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transmitida espontânea e naturalmente às novas gerações – estava associada às Musas,
especialmente Mnemósine – mãe das Musas
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e personificação da memória, que possuindo
o saber do passado podia prever o futuro. Segundo a tradição clássica, memória e
conhecimento estão intimamente interligados. Mnemósine detinha o poder de
presentificação, de “trazer à Presença o não-presente, coisas passadas ou futuras”
(TORRANO, 1991: 29). Revelando aquilo que se mostrava oculto, esquecido e,
rememorando o passado, a deusa Memória possuía o poder divino de salvar os feitos
humanos do esquecimento. Assim sendo, Mnemósine peleja contra seu próprio irmão,
Cronus, deus do tempo, que a tudo devora: seres, momentos, destinos. O embate da
memória em oposição ao tempo se dá justamente, como lembra Arendt, para:
preservar aquilo que deve sua existência aos homens, para que o
tempo não o oblitere, e prestar aos extraordinários e gloriosos
feitos de gregos e bárbaros louvor suficiente para assegurar-lhe
evocação pela posteridade, fazendo assim sua glória brilhar através
dos séculos (2000: 70).
No entanto, a época presente parece ter esquecido, ou quem sabe até mesmo
desconhecer tal importância.
Perante os problemas e perplexidades para os quais a tradição não conseguiu
dar respostas, a experiência de “algo novo” foi aceita facilmente na tentativa de superação
e resolução dos “velhos” problemas. A crise educacional é, portanto, fomentada pelo
deslumbramento com o “novo”, incrementada pela aceitação servil e indiscriminada das
mais modernas teorias no campo da Pedagogia (importadas de outros campos das ciências
humanas, sobretudo da Psicologia e da Sociologia
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) e que foram apresentadas como
promessa de solução para as mazelas do sistema educacional.
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As Musas eram, segundo a mitologia grega, nove irmãs. Filhas de Zeus, senhor do céu e da Terra, e de
Mnemósine, deusa da memória. Nascidas de nove noites de amor ,cada uma dessas divindades zelava por um
campo específico das artes e das ciências: Calíope, a musa da poesia épica; Clio, da História; Euterpe, da
música, das flautas; Erato, da poesia lírica; Terpsícore, da dança; Melpômene, da tragédia; Tália, da comédia;
Polímnia, dos hinos sagrados e Urânia da astronomia. As Musas cantavam o presente, o passado e o futuro;
inspiravam os poetas e os literatos em geral, os músicos e os dançarinos e, mais tarde, os astrônomos e os
filósofos.
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A esse propósito, José Sérgio de Fonseca Carvalho, em seu texto De Psicologismos, Pedagogismos e
Educação, proferido na Conferência da 21ª reunião anual da Anped (set/1997) e disponível no seguinte
endereço eletrônico www.forumeducacao.hpg.ig.com.br, declara que certas teorias da Psicologia viraram a
palavra de ordem nas pedagogias modernas, mas ao serem pedagogizadas (derivar uma ação pedagógica a
partir de dados psicológicos) e separadas do contexto histórico e teórico em que foram engendradas,
acabaram sendo banalizadas e sofrendo um grave reducionismo. Para Fonseca Carvalho esse fenômeno teria