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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA - CAMPUS I
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUAGEM E ENSINO
LINHA DE PESQUISA: LINGUAGEM E INTERAÇÃO EM CONTEXTO DE ENSINO
ELABORAÇÃO DE UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA
CENTRADA NO GÊNERO CARTUM
ANA MARIA BARRETO FREIRE
JOÃO PESSOA - PB 2007
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ANA MARIA BARRETO FREIRE
ELABORAÇÃO DE UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA CENTRADA NO
GÊNERO CARTUM
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Letras da UFPB, como
requisito para obtenção do título de Mestre
em Letras, na área de Linguagem em
Contexto de Ensino.
Orientadora: Professora Dra. Maura
Regina Dourado
Co-orientadora: Professora Dra. Maria das
Graças Carvalho Ribeiro
João Pessoa, 2007
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FICHA CATALOGRÁFICA
BARRETO FREIRE, Ana Maria
Elaboração de uma seqüência didática centrada no gênero cartum Ana Maria
Barreto Freire João Pessoa, 2007, 81p.
Orientadora: Profª Drª Maura Regina Dourado
Dissertação (Mestrado) –UFPB-CCHLA
TERMO DE APROVAÇÃO
ANA MARIA BARRETO FREIRE
ELABORAÇÃO DE UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA CENTRADA NO GÊNERO
CARTUM
Dissertação aprovada como requisito para a obtenção do título de mestre em Letras, área
de concentração em Linguagem e Ensino, do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
da Universidade Federal da Paraíba – UFPB.
Aprovação: João Pessoa, _______/________/ 2007
Profª. Dra. MAURA REGINA DOURADO – PPGL/UFPB
Prof
a
Dra. MARIA DAS GRAÇAS CARVALHO RIBEIRO
Dissertação de Ana Maria Barreto, intitulada Elaboração de uma seqüência
didática centrada no gênero cartum, defendida e aprovada como requisito final
para a obtenção do título MESTRE EM LETRAS, no Programa de Pós-graduação
em Letras da Universidade Federal da Paraíba.
BANCA EXAMINADORA
Professora Dra. Maria das Graças Carvalho Ribeiro
Co- orientadora
Examinadora
Examinadora
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela força em todos os momentos;
À minha orientadora, Professora Dra. Maura
Regina Dourado pela orientação constante e
competente;
À professora Dra. Maria das Graças Carvalho
Ribeiro, por ter aceitado, no papel de co-
orientadora, representar a Professora Dra. Maura
Regina Dourado (orientadora);
Ao meu querido marido, Carlos, por toda sua
compreensão, amor e companheirismo.
À minha amada filha Maria Eutália, por completar
minha vida.
Aos meus pais, por todo amor e apoio;
Aos meus irmãos, pelo incentivo, especialmente a
Sérgio e Kionara, pela acolhida em sua casa durante
esse período tão importante em minha vida;
Aos meus professores e colegas do mestrado;
A todos aqueles que direta ou indiretamente me
ajudaram a concluir o mestrado.
RESUMO
Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental (PCN) (re)pensam o ensino
de língua materna e estrangeira à luz das teorias de linguagem, letramento, ensino-
aprendizagem e gêneros textuais e objetivam o desenvolvimento de habilidades
comunicativas e pensamento crítico, necessárias a um usuário competente da linguagem.
Dentre a grande diversidade de gêneros textuais, optamos pelo gênero cartum para elaborar
uma seqüência didática por se tratar de um gênero que, apesar de ser pouco trabalhado nos
livros didáticos de língua inglesa para o ensino fundamental, pode gerar maior interesse
dos alunos, por ser da esfera humorística. De natureza teórico-aplicada, a pesquisa
apresenta duas etapas. A primeira compreende a análise da abordagem de cartuns em livros
didáticos, um de língua portuguesa e um de língua estrangeira do ensino fundamental. A
segunda etapa envolve a elaboração de uma proposta de seqüência didática centrada no
gênero cartum. Na análise dos livros verificamos que: i) apesar de não contemplar todos os
constituintes do gênero propostos por Bakhtin, o livro de língua portuguesa apresenta
atividades de linguagem que vão ao encontro dos postulados dos PCN para o ensino de
português. No entanto, em algumas atividades, há falhas ao antecipar a resposta para os
alunos; ii) o livro de língua estrangeira não apresenta abordagem do gênero e utiliza-o
apenas como pretexto para o ensino de gramática. A seqüência didática proposta está
ancorada nas teorias de gênero textual e letramento e tenta realizar a transposição didática
das recentes orientações curriculares visando a formação de um usuário competente da
linguagem, capaz de agir discursivamente num mundo globalizado, cujas práticas de
linguagem, atualmente, se realizam na língua inglesa.
Palavras chaves: PCN, ensino de inglês, gêneros textuais, seqüência didática, cartum.
ABSTRACT
Parameters for the Brazilian National Curriculum (PCN) rethink the teaching of first
and foreign languages in Brazil based on language, literacy and textual genre theories
and aim promoting the development of communicative and critical thinking skills
needed by effective language users. Among a wide range of genres, I chose cartoons.
Despite the fact of not being given attention in Brazilian EFL textbooks, cartoons may
enhance students’ interest for the very reason that they belong to a humorous social
context. Based on this assumption, the purpose of this research is twofold: first, it
analyzes how cartoons are approached in two language textbooks (one in Portuguese
and one in English). Second, it puts forward a cartoon-based didactic sequence for the
teaching of English. The analysis reveals that i) although the Portuguese textbook does
not consider all elements that constitute the genre, it presents language activities which
are in agreement with the PCN premises. However, in some activities, there are failures
when it anticipates answers to students in task prompts; ii) in the EFL textbook,
cartoons are used as a tool for the teaching of grammar. Finally, the target didactic
sequence, hereby submitted, is grounded in text genre and literacy theories and aims at
putting the recent educational parameters into practice. My ultimate objective is to
enable in-training language users to discursively enact in a globalized world, in which
language practices are currently carried out in English.
Key words: PCN, EFL, textual genres, didactic sequence, cartoon
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
11
CAPÍTULO I-GÊNEROS TEXTUAIS-SITUANDO AS BASES TEÓRICAS
15
1.1. Práticas sociais e Linguagem 15
1.2. O Conceito de Gênero 16
1.3. Gêneros e Tipos 19
1.4. Gêneros Textuais e Ensino 20
1.5. Gêneros Textuais: do Currículo à Seqüência Didática 23
1.6. Seqüência Didática e Temas Transversais 25
CAPÍTULO II-DOS QUADRINHOS AO CARTUM
27
2.1. Histórico dos Quadrinhos 27
2.2. Elementos Constitutivos dos Quadrinhos e Características 29
CAPÍTULO III-METODOLOGIA
35
3.1. A Pesquisa 35
3.2. O Corpus 35
3.3. Procedimentos e Critérios para Análise dos Cartuns nos Livros Didáticos 36
3.4. Procedimentos para a Elaboração da Seqüência Didática 37
CAPÍTULO IV-ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS
39
4.1.Os livros didáticos e suas propostas metodológicas 40
4.1.1.Português: Linguagens (Cereja e Magalhães, 1999 e 2006). 40
4.1.2 Hello!( Morino e Faria,2004) 41
4.2. A Abordagem do Cartum nos Livros Didáticos 42
4.2.1.1 O conceito de gênero 43
4.2.1.2 A localização do cartum 44
4.2.1.3. As atividades de linguagem 45
4.2.1.4. As dimensões bakhtinianas e a abordagem do cartum 50
4.2.2 A abordagem ao cartum 2 analisado no livro didático de língua portuguesa 51
4.2.2.1. O conceito de gênero 51
4.2.2.2 A localização do cartum 52
4.2.2.3 As atividades de linguagem 52
4.2.2.4. As dimensões bakhtinianas e a abordagem ao cartum 54
4.2.3. A abordagem ao cartum no Livro Didático de Língua Estrangeira 54
4.2.3.1. A localização do cartum 55
4.2.3.2. O conceito de gênero 55
4.2.3.3. As atividades de linguagem 55
4.2.3.4 As dimensões bakhtinianas e a abordagem do gênero 57
4.3. Português: Linguagens (Cereja e Magalhães) e o PNLD 57
CAPÍTULO V-A SEQÜÊNCIA DIDÁTICA
59
5.1. Módulo 1 - A Ativação do Conhecimento de Mundo 61
5.2. Módulo 2 - Apresentação da Situação de Comunicação: do Gênero 64
5.3. Módulo 3-Atividades de Linguagem Verbal e Não Verbal 65
5.4. Módulo 4 - Componentes Constitutivos do Gênero 72
5.5. Módulo 5 - Do Gênero como Objeto de Estudo ao Gênero como Prática
Social
75
CONCLUSÃO
76
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
80
ANEXOS
83
Sumário de Figuras (cartuns, tiras e quadrinhos)
Figura 1: Tira do Peanults 28
Figura: 2 Painel turma da Mônica 30
Figura 3: Trilho Cebolinha e Mônica 31
Figura 4: Balão do Garfield 32
Figura 5: Legenda da Mônica em Romeu e Julieta 32
Figura 6: Balões apresentando aspectos visuais da linguagem diversificados 33
Figura 7: Cartum apresentando temática sobre a família 33
Figura 8: Cartum de Quino 42
Figura 9: Cartum sobre a Sabedoria 50
Figura 10: Cartum para abordagem do Modo Imperativo 54
Figura 11: Cartum sobre obesidade infantil 60
Figura 12: Cartum aluno de música e professor 67
Figura 13: Cartum funcionário e patrão 67
Figura 14: Cartum pai e filho olhando o boletim escolar 68
Figura 15: Cartum menino e papagaio olhando uma prova escolar 68
Figura 16: Mulher conferindo o peso 69
INTRODUÇÃO
O ensino de língua estrangeira tem passado por diversas mudanças e
questionamentos nas últimas três décadas, prova disso são as diversas abordagens e
métodos utilizados ao longo do tempo: método áudio visual, total physical response,
abordagens comunicativas, dentre outras. Questionamentos sobre o que ensinar e como
ensinar estão cada vez mais freqüentes nas discussões sobre o ensino de língua. Se antes o
ensino era pensado como ensino de estruturas lingüísticas e vocabulário, hoje num mundo
globalizado, no qual a comunicação intercultural é uma necessidade e realidade, tal
concepção de ensino não é suficiente para a formação do aluno usuário de língua
estrangeira. Atualmente, na área de língua estrangeira, falamos de conteúdo formativo,
construção de sentido, identidade social, transformação social, comunicação intercultural
(cf. Zuengler & Miller, 2006; Referenciais Curriculares da Paraíba, 2007), e não apenas do
código e das estruturas lingüísticas.
Alinhados a mudanças na área de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras, os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sugerem uma redefinição dos objetivos do
ensino de língua estrangeira. Além disso, os conteúdos são agora orientados para o “mundo
multilíngüe e multicultural em que [o aluno] vive; a compreensão global (escrita e oral); o
empenho na negociação do significado e não na correção” (PCN de LE, 1998, p.66).
À medida que os PCN de LE versam sobre o ensino de língua pautado no mundo
multilíngüe e multicultural, na compreensão, os gêneros textuais se mostram como uma
ferramenta com a qual podemos alcançar tais objetivos. Os gêneros se apresentam como
alternativa ou mesmo ferramenta porque oportunizam trabalhar com a língua(gem) tal qual
ela se apresenta, ou seja, com textos contendo experiências reais de uso da língua(gem), e
não pré-fabricados. Ademais, o ensino centrado nos gêneros textuais, norteado por uma
abordagem que contemple suas características, funções, organização, etc, é relevante para a
formação do aluno na medida em que lhe permite estudar a língua(gem) em situações reais
de uso, o que, por sua vez, pode possibilitar o efetivo aprendizado e apropriação de cada
gênero, e conseqüentemente da língua(gem).
Nosso trabalho constitui-se de uma proposta para o ensino de língua estrangeira
baseada em gêneros. Considerando a infinidade de gêneros textuais existentes, optamos
pelo gênero cartum por se tratar de um gênero que, apesar de ser pouco trabalhado nos
livros didáticos de língua inglesa para o ensino fundamental, pode gerar maior interesse
dos alunos, pois, como Norton & Vanderheyden(2004) argumentam, os gêneros da esfera
humorísticas geram interesse, aumentam a motivação, apresentam língua(gem) acessível,
podendo tornar a aprendizagem significativa.
Outra razão para a escolha do gênero cartum é que esse gênero é de freqüente
circulação e familiar aos jovens. Ressaltamos, também, que explorar o cartum implica
proporcionar aos alunos a oportunidade de tornarem-se leitores de mais uma forma de
linguagem além das tradicionalmente dominadas, para não mencionar a inclusão do
componente criticidade na leitura comumente realizada de cartuns. Um outro aspecto que
vale ser destacado é o fato de muitos cartuns trazerem como temas questões sociais e
valores morais que podem promover a reflexão dos alunos sobre tais questões,
contribuindo, assim, em sua formação cidadã, como estabelecem, por exemplo, os artigos
27 e 32 da LDB 1996:
Art 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão,
ainda, as seguintes diretrizes:
I - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos
direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem
democrática;
Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove)
anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de
idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:
[...]
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema
político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se
fundamenta a sociedade;
III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo
em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de
atitudes e valores.
(ênfase nossa)
Face ao exposto, o objetivo geral dessa dissertação constitui-se na elaboração de
uma seqüência didática em língua inglesa, para o 9
o
ano do Ensino Fundamental,
utilizando o gênero cartum, produzido em língua inglesa. Para tal fim, elaboramos os
seguintes objetivos específicos:
I. caracterizar o cartum com base nas teorias de gênero textual;
II. analisar a abordagem do gênero cartum realizada em dois livros didáticos;
III. propor uma seqüência didática centrada no gênero cartum.
A elaboração de uma seqüência didática centrada em um gênero textual vem ao
encontro dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental, uma vez que
esses documentos postulam a necessidade de (re)pensar o ensino de língua materna e
estrangeira à luz das teorias de linguagem, letramento, ensino aprendizagem e gêneros
textuais, objetivando o desenvolvimento de habilidades comunicativas e pensamento
crítico, que permitam a formação de um usuário competente da linguagem.
Como hipótese do nosso trabalho temos que uma seqüência didática utilizando o
gênero cartum no ensino de língua inglesa pode contribuir na formação do aluno brasileiro
capaz de agir discursivamente na língua estrangeira, mesmo que mediado pela sua língua
materna, como preconizado pelos PCN de LE.
Organizamos o texto de nossa dissertação em 6 capítulos.
No primeiro capítulo, explanamos as bases teóricas que fundamentam nossa
pesquisa, mais especificamente as teorias de linguagem e gêneros discursivos de Bakhtin
(2003) e a teoria de Dolz e Schneuwly (2004) sobre seqüências didáticas. Apresentamos a
contribuição que os estudos sobre gêneros textuais e seqüências didáticas podem
proporcionar para o ensino de língua inglesa no ensino básico do contexto brasileiro e
revisitamos abordagens teóricas sobre o ensino de língua(gem) como prática social.
No segundo capítulo conceituamos e classificamos o cartum partimos do gênero
diferenciando-o de gêneros afins como charge e tira, e discorremos sobre os elementos
constitutivos do cartum.
No terceiro capítulo, abordamos a metodologia da pesquisa, apresentamos o corpus
tanto da análise dos livros didáticos quanto da seqüência didática, os procedimentos de
análise e os critérios tanto na análise quanto na elaboração da seqüência didática proposta.
No quarto capítulo trazemos uma análise de como esse gênero é trabalhado em duas
séries didáticas, uma de língua portuguesa, avaliada e aprovada pelo Programa Nacional do
Livro Didático (doravante PNLD) e uma de língua estrangeira, não avaliada pelo PNLD.
No quinto capítulo submetemos nossa proposta de seqüência didática, discutimos o
tema abordado, sua relevância para o público alvo, e uma proposta de como trabalhar as
questões de linguagem de maneira reflexiva nos cartuns.
No último capítulo concluímos essa pesquisa com as considerações finais que
trazem implicações pedagógicas, limitações e algumas contribuições para a área de ensino
aprendizagem de língua inglesa além de nossa conclusão sobre a experiência de
materializar uma proposta de transposição didática dos PCN de LE.
CAPÍTULO I
GÊNEROS TEXTUAIS-SITUANDO AS BASES TEÓRICAS
Neste primeiro momento abordamos a relação entre práticas sociais e linguagem, a
conceituação e as características de gêneros textuais. Abordamos também as diferenças
entre os gêneros primários e secundários e gêneros e tipologias. Estudamos como o
conceito de gêneros pode influenciar o ensino de língua(gem). Para isso nos baseamos,
principalmente, em Bakhtin (2003) e Dolz & Schneuwly (2004).
1.1 PRÁTICAS SOCIAIS E LINGUAGEM
Práticas sociais podem ser definidas por aquisições acumuladas pelos grupos
sociais no curso da história. Numa perspectiva interacionista, são o reflexo e o principal
instrumento de interação. São todas as experiências vividas e/ou conhecidas pelos falantes
em um dado contexto social. Ao definir práticas sociais em relação às estruturas sociais,
Fairclough (1992) as considera como “alguma coisa que as pessoas produzem ativamente e
entendem com base em procedimentos de senso comum compartilhado” (p.100). Para Dolz
& Schneuwly (2004), as práticas sociais são definidas como “o lugar de manifestações do
individual e social na linguagem” (p.73).
Dois outros conceitos relacionados com práticas sociais nos interessam. São eles:
práticas de linguagem e atividades de linguagem. Segundo Dolz & Schneuwly (2004, p.72)
o conceito de práticas de linguagem refere-se às “dimensões particulares do funcionamento
da linguagem em relação às práticas sociais em geral”, sendo que a língua(gem) é a
mediadora entre as práticas sociais e de linguagem. Como exemplo disso, temos uma aula
(prática social) na qual a linguagem, ou seja, os enunciados orais e escritos bem como os
gestos, os sons e os olhares realizados constituem a prática de linguagem desse contexto.
As atividades de linguagem, por sua vez, são concebidas como sistemas de ações.
Para Dolz, Pasquier e Bronckart (1993 apud Dolz & Schneuwly 2004, p.75), “uma ação de
linguagem consiste em produzir, interpretar e/ou memorizar um conjunto organizado de
enunciados orais e escritos” bem como os verbais e não verbais. Em outras palavras, as
atividades de linguagem são as ações que permitem que o leitor/falante compreenda ou
interprete um gênero. As ações de linguagem, por sua vez, implicam o desenvolvimento de
diversas capacidades por parte do sujeito: capacidade de ação, capacidade discursiva,
capacidade lingüístico-discursiva. As capacidades de ação referem-se à capacidade de
adaptação do sujeito às características do contexto e do referente; as discursivas referem-se
à capacidade de mobilizar modelos discursivos e as capacidades lingüístico-discursivas
referem-se às capacidades de dominar as operações psicolingüísticas e as unidades
lingüísticas. Essas capacidades são requeridas do falante para a produção e compreensão
de um gênero discursivo numa determinada situação de interação.
Os conceitos de práticas e atividades de linguagem nos interessam porque
defendemos que a comunicação nasce de uma prática social (de uma situação vivida pelos
sujeitos), materializadas nos chamados gêneros textuais. Esses gêneros são compreendidos
através de ações e atividades de linguagem que exigem capacidades específicas do falante/
leitor.
1.2 O CONCEITO DE GÊNERO
Bakhtin (2003, p.261) afirma que “todos os diversos campos da atividade humana
estão ligados ao uso da linguagem e que esta utilização acontece em forma de enunciados
orais e escritos concretos e únicos. O modo de utilização dessa língua varia de acordo com
as esferas da atividade humana. Assim, “cada campo da utilização da língua elabora seus
tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso.
Ainda de acordo com o autor “Se os gêneros do discurso não existissem e nós não o
dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo do discurso, de
construir livremente e pela primeira vez cada enunciado, a comunicação discursiva seria
quase impossível” (Bakhtin, op.cit, p.283)
Na citação acima Bakhtin demonstra que a comunicação apenas acontece por
intermédio de um gênero. Podemos, então, dizer que não criamos um novo gênero a cada
momento que falamos, nós escolhemos o que mais se adequa ao contexto em que
estivermos inseridos. Marcuschi (2005, p.35) afirma que “os gêneros não são frutos de
invenções individuais, mas formas socialmente maturadas em práticas discursivas”. Dessa
forma, os gêneros sempre se renovam, alguns emergem, se fundem ou mesclam com outros
já existentes (Fairclough, 1995) outros caem em desuso. É o caso, por exemplo, do chat ou
torpedo que têm ancoragem numa conversa face a face, mas assumem características
próprias desse novo gênero (smileys, linguagem eletrônica, abreviaturas).
Os gêneros apresentam algumas características que nos permitem reconhecê-los e
classificá-los. Essas características são definidas em três dimensões: conteúdo temático,
estilo e construção composicional. Nas palavras de Bakhtin,
Os enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de
cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo
da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos
e gramaticais da língua, mas acima de tudo, por sua construção
composicional (BAKHTIN, 2003 p.261
).
O conteúdo temático refere-se ao que é dizível por meio do gênero (Dolz &
Schneuwly, 2004, p.52), que de acordo com Bakhtin é diverso nos diferentes campos da
comunicação discursiva. A construção composicional refere-se à estrutura comunicativa
particular dos textos pertencentes ao gênero e o estilo refere-se às configurações
específicas das unidades de linguagem. Essas três dimensões permitem que reconheçamos
um gênero como pertencendo a uma determinada esfera de atividade humana. Por
exemplo, reconhecemos uma oração como pertencendo à esfera religiosa pelo seu
conteúdo temático (agradecimentos, pedidos a uma divindade) seu estilo ou organização
textual (começando com uma injunção como, por exemplo, Senhor, terminando com um
amém) e pelos recursos lexicais e fraseológicos utilizados (geralmente um registro formal).
Todavia, à medida que Bakhtin estabelece uma relação direta entre
língua/sociedade e ideologia, de forma que uma não existe sem a outra, é possível
afirmarmos, com base em Fairlcough (2003, p. 9), que representações ideológicas se fazem
presentes e são identificadas em textos, ou seja, nos gêneros e na linguagem, quer no
conteúdo temático, quer no estilo. Segundo esse mesmo teórico (ibid), as
[i]deologias são representações de aspectos do mundo que
contribuem para estabelecer e manter relações de poder,
dominação e exploração. Elas podem ocorrer nas e pelas formas
de interagir (e, portanto, nos gêneros) e se instalarem nas formas
de ser ou nas identidades (e, portanto, em estilos).
[tradução nossa, p. 218]
É importante destacar que Fairclough vai além da visão meramente descritiva de
ideologia como posição, atitude, crenças ou perspectiva e defende uma visão crítica de
ideologia como modalidade de poder (2003, p. 9), que, como ressaltam Jorge e Herbale
(2002), molda o comportamento das pessoas.
Resgatando nossa discussão de gêneros discursivos, uma distinção entre gêneros
primários e secundários é necessária. Segundo Bakhtin (2003, p.264), essa distinção tem
importância porque “a natureza do enunciado deve ser descoberta e definida por meio da
análise de ambas as modalidades”.
Os gêneros primários são considerados pelo referido autor como simples, enquanto
os secundários como complexos. Os secundários aparecem em situação de comunicação
cultural mais evoluída principalmente na forma escrita.
No processo de sua formação eles incorporam e reelaboram os
primários, que integram os complexos, aí se transformam e adquirem
um caráter especial: perdem o vínculo imediato com a realidade
concreta e os enunciados reais alheios”. (BAKHTIN, p. 263)
Revisitando a classificação original de Bakhtin, Schneuwly (2004, p.29) defende
que os gêneros primários se caracterizam pela interação, controle mútuo da situação, pelo
funcionamento imediato do gênero como entidade global. O gênero primário controla todo
o processo como uma única unidade. O gênero primário tem nenhum ou pouco controle
metalingüístico da ação lingüística em curso e necessita de um contexto imediato. Como
exemplo de um gênero primário temos uma conversa face a face para a qual a
contextualização se faz necessária para a sua compreensão. Por outro lado, os gêneros
secundários não são controlados diretamente pela situação. Embora não sejam
descontextualizados, não necessitam de um contexto imediato como os primários.
Enquanto os gêneros primários nascem da comunicação verbal espontânea, os
secundários não estão ligados de maneira imediata à situação de comunicação. Os gêneros
primários são instrumentos de criação dos gêneros secundários. Embora o cartum possua
características de gêneros orais, ele se apresenta como um gênero escrito, sendo, portanto,
considerado secundário.
1.3. GÊNEROS E TIPOS
Em se tratando do estudo de gêneros alguns conceitos precisam estar bem
definidos. Dentre esses conceitos encontram-se o de gênero e o de tipo textual, que são
muitas vezes utilizados indiscriminadamente.
Marcuschi (2005, p.25) observa que o termo tipo é utilizado equivocadamente em
situações escolares diárias para designar um gênero assim como a expressão gênero é
utilizada muitas vezes para designar um tipo. Esse uso indiscriminado ocorre inclusive nos
PCN de LE, como trataremos na seção 1.4.
De acordo com Marcuschi (2005, p.23) os tipos textuais diferenciam-se dos gêneros
por serem definidos como: i) construtos teóricos definidos por propriedades lingüísticas
intrínsecas; ii) constituírem seqüências lingüísticas ou seqüências de enunciados no interior
dos gêneros e não serem textos empíricos; iii) abrangerem um número limitado de
categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos relações lógicas e tempo
verbal; iv) classificarem-se como: narração, argumentação, descrição, injunção e
exposição.
De acordo com este autor,
“Para noção de tipo textual predomina a identificação de seqüências
lingüísticas típicas como norteadoras; já para a noção de gênero textual
predominam os critérios de ação prática, circulação sócio histórica,
funcionalidade, conteúdo temático estilo e composicionalidade.”
(MARCUSCHI, 2005, p.24)
Quando falamos sobre as diferenças entre tipos e gêneros não estamos propondo
que um existe independentemente do outro. Afinal, os gêneros textuais fazem uso de vários
tipos textuais. Como exemplo disso, Marcuschi (ibid, p.25) cita o gênero carta pessoal na
qual podemos encontrar seqüências injuntivas, argumentativas, narrativas e descritivas.
1.4.GÊNEROS TEXTUAIS E ENSINO
Buscando uma articulação entre práticas sociais, gêneros textuais e objetos de
ensino, Dolz & Schneuwly (2004, p.74) argumentam que “o gênero [deve ser] utilizado
como meio de articulação entre práticas sociais e os objetos escolares, mais
particularmente no domínio do ensino da produção de textos orais e escritos”. Dessa
perspectiva, os gêneros são instrumentos pelos quais as práticas de linguagem se
transformam em atividades de linguagem para os alunos. O gênero assim definido
atravessa a “heterogeneidade das práticas de linguagem” (cf. Dolz & Schneuwly 2004,
p.75) e faz emergir uma série de regularidades no uso, no propósito e na função. Desta
feita, são as atividades de linguagem que propiciam um maior domínio de um gênero no
que se refere ao seu uso, propósito e função.
Refletindo sobre a presença do gênero na escola, percebemos que é necessário rever
alguns critérios sobre sua abordagem para que o gênero não perca sua principal função
qual seja: a comunicação. Um primeiro ponto que deve ser considerado é que no momento
em que o gênero é levado para a sala de aula, ele passa a ser objeto de estudo. E como
objeto de estudo perde algumas de suas atribuições, pois o contexto e suas condições de
produção se modificam. (cf. Dolz & Schneuwly, 2004, p.76). É necessário que o professor
tente resgatar as condições de produção originais do gênero para que essa transformação
em objeto de ensino não descaracterize o gênero quando transportado de sua esfera de
circulação para a esfera escolar.
A necessidade de sistematizar o ensino de língua de modo que abranja os conteúdos
programados pela escola, pode fazer, com que o gênero passe equivocadamente a servir de
pretexto para o estudo de aspectos lingüísticos, desvinculando-os de um contexto e
abandonando a função de comunicação do gênero em prol dos aspectos formais presentes.
Isso porque ao transformar o gênero em objeto de estudo nas escolas, muitas vezes, se
produz, equivocadamente “uma inversão em que a comunicação desaparece quase
totalmente em prol da objetivação, e o gênero torna-se uma pura forma lingüística, cujo
domínio é o objetivo” (Dolz & Schneuwly, 2004, p.76).
Existe uma lacuna entre os materiais didáticos elaborados por professores de língua
inglesa e as recentes teorias lingüísticas e os modelos de ensino aprendizagem centrados na
perspectiva do interacionismo sociodiscursivo e nos Gêneros Textuais como nos mostra
Brito (2007). No entanto, um ponto que pode sinalizar uma possível mudança dessa
realidade é a abordagem dos gêneros nos livros didáticos de língua portuguesa aprovados
pelo PNLD (2005). Em tais livros percebemos que cada vez mais há uma preocupação em
abordar os gêneros textuais a partir de um propósito comunicativo. Embora inserida no
currículo de formação básica, a língua estrangeira permanece excluída do Programa de
distribuição e avaliação de livros didáticos.
À luz dessas considerações, cabe ao professor de línguas, quer materna, quer
estrangeira, procurar criar condições para que os alunos recuperem o contexto no qual o
gênero esteve inserido originalmente. Para tanto, Dolz e Schneuwly (op.cit, p.81) sugerem
a elaboração de modelos didáticos que explicitem o conhecimento do gênero. Três
princípios estão presentes na elaboração do modelo: a legitimidade que faz referência aos
saberes teóricos elaborados por especialistas sobre o gênero escolhido; a pertinência que
faz referência às capacidades dos alunos, às finalidades e aos objetivos da escola, aos
processos de ensino aprendizagem e a solidarização [solidificação dos saberes] que se
refere a tornar coerentes os saberes em função dos objetivos visados. Dolz e Schneuwly
(2004, p.80) alegam que a introdução de um gênero na escola é resultado de uma decisão
didática que visa a objetivos da aprendizagem. Os resultados são de dois tipos: i) a
necessidade de dominar um gênero para compreendê-lo dentro e fora do ambiente escolar;
ii) desenvolvimento de capacidades que ultrapassem um gênero específico e que sejam
transferíveis para outros mais próximos ou mais distantes.
Um modelo didático, segundo os referidos autores, apresenta duas características: i)
constitui uma síntese com objetivo prático, destinada a orientar as intervenções dos
professores; ii) evidencia as dimensões ensináveis com base nas quais diversas seqüências
didáticas podem ser concebidas.
Aplicando essas duas características ao ensino do cartum, a proposta de seqüência
didática do gênero, defendida nesta dissertação, envolve conhecimento da função que esse
gênero exerce no meio em que circula, bem como o espaço e o suporte nos quais é
veiculado. Envolve, também, a análise do lingüístico discursivo para assim compreender as
peculiaridades do gênero como, por exemplo: o humor, a sátira, a informalidade e os temas
abordados, bem como o estilo e a construção composicional do gênero em questão.
Inspirados nas teorias bakhtinianas, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)
sustentam que o ensino tanto de língua portuguesa quanto de língua estrangeira deve
basear-se no ensino de gêneros textuais.
Nessa perspectiva, não é possível tomar como unidades básicas do
processo de ensino as que decorrem de uma análise de estratos,
letras/fonemas, sílabas, palavras, sintagmas, frases que,
descontextualizados, são normalmente tomados como exemplos de
estudos gramaticais e pouco têm a ver com a competência discursiva.
Dentro desse marco, a unidade básica do ensino só pode ser o
texto.(PCN - LP, p.23).
A utilização em sala de aula de tipos de textos diferentes, além de
contribuir para o aumento do conhecimento intertextual do aluno, pode
mostrar claramente que os textos são usados para propósitos diferentes
na sociedade.(PCN - LE, p.45).
Observamos que, mesmo não utilizando o termo “gênero”, ao mencionarem “tipos
de textos” é ao conceito de gênero que a citação dos PCN - LE se refere. Em outro
momento, ao abordar os eixos em que os conteúdos de língua estrangeira estão
organizados: conhecimento de mundo, conhecimento sistêmico, tipos de texto e atitudes,
mais uma vez percebemos que, ao explicar o eixo “tipo de texto”, o conceito se refere ao
de gênero textual:
A determinação dos conteúdos referentes a tipos de texto (orais e
escritos) se pauta por tipos com os quais os alunos nessa faixa etária
estão mais familiarizados como usuários de sua língua materna:
1 Pequenas histórias, quadrinhas, histórias em quadrinhos,
2 Instruções de jogos, anedotas, trava-línguas, anúncios, pequenos;
3 Diálogos, rótulos de embalagens, cartazes, canções, pequenas
notícias;
4 Entrevistas, programação de TV, textos publicitários, cartas,
5 Reportagens, classificados, poemas, editoriais de jornal, artigos
jornalísticos, textos de enciclopédias, verbetes de dicionários,
receitas, estatutos, declarações de direitos.
(PCN -LE, p.74)
O conceito de gêneros textuais, a noção de gêneros como instrumentos pelos quais
as práticas de linguagem podem se transformar em atividades de linguagem, a abordagem
ao gênero, a estrutura de um modelo didático de uma perspectiva sociodiscursiva bem
como os princípios postulados pelos PCN - LP e LE nortearão a elaboração da seqüência
didática centrada no gênero cartum em Língua Inglesa.
Destarte, nos respaldamos nos PCN que sugerem que o ensino de língua estrangeira
seja pautado na concepção de língua(gem) como “prática social com possibilidades de
expressar opiniões, valores, sentimentos, informações oralmente e por escrito” e numa
concepção sociointeracionista de ensino-aprendizagem, segundo a qual “aprender é uma
forma de estar no mundo social com alguém em um contexto histórico, cultural e
institucional’ (PCN-LE, 1998, p.54-57).
No que se referem aos conteúdos, os PCN postulam que o ponto de partida para o
tratamento dos conteúdos seja o pré-conhecimento que o aluno tem de sua língua materna
e do mundo que o cerca.
(...) portanto, o critério principal de gradação das unidades é a
familiaridade que os alunos têm com os conteúdos indicados. Isso quer
dizer que o critério de gradação e adequação dos conteúdos deve
considerar o conhecimento do aluno em relação à sua língua materna e
ao conhecimento de mundo, para que a aprendizagem seja significativa
para o aluno.(PCN-LE,1998,p.71)
Dessa forma, os PCN sugerem que a progressão de conteúdos deve enfatizar o
conhecimento de mundo, a organização textual e conhecimento sistêmico.
1.5. GÊNEROS TEXTUAIS: DO CURRÍCULO À SEQÜÊNCIA DIDÁTICA
Como no segundo momento deste trabalho nos dispomos a propor a inserção dos
gêneros textuais em língua estrangeira através de uma seqüência didática, é necessário
traçar algumas considerações teóricas sobre como trazer os gêneros textuais para a sala de
aula e ensiná-los.
Dolz & Schneuwly (2004, p. 43) propõem a elaboração de um currículo no qual os
conteúdos disciplinares são definidos em função das capacidades de linguagem do
aprendiz e das experiências a ele necessárias visando ao letramento, à competência
sociodiscursiva, à formação de um falante que faça uso das várias práticas de linguagem.
Isso porque o aluno precisa dominar, primeiramente, os gêneros com os quais lida
cotidianamente e, posteriormente, dominar outros gêneros com os quais precise lidar numa
sociedade letrada. Segundo Dolz, Pasquier e Bronckart (1993 apud Dolz & Schneuwly,
2004, p.52), as capacidades de linguagem são habilidades requeridas para a compreensão e
produção de um gênero textual numa situação de interação.
De acordo com Coll (1992 apud Dolz & Schneuwly, 2004, p.43), as funções do
currículo são: i) descrever e explicitar o projeto educativo; ii) fornecer um instrumento que
oriente as práticas dos professores; iii) levar em conta as condições nas quais se realizam
essas práticas; iv) analisar as condições de exeqüibilidade.
Um currículo deve, então, fornecer aos professores informações concretas sobre os
objetivos visados pelo ensino, sobre saberes e habilidades implicados em sua apropriação.
Dentre os componentes do currículo, encontra-se a progressão que é a organização
temporal do ensino para que se chegue a uma aprendizagem satisfatória. A progressão é
viabilizada pelas seqüências concretas realizadas em sala de aula. Dolz e Schneuwly
(op.cit, p.51) definem seqüências didáticas como módulos de ensino organizados para
desenvolver uma determinada prática de linguagem. Os autores (op.cit, p.54) mostram a
apresentação de três partes possíveis que podem compor uma seqüência didática.
Salientamos que a execução da seqüência didática exige um trabalho que leva tempo, que
pode durar semanas ou até meses. Esse tempo é necessário para promover e refinar a
familiarização com o gênero, sua compreensão e, em seguida, sua produção, como
explanado a seguir.
Segundo os autores, a primeira parte de uma seqüência didática é dedicada à
apresentação de uma situação comunicativa. Nesse primeiro momento o professor expõe
aos alunos um projeto de comunicação, promove familiarização como o gênero textual em
foco e prepara e produção inicial. Essa familiarização compreende desde a ativação do
conhecimento prévio como, também, a pré-leitura. A segunda parte constitui-se da
produção inicial em si. Nesse momento, os alunos tentam elaborar um primeiro texto, oral
ou escrito, evidenciando, para si e para o professor, as representações que têm do gênero.
Como é o primeiro encontro, para fins pedagógicos, com o gênero é necessário que se
defina o que é preciso trabalhar a fim de desenvolver as capacidades de linguagem
necessárias ao gênero selecionado. Essa primeira produção delimita as necessidades
lingüístico-discursivas reais da turma que deverão ser objetos de trabalho nos módulos.
Esses módulos são constituídos por várias atividades ou exercícios necessários visando ao
domínio sócio discursivo do gênero em questão, pois as características apresentadas pelo
gênero devem ser colocadas de maneira sistematizada para um estudo aprofundado. Nos
módulos, os problemas que aparecem na primeira produção são trabalhados dando
instrumentos aos alunos para superá-los. O gênero é decomposto para abordar seus
elementos constitutivos, separadamente. A terceira parte é a produção final. Nessa fase, o
gênero, decomposto e transformado em objeto de estudo, volta a se agregar formando um
todo, deixando de ser objeto de ensino e assumindo as suas características de gênero
novamente. Nessa fase é necessário indicar aos alunos os objetivos a serem atingidos e
conscientizá-los sobre seu próprio processo de aprendizagem. Com isso, o professor e os
alunos avaliam os progressos realizados.
Segundo Dolz e Schneuwly (2004, p.108-115) dois aspectos devem subsidiar a
elaboração de uma seqüência didática, quais sejam: i) os princípios teóricos subjacentes ao
procedimento e ii) a articulação entre o trabalho na seqüência e outros domínios do ensino
de língua(gem). Os princípios teóricos se referem a) às escolhas pedagógicas,
psicológicas, lingüísticas e finalidades gerais; b) ao caráter modular do procedimento e
suas possibilidades de diferenciação: atividades variadas de acordo com as capacidades
desenvolvidas e dificuldades apresentadas; e c) às diferenças entre as práticas orais e
escritas: (ex: possibilidade de revisão, observação da própria produção, observação de
textos de referência). A articulação se refere à interrelação entre a seqüência didática e os
domínios da textualização, questões de gramática, sintaxe e ortografia e questões de
linguagem.
Observamos, contudo, que a seqüência didática elaborada por Dolz Noverraz e
Schneuwly (2004) tem como foco o ensino de língua francesa como língua materna e como
objeto de ensino um gênero oral. A nossa seqüência, por outro lado, se refere à elaboração
de uma seqüência didática para o ensino de inglês, como língua estrangeira, que tem como
objeto um gênero que apresenta características de gênero oral, mas é escrito. A despeito
dessa diferença, nossa seqüência toma por base a proposta elaborada por Dolz, Noverraz, e
Schneuwly (2004 p. 95) por considerarmo-na viável para subsidiar uma proposta de
seqüência didática centrada no gênero cartum em língua inglesa.
1.6. SEQÜÊNCIA DIDÁTICA E TEMAS
Como dito em seções anteriores, baseamos nossa seqüência didática na teoria de
gêneros de Bakhtin e nos PCN. Por compreenderem que o “compromisso com a construção
da cidadania pede necessariamente uma prática educacional voltada para a compreensão da
realidade social e dos direitos e responsabilidades em relação à vida pessoal, coletiva e
ambiental” (TEMAS TRANVERSAIS, 1997, p.12), os PCN sugerem que o trabalho
pedagógico inclua um conjunto de temas transversais: Ética, Pluralidade Cultural, Meio
Ambiente, Saúde e Orientação Sexual. De acordo com o referido documento, os temas
transversais não são disciplinas novas a serem incluídas nos currículos escolares, mas são
questões que devem estar presentes em todas as disciplinas.
À luz dessas orientações, a seqüência didática proposta aborda um cartum cuja
temática envolve o tema transversal: Saúde. Como poderemos constatar no capítulo 5, o
cartum traz como temática a obesidade infantil. De acordo com os Temas Transversais um
dos objetivos da inserção desses temas nas disciplinas escolares é justamente valorizar e
adotar “hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida”. (p.6).
Assim, consideramos que ao abordar um cartum que traga como tema a obesidade infantil,
atrelado a um trabalho pedagógico voltado para a conscientização e formação do aluno,
estaremos proporcionando oportunidades de reflexão não apenas sobre a necessidade de
cuidar da alimentação e do corpo, mas também sobre questões envolvendo valores
culturais relativos a padrões de beleza e aceitação.
CAPÍTULO II
DOS QUADRINHOS AO CARTUM
O trabalho com gêneros textuais requer definição e conhecimento de suas
características. Considerando que os quadrinhos, tiras, charges e assemelham-se em alguns
pontos, nesse capítulo abordamos as semelhanças e diferenças entre tais gêneros. Antes de
tratarmos dessas diferenças, todavia, faremos um histórico sobre os quadrinhos.
2.1 HISTÓRICO DOS QUADRINHOS
Segundo Saraceni (2003), existe uma relação entre quadrinhos e a comunicação das
antigas civilizações. Era comum, por exemplo, os egípcios usarem uma combinação de
imagens e hieróglifos para compor as seqüências narrativas de figuras. Isso também
acontecia em outras culturas antigas. No entanto, segundo o autor, os quadrinhos na forma
em que são conhecidos atualmente foram criados na última metade do século XIX na
Inglaterra. As primeiras tiras apareceram em 1884 bem como o primeiro herói dos
quadrinhos, Ally Sloper. Em 1890, Comic Cuts surgiu, o qual muitos consideraram o
primeiro quadrinho do mundo.
Saraceni (op.cit) explana que, depois de 1940, a popularidade dos temas de super-
heróis começou a cair, enquanto os temas de crime e horror ganharam mais leitores. Com o
crime e a violência cada vez mais ganhando espaço nos quadrinhos, muitos começaram a
se preocupar com a influência que tais publicações poderiam ter sob os leitores jovens.
Dentre as pessoas preocupadas com a “má” influência dos quadrinhos sobre os jovens,
duas se destacaram: Dr. Frederic Wertham nos Estados Unidos e George Pumpherey na
Inglaterra. Devido à preocupação sobre a influência dos quadrinhos sobre crime e horror
foram feitas campanhas contra os quadrinhos nos dois países, o que levou a sua censura em
meados de 1950. Nesse período foram criados os Peanuts trazendo temas cotidianos,
discutindo questões sociais ou até mesmo filosóficas. Abaixo temos um exemplo, o qual
apresenta o Snoopy dormindo nos primeiros quadros, mas ao acordar, depois de ter caído
do telhado da casa (local onde comumente dorme) “filosofa” sobre os “despertares rudes”
da vida. Ou seja, há uma relação entre o despertar rude do sono com uma queda e o
despertar rude do qual a vida é repleta.
1
Tira do Peanults
Assim, a partir de então os quadrinhos foram se tornando cada vez mais
intelectuais. Em 1960, houve o reaparecimento dos super-heróis e apenas em 1990, em
caráter experimental, os então chamados “quadrinhos adultos” foram publicados,
tematizando, inclusive, questões sérias. Essa tendência continua até hoje, com novos
autores explorando novas possibilidades fornecidas por desenhos digitais e Internet.
Apesar de terem características semelhantes quadrinhos, charges, tiras e cartuns se
diferenciam em alguns pontos que são importantes para a definição e caracterização de
cada gênero em particular.
De acordo com Mendonça (op.cit), as histórias em quadrinhos (HQ) são facilmente
identificáveis dada a peculiaridade dos quadros, dos desenhos e dos balões e de outros
constituintes abordados por Saraceni (cf. seção 2.1.1). No que se refere à linguagem,
buscam reproduzir o oral (geralmente informal), mas se realizam nos meios escritos. São
do tipo narrativo e dialogal, têm estreita relação com o cinema e desenhos animados.
As semelhanças entre cartuns, tiras e charges muitas vezes podem levar esses
gêneros a serem tomados como equivalentes. Ressaltamos que a denominação não é
apenas uma questão de nomenclatura diferente, mas sim uma questão de função social
1
A vida é repleta de despertares rudes.
distinta. Eles apresentam construções composicionais distintas que precisam ser
enfatizadas: no cartum, os personagens não são caricaturados e são anônimos, já na
charge, os personagens são identificáveis e caricaturados; a charge é temporal, o cartum
atemporal; já as tiras, assim como a charge, podem se referir a cenários políticos mas, não
necessariamente, e não são datadas como a charge.
Segundo Oliveira (2001), o objetivo maior da charge é criticar aqueles que se
destacam negativamente no cenário político enquanto os cartuns não estão
necessariamente relacionados ao cenário político. Tanto a HQ como os cartuns compõem-
se de um ou mais quadros com uma seqüência narrativa, mas essa seqüência é opcional
para os cartuns e obrigatória para a HQ. As tiras satirizam aspectos econômicos e políticos
do país (Mendonça op.cit).
Apontando a diferença entre quadrinhos e cartuns, Saraceni (op.cit) argumenta
sobre a necessidade de refletir sobre a linguagem. Os cartuns são constituídos por
enunciados verbais. Para entendê-los contamos com informações extratextuais, como por
exemplo, o fato (assunto, problema social) que gerou a produção do cartum. A linguagem
do quadrinho, cartuns, tiras e charges, por outro lado, é semelhante à linguagem dos textos
escritos. Os textos dos quadrinhos são formados por correntes de painéis da mesma forma
que um texto é formado por cadeias de frases e parágrafos.
O fato de esses gêneros terem denominações diferentes implica características,
organização, objetivos também diferentes. Entendemos que o trabalho com gêneros
textuais passa também por sua definição, pois “quando dominamos um gênero textual, não
dominamos uma forma lingüística e sim uma forma de realizar lingüisticamente objetivos
específicos em situações sociais particulares” (Marcuschi, 2005, p.29). Dominar um gênero
textual implica entre outras coisas conhecer a sua definição e a quais fins se destina.
2.2 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DOS QUADRINHOS E
CARACTERÍSTICAS
Para Saraceni (2003), as características mais importantes dos quadrinhos são: i) o
emprego de palavras ou desenhos, ou seja, linguagem verbal e não verbal e ii) a
organização do texto em unidades seqüenciais, separadas graficamente. O autor ainda
descreve os principais componentes dos quadrinhos, como explanamos abaixo.
O painel - cada página é normalmente composta de seis a nove enquadres
retangulares chamados painéis. Geralmente o painel mostra uma única imagem de uma
ação e apesar de eles geralmente se referirem a momentos específicos, e comparados com
fotografias, seus conteúdos são, de fato, muito mais variados. É muito raro um painel
representar apenas um instante da história. Isso porque os painéis contêm peças de diálogo
que são tipicamente mais longas que a duração de uma tomada de câmera, ou seja, o leitor
considera o painel como uma porção - que pode ter várias extensões de uma narrativa,
onde alguma coisa de fato toma lugar e tempo. Os diálogos nos painéis são apenas
elementos que indicam a duração dos painéis em instantes singulares.
2
2
Por ordem de sua alteza, o príncipe Xaveco, ficam todos avisados que ficam proibidas as brigas e duelos
entre inimigos... E quem perturbar a paz será severamente castigado...
Ah é?
Então saí que você está atlapalhando o jogo!
Você está pisoteando minhas bolinhas de gude, seu...
Socooooooorro!
http://www.turmadamonica.com.br/ingles/index.htm
Painel turma da Mônica
Vemos acima um exemplo de painel no qual há a representação de um único
momento da história, ou seja, o momento em que é anunciado um decreto do rei. Apesar de
se referir a um momento único, o painel acima apresenta os diálogos que são mais longos e
que não poderiam ser representados por um único desenho. Observamos que houve 5
momentos de fala dos personagens que não poderiam ser apresentados em um desenho
apenas, daí a importância do painel.
O trilho - Cada painel é separado dos outros por um espaço em branco chamado
trilho. O trilho é um elemento muito importante, já que é um espaço que contém tudo o que
acontece entre os painéis. Isso significa que o leitor tem que preencher, a partir do seu
conhecimento de mundo, os elementos que estão faltando para reconstruir a história. O
trilho é similar ao espaço que separa uma sentença da próxima. Em outras palavras, os
trilhos requerem leitura das entrelinhas o que, por sua vez, exige a participação ativa do
leitor, que deverá lançar mão de estratégias descendentes de leitura para construir sentido
para as estórias. Eles podem ser de diferentes formas: mais estreitos, mais longos,
desenhados ou não.
3
Trilho Cebolinha e Mônica
No exemplo acima constatamos que o trilho extrapola o limite do quadro. Neste
exemplo, o trilho não é apenas um constituinte estrutural do quadro, mas faz parte da
história, à medida que Mônica faz uso do trilho como se fosse uma porta. Em outros
termos, a função do trilho precisa ser compreendida para que contribua para a compreensão
do texto.
O balão - O balão é provavelmente o elemento mais associado com os quadrinhos.
É o espaço no qual a maior parte do texto verbal é contido. Os balões são usados para
3
Cebolinha! Abra esse trilho agora!
representar uma fala ou um pensamento. Tipicamente os balões são ovais ou em forma de
nuvem, mas variações são possíveis e significantes. O rabicho do balão indica o
personagem que está falando ou pensando. Normalmente o rabicho parece uma pequena
projeção pontuda, mas pode às vezes ser uma linha simples. Uma importante variação é
quando rabicho é formado por pequenas bolhas, que indica que é um balão de pensamento.
Vide o exemplo:
4
Balão do Garfield
A legenda - é outro elemento que contem elementos lingüísticos. A legenda não é
posicionada dentro dos painéis, aparece geralmente no topo do painel, mas às vezes pode
vir abaixo acima ou do lado esquerdo do mesmo. Normalmente a legenda representa a voz
do narrador. Sua função é acrescentar informação aos diálogos contidos nos painéis, assim
como acrescentar informações sobre todo o quadrinho. Em outras situações a legenda tem
a função de fornecer informações ao leitor para reconstruir o fluxo entre os painéis
preenchendo os espaços representados pelos trilhos. A legenda pode também conter as
falas dos personagens na ausência do balão.
4
Garfield, agora que Jon e eu estamos namorando, eu espero que você e eu possamos ser amigos
Não será fácil
É difícil ser amigo de alguém que viu você nu.
5
http://www.turmadamonica.com.br/ingles/index.htm
Legenda da Mônica em Romeu e Julieta
Saraceni (2003) defende ainda que o aspecto visual das palavras tem grande
importância nos quadrinhos, por exemplo, o negrito é geralmente utilizado para representar
ênfase, o humor e sentimentos dos personagens podem também ser representado pelo
desenho gráfico das palavras (tamanho, cor, forma).
6
Balões apresentando aspectos visuais da linguagem diversificados
No cartum abaixo podemos perceber as semelhanças entre quadrinhos e cartuns.
Observemos que a legenda assume a função do balão de fala, exercendo tanto a função do
balão (indicar a fala dos personagens) quanto à de legenda (auxiliar o leitor a construir
sentido para o não verbal).
5
...Viviam duas famílias inimigas: Os Montéquio e os Capuleto!
Todos os dias havia provocações e brigas entre as pessoas dessas famílias...
Até que um dia o príncipe Xaveco de Verona resolveu acabar de uma vez por todas om aquela confusão...
Chega!
6
Mulheres cientistas!
Oh, bom fracasso!
Interjeição de susto
Chega!!!!
Xingamentos
7
http://www.glasbergen.com/family.html
Cartum apresentando temática sobre a família
Assim, ao observarmos cuidadosamente os componentes dos quadrinhos,
percebemos que balões, legenda, trilhos e painéis são não apenas constitutivos do gênero
cartum, mas desempenham um papel específico para a produção de sentidos do texto, e,
portanto, fazem parte dos saberes necessários ao letramento básico do aluno em formação,
mais especificamente, ao leitor proficiente de cartum. Desta feita, uma seqüência didática
que se proponha ao ensino do referido gênero deve contemplar todos os seus elementos
constitutivos, quer verbais, quer não verbais.
7
Disciplina e bom comportamento são as chaves para a harmonia familiar, então meu marido e eu fazemos
tudo que nossos filhos nos mandam fazer.
CAPÍTULO III
METODOLOGIA
3.1 A PESQUISA
De natureza teórico-aplicada, a pesquisa apresenta duas etapas. A primeira
compreende a análise da abordagem de cartuns em livros didáticos, um de língua
portuguesa e um de língua estrangeira do ensino fundamental. A segunda, a elaboração de
uma proposta de uma seqüência didática centrada no cartum.
3.2 O CORPUS
O corpus da pesquisa consiste em 4 cartuns. 3 cartuns foram analisados na primeira
etapa dessa pesquisa (Anexo A) e um cartum que foi utilizado na elaboração da seqüência
didática na segunda parte da dissertação (Anexo B).
Do livro didático de língua portuguesa Português: Linguagens (Cereja e
Magalhães, 1999 e 2006) vol 8, foram analisados dois cartuns. Do livro didático de inglês
Hello! vol 6 de ( Morino e Faria, 2004), foi analisado 1 cartum. Na terceira e última etapa,
fizemos seleção de 1 cartum retirado de um site da Internet, com o qual elaboramos uma
seqüência didática.
3.2.1. Critério de Seleção dos Suportes
O critério para seleção do livro Português: Linguagens (Cereja & Magalhães, 2006)
levou em consideração o fato de esse livro estar entre os livros didáticos bem avaliados
pelo PNLD 2005 e encampar uma proposta de língua(gem) como prática social. Ademais,
o livro traz uma variedade de gêneros para serem trabalhados em sala de aula e, dentre
eles, o gênero cartum. Selecionamos o volume 8 porque estamos propondo uma seqüência
didática para uma turma de 9
o
ano (antiga 8ª série).
Dentre os livros disponíveis para o ensino fundamental, selecionamos o livro Hello!
(Morino e Faria, 2004) porque no momento da nossa busca de abordagens ao gênero
cartum em língua inglesa, esse volume foi o único que apresentou o cartum acompanhado
por atividade pedagógica.
Como critério de seleção do cartum com a qual fizemos a seqüência selecionamos
um que dispusesse um de banco de cartuns organizados por temas.
3.2.2. A Seleção do Tema para a Seqüência Didática
O tema do cartum que selecionamos na Internet para a seqüência didática proposta
refere-se à saúde que é um dos temas transversais propostos pelos PCN.
Como ressaltado na seção anterior, segundo o referido documento oficial, a
pertinência do trabalho com o tema saúde deve-se ao fato de que a “educação para a saúde
favorece o processo de conscientização no que se refere ao direito à saúde e
instrumentaliza para intervenção individual e coletiva sobre condicionantes do processo
saúde/ doença” (PCN, Temas Transversais, 1997, p.255).
3.3 PROCEDIMENTOS E CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DOS CARTUNS NOS
LIVROS DIDÁTICOS
Na primeira parte do trabalho, analisamos a abordagem aos cartuns no livro
didático considerando a importância a eles conferida considerando os seguintes pontos:
i) a localização do cartum no LD;
ii) o conceito do gênero cartum no livro didático;
iii) as atividades de linguagem propostas;
iv) o conceito de prática social e de linguagem.
Além desses pontos, analisamos os cartuns e suas abordagens considerando as 3
dimensões do gênero de acordo com Bakhtin:
i) conteúdo temático;
ii) estilo;
iii) construção composicional.
No que se refere à localização do cartum, interessou-nos saber em que momento da
lição ele foi abordado: se numa seção de leitura, que geralmente tem mais destaque no
livro, se numa seção de gramática ou numa seção lúdica, bem como sua articulação com o
restante dos conteúdos.
Um dos critérios do PNLD (2005) para a avaliação dos livros didáticos é a precisão
de conceitos, por isso, analisamos não apenas a abordagem do gênero em si no livro do
aluno, mas, também, as orientações no manual do professor. Considerando as teorias de
Dolz & Schneuwly para quem as atividades de linguagem permitem a compreensão e
interpretação do gênero, analisamos as atividades de linguagem e o conceito de práticas de
social e de linguagem propostas nas abordagens.
No que se refere ao conteúdo temático, analisamos quais temas e como os mesmos
foram abordados pelos cartuns analisados. No que se refere ao estilo, analisamos os
recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da linguagem apresentados nos cartuns.
Nessa parte da análise, buscamos subsídios nas teorias de Neves (2003) e Travaglia (2003)
por abordarem questões de conhecimentos lingüísticos e educação lingüística
indispensáveis à pesquisa.
No que se refere à construção composicional analisamos as formas estáveis do
cartum, isto é, seus elementos constitutivos para evidenciar a função de cada um desses
elementos no gênero. Para isso, nos baseamos em Saraceni (2003), como explanado
acima.
3.4 PROCEDIMENTOS PARA A ELABORAÇÃO DA SEQÜÊNCIA DIDÁTICA
Tendo como base a seqüência didática proposta por Dolz, Noverraz e Schneuwly
(2004) e os postulados dos PCN para o ensino de língua estrangeira definimos os seguintes
procedimentos para a elaboração de uma seqüência didática:
1) Ativação do conhecimento prévio sobre o gênero e o tema a ser abordado;
2) Apresentação do gênero;
3) Realização de atividades de linguagem para a produção de sentidos para o
cartum.Vale ressaltar que as atividades de linguagem têm também o objetivo a
transformação do gênero em objeto de ensino e estudo de seus constituintes
separadamente.
4) Agregação das partes – o gênero, que para fins didáticos foi transformado em
objeto de ensino, volta a ser estudado na íntegra com o fim de verificar se houve
compreensão. Sugerimos atividades que permitam avaliação formativa
8
sobre o
progresso feito pelo aluno: quais conhecimentos produzidos, de que forma a
atividade de linguagem vivenciada o ajuda a entender o mundo que o cerca,
transformar a realidade social, dentre outros.
Além dos critérios acima, as 3 dimensões bakhtinianas do gênero (conteúdo
temático, estilo e construção composicional) nortearam o planejamento da proposta de
seqüência didática e a elaboração das atividades de linguagem propostas.
Por se tratarem de textos predominantemente não verbais analisamos como o
verbal e o não verbal se completam para a produção do sentido, e como isso influencia
a leitura dos alunos.
8
Diferentemente da avaliação somativa, a avaliação formativa é uma avaliação para (a serviço da)
aprendizagem, e não da aprendizagem (Gardner, 2006, p.2).
CAPÍTULO IV
ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS
Partindo da suposição de que, após o lançamento dos documentos oficiais, os
gêneros textuais como charge, cartum e tira estão adquirindo um espaço que não tinham
anteriormente nas aulas de língua (portuguesa ou estrangeira), analisamos nesse capítulo as
abordagens ao gênero cartum em dois livros didáticos que, atualmente, circulam na esfera
escolar brasileira. Antes, todavia, faz-se necessário explanar a concepção de língua na qual
ambas as obras se estruturam.
De acordo com Cereja e Magalhães (1999/2006), “o ensino de português deve
abordar a leitura, a produção de texto e os estudos gramaticais sob uma mesma perspectiva
de língua - a perspectiva de língua como instrumento de comunicação e interação social”
(Manual do Professor, p. 3 e p. 2, respectivamente).
Diferentemente do livro didático de português não há no livro de inglês um
referencial teórico que explicite a concepção de língua presente no livro, ou qualquer outro
tipo de suporte teórico
9
a não ser um parágrafo no qual são mencionados os temas
transversais.
Os temas transversais (Ética, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural,
Orientação Sexual e Trabalho e Consumo) são abordados ao longo
de diversos momentos da coleção. Eles proporcionam reflexões
sobre questões de natureza social, com o objetivo de formar a
consciência crítica e despertar a cidadania do aluno, e devem ser
apropriados a cada faixa etária.(Manual do Professor, p. 32
).
4.1 OS LIVROS ANALISADOS E SUAS PROPOSTAS METODOLÓGICAS
4.1.1 Português: Linguagens (Cereja e Magalhães, 1999 e 2006)
Em 2005, ao nos dedicarmos à análise de um livro didático de língua portuguesa
que se propusesse a trabalhar com a língua a partir de uma perspectiva de gêneros textuais
e que fosse aprovado/recomendado pelo PNLD, encontramos em “Português: Linguagens”
9
Vale lembrar que os livros didáticos de língua inglesa ainda não foram inseridos no PNLD.
de Cereja e Magalhães (1999) o que buscávamos.
Desta obra, selecionamos a abordagem proposta para dois cartuns, visando não
apenas analisar como tal abordagem era realizada, mas, sobretudo, nortear os passos
iniciais de nossa própria seqüência didática em língua inglesa.
Logo após a defesa do trabalho de qualificação, tomamos conhecimento de que já
havia sido lançada uma edição revisada (2006) da referida obra. Apesar do pouco tempo
para a defesa final dessa dissertação, revimos nossa análise da versão de 1999, defendida
em outubro de 2006.
A edição de 1999 está organizada em 4 unidades temáticas que são desenvolvidas
em três capítulos. A versão atualizada também está organizada em 4 unidades temáticas,
mas contém quatro capítulos para cada unidade. Houve mudanças significativas na
organização dos capítulos. Na edição de 1999, os capítulos estão organizados em quatro
seções: Estudo do texto, Produção de texto, Para Escrever Certo e A língua em Foco (p.4).
Cada uma dessas seções, por sua vez, se subdivide. A seção O Estudo do Texto
apresenta as subseções: Compreensão e Interpretação, A linguagem do Texto, Leitura
Expressiva do Texto, Cruzando Linguagens, Trocando Idéias e Ler é. A seção Produção
de texto está subdividida nas subseções Agora é a Sua Vez e Intervalo. A seção Para
Escrever Certo se “transforma” em Para Escrever com expressividade, Para Escrever
com coerência e coesão e Para Escrever com adequação. Por fim, A Língua em Foco se
subdivide nas subseções Construindo o Conceito/ Conceituando, A Categoria Gramatical
Estudada na Construção do texto e Linguagem e Interação (p. 4-5).
A edição de 1999 apresenta ainda ao final de cada capítulo uma atividade lúdica
intitulada Divirta-se e ao final de cada unidade, uma seção intitulada Passando a limpo (p.
7).
Na versão atualizada, encontramos a seguinte organização: Estudo do Texto do qual
fazem partes as seguintes subseções: Compreensão e Interpretação, A Linguagem do
Texto, Leitura Expressiva do Texto, Cruzando Linguagens, Trocando Idéias, Ler é. A
edição apresenta ainda as seções: Produção de Texto, Para Escrever com Adequação,
Coerência, Coesão e Expressividade, A Língua em Foco; sendo que essa última apresenta
os seguintes tópicos: Construindo o Conceito / Conceituando e A Categoria Estudada na
Construção do Texto. Há ainda a subseção Semântica e Discurso e duas outras seções: De
Olho na Escrita e Divirta-se.
4.1.2 Hello! ( Morino e Faria, 2004)
O livro Hello! traz um plano de curso que contempla os seguintes tópicos: i)
objetivos específicos do Stage 6; ii) Conteúdos do Stage 6; iii)Cronograma ; iv) avaliação;
v) temas transversais; vi) referências bibliográficas.
O livro é organizado em 8 unidades, a saber: i) Nice to meet you (prazer em
conhecer); ii) Can you paint? (você pode pintar?); iii) I don’t feel well (Eu não me sinto
bem) iv) What does she do? (O que ela faz?); v) So you can cook for us (Então você pode
cozinhar para nós); vi) Do you have any money? (Você tem dinheiro?) vii) What are you
going to write? (O que você vai escrever?); viii) Where were you last Sunday? (Onde você
estava domingo passado?).
As unidades estão organizadas em 8 seções: Warm up: momento no qual ocorre a
ativação do conhecimento prévio dos alunos sobre o tema a ser abordado na unidade;
Finding out: nesta seção encontra-se um diálogo abordando questões que são temas das
unidades; Language points: seção destinada à abordagem de estruturas gramaticais;
Listening and oral practice: seção destinada à atividades de escuta e compreensão oral;
Expanding your vocabulary; destinada à ampliação do vocabulário trabalhado na lição;
Reading: seção na qual é apresentado um texto, mas que não é seguido de questões de
compreensão; English for fun: destinada a uma atividade lúdica, e Cooperative project:
seção na qual é proposta uma atividade em grupo.
4.2 A ABORDAGEM DO CARTUM NOS LIVROS DIDÁTICOS
Em nossa análise consideramos alguns pontos nas abordagens que demonstram a
importância conferida aos cartuns no livro didático. Esses pontos são: i) a localização do
cartum no LD; ii) o conceito do gênero nos livros didáticos e iii) as atividades de
linguagem; iv) o conceito de prática social e de linguagem. Além desses pontos,
analisamos os cartuns e suas abordagens considerando as 3 dimensões do gênero de acordo
com Bakhtin: i) conteúdo temático; ii) estilo e iii) a construção composicional.
Para dar suporte à análise do terceiro constituinte do gênero (construção
composicional), utilizamos Saraceni que faz um detalhamento de cada elemento
constitutivo do gênero em questão.
4.2.1. A abordagem do cartum 1 analisado livro didático de língua portuguesa
Na edição de 1999, o cartum 1 e respectivas atividades (Anexo A) encontram-se
numa unidade que aborda o tema Valores e, mais especificamente, no capítulo intitulado
Checando Valores, na seção Cruzando Linguagens. A única mudança na edição de 2006 é
o título do capítulo onde o cartum se encontra - os Valores e a Felicidade. Tanto o tema da
unidade quanto a seção em que o cartum se encontra permanecem inalteradas.
Cartum 1
p.72; p.59
Cartum de Quino
4.2.1.1 O conceito de gênero
Uma primeira questão importante é a indefinição terminológica no tratamento ao
cartum em foco. Observamos que ora o gênero é tratado como cartum, ( como observamos
no enunciado que precede o cartum, ora (no exercício abaixo) como tira.
Leia este cartum de Quino (p. 72)
1) O cartum narra uma história que envolve duas personagens e algumas ações(...) (p.73)
5) A tira de Quino, entre outras interpretações, pode representar diferentes visões que se
têm da realidade. (p.73)
[ênfase nossa]
Como mencionado anteriormente, apesar de pontos em comum, esses gêneros têm
características e objetivos diferentes. O gênero em foco é um cartum e não uma tira. O que
nos ajuda a distinguir que o gênero se trata de um cartum é o tema que se refere a valores
ou costumes sociais. A tira, por outro lado, tende a abordar questões políticas
assemelhando-se a charge nesse ponto. O cartum acima se assemelha também a uma
história em quadrinhos com uma seqüência de quadros, o que o diferencia da história em
quadrinhos, entretanto, é que estas são geralmente mais longas contendo vários painéis.
Utilizar os termos cartum, tira ou charge para denominar um mesmo gênero pode
induzir o aluno a concebê-los como sinônimos. Cumpre informar que o PNLD (2005) não
faz qualquer apreciação a essa indefinição terminológica em sua resenha crítica da obra (p.
189-197).
4.2.1.2 A localização do cartum
A seção Cruzando Linguagens na qual encontramos o cartum 1 é caracterizada
pelos autores como “ ... um tópico facultativo, que aparece sempre que necessário e
possível” e tem por objetivo “fazer o estudo comparado entre esse texto e o anterior, que
apresenta um tipo de linguagem diferente”( MP 1999, p.5 e MP 2006, p. 4).É esperado do
aluno neste momento que, por meio de comparação, estabeleça semelhanças e diferenças
quanto à abordagem ao tema e/ou aspectos formais dos textos.
O cartum juntamente com vários outros gêneros literários e não literários estão a
serviço da construção de visão de mundo do aluno sobre o tema Valores. Encontra-se em
um tópico facultativo e seu trabalho de leitura complementa o estudo de um texto anterior
Vai, de Ivan Ângelo, que inicia o capítulo na edição de 1999 e Tão Felizes, de Ivan
Ângelo, na edição de 2006. Esse texto é seguido pela seção Estudo do texto na qual, de
acordo com os autores, é a seção em que o trabalho de leitura está formalmente
organizado, embora ressalvem que a leitura seja trabalhada em toda obra: “Cabe ressaltar
ainda que, embora o trabalho de leitura esteja formalmente organizado nas atividades
propostas na seção Estudo do texto, na verdade a leitura é explorada em toda a obra(...)
(MP, 1999,p.4; 2006,p.3)
O fato de o cartum complementar a leitura de um outro texto é um aspecto positivo
na medida em que traz gêneros diferentes para abordar um mesmo tema, no entanto, uma
questão a se pensar seria o fato de, em ambas as edições, esse gênero não iniciar nenhuma
unidade ou capítulo. Os textos responsáveis por introduzir os capítulos e unidades são
sempre crônicas, entrevistas poemas dentre outros, e não uma charge, tirinha ou cartum.
Uma diferença que aparece no manual do professor da edição de 2006 encontra-se
na introdução quando os autores destacam seu “interesse em explorar (seja na condição de
receptor, seja na condição de produtor) outras linguagens além daquela verbal como a
pintura, a fotografia, o cinema o cartum o anúncio publicitário, etc”(MP 2006, p.2).
Percebemos na citação dos autores uma predisposição em trabalhar outras linguagens o que
talvez explique a maior presença de cartuns em comparação com a versão anterior.
Percebemos também uma sensível diferença no que se refere à importância dada a esse
gênero. Na versão de 1999, apenas os dois cartuns selecionados vieram seguidos de uma
abordagem, sendo os demais constituintes da seção Divirta-se, que é uma seção na qual
“sempre há alguma atividade lúdica que estimula o raciocínio do aluno. São charadas,
brincadeiras, adivinhas, tiras e pequenos textos de humor”. (MP, 1999, p.7).
No volume de 2006 percebemos que apesar de os cartuns ainda não abrirem um
capítulo ou uma unidade, ele aparece em vários momentos e em diferentes seções (18
cartuns na seção divirta-se, 33 seguidos de abordagem gramatical e 7 cartuns seguidos de
compreensão textual). Cumpre ainda ressaltar que despertar o gosto pela leitura prazerosa,
sem uma atividade pedagógica específica, tem lugar em qualquer proposta pedagógica que
objetive o letramento, no entanto, defendemos que isso deva ocorrer com todo e qualquer
gênero, e não apenas com aqueles da esfera humorística.
4.2.1.3 As atividades de linguagem
Em ambas as edições, podemos observar que as atividades de linguagem estão
centradas na compreensão do texto. Apresentaremos abaixo as informações constantes
tanto no livro do aluno quanto no livro do professor [entre colchetes e precedido por MP].
O exercício de compreensão do cartum 1 é constituído de 6 atividades de leitura,
sendo que o enunciado da atividade 1 contextualiza o cartum:
1) O cartum narra uma história que envolve duas personagens e algumas ações.
Chamaremos o homem sem bigode de personagem 1 e o homem de bigode de personagem
2. Observe os seis primeiros quadrinhos:
a) O que a personagem 1 faz no 2º quadrinho?
[MP - Observa algo (uma pessoa, um objeto ou um fato) por um buraco].
b) Que reação ela tem?
[MP - Ela acha engraçado]
p. 73/ p.59
Alegamos que essa contextualização de enunciado seja dispensável porque o aluno
pode recuperar o contexto lendo o cartum. No entanto, o que mais nos chama atenção é o
direcionamento da leitura do aluno (itens a e b) que vai de encontro ao que os autores
preconizam com base nos PCN de LP: “Formar um leitor competente supõe formar alguém
que compreenda o que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito,
identificando elementos implícitos” (MP, 1999/2006, p. 8 e 7 respectivamente).
Uma sugestão para essa questão seria não contextualizá-la num primeiro momento
poderia ser pedido que o aluno fizesse sua própria leitura de forma livre (sem ter o olhar
direcionado por qualquer pergunta). Para tanto, propomos a seguinte reformulação:
1) Descreva com suas próprias palavras o cartum abaixo:
Destarte, os autores estariam de fato estimulando a leitura do “que não está escrito”,
o que poderia, por sua vez, gerar outras leituras plausíveis e possíveis, como no mundo real
fora da esfera escolar. Note-se que as respostas no manual do professor não deixam dúvida
sobre qual a leitura desejada e autorizada (Coracini, 1999) embora os autores tentem
atenuar sua interpretação fornecida no enunciado da questão 5, que será posteriormente
analisada.
5) A tira de Quino, entre outras interpretações, pode representar as diferentes visões
que se tem da realidade.
[ênfase nossa]
Num segundo momento, no entanto, rumo a uma leitura mais detalhada e alinhada
com o propósito da escolha do cartum para a abordagem ao tema Valores, o
direcionamento do olhar do aluno para quadrinhos específicos (itens a, b, questão 2, 3 e 4)
poderia fazê-lo confrontar sua primeira leitura do cartum e articular processos ascendentes
e descendentes de leitura na construção de sentido para o texto.
2. Observe agora os quadrinhos 7, 8, 9. Como a personagem 2 reage diante do que vê?[MP
- Chora, lamenta]
A atividade 2 suscita que diferentes pessoas reagem de diferentes formas o que vai
ao encontro de um dos conteúdos sugeridos para a unidade que é justamente as
“influências do outro sobre nosso ponto de vista” ( MP, 1999,16). A atividade 5 também se
propõe a refletir sobre as influências do outro e promover a construção do sentido do texto.
5) A tira de Quino, entre outras interpretações, pode representar as diferentes visões que se
tem da realidade.
a) O que faz a personagem 1 mudar seu ponto de vista?
[MP - A influência da personagem 2 que viu a mesma coisa de forma diferente ]
b) É possível dizer que as personagens, por terem visões diferentes da mesma realidade,
também possuem valores diferentes? Por quê?
[MP - Espera-se que o aluno responda que sim, pois a forma como vemos o mundo, o que
julgamos bom ou ruim, verdadeiro ou falso, nossos padrões de beleza, são manifestações
de valores].
c) Pelo ponto de vista do cartum, é possível alterar o ponto de vista de uma pessoa? Em
caso afirmativo, como?
[MP - Sim, desde que se mostre a ela outra “verdade”].
p.73/p.60
As questões propostas na atividade apontam para a possibilidade de outras leituras,
inclusive marcadas textualmente no enunciado, mas não abre espaço para as mesmas nas
respostas fornecidas. A leitura pedida restringe-se àquela que teria relação com o texto
anteriormente trabalhado, com o qual será comparado a partir dessa questão.
Nesta questão, ao apontar para a possibilidade de outras interpretações, o autor
poderia questionar sobre as outras leituras possíveis e então, a partir dessas leituras
direcionar para a questão dos valores, que é o foco da atividade. Para isso, sugerimos as
seguintes questões:
1) A que conclusão você chega com o cartum de Quino?
2) Seria possível dizer que o cartum representa diferentes visões que se tem da realidade.
Justifique:
3) Em sua opinião, quais as implicações de haver diferentes visões da realidade?
A atividade 3, abaixo, demanda articulação das linguagens verbal e não verbal
assim como de processos ascendentes (observação dos quadrinhos 10 e 11) e descendentes
de leitura (sentido para a mão no queixo (10) , gestos com a mão (11)). Mais uma vez as
respostas fornecidas (que diferentemente do texto anterior eram sinalizadas por ‘Resposta
pessoal’ e/ou ‘Sugestão’) contribuem para a interpretação pretendida.
3) Observe o comportamento da personagem 1 nos quadrinhos 10 e 11.
a) O que expressa a feição da personagem e a mão no queixo?
[MP - Dúvida e preocupação].
b) O que significa o sinal que faz com as mãos no quadrinho 11?
[MP - Que o outro deve estar louco].
p.73/p.60
A questão 4, por sua vez, antecipa e impõe uma leitura, não dando espaço para a
interpretação do aluno, à medida que informa haver uma “mudança no estado emocional da
personagem” (item a) e “uma mistura de dois estados emocionais diferentes da
personagem” (item b). Vejamos:
4) Observe a reação da personagem 1 nos últimos quadrinhos.
a) O que muda no estado emocional da personagem no último quadrinho?
[MP - Ela antes se divertiu com o que viu; agora chora e xinga]
b) Quais dos quadrinhos expressam uma mistura de dois estados emocionais diferentes da
personagem? Por quê?
[MP - O 14; porque a personagem chora e ri ao mesmo].
. p.73; p.60
A “mão no queixo” pode ter vários sentidos dependendo dos esquemas de mundo
do aluno. Ao atribuir a tal feição o sentido de dúvida e preocupação, os autores limitam e
direcionam a leitura do aluno, a quem não é dada a oportunidade de perceber ou não uma
mudança de estado emocional, logo, resta aos alunos identificarem tal mudança bem como
a mistura de dois estados emocionais, como já mencionado.
Uma sugestão para um melhor aproveitamento dessas questões seria permitir aos
alunos perceber e atribuir sentido às feições das personagens. Leitura essa que pode ser,
inclusive, diferente daquela sugerida pelos autores ou professor.
4) Observe atentamente a reação da personagem 1:
a. Contraste sua reação nos quadrinhos 4, 14 e 15:
b. Interprete o quadrinho 14.
Por fim, na atividade 6, os autores cruzam as linguagens do cartum com o texto
anterior do capítulo. Espera-se do aluno, “[comparar] e estabelecer semelhanças e
diferenças quanto ao tema e/ou quanto aos aspectos formais dos textos...” (MP,
1999/2006, p. 5 e 4).
A fim de garantir a visão dos PCN de LP de que “Formar um leitor competente
supõe formar alguém que.... estabeleça relações entre o texto que lê e outros já lidos...”
(MP, 1999/2006, p. 8 e 7, respectivamente), propomos a seguinte reformulação:
1. Que relação você pode estabelecer entre o cartum de Quino e o texto ‘Vai’ de
Ivan Ângelo?
2.Qual a relação do cartum de Quino e o tema Valores?
No que se refere aos conceitos de prática social e prática de linguagem,
percebemos que na abordagem desse cartum ambos os conceitos foram devidamente
trabalhados. Analisando primeiramente o trabalho com o conceito de prática social que se
define por aquisições acumuladas pelos grupos sociais no curso da história, percebemos
que tal conceito é abordado no momento em que verificamos uma preocupação em trazer
uma situação com a qual os alunos já possam ter tido experiência, dando-lhes
oportunidade de estudar a linguagem partindo de experiências reais, possivelmente já
vivenciadas por eles.
O conceito de prática de linguagem que se refere às “dimensões particulares do
funcionamento da linguagem em relação às práticas de linguagem em geral” (Dolz e
Schneuwly 2004, p.72) também é contemplado na abordagem do cartum no momento em
que há uma abordagem do texto não verbal ( feições, gestos, sentimentos) relacionando
com a prática social em questão.
Um ponto, todavia, que merece atenção na abordagem proposta é o fato de os
autores, ao transformarem o gênero em objeto de ensino, não recuperarem seu contexto. A
recuperação do contexto de produção do gênero é crucial para a produção de sentido do
mesmo, como já mencionado.
4.2.1.4 As dimensões bakhtinianas e a abordagem do cartum
Ressaltando o que foi dito em momentos anteriores, para Bakhtin a abordagem de
qualquer gênero precisa considerar 3 dimensões: conteúdo temático, estilo, e construção
composicional. Nessa seção analisamos se a abordagem ao cartum 1, realizada pelo livro
didático em foco, contemplou essas dimensões, e, em caso afirmativo, como ocorreu essa
abordagem.
O tema refere-se ao conteúdo, assunto abordado no gênero, sem perder de vista o
componente ideológico. Percebemos que esse primeiro elemento é contemplado quando os
autores questionam sobre as “visões da realidade” (atividade 5, item c) por meio da
comparação de valores pessoais que constitui o tema do cartum.
O segundo elemento abordado por Bakhtin é o estilo. Este se refere à “intenção
discursiva do discurso” (Bakhtin, 2003, p. 281). O estilo está relacionado com recursos
lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua utilizados pelo autor. No caso do cartum em
análise, o estilo se refere a opção do cartunista em retratar o tema e quais recursos (opção
ideológica) ele utilizou na abordagem.
O terceiro elemento abordado por Bakhtin é a construção composicional. Esta não
foi trabalhada nas atividades de linguagem referentes a esse cartum. Não houve qualquer
explicação de nenhum dos seus constituintes (trilho, painel).
Não podemos dizer que a abordagem desse cartum contemplou a função social do
gênero visto que as atividades sugeridas para a compreensão do mesmo não abriram
espaço para fazer uma relação entre o cartum e a vida social ( fora do texto).Uma sugestão
para o trabalho da função social do cartum em análise é justamente relacionar a situação
apresentada no texto, com situações fora da sala de aula.
4.2.2 A abordagem ao cartum 2 analisado no livro didático de língua portuguesa
O segundo cartum e respectivas atividades (Anexo A) encontram-se na Unidade
Rumo ao século XXI, capítulo intitulado A vida e o vídeo, seção Linguagem e Interação
(edição de 1999). Na edição de 2006, encontra-se também na unidade Nosso tempo, no
capítulo intitulado De Volta Para o Presente, na seção Semântica e Discurso.
Cartum 2
p.212/ p.232
Cartum sobre a sabedoria
4.2.2.1. O Conceito do gênero
Assim como no cartum 1, percebemos que o conceito do gênero é indefinido: ora
definido como charge, ora como cartum, ora como tira. No enunciado do cartum como
pode ser visto logo acima do cartum, o gênero é denominado charge [Leia a charge
10
abaixo:], já no exercício a seguir, o gênero é denominado tira.
2.O humor da tira reside no fato de o chargista ter colocado marcas de produtos nas roupas
da Justiça e Verdade, enquanto a Sabedoria está a procura de patrocínio.
p. 212 p. 233[ênfase nossa]
4.2.2.2 A localização do cartum
Esse cartum não se encontra numa seção de leitura, mas numa seção destinada ao
ensino de gramática, intitulada Linguagem e Interação (edição de 1999) e Semântica e
Discurso (edição de 2006). Segundo os autores, o objetivo desse tópico é “retomar os
conteúdos gramaticais trabalhados no capítulo anterior e ampliar sua abordagem,
explorando-os pela perspectiva do discurso”. (ênfase do autor, MP, 1999, p.7) e “ampliar
ainda mais a abordagem do conteúdo gramatical do capítulo” (MP, 2006, p.06).
A localização desse cartum bem como a proposta dos autores, explicitada acima,
nos mostra que o objetivo de sua presença na unidade é a abordagem de conhecimentos
gramaticais numa perspectiva discursiva. Em outras palavras, o cartum aparece no livro a
serviço dos conteúdos gramaticais trabalhados, visto que se encontra numa seção que visa
à retomada de conteúdos gramaticais abordados no capítulo como vemos na atividade 3 a
seguir:
3. Observe o cartaz que a Sabedoria carrega. O verbo precisar, no sentido de “necessitar”,
é normalmente empregado como transitivo indireto tanto no padrão culto como popular.
Antigamente, entretanto, esse verbo era empregado como transitivo direto em frases
como “Se você precisar ajuda, conte comigo”.
a) Com qual das regências o verbo precisar foi empregado no cartaz da Sabedoria?
[MP – O verbo foi empregado como transitivo direto.].
b) Na sua opinião, qual foi a intenção do cartunista: mostrar que somente a Sabedoria
poderia conhecer essa regência rara do verbo, ou mostrar que a educação (o conhecimento,
o saber) atualmente, está tão em segundo plano que é até possível que a própria sabedoria
desconheça a regência moderna da elocução precisar?
10
Ênfase nossa
[MP - Resposta Pessoal.]
p.213 p. 233 [ênfase do original]
4.2.2.3 As atividades de linguagem
Seguindo a mesma linha de análise do cartum 1, defendemos que as atividades de
linguagem para o cartum 2 ( Anexo A) analisadas não deveriam antecipar a leitura
(interpretação) das figuras femininas como representando a justiça, a verdade e a
sabedoria. Ou seja, nossa crítica é no sentido de os autores não terem permitido que os
próprios alunos construíssem esse sentido para as figuras femininas.
1) Cada uma das figuras femininas está caracterizada de acordo com o que representa.
Qual delas representa:
a) a Justiça?
b) a Verdade?
c) a Sabedoria?
p.212 p. 232
Nessa atividade, percebemos que há uma intenção dos autores de não se limitarem à
leitura ascendente de busca de informações no texto, no entanto, observando toda a
unidade percebemos que ficaria difícil para os alunos, sem mediação do autor ou do
professor, reconhecerem os personagens dos cartuns considerando que eles não são
abordados em nenhum momento em questões anteriores.
Numa outra atividade percebemos, novamente, que os autores não possibilitam que
os alunos produzam sentido para o cartum pois eles o fazem no próprio enunciado:
2.O humor da tira reside no fato de o chargista ter colocado marcas de produtos nas
roupas da Justiça e Verdade, enquanto a Sabedoria está a procura de patrocínio.
p.213/233[ênfase nossa]
Nossa proposta para essa questão é permitir que o aluno decida i) se há humor no
cartum e ii) a partir de que situação foi criado “o humor” a que os autores se referem.
Dentre as questões que poderiam elicitar essa leitura são: i) O cartum aborda o tema de
forma humorística? ii) Se afirmativo, a partir de qual (is) fato (s) o humor foi produzido.
Percebemos que, mais uma vez, a abordagem desse cartum não considera as
condições de produção do cartum. O cartum foi retirado do seu contexto e levado para a o
livro didático (posteriormente para a sala de aula) sem a recuperação desse contexto,
indispensável para a sua compreensão e transformação em objeto de estudo.
No que se refere aos conceitos de prática social e prática de linguagem, percebemos
que no momento em que os autores trazem para a sala de aula um gênero desvinculado do
seu contexto de produção, o conceito de prática social (as experiências vividas pelos
grupos sociais ao longo da história) deixa de ser abordado, pois não se faz uma relação
entre o cartum e a prática social a qual ele está relacionado. Já no que se refere à prática de
linguagem, percebemos que essa foi trabalhada na medida em que se buscou trabalhar o
funcionamento da linguagem referente ao gênero em questão.
4.2.2.4 As dimensões bakhtinianas e a abordagem ao cartum
Não percebemos na abordagem desse cartum, um trabalho que considerasse o tema
apresentado no gênero. Em sua abordagem percebemos que o tema Valores é explicitado,
mas não trabalhado (vide exercício 1, acima). Notamos que neste, os personagens do
cartum são identificados, mas não há qualquer abordagem a respeito do conteúdo temático
do cartum e de que forma o cartum se relaciona com o tema da unidade Rumo ao século
XXI.
Verificamos também, uma preocupação dos autores em chamar atenção dos alunos
para os recursos gráficos e gramaticais do texto (o estilo, na perspectiva bakhitiniana),
como vemos no exercício 3 ao atentar para o nome dos patrocinadores e para a regência
arcaica do verbo ‘precisar’. Nesse cartum verificamos que há um trabalho referente ao
estilo do gênero, pois se questiona na atividade qual motivo teria levado o personagem a
escolher essa regência arcaica do verbo “precisar” e qual efeito essa escolha produz no
texto. Supomos que uma leitura possível seja questionar a valorização da educação. No
que se refere à atividade 3 acima, notamos, ainda, que a transitividade do verbo “precisar”
está sendo trabalhada de uma perspectiva reflexiva ao questionar as razões para se optar
por uma regência em detrimento de outra.
No que se refere à construção composicional, assim como no cartum 1, não
verificamos nenhuma abordagem dos elementos constituintes do gênero ou sobre sua
organização, visto que o mesmo não apresenta balões, legenda, trilhos ou painéis.
Podemos dizer que a abordagem desse cartum procurou contemplar a função social
do gênero visto que houve atividades que fizeram a relação entre o texto e a vida social.
No momento em que questiona na questão 2 (a.Que profissionais de nossa sociedade
costumam receber patrocínio e b) Você acha que o chargista, ao colocar a Sabedoria sem
patrocínio, pretende fazer alguma crítica? Em caso afirmativo a que?) percebemos que é
feita uma relação entre o cartum e a o meio social.
4.2.3 A abordagem ao cartum no Livro Didático de língua estrangeira
O cartum e as atividade de linguagem (Anexo A) que analisamos do volume de
língua estrangeira encontram-se na unidade 3 que tem como título “I don’t feel well” (Eu
não me sinto bem).
Hello! 2004, p. 43
Cartum para abordagem do Modo Imperativo
4.2.3.1 A localização do cartum
Referente à sua localização, o cartum aparece na seção Written practice, ou seja,
uma seção destinada à escrita, precedido por uma seção de escuta e seguido de 2 atividades
de linguagem.
4.2.3.2 O conceito do gênero
No que se refere à identificação do gênero, percebemos que o LD o reconhece
como cartum. No enunciado das atividades referentes ao texto encontramos “Look at this
cartoon” (Observe esse cartum). No entanto, cartoon é uma palavra polissêmica, pode se
referir a uma charge, a um desenho ou ainda a um cartum ( como entendemos em língua
portuguesa). Considerando a diversidade de sentidos que o termo cartoon possui, não é
possível perceber em qual sentido os autores fizeram uso do termo. Ademais, observamos
que os autores apenas nomeiam o gênero, mas não há qualquer preocupação em
caracterizá-lo.
4.2.3.3. As atividades de linguagem
A primeira questão de linguagem proposta está relacionada à compreensão do texto
e pede para que o aluno marque a alternativa que corresponde à figura. Para tanto,
apresenta 3 alternativas expressas no modo imperativo:
3) Now, mark the alternative that corresponds to the picture:
i) Don’t call the doctor. (Não chame o médico)
ii) Don’t stay here. (Não fique aqui)
iii)Don’t open that door. (Não abra aquela porta)
p.43
A alternativa considerada verdadeira pelo livro didático é a terceira, o que revela um
primeiro problema quanto à limitação da questão de compreensão. Ao propor possíveis
leituras, o LD impõe a leitura que corresponderia ao cartum, a questão não abre espaço
para outras leituras que os alunos pudessem apresentar. Nessa atividade podemos constatar
que os autores concebem a leitura como uma mera decodificação, pela qual supõem que a
resposta única e correta se encontra imanente ao texto.
Percebemos, ainda, que essa atividade não propicia a compreensão do gênero, uma vez
que em momento algum trabalham o cartum numa perspectiva de gênero textual, ou seja,
não há um trabalho acerca do tema, estilo e construção composicional há apenas uma
questão de decodificação de leitura, que tem como pretexto colocar em prática a forma
imperativa, objeto de estudo da lição.
Depois da questão apresentada na seção anterior são propostas atividades que visam
transformar frases imperativas positivas em imperativas negativas:
4) Change the sentences into Imperative Negative: (Transforme as frases em imperativo
negativo)
a) Eat sandwiches. (coma sanduíches)
Don’t eat sandwiches (não coma sanduíches)
b) Take an aspirin. (Tome uma aspirina)
________________________________________
c) Stay in bed. ( Fique na cama)
_____________________________________
(…)
p. 43
Como já antecipado, um outro ponto que observamos na abordagem desse texto é que a
sua utilização serviu com um pretexto para o ensino do modo imperativo na língua alvo.
Notamos que mesmo utilizando o texto para o ensino de gramática, a atividade continua
descontextualizada e desvinculada do tema I don’t fell well (Eu não me sinto bem),
proposto na unidade.
Uma das questões referentes à abordagem do cartum na seqüência didática proposta
é como desenvolver os conhecimentos lingüísticos necessários à produção de sentido para
o texto de forma contextualizada. Alinhados a Ellis (2006 p.41-42), acreditamos que uma
abordagem na qual se faça uma relação entre a forma (form - focused instruction -
instrução centrada na forma) e o sentido (meaning-focused instruction - instrução centrada
no sentido) seja mais apropriada. Para esse tipo de instrução, a situação e o propósito
comunicativo são mais importantes do que a instrução exclusivamente centrada na forma,
que, embora se refira à relação forma e sentido, privilegia o foco no lingüístico. Os
critérios de avaliação do PNLD são elucidativos em relação à questão de conhecimentos
lingüísticos e contextualização. No que se refere ao trabalho com o lingüístico, o PNLD
avalia se esse trabalho “Tem peso menor que os relativos à leitura, está relacionado a situações
de uso, estimula a reflexão e
propicia a construção de conceitos abordados” (PNLD, 2005, v.
2, p. 256).
Por fim, ressaltamos que a localização desse cartum numa seção destinada à escrita,
mas que, na prática, está voltada ao ensino de gramática por meio de realização de
exercícios escritos, denuncia uma prática de escrita bastante difundida nos livros didáticos
de língua estrangeira, aquela de escrita como mera resolução de exercícios.
4.2.3.4 As dimensões bakhtinianas e a abordagem do cartum
Nas atividades propostas no livro para o cartum não há qualquer trabalho orientado
para as dimensões do gênero ( conteúdo temático, estilo e construção composicional).
Dolz e Schneuwly (2004) advertem que o gênero, quando transformado em objeto de
ensino sofre algumas descaracterizações e cabe ao professor trazer todo o contexto de
produção para amenizar essa descaracterização. Nas atividades de linguagem propostas
para os três cartuns analisados não há nenhuma preocupação em recuperar o contexto de
produção do cartum, o que resulta na descontextualização do mesmo.
Assim como no cartum 1 analisado, não podemos dizer que a abordagem desse
cartum contemplou a função social do gênero visto que as atividades sugeridas não
abriram espaço nem para a compreensão do texto nem para fazer uma relação entre o
cartum e a vida social ( fora do texto).
Concordamos com Marcuschi (2005) que assume a posição de Bakhtin (2003) e
Bronckart (1999) de que a comunicação só ocorre por meio de um gênero textual e que
“quando dominamos um gênero, não dominamos uma forma lingüística e sim uma forma
de realizar lingüisticamente objetivos específicos” (2005 p.29).
A nosso ver, o ensino de língua seja ela materna ou estrangeira apenas tem
relevância se partir de uma prática social e estiver centrado nas práticas e ações de
linguagem que se realizam nos gêneros textuais.
4.3 PORTUGUÊS: LINGUAGENS (CEREJA E MAGALHÃES) E O PNLD
O PNLD faz avaliação de livros didáticos e divulga as resenhas obras avaliadas e
aprovadas pelo referido programa. Os critérios eliminatórios da avaliação de uma obra
são: “Correção e articulação dos conceitos e informações, coerência e pertinência didático-
metodológicos e construção da cidadania”, (PNLD, 2005, p.276). Nos livros didáticos são
avaliadas as naturezas do material textual, as atividades de leitura e compreensão de texto,
atividade de produção de textos escritos, o trabalho com a compreensão oral e a produção
de textos orais, o trabalho sobre os conhecimentos lingüísticos, o manual do professor e
aspectos gráfico-editoriais.
Buscando a parte da avaliação do livro que se refere à leitura, habilidade priorizada
pelos autores no trabalho pedagógico com os cartuns 1 e 2, percebemos que a abordagem
de leitura teve uma avaliação positiva por parte do PNLD. De acordo com a avaliação
Na abordagem da leitura, há sugestões de como motivar o estudante
para o conteúdo a ser trabalhado na unidade, contribuindo para torná-
lo um leitor competente. Essas indicações são compatíveis com os
objetivos declarados no manual do professor. Entre as habilidades de
leitura contempladas no livro do aluno, listam se a realização de
inferências, a utilização de conhecimentos prévios, a formulação e
checagem de hipóteses e a apreensão do conteúdo global do texto.
Em todos os volumes, os textos principais das atividades de leitura
são precedidos por questionamentos destinados a chamar a atenção
dos alunos para aspectos a serem enfatizados nos exercícios
posteriores. São pequenos textos introdutórios que estimulam o leitor
a formular hipóteses, cujas respostas encontram-se a partir das
atividades de compreensão e interpretação. (PNLD, 2005, p.191-
192).
Evidenciando o avanço da abordagem de gêneros textuais, prática social e de
linguagem no livro avaliado e aprovado pelo PNLD em relação ao livro de língua
estrangeira (não avaliado pelo PNLD), defendemos a necessidade de esse programa
abranger também a avaliação dos livros de língua estrangeira, visando diminuir o
descompasso existente entre as propostas de ensino de língua materna e as propostas de
ensino de língua estrangeira nos livros nacionais.
CAPÍTULO V
A SEQÜÊNCIA DIDÁTICA
Neste capítulo apresentamos a seqüência didática elaborada com base nos
pressupostos teóricos abordados ao longo dessa dissertação. Partindo do mais familiar para
o menos familiar, trabalhamos o cartum em língua inglesa tendo como ponto de partida as
experiências dos alunos enquanto leitores de jornais e revistas bem como dos
conhecimentos supostamente construídos nas aulas de português, e, gradativamente,
exploramos o contexto de produção e veiculação do cartum (o fato, problema social a
partir do qual o cartum foi gerado a relação do veículo de publicação com o tema abordado
no cartum e ideologia subjacente); a linguagem e a sua construção composicional. A
seqüência está elaborada visando os seguintes pontos:
1 Período de aplicação: 1 Bimestre ( 16 a 18 horas/aula)
2 Objetivos: Produzir sentido na leitura de cartuns; compreender os cartuns a partir
de uma abordagem baseada nas teorias de gêneros textuais; discutir o tema
obesidade infantil abordados nos cartuns.
3 Objeto de Estudo: gênero cartum
4 Material didático: Caderno; lápis; apostila contendo o cartum e as atividades
sugeridas para o estudo.
5 Número de Módulos – 5
Cartum selecionado para a seqüência com respectiva interpretação
Cartum sobre obesidade Infantil
No cartum podemos ver a presença de dois personagens obesos: um menino e uma
mulher, além de uma fita métrica. Parece haver um grau de intimidade entre ambos, prova
disso é o toque da mulher no menino e o sorriso dos personagens. Vemos, ainda, uma
aparência de aprovação por parte da figura feminina que acaricia a cabeça do menino e
vemos um menino, aparentando, com sorriso no rosto, ter feito algo que mereça aplausos.
Esse ‘algo’ pode ter, supostamente, a ver com a fita métrica.
O que ainda não é possível entender pela linguagem não verbal, entretanto, é o motivo
da satisfação. Considerando nosso conhecimento de mundo, podemos supor que a relação
entre a figura feminina e o menino é de mãe e filho, e que é comum os pais medirem a
altura de seus filhos, e estes ficarem orgulhosos por terem crescido mais alguns
centímetros. Mas é a linguagem verbal que nos permite 1. confirmar que a relação entre a
figura feminina e o menino é de mãe e filho (lingüisticamente marcada pelo vocativo‘filho
son em sua fala); 2. perceber a função da fita métrica no contexto (medir a largura do
menino); 3. entender que a aprovação da mãe se refere à largura e não à altura, quando diz:
‘Você aumentou mais uma polegada
11
desde a semana passada’ [You have put on another
inch since last week], percebendo, no entanto, que esses centímetros não se referem à
altura, mas sim à largura (que, por sua vez, denota aumento de peso) visto a disposição da
fita métrica.
Com base em nossos esquemas de mundo, poderíamos esperar que o elogio fosse ao
crescimento (em altura) do filho. Mas, o humor surge do inesperado, da ruptura com a
11
Unidade de medida de altura na língua inglesa, que equivale a aproximadamente 2,54 cm.
lógica, do elogio ao aumento de peso, e não crescimento em relação à altura. Essa inversão
de valores (em vez de crescimento de estatura, crescimento de volume, sendo merecedor
de elogio, em vez de crítica) fere a ‘lógica’ da sociedade ocidental contemporânea que se
preocupa com a obesidade infantil
12
, e faz emergir na confluência do verbal (fala da mãe)
com o não verbal (inversão da fita métrica) o humor.
Nos termos de Ross (1998, p.27), “o humor é causado pela incongruência na linguagem
[...] pelas combinações verbais intencionalmente absurdas, que rompem com a lógica
elementar”.
Sendo o cartum um gênero humorístico e crítico é necessário que o aluno perceba o
humor e saiba a partir de que situação foi criado esse humor. De acordo com Costa (2002,
p.8), “talvez uma das mais destacadas estratégias narrativo-discursivas do humor seja a
ruptura, a cena inesperada, a quebra da lógica na estruturação do discurso”. O referido
autor diz ainda que
Quando o observador conclui antecipadamente o final lógico de
uma narrativa, e este se confirma, o riso não se manifesta. Mas se,
como nas boas piadas/anedotas, o final quebra a lógica narrativa,
é possível levar o receptor à gargalhadas memoráveis”. (Costa,
2002, p.8)
Uma vez apresentada nossa própria interpretação do cartum, passemos a
apresentação da seqüência didática, composta por 5 módulos. Os módulos constam de
considerações sobre fundamentos teóricos subjacentes às questões abordadas em cada
módulo e percepções sobre o cartum, seguidas de respectivas sugestões de atividades.
Evidentemente, toda a proposta de leitura efetuada nos módulos é norteada por essa
interpretação do cartum, apresentada acima.
5.1. MÓDULO 1 - ATIVAÇÃO DO CONHECIMENTO DE MUNDO
A primeira etapa da nossa seqüência é dedicada à ativação do conhecimento de mundo.
Isso porque concordamos com os PCN que postulam que “um dos processos centrais de
construir conhecimento é baseado no conhecimento que o aluno já tem: a projeção dos
12
Note-se que pela aparência dos personagens, a obesidade não parece ser um problema.
conhecimentos que já possui no conhecimento novo, na tentativa de se aproximar do que
vai aprender” (PCN-LE, p.32).
A menção da necessidade de ativação do conhecimento de mundo no processo de
leitura tem respaldo também nos Referenciais Curriculares da Paraíba, que mesmo sendo
destinado ao ensino médio, podem iluminar a prática pedagógica do ensino fundamental.
De acordo com esse documento “todo o processo de leitura deve envolver 3 etapas:pré-
leitura, leitura e pós leitura”(Referenciais Curriculares, 2007, p.22
13
). A primeira etapa, a
pré-leitura, é constituída pela ativação do conhecimento prévio do aluno. Essa ativação
acontece em 3 níveis de conhecimento: conhecimento de mundo, da organização textual e
das condições de produção do texto.
Ainda de acordo com os Referenciais Curriculares da Paraíba (ibid.), o conhecimento
de mundo pode ser ativado através da exploração de “títulos, subtítulos, figuras, gráficos,
imagens, desenho, autor, fonte”.
Alguns questionamentos que podem auxiliar nesse primeiro momento de ativação do
conhecimento de mundo dos alunos visando à construção inicial de sentido para o texto
são
14
:
Descreva o cartum .
Com base na imagem, que relação podem ter os personagens do texto?
Analisando o texto não verbal, como você percebe a relação entre os personagens?
Demonstram satisfação, reprovação? Quais recursos apresentados no texto
justificam sua resposta?
Qual a função da fita métrica?
Como a fita métrica é comumente utilizada?
Como a fita métrica está sendo utilizada no cartum?
Por que a fita métrica está na posição horizontal e não vertical?
Observando o cartum, você pode dizer qual assunto é abordado neste texto? Se
afirmativo, qual a sua opinião acerca do tema?
13
Não tivemos como conferir as páginas da versão final dos Referenciais Curriculares, que foram recém
publicados. Portanto, adotaremos a paginação do Mimeo consultado.
14
Cabe ressaltar que esses questionamentos podem e devem ser desdobrados ou dispensados a partir das
respostas dos alunos.
Além do conhecimento de mundo, os Referenciais Curriculares da Paraíba
mostram a necessidade de ativar o conhecimento da organização textual, e segundo o
referido documento, essa ativação pode ocorrer através da exploração dos “itens
lexicais, cabeçalhos, distribuição gráfica do texto etc, reveladores da organização
textual” (ibid.), o que, nos termos de Bakhtin são denominados construção
composicional e estilo. No cartum, os conhecimentos sobre a organização textual
podem ser ativados pela verificação da disposição das imagens do texto (em primeiro
plano , a mãe e o menino, em segundo plano , a fita métrica), da disposição do texto
verbal (abaixo do texto não verbal) e pela predominância do texto não verbal.
Sugestões de Perguntas:
a) Há predominância de imagem (não verbal) ou de palavras (verbal) nesse texto?
15
b) O texto apresenta alguma voz? Quem fala no texto? Onde está a fala?
16
c) Observe se no texto escrito há palavras, frases, parágrafos, (sub)títulos, falas.
Justifique.
Ainda de acordo com os Referenciais Curriculares da Paraíba, a ativação das
condições de produção do cartum deve ser explorada. Essa ativação acontece através da
identificação do autor, do público alvo, do veículo de publicação e do propósito do
texto. Essas condições de produção devem ser exploradas porque sendo o gênero uma
prática social, isto é uma mediação comunicativa cristalizada, na qual as significações
são progressivamente construídas (PINTO, 2005, p.49), os gêneros possuem práticas de
linguagens inerentes, ou seja, temos o cartum que constitui uma prática social e temos,
no cartum, práticas de linguagem.
Observando as condições de produção do cartum, podemos chamar a atenção
dos alunos para o site no qual ele é veiculado. A partir de uma avaliação dos
personagens podemos encontrar o público ao qual se destina (crianças) como também o
propósito de se trabalhar esse tema (saúde-obesidade) por meio desse gênero
específico.
15
Resgataremos os elementos constitutivos do cartum no módulo 4.
16
Não se espera, nesse momento, que o aluno identifique que o enunciador seja a mãe. No entanto, pretende-
se lhe chamar atenção para uma fala (fora de um balão com rabicho).
Sugestões de Perguntas:
Qual a fonte desse texto? Onde você encontrou essa informação?
Em sua opinião, saber a fonte do texto é importante, ajuda a compreender o texto?
Por quê?
Para quem esse texto é direcionado? Quais recursos do texto justificam sua
resposta?
5.2 MÓDULO 2 - APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO DE COMUNICAÇÃO: DO
GÊNERO
A etapa seguinte à ativação dos conhecimentos de mundo constitui-se da
apresentação da situação de comunicação. Segundo Dolz, Noverraz e (2004, p.99), “A
apresentação da situação visa expor aos alunos um projeto de comunicação que será
realizado “verdadeiramente” na produção final”. A produção final a que se referem os
autores corresponde, no nosso caso, à produção de sentido do cartum por parte dos alunos.
De acordo com Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004, p.99-100), essa etapa de apresentação
da situação de comunicação constitui-se de duas dimensões: o projeto de comunicação e as
dimensões de conteúdo.
a) o projeto de comunicação
Para a nossa proposta essa dimensão remete à explicitação e delimitação da
proposta em questão para os alunos, de forma que eles saibam como será o processo
(trabalho de uma seqüência didática) e quais os objetivos (produzir sentido na leitura de
cartuns; compreender os cartuns a partir de uma abordagem baseada nas teorias de
gêneros
17
textuais; discutir o tema obesidade infantil abordado nos cartuns).
b) Dimensão dos conteúdos
Essa etapa do módulo é reservada à explicitação do conteúdo (o cartum) e a
importância do tema obesidade infantil a ser trabalhado. Cabe aos alunos nessa etapa, pela
mediação do professor, perceber a relevância do projeto que estamos iniciando e buscar
17
Vale ressaltar que quando afirmamos que o projeto de comunicação constitui-se em compreender os
cartuns a partir de uma abordagem de gêneros textuais, não estamos sugerindo explicitar para o aluno essa
teoria, mas fazer uso da mesma.
relacionar os conteúdos, que aprende na escola, com sua vida enquanto ser social.
A LDB defende que o ensino deve estar inspirado no princípio de “vinculação entre
a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais”, afinal o ensino “tem por finalidade o
pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o desenvolvimento da cidadania e
sua qualificação para o trabalho” (1996, p.1).
5.3 MÓDULO 3 - ATIVIDADES DE LINGUAGEM VERBAL E NÃO
VERBAL
Nos módulos anteriores enfocamos a ativação do conhecimento prévio. Nesse
módulo nos dispomos a elaborar algumas atividades que ensinem o aluno a lidar com o
verbal e não verbal do texto para construir sentido para o cartum. Essas atividades
envolvem fala, mediada pela língua portuguesa, leitura e atividades de gramática de uma
perspectiva descritivo-reflexiva (Referenciais Curriculares da Paraíba, 2007)
5.3.1 Texto verbal e não verbal
Nos módulos anteriores levantamos questionamentos sobre os personagens do
cartum, sobre o grau de intimidade ou parentesco entre os personagens, sobre a presença da
fita métrica na direção horizontal direção (na qual ela não é comumente utilizada) para
mensurar altura. Nesse módulo resgatamos esses questionamentos relacionando-os, agora,
com o texto verbal.
Apesar de concordarmos com os Referenciais Curriculares da Paraíba (2007, p.27)
que “as estratégias de leitura podem auxiliar o processo de produção de sentidos para um
texto, embora não garantam êxito”, propomos o uso das estratégias de inferência (como
vimos fazendo desde o Módulo 1) e de localização e resgate de vocabulário conhecido já
que ambas podem auxiliar na construção de sentido para esse cartum, como explanado
abaixo.
O professor pode incentivar o aluno a utilizar a estratégias de reconhecimento de
palavras cognatas e/ ou que já façam parte do seu do conhecimento. Embora não haja
palavras cognatas no texto, o aluno pode reconhecer as palavras well e you. Caso o aluno
não reconheça a palavra well, utilizada em combinação com done, formando a expressão
well done, o professor pode instigar o resgate das discussões feitas na pré-leitura (Módulo
1) e perceber que o vocábulo está sendo utilizado em um momento de aprovação e elogio.
A expressão well done indica elogio e pode ser elicitada por meio de situações
comunicativas que demandem elogios. Assim, inspirados em Travaglia, propomos algumas
atividades para uma abordagem descritivo-reflexiva do uso da expressão well done.
a. Atividade oral de resgate de situações típicas e familiares ao aluno, na qual ele
geralmente ouça elogios. O importante é que, por meio dessa atividade, realizada
na língua materna, o aluno se coloque na posição de seus pais, e elenque situações
merecedoras de elogio em nossa cultura. Um possível desdobramento dessa
atividade seria contrastar o que é merecedor de elogio do ponto de vista do aluno
em oposição à visão de seus pais
18
.
b. Atividade oral na qual o professor elicite dos alunos possíveis formas de elogiar
Provavelmente, a expressão muito bem, surgiria espontaneamente com base nos
esquemas de mundo que o aluno possui sobre falas maternas típicas, proferidas na
esfera cotidiana; cabendo, portanto, ao professor estender seu conhecimento
lingüístico na língua inglesa para que o aluno possa acomodar a expressão well
done.
c. Atividade oral que busque do aluno formas de elogiar na esfera humorística,
rompendo com a lógica e modos habituais de pensamento, satirizando, ironizando,
questionando valores
19
. Espera-se que essa atividade mobilize a criatividade,
motivação, a coerência com a situação comunicativa, e, sobretudo, o trabalho com e
na língua(gem). Em se tratando de alunos de ensino fundamental percebemos que
eles têm uma certa dificuldade (talvez receio de se expor) em buscar formas de
elogiar na esfera humorística. Muitas vezes ao lidar com gêneros dessa esfera, eles
preferem se ater ao que seria lógico ou esperado a tentar romper essa lógica com
uma expressão que possa denotar sátira, ou ironia mesmo que para isso lhes seja
pedido que o façam em sua língua materna.
d. Atividade escrita descrita abaixo:
18
Um outro desdobramento mais sutil e que demandaria competência pragmática é a percepção de que
situações que demandam elogios são culturalmente moldadas, i.e., diferente culturas elogiam diferentes feitos
e de diferentes maneiras (Poshar & Dourado, s/d).
19
Aqui, é oportuna a observação de Nash (1985, p.126) de que a busca pela linguagem humorística se
assemelha a busca pela linguagem poética. Nenhuma das duas é intrínseca ou imanente, mas surgem com e
no trabalho com a linguagem.
1) Destaque o(s) cartum(ns) em que a expressão well done seria adequada? Justifique.
Em qual(is) você não usaria a expressão well done? De que forma esses cartum(ns)
diferem/ se assemelham ao cartum anterior?
20
21
cartum aluno de música e professor Cartum funcionário e patrão
2. Agora leia os cartuns abaixo e responda:
a. O que o menino e o pirata estão segurando?
b. O que a postura física do personagem sentado e do papagaio sugerem?
c. A situação é merecedora de um elogio? Justifique.
d. Se a situação fosse merecedora de elogio, você poderia pensar em alguma expressão
de elogio?
22 23
Cartum pai e filho olhando boletim escolar Cartum menino e papagaio olhando uma prova escolar
2) Nesses dois cartuns, qual o motivo do elogio, por que se espera um elogio nessas
situações?
20
Harold, não foi apenas perfeito, foi perfeitíssimo
21
Não sucinto, mas exato Ambrose, exatamente como gostamos.
22
O que você esperava? Todas as outras crianças têm computadores mais potentes
23
Grasno Que piratas tiram notas realmente muito baixas?
Errado, John Silver.
Segundo Travaglia (2003, p.19), atividades descritivo-reflexivas são “mais
pertinentes para os alunos, pois os tornam mais competentes no uso dessas formas”. O
mesmo pode ser feito para elicitar a ação elogiada pela mãe [ganhar algumas polegadas na
largura, e não na estatura], que, como já mencionado, rompe com a forma habitual de se
pensar na sociedade contemporânea ocidental, cujo referencial cultural de beleza está na
esbelteza relacionada com a magreza. Argumentamos que o referencial de beleza tanto da
mãe quanto do menino parece difere do referencial ocidental e considera que ser esbelto
está relacionado com ser obeso.
Dando continuidade ao trabalho com o conhecimento lingüístico sobre o cartum
principal da seqüência, cabe destacar a ação [expressa pelo verbo] merecedora de elogio.
Há uma ação apresentada no suposto elogio da mãe, formulado oralmente (atividade b, p.
65, dessa dissertação) pelos alunos, e escrito em língua inglesa no quadro, pelo professor.
Essa ação possibilitará a reflexão sobre o tempo verbal utilizado.
Com base em nossa experiência de sala de aula, muito provavelmente, surgirá o
passado simples para se referir a uma ação relacionada a peso. Uma hipótese bastante
plausível que poderá surgir, com base no conhecimento de mundo, percepção de que tanto
mãe como filho são obesos, e trabalho de pré-leitura, é que há uma satisfação (expressa,
sobretudo, pelas expressões faciais) por ter perdido peso ( lose weight). Mas, como já dito,
o cartunista inverte os valores e cria humor à medida que relaciona satisfação ao fato de o
menino ter aumentado de peso (put on weight)
24
. Logo, dentre as suposições formuladas
pelos alunos, espera-se “... you lost weight!”.
Desta feita, se faz necessário refletir sobre o tempo verbal utilizado no texto. O
present perfect que, nesse cartum, indica uma ação que começou no passado, e que pode se
estender ao futuro. Faz-se necessário entender que o uso deste tempo verbal no texto
sugere todo esse sentido de uma ação que teve início em um passado que não importa, e
que se prolonga no tempo presente e, talvez no futuro. É preciso, ainda, explicitar que o
present perfect é usado para falar de resultados ou efeitos de uma ação ou situação
passada. O efeito ou o resultado da ação não foi terminado no momento da fala”, e que
nenhum outro tempo verbal produz o efeito que o present perfect produz. Mais
especificamente, o simple past (passado simples) que, diferentemente, é usado “se uma
24
Vale lembrar que a unidade de medida utilizada pelo cartunista não é peso (weight), mas sim polegada
(inch), utilizada para medir estatura. Essa escolha lexical, que também contribui para o humor do cartum,
será alvo de um trabalho lingüístico específico a seguir.
ação ou situação aconteceu num momento particular do passado, que [já foi] terminada [no
momento da fala]” (BOLTON & GOODEY, 1997, p. 26)
Tendo como base o trabalho de Travaglia (2003, p.167) com o tempo verbal em
português, selecionamos alguns aspectos que podem ser adaptados para o ensino do tempo
verbal em inglês. São eles: a) trabalhar mostrando que o tempo indica o momento de
ocorrência da situação expressa como anterior, simultânea ou posterior em relação ao
momento da fala; b) as noções temporais que cada tempo verbal pode exprimir; c) uso
textual dos tempos.
Sugestão de atividade:
She has lost weight.
Mulher conferindo o peso
1. Observe a ilustração acima, atente para o texto verbal que a segue e responda as
perguntas:
a) Quantos personagens há na ilustração?
b) O que acontece na ilustração?
c) Que conclusão você pode tirar dos dois momentos retratados na imagem?
Espera-se com o item ‘b’ que o aluno, dentre outras leituras possíveis, perceba que a
ilustração retrata dois momentos distintos, e que com o item ‘c’ explicite a perda de peso
da figura feminina. E, muito provavelmente, ele o dirá em português, e quando solicitado a
fazê-lo em inglês, ele utilizar-se-á do presente simples (na forma flexionada ou não) – She
lose*
25
(s) weight - ou do passado simples (na forma flexionada ou não) She lose*/losed*
(lost) weight.
25
* Formas gramaticalmente incorretas na variante padrão da língua inglesa
Independentemente da forma verbal utilizada, essa produção preliminar do aluno já
indica que ele é capaz de utilizar a expressão lose weight, cabendo agora se apropriar do
tempo verbal adequado para a situação comunicativa em foco. Aqui nossa seqüência se
desdobra mais uma vez para tentar dar conta das produções típicas dos alunos, que
refletem graus diferenciados de proficiência lingüística. Caso os alunos tenham elaborado
um enunciado no presente simples, flexionado ou não, propomos a atividade ‘d’, porém se
eles tiverem elaborado um enunciado utilizando-se do passado simples, com ou sem
flexão, propomos a atividade ‘e’.
d) Identifique a diferença entre:
She usually loses weight.
She lost weight last week.
She has lost weight.
O trabalho do professor seria perguntar e garantir que os
alunos entendam a situação comunicativa em que cada um
desses enunciados seria mais adequado:
situação habitual de alguém que sempre controla o seu
peso;
uma situação específica de perda de peso num tempo
determinado (semana passada);
uma situação específica de perda de peso num tempo
indeterminado, cujo foco está na perda de peso, e não no
quando o peso foi perdido.
e) Compare os enunciados abaixo e responda:
1) She has lost weight.
2) She lost weight when she was on diet.
Você pode dizer em qual tempo verbal estão as frases? Remetem ao presente, passado ou
futuro?
Nesse caso, cabe ao professor promover a percepção de que o 1º enunciado
expressa uma ação (perda de peso) que começou no passado e que continua a acontecer; já
o 2º remete à uma ação que aconteceu em um determinado tempo do passado (When she
was on diet- quando ela estava de dieta).
f) No texto do nosso cartum, encontramos o seguinte enunciado:
You’ve (have) put on another inch since last week.
f.1) Com qual dos enunciados acima, You’ve (have) put on ..., se assemelha?
f.2) O que o enunciado expressa? Espera-se, aqui, que o aluno diga que o menino vem
ganhado peso a cada semana.
f.3) Qual é a estrutura do tempo verbal utilizado acima? Aqui caberia ao professor destacar
a estrutura do tempo present perfect:
have (has) + participle (put on).
f.4) Como você diria, utilizando o mesmo verbo principal (put on), uma ação que
aconteceu em um determinado tempo do passado?
Além dessas atividades de linguagem, mais especificamente com conhecimento e
reflexão lingüística, outras duas (uma em relação à unidade de medida utilizada e uma em
relação ao pronome indefinido) são necessárias para compreensão da linguagem verbal
utilizada no cartum.
1. Trabalhando com a unidade de medida
a. Sabendo que inch é uma unidade de medida que equivale a 2,54 centímetros e
observando a situação descrita no cartum, reflita se a medida em centímetros é
adequada à situação?
b. Em sua opinião, existe uma outra unidade de medida mais adequada para a situação
do cartum? Qual?
c. Qual a intenção de usar uma medida que se refere a centímetros neste cartum?
2. Trabalhando com a função do pronome indefinido no contexto
a. Qual sentido melhor se aproxima do uso de another em You have put on another inch
since last week? Justifique:
( ) one more ( ) different.
b. Qual o efeito de sentido criado por ‘mais uma’ em oposição à ‘uma’ polegada?
Espera-se, no item ‘b’, que o aluno perceba que ‘mais uma’ pressupõe que o menino tenha
aumentado de peso na semana anterior, e que de lá para o momento da fala, tenha
“colocado mais uma polegada” (entenda-se aumentado seu peso)
26
.
Parece-nos oportuno trazer a posição de Cynthia & Drew Johnson (s/d, p.2), que
defendem que o ensino de vocabulário deva incluir 3 componentes: informação sobre a
definição e o contexto da palavra; múltiplas exposições da palavra em contextos variados
e encorajamento da ativa participação do aluno no seu aprendizado. À luz desse
posicionamento, ressaltamos que essa seqüência evidencia como o trabalho com o léxico
(linguagem verbal) pode ser feito, porém faltou-nos tempo para propiciar outras atividades,
que demandassem múltiplas exposições da palavra em contextos variados para another,
inch e put on, e que pudessem contribuir para o efetivo armazenamento dessas palavras.
Após esse trabalho específico de desenvolvimento de conhecimentos lingüísticos
26
Uma sugestão para futuras pesquisas é o trabalho com o humor a partir teoria da pressuposição.
viabilizado pela leitura, releitura e reflexão sobre o cartum, duas perguntas se fazem
necessárias num trabalho de educação lingüística, que permita ao aluno perceber como as
várias linguagens se integram e o papel desempenhado pelo conhecimento de mundo na
produção de sentido a todo e qualquer texto. Uma outra denominação utilizada pelos PCN
– LE, para essa fase do trabalho com as atividades de linguagem é ‘pós-leitura’.
Sugestão de perguntas:
a) Que modalidades de linguagens estão presentes no cartum?
b) É possível ler e interpretar esse cartum com base apenas na imagem (não verbal)?
c) É possível ler e interpretar esse cartum com base apenas na fala da mãe (verbal)?
e) Qual a importância do texto verbal e não verbal nesse ou em qualquer outro texto?
f. ) Pense em uma possível relação entre o verbal e o não verbal desse texto.
g) O cartum analisado cria humor? Se afirmativo, como?
h) Busque um cartum num jornal brasileiro escrito em português ou um na Internet escrito
em inglês, que trate de obesidade, e descreva o que você entende sem perder de vista o
papel das linguagens verbal e não verbal.
i) Mais adiante, faremos uma oficina de elaboração textual de elaboração de um cartum
que trate o tema obesidade infantil. Comece a pensar como você gostaria de criar o seu
próprio cartum. Trabalharemos juntos o inglês (linguagem verbal) na oficina.
j)Houve alguma mudança na sua opinião sobre a obesidade infantil? Permanece a mesma
que você tinha no início da seqüência? Se mudou, o que mudou, qual o motivo da
mudança?
5.4 MÓDULO 4 - COMPONENTES CONSTITUTIVOS DO GÊNERO
Nas atividades desse módulo objetivamos trabalhar cada constituinte do gênero. A
primeira atividade desse módulo se constitui em conscientizar o aluno dos constituintes do
gênero.
Propomos que as questões seguintes da nossa seqüência enfatizem as 3 dimensões
constituintes do gênero que segundo Bakhtin são construção composicional, tema e estilo.
5.4.1 A Construção Composicional
No que se refere ao estudo da construção composicional do cartum, um ponto
crucial é explicitar os elementos constitutivos do cartum assim como a função de cada um
deles.
5.4.1.1 A “voz” do cartum
O leitor deve estar lembrado que na seção ativação do conhecimento de mundo,
antecipamos a observação sobre quem fala no cartum, embora não tenhamos trabalhado
com os elementos constitutivos do gênero, o que é realizado a seguir.
Os balões
Os diálogos nos cartuns comumente apresentados em legendas ou balões
representam a fala ou os pensamentos dos personagens. Segundo Einster (2001, p. 149), os
diálogos contidos nos balões são repetidos dentro da cabeça do leitor. Ou seja, são as vozes
dos personagens. De acordo com o autor:
a primeira ação do leitor é passar os olhos pela página depois pelo
quadrinho. Se as imagens são pictoriamente muito instigantes ou
carregadas de detalhes, haverá uma tendência para uma leitura
superficial do texto do balão”.(Einster, 2001, p.149)
Sugestões de atividades:
1) Através de que recurso é mostrada a voz dos personagens no cartum?
2) Um outro recurso utilizado para representar a fala dos personagens dos cartuns são
balões. Pesquise em revistas em quadrinhos, revistas ou jornais, textos constituídos
por quadrinhos e verifique:
a) Através de qual(is) recurso(s) a fala, pensamentos e emoções dos personagens são
apresentados?
b) Quais os tipos de balões apresentados? Eles são uniformes? Qual o efeito de sentido
criado pelas diferentes formas dos balões?
c) Há legendas nos cartuns e qual a localização das mesmas?
d) Os balões são constituídos também por um elemento chamado rabicho, que, também,
pode apresentar diferentes formas:
1) Observe os quadrinhos da sua pesquisa e verifique a função do rabicho.
a) Se você fosse colocar a fala do personagem do cartum em análise em balões, qual
modelo de balão você criaria?Por quê?
b) No caso do 1º cartum apresentado para qual personagem o rabicho apontaria?
5.4.2. O tema
Como já mencionado, o tema refere-se ao que é dizível por meio do texto e é sempre
perpassado por uma ideologia.
Sugestão de atividades:
a) Qual o tema abordado no cartum? Justifique.
b) Na sua opinião por que o tema obesidade é tratado pelo cartunista?
c) Pela atitude da mãe do e do filho a obesidade é um problema que precisa de
tratamento?
d) Qual a visão da mãe do e do filho acerca da obesidade?
e) Como você justifica a atitude dos personagens?
f) Em sua opinião, há alguma crítica a algum valor da sociedade nesse cartum? Se
afirmativo, qual? Como essa crítica é apresentada no cartum?
5.4.3. O estilo
O estilo refere-se aos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais do Gênero.
Sugestão de atividade:
1)Observando o cartum acima, você diria que se trata de uma situação formal ou
informal? Que recursos (verbal ou não verbal) justificam sua resposta?
2) Como você classifica o texto do cartum? Justifique:
a) narrativo
b) descritivo
c) dialogal
d) argumentativo
3)De qual dos personagens é a “voz do texto”. Justifique:
4)Como você interpreta a postura da mulher em relação ao menino? O que os
gestos produzidos por ela representam para você?
5) Você pode dizer em qual tempo verbal está a frase? Remete ao presente, passado
ou futuro?
5.5. MÓDULO 5 - DO GÊNERO COMO OBJETO DE ESTUDO AO GÊNERO
COMO PRÁTICA SOCIAL
Como nos módulos anteriores desmembramos o cartum em dimensões ensináveis,
nesse último módulo visamos trabalhar o gênero, que para fins didáticos foi transformado
em objeto de ensino, em sua totalidade, a fim de verificar se houve compreensão do
gênero.
Sugestões de atividades:
1) Qual o tema abordado no cartum?
2) Como o tema foi trabalhado?
3) O cartum chama atenção para algum assunto abordado na mídia, na sociedade?
Podemos dizer que o cartum tem uma função social? Se afirmativo, qual?
4) Houve crítica a algum valor da sociedade? Como foi feita a crítica?
5) Você acha que diferentes culturas/sociedades possuem diferentes padrões de
beleza/estética?
6) Podemos dizer que o cartum é um texto humorístico? Se afirmativo, quais os
recursos que foram utilizados para produzir o humor?
7) Enumere as características peculiares desse gênero.
8) Crie você próprio um cartum, tratando do tema obesidade infantil
Por fim, vale ressaltar que esse trabalho de criação de um cartum deve ser,
parcialmente, realizado numa oficina de produção de cartum, à luz das sugestões nos
Referenciais Curriculares da Paraíba (2007, p.30), e subsidiar o trabalho pedagógico de
análise e reflexão lingüística e questões de linguagem (integração das linguagens,
coerência, ideologia).O trabalho interdisciplinar, com o professor de Artes, na exploração
da linguagem artística além de se alinhar às sugestões dos PCN – LE, mobilizaria, na
prática, a integração das várias linguagens na construção de sentido.
CONCLUSÃO
Nosso trabalho foi constituído de 3 objetivos i) caracterizamos o cartum com base
nas teorias de gêneros textuais;ii) analisamos as abordagens do gênero realizada em dois
livros didático e iii) elaboramos uma seqüência didática para o gênero cartum.
No que se refere ao primeiro objetivo constatamos que utilizando as teorias de
gêneros textuais caracterizamos o cartum considerando os três elementos constituintes do
gênero proposto por Bakhtin quais sejam: conteúdo temático, estilo e construção
composicional.
No que se refere ao segundo objetivo, analisamos a abordagem do cartum em 2
livros didáticos ( um de língua materna e um de língua estrangeira). Verificamos que
apesar de ainda não contemplar todos os constituintes do gênero propostos por Bakhtin, o
livro de língua portuguesa apresenta atividades de linguagem que vão ao encontro dos
postulados dos PCN para o ensino de português. No entanto, algumas questões apresentam
falhas ao antecipar a resposta para o aluno. Já no livro de língua estrangeira, percebemos
que não há nenhum trabalho com o gênero, não sendo sequer apresentado numa seção de
leitura e tendo sua presença no livro apenas o objetivo de trabalhar o modo imperativo.
Podemos dizer que a seqüência didática proposta procurou desenvolver cada uma
das capacidades necessárias a um usuário criticamente letrado. De acordo com Dolz,
Pasquier e Bronckart (1993 apud Dolz & Schneuwly 2004, p.74), as atividades de
linguagem implicam o desenvolvimento de diversas capacidades por parte do sujeito:
capacidade de ação, discursiva e lingüístico-discursiva. No que se refere à capacidade de
ação (capacidade de adaptar-se às características do contexto e do referente) foram
contempladas as representações da situação apresentada no cartum, houve contextualização
da situação comunicativa, das condições de produção do cartum, reflexão sobre o tema
obesidade infantil e valores da sociedade ocidental contemporânea.
No que se refere à capacidade discursiva (capacidade de mobilizar modelos
discursivos) propusemos atividades relacionadas à caracterização e função do gênero. Para
isso nos baseamos nas teorias de gêneros de Bakhtin.
No que se refere à capacidade lingüístico-discursiva (dominar as operações
psicolingüísticas e as unidades lingüísticas) desenvolvemos atividades de linguagem de
uma perspectiva descritivo-reflexiva interarticulando as linguagens verbal e não verbal. No
que tange à linguagem não verbal, nosso foco recaiu sobre o balão, rabicho (elementos
constituintes do cartum) bem como feições faciais, a disposição da imagem, personagens e
fita métrica. No que tange à linguagem verbal, elaboramos atividades que pudessem dar
conta da linguagem verbal do cartum principal (marcador de elogio, unidade de medida, o
efeito criado pelo uso do pronome indefinido, que permite ao leitor pressupor que o
menino já tinha aumentado de peso na semana anterior, suposição confirmada pela escolha
do tempo verbal. Explanamos, ainda, o humor criado na confluência das linguagens verbal
e não verbal e pela inversão do lugar comum, da lógica pelo cartunista, visando à
elaboração de um cartum por parte do aluno num trabalho integrado com a disciplina de
Artes que possa auxiliar na mobilização e interarticulação das linguagens na produção de
sentidos.
Na elaboração dessa seqüência didática centrada no cartum procuramos também
contemplar os 3 princípios que Dolz e Schneuwly (op.cit, p.81) sugeriram para a
elaboração de um modelo didático: legitimidade (referência aos saberes teóricos
elaborados por especialistas sobre o gênero escolhido); pertinência (referência às
capacidades dos alunos, às finalidades e aos objetivos da escola, aos processos de ensino
aprendizagem) e solidarização [solidificação dos saberes] (que se refere a tornar coerentes
os saberes em função dos objetivos visados). Nossa proposta além de procurar ensinar a
língua inglesa através do gênero cartum, constituiu-se de atividades de linguagem que
proporcionam uma reflexão sobre preocupações com saúde, valores e padrões de beleza da
sociedade ocidental contemporânea.
Em nosso trabalho apesar de trabalharmos com um gênero considerado complexo
por articular fatores sócio histórico ideológicos que demandam grau de letramento crítico
do leitor procuramos fazer uma abordagem que se adequasse ao público de 8ª série do
Ensino Fundamental. Para isso escolhemos um tema contemplado pelos PCN Temas
Transversais.
Podemos dizer que a seqüência didática cumpriu os objetivos visados, quais sejam:
produzir sentido na leitura de cartuns; promover compreensão dos cartuns a partir de uma
abordagem baseada nas teorias de gêneros textuais; discutir o tema obesidade infantil.
Nossa proposta contempla os pontos que subsidiam a elaboração de uma seqüência
didática. Em síntese, nossa seqüência possui: i) os princípios teóricos subjacentes ao
procedimento e ii) à articulação entre o trabalho na seqüência e outros domínios do ensino
de língua: textualização, questões de gramática e sintaxe. (Dolz &Schneuwly, 2004 p.108-
115).
A seqüência didática elaborada veio ao encontro do PCN-LE do Ensino
Fundamental uma vez que tais documentos postulam a necessidade de (re)pensar o ensino
de língua materna e estrangeira à luz das teorias de linguagem, letramento, objetivando
contribuir para a formação de um usuário competente da linguagem, capaz de agir
discursivamente num mundo globalizado, cujas práticas de linguagem, atualmente, se
realizam pela língua inglesa.
A hipótese de que uma seqüência didática centrada no gênero cartum no ensino
fundamental de língua inglesa poderia contribuir para a formação do aluno brasileiro capaz
de agir discursivamente na e pela língua estrangeira, como preconizado pelos PCN, só
poderá ser confirmada quando de sua aplicação da proposta, por outros professores.
A seqüência elaborada tenta fazer a transposição didática dos PCN e Referenciais
Curriculares da Paraíba. Acreditamos ter obtido êxito nesse trabalho. Acreditamos também
que muitas outras propostas de ensino possam ser apresentadas e sugerimos a elaboração
de outras seqüências, utilizando outros gêneros, outro público para que cada vez mais a
distância entre teoria e prática diminua no ensino de língua estrangeira do Brasil. A função
da escola está em possibilitar que o aluno conheça e domine diversas formas de realizar
diversas ações de linguagem. Relacionando com a nossa seqüência podemos dizer que o
ensino de língua estrangeira centrado no cartum é uma maneira de proporcionar ao aluno o
contato com gêneros correntes em seu cotidiano e mostrar o uso e função da linguagem
neste gênero.
Vale ressaltar que o embrião da seqüência elaborada nesse trabalho surgiu há mais
de 5 anos quando na posição de professora de inglês em uma escola estadual de ensino
fundamental da Paraíba e aluna de graduação do curso de Letras da UFCG, procurava
transpor os conhecimentos teóricos apresentados nas aulas para o meu trabalho. A
principio utilizando mais da pouca experiência de sala de aula e o interesse dos alunos, mas
cada vez mais procurando unir teoria e prática.
A partir do trabalho enquanto professora, cada vez mais sentia a necessidade de
tornar meu trabalho relevante e acredito que isso acontece com muitos outros professores e
professoras, que comprometidos com a educação, estão sempre abertos ao estudo no
sentido de procurar aprimorar seu trabalho sendo imprescindível para esse aprimoramento,
a formação continuada dos professores.
REFERÊNCIAS
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BEZERRA, Maria Auxiliadora. Textos: Seleção variada e atual. In DIONÍSIO, Ângela
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ZUENGLER, J; MILLER, E. Cognitive and Sociocultural Perspectives: Two Parallel SLA
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ANEXOS A
Cartuns dos livros didáticos analisados
ANEXOS B
Cartum utilizado na elaboração da seqüência didática
Cartum de Quino
Cartum sobre a sabedoria
Cartum para abordagem do Modo Imperativo
Cartum sobre obesidade infantil
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
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