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É-me difícil falar, com precisão, sobre o que me ocorreu intelectualmente há tantos
anos, mas conservo a impressão de que desse estudo derivou-se um senso de
interdependência e unidade relacionada que deu forma a impulsos intelectuais que
haviam permanecidos incompletos, e criou um certo tipo ou modo de ver as coisas
em função do qual deveria conformar-se qualquer material em qualquer campo.
Subconscientemente, pelo menos, fui levado a desejar um mundo e uma vida com as
mesmas propriedades do organismo humano numa imagem derivada do estudo do
darwinismo conforme o tratamento de Huxley. De qualquer modo, obtive mais
estímulo desse estudo do que de qualquer outro contato tido antes e, como nenhum
desejo foi despertado em mim para continuar nesse ramo particular de
conhecimento, eu dato desse tempo o despertar de um interesse filosófico distinto
(AMARAL, 1990, p. 40).
Esta iniciação foi o primeiro apoio sólido para sua fé na unidade da vida democrática,
não esquecendo que essa fé surgiu de seu ambiente familiar e fruto da organização
democrática da comunidade congregacionalista.
Augusto Comte também o influenciou intelectualmente com a idéia da necessidade de
encontrar uma função social para a ciência como meio de evitar a desorganização da vida
social existente, ou seja, a necessidade do homem assegurar-se dos resultados da ação através
do método científico.
Além da influência de Comte, Dewey também foi influenciado por Hegel, e na
Universidade Johns Hopkins pôde extrair da filosofia hegeliana o alimento intelectual para a
consolidação de sua fé na unidade do mundo tornando-se seu seguidor, mais tarde rejeitando-
o, mas proclama que o filósofo deixou marcas permanentes em seu pensamento. Em suas
narrações Dewey explica as razões de sua inclinação:
Há, contudo, razões subjetivas para o apelo que o pensamento de Hegel fez a mim.
Ele satisfez a necessidade de unificação que, sem dúvida, era um desejo emotivo
intenso ou mesmo um apetite que somente podia ser satisfeito pelo alimento
intelectual. É mais do que difícil, é mesmo impossível reviver aquela antiga
disposição. Mas o sentido das divisões e separações que, suponho eu, me foram
impostas como conseqüência da herança cultural da Nova Inglaterra, divisões
expressas pelo isolamento do eu em relação ao mundo, da alma em relação ao corpo,
da natureza em relação a Deus, ocasionou um doloroso sentimento de opressão ou
melhor uma dilaceração interna. Meus primeiros estudos filosóficos tinham sido
uma ginástica intelectual. A síntese hegeliana do sujeito e do objeto, da matéria e do
espírito, do divino e do humano não era, contudo, mera forma intelectual; ela
operava em mim como um alívio imenso, uma liberação (AMARAL, 1990, p. 43).
A síntese entre ideal e real para Hegel não seria uma fórmula intelectual, mas um
imenso desejo emocional de unificação sendo um apoio racional, mas que adquire força
preenchendo suas aspirações de unidade, e é nesse sentido que Hegel deixou uma marca
permanente no pensamento de John Dewey.