8
Um aspecto importante para esta pesquisa, no sentido de delimitar o foco de abordagem, é
que o contexto de nossas investigações situa-se particularmente nos trabalhos foucaultianos dos
anos oitenta, ao que nos referimos com a expressão “último Foucault”. À parte que o trabalho de
Foucault parece não ter deixado de ser, desde suas primeiras pesquisas, uma genealogia das
práticas
3
é notável que em seus últimos textos este modo de abordagem tenha encontrado na
genealogia da ética
4
um movimento de análise singular. Não apenas pelo modo de
problematização das práticas greco-romanas do cuidado de si (epiméleia heautoû)
5
com vistas ao
às práticas de si, portando ao contexto dos exercícios de ascese. Ora aproximando-o dos discursos de dominação
presentes no modo como os indivíduos são geridos tanto nos manicômios quanto nas prisões. Nesta pesquisa a noção
de técnica estará sempre associada à ascese, portanto, às práticas de si. Cf.FOUCAULT, M. Les techniques de soi.
pp. 1602-1632. In : Dits et écrits II, 1976-1988. Paris : Gallimard, 2001, p. 1603,1604.
3
A genealogia para Foucault é um empreendimento filosófico que pretende reativar aqueles saberes encobertos pelo
conhecimento com status científico, de modo a torná-los capazes de se opor e de lutar contra a coerção dos discursos
teóricos, unitários e formais. “Pouco importa que esta institucionalização do discurso científico se realize numa
universidade ou, de modo mais geral, em um aparelho político com todas as suas aferências, (...) são os efeitos de
poder próprios a um discurso considerado como científico que a genealogia deve combater.” (Cf. FOUCAULT, M.
Genealogia e Poder. pp. 167-177. In: FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 17ª.ed. Rio de Janeiro: Ed. Graal,
2002, p. 171.) “Daí, para a genealogia, um indispensável retardamento: para assinalar a singularidade dos
acontecimentos, fora de qualquer finalidade monótona; espreitá-los lá onde menos se espera e no que passa por não
ter história alguma”. (FOUCAULT, M. Nietzsche, a Genealogia, a História. pp. 260-281. In: DE 2, p. 260.) Neste
sentido é que se pode falar de uma genealogia das práticas, que entende como práticas “o conjunto das maneiras de
fazer mais ou menos regradas, mais ou menos acabadas através das quais se delineia simultaneamente o que
constituía o real para aqueles que procuram pensá-lo e dominá-lo, e a maneira como aqueles se constituíam como
sujeitos capazes de conhecer, analisar e eventualmente modificar o real.” (FOUCAULT, Michel. FOUCAULT, p.
234-239. In: DE 5, p.238.) De acordo com o prof. Edmilson Paschoal “na filosofia, é Nietzsche quem utiliza pela
primeira vez o termo ‘genealogia’”. (PASCHOAL, Antonio Edmilson. A genealogia de Nietzsche. Curitiba:
Champagnat, 2003. p. 69) de modo que uma primeira referência ao termo pode ser buscada em: NIETZSCHE, F.
Genealogia da Moral – uma polêmica. Trad., notas e posfácio: Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das
Letras, 1998.
4
“ ... estou escrevendo uma genealogia da ética. A genealogia do sujeito como um sujeito de ações éticas, ou a
genealogia do desejo como um problema ético.” Cf. FOUCAULT, M. Sobre a genealogia da ética: uma revisão do
trabalho. pp. 253-278. In: DREYFUS, Hubert L.; RABINOW, Paul. Michel Foucault: Uma trajetória filosófica
para além do estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995, p. 265.
5
Esta noção de origem grega, epiméleia heautoû, traduzida para o latim como cura sui é colocada como ponto de
partida para a questão das relações entre o sujeito e a verdade no curso de 1982. Foucault reconhece que a epiméleia
heautoû (cuidado de si) não teve ao longo da história da filosofia o mesmo status que o gnôthi seautón (conhece-te a
ti mesmo) e neste sentido propõe uma discussão (aula de 6 de janeiro) sobre as relações entre cuidado de si e
conhece-te a ti mesmo que justifique o cuidado de si como ponto de partida para suas análises. De modo geral
Foucault considera que a epiméleia heautoû (cuidado de si) “não cessou de constituir um princípio fundamental para
caracterizar a atitude filosófica ao longo de quase toda a cultura grega, helenística e romana.” (FOUCAULT, M. A
Hermenêutica do Sujeito. Op. Cit. p. 12.) Sobre a influência de Pierre Hadot na concepção do cuidado de si em
Foucault, deve-se referir-se aos seguintes livros: HADOT, P. Exercices spirituels et philosophie antique. Paris:
Etudes Augustinienes, 1977; HADOT, P. Réflexions sur la notion de culture de soi. In : Michel Foucault
philosophe. Rencontre Internationale, Paris, 9 : 261-269, 10, 11 janvier, 1988 ; HADOT, P. O que é a filosofia
antiga? São Paulo: Ed. Loyola, 1999.
d
pdfMachine
Is a pdf writer that produces quality PDF files with ease!
Produce quality PDF files in seconds and preserve the integrity of your original documents. Compatible across
nearly all Windows platforms, if you can print from a windows application you can use pdfMachine.
Get yours now!