a análise dos dados.
Para condução do estudo, optou-se por uma pesquisa do tipo exploratória, seguindo uma
metodologia de um estudo de caso (HUSSEY & HUSSEY, 1997; YIN, 2001). A literatura
baseada em relações inteorganizacionais encontra-se relativamente fragmentada e limitada em
termos de bases teóricas (OLIVER & EBERS, 1998). Além disso, existem poucos estudos
acadêmicos no campo da administração, relacionados à indústria de jogos eletrônicos (JOHNS,
2006). Assim, com o arcabouço teórico e empírico pouco desenvolvido sobre o tema, torna-se
coerente seguir uma abordagem exploratória. Nessa abordagem o pesquisador não se orienta
pelas definições de hipóteses ou proposições, mas sim pela experimentação de conceitos teóricos
e dados empíricos (tendo como escopo os objetivos da pesquisa) que sejam capazes de gerar
evidências que auxiliem no entendimento do fenômeno em questão e que sugiram futuras
investigações (HUSSEY & HUSSEY, 1997). Dessa forma, o desenvolvimento teórico e
metodológico é amadurecido ao longo de todas as fases da pesquisa (FIGURA 8).
Por se tratar de um estudo de caso da indústria brasileira de jogos eletrônicos, define-se
como unidade de análise a própria indústria (YIN, 2001). Segundo Todeva (2006), a indústria
pode ser analisada como redes de negócios, representada por atores, recursos e atividades
interligados (TODEVA, 2006). A abordagem de análise sugerida pela autora aponta uma
investigação em três níveis: ator da rede, suas relações com outros atores, e a configuração da
rede que sustenta a estratégia colaborativa. As variáveis recomendadas para a realização dessa
análise dependem da abordagem a ser utilizada na investigação: estrutural, relacional ou cultural.
Tendo em vista o objetivo de investigar estratégias colaborativas, opta-se pela abordagem
relacional, pois ela dá ênfase ao universo de conexões e relações existentes entre atores da rede,
suas atividades, eventos e recursos.
Assim, Todeva (2006) sugere, para investigação dos atores das redes, variáveis como
tamanho da empresa, seu papel, interesses e recursos acumulados, bem como prestígio e status.
No que se refere à análise da relação, a autora destaca variáveis como competição e cooperação
69
na rede, força das conexões e simetria das relações. Quanto à análise da configuração da rede, são
sugeridas variáveis como configuração espacial e estruturas de hierarquia, e eficiência da
governança em rede. Seguindo essa orientação e respeitando o esquema conceitual, no quadro a
seguir (QUADRO 4) são apresentadas as variáveis exploradas, bem como as fontes de evidência
utilizadas na pesquisa.
Esquema conceitual Variáveis Nível de investigação Fonte de evidência
Indústria brasileira
Perfil das empresas (tamanho,
localização; faturamento, nível
de internacionalização);
atividades da cadeia de valor no
Brasil; importância estratégica
das atividades e competência
das empresas.
Ator
Questionário Eletrônico;
Entrevista
Decisão estratégica dos
atores
Produção interna (hierarquia);
Compra (mercado); Cooperação
(estratégia colaborativa)
Ator; Conexão
Questionário Eletrônico;
Entrevista
Antecedentes das
estratégias colaborativas
Motivações individuais e/ou
organizacionais.
Ator; Conexão Entrevista
Formas de gestão das
estratégias colaborativas
Tipois de rede; mecanismos de
coordenação; nível de hierarquia
e formalização.
Conexão; Rede Entrevista
Resultados das
estratégias colaborativas
Flexibilidade; melhoria de
processos; ativos relacionais;
complementaridade; economias
de escala; aprendizagem e
geração de inovação.
Rede Entrevista
QUADRO 4 VARIÁVEIS EXPLORADAS E FONTE DE EVIDÊNCIAS.
Fonte: elaborado pelo autor.
Para reforçar o entendimento da análise das estratégias colaborativas na indústria de
jogos, destaca-se que este estudo avalia a empresa como um conjunto de atividades. Cada
atividade representa um elo da cadeia de valor dos jogos eletrônicos, sendo investigadas as
possibilidades da governança baseada na cooperação, de acordo com a Matriz CPC de Child et al.
(2005), avaliando a importância estratégica das atividades e a competência das empresas nas
mesmas. As atividades analisadas são identificadas no capítulo de levantamento da indústria
(CAPÍTULO 4), que explora a cadeia de valor dos jogos eletrônicos: Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e Controle de Qualidade (Teste e QA), Edição, Distribuição e Varejo.
Conforme Todeva (2006), a avaliação das operações da cadeia de valor como possíveis
funções de negócios da organização é importante para que a empresa decida estrategicamente
pela melhor forma de condução de suas atividades, basendo-se em custos e considerações de
qualidade (TODEVA, 2006). Jarillo (1988) também destaca ser relevante não enxergar a empresa
70
apenas como uma entidade sólida e única, e sim utilizar o conceito de cadeia de valor para
desmembrá-la em atividades. Assim torna-se mais fácil identificar as diferentes realidades
estratégicas da organização.
3.2 COLETA DE DADOS
As evidências empíricas foram obtidas a partir de uma triangulação de técnicas de coleta
de dados realizada em duas etapas. A primeira seguiu uma estratégia de levantamento
quantitativo (YIN, 2001), realizada através de um questionário eletrônico (APÊNDICE A). A
segunda compreendeu a realização de entrevistas em profundidade (APÊNDICE B). Essas etapas
são apresentadas em detalhes logo abaixo.
3.2.1 ETAPA QUANTITATIVA
Para um conhecimento mais amplo das características da indústria de jogos eletrônicos no
Brasil, foi realizada uma primeira etapa de coleta de dados quantitativos junto a 26 empresas de
desenvolvimento de jogos eletrônicos associadas à ABRAGAMES (Associação Brasileira das
Desenvolvedoras de Games). Dessa forma, as empresas associadas à ABRAGAMES representam
a população alvo do estudo (HAIR et al., 2005), e cobrem aproximadamente 43% das empresas
desenvolvedoras de jogos existentes no país (ABRAGAMES, 2004). Os dados foram coletados a
partir de um questionário eletrônico disponibilizado na web (FIGURA 9), utilizando o sistema
Hosted Survey (http://www.hostedsurvey.com). A pesquisa contou como apoio da
ABRAGAMES e do SENAC de São Paulo.
O questionário eletrônico representou uma etapa de levantamento quantitativo que, além
de visar à identificação das empresas a serem estudadas quanto às estratégias colaborativas,
também serviu de intrumento para obtenção de informações mais abrangentes sobre a indústria
brasileira de jogos. Assim, o questionário eletrônico contempla questões diversas que vão além
71
dos eleme ntos teóricos deste estudo, abrangendo pontos tais como tamanho das empresas,
faturamento, perfil dos colaboradores e exportação de produtos e serviços.
O questionário seguiu um formato estruturado, abrangendo questões abertas e fechadas,
dividas em quatro subgrupos. O primeiro compreende questões básicas de identificação da
empresa e do entrevistado, como nome da empresa, do respondente, localização, número de
colaboradores e faturamento. O segundo subgrupo visou identificar as atividades realizadas pelas
empresas, conforme descrição da cadeia de valor dos jogos eletrônicos (Design, Criação,
Desenvolvimento, Testes e Controle de Qualidade, Publicação, Distribuição e Vendas), níveis de
produção interna e contratação de atividades no mercado.
FIGURA 9 PÁGINA INICIAL DO QUESTIONÁRIO ELETRÔNICO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
72
O terceiro subgrupo focou os aspectos das estratégias colaborativas, importância
estratégica das atividades desenvolvidas pela empresa, competência nas atividades e experiência
com alianças ou arranjos cooperativos.
Por fim, o último subgrupo contemplou demais considerações dos respondentes e
configurou-se como uma seção opcional do questionário. Essa seqüência visou oferecer uma
experiência gradual e mais amigável ao entrevistado (HAIR et al., 2005). A partir dessa
formatação, o questionário foi discutido, aprimorado e validado junto ao presidente da
ABRAGAMES, em reunião presencial realizada em 17 de julho de 2007. Após a homologação
do questionário, um teste foi realizado com um profissional da indústria de jogos. Esse teste
permitiu aperfeiçoamentos finais na redação das questões e cronometragem de tempo de
preenchimento. Com a avaliação por parte de informantes-chave aumenta-se a validade dos
construtos utilizados na pesquisa (YIN, 2001). Após a validação do questionário, o mesmo foi
disponibilizado para as empresas que, entre 16 de agosto e 21 de setembro de 2007, responderam
às questões. Obteve-se retorno de 22 das 26 empresas (taxa de resposta de 84,6%) (ANEXO A).
3.2.2 ETAPA QUALITATIVA
Com as empresas mapeadas pela primeira etapa de coleta de dados, realizou-se a seleção
daquelas que fariam parte da etapa qualitativa. O critério para seleção foi buscar empresas
desenvolvedoras com histórico comercial e experiência no mercado, tendo a seguinte ordem de
prioridade: I) se a empresa já atua com produtos e serviços na indústria de jogos; II) número de
dez ou mais colaboradores (priorizando o maior número de colaboradores com vínculos formais);
III) atendimento às principais plataformas e aplicações da indústria (Celular, Jogos On-line, PC,
Console, Jogos para Propaganda, Jogos Sérios); e IV) maior experiência em alianças e nível de
internacionalização. Duas empresas foram selecionadas sem seguir os critérios acima, com o
objetivo de validar a versão piloto do questionário para entrevistas.
A partir da versão final do questionário, mais sete empresas foram selecionadas,
respeitando os referidos critérios. Ao todo foram entrevistadas nove empresas nas cidades de São
Paulo, Campinas, Recife, Porto Alegre e São Leopoldo, entre 29 de outubro e 6 de dezembro de
73
2007. As entrevistas foram realizadas junto aos gestores e fundadores das empresas, seguindo um
formato de entrevista em profundidade (HAIR et al., 2005) de aproximadamente uma hora e meia
de duração, guiada por uma conversa informal gravada e orientada por um questionário semi-
estruturado.
3.3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os resultados serão apresentados em duas etapas: a primeira de caráter descritivo, baseia-
se no questionário eletrônico e traça um panorama da estrutura da indústria brasileira de
desenvolvimento de jogos, caracterizando as empresas participantes, tamanho das mesmas, perfil
de colaboradores, faturamento, decisões estratégicas de governança das atividades e
internacionalização. Na etapa qualitativa é realizada uma apresentação das empresas analisadas,
mantendo a confidencialidade quanto à identificação das mesmas. É importante notar que a
unidade de análise do estudo é a indústria, portanto as investigações de cada empresa entrevistada
levantam informações que sempre são tratadas de forma agregada, priorizando o desenho de um
painel sobre a indústria e não sobre cada empresa, o que no caso nortearia o estudo em direção a
um estudo de múltiplos casos (YIN, 2001).
A análise dos dados ocorre por meio de um processo de análise de conteúdo, utilizando os
programas de computador ATLAS.ti 5.0 e NVivo 7. Com essa técnica, identifica-se freqüências de
expressões, qualificadas de acordo a unidade de análise e o esquema conceitual desenvolvido a
partir do referencial teórico, permitindo a realização de interpretações em cima das evidências
encontradas (HAIR et al., 2005).
A técnica de análise de conteúdo foi aplicada especificamente sobre as questões abertas
do questionário eletrônico e as transcrições realizadas a partir da gravação das entrevistas. Com
base no conteúdo das gravações foram categorizados termos e expressões que permitem
evidenciar os construtos propostos no esquema conceitual.
74
3.4 DESENVOLVIMENTO DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa parte são analisados os resultados da pesquisa frente aos objetivos específicos
definidos no estudo. Assim, após realizada a apresentação dos resultados e a análise dos mesmos,
é avaliado o levantamento das principais empresas brasileiras de desenvolvimento de jogos e suas
atividades e estratégias de governança, o nível de internacionalização das empresas, a
identificação de ações e projetos de cooperação que já estão sendo desenvolvidos entre as
empresas da indústria, e a apresentação de proposições que auxiliem os gestores e que orientem
políticas para o fortalecimento da competitividade da indústria brasileira de jogos eletrônicos. Por
fim, dedica-se um espaço para conclusões e observações finais sobre a pesquisa.
Após a explicação dos procedimentos metodológicos, o estudo segue com um
levantamento sobre a indústria de jogos eletrônicos, permitindo assim um melhor conhecimento
do tema antes de se proceder à apresentação e análise dos dados coletados. Após esse
levantamento tem-se a apresentação e análise dos resultados obtidos a partir das investigações de
campo.
75
4 A INDÚSTRIA DE JOGOS ELETRÔNICOS
Os jogos eletrônicos se destacam no cenário internacional como um dos segmentos mais
dinâmicos do setor de tecnologias da informação. Além de contribuir para o emprego de recursos
humanos com alta qualificação, esses jogos são capazes de prover múltiplas aplicações nas áreas
de entretenimento, educação e segurança industrial, gerando impactos de dimensões culturais e
econômicas (SOFTEX, 2005). Assim, com a vasta aplicação dos jogos eletrônicos, o que acaba
por envolver diferentes atores e indústrias relacionadas, torna-se necessário definir alguns
conceitos para delimitar o escopo deste estudo.
O conceito de indústria neste texto baseia-se na definição de Jarillo (1993) onde indústria
representa um grupo de empresas engajadas na produção de basicamente os mesmos produtos ou
entrega dos mesmos serviços. Dessa forma, indústria de jogos eletrônicos é definida como as
empresas responsáveis pelas atividades que compreendem a produção dos jogos. Além das
empresas da indústria, outros atores desempenham importantes papéis em elos comerciais, como
editores digitais e distribuidores (WILLIAMS, 2002). Esse complexo interorganizacional,
compondo atividades que vão desde a concepção do jogo até a entrega do produto ao
consumidor, é referido neste estudo como cadeia de valor dos jogos eletrônicos.
Ademais, considera-se aqui, para fins de escopo, somente o mercado de jogos eletrônicos
que não é orientado a jogos de azar, este último definido comumente como mercado de jogos de
apostas (PWC, 2007). Assim, os jogos eletrônicos referidos são aqueles presentes em plataformas
tais com consoles
1
(incluindo versões portáteis), computadores pessoais (PC), web sites de jogos,
telefones celulares e outros dipositivos portáteis como PDA
2
.
Inicialmente apresenta-se um breve histórico dos jogos eletrônicos, desde o surgimento
desse mercado a partir de um grupo de entusiastas, até a solidificação do mesmo em uma cadeia
de valor global especializada (GRANTHAM & KAPLINSKY, 2005). Posteriormente é dado
1
Equipamento digital dotado de um conector para o aparelho de TV e um encaixe para algum tipo de
unidade de armazenamento contendo programas e/ou dados de um jogo em particular (SOFTEX, 2005). Consoles
são normalmente referidos como videogames.
76
destaque ao cenário atual do mercado, analisando os tipos de jogos, o processo de produção, a
cadeia de valor e os números do mercado de jogos eletrônicos, em nível global e nacional.
4.1 HISTÓRICO
O surgimento da indústria de jogos eletrônicos está diretamente ligado a iniciativas
integradas, provenientes de dois países cultural e tecnologicamente avançados: EUA e Japão
(CONSALVO, 2006). Embora os jogos eletrônicos tenham se difundido por diferentes
plataformas, tais como computadores pessoais e dispositivos portáteis (GALLAHER & PARK,
2002), é na evolução retratada pelo arcade (no Brasil, comumente referido como fliperama) e
pelo console que a indústria contrói a essência de sua breve história de 35 anos (CONSALVO,
2006).
Acredita-se que a primeira iniciativa de algo próximo a um jogo eletrônico foi
desenvolvida pelo cientista William Higinbotham, em 1958, no Laboratório Nacional de
Brookhaven, nos EUA. Com o objetivo de tornar suas demonstrações mais interessantes aos
visitantes do laboratório, o cientista decidiu construir um pequeno jogo de tênis, utilizando um
computador analógico conectado a um osciloscópio. No visor, eram exibidos uma linha vertical
representando a rede da quadra de tênis, e um ponto luminoso que se deslocava horizontalmente,
controlado pelo jogador através de um botão de disparo e um botão giratório de controle de
angulação do lançamento (DOE, 2007).
Em 1961, uma segunda iniciativa deu maior visibilidade ao potencial dos jogos
eletrônicos. Steve Russel, estudante do MIT, desenvolveu um jogo chamado Space War, no qual
duas naves espaciais se enfrentavam em combates estelares. O jogo foi desenvolvido através da
programação de um mini computador interativo chamado PDP-1 e se tornou extremamente
popular entre os alunos. Em pouco tempo, o jogo foi reproduzido e distribuído em diversos outros
laboratórios que possuíam o computador (AOYAMA & IZUSHI, 2003). Apesar do pioneirismo,
2
PDA (Personal Digital Assistant) é um computador de dimensões reduzidas cumprindo as funções de
agenda e sistema de escritório elementar, com possibilidade de interconexão com um computador pessoal e uma rede
sem fios.
77
Higinbotham e Russel não transformaram suas invenções em oportunidades comerciais. Isso só
veio a acontecer no início dos anos 70 (ALLEN & KIM, 2005).
Em meio à emergente popularidade dos jogos eletrônicos, Ralph Baer fundou a empresa
Magnavox, e em 1972 lançou nos EUA o primeiro videogame, chamado Odyssey (TSCHANG,
2003). No mesmo ano o engenheiro americano Nolan Bushnell, um dos entusiastas da onda
Space War (WILLIAMS, 2002), fundou a empresa Atari, tendo como primeiro produto um jogo
chamado Pong. O jogo era um arcade operado por moedas e baseado no conceito do jogo de
tênis de Higinbotham (MMC, 1995; WILLIAMS, 2002). Pong foi um grande sucesso e acabou
por gerar uma versão portátil do mesmo jogo para uso doméstico (MMC, 1995).
Uma característica da época era a forte orientação do mercado para a venda do hardware
e não do software. Todos os equipamentos de jogos eletrônicos vinham com jogos embutidos e
pré-programados, não permitindo a troca do software por parte do usuário. Porém, em 1976 uma
nova entrante chamada Farchild Instrument and Camera identificou o desejo do mercado por
maior variedade e assim lançou o console Channel F. Esse videogame permitiu a substituição dos
jogos através de cartuchos, formato posteriormente seguido pela Magnavox com o lançamento do
Odyssey 2 (GALLAHER & PARK, 2002).
Com o grande sucesso dos jogos arcade e o promissor modelo de consoles de jogos
subtituíveis, as empresas gradativamente investiram nas plataformas que permitiam a venda de
jogos em escala (ALLEN & KIM, 2005). Assim, a Atari, em 1977, lançou o VCS (Video
Computer System), posteriormente chamado de Atari 2600 (GALLAHER & PARK, 2002). Com
a experiência da Atari em arcades, somada ao forte financiamento da Warner Communications, e
ao uso exclusivo de licenças de sucessos como Space Invaders, o VCS se tornou o console mais
popular da época (GALLAHER & PARK, 2002).
O domínio da Atari atingiu o seu ápice em 1980, quando o VCS praticamente eliminou os
demais videogames concorrentes, fazendo com que a Atari atingisse uma fatia de mercado de
80% nos EUA (ALLEN & KIM, 2005). Foi nesse período que a indústria começou a
efetivamente gerar somas significativas de lucro (WILLIAMS, 2002). Como consequência, deu-
se início a uma gradual desintegração vertical da indústria (JOHNS, 2006). Com a grande
demanda por jogos, um novo grupo de atores, as desenvolvedoras de jogos, começou a tomar
forma (WILLIAMS, 2002). A partir desse momento foi iniciada uma clara reorientação do
78
mercado em direção ao software, o que contribuiu para o enfraquecimento da Atari
(GALLAHER & PARK, 2002).
No início dos anos 80, a Activision, uma desenvolvedora formada por ex-programadores
da Atari, passou a oferecer jogos compatíveis com o VCS. Em 1982, após tentativas de
legalmente barrar a venda dos jogos da Activision, a Atari acabou permitindo a qualquer empresa
a produção de jogos para o VCS, em troca de uma pequena taxa de licenciamento sobre a venda
de cada jogo (GALLAHER & PARK, 2002).
Um conjunto de fatores começou a destruir o domínio da Atari e a própria indústria como
um todo: desenvolvedoras competentes como a Activision começaram a, gradativamente,
absorver a maior parte das receitas com títulos de sucesso, que antes eram obtidas pelo fabricante
do console. Ao mesmo tempo, deu-se início à proliferação de uma grande quantidade de jogos de
baixa qualidade, que prejudicavam as vendas do VCS (MMC, 1995). Além disso, uma nova
entrante, a Coleco, lançava no mercado o videogame Colecovision, com qualidade superior a do
VCS. Não cometendo os erros dos concorrentes anteriores, a Coleco adquiriu uma licença de
sucesso do arcade de aventura japonês Donkey Kong. Como se não bastasse, o desaquecimento
do mercado de computação doméstica nos EUA em 1983 fazia com que os fabricantes
colocassem produtos a preços muito baixos, atraindo a preferência dos consumidores em
detrimento dos videogames. Sendo a Atari um ator dominante em decadência, e o cenário
econômico desfavorável aos jogos, em 1984 o segmento de videogames nos EUA acabou
sofrendo um colapso, o que eliminou quase todos os principais atores, incluindo a maioria das
pequenas desenvolvedoras de jogos (GALLAHER & PARK, 2002).
Em 1985, com um mercado americano em crise, a japonesa Nintendo introduziu o console
NES (Nintendo Entertainment System), oferecendo capacidade gráfica superior a qualquer
videogame anteriormente lançado (GALLAHER & PARK, 2002; NINTENDO, 2007a).
Consciente das falhas cometidas pela Atari, a Nintendo estabeleceu um programa rigoroso de
desenvolvimento e licenciamento, produzindo internamente jogos de sucesso, como a série de
aventura Super Mario Bros, e autorizando um grupo restrito de desenvolvedoras a produzir para a
plataforma (ALLEN & KIM, 2005). Além disso, as desenvolvedoras deveriam produzir jogos
exclusivamente para o NES e limitados a cinco títulos por ano, prática que se acreditava
contribuir para a qualidade dos jogos (GALLAHER & PARK, 2002). Como um recurso
adicional, o NES continha um chip que bloqueava jogos fabricados sem a autorização da
79
Nintendo, que controlava também a manufatura dos cartuchos. Com esse processo, e favorecida
pelas poucas opções de plataformas promissoras no mercado, a Nintendo estabeleceu uma sólida
posição de liderança, atingindo 80% de participação no mercado americano em 1988 (ALLEN &
KIM, 2005).
O sucesso da Nintendo culminou com o lançamento, em 1989, do Game Boy, um console
portátil que trazia versões dos jogos de sucesso do NES (NINTENDO, 2007a). Durante esse
período de recuperação do mercado de jogos, nem a concorrente japonesa Sega, com o console
Master System e sua versão portátil Game Gear, nem a Atari, com o videogame 7800, foram
páreos para a forte rede de desenvolvedoras e as licenças exclusivas da Nintendo.
A partir de 1989, a Sega e a NEC introduziram o Genesis e o Turbo Grafix-16,
respectivamente. Uma importante mudança tecnológica ocorria na indústria: desde a primeira
geração de consoles, os jogos eram desenvolvidos com tecnologia de 8 bits e, naquele momento,
surgiam os primeiros videogames com 16 bits, o que significava capacidades gráficas e de
programação mais avançadas. Ambos os videogames sofriam com a falta de licenças
comprovadas de sucesso, o que culminou no fracasso da NEC. A Sega optou por três estratégias
para superar essa barreira: licenciar franquias famosas de esporte nos EUA, investir nos jogos de
aventura e ação de seu personagem Sonic e utilizar os recursos áudo-visuais de maior realismo do
seu videogame.
Com tais recursos a Sega promoveu a criação de jogos de maior apelo, como a série de
luta Mortal Kombat, intensa em cenas de violência. A estratégia foi bem sucedida. Dessa forma,
alguns jogos da Sega passaram a superar as vendas de jogos da Nintendo, contribuindo para uma
maior base instalada (número de consoles presentes nos lares) do Genesis. Com a eminência de
alternativas, as desenvolvedoras passaram a pressionar a Nintendo, que em 1990, derrotada em
uma ação antitruste, foi condenada a cessar os contratos de exclusividade, permitindo aos seus
licenciados produzirem jogos para o Genesis. Como conseqüência, ao longo dos anos 90 a Sega
atingiu praticamente a mesma fatia de mercado que sua maior concorrente. A Nintendo procurou
reagir e introduziu seu videogame de 16 bits Super NES. Entretanto, a Sega detinha uma grande
vantagem de base instalada do Genesis (ALLEN & KIM, 2005; GALLAHER & PARK, 2002).
Enquanto Nintendo e Sega competiam fortemente no mercado, outros concorrentes
procuravam introduzir novos videogames. Em 1993, a Atari lançou o Jaguar (SCHILLING,
2003) a SNK, o NEO GEO (MMC, 1995) e, em 1994, a 3DO lançou o Interactive Multiplayer
80
(GALLAHER & PARK, 2002). Todos esses consoles fracassaram no mercado por razões de
fraca distribuição, falta de conteúdo competitivo e alto preço de hardware ou software.
A Sega estreou seu videogame de 32 bits, Saturn, em 1995, mas com a desvantagem de
também ser um produto caro, comparado com os demais aparelhos (GALLAHER & PARK,
2002). Uma nova entrante no mercado foi a Sony, lançando também em 1995 o PlayStation
(ALLEN & KIM, 2005). Tanto o Saturn quanto o PlayStation incorporavam um novo padrão que
se desenhava para os videogames: a troca do cartucho pelo CD, que oferecia maior capacidade de
armazenamento para os jogos. No caso do PlayStation, havia uma outra vantagem: era possível
utilizar cartões de memória que salvavam as jogadas, permitindo recupe-las a qualquer
momento. Esse diferencial, somado à queda de preço do console da Sony em 1996, contribuiu
para que o PlayStation crescesse no mercado, assumindo a liderança no segmento de videogames.
A Nintendo, em 1996, introduziu o Nintendo 64 como um console de 64 bits e, embora não
conseguisse recuperar a liderança de mercado, obteve sucesso oferecendo um videogame com
capacidades bastante superiores pelo mesmo preço dos concorrentes (GALLAHER & PARK,
2002).
Até o fim dos anos 90 havia três grandes competidores no mercado de videogames: Sony,
Nintendo e Sega. Em 1999, a Sega deu o primeiro passo na era dos consoles de 128 bits, com o
Dreamcast e, com uma forte campanha de marketing, obteve um bom desempenho com o
videogame. Entretanto, um ano mais tarde a Sony lançava o PlayStation 2, com capacidades para
ler filmes em DVD e executar jogos do PlayStation (a versão anterior do console). Esses
diferenciais rapidamente popularizaram o novo videogame da Sony, forçando a Sega a operar
sucessivos cortes de preço no Dreamcast. O fracasso em duas gerações seguidas (Saturn e
Dreamcast) culminou com a saída da Sega, que parou a fabricação de videogames e passou a se
dedicar apenas ao desenvolvimento de jogos (GALLAHER & PARK, 2002).
Somente em 2001 é que a Nintendo lançou seu console de 128 bits chamado Game Cube.
Com uma indústria já desenvolvida, sendo os jogos um produto massificado e tendo a Sony como
um ator dominante, a Nintendo buscou uma estratégia mais focada, voltada a uma audiência mais
jovem, de 8 a 18 anos. No mesmo ano, uma nova entrante de peso, a Microsoft, introduziu no
mercado o seu primeiro videogame, o XBOX, com recursos tecnológicos superiores aos consoles
da Sony e Nintendo. Seguindo o exemplo da Nintendo, a Microsoft também optou por um
público mais específico, oferecendo jogos mais maduros e voltados ao público masculino de 18 a
81
34 anos (CONSALVO, 2006). Tanto o Game Cube quanto o XBOX não conseguiram superar o
domínio já estabelecido pela Sony com o PlayStation 2. Entretanto, a Nintendo consolidava sua
liderança no segmento de consoles portáteis, já conquistada com o Game Boy, lançando em 2003
uma versão mais sofisticada chamada Game Boy Advance (NINTENDO, 2007a).
No final de 2004, deu-se início à recuperação da Nintendo através do lançamento do
Nintendo DS, um console portátil compatível com o seu antecessor Game Boy Advance, porém
com maiores opções de interatividade, tais como dois visores de cristal líquido, acesso a jogos
através de rede sem fio, tela sensível ao toque e uso de apontador similar àqueles existentes nos
aparelhos PDA (NINTENDO, 2007a). Como essas possibilidades, o videogame ofereceu jogos
inovadores como Nintendogs
3
, mais acessíveis e atraentes a um público amplo, incluindo aqueles
sujeitos considerados como “não-jogadores”, e se tornou um sucesso de vendas (NINTENDO,
2007b).
Já havia consciência da necessidade de ampliação das possibilidades de uso dos
videogames, assim os novos consoles da Microsoft, XBOX 360 e Sony, Playstation 3, lançados
no final de 2005 e em 2006, respectivamente, enfatizaram a sua aplicação também em música,
vídeos e comunicação com outros usuários on-line. Entretanto, os consoles da Microsoft e da
Sony ainda estavam focados no público aficionado por jogos, comumente chamado no mercado
de hardcore gamer.
Já em 2006, a Nintendo consolidou sua estratégia de ampliar o seu público com o
lançamento do console de última geração Nintendo Wii. Esse videogame introduziu controles sem
fios e com sensores de movimento, permitindo ao usuário emitir comandos aos jogos sem a
necessidade de complicadas combinações de botões. Um exemplo dessas possibilidades é o jogo
Wii Music Orchestra, que permite ao usuário reger uma orquestra virtual simplesmente
movimentando o controle como se fosse uma batuta. Esse nível de interatividade contribuiu para
que o console se tornasse uma opção de entretenimento familiar e assim atraiu uma grande
audiência de jogadores casuais, aqueles não aficionados ou infreqüentes usuários de jogos
(DATAMONITOR, 2006; NINTENDO, 2007a). Com a consolidação desse novo posicionamento
da Nintendo, através do Nintendo DS e Wii, a empresa gradativamente passou a recuperar sua
posição de liderança. Na atual geração de videogames, a Nintendo já atinge 41,9% do total de
3
Nintendogs é um simulador onde o jogador deve adestrar e cuidar de pequenos animais de estimação
(NINTENDO, 2007b).
82
venda de consoles no mundo, contra 39,6% da Sony e 18,5% da Microsoft (DATAMONITOR,
2007a).
Como já referido por Consalvo (2006), a história dos jogos eletrônicos, no que tange a
literatura disponível, se concentra essencialmente na evolução dos consoles a partir do sucesso da
plataforma arcade, tendo como principal referência o mercado americano. De fato, os jogos para
consoles têm representado, por ampla margem, o maior segmento do mercado, atingindo mais de
75% de todo o faturamento gerado no mundo (SOFTEX, 2005). Nos EUA, representa mais de
82% do total de vendas de software de jogos (DATAMONITOR, 2007b). Como também
demonstram Gallaher & Park (2002) e Datamonitor (2006), o mercado de jogos se desenvolveu
de forma oligopolizada, com poucos grandes atores dominando o know how tecnológico e
suportando os altos investimentos em desenvolvimento e marketing exigidos pelos consoles.
Apesar de terem menor representatividade no mercado de jogos, os computadores
pessoais também surgiram como uma plataforma alternativa. Historicamente, os consoles sempre
levaram vantagens com relação aos computadores, principalmente pelo fato de serem
equipamentos dedicados com recursos áudio-visuais superiores aos oferecidos por computadores
populares da mesma época (DATAMONITOR, 2006). Os primeiros computadores que
permitiram possibilidades de jogos foram o Apple II, lançado pela Apple em 1977, e o
Commodore 64, lançado pela Commodore em 1982. Porém, ao longo dos anos 80, as empresas
desenvolvedoras de jogos passaram a concentrar seus lançamentos para os computadores IBM PC
e Apple em razão da crescente popularidade dessas plataformas (WILLIAMS, 2002). Um dos
poucos sucessos de vendas registrados nesse período foi o simulador de vôo Flight Simulator,
criado pela Microsoft (ALLEN & KIM, 2005).
Os computadores começaram a desempenhar papel mais relevante no mercado de jogos a
partir dos anos 90, com a emergência da internet. Um dos primeiros diferenciais dos
computadores foi a utilização dos recursos de rede, permitindo a criação de jogos com a
participação simultânea de vários jogadores, característica pouco explorada nos consoles. Em
adição a essa inovação, vieram as tecnologias gráficas tridimensionais, permitindo a criação de
jogos com maior realismo e ação. Durante esse período, jogos como Doom e Myst fizeram grande
sucesso, contribuindo para a consolidação de gêneros de tiro e estratégia nos computadores.
Desde 1995, os computadores vêm se apresentando como um nicho alternativo em relação aos
consoles, em razão da introdução de hardwares para gráficos tridimensionais cada vez mais
83
avançados e gradual diminuição de seus custos em comparação aos consoles (ALLEN & KIM,
2005).
O mercado de jogos, em termos de plataformas, vai além dos consoles e computadores,
abrangendo também outras emergentes como telefones celulares e assistentes de bolso (PDA).
Mesmo assim, pode-se identificar um conjunto de tecnologias pertencentes a sete gerações que
descrevem a essência da evolução do mercado de jogos (Erro! Fonte de referência não
encontrada.). Contudo, os jogos eletrônicos não se resumem aos aspectos tecnológicos,
constituindo-se em uma indústria criativa capaz de fomentar a sinergia entre múltiplas
tecnologias digitais, criatividade artística e entretenimento (AOYAMA & IZUSHI, 2003). Nesse
aspecto, torna-se também relevante mencionar a evolução da indústria quanto ao
desenvolvimento dos jogos e sua orientação criativa.
Na década de 70 as empresas fabricantes de consoles produziam os seus próprios jogos.
Entretanto, com a consolidação dos consoles de jogos substituíveis nos anos 80, gradativamente
surgiram empresas especializadas apenas no desenvolvimento dos jogos (GALLAHER & PARK,
2002).
Geração
Principais
videogames
Tecnologias
Computadores e
características
Principais atores
do mercado
1° 1970-75
Odyssey, arcade Pong
Jogos pré-
programados no
sistema
2° 1976-82
Atari 2600
8 bits, uso de
cartuchos de jogos
Apple II
Commodore 64
Fabricantes de
console produzem
o hardware e o
software
3° 1983-88
NES, Master System
8 bits, processamento
e recursos áudio-
visuais mais
avançados
Ascensão e
estabelecimento dos
padrões IBM PC e Apple
Desenvolvedoras
criam jogos para
os fabricantes de
console
4° 1989-94
SNES, Gênesis
16 bits,
processamento e
recursos áudio-
visuais mais
avançados
Emergência dos jogos com
gráficos em três
dimensões.
5° 1995-
1999
Nintendo 64, Saturn,
PlayStation
32-64 bits, recursos
mais avançados, uso
de cds e cartões de
memória
Emergência da internet e
de hardware gráfico, jogos
em rede, sucessos como
Doom e Myst
Desenvolvedoras,
fabricantes de
consoles, editores
digitais,
distribuidores,
varejistas
independentes
6° 2000-
2005
Game Cube,
Dreamcast,
PlayStation2, XBOX.
128 bits, uso de DVD
e recursos de rede e
jogos on-line.
a partir
de 2006
Wii, Playstation3,
XBOX 360
Aplicações em
multimídia e internet.
Ampliação do
público.
Consolidação dos jogos em
rede, de tiro e estratégia.
Desenvolvedoras,
fabricantes de
consoles, editores
digitais,
distribuidores,
grandes redes de
varejo
QUADRO 5 RESUMO DAS PRINCIPAIS PLATAFORMAS NA HISTÓRIA DOS JOGOS ELETRÔNICOS.
84
Fonte: adaptado de Gallaher & Park (2002).
Nessa época, desenvolvimento de jogos era uma atividade independente em que as
empresas tinham liberdade para introduzir suas próprias criações e, no caso dos computadores, os
jogos ainda eram produzidos por entusiastas e distribuídos entre amigos. Entretanto, com o
estabelecimento dos consoles em nível global e o aumento da sofisticação dos jogos, as
atividades de desenvolvimento se tornaram mais caras e arriscadas. Assim, no início dos anos 90
os fabricantes de consoles passaram a exercer maior controle na cadeia de valor, trabalhando em
conjunto com editores digitais e distribuidores que garantiam, respectivamente, jogos de maior
qualidade e potencial de vendas, e acesso aos varejistas para a comercialização dos produtos.
O nível de investimento e de risco dos jogos continuou se intensificando a partir do ano
de 2000, através de tecnologias mais complexas, custos mais altos de pessoal e desenvolvimento,
e conseqüentemente maior dependência de grandes volumes de venda e amplas redes de varejo.
Para se ter uma idéia, jogos de alto padrão para computadores já atingiam orçamentos de até US$
10 milhões (WILLIAMS, 2002). O editor digital, sendo o ator responsável pelas decisões
estratégicas de desenvolvimento, cresceu em importância, passou a investir no financiamento de
desenvolvedoras e na aquisição de propriedade intelectual, tais como licenças de filmes e
personagens famosos que contribuíam para atenuação do risco. Assim, os jogos deixaram de ser
uma indústria de criações independente e passaram a fazer parte de uma complexa cadeia de
valor cujas produções são governadas por editores digitais, representados como departamentos
dos fabricantes de consoles ou como empresas independentes (GRANTHAM & KAPLINSKY,
2005).
Como verificado no histórico, a indústria de jogos eletrônicos se tornou parte de uma
grande cadeia de valor, caracterizada pela criatividade e intensa inovação tecnológica, pelos altos
investimentos em marketing e distribuição, e também pelos altos riscos. Hoje o mercado
bilionário dos jogos eletrônicos (DFC, 2005) compreende uma miríade de gêneros de produtos e
aplicações, concebidos a partir de diferentes competências, tecnologias e modelos de negócios
que atingem diferentes audiências. Esses aspectos são analisados em maiores detalhes a partir da
próxima seção.
85
4.2 PLATAFORMAS, GÊNEROS E APLICAÇÕES
Os jogos eletrônicos podem ser acessados através de diferentes dispositivos, tais como
consoles, computadores pessoais e telefones celulares. Os jogos também são classificados em
diversos gêneros, como ação, aventura ou esporte, que atraem diferentes públicos e, por sua
riqueza multimídia e interativa, também servem de grande utilidade para outras aplicações, dentre
as quais estão a propaganda (SOFTEX, 2005) e o treinamento empresarial (SG, 2007).
Os diferentes dispositivos são referidos como plataformas de jogos (VENKATRAMAN,
2004; ESRB, 2007), ou seja, arquiteturas tecnológicas baseadas em hardware e/ou software
capazes de prover os recursos necessários para o uso de jogos (SOFTEX, 2005). Essas
plataformas podem ser organizadas em seis tipos (Erro! Fonte de referência não encontrada.).
Tipo de plataforma Descrição Exemplos
Console
Equipamento digital dotado de um
conector para o aparelho de TV e um
encaixe para uma unidade de
armazenamento, contendo programas
e/ou dados de um jogo em particular. É a
plataforma de jogos mais popular.
Os consoles de última geração são
Nintendo Wii, Sony PlayStation 3 e
Microsoft XBOX 360.
Computador
Computadores pessoais, de mesa ou
portáteis, capazes de executar jogos
através de mídias avulsas (CD, DVD) ou
através da internet.
IBM PC baseado em Windows ou Linux,
Apple Macintosh.
Aparelho celular
Telefones celulares com capacidade
áudio-visual para processar jogos.
Nokia N-Gage.
Aparelho portátil
Possui tela de maior tamanho e recursos
áudio-visuais de melhor qualidade se
comparado aos celulares. Pode ser ou não
dedicado a jogos. Fazem parte desta
categoria os consoles portáteis.
Apple IPod, PDA, Nintendo DS, Sony
PSP.
TV Digital
Sistema de TV provido de tecnologia que
permita a execução de conteúdo
interativo.
Televisor com Set-top Box para recepção
de TV Digital.
Multiplataforma
Representa padrões tecnológicos que
permitem que o mesmo jogo seja
executado em mais de uma plataforma.
Jogos on-line para Web/Internet
utilizando tecnologias Java ou Flash.
QUADRO 6 TIPOS DE PLATAFORMAS DE JOGOS.
Fonte: adaptado de SOFTEX (2005) & ESBR (2007).
No que se refere ao gênero, a maior parte dos jogos pode ser classificada em oito
categorias, conforme descritas por SOFTEX (2005):
86
a) RPG: é o acrônimo para Role Playing Game. Esse jogo consiste em uma
ambientação contextual (fantasia, medieval, horror), na qual o jogador deve buscar
informações e tomar decisões que afetarão o rumo da história e o desenvolvimento
de seu personagem. Exemplos são as séries Diablo e Ultima. Esse gênero é popular
em jogos MMOG (jogos on-line para milhares de usuários simultâneos).
b) Estratégia: exige raciocínio e planejamento das ações, podendo ser jogado em turnos
(uma jogada para cada participante) como no xadrez ou damas. Jogos de estratégia
como Emperor Battle for Dune permitem ao jogador assistir animações detalhadas
das batalhas resultantes de suas decisões de guerra.
c) Simulação: são jogos que procuram reproduzir uma situação real de forma
satisfatoriamente fiel. Tem-se como exemplo o simulador de vôo Flight Simulator,
utilizado inclusive em treinamento de pilotos.
d) Ação: esses jogo s tipicamente propõem uma forma de interatividade que exige
rápido reflexo do usuário. Um exemplo é o jogo de combate espacial Nemesis.
e) Aventura: esse tipo de jogo se caracteriza pela exigência de raciocínio lógico e por
um enredo que insere o jogador em um contexto de aventura, podendo ser
classificado, também, como uma história interativa. O jogador tem à sua disposição
diversas ações que podem ser aplicadas a elementos do jogo. A combinação de
diferentes ações gera uma cadeia de eventos que pode ou não culminar na solução do
desafio proposto.
f) Infantil: caracteriza-se por propostas simples como quebra-cabeças e normalmente
carregam elementos educacionais adequados às crianças.
g) Passatempo: são jogos com menor riqueza de enredo e comumente orientados a
tabuleiro (damas, xadrez, go), cartas (poker, paciência, sete-e-meio) ou palavras
(cruzadinhas ou caça-palavras).
h) Esporte: reproduzem com maior ou menor fidelidade modalidades populares, como
futebol, vôlei e basquete.
Diferentes gêneros de jogos tendem a atrair diferentes perfis de público. Por exemplo, em
um estudo da IGDA (2006), cita-se que passatempos baseados em raciocínio e concentração têm
grande apelo junto às mulheres na faixa dos 35 anos. Porém, independente de gênero, é possível
87
conceber propostas que atinjam eficazmente uma determinada audiência, baseando-se no seu
perfil de envolvimento com o universo dos jogos. O estudo destaca três diferentes tipos de
audiência para os jogos:
a) Aficionado (hardcore gamer): prefere jogos com alto nível de ação, extremamente
competitivos e que requerem alto nível de envolvimento e destreza para se vencer os
desafios.
b) Costumaz (core gamer): prefere jogos onde o aprendizado e as descobertas são mais
graduais, que envolvam ainda certo nível de comprometimento e complexidade.
c) Casual (casual gamer): normalmente não se considera como um jogador. Aprecia
jogos como passatempos para relaxar e divertir, em vez de um desafio a ser encarado
com relativo nível de comprometimento.
Os jogos em sua maioria, independente de plataforma, gênero ou audiência, são
concebidos com foco em entretenimento, ou seja, para diversão e passatempo. Entretanto, sua
popularidade e capacidade de prover uma experiência interativa difundiram duas outras
aplicações (Erro! Fonte de referência não encontrada.).
Aplicação Descrição Exemplos
Advergame jogo de
propaganda
São jogos concebidos para promover
marcas, produtos e aumentar a audiência dos
sites das empresas, além de coletar de forma
interativa informações sobre os consumidores.
Podem envolver qualquer plataforma e gênero.
Sneak King, elaborado para
promover a rede de lanches rápidos
da Burger King.
Serious Game
jogos sérios
Os “jogos sérios” levam em conta critérios
didáticos e pedagógicos associados aos conceitos
que visam difundir. Assim se destinam a
solucionar problemas em áreas como educação,
saúde, segurança e gerência corporativa.
Cyber-Budget, elaborado pelo
governo francês para auxiliar o
contribuinte a compreender a gestão
das finanças públicas.
QUADRO 7 OUTRAS APLICAÇÕES DOS JOGOS ELETRÔNICOS.
Fonte: adaptado de SOFTEX (2005) e SG (2007). Exemplos de GameSpot (2007) e Cyber-Budget (2007).
Outra característica que diferencia os jogos de propaganda e jogos sérios dos demais
voltados ao entretenimento é que eles são produtos concebidos para organizações e não para o
consumidor final. Isso faz com que a própria cadeia de valor nesses nichos dependa de diferentes
atores, como clientes corporativos e agências de publicidade que coordenam as campanhas de
marketing e viabilizam a produção dos jogos (SOFTEX, 2005).
88
4.3 PROCESSO DE PRODUÇÃO
A essência da indústria de jogos está no elo produtivo (WILLIAMS, 2002) que, por si só,
poderia constituir uma cadeia de valor, visto as diferentes disciplinas e competências envolvidas
em seu processo (IGDA, 2006). Para Tschang (2005), a produção dos jogos considera a
combinação de três áreas essenciais: design, criação artística e desenvolvimento tecnológico. Da
mesma forma, Williams (2002) descreve a produção dos jogos como uma seqüência de três
passos que representam conceito, criação e programação do jogo. Essa combinação oferece
suporte para a criação de uma experiência interativa para o jogador, capaz de evocar suas
emoções e proporcionar a sensação de conquista. Tal experiência é buscada ao longo de todo o
projeto, através de constante refinamento e experimentação do produto. Assim, atividades de
teste e controle de qualidade passam a também representar uma etapa relevante da produção
(IGDA, 2003; TSCHANG, 2005; JOHNS, 2006). Pode-se dizer então que as atividades básicas
que compõem a produção dos jogos são: Design, Criação Artística, Desenvolvimento
Tecnológico, Teste e processos de Qualidade (Erro! Fonte de referência não encontrada.).
O processo de design, referido na indústria como Game Design, compreende a definição
dos elementos basilares de um jogo, tais como a mecânica (princípios de interação que definem a
maneira como se joga - gameplay), os estilos áudio-visuais a serem respeitados, o conceito dos
desafios propostos em cada fase do jogo e a forma de comunicação (interface) com o usuário. O
design torna-se a espinha dorsal do projeto e suas definições geram impacto direto nas demandas
criativas e tecnológicas.
A etapa de criação artística envolve a produção visual do jogo, como o desenho e
modelagem gráfica em três dimensões de personagens, cenários e animações. Também
compreende a produção de efeitos sonoros e trilhas musicais. Nessa etapa, o conteúdo do jogo é
normalmente construído a partir das premissas definidas no design, preservando assim a unidade
e o propósito do produto.
O desenvolvimento tecnológico representa essencialmente a programação do software do
jogo. É nesse momento que o universo proposto pelo design, e ilustrado pela criação, passa a ter
vida com movimento e interatividade. Essa etapa pode contemplar o simples uso de uma
89
tecnologia de software pronta para a criação de jogos, chamada engine, como também envolver o
desenvolvimento de tecnologias tais como programação de efeitos visuais, inteligência artificial,
simulação de fenômenos físicos, rede para múltiplos jogadores na internet e visualização em três
dimensões.
FIGURA 10 ATIVIDADES ENVOLVIDAS NA PRODUÇÃO DE JOGOS.
Fonte: Johns (2006) e Tschang (2005).
A etapa de teste e controle de qualidade é considerada como importante para a produção
de um jogo que tenha competitividade no mercado (IDGA, 2003). É nessa atividade que planos
de testes são executados para identificação de possíveis falhas de software ou acabamento de
produto. Também é aqui que profissionais são alocados para jogar e constantemente avaliar a
qualidade de diversão. Assim, o teste e o controle de qualidade representam uma importante
atividade que contribui para que o produto proporcione ao consumidor a experiência de diversão
desejada.
Segundo Tschang (2005), o processo de produção de um jogo tende a ser pouco
seqüencial, ou seja, não há uma etapa exaustiva de planejamento e especificação em papel, nem
uma série de trabalho rígida na ordem “design-criação-desenvolvimento-teste”. A tendência é de
as atividades interagirem ao longo de todo o projeto. Para o autor, isso ocorre devido à complexa
natureza experimental da produção dos jogos, que combinam design, criação e tecnologia para
provocar uma experiência emocional no jogador. Essa experiência é muito difícil de ser
90
especificada a priori, o que faz com que a abordagem de produção dos jogos seja construtivista,
com repetidas iterações que adicionam novos elementos de design, criação e tecnologia à medida
que esses comprovam na prática contemplar mais satisfatoriamente o propósito do produto.
Dessa forma, a produção de jogos tende a carregar um alto nível de incerteza até
momentos antes da finalização do projeto, quando o jogo pode ser realmente experimentado em
sua plenitude. Esse alto nível de imprevisibilidade tem impacto na viabilidade dos projetos e, por
conseqüência, na própria estrutura de governança da cadeia de valor, como será visto na próxima
seção.
4.4 A CADEIA DE VALOR
A cadeia de valor dos jogos eletrônicos evoluiu de um modelo verticalizado, segundo o
qual o fabricante do videogame produzia todos os jogos, para uma estrutura especializada
composta por diferentes atores que abrangem desde a concepção até a venda do jogo (Erro!
Fonte de referência não encontrada.). Estudos como os de Williams (2002), Grantham &
Kaplinsky (2005) e Johns (2006) analisam a cadeia de valor do mercado de jogos eletrônicos,
identificando em conjunto os seguintes elos: produção, edição, distribuição, venda e consumo.
a) Produção: compreende a indústria de jogos eletrônicos onde se enquadram as
empresas responsáveis pelo desenvolvimento do jogo eletrônico. Algumas dessas
empresas são fornecedores especializados e podem prover apenas partes dos jogos,
tais como personagens, animações, cenários ou tecnologia de software para a
produção de jogos. Normalmente as empresas que desenvolvem jogos estabelecem
acordos com o editor digital para comercializar seu trabalho, mas em alguns casos
podem fazer uso de intermediários como os agentes que negociam contratos de
desenvolvimento, sendo remunerados com uma comissão.
b) Edição: aqui se enquadram os editores digitais, também referidos como publishers ou
publicadores. O editor digital é responsável pelo controle do desenvolvimento e
edição final, lançamento e marketing dos jogos. Além disso, esse ator negocia com
distribuidores e redes de varejos a colocação dos jogos no mercado. Segundo
91
Grantham & Kaplinsky (2005) os editores digitais têm também financiado as
produções de jogos.
c) Distribuição: o distribuidor é responsável pelo armazenamento físico e pela entrega
dos produtos junto às redes de varejo. Segundo Williams (2002), nos EUA a
distribuição dos jogos é normalmente concentrada em grandes atores que também
dominam a distribuição de música e vídeo, e que possuem acordos exclusivos com as
maiores cadeias de venda.
d) Venda/varejo: o varejista é representado por grandes redes de venda com contato
direto com o consumidor, tais como supermercados ou lojas especializadas em
artigos de informática.
e) Consumo: representa a ponta final da cadeia. É o consumidor que utiliza ou compra o
jogo eletrônico.
FIGURA 11 CADEIA DE VALOR DOS JOGOS ELETRÔNICOS
Fonte: adaptado de Grantham & Kaplinsky (2005), Johns (2006) e Williams (2002).
92
Com a emergência da internet, e dependendo do modelo de negócios, observa-se a maior
possibilidade de atingir diretamente o consumidor (ERRO! FONTE DE REFERÊNCIA NÃO
ENCONTRADA.). Segundo Williams (2002) e IGDA (2006) as empresas podem fazer uso do
comércio eletrônico para vender seus produtos, dispensando, por exemplo, elos como o de
distribuição e varejo. Observa-se porém que esse caminho não é tão evidente quando a
plataforma de jogos se trata de consoles, visto o nível de governança exercido pelo fabricante,
que controla a veiculação de conteúdos no videogame. A governança da cadeia de valor é
normalmente exercida pelos fabricantes de consoles e pelos editores digitais (GRANTHAM &
KAPLINSKY, 2005).
Quando se avalia o mercado de videogames, o fabricante de console passa a ter papel
fundamental. Diferentemente de computadores e telefones celulares, o console não é uma
plataforma aberta, ou seja, uma empresa não pode desenvolver jogos para um videogame sem
passar por um processo de seleção e aprovação. Além de controlar o desenvolvimento dos jogos,
o fabricante de console cobra pela licença de uso de sua tecnologia e ainda controla a manufatura
da mídia, cobrando taxas de licenciamento para cada cópia fabricada (WILLIAMS, 2002;
ALLEN & KIM, 2005).
O editor digital também exerce poder na cadeia de valor, em especial nas plataformas
abertas, devido a dois aspectos: o financiamento e a propriedade intelectual. Segundo Grantham
& Kaplinsky (2005) as produções de jogos passaram a ser cada vez mais sofisticadas e caras, o
que tornou a produção independente de jogos menos viável. Como se não bastasse, o crescente
nível de incerteza quanto ao sucesso de um jogo gerou uma necessidade de lançamentos de
produtos associados a marcas já reconhecidas no mercado. Munidos de recursos financeiros e
licenças famosas, os editores digitais juntaram condições para pressionar as desenvolvedoras por
produções mais baratas e mais rápidas.
4.5 O MERCADO DE JOGOS ELETRÔNICOS NO MUNDO
Segundo a DFC (2007a), o mercado de jogos eletrônicos atingiu US$ 33 bilhões no
mundo em 2006, e a expectativa é de que esse número chegue a US$ 47 bilhões até 2009. Esses
93
valores compreendem o total de vendas em hardware e software de jogos, tais como consoles e
suas versões portáteis, acessórios como controles e joysticks, e jogos para computadores e
videogames. Os EUA são considerados o maior mercado de jogos do mundo e sua indústria
(considera-se aqui a venda de software de jogos para computadores e consoles) atingiu US$ 9.5
bilhões em 2007 (NPD, 2008).
De acordo com o estudo do SOFTEX (2005) o mercado mundial de jogos está
concentrado nas regiões da Ásia/Pacífico, nos EUA e na Europa (EMEA). A região da
Ásia/Pacífico representa 38% do mercado (gastos de US$ 8,4 bilhões); os EUA respondem por
34% ou US$ 7,6 bilhões; e a EMEA, por 24% ou US$ 5 bilhões. As três regiões distribuem seus
gastos em quatro plataformas de jogos eletrônicos: 75% para console; 15% para computadores
pessoais (PC); 10% para plataformas on-line e dispositivos sem fio. Complementam a lista de
países a América Latina (AL), com 2% do mercado ou US$ 0,5 bilhão, e o Canadá, com 3% ou
US$ 0,78 bilhão. Nessas regiões os países que concentram a maior fatia do mercado são os EUA,
Japão, Reino Unido, Alemanha e França (DATAMONITOR, 2006).
A indústria de jogos é atualmente dominada pela plataforma console, incluindo os
videogames portáteis (SOFTEX, 2005; DATAMONITOR, 2007a). No caso do mercado
americano, esse domínio é mais evidente, sendo que a segunda plataforma mais popular
(computadores) atinge apenas 10% do volume de vendas dos jogos de videogame (NPD, 2008).
Além de a indústria ser concentrada nos videogames e estar desenvolvida em poucas regiões, ela
é comandada por poucos atores. Segundo a Datamonitor (2007a), apenas três fabricantes de
consoles detêm 100% da base instalada de videogames no mundo: Nintendo, Sony e Microsoft. A
Nintendo é atualmente a líder de mercado, com 41,9% de participação, seguida da Sony, com
39,6% e da Microsoft, com 18,5% dos videogames vendidos. No que diz respeito aos videogames
portáteis, a concentração é ainda maior, tendo a Nintendo uma participação de praticamente
100% no mercado (DATAMONITOR, 2006). Para se ter uma idéia, no ano fiscal de 2007 a
empresa faturou US$ 2.4 bilhões somente em vendas de jogos para seus consoles portáteis (DFC,
2007b).
Outro aspecto da indústria diz respeito à concentração das vendas de jogos para
computadores e consoles através de poucos editores digitais. Em estudos da Datamonitor (2007b,
2007c, 2007d, 2007e) nota-se que mais de 50% do volume de venda dos jogos, em quatro dos
cinco maiores mercados mundiais, que somam US$ 12,4 bilhões (EUA, Reino Unido, Alemanha
94
e França), é realizado por apenas quatro empresas. Os editores digitais Electronic Arts, Sega
Sammy, Activision e Konami em média comandam, respectivamente, 18,7%, 12,2%, 10,8% e
9,7% das vendas nessas regiões.
Apesar do amplo domínio dos consoles, os computadores apresentam grande potencial de
crescimento em decorrência da internet e da expansão acelerada dos jogos on-line. Os
computadores possuem a vantagem de ter adotado a internet há mais tempo que os consoles,
tornando, assim, os jogos on-line uma prática muito mais comum nessa plataforma, o que
contribuiu para estabelecer já em 2006 um mercado mundial avaliado em US$ 4,5 bilhões (DFC,
2007c). Também chama a antenção a dependência natural de conectividade exigida pelos jogos
on-line. Essa dependência cria mecanismos mais eficazes de combate à falsificação permitindo o
desenvolvimento do segmento inclusive em economias caracterizadas pelo alto nível de pirataria.
Assim acredita-se em um crescimento de 192% no segmento de jogos on-line até 2012, quando o
valor dele chegará a US$ 13 bilhões, através da exploração de basicamente três modelos de
negócios: assinaturas pagas para se jogar on-line, jogos gratuitos onde a receita é proveniente da
venda de espaço publicitário, e distribuição digital através da venda de downloads.
Esse segmento se desenvolverá basicamente nos EUA, Canadá, Japão, Europa e leste
asiático. A plataforma dominante tende a ser o computador pessoal, e o modelo de negócios mais
representativo possivelmente será a distribuição digital, com 40% do total de receitas, tendo forte
participação dos mercados do leste asiático como China e Coréia do Sul (Erro! Fonte de
referência não encontrada.).
FIGURA 12 POTENCIAL DE CRESCIMENTO DOS JOGOS ON-LINE.
95
Fonte: DFC (2007c).
Apesar do domínio dos computadores nesse segmento, acredita-se que os consoles
também crescerão nos jogos on-line, gerando até 2012 mais de US$ 1 bilhão em receitas com
distribuição digital (DFC, 2007c). Além dessas plataformas haverá também o crescimento de
novas audiências para os jogos. Dentre os jogos on-line mais populares na atualidade se
encontram aqueles do tipo MMOG caracterizados pela interação entre milhares de jogadores e
pelo maior grau de complexidade. Esse gênero continuará popular, mas haverá a emergência dos
jogos casuais, mais acessíveis e amplos ao grande público, atingindo até 2012 receitas de US$ 2,3
bilhões no mundo (DFC, 2007d).
Observa-se, pelas características dos jogos eletrônicos, uma natural inclinação para a
constituição de um mercado global (SOFTEX, 2005) que gradativamente se especializa em
plataformas, gêneros e audiências. As demandas cada vez mais sofisticadas da indústria de jogos
têm transformado uma simples brincadeira de entusiastas criativos, em uma estrutura de atores
profissionais, interconectados e que constituem uma verdadeira cadeia global especializada
(GRANTHAM & KAPLINSKY, 2005). A facilidade de comunicação introduzida pela internet
fez com que esses agentes econômicos se beneficiassem do acesso às informações, às ferramentas
e aos serviços. Isso tem provocado a desverticalização da cadeia em direção a um modelo de
empresas horizontais, voltadas às suas competências centrais, mais intensivas em transações com
parceiros externos (SOFTEX, 2005).
A esse respeito, à medida que o mercado de jogos evolui, percebe-se um movimento
crescente de externalização dos custos por parte das empresas de jogos situadas nos países mais
desenvolvidos. Um estudo da Screen Digest (2006) identifica que os altos custos de produção dos
jogos para os consoles de última geração têm provocado a terceirização de etapas do
desenvolvimento para países de mão-de-obra barata, tais como Índia, Hong Kong, Vietnã,
Taiwam e China. Acredita-se que até 2008 em torno de 90% das empresas de jogos utilizarão
essa estratégia, e mais de 40% dos orçamentos dos jogos (US$ 2.5 bilhões) serão gastos junto a
esses fornecedores. Entretanto, há a previsão de que a demanda por arte e animação de alta
qualidade aumentará, reduzindo o número de possíveis fornecedores de baixo custo. Isso
provocará o aumento dos preços, o que pode beneficiar outras regiões qualificadas, mas
periféricas à indústria de jogos, e que não possuíam até então uma grande vantagem de custo.
96
4.6 O MERCADO DE JOGOS ELETRÔNICOS NO BRASIL
Segundo a ABRAGAMES (2004), o mercado brasileiro encontra-se em estágio
embrionário, sendo estimado em algo próximo a 100 milhões de reais, mesmo com os elevados
índices de falsificação dos jogos. Nesse aspecto, a SOFTEX (2005) calcula que mais de 90% dos
jogos consumidos no Brasil sejam piratas. Esse problema, somado à alta carga de impostos sobre
os videogames, faz com que o Brasil não tenha a representação oficial dos fabricantes de console,
o que deixa a indústria brasileira em uma condição periférica frente ao maior segmento do
mercado de jogos (ABRAGAMES, 2005).
As empresas encontram grandes dificuldades para entrar no segmento de videogames, seja
por falta de qualificação ou pelos altos custos de aquisição das tecnologias de desenvolvimento.
Assim, elas buscam se concentrar em projetos menores, mais baratos mas menos rentáveis, e
realizados para plataformas abertas como computadores e celulares. Quando se trata de mercado
brasileiro, as empresas oferecem, em sua maioria, jogos para empresas ou para operadoras de
telefonia; uma forma supostamente eficiente de enfrentar a pirataria (SOFTEX, 2005). Tais
peculiaridades da indústria brasileira tendem a redefinir alguns atores tradicionais da cadeia de
valor de jogos, como se pode observar no quadro abaixo (Erro! Fonte de referência não
encontrada.).
Elo Descrição dos atores envolvidos
Desenvolvimento
Da mesma forma que no mercado internacional, aqui se concentram as
empresas que desenvolvem os jogos e os fornecedores especializados.
Entretando, geralmente não atuam no segmento de videogames.
Edição
Embora haja editores digitais no Brasil, a agência de publicidade surge
com um ator que tipicamente contrata desenvolvimento e promove os
jogos de propaganda. Em geral as desenvolvedoras buscam editores
internacionais para seus produtos utilizando-se de agentes.
Distribuição Distribuidores desempenham papel similar ao do mercado internacional.
Varejo/venda
O varejo é similar no que tange as grandes cadeias de venda, entretanto
um ator típico no cenário brasileiro é a operadora telefônica, que vende os
jogos através dos aparelhos celulares.
Consumo
No cenário global é majoritariamente o consumidor doméstico que
compra o jogo. No Brasil há uma significativa participação das empresas
como clientes de jogos para propaganda e jogos sérios.
QUADRO 8 CADEIA DE VALOR DOS JOGOS NO BRASIL.
Fonte: SOFTEX (2005), Johns (2006) e Williams (2002).
97
As barreiras para a inserção das empresas brasileiras no mercado nacional estão ligadas à
dificuldade de acesso aos canais de distribuição e às oportunidades locais escassas (SOFTEX,
2005). Para as empresas que se direcionam ao mercado internacional, a prestação de serviços
(outsourcing) para desenvolvedoras ou editores digitais estrangeiros acaba sendo a única
alternativa. Além disso, essa estratégia tende a inibir o desenvolvimento de propriedade
intelectual, ou seja, jogos de criação própria, por parte das empresas brasileiras (ABRAGAMES,
2004).
Uma conseqüência imediata das restrições citadas é percebida ao se observar o tamanho
das desenvolvedoras, em geral micro-empresas com uma média de 13 colaboradores e, em sua
maior parte, com menos de R$ 100.000,00 de faturamento anual (SOFTEX, 2005). Outro fator é
de a indústria brasileira ser relativamente nova, comportando empresas com menos de dez anos
de vida e geridas por jovens empreendedores de formação técnica, apaixonados por jogos. Esse
cenário pode fazer com que a própria inexperiência das empresas em relação às melhores práticas
do mercado influencie o desenvolvimento da indústria (ABRAGAMES, 2005).
Apesar de uma realidade desfavorável aos jogos, algumas iniciativas têm surgido no país
para fomentar a indústria. Segundo a SOFTEX (2005), o Estado do Paraná é um dos destaques,
com o trabalho conjunto entre governo e Universidades locais, que promovem incubadoras
empresariais, Cursos de Pós-Graduação em jogos, e a Rede de Excelência de Empresas de Jogos
de Entretenimento (GameNet). Em Recife, encontra-se o Porto Digital, um parque tecnológico
que abriga empresas estabelecidas na área de jogos e que conta com o CESAR (Centro de
Estudos e Sistemas Avançados do Recife), reconhecido centro de excelência em tecnologia e
inovação. Outra iniciativa é a ABRAGAMES, criada para representar a indústria junto aos órgãos
governamentais e promover um plano diretor para a inserção nacional e internacional da
produção de jogos brasileira. A associação representa a indústria no Comitê Assessor da
Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. Somada a essas ações, verifica-se a
emergência de opções de financiamento para pesquisa e desenvolvimento que atingem empresas
de jogos, tais como JogosBR (MC, 2006), promovido pelo Ministério da Cultura, e os fundos
setoriais da FINEP, agência do Ministério da Ciência e Tecnologia. Segundo a SOFTEX (2005)
mais de 38% das empresas analisadas já se beneficiavam de recursos dessa natureza.
98
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Esta etapa apresenta e analisa os resultados obtidos na coleta dos dados. Assim dividem-
se os resultados em duas seções: a primeira aborda os resultados quantitativos oriundos do
questionário eletrônico, que caracterizam as empresas de jogos e a indústria brasileira. A segunda
seção trata dos resultados qualitativos oriundos das entrevistas realizadas com um grupo seleto de
empresas.
5.1 RESULTADOS DA ANÁLIS E QUANTITATIVA
Na etapa quantitativa, busca-se identificar não somente as empresas existentes, mas
também elementos que auxiliem a compreender melhor a estrutura da indústria brasileira, tais
como produtos, serviços, geografia de atuação internacional e estratégia de governança das
atividades da cadeia de valor. Dessa forma, os dados são apresentados em quatro etapas: a) dados
gerais das empresas desenvolvedoras de jogos; b) atividades executadas pelas empresas na
indústria; c) decisões estratégicas na indústria e d) percepções gerais dos empresários com
relação à indústria brasileira de jogos.
5.1.1 DADOS GERAIS DAS EMPRESAS
As empresas desenvolvedoras de jogos estão localizadas em quatro das cinco regiões
brasileiras (Norde, Nordeste, Sudeste e Sul), abrangendo oito estados da federação (TABELA 1).
Destacam-se as regiões Sudeste e Sul (54,5% e 31,8% das empresas respectivamente),
respondendo por 19 das 22 empresas. São Paulo é o Estado que concentra o maior número de
empresas, totalizando dez.
99
TABELA 1 LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DAS DESENVOLVEDORAS DE JOGOS.
Região Representatividade* Estados Número de empresas
No rte 4,5% AM 1
Nordeste 9,1% PE 2
ES 1
MG 1
Sudeste 54,5%
SP 10
PR 1
SC 2
Sul 31,8%
RS 4
Centro-Oeste 0% - 0
Total 100% - 22
*Representatividade da região em relação ao total de empresas.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Essas empresas envolvem 382 colaboradores, sendo a média de colaboradores por
empresa de 17 profissionais (TABELA 2). Em termos de número de profissionais, as
desenvolvedoras de jogos no Brasil são tipicamente micro e pequenas empresas (SEBRAE,
2007), variando de 2 a 62 colaboradores, sendo dirigidas em média por três sócios.
TABELA 2 PERFIL TÍPICO DE UMA DESENVOLVEDORA BRASILEIRA DE JOGOS.
Perfil Representatividade* Número médio de colaboradores por empresa
Sócios 18% 3,09
Funcionários 41% 7,32
Estagiários 19% 3,23
Bolsistas 4% 0,68
Outros 18% 3,09
Total 100% 17,41
*Representatividade do perfil com relação à média total de colaboradores (17,41).
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Predomina, na composição de colaboradores, o profissional contratado com vínculo
empregatício, aqui definido como funcionários (41%). Nota-se que 18% dos colaboradores são
classificados como tendo relações de trabalho alternativas (outros). Com base nas entrevistas
realizadas junto a 9 das 22 empresas, identificou-se serem esses, em geral, profissionais
autônomos, contratados para atividades pontuais, tais como músicos, escritores e desenhistas.
Embora não estejam permanentemente envolvidos nos projetos, são considerados como parte da
equipe pelos empresários.
Das 22 empresas respondentes, dezenove (86%) já atuam com produtos no mercado de
jogos eletrônicos ou possuem clientes atendidos com serviços relacionados a jogos eletrônicos.
As outras três empresas (14%) encontram-se em fase de desenvolvimento, preparando o
100
lançamento de seu primeiro produto ou serviço. Incubadoras e parques tecnológicos, bem como
apoios de fundos governamentais têm sido uma alternativa cada vez mais comum para
potencializar e amadurecer negócios baseados em criatividade e tecnologia, como os jogos
(SOFTEX, 2005). Entretanto, a pesquisa identificou que apenas seis empresas (27,3% dos
respondentes) fazem uso de incubadoras ou parques tecnológicos, sendo as demais localizadas
em escritórios próprios fora do entorno científico e tecnológico. Da mesma forma, verificou-se
que apenas cinco empresas (22,7% dos respondentes) recebem apoio de agências de fomento para
seus projetos, especificamente CNPq (apóia cinco empresas), FINEP (apóia quatro empresas) e
FAPESP (apóia duas empresas).
Outro indicador importante de maturidades das empresas diz respeito ao faturamento.
Nesse aspecto, percebe-se a incipiência da indústria, sendo as empresas em termos de receita
caracterizadas como micro ou pequeno porte (SEBRAE, 2007). É importante destacar que os
dados médios de faturamento levam em consideração as empresas que declararam informações
de faturamento (TABELA 3).
TABELA 3 INFORMAÇÕES DE FATURAMENTO.
Perfil Percentual de empresas
Número de
empresas
Faturamento médio
2005**
Faturamento
médio 2006**
Declararam
faturamento
45,4% 10 R$ 421.000,00 R$ 536.444,00
Não declararam
faturamento
36,4% 8 - -
Ainda não tiveram
faturamento
18,2% 4 - -
Total 100% 22
*Considera as empresas que declararam receita pelo menos em um dos anos (2005 ou 2006).
** Considera apenas as empresas que declararam receita naquele ano.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Embora a receita média das empresas ainda seja modesta, há um indicador importante
quanto à evolução da indústria. Conforme se pode notar, o faturamento médio das empresas
aumentou de R$ 421.000,00, em 2005, para R$ 536.444,00 (crescimento de 27,4%). Esse
crescimento, no entanto, não se restringe aos dados de forma agregada. Das empresas que
declararam receitas em 2005 e 2006, 89% registraram aumento em seus ganhos, tendo em média
um crescimento de 56% no seu faturamento.
101
5.1.2 ATIVIDADES REALIZADAS PELAS EMPRESAS
Nesta seção identifica-se as atividades da cadeia de valor realizadas pelas empresas
desenvolvedoras de jogos, bem como a decisão estratégia (hierarquia ou mercado) utilizada para
a condição das atividades. As atividades analisadas compreendem os elos que vão desde a
concepção de um jogo até a entrega do produto final ao consumidor: Design, Criação,
Desenvolvimento, Testes e QA (controle de qualidade), Publicação/Edição, Distribuição e
Venda/Varejo. Além disso, verifica-se os tipos de produtos e serviços oferecidos pelas empresas,
as plataformas de jogos adotadas e o nível de atuação das empresas no mercado internacional.
5.1.2.1 ATIVIDADES, SERVIÇOS E PLATAFORMAS DE JOGOS
Primeiramente, as empresas foram indagadas a respeito das atividades exercidas na
indústria, ou seja, as atividades que as empresas podem oferecer aos seus clientes. O objetivo foi
identificar como as empresas se posicionam dentro da indústria. A maioria das empresas oferece
produtos e serviços relacionados a três atividades (TABELA 4). Por se tratar de empresas
desenvolvedoras de jogos, naturalmente são as atividades produtivas (Design, Criação e
Desenvolvimento) as mais realizadas. Destaca-se aqui a atividade Desenvolvimento, que envolve
a programação de software para os jogos (realizada por 95,5% das empresas).
TABELA 4 ATIVIDADES EXERCIDAS PELAS EMPRESAS.
Perfil Percentual de empresas Número de empresas
Design 68,2% 15
Criação 81,8% 18
Desenvolvimento 95,5% 21
Teste e QA 31,8% 7
Publicação/Edição 31,8% 7
Distribuição 13,6% 3
Venda/Varejo 13,6% 3
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
O perfil mais representativo é o da empresa que abrange três atividades das sete
apresentadas (40,9% dos respondentes, ou nove empresas). A configuração mais comum é a da
102
empresa que exerce ao mesmo tempo as atividades de Design, Criação e Desenvolvimento (oito
empresas) (FIGURA 13). Apenas três empresas têm foco em uma única atividade
(Desenvolvimento), e somente uma empresa realiza todas as atividades da cadeia.
FIGURA 13 ATIVIDADES OFERECIDAS NA INDÚSTRIA.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Visando identificar como o posicionamento das empresas é contemplado em termos de
organização das atividades, as desenvolvedoras foram questionadas sobre as atividades que eram
internalizadas (hierarquia) e aquelas delegadas a terceiros (mercado) (FIGURA 14). As atividades
Design, Criação e Desenvolvimento são internalizadas pela grande maioria das empresas. O nível
de internalização diminui conforme se move dos elos produtivos para os elos comerciais. Da
mesma forma, partindo dos elos produtivos para os comerciais tem-se o aumento no nível de
terceirização das atividades.
103
FIGURA 14 INTERNALIZAÇÃO E TERCEIRIZAÇÃO DAS ATIVIDADES.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
No caso de uma associação de empresas desenvolvedoras, é natural a inclinação para a
produção e não para comercialização. No que tange aos elos produtivos, é relevante destacar a
alta internalização das atividades, visto a direção que a indústria está tomando na forma de uma
cadeia especializada (GRANTHAM & KAPLINSKY, 2005). Dentre as possíveis interpretações,
isso pode sugerir que a maioria das empresas considera estratégico o domínio da produção
completa de um jogo, internalizando todas as atividades relacionadas, ao contrário de um
posicionamento focado em partes de um jogo.
Para entender como essas atividades refletem no mercado, solicitou-se às empresas a
descrição de seus principais produtos e serviços (TABELA 5). Das 22 empresas, dezoito
responderam a essa questão opcional. A partir da análise de conteúdo das descrições foi possível
categorizar os produtos e serviços exibidos, apresentados anteriormente. Os produtos/serviços
mais ofertados pelas desenvolvedoras são jogos para propaganda (oito empresas), jogos sérios
(cinco empresas), jogos para entretenimento para PC (quatro empresas) e jogos para Celular (três
empresas). Esses produtos e serviços são disponibilizados através de diferentes plataformas, tais
como computadores pessoais, internet, aparelhos celulares e consoles de videogame.
104
TABELA 5 PRODUTOS E SERVIÇOS OFERECIDOS.
Produtos/serviços Número de empresas*
Jogos para propaganda 8
Jogos sérios 5
Jogos de entretenimento para computadores 4
Jogos para celular 3
Jogos educacionais 2
Jogos casuais 2
Jogos on-line 2
Portagem (reprogramar um jogo para outra plataforma) 2
Outsourcing partes do jogo 2
Computação gráfica/multimídia 3
Jogos MMOG 1
Jogos console vintage 1
Tradução de jogos para outros idiomas 1
Serviços de teste e controle de qualidade 1
Distribuição de jogos 1
* A mesma empresa pode ofertar mais de um dos produtos/serviços listados.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
As plataformas PC e Web/Internet são as mais adotadas pelas empresas (63,6% e 59,1%
dos respondentes respectivamente) (TABELA 6). A terceira plataforma mais adotada é Aparelho
Celular, para a qual 27,3% das empresas oferecem soluções.
Consoles, sejam da nova geração, portáteis ou vintage, são adotados por uma parcela bem
menor de empresas. O que se percebe nesses dados é a tendência de as desenvolvedoras
brasileiras conectarem seus produtos a plataformas abertas tais como PC ou Web. Há uma
representatividade pequena de empresas conectadas a plataformas que exigem licença específica
de produção, como os consoles, que representam a maior fatia do mercado mundial
(ABRAGAMES, 2004; SOFTEX, 2005).
TABELA 6 PLATAFORMAS E MÍDIAS DE JOGOS ATENDIDAS.
Plataforma/mídia Percentual de empresas Número de empresas
Consoles nova geração 13,6% 3
Consoles vintage 9,1% 2
Computador pessoal (PC) 63,6% 14
Aparelho Celular 27,3% 6
Consoles portáteis 9,1% 2
TV Digital 4,5% 1
Jogos on-line/web/internet 59,1% 13
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
105
Com relação às plataformas que representam o maior percentual de faturamento para as
empresas, encontram-se Web/Internet, PC e Aparelho Celular. As empresas que atendem
Web/Internet geram em média 68,9% de suas receitas dessa plataforma (gráfico 2.4). No caso de
PC, essa média fica em 65,6%, e em Aparelho Celular, 65% das receitas (TABELA 7). Com menor
participação no faturamento das empresas têm-se os consoles e a plataforma de TV Digital.
TABELA 7 PERCENTUAL DE RECEITA GERADA POR PLATAFORMA.
Plataforma/mídia Percentual médio do total de receita gerada pela empresa
Consoles nova geração 24,5%
Consoles vintage 5%
Computador pessoal (PC) 65,6%
Aparelho Celular 65%
Consoles portáteis 7,5%
TV Digital 5%
Jogos on-line/web/internet
68,9%
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Com base nos dados apresentados de produtos/serviços, plataformas atendidas sua
participação nas receitas, é reforçada a orientação da produção de jogos para plataformas abertas
e, além disso, bastante orientada a serviços tipicamente para a web, como jogos para propaganda
e jogos sérios. Mesmo para as empresas que desenvolvem jogos para consoles da nova geração, a
participação da plataforma em suas receitas é modesta, representando em média 24,5% do seu
faturamento. A exceção seria para uma empresa que obtém 50% do seu faturamento dessa
plataforma. Quatro empresas especificaram “Outras” plataformas como sendo responsáveis em
média pela geração de 68,8% de suas receitas. Na análise do questionário, verificou-se que uma
das empresas ainda não havia lançado produtos no mercado, portanto foi ignorada. Na etapa de
entrevista verificou-se que outra empresa havia reportado 100% de sua receita em jogos
embarcados
4
, feitos especificamente para um modelo de aparelho celular.
A orientação para plataformas abertas pode sugerir uma dificuldade de as empresas
acessarem segmentos de games mais sofisticados, como mencionado em ABRAGAMES (2004).
Um ponto importante nesse caso é identificar o nível de conectividade das desenvolvedoras junto
ao mercado internacional, visto que o mercado nacional é caracteristicamente desprovido dos
segmentos mais ricos da indústria (ABRAGAMES, 2005; SOFTEX, 2005). Isso é o que será
abordado na próxima seção.
4
Corresponde a um software que funciona em conjunto com uma máquina específica, como por exemplo o software
para um modelo de telefone celular (SOFTEX, 2003).
106
5.1.2.2 ATUAÇÃO INTERNACIONAL DAS DESENVOLVEDORAS DE JOGOS
Das 22 empresas pesquisadas, 15 (68,2%) atuam no mercado internacional. Das sete
atividades da cadeia de valor, Desenvolvimento é a mais ofertada em nível internacional (13 das
15 empresas, ou 86,7%), seguida de Criação, Design, e Teste e QA (TABELA 8).
TABELA 8 ATIVIDADES OFERECIDAS EM NÍVEL INTERNACIONAL.
Atividade
Percentual de empresas que oferecem a
atividade no exterior*
Número de empresas que oferecem a
atividade no exterior
Design 46,7% 7
Criação 60,0% 9
Desenvolvimento 86,7% 13
Teste e QA 33,3% 5
Publicação/Edição 13,3% 2
Distribuição 13,3% 2
Venda 13,3% 2
*Percentual calculado sobre as empresas que internacionalizam suas atividades (15 empresas).
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Dentre os maiores mercados internaciona is, os EUA se destacam sendo o destino de
73,33% das empresas (TABELA 9). Em seguida tem-se Alemanha, Reino Unido e França.
Percebe-se que esses quatro países são destinos de boa parte das desenvolvedoras brasileiras, e
também representam os mercados mais sólidos de jogos eletrônicos (ESA, 2007; SOFTEX, 2005;
DATAMONITOR, 2007a).
TABELA 9 DESTINOS DAS EXPORTAÇÕES.
Atividade
Percentual de empresas que
oferecem a atividade no país
Número de empresas que oferecem a
atividade no país
EUA 73,3% 11
Japão 26,7% 4
Reino Unido 40% 6
França 40% 6
Alemanha 53,3% 8
América Latina 40% 6
Demais países Ásia/Pacífico 6,7% 1
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Uma exceção seria o Japão, que, embora sendo o segundo maior mercado mundial de
jogos (DATAMONITOR, 2007e), tem uma representatividade menor nas exportações brasileiras.
107
Outro dado que chama a atenção é que 80% das empresas exportam para outros países da Europa
que são mercados menos expressivos. Esse dado sugere uma investigação mais ampla a respeito
das oportunidades de exportação para as empresas brasileiras fora dos grandes centros
econômicos.
Embora boa parte das empresas atue no mercado internacional, em média a maior parte
das suas receitas vem do mercado nacional (61% contra 39%). A maioria das desenvolvedoras
(60%, ou 9 empresas) tem no mínimo 70% do faturamento gerado no mercado nacional. Com
relação às empresas mais orientadas ao exterior, cinco delas geram pelo menos 65% de suas
receitas do exterior, sendo que apenas duas indicam ter praticamente 100% do faturamento do
exterior. Apenas uma empresa tem um faturamento equilibrado (50% no Brasil e 50% no
exterior). Observa-se, nas empresas mais orientadas ao mercado externo, dois focos: o primeiro
trata-se de serviços de testes, portagem (reprogramar um jogo para outra plataforma) e
programação para Celular ou consoles da nova geração. O segundo, em menor intensidade, é a
comercialização de jogos independentes com propriedade intelectual própria.
FIGURA 15 MOTIVOS PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A última questão quanto à internacionalização foi verificar as motivações dos empresários
para internacionalizar suas atividades (FIGURA 15). Das 15 empresas que atuam no mercado
internacional, 12 responderam a essa questão opcional e descritiva. Através da análise de
108
conteúdo verificou-se 9 diferentes motivações, totalizando 16 observações. A maior demanda por
produtos e serviços no exterior se destaca como a motivação mais mencionada (quatro
observações), assim como a busca por produções mais sofisticadas (três observações). Em geral
as quatro razões mais citadas, que detém quase 70% das observações, retratam basicamente um
mesmo cenário como descrito por SOFTEX (2005): o Brasil é um mercado pequeno, com
problemas estruturais e com poucas oportunidades de negócios em projetos sofisticados de jogos.
Com tais desafios, em virtude de um mercado fragilizado, torna-se importante investigar
as possibilidades de ações com outros parceiros na busca de maior competitividade. A seção a
seguir busca apresentar uma melhor compreensão a respeitos das possibilidades de estratégias
colaborativas.
5.1.3 DECISÕES ESTRATÉGICAS NA INDÚSTRIA
A clareza quanto à importância estratégica de uma atividade, por parte do empresário,
combinada com o nível de competência de sua empresa, pode auxiliar a elaborar a melhor
estratégia de condução daquela atividade (CHILD et al., 2005). Assim, com base na Matriz CPC
(CHILD et al., 2005), propôs-se identificar o nível de importância estratégica e de competência
nas atividades, de acordo com a percepção das empresas. Para cada dimensão (importância
estratégica e competência) são fornecidos três níveis (alta, média e baixa), cuja combinação
indica se a melhor estratégia de condução das atividades seria realizada na forma de produção
interna, compra no mercado ou cooperação. O que se busca aqui é entender as possibilidades de a
cooperação se revelar como uma possível estratégia entre as empresas. Nesse aspecto, a maioria
das empresas revela já ter realizado um trabalho considerado como aliança ou parceria (77,3%
dos respondentes), principalmente em atividades de Desenvolvimento (45,5%), Design (36,4%) e
Criação (36,4% das empresas).
A primeira dimensão observada é a importância estratégica das atividades da cadeia de
valor para o negócio dos empresários. A importância estratégica está diretamente alinhada ao
foco e posicionamento do negócio. Por exemplo, se o grande diferencial da organização está em
sua tecnologia de programação de jogos, Desenvolvimento tende a ser uma atividade de alta
109
importância estratégica. A tabela abaixo apresenta as respostas dos empresários com relação à
importância estratégica (TABELA 10).
TABELA 10 IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DAS ATIVIDADES .
Importância estratégica
(número de empresas/percentual de empresas) Atividade
Alta Média Baixa
Design
16 72,7% 3 13,6% 1 4,5%
Criação
19 86,4% 1 4,5% 1 4,5%
Desenvolvimento 18 81,8% 4 18,2% 0 0,0%
Teste e QA
12 54,5% 6 27,3% 2 9,1%
Publicação/Edição
7 31,8% 3 13,6% 2 9,1%
Distribuição
7 31,8% 3 13,6% 1 4,5%
Venda/Varejo
8 36,4% 1 4,5% 2 9,1%
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A Criação surge aqui como a atividade de mais alta importância estratégica (86,36% das
empresas), seguida por Desenvolvimento (81,8%) e Design (72,7%). Nota-se que, na definição
deste estudo, criação envolve atividades de cunho artístico, como produção sonora e visual.
Entretanto, nas entrevistas se constatou que boa parte dos empresários entende essa etapa como
também sendo design, onde é concebida a proposta do jogo. Dessa forma, há a possibilidade de
que Design tenha uma importância maior do que os resultados aparentam. Uma análise mais
detalhada revela que mais da metade das empresas (54,5%) considera em conjunto as atividades
Design, Criação e Desenvolvimento como atividades altamente estratégicas. Identifica-se que a
partir do elo de Teste, seguindo em direção aos elos comerciais, a percepção de importância
estratégica cai consistentemente.
Os indicadores reforçam uma possível orientação da maior parte das empresas para a
produção do “jogo inteiro” e não para a especialização em etapas da produção de um jogo.
Avaliando os indicadores de alta importância estratégica, pode-se encontrar 13 empresas
(59,09%) que consideram quatro ou mais atividades como de alta relevância, sendo que duas
dessas empresas consideram todas as atividades como de alta importância estratégica. De modo
geral, os números caracterizam, baseando-se na percepção estratégica dos respondentes, um foco
bastante amplo de atuação.
A segunda dimensão analisada, seguindo o framework de Child et al. (2005), é a
competência na realização das atividades (TABELA 11). O nível de competência define a
capacidade de a empresa realizar a atividade tão bem quanto às melhores do mercado.
110
TABELA 11 NÍVEL DE COMPETÊNCIA NAS ATIVIDADES.
Nível de competência
(número de empresas/percentual de empresas)
Atividade
Alta Média Baixa
Design
15 68,2% 4 18,2% 1 4,5%
Criação
15 68,2% 6 27,3% 0 0,0%
Desenvolvimento
17 77,3% 5 22,7% 0 0,0%
Teste e QA
7 31,8% 6 27,3% 4 18,2%
Publicação/Edição
4 18,2% 1 4,5% 3 13,6%
Distribuição 2 9,1% 3 13,6% 4 18,2%
Venda/Varejo
2 9,1% 0 0,0% 5 22,7%
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Segundo a análise, Desenvolvimento foi a atividade com o maior número de empresas
que demonstram alta competência (77,27% ou 17 empresas), seguida de Design e Criação, com
68,18% (15 empresas) cada. Desenvolvimento se destaca como a melhor competência das
desenvolvedoras, o que conforma com SOFTEX (2005), que caracteriza as desenvolvedoras
brasileiras como aquelas formadas por jovens profissionais de alta capacitação técnica.
Entretanto, percebe-se que quando o assunto refere-se à competência, há uma visível diminuição
de empresas que a consideram como alta nas atividades inerentes à produção dos jogos.
Embora sete empresas se considerem como altamente competentes, seis empresas
possuem competência média, e quatro reconhecem baixa competência. Também em Publicação,
enquanto quatro empresas são altamente competentes, três possuem baixa competência, e uma
aponta média competência. A menor competência se intensifica em Distribuição e Venda, em que
há um número maior de empresas com baixa competência (quatro e cinco empresas,
respectivamente).
De modo geral, o que se percebe é que a grande maioria das desenvolvedoras brasileiras
considera os elos produtivos (Design, Criação e Desenvolvimento) como de alta importância
estratégica. Da mesma forma, a maioria delas considera ter alta, ou no mínimo média
competência nas mesmas atividades. Essa configuração traz implicações estratégicas, segundo
Child et al. (2005), pois a tendência é a de haver uma inclinação forte para a internalização,
diminuindo as possibilidades de cooperação (TABELA 12).
A Matriz CPC (CHILD et al., 2005) reforça a idéia de que as empresas se orientam
estrategicamente para a produção de um jogo inteiro (atividades de Design, Criação e
111
Desenvolvimento). Apenas em Design e Desenvolvimento se verifica a cooperação como melhor
estratégia, ainda assim para um número extremamente restrito de desenvolvedoras.
TABELA 12 DECISÃO ESTRATÉGICA COM BASE NA MATRIZ CPC.
Produzir Investir e Produzir Comprar Cooperar Atividade
Empresas % Empresas % Empresas % Empresas %
Design 15 68,18 3 13,64 1 4,55 1 4,55
Criação 15 68,18 5 22,73 1 4,55 0 0,00
Desenvolvimento 17 77,27 3 13,64 0 0,00 2 9,09
Teste e QA 6 27,27 4 18,18 2 9,09 5 22,73
Publicação/Edição 4 18,18 0 0,00 0 0,00 4 18,18
Distribuição 2 9,09 2 9,09 0 0,00 5 22,73
Venda/Varejo 2 9,09 0 0,00 1 4,55 4 18,18
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
As possibilidades de estratégias outras, em detrimento das competitivas, tornam-se um
pouco mais factíveis a partir do elo de Teste e QA em direção aos elos comerciais. Como
exemplos se destacam Teste e QA, e Distribuição, onde para cinco empresas é sugerida
cooperação o melhor caminho. Como aqui as empresas apresentam menor competência e ainda
consideram as atividades como relevantes, a Matriz CPC (CHILD et al., 2005) indica que essas
empresas deveriam explorar melhor as oportunidades de cooperação nesses elos.
Parece ser necessário entender de forma mais sistemática a realidade enfrentada pelos
empresários para identificar com maior precisão os desafios que levam as empresas a adotar uma
ou outra estratégia de condução das atividades. Um primeiro passo nessa direção é dado na
próxima seção.
5.1.4 PERCEPÇÕES DOS EMPRESÁRIOS A RESPEITO DA INDÚSTRIA
No questionário, em duas etapas, os empresários tiveram a oportunidade de manifestar
suas opiniões sobre a indústria brasileira. Uma primeira de ordem quantitativa, em que as
desenvolvedoras apontam a importância e o nível de disponibilidade de recursos, tais como mão-
de-obra e canais de distribuição no Brasil. A segunda refere-se a uma seção opcional do
questionário, de ordem descritiva, em que os empresários manifestam suas percepções a respeito
da participação das empresas brasileiras, barreiras, perspectivas e ações que deveriam ser
112
tomadas para o desenvolvimento da indústria. A seguir os resultados dessas duas etapas serão
apresentados em detalhes.
5.1.4.1 FATORES DE IMPACTO NA INDÚSTRIA
Com o objetivo de identificar fatores ambientais relevantes ao desenvolvimento das
empresas de jogos no Brasil, foi proposta aos respondentes a avaliação quanto à disponibilidade e
importância de oito fatores na indústria brasileira, adaptados e ampliados a partir dos estudos
realizados por SOFTEX (2005) e Grantham & Kaplinsky (2005). São eles: a) mão-de-obra
qualificada (FIGURA 16); b) informações sobre mercado nacional (FIGURA 17); c) opções de
financiamento (FIGURA 18); d) interação entre empresas da indústria (
FIGURA 19); e) oportunidades de negócios no mercado brasileiro (FIGURA 20); f) difusão
de práticas e processos de desenvolvimento (FIGURA 21); g) publicação e distribuição de jogos
para empresas nacionais (FIGURA 22); h) acesso às diferentes plataformas/mídia de jogos (FIGURA
23). Os empresários tinham a opção de classificar disponibilidade e importância em cinco níveis
(baixa, baixa-média, média, média-alta e alta). Abaixo são ilustrados os resultados para cada um
dos oito fatores.
FIGURA 16 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE MÃO-DE-OBRA.
113
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Relativamente à mão-de-obra, quando se considera profissionais devidamente
qualificados, percebe-se uma leve tendência à menor disponibilidade do recurso no mercado. A
percepção dos respondentes é equilibrada em quase todos os níveis mas, nenhuma empresa
considera que haja alta disponibilidade desse recurso. Em compensação, é enfática a alta
importância desse recurso para a indústria de jogos.
FIGURA 17 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE INFORMAÇÕES.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A maioria dos empresários considera que há poucas informações sobre o mercado
nacional (72,7% dos respondentes). Entretanto, há uma maioria consistente (63,7%) que
considera que tal fator tenha um impacto médio-alto ou alto nos seus negócios.
114
FIGURA 18 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE OPÇÕES DE FINANCIAMENTO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
O fator “Opções de financiamento” é o que mais chama atenção quando se trata de baixa
disponibilidade de recursos financeiros. Uma consistente maioria das empresas considera esse ser
um recurso escasso no Brasil, mas ao mesmo tempo importante para o desenvolvimento de seus
negócios (importância média-alta ou alta para 31,8% e 40,9% das empresas). A natureza da
indústria de jogos, baseada em inovação tecnológica e criatividade (SOFTEX, 2005), sugere
negócios caracterizados por alto risco, que dependem fortemente de mecanismos de
financiamento, especialmente capital de risco (POWELL, 1998; CHESBROUGH, 2003). Nesse
aspecto, a carência desse tipo de recurso parece ter um impacto relevante no desenvolvimento da
indústria.
115
FIGURA 19 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE INTERAÇÃO ENTRE EMPRESAS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A disponibilidade do fator “Interação entre empresas” é sensivelmente mais baixa,
considerando que nos demais níveis as opiniões se equilibram. Isso não torna evidente a alta
escassez desse fator no mercado. Entretanto, há uma consistente maioria que considera o fator
como de impacto médio-alto (45,5%) ou alto (9,1%) para seus negócios.
FIGURA 20 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE OPORTUNIDADES NO BRASIL.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
116
Quanto às oportunidades de negócio no Brasil, há uma considerável parcela de
empresários (50%) que sinalizam ser esse fator de baixa ou baixa-média disponibilidade. Apenas
27,2% acreditam que haja disponibilidade pelo menos razoável de oportunidades no mercado
nacional. O fato de haver oportunidades para desenvolver negócios no mercado local claramente
impacta nos negócios dos empresários, sendo de importância média-alta ou alta para 86,4% dos
respondentes.
Difusão de práticas e processos de desenvolvimento é vista como relativamente escassa.
Para 45,5% das empresas, o fator é de baixa ou baixa-media disponibilidade. Apenas 27,2% das
empresas acreditam que haja disponibilidade minimamente razoável do fator. Entretanto, o
impacto é considerável no negócio da maioria dos empresários (45,5% para médio-alto e 18,2%
para alto).
FIGURA 21 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE DIFUSÃO DE PRÁTICAS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A indisponibilidade de canais comerciais para os produtos e serviços das empresas fica
clara com uma consistente maioria, considerando o fator “Publicação/distribuição para empresas
nacionais” de baixa (31,8%) ou média-baixa (22,7%) disponibilidade. Quanto ao impacto nos
negócios das empresas, já não há uma diferença tão grande. Em torno de 54,5% das empresas
consideram como relevante o impacto, enquanto que 40,9% consideram tal fator de menor
impacto. Uma das possibilidades de explicação desse equilíbrio é o perfil das empresas
desenvolvedoras.
117
FIGURA 22 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE PUBLICAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Enquanto publicação e distribuição são necessidades típicas de desenvolvedoras
orientadas ao software pacote
5
, elas não representam um elo essencial para empresas que
desenvolvem serviços para o mercado empresarial, tais como jogos para propaganda.
FIGURA 23 DISPONIBILIDADE E IMPORTÂNCIA DE ACESSO A DIFERENTES PLATAFORMAS .
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
5
Típico software “de caixinha” feito para uso diário e destinado a um grande número de consumidores,
como um processador de textos, por exemplo (SOFTEX, 2003).
118
Quanto ao acesso a plataformas de jogos tais como os videogames, há uma consistente
percepção de que tal acesso é restrito (45,5% das empresas consideram o fator de média-baixa, e
22,7% consideram de baixa disponibilidade). Entretanto, o impacto desse fator não é evidente,
embora haja uma leve inclinação para uma importância alta. Da mesma forma que no fator
anterio r, a orientação das desenvolvedoras para o mercado corporativo, bem como o uso de
plataformas abertas pode justificar esse equilíbrio de opiniões.
O que se percebe a partir dessa avaliação quantitativa é um mercado bastante incipiente e
que sofre em face a uma conjuntura sócio-econômica inadequada à natureza do negócio. Percebe-
se uma considerável escassez de mão-de-obra qualificada, somada à falta de informações sobre o
mercado nacional e principalmente à carência de financiamento. Capital humano, informação e
capital de risco parecem elementos essenciais para sustentar um ambiente intensivo em
conhecimento, criatividade e inovação tecnológica. A seção a seguir procura investigar em maior
profundidade essas dificuldades, como também perspectivas e ações sugeridas pelas
desenvolvedoras.
5.1.4.2 DESAFIOS DA INDÚSTRIA BRASILEIRA DE JOGOS ELETRÔNICOS
Os empresários foram indagados a respeito de quatro pontos referentes à indústria
brasileira de jogos: a) percepção quanto à participação geral das empresas na indústria de jogos
nacional (Participação); b) barreiras encontradas para o desenvolvimento dos negócios
(Barreiras); c) perspectivas para o futuro da indústria nacional (Perspectivas); e) ações sugeridas
para evolução da indústria nacional (Ações). Embora essa fosse uma parte opcional do
questionário, 18 empresas (82% dos participantes da pesquisa) responderam pelo menos uma das
questões apresentadas, tornando relevante a identificação das percepções manifestadas pelos
empresários. Como são questões descritivas, realizou-se a análise de conteúdo, agrupando as
percepções similares de acordo com os pontos Participação, Barreira, Perspectivas e Ações. A
análise das respostas revelou 88 observações (
FIGURA 24).
119
FIGURA 24 FREQUÊNCIA DE OBSERVAÇÕES POR PONTO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Quando indagados sobre suas percepções acerca da participação das empresas brasileiras
e o mercado de jogos nacional, os empresários revelaram sete observações. As observações em
geral identificam idéias similares, que indicam uma participação pouco significativa das
empresas em uma indústria em estágio inicial de desenvolvimento.
FIGURA 25 BARREIRAS CITADAS PELOS EMPRESÁRIOS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
120
Mais especificamente, as observações destacam que a indústria brasileira representa
indicadores pouco significativos, com participação pequena ou nula das empresas brasileiras em
detrimento de produtos importados, restritos e limitados a poucos modelos de negócios viáveis,
em função da pirataria e da inexperiência dos gestores.
O ponto Barreiras foi o que levantou o maior número de observações, totalizando 46
(FIGURA 25). As observações foram agrupadas por similaridade, o que gerou dez categorias.
Problemas de financiamento e investimento se destacam, com 10 observações. Os empresários
observam as dificuldades encontradas, principalmente durante a etapa de desenvolvimento do
jogo, que requer investimento considerável e carece de opções adequadas de financiamento,
incluindo capital de risco. O segundo ponto mais abordado é a pirataria (9 observações), que
destaca o problema dos altos preços, mas também da “cultura pirata”, visto que o perfil do
consumidor não é necessariamente o de baixa renda. A “pouca experiência da indústria
brasileira” e a “limitação do mercado local” (oito e cinco observações, respectivamente) surgem
como barreiras para os empresários. Software de qualidade inferior, forte competição
internacional, pequeno mercado interno e inadequado para segmentos mais fortes, como o de
consoles, e falta de maturidade gerencial são pontos destacados.
A carga tributária inadequada à dinâmica das empresas é mencionada em menor número
(três observações). Com a mesma frequência aparece como barreira a Cultura, especificamente a
“cultura da pirataria” por parte de usuários com renda satisfatória, a cultura “não-comercial” dos
empresários da indústria de jogos, que supostamente agem por paixão e não pelo lucro, e a
“cultura de não-reconhecimento” da sociedade e do governo em relação aos jogos. A falta de
apoio governamental é manifestada pela falta de combate à pirataria e o pouco reconhecimento
do potencial do setor (duas observações). Duas observações revelam também como barreiras as
leis trabalhistas vigentes. A pouca tradição do país, por sua vez, inibe investimentos do exterior e
restringe a indústria local à fonte de mão-de-obra barata (duas observações). Por fim, duas
observações indicam a escassez de mão-de-obra qualificada como barreira.
As perspectivas quanto à evolução da indústria se tangibilizam em 10 observações, sendo
que a maior parte (seis observações) indica como o caminho mais provável a internacionalização
das empresas, visto a restrição do mercado local e a limitação dos modelos de negócios viáveis
para o Brasil. São destacadas parceiras internacionais, ações de outsourcing e missões
empresariais no exterior. Três observações enxergam um amadurecimento do mercado nacional,
121
onde restarão poucos estúdios bem estruturados. Apenas uma observação tem como perspectiva
um mercado futuro sem mudanças com relação ao cenário atual.
No que se refere às ações que poderiam auxiliar o desenvolvimento da indústria, foram
identificadas 25 observações, organizadas em 6 categorias (FIGURA 26).
FIGURA 26 AÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Financiamento aparece novamente como o item mais lembrado (11 observações),
sugerindo financiamento para desenvolvimento e contratação de mão-de-obra com experiência
nos mercados mais fortes (exterior), opções de financiamento a fundo perdido, capital de risco e
linhas de crédito a juros baixos (FIGURA 26). Outra alternativa sugerida de financiamento é a
criação de um publicador nacional para investir nas produções nacionais.
A revisão e redução da carga tributária do setor é o segundo item mais lembrado (seis
observações). A criação de canais comerciais (três observações) sugere a criação de um
publicador nacional, a representação oficial dos fabricantes de consoles no país e a realização de
missões/intercâmbios no exterior para possibilitar novos negócios. Cooperação empresarial (duas
observações) sugere maior interação entre empresas através de eventos sólidos e missões
empresariais. Investimento em mão-de-obra qualificada (duas observações) sugere o
investimento na formação e qualificação de profissionais, bem como na busca de profissionais
com experiência internacional. Combate à pirataria é mencionado em apenas uma observação, o
que contrasta com a relevância dada à pirataria quando se trata de barreira para o
desenvolvimento do mercado nacional.
122
De um modo geral, os indicadores quantitativos permitem um compreensivo desenho da
indústria brasileira, que é uma indústria incipiente em vários aspectos. Empresas de pequeno
porte, ainda carecendo de maturidade gerencial, muitas vezes estão limitadas a modelos de
negócios menos rentáveis, que melhor combatem a pirataria no Brasil, mas que mantêm as
empresas às margens dos segmentos atrelados aos mercados mais ricos. Além disso, há relativa
escassez de mão-de-obra qualificada e uma estrutura de financiamento e tributação incompatíveis
com a dinâmica de uma indústria digital, que envolve alta mobilidade de capital humano e
consideráveis margens de risco. Diante disso tudo, ainda percebe-se a tendência de as empresas
internalizarem toda a produção do jogo, não desenvolvendo ações cooperativas com outros
parceiros, pelo menos no sentido de melhor enfrentar a hostilidade ambiental da conjuntura
sócio-econômica brasileira.
Uma investigação mais a fundo é necessária para melhor entender a tendência de
internalização por parte das empresas e, quando existente a cooperação, em que situações elas
tendem a fazer uso dessa estratégia. Esse é o foco da próxima seção.
5.2 RESULTADOS DA ANÁLIS E QUALITATIVA
A etapa qualitativa é composta pela análise dos resultados das entrevistas em
profundidade. Nessas entrevistas, buscou-se melhor compreender a indústria de jogos no Brasil e
as decisões estratégicas das empresas, bem como identificar possibilidades de cooperação entre
as mesmas. Primeiramente, é feita uma introdução a respeito das empresas entrevistadas e suas
percepções quanto à indústria brasileira de jogos eletrônicos. Em um segundo momento, é
construída a análise dos resultados, com base no esquema conceitual das estratégias colaborativas
e também resgatando as observações coletadas na etapa quantitativa, quando úteis para auxiliar
no entendimento do fenômeno. Na análise das decisões estratégicas é enfatizado o mapa de
decisão estratégica segundo Child et al. (2005) e, em seguida, são exploradas em maiores
detalhes as estratégias colaborativas encontradas.
123
5.2.1 CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA COM BASE NAS EMPRESAS ENTREVISTADAS
Foram entrevistadas nove empresas associadas à ABRAGAMES, que estão localizadas
nas cidades de Campinas (SP), Porto Alegre (RS), Recife (PE), São Leopoldo (RS) e São Paulo
(SP). Algumas informações básicas a respeito de cada empresa são sumarizadas abaixo, mas por
questões de confidencialidade, elas são referidas como E1 a E9 (QUADRO 9). É importante
enfatizar que se tem como unidade de análise a indústria e não cada empresa. Portanto, o objetivo
de reunir as empresas é poder em conjunto prover material de análise para que se possa
compreender a funcionamento da indústria.
Empresa Posicionamento Segmento Atividades envolvidas*
E1
Fundação em 2000
Produtora de jogos
eletrônicos e aplicações
multimídia que requerem
competências semelhantes
àquelas dos jogos.
Jogos para PC, sistema
embarcado
Design, Criação,
Desenvolvimento,
Testes e QA
E2
Fundação em 2005
Produtora de jogos
independentes para
celular
Jogos para celular Desenvolvimento
E3
Fundação em 1996
Produtora de jogos para
PC e Console da Nova
Geração
Jogos para PC, Console
Design, Criação,
Desenvolvimento, Testes e QA
E4
Fundação em
2000/2001
Produtora e publicadora
de jogos on-line
Jogos on-line/web
Desenvolvimento
Publicação
E5
Fundação em 2000
Produtora de jogos
Jogos PC, on-line/web,
Jogos para propaganda.
Design, Criação,
Desenvolvimento
E6
Fundação em 2006
Produtora e publicadora
de jogos para celular
Jogos para celular
Criação, Testes e QA,
Publicação, Distribuição, Venda
E7
Fundação em 2005
Produtora de Jogos Sérios
e Jogos para
Entretenimento
Jogos Sérios, Jogos
para propaganda, Jogos
PC
Design, Criação,
Desenvolvimento
E8
Fundação em 2000
Produtora de soluções
baseadas em jogos.
Jogos Sérios, Jogos
para propaganda, Jogos
PC, Jogos Celular, on-
line/web
Design, Criação,
Desenvolvimento, Testes e QA
E9
Fundação em 2003
Produtora e publicadora
de jogos e aplicativos para
celular
Jogos e aplicativos para
Celular
Design, Criação,
Desenvolvimento, Testes e QA,
Publicação, Distribuição, Venda.
QUADRO 9 - POSICIONAMENTO, SEGMENTO E ATIVIDADES DAS EMPRESAS ENTREVISTADAS.
*Conforme informado no questionário eletrônico.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Com base nas entrevistas, constata-se que as empresas observadas cobrem, em conjunto,
todos os elos da cadeia de valor do setor de jogos eletrônicos (do Design à Venda). Também em
124
conjunto cobrem as importantes plataformas e aplicações de jogos, tais como computador Pessoal
(PC), console, celular, jogos para propaganda e jogos sérios.
Com base na TABELA 5 da seção quantitativa, observa-se que esse conjunto de empresas
abrange a grande maioria (81,25%) dos produtos e serviços identificados na indústria (TABELA
13). Oito das nove empresas têm atuação internacional, e sete das nove estão entre as associadas
com maior solidez em termos de quadro funcional ou faturamento declarado. Dessa forma,
acredita-se que esse conjunto de empresas oferece um panorama qualitativo bastante fiel e
elucidativo a respeito da indústria brasileira, considerando a população do estudo como sendo as
associadas da ABRAGAMES.
Um ponto evidente, mesmo considerando empresas que estão entre as mais sólidas da
indústria brasileira de jogos, é o pouco tempo de existência das mesmas. A maioria delas iniciou
suas atividades a partir de 2000, podendo ser considerado como um caso a parte a empresa E6
que, embora tenha sido fundada em 2006, é oriunda de outra empresa que operava desde 1999.
TABELA 13 PRODUTOS E SERVIÇOS OFERECIDOS PELAS EMPRESAS ENTREVISTADAS.
Produto/services Empresas entrevistadas que oferecem o produto/serviço*
Jogos para propaganda E5, E7, E8
Jogos sérios E7, E8
Jogos de entretenimento para computadores E1, E3, E5, E7, E8
Jogos para celular E2, E6, E8, E9
Jogos educacionais E8
Jogos casuais E4
Jogos on-line E4, E5, E8
Portagem (reprogramar um jogo para outra
plataforma)
E3, E9
Outsourcing partes do jogo E3, E5, E6, E8
Computação gráfica/multimídia E5
Jogos MMOG -
Jogos console vintage E4
Tradução de jogos para outros idiomas -
Serviços de teste e controle de qualidade E6
Distribuição de jogos E4, E6, E9
*A categorização nas empresas foi feita com base nos produtos e serviços informados durante a entrevista, e não no
questionário eletrônico.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A única empresa a operar desde a década passada é E3, que funciona desde 1996. Como
diz o presidente da ABRAGAMES “(...) o Brasil, pelo fato de ser uma indústria muito jovem,
tem poucas pessoas com larga experiência na área. Você consegue contar nos dedos quem no
Brasil tem mais de cinco ou seis anos de experiência na indústria de jogos” (PENHA, 2007).
125
Outro ponto reforça uma tendência observada na etapa quantitativa (TABELA 5),
considerando-se os segmentos de atuação das empresas (QUADRO 9): uma forte orientação para
jogos para propaganda, jogos sérios, jogos on-line e para celular. Enquanto apenas quatro
segmentos são contemplados, também se percebe uma atenção muito pequena à produção
independente de jogos ou jogos orientados a entretenimento. Nota-se que E2 é a única empresa
focada em produção independente, ou seja, com a criação de jogos de autoria própria, não
atrelada a nenhuma marca ou demanda de cliente.
Em princípio, a produção independente confere à desenvolvedora a possibilidade de
construir sua própria propriedade intelectual, tendo a possibilidade assim de se beneficiar de
economias tais como escopo e escala. Ser a única não é novidade, pois essa abordagem tende a
ser bastante arriscada. Isso ocorre, primeiro, porque há maior competição no mercado
internacional, onde as produções tendem a ser constituídas em cima de propriedade intelectual,
como descrevem Grantham & Kaplinsky (2005) e como reforça o empresário de E3. “(…) tu só
consegues colocar no mercado uma idéia tua se ela for excepcionalmente boa e que
impressioneo editor digital. Não tem garantia de vendas por causa da concorrência de IP
(propriedade intelectual). Isso virou uma estratégia amplamente utilizada e todos os jogos à
venda vêm de IP (marcas famosas). Tu não compras um jogo com personagem desconhecido. Tu
compras o jogo do Harry Pottter, tu compras o Fifa Soccer (jogo de futebol) e não aquele que
não tem o Ronaldinho Gaúcho” (E3, 2007).
Outro ponto, destacado por SOFTEX (2005), e que dificulta o desenvolvimento de jogos
originais, é a dificuldade de acesso a canais de distribuição para as produções independentes. Isso
ocorre mesmo dentro do Brasil, onde também há impacto da propriedade intelectual, conforme
destaca o empresário de E6. (...) “se você criar seu próprio título, independente, vai sentir falta
de uma forma para se vender isso aqui no Brasil. Não tem onde colocar esse jogo no mercado
brasileiro. Eu crio o meu jogo de vôlei, por exemplo, mas onde que eu vendo esse jogo de vôlei?
Não tem forma de se vender esse jogo. Eles (os varejistas) não colocam o jogo na prateleira.
Preferem colocar o jogo do Fifa Soccer e os outros super títulos que eles têm . Não tem como
distribuir os nossos jogos, pois hoje, no Brasil, distribuição é uma dificuldade total” (E6, 2007).
Não considerando a empresa E2, focada em jogos independentes, todas as demais são
orientadas de uma forma ou outra a serviço, atendendo pedidos de clientes e não necessariamente
focando-se no lançamento de produtos originais no mercado. No caso de empresas como E4 e E9,
126
quando lançam jogos orientados a entretenimento, eles são atrelados a marcas conhecidas e
restritas a plataformas como celular ou on-line.
Como já percebido na etapa quantitativa, em média as empresas geram maior parte de
suas receitas do mercado nacional (61% contra 39%). Assim, a dependência ainda grande do
mercado nacional pode provocar restrições quanto às possibilidades de negócios em detrimento
das hostilidades ambientais, tais como a pirataria. Nesse sentido, um empresário destaca que (...)
há poucas apostas de produtos bem sucedidas, no Brasil, que não sejam voltadas para jogos
celular e jogos on-line, pois estes dificultam bastante a pirataria. Se você ver, a maioria das
empresas que obtiveram algum tipo de resultado, que não seja com serviço, são hoje voltadas
para mercado de celular e on-line” (E4, 2007). Essa hipótese parece ser reforçada na tomada de
decisão do empresário E8 quanto ao posicionamento da organização. (...) “aqui a pirataria é
muito forte...se tivesse feito um jogo de caixinha, você ia acabar tendo problema de pirataria,
então fizemos um massive multiplayer (jogo on-line) para controlar isso aí. Outro negócio foi a
nossa unidade para o mercado corporativo: jogos para propaganda, treinamento e aplicações
interativas. Foi uma estratégia para atender o mercado brasileiro, pois era uma maneira de se
trabalhar com jogo diferenciada e que fugisse de pirataria no mercado nacional” (E8, 2007).
Exceções podem ser identificadas, como a empresa E3, que é focada em jogos para
entretenimento, incluindo consoles da nova geração. Entretanto, no grupo entrevistado, é a única
empresa com 100% da receita proveniente do mercado internacional. Isso denota que a forte
internacionalização pode minimizar o impacto da pirataria e prover a empresa com uma conexão
mais próxima a projetos maiores. Relativamente a esse assunto, o empresário E3 observa que
(...) “a primeria razão para ir lá para fora é a pirataria...seria loucura tentar vender alguma
coisa aqui para ganhar dinheiro com software; e segundo porque não tem o porquê não
exportar. E não tem outra alternativa...para fazer um jogo aqui no Brasil tem que ser jogo
microscópico, jogo para celular, projeto muito pequeno...não vai dar receita suficiente” (E3,
2007).
Partindo das percepções apresentadas, verifica-se que no Brasil há uma necessidade de
forte adaptação nos modelos de negócios, o que limita a exploração de valor dos jogos. Isso pode
sugerir que maiores benefícios podem ser adquiridos, buscando-se iniciativas no mercado
internacional. Todas as empresas, com exceção de E4, internacionalizam e verificam vantagens
como a natureza internacional do produto, assim os empresários comentam (...)o jogo já nasce
127
internacional e dá para vender pro mundo interiro” (E3, 2007); e (...)no mercado externo a
demanda é muito maior...você consegue pegar mais coisas para fazer, mais projetos” (E5,
2007). Além disso, (...) “é um mercado extremamente atraente do ponto de vista financeiro.
Existe uma percepção de valor em cima do mercado de jogos muitíssimo maior fora do Brasil do
que dentro. Por exemplo, um jogo para propaganda que é produzido no Brasil por R$ 50.000
reais sairia uns US$ 500.000 nos EUA” (E8, 2007).
Com relação ao mercado nacional, além de pirataria e dificuldade de acesso a canais de
distribuição, várias peculiaridades se tornam evidentes, o que o reforça como um mercado
extremamente incipiente. Pode-se também citar a questão da baixa renda do brasileiro e uma
suposta “cultura de levar vantagem”. Nesse caso, o empresário denota que há problemas dos altos
preços, pois (...) “a gente tem um mercado informal no Brasil que é enorme. Para classe média
jogo é muito caro, tecnologia é cara...é um problema de economia brasileira....imagine se a
gente tivesse videogames vendidos aqui a US$ 200? Mais pessoas teriam jogos desenvolvidos no
Brasil e eles seriam mais baratos, teria gente disposta a comprar (E8, 2007).
Mas não é só isso, (...) o brasileiro é tão mal acostumado. Ele pensa como eu vou burlar
primeiro, antes de pensar como eu vou pagar (problema da pirataria), e então a gente vê várias
vezes o pessoal mandando e-mail para a gente falando: não pode ficar cobrando, eu não consigo
burlar isso aí” (E4, 2007). Também se percebe que (...) “é aquela coisa de querer levar
vantagem em tudo. E brasileiro não que ganhar pouco; aí entra o negócio do preço. Um console
que custa US$ 200 lá fora, vai para R$ 3.000 aqui. Mas isso não é só imposto, é também o
jeitinho brasileiro do vou levar vantagem só porque não tem (o console) no Brasil” (E8, 2007).
Mas uma observação que parece reforçar essa incipiência é o fato de a indústria de jogos
não ser vista como indústria no país. A esse respeito, o empresário de E8 destaca que (...) “o
governo impede o crescimento do mercado. Há um tempo atrás o Ministério da Cultura
misturava games com áudio-visual, e o game nunca conseguia pegar recursos para nada. O
governo impede o crescimento de venda, não cria incentivos para que os consoles (maior
segmento da indústria) se instalem no Brasil, como Sony, Nintendo e Microsoft, e ainda tarifam
os videogames como mega computadores. Então custa lá fora US$ 200 e aqui custa R$ 2.500.
Porque quando o governo quer desenvolver qualquer indústria que precisa de matéria prima de
fora, ele derruba a tarifa para entrar barato aqui, para desenvolver o mercado, e então tarifar
128
depois. Como não se percebe (os jogos) como indústria, não se faz nada para mudar o cenário”
(E8, 2007).
Isso contribui para um problema: a falta de percepção de valor com relação aos jogos (...)
“onde não tem indústria consolidada, você também não enxerga muito valor...é uma
consolidação também do consumidor final. Eu chegava na agência e tomava porta na cara, ou
pediam 21 jogos por R$ 2.000, quando um dos jogos era R$ 21.000. Eles acham que jogo é feito
por menino na garagem de casa” (E8, 2007). Tal afirmação é reforçada por E3, quando destaca
que (...) “normalmente quando os clientes nos procuram para fazer jogos eles não têm noção do
custo geral de um projeto. Vem alguém aqui querer fazer um jogo e não tem noção de que pode
levar meses, com várias pessoas. Aí tu mostras o orçamento e a pessoa vê que é impossível,
porque tem uma verba pequena” (E3, 2007). Nesse sentido, E6 destaca que (...) “o que acaba
acontecendo é que eles (clientes) querem um super jogo, só que não com a verba adequada. A
primeira coisa é que as empresas entendam que se elas querem um super jogo, com bons
recursos de áudio e gráfico, sai caro” (E6, 2007).
Diante de todos esses desafios, é importante compreender como as empresas estruturam
suas decisões estratégicas, e como tais decisões promovem maior ou menor abertura a execução
de estratégias colaborativas. Esse é o tópico da próxima seção.
5.2.2 CARACTERIZAÇÃO DAS DECISÕES ESTRATÉGICAS
As empresas entrevistadas foram investigadas a respeito da importância estratégica das
atividades da cadeia de valor, e da competência que as mesmas acreditam possuir em cada uma
das atividades. Esse é um passo importante, segundo a Matriz CPC (CHILD et al., 2005), para a
compreensão de qual a melhor estratégia a ser tomada pela organização.
Também foram levantadas, a partir das entrevistas, as estratégias atualmente adotadas que
usam internalização, delegadas ao mercado ou trabalhadas em conjunto cooperativamente, e
porque usam tais configurações. A partir daí se traça um paralelo com o que sugere a Matriz CPC
para identificar a existência de possíveis possibilidades de estratégias colaborativas não adotadas
pelas empresas.
129
Ao entender melhor a importância estratégica e a competência nas atividades por parte
das empresas, reforçou-se o que foi antecipado nos resultados quantitativos, no sentido de uma
orientação das empresas para a internalização da produção de um jogo completo. O quadro
abaixo mostra, primeiramente, a percepção dos empresários quanto à importância estratégica das
atividades (QUADRO 10).
Percebe-se dois tipos de empresas. Um mais orientado à publicação e distribuição, e outro
dedicado à produção de jogos, enfatizando aspectos tecnológicos ou de conteúdo dos jogos.
Publicação torna-se a atividade de maior relevância estratégica para E4, E6 e E9. Para E4
observa-se que (...) “é importante trazer as empresas desenvolvedoras e fazer como que elas se
preocupem com desenvolvimento, usando nossa rede de publicação e distribuição. Isso ajudaria
desenvolvedoras que normalmente não conseguiriam ganhar dinheiro por si só, pela própria
dificuldade do mercado. A gente espera fortaceler nossa rede e ganhar mais dinheiro com isso”
(E4, 2007).
No caso de E6, observa-se a proximidade com o canal comercial e também a
maximização da fatia de receita obtida na cadeia, pois (...) “eu consigo falar diretamente com as
operadoras telefônicas, porque se eu tiver que usar outra firma que faça a venda, ela fica com
mais uma parte da receita. Assim a gente foca mais na parte de publishing (edição digital) para
se ter acordos diretos com as operadoras” (E6, 2007). Para E9 também se observa a importância
do posicionamento nos elos comerciais. (...) “a venda é bastante importante, pois a gente tem
uma relação boa com as operadoras conquistada com muito tempo, o que dá uma posição de
destaque para gente. Do lado principalmente da comercialização, publicação, o que a gente
desenvolveu de relacionamento no mercado acaba sendo uma barreira para os concorrentes”
(E9, 2007).
Para empresas concentradas nas atividades produtivas, há uma consistente importância
estratégica em torno das atividades de Design e Criação (seis das nove empresas). Conforme
observações de E7, (...) “a indústria de jogos é uma indústria criativa. Entende-se que aí que está
o capital intelectual envolvido” (E7, 2007). O empresário de E5 reforça a idéia anterior quando
destaca que (...) “a criação (nesse caso o empresário se refere ao Game Design e Criação) é o
pai de todas essas áreas. É a área que agrega maior valor” (E5, 2007).
130
Empresa
Atividades avaliadas pela
empresa*
Importância estratégica
E1 Design, Criação,
Desenvolvimento.
Design e Criação são considerados de média importância em face à
alta relevância de Desenvolvimento. É estratégico dominar a
tecnologia, pois ela capacita a empresa em diversas aplicações além
dos jogos.
E2 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA, Publicação,
Distribuição e Venda.
Todas as sete atividades são consideradas de alta importância, com
exceção de Teste e QA, que é de importância média. Design é
altamente relevante, pois é onde se concebe o look and feel
6
, regras e
história do jogo.
E3 Design, Criação,
Desenvolvimento e Teste e
QA.
Design, Criação, Desenvolvimento e Teste e QA são de alta
importância pois (...) “o que a gente faz melhor é um jogo completo e
com nossa tecnologia reduzimos os custos de projeto” (E3,2007).
E4 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA, Publicação,
Distribuição e Venda.
Publicação é da mais alta importância, pois a empresa está focando em
seu portal de jogos e deseja trazer conteúdos de outros parceiros.
Criação, Desenvolvimento, Teste e QA são de alta importância, pois
garantem o produto com alto acabamento.
Design e Distribuição são de média importância, e Venda tem baixa
importância.
E5 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA.
Design e Criação são de alta importância, pois o cliente paga mais por
um produto envolvente e consistente. De igual importância são o
Desenvolvimento e Teste e QA, pois permite controle, planejamento
da produção e o acompanhamento com o cliente para maximizar sua
satisfação.
E6 Desenvolvimento, Teste e
QA, Publicação,
Distribuição e Venda.
Publicação, Distribuição e Venda são de alta importância por
permitirem estabelecer contatos com operadoras e eliminar
intermediários. Desenvolvimento e Teste e QA também são de alta
importância. Teste e QA têm especial relevância, pois auxiliam na
credibilidade junto à operadora telefônica, não tendo bugs nos
produtos.
E7 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA.
Design e Criação são de alta importância, pois a empresa é orientada
ao conteúdo que representa a essência do capital intelectual do jogo.
Desenvolvimento e Teste e QA são de média importância.
Desenvolvimento, em especial, é de média importância, pois a
tecnologia é vista como commodity.
E8 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA.
As atividades de Design, Criação, Desenvolvimento, Teste e QA são
consideradas de alta importância. A empresa entende que é na coesão
entre todas as etapas de produção que se constrói um bom jogo.
E9 Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA, Publicação e
Distribuição.
Publicação e Distribuição são de alta importância, pois representam
uma barreira de entrada para concorrentes, visto o nível de
relacionamento e credibilidade desenvolvidos junto às operadoras.
Design e Criação também são de alta importância, pois a empresa
agrega valor através de propriedade intelectual, não sendo um mero
atravessador. Desenvolvimento (média importância) e Teste e QA
(baixa importância) são vistos como commodities, e fáceis de se buscar
no mercado.
QUADRO 10 - IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DAS ATIVIDADES .
*Importante frisar que se a empresa respondeu “não aplicável” em uma das dimensões, essa atividade é descartada
da análise.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
6
Expressão utilizada na indústria de jogos para descrever o nível de apelo e diversão promovido por um jogo
(GORDON, 2000).
131
E além de agregar valor permite para E9 construir (...) “a propriedade intelectual. Com
jogos próprios, se faz sucesso, você consegue alavancar bem a sua empresa...o risco é alto, mas
o ganho é proporcional” (E9, 2007).
Já com relação à importância estratégica das outras atividades produtivas, não há
unanimidade. E1 entafiza Desenvolvimento em função da possibilidade de utilizar a capacidade
desenvolvida em outras aplicações que não jogos. Já E5 acredita no Desenvolvimento como
importante para planejamento e controle de produção, enquanto que E7 e E9 o consideram como
uma commodity.
Em Teste e QA a observação mais relevante é a de E6, que considera a atividade como
estratégica para sua credibilidade junto à operadora. O empresário observa que (...) “temos aqui
uns 500 aparelhos celulares, e a gente testa o jogo para cada aparelho desses. Se, por exemplo,
esse jogo apresenta problemas no celular e o cliente liga para a operadora: - Eu estou com esse
jogo aqui, e ele deu problema. Isso gera para a operadora um custo de suporte que custa caro
para ela. E tem um ranking na operadora. Caso eles tenham tantas pessoas por dia/mês com
reclamação, eles pagam multa. Aí eles ligam: - O que aconteceu com o jogo?...não pode
acontecer mais...tudo bem aconteceu uma vez... Se passar de duas, três vezes, a operadora tira
esse título do ar, e se tiver mais do que cinco, seis vezes, ela me corta do negócio. É por isso que
essa parte é uma coisa muito crítica, e a gente não pode ter falha. Não é como comprar um jogo
para o seu computador, e se der problema é por incompatibilidade de algum hardware. Por isso
a gente tem esse foco grande na parte de teste; é fundamental para o negócio. Por isso tem que
ser feito aqui dentro” (E6, 2007).
No que tange às competências, as avaliações realizadas pelas empresas podem ser
observadas abaixo (QUADRO 11). Basicamente duas justificativas são utilizadas quando se
avaliam as competências. Primeiro, a maior parte das empresas (cinco desenvolvedoras) associam
a alta competência nas atividades à especialidade e ao conhecimento de seus profissionais, o que
reforça a idéia de que a indústria de jogos é intensiva em capital humano. Um exemplo é o que
afirma o empresário da empresa E1: (...) “na criação somos competentes, particularmente,
porque temos um líder de equipe muito experiente, e que sob o comando dele a coisa rende muito
bem. Ele é de nível internacional, e por causa disso o trabalho acaba se tornando de alta
qualidade” (E1, 2007).
132
Empresa
Atividades avaliadas
pela empresa*
Nível de competência
E1 Design, Criação,
Desenvolvimento.
Alta capacidade em Design, Criação e Desenvolvimento. Há equipe prolífica
em idéias de novos jogos, profissional de criação de nível internacional e sócio
com alto conhecimento de desenvolvimento de software.
E2 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA.
Alta competência em Design e Desenvolvimento. Há média competência em
criação e baixa competência em Teste e QA. Design e Desenvolvimento se
destacam, pois a empresa possui um parceiro qualificado de roteirização e
história de jogos, e uma equipe interna com domínio da tecnologia de jogos para
celular.
E3 Design, Criação,
Desenvolvimento e
Teste e QA.
Alta competência em Design, Criação e Desenvolvimento, pois o histórico da
empresa mostra jogos comprovadamente superiores a outros da mesma categoria,
inclusive feitos por empresas americanas. Também porque conta com sócios
experientes nessas três atividades. Já a competência em Teste e QA é média, pois
é um processo recente na empresa, e que está evoluindo.
E4 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA,
Publicação,
Distribuição e Venda.
Alta competência em Design, Criação, Desenvolvimento, Teste e QA, e
Publicação. A empresa já produziu 200 jogos para mais de 100 clientes. Os
sócios contam com alta qualificação técnica. A Distribuição (média
competência) e Venda (baixa competência) têm indicadores inferiores, pois a
empresa recentemente orientou-se para o portal de jogos e está adquirindo
experiência.
E5 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA.
A empresa é altamente competente em Desenvolvimento, pois possui
metodologia sólida de produção e sócios com alta capacitação técnica.
Considera-se como média a competência em Design e Criação, pois são áreas
conduzidas por profissionais técnicos não voltados às mesmas. A competência
também é média em Teste e QA.
E6 Desenvolvimento,
Teste e QA,
Publicação,
Distribuição e Venda.
Alta competência em Criação e Desenvolvimento, pois há excesso de pedidos
de clientes. É um feedback de que a qualidade é boa. A competência em
Publicação, Distribuição, Venda e Teste e QA também são altas. Teste e QA
se destacam, pois nunca houve problemas de bugs junto à operadora.
E7 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA.
A empresa tem alta competência em Design e Criação, pois conta com
profissionais especializados em formas de ludismo, narrativa e roteirização. Já
em Desenvolvimento e Teste e QA, a empresa possui competência média. Em
Desenvolvimento domina apenas programação de menor complexidade como
Flash.
E8 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA.
A empresa é altamente competente em Design, Criação e Desenvolvimento.
Seus parâmetros de qualidade são internacionais e sua qualidade visual e
tecnológica é equivalente ao das empresas americanas. Já a competência em
Teste e QA é média, pois a empresa considera não adotar as práticas mais
avançadas da área, visto o curto prazo de produção de jogos para propaganda.
E9 Design, Criação,
Desenvolvimento,
Teste e QA,
Publicação e
Distribuição.
A empresa possui alta competência em Design, Criação, Desenvolvimento,
Teste e QA, Publicação e Distribuição. Isso se dá pelo retorno recebido do
mercado, já que a empresa negocia seus produtos com grandes operadoras e
editoras internacionais, bem como publica no mercado doméstico jogos de
grandes produtoras do exterior.
QUADRO 11 NÍVEL DE COMPETÊNCIA NAS ATIVIDADES.
*Importante frisar que se a empresa respondeu “não aplicável” em uma das dimensões, essa atividade é descartada
da análise.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
A segunda justificativa se dá pelo fato de três empresas avaliarem sua competência com
base no retorno que seus clientes e parceiros dão em relação ao seu trabalho. Como exemplo, E9
133
destaca que (...) “consideramos como alta nossa competência nas atividades porque a gente
publica no exterior, junto à Vodafone Espanha, que diz: - Só publica aqui quem cobre 80% dos
celulares. Porque a gente assina acordos com a EA (maior editor mundial) para distribuir
nossos próprios jogos, porque a gente foi escolhida ano passado como a startup mais inovadora
do Brasil. A nossa competência técnica é alta porque é isso que o mercado diz para gente” (E9,
2007). Apenas uma empresa define sua competência com base em benchmarking do mercado
internacional, como se observa em E8 (...) “o mercado mundial é exigente, e a gente não se
baseia no Brasil. A gente se diferenciou aqui por conta disso. As empresas nacionais faziam (os
jogos) de qualquer maneira. Nosso gráfico, visual, desempenho e as tecnologias utilizadas são
comparáveis aos das empresas americanas” (E8, 2007).
A maioria das empresas indica alta competência em Design, Criação e Desenvolvimento,
ou seja, as atividades essenciais para a construção de um jogo inteiro. Alta competência em
Desenvolvimento é a característica mais comum, sendo apontado em todas as empresas. Esse fato
pode ser devido à formação dos sócios, que é tipicamente técnica, conforme destaca E9. (...)
“Somos uma empresa nascida na academia, muito boa tecnicamente,... talvez por termos nascido
da área técnica” (E9, 2007). Nesse sentido, afirma E5 que (...) “a área de desenvolvimento é
uma área que aqui já está num patamar superior até pela formação técnica dos sócios” (E5,
2007).
Sete das nove empresas se consideram altamente competentes em Design. Em geral essa
competência é destacada em função da capacidade da equipe conceber boas idéias e ter
profissionais experientes dedicados a essa área, como destacado por E7: (...) “temos na nossa
equipe uma competência técnica em Design muito grande. A gente tem pessoas que dedicaram
muita experiência em outras formas de ludismo, gente que já teve projeto comercial em jogos de
RPG, card games (jogos de carta), que estudam narrativa interativa, que já tiveram essa
preocupação na Faculdade. Então é uma área de conhecimento bastante rica, que não dá para
improvisar com alguém que tenha uma formação de arte ou tecnologia (E7, 2007). Já para
Criação, seis das nove empresas indicam alta competência, mas sem especificar em maiores
detalhes, simplesmente fazendo comparações com o estado da arte do mercado global, como em
E8, que destaca que (...)nosso gráfico, visual, desempenho e as tecnologias utilizadas são
comparáveis aos das empresas americanas” (E8, 2007).
134
Com relação às demais atividades, não há uma constância tão grande quanto ao nível de
competência. Das oito empresas que avaliam Teste e QA, uma empresa considera seu nível de
competência baixo, quatro o consideram como médio e três como alto. Em geral percebe-se que
essa é uma área ainda incipiente na produção de jogos e tem recebido maior atenção das
empresas recentemente, como observados por E3 e E8 (QUADRO 11). Atividades comerciais
como Publicação e Distribuição naturalmente não aparecem na maioria das empresas, que são
focadas em produzir os jogos, mas aparecem em E4, E6 e E9 que, em geral, consideram-se
altamente competentes. A exceção é E4, que ainda está dando os primeiros passos em
Distribuição e, portanto, reconhece sua competência como média.
Percebe-se que as empresas consideram, em sua maioria, altamente estratégicas atividades
essenciais à produção completa dos jogos, tais como Design, Criação e Desenvolvimento. De
igual forma, a maioria das empresas afirma ter alta competência nessas mesmas atividades.
Segundo Child et al. (2005), tais combinações de importância e competência sugerem uma
estratégia específica de condução das atividades. Para verificar como os empresários percebem
tais estratégias são listadas, primeiramente, as formas como eles conduzem suas atividades
(QUADRO 12).
A primeira observação mais contudente é o alto nível de internalização das atividades de
Design, Criação, Desenvolvimento, e Teste e QA. Baseando-se na Matrix CPC (CHILD et al.,
2005) e no depoimento das empresas, essa seria a estratégia mais adequada, o que restringiria o
espaço para possíveis estratégias colaborativas. Pode-se notar que a produção de um jogo está
ligada a uma alta interdependência de atividades como Design e programação de tecnologia
(Desenvolvimento). Nota-se também que para alguns empresários todas as atividades parecem
ser importantes possivelmente devido ao foco em jogos propriamente.
Essa alta interdependência das atividades pode tornar o jogo uma espécie de ativo
altamente específico (GEYSKENS et al., 2006) ou, como define Gereffi et al. (2005), uma
transação de alta complexidade, interessante de ser internalizada, como observa E7. (...) “Partes
mais centrais dos jogos, como questão de mecânica (Design) e a própria parte de tecnologia, e
outras que a gente reconhece permear jogo em si, a gente vai desenvolver internamente” (E7,
2007). Observa-se que a concepção e efetiva produção do jogo não são realizadas de forma
determinística e pré-especificada, mas sim de forma orgânica, com constantes atualizações ao
longo do projeto.
135
Empresa
Comprar Produzir Cooperar
E1
Criação (áudio), devido à
pequena demanda que não
justifica equipe interna.
Design, Criação (parte visual), por
questões de redução de custo; e
Desenvolvimento, por ser
estratégico.
Nenhuma atividade
E2
Criação, no que se refere
ao áudio.
Desenvolvimento e Teste e QA,
por questões de redução de custos e
diferenciação tecnológica.
Design e Criação, para reduzir
custo e diluir risco. Produção
conjunta de novos jogos para
mercado internacional através de
parceiros de roteirização e arte.
E3
Criação, quando há
excesso de volume de
trabalho.
Design, Criação,
Desenvolvimento e Teste e QA,
pois há um núcleo formado por
sócios que contemplam todas as
atividades produtivas.
Criação, através de rede de
produção artística.
E4
Criação, quando se trata de
atividades de pouca
demanda.
Design, Criação,
Desenvolvimento e Teste e QA,
para garantir qualidade e proteção
do código-fonte.
Publicação e Venda, pois o portal
de jogos é o novo negócio da
empresa.
Distribuição, para expandir
visibilidade do canal de jogos on-
line.
Publicação, para trabalhar em
parceria com desenvolvedoras e
criar conteúdo para o portal.
E5
Design, Criação,
Desenvolvimento e Teste
e QA, quando há excesso
de demanda e o projeto não
é estratégico.
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e QA,
pois se orienta à produção do jogo
inteiro.
Desenvolvimento, para produção
de novos jogos para o mercado
internacional.
E6
Criação (áudio),
Desenvolvimento (porting)
e Teste e QA, quando for
mais rápido que produzir.
Design, Criação,
Desenvolvimento e Teste e QA,
para reduzir custo.
Nenhuma atividade
E7
Design e Criação, quando
há necessidade de
especialistas como
pedagogos e redatores, ou
em casos de excesso de
demanda.
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e QA,
pois há um núcleo-base na empresa
que contempla todas as atividades
produtivas.
Design e Criação, através de rede
de especialistas e artistas.
Desenvolvimento, na criação de
novos jogos para mercado
internacional.
E8
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA, quando o custo é
menor e o projeto não é
estratégico.
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e QA,
pois são importantes para a coesão
do jogo, e quando os projetos são
estratégicos.
Desenvolvimento, através da
qualificação de fornecedores.
E9
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e
QA, para redução de custo
e quando o projeto não é
estratégico. Publicação e
Distribuição, para atingir
mercados externos.
Design, Criação,
Desenvolvimento, Teste e QA,
Publicação e Distribuição, pois a
empresa se orienta para a produção
e publicação de jogos para celular.
Desenvolvimento, através de
projetos de P&D com academia e
empresas de tecnologia*.
QUADRO 12 ESTRATÉGIAS ADOTADAS NA INDÚSTRIA.
* Não envolve cooperação com outras empresas da indústria de jogos.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
136
Assim, reforça-se a possibilidade de que há uma complexidade na codificação de
informação, o que dificultaria uma simples relação de mercado na produção de jogo. De fato,
Gereffi et al (2005) sugerem estratégias de internalização ou colaboração em situações onde a
transação e a codificação das informações são complexas. Essa mesma idéia é reforçada por E3:
(...) “o design do jogo para ser feito fora teria que ser muito colaborativo, então nesse
outsourcing as pessoas teriam que estar fisicamente presentes. A tendência é de ser (Design)
uma coisa viva no projeto...ele vai evoluindo ao longo do projeto. E na programação, poderia se
fazer fora em módulos, mas eu acho complicado porque exige um encaixe mais perfeito das
coisas” (E3, 2007).
Além da sinergia exigida na produção de jogos, há algumas evidências relacionadas à
incipiência da indústria, que justificam essa orientação para internalização. As empresas em geral
são pequenas e têm a participação ativa de sócios, com grande experiência nas atividades-chave.
Portanto, internalizar pode ser uma suposta forma de redução dos custos frente à qualidade do
resultado que se pode obter. Outra importante evidência é a escassez apontada por alguns
empresários de mão-de-obra qualificada, um recurso fundamental para a indústria. Nesse aspecto,
E8 diz que (...) “jogos se utilizam da mais alta tecnologia, por isso se utilizam dos profissionais
mais caros de TI e mais gabaritados no mercado. Podem até ser profissionais mais novos, mas
são os mais capazes” (E8, 2007). Quanto à escassez, E2 observa que (...) “uma limitação forte é
mão-de-obra especializada...a vantagem é que estamos juntos à Universidade, mas é
complicado. Mesmo quando colocamos um profissional especializado no projeto falta habilidade
para lidar com a história do jogo, milestone, deadline, esse é um dos principais empecilhos para
a empresa” (E2, 2007).
Com relação a essa situação, E3 garante que (...)se fossemos expandir a equipe de arte
ou programação, teríamos dificuldades em conseguir profissionais com experiência aqui no
Brasil. É um mercado específico, e experiência prática é realmente algo muito valorizado, mas
que quase ninguém tem” (E3, 2007). O empresário E5 sintetiza: (...) “justamente pelo fato de não
termos tradição, nós não temos profissionais tão qualificados dentro do país como nós teríamos
na Inglaterra, na Alemanha, França e EUA, que já trabalham com games há 20, 30 anos” (E5,
2007). Sendo vital a qualidade da mão-de-obra, sua escassez poderia contribuir ainda mais para
137
tornar um bom jogo um ativo complexo e raro de se obter, o que justificaria, segundo Geyskens
et al. (2006), uma estratégia de internalização, mesmo em pequenas empresas (JARILLO, 1993).
Assim, as empresas acabam por desenvolver seus talentos internamente, o que pode trazer
dificuldades como o tempo de maturação para se obter um bom profissional. Nesse aspecto,
exemplifica E3 (...) “não há muitas empresas de jogos fazendo coisas para ter uma grande
rotatividade de pessoas trabalhando para um lado e para outro. Tu pegas um artista e as vezes
tu tens que ensinar tudo. Ou tu pegas um programador, ele sabe programar diversas coisas,
como automação comercial, industrial, coisas comerciais. Sabe C (linguagem de programação),
sabe tudo, mas no final das contas ele nunca fez um jogo, que é uma coisa muito específica. No
passado o que mais deu certo foi começar com um estagiário, trainee, fazer meio que uma
escola. Na arte também aconteceu... a gente dá muito tema...coisas que a gente não vai usar
muito...durante alguns meses é mais para aperfeiçoar a pessoa, para chegar na hora do projeto
e estar prontinha. Já deu bons resultados, mas isso leva tempo e esse é o problema. Tem que
esperar um bom tempo para ter o retorno. Mas se a gente tem uma necessidade emergencial, tipo
se entrou um projeto agora, tem que entrar o dobro de programadores ou dobro de artistas, a
gente vai se ver em maus lençóis” (E3, 2007).
Um último aspecto com relação à internalização, baseada na incipiência da indústria, pode
estar relacionado à paixão dos empreendedores pelos jogos e ao pequeno mercado local,
orientando-os à produção completa dos mesmos. Há uma constância nas observações dos
empresários, como em E2: (...) “já tinha um plano de negócio e muita vontade de formar uma
empresa de games (E2, 2007). Afirma E6 que (...)foi muito por querermos entrar nessa área de
jogos. A gente gosta de ver, de criar o jogo...é para pessoas que curtem o que está atrás do jogo,
que cria o jogo, então foi da nossa mesmo, de tocar a cabeça nisso” (E6, 2007). Já E7 afirma
que (...) “basicamente meu negócio surgiu de um sonho pessoal meu de ter uma empresa na
indústria (de jogos)” (E7, 2007). Nesse sentido, afirma E8 (...) “iniciamos com cinco sócios
apaixonados por jogos” (E8, 2007).
Como destaca Grantham & Kaplinsky (2005), a indústria de jogos surgiu nos mercados
atualmente mais desenvolvidos de iniciativas amadoras e entusiásticas de seus idealistas. No
primeiro momento foi altamente internalizado devido ao pequeno tamanho do mercado (JOHNS,
2006), sofrendo uma posterior desverticalização com a evolução do mesmo, o aumento de
competição e a consequente especialização dos atores (WILLIAMS, 2002; GRANTHAM &
138
KAPLINSKY, 2005). Uma observação de E5 parece retratar bem essa diferença de estágio de
desenvolvimento. (...) “A cada ano a gente tenta aumentar nosso foco; e isso é uma coisa que a
gente enxergou inclusive no mercado internacional. A gente encontrou empresas que só faziam
cidades para jogos, é uma coisa bem específica. Nós fazemos jogos para PC, Console e Jogos
para propaganda que envolvem um outro know how e, além de games, você tem que mexer na
marca também” (E5, 2007).
A segunda observação que chama atenção, com relação às decisões estratégicas, diz
respeito à compra das atividades no mercado. Nesse caso, há uma forte constância na compra de
atividades de Criação, tais como artes gráficas e música. Outro ponto de possível observação é
que algumas empresas, em casos específicos apresentados a seguir, chegam a externalizar todas
as atividades produtivas.
No que se refere à atividade de Criação, que os empresários costumam chamar de arte,
observa-se em alguns depoimentos que esta é uma atividade mais acessível de se terceirizar. No
caso de E1 (...) “a questão artística é relativamente fácil de terceirizar. A questão é encontrar
um grupo adequado que consiga seguir nossos processos de produção de uma forma
satisfatória” (E1, 2007). Essa afirmação sugere que mesmo assim seria necessária uma boa
capacidade do fornecedor. Também E3 reforça ser a Criação uma atividade mais acessível para
terceirizar. (...) “O mais simples de se fazer outsourcing (terceirizar), em minha opinião, é arte,
que inclui visual, som, música. No desenvolvimento de um jogo que tenha 100 personagens, a
gente desenvolve 10 dos mais importantes e passa como referência para o outsourcing dos
outros 90” (E3, 2007). A Criação parece ter um nível de complexidade de codificação menor, ou
seja, tende a ser mais fácil de especificar e coordenar o projeto junto ao fornecedor (GEREFFI et
al., 2005), como complementa E3. (...) “Na arte, visualmente tu observas o que foi entregue, tu
consegues dizer na hora o que deve ser modificado, se funciona, se não funciona” (E3, 2007).
Os demais casos de terceirização, que não se restringem apenas à Criação, levam em
consideração basicamente três condições: a demanda, o custo e se o projeto é estratégico para a
empresa. Se as atividades tendem a representar demandas muito pontuais, que não justificam a
manutenção de equipe interna, a tendência é terceirizar, como especifica E4. (...) “Às vezes a
parte de ilustração, uma coisa mais específica, de interface, que não tem volume de trabalho,
não faz sentido a gente manter profissionais ociosos, a gente acaba indo no mercado para
contratar”. (E4, 2007) Complementa E7 que (...) “para conteúdos específicos, a gente gosta de
139
ter especialistas associados em determinados projetos. Se estamos desenvolvendo um Jogo Sério
sobre um determinado tema, a gente contrata uma pessoa que é especialista e vinculada ao
projeto específico, que não tem o porquê fazer parte da equipe permanente (E7, 2007).
Além de demandas pontuais, a terceirização também ocorre nos casos onde há excesso de
demanda. Em situações assim, começam a pesar questões de custos, mas também a própria
relevância estratégica do projeto. Como apontado por Child et al. (2005), quando os projetos
tendem a ter menor importância estratégica eles tendem a ser terceirizados. Questões de custos e
relevância estratégica, frente a grandes demandas, podem ser observadas em comentários como o
de E5: (...) “terceirizamos quando temos a capacidade da empresa já completa, e quando é uma
coisa até que não é estrategicamente interessante...tem o critério financeiro...se quem faz isso faz
mais barato e quem faz isso faz melhor, ou seja custo benefício” (E5, 2007).
Essa idéia também é reforçada por E8: (...) “projetos mais estratégicos ficam aqui dentro,
menos estratégicos, como 20 aplicativos-padrão, que a gente já sabe que são massificados, aí
podemos terceirizar partes ou o todo. Outro exemplo é o nosso parceiro de jogos de celular, que
tem um processo de porting de celular feito. Possivelmente pode custar para mim três a quatro
vezes mais fazer o porting do que custa para eles, que já criaram o pipeline (processo) de
porting. É mais fácil contratar eles do que perder meu cliente por causa do custo” (E8, 2007).
Em geral as decisões estratégicas mais comuns giram em torno da internalização completa
das atividades produtivas, ou da terceirização de demandas pontuais ou excedentes de menor
sofisticação, de menor importância e menor valor financeiro. Em resumo, as estratégias
dominantes não envolvem colaboração. Embora em um primeiro momento a teoria possa dar
suporte a algumas dessas decisões, é importante identificar alguns depoimentos que fornecem
parâmetros a respeito da maturidade gerencial e o nível de interação entre as empresas no Brasil.
Segundo Child et al. (2005) a clareza de foco e maturidade organizacional, quanto à composição
de sua cadeia de valor, são fundamentais para que a teoria de decisão estratégica se demonstre
consistente. A esse respeito se observa, conforme aponta Astley (1984), uma evidência que talvez
ilustre o pouco conhecimento em relação à cooperação, e a visão tradicional da competição
individualista descrita pelo autor.
Nesse aspecto, E4 destaca: (...) “há, pela própria situação de sobrevivência da indústria,
uma tendência natural de tentar se manter por si, justamente por aquela coisa do tipo: tem duas
pessoas nadando ali no alto mar e a tendência é cada uma correr atrás da sua bóia salva-vidas,
140
e se elas se juntam uma vai empurrar a outra para baixo e elas nem vão conseguir se ajudar
muito, porque ninguém tem a estrutura para se ajudar” (E4, 2007). Outro ponto com relação ao
foco organizacional vem de E8, quando comenta sobre as atividades produtivas da cadeia de
jogos eletrônicos. (...) “Acho que todos os elos são essenciais...para a gente é primordial. Tudo
isso tem estratégia, tem um ponto importante, então somos especialistas em tudo, tudo é
importante” (E8, 2007). Parece ser a estratégia colaborativa algo emergente, como se verifica em
E6. (...) “Infelizmente não tivemos relações desse tipo (cooperação). Acho que para ser bem
franco, a gente nunca pensou assim, essa nossa área para celular, de fazer projetos junto com
outras empresas (E6, 2006).
Um outro aspecto que pode ser mencionado, que é importante para estimular a
possibilidade de cooperação, está relacionado às oportunidades de interação entre as empresas
(DYER & NOBEOKA, 2000). A esse respeito têm-se alguns depoimentos com diferentes
posições, como o de E3. (...) “Não tem muita sinergia na indústria. A gente não recebe muitas
propostas, falo a nível de Brasil...empresas que vem aqui com idéias, propostas, são poucas...tem
mais gente que não é da área de jogos que vem aqui conversar. Talvez seja o isolamento da
nossa região, não sei” (E3, 2007). No mesmo sentido aponta E1 que (...) “em geral as empresas
não se mostraram interessadas em fazer negócios propriamente. Elas querem competir por conta
própria, do tipo “ó nós trabalhamos com esse orçamento bem reduzido”, daí a gente não topa
isso. Por exemplo, a gente não chegou a procurar desenvolver uma tecnologia em conjunto. Até
por que, para isso acontecer melhor, nós teríamos que encontrar mais empresas como o mesmo
nível de maturidade que a nossa empresa, e nós não encontramos” (E1, 2007).
Porém, há oportunidades segundo E6, embora não fiquem claras as relações de negócios
onde há colaboração. (...) “Todos associados se comunicam bastante, claro que tem uns que
falam, outros que falam menos, mas tem tido umas dez empresas que estão sempre passando
coisas. Ou passa dias ou fala “apareceu aqui uma metodologia nova”...a gente não tem esse
espírito para essa empresa, a gente não passa porque ela compete. Ainda tem tanta coisa a ser
feita...a gente ainda não tá nessa fase; então é um pool (conjunto) de empresas onde todo mundo
fala” (E6, 2006).
Embora o ambiente da indústria de jogos eletrônicos aparente não suportar com grande
força ações de cooperação entre as empresas, foi possível identificar alguns casos de estratégias
colaborativas. Três estratégias foram observadas: a) publicação e distribuição de jogos, ainda
141
incipiente; b) desenvolvimento conjunto de novos jogos; c) rede de fornecedores qualificados,
coordenados por uma empresa líder. Apesar de a empresa E9 ter destacado atividades de
cooperação em P&D, essas não envolvem outras empresas da indústria de jogos, portanto não
foram consideradas como estratégias colaborativas na indústria. As três estratégias observadas
são analisadas em maiores detalhes na próxima seção.
5.2.3 ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS IDENTIFICADAS
A primeira análise é realizada em torno da estratégia de publicação e distribuição junto à
E4, onde o empresário manifesta o interesse de desenvolver ações cooperativas junto a outras
empresas de jogos. Com a orientação de E4 para o seu portal de jogos, a empresa passou a
investir sua atenção na construção de uma audiência, a qual pudesse ser capitalizada com
produtos relacionados aos jogos eletrônicos.
Dentro dessa nova perspectiva, passa a ser importante a capacidade de constantemente
gerar conteúdo para o canal on-line. Assim, E4 observa como é interessante a realização de
parcerias com outros desenvolvedoras que possam agregar novos conteúdos. Na visão do
empresário essa estratégia traz benefícios para as empresas focadas no desenvolvimento, pois é
uma oportunidade de distribuição no mercado brasileiro. (...) É importante trazer as empresas
desenvolvedoras e fazer como que elas se preocupem com desenvolvimento, usando nossa rede
de publicação e distribuição. Isso ajudaria desenvolvedoras que normalmente não conseguiriam
ganhar dinheiro por si só, pela própria dificuldade do mercado. A gente espera fortalecer nossa
rede e ganhar mais dinheiro com isso” (E4, 2007).
Essa é uma nova estratégia, que E4 ainda não conseguiu colocar em prática, portanto os
resultados ainda não são palpáveis. Como antecedentes dessa estratégia colaborativa, identifica-
se motivações de ordem organizacional de necessidade (OLIVER, 1990; EBERS, 1997), em que
se percebe a dependência de recursos. O editor focado na parte comercial tem a dependência de
bons conteúdos para publicação, enquanto que a desenvolvedora busca canais para comercializar
suas criações.
142
Nesse aspecto, percebe-se para E4 que (...) “o que a gente imagina é que existem pessoas
talentosas no Brasil, ficando cada vez mais competentes e estão amadurecendo. Mas
comercialmente falando, muitas empresas não conseguem dar o passo, tipo, ela funciona bem
como um grupo de desenvolvimento, mas na hora de entrar no mercado elas não tem experiência
comercial, acham que tudo se restringe a fazer um bom jogo e sair ganhando dinheiro. Mas na
verdade, depois de fazer um bom jogo, é aí que começa o seu problema...então o que a gente
sente hoje é que a gente desenvolveu, por viver seguindo a lei do mercado desde o início da
empresa, esse lado comercial, então o que a gente talvez possa fazer é trazer essas empresas
para usarem nossa rede de publicação de distribuição e a nossa plataforma tecnológica já
desenvolvida (E4, 2007).
A forma de gestão inerente a esse trabalho cooperativo tende a constituir uma rede de
caracter mais vertical, na qual o publicador (E4) torna-se uma empresa líder (PROVAN &
KENIS, 2003), orientando as demais desenvolvedoras. O empresário de E4 acredita ser essa a
situação, pelo fato de ele conceber o modelo de negócios (...) “especificamente para as parcerias
com desenvolvedoras, a gente queria é realmente criar alguns modelos de negócios que
permitissem a participação de outras empresas. A gente acaba naturalmente por ter criado o
modelo de negócios tentando direcionar um pouco melhor a desenvolvedora(E4, 2007).
Além da forma da rede, observa-se que os mecanismos de interação baseados em sistemas
de informação (GRANDORI & SODA, 1995) são as principais formas imaginadas por E4, o que
viabiliza o trabalho cooperativo à distância com as desenvolvedoras. (...) “Há espaço dentro do
modelo que a gente gostaria de criar para trabalhar virtualmente, não existe a exigência de se
trabalhar fisicamente, afinal estão aí Skype (programa de mensagens instantâneas pela internet),
video conferência e outros meios para fazer essas coisas acontecerem no meio virtual (E4,
2007). Também, essa relação de cooperação tende a ser mais formal, ou seja, na forma de
contrato (MARCON & MOINET, 2001), em que se percebe a necessidade de se precaver e
mitigar relações de incertezas quanto ao negócio (GRANDORI & CACCIATORI, 2006).
Conforme E4, (...) “a grande questão, tudo que é falado sempre tem aquele espaço para certo
mal entendido. Já aconteceu algumas vezes, e se aquilo está escrito, não existe aquela dúvida,
então você minimiza a chance de criar um conflito no meio do caminho, mas caba perdendo mais
tempo na parte inicial para garantir que não surja nenhum tipo de conflito; que o fluxo seja
143
normal sempre. Uma vez que a parceria dê certo, é que as coisas vão acontecer naturalmente”
(E4, 2007).
Por fim, o que se observa em termos de possíveis resultados é a existência de
complementaridade de recursos, que permite às empresas estarem focadas em suas competências
centrais e atingirem o objetivo comum, que é a venda do jogo. Esses são benefícios de co-
especialidade (EBERS e JARILLO, 1998), através dos quais a empresa fornece a capacidade de
venda, e o parceiro desenvolvedor, o conteúdo.
Neste recente exemplo de estratégia colaborativa, pode-se resumir, com base no mapa de
orientação conceitual de redes (MARCON & MOINET, 2001), uma gestão de caracter mais
vertical e com nível de formalização maior, orientado ao contrato (FIGURA 27).
FIGURA 27 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE PUBLICAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Uma segunda estratégia colaborativa identificada envolve um número maior de empresas
entrevistadas e demonstra maior evolução com relação à primeira estratégia apresentada. Essa é a
estratégia colaborativa, baseada no desenvolvimento conjunto de produtos e serviços. As
empresas E2, E5 e E7 reportam trabalhar em conjunto com outras empresas de desenvolvimento
de jogos para a produção de novos títulos. E2 desenvolveu com parceiros seu primeiro jogo para
celular; E5, um jogo para PC; e E7 está executando um projeto conjunto para entrada no mercado
144
de consoles portáteis. São estratégias já executadas ou em execução, ao contrário da estratégia de
publicação, portanto oferecem um campo mais rico de percepções quanto às estratégias
colaborativas.
No que se refere aos antecedentes, é interessante observar um ponto comum nas
iniciativas de desenvolvimento conjunto das três empresas. Na necessidade de explorar um novo
mercado, cada empresa isoladamente não se considerava capaz de garantir recursos e assumir o
risco do projeto, unindo-se assim a um parceiro. Oliver (1990) destaca essa situação como
antecedentes de estabilidade e necessidade, em que se busca a cooperação como forma de
compartilhar riscos e garantir o fluxo de atividades necessárias à execução do projeto, mas
também como forma de complementar recursos e competências.
Nesse aspecto, E2, em busca do desenvolvimento de seu primeiro jogo para celular, cita:
(...) “esse foi o nosso primeiro projeto para celular...eu buscava redução de custos e faltava a
capacidade das competências para fazer o jogo dentro da empresa. Como minha base é
tecnológica...sempre falta capacidade artística. Então, sempre busco parcerias...nem me atrevo a
fazer arte inhouse (internamente). O projeto envolveu três parceiros (um escritor, um artista
gráfico e um estúdio de áudio). Então, realmente os três assumiram os riscos juntos...ninguém
me cobrou nada, não paguei nada, cada um desenvolveu sua parcela...um trabalho bem forte de
parceria” (E2, 2007).
Dentro dessa mesma linha, E5 ilustra relatando o que ocorreu quando preparava sua
entrada no mercado de jogos e planejava o seu primeiro projeto para PC. (...) “Era uma das
primeiras oportunidades que a gente teve de entrar no mercado de jogos. Tínhamos uma equipe
forte na área de programação, e estávamos iniciando a nossa equipe na área de arte. Essa
oportunidade iria explorar justamente a nossa área de programação, e a parte do nosso parceiro
seria desenvolvimento de arte. Nós aí teríamos um produto que nós não conseguiríamos fazer
sozinhos, e eles também estavam precisando de programação mais avançada, que nós tínhamos
para oferecer no momento” (E5, 2007).
Igualmente, E7 destaca as motivações para iniciar o desenvolvimento conjunto de um
jogo para explorar o segmento de consoles portáteis. Com domínio de Game Design, mas sem
capacidade para a programação avançada exigida por estes consoles, a empresa se aliou a um
parceiro de tecnologia para complementar sua competência mediana em desenvolvimento. É a
145
orientação estratégica mais adequada, complementando a carência em uma atividade relevante
(CHILD et al., 2005).
Assim, para E7 (...) “a motivação para trabalharmos com o parceiro é a
complementariedade de competências, então nós conhecemos bem as competências da nossa
empresa e reconhecemos a competência do nosso parceiro. E faz muito sentido a gente unir
forças. É muito mais fácil a gente vencer esse desafio inicial de lançar um jogo. A gente
desenvolve todo o jogo (Design e Criação) e eles desenvolvem a parte tecnológica
(Desenvolvimento), que é bastante importante ...o DS (plataforma) é de baixo nível
(programação complexa) e exige programadores dedicados para essa função...aí a gente tem
uma parceria mais clássica, divide os riscos e os lucros também” (E7, 2007).
Com relação à forma de gestão, identificam-se dois tipos de relacionamento entre os
parceiros que desenvolvem conjuntamente o jogo. No caso de E2, a empresa assumiu um papel
de empresa líder, coordenando uma rede de parceiros (PROVAN & KENIS, 2003). Nesse caso,
um artista, um estúdio de áudio e um escritor. Como destaca E2, (...) “tivemos uma relação
vertical, com nossa empresa mais no topo, e com os outros três parceiros subordinados a nós.
Por mais que existisse interação entre as 4 partes, sempre normalmente a decisão final era
nossa, de desenvolvimento. Coordenamos o projeto” (E2, 2007).
Já as formas das relações interorganizacionais estabelecidas por E5 e E7 seguem um
formato mais horizontal, de rede autocoordenada (PROVAN & KENIS, 2003). Nesse caso E5
destaca que (...) “nesse projeto foi bastante horizontal, porque toda a área de programação ficou
com a gente e toda a área de arte ficou com eles. Então, toda a mudança de arte era decidida lá
e poderia ter impacto na parte de programação. Quando houve impacto, nós conversávamos e
tomávamos uma decisão em conjunto. É a mesma coisa aqui, na área de programação” (E5,
2007).
Da mesma forma que E5, E7 também destaca uma relação horizontal. (...) “Nesse caso é
bastante horizontal, no ponto de vista da governança do projeto. A gente fica bastante
confortável de fazer dessa forma com nosso parceiro. No aspecto do produto em si, do projeto,
vai para certa verticalização conosco. Mas isso é natural, porque a gente ta entrando com a
parte do game design. Então a gente concebeu o produto e eles estão executando junto com a
gente” (E7, 2007).
146
Além do aspecto da forma da rede interorganizacional, observa-se os mecanismos de
coordenação utilizados. Predominam entre as empresas os mecanismos de seleção de parceiros,
de sistema de informação e de incentivos (GRANDORI & SODA, 1995). O primeiro diz respeito
aos critérios utilizados para a seleção do parceiro. Observa-se que aspectos como legitimidade e
alinhamento estratégico desempenham importante papel na seleção da empresas, como afirma
E2. (...) “Havia uma qualidade técnica do currículo dos parceiros. O escritor tinha escrito três
quatro livros, tinha uma competência na área de RPG...agregava valor ao produto quando ia
fazer um realease...teve o apoio de um escritor conhecido...o desenhista já havia ganhado vários
prêmios internacionais...então falar o nome do desenhista já agrega valor ao produto” (E2,
2007).
No caso de E5, (...) “nosso parceiro já possuía, nessa época, uma publicação no mercado
internacional; já possuía um jogo publicado internacionalmente. Então esse projeto, ele já
estava numa linha para ser publicado no mesmo país. Então essa foi uma motivação para a
gente, para eles também, de fazermos essa parceria e conseguirmos fazer esse produto” (E5,
2007). E para E7, (...) “nesse caso específico foi a proximidade, nesse caso a sinergia que nós
tínhamos com eles. A gente vê que eles têm uma visão de mercado bastante adequada, ou seja,
madura. Também acho que a sinergia e a proximidade, esses seriam os pontos mais fortes” (E7,
2007).
O segundo mecanismo utilizado pelas empresas é baseado em sistemas de informação. As
empresas se estruturam para trabalhar remotamente, portanto, nos três casos, é comum a
realização de reuniões virtuais e presenciais (especificamente no caso de E5) de periodicidade
semanal ou mensal, utilização de e-mails e mensagens instantâneas como ferramentas de
coordenação.
O terceiro mecanismo identificado está relacionado aos sistemas de incentivos. Como
mencionado por E5 e E7, o trabalho conjunto confere aos parceiros a possibilidade de ganhos
sobre os resultados. E2 oferece uma ilustração mais detalhada a respeito desse mecanismo. (...)
“A gente deixou bem claro principalmente as partes de revenue share (divisão das receitas de
venda), quando que os parceiros iriam receber, quanto e em que condições. Prazo também é
importante, se não há tipo sacanagem com o parceiro; tipo vocês vão receber por um ano...se o
prazo de lançamento do produto estoura, aí já passou um ano” (E2, 2007).
147
Observa-se que no caso de E2 há uma formalização das relações, com uso de contrato.
(...) “A gente fez um contrato. Registrei aqui no cartório, enviei duas cópias para cada parceiro,
registrada em cartório. Também eles mandaram uma cópia para mim” (E5, 2007). No caso de
E5, houve a assinatura de um termo de confidencialidade no início do projeto. Embora esse
projeto específico não tenha dado continuidade, os projetos conjuntos a seguir aumentaram a
formalidade, visto que havia compradores na outro ponto. Portanto a tendência é também de uma
relação mais formal. De forma similar, E7 iniciou o projeto com seu parceiro baseado em
confiança, mas acredita que, conforme o projeto evolua a ponto de manifestar potencial
econômico, os sistemas de incentivos tais como divisão de receitas e direitos de exploração
venham a ser formalizados em contrato.
Com relação aos resultados, observam-se diferentes ganhos para cada empresa. No caso
de E2, percebe-se ganhos de escala, ganhos coletivos de desenvolvimento conjunto de produtos e
ganhos de aprendizagem e melhoria de processo (DYER & SINGH, 1998; EBERS e JARILLO,
1998). A produção conjunta do jogo por parte de diversos profissionais permite carregar seu
trabalho a diferentes caminhos, ampliando a divulgação dos mesmos. Isso fica evidente na
passagem a seguir. (...) “Um divulga o trabalho do outro...quando o escritor ia nos canais
literários, ele podia divulgar o jogo, e divulgava a banda da música. No show, a banda de
música divulgava o jogo e divulgava o escritor. Eram formas complementares de divulgar um o
trabalho do outro” (E2, 2007). Há ganhos de desenvolvimento conjunto de produto: (...)
“conseguimos um produto bastante sólido; cada parte isoladamente não conseguiria fazer. Nós
fizemos um jogo de aventura tipo castlevania (um jogo famoso), bem consistente, com número
grande de fases, itens, cut scenes (vídeos) entre uma fase e outra. Ficou um produto bem
acabado graças à parceria” (E2, 2007).
também a experiência do trabalho conjunto permitiu à empresa aprender a melhor
estruturar seus processos de trabalho. (...) “A estrutura organizacional de aprendizagem, através
de tele-trabalho e desenvolvimento da tecnologia. A base do framework foi desenvolvida durante
esse jogo. Metade do desenvolvimento de nossa tecnologia saiu desse produto. Aprendemos um
monte de coisas sobre o que dá certo o que não dá; o que a gente deve fazer e o que não deve.
Dimensionar o projeto, entender um pouco mais o mercado mobile, também durante o
desenvolvimento desse produto(E2, 2007).
148
No caso de E5, é importante notar que o projeto conjunto acabou não sendo finalizado,
entretanto dois pontos importantes são percebidos. Um primeiro diz respeito à experiência
positiva do trabalho cooperativo, que construiu reputação, estimulou a reciprocidade e se
configurou como um antecedente para um novo projeto entre os parceiros, agora com
remuneração e não sob risco.
O segundo ponto é que os resultados se concentram em ganhos de aprendizagem (EBERS
e JARILLO, 1998). De acordo com E5, (...) “tivemos um ganho indireto com a parceria, que foi
o fato de nós iniciarmos parte de nossa área de jogos, que é essa nossa área de jogo para PC ;
foi iniciado nessa parceria. Então, alguns profissionais se capacitaram nessa época devido a
essa demanda, a esse projeto. Nós tínhamos uma tendência a estruturar nossa equipe de arte.
Uma vez que a gente viu esse tipo de trabalho, como uma boa empresa estava fazendo esse
trabalho, então foi mais fácil para a gente montar nossa equipe de arte. Esses resultados,
acredito, refletem até hoje...eles fazem parte do embrião da empresa” (E5, 2007).
Para E7 o projeto de desenvolvimento conjunto com seu parceiro ainda continua, mas o
empresário destaca sua experiência. Ele aponta ganhos como performance e flexibilidade
organizacional, e ganhos de co-especialidades (BRASS et al., 2004; EBERS e JARILLO, 1998).
Assim, o empresário afirma: (...) “basicamente a gente está conseguindo viabilizar
oportunidades que a gente não conseguiria normalmente. Então a gente tá conseguindo pular
etapas do nosso desenvolvimento de uma forma que é saudável. Através da cooperação a gente
consegue dar um passo um pouco maior do que as nossas pernas, porque a gente tem gente junto
que é complementar à gente. E a gente percebe é que hoje eu consigo responder algumas
demandas que se eu não tivesse uma aliança, eu teria primeiro que me estruturar, me
desenvolver, para depois poder atender essas oportunidades e, sem dúvida, eu já teria perdido
algumas” (E7, 2007).
Em resumo observa-se que o desenvolvimento conjunto de jogos é uma atividade comum
na produção de jogos independentes, de alto risco, como já observada (FIGURA 28). Não há uma
evidência clara quanto à forma de rede típica, mas os antecedentes são similares, focando-se em
elementos que diluam o risco da operação e viabilize a construção do jogo. Os mecanismos de
coordenação são consistentes e normalmente baseados em tecnologia da informação. Não há uma
clara orientação para a contratualização, pelo menos com os projetos em estágio inicial.
Entretanto, há evidências, com base nos depoimentos, de que o contrato tende a ser a norma a
149
partir do momento em que os projetos demonstram ter potencial econômico. Por fim, identifica-
se com consistência que essa estratégia colaborativa favorece a co-especialização e cria
oportunidades de aprendizagem.
FIGURA 28 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE DESENVOLVIMENTO CONJUNTO DE PRODUTO.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
O último tipo de estratégia colaborativa identificado diz respeito à rede de fornecedores
qualificados que presta serviços e normalmente é coordenada por uma empresa líder. Nesse tipo
de estratégia, a empresa coordenadora, ao contrário de uma simples relação de compra junto ao
fornecedor, engaja-se cooperativamente com os parceiros para constantemente aprimorar seus
produtos (GRANDORI & SODA, 1995). Foram identificadas estratégias colaborativas que
seguem essa forma nas empresas E3, E7 e E8. As redes elaboradas por essas empresas são
similares, representadas essencialmente por pequenas empresas ou profissionais autônomos,
engajados em atividades de criação artística e/ou programação de software dos jogos.
150
Com relação aos antecedentes, ao analisar as motivações das empresas para a formação de
suas redes, percebe-se quatro tipos: necessidade, reciprocidade, eficiência e legitimidade
(OLIVER, 1990; EBERS, 1997; LORENZONI & BADEN-FULLER). Com base em E7, nota-se
que a formação de um grupo externo de profissionais envolve os antecedentes de necessidade,
pela dependência de especialidades específicas; de reciprocidade, por confiar na rede social de
seus colaboradores como fonte para a montagem da equipe; e de eficiência, pela necessidade de
atenderem mais pedidos (escala) e reduzirem custos. Assim, E7 afirma: (...) “a gente recebeu
uma demanda cujo prazo era muito curto. Tinha três meses para desenvolver um projeto que
levaria no minimo seis...Começamos a montar uma equipe remota para desenvolver esse projeto
a partir dos colaboradores com que a gente já tem contato inclusive para trabalhar a
coordenação... Queríamos agregar muita qualidade ao projeto. Competências específicas de
especialistas, com um custo baixo, porque você está tratando aquela pessoa para cumprir aquela
necessidade, e não conseguiria justificar a permanência dela na equipe. E a possibilidade de
ganho de escala primeiro, para atender uma demanda mesmo com a equipe interna
sobrecarregada” (E7, 2007).
Em E3 observa-se essencialmente o antecedente de eficiência, com uma eminência de
reciprocidade. A empresa possuía know how interno de Criação, mas não como mão-de-obra em
quantidade suficiente para atender demandas sazonais. Assim, a empresa buscou uma estrutura
mais flexível para enfrentar essa limitação, porém com base em profissionais confiáveis. Como
diz E3, (...) “essa foi uma medida que a gente tomou depois daquilo que eu te falei, quando a
empresa começou a expandir, foi dar um passo a mais e teve problemas de sazonalidades
externas. Então a gente conseguiu uma forma de não ter que manter uma estrutura fixa (equipe
interna) para atender esses tipos de clientes, e a gente tá lucrando internamente com isso aí
também...utilizando essas pessoas para o desenvolvimento dos nossos próprios produtos, porque
se trata de uma rede confiável” (E3, 2007).
No caso de E8 observa-se novamente a busca por eficiência, ampliando a oferta de
soluções para o mercado através da qualificação de fornecedores. Mas também se observa uma
questão de legitimidade, já que E8 é vista como uma empresa experiente e capaz de gerar
oportunidade para os fornecedores. Afirma E8: (...) “nós queremos prover soluções mais
completas a nossos clientes, tendo parceiros específicos em cada área para desenvolver essas
soluções...Nós já temos estrada, temos experiência, aí a gente passa a experiência para eles
151
(fornecedores). Temos sido os catalisadores de boa parte dos negócios que têm caído para eles,
e queremos que o padrão de qualidade que a nossa empresa devolve para o mercado seja
mantido. Assim organizamos uma série de procedimentos de qualidade utilizados aqui dentro e
com eles também” (E8, 2007). Observa-se, dentre os quatro antecedentes, que a eficiência é a
razão mais comum para a estruturação de uma rede baseada em cooperação, onde o que se busca
é principalmente o aumento de escala.
Quanto à gestão, pode-se dizer que a forma da rede utilizada pelas três empresas segue
uma rede coordenada por uma empresa líder (PROVAN & KENIS, 2003). Como demonstrado
nos depoimentos, as empresas buscam uma forma de ampliar sua capacidade produtiva,
construindo uma rede de fornecedores qualificados, orientados por ela. Diversos mecanismos de
coordenação, conforme citados por Grandori & Soda (1995), foram identificados para a
coordenação deste trabalho cooperativo, tais como: a) comunicação, decisão e negociação; b)
sistemas de informação; c) sistemas de seleção; d) integração interunidade; e) sistemas de
controle e planejamento. Nas empresas E3 e E7 percebe-se, assim com nas outras estratégias
colaborativas, o uso de sistemas de informação como mecanismo de coordenação e também de
sistemas de controle e planejamento, buscando assim uma condução efetiva do trabalho, mesmo à
distância.
Entretanto, pelo número de membros a serem coordenados, esses mecanismos tendem a
ser combinados com sistemas de comunicação, decisão e negociação, na forma de reuniões
presenciais. Nesse aspecto, E3 destaca: (...)eles (os fornecedores) recebem internamente um
monte de procedimentos...todas as instruções de produção de arte têm um protocolo todo feito,
um trabalho bem minuncioso. O trabalho em geral é feito de forma totalmente remota, com
contatos via e-mail, Skype e, de vez em quando, o pessoal volta aqui para revisar os métodos”
(E3, 2007). Nesse sentido, garante E7: (...) “nossa forma de interação com nossos parceiros é, a
priori, 100% virtual, porque a gente não tem nem infraestrutura para essa equipe aqui. Como o
projeto é muito urgente, não tem margem de erro, a gente já teve que fazer uma série de
intervenções. Dá pau (erro de software), o artista não entende nada, ele ta perdendo tempo na
produção, vamos lá! Aí junta os três produtores, vai na cidade do cara. Então posso dizer que
trabalhamos de forma remota, mas às vezes a gente tem a necessidade de fazer alguma situação
de emergência, uma reunião esporádica (E7, 2007).
152
Outro mecanismo de coordenação identificado é o sistema de seleção, utilizado por E3
para preservar a qualidade de sua rede. Esse sistema, segundo E3, permite aprimorar o fluxo de
trabalho através da identificação das competências de cada membro. (...) “Tem outra coisa
interessante, a gente tem uma espécie de ingresso neste grupo que é: a gente seleciona. O
pessoal manda currículo e portfólio. Aí, quando a gente vê que é bom, quem tem potencial, a
gente faz testes com a pessoa. Quando tá tudo ok a gente estabelece a parceria. A gente vê:
Quanto tempo tu demoras para fazer isso? Tanto. A gente também começa a descobrir quais são
as qualificações de cada um para cada coisa...esse cara é bom nisso, esse cara é bom
naquilo...quando chega aqui um pedido...e até um pedido nosso, a gente sabe para quem
mandar” (E3, 2007).
E como último mecanismo está a integração interunidade. Segundo Grandori & Soda
(1995) esse mecanismo se manifesta quando profissionais de diferentes organizações
intercambiam papéis, ou seja, um gerente de uma organização pode controlar o desenvolvimento
de projeto de outra organização. A proximidade e troca de experiência em um trabalho
intensamente colaborativo constitui uma das características que diferencia uma estratégia
colaborativa de uma relação típica de contratação. Dentro dessa perspectiva, afirma E8 que (...)
“a gente tem um projeto conjunto com nosso parceiro, e eles têm um projeto lá no estúdio deles.
Mas tem um gerente de projetos deles que está aqui dentro, na nossa empresa, trabalhando ao
lado do nosso gerente. Assim ele tem oportunidade de aprender os processos por osmose e
guiado. E aí, no próximo projeto que for igual, ele já sabe o padrão, já sabe como deve ser” (E8,
2007). Nesse sentido, E7 relata: (...) “nesse nosso projeto a gente entrou só com Game Design e
Produção. Então quando a gente montou a equipe remota para desenvolver o projeto entre a
gente, inclusive trouxe pessoas para fazer a produção disso, para controlar os colaboradores
que estão trabalhando de forma descentralizada. E hoje a gente tem 30 pessoas, que é o dobro
do que temos na equipe interna. Então é um projeto que, pelo volume de trabalho envolvido, a
gente teve que ter 30 pessoas envolvidas para conseguir entregar” (E7, 2007).
Observa-se que nesse tipo de estratégia colaborativa há a tendência de formalização das
relações entre parceiros, ou seja, o uso de contrato (MARCON & MOINET, 2001). Exemplos
elucidativos vêm de E3 e E8. O primeiro destaca (...) “a confidencialidade entre nossa empresa e
esses parceiros é forte para manter a garantia e a confiança nesse serviço aqui. Eles não estão
aqui dentro da empresa, mas estão sob acordos de confidencialidade, e isso é importante. Todos
153
têm contratos assinados detalhadamente (E3, 2007). No caso de E7, (...) “usamos contrato por
profissionalismo, a gente tem que ter um controle, uma formalidade. A gente tem que agir assim
para que o projeto tenha um prazo agressivo, um compromisso oficial, formal. No contrato
abordamos questões de sigilo e toda parte de cessão de direitos autorais” (E7, 2007).
No que se refere aos resultados atingidos por E3, E7 e E8, observa-se ganhos de escala,
maior flexibilidade, performance, aprendizagem e melhorias de processos. A rede de artistas e
especialistas para fornecimento de serviços concebidos por E7 é formada por contatos confiáveis,
incluindo ex-funcionários das empresas. Essa rede possibilitou à empresa lidar com o não-
determinismo ambiental (ASTLEY, 1984), ou seja, o atendimento de demandas inconstantes e
sazonais, atingindo maior escala e flexibilidade (BRASS ET al., 2004; EBERS e JARILLO,
1998). (...) “A gente recebeu uma demanda de um cliente; e é um projeto que deveria ser
entregue muito rápido, e o prazo dele era muito curto. Teremos três meses para um projeto que
levaria no mínimo seis, e nossa equipe já estava totalmente alocada. O que a gente fez foi montar
uma equipe remota para esse projeto, com colaboradores com quem a gente tem contato,
inclusive trazendo as pessoas para fazer a produção disso, para controlar os colaboradores.
Essa equipe tem 30 pessoas, que é o dobro do que temos na equipe interna. Só entramos com
Game Design e Produção” (E7, 2007).
Nota-se também o aprendizado mútuo, que leva a empresa E3 a suportar melhor o
processo de desenvolvimento de novos produtos e a redução de incertezas (BRASS et al., 2004;
EBERS e JARILLO, 1998). (...)Internamente a equipe recebe um monte de procedimentos e
orientações. Para todas as instruções tem-se um protocolo, um trabalho bem minucioso aqui,
que as pessoas fazem, nos retornam, e a gente faz outras interações de vai e volta com elas.
Depois, manda o pacote com tudo lá para fora (cliente no exterior). O interessante é que a gente
foi obrigada a trabalhar os processos, escrever os processos e determinar tudo e organizar tudo,
coisa que a gente não fazia internamente. E passamos a usar internamente nos nossos projetos.
Os orçamentos dos projetos ficaram mais estáveis também. Uma pessoa trabalhando
internamente pode dizer que vai levar uma semana e acaba levando duas; e tu pagas a diferença.
No outro caso, a gente trabalha com um valor definido em contrato. A tendência é de levar
menos tempo para já pegar o próximo projeto” (E3, 2007).
Flexibilidade, performance e escala são pontos reforçados por E7. (...) “Acho que o ganho
vem mais de você perceber que você consegue ter essa escala, você consegue atender esse tipo
154
de demanda. Então tá sendo muito gratificante para mim ter que atender uma demanda de um
cliente que, a princípio, era totalmente inviável” (E7, 2007). Esses pontos também são abordados
por E8: (...) “a gente vê como ganho o fortalecimento da indústria, a possibilidade de
sobrevivência para essas pequenas empresas. A ge nte precisa se ajudar para construir a indústria,
senão, se você se propor a fazer tudo, você vai ter um alto custo e vai se estrangular no futuro.
Assim, com uma análise de antecedentes, gestão e resultados pode-se resumir a estratégia
colaborativa de redes de fornecedores qualificados na figura abaixo (FIGURA 29).
FIGURA 29 ESTRATÉGIA COLABORATIVA DE REDE DE FORNECEDORES QUALIFICADOS.
Fonte: elaborado pelo próprio autor.
Em geral observa-se que uma rede de fornecedores tende a ser uma alternativa para as
empresas enfrentarem a volatilidade do ambiente típico de tecnologia e inovação da indústria de
jogos. Dessa forma se busca melhorar a performance da organização, sem necessariamente onerar
sua estrutura, buscando parceiros externos confiáveis. A organização da rede é tipicamente
vertical e formalizada, e os ganhos coletivos trazem, além de benefícios relacionados à
155
performance organizacional, também grandes oportunidades de aprendizagem, contribuindo para
um maior desempenho competitivo.
Apesar de a análise dos resultados da pesquisa identificar estratégias predominantemente
competitivas na forma de governança hierarquia ou de mercado das atividades, foi possível
perceber o espaço para a emergência de algumas estratégias colaborativas. A incipiência da
indústria e as desestruturações do cenário sócio-econômico do Brasil colocam as empresas frente
a grandes desafios para crescerem, portanto é relevante, a partir desse aprendizado, identificar
possíveis implicações para o desenvolvimento do setor. As considerações finais a respeitos deste
estudo, incluindo as implicações e contribuições relacionadas, são assuntos do próximo capítulo.
156
6 IMPLICAÇÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo geral desta pesquisa foi o de compreender a estrutura da indústria brasileira de
jogos eletrônicos e identificar oportunidades de estratégias colaborativas, entre as empresas
desenvolvedoras de jogos, que possam contribuir para o aumento da competitividade do setor. Os
dados emp íricos revelam uma indústria em fase embrionária, com empresas de pequeno porte que
enfrentam um mercado com problemas de pirataria, contando ainda com pouca experiência,
inclusive gerencial, observando poucos modelos de negócios viáveis no mercado doméstico, e
sofrendo com a escassez de opções de financiamento, importantes para um negócio caracterizado
pela inovação e criatividade.
Entretanto, mesmo com essas barreiras, o estudo revela indicadores favoráveis como o
crescimento de faturamento da maioria das empresas, a inserção internacional, o
desenvolvimento de jogos para a maioria das principais plataformas e aplicações. Em decorrência
de um mercado pouco desenvolvido, as empresas tendem também a internalizar a produção
completa dos jogos, o que prioriza ações puramente competitivas em detrimento de possíveis
arranjos cooperativos, que poderiam suprir carências e ampliar oportunidades de negócios para os
parceiros. Entretanto, nota-se o desenvolvimento de três estratégias colaborativas que
demonstram trazer maior competitividade às empresas. Nas seções seguintes, essas descobertas
são discutidas, visando destacar os objetivos específicos e as contribuições da pesquisa.
6.1 QUANTO À CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA
Através do trabalho conjunto com a ABRAGAMES foi possível ter acesso a informações
sobre 22 das 26 empresas associadas. São empresas localizadas em quatro das cinco regiões
brasileiras, com significante inserção internacional, atendendo os principais mercados mundiais
de jogos. Essas empresas atendem às principais plataformas e aplicações de jogos. São também
digiridas por profissionais com qualificação tecnológica e grande interesse pelos jogos. Assim,
pode-se dizer que o universo de desenvolvedoras identificado nesta pesquisa reflete os principais
157
empreendimentos de desenvolvimento de jogos na indústria nacional. Tais empreendimentos
representam ainda micro ou pequenas empresas, em fase de consolidação, mas com indicadores
positivos de crescimento em faturamento e emergentes na participação internacional.
Foi possível identificar na indústria brasileira todas as atividades da cadeia de valor dos
jogos, mesmo que de forma pontual, a partir das empresas pesquisadas. Atualmente a indústria
nacional não conta com a presença dos fabricantes de consoles, que governam o maior segmento
de jogos no mundo, mas o tamanho da economia do país torna possível a existência de segmentos
alternativos visando clientes corporativos como jogos para propaganda e jogos sérios. Dessa
forma, a grande maioria das empresas acaba por concentrar suas atividades de produção de jogos
em serviços prestados para agências de publicidade ou empresas que procuram jogos sérios. Nos
casos onde são possíveis os jogos para entretenimento, estes são negociados junto às operadoras
telefônicas ou vendidos de forma on-line. Em resumo, os empreendimentos dependentes do
mercado doméstico fazem o que é possível em um cenário caracterizado pela forte pirataria.
Com relação às estratégias de governança, em geral as empresas internalizam as
atividades essenciais para a produção do jogo completo, que incluem Design, Criação e
Desenvolvimento. Segundo as evidências coletadas, internalizar todas as atividades, da produção
à venda, é uma exceção, e apenas uma empresa o faz assim. É pertinente destacar o fato de as
empresas acusarem alta competência e alta importância estratégica para todas as atividades de
produção dos jogos. Considerando esses indicadores, a Matriz CPC (CHILD et al., 2005) tende a
apontar a produção interna como melhor caminho, entretanto essa decisão deve ser vista com
cautela. A maioria das empresas não se encontra conectada aos segmentos mais sofisticados de
jogos, concentrando-se em produções mais modestas para o mercado brasileiro, e em geral são
pequenas para abraçarem a produção completa de projetos mais complexos. São poucos os casos
das empresas com orientação predominantemente internacional, pois em geral elas obtêm a maior
parte de suas receitas no mercado doméstico, o que pode justificar o fato de seus parâmetros
serem avaliados quanto à realidade nacional.
Enquanto aparentemente viável para a realidade brasileira, de produções menos
complexas e baratas, a internalização de todas as atividades de produção dos jogos parece ir em
direção contrária à tendência da indústria global que é de crescente foco e especialização. As
evidências empíricas revelaram de forma esporádica estratégias de mercado, concentradas nas
158
atividades de criação pois são consideradas pelos empresários como mais fáceis de controlar e
coordenar externamente.
Outro ponto relevante diz respeito aos atores mais influentes na cadeia de valor dos jogos
no Brasil. Ao contrário do mercado internacional, onde fabricantes de consoles e editores digitais
normalmente governam da cadeia de valor dos jogos, no Brasil essa realidade é um tanto distinta.
Primeiro, como apontado por SOFTEX (2005) e reforçado nas entrevistas, não há representação
dos consoles no país, e mesmo os editores digitais praticamente distribuem somente produções
internacionais de sucesso. Assim, com a incipiência do mercado, e inviabilidade de distribuição
dos jogos nacionais, as empresas tendem a recorrer a atores comerciais posicionados em
mercados adjacentes, como operadoras telefônicas e agências de publicidades, que intermediam o
acesso a milhares de consumidores e à verba de marketing das corporações.
Identifica-se nas entrevistas a baixa percepção de valor quanto às atividades de produção
dos jogos por parte desses atores, o que faz com que os mesmos em ofereçam termos de negócios
pouco lucrativos, mas que acabam sendo aceitos pelas empresas para se viabilizar sua
sobrevivência no país. Nota-se, então, que no cenário nacional, as operadoras telefônicas e as
agências de publicidade podem ser considerados relevantes influentes na cadeia de valor dos
jogos, tendo em vista o fato de serem as alternativas, em meio à inviabilidade de outros modelos
de comercialização, para se vender jogos.
No geral, como comentado nas entrevistas, a indústria de jogos é incipiente e retrata um
cenário composto por várias empresas pequenas tentando sobreviver e caminhar por si só.
Embora na cadeia de valor haja a presença de operadoras telefônicas e agências de publicidade,
elas não são empresas pertencentes à cadeia de valor tradicional dos jogos. Naturalmente essas
empresas não empregam investimentos estratégicos na indústria brasileira a ponto de permití-la
evoluir dentro dos mesmos patamares da indústria internacional de jogos. Adicionalmente, as
entrevistas denunciam a falta de reconhecimento governamental frente às carências da indústria,
principalmente no que diz respeito à tributação imposta à importação dos consoles, o que
inviabiliza o comércio dos mesmos no país, e a pirataria. Tal situação desencoraja mais ainda a
vinda dos fabricantes de console, que poderiam manufaturar os equipamentos no mercado
doméstico e provocar um maior adensamento da indústria local em termos de produções e
distribuição, criando alternativas comerciais para as desenvolvedoras frente àquelas atualmente
disponíveis.
159
Entretanto, há a consciência da necessidade de se estabelecer meios mais eficientes para
se coordenar o desenvolvimento da indústria. Em vista disso surgiu, em 2004, a ABRAGAMES,
que desde então vem trabalhando para potencializar a sinergia entre as empresas e em conjunto
construir legitimidade para uma melhor articulação junto a outros atores importantes.
6.2 QUANTO À PARTICIPAÇÃO INTERNACIONAL DAS EMPRESAS
As empresas geram a maior parte de seu faturamento do mercado doméstico, porém
percebe-se um nível significativo de internacionalização das desenvolvedoras de jogos do Brasil.
A maioria das empresas brasileiras oferece serviços no exterior, contemplando todos os sete elos
analisados na cadeia de valor e atingindo os maiores mercados mundiais como EUA, Reino
Unido, Alemanha e França. Entretanto, nota-se uma forte inclinação para exportação de partes
dos jogos, especialmente programação de software. Percebe-se que as empresas que detém a
maior parte do faturamento do mercado internacional estão geralmente concentradas em
atividades de portagem (programação de um jogo para outra plataforma) e testes. Partindo desses
dados, nota-se que a maioria das exportações está relacionada à prestação de serviços para outras
empresas de desenvolvimento no exterior (outsourcing), ou seja, as empresas brasileiras tendem a
se posicionar como opção de menor custo para atividades menos estratégicas.
Pode-se interpretar também que, embora as empresas de jogos internacionalizem, elas em
geral não conseguem gerar resultados econômicos em cima da exploração de capital intelectual,
especialmente no que se refere às criações e marcas próprias. Como já identificado, produção
independente e construção de propriedade intelectual são estratégias altamente arriscadas para a
realidade brasileira, experimentadas e executadas por poucas desenvolvedoras. Outro fator
relevante a ser considerado é que poucas empresas atendem o segmento de consoles, em que há
maior demanda por novos produtos.
Mesmo com uma realidade não “ideal” no mercado internacional, é evidente a
constatação de uma maior demanda por projetos de jogos, maior percepção de valor à produção
dos mesmos, e possibilidade de a empresa se envolver em projetos mais sofisticados. Quando se
compara o perfil dessas empresas às demais, orientadas ao mercado nacional, percebe-se
160
diferenças bastante elucidativas: em vez de uma orientação a jogos para propaganda e jogos
sérios, produtos para empresas sem risco de pirataria, as empresas mais internacionalizadas se
conectam a produções de jogos de entretenimento para celular e consoles, demandados por
desenvolvedoras e reconhecidos editores digitais. Em geral são serviços de programação,
portagem ou testes de software, com menor proporção de criação artística. Quando não há
demanda por parte de uma empresa no exterior, as empresas orientadas ao mercado externo
focam-se no desenvolvimento de propriedade intelectual e criam seus próprios jogos para celular,
computador pessoal e até console portátil. Embora esse indicador traga perspectivas positivas, ele
é excepcional; representado por apenas algumas empresas entre as quais poucas atingiram algum
sucesso econômico a partir dessas iniciativas.
Resumindo, identifica-se que as empresas com bom nível de internacionalização possuem
não somente melhores condições de enfrentar problemas tais como a pirataria, mas também de
estarem focadas no entretenimento e desenvolverem projetos mais sofisticados. Entretanto,
conforme já apontado, as informações obtidas na pesquisa sugerem ser difícil produzir jogos
completos dentro de modelos pragmaticamente viáveis, o que faz com que, em geral, os clientes
estrangeiros ofereçam partes dos jogos. Dentro desse raciocínio, percebe-se o contraste em
relação à estratégia de governança da maioria das empresas que priorizam a internalização de
todas as etapas de produção dos jogos. Reforça-se a percepção de que esta posição seja
dominante em decorrência de uma postura tipicamente orientada ao mercado interno, onde as
oportunidades são mais específicas e a escassez de recursos é maior.
6.3 QUANTO ÀS ESTRATÉGIAS COLABORATIVAS
As estratégias colaborativas encontradas foram pontuais, mas ao mesmo tempo
elucidativas quanto à possibilidade de as empresas da indústria de jogos atingirem maior
competitividade através de ações coletivas. Observa-se que o esquema conceitual elaborado a
partir do referencial teórico de gestão de redes e relações interorganizacionais mostrou-se um
importante orientador na compreensão dos antecedentes, da gestão e dos resultados alcançados
através das estratégias colaborativas.
161
A primeira estratégia diz respeito à publicação e distribuição de jogos on-line. A empresa
que realiza a comercialização do conteúdo apóia desenvolvedoras com tecnologia para a
construção de novos jogos. Essa estratégia está sendo aplicada em caráter inicial por apenas uma
empresa. É uma parceria que ocorre pela necessidade (OLIVER, 1990; EBERS, 1997) do
conteúdo, de um lado, e do canal de comercialização para colocação do jogo no mercado, de um
outro lado. Como conseqüência, ambas as empresas se aprimoram em suas competências
específicas, tendo ganhos de co-especialização (EBERS & JARILLO, 1998).
A segunda estratégia envolve o desenvolvimento conjunto de produtos, adotada por três
empresas. Há uma percepção interessante aqui, pois todos os casos envolvem a criação de jogos
independentes. Como já mencionado, a produção de jogos próprios, não atrelados à propriedade
intelectual já estabelecida, é uma atividade em que as chances de sucesso são muito baixas, o que
naturalmente faz com que parceiros se unam para garantir recursos e compartilhar seus riscos
(OLIVER, 1990). Nenhuma dessas ações coletivas ainda redundou em resultados econômicos,
porém as evidências empíricas revelam benefícios obtidos pelas empresas, que contribuem para o
aumento de sua competitividade. Compartilhando os riscos, as empresas puderam conceber novos
jogos, adquirir experiência, construir seu portfólio e aprimorar seus processos de produção
(BRASS et al., 2004; EBERS & JARILLO, 1998). Dois resultados aqui são de especial nota: um
dos projetos redundou em um jogo para celular que está sendo negociado para distribuição. Os
parceiros envolvidos conjugavam competências de Design, Criação e Desenvolvimento. O outro
caso ilustra a parceria entre duas empresas, somando competências de Design e
Desenvolvimento, para entrada no nicho de consoles portáteis. Esses são indicadores
embrionários mas positivos quanto à possibilidade de as empresas experimentarem com maior
intensidade a criação conjunta de jogos. É uma forma potencialmente mais rápida de se entrar em
novos nichos e dividir a complexidade dos requerimentos mais rigorosos dos mercados mais
sofisticados.
A terceira estratégia envolve a rede de qualificação de fornecedores. Observa-se que essa
abordagem conta com empresas mais estabelecidas que, com demandas sazonais de projetos,
acabam tendo que recorrer a outras empresas para atender seus clientes. Em geral as empresas
recorrem à colaboração com outros parceiros para manter a qualidade de seus serviços e otimizar
sua equipe interna, ou seja, eficiência (OLIVER, 1990). Entretanto, há um papel bastante
relevante da reciprocidade nesse processo. Em todas as três empresas que adotaram essa
162
estratégia esteve presente o histórico anterior positivo com os parceiros que fazem parte da rede.
Os resultados revelam que as empresas conseguem atingir maior escala, atendendo a um número
maior de pedidos sem necessariamente aumentar seus custos com pessoal interno. Além disso,
difundem aprendizado, melhoram processos e constroem uma estrutura organizacional mais
flexível (BRASS ET al., 2004; EBERS & JARILLO, 1998).
Em todas as estratégias colaborativas, o nível de formalização da rede é
predominantemente o contrato. Como destacado por Grandori & Soda (1995) e Grandori &
Cacciatori (2006), esse é o caso típico de empresas voltadas a atividades intensivas em
conhecimento e orientadas à inovação, visto o risco de oportunismo, potenciais conflitos e
imprevisibilidade dos resultados, fatores também suscitados nas entrevistas.
Outro ponto que chama a atenção, e que corrobora a teoria, diz respeito ao nível de
hierarquia da rede constituída pelas empresas em suas estratégias colaborativas, bastante
correlacionado com o nível de interdependência dos parceiros (GRANDORI & SODA, 1995). As
parcerias horizontais que envolvem empresas (e não empresas com profissionais autônomos)
estão associadas a projetos que exploram novas oportunidades, como um novo jogo independente
ou um novo nicho/plataforma de jogos. Nessa situação, todos os parceiros encontram-se em
condições equivalentes de carência, dependendo fortemente uns dos outros. Já em projetos em
que uma empresa é mais estabelecida e conta com relacionamento com vários clientes, a
tendência é de uma estrutura de rede vertical, preservando seu contato comercial. Assim verifica-
se que a hierarquia é positivamente relacionada com o nível de diferença em termos de recursos e
maturidade dos parceiros.
Os sistemas de informação são dominantes nos mecanismos de coordenação. Na indústria
de jogos as ferramentas de comunicação, via internet, são a norma, o que facilita sobremaneira o
trabalho remoto. Entretanto, deve-se ressaltar um mecanismo bastante rico utilizado por uma das
empresas, referido por Grandori & Soda (1995) como sistema interunidade. Nesse mecanismo,
um gerente de uma empresa trabalha coordenando projetos dentro de outra empresa, aprendendo
de forma explícita, mas também tácita, os processos de produção. Nota-se que no único caso
onde isso aconteceu havia proximidade física entre as empresas, localizadas em um parque
tecnológico. Isso pode sugerir que a proximidade física entre empresas encoraje o trabalho
conjunto e a disseminação de conhecimento. Autores como Dyer & Nobeoka (2000) demonstram
que ambientes que favorecem a aproximação entre empresas tendem a estimular trocas formais e
163
também informais que promovem maior interação entre as mesmas, contribuindo de forma mais
eficiente para os processos de inovação.
6.4 QUANTO ÀS CONTRIBUIÇÕES E IMPLICAÇÕES DA PESQUISA
Esta pesquisa permitiu a análise da indústria brasileira de jogos eletrônicos, a partir da
perspectiva estratégica beaseadas nas teorias das redes e relações interorganizacionais. Sendo a
estratégia rede um terceiro modelo de governança que demonstrar maior eficácia em ambientes
dinâmicos, intensos em informação em redes alternativa, chamada estratégia-rede, aqui
referenciada como estratégias colaborativas.
Conforme as evidências empíricas demonstram, a indústria de jogos eletrônicos no Brasil
ainda se encontra em sua infância. Isso não é devido apenas ao pouco tempo de existência das
empresas de jogos, mas também às barreiras características da realidade sócio-econômica do país,
tais como a pirataria e a baixa renda da população. Ademais, segundo identificado nas
entrevistas, o não reconhecimento por parte do governo da indústria de jogos faz com que a
pirataria e a realidade tributária do país sejam nefastas aos interesses da indústria, em especial no
que diz respeito ao maior segmento de jogos: os consoles.
Uma primeira medida, já manifestada pelos empresários, seria a adequação tributária para
a importação dos consoles e jogos relacionados, tornando os preços dos mesmos mais acessíveis
à população brasileira. Uma conseqüência dessa medida seria o maior adensamento tecnológico
do consumidor, aumentando a escala de vendas para os jogos e assim podendo encorajar
iniciativas de desenvolvedoras locais. Entretanto, mesmo com essa possibilidade, o segmento de
consoles tende a ser dependente de altas vendagens de jogos, uma realidade talvez impossível no
Brasil, pelo menos a curto prazo. O grande desafio está associado à prática da pirataria,
amplamente difundida no país. Esse problema, segundo os empresários, não tem sido tratado pelo
governo com rigor. Assim fica difícil esperar que o cenário atual, onde predomina a fácil
aquisição do software ilegal, venha a se modificar com rapidez. Uma alternativa para esse
problema no console seria a comercialização on-line de jogos, tecnologia já disponível nos
videogames. Entretanto as expectativas são de que valores significativos com jogo on-line em
164
consoles sejam alcançados apenas na próxima década; e isso nos países onde a indústria já é mais
desenvolvida.
Percebendo as possíveis limitações dos consoles no Brasil, torna-se relevante também
observar a importância das plataformas abertas. Nesse caso é fundamental destacar a aplicação do
jogo. Conforme os dados demonstram, grande parte das empresas atua com jogos para
propaganda ou jogos sérios, algumas outras com jogos para celular. A questão em torno dessa
orientação é que a indústria tende a se conectar a uma cadeia de valor governada essencialmente
por atores que não têm em sua agenda prioritária a promoção da indústria de jogos, o que pode
afetar a velocidade de crescimento da indústria nacional. Dessa forma, uma opção estratégica
para que a indústria desenvolva entretenimento no cenário nacional parece ser os jogos on-line.
Uma primeira razão diz respeito à expectativa das altas taxas de crescimento desse segmento,
aliado à difusão dos computadores e da internet de banda larga no mundo e no Brasil. A segunda
é a grande possibilidade de controle da pirataria através de mecanismos de assinatura,
publicidade ou venda on-line, que já geram excelentes resultados em países como a China. A
terceira é a característica multiplataforma dos jogos on-line, permitindo às empresas oferecerem
jogos através de diversos meios, tais como computadores, videogames ou TV Digital.
Enquanto é importante preparar a indústria nacional para um futuro que aponta para os
jogos e meios de distribuição on-line, não se pode ignorar os modelos de negócios mais sólidos e
que movimentam os maiores volumes na indústria internacional. A conjuntura brasileira pode não
ser adequada para suportá-lo, mas é no varejo físico de países como EUA, Japão, Reino Unido,
Alemanha e França que as mídias de jogos somam bilhões de dólares em vendas. Assim outra
medida para a indústria é a de se conectar a esse fluxo de valor, seja através dos elos produtivos
ou dos elos comerciais.
Já se observa, conforme resultados da pesquisa, a maior parte das empresas pesquisadas
vem oferecendo serviços, principalmente de desenvolvimento de software para clientes no
exterior, que são normalmente desenvolvedoras ou editores digitais que terceirizam partes do
jogo. Em um primeiro momento, verifica-se ser pouco provável para empresas brasileiras se
estabelecerem no mercado internacional, em um primeiro momento, por meio de criações
próprias, visto o alto nível de risco de um jogo independente e a competição com licenças
famosas no mercado. Em geral as empresas pesquisadas que possuem ênfase maior no mercado
internacional são subsidiárias de grupos estrangeiros e focadas na plataforma celular, estando,
165
portanto, legitimadas a contar com maiores demandas de projetos. As empresas que não possuem
essa realidade estão começando a internacionalizar ou construíram reputação através de anos de
experiência, permitindo uma conexão permanente a demandas de projetos no exterior. Para essas
empresas surgem barreiras como qualificação para abraçar projetos mais sofisticados e custo
Brasil (dólar, mão-de-obra), que dificulta a competição com concorrentes do leste asiático, como
China, por exemplo.
uma tendência crescente de externalização dos custos de desenvolvimentos das
indústrias mais ricas em atividades tais programação de software e produção artística (SCREEN
DIGEST, 2006). Em um primeiro momento, países do leste europeu e asiático têm se beneficiado
dessas demandas em detrimento de capacitação aceitável e baixos custos. Porém, o Brasil pode
vir a se beneficiar da evolução desse fenômeno, à medida que a sofisticação das demandas de
outsourcing provoque a redução de fornecedores qualificados e, por conseguinte, o aumento dos
preços, encorajando compradores a olharem para pólos alternativos.
Nesse aspecto, torna-se necessário ressaltar a necessidade de forte qualificação das
empresas para competirem nesse mercado. Conforme aponta este estudo, o estágio atual da
indústria caracteriza empresas com alto nível de internalização das atividades produtivas, o que
faz com que estratégias colaborativas tenham pouco espaço no mercado. Segundo Child et al.
(2005) a cooperação entre empresas com características complementares pode auxiliar as mesmas
a desenvolverem foco e aumentarem sua competitividade. Em um primeiro momento, a
preparação da indústria brasileira para atender projetos sofisticados parece estar muito mais
próxima da viabilidade a partir da estruturação de arranjos cooperativos, do que com ação
individual de empresas ainda buscando consolidação.
Por fim, considerando a abordagem das estratégias colaborativas, três pontos emergem
como relevantes: financiamento, ambiente para inovação e legitimidade. A indústria se
caracteriza por parâmetros de qualificação incompatíveis com as demandas mais sofisticadas do
mercado internacional. Investimentos em qualificação de profissionais, incluindo o envolvimento
de profissionais experientes na indústria; desenvolvimento e acesso a tecnologias de última
geração para os jogos; e interação com outras empresas em eventos internacionais se tornam
relevantes aqui. Adicionalmente, tem-se o desafio, mencionado pelas empresas, da construção
coletiva de um jogo. Como identificado no estudo de Tschang (2005) e evidenciado nas
entrevistas com as empresas E3 e E7, o cerne de um jogo é um processo construtivista e
166
essencialmente tácito, sugerindo uma interação muito forte dos parceiros. Pode-se perceber nos
mecanismos de coordenação utilizados nas estratégias colaborativas da indústria que a confiança
e o maior nível de interação emergem da proximidade física entre as empresas como nos casos de
cooperação das empresas E7 e E8. Da mesma forma Dyer & Nobeoka (2000) sugerem que
ambientes que favorecem proximidade física e contatos informais promovem atividades de
inovação e a disseminação de novos conhecimentos entre as empresas. Assim, estruturas
empresariais como incubadoras e parques tecnológicos podem desempenhar um papel importante
para atender esse requerimento.
Somada à política de financiamento e a um ambiente propício para o desenvolvimento de
inovação, identifica-se a importância de uma estrutura que possa conferir legitimidade a uma
indústria pouco conhecida. Esse seria o caso da ABRAGAMES. Conforme o próprio presidente
menciona, a instituição busca a legitimidade e permite que as empresas possam dialogar com
outros atores do mercado em bloco.
6.5 LIMITAÇÕES DO ESTUDO E OBSERVAÇÕES FINAIS
Torna-se relevante mencionar algumas limitações do presente estudo. A primeira diz
respeito à forma de análise das estratégias colaborativas, que se concentra na identificação de
grupos de duas ou mais empresas da indústria que se engajam em ações de cooperação, como
estratégia para competirem na indústria de jogos, não abordando as conexões entre esses grupos.
Assim, uma possibilidade para futuros estudos é a análise das possíveis conexões entre esses
diferentes grupos, o que viabilizaria o desenho de uma rede para a indústria nacional e suas
possíveis ramificações para indústrias adjacentes, bem como mercados internacionais, permitindo
dentro de uma abordagem analítica (PROVAN & KENIS, 2003; TODEVA, 2006) uma melhor
compreensão das estruturas de coordenação e poder entre os atores.
Outro ponto a ser destacado diz respeito à análise das estratégias colaborativas entre
empresas e profissionais autônomos. As indústrias intensivas em inovação se caracterizam pela
mobilidade do conhecimento, inclusive através de talentos individuais que se engajam em
projetos de diferentes organizações (CHESBROUGH, 2003). Na indústria de jogos pode-se notar
167
como comum o trabalho entre empresas e artistas, músicos ou outros especialistas. Nesse aspecto,
verificou-se a escassez de literatura na área de redes e relações interorganizacionais que
auxiliassem a melhor interpretar a cooperação entre organizações e indivíduos.
Uma última observação diz respeito à análise das estratégias de governança com base nas
atividades da cadeia de valor de jogos. Alguns empresários entendem atividade de Criação como
Design, o que pode provocar significativas alterações nos índices e conseqüente interpretação da
Matriz CPC (CHILD et al., 2005) da pesquisa. Assim, recomenda-se em futuras investigações
procedimentos que orientem o respondente e elucidem a diferença entre essas duas atividades.
Em suma, este estudo procurou compreender a estrutura da indústria brasileira de jogos
eletrônicos, bem como as estratégias colaborativas utilizadas. Verificou-se um alto nível de
internalização de atividades produtivas e uma orientação das empresas para produção de jogos
completos. Há uma percepção de que o pouco desenvolvimento da indústria no Brasil
desempenha um papel relevante nessa realidade. Por ser uma indústria intensa em trabalho
intelectual e inovação, há a necessidade de alta qualificação de mão-de-obra, não amplamente
disponível. Ainda não existe um grande número de empresas ou profissionais amplamente
estabelecidos, capazes de gerar rotatividade de conhecimento e disponibilidade imediata de
trabalho, o que facilitaria conexões fora do ambiente intraorganizacional. Também aponta-se a
imaturidade gerencial na indústria, que fica reforçada nas evidências do uso de estratégias
colaborativas em situações mais contigenciais que estratégicas, o que talvez ocorra também pela
tradicional visão de competição e de individualidade (ASTLEY, 1984). Entretanto, estratégias
colaborativas foram identificadas notadamente em atividades de criação, desenvolvimento e
edição. Mesmo que essas estratégias, com base nas empresas analisadas, não sejam amplamente
adotadas em todas as atividades produtivas, é possível, nos casos encontrados, identificar ganhos
competitivos tais como desenvolvimento de novos produtos, co-especialização, ganhos de escala,
de aprendizado e melhoria de processos (EBERS & JARILLO, 1998).
Para finalizar, percebe-se a necessidade de investigações mais amplas que permitam
melhor nortear as diferentes condicionantes das estratégias colaborativas na indústria de jogos.
Estimula-se aqui o estudo desse segmento no Brasil, em temas como, por exemplo, propriedade
intelectual, capital de risco, pirataria, entre outros que demonstram ser de elevada importância na
dinâmica competitiva dessa indústria, em especial no segmento de desenvolvimento de jogos.
168
Nesse sentido, a presente dissertação é uma primeira incursão em um projeto mais amplo
que está sendo desenvolvido dentro do GeRedes - Grupo de Estudo sobre Redes
Interorganizacionais UNISINOS e que é financiado pelo pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico (CNPq). Busca-se aprofundar o entendimento da realidade do
contexto brasileiro e internacional da indústria de jogos eletrônicos cuja progressiva
especialização da cadeia global sugere foco como condição importante para a performance das
empresas. Em face às situações restritas que caracterizam a realidade das empresas brasileiras, a
possibilidade de articular ações conjuntas com outros parceiros para concentrar esforços, suprir
carências e ampliar possibilidades de negócios parece ser um caminho natural.
169
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180
APÊNDICE A QUESTIONÁRIO ELETRÔNICO APLICADO NA INTERNET
181
182
183
184
185
186
187
188
189
190
191
APÊNDICE B ROTEIRO PARA AS ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE
Questões gerais sobre a empresa
1. Faça uma breve introdução sobre sua empresa, desde sua fundação até o momento
atual. Como foi o desenvolvimento da empresa e como se posiciona hoje no mercado?
2. A empresa atua no mercado internacional? Qual a razão para internacionalizar?
3. Quais os grandes desafios para o estabelecimento de um negócio em games no Brasil?
Decisões estratégicas
4. Qual a sua percepção de valor agregado nas atividades da cadeia de valor? Qual delas
é mais estratégica para a empresa? Qual delas a empresa detém mais competência?
5. Quais os critérios que sua empresa adota no momento de decidir pela produção interna
de uma atividade, compra da mesma no mercado ou um trabalho conjunto de desenvolvimento
com outra empresa?
6. Como você procura se diferenciar no mercado? Como funciona o processo de
inovação/p&d/novos produtos?
7. Você encontra limitações para atuação de sua empresa em alguma atividade? Que
ações você toma para lidar com essas barreiras?
Antecedentes das estratégias colaborativas
8. Quais as motivações para o estabelecimento de alianças com outras empresas?
192
9. Em sua opinião, quais são os riscos oriundos de uma aliança/cooperação? Que fatores
inibiriam seu envolvimento a ponto de preferir produzir internamente ou adquirir uma solução do
mercado?
Projetos de cooperação
10. Quais as parcerias e projetos de cooperação? Quais são os objetivos, em quais elos
ocorrem e como se seleciona o parceiro?
11. Como é a forma de gestão do projeto em termos formais (contrato/confiança) e em
termos de estrutura de governança (vertical/horizontal)?
12. Como é a forma de interação entre as partes (mecanismos de coordenação)? Qual a
frequência de interação entre os parceiros?
Resultados das estratégias colaborativas
13. Quais os resultados atingidos a partir da aliança?
Governança e poder de barganha
14. Considerando a cadeia de valor do setor de jogos eletrônicos, como você percebe seu
nível de influência, poder barganha e coordenação junto às empresas com quem se relaciona?
193
ANEXO A LISTA DAS EMPRESAS PARTICIPANTES DA PESQUISA
Empresa Estado Endereço na internet
Atlantis Studios SP http://www.atlantis-studios.com
Devworks Game technology SP http://www.devworks.com.br
Ene Solutions Digital Design SP http://www.enesolutions.com
Gestum Conhecimento Competitivo RS http://www.gestum.com.br
Hoplon Infotainment S.A. SC http://www.hoplon.com
Insolita Studios SP http://www.insolitastudios.com
Interama Jogos Eletrônicos LTDA-
ME
ES http://www.interama.net
Jynx Playware PE http://www.jynx.com.br
Ludens Artis RS http://www.ludensartis.com.br
Meantime PE http://www.meantime.com.br
Mimetic Entretenimento LTDA RS http://www.singularstudios.com
O2 Games MG http://www.o2games.com.br
Oniria - LDGames Produtora de
Softwares LTDA
PR http://www.oniria.com.br
Outline Interactive LTDA AM http://www.outlineinter.com.br
Overplay SP http://www.overplay.com.br
Perceptum Software LTDA SP http://www.perceptum.com
Sioux Serviços de informatica SP http://www.sioux.com.br
Skyzone Móbile SP http://www.skyzonemobile.com.br
Southlogic Studios RS http://www.southlogic.com
TecToy Desenvolvimento Digital
LTDA
SP http://www.tectoy.com.br
Thunderworks SC http://www.thunder-works.com
Webcore Serviços LTDA SP http://www.webcore.com.br
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo