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repressão e moralismo que sufocou as iniciativas que estavam se desenvolvendo. Entre 1964 e
1979
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, peças de teatro, filmes, músicas e livros foram objetos de censura e de mutilação,
debates universitários sobre a realidade brasileira tornaram-se “atos de subversão” e atitudes
consideradas como subversivas foram associados à imoralidade, ampliando o discurso da
ditadura para muito além dos aspectos políticos e econômicos ao incluir os comportamentos
dos indivíduos (COLLING, 1997). Ao descer a cortina da ditadura decretou-se informalmente
uma pausa na defesa da escola como educadora sexual, pois o país tinha outras questões a
resolver.
De uma forma semelhante ao processo de abertura política e redemocratização
vivenciado pelo Brasil a partir do governo Ernesto Geisel (março de 1974 a março de 1979) –
lento, gradual e seguro, conforme as declarações do presidente militar –, a sociedade
recomeçou a discutir questões sexuais através de revistas, livros e programas de televisão
6
. A
abertura política e a influência da mídia possibilitaram maior visibilidade às posturas que
defendiam a escola como espaço ideal para a educação sexual. O enfrentamento ao discurso
religioso e sua “reserva de mercado” para a família passou a tomar formato mais veemente,
conseguindo silenciar antes do final do século XX os discursos em contrário. A escola agora
vai ser nomeada como o lugar onde se discute conhecimento, se produz o diálogo e a reflexão,
ou seja, “um espaço privilegiado para discutir a sexualidade com crianças e adolescentes”
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Durante a ditadura militar (1964 – 1985) ocorreu um processo conhecido como abertura política, através do
qual o país retomou o caminho da democratização, com início em 1974 e seu ponto forte em 1979, quando foi
decretada a anistia (Fonte: Wikipédia).
6
Duas publicações de grande circulação nacional que começaram a abordar temas sexuais de uma forma
considerada “profissional e científica” foram as revistas Nova e Cláudia, ambas da Editora Abril. A revista Nova
foi lançada em setembro de 1973 e seu público alvo era mulheres solteiras das classes média e alta suscetíveis a
um novo discurso sobre o papel da mulher na sociedade. Com uma linha editorial inovadora a revista abordou
questões sexuais de forma objetiva, sugerindo às suas leitoras condutas consideradas adequadas para um
primeiro encontro e durante o namoro, além de técnicas para incrementar o relacionamento. A revista Cláudia é
direcionada à mulher mais madura e casada, mas também inovou em publicar em sua seção de cartas respostas às
duvidas de suas leitoras sobre questões sexuais.
Em 1978 foi publicado no Brasil o livro O relatório Hite, de Shere Hite (HITE, Shere. O relatório Hite – um
profundo estudo sobre a sexualidade feminina. 10ª ed. São Paulo: DIFEL. 1980) o qual aborda a sexualidade sob
o ponto de vista feminino a partir de entrevista com 3.000 mulheres norte-americanas entre 14 e 78 anos e
discute temas como masturbação, orgasmo e estimulação do clitóris.
Em 1979 a Rede Globo iniciou a produção do seriado Malu Mulher, veiculado semanalmente entre maio de 1979
e dezembro de 1980. Interpretada pela atriz Regina Duarte, Malu era uma socióloga separada do marido que
reconstituiu sua vida e criou sua filha adolescente. Este perfil abalou o conceito social ainda prevalente na época
de que mulheres separadas eram as culpadas pelo fim do casamento e discriminadas pela sociedade (muitos
vizinhos proibiam seus filhos de brincarem com os “daquela mulher deixada pelo marido”). O seriado, mesmo
com algumas dificuldades com a censura, foi ousado em abordar temas como aborto, pílula anticoncepcional,
virgindade e as dificuldades enfrentadas pelas mulheres brasileiras.
Outro marco importante na retomada de temas sexuais na imprensa foi o quadro Conversando sobre sexo do
programa matinal da Rede Globo TV Mulher, levado ao ar entre 1980 e 1986, no qual Marta Suplicy respondia
cartas de telespectadores de todas as idades com perguntas sobre sexo.