Download PDF
ads:
0
UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS
MESTRADO
MARTA HAMMEL
“... NO SENTIDO DE ENTENDER AS COISAS MELHOR” UMA
HISTÓRIA SINGULAR DE UM FAZER COLETIVO – EJA/RS
IJUÍ(RS)
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
MARTA HAMMEL
“... NO SENTIDO DE ENTENDER AS COISAS MELHOR” UMA
HISTÓRIA SINGULAR DE UM FAZER COLETIVO – EJA/RS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação nas Ciências
Mestrado, da Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
UNIJUI, como requisito parcial à obtenção do
título de Mestre em Educação.
Orientador: Professor Dr. Paulo Afonso Zarth
IJUÍ (RS)
2007
ads:
2
Às pessoas excluídas dos processos formais da Educação
Básica. Em especial, àquelas adultas que empreendem difíceis
jornadas em busca desse acesso, que lhes possibilita assumirem-se
cada vez mais como sujeitos de suas ações e de se constituírem seres-
no-mundo de forma efetiva.
Aos Educadores e às Educadoras que, mediante a injusta
realidade social, sensibilizam-se e engajam-se em lutas coletivas
pela modificação das estruturas desumanizantes e, nesse processo,
tornam-se mais humanos.
3
AGRADECIMENTOS
AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS
AGRADECIMENTOS
Ao Orientador, Prof. Dr. Paulo Afonso Zarth, pelas contribuições sempre
importantes e, pelo respeito às posturas e tempos necessários à nossa compreensão,
aprofundamentos e construções;
Aos Professores da Banca Examinadora: Msc. Dinarte Belato, Drª Elza
Maria Falkembach e Dr.Pe. Elli Benincá, seus olhares enriquecem qualquer
trajetória e, suas presenças aqui, nos instigam: muito obrigada pelas contribuições;
Aos Professores do PPGEC pelos estímulos diversos e reflexões, em especial,
à Helena Callai, pelos subsídios na qualificação do projeto desta pesquisa;
Aos Educandos/as NEEJACP/Ijuí 2002-2004 pelo exemplo de
perseverança e luta, em especial, aos aqui entrevistados;
À Equipe Diretiva do NEEJACP/ijuí, pelo compartilhamento de
experiências de construção nem sempre tranqüilas, pela disponibilização, para
pesquisa, de arquivos e equipamento de infra-estrutura;
Às Funcionárias do NEEJACP/Ijuí, pela organização, eficiência e
colaboração no manuseio dos arquivos;
Aos Educadores e às Educadoras do NEEJACP/Ijuí, pela acolhida,
convivência, compartilhamentos, aprendizagens e apoio;
À Secretaria Estadual de Educação/RS, extensivo à 36ª Coordenadoria
Regional de Educação, pela concessão, ao assegurado direito profissional à LQP
(Licença Qualificação Profissional);
Aos Educadores, Educadoras, Ejandos e Ejandas da Escola Estadual de
Educação Básica Érico Veríssimo/ Carazinho, (1996/2000), onde principiamos a
caminhada profissional de aprender/ensinar com adultos;
À Equipe da 39ª CRE/ Carazinho período 1999/2002 -, companheiros e
companheiras de processo educativo emancipatório;
Às amigas Adélia, Claudete, Cinara, Déspina, Emelda, Emília, Gelci,
Janete e Marinês: Mestras de minha constituição pedagógica e companheiras de
utopia;
À Liana Borges, pelo empréstimo de materiais para a pesquisa e pelo diálogo
construtivo;
Ao Carlos Otávio Silveira, pelas sugestões e criteriosa correção destas
palavras;
À minha mãe, Neli, pelo amor, exemplo e incentivo constante nos estudos;
Ao meu pai, Valdenor (in memorian) pelo amor, e, em especial o exemplo
pelo gosto às leituras desde sempre;
Aos meus pais, Neli e Valdenor, mestres em “União Familiar” e educação
dos cinco filhos;
Ao mano Aldemir e às manas Clarice, Maria Helena e Adriana, pelo
incentivo, carinho, amizade e pelo reconhecimento, de outros tempos, da
importância do estudo;
Às sobrinhas Manuella, Eduarda e Clarissa; aos sobrinhos André, Júnior e
Geovane pelo carinho e convivência, mesmo à distância;
Á Rosângela, Celso, Paulo e Evandro, carinhosamente denominados
“intrusos” na família, que permitiram ampliar nossos olhares de mundo e laços
fraternos;
Ao Francisco Mateus Conceição, meu companheiro das muitas jornadas, por
estar sempre próximo e, neste trabalho, em especial, contribuindo com escutas densas
e sugestões preciosas.
4
RESUMO
Nesta pesquisa buscamos registrar uma leitura de mundo permeada pela leitura da palavra,
englobando a Política Pública de Educação de Jovens e Adultos no Estado do Rio Grande do
Sul, do período 1999/2002, e o olhar do público que freqüentou o Núcleo Estadual de EJA e
de Cultura Popular de Ijuí durante a construção, a implantação e o desenvolvimento da
referida política.
Inicialmente, elaboramos uma breve análise da influência da globalização no contexto
educacional e no cotidiano de pessoas pouco ou não-escolarizadas; perpassamos por
colocações de diversos autores relativas às políticas públicas de EJA e a legislação pertinente
à modalidade. A seguir, compomos uma narrativa comentada da PPEJA/RS, construída e
implementada no período referido. Abordamos o processo de sua elaboração em termos de
Programa de Governo, nos debates da Constituinte Escolar, em momentos específicos com
educandos/as e educadores/as da EJA. Buscamos, do mesmo modo, retratar/comentar ações
de implementação da política: o cenário encontrado, a inclusão da modalidade nos
documentos escolares, a criação dos Núcleos Estaduais de EJA e Cultura Popular, e das
dificuldades surgidas na consecução da mesma. Para dar conta deste processo utilizamo-nos
de diversas bibliografias publicadas no/sobre o período, relatórios internos da equipe da SEE,
vídeos institucionais e acervos particulares, dados do IBGE e INEP, bem como dos textos
legais que regiam ou regem a EJA.
Num segundo momento, apresentamos um estudo local, de Ijuí e região enquanto
desdobramento da PPEJA/RS, mais especificamente no NEEJACP/Ijuí. Buscamos construir
respostas as indagações: O que traz de volta aos bancos escolares um número expressivo de
pessoas jovens e adultas? Como estas pessoas vêem o processo educativo, quando nele
inseridas? Após dois ou mais anos de conclusão da escolarização básica, via EJA, como
revêem suas expectativas iniciais? Que análises fazem da EJA frente à sua trajetória
particular, na sociedade/comunidade local/regional, nas questões pertinentes ao
trabalho/emprego? Na investigação fizemos uso basicamente de duas metodologias: análise
de fichas (do período em estudo e imediatamente posterior – sob forte influência do primeiro)
e entrevistas dirigidas (História Oral temática). Estruturamos o estudo em três sessões. Na
primeira, trabalhamos com as expectativas dos/das educandos/as. Como fonte de dados,
utilizamos “Fichas de Inscrição” e “Fichas de Matrícula” do Núcleo (Arquivos do
NEEJACP/Ijuí), com dados de inscritos ou matriculados no período 2001 a 2004.
Selecionamos, reprografamos e tabulamos um total de cento e setenta e cinco fichas, com
foco nas questões Que motivos o levaram a matricular-se no Núcleo?” e “Por que procurou
o Núcleo de EJA e Cultura Popular?” Na continuidade, nos utilizamos de Fichas de
Avaliação (do curso, da Instituição, da equipe do Núcleo) e Auto-avaliação, preenchidas por
5
ejandos e ejandas no decorrer do curso regido pela Política Pública de EJA 99/02.
Recortamos, destes instrumentos, depoimentos que dizem das leituras feitas pelos sujeitos no
decorrer do processo de escolarização quanto: ao acesso e à freqüência; aos educadores e
educadoras; à conciliação trabalho-estudo; às diferenças de faixa etárias nos Grupos de
Aprendizagem; ao autoconhecimento e aos bloqueios; ao trabalho em grupos; aos conteúdos,
as disciplinas e as avaliações e aos espaços do NEEJACP. A seguir, temos entrevistas
dirigidas com cidadãos/ãs egressos/as do Núcleo, que realizaram sua formação em nível
fundamental e/ou médio e fazem parte do grupo que “inaugurou” a instituição e que trilharam
itinerários diversos, tais como: mantiveram-se nas mesmas funções exercidas antes do curso;
conseguiram e/ou mudaram de emprego; evoluíram na carreira profissional; cursaram ou
cursam Ensino Técnico; cursaram ou cursam o Ensino Superior.
Subsidiaram as reflexões entre a PPEJA/RS (1999/2002) e os dados fornecidos pela pesquisa
com ejandos, o suporte teórico da Educação Popular, especialmente com Paulo Freire e
Milton Santos.
Palavras Chave: Políticas Públicas, Educação de Jovens e Adultos, Núcleo de EJA,
Globalização.
6
ABSTRACT
This research aims to record a world reading permeated by a word reading, addressing the
Government’s Youth and Adult Education Policy (GYAEP) in the state of Rio Grande do Sul,
Brazil, from 1999 to 2002, and the viewpoints of those who have attended the Núcleo
Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular of the town of Ijuí during the
creation, implementation and development of that policy.
Firstly, we briefly analyzed the influence of globalization on education and on the routine of
people who have little or no schooling; quoting several authors concerning the government’s
youth and adult education policies and laws. We also developed a commented history of the
PPEJA/RS created and implemented in the period mentioned above. We discussed its creation
process in terms of Government Program, in the debates of the School Constitutional
Convention, with teachers and students involved. Likewise, we aimed to present/comment on
actions of implementation of that policy: the situation found, the inclusion of youth and adult
education in school documents, the creation of State Centers of Youth and Adult Education
and Popular Culture and the difficulties encountered. In order to do so, we used bibliography
published in/about the period, State Education Department internal reports, institutional and
private videos, data from the Brazilian Institute of Geography and Statistics and National
Institute of Education Research and Study, as well as youth and adult education past and
present laws.
Secondly, we presented a local study, carried out in Ijuí and other towns in the northwest
region of the state, which unfolds the PPEJA/RS in the state of Rio Grande do Sul and, more
specifically, in the NEEJACP/Ijuí. We aimed to answer the following questions: What makes
a significant number of young and adult people return to school? What do they think about the
education process when they are involved in it? How do they review their initial expectations
two or more years after having finished school, via youth and adult education? What is their
analysis of youth and adult education in relation to their individual history, to local/regional
society/community, to the question of work/job? We used basically two research
methodologies: analysis of forms (of the period investigated and of the immediately
subsequent period under strong influence of the former) and guided interviews (Thematic
Oral History). We divided the study into three sections. The first one presents students’
expectations. As data source, we used “Application Forms” and “Enrolment Forms” of the
Center (files of the NEEJACP/Ijuí), which contained data about the students who applied or
enrolled at the Center from 2001 to 2004. We selected, copied and processed a hundred and
seventy-five forms, focusing on the following questions: “What reasons led you to enroll at
the Center?” and Why did you look for the Center?” For the second section, we used
Evaluation Forms (evaluation of the course, the institution and the staff) and Self-evaluation
7
Forms, which were filled in by students while the course was ruled by the Education Policy
EJA 99/02. We selected, from those research instruments, accounts of what the subjects read
during the process of schooling concerning: access and frequency; teachers; combining work
and study; age differences in Groups of Learning; self-knowledge and mental blocks; group-
work; school subjects, contents and evaluations; and the Center’s spaces. The third section
presents the interviews with former students of the Center who completed up to secondary or
high school education and took part in the group that “founded” the institution and who
followed diverse paths, such as: keeping the same job they had before the course; finding a
job or changing jobs; moving up in the career; taking further or higher education.
We based our reflections about the GYAEP (1999/2002) and the data obtained in this research
on the theoretical support of Popular Education, specially Paulo Freire and Milton Santos.
Key-words: Government’s Policies, Youth and Adult Education, Center of Youth and Adult
Education, Globalization.
8
LISTA DE SIGLAS
BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM – Banco Mundial
CE – Constituinte Escolar
CEB – Câmara de Educação Básica
CEES – Centro Estadual de Ensino Supletivo
CEEd/RS – Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul
CIE – Centro Interescolar de Educação Técnica
CNE – Conselho Nacional de Educação
CPERS – Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul
CRE – Coordenadoria Regional de Educação
CRES – Centro Rural de Ensino Supletivo
DE – Delegacia de Educação
DOU – Diário Oficial da União
EJA – Educação de Jovens e Adultos
EF – Ensino Fundamental
EM – Ensino Médio
FUNDEF Fundo para o Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do
Magistério
GAs – Grupos de Aprendizagem
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas “Anísio Teixeira”
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação
LER – Projeto de Alfabetização “Lendo e Escrevendo o Rio Grande”
MEC – Ministério da Educação
MOVA/RS – Movimento de Alfabetização do Rio Grande do Sul
NEEJACP – Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular
NOES – Núcleo de Orientação aos Exames Supletivos
ONU – Organização das Nações Unidas
OP – Orçamento Participativo
PC do B – Partido Comunista do Brasil
PEC – Projeto de Emenda Constitucional
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PP – Política Pública
9
PPEJA – Política Pública de Educação de Jovens e Adultos
P&D – Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual
PSB – Partido Socialista Brasileiro
PT – Partido dos Trabalhadores
RH – Recursos Humanos
RS – Estado do Rio Grande do Sul
SEE – Secretaria de Estado da Educação
SE – Secretaria da Educação
UNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Matrículas em Cursos Presenciais de EJA, com Avaliação no Processo por
Dependência Administrativa – Ano 1995 ................................................................................ 56
Tabela 2 Níveis de Escolarização de Pessoas Maiores de 15 anos Rio Grande do Sul
Ano 2000 .................................................................................................................................. 58
Tabela 3 – Evolução da Oferta de EJA em Estabelecimentos Educacionais Estaduais –
Comparativo com as demais Redes – Anos 1999 e 2003 ......................................................... 60
Tabela 4 – Matrículas em Cursos Presenciais de EJA, com Avaliação no Processo por
Dependência Administrativa – Ano 2002 ................................................................................ 61
11
LISTA DE ANEXOS
ANEXO I Texto “Constituinte Escolar: Esclareça suas dúvidas” e “Calendário da CE
Caderno 1 da Constituinte Escolar, p. 16, 17, 18.
ANEXO II – Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual – Caderno Pedagógico
5, p. 33 a 47
ANEXO III Política Pública de Educação de Jovens e Adultos do Rio Grande do Sul
Excerto do caderno pedagógico EJA 1 – p. 46 a 59.
ANEXO IV – Tabela 2979/IBGE – Pessoas de 7 anos ou mais de idade por grupos de anos de
estudo e grupos de idade (Unidade da Federação: Rio Grande do Sul)
ANEXO V Relação dos Núcleos Estaduais de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura
Popular do Rio Grande do Sul – Criação (Tabela)
ANEXO VI – Tabulamento das Fichas de Matrícula/Inscrição do NEEJACP/Ijuí
ANEXO VII – Modelos de Fichas de Matrícula e de Inscrição do NEEJACP/Ijuí
ANEXO VIII – Modelos de Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação do NEEJACP/Ijuí
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
1 POLÍTICA PÚBLICA PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO RIO
GRANDE DO SUL – PERÍODO 1999/2002 ........................................................................ 20
1.1 O Contexto e a Educação................................................................................................ 20
1.2 Proposta do Programa de Governo ................................................................................ 31
1.3 A Elaboração Participativa da Política Pública para a Educação ................................... 33
1.3.1. O Movimento Constituinte Escolar - Pressupostos, Metodologia e Momentos ..... 33
1.3.2 Tempo de Debates .................................................................................................. 35
1.3.2.1 Nas Comunidades Escolares ........................................................................... 36
1.3.2.2. Nas Pré-Conferências Municipais ou Microrregionais da Educação .............. 36
1.3.2.3. Nas Pré-Conferências Regionais da Educação ................................................ 37
1.3.2.4. Na Conferência Estadual da Educação ............................................................ 38
1.3.3. Os Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual ................................ 38
1.4 A Construção e Sistematização da Política Pública de Educação de Jovens e Adultos . 41
1.4.1. O Documento “Política Pública de Educação de Jovens e Adultos do Rio Grande
do Sul” .............................................................................................................................. 43
4.1.1.Conceito de Educação de Jovens e Adultos – A EJA como Direito ....................... 44
1.4.2.Organização dos Tempos e Espaços ........................................................................ 49
1.4.3 Avaliação ................................................................................................................. 52
1.5 A Implementação da Política Pública de Educação de Jovens e Adultos/RS (99/02) ... 55
1.5.1 O Encontrado ........................................................................................................... 56
1.5.2 A Inclusão da Modalidade EJA nos Documentos das Instituições Estaduais ......... 60
1.5.3 A Criação e Implantação dos Núcleos Estaduais de Educação de Jovens e Adultos e
de Cultura Popular ............................................................................................................ 62
2 ITINERÁRIOS EJANDOS: ANTES, DURANTE E APÓS O CURSO ....................... 68
2.1. As Expectativas da População-Alvo da EJA na Cidade de Ijuí/RS .............................. 68
2.1.1 Caracterização da Instituição ................................................................................... 68
2.1.2 Caracterização de Ejandos e Ejandas ...................................................................... 70
2.1.3 Das Expectativas Expressas .................................................................................... 71
2.1.3.1 Recomeçar; Obter mais conhecimentos; Completar os estudos ...................... 75
2.1.3.2. Recuperar o tempo perdido; Concluir rapidamente a Educação Básica;
Ingressar em Curso Profissionalizante e/ou Superior ................................................... 76
2.1.3.3 Próprio para adultos; Ótima forma de ensino; É mais fácil .............................. 77
13
2.1.3.4. Conseguir Emprego; Ascender Profissionalmente; Ter Maiores
Oportunidades; Garantir o Futuro ................................................................................ 78
2.1.3.5 Turno oferecido; Economia; Socialização; Convivência... .............................. 79
2.2 A Visão dos Ejandos e Ejandas na Trajetória do Curso ................................................. 81
2.2.1 O Acesso e a Freqüência ......................................................................................... 82
2.2.2 Os Educadores e Educadoras ................................................................................... 83
2.2.1.1 A Postura de Educador/a Consciente de seu Papel Frente a Educandos/as...... 84
2.2.2.2 Denunciando o Caráter Bancário da Educação Praticada ................................ 86
2.2.2.3 Dificuldades com as Metodologias Utilizadas pelos/as Educadores/as .......... 86
2.2.2.4 Das Transgressões da Ética de Ensinar ............................................................ 86
2.2.3 A Conciliação do Trabalho e o Tempo para Estudar............................................... 88
2.2.4 As Diferenças de Faixa Etária nos Grupos de Aprendizagem................................. 89
2.2.5 O Autoconhecimento e os “Bloqueios” ................................................................... 92
2.2.6 Os Trabalhos em Grupo ........................................................................................... 93
2.2.7 Os Conteúdos, os Componentes Curriculares e as Avaliações ............................... 93
2.2.8 Os Espaços do Núcleo ............................................................................................. 95
2.2.9 A Autorização de Funcionamento do NEEJACP/Ijuí ............................................. 96
2.2.10 Olhando e Avaliando a Trajetória ......................................................................... 97
2.3 A Leitura de Mundo de Cidadãos e Cidadãs Egressos/as do NEEJACP/Ijuí ................ 98
2.3.1 Avaliação Atual das Expectativas Iniciais e sua Consecução ............................... 100
2.3.2 As Relações no/com o Mundo e as Pessoas após o Curso .................................... 104
2.3.3 Carências no Curso de EJA ................................................................................... 106
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 108
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 114
ANEXOS ............................................................................................................................... 121
14
INTRODUÇÃO
“... o problema crucial é: como passar de uma situação crítica a uma visão crítica
e, em seguida, alcançar uma tomada de consciência. Para isso, é fundamental viver a
própria existência como algo unitário e verdadeiro, mas também como um paradoxo:
obedecer para subsistir e resistir para poder pensar o futuro. Então a existência é
produtora de sua própria pedagogia.” (Milton Santos)
Numa conjuntura mundial e nacional de globalização hegemônica perversa
1
, de
favorecimento ao capital, de “pacotes” educacionais forjados em gabinetes, temos, no
quadriênio 1999-2002, uma experiência local, de Estado, na contramão deste processo: o
governo eleito, oriundo dos movimentos sociais, visou atender demandas históricas da
população menos favorecida, envolvendo-a em ações que a colocaram como protagonista e/ou
companheira das mudanças de rumos da formulação e implementação das políticas blicas e
dos investimentos estatais.
Objetivamos registrar a potencialidade criadora de autonomização e empoderamento
da experiência democrática vivenciada no período, que não se deu apenas na área da educação
nosso tema central - mas em todas as demais (saúde, agricultura, habitação, saneamento,
assistência social, segurança...); ainda, destacou-se globalmente, em especial a organização do
orçamento do Estado Orçamento Participativo
2
(OP), que no período voltou os olhares do
mundo para o Rio Grande do Sul e o fez sede em três edições consecutivas do Fórum Social
Mundial
3
.
1
Uma das três denominações utilizadas por Milton Santos para caracterizar a globalização, explicitada no texto
dissertativo.
2
Iniciado na Prefeitura de Porto Alegre, capital do Estado, na gestão da Frente Popular, tendo como Prefeito
Olívio Dutra, e aperfeiçoado ao longo de quatro mandatos desta coligação, sendo este quarto concomitante ao
conquistado nas urnas para gerir o Estado (99/02).
3
Fórum Social Mundial: movimento de encontro de lideranças mundiais – governos, movimentos sociais,
Organizações Não-Governamentais (ONGs)... – para discussão e elaboração de proposições para um outro
mundo possível, nas palavras de Milton Santos, uma outra globalização, centrada no respeito às necessidades
humanas (e ambientais). Estruturou-se, inicialmente, como contraposição ao Fórum Econômico de Davos/Suíça,
15
A partir do ano de 1999, a Secretaria de Estado da Educação do Rio Grande do Sul
propôs-se a construir coletivamente com a sociedade gaúcha Políticas Públicas de Educação
Básica. Tendo presente a trajetória histórica pontual e fragmentada da Educação de Jovens e
Adultos, efetivada através de programas isolados e descontextualizados, inseriu esta
modalidade educativa no conjunto das reflexões da comunidade sul-rio-grandense no
movimento denominado “Constituinte Escolar”: por vezes em momentos específicos do
coletivo da EJA, por vezes com o conjunto da Rede.
Como conseqüência da formulação coletiva das Políticas Públicas para a Educação, e
aqui em especial destacamos a EJA, seguiu-se a inclusão e a expansão da oferta desta
modalidade na rede pública estadual: enquanto implementação/funcionamento, bem como de
previsão/intencionalidade, expressa nos documentos escolares (em especial dos Regimentos),
conforme demanda das comunidades de inserção das escolas. No período, também houve a
criação dos Núcleos Estaduais de EJA e Cultura Popular, em substituição aos Centros
Estaduais de Ensino Supletivo, Centros Rurais de Ensino Supletivo, Núcleos de Orientação
aos Exames Supletivos e Centros Interescolares de Educação Técnica.
A Educação de Jovens e Adultos historicamente marginalizada nas políticas
educacionais - experimentou um tempo de reconhecimento, relevo e expansão no Estado do
Rio Grande do Sul, no referido período. Esta política buscou abranger toda a educação básica,
da alfabetização - com o Movimento de Alfabetização/RS, efetivado mediante parcerias com
os movimentos sociais e instituições da sociedade civil - às políticas de efetiva inclusão da
modalidade na rede estadual de ensino nos níveis fundamental e médio, o que vinha sendo
preconizado desde a Constituição Federal de 1988, reforçado pela lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional de 1996; porém, não havia, ainda, uma atenção maior frente à matéria no
plano estatal. Abordou também, com seriedade a obrigatoriedade do oferecimento e aplicação
dos Exames Supletivos, buscando adequar os testes às especificidades locais; a elaboração dos
mesmos foi assumida pela equipe pedagógica da Secretaria de Estado da Educação,
assessorada por professores/as especialistas de cada área.
Temos a Educação de Jovens e Adultos como campo de atuação por mais de uma
década de trabalho escolar. Nele reconhecemos interfaces com a política local/regional/global,
com o mundo do trabalho, com a socialização e constituição de sujeitos mais autônomos.
Presenciamos e participamos de momentos de construção, reivindicação, avanços, rupturas,
onde se reuniam/se reúnem anualmente os líderes das nações mais desenvolvidas do globo com a finalidade de
traçarem metas para a economia/investimentos mundiais.
16
resistência, imposições e retrocessos: características que pontuam continuamente a história
oficial da EJA.
Em especial, a indignação frente às rupturas
4
e o desrespeito a construções e
conquistas efetuadas, a busca de alternativas viáveis e a elaboração de argumentação “...
como passar de uma situação crítica a uma visão crítica (...), subsistir e resistir para poder
pensar o futuro”,(Santos, 2000, p.116) - nos impulsionaram a buscar a academia, “obter mais
conhecimentos
5
”, refletir, embasarmo-nos teoricamente na tentativa de fazer uma leitura
(mais completa) da complexidade de relações que envolvem as políticas públicas para esta
modalidade da educação básica; ou ainda, como ressalta uma educanda do Núcleo de
Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí, “... no sentido de entender as
coisas melhor”
6
, parte do título deste trabalho.
Propomos-nos a registrar uma leitura de mundo
7
permeada pela leitura da palavra,
englobando a Política Pública de Educação de Jovens e Adultos no Estado do Rio Grande do
Sul (1999/2002) e o olhar do público que freqüentou o Núcleo Estadual de Educação de
Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí durante a implantação e o desenvolvimento da
referida política. Destes “fazeres”, “saberes” e “pensares”, procuramos constituir, e
“encharcar”, este texto.
Optamos em organizar a dissertação em dois capítulos. No primeiro, compomos uma
narrativa comentada da Política Pública para a Educação de Jovens e Adultos no Rio Grande
do Sul, construída e implementada no período 1999-2002. Abordamos o processo de
elaboração da mesma: em termos de Programa de Governo; nos debates da Constituinte
Escolar envolvendo a comunidade gaúcha
8
, que, num movimento histórico de democracia
participativa, constituiu princípios e diretrizes para reger a Educação Pública Estadual; em
momentos específicos com educandos/as e educadores/as da EJA, organizando relatos “da
EJA que temos à EJA que queremos”
9
. Destacamos também o intenso movimento de estudos
- nos estabelecimentos de ensino, nas CREs, na SEE familiarizando-se com o histórico e
com experiências atuais/contemporâneas da modalidade - tanto no Brasil quanto no mundo -
ouvindo e discutindo com assessorias da área, pesquisadores/as... para enfim sistematizar as
4
Período 2003/2004 na EJA do Rio Grande do Sul/Brasil.
5
Expectativa expressa por educandos/as para retornar aos bancos escolares da EJA após muitos anos fora da
escola(registrada no decorrer do texto).
6
Na Totalidade final do Ensino Médio, no semestre/2004, a educanda entre outras avaliações que faz da
trajetória escreve: “Me sinto outra pessoa, no sentido de entender as coisas melhor.”
7
Expressão de Paulo Freire, bem como a grifada logo após “leitura da palavra”.
8
Utilizamos o termo “gaúcha”, bem como seu masculino, enquanto gentílico para aqueles/as que nascem no
Estado do Rio Grande do Sul.
9
Título de momentos de reflexão, relato e sistematização.
17
linhas-mestras da PPEJA/RS e, posteriormente, desdobrá-la nos documentos das instituições
de ensino estaduais que viriam a trabalhar mais especificamente com a modalidade.
Buscamos, do mesmo modo, retratar/comentar ações de implementação da política: o cenário
encontrado, a inclusão da modalidade nos documentos escolares, a criação dos Núcleos
Estaduais de EJA e Cultura Popular. Elencamos ainda, brevemente, uma discussão das
dificuldades/entraves surgidas na consecução destas ações.
Para dar conta deste processo mais especificamente –, nos utilizamos de diversas
bibliografias publicadas no/sobre o período, relatórios internos da equipe da SEE, vídeos
institucionais e acervos particulares, dados do IBGE e INEP, bem como nos textos da
legislação que regem ou regiam a EJA. Na organização do capítulo, optamos por dividi-lo em
duas partes, sendo a primeira sobre o processo de elaboração da PPEJA/RS e, a segunda,
relativa à implementação da política.
O segundo capítulo apresenta um estudo local, de Ijuí e região enquanto
desdobramento da PPEJA/RS, mais especificamente no NEEJACP/Ijuí. Buscamos construir
respostas às indagações iniciais desta pesquisa: O que traz de volta aos bancos escolares um
número expressivo de pessoas jovens e adultas? Como estas pessoas vêem o processo
educativo, quando nele inseridas? Após dois ou mais anos de conclusão da escolarização
básica, via EJA, como revêem suas expectativas iniciais? Que análises fazem da EJA frente à
sua trajetória particular, na sociedade/comunidade local/regional, nas questões pertinentes ao
trabalho/emprego?
Na investigação das respostas, nos utilizamos basicamente de duas metodologias:
análise de fichas (do período em estudo e imediatamente posterior sob forte influência do
primeiro) e entrevistas dirigidas (História Oral Temática). Estruturamos o estudo em três
sessões. Na primeira sessão, trabalhamos com as expectativas de educandos/as. Como fonte
de dados, utilizamos “Fichas de Inscrição” e “Fichas de Matrícula” do Núcleo Estadual de
Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí (NEEJACP/Ijuí), com dados de
inscritos ou matriculados no período 2001 a 2004
10
. A amostragem foi recolhida,
aleatoriamente, em meio a um número bastante elevado de Fichas de Inscrição e/ou Matrícula
do acervo de arquivos da Instituição. Selecionamos, reprografamos e tabulamos um total de
cento e setenta e cinco (175) fichas, nas quais candidatos e candidatas responderam às
questões Que motivos o levaram a matricular-se no Núcleo?” e “Por que procurou o
10
Visando o funcionamento do NEEJACP/Ijuí a partir do início de 2002, procedeu-se a inscrição de candidatos
às vagas para o Ensino Fundamental e Médio neste estabelecimento ainda no ano de 2001; elencamos o ano de
2004, incluindo 2003, pela manutenção da proposta original do Núcleo (constituído em 2001/2002).
18
Núcleo de EJA e Cultura Popular?”, sendo que vários documentos com este espaço não
preenchido
11
. Além disso, relacionamos e tabulamos as respostas mais freqüentes às
características declaradas pelos educandos e educandas, tais como gênero, faixa etária,
empregado/desempregado/autônomo e contato mais recente com as formas de
educação/escolarização.
A segunda sessão deste capítulo foi construída tendo como base de análise Fichas de
Avaliação (do curso, da Instituição, da equipe do Núcleo) e Auto-avaliação, preenchidas por
ejandos e ejandas no decorrer do curso regido pela Política Pública de EJA 99/02. Recortamos
destes instrumentos colocações que dizem das leituras feitas pelos sujeitos no decorrer do
processo de escolarização quanto ao acesso e à freqüência; aos educadores e educadoras; à
conciliação trabalho-estudo; às diferenças de faixa etárias nos Grupos de Aprendizagem; ao
autoconhecimento e aos bloqueios; ao trabalho em grupos; aos conteúdos, as disciplinas e as
avaliações e aos espaços do NEEJACP/Ijuí. Elencamos ainda outros comentários e citações
gerais, que, embora sem um tema específico, contribuem para uma visão mais próxima e
qualificada da história do período e do “modo de ver” daqueles indivíduos, naquele tempo e
lugar.
Na seleção das citações de educandos e educandas, desta sessão, coletamos, de todas
as fichas arquivadas, aquelas que se destacam por expressarem “denúncia, anúncio, profecia,
utopia e sonho” (Freire, 2000, p.117), pelo posicionamento claro e ilustrativo que diziam da
realidade do momento no Núcleo, bem como pelas sugestões e alternativas propostas.
Encerrando este estudo, a terceira sessão do capítulo é composta tendo por base de
dados entrevistas dirigidas seguindo orientações da História Oral Temática - com
cidadãos/ãs egressos/as do Núcleo Estadual de EJA e Cultura Popular de Ijuí, que realizaram
sua formação em nível fundamental e/ou médio enquanto predominou a política pública
enfocada por esta pesquisa, ou seja, já egressos/as há cerca de dois, três ou mais anos.
Para concretizar esta sessão realizamos treze entrevistas com ex-ejandos e ex-ejandas
pertencentes ao grupo que “inaugurou” o Núcleo sem este estar autorizado a funcionar
(início de aulas em março/2002; autorização de funcionamento pelo CEEd em 18/12/2002);
todos, portanto, aqueles e aquelas que fizeram seu percurso escolar geridos pela Política
Pública de EJA do RS criada no período 1999/2002. Outro fator que elegemos para configurar
a amostragem foi a diversidade de itinerários trilhados por aquele público, ou seja, após a
conclusão do Ensino Médio na Educação de Jovens e Adultos do NEEJACP/Ijuí,
11
O preenchimento das referidas fichas era realizado pelos/as próprios/as candidatos/as à vaga, mas, muitas
vezes, as questões que embasam o estudo desta sessão não foram respondidas por eles/as.
19
alguns/algumas: mantiveram-se nas mesmas funções exercidas antes do curso; conseguiram
e/ou mudaram de emprego; evoluíram na carreira profissional; cursaram ou cursam Ensino
Técnico; cursaram ou cursam o Ensino Superior.
Contribuirá/implicará nas análises propostas em “PARA ENTENDER AS COISAS
MELHOR”: Uma História Singular de Um Fazer Coletivo EJA/RS (1999-2002) , nossa
experiência como profissional que atua vários anos na Educação de Jovens e Adultos
(oferta oficial), inicialmente em Curso Supletivo de Educação Geral em Nível de Grau
12
,
após em atividade na 39ª CRE
13
- na construção dos Princípios e Diretrizes para a Educação
Pública Estadual junto às comunidades escolares das 71 escolas de abrangência da CRE, em
seus 21 Municípios, na coordenação de grupos nas Conferências Microrregionais, Regional e
Estadual de Educação e, mais atualmente, na docência de Grupos de Aprendizagem por
Totalidades, Exames Fracionados Presenciais e Não Presenciais; bem como na Coordenação
Pedagógica do NEEJACP/Ijuí
14
.
“Suleando”
15
estes dados das pesquisas e experiências próprias, trazemos a análise de
vários autores que historiam, pesquisam e teorizam sobre a Educação de Adultos e Jovens,
outros que contribuem com o exame da conjuntura regional/nacional/global, bem como
aqueles que privilegiadamente (para nós) constroem uma amálgama com estes temas.
Destacamos, entre tantos lidos e/ou referenciados no conjunto do texto, Gaudêncio Frigotto,
Manuel Castells, Márcio Pochmann, Maria Clara Di Piero, Milton Santos, Sérgio Haddad,
Vanilda Paiva e, Paulo Freire, nosso mestre maior.
12
Escola Estadual de e Graus Érico Veríssimo/ Escola Estadual de Educação Básica Érico Veríssimo
Carazinho/RS (1994 – 2000: com a disciplina de Física, no então 2º Grau).
13
39ª Coordenadoria Regional de Educação/ Carazinho (2000 2002: Setor Pedagógico, Coordenação Geral,
Assessoria de Gabinete).
14
Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí (2002 – 2005).
15
Sulear é uma expressão utilizada por Paulo Freire para ressaltar a conotação ideológica dos termos nortear,
norteá-lo, nortear-se, orientação, orientar-se, e outras derivações. Estas reflexões advêm do contato com o físico
Márcio D’Olme Campos e suas publicações, tais como “A Arte de Sulear-se”. Para maiores informações,
consultar nota 15 da obra Pedagogia da Esperança – Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido.
20
1 POLÍTICA PÚBLICA PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO RIO
GRANDE DO SUL – PERÍODO 1999/2002
1.1 O Contexto e a Educação
Os termos Política Pública, Globalização, Educação de Jovens e Adultos, Ejandos/as
representam expressões-alicerce no decorrer do texto. Considerando-os parâmetros e, num
tempo de relativização de conceitos, para tornarmo-nos mais claros e efetuarmos uma
comunicação eficaz, passamos a expressar nosso entendimento dos mesmos e a leitura que
fazemos do entrelaçamento destes na tessitura da realidade social que analisamos.
A expressão Política Pública, em um primeiro olhar, indica uma redundância, pois a
palavra “política” já sugere algo “público”. Porém, utilizamos uma significação de Boneti, por
considerar que “quando se fala em políticas públicas, está se fazendo uma distinção entre
aquilo que é público, do ponto de vista orçamentário, e aquilo que é privado, considerando-se
que quando se menciona políticas públicas fala-se em recursos públicos, advindos do Estado”(
Boneti, 2006, p.09). Para o autor, e para esta pesquisadora, então, o significado da expressão
aponta “uma ação destinada a um público e que envolve recursos públicos” (Boneti, 2006,
p.09).
Entendemos, e aplicamos ao texto, políticas públicas enquanto ações que emergem do
contexto social, e que, para se investirem de legitimidade, necessitam passar pela esfera do
Estado e, somente então, transmutarem-se (ou não) em realidade. Representam, nesse caso,
parafraseando Boneti, uma decisão de intervenção pública numa dada conjuntura social,
consistindo em fazer investimentos ou regulamentações administrativas, pedagógicas...
Interpretamos também que as propostas de/para políticas públicas retratam o resultado
do “jogo de forças” que se coloca cotidianamente nas relações (de poder) estabelecidas por
grupos econômicos, políticos, segmentos/movimentos sociais, entidades da sociedade civil...
Estas relações demandam um conjunto de medidas atribuídas ao Estado, que orientam e
21
conduzem as ações desenvolvidas por seus administradores no sentido da construção da
sociedade que se deseja, bem como do cidadão e cidadã desejado/a. Explicitando, Boneti
(2006) aponta que:
Cada momento histórico produz, no contexto da inter-relação entre a produção
econômica, cultura e interesses dos grupos dominantes, ideologias a partir das quais
verdades relativas tornam-se absolutas, construídas ideologicamente em cada
formação social, produzem e referenciam as ações institucionais e, em particular, a
elaboração e a operacionalização das políticas públicas” (Boneti,2006,p.11).
O mesmo autor salienta, e sustenta em argumentações ao longo de outra obra, que “as
políticas públicas nem sempre têm como finalidade atender às necessidades da população. Às
vezes cria-se uma carência falsa, justificada por meio de explicações ‘científicas’, para
atender interesses particulares de grupos econômicos, de categorias profissionais, etc.”
(Boneti, 2006-b, p.105).
Até um passado recente, as políticas públicas eram produzidas no contexto nacional,
partindo de uma conjunção de forças entre diferentes segmentos da sociedade, com
determinação/supremacia de influências políticas aliadas à classe dominante. Atualmente,
tem-se mostrado claramente para tal formatação a interferência da esfera global (em geral
sobrepujando, impondo-se sobre) as instâncias nacionais, regionais e/ou locais. Ilustrando,
Boneti (2006) afirma que:
O caráter globalizador da economia é um fator determinante na formulação e
operacionalização das políticas públicas devido ao novo caráter de relação política
entre os diversos países do globo imposto pela economia globalizada. Este
condicionante tem muito mais peso nos dias atuais, nas últimas décadas, do que em
tempos passados, porque (...) vivemos sob uma nova configuração social. (...) Neste
sentido, as políticas públicas quando elaboradas devem levar em consideração o
contexto global no qual o país está inserido, nunca esquecendo a lógica e as
determinações do modelo capitalista de produção (Boneti, 2006, p.56).
No limiar do século XXI, encontramos um cenário mundial de globalização. Estando a
maioria dos Estados-Nações filiadas ao modelo capitalista de sociedade, o processo
globalizatório está centrado na economia e nos mercados financeiros. A maioria dos governos
dos Países, de seus Estados/Províncias (eleitos democraticamente ou não) são pautados por
convicção ou pressões – pelos ditames ditos globais.
A globalização é definida como um processo característico da segunda metade do
século XX, que conduz à crescente integração das economias e das sociedades dos vários
países, especialmente no que tange à produção de mercadorias e serviços, aos mercados
financeiros e à difusão de informações.
22
Para o geógrafo Milton Santos (2000), a globalização pode ser abordada em três
categorizações essenciais: como fábula, como perversidade e como possibilidade (uma outra
globalização).
a) Enquanto fábula A busca de fazer ver (e crer) que, dentro deste modelo – a aldeia
global –, tudo está ao alcance de todos: a instantaneidade das notícias, o encurtamento de
distâncias, o consumo de bens e serviços... Escamoteia-se o alcance de poucos às condições
de acesso e/ou manutenção dos meios para usufruir as informações, as viagens, o consumo,
bem como a participação no seleto grupo para o qual o Estado é máximo.
b) Enquanto perversidade o mundo como vemos e sentimos a cada dia: desemprego
crônico, aumento da pobreza, perda de qualidade de vida da classe média, salários tendendo a
baixar, fome e desabrigo em todos os continentes, instalação de novas e reaparecimento de
antigas doenças, inacessibilidade à educação de qualidade... A interferência/instalação de
regras globais solapando direitos dos trabalhadores, migração das empresas/empregos para as
mais diferentes regiões do globo, “guerra fiscal” entre cidades/Estados, parcos investimentos
oficiais na qualidade de serviços públicos em prol da qualidade de vida da maioria da
população. Em outras palavras, o caos social sob a predominância do capital econômico.
c) Enquanto possibilidade: outras formas, outros fundamentos sociais e políticos de
utilização das bases materiais, da técnica e de conhecimento existentes, voltados a uma
globalização mais humana. Condições estas vislumbradas pelo autor na sociodiversidade
16
,
na emergência de uma cultura popular esclarecida que se utiliza de meios técnicos antes
exclusivos das culturas de massa e na possibilidade de produção de um novo discurso de
universalidade, deixando esta de ser apenas elaboração abstrata para a possibilidade de poder
ser feita a partir de categorias de história concreta, do “saber de experiência feito” de cada um
e cada uma.
Da mesma forma, Frigotto (1999) expressa, quanto à globalização, que “nova é sua
escala, natureza e velocidade, sua capacidade paradoxal de excluir e fragmentar”(Frigotto,
1999, s/p). Assim como Santos, também enfatiza a influência das novas tecnologias
(microeletrônica, informacional, energética), conjugadas com formas de exclusão que não
encontram precedentes na história. O que se repete, segundo o autor, com longo histórico
precedente, é a conhecida e recorrente garantia de lucros para o capital financeiro
especulativo. Destaca, também, que
16
Sociodiversidade mistura de povos, culturas, gostos, filosofias, em/de todos os continentes, aglomerados em
espaços cada vez menores, construindo possibilidades.
23
“a positividade ou negatividade dos processos de globalização são definidos pelas
relações sociais. Romper as barreiras das cavernas, dos guetos e da província tem
sido uma busca constante na construção histórica do ser humano. Sua negatividade
reside na forma de relações sociais até hoje vigentes relações de classe que
tipificam, na expressão de Marx, a pré-história do gênero humano” (Frigotto, 1999,
s/p)
Colocação no mesmo sentido faz o pesquisador Manoel Castells (1999), que, em
longa, documentada e argumentada pesquisa, demonstra a globalização assentada sobre o
tripé informação-tecnologia-economia, que vertiginosamente em redes tomou o globo e
afetou das práticas sociais às vivências do espaço (não mais de território, mas de fluxos
17
) e
do tempo (agora intemporal
18
). Nesta nova ordem, o espaço não é mais definido enquanto
um lugar físico-geográfico, um território que é ou pode ser demarcado por/com fronteiras
materiais; é sim um espaço de fluxos, de idéias e de informações, movendo-se em um tempo
que nega sua característica central de ser a ordem de sucessão dos fenômenos, e, eliminada
esta seqüência, cria-se um tempo não-diferenciado, equivalendo à eternidade ou a um tempo
intemporal.
Enfatizamos também, a partir de Santos (2000), as possibilidades para uma outra
globalização ou uma globalização contra-hegemônica, geradas/movimentadas pela
aglomeração da população (em especial nas grandes cidades), tendo como propulsor sua
diversificação (étnica, de saberes, de comunicação, de solidariedade...). Para o autor,
a mudança histórica em perspectiva provirá de um movimento de baixo para cima,
tendo como atores principais os países subdesenvolvidos (...); os deserdados, os
pobres (...); o indivíduo liberado, partícipe das novas massas; o pensamento livre e
não o discurso único (Santos, 2001, p.14).
A comunhão do espaço geográfico, o papel da proximidade imposta aos pobres,
segundo Santos (1996) “numa gama infinita de situações, são a fábrica de relações numerosas,
17
Para Castells: “... espaço é o suporte material (simbólico) de práticas sociais de tempo compartilhado
(contigüidade)... há uma nova forma espacial característica das práticas sociais que dominam e moldam a
sociedade em rede: o espaço de fluxos. O espaço de fluxos é a organização material das práticas sociais de tempo
compartilhado que funcionam por meio de fluxos. Por fluxos, entendo as seqüências intencionais, repetitivas e
programáveis de intercâmbio e interação entre posições fisicamente desarticuladas, mantidas por atores sociais
dominantes. O ‘espaço de fluxos’ combina: a) um circuito de impulsos eletrônicos microeletrônica,
telecomunicações, processamento computacional, sistemas de transmissão e transporte em alta velocidade; b)
nós centros de importante funções estratégicas; c) organização espacial das elites gerenciais
dominantes”(Castels, 1999, p.436-7-8).
18
Conforme Manuel Castells: (...) é a mistura de tempos para criar um universo eterno que não se expande
sozinho, mas que se mantém por si só; não é cíclico, mas aleatório; não recursivo, mas incursor: tempo
intemporal, utilizando a tecnologia para fugir dos contextos de sua existência e para apropriar, de maneira
seletiva, qualquer valor que cada contexto possa oferecer ao presente eterno” (Castells, 1999, p.460). “O tempo
intemporal pertence ao espaço de fluxos, ao passo que a disciplina tempo, o tempo biológico e a seqüência
socialmente determinada caracterizam os lugares em todo mundo, estruturando e desestruturando materialmente
nossas sociedades segmentadas” (Castells, 1999. p. 490).
24
freqüentes e densas (...), uma acumulação que provoca uma mudança surpreendente movida
pela afetividade e pela paixão, levando a uma percepção global, ‘holista’, do mundo e dos
homens” (Santos, 1996, p.255). Para o autor, a condição de vizinhança impõe a
interdependência como prática, onde cooperação e conflito são a base da vida em comum.
Neste contexto, comum no chamado Terceiro Mundo (embora dele não se excluam
parcelas da população do Primeiro Mundo em especial de imigrantes), a predominante
escassez nas condições de vida da população não afasta a produção de necessidades,
embasadas no consumo dos segmentos mais abastados. Esta tentativa de homogeneização, de
usufruir de bens de consumo inacessíveis via “comércio legal”, gera uma esteira de trabalhos
imitativos, que se instalam e se reproduzem. Como aponta Santos (1996)
Este quadro ocupacional não é fixo: cada ator é móvel, podendo sem trauma exercer
atividades diversas ao sabor da conjuntura. Essas metamorfoses do trabalho dos
pobres na cidade cria o que em outro lugar denominamos de ‘flexibilidade tropical’.
uma variedade infinita de ofícios, multiplicidade de combinações em movimento
permanente, dotadas de grande capacidade de adaptação e sustentadas no seu
próprio meio geográfico (...) Desse modo, as respectivas divisões (...) de trabalho
(...) adaptam-se a si mesmas, mediante incitações externas e internas. Sua
solidariedade se cria e recria ali mesmo (...) (Santos,19996,p.260).
Complementando seu ideário dos caminhos para “Uma Outra Globalização”, Santos
(1996) coroa, longa e perspicazmente, as exposições anteriormente referidas no que
podemos denominar O elogio da Lentidão
19
- assinalando
Agora, estamos descobrindo que, nas cidades, o tempo que comanda, ou vai
comandar, é o tempo dos homens lentos. Na grande cidade, hoje, o que se dá é tudo
ao contrário. A força é dos ‘lentos’ e não dos que detêm a velocidade (...). Quem, na
cidade, tem mobilidade – e pode percorrê-la e esquadrinhá-la – acaba por ver pouco,
da cidade e do mundo. Sua comunhão com as imagens, freqüentemente pré-
fabricadas, é sua perdição. Seu conforto, que não desejam perder, vem, exatamente,
do convívio com essas imagens. Os homens ‘lentos’, para quem tais imagens são
miragens, não podem, por muito tempo, estar em fase com esse imaginário perverso
e acabam descobrindo as fabulações.
É assim que eles escapam ao totalitarismo da racionalidade, aventura vedada aos
ricos e às classes médias. Desse modo, acusados por uma literatura sociológica
repetitiva, de orientação ao presente e de incapacidade de prospectiva, são os pobres
que, na cidade, mais fixamente olham para o futuro.
(...) Por seremdiferentes’, os pobres abrem um debate novo, inédito, às vezes
silencioso, às vezes ruidoso, com as populações e as coisas presentes. É assim que
eles reavaliam a tecnosfera e a psicoesfera, encontrando novos usos e finalidades
para objetos e técnicas e também novas articulações práticas e novas normas, na
vida social e afetiva. Diante das redes técnicas e informacionais, pobres e migrantes
são tão passivos como as demais pessoas. É na esfera comunicacional que eles,
diferentemente das classes ditas superiores, são fortemente ativos.
(...) Então, o feitiço se volta contra o feiticeiro. O consumo imaginado, mas não
atendido (...), produz um desconforto criador. O choque entre cultura objetiva e
cultura subjetiva torna-se instrumento da produção de uma nova consciência
(Santos, 1996, p. 261).
19
Tomamos o tulo de artigo publicado por Milton Santos na Revista Eletrônica Trabalho Necessário, Ano 2,
nº02, 2004. (www.uff.br/trabalhonecessario - Acesso em 31/08/2006).
25
E, concordamos nós, a partir deste ponto a “nova consciência
20
as sementes para
uma outra, uma nova globalização.
um discurso generalizado e naturalizado da necessidade da educação escolar em
níveis cada vez mais elevados para a vida em sociedade. Esta máxima é propagada e está
inculcada na mente (e na fala) de todos (as), independente do papel e da condição social a que
cada um e cada uma estão adstritos (as). Enquanto base legal, nosso País tem ainda a
obrigatoriedade de ensino restrita ao período que corresponde ao Ensino Fundamental e, ao
nosso ver, firmamos um descompasso ao denominarmos oficialmente de ‘Educação Básica’
ao conjunto que abrange também outros níveis de educação.
Enquanto um dos pontos propulsores da necessidade da educação (e acreditamos que
do discurso em torno de), temos a coadunação trabalho-educação, onde exigências
introduzidas pela “modernização” dos meios de produção incitam o mercado de trabalho a
estabelecer, para a ocupação de seus postos de emprego, um nível crescente de escolarização.
Se juntam a estes fatores, mais atualmente, as ações de biopoder
21
do Estado.
Complementando este quadro – visto de nosso “ponto” – também chegam a todos (as),
via meios de comunicação de massa, modelos e padrões de vida globais homogeneizadores,
ensejando a produção de necessidades (e ilusões). Estes, entre outros discursos, apresentam a
educação como alternativa de ascensão social e de democratização de oportunidades”
(Andrioli, 2002). Também contribui neste movimento a visualização presente do “futuro
imaginado ou vislumbrado na abundância do outro e entrevisto, como contrapartida, nas
possibilidades apresentadas pelo Mundo e percebidas no lugar( Santos, 1996, p.261- grifo
nosso).
Todos estes fatores e provavelmente outros que não alcançamos neste momento da
análise e que podem vir a ser elencados atuando coletivamente no imaginário da população,
constituem a máxima anteriormente referida e, de igual modo, a esperança depositada nos
benefícios que a educação e os anos de estudo possam proporcionar a todos (as) e a qualquer
um (a).
Nossa legislação, em especial a Constituição Brasileira (1988), aponta como
obrigatoriedade o nível de educação denominado Ensino Fundamental, que compreende hoje
20
Consciência é aqui significada como um “dar-se conta” inicial que avança para a autonomização, ou, ainda,
para um empoderamento.
21
Biopoder é aqui usado como denominação das ões estatais ligadas em especial à saúde e à educação, que,
objetivando o bem-estar da população, “sujeitam-na” com intervenções em suas práticas cotidianas, tais como ao
uso de vacinas, realização de exames, freqüência à escola..., como pré-requisito ao acesso a outros benefícios
sociais. Esta interpretação advém do texto “A genealogia do Saber” de Michel Foucault publicado no livro de
Roberto Machado “Ciência e Saber – A trajetória de M. Foucault”.
26
no ensino regular a faixa etária dos seis aos catorze anos, perfazendo um total de nove
anos de escolarização (recentemente adotado). A Carta Magna aponta a necessidade e/ou
sugere a possibilidade de atendimento as faixas etárias inferiores (zero a cinco anos)
correspondendo a Educação Infantil e um pouco superiores (quinze a dezoito), atingindo o
Ensino Médio.
Interpretamos como uma incongruência a obrigatoriedade de ensino apontada pela lei
maior se analisada junto à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN
9394/96), que introduz a expressão “Educação Básica” e nela inclui a Educação Infantil, o
Ensino Fundamental e o Ensino Médio. Ora, por “básica” entendemos “que faz parte da base,
que é essencial, principal” (Ferreira,1999, s/p), ou ainda como discorre a LDBEN “a educação
básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum
indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e
em estudos posteriores”(LDBEN 9394/96, Art.22). É deveras interessante se conseguir
dissociar, legalmente, o que é indispensável do que é obrigatório. O que estaria implicado e
implicando neste contra-senso?
Como referido anteriormente, o mercado de trabalho vem avançando a cada dia
mais as requisições em torno das necessidades de escolarização (e, mais especificamente no
desenvolvimento de inúmeras “habilidades e competências”, da cnica ao convívio e atuação
coletivos) de seus quadros funcionais. Se o Estado baseia suas ações nos ditames deste
mercado, por que não amplia a obrigatoriedade de ensino?
Encontramos aqui empecilhos e interferências da globalização nas ações educacionais.
Desde o pós-guerra, globalmente buscam-se formas de estender a educação e a melhoria da
qualidade de vida (infra-estrutura) a todos os humanos do planeta (ao menos no discurso).
Para tanto, foram criadas instituições, vinculadas à Organização das Nações Unidas (ONU),
com o intuito de estudar, pesquisar, planejar e financiar ações mitigadoras das mazelas
causadas pelo subdesenvolvimento.
Não pretendemos esmiuçar toda a gama de questões que envolvem financiamentos e
exigências internacionais vinculadas ao setor educacional brasileiro, mas apenas ilustrar
22
a
partir de alguns autores - com colocações que consideramos esclarecedoras, as interrogações
acima levantadas.
22
Concordamos, porém, com Marília Fonseca(2001), que se faz importante “trazer à luz os fundamentos que
sustentam o processo de cooperação internacional liderados pelo Banco Mundial e também mostrar que a sua
influência política não se impõe de forma unilateral, mas compartilhada com setores governamentais, sendo
alimentada pelo próprio desconhecimento de sua existência por parte dos que atuam na escola. Nesse caso,
conhecer o problema e criar espaço para refletir sobre ele é o primeiro passo para superá-lo”(Fonseca,
2001,p.40).
27
Historiando brevemente, Costa (1996) aponta a tomada de empréstimos junto às
agências financiadoras pelos Países dos Terceiro Mundo (anos 40, 50, 60, 70) entre eles, o
Brasil – que passaram por surtos de crescimento e modernização; porém, frente à crise
mundial que se acirrou nos anos 80 (já manifestava-se em meados dos anos 70), tiveram
acentuadas perdas frente à elevação de juros da dívida contraída, conjugadas com forte
desvalorização de suas comoditties, que equilibravam seus orçamentos. Deu-se então o
endividamento galopante, a inadimplência e a incapacidade de saldar as dívidas adquiridas.
Grosso modo, estava pronto o cenário para a intervenção dos organismos internacionais na
política interna dos países endividados. Para Costa (1996),
a crise da virada 70/80 é identificada, no Primeiro Mundo, como uma crise dos
Walfare State, no lado de baixo da Linha do Equador, como derrocada do modelo de
Estado desenvolvimentista, condutor de políticas de industrialização/sustituição das
importações (Costa, 1996, p.50).
Destaca-se, entre as instituições financiadoras (e agora “cobradora”), o Banco
Mundial. Segundo Fonseca (2001), o fato deste ter passado a oferecer empréstimos
designados ao setor social
23
:
decorreu dos prognósticos internacionais sobre o crescimento acelerado da pobreza
no Terceiro Mundo, considerado como fator direto de transtornos sociais locais, com
sérias conseqüências para a estabilidade dos países desenvolvidos. Por essa razão, o
Banco e outras agências internacionais de fomento passaram a destinar créditos para
o desenvolvimento social (incluindo educação, saúde e desenvolvimento rural), para
atingir predominantemente determinados segmentos populacionais que se
encontravam fora dos limites aceitáveis de pobreza, denominados grupos
emergenciais ou de risco (Fonseca, 2001, p. 15 e 16).
Enquanto instituição financiadora, o Banco Mundial que, como bem sugere sua
nomenclatura, busca vincular, ou melhor, subordinar a educação ao setor econômico,
postando-a (ou seria prostrando-a?) no limiar de produto de mercado segundo Fonseca
(2001)
23
Em pesquisa, Soares (1996) explicita dados dos empréstimos do Banco Mundial ao Brasil, sendo em 1949 o
primeiro no valor de U$ 75 milhões, destinados ao setor de energia e transportes; entre 1949 e 1954, foram
financiados ao país um total de U$ 194 milhões. Segundo a autora, entre 1955-1957 e 1960-1964, mais por
motivos políticos do que discordâncias da ordem da política econômica, não houve aprovação de empréstimos
para o Brasil. com o início do regime militar, o referido banco foi ampliando seus empréstimos para o país,
que tornou-se o maior tomador de recursos do BIRD (Banco Internacional para a Reconstrução e
Desenvolvimento) nos anos 70. Financiamentos específicos para a educação ocorrem no período 1966-1975,
perfazendo um percentual de 1,6% do montante dos recursos financiados; repete-se o mesmo valor entre 1976-
1983.
28
detém a maior fonte de créditos para o financiamento de projetos na área, no
momento em que outras agências sofrem com a carência de recursos financeiros. Na
década de 1990, foi um dos principais financiadores de eventos educativos de
abrangência internacional, como a Conferência Mundial de Educação para Todos,
cujas conclusões constituíram referência para a definição de políticas educacionais
no Brasil (Fonseca, 2001, p.14 e 15).
São premissas do Banco Mundial dois elementos que condicionam a formulação de
políticas públicas: as privatizações e a redução do gasto público. Em termos de política
educacional específica, este banco, com o apoio da UNESCO, da UNICEF e do PNUD, tem
“impulsionado políticas de democratização do ensino” (Torres, 1996, p.126); porém, tendo
como componentes de seu quadro de assessores essencialmente economistas e não
educadores aponta que, embasado em pesquisas, “um ano adicional de educação primária
nos níveis mais baixos do sistema produz aumentos maiores de renda que em níveis mais
altos de educação”( Torres, 1996, p.127). Ou ainda, como salienta Fonseca (2001)
a oferta educacional deve ser seletiva, de forma que diminua os encargos financeiros
dos estados. Por essa razão, apenas o ensino inicial (quatro primeiras séries do
ensino básico) seria universalizado sob a responsabilidade do governo. À medida
que ascende na escala educacional, a oferta de ensino deve ser repassada ao setor
privado (Fonseca, 2001, p.18).
Nesta lógica, consideravam eles/as que ter completos os anos iniciais do ensino
fundamental era o suficiente para a população dos países em desenvolvimento e, pontuados os
custos e benefícios com os quais mediam o “retorno social da escolaridade em diferentes
países, mostravam que a rentabilidade social dos níveis mais elevados de ensino só era
favorável aos países mais desenvolvidos” ( Fonseca, 2001, p.36).
As orientações advindas da cooperação internacional, com base em pesquisas de seus
assessores, não levam em consideração as diferentes realidades, apesar de afirmarem observar
as especificidades locais; na prática, há um padrão constituído a partir de mesclas de dados de
diversas nações, portanto, “o que se verifica na ação é a imposição de conclusões genéricas
para amplas regiões, marcadas por diferenças culturais e econômicas” (Fonseca, 2001, p.26).
Reforçando estas afirmações, Torres (1996) enfatiza que o Banco Mundial não
apresenta idéias isoladas, mas uma proposta articulada – uma ideologia e um pacote de
medidas para melhorar o acesso, a eqüidade e a qualidade dos sistemas escolares,
particularmente do ensino fundamental. Embora se reconheça que cada País e cada situação
concreta requerem especificidade, trata-se, de fato de um “pacote” de reforma proposto aos
países em desenvolvimento que abrange um amplo conjunto de aspectos vinculados à
educação, das macropolíticas à sala de aula.
29
Então, ao nos voltarmos para a educação dos adultos pouco ou não-escolarizados,
nosso tema central de pesquisa, encontramos argumentos e posições de assessores do Banco
Mundial, reproduzidos em pesquisa de Haddad (1997), que comentam as políticas públicas
para o setor:
Isto não funcionou em lugar nenhum, a não ser em condições excepcionais (...), que
não podem ser reproduzidas no Brasil. s não temos recursos para colocar um
analfabeto por dez horas todos os dias na escola. É simples: não adianta oferecer a
ele uma segunda chance dentro do mesmo sistema no qual fracassou. Melhor
investir para que o sistema de educação básica passe a funcionar.(Declarações de
Cláudio Moura Castro, à Rev. Veja de 05.05.93 – Apud Haddad, 1997, p.221)
Haddad cita, no mesmo artigo, as colocações de outro assessor: “Alfabetizar adultos é
um suicídio econômico: um adulto que não sabe ler se adaptou a esta situação” (Sérgio
Costa Ribeiro, à Ver. Veja de 23.06.93 – Apud Haddad, 1997, p. 221).
Perceptíveis, em ambas as falas, a ausência da noção de justiça social, direitos e
cidadania. Salienta-se, predominante e único o discurso econômico bem aos moldes de
instituições financeiras. Concluindo, e à guisa de ilustração quanto a aplicação destas
orientações às políticas públicas de EJA, Di Piero e Graciano ( 2003) consideram que:
Apesar da demanda crescente de jovens e adultos por oportunidades educacionais
em virtude das exigências de escolaridade para o acesso e a permanência no
mercado de trabalho, o Governo Federal optou por priorizar a oferta de Ensino
Fundamental às crianças e adolescentes. O expediente utilizado para focalizar os
recursos públicos nesse grupo etário foi a restrição ao financiamento da educação
para jovens e adultos por meio do FUNDEF(criado em 1996 e implementado
nacionalmente a partir de 1998). Recorrendo à prerrogativa de veto do Presidente da
República, o Governo anulou um inciso da Lei 9424/96 aprovada pelo Congresso
regulamentando o Fundo, e que permitia computar as matrículas no Ensino
Fundamental presencial de jovens e adultos nos cálculos do FUNDEF. O veto
desestimulou Estados e Municípios a investirem na educação de jovens e adultos (Di
Piero e Graciano, 2003, s/p).
na análise de Dickel (2004), um empenho dos governos que têm- se sucedido no
Brasil, nos últimos dez anos, em torná-lo um país competitivo, capaz de disputar com outros
países um lugar na esfera da produção e da comercialização mediante a oferta de um ‘capital
humano’ de melhor qualidade. De outra parte, o aumento do contingente de pessoas que não
produzem e, portanto, também não consomem, gera uma instabilidade capaz de produzir
efeitos nocivos ao sistema econômico mundial. Para a autora,
isso transporta para o campo educacional uma nova demanda ou até mesmo a
necessidade de retomar a sua função originária: aprimorar o importante papel da
educação no que se refere à mobilidade e igualdade sociais. Diante desse quadro, é
preciso restituir às pessoas o desejo de ascensão e a percepção de que um dos
30
mecanismos para tanto é a escolarização, é o domínio de ferramentas básicas com as
quais possam lutar por um lugar no processo produtivo (Dickel, 2004, p. 21).
Mesmo admitindo como real tal preocupação dos governos, poucos deles apresentam
projetos, processos ou ações práticas oriundas desta apreensão na viabilização de um
incremento no nível de educação dos trabalhadores e trabalhadoras, em especial, como
destacavam anteriormente Di Piero e Graciano, na educação de jovens e adultos, ou seja,
de/para uma educação ao longo da vida.
Neste sentido Coraggio (1996) aponta para certo “vazio” na postura das políticas
educacionais brasileiras:
A duplicidade de critérios manifestada pelo Banco Mundial deve trazer-nos à mente
não somente os sentidos implícitos de suas propostas como também o vazio de
critérios nacionais bem definidos sobre nossas políticas educacionais. Partir de uma
posição nacional solidamente fundamentada ajudaria a colocar entre parênteses o
caráter técnico das propostas alternativas do Banco. (Coraggio, 1996, p.119)
A Educação de Jovens e Adultos, hoje, se constitui uma modalidade
24
da Educação
Básica. É caracterizada oficialmente pela oferta de ensino a população com faixa etária
superior a 15 anos, para o ingresso no Ensino Fundamental, e maior de 18 anos, para o Ensino
Médio não-cursados ou não-concluídos no período padrão estabelecido e priorizado,
historicamente, a estas aprendizagens.
Na legislação vigente, a EJA é assegurada como dever do Estado, de oferta obrigatória
e gratuita, conforme a Constituição Federal de 1988 (Art. 208, inciso I) para o nível
fundamental. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN Lei
9394/96), esta garantia é reafirmada como dever do Estado e expressa o reconhecimento da
diversidade da população a ser atendida:
oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e
modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos
que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola (LDBEN
Art. 4º, inciso VII).
Os Sistemas de Ensino assegurarão gratuitamente (...) oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e trabalho, mediante cursos e exames (LDBEN, Art. 37, § 1º).
O teor da LDBEN, portanto, amplia a abrangência do nível de ensino, em relação à
Constituição: “(...) destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no
ensino fundamental e médio na idade própria” (LDBEN, Art. 37 – grifo nosso).
24
Abordamos enquanto Modalidades da Educação Brasileira subdivisões da Educação Básica, inseridas em
seus níveis (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino dio), com características específicas de uma
população, como a Educação Especial, Educação Indígena, Educação de Jovens e Adultos,...
31
A EJA é atualmente ofertada em instituições educacionais públicas estatais e em
estabelecimentos de ensino privado (escolas, colégios, institutos, núcleos...), bem como em
convênios do poder público com várias entidades ou, ainda, de iniciativa e financiamento
próprio destas; em órgãos do Sistema S (SESI, SENAC, SENAR...); nos movimentos sociais
(associações, sindicatos, cooperativas, MST, MPA...); em/de empresas de diversos ramos a
seus funcionários (estimuladas a efetuarem ações de escolarização por meio de programas
empresariais programas/prêmios de qualidade e também por incentivos fiscais
governamentais), etc. Compõem-se de ações de alfabetização, cursos e exames, abrangendo o
Ensino Fundamental e Médio. Também ocorrem processos de educação à distância via rádio,
televisão e materiais impressos.
Numa educação que se quer libertadora, dialógica, de respeito à diversidade, à cultura,
ao conhecimento e à expressão popular, onde “Ninguém educa ninguém. Ninguém educa a si
mesmo. Os homens (e mulheres)
25
se educam em comunhão, mediatizados pelo
mundo”(Freire, 1967, p.79); em suma, uma educação de vertente humanista e “freiriana”, na
qual faz-se usual a expressão educando e educanda em substituição a aluno e aluna. O
neologismo ejando/ejanda
26
identifica e qualifica estudantes desta modalidade da Educação
Básica.
1.2 Proposta do Programa de Governo
Nas eleições ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 1998, a maioria
da população gaúcha elegeu o projeto da Coligação “Frente Popular”, constituída por partidos
políticos de esquerda (PT, PC do B, PSB), tendo como governador Olívio Dutra e vice-
governador, Miguel Rosseto. No Programa de Governo, no que tange à educação, estava
previsto:
Os Princípios e Diretrizes da Política Educacional passarão por intensa discussão
das comunidades escolares, urbanas e rurais. A mantenedora (Secretaria de Estado
da Educação) organizará com as escolas e as entidades ligadas à educação, a
Constituinte Escolar, que culminará com o 1º Congresso Constituinte da Rede
Pública Estadual de Ensino. O Congresso definirá as linhas básicas da Política
Educacional a ser implementada pelo Governo Popular (Programa de Governo da
Frente Popular, 1998).
25
Acréscimo da autora: certamente - de onde estiver - Freire “verá com bons olhos”.
26
Expressão utilizada pelo professor Dinarte Belato,(UNIJUÌ/RS) em momento de formação para educadores de
EJA, organizado pela 36ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE/Ijuí), em 13/08/2004, no texto “A
Constituição do Sujeito da EJA” de sua autoria.
32
Neste projeto, concebia-se
a política educacional como desdobramento de um projeto de radicalização da
democracia, através da participação da comunidade escolar na formulação,
execução, gestão e fiscalização das políticas públicas para o setor. Trata-se de
construir e consolidar, na dimensão educacional, uma esfera pública de decisão,
fortalecendo o controle social sobre o Estado e garantindo que a escola seja
realmente pública (Elementos do Programa de Governo Democrático e Popular para
a Educação – 1998).
Propunha-se uma educação popular que, apontando para a democratização da escola
como eixo central, emanaria o compromisso político com a viabilização de um intenso
processo participativo para concretizar um ensino “de qualidade social, transformador e
libertador”, vinculado à realidade e articulado com o projeto de desenvolvimento para o
Estado e o País. Comprometia-se com a democratização do acesso à escola, buscando: a
universalização do Ensino Fundamental; a expansão do Ensino Médio; políticas para o
atendimento das crianças de 0 a 06 anos e a Portadores de Necessidades Educativas Especiais;
amplo Movimento de Alfabetização e de Educação de Adultos, bem como projetos adequados
à educação de jovens e adultos trabalhadores.
Cabe destacar, como elemento estruturador/inspirador do programa de governo para a
educação, a experiência desenvolvida na gestão de Olívio Dutra e nos três mandatos
sucessivos da Frente Popular na Prefeitura de Porto Alegre Capital do Rio Grande do Sul,
bem como em experiências e gestões de outros Municípios da Frente Popular, no Estado e no
País. Há a participação de parcela significativa do grupo da gestão municipal no planejamento
e execução agora em nível bastante ampliado da Política Pública para a Educação, aqui
abordada em especial a de Jovens e Adultos.
Com a assunção dos eleitos, em janeiro de 1999 e empossada a Secretária de
Educação, professora Lúcia Camini como longo histórico de participação nos movimentos
sociais, em especial na militância e presidência do CPERS/Sindicato
27
e constituída sua
equipe de trabalho, desencadeou-se em todo o Estado o “Movimento Constituinte Escolar”.
27
CPERS/Sindicato Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul, renomeado para Sindicato dos
Trabalhadores em Educação, passando a ser constituído também pelos funcionários/as das Instituições ligadas à
Educação.
33
1.3 A Elaboração Participativa da Política Pública para a Educação
Para viabilizar os objetivos e propostas do Programa de Governo para a Educação, a
Secretaria da Educação apresentou como prioridade o “Projeto Constituinte Escolar
Construção da Escola Democrática e Popular”.
Como o termo constituinte
28
sugere, este projeto propiciou a toda a comunidade sul-
rio-grandense que, observando e lendo sua realidade local/global, se tornasse constituinte da
Política Educacional do Estado do Rio Grande do Sul; portanto, enquanto sujeitos de um
processo de construção, se manifestassem elencando propostas de manutenção,
transformações, alterações, redimensionamentos... nas ações educacionais do Estado:
discutindo-as com seus “pares” das diversas escolas e instituições das diferentes regiões;
elegendo/votando os pilares que passariam a constituir a Política Educacional e, em momento
posterior – não menos importante –, transcrevendo-os em documentos escolares (Projeto
Político-Pedagógico, Regimento, Planos de Estudo...) e práticas nas instituições da Rede
Estadual.
1.3.1. O Movimento Constituinte Escolar
29
- Pressupostos, Metodologia e Momentos
A Constituinte Escolar é um amplo movimento, de participação ativa da comunidade
escolar (alunos, pais, trabalhadores em educação), organizações da sociedade civil,
instituições do poder público na definição de princípios e diretrizes da Educação
Pública no Estado do Rio Grande do Sul. Enquanto método deve assegurar
diversificados fóruns e espaços de debate, reflexão e formulação de propostas pela
comunidade escolar. Fundamenta-se nos seguintes pressupostos: educação como um
direito, participação popular, dialogicidade, radicalização da democracia e a utopia
(SEE, 1999-a, p. 3-4).
O Movimento Constituinte Escolar (CE) possuía como objetivo geral a elaboração dos
princípios e diretrizes para orientar a construção de uma escola democrática e popular e, por
decorrência, criar as condições para a sua implementação. Conjuntamente, também caberia
estudar a realidade regional, enfatizando o contexto do aluno, resgatar as práticas educativas
realizadas nas escolas públicas estaduais, em organizações da sociedade civil e em instituições
públicas e refletir sobre elas. Da mesma forma, buscaria constituir-se em/como espaço de
formação dos trabalhadores em educação.
28
Constituinte , segundo o Dicionário Aurélio (1999) refere-se ao “que tem atribuições constituídas pelo povo
e/ou pelo governo para elaborar, redigir ou reformar a constituição; assembléia constituinte; comissão
constituinte.”
29
Ver visão geral no Anexo I “Constituinte Escolar – Esclareça suas dúvidas” e “Calendário da CE”.
34
A CE envolveu a comunidade escolar (alunos, professores, funcionários e pais),
organizações da sociedade civil e instituições do poder público “num grande movimento que,
através de debates, estudos e socialização de experiências, oportuniza, de forma inédita, que a
comunidade do Rio Grande do Sul retome e analise, participativamente, o cotidiano da escola
pública” (SEE, 2000-f, p.10). Para coordená-lo, as responsabilidades eram compartilhadas
pela Secretaria de Estado da Educação (Geral/Estadual); pelas então Delegacias de
Educação
30
(Regionais); pelas Escolas, organizações e instituições educacionais (Locais).
Enquanto opção metodológica, a CE trabalhou com a Concepção Dialética do
Conhecimento, entendendo-a como “um processo sistemático e intencionado de compreensão
da prática social para transformá-la de maneira consciente, em função de processos
organizativos concretos e na perspectiva da construção do projeto histórico” (Leis, apud SEE,
2000-f, p. 18). Nesta concepção, o ponto de partida do processo de construção do
conhecimento é a prática social concreta e a realidade onde ela ocorre; analisando-a,
constroem-se novos níveis de compreensão e abstração sobre a mesma, buscando vê-la de
modo diferente, apreendendo sua complexidade histórica (político-social e econômico-
cultural), desvelando-a e, então, propondo alternativas para sua modificação/adequação.
Dentre o leque de alternativas de metodologias possíveis, decidiu-se pela Pesquisa
Participante
31
devido a esta compor, ao mesmo tempo, uma prática de participação, de
investigação e de ação educativa. Na CE, as principais características desta pesquisa foram:
a) a intencionalidade política explícita de trabalho com as camadas populares,
geralmente excluídas de processos decisórios;
b) uma prática integrada, articulada, de educação, investigação e participação social;
c) participação efetiva das camadas populares como sujeitos de um processo de
produção de conhecimento e, ao mesmo tempo, de definições de políticas públicas; e
d) o suporte de trabalho em grupos organizados, que formulem propostas práticas de
intervenção na realidade que está sendo investigada, na perspectiva de sua
transformação (SEE, 2000-f, p.21-22).
30
No decorrer do Governo (1999/2002), procederam-se discussões que ensejaram na mudança da nomenclatura
dos órgãos regionais de educação, passando de “Delegacias”, que carregavam uma conotação autoritária, de
inspetoria/fiscalização, a “Coordenadoria”, que propunha a gestão e construção compartilhada das decisões
pertinentes ao campo educacional.
31
A Pesquisa Participante caracteriza-se como uma prática de investigação que incorpora os grupos excluídos às
esferas de decisão, produção e comunicação de conhecimentos, visando contribuir na transformação da realidade
com mudança, nas condições de dominação. Seus objetivos situam-se em, basicamente, três direções: visar à
compreensão e transformação da realidade; proporcionar a ruptura do monopólio do saber e do conhecimento,
capacitando a comunidade para pesquisar e interpretar sua realidade de maneira autônoma; provocar a
reconstrução curricular, definindo as temáticas significativas para o trabalho pedagógico e afirmando o papel do
educador como mediador e problematizador das diferentes concepções/visões de mundo presentes na
comunidade (SEE, out./2002).
35
A condição primeira para a assunção, respeito e defesa de uma proposta passa por uma
efetiva participação daqueles a que se destina, tanto na elaboração quanto na definição, bem
como na pertinência desta à realidade de inserção. Tendo clareza disso, a elaboração dos
Princípios e Diretrizes que passariam a embasar a ação educacional governamental foi
“precedida de um amplo trabalho de identificação das necessidades que a realidade
educacional e escolar apresenta, articuladas à análise e compreensão dos fatores que são
determinantes dessa realidade” (SEE, 2000-f, p. 22).
O movimento CE foi organizado em cinco momentos, articulados entre si e não
estanques:
a) Primeiro: elaboração da proposta, sensibilização, preparação das condições para o
desencadeamento do processo e lançamento da Constituinte;
b) Segundo: estudo da realidade regional contextualizada, resgate de práticas
pedagógicas e levantamento das temáticas para aprofundamento;
c) Terceiro: aprofundamento das temáticas levantadas no 2º momento;
d) Quarto: definição de princípios e diretrizes da Escola Democrática e Popular; e
e) Quinto: reconstrução dos projetos político-pedagógicos nas diferentes instâncias -
Escolas, DEs, SEE (SEE, 1999-a, p. 05).
1.3.2 Tempo de Debates
Lançada em abril de 1999, a CE reverteu a prática de “projeto de gabinetes” levados às
Escolas em manuais para serem executados, não apenas entregando à comunidade a primazia
(e a enorme responsabilidade) de construir, elaborar a proposta a ser desenvolvida na “sua”
escola, mas, em um processo de constante diálogo, que envolveu a avaliação e reavaliação de
conhecimentos, opiniões, discussões, argumentações, estudos..., fez-se a leitura (da leitura
feita pelos cidadãos e cidadãs) da realidade do Estado, de cada uma de suas regiões, de cada
comunidade escolar; foram problematizadas as diferentes visões buscando a emergência da
consciência crítica e a superação do pensar mágico/ingênuo/conformista numa versão
sempre atual – do primeiro momento da Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire (2005):
A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois
momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão comprometendo-se, na
práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a realidade
opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos
homens em processo de permanente libertação (Freire, 2005, p.46).
O processo se desenvolveu durante dezoito meses com constantes encontros e
contatos nas/das comunidades escolares,além de intensos trabalhos das comissões
coordenadoras da CE nas suas diversas instâncias, perpassados:
36
1.3.2.1 Nas Comunidades Escolares
Constituída uma “Comissão da CE” em cada Escola, formada por representantes de
todos os segmentos (funcionários/as, pais/mães, alunos/as, professores/as) eleitos/as por seus
pares e representantes de organizações populares existentes na comunidade, deu-se início aos
trabalhos de resgate de práticas pedagógicas da escola
32
(critérios que as embasam e/ou
deveriam embasar, potencialidades, dificuldades e conflitos existentes); da história da escola
na comunidade e de seu papel no desenvolvimento da comunidade e região. Tais discussões,
sendo realizadas e sistematizadas, geraram, a nível estadual, temáticas
33
articuladas a temas,
que retornaram em forma de subsídios para estudos e aprofundamentos às comunidades
(Cadernos Temáticos
34
);
1.3.2.2. Nas Pré-Conferências Municipais ou Microrregionais da Educação
De posse da sistematização geral das discussões que ocorreram em cada comunidade
escolar do Estado, com as elaborações e proposições para uma educação inclusiva, de
qualidade social, transformadora e libertadora, produziu-se um “Texto-Base”
35
destinado às
discussões nas Pré-Conferências Municipais/Microrregionais da Educação, subdividido em
quatro partes, contendo organizadamente (nas temáticas anteriormente referidas), em forma
de Princípios e Diretrizes Preliminares, as “falas” das comunidades que:
32
Sistematizadas e organizadas em cada Coordenadoria Regional no Caderno 4 – Estudo da Realidade e Resgate
de Práticas Pedagógicas.
33
Da sistematização dos debates, emergiram quatro (04) temáticas principais: Educação Democracia e
Participação; Construção Social do Conhecimento; Políticas Públicas e Educação; Concepção de Educação e
Desenvolvimento.
34
Das temáticas, também demandados pelas comunidades, elencaram-se 25 temas apontados com recorrência e
organizados para estudos (aprofundamento teórico) em Cadernos Temáticos distribuídos às escolas, sendo eles:
Gestão Democrática (administrativa, financeira e pedagógica); Planejamento Participativo; Estrutura do Sistema
Educacional Escolar; Relações de Poder na Escola e na Sociedade (interpessoais, de trabalho, família-escola,
escola-comunidade, escola e diferentes organizações da sociedade); Concepções Pedagógicas/ Teorias de
Ensino-Aprendizagem; Conhecimento Científico e Saber Popular; Currículo (avaliação como processo,
metodologia, interdisciplinaridade, ritmo, tempo, espaço, conteúdos/conhecimento); Evasão e Repetência;
Avaliação da Prática Educativa; Papel do Estado, do Serviço Público e Função Social da Escola; Escola como
Espaço Público, de Produção de Conhecimento, Cultura, Lazer e Recreação; Educação: Humanização ou
Exclusão?; Projetos de Desenvolvimento Sócio-Econômico e Educação; Qualificação, Valorização e Formação
Permanente dos/as Trabalhadores/as em Educação; Saúde dos/as Trabalhadores/as em Educação; Educação
Ambiental; Educação no Meio-Rural; Educação e Tecnologias; Violência; Trabalho Infantil e Adolescente;
Influência dos Meios de Comunicação na Formação, Controle e Alienação dos Sujeitos Sociais; Diversidade
Sóciocultural, Étnica e de Gênero; Ética, Cidadania e Valores; A Construção da Unidade Político-Pedagógica na
Diversidade dos Níveis e Modalidades de Ensino.
35
Caderno “Texto Base para as Pré-Conferências Municipais/Microrregionais da Educação” Momento da
CE.
37
I) foram consenso nas discussões realizadas;
II) apresentaram discordâncias (anexada a esta sessão material com problematizações,
no sentido de analisar as colocações discordantes em relação aos pressupostos da CE e aos
Princípios e Diretrizes consensuais);
III) outras questões levantadas que não constituem Princípio e nem Diretriz, porém
expressam a preocupação de parcela dos participantes apontando para ações, atividades ou
reivindicações (estão registradas e voltam às discussões).
Foram realizadas mais de 190 Pré-Conferências entre os dias 10 e 27/7/2000,
envolvendo cerca de sessenta mil pessoas, as quais: discutiram o texto-base em pequenos
grupos; socializaram as discussões em plenária; votaram os pontos em desacordo (após
argumentações); e elegeram delegados e delegadas de cada segmento representativo das
comunidades escolares e de outras instituições participantes para a próxima etapa.
1.3.2.3. Nas Pré-Conferências Regionais da Educação
Sistematizados os indicativos da comunidade (na instância regional e, após o conjunto
destas, no âmbito estadual equipes CREs e SEE), re-organiza-se o material produzido em
“Texto-Base para as Pré-Conferências Regionais”
36
, constituído assemelhadamente ao
anterior (dentro de cada temática):
I) Princípios e Diretrizes construídos ao longo do processo;
II) acréscimos ou alterações propostos em “I”, não-contraditórios ao mesmo;
III) acréscimos ou alterações propostos que são contraditórios a “I”; junto a estes estão
elencadas problematizações que, como no texto anterior, visam a reflexão e a análise junto
aos demais pontos consensuais; e
IV) presentes também as “outras questões”, levantadas no primeiro texto e
ampliadas neste.
Entre os dias 07 a 12/8/2000, foram realizadas 31 Pré-Conferências Estaduais da
Educação, quando cerca de nove mil pessoas constituídas delegados/as eleitos/as na
conferência anterior debateram o Texto em pequenos grupos, levaram suas posições à
plenária, votaram os argumentos apresentados e, ao final, elegeram delegados e delegadas
para a Conferência Estadual.
36
Caderno “Texto-Base para as Pré-Conferências Regionais da Educação” – 4º Momento da CE.
38
1.3.2.4. Na Conferência Estadual da Educação
Os indicativos aprovados, acrescentados ou alterados pelas Pré-Conferências
Regionais foram novamente organizados em um Seminário Estadual (Equipes das CREs e da
SEE), gerando o Texto-Base para a Conferência Estadual da Educação. Neste, permaneceu a
estrutura dos textos antecedentes, com as mesmas divisões e subdivisões; dele foram retiradas
as propostas debatidas pela comunidade e votadas em todas as Pré-Conferências Regionais
para serem excluídas, permanecendo no texto todas as sugestões que foram mantidas por
alguma Regional.
Nos dias 24, 25 e 26 de agosto de 2000, reunidos na Capital do Estado, três mil e
quinhentos delegados e delegadas oriundos de todos os pontos do Estado alunos/as,
pais/mães, funcionários/as, professores/as participaram de palestras, comunicações, de
momentos culturais, socializaram conhecimentos, e, distribuídos em cem grupos de trabalho,
analisaram o “novo texto”.
Sistematizados os apontamentos de todos os grupos em outro documento, procedeu-se
à discussão e votação na grande Assembléia e Plenária Final da Constituinte Escolar: estavam
agora definidos os Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual.
Testemunhando sobre o Movimento Constituinte Escolar, que foi protagonizado por
inúmeros atores sociais, encontramos declarações, como:
Quando Mário Quintana escreveu ‘Das Utopias
37
provavelmente não imaginava
que, depois de décadas de ditadura militar, a utopia de milhões de brasileiros estaria
sendo realizada em terras gaúchas.
As fotos do processo Constituinte Escolar mostram assembléias lotadas, com
professores/as, alunos/as, funcionários/as, pais e mães participando ativamente.
Relatos (quase sempre entusiasmados e emocionados) das pessoas que participaram
enfatizam o envolvimento de todos que consideram a educação como um direito
fundamental.
Lendo o documento “Princípios e Diretrizes (...) e observando as fotos nele
publicadas não pude deixar de pensar na idéia de Paulo Freire, insistentemente
repetida, de que somos ‘sujeitos da história’ (Reigota, 2002, p. 07).
1.3.3. Os Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual
O documento elaborado após a Conferência Estadual da Educação, sistematizando
o ideário da comunidade gaúcha para a escola pública estatal, retrata o histórico do
37
Das Utopias
Se as coisas são inatingíveis ... ora! / Não é motivo para não querê-las /
Que tristes os caminhos, se não fora / A presença distante das estrelas.” rio Quintana
39
Movimento Constituinte Escolar em todas as suas etapas, contém registros fotográficos dos
diversos momentos, e, organizados nas quatro Temáticas iniciais, um conjunto
38
de 23
princípios e 64 diretrizes. Constam também do “texto constitucional” questões que, não
consideradas princípio nem diretriz, apontam ações/atividades e reivindicações sugeridas ao
longo do processo.
Endossamos enquanto cidadã participante do processo, educadora e componente da
equipe de trabalho da 39ª CRE
39
- esta afirmação da Secretaria de Estado da Educação:
Pela primeira vez na história do nosso Estado, tantas pessoas foram sujeitos efetivos
da construção dos rumos para a escola pública estadual. Fica comprovada a
capacidade e possibilidade real de elaboração, teorização e construção coletiva do
conhecimento.
(...) Tivemos momentos de alegria, mas também de muitas incertezas e insegurança,
pois estávamos refletindo o nosso fazer, que é mais significativo e desafiante do que
refletir sobre o fazer dos outros. Sem dúvida, isso nos assustou num primeiro
momento, até que nos demos conta de que através da mudança da nossa forma de
pensar e agir na prática concreta é que mudamos a escola, a educação e,
conseqüentemente, o mundo ao nosso redor (SEE, 2000-f, p. 30-31).
Finalizado o 4º Momento da Constituinte Escolar, passou-se ao seguinte, no qual
“devolvia-se”
40
a toda a comunidade escolar os “resultados”, agora transcritos em Princípios e
Diretrizes que balizariam a construção dos documentos da escola: Projeto Político-
Pedagógico, Plano(s) de Estudos ou de Curso e Regimento Escolar.
Testemunhamos a incredulidade de ‘novos/as companheiros/as’ de processo
participantes de governos/equipes anteriores que afirmavam ter inúmeras vezes sugerido às
escolas a modificação de seus documentos, em especial o Regimento Escolar; mas, neste
momento, nenhuma das instituições lembrava este dado e, surpreendentemente para estes,
predispunham-se a refazê-los. Víamos, então, reafirmado o pressuposto freiriano de que “a
realidade não pode ser modificada, senão quando o homem descobre que é modificável e que
ele pode fazê-lo” (Freire, 1980, p. 40). Por outro lado,para que a mudança seja vislumbrada e
efetivada, ela requer a consciência
41
da realidade, nas palavras de Paulo Freire (1999):
A realidade concreta é algo mais que os fatos tomados mais ou menos em si
mesmos. Ela é todos esses fatos e todos esses dados e mais a percepção que deles
38
Material que constitui o Anexo II.
39
39ª Coordenadoria Regional da Educação sediada na cidade de Carazinho. Abrange 21 Municípios e atendia
no período - a um total de 71 Escolas Estaduais e suas comunidades.
40
Momentos organizados em cada escola, quando seu grupo de representantes (delegados/as) retornava de
seminários, pré-conferências,...
41
Tomo a expressão de Paulo Freire, em que o termo consciência/conscientização implica ação, isto é, uma
relação particular entre o pensar e o atuar desvelando a razão de ser das coisas, acompanhado de uma ação
transformadora. Para Paulo Freire, conscientização é o desenvolvimento crítico da tomada de consciência,
comportando um ir além da apreensão (fase espontânea) até chegar a uma fase crítica na qual a realidade se
torna objeto cognoscível e se assume uma posição epistemológica procurando conhecer (Gadotti, 1996, p.716).
40
esteja tendo a população neles envolvida. Assim, a realidade concreta se a mim
na relação dialética entre objetividade e subjetividade (Freire apud SEE, 1999-b,
Apresentação).
Visando subsidiar este novo e importante momento, prosseguiram os encontros SEE-
CRE-Escola-Comunidade, com assessorias, levantamentos e pesquisa de anseios da
comunidade mais próxima, problematizações, aprofundamentos teóricos, escritas e re-escritas.
Esse era um tempo importante para:
Escrever na ‘peça da lei’(Regimento Escolar) e nos Planos de Estudos e/ou Curso,
nossas convicções, concepções político-pedagógicas, visões de espaço e tempo na
totalidade do currículo, valores no sistema avaliativo e a democratização do espaço
pedagógico-administrativo e financeiro da escola.
(...) Registrar, na frieza do papel, que sociedade nós queremos. Para tal desafio,
precisamos garantir um texto vivo, ou seja, um texto de contexto. Assim poderemos
visualizar as identidades locais, distribuídas (...) e ‘espraiadas’ nas áreas do
conhecimento, garantindo um corpo político-pedagógico, administrativo e financeiro
interligado pelas raízes da própria comunidade em que está inserida nossa escola.
(...) Resgatar nossa memória, construir nossa história e legalizá-la, pois legítimas já
são (SEE, 2000-g, p.2).
Da mesma forma que cada escola foi desafiada a construir coletivamente os
documentos que regeriam suas ações, também a Secretaria de Estado da Educação (SEE)
redimensionou suas ações, para “dar corpo” e sistematizar as diversas políticas públicas
educacionais, ensejadas nos Princípios e Diretrizes: Educação Infantil, Educação
Fundamental, Ensino Médio, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional,
Educação Especial, Educação Ambiental, Educação Indígena, Educação Básica do Campo.
A SEE optou pela nucleação para atender às demandas escolares em sua totalidade e
subsidiar, bem como continuar a gestão coletiva da educação estadual, com discussões
bimestrais, com as equipes das CREs em cada núcleo (sediado alternadamente nas cidades-
sedes de cada Coordenadoria), mantendo mensalmente reuniões na sede da SEE com as
Coordenações gerais de cada Regional. O Estado foi dividido em cinco regiões e, cada
região/núcleo comportou seis Coordenadorias Regionais, bem como cada núcleo integrava
todas as políticas da Educação Básica.
41
1.4 A Construção e Sistematização da Política Pública de Educação de Jovens e
Adultos
42
No Movimento Constituinte Escolar a Educação de Jovens e Adultos - assim como as
demais modalidades da educação básica - foi contemplada com vários espaços e instâncias de
discussões, conjuntamente com toda a rede e, também, em momentos próprios.
Estimulada pelas discussões da CE e tensionada pela legislação
43
, que extinguia, a
contar de dezembro de 2001 as instituições de cunho “supletivo” existentes (LER, NOES,
CES, CRES, Cursos de Suplência)
44
, a EJA sul-riograndense viu-se desafiada a (re)pensar
propostas avaliando a realidade existente, propondo e pesquisando alternativas e
possibilidades diversas.
Em encontro específico no primeiro momento da CE, que correspondeu ao “Estudo da
Realidade”, a Coordenação Estadual de EJA organizou Seminários Regionais – um por
Coordenadoria Regional de Educação contando com a participação de educadores/as,
educandos/as, comunidade escolar e universidades: “A pauta foi comum em todas as regiões,
iniciando com um histórico da EJA no Brasil e depois fazendo um levantamento sobre a EJA
no RS em duas dimensões: A EJA encontrada e a EJA desejada” (SEE, 2001-a, p.46).
A situação vivenciada pela modalidade apontava algumas dificuldades como
Não raras vezes, os alunos da EJA são acomodados na sala do Jardim de Infância
(...); emprestam uma sala de aula, o grupo fica sozinho na escola, quase sempre mal
iluminada, no último corredor. Ou ainda: não abrem as bibliotecas e não servem
merenda à noite porque não funcionários; fecham os portões ao primeiro sinal
sem compreender a dinâmica da vida que se passa lá fora: os jovens e adultos
trabalham, cuidam da família, sofrem, sonham, têm direito de estar na escola e
aprender (Camini, 2001, p. 79).
Da mesma forma, diziam da angústia dos professores ao avaliar alunos que chegavam
aos NOES com uma prova para verificar suas possibilidades de autodidaxia frente ao nível de
materiais que necessitaria apreender para prestar os Exames Supletivos bem como, a incerteza
da avaliação externa frente a uma listagem gigantesca de “conteúdos básicos” e um tempo
demasiado curto a quem retorna aos bancos escolares com sede de tecer redes de
42
Salientamos o referencial “carregadopela equipe do Gov. Estadual vindo do Governo Municipal de
Porto Alegre, em especial relativo à implantação e consolidação do SEJA (Serviço de Educação de Jovens e
Adultos), componente da Secretaria de Educação, bem como da experiência exitosa do MOVA/POA.
43
Parecer 774/99 e Resolução 250/99 do Conselho Estadual de Educação/RS, embasados nos apontamentos da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDBEN, do ano de 1996, que abolia a distinção entre os
subsistemas de ensino regular e supletivo, integrando organicamente a educação de jovens e adultos ao ensino
básico comum.
44
Na seqüência do texto, abordaremos as instituições, projetos e cursos aqui mencionados.
42
convivências, socializar/questionar experiências, agregar e ampliar conhecimentos. Em
contrapartida, apontavam o entusiasmo de grande número de professores dos cursos
supletivos, com avaliação própria ao exercer a docência para adultos, quando sua vivência
diária constava de público adolescente e pré-adolescente (EF e EM) com várias ressalvas no
quesito atenção, motivação, dedicação e disciplina.
Enquanto desejos e pretensões para a EJA, foram elencados e sistematizados em todo
Estado:
a) a necessidade de uma política para todos/as que abrangesse campo e cidade
contendo os princípios basilares da Educação Popular, com caráter permanente, coletiva e
articulado com a vida;
b) a importância de redefinir a concepção de EJA e ofertá-la nos diversos projetos
(LER, Exames, Suplências) e instituições (NOES, CES, CRES) existentes na área, bem como
na política educacional dos/para os presídios;
c) demanda de integração da EJA nas Escolas enquanto projeto próprio desta
instituição, com envolvimento da comunidade;
d) a educação para mulheres;
e) a integração da educação com o trabalho e capacidades técnicas, ensejando a
qualidade social e a formação integral do cidadão;
f) os resgate das experiências/saberes do povo, respeito às necessidades dos
educandos/as, interdisciplinaridade e avaliação emancipatória;
g) a formação constante e permanente para educadores/as, concurso público para
atuação na modalidade, assessorias, organização de grupos de estudo;
h) a articulação de parcerias com os Movimentos Populares, Cooperativas, Sindicatos,
Universidades.
Um segundo momento dentro da trajetória da CE que efetuava este movimento na
totalidade da rede – foi planejado tendo em vista o “Resgate de Práticas” em EJA,
para isso, foram realizados oito Seminários Macrorregionais (mais de uma Regional
de Educação). Esses contaram com a representação das diferentes organizações da
EJA – Centros de Ensino Supletivo, Turmas de Suplência, EJA dos Presídios e
turmas de alfabetização, antigo Projeto LER (Camini, 2001, p. 79).
Estas duas oportunidades foram de extrema importância, tanto para a Comunidade-
Constituinte que pôde vislumbrar e refletir sobre as condições reais encontradas no
atendimento aos jovens e adultos pouco ou não-escolarizados, seus/as educadores/as, os
projetos/programas/cursos de inserção quanto para o coletivo Ejando que ao dizer a sua
43
palavra, início a um processo de apoderamento e reflexão sobre a realidade, projetando
seus anseios num campo – que se propunha - de construção de “inéditos viáveis”
45
.
1.4.1. O Documento “Política Pública de Educação de Jovens e Adultos do Rio Grande
do Sul”
Na percepção da SEE, após estes eventos “a EJA tomou fôlego para participar do
restante da CE com a dignidade resgatada; por outro lado, (...) temos a certeza de que essa
modalidade da Educação Básica foi impulsionada e trazida para o centro do debate das
políticas educacionais” (SEE, 2001- a, p. 46).
Como modalidade da Educação Básica (Ensino Fundamental e dio), tendo
reconhecida e respeitada sua especificidade no bojo das discussões da CE, a EJA encontra-se
contemplada e respaldada na totalidade dos Princípios e Diretrizes para a Educação Pública
Estadual
46
(P&D), reafirmando seu ideário, suas utopias e linhas “suleadoras” originárias da
educação popular.
Congregando os materiais oriundos dos P&D, dos momentos específicos do coletivo
de EJA na CE, analisando-os e buscando articula-los às discussões nacionais e internacionais
progressistas, a produções de pesquisadores e estudiosos da área, bem como mapeando e
“esquadrinhando” meticulosamente as bases legais à procura de sustentação, os
coordenadores estaduais (SEE) e regionais (CREs) da Política de EJA/RS sistematizaram e
elaboraram o documento “Política Pública de Educação de Jovens e Adultos do Rio
Grande do Sul”
47
(PPEJA/RS), e o apresentaram no mês de abril de 2001.
Este texto “socializa as posições do Governo Estadual para com as pessoas que, acima
dos quinze anos, não concluíram ou não tiveram acesso à escolarização” (Oliveira, SEE,
2001-a, s/p.) e assume a responsabilidade social para com a educação de seus cidadãos e
cidadãs, bem como a função de indutor dessa demanda. Tendo a política central de Governo
priorizado a participação popular em todas as áreas e, desta forma, potencializado a
divulgação direta das ações que ocorriam no Estado em especial via Orçamento
45
Inédito viável expressão freiriana cujo significado é o devir, o futuro a se construir, a futuridade a ser criada,
o projeto a realizar; a possibilidade ainda inédita de ação, é a ‘futuridade’ histórica, que não pode ocorrer se nós
não superarmos a situação-limite, transformando a realidade na qual está com a nossa práxis (Gadotti, 1996, p.
721).
46
Anexo II.
47
Anexo III Excerto do “Caderno Pedagógico EJA 1: Política Pública de Educação de Jovens e Adultos
do Rio Grande do Sul”, publicado pela SEE, que sintetiza as intenções do Governo Estadual para com a
modalidade.
44
Participativo
48
e Constituinte Escolar –, gerou-se um movimento de e por cidadania, o que
veio a ampliar a procura por escolarização do contingente populacional jovem e adulto
excluído dos processos educacionais oficiais. Dessa maneira,
levando em consideração a trajetória fragmentada e pontual da EJA, através de
Programas isolados e descontextualizados, destacamos, então a importância de
inserirmos esta modalidade educativa no conjunto das reflexões feitas pelas Escolas
da Rede Estadual, como também junto às demais Redes de atendimento
Municipais, Privadas e nas experiências dos Movimentos Sociais” (Oliveira, SEE,
2001-a).
Historicamente, a Educação de Jovens e Adultos, no Estado e no País, com poucas
exceções, foi/é tratada marginalmente, isto é, deixada à margem de uma Política
Nacional/Estadual de Educação: com parcos recursos, dependente de ações voluntárias, de
espaços particulares cedidos/emprestados, sujeita a interrupções e desmotivação/descrédito do
público a que se destina. Buscando reverter este quadro, o Governo Estadual 99/02 aborda a
temática de modo a incluí-la no Sistema Estadual de Ensino e estabelecer uma Política de
Estado para a EJA, afirmando e reconhecendo seu lugar no processo de desenvolvimento do
Rio Grande do Sul.
O âmago do texto da PPEJA/RS para nosso estudo e que passamos agora a
comentar e analisar está organizado nos tópicos: Conceito de Educação de Jovens e Adultos
– A EJA como Direito; Organização dos Tempos e Espaços; e Avaliação.
4.1.1.Conceito de Educação de Jovens e Adultos – A EJA como Direito
A noção de direitos das pessoas, ao longo da história, vem sendo ampliada – ao menos
registradas gráfica e juridicamente, embora globalmente pouco praticada: da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa de 1789 à Declaração Universal
dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1948, na qual o direito
à educação é expresso nos seguintes termos: “Todo ser humano tem direito à educação. A
48
Orçamento Participativo (OP) – Programa de gestão pública que envolve a participação regular dos cidadãos e
cidadãs no processo de definição e alocação de recursos do orçamento. Implantado pela primeira vez em 1989
em diferentes municípios da federação, em 1999 foi implantado no Estado do Rio Grande do Sul pelo então
Governo de Olívio Dutra e Miguel Rosseto. O OP promoveu um deslocamento das prioridades para as
necessidades mais prementes da população; conseguiu ampliar o número de pessoas que fazem parte do processo
de tomada de decisão local, democratizando, assim, a relação entre o governo e os cidadãos; impulsionou o
surgimento de redes associativas em lugares que não existiam; criou mecanismos de geração de uma democracia
distributiva; alcançou um nível de eqüidade maior na forma de distribuição dos recursos, na medida em que
limitou a ação dos mediadores políticos substituindo-os por fóruns nos quais a população toma as principais
decisões sobre essa distribuição. (Farias, 2005)
45
educação deve ser gratuita, ao menos nos estágios elementar e fundamental. A educação
elementar deve ser compulsória” (ONU, 1948, art.26).
Segundo Machado, “este direito é reconhecido em praticamente todas as Constituições
deste século; (...) a alemã de Weimar, de 1918, foi a primeira a incluir em seu texto um
capítulo específico para a educação” (Machado, 2001, p.33). Para a mesma autora,
além de ser um direito social, a educação é um pré-requisito para usufruírem-se os
demais direitos civis, políticos e sociais, emergindo como componente básico dos
direitos do homem. A educação enquanto direito humano é quase um pressuposto
para se poder usufruir dos demais, concepção adotada explicitamente na Declaração
de 1948” (Machado, 2001, p.34).
A legislação brasileira tem incorporado gradualmente o direito a educação; em
histórico organizado por Machado (2001), esta aponta
“elevado ao nível constitucional a partir de 1934. Mesmo as Constituições ditatoriais
de 1967 e sua Emenda de 1969 o ampliam. Finalmente, em 1988 é detalhado,
precisado e explicitado, estabelecendo-se até mesmo os mecanismos para sua
garantia como em nenhuma das Constituições anteriores.” (Machado, 2001, p.34)
Pesquisadores, sociedade engajada e público diretamente envolvido, apontam alguns
retrocessos em modificações feitas via Emenda Constitucional no Art.60
49
das Disposições
Transitórias da Constituição de 1988, no ano de 1996, onde previa-se a destinação de 50% dos
recursos da educação para a superação do analfabetismo e universalização do Ensino
Fundamental em um período estabelecido de dez anos, bem como mudanças no corpo da
legislação com alterações sutis no Art 208
50
, conforme analisa Haddad (1996):
49
Art 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias Nos dez primeiros anos da promulgação da
Constituição, o poder público desenvolverá esforços, com a mobilização de todos os setores organizados da
sociedade e com aplicação, pelo menos, de cinqüenta por cento dos recursos a que se refere o Art 212 da
Constituição, para eliminar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental.” (Brasil, 1989, p.131)
Nova Redação (1996): “Nos dez primeiros anos da promulgação desta Emenda, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios destinarão não menos de sessenta por cento dos recursos a que se refere o caput do Art. 212 da
Constituição Federal, à manutenção e ao desenvolvimento do ensino fundamental, com o objetivo de assegurar a
universalização de seu atendimento e a remuneração condigna do magistério.;"( Emenda Constitucional 14,
de 12 de setembro de 1996 - Intervenção no Estado e no Distrito Federal - Manutenção e Desenvolvimento do
Ensino - DOU 13/09/1996)
50
O Art 208 preconizava: “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I ensino
fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II
progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio.”(Brasil, 1989, p. 100)
Nova Redação (1996): "I - ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita
para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva universalização do ensino médio
gratuito;"( Emenda Constitucional 14, de 12 de setembro de 1996 - Intervenção no Estado e no Distrito
Federal - Manutenção e Desenvolvimento do Ensino - DOU 13/09/1996)
46
A ruptura começa a ocorrer no momento em que a PEC 233-A/1995
51
é lançada (...)
não apenas por cortar em 50% os recursos para enfrentar o analfabetismo e retirar os
10 anos para a sua superação, mas também por retirar o dever do Estado com relação
à oferta desta modalidade de ensino, mantendo-se apenas o direito do cidadão e não
considerando a educação de jovens e adultos um problema de fundo. (Haddad, 1996,
p.14)
Então, iniciando na Carta Magna (1988) e estendendo-se a atual Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96), a educação é apontada como direito de todos
(as). No entanto, na prática
52
um senso comum que reconhece como detentores deste
direito apenas as crianças e os adolescentes, propiciando e justificando a pouca e/ou
inexistente pressão da população adulta que não teve acesso à educação básica por ações
educativas apropriadas e vagas nos Sistemas de Ensino Públicos Oficiais, ou seja, poucos
acessam este direito assegurado muitos anos (desde a Constituição de 1934 ) pelas leis,
como afirma Di Piero (2000):
A história da educação de jovens e adultos (...) é marcada pela contradição entre a
afirmação no plano jurídico do direito formal da população jovem e adulta à
educação básica, de um lado, e sua negação pelas políticas públicas concretas, de
outro (Di Piero, 2000, p. 15).
Perpassando por uma leitura do perfil dos cidadãos/ãs que procuram a EJA, consta do
material em análise (PPEJA/RS, 2001) e é verificado na vivência diária de escolas/núcleos
que ofertam a modalidade – existir
uma diversidade sociocultural, de valores, de gênero, de etnia, de idades e de ritmos
de socialização e aprendizagem. Dentro dessa heterogeneidade, educandos com
vivências diferenciadas no mundo do trabalho, nas responsabilidades familiares,
excluídos da alfabetização e portadores de necessidades educativas especiais (SEE,
2001-a, p. 47-48).
De igual modo, olhando a história da EJA com Di Piero (2000) pode-se constatar que:
51
PEC – Projeto de Emenda Constitucional, lançada no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
52
“Se não vaga para uma criança de 07, 10 ou 12 anos, a imprensa cai em cima, o Ministério Público, o
Conselho Tutelar... Felizmente, a nossa luta pelos direitos da criança, o Estatuto da Criança e do Adolescente,
tudo isso produziu uma mudança cultural importante no sentido de (...) garantias que foram incorporadas ao
imaginário e vivência social. No entanto, se um jovem, ou um adulto, está analfabeto, ou tem menos de 04 anos
de estudo, ou tem 06 anos de estudos e, por causa disso, não encontra emprego, etc., a sociedade não fica
indignada, o Ministério Público não aciona e a imprensa não cai em cima. Eu afirmo que a minha meta é que isso
venha a ocorrer; devemos trabalhar para (...) produzir uma mudança cultural para que isso que es na
Constituição de 88, que está na LDB, que esno Plano Nacional de Educação, que está na Constituição do
Estado do Rio Grande do Sul, para que isso venha a ser incorporado como uma mudança cultural, e as pessoas
passem a exigir a oferta pública da Educação de Adultos de qualidade, como hoje já exigem para as crianças”
(Di Piero, 2001 – transcrições de Encontro EJA/RS).
47
uma ou duas décadas atrás, a maioria dos educandos de programas de
alfabetização e de escolarização de jovens e adultos eram pessoas maduras ou
idosas, de origem rural, que nunca tinham tido oportunidades escolares. A partir dos
anos 80, os programas de escolarização de adultos passaram a acolher um novo
grupo social constituído por jovens de origem urbana, cuja trajetória escolar anterior
foi malsucedida. O primeiro grupo vê na escola uma perspectiva de integração
sociocultural, o segundo mantém com ela uma relação de tensão e conflito aprendida
na experiência anterior. Os jovens carregam consigo o estigma de alunos-problema,
que não tiveram êxito no ensino regular e que buscam superar as dificuldades em
cursos aos quais atribuem o caráter de aceleração e recuperação. Estes dois grupos
distintos de trabalhadores de baixa renda encontram-se nas classes dos programas de
escolarização de jovens e adultos e colocam novos desafios aos educadores, que têm
que lidar com universos muito distintos nos planos etários, culturais e das
expectativas em relação à escola. Assim, os programas de educação escolar de
jovens e adultos, que originalmente se estruturaram para democratizar oportunidades
formativas a adultos trabalhadores, vêm perdendo sua identidade, à medida que
passam a cumprir funções de aceleração de estudos de jovens com defasagem série-
idade e regularização do fluxo escolar (Di Piero, 2001, 13).
Pontua-se, então, a necessidade de uma educação que além da formal existente,
incorporando práticas e saberes edificados no dia-a-dia, e que se capacite a assumir a
demanda advinda da educação não-formal, desenvolvida nos/pelos movimentos populares e
organizações sociais em especial, naquele momento a proveniente do MOVA/RS
53
e/ou
outros programas de alfabetização. Que fuja ao lugar-comum de reposição de
escolaridade/conteúdos/conhecimentos ministrados em conta-gotas (em quantidade e
qualidade) e de forma aligeirada, “supletivamente”.
Aponta-se para a modalidade como “uma prática de Educação voltada para a vida, em
que o/a educando/a aprende a apreender a sua realidade, vivenciando sua cidadania
plenamente”(SEE, 2001-a, p. 49). Esta é uma das premissas mais importantes do pensamento
e ação do educador Paulo Freire, que embasam sua prática de alfabetização de adultos e
organização social. Da mesma forma, a concepção também estava presente nos movimentos
de educação e cultura popular (em Ijuí no Movimento Comunitário de Base coordenado por
educadores e educadoras ligados/as à FAFI - hoje UNIJUÍ) com auge nos anos sessenta
(anterior ao período da ditadura militar) contemporâneos da divulgação do “Método Paulo
Freire de Alfabetização”.
No texto desta PPEJA, encontra-se expressa a concepção de Educação de Jovens e
Adultos como educação ao longo da vida”, forjada no decorrer dos anos em debates de
instâncias locais, regionais, nacionais e internacionais, especialmente na Conferência
Internacional de Jomtien, quando foi então “oficializada globalmente”.
53
MOVA/RS Movimento de Alfabetização de Pessoas Jovens e Adultas, pioneiro como ação com caráter
estadual, lançado pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, criado em maio de 1999 e iniciado,
efetivamente, em setembro do mesmo ano. Para maiores informações, consultar Brandão, 2001.
48
Na base desta visão, encontram-se os novos fundamentos da Pedagogia e da
Psicologia que descartam o princípio culturalmente arraigado de que um tempo
privilegiado para aprender (infância e adolescência), após o qual limites e barreiras quase
intransponíveis para o processamento de novas aprendizagens e conhecimentos; proclama-se
oficialmente, pelas Ciências de direito considerando pesquisas, estudos e descobertas mais
recentes – que o ser humano porta capacidades de aprender durante todo o seu ciclo de vida.
Junto a este fato relevante, não com menor importância, está a mudança societária,
mais especialmente ligada ao mundo do trabalho e às modernas tecnologias de produção,
serviços e informação: não pleno emprego; não inércia no processo produtivo as
mudanças dão-se a cada nova inserção de inventos, de adequação de tecnologia, de criação de
novos mercados... Não mais a possibilidade de um tempo (curto) para acessar
aprendizagens e outro para utilizá-las (ao longo da vida): atualmente estes processos são
requeridos ao longo da vida cotidiana e do trabalho, conforme Delors (1999):
A divisão tradicional da existência em períodos distintos o tempo da infância e da
juventude consagrados à educação escolar, o tempo da atividade profissional adulta,
o tempo da aposentadoria já não corresponde às realidades da vida contemporânea
e, ainda menos, ás exigências do futuro” (Delors, 1999, p.103).
Esta colocação é alongada nas palavras de Di Pierro(2000) quando ela se refere a
práticas ou políticas de EJA nos países mais desenvolvidos:
Um movimento em sentido oposto ao esvaziamento do direito dos jovens e adultos à
escolaridade sica vem sendo observado em países desenvolvidos da Europa,
América do Norte e Sudeste Asiático, onde a população adulta passa a dispor de
oportunidades crescentes de formação geral, profissional e atualização permanente.
A extrema valorização da educação nas sociedades pós-industriais está relacionada à
aceleração da velocidade de produção de novos conhecimentos e difusão de
informações, que tornaram a formação continuada um valor fundamental para a vida
dos indivíduos e um requisito para o desenvolvimento dos países frente a sistemas
econômicos globalizados e competitivos (Di Piero, 2001, 15).
Enquanto modalidade que tem como público-alvo cidadãos e cidadãs acima dos
quinze anos de idade, que não possuem a escolarização básica completa Ensino
Fundamental e Ensino Médio - um universo de aproximadamente 53% dos gaúchos e
gaúchas (Censo IBGE/2000
54
), objetivou-se uma educação como ato político, reflexivo,
conscientizador, emancipador e que contribua no processo de
54
Ver no Anexo IV a Tabela nº 2979, correspondente aos dados do Censo IBGE/2000 para o Rio Grande do Sul.
49
(...) construção de um novo modelo de desenvolvimento solidário e sustentável para
o RS, ‘promovendo a formação de indivíduos capazes de decidir sobre suas vidas,
ascender social e individualmente, adaptar-se a novos contextos, participar das
decisões de políticas públicas, crescer em liberdade e autoconsciência com os
outros, com vistas a uma sociedade mais justa e igualitária’(SEE, 2001-a, p. 49).
Dentre os diversos desafios postos a esta educação – agora em tempos de globalização
perversa
55
–, está a busca coletiva dos sujeitos ejandos e seus educadores e educadoras de
encontrar e/ou construir estratégias e ferramentas para “fazer frente ao contexto de
precarização das relações de trabalho e à elevação do patamar de desemprego nas
sociedades”(SEE, 2001-a, p.49). Sabe-se que apenas o campo educacional não muda/mudará
o mundo, no entanto, se libertador e emancipador, aglutinado a outros campos, constituindo
políticas cidadãs afirmativas, poderá compor experiências significativas de inclusão e
participação.
A EJA projetada nesta Política de Governo objetivava também o “(...) resgate e
afirmação das origens e potencialidades locais, com a garantia de espaços nos quais as
comunidades possam afirmar sua identidade e, assim, reivindicar seus direitos com vistas à
transformação social”(SEE, 2001-a, p.49). Para tanto, incentivou a utilização da Pesquisa
Participante como instrumento e ponto de partida para o currículo contextualizado e com a
“cara da escola”, que viria a superar o histórico de listas pasteurizadas de conteúdos mínimos,
sem vínculo com as especificidades de cada localidade.
A implantação, desenvolvimento e consolidação desta política que desafiava a
construir, a superar a inércia característica das práticas escolares, a instigar educadores e
educadoras para se constituírem pesquisadores/as dialógicos/as permanentes, enfrentar e
desconstruir a visão “tradicional” de escola e de educação, arraigadas em educandos e
educandas, educadores e educadoras, estava embasada nos P&D construídos e, em especial,
na proposição de espaços de formação e estudo constantes (semanais) dentro da “carga
horária” dos/das trabalhadores/as em educação. Os P&D e a PPEJA/RS destacavam também
momentos de formação envolvendo toda a comunidade escolar.
1.4.2.Organização dos Tempos e Espaços
Lançadas as bases da concepção da EJA almejada com e para educandos e educandas,
passou-se à discussão para concretizá-la na organização dos tempos e espaços do aprender e
55
Termo difundido pelo geógrafo Milton Santos, em especial na obra “Por uma outra Globalização” (Ver
Referências Bibliográficas).
50
do ensinar. Impunha-se, então, o desafio de superar a visão predominante de “encurtar o
tempo de permanência na escola, aligeirando, ao máximo, a conclusão do Ensino
Fundamental ou Médio” (SEE, 2001-a, p.51), bem como o de suplantar o caráter
compensatório, de “reposição” de uma aprendizagem “em falta” e de um tempo “perdido”.
Para tanto, são elencadas e fundamentadas na PPEJA/RS, uma série de compromissos
que a modalidade assumiu perante a sociedade gaúcha:
com a vida, com a realidade e com os interesses dos/das educandos/as; com a justiça
social e com o respeito às diferenças; com a transformação da realidade; com um
currículo crítico, democrático e transformador, que parte da realidade dos/das
educandos/as; com a construção da identidade da EJA;com a adequação e utilização
dos espaços das escolas/núcleos; com uma recepção qualificada; com a formação
permanente dos segmentos da comunidade escolar”(SEE, 2001-a, p 52, 53, 54, 55).
56
Estes compromissos explicitados trazem balizas que esboçam o perfil do currículo
pretendido, não deixam dúvidas quanto à sua intencionalidade e apontam o Tema Gerador – a
ser forjado por meio de pesquisa nas comunidades de inserção da EJA - como articulador dos
“Campos do Saber”
57
e indutor da interdisciplinaridade, inerente à consecução dos objetivos
desta Política Pública.
A PPEJA/RS é também alicerçada por avanços na legislação, de que salientamos
pontos do Parecer 11/2000, da Câmara de Educação Básica (CEB) onde é reconhecido que “a
EJA necessita ser pensada como um modelo pedagógico próprio a fim de criar situações
pedagógicas e satisfazer necessidades de aprendizagem de jovens e adultos” (Parecer
CNE/CEB nº 11/2000, p.08) e aponta tempos e espaços diferenciados da educação das
crianças, bem como de ritmos e condições de aprendizagem, conforme se destaca nesta
recomendação:
Devem ser considerados, quando da busca de uma ascensão qualitativa nos estudos,
que a defasagem pedagógica em termos de pouca experiência com os processos de
leitura e da escrita pode ser redefinida por meio de uma intensidade qualitativa de
atenção e zelo e o avanço pode ser resultado de um capital cultural mais vasto
advindo, por vezes, de outras formas de socialização que não a escolar, considerados
tanto os fatores internos relativos à escola, como os externos, relativos à
estratificação social (Parecer CNE/CEB nº 11/2000, p. 32).
Da mesma forma, o Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, em seu
sistema próprio de ensino, prevê que
56
Tomou-se nesta citação a forma de parágrafo o que no texto original são subtítulos desenvolvidos por meio de
um a dois parágrafos.
57
Forma de tratamento a ser utilizada posteriormente, em substituição ou sinônimo de “disciplina”,
“componente curricular”...
51
é possibilitado ao aluno transitar pelo currículo de acordo com o seu tempo próprio
de construção das aprendizagens. Assim, os alunos poderão levar 1200 horas (para a
alfabetização), 3200 horas (para os anos finais do Ensino Fundamental) e 2400 horas
(para o Ensino Médio) ou mais para concluir estes estudos; outros poderão concluí-
los em espaços de tempo menores, considerando seus conhecimentos anteriores e
seus espaços-tempo próprios de aprendizagens (Parecer CEEd/RS nº 774/99, p. 05).
Enquanto mantenedora, a SEE (e as respectivas CREs) articula então as diretrizes
emanadas destes pareceres (Federal e Estadual) com as pretensões e deliberações da
comunidade ejanda gaúcha, nos quesitos tempo e espaço, primando pela “distinção entre o
tempo da escola/núcleo e o tempo do/a educando/a, com flexibilidade responsável”(SEE,
2001-a, p.54).
Faz-se necessário entender estes tempos como distintos: as escolas/núcleos seguem as
prescrições da legislação enquanto instituições e oferecem a carga horária obrigatória para a
conclusão dos níveis de ensino (Fundamental e Médio), padrão na educação básica brasileira.
No entanto, o ejando e a ejanda, cidadãos/ãs adultos/as ou jovens demandados/das pela vida
em seus ltiplos aspectos (família, saúde, trabalho ou procura por, religião, mudanças de
endereço...) inúmeras vezes não conseguem cumprir/adequar-se à trajetória retilínea e
inflexível das escolas “regulares” evadindo-se (legalmente, por uma certa quantidade de
faltas), ou desmotivando-se ao recomeçar em repetidas ocasiões e serem considerados/as
tábula rasa (mesmo tendo cursado alguns meses de aula com bom aproveitamento) a cada
retorno em “tempos/espaços” que se mostram, momentaneamente, favoráveis à sua volta aos
estudos.
Considerando estas especificidades dos jovens e adultos, respeitando as suas
trajetórias, bem como visando o rompimento da concepção simplista e preconceituosa que
justifica o abandono dos cursos como acomodamento, preguiça, falta de persistência... por
reconhecer a importância da energia e do protagonismo desta população no desenvolvimento
do Estado, prevê-se na PPEJA/RS que
o tempo da escola/núcleo deve ser permeado pelos tempos dos/das
educandos/as, por isso é necessário garantir momentos permanentes de acesso. O
tempo do/a educando/a refere-se ao tempo de aprendizagem, respeitando as
trajetórias de construção de conhecimento. Nesse caso, é possível avanços
progressivos em tempos maiores ou menores em relação ao tempo da escola; a
escola/núcleo organizará mecanismos de avaliação contínuo, ao longo do
desenvolvimento do currículo.
(...) O tempo do/a educando/a é plural, pois consideramos, pelo menos, três
realidades:
- aqueles/as educandos/as que têm tempo para estar na escola/núcleo;
- aqueles/as educandos/as que têm pouco tempo para estar na escola/núcleo;
- aqueles/as educandos/as que não têm tempo para estar na escola/núcleo e que
buscam, quase sempre, preparação aos Exames Supletivos.”(SEE, 2001-a, p.54
grifos nossos)
52
A forma de implantação destas assertivas coube a cada escola/núcleo e, tendo sido
construída em seus documentos específicos (Proposta Político-Pedagógica, Regimento, Plano
de Estudos ou Cursos), o que comentaremos posteriormente.
1.4.3 Avaliação
Nas práticas escolares atuais, a avaliação ainda é predominantemente concebida e
ligada à elaboração e aplicação de testes, provas e exames que implicam basicamente o
exercício de julgamentos e a classificação de estudantes. casos em que é instrumento de
poder dos/das professores/as e está ligada a noção de punição. Observa-se então que a ênfase
maior da avaliação está quase totalmente centrada nos “produtos” ou “resultados” de um
determinado período de estudo ou de “pontos/conteúdos estudados”; raramente são
encontradas ações ou disponibilizados (aos educadores e educadoras) momentos de reflexão
visando analisar
não somente o grau que o aluno aprende um conjunto de habilidades ou um tipo de
conhecimento; (...) também responder a questões de justificativa (por que os alunos
aprendem x?), bem como a questões que buscam detectar efeitos de aprendizagem
não pretendidos (o que mais os alunos aprenderam? O que deixaram de aprender?)
(Saul, 2000, p.45).
Ciente da importância do elo “avaliação” no conjunto do processo educativo e na
configuração coerente da PPEJA/RS, registra-se nesta:
redimensionar a avaliação passa a ser crucial e estratégico, pois, caso contrário,
todos os ganhos curriculares ocupariam o lugar de senso comum ou do discurso
simplesmente teórico.
O caráter classificatório atribuído às práticas avaliativas não tem como assumir
um currículo que pressuponha as duas dimensões de tempo colocadas no currículo
o tempo da escola e o tempo dos/as educandos/as, por isso, propomos inverter a
lógica, passando a legitimar a avaliação emancipatória
58
. (SEE, 2001-a, p.56
grifos nosso)
A reflexão sobre a ão avaliativa, numa perspectiva emancipatória, perpassa pela
assunção fundamental que o conhecimento é (será, no caso da modalidade) construído
58
Segundo Ana Maria Saul, não registro, na literatura de avaliação educacional, da denominação “avaliação
emancipatória”, isto no ano 2000 (quando de sua publicação). Para esta autora, a avaliação emancipatória está
situada numa vertente político-pedagógica em que o maior interesse é emancipador, o que qualifica como
“libertador, visando provocar a crítica, de modo a libertar o sujeito de condicionamentos deterministas” (Saul,
2000, p.61). Prosseguindo no raciocínio, a autora aponta dois objetivos para esta avaliação: iluminar o caminho
da transformação e beneficiar as audiências no sentido de torná-las autodeterminadas. Também propõe a sua
construção inspirada em três vertentes teórico-metodológicas: 1ª - avaliação democrática; 2ª - crítica institucional
e criação coletiva; e, 3ª - pesquisa participante.
53
socialmente e, desta forma, está/estará intrinsecamente comprometido com a apreensão
(leitura, interpretação, desvelamento) da realidade histórica que, em interação com os diversos
saberes, pode/poderá proporcionar a laboração de “inéditos viáveis” e sua consecução. Para
tanto, na PPEJA elencam-se pressupostos:
a) que apontam como perfil para atuação na Educação de Jovens e Adultos
“educador/a-educando/a mediadores/as, construtores/as do conhecimento; educador/a
pesquisador/a; educador/a aberto/a a aprender a aprender e aprender a ensinar”(SEE, 2001-a,
p.56), bem como, que se dis(pro)ponham à formação contínua, à auto-avaliação e
avaliação(de educando/as e do coletivo) permanentemente;
b) que assinalam características para o processo ensino-aprendizagem
currículo interdisciplinar emancipatório; valorização do saber popular articulando-o
ao saber escolar; abordagem qualificativa na análise da realidade (pesquisa); parecer
descritivo do processo ensino e aprendizagem, tanto do/a educador/a quanto do/a
educando/a; formação permanente do educador/a, educando/a e comunidade escolar
(SEE, 2001-a, p.56)
c) que apresentam indicações para procedimentos
possibilidades de situar os/as educandos/as conforme os níveis de conhecimento em
que se encontram; perceber as dificuldades , as necessidades, interesses e avanços
quanto ao processo de construção social do conhecimento; ressignificar as práticas
pedagógicas do cotidiano através da reflexão crítica e permanente da realidade
(...)(SEE, 2001-a, p. 56 e 57).
Em ação, estes pressupostos tendem a romper com a avaliação meramente
classificatória e avançar para outra, diagnóstica e participativa, que tem o processo educativo
e o sujeito (em sua totalidade) como propósito, sempre visando à excelência desta educação
que se quer geradora/impulsionadora de uma sociedade justa, democrática, humanista,
economicamente viável e ambientalmente sustentável.
Para a Avaliação Emancipatória, são atribuídas características como: “dinâmica;
provocadora de crítica à realidade; descritiva e analítica; comprometida com o
desenvolvimento da autonomia; diagnóstica, participativa; educadora/a pesquisador/a e
mediador/a”
59
(SEE, 2001-a, p.57 e 58).
São fundadas, também, novas categorias para o processo avaliativo emancipatório: a)o
Avanço e a Permanência; b) Afastamento e Cancelamento.
59
Tomou-se também nesta citação a forma de parágrafo o que no texto original são itens desenvolvidos por meio
de um a dois parágrafos.
54
a) A categoria Avanço e Permanência contempla a “concepção de que o conhecimento
é construído em processo, em que os tempos e espaços de aprender são diferentes entre os/as
educandos/as, podendo então, na análise da produção escolar, alguns/mas educandos/as
avançarem e outros não”(SEE, 2001-a p. 58). No espaço deste dispositivo é respeitada a
diversidade de ritmos de aprendizagem, naturalmente tão distintos de um/a educando/a para
outro/a mesmo em um único sujeito nos diferentes campos do conhecimento o que, na
estrutura escolar vigente, não é reconhecida predominando um processo de massificação. Há
educando/as que necessitam um tempo maior para consecução das aprendizagens propostas
por “n” motivos então, “considera-se a Categoria Permanência, não significando, contudo,
estagnação no processo (...), pois existem avanços internos àquele tempo/espaço em que se
encontram”(SEE, 2001-a, p.58).
Naturalmente, sempre ocorrem aprendizagens, o ser humano é por definição um ser
aprendente, inacabado e em permanente construção. Portanto, jamais permanecerá em um
ambiente sem efetivar conhecimentos o que o fará não ser mais o mesmo sujeito que iniciou o
processo, conseqüentemente, a abordagem “tabula rasa” comumente atribuído àqueles que
permanecem (na escola regular diríamos “reprovam”) não cabe nesta concepção de Educação
de Jovens e Adultos.
Considerando a individualidade de cada ejando/a quanto ao conjunto de saberes
construídos no cotidiano, sua cadência de produção, dentro dos tempos que tem disponível – e
a flexibilidade proposta na PPEJA/RS, a categoria Permanência adquire uma dimensão
pequena, praticamente insignificante, haja vista que “não haverá data preestabelecida em
calendário para verificação da aprendizagem”(SEE, 2001-a, p.58). Ressaltamos que este olhar
para a individualidade dos sujeitos ejandos, em tempo algum exclui o trabalho coletivo da
classe e ainda reforça o imperativo essencial das características enunciadas do/da
educador/a de EJA e sua formação permanente, bem como afirma a máxima de que cada
educando/a constrói o seu conhecimento e, portanto, também o seu tempo de percurso.
b) A categoria Afastamento e Cancelamento consolida a identidade da Educação de
Jovens e Adultos posta, pois “coloca como requisito a compreensão das dimensões
formadoras da vida juvenil e adulta” (SEE, 2001-a, p.58), entendendo que a ausência deste
público nas atividades escolares “surge em função das demandas familiares, do trabalho, das
individualidades/subjetividades” (SEE, 2001-a, p.58) de cada um/a. Coloca-se, então, junto à
premissa do acesso permanente à escola, a possibilidade legal do/a ejando/a comunicar e
justificar seu afastamento temporário da instituição para breve retorno, ou solicitar o
cancelamento da matrícula.
55
Retoma-se, assim a discussão do
tempo/espaço da EJA tempo da escola e tempo do/a educando/a, para reafirmar
que o percentual de 75% de freqüência obrigatória recai no tempo do/a educando/a.
O mesmo valerá para o atendimento semipresencial e a distância, ou seja,
prevalecerá o tempo do/a educando/a em detrimento do tempo da escola”(SEE,
2001-a, p.59).
Ora, conforme discutido, o tempo do/a educando/a é construído por ele/a no
momento em que constitui/consolida/apresenta/manifesta aprendizagens requeridas para o
avanço dentro dos níveis do curso. Por essa razão, interpretamos que neste período (instituído
pelo sujeito, podendo ou não ser permeado por afastamentos – não contabilizados como
tempo efetivo de matrícula), o mesmo deverá ter registros iguais ou superiores a 75% de
freqüência nas atividades escolares.
Da mesma forma, nas possibilidades de atendimento às demandas não-presenciais, a
PPEJA/RS estabelece a avaliação como emancipatória, especialmente nas suas características
diagnósticas, onde “cada componente curricular oportunizará tantas avaliações quantas se
fizerem necessárias, possibilitando o diagnóstico claro dos avanços e obstáculos do/a
educando/a e do/a educador/a no processo de ensino e aprendizagem” (SEE, 2001-a, p.59).
Ciente das dificuldades detectadas, poderá então o/a educador/a produzir(-se), adequar(-se),
buscar aperfeiçoamento (próprio e para o material) e, a posteriori, indicar diferentes materiais
e atividades para suprir as carências/necessidades do/a educando/a.
1.5 A Implementação da Política Pública de Educação de Jovens e Adultos/RS (99/02)
Inicialmente, vamos procurar caracterizar brevemente a Educação de Jovens e
Adultos existente no Estado do Rio Grande do Sul, a partir de dados apresentados pelo
Ministério da Educação/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio
Teixeira”, na obra “Os Desafios do Plano Nacional de Educação”. Apontam estes números
que, no ano de 1995, não havia no Estado nenhuma (zero) matrícula em Curso Presencial,
com Avaliação no Processo, no Ensino Fundamental de a série, tampouco no Ensino
Médio; portanto, a Educação Básica na modalidade EJA, oficialmente, era inexistente, como
podemos ver na tabela baixo.
56
Tabela 1 – Matrículas em Cursos Presenciais de EJA, com Avaliação no Processo por
Dependência Administrativa – Ano 1995
Nível da
Ed. Básica
Unidade
Geográfica
Federal Estadual Municipal Privada Total
Anos
Iniciais
(1º ao 4º)
Brasil 83 538.957 273.746 37.365 850.151
Região Sul - 22.281 16.808 369 39.456
Paraná - 14.402 15.034 321 20.707
Stª Catarina - 7.879 1.774 48 9.701
Rio G do Sul
- - - - -
Anos
Finais
(5º ao 8º)
Brasil 202 839.141 232.854 214.160 1.286.357
Região Sul - 114.946 12.800 31.489 159.235
Paraná - 83.981 6.823 14.618 105.422
Stª Catarina - 30.965 5.977 16.871 53.813
Rio G do Sul
- - - - -
Ensino
Médio
Brasil - 187.131 13.504 139.411 340.046
Região Sul - 33.534 866 37.620 72.020
Paraná - 19.091 358 19.376 38.825
Stª Catarina - 14.443 508 18.244 33.195
Rio G do Sul
- - - - -
Fonte: MEC/INEP
Comparativamente, em termos de Brasil, somente encontramos tal situação para o ano
de 1995 nos dados pertinentes ao Distrito Federal e, no que concerne ao Ensino Médio, para o
Estado de Tocantins; todos os demais entes federativos dispunham de Cursos Presenciais
Estaduais com Avaliação no Processo.
Perguntamo-nos a que se devia esta não-oferta de educação oficial aos sul-rio-
grandenses; estaria toda a população alfabetizada, com o Ensino Fundamental e Médio
concluídos?
Bastante presente em nosso imaginário a premissa divulgada aos quatro cantos do País
de que somos o Estado brasileiro mais politizado, escolarizado e com melhor índice de
qualidade de vida; seria esta uma justificativa oficial para ignorar as necessidades da
população e destinar recursos estatais a outros campos, que não o educacional, para jovens e
adultos pouco ou não-escolarizados?
1.5.1 O Encontrado
No final do ano de 1998, a Educação de Jovens e Adultos no Estado do Rio Grande do
Sul apresentava, enquanto forma de atendimento a sua demanda:
57
a) Projeto LER (Lendo e Escrevendo o Rio Grande) - atendimento à demanda
por alfabetização e escolarização até a série, junto às escolas estaduais. Entre 300 a 400
turmas, envolvendo cerca de 250 professores.
b) PIÁ 2000em seu eixo para a alfabetização de jovens e adultos, realizou mais
uma “campanha para erradicação do analfabetismo, com caráter assistencialista, filantrópico,
de suprimento e total descaso com o pedagógico. Foi realizado em 44 Municípios, com
duração predeterminada e faixa etária a ser atendida limitada entre 15 e 29 anos” (SEE, 2002,
p.04).
c) Cursos de Ensino Supletivo oferta de escolarização compreendendo os anos finais
do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, nas escolas estaduais, majoritariamente no turno
da noite. Contava-se 294 autorizações no Ensino Fundamental e 78 no Ensino Médio.
d) NOES (Núcleos de Orientação aos Exames Supletivos) acolhia a população
que tencionava realizar os Exames Supletivos e buscava algum tipo de atendimento. Pesquisa
de Wadi (2005) cita que “ofício da Secretaria de Educação e Cultura do RS, datado de 1990,
aponta com maior clareza o objetivo da criação dos NOES: orientar a aprendizagem dos
clientes que estejam se preparando para os exames supletivos de e graus ”(Wadi, 2005,
p.37). Havia 16 NOES para o atendimento à população “livre” e dez orientando a demanda
carcerária dentro nos presídios, totalizando 26 Núcleos.
e) CEES (Centros Estaduais de Ensino Supletivo) em número de cinco em todo o
Estado. Orientavam estudos à distância (e presenciais) e, via exames próprios, certificavam a
conclusão de Ensino Fundamental e Médio.
f) CRES (Centros Rurais de Ensino Supletivo) cinco entidades no Estado. Visavam
atender à população rural com educação geral e orientação/formação voltada a atividades
agropecuárias.
g) Exames Supletivos atendendo aproximadamente 100 mil candidatos e mais
de 900 mil exames requeridos ao ano/edição dos exames, num custo aproximado de três (03)
milhões de reais.
Analisando os dados colhidos ao assumir a Secretaria Estadual de Educação do Rio
Grande do Sul, no ano de 1999, a nova equipe interpretou e avaliou como diagnóstico, além
dos números acima citados:
que a oferta de EJA no RS é pequena:
- o problema do analfabetismo no RS é encoberto pelos índices existentes em outros
Estados brasileiros, como é o caso do Nordeste (...);
- (...) nos deparamos com índices alarmantes relativos àquelas pessoas que não têm o
1º ciclo ou o ensino fundamental completo (SEE, 2002-a, p.01 – grifos nosso).
58
Verificando os números constantes do Censo IBGE/2000, encontramos, para o
período, num total de aproximadamente 10.187.84 habitantes, os seguintes dados:
Tabela 2 Níveis de Escolarização de Pessoas Maiores de 15 anos Rio Grande do Sul
Ano 2000
Grupos de
anos de
estudo
15
anos
16 e 17
anos
18 e 19
anos
20 a 24
anos
25 a 29
anos
30 a 34
anos
35 a 39
anos
40 a 49
anos
50 a 59
anos
60 a 69
anos
70 anos
ou
mais
Sem
instrução e
menos de 1
ano
2.897
4.857 5.091 15.222 16.463 20.709 22.669 60.078 88.551 100.001
115.505
1 a 3 anos
7.042
13.727 14.113 44.745 52.905 65.107 71.973 176.868
188.864
156.462
119.524
4 a 7 anos
96.08
6
142.022
109.864
266.813
286.671
310.189
328.076
573.568
377.674
235.837
164.554
8 a 10 anos **** ****
60
143.167
200.382
149.802
148.253
147.517
203.677
92.237 41.876 28.073
Tabela 2979 – Censo IBGE/2000, adaptada pela autora.
Adaptamos a tabela
61
deste Censo, excluindo a coluna pertinente ao grupo de faixa
etária 10 a 14 anos; utilizamos para análise dados de pesquisados/as acima de 15 anos de
idade, mínimo exigido para a matrícula na EJA.
Na estimativa dos percentuais que seguem, adotamos como base de comparação os
grupos de anos de estudo relacionados às etapas da educação básica, ambas coadunadas com a
idade-padrão de conclusão dos referidos períodos, sem reprovação, ou seja:
a) Grupo de 1 a 3 anos de estudos correspondendo aos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, com conclusão-padrão aos 10 anos;
b) Grupo de 4 a 7 anos de estudos correspondendo aos Anos Finais do Ensino
Fundamental, com conclusão-padrão aos 14 anos;
c) Grupo 8 a 10 anos de estudos correspondendo ao Ensino Médio, com conclusão-
padrão aos 17 anos.
60
Ignorados ambos os dados do Censo IBGE/2000 por não se adequarem à nossa análise, que, embasada na
legislação de ensino vigente no período, na idade de 15 anos o/a pesquisado/a pode estar normalmente
concluindo o Ensino Fundamental e, aos 16/17 anos, cursando o Ensino Médio, não o concluindo e, no entanto
nos interessa aqui o período de conclusão do Nível Médio.
61
Anexo IV – Tabela Original.
59
Na perspectiva explicitada acima, a tabela nos fornece para a população pesquisada no
ano de 2000, acima de quinze anos de idade
62
: um índice de 5,76% de analfabetos; 17,38%
desprovidos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e 54,24% sem concluir dos anos finais
do Ensino Fundamental. E, concluindo a leitura do Censo IBGE/2000, para a Educação
Básica (aqui ressaltada apenas o Ensino Fundamental e Médio) objeto da modalidade deste
estudo, a Educação de Jovens e Adultos, encontramos uma estimativa de 66,14% de sul-rio-
grandenses acima de 18 anos que não possuíam o Ensino Médio completo.
Podemos, então, confirmar que a oferta de EJA estava aquém das necessidades de
formação básica da população do Estado. O RS não assumia uma postura indutora desta
demanda e, segundo Relatório da SEE/2002-a, “usou da LDB para fugir dessa
responsabilidade, através da seguinte expressão: ‘O poder público tem, constitucionalmente,
obrigação de oferecer serviços educacionais à população de qualquer idade, quando
solicitado’
63
(SEE, 2002-a, p.2).
Prosseguindo, no diagnóstico feito para a EJA/1999, apontava-se que a “A EJA está
mais de 10 anos estagnada do ponto de vista político-pedagógico. Todos os atendimentos
(...) não têm merecido uma política de formação dos educadores, até porque a concepção de
EJA está voltada para a idéia de ‘suplência’” (SEE, 2002-a, p.01-02) e, conforme já ensejado
em discussões anteriores, a visão de suplência como mera reposição de escolaridade,
indistinta do ensino ministrado a crianças e adolescentes, não era contemplada com reflexões
advindas do diferencial trazido pelas vivências, características sócio-econômico-culturais de
adultos; portanto, não demandava formações específicas aos educadores e educadoras.
O relatório-diagnóstico assinala, ainda, que “em relação aos atendimentos oferecidos
no RS, entre eles não nenhuma articulação. São estanques, em que cada programa
representasse uma fase ou prioridade de um determinado governo”(SEE, 2002-a, p.01).
Partindo destes dados, a nova gestão solidifica seu pressuposto de construir com a
comunidade gaúcha uma Política Pública de Educação de Jovens e Adulto capaz de balizar e
articular todas as ações ejandas, do atendimento à demanda (alfabetização, ensino
fundamental, ensino médio), à formação continuada de educadores/as, à previsão/captação de
financiamento, às necessárias articulações com entidades da sociedade civil...
62
Para efetuar estes percentuais contabilizamos, da tabela já citada, o total de 7.844.238 pessoas pesquisadas
acima de 15 anos de idade.
63
Excerto, citado no Relatório SEE/2002-a, de texto original da SE (Gestão Antônio Britto – 95/98).
60
1.5.2 A Inclusão da Modalidade EJA nos Documentos das Instituições Estaduais
Assumindo os pleitos levantados pelo Movimento Constituinte Escolar, elencados nos
Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual e retomados nas discussões que
gestaram os Projetos Políticos-Pedagógicos, Planos de Estudo e/ou Cursos e Regimentos
Escolares nas Comunidades Escolares, a modalidade “Educação de Jovens e Adultos” passou
a integrar os projetos próprios das instituições.
Estabelecimentos de ensino regular passaram também a ofertar a EJA em suas
propostas/documentos, agora reformulados. Readequando seus projetos, superando a
nomenclatura “supletivo” e buscando avanços nas práticas, as escolas que ofereciam cursos
supletivos noturnos, igualmente, confirmaram a continuidade de suas ações junto à população
jovem e adulta do Estado. A maioria das demais Escolas Estaduais previu legalmente a
possibilidade/ o compromisso de ofertá-la no momento em que surgisse a demanda local.
Comparando dados de Censos Escolares dos anos de 1999 (início da Gestão do
Governo Democrático e Popular do RS) e 2003 (final da Gestão em estudo), verificamos um
incremento de 66,22% no número de instituições estaduais que passaram a atuar com a
Educação de Jovens e Adultos, enquanto observamos um pequeno acréscimo na rede
municipal (7,3%) e o decréscimo na rede particular (-34,4%), conforme podemos vislumbrar
na tabela
64
abaixo:
Tabela 3 – Evolução da Oferta de EJA em Estabelecimentos Educacionais Estaduais –
Comparativo com as demais Redes – Anos 1999 e 2003
Anos Redes de Ensino (nº
s
absolutos de
estabelecimentos cadastrados)
Estadual Municipal Particular
1999 447 205 189
2003 743 220 124
Fonte: Arquivos SEE/RS – Departamento de Planejamento/Divisão de Informática
64
Dados do cadastro dos Estabelecimentos de Ensino que oferecem EJA/RS 1999 e 2003. Fonte: Divisão de
Informática Departamento de Planejamento Secretaria de Educação Governo do Estado do Rio Grande do
Sul.
61
Outro dado relevante, anterior ao acima citado, diz do número de matrículas em
Cursos Presenciais com Avaliação no Processo no ano de 2002:
Tabela 4 – Matrículas em Cursos Presenciais de EJA, com Avaliação no Processo por
Dependência Administrativa – Ano 2002
Nível da
Ed. Básica
Unidade
Geográfica
Federal Estadual Municipal Privada Total
Anos
Iniciais
(1º ao 4º)
Brasil 113 298.309 1.036.313 18.728 1.353.463
Região Sul - 24.859 43.601 763 69.223
Paraná - 4.092 31.914 66 36.072
Stª Catarina - 7.313 5.399 458 13.170
Rio G do Sul
- 13.454 6.288 239 19.981
Anos
Finais
(5º ao 8º)
Brasil 2.620 800.516 551.592 79.922 1.434.650
Região Sul 357 150.916 36.316 19.650 207.239
Paraná - 67.079 2.263 627 69.969
Stª Catarina 357 31.668 17.098 7.554 56.677
Rio G do Sul
- 52.169 16.955 11.469 80.593
Ensino
Médio
Brasil 548 634.776 25.864 212.813 874.001
Região Sul 85 101.313 2.477 55.234 159.109
Paraná - 43.429 - 3.328 46.757
Stª Catarina 14 30.160 1.059 17.759 48.992
Rio G do Sul
71 27.724 1.418 34.147 63.360
Fonte: MEC/INEP
Podemos observar que, nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio,
da Educação Básica - Modalidade EJA, o Rio Grande do Sul apresenta o maior número de
matrículas, englobando as quatro redes de ensino.
Analisando o primeiro bloco da tabela, podemos entender que no ano de 2002, a
matrícula total sul-rio-grandense relativa à EJA/anos iniciais tem, na esfera estadual, o
percentual de 67%, superando a rede municipal, que alcança cerca de 31%, e as entidades
privadas, com cerca de 2%. Suplantam também o Estado de Santa Catarina em praticamente o
dobro e o do Paraná em aproximadamente o triplo de registros na Dependência
Administrativa Estadual. Fazendo um comparativo com os dados anteriores, de 1995, quando
PR e SC já mantinham cursos presenciais oficiais com avaliação no processo, podemos
constatar um grande decréscimo na rede estadual do Paraná em torno de 70% e o acréscimo
na municipal, em torno de 47%; em Santa Catarina, o índice de atendimento na rede estadual
decresceu levemente, em apenas 8%, e a municipal teve um incremento, em cerca de 67%.
Quanto às matrículas para os Anos Finais do Ensino Fundamental, observamos a
grande procura da população: imensamente maior que Anos Iniciais e Ensino Médio no RS.
62
Detecta-se a supremacia da rede estadual em cerca de 65% das matrículas, a rede municipal
com 21% e a privada respondendo por 14%. Comparativamente aos outros Estados da Região
Sul, superamos Santa Catarina com 30% de atendimentos e somos suplantados pelo Paraná
em cerca de 20% de matrículas.
No que concerne à EJA/Ensino Médio, a rede estadual do Rio Grande do Sul responde
por cerca de 44% da matrícula total, a rede municipal em torno de 2% e as entidades privadas
por 54% do atendimento a esta demanda. O atendimento propiciado pela rede estadual do
Paraná responde por cerca de 93% de suas matrículas e, em Santa Catarina, esta absorção da
demanda representa 62%.
Consideramos informação relevante, para pensar o quadro de oferta de EJA/Médio na
rede estadual do RS, o avanço lento dos programas de expansão deste nível de ensino em
regime regular, em especial, frente aos parâmetros do Conselho Estadual de Educação e a
premissa de que uma instituição somente pode oferecer a modalidade EJA estando
efetivado o vel de ensino na estrutura regular. Fica a interrogação quanto a todas as
justificativas que influenciam o órgão regulador da educação sul-rio-grandense a firmar
normas tão austeras à aprovação de novas instituições públicas estatais de nível médio regular
e EJA.
1.5.3 A Criação
65
e Implantação dos Núcleos Estaduais de Educação de Jovens e Adultos
e de Cultura Popular
Nas primeiras discussões ocorridas no Movimento Constituinte Escolar, ou melhor,
em momento anterior ao lançamento deste movimento, quando a equipe de Coordenação da
Educação de Jovens e Adultos no Governo Estadual desencadeou, junto à sua rede de ensino,
um processo de levantamento da situação da EJA/RS, ainda no mês de março/99, por meio de
Seminários Regionais que abrangiam as 30 regiões escolares do Estado, foram ensejados os
Núcleos de EJA e Cultura Popular do RS: nos sonhos, nos objetivos, nos desejos
66
dos
educadores/as e educandos/as desta modalidade da Educação Básica. No período, era
65
Frisamos a singularidade do olhar desta pesquisadora sobre o processo de criação dos NEEJACPs, o qual
representa uma leitura do processo, construído e vivenciado por muitos (as) que podem abordá-lo por ângulos
diferentes deste.
66
Nos referidos Seminários, foram sistematizadas falas que apontavam a necessidade de “Centros de Educação
Popular”, “Escola aberta à comunidade”, entre outros pontos que posteriormente ‘suleariam’ a concepção e
criação dos Núcleos.
63
premente, inclusive via legislação estadual, a necessidade de redimensionar a oferta de
educação à população jovem e adulta, passando da supletividade (Ensino Supletivo
67
) a
propostas e programas que atendam aos interesses desta parcela da população,
resgatando o conhecimento prévio dos educandos, fazendo-os partícipes nos
processos de investigação, na resolução de problemas, na construção do
conhecimento, de forma a responder com pertinência e eficácia às necessidades de
vida, trabalho e participação social (Parecer CEEd nº 774/99, p.03).
E, portanto, redimensionar a estrutura e a ação dos Núcleos de Orientação aos Exames
Supletivos (NOES), Centros Estaduais de Ensino Supletivo (CEES), Centros Rurais de
Ensino Supletivo (CRES), bem como dos Centros Interescolares de Ensino de Técnicas
(CIES.)
Elaborado e amadurecido em inúmeros e densos momentos de discussão, reflexão, de
estudos com educadores/as da rede (Secretaria de Estado da Educação, Coordenadores/as
Regionais de Educação, Coordenadores/as da Regionais da Política de EJA, Educadores/as
dos NOES/CEES/CRES/CIES) e assessorias externas, bem como dialogando com outras
experiências congêneres
68
, elaborou-se
69
o documento-base que sulearia a proposta dos
Núcleos Estaduais de EJA e Cultura Popular do Rio Grande do Sul.
O referido documento traz uma apresentação remetendo a desdobramentos da Política
Pública de EJA do Estado e uma conceituação dos NEEJACPs enquanto
espaços em que se organizam ações educativas, profissionalizantes e culturais, para
as pessoas jovens e adultas que foram excluídas da escola ou que a ela não tiveram
acesso, tendo, então, como pressupostos a Educação Popular, a Democracia
Participativa e o cumprimento das deliberações da V Conferência Internacional de
Educação de Jovens e Adultos EJA, no que tange aos conceitos de EJA e
Alfabetização (SEE/DEJA, 2001-b, p.04).
67
Regulamentado pela Lei 5692/71, pelo Parecer CFE 699/72 e, dentre outros, pela Resolução CEEd
213/94, o Ensino Supletivo “não conseguiu (...) impor-se no Sistema Estadual de Ensino como uma alternativa
de escolarização séria e de vanguarda. Seus programas careceram de credibilidade social, porque muitas das
propostas pareciam reduzir-se a programas escolares compensatórios, cuja finalidade se restringia à certificação
de conclusão de curso. As razões para esse estigma foram muitas, desde a intenção de garantir a igualdade de
oportunidade de escolarização àqueles que não a tiveram em idade própria através de programas de curta
duração e exigências mínimas, até as ofertas de escolarização pela iniciativa privada que descobria um filão
comercial, uma vez que ao programas previam requisitos mínimos de ingresso e reduzido período de
permanência nos cursos”(Parecer CEEd nº774/99, p.01).
68
As experiências observadas/estudadas foram o CMET/RS Paulo Freire, de Porto Alegre; NUPEP/PE – Núcleo
de Pesquisa e Educação Popular, de Recife e EPA- Escuela de Educación de Adultos La Verneda
de San Martín, em Barcelona/Espanha.
69
Ao simplesmente dizermos “elaborou-se” o documento, apontamos a redação do documento, sem querermos
adentrar na riqueza de discussões, reflexões, dúvidas, desejos, conflitos... do processo - registrado em detalhes
pela eficiente equipe que coordenava em nível estadual os trabalhos, em especial da Coordenadora, profª Liana
Borges, na forma de relatos escritos e vídeos VHS.
64
Dispõem sobre a identidade pedagógica dos Núcleos, apontando:
a) a organização dos tempos e espaços, em conformidade com a flexibilidade
ditada pelo Parecer nº 774/99 do Conselho Estadual de Educação/RS;
b) garantia das dimensões educativas, abrangendo: a escolarização básica, com
acesso ao Ensino Fundamental e Médio; o trabalho como princípio educativo; a educação
como ação cultural e a preparação aos exames supletivos;
c) a certificação no processo educativo, salientando apontamentos da LDB (Lei
9293/94) e do Parecer nº 11/2000 do Conselho Nacional de Educação.
Na seqüência, o texto-base insere a abertura para a constituição de
redes de relações com diferentes órgãos governamentais, não-governamentais,
entidades e movimentos sociais, através de mecanismos coletivos de decisão, com
“articulação, proposição e execução de políticas educacionais (...) na perspectiva do
desenvolvimento social” (SEE, 2001-b, p.11).
Também disciplina a composição da gestão e estabelece pontos-chave para a
efetivação de um trabalho democrático e participativo na condução dos núcleos.
Concluindo o material, estão elencadas interfaces que os NEEJACPs podem vir a
estabelecer em relações de parceria visando à consecução de atendimento qualificado às
especificidades do público que demanda Educação de Jovens e Adultos, formal e não formal,
enquanto educação ao longo da vida.
Tendo como parâmetro o documento concebido, construído, redigido coletivamente e
divulgado em agosto do ano de 2001, as instituições regionais/locais (ex-NOES, CEES,
CIES...) afinaram suas discussões e redações, buscando articular ao geral (macro) a
especificidade da população a que se destinava em cada região de inserção (micro) do Núcleo
Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular
70
, cada qual no ritmo de seu
grupo de trabalho.
Estruturadas as propostas regionais de cada Núcleo e encaminhadas à Secretaria de
Estado da Educação, deu-se o processo de Criação e Denominação dos NEEJACPs, de janeiro
a junho de 2002. À medida que se concluía este processo, fazia-se o encaminhamento ao
Conselho Estadual de Educação para aprovação e autorização de funcionamento.
O processo de concepção, elaboração coletiva, criação e autorização de funcionamento
dos Núcleos de EJA e Cultura Popular do Estado, para além das características e momentos
anteriormente já destacados neste texto, foi também permeado por momentos de divergências,
70
No momento em que ocorreu o encerramento da redação do Documento-base dos NEEJACPs e este foi
divulgado, em algumas regiões a discussão e sistematização da proposta a ser desenvolvida dentro do Núcleo
estava bastante adiantada e, inclusive, em alguns momentos serviu de referência aos demais.
65
incompreensões da proposta, incompatibilidades na concepção de educação de adultos, entre
outros fatores bastante comuns em coletividade -, que dificultaram a execução e
consolidação deste projeto diferenciado de educação.
A postura de muitos/as educadores/as frente ao processo Constituinte Escolar, e neste
a Criação dos NEEJACPs, reflete uma certa inércia: resistência a mudanças; acomodação à
rotina escolar de antigas e arraigadas certezas; a tradição do ‘foi sempre assim’; pouca, ou
inexistente, reflexão acerca do “ofício de mestre”
71
; alheamento da realidade; ... justificada,
para alguns, mediante sua indignação frente à situação salarial e social de desvalorização do
magistério
72
bem como, de enfrentamentos a propostas educacionais “de gabinete” de
governos anteriores.
Conhecendo tal realidade e apostando na possibilidade concreta de mudança, a Gestão
Estadual 99/02 explicitou o caráter de convite à participação de todos/as que se sentissem
comprometidos com uma educação de qualidade social e se dispusessem a compor um grande
coletivo para construí-la. Encontramos em Freire (1999), diretrizes que sulearam esta
concepção adotada na construção da Política Pública para a educação:
A escola que se quer não nascerá de puro decreto publicado no Diário Oficial,
mesmo porque isto, além de ser uma postura autoritária, em nada garante que a
escola será melhor. Mudar a escola na direção que esta administração deseja implica
um trabalho profundo e sério com educadores que m a ver com a questão
ideológica, com o assumir compromisso, com a qualificação dos profissionais e este
caminho é, no meu entender, a dificuldade maior a transpor. o considero, porém,
que seja uma dificuldade intransponível (Freire, 1999, p.97).
Buscando avanços na direção da superação de práticas autoritárias, inconscientes ou
não-refletidas, priorizou-se momentos de formação por vezes envolvendo toda comunidade
escolar, conforme relatado neste texto - firmados no pressuposto freiriano de que “uma das
mais importantes tarefas em que a formação permanente dos educadores se deveria centrar
seria convidá-los a pensar criticamente sobre o que fazem. Pensar a prática” (Freire, 1999, p.
123).
Tal assertiva vinha sendo apontada por educadores bastante tempo, como a
colocação de Guyesse apresentada por Freire (1980) em seus estudos:
71
Expressão popularizada pelo educador Miguel Arroyo em obra homônima.
72
No ano de 1999, enquanto forma de pressão por melhoria salarial e reivindicações históricas, o
CPERS/Sindicato desencadeou/liderou um boicote ao Movimento Constituinte Escolar conseguindo, por algum
tempo, dificultar o andamento deste, em especial em cidades sedes dos Núcleos do Sindicato.
66
O homem chega a ser sujeito por uma reflexão sobre sua situação, sobre seu
ambiente concreto. (...) Conscientizar-se consiste em compreender o mecanismo (...)
ao qual se submetem por simples tradição, examinar e criticar os atos diários que
cumprem por rotina. Para vencer a tradição e a rotina, o melhor procedimento
prático não se encontra nas idéias e conhecimentos exteriores e distantes, mas no
questionamento da tradição por aqueles que se conformam com ela, no
questionamento da rotina em que vivem... (C. Guyesse apud Freire, 1980, p.35)
A proposta metodológica de trabalho dos NEEJACPs incluíam a Pesquisa
Participante como fonte primeira para a organização do currículo, porque ela
coloca o desafio de trazer a realidade para a sala de aula e a partir deste ponto
procurar estabelecer relações entre os diferentes conhecimentos, áreas e estratégias
de pensamento para possibilitar aos sujeitos instrumentos capazes de contribuir para
a compreensão e a transformação dessa realidade (SEE, out/2002, p.28).
Em suma, tratava-se de um projeto ousado que envolvia o levantamento da realidade
vivenciada por educandos/as, estudos interdisciplinares para a construção de conhecimentos
consistentes sobre a mesma, superação da visão ingênua, forjamento de visão crítica,
“desvelamentos”, constituição de proposições reais para transformação da situação estudada...
Esta temática – a Pesquisa da Realidade – tornou-se centro de momentos de formação,
discussões, exercícios... E, como em todo processo novo, as dificuldades de implementação,
de produzir este “novo” para realmente ser participante, bem como para que educadores/as se
capacitassem para gestar uma Pesquisa Participante, da concepção ao momento final, de
“devolução à comunidade”.
Toda proposta, e o currículo em especial, demandava um grande envolvimento do
coletivo de educadores/as, exigia integração das áreas do conhecimento, reconhecimento de
cada um e cada uma como ser em permanente formação, inconcluso/a. Requeria um perfil de
educador/a “programado/a para aprender” e expor-se frente a colegas de profissão e
alunos/as, tornando-se realmente educador-educando ou educadora-educanda, ou seja,
ensinando e aprendendo enquanto processo uno.
A efetivação deste projeto nos NEEJACPs careceu de tempo para amadurecimento,
avaliação, continuidade, formação específica... mas, especialmente, de tempo. Seus
regimentos foram aprovados pelo Conselho Estadual de Educação no mês de dezembro de
2002, ou seja, no limiar da Gestão Estadual em que se originaram. Findo o governo,
investimentos em prioridades da nova gestão, incompreensão (desinteresse) da proposta dos
núcleos, incapacidade de trabalhar com estabelecimentos de ensino com estrutura diversa,...
67
Segundo depoimento da Equipe Pedagógica SEE/RS ao apresentar ao CEEd/RS
73
o
documento-base dos NEEJACPs instituições que viriam a substituir CEES, NOES, CRES,
enfim, as modalidades até então denominadas supletivas, determinadas por pareceres deste
mesmo órgão ainda no ano de 2001, seus representantes não compreendiam a proposta;
percebia-se que imaginavam a continuidade da aplicação de provas, sem um efetivo trabalho
pedagógico junto à demanda; fizeram-se necessárias várias reuniões, debates, movimentos e
pressões das comunidades que aguardavam pelo projeto para que o referido Conselho
emanasse os Pareceres de Aprovação dos Núcleos.
Avaliando, a posteriori, todo desenvolvimento do Programa de Governo da Gestão
1999/2002 para a Educação de Jovens e Adultos, a ex-Coordenadora EJA/MOVA , Profª. Msc
Liana Borges pontua, enquanto questão que poderia ter contribuído na consolidação das
propostas dos NEEJACPs, que foram instituições com projetos totalmente originais no
Estado, a aceleração do processo de constituição dos mesmos, que, no entanto,
acompanharam todo Movimento Constituinte Escolar para, somente ao final deste,
formatarem sua proposta; mesmo estando o levantamento inicial, estudos e sistematizações
bastante avançados no ano de 1999 em algumas unidades. Porém, era premissa do Governo
e da Secretaria de Estado da Educação, o andamento conjunto de toda rede na formatação de
Princípios e Diretrizes comuns à Educação Básica Pública Estadual.
Salientava-se a importância de não separar a discussão da EJA daquela das escolas da
rede como um todo, evitando a fragmentação do processo, sendo que se objetivava a
implementação da modalidade no interior das instituições de ensino.
Um aspecto negativo neste processo, destacado pela ex-Coordenadora foi o atraso na
consecução dos Núcleos, na sua visão os mais prejudicados com a mudança de governo e que,
posteriormente, não chegaram a se efetivar, se enraizar enquanto proposta. Não tiveram o
tempo necessário para amadurecer, fazer a formação dos professores, avaliar... Ela aponta
como prejuízo o fato de não se ter avançado com este programa mais rapidamente.
73
O Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (CEEd/RS) é o órgão fiscalizador, consultivo,
deliberativo e normativo do Sistema Estadual de Ensino.
68
2 ITINERÁRIOS EJANDOS: ANTES, DURANTE E APÓS O CURSO
2.1. As Expectativas da População-Alvo da EJA na Cidade de Ijuí/RS
O massivo retorno da população jovem e adulta aos bancos escolares tem despertado
interesse de educadores, pesquisadores e estudiosos, gerando pesquisas, artigos e produções
intelectuais diversas. Neste trabalho de pesquisa, buscamos subsídios para caracterizar este
recomeço na Educação de Jovens e Adultos em Ijuí uma das cidades-pólo do Noroeste do
Rio Grande do Sul no depoimento de educandos e educandas, bem como nos postulados de
alguns autores, analisando-os à luz da realidade local/global.
Referenciando-nos no pressuposto freiriano de refletir sobre a prática visando o
aprimoramento da práxis (ação-reflexão-ação), optamos pela análise da demanda atendida
pelo Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí –
NEEJACP/Ijuí, local de efetivo exercício da autora, como Educadora e Coordenadora
Pedagógica. O período selecionado (1999/2002) diz respeito à primeira formulação -
democrática, participativa, de respeito e incentivo à emersão/expressão/afirmação das
diferentes realidades e peculiaridades das comunidades do RS de uma Política Pública para
a EJA/RS e sua repercussão/ressonância junto à comunidade gaúcha.
2.1.1 Caracterização da Instituição
O NEEJACP/Ijuí, criado em 24 de maio de 2002 pelo Decreto Estadual 41631,
publicado no Diário Oficial/RS de 27/05/2002, ousadamente deu início às suas atividades
letivas, com educadores/as e educandos/as, em março de 2002, enquanto aguardava a
autorização de funcionamento, a qual foi concedida pelo Conselho Estadual de Educação
69
somente em 18 de dezembro desse ano, pelo Parecer CEEd 1480/2002, após inúmeras
discussões CEEd versus SEE/CREs/Comunidades Escolares além de mobilizações e
manifestações da comunidade local e estadual (no período adjacente, outros 32 núcleos
também foram autorizados a funcionar no Rio Grande do Sul
74
).
Originário do Núcleo Estadual de Orientação aos Exames Supletivos NOES,
existente no Município, o NEEJACP/Ijuí dispunha então de grupo de educadores/as e uma
demanda de educandos/as que recorriam à instituição buscando preparação aos Exames
Supletivos; esta foi a base inicial para estudar, discutir e, em muitos momentos de formação -
locais, regionais e estaduais - formatar a Proposta Pedagógica a ser implementada em
substituição àquela ofertada pelo NOES/Ijuí.
Como anteriormente referido, as ações com educandos/as dentro da nova proposta
tiveram seu início em março de 2002, com a formação de Grupos de Aprendizagem (ex-
turmas), por Totalidades (ex-séries). Havia uma demanda muito superior por Ensino Médio
75
,
em comparação à do Ensino Fundamental. O atendimento dava-se nos turnos da tarde para o
Ensino Fundamental e primeira Totalidade do Médio (prédio alugado ao Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Ijuí, na Rua 14 de Julho, 146 - Centro) e à noite, neste local para o
Ensino Fundamental e, na sede oficial, a Escola Estadual de Ensino Fundamental Ijuí, para o
Ensino Médio.
Visando a atender, com responsabilidade e respeito, a educandos/as, suas expectativas
de formação e conquista de certificados conclusivos (EF e EM), evitou-se a formação de
Grupos de Aprendizagem nas Totalidades Finais de ambos os níveis de ensino, enquanto não
houvesse a autorização de funcionamento do NEEJACP/Ijuí.
No ano de 2003, de posse da regulamentação do CEEd/RS, houve uma expansão na
oferta de vagas, sendo possível atender a todas as Totalidades em que surgiu demanda a para
formação de Grupos de Aprendizagem, inclusive para as Totalidades Finais. Passou-se a
formar, também, Grupos de Aprendizagem Especiais”, constituídos por educandos e
educandas com pendências em até três disciplinas a serem concluídas, tendo “eliminadas” as
demais nos Exames Supletivos ofertados pela Secretaria de Estado da Educação.
No ano de 2004, com a primeira equipe diretiva eleita democraticamente pela
comunidade escolar, ampliou-se ainda mais a oferta de vagas, sendo necessário buscar mais
espaços para o atendimento da demanda, em especial noturna: conseguiu-se salas junto à
74
Ver AnexoV – Tabela com dados de criação dos NEEJACPs do RS.
75
Segundo Delors (1999), “há um fenômeno cumulativo: quanto mais formado se é, mais desejo se tem de
formação, e esta tendência observa-se tanto em países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento”
(Delors, 1999, p. 105).
70
Escola Estadual de Ensino Fundamental Rui Barbosa - Centro, o que se mostrou também
insuficiente no tocante ao nível médio e sua imensa procura. Neste mesmo ano, o Núcleo
passou a atender uma sala de aula de Ensino Médio demandada pela Empresa Medianeira de
Transportes Urbanos/Ijuí, exercitando a previsão de seu Regimento e Proposta Político
Pedagógica: atendimento descentralizado, por meio de Extensões.
Salientamos que a população regional que pleiteia Educação de Jovens e Adultos no
NEEJACP/Ijuí busca fundamentalmente o Ensino Médio, sendo o Núcleo a única instituição
pública que oferta a EJA nesse nível. Podemos comprovar esta abrangência regional nas
fichas de matrícula dos/das ejandos/as que embasam esta pesquisa; catalogamos a presença de
cidadãos e cidadãs dos Municípios de Augusto Pestana, Catuípe, Coronel Barros, Doutor
Bozano, Ijuí, Jóia, Pejuçara e Redentora.
2.1.2 Caracterização de Ejandos e Ejandas
Caracterizada, brevemente, a Instituição a que se encontram vinculados/as
educandos/as alvo desta pesquisa, passamos aos dados do grupo pesquisado. Coletamos para
tabulamento
76
e análise um total de 175 fichas de matrícula
77
utilizadas no NEEJACP Ijuí,
do final do ano de 2001, do ano de 2002, 2003 e de 2004. Examinando as fichas, nos
detivemos nas questões “Que motivos o levaram a matricular-se no Núcleo?” e “Por que
procurou o Núcleo de EJA e Cultura Popular?
78
”, as quais são centrais para a nossa
indagação inicial: Quais expectativas trazem jovens e adultos aos bancos escolares?
Consideramos importante, também, relacionar as respostas mais freqüentes às
características declaradas pelos educandos e educandas, tais como: gênero, faixa etária,
situação quanto ao mercado de trabalho, nível de ensino buscado e contato mais recente com
as formas de educação/escolarização.
A amostragem, recolhida das fichas, nos apresenta um grupo constituído por:
a) uma maioria de 60% do gênero feminino;
b) faixa etária predominando entre 18 e 31 anos de idade;
c) cerca de 21% são estudantes que saem da escola regular ao atingirem a idade
mínima exigida para a Educação de Jovens e Adultos; 20% estavam há mais de dez anos sem
76
Ver Anexo VI – Tabulamento das Fichas de Inscrição/Matrícula no NEEJACP/Ijuí – anos 2001,2002,2003.
77
Anexo VII – Modelos de Fichas de Matrícula/Inscrição do NEEJACP/Ijuí.
78
Questões presentes na “Ficha de Matrícula” do NEEJACP/Ijuí nos anos de 2001 a 2003 respondidas por sua
demanda. Anexo VII.
71
contato com formas de escolarização e 12% entre três a seis anos de afastamento; 47% não
declararam esta condição;
d) 22% apontam algum contato com diferentes propostas de EJA das redes
municipal, estadual, privada ou projetos desenvolvidos por Movimentos Sociais Organizados;
e) 45% estavam empregados/as, 13% desempregados/as, 09% autônomos/as; 33% não
declararam;
f) 65% estavam matriculados/as no Ensino Médio.
2.1.3 Das Expectativas Expressas
Desde o nascimento (ou até mesmo antes, ainda na concepção) os seres humanos são
movidos por sonho, ideais, expectativas de outros e, a posteriori, nos primeiros raciocínios
próprios, impulsionam caminhos. Para Camargos (2004),
o sentido fundamental de "expectativa" não vai muito além de nosso sentimento de
antecipar algum acontecimento futuro, mas pode trazer reflexões profundas. Nosso
momento presente parece estar intimamente entrelaçado ao horizonte de
expectativas que projetamos: um não existiria sem o outro e, embora não possamos
determinar completamente nossas ações, somos compelidos a buscar disposições
mentais para enfrentar nossa incessante atenção expectante. Isto implica que grande
parte de nossos sentimentos e decisões envolvem expectativas e, portanto,
apreensões sobre o futuro (Camargos, 2004, p.03).
Na vivência de um mundo perversamente globalizado, cidadãos/ãs ejandos/as almejam
conquistar um espaço que lhes proporcione (e aos seus) melhores condições de vida e de
inserção na sociedade. Encontramos expressões que, entre outras, dizem de seu retorno a
classes de formação, tais como: Lutar de igual para igual. Procuro encontrar o meu caminho
no mercado de trabalho; com estudo é difícil, sem é ainda pior. Tenho de terminar os estudos
para ser alguém na vida” (Fichas de Inscrição/Matrícula do NEEJACP/Ijuí – anos 2001, 2002,
2003; 2004 - Arquivos). Estas falas indicam projeções e expectativas amplas em relação ao
projeto de vida de cada um/a.
Tentando entender a dinâmica do mundo globalizado - em especial o mundo do
trabalho para postar-se como sujeito perante ele, ejandos/as nos levam a refletir e fazer
analogias desta realidade com o Mito da Caverna
79
de Platão. Sublinhamos que, de maneira
79
No livro VII de A República, Platão ilustra o seu pensamento com o famoso “mito da caverna”, que representa
, segundo ele, o estado de nossa natureza relativamente à instrução e à ignorância.
“Suponhamos uns homens numa habitação subterrânea em forma de caverna, com uma entrada aberta para a luz,
que se estende a todo comprimento desta gruta. Estão dentro desde a infância, algemas de pernas e pescoços,
72
alguma, enquanto cidadã-educadora, nos colocamos fora, além ou aquém deste quadro;
concordamos com a afirmação de Platão, em relação aos prisioneiros da caverna imaginária:
“Semelhantes a nós” (Platão, 2001, p.316), pois todos nós estamos condenados a ver sombras
à nossa frente e tomá-las como verdadeiras, em especial frente à gama de conhecimentos
produzidos atualmente, a cada instante.
Os prisioneiros da caverna “liam o mundo” e a si próprios por intermédio do bruxuleio
das sombras dos objetos, surgindo e se desfazendo diante deles: imaginação atuando, a
procura de desvelar o que eram as obscuras formas apreendidas. Acreditavam que as imagens
fantasmagóricas que apareciam aos seus olhos eram verdadeiras; então, somente os espectros
do “verdadeiro mundo” os constituíam.
Hoje, podemos ver os cidadãos e cidadãs dos anos 2000 compondo leituras de mundo
não por meios das sombras projetadas por uma fogueira, mas mediados e em muitos casos
até conduzidos e/ou submetidos pela fábula da globalização, tomando como verdades
fantasias insistentes e midiaticamente repetidas, fornecendo base falsamente sólida à sua
interpretação. Esta fábula
80
advoga que basta se esforçar, ter força de vontade, ter estudo que,
dentro deste modelo, tudo está ao alcance de todos, de preferência individualmente (como os
prisioneiros da caverna acorrentados sem poder voltar-se a nenhum lado e/ou companheiro de
cativeiro), isolado da coletividade, de seus iguais, pois estão a “concorrer, competir” pelo
mesmo espaço. O que não se revela - se escamoteia - é o alcance de poucos às condições de
acesso e/ou manutenção dos meios para usufruir “da fábula”: a instantaneidade das
informações, do “bom” emprego, do consumo, das viagens, e ainda do pequeno grupo para o
qual o Estado é máximo. Esconde-se que a ação coletiva é a maior força para a manutenção
de direitos adquiridos, e, quiçá do alargamento dos mesmos; ao contrário, se constrói e se
publiciza a demonização/criminalização dos movimentos sociais, sindicatos e centrais de
trabalhadores/as.
de tal maneira que lhes é dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de mover a
cabeça por causa dos grilhões; serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao longe, numa eminência, por
detrás deles; entre a fogueira e os prisioneiros um caminho ascendente, ao longo do qual se construiu um
pequeno muro (...). Visiona também ao longo deste muro homens que transportam toda espécie de objetos, que o
ultrapassam: estatuetas de homens e animais de pedra, de madeira e de toda espécie de lavor; como é natural, dos
que os transportam, uns falam e outros seguem calados. (...) Pensas que, nestas condições, eles tenham visto, de
si mesmos e dos outros, (...) as sombras projetadas pelo fogo na parede oposta da caverna (...) E dos outros
objetos. Se, portanto, fossem capazes de conversar uns com os outros, (...) julgariam estar a nomear objetos reais
quando designavam o que viam” (Excertos do Mito da Caverna - Platão, 2001,p. 315-316).
80
Para o sociólogo Ricardo Antunes, “A tentativa de introjetar na subjetividade do trabalhador e da trabalhadora
a idéia do ‘você querendo, você consegue, você sozinho é capaz’. É o individualismo possessivo inculcado em
cima de subjetividades despossuídas, porque o trabalhador não tem posse alguma. Isso é tão violento que hoje
você vai a uma empresa e eles não podem dizem mais trabalhador, eles dizem ‘parceiro’, ‘consultor’. Qual
parceria, se na primeira crise demite todos os ‘parceiros’? É falacioso, é ideológico.” (Antunes, mar/2007, p.20)
73
Prosseguindo
81
na alegoria da caverna de Platão, onde um prisioneiro é liberto das
cadeias, separado dos demais, levado “a ver a luz” - relacionamo-la às vivências de
educador/a-educando/a na Educação de Jovens e Adultos, onde objetivamos freirianamente
propiciar a leitura crítica do cotidiano, a re-significação e re-invenção da leitura e ação no
mundo. Constatamos certa resistência na maioria dos/das ejandos/as em (pré)dispor-se a
refletir sobre o cotidiano, vinculando-o ao conteúdo programático da EJA e à realidade social.
Num primeiro momento, atribuímos este fato às atividades desenvolvidas
cotidianamente pela maioria dos/das ejandos/as: a obediência a um padrão de ação, a
mecanização (ação sem o acompanhamento da reflexão) frente a seu trabalho. Amalgamada a
este fator, apontamos a hierarquia estabelecida na nossa sociedade onde ao/à trabalhador/a
cabe receber ordens e executá-las, seguindo modelos e prescrições, questionamentos,
sugestões, contrapontos não são permitidos sendo considerados atributos de desordem,
insubordinação, má reputação...
Nesta mesma direção, Freire (2005) nos aponta que
de tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes, que não sabem nada, que não
podem saber, que são enfermos, indolentes, que não produzem em virtude de tudo
isso, terminam por se convencer de sua “incapacidade” falam de si como os que não
sabem e do “doutor” como o que sabe e a quem devem escutar (Freire, 2005 p.56).
Ilustrando com grande similitude o comportamento de um dos prisioneiros da
Caverna descrito por Platão - Freire (2005) se refere a uma fala em um dos “Círculos de
Cultura” feita por um dos camponeses participantes: “Por que o senhor não explica
primeiramente os quadros (codificações do processo de alfabetização)? Assim, concluiu nos
custa menos e não nos dói a cabeça.” (Freire, 2005, p.56 – nota de rodapé).
Neste mesmo sentido Benincá em seus estudos relativos ao senso comum, práxis e
resistência – afirma que:
A consciência prática construída no cotidiano cultural, e que tem por função orientar
as ões, poderá negar e reagir contra todas as evidências que a reflexão oferece. A
reflexão poderá denunciar incoerências e contradições no interior da concepção do
mundo e mostrar a necessidade de transformá-la. Contudo, o senso comum pode não
ter novas experiências e conhecimentos disponíveis para operar a transformação e,
81
“Logo que alguém soltasse um deles e o forçasse a endireitar-se de repente, em voltar o pescoço, a andar, e a
olhar para a luz, ao fazer tudo isso, sentiria dor, e o deslumbramento impedi-lo-ia de fixar os objetos cujas
sombras outrora via. O que achas, pois, que ele responderá se alguém lhe vier dizer que tudo quanto vira até
então eram vãos fantasmas, mas que presentemente, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais,
de maneira mais justa? Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas passantes, o obrigar, à força de perguntas,
a dizer o que é isso? Não crês que ficará embaraçado e que as sombras que via pouco lhe parecerão mais
verdadeiras do que os objetos que ora lhe são mostrados?” (Platão, 2001, p. 316-317).
74
posteriormente, dar continuidade à ação. Quando o senso comum não dispõe de
experiências de transformação, não tem como garantir a unidade de sua concepção
de mundo e, conseqüentemente, da própria identidade. Por isso, uma possível reação
do senso comum é impedir o avanço da reflexão, provocando medo e insegurança
nos indivíduos. (Benincá, 2002, p. 125-126)
No entanto, esta é uma
82
das inúmeras contingências que afetam ejandos e ejandas.
Por não terem concluído a escolaridade estes/as encontram-se em situação de desigualdade,
numa sociedade onde: o conhecimento é imprescindível, a Educação Básica é Direito
Constitucional, o mundo do trabalho exige níveis de estudo cada vez mais elevados. Então,
dificulta-se para os que não estudaram, as alternativas de trabalho e geração de renda.
O nível de escolarização da mão-de-obra constitui um indicador importante da
qualidade da força de trabalho. No Brasil, segundo dados, este é tradicionalmente baixo, com
uma média de escolaridade de 3,9 anos. Para Pochmann (1999),
... a educação torna-se cada vez mais uma condição necessária para o emprego de
mão-de-obra. A oferta de trabalho tende a estar mais identificada com a busca de
maior qualificação profissional e a escolaridade passa a ser um recurso inadiável de
elevação da qualidade da mão-de-obra, já que há correlação direta entre baixa
escolaridade e baixa qualidade ocupacional (Pochmann, 1999. p 97).
Global e localmente, porém, as modificações do trabalho e do mercado de trabalho
extinguem e criam profissões à medida que cresce a invenção, o aperfeiçoamento, a difusão e
a utilização da tecnologia e a mecanização - bem como a visão capitalista centrada num
pensamento único de lucro e poder - substituindo a mão-de-obra humana, em especial, em
trabalhos envolvendo processos repetitivos.
Conforme Castells, em análise sobre o processo do trabalho no paradigma
informacional,
embora um número substancial de empregos esteja melhorando de nível em relação
à qualificação e, às vezes, a salários e condições de trabalho nos setores mais
dinâmicos, muito empregos estão sendo eliminados gradualmente pela automação da
indústria e dos serviços. São, geralmente, trabalhos não-especializados o suficiente
para escapar da automação... Qualificações educacionais cada vez maiores, gerais ou
especializadas, exigidas nos cargos requalificados da estrutura ocupacional
segregam ainda mais a força de trabalho com base na educação. (Castells,1999,
p.315)
Da mesma forma, parafraseando Castells em suas análises, o novo sistema produtivo
informacional requer uma nova força de trabalho e os indivíduos e grupos incapazes de
82
Não pretendemos aqui diminuir a importância da superação da visão/consciência ingênua, proposição maior da
educação popular. Pretendemos colocá-la como mais um, dos muitos desafios enfrentados por Ejandos/as.
75
adquirir conhecimentos informacionais poderiam ser excluídos do mercado de trabalho ou
rebaixados e, ainda, encontrar grandes dificuldades em tarefas cotidianas que envolvam o
conhecimento informacional.
Nas palavras de educandos(as) - que freqüentaram o NEEJACP/Ijuí no período
2001/2003/2004, com registros nas fichas individuais de matrícula - os motivos que os trazem
às diferentes formas de acesso ao saber escolar e à certificação destes perpassam pela questão
do trabalho (emprego/desemprego) e da qualificação; buscam adequar-se às transformações
do mundo do trabalho via educação e, nesta, a EJA. Além disso, destacam a otimização do
tempo, os objetivos futuros, a convivência com iguais, a gratuidade e a frustração com o
ensino regular.
Passamos a interpretar, tentando “ler nas entrelinhas” das respostas às perguntas
contidas nas fichas de matrícula “Que motivos o levaram a matricular-se no Núcleo?” e Por
que procurou o Núcleo de EJA e Cultura Popular?” na ordem numérica decrescente de
regularidade e freqüência que foram declaradas. Salientamos que as mesmas foram agrupadas
por aproximação, segundo nosso entendimento, bem como ressaltamos que a maioria dos
documentos apresenta várias expectativas entremeadas donde destacamos aquela colocada
inicialmente e/ou com maior ênfase.
2.1.3.1 Recomeçar; Obter mais conhecimentos; Completar os estudos
Estes motivos foram expressos em cerca de 40% dos documentos pesquisados, com
preponderância ao item “completar os estudos” (30% do levantamento geral), referindo-se à
Educação Básica e as mais recentes exigências do mercado de trabalho: Ensino Médio
completo. Deste total:
a) 58% na faixa etária dos 18 aos 31 anos de idade, 19% entre 32 a 38 anos;
b) 60% do sexo feminino;
c) 68% matriculados/as no Ensino Médio;
d) 44% empregados/as, 18% desempregados/as, 10% autônomos/as e 28% não
declararam sua situação frente ao mercado de trabalho.
76
2.1.3.2. Recuperar o tempo perdido; Concluir rapidamente a Educação Básica;
Ingressar em Curso Profissionalizante e/ou Superior
Perspectivas registradas por 25% dos ejandos e ejandas que buscaram o NEEJACP·no
período pesquisado, dos quais a primeira afirmação “concluir rapidamente a Educação
Básica” soma 15% do total. São características deste grupo:
a) 67% na faixa etária dos 18 aos 31 anos de idade;
b) 74% do sexo feminino;
c) 72% matriculados/as no Ensino Médio;
d) 43% não declararam sua situação frente ao mercado de trabalho, 40%
empregados/as, 11% se declararam desempregados/as e 06% autônomos/as.
A expressão “Recuperar o tempo perdidoestá muito presentes no público da EJA (e
faz jus a um trabalho de desmistificação). Ao mesmo tempo em que expressa “culpa” de
alguns que relatam a não-valorização da escolarização no período de adolescentes (própria ou
de seus responsáveis), registra também a dificuldade/impossibilidade de acesso de outros
(trabalho precoce, inexistência ou distância de escolas no campo...).
Junto ao desejo de reaver o tempo perdido e/ou desperdiçado vem a pressa em obter a
certificação, “Concluir rapidamente”. Nesta perspectiva, a flexibilidade da EJA (e a
discussão homérica de educadores/as, coordenadores/as, dirigentes das mantenedoras), que
possibilita a coerente (porém difícil) individualização do tempo e ritmo de cada um/a para
concretizar suas aprendizagens e conseqüente certificação (trabalho e avaliação
personalizados).
A aplicação da flexibilização prevista na legislação, nas práticas das Escolas e Núcleos
de EJA, provoca equívocos na interpretação da estrutura dos tempos desta modalidade,
percebidos nas falas da população em geral: acredita-se que um tempo menor de duração
em relação à escola regular, não pressupondo a individualidade do processo de aprendizagem,
e a possibilidade de alguns/mas concluírem em menos tempo que outros/as ou ainda em
tempo menor que o previsto pela escola, ou seja, anualmente duzentos dias letivos e
oitocentas horas-aula. Ignora-se que o tempo cronológico - do relógio e do calendário
gregoriano - e o tempo de um fenômeno, neste caso, de sistematização de aprendizagens, são
diferentes: cada um tem suas marcas e finalidades específicas. Conforme podemos observar
no Parecer da CEB/CNE “a validação do que se aprendeu ‘fora’ dos bancos escolares é uma
das características da flexibilidade responsável que pode aproveitar estes ‘saberes’ nascidos
77
destes ‘fazeres’”(Parecer CEB/CNE 11/2000, p. 31). Da mesma forma o relator do Parecer
já mencionado aponta que:
acelerar quem está com atraso escolar significa não retardar mais e economizar
tempo de calendário mediante condições apropriadas de aprendizagem que
incrementam o progresso do aluno na escola. Tal progresso é um avanço no tempo e
no aproveitamento de estudos de tal modo que o aluno atinja um patamar igual aos
seus pares. Quem está com adiantamento nos estudos também pode ganhar o
reconhecimento de um aproveitamento excepcional (Parecer CEB/CNE nº11/2000,
p. 32).
Complementando a expectativa destes ejandos e ejandas de “Recuperar o tempo
perdido” e “Concluir rapidamente a Educação Básica”, vem o ideal de dar continuidade a seu
projeto de vida ingressando em curso profissionalizante (pós-médio) ou prestar vestibular e
adentrar no ensino superior.
2.1.3.3 Próprio para adultos; Ótima forma de ensino; É mais fácil
Citadas por 13% dos/das pesquisados/das com as seguintes características:
a) 82% com idade entre 18 e 31 anos;
b) 52% do sexo feminino;
c) 78% matriculados/as no Ensino Fundamental;
d) 60% empregados/as, 20% desempregados/as, 11% autônomos/as e 09% não
declararam.
Para além das expectativas anteriormente citadas, jovens e adultos/as trabalhadores/as
procuram um tratamento diferenciado daquele dado pela escola a crianças e adolescentes. Um
local e uma “forma de ensino” “próprios para adultos” conforme expressão dos educandos e
educandas, que tem respaldo nas ponderações do Parecer (2000):
A heterogeneidade do público da EJA merece consideração cuidadosa. A ela se
dirigem adolescentes, jovens e adultos, com suas múltiplas experiências de trabalho,
de vida e de situação social, compreendidos as práticas culturais e valores já
constituídos.
... A regra metodológica é: descontextualizá-los da idade escolar própria da infância
e adolescência para, apreendendo e mantendo seus significados básicos,
recontextualizá-los na EJA. Mas para isto é preciso (...) reconhecer a diversidade da
escola média, necessária para contemplar as desigualdades nos pontos de partida de
seu alunado, que requerem diferenças de tratamento como forma mais eficaz de
garantir a todos um patamar comum nos pontos de chegada”(Parecer CEB 11/2000,
p.55-56).
78
Para a consecução deste desafio, proposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a
EJA e almejado por ejando/as, é premissa básica a formação inicial
83
(mais profissionalização
e menos voluntariado) e continuada dos/das educadores/as. Para tanto, legislação (2000)
que “insta os sistemas a implementar programas de desenvolvimento profissional dos
docentes em exercício”, (Parecer CEB 11/2000, p.54) e, na mesma dimensão,
para qualquer profissional que se ocupe do magistério, a garantia de padrão de
qualidade é um princípio que cobre o espectro da cidadania a que se destina. A pior
forma de presença é aquela que se situa nas antípodas da qualidade e que atende pelo
termo mediocridade, já expresso pelo cinismo da fórmula “qualquer coisa serve” ou
“antes isso do que nada”.
A formação adequada e a ação integrada implicam a existência de um espaço
próprio, para os profissionais da EJA, nos sistemas, nas universidades e em outras
instituições formadoras (Parecer CEB 11/2000, p.54).
2.1.3.4. Conseguir Emprego; Ascender Profissionalmente; Ter Maiores Oportunidades;
Garantir o Futuro
Apontadas por 12% dos educandos e educandas participantes da pesquisa, sendo as
características destes/as:
a) 50% na faixa etária dos 18 aos 31 anos;
b) 72% do sexo feminino;
c) 67% matriculados/as no Ensino Médio;
d) 44% empregados/as, 33% não declararam, 16% autônomos/as e 07%
desempregados/as.
A possibilidade, beirando a certeza, pregada pelo senso comum e pela fábula da
globalização de viabilização de emprego mediante um maior nível de escolarização, tem seu
ponto positivo: o retorno da população jovem e adulta aos bancos escolares. Está presente
também a esperança da ascensão na carreira por meio do porte de um grau maior de instrução,
o que ocorre em especial com servidores públicos cujas categorias possuem plano de carreira
regulamentado.
Para a maior parte dos/das trabalhadores/as observa-se, como bem coloca Frigotto
(2002) “um tempo de insegurança ou ameaça de desemprego estrutural ascendente e de
83
Segundo os dados do INEP de 2002, das 519 Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras que ofertam o
curso de Pedagogia e foram avaliadas pelo Exame Nacional de Cursos, apenas 9 (1,74%) oferecem a habilitação
de EJA: 3 na região Sul, 3 na Sudeste e 3 na região Nordeste (MEC/INEP, 2002). Os dados de 2005 revelam que
houve um aumento, ainda que pouco expressivo, do número de instituições que estão ofertando a habilitação de
EJA para os cursos de Pedagogia: das 612 contabilizadas, 15 oferecem a habilitação (2,45%) e, dos 1698 cursos,
há 27 ofertando essa formação específica (1,59%) (Soares, S/D, p. 03).
79
precarização do emprego. Produz-se nos assalariados, particularmente nos precarizados,
desempregados, um sentimento de uma existência provisória sem prazo” (Frigotto, 2002-a,
s/p). Este sentimento vincula-se à velocidade com que a globalização tecnológica, guiada pelo
viés capitalista de acumulação de bens, extingue profissões e desampara trabalhadores/as,
bem como a migração das empresas em busca de locais que lhes assegurem maiores ganhos
(menores salários, menores impostos, maiores isenções...).
Nas palavras “ter maiores oportunidades” dos/das ejandos/as, podemos interpretar
parafraseando Frigotto (2002-b) - o novo vocabulário do ideário neoliberal (agora no campo
educacional) em especial a empregabilidade
84
, conjuntamente com qualidade total, sociedade
do conhecimento, educar por competência e para a competitividade, cidadão ou trabalhador
produtivo, etc. Para este autor:
No quadro do ajuste de nossas sociedades à mundialização do capital o campo
educativo é direcionado para uma concepção produtivista e empresarial das
competências e da competitividade, cujo papel é o de desenvolver habilidades de
conhecimento, de valores e atitudes e de gestão de qualidade, definidas no mercado
de trabalho e cujo objetivo é o de formar em cada indivíduo um banco ou reserva de
competências que lhe assegure empregabilidade (Frigotto, 2002-b, p.09).
No bojo deste fato “podemos perceber a ansiedade dos trabalhadores adultos e dos
jovens, mesmo da classe média, para se agarrarem em diferentes cursinhos que lhes prometem
empregabilidad.” (Frigotto, 2002, p.10). E/ou certificados em menor tempo (de calendário, de
aula, de estudo em casa), menor esforço e, provavelmente, bem menor qualidade,
conhecimento, formação...
2.1.3.5 Turno oferecido; Economia; Socialização; Convivência...
Motivadores de aproximadamente 10% da amostragem tabulada, sendo que esta é
constituída por:
a) 65% do sexo masculino e 35% feminino;
84
A empregabilidade é um conceito mais rico do que a simples busca ou mesmo a certeza de emprego. Ela é o
conjunto das competências que você comprovadamente possui ou pode desenvolver – dentro ou fora da empresa.
É a condição de se sentir vivo, capaz, produtivo. Ela diz respeito a você como indivíduo e não mais à situação,
boa ou ruim da empresa ou do país. É o oposto ao antigo sonho da relação vitalícia com a empresa. Hoje a
única relação vitalícia deve ser com o conteúdo do que você sabe e pode fazer. O melhor que uma empresa pode
propor é o seguinte: vamos fazer este trabalho juntos e que ele seja bom para os dois enquanto dure; o
rompimento pode se dar por motivos alheios à nossa vontade (...) Empregabilidade é como a segurança agora se
chama (Moraes, 1998 Apud Frigotto, 2002, p. 9).
80
b) faixa etária de 16 a 25 anos representando 50% das citações, na idade de 31 a 26
anos 25% e, na faixa de 43 a 52 anos de idade, constituindo também 25% de referências a
este quesito;
c) 47% empregados/as, 47% não declararam sua posição quanto ao mundo do
trabalho, 03% desempregados/as e 03% autônomos/as;
d) 53% matriculados/as no Ensino Médio e 47% no Ensino Fundamental.
A (in)disponibilidade de tempo é uma das características mais marcantes da demanda
da Educação de Jovens e Adultos trabalhadores/as, seja sua jornada de trabalho cumprida em
empresas ou dentro de sua residência (donas de casa, outros/as trabalhadores/as
autônomos/as). O NEEJACP/Ijuí proporcionou atendimento nos turnos da tarde e noite nos
anos iniciais de seu funcionamento (2002/2003) e, a partir de 2004 passou a atender também
no turno da manhã, bem como prevê, regimentalmente e embasado na Política Pública de EJA
99/02, a categoria Afastamento
85
, visando contemplar a necessidade de ausência do
educando e da educanda das atividades escolares presenciais e a validação do tempo e das
aprendizagens construídas no período em que se fez presente.
Sendo a maioria do alunado composta por trabalhadores/as assalariados/as e/ou
autônomos/as, jovens e donas de casa (sem rendimentos), é plenamente justificada a alegação
da economia no orçamento familiar. Muitos/as apontam que, se não houvesse a gratuidade,
não lhes seria possível o retorno aos estudos.
Também encontramos, como fatores de motivação para o retorno aos bancos
escolares, a convivência e a socialização. Este apontamento está relacionado por educandos/as
na faixa etária acima de 50 anos, que buscam, provavelmente, níveis mais elevados e a
constituição de laços mais fortes de compromissos de grupo, cooperação, ajuda mútua,
interdependência, troca de experiências..., que encontros para diversão, rodas de chimarrão e
conversas.
No tabulamento das expectativas de ejandos/as, foram encontradas ainda citações, tais
como auxiliar os filhos nos estudos, a decepção com a escola regular (reprovações),
recomendações de vizinhos/amigos/patrões/conhecidos... que permeiam as demais falas
comentadas.
85
Afastamento - A categoria Afastamento e Cancelamento consolida a identidade da Educação de Jovens e
Adultos posta, pois “coloca como requisito a compreensão das dimensões formadoras da vida juvenil e adulta”
(SEE, 2001-a, p.58), entendendo que a ausência deste público às atividades escolares “surge em função das
demandas familiares, do trabalho, das individualidades/subjetividades.” (SEE, 2001-a, p.58) de cada um/a.
Coloca-se, então, junto à premissa do acesso permanente à escola, a possibilidade legal do/a ejando/a comunicar
e justificar seu afastamento temporário da instituição para breve retorno, ou solicitar o cancelamento da
matrícula.
81
Finalizando este olhar para as expectativas dos ejandos e ejandas, fazemos coro a
Milton Santos (1996)
Trata-se, para eles, da busca do futuro sonhado como carência a satisfazer – carência
de todos os tipos de consumo, consumo material e imaterial, também carência do
consumo político, carência de participação e de cidadania. Esse futuro é imaginado
ou entrevisto na abundância do outro e entrevisto, como contrapartida, nas
possibilidades apresentadas pelo Mundo e percebidas no lugar (Santos, 1996, p.
261).
Reafirmamos, no decorrer da análise das falas dos/das educandos/as, a relação
intrínseca entre o momento presente, a ação expectante e o futuro idealizado. Em todas elas,
está retratada a carência de diversos elementos constitutivos do cotidiano (presente), seja
material/físico ou subjetivo/afetivo que o/a cidadão/ã observa em outrem ou capta via antenas
globalizantes da dia e seus discursos homogeneizantes/ilusórios e o deseja para si (num
futuro próximo), impulsionando-o/a na busca pelos meios apontados e/ou vislumbrados nas
possibilidades locais.
Ressaltamos, também as considerações de Freire (2005):
É preciso que nos convençamos de que as aspirações, os motivos, as finalidades, os
motivos humanos (...) não estão aí, num certo espaço, como coisas petrificadas, mas
estão sendo. São tão históricos quanto os homens. Não podem ser captados fora
deles, insistamos. Captá-los e entendê-los é entender os homens que os encarnam e a
realidade a eles referida (Freire, 2005, p.115).
Que nos impulsiona a acompanhar a caminhada traçada pelos sujeitos que chegam ao
Núcleo carregados de expectativas e os rumos que estas tomarão em seu novo momento
histórico.
2.2 A Visão dos Ejandos e Ejandas na Trajetória do Curso
Tendo a expectativa e a oportunidade de formação/estudo presencial como pontos de
partida, ejandos e ejandas lançam-se às experiências de sala de aula: construção e exercício de
princípios de convivência (solidária, humanista...), coexistência com aparentemente iguais e
com diferentes, confronto de saberes, dialogicidade, erros, acertos,... E neste primeiro
momento, como bem coloca Guimarães Rosa (1985), todos estão “entretido na idéia dos
lugares de saída e de chegada”(Rosa, 1985, p.33).
Buscamos, nesta seção, analisar os registros gráficos de educandos e educandas que
expressam um pouco de sua visão durante a trajetória do curso Ensino Fundamental e/ou
82
Ensino Médio, ou ainda de ambos seqüencialmente. Para tanto, nos utilizamos de cópias
reprográficas das “Fichas de Avaliação e Auto-avaliação”
86
preenchidas nas diferentes etapas
ao longo do nível de ensino da matrícula efetiva do/a educando/a.
As impressões
87
dos ejandos e ejandas, recolhidas das fichas, nos apresentam uma
leitura particular - por vezes repetida, citada por vários indivíduos - dos diversos elementos e
aspectos constitutivos da Instituição, bem como da postura de cada um e de cada uma
enquanto estudante do Núcleo e cidadão/ã do mundo, suas dificuldades e potencialidades.
Optamos por sistematizar e apresentar as colocações subdivididas nos tópicos: a freqüência e
o acesso; os educadores e educadoras; a conciliação do trabalho e o tempo para estudar; as
diferenças de faixa etária nos grupos de aprendizagem; o autoconhecimento e os ‘bloqueios’;
os trabalhos em grupo; os componentes curriculares, os conteúdos e as avaliações; os espaços
do Núcleo; a autorização de funcionamento do NEEJACP/Ijuí e,ainda, citações/comentários
gerais.
2.2.1 O Acesso e a Freqüência
Apontados em praticamente todos os documentos que normatizam e dissertam sobre a
Educação de Jovens e Adultos, estes dois aspectos também são bastante citados pelos ejandos
e ejandas que, em especial trazem relatos de grandes dificuldades em variados quesitos, como
podemos vislumbrar nos depoimentos a seguir:
Eu não venho em todas as aulas por não ter tempo, é sempre corrido. Muitas vezes
não almoço nem janto, venho para a aula até mesmo sem banho e outras tantas vezes
trago meu filho pequeno junto para a escola. É muito difícil, mas quero terminar o
Ensino Médio ainda este ano.
Para mim vir estudar não é nenhum mar de rosas, claro que todos têm dificuldade,
mas eu arrisco a minha vida; por isso tenho que sair mais cedo. O meu trajeto é
difícil, tenho até que atravessar potreiro.
Muitas vezes falto aula por motivo de estar desempregada e não ter dinheiro para o
ônibus, pois moro no bairro Modelo, mas copio o conteúdo que foi dado naquele
dia. (Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04- grifos nossos)
86
As referidas fichas se constituíam em instrumento de auto-avaliação do/a ejando/a, de avaliação feita por ele/a
do Grupo de Aprendizagem que compunha, bem como da proposta de trabalho e seu desenvolvimento em todos
os setores do NEEJACP/Ijuí. Eram observadas e consideradas por educadores/as e equipe diretiva na classificação
dos/as educandos/as junto aos demais instrumentos de avaliação desenvolvidos durante o período - na
sistematização dos Relatórios de Aprendizagem individuais, bem como na avaliação da Instituição e elaboração
de planos para a(s) próxima(s) etapa(s). Ver modelos utilizados nos anos 2002, 2003 e 2004 no Anexo IV.
87
A identificação do ejando ou ejanda será suprimida do corpo do texto e mantido sob sigilo absoluto por
motivos éticos inerentes à pesquisa.
83
Encontramos, nestas citações, entre outros dados que poderão vir a ser vislumbrados, o
desabafo, a expressão do cotidiano que angustia e o perfil de cidadãos/ãs trabalhadores/as
que:
a) no afã de conseguir recursos para o sustento da família na atividade informal,
despendem todo o tempo do dia, deixando de lado inúmeras vezes - as necessidades de
alimentação, conforto pessoal e dos/as filhos/as;
b) paradoxalmente, valorizando a vida - e acreditando que o retorno das jornadas de
estudos reverterá em benefícios - a expõem, de certa maneira, a riscos, percorrendo
solitariamente trajetos ermos, de difícil acesso e não contemplados com linhas de transporte
após as vinte e duas horas, isto em uma sociedade permeada por ltiplos tipos de violência.
Como assinala Galeano (1991):
Cada promessa é uma ameaça; cada perda, um encontro. Dos medos nascem as
coragens; e das vidas, as certezas. Os sonhos anunciam outra realidade possível e
os delírios, outra razão. Somos, enfim, o que fazemos para transformar o que somos.
A identidade não é uma peça de museu, quietinha na vitrine, mas a sempre
assombrosa síntese das contradições nossas de cada dia (Galeano, 1991, p. 123).
c) em havendo transporte urbano, surge também a dificuldade financeira de acesso a
este, produzida pelo desemprego e a falta de rendimentos; salientamos aqui, mais uma vez, a
existência de apenas uma Instituição que atende à demanda por Ensino Médio/Modalidade
EJA na cidade e na Região de abrangência da 36ª Coordenadoria Regional de Educação em
contradição à imensa
88
procura por vagas, que o Núcleo não apresentava condições de suprir.
2.2.2 Os Educadores e Educadoras
Na concepção almejada para o perfil de educador/a a atuar no NEEJACP/Ijuí,
postulou-se vários atributos, sendo uma de suas possíveis sínteses o pensamento dialético de
Freire (2000):
É preciso que (...) desde os começos do processo, ficando cada vez mais claro
que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é
formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é
transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ão pela qual um sujeito criador
forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não docência sem
88
Como ilustração deste dado, temos registros junto à secretaria do NEEJACP/Ijuí, do ano de 2004, quando,
esgotadas as vagas disponíveis (tendo como referência o número de salas de aula e docentes disponíveis),
decidimos elaborar “Listas de Espera” para contato em torno de um mês a um mês e meio após iniciadas as
aulas, vislumbrando a possibilidade sempre presente de desistência dos primeiros matriculados (titulares da
vaga); incrivelmente, chegamos a anotar para a Totalidade do Ensino Médio cerca de 04 novos Grupos de
Aprendizagem (tínhamos em torno de 06 GAs programados para atendimento com cerca de 25 a 30
educandos/as matriculados em cada um deles).
84
discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam,
não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar
e quem aprende ensina ao aprender (Freire, 2000, p. 25).
Para criar e/ou vitalizar esta postura de educador-educando em cada profissional que
atuava no Núcleo, a Formação Continuada instituída semanal foi considerada
imprescindível, bem como para a consecução e aprimoramento da proposta, reflexão e
avaliação das práticas de sala de aula e dos setores da Instituição, aprofundamento teórico,
socialização de experiências entre as áreas e veis de ensino... Enfim, para o forjamento da
identidade da Educação de Jovens e Adultos (educadores/as, educandos/as, currículo,
metodologias, tempos, espaços, relações...) desejada para o NEEJACP/Ijuí.
Enquanto condição de educadores/as, como bem coloca Freire (2000)
a responsabilidade, de que às vezes não nos damos conta, é sempre grande. A
natureza mesma de sua prática eminentemente formadora, sublinha a maneira como
a realiza. Sua presença na sala de aula é de tal maneira exemplar que nenhum
professor ou professora escapa ao juízo que dele ou dela fazem os alunos. E o pior,
talvez, dos juízos é o que se expressa na “falta” de juízo. O pior juízo é o que
considera o professor uma ausência na sala (Freire, 2000, p.73).
Catalogadas as fichas de avaliação, optamos por organizar a leitura, feita por ejandos e
ejandas, da ação dos educadores e das educadoras em sala de aula e demais espaços do
Núcleo, em dois momentos. No primeiro - e predominando nas falas - a postura de educador/a
consciente de seu papel frente à educandos/as. No segundo, elencamos colocações
denunciando o caráter bancário da educação praticada por quatro educadores/as, num total de
quarenta e seis que atuavam na Instituição.
2.2.1.1 A Postura de Educador/a Consciente de seu Papel Frente a Educandos/as
Os professores são muito pacientes e atenciosos, têm com os alunos uma amizade
muito grande que nos deixa confortáveis.
Com os professores o relacionamento foi ótimo, encontrei não professores, mas
verdadeiros amigos e, muitas vezes, confidentes.
Aos demais professores o meu muito obrigado de coração, sem a paciência, a
compreensão e o carinho deles eu não teria conseguido. Que Deus os abençoe muito.
Os professores são ótimos, excelentes, continuem assim.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Observamos nestas citações o reconhecimento, a gratidão, a afetividade e a
valorização da postura de educador/a atestada pelos educandos e educandas. Nestes olhares,
ousamos detectar alguns dos postulados de Freire(2000) de que
85
Ensinar exige: respeito aos saberes dos educandos; estética e ética; corporeificação
das palavras pelo exemplo; respeito à autonomia de ser do educando; bom senso;
apreensão da realidade; alegria e esperança; segurança, competência profissional e
generosidade; comprometimento; liberdade e autoridade; saber escutar;
disponibilidade para o diálogo; querer bem aos educandos (Freire, 2000, p.7,8,9).
Salientamos também, fazendo coro à pesquisadora Naíma M Wadi (2005) – que
disserta a respeito da experiência vivenciada no NEEJACP Paulo Freire, de Santa Rosa/RS,
no mesmo período analisado por esta pesquisa:
As expressões dos sujeitos mostram a extrema importância que tem o educador em
qualquer proposta de EJA, e particularmente na proposta do NEEJACP. E levam-me
a afirmar, ainda, que não a atenção e o carinho dedicados aos educandos são
fundamentais, mas, sobretudo o entendimento das especificidades dessa modalidade
de ensino, da consideração da realidade e características de aprendizagem dos
sujeitos. E mais ainda pelo necessário envolvimento e comprometimento com os
educandos e com a proposta, o que demanda opção, ruptura, decisão e encaminha
para a compreensão da politicidade da educação, da qual Freire não se cansou de
falar no decorrer de sua vida e de seus escritos, que perpassou toda proposta do
NEEJACP, e ainda que com limitações, foi ensaiada pelos educadores, no período
em análise (Wadi, 2005, p. 212).
O olhar de sujeito que fez parte da história ora em análise, aglutinado com o da agora
pesquisadora (distanciado?) não nos deixou passar despercebidas
89
, em ambos os momentos,
limitações na ação educativa e restrições (mesmo que dissimuladas) frente à proposta
inovadora – e muitas vezes causadora de polêmica – do NEEJACP/Ijuí, entre elas:
a) educandos/as como seres condicionados
90
por vivências pessoais e influenciados
pelos ditames da sociedade, inúmeras vezes aplaudem posturas pouco (ou nada)
emancipatórias de seus mestres;
b) maioria de educadores/as contratados/as
91
, rotatividade no quadro de RH,
desconhecimento da proposta, dificultando a construção de uma caminhada consistente e de
avanços.
A Formação Continuada não buscava unanimidade de idéias e ações, bem como tinha
presente a premissa freiriana da condição humana de ser aprendente, ser condicionado e do
inacabamento; no entanto, pautava como imprescindíveis a coerência, a transparência, a ética,
89
Visão enquanto Coordenadora Pedagógica (out/dez 2002 e ano de 2004) e Educadora (2003 e 2004).
90
Expressão de Paulo Freire em Pedagogia do Oprimido.
91
Este expediente, no mínimo dual, favoreceu a presença, na Instituição, de educadores/as recém-formados,
engajados em movimentos sociais e/ou estimulados por ideais de mudanças na sociedade via educação, o que
infelizmente pouco observávamos em vários colegas com maior experiência profissional. Como bem lembra
Freire(2000): “É próprio do pensar certo a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo que não pode ser negado
ou acolhido porque é novo, assim como o critério de recusa ao velho não é apenas cronológico. O velho que
preserva sua validade ou que encarna uma tradição ou marca uma presença no tempo continua novo”(Freire,
2000, p. 39).
86
a seriedade e a responsabilidade com os compromissos assumidos perante o coletivo de
educadores/as e educandos/as da Instituição.
2.2.2.2 Denunciando o Caráter Bancário da Educação Praticada
Neste quesito, organizamos as colocações e avaliações de educandos/as em duas
partes.
2.2.2.3 Dificuldades com as Metodologias Utilizadas pelos/as Educadores/as
Eu pediria assim, que alguns professores, na hora de explicar, que se virassem para
os alunos e transmitissem a eles o raciocínio do conteúdo que está sendo dado.
Sugiro que o professor passe conteúdo no quadro; não só fale a aula inteira o
conteúdo, mas passe também para a gente ter no caderno.
Gostaria que o professor (...) mudasse um pouco a metodologia, a maneira dele
explicar, porque a maioria não consegue pegar a matéria.
Sugiro que o professor (mesmo da fala acima) modificasse o modo de explicar para
os colegas, indo ao encontro do aluno.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
As críticas se dão em torno da forma com que educadores/as se colocam frente a
educandos/as e, no mesmo nível de importância, da mediação que fazem entre o saber
escolar/conteúdo da disciplina que ministram e os sujeitos aprendentes.
2.2.2.4 Das Transgressões da Ética de Ensinar
a professora (...) não aceita a opinião do aluno, ou ela diz: Eu sou a professora e
você é o aluno, eu dou a aula que eu quero”, que ela tem problemas e nós temos que
respeitá-la; mas e nós? Que deixamos marido, a casa, cansados e temos ainda que
ouvir ela se queixar?
a professora (anteriormente mencionada) não muda sua maneira e as aulas dela são
chatas e pouco interessantes.
..menos intimidação de alguns professores, pois não somos crianças.
...penso que a professora (....) deveria ser mais sociável e derrubar aquela barreira
que ela põe ao seu redor; somos todos adultos e por mais que ela seja professora não
é mais que ninguém e, professora com livro do lado, até eu. Sobre esta professora,
não é por mal, mas para quem vem estudar depois de 22 anos, com o cérebro
entravado, e a pessoa diz: ‘Eu já expliquei!e a aula morre, porque ninguém tem
coragem de perguntar. Vamos para casa com a garganta trancada.
Sugiro para o próximo ano substituir a professora (falas anteriores), pois ela tem
dificuldades de se relacionar com os alunos, quando precisa de uma explicação ela
não sabe se expressar ao aluno.
87
Senti muita falta de estudar ...(disciplina da professora das falas anteriores) pois
quando estava aprendendo e gostando a professora não tinha tempo de ensinar,
explicava uma única vez e não mostrava interesse em nos ajudar. Essa disciplina não
é assim para ensinar; só por Deus para alguém da nossa turma passar em um
concurso ou vestibular nesta matéria. Faltou profissionalismo e ética, pois ensinar
adultos não é para qualquer um.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Que dizer frente a colocações que exprimem momentos difíceis da convivência
educador/a-educando/a? Da indignação que nos acomete mediante depoimentos “de garganta
trancada”, quando esperamos educandos/as e nós, educadores/as - cumplicidade no ato de
(re)construir saberes ?
Sendo o diálogo importante pressuposto da proposta de trabalho da Instituição e,
fundamentalmente, no momento e na situação em que emergiram tais falas a Avaliação das
Práticas do/no NEEJACP/Ijuí –, não podíamos esquecer que “a avaliação da prática é fator
importante e indispensável à formação do/a educador/a. (...) Avaliamos
92
para melhorar a
ação dos sujeitos, para formar” (Freire, 2000, p.15).
Enquanto componente da Equipe de Coordenação Pedagógica do Núcleo (no período),
rememoro as longas e difíceis conversas com educadores/as que, subjugados alguns(mas) pelo
autoritarismo, outros/as pelos problemas enfrentados no seu cotidiano família, duas a três
escolas, dificuldades financeiras, de saúde... oprimidos/as pelo inexistente tempo de lazer,
de vivência familiar e, perante uma jornada extenuante de 60h de trabalho, sucumbem e não
conseguem se perceber como seres de ação-reflexão-ação, agindo (ou reagindo?) como
autômatos. Privados/as de condições para exerce sua “humanidade”, não a reconhecem ou a
respeitam no outro e na outra. Esforçamo-nos, enquanto equipe, para manter a coerência e a
clareza de que estávamos a avaliar a prática do/a educador/a e não sua pessoa; avaliávamos
para aprimorar a práxis educativa e não para punir.
Ressaltamos que as colocações feitas pelos educandos e educandas - sistematicamente
lidas, analisadas e avaliadas coletivamente pela Equipe Diretiva da Instituição, num primeiro
momento sem a presença e após com o/a educador/a – mostraram-se eficazes instrumentos de
reflexão da prática, de (re)conhecimento da proposta de trabalho da Instituição e do perfil de
ejandos e ejandas matriculados/as. Estes diálogos e, certamente, a reflexão consciente do/a
92
As fichas individuais onde se encontram registradas as avaliações dos educandos e educandas eram
costumeiramente lidas pelo coletivo do grupo de educadores(as), antes de se proceder à sistematização do
Relatório de Aprendizagem. Em casos como os citados nesta seção, a equipe pedagógica reservava as fichas para
posterior diálogo dos/as educadores/as citados/as com o coletivo da Equipe Diretiva.
88
avaliado/a atos com limitações
93
- ensejaram a superação de práticas
94
“bancárias” e
desrespeitosas, bem como resultaram em remanejamento voluntário de educadores/as para
outros estabelecimentos de ensino e/ou outras funções.
Salientamos aqui, como complementação a este diálogo permeado por condições
muito humanas de existência e convivência, duas colocação de Freire(2000) acerca da ética
do ato docente e do querer-bem inerentes a ele:
O preparo científico do professor ou da professora deve coincidir com sua retidão
ética. É uma stima qualquer descompasso entre aquela e esta. Formação científica,
correção ética, respeito aos outros, coerência, capacidade de viver e de aprender com
o diferente, não permitir que o nosso mal-estar pessoal ou de nossa antipatia com
relação ao outro nos façam acusá-lo do que não fez são obrigações a cujo
cumprimento devemos humilde, mas perseverantemente nos dedicar (Freire, 2000,
p. 18).
O desrespeito à educação, aos educandos, aos educadores e às educadoras corrói ou
deteriora em nós, de um lado, a sensibilidade ou a abertura ao bem querer da própria
prática educativa de outro, a alegria necessária ao que-fazer docente. É digna de nota
a capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular,
desenvolver em nós o gosto de querer bem e o gosto da alegria sem a qual a prática
educativa perde o sentido. É esta força misteriosa, às vezes chamada vocação, que
explica a quase devoção com que a grande maioria do magistério nele permanece,
apesar da imoralidade dos salários. E não apenas permanece, mas cumpre como
pode, seu dever. Amorosamente, acrescento (Freire, 2000, p. 160 e 161).
2.2.3 A Conciliação do Trabalho e o Tempo para Estudar
Conforme mencionado no corpo deste texto, a maioria dos educandos e educandas
são trabalhadores/as - assalariados/as, com jornada estabelecida em número de horas,
autônomos/as, ou ainda informais - ocupando praticamente todo tempo livre, e/ou também
envolvidos/as em atividades de “organização/gerenciamento/manutenção”
95
da família na
residência. Praticamente todos/as necessitam, portanto, organizar para si uma rotina/disciplina
que lhes permite conciliar estas duas a três jornadas diárias de atividade.
Em suas avaliações, expressam-se sobre este tema com declarações do gênero:
Gostaria que os/as professores/as não fizessem tanto trabalho fora das aulas para
nós, porque não tenho muito tempo, trabalho como autônomo e quase sempre fico
mais tempo que deveria trabalhando.
93
Éramos, no período, cerca de quarenta e seis educadores/as atuando, dos quais apenas quatro deles/as são
citados negativamente pelos educandos e educandas.
94
Constatadas em fichas posteriores e em conversas com educandos/as, no fortalecimento da participação e
posicionamento crítico-progressista em debates nos momentos de formação no Núcleo e no conjunto da rede da
mantenedora.
95
Atividades executadas, em geral por mulheres, que historicamente são denominadas afazeres “do lar”, pouco
reconhecidas como trabalho, tanto que suas/seus ocupantes se autodenominam “desempregadas/os” ou “não-
trabalhadores/as”.
89
Trabalho por comissão, quando não venho às aulas, trabalho até mais tarde.
Peço também que passem um pouco menos de tema. O importante é nós
entendermos mais e aprender quando estamos aqui. Espero sua atenção.
Queria poder ter mais tempo disponível para poder ficar com os cadernos e livros.
No final de semana trabalhei com História e, lendo e descrevendo, descobri como é
linda a História; as desavenças das pessoas e a ganância pelo poder não são de
antigamente mas como nos dias atuais a ganância é grande.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
As colocações que fazem em torno deste item estendem-se:
a) das sugestões aos educadores/as – beirando ao pedido de auxílio –, para otimizarem
o tempo de trabalho em sala de aula e, desta maneira, evitarem que uma de suas jornadas
interfira negativamente na outra, ou, em outras palavras, em suas rotinas tão atribuladas por
imprevistos da (sobre)vivência cotidiana solicitam que a Escola não acrescente outras
exigências;
b) as suas carências de tempo desejado para a maior dedicação aos estudos, com
revisões e outras leituras; demonstram que, ao experimentar tal exercício, descobrem a
“boniteza” das disciplinas e tecem relações analítico-comparativas e espaço-temporais das
mesmas e seus objetos de estudo com o cotidiano.
2.2.4 As Diferenças de Faixa Etária nos Grupos de Aprendizagem
A presença expressiva de adolescentes
96
em cursos e projetos até então destinados a
adultos é uma nova especificidade da Educação de Jovens e Adultos que iniciou a partir dos
anos 80 e vem se acentuando desde a década de 90 até nossos dias.
O Núcleo de EJA e Cultura Popular de Ijuí, num primeiro momento toma por
pressuposto não compor (segregar) os Grupos de Aprendizagem baseado na faixa etária
dos/as matriculados/as e, além disso aposta no intercâmbio intergeracional como ganho para a
aprendizagem de todos/as. Reforçando esta gica estão dados determinantes (de certa forma
limitantes), como o espaço físico disponível, quadro de educadores/as, demanda de
inscritos/as, etc.
Na convivência entre estes dois grupos, aparentemente distintos
97
, emerge uma relação
de tensão na sala de aula, que pode ser constatado nas falas:
96
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069 de 13 de julho de 1990, adolescente é todo
aquele/a que possui de 14 a 18 anos de idade. Aqui neste texto, especificamente nos referimos aos educandos e
educandas de 15 a 18 anos.
90
Gostaria que, quando mudasse de Totalidade, os jovens ficassem numa sala e os
adultos numa outra, porque é muita bagunça na sala de aula, a gente não consegue
entender direito as coisas.
Que na próxima Totalidade possamos ser separados dos jovens, pois muita
bagunça.
Alguns adolescentes, que não fazem nada, atrapalham na sala de aula. Falta mais
respeito entre os jovens, tem alguns que não respeitam os mais velhos. Gostaria que
os separassem.
Acho que a Diretoria deveria estudar bem o caso dos menores que vem para
bagunçar no colégio.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Estas considerações são todas feitas por educandos/as adultos/as; nas fichas
preenchidas por adolescentes/jovens não constam problemas de relacionamento com adultos
e/ou dificuldades na convivência. Destacamos também que as reclamações deste gênero
ocorrem na sua maioria nas salas de Ensino Fundamental, onde encontramos adolescentes.
Pensando sobre as falas e buscando apreendê-las/compreendê-las para além da
aparência inicial de “choque” de gerações, incompreensões, ritmos e interesses diferentes
encontramos uma gama de diversidades muito bem colocadas por Di Piero (2001):
O primeiro grupo de adultos busca na escola uma perspectiva de integração
sociocultural, o segundo de jovens e adolescentes - mantém com ela uma relação
de tensão e conflito aprendida na experiência anterior. Os jovens carregam consigo o
estigma de alunos-problema, que não tiveram êxito no ensino regular e que busca
superar as dificuldades em cursos aos quais atribuem o caráter de aceleração e
recuperação (Di Piero, 2001, p.13 - acréscimos grifados nossos).
Estas diversidades (im)postas às instituições que trabalham com a EJA representam
novos desafios aos educadores, que têm de lidar com universos muito distintos nos planos
etários, culturais e das expectativas em relação à escola.
Buscando compreender o descompasso citado por ejandos/as
98
elencamos a
observação expressa pela educadora e pesquisadora Maria Clara Di Piero a educadores/as em
momento de formação (2001): “Quem trabalha com a Educação de Adultos está cansado de
ver que as pessoas mais idosas são mais lentas; se elas estão afastadas há muito tempo das
97
Sobre este aspecto, o pesquisador João Francisco de Souza assim se refere: “Embora freqüentemente
constituindo dois subgrupos distintos (o de ‘jovens’ e o de ‘adultos’) tal grupo se define como relativamente
homogêneo ao agregar membros em condições de não-crianças’, de excluídos da escola e de pertinentes a
parcelas ‘populares da população (em oposição às classes médias e aos grupos dominantes), pouco
escolarizadas e inseridas no mundo do trabalho em ocupações de baixa qualificação profissional e baixa
remuneração”(Souza, 2002, p.41).
98
Estas falas são todas feitas por educandos(as) adultos; nas fichas preenchidas pelos adolescentes/jovens não
constam problemas de relacionamento com os adultos e/ou dificuldades na convivência. Destacamos também
que as colocações deste gênero ocorrem na sua maioria nas salas de Ensino Fundamental, onde encontramos
adolescentes.
91
práticas escolares, freqüentemente, elas são muito mais lentas do que os jovens”.
Testemunhando em muitas ocasiões este fato, a lentidão adulta nos processos escolares -
atribuída via senso comum por um entravamento no cérebro”
99
- inferimos que esta pode
estar vinculada à ação mental seletiva do adulto, a tentativa de “realmente”
compreender/apreender o que está sendo tratado e estabelecer conexões com seus saberes,
alguma dificuldade em readaptar-se ao exercício da abstração e ao “funcionamento” da rotina
de sala de aula. para o/a adolescente, habituado/a com a rotina da escola regular,
geralmente este tempo “estendido” em explicações e retomadas é considerado como “perda”
e, invariavelmente ele/a opta por ocupá-lo com conversas com colegas e saídas da sala de aula
alegando motivos diversos.
Di Piero (2001) traz à nossa reflexão sobre este conflito uma visão do/a
adolescente/jovem que chega a EJA:
Os jovens com defasagem série-idade em relação ao ensino regular, que não
encontram na escola um espaço prazeroso, quer dizer, a escola não é um espaço de
prazer, e eles precisam da certificação para ascender ou progredir no mercado de
trabalho. Essa é a primeira demanda que cai na vala comum do supletivo, da
Educação de Jovens e Adultos (Di Piero, 2001, Transcrição de Palestra).
A pesquisadora aponta também alguns níveis de abordagem do problema colocado
quanto à escola regular que citamos como ilustração, a qual por não constituir objeto
específico de nosso estudo não nos cbe aprofundar neste trabalho.
Um primeiro tratamento é na própria escola de ensino regular de criança e
adolescente, no sentido tanto de que ela não produza reprovação, defasagem, evasão
e repetência, como no sentido de que ela seja mais significativa, mais relevante,
mais prazerosa para que esses jovens prefiram passar um período mais longo da sua
vida naquela sociabilidade, que nós julgamos seja formativa, ao invés de buscar uma
certificação que seja facilitada em Exames ou outros mecanismos de aceleração (Di
Piero, 2001, transcrição de Palestra).
Em estando o/a adolescente à nossa porta – ontem demanda inexistente, hoje potencial
- juntamente com o/a adulto/a trabalhador/a demanda efetiva - nos resta, enquanto
Educação de Jovens e Adultos, acolhê-los/las e ir em busca de formação, de concepções,
planejamentos, compromissos e intenções/propósitos para proporcionar a todos/as uma
educação diversificada, flexível, responsável e de qualidade social.
99
Expressão de educando/a em avaliação de educadores/as (item 2.2.2.2).
92
2.2.5 O Autoconhecimento e os “Bloqueios”
No decorrer da trajetória, entre um aprendizado e outro, o/a ejando/a vai se
(re)conhecendo, admitindo para si, para colegas e educadores/as peculiaridades suas, por
vezes com expressões “fortes” tipicamente populares:
Eu só criei vergonha na cara quando comecei a trabalhar e me obriguei a ser
responsável.
Sou um pouco tímida, tenho um medo de perguntar algumas coisas...
Sou um pouco conversador.
Reconheço que às vezes sou bem irresponsável.
(...) Muitas vezes eu mesma me surpreendo pela rapidez do meu raciocínio.
Foi aqui que consegui, eu e meus colegas, sermos pessoas mais expressivas e deixar
de lado a timidez.
(...) Questiono, pergunto, dou minha opinião e se não entendo não tenho medo de
pedir explicações para meu melhor aprendizado.
(...) Tento contribuir opinando sobre coisas que sei, e não tenho vergonha em fazer
perguntas sobre assuntos que são totalmente novos para mim.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Ainda, ponderam sobre sua (re)ação frente ao que se lhes apresentam, ao modo como
interpretam ou às razões que atribuem suas limitações:
Minha maior dificuldade foi em Português, talvez por falta de leitura, que não tenho
o hábito de ler.
Eu aprendi muitas coisas, inclusive conviver com nova família, não sei tudo mas
consigo ir em frente. Tenho um pouco de dificuldade em ler porque estou curta das
vistas e, também, não consigo me concentrar quando tem alguém falando alto perto
de mim.
(...) provas com consultas são ótimas, porque a gente não consegue tirar a resposta, é
um apoio, porque de saber que é prova tu fica nervosa e acaba esquecendo a
matéria que, depois, em aula normal a gente faz tudo, porque não está pressionada.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Falam de seus bloqueios
100
, dificuldades, descrédito/depreciação consigo e
supervalorização do outro - reflexos de discursos e práticas da sociedade em relação aos
menos favorecidos:
100
A primeira citação aponta dificuldade não superada na fala - de uma etapa para outra, mesmo obtendo o
avanço de Totalidade.
93
Tenho dificuldade de raciocinar (F,Q,M) para mim é muito difícil, mas nem por isso
vou atrapalhar o andamento das aulas e o desempenho dos colegas. Sei que meu
raciocínio é lento(1º sem/03).
(...) 03 matérias eu não consigo pegar, é simples, todas têm fórmulas mas que
infelizmente sou muito fraco e lento (2º sem/03).
(...) Eu não me destaquei em nada, só participei com esforço e zelo.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
2.2.6 Os Trabalhos em Grupo
A dinâmica de trabalho em grupos suscita sugestões, solicitações, comentários,
avaliações diversas e discordantes:
É bem melhor trabalhar em grupo.
No nosso grupo todos participaram do trabalho todo, pesquisaram; fizemos mesmo
um trabalho em grupo.
Os trabalhos que foram feitos em grupo eu gostei muito, porque o que a gente não
sabe, aprende, e o que sabe, ensina.
Participo no grupo de trabalho, mas confesso que tenho preferência em trabalhar
individualmente, pois tenho opinião própria, ouço a dos outros, mas a minha sempre
prevalece.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Ademais, assinalam quanto à força, segurança, camaradagem e compartilhamento de
responsabilidades do/no coletivo e à carência do espírito “desarmado”, dialógico, propício ao
saber ouvir e crescer solidária e conjuntamente frente à diversidade de posicionamentos.
2.2.7 Os Conteúdos, os Componentes Curriculares e as Avaliações
Escrevendo sobre o cotidiano das atividades didáticas de sala de aula, ejandos e
ejandas ressaltam vários pontos, donde selecionamos sua interpretação:
a) de aulas “de cunho progressista” que seguem às diretrizes do Núcleo
É excelente o método de mesclar aulas teóricas e práticas com o conhecimento dos
próprios educandos.
Aprendi muito nas aulas, acho que os conteúdos abordados foram esclarecedores,
bem na nossa realidade. Não tive dificuldades em aprender, pois esse era o meu
objetivo e consegui.
Com o decorrer das aulas, aprendi a relacionar os conteúdos e criar opiniões
consistentes, adquiri um bom conhecimento de mundo estabelecendo relações entre
as diferentes áreas estudadas.
94
Solidifiquei um pouco mais meus conhecimentos de maneira geral, tomando gosto
por leituras, que antes não tinha o hábito de ler.
Temos dificuldades quando não sabemos do que se trata; depois que temos
conhecimento os termos se encaminham de maneira mais clara.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
b) dos componentes curriculares e seus conteúdos
A área de Letras sempre foi o meu forte, na Matemática quando, eu estudava
(adolescente) era um bicho-papão, hoje consigo ver que eu não gostava, consigo
gostar e rever coisas que não sabia e vejo que não eram tão difíceis, eu que
complicava.
Dentre todas as matérias, as que mais aprendi foi Química e Física, porque não sabia
quase nada. No ano passado (02), tivemos poucas aulas e, como para mim era
novidade, não aprendi quase nada. No geral gosto de todas as matérias, tenho um
pouco de dificuldades nas aulas de Matemática e Português, mas agora não vejo
essas duas como um bicho-de-sete- cabeças.
Minha maior dificuldade é Matemática, por mais que a professora explique, eu acho
complicado.
Consegui me surpreender comigo mesma, tive mais facilidade nos conteúdos. Achei
que Física fosse ruim, mas foi muito bom de trabalhar, em Português e Literatura
tive mais facilidade com os textos. Geografia e História fique surpresa quando
trabalhamos com meridianos, a história do homem, em Biologia consegui
compreender os transgênicos e, em Química, fiz novas descobertas, mas tive um
pouco de dificuldades em Matemática com o novo conteúdo, mas, com um pouco de
esforço supero isso também.
Nessa caminhada, aprendi muitas coisas que variam entre conteúdos passados em
sala de aula e trocas de experiências com os colegas com assuntos do cotidiano.
Com relação aos conteúdos, em todas as disciplinas, de minha parte não houve
dificuldades. Os conteúdos são atrativos e convidativos para a aprendizagem,
estimulam e incentivam a gente a aprender, procurar respostas ao nosso dia-a-dia.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
c) das avaliações e a problemática que historicamente a envolve
Sugiro não ter provas, isso deixa os alunos nervosos. Fazer avaliações pequenas para
que se tenha um bom aproveitamento. Ter trabalhos diferenciados, que os alunos
possam escolher o assunto.
Não gosto muito dessa coisa de prova ou avaliação, sou a favor de trabalho dentro
da sala de aula e que se faça do conteúdo que foi dado no mesmo dia.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Enfatizamos, deste ponto, a importância do ato de escrever, aqui, especialmente, sobre
a prática/ação de estudar no NEEJACP/Ijuí” com todas as nuances e os processos que deste
ato derivam ou nele se inserem. Reafirmamos, parafraseando Freire (2000-b), que, lendo o
95
mundo e escrevendo sobre a leitura que dele fazemos, repensamos a própria leitura e a nossa
ação frente a ele. O autor salienta que
um movimento dinâmico entre pensamento, linguagem e realidade, o qual, bem
assumido, resulta numa crescente capacidade criadora de tal modo que, quanto mais
vivemos integralmente esse movimento tanto mais nos tornamos sujeitos críticos do
processo de conhecer, de ensinar, de aprender, de ler, de escrever, de estudar (Freire,
2000-b, p.08).
Pensamos, então, na (re)leitura de educandos/as ao registrarem suas impressões sobre
conteúdos, componentes curriculares, avaliações e sua própria (re)ação frente a cada tópico;
este processo se constituído como ato reflexivo e consciente principiam sua postura e
(re)escrita frente as próximas etapas, bem como apontam sugestões para a melhoria dos
mesmos aos dirigentes da Instituição e a seus/as educadores/as, companheiros/as de processo
ensino-aprendizagem.
Versando também sobre avaliação, e de avaliação emancipatória, com respeito aos
ritmos e tempo de cada um/a pressuposto dos Núcleos sul-rio-grandenses de EJA-
encontramos o claro apelo de um/a ejando/a:
Gostaria que os professores se preocupassem um pouco mais com os alunos que têm
dificuldades financeiras e particulares, porque todos têm condições de aprender,
cada um só tem um tempo certo.
(Fichas de Avaliação e Auto-avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04 - grifo nosso)
2.2.8 Os Espaços do Núcleo
Conforme mencionado no texto, o NEEJACP/Ijuí atendia a sua demanda
inicialmente (2002) em dois endereços e, após (2004), em quatro espaços diferentes, buscando
acolher o maior número possível da demanda por vagas.
101
Esta descentralização “inédita”
gerava algumas dificuldades – acreditamos que, comparativamente, bem menores que os
benefícios que trazia - comentadas pelos/as educandos/as:
Gostaria que a escola fosse um todo, pois, durante o tempo que passamos aqui houve
certa dificuldade de diálogo entre nós e os alunos do Ijuí - e que as decisões fossem
tomadas em conjunto: direção, professores, alunos, pois todos nós temos o direito de
opinar sobre as atividades e não aceitar tudo o que nos é proposto sem que nos fosse
consultado.
101
Um caso específico demandado pela empresa concessionária de transporte coletivo da cidade, para uma turma
de Ensino Médio. A referida empresa mantinha convênio com a rede municipal para EJA-Ensino Fundamental e
buscou a rede estadual para a conclusão da Educação Básica pela referida turma, composta por seus
“colaboradores”.
96
Gostaria que o NEEJACP tivesse sua própria sede para não continuar dividido.
Desejamos que a escola possa ser um dia ampliada para dar maior conforto e bem-
estar ao aluno, uma escola onde possa reunir todos os alunos do Ensino Médio.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Uma sede própria, com espaço único e amplo para o Núcleo, fazia-se uma premissa
constante entre educandos/as, educadores/as e comunidade, que não viam contemplada sua
aspiração por vagas, em quantidade e turno procurados. Este impedimento dificultava as
possibilidades diversificadas de atendimento previstas na proposta do NEEJACP/Ijuí no que
tange a uma educação ao longo da vida, em parcerias com entidades para atividades de
formação diversas, bem como as referências à sede própria também apontam a necessidade de
sentir e expressar o pertencimento a um lugar, marcando a identidade dos sujeitos.
2.2.9 A Autorização de Funcionamento do NEEJACP/Ijuí
Anteriormente referida, a autorização de funcionamento do Núcleo somente veio a ser
referendada pelo Conselho Estadual de Educação em 18 de dezembro de 2002. Este fato,
esperado pela comunidade regional Equipe da 36ª Coordenadoria Regional de Educação
(99-02), Equipe do Núcleo de Orientação aos Exames Supletivos (99-02) e cidadãos/ãs que
buscavam escolarização fundamental e média - a exemplo de Freire (2000-c) em sua “Canção
Óbvia”
102
, registram que
(...) Quem espera na pura espera
Vive um tempo de espera vã.
Por isto, enquanto te espero,
Trabalharei os campos
E conversarei com os homens.
(...) Não te esperarei na pura espera,
Porque o meu tempo de espera é um
Tempo de quefazer.
(Adaptação de Freire, 2000-c, “Prefácio”)
Então, estes sujeitos, coletivamente, fizeram do período março/dezembro de 2002 um
tempo de “quefazer”. Um “quefazer” educativo que acolheu inúmeros ejandos e ejandas de
toda a região em aulas presenciais com Avaliação no Processo, convencidos/as de que havia a
possibilidade concreta de retornar aos estudos e fazer seu próprio tempo e itinerário de curso
em uma proposta que reconhecia as suas especificidades de trabalhadores/as; um tempo
102
Poema escrito por Paulo Freire em março de 1971, no exílio.
97
permeado de incertezas, construção de saberes, de debates, indignações, mobilizações e muita
esperança, onde, como Freire, todos/as estavam
(...) preparando a (...) chegada
Como o jardineiro prepara o jardim
Para a rosa que se abrirá na primavera.
(Adaptação de Freire, 2000-c, “Prefácio”)
A expressão de uma educanda, “... felizmente conseguimos a aprovação do EJA,
mesmo ouvindo de alguns professores que o ano passado não valeu nada. Obs.: Mas com
certeza valeu!” (Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí- sem/03), também
nos remete à reflexão em especial de um excerto do poema de Freire:
Minhas mãos ficarão calejadas;
Meus pés aprenderão o mistério dos caminhos;
Meus ouvidos ouvirão mais;
Meus olhos verão o que antes não viam.
(Adaptação de Freire, 2000-c, “Prefácio”)
Aponta indícios da leitura crítica que esta e provavelmente muitos outros/as - faz do
posicionamento de alguns/mas educadores/as frente ao processo de implementação do
Núcleo; postura que diminuía/desconsiderava a importância da conquista de um espaço que
proporcionasse a todos/as a possibilidade de formação e educação ao longo da vida.
2.2.10 Olhando e Avaliando a Trajetória
Dentre tantos depoimentos que dizem da história deste período do NEEJACP/Ijuí e
seus protagonistas, na condição de educandos/as - certamente também educadores/as -
gostaríamos de frisar ainda alguns deles que, em nossa visão, não estão em nenhum dos
subitens elencados e, ao mesmo tempo, perpassam todos eles. Constituem-se de expressões
registradas no final do curso Fundamental ou Médio - com predominância para o último, pelo
número de matrículas e fichas tabuladas/observadas.
Me sinto outra pessoa, no sentido de entender as coisas melhor.
103
O NEEJACP, para mim, é o remédio que me faltava e espero que ele permaneça
sempre, porque oportunidade para as pessoas poderem terminar os estudos,
poderem fazer do futuro um futuro melhor.
Fortifiquei a minha aprendizagem e história.
103
Expressão que utilizamos como parte do título deste texto.
98
Estive muitos anos fora do colégio e, agora que peguei o gosto, é como doce, acaba
tão rápido. Mas pode ter certeza que algo vou fazer no ano que vem e, assim,
sucessivamente.
A minha participação foi muito importante, porque tive o privilégio de voltar a
estudar.
O que estava fora da realidade e parecia um sonho do passado hoje se torna
realidade. Após dois anos estudando no NEEJACP, estamos a poucos dias para o
sonho do passado, que parecia uma utopia irrealizável tornar-se realidade. O nosso
ideal não é mais um sonho, pois acordamos novamente para o estudo, para a
educação, para a vida, para o conhecimento, para um futuro melhor para o meu ‘eu’.
Aquilo que havia ficado no passado hoje já não é mais imprevisível, é realidade.
(Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação NEEJACP/Ijuí 02/04)
Apontam breves avaliações da trajetória pessoal, do grupo de aprendizagem de
pertencimento, da instituição e sua proposta, bem como projetam ações futuras próprias
(novas expectativas frente ao mundo) e votos para a continuidade do NEEJACP/Ijuí.
2.3 A Leitura de Mundo de Cidadãos e Cidadãs Egressos/as do NEEJACP/Ijuí
Encerrando este estudo, compomos uma seção tendo por base de dados entrevistas
dirigidas com cidadãos/ãs egressos/as do Núcleo Estadual de EJA e Cultura Popular de Ijuí,
que realizaram sua formação em nível fundamental e/ou médio enquanto predominou a
política pública enfocada pela pesquisa, ou seja, já egressos/as há cerca de dois ou mais anos.
Realizamos um total de treze entrevistas com ex-ejandos e ex-ejandas pertencentes ao
grupo que “inaugurou” o Núcleo sem este estar autorizado a funcionar, conforme já
mencionado neste texto - ou a ele se agregaram em momento imediatamente posterior.
Portanto, com aqueles e aquelas que fizeram seu percurso escolar geridos pela Política
Pública de EJA do RS, criada e implementada no período 1999/2002. Outro fator que
elegemos para configurar a amostragem foi a diversidade de itinerários trilhados por aquele
público, ou seja, após a conclusão do Ensino Médio na Educação de Jovens e Adultos do
NEEJACP/Ijuí, alguns/mas: mantiveram-se nas mesmas funções exercidas antes do curso;
conseguiram e/ou mudaram de emprego; evoluíram na carreira profissional; cursam ou
cursaram Ensino Técnico; cursam ou cursaram o Ensino Superior.
Sopesou ainda, na consecução das entrevistas, logicamente, o contato com os/as
egressos/as, sua disponibilidade em participar da pesquisa e contribuir com sua atual leitura
de mundo frente ao processo de EJA vivenciado no período estudado, bem como a
predisposição em expor a análise que tecem em torno das expectativas que portavam ao
99
matricular-se e ao cursar a Educação Básica, ou parte dela, na modalidade EJA naquele tempo
e lugar.
Nos primeiros contatos, destacamos, por parte dos/das contatados/as, a presteza,
disposição e certa alegria em participar e auxiliar na pesquisa, agradecendo “a lembrança” de
seu nome, ora reconhecidos como sujeitos desta história.
Também nos deparamos com questões corriqueiras às solicitações de entrevistas e
depoimentos, conforme enfatiza Meihy (2005): “É comum encontrar pessoas queo se
acham importantes ou que delegam a outros a capacidade de narrar. Isso se deve a uma
característica de nossa sociedade, sempre aberta a celebrizar certas pessoas e diminuir o papel
das pessoas comuns” (Meihy, 2005, p. 112). Esta consideração corrobora a fala de duas
egressas:
a) uma apontando o fator idade, “O que uma velha pode ter a dizer?”, mesmo tendo
dito durante o processo de entrevista, ter superado as barreiras de inferioridade - frente aos
demais, que atribuía a si própria - após cursar e concluir o Ensino Médio; e
b) outra, dizendo de sua não-continuidade de estudos, após concluir o Ensino Médio;
mesmo tendo deixado a atividade informal e constituído, com seu cônjuge, uma
microempresa e aprimorado a qualidade de vida familiar.
A metodologia para a realização das entrevistas tomou por base a história oral
temática, a qual, segundo Meihy (2005) “quase sempre, equipara o uso da documentação oral
ao uso das fontes escritas”(Meihy, 2005, p. 162). Para nossa finalidade de análise, tomamos
a documentação oral (gravações de depoimentos), com valor equivalente aos registros
presentes nas fichas de inscrição e/ou matrícula, bem como naquelas de avaliação e auto-
avaliação. Outro ponto que nos aproximou da referida técnica fez-se por esta “partir de um
assunto específico e previamente estabelecido, sobre algum evento definido”(Meihy, 2005, p.
162), bem com fazer uso de questionário, com intervenções diretas e indutivas e, por vezes,
indiretas e dedutivas.
Na realização das entrevistas, pontuamos para a fala do/da egresso/a algumas
rememorações como: o tempo de afastamento dos estudos; as expectativas iniciais que
motivaram o retorno aos processos formais de educação; a caminhada para o processo de
autorização de funcionamento do NEEJACP/Ijuí; o processo escolar da EJA vivenciado no
período. Frisamos, enquanto foco central de registro para este estudo: a avaliação atual das
expectativas iniciais e sua consecução; as relações no/com o mundo e as pessoas após o curso;
e as carências no curso de EJA, hoje percebidas. Acrescentamos ainda, para
comentário - que não diz exatamente da trajetória pessoal de cada um e cada uma, assim como
100
não traduzem nossa preocupação primeira nesta dissertação os itens Aulas Presenciais X
Exames Supletivos, EJA e Escola Regular Noturna: discussões que permeiam e envolvem a
modalidade da Educação Básica, tema desta pesquisa e que buscaremos aprofundar em outro
momento de estudo.
Enquanto características do grupo entrevistado, num total de treze pessoas, citamos:
a) a composição de oito (08) do sexo feminino, cinco (05) do sexo masculino;
b) a faixa etária variando entre 25 a 54 anos;
c) advindos de programas presenciais recentes de educação de adultos 04; 01
transferido da escola regular; 02 inscreviam-se anualmente nos Exames Supletivos. Estavam
sem estudar: cerca de nove anos 02; em torno de 18 a 22 anos 02 e, acima de 25 anos
também 02 dos entrevistados/as;
d) em relação ao trabalho exercido atualmente, temos: um aposentado; um
microempresário; uma funcionária pública estadual (merendeira); uma técnica em
enfermagem; uma bolsista da UNIJUÍ (Programa AABB Comunidade); um trabalhador da
construção civil; um vigilante; duas comerciárias e um comerciário; e três donas de casa; e
e) quanto à continuidade de estudos após o Ensino Médio/EJA temos: três que
ingressaram na Universidade e dois em Curso Técnico; dois buscaram aperfeiçoamento em
curso de atualização (em especial na área de informática); e seis não buscaram outros cursos.
Estudando as transcrições das entrevistas realizadas, passamos a expor, nos itens
anteriormente mencionados - avaliação atual das expectativas iniciais e sua consecução; as
relações no/com o mundo e as pessoas após o curso; carências no curso de EJA - a leitura de
mundo atual dos egressos e egressas (amostragem) do Núcleo Estadual de Educação de
Jovens e Adultos e de Cultura Popular de Ijuí.
2.3.1 Avaliação Atual das Expectativas Iniciais e sua Consecução
Ingressando nos cursos ofertados pelo Núcleo Estadual de EJA e de Cultura Popular
de Ijuí, retornando aos estudos presenciais após muitos anos ou remanejando-se de escola
regular, cidadãos e cidadãs trazem consigo inúmeras expectativas inseridas em projetos para a
vida. Concluída a etapa escolar, passados dois ou mais anos, avaliam suas expectativas
iniciais expondo reflexões que hoje tecem em torno delas.
101
Encontramos declarações que dizem da satisfação por portar a Educação Básica
completa ou, fazendo uso da expressão da maioria dos/das entrevistados/as, o “segundo
grau”
104
.
Modificou para mim mesmo, saber que eu tenho o grau. É gratificação pessoal.
Continuei na mesma atividade, progredi nela.
Quando eu fui fazer a entrevista ela (proprietária do estabelecimento comercial)
perguntou se eu tinha o grau e eu me senti muito bem em dizer que tenho; é
pouco, mas há muita gente que não tem nem o 1º grau.
Para mim foi muito satisfatório, eu me sinto vencedora. Para falar bem a verdade
pretendo ainda ir adiante. Foi uma experiência muito boa, não me arrependo de ter
procurado esta modalidade. Creio que o EJA dá uma oportunidade muito boa para o
pessoal retornar.
(Entrevistas, julho/2007)
Analisando várias pesquisas com o público jovem-adulto, Piconez (2004), em suas
observações ressalta:
Temos observado, durante oito anos no PEA (Programa de Educação de Adultos da
Faculdade de Educação da USP), que um dos efeitos favoráveis inquestionáveis da
educação básica de adultos, ponto pacífico em todos os estudos realizados, é o
crescimento da auto-realização pessoal do adulto, pela qual lhe é possível assumir-se
cada vez mais como sujeito de suas ações (Piconez, 2004, p.48).
Em momento de análise de pesquisas referentes ao público adulto em situação escolar,
a mesma pesquisadora afirma: “Do ponto de vista individual, há um encontro do aluno
consigo mesmo, o que lhe permitiria ser-no-mundo de forma efetiva, numa auto-realização
existencial” (Piconez, 2004, p.36).
Nas avaliações, entremeadas nas falas, a realização e o exemplo aos familiares, em
especial quanto a consecução de objetivos junto aos filhos e filhas:
Valeu muito, comecei a me sentir melhor, até para ajudar as crianças no colégio com
os trabalhos.
O que eu mais queria era ter um pouco mais de conhecimentos, eu precisava me
atualizar um pouquinho mais. Eu tenho filho ainda adolescente e precisava aprender,
entrar assim nos assuntos dele, poder ensinar um pouco mais. Os outros filhos já
estavam criados e casados. Mas o pequeno eu precisava dar mais atenção,
acompanhar mesmo.
até para incentivar as crianças; o meu guri já estava meio querendo deixar os
estudos, com doze/treze anos, e então nós tínhamos mais argumento: nós também
estamos estudando, tem de continuar, é importante estudar, tem que estudar
(Entrevistas, julho/2007)
104
Nomenclatura que designava os anos finais da Educação Básica, hoje denominada Ensino Médio, porém
ainda não totalmente inserida nas expressões orais da maioria da população.
102
Da mesma forma, a explicitação das implicações em ser estudante-trabalhador/a-
provedor/a da família:
Não tinha tempo nem para mim, era o trabalho, a casa, os filhos, os netos, e daí era
uma loucura, mas valeu mesmo. Eu amei voltar a estudar, foi o tempo em que eu
vivi melhor. Tenho um carinho muito grande por tudo isso aqui (o Núcleo). Acho
lindo estudar, mexer com coisas do colégio.
Então eu estava trabalhando, trabalhando e estudando, meu Deus do Céu! E tinha
marido, filho, casa... havia dias em que tinha vontade de não ir, mas depois pensava
“é melhor, vale a pena”. No começo foi sofrido, morávamos longe, descia do ônibus
correndo, com medo... credo! Mas acho que valeu a pena. Até muitas vezes quis
desistir, mas aí vinha o meu marido e dizia que faltava tão pouco.
(Entrevistas, julho/2007)
Falas quanto à impossibilidade de prosseguir estudando, especialmente devido à
condição financeira:
Mas não consigo mais estudar por causa do dinheiro, é tudo tão caro...
Até pensei em continuar estudando, mas não deu certo. Quer dizer, posso voltar a
qualquer hora, mas por enquanto não.
Enquanto não consigo dar aquele passo que quero, continuo fazendo aquele trabalho
de sempre, e estou batalhando por um concurso público. Pretendo ainda fazer algo,
não defini bem o quê; além das tentativas para concurso, pretendo fazer algum curso
profissionalizante mesmo.
Eu queria concluir, deu tudo certo. Adorei. Queria ter continuado, fazer uma
faculdade, de Pedagogia. Ainda não deu, mas quero voltar.
Penso em fazer faculdade de Direito; não sei quando nem como, mas vou fazer.
Proponho-me a ir fazendo cursos e mudando de profissão até ganhar o suficiente
para fazer faculdade. Estou tentando o ENEM, já fiz um e minha média foi em torno
de setenta, setenta e poucos, mas para Direito a média é noventa. Até poderia fazer
Administração ou Matemática, para a área da Educação é mais fácil entrar, mas eu
recém havia entrado no emprego e não tinha como cursar, meus horários eram
incompatíveis com a universidade.
(Entrevistas, julho/2007)
Declarações daqueles/as que prosseguiram estudando:
Terminei o Ensino Médio na EJA, passaram-se quatro meses, e aí ingressei no
Técnico em Enfermagem. Foram dois anos e meio de curso; formei-me em
dezembro/06 e em março/07 fui chamada para começar a trabalhar no Hospital.
A meta que eu tracei quando entrei eu consegui atingir, os objetivos todos. Hoje
estou formada, sou professora de à série, terminei meu Magistério, concluí o
ano passado (2006) com o estágio.
Ajudou bastante depois. Nós dois fizemos vestibular e passamos. Cheguei a cursar
um semestre de Educação sica e depois tranquei. Optei por fazer um curso na
Brigada para poder seguir na carreira. Em Santa Maria.
(Entrevistas, julho/2007)
Comentários feitos quanto à questão da idade como entrave, próprio (superado) ou
comentado por outros:
103
Quando comecei a trabalhar na Escola, convivendo com crianças, aquilo me marcou
muito e eu fui indo e comecei a freqüentar as aulas do EJA no mesmo espaço onde
trabalho, escondido de uma colega que trabalhava comigo e ficava até as 19h30min.
Ela dizia: “O que uma velha vai fazer, querendo estudar?” Então eu deixava ela ir
embora e eu corria para as aulas, para ela não pegar no meu pé. Todos os outros
sabiam: professores e a Direção. Então outra colega minha, que tinha estudado
aqui no Núcleo me convidou para vir estudar aqui, falou muito das aulas e eu não
pensei duas vezes; pensei, não preciso ficar me escondendo. Eu tinha receio por
causa da minha idade, estou agora com 54 anos.
Tinha gente que dava risada quando ficavam sabendo que eu estava estudando,
diziam: “O que tu queres com isso?”; eu os convidava para ir também, hoje se
arrependem por não ter ido. Mas não m coragem: mulheres com quarenta anos se
acham velhas para estudar. Eu já acho que nunca é tarde para retornar.
(Entrevistas, julho/2007)
Constatações e melhorias na vida doméstica-familiar:
Eu adorava escrever e tanto tempo não escrevia: em casa a gente não escreve.
Agora temos livros em casa, deixo a Bíblia aberta na cabeceira da cama, leio um
pouco antes de dormir.
Entrevistas, julho/2007)
Repercussão junto à comunidade de origem:
Depois que conclui o Ensino Médio na EJA e entrei na Universidade, me
convidaram para gravar uma propaganda na rádio para incentivar o pessoal a
estudar, gravei e rodava a gravação na rádio, várias vezes ao dia.
(Entrevistas, julho/2007)
O desvelamento de algumas ilusões e a percepção das estratégias do mercado de
trabalho:
Não possuindo o Ensino dio está excluído de saída, não tem chance, está fora;
nem que tenha dinheiro não pode participar, concorrer.
Eu tinha a expectativa de que, terminado o Ensino Médio, já ia arrumar outro
trabalho, iria ser maravilhoso. Aí, quando concluí, vi que não era bem assim, o
mercado de trabalho está cada vez mais competitivo. Se você almeja um posto de
trabalho e tem o Fundamental, tem 04 a 05 com o Médio competindo contigo; se
você tem o Médio, há 02 ou 03 com faculdade ou cursando ela na competição. Então
percebi que não seria fácil.
(Entrevistas, julho/2007)
Predomina, nas escolas, e estas refletindo uma visão geral da sociedade, o discurso da
melhoria da qualidade de vida mediante a aquisição de maiores níveis de conhecimento;
também ecoa em escolas para adultos e, alguns/mas educandos/as, conforme podemos
visualizar na citação acima, espelham-no para a sua vida. Por vezes, porém, esta máxima
extrapola o limite possível de consecução via educação, conforme alertava Freire (1999):
104
Não podemos alimentar a ilusão de que o fato de saber ler e escrever, por si só,
contribuir para alterar as condições de moradia, comida e mesmo de trabalho. Essas
condições vão ser alteradas pelas lutas coletivas dos trabalhadores por mudanças
estruturais da sociedade (Freire, 1999, p.70).
Analisando a expressão do/da egresso/a, podemos captar sua leitura do que Santos
(2000) configura como “uma produção ilimitada de carência e escassez: no contexto
globalizado do mundo capitalista não satisfação ou mesmo espaço para todos” (Santos,
2000, p. 129).
2.3.2 As Relações no/com o Mundo e as Pessoas após o Curso
Desafiados a refletir e expressar o juízo que fazem de si mesmos frente às relações que
mantém com o mundo que os cerca, egressos e egressas da EJA/Ensino Médio apontam
superações, avanços, confiança em si mesmos/as, conforme depoimentos a seguir.
Superei a vergonha de chegar nas pessoas e conversar, dar o meu parecer das coisas.
Os colegas e até a direção da escola em que trabalho me dizem isso. Quando
acredito que pode ser diferente, nem que não venha a ser aquilo que a gente diz, eu
vou e dou a minha opinião; e isso eu vim buscar aqui nos estudos. A gente já sabe
chegar nas pessoas. A gente tinha vergonha de se expressar; hoje eu me valorizo
mais como pessoa. Não porque terminei o grau, mas porque passei a ter mais
iniciativa, me expor mais.
Eu era muito tímida, insegura para falar; agora eu chego até as pessoas, falo; isto me
ajudou bastante, qualquer coisa que ocorra a gente chega e fala sem receios,
vergonha. Também não deixo “subir à cabeçao fato de estar na Universidade, e de
repente me sentir melhor que os outros, não é assim; estudar é normal - ou deveria
ser - para todos.
Uma coisa que eu tinha assim era vergonha ou medo de falar ao público; apresentar
um trabalho, chegar e ver todo mundo olhando... nada a ver comigo e eu não ia. No
início, no Integrar até que eu perdi um pouco do medo e no NEEJACP acho que
superei isto. Muitas vezes pensamos como chegar numa pessoa e falar com ela,
sendo ela um doutor, advogado,... você fica com receio de falar bobagem, já tem um
grau de instrução menor que o dele. Mas hoje, não tenho este receio: falar com o
Presidente ou com o cara do lixo para mim é tranqüilo; ele que me ouça da maneira
que ele quiser, eu falo do jeito que eu falo. Eu perdi esse receio de falar em público,
tínhamos que apresentar trabalhos, falar em frente a todos, aquilo foi muito legal.
(Entrevistas, julho/2007)
Nas palavras de Freire (2005), “a cultura do silêncio, que se gera na estrutura
opressora, dentro da qual e sob cuja força condicionante vem realizando sua experiência de
quase coisas, necessariamente os constitui desta forma”(Freire, 2005, p. 201). A busca de
superação, deste estado perpassa pelo descobrir-se, cada um e cada uma, como ser humano
produtor de cultura e história. Encontramos, nos pronunciamentos destes/as egressos/as,
afirmações da potencialidade de pequenas ações dialógicas e desafiadoras, proporcionadas
pelas experiências de EJA neste percurso de constituição de sujeitos.
105
Salientada também pelo/as por entrevistados/as, a relevância da obtenção de
conhecimentos e/ou alargamento destes, na constituição e modificação da visão de mundo e
de si próprios/as frente a este.
No meu ponto de vista modifica, porque você adquire conhecimento, você quer ir
além, você sabe que é capaz. Eu sei que sou capaz. Sem conhecimento, formação,
muitas vezes você não sabe nem o que falar, você mesmo se oprime. Fazendo um
curso, estudando, tendo conhecimentos, convivendo com outras pessoas, você se
desenvolve, cresce, fica desinibido.
Modificou a minha visão de mundo em 100%; a gente adquire muito mais
conhecimento, muito mais vivência com as outras pessoas, é que você aprende
mais. A vida muda totalmente, e para melhor. Porque você está sempre em busca
de algo mais, sempre está querendo mais e isto é bom.
Abriu minha cabeça, minha visão mudou completamente através das aulas. A cada
conhecimento que você tem, a tua visão de mundo modifica; você que coisas que
pensa não são bem assim, o que imagina não é tão fácil de acontecer.
(Entrevistas, julho/2007)
Ressaltado, do mesmo modo, o aprendizado proporcionado pela convivência em grupo
diverso daquele do contexto familiar, influenciando o modo de ver o mundo e as vicissitudes
presentes no cotidiano. Ou, ainda, como afirma Santos (2000): “Quanto mais diferentes são os
que convivem num espaço limitado, mais idéias do mundo estarão para ser levantadas,
cotejadas e, desse modo, tanto mais rico será o debate silencioso ou ruidoso que entre as
pessoas se estabelece” (Santos, 2000, p. 131).
Mudou bastante meu modo de pensar em relação à vida, às pessoas. Às vezes, eu
chegava lá com um problema na cabeça e via que tinha outra pessoa com um
problema bem maior que o meu; isto me ensinou que todas as pessoas têm
problemas, não eu. Cada um tem um tipo de problema e, muitas vezes, o nosso
problema é um grão de areia perto do mar que é o problema do outro. Eu era muito
isolada, em casa; hoje eu tenho um grupo de convivência, tenho amizades, estou
fazendo um curso de tricô.
Creio que modifica a visão de mundo e as relações humanas, porque na EJA a gente
compartilha experiências com os demais colegas, que são todos adultos e todos têm
experiência de vida; então nos momentos em que não estávamos trabalhando um
tema específico, comentávamos sobre a vida: “Para mim aconteceu isto, para outro
aquilo...” São experiências de vida que a gente acaba conhecendo de pessoas que
não estão convivendo no dia-a-dia conosco, e essas experiências são válidas penso
para a própria pessoa crescer, tomando como exemplo o que outras passaram,
evitamos pisar no mesmo buraco que estas pisaram. Muitas vezes achamos que
nossa situação está ruim e vemos que outra pessoa está em maiores dificuldades,
então constatamos que nossos problemas não são tão grandes.
(Entrevistas, julho/2007)
Analisando a cotidianidade da sala de aula para adultos e jovens - permeada por
momentos de pedagogia crítica, de favorecimento à expressão de educandos/as
declarações que expressam o favorecimento de leituras, interpretações e projeções da/para a
realidade.
O dia-a-dia de uma dona de casa e mãe, eu no caso, era daquelas que tinha
informações da televisão; no momento que eu entrei para a sala de aula, a visão
106
do que está acontecendo hoje, estas modificações todas das leis, isto de não
assinarem mais carteira, pegarem trabalhadores por contratos, a gente vinha
discutindo na sala de aula naquela época, tínhamos noção cerca de quatro anos
atrás (quando parei de estudar). A gente estava com a cabeça aberta. Se eu tivesse
dentro de casa, só iria ter o impacto agora, e pela televisão.
Para se informar sobre o mundo, digo sobre o mundo, não o Brasil, porque abre
totalmente a visão da gente para o mundo; o que está acontecendo e que pode vir a
acontecer.
(Entrevistas, julho/2007)
2.3.3 Carências no Curso de EJA
Avaliando a estrutura do curso que concluíram na modalidade EJA, especificamente
no Núcleo Estadual de EJA e Cultura Popular de Ijuí, no regime de Totalidades do
Conhecimento, egressos e egressas apontam, num primeiro momento:
Não posso dizer que faltou alguma coisa; foi bem trabalhado tudo.
Não achei falta de nada, foi tudo tranqüilo.
Eu acho que, como estava quando nós estudamos, estava tudo ótimo, o ensinamento,
os professores,...
(Entrevistas, julho/2007)
Outros/as, mergulhados no cotidiano do trabalho comercial e vislumbrando maiores
oportunidades neste, assinalam:
Não tínhamos informática. A maioria faz hoje cursinho separado, porém eu acho que
para muita gente, se tivesse informática, era mais uma oportunidade. Se tivessem na
época computadores, a gente teria uma noçãozinha pelo menos; hoje a maioria das
coisas é feita pelo computador.
A informática vai ser uma grande vantagem para quem está aqui agora. Pena que no
nosso tempo não havia.
Acho que as aulas de Língua Estrangeira, Espanhol que nós tivemos; eu quase não
peguei nada. Foram poucas as aulas e hoje em dia pedem muito, falam muito em ter
uma outra língua. As crianças sabem mais que a gente, elas vêm perguntar uma que
outra palavra e eu não sei nada.
(Entrevistas, julho/2007)
Alguns/mas dizem do aporte cultural, que talvez pudesse ter sido melhor trabalhado:
Algo que penso que faltou foi “Artes”, porque a gente, leigos como eu, uma
exposição e não entende muita coisa, se que o artista usou tais cores, não
sabemos se é abstrata a pintura, a escultura... Lembro que fizemos apenas uma
pesquisa às presas porque faltaram aulas da disciplina, não foi de muito proveito,
como talvez pudesse ter sido.
Eu acho que mais aprofundamento nos conteúdos, apesar de o tempo ser curto para
tanto. Senti que eu queria aprender mais do que eu aprendi, do que foi oferecido.
(Entrevistas, julho/2007)
107
Nos três blocos de reflexõesções anteriores podemos vislumbrar e corroborar
pesquisas examinadas por Piconez (2004) que apontam “ao contrário do que reza o senso
comum, o aluno não o ensino supletivo como precário ou de segunda categoria, mas tão-
somente como um ensino adequado ao seu contexto e às suas necessidades profissionais e de
realização pessoal”(Piconez, 2004, p.36). No mesmo viés, a pesquisadora salienta que
“muitos dos direcionamentos em relação ao aprofundamento dos conteúdos ensinados são
solicitados pelos alunos atendendo suas necessidades de trabalho: Biologia pelos servidores
da saúde, Língua Espanhola por recepcionista e porteiros...” (Piconez, 2004, p.33) Neste
último excerto, incluímos a fala quanto às necessidades que surgiram para os/as egressos e
egressas do NEEJACP/Ijuí após ingressar num outro campo de trabalho, diferente portanto
daquele que os mantinha no momento do curso; sentiram eles/as, então, o imperativo de
aprofundar conhecimentos; o que apontamos aqui como “carência do curso de EJA”, e que
podemos mais especificamente, vislumbrar como exigência de educação ao longo da vida: a
cada nova função, novo emprego, novas tecnologias no trabalho ou em casa... é inevitável que
sintamos todos/as a falta de instruções, conhecimentos, etc. Ou ainda, com afirma
Santos(2000): “A própria existência, adaptando-se a situações cujo comando freqüentemente
escapa aos respectivos atores, acaba por exigir de cada qual um permanente estado de alerta,
no sentido de apreender as mudanças e descobrir as soluções indispensáveis” (Santos, 2000,
p. 110).
As condições físicas insuficientes, a estrutura do ambiente de estudo proporcionado
pela Instituição, foram também avaliadas por outro grupo de egressos/as:
Creio que faltava uma sede central, onde possa unir todos, não ficar a metade em
cada lugar; acho que a primeira coisa seria um espaço único.
Faltava uma cantina, um lugar para vender um lanche, porque muitas vezes íamos
direto do trabalho para o Núcleo sem comer, não havia tempo; não digo ter merenda,
mas ter para vender um pastel ou algo assim para os alunos para que possam ter uma
refeição.
Sentíamos falta de um abrigo fora da Escola Ijuí, onde estudávamos. O pessoal
responsável saía e nós ficávamos para fora do portão; às vezes, chovia, nosso
motorista demorava a passar: era complicada esta situação. Mas o restante era muito
bom.
(Entrevistas, julho/2007)
108
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No andarilhar
105
pelos temas abordados nesta pesquisa, na tessitura dos inúmeros
“fios” que constituem a malha da Educação de Jovens e Adultos, buscamos pinçar (e
esmiuçar) alguns que, a nosso ver, constituem uma história coletiva no recente quadriênio
1999/2002 no Rio Grande do Sul: idealizada por muitas mentes, tramada por milhares de
mãos, olhada por incontáveis olhos e avaliada em variadas versões.
A Educação de Jovens e Adultos, enquanto modalidade da Educação Básica
Brasileira, compreende os níveis Fundamental e Médio, abrangendo setores da população com
faixa etária mínima de quinze e dezoito anos - respectivamente aos veis mencionados
pouco ou não escolarizados. Historicamente, as Políticas Públicas pertinentes a esta área
apresentam rupturas e descontinuidades, para as quais atribuímos fatores como interferências
internacionais globalizantes, carência de critérios nacionais e estaduais bem definidos,
firmados em políticas educacionais de Estado, bem como a influência do projeto de sociedade
defendido/sustentado pelo governo em vigência.
Neste trabalho de pesquisa, abordamos a proposta educacional da gestão 1999-2002, a
qual privilegiou a construção coletiva, democratizou a concepção e a construção das políticas
públicas; saiu dos gabinetes e ganhou corpo com as falas da população, então ouvida,
questionada, chamada a opinar e respeitada em sua leitura de mundo e proposição, conforme
narramos no decorrer do texto. Este processo democrático, manteve-se aberto à discussão
com as várias esferas da sociedade gaúcha (educandos/as, pais, mães, funcionários/as e
educadores/as de todos os níveis de ensino, especialistas, universidades e sociedade civil) e
representou um período de democracia participativa, envolvendo amplos setores da população
historicamente excluída das tomadas de decisões, para os quais o Estado vinha sendo
105
Termo utilizado por Freire, significando caminhadas, viagens pelo mundo físico e/ou intelectual.
109
minimizado continua e crescentemente. Salientamos, também, a característica não elitista nem
basista
106
do movimento, espelhado nas palavras de Freire, “a rigorosidade necessária deve
contemplar prática e teoria iluminando-se mutuamente” (Freire, 2000, p.125).
A Política Pública de EJA, construída com as contribuições de pesquisadores e
militantes da área, na ação direta com educadores/as e gestores/as da rede estadual, teve,
como parâmetros, os Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual levantados,
discutidos e eleitos pela comunidade sul-rio-grandense - os materiais oriundos dos momentos
específicos com educadores/as e educandos/as da Educação de Jovens e Adultos na
Constituinte Escolar, bem como os tradicionais pilares suleadores da Educação Popular
firmados pela “pedagogia freiriana”, acrescida ainda, de uma visão crítica do mundo
globalizado e suas repercussões no campo educacional. Contribuíram, significativamente, nos
debates e definições finais da PPEJA/RS, experiências locais (de Porto Alegre), nacionais
(Recife) e internacionais (Barcelona Espanha), as Conferências Internacionais de Educação
de Jovens e Adultos, em especial a quinta edição (Hamburgo/Alemanha - 1997) e a
Conferência Mundial de Educação para Todos (Jomtien/Tailândia – 1990).
Mediante a concepção da modalidade EJA como direito, prevendo tempos e espaços
diferenciados com vistas a respeitar a individualidade de cada ejando/a e tendo como premissa
a avaliação emancipatória, cada comunidade escolar elaborou suas propostas antevendo,
definindo e implementando a prática da EJA na medida da realidade e da demanda local.
Constatamos, para a EJA/RS formal, a existência de uma demanda advinda da tardia
(ou inexistente?) universalização da educação básica. Até o ano de 1995 não havia registro de
matrículas da modalidade em cursos presenciais com avaliação no processo, junto ao
MEC/INEP. Tal dado não se justificava por um vel desejável de escolarização básica da
população gaúcha. O Censo IBGE/2000 apontava, no RS, para a população pesquisada no ano
de 2000, acima de quinze anos de idade um índice de 5,76% de analfabetos; 17,38%
desprovidos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e 54,24% sem concluir dos anos finais
do Ensino Fundamental, complementando os dados 66,14% de sul-rio-grandenses acima de
18 anos que não possuíam o Ensino Médio completo.
Ou seja, em especial, na etapa final da Educação Básica – anos finais do nível
fundamental e todo o nível médio - são números inconcebíveis como residuais e que possam
ser superados ou extintos natural e rapidamente (pela sucessão de gerações), como prevêem
106
Nos utilizamos dos conceitos de Freire, para o qual elitista é a postura que nega a validade da prática, e
basista a atitude que nega a validade da teoria. Em suas palavras, a rigorosidade necessária deve contemplar
“prática e teoria iluminando-se mutuamente”(2000, p.125)
110
alguns órgãos internacionais. Não justificativa plausível para negar investimentos numa
modalidade de educação que pode incluir e elevar o nível de educação de mais da metade da
população total do Estado.
Ao final da gestão enfocada nesta pesquisa, verificava-se um acréscimo em torno de
66% de instituições da rede estadual de ensino desenvolvendo atividades escolares com
pessoas jovens e adultas: educação presencial, com avaliação no processo, de caráter público
gratuito, especialmente noturno. Da mesma forma, no ano de 2002, dados do MEC/INEP para
o Rio Grande do Sul registram grande número de matrículas em cursos presenciais, com
avaliação no processo, os quais se apresentam em maior escala na rede estadual de ensino,
exceção feita à oferta de Ensino Médio onde predomina o investimento de instituições
privadas.
Abordamos, no decorrer do texto, de forma sucinta, todo o processo envolvendo os
Núcleos de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular um dos desdobramentos da
política pública de EJA/RS - 1999/2002, que viria a constituir trinta e três instituições no
Estado - em consonância com sua realidade. Estes núcleos foram concebidos para ofertar
variadas formas de atendimento à demanda. Cada educando/a nele matriculado/a poderia
optar pela forma de atendimento, estudar e construir conhecimento contextualizado no seu
ritmo próprio e - na proporção de seus saberes de experiência feitos, dedicação pessoal e
disponibilidade - fazer” o seu tempo de curso, contemplado/a pela proposição
regulamentada de flexibilidade (responsável) no tocante a afastamentos imprevistos,
(im)postos pela vida aos trabalhadores e trabalhadoras.
Narramos também de forma breve, a sucessão de percalços e limitações à criação,
aprovação e consecução das propostas dos NEEJACPs; a dificuldade de gestar algo inédito na
educação estadual, que ia de encontro e suprimia as tradicionais formas de ensino – em
especial a linearidade e a inércia do currículo pronto e a postura bancária de educadores/as; o
longo período e as inúmeras reuniões da equipe da Secretaria de Estado da Educação, junto ao
Conselho Estadual de Educação/RS, para que este compreendesse a pertinência e a
potencialidade da proposta-base apresentada e a aprovasse.
Ressaltamos, também, a positividade da experiência, conforme já frisado neste texto, a
potencialidade criadora de autonomia e empoderamento proporcionada pela dialogicidade
predominante no processo. O “dar-se conta”, expresso nas palavras de Freire (2000): “se é
possível mudar o mundo que não fizemos, o da natureza, por que não mudar o mundo que
fazemos, o da cultura, o da história, o da política? (Freire, 2000, p.98)
111
No segundo capítulo da dissertação buscamos o olhar de cidadãos e cidadãs a quem se
destinou - mais diretamente - toda Política Pública discutida anteriormente, e, aqui de maneira
específica, educandos e educandas do Núcleo Estadual de EJA e Cultura Popular de Ijuí.
As expectativas expressas por aqueles e aquelas que retornam aos estudos perpassam
pelo desafio de recomeçar e completar a jornada básica de escolarização, pela obtenção de
maior bagagem de conhecimentos, pela retomada de sonhos agora mais reais e factíveis em
relação aos da infância e adolescência, por exigências do mundo do trabalho e perspectivas de
melhoria da qualidade de vida pessoal e familiar. Em todas elas, está explícita a relação entre
o momento presente, a ação expectante e o futuro idealizado, bem como o registro da carência
de diversos elementos constitutivos do cotidiano (presente), seja material/físico ou
subjetivo/afetivo, que o/a cidadão/ã observa em outrem ou capta via antenas globalizantes da
mídia e seus discursos homogeneizantes e o deseja para si, impulsionando-o/a na busca pelos
meios apontados e/ou vislumbrados nas possibilidades locais.
No decorrer do curso, para além das idéias dos lugares de saída e de chegada,
relatamos impressões e leituras do processo escolar na ótica de estudantes do NEEJACP/Ijuí,
cidadãos e cidadãs do mundo. Depoimentos sobre a trama do cotidiano de estudantes da EJA
que dizem da conciliação dos tempos de trabalho, de estudo e convivência familiar; do
orçamento que precisa também cobrir a despesa com transporte; dos perigos da noite nos
espaços mais periféricos da cidade (sem estrutura urbana). Testemunham tais depoimentos,
sobretudo, a persistência para enfrentar cada nova jornada e perseguir a expectativa presente,
articulada à oportunidade proporcionada pela política pública: Tempo de descobertas sobre
potencialidades desconhecidas de si próprios/as, valorização pessoal e, especialmente, de “(re)
conhecer o antes não conhecido, conhecer melhor alguma coisa que sabia mal ou preencher
uma lacuna de saber” (Freire, 1999, p. 116).
Enquanto percorrem a trajetória estudantil, contribuem, com olhares críticos, no
aperfeiçoamento da proposta político-pedagógica da instituição: apontam falhas, assinalam
conflitos de gerações e denunciam práticas “bancárias de educação”, tecem elogios à ação da
maioria dos docentes e ressaltam a potencialidade do diálogo nos processos de ensinar-
aprender, nas aulas ou nos contatos informais com colegas.
Concluída a educação básica, egressos e egressas, dois ou mais anos, avaliam o
itinerário percorrido na modalidade, no Núcleo, regidos pela Política Pública de EJA
1999/2002. Assinalam o desvelamento de algumas ilusões provenientes de um discurso fácil
da melhoria da qualidade de vida - incluindo condições de moradia, comida e mesmo de
trabalho - mediante a aquisição de maiores níveis de escolarização. Com isso, descobrem
112
fatores que extrapolam o limite possível de consecução via educacional e a existência de
barreiras que “só vão ser alteradas pelas lutas coletivas dos trabalhadores por mudanças
estruturais da sociedade” (Freire, 1999, p.70). Por extensão, alcançam um novo processo de
leitura frente às estratégias do mercado de trabalho perversamente globalizado, no qual “não
há satisfação ou mesmo espaço para todos” (Santos, 2000, p. 129).
Egressos/as que prosseguiram estudos, em curso técnico profissionalizante ou em
nível superior, frente às alegadas carências da qualidade de ensino praticada na modalidade, é
unânime em negar tal afirmação, afirmando a adequação ao contexto, às condições de
heterogeneidade dos demandantes e, também, ao tempo programado pela instituição para o
curso. Consideram-se vencedores/as pela superação das dificuldades enfrentadas na época;
salientam momentos de pedagogia crítica, vivenciados no curso que proporcionaram – e
continuam proporcionando - o favorecimento de leituras, interpretações e projeções da e para
a realidade; dizem de sua satisfação por possuírem a Educação Básica completa, da realização
pela qual lhes é possível assumirem-se cada vez mais como sujeitos de suas ações e
constituírem-se ser-no-mundo de forma efetiva.
Então, podemos afirmar que a PPEJA/RS analisada gerou um grande movimento de
construção e implantação de propostas emancipatórias de educação; muniu de argumentos e
conhecimentos cidadãos/ãs-educadores/as-educandos/as e instituições educacionais, ou seja,
“empoderou” setores da população na busca de seus objetivos coletivos e individuais,
fortaleceu-os na luta por direitos constituídos e assegurados legalmente, porém, muitas
vezes escamoteados.
Com a mudança de governo em 2003, a capacidade de resistência nova para
muitos/as - permitiu a continuidade da maioria das ações educacionais ejandas no RS,
especialmente nas escolas da rede. Grande parte dos NEEJACPs
107
tiveram sua estrutura
totalmente modificada nos anos 2003 e 2004, com diretrizes/determinações do novo governo,
remanejamento de pessoal e conseqüente esvaziamento da proposta original. outros,
dependendo da postura de resistência e argumentação de suas equipes bem como da
manutenção de seus quadros, permaneceram com a proposta original. A trajetória singular de
cada um dos Núcleos, no confronto com novos momentos históricos, descreveu caminhos
também diversos. Enquanto campo de conflitos político-pedagógicos e espelho de projetos de
sociedade dos governos constituídos em cada período, se faz oportuna a realização de estudos
107
O NEEJACP/Ijuí manteve sua proposta intacta e ampliou atendimentos até meados do 2º semestre de 2005.
113
que sistematizem o itinerário do conjunto destas instituições, cuja história, para usar uma
expressão de Freire, está sendo
108
.
NO SENTIDO DE ENTENDER AS COISAS MELHOR Uma História Singular de
um Fazer Coletivo EJA/RS” buscou então, relatar, refletir, registrar e socializar a coletiva
idealização, construção, implementação, desenvolvimento e avaliação de uma Política Pública
de Educação de Jovens e Adultos, especialmente iluminada pelo olhar dos sujeitos aos quais
ela se destinou: educandos e educandas até então excluídos dos processos regulares de
educação, adolescentes, jovens, adultos, aqui denominados Ejandos e Ejandas, à procura de
superações, “de entender as coisas melhor” para ler, reler e postar-se frente ao mundo.
108
Neste período setembro/outubro-2007 discutem-se medidas de “enxugamento” da estrutura do Estado e,
inclusa nelas a possibilidade de extinção das atividades presenciais dos NEEJACPs.
114
REFERÊNCIAS
ANDRIOLI, Antônio Inácio. As Políticas Educacionais no contexto do neoliberalismo.
Revista Eletrônica Espaço Acadêmico, Ano II, 13, junho/2002.
www.espacoacademico.com.br. Acesso em 10/08/2005.
ANTUNES, Ricardo. Trabalho X Capital (Entrevista) Revista Caros Amigos, Ano X, N. 120,
março de 2007.
ARROYO, Miguel. A Educação de Jovens e Adultos em tempo de exclusão.
In.:Alfabetização e Cidadania, Nº 11. Abril de 2001.
______. Ofício de Mestre: imagens e auto-imagens. 3ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
BENINCÁ, Elli. O senso comum pedagógico: práxis e resistência. Tese de Doutorado em
Educação – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2002.
BONETI, Lindomar Wessler. Políticas Públicas por dentro. Ijuí, RS: Unijuí, 2006-a.
______. Políticas educacionais, contrato social e cidadania na América Latina. In.:
MACHADO, Evelcy Monteiro e MUELLER, Helena Isabel (Orgs.) Políticas públicas
educacionais: múltiplos olhares.Ijuí, RS: Unijuí, 2006-b.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues (Org.) De Angicos a Ausentes: 40 anos de educação popular.
Porto Alegre: MOVA/RS; CORAG, 2001.
BRASIL. Constituição de 1988. Rio de Janeiro: MEC/FAE/RJ, 1989.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Lei Darcy Ribeiro, sancionada
em 20 de dezembro de 1996. (Lei 9394/96,publicada no Diário Oficial de União a
23/12/1996, Seção I.)
______. Ministério da Educação. Plano Nacional de Educação PNE/Ministério da
Educação. Brasília: Inep, 2001.
_______. Conselho Nacional de Educação - Câmara de Educação Básica. Parecer 11/2000.
Estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA. Brasília, 2000.
115
______. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Contagem da População.
Brasília. 2000.
______. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Os desafios
do plano Nacional de Educação. Brasília: Inep, 2004.
BRUM, A.J. Unijuí Uma experiência de universidade comunitária Sua história, suas
idéias. Ijuí, RS: Unijuí, 1994.
CAMARGOS, Luiz Rogério de. Fundamentos para uma Teoria de Expectativa
Econômica. Textos para Discussão – 138. FGV-EESP – Fundação Getúlio Vargas –Escola de
Economia de São Paulo. São Paulo, 2004.
CAMINI, Lúcia e Outros. Educação Pública de Qualidade Social conquistas e desafios.
Petrópolis,RJ: Vozes, 2001.
CASTELLS, Manuel. A Era da Informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e
Terra, 1999. Vol.1. A Sociedade em Rede.
COLIGAÇÃO FRENTE POPULAR/RS. Programa de Governo da Frente Popular. Rio
Grande do Sul. 1998.
CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO - RS. Parecer 774/99. Dispõe sobre a
Educação de Jovens e Adultos no Sistema Estadual de Ensino. Porto Alegre, 10 de
novembro de 1999.
CORAGGIO, José Luís. Propostas do Banco Mundial para a Educação: sentido oculto ou
problemas de concepção? In.: De Tomasi, Lívia; Warde, Miriam Jorge e Haddad, Sérgio
(Orgs). O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1996.
COSTA, Márcio. A Educação em tempos de conservadorismo. In.: Gentili, Pablo (Org).
Pedagogia da Exclusão Críticas ao neoliberalismo em educação. 2 ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1996.
DELORS, Jacques e Outros. Educação um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO
da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 3. ed. São Paulo: Cortez;
Brasília (DF): MEC, UNESCO,1999.
DICKEL, Adriana. Globalização e Política Educacional. In.: Zarth, Paulo Afonso
(Org).Ensino de História e Educação. Ijuí, RS: Unijuí, 2004.
DI PIERRO, Maria Clara; HADDAD, rgio. Escolarização de jovens e adultos. São Paulo
ANPEd, Revista Brasileira de Educação, n. 14, mai.-ago. 2000, p. 108-130. (Extrato do
artigo citado, organizado para Encontro Estadual de Coordenações de EJA/MOVA-RS, Porto
Alegre, de 30/05 a 01/06/2001)
______. Palestra em Encontro Estadual de EJA, maio/2001 Transcrição de fitas. SEE/RS.
(Reprografado)
116
______ e GRACIANO, Mariângela. A Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Informe
apresentado a Oficina Regional das UNESCO para a América Latina y Caribe. Ação
Educativa – Assessoria, Pesquisa e Informação. São Paulo, Brasil – Junho de 2003.
FALKEMBACH, Elza Maria. Socialização e Individuação: MST, uma estilística de
resistência. Ijuí, RS: Unijuí, 2006.
FARIAS, Cláudia Feres. O Estado em Movimento: complexidade social e participação
política no Rio Grande do Sul. Tese de Doutorado, 2005. Belo Horizonte: Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG).
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Eletrônico Séc. XXI.
Produto da Lexikon Informática Ltda, corresponde a versão integral do Novo Dicionário
Aurélio Séc XXI, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, publicado pela Editora Nova
Fronteira em 1999.
FONSECA, Marília. A gestão da educação básica na ótica da cooperação internacional:
um salto para o futuro ou para o passado? In.: Veiga, Ilma Passos Alencastro e Fonseca,
Marília (Orgs). As dimensões do projeto político-pedagógico: novos desafios para a escola.
Campinas, SP: Papirus, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 41. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
______. Conscientização – Teoria e Prática da Libertação: uma introdução ao pensamento de
Paulo Freire. 3. ed. São Paulo: Moraes, 1980.
______. Pedagogia da Autonomia Saberes necessários à prática educativa. 15. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2000-a.
______. Professora sim, Tia não cartas a quem ousa ensinar. 10. ed. São Paulo: Olho
d’água, 2000-b.
______. Pedagogia da Esperança Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. 6. ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
______. Pedagogia da Indignação Cartas Pedagógicas e outros escritos. reimpressão.
São Paulo: UNESP, 2000.
______. Educação como prática da liberdade. 27. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.
______. A educação na cidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999.
______ e SHOR, Ira. Medo e Ousadia O cotidiano do professor. 5ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1993.
______ e HORTON, Myles. O caminho se faz caminhando conversas sobre educação e
mudança social. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
FRIGOTTO, Gaudêncio. A dupla face do trabalho: criação e/ou destruição da vida. In.:
Coletânea do Núcleo de Estudos, Documentação e Dados sobre Trabalho e Educação
(NEDDATE), da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF). 2002-a
(xerografado).
117
______. Trabalho, educação e a construção social do conhecimento. In.: Caderno
Pedagógico Seminário Estadual de Educação Popular - SEE/RS. Porto Alegre. CORAG,
julho de 2002-b.
______. Globalização e Crise do Emprego: mistificações e perspectivas da formação técnico-
profissional. Boletim Técnico do Senac, 1999, Vol.25, nº2.
GADOTTI, Moacir (Org.). Paulo Freire Uma Biobibliografia. São Paulo: Cortez, Instituto
Paulo Freire; Brasília, DF: UNESCO, 1996.
GALEANO, Eduardo. O livro dos abraços. Tradução de Eric Nepomuceno. 2. ed. Porto
Alegre: L&PM, 1991.
GENTILI, Pablo A.A. e SILVA, Tomaz Tadeu. Neoliberalismo, Qualidade Total e
Educação. 11. ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.
HADDAD, Sérgio (Org.) Sociedade civil e educação. Campinas: Papirus, CEDES; ANPED;
ANDE, 1996.(Coletânea CBE).
______. Políticas e Gestão de educação de jovens e adultos no Brasil. In.Anais do
Seminário Internacional de Educação de Jovens e Adultos - São Paulo, 1996. Instituto
Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário. Brasília: MEC, 1997.
HENN, Iara Aquino. Sujeitos de conhecimento, cultura e poder: a educação de pessoas
jovens e adultas. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUI). Ijuí, 2006.
MACHADO, Lourdes Marcelino; OLIVEIRA, Romualdo Portella de. Direito à educação e
legislação do ensino. In.: WITTMANN, Lauro Carlos; GRACINDO, Regina Vinhaes
(Orgs.). Políticas e Gestão da Educação (1991-1997). Brasília –DF, MEC-Inep/Comped,
2001. Série Estado do Conhecimento. Realização: Associação Nacional de Políticas e
Administração da Educação.
MACHADO, Roberto. Ciência e Saber A trajetória da Arqueologia de Michel Foucault.
Rio de Janeiro: Edições Graal, 1981.
MCLAREN, Peter e FARAHMANDPUR, Ramin. Pedagogia revolucionária na
globalização. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
MARQUES, Mário Osório. Escrever é preciso O princípio da pesquisa. Ijuí, RS: UNIJUÍ,
1997.
______. Conhecimento e Educação. Ijuí, RS: UNIJUÍ, 1988.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral. 5. ed. São Paulo: Edições Loyola,
2005.
NEEJACP/Ijuí Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular de
Ijuí. Arquivos. Anos de 2001 a 2004.
118
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Jovens e Adultos como sujeitos de conhecimento e
aprendizagens. In.: RIBEIRO, Vera Masagão (Org.) Educação de Jovens e Adultos – novos
leitores, novas leituras. Campinas, SP: Mercado de Letras; Associação de Leitura do Brasil
ALB; São Paulo: Ação Educativa, 2002 – 1ª reimpressão.
PAIVA. Vanilda Pereira. Educação Popular e Educação de Adultos. São Paulo: Edições
Loyola, 1987.
PERONI, Vera. Política educacional e papel do Estado No Brasil dos anos 1990. São
Paulo: Xamã, 2003.
PICONEZ, Stela C Bertholo. Educação Escolar de Jovens e Adultos Das competências
sociais dos conteúdos aos desafios da cidadania. 3 ed. Campinas, SP: Papirus, 2002.
PLATÃO. A República. Introdução, tradução e notas de Maria Helena da Rocha Pereira.
9. ed. Porto – Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
POCHMANN, Márcio. O trabalho sob fogo cruzado. São Paulo: Contexto, 1999.
QUINTANA, Mário. 80 anos de poesia. 7 ed. São Paulo: Globo, 1996.
REIGOTA, Marcos e ESMÉRIO, Milton (Orgs.). Um olhar sobre a educação ambiental.
Porto Alegre: Secretaria Estadual da Educação – RS, 2002.
ROSA, João Guimarães. Grande Sertão Veredas. 18. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1985.
SANTOS, Milton. A força do lugar In: A natureza do Espaço: Técnica e Tempo. Razão e
Emoção. São Paulo: HUCITEC, 1996.
______. Por uma outra globalização do pensamento único à consciência universal Rio de
Janeiro: Record, 2000.
SAUL, Ana Maria. Avaliação Emancipatória Desafio à teoria e à prática de avaliação e
reformulação de currículo. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2000.
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. Caderno 1 da Constituinte Escolar.
Fundamentação, objetivos e momentos da Constituinte Escolar. Porto Alegre, CORAG, 1999-
a.
______. Caderno 2 da Constituinte Escolar. Realidade socioeconômica e dados
educacionais do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: CORAG, 1999-b.
______. Caderno 3 da Constituinte Escolar. Estudo da realidade e Resgate de Práticas
Pedagógicas. Porto Alegre: CORAG, 1999-c.
______. Caderno 4 da Constituinte Escolar. Sistematização do Momento (Estudo da
Realidade e Resgate de Práticas Pedagógicas). Porto Alegre: CORAG, abril/ 2000-a.
119
______. Texto-Base para as Pré-Conferências Municipais/Microrregionais da Educação.
Porto Alegre: CORAG, Jul./2000-c.
______. Texto-Base para as Pré-Conferências Regionais da Educação. Porto Alegre:
CORAG, Ago./2000-d.
______. Texto-Base para a Conferência Estadual da Educação. Porto Alegre: CORAG,
Ago./ 2000-e.
______. Princípios e Diretrizes para a Escola Pública Estadual RS.Porto Alegre:
CORAG, Nov./2000-f.
______. Regimentos da Conferência Estadual da Educação. Porto Alegre: CORAG,
Jun./2000-b.
______. Caderno Pedagógico 6. Sistematizando o Projeto Político-Pedagógico, Regimento
Escolar e Plano(s) de Estudos. Porto Alegre: Secretaria de Estado da Educação Governo do
Estado do Rio Grande do Sul, 2000-g.
______. Cadernos Pedagógico EJA 1 – Política Pública de Educação de Jovens e Adultos do
Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Secretaria de Estado da Educação/RS , abril/2001-a.
______. Caderno Pedagógico “A Pesquisa da Realidade na Construção Social do
Conhecimento”. Porto Alegre: CORAG, outubro/2002.
______. cleos de Educação de Jovens e Adultos e de Cultura Popular. Documento
Final. Porto Alegre: SEE/DP/DEJA/CREs, ago.2001-b. Material Reprografado.
______. Relatório de Gestão: A Educação de Jovens e Adultos no Governo Democrático e
Popular do RS. 2002 -a. Material Reprografado.
SOARES, Leôncio. O Educador de Jovens e Adultos em Formação. GT: Educação de
Pessoas Jovens e Adultas / n.18. Agência Financiadora: CNPq e FAPEMIG UFMG S/D.
Disponível em www.anped.org.br – Consulta em 12/04/2007.
SOARES, Maria Clara Souto. Banco Mundial: políticas e reformas. In.: De Tomasi, Lívia;
Warde, Miriam Jorge e Haddad, Sérgio (Orgs). O Banco Mundial e as Políticas
Educacionais. São Paulo: Cortez, 1996.
SOUZA, João Francisco de. Atualidade de Paulo Freire: contribuição ao debate sobre a
educação na diversidade cultural. São Paulo: Cortez, 2002. (Biblioteca Freiriana; Vol.3)
TORRES, Rosa Maria. Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do banco
Mundial. In.: De Tomasi, Lívia; Warde, Miriam Jorge e Haddad, Sérgio (Orgs). O Banco
Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1996.
TROMBETTA, Derlan. Políticas Públicas: homogeneização X singularidade. Dissertação de
Mestrado em Educação. Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
– UNIJUI. Ijuí, 2003.
120
VAIDERGORN, José. Uma perspectiva da globalização na universidade brasileira.
Cadernos CEDES, v.21, n.55. Campinas – SP, nov. 2001.
WADI, Naíma Marmitt. Educação de Jovens e Adultos: Práticas, Histórias e Narrativas
Biográficas. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade do Noroeste do Estado do
Rio Grande do Sul - UNIJUÍ. Ijuí, 2005.
ZANETTI, Maria Aparecida. Exames Supletivos/ Certificação na Educação de Jovens e
Adultos. Texto produzido para audiências sobre a reformulação da Resolução CNE/CEB
11/2000 – Fóruns de EJA/2007 (reprografado.)
121
ANEXOS
122
ANEXO I
Texto “Constituinte Escolar: Esclareça suas dúvidas” e “Calendário da CE”
A) Texto “Constituinte Escolar: Esclareça suas dúvidas”
O que é Constituinte Escolar?
É um movimento que visa a definição de princípios e diretrizes da ducação da rede
pública estadual, através de debates, plenárias, seminários, painéis, encontros e conferências.
Quem participa?
- A comunidade escolar (alunos, pais, professores e funcionários).
- As organizações da sociedade civil.
- As instituições do poder público.
Quando acontece?
De janeiro de 1999 a dezembro de 2000.
Onde acontece?
Nas escolas, nos municípios, nas regiões, no estado do Rio Grande do Sul.
Quem coordena?
Na escola, a Comunidade Escolar escolhe sua coordenação. Haverá também uma
Coordenação Regional (DE) e uma Coordenação Geral (SE).
Os trabalhadores em educação participam?
Professores e funcionários são convidados a participar dos dias de formação não
letivos, organizados pelas escolas e pelas DEs. Além disso, participam das atividades
organizadas pelas Escolas e previstas no calendário letivo.
Como os alunos participam?
Cada escola propõe a melhor maneira de garantir que os alunos participem da
Constituinte Escolar. Atividades como reuniões, seminários, poderão ser constadas como dias
letivos desde que os eventos envolvam alunos, professores, funcionários.
Como os pais e a comunidade participam?
As escolas e as Delegacias da Educação realizam atividades abertas a toda
comunidade, representantes de organizações da sociedade civil, tais como igrejas,
movimentos, sindicatos, associações, etc...
Há certificado?
123
Os participantes que desejarem, receberão certificado. Mas o mais importante é a
contribuição de todos, através de reuniões, debates, para a Construção da Escola Democrática
e Popular.
Como acontece o processo?
A Constituinte Escolar ocorre em cinco momentos:
1º - Sensibilização e preparação para o desencadeamento do processo na
comunidade gaúcha (janeiro a maio de 1999).
2º - Estudo da realidade regional contextualizada (social, econômica, política e
cultural), regate de práticas pedagógicas, socialização de experiências e levantamento de
temáticas (maio de 1999 a fevereiro de 2000).
3º - Aprofundamento das temáticas levantadas no momento anterior (março a
maio de 2000).
4º - Definição de princípios e diretrizes (junho e julho de 2000).
5º - Reconstrução do projeto político-pedagógico no âmbito da SE, DEs e
escola (agosto a dezembro de 2000).
B) CALENDÁRIO DA CONSTITUINTE ESCOLAR
Momentos
Ações Centrais Sujeitos
envolvidos
Coordenação Prazos
1
2
3
4
1.Apresentação da
proposta à
comunidade escolar e
a sociedade em geral
Escolas
Sociedade em
geral
Geral Abril e maio
1999
2. Discussão da
proposta com as DEs,
organizações da
sociedade civil,
associações de
municípios, CPERS,
instituições de ensino
superior.
DEs,
organizações
sociais
Geral
Regional
Maio de
1999
3. Estudo da realidade
e resgate das
experiências
educativas nas
Escolas.
Comunidade
escolar
Escolas Maio a
junho 1999
4. Socialização e
resgate de
experiências de
organizações da
Organizações
sociais,
escolas,
Comunidade
Geral,
Regional,
Escolas
Maio a
outubro de
1999.
124
5
sociedade civil e de
instituições públicas.
Escolar, DEs,
SE
5. Sistematização.
Escolas, DEs,
SE
Escolas,
Geral,
Regional.
Novembro a
fevereiro de
2000
6. Aprofundamento de
temáticas nas escolas.
Escolas Escolas Março a
maio de
2000
7. Seminários
municipais para
aprofundar as
temáticas.
Escolas,
comunidade
escolar, SE,
DEs, org.
civis e inst.
Públicas.
Regional e
Escolas
Abril e maio
de 2000
8. Seminários
estaduais para
aprofundar as
temáticas.
Geral Abril e maio
de 2000
9.Sistematizações. Escolas, DEs,
SE
Escolas,
Geral,
Regional.
Maio de
2000
10.Pré-Conferência
Estadual nos
Municípios.
Representante
s das escolas,
comunidade
escolar, SE,
DEs, org.
civis e inst.
Públicas
Regional e
Escolas
Junho de
2000
11. Pré-Conferência
Estadual nas regiões.
Representante
s das Conf.
Municipais
Regional
Junho de
2000
12. Conferência
Estadual.
Representante
s das Conf.
Regionais
Geral Julho de
2000
13. Reconstrução dos
projetos nas escolas,
Delegacias da
Educação e secretaria
da Educação.
Escolas, DEs,
SE
Geral,
Regional,
Escolas.
Agosto a
dezembro
de 2000.
OBSERVAÇÕES:
A data, local e horário dos eventos serão informados pela
coordenação nas escolas, Delegacias de Educação (DE) ou Secretaria da Educação
(SE). Material de apoio como cartaz, prospecto e adesivo, devem ser buscados junto às
Coordenações.
125
ANEXO II
Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual
A) PRINCÍPIOS E DIRETRIZES PARA A EDUCAÇÃO PÚBLICA
ESTADUAL
TEMÁTICA 1 - EDUCAÇÃO: DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO
PRINCÍPIOS
1.Educação como um direito de todos.
2.Educação libertadora, formadora de sujeitos críticos e transformadores da realidade,
na perspectiva da construção de uma sociedade justa, democrática e humanista.
3. Escola como espaço coletivo de construção de direitos e deveres (ética, valores,
cidadania, responsabilidade), de exercício de democracia participativa, diálogo, justiça e
igualdade.
4.Escola como espaço de compreensão crítica dos meios de comunicação, como um
dos instrumentos da construção de uma sociedade justa e democrática.
5. Respeito à diversidade cultural, étnica, de gênero e opção sexual, religiosa e
política.
DIRETRIZES
1.Fortalecimento da participação da comunidade na escola e da escola na comunidade,
qualificando a integração escola-família-sociedade, para o comprometimento de todos no
processo educativo.
2. Avaliação constante da prática pedagógica, de forma dialógica, interdisciplinar e
não excludente, por toda comunidade escolar.
3.Desenvolvimento de práticas de avaliação da aprendizagem coerentes com um
processo pedagógico democrática, participativo e dialógico.
4. Construção de um processo participativo de tomada de decisões administrativas,
financeiras e pedagógicas, através da qualificação das relações entre Secretaria de Educação,
delegacias de Educação e Escolas e de suas relações internas.
5. Qualificação das relações entre Secretaria da Educação, Delegacias de Educação,
Escolas, Promotoria Pública, conselhos Tutelares, secretarias Municipais de Educação,
Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Estadual de
Educação, Conselhos Municipais de Educação e outros Conselhos, no acompanhamento das
políticas públicas educacionais.
126
6. Superação da estrutura centralizada, fragmentada e verticalizada do Sistema
Estadual de Educação.
7. Participação da comunidade na elaboração do calendário escolar, oportunizando
tempo/espaço para estudo e debate sobre práticas pedagógicas, de acordo com a realidade de
cada escola.
8. Fortalecimento do Grêmio Estudantil e do Conselho Escolar como espaços
representativos dos segmentos da comunidade escolar, de exercício da democracia
participativa e da capacitação política e formação de lideranças.
9.Qualificação das instâncias representativas e setores da escola (Grêmio Estudantil,
Conselho Escolar, equipe Diretiva) para intensificar as práticas participativas.
10. Posicionamento crítico frente aos meios de comunicação social e construção de
formas alternativas para acesso da comunidade escolar à informação.
11. Planejamento participativo como instrumento de trabalho coletivo na escola.
12. Constituição da Secretaria da Educação, delegacias de Educação e Escolas em
espaços de reflexão para integração da comunidade escolar.
TEMÁTICA 2 – CONSTRUÇÃO SOCIAL DO CONHECIMENTO
PRINCÍPIOS
1.Conhecimento universal compreendido como um direito de todos, construído
coletivamente como processo de desvelamento, apreensão e transformação da realidade e
mediado pelo contexto histórico-social.
2.Construção do conhecimento comprometido com a transformação social,
referenciado na realidade histórica, em interação com os diferentes saberes e valorização da
cultura popular.
3.A construção do conhecimento como processo coletivo e constante pressupõe a
formação permanente dos/das trabalhadores/as em educação.
4.Prática educativa democrática, participativa e dialógica como pressuposto do
processo de construção social do conhecimento.
5.Educação fundada em valores humanistas (solidariedade, justiça social, honestidade,
responsabilidade e respeito às diferenças, como condição da construção social do
conhecimento).
6. Escola como espaço de socialização e construção coletiva do conhecimento.
DIRETRIZES
1.Participação de todos os segmentos da comunidade escolar na construção social do
conhecimento.
127
2.Reconstrução curricular a partir da realidade, contextualizada historicamente,
valorizando o saber popular, articulado ao saber científico.
3. Currículo voltado para as diferentes realidades e sujeitos.
4. Currículo construído de forma interdisciplinar, integrando as ares do conhecimento,
através de propostas pedagógicas construídas a partir da realidade.
5. Incentivo à pesquisa da realidade como metodologia de construção social do
conhecimento.
6. Processo ensino-aprendizagem embasado na relação dialética entre a prática e a
teoria.
7.Utilização crítica e democrática dos recursos tecnológicos e dos meios de
comunicação social.
8.Criação de espaços de participação de todos os segmentos na vida da escola,
tornando-os co-responsáveis no processo de construção do conhecimento.
9.Valorização da cultura da população do campo nos Projetos Político-Pedagógicos
das escolas do meio rural.
10.Construção de práticas avaliativas contínuas, diagnósticas, investigativas,
participativas, democráticas e emancipatórias, que levem em consideração o aluno como um
todo, as diferenças individuais e os diferentes saberes.
11.Superação da fragmentação do currículo, através da construção do conhecimento de
forma interdisciplinar e de diferentes metodologias, que considerem os sujeitos com suas
histórias e vivências.
12. Construção de um projeto político-pedagógico coerente com os princípios e
diretrizes construídos no processo Constituinte Escolar e definidos na Confer~encia Estadual
de Educação.
13. Reordenamento do tempo e espaço escolar, respeitando o ritmo e os tempo de
aprendizagem e as diversidades socioculturais.
14. Educação Ambiental como conhecimento integrado à totalidade do currículo
escolar.
15. Construção coletiva de práticas pedagógicas que evidenciem a importância da
busca do conhecimento.
16. Currículo escolar voltado às necessidades e aos interesses da população e
articulado com a realidade social e histórica dos espaços urbanos e rurais em nível local,
regional, nacional, mundial, considerando as diferenças culturais.
128
17. Criação de mecanismos e espaços para apoio pedagógico aos alunos com
necessidades educativas especiais, articulados à proposta pedagógica da escola.
TEMÁTICA 3 – POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO
PRINCÍPIOS
1. A educação de qualidade social, direito de todos e dever do estado, passa pela
democratização do acesso e garantia de permanência e aprendizagem na Escola Pública, sem
discriminação de qualquer natureza.
2. As políticas públicas educacionais do Estado devem ser construídas com a
participação da comunidade escolar.
3. As políticas públicas para a educação devem estar articuladas ao projeto de
desenvolvimento social do Estado.
4. O atendimento às demandas educacionais no estado do Rio Grande do Sul deve ser
construído em regime de colaboração com os Municípios e a União.
5. A Escola Pública Estadual, compreendida como patrimônio da comunidade, deve
ser um espaço público de cultura e lazer.
6. O acesso às tecnologias, na rede pública estadual, deve possibilitar a qualificação e
inclusão social.
DIRETRIZES
1. Construção da política pública educacional de valorização, qualificação e formação
permanente dos/das trabalhadores/as em educação, com a participação da comunidade
escolar.
2. Construção coletiva dos Planos de Carreira, política de Atenção integral à Saúde do
trabalhador em educação, formação permanente e em serviço, e política salarial.
3. Articulação de políticas e programas suplementares à educação (bolsa-escola, renda
mínima, etc.), que contribuam para a garantia do acesso e permanência na escola de
estudantes com necessidades.
4. Incentivo e apoio à construção de propostas alternativas de comunicação, como
forma de valorizar a capacidade criativa da comunidade escolar e contribuir para a
democratização dos meios de Comunicação Social.
5. Qualificação da política pública de alimentação escolar.
6. Políticas públicas que garantam recursos tecnológicos, humanos e financeiros para o
enriquecimento e qualificação do processo ensino-aprendizagem.
7. Adequação do espaço físico das escolas para atividades de construção do
conhecimento, cultura, lazer e recreação.
129
8. Construção coletiva de uma política de provimento de recursos humanos (concurso
público, difícil acesso, carga-horária, etc.).
9. Valorização da escola do meio rural através de políticas públicas voltadas para a
educação básica do campo.
10. Qualificação e formação de trabalhadores/as em educação para o atendimento às
diversidades, democratizando o acesso à educação.
11. Construção de políticas efetivas de inclusão de jovens e adultos, estudantes com
necessidades educativas especiais, indígenas e assentados, com provisão de recursos
humanos, pedagógicos, tecnológicos e estrutura física.
12. Redefinição e qualificação dos cursos de formação de professores/as das escolas
públicas estaduais de nível médio – modalidade normal.
13. Reorganização, redimensionamento e qualificação do espaço físico, estrutura
organizacional e fluxos da Secretaria de Educação, Delegacias de Educação e Escolas.
14. Fortalecimento de políticas públicas que respeitem e promovam os direitos da
criança e do adolescente.
15. Políticas públicas educacionais que contemplem o atendimento a crianças e
adolescentes em situação de risco.
16. Preservação e utilização do patrimônio público através de programas elaborados
com a comunidade.
17. Redefinição dos critérios de repasse dos recursos da autonomia financeira.
18. Desencadeamento de ações visando ao estabelecimento de políticas de finciamento
para a Educação Básica (FUNDEB).
19. Proposição de alternativas que viabilizem o acesso ao Ensino Médio em
municípios pouco populosos ou em comunidades isoladas (poucos estudantes e/ou difícil
acesso).
20. Elaboração de uma lei de gestão que dê conta dos Princípios e Diretrizes da
Educação Pública Estadual.
21. Articulação, proposição e execução de políticas educacionais em cooperação com
a sociedade organizada e demais instituições públicas, na perspectivas do desenvolvimento
social.
22. Proposição de políticas que visem ao fortalecimento das instãncias representativas
dos segmentos da escola, como Grêmio Estudantil e Conselho escolar.
23. Construção de políticas públicas que garantam o acesso à educação os estudantes
com necessidades educativas especiais em modalidades que respeitem suas diferenças.
130
24. Articulação de políticas públicas de atendimento especializado na área da saúde
aos estudantes com necessidades educativas especiais.
TEMÁTICA 4 – CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
PRINCÍPIOS
1. Educação como base do desenvolvimento social, entendido como socialmente justo,
economicamente viável, ambientalmente sustentável, solidário e igualitário, que considere o
homem e a mulher em sua relação com o meio e com os demais.
2. Valorização da vida com qualidade social e condição digna de existência para todos.
3. Educação como processo participativo de construção e apropriação do
conhecimento e de tecnologias para a transformação da sociedade.
4. Educação como processo permanente de formação de sujeitos autônomos, com
posição crítica frente às desigualdades e injustiças sociais.
5. Escola como espaço de reflexão e construção das lutas e movimentos sociais no
projeto de desenvolvimento social.
DIRETRIZES
1. Participação da comunidade na construção de uma educação e escola
comprometidas com o desenvolvimento social.
2. Construção de um currículo contextualizado, que contribua para o desenvolvimento
social na comunidade em que a escola se insere.
3. Implementação de políticas específicas que potencializem o desenvolvimento
social, em parceria com entidades e outros órgãos públicos.
4. Garantia de acesso, permanência e aprendizagem na Educação Básica como
exigência do desenvolvimento social.
5. Reestruturação do ensino Técnico, relacionando-o às políticas voltadas para um
projeto de desenvolvimento social.
6. Incentivo a práticas de pesquisa e projetos que contemplem o desenvolvimento da
agricultura familiar e práticas agroecológicas.
7. Incentivo à pesquisa como forma de fortalecer o desenvolvimento rural e urbano.
8. Investimento no uso de tecnologias educacionais que potencializem o
desenvolvimento rural e urbano.
9. Qualificação da participação da comunidade escolar no Orçamento Participativo
como forma de potencializar o desenvolvimento na região.
10. Desenvolvimento de práticas educativas que recuperem e preservem o meio
ambiente.
131
11. Universidade Pública Estadual inserida e articulada ao projeto de desenvolvimento
social do Estado.
OUTRAS QUESTÕES
AÇÕES/ATIVIDADES
1. Elaboração de projetos que busquem a participação e trocas de conhecimento entre
escolas das redes Estadual, Municipal e Particular.
2. Gestão da merenda escolar direta pela Escola.
3. Participação da Comunidade Escolar em discussões e ações para combater a
violência do cotidiano escolar.
4. Levantamento constante de crianças e adolescentes que estão trabalhando.
5. Aprofundamento teórico-prático do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
6. Reorganização dos livros didáticos a partir de fórum com a comunidade gaúcha.
7. Utilização do livro como suporte ou fonte de pesquisa.
8. Realização de encontros com maior participação dos membros de vários setores das
CREs junto com as Escolas e SEE – Grupo de Estudo.
9. Estudo e reflexão da prática através de encontros, debates, e fórum com os
segmentos escolares.
10. Informativo para a comunidade sobre questões ambientais.
11. Conscientização da comunidade, através de palestras, seminários, teatro, sobre o
cultivo ecológico, cultivo de viveiro e distribuição de mudas (reflorestamento).
12. Incentivo ao consumo de alimentos agroecológicos.
13. Incentivo às escolas para a organização e coleta seletiva do lixo e destino
adequado de resíduos de produtos químicos.
14. Realização de Conselho de Classe com a participação de todos os segmentos da
comunidade escolar.
15. Construção de Regimentos Escolares que atendam às necessidades apontadas pela
comunidade escolar.
16. Elaboração de Plano de Estudos com toda a comunidade escolar e de acordo com a
realidade.
17. Articulação com redes de atendimento que promovam os direitos das crianças e
dos adolescentes.
18. Criação de classes para jovens e adultos.
19. Reorganização do Ensino supletivo em todos os municípios.
132
20. Ampliação de escolas especializadas para pessoas com comprometimento mais
severo, com suporte de equipe multidisciplinar.
21. Ampliação das Salas de Recursos para apoio pedagógico aos alunos com
necessidades educativas especiais que freqüentam o ensino regular.
22. Reflexão crítica na escola sobre a compreensão dos instrumentos ideológicos da
sociedade (meios de comunicação, igrejas, sindicatos, etc.) como instrumentos da construção
de uma sociedade democrática.
23. Criação de lei complementar, transformando o Conselho Escolar em entidade
jurídica e executora.
24. Criação e manutenção de escolas de Ensino Fundamental e Médio para surdos,
com profissionais capacitados, respeitando a identidade, a língua e a cultura.
25. Criação do cargo de Instrutor Surdo e Intérprete de Libras (Língua Brasileira de
Sinais) nas escolas para surdos e para atividades sociais.
26. Inclusão de Educação para o trânsito no currículo interdisciplinar, implantando o
artigo 76 do novo Código de Trânsito Brasileiro, como forma de valorização da vida.
27. Promoção de intercâmbio entre escolas do meio rural e urbano.
REIVINDICAÇÕES
1.Criação de uma Escola de Ensino supletivo com cursos técnicos e uma infra-
estrutura igualitária.
2. Provimento de recursos humanos nas escolas com mais rapidez e eficiência.
3. Rediscussão da terceirização dos bares escolares.
4. Delimitação do número de alunos por turma (máximo de 20 a 25 alunos).
5. Revisão dos critérios e valores para definição do difícil acesso, de acordo com a
distância percorrida pelo professor.
6. Garantia de unidocência para todos os professores do currículo por atividades.
7. Manutenção do serviço de previdência do Estado (IPE) para o trabalhadores/as em
educação.
8. Garantia de vagas da Universidade Estadual para estudantes de baixa renda e bom
rendimento escolar.
9. Segurança nas escolas.
10. Garantia da valorização profissional, a partir de uma política salarial justa, aos/às
trabalhadores/as em educação.
11. Tornar o Conselho Escolar um órgão executor.
12. Valorização dos funcionários de escola.
133
13. Construção do planejamento escolar com Direção, Conselho Escolar e Delegacia
de Educação, das necessidades para o ano seguinte.
14. Garantia de auxílio financeiro para gastos no desenvolvimento das atividades em
nível de ensino médio, no período de estágio supervisionado (e outras questões).
15. Criação do Curso Normal Superior na universidade Estadual.
134
ANEXO III
POLÍTICA PÚBLICA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO RIO GRANDE
DO SUL
A Constituinte Escolar CE foi organizada em cinco momentos de debate, reflexão
e construção coletiva, nos quais a EJA inseriu-se no processo com o conjunto da Rede
Estadual; entretanto, no primeiro e no segundo momentos foram organizados alguns
encontros específicos.
No primeiro momento, denominado de Estudo da Realidade, a EJA realizou trinta
seminários regionais, um em cada Regional de Educação, coordenados pelos responsáveis
dessa política, com a participação de professores/as, alunos/as, comunidade escolar e
universidades.
A pauta foi comum em todas as regiões, iniciando com um histórico da EJA no Brasil
e depois fazendo um levantamento sobre a EJA no RS em duas dimensões: a EJA encontrada
e a EJA desejada.
109
Secretaria de Estado da Educação/RS. Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual. SEE/RS,
abril de 2000.
Temática 3
Principio 1
A
educação de qualidade social, direito de
todos e dever do Estado passa pela
democratização do acesso e garantia de
permanência e aprendizagem na Escola
Pública, sem discriminação de qualquer
natureza.
Diretriz 11 Construção de
políticas efetivas de inclusão de jovens e
adultos (...) com provisão de recursos
humanos, pedagógicos, tecnológicos e
estrutura física. (SEE,2000: p. 40)
109
135
O segundo momento foi planejado tendo em vista o Resgate de Práticas em EJA e,
para isso, foram realizados oito seminários macro-regionais (mais de uma Regional de
Educação). Esses contaram com a representação das diferentes organizações da EJA
Centros de Ensino Supletivo, Turmas de Suplência, EJA dos Presídios e turmas de
alfabetização (antigo Projeto LER).
Estas duas experiências foram e são de grande relevância pois, por um lado, a EJA
tomou fôlego para participar do restante da CE com a dignidade resgatada; por outro lado,
porque temos a certeza de que esta modalidade da Educação Básica foi impulsionada e trazida
para o centro do debate das políticas educacionais visto a Rede ter compreendido a
importância da EJA para o Rio Grande do Sul, colocando-a nos Princípios e Diretrizes para a
Educação Pública no Estado do Rio Grande do Sul.
Embalados por esse desejo de retirar a EJA, de uma vez por todas, do lugar de segunda
categoria, apresentamos nossas posições acerca do:
1.Conceito de EJA e EJA como Direito;
2. Organização dos Tempo e Espaços;
3. Avaliação.
5.1. Conceito de Educação de Jovens e Adultos – A EJA como direito
No mundo capitalista, caracterizado essencialmente pela injusta distribuição de
riqueza e pela supremacia do capital especulativo e do poder econômico sobre o trabalho e a
dignidade humana, qualquer estudo de realidade ou pesquisa sociocultural, referente aos
países latino-americanos, revelará matrizes sociais muito próximas. Tópicos como violência,
desemprego, drogas, analfabetismo e fome também foram considerados na V Conferência
Internacional de EJA, na Alemanha/Hamburgo.
Os processos de transformação econômica indicam uma tendência e ampliação em
nível global, do modo de produção capitalista, assim como mudanças tanto nas formas de
articulação financeira da economia em nível transacional (...) a globalização dos mercados, do
comércio e das comunicações traz consigo, também, o aumento da pobreza e da
marginalidade. (UNESCO,1997:p.21)
110
Ao analisarmos o perfil dos/as educandos/as das comunidades que buscam a
Educação de Jovens e Adultos, percebemos que possuem uma diversidade sociocultural, de
110
UNESCO. CONFITEA V. Declaración de Hamburgo sobre la educación de adultos y Plan de ación para el
Futuro. Hamburgo: UIE/UNESCO, 1997. Resoluciones de la V Conferencia Internacional sobre Educación de
adultos, 1997.
136
valores, de gênero, de etnia, de idades e de ritmos de socialização e aprendizagem. Dentro
dessa heterogeneidade, há educandos/as com vivências diferenciadas no mundo do trabalho,
nas responsabilidades familiares, excluídos da alfabetização e portadores de necessidades
educativas especiais.
A EJA, ao longo da história da Educação, caracterizou-se por um modelo de suplência
e de alfabetização com caráter eminentemente compensatório, na maioria das vezes, com o
único objetivo de preparar mão-de-obra para o mercado de trabalho. Constituía-se em uma
educação modular, fragmentada e conteudista, contribuindo para a manutenção da
subescolarização das pessoas e para a ampliação da demanda de EJA.
Nessa visão, questiona-se as concepções que relacionam o ensino apenas às situações
de sala-de-aula, limitadas à educação formal.
A EJA, mais que ir além da Educação Formal, deve incorporar as práticas e os saberes
construídos no cotidiano, assumindo a educação não-formal, quase sempre desenvolvida nos
movimentos populares e organizações sociais. Como por exemplo, citamos a experiência do
MOVA-RS Movimento de Alfabetização que, sob a forma de parceria do Estado com a
sociedade civil, nesse momento se faz presente em mais de quatrocentos municípios, através
de cinco mil grupos de alfabetização.
O conceito de parceria proposto no Governo do Rio Grande do Sul pressupõe partilha
de responsabilidades, inclusive porque esta é uma das principais características da EJA,
porém, ao Estado cabe o papel de indutor dessa demanda, garantindo a todos os jovens,
adultos e idosos o acesso à Educação Básica.
Para isso, devem-se desencadear ações que revertam a exclusão dessa modalidade de
ensino, buscando parcerias com outras instâncias de governo e organizações da sociedade
civil, através de um efetivo regime de colaboração.
A situação da EJA no plano federal é bastante complexa, uma vez que não está
contemplada na distribuição de recursos do FUDEF Fundo de Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e Valorização do Magistério, apesar de ser considerada uma modalidade da
Educação Básica de acordo com a LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
Lei nº 9394/96.
Nesse aspecto, torna-se necessário o envolvimento de toda a sociedade no debate de
políticas públicas para a EJA, pois estas inexistem em nível federal enquanto, para ações de
interesse do Governo Federal, são repassadas verbas generosas, como por exemplo, ao
Programa “Alfabetização Solidária”.
137
No Rio Grande do Sul a Educação de Jovens e Adultos desenvolverá uma prática de
Educação voltada para a vida, em que o/a educando/a aprende a apreender a sua realidade,
vivenciando sua cidadania plenamente.
A EJA será agente de construção de um novo modelo de desenvolvimento solidário e
sustentável para o RS, promovendo a formação de indivíduos capazes de decidir sobre suas
vidas, ascender social e individualmente, adaptar-se a novos contextos, participarem da
tomada de decisões de políticas públicas, crescerem em liberdade e autoconsciência com os
outros, com vistas a uma sociedade mais justa e igualitária.”(CNE/CEB,2000:31)
111
Outro desafio da Educação é fazer frente ao
contexto de precarização das relações de trabalho e à
elevação do patamar de desemprego nas sociedades.
A Educação de Jovens e Adultos reafirma o
compromisso com o “aprofundamento do caráter
humanista da escola pública, em oposição à visão, hoje
hegemônica, de submissão aos valores do mercado, cuja
preocupação única é formar consumidor e
clientes.”(Luckesi, 1998:04)
113
A perspectiva aqui sugerida implica resgate e afirmação das origens e potencialidades
locais, com a garantia de espaços nos quais as comunidades possam afirmar sua identidade e,
assim, reivindicar seus direitos com vistas à transformação social:
Segundo um enfoque intercultural de educação para o exercício da cidadania
democrática, com uma forte orientação para a formação humana centrada nos valores que
fortaleçam os direitos humanos, a justiça social, a educação ambiental e a não-discriminação
(...), destacando o fortalecimento do papel da mulher e a sensibilização dos homens à questão
da eqüidade de Gênero. (UNESCO, 1997:25)
114
O conceito de alfabetização será revisitado, considerando as experiências que ainda
organizam ações pontuais, limitadas em tempo e desarticuladas de uma macropolítica de
educação e, mais especificamente, de EJA.
111
Brasil. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. Parecer CEB 11/2000. Aprova as
Diretrizes Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. (s.l.:s.n.,2000)
112
Secretaria de Estado da Educação/RS. Princípios e Diretrizes para a Educação Pública Estadual. SEE/RS, abril
de 2000
113
Luckesi, Cipriano Carlos. Avaliação da Aprendizagem Escolar: Estudos e proposições. São paulo, Cortez,
1998.
114
Idem nota 109.
Temática 2 – Princípio 5
Educação fundada em
valores humanistas
(solidariedade, Justiça social,
honestidade, responsabilidade e
respeito às diferenças), como
condição da construção social do
conhecimento. (SEE, 2000:36)
112
138
A superação dessas práticas dá-se na medida em que assumimos a alfabetização como
aquele aprendizado que corresponde ao primeiro segmento do Ensino Fundamental,
alicerçada na visão Freireana de construção da leitura e da escrita, como um processo que
ocorre a partir da leitura crítica do mundo.
A concepção de alfabetização na Educação de Jovens e Adultos gaúchos/as articula a
Educação Popular ao Construtivismo Interacionista, considerando os/as educandos/as sujeitos
desse processo e agentes de transformação da realidade nas suas diferentes dimensões:
afetiva, cognitiva, social, cultural, econômica e política.
Rompe-se, também, com a simples decodificação de signos, repasse de informações
e/ou conteúdos mínimos preestabelecidos, conforme assegura o Parecer do CNE nº 11/2000:
Os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência
humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. Todo este processo
desencadeia-se a partir da consideração da realidade. (CNE/CEB, 2000, s/p)
115
.
Essa concepção de Educação de
Jovens e Adultos será garantida através de
espaços de formação permanente e continuada
dos sujeitos envolvidos (educadores/as,
educandos e comunidades) para que eles/as
próprios/as construam, num processo de
relações horizontais, uma concepção de
educação continuada ao longo da vida, com
interação e dialogicidade.
5.2. Currículo em Educação de Jovens e Adultos os Tempos e os Espaços de Ensinar e
Aprender
A Educação de Jovens e Adultos, mesmo depois de toda a produção construída ao
longo dos últimos dez anos, conforme descrevemos em capítulo próprio, ainda hoje padece
dos males da Suplência, uma vez que esta é uma marca registrada nas experiências brasileiras
desenvolvidas em todos os cantos do país.
Ao tomarmos contato com essas práticas educacionais voltadas às pessoas acima dos
quinze anos, deparamo-nos com os tradicionais centros, cursos, núcleos ou turmas de Ensino
115
Idem nota 110.
116
Idem nota 111.
Temática 2 – Princípio 3
A construção do conhecimento como
processo
Coletivo e constante pressupõe a
formação
permanente dos/as trabalhadores/as em
educação
(SEE, 2000:36)
116
139
Supletivo, todos uniformemente preparados para encurtar o tempo de permanência na escola,
aligeirando, ao máximo, a conclusão do ensino Fundamental ou Médio.
O caráter compensatório não característica do passado, pois os módulos de disciplinas
condensam e infantilizam o dito conteúdo escolar, dando aos jovens e adultos o mesmo dado
as crianças, porém em dosagens menores, em conta-gotas, talvez porque a pedagogia, a
antropologia, a psicologia, etc. pouco tenha avançado sobre o tema das aprendizagens no
mundo juvenil e adulto.
Passaram-se trinta anos desde a Lei 5692/71, que criou a Suplência, temos a nova
Lei 9394/96, e a EJA permanece no lugar de segunda categoria. Isso não é retórica, haja
vista os inúmeros exemplos encontrados: colocam a EJA na sala do Jardim de Infância sem
dar-se conta de que as mulheres e os homens de 40, 60 ou 70 anos não cabem numa
cadeirinha; emprestam uma sala de aula, o grupo fica sozinho na escola, quase sempre mal
iluminada, no último corredor, perto do depósito de lixo. Ou ainda: não abrem as bibliotecas e
não servem merenda à noite porque não funcionários; fecham os portões ao primeiro sinal
sem compreender a dinâmica da vida que passa fora: trabalham, cuidam da família, sofrem,
sonham, têm direito de estar na escola e aprender.
Por isso, propomos outras formas de pensar o currículo em Educação de Jovens e
Adultos, definindo novos compromissos para a organização dos tempos e os espaços de
ensinar e aprender.
5.2.1. Compromissos com a vida, com a realidade e com os interesses dos/as
educandos/as
Os princípios balizadores da organização dos projetos Políticos e Pedagógicos das
comunidades escolares emergirão da situação real de vida do/a educando/a, pois considera
que a EJA atende um universo de pessoas jovens, adultas e idosas bastante diverso, com
trajetórias de vida distintas, com ou sem repertório escolçar prévio, que chegam da ou
retornam à escola movidos por interesses e disponibilidades também diferenciados. A EJA
tem compromisso em promover a justiça educacional priorizando as mulheres, nômades,
negros, índios, idosos, camponeses e portadores de necessidades educativas especiais.
140
5.2.2. Compromisso com a justiça social e com o respeito às diferenças
A comunidade escolar se organizará para compreender esta diversidade, dialogando
com a multiplicidade de características, tais como idade cronológica, condições de trabalho,
identidade cultural, étnica, de religião e de gênero, participação na sociedade, linguagens nas
suas expressões lingüísticas e corporais, etc. na perspectiva de melhoria da qualidade de vida.
5.2.3. Compromisso com a transformação da realidade
Participar de mecanismos de organização popular na perspectiva de intervenção na
realidade para transformá-la, na busca de uma sociedade justa, solidária, igualitária e
humanista.
5.2.4. Compromisso com um currículo crítico, democrático e transformador, que parte
da realidade dos/as educandos/as
O ato de aprender parte da realidade dos/as educandos/as, do respeito e da valorização
das experiências e saberes construídos no cotidiano, em que os mesmos são o centro do
processo.
Os conteúdos básicos da escola articulam-se com a vida, para problematizá-los e
recria-los, garantindo uma aprendizagem contínua e de qualidade social.
Os conteúdos serão trabalhados através do Tema Gerador na articulação dos campos
do saber, tomando como ponto de partida a realidade levantada através de pesquisa nas
comunidades.
5.2.5. Compromisso com a construção da identidade da EJA
A construção da identidade da EJA concretiza-se na organização curricular, pois é
neste momento que marcamos os tempos e os espaços de ensinar e aprender, em que a
diversidade apresentada por este grupo aponta-nos à construção de um currículo flexível, mas
com a garantia da qualidade pedagógica que assegure a articulação entre os saberes vividos e
escolares.
141
5.2.6. O currículo da EJA abrange a Educação Básica da seguinte forma:
a) Educação Fundamental
- Alfabetização – 1ª a 4ª séries, com 1200h de carga horária;
- Pós-Alfabetização – 5ª a 8ª séries, com 3200h de carga horária.
b) Ensino Médio – com 2400h de carga horária.
5.2.5.2. O currículo da EJA abrange as experiências desenvolvidas nas escolas estaduais
e nos Núcleos de Educação e Cultura Popular de EJA
5.2.5.3. A marcação desses tempos e espaços levará em consideração
- A riqueza das dimensões formadoras da vida adulta em todos os seus domínios:
cultura, trabalho, lazer, religião, valores, etc. e o conhecimento escolar, respeitando os saberes
e a história pessoal e coletiva e a identidade dessa população.
- A distinção entre o tempo da escola e o tempo do/a educando/a, com flexibilidade
responsável.
a) o tempo da escola refere-se ao tempo estabelecido na legislação de EJA, garantindo,
então, uma carga horária de 3200h e de 2400h para o Ensino Fundamental e Médio,
respectivamente. Na alfabetização – 1ª a 4ª séries – o tempo da escola é de 1200h.
O tempo da escola é permeado pelos tempos dos educandos/as, por isso é necessário
garantir momentos permanentes de acesso. A escola organizará mecanismos de avaliação
contínuos, ao longo do desenvolvimento do currículo.
b)o tempo do/a educando/a refere-se ao tempo de aprendizagem, respeitando as
trajetórias de construção de conhecimento. Nesse caso, é possível avanços progressivos em
tempos maiores ou menores em relação ao tempo da escola. A freqüência obrigatória 75%
diz respeito ao tempo do/a educando/a. O tempo do/a educando/a é plural, pois consideramos,
pelo menos, três realidades:
- aqueles/as educandos/as que têm tempo para estar na escola/núcleo;
- aqueles/as educandos/as que têm pouco tempo para estar na escola/núcleo;
- aqueles/as educandos/as que não têm tempo para estar na escola/núcleo e que
buscam, quase sempre, preparação aos Exames Supletivos.
142
5.2.6. Compromisso com a adequação e utilização dos espaços das escolas/núcleos
A EJA ocupará e adequará os espaços pedagógicos e administrativos das escolasa
estaduais e dos Núcleos de educação e Cultura Popular de EJA Biblioteca, Áudio,
Refeitório,...
5.2.7. Compromisso com a recepção qualificada
O Ensino a Distância é uma modalidade alternativa de atendimento na EJA,
especialmente àqueles/as educandos/as que m pouco tempo para o ensino presencial,
entretanto, assegurando a garantia de uma recepção qualificada e acompanhada por
professores/as.
5.2.8. Compromisso com a formação permanente dos segmentos da comunidade escolar
A organização curricular preverá tempos e espaços para a formação inicial e
permanente dos segmentos da comunidade escolar no sentido de qualificar as relações
político-pedagógicas. Para os/as professores/as, a formação pedagógica será semanal.
5.3. Avaliação
Em nossas práticas escolares, denominamos, restritamente, de avaliação a elaboração
de provas e/ou exames, uma vez que essas estratégias são compatíveis com aquilo que é
esperado e exigido pela sociedade competitiva, seletiva e excludente.
Provas e exames implicam exercermos julgamentos, escolhendo o certo e eliminando
o errado, em que o primeiro é declarado com sucesso; o segundo, com fracasso, ambos
conceitos classificatórios, que são reforçados pelo modelo neoliberal.
Os indicadores do sucesso e do fracasso, geralmente caracterizados por objetivos
específicos e mensuráveis, tornam-se parâmetros avaliativos e excludentes, massacrando
inúmeros educandos/as que tentam, incessantemente, cumprir com os procedimentos
planejados pela escola/núcleo.
O número de reprovações e de evasões é crescente, por isso é fundamental nos
questionarmos sobre os motivos do fracasso, sem deixar delevar em consideração que, no
143
processo de avaliação classificatória, os aspectos quantitativos são mais valorizados que os
qualitativos.
A avaliação é, e na maioria dos casos continua a ser, instrumento de poder dosas
professores/as quando decidem sobre os rumos dos/as educandos/as – quando entrar na
escola/núcleo, como ficar na escola/núcleo e a hora de sair da escola/núcleo.
Se, por um lado, é verdade que reorganizar os tempos de ensinar e aprender em EJA é
um desafio, por outro, redimensionar a avaliação passa a ser crucial e estratégico, pois, caso
contrário, todos os ganhos curriculares ocupariam o lugar do senso-comum ou do discurso
simplesmente teórico.
O caráter classificatório às práticas avaliativas não tem como assumir um currículo
que pressuponha as duas dimensões de tempo colocadas no currículo o tempo da escola e o
tempo dos/as educandos/as, por isso, propomos inverter a gica, passando a legitimar a
avaliação emancipatória.
A avaliação emancipatória tem como princípio basilar a construção social do
conhecimento comprometido com a transformação, referenciado, portanto, na realidade
histórica em interação com diferentes saberes, a partir dos seguintes pressupostos.
1 – Formação permanente do educador/a-educando/a- comunidade escolar;
2 - Parecer descritivo do processo ensino e aprendizagem, tanto do educador/a quanto
do/a educando/a;
3 – Auto-avaliação do educador/a-educando/a;
4 – Educadores/as-educandos/as mediadores/construtores do conhecimento;
5 – Educador/a-pesquisador/a;
6 – Educador/a aberto a aprender a aprender e aprender a ensinar;
7 Possibilidades de situar os/as educandos/asa conforme os níveis de conhecimento
em que se encontram;
8 – Valorização do saber popular articulando-a ao saber escolar;
9 – Currículo interdisciplinar e emancipatório;
10 – Abordagem qualitativa na análise da realidade (pesquisa);
11 Perceber as dificuldades, as necessidades, interesses e avanços quanto ao
processo de construção social do conhecimento;
12 Ressignificar as práticas pedagógicas do cotidiano através da reflexão crítica e
permanente da realidade propiciando ao sujeito que se constitua em um cidadão autônomo;
13 – Estar pautada nos princípios políticos pedagógicos da Educação popular.
144
Com base nestes pressupostos, essa
concepção rompe com o paradigma da avaliação
classificatória remetendo-nos a uma avaliação
libertadora, diagnóstica e participativa, cujo
pressuposto é o processo educativo e o sujeito
em sua totalidade, a partir das características a
seguir.
1 É provocadora e faz crítica à
realidade, libertando os sujeitos de idéias pré-
concebidas, reforçadas pelo contexto social em que vivem, sobre o que são ou não capazes de
ser, fazer e aprender.
2 É descritiva e analítica, comprometida com o diálogo que toma como ponto de
partida as experiências dos/as educando/as, no processo ação-reflexão-ação visando à
(re)construção social do conhecimento.
3 É comprometida com o desenvolvimento da autonomia desses sujeitos, através de
estratégias permanentes de participação, tornando-se escritores da própria história e geradores
de suas próprias alternativas de ação.
4 – É diagnóstica e participativa, pois está atenta aos momentos do processo de ensinar
e aprender, constatando dificuldades e avanços para redimensionar as metas da ação
educativa. Esses encaminhamentos são construídos coletivamente, envolvendo a comunidade
escolar.
5 O/a educador/a é pesquisador/a permanante, levantando elementos de
compreensão e análise do contexto sócio-político-educacional.
6 O/a educador/a é mediador/a na articulação entre os saberes vivvidos e os saberes
escolares, reconhecendo a construção do conhecimento independentemente do tempo e da
escola através da garantia de avanços progressivos em relação ao tempo/espaço em que se
encontra. É importante que o/a educador/a seja comprometido/a com o processo, tendo
sensibilidade para compreender que a construção do conhecimento se de forma contínua,
não no tempo da escola, mas no tempo do/a educando/a.
7 É um processo dinâmico, portanto, deve estar aberto a qualquer momento para o
ingresso de novos sujeitos que buscam a socialização, a sistematização dos saberes informais
e a construção de novos saberes.
117
Idem nota 111.
Temática 2 – Diretriz 10
Construção de práticas avaliativas
contínuas, diagnósticas, investigativas,
participativas, democráticas e
emancipatórias, que levem em
consideração o aluno como um todo, as
diferenças individuais e os diferentes
saberes. ( SEE, 2000:36)
117
145
8 – A Avaliação Emancipatória considera novas categorias.
a) AVANÇO E PERMANÊNCIA
O AVANÇO é compreendido a partir da concepção de que o conhecimento é
construído em processo, em que os tempos e espaços de aprender são diferentes entre os/as
educandos/as, podendo, então, na análise da produção escolar, alguns educandos/as
avançarem e outros não.
No caso desses/as educandos/as, considera-se a categoria da PERMANÊNCIA, não
significando, contudo, estagnação no processo de aprendizagem, pois existem avanços
internos àquele tempo/espaço em que se encontram.
Como os avanços variam de sujeito para sujeito inclusive, também, diferentemente
com relação a cada área do conhecimento não existirá data preestabelecida em calendário
para a verificação de aprendizagem.
b) AFASTAMENTO E CANCELAMENTO
A identidade atribuída a EJA, ao longo desse documento, coloca como requisito a
compreensão das dimensões formadoras da vida juvenil e adulta; portanto, não cabe mais
considerarmos a evasão como explicativa dos abandonos da escola.
Se estamos atentos, sabemos que isso surge em função das demandas familiares, do
trabalho, das individualidades/subjetividades, por isso, tomaremos as categorias do
AFASTAMENTO e CANCELAMENTO.
As experiências mostram que, na medida em que há essa compreensão por parte dos/as
educadores/as e educandos/as, os últimos passam a informar a escola sobre os motivos do
afastamento e, na maioria das vezes, retornam; caso contrário, solicitam cancelamento da
matrícula.
Nesse momento, retomemos as duas dimensões do tempo/espaço da EJA tempo da
escola e tempo do/a educando/a, para reafirmar que o percentual de 75% de freqüência
obrigatória recai no tempo do/a educando/a. O mesmo valerá para o atendimento
semipresencial e à distância, ou seja, prevalecerá o tempo do/a educando/a em detrimento do
tempo da escola.
As escolas e os núcleos de educação e cultura popular, dentro da possibilidade de
ensino à distância, poderão oferecer material elaborado com metodologia específica para o
estudo à distância, objetivando a avaliação emancipatória.
Cada componente curricular oportunizará tantas avaliações quantas se fizerem
necessárias, possibilitando o diagnóstico claro dos avanços e obstáculos do/a educando/a e do
educador/a no processo de ensino e aprendizagem.
146
ANEXO IV
TABELA 2979/IBGE Pessoas de 07 anos ou mais de idade por grupos de anos de
estudo e grupos de idade (Unidade da Federação: Rio Grande do Sul)
Tabela 2979 - Pessoas de 7 anos ou mais de idade por g
rupos de anos de estudo e grupos
de idade
Variável = Pessoas de 7 anos ou mais de idade (Pessoas)
Ano = 2000
Unidad
e da
Federa
ção
Grupo
s de
anos
de
estudo
Grupos de idade
10 a
14
anos
15
anos
16 e
17
anos
18 e
19
anos
20 a
24
anos
25 a
29
anos
30 a
34
anos
35 a
39
anos
40 a
49
anos
50 a
59
anos
60 a
69
anos
70
anos
ou
mais
Rio
Grand
e do
Sul
Sem
instru
ção e
menos
de 1
ano
17.54
2
2.89
7
4.857
5.091
15.22
2
16.46
3
20.70
9
22.66
9
60.07
8
88.55
1
100.0
01
115.5
05
1 a 3
anos
247.7
57
7.04
2
13.72
7
14.11
3
44.74
5
52.90
5
65.10
7
71.97
3
176.8
68
188.8
64
156.4
62
119.5
24
4 a 7
anos
616.0
39
96.0
86
142.0
22
109.8
64
266.8
13
286.6
71
310.1
89
328.0
76
573.5
68
377.6
74
235.8
37
164.5
54
8 a 10
anos
27.39
9
77.0
61
210.9
60
143.1
67
200.3
82
149.8
02
148.2
53
147.5
17
203.6
77
92.23
7
41.87
6
28.07
3
11 a
14
anos
- -
16.38
5
112.0
80
297.9
24
202.7
52
174.6
08
166.8
23
221.2
56
94.63
2
37.83
8
21.30
3
Fonte: www.ibge.gov.br/SIDRA em 21/02/2007.
147
ANEXO V
RELAÇÃO DOS NÚCLEOS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS E DE CULTURA POPULAR (NEEJACPS) DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL – CRIAÇÃO
NEEJACP Coord. Reg. de
Educação (CRE) -
localidade
Decreto/Portaria
Data de Criação
01 Paulo Freire 1ª - Porto Alegre
Porto Alegre
Port. Nº 00012
15/01/2002
02 De Santo Ângelo 14ª - Santo Ângelo
Santo Ângelo
Port. Nº 00013
15/01/2002
03 Rio Grande 18ª - Rio Grande
Rio Grande
Port. Nº 00023
22/01/2002
04 Ensinando e
Aprendendo
20ª -Palmeira das
Missões
Palmeira das Missões
Nº 41591 -
10/05/2002
05 Érico Veríssimo 9ª - Cruz Alta
Cruz Alta
Port. Nº 00032
25/01/2002
06 De Caxias do Sul 4ª - Caxias do Sul
Caxias do Sul
07 Menino Deus 1ª - Porto Alegre
Porto Alegre
Port. Nº 00034
29/01/2002
08 Paulo Freire 32ª - São Luiz Gonzaga
São Luiz Gonzaga
Dec.Nº 41592 –
10/05/2002
09 Paulo Freire 24ª - Cachoeira do Sul
Cachoeira do Sul
Dec.Nº 41626 –
22/05/2002
10 Aprendendo a
Aprender
20ª -Palmeira das
Missões
Frederico Westphalen
Dec.Nº 41627 –
22/05/2002
11 Paulo Freire 17ª - Santa Rosa
Santa Rosa
Dec.Nº 41629 –
24/05/2002
12 Paulo Freire 17ª - Santa Rosa
Três de Maio
Dec.Nº 41630 –
24/05/2002
13 De Ijuí 36ª - Ijuí
Ijuí
Dec.Nº 41631 –
24/05/2002
14 Paulo Freire 23ª - Vacaria
Vacaria
Dec.Nº 41632 –
24/05/2002
15 Paulo Freire 17ª – Santa Rosa
Santo Cristo
Dec.Nº 41633 –
24/05/2002
16 Felipe Roberto
Sehn
39ª - Carazinho
Carazinho
Dec.Nº 41634 –
24/05/2002
17 De Bento
Gonçalves
16ª - Bento Gonçalves
Bento Gonçalves
Dec.Nº 41635 –
24/05/2002
18 De Lajeado 3ª - Estrela Dec.Nº 41636 –
148
Lajeado 24/05/2002
19 De Pelotas 5ª - Pelotas
Pelotas
Dec.Nº 41637 –
24/05/2002
20 De Santa Maria 8ª - Santa Maria
Santa Maria
Dec.Nº 41638 –
24/05/2002
21 Rizoma 11ª- Osório
Santo Antônio da
Patrulha
Dec.Nº 41658 –
04/06/2002
PRESÍDIOS E/OU
PENITENCIÁRIAS
22 Alaor Antônio
Terra
- Central de Porto
Alegre
Dec.Nº 41649
28/05/2002
23 Julieta V Balestro -Regional de Passo
Fundo
24 Julieta V Balestro -Regional de Santa
Maria
25 Julieta V Balestro 12ª- Estadual do Jacuí
Charqueadas
26 Julieta V Balestro 13ª - Regional de Bagé
27 Admar B
Rodrigues
16ª -Estadual de Bento
Gonçalves
28 Paulo Freire 17ª - Estadual de Santa
Rosa
29 Josino dos Santos
Lima
- Estadual de Cruz
Alta
Dec.Nº 41659 –
04/06/2002
30 De Caxias do Sul - Industrial de Caxias
do Sul
Dec.Nº 41918 –
31/10/2002
31 Promotor Jorge V
Pacheco
32ª - Estadual de São
Luiz Gonzaga
Dec.Nº 41919 –
31/10/2002
32 Julieta V Balestro 24ª - Estadual de
Cachoeira do Sul
Dec.Nº 41880 –
11/10/2002
149
ANEXO VI
Levantamento em Fichas de Inscrição/Matrícula no NEEJACP – Anos 2001, 2002, 2003 e 2004
Examinando as fichas nos detivemos nas questões “Que motivos o levaram a matricular-se no Núcleo?” e “Por que procurou o Núcleo de EJA e Cultura Popular?
Expectativas/Motivos Faixa Etária(anos)
63 25 31 36 34 20 38 16 27 43 48 52
Tempo fora da Esc.(anos)
11 03 32 06 18 14 24 43 NC R
Egres. de EJAs
N Mun Int ES Part
Mercado deTrab. Emp Des Aut
N/C
Gênero
Fem Masc.
Ensino
Fund. Méd.
Completar os estudos
00 05 09 01 03 13 04 05 02 05 02 01 01 04 00 03 04 02 02 01 09 11 11 00 03 01 03 18 08 04 17 27 20 13 35
Obter mais conhecimentos
01 00 02 02 01 01 00 00 02 00 01 00 02 01 00 00 00 00 00 00 05 01 04 00 01 01 00 06 02 01 02 07 04 04 07
Recomeçar
00 04 01 01 01 00 00 00 00 01 00 00 02 00 00 00 00 01 01 00 06 03 02 00 00 00 00 06 02 02 00 07 03 06 04
Concluir rapidamen
te a Educ.Bás.
00 04 05 01 00 07 02 03 03 01 00 00 02 05 00 02 01 04 00 00 05 05 03 00 00 03 00 09 04 02 09 20 06 07 19
Recuperar o tempo perdido
00 00 00 01 00 01 00 03 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 06 04 00 00 00 01 00 00 01 00 06 02 04 04 02
Ingressar em Curso Profis. ou Superior 00 02 02 02 00 04 00 00 01 01 00 00 01 00 00 00 00 01 00 00 04 03 03 02 00 00 00 09 00 01 04 10 02 03 10
Próprio para adultos
00 01 02 00 00 00 00 00 01 00 01 00 00 00 00 01 01 00 00 00 06 00 02 00 00 00 00 03 00 01 00 04 01 04 00
Ótima forma de ensino
00 02 02 00 00 02 01 00 02 00 00 00 01 02 00 00 00 01 00 00 05 03 03 00 01 00 00 06 03 01 01 05 05 05 05
É mais fácil
00 01 01 00 00 05 01 01 00 00 00 00 01 02 00 02 00 01 00 00 08 00 01 00 00 00 00 05 02 01 01 03 06 09 01
Ascender profissionalmente
00 01 03 00 00 00 02 00 00 01 00 00 00 00 00 01 00 00 01 00 07 00 02 00 01 00 00 04 00 00 03 04 03 02 05
Conseguir emprego
00 00 02 00 01 02 00 02 02 01 00 00 00 00 00 00 02 00 00 00 05 03 01 00 00 00 00 04 01 02 03 09 02 03 07
Socialização e convivência
00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 01 00 00 02 00 01
Economia
00 00 00 01 01 01 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 01 00 00 00 05 01 00 01 00 01 00 03 00 00 01 02 02 01 03
Turno(s) oferecidos(s)
00 02 02 00 00 02 00 03 00 00 02 01 02 01 01 00 01 00 00 00 05 02 01 01 00 01 00 05 01 00 07 04 07 06 05
Auxiliar filhos(as)
00 00 00 00 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00
Garantir o futuro
00 00 00 00 02 00 00 01 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 06 01 00 01 00 00 00 02 00 01 02 02 02 02 02
Ter mais oportunidades
00 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 01 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00
TOTAIS 01 20 33 09 10 41 10 18 13 10 07 03 12 15 01 06 06 11 04 01 82 37 34 05 06 08 03 80 24 16 55 106 69 69 106
Expectativas/Motivos Faixa Etária(anos)
63 25 31 36 34 20 38 16 27 43 48 52
Tempo fora da Esc.(anos)
11 03 32 06 18 14 24 43 NC S
Egres. de EJAs
N Mun Int ES Part
Mercado deTrab.
Emp Des Aut
N/C
Gênero
Fem Masc.
Ensino
Fund. Méd.
Totais Gerais 175 175 56 175 175 175
OBSERVAÇÕES:
a)Na coluna “Egressos/as de Educação de Jovens e Adultos” anotamos
N – para NOES e/ou NEEJACP ES – para Exames Supletivos
Mun – para rede Municipal Part – para rede particular
Int – para Programa Integrar
b) Na coluna “Mercado de Trabalho” anotamos as alternativas :
Emp - para Empregado/a
Des - para desempregado/a
Aut - para Trabalhadores/as Autônomos/as
N/C - para não consta na ficha
c) Na coluna “Tempo fora da Escola” utilizamos, além do número de anos :
NC – para não consta na ficha
R – para egresso/a recente do ensino regular (completou a idade mínima exigida
150
ANEXO VII
Modelos de Fichas de Inscrição/Matrícula do NEEJACP/Ijuí utilizadas de 2001-04
A) Ano de 2001
FICHA DE LEVANTAMANTO DE DADOS DOS ALUNOS
1. NOME DO ALUNO(A): ____________________________________________________
2. IDADE: ________________ TELEFONE: _____________________________________
3.SEXO: ( )MASCULINO ( )FEMININO
4.RUA: ________________________________ Nº: ___________ BAIRRO: ____________
5.UTILIZA TRANSPORTE COLETIVO? ( )SIM ( )NÃO
6. QUAL A LINHA? ________________________________________________________
7. ESCOLARIDADE: (Marque com X as séries que você já cursou)
FUNDAMENTAL: ( ) 1ª Série ( )2ª Série ( )3ª Série ( ) 4ª Série
( ) 5ª Série ( )6ª Série ( )7ª Série ( ) 8ª Série
ENSINO MÉDIO: ( ) 1ª Série ( )2ª Série ( )3ª Série
8- No ano letivo de 2002:
( ) fui aluno do EJA na Totalidade ______ Turno ______
( ) estudei na escola regular – Série _____
( ) participei das turmas especiais na escola ______________________________________
9- Em 2003 ainda falta eliminar a(s) disciplina(s): (ENSINO MÉDIO)
( ) português ( )matemática ( )história ( )química ( )literatura
( )línguas ( )física ( )geografia ( )biologia
10- Qual o turno que pretende estudar? ( )tarde ( )noite
11- Em 2003 ainda falta eliminar a(s) disciplina(s): (ENSINO FUNDAMENTAL)
( ) português ( )matemática ( )história ( )ciências ( )geografia
( )línguas ( )educação artística
12- Qual o turno que pretende estudar? ( )tarde ( )noite
13- Você está empregado? ( )sim ( )não
14- Que profissão exerce? ___________________________________________
151
15- Que motivos o levaram a matricular-se no
Núcleo?____________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
______________________________________________________________________
16 – Para este ano o que você espera:
a- desta Escola__________________________________________________
b- deste ano letivo_____________________________________________
17- Sugira algum(s) assunto(s) que poderão ser trabalhados durante o ano letivo de
2003.
18- Sugestões: use o verso.
B) Ano de 2002 e 2003
NÚCLEO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E DE CULTURA
POPULAR - FICHA DO EDUCANDO (2002/2003)
DADOS PESSOAIS
DATA DA INSCRIÇÃO: _____________________
NOME:_____________________________________________________________________
ENDEREÇO RESIDENCIAL: _________________________________________________
LOCALIDADE: _______________________________________ CEP: _________________
TELEFONE: _______________ DATA DE NASCIMENTO: _________________________
CARTEIRA DE IDENTIDADE: _______________________ CPF: ____________________
FILIAÇÃO: _________________________________________________________________
DADOS PROFISSIONAIS:
FUNÇÃO:__________________________________ TEMPO DE SERVIÇO: ____________
ENDEREÇO PROFISSIONAL: _________________________________________________
TELEFONE: __________________________
DESEMPREGADO? ______________________ HÁ QUANTO TEMPO? ______________
OBSERVAÇÕES:____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
____
152
DADOS ESCOLARES:
- ÚLTIMO ANO QUE ESTUDOU: ____________________________ SÉRIE: __________
- ESCOLA: ________________________________________________________________
-LOCALIDADE: ____________________________________________________________
- JÁ REPROVOU? ( ) SIM ( )NÃO EM QUE SÉRIE? ______________________
- DISCILINA REPROVADA? __________________________________________________
- PORQUE PROCUROU O NÚCLEO DE EJA E CULTURA POPULAR?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
- NÍVEL DE ENSINO QUE FREQUENTARÁ?
( ) SÉRIES INICIAIS (1ª a 4ª)
( )SÉRIES FINAIS – ENSINO FUNDAMENTAL
DISCIPLINAS:
__________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
( )ENSINO MÉDIO
DISCIPLINAS:
___________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
C) Ano de 2003 e 2004
NÚCLEO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E DE
CULTURA POPULAR - FICHA DE MATRÍCULA
DADOS PESSOAIS
NOME:____________________________________________________________________
PAI: _______________________________________________________________________
MÃE:______________________________________________________________________
DATA DE NASCIMENTO: _________________________ NATURAL DE: ____________
ENDEREÇO RESIDENCIAL: __________________________________________________
BAIRRO: _______________________ CIDADE: ___________________ CEP: __________
153
TELEFONE:____________________ CARTEIRA DE IDENTIDADE:_________________
DADOS ESCOLARES:
- ÚLTIMO ANO QUE ESTUDOU: ____________________________ SÉRIE: __________
- ESCOLA: _________________________________________________________________
-LOCALIDADE: ____________________________________________________________
- JÁ REPROVOU? ( ) SIM ( )NÃO EM QUE SÉRIE? ______________________
- DISCILINA REPROVADA? __________________________________________________
- PORQUE PROCUROU O NÚCLEO DE EJA E CULTURA POPULAR?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
MODALIDADE
ENS. FUND. SÉRIES INICIAIS T1 ( ) ( )TARDE ( )NOITE
ENS. FUND. SÉRIES FINAIS T2 ( ) T3 ( ) T4 ( ) T5 ( ) ( )TARDE ( )NOITE
ENS. MÉDIO T6 ( ) T7 ( ) T8 ( ) ( )TARDE ( )NOITE
Por disciplina:_______________________________________________________________
Em: ___________________ Promovido para _______________ Ass: _________________
Em: ___________________ Promovido para _______________ Ass: _________________
Em: ___________________ Promovido para _______________ Ass: _________________
Em: ___________________ Promovido para _______________ Ass: _________________
Em: ___________________ Promovido para _______________ Ass: _________________
Em: __________________ Promovido para _______________ Ass: __________________
CONCLUIU EM: ______________________
TERMO DE COMPROMISSO
Solicitada a matrícula do educando(a) citado, na Modalidade e Totalidade expressa,
assumo a responsabilidade pelas informações prestadas nesta ficha e declaro aceitar as normas
disciplinares o Regimento deste estabelecimento.
154
Ijuí, ________________________.
_____________________________________
Ass. Educando ou Resp.
_____________________________________
Ass. Resp. matrícula
155
ANEXO VIII
Modelos de Fichas de Avaliação e Auto-Avaliação do NEEJACP/Ijuí
A) Em 2003
NÚCLEO DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E CULTURA
POPULAR - NEJA -
AUTO-AVALIAÇÃO
Educando: __________________________________________________________
Totalidade:______________________ Turno: ___________________
Participação____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_________________________________________________________________
Aprendizagem (o que aprendeu, o que você não aprendeu, dificuldades encontradas)
_____________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________
Relacionamento com colegas e professores
_____________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
Cumprimento com os compromissos:
grupo de trabalho_______________________________________________________
___________________________________________________________________________
_________________________________________________________________
#responsabilidade_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________
156
#disponibilidade______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________
Sugestões
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
__________________________________________________
B) Em 2004
NÚCLEO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E DE CULTURA
POPULAR DE IJUÍ – NEEJACP
AVALIAÇÃO E AUTO-AVALIAÇÃO (2004)
Educando (a): _____________________________________________________________
Grupo de Aprendizagem: _________ Totalidade: ________
Estamos hoje parando para pensar e sistematizar/escrever sobre o seu e o nosso
processo de educação no NEEJACP e, em como ele se aglutina no processo maior de
aprender ao longo da vida.
1. Como você se auto-avalia quanto:
a) à freqüência, participação ao envolvimento e realização das atividades e trabalhos
solicitados
_________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_________________________________________________________________
157
c)a aprendizagem individual (facilidades e dificuldades, se possível com justificativas) e a
contribuição para a aprendizagem coletiva, no grupo
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
________________
2. Como você avalia a turma como um todo, enquanto coletivo de aula (dificuldades,
limites, crescimento, potencialidades, destaques...)______________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_______
3.Como avalias a atuação do NEEJACP, como um todo, frente as suas expectativas e a
realidade (equipe diretiva, educadores que atuam na turma, proposta,...). Aponte sugestões.
_____________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
________________________________________________________
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo