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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
FACULDADE DE FARMÁCIA, ODONTOLOGIA E ENFERMAGEM
DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM - DOUTORADO
LEILA MEMÓRIA PAIVA MORAES
ATENÇÃO DE ENFERMAGEM AO FAMILIAR DO DEPENDENTE
QUÍMICO: GRUPO COMO ESTRATÉGIA DO CUIDAR
Fortaleza - Ceará
2008
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1
LEILA MEMÓRIA PAIVA MORAES
ATENÇÃO DE ENFERMAGEM AO FAMILIAR DO DEPENDENTE
QUÍMICO: GRUPO COMO ESTRATÉGIA DO CUIDAR
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem Doutorado da Faculdade de
Farmácia, Odontologia e Enfermagem, da
Universidade Federal do Ceará, como requisito
parcial para obtenção do título de Doutor.
Área de Concentração: Enfermagem em Saúde
Comunitária.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Violante Augusta Batista
Braga.
Fortaleza - Ceará
2008
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2
M821 e Moraes, Leila Memória Paiva
Atenção de enfermagem ao familiar do dependente
químico: grupo como estratégia do cuidar / Leila Memória
Paiva Moraes, 2008.
ix, 242f.:il.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Violante Augusta Batista Braga.
Tese (Doutorado) Universidade Federal do Ceará.
Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem.
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Fortaleza,
2008.
1. Transtornos relacionados ao uso de substâncias. 2.
Relações familiares. 3. Prática de grupo. 4. Enfermagem. 5.
Saúde mental. I. Braga, Violante Augusta Batista (Orient.). II.
Título.
CDD 362.29
3
ATENÇÃO DE ENFERMAGEM AO FAMILIAR DO DEPENDENTE
QUÍMICO: GRUPO COMO ESTRATÉGIA DO CUIDAR
Leila Memória Paiva Moraes
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Violante Augusta Batista Braga.
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Doutorado - da
Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem, da Universidade Federal do Ceará, como
requisito parcial para obtenção do título de Doutor.
Aprovada em: 26 / 06 / 08
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Violante Augusta Batista Braga (Presidente)
Universidade Federal do Ceará – UFC
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ana Ruth Macedo Monteiro (Examinadora)
Universidade Estadual do Ceará – UECE
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Lia Carneiro Silveira (Examinadora)
Universidade Estadual do Ceará – UECE
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria de Nazaré de Oliveira Fraga (Examinadora)
Universidade Federal do Ceará – UFC
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ângela Maria Alves e Souza (Examinadora)
Universidade Federal do Ceará – UFC
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ana Karina Bezerra Pinheiro (Examinadora Suplente)
Universidade Federal do Ceará – UFC
__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria de Fátima Araújo Maciel (Examinadora Suplente)
Universidade Federal do Ceará – UFC
4
Ao José Filho, meu companheiro de sempre, que esteve presente nas
horas e momentos certos. Obrigada pelos braços ofertados nos momentos de angústia e
dúvida, pela caminhada ao meu lado nessa trajetória de muitas flores, mas também de muitos
espinhos; a sua paciência em me ajudar e ser companheiro de todas as horas, por ter segurado
em minha mão nas horas em que mais precisei, mas também por ter soltado em alguns
momentos, enfim... Obrigada pela sua existência e, o mais importante, estar junto a mim.
Aos meus filhos Ana Caroline e João Mateus, a minha eterna paixão.
Aos meus pais, Francisco e Sofia, por terem sido os escolhidos por
Deus para me colocar nesse mundo tão maravilhoso.
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Agradecimentos
AgradecimentosAgradecimentos
Agradecimentos
A Deus, por suas infinitas graças;
aos meus pais, por terem me dado condições de existência de ter chegado até aqui. Obrigada
por tudo o que já fizeram por mim e muito mais;
ao meu pai, em especial, por sempre acreditar em mim, levando-me muitas vezes a refletir
sobre minhas reais implicações nesse caminho que escolhi para a vida;
ao meu marido, amigo e “coorientador da vida” nas horas vagas, o meu eterno agradecimento
por tudo o que você tem feito por mim e pela nossa felicidade;
aos meus filhotes Ana Caroline, maravilhosa, que nasceu quase mestra e agora concluiu junto
comigo mais essa jornada. Ao João Mateus, que nasceu quase doutor e trouxe mais
serenidade, tranqüilidade e paz para minha vida. Obrigada a essas coisinhas lindas que se
fizeram presentes nos momentos mais angustiantes, dando cor e mais vida a esse processo.
Com a existência dessas crianças no meu dia a dia estou aprendendo a enxergar a vida de
outra forma, com mais alegria e colorida;
à Viola, pela amiga e orientadora que foi durante todo esse tempo de convivência. Obrigada
por sua existência, compreensão e por fazer parte de uma parte de minha história de vida;
aos meus sogros José Moraes e Leny, pelo incentivo, em especial a dona Leny, por sempre
me transmitir palavras de coragem, apoio e elogios. Vocês são meus segundos pais;
ao meu irmão e a minha cunhada, Mauro e Rosa Maria, ao me mostrarem que é sempre
possível sonhar; que tudo é possível, bastando querer, acreditar e fazer;
a minha irmã-mãe, Francisca, por ter dedicado parte do tempo de sua vida para cuidar de
mim, dando sempre muita atenção, carinho e amor. Obrigada por fazer parte de minha vida;
à professora e amiga doutora Ângela Souza, pela sua amizade, seu incentivo e, acima de tudo,
por acreditar no que eu faço e na profissional que tenho sido; muito obrigada;
às colegas do doutorado, pelo prazer de uma convivência gostosa e saudável;
a Mônica e Aline, meu obrigado especial pela amizade e companheirismo. Mônica, durante
esse doutorado, você continuou sendo cada vez mais uma amiga muito especial. Aline, você
foi amiga das horas difíceis quando recebi o apoio certo nas horas certas;
às amigas Kaelly Virgínia e Eucléa Gomes, pelos momentos de partilha;
aos familiares que compuseram o grupo, por terem aceitado enfrentar esse desafio, comigo
revelando suas mais íntimas e sofridas histórias de co-dependência;
6
à terapeuta ocupacional do CAPs-ad/SER III, Karolina Martins, pelo seu apoio, dedicação,
envolvimento e infinitas contribuições nessa jornada tão importante de minha vida; muito
obrigada por tudo;
à sobrinha querida, Marina, que me ajudou a transcrever parte das sessões grupais, com
imensa perfeição;
à amiga e prima Joelma, pelo seu significativo apoio e ajuda;
a todos os profissionais do CAPs-ad/SER III e, em especial, à enfermeira e coordenadora
Socorro, pela sua disposição e apoio;
aos professores do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, pelos ensinamentos e
incentivos a assumir uma atitude crítica diante dos fatos e da própria vida;
à amiga Alane Andréa, pelo apoio, amizade, acolhida e ajuda nos momentos de intensa
solidão e desespero;
aos funcionários da Pós-Graduação, pela disposição e acolhida;
à minha secretária do lar, que assumiu minha posição nos momentos de ausência, cuidando de
tudo e de todos de meu lar, doce lar; às inúmeras babás que cuidaram de meus filhos,
assumindo um papel que não era delas, muito obrigada;
aos colegas da Faculdade Católica Rainha do Sertão, por haverem compartilhado comigo
momentos dessa intensa jornada de construção;
à FUNCAP, pelo apoio financeiro; e
às pessoas que não foram citadas, mas que certamente assumiram uma posição indispensável
nessa trajetória.
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Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é!
Caetano Veloso
8
RESUMO
Moraes, Leila Memória Paiva. Atenção de enfermagem ao familiar do dependente
químico: grupo como estratégia do cuidar. Fortaleza, 2008. 242p. Tese (Doutoramento em
Enfermagem) - Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do
Ceará.
A família é parceira imprescindível no tratamento do dependente químico. Convivendo
diretamente com o uso abusivo de drogas por parte de alguns de seus membros, a organização
familiar passa a vivenciar, também, dificuldades ao lidar com essa problemática, a qual se
tornou um sério agravo à saúde pública. Supondo que a família é um elemento importante na
montagem da rede de apoio ao dependente químico e partindo do princípio de que o
comportamento de co-dependência está presente na vida desses familiares, interferindo em
sua saúde mental e no modo de lidar com a condição de dependência química de seu parente,
defendemos a tese de que os familiares de dependentes químicos necessitam de assistência,
podendo ser beneficiados por meio de um grupo de apoio. Objetiva-se Analisar o processo
grupal como instrumental do cuidado de enfermagem ao familiar do dependente químico,
mediante: caracterização do grupo nos aspectos socioeconômicos e demográficos; descrição
do processo e das fases de desenvolvimento do grupo; e identificação do modo como a co-
dependência é expressa no grupo de familiares de dependentes químicos. Estudo descritivo
com abordagem qualitativa, realizado com familiares de dependentes químicos assistidos em
um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS-ad) de Fortaleza-Ceará. Dados produzidos por
meio de entrevista individual e de dez sessões grupais, utilizando-se oficinas vivenciais.
Como suporte teórico-metodológico, utilizou-se o processo grupal para enfermeiros,
desenvolvido por Loomis (1979). Participaram da pesquisa onze familiares de dependentes
químicos em acompanhamento. Nos resultados, constatou-se ser um grupo heterogêneo
quanto às características socioeconômicas, demográficas e de suas histórias de vida. Os
familiares de dependentes químicos podem ser beneficiados por meio de grupo de apoio como
estratégia do cuidar; os princípios teóricos descritos foram exeqüíveis, contribuindo para a
efetividade do grupo e para a qualidade da assistência em saúde mental; o método utilizado se
adequou à investigação, possibilitando a aproximação da realidade vivenciada e a
identificação das formas de expressão da co-dependência. Os familiares manifestaram o
comportamento co-dependente por meio do sofrimento, dor emocional e adoecimento físico e
psíquico, refletidos em respostas múltiplas, entre elas: medo, desconfiança, culpa, excesso de
cuidado/controle para com o outro e descuido para consigo e mudanças no estilo de vida. No
grupo foram identificados alguns sentimentos oriundos dessa vivência de co-dependência,
entre eles: descontentamento, incertezas, angústia, medo, depressão, ansiedade, tristeza,
desesperança e sentimentos de perda e de culpa. Esta investigação mostra-se relevante por
desvelar a vivência do membro familiar do dependente químico, pelo fato de reforçar a
importância do fortalecimento desta rede de apoio e pela aproximação de um referencial
teórico e instrumental, a abordagem grupal, necessária para a prática do enfermeiro.
Palavras-chave: Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias; Relações Familiares;
Prática de Grupo; Enfermagem; Saúde Mental.
9
ABSTRACT
Moraes, Leila Memória Paiva. Nursing Attention to the Drug Addict’s Family: Group as a
Care Strategy. Fortaleza, 2008. 242p. Tese (Doutoramento em Enfermagem) - Programa de
Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Ceará.
The family is an important partner in the drug addict’s treatment. By living directly with drug
abuse by part of its members, however, the family also starts to face difficulties in dealing
with this matter, which became a serious public health problem. Supposing that the family is
an important element in the establishment of support to the addict and starting from the
principle that the codependent behavior is present in the lives of the relatives, we denfend the
thesis that family members of drug addicts need assistance, having the chance to benefit from
a support group. One aims to analyze the group process as in instrument for Nursing Care to
relatives of drug addicts through: group’s characterization in socioeconomic and demographic
terms; description of the process and the phases of the group’s development and identification
of the way codependence is expressed in groups of drug addicts’ relatives. Descriptive study
with a qualitative approach, conducted with relatives of drug addicts attended by a Center Of
Psicosocial Attention (CAPS-ad) in Fortaleza-Ceará. Data produced through a semi structured
interview and ten group sessions, using experience workshops. As theoretical-methodological
support, one used the Nurse Group Process, developed by Loomis (1979). Participated in the
research eleven families of drug addicts in treatment. In the results, one noticed it is a
heterogeneous group concerning socioeconomic and demographic characteristics, as well as
stories of life. The relatives of drug addicts may benefit from support groups as a care
strategy; the theoretical principles described were feasible, contributing for the affection in the
group and for the quality of the assistance in mental health; the method used was appropriate
for the investigation, making possible the approximation of the reality experienced and the
identification of forms of expression of codependence. The relatives presented a codependent
behavior through suffering, emotional pain and physical and psychic disease, reflected in
multiple responses, between them: fear, distrust, guilt, excess of care/control for others and
lack of care for themselves and changes in lifestyle. One identified some feelings which came
from this experience, among them: unfulfillment, unsureness, anguish, fear, depression,
anxiety, sadness, hopelessness and feelings of loss and guilt. This study becomes relevant due
to revealing the experience of the family member of drug addicts, because it strengthens this
support net and because it approximates a theoretical and instrumental reference, and the
group approach, necessary for the nurse’s practice.
Keywords: Substance-Related Disorders; Family Relations; Group Practice; Nursing; Mental
Health.
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RESUMEN
Moraes, Leila Memória Paiva. Atención de enfermería al familiar del dependiente
químico: grupo como estrategia de atención. Fortaleza, 2008. 242p. Tese (Doutoramento em
Enfermagem) - Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do
Ceará.
La familia es compañera imprescindible en el tratamiento del dependiente químico. Convivi
directamente con el uso demasiado de drogas por parte de algunos de sus miembros, todavía,
esa familia pasa a vivir, también, dificultades al lidiar con ese problema, que se cambió en un
serio agravio a la salud pública. Se supone que la familia es un elemento importante en el
establecimiento de la red de ayuda al drogadicto y partiendóse de que el comportamiento de
codepencia se queda presente em la vida de familiares, interferiéndose em su salud mental y
em el modo de lidiar con la condición de dependencia química del membro familiar, hubo la
defensa de la tesis de que los familiares de dependientes químicos necesitan de asistencia, lo
que pueden ser beneficiados a través de um grupo de ayuda.. Se objetiva analizar el proceso
grupal como herramienta de atención de enfermería al familiar del dependiente químico,
delante de la caracterización del grupo en términos socioeconómicos y demográficos; de la
creación de dispositivos que favorezcan la expresión de sentimientos y subjetividades
mientras al problema vivido e identiifcación de elementos indicadores de codependencia.
Estudio descriptivo con abordaje cualitativa, hecho con familiares de dependientes químicos
asistidos en un Centro de Atención Psicosocial (CAP-ad) de Fortaleza-Ceará.
Datos
produccidos a través de entrevista individual y de diez sesiones grupales, utilizandóse talleres
vivenciales. Como soporte teórico y metodológico, se utilizó el proceso grupal para
enfermeros, desarrollado por Loomis (1979). Participaron de la investigación once familiares
de drogadicto en acompañamiento. En los resultados, se comprobó ser um grupo heterogeneo
mientras a las características socioecómicas, dmeográficas y de sus historias de vida. Los
familiares de dependientes químicos pueden ser beneficiados a través de grupo de apoyo
como estrategia de atención; la base teórica descrita fue fundamental, lo que contribuyó para
la efetictividad del grupo y para la cualidad de la asistencia en salud mental; el método
utilizado fue adecuado a la investigación, lo que posibilitó la aproximación de la realidad
vivida y la identificación de las formas de expresión de la codependencia. Los familiares
manifestaron el comportamiento codependiente a través del sufrimiento, dolor emocional y
adoecimiento físico y psíquico, reflejados en respuestas múltiplas, entre ellas: miedo,
inseguridad, culpa, exceso de atención/ control para con el outro y falta de atención para
consigo y cambios en el estilo de vida.
En el grupo, fueron identificados algunos sentimientos
venidos de esa experiência de codependencia, entre ellos: descontentamiento, inseguridad,
angustia, miedo, despresión, ansiedad, tristeza, falta de esperanza y sentimientos de pérdida y
de culpa. Esta investigación se presenta importante por señalar la experiencia del miembro
familiar del dependiente químico, debido al reforzo de la importancia del fortalecimiento
familiar de esta red de ayuda y a la aproximación de uno referencial teórico y de herramienta,
el abordaje grupal, necesaria para la práctica del enfermero.
Palabras clave: Trastornos Relacionados con Sustancias; Relaciones Familiares; Práctica de
Grupo; Enfermería; Salud mental.
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LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Apresentação das fases de produção de dados do estudo com o grupo de
componentes familiares de dependentes químicos.................................................................79
QUADRO 2 – Demonstrativo da fase de produção dos dados.............................................236
QUADRO 3 – Demonstrativo da fase de planejamento do grupo de familiares de dependentes
químicos.............................................................................................................................105
QUADRO 4 - Demonstrativo da sessão preparatória da fase de intervenção estrutura, do
grupo de familiares de dependentes químicos......................................................................108
QUADRO 5 Demonstrativo da sessão I da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................119
QUADRO 6 - Demonstrativo da sessão II da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................127
QUADRO 7 - Demonstrativo do tipo de caminhar expresso por parte de cada um dos
participantes do grupo de familiares de dependentes químicos............................................132
QUADRO 8 - Demonstrativo da sessão III da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................139
QUADRO 9 - Demonstrativo da sessão IV da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................147
QUADRO 10 - Demonstrativo da sessão V da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................152
QUADRO 11 - Demonstrativo da sessão VI da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................158
QUADRO 12 Demonstrativo da sessão VII da fase de avaliação Resultados do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................168
QUADRO 13 - Demonstrativo da sessão VIII da fase de avaliação Resultados do grupo de
familiares de dependentes químicos....................................................................................174
QUADRO 14 Demonstrativo da freqüência dos participantes do grupo de familiares de
dependentes químicos e seus fatores curativos expressos ....................................................204
12
LISTA DE FOTOS
FOTO 1 Foto da técnica grupal partilha em Dupla” disposição dos participantes
Sessão Preparatória ............................................................................................................110
FOTO 2 Foto das produções realizadas na técnica grupal desenhos em pedaços de papel”
– sessão I.................................................................................................................................122
FOTO 3 Foto da disposição dos participantes durante a produção de dados sessão II
.................................................................................................................................................133
FOTO 4 Foto das produções realizadas na técnica grupal “Percepções de minha família”
sessão III. ...............................................................................................................................143
FOTO 5 – Foto das produções realizadas na técnica grupal Relógio da vida” – Sessão
IV............................................................................................................................................150
FOTO 6 – Foto da disposição dos participantes no momento do relaxamento – viagem
imaginária “O guia sábio” – sessão V. ..................................................................................154
FOTO 7 foto das produções realizadas na técnica grupal de produção de dados sessão VI
................................................................................................................................................160
FOTO 8 Foto dos participantes durante a atividade de alongamento corporal sessão VIII
................................................................................................................................................176
13
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..............................................................................................................15
2 OBJETIVOS ........................................................................................................................24
3 REVISÃO DE LITERATURA........................................................................................26
3.1 Contextualização do problema do uso das drogas psicoativas.......................................26
3.2 Abordagens e tratamentos ao dependente químico e família.........................................36
3.3 Os serviços de assistência ao dependente químico e sua família ...................................47
3.4 Abordagem em saúde mental por meio de recursos artísticos .......................................53
3.5 O grupo como espaço de convivência e estratégia de intervenção.................................57
4 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO: O PROCESSO GRUPAL PARA
ENFERMEIROS ................................................................................................................63
5 O CAMINHO METODOLÓGICO ................................................................................74
5.1 Caracterização do tipo de estudo..................................................................................74
5.2 Contexto/Local do estudo.............................................................................................75
5.3 Participantes do estudo.................................................................................................76
5.4 Procedimentos e instrumentos para a produção dos dados ............................................77
5.5 Interpretação e análise dos dados..................................................................................81
5.6 Aspectos legais e éticos da pesquisa.............................................................................83
6 OS PARTICIPANTES DO GRUPO...............................................................................85
6.1 Análise das características dos participantes do grupo de familiares.............................97
6.2 Análise das características dos familiares dependentes químicos dos participantes do
grupo...............................................................................................................................101
7 SESSÕES GRUPAIS: DESCRIÇÃO E EXIBIÇÃO DAS FASES ..............................104
7.1 Fase de planejamento –
Objetivos do grupo................................................................104
7.2 Fase de intervenção – Estrutura e processo do grupo..................................................107
7.3 Fase de Avaliação – Resultados do grupo...................................................................166
8 A EXPRESSÃO DA CO-DEPENDÊNCIA NOS FAMILIARES PARTICIPANTES
DO GRUPO .....................................................................................................................186
9 PROCESSO E AVALIAÇÃO GRUPAL .....................................................................200
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................213
REFERÊNCIAS ...............................................................................................................219
ANEXOS...........................................................................................................................226
APÊNDICES.....................................................................................................................228
14
Introdução
IntroduçãoIntrodução
Introdução
15
1 Introdução
1 Introdução1 Introdução
1 Introdução
O consumo de drogas psicoativas pode ser considerado uma forma de percepção e
expressão da pessoa em si mesma, envolvendo relações que incluem os outros e o ambiente
em que se vivem.
Mendes (2005) refere que o consumo de drogas é um fenômeno essencialmente
complexo e que ultrapassa fronteiras internacionais, tornando-se um dos maiores problemas
de saúde pública mundial. Carraro, Rassool e Luis (2005) aludem a esse fenômeno como
problema tanto de ordem social, quanto de saúde, exacerbando-se em conseência da
globalização.
Múltiplos são os fatores que concorrem para o uso das drogas pela população
mundial. Martins e Corrêa (2004) trazem à cena a multiplicidade de situações que fazem a
sociedade passar por inúmeras modificações: a urbanização acentuada e desorganizada; a falta
de oportunidade de desenvolvimento e emprego para todos; o desrespeito público, inclusive
do próprio papel dos governos e autoridades; a globalização da economia, derrubando muros
e mitos, mas mantendo as desigualdades socioeconômicas; a modificação intensa dos valores
sem a acomodação equilibrada dos pensamentos, ações e idéias; e o telejornalismo, com
destaque para a violência exacerbada. Essas são algumas situações que podem afetar as
pessoas e contribuir para mudar seu modo de viver, entre elas, o consumo de drogas.
O uso de drogas no Brasil intensifica-se sempre mais, tornando difícil e complexa
a sua abordagem, principalmente porque as políticas públicas voltadas a esse setor não logram
acompanhar os avanços desse fenômeno, não criando dispositivos legais e de atenção que
atendam a essa realidade.
Na nossa trajetória profissional, o despertar para estudar sobre o tema
dependência química, iniciou-se em 1996, ainda no Curso de Graduação em Enfermagem.
Naquela época, nos inquietava pensar como a Enfermagem poderia assistir adolescentes que
faziam uso de drogas ilícitas, uma vez que percebíamos lacunas na formação do enfermeiro
para lidar com essa clientela. Atualmente, podemos constatar que a realidade nos cursos de
Enfermagem quanto ao aprendizado relacionado à dependência química não é muito
diferente, permanecendo a lacuna, não na Enfermagem, mas, também, em outros cursos da
área da saúde (BRAGA; BASTOS, 2004).
Pesquisando sobre o significado para o trabalhador de Enfermagem acerca de
como lidar com substâncias psicoativas, Martins e Corrêa (2004) ressaltaram que esses
16
trabalhadores talvez não estejam preparados para enfrentar situações que envolvam o cuidado
a pessoas que fazem uso de drogas psicoativas, tornando-se necessário repensar sua formação.
Os currículos devem contemplar a discussão do tema, conforme as políticas nacionais e
internacionais de saúde, estimulando os futuros profissionais a perceberem de forma mais
consciente e crítica esse fenômeno e suas conseqüências.
Ao cursarmos a disciplina Enfermagem Psiquiátrica na graduação, em 1997,
apreendemos o quanto a Enfermagem pode atuar nessa área, com ações nos níveis de
promoção, prevenção e recuperação. Embora seja um trabalho complexo e em longo prazo,
cujas conquistas possam parecer pequenas, essa área nos atrai e se mostra como um campo de
atuação vasto e com poucos profissionais envolvidos, ou mesmo pouco preparados.
Ainda sobre nossa aproximação com o tema, em 1999, como enfermeira da
Atenção Primária em Saúde, em um município do interior do Estado do Ceará, participamos
de um programa de atendimento a adolescentes grávidas e, neste período, observamos que era
elevado o número de adolescentes que consumiam drogas, principalmente o álcool e o fumo.
Em 2000, como docente do Curso de Enfermagem de uma universidade pública
de Fortaleza, acompanhando alunos em prática curricular em uma maternidade pública,
pudemos, mais uma vez, nos deparar com o uso abusivo de drogas em adolescentes puérperas.
Na mesma universidade, agora atuando na área de saúde mental, assistimos dependentes
químicos e adolescentes em situação de risco, atuando como supervisora de estágio em uma
unidade de tratamento e de reabilitação.
Em 2002, em nossa pesquisa de mestrado, abordamos a problemática da
dependência química junto a adolescentes usuários de drogas e institucionalizados em um
abrigo público do Estado do Ceará. Constatamos vários sentimentos dos adolescentes desde
seus primeiros contatos com as drogas, entre os quais, a atribuição desse uso de drogas à
busca do prazer, decorrente, na maioria das vezes, das próprias histórias de vida, marcadas
pela pouca presença e/ou ausência da família em sua existência e no próprio lar. Percebemos,
entre outras coisas, a expressão do desejo dos adolescentes em contar com a
presença/participação das famílias em suas vidas, considerando isso como elemento
indispensável para a manutenção de uma existência equilibrada e saudável (MORAES, 2003).
Os dados de nossa pesquisa de mestrado revelaram que os adolescentes
dependentes químicos que participaram do estudo, em seu decurso de crescimento,
desenvolvimento e ressocialização, têm a família como referência maior para a vida, sendo ela
a principal colaboradora em sua formação, influenciando em seu modo de pensar e perceber o
mundo e as outras pessoas. Essa influência na formação reflete na maneira de ver a si mesmo
17
e ao outro, no estilo de vida que adotará para compreender a realidade, no modo de
enfrentamento das dificuldades comuns nessa fase e nos inúmeros fatores de risco aos quais
estão expostos, entre eles o uso abusivo de drogas psicoativas. A família, sendo a referência
fundamental, muitas vezes, não está preparada para lidar com a dependência química, tendo
atitudes de distanciamento do componente envolvido. Observamos, ainda, que as famílias dos
adolescentes pouco participavam de seu cotidiano na reinserção na sociedade, comunidade e
na própria família e, quando esse contato ocorria, dava-se de maneira esporádica, como, por
exemplo, por meio de visitas domiciliárias realizadas por algum técnico do serviço ou
participando de reuniões na instituição asilar, quando convocadas (MORAES, 2003).
Após o ano de 2003, ao concluirmos o curso de mestrado, continuamos na
docência acompanhando a prática de alunos da graduação em Enfermagem em serviços de
assistência ao dependente químico, realizando estudos e nos aperfeiçoando e aprofundando
cada vez mais a respeito do assunto.
Levando em conta estas questões vivenciadas e principalmente durante a pesquisa
de mestrado, e acompanhando alunos em campos de prática de assistência ao dependente
químico, consideramos imprescindível a atuação da família na prevenção ao uso indevido de
drogas psicoativas, assim como na recuperação e reinserção social do dependente químico.
Cada família tem o próprio modo de viver obedecendo a regras, mitos e crenças,
os quais são características de suas relações internas, expressando, assim, a dinâmica familiar
e o seu cotidiano. Sobre esse aspecto, Monteiro (2001) ressalta que a dinâmica da família
revela significativa rede de apoio nas diversas situações da vida real, além da ‘grande e árdua’
tarefa de educar os filhos.
Para Seibel e Toscano Junior (2001), na elaboração de uma ‘rede de apoio ou o
sistema terapêutico’, são solicitados e valorizados os recursos da própria família (nuclear e
ampliada).
Em nossa vivência de assistência ao dependente químico, observamos amiúde a
pouca atuação de profissionais de saúde junto aos seus familiares, incentivando-os a participar
do tratamento de seu componente usuário, e tampouco os visualizando na qualidade de co-
dependentes, ou seja, como aquela pessoa que também sofre com a dependência química.
Wegsheider (1981) introduziu o conceito de co-dependência, caracterizado-a
como uma obsessão familiar sobre o comportamento do dependente e seu bem-estar, em que o
controle alcoólico passa a ser o eixo da organização familiar. O conceito de co-dependência
implica uma ‘relação recíproca de co-dependência’, e, no interior desses sistemas afetivos,
18
percebemos o quanto essa condição interfere, além das relações interpessoais, o modo como a
família lida com o drogadito.
Ao estudar os padrões de co-dependência e prevalência de sintomas
psicossomáticos em pessoas de famílias com histórico de alcoolismo, Zampieri (2004, p.6)
conceituou co-dependente da seguinte forma:
... refere-se àquela pessoa que convive de forma direta com algum sujeito que
apresenta alguma dependência química, e em especial, ao álcool. E por extensão às
pessoas que por qualquer outro motivo viveram uma prolongada relação
parentalizada na família de origem, assumindo precocemente responsabilidades
inadequadas para a idade e o contexto cultural.
Embora haja divergências quanto à descrição da co-dependência, esse termo se
tornou importante conceito no tratamento do abuso de substâncias (HUMBERG, 2003).
As pesquisas nacionais e internacionais sobre dependência química apontam para
a importância da família na reabilitação do dependente químico. A abordagem familiar como
modalidade de tratamento nessa área ainda é recente (FIGLIE; PILLON; DUNN;
LARANJEIRA, 1999).
Ao visualizarmos a família como parceira do tratamento do drogadito, precisamos
atentar para as necessidades e dificuldades desse grupo e para seu adoecimento, o qual pode
interferir diretamente no agravamento da problemática vivenciada pelo núcleo familiar,
notadamente do próprio usuário de drogas. Trabalhando as limitações, dificuldades e
sentimentos da família co-dependente e, em especial, daquele partícipe que mais interage com
o dependente químico, assumindo, muitas vezes, o papel de cuidador e também responsável,
será mais fácil ocorrer interferência positiva no tratamento.
Na prática assistencial, o fato de o membro familiar assumir a posição de cuidador
e, principalmente, responsável pelo dependente químico, põe na berlinda o princípio da
autonomia e da responsabilidade individual tão discutida pela proposta da Reforma Sanitária,
da Reforma Psiquiátrica, estando incluído nos preceitos do Sistema Único de Saúde e também
na Constituição Brasileira.
Zoboli e Fortes (2006) referem que o cuidado com a ação do Estado e da
sociedade no estabelecimento de limites à liberdade da pessoa não é novo. Desde o século
XIX, John Stuart Mill a manifestava, entendendo que o único fim com o qual a sociedade
deveria interferir na liberdade de qualquer um de seus membros seria a autoproteção desta. O
único propósito, então, com o qual o poder estatal ou da sociedade poderia ser exercido
corretamente contra a vontade do individuo seria prevenir danos a outros indivíduos ou à
própria coletividade. Dessa forma, não seria moralmente justificada a imposição de restrições
19
às ações dos indivíduos autônomos em nome de supostos benefícios para os próprios,
benefícios estes julgados segundo uma óptica externa. Ações desse tipo são consideradas
paternalistas e contrárias à idéia de respeito à autonomia individual. Dessa forma, resta clara a
noção de que ações de saúde pública podem ensejar conflitos de ordem moral ao restringir a
autonomia individual.
Na prática, essas ações de saúde pública podem produzir conflitos morais, pois
muitas vezes limitam ou restringem liberdades e decisões individuais, ensejando o bem
comum ou a prevenção de conseqüências anti-sociais. Isso é o que acontece com a
dependência química, que o uso indiscriminado de droga chega, muitas vezes, a causar
conflitos de ordem moral.
Embora saibamos da importância da autonomia e individualidade na vida dos
cidadãos, no caso das drogas, a questão é mais complexa, pois mesmo os usuários sentindo
prazer ao utilizar a droga, esse uso indiscriminado deve ser combatido à medida que ela traga
problemas à coletividade, pois vivemos numa sociedade com normas a obedecer.
Ao voltarmos à atenção para a família do drogadito, temos em mente, ainda, a
idéia de que o usuário de drogas pode ser considerado o ‘bode expiatório’ do adoecimento do
núcleo familiar em sua rede de relações. Por meio de seu comportamento sintomático, são
expressos o sofrimento coletivo do grupo e o sofrimento individual daquele membro mais
sensível à problemática ou menos preparado para seu enfrentamento. O adoecimento de um
dos membros do grupo enseja uma rie de conflitos que interferem na rede de relações,
ampliando o círculo de adoecimento, tornando-se a família co-dependente necessitada,
também, de assistência.
Seibel e Toscano Junior (2001) exprimem que as dependências químicas,
envolvem, pelo menos, outra pessoa, além do toxicômano, ou seja, os co-dependentes, que
podem tomar iniciativas para mudar, porém, por vezes, ilusórias. Esse co-dependente é o
parceiro indissociável do dependente químico que, ao expressar desejo de ajudar, deve ser
chamado a participar do tratamento, pois constitui um recurso importante pelo poder que
exerce sobre o conjunto de relações nas quais o toxicômano é o elemento central.
Se pudermos entender que o uso de drogas já indica uma dinâmica familiar
comprometida, ampliamos nossa concepção e expandimos a compreensão do fenômeno no
sentido de que não abordamos apenas um indivíduo que se droga, e sim uma família que
forma um sistema no qual a dependência química de um de seus membros é parte da sua
dinâmica (LEITE; ANDRADE et al., 1999).
20
De acordo com critérios do DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disordens Sistema Oficial de Diagnóstico da Associação Americana de Psiquiatria) e CID-
10 (Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde OMS) o uso
nocivo de substância é considerado uma patologia, tendo na CID-10 o diagnóstico de
dependência de substâncias (SEIBEL; TOSCANO JUNIOR, 2001).
Esse é o conceito que mais prevalece nos estudos e na literatura de dependência
química. De acordo com Spricigo e Alencastre (2004), essa é a visão da droga como doença e
problema psiquiátrico ou de saúde mental embutida no modelo teórico médico-sanitário e
psicossocial. Dessa forma, a co-dependência é considerada uma disfunção, pois o componente
familiar passa a focalizar mais as necessidades dos outros do que as suas, se deixando
envolver e dominar por uma condição mórbida, passando a agir em função desse estado.
Para a CID-10 (Classificação Internacional de Doenças), a dependência química é
uma doença e a co-dependência permanece à sombra, quase sempre não levada em
consideração pelos profissionais de saúde (MELLO, 1999).
Esta definição de dependência química, considerando-a como uma doença foi
proposta pela OMS em 1950 (LEITE; ANDRADE et al., 1999). Portanto, é algo novo diante
do tempo em que se iniciou o consumo de substâncias nocivas e reconhecendo a importância
da família na formação de seus membros, sendo elemento principal na construção de uma
rede social de apoio ao dependente, a equipe de saúde mental precisa estar atenta ao seu
funcionamento, criando laços de parceria, fundamentais e imprescindíveis no tratamento do
dependente químico e no desenvolvimento de relações mais sadias e/ou significativas. Dessa
forma, a integração da família na dinâmica de atenção ao adicto pode facilitar sua
recuperação, proporcionando modos de enfrentamento de forma eficaz, resultando em melhor
qualidade de vida.
A família deve ser considerada participante ativa na produção da saúde e
cidadania de seus integrantes. Nessa realidade, afirmamos sua importância, ao se envolver na
recuperação do dependente químico, mas, para que isso ocorra, é necessário conhecermos
essa instituição, na busca de melhor apreensão da dinâmica familiar com atenção para o
problema vivenciado.
Assim, percebendo como imprescindíveis à presença e atuação da família no
tratamento de dependentes químicos, uma vez que essa vivência é influenciada e influencia o
assunto em foco, pretendemos com este estudo responder à seguinte indagação: Como o
familiar do dependente químico responde à abordagem grupal?
21
Este estudo torna-se relevante por dar ênfase a assistência junto a equipe de
profissionais de saúde mental por meio da abordagem grupal com familiares de usuários de
drogas, população que o é muito explorada por aqueles que estudam a dependência
química. Como parceira no tratamento e recuperação do dependente químico, a família
necessita, também, ser assistida, sendo de importância fundamental seu envolvimento na
terapia, tornando-se foco de interesse, atenção e investigação.
De acordo com Asen (1997), a abordagem familiar na dependência química como
modalidade de inclusão na assistência e tratamento é recente e, indiscutivelmente, a família é
um fator crítico no tratamento de seus membros dependentes químicos, sendo essa abordagem
um procedimento fundamental nos programas terapêuticos.
Para Leite, Andrade et al. (1999), a abordagem da dimensão familiar na prática da
clínica ao dependente químico, mostra-se de essencial importância para alcançar o objetivo de
permitir a esses indivíduos uma mudança efetiva no seu comportamento adicto. Conhecer a
família e, especificamente, aquele componente familiar que mais convive com o dependente
químico é tão essencial e esclarecedor sobre os pacientes quanto as entrevistas clínicas de
anamnese com eles próprios.
Lembra Monteiro (2001) que a Enfermagem desenvolve assistência à saúde da
família algum tempo, estudando, pesquisando e prestando cuidados nas demais situações
de saúde-doença. Apesar de no Brasil, entretanto, esses estudos encontrarem-se em fase
inicial, somos conscientes de que a família merece mais atenção por parte dos profissionais da
saúde.
Este estudo exibe-se também como importante, porque nos propusemos formular
o conhecimento com suporte na vivência do membro familiar que mais convive e se relaciona
com o dependente químico, seja ele o cônjuge, pai, mãe, filhos, irmãos, parentes mais
próximos ou mesmo pessoas sem parentescos afins, mas, com laços de afetividade.
Outro aspecto de relevância deste ensaio pauta-se no fato de estarmos na mesma
direção de nossa pesquisa de mestrado (MORAES, 2003). Nessa perspectiva, decidimos
eleger os membros familiares de dependentes químicos como sendo nossa população-alvo,
que no estudo anterior há pouco citado focamos a atenção nos próprios usuários adolescentes.
Destacamos, ainda, o fato de estarmos, com o presente estudo, buscando ampliar
os horizontes no que se refere ao uso e/ou abuso de drogas psicoativas, contribuindo com
maior aproximação do objeto estudado, apresentando-o sob a perspectiva do familiar do
dependente químico. Essa formulação teórica que procuraremos tecer certamente oferecerá
22
subsídios para se repensar à prática em saúde junto ao dependente e sua rede de relações, na
busca de estratégias que ajudem a lidar melhor com essa importante questão de saúde pública.
Dessa forma, no pressuposto de que a família é um elemento importante na
montagem da rede de apoio ao dependente químico e partindo do princípio de que o
comportamento de co-dependência está presente na vida desses familiares, interferindo em
sua saúde mental e no modo de lidar com a condição de dependência química de seu parente,
defendemos a tese de que os familiares de dependentes químicos necessitam de assistência,
podendo ser beneficiados por meio de um grupo de apoio.
23
Objetivos
ObjetivosObjetivos
Objetivos
24
2
2 2
2 Objetivos
Objetivos Objetivos
Objetivos
Geral
- Analisar o processo grupal como instrumental do cuidado de enfermagem ao familiar do
dependente químico.
Específicos
- Caracterizar o grupo nos aspectos socioeconômicos e demográficos;
- Descrever o processo e as fases de desenvolvimento do grupo;
- Identificar o modo como a co-dependência é expressa no grupo de familiares de
dependentes químicos.
25
Revisão de
Revisão de Revisão de
Revisão de Literatura
LiteraturaLiteratura
Literatura
26
3
33
3 Revisão de Literatura
Revisão de Literatura Revisão de Literatura
Revisão de Literatura
3.1 Contextualização do problema do uso das drogas psicoativas
Os problemas derivados das drogas, sejam aqueles ligados ao tráfico ou às
conseqüências individuais e coletivas do consumo, estão inseridos no cotidiano das pessoas, e
a relação do homem com as substâncias psicoativas é bastante antiga, portanto, a presença
das drogas não é um fato recente.
Seibel e Toscano Junior (2001) referem que o uso de drogas pelos humanos é
uma presença contínua na história humana e que envolve Medicina, ciência, magia, religo,
cultura, festa e deleite.
Mesmo com toda essa questão histórica que compreende a produção e consumo
de drogas, o aumento do uso dessas substâncias lícitas e ilícitas tornou-se um dos maiores
problemas de saúde pública mundial. Lobosque (2001), Pensky e Bessa (2004) acentuam que
é grave o problema do abuso ou uso compulsivo de algumas drogas, pois seguramente
prejudica o usuário, e, quando chega a afetar a sociedade brasileira, como está acontecendo
com a nossa, é porque indica uma desregulação da presença dessas drogas entre nós.
Ao iniciarmos essa revisão de literatura, surge uma imensidão de questões e
contradições. Em primeiro lugar: quais os verdadeiros malefícios da utilização das drogas
para a sociedade? Ou o contrário: quais os malefícios da sociedade para os usuários?
De fato, as drogas trazem vários problemas de ordem biopsicossocial e
econômica para o usuário. Na atualidade, praticamente todos os países estão às voltas com os
mesmos problemas: a dependência química, resultado da produção e tráfico de drogas;
criminalidade; violência; e crescente número de jovens e adultos fazendo uso de substâncias
psicoativas.
Por outro lado, no entanto, nos questionamos até que ponto essa dependência
química não é uma doença da sociedade, que ela própria também é responsável pelos
indivíduos que dela fazem parte. Para Leite, Andrade et al. (1999), presenciamos mais do que
o surgimento de uma nova doença, ou seja, a dependência de drogas parece revelar a
perversidade de nossa forma atual de vida, que se apresenta pela geração de indivíduos com
escassos recursos pessoais e sociais, o que o impossibilita de viver com dignidade humana e
saúde.
27
Certamente, um consenso de que o abuso ou uso compulsivo de drogas é um
problema grave, danificando produção e vida, corpos e mentes, relações amorosas e sociais
(LOBOSQUE, 2001).
As drogas mostram-se não somente como fatores de marginalização, mas como
elementos de integração social, capazes de superar o estresse e aumentar o desempenho das
pessoas. Essa integração social a que nos referimos não é aquela na qual prevalece o
assistencialismo ou a indiferença, mas aquela onde cada um de nós possa ter uma
participação efetiva na conquista social, oferecendo ajuda ao dependente químico, aceitando
as diferenças e tornando suportável a dor.
Lobosque (2001) faz alusão à necessidade de uma abordagem sem preconceitos
em relação ao problema das drogas, pois para seu enfrentamento, é necessária uma crítica
incisiva ao individualismo das saídas e dos ideais hoje oferecidos às pessoas, prevalecendo a
reinserção social como forma de constituição de uma consciência social em que se produza a
solidariedade da ão coletiva, substituindo a mania de salvação pelo crescimento da
responsabilidade de fazer-se presente, na qual a esmola lugar ao dom, reavendo o valor
sem preço da generosidade; e a coragem da luta nos faça correr os riscos das perdas. Enfim,
apostamos no homem e na decisão do seu desejo.
Ao tentarmos conceituar a palavra droga surge uma variedade de definições,
muitas vezes equivocadas, que chegam inclusive a confundir, ensejando dúvidas e
preconceitos, dificultando, assim, a abordagem preventiva. Seibel e Toscano Junior (2001)
conceituam drogas de abuso ou substâncias psicoativas como aquelas que agem nos
mecanismos de gratificação do cérebro, provocando efeitos estimulantes, euforizantes e/ou
tranqüilizantes.
A palavra droga, na communis opinio, tem significado ruim, desagradável, de
pouco ou nenhum valor. Pela comunidade científica, essa palavra tem a mesma acepção de
remédio. Realmente, muitos remédios causam estragos terríveis ao organismo são as
chamadas reações adversas ou efeitos colaterais. De acordo com Aluani (1999, p.20), o
termo droga originou-se da palavra droog (holandês), que significa folha seca, pois
antigamente os medicamentos eram à base de vegetais. Mas hoje, devemos entender como
droga, toda substância química que, introduzida no organismo, altera uma ou mais funções”.
Afinal de contas, o que é droga? Droga ou fármaco é qualquer substância que, ao
ser introduzida no organismo, altera o seu funcionamento, portanto, tudo o que é inalado,
absorvido, ingerido ou injetado pode ser considerado uma droga, o que nos remete à idéia de
que qualquer fármaco pode ser tóxico em hiperdosagem (CARLINI, 1995).
28
O Ministério da Saúde faz referência às drogas como sendo substâncias
psicoativas ou psicotrópicas, que produzem alterações no sistema nervoso central do
indivíduo, e, conseqüentemente, nos seus padrões comportamentais e emocionais (BRASIL,
1991).
Essas drogas psicoativas promovem o aparecimento de estados psíquicos
anormais, ou não usuais, como alucinações, idéias delirantes, euforia e desibinição, e seu uso
terapêutico é limitado. Tiba (1994) refere que a droga, antes de provocar problemas físicos,
traz alterações comportamentais, que não se instalam bruscamente, mas aos poucos, com seu
uso contínuo.
Para Lobosque (2001), as drogas são tidas como diferentes substâncias que
alteram a atividade cerebral, produzindo uma sensação experimentada como agradável pelo
usuário, de tal forma que este pode vir a usar de forma compulsiva a substância em questão.
Nem sempre as drogas causam compulsão ou vício ao usuário, mas elas sempre promovem
uma sensação agradável, de modo que é um mito assinalar que o ideal é conviver numa
sociedade sem drogas, pois é praticamente impossível extingui-las do nosso meio, assim
como o desejo do homem de consumi-la.
Quanto aos tipos de drogas psicoativas, podem ser classificadas de acordo com
sua atuação no sistema nervoso central, podendo ser psicolépticas substâncias que ‘inibem’
o tônus mental, representadas pelo álcool, ansiolíticos, hipnóticos, tranqüilizantes
benzodiazepínicos e derivados do ópio; psicoanalépticas – substâncias que ‘estimulam’ o
tônus mental, entre elas, tabaco, cafeína, anfetamínicos, cocaína e crack; psicodislépticas, que
são as substâncias ‘perturbadoras’ do tônus mental, representadas pela Cannabis sativa e
derivados (maconha e haxixe), solventes orgânicos voláteis (éter, cola de sapateiro, gasolina)
e alucinógenos (LSD, mescalina e “Santo Daime”) (SEIBEL; TOSCANO JUNIOR, 2001).
Liddle e Dokof (1995) chamam a atenção para os distúrbios provocados pelo uso
abusivo de drogas, por serem uma ameaça à saúde pública, trazendo ônus considerável ao
adicto e a sua família, pois comumente a adicção leva à perda de empregos, rupturas
familiares, instabilidade financeira, abuso físico e psicológico. A comunidade também é
onerada, porque vítimas de crimes e acidentes relacionados com as drogas, altos custos de
encarceramento, no caso de substâncias ilegais, e tratamento.
Com relação à legalidade das substâncias psicoativas, no Brasil, a legislação
vigente classifica as drogas em lícitas, sendo substâncias utilizadas pela Medicina, Medicina
Veterinária ou indústria de medicamentos, álcool e fumo, ou ilícitas, aquelas que o
apresentam uso medicinal. Não estando liberadas pelo Ministério da Saúde, são consideradas
29
ilegais, a exemplo da maconha, cocaína, LSD, vários alucinógenos e alguns opiáceos, como a
heroína e outros. É válido lembrar, porém, que em nosso País, para a venda e consumo de
drogas citas como o fumo, álcool e solventes, não existe controle sanitário eficaz
(MORAES, 2003).
A legislação brasileira mostra-se arbitrária ao categorizar as drogas quanto a sua
proibição ou não pela lei, ao ponto de surgirem questões como: por que certas drogas são
lícitas e outras não? Ao tentar responder a essas perguntas, podemos tomar como critério o
mal que causa à saúde ou o dos comportamentos anti-sociais. Se o critério utilizado for o
primeiro, em nosso País encontramos o tabaco como sendo uma droga lícita e que certamente
causa mais males à saúde comparado a outras drogas. Já no segundo critério, temos como
exemplo o álcool como droga aceita legalmente, e a cocaína não, sendo que as duas são
igualmente capazes de causar comportamentos anti-sociais como a violência e a
agressividade. Assim, não temos argumentos sólidos e claros quanto à proibição ou não de
certas drogas. Lobosque (2001, p. 72) refere que: “não há uma relação objetiva entre a
potencialidade de causar danos de uma droga e a sua proibição ou não pela lei”.
De fato, ao tentarmos resolver as questões legais das drogas psicoativas, devemos
ser cautelosos nas expectativas de soluções baseadas em reforços do aparato legal. O que
devemos fazer é interrogar suas ambigüidades, caso existam, fazendo valer a lei quando esta
for clara e justa, tendo como exemplo a investigação de crimes relativos ao narcotráfico,
sejam eles relativos à marginalidade ou à esfera da corrupção administrativa, judicial e
policial.
A própria freqüência do uso é outro ponto que suscita indefinição. Segundo a
ONU, podemos classificar os usuários em quatro tipos (BRASIL, 1999, p.43):
- o experimentador limita-se a experimentar uma ou várias drogas (ou
substâncias), por diversos motivos, como curiosidade, desejo de novas experiências,
pressões do grupo de amigos/as, da publicidade, etc. Na grande maioria dos casos, o
contato com a substância não passa das primeiras experiências;
- o usuário ocasional utiliza um ou vários produtos, de vez em quando, se o
ambiente for favorável e a droga disponível. Não dependência nem ruptura das
relações afetivas, profissionais e sociais;
- o usuário habitual faz uso freqüente de drogas. Em suas relações se observam
sinais de ruptura. Mesmo assim, ainda “funciona” socialmente, embora de forma
precária e correndo riscos de dependência;
- o usuário dependente ou disfuncional - vive pela droga e para a droga, quase
exclusivamente. Como conseqüência, rompem-se os seus vínculos sociais, o que
provoca isolamento e marginalização, acompanhados eventualmente de decadência
física e moral.
Embora seja uma classificação padronizada pela Organização das Nações Unidas,
discordamos, em parte, apesar da freqüência do uso de drogas ser um aspecto importante na
30
hora de traçar o plano de intervenção ao dependente químico. Este tipo de classificação
mostra-se preconceituoso e estigmatizante, pois vem reforçar a forma como a sociedade,
em geral, trata diferentemente pessoas que consomem bebidas alcoólicas somente uma vez
por semana, por exemplo, daquelas que mantêm esta prática diariamente; como também
pessoas que esporadicamente usam maconha em relação àquelas que apresentam maior
dependência. Em geral, essas pessoas que conservam maior freqüência de uso são tachadas de
bêbadas ou alcoólatras e maconheiros, respectivamente, como se isso fosse o fator que
distinguisse se alguém é usuário ou não de drogas, uma atitude que, muitas vezes,
discrimina.
Outro aspecto importantíssimo que devemos destacar é a diferença de tratamento
dado às pessoas que usam somente drogas lícitas, em especial, fumo e álcool, daquele
reservado às que utilizam drogas ilícitas, sendo estas últimas, comumente, vistas e tratadas
como pessoas perigosas, que ameaçam a sociedade, necessitando, assim, de maiores cuidados
(MORAES, 2003). Compreendemos que isso seja mais uma forma preconceituosa de
visualizar as drogas, pois pensar em perigo denota, de alguma forma, em nossas mentes, a
violência e o álcool, que, por sua vez é uma droga lícita, é tão causadora de episódios de
violência quanto as drogas ilícitas.
Em países onde o consumo de álcool é comum e é lícito, ele é socialmente aceita.
Até recentemente, muitas pessoas falavam de álcool e de outras drogas com a sugestão
implícita de que o álcool era diferente das “outras drogas”. Além disso, o fato do consumo
social ser legal na maioria dos países significa que, de certa forma, ele é mais seguro do que
as outras drogas; porém, legalidade não confere segurança (BRASIL, 2004).
É considerado um problema de saúde pública em termos de custos econômicos,
principalmente no que se refere aos gastos oriundos de tratamentos advindos de problemas
causados por álcool e outras drogas, como doenças crônico-degenerativas e outras advindas
de acidentes de trânsito, além de perda da produtividade dos indivíduos acometidos,
resultando em prejuízos para os cofres da previdência social do País, causando desajuste de
ordem econômica e social nas famílias.
Estudos realizados em países da América Latina indicam que as drogas lícitas,
como o álcool e o tabaco, são as substâncias mais utilizadas. Entre as ilícitas, destacam-se a
maconha e as derivadas do cloridrato de cocaína, observando-se aumento marcante do uso
indevido de produtos farmacêuticos, entre eles: os tranqüilizantes, sedativos e morfinas
sintéticas, compradas sem prescrição médica. Há, inclusive, as novas tendências do uso de
drogas sintéticas como o extasis e derivados anfetamínicos; o uso de drogas mescladas, como
31
o dietilamida de ácido lisérgico (LSD) com formaldeído; cocaína com maconha e ainda o
crescimento do consumo de drogas por via injetável, o que aumenta os riscos de enfermidades
transmissíveis, tais como a hepatite B, C e o HIV/AIDS (WRIGHT; CHISMAN, 2004).
Entre os problemas causados à população pelo consumo de drogas lícitas e
ilícitas, prevalecem a violência e a criminalidade, morte precoce, dependência, acidentes de
trabalho acompanhados de absenteísmo –, licenças médicas e elevação do número de casos
de doenças, como AIDS e hepatites B e C.
É nítido para nós que somos brasileiros o quanto o problema das drogas afeta o
Brasil e outros países da América Latina e Central. É conhecido o fato de que todas essas
nações, juntamente com a nossa, produzam grande parte da droga consumida no mundo.
Além da produção, a América Latina possui uma diversidade botânica acentuada em suas
inúmeras matas, com destaque especial para a Floresta Amazônica. Sob esse aspecto, estudos
revelam que foram encontradas aproximadamente 100 espécies de plantas alucinógenas na
América, enquanto na Europa e Ásia, juntas, encontraram-se apenas dez tipos (SEIBEL;
TOSCANO JUNIOR, 2001).
De acordo com a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas
(CICAD), integrada pelos Estados Membros da Organização dos Estados Americanos (OEA),
o desenvolvimento socioeconômico não pode prosperar na ausência de condições que
promovam a dignidade individual, a democracia e a segurança. Portanto, a prevenção do uso
indevido de drogas e a luta contra o tráfico de substâncias ilícitas, associada ao
desenvolvimento material da sociedade, devem figurar no contexto das políticas de
desenvolvimento socioeconômico dos países (CARRARO et al., 2004).
A CICAD tem como objetivo promover e facilitar estreita colaboração entre os
países para o controle do tráfico, da produção e do consumo ilícito de drogas. Para isso, entre
as suas diversas atividades, desenvolve o Projeto de Enfermagem na América Latina, com a
finalidade de formar e capacitar enfermeiros para a promoção da saúde e prevenção do uso
indevido de drogas (CHISMAN; WRIGHT, 2001).
A ação da CICAD é efetiva, pois o estudo da dependência química ainda se
mostra frágil diante dos problemas que a droga tem causado aos diversos países que compõem
a OEA.
Evidenciamos o quanto é complexa e pouco explorada a questão das drogas,
apontando a necessidade de que mais estudos sejam desenvolvidos para a melhor apreensão e
transformação da realidade atual. Ressaltamos ainda o quão importante e necessária é a
inclusão do estudo da dependência química nos programas curriculares de graduação,
32
especializações, mestrados e doutorados em Enfermagem, a fim de formar os profissionais
para melhor lidarem com as questões de saúde decorrentes do uso de drogas e a melhor forma
de prevení-los (MORAES, 2003).
Quanto às políticas públicas brasileiras, o documento referente à Política Nacional
Antidrogas cita que, entre os efeitos gerados pelo uso indevido de substâncias psicoativas,
está a associação do tráfico de drogas ilícitas e dos crimes conexos, geralmente de caráter
transnacional, que ameaçam a vida das pessoas, inclusive a soberania do País (BRASIL,
2001).
Em pesquisa realizada com adolescentes em situação de risco, o uso de drogas é
visto como uma relação de prazer e violência, e, na maioria das vezes, a violência é
representada pelo sangue que resulta da própria guerra do tráfico, uma luta em que a droga é
vista como a principal causa. Os profissionais de saúde, a sociedade e as instituições
governamentais, porém, se esquecem de que por trás dessa guerra do tráfico de drogas, existiu
antecipadamente uma luta pela oportunidade de viver tranquilamente, ter direito à família, à
moradia, à saúde, à educação e dignidade, luta essa que continua sendo travada, e
infelizmente, a violência e a criminalidade são conseqüências daí resultantes (MORAES,
2003).
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 10% das
populações dos centros urbanos de todo o mundo consomem abusivamente substâncias
psicoativas, independentemente da idade, sexo, nível de instrução e poder aquisitivo.
Nacionalmente, essa realidade encontra equivalência em todo o Território brasileiro, salvo
variações sem grande repercussão epidemiológica (COSTA, 2004).
Chamamos a atenção para o uso abusivo de drogas entre os adolescentes, grupo
etário no qual aumenta o seu consumo. Conforme o Levantamento Nacional Sobre o
Consumo de Drogas Psicotrópicas” realizado por Carlini et al. (1997), o uso indevido de
drogas no Brasil acontece cada vez mais cedo (por volta dos dez anos de idade), em ambos os
sexos, e em média 24,6% dos estudantes de ensino fundamental e médio de dez capitais
brasileiras já fizeram uso de drogas pelo menos uma vez na vida.
De acordo com o “5º Levantamento Nacional Sobre o Consumo de Drogas
Psicotrópicas entre estudantes”, realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas
Psicotrópicas CEBRID, na rede pública de ensino fundamental e médio das 27 capitais
brasileiras, 12,6% dos alunos com idade entre dez e 12 anos já consumiram algum tipo de
droga pelo menos uma vez na vida, percentual que sobe para 23,2% na faixa etária de 13 a 15
anos (GALDURÓZ; NOTO; FONSECA; CARLINI, 2005).
33
Historicamente, o Brasil formula sua Política Nacional Antidrogas baseado nas
medidas descritas no Artigo 14, parágrafo 4º, do documento da Convenção das Nações
Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, de 1988, que
trata, respectivamente, de medidas para erradicar o cultivo ilícito de plantas das quais se
extraem entorpecentes e para eliminar a demanda ilícita de entorpecentes e substâncias
psicotrópicas. Esse parágrafo refere que as partes adotarão medidas adequadas que tenderão a
suprimir ou reduzir a demanda ilícita de entorpecentes e de substâncias psicotrópicas, com
vistas a diminuir o sofrimento humano e eliminar os incentivos financeiros do tráfico ilícito
(BRASIL, 2001).
Entre as ações mundiais, em 1998, na Sessão Especial da Assembléia Geral das
Nações Unidas, o Brasil aderiu aos princípios diretivos de redução da demanda por drogas,
reestruturando o Sistema Nacional Antidrogas e reforçando o compromisso político, social,
sanitário e educacional, de caráter permanente, no investimento em programas de redução de
demanda, com a finalidade de eliminar o flagelo representado pelas drogas psicotrópicas no
País.
O Sistema Nacional Antidrogas SISNAD foi regulamentado pelo decreto de
número 3.696, de 21/12/2000, o qual se orienta pelo princípio básico da responsabilidade
compartilhada entre Estado e sociedade, adotando como estratégia a cooperação mútua e a
articulação de esforços entre Governo, iniciativa privada e cidadãos considerados
individualmente ou em suas livres associações. A estratégia visa a ampliar a consciência
social para a gravidade do problema representado pela droga e comprometer as instituições e
os cidadãos com o desenvolvimento das atividades antidrogas do País (BRASIL, 2001).
A Política Nacional Antidrogas, em sua descrição, menciona a importância da
municipalização das ações antidrogas como forma de alcançar melhores resultados no
combate a essa problemática, pois, para a Secretaria Nacional Antidrogas, “os resultados
obtidos em sua ampliação serão de pouca objetividade caso não sejam acolhidos e bem
conduzidos em nível de ‘ponta de linha’, ou seja, no ambiente onde predomina o universo de
risco.” (BRASIL, 2001, p. 9).
E o que seria o universo de risco para a literatura de dependência química?
Compreendemos que, na atualidade, ao planejarmos as ações antidrogas, não podemos falar
em universo de risco, pois o uso de drogas perpassa a todos os setores da sociedade, sem
distinção de raça, cor, sexo, condição socioeconômica ou credo religioso. Para Lobosque
(2001, p. 83), o uso de drogas é possível por conta do crime organizado, e este “só se torna
possível porque permeia todas as classes: ‘não é coisa de gente de outra laia’”.
34
No tocante à municipalização das ações propostas pela Política Nacional
Antidrogas, essa prática tem repercussão no combate às drogas psicotrópicas, pois estimula a
organização de um possível conselho municipal antidrogas, potencializa a participação da
sociedade civil, organizada nas ações e estas serão específicas à problemática da área, levando
em consideração as características socioculturais e econômicas da população afetada. Pouco
repercutirá, entretanto, se a população não for assistida quanto as suas necessidade de saúde,
renda, moradia, educação, alimentação e lazer. A ação isolada desses fatores determinantes e
condicionantes de uma vida digna não terá efeito no combate antidrogas.
No que se refere à dinâmica de atuação para com dependentes químicos, existe
uma lacuna, ou seja, uma precária rede de estratégias que visam a incluir a família nas
atividades que compõem o trabalho de reabilitação. Além disso, sabemos, para que isso
ocorra, é importante conhecer a vivência familiar em relação às drogas.
Se a família estiver envolvida com o dia-a-dia do tratamento, e a instituição
empenhada em trazê-la para o cotidiano do serviço, primeiramente conhecendo e entendendo
sua dinâmica para posteriormente assistir e inseri-la na rotina terapêutica, provavelmente
teremos melhores resultados no que se refere às recaídas. Assim, a família estaria mais
preparada para administrar situações difíceis que ocorrem na dinâmica de seus
relacionamentos, como também exercendo seus papéis, como acolher e cuidar de seus
integrantes.
A recaída, por sua vez, faz parte do processo de mudança do estilo de vida do
dependente químico, pois não devemos enxergá-la apenas como um fracasso na terapêutica, já
que este fato pode sempre ocorrer, obrigando novamente o dependente a recomeçar o estágio
de mudança e adiar a fase de manutenção de um comportamento o adicto (PILLON; LUIZ,
2004; DICLEMENTE, 1993).
Utilizando-nos da conceituação dos modelos médico-sanitário e psicossocial,
podemos dizer que a dependência química é um tipo de patologia clínica e social que exige
um sério, corajoso e ético trabalho de rede. Tanto os familiares como os próprios dependentes
químicos têm dificuldades ao vivenciarem experiências perante os desafios de mudanças
elementares e fundamentais de relação e funcionamento, como também de formação de
vínculos afetivos profissionais de segurança e apoio para sustentação do o-uso de drogas.
Portanto, a recaída ainda é a condição de maior insegurança vivida pelos usuários, familiares
e equipe terapêutica.
Por que os tratamentos de dependência química são de tal modo marcados por
insucesso, com tantos momentos de recaídas e síndromes de abstinência?
35
Realmente o uso compulsivo de drogas é caracterizado por um ciclo infindável de
repetição em que o usuário mergulha, e, queira ou não, a família e até o serviço de assistência
vão juntos, compartilhando desse insucesso.
Essa compulsão é explicada biologicamente por meio do efeito da tolerância, de
sorte que são necessárias doses cada vez maiores para produzir o mesmo efeito de antes,
sendo que algumas das drogas psicoativas também produzem o que chamamos de efeito de
abstinência, ou seja, na ausência de doses sangüíneas, ocorre um mal-estar desagradável físico
e/ou psíquico, que cessa quando o organismo recebe uma nova porção da droga desejada
(MORAES, 2003; LOBOSQUE, 2001; SEIBEL; TOSCANO JUNIOR, 2001).
Dessa forma, as recaídas são causadas por determinação orgânica, ou seja, o
indivíduo usa a droga para não se sentir mal. Podemos nos questionar porém: por que essa
pessoa deixou chegar a esse estado tão ruim para sua saúde física e mental, uma condição fora
do normal? Como já foi suscitado, isto pode ser explicado pelo fato de a droga causar
sensações tidas como agradáveis e prazerosas ao usuário ao ponto dele querer sempre mais e
mais. Por que, então, se perdeu o limite, a noção de quando parar e de que é chegada a hora de
tomar uma atitude firme perante o problema?
A Psicanálise oferece algumas contribuições na resposta desta questão, aludindo à
perturbação do homem diante do desejo, ou seja, o abuso de substâncias psicoativas é visto
como adaptativo e defensivo (KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1997; LOBOSQUE, 2001). O
fato de estar sob os efeitos das drogas, em geral, reduz ou anula o incômodo que a condição
de estar abusando provoca, devolvendo a euforia, fazendo parecer tudo completo, e, quando
se descobre que não está, é só se drogar novamente, e assim o indivíduo vai se drogando cada
vez mais ao ponto de se tornar um dependente químico.
A condição de ser usuário de droga é uma experiência muito solitária, pois,
mesmo que o usuário de drogas frequentemente ande em grupos, a ‘viagem da droga’ é
fundamentalmente solitária, pois recusa o desejo que nos leva ao outro. A ruptura com a
dimensão social, então, se torna difícil de refazer (LOBOSQUE, 2001).
Na condição de enfermeiros, pois, ao cuidarmos de alguém que está vivenciando a
dependência química, devemos principalmente sustentar a oferta da nossa presença, fazendo
também sustentar a presença da família, pois em certos momentos dessa prazerosa e dolorosa
vivência, o indivíduo dependente químico o nos escuta e não adianta gritar, ou persegui-
lo, cabendo-nos simplesmente estar presente.
36
3.2 Abordagens e tratamentos ao dependente químico e família
Com relação ao entendimento das dimensões do problema do consumo de álcool e
outras drogas, existem diversos modelos explicativos desse fenômeno que afeta as populações
mundiais, especialmente as da região ocidental. Esses modelos são os mais utilizados no
tratamento e/ou prevenção do consumo.
São abordados por Pillon e Luis (2004) da maneira descrita na seqüência.
1 Modelo ético-legal concepção vinculada aos profissionais do Direito e
Segurança Social, suas causas estão nas atitudes anti-sociais e/ou imorais de grupos que a
sociedade rotula como transgressores. Sua abordagem com intuito de intervir preventivamente
apóia-se em medidas de caráter positivo e punitivo, por meio dos sistemas legislativos,
judicial e policial;
2 Modelo moral nele os dependentes são considerados responsáveis pelo início
e desenvolvimento do problema, além da obtenção das soluções, e acredita-se que necessitam
apenas de motivação. Neste, as pessoas são levadas a sentirem-se culpadas pelo
desenvolvimento do problema e pelo fracasso por não conseguirem alterar seu
comportamento de dependência;
3 Modelo médico ou de doença esse modelo baseia-se na suposição de que a
dependência de substâncias psicoativas é algo de caráter progressivo, com origem e
manifestações físicas que necessitam de tratamento médico. Nesse modelo, o reforço do
termo dependência” em detrimento de outro com maior conotação moral, “vício”. Esse
problema deve ser visto como um conjunto de sintomas clínicos, isto é, uma doença na qual o
individuo espera ser tratado como doente e a abstinência total é o objetivo do modelo;
4 Modelo psicológico ou psicossocial inclui o aprendizado social, a interação
familiar e os traços da personalidade do individuo, pregando a noção de que o comportamento
social é aprendido mediante observação e imitação;
5 Modelo sociológico ou sociocultural concebe o problema das drogas como
resultado de um número de forças sociais, enfatizando a função do meio cultural com suas
crenças, valores e atitudes que conduzem a comunidade ou seus grupos específicos ao
caminho da obtenção ou do uso de drogas. É um modelo ambientalista e fatores sociológicos
(desemprego, privação social, etnicidade, religião e outros) influenciam no início e no uso
continuado ou não da substância.
Como vimos no modelo médico ou de doença, a “dependência” é divisada como
um conjunto de sintomas clínicos, doença, e a abstinência total ao uso é o objetivo principal
37
desse modelo. Essa questão focada na abstinência total do usuário, porém, faz com que esse
modelo enseje muitos episódios de insucesso, pois as possíveis recaídas da pessoa em
tratamento são vistas como a não-aderência e, conseqüentemente, começa tudo novamente,
passando para a pessoa que busca a recuperação a sensação de que é difícil ou até impossível;
sem falar que nesse modelo o uso da substância exerce papel de doença e o indivíduo espera
ser tratado como doente. Essa característica do modelo médico ou de doença promove a baixa
auto-estima, firmando o caráter normativo de atenção à saúde, deixando o usuário isento da
responsabilidade nas mudanças. Entre suas desvantagens, citamos ainda o fato de ele ignorar
os fatores psicológicos, culturais e ambientais, além do usuário ser isento de responsabilidade
nas mudanças.
Para os profissionais que se inspiram nesta abordagem, é comum a sensação de
fracasso na sua prática, pois inúmeras vezes eles também m de conviver com as recaídas,
ficando assim o vazio de que nada se conseguiu; é como se fazer “castelos na praia”.
Quanto ao modelo ético-legal, podemos dizer que uma de suas falhas é de não
haver um aprofundamento da análise da dependência de substâncias e dos processos que a
determinam.
o modelo psicológico ou psicossocial apresenta como vantagem a fácil
interação com os outros modelos, porém se pauta como desvantagem o fato de que mudanças
nas situações sociais são suficientes para a recuperação, porém, na prática, sabemos que é um
conjunto de vários outros fatores.
Com relação ao modelo sociológico ou sociocultural, podemos mencionar como
vantagem a noção de não ser valorizada a culpa ou punição pelo uso de drogas, sendo sua
desvantagem a tendência de ignorar o fato de que o uso excessivo da substância afeta a
personalidade do indivíduo.
Sobre esses modelos, não acreditamos em nenhuma proposta que não envolva o
próprio sujeito interessado em deixar de consumir a droga, em que sua autonomia o
prevaleça, caso contrário, é possível obter resultados.
Spricigo e Alencastre (2004, p. 428) deixam claro que a produção teórica sobre as
drogas apresenta vários enfoques e propostas, ou seja, uma diversidade de teorias e modelos:
Encontramos teorias biológicas; de aprendizagem; psicológicas, baseadas em causas
intrapessoais; modelos baseados no enfoque sistêmico; modelo evolutivo e modelo
compreensivo e seqüencial através dos distintos níveis em relação ao consumo de
drogas dentre outras.
Existe, ainda, o agrupamento dos acúmulos teóricos sobre o fenômeno das drogas
em quatro categorias, frisando visões e modelos teóricos:
38
Droga como um problema legal – Modelo ético-jurídico; droga como doença e
problema psiquiátrico ou de saúde mental Modelo médico-sanitário e psicossocial;
Droga como um problema social Modelo sócio-cultural, modelo geo-político e
estrutural; Droga como um problema de poder (econômico) e parte das relações
internacionais Modelo crítico-holístico de saúde internacional. (SPRICIGO;
ALENCASTRE, 2004, p.429).
Tais modelos se superpõem na prática, não existe aquele ideal e correto para
abordar os problemas relacionados ao consumo de drogas, pois todos são válidos, apenas
procurando-se desencorajar a utilização do modelo moral, por visualizar o indivíduo como
mau-caráter, sendo a punição um dos objetivos do tratamento. Esse tipo de modelo,
infelizmente, ainda é muito almejado pela população em geral e por profissionais da área de
saúde como a principal forma de abordagem desse usuário. A essas questões de uso e abuso
de drogas, no entanto, pensamos que elas necessitam de um enfoque mais holístico, tanto para
entender a causa do uso pelo indivíduo como para sua aplicação no atendimento ao usuário.
Para Rosa e Tonhon (2000), dentre os possíveis enfoques terapêuticos às
farmocodependências, deveremos optar por aqueles os quais acreditamos mais fecundos, ou
seja, os que se utilizam de conhecimentos e intervenções das diversas áreas do saber. As
terapêuticas que valorizem o autocuidado mostram-se como estratégias eficientes de
intervenção, pois o autocuidado desenvolve e reforça nessas pessoas a capacidade de refletir
sobre seus problemas e de cuidar-se.
Schenker e Minayo (2004) reforçam a idéia de que em dependência química é
preciso abordar separadamente os estágios de tratamento da adicção, desde o engajamento do
adicto no tratamento até o período posterior. Quanto aos métodos para o engajamento inicial
dos adictos os autores fazem menção a:
1 Método de Intervenção (intervention) – a intervenção é constituída pelos
membros familiares e pelas pessoas significativas para o usuário, visando a dar-lhe um
ultimato quanto ao uso abusivo de drogas.
2 Abordagem de Reforço da Comunidade (Community Reinforcement
Approach-CRA) constitui intervenção comportamental compreensiva, tendo sido criado
para pacientes alcoólatras, com o intuito de reorganizar aspectos diversos da sua
"comunidade", de forma que passe a ser mais atraente para eles um estilo de vida sóbrio, em
lugar de um dominado por drogas e álcool, enfocando as contingências ambientais, por
considerar que os reforços familiares, sociais, recreacionais e ocupacionais influenciam o
indivíduo na mudança de seus comportamentos adictivos, fortalecendo o contexto que apóia a
sobriedade e desencoraja o uso da substância nociva. Fazem parte do programa CRA,
métodos de prevenção e cuidado com a recaída.
39
3 todo do Treinamento de Reforço da Comunidade (Community
Reinforcement Training-CRT) – o profissional está disponível para ver o membro da família
que telefona buscando auxílio neste mesmo dia. Além disto, esdisponível, mesmo nas suas
horas de lazer, para chamados de urgência da família, se, por acaso, o adicto entrar em crise.
4 Treinamento de Família e o Reforço da Comunidade (Community
Reinforcement and Family Training-CRAFT) foi desenvolvido para ajudar alcoólatras
resistentes ao tratamento e seu objetivo é auxiliá-los na busca de tratamento por meio da
persuasão e do suporte de familiares e de amigos.
5 Alcoólatras Anônimos-(AA) desenvolvido para trabalhar com o membro
familiar mais motivado da família com o intuito de conseguir incluir o alcoólatra nos
Alcoólatras Anônimos (AA), criando também estratégias com o cônjuge (no caso de casais)
visando a ajudá-lo (a) a desligar-se do (a) alcoólatra.
6 Terapia de Família Unilateral (Unilateral Family Therapy-UFT)
combinando o CRA e a "Intervenção", essa terapia é feita com o cônjuge (no caso de casais),
durante alguns meses, visando à entrada do dependente em tratamento.
7 Aconselhamento Cooperativo (Co-operative Counseling) programa
experimental que envolve os membros da família por intermédio de uma campanha nos
media, com o objetivo de induzí-los a comparecer ao centro de tratamento a fim de serem
treinados, no caso de estarem preocupados com o problema de alcoolismo de seus parentes.
8 Método de Engajamento Sistêmico Estrutural-Estratégico (Strategic
Structural-Systems Engagement-SSSE) o qual visa a engajar no tratamento o adolescente
dependente e seus membros familiares, partindo das premissas da terapia sistêmica estrutural
e estratégica, na qual a família é vista como um sistema social que estabelece padrões de
transação rotineiros entre os seus membros e com o contexto. Esse método foca a mudança
desses padrões de interação que permitem, encorajam ou mantêm o sintoma. A resistência ao
engajamento na terapia parte do mesmo princípio do tratamento que focar os padrões de
interação para se tocar na estrutura familiar mal adaptada.
9 Uma Seqüência de Intervenção Relacional para o Engajamento (A
Relational Intervention Sequence for Engagement- ARISE) criada para vincular adictos
muito ambivalentes em relação ao tratamento, configura-se como forma de intervenção mais
flexível, ao permitir que a família, juntamente com seu membro dependente químico, decida
quando tomar decisões mais severas em relação ao comportamento do usuário de drogas.
Todos os descritos métodos de engajamento ao tratamento por parte de adictos, à
exceção do SSSE, caracterizam-se como intervenções que envolvem a família, nesse
40
processo, pois partem da premissa de que esta pode auxiliar o adicto a se engajar no
tratamento de formas variadas. Nenhum deles, no entanto, considera a família como
diretamente implicada ou responsável pela formação da adicção.
No que se refere aos diversos métodos de tratamento para o uso indevido ou
abusivo de drogas, Schenker e Minayo (2004) citam os principais:
1 Terapia Comportamental (Behavioral Therapy) baseia-se no
condicionamento clássico e operante, recompensa e punição de comportamentos considerados
apropriados ou inapropriados, respectivamente: assinala que o uso de droga é um
comportamento aprendido pelo indivíduo em seu contexto. O cerne da intervenção resume-se,
em primeiro, a identificar os comportamentos que instigam o uso de drogas; em segundo
lugar, prover o indivíduo de habilidades que rompam tal ciclo de conduta; e, em terceiro,
propiciar-lhe formas de lidar com situações propensas à recaída. Os pais aprendem esses
princípios terapêuticos mediante um treinamento sobre o gerenciamento e monitoramento
parental, de forma a utilizá-los com o adicto.
2 Terapia Comportamental Cognitiva (Cognitive Behavioral Therapy- CBT)
expande os princípios da terapia comportamental, ao reconhecer a influência de elementos
cognitivos, como o processamento da informação, a aprendizagem social e os estádios de
desenvolvimento para a formação do indivíduo. O tratamento foca as interações dos fatores
comportamental, cognitivo, social e do desenvolvimento, visando a mudanças nas percepções
e crenças e no comportamento do indivíduo. O uso de drogas é aqui entendido como
funcionalmente relacionado aos problemas da vida do indivíduo e influenciado, por sua vez,
pelos fatores sociais e cognitivos. O objetivo desta terapia é auxiliar no reconhecimento de
situações que o podem levar ao uso de drogas; evitá-las mediante habilidades e lidar com
problemas associados a elas.
3 Terapia Motivacional (Motivational Therapy) auxilia o indivíduo, de forma
empática, a se movimentar pelos estádios de mudança, que são os seguintes: pré-
contemplação, em que a pessoa não reconhece ter problemas com drogas; contemplação,
momento de ambivalência com relação às razões para a mudança; preparação, em que um
aumento do compromisso com a transformação; ão, na qual o indivíduo pára de usar
drogas; e manutenção, em que ele desenvolve um estilo de vida que evita a recaída.
4 Intervenções Farmacológicas (Pharmacotherapy) usadas principalmente
com adultos no tratamento de sintomas graves de dependência a drogas, com os adolescentes,
geralmente utilizadas para a desintoxicação e tratamento de co-morbidade.
41
5 Terapia dos 12 Passos (Twelve-Steps Approaches) também conhecida como
o Modelo Minnesota (Minnesota Model), utilizado pelos Alcoólicos Anônimos (AA) e os
Narcóticos Anônimos (NA), os quais concebem a dependência química como doença
progressiva e crônica, caracterizada pela negação e perda de controle. A espiritualidade é um
elemento-chave nesses tratamentos. Pede-se aos participantes que aceitem, com humildade, o
fato de terem perdido a batalha do controle sobre as drogas e se rendam ao poder superior. A
ideologia dos 12 passos prega a idéia de que a recuperação é possível pelo reconhecimento
individual de que as drogas são um problema e admissão da falta de controle sobre seu uso.
6 Abordagem da Comunidade Terapêutica (Therapeutic Community
Approach-TC) programas residenciais de longa duração para adolescentes com severo
abuso de drogas. O abuso de drogas é entendido como um distúrbio da pessoa global,
resultado de uma interrupção do desenvolvimento normal da personalidade, com deficiências
nas habilidades interpessoais e na consecução de metas. Como objetivo, essa abordagem tem
de prover um meio seguro, saudável e acolhedor, no qual o jovem possa desenvolver
comportamentos, crenças e atitudes pessoais socialmente mais adaptados.
7 Intervenções Multi-Sistêmicas e baseadas na Família (Family-based and
Multi-Systemic Interventions) contextualizam o adolescente em sua família e na sociedade
com seus pares, escola e comunidade, com origem no princípio de que as relações do
adolescente com esses contextos podem ser saudáveis ou adoecidas, no último caso,
facilitadoras do uso de drogas. Tais tratamentos têm como base as relações disfuncionais do
indivíduo com qualquer um desses sistemas, e a terapia terá, necessariamente, que envolver
pessoas desses variados universos. Consideram que a dinâmica destas relações influencia seus
pensamentos e suas percepções, contribuindo, então, para formar padrões de comportamentos.
Reconhecem a influência crítica que o sistema familiar do adolescente tem no
desenvolvimento e na manutenção de problemas de abuso de drogas.
Destacamos, neste conjunto de propostas, as diversas terapias de família,
consideradas essenciais para a abordagem da drogadicção. O método de intervenção varia de
acordo com a orientação teórica do terapeuta, mas a maior parte delas vem da Teoria
Sistêmica, em que a ênfase é conferida à natureza relacional e contextual do comportamento
humano. Nessa perspectiva, o funcionamento do indivíduo está reciprocamente
interconectado ao dos outros que compõem o seu primeiro contexto relacional: a família. Essa
abordagem considera o comportamento como um sintoma da disfunção familiar, uma vez que
o comportamento individual ocorre e adquire o seu significado no contexto dessa micro-
instituição.
42
Entre as abordagens para o tratamento da família, Schenker e Minayo (2004)
citam como sendo as principais encontradas na literatura:
1 Modelo da doença familiar – parte do princípio de que a família e o adicto têm
uma doença, sendo mais utilizado para o tratamento do alcoolismo, considerando que os
membros da família sofrem de co-dependência.
2 Terapia de Família Comportamental-Cognitiva integra a Teoria Sistêmica,
com princípios e técnicas da terapia comportamental cognitiva individual. Enxerga o uso
abusivo de drogas do adolescente como comportamento condicionado, reforçado por dicas,
insinuações e contingências existentes dentro da família. As intervenções levam ao
gerenciamento das interações familiares, fazendo com que as condições e os comportamentos
compatíveis com o uso de drogas sejam diminuídos e os incompatíveis com o uso de drogas
sejam reforçados.
3 Terapias Integrativas também chamadas de ecológicas, esse tipo de
abordagem integra a terapia de família multidimensional MDFT e terapia multissistêmica
da família. O diferencial deste tratamento é efetuar as sessões na casa das famílias, ou seja,
em suas comunidades, promovendo vínculos terapêuticos.
Quando pesquisamos os tipos de métodos para o engajamento do dependente
químico ao tratamento e os métodos de tratamento para o uso indevido e/ou abusivo de drogas
observamos que as intervenções, cuja base é a família, podem ter maior sucesso no
engajamento, na retenção e no resultado com os dependentes químicos, comparadas às
intervenções focadas apenas no indivíduo.
Entre os modelos de abordagem ao dependente químico, temos as estratégias para
redução de danos e riscos associados ao consumo prejudicial de drogas psicotrópicas, que é a
Política Nacional da atualidade.
Na Política (do Ministério da Saúde) para o Álcool e outras Drogas, o conceito de
‘redução de danos’ é consolidado como um de seus eixos norteadores para a prevenção de
DST´S/AIDS, desde 1994. no campo do álcool e outras drogas, o paradigma da redução de
danos está situado como estratégia de saúde pública que visa a reduzir os danos causados pelo
abuso de drogas lícitas e ilícitas, recuperando o usuário em seu papel auto-regulador, sem a
exigência imediata e automática da abstinência, e incentivando-o à mobilização social
(BRASIL, 2005).
Para a Associação Internacional de Redução de Danos (IHRA), redução de danos
pode ser definida como políticas e programas que tentam, principalmente, reduzir, para os
usuários de drogas, suas famílias e comunidades, as conseqüências negativas relacionadas à
43
saúde, a aspectos sociais e econômicos decorrentes de substâncias que alteram o
temperamento. O foco dessa definição é no trato das conseqüências do uso de drogas em vez
de enfatizar apenas a redução do consumo de determinada droga, podendo ser aplicada tanto
para drogas lícitas como ilícitas, além da produção legal e clandestina de álcool, fumo e outras
drogas (BRASIL, 2004).
Dois comentários são pertinentes. Em primeira mão, esse conceito não incentiva
nem fecha os olhos para o uso de drogas, pois reconhece que existem danos e conseqüências
envolvidas. Em segundo lugar, a redução de riscos, como definida, não rejeita abstinência. De
fato, algumas pessoas defendem a idéia de que a maneira mais eficiente de reduzir os danos é,
em primeiro lugar, não usar drogas.
Sobre os objetivos do programa de redução de danos, em sua maioria minimizam
os efeitos causados pelo uso de drogas injetáveis e desenvolvem ões de caráter preventivo
junto a populações específicas.
Esse tipo de política é algo que deve ser discutido em virtude de sua eficácia, pois
existem estudiosos a defender sua implantação por diversas regiões do Brasil, por se tratar de
um país onde a problemática das drogas é considerada questão de saúde publica, mas para
alguns profissionais de saúde, redução de danos é polemizar o uso das drogas, o que cria um
impasse entre aqueles que acreditam ser uma política de incentivo à saúde e qualidade de vida
(BOLOGNA; SCHLICHTING, 2000).
É estratégia da redução de danos a ampliação do acesso aos serviços de saúde,
especialmente dos usuários que não têm contato com o sistema de saúde, por meio de trabalho
de campo; a distribuição de insumos (seringas, agulhas, cachimbos) para prevenir a infecção
dos vírus HIV e Hepatites B e C entre usuários de drogas; a elaboração e distribuição de
materiais educativos para usuários de álcool e outras drogas, informando sobre suas formas
mais seguras do uso, sobre as conseqüências negativas do uso de substâncias psicoativas e,
por último, os programas de prevenção de acidentes e violência associados ao consumo.
Faz-se necessário assegurar, entretanto, que a estratégia de redução de danos não é
somente a prevenção de doenças, pois esta assume o papel de analisar toda uma discussão
teórica sobre a real necessidade de abstinência pelo usuário. É importante ressaltar que a
ênfase do Ministério da Saúde na atualidade é em torno desta abordagem.
Para Brasil (2004), países em transição, como é o caso do nosso, estando em
desenvolvimento suas políticas públicas de redução de danos, as quais complementam as
políticas tradicionais de álcool e outras drogas em vez de competir com ela, devem levar em
conta as grandes desigualdades sociais e hão de tentar melhorar a cidadania da população.
44
Podemos sugerir que a política de redução de danos não adote a passividade
diante da questão do uso e abuso de álcool e outras drogas, tampouco eleja propostas
repressivas, “antialcoólicas e antidrogas”, pois seria uma utopia.
Quanto à inserção dos profissionais de saúde, observamos em nossa prática o fato
de que poucos deles se dedicam a esta área de atuação e geralmente aqueles envolvidos não
incorporam o conhecimento advindo dessas intervenções, citadas anteriormente, talvez pelo
pequeno acesso às investigações realizadas, o que evidencia ainda haver um distanciamento
entre o mundo da pesquisa e o da prática clínica.
Para Schenker e Minayo (2004), é comprovada a importância da família para a
formação e o desenvolvimento do uso abusivo de drogas, havendo a necessidade de se tratar o
sistema familiar para a transformação da dependência química em produção de saúde.
O dependente químico que busca tratamento é alguém que, pela problemática
vivenciada, se encontra em situação de desconforto físico, emocional e fragilizado,
necessitando de assistência humanizada. Nesse sentido, é interessante buscar métodos de
tratamento, no contexto dos quais tanto ele quanto a sua família sejam assistidos em sua
dimensão física, afetiva, mental, emocional e espiritual.
Saviani (2005) nos remete à idéia de que o dependente químico merece em seu
tratamento a atenção de profissionais que tenham atitude de compreensão desse ser em sua
totalidade, devendo existir um cuidado humanizado. Este deve ser pautado em dimensões
básicas e na competência técnica que se inicia na formação profissional, incluindo a condição
do exercício do cuidado até o espaço físico para o atendimento; também na competente
narrativa que envolve a capacidade de observar e respeitar a subjetividade da pessoa
dependente química e de seu componente familiar, valorizando suas histórias; e, por último, a
competência relacional, que é o estabelecimento do envolvimento ou vínculos cidadãos, em
que o profissional de saúde deve tratar o com cuidado e sensibilidade.
Como, no entanto, podemos humanizar em tempos de extrema tecnologia?
Começaremos respondendo a essa pergunta, assinalando que a tecnologia e suas máquinas são
importantes para a vida humana, pois aceleram a velocidade e reduzem a margem de erro,
mas, de maneira alguma, substituirão o vínculo das expectativas, as esperanças e temores,
contradições e ambigüidades vivenciadas, diariamente, pelo profissional de saúde mental, o
cliente dependente químico e seu membro familiar.
A droga caminha muito próxima do indivíduo com auto-estima baixa, sem
perspectiva e insatisfeito em relação à vida, inclusive com as oportunidades que lhe são
45
oferecidas. Portanto, é preciso tratar com cuidado, carinho e individualidade, de sorte que a
palavra-chave ao cuidar da dependência química é subjetividade, encontrar-se com.
Spricigo e Alencastre (2004, p. 42) referem que:
Cuidar, em enfermagem é, antes de tudo, encontrar-se com. Encontrar-se com uma
pessoa, muitas vezes percebida somente como paciente portador de um determinado
diagnóstico. Nessa forma de perceber, o outro é reduzido a sintomas ou ndromes,
pouco restando da pessoa. Encontrar-se com o outro é encontrar-se com uma
história, com uma trajetória, com sonhos, desejos, crenças e descrenças, valores,
saberes e expectativas. Reconhecer o outro como sujeito é uma imposição àqueles
que desejam exercer sua profissão na assistência ao usuário de drogas.
No que concerne à prática de Enfermagem junto a usuários ou dependentes
químicos, observamos que o planejamento dos cuidados é diversificado, não se prendendo
apenas a um modelo, mas é uma maneira de intervir direcionada às necessidades de respostas
aos problemas de saúde da população afetada, razão porque, prática, nem sempre atende as
especificidades dos usuários de drogas, já que se cuida de problemas tão complexos.
Os modelos são tentativas teóricas para explicar e tratar o uso e abuso das drogas,
motivo pelo qual a Enfermagem deve utilizar mais de um modelo ao planejar a assistência de
seus clientes, porém sem perder de vista a especificidade e a identidade de cada cliente.
Na perspectiva de Spricigo e Alencastre (2004, p.42), “(...) para prestar assistência
a usuários de drogas, não basta o conhecimento das várias teorias e abordagens sobre a
questão. Necessário também se conhecer”.
Pillon e Luis (2004) enfatizam a idéia de que a assistência de Enfermagem a essas
pessoas deve estar focada em uma aliança terapêutica envolvida de um ambiente acolhedor,
de empatia, e conduzindo ao relacionamento interpessoal.
Sobre o significado de acolhimento, Inojosa (2005) refere que acolher é entrelaçar
uma rede de confiança e solidariedade entre os envolvidos na relação, ou seja, a produção de
saúde deve propiciar um encontro entre cidadãos usuários e profissionais de saúde por
intermédio de uma relação de respeito, solidariedade e ajuda mútua, um verdadeiro encontro
de paz.
Ao tratar o dependente químico, faz-se necessário acolhimento, visto ser uma
doença impregnada de muitos preconceitos e estigmas.
Existem vários modelos de abordagem ao dependente químico, no entanto, na
literatura ainda não existe referência a um modelo ideal. Devemos nos basear em aspectos
positivos de cada um deles, em que o usuário do serviço e seus membros familiares se achem
acolhidos, pois o processo de tratamento e recuperação do dependente químico é algo que
merece intensa atenção de todos os implicados com esta problemática.
46
Pillon e Luis (2004, p. 680), ao abordar a prática da Enfermagem junto aos
usuários de álcool e outras drogas, deixam claro que:
(...) os modelos são tentativas teóricas para explicar um fenômeno complexo e
multifacetado que é o uso de álcool e drogas. Por isso, a assistência ao usuário é uma
prática complexa e, freqüentemente, o profissional pode avaliar seu cliente sob o
olhar de mais de um modelo ao mesmo tempo: o moral, quando ele não ouve’ seus
conselhos, o médico, quando executa procedimentos terapêuticos; o social, quando
não identifica a retaguarda necessária para a reintegração social.
Dessa forma visualizamos como positivos aqueles modelos onde a família possa
estar inserida nos procedimentos da terapia.
A Reforma Psiquiátrica, bem como a consolidação do Sistema Único de Saúde
(SUS), somente serão exeqüíveis com a participação ativa de trabalhadores, usuários e
familiares na consolidação dos modos de tratar e nos fóruns de negociação e deliberação do
SUS (conselhos gestores de unidades, conselhos municipais, distritais, estaduais e nacional de
saúde, conferências). A participação dos usuários e de seus familiares, porém, não deve
ocorrer somente nas instâncias previstas pelas estruturas do SUS, mas também no cotidiano
dos serviços da rede de atenção à saúde mental e na militância, nos movimentos sociais, na
luta por uma sociedade sem manicômios e com melhores redes de assistência ao doente
mental, ao dependente químico e os seus componentes familiais esse é o grande desafio da
Reforma Psiquiátrica no País (BRASIL, 2005).
A família é o canal através do qual as influências fundamentais fazem nutrir seus
integrantes, principalmente os adolescentes. Portanto, no caso de qualquer integrante do
núcleo familiar fazer uso abusivo de drogas, recomenda-se que a família busque tratamento
para que possa lidar com o impacto desse comportamento em seu funcionamento, tornando
explícitos os mecanismos inconscientes desse processo auto-destrutivo.
Em trabalhos de revisão de literatura sobre o tratamento para o uso indevido e/ou
abusivo de drogas, desde o engajamento ao período posterior, Schenker e Minayo (2003;
2004) referem que é importante a inserção da família nos diversos estádios, priorizando a
adolescência como momento do ciclo vital mais fértil para o uso indevido de drogas. Nestes
trabalhos, a família aparece como co-autora, tanto do surgimento do abuso de drogas quanto
como instituição protetora para a saúde de seus integrantes.
Entende-se por família uma instituição privada e passível de vários tipos de
arranjo, mas com uma função básica, que é a socialização primária das crianças e dos
adolescentes.
Mesmo em tempos pós-modernos, a família nuclear e extensa ainda é o lugar
privilegiado da socialização primária. No caso do comportamento social para o uso das
47
drogas, são aprendidos predominantemente no contexto das interações como as fontes
primárias de socialização que, na sociedade ocidental, são a falia, a escola e os amigos na
adolescência, ou na fase de adulto jovem.
Uma família é um conjunto de pessoas em interação, e não pode ser percebida
apenas com respaldo nas características individuais ou da personalidade de cada um de seus
membros, mas o que a caracteriza é, sobretudo, a natureza das relações entre seus
componentes, ou seja, a forma como interagem e como estão vinculados nos diferentes papéis
e subsistemas. Por ser um subsistema em constante evolução, a família precisa também
adaptar sua estrutura às mudanças relacionais inerentes ao ciclo de vida e também a outras
mudanças referentes ao contexto social mais amplo ou, ainda, às situações específicas de cada
membro, como, por exemplo, a drogadicção (SEIBEL; TOSCANO JUNIOR, 2001).
Stanton e Shadish (1997) reforçam a idéia de que é preciso atingir as famílias e
trabalhar os vínculos entre seus membros, nos casos dos indivíduos adictos que querem sair
dessa situação. Relataram que de 60% a 80% dos usuários de drogas moravam com os pais ou
falavam diariamente com pelo menos um deles; e de 80 a 95% comunicavam-se com a família
toda semana. Portanto, o tratamento do adicto se beneficiará da inclusão do sistema familiar
no trabalho dos vínculos familiares, uma vez que os resultados das pesquisas revelam a
ligação estreita entre o dependente e seus integrantes.
Diante de todas essas questões abordadas nesse item da revisão de literatura de
nosso estudo, concluímos que tratar o dependente químico implica incluir o sistema familiar
para trabalhar seus vínculos, os quais são permanentes, mas não estáticos.
3.3 Os serviços de assistência ao dependente químico e sua família
A assistência aos dependentes químicos, durante muitos anos, permaneceu sob a
responsabilidade de serviços filantrópicos, organizações não governamentais, entidades
comunitárias e clínicas particulares. Somente nos últimos anos, o poder público passou a
assumir tal responsabilidade, em virtude do aumento abusivo do uso das drogas haver se
tornado um problema para a saúde pública; então começam a surgir as primeiras políticas
públicas sobre drogas.
Historicamente, no Brasil, o tema do uso do álcool e de outras drogas psicoativas
é associado à criminalidade, a práticas anti-sociais e à oferta de tratamentos inspirados em
modelos de exclusão e separação dos usuários do convívio social. As iniciativas
48
governamentais restringiam-se a poucos serviços ambulatoriais ou hospitalares, em geral,
vinculados a programas universitários.
Caso contrário, esses dependentes químicos eram tratados em hospitais
psiquiátricos tradicionais por falta de espaço para eles, e, em sua maioria, mediante uma
abordagem terapêutica inadequada, geralmente centrada apenas no uso de psicofármacos.
Acerca dessa realidade, Brasil (2004) refere que, na população dos hospitais
psiquiátricos brasileiros, quase um quarto dos pacientes foi internado por transtornos ligados a
álcool, e, em torno de 40%, apresentam o consumo prejudicial de álcool como parte do
quadro clínico. Sabemos que a internação nos hospitais psiquiátricos apresenta inúmeras
desvantagens para a recuperação destes pacientes, contribuindo para sua estigmatização e
isolamento social. Os hospitais gerais, contudo, têm absoluta resistência a atender pacientes
com esse tipo de problemas, resultando num impasse assistencial grave, que somente agora
começa a ser energicamente enfrentado pelo SUS.
Somente no ano de 1992, o Ministério da Saúde indicou a criação dos
núcleos/centros de atendimento de atenção psicossocial (NAPS/CAPS) pela Portaria 224,
de 29 de janeiro de 1992 (RIBAS; BORENSTEIN, 1999). Na realidade, apenas no inicio do
século XXI começou de fato a expansão de uma rede de assistência especializada em saúde
mental, com a implantação de alguns desses serviços.
Mesmo os dependentes químicos sendo atendidos em CAPS geral, este era um
local adequado, pois a terapêutica muitas vezes o era dirigida ao usuário de drogas, que
eles dividiam espaço com pessoas com outros tipos de sofrimento mental. Quando muito, os
profissionais do serviço, dependendo da programação, realizavam grupos específicos para
dependentes químicos.
As mudanças nas necessidades de saúde da população e a própria história do uso
de álcool e outras drogas solicita a existência da demanda de novos serviços (PILLON; LUIS,
2004).
Aliado ao surgimento dos CAPS no Brasil, foi criado no Ceará o Programa Saúde
da Família (PSF), um macroprograma que surgiu logo após a criação do Sistema Único de
Saúde (SUS). Trata-se de uma estratégia oferecida como atenção básica, como porta de
entrada ao usuário no serviço de saúde. Este servo tem muitas possibilidades para também
assistir o usuário de droga e sua família em suas práticas humanizadas de assistência.
A estratégia do PSF é a porta de entrada do sistema de saúde no Brasil, pois
trabalha voltada e integrada com a atenção primária à saúde, podendo ser uma das principais
parceiras na integração da saúde mental, a partir da coerência nos discursos da estratégia
49
saúde da família e de saúde mental, uma vez que estas consistem em práticas sociais que têm
perspectiva mais abrangente, integral, do sujeito e do seu processo saúde doença (OLIVEIRA
et al., 2004).
O PSF tem grande dimensão e pode atuar nas mais diversas formas de
abordagens, prevenindo, detectando e encaminhando ou até mesmo tratando e recuperando
usuários e familiares co-dependentes de drogas, tudo isso sendo realizado na própria
comunidade (BRASIL, 2006).
O dependente químico e sua família precisam ser atendidos em suas reais
necessidades, e a equipe de Saúde da Família deve estar organizada e preparada para assistí-
los na sua própria comunidade, respeitando suas culturas e costumes, incentivando-os à
prática do auto-cuidado e sempre trabalhando na perspectiva de possível recaída. Então a
família deve ser sempre incentivada na perspectiva de que ela é uma das principais rede social
de apoio do usuário de droga que busca sua recuperação.
Sabemos, entretanto, que para uma equipe de Saúde da Família assistir os
dependentes químicos e integrantes familiares na comunidade, precisam ser superados alguns
desafios, como: formação e capacitação social de quem presta assistência; oportunidades
sociais concretas de inserção social e econômica do portador de dependência química; e o uso
de tecnologias de cuidado, escuta e acolhimento em saúde.
Assim, a meta dos serviços de assistência à comunidade (PSF), especificamente às
pessoas dependentes químicas, será sempre pautada na tentativa de transformação dos
contextos sociais, diminuição de recaídas e recuperação destes e da própria família onde eles
estão inseridos, resultando num território de trocas afetivas e materiais, de saberes e práticas
mais criativas e flexíveis, sempre valorizando a subjetividade dos sujeitos integrantes, sejam
eles usuários, componentes familiares ou profissionais.
Sabemos, porém, que somente os servos de atendimento do PSF não são
suficientes para a complexidade da assistência que envolve a dependência química nas suas
mais diversas formas. Passaram-se mais de dez anos de sua implantação e o percebemos o
seu envolvimento com o uso demasiado de drogas. Evidenciamos em nosso cotidiano o fato
de que sua filosofia nem sempre se focalizou na promoção da saúde
.
Mesmo com a criação e implantação do Programa Saúde da Família pelo
Ministério da Saúde em meados da década de 1990, este não foi suficiente para abordar a
dependência química, intensificando seu uso com o passar dos anos e, conseqüentemente, os
problemas decorrentes desse aumento. Acreditamos que a falta de uma rede de assistência
especializada tenha contribuído.
50
A saúde pública brasileira não se preocupou devidamente com o grave problema
da prevenção e tratamento de transtornos associados ao consumo de álcool e outras drogas,
produzindo-se historicamente uma importante lacuna na política pública de saúde, deixando-
se a questão das drogas para as instituições da justiça, segurança pública, pedagogia,
benemerência e associações religiosas.
A complexidade do problema contribuiu para a relativa ausência do Estado,
possibilitando a disseminação, por todo o País de opções de atenção de caráter total, fechado,
baseadas em práticas predominantemente psiquiátrica ou médica, ou, ainda, de cunho
religioso, tendo como principal objetivo a ser alcançado a abstinência. Esta rede de
instituições, em sua maioria filantrópica, cumpre papel relevante, e aponta a necessidade de
assunção, pela saúde pública, de uma política mais clara e incisiva para o uso de drogas
(BRASIL, 2005).
Somente em 2002, concordando com as recomendações da III Conferência
Nacional de Saúde Mental, o Ministério da Saúde instituiu um programa especifico para o
atendimento de usuários de drogas psicotrópicas, o Programa Nacional de Atenção
Comunitária Integrada aos Usuários de Álcool e outras Drogas, reconhecendo o problema do
uso prejudicial de substâncias como importante ponto da saúde pública e formulando uma
política pública específica para a atenção às pessoas que fazem uso de álcool ou de outras
drogas. Essa política é situada no campo da saúde mental, cuja estratégia é a ampliação do
acesso ao tratamento, a compreensão integral e dinâmica do problema, a promoção dos
direitos e a abordagem de redução de danos (BRASIL, 2005).
Como parte das ões desse Programa, principalmente ante à necessidade de
políticas publica de saúde mais claras e incisivas, o Ministério da Saúde baixou a Portaria
816/GM, de 30 de abril de 2002, regulando o atendimento do dependente de drogas e álcool
em centros de atenção psicossocial especializados - CAPS-ad - (PORTARIA 816/GM).
Criaram-se oficialmente os centros de atenção psicossocial para assistência exclusiva aos
usuários de álcool e drogas e sua família.
A implantação desses CAPS para usuários de álcool e outras drogas é um
exemplo entre as várias propostas da reforma psiquiátrica brasileira.
Segundo Silveira (2004), infelizmente, na prática, observa-se a dificuldade de
implantação das propostas da reforma psiquiátrica, estando associada, entre outras coisas,
principalmente à falta de decisão política de alguns gestores públicos; à resistência por parte
dos donos de hospitais, que não querem perder um negócio lucrativo com a internação de
51
dependentes, principalmente de álcool; da família e até da comunidade que, muitas vezes,
chegam a temer a dependência química, negando-a.
Atualmente existem instituições que fazem atendimento em saúde mental, em
específico, ao dependente químico, desde aqueles que assistem crianças e adolescentes de rua,
incluindo os de prevenção de recaídas e projetos de redução de danos, para a acolhida e
tratamento dos dependentes químicos, sendo ainda em número reduzido e a assistência
incipiente.
Essa rede de atenção à saúde mental é constituída, principalmente, pelos centros
de atenção psicossocial (CAPS), serviços residenciais terapêuticos (SRT), centros de
convivência, ambulatórios de saúde mental e hospitais gerais, estes se caracterizam por serem
essencialmente públicos, de base municipal e com um controle social fiscalizador e gestor no
processo de consolidação da reforma psiquiátrica.
Verificamos amiúde que a rede de atenção à saúde mental do SUS se define como
de base comunitária, sendo, portanto, necessária a participação de integrantes da comunidade,
trabalhadores, usuários de saúde mental e seus integrantes familiares no processo da gestão do
SUS, direcionado à criação de formas e de outros espaços para assistir. Essa participação deve
ser garantida pelos conselhos municipais, distritais, estaduais e nacionais de saúde.
Com relação às instituições que assistem crianças e adolescentes em situação de
rua, no último levantamento do Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas
CEBRID, foram mapeadas ao todo 94 instituições nas 27 capitais brasileiras, e, em
Fortaleza-Ceará, foram mapeadas seis instituições, sendo elas: Pólo Central de Atendimento,
Casa de Meu Pai, Associação Beneficente Pastoral Menor “Talita Kuna”, Casa da Juventude,
Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua - MNMMR e Associação Corumins
(NOTO et al., 2004).
Quanto aos CAPS, o seu valor estratégico para a reforma psiquiátrica brasileira é
demonstrar a possibilidade de organização de uma rede substitutiva ao hospital psiquiátrico
no País. Sua função é prestar atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando as
internações em hospitais psiquiátricos, promover a inserção social das pessoas com
transtornos mentais e usuários de álcool e outras drogas, por meio de ações intersetoriais,
regular o fluxo de entrada da rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação e dar
suporte à atenção à saúde mental na rede básica.
Em documento do Ministério da Saúde sobre reforma psiquiátrica e política de
saúde mental no Brasil, a função de excelência do CAPS é organizar a rede de atenção às
pessoas com transtornos mentais nos municípios, sendo os principais articuladores
52
estratégicos desta rede e da política de saúde mental num determinado território. Eles devem
ser de natureza substitutiva e não complementares ao hospital psiquiátrico (BRASIL, 2005).
Quando pensamos nos CAPS, como sendo uma das principais instituições de
atendimento também ao usuário de álcool e outras drogas, reporta-se a nossa mente à idéia de
que os CAPS têm papel importante para o fortalecimento dos laços familiares e comunitários
do usuário dependente.
De acordo com os dados do Ministério da Saúde, em outubro de 2005, o Brasil
dispunha de um total de 689 CAPS em funcionamento, distribuídos em quase todos os
Estados brasileiros, e o Ceará tinha 34 CAPS, destribuídos em CAPS I, CAPS II, CAPS i
(infantil) e CAPS-ad (álcool e drogas). Embora saibamos que essa cobertura assistencial vem
melhorando progressivamente com base nos parâmetros de cobertura estabelecidos pelo
próprio Ministério da Saúde, sua distribuição espacial ainda reflete as desigualdades
estruturais entre as regiões brasileiras, que o indicador de referencia é de um CAPS para
cada 100.000 habitantes (BRASIL, 2005).
O Município de Fortaleza conta hoje com um número de 14 CAPS, sendo que seis
desses serviços fazem parte da modalidade álcool e droga (AD), ou seja, são especializados
em assistir os casos de álcool e outras drogas. Todas as sedes estão localizadas em umas das
seis secretarias executivas regionais da Capital (SMS-Fortaleza, 2008).
Os CAPS se diferenciam pela capacidade de atendimento, clientela atendida e
organizam-se no País de acordo com o perfil populacional dos municípios brasileiros,
podendo ser CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPS i (infantil) e CAPS-ad (álcool e drogas)
(BRASIL, 2005).
Com relação aos CAPS-ad, especializados no atendimento a dependência e/ou uso
prejudicial de álcool e outras drogas, existem 91 deles implantados pelo País. Esses são
serviços previstos para cidades de mais de 200.000 habitantes, ou ainda cidades que, por sua
localização geográfica (municípios de fronteira, ou parte de rota de tráfico de drogas) ou
cenários epidemiológicos importantes, necessitem deste tipo de serviço para dar resposta
efetiva às demandas de saúde mental. Funcionam durante os cinco dias úteis da semana tendo
capacidade para realizar um acompanhamento em média de 240 pessoas por s. A equipe
mínima prevista para esses serviços deve ser composta por 13 profissionais de nível dio e
superior, dentre eles médico psiquiatra, enfermeiro, psicólogo, assistente social, terapeuta
ocupacional, auxiliar de enfermagem e outros (BRASIL, 2005).
Embora os CAPS-ad sejam os dispositivos estratégicos da rede de atendimento a
pacientes com dependência e/ou uso prejudicial de álcool e outras drogas, devem existir
53
outros componentes importantes de assistência, e sua implementação de ser incentivada
nos estados e municípios.
No âmbito da atenção primária, deve haver articulação com serviços de suporte
social tais como: grupos de auto-ajuda, ajuda mútua e entidades filantrópicas; implantação de
leitos e serviços especializados nos hospitais gerais, para casos de atendimento de urgência e
emergência; hospitais funcionando com papel de retaguarda; e centros de reabilitação
psicossocial (BRASIL, 2005).
Essa rede de atenção ao dependente químico deve ser diversificada, complexa,
com abordagem diversa e tendo sempre a preocupação de realizar integração social do
usuário. Observamos, porém, que essa rede de serviços ainda está se adequando à demanda da
população brasileira, principalmente no que se refere à quantidade dos serviços oferecidos e
na abordagem proporcionada ao usuário dependente e seus componentes familiares.
3.4 Abordagem em saúde mental por meio de recursos artísticos
Quando paramos para pensar no cuidado em saúde mental no contexto da reforma
psiquiátrica, pensamos também nas transformações pelas quais o cuidado em saúde mental
passou nas últimas décadas no Brasil, haja vista as transformações mais gerais do contexto de
saúde brasileira e a progressiva incorporação da reforma psiquiátrica, porém ainda muito o
que se fazer.
Fraga, Souza e Braga (2006, p.211) concordam com esse pensamento quando
acentuam que:
(...) a despeito de inúmeras dificuldades, ao longo desses anos, a reforma foi
abraçada por diversos segmentos sociais, o que fez com que ocorressem avanços
consideráveis (...) Somos do parecer que não podemos nos contentar com os avanços
alcançados no âmbito da reforma psiquiátrica. É fundamental que todo cidadão
esteja atento e vigilante, para impedir retrocessos e para cobrar o que ainda não lhe
satisfaz (...) No campo da saúde mental essa vigilância se faz particularmente
necessária no presente momento, pois muito ainda para construir.
Essa vigilância necessária pode ser traduzida em vários aspectos, entre os quais,
na forma como o cuidado em saúde mental é dispensado e nos recursos e técnicas utilizados
para a execução desse cuidado.
Sobre a construção e o redimensionamento de tecnologia de cuidado em saúde
mental, destacamos a reabilitação psicossocial como um saber-fazer criativo constituído no
cotidiano dos serviços de saúde mental. Esse saber-fazer criativo, de acordo com Ferreti
54
(2005, p.134), utiliza-se de um “caminho que nos ajuda a transmutar as sensações e os
sentimentos, que trazem consigo o prazer de se desafiar na conquista do novo”.
É necessário, no entanto, deixarmos claro que na assistência em saúde mental não
basta apenas destruir os manicômios, acolher as pessoas em sofrimento mental e dependentes
químicos, ou até relativizar a noção de loucura, compreendendo seus determinantes
psicossociais, mas é necessário recusar esse império da razão, ou seja, criar no exercício do
pensar e das práticas sociais novas formas de se relacionar com o acaso, com o desconhecido.
E nessas novas formas de se relacionar com o acaso, com o desconhecido foi que
Farias e Furegato (2005) revelaram serem poucos os profissionais dedicados a ouvir e a
desenvolver atividades artísticas e que enfocam o dito pelos usuários. necessidade de
serem explorados as vivências, as emoções e os sentimentos daquele que recebe o cuidado ou
que se quer conhecer por meio de metodologias e/ou técnicas que privilegiem a expressão da
subjetividade, ativando a imaginação e criatividade.
Para Kantorski (2004), as opções teórico-metodológicas e ideológicas dos cursos
de formação dos profissionais que assistem em saúde mental podem favorecer a conformação
de saberes e práticas manicomiais e/ou de transformação destes. Devemos optar pelos
referencias teóricos e campos de prática do ensino que possibilitem a reflexão ctica acerca
da definição do objeto de trabalho o indivíduo portador de sofrimento psíquico, seja ele
doente mental ou dependente químico, sua família, os grupos, além das tecnologias adotadas
com vistas a redimensionar o cuidado em saúde mental.
Então visualizamos a expressão do ser por meio de recursos artísticos como
possibilidade para um saber-fazer dotado de autonomia e criatividade, pois, quanto mais
deixamos o poder criativo fazer seu papel, mais nos aprofundamos no conhecimento do nosso
ser, dando espaço para o imaginário.
Sobre imaginação, Cemin (2001) expressa a idéia de que o mundo do homem não
é de fatos, é imaginário: a razão, a linguagem lógica e conceitual, a ciência, a arte, a religião e
os sentimentos são dimensões imaginárias. Não contraposição entre o real e o imaginário,
porque o real é constituído socialmente. O real, portanto, é a interpretação que os homens
atribuem à realidade, por meio das incessantes trocas entre as objetivações e as subjetivações
que se fazem constantemente.
Ao expressar seu pensamento sobre arte e imaginação, Adams e Mylander (2002,
p. 137) revelam sua importância fundamental para o cuidado com a saúde, referindo que
“Nenhum universo é mais vasto que a imaginação. Tudo passa primeiro por ela: todas as
55
artes, filosofias, invenções, assim como toda mudança e desvio do dia a dia. A imaginação é o
melhor amigo da mente, o burilador de sonhos e a companhia feliz da vida”.
A arte é uma aliada essencial dos profissionais de saúde mental como instrumento
do cuidado humano, por viabilizar um contato sincero e profundo do indivíduo com seu
mundo, realizando inclusive conexões com o universo de fora. Nesse contato, o indivíduo é
capaz de redescobrir o prazer de viver e produzir, de se comunicar e se sentir vivo, porém é
preciso cuidar para não utilizar a arte como meio de repetição de tarefas sem sentido ou ações
desprovidas do desejo genuíno de entrar em contato com o sentimento íntimo, necessário à
produção artística (MUNARI, 2004).
Adams e Mylander (2002, p. 132) também fazem menção à arte como aliada
essencial dos profissionais de saúde como instrumento do cuidado humano, referindo que a
arte é o estilo em que a ciência é empregada, um modo coadjuvante, o modo como se exprime
a compaixão, se promove a harmonia da equipe ou apenas se comunica. O verbo de ação da
arte, criar, inclui o modo de buscar soluções, fazer pesquisas e equilibrar complexidades.
Temos observado que a apropriação da arte como estratégia de acesso ao mundo
subjetivo da loucura e da mente de um indivíduo em tratamento de dependência química, nem
sempre, é utilizada com objetivo de possibilitar a conecção da pessoa com sofrimento mental
com a realidade e o mundo externo. Muitas vezes ela é empregada como recurso de simples
ocupação do paciente no serviço ou ainda para a confecção de produtos rentáveis.
Para Munari (2004), não basta apenas a utilização da arte, por exemplo, como
recurso terapêutico, se a prática profissional é baseada no paradigma tradicional de assistência
psiquiátrica; é necessária uma mudança paradigmática, que por sua vez é, e continua sendo o
maior desafio dos profissionais da área. Essa nova perspectiva deve ser constituída pelos
profissionais, exigindo deles uma atitude alerta de reconstrução diária do modo de ver, sentir,
encarar e tratar o sofrimento mental.
A arte utilizada por pessoas em sofrimento mental na área da saúde mental
assume funções terapêuticas, porque, ao se expressar artisticamente, o indivíduo ativa seu
inconsciente, acessando conteúdos profundos que se apresentam em forma de imagens
(SOUZA, 2004).
Essas imagens podem ser traduzidas em forma de desenhos e pinturas, uma vez
que esse tipo de técnica facilita a formação do vínculo de confiança essencial ao
relacionamento interpessoal. Farias e Furegato (2005, p.702) utilizaram a técnica projetiva por
meio de desenhos em pesquisa, que objetivou identificar o significado das vivências, emoções
e sentimentos dos usuários de drogas. Concluíram que “O desenho foi a estratégia que
56
propiciou descontração e criou um ambiente favorável para isso, (...) Sendo um processo
inconsciente, o desenho retrata, em linguagem gráfica, o sentimento de quem desenhou”.
Quando desenvolvemos atividades com recursos artísticos, passamos a utilizar
também nosso hemisfério cerebral direito, responsável pela dimensão da linguagem e emoção,
sensibilidade e intuição, esquecida muitas vezes pela supervalorização do hemisfério cerebral
esquerdo, onde existem comandos responsáveis pela linguagem racional verbal e inteligência.
Na prática, buscamos o equilíbrio entre estas partes. A implantação de recursos artísticos em
nossas práticas facilita esse processo, ou seja, um diálogo, de convivência, interação e trocas
no trato de profissionais e população, por meio do nosso corpo, falas, culturas, matrizes
fundamentais de nossa identidade.
Nesse contexto, os recursos artísticos no cotidiano das práticas de assistência à
saúde mental apresentam-se como possibilidade diferenciada no estabelecimento e
aprofundamento do vínculo terapêutico, diferenciando-se de outras práticas terapêuticas,
porque a própria linguagem criativa, os materiais utilizados (cores, texturas, possibilidades de
expressão com cada material), tornaram-se incentivadores das experimentações de expansão
ou continência necessárias em cada momento do processo. Utilizando esses elementos de tal
forma, que eles são, em grande parte dos casos, um instrumental de melhor adesão terapêutica
e que têm menos possibilidade de suscitar resistências que ocorreriam por meio das
expressões verbais, já que nelas os pacientes têm amplo domínio da linguagem racional verbal
e maior capacidade de manipulação, dissimulação e controle (MULLER, 2005).
Nesta perspectiva, visualizamos o uso dos recursos artísticos como forma de
adentrar o mundo interior do familiar do dependente químico e de seus componentes
familiares, já que os problemas advindos do uso da droga se manifestam das mais diversas
formas.
A utilização de oficinas ou vivências com o uso de recursos artísticos parte de um
“princípio de prazer”, de exercícios criativos, de grandes possibilidades de envolvimento mais
imediato, de permanente experimentação de campos intensivos, de irrupção de devires
desconectadores das linhas duras racionalísticas que nos atravessam e nos impedem de
vivenciar a riqueza de nossos processos de subjetivação (MULLER, 2005).
As oficinas vivenciais dá condições para que a pessoa que sofre dessa condição de
ser familiar de um dependente químico possa refletir sobre si própria, analisando seu grau de
envolvimento, seus comportamentos disfuncionais diante da co-dependência, conquistas,
crescimento e perdas; no caso específico do usuário, dando-lhe também, condições para sua
57
livre escolha, algo que é de grande valor na recuperação do dependente químico e na
retomada dos vínculos familiares.
A abordagem em saúde mental por intermédio de recursos artísticos tem condição
de atuar como nutriente para esse mundo invisível da imaginação, sentimentos, idéias,
fantasias e desejos do dependente químico e de seus familiares co-dependentes, facilitando
sua expressão de forma clara e criativa por meio da arte, tornando-o consciente de seu mundo
interior. Essa conscientização possibilitará a transformação no mundo físico e visível
(SAVIANI, 2005).
Dessa forma, os participantes de oficinas vivenciais exploram diferentes técnicas e
materiais, os quais possibilitam a entrar em si mesmos, suas polaridades, trabalhando a
conscientização, o crescimento psicoemocional e a transformação, facilitando o caminhar no
percurso de busca da recuperação dos transtornos advindos com a entrada das drogas
psicoativas no ambiente familiar e social de seus envolvidos.
3.5 O grupo como espaço de convivência e estratégia de intervenção
O homem passa a maior parte de seu tempo em grupo, e essa associação é
importante na vida de qualquer pessoa, pois os seres humanos são entes sociáveis, ou seja, a
humanidade e a própria sociedade ditam a necessidade de uma estrutura social organizada em
grupos, que durante toda nossa vida vivenciamos várias experiências em grupo. Portanto,
percebemos o quanto é antiga essa característica do ser humano, mais antiga do que mesmo
sua consciência da necessidade de viver em grupo (MUNARI, 1995; ZIMERMAN; OSÓRIO,
1997).
O ser humano pertence necessariamente ao mesmo tempo a diversos grupos, e em
determinado grupo, seu comportamento não será resultado de sua relação intragrupal, mas
sim intergrupal, ou seja, ele é o produto da dinâmica dos vários grupos a que ele pertence.
Para Souza (2004), estar em grupo nos concede a possibilidade da percepção de
limites, as sensações da diferença e de contato entre seus membros. O grupo é um fenômeno
cuja essência reside no seu poder de transformação, de escutar, de sentir, de se posicionar, de
se arriscar a compreender a significação dos atos de viver e responsabilizar-se.
Os grupos funcionam como mediadores da relação entre o todo social e a
particularidade do individuo, sendo assim, não podemos analisá-lo como algo isolado,
principalmente porque podemos utilizá-lo como instância de ajuda entre as pessoas. Não deve
58
ser visto como algo individual e isolado do seu meio especifico pois, é um local de produção
do contexto social e histórico.
Entendemos que um grupo pode ser percebido como um emaranhado de linhas
subjetivas em que cada sujeito define seu espaço e, ao mesmo tempo, entra em contato com o
espaço do outro, elaborando, assim, novas configurações. Estas configurações, porém, não são
estáticas, mas dinâmicas. No grupo, as relações devem ser horizontalizadas, proporcionando
essa condição mais dinâmica.
A literatura sobre grupos nos aponta a importância do papel social que esses
desempenham na sociedade e do caráter decisivo dos movimentos por eles desencadeados no
contexto social. Mundialmente, busca-se o trabalho cooperativo e em grupo, a fim de atingir o
aperfeiçoamento de instituições sociais que, por sua vez, devem buscar a melhoria das
condições das populações humanas.
Historicamente, os grupos surgiram muitos anos. indícios de que surgiram
na Grécia Antiga (MUNARI; RODRIGUES, 1997). De acordo com Taylor (1992) e
Zimermam (2000), os grupos com objetivos terapêuticos começaram a surgir no início do
século passado, por volta de 1905, desenvolvidos por Pratt, no Hospital Geral de
Massachussets, nos EUA, tendo se intensificado após a Segunda Guerra Mundial, e,
atualmente, tornando-se uma intervenção padronizada para o tratamento de pessoas
diagnosticadas como mentalmente enfermos.
O primeiro registro na literatura foi do médico J. Pratt que desenvolveu,
inicialmente, com pacientes tuberculosos reuniões em grupos para informá-los sobre sua
doença e as medidas higiênicas necessárias para sua recuperação. Posteriormente, esse médico
utilizou o mesmo método para pacientes diabéticos e cardíacos. O fundamento desse método
pressupunha que os resultados do tratamento dependiam da influência benéfica de uma pessoa
sobre a outra (TAYLOR, 1992; MUNARI, 1995; ZIMERMAM, 2000).
A história mostra que esse espaço grupal começa também a ser visto como
oportunidade para trabalhar a solidão, o pessimismo, a depressão e outros efeitos psicológicos
advindos da doença, desconforto que passa a ser aliviado pelo suporte emocional existente em
um grupo estável de pessoas com preocupações e experiências semelhantes.
Acreditamos que o efeito positivo de abordagens grupais terapêuticas deve-se ao
fato de os grupos tenderem a simular situações que para os participantes são familiares. Os
membros do grupo encontram suporte na percepção de que outros têm problemas semelhantes
aos seus, portanto, é um local de apoio e reasseguramento.
59
Ainda no inicio do século, Sigmund Freud reunia-se com o seu grupo de estudos,
a Sociedade Psicológica das Quartas-feiras, tendo inicialmente como tarefa a discussão de
casos de pacientes. Com o tempo, desviou-se da sua costumeira atividade, passando a analisar
os integrantes do grupo, ou seja, os próprios membros. Freud não organizava o grupo com o
objetivo terapêutico, porém, o havia diferença de uma terapia em muitos de seus aspectos
(ZIMERMAM, 2000).
Entre outras experiências, posteriormente, surgem trabalhos como o de Jacob
Lewin Moreno, criador do psicodrama, abordagem baseada nas técnicas teatrais como
fundamento da condução da psicoterapia grupal e introdutora das expressões como, "terapia
de grupo" e "psicoterapia de grupo". Suas técnicas grupais do psicodrama e o sociodrama
foram difundidas e hoje são praticadas no mundo inteiro (MORENO, 1994). Posteriormente,
tivemos no ano de 1930 contribuições de Kurt Lewin, psicólogo da corrente gestáltica, que
criou a expressão "dinâmica de grupo” e popularizou-se desde a Segunda Guerra Mundial.
A abordagem de Lewin sobre o grupo é diferenciada daquelas apresentadas até
então, pois, na perspectiva desse autor, o grupo não é meramente uma coleção de indivíduos,
mas uma entidade em si mesma, com qualidades que podem diferir daquelas de cada membro
em particular. Kurt Lewin diferenciava-se do que era comum na época, pois, até então, os
grupos eram utilizados com finalidades estritamente terapêuticas. Ele e seus seguidores
desviaram-se do modelo médico, pois sua ênfase no trabalho com pequenos grupos era
voltada para o contexto educacional (MUNARI, 1995; ZIMERMAN; OSÓRIO, 1997).
Em seguida, afloraram outros movimentos, como o da terapia centrada no cliente
e transposta para o contexto grupal de Carl Rogers (ROGERS, 1979), bem como a
gestaltterapia, criada por Frederick Perls. Enrique Pichon-Riviere, psicanalista argentino,
intituiu o grupo operativo, não com finalidade de terapia, mas para desenvolver determinada
tarefa. Na década de 1970, Irving Yalom, psiquiatra e com a colaboração da enfermeira norte-
americana Maxine Loomis, juntos, publicam a obra Teoria e prática da psicoterapia de
grupo. Maxine Loomis, posteriormente, deu significativa contribuição aos trabalhos grupais
coordenados por enfermeiros, com a publicação de sua obra Processo grupal para
enfermeiros (MUNARI; RODRIGUES, 1997; ZIMERMAN; OSÓRIO, 1997; SOUZA,
2004).
Nesta tese, a obra de Maxine Loomis nos serviu de guia para a compreensão do
trabalho grupal desenvolvido. Esta abordagem foi o nosso referencial teórico, cujo conteúdo
apresentaremos no capítulo a seguir.
60
Com arrimo em estudos pioneiros como os que citamos até agora, o que temos na
atualidade é o desenvolvimento de trabalhos com grupos dentro das diversas vertentes, como,
por exemplo, a psicodramática, a sociológica, a dos grupos operativos, a institucional, a dos
grupos comunitários, a gestáltica, a psicanalítica entre outras. Oriundos dessas vertentes na
atualidade, o trabalho de Pichon-Riviére, na Argentina, e de seus seguidores Bleger, Bauleo,
Baremblitt e outros, na compreensão dos fenômenos grupais, não do ponto de vista
psicoterápico, mas para a operação de tarefas objetivas no âmbito institucional, médico,
pedagógico e empresarial, têm influenciado e difundido suas idéias no Brasil
(BAREMBLITT, 1986; ZIMERMAN, 2000).
No Brasil, tanto a modalidade de grupos operativos, como a de grupos
terapêuticos com a psicoterapia de grupo em diferentes abordagens, o praticadas por grande
número de profissionais de áreas diversas. A condução de grupos constitui um dos principais
recursos terapêuticos nos mais diferentes contextos de assistência à saúde mental e isso
decorre das condições criadas pela reforma psiquiátrica, priorizando a ressocialização do
indivíduo em sofrimento psíquico.
No âmbito da reforma psiquiátrica, estão sendo criados serviços de saúde mental e
neles são desenvolvidos grupos coordenados por profissionais da equipe interdisciplinar. O
enfermeiro, por sua vez, implementa ões a cada ano com atuação crescente em publicação
nessa prática. Portanto, o grupo se torna espaço terapêutico para as pessoas e de afirmação da
nova atuação dos profissionais de saúde mental (SOUZA, 2004). É necessário, entretanto, que
os coordenadores analisem suas práticas e atitudes ao conduzir os diversos tipos de grupos,
nas suas mais variadas abordagens.
É grande o universo de possibilidades de referencias teóricos que dão suporte à
compreensão dos fenômenos grupais e suas necessidades, além de oferecer aos facilitadores
de grupos caminhos diferentes em busca de sua identidade. Acreditamos que todas têm sua
relevância ao trabalho grupal; basta que saibamos aplicar.
É importante a compreensão de cada vertente, não as adotando como miscelânea
de conceitos e idéias, mas utilizando-as como uma forma racional do uso de recursos
diferentes úteis para o trabalho grupal, pois é difícil dizer o que é e o que não é psicoterapia
de grupo, já que os grupos não terapêuticos podem atingir muitos resultados específicos de
grupos terapêuticos (MUNARI, 1995).
Quanto às características dos grupos, Taylor (1992) e Zimerman (2000) referem
algumas condições básicas para caracterizarmos um grupo, seja ele de natureza operativa ou
terapêutica. Para esses autores, o grupo não é um mero somatório de indivíduos; pelo
61
contrário, constitui-se como nova entidade, com leis e mecanismos próprios e específicos.
Todos os seus integrantes estão reunidos em torno de uma tarefa e objetivos comuns. O seu
tamanho não pode exceder o limite que ponha em risco a indispensável preservação da
comunicação, seja ela visual ou auditiva.
Sobre a natureza operativa dos grupos, esta se alicerça na proposta de aprender a
pensar em grupo na vida cotidiana, sendo a aprendizagem compreendida como um processo
de apropriação instrumental da realidade. Em pesquisa realizada com grupo operativo de
tabagistas, essa modalidade terapêutica subsidia a intervenção de Enfermagem em Saúde
Mental a dependentes químicos, como sendo uma forma apropriada e viável de assistir o
dependente, como espaço terapêutico e na assistência em grupo, oferecendo suporte entre os
usuários, permitindo a liberação de emoções, sentimentos e vivências relacionada à droga-
dependência (CAVALCANTE; HUIMEREZ, 2000).
Taylor (1992) afirma que para o enfermeiro trabalhar com abordagens grupais,
seja na assistência ou pesquisa é importante e necessário que ele desenvolva um entendimento
sobre estas características.
Zimerman (2000) cita ainda alguns outros requisitos que caracterizam um grupo,
como: deve haver a instituição de um setting e o cumprimento das combinações nele feitas,
tendo os objetivos claramente definidos; o grupo deve levar em conta uma estabilidade de
espaço (local das reuniões), de tempo (horário, férias etc.) e algumas regras e outras variáveis
equivalentes que delimitam e normatizam a atividade grupal proposta. Por último, que no
grupo ocorra a existência entre seus membros de uma interação afetiva, a qual costuma ser
múltipla e variada.
Quanto aos objetivos do trabalho grupal, estes variam de acordo com cada
corrente e algumas delas trabalham na perspectiva de promover a adaptação do indivíduo à
realidade. Acreditamos, porém, que o objetivo do trabalho grupal, seja ele qual for, não deve
adaptar e/ou acomodar o participante, mas possibilitar aos sujeitos condições de transformar a
realidade, superando seus limites e desencadeando um crescimento pessoal.
62
Referencial Teórico
Referencial TeóricoReferencial Teórico
Referencial Teórico-
--
-Metodológico: o
Metodológico: o Metodológico: o
Metodológico: o
processo grupal para enfermeiros
processo grupal para enfermeiros processo grupal para enfermeiros
processo grupal para enfermeiros
4
44
4
Referencial
Referencial Referencial
Referencial Teórico
TeóricoTeórico
Teórico-
--
-Metodológico
MetodológicoMetodológico
Metodológico: o proce
: o proce: o proce
: o processo grupal para
sso grupal para sso grupal para
sso grupal para
enfermeiros
enfermeiros enfermeiros
enfermeiros
63
O estudo foi desenvolvido junto a integrantes familiares de dependentes químicos
em tratamento, utilizando-se o grupo como dispositivo para a expressão de sentimentos e
subjetividades quanto à vivência deles com a dependência química de parentes.
O trabalho grupal teve como orientação teórica os preceitos utilizados pela
enfermeira norte-americana Maxine Loomis, apresentado na obra Group Process for Nurse
(Processo Grupal para Enfermeiros). A autora propõe que o trabalho grupal para enfermeiros
seja executado por meio de um jogo de variáveis que podem acontecer no ambiente do grupo
e que estão dispostas em quatro descritores interdependentes: objetivos, estrutura, processo e
resultados do grupo (LOOMIS, 1979).
Para melhor entendimento e execução do processo grupal, distribuímos em nosso
estudo as varveis propostas por Loomis (1979) em três fases: planejamento (objetivos),
intervenção (estrutura e processo) e avaliação (resultados).
Segundo Loomis (1979), os tipos de grupos disponíveis podem ser caracterizados
também de acordo com as mesmas variáveis. Identificar as necessidades dos clientes
relacionadas ao comportamento da saúde biopsicossocial, assim como suas expectativas, é
fator fundamental para a elaboração dos objetivos e metas do grupo, correspondendo a uma
pré-avaliação necessária na fase de planejamento. Dessa forma, o grupo pode ser categorizado
de acordo com seu objetivo principal e esse mesmo grupo pode assumir um dos seis objetivos
citados a seguir.
Objetivos do grupo apoio/suporte, realização de tarefas, socialização,
aprendizagem e mudanças de comportamento, treinamento de relações humanas, psicoterapia
– introspecção e mudança de comportamento.
Com o estudo que ora apresentamos na fase de planejamento, foi identificada pelo
grupo a necessidade de ser criado um grupo com o objetivo de apoio/suporte. Para Loomis
(1979), os grupos com objetivos de apoio podem ajudar indivíduos durante períodos de
ajustamento às mudanças, no tratamento de crises ou ainda na manutenção ou adaptação às
novas situações. Esse potencial preventivo emerge da possibilidade de pessoas com situações
semelhantes poderem compartilhar experiências comuns e o apoio do grupo faz com que o
participante aprenda a lidar com seus sentimentos, adaptando-se a novos planos de vida.
Munari e Zago (1997) corroboram a idéia anterior, quando expressam que os
grupos de apoio têm como finalidade fornecer aos indivíduos convivendo com situações
semelhantes, dando oportunidade de expressar suas preocupações e considerar modos
64
alternativos para modificar seu estilo de vida, consistindo em sistema de apoio social extra-
familiar.
Para Loomis (1979), a própria estrutura do grupo pode ser usada para definir o
tipo de grupo que pretendemos trabalhar, ou seja, seu objetivo. A seguir apresentaremos os
parâmetros que descrevem a estrutura do grupo:
Estrutura do grupo
Tipos de clientes é uma das considerações estruturais mais importantes. A
definição dos indivíduos que farão parte do grupo é fundamental para a sua efetividade,
estando diretamente ligado à capacidade dos participantes em contribuir com os objetivos
grupais. Desta forma, podemos ter grupos homogêneos ou heterogêneos quanto a idade, sexo,
grau de necessidade, tipo de problema que apresentam, entre outras coisas.
Nível de prevenção refere-se ao tipo de cliente considerado membro do grupo,
pois, com base nele, serão traçadas as metas do que se pretende atingir. Torna-se necessário
fazer uma correlação entre as necessidades do grupo, seus objetivos e o nível de prevenção
compatível com cada trabalho.
Grau de estrutura depende do tipo de funcionamento e organização interna do
grupo. A organização em regime fechado ou aberto leva à classificação de muito ou pouco
estruturado. Vale ressaltar a importância de o enfermeiro discutir esses parâmetros estruturais
antes de o cliente entrar no grupo.
Orientação teórica – a orientação teórica do grupo e do coordenador ou terapeuta
grupal pode ser usada para explicar o que acontecerá no grupo. Este pode assumir uma forma
de acordo com a orientação que o coordenador utiliza para a sua condução. Esse parâmetro
também afeta diretamente seu grau de estrutura, pois podemos encontrar grupos que dão
enfoque principal ao aprendizado, autoconhecimento, conclusão de tarefas etc.
Grau de orientação de insight ou orientação de introspecção esse tipo de
grupo é voltado para ativar as habilidades de seus integrantes em refletir sobre os próprios
comportamentos, sentimentos, motivações, entendimento das suas possibilidades e descoberta
de seus potenciais.
Variáveis físicas esse é o parâmetro final de estrutura do grupo. Para que este
aconteça, são fundamentais as adequações físicas do ambiente onde ele acontecerá. É
importante oferecer condições de trabalho. Recursos como local amplo, ventilado, com
privacidade necessária para a realização do trabalho e acomodações para todos os
participantes, preferencialmente que possibilitem formar um círculo, são imprescindíveis para
65
o sucesso da intervenção grupal. Todos esses parâmetros estruturais podem ser usados para
descrever as diferenças entre os grupos.
O gráfico a seguir mostra todos os passos descritos por Loomis (1979), resumindo
sistematicamente o que realizamos no grupo de membros familiares dos dependentes
químicos em tratamento no CAPS.
Gráfico 1 Modelo de variáveis de grupos pequenos objetivos, estrutura, processo e
resultados.
Fonte: Adaptado do modelo de Loomis (1979).
O processo grupal
Manutenção
Emocional
Comportamental
PESQUISA CLINICA
Efetividade do
Grupo
Aprendizagem
Insight, Processo
Interpessoal
COESÃO GRUPAL
Metas do grupo Normas do grupo
Resultados
Esclarecimento
das normas
apresentadas
Acordo qto
aos meios
p\ alcançar
as metas
Esclarecimento
das metas
apresentadas
Compatibilidade
às normas do
grupo
Papel do coordenador INTERAÇÃO DOS MEMBROS
Estimulação emocional Papéis
Cuidado Poder e Influência
Atribuição de significado Comunicação
Função executiva
FATORES
CURATIVOS
Contrato de
cuidado Saúde
OBJETIVOS E
METAS
Adequações
Físicas
Seleção de
Clientes
Necessidades
dos Clientes
Objetivos do
coordenador
Expectativa do
Sistema
Preparação de Clientes
Objetivos
Estrutura
Processo
Resultados
Reembolso
Processo
Estrutura
Objetivos
Mudança de
comportamento:
Intrapessoal, Interpessoal,
Pessoal, Ambiental
66
No referencial teórico escolhido, o foco está centrado em grupos de cuidados de
saúde e é assumida a noção de que, se qualquer grupo apresentar apoio, tarefa ou psicoterapia,
terá um objetivo terapêutico global. Para a autora, os grupos também podem ser descritos e
definidos de acordo com seu processo interno. É válido ressaltar que, embora os objetivos e a
estrutura do grupo possam ser definidos pelo coordenador, o processo em si, para ser
compreendido, necessita de algumas reflexões que fazem parte do próprio movimento grupal.
Loomis (1979) utiliza a obra de Yalom (1975) como referência para explicar o
que ele chama de “fatores curativos”, que para nós significam parâmetros norteadores
determinantes do grau de efetividade do movimento grupal como elemento terapêutico. Cada
uma dessas categorias, na realidade, corresponde a movimentos que podem ocorrer nos
grupos, dando-lhes características mais ou menos terapêuticas. Esses fatores curativos
provêem uma base significativa para discussão e classificação do processo terapêutico de
grupos de cuidado à saúde.
Realizaremos abordagem de cada um desses fatores distintamente, buscando
entendê-los, uma vez que eles constituem a base substancial para a discussão e classificação
do processo terapêutico dentro dos grupos de cuidado em saúde (LOOMIS, 1979).
- Instilação de esperança este é um dos princípios mais importantes no relacionamento
intragrupal. É a esperança na cura, ou no que as coisas podem ser diferentes, que oferece aos
participantes estímulos para se manterem no grupo. Independentemente da natureza do
grupo, é possível encontrarmos pessoas com experiências similares e é a troca dessas
situações de vida que alimenta a esperança. A atitude do coordenador é importante na medida
em que estimula novos membros afirmando sua crença nos benefícios de seu envolvimento
grupal.
- A universalidade é como se fosse um esforço ao incentivo da esperança. É um
movimento que se revela por meio da exposição de experiências comuns, do aprendizado de
que os membros não estão sozinhos. Apesar das particularidades individuais, a solidariedade
pelos problemas alheios ensina às pessoas que não são somente elas que sofrem que suas
dificuldades podem ser solucionáveis e que nada está perdido.
- O oferecimento de informações inclui todas as orientações de cuidados em saúde
importantes para os membros de um grupo feitas pelo coordenador. Sendo ou não o objetivo
central da atividade, congrega relativa quantidade de informações que podem ser oferecidas
durante trabalhos de grupos de saúde. Embora a informação cognitiva seja condição
necessária para a mudança de comportamento na maioria das instâncias, por si, o é
suficiente para alterar a situação do cliente. Poucas pessoas mudam apenas pela informação
6
7
recebida. Por outro lado, cada informação mesmo não sendo dirigida especificamente para
uma pessoa em particular, pode freqüentemente se tornar benéfica para a maioria dos
membros do grupo.
Loomis (1979), Munari (1995) e Souza (2004) referem que o coordenador deve
evitar que o grupo fique centrado em apenas um problema pessoal de um dos membros, pois
isso pode provocar nos demais elementos um sentimento de frustração, porquanto o grupo
permanece o tempo todo centrado em apenas um problema pessoal, esquecendo portanto das
metas a alcançar. Compreendemos que a orientação contextualizada no momento adequado
dentro do grupo possibilita aflorar sentimentos, tornando os participantes mais ativos à
medida em que podem também expor suas experiências.
O coordenador deve estimular a verbalização de outras experiências já
vivenciadas pelos membros do grupo em situações semelhantes, podendo assim ajudar a se
ter uma idéia do que cada um passará, ou ainda fazer com que cada um reflita sobre o que
está passando.
- O altruísmo refere-se à experiência de compartilhar uma parte de si mesmo com os
outros. O envolvimento/movimento grupal possibilita compartilhar informações,
sentimentos, experiências e assistência concreta. Quanto mais esse movimento existir no
contexto grupal, maiores serão as possibilidades de os membros do grupo estreitarem seus
laços, comunicando-se, fazendo visitas uns aos outros e ajudando-se em períodos de crise ou
de necessidade, estimulando diretamente o desenvolvimento da socialização.
- A reedição corretiva do grupo primário familiarpode acontecer, pois o grupo pode ser
formado por vários membros com características diferentes, podendo assemelhar-se
simbolicamente a figuras parentais ou com pessoas que tenham significado importante em
suas relações. Nesse sentido, essa característica pode facilitar a percepção de alguns
membros que possam experimentar trabalhar com alguns de seus conflitos vivenciados a
partir do seu grupo familiar de origem. Isso geralmente ocorre pelos movimentos
transferenciais que todos trazemos de algum modo em nossos relacionamentos.
Nesse fenômeno, o coordenador e os membros do grupo podem facilitar
mudanças de atitudes quando podem mostrar ao participante, que expressa alguma
dificuldade, a forma como este se coloca diante das situações que emergem do grupo,
buscando correlacioná-la com outras vivenciadas fora do contexto grupal. Em geral, nesse
momento, o indivíduo é chamado a perceber sua participação no relacionamento e
responsabilidade perante suas atitudes.
68
- O desenvolvimento de técnicas de socialização pode acontecer como objetivo central
da atividade, como uma meta a ser desenvolvida por pessoas que necessitam de uma ajuda
para sua reinserção na comunidade após um afastamento do contexto social. Um grupo cujo
objetivo central seja de apoio/suporte ou de psicoterapia pode ter como beneficio
secundário estimular o relacionamento com outras pessoas. Para muitos participantes, o
grupo é o único espaço de que dispõem para refletirem sobre si próprios e seus
relacionamentos, e para treinarem sua reinserção na família e comunidade.
- A imitação de comportamentos é um recurso utilizado pelo ser humano desde muito
cedo. Mais tarde, continuamos nos espelhando nesse processo, mesmo o tendo a
consciência de fazê-lo. No grupo, o coordenador e os demais participantes podem tornar-se
“modelos” de aprendizado para novos comportamentos e atitudes como um recurso para o
aprimoramento das relações. Não queremos dizer com isso que eles devam ser aprendidos
mecanicamente como fazem os animais, mas construindo-se no primeiro passo para que o
indivíduo experimente novas formas e valores em seu relacionamento com o mundo e com
as pessoas.
- O aprendizado pessoal é um processo complexo muitas vezes sobreposto a outros
fatores descritos. Dependendo do objetivo do grupo, esse aspecto constitui o primeiro fator
curativo, especialmente nos grupos de psicoterapia. O grupo, como um representante do
complexo social em que vivemos, oferece aos seus membros a possibilidade de viver fora e
dentro dele situações muito semelhantes. O coordenador tem o papel fundamental de usar
esse recurso como uma forma de dar feedback aos participantes, oferecendo oportunidades
para a realização de mudanças, para o entendimento e enfrentamento de dificuldades, assim
como para experimentar novos comportamentos.
- A coesão grupal não é somente uma variável do processo, mas também uma condição
essencial para o funcionamento terapêutico e para avaliação da maioria dos tipos de grupos,
pois funciona como um vínculo análogo estabelecido na terapia individual. A coesão do
grupo congrega o vínculo de cada participante com o coordenador, dos membros entre si e
do grupo como um todo. O mais importante nesse processo é a manutenção das forças que
mantêm as características do grupo, com suas facilidades e dificuldades, dos seus valores,
compromisso, confiança e vínculo, interligando os membros do grupo e o coordenador.
- A catarse para Loomis (1979), é o mais importante aspecto da experiência grupal, por
ser o que permite a expressão de sentimentos de reconhecido valor terapêutico. Por si, a
catarse não é suficiente para produzir mudanças demoradas na vida dos participantes se ela
não for devidamente trabalhada e integrada no contexto apresentado pelo cliente ao grupo.
69
Esse processo relaciona-se intimamente à coesão grupal, embora essa última seja
fundamentalmente anterior, pois permite a expressão dos sentimentos. A catarse é uma
característica variável, visto que nem todos os tipos de grupo são continentes para a sua
expressão, e isso deve ser um alerta ao coordenador na condução do grupo. É importante
avaliar se temos preparo suficiente para lidar com essa variável, e se o grupo tem condições
de funcionar com esse movimento, pois precisamos saber conduzir grupos.
- Os fatores existenciais são todos os elementos do processo grupal que ajudam seus
membros a lidar com os sentimentos que envolvem o significado da sua existência. Tais
fatores o mais presentes naqueles grupos que se preocupam com o significado daquilo
que seus membros pensam, falam e sentem do que naqueles nos quais a prioridade é a
execução de tarefas. São elementos na avaliação do grupo, pois ajudam as pessoas a pensar
como e se conseguiram modificar-se a partir do grupo. Além disso, oferecem ao
coordenador pistas para uma condução mais segura do processo grupal, de inegável valor
terapêutico
.
Pode ser que todos esses fatores não estejam presentes ao mesmo tempo na vida
do grupo, principalmente porque alguns deles são mais observáveis em diferentes estádios
do processo do grupo do que outros e vice-versa, como também em alguns tipos de grupos
e em outros não.
Resultados do grupo
Os grupos podem ser definidos e descritos de acordo com seus resultados. Loomis
(1979) aponta os seguintes parâmetros de resultados:
manutenção a manutenção do estado emocional e/ou comportamental é um
resultado muito significativo para certos tipos de clientes, os quais, entrando no grupo, têm
grande probabilidade de piorar a si próprios e com poucas chances de melhorias. Os grupos de
socialização e de apoio/suporte dão grande ênfase à manutenção das forças emocionais e dos
comportamentos existentes;
aprendizagem possibilita a aquisição de conhecimentos e informações
essenciais para que alguns comportamentos sejam adquiridos ou transformados, com o
exercício de novas tarefas ou de atos planejados;
mudança de comportamento está ligada à aprendizagem de novas atitudes e
comportamentos. Também aparece como resultado da convivência grupal. Em geral, essas
mudanças podem ser classificadas como automudanças, mudanças em relações interpessoais e
mudança em ambiente pessoal, ou seja, no ambiente em que vivemos. O grupo serve como
espaço para se praticar essas mudanças.
70
Na fase de intervenção, devem ser observados os aspectos que dizem respeito à
estruturação dos grupos, como: seleção dos clientes, a organização física, o tempo, o tamanho
do grupo, o espaço e o ambiente, assim como a preparação dos integrantes. Nesse momento,
deverá haver a aproximação entre o enfermeiro e a clientela, quando serão definidas as regras
e normas para a convivência durante o tempo em que o grupo funcionar. Loomis (1979)
refere-se a esse processo de contrato de trabalho, alertando para a noção de que devem ser
consideradas as expectativas dos participantes e do coordenador, sendo importantes sua
avaliação e sua revisão constantes para ajustes, sempre que necessário.
Loomis (1979) ressalta, ainda, outros aspectos relevantes do processo grupal,
conforme destacado a seguir.
As preocupações iniciais do grupo as apresentações são formais e os
momentos de silêncio comuns, pois a incerteza do que acontecerá poderá provocar ansiedade
antecipada, extremamente comum no primeiro contato. A interação dos membros do grupo
ocorreprimeiramente pelo desenvolvimento de papéis, o que esintimamente relacionado
ao desenvolvimento do padrão de poder e influência de cada integrante, inclusive do
coordenador, e pelo desenvolvimento do padrão de comunicação do grupo durante a sessão.
O desenvolvimento da coesão grupal – a coesão grupal é fator terapêutico
imprescindível para o alcance dos objetivos e efetividade do grupo. É resultante de todas as
forças de ação dos membros para continuarem no grupo. A coesão é determinada por
elementos como as metas e normas do grupo e o papel do coordenador. O que facilita o
desenvolvimento da coesão grupal é o fato de a coordenação ter sempre claros os objetivos
propostos, relacionando-os com as necessidades dos clientes e com a própria perspectiva.
Loomis (1979) aponta, no entanto, alguns aspectos que constituem ameaças para o
desenvolvimento da coesão grupal:
a instabilidade dos membros do grupo’, fator que dificulta o processo grupal
como um todo. Essa instabilidade pode ser provocada pelas próprias normas estabelecidas,
pela falta de limite para o número de elementos do grupo, pela ausência de respeito aos
horários, mudanças no local dos encontros, pela rotatividade da equipe, visitas e outros;
os desvios do grupo’ são aqueles membros que dificultam o processo grupal,
em virtude da sua oposição ou não-aceite das normas e metas do grupo. A avaliação dos
resultados e a participação voluntária de cada componente no processo, desde o
estabelecimento das metas e definição das normas, o importantes para o bom andamento do
grupo;
71
a formação de subgrupos’ geralmente resulta da insatisfação, relutância ou da
inabilidade em aderir às normas e metas do grupo, dificultando a efetividade da coesão
grupal, estimulando a competitividade; e
– os ‘problemas de liderança’ põem em risco a integridade do grupo. Resultam da
falta de conhecimento ou da habilidade do coordenador para trabalhar a favor da coesão
grupal. A fase de planejamento e estruturação do trabalho pode ajudar o enfermeiro a evitar
dificuldades dessa natureza. Dificuldades desse tipo podem ser evitadas na fase de
planejamento e estruturação.
A fase de funcionamento dos grupos – é considerada por Loomis (1979) a
principal etapa do grupo, caracterizada pela ação do coordenador e dos membros, por meio da
participação na efetivação dos seus objetivos e metas. Os objetivos podem ser realizados por
dois caminhos: o do conteúdo e o do processo. Através do caminho do conteúdo, o grupo se
movimenta no sentido de utilizar a maior parte do seu tempo e de sua energia na busca de
aspectos concretos do que se faz ou do que se diz. Pelo caminho do processo, é importante
como o grupo se desenvolve em todas as suas nuanças, considerando as intenções de
comunicações, sua seqüência, tempo destinado a cada integrante, enfim, todos os significados
possíveis de apreensão pelos participantes e pelo coordenador. Na prática, os grupos usam
uma mistura dessas duas dimensões, de modo a beneficiar-se de ambos, conteúdo e processo,
no seu desenvolvimento.
É determinante, para as outras sessões, a avaliação criteriosa que o coordenador
faz na fase de finalização do grupo. Loomis (1979) assevera que a fase de avaliação é uma
etapa importante do trabalho grupal. Embora muitos autores se refiram a esse aspecto de
forma subjetiva, ela cita que o enfermeiro pode recorrer à avaliação clínica, ou seja, à
observação de “O que acontece?”, “De que forma”? e “Como”? Ela sugere alguns modelos de
avaliação:
1 avaliação individual dos membros do grupo é imprescindível, constituindo
importante termômetro para avaliarmos o potencial de efetividade do grupo;
2 avaliação sob a perspectiva do coordenador do grupo, utilizada com base na
observação do coordenador perante os fatos ocorrentes no desenvolvimento do trabalho
grupal;
3 na avaliação sob a perspectiva de outros membros da equipe que trabalha com o
grupo, um coordenador auxiliar ou pessoas outras que dão apoio ao trabalho grupal, podem
contribuir nesse processo de validação dos resultados;
72
4 na avaliação com suporte na opinião de pessoas que convivem com os membros
do grupo, ou seja, é a avaliação realizada por integrantes familiares, companheiros, amigos
e/ou outras pessoas;
5 na avaliação de um supervisor externo ao grupo, realizada por algm de fora,
mas com experiência e conhecimento teórico e técnico sobre grupos, auxiliando, sobretudo,
na análise do coordenador.
Como citamos, a avaliação também pode ser realizada sob a perspectiva dos
resultados do grupo, utilizando-se três parâmetros, tendo como indicadores os objetivos e
metas estabelecidas para o trabalho grupal: manutenção, aprendizagem e mudança de
comportamento.
Diante do exposto, utilizamos os recursos do Processo Grupal para Enfermeiros,
da enfermeira dos Estados Unidos Maxine Loomis como instrumental de produção de dados e
estratégia de promoção da saúde junto aos sujeitos do estudo.
73
O Caminho Metodológico
O Caminho MetodológicoO Caminho Metodológico
O Caminho Metodológico
5
55
5 O Caminho Metodológic
O Caminho Metodológic O Caminho Metodológic
O Caminho Metodológico
oo
o
5.1 Caracterização do tipo de estudo
74
Realizamos um estudo do tipo qualitativo, por meio do referencial teórico de
Loomis (1979), o qual trata do desenvolvimento da abordagem grupal para enfermeiros. Esse
referencial teórico utiliza a abordagem grupal como proposta metodológica. Pesquisar com
metodologias que privilegiam a abordagem grupal é algo de grande relevância para a prática
de Enfermagem.
Sobre pesquisa qualitativa, Lobiondo-Wood e Haber (2001) descrevem que este
tipo de estudo abarca a totalidade de seres humanos, concentrando-se na experiência humana
em cenários naturalistas. O pesquisador que usa essa abordagem acredita que seres humanos
singulares atribuem significado a suas experiências e que elas derivam do contexto da vida.
Essa abordagem é fundada na convicção de que dados objetivos fatuais não apreendem a
experiência humana.
Na abordagem qualitativa, não podemos prescindir da escuta sensível. Para Freire
(1997) esta não é um simples ato de escutar com os ouvidos, e sim a capacidade de o
pesquisador sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para compreender o
interior, as atitudes e os comportamentos, as idéias, os valores, os símbolos e os mitos.
Realizamos um estudo grupal por meio de oficinas de vivências como forma de
avaliar o processo grupal ocorrido junto a familiares de dependentes químicos, em que a
utilização de recursos artísticos foi a orientação metodológica para esse estudo. As técnicas
empregadas serviram para facilitar a expressão de sentimentos e subjetividades, tornando-se
conscientes e acrescidos de significados para os participantes do grupo. Mediante as
atividades propostas, os participantes do estudo expuseram também como a co-dependência é
expressa em suas vidas.
Para Araújo et al. (1998), as oficinas vivenciais favorecem a investigação,
incorporando os significados dos atos e das relações com as estruturas sociais, e promovem o
exercício da autogestão, incentivando uma atitude participante e mobilizando conhecimentos
para o alcance de objetivos socialmente significativos.
Na abordagem grupal, o uso de recursos artísticos e o saber produzido pelo grupo
têm significado, tanto para o pesquisador como para os demais participantes da pesquisa,
representando vozes, sentimentos e percepções desses, traduzindo-se em uma linguagem que
pode ser entendida dentro e fora do âmbito da academia. Os integrantes ou sujeitos da
pesquisa tornam-se também co-pesquisadores, contribuindo para a formulação do
conhecimento e participando de todas as decisões da pesquisa, havendo uma tendência a
ocorrer uma quebra da tradicional relação pesquisador/objeto de estudo.
75
Em nosso estudo, substituiremos a expressão ‘coleta de dados’ por ‘produção de
dados’, pois entendemos que os indicadores são produzidos pela ação dos sujeitos da pesquisa
ou participantes do grupo e pela sua aceitação para compor a formação. Esses dados não
aparecem espontaneamente na realidade vivenciada, mas são produzidos pela ação dos
participantes do grupo e pela sua aceitação no ato da pesquisa e pelos coordenadores do
grupo.
Na sessão grupal, cada integrante possui também a função de potencializar o
conhecimento produzido na investigação em foco, uma vez que considera os sujeitos
envolvidos e oportunidade para cada integrante do grupo olhar para si através da vivência
do outro.
5.2 Contexto/Local do estudo
O estudo foi desenvolvido em um Centro de Atenção Psicossocial especializado
no tratamento de usuários de álcool e outras drogas – CAPS-ad da Secretaria Executiva
Regional III (SER III)/Prefeitura Municipal de Fortaleza, em convênio com a Universidade
Federal do Ceará (UFC), localizado na rua Papi Junior 1221, Rodolfo Teófilo, CEP: 60.430-
230, Fortaleza-Ceará.
O serviço possui uma equipe de profissionais composta de enfermeiro, médico
psiquiatra, médico clinico, terapeuta ocupacional, psicólogo, assistente social, técnico de
enfermagem, técnico administrativo e auxiliar de serviços gerais. Possui espaço para
atendimentos individual, grupal, sala de espera, cozinha e sala para refeições, sala da
coordenação, recepção e banheiros masculino e feminino.
No que se refere à escolha do CAPS-ad para o local de produção de dados, isso
decorreu do fato de esse tipo de serviço ser um local específico para o atendimento ao
dependente químico e por integrar a proposta da reforma psiquiátrica, em implantação no
Brasil, constituindo espaço ideal para estudo dessa natureza.
Outro aspecto que nos fortaleceu escolhermos esse serviço como cenário de nossa
pesquisa foi o fato de ser um local novo de assistência ao dependente químico, que estava
iniciando sua implantação e principalmente porque ainda não dispunha de nenhum tipo de
assistência aos componentes familiares dos usuários.
O período que ocorreu as oficinas vivenciais foi durante os meses de junho a
agosto de 2007.
76
5.3 Participantes do estudo
Os participantes foram os componentes familiares que se encontravam na
condição de acompanhantes dos dependentes químicos que estavam sendo assistidos no
CAPS-ad escolhido para a realização da pesquisa. Os critérios de inclusão do membro
familiar para participar do estudo foram: aqueles que estivessem na condição de responsáveis
e/ou cuidadores principais da pessoa em tratamento; que aceitassem participar do estudo após
os esclarecimentos necessários e o cumprimento do previsto na Resolução 196/96 (BRASIL,
1996).
Ainda fazendo parte dos critérios de inclusão no estudo, só foi considerado sujeito
da pesquisa o integrante familiar que esteve presente em pelo menos três encontros do total
estabelecido (dez encontros grupais e um encontro individual) para a produção de dados.
Para seleção dos participantes do grupo, foi feito o primeiro contato, quando
foram explicitados os objetivos do trabalho e a confirmação do aceite para estar presente à
entrevista individual. O primeiro contato foi realizado por intermédio da escolha de 13
famílias por meio dos prontuários do serviço, dessas 13 famílias estiveram presentes 16
membros. A escolha das famílias deveu-se à necessidade sentida pelos profissionais do
serviço, que apontaram como sendo essas as famílias que mais precisavam de ajuda
terapêutica. A evidência indicada pelos profissionais ocorreu durante seus atendimentos e
foram discutidos em reuniões semanais.
Em seguida, foi aprazada uma entrevista individual com cada familiar que aceitou
fazer parte do grupo. Dos 16 componentes familiares que se comprometeram a fazer parte do
grupo a estarem presentes à entrevista individual, compareceram 11 representantes de 11
famílias diferentes para a entrevista e esses mesmos 11 permaneceram fazendo parte da
pesquisa. Então, se formou um grupo fechado, constituído pelos 11 integrantes familiares.
O tipo de vínculo familiar dos participantes com os dependentes químicos era:
uma madrasta, um irmão, uma esposa, duas irmãs, seis mães.
Como se tratava de um grupo do tipo fechado, não foram incluídos novos
membros em nenhum momento do processo grupal. Após o período de prodão estabelecido,
o grupo continuou ocorrendo, porém recebeu pessoas novas, alguns participantes se
desligaram, houve mudança de coordenadora principal e o dia da semana escolhido para o
encontro mudou, entretanto, a equipe do serviço que assumiu o compromisso de continuar
com esse tipo de assistência no CAPS-ad permaneceu com objetivos e metas para um grupo
de apoio/suporte.
77
Com relação ao tamanho de um grupo, Loomis (1979) refere que este pode ser
baseado nas necessidades dos clientes e na técnica por meio da qual os objetivos serão
alcançados. Também aponta que alguns autores sugerem a delimitação do grupo em cinco ou
seis membros e outros referem de seis a dez integrantes, sendo que esses números permitirão
a diversidade dos membros do grupo e o desenvolvimento da interação grupal. Grupos com
mais de doze participantes, entretanto, podem ensejar prejuízo no atendimento das
necessidades dos membros, além de tornar difícil a coordenação, podendo constituir fator que
impossibilite a coesão grupal.
De acordo com Souza (2004), mesmo que a literatura, aliada à experiência de
quem trabalha com grupo, indiquem um número entre seis e 12 pessoas como sendo o mais
adequado para o desenvolvimento da abordagem grupal, é interessante que optemos por um
número maior no ato da seleção dos participantes, pois a possível desistência de pessoas é um
fato na formação de grupos.
Por se tratar de um grupo de apoio, em que teve como objetivo a produção de
dados de pesquisa foi necessário contarmos com uma margem de segurança de participantes
para que, ao final, tivéssemos um número ideal para a realização de pequenos grupos de
cuidado à saúde.
Consideramos que os 11 participantes representaram um número ideal, por não ser
tão grande, já que ocorre sempre desistência de participantes na formação e andamento de um
grupo (MORAES, 2003). Embora esse fato felizmente o tenha ocorrido com o grupo, o
tivemos desistência ao longo da jornada, mantendo os mesmos participantes do começo ao
fim da produção de dados.
5.4 Procedimentos e instrumentos para a produção dos dados
Para a produção de dados, seguimos três fases: planejamento, intervenção e
avaliação. Foram assim denominadas para condução do grupo, adequando-se aos quatro
descritores nomeados por Loomis (1979). A fase de planejamento correspondeu à etapa dos
objetivos; a fase de intervenção às etapas de estruturação e processo; e, por último, a de
avaliação, correlata aos resultados do grupo.
No segmento de planejamento, identificamos as necessidades dos integrantes
familiares e definimos os objetivos e metas para o grupo. Foi realizado o primeiro encontro
grupal, tendo como objetivo a explanação da pesquisa aos membros familiares, a apresentação
das coordenadoras principal e auxiliar, proporcionando o desenvolvimento de maior vínculo
78
entre coordenadores e participantes do grupo, além de ter sido agendado com os participantes
interessados o encontro para a realização da entrevista individual.
Posteriormente, elaboramos um roteiro individual de entrevista semi-estruturada,
com perguntas abertas e fechadas para os participantes, objetivando caracterizar os integrantes
do grupo pesquisado em relação as suas condições socioeconômicas e demográficas, sua
percepção e sentimentos diante da problemática vivenciada, conhecer as principais
características do familiar do usuário de droga e principalmente iniciar um processo de
delimitação de objetivos e metas para a constituição do grupo (Apêndice A). Essa entrevista
foi agendada e realizada de acordo com data e horário de conveniência do familiar no CAPS-
ad.
Optamos pela entrevista por ser uma técnica que permiti interação com o
participante, iniciando assim uma relação de confiança necessária entre coordenador e
participante durante o processo grupal.
Para Gil (1999), a entrevista é uma forma de interação social, um diálogo
assimétrico em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de
informação, sendo muito eficiente para a obtenção de dados em profundidade acerca do
comportamento humano, além de ser uma técnica cujo sucesso depende fundamentalmente do
nível de relação pessoal estabelecido entre entrevistador e entrevistado.
As entrevistas individuais foram realizadas durante cinco dias consecutivos no
próprio CAPS-ad. Ao iniciarmos cada entrevista realizávamos uma reapresentação da
pesquisadora e explicitação de toda a pesquisa, fornecendo informações sobre os aspectos
éticos em pesquisa, in anima nobili, isto é, envolvendo seres humanos. Após isto, foi feita a
leitura do termo de consentimento livre e esclarecido, solicitando-se a sua assinatura, em caso
de aceite (Apêndice B).
Na fase de intervenção, foram abordados e observados aspectos da estrutura do
grupo, quando realizamos a sessão preparatória, como forma de introduzir os clientes para a
experiência do grupo e do compartilhamento de expectativas, formulando um Contrato Inicial
de Trabalho (Apêndice C) e a criação de um documento constando as Regras de Convivência
Grupal Saudável (Apêndice D). Para Loomis (1979), realizando-se uma sessão preparatória
antes de iniciar o momento do processo grupal propriamente dito, o grupo passa a ser um
veículo útil para desenvolver expectativas mútuas entre os participantes e o coordenador do
grupo, como também facilitar a inserção dos membros do grupo. Os clientes providos de
informação sobre a estrutura e processo do grupo, e quanto aos sentimentos que poderão
experimentar nesse ambiente, demonstram ser participantes mais ativos.
79
Nessa fase de intervenção, também foi coberto o processo grupal, organizado por
meio da formação do grupo de apoio/suporte com os membros familiares dos dependentes
químicos. Realizamos seis sessões grupais, com uma freqüência semanal. Essa modalidade de
grupo de apoio/suporte foi decidida após a realização do primeiro encontro grupal e,
principalmente, após a entrevista e a sessão preparatória, respeitando as necessidades dos
clientes, suas metas e objetivos para o grupo.
Na fase de avaliação, foram discutidos os resultados do grupo, correspondendo a
duas sessões grupais. No total, tivemos um encontro geral com todos os participantes
convidados a fazer parte do grupo, uma entrevista individual com aqueles que aceitaram uma
sessão preparatória e oito sessões grupais.
Quadro 1 Apresentação das fases de produção de dados do estudo com o grupo de
componentes familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
FASES DESCRITORES SESSÕES
Fase de Planejamento Objetivos do grupo 1º encontro grupal geral
Entrevista individual
Estrutura do grupo Sessão Preparatória Fase de Intervenção
Processo do grupo Sessões I a VI
Fase de Avaliação Resultados do grupo Sessões VII e VIII
Fonte: elaboração da autora.
O horário estabelecido para o início e rmino da sessão foi de 13h30min às
16h00min, totalizando duas horas e meia de encontro, conforme decidido coletivamente entre
coordenadora principal e auxiliar e participantes do grupo. O dia da semana escolhido para a
realização do grupo foi a segunda-feira. Os encontros foram todos semanais desde a sessão
preparatória.
A periodicidade semanal justifica-se pela nossa experiência com a condução de
grupos, pois encontros intercalados por sete dias são suficientes para a manutenção de
vínculos, estímulos para emergir resultados advindos da utilização da aprendizagem, apoio e
enfrentamento das experiências desses integrantes familiares. Além dessas questões, esse
período foi suficiente para que planejássemos as sessões subseqüentes e pudéssemos ter uma
visão geral de como estava se processando o desenvolvimento do grupo de apoio.
Os grupos de apoio são coordenados por um profissional que pode ou não assumir
a sua liderança. Os objetivos convergem para a educação e/ou socialização dos participantes e
podem apresentar estrutura variada. Em geral, têm uma ligação com uma instituição e, para a
80
inserção e manutenção do grupo, é preciso que todos estejam disponíveis e conscientes do
tipo e objetivo da participação (MUNARI; ZAGO, 1997).
O grupo formado para a pesquisa, a exemplo de outros de apoio/suporte, iniciou-
se tendo como objetivo primário oferecer apoio e suporte emocional. Para Loomis (1979), o
grupo com o objetivo de oferecer apoio/suporte pode ajudar pessoas durante períodos de
ajustamentos às mudanças, no tratamento de crises ou ainda na manutenção ou adaptação às
novas situações. Esta modalidade focaliza primariamente o apoio e a manutenção de forças e
se fortalece na confiança e reforço, recursos pessoais e ambientais de seus membros.
O potencial preventivo desses grupos emerge da oportunidade dos participantes
com situações semelhantes para compartilhar experiências comuns. A possibilidade de o
indivíduo não só receber suporte do grupo, mas também de ser capaz de exercitar em colocar-
se expondo sua vivência e dar feedback aos outros membros, demonstra o quanto essa
convivência pode contribuir para o crescimento de todos e qualificar o caráter transformador
do grupo (MUNARI; RODRIGUES, 1997).
Levando em consideração as necessidades dos participantes e o tamanho do
grupo, escolhemos as técnicas grupais pelas quais os objetivos do estudo foram alcançados,
fazendo adequações, sempre que necessário. Esses aspectos foram decididos coletivamente,
de acordo com a disponibilidade e interesse do grupo no ato da sessão preparatória e no
decorrer dos encontros grupais inicias.
Todas as sessões foram divididas em três momentos: Acolhimento, destinado à
exposição de assuntos considerados importantes pelos participantes, lembretes, avisos e ao
acolhimento dos participantes; desenvolvimento, no qual foram realizadas atividades com
recursos artísticos, havendo sempre anteriormente o momento de preparação para o tema,
sendo estimulado um relaxamento ou alongamento corporal, no intuito de que os participantes
se concentrassem para a atividade, reflexão e verbalização das vivências; e, por último, a
avaliação da sessão, quando realizávamos uma análise prévia e contínua do encontro e do
grupo como um todo.
No relaxamento, freqüentemente, os participantes eram convidados pelo
coordenador do grupo a viajarem pela imaginação, fazendo livres associações de sua vivência
na qualidade de membro familiar de uma pessoa dependente química em tratamento. Depois
eram encaminhadas ao momento da técnica de produção, que a utilização de recursos
artísticos como, desenho e pintura, em si aguçam a linguagem simbólica e criativa,
permitindo, assim, ultrapassar a simples dimensão consciente do pensamento dos
participantes do grupo.
81
Para Ferreti (2005, p. 134), a relação entre o trabalho corporal, o relaxamento e a
elaboração criativa resulta na ampliação da consciência, facilitando o caminho psicoterápico e
de autoconhecimento da pessoa envolvida num processo artístico, pois vivências artísticas
fazem emergir a criatividade, esboçada também em diversas formas de linguagem, as quais
expressam conteúdos inconscientes, sendo que esses teores devem ser trabalhados a fim de
que haja maior conhecimento de si mesmo. Destaca, ainda que, durante as oficinas vivenciais,
...a interação da pessoa com o material é facilitador para o ato criativo, pois, à
medida que nasce a imagem concreta, abre-se uma nova relação da pessoa consigo e
com seu mundo mais intenso. O diálogo entre sujeito e objeto dá-se na dialógica
entre a obra e a subjetividade de seu criador.
As sessões grupais foram voltadas para a produção de dados e sempre almejando
a busca dos objetivos do grupo. Para isso, essas sessões constituíram espaço de expressão de
sentimentos e subjetividades relacionados à vivência do componente familiar quanto à
problemática de um ente dependente químico. O grupo ofereceu subsídios para maior
aproximação da realidade vivenciada, fornecendo elementos para que pudéssemos responder à
nossa questão de estudo. E por último, ainda como forma de obter dados, tivemos um diário
de campo, onde foram anotados aspectos importantes da pesquisa, como acontecimentos,
informações relevantes e os relatos dos encontros registrados ao final de cada sessão pelas
coordenadoras principal (enfermeira e pesquisadora) e auxiliar (terapeuta ocupacional do
serviço), além de anotações realizadas pelos próprios participantes e trazidas para ser
discutidas com o grupo ou somente entregues para a coordenadora principal (Apêndice E e F).
5. 5 Interpretação e análise dos dados
A produção e análise das informações ocorreram de forma simultânea, pois dessa
forma analisamos melhor a vivência dos componentes familiares, compreendendo como a co-
dependência é expressada em suas vidas, revendo constantemente a condução do grupo.
Os dados utilizados para análise foram:
observações do processo grupal, registradas no diário de campo;
os discursos dos participantes na entrevista individual e nas sessões grupais,
gravados em aparelho digital;
as fotos registradas em cada sessão;
o material produzido nos momentos que envolveram as técnicas grupais
mediante os recursos artísticos;
82
a disposição dos participantes em cada sessão, apresentada em configuração do
padrão comunicativo.
Para a análise dos discursos dos sujeitos, utilizamos a técnica de ‘análise do
discurso’. Gill (2002) ressalta que o discurso é empregado para se referir a toda forma de fala
e textos, seja quando ocorre naturalmente nas conversações, como quando é apresentado
como material de entrevistas ou tipos outros de textos escritos. Na análise de discurso, a
primeira exigência é uma transcrição, que deve ser um registro o detalhado quanto possível
do discurso analisado. A transcrição não pode sintetizar a fala, nem deve ser limpa ou
corrigida, para não perder as características centrais da fala. Após leitura exaustiva dos
discursos, iniciou-se o processo de codificação e categorização.
Os dados produzidos foram organizados de acordo com as datas das sessões e
seus momentos, para aprofundamento analítico posterior.
A interpretação e análise das informações obtidas no decorrer do estudo foram
norteadas pelo referencial teórico Group Process for Nurses (LOOMIS, 1979). Cada sessão
foi descrita e analisada segundo o conteúdo emergido no grupo e o processo grupal
desenvolvido durante os encontros, no qual observamos a evidência de aspectos relacionados
às preocupações iniciais (interação dos membros, papéis do coordenador e fatores curativos),
ao desenvolvimento da coesão (metas e normas do grupo, papel do coordenador e ameaças à
coesão grupal), ao funcionamento (resistência a mudanças, proximidade, conflito e resolução)
e à finalização do grupo, assim como os resultados da sua efetividade.
Em relação aos fatores curativos, Loomis (1979) apresenta um modelo para a
avaliação de grupos. Para os grupos com o objetivo de apoio, a autora prevê a expressão de
todos os fatores curativos, porém ela assinala que são mais freqüentes as instilações de
esperança, universalidade, oferecimento de informação, altruísmo, aprendizado interpessoal,
com ênfase no desenvolvimento de técnicas que promovam a coesão grupal.
Os aspectos da co-dependência foram evidenciados e analisados com base em
outros estudos sobre a temática e na perspectiva de categorias analíticas de co-dependência.
5.6 Aspectos legais e éticos da pesquisa
Referente aos princípios e aspectos legais e éticos da pesquisa, o projeto foi
apresentado em reunião ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará
em atendimento às diretrizes estabelecidas pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de
83
Saúde (BRASIL, 1996) e recebeu protocolo de número 268/06 (Anexo A). Todos os aspectos
foram considerados, com atenção especial para o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido dos sujeitos, ponderação entre riscos e benefícios, confidencialidade e
privacidade, proteção da imagem e não-estigmatização, justiça, autonomia e liberdade de
retirar-se da pesquisa a qualquer momento (Anexo B).
Como os sujeitos da pesquisa foram considerados vulneráveis, atenção especial
lhes foi dedicada, a fim de garantir que eles não sofressem nenhum tipo de lesão física,
emocional ou psicológica. Tendo em vista essa preocupação, incluímos no grupo
componentes familiares orientados no tempo e no espaço e com plenas condições de
participar da investigação, compreendendo as informações sobre os objetivos da pesquisa e o
processo de produção de dados. Iniciamos o estudo após o consentimento, por escrito, de cada
participante.
Respeitando o prinpio do anonimato aos participantes do grupo, estes receberam
pseudônimos com a denominação de outros nomes próprios que não os seus. Na apresentação
dos discursos dos participantes, esses nomes foram acompanhados do grau de parentesco do
partícipe familiar com o dependente químico em tratamento, com o objetivo de facilitar para o
leitor a percepção e a análise dos dados.
Nos capítulos seguintes, passaremos à análise e à discussão dos nossos achados.
84
Os Participantes do Grupo
Os Participantes do GrupoOs Participantes do Grupo
Os Participantes do Grupo
6
6 6
6 O
OO
Os Participantes do Grupo
s Participantes do Grupos Participantes do Grupo
s Participantes do Grupo
Mesmo que o estudo tenha sido desenvolvido com um grupo de composição
homogênea, formado por componentes familiares de dependentes químicos, individualmente,
os participantes apresentam peculiaridades que tornam esse espaço marcado de encontro de
pessoas diferentes, com vidas e histórias também diversos que merecem ser destacadas.
85
Descreveremos sobre cada um dos participantes, sua caracterização
sociodemográfica, aspectos particulares da vida de cada um e de seus familiares dependentes
químicos. Para identificação de cada participante utilizamos os nomes fictícios, tomados
aleatoriamente, compondo o grupo: Ana, Vicente, Adriana, Flávia, Eunice, Janete, Maria,
Nara, Helena, Sandra e Andréia.
ANA (MÃE)
Procedente de Fortaleza-CE, 44 anos, ensino superior, funcionária publica
municipal e possui renda fixa, de aproximadamente, oito salários mínimos. Ana é viúva de
um casamento de 19 anos de duração. Seu marido morreu de AVC hemorrágico três anos.
Mora em casa própria, com dois filhos: uma menina de 19 anos, filha de seu casamento com
seu esposo falecido e um filho adotivo de 14 anos, o qual faz uso de drogas desde os 11 anos
após a morte do pai. Ana acredita que o motivo que levou seu filho a utilizar drogas foi a
perda do pai, associado a outros fatores, como a cobrança de outros familiares de que ele
deveria assumir o papel do pai, sendo o homem da casa; e, como seu pai bebia, ele também
passou a beber. Acredita também que o filho deve ter feito essa associação. Relatou que após
a morte de seu esposo assumiu um novo cargo no trabalho, a fim de esquecer e preencher a
dor da perda e com isso ele ficou mais tempo sozinho em casa. Considera, ainda, que faltaram
limites, acompanhamento e orientação na hora em que ele mais precisava, em razão da morte
de seu pai e a fase de adolescência.
Com relação às drogas, ele consumiu maconha, álcool, crack, cigarro, anfetaminas
e análogos. Foi a primeira vez que ela acompanhou alguém em tratamento de dependência
química.
Relatou que o filho vinha se mostrando cada vez mais rebelde e com dificuldades
de relacionamento, porém percebia ingenuidade e inocência no filho, comparando-o a uma
criança perdida sendo guiado por outras pessoas que não ela. Afirmou, ainda, que tem
dificuldades de relacionamento com adolescentes, em razão da sua atitude, muitas vezes,
arbitraria e autoritária, fruto da educação que recebeu de seus pais. Refere que se sente
culpada por tudo isso que está acontecendo.
Acreditava que se pudesse ajudar seu filho era fazendo com que ele mudasse as
amizades, participasse do atendimento terapêutico do CAPS e dando-lhe mais limites, atenção
e amor. Tinha expectativas de que o grupo pudesse ajudá-la, pois acreditava que as
experiências dos outros participantes pudessem ensiná-la a lidar melhor com seu filho.
Considerou válido esse tipo de trabalho que estávamos fazendo (grupo de familiares),
86
principalmente por ser uma área o difícil de atuar, já que os familiares acabam se
envolvendo tanto e resultando em intenso sofrimento.
VICENTE (IRMÃO)
Procedente de Fortaleza-CE, 41 anos, ensino superior, solteiro e católico. Relatou
estar desempregado e que financeiramente dependia da e, a qual é viúva e possui uma
renda familiar de aproximadamente nove salários mínimos, proveniente de um benefício
social (aposentadoria).
Mora em casa própria com a mãe e os irmãos solteiros. Filho de uma prole de oito
filhos, Vicente tem um irmão de 42 anos, dependente químico desde os 15 ano, e outro de 37,
que também iniciou o uso de droga na mesma idade, mas que está em abstinência muito
tempo. Referiu, porém, que a problemática maior tem sido por conta desse irmão mais velho
(42 anos). Ele referiu que são muitos anos de sofrimento na família com esses dois irmãos
dependentes químicos, principalmente com o irmão velho, que consome drogas 27 anos,
causando transtornos na família, como, por exemplo, a venda de objetos e bens de valores da
família. O irmão usuário de drogas consome vários tipos, entre elas: álcool, crack, maconha e
cigarro. Para Vicente, a única forma de ajudá-lo seria sair de perto dele, pois o considerava
como um inimigo. Acreditava também que, entre outras formas de ajudar o irmão, a ocupação
seria a mais válida.
Acreditava que, como o irmão começou a utilizar drogas ainda na adolescência, o
motivo foram as amizades, pois ele deixou se envolver pelos outros, e pela curiosidade.
Vicente relatou ser a primeira vez que está acompanhando o tratamento de alguém
dependente químico, e que aceitou participar da reunião porque também estava
necessitando de apoio.
Após a formação do grupo, participou apenas da sessão preparatória. Mantivemos
contato com ele por telefone após suas duas primeiras faltas e ele nos relatou que, após os
nossos primeiros encontros, a entrevista individual e a sessão preparatória, o grupo lhe
impulsionou a pensar melhor sobre sua vida. O que foi falado nesses encontros foi positivo e
ele resolveu sair para procurar emprego e fazer um curso, o qual coincidiu com o horário das
sessões grupais. Essa foi sua justificativa para não continuar no grupo. Vejamos o que foi dito
por Vicente, quando indagamos na entrevista sobre o que ele esperava do grupo:
Acho que a palavra mais forte é ajuda e apoio; um equilíbrio pra
mim. Realmente, eu estou precisando, estou totalmente fragilizado, eu
não tenho coragem de..., devido todos esses traumas de... . Eu não me
sinto com força pra ir atrás de um emprego, tentar uma entrevista...,
estou me sentindo fragilizado, e então, necessito de um apoio, ajuda.
87
De acordo com a fala de Vicente, ele não se relacionava freqüentemente com o
irmão, mesmo morando sobre o mesmo teto, pois, quando indagamos no ato da entrevista
individual, se era a primeira vez que ele estava acompanhando o tratamento de um familiar
dependente químico, ele nos respondeu que sim e nem sabia porque, pois odiava o irmão,
sentia-o como um inimigo e detestava esse meio onde eram tratados os dependentes químicos.
Vejamos sua fala:
Eu tenho um trauma tão grande que eu não suporto ele. Porque esse
sofrimento vem desde os 15, 16 anos. ...eu não consigo mais ter
amizade com ele. Não consigo mais encarar ele. Ele é um estranho
comigo dentro de casa. Porque eu o tenho como um inimigo. Uma
pessoa que fez a gente sofrer a vida toda. Dentro de casa. ...Esse
sentimento de ódio por ele que eu tenho não sai de dentro de mim. ...E
eu vou ser bem franco: como eu tenho esse ódio pelas atitudes dele,
pela vida todinha, eu não queria estar nesse meio não, que eu detesto
esse meio de droga, essas coisas; Eu estou aqui à força! Mas é porque
eu tenho que também melhorar, eu tenho que fazer alguma coisa,
porque eu também estou doente, a família, claro, não é?
Embora a permanência de Vicente no grupo tenha sido pequena, ele marcou muito
nosso estudo, por toda a sua história de vida e de sua família diante do envolvimento do irmão
com as drogas. Sua posição e seu papel dentro do grupo chamaram a atenção das
coordenadoras e dos outros participantes: o fato de ser do sexo masculino, compondo um
grupo formado apenas de mulheres e, principalmente, porque ele continuou sendo lembrado,
mesmo ausente do grupo.
Vicente demonstrava ser uma pessoa ansiosa e não quis falar durante o primeiro
encontro. Somente no momento da entrevista individual, relatou sobre sua tristeza e desespero
diante da situação que estava vivenciando com irmão dependente químico. Mostrou-se com a
auto-estima baixa, sem coragem nem estímulo para procurar emprego ou mesmo para
enfrentar a vida; inclusive já havia pensado em suicídio.
88
ADRIANA (MÃE)
Procedente de Fortaleza-CE, 39 anos, ensino fundamental, separada e evangélica.
Mora com os pais e o possui renda própria, dependendo deles para sobreviver, juntamente
com o filho adolescente, 19 anos. Relatou que estava lutando na Justiça contra o pai de seu
filho para que ele pague uma pensão para ela, pois ela possui a guarda do filho. Seu filho foi
usuário de drogas no passado e hoje faz acompanhamento no CAPS-ad.
As drogas que seu filho utilizou no passado foram as anfetaminas e análogos e
álcool. Atribui o motivo desse uso de drogas do filho a sua separação do pai dele, pois o
adolescente ficou morando durante três anos seguidos com o pai e, durante esse tempo,
segundo Adriana, o filho ficou abandonado sem cuidados, sem a atenção devida do pai e sem
limites, fazendo tudo o que queria. O pai mudou o filho de colégio, tirando-o de uma escola
particular e colocando-o em um colégio público, onde o rendimento do adolescente se tornou
mais baixo. Ficou distante da mãe e de certa forma sofreu com a separação dos pais.
Adriana relatou que, durante esse tempo que seu filho esteve na casa do pai, não
recebeu nenhum tipo de educação; o pai apenas o violentava fisicamente.
Não foi a primeira vez que Adriana acompanhou o tratamento de uma pessoa
dependente química. Relatou que havia acompanhado seu filho em internações anteriores,
antes mesmo de ter iniciado esse tratamento no CAPS-ad. Após sua última internação, foi
encaminhado ao CAPS e com esse novo tratamento, ela estava se dedicando totalmente a
cuidar do filho e já percebia os resultados.
Relatou que, quando seu filho utilizava drogas, ficava agressivo, violento. Ela
ficava nervosa, angustiada, com medo e com extremo cansaço físico, quando o filho estava
drogado. Gostaria que ele tivesse continuado a estudar, mas não se adaptou à escola pública.
A forma que Adriana utilizava para ajudar seu filho era acompanhando-o para o
CAPS-ad e para todos os locais aonde ele ia. A expectativa dela era de que o grupo a ajudasse
a se fortalecer.
FLÁVIA (MÃE)
Procedente de Fortaleza-CE, 51 anos, ensino superior, viúva, evangélica e mãe de
três filhos, uma do sexo feminino. Flávia estava desempregada, mas possuía uma renda
familiar aproximada de 5 salários e meio, fruto de um benefício social (aposentadoria) de seu
marido. Residia com os dois filhos homens, o mais novo tinha 16 anos e era dependente
químico. Sua filha era casada e residia em outra casa com o marido. Relata que o outro filho
não usuário tem atitude passiva diante do comportamento e das atitudes do irmão, e isso
passou a ocorrer depois que ele foi agredido fisicamente pelo irmão dependente químico.
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Flávia parou de trabalhar para ficar próximo do filho dependente químico, que
passou a consumir drogas aproximadamente três anos e meio. Descobriu que ele utilizava
drogas por meio de um atendimento em psicologia para onde ela começou a levá-lo, pois,
nesse período, começou a rebeldia dele e ela procurou intervenção terapêutica, quando foi
descoberto o fato.
Relatou que o filho sempre teve comportamento difícil, violento, agressivo,
chegando inclusive a encontrar armas brancas nos seus pertences. Achava ele muito precoce
para sua idade. Entre as drogas utilizadas por seu filho, Flávia referiu cocaína inalada, álcool e
cigarro.
Segundo ela, o motivo que levou seu filho a consumir drogas foi falta de mais
cuidados da parte dela, pois ele ficava sozinho e ela ia trabalhar. Então, ele acabou se
envolvendo com quem não deveria, pessoas dependentes de drogas. Anteriormente ela bebia e
fumava e o filho sempre presenciava. Relata que não impôs os limites necessários para seu
filho e, quando veio a perceber, já era tarde demais, pois ele havia se envolvido com as
drogas; porém, revela que seu filho alega que ela é muito orgulhosa e gosta de humilhar as
pessoas. Ela relata que passa o tempo indo atrás dele e não sabe se isso é normal ou se já se
tornou obsessão, porque ela só está contente quando o filho está dentro de casa.
Não é a primeira vez que Flávia está acompanhando um tratamento de seu filho.
Antes de ir ao CAPS, ele fez atendimento individual em uma clínica de Psicologia e
posteriormente chegou a ser internado por conta do uso exagerado de drogas.
Flávia percebe o filho como pessoa muito difícil de se relacionar com ele, cheio
de vontades próprias e sem limites. Sente-se uma pessoa desequilibrada diante de toda essa
vivência, inclusive chegou a se arrepender por ter engravidado dele e até revelou esses
sentimentos para ele e, após ter revelado, pediu perdão.
Relatou que não sabe de que forma pode ajudar o filho, pois viabilizou
atendimento psicológico individual e a internação e não surtiu efeito. Verbalizou que o
tratamento dele no CAPS não estava sendo eficiente, pois ele o aceitava participar das
atividades grupais, não tomava a medicação prescrita pelo psiquiatra e faltava muito ao
atendimento individual do Serviço de Psicologia.
Para ela essa é uma situação de resolução difícil, pois não é fácil se comunicar
com ele em virtude da sua permanente rebeldia. Quando está drogado, fica agressivo e
violento; agrediu seu irmão mais velho com uma arma branca, agride fisicamente a mãe ou
qualquer outra pessoa da família que esteja próximo quando está drogado e causou muitos
prejuízos financeiros, como a quebra de objetos domésticos. Ela atribui essa agressividade
90
dele à falta de educação e limites. Vejamos em sua fala: Eu não pus limite pra ele. Tudo que
ele queria eu dava com medo dele. Pra calar ele.
Verbalizou que esperava do grupo de familiares aprender a ter mais equilíbrio
para conviver com ele e buscar ajuda e apoio, pois é o de que mais a família de um
dependente químico necessita.
Durante o primeiro encontro e na entrevista individual, ela se apresentava muito
ansiosa e referiu que se sentia incomodada em trabalhos grupais, pois os depoimentos das
outras pessoas e suas histórias de vida a deixavam triste. Relatou sentir-se muito cansada ao
vivenciar essa problemática da dependência química do filho.
...eu não estou mais vivendo. Eu vivo com medo. Basta ele sair, eu
tenho medo, um medo, medo que eu choro com medo dele vir bêbado
e querer me matar, querer quebrar as coisas. Isso é horrível! Uma
mãe chegar a um ponto de viver com medo de um filho, é triste!
EUNICE (MADRASTA)
Procedente de Boa Viagem-CE, 40 anos, ensino fundamental, em união
consensual, católica. Renda familiar de dois salários mínimos. De sua união consensual,
Eunice teve uma filha, uma de nove anos, fruto de seu relacionamento atual. Seu companheiro
tem uma filha de um relacionamento anterior, esta é criada por Eunice como sendo sua filha.
A garota de 20 anos foi abandonada por sua mãe biológica quando ainda era uma criança,
sendo criada por Eunice desde os dois anos de idade, sua madrasta. Essa garota começou a
utilizar droga, aproximadamente, há quatro anos. .
Hoje ela faz tratamento no CAPS há aproximadamente um ano. Os tipos de
drogas utilizadas por ela no passado foram maconha e crack. Para Eunice, o motivo que levou
sua filha a utilizar drogas foi o trauma psicológico de ter sido abandonada pela sua mãe
verdadeira ainda quando criança, por influência das amizades e por não ter recebido os limites
necessários do pai e dela na qualidade de mãe adotiva.
Essa filha “adotiva” de Eunice, antes de ir fazer acompanhamento no CAPS-ad
ficou internada em uma fazenda para recuperação de dependentes químicos durante uns dois
anos. Ao voltar, procurou o CAPS para dar continuidade ao tratamento.
Eunice e sua filha tinham muita dificuldade de relacionamento, e esse foi um dos
motivos que a levou acompanhar o tratamento da filha no CAPS-ad e principalmente
participar do grupo de familiares.
Essa foi a primeira vez que Eunice acompanhou o tratamento da filha. Para ela, o
importante era que a filha continuasse sem usar drogas e que permanecesse sempre ocupada,
91
trabalhando. Entre as formas de ajuda, Eunice considera que sejam importantes o diálogo, a
ocupação com um trabalho qualquer e uma diversão saudável.
Esperava que o grupo pudesse melhorar seu relacionamento com a filha, que
aprendesse algo e, principalmente, o grupo pudesse ajudá-la a se sentir melhor diante da
problemática da filha e da dificuldade de relacionamento entre mãe e filha.
JANETE (IRMÃ)
Procedente de Fortaleza-CE, 36 anos, possuía o ensino médio; casada e católica.
Renda familiar de um salário e meio. Mora em uma casa que pertence ao seu pai, com seu
marido e duas filhas. Sua profissão é doméstica e somente seu marido possui renda, embora
eles também recebam ajuda de seu pai, que é viúvo. Com a morte da mãe Janete passou a
assumir o papel de mãe para com seus irmãos mais novos, que ela era a filha mais velha da
família, o referencial tanto do pai quanto dos irmãos. Janete assumiu o poder de decisão e
resolução de toda a família. E após o falecimento da mãe, oito anos, um de seus irmãos do
sexo masculino começou a utilizar drogas, ainda adolescente, com 16 anos. Daí então ela
passou a cuidar e proteger seu irmão da dependência química. Trouxe-o para o CAPS-ad em
busca de tratamento e freqüentemente o - acompanhava ao serviço.
As drogas utilizadas pelo irmão de Janete foram álcool, maconha, crack,
anfetaminas e análogos. Para ela, o início desse consumo coincidiu com a morte de sua mãe,
atribuindo a dor da perda como sendo um dos fatores que o levou a utilizar drogas, além de
influência dos pares. Janete revelou que, mesmo com a morte da mãe, eles nunca deixaram de
ter o apoio, amor e carinho de seu pai.
É a primeira vez que ela acompanha seu irmão no tratamento da dependência
química. Sua percepção do irmão era de que este continuava sendo uma criança pequena e
que ela o protegia demais, pois ele jamais poderia sofrer agressões físicas. Passou inclusive a
morar com ela em sua casa, pois o pai morava em uma favela e ela acreditava que o local o
era propício a ele, facilitando ainda mais o contato dele com as drogas, que nesta favela
segundo ela existia tráfico de drogas.
Janete estava lidando com essa situação com imenso cansaço físico e mental;
dizia-se fraca, pois já não tinha mais coragem de resolver os problemas familiares que
surgiram e principalmente livrar o irmão de problemáticas como, por exemplo, o
envolvimento direto com traficantes. Referiu que, quando ele começou a usar drogas, ela
sabia se sair de situações difíceis, como, por exemplo, procurá-lo em locais com alto índice de
consumo e negociar dívidas do irmão com traficante, mas, ultimamente, não, pois procurava
respostas para muitas perguntas na sua vida, mas não as encontrava, que não estava mais
92
sabendo lidar com isso. Referiu que estava dormindo e acordando cansada em decorrência
dessa condição de dependência química de seu irmão.
Após o início do uso de drogas do irmão, passou a ter problemas de saúde, como
comportamento ansioso. Suas duas gravidezes foram de risco e estava se queixando de
momentos de depressão e baixa auto-estima.
Acreditava que, participando do grupo, pudesse ajudar seu irmão a deixar as
drogas e melhorar sua vida, pois certamente o grupo lhe causaria bem-estar, sentindo-se mais
aliviada.
MARIA (IRMÃ)
Procedente de Lavras da Mangabeira-CE, residente em Fortaleza, 38 anos. Possui
nível superior, casada, católica, com renda familiar de quatro salários mínimos. Reside com
seu esposo e filhos. Atualmente está hospedando o irmão que também veio do interior, Lavras
da Mangabeira, em busca de tratamento para seu problema de dependência das drogas.
O irmão de Maria atualmente tem 26 anos e vem consumindo drogas desde os 16
anos, totalizando dez anos de uso. Fez uso no passado de maconha e, desde o final de 2006,
ele passou a utilizar também o crack. Ele afirmou para a família que o motivo que o levou a
utilizar droga foi curiosidade, quando adolescente. Segundo Maria, ela convidou o irmão para
vir para Fortaleza em busca de tratamento, sendo que foi a primeira vez que ele começou uma
terapia, pois ele jamais havia pensado em deixar de consumir drogas, que, quando
consumia apenas a maconha, ele ficava sonolento, desligado do mundo, e, após introduzir o
crack em sua rotina de uso, misturando-o com a maconha, passou a se comportar com
agressividade, dormir fora de casa e estando mais distante de sua família.
Maria refere que sempre dialogou com o irmão e que procurou intermediar os
desentendimentos dele com a sua mãe. Vejamos o que diz:
Eu sempre procurei lidar assim, conversando com ele, mostrando,
pedindo pra ele deixar, porque é a única forma que eu tinha de agir,
porque nunca deixamos de conversar, nunca ele foi colocado fora de
casa. A minha mãe me falava sempre tudo que ela sentia ou que ele
fazia com ela. Ele sempre se desentendia, mas porque também
convivia mais com ela. sempre ela me chamava pra conversar com
ele. Tudo eu sempre fui a pessoa que intermediava. Não morava
dentro de casa com eles, mas sempre era quem apaziguava.
Ao relatar sobre seus sentimentos, Maria expressou medo do amanhã, referindo-se
a possíveis recaídas do irmão, sentia-se insegura.
Compreende que uma das formas de ajudá-lo é fazendo com que ele possa se
afirmar, trabalhar sua liberdade, mas, com responsabilidades, impondo limites. Relatou que
93
era necessário estar sempre disposta a ouví-lo, quando necessário. Ao indagar sobre suas
expectativas quanto ao grupo, referiu que esperava encontrar apoio no grupo de familiares.
NARA (ESPOSA)
Procedente de Caridade-CE, 25 anos. Possui o ensino fundamental incompleto,
estado civil solteira, porém em união consensual, evangélica. Trabalhadora informal, possui
renda familiar aproximada de dois salários mínimos. De sua união consensual, foi gerada uma
criança que mora juntamente com ela e seu companheiro, que é dependente de drogas.
Nara referiu que seu companheiro é usuário de drogas desde a adolescência,
começando o uso com álcool, fumo e maconha. Posteriormente, introduziu cocaína e
atualmente ele vem utilizando álcool, fumo, maconha e crack. Nara conheceu seu
companheiro uns cinco anos e não sabe direito o que o motivou a consumir drogas, porém
ele falou para ela que foi por causa da separação de seus pais, que ocorreu quando ele ainda
era criança. Por conta dessa separação, ela observa que ele cresceu revoltado com essa
condição de pais separados.
É a terceira vez que ela acompanha seu companheiro em tratamento para
dependência química. Tanto a primeira como a segunda foram internações em hospital
psiquiátrico, com espaço para tratar usuários de drogas. Ela refere que esse vício dele só tem
trazido desprazeres para sua vida, pois, segundo Nara, ela gosta muito dele, mas não sabe até
quando agüentará essa situação, pois tem vivido em função dele, trabalhando como vendedora
ambulante para cobrir as despesas de casa, as despesas dele com as drogas, as quais não são
pequenas, além de serem extremamente imprevisíveis. Cuida de casa, do filho e jamais sobra
tempo para ela. Ele trabalhava como cobrador de ônibus, porém foi afastado do cargo por
suspeita de roubo. Realiza acompanhamento no CAPS, mas tem dificuldades de aderência ao
tratamento.
Nara mostra-se inconformada com a condição de vida de seu companheiro, não
aceita nem entende por que ele optou por essa vida. Para ela essa é uma vida sem futuro e sem
sentido. O fato de Nara gostar muito dele e ter se envolvido muito com sua problemática é
que a faz buscar tentativas para ajudá-lo, mas tem vergonha de ter que conviver com uma
pessoa assim. Sente angústia e insônia; quando ele usa droga, ela sente raiva, nojo, mas
quando não, ela se sente bem com ele. Nara acredita que sua melhor forma de ajudá-lo é:
“agüentando as coisas dele, relevando muitas coisas...”. Entre outras formas de ajuda, ela
acredita no apoio da família e na própria vontade dele em deixar de consumir. Ela espera que
o grupo melhore sua auto-estima e seu bem-estar, pois sua vida se resume a cuidar do
companheiro dependente.
94
HELENA (MÃE)
Procedente de Petrópolis-RJ, 51 anos, atualmente reside em Fortaleza-CE. Ensino
médio completo, viúva, evangélica, com renda familiar de aproximadamente dois salários
mínimos e meio, fruto de um emprego público federal, onde desempenha a função de auxiliar
de nutrição em uma cozinha de um hospital público federal. Após o falecimento de seu
esposo, Helena conheceu uma pessoa com quem teve um relacionamento durante vinte e dois
anos, tendo tido um filho deste.
O filho de Helena tem 17 anos, fruto de seu último relacionamento. Hoje vive nas
ruas e é usuário de drogas mais de quatro anos, entre elas: solventes, maconha e crack.
Helena atribui o uso de droga a sua separação com o pai de seu filho e às amizades do
adolescente como um dos motivos que o levaram a consumir drogas. Após a separação, ela
passou a trabalhar durante os turnos da tarde e da noite, e seu filho ficou muito largado, sem
apoio nem orientação. Ele começou a ter amizades que ela não conhecia. A mãe acredita que
ele recebeu influências dessas pessoas, inclusive para consumir drogas.
Quando indagamos se era a primeira vez que ela o estava acompanhando no
tratamento, ela referiu que não, pois ele havia sido internado em vários locais, entre eles:
um hospital psiquiátrico particular em convênio com o SUS, um hospital psiquiátrico público
e em casas de amparo ao adolescente usuário de drogas; porém, em nenhuma dessas vezes, ele
teve sucesso, e que estava fazendo tratamento no CAPS-ad, mas permanecia com dificuldades
de aderência ao plano terapêutico.
Helena referiu que, quando o filho quer usar droga, fica agitado, agressivo,
querendo conseguir a droga a qualquer preço, inclusive chega a roubar pertences e dinheiro de
estranhos, de pessoas da família, inclusive dela e do pai. Ele fica extremamente agressivo, ao
ponto que querer bater nela. Ela em sua fala comparou-o com um bicho”; no início, ela
ficava com medo, mas agora já o enfrenta. Helena fez a seguinte afirmação:
Eu vejo ele diferente, é como um bicho, agressivo, e eu tinha medo na
hora, mas agora, graças a Deus, eu já vou em cima, eu já enfrento...
Para ela enfrentar o filho, é necessário agredi-lo fisicamente com uma corda que
mantém constantemente guardada em sua bolsa. Essa situação é péssima para Helena, pois
referiu que vem sofrendo há muito tempo, sem falar que em sua família não existe nenhuma
pessoa consumindo drogas. Sente-se só, sem apoio das pessoas da família e principalmente do
pai dele, que não a apóia diante da forma como ela age com o filho, pois o filho do casal mora
na rua e a mãe vai deixar comida para ele diariamente, cuida de suas roupas, além de levá-lo
para o CAPS-ad. Seu ex-companheiro quer que ela deixe de procurá-lo, porém ela tem
95
dúvidas diante de suas atitudes com o filho usuário de drogas, se estão certas ou não. A
participante referiu que:
O pai se cansou, e ele não quer que eu leve comida pra ele, quer que
eu deixe ele com fome, que é pra ele voltar pra casa, e eu digo: se ele
ficar com fome vai ser pior; e eu acho errado, não sei se eu estou
certa, não sei se estou errada, tenho dúvidas.
Referiu que está muito cansada com essa condição do filho, vem perdendo peso e
não se alimenta direito; tem pena dele, gostaria de mudar sua condição de vida e não pode.
Ela não tem mais lazer nem vida social. As coisas que lhe dão prazer são seu trabalho e ir à
igreja. Relatou não ter mais gosto por nada e tudo isso por conta da dependência química do
filho.
não sabe mais como poderá ajudar o filho. Acha que a ajuda do pai dele era
importante, mas, como não pode contar, ela acredita que mais uma internação talvez fosse
útil, porém seu filho não aceita.
Ao indagar o que ela esperava desse grupo de familiares, Helena relatou que
almejava ser ouvida e melhorar com o grupo, pois, além de ser um ambiente onde ela pudesse
desenvolver mais força a fim de ajudar o filho, e viver mais feliz, principalmente por ser o
grupo um local onde ela jamais sofreria preconceitos.
SANDRA (MÃE)
Procedente da cidade de Santana do Acaraú-CE, 42 anos, nível superior, casada e
católica. Renda familiar aproximada de nove salários mínimos. Sua profissão atual é
doméstica e somente o esposo está trabalhando fora.
Sandra possui dois filhos, sendo um menino de 11 anos e um rapaz de 23. Esse
rapaz vem consumindo drogas desde a adolescência, há aproximadamente sete anos, ou seja, a
informante acredita que o uso se iniciou aos 17 anos, tendo como motivo o fato de começar a
sair e se envolver com más companhias e com o término de um namoro do início da
adolescência.
Sandra revelou que o sabia durante todo esse tempo que seu filho utilizava
drogas. soube poucos meses atrás, inclusive não sabia nem mesmo que tipo de drogas
ele usava. E foi pelo psiquiatra que ficou sabendo que a escolha do filho eram as drogas:
álcool, maconha, crack e mesclado, ou seja, uma mistura de maconha e crack.
É a primeira vez que acompanha seu filho no tratamento para dependência
química.
96
Ao falar do filho, Sandra revelou que este, após o início do consumo de drogas, se
tornou triste, deprimido, descontrolado e irritado com tudo e todos. Sandra referiu que às
vezes também se sente triste, deprimida e insegura diante dessa condição do filho. Relatou:
Eu também me sinto, a maioria da vezes, muito deprimida e insegura,
porque muitas vezes eu não sei como lidar com essa situação,
gostaria de ser, assim, uma fada madrinha para poder tocar e tudo
acabar de repente, que a gente voltasse a ter uma vida normal...
Ela compreende que pode ajudá-lo da forma como ela o ajuda, ou seja,
acompanhando-o até o CAPS-ad, comprando os remédios prescritos pelo psiquiatra, dando-
lhe alimento e acomodação tranqüila e confortável, pagando um bom colégio para ele, no
caso, um preparatório para vestibulares e, por fim, tentando arranjar-lhe um emprego. Entre
outras formas de ajuda, ela acredita que o lazer em família poderia ser importante.
Do grupo de familiares, Sandra espera encontrar ajuda para que possa ajudar o
filho, como também para que melhore a auto-estima e o humor, pois vem se sentindo muito
entristecida e se denomina de “depressiva”.
Ao final da entrevista, Sandra nos pediu esclarecimento quanto ao tratamento do
filho com relação a sua freqüência semanal ao serviço, de quais tipos de atividades e
acompanhamento terapêutico ele participava e com quem.
ANDRÉIA (MÃE)
Procedente de Fortaleza-CE, 64 anos de idade, com baixo grau de instrução,
apenas ensino fundamental incompleto, casada, evangélica, renda familiar de dois salários
mínimos e meio. É mãe de um rapaz com 35 anos, usuário de drogas desde a adolescência.
Iniciou aproximadamente com 15 anos de idade. É homossexual e portador do vírus HIV. As
drogas utilizadas por ele são: álcool, maconha, cocaína e crack, mas atualmente vinha
utilizando somente o crack e a maconha.
Andréia acredita que o motivo que levou seu filho a consumir drogas foi o
constante constrangimento pela sua escolha sexual. Ela acredita que ele se sentia discriminado
pela família e sociedade, porém garante que, da parte deles, familiares, nunca houve
discriminação, principalmente dela, mãe. Ela acredita que tudo isso tenha contribuído para ele
ir buscar refúgio nas drogas. Hoje ele é portador do vírus HIV e Andréia acredita que essa
contaminação pelo vírus tenha ocorrido após algum tempo de consumo de drogas, entre elas,
cocaína injetável, aproximadamente em 1997 quando foi diagnosticado.
Para Andréia, a escolha sexual de seu filho não era encarada como uma coisa fácil
para ele. Em sua fala ela menciona sobre essa dificuldade, relatando que
97
...eu acho que a vida dessas pessoas não é fácil. a gente sendo
homem e mulher é uma vida difícil de ser feliz, quanto mais uma coisa
que a gente vê que é errada. E que não é aceita.
Mesmo tendo deixado claro que ela não o discriminava, percebemos em sua fala
certo preconceito ao referir que essa é uma prática errada.
É a primeira vez que ela acompanha o tratamento de um dependente químico,
relatando que tem percebido que esse consumo de drogas o deixou deprimido, triste, pois foi
ele mesmo que pediu para que ela o ajudasse a se recuperar, pois ele o agüentava essa
oscilação de humor e essa falsa alegria proporcionada pelas drogas.
Andréia referiu que vem procurando ajudá-lo a sair desse vício, tendo paciência
com ele, mas fazendo com que ele tenha responsabilidade para com seu tratamento. Relatou
que o filho está avisado de que se não deixar de consumir drogas, ela e o pai não vão mais
aceitá-lo em casa e ele será expulso do ambiente familiar. Vejamos sua fala:
E eu sempre dizendo pra ele: tu botas na tua cabeça que eu estou te
dando uma oportunidade.
Entre outras formas de ajuda, Andréia considera importante que a família tivesse
condição financeira que pudesse levá-lo para outros locais, ou seja, ambientes diferentes, onde
ele não tivesse facilidade de encontrar pessoas que consomem drogas.
Relatou que esperava que o grupo de familiares ajudasse a melhorar sua auto-
estima, entender algumas coisas e se sentir forte.
6.1 Análise das características dos participantes do grupo de familiares
Nesse momento, realizaremos breve análise das informações obtidas com os
familiares participantes do grupo por meio da entrevista individual, tendo sido
complementadas com anotações realizadas no diário de campo e na leitura exaustiva das
expressões verbais no decorrer dos encontros grupais.
Conforme apresentado anteriormente, o grupo de familiares foi composto por
pessoas com características socioeconômicas e demográficas bastante heterogêneas, mas com
aspectos particulares de suas vidas bem próximos.
A maioria dos participantes era procedente da Capital e todos residiam em
Fortaleza-CE, em bairros de abrangência do CAPS-ad da Secretaria Executiva Regional III,
local onde foi desenvolvida a pesquisa. Uma das coisas que nos chamou a atenção foi o fato
de um dos participantes com residência fixa na Capital, mas procedente do interior do Estado,
98
ter trazido o irmão para fazer tratamento em Fortaleza por o existir nenhum local
especializado mais próximo da casa dele, ou mesmo em cidades vizinhas.
Assim como esse paciente, pode haver muitos outros nessa condição de não ter
fácil acesso ao tratamento. Isso nos permite afirmar que ainda é pequena a rede de serviços
especializados na assistência ao dependente químico.
Quanto à idade, dez participantes tinham a faixa etária de 25 a 60 anos, apenas
uma participante do sexo feminino tinha mais de 60 anos. Desse modo, o grupo de familiares
foi composto de pessoas adultas, predominantemente do sexo feminino, sendo dez mulheres e
apenas um homem. Isso talvez seja explicado pela nossa cultura, pois na maioria das vezes, a
mulher é responsável por cuidar da casa e da saúde dos integrantes da família. Essa cultura é
passada de geração em geração, sem contar que são as mulheres que procuram mais
assistência nos serviços de saúde.
Destacamos, entretanto, a idéia de que a co-dependência não é algo vivenciado
somente por pessoas do sexo feminino, pois, segundo Humberg (2003), embora as mulheres,
mais do que os homens, sejam treinadas para atender os outros e focando sua energia na
capacidade de cuidar, a co-dependência não se restringe somente a elas.
Com relação ao parentesco, o grupo foi composto por parentes como: mães,
irmãs, irmão, madrasta e esposa, os quais conviviam diretamente com o dependente químico.
A proximidade da relação justifica a condição de cuidadores e/ou de responsáveis, mais
diretos, pelo parente usuário de drogas psicoativas.
Humberg (2003), ao assistir familiares de dependentes químicos, observou que
eles necessitam tanto de auxílio quanto os usuários.
Entre os pesquisados, aqueles que estiveram mais presentes foram as mães (Ana,
Adriana, Sandra e Andréia), reforçando a dimensão do papel materno e o seu desdobramento
no cuidar humano.
Outro aspecto levantado foi a condição de religiosidade, evidenciando-se que o
grupo foi constituído por católicos e evangélicos, em proporções equivalentes. Muitos dos
participantes declararam em suas falas o seu sentimento de e esperança em Deus na
recuperação de seus membros familiares. Vale ressaltar, porém, que a recaída dos
dependentes químicos é um fator que torna os cuidadores extremamente revoltados e sem
esperança, até mesmo com o ser superior, “Deus”.
Para Rigotto e Gomes (2002), a experiência da recaída em usuários de droga está
associada a situações como: falta de apoio familiar, falta de comportamento apropriado,
99
envolvimento com antigos amigos usuários, uso de bebidas alcoólicas, necessidade de
aprovação social e frustrações diante de circunstâncias adversas.
Quanto ao grau de instrução, cinco participantes têm nível superior, dois nível
médio e quatro ensino fundamental. Mesmo que o grupo tenha sido heterogêneo quanto ao
nível de escolaridade, o constatamos obstáculos na realização dos grupos e na participação
dos sujeitos estudados, acreditamos que o fato de estarem vivenciando a mesma dor com
relação a dependência química de seus parentes os aproximou e as diferenças não se
mostraram.
O estado civil dos participantes também foi heterogêneo, apresentando: quatro
casados, três viúvos, uma separada, um solteiro e duas em união consensual.
Quanto à condição econômica, a maioria dos participantes do grupo tem renda
familiar de mais de dois salários mínimos, assim distribuídos: duas com até dois salários,
cinco de dois a cinco salários mínimos e quatro de cinco ou mais salários.
Com esses dados, reforçamos a idéia de Lobosque (2001), quando ela explicita
que a droga está transitando por todas as classes sociais. Galduróz, Noto, Fonseca e Carline
(2005) concordam com essa idéia, pois referem que o uso de drogas não é exclusividade de
determinada classe socioeconômica, distribuindo-se regulamente por todas elas. Portanto, as
campanhas preventivas não precisam se preocupar apenas com determinados segmentos
populacionais, mas devem dar atenção a todos sem distinção.
Quanto aos sentimentos relativos à condição de dependência química de seu
familiar, os participantes mostraram-se tristes, angustiados, alguns já desenvolvendo sintomas
depressivos e de ansiedade, principalmente chegando numa fase de não-aceitação do membro
familiar usuário. Percebe-se em suas falas e expressões a presença de sinais de cansaço e
esgotamento físico e mental. Entre os sentimentos apreendidos destacamos a culpa de alguns
dos participantes por tudo o que vem acontecendo com o familiar dependente químico,
presente, principalmente, entre as mães do grupo pesquisado.
Beattie (2007) refere serem essas características progressivas que aparecem nos
últimos estádios da co-dependência, em que o co-dependente tende a começar a perder as
esperanças e planejar o afastamento do relacionamento ao qual se sente aprisionado.
Dos 11 participantes, sete referiram ser a primeira vez que acompanham seu
parente em um tratamento para dependência química e apenas quatro já haviam participado de
outros tipos de assistência com seus parentes em outros locais. O tratamento mais freqüente
foi em hospitais psiquiátricos, o que reforça a afirmação de que faltam servos especializados
100
para atendimento do dependente químico, estando essa condição, muitas vezes, à margem de
uma abordagem inadequada, ineficiente, preconceituosa e estigmatizadora.
Em relação às formas de ajuda que o participante considera importante para seu
familiar em tratamento, a mudança de amizades, a imposição de limites, o amor e o carinho
são fatores importantes descritos por todos.
Outro fator citado é a co-participação junto ao dependente químico no tratamento,
significando dizer que o ideal seria manter o usuário ativo em seu plano terapêutico no CAPS-
ad e o familiar estar sempre por perto, dando assistência; entretanto, observamos que esse
“estar-junto”, muitas vezes, se reverte em controle, vigilância, desconfiança, traduzindo-se em
uma relação de co-dependência expressa em um cuidado excessivo e controlador. Humberg
(2003) faz alusão a essa compulsão de cuidar e controlar o outro, associando ao conceito de
co-dependência, ficando evidente nesse tipo de família a presença de cuidadores compulsivos.
A atenção, o diálogo e a escuta sensível são necessários por parte daqueles que
mais convivem ou cuidam do dependente químico, especialmente dos familiares mais
próximos, e, aliado a todos esses fatores, encontra-se aquele primordial, o apoio familiar.
É válido ressaltar, porém, que muitos têm dificuldade em interpretar e pôr em
prática o que elegemos como sendo apoio familiar, pois confundem esse apoio como sendo a
permissão de repetitivas atitudes em função das drogas que chegam a prejudicar,
freqüentemente, pessoas da família e de fora dela. É “vista grossa”, encobrindo erros e
aparando arestas. Acreditamos que esse tipo de comportamento não é saudável para a relação
familiar e, principalmente, para a recuperação do dependente químico.
Referente às expectativas, os participantes da pesquisa, por unanimidade,
esperavam que o grupo fosse importante para transmitir apoio e suporte emocional, pois,
mediante os encontros, o grupo poderia ajudar cada componente familiar a se fortalecer,
melhorando sua auto-estima e bem-estar e, conseqüentemente, aprendendo a buscar equilíbrio
para uma melhor convivência com o usuário e com a própria condição de dependência
química. Essa expectativa foi atingida e fomos comprovando a medida que o grupo ocorria.
Esse aspecto será visualizado mais claramente no capitulo referente ao processo grupal.
101
6.2 Análise das características dos familiares dependentes químicos dos participantes do
grupo
Relativamente à percepção dos familiares participantes do grupo para com os
dependentes químicos, indagamos sobre o motivo que eles achavam haver levado seu parente
a utilizar drogas. Os mais citados foram: perda de figura paterna ou materna, por morte ou
separação dos pais; falta de limites; influência de amizades, acompanhada de intensa
curiosidade, fato comum na adolescência, já que todos os dependentes químicos parentes dos
participantes da pesquisa iniciaram o consumo nessa fase de vida.
De acordo com o V Levantamento Nacional sobre o Consumo de Drogas
Psicotrópicas entre Estudantes do Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública de Ensino,
realizado nas 27 capitais brasileiras, o uso de drogas na faixa etária de dez a 12 anos é
expressivo, com um percentual de 12,7%, do total de estudantes dessa faixa etária
(GALDURÓZ; NOTO; FONSECA; CARLINE, 2005).
Conforme o grupo pesquisado, todos os familiares dependentes químicos
iniciaram o uso de drogas ainda adolescentes, fase marcada por necessidade de afirmação,
aceitação por si e pelos pares, incertezas e curiosidade. Tiba (1994) faz referência a esses
sentimentos na vida do adolescente como sendo aqueles que podem contribuir para o uso de
droga. A insegurança, o medo de ser rejeitado, a necessidade de ser aprovado e de se afirmar
perante os amigos ou querer se mostrar mais do que realmente é, são fatores que podem
contribuir para o consumo de drogas.
A adolescência, de fato, constitui um período crucial no ciclo vital para o início do
uso de drogas, seja como mera experimentação, seja como consumo ocasional, indevido ou
abusivo (SCHENKER; MINAYO; 2005).
Somos sabedores do papel da família na prevenção e na promoção da resiliência,
embora apresente muitas deficiências, e como instituição, não é perfeita, mas é a célula mater
responsável pela socialização dos indivíduos.
Quanto aos fatores de risco e proteção para o uso de drogas, todavia, a
problemática não se reduz ao contexto familiar, pois o adolescente está inserido numa rede de
relações, vive no contexto sociocultural e histórico, mas as famílias têm papel primordial no
trato com seus filhos, por isso são necessárias práticas de orientação familiar. Para Galduróz,
Noto, Fonseca e Carline (2005), o relacionamento efetivo com os pais parece ser um dos
fatores responsável pela proteção do não-uso de álcool e outras drogas, principalmente o
consumo exacerbado.
102
Quanto às drogas utilizadas pelos familiares dos participantes do grupo, aquela
que apareceu como sendo a mais consumida foi o crack (cocaína fumada), vindo em seguida
álcool e maconha, fumo, anfetaminas, solventes, e, por último, cocaína (uso nasal e
endovenoso). Estes dados são preocupantes, pois o consumo de crack vem aumentando,
sendo evidenciado não em nossa pesquisa, mas, também, em vários outros estudos.
Diariamente, os media mostram também o crescimento do consumo dessa droga. O que é
mais agravante é o grande potencial para desenvolver dependência, tornando o usuário apto a
conseguir a droga a qualquer custo, inclusive com atos de violência.
Pelo fato de o crack ser mais barato do que a cocaína em pó, de ter uma absorção
mais rápida e mais efetiva, mesmo do que a via endovenosa, essa droga tem um potencial de
dependência muito maior do que qualquer outra usada no mundo; e, por ser um potencial
estimulante, além de o seu efeito durar somente alguns minutos, o usuário de crack costuma
tentar obter uma fonte constante da droga a qualquer custo, tornando-se mais fácil seu
envolvimento com o tráfico, criminalidade e outras complicações sociais (LARANJEIRA;
DUNN; RASSI; MITSUSHIRO; FERNANDES, 1998).
o álcool e o fumo foram relatados como as primeiras drogas experimentadas
por esses adolescentes ao iniciarem seu contato com substâncias psicoativas, seguido da
maconha, anfetaminas, solventes e, por último, crack e cocaína em pó.
Sobre o consumo dessas drogas lícitas, álcool e fumo, a literatura mostra que
apenas 10 a 15% da população geral não faz uso de álcool, inscrito milenarmente na
cultura. Entre 50 e 60% usam bebidas alcoólicas de modo não prejudicial à saúde e
ao bem-estar social, mas podem eventualmente fazer uso de maneira nociva. E em
torno de um terço da população apresenta problemas, de maior ou menor gravidade,
com o uso de bebidas alcoólicas, entre os quais 10% da população total apresentam
sinais de dependência. (BRASIL, 2004, p. 126).
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2001), cerca de 10% das
populações dos centros urbanos de todo o mundo consomem abusivamente substâncias
psicoativas, independentemente da idade, sexo, nível de instrução e poder aquisitivo. A
despeito do uso de substâncias psicoativas de caráter ilícito, considerando-se qualquer faixa
etária, o uso indevido de álcool e tabaco tem a maior prevalência global, trazendo, também, as
mais graves conseqüências para a saúde pública mundial.
Brevemente realizamos um apanhado geral das características dos dependentes
químicos familiares dos participantes do grupo, suscitando principalmente o motivo que os
levou a consumir drogas e quais são essas substâncias mais consumidas em suas vidas. A
seguir, passaremos para o próximo capítulo de análise, onde descrevemos e apresentamos,
detalhadamente, cada sessão grupal.
103
Sessões Grupais: descrição e exibição
Sessões Grupais: descrição e exibição Sessões Grupais: descrição e exibição
Sessões Grupais: descrição e exibição
das fases
das fasesdas fases
das fases
104
7
77
7 Sessões Grupais: descrição e exibição d
Sessões Grupais: descrição e exibição d Sessões Grupais: descrição e exibição d
Sessões Grupais: descrição e exibição das fases
as fases as fases
as fases
Nesse momento começaremos a descrição das sessões grupais, tentando fazer com
que o leitor entenda por meio de nossa descrição como ocorreram os encontros.
Mostramos no Quadro 2 - Demonstrativo da fase de produção dos dados
(Apêndice G), que o processo grupal inclui desde o planejamento até a avaliação de todas as
sessões realizadas no estudo, descrevendo todo o nosso percurso, e, na seqüência, cada sessão
separadamente, apresentando os seus dados produzidos e possíveis análises.
Desde o Quadro 2, desenvolvemos a análise de cada sessão, agrupadas nos
seguintes tópicos: Fase de planejamento Objetivos do grupo (Primeiro Encontro para
apresentação e Segundo Encontro para entrevista individual); Fase de Intervenção
Estrutura do grupo (Sessão Preparatória); Fase de Intervenção Processo do grupo (Sessões
I, II, III, IV, V e VI) e Fase de Avaliação Resultados do grupo (Sessões VII e VIII). Todo
este processo foi realizado em um encontro grupal geral; um encontro individual e nove
sessões grupais.
Para melhor compreensão de cada momento do processo grupal, desmembramos o
Quadro 2 (Apêndice G) em vários outros, apresentados individualmente em cada sessão,
analisando-se as informações contidas, como segue.
7.1 Fase de planejamento –
Objetivos do grupo
A fase de planejamento corresponde à etapa na qual se identificam necessidades e
as expectativas dos participantes, traçando-se objetivos e metas a serem atingidos, sendo
considerado um momento importante para o planejamento do processo grupal (LOOMIS,
1979).
Essa avaliação das necessidades do cliente deve ser ajustada a uma das categorias
descritas por Loomis (1979), entre as quais apoio, realizar tarefas, socialização, aprender
mudanças de comportamento, treinar relações humanas e psicoterapia introspecção e
mudança de comportamento.
Nesta fase, é importante que os objetivos do enfermeiro coordenador do grupo
estejam relacionados com as necessidades dos clientes e estas devem se vincular aos objetivos
dos tipos de grupos.
105
Nesse momento da fase de planejamento, é papel do coordenador principal do
grupo promover o primeiro contato com os possíveis participantes, iniciando o vínculo
indispensável à relação de confiança, assim como transmitir motivação para a inserção no
grupo, principalmente quando os participantes e o coordenador do grupo são estranhos uns
aos outros.
Consideramos que a fase inicial de planejamento do trabalho desenvolvido foi
fundamental para a efetividade do grupo, no que diz respeito, tanto à identificação das
necessidades a serem satisfeitas no grupo, como para esclarecimentos sobre a proposta da
intervenção grupal. Percebemos que essa etapa foi importante para o alcance dos objetivos
elaborados para o estudo.
No ensaio em foco o grupo foi do tipo apoio/suporte, tendo como objetivo
primário oferecer apoio emocional aos parentes dos usuários de drogas. Observamos, porém,
que, à medida que aumentava a coesão grupal, ele foi estabelecendo como objetivo secundário
promover a terapia entre os participantes.
A seguir, apresentaremos o Quadro 3, que esboça os aspectos referentes à fase de
planejamento com o grupo de componentes familiares de dependentes químicos.
Quadro 3 Demonstrativo da fase de planejamento do grupo de familiares de
dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
18/06/07
a
22/06/07
Fase de
planejamento
(objetivos)
- Realização do encontro com
os prováveis participantes do
grupo com:
- Apresentação das coordenadora
principal e auxiliar.
- Apresentação dos participantes.
- Apresentação dos objetivos da
pesquisa.
- Realização das entrevistas
individuais antes da inserção no
grupo com uma sondagem das
expectativas.
- Esclarecimento e assinatura do
Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido
- Agendamento da sessão
preparatória.
- Exposição
dialogada e
participativa.
* “Técnica Galeria de
Artes”.
- Entrevista
individual.
- Estabeleceu o
primeiro contato
entre coordenadoras
do grupo e
participantes.
- Identificou quais as
necessidades dos
familiares
participantes a fim de
formular os objetivos
e metas para o grupo.
- Iniciou o
planejamento das
sessões posteriores a
partir dos objetivos e
metas formulados
para o grupo.
Fonte: elaborado pela autora.
106
7.1.1 Primeiro encontro com os componentes familiares – apresentação
Para a constituição do grupo, contatamos 15 famílias de dependentes químicos
assistidos pelo CAPS-ad, das quais compareceram 16 membros. Entramos em contato com
essas famílias mediante informações contidas nos prontuários.
O encontro estava programado para iniciar às 13h30min, porém, a partir de 13h as
pessoas foram chegando até às 14h e, como esse foi nosso primeiro encontro, esses atrasos
foram permitidos. As pessoas foram chegando e acomodando-se na sala reservada para o
acolhimento do grupo. Eram nítidos os olhares apreensivos e, para alguns deles, a pressa para
que o encontro terminasse, quando nem mesmo havia iniciado. Parecia-nos que as pessoas
estavam com receio de se expor e falar de algo o complexo quanto a dependência química
de um parente, como se esta situação não fosse comum aos presentes.
Compreendemos que na fase inicial do grupo as apresentações são formais e os
momentos de silêncio são comuns. A incerteza acerca do que acontecerá, a emergência do
novo, pode provocar ansiedade, comum no primeiro contato.
Iniciamos o encontro com a apresentação das coordenadoras: a principal (a
pesquisadora) e a coordenadora auxiliar (terapeuta ocupacional do serviço). Após a nossa
apresentação, solicitamos aos participantes que se apresentassem mediante a técnica "Galeria
das Artes". Nela eles escolheram uma figura que tinha alguma coisa relacionada consigo, que
lembrasse algo, chamasse a atenção pela expressão que era passada ou simplesmente que
representasse o motivo de ter vindo para esse encontro. Essa "Galeria de Artes" foi criada e
representada por meio de diversas figuras espalhadas pelo centro da sala. Posteriormente,
todos os participantes, após terem escolhido sua figura, se apresentaram. Consideramos que
não foi somente uma apresentação, mas um momento que ensejou muitos sentimentos,
ansiedades, importantíssimo para selar o primeiro contato, além de identificar as necessidades
dos clientes e suas expectativas.
Esse encontro teve como objetivo estabelecer o primeiro contato entre
coordenadora e sujeitos da pesquisa. Foi um momento em que nos apresentamos; falamos da
pesquisa e de nossos objetivos na qualidade de pesquisadora. Expomos nossa proposta de
trabalho, agendando um próximo encontro para o ato da entrevista individual.
7.1.2 Segundo encontro – a entrevista individual
A entrevista individual permitiu manter um contato mais próximo com os parentes
dos usuários do serviço, além de conhecer os possíveis participantes do grupo, identificando
suas necessidades para formulação dos objetivos e metas para o grupo. Identificamos as
107
necessidades de apoio/suporte entre os participantes entrevistados. Estes objetivos foram
validados com todos os familiares participantes, no ato da sessão preparatória.
Fizemos a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice B),
atentamos para o caráter voluntário na participação grupal e, consequentemente, na pesquisa.
As pessoas que concordaram em participar do estudo assinaram o Termo e em seguida
receberam uma via contendo os números de telefones, caso houvesse necessidade de nos
comunicarmos. Ao final da entrevista individual, agendamos nosso próximo encontro, que foi
a sessão preparatória.
7.2 Fase de intervenção – Estrutura e processo do grupo
A etapa de estrutura do grupo faz parte da fase de intervenção grupal. Loomis
(1979) cita os seguintes parâmetros para a descrição da estrutura do grupo: tipos de clientes,
nível de prevenção, grau de estrutura, orientação teórica, orientação de introspecção e
variáveis físicas.
Na fase de intervenção grupal, foram traçados os aspectos relacionados à
estruturação do grupo como: seleção de clientes, organização física, tempo, tamanho do
grupo, espaço e ambiente e preparação dos integrantes para o grupo. Loomis (1979) afirma
que a própria estrutura do grupo pode ser usada para definir o tipo de grupo que se pretende
trabalhar.
Todos esses aspectos foram discutidos e definidos entre os participantes,
coordenadora principal e auxiliar, chegando-se a um consenso. Vale ressaltar que esse grupo,
desde o seu início, tornou-se um ambiente permeado por uma atmosfera de acolhimento que
possibilitou igualitariamente a comunicação e o diálogo entre todos.
Foram definidas as regras e normas para a convivência grupal durante o tempo de
funcionamento, por meio do estabelecimento do Contrato de Trabalho ou Contrato de
Cuidados à Saúde (Apêndice C) e as Regras de Convivência Grupal Saudável (Apêndice D).
Nesse grupo de parentes de dependentes químicos procuramos atingir os objetivos
e metas tanto pelo caminho do conteúdo, como do processo.
7.2.1 Sessão preparatória – estrutura do grupo
A seguir, apresentamos o Quadro 4, referente ao planejamento da sessão
preparatória da fase intervenção do grupo de familiares de dependentes químicos. Após a
apresentação do quadro, começaremos a descrição da sessão grupal, respeitando seus três
momentos: acolhimento, desenvolvimento e avaliação.
108
Quadro 4 - Demonstrativo da sessão preparatória da fase de intervenção estrutura, do
grupo de familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
25/06/07
13h30min as
16h00min
Sessão
preparatória
Fase de
intervenção
(Estrutura)
- Sessão preparatória.
*Apresentação dos participantes.
*Discussão e esclarecimento das
necessidades dos clientes
participantes, objetivos e metas
do grupo e da coordenadora da
pesquisa.
*Continuação da sondagem das
expectativas do grupo.
*Compartilhamento e
esclarecimento de aspectos
funcionais do grupo, como:
objetivos, estrutura, processo e
resultados.
*Discussão e estabelecimento
das regras de convivência grupal
saudável.
- Assinatura do contrato de
cuidado de saúde/contrato de
trabalho.
- Agendamento das sessões
grupais posteriores.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa;
- Técnica “Partilha
em dupla”.
- Técnica de
relaxamento:
“Respiração”.
- Técnica: “Liberação
dos sentimentos”.
- Proporcionou aos
participantes
conhecerem melhor
uns aos outros.
- Promoveu o
compartilhamento de
sentimentos com
vistas ao processo de
apoio/suporte e
coesão grupal.
- Promoveu a
interação dos
membros do grupo.
- Preparou os
familiares para
iniciarem sua
participação no
grupo, contribuindo
para a efetivação dos
resultados da
intervenção grupal.
- Começou o
processo de
identificação dos
sentimentos dos
participantes, a fim
de visualizar como a
co-dependência se
expressa.
- Firmou contrato de
trabalho e regras de
convivência grupal
saudável entre os
participantes do
grupo e as
coordenadoras.
Fonte: elaborado pela autora.
Loomis (1979) refere sobre a importância da preparação dos participantes como
forma de efetivação dos resultados da intervenção grupal. Essa sessão foi realizada com este
objetivo, embora tivéssemos quase a certeza de que seria um grupo de apoio-suporte, pelas
necessidades antes percebidas, durante os encontros passados.
Consideramos que essa sessão foi uma das mais importantes para o
desenvolvimento do grupo como um todo e suas futuras configurações.
Contávamos com a presença de 11 familiares, porém compareceram seis
(Andréia, Janete, Eunice, Ana, Maria, Vicente). Ainda no encontro da entrevista individual,
alguns dos familiares faltosos avisaram que não poderiam vir à sessão preparatória por
109
motivos pessoais, planejados antes de marcamos esse encontro, mas que estariam presentes às
próximas sessões.
Preparamos a sala antecipadamente e, aos poucos, as pessoas começaram a
chegar. Estava, particularmente, um pouco ansiosa, talvez por ser o início de mais uma fase da
pesquisa. Nestas horas, é difícil separar nossos sentimentos. Comentamos sobre nossa
ansiedade com a coordenadora auxiliar e ela nos fez lembrar que antes de trabalharmos em
prol de uma pesquisa de doutorado, estávamos lidando com pessoas que estavam na condição
de usuários do serviço e que contratempos são possíveis. A sua presença naquele momento foi
importante para nós.
Sentimos, desde o início, que essas pessoas todas tinham interesse em participar
da pesquisa e do grupo, mas principalmente seu objetivo maior era se beneficiarem desse
grupo. Embora isso estivesse claro para todos, não nos podíamos esquecer das condições de
disponibilidade de cada uma delas, pois todos ainda no primeiro encontro referiram sobre a
importância do grupo, mas que também tinham obrigações, seja trabalho, cuidado com filhos
pequenos, enfim, assuntos particulares a resolver naquela ocasião.
A sessão não começou no horário planejado (13h30min), porque estávamos
esperando que chegasse mais alguém. Às 13h45min, Maria comentou sobre a importância da
pontualidade num encontro dessa natureza; as outras pessoas apenas escutaram a sua fala.
Após isto, resolvemos começar com apenas cinco participantes e depois de dez minutos que
havíamos iniciado, chegou Vicente. Ao final do grupo, ele perguntou por algumas pessoas
com as quais ele já havia iniciado uma interação no encontro passado.
Realizamos uma acolhida aos participantes presentes a fim de desejar-lhes boas-
vindas e, mais uma vez, nos apresentamos explicando a técnica "Partilha em Dupla",
(LIEBMANN, 2000). Nessa técnica, os participantes conversaram em dupla ao som de uma
música tranqüila e suave sobre suas vidas e suas principais características. Em seguida, cada
pessoa apresentou o seu parceiro de dupla. Observemos a disposição dos participantes na foto.
110
Foto 1 – Sessão preparatória.
Fonte: Pesquisa.
Ao conversarem entre si, percebemos que todos estavam familiarizados uns com
os outros. Apenas Eunice que se mostrou um pouco tímida e, ao apresentar a colega Maria,
errou por duas vezes seu nome ao falar, além de ter esquecido detalhes de sua apresentação.
As duplas formadas foram: Ana e Vicente, Maria e Eunice, Janete e Andréia.
Cada dupla conversou por aproximadamente dez minutos.
Ana iniciou apresentando Vicente; em seguida, Vicente apresentou Ana e falou
um pouco de si, porém mostrou-se compadecido com o problema de Ana, fazendo uma
menção ao sofrimento dele, que, assim como o filho de Ana, está com 13 anos e consome
drogas, referiu também que seu irmão iniciou o consumo aos 15 anos e hoje está com 42 e
ainda continua nessa vida; ele torce para que não aconteça o mesmo com o filho de Ana.
A segunda dupla a falar foi Maria, que apresentou Eunice. Iniciou ressaltando a
necessidade e importância do grupo para o bem-estar de sua colega. A fala de Maria, ao
apresentar a colega Eunice, evidenciou o desgaste nas relações de famílias que tiveram ou
ainda têm um de seus membros usuários de droga, existindo a necessidade de
acompanhamento profissional para que essas dificuldades nas relões sejam trabalhadas.
Maria se expressou assim em relação a Eunice:
...O desafio que ela está enfrentado agora é com relação a
convivência, é aprender a conviver melhor com a filha e ela veio aqui,
pedir essa ajuda. Ela quer aprender a lidar melhor com a filha, e ela
disse que até já notou alguns avanços, pois a filha já senta, já fala dos
111
problemas, das angústias que tem, para ela, e ela conta que também
devido a tanta vivência, de sofrimento, de lidar com ela, devido ao
uso de droga, ela vem notando que também tem um pouco de
impaciência com a filha. Então, ela precisa se trabalhar nesse
sentido. (Irmã).
A terceira dupla começou por Janete, apresentando Andréia, referindo que a
colega precisa muito mais do que ela de apoio profissional e do grupo; Janete mostrou-se
preocupada e sensibilizada com o problema de Andréia:
...Ela está precisando mais do que eu, porque ela está muito
angustiada, muito triste. Ela disse que está com 64 anos; ela achou
que quando chegasse a essa idade ela ia ter um pouco de paz e não
está tendo paz nenhuma. Tem sete filhos, sete netos, ele, um
filho, faz uma reviravolta grande na vida dela e na família. Como ela
disse, não pode passear, não pode ir pra casa de um outro filho por
causa dele. (Irmã).
Andréia, antes mesmo de apresentar Janete, falou um pouco de seu problema,
uma espécie de desabafo. Sentimos como se ela estivesse sufocada e precisasse de socorro, e
isso seria propiciado com alguém, ouvindo sua problemática. Apresentou rapidamente sua
colega e em seguida falou entusiasmada de sua esperança com a proposta do grupo para o seu
bem-estar e do seu filho.
Na apresentação, todos permaneceram sorridentes e atentos ao grupo.
Essa técnica propiciou um momento de integração entre os participantes do grupo,
um acontecimento ideal para começarmos um relacionamento entre pessoas.
Após a apresentação, começamos a discutir alguns pontos importantes no ato da
sessão preparatória, a fim de orientar os participantes para alcançarmos efetivação dos
resultados da intervenção grupal.
Entre os pontos discutidos, esclarecemos os objetivos do grupo e das
coordenadoras, compartilhamos as expectativas de todos, aspectos de funcionamento do
grupo, discutimos e estabelecemos o Contrato de Trabalho ou Contrato de Cuidado à Saúde
(Apêndice C) e as Regras de Convivência Grupal Saudável a fim de garantir a boa
convivência grupal (Apêndice D).
Em seguida, passamos para a ocasião do desenvolvimento. Deitados em um
colchonete, solicitamos aos integrantes que se entregassem ao som de uma música
instrumental, tentando parar o corpo e a mente, e sentissem apenas a sua respiração. No ato do
relaxamento, observamos que essas pessoas o estavam familiarizadas com atividades desse
tipo, porém era algo necessário num trabalho desses.
112
Após a realização do relaxamento, iniciamos uma técnica cujo objetivo foi validar
as necessidades identificadas nos integrantes do grupo, por meio do primeiro encontro grupal
e das entrevistas individuais iniciais. A técnica utilizada, denominada “Liberação de
Sentimentos”, buscou fixar objetivos do grupo, por meio da identificação dos sentimentos e
necessidades dos participantes.
Sugerimos ao grupo que construíssem algo com base em suas experiências
relacionadas com a convivência com o familiar dependente químico. Essa construção foi
desencadeada com a seguinte pergunta: "Qual seu sentimento em relação à dependência
química de seu membro familiar?”. Para essa elaboração, os participantes tiveram acesso ao
material exposto no centro da sala, entre eles: lápis de cor, lápis de cera, revistas, tesouras,
cola, papéis diversos, canetas e pincéis coloridos. Eles poderiam fazer algo por meio de
desenhos e pinturas, escritos e/ou colagens. Os desenhos e pinturas, no entanto, não foram
formas de expressão utilizadas pelos participantes, prendendo-se, apenas, ao processo de
colagem, embora tivéssemos outros materiais disponíveis.
Consideramos que técnicas de produção e expressão que envolvem a colagem
tendem a inibir a criatividade das pessoas, pois é comum que eles encontrem figuras de cenas
que se aproximam do que eles querem expressar, podendo tornar a produção um pouco
mascarada em relação aos seus sentimentos. Isso foi vivenciado e relatado por nós
(MORAES, 2003), em trabalho de grupo com adolescentes.
Após a construção, cada participante expôs o que fez, fazendo sempre associação
com os seus sentimentos despertados e com a vivência de cada um.
Percebemos que todos os participantes, desde o início da sessão preparatória,
conseguiram captar o significado do trabalho em grupo e, especificamente, ao que nosso
grupo estava se propondo, que era constituir um espaço de apoio aos componentes familiares
de dependentes químicos.
Ana iniciou falando sobre sua produção e seus sentimentos diante da dependência
química do filho:
Eu me sinto assim hoje, com um peso enorme nas costas, um
problema que eu não sei resolver e que me deixa triste, um lado de
mim fica na luz, que é quando eu estou procurando na fé, na ida à
igreja, passei a ir à missa todos os dias, a rezar, pedir a Deus força,
sabedoria e paciência para lutar com esse problema. E ao mesmo
tempo eu me vejo na escuridão da incerteza, dos momentos difíceis,
da falta de paciência quando ele está revoltado dentro de casa, que eu
não deixo ele sair para local nenhum. Me sinto na escuridão quando
a minha família não me apóia, não retira dos meus ombros um pouco
dessa carga, que poderiam muito bem convidá-lo pra passar um final
113
de semana fora, que ali me daria um alívio, um final de semana, eu
estaria tranqüila sabendo que ele estaria com outras pessoas, que os
amigos não viriam chamá-lo, alguma coisa assim. Tem horas que eu
estou na escuridão e tem horas que eu estou na luz... Com a ajuda
desse grupo eu estou querendo me trabalhar. (Mãe).
Vicente também ressaltou cansaço ao conduzir sua família, que o pai morreu, a
mãe já era idosa e o irmão mais velho é usuário de drogas muito tempo (aproximadamente
25 anos de intenso consumo). Referiu, também, o tempo de sofrimento que a família passa,
reconhecendo esta condição como um peso em suas costas. Expressa o desconforto da
condição vivenciada, dizendo sentir um vazio muito grande em sua vida, tendo medo de tudo
isso levá-lo à loucura ou de fazer algo de ruim com ele próprio (suicídio) ou com o irmão.
Transcrevemos parte de sua fala:
Também estou sentindo um peso nas minhas costas, pois meu pai
faleceu, eu cuido agora de tudo de dentro de casa, minha mãe com
mais de 70 anos... Então eu me sinto carregando um piano nas costas,
como se diz, um peso, que causa um vazio muito grande, uma
impotência muito grande, e eu tenho isso daqui como a figura da
loucura, que às vezes, ou essa impotência que eu tenho pela demora,
pelo espaço de tempo que eu fui nessa vida, que é quase a minha
vida toda também, que é de 15 anos pra cá, 15 a 42 anos, que foi a
minha adolescência, entrando na fase adulta todinha nisso. Ou seja, o
consumo de droga do meu irmão. Então, eu tenho medo de chegar à
loucura e praticar o suicídio, por causa da impotência, do vazio, e
você não saber como lutar contra isso. (Irmão).
Maria inicia dizendo que, antes de enxergar a dependência química de seu irmão
como uma doença, achava que ele usava drogas porque era ruim. Hoje, no entanto, havia se
conscientizado de que ele estava doente e precisava de ajuda, assim como também ela, para
enfrentar esse problema. Ela conceituou a dependência química como uma doença que afeta o
corpo e a alma, destruindo os sonhos, e que dependentes químicos e familiares mais próximos
precisavam de apoio para traçar novos horizontes:
...Hoje eu vejo que isso é uma doença. Ele tem uma doença; é uma
doença... Mas de qualquer maneira, ele tem alguma coisa que
procura se esconder, esquecer, como ele mesmo diz... Então ele se
esconde atrás disso, atrás da droga, e que eu vejo essa doença como
uma doença que afeta o físico, afeta o corpo, também afeta a alma, a
gente isso quando olhamos para os olhos da pessoa quando ela
está usando droga, é aquele olhar morto, aquele olhar vazio, distante,
é sem vida, se houver quem acredite em força sobrenatural, em força
do mal, é como se o mal estivesse instalado na pessoa, eu vejo assim.
Essa doença destrói sonhos, os sonhos que nós enquanto famílias têm
que não é, acredito que não seja você querer se apropriar da vida do
outro, mas a gente enquanto mãe, enquanto irmão, sempre quer, por
114
exemplo, traçar circulando por isso, aqui: você não quer ser isso, o
que você quer ser quando crescer? Estudar pra ser isso! De qualquer
forma a gente projeta, é sonhos, e que ao final a droga desmantela
tudo, e depois descobrimos que a pessoa tem essa doença, o único
sonho que a gente passa a ter, é que ele deixe de usar droga, só isso,
não precisa ele ser mais ninguém que tenha destaque, assim, para o
mundo, a sociedade, mas para ele mesmo e para nós enquanto
familiares, isso é suficiente, mas para isso precisamos de muita
ajuda, porque nem ele consegue só, e nem nós conseguimos, porque
como eu disse, é como se, ‘santo de casa não fizesse milagre’, e a
gente precisa muito de ajuda para poder traçar esses novos
horizontes... Novos horizontes, não tão belos e grandiosos como a
gente traçava antes, mas que mesmo simples, se mantenham distantes
desse inferno que é usar droga. (Irmã).
Essa participante compreendia a dependência química como doença, sendo
perfeitamente aceitável o modelo de doença ou modelo médico; assim como a co-dependência
poderia também ser considerada uma doença, que os familiares precisavam de apoio para
enfrentar esta problemática.
Eunice apresentou-se um pouco calada, passando grande parte da sessão com o
olhar disperso. Durante sua fala, revelou-se tímida. Em sua produção, ela deixa claro que
precisa melhorar suas relações interpessoais, principalmente com seu marido e sua filha que é
dependente química. Revelou que buscou o grupo com a finalidade de receber apoio, além de
tentar aprender a relacionar-se com a filha, pois, às vezes, não se acha capaz de ajudá-la.
...Aqui representa eu e o meu marido. Nós conversando, pois ele está
me ajudando, porque é uma coisa que eu ainda não consigo é me
relacionar direito com ela... Isso representa o diálogo que não existe
entre a gente, porém está começando a haver agora depois que esse
grupo entrou na minha vida, mas, antes não tinha. (Madrasta).
Em seguida, falou Andréia, que se mostrou muito fragilizada com a problemática
de seu filho. Revoltada por essa condição de sua vida, pois para ela estar com essa idade e ter
que enfrentar e suportar toda essa problemática é algo muito doloroso. Referiu cansaço e
tristeza ao verbalizar o que construiu em seu trabalho individual. Por várias vezes, pediu ajuda
ao grupo para que analisasse sua situação, suas atitudes, se estavam corretas ou não. Mostrou-
se plenamente confiante no grupo, ficando clara sua necessidade de apoio, recorrendo à
opinião das participantes e coordenadoras do grupo.
Andréia, em seu desenho, usou cores negras para retratar o momento porque
estava passando, porém, acreditava que um dia tudo pudesse melhorar, e as cores iam
mudando , tornando-se mais claras.
115
...Eu estou me sentindo nesse momento, assim, subindo naquelas
montanhas das praias que a gente vai, num morro muito escuro, e eu
estou sofrendo muito. Mas, tem momentos que eu me sinto assim,
confusa, um pouco de... liberdade ou de esperança, mas muito
pequeno para o momento. Mas eu tenho esperança de sair desse
problema, para isso eu tenho que percorrer todo esse caminho...
(Mãe).
Ao final de sua fala, perguntou para as coordenadoras e para o próprio grupo se
deveria confiar no filho ou estar sempre desconfiando dele. Vicente se posicionou dizendo
que não confia mais. Vejamos em sua fala: ...Eu não confio mais! De jeito nenhum! (Vicente-
irmão).
Janete também interferiu na questão abordada inicialmente por Andréia, contando
um pouco para o grupo sua experiência com o iro. Referiu que vem criando estratégias
pessoais a fim de testá-lo e analisar se pode ou não confiar nele. Posicionou-se, dizendo que
atualmente, com o uso de drogas do seu irmão, ela estava se sentindo um ‘peixe fora da água’.
Ana e Maria também se queixaram, dizendo que gostariam de confiar, mas as atitudes dos
seus familiares não permitem.
Ana permaneceu atenta ao movimento grupal, sorridente, e falando somente
quando solicitada. Assim como Janete, que foi a última a falar sobre sua produção, aparentava
tranqüilidade e esperança, referindo que o grupo, mesmo estando no início, estava sendo
útil para que ela observasse o quanto há pessoas com problemas maiores do que o dela.
Houve muitos momentos de opinião dos integrantes uns em relação aos outros.
Entre aqueles que mais nos chamou a atenção, destacamos aquele em que todas as
participantes presentes Ana, Eunice, Andréia, Maria e Janete –, deram feedback a Vicente
sobre esse seu pensamento de suicídio.
Entre todos os participantes presentes, Maria foi aquela que mais se preocupou
com Vicente, referindo que, quando uma pessoa chega a essa situação de pensar em suicídio,
é porque precisava de ajuda profissional; disse que isso é doença. Vicente reconheceu que
precisava de ajuda, mas reprovava Maria quando ela disse que aquele tipo de comportamento
havia virado doença. Ele reconheceu que precisava de ajuda profissional, justificando sua
presença no CAPS e especificamente no grupo de familiares.
Ao final da fala de Maria, observamos na fisionomia de Vicente e sentimos como
se ele não estivesse satisfeito com as palavras de Maria. Ficou incomodado com o que ouviu,
dando-nos a impressão de que ele ainda tivesse algo a falar, porém preferiu calar e somente
observar o movimento grupal.
116
No final desse momento, quando íamos passar para o instante da avaliação,
após termos falado sobre todos os assuntos que o grupo suscitou, Vicente conversou somente
com Maria, checando o horário de término do encontro e disse para todos os presentes, em
alto e bom tom de voz: Nosso grupo acaba às 16h não é? Pois agora eu quero falar! (Irmão).
Em sua fala, Vicente se mostrou extremamente revoltado com essa condição que
vivia, pois não tinha mais confiança no irmão, não estava falando com ele e não tinha mais a
menor vontade de relacionar-se com ele. Hoje o seu maior desejo era sair de casa, de perto
dele. Fez comparação com os outros integrantes do grupo com relação ao seu sofrimento,
deixando claro que já tem mais anos de sofrimento do que todos os colegas de grupo, além de
parecer ser um sofrimento maior. Expressou-se assim:
...Eu tenho 40 anos, vou fazer 41 se Deus quiser, mas, a minha vida
toda lá em casa foi ser o cabeça da família. Então até todo mundo
para fazer tudo lá em casa tem que ter meu conselho. Então eu me
sinto o que? Uma estaca! E isso me deu muita responsabilidade. Esse
vazio que eu sinto aqui é falta de liberdade, pois você não pode deixar
uma bolsa, você não pode deixar uma chave, você não pode deixar
uma porta aberta... As compras de casa, temos armários, as coisas
são tudo trancadas no meu quarto. É triste gente! Você dentro de
casa, conviver com um ladrão. Isso é triste! Eu botei um armário de
aço, lá no meu quarto e o feijão, arroz, macarrão, tudo eu guardo lá,
isso é triste! Eu não desejo isso pra ninguém! Você tem medo de
sair, você não sai com celular, você sai com medo de ser roubado,
você sai com o dinheiro do ônibus, e ainda dentro de casa você
conviver com isso! Pelo amor de Deus! É triste! Se eu falo, é
porque, eu que sei mesmo e vocês não tem uma idéia desse meu
sofrimento. É difícil. Isso acaba com você, com sua auto-estima. Meu
problema, é sair de perto do meu irmão. Então é muito difícil. Não é
que eu queira morrer por nada, de maneira nenhuma. Deus me livre!
(Irmão).
A impressão que Vicente nos passou foi de que, após todos falarem à vontade de
seus problemas, e ele, por não ter falado tudo o que estava sentindo no momento da
verbalização da produção individual, ao final, quando não tínhamos mais tempo, começou a
falar de todas as questões referentes à dependência química de seu irmão. Era como se ele
quisesse mostrar, com muita intensidade, a revolta, que considerava que o seu sofrimento
era maior do que o de todos que ali estavam presentes, e isso também o revoltava. O seu
desabafo nos transmitia tristeza, angústia e revolta; seu tom de voz soava desespero diante de
sua condição de vida, chegando inclusive a pensamentos mórbidos. Maria, Ana e Andréia
deram apoio a Vicente e incentivaram-no a procurar um emprego e se relacionar
amorosamente com algumas mulheres, e ele sempre revidando referindo que isso não resolvia
117
seu problema, pois, embora desempregado, em outros momentos do passado, estava
empregado, além de já ter tido namoradas, mas não tinha sido diferente.
Acreditamos que, quando Vicente perguntou sobre o horário de término do
encontro, foi porque ele se preocupou com as normas do grupo. Elas foram esclarecidas para
o alcance dos objetivos, havendo compatibilidade de metas entre todos seus membros. Para
Loomis (1979), tudo isso se trata de normas de possibilidades, ou seja, um possível caminho
para guiar e orientar o grupo a fim de alcançar suas metas.
Realizamos uma avaliação rápida do grupo e da sessão. Consideramos que o
encontro foi satisfatório tanto para os participantes como para nós, coordenadora principal e
auxiliar. Na avaliação do encontro, os integrantes disseram que estavam se sentindo melhor,
comparados a quando chegaram e, principalmente, em relação ao primeiro encontro grupal e
ao momento da entrevista individual.
Os participantes do grupo avaliaram a sessão da seguinte forma:
Hoje foi melhor do que o encontro passado (rsrsrs) e vai ser melhor
ainda... Janete (irmã).
Eu estou saindo com bastante e mais coragem, que da maneira que
eu cheguei aqui... Às vezes a gente pensa que é a gente que está
sofrendo. E eu fico muito feliz de ter pessoas como vocês que
procuram nos ajudar. Andréia (mãe).
...Eu estou saindo ótima, estou saindo daqui muito bem também,
maravilhosamente bem. Eunice (madrasta).
Hoje foi bem melhor do que o primeiro dia, porque o primeiro dia a
gente desabafou mesmo, foi dolorido, foi muito sofrido, mas hoje a
gente está de certa forma mais um pouquinho mais fortalecido...
Maria (irmã).
Muito bem, porque eu tenho como desabafar. Está todo mundo no
mesmo barco furado ou não... (rsrsrs). Eu me senti bem aqui porque
eu tive como desabafar, a gente não pode conversar isso com todo
mundo porque as pessoas lá fora não entendem... Vicente (irmão).
...Eu cheguei bem, vou saindo melhor ainda, legal, foi bom. Ana
(mãe).
Finalizamos o encontro da sessão preparatória com um momento ainda mais
integrador, um lanche coletivo que resolvemos chamar de: “o nosso lanche de cada dia”. Esse
lanche, dentro da própria sala de grupo, foi uma forma que encontramos para unir e fortalecer
cada vez mais o grupo, um momento de descontração e liberador de possíveis tensões
118
causadas pelas questões que permearam a sessão. O lanche foi realizado após todas as outras
sessões subseqüentes.
Embora essa tenha sido uma sessão preparatória com o objetivo de preparar os
participantes para o início do grupo, ou seja, esclarecer as necessidades de todos para uma
melhor efetivação dos resultados da intervenção grupal, consideramos que esse momento
transpôs os objetivos propostos.
Além de definir os aspectos do funcionamento do grupo de familiares de
dependentes químicos, essa sessão também teve a característica de transmitir apoio e bem-
estar aos participantes. Todos se preocuparam com a problemática de Vicente e Andréia.
Vicente, por causa do seu tempo de sofrimento com seu irmão utilizando drogas, além de sua
condição atual por estar ansioso, revoltado e sem esperança.
com Andréia, o que comoveu o grupo foi o fato de ela ter mais de 60 anos de
idade, ter trabalhado tanto na vida para criar e educar os filhos e ainda hoje enfrentar a
problemática de um filho dependente químico.
Nessa sessão, falamos até mais do que os participantes, dando feedback para as
questões que iam sendo expressas pelos presentes. Sentimos o grupo se soltando mais ao final
do encontro. Consideramos algo comum para um grupo de pessoas estranhas entre si e que
estavam iniciando um relacionamento.
Sobre o início de um relacionamento grupal, Loomis (1979) refere que a interação
dos membros do grupo se dará, primeiramente, pelo desenvolvimento de papéis, os quais
estão intimamente relacionados ao desenvolvimento do padrão de poder e influência de cada
integrante, inclusive do coordenador, e pelo desenvolvimento do padrão de comunicação do
grupo durante a sessão. É uma etapa na qual ocorrem os primeiros experimentos nos papéis de
liderança e de teste da capacidade do coordenador de conduzir o grupo com suas diversidades.
Portanto, o papel do coordenador nessa fase é de suma importância para o sucesso do grupo,
pois dele depende a coesão grupal. O coordenador pode assumir a função de estimulação
emocional, cuidador, de atribuição de significado e de executivo.
Quanto aos fatores curativos, estes podem influenciar a mudança dentro do grupo,
por conseguinte, também estão entre as preocupações iniciais do grupo (LOOMIS, 1979).
O desenvolvimento da coesão grupal foi um fator terapêutico imprescindível para
o alcance dos objetivos e metas traçados para o grupo de familiares dos dependentes
químicos, tendo sido fundamental para que os participantes continuassem no grupo.
Loomis (1979) considera três aspectos importantes para que ocorra a coesão no
grupo: as metas, as normas do grupo e o papel do coordenador. Já o vínculo entre os
119
participantes do grupo pode emergir de várias fontes, como: necessidades das pessoas que
compõem o grupo; expectativas das pessoas e dos benefícios que elas terão como
conseqüência de sua participação no grupo; percepção destas sobre a efetividade do grupo
com base no valor de seus resultados.
Uma das facilidades para o desenvolvimento da coesão grupal foi a nossa atitude,
na qualidade de coordenadora grupal, ao termos o cuidado de esclarecer os objetivos
propostos, relacionando-os com as necessidades dos participantes e sua própria perspectiva
.
7.2.2 Sessão I – o processo grupal
A seguir, descreveremos a sessão 1 da fase de processo grupal. Começamos por
apresentar o quadro 5, que resumidamente demonstra tudo o que foi realizado.
Quadro 5 Demonstrativo da sessão I da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
02/07/07
13h30min as
16h00min.
Sessão I
Fase de
Intervenção
(Processo)
1º momento: Acolhimento:
- Recepção dos participantes.
- Reapresentação dos
participantes.
- Leitura do contrato de trabalho
e regras de convivência grupais
saudáveis estabelecidas na
sessão preparatória.
2º momento: Desenvolvimento:
- Preparação para o momento de
expressão.
* O que é co-dependência?
* Como esta se expressa na vida
do familiar de um dependente
químico?
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
- Verbalização dos sentimentos
por ter participado e como cada
um estava saindo do encontro
grupal.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Exercícios de
movimentos”.
- Técnica: “Desenhos
em pedaço de papel”.
- Proporcionou bem
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Contribuiu para a
memorização dos
nomes dos
participantes e suas
características
principais.
- Identificou o
conhecimento prévio
dos participantes
sobre o que é co-
dependência e como
ela tem se expressado
em suas vidas.
- Estimulou a
verbalização de
sentimentos.
- Promoveu a
interação grupal.
- Contribuíu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
Participaram do encontro as seguintes integrantes grupais: Flávia, Sandra,
Andréia, Adriana, Janete, Nara, Eunice e Helena.
A primeira participante a entrar na sala foi Flávia. Percebemos muita aflição de
sua parte, com relação às questões que ela vivencia com seu filho. Diz sentir vergonha dos
atos dele na rua e em casa; referiu sentir vergonha dos vizinhos, das pessoas que ela conhece
120
como amigos íntimos da família e, principalmente, da sociedade. Deixou claro, antes mesmo
de a oficina começar, que esconde os erros de seu filho das pessoas, conserta seus atos
errados, se puder, tudo o que ele quer, para o vê-lo revoltado. Referiu que faz tudo
isso só para não contrariá-lo, pois tem medo e pavor que ele vá para a rua e gere brigas.
Tudo isso foi constatado ao final de nossa conversa, por mim e pela coordenadora
auxiliar, quando Flávia revelou que havia ido ao grupo porque se comprometera, mas,
inicialmente, não estava se sentindo à vontade, pois sabia que no grupo havia um participante,
Vicente, o qual era seu vizinho e não gostaria de revelar toda a sua problemática e de seu filho
na frente dele. Conversamos com ela, esclarecendo sobre a finalidade do grupo e frisamos,
novamente, a existência do contrato de trabalho grupal e que ela tentasse se sentir à vontade,
falando apenas aquilo que a deixasse segura, sem ter a privacidade ameaçada. Por
coincidência, Vicente faltou à sessão nesse dia e ela foi a participante que mais falou e
recebeu feedback de todas as pessoas, principalmente de Adriana e Eunice.
O grupo iniciou exatamente às 13h30min, com apenas quatro participantes:
Flávia, Andréia, Sandra e Adriana; posteriormente foram chegando outras pessoas.
Apenas Ana e Maria avisaram, antecipadamente, que não poderiam ir ao grupo.
Comunicamos e justificamos aos participantes restantes suas ausências.
Iniciamos o acolhimento do grupo, realizando a recepção dos participantes,
dando-lhes boas vindas. Em seguida, nos dispomos em círculo, como forma de nos apresentar
novamente. Solicitamos ao grupo que apresentasse, apenas com o pré-nome, o colega da sua
esquerda, a fim de nos lembrar do nome dos participantes e entregar os crachás.
Em seguida, fizemos uma leitura do contrato inicial de trabalho construído na
sessão preparatória, a fim de relembrar e fixar os aspectos do contrato de cuidados de
saúde/contrato de trabalho e também das regras de convivência grupal saudável para aqueles
que participaram da sessão preparatória e informar àqueles que estavam vindo pela primeira
vez.
Ao fazer a leitura do contrato de trabalho e das regras de convivência grupal
saudável, o grupo permaneceu atento e não fez nenhum acréscimo. Apenas alguns deles se
colocaram justificando seu atraso, entre eles Eunice, Nara, Janete e Helena.
Comentamos que aspectos como as faltas dos participantes ou possíveis atrasos
constituem-se ameaças para o desenvolvimento da coesão grupal.
Loomis (1979) aponta alguns aspectos que constituem ameaças para o
desenvolvimento da coesão grupal, entre eles, a instabilidade dos membros do grupo é um
fator que dificulta o processo grupal como um todo. Essa instabilidade pode ser provocada
121
pelas próprias normas estabelecidas, pela falta de limite para o número de elementos do
grupo, pela falta de respeito aos horários, mudanças no local dos encontros, pela rotatividade
da equipe, visitas e outros.
Ao final, procuramos saber como estavam os participantes, como cada um passou
a semana e o final de semana e se algum deles tinha algum assunto breve que gostaria de
socializar com o grupo. Janete iniciou, referindo que o seu final de semana foi ótimo, saiu
para passear com o irmão, já que ele não consumiu álcool, nem outras drogas. Sandra passou
o final de semana tensa, apreensiva e inquieta com medo do filho sair e ir utilizar drogas;
Andréia relatou que estava tranqüila, e que o grupo estava lhe fazendo também muito bem;
Nara relatou que não teve um final de semana muito agradável, pois seu esposo consumiu
álcool e outras drogas durante todo o final de semana, enquanto ela trabalhava. Adriana
relatou que teve um final de semana tranqüilo, que o filho foi para a casa do pai e ela pôde
se divertir, ir à igreja e conversar com amigas, porém, no restante da semana, não fez outra
coisa a não ser cuidar dele. Eunice relatou que estava se relacionando muito bem com a
família, e por último falou Flávia, relatando um pouco sobre sua vida. Referiu que sempre fica
bastante apreensiva com medo do filho sair de casa e ir utilizar drogas, não importa o dia da
semana, que está sempre com medo dele e do que ele pode fazer. Vejamos o seu depoimento:
...porque onde tem bebida, ele vai atrás e eu não seguro mesmo. Nós
temos problemas, mas também vivemos com medo desse meu filho
usuário de droga. Aliás, eu vivo tensa, com medo direto que ele
beber, e isso está me fazendo é mal, e não basta dizer que vai pra
um canto, eu fico tranqüila quando ele está no colégio, está no
colégio eu fico bem, assisto televisão, leio meu livro, sossegada. O
menino chegou, pronto, fico que parece uma louca, num e no
outro. Mas eu acho que também se torna até prejudicial pra ele, essas
minha forma, ele mesmo disse pra mim... Tem horas que eu digo que
Deus não está olhando pra mim, eu estou ficando é louca, De repente,
tem horas que vontade de eu sair correndo feito louca. É como eu
te falei, eu fico tão desesperada, e eu não faço isso porque eu tenho
vergonha sabe. Ainda bem que tem aquela coisa que me impede. Puxo
meus cabelos! É uma loucura! O menino me obriga a dar dinheiro...
É aquela loucura... Eu não tive controle sob o menino, soltei o
menino, é uma coisa horrorosa! E eu tenho medo dele, o pior é isso,
eu tenho medo do meu próprio filho! Isso é triste, a mãe ter medo do
filho. (Mãe).
No desenvolvimento, antes mesmo da produção artística individual, realizamos
exercícios de alongamento corporal, com movimentos simples, como chacoalhar os braços e
as pernas, movimentos de rotação com a cabeça, alongamentos de musculatura corporal e de
122
consciência dos membros, técnica denominada de “Exercício de movimentos” (LIEBMANN,
2000).
A construção individual foi baseada na adaptação das técnicas Colcha de retalhos,
fatos da vida e associação de cores (LIEBMANN, 2000). Na técnica adaptada, os
participantes deveriam fazer “desenhos em pedaços de papel” com tintas em tons diversos:
verde, amarelo, vermelho, preto e branco. Solicitamos que fizessem a associação de cores a
coisas abstratas, tais como: o que é co-dependência; sugerimos que o desenho viesse a
expressar os diversos fatores, como, por exemplo: emoções (tristeza e medo); funções
psíquicas (pensamentos, sentimentos, intuição e sensações); funções físicas (respiração,
digestão, aparecimento de doença etc.).
Os materiais utilizados para a técnica foram tintas guache, papéis e pincéis.
Esse momento de produção foi marcado por silêncio e concentração dos
participantes. Apenas Janete, Nara e Helena comentaram em voz baixa sobre o que era para
fazer e explicamos novamente a atividade.
A seguir apresentamos a foto 2, que trata sobre a produção dos participantes do
grupo.
Foto 2 – Sessão grupal I.
Fonte: Pesquisa.
Em seguida à construção individual, os participantes verbalizaram sobre sua
produção e sua percepção do que é a co-dependência e como é conviver com ela.
123
Após a produção, no ato da verbalização, Helena foi a primeira a falar, pois
chegou ao grupo aflita, agitada e angustiada, além de ter sido a última a chegar e um pouco
atrasada, já ao final do alongamento do qual não participou.
Ao iniciar sua fala, Helena começou a chorar. Produziu algo que associou à
dependência química, a pessoa estar sempre em perigo e com medo, medo do próprio
dependente, no caso de seu filho, e de que pessoas façam alguma coisa de ruim com ele. Nas
cores, ela associa o vermelho, preto e amarelo ao perigo e ao medo, o qual o familiar de um
dependente químico vivencia. Para ela ser um co-dependente é estar sempre sentindo pânico,
tristeza, medo e perigo. Ela associou o branco, azul e verde à paz, um sentimento com o qual
há muito tempo ela não convive.
No meu desenho eu estou representando o perigo que as drogas
causam: é o vermelho, o preto, o amarelo. Eu creio que o perigo está
aqui nessas cores. a paz, é branca, verde, azul, que é o que nós
procuramos ter. Porque, é difícil, mas não é impossível. Mas, é ruim,
é duro, é duro ser co-dependente... (choro). O perigo que a gente
corre acaba com a nossa paz. Tem horas que ficamos em pânico, tem
aquele pânico... (Mãe).
A segunda participante a falar foi Flávia. Também muito aflita e angustiada, falou
do seu desenho, referindo que ele expressava a idéia de que com a dependência química de
seu filho, ela se sentia um trapo, um palhaço, que vivia em um mundo negro (usou cores
como: preto e vermelho) e que estava sempre esperando algo de ruim acontecer, porém tinha
esperanças de que sua vida melhorasse. Resumiu sua produção na seguinte frase: Meu mundo
é negro, preto. (Mãe). Ao explicar sua produção ela fez as seguintes afirmações:
Aqui é um boneco, esse boneco, ele está chorando, sabe? É como eu
vejo a família de co-dependente, e vive sempre triste, cheios de
mágoa; é um... como se fosse um... é um palhaço. A gente se torna
um palhaço no meio de toda essa sujeira, um trapo. É como eu me
sinto, a minha família, eu, a minha mãe, os outros, meus filhos,
diante do meu filho usuário de droga. Então, nós somos assim, uns
trapos pra aquele menino. A gente faz de tudo, tudo... e aqui são
umas nuvens. E aquele meu mundo que era maravilhoso, lindo, azul,
hoje ele é negro, triste, se tornou pra mim aquele... um mundo
perverso, cheio da maldade. E pra mim, eu acho que a gente vive no
medo, esperando qualquer hora uma coisa ruim acontecer, mesmo a
gente tendo muita força, muita em Deus. Mas a gente essempre
com um na frente e outro atrás, com medo. Eu por exemplo. Eu
vivo com medo. Então, hoje eu tenho alegria, amanhã eu estou triste.
Hoje eu estou alegre, amanhã, no outro dia, eu estou chorando.
sempre assim...irregular. Isso não é vida pra ser humano nenhum.
Porque todo mundo quer viver bem, em paz. (Mãe).
124
Flávia recebeu feedback de Adriana e Eunice. Adriana disse que é necessário
Flávia mudar sua atitude diante do filho, pois ela referiu que percebia necessitar Flávia de
agir de uma forma mais rígida, sem medo dele e aenfrentá-lo. Adriana falou palavras de
esperanças, mas foi extremamente firme ao revelar seu posicionamento diante da atitude da
Flávia para com o filho. Vejamos em sua afirmação:
...você tem que tirar esse medo, com a ajuda da gente... é acabar com
o medo dele. Você não pode ter medo! Eu já tive medo do meu. Então
você diz nessa hora: eu não tenho medo. Na hora que ele chegar em
cima de você e você diz: eu não tenho medo! Vai bater em mim? Eu
não tenho medo! Porque você tem que ter forças, inverter a situação,
porque isso, esse quadro muda, mas se você tomar uma atitude,
porque se você não tomar uma atitude, esse quadro não vai mudar,
de jeito nenhum. Você realmente tem que mudar o quadro, porque se
você não mudar, não tomar uma atitude de mãe, vai continuar e isso
não vai acabar é nunca. (Mãe).
Nara aproveitou da fala da Adriana para citar o que aconteceu com seu marido,
reforçando o fato de que, muitas vezes, realmente o dependente necessita de ameaças e
atitudes rígidas. Aproveitou o momento e falou de seu desenho, referindo que ser co-
dependente é morar em uma casa no deserto, viver isolada de tudo e de todos:
A co-dependência representa pra mim, é, isso aqui: seria eu numa
casa, num deserto, acho que longe de tudo; e essa nuvem aqui com
esses pingos aqui caindo, seriam a chuva, acho que para limpar
tudo! Porque tem muita sujeira aqui, nessa terra, né? Se desse uma
chuva pra limpar tudo, enquanto essa chuva não caísse eu estaria
num deserto, numa casa, sozinha de tudo e de todos... Eu moro muito
perto de onde tem aquelas coisas... de onde tem a sujeira, do
movimento todinho, pertinho; duas ruas já está dentro do movimento.
Eu queria me isolar assim, enquanto não tivesse uma limpeza geral
(Esposa).
Mesmo tendo chegado atrasada e estando um pouco apreensiva e preocupada com
o filho de dois anos que estava fora da sala com o irmão mais velho, Nara se referiu a
Flávia, aconselhando-a e apoiando. Ficou de emprestar-lhe um livro de auto-ajuda, o qual a
auxilia nas horas difíceis. Nesse dia, Nara estava um pouco inquieta e realmente preocupada
com os filhos, pois não teve com quem deixá-los em casa.
Janete refere-se à problemática de seu irmão, tentando ajudar Flávia. E corrobora
a idéia de Adriana sobre a necessidade do que ela chama de ‘pulso forte’, e diz que o início é
difícil, mas, aos poucos, a pessoa vai conseguindo resultados positivos.
125
Andréia fala que ser co-dependente é participar de tudo da vida do familiar
dependente químico; é difícil e a pessoa sente medo. Ela também foi uma das participantes
que falou palavras de esperança a Flávia.
...eu acho que ser co-dependente é participar de alguma forma; aqui,
se ele está assim, com esse vermelho também, eu estou também, no
perigo, ali, junto com ele. Eu acho que ser co-dependente é tudo isso
a gente está ali participando, a vida fica assim, meio escurecida,
sentimos vergonha de tudo... Agora, como ele está fazendo o
tratamento, aqui melhorou. Tem umas cores verdes, um verde de
esperança, porque ele tem conseguido passar, assim, quatro dias
sem pegar na droga... (Mãe).
Eunice transmitiu tranqüilidade e bem-estar e isso foi constatado na sua fala, ao
explicar sobre seu desenho, o qual não teve nenhuma associação com a co-dependência.
Eunice estava muito bem nesse dia e seu desenho foi de um jardim com muitas flores
coloridas.
Esse é o meu desenho gente. Eu escolhi essas flores pelo dia alegre
que eu tive ontem. Eu tive muita paz de espírito, muita brincadeira,
através da minha própria filha, sendo uma palhaça dentro de casa,
ela mesma foi quem fez o almoço. (Madrasta).
Para Sandra, a co-dependência é algo anormal e com ela a vida fica sem brilho.
Vejamos a sua comparação para a co-dependência:
...Eu comparo a co-dependência como é essa árvore seca, anormal.
Porque a pessoa passa a ter atitudes anormais, e quem tem um
dependente dentro de casa, fica assim, sem brilho, eu, depois que eu
fiquei sabendo, mesmo, até antes, quando eu comecei a desconfiar, a
minha vida se transformou totalmente, todas as pessoas, meu ciclo de
amizade, eu passei a ser uma pessoa sozinha, ser uma pessoa mais
triste, tá entendendo? E minhas amigas perguntam: Sandra, cadê
aquele vigor, aquela alegria que você tinha, aquele brilho no olhar,
aquela coisa toda? Quer dizer, que hoje eu sou outra pessoa... então
me sinto, assim, como uma árvore, assim, queimada, seca e sem
brilho. (Mãe).
Essa participante falou pouco durante a sessão. Apresentava-se calada e parecia
distante daquele momento. Comentamos com ela sobre o que poderia estar acontecendo e ela
nos relatou que estava sob efeito de medicamentos.
...Eu estou um pouco calma porque eu estou tomando um
medicamento, e está influenciando, porque eu não estou mais
conseguindo reagir, eu tenho que ter uma ajuda realmente, passei
essa semana muito tensa, porque ele não bebeu, mas eu senti, eu não
sei se é impressão minha, mas eu senti que ele fumou, chegou a fumar
droga, entendeu? Então, eu fiquei muito triste, eu tenho que tomar o
126
meu medicamento para que eu venha passar essa tranqüilidade,
diante daquela harmonia dentro de casa e que o pai nem o irmão
venha perceber também... (Mãe).
Observamos na fala de Sandra que o medo da recaída é algo que aflige muito as
familiares de usuários de drogas. Essa participante foi uma das últimas a se expressar sobre
sua produção e, como nosso encontro estava ao final, ela fez questão de verbalizar a sua
percepção do que é participar de um grupo como esse:
...Eu vejo que cada experiência é uma experiência nova pra mim, e é
um aprendizado, eu vejo a possibilidade de realmente a gente nos
ajudar (Mãe).
Adriana, ao explicar seu desenho, compara o co-dependente com aquele que há de
dar apoio e limites ao usuário de droga, alguém que está próximo e ajuda.
...O meu desenho foi uma plantinha... Os verdezinho que é
esperança que eu tenho, e aqui é o sol, que é a luz. Eu acho que eu dei
uma luz pro meu filho, porque ele estava lá no fundo do poço, não
tinha ninguém pra ajudar ele, eu dei a luz e eshoje como ele está.
Ele está bem. As vezes se irrita, entra numa crise, mas ele me
obedece. Eu não tenho muito a reclamar, que ele tem 19 anos e ele
não sai para nenhum canto a não ser comigo. Se eu não tivesse
ajudado ele, ele estaria no fundo do poço... Se eu não tivesse dado a
mão para ele, mas, dando a mão, também podando. Porque se for
fazer tudo o que ele quer, não vai da certo. (Mãe).
Ao final da sessão, realizamos uma avaliação, perguntamos aos participantes
como cada um estava se sentindo ao sair daquele encontro.
Ao iniciar a avaliação, Flávia fez questão de iniciar, dizendo:
Eu me senti bem no grupo, mas, ninguém vai dizer o contrário da
minha forma de pensar, sabe, é a minha maneira de ser... Pode ser
que eu até mude mais na frente, mas, nós também começamos
agora, está muito recente não é? (Mãe).
Flávia fez essa colocação porque, embora tenha gostado de estar no grupo e
assumido a responsabilidade de que, por várias vezes agia erradamente com o filho, ela sentiu
certa pressão das participantes para que tentasse mudar suas atitudes diante do filho,
principalmente da participante Adriana, que dirigiu toda a sua atenção para ela. Podemos
dizer que a problemática vivenciada por Flávia e sua família, com o filho dependente de
drogas, foi o assunto mais falado nesse dia no grupo. Nas diversas colocações, ficou clara a
necessidade de imposição de limites aos pacientes em tratamento, dizendo não e que quando
não é dito esse ‘não’ é porque o medo está prevalecendo.
127
Em seguida Nara diz: Eu estou saindo ótima! Conversei muito... Melhor de
quando entrei... (Esposa).
Eu estou me sentindo, assim, com mais experiência...; mais maneiras
de lidar com o problema e não sofrer tanto, que é isso que eu quero.
Eu quero é ajudar, sofrer, morrer, porque não é do agrado de Deus
que ninguém se anule por outra pessoa, mesmo sendo filho... (Sandra
- mãe).
maravilhoso! Tudo bom! Esse relaxamento foi ótimo. O grupo foi
ótimo! Eu não vim semana à passada, porque não pude. Hoje foi
maravilhoso. (Adriana - mãe).
Eu gostei, também, sabe? Eu estou me sentindo bem. Como da outra
vez, eu vou para casa me sentindo bem. Hoje eu vou me sentindo
melhor ainda, comparada a sessão passada; e é assim que a gente vai
crescendo. (Eunice - madrasta).
Também estou saindo melhor ainda, porque a gente vai adquirindo
experiência... uma ajuda a outra... A gente sente apoio, exatamente.
Eu estou saindo melhor do que semana passada, que eu saí bem.
Que eu cheguei muito ruim, na semana passada, e saí bem e hoje
está sendo melhor ainda. (Andréia - mãe).
Eu, graças a Deus, eu estou bem. namorei! Eu nem mesmo queria
que meu marido me beijasse, era tanta coisa... (risos). Já namorei
muito essa semana! (Janete - irmã).
Apesar de ser o primeiro dia, eu estou me sentindo mais leve e
aprendendo. Cada um, uma história diferente e a gente vai... É um
aprendizado... Nós temos que ir aprendendo... (Helena - mãe).
Após a avaliação, realizamos o lanche coletivo.
7.2.3 Sessão II – o processo grupal
Começaremos a descrição da sessão 2 da fase de processo grupal, apresentando o
quadro 6, que resumidamente demonstra tudo o que foi realizado nesse encontro.
Quadro 6 - Demonstrativo da sessão II da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
09/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão II
Fase de
intervenção
(Processo)
1º momento; Acolhimento:
- Recepção dos participantes.
- Releitura do contrato de
trabalho e das regras de
convivência grupal saudável.
2º momento: Desenvolvimento:
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
Relaxamento:
“Técnica do andar”.
- Atividade de
- Proporcionou bem
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Relembrou a
existência do contrato
de trabalho e das
regras de convivência
128
- Preparação para o momento de
expressão.
- Feitura de desenhos e
continuação do desenho de cada
um dos presentes na sessão.
- Reflexão sobre o desenho
inicial e após ter sido
complementado pelos
participantes da sessão.
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
- Utilizando medalhas
simbolicamente como forma de
avaliar a sessão e como estavam
saindo daquele momento.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
desenho: “Complete
os desenhos e
continue o desenho”.
- “Técnica das
medalhas”.
grupal saudável,
focalizando sua
importância para a
coesão grupal e o
processo de pesquisa.
- Refletiu sobre a
condição de ser um
familiar de um
dependente químico.
- Promoveu a auto
percepção dos
participantes.
- Proporcionou que
os participantes do
grupo conheçam
melhor uns aos
outros, facilitando o
processo de apoio e
suporte.
- Estimulou a
verbalização de
sentimentos,
compartilhando com
todos os membros do
grupo.
- Contribuiu para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promoveu a
interação grupal.
- Sensibilizou para a
importância e
relevância do
trabalho de grupo.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
Estavam presentes a esse encontro: Sandra, Maria, Ana, Flávia, Adriana e Nara,
porém a primeira participante a chegar foi Sandra, apresentando-se um pouco apreensiva
quanto ao tratamento de seu filho no CAPS, pois, a cada dia que passava, ela vinha
percebendo seu filho mais irritado e mal humorado. Referiu que não sabia como estava seu
tratamento, se ele realmente vinha para o atendimento, não sabia nem mesmo qual
profissional procurar para obter informações sobre a terapêutica dele. Disse, também, que o
grupo a estava ajudando nessas dificuldades, mas sentia-se, ainda, muito desinformada quanto
à dependência química. Vejamos sua fala:
129
...Eu gostaria de ter esclarecimento em relação ao tratamento do meu
filho, por exemplo, ele disse pra mim que estava vindo três vezes por
semana aqui, com quem eu conseguiria isso, essas informações?
Agora eu estava olhando o prontuário dele e isso que ele me falou
não está acontecendo, quer dizer. Será que ele está ficando solto no
meio da rua? Não sei! Então, eu gostaria de saber tudo, eu queria ter
mais esse acompanhamento, com quem eu devo falar? Com quem...?
Eu queria poder ter esse controle, sem ele saber é claro... (Mãe).
Na ocasião, lembramos a finalidade do nosso grupo, que era de apoio/suporte,
mas acrescentamos que, sempre que pudéssemos esclareceríamos dúvidas quanto ao
tratamento no CAPS sobre a dependência química.
Constatamos o que havíamos observado em outros momentos, referente à
distância entre o serviço e a família do usuário em acompanhamento, mostrando-se pouco
efetiva a comunicação entre todos os envolvidos no processo de tratamento e reabilitação,
função essa que deve ser exercida pelo CAPS.
Consideramos que este tipo de comportamento por parte da equipe
multiprofissional dificulta a adesão do usuário e o engajamento da família no processo de
tratamento. Compreendemos que serviço, usuário e família devem estar em parceria na busca
da recuperação de saúde do dependente químico.
Diante da questão exposta por Sandra, ressaltamos a necessidade de supervisão
nas instituições de atenção aos dependentes químicos como o CAPS-ad. Na supervisão a esses
serviços, devem ser observadas questões que envolvam a dinâmica da equipe de profissionais,
sua auto-estima e estímulo ao conviverem com usuários de droga, os problemas que ocorrem
na instituição, atividades que são desenvolvidas e seus resultados.
Dentre essas atividades a serem desenvolvidas, compreendemos ser necessário
que o serviço disponha do que chamamos de terapeuta de referência, ou seja, cada
profissional será responsável por uma quantidade de usuários. Esse terapeuta de referência
será aquele profissional que acompanhará todo o seu processo de tratamento, monitorizando-o
e sendo aquela pessoa com quem o usuário tem mais afinidade e da qual está mais próxima,
inclusive é o profissional ideal para tirar dúvidas em geral, esclarecer e envolver a família
também no tratamento. Acreditamos que Sandra, assim como vários outros participantes,
sentiam falta de um profissional que desenvolvesse esse papel, pois o sabiam a quem
procurar, qual seria o profissional mais indicado. Em outros encontros, estavam sempre
suscitando dúvidas e discutindo o papel do serviço, e Sandra era a participante que mais
incluía a discussão desse assunto no grupo.
130
Sandra abordou, ainda, a questão da terapia medicamentosa realizada com
psicofármacos, pois para ela era necessário que os familiares recebessem as devidas
informações sobre o uso dessas drogas, pois existem alguns totalmente desinformados assim
como é o caso dela.
...Eu acho assim, que para o profissional passar medicamentos ele
tem que conscientizar a família para ajudar, porque passam um
medicamento que não ensinam como fazer, como devo proceder
diante do tratamento, eu acho isso errado, porque eu não tive essa
informação, e o menino pegou um monte de medicamento e guardava
na gaveta, eu só fazia perguntar: meu filho, tu tomou hoje?Ele: tomei;
só isso, eu pergunto e o menino diz que tomou. (Mãe).
Essa participante trouxe à cena do fato riscos do uso de psicofármacos sem as
devidas orientações e, principalmente, sem a supervisão dos familiares. Ficaram claros os
riscos de possíveis superdosagens, o uso concomitante com outras drogas ou substâncias
como cafeína ou refrigerantes à base de cola. Compreendemos que tanto os familiares quanto
o usuário em tratamento devem ter conhecimento de todas as informações necessárias à
terapêutica medicamentosa, principalmente sobre posologia, contra-indicação, superdosagem,
interações medicamentosas e reações adversas.
Posteriormente, chegaram Maria e Ana. Perguntamos ao grupo se poderíamos
começar, já que estávamos no nosso horário marcado. Maria e Ana pediram para esperar mais
um pouco por outros participantes, especialmente por Nara, que já estava vindo a caminho.
Maria e Ana demonstraram apoio a Nara, ao referirem sobre sua problemática,
pedindo que esperássemos ela chegar para começar o grupo e de fato observamos que o
depoimento dela em nosso primeiro encontro foi comovente para o restante do grupo, talvez
pela condição de esposa de um dependente químico e por ter que enfrentar toda essa
problemática sem o apoio de outros familiares, diferentemente dos outros participantes.
Antes de a sessão começar ficamos falando de outros assuntos, a que os
presentes referiram sobre o seu final de semana e o momento certo de um usuário em
tratamento voltar a trabalhar. Sandra mostrou-se apreensiva quanto ao seu desejo do filho
trabalhar, mas o sabia se ele estava preparado. Sandra, como sempre, era calada e
observadora. Maria afirmou também que essa era sua dúvida, mas com o grupo ela está se
conscientizando de que o seu irmão saberia o momento certo para voltar a trabalhar.
Flávia chegou alegre e feliz. Referiu que o seu final de semana foi ótimo.
Adriana fez questão de dizer que não estava bem e que está se cansando com essa vida de
somente cuidar do filho.
131
Eu não estou muito tranqüila não, meu filho me deu muito trabalho
nesse final de semana (Mãe).
Verbalização de como haviam passado o final de semana era algo muito freqüente
nos nossos encontros, e ocorria sempre antes de iniciar a sessão ou no momento do
acolhimento, talvez porque os encontros fossem sempre nas segundas-feiras e por ser o final
de semana, algo que os familiares e os próprios usuários em tratamento diziam temer, pois
eram os dias em que ocorriam mais recaídas, além de estarem mais distantes da rotina de
tratamento do CAPS-ad.
Nara chegou um pouco aflita (por estar atrasada) ao grupo, mas ao mesmo tempo
tranqüila por não ter trazido para o CAPS seu filho mais novo. Ele havia ficado com o pai em
casa.
O grupo iniciou-se no horário previsto, com seis participantes.
Perguntamos ao grupo se alguém tinha algum assunto breve que gostaria de
expressar, mas ninguém falou nada. Quando lembramos sobre a existência do nosso Contrato
de Trabalho (Apêndice C) e das Regras de Convivência Grupal Saudável (Apêndice D),
ressaltamos o item sobre o possível desligamento do grupo, o qual previa que se o participante
tivesse duas faltas seguidas sem avisar antecipadamente que iria faltar seria desligado do
grupo. O grupo se posicionou firme, referindo que isso era o correto, pois havia muitas
pessoas querendo participar de um grupo como esse.
Em seguida, Maria perguntou por Vicente, se ele havia vindo na sessão passada, e
como ele não havia vindo e nem tinha se justificado, é que, de acordo com o nosso contrato de
trabalho, ele estava desligado. Ao mesmo tempo, ela questionou sobre o motivo de não ter
vindo mais, se seria porque ela lhe disse coisas, orientando-o a mudar de atitude, arranjar um
emprego e relacionamentos amorosos. Não respondemos sua dúvida, preferimos responder
em outra oportunidade, até porque não sabíamos se era por conta disso que ele não havia mais
ido ao grupo. Apenas afirmamos que aquele era um grupo de apoio/suporte e que ela não
errou ao se posicionar em relação às questões explicitadas por Vicente.
...Quando a gente diz alguma coisa assim que vai contra o que o outro
está dizendo, eu lembro do nosso acordo, o contrato de trabalho, a
gente tem que respeitar... Nossa intenção não é essa, de desrespeitar
o que o outro está sentindo, mas... Porque naquele dia eu fiquei muito
pensativa após a oficina, depois do que a gente falou para o Vicente.
A questão dele sempre falar em se matar e tudo, na verdade quem
sabe o que ele sente é ele, mas a gente quer tirar da cabeça dele essa
história dele se matar... (Irmã).
132
A participante fez essa abordagem sobre a necessidade de respeito para com os
sentimentos do outro, mas também o que ficou claro foi a importância de cada participante
estar aberto à possibilidade de um escuta sensível num grupo como esse, de apoio-suporte;
esse foi um, entre vários acontecimentos, que fortaleceu a coesão grupal.
No relaxamento, realizamos a “técnica do andar”. Nela todos deveriam andar pela
sala de pés descalços, compassadamente, com todo o no chão, de ponta de pé, lateral dos
pés, planta dos pés, ao som de uma música tranqüila. No momento da técnica, eles deveriam
sentir os pés, sua imporncia, fixar-se somente neles. Ao final, foi solicitado que eles
pensassem como cada um estava se sentindo naquele dia e com quais sentimentos haviam
chegando ao grupo.
Essa técnica teve a finalidade de fazer com que os participantes sentissem o seu
caminhar, como ele é, sentir os movimentos refletindo sobre sua condição atual, uma forma
de fazer com que os participantes se envolvessem com aquele momento.
No relaxamento que antecedeu o início da produção grupal, foi interessante para
ver o movimento corporal dos participantes, pois o caminhar destes demonstrou como têm
sido as suas vidas ao conviver com a dependência química de seus familiares, e de como eles
gostariam que fosse esse caminhar. Tivemos como resposta a essa técnica o que apresentamos
a seguir no quadro 7.
Quadro 7 - Demonstrativo do tipo de caminhar expresso por parte de cada um dos
participantes do grupo de familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
Participante Como tem sido seu
caminhar
Como gostaria que fosse seu
caminhar
Ana Tropeçando Firme e elegante
Flávia Devagar Depressa e firme
Adriana Caindo e rápido Lento e tranqüilo
Maria Caindo Firme e tranqüilo
Nara Caindo e tropeçando Firme
Sandra Devagar Depressa
Fonte: elaborado pela autora.
Em seguida, iniciamos a atividade proposta com todos em silêncio. Propusemos a
“técnica de atividade de desenho”, com adaptação das técnicas: complete os desenhos e
continue o desenho (LIEBMANN, 2000).
Na “técnica de atividade de desenho”, solicitamos que os participantes
escolhessem papéis que continham linhas e formas iniciais simples, onde cada pessoa
133
individualmente construiu seu desenho inicial por cinco minutos. Em seguida, após essa
construção individual, o desenho foi passando para outra pessoa do grupo e esta teve um
minuto para inserir algo no desenho do colega, e assim por diante, até que todos recebessem
seu desenho inicial. Foram dispostos ao centro da sala folhas de papel com pequenos rabiscos
de linhas ou pontos, lápis de cor e lápis de cera. Os participantes foram instruídos para iniciar
seu desenho, tendo cinco minutos. Depois passaram para o participante do lado, em sentido
horário. A cada minuto, a folha do desenho circulava até o desenho inicial voltar para a mão
de cada participante, momento em que finalizou a atividade de produção.
Vejamos a disposição dos participantes no momento da produção de dados
proposta nesse encontro.
Foto 3 – Sessão grupal II.
Fonte: Pesquisa.
Durante a produção, eles deveriam pensar na seguinte questão: como eles se
enxergavam diante da dependência química de seus familiares? No ato da produção, não
deveria haver conversa entre os participantes. A discussão disse respeito ao que essas pessoas
produziram individualmente e de seus sentimentos, além de seus sentimentos e percepções
diante das modificações em seus desenhos realizados pelo grupo. Após a produção, todos
verbalizaram sobre sua construção inicial e depois de ser modificada pelo grupo.
Com a técnica de atividade de desenho”, o grupo expressou seus sentimentos
com pintura e Sandra fez um desenho representando altos e baixos nesse processo de
tratamento do filho.
134
O meu desenho eu fiz essa paisagem, que é assim, uma montanha,
onde é cheio de altos e baixos, coloquei o verde que é uma cor de
esperança, significa esperança, é as nuvens chovendo significa o
choro, em muitos momentos a gente tem que se debruçar em choro... .
...acho que Deus colocou na minha vida, esse grupo, esse
tratamento do meu filho, a vontade que ele está em continuar,
disponível a vir pra esse grupo, então eu acho que esse arco-íris é o
que vai realmente brilhar na nossa casa, na nossa família, na vida
dele, e que tudo vai ficar bem, e depois da modificação pelos colegas
de grupo... desenhou o sol, que o sol venha brilhar realmente na
nossa vida, como luz. Então, resumindo: eu vejo um alto e baixo, um
alto assim, porque as vezes você tá cheia de esperança, vai dar certo,
ele não vai mais ficar deprimido, ele não vai mais usar drogas... e de
repente você que começa tudo de novo, você tem que criar força,
arranjar e conseguir para subir de novo. E a cada vez, cada recaída
dessa é mais uma esperança que morre... comigo é assim, é como se
eu me sentisse impotente em relação a transformação, ao
tratamento... (Mãe).
Flávia reforça a idéia de Sandra quando diz:
...É como se a gente tivesse sempre uma dificuldade na vida da gente,
uma modificação, está sempre mudando, está sempre modificando,
hoje está tudo bem, amanhã pode ter tudo mudado, está sempre
modificando... eu pelo menos só vivo assim... (Mãe).
Esses altos e baixos expressados por Sandra e Flávia representam a inconstância
do tratamento de um dependente químico, tornando-se cansativo para os familiares que estão
acompanhando o processo, pois os resultados que surgem, na maioria das vezes, são lentos e
às vezes insuficientes para o familiar, além da instabilidade com relação às recaídas. E o
familiar que às vezes almeja que o vício seja largado com apenas poucos dias de tratamento é
a pessoa que mais sofre, e na prática sabemos que isso não é comum, embora perfeitamente
possível.
Em seguida, Flávia, ao relatar sobre o que produziu, falou e fez questão de
mencionar o quanto seu desenho estava diferente da sessão passada, mais alegre e vivo,
referindo o quanto as palavras de Adriana foram importantes para ela refletir sobre a forma
como tem agido com seu filho, pois, na sessão passada, Adriana passou toda o tempo dando
idéias e sugestões de como deveria agir com o filho, principalmente que ela tivesse um
posicionamento mais firme com ele.
Olha, veja só, já foi modificado bastante o meu desenho da semana
passada pra cá, semana passada, eu desenhei o que? Um boneco, não
sei se vocês lembram, aquela coisa horrorosa (risos), hoje, essa
semana, pra mim foi assim, foi como esse u aqui, bem estrelado,
azul, bonito, aqui, essas montanhazinhas baixas, mas que vão
135
aumentando de tamanho, no início elas são baixas mas no final elas
terminam bem alto, porque eu vou subindo e eu vou chegar lá, porque
eu creio que eu vou chegar... essas pessoas que colocaram aqui...
porque é difícil a gente interpretar o desenho dos outros, mas eu acho
que essa aqui foi como se fosse eu, a mãe, e aqui o meu filho que veio
aqui à minha procura, e ele está aqui tão sorridente, quem sabe feliz,
por não querer mais saber desse vício nojento, sabe? O meu desenho
representa a esperança, e eu estou sempre na esperança, eu vou
vencer, em nome de Jesus, eu vou mesmo. (Mãe).
A esperança e a no Ser Superior são sentimentos sempre presentes nas
verbalizações dos participantes.
Adriana foi a última a falar. Passou a sessão toda calada, apenas observando e
ouvindo. Não dirigiu a palavra nenhuma vez aos participantes presentes, dando a sua opinião
ou conselhos como eles costumavam falar, ao contrário de outras sessões. Ao final, falou de
seu desenho e de sua condição atual de vida e referiu ainda que ficou calada por ter medo de
cometer o mesmo erro da semana passada, ao falar da posição de Flávia com o filho. Sobre
seu desenho, ela disse:
Aqui, eu fiz essas várias pegadas, marcas de caminhadazinhas porque
é uma caminhada, direto, é uma caminhada, é cheia de altos e baixos,
fiz essas nuvens porque meu final de semana não foi muito bom
porque meu filho está desobediente, não porque ele esteja usando
droga, porque depois... que eu sou separada do pai dele, e quando ele
vai para a casa do pai no final de semana, ele vem diferente, depois
fiz o sol porque é uma luz... (Mãe).
Após Adriana falar, em seguida, Flávia mencionou para Adriana que aquilo foi
bom para ela e que ela não havia cometido nenhum erro ao lhe dizer verdades. Observemos na
fala de Flávia:
Porque da outra vez, na sessão passada, ela me disse que eu teria que
aprender a dizer ‘não’ para o meu filho. Na hora que ela disse eu me
chateei sabe, porque eu sempre me chateio quando uma pessoa diz
assim: diga isso, faça assim; mas, de repente, eu vejo no meu dia a
dia que realmente eu tenho que mudar, que é o melhor não pra
mim mas também pra ele. E foi importante para mim (Mãe).
Nesse momento, o grupo deu sinais de que ficou mais fortalecido, de modo que a
coesão grupal aumentava e os participantesestavam se identificando uns com os outros.
Em seguida, enfatizamos o fato de que no grupo alguns estavam vivendo
problemáticas diferentes, mas parecidas e que essa característica de uns ajudar os outros com
sugestões, idéias e afirmações era necessária. Nesse instante, todos concordaram com o nosso
posicionamento como coordenadora.
136
Maria mais uma vez citou a necessidade de respeito entre os participantes, mas
que às vezes é necessário fazermos colocações a fim de ajudar o colega. Ela, como sempre,
entendeu perfeitamente a proposta metodológica de construção do desenho e escolheu uma
folha com apenas uma linha inclinada e, a partir dela, construiu apenas outras linhas com
cores diferentes representando a inconstância da vida de seu irmão que fazia tratamento de
dependência química e ela como espectadora dessa inconstância.
Eu escolhi essa folha porque você pediu que a gente encontrasse algo
que representasse o nosso caminhar, então, aqui tinha um traço
pequeno, que representa um caminho pequeno, que é o início da
caminhada, que foi quando ele disse “sim”, “sim” para o tratamento
e começou a dizer “não” para o uso de drogas, aqui começou a
caminhada, que eu não representei assim em forma de altos e baixos
como algumas das colegas, mas que uma hora... a inconstância que
está no discurso de todo mundo, ninguém pode negar que uma hora
vai estar escuro, outra hora vai estar verde, vai estar animado, outra
hora vai ter suspense, e eu penso que vai ser assim, mas que nunca...
eu coloquei aqui até duas setinhas, que sempre vai... vai ser como a
nossa vida mesmo, de altos e baixos, e que a gente não pára, e aqui
no meio eu fiz um sol, porque eu pensei assim, se a gente vai
caminhando, mas o que vai ser... eu nem pensei que ia passar por
ninguém não. Mas no meu desenho eu não consegui imaginar o que é
que meu irmão irá fazer com a vida dele, além do tratamento, pois ele
não vai viver toda a vida de baixo da minha asa; o quê que ele ia
fazer aqui. O quê que ele vai deixando, vai construindo da vida dele,
ao longo desse caminho que eu representei, mas alguém colocou uma
casa, colocou um jardim com flores e uma pessoa. E receber de volta
esse desenho com essa casa dentro, ah, foi bom, foi positivo, não sei
se coincidência preencheu o vazio que eu deixei aqui, por não querer
me arriscar, a não criar expectativas com relação à vida que é dele,
que ele é que vai ter que decidir o que ele vai fazer.
(Irmã).
Ana escolheu uma folha com apenas uma linha vertical no centro e continuou esse
traçado com linhas em alto e baixo, formando subidas e descidas. Para ela, isso era uma forma
de representar como tem vivido e se enxergado diante dessa condição do filho.
Aqui é o ponto de partida... e sai daqui do grupo, e caminhando,
cheguei aqui, tive assim, uma expectativa muito grande, estava em
cima e de repente a vida vem e vai dar aquela... baixa um pouco mais
a bola, a gente vai e caminha, e caminha, e está caminhando legal e
de repente a gente conversa com as pessoas e elas nos colocam para
baixo, pois o meu filho disse assim: eu nunca mais tive vontade de
beber; a mesma pessoa que nos coloca para baixo diz: isso é porque
ele quer te ganhar no bico, ele quer ganhar a tua confiança; eu caio
novamente, vou lá em baixo, eu começo a conversar de novo com meu
filho,eu vou observando o jeito que ele vai indo eu vou subindo mais
um pouquinho, ele vai caminhando a gente tem até a alegria de ver,
que nesse final de semana foi o aniversário dele, ele se comportou
137
bem, os amigos que foram, não foi gente que botou ele pra baixo, e é
assim que eu me vejo, sobe, caminha, desce, vai em baixo, lá no fundo
do poço, volta, sobe de novo e vamos caminhando de novo. Essa é a
vida de alguém que tem um filho dependente químico” (Mãe).
Além da inconstância, a participante deixa claro que a interferência de alguns
familiares enseja desprazeres, pois mexe com a esperança e muitas vezes reforça o sentimento
de desconfiança do familiar co-dependente para com o dependente químico, dificultando as
relações familiares.
Nara escolheu uma folha com apenas uma linha na vertical separando a folha
em duas partes. Em seguida, fez uma pintura em vermelho de um lado e preto do outro. Com
esse desenho e com essas cores, representou o constante perigo que é conviver com um
dependente químico, além da incerteza do futuro.
Essa semana, foi isso pra mim, o perigo e uma escuridão, o
que aconteceu. Para mim, o vermelho representou o perigo e o
preto a escuridão. A vontade que eu tenho é de pegar o que eu
tiver na minha frente e jogar pra cima dele, fazer uma besteira
mesmo com ele, porque eu trabalho com um carrinho de lanche
então quase todo dia tenho dinheiro, mas ele não sabe
sustentar o dinheiro, se faturo vinte e cinco reais ele gasta todo
o dinheiro, e no outro dia eu trabalho com o que? Quase toda
semana para mim é isso aqui, o perigo que eu corro de estar
com ele também, de fazer uma besteira, ou ele fazer comigo.
(Esposa).
Nara foi uma das participantes que deixou claras as chantagens emocionais com
que um familiar ou alguém mais próximo de um dependente químico convive constantemente,
pois o usuário almeja somente consumir a droga e muitas vezes apela para a venda ou troca
dos bens materiais da própria residência familiar, caso contrário, ele passa a roubar e até
matar para ter como conseguir a droga.
Meu marido bebeu, passou a noite toda bebendo, querendo carregar o
botijão de gás, então eu discuti com ele, porque se eu não desse o
dinheiro que ele queria, ele levaria o botijão, sei que foi duas
vezes, ele me chantageou, duas vezes, tive que dar o dinheiro que ele
queria em troca do botijão, porque por duas vezes ele pegou o bujão,
e eu não tenho a força de lutar com um homem, vem a chantagem, ou
dar o que ele quer, ou amanhã eu não faço comida e nem o mingau da
criança. (Esposa).
Nessa sessão, exceto Adriana, todas falaram bastante de suas problemáticas e
principalmente das questões que Nara vivenciava com a dependência química do esposo.
138
Ao final, antes mesmo de propor a técnica de avaliação, fizemos um fechamento
para o grupo, ou seja, uma “leitura” do grupo e resumidamente de cada participante, aquilo
que mais chamou a atenção, descrevendo o processo grupal vivenciado por todos.
Para avaliar o encontro, foi realizada a técnica das medalhas”. Os participantes
avaliaram como estavam saindo do grupo e como havia sido a sessão. Para isso, atribuíam
medalhas, podendo ser ouro-excelente, prata-bom e bronze-ruim.
Maria (irmã): É, eu escolho ouro, porque para mim os grupos são para ajudar
as pessoas que se encontram com os mesmos problemas. Então eu às vezes chego no grupo
me sentindo ruim, péssima, e a gente sai como se tivesse trazido um peso, carregando um
peso mesmo, qualquer coisa pesada, e que deixa aqui, e que vai embora mais leve. Eu me
sinto muito bem no grupo.
Ana (mãe): Eu quis escolher o ouro também, mas eu estou vendo que eu tenho
que escolher ainda a prata, porque já que eu tenho que melhorar bastante ainda. Mas hoje eu
estou bem, eu saio muito bem daqui, é muito bom estar aqui, tanto que eu não pude vir
semana passada, senti falta. Eu sempre saio daqui muito bem, meu astral fica em cima,
minha auto-estima também, vou tendo mais paciência com meu filho. O grupo está me
ajudando muito, muito, muito mesmo, eu estou adorando, e quero colaborar, e ajudar
também outras pessoas.
Sandra (mãe): Para o grupo eu tiro o ouro, está sendo uma ajuda e
conhecimento e para mim eu tiro o bronze, porque eu não sabia de nada...
Nara (esposa): Para mim hoje, eu vou tirar o ouro, apesar de ter passado muitas
coisas essas semana, mas pra mim o ouro, não assim materialmente, mas pela minha força e
meu sofrimento. E para o grupo, ouro também, porque foi bom, eu ouvi muitos conselhos,
minha cabeça vai sair melhor daqui hoje.
Flávia (mãe): Eu vou tirar o bronze, porque eu acho assim, eu estou numa
caminhada, estou caminhando nesse dia-a-dia, até chegar no ouro, porque a minha
esperança é essa, e eu estou a espera disso, sei que vou chegar lá, para o grupo, eu estou
tendo acompanhamento e tiro prata, porque eu quero ver coisas melhores, mais e mais
melhores.
Adriana (mãe): para mim eu tiro prata porque eu não passei um final de semana
muito bom e para o grupo eu tiro ouro, que foi muito bom, você vai aprendendo mais e mais,
uns com os outros, foi uma maravilha.
Ao final, solicitamos aos participantes do grupo sugestões do que eles gostariam
de fazer nos próximos encontros. Adriana se manifestou referindo que fosse feito novamente
alongamento no momento do relaxamento. Ana referiu que a condução do grupo estava indo
bem e que, entre as técnicas de avaliação, a das medalhas deveria ser repetida em outra
ocasião. Em seguida, o grupo solicitou que continuássemos realizando técnicas que
utilizassem pintura e desenhos como forma de expressão e produção de dados.
Nessa sessão, o conteúdo que emergiu foi a questão da instabilidade do tratamento
de um dependente químico, cuja família também sofre com isso, além de questões como a
139
falta de apoio e incompreensões de alguns familiares para com esses outros componentes da
família que estão acompanhando de perto o tratamento destes dependentes químicos.
Geralmente, esses que estão mais próximos são a mãe, o pai, o irmão, a irmã, a esposa, o
esposo ou os filhos. Nesse dia também emergiram mais informações sobre cada participante,
sendo possível conhecer um pouco mais de cada um deles.
Houve bastante feedbacks entre eles, porém o que mais prevaleceu foi a atenção
que o grupo deu à probletica da Nara.
Maria, Ana, Sandra e Flávia comoveram-se com os problemas de Nara.
Percebemos de certa forma um desejo em tentar ajudá-la a resolver sua situação com seu
esposo e certa proteção do grupo para com Nara. Esta foi a participante mais jovem do grupo.
Maria e Ana se colocavam dando opinião aos outros participantes do grupo,
agindo sempre com a devida coerência em suas idéias e sugestões, talvez pelo grau de
instrução.
7.2.4 Sessão III – o processo grupal
A seguir, apresentaremos o quadro 8 com a síntese de tudo o que foi realizado na
terceira sessão do processo grupal e, logo após, descreveremos a sessão.
Quadro 8 - Demonstrativo da sessão III da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
16/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão III
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento:
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de sentimentos e
fatos de sua vida diária que
estavam incomodando os
participantes.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparando os participantes
para refletir sobre suas relações
familiares.
- Construção de uma árvore
baseada nos seguintes
questionamentos: como você
visualiza as relações em sua
família? Como a co-dependência
se expressa nessas relações?
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação:
- Avaliação da sessão.
-Escolha de flores e
oferecimento pelo participante
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento: viagem
imaginária “Uma
vista da montanha”.
- Técnica:
“Percepções de
minha família”.
- Técnica de
avaliação: “Que bom
que pena e que tal?”
- Oferecimento de
flores.
- Proporcionou bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Promoveu a auto-
percepção dos
participantes.
- Proporcionou que
os participantes do
grupo conheçam
melhor uns aos outros
facilitando o processo
de apoio e suporte.
- Estimulou a
verbalização de
sentimentos
partilhado com todos
os membros do
grupo.
- Contribuiu para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
140
para qualquer outro membro do
grupo; a flor simbolizava algo
que o participante queria ofertar.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Promoveu a
interação grupal
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
- Proporcionou
momentos de
reflexão sobre as
relações familiares.
- Contribuiu para que
os participantes
analisem de que
forma a co-
dependência tem se
expressado em suas
vidas.
- Contribuiu para a
ocorrência de fatores
curativos como
instilação de
esperança e
universalidade entre
os membros do
grupo.
Fonte: elaborado pela autora.
Participaram dessa sessão as integrantes Maria, Ana, Janete, Andréia, Adriana e
Helena.
Nara, que o participou da sessão nesse dia, chegou antecipadamente para
justificar sua ausência no grupo. Referiu que não havia com quem deixar seu filho, já que seu
esposo tinha ido à Casa do Cidadão retirar a segunda via de seus documentos, pois havia
perdido em uma de suas saídas para consumir drogas. Ela referiu que ele estava alcoolizado
ao perder os documentos. Nara fez questão de vir pessoalmente ao serviço, pois queria
conversar individualmente com a coordenadora principal. Falou sobre suas atitudes para com
o esposo e para com ela mesma. Disse que após ter vindo ao grupo, estava se preocupando
mais consigo, cuidando melhor do seu bem-estar físico e mental e de sua aparência. Referiu
que o grupo estava lhe fazendo bem.
...eu melhorei muito depois do grupo, eu vivia muito angustiada,
agora eu não sou mais assim de estar me preocupando, estou
dormindo direito. ...Outra coisa: eu não usava calça, eu tinha
vergonha porque eu estou magrinha, pensei: sabe de uma coisa todo
mundo vai de calça e eu que vou de saia pro grupo, até calça eu
passei a usar, eu não usava antes, tinha vergonha de colocar essa
roupa em mim, agora já não tenho mais. (Esposa).
Aos poucos os participantes chegaram. Ana, Maria e Adriana foram as primeiras
pessoas a chegar. Ana estava intranqüila e compartilhou sua intranqüilidade com Maria e
141
Adriana. Posteriormente, chegaram Andréia e Janete e, por último, Helena que entrou na sala
atrasada, interrompendo o grupo e carregando uma bolsa cheia de pertences, pois sempre
quando tinha oportunidade ela falava dessa sua bolsa, referindo que nela tinha roupas para seu
filho trocar ao tomar banho no CAPS todos os finais de tarde, materiais de higiene pessoal e
até um pedaço de fio de eletricidade que seria utilizado para bater em seu filho sempre que
necessário, geralmente quando ele estava querendo dinheiro ou bens para trocar por drogas.
Helena chegava sempre muito atrasada e apressada. Demonstrava tristeza
profunda, tinha comportamento ansioso e sempre chorava com facilidade durante a
verbalização de suas experiências e de acontecimentos diários que envolviam seu filho
dependente químico.
A sessão começou no horário previsto, com a presença de seis participantes.
Como no acolhimento sempre recebíamos os participantes com boas-vindas e
procurávamos saber se o grupo tinha algum assunto breve que gostaria de expressar, nesse
dia, fugiu um pouco à rotina, pois esse acolhimento demorou um pouco mais, que a
intranqüilidade de Ana e Helena foram compartilhadas com todos, porquanto as duas
participantes encontravam-se fragilizadas e necessitando de mais apoio. A conversa se
estendeu com os comentários de Maria e Andréia. Nesse dia, nosso acolhimento se estendeu
por muito tempo.
O momento do acolhimento propriamente dito o foi devidamente delimitado,
pois, à medida que os participantes iam chegando, eles próprios começaram a falar de seus
problemas com seu familiar dependente químico; suas relações, seus avanços e recuos nesta
caminhada, dúvidas e receios. Envolvemo-nos com todos e, quando observamos o tempo, já
era hora de começar a atividade de produção.
Nesse dia realizamos relaxamento com o grupo. Sugerimos que eles imaginassem
uma viagem induzida, uma vista da montanha (LIEBMANN, 2000). Com o som de uma
música instrumental, solicitamos ao grupo que respirasse profundamente, preparando-se para
fazer uma viagem.
Viagem: “Vista da Montanha”
Você está em certo lugar no campo, um lugar muito bonito, verde, com muitos
pássaros, um lago com águas claras, escute o som das águas escorrendo... montanhas,
muitas montanhas, e nela você tenta escalar... Escale-as... Descreva essa viagem ao atingir
essas montanhas... Atinja o topo das montanhas... Olhe a vista... E de cima você visualiza
muitas coisas, inclusive sua família, você visualiza sua família... Todas as pessoas mais
próximas de sua família as quais você convive... Quem são elas? O que você enxerga neles?
Como está sendo sua relação com eles? Como é essa relação de vocês? O que você gosta? O
142
que você não gosta? Agora visualize mais uma vez a beleza dessas montanhas que cercam
esse local e desça para junto de sua família. (Coordenadora principal).
Coordenadora Principal: Como foi essa viagem para vocês? Conseguiram
relaxar?
Andréia (mãe): Foi maravilhosa, porque consegui relaxar, pois em visualizar
já faz bem.
Ana (mãe): Consegui relaxar.
Maria (irmã): É sempre bom fazer esses exercícios de relaxamento. Foi muito
bom, e quando a gente tenta imaginar mesmo, às vezes a gente chega a sentir, como se
estivesse no ar puro de um local, é como se não estivesse no ar condicionado.
Janete (irmã): Hoje foi bem (risos). Não tive vontade de chorar (risos). Como se
eu estivesse na praia, não sei...
Adriana (mãe): O relaxamento foi ótimo! Foi maravilhoso e eu não queria nem
acordar daquele sonho, daquela viagem à montanha. Eu vi a água caindo da cachoeira.
Após o relaxamento, iniciamos o momento de produção individual, utilizamos a
técnica “Percepções de minha família”. Essa técnica foi criada adaptando as técnicas
“Retratos de família e Esculturas das relações familiares” (LIEBMANN, 2000). O
participante deveria representar as relações em sua família, colocando cada pessoa numa
posição em relação às outras, explicando a importância e distância emocional entre eles. Tudo
isso foi simbolizado em uma árvore. Para a construção, os participantes basearam-se nas
seguintes questões: Como você visualiza as relações em sua família? Como a co-dependência
é expressa nessas relações?
Para a construção da árvore, sugerimos que os participantes imaginarem que sua
família fosse uma árvore daquele campo, e que essa árvore deveria ser desenhada pensando na
disposição de todos os membros, principalmente dele e de seu familiar dependente químico.
Observemos a imagem das produções:
143
Foto 4 – Sessão grupal III.
Fonte: Pesquisa.
Andréia começou a falar sobre sua produção, comparando com uma árvore firme
e estruturada, mas, com esse problema, a árvore tombou. Andréia se colocou como sendo a
rosa principal, mas hoje não é, e atualmente apóia-se psicoemocionalmente nas filhas.
Compara sua vida atual com uma árvore tortuosa e diz:
Eu representei essa árvore assim torta, é como eu me sinto agora, e é
assim que está minha família, mas eu estou me segurando nos outros
filhos... ou seja, eu e o pai estamos nos segurando primeiramente em
Deus e depois nos outros filhos. (Mãe).
Andréia compara sua família com uma árvore que está pendendo, próximo de cair,
e que se não tiver sustentação agindo, rapidamente cairá. Estando com medo de não poder
segurar a árvore.
No processo grupal, os participantes demonstraram o medo como um dos
sentimentos mais presentes na vida dessas pessoas. Zampieri (2004), estudando o padrão de
co-dependência e prevalência de sintomas psicossomáticos, observou que diferentes
espécies de medo, entre eles, medo do futuro, de errar e de prováveis recaídas.
Ana iniciou esse momento de verbalização, expressando medo de errar e de
possíveis recaídas do filho. Na construção de sua árvore, ela simbolizou, comparando as
raízes a Deus e o tronco ao seu esposo que já faleceu; deles, ela recebe a força necessária para
144
dar sustentação à árvore que vem apresentando um grande galho com risco de queda. Esse
galho é seu filho, que vem sendo sustentado por uma estaca, que são os tratamentos
dispensados ao filho e a ela. Outras pessoas próximas, como o namorado, a irmã, a mãe, a
filha e ela própria foram dispostas na árvore como sendo frutos e flores. Essas pessoas vêm
participando de sua vida dando-lhe um melhor colorido, ou seja, elas participam diretamente
com ela dessa co-dependência, principalmente sua filha que também é adolescente.
Em seguida, Maria também fez alusão às raízes de sua árvore como sendo Deus,
além de estar na condição de luz que a ilumina. Já o tronco foi representado por ela e pela sua
mãe, familiares mais próximos de seu irmão usuário, que sofrem diretamente com a co-
dependência. Na copa da árvore, encontram-se seu esposo, suas filhas e seu irmão, que é
usuário de droga. Maria fala do amor de Deus pelas pessoas e que devemos fazer o mesmo.
Mostra sua resignação por sua condição de co-dependente, referindo que, assim como Deus,
ama seu irmão, mesmo não concordando com suas ações e pensamentos.
Em contraponto a essa resignação, Maria apresenta-se revoltada por sua condição
de co-dependente, já que seu irmão escolheu a dependência de drogas, mas ela e sua mãe não
escolheram essa condição, conseqüentemente os sonhos deles vão embora junto com a
dependência de drogas que foi uma escolha apenas dele e diz: pelo menos eles escolheram... e
eu não escolhi... ruim é estar sofrendo por uma coisa que você não escolheu... (Irmã).
A indignação é um sentimento do co-dependente que Maria afirmou no decorrer
desse encontro, principalmente ao descrever sua produção artística, quando aludiu à
dependência química, comparando-a a uma brisa negra, referindo que:
O meu irmão tem um pensamento meio distorcido, eu acho, não sei a
compreensão dele com o mundo, pois aqui no desenho no meio dessa
brisa que envolve a árvore tem um vento preto que representa a
dependência química dele... (Irmã).
Revelou ainda que, embora compreenda a dependência química como sendo uma
doença, ela é contra essa visão de doença, ou seja, do modelo médico, não concordando com a
aceitação das recaídas constantes. Para ela:
...tem os momentos de queda e de fraqueza, mas acho que devemos
advertir, deixar bem claro sobre essas recaídas porque se não se
tornará o quê? Vou usar de novo porque no meio do tratamento tem
recaídas mesmo? Como se fosse um direito? porque está em
tratamento? Eu acho e acredito que não. Quando conversamos sobre
isso ele diz que é uma cobrança e quer abrir mão disso, mas não acho
que seja certo ficarmos passando a mão sempre que ele tem uma
recaída. Eu disse para ele que não estava disposta a estar
participando de todas as recaídas de que ele tivesse direito. (Irmã).
145
Na produção de arte, Helena fez uma paisagem com coqueiros, sol, lua, aves,
cachoeira, os peixes e patinhos, comparando-os com seus filhos, que estão lhe dando muito
trabalho, principalmente seu filho adolescente usuário de drogas. Sente-se como uma ave que
precisa cuidar de seu ninho para que nada de mau aconteça com seus filhotes. Não se deteve
muito na produção do desenho, porém falou bastante, de sua vida, de sua dificuldade de
relacionamento com o filho usuário, da filha, que também está iniciando o consumo freqüente
e o seu ex-esposo que, segundo ela, não a ajuda a resolver os problemas. Para o grupo, Helena
passa a impressão de que seu ex-esposo tem todo o poder de resolver os problemas de seu
filho dependente químico, mas ele não se interessa e ela o culpa por o se dispor nessa luta
junto a ela.
Helena recebeu feedback de Ana, Adriana, Maria e Andréia, todas tentando
entender as questões suscitadas e ajudá-la.
Helena falou sobre seu sofrimento diante das questões de sua família, que envolve
seus filhos, esposo e dependência química, revelando que muito tempo perdeu sua vontade
de viver, de se arrumar e de se cuidar, além de sua auto-estima.
Janete relatou que muitas coisas já melhoraram, mas a tristeza ainda afeta seu ser.
Restringiu-se a descrever seus sentimentos e acontecimentos freqüentes de sua vida que tem
envolvido sua família, principalmente o irmão usuário de drogas. Em todas as questões
suscitadas, a dependência química estava envolvida. Janete não expressou nenhum fato
relacionado à construção de sua árvore.
Com relação à Janete, sua presença foi percebida por Maria como desnecessária.
A impressão que ela transmitia era de que o havia necessidade de estar no grupo e, de
acordo com Maria, era como se ela já estivesse com tudo resolvido.
A última participante a se expressar sobre sua produção de arte foi Adriana,
relatando solidão e desentendimento familiar ao falar sobre sua árvore:
O tronco da minha árvore sou eu mesma, pois minha mãe me coloca
em baixo, sabe me derrubar, meu pai diz muitas coisas, depois
que me separei de meu esposo, a minha família não se entende bem
comigo. O tronco da minha árvore sou eu e meu filho, ou seja, minha
família, e está ai, está verdinha, está com frutos. (Mãe).
Realizamos a avaliação do encontro com a técnica: “Que bom, Que pena e Que
tal?” (GOMES, 2001). As pessoas avaliaram como foi o encontro com uma palavra ou frase.
146
Andréia (mãe): que bom, o relaxamento foi maravilhoso, que pena que a gente
ainda não conseguiu resolver ainda o que quer que seja que os filhos saiam da droga...
esperança; achei ótimo esse encontro, a gente chega em casa com mais coragem.
Ana (mãe): que bom estar aqui, que a gente se sente muito bem; que pena que as
pessoas passam por esse sofrimento que a gente escuta falar... e quem sofre no final dessa
história somos nós; que tal se nós fizéssemos uma festa (risos).
Maria (irmã): que bom que a gente pode estar juntas hoje, eu sinto falta, no final
de semana eu fico imaginando chegar a segunda-feira e chego até a pensar no dia que
possivelmente não existir o grupo... o grupo é bom, a gente se sente uma super pessoa, mas
tem o dia que estamos precisando de apoio. Que pena que ainda tem gente no grupo sofrendo
com situações que nos deixam vulneráveis e que talvez nos próximo encontro possa contar, e
dizer e divulgar coisas boas de nossos familiares, para que no próximo encontro nós
possamos compartilhar coisas boas, mas se não houver que tal compartilhar também o que
está deixando o outro angustiado.
Adriana (mãe): que bom estar aqui; que pena a colega Helena estar um pouco
sofrida, mas todas vão tentar ajudá-la, que me tocou muito a situação dela; que tal continuar
com esse tipo de grupo de apoio por muito tempo no CAPS.
Ao final da avaliação todas referiram estar saindo melhor do grupo. Realizamos a
técnica “Simbologia da árvore”. Nela compartilhamos com todas as participantes do grupo
flores, denominadas crisântemo Lilás, nesse momento cada um dos participantes ofertou entre
si, como uma forma de se fortalecer, de desejar coisas boas umas as outras.
Ana ofertou para Helena e disse: vou para uma pessoa que eu acredito que
ela está precisando muito se fortalecer, então eu espero que com essas flores simbolizando a
esperança, que a vida dela floreça, que os problemas dela desabrochem e desapareçam
(Mãe). Helena ofertou para Adriana. Adriana para Maria. Maria para Janete.
Janete ofertou para Andréia e disse: é por que ela hoje está um pouco triste
(Irmã).
Andréia ofereceu à coordenadora principal e disse: porque simboliza a dedicação
que temos recebido de você, pois se preocupar com um tipo de trabalho como esse, ou seja, o
sofrimento dos familiares, não é qualquer profissional que faz isso, que você tenha força para
continuar com esse trabalho. (Mãe).
Em seguida, a coordenadora principal ofertou para todas as pessoas do grupo que
estavam presentes. A primeira delas a receber foi Ana. E a coordenadora principal disse: (...)
pela rosa que você é, para que você se cobre menos e se fortaleça e seja mais forte em alguns
aspectos, saiba filtrar o que as pessoas de sua árvore têm de bom para lhe dar... E para a
Helena isso é um chamado, para que você aprenda a ser mais você mesma, a cuidar de si.
Depois ofertamos para todas as outras: Adriana, Maria, Andréia e Janete.
7.2.5 Sessão IV – o processo grupal
147
A seguir, apresentaremos o quadro 9 com a síntese de tudo o que foi realizado na
quarta sessão do processo grupal e, logo após, iniciamos sua descrição.
Quadro 9: Demonstrativo da sessão IV da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
23/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão IV
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento
- Recepção dos participantes.
- Relembrando a sessão III
Como têm ocorrido as relações
familiares e como a co-
dependência tem se expressado
nessas relações.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparação para o momento de
expressão.
- Representação através da
construção de um relógio de
como tem sido sua rotina diária
como familiar de um dependente
químico; como a co-dependência
se expressa nessa rotina diária.
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação:
- Avaliação da sessão.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Alongamento
corporal”.
- Técnica: “Relógio
da vida”.
- Avaliação da
sessão.
- Proporcionou bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Contribuiu para o
entendimento da
relevância de refletir
sobre as relações
familiares e a
expressão da co-
dependência nessas
relações.
- Promoveu a auto-
percepção dos
participantes.
- Refletiu sobre a
condição de co-
dependente e qual a
repercussão diária na
vida dos participantes
do grupo.
- Estimulou os
participantes a
analisarem sua rotina
diária como familiar
de um dependente
químico.
- Estimulou a
verbalização de
sentimentos.
-- Contribuiu para
que os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
- Promoveu a
interação grupal.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
Participaram desse encontro cinco integrantes do grupo de familiares: Sandra,
Andréia, Janete, Adriana e Helena.
148
Sandra foi a primeira participante a chegar e aparentava tristeza. Em seguida,
Andréia e Janete que, ao entrarem na sala, perceberam a tristeza no rosto de Sandra. Depois
chegou Adriana e por último Helena, que adentrou a sala após o acolhimento.
Durante o acolhimento, procuramos saber como cada uma das participantes estava
se sentindo e como haviam passado a semana. Justificamos a falta dos que avisaram
antecipadamente e relembramos a sessão passada, quando as participantes deveriam na
atividade proposta visualizar as relações em sua família, deixando claro como a co-
dependência se expressava nessas relações.
Ao darmos espaço para cada um dos participantes expressarem como estavam se
sentindo, Andréia foi a primeira a falar. Mostrava-se comovida com a tristeza de Sandra. Ela
falou de sua experiência de vida e que sua idade estava avançada para que ela vivenciasse
tanto sofrimento. Relatou que estava sentindo falta de alguns de seus bens, e sempre vigiando
os passos do filho, ou seja, vinha tratando-o com liberdade assistida, mas que o mais
importante era recuperá-lo e jamais perder as esperanças. Referiu que o filho quis se
suicidar e, por isso, necessitava de ser forte, precisando estar sempre dosando amor, carinho e
atenção com limites.
Em sua fala, Andréia se dirigia a Sandra, instilando esperança, assim como se
quisesse fortalecê-la diante de tanta tristeza e desesperança expressas em seu rosto. Sandra
somente escutou e agradeceu ao final.
Adriana relatou que estava bem, mas não descansava e estava sempre sob tensão,
observando todos os passos do filho. Utilizou inclusive a expressão marcação cerrada’, para
nomear o seu comportamento para com o filho. Quanto ao risco de suicídio expresso por
Andréia, Adriana suscitou uma possível depressão provocada pelo consumo de algumas
drogas, como o crack, utilizada pelo filho de Andréia, e o êxtase, droga que está crescendo
muito em utilização no momento.
No mundo, estima-se que 14 milhões de pessoas façam uso abusivo de cocaína. No
Brasil, de acordo com o I Levantamento Domiciliar sobre o uso de Drogas, realizado
pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID),
constatou-se que 7,2% dos indivíduos do sexo masculino, entre 25 e 34 anos de
idade, usaram a droga, e dados epidemiológicos recentes mostram que o uso de
cocaína/crack vem crescendo nos últimos anos entre os estudantes do ensino médio
e fundamental, bem como entre os pacientes que procuram atendimento nas clínicas
especializadas. (CUNHA et al., 2004).
Sandra falou de sua angústia, ao referir que o filho estava há três dias fora de casa
sem dar notícias. Ao falar, sua voz saía trêmula; os outros participantes se comoveram com
seu depoimento. A participante fez o seguinte relato:
149
Tomei um comprimido de diazepam e dormi a noite inteira. É a única
forma que eu tenho realmente de dormir e não pensar e se eu não
fizer, não consigo trabalhar, não consigo dirigir, não consigo fazer
nada, fico nervosa. A única forma que eu acho é tomar esses
comprimidos para suportar. (Mãe).
O filho de Sandra estava com dificuldade de aderir ao tratamento e a mãehavia
expressado por várias vezes que vinha lutando contra o desinteresse do filho. Vejamos seu
depoimento:
É difícil demais, porque você senta, conversa, ele finge que vai
obedecer, finge... (Mãe).
Janete interferiu no discurso de Sandra, referindo que chegava um ponto em que
essas pessoas o mereciam que sofrêssemos por elas. Referiu, também, que seu irmão não
tinha usado o crack, mas que, no final de semana, continuava consumindo álcool e que ela
procurava não se envolver mais com ele, embora ela o amasse tanto. Infelizmente, porém,
uma de suas filhas, de tanto conviver com a problemática na família, vinha assumindo esse
papel de protetora do tio. E por ser uma criança e estar sempre preocupada com o tio, ela
estava apresentando comportamento anormal para uma pessoa de sua idade, com medo de sair
só, tendo sono intranqüilo e com pesadelos, choro fácil e sempre pensando ou falando no tio,
questionando se ele havia se alimentado, onde estava e com quem, se estava bebendo ou
será que ele vinha para casa. Janete referiu que agora, mais do que nunca, tinha que continuar
no grupo para se fortalecer e cuidar da filha, pois a dependência química de seu irmão havia
atingido sua filha.
Janete recebeu feedback de Sandra, Andréia e Adriana, aprovando o
comportamento dela para com o irmão usuário.
Helena o participou do acolhimento porque chegou atrasada, mas pediu
desculpas ao grupo, referindo que preferiu chegar atrasada a ter que faltar a sessão.
Iniciamos o momento do desenvolvimento com um alongamento corporal
conduzido pela coordenadora auxiliar. Em seguida, explicamos a técnica “Relógio da vida”.
Essa técnica foi realizada com o emprego de colagens, pinturas, desenhos e outras criações
diversas. O grupo formou o seu relógio da vida, representando um dia de suas vidas, ou seja, a
rotina diária como membro familiar de um dependente químico. No momento da criação do
relógio, realizamos as seguintes questões: Como tem sido sua rotina diária como familiar de
um dependente químico? Como a co-dependência é expressa nessa rotina diária?
150
Durante a construção individual, não deveria haver conversa entre os participantes
e, após essa construção, todos verbalizaram sobre sua produção. O material utilizado foi lápis
de cores, lápis de cera, tinta guache, cola, tesouras e papéis diversos.
Os participantes realizaram a atividade solicitada de forma concentrada. Apenas
Sandra, que deixou seu telefone celular ligado e este chamou na hora da produção de arte,
parando sua atividade para atender.
A seguir, apresentamos a imagem do conjunto de produções dos participantes:
Foto 5 – Sessão grupal IV.
Fonte: Pesquisa.
Após a produção, a primeira participante a falar foi Helena, que iniciou sua
verbalização referindo sobre seu desenho, o qual representava um relógio de alguém que
passa 24 horas no ar. Vejamos o que relatou sobre o seu relógio:
Meu relógio, ou seja, minha vida são 24 horas no ar. É a cabeça que
não pára de pensar nenhum minuto... Minha vida é correndo tentando
chegar a algum lugar e até agora ainda não cheguei... Meu
pensamento, que eu vivo nas 24 horas, é assim de voar, de ir embora.
Não vejo a hora de me aposentar; ou eu vou pra Recife, ou pra
Petrópolis, eu vou embora e ele fica aí com o pai dele. (Mãe).
Quando a participante referiu que o pára de pensar, estava se reportando a sua
atenção, que é constantemente voltada para o filho dependente químico.
151
Helena não foi uma participante assídua ao grupo. Estava sempre apressada,
chegando quase sempre atrasada, e nos dias em que estava presente nas sessões do grupo, às
vezes, era interrompida por seu filho, que insistia em falar com ela ou saber se ela estava
mesmo presente.
Sentimos que o grupo não aprovava aqueles momentos em que era atrapalhado,
demonstrando uma espécie de rejeição por tudo aquilo que ocorria. Helena, como participante
do grupo, sentia essa rejeição e tentava se explicar, sempre dando justificativa, entre elas: de
que era sozinha para tudo; o pai não ajudava a cuidar do filho e ela necessitava cuidar dele,
pois o adolescente morava na rua e, diariamente, ela levava o almoço dele para o CAPS-ad
onde ele realiza tratamento ou para a praça onde ele se abriga.
Sandra extravasou sua tristeza, ao realizar sua produção individual e verbalizar
sobre seu significado, chorando. Após esse momento continuou chorando por certo tempo,
comovendo os participantes presentes. Ao descrever sobre seu relógio da vida ela disse o
seguinte:
A cada dia que eu me acordo as 06h00... a primeira coisa que eu faço
é ir para o quarto dele. E como eu gostaria de poder encontrar ele
assim, ele no colo protegido de tudo e todos. Mas infelizmente, ele
cresceu e eu não posso mais fazer isso. 24h00 é a hora mais
angustiante da minha vida... Pois eu fico esperando ele chegar e fico
imaginando como está meu filho. Será que ele está embriagado,
drogado? Será que ele caiu? É isso que eu sinto o dia todo; é essa
ansiedade, esse medo, essa angústia...(Mãe).
Andréia, mais uma vez, se voltou para Sandra, aconselhando-a a orar cada vez
mais e, em seguida, lhe ofertou um livro que, segundo ela, a ajudou muito nos momentos
difíceis. Helena também lhe dirigiu palavras de apoio.
Janete não deu muita importância à produção que fez e descreveu que ela
estava bem e que não estava mais tomando redio para depressão e insônia, como antes de
começar os encontros grupais.
...eu não pensava em mim, nos outros. Porém, com o grupo eu
resolvi a pensar em mim. No momento que eu tomava os
comprimidos, era pra dormir... E em um momento, eu disse: eu vou
parar. Porque se eu tivesse continuado a tomar tanto diazepam e
remédio para depressão, como eu tomava, hoje eu acho que eu não
estava contando histórias, porque eu estava dependente deles. Eu
resolvi parar pra pensar em mim um pouquinho. Acho que ainda não
estou pensando muito, mas eu parei pra pensar um pouco em mim.
Porque, antes, eu não conseguia sorrir... (Irmã).
152
Adriana em seu relato, deixou clara sua rotina diária ao cuidar de seu filho. Em
seu relógio, demonstra o cuidado diário para com o filho, o horário de acordar, dormir e tomar
a medicação, os dias em que vai ao CAPS-ad, a alimentação, enfim uma rotina a cumprir e,
somente aos sábados, que ela reserva para se dedicar a si, ir para as amigas, a igreja, pois o
filho vai para a casa do pai.
Andréia relatou que sua preocupação maior era o momento do horário da
medicação de seu filho, pois tinha medo de que ele consumisse outras substâncias, como
álcool, para obter o efeito de outras drogas pesadas. Esclareceu em sua produção que:
De 06h às 12h da manhã é aquela despreocupação, porque eu faço
minhas coisas despreocupada, e nem corro para pastorar ele, porque
esse horário da manhã ele não pega nesse negócio de drogas. Minha
preocupação maior é de 12h até as 18h. Aí chega a hora do remédio e
eu fico: será que ele vai tomar o remédio? Ou será que ele vai tomar
droga? (Mãe).
Avaliamos o encontro e nesse momento os participantes deveriam dizer como
tinha sido a sessão. Andréia começou falando; em seguida, as outras pessoas. Como resultado
da avaliação da sessão pelas participantes tivemos:
Andréia (mãe) excelente.
Sandra (mãe) excelente.
Janete (irmã) excelente.
Adriana (mãe) excelente.
Helena (mãe) boa demais.
Após a realização da técnica de avaliação pedimos sugestões ao grupo de como
conduzir as próximas sessões, e quais atividades gostariam que trouxéssemos. Não houve,
porém, nenhuma sugestão diferenciada. Apenas Adriana pediu que mantivéssemos o
momento do relaxamento e atividades com desenhos e pinturas.
Finalizamos o encontro fazendo um resumo geral do grupo, do que havia ocorrido
e daquilo que mais chamou a atenção na produção e verbalização de cada participante.
7.2.6 – Sessão V – o processo grupal
A seguir, apresentaremos o quadro 10, com a síntese de tudo o foi realizado na
quinta sessão do processo grupal e, logo após, iniciamos sua descrição.
Quadro 10 - Demonstrativo da sessão V da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
30/07/07 Sessão V 1º momento: Acolhimento - Exposição
dialogada e
- Proporcionou bem
estar dos
153
13h30min às
16h00min.
Fase de
intervenção
(processo)
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de assuntos
considerados importantes para os
participantes.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Construção de desenho que
retrate o encontro com o guia
sábio.
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação
Avaliação da sessão por meio de
palavras.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
participativa;
- Técnica de
Relaxamento:
Viagem imaginária:
“O guia sábio”.
- Atividade de
desenho: “Pintura
com dedos”.
- Avaliação com
palavras.
participantes no
espaço grupal.
- Refletiu sobre o
término da fase de
intervenção grupal.
- Preparou os
participantes para a
fase de avaliação
grupal.
- Proporcionou
espaço para que os
participantes do
grupo reflitam sobre
o que estão
vivenciando.
- Estimulou a
liberação de
sentimentos por meio
da imaginação e
intuição.
- Proporcionou que
os participantes
encontrem respostas
para suas dúvidas nas
relações familiares
com o dependente
químico.
- Contribuiu para que
os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
- Promoveu a
interação grupal.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
As participantes dessa sessão foram: Andréia, Adriana, Flávia, Ana, Maria,
Eunice e Janete.
Realizamos a recepção dos participantes com uma música instrumental, iniciando
a preparação para a fase seguinte: mais uma vez utilizamos a técnica daviagem imaginária”.
O momento também foi oportuno para procurar saber se o grupo tinha algum assunto que
gostaria de discutir. Nessa sessão, além de intervenção grupal, tivemos como objetivo fazer o
grupo refletir sobre o término da primeira fase, ou seja, preparando-o para a separação de cada
participante, pois haveria mais uma sessão de intervenção e iniciávamos a fase de avaliação
grupal.
154
No desenvolvimento, convidamos os participantes para um relaxamento por meio
de uma imaginação dirigida que chamamos de ‘Viagem imaginária’. O nome da técnica é “O
Guia Sábio” (LIEBMANN, 2000).
Ao ar livre em um dia calmo e ensolarado... Nesse momento você se
encontra em uma clareira na floresta... Perceba os cheiros e os sons...
Sinta muita segurança... Há uma trilha na mata... Você chega a uma
clareira... uma fogueira no centro dela... Do outro lado da
fogueira está o seu guia sábio, esperando calmamente... Coloque uma
acha no fogo... Sente-se com a pessoa sábia e converse bastante com
ele... Como ele é?... Quando estiver pronto, faça uma pergunta...
Ouça a resposta... Descanse um pouco e agradeça seu guia... Ele o
abraça quando você sai e lhe um presente de recordação do
encontro que vocês tiveram... Você volta à trilha calmamente... Para a
clareira inicial. E agora pense na pergunta que você fez e a resposta
que o guia lhe deu e expresse através da pintura. (Coordenadora
Principal).
A seguir, apresentamos uma imagem do grupo no momento do relaxamento.
Foto 6 – Sessão grupal V.
Fonte: Pesquisa.
Na produção de arte individual, os participantes deveriam criar um desenho que
retratasse sua pergunta e resposta ao guia sábio da viagem imaginária, um resumo daquilo que
você mais gostaria de saber. Os desenhos foram confeccionados com tinta guache, utilizando
apenas os dedos, ou seja, “Pintura com dedos”. Durante a verbalização, o mais importante era
que o grupo conversasse sobre as perguntas e resposta obtidas no momento da viagem
155
imaginária que o familiar de um dependente químico gostaria de fazer para a pessoa escolhida
para ser seu guia sábio.
Ana, como sempre, foi a primeira participante a querer falar. Com muita
facilidade de expor seus sentimentos, iniciou sua fala dizendo:
Essa viagem foi muito boa, um momento assim de relaxamento total e
eu perguntei para o guia sábio se eu estava agindo corretamente, por
isso que eu fiz o desenho do sol, o u, da árvore com todas as suas
nuances, procurei não esquecer de nada. E ele disse que eu estava
agindo com o coração, mas permeado de razão que estava indo tudo
bem... ele me deu um presente, esse presente foi uma flor, uma rosa.
Esse guia sábio foi meu guia que foi embora, o baiano, meu esposo,
que está por e é ele que vem aqui e acolá me ajudar por aqui...
Espero que eu esteja no caminho certo... (Mãe).
Em seguida, Maria revelou sentimentos de insegurança e medo de errar, assim
como Ana. E disse:
Eu quero dizer que hoje no momento do relaxamento eu penso, eu
senti que eu relaxei mais do que a vez anterior. Quando eu encontrei
o meu guia, o guia sábio, que para mim é Deus... e eu perguntei:
como eu poderia viver melhor sem estar sempre me angustiando,
sempre me questionando a respeito das incertezas que eu tenho com
relação a meu irmão? Como conviver com ele sem que isso
prejudique o tratamento dele e a mim? Pois isso é o que eu mais
coloco é a gente viver nessa constante incerteza e Deus respondeu
para mim e continua respondendo a todo o momento, pois tem a
questão do amor, não deixar que essas dúvidas atrapalhem nem
adoeçam a gente também... (Irmã).
Maria, em sua fala, abordou as incertezas como sendo algo responsável por gerar
processos de adoecimentos no familiar.
Eunice não conseguiu expor completamente sua viagem imaginária e o encontro
com o seu guia sábio, pois se emocionou bastante. Apenas perguntou ao guia sábio se estava
agindo certo com a filha, pois brigou e discutiu com esta, já que ela continua tendo amizades
com pessoas usuárias, mesmo estando em abstinência e sabendo dos riscos que corre. Eunice
percebe que a filha é insegura e tem medo que esta tenha recaídas. O guia sábio respondeu
para Eunice que ela não estava agindo corretamente, pois brigou com a filha, tendo
desconfiado dela. A participante referiu:
Eu reagi com violência, eu bati nela, não foi o certo o que eu fiz.
(Madrasta).
Ana e Maria orientaram que Eunice pedisse desculpas para a filha, mas, que, ao
fazer isso, deixasse claro para ela que o fato dela ter perdido as ‘estribeiras’, decorre do
156
comportamento dela ser irresponsável, de ter saído para uma festa e não ter voltado para
dormir em casa, sem ter tido o cuidado de avisar antecipadamente e, principalmente, por ainda
manter amizades e contato freqüente com pessoas usuárias, mesmo sabendo que isso é
prejudicial para ela.
Mais uma vez o medo, a incerteza e a insegurança aparecem nas falas das
participantes, sentimentos muito presentes na vida de familiares de usuários de drogas.
A participação no grupo de apoio ajudou essas pessoas a responderem muitas de
suas questões, tirando dúvidas e entendendo fatos e acontecimentos. Maria passou a
compreender fatos e acontecimentos diários da vida de familiares de dependentes químicos.
Ela fez a seguinte revelação:
...por exemplo, eu passei a entender quando eu ficava ansiosa,
preocupada, eu estava perdendo peso eu não estava dormindo, a
gente fica aborrecida com as pessoas que não têm nada a ver, no caso
meu marido, minha filha e isso não é bom e nem resolve o problema,
faz é criar outro... Eu estou aprendendo a conviver sem me
maltratar... (Irmã).
Flávia reforçou essa idéia, quando comentou que: estou aprendendo a dizer não a
meu filho... (Mãe).
Na “viagem imaginária”, Andréia fez sua pergunta ao ser superior, Deus,
indagando: Senhor, quando é que nós vamos viver em paz? (Mãe). Desde o início desse
grupo, Andréia deixou clara a sua indignação por já ser uma pessoa idosa, ter criado todos os
filhos, passado por muitas dificuldades e ainda ter que enfrentar uma problemática dessas.
Para ela, esse fato é um dos maiores estresses e chateações por que já passou em sua vida.
Janete não assimilou a proposta da viagem imaginária e encontro com o guia
sábio. Acreditamos que pela sua condição emocional, pois se encontrava muito triste e
chorosa por sua filha mais velha estar doente. Aparentemente, o conseguiu relaxar.
Segundo Janete, a doença da filha é conseqüência da dependência química do tio, pois ela
vem assumindo o papel de cuidadora do tio, já que Janete está deixando ele mais de lado; sem
falar que a gravidez dessa sua filha foi intensamente conturbada em razão do uso de drogas do
seu irmão.
Ao solicitar que ela falasse sobre sua viagem imaginária, Janete disse o seguinte:
Hoje eu estou triste pela minha filha; ela está doente...(choro). As
vezes eu acho: eu nem me preocupo mais com ele. Não sei se estou
sendo muito ruim, mas é porque eu estou pensando mais em mim um
pouco. (Irmã).
157
A seguir, observemos um trecho de um diálogo de Janete com seu irmão
dependente químico revelado por ela nesse momento do encontro:
Irmão de Janete: Janete, me desculpa, mas hoje eu vou usar...
Janete: Sua cabeça é seu guia, quem sabe é você.
Irmão de Janete: Você está mandando?
Janete: Não estou mandando, mas também não vou implorar não, não vou, e se
você começar essa mesma rotina que você tinha antes, você não bata mais na minha porta
porque eu não lhe sirvo mais.
Janete foi apoiada por Andréia, Flavia e Maria sobre sua atitude. Os participantes
afirmaram que ela estava correta, sendo realmente necessário que se preocupasse mais com
ela, sua filha e família, deixando de lado um pouco o irmão dependente químico.
Eunice, especificamente, falou da necessidade de Janete trabalhar cada vez mais a
auto-estima dela e da filha, vivenciando outras experiências. Considera que essa preocupação
excessiva da filha de Janete para com o tio decorre de tudo o que vem sendo vivenciado pelas
duas, desde o início da gestação, que foi muito conturbada, pelo uso de drogas do tio. Eunice
revelou para o grupo que teve esses mesmos problemas com sua filha mais nova e, após
muitas idas ao pediatra, neurologista, psiquiatra e psicólogo, foram encontrando as soluções.
Eunice sugeriu ocupação para as duas, mãe e filha, como dança e exercícios físicos,
participação em outros tipos de grupos e lazer.
No decorrer dessa sessão, assim como em outras passadas, observamos que o
desprezo e o abandono de um cuidado que era anteriormente excessivo são sentimentos
revelados por Janete e outras participantes, após alguns encontros grupais, revelando uma
mudança de atitude perante seus familiares dependentes químicos.
Flávia, ao falar sobre sua viagem imaginária, evidencia a busca pela felicidade.
Disse:
Na minha viagem eu fiz uma pergunta ao meu guia: Minha pergunta
foi: Um dia eu serei feliz? Meu anjo respondeu que sim; porque feliz
eu sou, mas não da forma que eu quero, que eu desejo, que eu almejo.
Meu guia é meu anjo da guarda. Ele disse para mim que sim, eu vou
ser feliz um dia, mas que para isso, eu terei que ser mais sábia, mais
confiante, mais humana... que eu abrisse mais meu coração... (Mãe).
Ainda nessa mesma linha da busca pela felicidade Adriana disse:
Eu perguntei para o meu guia como é que eu fazia para viver melhor:
ele disse que eu tinha que ter mais em Deus, ter mais paz, mais
alegria, felicidade, amor e ser mais compreensiva. (Mãe).
158
A avaliação da sessão foi realizada com uma palavra que resumisse como foi o
encontro para cada um dos participantes, técnica “Avaliando com palavras”.
Coordenadora Principal: E agora vocês vão dizer com uma palavra como é que
foi esse momento de hoje.
Ana (mãe): Proveitoso.
Eunice (madrasta): Para mim foi muito bom.
Marta Jane (irmã): Foi ótimo.
Andréia (mãe): Foi muito bom, nos ajuda bastante.
Maria (irmã): Para mim eu aprendo muito.
Adriana (mãe): Foi ótimo.
Flávia (mãe): Nota dez.
Finalizamos a sessão grupal com uma leitura geral do grupo e, resumidamente, de
cada participante, aquilo que mais chamou atenção das produções e verbalizações de cada um
deles. Após a avaliação da sessão realizamos o lanche coletivo.
7.2.7 – Sessão VI – o processo grupal
A seguir, apresentaremos o quadro 11 com a síntese de tudo o que foi realizado na
sexta e última sessão do processo grupal e, logo após iniciamos sua descrição.
Quadro 11 - Demonstrativo da sessão VI da fase de intervenção processo do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
06/08/07
13h30min às
16h00min.
Sessão VI
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento.
-Recepção dos participantes.
- Leitura de Mensagem trazida
por uma participante do grupo.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Construção de desenho que
retrate o encontro com o guia
sábio.
- Espaço para verbalização.
- Comentários gerais sobre a
relação existente entre o guia
sábio e cada participante.
3º momento: avaliação.
- Utilizando medalhas
simbolicamente como forma de
avaliar a sessão e como estavam
saindo daquele momento.
- Lanche coletivo: “o nosso
- Exposição
dialogada e
participativa.
Técnica de
Relaxamento –
Viagem imaginária:
“Mais uma vez diante
de meu guia sábio”.
- Atividade de
desenho através da
pintura.
- Técnica do espelho.
- “Técnica das
Medalhas”.
- Proporcionou bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Refletiu sobre o
término da fase de
intervenção grupal.
- Preparou os
participantes para a
fase de avaliação
grupal.
- Proporcionou
espaço para que os
participantes do
grupo reflitam sobre
o que estão
vivenciando.
- Estimulou a
liberação de
sentimentos através
da imaginação e
intuição.
159
lanche de cada dia”. - Proporcionou que
os participantes
encontrem respostas
para suas dúvidas nas
relações familiares
com o dependente
químico.
- Contribuiu para que
os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
- Promoveu a auto-
percepção dos
participantes.
- Promoveu a
interação grupal.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
Os participantes presentes a esse encontro foram: Ana, Sandra, Andréia, Maria e
Eunice.
Ana foi a primeira participante a chegar à sala. Apenas nos cumprimentou e
começou a ler; ficou o tempo todo lendo ou, quando parava a leitura, apenas observava;
demonstrou semblante de tristeza.
Sandra foi a segunda participante a chegar e distribuiu uma mensagem para todos.
Aparentava uma excelente fisionomia, pois seu visual estava diferente: mais arrumada e mais
feliz. Em seguida, chegaram as participantes Andréia, Maria e Eunice.
Andréia falava de várias coisas ao mesmo tempo, mas estava tranqüila.
Durante o acolhimento, fizemos a leitura de uma mensagem (Apêndice F) trazida
por Sandra. Ela distribuiu para todos os participantes do grupo.
Após receberem a mensagem distribuída por Sandra, o grupo fez questão de que
lêssemos e discutíssemos. Andréia coordenou a reivindicação do grupo para que a mensagem
fosse lida. Optamos por fazer isso durante o acolhimento. A mensagem falava sobre a
importância de termos amigos.
Ana foi a única participante que não fez nenhum comentário sobre a mensagem,
permanecendo calada por todo o tempo. Andréia fez comentários sobre o seu comportamento,
perguntando o que tinha ela naquele dia. Ela respondeu, com um pequeno sorriso, e disse que
apenas estava lendo.
No relaxamento que antecedeu a atividade de produção, foi realizado mais um
encontro com um possível ‘guia sábio’ dos participantes, em uma viagem imaginária. Essa
160
viagem teve o seguinte título: “Mais uma vez diante de meu guia sábio”. Foi introduzido aos
participantes o seguinte texto para o momento da imaginação dirigida:
Mais uma vez em um dia ensolarado, em um local muito tranqüilo, verde, cheio
de pássaros cantando, escute o barulho dos pássaros, sinta o cheiro das flores, a brisa
fresquinha tocando a sua pele, veja como esse local é bonito, verde, cheio de plantas, água
correndo de uma cachoeira, esse local é muito tranqüilo, você se sente muito bem. Respire
profundamente e aprecie esse local tão tranqüilo. Ao andar por esse local você tem a
oportunidade de encontrar mais uma vez com seu guia sábio, você conversa bastante com ele
sobre a dependência química de seu familiar. Converse com ele, faça perguntas, escute
respostas e orientações... Mais uma vez você expressa sua problemática para ele. Ele mostra
seus pontos fortes e fracos em sua relação com seu familiar, como você tem agido, o que você
deve mudar, o que já mudou, o que faria diferente, e lhe revela de que forma você deve fazer
e/ou agir para conviver melhor com essa problemática sem ter que sofrer tanto, aprender a
ter mais saúde. O guia sábio tem que ir embora, você se despede dele, agradece e continua a
andar e apreciar a floresta, refletindo sobre tudo aquilo que seu guia sábio lhe falou.
Continuem refletindo em tudo o que vocês conversaram e aos poucos vá voltando para o
nosso momento atual. (Coordenadora principal).
O relaxamento foi conduzido e, após esse momento, ainda ao som de uma música
instrumental, cada participante iniciou em silêncio sua produção de arte. Todos estavam
concentrados em seus desenhos.
O material utilizado para a produção foi papel e tinta guache. Nesse trabalho, foi
retratado o encontro que cada participante teve com o guia sábio da viagem imaginária.
Vejamos a imagem das produções desse momento:
Foto 7: sessão grupal VI.
Fonte: Pesquisa.
161
Em seguida, cada participante falou sobre sua viagem, sua conversa com seu guia
sábio, seus sentimentos e percepções. Durante a verbalização, foi priorizada, ainda, a idéia de
que os participantes conversassem sobre sentimentos e percepções diante uns dos outros.
Começando o compartilhar da produção individual, Ana, que permaneceu calada
por todo o acolhimento, foi a primeira a concluir e falar sobre sua produção. Relatou que
relaxou por completo e disse o seguinte sobre seu encontro com seu guia sábio.
É, eu consegui relaxar muito bem, pois teve uma hora que eu não
escutava mais nada. Acho que eu estava era quase dormindo. Eu
conversei com meu guia e perguntei a ele diversas coisas, entre elas:
como conseguir sair; como conseguir fazer; como conseguir ajudar o
meu filho a sair dessas interrogações, dessa vida que ele está. Porque
domingo passado eu encontrei maconha na bolsa dele e eu,
simplesmente, entrei em parafusos de novo. Fiquei mal, mal mesmo e
chamei-o para conversar e ele negou, disse que não era dele. Mais
tarde eu esperei os ânimos se acalmarem, a raiva dele passar, pra
conversar com ele e ele me disse que se tinha entrado naquela vida
era porque não tinha mais saída; que foi a vida que colocou ele
naquele jeito de ser. E eu disse a ele que não que não foi a vida, foi
escolha dele entrar nas drogas e entrar nessa vida de fazer as coisas
erradas, mas que eu enquanto mãe, não tinha escolhido fazer aquilo
ali; que eu não estava escolhendo sofrer; que eu estava sofrendo por
causa dele; que eu tava vendo ele se matar, vendo ele fazer o que era
errado e eu ensinando o que era certo. Jamais! Eu não tinha
escolhido sofrer, estar sofrendo com ele daquele jeito. Porque eu não
sabia até quando eu iria suportar viver daquele jeito. (Mãe).
A participante relatou sobre o sofrimento vivenciado em decorrência do uso das
drogas dos familiares dependentes químicos, mas, que esse sofrimento não foi uma escolha
dos dois, apenas do usuário e que, de certa forma, isso era injusto.
Ana também evidencia manifestações de problemas físicos oriundos dessas
questões que vivencia com o uso de drogas do filho. Entre esses problemas físicos, está a
manifestação de hipertensão arterial.
Nessa mesma semana descobri que estava com pressão alta, que a
minha pressão está um pouco alterada e nesse dia joguei tudo em
cima dele. Eu disse: olha isso é conseqüência do que você es
fazendo eu passar e está difícil para mim. (Mãe).
Também mostrou a necessidade de ter posicionamento mais firme com o filho.
Meu guia disse para mim que eu tenho muito amor pelo ‘fulano’ e que
tenho que olhar mais na firmeza, dar mais não para ele; e, às vezes eu
não consigo dar o não. Ele quer sair e eu dizer: não vai! Ele fica
revoltado. Ele diz: é porque a senhora não confia. A gente confia e ele
vai e faz do mesmo jeito. Eu não sei como agir. Então, o meu desenho
162
está assim, meu coração esassim com um ponto de interrogação,
assim escuro, aí clareou mais um pouco. (Mãe).
No discurso de Ana ficou ressaltado o desgaste da relação com o filho que é
usuário, bem como ressaltados a desconfiança, as dúvidas de quando deve ou não confiar e
acreditar, as chantagens emocionais, o fato de ser ou não ser firme. As desculpas que seu filho
utiliza como sendo a causa para o início desse consumo de drogas e que muitas vezes o
familiar acredita, mas os dois têm convicção, familiar e usuário, pois sabem que houve outros
motivos. A culpa é vivenciada por alguns familiares. Esses sentimentos foram verbalizados
por todos os participantes do grupo em vários outros momentos, caracterizando assim essa
relação de co-dependência do familiar para com o usuário.
Observemos um trecho da fala de Ana, que revela os sentimentos comuns aos
familiares:
...às vezes eu não digo o não, não consigo porque ele se revolta, ele
fica tão revoltado quando eu digo não. Quando não dou dinheiro, por
exemplo, tem horas que eu resolvo dar o dinheiro para ele não ficar
nos meus ouvidos, também porque tem dia que eu estou cansada e que
não sei ser firme por conta que estou desgastada. A relação da
gente está assim e quando a gente começa a conversar mais com ele,
ele nega tudo, nunca ele diz que faz, que ele é o errado, sempre
procura colocar a culpa em outra pessoa... mas nós também temos um
pouco de culpa. Eu como mãe era para ter visto isso mais cedo, não
percebi, tento procurar não me culpar, mas eu sei que tenho uma
parcela de responsabilidade no que aconteceu... não foi porque o
pai dele faleceu, eu acho que a gente que deu essa desculpa para ele e
para nós mesmos da família... (Mãe).
A necessidade de educação para a saúde nas escolas e na própria comunidade,
abordando temáticas sobre dependência química, é algo de grande relevância para a
prevenção do uso de drogas, principalmente na fase da adolescência. Em pesquisas sobre o
consumo de drogas psicotrópicas no País, observam-se bastantes solicitações, por parte do
núcleo gestor das escolas e dos próprios estudantes e pais, para que sejam ministradas
palestras educativas nas escolas, além da elaboração de programas de como lidar com a
questão das drogas, principalmente entre estudantes adolescentes e adultos jovens
(GALDURÓZ; NOTO; FONSECA; CARLINI, 2005).
Essa necessidade foi implicitamente abordada por Ana como forma dos pais
saberem lidar com questões como essa antes mesmo que aconteçam.
Eu acho que se tivesse mais esclarecimento para os pais dos
efeitos que essas drogas trazem, o que elas fazem talvez a gente
abrisse mais os olhos de saber quando o filho faz uma queixa,
16
3
como por exemplo, quando ele diz que não quer mais ir para o
colégio, pois isso aconteceu com o meu filho, e foi bem nessa
época que ele iniciou o uso. (Mãe).
Ao final da fala de Ana, esta mostrou algo que percebemos nas falas de muitas
outras participantes do grupo no decorrer dos diversos encontros o medo e a incerteza do
que são capazes de fazer quando o cansaço e a falta de esperança se tornarem algo presente no
dia-a-dia de suas vidas, ou seja, quando a desilusão e o desprezo pelo familiar usuário forem
algo vivenciados. Ana fez a seguinte revelação:
tenho medo de um dia eu dar o desprezo a ele, de não mais fazer
nada por ele e eu disse a ele que se ele chegar a roubar, se chegar
a fazer uma coisa errada e a polícia pegar, eu não tenho estrutura
emocional para ver o que a polícia faz com uma pessoa dessas, para
ver fazerem com ele. Então, nesse dia, eu vou ter que dá-lo como
morto, para eu conseguir viver. Quem quiser da família, que tome
conta dele porque não tenho essa estrutura. Eu disse isso a ele,
nem ligue para mim porque eu não vou onde ele estiver precisando
de socorro. No dia que acontecer você assuma suas responsabilidades
pelo que fez porque eu não vou passar a mão na sua cabeça. Eu entro
dentro hospital. Eu vou para qualquer outro canto com ele, mas, para
a delegacia, na polícia, Deus me perdoe. Esse é o meu maior medo.
(Mãe).
Maria disse que, como Ana, foi sempre a primeira pessoa a falar no grupo. Ela era
a segunda, e referiu que Ana era sua amiga, tanto de trabalho, como de problemas e
dificuldades a serem vencidas, e dividiam o mesmo espaço de tratamento para seus familiares
dependentes químicos.
Maria veio questionando desde o início do grupo sobre a necessidade de
independência de seu irmão, para que ele viesse a ter um emprego e ser responsável por sua
vida e seus atos. A atitude de Maria diante do irmão aparentava ter mudado após sua
participação no grupo. Mostrava-se firme, determinada e menos ansiosa diante de seu
relacionamento com ele.
...na minha conversa com o meu guia eu fiz uma pergunta: porque nós
agora estamos chegando, assim, uma fase. Nós que eu digo. Eu e o
meu irmão. Numa fase que vai se tornando, assim, decisiva para ele...
está recebendo alta de alguns grupos que ele participa. E nessa
conversa, eu perguntei ao meu guia como é que ele vai conseguir
seguir essa estrada. É tanto que eu fiz, assim, um sol cheio de raios, o
máximo de raios que eu consegui colocar aqui eu coloquei; uma
estrada que ele tem que seguir. Agora, assim com o maior nível de
independência possível, porque eu acho que a gente tem dar essa
chance, embora a gente fique olhando disfarçadamente. Eu acho que
ele tem que se sentir o máximo só consigo, no sentido de dar rumo à
164
vida dele, ele decidir a vida que quer agora. É tanto que eu até
conversando um dia desses com a ‘Ana’, dizendo que eu acho que
chegou a hora comparando com a história da águia que empurra o
filhote do ninho para aprender a voar. Porque ele tem 26 anos, e
agora ou ele aprende a voar ou ele cai no chão. Porque eu tinha 15
anos quando comecei a trabalhar para colocar comida dentro de casa
e não tenho nenhum trauma, nenhuma tristeza por causa disso. Meu
outro irmão também saiu de casa muito cedo para trabalhar. A
desculpa dele é porque o meu pai morreu, que também é meu, tanto
que é pai dele. A morte do nosso pai é a desculpa que ele inventou
para ele poder justificar o uso de drogas. Então, eu penso que ele tem
que conseguir dar um início na vida dele, não importa se é
trabalhando ou ganhando muito dinheiro ou pelo menos conseguindo
ganhar algum dinheiro para ele se manter pelo menos, ele não é
mais um garotinho não. (Irmã).
Ao verbalizar sobre o seu momento de meditação interior e produção, Eunice
ainda se mostrava com desconfiança diante da filha, existindo dúvida de quando é o momento
certo de dizer sim ou não para ela.
Hoje eu estou bem comigo e com todos da minha família. Eu estou
mais assim preocupada, porque eu nunca sei quando é a hora de dizer
sim ou não para ela, mas é da vida. E sobre o meu guia, eu fiz esse
desenhozinho, mas ele disse que eu ainda estou muito assim em
dúvida, porque às vezes ela vem me pedir para sair, para fazer
alguma coisa e outra e eu ainda não sei se digo sim ou não. Muitas
vezes eu fico calada não sei dar essa resposta e muitas vezes, eu digo
assim minha filha não vá hoje não porque amanhã você tem que
acordar tão cedo... (Madrasta).
Eunice era aquela pessoa que, ao falar, o grupo todo achava engraçado os seus
exemplos. Talvez pelo fato de ter um jeitão bem nordestino, com sotaque típico e exemplos
grotescos.
A participante Sandra mostrou-se mais tranqüila, comparada ao encontro passado,
sessão V, quando estava triste e chorosa. Fez menção a Jesus Cristo como sendo seu guia
sábio.
A coordenadora no relaxamento nos orientou que a gente se
colocasse diante do guia e eu me coloquei assim como uma árvore
seca, sem muita esperança e pedindo assim sempre algo para ele
falar. E uma das coisas que veio na minha mente que meu guia foi
Jesus eu imaginei Jesus e conversando com ele, porque eu acho que
não tem um guia melhor do que ele. Então, assim uma das palavras
que ele me dava e colocava no meu coração era a paciência e sempre
falando algo a mais, então eu fui sentindo minha arvorezinha criando
folhas, depois ele falava assim da afetividade, que eu tinha que
tentar me acalmar mais nessas situações que acontecem em casa e
a arvorezinha começou a criar as ramagens verdes e as flores e
165
ultimamente a minha árvore já estava assim bem florida e dando
frutos. Isso eu espero que seja em um futuro bem próximo e toda essa
batalha que eu estou passando agora venha acabar e essa árvore
possa dar bons frutos para eu colher e poder acabar com a angústia
que sinto no meu peito. (Mãe).
Andréia referiu que seu guia sábio foi um ser divino. Usou do discurso de Ana
para dizer que também perdeu a esperança algumas vezes. Pediu que Ana, entretanto, não
desanimasse e que nem por um minuto ela desistisse ou perdesse a fé. O fator terapêutico
instilação de esperança era a característica principal de Andréia ao se relacionar com os
participantes do grupo. Vejamos seu depoimento:
...O meu guia, que eu perguntei foi exatamente o nosso criador que
nos criou. Então, eu fiz aqui essas coisas tipo o céu e essas coisas
coloridas, que para mim significa, assim, esperança de viver em paz e
com tranqüilidade. Ele me disse que eu tinha que ter mais fé... Não
percam as esperanças, porque eu também, tem horas que eu quero
perder, principalmente quando a própria pessoa, meu filho diz que
não vai conseguir deixar o vício. E o que eu quero dizer para vocês e,
principalmente, para ‘Ana’, é que o amor, e também a autoridade, é
uma forma da gente amar, é uma forma da gente dizer: olha eu estou
agindo dessa maneira porque eu gosto de você; porque eu quero ver
você que é meu filho feliz” (Mãe).
Após os discursos, comentamos sobre esse ‘guia sábio’ de nossas vidas, e que
todos temos um guia, e, para escutar e entender o que ele tem para nos dizer, é necessário ter
sensibilidade e serenidade.
Ao final, realizamos a “técnica do espelho”. Foi passada uma caixa contendo um
espelho no fundo, e, antes de a caixa passar pelas mãos de cada participante, foi dito que ali
estava mais um de seus guias. A caixa passou de mão em mão e, aos poucos, cada um se
olhou Eunice, Andréia e Sandra ficaram surpresas com o guia que encontraram, mas Maria
e Ana disseram que esperavam o que iam encontrar. A técnica despertou descontração; foi
um momento para reflexão. Vejamos a alusão que cada participante fez de seu guia sábio:
Ana (mãe): Esse guia sábio aqui está bem melhor, me sinto mais segura, tem
horas que fraquejo, mas tento retomar, pego na mão das amigas de caminhada e desabafo e
assim a gente vai conseguindo superar e ver e retomar daquele ponto de serenidade, de
paciência de calma.
Andréia (mãe): Esse grupo para mim foi muito importante porque me ensinou a
agir de várias maneiras, como se realmente é muito certo esse guia, porque as vezes a gente
chega assim a pensar, será que dessa maneira está certo e a gente vai procurando a maneira,
e a maneira mais certa é só a gente que sabe, e principalmente ter serenidade.
Eunice (mãe): Ah! Para mim esse grupo foi muito importante.
166
Sandra (mãe): Eu consegui amadurecimento, porque, antes, eu ficava trancada e
eu não tinha conseguido, assim, falar com ninguém, nem com a minha família sobre o
problema. E hoje, não, eu já falei com a minha mãe, com a minha irmã. Então, quer dizer que
eu estou dividindo aquilo que ficou muito tempo abafado dentro de mim. Porque o apoio que
eu tive aqui, porque antes eu achava que era eu que estava com esse problema. Agora,
depois que eu encontrei vocês (as outras participantes) com a mesma dificuldade que eu
estava passando, que eu vi que não sou eu que estou passando por essa situação,então
porque não dividir com a minha família, com as pessoas mais íntimas? Agora eu contei
para minha mãe e para minha irmã, para uma das minhas cunhadas. Eu amadureci muito e
estou querendo mais e mais amadurecimento. Inclusive, eu estou pensando já que vai
terminar a primeira fase desse grupo, eu estou querendo um acompanhamento mais
individualizado comigo com outro profissional, pois o grupo e meu guia sábio me fez
enxergar que eu posso me tornar uma pessoa melhor e mais feliz, pois eu sei que eu estou
precisando...
Maria (irmã): O meu guia sábio, que não deixa, assim, de ser o que eu pensei
antes. Porque, na verdade, o meu guia é Deus e que se é verdade que Deus é nossa imagem e
semelhança, então, Ele está dentro de mim e é através dele e do grupo que eu tenho
conseguido me libertar de um dos meus maiores medos, que é justamente o amanhã. E
quando eu perguntei a ele o que é que vai ser do meu irmão nessa caminhada e ele me
respondeu o seguinte: que só ele é que vai poder dizer quando ele começar e que não adianta
eu ficar sofrendo antes, saber se ele vai usar hoje, quanto tempo ele vai ficar sem usar,
porque esse medo não vai impedir. E que nem um sofrimento que eu tenho vai fazer com que
ele deixe de usar ou não e que, principalmente o sofrimento não vai fazer bem para mim.
Com o grupo, do dia que eu comecei a participar até hoje eu consegui melhorar bastante,
não com relação ao problema com meu irmão, mas com relação a outras coisas que eu
tinha assim com relação a mim mesma. Eu acho que eu passei a me ver mais e melhor,
porque eu sempre fui assim uma pessoa que sempre olha primeiro o outro, primeiro a minha
filha, o marido e por último eu e agora eu não estou mais assim.
Na avaliação, repetimos a técnica das medalhas solicitada em outro momento
pelos participantes do grupo.
Ana (mãe): A nota do grupo hoje e medalha de ouro, foi muito bom todo mundo
partilhou e compartilhou bem as suas coisas, medalha de ouro.
Andréia (mãe): Eu dou também medalha de ouro para o grupo, nota dez.
Eunice (madrasta): Hoje também eu dou a medalha de ouro. Gostei de hoje
também.
Sandra (mãe): Hoje também eu dou medalha de ouro o grupo foi muito
proveitoso.
Maria (irmã): Eu continuo dando medalha de ouro para o grupo.
7.3 Fase de Avaliação – Resultados do grupo
Nessa fase, é avaliada a efetividade da prática do grupo, por meio da avaliação
clínica. Esta pode acontecer mediante a participação individual de cada membro e do
coordenador do grupo, por pessoas do ambiente dos membros do grupo e por um supervisor
167
externo ou especialista em grupo. A medida primária de efetividade de grupos de cuidado de
saúde são os resultados, que podem ser de manutenção do funcionamento emocional e
comportamental, aprendizagem e mudança de comportamento (LOOMIS, 1979).
Optamos neste grupo pela avaliação individual realizada pelos membros do grupo
e pela avaliação grupal realizadas pelas coordenadoras principal e auxiliar.
A avaliação do coordenador do grupo traz valiosas percepções acerca da
efetividade, pois ele percebe a dinâmica do espaço grupal e pode confirmar estas percepções
com os participantes. Dependendo do coordenador e da situação, podem ser feitos ajustes
necessários e melhorias, enquanto o grupo ainda esfuncionando. Essa técnica de avaliação
faz parte do continuum do grupo e é essencial para manter seu funcionamento viável. A
avaliação clínica contínua, no entanto, permite ajustes, mas não uma conclusão definida sobre
o resultado do que foi trabalhado no grupo. Permite dizer, porém, que um resultado foi
alcançado mais do que se o cliente não estivesse em um grupo (LOOMIS, 1979).
Neste estudo, estávamos, a todo o momento, avaliando o grupo e, quando
percebíamos algo que estava dificultando a coesão grupal ou o alcance dos objetivos e metas,
tentávamos fazer os ajustes necessários.
Quanto à medida de efetividade desse grupo de cuidado à saúde de familiares de
dependentes químicos, utilizamos um nível alto de manutenção de funcionamento emocional,
com a constatação de mudança de comportamento e atitude, além de aprendizagem, todavia
em menor intensidade.
Os resultados do grupo foram medidos com base nas metas e objetivos
estabelecidos no momento inicial de sua formação, especialmente no ato da sessão
preparatória.
Em todas as sessões, antes mesmo de iniciarmos a atividade grupal do dia,
observávamos os diálogos entre os participantes, os quais sempre estavam contando histórias
de suas vidas sobre o antes e o depois de entrarem no grupo, acerca de seu comportamento em
relação ao familiar usuário de droga e suas dúvidas ante à situação vivida. Observávamos,
também, quais eram os assuntos dos diálogos após o término de cada sessão, no momento do
lanche coletivo que oferecíamos sempre após cada encontro. Consideramos que esse
momento do lanche foi fundamental para promovermos a união e o envolvimento entre os
participantes, fortalecendo a coesão grupal.
A dificuldade de conceituar e mensurar em quase todos os aspectos de pesquisa de
grupo de cuidado de saúde tem por base o desenvolvimento de critérios de avaliação de
resultado e ferramentas de medida. Estes resultados devem estar, de algum modo,
168
relacionados às necessidades dos clientes e objetivos do coordenador, mas, não devem se
restringir somente a isso, pois a avaliação da afetividade do grupo deve levar em conta
possibilidades de resultados múltiplos (LOOMIS, 1979).
Sabendo dessa dificuldade de desenvolver critérios de avaliação de resultados e
ferramentas de medida, além de se tratar de uma temática tão complexa, é que procurávamos,
a todo o momento possível, avaliar o grupo, sua efetividade e, principalmente, a nossa posição
de coordenadora e pesquisadora, procurando sempre respeitar o método e estar aberta a
possibilidades de resultados múltiplos.
Acreditamos que o objetivo do grupo, de oferecer apoio/suporte uns aos outros,
foi possível, visto que, durante as sessões, ficou nítido o fato de que os participantes
ajudaram, fazendo questionamentos uns aos outros, dando sugestões e oportunidades de
reflexão, concordando e discordando.
7.3.1 Sessão VII – os resultados grupais
A seguir, apresentaremos o quadro 12, com a síntese de tudo o que foi realizado
nessa sessão, equivalente à primeira sessão da fase de avaliação dos resultados do grupo de
familiares de dependentes. Logo após a apresentação do quadro, iniciamos a descrição desse
encontro.
Quadro 12 – Demonstrativo da sessão VII da fase de avaliação – Resultados do grupo de
familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
13/08/07
13h30min às
16h00min.
Sessão VII
Fase de
Avaliação
(resultados)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de assuntos
considerados importantes para os
participantes.
- Esclarecimento sobre o
desligamento de alguns
participantes do grupo (alta) e a
nova fase do grupo de
familiares.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Realização de um desenho
produzido por todos os
participantes do grupo,
avaliando o mesmo a partir da
viagem imaginária.
- Espaço para verbalização dos
sentimentos do grupo.
3º momento: Avaliação.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Imaginação
dirigida”, Ouvindo
música instrumental”.
- Atividade de
desenho: Desenho
grupal”.
Técnica de avaliação:
“Avaliação Clínica”.
- Proporcionou bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Avaliou os
resultados do grupo
pelos membros e
coordenadoras do
grupo.
- Proporcionou
espaço para que os
participantes do
grupo refletissem
sobre o que estão
vivenciando.
- Estimulou a
liberação de
sentimentos mediante
a imaginação e a
intuição.
- Proporcionou que
os participantes
encontrassem
169
- Avaliação da sessão.
- Primeira avaliação final dos
encontros.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
respostas para suas
dúvidas nas relações
familiares com o
dependente químico.
- Contribuiu para a
percepção do outro.
- Contribuiu para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promoveu a
interação grupal.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
Participaram desse encontro de avaliação do grupo as participantes: Andréia,
Adriana e Janete.
Esse momento havia sido marcado para ser a última sessão grupal, destinada à
avaliação dos resultados alcançados na intervenção grupal. Não foi, porém, a última sessão,
pois os participantes presentes pediram para que houvesse outro momento de avaliação, já que
havia cinco pessoas presentes no grupo, sendo três participantes e duas coordenadoras
principal e auxiliar.
Compreendemos que o pedido do grupo deveria ser atendido, pois assim, com
mais pessoas presentes, teríamos como realizar uma avaliação fidedigna com a maioria. As
duas sessões de avaliação foram realizadas pelos membros do grupo e por nós, como
coordenadora principal e coordenadora auxiliar.
Chegamos ao CAPS-ad, nesse dia, antes do horário combinado, que era sempre às
13horas e 30 minutos, como de costume. Organizamos a sala e o material, conversamos com a
coordenadora auxiliar sobre o planejamento do dia, separamos os prontuários dos usuários do
serviço e fomos esperar os participantes para iniciarmos a sessão. A cada encontro, os
prontuários dos usuários eram separados para que pudéssemos anotar a evolução de como
tinha sido a participação do familiar no grupo; não estávamos somente pesquisando, mas,
também, assistindo os familiares, contribuindo com a terapêutica do usuário e com as relações
na família, além de ser uma exigência administrativa do serviço, pois a cada participação do
familiar no grupo, ele também registrava sua freqüência, assinando no prontuário.
Nesse dia, intuímos, antes de começar o encontro, que não era nosso último dia de
grupo, por mais que já tivéssemos planejado desde o início.
170
Ao chegarem, as participantes Janete, Andréia e Adriana, todas juntas, foram em
seguida perguntando pelo restante do pessoal, inclusive ficaram recordando se alguém do
grupo não sabia que aquele era o nosso último dia de encontro de produção de dados de nossa
pesquisa. Concluíram que todas foram avisadas e, se grande parte das pessoas do grupo não
estava presente, aquele dia não poderia ser o encerramento do grupo. Solicitaram outro
encontro de avaliação. Acatamos a proposta e marcamos para a semana seguinte. Para nós,
essa decisão do grupo foi importante, pois tivemos a oportunidade de fazer uma avaliação
com um maior número de participantes.
Percebemos que, mesmo com a falta de alguns dos participantes, as atividades
propostas fluíram normalmente, dentro do esperado.
Iniciamos o acolhimento, oficializando a justificativa quanto à falta de algumas
participantes. Ana e Maria ligaram, avisando que não poderiam participar do encontro por
terem compromisso de trabalho; Sandra e Flavia também, dizendo que estavam doentes, e
Nara não tinha com quem deixar seus filhos pequenos.
No início da acolhida, referimos sobre as possíveis altas das integrantes do grupo.
Após essas sessões de avaliação, houve um intervalo de três semanas para o planejamento de
um novo grupo. Agora coordenado por técnicos do próprio CAPS-ad, entre eles, a terapeuta
ocupacional que participou deste grupo como coordenadora auxiliar e uma psicóloga.
Sobre a alta, Janete referiu dizendo que ainda não estava pronta para deixar o
grupo, embora estivesse melhor, pois necessitava se fortalecer, mais ainda, para viver essa
nova fase de sua vida. Afirmou, ainda, que voltou a ser ela mesma depois de muitos anos e
por ter passado por diversos acontecimentos que marcaram sua vida, entre eles a morte de sua
mãe e os vários anos de consumo de drogas pelo seu irmão.
Eu acho que eu não dependo do grupo. Eu não estou dependente só
dele, mas por tudo que aconteceu nessas últimas semanas de minha
vida eu vi que agora mesmo não é a hora de sair, e até mesmo
conversando com o meu marido ele falou: é minha filha, eu agora
estou vendo que você não é mais a mesma, o grupo de fato está lhe
fazendo bem. Então, eu acho que eu sair agora nesse momento não é
o ideal. (Irmã).
Em seguida, Janete expressou que, após sua entrada no grupo, ela própria tem se
assustado com algumas de suas atitudes, entre elas: dizer não para as pessoas e,
principalmente, para o irmão usuário de drogas, preocupar-se mais consigo e menos com os
outros, tomar decisões mais coerentes, estar menos sensível e deixar de assumir papéis e
responsabilidades que não eram suas. Observemos em seu depoimento:
171
...por um lado, eu não estou me reconhecendo, principalmente em
relação à minha postura diante das coisas da vida e de meu irmão
usuário de drogas. (Irmã).
Adriana afirmou que, também, não estava pronta para receber alta e que gostaria
de poder participar dessa nova fase do grupo.
Somente Andréia relatou que iria sair do grupo, pois compreendia que necessitava
dar espaço para que outras pessoas pudessem ter oportunidade de vivenciar uma experiência
como essa. Referiu que aproveitou cada momento vivenciado no grupo.
Como essa foi a primeira sessão de avaliação, induzimos os participantes a
refletirem um pouco sobre essa avaliação, o que foi para eles participar de um momento como
este.
Iniciamos um relaxamento com uma música tranqüila, e posteriormente
induzimos uma imaginação dirigida por meio de uma viagem imaginária.
Mais uma vez em um dia ensolarado, em um local muito tranqüilo, verde, cheio
de pássaros cantando, escute o barulho dos pássaros, sinta o cheiro das flores, a brisa
fresquinha tocando a sua pele, veja como esse local é bonito, verde, cheio de plantas, água
branquinha correndo de uma cachoeira, esse local é muito tranqüilo, você se sente muito
bem. Respire profundamente e aprecie esse local tão tranqüilo. Ande por esse local... Ao
andar por esse local você tem a oportunidade de refletir como você está convivendo com a
dependência química de seu filho. O que mudou em você nesses dois meses e meio de grupo?
Como você está se sentindo? O que o grupo contribuiu? O que ainda pode ou deve ser
mudado? Pense sobre isso e continue a andar e apreciar a floresta, refletindo sobre tudo
isso. Sinta-se tranqüila e respire profundamente. Continuem refletindo em tudo isso e aos
poucos vá voltando para o seu encontro com o aqui e agora. (Coordenadora principal).
Após o término do relaxamento, com o retorno da viagem imaginária, pedimos
que o grupo desenhasse junto, cujo objetivo principal era avaliar o grupo a partir da viagem
imaginária. Propusemos que o grupo fizesse um desenho coletivo representativo, em uma
folha de papel-madeira. Essa técnica foi uma adaptação da atividade “Desenho Grupal”
(LIEBMANN, 2000). Os participantes criaram um desenho que retratou como foi participar
desse grupo e o que mudou em suas vidas, principalmente na sua relação com seus familiares
dependentes químicos, após a sua entrada no grupo.
Quando o relaxamento terminou, solicitamos aos participantes que conversassem
sobre suas viagens imaginárias, seus sentimentos e emoções, correlacionando-os sempre com
sua experiência ao participar do grupo.
A discussão disse respeito ao que essas pessoas produziram individualmente e aos
seus sentimentos, além de suas sensações e perceões diante uns dos outros e do que ocorreu
no grupo. Após a discussão o desenho foi confeccionado.
172
Confeccionado o desenho, os participantes disseram sobre o significado da
produção coletiva, expressando sentimentos e emoções, quanto à contribuição do grupo para
suas vidas. No desenho, ficou evidente o antes e o depois da vida dos participantes após o
início do grupo.
Em seguida, vejamos nas falas o que os participantes presentes concluíram ao
participar do grupo, estando representado no desenho coletivo.
Nós em grupo achamos, assim, que quando nós chegamos havia as
nuvens escuras, o sol também não estava brilhando. Quando a gente
chegou era só angústia, medo, tristeza, escuridão, nervosismo e
trauma que a gente tinha. Agora, nesse outro lado do desenho, aqui
é uma esperança, sentimento de paz, tranqüilidade. Isso é porque
quando a gente entrou no grupo, então, já começamos a sentir
esperança das coisas melhorarem. E graças a Deus, para mim,
melhorou bastante mesmo. (Andréia - mãe).
Aqui era antes do grupo, como a gente se sentia; tudo era escuro.
Nós sentíamos tudo isso e mais, ainda, medo, tristeza, nervosismo.
Tudo isso eu sentia e muita, mas muita coisa que eu antes não sabia
nem o que explicar. (Janete - irmã).
Aqui é o antes; esse solzinho tem as nuvens, está aqui cheio de
traumas, tristeza, nervosismo e angústia. Agora, ainda tenho um
pouco, não vou dizer que não tenho, ainda tem alguma coisa, mas, já
comecei a trabalhar essas minhas dificuldades. aqui é o outro
lado da história, o sol. Aqui fiz uma árvore que é a vida e aqui eu
disse que Deus me fortalecia mais e mais nessa batalha. (Adriana -
mãe).
Andréia também deixou claro o valor curativo do grupo, ao referir que ele
incentivou-a cuidar mais de si mesma, a se valorizar e a ter mais forças para enfrentar a
problemática de seu filho.
O grupo foi o que me deu força, para eu poder enfrentar os
problemas, me fez assim pensar mais em mim, assim como me
valorizar e eu procurar me cuidar mais, apesar de todos os
problemas, eu procurar me ver primeiro, pois eu via o filho e os
problemas dele, e eu cada vez mais me deixando de lado. Mas depois
que eu passei a participar do grupo, então eu comecei realmente a me
valorizar em termos de estar com problemas, mas ter forças de lutar
por aquele problema. Esse grupo que foi muito bom para mim. (Mãe).
Janete falou sobre os sentimentos que uma pessoa que convive próximo a um
dependente químico manifesta, entre eles: medo, angústia, raiva, tristeza e incerteza. Estes são
alguns exemplos desses sentimentos sempre presentes na vida dos membros familiares.
Como metodologia e técnica de avaliação, foi realizada a técnica de “Avaliação
Clínica” (LOOMIS, 1979). Essa ocorreu com a realização de uma pergunta e foram surgindo,
173
assim, outras, à medida que iam sendo respondidas. Uma boa avaliação clínica repousa em
fazer as perguntas certas, de forma clara, favorecendo a obtenção de respostas que atendam ao
objetivo proposto.
Coordenadora principal: Após inicio do grupo, vocês ainda sentem medo,
tristeza, angústia e todos esses sentimentos verbalizados por vocês?
Janete (irmã): Assim, antes eu até em assistir um filme chorava e novamente hoje
eu vi a minha amiga chorando e eu não sinto mais vontade. Não estou mais tão fragilizada,
sou mais independente. Na realidade, eu ainda estou procurando entender o porquê de tanta
transformação que está acontecendo comigo.
Coordenadora principal: Será que, talvez, pelo fato de você estar insegura e
necessitar de mais um tempo no grupo para se fortalecer mais, ainda, e para se reconhecer
como a verdadeira Janete, a qual você não está se reconhecendo, e, principalmente, a
existência da dependência química do seu irmão durante muito tempo lhe fez se tornar essa
pessoa sensível, medrosa, assustada, ansiosa, triste e com todos esses sentimentos que você
tem citado? É isso? Ou seja, você está tendo que conviver com a verdadeira Janete que era
antes do seu irmão usar droga e que você não conhecia mais?
Janete (irmã): É isso mesmo, que eu não conhecia. Hoje mesmo eu não me
conheço. Eu digo é muito na minha casa: eu não sou mais a Janete de antes.
Coordenadora principal: Na realidade você talvez esteja convivendo com a
Janete de antes de quando seu irmão consumia drogas, que você havia se separado dela
durante muito tempo e já nem conhecia mais. É verdade? Você está se redescobrindo?
Janete (irmã): É isso é mesmo. Pode-se dizer que é assim.
Coordenadora principal: E com você está convivendo com essa redescoberta?
Janete (irmã): Eu estou gostando muito, mas estou com medo.
Coordenadora principal: Medo de quê?
Janete (irmã): De decepcionar as pessoas.
Coordenadora principal: Janete, você lembra no dia da sua entrevista
individual, que você nos disse que achava que ia procurar um médico que estava
desenvolvendo uns problemas de saúde e que, possivelmente, estava com depressão; que
queria se consultar com algum psiquiatra ou qualquer outro médico porque não estava se
sentindo bem? E depois que o grupo começou como você tem se sentido?
Janete (irmã): Bem, eu não fui mais nem atrás de médico. O grupo mudou tudo.
Graças a Deus mudou tudo. Posso dizer hoje que mudou tudo, tudo mesmo. Porque, eu não
sei, eu até me desconheço hoje. Eu não sei mais nem explicar como eu era aquela ‘abestada’.
A chorona que eu não podia ver um filme, que eu não podia ver nada, que eu estava
chorando.
Coordenadora Principal: Então tudo aquilo que você estava sentindo passou?
Janete (irmã): Passou. Graças a Deus, passou.
Coordenadora Principal: Você acha que todos esses sentimentos negativos
foram frutos da sua relação de co-dependência com seu irmão usuário de droga?
Janete (irmã): Foi, foi sim! Até mesmo como eu disse meu nervosismo, a minha
ansiedade, eu ficava todo tempo comendo, querendo procurar o que comer, com fome. Eu
174
ficava com fome porque eu sentia tristeza ao ver as pessoas passando por aquela coisa;
aquela tristeza, aquela coisa e eu não consigo e nem quero mais, eu não quero mais passar
por aquilo que eu passei. Eu não quero!
Coordenadora principal: E você, Adriana, em que o grupo a ajudou?
Adriana (mãe): Esse grupo me fortaleceu mais. Fortaleceu-me, assim, mais a
tomar decisões, porque eu estava em tempo de ficar louca. Eu não sabia o que fazer com o
comportamento desse menino (filho).
7.3.2 Sessão VIII – os resultados grupais
A seguir, apresentaremos o quadro 13, com a síntese de tudo o que foi realizado
na última sessão de avaliação do nosso estudo e também da fase de avaliação dos resultados
do grupo de familiares de dependentes químicos. Logo após a apresentação do quadro,
iniciamos a descrição desse encontro.
Quadro 13 - Demonstrativo da sessão VIII da fase de avaliação Resultados do grupo
de familiares de dependentes químicos. Fortaleza-Ceará, 2008.
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVO
ATINGIDO
20/08/07
13h30min às
16h00min.
Sessão VIII
Fase de
avaliação
(Resultados)
1º momento: Acolhimento.
-Recepção dos participantes.
- Repetição de esclarecimento
sobre o desligamento de alguns
participantes do grupo (alta) e a
nova fase do grupo de
familiares.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Realização de uma produção
plástica que retratasse sobre o
momento de reflexão de cada
participante sobre tudo o que foi
produzido durante as sete
sessões grupais. Questões para
reflexão: O que essa experiência
de expressar seus sentimentos
foi para cada um de vocês? O
que o grupo contribuiu? O que o
grupo fez para cada um de vocês
mudassem em relação ao seu
comportamento, atitudes, saúde
mental e física diante da
dependência química de seu
parente? O que cada uma dessas
produções significaram para
vocês?
- Espaço para verbalização dos
sentimentos individuais e
grupais.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Alongamento
corporal”.
- Técnica: “Galeria
de Expressões
artísticas e
sentimentais”.
- Proporcionou bem
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Avaliou os
resultados do grupo
pelos membros e
coordenadoras do
grupo.
- Contribuiu para que
os participantes
analisassem como
entraram e como
estão saindo do
grupo, ou seja, a sua
evolução.
- Estimulou
verbalização dos
sentimentos.
- Contribuiu para a
percepção do outro;
- Contribuiu para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promoveu a
interação grupa.
- Contribuiu para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
175
3º momento: Avaliação.
- Confraternização final.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
Fonte: elaborado pela autora.
Participaram do último encontro os integrantes grupais Sandra, Andréia, Ana,
Adriana, Janete, Flávia e Eunice.
Todos os participantes conversavam alegres por terem se encontrado e
comentaram sobre a felicidade de estarem juntos novamente. A impressão que dava era de
que o grupo o queria que aqueles momentos fossem desfeitos jamais, que nenhuma pessoa
desconhecida entrasse para essa nova fase do grupo ou que nenhum coordenador fosse
mudado.
No acolhimento, conversamos sobre vários assuntos e procuramos saber como
estavam os participantes do grupo, à medida que eles iam chegando. Sandra, Ana, Flávia e
Eunice demonstraram surpresa e alegria por terem sido avisadas de que haveria o segundo
encontro de avaliação grupal.
Conversamos sobre a alta de cada uma delas no grupo e sobre a justificativa das
participantes Maria, Helena e Nara por terem faltado ao encontro do dia. Maria e Helena
estavam trabalhando; Andréia fez questão de expressar o quanto Helena não se ajudava nem
permitia que os outros a ajudassem, afirmando que sua postura era sempre de vítima e coitada.
Nara, mais uma vez, faltou por o ter com quem deixar seus filhos, pois o
esposo, que era o dependente químico da família, estava freqüentemente utilizando álcool e
crack, sempre com dificuldade de adesão ao tratamento e ela não tinha confiança de deixar os
filhos com ele.
Sandra lembrou-se de Nara, referindo que ela era uma das participantes que mais
precisava do grupo e que, infelizmente, participou de poucos encontros.
Na ocasião, discutimos mais uma vez sobre as altas. Analisamos, juntamente com
todos os participantes presentes, e decidimos juntas que Andréia estava de alta, sendo essa a
sua última sessão. O seu momento no grupo terminava ali, assim como a primeira fase do
grupo de apoio/suporte de familiares dos pacientes do CAPS-ad da SER III da Prefeitura
Municipal de Fortaleza, o qual foi idealizado e executado na perspectiva de se realizar um
estudo acadêmico voltado para a produção e defesa de tese de doutorado da coordenadora
principal.
Andréia foi a participante mais assídua ao grupo, aquela que sempre participou e
que estava sempre disposta a cooperar com o grupo e, individualmente, com cada
176
participante. Instilação de esperanças e altruísmo foram os fatores curativos que estiveram
sempre presentes em suas ações ou palavras. Ela própria disse que não precisava mais do
grupo, poishavia se fortalecido e aprendido a lidar com a problemática do filho, além de ter
descoberto junto com o grupo o porquê de algumas coisas terem acontecido com sua mente e
com seu corpo diante do consumo de drogas de seu filho.
Sobre esses dois fatores curativos, Vinogradov, Cox e Yalom (2006) revelam que
instilar e manter a esperança são cruciais em todas as psicoterapias e desempenham um papel
singular na terapia de grupo; e o altruísmo em um grupo de terapia é algo indispensável, pois
os participantes se tornam muito úteis uns para os outros, porquanto compartilham problemas
semelhantes e trocam apoio, confiança, sugestões e compreensão.
Maria, Janete, Adriana e Eunice continuavam no grupo, mas com desligamento
previsto para o mais breve possível. Comentamos sobre uma possível ‘co-dependência’
também ao grupo. Aquelas pessoas que já não necessitavam tanto de estar no grupo, mas que
permaneciam, e que de certa forma tinham medo de caminhar com os próprios pés, mesmo
não se tratando de um grupo terapêutico, mas de apoio/suporte, elas precisavam, também,
aprender a buscar outro tipo de apoio ou assistência que não fosse somente o grupo.
Ana, Sandra, Flávia, Helena e Nara necessitavam de uma atenção maior, pois
existia ainda muito o que ser trabalhado e modificado na vida dessas pessoas em relação à co-
dependência.
Iniciamos a atividade de avaliação com um alongamento corporal, ao som de uma
música instrumental e relaxante. Vejamos a imagem desse alongamento corporal:
Foto 8: Sessão grupal VIII.
Fonte: Pesquisa.
177
Após esse momento, os participantes deitaram-se nos cochonetes, respirando
profundamente e procurando relaxar cada vez mais, ouvindo uma música instrumental.
Flávia e Eunice chegaram quando o alongamento havia iniciado. Eunice,
freqüentemente, chegava atrasada e tinha dificuldades de insigth. Nessa sessão, ficou nítida a
sua insegurança, durante o momento da produção individual, ela não se concentrou, pois ficou
olhando o trabalho das colegas, como se não soubesse o que fazer por não ter entendido.
Explicamos novamente a proposta.
Após o alongamento realizamos a técnica “Galeria de expressões artísticas e
sentimentais”. A produção de arte de cada participante foi exposta na sala e todas elas
apreciaram suas ‘obras’ para que pudessem avaliar o que fizeram.
Ao som de música instrumental, solicitamos que cada participante visualizasse
suas produções e analisasse, pensando sobre o que cada um produziu ou que expressou nesse
tempo de grupo. Solicitamos que todas as pessoas refletissem sobre as seguintes questões: O
que essa experiência de expressar seus sentimentos foi para cada um de vocês? O que o
grupo contribuiu? O que o grupo fez para que cada um de vocês mudasse em relação ao seu
comportamento, atitudes, saúde mental e física diante da dependência química de seu
parente? O que cada uma dessas produções significou para vocês? (Coordenadora principal).
Cada participante visualizou e refletiu sobre todas as suas produções, desde a
sessão preparatória aa sexta sessão de intervenção grupal, totalizando produções de sete
encontros. Em seguida, foi solicitado que cada participante realizasse outra produção plástica,
retratando sobre tudo o que foi refletido. Como a atividade era individual, solicitamos aos
participantes que permanecessem em silêncio durante a atividade, evitando a dispersão.
Ao realizarem suas produções, não houve conversas paralelas, somente o repasse
e a troca de materiais utilizados para a confecção do desenho individual.
Após o término da atividade, indagamos quem gostaria de falar e Sandra pediu a
palavra, certificando-se sobre o que havíamos solicitado. Entendemos como sendo uma
espécie de confirmação se o que ela havia feito estava correto. Pedimos que continuasse. Ela
relatou que, ao chegar ao grupo, ela pensava em tragédia, na vida de seu filho, onde ele
pudesse estar, e se comportava neurótica pela limpeza da casa. Para ela, essa obsessão por
limpeza era seu refúgio.
Sandra relatou que, embora ainda se sentisse insegura de como agir com seu filho,
se sentia mais feliz e segura diante de seu relacionamento com seu esposo; tomava
decisões, melhorou sua auto-estima e conseguia dormir sem a ajuda de ansiolíticos. No
178
grupo ficou notório o fato de que havia modificado seu visual, além de passar a cuidar mais
de si.
...A única coisa que eu tinha na minha cabeça era que qualquer hora
podia acontecer uma tragédia com o meu filho. Eu andava sempre
como essas mulheres aqui do meu desenho, triste, pensativa; eu não
conseguia trabalhar direito; não exercia bem o meu trabalho; ficava
sempre pedindo alguns dias de descanso e nada acontecia em relação
a eu descansar, porque não estava cansada de trabalhar, era só
mentalmente que eu estava cansada. E eu via o meu filho usuário e
as coisas de casa para fazer, somente isso. Mesmo tendo uma pessoa
em casa, quando chegava, era sempre vasculhando, mania de
limpeza, sabe? Estar toda hora verificando se as panelas estavam
limpas? Hoje em dia, eu nem ligo para panela e nem para nada. Pode
estar a casa toda empoeirada. O que dar para fazer, eu faço, e o
que não der, eu não vou fazer. E hoje, eu me sinto, assim, como essa
outra mulher do meu desenho: bem graças a Deus. Estou dormindo,
não sei se a coordenadora e o restante de vocês lembram que eu
cheguei aqui, eu estava um tempão que eu não dormia, eu estava com
6 meses dormindo à base de medicamentos e nessa última trajetória
ele passou 10 dias fora e eu consegui dormi os 10 dias muito bem,
graças a Deus, sem nenhum comprimido. ...E a única coisa que eu
penso hoje, é em ser feliz com o meu marido e com o meu outro filho e
ele também, mas se ele quiser. Sendo que, se ele não quiser eu não
vou morrer por isso... . Porque, antes, não, eu só fazia brigar. Se eu
estava mal com esse meu filho, que é usuário de droga, eu estava mal
com o mundo inteiro; era no trabalho, era com o meu marido e era
com o meu outro filho. Eu não saía e nem colocava nem o rosto para
o lado de fora na calçada se tivesse brigado com ele. Hoje não, eu
tento. Ele é muito importante para minha vida. Muito mesmo!
Somente Deus sabe o quanto ele é importante. Mas, ele escolheu e o
que eu puder ajudar para que ele saia dessa vida, eu vou ajudar.
Agora eu não posso morrer por ele. (Mãe).
Ana deu feedback para Sandra, referindo sobre a imporncia de ela tomar atitudes
com posicionamentos firmes diante do comportamento do filho usuário de droga. Referiu que
teve experiências com seu filho parecidas com as que foram relatadas por Sandra.
Observemos o relato de Ana referente ao filho de Sandra, que passou muitos dias fora de casa
sem comunicar onde sequer se encontrava.
Mas no dia que você tomar uma atitude, ele resolve ou para sim ou
para não. É sua cabeça que tem que resolver ou você o apóia e deixa-
o viver desse jeito que ele quer ou você diz meu filho chegou o limite,
agora daqui para frente ou você anda assim ou não aceito mais. Está
aqui sua passagem tome seu rumo. Só tem essas duas escolhas. (Mãe).
Ana continuou sua fala, referindo que a presença do grupo em sua vida lhe deu
força e luz, comparando o grupo como a luz solar, pois tem se sentido mais forte. Em sua
179
produção, ela fez uma árvore, comparando-a com a árvore da técnica “Percepções de minha
família” da sessão III, quando foi construída uma, explicitando as relações familiares e a
expressão da co-dependência nessas relações.
Bem quando eu cheguei aqui eu estava assim, com um problema
pesado levando o mundo nas costas e triste. Sem perspectiva nenhuma
e queria ficar assim com essa família unida no final. Então, com
alguns dias de grupo eu tinha uma árvore, onde eu era uma flor
dessa árvore, o tronco era o meu marido que faleceu, as raízes era
Deus. Essa árvore tinha duas flores, a minha mãe e a minha irmã,
e tinha um fruto que era a minha filha. tinha um botãozinho de
nada aqui que é um relacionamento que eu estou tendo... E o meu
filho era esse galho caído aqui. Como é que eu me sinto hoje? Eu
sinto que o grupo é o sol, que ele me deu forças, iluminou a minha
casa e que essa árvore deu frutos e flores e essas flores se chamam:
as coordenadoras do grupo e hoje eu não me sinto mais flor como
antes, eu me sinto um pouco tronco, tenho mais forças para
segurar e levar o barco, estou dividindo aqui ainda com o meu esposo
porque eu acho que ele também nunca vai deixar de fazer parte dessa
árvore que é a nossa família. E Deus faz parte das minhas raízes,
acho que é a mola mestre que segura. Mas o grupo, vocês todas foram
o que me deram forças, que me deram a luz, que me ajudaram a hoje
eu estár assim, uma árvore bonita e o meu filho que era um
galhozinho caindo, que as folhas dele estavam no chão, não sei se
vocês percebem que aqui não tem nenhuma folhinha no chão, o
galhinho está crescendo e está começando a dar flores, folhas e eu
vejo um frutozinho, é pequeno esse fruto, mas eu vejo que é um
progresso. (Mãe).
Embora estivesse se sentindo mais forte e segura, queria continuar no grupo, pois
reconheceu que precisava melhorar em alguns aspectos, como, por exemplo, ser mais
carinhosa com seus filhos. Sugerimos brincadeiras, passeios e reuniões em família.
Eu quero ficar mais no grupo, pelo menos um tempo eu ainda quero
ficar. Não me sinto segura ainda. Após o relaxamento eu pensei que
eu preciso mudar com relação a dar mais carinho aos meus filhos. Eu
preciso beijar mais e abraçar mais os meus filhos, não o ‘fulano’,
mas a ‘fulana’ também. Então é assim, eu acho que eu estou
precisando me soltar mais, eu acho que é porque eu não fui muito,
acariciada pelo meu pai e pela minha mãe, acho que está faltando
isso na nossa relação de mãe e filho. (Mãe).
Eunice iniciou sua fala, pedindo desculpas ao grupo por ter faltado à sessão
passada. Ela referiu que estava mais tranqüila, pois sua filha não havia consumido mais
drogas; o grupo estava ajudando a conduzir seu relacionamento com a filha, pois essa
adolescente, como já foi citado, não era sua filha e no passado foi largada pela mãe biológica.
180
Bem gente, hoje eu me sinto bem no grupo. Porque, também, cheguei
com muitos problemas; muitos deles já ficaram para o passado e
outros ainda estão se resolvendo. Mas, eu já me sinto muito bem. Esse
grupo contribuiu e ainda está contribuindo na minha vida. Se não
fosse por ele, eu não tinha a capacidade que eu tenho hoje.
(Madrasta).
Eunice recebeu orientação de Ana e Sandra, recomendando-lhe incentivar a
adolescente a voltar os estudos.
Intervimos no grupo e nos dirigimos especificamente a Eunice sobre a
necessidade de elaborarmos o nosso poder de decisão e a respeito da importância de sermos
independentes ao tomarmos decisões em nossa vida, e que essas questões deveriam ser
repassadas para seus familiares que estavam passando por esse momento difícil de suas vidas
o abuso de drogas. Abordamos sobre a importância de recomeço na vida dos dependentes
químicos.
Perguntamos para Eunice se ela desejava continuar no grupo:
Eunice (madrasta): Quero continuar e vou sim, se Deus quiser. Eu
preciso aprender ainda muitas coisas aqui no grupo, principalmente
a me relacionar melhor com essa minha filha.
Andréia, em sua fala, referiu que o profissional da área da saúde que trabalha na
área da dependência química, muitas vezes, não tem a resposta pronta para dar ao familiar que
sofre com a problemática de seu ente querido; mas, que essas respostas, na maioria das vezes,
estão dentro de cada uma das pessoas. Fez referência aos participantes do grupo, relatando
que, para que cada um deles encontrasse essa resposta, era preciso ser sensível e estar aberto a
possibilidades múltiplas.
Bem, o grupo me fez ser uma pessoa mais decidida, a tomar decisões.
Então o grupo me fez muito bem assim nesse sentido, porque nós não
podemos exigir que o profissional resolva tudo e bote todas as
decisões na cabeça no nosso familiar. Mas o grupo nos faz ver o que
temos que fazer e como agir, que decisão tem que tomar. Então ele dá
aquela força da gente tomar essas decisões, como no meu caso eu
comecei a passar a cobrar do meu filho e impor limites. (Mãe).
Andréia também fez questão de abordar sobre os sentimentos dos profissionais
que trabalham com a dependência química, referindo ser um trabalho árduo e de poucas
conquistas. Observemos seu discurso:
O grupo me ajudou muito, muito mesmo, viu! E eu tenho a
agradecer a vocês profissional de saúde, que eu sei que é um trabalho
muito árduo, pois vocês têm que conviver com muitos dos nossos
problemas e eu tenho certeza absoluta, que por mais neutros que
vocês sejam, eles afetam a vocês. Sem falar que o profissional faz e
181
faz e pouco o resultado. Isso é o que eu vejo aqui no CASP. Eu
tenho a agradecer a vocês, pois resolver esses problemas, apesar de
ser um tipo de trabalho e tudo, mas, é uma coisa árdua que vocês
sofrem também. (Mãe).
Em 2003 (MORAES), abordávamos essa freqüência de insucesso no tratamento
da dependência química, fazendo com que o profissional de saúde aprenda a lidar com esse
sentimento.
Em seu desenho, Andréia comparou o grupo a rosas vermelhas, que passaram a
fazer parte do seu jardim, unindo-se a outras róseas que foram representadas como sendo ela,
suas filhas e netas. Relatou, ainda, que, com o grupo, ela se fortaleceu, ficou mais decidida e
segura de como agir com seu filho. Referiu que estava agindo sempre com amor, mas de
maneira rígida e com limites, sem se sentir culpada. Fez menção à abstinência do filho e
estava feliz por isso, mas que tinha medo de uma possível recaída, embora sabendo dessa
possibilidade, por isso precisa aprender a conviver com isso, pois, uma vez dependente
químico, sempre.
...sempre quando eu estou bem eu não sei porque explicar, porque eu
gosto de rosa então, aqui essas duas rosas vermelhas para mim
significam o grupo, essas rosas aqui essa grande sou eu e essas
menores são minhas filhas e minhas netinhas. E o grupo me fez ver
muitas coisas, é uma ajuda, pois a gente chega sem saber assim como
agir, então conversamos e um diz uma coisa e outra e a gente vai
tendo experiência. (Mãe).
Em seguida, Sandra perguntou a Andréia sobre a medicação que o filho dela vinha
tomando e comparou com a medicação do seu. Sandra foi uma dos participantes que mais
apresentou necessidade de momentos de ensino-aprendizagem no grupo, questionando sobre
os efeitos das drogas tranqüilizantes, como os ansiolíticos que o seu filho consumia. Referiu,
por vários outros momentos no grupo, que não reconhecia quando seu filho estava drogado,
não conhecia as drogas, não sabia nada sobre seus efeitos, os tipos e até o preço aproximado
de cada uma delas.
Quando Sandra entrou no grupo, ela pouco falava. A impressão que tínhamos era
como se ela estivesse na fase do choque inicial quando um familiar recebe a notícia de que o
filho era um usuário de drogas, pois havia descoberto apenas seis meses, além de ser uma
descoberta impactante. A sua mudança de atitude passiva para ativa era perceptível.
Janete mostrou em sua produção individual e falando sobre sua atitude e
comportamento anteriormente ao grupo, que se sentia como um palhaço, um fantoche, ou
seja, um boneco que era dominado pelo irmão dependente químico, fazendo ou dando tudo o
182
que ele queria. Agora ela gostava mais de si, sentia-se importante e capaz de enfrentar
barreiras. Relatou que com o grupo aprendeu a dizer não para o irmão e não se sentir culpada.
Eu estou bem, eu acho que eu estou tão bem que às vezes eu acho
estranho. Tem horas que eu acho até engraçado, porque antes meu
irmão era aquela coisa que era tudo para mim, até mais que minhas
filhas e meu marido. Eu tinha que ajeitar ele, eu tinha que fazer isso,
fazer aquilo. E hoje não é assim. (Irmã).
Flávia foi impulsionada pelo discurso de Janete sobre sua mudança de
comportamento com o irmão e expressou seus sentimentos, embora, ao final da sessão, porém
tenha sido a primeira a terminar a produção individual. Comparou seu desenho com o mar,
cheio de ondas altas e baixas, e relatou que estava à procura de fuga e refúgio. Disse que
estava sempre recaindo, cada vez que seu filho consumia drogas; ele chegou inclusive a
agredi-la fisicamente. Relatou que o grupo de apoio era o seu refúgio e que se sente bem,
porém a freqüência de Flávia no grupo foi pequena. Segundo a participante, suas faltas tinham
como justificativas idas e vindas a consultas médicas, pois fazia acompanhamento para
Diabetes mellitus e hipertensão arterial, que segundo ela surgiram após o início do consumo
de drogas do filho e, em razão disso, ultimamente não estava conseguindo controlar sua
glicemia, estando sempre acima do normal preconizado.
O meu desenho que eu fiz está assim como uma maré, horas está alta
e de repente baixa. Assim está a minha vida. Quando eu cheguei aqui
eu cheguei naquela fase bem negra, até nos meus desenhos era tudo
preto aquela coisa negra. Comecei a melhorar, que eu dei uma
recaída de novo, não só eu como o meu filho. Eu recaio junto com ele,
pois eu não posso ver meu filho embriagado, sabe eu me perco
todinha. Ele bate em mim, quebra as coisas, eu chego a ter medo dele,
saio de casa correndo. Isso é triste para uma mãe! Ele me trancou,
trancou a namorada, o outro meu filho que já tinha chegado da
faculdade, o meu filho não dava uma palavra bem quietinho no
quarto, também com medo dele. E eu comecei a orar e de repente, ele
foi parece que amansando, sabe abrandando mais aquele coração
duro que ele tem o coração tão duro. E eu disse meu filho me a
chave olha se você não me der é arriscado eu morrer eu quero ir para
o hospital, mas eu estava realmente me sentindo mal a minha glicemia
está em 305, está alta devido essas coisas que também eu venho
passando. ...o grupo aqui para mim é uma espécie de refúgio, eu
venho para porque eu estou precisando, eu me sinto bem.
Enquanto eu estou aqui eu aprendo um bocado de coisas, sabe? Eu
me acho dura, aquela fortaleza, amparada pelas colegas e pelas
doutoras sabe? Mas de repente quando acontece o pior eu fraquejo.
Eu sinto tanto medo dele que eu tremo. É triste para uma mãe ter
medo do filho. Então como eu falei esse espaço do grupo é para
mim o meu refúgio, aqui eu venho buscar refúgio, a minha
serenidade. (Mãe).
183
Flávia reconheceu que participou de poucos encontros, mas que não podia largar o
grupo agora, que ele era seu refúgio. Admitiu que necessitava de ajuda, que não estava
conseguindo mudar sua atitude com o filho.
Eu não estou querendo sair do grupo. Aqui para mim é a minha
segurança. Mesmo tendo faltado muito, em nenhum momento eu
pensei em sair. Quanto às faltas é porque sempre tenho uma coisa a
resolver. Quando eu falto é porque não mesmo, eu tenho sempre
que ir ao médico por conta da diabetes e hipertensão. Mas eu não
quero deixar de vir ao grupo, eu não posso. Eu preciso do grupo, ele
é como que fosse o meu remédio. Preciso de vocês, das meninas que
eu gosto de ouvir que é aqui que eu aprendo, vou aprendendo, apesar
de que quando chego em casa parece que eu desaprendo tudo quando
eu vejo o pior. (Mãe).
Janete referiu que Flávia precisava mudar seu comportamento diante do filho para
que ele pudesse também mudar, pois, caso contrário, tudo permanecia como estava; Janete
ainda exemplificou com a sua mudança de posição em relação ao seu irmão.
Flávia recebeu orientações de todos os participantes do grupo de como mudar sua
posição perante seu filho. Inclusive houve momentos em que várias pessoas do grupo falaram
ao mesmo tempo, querendo conscientizá-la de que era preciso ela mudar para que sua vida se
tornasse mais feliz, e dando dicas de como mudar. Nós, coordenadoras do grupo, sabemos,
porém, que cada pessoa tem o seu tempo e Flávia ainda não havia se sensibilizado para
algumas questões, ou seja, ela precisava de mais tempo, diferentemente de outras
participantes.
Adriana relatou que precisava pensar mais em si. Essa participante passou a maior
parte da sessão calada, falou somente quando fui orientar Flávia. Adriana tornou-se o
referencial para Flávia pela sua determinação ao falar sobre como deveria ela agir com seu
filho. Flávia passou a admirá-la.
Esse momento de relatório finalizou com todas as participantes orientando Flávia
sobre o modo como esta deveria mudar de comportamento diante do filho e de sua co-
dependência.
Em virtude de todos os depoimentos das participantes, tanto nesse encontro como
no passado, na sessão VII, decidimos que não havia mais necessidade de avaliar o grupo,
que as próprias técnicas de produção, em seu desenvolvimento, já estavam avaliando o grupo.
Apenas finalizamos o encontro, explicando como seria a próxima fase do grupo e quando
iniciaria. Combinamos que o CAPS-ad se responsabilizaria por ligar para cada pessoa,
184
relembrado o dia do próximo encontro, então com a presença de novos familiares
participantes.
Após esse momento, realizamos um lanche coletivo, alegre e integrativo.
Com a descrição desse último encontro de avaliação, finalizamos este capítulo de
descrição das fases ocorridas durante o percurso do grupo de apoio aos familiares de
dependentes químicos. Em seguida, passamos para analisar como a co-dependência é expressa
no grupo de familiares.
185
A Expressão da Co
A Expressão da CoA Expressão da Co
A Expressão da Co-
--
-Dependência no
Dependência no Dependência no
Dependência no
Grupo de Familiares de Dependentes
Grupo de Familiares de Dependentes Grupo de Familiares de Dependentes
Grupo de Familiares de Dependentes
Quím
QuímQuím
Químicos
icosicos
icos
186
8
88
8 A Expressão da Co
A Expressão da Co A Expressão da Co
A Expressão da Co-
--
-Dependência no
Dependência noDependência no
Dependência no Grupo de
Grupo de Grupo de
Grupo de Familiares
Familiares Familiares
Familiares de
de de
de D
DD
Dependentes
ependentes ependentes
ependentes
Q
QQ
Químicos
uímicosuímicos
uímicos
Iniciaremos essa parte de análise dos dados do estudo, agora de um modo
diferente dos dois últimos capítulos anteriores, nos quais procuramos descrever as
características socioeconômicas e demográficas do grupo, além de descrever as fases
ocorridas durante o percurso do grupo de apoio aos familiares de dependentes químicos.
Neste momento, tentaremos apreender, recortar e categorizar a riqueza de
expressão de subjetividades do grupo de apoio-suporte realizado com familiares de
dependentes químicos, tarefa não muito cil, diante da grande quantidade do que foi
produzido durante todo o percurso grupal.
Esclarecemos que esta análise representa o esforço de uma aproximação da
realidade vivenciada, na busca de uma apropriação do modo como a co-dependência é
expressa no grupo de familiares de dependentes químicos. Reconhecemos, ainda, as
dificuldades nesta construção teórica, uma vez que o conceito de co-dependência é de grande
abrangência, sendo utilizado em outras condições, que não aquela relativa à dependência
química.
Buscamos revelar nuanças da vivência do familiar junto ao dependente químico,
indicativas de comportamento de co-dependência, com base no que foi revelado durante os
encontros e apreendido por nós, no decurso do processo grupal. Na condição vivenciada e nos
vários papéis assumidos por nós, de enfermeira, de coordenadora grupal e pesquisadora,
ressaltamos que compomos apenas uma voz a mais, entre todas as outras que constituíram o
grupo de familiares.
Nesta fase da pesquisa, entramos na etapa mais solitária, caracterizada por
momento de intensas reflexões e conflitos, pessoais, profissionais e teóricos. Superados
alguns destes obstáculos, procuraremos nos aproximar das produções, buscando identificar o
modo como a co-dependência é expressa no grupo de familiares de dependentes químicos.
Vale destacar o fato de que estamos nos referindo à co-dependência como algo
que tem muitas conceituações, ou mesmo como um conceito em evolução, mostrando-se,
neste estudo, como uma das apreensões possível, sem se descartar outras possibilidades de
leituras. Deste modo, ousamos afirmar ser esta construção original, referente ao grupo
estudado.
187
De acordo com Beattie (2007), ser co-dependente é ser um parceiro na
dependência, em que a pessoa se deixa afetar pelo comportamento de outra, tornando-se
obcecada em controlar o comportamento rejeitado ou condenado. Para Zampieri (2004), a co-
dependência é uma doença crônica e progressiva. Humberg (2003) o a considera como
sendo uma doença, mas é uma reação normal em pessoas anormais, propondo inclusive outro
termo para a substituição de co-dependência, passando a chamar de dependência do
vínculo”.
Para Beattie (2005, p.26),
a palavra co-dependência ainda é um jargão. Não existe uma definição padronizada.
Ainda não se chegou a um acordo sobre se a co-dependência é uma doença, um
estado ou uma reação normal a pessoas anormais. Ainda não concordamos se é
hifenizada ou não: co-dependência ou codependência?
Embora não exista o reconhecimento de um padrão de personalidade dito co-
dependente na classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10, o co-
dependente é aquela pessoa que, além do padecimento psíquico e reflexos sociais, sofre com
sintomas sicos e onera o serviço público de saúde como endemia sistêmica (ZAMPIERI,
2004).
Levando em consideração essas abordagens teóricas do termo co-dependência,
revelaremos aspectos mais intrínsecos da vivência dos familiares, indicativos de co-
dependência.
De forma geral, com maior ou menor intensidade, todos os familiares que
compuseram o grupo se encontravam emocionalmente dependentes de seus filhos, filhas,
esposos ou irmãos dependentes químicos; desconheciam parte de sua realidade; não
conseguiam estabelecer limites, para si e para o parente adicto; perderam parte, ou totalmente,
de sua identidade e autonomia, passando a viver a vida do outro, a quem queriam controlar e
conduzir os pensamentos e o comportamento. Observamos atitudes de marcação cerrada’
sobre o outro, o que se revelou como sendo a maior causa dos desentendimentos nas relações
familiares e mal-estar na vida do membro familiar. Entendemos estes comportamentos como
prejudiciais a ambas as partes, refletindo-se em cerceamento da liberdade, tanto do
dependente químico quanto do familiar.
Alguns familiares revelaram nas vivências grupais a condição de se sentirem
‘salvadores da pátria’, acreditando-se responsáveis pela felicidade e necessidades do outro. A
intensidade desta constatação estava diretamente ligada às condições seguintes: presença de
perdas durante a vida; tempo de dependência emocional e de descoberta do uso de drogas pelo
188
seu parente dependente químico; questões de relações familiares; e as histórias de vida de
cada um desses familiares que constituíram o grupo.
Observamos inúmeros sentimentos provenientes dessa relação indicativa de co-
dependência, entre eles: baixa auto-estima, caracterizada pela falta de amor próprio;
dificuldades diversas, entre elas, de negação e imposição de limites; sentimentos de ilusão,
sofrimento, ansiedade, angústia, medo, impotência, fracasso; sensação de vazio; e o
desconhecimento dos próprios sentimentos.
Neste capitulo, abordamos a dependência química como grande e específico eixo
da saúde mental, com ênfase na categoria teórica central escolhida por nós, a co-dependência
do familiar do dependente químico. Utilizamos a abordagem grupal como instrumental de
promoção da saúde mental junto aos familiares dos dependentes químicos em
acompanhamento em um dos CAPS-ad da cidade de Fortaleza, Ceará.
Com base no exposto, fizemos um recorte das diversas categorias empíricas que
emergiram do nosso processo de análise, tendo como categoria analítica central o
comportamento indicativo de co-dependência.
A seguir, destacaremos as respostas do grupo de apoio de familiares de
dependentes químicos indicativas de co-dependência, ilustrando com recortes do discurso dos
participantes. Pela análise de suas falas foi possível analisar as seguintes respostas de co-
dependência: medo; culpa; cuidado e/ou controle; mudanças de estilo de vida; desconfiança.
Vejamos como isto se manifestou.
O medo: Eu sinto tanto medo que eu tremo. Sabe, é triste para uma mãe ter medo do filho.
(Flávia - mãe).
O medo é um dos sentimentos mais presentes e marcantes na vida dessas pessoas
e, especificamente na expressão do grupo, ele ficou caracterizado em várias situações,
associado à violência contra o outro e a si próprio, ao abandono, medo de cometer erros, medo
de ter vida própria e medo de que aconteça algo ruim com o usuário.
A violência física resulta do efeito do uso das drogas em alguns dependentes
químicos, ocasionando o medo nos familiares e em outras pessoas de sua convivência.
Participantes como mães e esposa referiram sentir medo de agressão física por parte de seus
familiares dependentes químicos.
O medo expresso pode estar associado, também, a respostas de violência dirigida
ao parente dependente, desencadeada pela situação conflitante vivenciada no cotidiano
doméstico. Desse modo, a co-dependência pode ser expressa mediante a sensação de ser
capaz de responder com violência contra aquele ou aquela situação fora de seu controle.
189
Nessa hora, quem entra em cena é a sensação de dúvida e desconfiança de si próprio gerada
pela raiva, frustração ou mesmo fúria dirigida ao adicto ou autodirigida. Tal situação, não
raro, termina em tragédia, conforme acompanhamos pelos media os relatos de homicídios ou
suicídios cometidos por esses familiares. Beattie (2007, p. 64) faz referência a esse mesmo
comportamento do familiar, quando acentua que “muitos co-dependentes têm medo da
própria raiva”.
O contato com as substâncias psicoativas leva a diferentes tipos de violência,
entre elas a doméstica, de rua, gênero e até institucional. Adictos afirmam que a relação entre
drogas, violência e prazer é vivenciada por eles de forma conflituosa, e que seus familiares,
quando cansados de presenciarem essa relação, sentem medo de intensificar situações
geradoras de violência (MORAES, 2003).
O medo de fazer algo contra si foi percebido quando um dos participantes falou
sobre a possibilidade de praticar suicídio:
...quase toda a minha vida, que foi de 15 anos pra cá, pois hoje tenho
42 anos... e então, foi a minha adolescência, entrando na fase adulta
todinha nisso, convivendo com as drogas. Então eu tenho medo de
chegar à loucura e praticar o suicídio, por causa da impotência, do
vazio e você não saber como lutar contra isso. (Vicente - irmão).
O familiar tem medo de ficar sozinho, da rejeição e do abandono do outro. Passa a
utilizar artifícios inadequados e, de uma maneira distorcidos, para que isso não aconteça.
Ter medo de cometer erros é uma das características da co-dependência que mais
reprime, dificultando o processo de tomada de decisão perante toda a situação vivenciada.
o medo de se permitirem ser quem são, abrindo mão da própria vida, é uma das
características listadas por Beattie (2007), também observada nas experiências vivenciadas
pelos familiares pesquisados.
Janete foi a participante que expressou essa característica com maior clareza, pois
estava feliz com a mudança em seu estilo de vida, mas tinha medo de viver essa nova vida.
Um medo que nem ela mesma sabia decifrar, pois estava se redescobrindo, e essa
redescoberta estava sendo vivenciada com muito temor. Observemos na fala de Janete: estou
muito feliz com esse meu novo jeito de ser, mas estou com medo por não estar mais sentindo
medo. Tenho medo do que pode acontecer. (Irmã).
E, por último, o familiar está sempre com medo de que aconteça algo de ruim com
o dependente químico, que ele saia de casa e à busca da droga, recaindo. O medo da
recaída culmina no constante medo do futuro, do amanhã.
190
A culpa: Aqui no grupo a gente diz assim: não, você não tem culpa! Mas, a gente tem um
pouco de culpa, sim! (Ana - mãe).
O sentimento de culpa apreendido das falas dos familiares se faz presente em
vários momentos. Chamou-nos a atenção, particularmente, o depoimento de uma das
participantes do grupo no ato da entrevista individual, quando expressou seu desagrado
relativo à condição de dependência química de seu filho, exprimindo arrepender-se de tê-lo
trazido ao mundo. Diz o seguinte:
Eu me sinto desequilibrada, culpada e arrependida de ter tido ele...
(Flávia - mãe).
Nesse depoimento, encontra-se evidente um dos mecanismos de defesa do ego
identificados por Freud (1968), os quais foram e continuam sendo estudados para descrever a
luta do ego contra idéias e afetos dolorosos e insuportáveis.
O sentimento de culpa e arrependimento descrito pela participante é por nós
nomeado negação, que é um mecanismo de defesa bastante utilizado pelo dependente
químico e pelo co-dependente. Essa negação refere-se a uma parte da realidade externa
desagradável ou indesejável, pela fantasia de satisfação de desejos ou pelo comportamento. O
co-dependente nega seu desejo, anulando parcialmente as conseqüências dolorosas de lidar
com este.
Em família, na vivência cotidiana do problema da dependência de drogas, é
comum as pessoas não falarem sobre esse assunto, não manifestarem o que pensam e o que
sentem a respeito; passa a imperar a regra do não falar sobre. Outros focos de atenção
começam a surgir como estratégia de negação ao problema da droga. Problemas outros
ganham super-ênfase e a droga ganha sub-ênfase. Podemos dizer que a família acaba
tornando-se mantenedora do problema. Geralmente, as famílias começam a se preocupar com
o uso da droga a partir do momento em que sintomas sicos e emocionais são manifestados
pelos seus membros. Até então, o que se observa na família é uma ilusão de controle sobre o
problema (MARTINS; PILLON; LUIS, 2004).
A culpa é um dos sentimentos mais perceptíveis na condição de co-dependência
do familiar, manifestando-se em vários momentos: no início do consumo de droga de seu ente
querido, referindo que, se ele tivesse percebido antes, teria como ter coibido precocemente; na
falta de imposição de limites, pois a pessoa que vivencia esse sentimento passa a fazer uma
constante retrospectiva das vezes que deixou de impor regras ou de dizer não ao dependente
químico. Observamos, também, que, em virtude desses sentimentos, o familiar assume uma
atitude obsessiva para cuidar, preocupando-se e controlando excessivamente o dependente
191
químico. Nesse momento, entra em cena uma das principais características da co-
dependência, diríamos, que é o excesso de atenção ao outro, muitas vezes, esquecendo-se de
si próprio.
Beattie (2005) alude ao co-dependente como aquela pessoa que permitiu a si
mesma ser afetada por outra e por seus problemas e que perdeu o amor próprio, a capacidade
de se afirmar e de cuidar de si mesma.
Mesmo amando, se preocupando, cuidando e controlando excessivamente, o co-
dependente carrega um conflito, muitas vezes inconsciente, sentindo-se culpado por algum
sentimento negativo que possa sentir, como raiva, desconforto pela dependência psico-
emocional ou financeira. Essa condição emocional conflituosa pode favorecer a diminuição
da auto-estima, do autocuidado e do interesse sobre si próprio. Para Zampieri (2004), a auto-
estima do co-dependente é regulada pelo que consegue agradar ou não o outro.
Como o co-dependente tende a assumir toda a responsabilidade para com o
dependente químico, ele passa também a ser a principal referência para os outros integrantes
da família quando o assunto envolve a dependência química daquele membro usuário. Dessa
forma, passa a receber cobranças dos outros e de si próprio. As cobranças são referentes aos
problemas causados pelo uso de drogas e, principalmente, pelas inúmeras tentativas, muitas
vezes frustradas, de busca de solução.
A vivência desses e de outros sentimentos e conflitos, enseja insegurança e mal-
estar no co-dependente, resultando em outro tipo de cobrança, só que, dessa vez, quem passa a
ser exigido é o dependente químico. Em resposta a essa pressão o dependente químico passa a
fazer falsas juras de mudanças de comportamento e atitude a mentir sobre vários assuntos.
Entre as respostas mais freqüentes do dependente químico: destacamos: dizer que não está
mais consumindo drogas e que não vai mais consumir no futuro; prometer que vai mudar de
comportamento, sendo mais responsável com sua vida, gerando assim falsas crenças no co-
dependente.
Essa cascata de cobranças é permanente e enseja dificuldades nas relações
familiares, favorecendo o isolamento do co-dependente e do usuário, muitas vezes, tornando a
relação de ambos mais doentia e conflituosa.
Cuidado e/ou controle: A pessoa tem que ter cuidado 24 horas. É só o que eu faço. Cuido
do meu filho 24 horas sem parar, só tenho folga no sábado quando ele vai para a casa do pai
dele. (Adriana - mãe).
Ser co-dependente é ser alguém que ama e cuida exageradamente, comportamento
que pode ter sido aprendido ainda quando criança, ou mais tarde, na vida adulta, com a
192
interpretação de alguns fatores culturais. Amar e cuidar excessivamente pode ter sido fruto de
uma necessidade de alguém se proteger ou satisfazer as próprias necessidades, traduzindo-se
em uma forma de sobreviver emocional, mental e fisicamente (BEATTIE, 2007).
Mesmo na atualidade, ainda é comum encontrarmos mulheres ensinadas no
sentido de que cuidar do outro é uma qualidade feminina desejável (BEATTIE, 2007).
Humberg (2003) ressalta que as mulheres, mais do que os homens, são treinadas para atender
os outros e focam sua energia na capacidade de cuidar.
O grupo em estudo foi composto, na sua maioria, por mulheres, reforçando essa
característica do sexo feminino em cuidar do outro. Destacamos, entretanto, que, tanto a
mulher quanto o homem, sofrem com a co-dependência, pois esse cuidar do familiar ao
usuário de drogas torna-se uma necessidade imperativa e não escolha. Para Humberg (2003,
p. 22), o cuidar pode traduzir-se em “...uma forma de controle, de si e do outro.”
O cuidado/controle foi observado no grupo de familiares dos usuários de drogas
como uma característica marcante em todos os participantes, tanto o cuidado excessivo, como
a omissão do cuidado para consigo. A expressão do cuidar excessivo manifestou-se por meio
de alguns comportamentos observados: preocupação permanente com o cuidar e se relacionar
com o usuário; observação rigorosa de todos os passos, comportamento e atitudes; busca de
soluções para o problema, oferecendo sugestões; tendência a antecipar as necessidades da
outra pessoa; dificuldade de dizer não ao usuário; fazendo coisas que realmente não gostaria
de fazer; realizando coisas que a outra pessoa é capaz de fazer por si mesma; procurando
agradar os outros, principalmente o usuário de drogas, em vez de a si mesmo.
O cuidado excessivo também está sendo expresso quando o familiar, por inúmeras
vezes, considera-se e sente-se responsável pelo usuário, por seus sentimentos, pensamentos,
ações, escolhas, desejos, necessidades, bem-estar e falta de bem-estar e, inclusive, pelo
destino dessas pessoas. Essas características ficaram muito evidentes no grupo.
Observamos também, nos depoimentos dos participantes e na expressão de seus
sentimentos, que eles se achavam seguros quando se colocavam à disposição para ajudar ou
fazer algo pelo seu familiar usuário. Essa, contudo, foi uma das características que foi
desaparecendo em alguns participantes, à medida que o grupo evoluía.
O grupo revelou que cuidar excessivamente e/ou controlar o dependente químico
desenvolve uma sensação no familiar de que o drogadito o está levando à loucura, deixando-o
confuso e deprimido. Esses sentimentos do familiar parecem contribuir com a baixa auto-
estima, pois o familiar co-dependente não entende por que ele faz e cuida tanto e acaba não
tendo o resultado esperado. Observemos no depoimento de Flávia:
193
Vou acabar é ficando louca. De repente, tem horas que vontade de
eu sair correndo feita louca; fico tão desesperada..., e eu não faço
isso porque eu tenho vergonha, sabe? Ainda bem que tem aquela
coisa que me impede. Puxo meus cabelos! É uma loucura! O menino
me obriga a dar dinheiro...; é aquela loucura! E eu acabo fazendo
tudo o que ele quer. Cuido dele tão bem, faço tudo por ele para que
ele saia dessa, mas não tem jeito... Na realidade, o que aconteceu foi
que eu não tive controle sob meu próprio filho, soltei o menino. É uma
coisa horrorosa! Mas o que eu não admito mesmo é porque eu faço
tanto por ele, cuido tão bem dele e ele não agradece. Diz que eu faço
é sufocar ele. Pode? (Mãe).
Para Beattie (2005, 2007), a co-dependência é apenas uma maneira de tentar
satisfazer necessidades que não se consegue implementar, fazendo as coisas erradas pelas
razões certas.
Sobre o cuidado, Boff (2004, p.159) nos reporta ao homem que cuida. E diz: “seu
bem nunca é inteiramente bom. Seu mal jamais totalmente mau. Mesclam-se bem e mal, dia-
bólico e sim-bólico, insensatez e sabedoria, cuidado essencial e descuido fatal... devemos
exercer a compaixão para conosco mesmos”.
O cuidado essencial ao ser humano deve ser dispensado de forma equilibrada e
natural, pois, quando dado em excesso, se transforma em obsessão, tornando-se doentio e
prejudicial, para ambos, dependente e co-dependente. Do mesmo modo, em sua carência,
origina o descuido e o abandono. A busca do equilíbrio, depende de vários fatores e, muitas
vezes, as pessoas envolvidas com a problemática de um ente querido não sabem definir a
condição mais propícia ou ideal. No grupo trabalhado, foi possível observar e analisar por
meio dos discursos dos participantes o quanto a atividade grupal favoreceu a percepção e
busca do equilíbrio, rompendo ou mesmo tornando consciente o comportamento co-
dependente.
Segundo Focchi, Leite, Laranjeira e Andrade (2001), a alternativa terapêutica de
terapia grupal breve com os familiares de adictos parece ser eficaz no sentido de adequar e
orientar condutas, contribuindo para a melhora das relações e organizão do contexto
familiar em dependência química, constituindo-se uma excelente forma de suporte para esta
clientela.
O grupo revelou o cuidado, ainda, em várias situações do cotidiano das relações
familiares mediante comportamentos, atitudes e ações, tais como: cuidado com a
administração de medicamentos, alimentação, preocupação com o bem-estar físico e mental;
acompanhar o dependente químico para quase todos os locais, vigiá-lo e cuida-lo para que ele
194
não entre em contato com a droga ou sofra agressões na rua, principalmente de pessoas
envolvidas com o tráfico de drogas.
Mudanças de estilo de vida: ...estou mais tranqüila porque ontem ele não bebeu. Eu
pude dormir a noite toda e hoje de manhã eu já estou mais recuperada. (Nara - esposa).
A co-dependência é expressa também por intermédio de outras características
como mudança no estilo de vida e o conseqüente aparecimento de respostas sicas e
emocionais, destacando-se: cefaléias, alteração de pressão arterial, alteração nos valores
glicêmicos, insônia, alterações de sono, ansiedade, nervosismo, choro fácil, cansaço físico e
mental, distúrbios alimentares. Foram relatados, também, comportamento letárgico,
deprimido e pensamento suicída, notadamente por alguns participantes no início das
atividades grupais.
Os sintomas ou respostas físicas e emocionais identificados interferem na
qualidade de vida do familiar e alteram suas condições de saúde, levando à busca de ajuda
médica e à conseqüente medicação com uso indiscriminado de ansiolíticos e antidepressivos,
provocando-se, muitas vezes, somente mais uma dependência química.
O co-dependente somatiza sua dor emocional, traduzindo-a em queixas e
respostas somatoformes. Os sintomas e doenças psicossomáticas, na visão psicanalítica, são
achados que estabelecem correlações com ansiedade, conflito e defesas (ZAMPIERI, 2004).
Com suporte nessa afirmação, podemos supor que os sentimentos experimentados
pelo co-dependente e, muitas vezes não expressos adequadamente, teriam sua expressividade
em sintomas físico e/ou emocionais, como observado nos participantes do grupo estudado.
Em sua grande preocupação com o outro e na impotência para efetivamente ajudá-
lo, o co-dependente tenta formas aparentemente inadequadas de se comunicar com o
dependente químico, quer tentando controlar e impor sua vontade e verdade, quer
simplesmente adoecendo, e assim as relações familiares vão cada vez mais se enfraquecendo
(HUMBERG, 2003; ZAMPIERI, 2004).
Observamos nos participantes reações diversas de adaptações físicas,
comportamentais e emocionais ocorridas em razão do estresse causado pela condição de
dependência química do familiar em tratamento. Zampieri (2004, p. 59) refere que:
O estresse desencadeia reações de adaptação físico-bioquímicas e quanto ao
comportamento do organismo. Essas reações vão desde adaptações para um estado
de alerta (comportamento do organismo) e alterações adaptativas do tônus
cardiovascular, respiração, glicose e alimentação do sistema nervoso central e outros
locais do corpo estressado. Com o co-dependente essas alterações adaptativas
podem levá-los a um estado de alerta ou com sinais orgânicos mais acentuados por
todo o corpo estressado.
195
A mudança no estilo de vida também foi observada no comportamento dos
participantes do grupo quando,por inúmeras vezes, foi verbalizada por eles a alteração no
comportamento pessoal, como supervisionar/vigiar o dependente químico, passando a evitar
deixá-lo sozinho em grande parte do dia. Dizemos parte dos passos porque alguns
dependentes químicos, conscientes ou não de sua necessidade de apoio e tratamento, não
querem ou conseguem deixar de consumir as drogas e ficam lutando, arranjando sempre uma
forma de fugir, esconder e buscar situações que lhe permitam o uso, burlando a vigilância e
controle do familiar.
Esse comportamento de ambos, familiar e usuário de drogas, enseja uma condição
de instabilidade emocional no co-dependente e a eclosão de vários sentimentos, normalmente
negativos e prejudiciais a si e ao outro, destacando-se a ansiedade. Para Simmons (2000), a
ansiedade caracteriza-se por uma vaga sensação de que algo desagradável pode acontecer,
decorrendo de uma situação conflituosa que pode estar total ou parcialmente inconsciente.
Tais conflitos podem ocorrer entre sujeito e sociedade, ou mesmo entre partes da
personalidade, como conflitos internos, em geral inconscientes, e gerados ao longo do
desenvolvimento pela assimilação das experiências de vida. Simmons (2000) e Zampieri
(2004) assinalam que esses são nossos conflitos internos e podemos ressaltar que os externos
são mais patogênicos quanto mais intensificam os conflitos do nosso mundo interno. Dessa
forma, situações emocionalmente significativas e não resolvidas de um mundo internalizado
podem ser estimuladas por situações atuais.
Ansiedade, insegurança, comportamento obsessivo-compulsivo e medo podem
estar entre os fatores influentes na reincidência de sintomas que caracterizam a mudança no
estilo de vida experimentado pelo co-dependente. Essas mudanças no estilo de vida
demonstram os últimos estádios da co-dependência, em que o indivíduo pode se isolar e/ou
afastar do dependente químico, negligenciando-o, independentemente do parentesco, ou
eximindo-se de outras responsabilidades, perdendo, também, a esperança na recuperação ou
na possibilidade de alterar as relações. Em resposta a isto, pode começar a planejar o
afastamento do relacionamento ao qual o co-dependente se sente aprisionado (BEATTIE,
2007).
Com relação a planejar afastamento da relação identificamos nos discursos dos
participantes do grupo a sensação de cansaço por se encontrarem naquela situação de vida,
sendo acompanhada do sentimento de perda de esperanças em mudanças relativas à
dependência química, conforme relata Sandra.
196
Então, hoje eu penso assim: hoje eu estou me preparando até para
que realmente se acontecer alguma coisa com o meu filho, ele
escolheu. Não fui eu. Ele escolheu! Eu coloco tudo isso na minha
cabeça: eu não sou culpada pelo que acontecer com ele e eu quero
viver bem, continuar dormindo. Ser firme com ele ao ponto de mandá-
lo escolher a vida que ele quer levar. Agora eu não sei como vou fazer
isso porque, infelizmente, ainda está assim muito confuso na minha
cabeça. (Mãe).
Desconfiança: ...parece que o discurso da família vai se tornando vazio, sabe? É como se
fosse uma coisa que bate, mas não entra mais. Então se fecha e nós começamos a desconfiar
cada vez mais. (Maria - ir).
O co-dependente vive uma intensa desconfiança de várias coisas, entre elas, de
que está sendo roubado e enganado. Pode haver chantagens emocionais para o dependente
químico conseguir dinheiro e bens materiais para serem trocados por drogas. O co-dependente
desconfia de que seu componente familiar possa estar mentindo, começando, assim, as
inúmeras interrogações e um grande sentimento de vazio e impotência de que tudo que ele
está fazendo não está tendo o resultado esperado.
O grupo de apoio/suporte revelou, por intermédio de suas produções e
verbalizações, que essa desconfiança não é somente do co-dependente para com o dependente
químico, mas do co-dependente para com ele próprio. Esse clima de desconfiança ocasiona
incertezas no familiar, inclusive de seus próprios sentimentos ou mesmo se desconhecendo,
passando a não confiar nas suas decisões e se sentindo inseguro de ter que tomar alguma
atitude.
Essa constante desconfiança produz um sentimento de vazio interior que pode
resultar na perda, entre outras coisas, da e confiança em um ser superior, tão presente nos
membros deste grupo. Essa forma de expressão da co-dependência resultou inúmeras vezes na
utilização de fatores curativos, como instilação de esperança e altruísmo pelos membros do
grupo durante o processo grupal.
E quando o familiar descobre que algo de que ele desconfiava, em relação ao
usuário, se concretizou, ele passa a cobrar mais ainda, fazendo inúmeras pressões emocionais
e ameaças. Começam, então, a surgir, da parte do dependente químico, promessas de
mudança, quase sempre não cumpridas.
Não podemos esquecer de citar que, com isso, a família, como um todo, passa a
viver todo esse clima de desconfiança gerado, principalmente, pela relação de ambos, familiar
com atitude de co-dependência e dependente químico.
197
Enfim... o grupo de familiares de dependentes químicos e a identificação do significado
do que é ser co-dependente
A co-dependência foi expressa pelos familiares participantes do grupo, em meio a
um caldeirão de emoções e sentimentos; produziu dados necessários à formulação de um
conceito de co-dependência.
Em meio à partilha de choros, sorrisos, vozes e emoções vivenciadas no grupo de
apoio/suporte trabalhado a co-dependência foi traduzida de formas diversas ou composta por
muitos fragmentos de vidas que se interligam para dar sentido a cada existência. Deste modo,
a co-dependência se traduz em um turbilhão de sentimento, muitas vezes ambíguos; em
alterações físicas, emocionais e no estilo de vida; em respostas de desconfiança, culpa,
controle, desesperança; em um viver em constante perigo, medo, pânico e desassossego;
conviver de perto com sentimentos como tristezas, ansiedades, incertezas, ambigüidades e
inseguranças; paz e tranqüilidade são desejos distantes.
Para o grupo, ser co-dependente é ter a identidade própria roubada por si mesmo
ou estraçalhada pelas drogas. É nessa roda viva em que as drogas, na maioria das vezes,
entram como a causa de tantos males e sofrimentos, dos usuários e dos que os cercam. Em seu
efeito, ela não atinge somente aquele que a busca, sente prazer e seus efeitos devastadores,
mas, também, os que formam a rede de relações do usuário, afetando toda esta teia,
notadamente aqueles que convivem diretamente com ele. Neste grupo de pessoas,
normalmente, familiares, principalmente mães ou esposas, a dependência química atua como
desagregador e provocador de sofrimento, muitas vezes, traduzido em comportamento tão
alterado quanto o do usuário, tornando-se co-dependente. Esses familiares que, mais do
espectadores assistindo um espetáculo, se sentem um trapo, uma espécie de palhaço vivendo
em um mundo nebuloso e sem alegria. Nesta condição, vivenciam intenso antagonismo: ser
palhaço e não transmitir e, muito menos, sentir alegria ou prazer.
No mundo conflitante da co-dependência, o familiar do dependente químico
convive de perto com a tristeza, mágoa, aflição e angústia, sempre esperando que algo de
ruim aconteça, embora a todo momento surjam esperanças, mesmo que dissipadas
rapidamente. Mais um antagonismo na vida dessas pessoas: o duelo entre a crença e a
descrença.
O co-dependente, no auge de sua cegueira, enxerga apenas a droga como
responsável por todo esse descontentamento e por relações familiares em desarmonia; a
negação do prazer e os possíveis traumas não são considerados.
198
Para o grupo, a solidão é um sentimento que também habita a existência de um
co-dependente, através da sensação de isolamento de tudo e de todos, vivendo-se distante da
realidade de outras pessoas. Contraditoriamente, esta solidão é preenchida pela a apropriação
da vida do dependente químico, buscando-se assumir o seu controle e toda a problemática
decorrente, como se fosse sua vida. Os conflitos oriundos desta mistura de papéis se
mostraram de modo bem marcante na expressão dos participantes do grupo de apoio/suporte.
Omissão de si mesmo e cuidado excessivo para com o outro entrariam na
formulação do conceito de co-dependência, fortalecendo ainda mais a condição do cuidado
patológico, tão presente na posição do co-dependente. Se a co-dependência se mostra como
uma vivência de dor, sofrimento, isolamento, adoecimento, alheamento de si mesmo, entre
outras coisas, poderíamos questionar: que ganhos teria uma pessoa com este tipo de
comportamento? Com o nosso estudo, poderíamos levantar algumas situações indicativas de
ganhos, traduzidas em mecanismos de defesa, tais como sublimação, negação e projeção.
Em síntese, para Flávia, Sandra, e Nara, a co-dependência se define como:
A família do co-dependente vive sempre triste, cheia de mágoa; é
um... como se fosse um... palhaço. A gente se torna um palhaço no
meio de toda essa sujeira, um trapo. É como eu me sinto... Ser co-
dependente é viver num negro, triste e cheio da maldade. E pra mim,
eu acho que a gente vive no medo, esperando qualquer hora uma
coisa ruim acontecer. Eu vivo com medo. Então, hoje. eu tenho
alegria, amanhã eu estou triste. Hoje, eu estou alegre, amanhã, eu
estou chorando. (Flavia - mãe).
A co-dependência representa pra mim sujeira. (Nara - esposa).
Eu comparo a co-dependência com essa árvore: seca, anormal.
Porque a pessoa passa a ter atitudes anormais, e quem tem um
dependente dentro de casa, fica assim, sem brilho... O co-dependente
é triste, vive sozinho, por mais que esteja cercado de pessoas. (Sandra
- mãe).
Por fim, é também por via das necessidades humanas básicas que o co-dependente
é afetado, seja no excesso ou falta de vontade de se alimentar, na insônia ou no sono
intranqüilo, que alteram o bem-estar corporal; na tranqüilidade de pequenas horas ou na
ansiedade permanente que naturalmente modifica os movimentos cardíacos e respiratórios,
deixando-o mais letárgico ou agitado.
Lutar contra a co-dependência é buscar coragem e procurar modificar atitudes
internalizadas, sob pena de manter uma vida guiada pelo medo, insegurança, desespero e
tantas outras respostas físicas, emocionais e comportamentais indicativas de sofrimento
emocional.
199
Processo e Avaliação Grupal
Processo e Avaliação GrupalProcesso e Avaliação Grupal
Processo e Avaliação Grupal
200
9
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9 Processo
Processo Processo
Processo e Avaliação
e Avaliação e Avaliação
e Avaliação Grupal
GrupalGrupal
Grupal
Cada grupo desenvolve um processo que é único, em si mesmo, e suas
especificidades são imprevisíveis enquanto não o vivenciamos. Munari (1995) refere que,
quando falamos em processo grupal, estamos considerando os seus movimentos vitais, as
nuanças que o determinam e as características peculiares de cada grupo.
No estudo em foco, todo o processo grupal transcorreu de forma tranqüila, tendo
sido caracterizado por um ambiente propicio para a verbalização de sentimentos e
subjetividades e o alcance do seu objetivo principal, que foi de apoio/suporte.
Houve espaço para a verbalização dos sentimentos, acompanhada de discussão de
idéias, reflexão sobre atitudes e, para alguns, a oportunidade de perceber, entender e a
mudar de atitude e comportamento relativamente ao uso e abuso de droga do seu familiar,
tornando o processo menos doloroso, diante da problemática vivenciada por parte de cada
participante.
Durante o processo grupal os participantes sempre fizeram questão de deixar
evidente a necessidade de que o atendimento ao usuário em tratamento fosse extensivo,
também, à família, devendo ser algo concretizado na prática, planejado e supervisionado, a
fim de se obter melhores resultados. Os participantes Sandra, Ana, Maria e Vicente
evidenciaram esse fato, à medida que o grupo discutia algo ligado ao assunto.
O espaço grupal foi caracterizado como um ambiente acolhedor e terapêutico.
Todos os participantes se relacionaram uns com os outros e, sempre, quando surgiram
divergências, estas sempre foram positivas e tinham como objetivo a discussão de idéias e
experiências vividas, buscando o entendimento de algo e, conseqüentemente, a busca do
bem-estar do familiar participante envolvido na questão em foco. Vale ressaltar que as
divergências sempre foram respeitadas.
No início da aproximação entre os participantes, foi possível perceber certa
ansiedade por parte de alguns membros, comum em situações de um primeiro contato. Yalom
(1975) em sua obra Teoria e prática de psicoterapia grupal, descreve como sendo a fase do
‘in or out’, um movimento de hesitação entre os membros do grupo que é mantido por não ter
certeza de que esse ambiente grupal seja um lugar seguro para que as pessoas exponham seus
problemas e dúvidas.
Esse fato ocorreu quando a participante Flávia nos verbalizou, no dia em que
ocorreu a sessão 1, sobre sua dúvida se continuaria ou não no grupo em virtude da presença
201
de Vicente, o qual era seu vizinho e o gostaria de compartilhar na presença dele seus
problemas e de seu filho, pois, por ele ser seu vizinho, não queria se expor, tinha vergonha.
Acreditamos que o fato de Vicente ter participado apenas até a sessão preparatória fez com
que ela continuasse no grupo, já que eles se encontraram apenas no primeiro encontro geral.
No início, as apresentações foram um pouco formais e houve alguns momentos de
silêncio. Apenas nós, coordenadora principal e auxiliar, falávamos. Posteriormente isso se
inverteu, tendo que se controlar o tempo de fala dos participantes, que, a cada encontro,
aumentava o nível de confiança no grupo, instalando-se a coesão grupal.
A coesão grupal destacou-se como fator terapêutico, constituindo-se no principal
mecanismo facilitador das mudanças que ocorreram no grupo. Ela é a resultante de todas as
forças de ação dos membros que continuaram no grupo (LOOMIS, 1979; MUNARI, 1995).
Visualizamos esse grupo de familiares de dependentes químicos como tendo sido
coeso, pois dez participantes permaneceram até o final, embora tivéssemos a ausência de
alguns deles nas sessões, que geralmente ocorria por imprevistos. Apenas Vicente, não
continuou. Após as duas faltas consecutivas dele, nós comunicamos com o mesmo e ele nos
referiu que não viria mais ao grupo, pois estava em busca de um trabalho e nos horários do
grupo estava realizando um curso preparatório para concursos públicos. Referiu que o grupo
o impulsionou a mudar sua posição diante de sua vida.
O processo grupal foi caracterizado por um ambiente acolhedor, composto por
pessoas que se mostraram abertas às mudanças e sempre dispostas a ouvir o que cada
participante tinha a falar, analisando individualmente a problemática de cada um. Portanto,
houve coesão grupal durante todo o seu funcionamento. Essa coesão facilitou a obtenção do
objetivo terapêutico global, o apoio/suporte (LOOMIS, 1979). Mesmo que o objetivo
primordial do grupo tenha sido de apoio/suporte, ele também teve seu objetivo terapêutico,
assim como os discretos momentos de ensino e aprendizagem.
Mesmo no clima de coesão, identificamos várias diferenças entre os participantes,
e o grupo teve que apreender a considerar as diversas opiniões e decisões, desenvolvendo um
posicionamento mais crítico e reflexivo sobre as relações produzidas nessa convivência.
O nosso comportamento, na qualidade de coordenadora principal, para trabalhar
da melhor forma possível, foi sempre deixar claros os objetivos a que nos propusemos,
relacionando-os com as necessidades dos participantes e com suas perspectivas.
Estabelecemos normas que foram seguidas e que certamente ajudaram na manutenção da vida
do grupo.
202
Loomis (1979, p. 95) acentua que: “nos grupos nos quais existe um alto nível de
relacionamento interpessoal, existirá também um movimento de troca de experiências entre os
membros de forma contínua, no contexto do processo grupal”. E assim ocorreu com os
familiares que fizeram parte desse estudo, os quais passaram a ouvir uns aos outros, trocar
experiências, dar sugestões e realizar reflexões e questionamentos.
Na fase de vida do grupo, inúmeras vezes presenciamos algumas questões
inerentes à dinâmica das relações humanas dos participantes grupais, entre as quais a
resistência a mudanças. A participante Flávia, por várias vezes, ressaltou seu desejo de
mudança de atitudes e comportamento para com o filho, mas, durante toda a sua permanência
no grupo, resistiu fortemente a essa mudança, apresentando sentimentos de ambivalência
entre querer e poder ou não. Durante todo o processo grupal, Flávia expressou sua dificuldade
ao experimentar o novo e a mudança em sua co-dependência e a dependência química do
filho. Sempre foi muito questionada por todos os participantes do grupo, principalmente por
Ana e Adriana, pessoas a quem ela sempre expressava sua admiração e respeito;
diferentemente de Janete e Andréia, que demonstraram haver mudado seu comportamento e
atitude em relação à dependência química do seu parente e sua própria co-dependência.
A proximidade foi outro aspecto presente na fase de intervenção - processo
grupal. Aos poucos, ela se foi desenvolvendo, que todos os participantes compartilharam
muitas experiências comuns, estimulando, assim, o aparecimento de sentimentos também
comuns e a formação da identidade do grupo.
As histórias de vida dos participantes mostraram-se heterogênea e cada pessoa
carregava consigo marcas diferentes, criadas pelo uso de drogas de seus entes querido.
Observamos, porém, como sendo algo homogêneo nesse grupo, o sofrimento provocado pela
dependência química de seus familiares e a co-dependência desenvolvida por parte de cada
um dos participantes do grupo.
Na qualidade de enfermeira e coordenadora principal, procuramos respeitar o
tempo de cada participante para que se colocasse e tomasse suas decisões. Com isto,
acreditamos que tenhamos possibilitado aos familiares à transposição do vivido no grupo para
o seu dia-a-dia e a experimentação de mudanças em outros contextos fora do grupo. Esta
questão ficou expressa nas verbalizações de Ana, Maria, Janete, Nara, Sandra e Andréia,
quando, por várias vezes, demonstraram que estavam mudando de atitude com seus familiares
dependentes químicos, com a própria família e, principalmente, consigo mesma, sentiam-se
mais felizes. Por isso, dizemos que o grupo conseguiu identificar e romper essa relação de co-
dependência.
203
Com relação às situações de conflito resultantes da divergência e diversidade de
opiniões, tivemos poucos fatos que se caracterizaram como sendo questões conflituosas. Entre
estes, podemos citar algumas que marcaram o grupo, mas que, aos poucos, contornávamos os
diversos argumentos e questões expressas pelos envolvidos. Um deles foi o fato de o
participante Vicente realizar diversas comparações de que o seu sofrimento na vida com a
dependência química do seu irmão era maior do que de qualquer outro participante do grupo,
chegando, inclusive, a desconsiderar as experiências dos outros. Observamos um
comportamento manipulador e o seu papel desenvolvido no grupo, mesmo que por pouco
tempo, foi de desestabilizador grupal. A impressão que ele nos passou foi a de querer a
atenção do grupo apenas para si. De acordo com Zimermam e Osório (1997), esse é uma
espécie de ‘papel patológico’.
Vicente expressou o fenômeno que Zimermam e Osório (1997, p 39) chamam de
paciente identificado, pois a “família elege alguém para servir como depositário da doença
oculta de todos os demais”. Na fala de Vicente, foi possível apreendermos que, para ele e sua
família, o irmão dependente químico era o culpado por tudo de ruim que acontecia,
principalmente pelo fato de encontrar-se abalado emocionalmente precisando de apoio
profissional.
Outra situação de conflito vivenciada por todos do grupo foi à dificuldade e
resistência de Flávia em mudar de atitude diante do filho, pois ela se mostrou muito
permissiva. Em resposta, os participantes insistiam na sua mudança como forma de amenizar
os problemas nas relações familiares, e ela reagia, afirmando não ter coragem de mudar,
mesmo admitindo que necessitava.
A presença do coordenador auxiliar foi útil e importante para o processo grupal,
pois nos auxiliou na resolução dos conflitos, dividindo a carga emocional e intelectual exigida
à coordenação de um grupo desta natureza, além de nos auxiliar no exame de nossa posição
como coordenadora principal perante o trabalho grupal como um todo, desde o planejamento
até à avaliação. A presença da coordenadora auxiliar foi oportuna, também como
fortalecedora da nossa constante auto-avaliação.
O grupo teve freqüência média de seis participantes por sessão, além da
coordenadora principal e auxiliar.
Surgiram vários fatores curativos no decorrer do grupo de apoio/suporte aos
familiares de dependentes químicos, sendo que cada familiar apresentou fatores curativos
diferentes dos demais.
204
Observemos a seguir o quadro 14, demonstrativo dos participantes do grupo e a
sua freqüência, além dos fatores curativos que mais prevaleceram em seus comportamentos,
falas e ações durante as sessões.
Quadro 14 Quadro demonstrativo da freqüência dos participantes do grupo de
familiares de dependentes químicos e seus fatores curativos expressos. Fortaleza-Ceará,
2008.
Participantes Freqüência de sessões Fatores curativos
Ana
(mãe)
1º encontro geral, entrevista, sessão
preparatória; sessões II, III, V, VI e
VIII.
Oferecimento de informação,
altruísmo e catarse.
Vicente
(irmão)
encontro geral, entrevista,
sessão preparatória.
Catarse e o altruísmo.
Adriana
(mãe)
encontro geral, entrevista,
sessões I, II, III, IV, V, VII e VIII.
Universalidade, oferecimento de
informação, altruísmo,
desenvolvimento de técnicas de
socialização e catarse.
Flávia
(mãe)
encontro geral, entrevista,
sessões I, II, V e VIII.
Altruísmo, comportamento
imitativo e catarse.
Eunice
(madrasta)
1º encontro geral, entrevista, sessão
preparatória, sessões I, V, VI e
VIII.
Instilação de esperança,
oferecimento de informação,
altruísmo, desenvolvimento de
técnicas de socialização e coesão
grupal.
Janete
(irmã)
1º encontro geral, entrevista, sessão
preparatória, sessões I, III, IV, V,
VII e VIII.
Altruísmo, reedição corretiva do
grupo familiar primário,
comportamento imitativo,
aprendizagem interpessoal, coesão
grupal e catarse.
Maria
(irmã)
encontro geral, entrevista,
sessão preparatória, sessões II, III,
V, VI.
Universalidade, oferecimento de
informação, altruísmo,
aprendizagem interpessoal, coesão
grupal e catarse.
Nara
(esposa)
encontro geral, entrevista,
sessões I e II.
Altruísmo e instilação de
esperança.
Helena
(mãe)
Entrevista, sessões I, III e IV. Altruísmo e a catarse.
Sandra
(mãe)
encontro geral, entrevista,
sessões I, II, IV, VI e VIII.
Desenvolvimento de técnicas de
socialização, coesão grupal e
altruísmo.
Andréia
(mãe)
Entrevista, sessão preparatória,
sessões I, III, IV, V, VI, VII e VIII.
Altruísmo, aprendizagem
interpessoal, coesão grupal,
instilação de esperança e
oferecimento de informação.
Fonte: elaborado pela autora.
Os participantes do grupo referiram necessidade de serem acolhidos por
terapeutas do serviço devido a inúmeros fatores, entre eles: recaídas dos dependentes
químicos, resistência em manter o tratamento ou desistência, condutas que dificultam a
205
recuperação dos usuários (por exemplo, dar dinheiro, fiscalizar, desconfiar e vigiar
ostensivamente, entre outros), além de ansiedade no trato com dependente químico.
Os familiares de dependentes químicos sentem necessidade de receber
orientações, compartilhar experiências no sentido de qualificar as conversas e diálogos,
receber esclarecimentos sobre limites e mudanças na forma de se relacionar, para que possam
auxiliar o usuário dependente e ele próprio sentir-se mais aliviado (FOCCHI; LEITE;
LARANJEIRA; ANDRADE, 2001).
Finalmente, ressaltamos que o processo grupal com os familiares dos dependentes
químicos foi ocasionado com base nas relações de ajuda e suporte que se instalaram no
decorrer dos encontros com todas as suas vicissitudes. Procuramos canalizar todas as nossas
energias para um trabalho construtivo e terapêutico.
Como se tratou de um grupo de apoio/suporte, o que as pessoas esperavam e
encontravam dependeu do quanto estavam envolvidas e afetadas com a situação do uso de
drogas de seus familiares, ocorrendo variações entre os diversos tipos de pessoas e culturas,
inclusive costumes familiares.
Com arrimo nas fases descritas e, principalmente, no processo grupal que
acabamos de traçar, achamos conveniente dedicar parte deste capítulo para avaliação do grupo
de apoio/suporte, realizado com familiares de dependentes químicos, da nossa posição como
coordenadora principal e da relevância das mudanças provocadas nos participantes grupais.
No desenvolvimento grupal foi possível alcançarmos alguns objetivos propostos:
- perceber as pessoas mais felizes, menos preocupadas e ansiosas, conseguindo
visualizar outras atividades que não fossem apenas cuidar do familiar dependente químico,
sentimentos ou situações positivas, restabelecedoras da sua saúde mental;
- propiciar integração e a coesão grupal;
- promover a expressão e o compartilhamento de sentimentos dos participantes;
estar apto para ouvir, pois o simples fato de ouvir pode ser terapêutico;
- proporcionar espaço para a discussão dos sentimentos dos participantes, fazendo
com que as pessoas envolvidas se tornassem mais conscientes de suas reações;
- fortalecer outros aspectos positivos de suas vidas que não fossem apenas o uso
de drogas por seus familiares;
- trabalhar a sensação de que nada poderia se feito ou a sensação de estar
amarrado com relação ao uso de droga de seus familiares, mediante a percepção de que existe
a possibilidade de fazer algo ou simplesmente aceitar o fato de que não pode fazer nada em
determinadas situações;
206
- incentivar a fazer o melhor pela família e por si mesmo, levando em conta as
necessidades de todas as pessoas envolvidas direta ou indiretamente com a dependência
química;
- estimular a capacidade dos participantes de saírem e se divertirem, sem sentir
culpa por ter bons momentos, tornando as pessoas aptas a realizar atividades fora do lar.
Na avaliação, o grupo pôde expressar diversas mudanças, destacando-se:
- menos sofrimento ao presenciar a recaída dos familiares dependentes;
- mais segurança ao tratar o familiar dependente;
- diminuição de condutas que dificultavam a recuperação do paciente (ex.: dar
dinheiro, fiscalizar, desconfiar, vigiar ostensivamente, cuidar excessivamente, entre outros);
- diminuição do nível de ansiedade no trato com o familiar dependente;
- aumento da auto-estima dos participantes do grupo; e
- melhora das relações como familiares, principalmente relações afetivas e
sexuais.
Após dez dias do término de todas as sessões grupais, realizamos uma avaliação,
juntamente com a coordenadora auxiliar, de todas as etapas do grupo.
Para essa atividade, baseamo-nos nas sugestões de Loomis (1979) quando leciona
que clínicos devem avaliar a efetividade de sua prática e atitude.
Loomis (1979) sugere, entre outras, como estratégia de avaliação, as seguintes
formas:
- avaliação sob a perspectiva do coordenador do grupo como sendo um recurso
utilizado com suporte na observação do coordenador principal, ante os fatos que ocorrem no
desenvolvimento do trabalho grupal. Para complementação dessa forma de avaliação, podem
ser validados as impressões do coordenador com as opiniões dos participantes;
- na avaliação sob a perspectiva de outros membros da equipe que trabalha com o
grupo, um coordenador auxiliar ou pessoas outras que o apoio ao trabalho grupal podem
contribuir na validação dos resultados, ajudando o coordenador a captar detalhes importantes
sobre o seu desempenho, dos componentes do grupo e do processo como um todo.
De acordo com nossa avaliação e também sob a óptica da coordenadora auxiliar,
a formação e a realização do grupo de apoio/suporte foi importante em vários aspectos.
Destacando-se que ele cumpriu suas metas e objetivos, causando bem-estar na vida dos
participantes e, conseqüentemente, melhorando o processo terapêutico do usuário do serviço.
Ao perguntar para a coordenadora auxiliar qual a avaliação que ela fazia do grupo, ela nos
respondeu:
207
...Eu acho que foi altamente gratificante, tanto para mim como para
as participantes, porque a gente viu uma melhora em todas elas. Em
algumas, foi uma melhora não tão grande, mas todas tiveram
melhora: de como está enxergando a vida, de como está enxergando o
familiar dependente químico; de como agir em relação essa
dependência química. É como se elas estivessem, antes do grupo,
aprisionadas e, a partir do momento que o grupo começou, era como
se elas tivessem se libertando daquele sentimento de impotência, de
fracasso. Elas tinham muita culpa. Era como se elas tivessem a culpa
do que estava acontecendo com o familiar delas. Então, foi muito
gratificante. A troca de experiência entre elas, por meio das
dinâmicas dos trabalhos que a gente oferecia, que tu planejavas, elas
foram trocando experiências, umas com as outras, e isso acabava
ajudando. Era como se a gente tivesse criado um elo entre cada uma
delas, para cada uma delas conhecer um pouco da vida da outra, os
seus problemas e, a partir daí, aprender a solucionar seus próprios
problemas, através do problema do outro. (Coordenadora auxiliar).
Com esse grupo constatamos que realmente é necessário assistir o familiar
dependente químico, pois este passa a assumir um papel de co-dependência, que inúmeras
vezes não é levado em consideração pelos serviços de assistência ao dependente químico.
Assistir o usuário implica, também, inserir a família no processo, investindo durante a
terapêutica na excelência das relações familiares.
Ainda muita desinformação sobre o que é co-dependência e as dificuldades
causadas por essa síndrome emocional na vida dessas pessoas que estão sempre em busca,
muitas vezes de forma perversa e autodestrutiva, de preencher o terrível vazio emocional das
suas vidas.
Em virtude do que observamos, achamos que, além de o dependente químico
estar em tratamento, os seus familiares também devem ser assistidos em sua co-dependência.
Com relação às falhas ocorridas no percurso, tentamos evitar o máximo a
ocorrência delas, respeitando o rigor do método, processo grupal para enfermeiros, e ao
mesmo tempo executamos o planejamento, proporcionando coesão grupal, bem-estar dos
participantes e, conseqüentemente, a fidedignidade dos dados produzidos para a pesquisa,
sem nos esquecer de que se tratava de um grupo de apoio/suporte que assistia familiares de
usuários e não apenas de um grupo de pessoas que faziam parte de uma pesquisa.
O grupo teve vida própria. Seus participantes assumiram atitude ativa diante uns
dos outros. Foi caracterizado por um ambiente democrático e de respeito mútuo.
Consideramos que essa atitude ativa dos participantes fez com que eles saíssem da
condição de co-dependência, rompendo essa disfunção que foi o bem expressa pelos
familiares.
208
A ruptura da co-dependência foi sendo caracterizada a cada sessão, quando
através da realização das atividades planejadas para o encontro, os participantes expressavam
seus sentimentos, preocupados em mudar de atitude, tentando cada vez mais se libertar de
comportamentos e pensamentos que os tornavam co-dependentes. Ao final do grupo, os
participantes já estavam mais conscientes de seu papel de familiar, porém, se cobravam
menos, estavam mais felizes e com auto-estima mais elevada.
Para que isso tenha ocorrido, como coordenadora principal, nos colocamos como
integrante e próximo ao grupo, utilizando de orientações, sugestões, incentivos e reflexões, os
quais fomos buscar no nosso conhecimento e experiência de atuação como enfermeira de
saúde mental, que já vem sendo construído desde muito cedo, principalmente por meio da
modalidade de assistência grupal.
Sobre as falhas, realizamos a seguinte questão para a coordenadora auxiliar.
Coordenadora Principal: Que falha você percebeu durante essa nossa jornada
no grupo?
Coordenadora auxiliar: Não vi nenhuma falha, assim, propriamente dita.
Talvez, o que precisasse mais fosse de tempo com elas, assim, para, mais sessões, você sendo
a coordenadora principal. Com as sessões em si, não ocorria nenhum problema...
Em sua fala, a coordenadora auxiliar expressou que o número de sessões grupais
realizadas talvez tenha sido pequeno. Justificamos que, desde o início, havíamos proposto
essa quantidade de sessões para a produção de dados e, após isso, o grupo continuaria com os
mesmos participantes, mas com algumas modificações, já citadas, não havendo prejuízos.
Desde o início, todos os participantes foram informados e, ao longo das sessões,
trabalhávamos essas futuras modificações, como, por exemplo: mudança de coordenador
principal, a abertura para novos participantes e desligamento de alguns.
Com relação ao planejamento, procuramos obedecer ao referencial teórico
utilizado, mas, ao mesmo tempo, utilizando outros conhecimentos e experiências adquiridas
ao longo de nossa vida profissional, atuando com grupos.
A coordenadora auxiliar expressa o seguinte posicionamento:
...todas as sessões tinham sempre começo, meio e fim; sempre todas
foram escutadas. Nunca ficou: vamos acabar a sessão aqui porque
acabou o horário. Não, isso não. Sempre teve começo, meio e fim, um
fechamento direitinho; todas ficavam satisfeitas em botar para fora o
que estavam necessitando e as outras acolherem e a gente acolher.
Consideramos que ao planejar um grupo a experiência do coordenador é de
grande relevância. Essa experiência que temos acumulado ao longo de nossa vida profissional
como enfermeira de saúde mental nos ajudou bastante, pois realizamos um planejamento
209
simples, mas adequado para aquele grupo de familiares, levando em consideração todas as
questões estruturais; além disso, o grupo sentiu garantida sua privacidade, pois para os
participantes falar do assunto drogas ainda é algo permeado de preconceitos.
Nem sempre a decisão de buscar ajuda é fácil ou tranqüila para o familiar do
dependente químico. Admitir sua própria fraqueza” e dizer a respeito dela para alguém é
mais difícil ainda. As pessoas têm medo de não serem compreendidas e aceitas pelos outros, e
quando decidem entregar-se a uma relação de ajuda é porque estão dispostas a confiar no
terapeuta ou coordenador do grupo e este não pode trair sua confiança (FELDMAN;
MIRANDA, 2002). Por isso, reforçamos a importância da coesão grupal no desenvolvimento
do processo grupal.
Construímos tudo com muita simplicidade, mas sempre pensando na efetividade
do grupo. Sentimos-nos sempre muito a vontade no grupo, e com um enorme sentimento de
segurança ao conduzi-lo. Produzir esses dados foi uma experiência prazerosa e principalmente
por termos constatado cientificamente que o grupo floresceu enquanto instrumento do
processo de cuidar de Enfermagem, fortalecendo nossa prática profissional.
Esse planejamento adequado das sessões de certa forma refletiu na efetividade do
processo grupal, pois, para a coordenadora auxiliar,
...Vi que, quando um grupo é bem montado, e bem estruturado,
quando é um grupo que você planeja antes de vir, planeja as sessões,
ele realmente vai surtir efeito na vida daquelas pessoas que estão no
grupo... Quando o grupo é bem planejado, estruturado, ele realmente
é uma ótima forma de tratamento. Porque a gente viu, foi
comprovado a melhora delas, umas melhoraram, outras menos, as
que melhoraram menos é porque faltaram mais, compareceram
menos... As que tinham mais assiduidade foram realmente as que
tiveram uma melhora significativa...
Observamos durante o processo grupal que aqueles participantes que mais
estiveram presentes apresentaram mudanças significativas em sua posição com o dependente
químico, apresentaram menos sentimento de culpa e, conseqüentemente, estavam mais
firmes, principalmente conscientes de seu papel nessas relações familiares com o usuário,
estavam entendendo essa sua co-dependência, passando a lidar e enfrentar melhor seus
comportamentos e atitudes e também do familiar usuário de drogas. Enfim, essas pessoas
pareciam estar mais felizes.
Com relação às questões institucionais, compreendemos que a realização desta
pesquisa, especialmente nesse CAPS-ad foi de grande relevância para o serviço, pois, por se
210
tratar de um local de assistência com poucos meses de atuação, ainda não dispunha desse tipo
de atendimento e esse fato foi positivo para a criação do grupo de familiares.
Acerca desses aspectos, indagamos da coordenadora auxiliar:
Coordenadora Principal: Como é que você visualiza esse nosso trabalho que foi
feito durante dois meses e meio? Que frutos você acha que ele trouxe para o serviço e no que
ele colaborou? O que ele poderia ter feito e não foi?
Coordenadora Auxiliar: Foi uma semente que foi plantada. O serviço
necessitava de um grupo para familiares e ainda não dispunha. ...Porque com o grupo a
gente passou a ter contato com o familiar, pois a gente tem muita dificuldade de ter esse
contato, e também porque através desse grupo elas deram a idéia de existir o feedback para o
familiar de como estava acontecendo e evoluindo o tratamento do usuário e eu já levei para a
reunião do serviço, inclusive falei com a coordenadora e ela adorou a idéia. Será da
seguinte forma: cada grupo mensalmente, terá uma sessão com os familiares de seus
participantes, ao invés da sessão ser com os próprios usuários, pois assim teremos condições
de passar para o familiar como está à terapêutica do usuário do serviço, tirar suas dúvidas e
ao mesmo tempo ouvir o familiar procurando saber como o dependente está reagindo a
terapêutica. Essa idéia foi outra semente que foi plantada através desse grupo de familiares,
pois além de melhorar os familiares, vai surtir sucesso nos tratamentos como um todo,
porque o dependente vai passar a ter um melhor convívio com o familiar.
Como coordenadora principal e enfermeira conseguimos tornar o grupo de
familiares de dependentes químicos não apenas como um espaço para análise do processo
grupal ocorrido, mas um espaço em que floresceu o cuidado de enfermagem em saúde mental.
Portanto, tornamos o grupo terapêutico, ou seja, um instrumento do processo do cuidar do
enfermeiro.
Estudos mostram que a grande maioria dos familiares que acompanham os
usuários a centros de tratamento necessita também de assistência, voltada para orientação
profissional em como lidar com o dependente químico, informações sobre a cura da doença e
as próprias relações familiares (FOCCHI; LEITE; LARANJEIRA; ANDRADE, 2001).
Apostamos na melhora do familiar, conseqüentemente, pudemos, em pouco tempo,
perceber evolução do relacionamento familiar, embora esse não fosse nosso objetivo
principal, mas os discursos dos participantes foram nos revelando isso.
Nosso grupo de apoio/suporte foi o início de tudo, no que se refere à assistência
ao familiar do usuário do serviço e à sua inserção direta no processo terapêutico desse
usuário. Com a nossa pesquisa, começou um tipo de assistência em rede, que até então não
havia iniciado. Passar a dar retorno para os familiares quanto à terapêutica de seus entes
queridos foi providência expressa em vários momentos do grupo por diversas pessoas,
principalmente pelas participantes Sandra, Ana e Maria.
211
Faz-se necessário que o serviço constantemente avalie suas práticas, estando
principalmente disposto a possíveis mudanças de atitude dos profissionais que fazem aquela
instituição e de rotinas instituídas.
212
Considerações Finais
Considerações FinaisConsiderações Finais
Considerações Finais
213
10
1010
10 Considerações Finais
Considerações Finais Considerações Finais
Considerações Finais
Elaborar esse capítulo das possíveis conclusões desta tese o foi fácil, pois,
nesse momento, gostaríamos de expressar todos os nossos sentimentos como co-dependente
da vida, os nossos inúmeros prazeres e desprazeres ao ‘parir mais esse filho’, a tese. Foram
múltiplos os acontecimentos em nossa vida, mas todos eles nos tornaram uma pessoa mais
madura profissionalmente. E mais feliz. Certamente, se hoje começássemos tudo novamente,
nesta nossa trajetória acadêmica, muita coisa seria repetida e outras apenas aprimoradas, mas,
nosso objeto de estudo seria o mesmo. Ao final, podemos acentuar que o que foi produzido é
importante para se repensar a prática diária dos serviços de atenção à saúde do dependente
químico, incluindo-se seus membros familiares, especialmente aquelas pessoas que
desenvolvem a condição de co-dependência.
Se puder falar em amor e felicidade no mundo acadêmico, essa tese foi uma
delas, pois, desde o início, nos propusemos a edificar algo em que acreditássemos. Foi assim
que aconteceu. Experimentamos muitas coisas, certamente temperadas com pitadas de
empenho, responsabilidade e rigor, mas, também, de muita serenidade durante seu percurso.
No final, achamos que o trabalho foi válido para todos: coordenador-principal e auxiliar,
participantes do grupo, dependentes químicos, família e serviço.
Este ensaio foi elaborado com o propósito de analisar o processo grupal como
instrumental do cuidado de enfermagem ao familiar do dependente químico, e, então,
conhecermos melhor o mundo dessas pessoas. Partimos da premissa de que fortalecendo a
rede social de apoio, representada neste estudo pela família, criaríamos condições mais
favoráveis na atenção ao dependente químico, ajudando também romper a condição de co-
dependência do familiar.
Por meio do grupo, pudemos adentrar um pouco o mundo de familiares de
dependentes químicos, conhecendo de perto suas vivências e a imensidão de seus sentimentos
relativos a esta problemática.
O grupo formado nessa pesquisa foi composto por familiares cuidadores de
dependentes químicos que estavam em tratamento no CAPS-ad da Secretaria Executiva
Regional III do Município de Fortaleza – Ceará. Foi um grupo heterogêneo quanto às
características socioeconômicas, demográficas e das histórias de vida de cada componente,
mas, quanto à vivência próxima à questão das drogas e expressão da co-dependência, ele se
214
revelou homogêneo, embora heterogêneo no que se refere ao seu comportamento e
enfrentamento diante dessa co-dependência.
Esses familiares sofrem com a condição de dependência química de seus parentes
e manifestam esse sofrimento por meio de sentimentos múltiplos, entre os quais: medo,
desconfiança, culpa, cuidado/controle excessivo para com o outro e descuido para consigo,
além de apresentarem mudanças no estilo de vida. Essas foram as principais formas de
expressão da co-dependência pelos participantes do grupo.
A permanência constante desses inúmeros sentimentos na vida do membro
familiar produz um comportamento de co-dependência para com o dependente químico. Esse
passa a gastar a maior parte de sua energia vital em função do outro, esquecendo-se de si, de
suas necessidades, de seus anseios e de seus projetos de vida. Este comportamento origina
outros inúmeros sentimentos, entre eles: descontentamento, incertezas, angústia, medo,
depressão, ansiedade, tristeza, desesperança e sentimentos de perda e de culpa. Em resposta a
estes sentimentos, o co-dependente passa a somatizar, referindo queixas que mexem com seu
bem-estar físico e mental. Essas queixas, quando muito intensas, são interpretadas pelo
familiar como sendo o início do desenvolvimento de uma doença física ou mental, oriunda da
problemática que ele vivencia em virtude da dependência química de um ente querido.
O grupo revelou que ser um familiar co-dependente é ser alguém que vivencia
inúmeros sofrimentos, necessitando de ajuda e assistência profissional, pois os familiares têm
sentimentos ambivalentes entre querer e não querer mudar seu comportamento diante do que
vivenciam, ou entre querer e conseguir. Foi possível identificar o fato de que eles sofrem e
muitos querem ajuda e a procuram. Observamos na prática dos servos de tratamento da
dependência química o fato de que o sofrimento e as necessidades dos familiares parecem
não ser percebidas ou valorizadas, concentrando-se a atenção apenas no usuário. Com esta
atitude, o familiar não é contemplado em suas necessidades nem percebido e valorizado
como rede de apoio na atenção ao dependente químico.
Esta tese nos permitiu fomentar uma reflexão sobre nossa prática de intervenção
de saúde junto aos familiares dos dependentes químicos, ressaltando e valorizando cada vez
mais o papel da família como rede de suporte ao membro usuário de drogas e do enfermeiro
como importante agente do cuidado em saúde mental da família do dependente químico.
Pois, essas práticas de intervenção, ainda são muito focadas na droga, e, por conseguinte, no
indivíduo que dela é dependente.
A ampliação deste olhar se faz necessária, pois nos permite a superação de uma
apreensão fragmentada do dependente, na proposição de uma visão ampliada acerca do
215
problema, que inicialmente se apresenta como sendo a droga. Compreender o fenômeno da
dependência química como sendo a manifestação de um sintoma que reflete e esconde toda
uma intrincada rede de relações, na qual o indivíduo se insere. Significa entender o
dependente como parte integrante de um sistema o familiar, do qual a dependência, como
sintoma, é resultante das interações recíprocas entre seus membros, e, ainda, entender a
família como parte de um universo ainda mais amplo, que é a sociedade.
Ao entender a família como núcleo primário deste contexto mais amplo, não seria
coerente abrir mão de sua participação e seu envolvimento no processo terapêutico do
membro em tratamento. Caso contrário estaria aceitando a explicação linear dos fenômenos e
nos distanciando da noção de circularidade; da responsabilidade compartilhada. Uma
responsabilidade que não é apenas da família, mas da sociedade como um todo mais amplo,
no qual ela está inserida.
Com este estudo, podemos analisar o grupo de apoio e constatarmos que
realmente os familiares dos dependentes químicos necessitam também de assistência,
especialmente aquele que está mais próximo do usuário de droga e que desenvolve um
comportamento de co-dependência.
Esses co-dependentes necessitam de apoio e compreensão, e a Enfermagem,
como partícipe da equipe interdisciplinar envolvida no processo de cuidar, deve valorizar e
inserir cada vez mais a família no tratamento, sem estereotipar os clientes, negar as
diferenças ou deixar de acolher e escutar, buscando a individualidade e singularidade de cada
caso trabalhado. Como profissional do cuidar, o enfermeiro deve ter na escuta, individual ou
coletiva, o instrumental sico de sua prática, procurando atuar com necessária competência
técnica, ética e humana, objetivando o atendimento das necessidades da clientela assistida.
É papel da enfermagem ao cuidar do dependente químico e de seus familiares, a
assistência voltada para interação inter-pessoal e escuta ativa, objetivo maior da inserção do
enfermeiro no cuidado ao dependente químico e sua família. A profissão de Enfermagem
pode desempenhar um papel de liderança importante e significativa na área de redução da
demanda de drogas, uma vez que constituem a maior força de trabalho do setor saúde.
Estudar esse tema das drogas psicoativas é algo de extrema relevância na
atualidade, pois as questões relativas as relações que o sujeito dependente químico
estabelece consigo mesmo, com a família e com a sociedade precisam ser abordadas e
debatidas, e a enfermagem se insere como uma das profissões da área de saúde que se propõe
abordar o surgimento do sofrimento psíquico experimentado nessas relações e, portanto
precisa estar desenvolvendo estudos que lhe permitam pensar estes acontecimentos.
216
A importância desse estudo pauta também em afirmar que a maioria dos serviços
de saúde mental que tratam das questões que envolvem essa clientela ainda está dando os
primeiros passos para incorporar ao processo terapêutico a assistência aos familiares, e a
enfermagem é peça chave para que essas mudanças verdadeiramente ocorram, pois as
mudanças ocorridas no âmbito da saúde mental no Brasil, principalmente com a reorientação
do modelo de atenção e criação dos CAPS, exige que possamos reorientar também a forma
como os trabalhadores de saúde e especialmente os da enfermagem se insiram nos mesmos,
reivindicando suas práticas.
É partindo desse principio que reforçamos a idéia que este estudo contribui para
os serviços públicos de assistência ao dependente químico, para os enfermeiros da área que
poderão repetir a experiência melhorando suas práticas e criando novas maneiras de cuidar,
além de beneficiar pessoas, principalmente os dependentes químicos e seus familiares.
Com esse grupo de familiares de dependentes químicos, constatamos realmente o
que afirmamos no início do estudo, ou seja, pressupomos que a família é um elemento
importante na montagem da rede de apoio ao dependente químico e partimos do princípio de
que o comportamento de co-dependência está presente na vida desses familiares, interferindo
em sua saúde mental e no modo de lidar com a condição de dependência química de seu
parente. Portanto, observamos que de fato a co-dependência é motivo de sofrimento em
alguns familiares, e, embora cada família apresente diferentes tipos de relações, a expressão
da co-dependência é praticamente igual em todas elas.
Acreditamos haver atingido os objetivos do nosso estudo, na medida em que
conseguimos analisar o processo grupal como instrumental do cuidado de enfermagem
ocorrido junto aos familiares de dependentes químicos, num ensaio com um grupo de apoio
composto de onze familiares, ocasião em que pudemos caracterizar o grupo nos
aspectos socioeconômicos e demográficos; descrever o processo e as fases de
desenvolvimento do grupo e identificar o modo como a co-dependência é expressa no grupo
de familiares de dependentes químicos.
Com a formação desse grupo, tudo isso foi possível e, ao mesmo tempo, também,
avaliar a repercussão da intervenção grupal junto aos componentes familiares. Reconhecemos
que o que favoreceu o alcance dos objetivos propostos e o fato de termos avançado nos
resultados junto ao grupo de familiares foi a opção teórica relativa ao desenvolvimento do
processo grupal conduzido por enfermeiros em grupos de cuidado de saúde. Consideramos,
no entanto, que um avanço foi conseguido, além da proposta teórica, pois, quando na
utilização desta, pudemos apresentar os passos sugeridos pela autora, organizados em fases
217
(planejamento, intervenção e avaliação), para que a produção de dados e a intervenção grupal
fossem exeqüíveis.
O objetivo primário do grupo foi oferecer apoio/suporte e isso foi alcançado,
conforme contatamos na avaliação processual, realizada pelos integrantes do grupo após cada
sessão, bem como ao final de todo processo grupal.
Com o estabelecimento das relões interpessoais dos familiares pudemos
desenvolver fatores curativos e o conseqüente oferecimento de apoio/suporte uns aos outros.
Os objetivos propostos em cada sessão, no intuito de estimular a coesão grupal para melhor
expressão da co-dependência (promoção do autoconhecimento, conhecimento do outro,
interação grupal), também foram alcançados durante o processo grupal.
Em meio ao turbilhão de singularidades e diferenças entre os participantes do
grupo de apoio/suporte com familiares de dependentes químicos, destacamos alguns pontos
que consideramos importantes relativos à nossa vivência na qualidade de coordenador-
principal, pesquisadora e enfermeira:
- mostra-se viável e terapêutica a formação de grupos de apoio/suporte para
familiares de dependentes químicos nos CAPS-ad, haja vista que a socialização e o
compartilhamento de experiências constituem fatores primordiais para que o grupo cresça e
aprenda a conviver com suas dificuldades. Ao enfermeiro cabe estimular a integração e a
expressão de subjetividades, fortalecendo a coesão grupal em busca de apoio/suporte para os
familiares e, conseqüentemente, a adaptação deles ou mudanças de comportamentos;
- a assistência ao familiar resulta na melhoria das relações familiares, e a
incapacidade ou inabilidades dos familiares conviverem com seus membros usuários de
droga foi identificada, chegando a interferir negativamente na terapêutica do usuário,
ensejando mais conflitos. É o familiar mais próximo do usuário de drogas, porém, que
desenvolve o comportamento de co-dependência, por isso é importante que os serviços de
atenção ao dependente químico instituam esse tipo de cuidado, visando à criação de grupos
de apoio/suporte e até outros tipos, como os terapêuticos e os de ensino-aprendizagem, e a
enfermagem deve ser agente ativo na instituição desse cuidado;
- identificamos vários fatores curativos durante as sessões grupais, entre eles: o
altruísmo, instilação de esperança, oferecimento de informações, catarse, universalidade,
desenvolvimento de técnicas de socialização, comportamento imitativo, reedição corretiva do
grupo familiar primário, aprendizagem interpessoal e coesão grupal; sendo que a coesão
grupal foi trabalhada desde o início como algo necessário para a efetividade do grupo e, ao
218
final, pudemos percebê-la como resultado desta efetividade. Em todas as sessões, sempre
estiveram presentes vários fatores curativos;
- a fertilidade de histórias vividas e a veracidade na expressão dos sentimentos
dos participantes favoreceram o fortalecimento da coesão durante o processo grupal; e
- o ambiente grupal favoreceu intenso aprendizado interpessoal a esses familiares
quanto à questão do uso de drogas de seus entes dependentes químicos, tornando o ambiente
também terapêutico.
Finalmente, com relação aos princípios teóricos descritos neste estudo, que tratam
do processo grupal conduzido por enfermeiros em grupos de cuidados de saúde, permitiram
que esse tipo de intervenção ocorresse de forma sistemática e exeqüível, contribuindo, assim,
para a efetividade do grupo e, conseqüentemente, para a qualidade da assistência em saúde
mental aos familiares de usuários de droga.
Consideramos que o método teórico utilizado se adequou à investigação, pois,
mediante o processo grupal, mais nos aproximamos da realidade vivenciada pelo familiar do
dependente químico.
Ressaltamos, ainda, o fato de que para a Enfermagem, esta investigação se mostra
relevante, por desvelar, um pouco, a realidade vivenciada pelo familiar do dependente
químico, pois reforça a importância de se investir no fortalecimento desta rede de apoio e
aproxima de um referencial teórico de embasamento de um instrumental importante para a
prática profissional junto ao dependente químico.
Comprovamos a tese de que os familiares de dependentes químicos necessitam de
assistência, podendo ser beneficiados por meio de um grupo de apoio, pois assim ocorreu no
grupo estudado e compreendendo as principais dificuldades enfrentadas pela família ao lidar
com um de seus membros dependentes químicos é que afirmamos que o enfermeiro poderá
fomentar estratégias de enfrentamento no âmbito familiar, avançando, assim, na promoção da
saúde mental do dependente químico e de sua família, criando condições para tornar essa
família a principal aliada no processo de tratamento.
Esperamos que, com esta tese, possamos contribuir com as instituições de saúde
e, especificamente, com aquelas de assistência ao dependente químico e sua família, por meio
de subsídios que norteiem trabalhos de intervenção ao dependente químico em tratamento e
sua família. Finalmente, ao conhecermos os indicadores de co-dependência presentes na
vivência do familiar do dependente químico que é assistido em um grupo, certamente ficará
mais fácil interferir na rede de relações familiares e no processo de adoecimento e tratamento
dos envolvidos com a dependência química.
219
Referências
ReferênciasReferências
Referências
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ALUANI, E. P. Drogas: Classificação e efeito no organismo. Mundo da Saúde, São
Paulo, ano 23, v. 23 , n. 1, p. 24-27, jan./fev. 1999.
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225
ANEXO
226
ANEXO A
PARECER DE APROVAÇÃO JUNTO AO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
227
APÊNDICES
228
APÊNDICE A
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
Data: __/__/__ Nº da Entrevista: ___________
Nome fictício do participante: ____________________
Procedência: _________________ Data do nascimento/idade: _______________
Grau de instrução: _________________
Estado civil: _____________________
Religião: _________________________
Renda familiar: ____________________
Qual seu parentesco com a pessoa em tratamento no CAPS-ad? ____________________
Desde quando ele (a) usa drogas? ____________________________________________
Qual o tipo de droga utilizado por ele(a), no passado e
atualmente?_____________________________________________________________
Qual motivo você acha que levou seu parente a utilizar
drogas?________________________________________________________________
É a vez que você esacompanhando o tratamento de um parente dependente químico?
____________________________________________
Se não, quantas vezes antes? ________________Onde foram? ____________________
1. Como você percebe o seu parente dependente químico?
2. Como você lida com esta situação?
3. Como você se sente diante dessa condição de dependência química de seu familiar?
4. Como você acha que poderia ajudar o seu familiar?
5. Que outras formas de ajuda você considera que seriam importantes?
6. O que você espera deste grupo de familiares?
7. Gostaria de acrescentar mais alguma coisa?
229
APÊNDICE B
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
FACULDADE DE FARMÁCIA, ODONTOLOGIA E ENFERMAGEM
DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
TÍTULO DO ESTUDO: VIVÊNCIA DE FAMILIARES DE DEPENDENTES
QUÍMICOS: A EXPRESSÃO DA SUBJETIVIDADE COMO ESTRATÉGIA DE
PROMOÇÃO DA SAÚDE
PESQUISADOR RESPONSÁVEL: LEILA MEMÓRIA PAIVA MORAES
REGISTRO NO COMEPE: ___________
Prezada Senhor(a),
Sou Leila Memória Paiva Moraes, enfermeira e aluna do Curso de Doutorado em
Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Estou desenvolvendo neste serviço uma
pesquisa intitulada Vivência de familiares de dependentes químicos: a expressão da
subjetividade como estratégia de promoção da saúde.
A dependência química é algo que traz inúmeros transtornos para o dependente e seus
familiares, tornando na maioria um processo doloroso para ambos, usuário e familiar.
Portanto o uso de droga traz muitos problemas, não só para a pessoa que usa, como para sua
família. Dessa forma, esse trabalho tem o objetivo de analisar o modo como a co-
dependëncia é expressa em familiares de dependentes químicos.
Para isso, preciso da sua colaboração, pois pretendo formar um grupo com familiares
de dependentes químicos que estejam sendo atendidos neste CAPS-ad. Caso aceite participar
da pesquisa agendarei os dias dos encontros com o grupo que serão aqui no próprio CAPS-ad,
além de uma entrevista individual. Sua participação neste estudo é livre e exigirá em torno de
duas horas para cada sessão grupal e de 15 a 20 minutos para o ato da entrevista.
O grupo será uma oportunidade para expor como está se sentindo com essa
experiência de ter uma pessoa enfrentando a dependência química em sua família. O que
acontecer será registrado e, com sua autorização, utilizaremos gravador, máquina fotográfica
ou filmadora. Depois as falas serão transcritas e no último encontro confirmarei com você o
que escrevemos. E suas fotos serão também divulgadas junto ao texto do que foi vivenciado
no grupo.
Dou-lhe a garantia de que as informações a obter serão apenas para a realização do
meu trabalho, e seu nome e nada que puder identificá-la será utilizado. Também asseguro que
a qualquer momento terá acesso às fitas gravadas, às anotações das informações obtidas e
fotos, inclusive para resolver dúvidas que possam ocorrer. Terá a liberdade de retirar sua
autorização ou consentimento a qualquer momento, sem que isso lhe traga prejuízo à
continuidade do tratamento de seu familiar, nem em relação à sua permanência na instituição.
E, finalmente, informo que os dados do estudo serão codificados e, portanto, sua identidade
não será revelada durante a condução do estudo nem quando o estudo for publicado em
eventos ou períodicos científicos. A participação neste estudo não trará nenhuma despesa para
você.
Caso precise entrar em contato comigo, informo meu nome e endereço, de minha
orientadora e do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará:
230
Pesquisador: Leila Memória Paiva Moraes.
Endereço: Rua Carlos Vasconcelos 2459, apart.301, Aldeota, Fortaleza-Ceará. Cep: 60115-171
Fone: (0xx85) 3246-0232 / 9977-4765.
Orientadora: Violante Augusta Batista Braga – Doutora.
Fone: (0xx85) 3366-8454
O comitê de Ética em Pesquisa – UFC está disponível para quaisquer informações no telefone:
(0XX85)3366-8338.
__________________________________________
Pesquisadora
CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIMENTO
Tendo sido satisfatoriamente informada sobre a pesquisa Vivência de familiares de
dependentes químicos: a expressão da subjetividade como estratégia de promoção da saúde
pela pesquisadora e entendido o que me foi explicado, e estando ciente de meus direitos,
concordo em participar da pesquisa a ser realizada pela enfermeira Leila Memória Paiva
Moraes.
Fortaleza, ____ de ___________de_______.
_________________________________________________
Assinatura do Sujeito Participante/RG
__________________________________________________
Assinatura do Pesquisador
231
APÊNDICE C
CONTRATO DE CUIDADOS DE SAÚDE
CONTRATO DE TRABALHO
Identificamos as necessidades de apoio/suporte confirmadas pelos participantes do
grupo como sendo as suas necessidades primordiais.
Portanto, o tipo de grupo proposto é de apoio emocional, para o qual foram
estabelecidos os seguintes objetivos:
- fornecer apoio/suporte aos participantes do grupo, dando espaço para verbalização de
seus sentimentos;
A meta estipulada a ser alcançada pelo grupo de familiares dos dependentes químicos
foi de que cada participante fornecesse apoio/suporte uns aos outros.
O grupo será estruturado da seguinte forma:
- tipos de clientes-familiares dos usuários do Centro de Atenção Psicossocial para
Álcool e outras Drogas (CAP-ad) da Secretaria Executiva Regional III da Prefeitura
Municipal de Fortaleza-Ceará, em convênio com a Universidade Federal do Ceará.
- Arranjos físicos.
* Tempo (horário e freqüência) as oficinas de produção de dados acontecerão das
13h e 30h às 16h, com encontros semanais às segundas-feiras, iniciando no dia 25 de junho de
2007 a 13 de agosto de 2007; após esse período, continuarão os encontros, mas sob a
coordenação principal de algum profissional do serviço, provavelmente a atual coordenadora
auxiliar, a terapeuta ocupacional Karolina Martins; o grupo recebeoutros participantes e
aqueles que desejarem continuar ou sair dele terão a inteira liberdade.
* Local (espaço e ambiente) o grupo se reuni na sala reservada para atendimento
grupal do CAPS-ad.
* Tamanho do grupo e estrutura –contará com no máximo 11 participantes, sendo que
se tratará de um grupo fechado.
* Desligamento do grupo o participante se desligará do grupo se ele tiver duas faltas
consecutivas sem antes ter comunicado ou justificado que vai faltar.
Ficam autorizados pelos membros do grupo a gravação e o registro das falas dos
participantes e a realização de fotografias durante os encontros.
Serão desenvolvidas técnicas vivenciais mediante recursos artísticos como meio
utilizado para o alcance das metas propostas.
O papel das coordenadoras será o de facilitar o processo grupal, executando as funções
necessárias para que o grupo aconteça, bem como prestar cuidados necessários aos
participantes, estimular o compartilhamento de experiências, sentimentos e emoções entre
eles, além de registrar dados importantes para a pesquisa e para o processo de assistência
terapêutica ao usuário.
Como resultado deste trabalho, o grupo espera contribuir para a melhoria do processo
terapêutico do usuário em atendimento no CAPS-ad, convivência através da manutenção do
nível de socialização, alçando assim, o apoio/suporte para os familiares participantes do grupo
e conseqüentemente de toda a família do usuário do serviço.
Essa efetividade do grupo será avaliada por meio dos depoimentos individuais dos
participantes e pela percepção das coordenadoras.
Fortaleza, 25 de junho de 2007.
232
Eu, após a leitura do contrato de trabalho, concordo com o que está escrito e confirmo
minha participação nas sessões subseqüentes, de acordo com o que foi estabelecido.
_____________________________________
Participante do grupo
_____________________________________
Coordenadora Principal do Grupo
233
APÊNDICE D
REGRAS DE CONVIVÊNCIA GRUPAL SAUDÁVEL
1. Cada membro se compromete a participar das sessões semanais do grupo.
2. Todos devem respeitar-se, procurando entender e ajudar uns aos outros.
3. Todos os membros do grupo devem participar e dar sua opinião sobre os temas
abordados, mantendo-se o respeito ao outro.
4. O horário marcado pelo grupo para o início da sessão deve ser respeitado, assim
como horário de término.
5. O que foi dito no ambiente do grupo é confidencial.
6. o deverá haver conversas paralelas.
7. Quando o for possível a participação no grupo, deverá ser justificada com
antecedência a ausência (telefone do CAPS ou da coordenadora principal
disponível no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido); caso contrário,
haverá desligamento do participante ao grupo se ele tiver duas faltas
consecutivas, sem antes ter comunicado ou justificado ao grupo que vai faltar.
8. Serão estritamente proibidas agressões verbais ou físicas.
234
APÊNDICE E
DADOS COMPLEMENTARES TRAZIDO POR FLÁVIA
Perguntas e respostas ao meu poder superior
Pergunta 1 (FLÁVIA): Que fazer, meu anjo, meu guia, para me sentir com mais
forças, ter menos ansiedades?
Poder Superior Responde: Tenha mais fé, mude seu ritmo de vida, ocupe-se em algo
de mais importância.
Comentários de FLÁVIA: Sabe, meu anjo, hoje quarta feira dia 16, tive mais uma
recaída; quis perder a e confiança, eu preciso de uma luz que clareie a minha vida, o meu
mundo está tornando-se triste.
Poder Superior Responde: Tente mudar o seu rumo de vida, sem choro sem
lágrimas, aceite alguém compartilhar junto de você, esqueça o medo e aceite antes de tudo
ajuda.
16 de Agosto de 2007
Assina FLÁVIA
235
APÊNDICE F
MENSAGEM QUE A PARTICIPANTE SANDRA TROUXE PARA O GRUPO
AMIGOS
Muita gente vai entrar e sair da sua vida, mas somente verdadeiros amigos deixarão marcas
em seu coração.
Para se segurar, use a cabeça; para segurar os outros, use o coração.
Ódio é apenas uma curta mensagem de perigo. Grandes mentes discutem idéias; mentes
medianas discutem eventos; mentes pequenas discutem pessoas.
Aquele que perde um amigo perde muito mais; aquele que perde a fé perde tudo.
Jovem bonito é um acidente da natureza; velho bonito é uma obra de arte.
Aprenda com os erros dos outros. Você não pode viver bastante o suficiente para cometê-los
todos por si só.
Amigos, eu e você... Você trouxe outro amigo...
E nós iniciamos um grupo... Seu círculo de amigos...
E como um círculo, não tem começo, nem fim...
Ontem é Historia. Amanhã é mistério. Hoje é uma dádiva.
236
APÊNDICE G
Quadro 2 – Demonstrativo da fase de produção dos dados
PERÍODO FASE ATIVIDADE
DESENVOLVIDA
METODOLOGIA/
TÉCNICA
OBJETIVOS
A ATINGIR
18/06/07
a
22/06/07
Fase de
planejamento
(objetivos)
- Realização do encontro com
os prováveis participantes do
grupo com:
- Apresentação da coordenadora
principal e auxiliar.
- Apresentação geral e resumida
dos participantes.
- Apresentação dos objetivos da
pesquisa.
- Realização das entrevistas
individuais antes da inserção no
grupo com uma sondagem das
expectativas.
- Esclarecimento e assinatura do
termo de consentimento livre e
esclarecido.
- Agendamento da sessão
preparatória.
- Exposição
dialogada e
participativa.
* “Técnica Galeria de
Artes”.
- Entrevista
individual.
-- Estabelecer o
primeiro contato
entre coordenadoras
do grupo e
participantes.
- Identificar quais as
necessidades dos
familiares
participantes, a fim
de formular os
objetivos e metas
para o grupo.
- Iniciar o
planejamento das
sessões posteriores a
partir dos objetivos e
metas formulados
para o grupo.
25/06/07
13h30min às
16h00min
Sessão
preparatória
Fase de
intervenção
(Estrutura)
- Sessão preparatória.
*Apresentação dos participantes.
*Discussão e esclarecimento das
necessidades dos clientes
participantes, objetivos e metas
do grupo e da coordenadora da
pesquisa.
*Continuação da sondagem das
expectativas do grupo.
*Compartilhamento e
esclarecimento de aspectos
funcionais do grupo, como:
objetivos, estrutura, processo e
resultados.
*Discussão e estabelecimento
das regras de convivência grupal
saudável.
- Assinatura do contrato de
cuidado de saúde/contrato de
trabalho.
- Agendamento das sessões
grupais posteriores.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica “Partilha
em dupla”.
- Técnica de
relaxamento:
“Respiração”.
- Técnica: Liberação
dos sentimentos”.
- Proporcionar que os
participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
- Promover o
compartilhamento de
sentimentos com
vistas ao processo de
apoio suporte e
coesão grupal.
- Promover a
interação dos
membros do grupo.
- Preparar os
familiares para
iniciarem sua
participação no
grupo, contribuindo
para a efetivação dos
resultados da
intervenção grupal.
- Começar o processo
de identificação dos
sentimentos dos
participantes, a fim
de visualizar como a
co-dependência é
expressa.
- Firmar contrato de
237
trabalho e regras de
convivência grupal
saudável entre os
participantes do
grupo e as
coordenadoras.
02/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão I
Fase de
Intervenção
(Processo)
1º momento: Acolhimento:
- Recepção dos participantes.
- Reapresentação dos
participantes.
- Leitura do contrato de trabalho
e regras de convivência grupais
saudáveis estabelecidas na
sessão preparatória.
2º momento: Desenvolvimento:
- Preparação para o momento de
expressão.
* O que é co-dependência?
* Como é expressa na vida do
familiar de um dependente
químico?
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
- Verbalização dos sentimentos
por ter participado e como cada
um estava saindo do encontro
grupal.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Exercícios de
movimentos”.
- Técnica: “Desenhos
em pedaço de papel”.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Contribuir para a
memorização dos
nomes dos
participantes e suas
características
principais.
- Identificar o
conhecimento prévio
dos participantes
sobre o que é co-
dependência e como
se expressa esta em
suas vidas.
- Estimular a
verbalização de
sentimentos.
- Promover a
interação grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
09/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão II
Fase de
intervenção
(Processo)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Releitura do contrato de
trabalho e das regras de
convivência grupal saudável.
2º momento: Desenvolvimento:
- Preparação para o momento de
expressão.
- Construção de desenhos e
continuação do desenho de cada
um dos presentes na sessão.
- Reflexão sobre o desenho
inicial e após ter sido
complementado pelos
participantes da sessão:
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
- Utilizando medalhas
simbolicamente como forma de
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
Relaxamento:
“Técnica do andar”.
- Atividade de
desenho: Complete
os desenhos e
continue o desenho”.
- “Técnica das
medalhas”.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Relembrar a
existência do contrato
de trabalho e das
regras de convivência
grupal saudável,
frisando sua
importância para a
coesão grupal e o
processo de pesquisa.
- Refletir sobre a
condição de ser um
familiar de um
dependente químico.
- Promover a auto-
percepção dos
participantes.
- Proporcionar que os
238
avaliar a sessão e como estavam
saindo daquele momento.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
participantes do
grupo conheçam
melhor uns aos
outros, facilitando o
processo de apoio e
suporte.
- Estimular a
verbalização de
sentimentos
compartilhando com
todos os membros do
grupo.
- Contribuir para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promover a
interação grupal.
- Sensibilizar para a
importância e
relevância do
trabalho de grupo.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
16/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão III
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de sentimentos e
fatos de sua vida diária que
estavam incomodando os
participantes.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparando os participantes
para refletir sobre suas relações
familiares.
- Construção de uma árvore
baseada nos seguintes
questionamentos: Como você
visualiza as relações em sua
família? Como a co-dependência
é expressa nessas relações?
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação:
- Avaliação da sessão.
- Escolha de flores e
oferecimento por parte de cada
participante para qualquer outro
membro do grupo; a flor
simbolizava algo que o
participante queria ofertar.
- Lanche coletivo: “o nosso
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento: viagem
imaginária “Uma
vista da montanha”.
- Técnica:
“Percepções de
minha família”.
- Técnica de
avaliação: “Que bom
que pena e que tal?”
- Oferecimento de
flores.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Promover a auto-
percepção dos
participantes.
- Proporcionar que os
participantes do
grupo conheçam
melhor uns aos
outros, facilitando o
processo de apoio e
suporte.
- Estimular a
verbalização de
sentimentos,
partilhando com
todos os membros do
grupo.
- Contribuir para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promover a
interação grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
239
lanche de cada dia”.
coesão grupal.
- Proporcionar
momentos de
reflexão sobre as
relações familiares.
- Contribuir para que
os participantes
analisem de que
forma a co-
dependência é
expressa em suas
vidas.
- Contribuir para a
ocorrência de fatores
curativos como
instilação de
esperança e
universalidade entre
os membros do
grupo.
23/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão IV
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Relembrando a sessão III
Como têm ocorrido as relações
familiares e como a co-
dependência é expressa nessas
relações.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparação para o momento de
expressão;
- Representação pela construção
de um relógio de como tem sido
sua rotina diária como familiar
de um dependente químico;
como a co-dependência se
expressa nessa rotina diária.
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
- Avaliação da sessão.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa;
- Técnica de
relaxamento:
“Alongamento
corporal”.
- Técnica: Relógio
da vida”.
- Avaliação da
sessão.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Contribuir para o
entendimento da
relevância de refletir
sobre as relações
familiares e a
expressão da co-
dependência nessas
relações.
- Promover a auto-
percepção dos
participantes.
- Refletir sobre a
condição de co-
dependente e qual a
repercussão diária na
vida dos participantes
do grupo.
- Estimular os
participantes a
analisarem sua rotina
diária como familiar
de um dependente
químico.
- Estimular a
verbalização de
sentimentos.
-- Contribuir para que
os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
240
- Promover a
interação grupal;
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
30/07/07
13h30min às
16h00min.
Sessão V
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de assuntos
considerados importantes para os
participantes.
2º momento: Desenvolvimento
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Construção de desenho que
retrate o encontro com o guia
sábio.
- Espaço para verbalização.
3º momento: Avaliação.
Avaliação da sessão através de
palavras.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
Relaxamento:
Viagem imaginária:
“O guia sábio”.
- Atividade de
desenho: “Pintura
com dedos”.
- Avaliação com
palavras.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Refletir sobre o
término da fase de
intervenção grupal.
- Preparar os
participantes para a
fase de avaliação
grupal.
- Proporcionar espaço
para que os
participantes do
grupo reflitam sobre
o que estão
vivenciando.
- Estimular a
liberação de
sentimentos através
da imaginação e
intuição.
- Proporcionar que os
participantes
encontrem respostas
para suas dúvidas nas
relações familiares
com o dependente
químico.
- Contribuir para que
os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
Promover a interação
grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
06/08/07
13h30min
às 16h00min.
Sessão VI
Fase de
intervenção
(processo)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Leitura de mensagem trazida
por uma participante do grupo.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Construção de desenho que
- Exposição
dialogada e
participativa.
Técnica de
Relaxamento
Viagem imaginária:
“Mais uma vez diante
de meu guia sábio”.
- Atividade de
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Refletir sobre o
término da fase de
intervenção grupal.
- Preparar os
participantes para a
241
retrate o encontro com o guia
sábio;
- Espaço para verbalização;
- Comentários gerais sobre a
relação entre o guia sábio e cada
participante.
3º momento: avaliação.
- Utilizando medalhas
simbolicamente como forma de
avaliar a sessão e como estavam
saindo daquele momento.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
desenho através da
pintura.
- Técnica do espelho.
- “Técnica das
Medalhas”.
fase de avaliação
grupal.
- Proporcionar espaço
para que os
participantes do
grupo reflitam sobre
o que estão
vivenciando.
- Estimular a
liberação de
sentimentos através
da imaginação e
intuição.
- Proporcionar que os
participantes
encontrem respostas
para suas dúvidas nas
relações familiares
com o dependente
químico.
- Contribuir para que
os participantes
conheçam melhor uns
aos outros.
- Promover a auto-
percepção dos
participantes.
- Promover a
interação grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
13/08/07
13h30min às
16h00min.
Sessão VII
Fase de
Avaliação
(resultados)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Verbalização de assuntos
considerados importantes para os
participantes.
- Esclarecimento sobre o
desligamento de alguns
participantes do grupo (alta) e a
nova fase do grupo de
familiares.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Realização de um desenho
produzido por todos os
participantes do grupo,
avaliando-o a partir da viagem
imaginária.
- Espaço para verbalização dos
sentimentos do grupo.
3º momento: Avaliação:
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Imaginação
dirigida”, Ouvindo
música tranqüila”.
- Atividade de
desenho: Desenho
grupal”.
Técnica de avaliação:
“Avaliação Clínica”.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Avaliar os
resultados do grupo
pelos membros e
coordenadoras do
grupo.
- Proporcionar espaço
para que os
participantes do
grupo reflitam sobre
o que estão
vivenciando.
- Estimular a
liberação de
sentimentos através
da imaginação e
intuição.
- Proporcionar que os
participantes
242
- Avaliação da sessão.
- Primeira avaliação final dos
encontros.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
encontrem respostas
para suas dúvidas nas
relações familiares
com o dependente
químico.
- Contribuir para a
percepção do outro.
- Contribuir para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promover a
interação grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
20/08/07
13h30min às
16h00min.
Sessão VIII
Fase de
avaliação
(Resultados)
1º momento: Acolhimento.
- Recepção dos participantes.
- Repetição de esclarecimento
sobre o desligamento de alguns
participantes do grupo (alta) e a
nova fase do grupo de
familiares.
2º momento: Desenvolvimento.
- Preparando os participantes
para o momento de expressão.
- Realização de uma produção
plástica que retratasse sobre o
momento de reflexão de cada
participante sobre tudo o que foi
produzido durante as sete
sessões grupais. Questões para
reflexão: O que essa experiência
de expressar seus sentimentos
foi para cada um de vocês? O
que o grupo contribuiu? O que o
grupo fez para cada um de vocês
mudassem em relação ao seu
comportamento, atitudes, saúde
mental e física diante da
dependência química de seu
parente?O que cada uma dessas
produções significaram para
vocês?
- Espaço para verbalização dos
sentimentos individuais e
grupais.
3º momento: Avaliação.
- Confraternização final.
- Lanche coletivo: “o nosso
lanche de cada dia”.
- Exposição
dialogada e
participativa.
- Técnica de
relaxamento:
“Alongamento
corporal”.
- Técnica: “Galeria
de Expressões
artísticas e
sentimentais”.
- Proporcionar bem-
estar dos
participantes no
espaço grupal.
- Avaliar os
resultados do grupo
pelos membros e
coordenadoras do
grupo.
- Contribuir para que
os participantes
analisem como
entraram e como
estão saindo do
grupo, ou seja, a sua
evolução.
- Estimular
verbalização dos
sentimentos.
- Contribuir para a
percepção do outro.
- Contribuir para que
os participantes do
grupo dêem feedback
uns aos outros.
- Promover a
interação grupal.
- Contribuir para o
desenvolvimento da
coesão grupal.
Fonte: elaborado pela autora.
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