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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC - SP
Maria Célia da Silva Orlando
A coerência e a coesão nas redações dos alunos do Ensino
Médio sob a perspectiva da Lingüística Sistêmico - Funcional
MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA
LINGUAGEM
SÃO PAULO
2008
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ii
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC - SP
Maria Célia da Silva Orlando
A coerência e a coesão nas redações dos alunos do Ensino
Médio sob a perspectiva da Lingüística Sistêmico - Funcional
MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA
LINGUAGEM
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em
atendimento à exigência parcial para obtenção do
título de Mestre em Lingüística Aplicada e Estudos
da Linguagem.
Orientadora: Profª. Dra. Sumiko Nishitani Ikeda.
SÃO PAULO
2008
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iii
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
____________________________________
____________________________________
iv
À família Orlando da Costa, por
cultivar a valorização da ética, a
dedicação ao trabalho e o amor
ao próximo.
v
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela força espiritual e por permitir a realização deste trabalho.
À PUC-SP, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pela contribuição
intelectual.
À minha querida orientadora, Profª Dra. Sumiko Nishitani Ikeda, pelos
preciosos ensinamentos e pela paciência incondicional.
À Profª Dra. Maria Antonieta Alba Celani, idealizadora do ‘Projeto Reflexão
Sobre a Ação’ do qual tive o privilégio de participar, por ter possibilitado uma
inesquecível viagem pela História da Lingüística Aplicada.
À Profª Dra. Rosinda de Castro Guerra Ramos, membro da Banca de
Qualificação, pelas sugestões e questionamentos enriquecedores.
À Profª Dra. Tânia Regina de Souza Romero, membro da Banca de
Qualificação, pelo incentivo que despertou o desejo de realização do curso de
Mestrado, e pelas valorosas sugestões que contribuíram para a finalização desta
pesquisa.
Aos mestres do Programa de Pós-Graduação em Lingüística Aplicada e
Estudos da Linguagem, da PUC-SP, com os quais tive a oportunidade de ampliar
meus conhecimentos.
Aos colegas com os quais compartilhei conhecimentos e experiências
indispensáveis para nosso amadurecimento profissional.
Às secretárias Márcia e Maria Lúcia, pela amizade, carinho e dedicação.
E por último, mas não menos importante, à minha família cujo apoio, carinho
e força foram imprescindíveis nas horas mais difíceis.
vi
Epígrafe
“Assim, como os objetos visíveis
só são vistos, quando o Sol brilha
sobre eles, a verdade só é
aprendida, quando iluminada
pelas idéias do bem”.
(Platão)
vii
A coerência e a coesão nas redações dos alunos do Ensino Médio
sob a perspectiva da Lingüística Sistêmico - Funcional
RESUMO
Esta pesquisa tem como objetivo examinar textos dissertativo-argumentativos,
produzidos por alunos da 1ª série do Ensino Médio da Rede Pública, do período
noturno, motivada pela proposta da Secretaria Estadual da Educação sobre a
necessidade de elevação dos índices nos resultados dos exames do Sistema de
Avaliação e Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – SARESP - e pela
preocupação dos próprios alunos em melhorar o nível de suas produções escritas
com vistas às vagas da universidade e do mercado de trabalho. O corpus desta
pesquisa é composto de 70 redações das quais foram selecionadas duas para
análise, considerando os seguintes critérios: recenticidade, tema idêntico. Para a
análise dos dados deste estudo qualitativo, buscamos apoio, basicamente, na
Lingüística Sistêmico-Funcional, através de Halliday & Hasan (1976), Halliday &
Hasan (1989) e Eggins (1994), além de contribuições mais recentes que têm
enriquecido as noções de coesão e de coerência. Assim, as redações são
analisadas em relação à coerência por meio das noções de contexto cultural e
contexto situacional e, em relação à coesão, pela manutenção dos participantes, da
seleção lexical e do uso das conjunções. Os resultados demonstraram que a não
observância dos referidos critérios pode explicar a razão dos textos examinados
carecerem de coerência e de coesão, o que prejudica a argumentação delineada
pelo seu autor.
Palavras-chave: Lingüística Sistêmico-Funcional, coerência, coesão, texto
dissertativo-argumentativo.
viii
The coherence and cohesion in the writing of High School students
under the view of Systemic Functional Linguistics
ABSTRACT
This study aims to investigate argumentative essays written by second grade
students attending the first year of evening classes in a public high school in Sao
Paulo. The factors which have led me to do this research are two: the proposal made
by the State Secretary of Education through the necessity to rise the level of the test
grades administered by the School Achievement Assessment System of the State of
Sao Paulo (SARESP), and students’ concern to improve their writing skills so as to
get into university and the labor market. The corpus of this research consists of 70
argumentative essays, two of which have been chosen for the analysis. The criteria
used for the analysis are recentness and sameness of theme. For the analysis of the
data of this qualitative study we have drawn upon the Systemic Functional Linguistics
of Halliday & Hasan (1976), Halliday & Hasan (1989) and Eggins (1994), as well as
on more recent researches which have enriched the notions of cohesion and
coherence. Thus, as far as text coherence is concerned, its analysis has been carried
out by taking into account the notions of cultural and situational contexts. The
analysis of text cohesion, on the other hand, has been made by observing lexical
choice, maintenance of participants and use of conjunctions. The results have shown
that the non-observance of those criteria may explain why the texts examined lacked
both coherence and cohesion, which affects the argumentative effect desired by the
author.
Keywords: Systemic Functional Linguistics, coherence, cohesion, argumentative
texts.
ix
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Argumentação formal .......................................................................... 12
Quadro 2 - Tipos de estrutura do texto dissertativo-argumentativo....................... 14
Quadro 3 - A textura, a estrutura e o contexto de situação ................................... 28
Quadro 4 - Textos ilustrativos de elos coesivos..................................................... 29
Quadro 5 - Identificação do N-Rema..................................................................... 58
Quadro 6 - Tipos de coesão .................................................................................. 66
Quadro 7 - Verificação da coerência de Gênero - Texto 1 .................................... 68
Quadro 8 - Manutenção dos participantes e Progressão Temática - Texto 1........ 72
Quadro 9 - Verificação da coesão - Texto 1 .......................................................... 75
Quadro 10- Verificação da coerência de Gênero - Texto 2 .................................... 79
Quadro 11- Manutenção dos participantes e Progressão Temática - Texto 2........ 83
Quadro 12- Verificação da coesão - Texto 2 .......................................................... 85
x
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..................................................................................................... 1
1 APOIO TEÓRICO........................................................................................... 5
1.1 O Texto, a Lingüística Textual e a Análise do Discurso.................... 5
1.1.1 O texto dissertativo-argumentativo............................................... 11
1.1.2 A Estrutura Problema-Solução..................................................... 14
1.2 A Lingüística Sistêmico-Funcional ..................................................... 17
1.2.1 O texto na Lingüística Sistêmico-Funcional ................................. 19
1.2.1.1 Unidade de Estrutura...................................................... 20
1.2.1.2 Unidade de Textura ........................................................ 23
1.3 A Coesão na Lingüística Sistêmico-Funcional .................................. 26
1.3.1 O elo coesivo ............................................................................... 29
1.3.2 Coesão e Coerência no Discurso................................................. 33
1.3.2.1 Tipos de elo coesivo ....................................................... 34
1.3.2.2 A inseparabilidade entre coesão e coerência ................. 37
1.3.2.3 Exófora em lugar de endófora ........................................ 41
1.3.2.4 O frame e a coerência .................................................... 48
1.4 A relação entre coerência e coesão.................................................... 50
1.5 Progressão Tópica................................................................................ 51
1.5.1 A Progressão Temática................................................................ 53
1.5.1.1 O Contrato Dado-Novo................................................... 55
1.5.1.2 A Máxima da Antecedência ............................................ 56
1.6 N-REMA.................................................................................................. 57
2 METODOLOGIA............................................................................................. 59
2.1 Dados..................................................................................................... 59
2.1.1 Caracterização da Escola ............................................................ 59
2.1.2 Os sujeitos da pesquisa............................................................... 60
2.1.3 Procedimentos metodológicos para coleta de dados................... 61
2.1.4 Modelo de estrutura ..................................................................... 64
2.2 Procedimentos metodológicos de análise dos dados....................... 65
xi
3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................ 67
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 88
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 89
1
A coerência e a coesão nas redações dos alunos do Ensino Médio sob a
perspectiva da Lingüística Sistêmico - Funcional
INTRODUÇÃO
Desde 1992, ano em que ingressei no quadro de funcionários da Secretaria
da Educação do Estado de São Paulo, da Diretoria de Ensino Sul 2, leciono Língua
Portuguesa aos alunos do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio: a princípio em
uma escola do Jardim das Rosas, onde permaneci por três anos e, atualmente, em
uma escola do Parque Maria Helena, ambas localizadas na Zona Sul, região de
Santo Amaro.
Nos últimos dez anos, na Unidade Escolar do Parque Maria Helena, tenho
trabalhado com alunos dos 1º e 2º anos do Ensino Médio, a produção e a análise de
textos escritos, com vistas aos exames vestibulares universitários. Esse trabalho
possibilitou a realização de um diagnóstico dos problemas nucleares presentes na
composição dos parágrafos das redações produzidas pelos alunos, e que
comprometem a coesão e a coerência textual. Por isso decidi-me por desenvolver
um trabalho mais focalizado nestes dois itens, objetivando buscar meios para auxiliar
os alunos a perceber, não só como se realiza o processo coesivo de suas redações,
mas também a coerência dos textos produzidos.
Nesta pesquisa, examino a coerência e a coesão de textos dissertativo-
argumentativos escritos por alunos do 1º ano do Ensino Médio, do período noturno.
Quanto ao nome ‘dissertativo-argumentativo’, devo esclarecer que, embora haja
autores que distingam argumentação de dissertação, sigo a opinião de Cereja &
Magalhães (2003), que dizem que os exames vestibulares do país solicitam aos
candidatos a produção de textos dissertativos, mas, na verdade, pela natureza
polêmica dos temas, quase sempre o que se espera do candidato é que ele produza
um texto argumentativo ou dissertativo-argumentativo, i.e., um texto em que o autor
analise e discuta um problema da realidade, defenda seu ponto de vista e, às vezes,
proponha soluções. Portanto, adoto aqui o termo ‘texto dissertativo-argumentativo’.
Introdução
2
Beaugrange e Dressler (1981: 3) dizem que, para que o texto seja uma
ocorrência comunicacional, ele deve satisfazer a um conjunto de critérios
interdependentes (1) coesão: perceptível pelo jogo de interdependências entre as
frases; (2) coerência: remete para a intenção global do texto, fundamental para a
textualidade. Ambas promovem a inter-relação semântica entre os elementos
textuais, respondendo pela conectividade textual.
Também Indursky (2006: 47) afirma a importância da coesão e da coerência
para o exame da textualidade, propriedade intrínseca de um texto, e esses conceitos
representam o cerne dos estudos textuais para essa área de conhecimento. Por
outro lado, a assim chamada Lingüística Textual começou a perceber que o texto,
além de ser uma superfície que pode ser examinada em relação aos seus fatores de
coesão e de coerência, é também um ato comunicativo. Os lingüistas admitem o fato
de que para estudar o texto é preciso examinar relações que ultrapassam o limite do
texto propriamente.
Dentro dessa perspectiva, Bednarek (2005) refere-se à diferença entre
coesão e coerência. A coesão é uma propriedade de textos e refere-se aos meios
lingüísticos para prover ‘textura’, i.e., liga as sentenças de um texto, tal como a
referência, a substituição, a elipse, a reiteração, a colocação e a conjunção, de
Halliday e Hasan (1976), os padrões do léxico, de Hoey (1991). Nesse sentido, ela
está de acordo com Halliday & Hasan (1976), para quem a coesão é um fenômeno
semântico (1976), ou seja, requer que os traços morfológicos da anáfora pronominal
combinem com os da expressão antecedente, isto é, do seu referente. Já, para
Cornish (2003: 1-26), essa requisição não é necessária, especialmente no discurso
falado. Nos casos em que não existe antecedente co-textual relevante, podemos
trabalhar, propõe ela, com a chamada 'exófora' que a autora afirma funcionar
essencialmente do mesmo modo que a endófora padrão.
Quanto à coerência, Bednarek julga que esse conceito seja mais bem descrito
como um fenômeno que envolve conexão semântica, lógica ou cognitiva, que está
subjacente ao texto (cf. Beaugrande & Dressler (1981: 4); Bussmann (1996: 80);
Thompson & Zhou (2000: 121). Ao invés de supor que essas conexões existam
independentemente do falante ou do ouvinte, a coerência é hoje claramente definida
em relação à contribuição do ouvinte: “[...] a coerência é somente mensurável em
termos da avaliação do leitor” (Hoey, 1991: 11).
Introdução
3
Para a análise dos dados desta pesquisa, busco apoio, basicamente, na
Lingüística Sistêmico-Funcional, através de Halliday & Hasan (1976), Halliday &
Hasan (1989) e Eggins (1994), que traça uma visão ampla dos escritos de Halliday,
de 1973 a 1985, além de contribuições que em data mais recente têm enriquecido
as noções de coesão e de coerência. Segundo Eggins, o texto é o resultado da
coerência contextual - Gênero e Registro - e da coesão, elos semânticos através dos
quais cada parte do texto depende de outras para sua interpretação. Portanto, as
redações serão analisadas em relação à coerência, com base nas noções de
contexto cultural e contexto situacional, e em relação à coesão, verificando-se os
elos semânticos por meio da manutenção dos participantes, da seleção lexical e do
uso das conjunções.
O objetivo desta dissertação é examinar a coerência e a coesão de textos
dissertativo-argumentativos produzidos, durante o ano letivo de 2007, por alunos do
1º ano do Ensino Médio, do período noturno, de uma Escola Pública Estadual,
localizada na Zona Sul do Estado de São Paulo. Para tanto, deverá responder às
seguintes perguntas de pesquisa:
(a) quais os elementos de estrutura de Gênero e de Registro que não são usados
pelos alunos e comprometem a coerência das redações?
(b) quais os elementos coesivos que por faltarem nos textos contribuem para
diminuir a textura das redações?
Justificativa da pesquisa
Dentre as motivações para a escolha do tema desta pesquisa posso citar
duas que foram de fundamental importância. A primeira decorre da discussão da
proposta da Secretaria Estadual da Educação sobre e na necessidade da criação de
metas para a elevação dos índices nos resultados dos exames do Sistema de
Avaliação e Rendimento Escolar do Estado de São Paulo, o SARESP. A segunda,
diz respeito à preocupação dos próprios alunos, principalmente os do Ensino Médio,
em melhorar o nível de suas produções escritas para poderem obter êxito em testes
de seleção para as vagas da universidade e do mercado de trabalho. Mais do que
isso reside no fato de que o exercício pleno da cidadania depende do conhecimento
Introdução
4
da língua, como nos lembram os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1997:
23).
O domínio da língua tem estreita relação com a
possibilidade de plena participação social, pois é por meio
dela que o homem se comunica, tem acesso à informação,
expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói
visões de mundo, produz conhecimento.
5
1 APOIO TEÓRICO
Inicio o apoio teórico que embasa a minha pesquisa, tratando em primeiro
lugar do conceito de texto, mencionando os trabalhos, entre outros, de Rasia (2005:
21-22), que faz um retrospecto da trajetória dos estudos do texto do século XII ao
XIV; de Indursky (2006: 44-47), que traça a distinção entre a fase Transfrástica e a
Gramática do Texto; de Koch (2002: 16-17), que trata o texto como um produto do
pensamento a ser decodificado pelo leitor; de Karnopp (2006: 19-20), que fala da
Teoria do Texto, como uma investigação do funcionamento de textos em uso, com
base na análise das condições de produções e recepção textuais; e de Cornish
(2003), que relaciona texto e discurso ao contexto de uso. Essa relação entre língua
e contexto é imprescindível para a Lingüística Sistêmico-Funcional, que embasa a
minha análise. Feito isso, examino os caminhos percorridos pelas noções de
coerência e coesão desde de Halliday & Hasan (1976, 1989) até os nossos dias,
como esclareço mais adiante.
1.1 O Texto, a Lingüística Textual e a Análise do Discurso
De acordo com Rasia (2005: 21), demarcamos como espaço de fundação do
conceito de texto o contexto do século XII, quando o significado literal da palavra era
o ‘livro do evangelho’. Por estarem associados ao campo do sagrado e à concepção
do que se tinha por sagrado na época; os sentidos tinham uma interpretação pré-
dada e estável. É somente no século XIV que surge a figura do interpretante, o
mestre que coloca em questão as leituras para, depois disso, chegar à suposta
verdade final.
Essa visão em torno da matéria escrita legou-nos o modo como o objeto texto
vem sendo tratado, desde então, e mais especificamente no contexto escolar, não
obstante as diversas teorias que dele têm tratado, com ênfase na questão da
interpretação. Ainda, afirma a autora, as teorias contemporâneas têm abordado a
questão do texto e da textualidade a exemplo da Lingüística Textual, de berço
europeu, em contraponto com o postulado teórico da Análise do Discurso, da escola
francesa, cujo advento se deu no final da década de 60, em meio às lutas políticas
desencadeadas na França.
Apoio teórico
6
Segundo Rasia (2005), o conceito de texto pode ser sintetizado, no âmbito da
Lingüística Textual, como uma unidade de linguagem em uso e que leva em conta
as intenções de seu produtor, implicando para sua constituição enquanto texto, a
história de leitura de seus interlocutores. Em linhas gerais, a Lingüística Textual
concebe o texto como uma extensão da frase e, além disso, considera alguns
elementos do contexto de produção que constituem os fatores de textualidade.
Já no âmbito da Análise do Discurso, declara a autora, o texto é visto na
concepção da linguagem em interação, ou seja, considerando as relações
estabelecidas pelos interlocutores. Assim, o discurso inscreve-se no espaço situado
entre a língua, que emerge do social, e a fala de caráter individual. O discurso é o
próprio lugar social e a linguagem passa a ser entendida como processo da
construção dos sentidos. Por esse ponto de vista, trabalhar com textos significa
mexer com discursos de forma que o lingüístico não deixa de ser matéria de
trabalho, porém é considerado em suas determinações histórico-sociais e nas
formas como essas determinações são manifestadas pela língua.
Ainda, de acordo com Rasia, o ponto de vista da Análise do Discurso
diferencia-se daquele da Lingüística, posto que, enquanto esta tem como objeto a
língua em sua imanência, aquela tem o discurso como objeto de análise, o qual tem
sua materialidade na língua que tece os diferentes textos. A diferença entre ambos
reside no aspecto conceptual, pois, o discurso é tomado como conceito teórico e
metodológico, e o texto, em contrapartida, como o conceito analítico correspondente,
havendo entre eles uma relação necessária.
Rasia (2005) elabora a questão, dizendo que, se consideradas as condições
de realização de um texto, ele pode ser visto como uma unidade completa de
análise, a qual não é formal, mas pragmática. Unidade completa porque se
apresenta como ponto de convergência para o processo de comunicação, para onde
se dirige a perspectiva dos interlocutores, e também ponto de partida para a
recuperação dos processos discursivos, a partir da materialidade que ele propõe. O
discurso, por sua vez, realiza-se na relação dialógica texto-interlocutores, à medida
que estes últimos agem sobre os diferentes textos em suas diferentes formas,
produzindo efeitos de sentidos diversos.
Nessa linha de raciocínio, Indursky (2006: 44-52) diz que os precursores dos
estudos textuais tinham como objetivo as regularidades que transcendem a frase,
Apoio teórico
7
sem abandonar os estudos frasais nem criar um novo objeto de estudo. Entendiam o
texto como uma seqüência coerente de frases, fase conhecida como Transfrástica.
Num segundo momento, fase que se denominou de Gramática do Texto, diz a
autora, os pesquisadores buscaram o entendimento do texto, indo para além dos
limites descritivos de uma única frase. Estudavam-se as relações referenciais, co-
referenciais e de pronominalização, buscavam transferir para o objeto texto o
conhecimento sobre o objeto frase, ou seja, pretendiam escrever uma gramática
para explicar certos fenômenos que se instauravam para além do limite frasal. Para
tanto, questionavam os princípios de constituição do texto, os fatores de sua
coerência, de sua coesão e de sua textualidade. Diziam que havia diferença
qualitativa de significação que derivava do todo textual da qual a soma de frases não
dava conta.
Para Indursky (2006: 22), pode-se dizer que a unidade da análise de discurso
é o texto, uma unidade significativa. Reconhece-se um texto pela textualidade que,
por sua vez, é função da relação do texto consigo mesmo e com a exterioridade. A
autora declara que não são as palavras que significam, mas é o texto que é dotado
de sentido. Quando uma palavra possui significado é porque ela tem textualidade,
ou seja, é porque sua interpretação deriva de um discurso que a sustenta, que a
provê de realidade significativa. Dessa forma, considerando o ponto de vista de sua
apresentação empírica, um texto é um objeto com começo, meio e fim; mas do ponto
de vista do discurso reinstala-se, imediatamente, sua incompletude. Isso ocorre
porque o sujeito, o discurso e os sentidos também são incompletos, dependem da
relação com outros elementos para serem considerados unidade inteira.
Também para Koch (2002:16-17), na concepção de língua como
representação do pensamento e do sujeito, o texto é visto como um produto lógico
do pensamento do autor, cabendo ao leitor/ouvinte ‘captar’ essa representação
mental, juntamente com as intenções do produtor. Na concepção tradicional de
língua como código, diz ela, como instrumento de comunicação e da concepção de
sujeito como pré-determinado pelo sistema, o texto é visto como simples produto da
codificação de um emissor a ser decodificado pelo leitor/ouvinte, bastando a este,
para tanto, o conhecimento do código, já que o texto codificado é totalmente
explícito. Nesta concepção o papel do ‘decodificador’ é essencialmente passivo.
Apoio teórico
8
Segundo Koch (2002), na concepção interacional da língua, na qual os
sujeitos são vistos como atores-construtores sociais, o texto passa a ser considerado
o próprio lugar da interação e os interlocutores como sujeitos ativos, nele se
constroem e são construídos. Desta forma, há lugar no texto para toda uma gama de
implícitos dos mais variados tipos, somente detectáveis quando se tem, como pano
de fundo, o contexto sócio-cognitivo dos participantes da interação.
Adotando-se esta concepção de língua, de sujeito, de texto, a compreensão
deixa de ser entendida como simples captação de uma representação mental ou
como a decodificação da mensagem resultante de uma codificação de um emissor.
É uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se
realiza com base nos elementos lingüísticos presentes na superfície textual e na sua
forma de organização, mas que requer a mobilização de um vasto conjunto de
saberes e sua reconstrução no interior do evento comunicativo.
Para a autora, o sentido de um texto é construído na interação texto-sujeito ou
co-enunciadores e não como algo que preexista a essa interação. Também a
coerência deixa de ser vista como mera propriedade ou qualidade do texto,
passando a dizer respeito ao modo como os elementos presentes na superfície
textual, aliados a todos os elementos do contexto sócio-cognitivo mobilizados na
interlocução, vêm a constituir uma configuração veiculada de sentidos.
De acordo com Karnopp (2006: 19-20), a Lingüística Textual é um ramo
recente da Lingüística, pois surgiu na década de 60, na Europa, onde teve grande
desenvolvimento a partir dos anos setenta, principalmente, na Alemanha. Desde
então, a Lingüística Textual vem apresentando ampla expansão, atravessando
diferentes fases e baseando-se em diferentes modelos teóricos, fato que
naturalmente liga-se à diversidade de abordagens.
Nos principais momentos do desenvolvimento de estudos da Lingüística
Textual, declara Karnopp, o que se observou foi, em primeiro lugar, uma
necessidade inadiável de ultrapassar os limites da frase, para dar conta de
fenômenos lingüísticos, tais como a referenciação, a relação semântica entre frases,
a seleção do artigo, a concordância dos tempos verbais, e assim por diante,
fenômenos que só podem ser explicados em termos textuais ou ligados a um
contexto situacional.
Apoio teórico
9
Quanto aos estudos de ordem estruturalista e gerativista, dizem Vilela e Koch
(2001: 444), mostraram-se insatisfatórias ao se dedicarem a pesquisar as regras de
encadeamento de seqüências maiores do que as frases, ou seja, em textos, a partir
de uma metodologia até então utilizada na análise sentencial. Por isso, suas
tentativas de desenvolver uma Lingüística Textual como uma Lingüística da Frase,
ampliada ou corrigida, acabaram sendo abandonadas. As autoras informam também
ter, assim, ficado claro que as diferenças entre texto e frase eram de aspecto
qualitativo, e os estudiosos começaram a elaborar as gramáticas textuais, tendo o
objetivo de refletir sobre fenômenos textuais.
Karnopp (2006) afirma que, na década de setenta, muitos autores se
dedicaram a refletir sobre fenômenos não explicáveis através da gramática
sentencial, propondo que, a partir do texto, fossem analisadas e classificadas as
unidades menores, desde que não se perdesse de vista a função textual dos
elementos isolados.
De acordo com a autora, com o passar dos anos, observou-se que as
gramáticas do texto eram ineficientes para o estabelecimento das regras que
poderiam descrever todos os textos possíveis em uma língua natural. Como explicar,
por exemplo, textos que não se enquadravam nas regras propostas pela gramática
do texto? O que é texto e o que o distingue de uma frase ou de um conjunto de
frases? Surge, a partir desses questionamentos, a necessidade de investigar a
constituição, o funcionamento, os processos de produção e recepção textuais. Os
textos passam a ser investigados, considerando o contexto, e observadas as
condições externas à produção, ou seja, os processos de interpretação, de produção
e de recepção textuais.
O foco das investigações, continua a autora, passou a ser a Teoria do Texto
havendo, conseqüentemente, mudanças em relação à concepção de língua,
considerada, não mais como sistema virtual, mas língua como uso efetivo em
contextos comunicativos. As concepções de texto, não mais visto como produto,
mas como um processo e aos objetivos a serem alcançados, ou seja, a análise e
explicação de unidade texto em funcionamento, ao invés da análise e explicação da
unidade texto formal, abstrata.
Dessa forma, diz Karnopp, a partir do momento em que a Lingüística Textual
passou a enfocar o contexto no funcionamento e no processamento lingüísticos,
Apoio teórico
10
houve um deslocamento do tratamento formal dos textos, passando a prevalecer a
elaboração de uma Teoria do Texto que teve como propósito à investigação do
funcionamento de textos em uso, ou seja, a análise das condições de produções e
recepção textuais.
Travaglia (2006: 67) chama de discurso toda atividade comunicativa de um
locutor, numa situação de comunicação determinada, englobando não só o conjunto
de enunciados por ele produzidos em tal situação, mas também o evento de sua
enunciação. O autor define o texto como uma unidade lingüística concreta, que é
tomada pelos usuários da língua, em uma situação de interação comunicativa
específica, como uma unidade de sentido e como preenchendo uma função
comunicativa reconhecível e reconhecida, independentemente de sua extensão.
Cornish (2003: 1-26) faz a distinção entre texto e discurso e enfoca o
contexto, declarando que o texto age como um reservatório de pistas servindo de
instrução para o receptor construir um modelo conceitual da situação evocada pelo
produtor, um modelo que o receptor pretende que seja idêntico ao modelo do
produtor. O discurso, por outro lado, designa o resultado das seqüências de atos
enunciativos, ilocucionários e indexicais hierarquicamente estruturados,
mentalmente representados em que os participantes se engajam conforme a
comunicação se desenrola. Tais seqüências têm como razão efetiva a realização de
alguma meta comunicativa, e podem ser vistas como constituídas de unidades
menores caracterizadas pelo fato de que as ‘microproposições’ que elas contêm são
localmente coerentes, isto é, realizam um nível que Grosz e Sidner (1986) chamam
‘estrutura intencional’. Essa distinção é feita, continua a autora, porque o discurso é
um empreendimento re-construtivo e, portanto, altamente probabilístico. Da
perspectiva do receptor, não é uma questão de simplesmente decodificar o texto
para chegar à mensagem plena originalmente pretendida pelo produtor. O
‘significado’ não está ‘no texto’; ele tem de ser construído pelo receptor através do
texto e do contexto apropriado. Em qualquer caso, o texto é, em geral, se não
sempre, incompleto e indeterminado em relação ao discurso que pode ser derivado
do texto em conjunção com o contexto.
Apoio teórico
11
1.1.1 O texto dissertativo-argumentativo
Koch (1987: 19) diz que, diante da aceitação de que o ato de argumentar, de
orientar o discurso no sentido de determinadas conclusões, “constitui o ato
lingüístico fundamental, pois a todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia” faz
cair por terra a distinção entre o que tradicionalmente se costuma chamar de
dissertação e de argumentação, já que a dissertação seria uma exposição de idéias
sem posicionamento pessoal.
Segundo a autora, foi com o surgimento da Pragmática que o estudo da
argumentação ou retórica passou a ocupar um lugar central nas pesquisas sobre a
linguagem. A argumentação visa a provocar ou a incrementar a “adesão dos
espíritos às teses apresentadas ao seu assentimento, caracterizando-se, portanto,
como um ato de persuasão”, conforme Perelman (1970, apud Koch 2004: 19).
A propósito, Van Dijk (1992, apud Kitis e Milapides, 1996) fala em convicção e
em sedução como processos que se incluem numa relação de espécie-para-gênero,
no hiper-processo da persuasão. A convicção envolve uma lista de passos
argumentativos que - espera-se - deverão ser aceitos pelo fato de incluir a ativação e
a participação do sistema cognitivo, essa recepção constitui-se num processo
cognitivo. Mas, freqüentemente, a persuasão cerceia a participação cognitiva do
leitor no processo de aceitar a perspectiva do autor e, nesses casos, podemos falar
de 'sedução' em vez de convicção.
Pode-se conjecturar, diz o autor, que os mecanismos de sedução na relação
entre o persuasor e sua 'vítima' ou 'cúmplice' sejam identificáveis tanto ao nível do
texto quanto ao do sub-texto, i.e., não somente ao nível do léxico, estruturas e
figuras de linguagem como componentes da estrutura local do texto, mas também ao
nível de sua coerência geral. Os mecanismos de sedução, portanto, podem ser
isolados tanto ao nível da coesão quanto ao da coerência - entendidos como nível
de suposições inferidas ou ativadas para tornar coerente o texto. Em outras
palavras, não só estamos lidando com escolhas lingüísticas feitas no texto, mas
também com um tipo de suposição que apóia aspectos da coerência. Segundo Citelli
(1995):
Apoio teórico
12
... a linguagem cumpre certos objetivos e realiza
determinadas intenções. Particularmente nos textos
argumentativos, uma série de mecanismos é acionada – de
forma mais ou menos consciente – pelos usuários, com a
finalidade de construir teses, elaborar idéias, assumir pontos
de vista e rechaçar preconceitos.
Seguindo essa linha de raciocínio, é possível afirmar que um dos aspectos
asseguradores da unidade do texto é a existência do ponto de vista das concepções
do que se pretende demonstrar. Alguns mecanismos básicos são necessários para a
construção do ponto de vista decorrentes de experiências acumuladas, leituras
realizadas, informações obtidas.
A argumentação esteia-se em dois elementos principais, segundo Garcia
(1997): a consistência do raciocínio e a evidência das provas. São cinco os tipos
mais comuns de evidência: os fatos propriamente ditos, os exemplos, as ilustrações,
os dados estatísticos e o testemunho.
Segundo o autor, ao lado da argumentação informal – presente em quase
todas as conversas – a argumentação formal, embora pouco diferente daquela, na
essência, exige cuidados. Esta se caracteriza pela: (a) proposição – deve ser
argumentável, e não uma verdade universal –; (b) análise da proposição; (c)
formulação de argumentos – a argumentação propriamente dita, em que o autor
apresenta as provas ou as razões, o suporte de suas idéias –; (d) conclusão, que
deve ‘brotar’ naturalmente das provas arroladas. Assim, temos o seguinte quadro:
Quadro 1 - Argumentação formal.
1. Proposição
(afirmativa, suficientemente definida e limitada; não deve conter
em si mesma nenhum argumento, isto é, prova ou razão)
2. Análise da proposição
3. Formulação dos argumentos (evidências):
(a) fatos;
(b) exemplos;
(c) ilustrações;
(d) dados estatísticos
(e) testemunho
4. Conclusão
Fonte: Garcia, 1997
Apoio teórico
13
Por outro lado, segundo Van Eemeren et al. (1997) o uso da argumentação
serve para justificar ou refutar um ponto de vista com o objetivo de assegurar o
entendimento das opiniões. O estudo da argumentação centra-se em um de dois
objetos: interações em que duas ou mais pessoas conduzem ou têm argumentos
tais como discussões ou debates; ou textos tais como discursos ou editoriais em que
uma pessoa produz um argumento (O’Keefe, 1977).
O discurso, diz Koch (1987), para ser bem estruturado, deve conter implícitos
ou explícitos, todos os elementos necessários à sua compreensão, deve obedecer
às condições de progresso e coerência, para, por si só, produzir comunicação: em
outras palavras, deve constituir um texto. Todo texto caracteriza-se pela textualidade
– tessitura –, rede de relações que fazem com que um texto seja um texto – e não
uma simples somatória de frases –, revelando uma conexão entre as intenções, as
idéias e as unidades lingüísticas que o compõem, por meio do encadeamento de
enunciados dentro do quadro estabelecido pela enunciação.
Devo esclarecer que o texto dissertativo-argumentativo é por alguns
considerado Gênero, enquanto outros o consideram um tipo de texto (Paltridge,
2002). De fato, declara ele, muito freqüentemente esses dois termos são usados
alternadamente. Não há um acordo universal de que Gênero e tipo de texto se
refiram ao mesmo aspecto de um texto. Biber (1999) observa que textos dentro de
certos Gêneros podem diferir bastante em suas características lingüísticas. Para ele,
tipos de texto, por outro lado, representam modos retóricos, tais como, problema-
solução, exposição, argumentação, que são semelhantes em termos de padrões
discursivos internos, não importando o Gênero. Gênero e tipo de texto assim
representam perspectivas diferentes embora complementares nos textos. Vou usar
os termos ‘estrutura esquemática’ e ‘estrutura de Gênero’, alternadamente, pois
podem ser considerados sinônimos, e uso ‘estágios de Gênero’ (Martin 1985), por
motivos práticos para me referir às divisões dentro dessa estrutura.
No Quadro 2, apresento algumas propostas de estrutura esquemática ou
estrutura de Gêneros com seus estágios.
Apoio teórico
14
Quadro 2 - Tipos de estrutura do texto dissertativo-argumentativo.
WINTER (1974)
Hipotético (João diz x)
Real (Isso está errado, pois de fato é y)
COLLIER-WRIGHT (1984)
Pergunta (Por que x?)
Resposta-Avaliação negativa (Não é y)
Resposta-Avaliação negativa (Não é z)
Resposta-Avaliação positiva (Mas é u)
HOEY (1986)
Afirmação (por M)
Avaliação (de T da afirmação de M)
Correção (de T da afirmação de M)
(T é o autor do texto)
HOEY (1986)
Hipotético (dito por J)
Negação (dito por K)
Correção
HOEY (1994)
Situação
Problema
Solução
Resultado/Avaliação
Fonte: Biber, 1999
1.1.2 A Estrutura Problema-Solução
Dos esquemas acima, vou detalhar a estrutura esquemática de Hoey (1994),
pois esta é o que aparece como a de maior freqüência nas redações que examinei.
Talvez esse fato se deva à característica mais geral do esquema de Hoey, que de
alguma forma permeia as demais propostas. O que se vê nesses esquemas é que,
para acontecer uma argumentação, a hipótese, a afirmação ou a avaliação devem
se constituir em problemas que justifiquem a discussão.
(1) Eu estive na função de sentinela.
Eu vi o inimigo se aproximando.
Eu abri fogo.
Eu venci o ataque inimigo.
Existem 24 seqüências possíveis, mas é apenas uma que pode ser lida sem
entonação especial e que faz sentido. Mas se a segunda sentença for lida com
entonação intercalada, a (2) também faz sentido:
(2) Eu vi o inimigo se aproximando.
(Eu estava na função de sentinela).
Eu abri fogo.
Eu venci o ataque inimigo.
Apoio teórico
15
Outras seqüências parecem mais difíceis de serem aceitas:
(3) Eu abri fogo.
Eu estive na função de sentinela.
Eu venci o ataque inimigo.
Eu vi o inimigo se aproximando.
Esses fatos sugerem, continua o autor, que podemos dividir as seqüências
em três categorias: seqüências não-marcadas, seqüências marcadas e seqüências
incoerentes. Mas não é apenas a seqüência das sentenças que é importante,
também a sua presença. Nenhuma das quatro sentenças pode ser omitida, a menos
que seja pressuposta, sem ameaçar a clareza do texto. O que isso sugere é que
cada uma das quatro sentenças é essencial para a estrutura, que podemos,
inicialmente, identificar como estrutura Problema-Solução, com os seguintes
elementos e suas funções, ou estágios e suas finalidades - por uma questão de
coerência metalingüística, adotaremos a sugerida por Martin (1985), de estágios e
finalidades:
Situação Eu estava de sentinela.
Problema Vi o inimigo se aproximando.
Resposta Abri fogo.
(Avaliação/Resultado)
1
Venci o ataque inimigo.
Surge, então, a questão: como pode o leitor identificar essa estrutura de
Gênero no discurso? O autor considera duas possíveis respostas para a questão, ou
seja, a estrutura de Gênero pode ser identificada por dois processos
complementares indicados resumidamente como:
(a) projeção dentro do diálogo;
(b) identificação dos sinais lexicais.
Assim, as sentenças do texto artificial podem agora ser projetadas em
diálogo.
1
O parêntese indica fusão dos elementos da estrutura (Hoey 1994: 44 Notas)
Apoio teórico
16
A: Qual era a situação?
B: Eu estava na função de sentinela.
A: Qual era o problema?
B: Eu vi o inimigo se aproximando.
A: Qual foi a sua solução?
B: Eu abri fogo.
A: Qual foi o resultado? ou Como foi o êxito disso?
B: Eu venci o ataque inimigo.
A projeção do monólogo em forma de diálogo pergunta-e-resposta é um
importante teste da estrutura de Gênero do discurso. Pode-se afirmar que essa
projeção é a conseqüência da descrição não da língua, mas da realidade que a
língua codifica. Na minha experiência de magistério, considero esta fase importante
para o aluno, pois é aqui que ele planeja a sua redação, dividindo coerentemente as
partes do conteúdo que a comporão.
A seguir, apresento a teoria que embasará a minha análise dos textos
dissertativo-argumentativos de alunos do 1º. ano do Ensino Médio, ou seja, a
Lingüística Sistêmico-Funcional, e a proposta dos sistemicistas no exame da coesão
e coerência textuais. Assim o faço, porque a Lingüística Sistêmico-Funcional - uma
teoria que considera a língua como um processo social -, procura desenvolver uma
metodologia com vistas a uma descrição detalhada e sistemática dos padrões
lingüísticos, sempre levando em consideração o contexto social-cultural e situacional
- em que a língua é usada. Assim, acredito que ela me forneça os meios para a
operacionalização de conceitos através dos elementos lingüísticos que os realizam.
Obviamente, embora a análise da coerência e da coesão deva considerar os
aspectos discursivos evocados pelo texto, deve também levar em conta os aspectos
mais concretos da análise, que são as escolhas léxico-gramaticais que respondem,
em geral, pela grande maioria das questões que envolvem esses fenômenos. E,
aqui, as categorias sugeridas por Hasan (1989) são de importância fundamental, e,
assim, constituem o ponto de apoio de minhas análises.
A partir de Halliday & Hasan (1976, 1989) mostro o avanço dos estudos sobre
coerência e coesão, trazendo as posições de Koch (1990, 2005), Fávero (1991),
Apoio teórico
17
Antunes (2005), Paladino (2006), Indursky (2006) e as opiniões renovadoras de
Cornish (2003) sobre coesão e a contribuição de Bednarek (2005) que, a meu ver,
ao introduzir a noção cognitiva de frame, esclarece fatos já citados pelos autores
aqui referidos como ‘elementos do contexto de produção’ (Rasia, 2002), ‘condições
externas à produção’ (Karnopp, 2006), ao falarem do texto no âmbito do discurso.
1.2 A Lingüística Sistêmico-Funcional
Halliday (1985, 1994), com sua teoria de contexto construído no seu modelo
de linguagem, a Lingüística Sistêmico-Funcional (LSF), fornece um conjunto
poderoso de instrumentos analíticos e explanatórios no exame do modo como as
escolhas léxico-gramaticais refletem o contexto de uso da língua e, ao mesmo
tempo, é por ele determinado. Construído como um modelo de relações
texto/contexto, o modelo sócio-semiótico de discurso de Halliday, fornece um
tratamento integral de como a micro-semântica das interações contribuem para a
realidade social.
Segundo Eggins (1994), que estuda os escritos de Halliday, abrangendo um
período que vai de 1973 a 1985, há 4 pontos – funcional, semântico, contextual e
semiótico –, que caracterizam a abordagem sistêmica como sendo uma abordagem
semântico-funcional da língua:
(1) o uso da língua é funcional;
(2) a função da língua é construir significados;
(3) os significados sofrem a influência do contexto social em que são
intercambiados;
(4) o processo envolvido no uso da língua é semiótico: processo de construção do
significado através de escolhas.
Em outras palavras, ninguém usa a língua, isto é, fala ou escreve, sem um
propósito (função) em mente; é necessário mais do que uma sentença isolada.
Mesmo um Fecha a porta, está estruturado para elucidar uma resposta, verbal ou
não-verbal, exigindo, pois, dois movimentos. Na maioria dos casos, precisamos de
mais do que dois movimentos, ou seja, precisamos de um texto, interação lingüística
Apoio teórico
18
completa - falada ou escrita -, em geral com um começo e um fim. Por outro lado,
alguns fatos mostram que língua e contexto estão interrelacionados:
(a) somos capazes de deduzir o contexto de um texto que carrega aspectos do
contexto em que foi produzido;
(b) somos capazes de predizer a língua por meio de um contexto podemos
predizer o tipo de estrutura sintática, as palavras, que ocorrerão no texto;
(c) sem um contexto não somos capazes, em geral, de dizer o significado que está
sendo construído.
Portanto, ao fazermos perguntas funcionais, não é suficiente enfocarmos
somente a língua, mas a língua usada em um contexto. Mas quais as feições desse
contexto afetam o uso da língua? Para responder a essa questão, os sistemicistas
lançam mão de dois conceitos: Registro e Gênero, conforme Eggins (1994).
Registro - descreve a influência das dimensões do contexto situacional imediato
sobre a língua. Tais dimensões são 3 - Campo: assunto, Relações: quem fala com
quem e Modo: a estruturação de Campo e Relações através da língua.
Gênero - descreve a influência das dimensões do contexto cultural sobre a língua.
E.g. a dissertação é constituída, no Brasil, por Introdução, Desenvolvimento e
Conclusão; no Japão/Coréia, por Ki-Shoo-Ten-Ketsu, em que o ten refere-se a fato
não diretamente ligado ao tema.
No modelo da LSF, a língua é vista, não como um veículo neutro para
expressar estruturas mentais pré-existentes, nem como uma expressão direta da
realidade material, mas como um recurso que, simultaneamente, reflete e
ativamente cria uma realidade. Tal realidade é construída pelas escolhas léxico-
gramaticais, a gramática e o vocabulário, no modelo operando
interdependentemente no mesmo nível, para atingir metas sociais de acordo com
três metafunções: experiencial, interpessoal e textual. Assim, a língua serve para
criar três significados, ou metafunções.
A metafunção experiencial refere-se à construção de sentido no mundo,
representando e refletindo sobre a experiência não só do mundo observável, mas
também no mundo interior da consciência. Essas experiências são representadas
Apoio teórico
19
em termos de acontecimentos, participantes nesses acontecimentos, e
circunstâncias nas quais esses acontecimentos ocorrem. Uma vez que as funções
sociais, segundo Halliday, são construídas na própria estrutura da língua, esses
componentes da experiência são ‘realizados’ no nível léxico-gramatical através do
sistema da Transitividade, em termos de Processos, Participantes e Circunstâncias.
A metafunção interpessoal é usada na interação com outros, envolvendo
significados sobre papéis, relações e atitudes dos participantes. A metafunção
interpessoal constrói o ‘tenor’, as relações sociais, referindo-se à língua como uma
ação social. No nível léxico-gramatical, os sistemas de Mood e Modalidade estão
mais diretamente implicados com a metafunção interpessoal. Por exemplo, o
professor como o interactante com maior poder e status na sala de aula, é o mais
provável a usar o Mood imperativo para regular o comportamento dos demais.
A terceira metafunção, a textual, relaciona-se com a organização do que se
entende como textos significativos, dentro de um dado contexto interpessoal.
Halliday concebe o componente textual como o que fornece relevância, ou como ‘a
ecologia do texto’ (1989: 60). Um desses sistemas envolvidos na expressão dos
significados textuais é o sistema de Tema, em que Tema é ‘o elemento que serve
como o ponto de partida da mensagem; é aquele do qual trata a oração’ (Halliday
1994: 37). Esta metafunção está ligada à noção de Progressão Temática que
desenvolvo mais adiante.
1.2.1 O texto na Lingüística Sistêmico-Funcional
Inicio o exame da noção de texto na LSF enfocando a unidade de estrutura e
a unidade de textura. Halliday define texto como sendo “language that is functional
e funcional como “language that is doing some job in some context” (Halliday 1989:
52). Nesse sentido, partindo do princípio de que texto e contexto estão tão
intimamente relacionados, tal que nenhum desses conceitos pode ser enunciado
sem o outro, Hasan propõe examinar com mais detalhe a definição de texto.
Para ela, a unidade é a característica mais importante de um texto. É a
unidade que nos capacita distinguir um texto de um não-texto, de um texto completo
de um incompleto. Há dois tipos de unidade: unidade de estrutura e unidade de
textura.
Apoio teórico
20
1.2.1.1 Unidade de Estrutura
Uma das fontes da unidade textual é a estrutura. Para ilustrar a noção de
estrutura, a autora refere-se ao modelo mais antigo de estrutura de texto no
Ocidente, que se origina em Aristóteles, quando este definiu a tragédia grega como
sendo constituída de três elementos: começo, meio e fim; refere-se também à peça
teatral japonesa, o kabuki, e declara que, neste, o Gênero Sewamono inclui um sub-
Gênero, o Enkirimono, que apresenta uma estrutura constituída de Evento
Precipitativo, Evento Resultativo e Revelação, que são essenciais ao Enkirimono.
Hasan diz, então, que tanto a tragédia grega quanto o Enkirimono são exemplos de
Gênero. Feito isso, a autora passa a esclarecer o que ela entende por ‘elemento da
estrutura de um texto’ e ‘a estrutura de Gênero de um texto’.
Entre a tragédia grega e a conversa casual, há uma vasta gama de Gêneros,
variando na medida em que a estrutura global de sua mensagem parece ter uma
forma definida. Muitos poderão se surpreender, segundo Hasan, diante da sugestão
de que há uma estrutura até num texto gerado durante a compra de um quilo de
batatas e três cabeças de alho.
Hasan lembra uma pergunta feita por Halliday: ‘como explicar o sucesso com
o qual as pessoas se comunicam?’ Halliday sugeriu, então, que ‘a situação na qual a
interação lingüística acontece dá aos participantes as informações sobre os
significados que estão sendo intercambiados’, e então é igualmente verdadeiro que
os significados que estão sendo construídos pela língua darão aos participantes
muitas das informações sobre o tipo de situação em que eles estão.
Essa relação entre língua e contexto é importante, continua a autora, por dois
motivos, um teórico e outro prático. Teoricamente, esse fato revela uma visão do
senso não-comum. O senso comum, numa compra de batatas, seria dizer: ‘Me dá
um quilo de batatas’, ‘Quanto custa?’ O senso não-comum é a visão de que a
compra se constitui num tipo culturalmente reconhecível de situação que foi
construída através dos anos pelo uso precisamente desse tipo de linguagem. Sem o
reconhecimento dessa bi-direcionalidade, língua-contexto/contexto-língua, seria
difícil considerar a possibilidade da arte verbal, da ciência, da filosofia – de fato, todo
o domínio do conhecimento humano – ou dos desentendimentos.
Apoio teórico
21
Do ponto de vista prático, esse fato é importante porque, para Hasan, ajuda a
entender os detalhes da relação entre o contexto e a estrutura de um texto. Halliday
(1989) fala de três termos: campo, relação e modo, que se referem a certos
aspectos das situações sociais que agem sempre sobre a língua em uso. Hasan
introduz um conceito a eles relacionado: a Configuração Contextual, doravante CC.
Cada um dos três – campo, relação e modo – podem ser pensados como
uma variável que é representada por algum valor específico – ou, usando um termo
técnico – Opção. Assim, a variável campo pode ter o valor de ‘elogio’ ou ‘caçoada’; a
relação pode permitir uma escolha entre ‘mãe-para-filho’ ou ‘chefe-para-subordinado’
e modo pode ser ‘oral’ ou ‘escrito’. Esses pares de opções podem ser combinados
entre qualquer membro de qualquer outro, resultando numa CC. E.g. mãe elogiando
o empregado. Portanto, a CC é um conjunto específico de valores que realizam
campo, relação e modo.
Precisamos da noção de CC para tratarmos da estrutura de um texto, pois
são as feições específicas de uma CC – os valores das variáveis – que permitem
afirmações sobre a estrutura de um texto. Precisamos ver o conjunto total das
feições – todos os valores selecionados das três variáveis – como uma configuração,
e não tentar relacionar aspectos da estrutura de um texto a ‘cabeçalhos’ individuais.
Na unidade estrutural de um texto, a CC tem papel central. Se o texto pode
ser descrito como ‘língua fazendo algum trabalho num contexto’, é razoável,
segundo Hasan (1980), descrever a expressão verbal de uma atividade social: a CC
é uma explicação dos significados atribuídos nessa atividade social. Assim, não
surpreende que as feições da CC possam ser usadas para fazer certos tipos de
predição acerca da estrutura de um texto: Que elementos devem ocorrer? Que
elementos podem ocorrer? Onde eles devem ocorrer? Onde eles podem ocorrer?
Com que freqüência eles podem ocorrer? Ou seja, mais sucintamente, podemos
dizer que uma CC prediz os elementos obrigatórios e opcionais da estrutura de
um texto, bem como a sua seqüência e a sua repetição.
A seguir, a autora examina os valores das três variáveis numa compra em
supermercado.
O campo do discurso - O campo, dizendo respeito à natureza da atividade social,
envolve tanto o tipo de ação realizada quanto suas metas. Aqui, há uma meta a
Apoio teórico
22
curto prazo que é a aquisição de alimentos em troca de dinheiro. Isso é o que
chamamos de ‘compra’, e compra sempre envolve ‘venda’.
A relação do discurso - A atividade social é institucionalizada. E, assim, a natureza
da atividade prediz o conjunto de papéis relevantes no desenrolar da atividade
Hasan (1980), que chamamos de componente de Papéis de Agentividade da relação
do discurso: o vendedor e o comprador. Há ainda um outro componente da relação,
suscetível também ao fato de a atividade ser ou não ser institucionalizada.Trata-se
do grau de controle ou poder que um participante pode exercitar sobre o outro, em
virtude da relação de papéis. A distância social é um continuum entre máxima e
mínima, e ela afeta o estilo da comunicação, a distância social entre vendedor e
comprador é próxima da máxima.
O modo do discurso - Esta variável pode ser descrita sob pelo menos três sub-
títulos. (1), o papel da língua: se constitutiva ou auxiliar, categorias que nem sempre
são claramente evidentes, mas pontos extremos de um continuum. No caso da
compra, o papel da língua é auxiliar, pois apenas acompanha a troca de mercadoria
por dinheiro. (2) o processo de partilhamento: os interlocutores participam da criação
do texto ou entram em contato com um texto pronto? (3) o canal: fônico ou gráfico?
Esta categoria está próxima do partilhamento, pois numa conversa, os interlocutores
estão face-a-face, enquanto que na escrita, o texto está pronto. Hasan, então,
estabelece os elementos de um texto:
(1) obrigatórios, que obedecem a uma seqüência;
(2) opcionais cuja ocorrência não deve ser pensada como sendo livre;
(3) interativos ou repetitivos.
Há uma boa razão para o estabelecimento de limites dos elementos
estruturais de um texto. Sem isso, a análise permanece tão intuitiva que duas
pessoas analisando um mesmo texto poderiam diferir muito. Assim, declara a autora,
é desejável encontrar um critério para decidir que parte do texto realiza que
elemento; mais do que isso, é importante estabelecer o tipo de critério para tanto.
Uma coisa que parece ser certa é que não há uma correspondência bi-
unívoca entre elemento estrutural e a oração ou sentença. Nem é o elemento
Apoio teórico
23
estrutural sempre co-extensivo com uma mensagem ou ato individual. Por exemplo,
um agradecimento exige o agradecimento e a resposta a ele.
Segundo a autora, pensar a estrutura textual não em termos da estrutura de
cada texto individual como entidade separada, mas como uma afirmação sobre um
Gênero como um todo, é implicar que há uma relação próxima entre texto e
contexto. O valor desse tipo de abordagem é em última instância o reconhecimento
da natureza funcional da língua. Se texto e contexto estão relacionados, segue-se
que não existe uma única maneira certa de falar ou de escrever. O que é adequado
num ambiente pode não sê-lo em outro.
Aprende-se a escrever texto, escrevendo textos, tal como se aprende uma
língua, falando essa língua. A familiaridade com diferentes Gêneros não se
desenvolve automaticamente com a idade, mas requer experiência social. A
relevância de estrutura é importante para a memória, na medida em que um trecho
escrito pode ser mais facilmente lembrado se a sua estrutura estiver clara.
1.2.1.2 Unidade de Textura
De acordo com Hasan (1989), o falante de uma língua ao ouvir ou ler um
trecho de língua mais extenso que uma sentença em extensão, saberá decidir sem
dificuldade se ele forma uma unidade ou é apenas um conjunto de sentenças não
relacionadas. A palavra texto é usada na lingüística para se referir a qualquer
passagem, falada ou escrita, que forma um todo unificado. A distinção entre um
texto e um conjunto de sentenças não relacionadas, é em última instância uma
questão de grau, pois pode haver instâncias sobre as quais podemos não ter
certeza. Mas isto não invalida a observação geral que somos sensíveis à distinção
entre o que é o e que não é texto.
Esse fato sugere que existem fatores objetivos aí envolvidos – deve haver
certas feições que sejam características de textos e que não são encontradas fora
dele. Hasan tenta identificar, a fim de estabelecer as propriedades de textos, o que
distingue um texto de uma seqüência desconectada de sentenças.
Texto é uma unidade da língua em uso. Não é uma unidade gramatical, como
a oração ou a sentença; e não é definida pelo seu tamanho. É errado pensar,
Apoio teórico
24
continua a autora, que um texto seja uma super-sentença, uma unidade gramatical
maior que uma sentença. O texto não é algo que se pareça com uma sentença,
apenas maior; ele é algo que difere da sentença pelo tipo.
Um texto é uma unidade semântica: não uma unidade da forma, mas de
significado. Assim, ele se relaciona com uma oração ou sentença não pelo tamanho,
mas pela realização, a codificação de um sistema simbólico em outro. Um texto não
consiste de sentenças, ele é realizado por ou codificado em sentenças. Se
entendermos isso desse modo, não vamos esperar o mesmo tipo de integração
estrutural entre as partes de um texto como a encontramos numa sentença ou numa
oração. A unidade de um texto é um tipo diferente.
O conceito de textura é inteiramente apropriado para expressar a propriedade
de ‘ser um texto’. Um texto tem textura, e isso é o que o distingue de algo que não
seja texto. O texto deriva essa textura do fato de funcionar como uma unidade em
relação ao seu contexto. O que os autores investigam são os recursos para a
criação da textura. Veja o exemplo (1):
(1) Lave e descasque seis maçãs
. Coloque-as em um prato a prova de fogo.
Está claro que as na segunda sentença refere-se ao antecedente - é
anafórico - a seis maçãs, na primeira sentença. Essa função anafórica de as
proporciona coesão para as duas sentenças, tanto que as interpretemos como um
todo; as duas sentenças, juntas, constituem um texto, ou melhor, formam partes do
mesmo texto.
A textura é fornecida pela relação coesiva que existe entre as e seis maçãs. É
importante notar esse ponto, afirma Hasan, porque estaremos constantemente
focalizando a atenção nesses itens, tais como as, que tipicamente se refere ao
antecedente, mas a coesão não é efetivada pela presença do referido item sozinho,
mas pela presença de ambos: o item referido e o item a que ele se refere. Em outras
palavras, não é suficiente que haja uma pressuposição; a pressuposição precisa ser
satisfeita.
Isso explica o efeito humorístico produzido por um comediante que começa
seu ato com a sentença:
(2) Então nós o empurramos para baixo do outro.
Apoio teórico
25
Essa sentença contém pressuposições, localizadas nas palavras então, o e
outro, e uma vez que era a sentença de entrada, nenhuma delas pode ser
entendida.
Qual é o significado da relação coesiva entre as e seis maçãs? O significado
é que eles se referem a uma mesma coisa. Os dois itens são idênticos na referência,
ou seja, são co-referenciais. O agente coesivo nesse exemplo, que provê a textura,
é a co-referencialidade de as e seis maçãs. O sinal, ou a expressão, dessa co-
referencialidade é a presença do item potencialmente anafórico as na segunda
sentença junto com o item alvo potencial seis maçãs na primeira.
A identidade de referência não é a única relação de significado que contribui
para a textura, pois existem outros além dela. Nem é o uso de um pronome, a única
forma para expressar a identidade de referência. Poderíamos ter:
(2) Lave e descasque seis maçãs. Coloque as maçãs em um prato a prova de fogo.
Aqui o item coesivo é as maçãs, que funciona pela repetição da palavra
maçãs acompanhada pelo artigo definido as como um sinal anafórico. Uma das
funções do artigo definido é sinalizar a identidade de referência com alguma coisa
que veio antes.
O termo para a referência a uma única instância de coesão, isto é, um termo
para uma ocorrência de um par de itens coesivamente relacionados, é laço. A
relação entre as e seis maçãs, no exemplo (1) constitui um laço.
Podemos caracterizar qualquer segmento de um texto em termos de número
e tipos de laços que apresenta. Em (1) existe apenas um laço, de um tipo particular
que poderá ser de referência. Em (2), existem dois laços, em que um deles é do tipo
referência, e consiste na relação anafórica de as e seis maçãs, enquanto o outro é
de um tipo diferente e consiste na repetição da palavra maçãs.
O conceito de laço possibilita analisar o texto em termos de propriedades
coesivas, e dá um tratamento sistemático dos padrões de textura. Vários tipos de
questões podem ser investigados dessa maneira: as diferenças entre fala e escrita;
a relação entre coesão e a organização de textos escritos em sentenças e
parágrafos; e as possíveis diferenças entre Gêneros e autores nos tipos de laços
que eles empregam.
Apoio teórico
26
1.3 A Coesão na Lingüística Sistêmico-Funcional
O conceito de coesão é semântico, e refere-se às relações de significado que
existem no interior do texto, e que o definem como texto, segundo Hasan (Halliday &
Hasan, 1989). A coesão ocorre onde a interpretação de alguns elementos no
discurso é dependente de outro. Um pressupõe o outro, no sentido de não se poder
decodificar, se não for por recorrência a eles. Quando isso ocorre, a relação de
coesão se instala e os dois elementos, o que pressupõe e o pressuposto, são desse
modo, integrados em texto.
A coesão é parte do sistema de uma língua, declara a autora. O potencial
para a coesão está nos recursos sistemáticos de referência, elipse e outros que são
construídos na própria língua. Como outras relações semânticas, a coesão é
expressa por meio da organização em camadas da língua. A língua pode ser
explicada como um sistema múltiplo de codificação, compreendendo três níveis de
codificação ou ‘camadas’: semânticas (significados), a léxico-gramática (formas),
fonologia e ortografia (expressão). Os significados são realizados (codificados) como
formas, e as formas são realizadas (decodificas) como expressões.
Numa camada, não existe nenhum peso na divisão entre vocabulário e
gramática, pois a principal orientação da língua é que os significados mais
generalizados sejam expressos por meio da gramática e os significados mais
específicos por meio do vocabulário. Relações coesivas instalam-se dentro de um
mesmo padrão geral. A coesão é expressa particularmente por meio do vocabulário.
Uma vez que as relações de coesão não se referem à estrutura, elas podem
ser encontradas dentro da sentença bem como entre as sentenças. Elas chamam
menos atenção dentro da sentença por causa da força coesiva da estrutura
gramatical, porque uma sentença já liga as orações, ou seja, a coesão não é
necessária para isso. Mas a relação coesiva lá está do mesmo modo. Por exemplo.
(1) Se acontecer de você encontrar o almirante, não lhe diga que o navio dele já se
foi.
Aqui o lhe e dele e podem ser decodificados pela referência a almirante,
exatamente como o seriam se houvesse um limite sentencial entre eles. Da mesma
forma:
Apoio teórico
27
(2) Maria prometeu enviar a foto das crianças
, mas não o fez.
Aqui o fez equivale a enviar a foto das crianças, e é irrelevante se as duas
estão ou não na mesma sentença. As relações coesivas nada têm a ver, em
princípio, com limites de sentença. A coesão é uma relação semântica entre um
elemento no texto e algum outro que é crucial para a sua interpretação. Esse outro
elemento deve ser encontrado no texto; mas sua localização no texto não é
determinada pela estrutura gramatical. Os dois elementos, o que pressupõe e o
pressuposto podem ser estruturalmente relacionados entre si, ou não; tal fato que
não faz nenhuma diferença para o significado da relação coesiva.
Entretanto, continua Hasan, existe um sentido pelo qual a sentença é uma
unidade significante para a coesão, precisamente porque ela é a unidade mais alta
da estrutura gramatical: ela tende a determinar o modo como a coesão é expressa.
Por exemplo, se a mesma entidade é referida duas vezes na mesma sentença,
existem regras que governam sua forma de realização. Essas são regras de
pronominalização, é a estrutura da sentença que determina, dentro de limites, se a
segunda menção da entidade pode ser chamada novamente ou se será referida por
um pronome. Por exemplo, não podemos dizer.
(3) João pegou o chapéu de João e pendurou o chapéu no cabide de João.
Suponha que exista somente um João e somente um chapéu. Então essa
identidade de referência pode ser expressa pelo uso de formas pronominais: João
pegou seu chapéu e o pendurou no cabide.
Esse tipo de coesão poderia ser tratado por referência à estrutura da
sentença: a relação entre um item e outro que o pressupõe pode ser explicada como
uma relação estrutural. Mas isso poderia estar errado, segundo a autora. Somente
certas instâncias de coesão podem ser tratadas estruturalmente e somente quando
os dois itens, o que pressupõe e o pressuposto, ocorrem dentro da mesma
sentença. Mas como vimos, a questão de estarem ou não as duas na mesma
sentença é irrelevante para a natureza da relação coesiva; a coesão é uma noção
mais geral, e está acima da estrutura. Além disso, somente certos tipos de coesão
são governados por tais regras; principalmente aquelas que envolvem identidade de
referência, que, sob certas condições devem ser sinalizadas por um item de
Apoio teórico
28
referência. A coesão que é expressa por meio de substituição e de elipse não é
afetada pela estrutura da sentença; assim também é a coesão lexical. No caso da
conjunção, existem formas especiais para expressar as várias relações conjuntivas
em que estas são associadas à estrutura gramatical; compare (4a), que é não-
estrutural com sua contrapartida estrutural (4b):
(4) a. Está chovendo. Então vamos ficar em casa.
b. Já que está chovendo, vamos ficar em casa.
Apesar da presença ou da ausência do elo estrutural, a relação semântica
que provê a coesão, no caso, de causa, é a mesma em ambos, diz Hasan. Por
essas razões, a coesão dentro da sentença não precisa ser considerada um
fenômeno essencialmente distinto. A coesão é uma relação geral de formação-de-
texto que, quando incorporada dentro da estrutura da sentença, sujeitam-se a certas
restrições – sem dúvida porque a condição gramatical de ser uma sentença
assegura que as partes estejam juntas para formar um texto. Mas as relações
coesivas são as mesmas estejam ou não seus elementos dentro da mesma
sentença.
Como regra geral, os exemplos citados pela autora são de coesão através de
limites sentenciais, já que aqui o efeito é mais definitivo e o significado é mais óbvio;
laços coesivos entre sentenças respondem mais claramente porque são as únicas
fontes de textura, enquanto na sentença há relações estruturais também. Na
descrição de um texto, é a coesão intersentencial que é significante porque
representa a variabilidade dos aspectos da coesão distinguindo um texto de outro.
A textura, como a estrutura, está relacionada ao contexto de situação.
Comparemos os seguintes exemplos:
Quadro 3 - A textura, a estrutura e o contexto de situação
Exemplo A:
Era uma vez uma menininha
e ela saiu para um passeio
e ela viu um ursinho fofinho
e então ela o levou para casa
e quando em casa ela o lavou.
Exemplo B:
Ele montou num búfalo.
Eu o pus no armário.
Eu reservei um lugar.
Eu não o comi.
Fonte: Hasan, 1989.
Apoio teórico
29
O texto A apresenta uma certa continuidade que falta em B. Uma dessas
continuidades pode ser descrita em termos de estrutura de Gênero. Embora A esteja
incompleto, é um exemplo claro de um Gênero familiar, isto é, uma estória
inacabada. Já não se reconhece tão facilmente o Gênero de B, embora possamos
perceber as sentenças como tendo sido retiradas de um livro de exercícios de
língua. Mas B não apresenta uma estrutura de começo, meio e fim.
Mas a continuidade estrutural não é o único tipo de continuidade. Assim, A
possui o atributo da textura, que falta ao texto B. Notemos que em A há certos tipos
de relação de significados entre suas partes que não se encontram em B. São essas
relações de significado que constituem a textura. Por exemplo, ela refere-se à
menininha. Uma maneira mais concisa de dizer é dizer que ela é co-referencial à
menininha.
Para Hasan, a textura de um texto se manifesta através de certos tipos de
relações semânticas entre suas mensagens, e se propõe a examinar a natureza
dessas relações e os padrões léxico-gramaticais que as realizam. Pelo menos num
primeiro momento, textura e estrutura de texto devem ser encaradas como
fenômenos separados. Dizer que uma passagem possui textura não significa dizer
nada a respeito do status especifico de estrutura dessa passagem. A propriedade de
textura está relacionada à percepção de coerência pelo leitor. Assim, A será visto
como coerente, enquanto B não o será.
1.3.1 O elo coesivo
Hasan dá os seguintes exemplos, com tradução minha, para mostrar tipos de
elo coesivo.
Quadro 4 - Textos ilustrativos de elos coesivos
(A) Eu tinha uma arvorezinha
Nada ela carregava
Mas uma noz de prata
E uma pêra dourada
(B) Eu toco violoncelo. Meu marido também.
Fonte: Hasan, 1989
Apoio teórico
30
O elo coesivo pode ser de 3 tipos:
a) co-referencialidade: entre arvorezinha e ela;
b) co-extensão: entre prateado e dourado, ou seja, entre termos que entram em
relação de sinonímia, antonímia, hiponímia, meronímia - parte-todo -;
c) co-classificação: entre toco violoncelo e também.
Ela e também são instrumentos de codificação implícita, isto é, só podem ser
interpretados através da relação com outro, e por isso eles são essencialmente
relacionais. A pergunta que surge: onde se deve encontrar o outro? Já vimos a
natureza funcional da língua e a relação íntima entre contexto e estrutura textual. A
unidade textual possui duas circunstâncias:
(a) circunstância extra-lingüística – contexto – relevante para o texto inteiro;
(b) circunstância lingüística – co-texto – a língua que acompanha a unidade em
foco.
A resposta para a pergunta acima: A interpretação do elemento implícito deve
ser encontrada no co-texto ou no contexto. A interpretação é, então, considerada:
(a) Endofórica: a fonte de interpretação do elemento implícito está no co-texto:
(i) anafórica - se o elemento implícito vier depois do referente (e.g. João comprou
um carro, mas ele não sabe dirigir.);
(ii) catafórica - se vier antes (Eu a vi, então. Maria estava linda!).
(b) Exofórica: a fonte está no contexto, fora do co-texto. Pare de gritar aqui. (você)
A coesão gramatical depende da coesão lexical e vice-versa. Veja exemplos
ilustrativos desses tipos de coesão:
(1) (a) João acorda cedo. Compramos uma gravata. Ele adora pêssegos. Minha
casa é perto da dele. (sem coesão lexical).
(b) Um gato está na cerca. A cerca é feita de madeira. Os carpinteiros
trabalham com madeira. Tábuas de Madeira podem ser compradas na
marcenaria. (sem coesão gramatical).
Apoio teórico
31
Os membros de uma cadeia de identidade são ligados por co-referência. Os
membros de uma cadeia de semelhança são ligados por co-extensão e por co-
classificação. Dois textos mergulhados na mesma Configuração Contextual
apresentarão coincidência na cadeia de semelhança. Os itens de uma cadeia de
semelhança pertencem ao mesmo Campo e formam agrupamentos semânticos -
que são específicos para cada Gênero.
Elementos que garantem a coerência e a coesão de um texto
Segundo Eggins (1994), a coerência depende do:
(i) contexto cultural - Gênero: estrutura esquemática e finalidade;
(ii) contexto situacional - Registro: campo, relações e modo.
Eggins analisa, passo a passo, os vários fatores que constituem a coerência e
a coesão de um texto. Antes de mais nada, o texto exige seqüencialização. Veja:
(2) A: Que horas são?
B: Júlia desceu do carro na estação da Luz.
Examinando a conversa do cotidiano, os especialistas notaram que: ‘Nenhum
enunciado real pode ocorrer fora de uma seqüência específica. Qualquer coisa que
for dita, será dita num contexto seqüencial’. (Atkinson & Heritage 1984).
Eggins analisa várias seqüências, das quais selecionamos algumas, e mostra
como o texto que não contém os elementos citados acima, ou seja: os que se
referem ao contexto cultural (Gênero) e ao contexto situacional (Registro) não são
satisfatórios em termos de coerência. Veja exemplo:
(3) Era uma vez um ratinho chamado Pito. Está quente como nunca em Paris.
Quando a corrida vai começar? Ele faz assim. Não, não sei fazer biscoitos
de chocolate.
A que Gênero pertenceria este trecho? Parece ser, inicialmente, uma
narração, mas a continuação é de comentário e o final é um diálogo. Ou seja, não há
coerência de Gênero. O que significa dizer que o texto não apresenta textura, isto é,
não é um texto. Quanto à coesão, Eggins mostra que ela depende da:
Apoio teórico
32
(i) manutenção dos *participantes, referência;
(ii) seleção lexical;
(iii) conjunções.
* Notemos que participantes não têm o significado de Participante, elemento da transitividade, da
metafunção ideacional. Aqui significa um elemento ligado ao tópico tratado no texto cuja
manutenção através do texto contribui para a coesão.
Veja a seguir, um texto que não apresenta os referidos elementos. Notemos
que, em termos de coerência, o exemplo é uma narração, isto é, segundo Labov
(1966), contém as partes de uma narrativa: resumo, orientação, complicação,
resolução, avaliação e coda.
(4) Era uma vez um ratinho chamado Pito. Os meninos viviam em uma ampla casa
de tijolo vermelho e telhado de sapé na rua mais comprida da vila. Naquela
manhã, dona Amélia saiu de casa apressada. Mas, mais tarde, Renato
percebeu que o carro não tinha breque. Por isso eles correram e correram e
correram até que o gigante ficou cansado e não conseguiu mais persegui-los.
“Que dia!”, ela suspirou. Assim ele não vai mais sozinho às lojas.
Mas não apresenta coesão, pois (a) não há manutenção de participantes.
Começa falando no ratinho Pito, passa para meninos - que poderiam ser os donos
do Pito -, mas a seguir fala da dona Amélia e depois no Renato, cuja ligação com a
narrativa não fica clara. Com a menção do gigante, e com os comentários finais,
chega-se à conclusão de que o texto não mantém os participantes de maneira que
permita compreender a narrativa. (b) O que dizer sobre a seleção lexical? Ela está
prejudicada devido à falta de manutenção dos participantes. (c) E sobre os elos
lógicos? Existem elos lógicos, mas como ligam fatos semanticamente
desconectados entre si, sua função igualmente sem sentido.
O texto é, portanto, o resultado da coerência contextual, Gênero e Registro, e
da coesão, elos semânticos através dos quais cada parte do texto depende de
outras para sua interpretação. Mas, segundo Eggins, o texto não é uma categoria
preto-no-branco há, isto sim, um contínuo, entre mais e menos textualidade.
Apoio teórico
33
1.3.2 Coesão e Coerência no Discurso
Tendo examinado as propostas de Halliday & Hasan (1976; 1989), que
abriram caminho para o estudo da coerência e da coesão, com sua obra sempre
citada Cohesion in English (1976), e Eggins (1994), passo a apresentar os caminhos
que essas noções tem trilhado até data mais recente. Trato das posições de Koch
(1990, 2005), Fávero (1991), Antunes (2005), Paladino (2006), Indursky (2006). É
importante notar o modo como a informação dada e a informação nova são
integradas ao texto, e como esse fato contribui para a coesão e para a coerência do
texto. Também se mostram essenciais aqui, as noções de Tema e Rema, bem como
o papel do contexto no estabelecimento dos elos entre os elementos do texto. Mais
abaixo apresento exemplos cujos elos coesivos – nem sempre presentes no texto –
são inseridos pelo leitor devido ao conhecimento do contexto cultural, ou seja, do
Gênero, ou do contexto situacional, Registro, o mesmo acontecendo com a
coerência atribuída pelo leitor na sua interação com o texto. Esses fatos levam-me a
considerar a questão da Progressão Temática que, com base nesses elos, constitui
o fluxo da informação no texto.
Koch (1990: 68) estabelece que a coerência de um texto se consagra no
equilíbrio entre informação dada e informação nova. Seriam consideradas, ainda,
informações conhecidas, aquelas que constituem o co-texto, ou seja, que são
recuperáveis a partir do próprio contexto situacional, ou seja, da situação em que se
realiza o ato da comunicação, informações que são de conhecimento geral em dada
cultura, e que remetem ao conhecimento comum do produtor e do receptor. Afinal, a
construção de um mundo textual compreensível é o fator primordial para que o texto
possa ser, a partir desse dado, considerado como coerente ou não.
A autora argumenta que, para que possamos estabelecer a coerência de um
texto, é preciso que haja correspondência entre os conhecimentos nele ativados e o
nosso conhecimento de mundo, ou não teremos condições de construir o mundo
real dentro do qual as palavras e as expressões do texto ganham sentido. A
coerência não é característica do texto nem dos usuários, mas reside no processo
que coloca o texto e os usuários em relação em uma determinada situação, isto é, a
construção da coerência decorre de uma multiplicidade de fatores das mais diversas
Apoio teórico
34
ordens: lingüísticos, discursivos, cognitivos, culturais e interacionais. Para Koch
(2005: 7).
A Lingüística Textual teve inicialmente por preocupação
descrever os fenômenos sintático-semânticos ocorrentes
entre enunciados ou seqüências de enunciados, alguns
deles, inclusive, semelhantes aos que já haviam sido
estudados no nível da frase. Este é o momento a que se
denomina ‘análise transfrástica’, no qual não se faz, ainda,
distinção nítida entre fenômenos ligados uns à coesão,
outros à coerência do texto.
Para a autora, a coesão textual envolve uma quantidade de diferentes
relações lingüísticas, lexical, referência, substituição, que são responsáveis pela
formação da textura. É imprescindível que haja ligações, formando um tecido que
funciona como um todo. O texto precisa apresentar textualidade, isto é, ser bem
estruturado, ter palavras, frases e idéias articuladas entre si. Palavras relacionando-
se com palavras, frases com outras frases, parágrafos com outros parágrafos,
conexão garantida pela coerência e pela coesão textual. Logo, a produção textual
envolve uma série de procedimentos, como seleção vocabular, antecipação,
inferência, que permitem controlar o que vai ser escrito e lido.
De acordo com Fávero (1991: 17), a coerência não é uma unidade de sentido,
mas uma dada possibilidade interpretativa resultante localmente. Dois interlocutores
se entendem não só porque são coerentes no que dizem, mas, principalmente,
porque sabem do que se trata em cada caso. E, quando não sabem, manifestam
seu desentendimento de modo a integrá-lo como parte efetiva no próprio texto. A
coerência ocorre quando não há contradição entre os diversos valores textuais, cada
segmento textual é pressuposto do segmento seguinte, que, do mesmo modo, será
pressuposto para os que sucederem, formando uma cadeia em que todos estejam
sintaticamente ligados.Texto incoerente é aquele em que o receptor não consegue
descobrir qualquer continuidade de sentido, seja pela discrepância entre os
conhecimentos ativados, seja pela inadequação entre esses conhecimentos e o
universo cognitivo.
1.3.2.1 Tipos de elo coesivo
Para Antunes (2005: 58), a coesão dos textos não se limita a operações de
tirar e pôr palavras, toda interação verbal resulta de uma rede de conhecimentos, de
Apoio teórico
35
relações, de intenções partilhadas. É um processo que se constitui na atividade
social. A produção e recepção de um texto são atividades interativas, pois mobilizam
conhecimentos de muitos tipos e são partes de atuação e práticas sociais mais
amplas. Produzir um texto coeso e coerente é muito mais que emitir palavras em
cadeia ou interligar orações e períodos, pois o texto vai além do que aparece, do
que está explícito em suas formas lingüísticas.
O propósito da autora é o de conceituar, classificar e exemplificar os tipos de
processos coesivos que contribuem para a tessitura textual. São três os tipos de
elos, e diferem quanto ao nexo que promovem nas relações de: reiteração,
associação ou conexão.
(1) A coesão pela relação de reiteração, de acordo com Antunes (2005), é a
relação pela qual os elementos do texto vão sendo retomados, criando um
movimento constante de volta aos segmentos prévios, como se um fio o
perpassasse do início ao fim. É por isso que todo texto se desenvolve de modo
que cada palavra se vai ligando às outras anteriores. Esse movimento indica
que tudo o que vai sendo posto no texto é virtualmente objeto de futuras
retomadas.
Cada vez que substituímos uma expressão por um pronome ou por um
sinônimo, ou repetimos a palavra estamos promovendo sua coesão. Como
acontece no trecho abaixo em que o processo de reiteração é promovido pela
repetição das palavras células-tronco e tipo:
Há três tipos de células-tronco. As mais comuns são
encontradas na medula do ser humano em qualquer idade,
mas seu poder de reprodução e especialização é baixo.
Outro tipo são as células-tronco existentes no cordão
umbilical, mais potentes que as da medula. Mas o tipo mais
promissor são as células-tronco dos embriões humanos.
(Veja, 02/03/2005).
(2) A coesão pela relação de associação é um tipo de relação que se cria no texto
por ocasião da ligação de sentido entre diversas palavras presentes. Palavras
de um mesmo campo semântico ou de campos semânticos afins criam e
sinalizam esse tipo de relação. Existe sempre uma ligação entre as palavras de
um texto, pois todo texto é marcado por uma unidade temática, isto é, pela
Apoio teórico
36
concentração em um único tema, às vezes, desenvolvido em subtemas
diversos, como ocorre no exemplo abaixo:
Há três tipos de células-tronco. As mais comuns são
encontradas na medula do ser humano em qualquer idade,
mas seu poder de reprodução e especialização é baixo.
Outro tipo são as células-tronco existentes no cordão
umbilical, mais potentes que as da medula. Mas o tipo mais
promissor são as células-tronco dos embriões humanos.
(Veja, 02/03/2005).
No exemplo citado, pode-se constatar a proximidade de sentido entre palavras
como: célula-tronco, medula, cordão umbilical, embrião, ser humano, que
comprova que predomina no trecho um tópico sobre o qual se está falando.
Uma forma de garantir a coesão do trecho.
(3) A coesão pela relação de conexão, para Antunes (2005: 55), corresponde ao
tipo de relação semântica que acontece entre as orações, períodos, parágrafos
ou blocos supraparagráficos. Realizam-se pelas conjunções, preposições e
respectivas locuções – ou expressões de valor circunstancial. Abaixo, em
destaque, duas ocorrências da conjunção adversativa ‘mas’.
Há três tipos de células-tronco. As mais comuns são
encontradas na medula do ser humano em qualquer idade,
mas seu poder de reprodução e especialização é baixo.
Outro tipo são as células-tronco existentes no cordão
umbilical, mais potentes que as da medula. Mas o tipo mais
promissor são as células-tronco dos embriões humanos.
(Veja, 02/03/2005).
Os conectores indicam a relação semântica que se pretende estabelecer
entre os segmentos: orações, períodos, parágrafos. Qualquer texto mais longo
comporta todas essas relações: de causalidade, de temporalidade, de oposição, de
finalidade, de adição etc, as quais vão indicar a direção argumentativa do texto, além
de funcionarem como elos com que se conectam às várias partes de um texto.
Qualquer texto comporta uma ou todas essas relações, dos mais curtos aos mais
extensos, pois as relações requisitadas para a recuperação das informações da
comunicação podem ser presumidas pela situação contextual.
Para a autora, a função da coesão é a de criar, estabelecer, e sinalizar os
laços que deixam vários segmentos do texto ligados, articulados, encadeados, por
isso identifica-se um texto coeso quando suas partes das palavras aos parágrafos
Apoio teórico
37
estão unidas entre si. A coesão, ainda, exerce a função de promover a continuidade
do texto para que não se perca do fio de unidade que garante a sua
interpretabilidade. Por causa das sucessivas ligações que vão se estabelecendo, a
interpretação de cada segmento vai sendo afetada pela interpretação das outras
anteriores ou subseqüentes. As ligações não vão acontecendo simplesmente na
superfície da seqüência textual, mas sinalizam as ligações conceituais subjacentes à
superfície. Se há ligações na superfície textual é porque existem no âmbito do
sentido e das intenções pretendidas. A compreensão do que o outro diz resulta
dessa relação que se estabelece em cada segmento, em todos os níveis.
Segundo Antunes (2005: 43-61), o conhecimento do valor semântico das
palavras de um texto ainda não é suficiente para se apreender seu sentido global; é
preciso, ainda, estabelecer relações entre as diferentes unidades. Em suma, quando
se pretende que os textos sejam coesos, deve-se preservar sua continuidade, para
que se efetive a unidade do sentido e das intenções da interação verbal. A
continuidade é providenciada no percurso do texto e os termos se vão ligando
porque se vão relacionando conceitualmente.
Ainda, declara a autora, é importante ressaltar que a continuidade que se
instaura pela coesão é uma continuidade semântica, que se expressa pelas relações
de reiteração, associação e conexão que ocorrem graças a vários procedimentos
que se desdobram em diferentes recursos.
1.3.2.2 A inseparabilidade entre coesão e coerência
Segundo Paladino (2006: 1), no campo da definição do texto, a coerência é,
em Lingüística Textual, inseparável da noção de coesão, com a qual é
freqüentemente confundida, e é uma das questões fundamentais que mais atenção
tem recebido por parte de disciplinas como Análise do Discurso e a Teoria do Texto.
Ao longo das últimas décadas, numerosos têm sido os estudos efetuados nesse
domínio. A própria noção de coesão tem sido objeto de abordagens diversas,
confundindo-se por vezes o seu âmbito com o de noções como coerência,
conectividade etc.
Para ela, todo texto apresenta um equilíbrio entre informações pressupostas e
informações retomadas de frase em frase, sobre as quais os novos enunciados se
Apoio teórico
38
apóiam, principalmente, quanto à repetição assegurada pelos temas, de um lado, e
à contribuição de novas informações, remas, do outro. A autora declara que a
Lingüística Textual tem como objetivo principal, a teorização da coesão. A coerência,
ao contrário, da ordem das práticas discursivas, refere-se mais à Análise do
Discurso atenta ao Gênero, ao objetivo, aos saberes recíprocos dos co-enunciados
no contexto de uma dada interação.
Paladino (2006: 10) afirma que a coesão textual compreende as articulações
gramaticais existentes entre as palavras, orações, frases, parágrafos e partes
internas de um texto. Ela é responsável pela clareza e precisão das idéias do texto.
É decorrente de relações de sentido que existem entre elementos componentes do
texto. Assim, a interpretação de um termo depende da interpretação do outro termo
ao qual faz referência, isto é, a significação de uma palavra vai pressupor a de outra.
A coesão se manifesta no plano lingüístico, ou seja, nas relações semânticas e
gramaticais entre os vários enunciados do texto. Portanto, diz-se que um texto está
coeso quando ocorre perfeita articulação de sentido entre os elementos gramaticais
que o compõem, isto é, quando seus vários enunciados estão organicamente
articulados entre si, havendo concatenação entre eles.Tanto a coerência quanto à
coesão são responsáveis pela construção do sentido do texto e, portanto, de sua
textualidade.
Para a autora, a coesão é elemento indispensável para a compreensão do
texto, mas é a coerência que lhe dá sentido. Portanto, é importante observar que há
textos desprovidos de elementos de coesão, mas coerentes, e também textos que
apresentam vários mecanismos de coesão, mas que não são coerentes. A relação
de sentido entre as orações de um período é estabelecida, sobretudo, por certas
categorias de palavras (preposições, conjunções, pronomes, advérbios), chamadas
conectivos ou elementos de coesão que não são simples palavras de ligação, mas
elementos gramaticais dotados de valor semântico que estabelecem inúmeras
relações de sentido entre partes de um enunciado: causa, finalidade, conclusão,
condição, contradição, explicação, conseqüência etc.
Para Indursky (2006: 47-50), há três conceitos fundamentais formulados pelos
lingüistas textuais quando se trata de estrutura textual. Inicialmente é necessário
examinar a textualidade, propriedade intrínseca de um texto e, ainda, analisar a
coesão e a coerência. Estes três conceitos representam o cerne dos estudos
Apoio teórico
39
textuais para essa área do conhecimento. Os estudos da Lingüística Textual
imprimiram dois movimentos distintos às pesquisas de campo de conhecimento: de
um lado, pretendeu-se constituir uma gramática do texto e, de outro, buscou-se
estudar as conexões entre frases. Seja por uma ou por outra, é pela análise do texto
e de sua coesão que é possível perceber a unidade que dá origem à coerência.
É importante ressaltar que em nenhum momento anterior esta teoria
interrogou-se sobre o sujeito que produz o texto, ou seja, a Lingüística Textual
também afastou a consideração de sujeito. A partir deste quadro, continua a autora,
a Lingüística Textual começa a perceber que o texto, além de ser uma superfície,
pode ser examinado em relação aos seus fatores de coesão e de coerência, é
também um ato comunicativo. Os lingüistas admitem o fato de que para estudar o
texto é preciso examinar relações que ultrapassam o limite do texto propriamente.
Segundo a autora, na perspectiva da Lingüística Textual, o texto é concebido
como uma unidade pragmático-comunicativa porque o autor tem certas intenções
comunicativas que se fazem presentes. Por isso o texto deve satisfazer a um
conjunto de critérios interdependentes (1) Coesão: perceptível pelo jogo de
interdependências entre as frases; (2) Coerência: remete para a intenção global do
texto, fundamental para a textualidade. Ambas promovem a inter-relação semântica
entre os elementos textuais, respondendo pela conectividade textual. Os outros
cinco critérios: intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e
intertextualidade, a autora declara, remetem às qualidades pragmáticas do texto. A
intencionalidade e a intertextualidade se referem diretamente aos protagonistas do
texto. Por meio da intencionalidade o locutor propõe-se a produzir um texto que
desencadeie um determinado efeito sobre o interlocutor; a intencionalidade está
ligada ao efeito desejado no jogo de atuação comunicativa. A aceitabilidade
representa o outro ponto deste jogo de atuação, é o receptor do texto que precisa
demonstrar a permissão no que tange as instruções expressas pelo texto. Ambas
representam os dois pólos do jogo pragmático de atuação comunicativa mediada
pelo texto. Já, a situacionalidade aponta para a relevância e pertinência do texto em
relação ao contexto produzido e a informatividade é o critério através do qual o
receptor vai avaliar o grau de informação nova que o texto veicula. E, por último, a
intertextualidade: um texto faz sentido se colocado em relação a outros textos, que
funcionam como seu contexto. Fica claro que há uma diferença qualitativa entre os
Apoio teórico
40
critérios, em decorrência, estabelece-se uma certa hierarquia que pretende dar conta
do texto.
De acordo com Indursky, dos dois primeiros critérios – coesão e coerência -,
de natureza semântico-formal, decorrem as qualidades da textualidade, fatores
essenciais para desencadear a reflexão do texto por parte do leitor. A partir destes
dois critérios, inicia-se uma escala descendente que marca que nem todos têm a
mesma importância. A intencionalidade e a aceitabilidade são as mais importantes,
pois mobilizam os atores da ação comunicativa. Depois os autores apontam o
critério situacionalidade e relevância do texto para o contexto comunicativo. O quarto
critério coloca o receptor como avaliador do volume de informação nova contida no
texto, atividade que está cada vez mais distante da textualidade do texto. Por último,
o receptor vai relacionar o texto com outros textos.
Continuando, a autora declara que os critérios pragmáticos, neste campo do
conhecimento, são secundários e não constitutivos do texto, ou seja, procuram
contemplar elementos da exterioridade. Os últimos são mobilizados em ordem
decrescente de importância. Enquanto a coesão e a coerência são constitutivas da
textualidade, os fatores pragmáticos desempenham papel importante, mas não
essenciais para a construção da textualidade de um texto.
O que permite afirmar isto, na visão de Indursky (2006: 51), é o exame
cuidadoso das análises que trabalham com esta concepção teórica de texto: a
ênfase aos mecanismos lingüísticos que vão tramando o texto, nas tomadas e
retomadas e em sua progressão. Os outros critérios vieram juntar-se aos dois
primeiros, muito tempo depois, oriundos de outras áreas do conhecimento, e foram
acoplados à teoria, à medida que os estudos apontavam para a natureza
pragmático-comunicativa ou cognitiva do texto.
Outra conseqüência desta heterogeneidade teórica, ou seja, da confluência
dos critérios citados acima, é que, inicialmente, falava-se em texto, com o tempo, a
teoria passa a mencionar também discurso, inserido no corpo teórico da Lingüística
Textual, sem a busca da distinção entre os dois. Ao contrário, texto e discurso
passam a conviver e serem utilizados um pelo outro, numa espécie de sinonímia.
A Lingüística Textual, de acordo com Indursky (2006), formulou muitas
noções teóricas tais como: coesão, coerência, textualidade, sentido textual, unidade
Apoio teórico
41
de significação etc., mas outras noções foram emprestadas, tomadas de outros
campos do conhecimento, tais como a lingüística, a pragmática, a teoria dos atos de
fala, a análise do discurso e a teoria da enunciação, entretanto, sem submetê-las a
nenhuma teorização, trabalho que pertence ao campo em que foram formuladas e
não a Lingüística Textual. Tais empréstimos fazem com que os contornos teóricos
específicos da Lingüística Textual, os limites e as fronteiras fiquem embaçados,
encobertos pelos saberes de outros campos. De qualquer forma, reservadas essas
observações, o grande mérito da Lingüística Textual foi e sempre será o de ter
ultrapassado as fronteiras da frase e da lingüística convencional na construção de
um novo objeto de análise, o texto.
1.3.2.3 Exófora em lugar de endófora
De acordo com Cornish (2003: 1-26), o discurso designa o resultado das
seqüências de atos enunciativos, ilocucionários e indexicais hierarquicamente
estruturados, mentalmente representados em que os participantes se engajam
conforme a comunicação se desenrola. Tais seqüências têm como sua raison d'être
a realização de alguma meta comunicativa, e podem ser vistas como constituídas de
unidades menores caracterizadas pelo fato de que as 'microproposições' (Kintsh &
Van Dijk, 1978) que elas contêm são localmente coerentes, isto é, realizam um nível
conhecido como 'estrutura intencional'. Tais unidades mantêm entre si uma certa
relação manifestando um tipo mais global de coerência.
Essa distinção é feita porque o discurso, isto é, a construção situada e a
interpretação da mensagem via um texto relativo a um contexto, em termos das
intenções do produtor – é um empreendimento (re-construtivo) e, portanto, altamente
probabilístico. Da perspectiva do receptor, não é uma questão de simplesmente
decodificar o texto para chegar à mensagem plena originalmente pretendida pelo
produtor. O 'significado' não está 'no' texto; ele tem de ser construído pelo receptor
através do texto e do contexto apropriado. Em qualquer caso, o texto é, em geral, se
não sempre, incompleto e indeterminado em relação ao discurso que pode ser
derivado do texto em conjunção com o contexto. A distinção está ligada ao fato bem
conhecido de que a evocação de aspectos superficiais do texto é mais alta
imediatamente depois da leitura pelo leitor; mas essa habilidade desaparece quando
Apoio teórico
42
um lapso de tempo significativo separa a leitura da evocação: aqui, o conteúdo geral
- o 'essencial' do texto - é mais bem lembrado que os detalhes da superfície do texto.
Muito do discurso cotidiano é em todo caso 'oblíquo', isto é, não há uma relação
uma-a-uma entre forma e significado, ou seja, o enunciado ou o significado do
produtor, oposto ao significado lingüístico.
Diferentemente da abordagem tradicional da anáfora em termos da chamada
endófora (e.g. Halliday & Hasan, 1976), em que a expressão anafórica precisa
primeiramente ligar-se a um antecedente textual co-ocorrente adequado para que a
relação anafórica se estabeleça, a abordagem desenvolvida por Cornish pede uma
relação mais indireta, em três vias, entre o que o autor chama de (a)
desencadeador-de-antecedente (Cornish, 1999: 41-43); (b) uma representação
discursiva mental; e (c) uma anáfora. Sob essa abordagem há uma interação entre
os domínios do texto e do discurso, enquanto que, sob a concepção tradicional, a
relação é estabelecida inteiramente dentro do texto. É por razões 'top-down' em vez
de exclusivamente 'bottom-up', o que inclui fatores intertextuais, que a referência
indexical da anáfora do discurso é estabelecida (veja Emmott 1995: 84-86; Werth
1999: 291-293). A definição de anáfora citada a seguir é exemplo típico de
abordagem intratextual de anáfora - hoje descartada -: 'uma expressão é anafórica
se sua interpretação referencial depender de outra expressão que se encontra no
co-texto'.
Segundo Cornish, não há necessidade de haver nenhuma outra 'expressão
relevante ocorrendo no co-texto' com a qual se contrate tal relação. Mesmo quando
há um co-texto antecedente potencial, é evidente que a escolha não é algo que se
faça automaticamente - mesmo embora, em muitas circunstâncias de uso normal da
língua, a 'resolução' da anáfora é virtualmente automática, e não oferece chance
para um cálculo consciente da parte do receptor. Charolles & Sprenger-Charolles
(1989) raramente observaram regressões do olhar do leitor em direção a um
antecedente textual ao encontrar uma anáfora. Além disso, para os autores, o
tratamento da anáfora pelos textualistas requer que os traços morfológicos da
anáfora pronominal combinem com os da expressão antecedente, isto é, do seu
referente. Mas essa combinação não é necessária, especialmente no discurso
falado.
Apoio teórico
43
Nos casos em que não existe antecedente co-textual relevante, podemos
trabalhar com a chamada 'exófora' que Cornish afirma funcionar essencialmente do
mesmo modo que a endófora padrão. Para ilustrar esse fato, tomemos um exemplo:
(1) [Contexto: diante de uma porta fechada do escritório de um membro do staff
acadêmico da Universidade de Kent em Canterbury, UK. Um estudante está indeciso
diante da porta, evidentemente interessado em ver o membro em questão. Um outro
estudante, que conhece o membro do staff em questão, passa, e vendo a situação,
diz]:
Ele
não está aí!
Notemos que o referente indicado pelo pronome ele não está co-presente na
situação do enunciado. O que é mais importante é a existência de uma
representação discursiva partilhada de uma situação saliente na qual esse referente
desempenha o papel central.
Para Cornish (1999), a presença do estudante diante da porta atua como o
desencadeador-de-antecedente (DA). Como tal, ele induz o estabelecimento da
representação discursiva relevante na mente do produtor, algo como: 'este
estudante está querendo ver X'. A relação metonímica entre o estudante enfocando
a porta e o membro do staff é um tipo de conexão explorada no estabelecimento da
anáfora. A interpretação completa do pronome ele em (1) pode ser representada,
informalmente, como 'o membro do staff X que o estudante Y está tentando
contatar'.
Na proposta de Kleiber (1994: 3) da operação da anáfora pronominal, a
predicação anafórica constitui uma extensão coerente da situação contextualmente
saliente representada em termos do desencadeador de antecedente, em que o
pronome tem como seu referente o protagonista central nessa situação saliente.
Aqui temos uma relação de 'efeito-causa' integrando as duas representações.
'Estudante Y quer ver o membro do staff X, mas o escritório de X está
fechado'(EFEITO), 'e isto é porque X não está aqui'(CAUSA). A situação é assim
idêntica a que seria, se o referente do pronome estivesse mencionado
explicitamente no segmento relevante do co-texto, como em:
(2) Estudante: Você sabe se o sr. Smith está em seu escritório?
O outro: Não, ele
não está aí.
Apoio teórico
44
Nos casos tanto da anáfora co-textual, 'endófora' como em (2), quanto da
anáfora contextual 'exófora', como em (1), a representação da interpretação da
anáfora em contexto torna explícita a relação que o seu referente contrai com a
situação circundante – dado que as anáforas zero e átonas sempre recuperam o
referente de uma situação saliente na qual desempenha papel central. Se esse
referente foi evocado direta e explicitamente no co-texto precedente - ou
subseqüente, no caso da catáfora -, ele não é nem uma condição necessária nem
suficiente para a existência da anáfora. O referente visado pela anáfora está
associado de algum modo à representação discursiva evocada via o DA - um
enunciado, um gesto -, e é estabelecido como uma função do segmento inteiro do
discurso construído, subseqüente à introdução dessa representação.
Paralelamente, não é apenas a anáfora, que pinça a representação
'antecedente', mas a oração ou frase anafóricas inteiras, em que o componente
predicativo dessa unidade hospedeira desempenha um papel decisivo nesse
processo. Assim, com a anáfora, para Cornish, não é apenas uma questão de uma
relação sendo contraída entre duas expressões independentes - entre o
antecedente, como tradicionalmente concebido, e a anáfora -, e nem o referente da
anáfora ou denotatum é simplesmente o referente ou denotatum do DA. É aqui que
a construção do discurso desempenha um papel decisivo. No caso da resolução da
anáfora, esta envolve essencialmente um processo de integração da predicação do
DA com o seu contexto discursivo, a modificação da representação assim
introduzida como uma função de predicações subseqüentes, e na elaboração
adicional dessa representação discursiva via integração do conteúdo da unidade
anafórica e o contexto discursivo predominante no ponto de ocorrência. Vamos
examinar um interessante exemplo falado, altamente elíptico, para ilustrar essa
proposta complexa do modo como a anáfora atua em termos do discurso:
(3) [Diálogo num filme:]
Mulher: Por que você não escreveu para mim?
Homem: Eu escrevi... começava-a, mas eu sempre as rasgava.
(Fragmento do filme Summer Holiday).
Segundo Cornish (1999), o primeiro enunciado desse fragmento de diálogo é
o DA, junto com o seu ponto ilocucionário, o pedido feito ao homem que justifica o
Apoio teórico
45
fato de ele não ter escrito [nenhuma carta] para a mulher. A existência de uma ou
mais cartas escritas pelo homem para a mulher é negada pela sua pergunta
negativa, assim o referente de as não pode ser idêntico ao do seu 'antecedente'. O
predicador escrever na pergunta da mulher é para ser interpretado no sentido de
'corresponder', com o seu argumento interno não expresso sendo construído como
'a carta'.
No enunciado inicial elíptico na resposta do homem, introduz-se uma
representação da escrita passada de uma carta ou cartas para a mulher - já que
esse enunciado é uma rejeição direta da pressuposição incluída na pergunta
negativa da mulher -, e essa representação é imediatamente revista através do
segundo enunciado elíptico do homem começava a, que cria a implicatura de que a
carta ou cartas não foram enviadas à mulher. Essa implicatura é confirmada através
do processamento do terceiro enunciado do homem, em que se afirma que ele
destruía as cartas parcialmente escritas.
O fato de o verbo rasgar nesse conjunto anafórico ser modificado pelo
advérbio quantificador sempre, no sentido de 'em toda ocasião em que te escrevi
uma carta', significa que a própria frase verbal está quantificada, e justifica o plural
do pronome clítico (as), a referência sendo mais de uma carta. O fato de o pronome
ocorrer como objeto direto do verbo rasgar - assim correspondendo ao seu
argumento interno em termos léxico-semânticos - significa que o referente
pretendido deve ser construído como um objeto físico 'rasgável', algo que uma carta
pode ser.
Vemos então que o referente discursivo envolvido é construído
progressivamente como uma função das três predicações indexicais que o evoca,
[desencadeador-de-antecedente - uma representação discursiva mental - uma
anáfora]. Temos evidência dos papéis do DA e das predicações anafóricas, bem
como das inferências trazidas para conectar as duas, numa representação
discursiva coerente de um dado fragmento de texto – que pode ser relativamente
não explícito.
Ao estudar os exemplos (1) e (3), tratamos de dois dos três pólos dos
funcionamentos anafóricos citados no início, isto é, o DA e a representação
discursiva criada ou modificada no processo da resolução do referente da anáfora.
Vamos examinar o terceiro pólo, ou seja, o tipo de anáfora envolvida na relação. Os
Apoio teórico
46
exemplos (1) e (3) ilustraram o uso de pronomes da terceira pessoa (ele e as
respectivamente). Esse tipo de anáfora é especializado em sinalizar continuidade de
referência, e seu uso pressupõe que o referente pretendido ou denotatum seja
altamente saliente e topical no desenvolvimento da unidade discursiva. Como
Kleiber (1994: 3) mostra, uma predicação que contenha um pronome átono
referencial de 3ª. pessoa serve para estender a situação evocada através de uma
dada predicação antecedente, uma situação que seja psicologicamente saliente e na
qual esteja o protagonista central. Nos casos em que essa condição não acontece,
um tipo de forma indexicalmente 'mais forte' precisa ser usada no lugar do pronome
pessoal. Isto é ilustrado no exemplo (4), em que o demonstrativo, e não um pronome
pessoal, é requerido para efetuar a referência pretendida:
(4) a) A funcionária repetiu ingenuamente sua mentira para Mlle Vatnaz; esta
acabou contando para o bom funcionário (sobre isso).
b) # A funcionária repetiu ingenuamente sua mentira para Mlle Vatnaz; ela
acabou contando para o bom funcionário (sobre isso).
Dado que a protagonista saliente na primeira oração é a funcionária, então o
pronome da 3ª. pessoa 'ela' é indicada como a anáfora apropriada para recuperar
esse referente. Note que o SN funcionária em (4) é um nominal definido em posição
de sujeito, e assim um bom candidato para tópico da oração - em que a oração
como um todo é construída como uma estrutura de informação tópico-comentário.
Mas a integração do conteúdo da segunda oração com o da primeira seria
bem menos coerente neste caso, já que é mais provável que a pessoa para quem
alguém 'ingenuamente contou uma mentira' passará a uma terceira pessoa, e não
para o originador da 'repetição'. Assim a situação denotada pela segunda oração
não está em continuidade com a primeira, já que o agente (Vatnaz) da passagem da
informação originária é – normalmente - distinto da fonte da informação. Além disso,
Mlle Vatnaz é expressa como objeto indireto do verbo repetir, e assim está apenas
na periferia, e não no foco central da atenção quando a oração inicial foi processada.
Um pronome pessoal, como na segunda oração em (4b), não pode, portanto,
pinçar o referente de modo natural, se o componente predicativo dessa oração
mantiver a continuidade da situação denotada pela primeira - esta falta de coerência
é indicada através do prefixo # em 4b.
Apoio teórico
47
Um pronome demonstrativo como esta, por outro lado, fica perfeito para esse
propósito, já que sua 'instrução de uso' requer que o usuário recorra ao contexto do
enunciado do token indexical, fazendo uso deste para construir o referente
pretendido. Isto pede a introdução de uma 'quebra' na continuidade da situação
precedente, pela qual uma nova situação se estabelece. Mais ainda, o
estabelecimento do referente de uma expressão baseada-num-pronome-
demonstrativo requer que o receptor recupere mais de um referente potencial, caso
em que o demonstrativo pressupõe um contraste num conjunto de tais referentes.
Este é o caso em (4a), em que dois referentes femininos foram evocados na oração
inicial.
Finalmente, SNs com núcleo lexicalmente definido, como expressões
baseadas-em-demonstrativo, podem ser usados deiticamente ou anaforicamente. Ao
contrário dos SNs demonstrativos, os SNs definidos no singular pressupõem
unicidade, dentro de um dado conjunto partilhado de referentes (Hawkins, 1978) do
referente pretendido, e referem-se inclusivamente a todos os membros desse
conjunto em que há mais que um referente. Na visão do autor é essa propriedade
dos SNs definidos que os marca como favoráveis ao uso anafórico em lugar do
dêitico.
Hawkins adota uma visão discursiva-dinâmica dos SNs definidos - mais
especificamente do artigo o -, afirmando que tais expressões não necessariamente
pressupõem a unicidade ou familiaridade do receptor com o referente pretendido.
Pelo contrário, o que é comum em todos os usos do artigo definido é o fato de que
seu uso pressupõe um baixo grau de acessibilidade cognitiva do referente do SN
que ele introduz, e que um 'acesso ao caminho' para esse referente seja disponível
em termos do conhecimento corrente do receptor. Um 'acesso ao caminho' neste
sentido denota um 'conjunto de conexões ou elos cognitivos' possíveis de serem
construídos pelo receptor entre a entidade designada pelo SN em questão e o
conhecimento relevante acessível ao receptor (Epstein, 2002: 345). O artigo definido
nos SNs definidos é tratado como um 'desencadeador' para o estabelecimento de
um 'acesso ao caminho' relevante para o referente pretendido. O último é então
marcado como sendo proeminente-discursivo, embora não necessariamente de alto
acesso no ponto em que o SN ocorre.
Apoio teórico
48
1.3.2.4 O frame e a coerência
Por sua vez, Bednarek (2005) refere-se à diferença entre coesão e coerência.
A coesão é uma propriedade de textos e refere-se aos meios lingüísticos para prover
‘textura’, isto é, liga as sentenças de um texto, tal como a referência, a substituição,
a elipse, a reiteração, a colocação e a conjunção, de Halliday e Hasan (1976), os
padrões do léxico, de Hoey (1991), etc. A coerência, por outro lado, é mais bem
descrita como conexão semântica, lógica ou cognitiva que está subjacente ao texto
(cf. de Beaugrande and Dressler, 1981: 4; Bussmann, 1996: 80; Thompson & Zhou,
2000: 121). Ao invés de supor que essas conexões existam independentemente do
falante ou do ouvinte, a coerência é hoje claramente definida em relação à
contribuição do ouvinte: ‘[...] a coerência somente é mensurável em termos da
avaliação do leitor’ (Hoey, 1991: 11). Assim, chega-se a uma simples distinção entre
coerência e coesão: a coerência não é uma propriedade inerente ao texto; ela se
refere a relações lógicas de um texto e é estabelecida pelos ouvintes. Em outras
palavras, ela se refere à extensão pela qual os ouvintes julgam que este texto ‘está
unido’ e constitui um todo unificado. A coesão, por outro lado, é uma propriedade
inerente ao texto; ela se refere aos meios textuais explícitos pelos quais as conexões
lógicas potenciais são sinalizadas. Em outras palavras, ela se refere ao modo pelo
qual as sentenças ligam-se no texto por meios lexicais e estruturais (cf. also Bublitz,
1999).
Assim, a autora supõe que são os ouvintes que estabelecem a coerência, e
não os textos, embora os meios coesivos dos textos exerçam um amplo papel
ajudando os ouvintes a estabelecer a coerência. Em geral, operamos por princípio
automático de coerência (cf. Brown e Yule, 1983: 66; Bublitz & Lenk, 1999:156),
supondo que o texto seja coerente e que o falante obedeça aos princípios de
cooperação (Grice, 1975) que são tacitamente aceitas na conversa. Daí o porquê do
esforço que fazemos para criar coerência, apoiando-nos em pistas possíveis.
Frame é uma noção introduzida pelo psicólogo Bartlet em 1932. Numa
primeira definição, um frame pode ser considerado como uma estrutura mental de
conhecimento que capta feições ‘típicas’ do mundo. Bednarek (2005) trata da
aplicação de frames ao discurso pelo ouvinte para garantir a coerência. A teoria de
frame trata do conhecimento de mundo e, desde a sua concepção, o conceito tem
Apoio teórico
49
interessado pesquisadores de vários campos e tradições (cf. Tannen, 1993: 3;
1993b:15). Os pioneiros vieram da filosofia e da psicologia, mas seus conceitos
foram desenvolvidos e reinterpretados por pesquisadores da inteligência artificial
(Minsky, 1975, 1977) e da sociologia (Goffman, 1974, 1981) para nomear apenas
alguns campos e autores.
Segundo a autora, frame tornou-se um termo associado e ligado a fenômenos
diferentes, embora relacionados, ou seja, uma série de outras expressões foi
escolhida para referir-se a essas noções. Parece que os termos competidores
scenario, schema, script, geralmente diferem apenas em ênfase e não podem ser
facilmente distinguidos e, considerando os exemplos usados em sua elaboração,
eles podem ser vistos como instâncias particulares de frames. A autora segue
Fillmore (1992: 111) no que se refere a frame, mas a definição de acordo com
Minsky (1977) é hoje muito conhecida e referência sempre citada em lingüística (e.g.
Konerding, 1993: 24; Brown & Yule, 1983: 238).
Para Minsky (1977: 355), aqui está a essência da teoria de frame. Quando
encontramos uma situação nova [...], selecionamos na memória uma estrutura
chamada frame. Esta é uma estrutura lembrada para ser adaptada para ajustar à
realidade através de mudanças de detalhes se necessário. Um frame é uma
estrutura-de-dados para representar uma situação estereotipada como estar numa
certa sala ou indo para uma festa de criança. Ligados a cada frame há muitos tipos
de informações. [...] Alguns são sobre o que se pode esperar que aconteça a seguir’.
A esse respeito, Luchjenbroers & Aldridge (2007: 27) dizem que, uma vez que
um frame é acessado, todas as informações associadas relevantes para aquele
frame e traços contextuais adicionais ficam imediatamente disponíveis para
inferências suplementares. É o frame que capta as experiências sociais e culturais
bem como as expectativas associadas com essas referências. Mais ainda, contudo,
cada escolha lexical ativa que fazemos revela mais diretamente como encorajamos
os outros a pensar sobre certas pessoas, ações e eventos.
A socialização é sempre tanto individual quanto social. Experienciamos a vida
individualmente e subjetivamente, mas também possuímos certos padrões de
percepção inatos que usamos para interpretar o mundo, e temos mais ou menos as
mesmas experiências sociais dependendo de nossa cultura (cf. Müller, 1984: 57).
Apoio teórico
50
Tanto quanto eles são relevantes para a comunicação, os frames parecem ser
convencionalizados e captam as feições prototípicas de uma situação.
1.4 A relação entre coerência e coesão
Sabe-se que a coesão contribui para estabelecer a coerência, mas não
garante sua obtenção. O texto pode ser coerente, não porque as frases que o
compõem guardam entre si determinadas relações, mas essas relações podem ser
supridas pelo leitor, uma vez que o texto se apresente coerente para ele. Por outro
lado, pode haver texto em que se encontram os elos coesivos, mas que não faça
sentido, ou seja, não é coerente. Para o texto ser coerente, a coesão é suprida pelo
conhecimento de mundo do leitor. Esse conhecimento, ou seja, esse frame, segundo
Bednarek (2005), que o leitor traz na sua interação com o texto, inclui a noção de
gênero – no caso uma poesia moderna -, que contribui para que o leitor seja capaz
de inserir os elos coesivos necessários.
A seguir, apresento: (a) texto coerente, porém sem coesão; (b) texto (em
prosa) coerente, porém sem coesão; e (c) texto coeso, mas incoerente.
(a) Texto coerente, porém sem elos coesivos:
A PESCA (Affonso Romano de Sant’Anna.)
o anil
o anzol
o azul
o silêncio
o tempo
o peixe
a agulha
vertical
mergulha
a água
a linha
a espuma
estabanado
o tempo
a âncora
o peixe
a garganta
a âncora
o peixe
a boca
o arranco
o rasgão
aberta a água
aberta a chaga
aberto o anzol
Apoio teórico
51
aquelino
ágil claro
o peixe
a areia
o sol
(b) Texto em prosa, coerente, porém sem elos coesivos:
CORTE
O dia segue normal. Arruma-se a casa. Limpa-se em volta. Cumprimenta-se os vizinhos.
Almoça-se ao meio-dia. Ouve-se rádio à tarde. Lá. pelas 5 horas, inicia-se o sempre. Maria Amélia
Mello. (Miniconto publicado no Suplemento Literário do Minas Gerais no. 686, ano XIV. 24/11/1979,
p.9).
(c) Texto coeso, mas incoerente:
Desde o pé da colina
Desde o pé da colina se espalhava em todas as direções, até o horizonte, uma planície
coberta de areia. Na noite em que completava 30 anos, João, sentado nos degraus da escada
colocada à frente de sua casa, olhava o sol poente e observava como a sua sombra ia diminuindo
no caminho coberto de grama. De repente, viu um cavalo que descia para a sua casa. As árvores e
as folhagens não o permitiam ver distintamente; entretanto observou que o cavalo era manco. Ao
olhar de mais perto verificou que o visitante era seu filho Guilherme, que há 20 anos tinha partido
para alistar-se no exército, e, em todo este tempo, não havia dado sinal de vida. Guilherme, ao ver
seu pai, desmontou imediatamente, correu até ele, lançando-se nos seus braços e começando a
chorar. Autor desconhecido.
1.5 Progressão Tópica
Para Koch (2006: 97), um texto compõe-se de segmentos tópicos, direta ou
indiretamente relacionados com o tema geral ou tópico discursivo. A Progressão
Tópica pode ser feita de maneira contínua ou descontínua. Após o fechamento de
uma seqüência tópica, tem-se a continuidade ou mudança tópica, ou seja, a
descontinuidade tópica, quebra ou ruptura antes do fechamento de um segmento
tópico. Para que um texto possa ser considerado coerente é preciso que apresente
continuidade tópica, isto é, que se realize de forma que não ocorram rupturas
definitivas ou interrupções excessivamente longas do tópico em andamento sem que
haja justificação.
Segundo Goutsos (apud. Koch 2006: 99) a tarefa importante do produtor do
texto é indicar a descontinuidade dentro da continuidade mais ampla que se espera
Apoio teórico
52
do texto, monitorar a interação discursiva em termos de seqüencialização e
segmentar o discurso em blocos, indicando suas fronteiras, isto é, sinalizar a
descontinuidade porventura existente entre eles.
O autor pergunta ainda se haveria necessidade de sinalizar também a
continuidade, especialmente por se tratar do caso défault na interpretação, de
acordo com o Princípio da Analogia (Brown & Yule, 1983). Segundo ele, a
sinalização cria redundância no texto, o que reduz o esforço exigido do leitor,
assegurando-lhe que está no caminho certo e possibilitando-lhe ir adiante. Além
disso, o reforço da continuidade faria ressaltar a descontinuidade, quando ela
ocorresse. Continuidade envolve progressão. A progressão textual necessita garantir
a continuidade de sentidos, o constante ir-e-vir entre o que foi dito e o vir-a-ser dito,
responsável pelo entretecimento dos fios do discurso. Para isso o autor dispõe de
uma série de estratégias:
1. Continuidade referencial – a continuidade dos referentes obtida por meio das
cadeias referenciais mantendo-se em estado de ativação na memória de
trabalho.
2. Continuidade temática – o emprego de termos de um mesmo campo
semântico/lexical mantém ativado o frame de que tais termos são representantes,
o tipo de relacionamento que estabelece entre segmentos textuais permite ao
interlocutor verificar que se trata de um contínuo textual dotado de sentido.
3. Continuidade tópica – o uso destas estratégias garante a manutenção do
supertópico e dos quadros tópicos em desenvolvimento. Inserções tópicas e
mesmo as chamadas ‘digressões’, servem para garantir a construção da
coerência a não ser nos raros casos de abandono do tópico em curso.
Entre os conceitos aqui discutidos, Koch (2006), há uma relação de inclusão:
a progressão textual é garantida pela progressão/continuidade tópica; esta engloba
a progressão/continuidade temática que, por sua vez, repousa na progressão
continuidade referencial. No interior de uma concepção de texto, aquelas devem ser
vistas como resultado de estratégias postas em ação pelos sujeitos sociais, tendo
em mira a construção textual dos sentidos.
Apoio teórico
53
Detalho a seguir a Progressão Temática, que, através de escolhas léxico-
gramaticais adequadas, tematiza ou rematiza o tópico do discurso, com apoio nos
elementos referenciais do texto. Relacionados à Progressão Temática, refiro-me
também aos princípios a que ela deve obedecer para garantir o fluxo no texto, que
são estabelecidos pelo Contrato Dado-Novo e à Máxima de Antecedência. Feito
isso, trato do Rema, elemento que contém a informação nova, ou a informação
propriamente dita, mas que não tem sido foco de estudos como tem sido o Tema.
1.5.1 A Progressão Temática
Segundo Daneš (1974), da Escola de Praga, a Perspectiva Funcional da
Sentença refere-se ao fluxo de informação no interior de um enunciado e que se
efetiva através da ordem das palavras escolhidas pelo falante ao expor suas idéias.
O exame da língua em uso mostra que, de uma maneira geral, essa ordem ocorre
da seguinte forma na oração: (a) ocupando a posição inicial, um elemento que, na
maioria dos casos, coincide com sujeito da oração, com a informação dada, isto é,
conhecida ou identificável pelo ouvinte, e com o Tema do enunciado, ou seja, aquilo
de que se fala no enunciado; (b) a seguir, o predicado da oração coincidindo com a
informação nova, e com o Rema, aquilo de que se fala do Tema.
Daneš (1974) chama de Progressão Temática (PT) a escolha e a ordenação
dos Temas dos enunciados de um texto, que se concatenam e se hierarquizam entre
si, bem como à sua relação com o hipertema das unidades textuais superiores - tais
como o parágrafo, o capítulo -, e essa relação estendendo-se ao texto todo e à
situação. A PT seria um esqueleto da trama textual, um dos elementos responsáveis
pela coesão de um texto.
(a) PT linear simples (T
1
- R
1
; T
2
- R
2
; T
3
- R
3
, com R
1
= T
2
; R
2
= T
3
)
(...) Eu (T1) comprei um bolo. Ele (T2) foi comprado na Brunela. Essa loja (T3) fica perto de
casa.
(b) PT com T constante (T - R1; T - R2; T - R3)
(...) Pedro (T) foi sempre um bom aluno. Ele (T) quer fazer Engenharia, mas (T) acha que o
vestibular vai ser difícil.
Apoio teórico
54
(c) PT com T1, T2, T3 derivados de hipertema, T, no caso ‘campus da PUC’:
(...) Vamos explicar o campus da PUC (T). O prédio velho, que fica na rua Monte Alegre (T1);
o prédio novo, que fica na rua Ministro Godói (T2) e, finalmente, a casa da Cardoso de
Almeida (T3).
Segundo Daneš (1974), a Progressão Temática realiza-se de diversas
maneiras, ou seja, com tema constante, progressão linear, progressão com tema
derivado, progressão por subdivisão do rema, progressão com salto temático tem
relação com os propósitos e atitudes do produtor.
As relações entre segmentos textuais estabelecem-se em vários níveis, e se
dá em termos da articulação Tema-Rema, objeto de estudo da Perspectiva
Funcional da Frase. A informação temática é informação dada, conhecida, enquanto
a remática constitui informação nova. Dificilmente se encontra em um texto um único
tipo de Progressão Temática, pois há uma combinação para que o texto tenha a
organização desejada. De acordo com o autor, há certas ‘preferências’ de
determinados tipos de seqüência textual por determinado tipo de Progressão
Temática: com tema constante adapta-se às seqüências descritivas; com subdivisão
do tema ou do rema para as seqüências expositivas ou argumentativas; a linear é
comum na estruturação de todos os tipos de texto.
Outra acepção de Progressão Temática diz respeito ao avanço do texto por
meio de novas predicações sobre os elementos temáticos. É nesse sentido que, na
referenciação por meio de anáforas indiretas ocorre o que Schwars (2000) denomina
‘tematização remática’. Além dos encadeamentos entre anunciados por justaposição
ou conexão, inclui-se o encadeamento por segmentação textual que se realiza por
intermédio dos articuladores textuais. O emprego adequado dos articuladores
garante a continuidade temática, na medida em que ficam explicitadas as relações
entre os segmentos textuais que interligam, quer as do tipo lógico-semântico, quer
as de caráter discursivo-argumentativo.
Relacionado à Progressão Temática, há um princípio a que os falantes devem
obedecer para garantir o fluxo da informação no texto. Trata-se do Contrato Dado-
Novo, que apresento a seguir.
Apoio teórico
55
1.5.1.1 O Contrato Dado-Novo
De acordo com Clark & Havilland (1977), o falante e o ouvinte pressupõem
um acordo tácito sobre como a informação já conhecida e a informação
desconhecida devem aparecer na sentença. O núcleo desse contrato é a Máxima da
Antecedência, um preceito pelo qual o falante assegura ao ouvinte a informação
subentendida como dada ‘Máxima da Antecedência’. Tenta construir seus
enunciados de tal modo que o ouvinte tenha um e apenas um antecedente para
qualquer informação dada, e que este seja o antecedente pretendido. O Contrato
Dado-Novo é um procedimento de três etapas para integrar informações no texto.
Na etapa 1, o ouvinte isola na sentença a informação dada da informação nova. Na
etapa 2, ele procura na memória o único antecedente que coincide com a
informação dada. Finalmente, na etapa 3, o ouvinte integra a nova informação,
vinculando-a ao antecedente encontrado na etapa 2. Se o falante violar a Máxima da
Antecedência, o ouvinte não poderá encontrar o antecedente. Nesse caso, ele
adotará um dos seguintes procedimentos: (a) conexão; (b) adição e (c) re-
estruturação.
(a) Conexão: o ouvinte criará um antecedente ‘indireto’, construindo uma inferência
a partir de algo que ele já conhece. Lakoff (1971) dá um exemplo que ilustra o
procedimento: João é democrata. Bill é honesto também.
(b) Adição: nem sempre é possível a conexão. Nesse caso, o ouvinte acrescentará
à memória um novo nó - um nominal associado a um ou mais proposições -
que servirá de antecedente à informação dada. Isso ocorre, por exemplo, no
começo de estórias, tal como em: A velha morreu. A informação dada aqui é
‘existe uma velha’. Como não há contexto prévio, o ouvinte não sabe de
nenhuma velha. Ele então acrescenta um nó na memória correspondente a
‘aquela que é mulher e que é velha’ e usá-lo como antecedente da informação
dada em ‘A velha morreu’, e prosseguir em direção à etapa (3).
(c) Re-estruturação: quando o falante viola completamente o Contrato Dado-Novo,
o ouvinte só pode entender o que lhe está sendo transmitido, se re-estruturar o
que é dado e o que é novo no enunciado. Ex.: Ana viu alguém. Foi Ana que viu
Maria. A informação dada da segunda sentença é ‘x viu Maria’, que não
equivale a nenhuma proposição na memória, já que não há nenhum
Apoio teórico
56
antecedente adequado ao qual vincular a nova informação ‘x = Ana’. Nesse
caso o ouvinte pode re-estruturar a informação dada e a nova, na sentença, tal
que ‘Ana viu x’ seja dada e ‘x = Maria’ seja nova.
1.5.1.2 A Máxima da Antecedência
Glatt (1982) relaciona o Contrato Dado-Novo com o Princípio da Progressão
Temática, ou seja, a informação dada deve preceder a informação nova. A autora
estabelece algumas definições. O Tema está associado àquilo de que se fala. O
Rema refere-se àquilo que se fala sobre o Tema. Geralmente o Rema é
representado pelo predicado, o termo progressão refere-se à relação referencial da
informação dentro ou entre sentenças. Exemplifiquemos:
(a) A Betty gosta de peixes tropicais.
(b) Ela
visita o aquário uma vez por semana.
A informação temática (sublinhada) de (a) é correferencial à de (b): em
ambos, a informação temática permanece na posição inicial.
(c) Pedro ajudou a Sandra a entrar no carro.
(d) Ela tem um defeito físico.
A informação temática de (c) difere da informação temática de (d). Notemos
que esta é correferencial à informação remática de (c). Glatt estuda os recursos
lingüísticos disponíveis para marcar a correferencialidade. Tais são as anáforas
que, por definição, contêm informação dada: elas possibilitam substituir uma
palavra ou frase por outras, sem mudar o significado essencial da sentença. Pelo
contrário, eles possibilitam a manutenção do significado.
Glatt (1982) refere-se aos dois tipos de Progressão Temática estudados por
Daneš (1974).
Linear, em que a informação remática de uma oração é a mesma da informação
temática da oração seguinte:
(1) O juiz explicou as regras da competição, mas elas foram mal interpretadas pelos
competidores.
Apoio teórico
57
Linear interrompida, em que a informação remática é idêntica no par de
orações:
(2) O juiz explicou as regras da competição, mas os participantes as interpretaram mal.
Translinear, em que a informação temática do par de orações é idêntica:
(3) O juiz explicou as regras da competição, mas ele foi mal interpretado pelos competidores.
Translinear interrompida, em que a informação temática de uma oração é a
mesma da informação remática da oração seguinte:
(4) O juiz explicou as regras da competição, mas os participantes o interpretaram mal.
Como já vimos, o Tema e o Rema são geralmente definidos em posição inicial
e não-inicial, respectivamente. Segundo os praguenses, o grau de dinamismo
comunicativo tende a cair na informação dada, enquanto o grau mais alto associa-se
à informação nova. Para Glatt, quando o Tema, o dado e a posição inicial da oração
coincidem, aliança denominada Máxima da Progressão Temática, como ocorre nas
progressões temáticas linear e translinear, pode-se prever que essa justaposição
tenha o efeito de marcar redundantemente uma informação como dada. Tal fato
aliado ao Contrato Dado-Novo deverá ajudar o leitor a identificá-la mais facilmente.
Segundo Glatt, tal predição é confirmada por pesquisas sobre memória,
fornecendo indício de que a informação apresentada de acordo com o par perfeito,
linear e translinear, reativa continuamente a mesma área mental ou nó, pela
referência repetida da informação dada. Cada vez que o nó é ativado, fortalece-se
provavelmente a ligação, com isso diminuindo o número de procuras (Kintsch 1984)
e facilitando a estocagem e a integração subseqüente da informação nova com a
dada (Collins & Loftus 1975).
1.6 N-REMA
Rema é tudo menos o Tema. O que significa que existe muita coisa dentro do
Rema, mas não significa que tudo que esteja aí tenha a mesma função. Assim, Fries
(1995) destaca o Novo dentro do Rema, unindo assim o sistema do Tema/Rema
com o sistema da informação Dado/Novo, chamando esse elemento de N-Rema e o
que resta do Rema ele chama de Outros.
Apoio teórico
58
O que seria esse N-Rema? N-Rema, o constituinte final da oração, é o local
não-marcado de colocação da Informação Nova (Fries, 1995: 349). Vamos analisar
um exemplo, dado por ele:
Quadro 5 - Identificação do N-Rema
Adeus às armas
1. No fim do verão daquele ano
, moramos numa casa de uma vila que se via através do rio e
Tema Outros N-Rema (O.Ant)
da
planície próximos da montanha.
N-Rema (Skip 3)
2a. No leito do rio havia seixos e pedras, secos e brancos ao sol,
2b. e a água era clara e se movia suavemente e era azul nos canais.
3a. Os rebanhos passavam diante da casa e desciam pela estrada,
3b. e a poeira que eles que levantavam polvilhavam as folhas das árvores
.
N-Rema
4a. Os troncos das árvores também estavam empoeirados
4b. e as folhas caíram cedo naquele ano
4c. e vimos os rebanhos marchando pela estrada ...
5a. A planície era rica de plantações,
Fonte: Fries, 1995
No exemplo, o N-Rema rio é o que o escritor quer que o leitor se lembre
quando ler 2a e 2b (rio, no leito do rio e água formam uma cadeia de semelhança).
Notar que as folhas das árvores
e as folhas formam uma cadeia de identidade. Não
é o Rema todo que deve funcionar nesse sentido, mas apenas o N-Rema, segundo
a proposta de Fries. E ele é chamado N-Rema- O.Ant (da oração anterior). Por outro
lado, planície
deve ser lembrada pelo leitor em 5a. (3 sentenças abaixo) e portanto é
chamado N-Rema Skip 3.
59
2 METODOLOGIA
Neste capítulo, apresento a metodologia de pesquisa adotada para a
realização desta dissertação, incluindo a caracterização dos dados, do contexto da
pesquisa, dos sujeitos envolvidos, bem como da descrição dos procedimentos
metodológicos desenvolvidos para a coleta e análise dos dados.
A metodologia de pesquisa descrita neste estudo insere-se na categoria de
pesquisa qualitativa, com um estudo de caso, pelo fato de analisar textos
dissertativo-argumentativos produzidos por alunos do 1º ano do Ensino Médio, em
uma comunidade específica.
2.1 Dados
O corpus desta pesquisa é composto de textos dissertativo-argumentativos,
produzidos por 34 alunos de dois 1º anos do Ensino Médio, do período noturno, de
uma escola localizada em São Paulo, na região de Santo Amaro, pertencente à
Diretoria de Ensino Sul 2. Das 70 redações produzidos ao longo do ano letivo de
2007 com temas diversos, 21 foram selecionadas e 2 unidades foram escolhidas
para análise sob os seguintes critérios: recenticidade e tema idêntico. O critério
recenticidade refere-se à época da produção do texto, o tema, refere-se ao fato de
que todas as redações analisadas tratam do mesmo assunto. A seguir, passo a
traçar o perfil da escola envolvida na pesquisa.
2.1.1 Caracterização da Escola
A Unidade Escolar participante desta pesquisa está situada na Zona Sul da
cidade de São Paulo, região populosa, composta por migrantes de todos os estados
do Brasil, principalmente oriundos do Nordeste, que se estabeleceram no bairro pela
facilidade de moradia de baixo custo.
A região possui características de classe média baixa e classe baixa,
respectivamente. O bairro, embora apresente sinais de desenvolvimento,
perceptíveis pelos investimentos na construção civil e expansão imobiliária de
Metodologia
60
condomínios; pela ampliação da malha viária da Cia do Metroviário do Estado de
São Paulo, por meio da linha Largo Treze - Capão Redondo; e pelas construções
dos terminais de ônibus Capelinha e Capão Redondo necessita de investimentos em
áreas destinadas às práticas de esporte e à instalação de instituições que promovam
eventos educacionais e culturais. Em contrapartida, o bairro apresenta, também,
construções típicas da ocupação e do crescimento desordenados que contribuem
para a expansão das comunidades carentes e acentuam as dificuldades de acesso
aos serviços de saúde, educação, cultura e lazer.
Outro dado importante é o fato de não haver bibliotecas públicas instaladas
na região, em virtude disso, alguns alunos da Unidade Escolar envolvida nesta
pesquisa, contam com a ajuda de instituições não governamentais que oferecem
acervo de materiais para pesquisas, cursos profissionalizantes, cursos de
informática e acesso à internet. Entretanto, existe a dificuldade no atendimento à
comunidade escolar por causa da demanda de usuários e do baixo nível de recursos
destinados à instalação e à manutenção dos equipamentos disponíveis nessas
organizações.
A Unidade Escolar funciona nos períodos da manhã, tarde e noite; com carga
horária distribuída da seguinte maneira: no 1º período, 8ª séries do Ensino
Fundamental II e 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio; no 2º período, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª do
Ensino Fundamental II; no 3º período, 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio Regular e
Ensino para Jovens e Adultos - EJA.
2.1.2 Os sujeitos da pesquisa
Considerando o contexto apresentado, pode-se afirmar que todas as
dificuldades citadas contribuem para formar o perfil do aluno participante desta
pesquisa. Geralmente o curso noturno recebe o aluno trabalhador, que depois de
uma média de oito horas trabalhadas, enfrenta as dificuldades do transporte público
e do congestionamento e vai direto para a escola. Esse aluno, além de apresentar
um quadro de dificuldades na aprendizagem de leitura e interpretação de textos,
também, demonstra problemas no momento em que precisa produzir textos
dissertativo-argumentativos, tema desta dissertação.
Metodologia
61
O grupo participante desta pesquisa foi formado por jovens de duas salas do
1º ano do Ensino Médio; em torno de 40% eram repetentes da série em que
estavam matriculados no ano de 2007; na faixa etária dos 17 aos 25 anos e
pertencentes à classe social baixa. Em média 90 por cento do grupo trabalha em
torno de seis a oito horas durante o dia e, por isso os alunos optaram pelo estudo
noturno.
O grupo divide-se em duas salas, doravante denominadas classes A e B
cujos perfis se assemelham pelo fator origem e localização da moradia. A classe
identificada por A, são 13 jovens do sexo masculino e 6 do sexo feminino; na classe
identificada por B, são 9 jovens do sexo masculino e 6 do sexo feminino. Pode-se
dizer que o contexto sócio-cultural desprivilegiado contribuiu para o baixo nível de
formação desses jovens, pois apresentam dificuldades na leitura e na interpretação
de textos de Gêneros diversos, principalmente, os que exigem do educando
habilidade e competência tais como: leitura, seleção e apreensão de informações em
textos de opinião, análise e produção de textos a considerar o texto argumentativo-
dissertativo.
2.1.3 Procedimentos metodológicos para coleta de dados
Para melhor entendimento da proposta desta dissertação cujo objetivo é a
análise da coesão e da coerência em textos dissertativo-argumentativos produzidos
por alunos do Ensino Médio, julgo pertinente descrever, detalhadamente, todos os
procedimentos metodológicos utilizados para a coleta dos dados.
O corpus compõe-se de textos produzidos de acordo com os seguintes
procedimentos: (a) escolha do assunto pelos alunos; (b) discussão de questões
sobre o tema escolhido em grupos de quatro ou cinco alunos; (c) apresentação do
resultado da discussão para toda a classe; (d) orientações para a produção dos
textos dissertativo-argumentativos.
Para a realização do trabalho, foram quatro etapas distribuídas em atividades
diversificadas e desenvolvidas ao longo de três semanas contadas a partir da
apresentação do projeto ‘Propaganda’ até o momento da entrega das redações
escritas pelos alunos. Considerando a apresentação da proposta, o desenvolvimento
Metodologia
62
de cada atividade e a produção dos textos foram 8 aulas de 45 minutos. Da pequena
carga horária de quatro aulas semanais de 45 minutos destinadas ao estudo de
Literatura, Gramática e Produção de texto, decidi pela reserva de duas aulas
semanais para o desenvolvimento da produção de textos tendo em vista as
dificuldades apresentadas pelos alunos.
A primeira etapa para coleta do corpus foi uma atividade que objetivava a
escolha do assunto que seria tratado pelos alunos nas redações do 3
o
bimestre do
ano de 2007. Havia três propostas de assunto, previamente sugeridas pelos alunos
por meio de votação simples em sala de aula. Solicitei aos alunos presentes para o
desenvolvimento dessa atividade, 22 meninas e 12 meninos a decidir livremente
entre os temas aborto, escolha profissional e propaganda, que foram colocados na
lousa para que o grupo escolhesse de forma democrática.
Escolhido o assunto propaganda, os alunos organizados em grupos de quatro
ou cinco participantes discutiram questões a respeito da propaganda brasileira;
quais os recursos utilizados nas propagandas para atrair o consumidor? O
consumidor consegue perceber que alguns recursos são utilizados para estimular o
consumo? Esta atividade teve a duração de duas aulas de 45 minutos contadas a
partir da proposta ao final da discussão. Durante a realização do trabalho, circulei
pela sala para conversar com os alunos sobre o assunto em pauta. A interação entre
a professora e os grupos foi necessária não só para direcionar e orientar a
discussão, mas também para saber como estava a participação de todos na
realização da atividade. Considero esse momento da atividade importante porque os
alunos tiveram a oportunidade de compartilhar e ampliar os conhecimentos a
respeito da propaganda brasileira, que está presente no cotidiano das pessoas, mas
que não suscita muitos questionamentos quando apresentada ao grande público
consumidor.
Em uma segunda etapa, após a discussão, cada grupo de alunos teve
oportunidade de democratizar o resultado do trabalho, apresentando para toda a
classe o produto final, ou seja, a conclusão da atividade realizada. Nessa fase da
atividade, esperava-se que os alunos ampliassem o conhecimento sobre o assunto,
acumulando e trocando informações, ou seja, compondo o material que poderia ser
utilizado na produção dos textos. Os alunos chegaram a conclusão de que entre os
recursos mais utilizados pelos publicitários para atrair os consumidores, isto é, as
Metodologia
63
estratégias publicitárias que ficaram mais evidentes foram as que lançam mão da
sedução e do erotismo para chamar a atenção do consumidor. Destaco aqui a
contribuição da atividade, pois foi um momento que proporcionou aos alunos a
possibilidade de apresentar o problema, avaliar e comentar sobre o assunto em
pauta, ou seja, os alunos desenvolveram a habilidade de raciocínio, aprenderam a
encadear as idéias defendidas no tratamento argumentativo de determinado tema.
A terceira etapa do trabalho foi uma atividade prática, uma análise de textos
de publicitários. Ainda, no mesmo grupo de quatro ou cinco participantes, os alunos
tiveram a tarefa de pesquisar e selecionar, no prazo de uma semana, modelos de
propagandas, com fotos e textos escritos que utilizam, para atrair o consumidor, os
recursos de sedução e de erotismo apontados por eles na atividade anterior. Esse
trabalho foi elaborado por meio de cartazes para posterior apresentação. Cada
grupo confeccionou um cartaz contendo os seguintes itens: a identificação do
produtor e do produto; a utilidade do produto e o tipo de consumidor. Os grupos
deveriam, ainda, destacar no texto, os recursos utilizados para atrair o consumidor,
ou seja, grifar na redação da propaganda escolhida, o que consideravam recursos
de sedução ou de erotismo na propaganda selecionada. O resultado dessa atividade
prática foi apresentado, democraticamente, para toda a sala, um momento que julgo
pertinente porque o aluno tem a oportunidade de desenvolver a habilidade de
seleção, interpretação e análise de informações importantes de um texto publicitário,
isto é, pode perceber o que há por traz do texto e qual a intenção do publicitário ao
apresentar a propaganda de um produto.
A quarta etapa do trabalho foi uma atividade individual de redação sobre o
assunto trabalhado nas etapas anteriores. Cada aluno deveria elaborar um texto
dissertativo-argumentativo explorando o assunto ‘propaganda’ discutido nas
atividades desenvolvidas anteriormente. Creio que todos os procedimentos
metodológicos tenham sido cruciais para que os alunos pudessem escrever o texto
dissertativo-argumentativo. Além disso, o desenvolvimento de cada etapa contribuiu
para que os alunos exercitassem as habilidades de argumentação oral e defesa de
opiniões em relação a temas polêmicos.
Selecionado o corpus, os textos escolhidos para análise foram transcritos sem
que houvesse qualquer tipo de alteração, ou seja, todas as inadequações em
relação à estrutura textual, à ortografia, às normas gramaticais foram conservadas.
Metodologia
64
2.1.4 Modelo de estrutura
Nesta seção apresento um modelo de estrutura utilizado pelos alunos do
Ensino Médio com o objetivo de se preparar para os testes de seleção para vagas
no mercado de trabalho e, também, para os exames oficiais propostos pelo Governo
do Estado de São Paulo. São orientações básicas transmitidas aos alunos,
principalmente, para aqueles que nunca tiveram contato ou produziram textos
argumentativo-dissertativos. Durante a semana de 14 a 16 de fevereiro do ano de
2007, em quatro aulas de 45 minutos os alunos estudaram a proposta de Granatic
(2005: 76), acompanhe o esquema abaixo:
Esquema básico da dissertação
Imagine que você queira dissertar sobre o seguinte tema:
TEMA Chegamos ao terceiro milênio, entretanto, o homem ainda não conseguiu resolver
graves problemas que preocupam a todos.
Por quê?
Existem populações vivendo em completa miséria.
A paz é interrompida freqüentemente por conflitos internacionais.
O meio ambiente está ameaçado por sério desequilíbrio ecológico.
Terra: uma preocupação constante
Chegamos ao terceiro milênio, entretanto, o homem ainda não conseguiu resolver graves
problemas que preocupam a todos, pois existem populações vivendo em completa miséria, a paz é
interrompida com freqüência por conflitos internacionais e, além disso, o meio ambiente está
ameaçado por sério desequilíbrio ecológico.
Embora o planeta disponha de muitas riquezas, estas são mal distribuídas entre os Estados
e os indivíduos e, por conta disso encontramos legiões de famintos em pontos específicos da Terra.
Nos países do Terceiro Mundo, sobretudo em certas regiões da África, vemos, com tristeza, a
falência da solidariedade humana e da colaboração entre as nações.
Nestas últimas décadas temos assistido, com certa preocupação, aos inúmeros conflitos
internacionais que se sucedem. Muitos trazem na memória a triste lembrança das guerras do Vietnã
e da Coréia, as quais provocaram grande extermínio de pessoas inocentes. Em nossos dias,
testemunhamos conflitos na Iugoslávia, em alguns países membros da Comunidade dos Estados
Independentes, sem falar da guerra do Golfo, que tanta apreensão causou ao mundo.
Outra preocupação constante é o desequilíbrio ecológico, provocado pela ambição
desmedida de alguns, que promovem desmatamentos desordenados e poluem as águas dos rios.
Tais atitudes contribuem para que o meio ambiente, em virtude de tantas agressões, acabe por se
transformar em local inabitável.
Enfim, é possível perceber que o homem está muito longe de solucionar os grandes
problemas que afligem diretamente a uma grande parcela da humanidade e indiretamente a
qualquer pessoa consciente e solidária. É desejo de todos que algo seja feito no sentido de conter
essas forças ameaçadoras, para que se possa suportar as adversidades e construir um mundo que,
por ser justo e pacífico, será mais facilmente habitado pelas gerações vindouras. (Fonte: Granatic,
2005, texto adaptado).
Metodologia
65
Note que, de acordo com a sugestão da autora, no primeiro parágrafo, ou
seja, na introdução, há apresentação do tema e dos três argumentos propostos. No
desenvolvimento do segundo ao quarto parágrafo, o aluno deveria desenvolver
todos os argumentos, apresentando justificativas, exemplos, dados estatísticos para
embasar sua argumentação. E, por último, no parágrafo conclusivo, deveria
apresentar uma proposta de solução ou de intervenção para o problema proposto.
A utilização desse esquema serviu para orientar o aluno e situá-lo a respeito
das exigências na produção de um texto dissertativo-argumentativo. Na verdade, foi
uma solução encontrada pelos professores para auxiliar os alunos na produção de
textos. A intenção não foi resolver o problema a curto prazo, mas amenizar as
dificuldades que os alunos encontram na hora de elaborar um texto.
2.2 Procedimentos metodológicos de análise dos dados
As redações são, inicialmente, apresentadas em sua forma original, na
íntegra. A seguir, são avaliadas em termos de coerência e de coesão, conforme a
proposta de Eggins (1994):
(a) coerência – enfoque no Gênero e no Registro
(i) examinar os estágios de Gêneros, seguindo Hoey (1994), cuja estrutura
prevê:
situação
problema
solução
resultado ou avaliação
(ii) estabelecer as variáveis de Registro:
campo
relações
modo
(b) coesão – enfoque em:
(i) manutenção dos participantes
(ii) seleção lexical
(ii) elos entre orações
Metodologia
66
Adotamos as categorias apresentadas por Hasan (1989), que distingue a
coesão não-estrutural da coesão estrutural.
Quadro 6 - Tipos de coesão
C O E S Ã O NÃO-E S T R U T U R A L
RELAÇÕES COMPONENCIAIS RELAÇÕES ORGÂNICAS
Coesão Gramatical
Relação típica do elo
A. Referência
Pronome
(Pedro chegou e ele ...).
Demonstrativo
(São bons livros. Leia
este
).
Artigo definido (Eu vi um rato. O rato ...).
Comparativo (Um problema diferente ...).
B. Substituição e elipse
Nominal
(transfusão e hospital).
Verbal (latir e cachorro).
Oracional (Ele falou isso e eu também.).
Co-referencial
(referem-se ao
mesmo item).
Co-referencial/Co-
classificatório
Co-classificatório
(referem-se a
itens da mesma classe).
A. Conjunções
Elo causal, concessivo
B. Pares adjacentes
Pergunta/resposta
Oferta/aceite
Ordem/obediência
Coesão Lexical
A. Geral
Repetição
Sinonímia
Antonímia
B. Instancial
(específicos de
um texto).
Equivalência
Semelhança
Nomeação
(João = padre
num determinado texto)
.
co-classificação ou
co-extensão
(semelhança geral).
co-referência ou
co-classificação
Continuativos
ex.: ainda, já, etc.
C O E S Ã O E S T R U T U R A L
A. Paralelismo
B. Desenvolvimento Tema-Rema
C. Organização dado-novo
Fonte Hasan, 1989
67
3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Inicio a análise dos textos dissertativo-argumentativos adotando, para a
averiguação da coerência e da coesão das referidas produções discentes, os
requisitos que se encontram em Eggins (1994), de que a coerência é dada pelo
respeito ao Gênero - com sua estrutura esquemática (Hasan 1989) ou estrutura de
Gênero (Martin 1992) com seus estágios e finalidades - e ao Registro - submetendo-
se às variáveis de Campo, Relação e Modo. Quanto à coesão, esta se apóia na
manutenção dos participantes, na seleção lexical e na conjunção de orações.
Análise do texto 1
A análise do texto 1 - “Campanhas eróticas” seguirá dois movimentos: (I)
análise da coerência, com (a) verificação dos estágios de Gênero e suas finalidades
e (b) das variáveis de Registro: Campo, Relação e Modo; e (II) análise da coesão,
quando serão examinadas (a), a manutenção dos participantes no texto, (b) a
seleção lexical e (c) a conjunção de orações.
Apresento, a seguir, na íntegra, o texto 1 “Campanhas eróticas”, escrito por
aluna do 1º. ano do Ensino Médio, em 12/09/2007.
Texto 1
Campanhas eróticas
As campanhas publicitárias utilizam o erotismo para seduzir o consumidor, porque essa é
uma forma de atrair e seduzir as pessoas e, além do mais, com isso eles conseguem vender seu
produto de uma maneira eficiente.
Nas campanhas publicitárias o que é mais utilizado é o erotismo, um exemplo é a
propaganda de cerveja ou até mesmo comercial de sandália. No comercial de cerveja existe muita
sedução pois nele vemos mulheres semi-nuas bonitas e muito sedutoras tomando cerveja. A
propaganda de sandália Havaianas é feita por atrizes famosas como Débora Seco, Juliana Knuch,
Carol Castro. No comercial elas estão bem sedutoras para induzir as pessoas comprarem. Com
pessoas famosas fazendo propagandas sedutoras, o consumidor é muito mais induzido a comprar
o produto que está sendo oferecido.
Com o erotismo a venda fica muito mais eficiente, pois é um jeito de chamar a atenção de
quem os vê. Um exemplo disso são propagandas que enunciam tecnologia, pois todo jovem quer
ter um celular com mil e uma qualidade, um MP4, Ifone e muitos outros. Mesmo que eles não
tenham condições fazem de tudo para tê-los. Mesmo que já tenhamos o produto ou não
precisamos dele a sedução é tão grande que acabamos comprando. Só de pensar em ter um
celular que todos desejam ter isso é tudo.
Os recursos que os publicitários podiam usar, seria falando e valorizando mais o produto
sem erotismo. Não teria o mesmo efeito porque iria faltar algo para chamar atenção do público.
Com o erotismo é muito mais fácil atrair e seduzir o consumidor.
Análise e discussão dos resultados
68
I. Análise da coerência
(a) A coerência referente ao Gênero
A seguir, no quadro 7, analiso os elementos referentes à coerência,
enfocando os estágios e suas finalidades no texto “Campanhas eróticas” cujos
parágrafos são indicados pelas letras do abecedário e cuja estrutura de Gênero está
dividida em estágios, de acordo com as colunas à direita.
Quadro 7 - Verificação da coerência de Gênero – Texto 1
Exame da coerência de Gênero
Campanhas eróticas
Aluna do 1º ano do Ensino Médio
Data: 12/09/2007
Estágios de
Gênero e
Finalidades
(a) As campanhas publicitárias utilizam o erotismo para seduzir o
consumidor, porque essa é uma forma de atrair e seduzir as pessoas
e, além do mais, com isso eles conseguem vender seu produto de uma
maneira eficiente.
Tese
(b) Nas campanhas publicitárias o que é mais utilizado é o erotismo,
um exemplo é a propaganda de cerveja ou até mesmo comercial de
sandália. No comercial de cerveja existe muita sedução pois nele
vemos mulheres semi-nuas bonitas e muito sedutoras tomando
cerveja. A propaganda de sandália Havaianas é feita por atrizes
famosas como Débora Seco, Juliana Knuch, Carol Castro. No
comercial elas estão bem sedutoras para induzir as pessoas
comprarem. Com pessoas famosas fazendo propagandas sedutoras, o
consumidor é muito mais induzido a comprar o produto que está sendo
oferecido.
Evidências para
apoiar a tese
(c1) Com o erotismo a venda fica muito mais eficiente, pois é um jeito
de chamar a atenção de quem os vê. Um exemplo disso são
propagandas que enunciam tecnologia, pois todo jovem quer ter um
celular com mil e uma qualidade, um MP4, Ifone e muitos outros.
Evidência? A
propaganda da
tecnologia apóia-
se no erotismo?
(c2) Mesmo que eles não tenham condições fazem de tudo para tê-los.
Mesmo que já tenhamos o produto ou não precisamos dele a sedução
é tão grande que acabamos comprando. Só de pensar em ter um
celular que todos desejam ter isso é tudo.
Problema
(d) Os recursos que os publicitários podiam usar, seria falando e
valorizando mais o produto sem erotismo. Não teria o mesmo efeito
porque iria faltar algo para chamar atenção do público. Com o erotismo
é muito mais fácil atrair e seduzir o consumidor.
Solução
contraditória
Análise e discussão dos resultados
69
Discussão
No exame da estrutura de Gênero, verifica-se que o texto está constituído de
quatro parágrafos distribuídos em cinco estágios. A análise mostra que o texto
segue, em linhas gerais, o esquema de Hoey (1994), de Problema-Solução. Os
estágios são os seguintes: (a) apresentação da Tese (o erotismo ajuda a
propaganda); (b) e (c1) Evidências para apoiar a tese; (c2) Problema (os malefícios
da propaganda) e (d) Solução. Porém, ao examinarmos as finalidades desses
estágios (Martin, 1985), verificamos dois problemas: (i) no estágio (c1):
‘Um exemplo disso são propagandas que enunciam tecnologia, pois todo jovem quer ter um
celular com mil e uma qualidade, um MP4, Ifone e muitos outros’.
A conjunção ‘pois’ traz uma outra causa para a propaganda, ou seja, o ‘desejo
do jovem’. Falta aí a informação de que ‘é o erotismo que desperta o desejo no
jovem’, que, pelo contexto ‘juventude’ pode não ser o caso, já que as características
desse contexto variam de acordo com o frame que o leitor trará na sua interação
com o texto. Talvez a verdadeira causa esteja no próprio objeto – celular, MP4,
Ifone, ou seja, nas maravilhas apresentadas pela tecnologia moderna. (ii) Outro
problema está em (d), quando a Solução contradiz a Tese, em vez de corroborá-la:
Não teria o mesmo efeito porque iria faltar algo para chamar atenção do público’.
O uso do ‘pois’, para quem tem a Tese de que o erotismo serve para chamar
a atenção do público, trazer como Solução algo que deixa de fazê-lo, é invalidar a
Tese em favor de outra. Portanto, o exame do Gênero nos autorizaria a dizer que o
texto é incoerente.
(b) A coerência referente ao Registro
Examino, na averiguação da coerência do texto, o comportamento das
variáveis de Registro: Campo, Relações e Modo. Como não poderia deixar de ser, o
Registro também fica prejudicado, devido a problemas apresentados no Gênero, já
que ambas se interrelacionam. Em Campo, ou seja, assunto, (c1), ao trazer o
‘desejo do jovem’ como causa da compra de tecnologia moderna, quando deveria
manter o erotismo como essa causa, o texto muda de Campo, o mesmo
Análise e discussão dos resultados
70
acontecendo em (d), quando o autor entra em contradição ao apontar uma Solução
que vai contra a sua Tese, mudando, portanto, o enfoque de Campo. A variável
Relação apresenta-se de acordo com a interação ‘aluno escrevendo um texto
dissertativo-argumentativo para sua professora’, em que se observa o respeito à
distância entre as pessoas envolvidas. Quanto ao Modo, há problemas de
interferência da linguagem oral na escrita: ‘além do mais’ em (a), ‘um jeito’ (c1), ‘e
muitos outros’ (c1), ‘condições’ sem o complemento nominal (c2), mudança de ‘eles’
para ‘nós’, sem motivo para tal (c2), ou ‘Só de pensar em ter um celular que todos
desejam ter isso é tudo’. Além disso, existem falhas gramaticais como: ‘comprarem’
em vez de ‘a comprarem’ (b), ‘mil e uma qualidade’ em vez de ‘mil e uma qualidades’
(c1), ‘precisamos’ em vez de ‘precisemos’ (c2).
Discussão
A análise do Registro revela muitos problemas nesse texto. Por meio de um
exame detalhado, o autor poderá compreender que o ato de escrever, longe de ser
uma tarefa árdua e difícil, poderá ser uma atividade de realização simples e
agradável. Entretanto, há de se considerar alguns pontos fundamentais a serem
observados antes da escritura de um texto. Primeiramente, durante a elaboração de
um texto, o autor deveria se conscientizar de que o texto possui uma estrutura a ser
seguida, que se apóia nas escolhas léxico-gramaticais; em segundo lugar, a atenção
dispensada ao Campo, assunto, geralmente, proposto na introdução que o autor
deverá discutir ao longo do texto. E, por último, o item Relação que, para garantir a
coerência de Registro, exige que sejam realizadas escolhas adequadas em
concordância com a relação estabelecida entre autor/leitor.
Conclusão: há inadequações tanto no item Gênero quanto no item Registro
que fazem o texto ser considerado incoerente. Esse procedimento de análise
esclarece ao aluno – de maneira pontual - os problemas de sua redação, o que
contribui para que ele tenha uma noção mais exata dos motivos de sua escrita ainda
precisar de maiores cuidados. Se o autor estiver bem consciente dos itens em que
deve prestar atenção, ficará mais fácil para ele mesmo perceber os pontos fracos e
Análise e discussão dos resultados
71
se auto-corrigir, fato que, evidentemente, lhe dará mais confiança ao enfrentar o
processo da escrita e mais satisfação na execução dessa tarefa.
II. Verificação da coesão
(a) A manutenção do participante e a Progressão Temática
A manutenção dos participantes no decorrer do texto é um dos requisitos da
coesão, conforme Eggins (1994), que, além disso, alista a seleção lexical e a
conjunção de orações como fatores proporcionadores de um texto coeso. Como
vimos, a manutenção dos participantes pode ser feita por meios gramaticais
(pronome, demonstrativo, artigo, elipse, comparação) e por meios lexicais (geral:
repetição, sinonímia, antonímia; instancial: equivalência, semelhança e nomeação),
Halliday & Hasan (1989). O rastreamento de um determinado participante no
desenrolar do texto forma o que Martin (1992) denominou Cadeia de Referência.
Vejamos a seguir, no quadro 8 o exame da manutenção de ‘erotismo’ no texto
“Campanhas eróticas”, através das categorias ditadas por Halliday & Hasan.
Análise e discussão dos resultados
72
Quadro 8- Manutenção dos participantes – Texto 1
Campanhas eróticas
Manutenção
de
‘erotismo’
(a) As campanhas publicitárias utilizam o erotismo para seduzir
(1) o consumidor, porque essa é uma forma
(2) de atrair e
seduzir
(3) as pessoas e, além do mais, com isso (4) eles
conseguem vender seu produto de uma maneira eficiente
(5).
(1) Ins. Equivalência
(2) Ins. Nomeação
(3) Ins. Semelhança
(4)Ref.Demonstrativo
(5) Ins. Nomeação
(b) Nas campanhas publicitárias o que é mais utilizado é o
erotismo
(1), um exemplo é a propaganda de cerveja ou até
mesmo comercial de sandália. No comercial de cerveja existe
muita sedução
(2) pois nele vemos mulheres semi-nuas bonitas
(3) e muito sedutoras
(4) tomando cerveja. A propaganda de
sandália Havaianas é feita por atrizes
famosas (5) como Débora
Seco, Juliana Knuch, Carol Castro. No comercial elas estão bem
sedutoras
(6) para induzir as pessoas comprarem. Com pessoas
famosas fazendo propagandas sedutoras
(7), o consumidor é
muito mais induzido a comprar o produto que está sendo
oferecido.
(1) Ger.Repetição
(2) Ins. Equivalência
(3) Ins. Equivalência
(4) Ger.Repetição
(5) Ins. Nomeação
(6) Ins. Equivalência
(7) Ins. Equivalência
(c1) Com o erotismo (1) a venda fica muito mais eficiente (2),
pois é um jeito
(3) de chamar a atenção de quem os vê. Um
exemplo disso são propagandas que enunciam tecnologia, pois
todo jovem quer ter um celular com mil e uma qualidade, um
MP4, Ifone e muitos outros.
(1) Ger. Repetição
(2) Ins. Nomeação
(3) Ins. Nomeação
Há aqui uma
interrupção de
‘erotismo’ para
‘tecnologia’, como já
foi explicado.
(c2) Mesmo que eles não tenham condições fazem de tudo para
tê-los. Mesmo que já tenhamos o produto ou não precisamos
dele a sedução
(1) é tão grande que acabamos comprando. Só
de pensar em ter um celular que todos desejam ter isso é tudo.
(1) ‘Sedução’ passa
a traduzir não o
erotismo mas as
maravilhas da
tecnologia. Há um
desvio de Campo.
(d) Os recursos que os publicitários podiam usar, seria falando e
valorizando mais o produto sem
erotismo (1). Não teria o mesmo
efeito porque iria faltar algo para chamar atenção do público.
Com o erotismo
(2) é muito mais fácil atrair e seduzir o
consumidor.
(1) ‘Erotismo’ com
para a ‘erotismo’
sem, ou seja, a-
erótico.
(2) Ger. Repetição
Análise e discussão dos resultados
73
O rastreamento do participante ‘erotismo’ mostra que o autor para efetivar a
coesão utilizou os recursos: Referência (1 demonstrativo); Geral (4 repetições),
Instancial (5 equivalências, 5 nomeações, 1 semelhança). Como já foi dito, o item
‘coesão gramatical via substituição’ não se justifica, pois na análise coincide com um
dos tipos de anáfora. Assim, o autor – embora com seleção lexical pouco variada –
tenta efetivar a coesão.
Considerando a descrição acima, nota-se que até o terceiro parágrafo há
coesão com a manutenção do participante ‘erotismo’, mas de maneira repetitiva
como se pode constatar no texto, o erotismo é mantido através de ‘sedução’ e
‘atração’. Do meio do segundo parágrafo em diante, o autor passa a falar em ‘fama’,
que não necessariamente envolve erotismo, e a Cadeia de Referência sofre uma
interrupção.
No terceiro parágrafo, inicia-se novo referente, ou seja, a ‘tecnologia’, que
também não necessariamente envolve ‘erotismo’, a menos que o autor ligasse um
referente a outro. Mas não é o caso, pois o comprador é seduzido pelo avanço
tecnológico, e com isso a Cadeia sofre novamente uma interrupção. A conclusão
também fica prejudicada, pois retorna apenas aos referentes iniciais erotismo,
sedução e atração, mas a ‘fama’ e a ‘tecnologia’ são esquecidas.
Segundo Eggins, um texto coeso deve amarrar os elementos que são
introduzidos no texto através dos recursos de referência e de relação lexical,
também concorrem para essa coesão a seleção lexical e a conjugação das orações
através de conectivos adequados, que veremos a seguir. A Cadeia de Referência é
um recurso que contribui para que o autor perceba a importância da textualidade
para a melhora da sua redação, isto é, que aprenda que o texto não deve ser um
aglomerado de frases desconexas, mas que a produção compreende uma
seqüência de idéias tecidas uma a uma para a composição do texto. Em relação ao
participante ‘erotismo’, o autor deve ter consciência de que o leitor criará a
expectativa de que o termo será discutido ao longo do texto. É um momento em que
se evidencia sua habilidade de persuasão e de convencimento, indispensáveis a sua
argumentação, para conduzir o leitor a adesão das idéias apresentadas.
Análise e discussão dos resultados
74
(b) Seleção lexical
No item seleção lexical, o problema maior está relacionado às marcas da
oralidade, que não deveriam aparecer na transposição de um texto dissertativo-
argumentativo e, às omissões ou ao uso inadequado de conjunções que ocasionam
mudança de sentido do texto.
Esse é um momento importante para mostrar ao aluno que um texto com
marcas de incoerência de Gênero ou de Registro e com a Cadeia de Referência
interrompida, em virtude das falhas na manutenção dos participantes,
conseqüentemente, apresentará problemas na seleção lexical, pois é a conjunção
desses itens que contribuem para a boa formação do texto quanto à coerência e à
coesão. Portanto, fica evidente a necessidade de um planejamento para a
elaboração de um texto dissertativo-argumentativo, que deve iniciar com a discussão
do assunto a ser tratado, seguir para a escolha do vocabulário, adequado ao Gênero
considerando os estágios e suas finalidades, e, ainda, valorizar, a reflexão a respeito
da forma que o tema será discutido ao longo do texto. Ou seja, o autor deverá
considerar como o texto será estruturado para que sua comunicação com o leitor
seja garantida.
A análise da coesão na manutenção dos participantes confirma que os
participantes, que são introduzidos no desenvolvimento dos estágios, devem ser
retomados para garantir a coesão, segundo Hasan (1989) e Eggins (1994).
Também, contribuem para que a coesão se efetive, a seleção lexical e a conjugação
das orações através de conectivos adequados, que veremos a seguir.
(c) Elos lógicos
No quadro 9, passo a examinar os elos lógicos entre as orações do texto 1,
“Campanhas eróticas” e a Progressão Temática que percorre o texto.
Análise e discussão dos resultados
75
continua
Quadro 9 – Verificação da coesão – Texto 1
Campanhas eróticas
Os elos entre
orações e a
Progressão Temática
(PT)
(a) As campanhas publicitárias utilizam o erotismo para seduzir o
consumidor, porque
(1) essa é uma forma de atrair e seduzir as
pessoas e, além do mais, com isso eles conseguem vender seu
produto de uma maneira eficiente.
(1) Relação causal
circular.
Comentário
(1) A relação causal é circular já que dizer ‘o erotismo para seduzir o consumidor, porque
essa é
uma forma de seduzir’, nada informa.
(b) Nas campanhas publicitárias o que (1) é mais utilizado é o
erotismo, um exemplo é a propaganda de cerveja ou até mesmo
comercial de sandália. No comercial de cerveja existe muita
sedução pois
nele vemos mulheres semi-nuas bonitas e muito
sedutoras tomando cerveja (2). A propaganda de sandália
Havaianas é feita por atrizes famosas como Débora Seco,
Juliana Knuch, Carol Castro. No comercial elas estão bem
sedutoras para induzir as pessoas comprarem. Com pessoas
famosas fazendo propagandas sedutoras, o consumidor é muito
mais induzido a comprar o produto que está sendo oferecido.
(1)
Comprometimento
da PT.
(2) ‘Pois’ introduz
causalidade não
bem explicada.
Comentário
(1) O uso de catáfora compromete a PT. O uso do pronome ‘o’ (=aquilo) vindo antes de
‘erotismo’, provoca uma PT linear interrompida (Glatt, 1982), viola o Contrato Dado-Novo e
dificulta a identificação do referente (Máxima de Antecedência) (Clark & Havilland. 1977). Para a
manutenção da PT pode se sugerir algo como ‘Nas campanhas publicitárias, o erotismo é um
dos recursos mais utilizados’, em que se mantém como Tema ‘erotismo’, estabelecido pelo N-
Rema do estágio (a).
(2) Mesmo aqui, com a conjunção ‘pois’, introduzindo relação de causalidade, que um leitor mais
habituado à linguagem oral aceitaria, creio que para uma argumentação sólida deveria haver
uma explicitação mais detalhada da informação aí contida. Dizer ‘No comercial de cerveja existe
muita sedução pois
nele vemos mulheres semi-nuas bonitas e muito sedutoras tomando cerveja’,
omite informações prévias, fato que se verifica no oral, por pressão de tempo, por exemplo, em
que se confia mais em elementos exteriores ao texto, como o frame. Além disso, notemos a
causalidade circular novamente em ação: ‘existe sedução porque mulheres sedutoras’. Mas na
escrita, acredito que se deveria explicar, numa primeira etapa, que mulheres bonitas e semi-nuas
são motivo de sedução erótica, e daí então partir para a segunda etapa, referente à sua
utilização na propaganda.
Em termos de PT, essas omissões de informações necessárias prejudicam o acompanhamento
de Temas e Remas no desenrolar do texto. Mas o texto escrito, mais ainda o texto que visa a
argumentar para persuadir, exige esse caminhar passo a passo com vistas a fundamentar a tese
aí enfocada.
(c1) Com o erotismo a venda fica muito mais eficiente, pois é um
jeito de chamar a atenção de quem os vê. Um exemplo disso são
propagandas que enunciam tecnologia, pois
(1) todo jovem quer
ter um celular com mil e uma qualidade, um MP4, Ifone e muitos
outros.
(1) Conectivo causal
que introduz causa
diferente da
estabelecida pelo
Tema do parágrafo.
Comentário
Como já foi comentado, o conectivo causal ‘pois’, após a introdução de ‘erotismo’, no Tema do
parágrafo, deveria encabeçar um fato erótico como causa da propaganda de tecnologia. Mas,
novamente, talvez devido à influência do oral, há um salto em que se omite a ligação da
tecnologia com o erotismo. Ou, em possibilidade alternativa, o autor esqueceu-se de que sua
tese versava sobre erotismo na propaganda.
Análise e discussão dos resultados
76
Continuação
Campanhas eróticas
Os elos entre
orações e a
Progressão Temática
(PT)
(c2) Mesmo que eles não tenham condições fazem de tudo para
tê-los. Mesmo que já tenhamos (1) o produto ou não precisamos
dele a sedução é tão grande que acabamos comprando. Só de
pensar (2) em ter um celular que todos desejam ter isso é tudo.
(1) PT não mantida.
(2) Contrato Dado-
Novo e Máxima da
Antecedência não
respeitada.
Comentário
Neste estágio, o autor começa com o pronome ‘eles’ e logo a seguir o substitui por ‘nós’, sem
nenhum motivo aparente para esse procedimento. Evidentemente, a PT perde sua continuidade,
tanto é que em (2), não se sabe mais quem seria o sujeito de ‘pensar’, o que traduz violação do
Contrato Dado-Novo e da Máxima de Antecedência. Em termos de N-Rema, aquilo que o leitor
deve lembrar-se, que é ‘eles’ fazem de tudo, o texto contraria esse preceito, com a introdução de
‘nós’.
(d) Os recursos que os publicitários podiam usar, seria falando e
valorizando mais o produto sem erotismo. Não teria o mesmo
efeito porque
iria faltar algo (1) para chamar atenção do público.
Com o erotismo é muito mais fácil atrair e seduzir o consumidor.
(1) O que seria esse
algo?
Comentário
(1) O autor propõe: ‘Os recursos que os publicitários podiam usar, seria falando e valorizando
mais o produto sem erotismo’, ou seja, falar do produto sem a utilização de recursos sem
conexão com a mercadoria. O conectivo causal ‘porque’ introduz o motivo que invalida a Solução
proposta pelo autor.
III. Discussão geral
No texto “Campanhas eróticas”, o título mais adequado poderia ser “O
erotismo na propaganda”, pois o título original pode propiciar interpretações
equivocadas que afastariam a proposta inicial do texto que é tratar da utilização do
erotismo pela propaganda. Em linhas gerais o texto segue o esquema de Hoey
(1994), que sugere a estrutura Problema-Solução. O texto é constituído de quatro
parágrafos distribuídos em cinco estágios: apresentação da Tese, de duas
Evidências para apoiá-la, um Problema e uma Solução contraditória à Tese
apresentada. Há dois problemas na análise de Gênero: o uso da conjunção ‘pois’, o
autor apresenta como causa para a propaganda ‘o desejo do jovem’, mas omite a
informação de que é o erotismo que desperta o desejo do jovem. Evidencia-se um
problema de coerência porque não há como saber qual a verdadeira causa, se ‘no
desejo dos jovens’ ou ‘nas maravilhas apresentadas pela tecnologia’. Outro
problema reside na contradição da Tese, isto é, na proposta de Solução que
Análise e discussão dos resultados
77
contraria o papel desempenhado pela propaganda, a divulgação do produto. Nesse
caso, a propaganda sem utilização do erotismo pode não chamar a atenção do
consumidor, o que contradiz a Tese apresentada pelo autor.
Quanto ao Registro, pelo fato estar relacionado ao Gênero, também,
apresenta falhas nas variáveis Campo e Modo. No item Campo, pode-se dizer que
houve mudança, pois, na proposição, do título ao primeiro parágrafo, há sugestão de
que autor irá tratar do erotismo, mas o surgimento do ‘desejo do jovem’ como causa
da compra de equipamentos tecnológicos contribui para a mudança de Campo. Na
variável Modo, há problemas gramaticais que envolvem a regência e a concordância
verbal e nominal e, ainda, marcas da interferência da linguagem própria da oralidade
que prejudicam a sustentação da linha argumentativa.
Pela análise realizada, constata-se que uma redação que apresenta
problemas de coerência pode ter como causa o fato de o autor não seguir a
estrutura esquemática exigida pelo Gênero dissertativo-argumentativo. A coesão,
conseqüentemente, fica prejudicada, caso o autor não tenha cuidado em relação às
escolhas léxico-gramaticais. De certa forma houve uma preocupação com a
manutenção do participante ‘erotismo’, realizada por meio da repetição de outros
termos semanticamente ligados, mas a introdução do participante ‘tecnologia’ acaba
por romper a Cadeia de Referência (Martin 1989) comprometendo a coesão textual,
pois não há ligação entre ‘erotismo’ e as maravilhas oferecidas pela tecnologia.
Análise do texto 2
A análise do texto 2 - “A malícia da Propaganda” seguirá dois movimentos: (I)
análise da coerência, com (a) verificação dos estágios de Gênero e suas finalidades
e (b) das variáveis de Registro Campo, Relação e Modo; e (II) análise da coesão,
quando serão examinadas (a) a manutenção dos participantes no texto, (b) a
seleção lexical e (c) a conjunção de orações.
Apresento, a seguir, na íntegra, o texto “A malicia na propaganda”, escrito por
aluno do 1º. ano do Ensino Médio, em 12/09/2007.
Análise e discussão dos resultados
78
Texto 2
A malicia na propaganda
As campanhas publicitárias brasileiras utilizam o erotismo para seduzir o consumidor, pois
muitos deles são atraídos pela malicia porque primeiro enchergam a sedução do comercial para
conseqüentemente depois prestarem atenção no produto. A campanha publicitária sabe que esse
publico é maioria, partindo dos jovens que só pensam é levam quase tudo na malicia com isso as
propagandas usam cada vez mais mulheres semi-nuas e outros tipos de insinuações maliciosas para
a elaboração da mesma.
Não são só os jovens que são atingidos pela malicia, mulheres se deixam levar muito pela
beleza da modelo que usa uma peça intima no comercial, pois se cai bem no corpo da moça, porque
não cairia no dela.(Telespectadora)
Há ainda casos em que a propaganda apela para uma malícia menos inplicita que não dê
para compreender logo de cara, isso causa uma compreenção só de alguns.
As propagandas de hoje sabem que podem atrair muito mais clientes utilizando muito a
malicia. E uma solução viável para essa malicia das campanhas publicitárias seria usar a comedia
para promover o produto isso não atrairia tanto publico quanto a sedução mas seria uma idéia.
I. Análise da coerência
(a) A coerência referente ao Gênero
A seguir, no quadro 10, analiso os elementos referentes à coerência,
enfocando os estágios e suas finalidades no texto “A malicia na propaganda” cujos
parágrafos são indicados pelas letras do abecedário e a estrutura de Gênero está
dividida em estágios, de acordo com as colunas à direita.
Análise e discussão dos resultados
79
Quadro 10 - Verificação da coerência de Gênero – Texto 2
Exame da coerência de Gênero
A malicia na propaganda
Aluna do 1º ano do Ensino Médio
Data: 12/09/2007
Estágios de gênero e
Finalidades
(a1) As campanhas publicitárias brasileiras utilizam o erotismo para
seduzir o consumidor, pois
muitos deles são atraídos pela malicia
porque primeiro enchergam a sedução do comercial para
conseqüentemente depois prestarem atenção no produto.
(a2) A campanha publicitária sabe que esse publico é maioria,
partindo dos jovens que só pensam é levam quase tudo na malicia
com isso as propagandas usam cada vez mais mulheres semi-nuas
e outros tipos de insinuações maliciosas para a elaboração da
mesma.
(b) Não são só os jovens que são atingidos pela malicia, mulheres
se deixam levar muito pela beleza da modelo que usa uma peça
intima no comercial, pois se cai bem no corpo da moça, porque não
cairia no dela.(Telespectadora)
(c) Há ainda casos em que a propaganda apela para uma malícia
menos inplicita que não dê para compreender logo de cara, isso
causa uma compreenção só de alguns.
Situação/Problema(?)
Detalhamento do
público atingido e do
tipo de malícia
(d) As propagandas de hoje sabem que podem atrair muito mais
clientes utilizando muito a malicia. E uma solução viável para essa
malicia das campanhas publicitárias seria usar a comedia para
promover o produto isso não atrairia tanto publico quanto a
sedução mas seria uma idéia.
Solução
Avaliação
Discussão
No exame da estrutura de Gênero, verifica-se que o texto está constituído de
quatro parágrafos, os primeiros três constituindo um estágio, que apresenta a
Situação, em termos de Hoey (1994), tratando do emprego do erotismo e da malícia
explícita e implícita pela propaganda, e detalhando o público atingido: jovens e
mulheres; o quarto parágrafo constitui o segundo estágio, o da Solução/Avaliação.
Assim, não existe uma argumentação nem a favor nem contra a ‘malícia na
propaganda’ no primeiro estágio, que, no entanto, ocupa ¾ desse texto, que se
pretende dissertativo-argumentativo. Somente no quarto parágrafo, é que, a julgar
pela Solução aqui apresentada, percebe-se que a malícia é o Problema.
Análise e discussão dos resultados
80
Por outro lado, a relação entre ‘erotismo’ e ‘malícia’ não é esclarecida em
nenhum desses estágios. Além disso, como a malícia não é apresentada claramente
como um Problema, o parágrafo (c) – que trata da malícia implícita - fica deslocado,
contribuindo para a caracterização do texto como incoerente.
“Há ainda casos em que a propaganda apela para uma malícia menos inplicita que não dê
para compreender logo de cara, isso causa uma compreenção só de alguns”
Por último, no segundo estágio, que ocupa o parágrafo (d), o autor apresenta
uma Solução - a utilização da comédia ao invés da malícia, para divulgação de
produtos – logo avaliada por ele mesmo como inviável, o que compromete a
coerência do texto.
O exame do Gênero e seus estágios e finalidades mostra-se um forte
instrumento de avaliação da coerência de um texto, já que permite visualizar de
maneira nítida a estrutura esquemática do texto, apontando, como no caso, não só o
desequilíbrio entre as partes integrantes do texto, mas também a incoerência que
perpassa o texto.
Por outro lado, esse exame mostra que, subjacente ao texto, existe uma
argumentação que não se realiza no texto, não porque seu autor a quis implícita,
mas porque ele não sabe como expor o que lhe vai na mente. Acredito que esta
etapa da análise deve servir para a conscientização do aluno a respeito da
exposição passo a passo de suas idéias, num movimento que deve incluir um
raciocínio que envolva a questão de como as idéias devem ser ligadas para formar
um todo coerente. Aqui, a fase de pergunta-reposta, preconizada por Hoey (1994),
de que tratamos no Apoio teórico, é de grande validade para guiar os passos do
discente nesse processo de reflexão.
(b) A coerência referente ao Registro
Examino aqui, na averiguação da coerência do texto, o comportamento das
variáveis de Registro: Campo, Relações e Modo, que, segundo vimos, constituem
fatores relacionados à coerência textual, juntamente com os estágios de Gênero.
Como não poderia deixar de ser, o Registro também fica prejudicado, devido
a problemas apresentados no Gênero, já que ambos se interrelacionam. Em Campo,
Análise e discussão dos resultados
81
pode-se dizer que houve mudança de assunto porque o autor se propõe a falar em
malícia, transmite sua intenção desde a exposição do título, mas introduz o texto
com o tema erotismo sem explicar a relação que há entre ‘erotismo’ e ‘malícia’.
É possível que autor tenha utilizado os termos como sinônimos, mas, neste
caso, esse fato deveria ser esclarecido, o que parece improvável, pois nem todo
erotismo envolve malícia. A variável Relação também apresenta problemas, pois o
autor utiliza expressões típicas da oralidade, inadequadas para esse Gênero, a
exemplo de ‘logo de cara’ em (c), que não está de acordo com a interação ‘aluno
escrevendo um texto dissertativo-argumentativo para sua professora’, em que se
deveria observar o respeito à distância entre as pessoas envolvidas. Quanto ao
Modo, há problemas de interferência da linguagem oral na escrita, como: (i) omissão
de complemento ‘partindo dos jovens que só pensam é levam quase tudo na malicia’
(pensam em quê?); (ii) com orações ligadas por conectivos inadequados ou por
contigüidade com omissão do conectivo ‘não são só os jovens que são atingidos
pela malicia, mulheres se deixam levar’; ‘E uma solução viável para essa malicia das
campanhas publicitárias’; (iii) seleção lexical inadequada ‘logo de cara’; além de
falhas ortográficas tais como: ‘enchergam’, ‘inplicita’ e ‘compreenção’ que também
respondem pelos problemas de coerência de Registro.
Discussão
A verificação do Registro aponta várias inadequações nesse texto. Através
desta análise, o autor do texto deverá compreender (a) quando escrevemos,
devemos prestar atenção para o fato de estarmos expressando simultaneamente
três significados e que, portanto, (b) devemos nos concentrar no assunto (Campo)
proposto na introdução do texto; tomar cuidado com a linguagem usada, que deve
se adequar à relação entre determinado escritor e determinado leitor (Relação) e,
finalmente, fazer as escolhas de palavras e estruturas que estejam de acordo com
esses dois elementos, tendo em vista facilitar a compreensão do leitor (Modo).
Conclusão: há inadequações tanto no item Gênero quanto no item Registro
que fazem o texto ser considerado incoerente. Se, através das duas análises, o
aluno puder perceber a construção de um texto dissertativo-argumentativo, ficará
Análise e discussão dos resultados
82
mais fácil para ele perceber os pontos falhos da sua redação e se auto-corrigir, fato
que, evidentemente, lhe dará mais confiança ao enfrentar o processo da escrita e
mais satisfação na execução dessa tarefa.
II. Verificação da coesão
(a) A manutenção do participante e a Progressão Temática
A manutenção dos participantes no decorrer do texto é um dos requisitos da
coesão, conforme Eggins (1994), que, além disso, alista a seleção lexical e a
conjunção de orações como fatores proporcionadores de um texto coeso. Como
vimos, a manutenção dos participantes pode ser feita por meios gramaticais
(pronome, demonstrativo, artigo, elipse, comparação) e por meios lexicais (geral:
repetição, sinonímia, antonímia; instancial: equivalência, semelhança e nomeação),
Halliday & Hasan (1989). O rastreamento de um determinado participante no
desenrolar do texto forma o que Martin (1992) denominou Cadeia de Referência.
Vejamos a seguir, no quadro 11 o exame da manutenção de ‘malícia’ no texto
“A malícia na propaganda”, através das categorias ditadas por Halliday & Hasan.
Análise e discussão dos resultados
83
Quadro 11 - Manutenção dos participantes e Progressão Temática – Texto 2
A malicia
na propaganda
Manutenção de
‘malícia’
(a1) As campanhas publicitárias brasileiras utilizam o erotismo
(1) para seduzir
(2) o consumidor, pois muitos deles são atraídos
(3) pela malicia
(4) porque primeiro enchergam a sedução (5) do
comercial para conseqüentemente depois prestarem atenção no
produto.
(1) Ins. Equivalência
(2) Ins. Semelhança
(3) Ins. Semelhança
(4) Ins. Sinônimo
(5) Inst. Semelhança
(a2) A campanha publicitária sabe que esse publico é maioria,
partindo dos jovens que só pensam é levam quase tudo na
malicia
(1)com isso as propagandas usam cada vez mais
mulheres semi-nuas
(2) e outros tipos de insinuações maliciosas
(3) para a elaboração da mesma
(4).
(1) Ins. Equivalência
(2) Ins. Nomeação
(3) Ins. Nomeação
(4) Ref. Pronome
(b) Não são só os jovens que são atingidos pela malicia, (1)
mulheres se deixam levar muito pela beleza da modelo que usa
uma peça intima
(2) no comercial, pois se cai bem no corpo da
moça, porque não cairia no dela.(Telespectadora)
(1) Ins. Equivalência
(2) Ins. Nomeação
(c) Há ainda casos em que a propaganda apela para uma
malícia
(1) menos inplicita que não dê para compreender [a
malícia
] (2) logo de cara, isso causa uma compreenção só de
alguns.
(1) Ins. Equivalência
(2) omissão do
objeto direto
(d) As propagandas de hoje sabem que podem atrair (1) muito
mais clientes utilizando muito a malicia
(2). E uma solução (3)
viável para essa malicia
(4) das campanhas publicitárias seria
usar a comedia para promover o produto isso não atrairia
(5)
tanto publico quanto a sedução
(6) mas seria uma idéia.
(1) Ins. Equivalência
(2) Ins. Semelhança
(3) Ins. Equivalência
(4) Ger. Repetição
(5) Ins. Semelhança
(6) Ins. Semelhança
O rastreamento do participante ‘malícia’ evidenciou que o autor utilizou o
recurso gramatical 1 vez e omitiu ‘malícia’, objeto direto de ‘compreender’ (que
poderia ser um pronome; utilizou o recurso da escolha lexical Geral em (1 repetição)
e (1 sinônimo); Instancial (6 equivalências, 3 nomeações, 6 semelhanças) para
realizar a coesão lexical. Porém, tendo colocado ‘erotismo’ como Tema do
parágrafo, sugere que vai tratá-lo ao longo do texto, mas acaba por substituí-lo pelo
participante ‘malícia’, sem justificar a relação entre os dois assuntos. O mesmo
ocorre no parágrafo (c), que trata da ‘malícia implícita’. Como ‘malícia’ não está
claramente caracterizada como Problema, a menção de ‘malícia implícita’,
aparentemente como Problema, não se encaixa na Cadeia de Referência. Caso o
autor tivesse dito que o ‘erotismo’ é encarado com ‘malícia’, fato que ele avalia
Análise e discussão dos resultados
84
negativamente, mas que a propaganda se aproveita exatamente dessa
característica para persuadir jovens e mulheres (e os homens?), caberia citar que
essa persuasão se faz de maneira implícita, o que, por extensão, aumentaria a
negatividade da questão. Em termos de progressão temática, a falta de manutenção
de ‘erotismo’, compromete a coesão devida à seleção lexical; o mesmo ocorre com a
‘malícia implícita’, como acabamos de citar; ou a proposta de substituir ‘malícia’ por
‘comédia’, sem uma explicação para tanto, compromete a textura, daí por que o
texto não ter força argumentativa.
(b) Seleção lexical
Num texto com a coerência prejudicada e sem a manutenção de vários
participantes, a seleção lexical que o realiza também se apresenta caótica, sem um
rumo bem orientado. Esse fato poderia esclarecer ao autor do texto a importância de
um texto bem estruturado, através de estágios/finalidades coerentes em torno de um
tema perceptível. Portanto, o planejamento de um texto dissertativo-argumentativo
deve sempre se antecipar a sua redação. Após a discussão de um tema, cada aluno
deve refletir sobre o assunto que tratará no seu texto e pensar em como o dividirá
para facilitar a compreensão do leitor.
(c) Elos lógicos
Passo a examinar, no quadro 12, os elos lógicos entre as orações do texto 2,
“A malicia na propaganda” e a Progressão Temática que percorre o texto.
Análise e discussão dos resultados
85
Quadro 12 – Verificação da coesão – texto 2
A malicia na propaganda
Os elos entre
orações e a
Progressão Temática
(PT)
(a1) As campanhas publicitárias brasileiras utilizam o erotismo
para seduzir o consumidor, pois
(1) muitos deles são atraídos
pela malicia porque
(2) primeiro enchergam a sedução do
comercial para conseqüentemente depois prestarem atenção no
produto.
(1) e (2) Introduz
idéia de explicação
PT comprometida
Comentário
(a1), Existem dois casos do uso inadequado de conjunções explicativas “pois” e “porque”. Pois
encabeça uma causa para a utilização do erotismo, mas sem explicar o elo que une ‘erotismo’ e
‘malícia’. Erotismo nem sempre significa malícia. ‘Porque’ encabeça um causa para ‘malícia’,
mas ‘enxergar a sedução do comercial’ não é a causa de malícia. Pelo contrário, a malícia
existente no leitor é que o faz o comercial seduzi-lo. A PT fica comprometida porque ‘malícia’
deveria ser o Tema da oração e não ‘erotismo’, uma vez que – pelo título – é sobre a malícia que
deve discorrer o texto.
(a2) A campanha publicitária sabe que esse publico é maioria,
partindo dos jovens que só pensam é levam quase tudo na
malicia com isso as propagandas usam cada vez mais mulheres
semi-nuas e outros tipos de insinuações maliciosas para a
elaboração da mesma.
(a2) Oração
reduzida de
gerúndio
Comentário
(a2) O uso inadequado da oração subordinada reduzida de gerúndio desencadeou um problema
de coesão textual. Houve uma substituição da oração subordinada adjetiva restritiva “A
campanha publicitária sabe que o público jovem
“ parece que intenção do autor foi esclarecer que
não se trata de qualquer tipo de público, mas se refere, especificamente, ao público jovem que
só pensa e leva quase tudo na malícia. Possivelmente esse tipo de linguagem seria aceita por
um leitor habituado a uma linguagem oral, mas, nesse tipo de texto, espera-se do autor a
utilização de uma linguagem mais solidificada e escolhas lexicais adequadas para a sustentar a
argumentação. A sugestão de uso da oração subordinada adjetiva restritiva parece mais
adequada para a manutenção da PT.
(b) Não são só os jovens que são atingidos pela malicia, (1)
mulheres se deixam levar muito pela beleza da modelo que usa
uma peça intima no comercial, pois se cai bem no corpo da
moça, porque (2) não cairia no dela.(Telespectadora)
(1) Falta conectivo
(2) por que
Comentário
(1) Falta a segunda parte do conectivo aditivo (não só mas também). Assim conjunção das duas
orações está sendo feita por contigüidade, fato que causa a oralidade do texto. Em (2), não se
está oferecendo a causa (porque), mas está se perguntando (por que?, ou seja, por que
motivo?).
(c) Há ainda casos em que a propaganda apela para uma
malícia menos inplicita que não dê para compreender logo de
cara, (1) isso causa uma compreenção só de alguns.
Ausência de elo
lógico
Comentário
Em (1), deveria ser ‘fato que causa...’. A construção em (1) é comum na modalidade oral.
continua
Análise e discussão dos resultados
86
continuação
A malicia na propaganda
Os elos entre
orações e a
Progressão Temática
(PT)
(d) As propagandas de hoje sabem que podem atrair muito mais
clientes utilizando muito a malicia. E uma solução viável (1) para
essa malicia das campanhas publicitárias seria usar a comedia
para promover o produto (2) isso não atrairia tanto publico
quanto a sedução mas seria uma idéia.
(1) Oração final
(2) Falta de
conjunção
Comentário
Em (1), a oração subordinada adverbial final omite um verbo, como ‘combater’ ou ‘evitar’ (uma
solução viável para combater essa malícia ... ). Em (2), caracterizando novamente a oralidade do
texto, o autor omite a conjunção coordenativa adversativa (‘mas’,‘porém’).
III. Discussão geral
O texto “A malícia da propaganda”, melhor seria “A malícia na propaganda”,
pode ser caracterizado como parcialmente incoerente e com sua textura
comprometida. Assim é, pois a análise da coerência através (a) do exame de
Gênero, no caso, dissertativo-argumentativo, mostra que não há uma argumentação
claramente delineada, mas somente algumas pistas mal alinhavadas de que o
Problema seria o uso da ‘malícia’ nas propagandas. O texto, composto de quatro
parágrafos, ocupa os três primeiros apresentando a Situação, ou seja, o apelo à
malícia na propaganda, que atinge jovens e mulheres, e que pode ser veiculada de
maneira implícita. Não há nesse estágio de Situação - nenhum posicionamento a
favor ou contra esse procedimento, até no último parágrafo, ou seja, no segundo
estágio, a ‘malícia’ é caracterizada como Problema, já que ‘deve ser substituída pela
comédia’. Assim, por um caminhar em retrocesso, sabe-se que ‘malícia’ deve ser
considerada um Problema, e assim por extensão, o terceiro parágrafo, que trata da
‘malícia implícita’, também dever ser incluído como Problema. Evidentemente,
devido a essa indefinição do tema, a coerência acaba sendo prejudicada.
Quanto ao Registro, que na realidade caminha juntamente com o Gênero, o
texto apresenta falhas em todos as suas variáveis: Campo (o assunto não fica claro);
Relação (há inadequações no relacionamento do texto, que deveria levar em
consideração o fato de um aluno estar escrevendo para o professor um texto
Análise e discussão dos resultados
87
dissertativo-argumentativo; e Modo (há várias inadequações, mormente referentes à
oralização do texto escrito).
Como já nos referimos, um texto mal estruturado, que não respeita a estrutura
esquemática de uma dissertação-argumentativa, acaba comprometendo a coesão e,
assim, a textura do texto, nos termos de Hasan (Halliday & Hasan, 1989). A
manutenção dos participantes sofre várias interrupções, prejudicando a Progressão
Temática do texto, já que não há uma estrutura firme embasando o aparecimento
em cena desses participantes. Do ‘erotismo’ passa-se para ‘malícia’, sem nenhuma
explicação, mas conectados por elo causal; por outro lado, passa-se de ‘malícia’,
não caracterizada como Problema para ‘malícia implícita’ como um Problema
adicional (“Há ainda casos...”, em que ‘ainda’ sinaliza para um aumento de um
Problema), quando o Problema inicial não é deixado claro.
A seleção lexical bem como a ligação das orações, refletindo o texto
incoerente, ou talvez contribuindo para essa incoerência, deixam a desejar. Há
léxico que revela a oralização imprópria do texto, bem como omissões de conectivo,
ou de complementos, típicos da modalidade oral.
A análise mostra que, se esses passos que seguimos até aqui forem
ensinados aos autores de textos insatisfatórios em termos de coerência e de coesão,
eles terão em mãos um instrumento esclarecedor de suas falhas e daquilo que
devem ter em mente quando produzirem seus textos. O esquema de Hoey, em
especial, e as categorias de análise de Hasan e Eggins são de grande utilidade para
esse fim.
88
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após essa caminhada de dois anos, em que me vi, inicialmente perdida no
meio de várias idéias que foram surgindo através das disciplinas que cursei, das
trocas com colegas e discussões com meus mestres, chego, finalmente, ao
momento em que devo encerrar esta pesquisa. Tive e tenho sempre firme uma
meta: proporcionar aos meus alunos um meio de melhorarem suas produções
escritas, objetivo que foi citado como uma das justificativas desta dissertação de
mestrado.
Sinto que ainda estou no meio do caminho, pois percebo que, nessa análise
que fiz, falta um aprofundamento do conhecimento a respeito das categorias que
utilizei. Gostaria de examinar mais detidamente a relação que existe entre Gênero e
Registro, pois é, acredito, no entrecruzamento dessas duas noções é que se
encontra a textura, noção ainda vaga para mim. E se considerarmos neste contexto
o fato da coesão, o que dizer de textos coerentes sem elos coesivos? Ou vice-
versa? Como é feita a coesão pelo leitor num caso assim, e então como censurar o
aluno de que sua redação carece de elementos coesivos?
Um exame que poderia esclarecer muitas dessas questões seria a
comparação de textos pertencentes a Gêneros diferentes. Porque é evidente que há
graus de coerência e de coesão exigidos por esses Gêneros. Acredito que o texto
dissertativo-argumentativo, por seu caráter persuasivo por excelência, deve ser
aquele que mais exige dos elementos de coesão, pois muito da coerência desses
textos repousa em escolhas léxico-gramaticais solidamente unidos. Mas este é um
assunto que deixo para estudos futuros. Por enquanto, se conseguir passar o que
aprendi neste mestrado aos meus alunos já preencheria minhas aspirações.
89
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