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NIVERSIDADE
R
EGIONAL DO
N
OROESTE DO
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STADO DO
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RANDE DO
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ABRÍCIO
D
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ARTINS
C
URRÍCULO DE
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA
:
REFLEXÕES EM TORNO DE UMA EXPERIÊNCIA
Ijuí
2008
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ABRÍCIO
D
ÖRING
M
ARTINS
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URRÍCULO DE
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA
:
REFLEXÕES EM TORNO DE UMA EXPERIÊNCIA
Dissertação de Mestrado em Educação nas Ciências
Para a obtenção do título de Mestre em Educação
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
Programa de Pós-graduação em Educação nas Ciências
Orientador: Paulo Evaldo Fensterseifer
Ijuí
2008
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À Sofia e Lucimara,
luz e inspiração.
À minha família
pelo amor, carinho e
estímulo que me oferecem,
dedico-lhes essa conquista como
gratidão.
Agradeço, especialmente, aos meus alunos e alunas,
Adriana, Aline, Analise, Anelise, Elias, Fernando,
Franciele M., Franciele R., Franciele D., Graziele, Iara,
Jean, Leonilda, Luciana, Márcio, Marcos, Odirlei, Renan, Sônia,
Taciara, Tiago, Valéria, Adriana H., Angélica, César, Cláudia,
Edevaldo, Elaine, Francieli, Graciele, Jéssica, Lucas, Márcio,
Odair, Patrícia L., Patrícia O., Renan, Sílvia, Adriane, Andressa,
Cláudia, Daiane, Ederson, Giovano, Juliano, Lucian,
Marcelo, Margarete, Marta, Mirian, Rangel, Roseli, Tuani,
Alessandro, Daiana, Daiane, Joicieli, José, Leandro, Lídia,
Marcos, Michele, Régis, Rogério A., Rogério F., Silvana,
Ana R., Ana A., Andressa, Angélica, Camila, Cristian, Cristiane,
Daniele, Guilherme S., Guilherme H., Jamile, Lara, Lucas, Maicon,
Marcos L., Marcos S., Marinês, Nicolas, Régis, Simone, Taísa
Taíse, Tiago M. e Valéria
pois sem eles esse trabalho não seria possível.
“Existem dois tipos de jogos.
Um poderia ser chamado de Finito e o outro de Infinito.
O jogo Finito é jogado com o objetivo de vencer,
e o jogo Infinito tem o propósito de continuar jogando.
As regras do jogo Finito não podem ser mudadas,
enquanto que no jogo Infinito,
elas são dinamicamente transformadas.
Jogadores Finitos jogam dentro dos limites,
e os jogadores Infinitos transcendem as fronteiras.
O jogador Finito joga para alcançar a vida eterna,
e o jogador Infinito, joga para nascer eternamente “.
James P. Carse
RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de abordar o currículo de Educação Física em uma escola
pública estadual, do município de Ijuí (RS), bem como o de realizar reflexões em torno dessa
experiência. A análise desse processo é pautada pelos entendimentos acerca da cultura
corporal de movimento e suas relações com a Educação Física, a abordagem dos propósitos
da Educação Física escolar, o desenvolvimento da concepção de currículo, bem como o
conhecimento sobre os conteúdos de ensino vinculados à Educação Física, no primeiro
capítulo. O segundo capítulo recupera minha história profissional, balizada por um processo
de análise crítica, enquanto professor “pesquisador” com o auge no desenvolvimento do meu
trabalho de especialização em Educação Física escolar. O terceiro capítulo está centrado na
descrição detalhada da “segunda etapa” de minha vida profissional, quando começo a
desenvolver o programa curricular de Educação Física, em uma das escolas em que trabalhei.
Nessa descrição, poderão ser encontrados muitos detalhes de meu trabalho, exemplificados
em forma de planos de aula, fotos, trabalhos escritos, por parte dos alunos, quadros
comparativos e algumas formas de avaliação utilizadas durante as aulas, que foram
desenvolvidas com alunos dos quatro últimos anos do Ensino Fundamental e registradas a
partir de alguns elementos, tais como: meu diário com os planos de aulas, registros
fotográficos, alguns de seus cadernos e os materiais citados, confeccionados pelos alunos.
Ainda nesse capítulo, são realizadas algumas análises de alguns dilemas que surgiram durante
as aulas, nesse constante processo de enfrentamento com os alunos, que são: a hegemonia do
futebol, as implicações da formação do professor nas aulas de Educação Física, a “falta” de
materiais para as aulas e, também, as motivações para manter esse trabalho. Por fim, nas
considerações finais é realizada uma reflexão a respeito da atuação docente e quanto ao
entendimento do exercício concreto da Educação Física na Educação Básica, além das
possibilidades e limitações encontradas no desenvolvimento desse processo teórico-prático de
efetivação das aulas.
Palavras-chave: Educação Física escolar; cultura corporal de movimento; currículo;
conteúdos.
A
BSTRACT
The present work has as objective to approach the curriculum of Physical Education in a
public school of Ijuí (RS), as well as making some reflections about this experience. The
analysis of this process is guided by the comprehension about the corporal culture of motion
and its relations with the Physical Education, the approach of the purposes of the Physical
Education in the school, the development of the concept of curriculum, as well as the
knowledge about the contents of teaching linked to the Physical Education, in the first
chapter. The second chapter brings my professional history, conducted by a process of critic
analysis as a “researcher-teacher” with the climax in the development of my specialization
work in Physical Education in Schools. The third chapter is focused on the detailed
description of the “second stage” of my professional life, when I start to develop a curricular
program of Physical Education in one of the schools where I work. In this description, it is
possible to find many details of my work, such as lesson plans, pictures, written works
produced by the students, comparative charts and some ways of assessment used during my
classes, which were developed with students from the last four years of the elementary school
and registered from some elements such as my class diary with the lesson plans, photographic
registers, some of my notebooks and the previously mentioned materials done by the students.
In this same chapter, it is carried out an analysis of some dilemmas that appeared during the
classes, in this constant process of “confrontation” with the students, namely: the dominance
of soccer, the implications of the education of the teacher in the Physical Education classes,
the “lack” of materials for the classes and, also, to motivations to keep this job. To conclude,
in the final considerations, it is presented a reflection about the teacher practice regarding the
understanding of the concrete work of the Physical Education in the Elementary School, and
the possibilities and limitations found in the development of this theoretical-practical process
of rendering the classes.
Key words: Physical Education in the school; corporal culture of motion; curriculum;
contents.
L
ISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Página do caderno de uma aluna da oitava série, contendo os eixos do
Programa Curricular da disciplina de Educação Física, a quantidade
aproximada de cada unidade didática e a ordem de abordagem dos
conteúdos.................................................................................................45
Figura 2 Alunos da turma da quinta série, com os materiais para as aulas sobre o
“Jogo de Taco”.........................................................................................48
Figura 3 Vista parcial da quadra da escola, com dois grupos praticando o jogo de
“Taco Gigante”. Cada grupo composto por oito alunos..........................49
Figura 4 Vista parcial do “campinho”, com um grupo praticando o jogo de “Taco
Gigante”...................................................................................................49
Figura 5 Palestra sobre aspectos da cultura gaúcha, ministrada pelo professor de
dança do CTG Clube Farroupilha de Ijuí/RS, para todos alunos de quinta
à oitava séries...........................................................................................51
Figura 6 Início da aula prática para toda turma da quinta série e para alunos
interessados, de sexta até oitava séries....................................................51
Figura 7 – Prática da coreografia oficial do “Maçanico”.........................................52
Figuras 8 e 9 Apresentação da recriação da dança do “Maçanico”. Cada grupo
com a sua coreografia..............................................................................52
Figuras 10, 11, 12, 13, 14 e 15 Páginas de trabalhos de alunos com a
sistematização das regras criadas nas aulas que tematizaram o
Judô......................................................................................54, 55, 56 e 57
Figura 16 Um dos grupos ajustando as regras de uma das “provas” de atletismo
que criaram..............................................................................................59
Figura 17 Outro grupo confeccionando materiais para serem utilizados na “prova”
que foi criada...........................................................................................59
Figuras 18 e 19 Páginas do trabalho com as regras e um desenho sobre a “corrida
com obstáculos” que o grupo conseguiu criar.........................................60
Figuras 20, 21 e 22 – Páginas do trabalho com regras e desenhos sobre a “corrida de
revezamento” criada pelo grupo......................................................60 e 61
Figura 23 – Aluna executando uma tentativa do “salto com vara”...........................62
Figura 24 – Registro de uma parte da “prova” da “corrida de revezamento”, criada e
adaptada pelo grupo. Fonte: acervo particular.........................................63
Figura 25 Turma da sétima série com os tacos e as bolinhas para prática das
aulas.........................................................................................................64
Figura 26 Um dos grupos praticando, criando e ajustando as regras do seu jogo,
no espaço do “campinho”........................................................................65
Figuras 27 e 28 Registros de momentos das práticas dos jogos criados pelos
grupos. Fonte:acervo particular...............................................................65
Figura 29 – Maquetes dos quatro espaços para as práticas do “Nosso Golfe”........66
Figuras 30, 31, 32 e 33 Trabalho final do grupo responsável pelas regras básicas
do “nosso golfe”.........................................................................67, 68 e 69
Figura 34 – Registro do desenvolvimento da técnica de condução da bolinha........70
Figura 35 Vista parcial da quadra da escola, com um dos grupos praticando e
organizando seu jogo, com elementos do hóquei....................................71
Figura 36 Vista parcial da quadra da escola, com o outro grupo praticando e
organizando seu jogo com elementos do hóquei.....................................71
Figura 37 Turma da oitava série com os materiais para as aulas de ginástica:
trampolim (confeccionado pela turma),colchão e colchonetes................73
Figuras 38 e 39 Alunos executando alguns movimentos básicos da ginástica:
rolinho de costas e “salto livre sobre o cano”..........................................73
Figura 40 Registro de parte da seqüência de movimentos elaborada e apresentada
por uma aluna, para toda turma...............................................................74
Figuras 41 e 42 Registro de ginas do trabalho da manifestação do “Esporte
Educação”........................................................................................75 e 76
Figura 43 Registro do quadro comparativo entre as manifestações do esporte,
pautado pelos seguintes aspectos: idéias principais, participantes, regras,
espaço de jogo e atitudes mais significativas...........................................77
L
ISTA DE QUADROS
Quadro 1 Distribuição dos conteúdos das turmas e a ordem de abordagem dos
mesmos......................................................................................................................................38
Quadro 2 – Proposta de conteúdos para a Educação Física escolar........................................43
S
UMÁRIO
I
NTRODUÇÃO
13
1. E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA E
C
ULTURA
C
ORPORAL DE
M
OVIMENTO
15
1.1. O
S PROPÓSITOS DA
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA
E
SCOLAR
18
1.2.
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA E
C
URRÍCULO
23
1.3. E
DUCAÇÃO FÍSICA E
C
ONTEÚDOS
27
2.
M
INHA PRIMEIRA FASE PROFISSIONAL
:
A
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA NA PERSPECTIVA DO
PLANEJAMENTO PARTICIPATIVO
33
2.1. O
P
LANEJAMENTO E SUA NEGOCIAÇÃO
35
2.2.
A
LGUMAS LINHAS E ESTRATÉGIAS SOBRE SUA IMPLEMENTAÇÃO
36
2.2.1. Abordagem inicial – Planejamento Participativo nas aulas 36
2.2.2. Explicação das dimensões da Educação Física 36
2.2.3. Citação das atividades 37
2.2.4. As possibilidades de escolha 37
2.2.5. O momento mais esperado: a escolha! 38
2.2.6. Definição dos períodos 39
2.3. L
IMITAÇÕES PARA A CONTINUIDADE DO TRABALHO
39
3.
A
S
EGUNDA FASE DE MINHA VIDA PROFISSIONAL E A TEMATIZAÇÃO
DE CONTEÚDOS
41
3.1. E
XPLANAÇÃO DE ALGUNS CONCEITOS DO QUADRO DE CONTEÚDOS
44
3.2. P
ROCESSO DE ESCOLHA E SEQÜÊNCIA DE ABORDAGEM DOS CONTEÚDOS
45
3.3. U
NIDADES DE TRABALHO
46
3.3.1. O Jogo de Taco 47
3.3.2. A Dança 50
3.3.3. O Judô 53
3.3.4. O Atletismo 57
3.3.5. O Golfe 63
3.3.6. O Hóquei 69
3.3.7. A Ginástica Olímpica 72
3.3.8. As Manifestações do Esporte 74
3.4. D
ILEMAS
78
3.4.1.Hegemonia do futebol
78
3.4.2.
Implicações da formação do professor nas aulas
de Educação Física
80
3.4.3.
A “Falta de Materiais” nas aulas de Educação Física
81
3.4.4.
Motivações para manter o trabalho – estar sozinho...
83
C
ONSIDERAÇÕES
(
FINAIS
)
ACERCA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA
87
O
BRAS CONSULTADAS
90
I
NTRODUÇÃO
Este trabalho de pesquisa tem o propósito de realizar reflexões em torno de uma
experiência com um currículo de Educação Física, em uma escola pública estadual de ensino
fundamental do interior do município de Ijuí (RS). As aulas foram desenvolvidas com alunos
dos quatro últimos anos do ensino fundamental e registradas a partir de alguns elementos, tais
como: meu diário com os planos das aulas, registros fotográficos, materiais confeccionados
pelos alunos, como “provas”, trabalhos, quadros de sistematização e alguns de seus cadernos.
Compreendendo a Educação Física enquanto componente curricular, que compõe o
contexto escolar, e este desempenhando a função principal de proporcionar aos alunos a
apropriação de conhecimentos e que possui caráter pedagógico, a minha intervenção na escola
é sustentada a partir do entendimento dessa disciplina escolar enquanto processo, pautado
pelas relações estabelecidas com as concepções de cultura corporal de movimento, currículo
escolar e conteúdos de ensino.
A partir da análise e teorização desse processo, pretende-se sistematizar alguns
elementos capazes de mostrar as limitações e/ou possibilidades dessa perspectiva de trabalho
com a Educação Física escolar, desenvolvido na Escola Estadual Fundamental 24 de
Fevereiro, no Distrito de Chorão, interior de Ijuí, nos anos de 2001, 2002 e 2003.
1
Essa
escola possuía, na época, em torno de 150 alunos, provindos dos arredores do distrito. Alguns
alunos moravam na própria localidade, outros deslocavam-se de transporte escolar por até
treze quilômetros. Esse distrito, tal como a maioria das localidades do interior de Ijuí, possui
1
Atualmente atuo como professor de Educação Física na Escola Estadual de Ensino Fundamental 6 de Agosto,
em Esquina Irgang, Linha 6 Norte. É uma escola do interior, pertencente à rede pública estadual de ensino,
também localizada no município de Ijuí (RS).
apenas a escola, juntamente com uma ou mais igrejas com seus salões paroquiais, como seus
principais segmentos sociais.
O Distrito de Chorão localiza-se distante dez quilômetros da cidade, na direção norte.
É banhado pelo Arroio Azul e fica muito próximo do Rio Ijuí. Possui aproximadamente
trezentos moradores na localidade, que tem em sua estrutura, a escola, duas igrejas, uma
rodoviária, uma ervateira, um mercado, um viveiro de mudas de flores, uma pequena fábrica
de panelas, um campo de futebol, balneários, borracharias e alguns bares.
As famílias dos alunos podem ser consideradas de pequenos e médios agricultores que
vivem da agricultura familiar, do gado leiteiro, produção hortifrutigranjeira e da produção de
grãos, tais como soja, milho e trigo.
O principal propósito dessa pesquisa é a tentativa de sistematização de todo o trabalho
de um professor de Educação Física que tem no seu dia-a-dia escolar todo o cenário e
elementos significativos para a constituição dessa escrita, a qual torna-se necessária a partir
do momento em que percebo a quantidade considerável de registros de alguns momentos
importantes da vida escolar desses alunos, oportunizados pelos encontros nas aulas de
Educação Física.
O trabalho é desenvolvido em três capítulos. No primeiro, procuro tematizar aspectos
centrais de minha “prática”, tais como o entendimento da relação entre a Educação Física e a
cultura corporal de movimento, a abordagem dos propósitos da Educação Física escolar, o
desenvolvimento da concepção de currículo e o conhecimento sobre os conteúdos da
Educação Física.
No segundo capítulo, recupero a trajetória de minha história profissional, pautada por
um processo de análise crítica, enquanto professor “pesquisador” com o auge no
desenvolvimento do meu trabalho de especialização em Educação Física escolar.
No terceiro capítulo, efetuo uma descrição detalhada da “segunda etapa” de minha
história profissional, quando começo a desenvolver o programa curricular de Educação Física
em uma das escolas em que trabalhei. Nessa descrição, poderão ser encontrados muitos
detalhes de meu trabalho, exemplificados em forma de planos de aula, fotos, trabalhos
escritos, por parte dos alunos, quadros comparativos e algumas formas de avaliação utilizadas
durante o desenvolvimento das aulas.
Por fim, nas Considerações Finais realizo uma reflexão pedagógica a respeito da
atuação docente e o entendimento do exercício concreto da Educação Física na educação
básica, além das possibilidades e limitações encontradas no desenvolvimento desse processo
teórico-prático das aulas.
1. E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA E
C
ULTURA
C
ORPORAL DE
M
OVIMENTO
O histórico da Educação Física, principalmente no contexto escolar, mostra sua
existência como uma disciplina sempre vinculada e subordinada a interesses externos, em
épocas distintas de nossa sociedade. Pelo fato de existirem referências bibliográficas e
trabalhos abordando esse processo histórico, esse aspecto não será focado. Isso não significa
que ignoramos o passado e suas determinações, pois aprendemos e compreendemos a
Educação Física atual com ele e, a partir dele, esboçamos uma tentativa de visualizar
possibilidades de caminhos a serem percorridos nessa área de conhecimento.
Parecia improvável, três décadas atrás, abordar a Educação Física a partir de
concepções culturais, pois havia predomínio das ciências biológicas nas explicações do corpo,
da atividade física e do esporte. Atualmente, essa tarefa parece estar sendo dividida com
conhecimentos provindos de áreas como a antropologia social, a sociologia, a história, a
ciência política, entre outras. Assim, podemos afirmar que a Educação Física trabalha com
conteúdos culturais; porém, a grande dificuldade parece residir, agora, em como desdobrar tal
feito efetivamente no âmbito das intervenções pedagógicas.
Conforme Daolio (2005), várias áreas de conhecimento das Ciências Humanas têm o
termo “cultura” como um dos mais utilizados e mais importantes, não sendo exclusividade de
nenhuma delas. Além disso, ela possui inúmeras definições que podem expressar um sentido
extremamente genérico e abrangente. Nesta pesquisa, o termo “cultura” é entendido como
um conglomerado aberto de representações e normas de comportamento que
contextualizam a rica, mutante e criadora vida dos membros de uma comunidade e
que vai se ampliando, enriquecendo e modificando precisamente como
conseqüência da vida inovadora daqueles que atuam sob o guarda-chuva de sua
influência. Por isso, a cultura oferece sempre um espaço de negociação de
significados e se recria constantemente como conseqüência deste mesmo processo
de negociação.
Os indivíduos participam criadoramente na cultura ao estabelecer uma
relação viva e dialética com a mesma. Por um lado, organizam suas trocas e o
significados a suas experiências em virtude do marco cultural em que vivem,
influenciados pela cultura. Por outro, os resultados de suas experiências
mediatizadas oferecem novos termos que enriquecem e ampliam seu mundo de
representação e experiências, modificando, com isso, ainda que seja paulatina, mas
progressivamente, o marco cultural que deve alojar os novos significados e
comportamentos sociais (S
ACRISTÁN
;
G
ÓMEZ
,
2000, p.
60-61).
Essa dialética é vivenciada e aprendida pela criança, ao longo da sua vida, de maneira
espontânea e cotidiana. Ela é incorporada à cultura produzindo elaborações e interpretações
pessoais da mesma que, dependendo do caráter de suas experiências e intercâmbios, podem
ser mais ou menos acertadas ou equivocadas. Deste modo, ao mesmo tempo mediatizado e
criador, vai elaborando o mundo de suas representações e modos de atuação. Assim, a criança
constrói um sistema de representação com relações significativas entre os elementos e
concepções que o compõem, que se mostram ao mesmo tempo relevantes para analisar o
cenário e decidir os modos de intervenção nele.
Seguindo essa idéia da cultura enquanto processo que se constitui e se reconstitui, para
Geertz (apud D
AOLIO
), ela é
a própria condição de vida de todos os seres humanos. É produto das ações
humanas, mas é também processo contínuo pelo qual as pessoas dão sentido às suas
ações. Constitui-se em processo singular e privado, mas é também plural e público.
É universal, porque todos os humanos a produzem, mas é também local, uma vez
que é a dinâmica específica de vida que significa o que o ser humano faz. A cultura
ocorre na mediação dos indivíduos entre si, manipulando padrões de significados
que fazem sentido num contexto específico (2004, p. 7).
O homem, desde suas origens, produziu cultura. Sua história é uma história de cultura,
na medida em que tudo o que faz está inserido num contexto cultural, produzindo e
reproduzindo cultura, sendo entendida, como um produto da sociedade, da coletividade à qual
os indivíduos pertencem, antecedendo-os e transcendendo-os.
Além disso, Forquin (1993) acena para a existência de uma relação muito próxima
entre educação e cultura. Independentemente se tomarmos a palavra “educação” no seu
sentido genérico, de formação e socialização do sujeito, ou unicamente restringi-lo ao campo
escolar, é importante salientar que, se toda educação é sempre educação de alguém por
alguém, ela pressupõe, fundamentalmente, a comunicação, a transmissão, a aquisição de
conhecimentos, competências, crenças, hábitos, valores, que constituem o que se chama
precisamente de “conteúdo” da educação.
Devido ao fato de que este conteúdo parece irredutível ao que de
particular e de contingente na experiência subjetiva ou intersubjetiva imediata,
constituindo, antes, a moldura, o suporte e a forma de toda experiência individual
possível, devido, então, a que este conteúdo que se transmite na educação é sempre
alguma coisa que nos precede, nos ultrapassa e nos institui enquanto sujeitos
humanos, pode-se perfeitamente dar-lhe o nome de cultura. Reconheçamos contudo
a parcela de arbitrário que implica um tal emprego da palavra “cultura” e a
necessidade de um esclarecimento léxico (F
ORQUIN
, 1993, p. 10).
Nesse mesmo caminho, podemos afirmar que “a cultura é o conteúdo substancial da
educação, sua fonte e sua justificação última: a educação não é nada fora da cultura e sem ela”
(F
ORQUIN
, 1993, p. 14). Porém, parafraseando o mesmo autor, ao mesmo tempo, pode-se
dizer que é pela e na educação, através do trabalho docente, que a cultura se transmite e se
perpetua.
Pensando nesse trabalho docente na Educação Física, para Bracht, um dos motivos
pelos quais utiliza-se a palavra “cultura”, relacionada à essa nossa área, é que ela
força uma redefinição da relação da Educação Física com a Natureza e com seu
conhecimento fundamentador. É preciso superar certo “naturalismo” presente
historicamente na nossa área. Tudo na nossa área era (em parte ainda é)
considerado natural: o corpo é algo da natureza, as ciências que nos fundamentam
são da natureza, a própria existência e/ou necessidade da Educação Física é natural.
Entender nosso saber como uma dimensão da cultura não elimina sua dimensão
natural, mas a redimensiona e abre nossa área para outros saberes, outras ciências
(outras interpretações) e amplia nossa visão dos saberes a serem tratados.
Uma das conseqüências é ver as atividades físicas ou as práticas corporais
(que perfazem nossa cultura corporal, de movimento ou corporal de movimento)
como construções históricas, portanto não mera conseqüência da ordem natural,
com sentidos e significados advindos dos diferentes contextos onde são/foram
construídos pelo homem (2004, p. 2).
Nos dias de hoje, a Educação Física também se fundamenta nas concepções de corpo e
movimento, sendo que esse trabalho possui estreita relação com a compreensão que se tem
desses dois conceitos. Além disso, torna-se possível discutir o corpo como uma construção
cultural, conforme Daolio (1994), que cada sociedade se expressa diferentemente por meio
de corpos diferentes. Todo homem, mesmo inconsciente desse processo, é portador de
especificidades culturais no seu corpo. Tornar-se humano é tornar-se individual,
individualidade esta que se concretiza no e por meio do corpo, que é, segundo Rodrigues
(apud D
AOLIO
, 1994), “o mais natural, o mais concreto, o primeiro e o mais normal
patrimônio que o homem possui” (p. 36).
Além disso, os inúmeros conhecimentos e representações que se transformaram ao
longo do tempo, tendo ressignificadas as suas intencionalidades e formas de expressão que
dizem respeito às criações que tornaram os movimentos mais eficazes, seja por razões
“militares”, relativas ao domínio e uso de espaço, seja por razões econômicas, que dizem
respeito às tecnologias de caça, pesca e agricultura, seja por razões religiosas, que tangem aos
rituais e festas ou por razões apenas lúdicas, se constituem, segundo os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN´s, 2001), o que se pode chamar de cultura corporal.
Algumas dessas produções da cultura corporal foram incorporadas pela Educação
Física em seus conteúdos, tais como o jogo, o esporte, as atividades expressivas, as ginásticas,
entre outros, tendo em comum a representação corporal, com características lúdicas, de
diversas culturas humanas.
Indo além e incorporando o termo “movimento” ao final dessa denominação cultura
corporal de movimento –, Pich afirma que seu conceito deve ser entendido “a partir do
processo de ruptura com a visão biologicista-mecanicista do corpo e do movimento situado de
forma hegemônica na Educação Física até o início da crise epistemológica ocorrida nos anos
80. Assim sendo, o conceito veio representar a dimensão histórico-social ou cultural do corpo
e do movimento (2005, p. 109)”.
Contudo, a Educação Física possui condições de ampliar seus horizontes,
abandonando a idéia de área que estuda o movimento humano, o corpo físico ou o esporte na
sua dimensão técnica, a partir da revisão do conceito de corpo e considerando a dimensão
cultural simbólica apresentada por Geertz (apud D
AOLIO
, 2004), para se tornar uma área que
considera o ser humano num sentido eminentemente cultural, contínuo construtor de sua
cultura relacionada aos aspectos corporais. Portanto, a Educação Física, de fato, deve ser
considerada uma área que possui legitimidade para estudar e atuar com a cultura corporal de
movimento.
1.1. O
S PROPÓSITOS DA
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA ESCOLAR
A escola é uma instituição de fundamental importância na sociedade atual, exercendo
a função essencial de transmitir parte do patrimônio cultural de uma geração para outra.
Segundo a concepção de Sacristán e Gómez (2000), por seus conteúdos, suas formas e seus
sistemas de organização, a escola proporciona aos alunos, paulatina e progressivamente, a
apropriação de idéias, conhecimentos, concepções, disposições e modos de conduta que a
sociedade adulta requer.
Nesse processo complexo, a escola acaba se tornando um espaço que recebe muitas
críticas, da sua organização de forma geral, passando pelos seus projetos, até às práticas
pedagógicas desenvolvidas nas salas de aula (S
OUZA
J
ÚNIOR
, 1999).
Apesar dessa situação constante de críticas e questionamentos, o objetivo da escola,
como um todo, continua sendo o de educar. Essa função educativa está ligada
[...] na tensão dialética entre reprodução e mudança, oferecendo uma contribuição
complicada, mas específica: utilizar o conhecimento, também social e
historicamente construído e condicionado, como ferramenta de análise para
compreender, para além das aparências superficiais do status quo real assumido
como natural pela ideologia dominante , o verdadeiro sentido das influências de
socialização e os mecanismos explícitos ou disfarçados que se utilizam para sua
interiorização pelas novas gerações. Deste modo, explicitando o sentido das
influências que o indivíduo recebe na escola e na sociedade, pode oferecer àquela,
espaços adequados de relativa autonomia para a construção sempre complexa e
condicionada do indivíduo adulto (S
ACRISTÁN
;
G
ÓMEZ
, 2000, p.
22).
Sendo a escola um espaço para tratar do conhecimento produzido pelo homem e com a
Educação Física inserida nesse contexto, que papel ela deve desenvolver no ambiente escolar?
Ela possui o caráter de treinamento esportivo ou é uma área que trata da apropriação de
conhecimentos acerca da cultura corporal de movimento?
Atualmente se concebe a existência de algumas abordagens para a Educação Física
escolar no Brasil que resultam da articulação de diferentes teorias psicológicas, sociológicas e
concepções filosóficas. Todas essas correntes têm ampliado os campos de ação e reflexão
para a área e a aproximado das ciências humanas e, embora contenham enfoques científicos
diferenciados entre si, com pontos muitas vezes divergentes, têm em comum a busca de uma
Educação Física que articule as múltiplas dimensões do ser humano.
Segundo Bracht (1999), a Educação Física, em boa parte de sua história, foi
hegemonizada por um discurso baseado nas ciências naturais, de controle do corpo, de
“construção” de um corpo saudável e produtivo, treinável, capaz de grandes e belos
desempenhos motores. Era o corpo “natural” submetido ao entendimento dominante de nossa
corporeidade, não havendo espaço para considerar o corpo como “sujeito” de cultura,
“produtor” de cultura, pois, nessa perspectiva, ele apenas “sofre cultura”.
Tani (apud B
RACHT
, 1999, p. 66) reclama do fato de que “sempre se privilegiou o
entendimento da Educação Física enquanto profissão negligenciando-a enquanto disciplina
acadêmica, sugerindo algum tipo de antagonismo”. Já Bracht entende
[...] que não antagonismo, mas, reconhecer a Educação Física, primeiro
enquanto prática pedagógica é fundamental para o reconhecimento do tipo de
conhecimento, de saber o necessário para orientá-la e para o reconhecimento do
tipo de relação possível/desejável entre a Educação Física e o “saber científico” ou
as disciplinas científicas (1999, p. 66).
No entanto, a partir do início da década de 80, segundo Bracht (1999),
[...] caracteriza-se no Brasil um movimento de “repedagogização” da teorização em
Educação Física, fundamentada em diálogo com as Ciências Humanas e Sociais,
efetuado por intermédio do discurso pedagógico; o entendimento de Educação
Física é remetido a uma prática pedagógica. A partir de então a expressão
“Educação sica” passa a ter pelo menos dois entendimentos: (i) é uma área de
conhecimento (científico); (ii) é uma prática pedagógica (para alguns, restrita à
instituição escolar).
Além disso, conforme os PCN´s (2001), deve-se levar em conta que a Educação Física
possui pelo menos um século e meio de história no mundo ocidental moderno, com tradição
no saber-fazer; porém, tem buscado a formulação de um recorte epistemológico próprio.
O componente curricular da Educação Física, para Bracht (1999), contempla múltiplos
conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a respeito do corpo e do movimento,
cabendo a ela ser uma prática de intervenção que tematiza as manifestações da nossa cultura
corporal de movimento com uma intenção pedagógica, buscando fundamentar-se em
conhecimentos científicos, oferecidos pelas abordagens dos diferentes componentes
curriculares.
Na tentativa de reformulação da Educação Física, para Betti (1998), uma de suas
tarefas é preparar o aluno para ser um praticante lúcido e ativo, que consiga incorporar o
esporte, o jogo, a dança e as ginásticas em sua vida e tirar o melhor proveito possível deles.
Isso implica também compreender a organização institucional da cultura corporal em nossa
sociedade; é preciso prepará-lo para ser um consumidor do esporte espetáculo, desenvolvendo
uma visão crítica do sistema esportivo profissional e dos instrumentos conceituais e
perceptivos para uma apreciação estética e técnica do esporte e, ao mesmo tempo, estar
preparado para analisar criticamente as informações que recebe dos meios de comunicação
sobre a cultura corporal de movimento.
Pode-se dizer, ainda para Betti (1998), que a Educação Física também propicia aos
alunos, como os outros componentes, certo tipo de conhecimento. Porém não é um
conhecimento que se possa incorporar dissociado de uma vivência concreta. Ela não pode se
transformar em um discurso sobre a cultura corporal de movimento, sob pena de perder a
riqueza de sua especificidade, ela deve se constituir como uma ão pedagógica com aquela
cultura. Essa ação pedagógica a que se propõe a Educação Física será sempre uma vivência
impregnada da corporeidade do sentir e do relacionar-se. A dimensão cognitiva será feita
sempre sob esse substrato corporal. O professor de Educação Física deve auxiliar o aluno a
compreender seu sentir e seu relacionar-se na esfera da cultura corporal de movimento
(B
ETTI
, 1998, p. 13).
Já, segundo o Coletivo de Autores (1992), a Educação Física é uma prática pedagógica
que, no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais, como jogo,
esporte, dança e ginástica, as quais configuram uma área do conhecimento que podemos
chamar de cultura corporal.
É fundamental, para essa perspectiva da prática pedagógica da Educação Física,
segundo o Coletivo de Autores (1992), o desenvolvimento da noção de historicidade da
cultura corporal. É preciso que o aluno entenda que o homem não nasceu pulando, saltando,
arremessando, balançando, jogando, etc. Todas essas atividades corporais foram construídas
em determinadas épocas históricas, como respostas a determinados estímulos, desafios ou
necessidades humanas.
A Educação Física escolar não possui a intenção de fazer os alunos aprender a repetir
gestos estereotipados, com o objetivo de apenas automatizá-los e reproduzi-los, restringindo
os alunos ao simples exercício de certas habilidades e destrezas, mas sim de proporcionar a
apropriação do processo de construção de conhecimentos relativos ao corpo e ao movimento,
construindo uma possibilidade autônoma de utilização de seu potencial gestual, capacitando o
sujeito a refletir sobre suas possibilidades corporais e, com autonomia, exercê-las de maneira
social e culturalmente significativa e adequada (PCN´s, 2001).
Por isso, na escola, a Educação Física “recorta” a cultura corporal de movimento, com
a intenção de proporcionar aos alunos a sua apropriação crítica, relacionando organicamente o
“saber movimentar-se” ao “saber sobre” esse movimentar-se, constituindo o que Betti (1994)
denominou saber orgânico. O papel da Educação Física é fazer a mediação simbólica desse
saber orgânico para a consciência, levando o sujeito à autonomia crítica no âmbito da cultura
corporal de movimento, sendo definida como
uma disciplina que tem por finalidade propiciar aos alunos a apropriação crítica da
cultura corporal de movimento, visando formar o cidadão que possa usufruir,
compartilhar, produzir, reproduzir e transformar as formas culturais do exercício da
motricidade humana: jogo, esporte, ginásticas e práticas de aptidão física, dança e
atividades rítmicas/expressivas, lutas/artes marciais e práticas corporais alternativas
(B
ETTI
, 2003, p. 56).
Enquanto isso, para Gallardo (1998), cabe à Educação Física compreender e explicar o
corpo, buscando despertar nos educandos uma consciência corporal que lhes permita
perceberem-se no mundo em que vivem e, de posse dessa consciência, interferir criticamente
no processo de construção da sociedade brasileira, pois não se pode esquecer, também, que
a Educação Física, ao desenvolver o movimento através dos exercícios físicos,
orienta-se para atividades recreativas, esportivas e de ginástica. Aqui talvez esteja o
ponto mais polêmico das atividades educativas da Educação Física. Isso porque se
pode perder o significado humano do movimento e, além disso, o esporte pode ser
dominado pelos princípios de alto rendimento, perdendo as perspectivas da
atividade lúdica e da compreensão da corporeidade humana. Ainda mais, as práticas
esportivas podem se tornar conflitantes porque, em lugar de ser educativas, podem
se transformar em instrumentos de controle social, vinculados a interesses
econômicos ou a explorações ideológicas (G
ALLARDO
, 1998, p. 28).
Além disso, a Educação Física escolar, para os PCN´s (1997), possibilita, também, aos
alunos o acesso a conhecimentos práticos e conceituais a partir da sistematização de situações
de ensino e aprendizagem. Porém, para que isso aconteça, é fundamental a mudança da ênfase
na aptidão física e no rendimento padronizado, que caracterizava a Educação Física, para uma
concepção mais ampla, que consiga contemplar todas as dimensões envolvidas nas práticas
corporais. É importante, também, diferenciar os objetivos da Educação Física escolar e os
objetivos do esporte, da dança, da ginástica e da luta profissionais, pois, embora seja uma
referência, o profissionalismo não pode ser o ideal almejado pela escola. A Educação Física
escolar deve proporcionar a todos os alunos situações para que desenvolvam suas
potencialidades, de forma democrática e não seletiva, visando seu melhoramento como seres
humanos.
Segundo o que nos traz o Coletivo de Autores (1992), na perspectiva da reflexão sobre
a cultura corporal, a dinâmica curricular, no âmbito da Educação Física, busca desenvolver
uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem
tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal: jogos, danças,
lutas, exercícios ginásticos, esporte, malabarismo, contorcionismo, mímica e outros que
podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo
homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas.
Nesse sentido, segundo os PCN’s, na Educação Física,
[...] independentemente de qual seja o conteúdo escolhido, os processos de ensino e
aprendizagem devem considerar as características dos alunos em todas as suas
dimensões, sejam elas cognitivas, corporais, afetiva, ética, estética, de relação
interpessoal e inserção social. Sobre o jogo da amarelinha, o voleibol ou uma dança,
o aluno deve aprender para além das técnicas de execução, a discutir regras e
estratégias, apreciá-los criticamente, analisá-los esteticamente, avaliá-los
eticamente, ressignificá-los e recriá-los.
É tarefa da Educação Física escolar, portanto, garantir o acesso dos alunos às
práticas da cultura corporal, contribuir para a construção de um estilo pessoal de
exercê-las e oferecer instrumentos para que sejam capazes de apreciá-las
criticamente.
A prática da Educação Física na escola poderá favorecer a autonomia dos alunos
para monitorar as próprias atividades, regulando o esforço, traçando metas,
conhecendo as potencialidades e limitações e sabendo distinguir situações de
trabalho corporal que podem ser prejudiciais (1997, p. 28-29).
Para isso, torna-se necessário ao aluno construir uma possibilidade autônoma de
utilização de seu potencial gestual, através da apropriação do processo de construção de
conhecimentos relativos ao corpo e ao movimento e que não se limite apenas à repetição de
gestos estereotipados, com vistas a automatizá-los e reproduzi-los (
PCN
´s, 1996).
Portanto, o processo de ensino e aprendizagem em Educação Física escolar busca
capacitar o indivíduo a refletir sobre suas potencialidades corporais e, com autonomia, exercê-
las de maneira social e culturalmente significativa e adequada, não se restringindo ao simples
exercício de certas habilidades e destrezas (
PCN
´s, 1996).
Nesse momento torna-se importante registrar e reconhecer a heterogeneidade das
posições dos autores abordados até aqui, percebendo em todos eles elementos para a
superação do que poderíamos chamar de uma Educação Física “tradicional”, com a idéia
centrada no “exercitar-se”.
Diante dessas diferentes concepções, acredito que as idéias de Betti são as que mais se
aproximam do que considero o papel ideal para a Educação Física se constituir em um
componente curricular real, sendo capaz de dar conta do que acreditamos ser o sentido de
nossa área: a cultura corporal de movimento.
1.2. E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA E
C
URRÍCULO
Para tentar dar conta desse item, torna-se importante reconhecer alguns conceitos de
currículo. Do ponto de vista etimológico, a palavra “currículo” tem sua origem no termo
latino scurrere, que significa carreira, percurso que deve ser realizado e, por conseqüência,
sua representação ou apresentação (S
OUZA
J
ÚNIOR
, 2001).
Segundo Forquin (apud S
OUZA
J
ÚNIOR
, 2001), o termo currículo significa o conjunto
de tudo o que se ensina e o que se aprende, tendo como referência alguma ordem de
progressão, podendo referir-se para além do que está escrito oficialmente, isto é, o que é
efetivamente ensinado e aprendido no interior da sala de aula e, ainda, por aquilo que, contido
no conteúdo latente, se adquire na escola por experiência, impregnação, familiarização ou
inculcação. Portanto, currículo, num sentido amplo, é a dimensão cognitiva e cultural do
ensino, ou seja, seus conteúdos, saberes, competências, símbolos e valores. Além disso, ainda
para Forquin (apud S
OUZA
J
ÚNIOR
,
2001, p. 82), “o currículo é fruto de uma seleção da
cultura, destinada a ser transmitida às novas gerações, mas que precisa tornar-se assimilável”.
.Já para Coll (2003), o currículo, pensado enquanto projeto, torna-se um guia para os
encarregados de seu desenvolvimento, ou seja, um instrumento útil para orientar a prática
pedagógica, uma ajuda ao professor. Em função disso, ele não pode limitar-se simplesmente a
enunciar uma rie de intenções, princípios e orientações gerais que, por excessivamente
distantes da realidade das salas de aula, sejam de escassa ou nula ajuda para os docentes.
Nesses termos, o currículo é entendido, segundo Coll, como “o projeto que preside as
atividades educativas escolares, define suas intenções e proporciona guias de ação adequadas
e úteis para os professores, que são diretamente responsáveis pela sua execução” (2003, p.
45). Para isso, ainda citando Coll (2003), o currículo proporciona informações concretas sobre
o que ensinar (conteúdos: conceitos, sistemas explicativos, habilidades, normas, valores, etc.;
e objetivos: os processos de crescimento pessoal que se deseja provocar, favorecer ou facilitar
mediante o ensino), quando ensinar (a maneira de ordenar e dar seqüência aos conteúdos e
objetivos), como ensinar (a maneira de estruturar as atividades de ensino/aprendizagem das
quais participarão os alunos, a fim de atingir os objetivos propostos em relação com os
conteúdos selecionados) e o que, como e quando avaliar (a avaliação é um processo
fundamental que assegura se a ação pedagógica responde adequadamente às mesmas e
introduz as correções oportunas em caso contrário, na medida em que o projeto corresponde a
certas intenções).
Porém, por outro lado, se pensarmos que a vida escolar é um caminho para todos os
alunos, e o currículo é seu conteúdo ou o guia de seu progresso pela escolaridade, segundo
Sacristán; Gómez,
um sistema escolar complexo, freqüentado por muitos alunos, deve organizar-se e,
servindo a interesses sociais com conseqüências tão decisivas, tende a ser
controlado inevitavelmente. Implica, pois, a idéia de regular e controlar a
distribuição do conhecimento. Além de expressar os conteúdos do ensino o que é
e, por isso mesmo, o que não é objeto de ensino –, estabelece a ordem de sua
distribuição. É óbvio, que tem certa capacidade reguladora da prática,
desempenhando o papel de uma espécie de partitura interpretável, flexível, mas de
qualquer forma determinante da ação educativa (2000, p. 125).
Atualmente, pensar o termo “currículo”, no contexto escolar, nos remete,
primeiramente a uma discussão e compreensão no que se refere ao entendimento conceitual e
teórico, não limitando-se apenas a elencar ou enumerar uma seqüência de itens a serem
abordados nos diferentes níveis e/ou modalidades de ensino, pois, vários são os fatores e
aspectos que interferem na constituição de um currículo, enquanto um processo, pois para
Lundgren
o currículo é o que tem atrás toda educação transformando suas metas básicas em
estratégias de ensino. Tratá-lo como algo dado ou uma realidade objetiva e não
como um processo no qual podemos realizar cortes transversais e ver como está
configurado num dado momento não seria mais que legitimar de antemão a opção
estabelecida nos currículos vigentes, fixando-a como indiscutível (apud
S
ACRISTÁN
, 2000, p. 16).
O currículo, enquanto processo, é entendido ainda, segundo Sacristán (2000), como
ponto de equilíbrio de interesses que influenciam o sistema educativo em determinado
momento, enquanto que através dele se realizam os fins da educação no ensino escolarizado.
A partir de seus conteúdos e suas formas, o currículo é uma opção historicamente
configurada, que se “depositou” dentro de uma determinada trama cultural, política, social e
escolar. Portanto, ele está carregado de valores e pressupostos que é preciso decifrar.
Enquanto isso, a escola, com seu projeto cultural e de socialização para seus alunos,
possui certa intencionalidade e, de alguma forma, o currículo reflete o conflito entre interesses
dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem os processos educativos. As
finalidades que são atribuídas e destinadas implícita ou explicitamente para a instituição
escolar, de socialização, de formação, de segregação ou de integração social, acabam,
conforme Sacristán,
necessariamente tendo um reflexo nos objetivos que orientam todo o currículo, na
seleção de componentes do mesmo, desembocam numa divisão especialmente
ponderada entre diferentes parcelas curriculares e nas próprias atividades
metodológicas às quais lugar. Por isso, o interesse pelos problemas relacionados
com o currículo não é senão uma conseqüência da consciência de que é por meio
dele que se realizam basicamente as funções da escola como instituição (2000, p.
17).
A partir do momento em que se entende o currículo como seleção particular de
cultura, compreende-se uma relação de conteúdos intelectuais a serem aprendidos,
pertencentes a diferentes âmbitos da ciência, das humanidades, das ciências sociais, das artes,
da tecnologia, entre outras, como sendo o primeiro significado e o mais elementar. No
entanto, para Sacristán,
a função educadora e socializadora da escola não se esgota aí, embora se faça
através dela, e, por isso mesmo, nos níveis do ensino obrigatório, também o
currículo estabelecido vai logicamente além das finalidades que se circunscrevem a
esses âmbitos culturais, introduzindo nas orientações, nos objetivos, em seus
conteúdos, nas atividades sugeridas, diretrizes e componentes que colaborem para
definir um plano educativo que ajude na consecução de um projeto global de
educação para os alunos. Os currículos, sobretudo nos níveis da educação
obrigatória, pretendem refletir o esquema socializador, formativo e cultural que a
instituição escolar tem (2000, p. 18).
Com relação ao currículo de Educação Física, Kunz (1998) acredita que ainda não
possuímos um “programa mínimo” de conteúdos, capaz de acabar com a nossa “bagunça
interna” como disciplina/atividade escolar, ou seja, o fato de não termos um programa de
conteúdos numa hierarquia de complexidade, nem objetivos claramente definidos para cada
série de ensino, pois o professor tem o poder de decidir, de acordo com alguns fatores (entre
eles o seu bom ou mau humor), o que ensinar. Um exemplo disso é o professor desenvolver
um trabalho na quinta série e no primeiro ano do ensino médio da mesma maneira e com o
mesmo grau de aprofundamento.
Essa dificuldade em definir os objetivos e organizar os conteúdos numa certa
seqüência pedagógica esdiretamente ligada em como o currículo da Educação Física se
estrutura na escola, a partir do entendimento de currículo como sendo
[...] uma práxis antes que um objeto estático emanado de um modelo coerente de
pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e dos jovens, que
não se esgota na parte explícita nos projetos das escolas... É uma prática que se
expressa em comportamentos práticos diversos. O currículo, como projeto baseado
num plano construído e ordenado, relaciona a conexão entre determinados
princípios e uma realização dos mesmos, algo que se de comprovar e que nessa
expressão prática concretiza seu valor (S
ACRISTÁN
,
2000, p.
15-6).
Essa mesma práxis, de acordo com o Coletivo de Autores (1992), possui a função
social de ordenar a reflexão pedagógica do aluno de forma a pensar a realidade social
desenvolvendo determinada lógica, apropriando-se do conhecimento científico, confrontando-
o com o saber que o aluno traz do seu cotidiano e de outras referências do pensamento
humano: a ideologia, as atividades do aluno, as relações sociais, entre outras.
Em uma perspectiva crítica da educação, que defende uma noção ampliada de
currículo, as práticas e os saberes escolares são orientados para a construção de uma prática
pedagógica ancorada, fundamentalmente, na cultura e nos interesses das classes populares.
Sua maior ambição é criar condições para o surgimento de uma nova cidadania popular,
consciente da necessidade de lutar pela organização social na defesa da igualdade de direitos e
de oportunidades, bem como pela conquista de novos espaços institucionais. Sem o
aplainamento de contradições de classes o currículo torna-se, objetivamente,
uma estratégia de intervenção intersubjetiva dotada de procedimentos
metodológicos e que se efetiva no interior de um determinado sistema educativo
com a finalidade de: a) definir princípios ético-político-pedagógicos; b) selecionar e
filtrar informações e/ou conhecimentos advindos do contexto sócio-cultural, de
acordo com a política cultural adotada para a construção de saberes escolares
sistematicamente organizados; c) compartilhar as informações/conhecimentos
coletados, objetivando a sua internalização (crítica) por educadores e alunos,
utilizando experiências de ensino-aprendizagem criadas para essa finalidade, de
acordo com níveis/estágios de compreensão/escolarização; d) manter o sistema em
avaliação constante, criando e empregando mecanismos e metodologias diversas
(Muñoz Palafox
apud
PIROLO
,
2005,
p.
121).
O currículo, enquanto estratégia de intervenção crítica representa um dos muitos
mecanismos produtores de cultura (Saul apud P
IROLO
, 2005) e adquire identidade própria em
cada um dos contextos históricos em que se cria e se desenvolve, caracterizando-se, assim,
num importante campo de pesquisa e de estudo científico. Além disso, constitui um
instrumento dinâmico e mutável em constante movimento a ser construído coletivamente no
qual é possível identificar que os temas associados ao seu estudo e ao seu desenvolvimento
apresentam
[...] dois níveis de generalidade: o primeiro relaciona-se com o sistema educativo
em que são abordados os problemas curriculares gerais ou macrocurriculares
referentes à estrutura de todo o currículo no seu conjunto. São os problemas sociais
que, tradicionalmente, afetam o processo escolar e que são tratados a partir de
vários enfoques de análise (filosóficos, sociológicos e da didática geral). O segundo
associado dialeticamente ao nível de generalidade anterior, inclui os problemas
microcurriculares relacionados com cada conteúdo, matéria ou disciplina em
particular (Sacristán; Gómez apud PIROLO, p. 121, 2005).
Ainda estrategicamente, o currículo apresenta uma diretriz básica de intervenção, ou
seja, sua construção, desenvolvimento e avaliação devem apoiar-se em procedimentos de
deliberação ou de raciocínio prático, associados à necessidade de se adotar um
comportamento político-pedagógico voltado para acompanhar tanto as mudanças na educação
quanto o papel dos educadores e da comunidade escolar envolvidos no processo de
transformação da escola pública.
1.3. E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA E
C
ONTEÚDOS DE
E
NSINO
Um dos aspectos mais polêmicos ligados à Educação Física e que tem motivado
muitos autores a abordar e tentar dar conta dessa problemática, diz respeito aos conteúdos de
ensino e, também, sua relação com essa área do conhecimento, desde questões de escolha e
seleção até metodologias de apropriação desses conteúdos. Além disso, pode-se perceber,
durante leituras de vários autores, como Forquin, Coll, Sacristán, Gómez, Darido, estreita
ligação entre elementos do “conteúdo” (sendo ele de ensino ou não) e do “currículo”. Em
muitos momentos, não se pode abordar um deles sem ter que citar o outro e vice-versa.
O problema de definir o que é conteúdo do ensino e como chegar a decidi-lo
é um dos aspectos mais conflituosos da história do pensamento educativo e da
prática de ensino, condição que se reflete nos mais diversos enfoques, perspectivas
e opções. O próprio conceito de conteúdos do currículo já é por si mesmo
interpretável; e é, sobretudo, porque responder à pergunta de que conteúdo deve
tratar o tempo do ensino implica saber que função queremos que este cumpra, em
relação aos indivíduos, à cultura herdada, à sociedade na qual estamos e à qual
aspiramos conseguir. Como frente a essas funções não existe uma única
perspectiva, pois em torno da determinação dos conteúdos do ensino se pode
observar uma das controvérsias mais significativas da história da escolarização e do
pensamento curricular (S
ACRISTÁN
;
G
ÓMEZ
, 2000, p. 149).
O termo conteúdos” nos é mostrado carregado de significados culturais, próprio da
tradição dominante das instituições escolares nas quais foi forjado e utilizado. Por um lado, os
conteúdos nos lembram os elementos das disciplinas, matérias e diversas outras informações.
Por outro, é um conceito que reflete a perspectiva dos que decidem o que ensinar e dos que
ensinam (Sacristán; Gómez, 2000).
para Rosengardt, todos os objetos de nossa realidade possuem forma e, também,
conteúdo. “O conteúdo é a unidade de todos os elementos integrantes do objeto, de suas
propriedades, processos, nexos, contradições, tendências internas, movimentos. A forma pode
ser definida como a particular estruturação desses elementos na situação histórico-social
concreta” (2005, p. 94). Mesmo assim, nesse contexto, o conteúdo acaba sendo o elemento
mais dinâmico.
Enquanto isso, a Educação Física, pensada como uma estrutura que a um objeto
determinada estabilidade e forma possui conteúdos, e torna-se, por sua vez, a maneira de
manifestação desses conteúdos, que podem ser classificados como fundamentais, ou seja,
aqueles que fazem a existência ou a própria identidade do objeto.
Esses conteúdos compreendem, segundo Sacristán; Gómez,
todas as aprendizagens que os alunos devem alcançar para progredir nas direções
que marcam os fins da educação numa etapa de escolarização, em qualquer área ou
fora delas, e para tal é necessário estimular comportamentos, adquirir valores,
atitudes e habilidades de pensamento, além de conhecimentos. Por isso, é preciso
referir-se não apenas a informações que necessitam ser adquiridas, mas também aos
efeitos que se derivam de determinadas atividades, que é necessário praticar para
obter aprendizagens variadas como as mencionadas (2000, p. 150).
Coll e outros (apud D
ARIDO
, 2005, p.97) definem conteúdo como uma “seleção de
formas ou saberes culturais, conceitos, explicações, raciocínios, habilidades, linguagens,
valores, crenças, sentimentos, atitudes, interesses, modelos de conduta, etc., cuja assimilação
é considerada essencial para que se produza um desenvolvimento e uma socialização
adequada ao aluno”. Portanto, os conteúdos formam a base objetiva da instrução, ou seja, são
conhecimentos sistematizados referidos aos objetivos e viabilizados pelos métodos de
transmissão e assimilação.
Libâneo (apud D
ARIDO
) entende que conteúdos de ensino
[...] são o conjunto de conhecimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos e
atitudinais de atuação social, organizados pedagógica e didaticamente, tendo em
vista a assimilação ativa e aplicação pelos alunos na sua prática de vida.
Dessa forma, ao nos referirmos aos conteúdos estamos englobando conceitos,
idéias, fatos, processos, princípios, leis científicas, regras, habilidades
cognoscitivas, modos de atividade, métodos de compreensão e aplicação, hábitos de
estudos, de trabalho, de lazer e de convivência social, valores, convicções e atitudes
(2005, p. 98).
A verdade é que o termo “conteúdo” ainda é utilizado para definir o que se deve
aprender no que diz respeito aos conhecimentos das disciplinas referentes a nomes, conceitos
e princípios. O conteúdo da Educação Física é composto por um vasto conjunto de atividades
corporais e motrizes efetivadas em diferentes contextos institucionais, tais como educação,
esporte, saúde, lazer e tempo livre entre outras.
Nas aulas de Educação Física, os conteúdos têm-se modificado conforme as
influências de outras instituições sejam elas, a militar, a médica, a esportiva, bem como as
tendências educativas e os valores sociais dominantes. Devemos compreender que os
conteúdos não são objetos naturais sendo formatados para o ensino. São conseqüências de
decisões políticas, epistemológicas, científicas e pedagógicas de um conjunto variado de
sujeitos envolvidos no processo, tanto das mais altas esferas que conduzem o sistema
educativo, até os próprios professores que selecionam cotidianamente aquilo que consideram
significativo para ser ensinado em suas aulas. Entendemos que, no caso da Educação Física
crítica, que recebe influências das perspectivas crítica-superadora do Coletivo de Autores e
crítica-emancipatória de Kunz, a fonte para a construção dos conteúdos trata-se das
manifestações da cultura corporal que se consideram valiosas para introduzir na escola e
ensinar aos alunos mediando um processo de recontextualização.
É necessário ressaltar que, ao longo de sua trajetória, a Educação Física, ao contrário
dos outros componentes curriculares, priorizou os conteúdos numa dimensão quase que
exclusivamente procedimental, o saber-fazer e não o saber-saber sobre a cultura corporal.
Contudo, atualmente, existe um esforço intelectual coletivo para que, além do saber-fazer, os
conteúdos da Educação Física consigam dar conta do “pensar sobre” o saber-fazer, sempre
vinculado a uma metodologia coerente, contemplando o conjunto de conhecimentos
conceituais, procedimentais e atitudinais que cabe à Educação Física.
Outro aspecto pertinente desse item relaciona-se à seleção e organização dos
conteúdos, que, segundo Darido (2001), são sistematizados de maneira a vincular os
diferentes conteúdos de aprendizagem que formam as unidades didáticas, sendo que, quanto
maior a relação entre si, maior a potencialidade de uso e compreensão. Neste sentido,
cada vez mais podemos encontrar propostas e experiências que rompem com a
organização dos conteúdos centrados exclusivamente nas disciplinas escolares.
Estas novas formas de organização buscam estabelecer relações entre os conteúdos
de diversas maneiras, de tal modo que os alunos passem a compreender a realidade,
que sempre se manifesta globalmente.
O autor cita como exemplos desta forma de organização dos conteúdos, que
prescindem da compartimentalização disciplinar, os centros de interesses, o
trabalho por temas ou tópicos, os projetos, nos quais o ponto de partida é o interesse
e aprendizagem do aluno e não a lógica interna das disciplinas. Por outro lado, as
propostas de organização que não têm como referência a própria disciplina, podem
ser consideradas em projetos multidisciplinar, transdisciplinar ou interdisciplinar
(Zabala apud D
ARIDO
, 2001, p. 15).
Na Educação Física, algumas tendências se manifestam favoravelmente na busca de
conexões entre os seus conteúdos com os grandes problemas da sociedade brasileira; porém,
as iniciativas de discutir e analisar propostas que ampliem a compreensão dos conteúdos da
Educação Física, para além da perspectiva disciplinar, ainda se mostram bastante limitadas
(D
ARIDO
, 2001).
Concordando com Sacristán; Gómez,
Uma vez feita a escolha de que se ensinarão estudos sociais ou linguagem,
será necessário ajustar a matéria pedagogicamente ao aluno/a, ordenar suas
dificuldades e justificá-la desde o ponto de vista psicológico. [...] Um conteúdo
passa a ser valioso e legítimo quando goza do aval social dos que têm poder para
determinar sua validade; por isso, a fonte do currículo é a cultura que emana de
uma sociedade. Sua seleção deve ser feita em função de critérios psicopedagógicos,
mas é preciso considerar antes de mais nada a que idéia de indivíduo e de sociedade
servem (S
ACRISTÁN
;
G
ÓMEZ
, 2000, p. 154).
Sabemos que a seleção dos conteúdos, considerada como apropriada, é influenciada
pelas forças dominantes de cada momento histórico e dos valores que foram pautando o que
se acredita que é pertinente para ser ensinado ou transmitido. Os conteúdos são construções
históricas, ou seja, não foram criados, exclusivamente, pelo pensamento educativo.
Sacristán; Gómez (2000) destacam alguns aspectos que caracterizam o esse processo
de seleção de conteúdos, como sendo os seguintes:
a) A relatividade histórica: entendeu-se de forma diferente o que era importante a ser
transmitido, em cada lugar e momento. Cada sociedade, através de meios próprios
para propor ou impor, escolheu um tipo de conhecimento como digno de ser
propagado nas escolas, menosprezou a importância de outros conteúdos e chegou,
inclusive, a impedir o acesso de alguns não considerados dignos ou apropriados a
entrarem no currículo. A valorização de alguns conhecimentos mais do que outros,
certas habilidades nos alunos, estímulo do desenvolvimento de uns aspectos do
indivíduo sobre outros, são originados a partir da evolução dos valores sociais, da
mudança de prioridades entre certos objetivos da educação, do surgimento de novas
exigências na economia, na cultura, entre outros. Algumas tendências sociais ligadas
ao ensino das línguas, valorização de idiomas dominantes na economia, a era da
informática, o culto à forma/estética corporal, entre outras, acabam refletindo as
mudanças em nossa sociedade, que, posteriormente, serão transformadas em
exigências para a escolaridade.
b) A seleção de conteúdos do currículo favorece mais uns do que outros: o valor do
conhecimento escolar, abordado nos currículos, é diferente para os alunos de acordo
com sua procedência social e conforme as possibilidades de sua permanência no
sistema educativo. O conteúdo selecionado como dominante não é indiferente às
divisões sociais entre grupos humanos: mulher-homem, criança rural/criança urbana,
aluno de classe média-baixa ou alta, grupos étnicos minoritários e majoritários,
candidatos a operários agrícolas ou manuais frente a profissionais de “colarinho
branco”, etc. Entretanto, aproximando essa seleção de conteúdos à nossa realidade,
nem sempre se considera essa diferenciação ligada estreitamente às divisões sociais,
pois o conteúdo transmitido tanto para a criança do meio rural quanto para a criança da
cidade, por exemplo, acaba sendo o mesmo.
c) Nem todos têm o mesmo poder decisório: o processo de selecionar os conteúdos que
estruturam os currículos é um processo político que não é indiferente socialmente, pois
nele se evidenciam cotas desiguais de poder na tomada de decisões. Os procedimentos
que decidem a confecção e renovação de currículos não são abertos por igual a todos
os segmentos envolvidos nem a todos os cidadãos, ou seja, os poderes públicos, os
especialistas, os empresários, os pais, os alunos, os professores e os que confeccionam
materiais didáticos possuem uma capacidade muito desigual de interferir nessas
decisões.
Além desses aspectos, que dão sentido ao processo de seleção dos conteúdos, os
mesmos instrumentos que podem/devem ser usados para exercer papel crítico/reflexivo diante
da escolaridade, do currículo, dos professores e dos materiais didáticos que tendem a
reproduzir a cultura hegemônica e favorecer mais uns do que outros, ou seja, entender que “o
conhecimento admitido no currículo como legítimo deve ser o resultado de um consenso que
foi objeto de revisões e de críticas, resultado de uma deliberação democrática constante”
(Sacristán; Gómez, 2000, p. 157).
Essas concepções abordadas até aqui compuseram os critérios para as reflexões
realizadas de minha experiência profissional. Foram alguns conceitos principais que pautaram
a análise da intervenção de um professor de Educação Física, que pratica vários esforços para
perceber alguns elementos significativos no dia-a-dia de nossa área e os enfrentamentos dos
quais estamos freqüentemente participando, tanto no ambiente escolar quanto fora dele.
Assim, na continuidade do trabalho, acontece uma breve retomada do começo de
minha atuação como professor de Educação Física, tentando trazer à tona algumas situações
peculiares para um recém-formado e a análise de alguns encaminhamentos que foram feitos
para tentar se dar conta de dúvidas, inseguranças e dificuldades encontradas na chegada na
escola.
2.
M
INHA PRIMEIRA FASE PROFISSIONAL
:
A
E
DUCAÇÃO
F
ÍSICA NA PERSPECTIVA DO
P
LANEJAMENTO
P
ARTICIPATIVO
Esta primeira fase de minha atuação profissional aconteceu enquanto professor
nomeado para atuar na rede pública municipal de Ijuí (RS), na Escola Municipal Fundamental
Joaquim Porto Villanova, do Bairro Lambari, no ano de 2000, no começo do segundo
bimestre. A escola, na época, possuía em torno de duzentos e cinqüenta alunos e as aulas de
Educação Física eram desenvolvidas em três períodos semanais, cada qual com cinqüenta
minutos de duração.
A partir do terceiro bimestre do referido ano letivo, as aulas modificaram-se
significativamente, pois foi nesse período que implementamos a Educação Física trabalhada a
partir da perspectiva do Planejamento Participativo; porém, uma caminhada inicial e muito
importante teve que ser feita, para se chegar até essa escolha.
Pensar em trabalhar com Educação Física na escola me parecia muito mais tranqüilo
do que realmente nos mostram as realidades nas quais nos inserimos. Não me refiro aqui
somente às dificuldades com relação aos materiais e à disponibilidade de espaços para as
aulas, que são fatores que interferem diretamente no planejamento e desenvolvimento de
nossa prática docente. Mas, também, quero apontar para outros aspectos pertinentes à nossa
área de conhecimento, como, por exemplo, as nossas limitações e dificuldades em termos de
articulações dos conteúdos da Educação Física com as faixas etárias dos alunos e, também,
com as outras áreas do conhecimento que fazem parte do contexto escolar. Outra situação é
como pensar em constituir um currículo para este componente curricular. Ainda outro ponto
que vale ressaltar é o fato de, recém-formados, estarmos diante de realidades diferentes ao
mesmo tempo. No meu caso: uma escola pública municipal, na cidade, e outra escola pública
estadual, no interior do município. E agora? O que fazer? Como trabalhar? Onde estão as
“receitas” para “darmos” aulas de Educação Física?
Uma das saídas que encontrei foi a de tentar socializar todas as minhas angústias com
outros colegas da área que se encontravam na mesma situação. Dessas conversas, trocas de
experiências e angústias, surgiram alguns encaminhamentos significativos que foram
fundamentais para a elaboração e o desenvolvimento de nossas aulas. Acabamos conseguindo
suporte em nossos ex-professores da graduação, que nos ajudaram muito, nos incentivando e
desafiando a pensarmos trabalhos importantes para nossas realidades e a continuarmos nossa
formação na profissão que escolhemos.
Nessa época surgiu, então, nosso grupo de estudos, inicialmente coordenado pelo
professor Santiago Pich. Através de muitas leituras, pesquisas, trocas de idéias, acabamos
alinhavando algumas intenções para o currículo de Educação Física em nossas escolas.
Começamos a nos apropriar de conhecimentos que nos auxiliaram muito para que
pudéssemos pensar em como tentar desenvolver os conteúdos da Educação Física no contexto
escolar.
Acredito que o principal propósito da implementação do Planejamento Participativo
nas aulas de Educação Física surgiu de uma necessidade de dar conta de todos os anseios, as
angústias e as incertezas que surgiram diante de mim quando me defrontei com uma turma de
vinte e tantos alunos, com os materiais precários e os espaços limitados destinados para a
Educação Física, pois minha intenção não era a de trabalhar somente com o esporte e,
principalmente, de apenas “largar” uma bola e deixar que os alunos se organizassem e
passassem o tempo todo das aulas jogando.
Outra intenção de ser trabalhado esse planejamento foi o de criar um suporte,
constituir um “caminho a ser seguido” para nossas aulas e nossos planejamentos. Nesse
momento era muito importante começarmos a definir algumas linhas gerais a serem
abordadas e desenvolvidas em nossas aulas, para que nos desse parâmetro de como trabalhar a
Educação Física.
Todas as angústias sentidas durante o processo inicial do trabalho acabaram de alguma
forma, sendo minimizadas ou superadas. Porém, com o passar do tempo, a partir do decorrer
das aulas, com o retorno que tínhamos dos alunos com relação ao trabalho, outras incertezas,
dúvidas e inseguranças surgiram, sendo que foram motivos para tentar se avançar e melhorar
o trabalho da Educação Física no contexto escolar.
2.1. O
PLANEJAMENTO E SUA NEGOCIAÇÃO
A implementação do Planejamento Participativo foi um processo interessante, pois
foram criadas expectativas com relação às nossas próximas aulas, de como aconteceria a
participação dos alunos nos encaminhamentos e decisões dos fenômenos abordados e quais
seriam as possibilidades de conteúdos que seriam escolhidos pelas turmas. Fenômeno aqui é
entendido como as diferentes formas de manifestação da cultura corporal de movimento. Por
exemplo: um jogo, uma brincadeira, uma modalidade esportiva, uma atividade expressiva...
O início desse processo foi tranqüilo, com relação à aceitação, por parte das turmas,
dessa nova metodologia de trabalho quando foi exposto e explicado para todos que
aconteceriam algumas mudanças significativas em nossas aulas. Os alunos teriam o poder de
escolher o que queriam fazer e aprender com relação aos temas da Educação Física a serem
desenvolvidos até o final do ano letivo. Criou-se um misto de empolgação, motivação e
dúvidas sobre as próximas aulas.
Quando uma mudança como essa acontece, se faz necessário que se esclareçam alguns
pontos importantes, principalmente sobre as responsabilidades e os papéis de cada um. No
caso: funções dos alunos e do professor. É preciso que se deixe bem claro o que cada um pode
e/ou deve realizar para que todos cresçam e aprendam.
Esse processo de negociação no Planejamento Participativo acabou gerando várias
situações interessantes e significativas. Alguns momentos foram tranqüilos, quando todos
convergiram em suas opiniões e entraram em consenso sem dificuldades mas outras situações
necessitaram de um certo tempo para serem superadas, como, por exemplo, quando a turma ia
escolher os conteúdos de alguma dimensão: surgiam mais do que uma opção de escolha, ou
seja, alguns alunos escolheram um determinado fenômeno e outros acabaram preferindo
outro, ou mais que dois fenômenos.
Esses eram os momentos nos quais os alunos argumentavam, dialogavam muito na
tentativa de fazerem valer suas opiniões perante toda a turma, o que nem sempre acontecia,
pois várias posições eram tomadas, dada a existência de alunos diferentes, com fenômenos
diferentes, na mesma turma. Esses momentos geraram um processo de negociação muito
interessante, pois cada um queria defender sua idéia. Tudo isso com muita ordem, respeito ao
direito de opinar de todos e com liberdade de expressarem suas intenções.
O papel do professor também foi bastante importante nesse processo, pois se tornou o
mediador de tudo isso, tendo que cuidar para que não ocorressem divergências mais sérias
entre a turma e eles fossem capazes de interferir no andamento das aulas. Outro papel
importante, também, foi a de ter a sensibilidade de escutar e fazer a turma ouvir, respeitar e
considerar todo aluno/colega que quisesse dar sua opinião, pois nessa fase do planejamento é
que acontece o maior índice de participação dos alunos. Enfim, a partir de muita conversa,
muita argumentação e muita negociação, cada turma chegou às listas de atividades escolhidas,
quando cada educando se sentiu responsável por, pelo menos, alguma parte de todo esse
processo de planejamento de nossas aulas de Educação Física.
2.2. A
LGUMAS LINHAS E ESTRATÉGIAS SOBRE SUA IMPLEMENTAÇÃO
2.2.1. Abordagem inicial – Planejamento Participativo nas aulas
No primeiro encontro, em cada turma, após o retorno do recesso escolar do mês de
julho do ano de 2000, passamos a explanar para todos os alunos, de (duas turmas) à
séries, nos seus respectivos horários, sobre como aconteceriam as aulas.
Nessa etapa de nossas aulas, tentamos passar para os alunos o significado do
Planejamento Participativo. Através de uma aula expositiva, explanamos aos grupos sobre as
suas responsabilidades e o compromisso de cada um deles para o sucesso de nossas aulas de
Educação Física, a partir daquele momento. De imediato, os grupos de alunos demonstraram
entusiasmo com a possibilidade de terem a oportunidade de escolherem as atividades que
queriam aprender nas aulas de Educação Física.
2.2.2. Explicação das dimensões da Educação Física
Conforme Gallardo (et al, 1998, p. 41), um dos caminhos para o Planejamento
Participativo é definir algumas linhas temáticas e eixos geradores de interesses.
Essas linhas foram denominadas de dimensões ou lógicas, as quais possibilitam que, a
partir de uma revisão dos conteúdos tradicionais da Educação Física escolar, os mesmos
possam ser sistematizados a partir de quatro princípios orientadores de sentido, denominados
de 1. princípio agonístico, 2. princípio de introspecção, 3. princípio do diálogo motor entre o
homem e o ambiente e 4. princípio comunicativo (
PICH
, 2002).
Em função de nosso contexto escolar e do momento em que nos encontrávamos,
acabamos abordando os princípios do diálogo motor entre o homem e o ambiente e o de
introspecção num mesmo eixo denominado de princípio da consciência corporal e
acrescentamos o princípio dos jogos populares locais.
2.2.3. Citação das atividades
Na seqüência dos trabalhos com o Planejamento Participativo nas aulas de Educação
Física, os grupos de alunos, de cada turma, citaram todos os tipos de fenômenos que
conheciam, de alguma forma, seja por alguma mídia, alguma prática anterior ou de alguma
outra maneira, respeitando as referidas dimensões da Educação Física.
Nessa etapa, o que mais chamou a atenção foi que, praticamente, todos os alunos
opinaram em, no mínimo, uma das lógicas, contribuindo para a organização de nossas aulas.
2.2.4. As possibilidades de escolha
Esperando que surgissem vários tipos de fenômenos nas turmas, cada grupo de alunos,
através de muita argumentação entre eles e com o professor, elegeu todas as atividades que
seriam possíveis de serem trabalhadas nas aulas de Educação Física, levando em consideração
o espaço físico, os materiais disponíveis e as condições climáticas.
Com relação a essa “possibilidade” de se trabalhar determinados fenômenos nas aulas
de Educação Física na escola, gostaria de ressaltar que muitos conteúdos podem ser
desenvolvidos no contexto escolar. Claro que o trabalho deve ser voltado para o fenômeno da
escola e não na escola.
2
Nessa fase, escolhemos os fenômenos, levando em consideração o contexto escolar, o
espaço físico, os materiais disponíveis e as condições climáticas, em função de que surgiram
atividades que, acredito, estavam muito distantes de serem trabalhadas em nossa escola na
época, por vários fatores, como, por exemplo, o Boxe e o Pólo Aquático.
2
Essa abordagem do esporte “da” escola e do esporte “naescola foi amplamente explanada por BRACHT,
Valter. Esporte na escola e esporte de rendimento. Movimento, ano VI, Porto Alegre, v. 1, n. 12, p. XIV
XXIV(Especial. Temas polêmicos), 2000/01.
2.2.5. O momento mais esperado: a escolha!
Chegada a hora de as turmas escolherem as atividades que iriam trabalhar até o final
do ano, a única exigência é que fosse indicado, no mínimo, um fenômeno de cada lógica.
Essa foi uma das principais fases de nossas aulas, pois foi uma etapa vivenciada, entre
o grupo de alunos, com muita conversa, argumentação, discussões, entusiasmo,
posicionamentos e de decisões fundamentais para a continuidade de nosso trabalho. Esses
elementos, que caracterizaram essa etapa de trabalho, foram fundamentais no processo de
constituição de nossas aulas de Educação Física.
As turmas entenderam o processo de escolha dos fenômenos e conseguiram eleger
atividades de todas as gicas da Educação Física. As atividades escolhidas pelos grupos de
alunos foram consideradas diferenciadas daquelas tidas como tradicionais das aulas, porém,
seguiram uma mesma linha, e todas as turmas escolheram basicamente fenômenos
semelhantes.
Quadro 1 – Distribuição dos conteúdos das turmas e a ordem de abordagem dos mesmos.
Ordem 6ª série (turma 61) 6ª série (turma 62) 7ª série 8ª série
Judô Baralho Jogo de Taco
Carrinho de
lomba
Danças
Jogo de Taco Ginástica Olímpica
Judô
Espiribol/Taco
Tênis Pingue-pongue Ciclismo
Ciclismo Futebol
Futebol de
tampinhas
Tênis
Atividades Ecológicas
Ciclismo Futebol Danças
Atividades ecológicas
Danças
Atividades
ecológicas
Fonte: elaboração do autor a partir das escolhas feitas pelas turmas.
2.2.6. Definição dos períodos
Nessa fase de nossas aulas, o grupo de alunos sentiu-se responsável pela determinação
dos períodos destinados para o trabalho de cada fenômeno escolhido.
Levamos em consideração a previsão da quantidade de aulas que teríamos até o final
do ano letivo, argumentando com os alunos para a importância de se designar um maior
número de aulas para os fenômenos mais significativos, que possivelmente iriam necessitar de
maior atenção no nosso trabalho, no caso, o Judô, o Ciclismo e o Tênis.
Depois do trabalho inicial com as turmas sobre a explanação de como aconteceriam as
aulas até as escolhas dos fenômenos e os períodos em que eles seriam trabalhados, chegou o
momento das aulas que haviam sido planejadas com a participação de todos.
2.3. L
IMITAÇÕES PARA A CONTINUIDADE DO TRABALHO
As dificuldades que surgiram ao final do trabalho anual, na perspectiva do
Planejamento Participativo, quando se começou a pensar o próximo ano letivo para a área de
Educação Física, foram com relação à seqüência/continuidade dos conteúdos nas séries e o
aprofundamento obtido em cada fenômeno trabalhado. O que trabalhar na série seguinte na
dimensão do esporte, por exemplo? Que tipo de tratamento dar aos fenômenos escolhidos pela
turma no próximo ano letivo?
Esse primeiro ano de trabalho com o Planejamento Participativo acabou nos
mostrando a limitação com relação à seqüência de conteúdos em Educação Física. A
dimensão agonística dos esportes, por exemplo, nos mostrou a dificuldade de planejar as aulas
das modalidades esportivas escolhidas, de acordo com a faixa etária de cada grupo de alunos,
pois a seqüência do que se queria com o esporte, em cada uma das séries, não ficou muito
clara. Outro ponto importante, que contribuiu para isso, foi ter nos fenômenos trabalhados um
fim neles mesmos, pois as turmas abordaram as manifestações sem perspectivas de
continuação nas mesmas, com um outro tipo de aprofundamento.
O tipo de tratamento dado aos fenômenos escolhidos pelas turmas foi outro aspecto
que gerou algumas incertezas. Refletiu-se, também, sobre como desenvolver um trabalho
adequado e que desse conta do que se queria que os alunos tivessem condições de saber ao
concluírem o Ensino Fundamental. O que trabalhar em cada rie? Será que a melhor saída
seria desenvolver uma modalidade esportiva por série, limitando-se a apenas repassar
conhecimentos técnicos de como era um saque no voleibol, de quantos jogadores constituíam
uma equipe de handebol, como o aluno deveria executar um passe no futebol e conseguir,
sempre que possível, trazer as atualizações das regras institucionalizadas pelas federações
esportivas e, além disso, continuar o processo de exclusão dos alunos das aulas e até mesmo, a
própria Educação Física da escola como disciplina curricular, apesar de desempenhar função
importante na formação da sociedade em que vivemos?
O aprofundamento dado a cada fenômeno individualmente, em cada faixa etária requer
um planejamento mais amplo do que simplesmente organizar as aulas para cada série de
forma isolada. Isso quando esse planejamento acontece e o professor não tem a improvisação
como elemento principal de suas aulas. É preciso que haja um comprometimento do
conhecimento da Educação Física que perpasse todas as idades, respeitando o nível de
desenvolvimento de cada uma delas, passando pelas lógicas ou dimensões que fazem parte do
universo da cultura corporal de movimento.
3.
A
SEGUNDA FASE DE MINHA VIDA PROFISSIONAL
E A TEMATIZAÇÃO DE CONTEÚDOS
Essa segunda fase de minha trajetória profissional teve como cenário a Escola
Estadual Fundamental 24 de Fevereiro, no Distrito de Chorão, interior do município de Ijuí
(RS), local que já foi descrito durante a introdução deste trabalho.
Verificando as limitações e dificuldades que surgiram no trabalho inicial, tentei, então,
tomar conhecimento de algumas estratégias que pudessem dar conta e, de alguma forma,
contemplar e aprimorar os trabalhos já realizados, dando uma continuidade coerente ao que já
havia acontecido.
Uma das perguntas surgidas, a partir de uma análise inicial foi: por que tematizar
determinadas modalidades esportivas nas aulas de Educação Física? A resposta foi de certa
forma, simples: porque os alunos escolheram as modalidades esportivas que queriam
“aprender”, “praticar”, saber mais”, “conhecer outras”, pois já estavam “cansados de fazer
sempre as mesmas coisas”
3
... Porém, todas as escolhas seguiram um processo semelhante ao
do trabalho anterior, com alguns critérios melhor elaborados, ou seja, os alunos continuaram a
ter participação efetiva nas decisões e encaminhamentos das aulas, que inseridos em uma
organização mais aperfeiçoada, comumente verificada numa ordem de “progresso” natural.
Para tal organização, a partir da continuidade do grupo de estudos, de leituras e
discussões, no ano de 2001, dessa vez coordenado pelo professor Fernando J. Gonzalez, me
apropriei do instrumento de intervenção denominado de “Projeto Curricular Guia (PCG)”,
4
3
Palavras que os alunos usaram/usam para argumentar quanto aos motivos das escolhas por determinada
modalidade esportiva, como vimos no capítulo anterior.
4
Projeto elaborado pelo Prof. Ddo. Fernando Jaime Gonzalez, professor da Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ), responsável pelo grupo de estudos do qual fui integrante e do qual
me apropriei de praticamente todos elementos que fazem parte de minhas aulas atualmente.
que reúne alguns princípios orientadores gerais, desenvolvidos de forma coletiva, para
auxiliar na constituição de propostas curriculares adequadas para cada realidade escolar.
O conjunto de princípios organizados para a elaboração do projeto, antes de iniciar o
trabalho, e de outros que foram sendo constituídos durante seu andamento, são, segundo
Gonzalez, é este:
- O desenvolvimento do projeto é pautado pela idéia de aprendizagem, o que
significa uma clara explicitação dos conteúdos (procedimentais, conceituais e
atitudinais) que se entendem de responsabilidade da Educação Física. [...]
- O projeto deve ser coerente com a idéia de tematização da cultura corporal de
movimento, o que significa o tratamento da totalidade plural do rico patrimônio
desta dimensão da cultura. O motivo dessa decisão se localiza na idéia de que cada
uma das manifestações da cultura corporal de movimento proporciona ao sujeito
acessar uma dimensão de conhecimento e de experiência que outras não lhe
permitem, fazendo cada uma delas insubstituível. Isto significa que se não for
possibilitado ao estudante introduzir-se em cada uma das possibilidades do “se-
movimentar” que os seres humanos têm produzido no transcurso de sua existência,
ele perderá parte do acervo cultural da humanidade e uma possibilidade singular de
perceber o mundo e de perceber a si mesmo.
- O PCG deve propiciar possibilidades para a releitura e a apropriação crítica dos
conhecimentos da cultura corporal de movimento. Isso significa incluir os
conhecimentos que não fazem parte da socialização destas manifestações e a área
de conhecimento fora da escola, como também a contextualização da origem do
fenômeno e do lugar social que o mesmo desfruta na sociedade contemporânea.
- O PCG deve permitir aos projetos curriculares orientados por ele subordinarem-se
aos projetos escolares respectivos, o que significa que o PCG não poderia ser
pensado como “O” projeto curricular, independente da escola, mas como aquilo que
de fato se propõe a ser: um modelo, um guia, um instrumento de trabalho para
desenvolver projetos curriculares de Educação Física adequados aos projetos
escolares, que dialoguem com a escola e os entendimentos de Educação Física dos
professores. Não pode ser pensado como uma solução imposta, de amarrar o
professor a um projeto estranho, alheio, entre outras questões, às condições de
efetiva realização de qualquer projeto.
- Permitir a participação efetiva dos alunos no planejamento das unidades didáticas
sem, com isso, comprometer os princípios anteriormente mencionados [...] (2006,
p. 83-4).
Nesse sentido, pensou-se num projeto que explicitasse a necessidade de tematizar a
totalidade das manifestações que fazem parte da cultura corporal de movimento, para as séries
finais do Ensino Fundamental, com cinco eixos de conhecimentos que, por sua vez, foram
subdivididos.
Quadro 2 – Proposta de conteúdos para a Educação Física escolar
Esportes em que interação com
adversário direto ou com oposição direta
Esportes em que
não há interação com
adversário direto ou
com oposição direta
Ginástica Atividades expressivas
Jogos motores
Projetos
especiais
S
É
R
I
E
S
Translação
Luta
Campo
e taco
Quadra
dividida
ou muro
Invasão
Marca
Precisão
ou alvo
Estético
Movimentos
acrobáticos
Exercício
físico
Dança
Expressão
corporal
Populares,
tradicionais e
cooperativos
Conhecimentos
sobre a cultura
corporal de
movimento
Senso-
perceptivas
Fonte: elaboração do Professor Fernando J. Gonzalez, Unijuí.
O processo para o planejamento das aulas de Educação Física foi mantido
praticamente o mesmo do anterior, porém, como podemos ver no Quadro 2, com elementos
melhor definidos e classificados.
Assim como na escola da rede municipal, citada no capítulo anterior, na mesma época
o mesmo trabalho foi desenvolvido nessa escola da rede estadual, o que facilitou a
implementação desse programa de conteúdos a partir do ano de 2002.
Cabe ressaltar que não tenho a pretensão de utilizar o quadro de proposta de conteúdos
como uma proposição de trabalho, mas sim realizar uma análise de alguns recortes desse
instrumento de intervenção, que fazem parte do meu dia-a-dia enquanto professor.
3.1.
E
XPLANAÇÃO DE ALGUNS CONCEITOS DO QUADRO DE CONTEÚDOS
Nesta fase, as aulas de Educação Física são organizadas e planejadas desde o primeiro
encontro do ano, em conjunto com os alunos.
O quadro de conteúdos é mostrado para as turmas, cada qual nos seus dias e horários
pré-definidos. Isso acontece, de maneira expositiva e breve, com o grau de aprofundamento
respeitando as faixas etárias dos alunos, juntamente com algumas explicações a respeito de
alguns pontos importantes do programa de conteúdos. Todos os alunos devem ter uma cópia
desse quadro em seus cadernos, o qual será completado de acordo com os interesses de cada
turma.
Figura 1 Página do caderno de uma aluna da oitava série, contendo os eixos do Programa Curricular da
disciplina de Educação Física, a quantidade aproximada de cada unidade didática e a ordem de abordagem dos
conteúdos. Fonte: acervo particular.
3.2. P
ROCESSO DE ESCOLHA E SEQÜÊNCIA DE ABORDAGEM DOS CONTEÚDOS
O processo de escolha dos conteúdos a serem tematizados nas aulas acontece da
seguinte forma: os alunos, após a explanação inicial, citam todos os tipos de manifestações da
nossa cultura corporal de movimento que conhecem de alguma forma, através de práticas
anteriores, divulgação por algum tipo de mídia, entre outros. Essa citação deve respeitar as
dimensões do Projeto Curricular Guia, bem como de suas subdivisões.
Após, são selecionadas todas as manifestações “possíveis” de ser tematizadas na
realidade de nossa escola, ou seja, o fato de não dispormos de uma pista oficial de atletismo
não significa que não temos condições de abordar o atletismo em nossa escola.
Na seqüência, os alunos são desafiados a, mediante o quadro exposto, serem capazes
de escolher, de forma organizada, os conteúdos que farão parte do ano letivo da Educação
Física para cada turma. Esse processo é carregado de muita argumentação e troca de idéias. O
caso agora já não se limita apenas às escolhas de modalidades esportivas, por exemplo, que os
alunos nunca “praticaram”, mas sim, como ocorre nas turmas finais, os alunos devem levar
em conta o que já aprenderam nas próprias aulas de Educação Física anteriormente.
Feito isso, os alunos, novamente, têm a responsabilidade de definir a seqüência de
abordagem dos conteúdos, ou seja, o que a turma vai “aprender” primeiro e o que vai ficar
estabelecido para o decorrer do ano. Isso tudo levando em conta, no nosso caso, as estações
climáticas do ano. Por exemplo: conteúdos que podem ser desenvolvidos tanto dentro quanto
fora da sala de aula são abordados durante o período mais frio do ano.
Além disso, os alunos também definem a ordem das dimensões a ser organizada,
sendo que os esportes sempre garantem a eles as primeiras aulas do ano.
3.3.
U
NIDADES DE TRABALHO
Durante o período dessas aulas muitos momentos marcaram nossos encontros, sejam
eles de aprendizagem, de superação de limites, do nível de retorno que os alunos deram a
partir das aulas, entre outros, com questões relacionadas a atitudes, emoções e socialização.
Em termos didático-pedagógicos esses momentos foram e são balizados pelas idéias
dos conteúdos procedimentais, conceituais e atitudinais.
Os conteúdos de natureza procedimental envolvem o “saber fazer”, que inclui aqui o
saber operar com objetos e com informações.
Os procedimentos expressam um saber fazer, que envolve tomar decisões e realizar
uma série de ações, de forma ordenada e não aleatória, para atingir uma meta.
Os conteúdos conceituais envolvem a abordagem de conceitos, fatos e princípios, que
se referem à construção ativa das capacidades intelectuais para operar com símbolos, signos,
idéias e imagens que permitem representar a realidade. Geralmente são abordados quando se
discutem as categorias do esporte: conceito, características, exigências aos praticantes
(mecanismos e capacidades físicas).
os conteúdos atitudinais referem-se às atitudes, valores e normas. As atitudes são
bastante complexas, pois envolvem tanto a cognição (conhecimentos e crenças), quanto os
afetos (sentimentos e preferências) e as condutas (ações e declarações de intenção).
A escola é um contexto socializador, gerador de atitudes relativas ao conhecimento, ao
professor, aos colegas, às disciplinas, às tarefas e à sociedade. A não compreensão de atitudes,
valores e normas como conteúdos escolares faz com que estes sejam comunicados, sobretudo,
de forma inadvertida acabam por serem aprendidos sem que haja uma deliberação clara
sobre esse ensinamento.
Pretendo selecionar alguns desses momentos mais significativos e realizar uma breve
sistematização de como foram tematizadas algumas manifestações de nossa cultura corporal
de movimento, bem como exemplificá-las, a partir de fotos, cadernos, trabalhos e quadros,
enfim, momentos registrados e sistematizados pelos alunos.
Serão descritas apenas algumas unidades didáticas, mas todas as séries serão
contempladas nesse item, na tentativa de demonstrar a abrangência do trabalho.
3.3.1. O Jogo de Taco
(5ª série)
O Jogo de Taco é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida
pela turma a partir da Dimensão dos Jogos Populares, segundo nosso programa de conteúdos.
Esse jogo lembra muito o Críquete.
Essas aulas foram interessantes e chamaram minha atenção pelo fato de que,
praticamente, metade dos alunos sabia “jogar” e a outra metade nem conhecia o jogo.
Antes de começarmos as “aulas de taco”, os alunos tinham a tarefa de providenciar,
cada um, o seu material, ou seja, cada criança deveria ser responsável em ter o seu taco ou
bastão. As bolinhas, o professor e a escola providenciaram e as “casinhas” foram
improvisadas com materiais de sucata, entre os quais, latinhas e PET’s com um pouco de areia
dentro de cada um.
Figura 2 Alunos da turma da quinta série, com os materiais para as aulas sobre o “Jogo de Taco”. Fonte:
acervo particular.
No primeiro momento dessas aulas, a turma foi dividida em vários grupos, sendo que
deveriam ser formados por pelo menos dois alunos que já sabiam jogar, para desenvolverem a
função de “líderes”, auxiliando no processo de aprendizagem daqueles que não sabiam jogar
ainda. Foi proposta aos grupos, nesse momento, a criação de vários jogos simples, com a
intenção de explorar os materiais das aulas: taco, bolinhas e as “casinhas” em várias
possibilidades de práticas, para os alunos irem adquirindo ou melhorando os movimentos
necessários para se praticar o “Jogo de Taco”.
Num segundo momento, fomos então para a aprendizagem e prática do jogo em si. Os
líderes desempenharam bem suas funções de usar os seus conhecimentos para ensinar os
colegas, sustentados pela idéia de proporcionar a utilização do seu potencial gestual,
capacitando esse sujeito a refletir sobre as suas possibilidades corporais e, com autonomia,
exercê-las de maneira social e culturalmente significativa e adequada, segundo os PCN’s,
citados no primeiro capítulo.
As “aulas de taco” terminaram com a invenção de um jogo a partir do que os alunos
aprenderam nas aulas. Esse jogo ficou conhecido como “Taco Gigante”, com quatro bases no
lugar de duas e com oito alunos jogando ao mesmo tempo, no lugar de apenas quatro, com
uma dinâmica semelhante ao jogo de Beisebol.
Figura 3 Vista parcial da quadra da escola, com dois grupos praticando o jogo de “Taco Gigante”. Cada grupo
composto por oito alunos. Fonte: acervo particular
Figura 4 Vista parcial do “campinho”, com um grupo praticando o jogo de “Taco Gigante”. Fonte: acervo
particular.
Uma das avaliações sobre o “Jogo de Taco” foi a sistematização das regras que se
tornaram comuns a todos os alunos, através de escrita e desenhos, tentando dar conta de
critérios como espaço de jogo, pontuação e regras básicas. A partir disso, essas aulas se
caracterizaram pela possibilidade de os alunos não somente praticarem um jogo “ensinado”
pelo professor, mas de participarem direta e efetivamente do processo de apropriação de
conhecimentos com relação ao jogo específico.
3.3.2. A Dança
(5ª série)
A Dança é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida pela
turma, a partir da Dimensão das Atividades Expressivas, unidade da dança, segundo nosso
programa de conteúdos.
Trabalhar com a dança na escola, como conteúdo, talvez tenha sido o momento mais
desafiador nesse tempo em que estou atuando como professor, pelo fato de, particularmente,
nunca ter me envolvido ou me identificado com alguma atividade relacionada com o tema das
aulas, além das noções básicas de uma disciplina da graduação.
Porém, as aulas, trabalhadas nessa perspectiva de abordagem, não deixam espaço para
o professor desenvolver apenas os conteúdos de seu interesse particular, mas, sim, cumprir e
dar conta do que foi organizado e escolhido com a participação dos alunos, tentando dar conta
de uma das intenções da Educação Física escolar que é de contemplar os múltiplos
conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a respeito do corpo e do movimento,
concordando com Bracht, já devidamente citado no primeiro capítulo.
A unidade de dança foi desenvolvida próxima à época da Semana Farroupilha e, para
essas aulas, entrei em contato com a representação de um grupo de danças folclóricas do Rio
Grande do Sul, através de um professor que atuava junto ao CTG Clube Farroupilha, do
município de Ijuí.
No primeiro momento dessa unidade, foi realizada uma exploração de práticas
envolvendo música e movimentos corporais, tais como brincadeiras e atividades simples,
criadas pelos próprios grupos de alunos.
O momento seguinte foi dedicado para uma palestra sobre assuntos ligados aos
gaúchos e alguns de seus costumes, tais como hábitos, vestimentas de épocas distintas e
aspectos ligados à Revolução Farroupilha. Para essa aula, o diretor da escola na época
percebeu a importância do momento e permitiu que todas as séries, juntamente com os
respectivos professores responsáveis, tivessem oportunidade de estar presentes nessa palestra.
A mesma foi finalizada com uma aula sobre danças típicas (Pezinho e Maçanico) para todos
os alunos presentes que estavam interessados em aprender os passos; porém, toda a quinta
série que estava desenvolvendo a unidade deveria participar.
Figura 5 Palestra sobre aspectos da cultura gaúcha, ministrada pelo professor de dança do CTG Clube
Farroupilha de Ijuí/RS, para todos alunos de quinta à oitava séries. Fonte: acervo particular.
Figura 6 Início da aula prática para toda turma da quinta série e para alunos interessados, de sexta até oitava
séries. Fonte: acervo particular.
Figura 7 – Prática da coreografia oficial do “Maçanico”. Fonte: acervo particular.
A última parte de nossas aulas de dança foi dedicada à criação de uma coreografia
diferente para uma das danças aprendidas durante a palestra anterior. A turma toda foi
dividida em dois grupos, que tiveram uma aula inteira para se organizar, criar e ensaiar a
dança, que foi apresentada na aula seguinte. Um grupo apresentou ao outro o que conseguiu
criar.
Figuras 8 e 9 Apresentação da recriação da dança do “Maçanico”. Cada grupo com a sua coreografia. Fonte:
acervo particular.
Certamente essas aulas de dança foram mais marcantes para mim enquanto professor
do que para os alunos, pois consegui superar uma dificuldade minha relacionada às minhas
limitações quanto à expressão corporal, e consegui, também, dar conta dessa unidade de
trabalho de maneira adequada e coerente com o que essa perspectiva de Educação Física
proporciona.
3.3.3. O Judô
(6ª série)
O Judô é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida pela
turma, a partir da Dimensão dos Esportes, unidade das lutas, também segundo nosso
programa de conteúdos.
Essa unidade didática, com certeza, foi a mais polêmica e mais difícil para ser
trabalhada, pois o processo de esclarecimentos perante os alunos, sobre qual seria o caráter
das aulas, foi complexo e, principalmente, justificar a abordagem de um fenômeno de luta,
nas aulas de Educação Física, diante da equipe diretiva, sendo que o tema gerador, na época
era: “Paz no campo!”, também não foi um processo muito tranqüilo.
O primeiro passo foi explicar para a turma como seria tematizado o Judô nas nossas
aulas. A primeira reação dos alunos, quando é falado em aulas de luta ou aulas de judô, é a
empolgação dos meninos em “aprender a bater em alguém”
5
(e vão executando alguns
socos e chutes no ar) e o repúdio das meninas, imaginando que vão “apanhar dos meninos” e
que “não vai dar nem graça essas aulas!”.
6
Diante desse quadro inicial, a minha função, enquanto professor foi explicar, de
maneira clara, objetiva e enfática, para todos, as intenções de se trabalhar com a luta no
ambiente escolar e o modo como seria abordado o conteúdo no decorrer de nossos encontros,
pois não tínhamos (e não temos) a intenção de criarmos uma academia de luta na escola e,
sim, de proporcionar, para esses alunos, a tematização de mais essa manifestação de nossa
cultura corporal de movimento, adaptada à nossa realidade.
Quando essa questão havia sido contornada e compreendida por todos, o próximo
passo ficou por conta de argumentar e justificar quanto aos motivos dessas aulas de luta para a
equipe diretiva da escola que, num primeiro momento, achou inconcebível e inviável o
5
Palavras dos próprios meninos.
6
Algumas falas das meninas.
desenvolvimento desse conteúdo. Assim, praticamente as mesmas idéias e argumentos
passados para os alunos foram usadas para convencê-los e colocá-los a par de nossas aulas e
justificar sua importância no próprio desenvolvimento do tema da escola.
As aulas de luta tiveram etapas distintas: a) fase da exploração de brincadeiras com a
lógica do combate; b) divisão da turma em grupos e criação de uma luta em cada grupo, com
regras próprias; c) sistematização e socialização das regras criadas; d) sistematização dos
elementos comuns em cada luta inventada, a criação do “nosso judô”, com a participação de
toda a turma; e) produção de um vídeo “caseiro” com as explicações das regras da “nossa”
luta; e, por fim, f) a comparação das “nossas” regras, a partir de trabalhos escritos, com as
regras do Judô enquanto modalidade esportiva institucionalizada.
Figuras 10, 11, 12, 13, 14 e 15 Páginas de trabalhos de alunos com a sistematização das regras criadas nas
aulas que tematizaram o Judô. Fonte: acervo particular.
Deste modo, a partir das aulas dessa unidade didática, tematizando o Judô na escola, a
Educação Física escolar consegue cumprir uma de suas tarefas que, conforme Betti,
referenciado no primeiro capítulo, é a de preparar o aluno para ser um praticante lúcido e
ativo, conseguindo incorporar o esporte (no caso o Judô), as ginásticas, as atividades
expressivas e os jogos em sua vida e, conseqüentemente tirar o melhor proveito possível
deles.
3.3.4. O Atletismo
(6ª série)
O Atletismo é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida
pela turma, a partir da Dimensão dos Esportes, unidade das modalidades de marca, segundo
nosso programa de conteúdos.
Quando falamos em aulas de atletismo, principalmente para as turmas nas escolas, a
primeira questão que surge é: como praticar ou ter aulas de atletismo se na nossa escola o
existe uma pista, caixa de areia ou colchão, entre outros materiais?
A resposta está na própria pergunta, ou seja, quando se pensa em “aulas” sobre a
modalidade do atletismo, considero não ser imprescindível a existência de um complexo
esportivo para a realização das provas de pista e de campo, pois a intenção do trabalho é de
tematizar a referida modalidade na escola, de maneira que os alunos tenham possibilidade de
acesso a esse conteúdo, não tendo, necessariamente, a idéia da formação de uma equipe
representativa em que somente os “melhores” podem ter a chance de participar.
O atletismo é um bom exemplo da abordagem do esporte “da” escola e não do esporte
“na” escola, segundo Bracht, pois, apesar de a modalidade institucionalizada exigir uma
estrutura complexa para a sua prática, para essa perspectiva de aulas de Educação Física
escolar, é o conteúdo que menos requer materiais para o desenvolvimento das aulas.
A turma da sexta série foi dividida em três grupos, cada qual com o objetivo de criar
alguns jogos, de acordo com alguns requisitos pré-estabelecidos. O atletismo foi subdividido
em corridas (rápidas, revezamento e obstáculos), saltos e lançamentos ou arremesso. Ao final
do processo de escolha e de organização das aulas de atletismo, ficou combinado que os
grupos criariam jogos a partir dos elementos básicos das corridas e dos saltos, abrindo mão
das provas de lançamentos e arremesso, em função do aspecto da quantidade de aulas
previstas para essa unidade.
Cada grupo, então, ficou responsável pela invenção de uma corrida e um salto, com
algumas diferenças básicas entre si, ou seja, um grupo foi designado a criar uma corrida com
obstáculos e um salto em distância; outro grupo uma corrida “rápida” e um salto em altura e o
último, por uma corrida de revezamento e um salto com auxílio de algum objeto.
O passo seguinte foi destinado ao processo de criação propriamente dito, pois cada
grupo deveria elaborar, praticar, testar, modificar, reformular, praticar novamente, até
chegarem a uma estrutura nima com regras definidas de um jogo inventado e praticadas de
comum acordo entre todos.
Figura 16 Um dos grupos ajustando as regras de uma das “provas” de atletismo que criaram. Fonte: acervo
particular.
Figura 17 Outro grupo confeccionando materiais para serem utilizados na “prova” que foi criada. Fonte:
acervo particular.
Após, cada grupo deveria sistematizar as regras criadas e apresentá-las no formato de
um trabalho escrito com desenhos e explicações do que foi criado. Os grupos apresentaram
para toda a turma e todos os alunos praticaram algumas vezes o que lhes foi mostrado.
Figuras 18 e 19 Páginas do trabalho com as regras e um desenho sobre a “corrida com obstáculos” que o
grupo conseguiu criar. Fonte: acervo particular.
Figuras 20, 21 e 22 Páginas do trabalho com regras e desenhos sobre a “corrida de revezamento” criada pelo
grupo. Fonte: acervo particular.
Ao final dessa unidade foi realizado um “mini-torneio” interno, sendo que cada grupo
era uma equipe e todas as provas criadas foram praticadas por todos. Pontos foram destinados
para cada jogo e, ao final, foi contabilizada a quantidade que cada equipe conseguiu alcançar.
Os resultados dessas provas foram comparados com os recordes das provas oficiais e
estabelecidas relações entre as marcas alcançadas pelos alunos e as atingidas pelos atletas de
alto nível.
A partir dessa estrutura de aula de Educação Física, todos os alunos (não somente
dessa turma, mas de todas com que trabalhei com o atletismo) têm a possibilidade de
participar de forma ativa e lúcida das aulas dessa unidade didática, mesmo a escola não
possuindo um complexo poliesportivo com as dimensões oficiais para as provas de pista e de
campo.
Figura 23 – Aluna executando uma tentativa do “salto com vara”. Fonte: acervo particular.
Figura 24 – Registro de uma parte da “prova” da “corrida de revezamento”, criada e adaptada pelo grupo. Fonte:
acervo particular.
3.3.5. O Golfe
(7ª série)
O Golfe é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida pela
turma, a partir da Dimensão dos Esportes, unidade das modalidades de Precisão ou Alvo,
segundo nosso programa de conteúdos.
Esse conteúdo é outro que, num primeiro momento, parece improvável ter condições
para ser trabalhado na escola.
Na aula anterior ao início do trabalho com o golfe, os alunos tinham a tarefa de
confeccionar um taco que pudesse ser usado para as aulas práticas. Algumas idéias e
sugestões surgiram dos próprios alunos para a construção dos materiais. Todos acabaram
utilizando um pedaço de cano plástico, adaptando uma embalagem de xampu em uma das
extremidades do “taco”. Para esse processo, se pensou na continuidade das aulas, pois o
conteúdo seguinte a ser abordado pela turma seria o hóquei. Então pensamos em construir
algo que pudesse ser utilizado tanto para um conteúdo quanto para o outro.
Figura 25 – Turma da sétima série com os tacos e as bolinhas para prática das aulas. Fonte: acervo particular.
A turma foi dividida em grupos, que foram distribuídos pelos vários espaços do pátio
da escola: campinho de grama, quadra, bosque e pracinha. A primeira aula foi destinada à
exploração dos materiais (tacos e bolinhas), nos respectivos espaços destinados para cada
grupo.
Logo após, os grupos tiveram que começar o processo de criação de um jogo, nos
espaços da escola que escolheram, com alguns elementos básicos, comuns para todos: início,
um alvo, pontuação e as regras principais. Esse momento foi alternado entre práticas,
conversas, mais práticas e acertos entre os próprios alunos até chegarem a um consenso.
O próximo passo das aulas foi a sistematização do que havia sido criado, a partir das
regras de cada grupo, a assimilação do que havia sido feito em comum entre eles e o ajuste de
regras criadas no grande grupo para todos praticarem. Essa fase ficou caracterizada pela
conversa e argumentação para se chegar a um consenso. Fizemos algumas comparações com
a modalidade oficial do golfe e incluímos duas contagens de pontos: o par de campo e o par
de buraco.
Feito isso, voltamos para a “prática”! Todos os grupos passaram determinado tempo
em cada espaço de jogo até completarem duas voltas nos quatro lugares destinados para o
jogo e realizar o controle da pontuação de cada “jogador”.
Figura 26 Um dos grupos praticando, criando e ajustando as regras do seu jogo, no espaço do “campinho”.
Fonte: acervo particular.
Figuras 27 e 28 – Registros de momentos das práticas dos jogos criados pelos grupos. Fonte:acervo particular.
Essa foi a fase mais interessante das aulas, pois foi o momento em que todos os alunos
puderam praticar bastante o golfe, da maneira que podíamos realizar, com a consciência de
que estavam todos jogando algo diferente e, ao mesmo tempo, experimentando um conteúdo
que cada um se sentiu responsável pela tematização. Outro fato que chamou minha atenção
foi que os alunos que mais se destacavam em modalidades esportivas tradicionais, como
futebol, por exemplo, tiveram que ver colegas, principalmente meninas, se destacarem e até
chegarem em primeiro lugar na contagem de pontos, possibilitando a todos, além da prática, a
chance de potencializarem suas capacidades e habilidades.
Logo após, o conteúdo foi dividido nos aspectos do espaço de jogo, contagem de
pontos, regras básicas e O “Nosso” Golfe X O Golfe. Um sorteio definiu o que cada grupo
deveria apresentar.
A finalização dessa unidade didática foi com a apresentação dos grupos, que não
pouparam criatividade para mostrarem aos colegas o que haviam aprendido nas aulas sobre o
golfe.
Figura 29 – Maquetes dos quatro espaços para as práticas do “Nosso Golfe”. Fonte: acervo particular.
Figuras 30, 31, 32 e 33 – Trabalho final do grupo responsável pelas regras básicas do “nosso golfe”. Fonte:
acervo particular.
3.3.6. O Hóquei
(7ª série)
O Hóquei é uma das manifestações da cultura corporal de movimento, escolhida pela
turma, a partir da Dimensão dos Esportes, unidade das modalidades de Invasão, segundo
nosso programa de conteúdos.
Esse conteúdo teve como objetivo principal, também, que as aulas de Educação Física
escolar conseguissem dar conta da tematização de uma modalidade esportiva pouco comum
para os alunos.
No começo das aulas foram destacadas duas perguntas para o grupo de alunos tentar
responder: o que sabemos sobre o Hóquei? O que queremos saber sobre o Hóquei? Essa
unidade didática foi estruturada a partir dessas duas questões que fiz para os alunos, com a
tentativa de responder, em boa parte, cada uma delas da melhor maneira possível.
A estrutura dessas aulas é sustentada pela idéia, citada no primeiro capítulo, a partir
dos PCN’s, da necessidade de mudança da ênfase na aptidão física e no rendimento
padronizado que ainda, de certa forma, caracteriza a Educação Física, para uma concepção
mais ampla, que conta de todas as dimensões envolvidas em cada prática corporal, seja ela
uma modalidade esportiva tradicional ou não, ou uma ginástica, uma dança ou um jogo.
A partir disso, as aulas continuaram com a exploração inicial dos materiais, tais como
taco e bolinhas de tênis. Os próprios alunos criaram alguns jogos simples e, também, fizeram
a adaptação da tradicional brincadeira do “Bobinho”, porém, com a utilização dos tacos. Tudo
isso com a intenção de iniciar os alunos com algumas técnicas básicas do jogo de hóquei.
Como os alunos nunca tiveram a oportunidade de praticar tal esporte, decidi dar certa
ênfase no aprimoramento de algumas técnicas que julguei importantes para o andamento de
nossas aulas de hóquei, tais como a condução da bolinha, o passe e recepção e o arremate ao
gol. Tudo isso com a intenção principal de fazer os alunos irem se adaptando ao uso do
stick” (como é conhecido o taco), situação que era nova para todos eles, em termos de
prática corporal.
Figura 34 – Registro do desenvolvimento da técnica de condução da bolinha. Fonte: acervo particular.
Dessa vez a turma foi dividida em dois grupos, que tinham a função de, a partir de um
jogo reduzido de três contra três, criar regras próprias para praticar o hóquei, tendo como base
o desenvolvimento das técnicas aprendidas no início das aulas.
Após esse momento, as regras foram socializadas entre a turma e, a partir de minha
intervenção, formalizamos o que se criou de comum nos grupos para sistematizarmos regras
para a prática do “nosso” hóquei. Os alunos jogaram bastante até assimilarem minimamente o
que foi feito por eles também. Feito isso, demos prioridade para desenvolvermos as idéias dos
papéis e subpapéis táticos de ataque e defesa, utilizando a modalidade esportiva do hóquei, a
partir de exercícios práticos e uma parte teórica sobre esse assunto. Além disso, encerramos
essas aulas com a elaboração e entrega de um trabalho escrito, individualmente, sobre o que
havia sido trabalhado.
Figura 35 Vista parcial da quadra da escola, com um dos grupos praticando e organizando seu jogo, com
elementos do hóquei. Fonte: acervo particular.
Figura 36 Vista parcial da quadra da escola, com o outro grupo praticando e organizando seu jogo com
elementos do hóquei. Fonte: acervo particular.
Enfim, os alunos da sétima série puderam ter contato com uma das várias modalidades
esportivas possíveis de serem trabalhadas na escola, como um todo, tematizando-a de uma
forma minimamente coerente, possibilitando para todos a apropriação dessa manifestação de
nossa cultura corporal de movimento.
3.3.7. A Ginástica Olímpica
(8ª série)
A Ginástica Olímpica é uma das manifestações da cultura corporal de movimento,
escolhida pela turma, a partir da Dimensão dos Esportes, unidade das modalidades Estéticas,
segundo nosso programa de conteúdos.
Essa unidade didática proporcionou para os alunos momentos de superação de seus
próprios limites e inseguranças, com relação a algumas práticas corporais, desde a execução
de um rolinho para a frente, passando pela parada de mãos, chegando ao salto com pirueta.
“Não vou conseguir virar desse jeito!”, “Nunca pensei que ia fazer isso!”, “Só a gente
tentando pra ver se consegue fazer!”. Essas frases dos alunos foram minhas referências para
afirmar a superação dos limites, citada no início do parágrafo.
Muito mais do que realizar uma acrobacia esteticamente bem executada, é importante,
nessas aulas, que cada aluno perceba a si mesmo e a seu próprio corpo, a partir de suas
possibilidades e/ou limitações motoras, pois cabe à Educação Física buscar a compreensão do
corpo e do movimento, despertando nos educandos uma consciência corporal que lhes permita
perceberem-se no mundo em que vivem, conforme já referenciado no primeiro capítulo.
Outro fato significativo foi a aquisição dos materiais utilizados para as práticas:
colchonetes, cano plástico, trampolim de câmera de caminhão e um colchão grande, quase
todos conseguidos por mim, com exceção do colchão grande, que a escola adquiriu
especialmente para essas aulas. Fato esse conquistado a partir da consideração pelo histórico
recente das aulas de Educação Física e da justificativa da importância que seria para a
aprendizagem dos alunos se a escola adquirisse, mesmo que por um valor alto para os padrões
de nossa realidade escolar.
Figura 37 Turma da oitava série com os materiais para as aulas de ginástica: trampolim (confeccionado pela
turma),colchão e colchonetes. Fonte: acervo particular.
Com os materiais à disposição, os alunos foram desafiados a realizar, cada qual à sua
maneira, mas com meu auxílio e minha orientação, alguns elementos básicos da ginástica, tais
como: meia pirueta, pirueta, rolinho para a frente, rolinho para trás, parada de mãos, a roda
(estrelinha), saltos sobre um colega, sobre um cano plástico e, finalmente, saltos com a
utilização do nosso trampolim. Essa etapa de nossas aulas ocupou a maior parte do tempo,
pois era algo novo para os alunos, uma vez que todos tinham dificuldades para realizar os
movimentos mas, por outro lado, queriam melhorar cada vez mais a execução das acrobacias
que haviam aprendido.
Figuras 38 e 39 Alunos executando alguns movimentos básicos da ginástica: rolinho de costas e “salto livre
sobre o cano”. Fonte: acervo particular.
Depois dessa etapa, como forma de avaliação, cada aluno teve que, a partir das
práticas anteriores, elaborar e aprimorar uma seqüência de movimentos que deveriam ser
apresentados para toda a turma. Alunos que não conseguiam realizar um rolinho para a frente,
superaram essa dificuldade. Outros, que tinham receio de executar uma parada de mãos,
conseguiram ficar um tempo mínimo de cabeça para baixo, sustentados pelos próprios braços.
Certamente foram sensações que marcaram significativamente a vida escolar desses alunos.
“Vou treinar e fazer em casa essa parada de mão!”, “Vou mostrar pra minha mãe o que
consigo fazer agora!”. Esses são alguns registros de frases efetuados durante os últimos
momentos dessas aulas.
Figura 40 Registro de parte da seqüência de movimentos elaborada e apresentada por uma aluna, para toda
turma. Fonte: acervo particular.
3.3.8. As Manifestações do Esporte
(8ª série)
As Manifestações do Esporte foi um conteúdo abordado em nossas aulas de Educação
Física escolar, a partir da Dimensão dos Projetos Especiais, unidade didática dos
conhecimentos sobre a cultura corporal de movimento. Esse conteúdo conceitual foi
incorporado, juntamente com as aulas dos esportes, justamente por possuir relação
significativa entre essas duas temáticas.
A intenção foi tentar esclarecer, para os alunos, as diferentes maneiras pelas quais o
esporte se manifesta em nossa sociedade, como esporte de rendimento, esporte educação e
esporte de lazer, e tentar estabelecer alguma relação com as nossas aulas de Educação Física
na escola.
Esse conteúdo foi desenvolvido de uma forma teórica, a partir da leitura e análise de
alguns textos sobre o tema. A turma da oitava série foi dividida em três grupos e cada qual se
responsabilizou por uma manifestação diferente.
Num primeiro momento, os alunos assistiram a um deo e receberam os textos que
continham as concepções das três manifestações do esporte. Deveriam ler os três, para ter
uma noção de todas e, logo após, se deter apenas no tema do seu grupo.
Foram passados os passos que deveriam ser realizados para a conclusão do trabalho.
Cada grupo teria que entender bem o seu assunto, elaborar um resumo com os aspectos mais
importantes, tentar identificar os locais e as situações onde a sua manifestação do esporte
acontecia e, também, se apropriar dos outros dois temas para poder elaborar uma série de
questionamentos para os outros grupos responderem, no seminário que seria realizado para o
fechamento dessa unidade didática.
Figuras 41 e 42 Registro de páginas do trabalho da manifestação do “Esporte Educação”. Fonte: acervo
particular.
Em outras palavras, cada grupo, ao final do trabalho, deveria tentar argumentar e
defender a posição de que a sua manifestação do esporte era a melhor e mais interessante de
todas.
Durante a realização do seminário, cada grupo teve um tempo para apresentar o que
havia entendido do seu tema, com a utilização de cartazes para melhor visualização do
restante da turma. Logo após ocorreu o esperado debate entre as diferentes correntes. Os
grupos se revezaram em perguntar e responder, a partir do que haviam lido e entendido dos
seus assuntos, sempre na tentativa de provar as melhores intenções de determinada
manifestação do esporte.
Ao final, constituímos um quadro comparativo entre as três diferentes manifestações
do esporte, pautado pelos seguintes critérios: as principais idéias, o perfil dos participantes,
como se constituem as regras, o espaço para a prática e as atitudes mais significativas.
Figura 43 Registro do quadro comparativo entre as manifestações do esporte, pautado pelos seguintes
aspectos: idéias principais, participantes, regras, espaço de jogo e atitudes mais significativas. Fonte: acervo
particular.
Foram momentos que geraram muita discussão, argumentação e apropriação desses
conhecimentos, pois, até então, nenhum aluno possuía o discernimento para conseguir
visualizar e compreender as várias formas de como o esporte se apresenta em nossa
sociedade. É um dos propósitos da Educação Física escolar, citado no primeiro capítulo, a
partir de Betti, preparar o aluno para ser um consumidor do esporte espetáculo,
desenvolvendo uma visão crítica do sistema esportivo profissional e dos instrumentos
conceituais e perceptivos para que ocorra uma apreciação estética e técnica do esporte, ao
mesmo tempo em que auxilia o aluno a analisar criticamente as informações que recebe dos
meios de comunicação sobre a cultura corporal de movimento.
Isso auxiliou diretamente no andamento de nossas aulas, pois alguns alunos ainda
insistiam em ver nas aulas sobre esporte momentos de pura competição, performance e
resultados, situação que, após esses momentos, foram significativamente modificadas.
3.4.D
ILEMAS
Durante todos esses anos de trabalho com Educação Física escolar, além de todas as
questões que surgiram, possíveis de serem analisadas, alguns aspectos significativos
estiveram mais presentes em vários momentos das aulas, desde os planejamentos, passando
pelos momentos com os alunos e chegando até as avaliações.
Entre esses pontos, quero destacar a hegemonia que o fenômeno do futebol exerce em
nossas aulas, as implicações da formação acadêmica do professor nas aulas na escola, assim
como a respeito do discurso para justificar a precariedade nas aulas de Educação Física e os
principais aspectos da motivação para manter e tentar melhorar o trabalho.
3.4.1.Hegemonia do futebol
Desde o início do trabalho, na perspectiva do planejamento participativo nas aulas de
Educação Física, todas as vezes que os alunos tiveram a oportunidade de escolher os
fenômenos da dimensão do esporte, o primeiro termo que surgia era:
FUTEBOL
!”. Questões
óbvias, ligadas à massificação do futebol, interferência da mídia, aspectos histórico/culturais,
influenciam diretamente e explicam os motivos para os alunos elencarem o futebol como
primeira opção de escolha.
Apesar disso, dentro do processo de planejamento das aulas, com a participação
efetiva dos alunos, foi possível tematizar algumas outras possibilidades de manifestações
corporais, tais como basquete, handebol (como mais conhecidos), futebol americano, hóquei
(como menos conhecidos), para que fossem trabalhados no lugar que seria atribuído ao
futebol.
A intenção dessa perspectiva de trabalho na Educação Física não é de negar a “cultura
do futebol” em nossa sociedade. Muito pelo contrário, objetiva-se tematizar esse fenômeno no
ambiente escolar de uma maneira crítica e contextualizada com cada realidade. Além disso,
proporcionar aos alunos uma pluralidade de vivências motoras a partir das mais variadas
formas possíveis de manifestações de nossa cultura corporal de movimento.
Não se trata, de forma alguma, de querer colocar o Futebol, enquanto conteúdo, contra
outra modalidade esportiva. Esse tipo de trabalho não tem a intenção de forçar” os alunos a
aprender/vivenciar outros tipos de esportes. Um dos objetivos é de abordar os esportes
enquanto suas lógicas internas, suas dinâmicas e, sim, utilizar as modalidades como o
futebol, o handebol, o futebol americano... para auxiliarem no desenvolvimento dessa
perspectiva de trabalho.
O que mais chamou a atenção foi que, apesar da insistente procura e preferência pelo
futebol, durante o processo de escolha e negociação com os alunos, eles mesmos acabavam
por optar por outra modalidade esportiva para ser tematizada, ao invés de ser escolhido o
futebol. Ou seja: os próprios alunos participam da tomada de decisão que rompe com aquela
hegemonia do futebol para os meninos e o voleibol para as meninas, pois ficou definido,
dentro de um planejamento, que não querem mais “só jogar bola”.
A partir do momento em que os alunos começaram a visualizar outras possibilidades
de “praticar” modalidades esportivas até então desconhecidas, em algumas situações,
visualizou-se o fenômeno do futebol com outros olhos e com outros entendimentos. Quando
se consegue tematizar outra manifestação da cultura corporal de movimento, a concepção do
aluno sobre o futebol muda, pois a visão de fora de sua ótica ajuda nessa mudança de
compreender que não existe somente o futebol como conteúdo da Educação Física e, ainda,
quando forem retomadas as aulas, em algum momento, os próprios alunos não vão querer
“apenas” jogar bola.
As tematizações de manifestações da cultura corporal de movimento que não são o
Futebol e outras tidas como “tradicionais”, dependendo da situação, acabam gerando certos
desconfortos, principalmente diante dos professores das outras áreas e,também, da direção da
escola. Podem ser citados dois exemplos: o Judô e o Beisebol. O primeiro originou uma rie
de “brincadeiras de lutinhas” entre os alunos, enquanto esperavam os veículos do transporte
escolar, após o rmino das aulas, quando as crianças ficavam aguardando em um gramado
muito propício para essas práticas. Observando de longe, era muito interessante presenciar
aquele momento, com os “olhos” da Educação Física. Várias duplas de alunos brincando e
transferindo as normas criadas pelos próprios alunos para aquele momento fora da aula. Já, a
partir de outros olhares, comentários como: “Meu Deus! Essas crianças vão se quebrar!”, “Só
vão parar quando alguém sair machucado!” foram freqüentes.
o Beisebol acabou substituindo o Futebol em alguns recreios, por conta dos alunos,
com a organização de um campinho na frente da escola e outro na quadra. Porém, em função
de alguns incidentes com os bastões, que eram atirados para trás depois das rebatidas,
enquanto que a regra diz que o taco precisa ser jogado pra dentro do campo, exatamente para
a segurança de seus praticantes, a direção da escola acabou pedindo a interferência do
professor de Educação Física para controlar essa situação e até mesmo incentivar para os
alunos trocarem as bolinhas e os bastões pela... BOLA DE FUTEBOL!, pois era “mais
seguro”.
Ora, toda mudança, tudo o que não é “normal” no dia-a-dia necessita de justificação
para fazer parte da rotina dos alunos e da escola. Um aluno pode se machucar tanto num jogo
de futebol quanto numa partida de beisebol. Pode cair e bater o rosto no chão durante uma
disputa de bola ou num movimento das lutas. Mas o entendimento dessas situações limitou-se
a ficar no universo dos alunos e do professor de Educação Física, não conseguindo tocar os
outros professores, funcionários e equipe diretiva.
3.4.2. Implicações da formação do professor nas aulas de Educação Física
Um aspecto muito presente e, às vezes, polêmico é o fato de serem desenvolvidas
aulas sobre alguns fenômenos pouco comuns quando falamos sobre aulas de Educação Física.
Como é possível tematizar o golfe, o hóquei, a bocha, o tênis e o judô, por exemplo, se o
professor nunca “treinou” nenhuma dessas modalidades? Como o professor atua nas aulas de
judô, se nunca vestiu um quimono? Como acontece esse processo de ensinar aos alunos algo
que o professor não teve sequer um contato durante a graduação?
Existe certo pré-conceito de que professor de Educação Física tem que ser uma pessoa
magra, com um ótimo condicionamento físico e que, principalmente, precisa saber executar
todos os gestos técnicos das modalidades esportivas para poder servir de “modelo” para os
alunos.
O professor de Educação Física não precisa ser um exímio atleta, capaz de realizar
todas as técnicas esportivas. Pensemos o contrário: o aluno vai deixar de aprender a chutar
uma bola se não ver o professor realizar o gesto? O aluno não vai aprender a executar um
rolinho simples só porque o professor não consegue realizar o movimento exato? Com certeza
o aluno vai aprender e entender o judô, por exemplo, o espaço para a prática, a pontuação, os
objetivos e suas regras básicas, vivenciando minimamente a lógica interna dos esportes de
luta sem precisar freqüentar uma academia, uma escolinha esportiva e, também, sem o
professor ser um “faixa preta”.
De fato, durante a graduação os futuros professores não recebem subsídios suficientes
para muitas das aulas que são possíveis de ser realizadas na escola. Por mais que os currículos
sejam alterados, incrementados, aperfeiçoados, a formação do profissional deve continuar
além da universidade.
7
A busca pelo conhecimento, para suprir alguma necessidade ou
expectativa dos alunos, deve ser constante. Porém, essa busca não pode se limitar somente às
atualizações das regras das modalidades tradicionais, como futsal ou voleibol, e sim a como
abordar determinado esporte, como fazer o aluno se apropriar de determinada modalidade
esportiva, o que é realmente importante e o que pode ser deixado de lado.
Essa perspectiva de trabalho indicativos para uma outra forma de privilegiar os
conteúdos, em especial no que se refere ao esporte tematizado “como um fenômeno cultural
que tem de ser sistematizado e transformado em objeto de conhecimento para converter-se em
conteúdo escolar, passando por uma análise que permita organizar esse conhecimento”
(G
ONZALEZ
, 2006, p. 89). Isso porque, se as modalidades esportivas fossem trabalhadas e
abordadas com um fim nelas mesmas, em função da quantidade de esportes existentes, um
curso normal de Educação Física, que tem duração de aproximadamente 4 a 5 anos, levaria
muito mais tempo para poder dar conta de todas ou quase todas as modalidades que
demandam os interesses dos acadêmicos.
3.4.3. A “falta de materiais” nas aulas de Educação Física
A principal ou uma das principais “desculpas” dos professores de Educação Física que
interfere diretamente no (possível) planejamento e desenvolvimento das aulas é a
precariedade de materiais e espaços físicos adequados que a escola tem condições de oferecer.
Esse discurso foi muito debatido, questionado e polemizado durante, praticamente, toda a
7
Atualmente existe uma tentativa de alcançar essa abrangência no Curso de Educação Física em que fui
formado, porém, tive contato e tentei me apropriar dessa perspectiva de trabalho após minha formação
acadêmica.
minha graduação, sendo que, em alguns momentos, tínhamos que nos deter a produzir
materiais didáticos alternativos possíveis de ser aproveitados nas aulas de Educação Física em
uma escola que não pudesse oferecer condições adequadas para as práticas.
Atualmente a falta ou a limitação de materiais, como bolas, redes, colchões, cordas,
entre outros, é sim uma dificuldade encontrada por nós, professores de Educação Física.
Outro fator é a questão que se refere aos espaços físicos destinados ao desenvolvimento das
aulas, que às vezes são inadequados, pequenos ou até mesmo inexistentes no ambiente da
escola.
Uma situação pertinente nesses anos de trabalho, nessa perspectiva, foi que a
metodologia de desenvolvimento das aulas interfere diretamente na questão dos “materiais”
para as aulas. Se a Educação Física for trabalhada na perspectiva de treinamento, de
performance, de desenvolvimento da aptidão física, a estrutura de materiais e espaços
destinados às aulas deve ser o mais próximo da realidade do alto nível de treinamento
possível, com várias bolas de várias modalidades esportivas (pelo menos uma bola para cada
dois ou no máximo três alunos), espaços físicos com as dimensões oficiais, instituídas pelas
federações e confederações esportivas, dentre outros.
Por outro lado, se a Educação Física for trabalhada na escola numa perspectiva crítica,
tematizando as manifestações da cultura corporal de movimento e abordando o esporte “da”
escola e não “na” escola, a questão dos materiais e espaços adequados já toma um outro rumo.
As bolas, as redes, as raquetes, os bastões, os tacos, as quadras, os campos, as pistas de
corridas, entre outros materiais e espaços, acabam sendo um item incorporado no próprio
planejamento e organização das aulas em conjunto com os alunos e integrado no processo de
avaliação das aulas, por exemplo.
Não sabemos se alguma escola pública possui um complexo esportivo com quadras
desportivas, pista de atletismo, campo de golfe, quadra de tênis, um tatame para as lutas,
velódromo, quadra para o badminton, campo de futebol americano ou piscina oficial.
Provavelmente nenhuma. Porém, o fato de a escola não dispor dessas estruturas, ou de alguma
delas, não significa que os alunos não possam ter a oportunidade de vivenciar, conhecer, criar,
transformar e aprender conhecimentos básicos sobre qualquer manifestação da cultura
corporal de movimento.
Além disso, o entendimento que se tem da responsabilidade da Educação Física na
escola está diretamente relacionado com a avaliação que se faz dos espaços/materiais
disponíveis, pois podemos dispor de apenas uma bola velha de futebol para nossas aulas,
independentemente do mero de turmas e de alunos, até um espaço próprio para serem
armazenadas bolas, colchões, cordas, redes, raquetes, entre outros. Isso tudo vai depender do
papel que a Educação Física estiver desenvolvendo no ambiente escolar.
8
Podemos muito bem
desenvolver um trabalho em uma turma de sexta série, na dimensão dos esportes, com
unidades didáticas de Judô, Atletismo e Futsal, por exemplo. Isso não significa que a escola
deva dispor de um tatame para a luta, uma pista de atletismo oficial e uma quadra oficial
(geralmente uma quadra as escolas possuem, de acordo com as condições de cada contexto).
Nesse momento é que entra a questão da metodologia de trabalho do professor de Educação
Física, que, dentro do seu planejamento, fará a tematização dessas modalidades esportivas de
acordo com as condições e realidade da comunidade escolar que está inserido. Em nossas
aulas, por exemplo, estão caracterizados o “nosso” judô, o “nosso” atletismo, pois são
fenômenos abordados na escola de uma forma adaptada, mas que não deixam de proporcionar
aos alunos as vivências das lógicas internas de cada modalidade esportiva, seja ela uma luta,
um esporte de invasão, um esporte de quadra dividida, uma ginástica, entre outros.
Assim, também, concordando com Bracht,
a corrida como realizada no esporte atletismo, não é uma manifestação apenas
biológica do corpo, mas uma construção histórica com um determinado significado
social. Mas qual seu significado? Este significado é imutável? Podemos alterá-lo,
atribuir novos? Estas questões passam então a ser objeto também de nossas aulas,
pois temos a atribuição de propiciar aos nossos alunos que se apropriem dessa
manifestação cultural (no seu sentido amplo), mas não apenas de forma a repeti-la
e, sim, de forma a permitir que participem dessa construção, para o que é
fundamental que a compreendam, que aprendam também a construir cultura
(corporal,
de movimento ou corporal de movimento) (2004, p. 2).
Para essas vivências, os alunos desenvolvem suas raquetes de tênis, criam seus
espaços para o judô, confeccionam os tacos para o golfe. Porém, o fato de haver todas essas
limitações materiais e de espaços adequados, não se pretende de forma alguma fazer uma
apologia à precariedade, mas, também, reconhecer que esta precariedade não constitui
argumento decisivo para o professor não fazer nada em suas aulas ou encontrar desculpas para
realizar um trabalho precário e limitado.
3.4.4. Motivações para manter o trabalho – estar sozinho...
“Você está trabalhando assim em função da monografia? Esse tipo de trabalho vai
acontecer nos anos iniciais do exercício da profissão?”. Essas e outras perguntas e
8
Exemplo disso é o caso do colchão que a escola adquiriu especialmente para as aulas de Educação Física que
tematizaram a ginástica. A partir do meu pedido, enquanto professor, e do trabalho anterior, reconhecido, a essas
aulas, a equipe diretiva entendeu ser importante a aquisição desse material para incrementar nossas aulas.
comentários foram surgindo durante todo o processo de implementação dessas aulas de
Educação Física. Aconteceram algumas oportunidades de debates e apresentações desse
trabalho para grupos variados e essas indagações fizeram parte de praticamente todas as
discussões.
Seria muito tranqüilo e bem cil para o professor, que trabalha em uma escola de
interior, com turmas pequenas, que possui, ao redor dos espaços utilizados para as aulas de
Educação Física, lavouras, potreiros, muitas árvores e muito mato, “largar” uma bola de
futebol entre outros materiais e deixar que os alunos joguem, brinquem e se auto-organizem,
pois afinal, ninguém está “cuidando” o que o professor faz ou deixa de fazer. Entretanto,
se formos analisar, uma das grandes reclamações dos professores é exatamente a dificuldade e
a limitação que a escola oferece em termos de espaços adequados para as aulas de Educação
Física. Isso é um problema? Sim, é um problema. Mas, assim como a precariedade dos
materiais, esse fator não pode ser usado como desculpa pelos professores para limitar suas
atuações enquanto educadores responsáveis por uma importante área do conhecimento, que é
a Educação Física escolar. Aliás, essas situações é que devem ser os fatores determinantes
para a motivação do professor. No lugar do comodismo, tentar visualizar, em uma árvore, um
elemento para ser explorado nas aulas; um mato se transformar nas os dos alunos e do
professor; a quantidade de alunos das turmas ser vista como um ponto positivo, pois as
vivências acontecem com mais freqüência.
Outro ponto importante que precisa ser abordado, e que foi muito questionado
também, é como encontrar motivação para trabalhar se, aparentemente, o professor está
distante dos centros onde, teoricamente, tudo acontece, longe de colegas que, em princípio,
poderiam colaborar no desenvolvimento desse processo e, principalmente, o fato de trabalhar
sozinho.
Talvez esteja o fator principal para o professor conseguir realizar seu trabalho:
pensar e agir sozinho. Essa frase pode parecer “forte” num primeiro momento; porém, tem a
intenção de apontar para o fato de que é mais fácil trabalhar como único professor de
Educação Física em uma escola. Mas esse “pensar e agir sozinho” estão baseados em
princípios e perspectivas teóricas referenciadas por pensadores, que estão sempre atuando,
discutindo e refletindo acerca de elementos pertinentes para a nossa área. Não podemos
confundir esse trabalhar “sozinho”, com o fato de o professor fazer o que quiser e bem
entender de suas aulas e sua atuação com os alunos (embora isso aconteça), muito menos
ignorar o compromisso que a Educação Física possui enquanto componente curricular,
inserido e interagindo com o contexto escolar, e que possui, cada qual, o seu projeto político-
pedagógico.
O ponto positivo que existe na atuação individual do professor em uma escola é o fato
de não ser preciso o enfrentamento de idéias com colegas da própria área que, sabemos muito
bem, nem sempre convergem para a mesma direção ou a mesma perspectiva de trabalho. Já se
torna um processo altamente complexo ter que praticar esse enfrentamento com o grupo de
alunos e fazê-los compreender essa lógica das aulas. Mais difícil ainda é acontecer isso com
colegas da própria área, que são formados em outros cursos de Educação Física, com linhas
de pensamentos diferentes e, também, conseguir interagir e apontarmos para uma mesma
direção. Às vezes as discussões sobre as diferenças ajudam, mas, na maioria desses casos,
servem para emperrar e comprometer o desenvolvimento das aulas. Em minhas passagens por
várias escolas, inclusive de ensino médio e de redes particulares, tive a oportunidade de
trabalhar com vários profissionais, sendo que me chamou a atenção ser mais tranqüilo o
processo de enfrentamento dessa proposta muito mais por parte dos alunos do que dos
professores de Educação Física.
Além disso, não se pode esquecer que, atualmente, as escolas e os alunos, sendo de
grandes centros, da periferia, do interior ou de onde quer que sejam, cada vez menos estão
suportando a Educação Física apenas como uma ocupação de tempo ou como uma distração.
Os próprios projetos das escolas estão exigindo, de todos os componentes curriculares,
comprometimento com os elementos que fazem parte do processo da educação. E a Educação
Física, inserida na escola, precisa cada vez mais mostrar a sua real importância enquanto uma
prática pedagógica comprometida em dispor aos alunos os conhecimentos sobre a cultura
corporal de movimento.
Porém, se por um lado é mais tranqüilo pensar e agir como único professor de
Educação Física em uma escola, ao mesmo tempo cria-se uma dificuldade ou um ponto
negativo: “Com quem serão divididas as angústias do trabalho? Não se tem alguém para
contar o que está sendo feito!”.
É importante também, para a melhoria da constituição e do desenvolvimento do
trabalho, existir mais do que apenas um professor, seja na mesma escola ou não, isto é, a
existência de um grupo de estudos, por exemplo, é fundamental enquanto um espaço
sistematizado para que existam trocas e interações entre professores que “falam a mesma
língua” e convergem para a mesma direção em suas aulas, conseguindo, a partir das
discussões, repensar, reconstruir e aprimorar as suas próprias aulas de Educação Física,
estando na mesma escola ou em instituições diferentes.
Cabe aqui o registro de um grande desafio que vem sendo percebido em nossa área
profissional: se, às vezes, nem em uma escola conseguimos nos entender, o que pensar de
toda a área da Educação Física?
Acontece que a motivação para trabalhar nessa perspectiva de abordagem da Educação
Física deve estar intimamente ligada ao comprometimento do professor com os alunos, com a
escola, enfim, com a educação de maneira geral e que se possa contribuir minimamente na
formação dos alunos que passam pelos bancos escolares e experimentam essas aulas.
C
ONSIDERAÇÕES
(
FINAIS
)
ACERCA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA
Antes de tudo, preciso registrar aqui uma sensação de que este trabalho apresenta
limitações de caráter teórico-reflexivo, pois muitas análises acabaram ficando “capengas” em
função de dificuldades em conseguir dar conta de atingir um nível maior de abstração, que em
alguns momentos acabou não acontecendo ou acontecendo pouco. Porém, espero que isso não
seja decisivo a ponto de comprometer potencialmente a análise de minha intervenção
pedagógica. Consolo-me com a máxima de que a clareza teórica infinita tem como correlato a
inoperância prática.
Esse trabalho de pesquisa é produto de reflexão de um professor que continua
pensando a prática pedagógica sustentada teoricamente, considerando que minha intervenção
na escola é resultado de um processo de constituição e de formação profissional pautado pela
constante busca de suporte teórico para dar sentido à minha atuação como professor de
Educação Física. Por outro lado, de alguém que sabe que precisa agir apesar das incertezas
que acompanham a função docente.
Um dos pontos que quero destacar é a participação decisiva e efetiva de interlocução.
É a partir de momentos de interação, de trocas e de reflexão com pessoas que “falam a mesma
língua” que temos condições de incrementar e constituir nossa formação profissional de
maneira bastante significativa. É com eles que “testamos” nossas convicções e avaliamos
nossas intervenções.
Sentimos na pele a dificuldade em conseguirmos estabelecer uma relação satisfatória
entre a teoria e prática quando falamos em Educação Física. Sabemos que todos os conteúdos
que abordamos com os alunos possuem sua “teoria”, mas nem sempre as mediações são
claras. Meu esforço é apontar aqui a importância de pensarmos nossa prática pedagógica para
além dos planos de aulas prontos para “darmos” aos nossos alunos e dos livros de mil e um
exercícios que nos dispensam de pensar. Essa deve ser a função primeira de nossa sustentação
teórica: nos fazer pensar, repensar, refletir, discernir, questionar, refazer e transcender nossa
intervenção na escola.
Outro aspecto pertinente para ser destacado é a importância do vínculo entre a
proposição de trabalho com o contexto no qual estava acontecendo. Assim como citado
anteriormente, além do esporte da escola, podemos dizer também, e por que não, que esse
currículo de Educação Física também é da escola “X”, pois foi algo estabelecido a partir de
alguns critérios, porém só teve real sentido depois que foi se constituindo a cada aula, no dia-
a-dia escolar.
Afirmar essa particularidade do contexto não significa ignorar que, de certa forma,
existe um caráter de universalidade nessa proposição de trabalho, pois torna-se uma proposta
que, além de contemplar considerável gama de manifestações de nossa cultura corporal de
movimento, também possui condições de ser desenvolvida em uma escola da cidade, em uma
escola particular, em uma escola pequena ou grande. Entretanto, é imprescindível que se
tenha compreensão de que tal proposta não pode ser implementada em qualquer contexto da
mesma maneira, pois, embora seja de fundamental importância manter a estrutura essencial,
também é imprescindível buscar sempre adaptar/contextualizar tal instrumento pedagógico de
maneira que não ignore a realidade em que está sendo trabalhada.
Esse é um ponto bastante pertinente, pois é preciso entender que tal estrutura de
trabalho em Educação Física não tem a intenção de se tornar uma das muitas “receitas” que
existem, das quais a única preocupação do professor é a aplicabilidade de tal instrumento
(espécie de remédio de “amplo espectro”). A intencionalidade desse trabalho é, acima de
tudo, uma tentativa de se constituir em uma base de apoio possível de ser inserida e adaptada
nas mais diferentes realidades escolares existentes, sem, no entanto, deixar de atingir os
critérios estabelecidos (e já mencionados anteriormente) para sua organização inicial.
A partir disso é importante, também, ser destacada a idéia do inacabamento dessa
proposição de trabalho em Educação Física escolar. Todas as unidades didáticas de cada
dimensão dos conteúdos elencados, cada vez que são tematizadas, sempre trazem elementos
significativos que fazem repensar a prática, pois uma única manifestação de nossa cultura
corporal de movimento pode ser abordada de diferentes maneiras, porém, sem deixar de dar
conta de sua função pedagógica.
Não é o fato de existir uma tentativa de estruturar um currículo de Educação Física
escolar que vai fazer com que essa estrutura se torne algo engessado, sem condições de se
expandir ou ampliar. À medida que as aulas o acontecendo, cada grupo de alunos, que
possuem suas particularidades, dão retornos diferentes para cada tematização de conteúdo.
Isso faz com que o projeto curricular sendo formatado no decorrer desse processo,
passando a impressão de algo que “está sendo” e não de algo que é”. De forma quase que
paradoxal poderíamos afirmar que cada ano letivo, cada turma, cada desenvolvimento de
conteúdos, são e não são os mesmos.
Por fim, acredito que experiências como essas, aqui reflexivamente relatadas, o
compondo o “sendo” da Educação Física, não apenas na escola 24 de Fevereiro, do interior de
Ijuí, mas da própria área, pois dessas experiências podem emergir um novo imaginário em
torno da Educação Física. Não mais restrito ao caráter de “atividade” que por longos anos
pairou sobre nós, mas como um componente curricular capaz de assumir compromisso com a
especificidade da área e com a proposta político-pedagógica da escola em que se desenvolveu.
As características de como o faz também nos permitem visualizar uma superação da
dicotomia biológico/cultural que atravessa nossa história recente. Da mesma maneira, acredito
ter avançado, com essas experiências de intervenção, na direção de desfazer a, para nós falsa,
polêmica que opõe a competência técnico/pedagógica ao compromisso político que deveria
acompanhar toda a proposta educacional emancipatória.
Nesse “jogo infinito” que caracteriza a existência humana, historicidade e
perspectivismo não devem ser tomados como limites, mas como marca das ações humanas, e
isto não deveria ameaçar a dignidade da condição humana, apenas lembrar que toda
proposição de sentido está filiada de forma incontornável ao espaço-tempo de sua gestação. É
tomando isso em conta que gostaríamos que este texto fosse lido.
O
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