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CÂNDICE LISBÔA BRANDÃO
ASSENTAMENTOS RURAIS E LICENCIAMENTO AMBIENTAL
EM MINAS GERAIS
Tese apresentada à Universidade
Federal de Viçosa, como parte das
exigências do Programa de Pós-
Graduação em Extensão Rural, para
obtenção do título de “Magister
Scientiae”.
VIÇOSA
MINAS GERAIS – BRASIL
2006
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Ficha catalográfica preparada pela Seção de Catalogação e
Classificação da Biblioteca Central da UFV
T
Brandão, Cândice Lisbôa, 1980-
B817a Assentamentos rurais e licenciamento ambiental em
2006 Minas Gerais / Cândice Lisbôa Brandão. – Viçosa : UFV,
2006.
xv, 170f. : il. ; 29cm.
Inclui apêndice.
Orientador: José Ambrósio Ferreira Neto.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de
Viçosa.
Referências bibliográficas: f. 126-131.
1. Reforma agrária - Minas Gerais. 2. Assentamentos
humanos - Minas Gerais. 3. Posse de terra. 4. Reforma
agrária - Aspectos ambientais - Brasil. 5. Trabalhadores
rurais - Minas Gerais. I. Universidade Federal de Viçosa.
II.Título.
CDD 22.ed. 333.318151
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CÂNDICE LISBÔA BRANDÃO
ASSENTAMENTOS RURAIS E LICENCIAMENTO AMBIENTAL
EM MINAS GERAIS
Tese apresentada à Universidade
Federal de Viçosa, como parte das
exigências do Programa de Pós-
Graduação em Extensão Rural, para
obtenção do título de “Magister
Scientiae”.
APROVADA: 31 de março de 2006.
Luiz Arnaldo Fernandes Eloy Alves Filho
Francisco de Paula Neto Sheila Maria Doula
(Conselheiro) (Conselheira)
José Ambrósio Ferreira Neto
(Orientador)
À minha mãe, Beatriz Caldas Lisbôa,
na certeza de que ela, embora ausente,
compartilhará comigo de um grande momento da minha vida,
se não na matéria, através da espiritualidade.
ii
AGRADECIMENTO
De forma especial, agradeço a Deus pela coragem e força,
principalmente durante as diversas dificuldades que se apresentaram no
transcorrer do mestrado e da confecção da dissertação. Sem seu amparo e
amor, tenho ciência de que este trabalho não seria possível.
À minha grande amiga e e, Beatriz Caldas Lisbôa, pelo amor
incondicional e incentivo para os novos caminhos da vida, principalmente nos
momentos de indefinições e expectativas, companheira de acalento e afeto
que, ao partir, deixou saudades eternas.
Ao Xavier, pela paciência e compreensão durante as constantes
ausências relacionadas ao mestrado.
Aos amigos do curso, principalmente a Danielle Marota, Dani, Karla e
Cyntia, que dividiram comigo as angústias das matérias, os apertos das provas,
e com quem gostaria de dividir a alegria da conclusão desta etapa.
Aos amigos que fizeram parte desta trajetória, Betânia e sua querida
família, minhas primas Luisa e Marina, Vó Natávia.
Aos professores, pela compreensão e tranqüilidade, principalmente
quando ficávamos desesperados com as matérias. Agradecimento especial à
Sheila e ao Ambrósio, que, a todo momento, se mostraram prestativos e
atenciosos, ultrapassando as definições de professor para se tornarem amigos.
iii
BIOGRAFIA
CÂNDICE LISBÔA BRANDÃO, filha de Sérgio Braga Alves e Beatriz
Caldas Lisboa, nasceu na cidade de São Pedro dos Ferros, Minas Gerais, no
dia 10 de junho de 1980.
Cursou o ensino fundamental, de 1.ª a 4.ª série, na Escola Estadual
Professor Alves de Souza, e da 5.ª a 8.ª série na Escola Estadual Levindo
Coelho, ambas na cidade de São Pedro dos Ferros. Terminou o ensino
fundamental no Colégio Anglo, na cidade de Rio Casca.
Ingressou no COLUNI (Colégio Universitário da UFV) no ano de 1995,
ocasião em que se mudou para Viçosa, tendo concluído o 3.° ano em 1997,
almejando cursar Direito na UFV. Entretanto, por não ter passado no primeiro
vestibular, tentou no meio do ano de 1998 o curso de Ciência da Computação
na Universidade Federal de Lavras, tendo obtido êxito no vestibular e
começado o referido curso. No fim de 1998, tentou novamente vestibular para
Direito na UFV, tendo ingressado no curso em 1999 e colado grau em janeiro
de 2004.
Em março de 2005, iniciou o mestrado em Extensão Rural na
Universidade Federal de Viçosa, tendo como orientador o professor José
Ambrósio Ferreira Neto; submeteu-se à defesa de tese no dia 31 de março de
2006, findando parte de sua trajetória acadêmica na cidade universitária.
iv
ÍNDICE
Página
LISTA DE FIGURAS ............................................................................. viii
LISTA DE GRÁFICOS .......................................................................... ix
LISTA DE SIGLAS ................................................................................ x
RESUMO .............................................................................................. xii
ABSTRACT ........................................................................................... xiv
1. INTRODUÇÃO .................................................................................. 1
CAPÍTULO 1 ......................................................................................... 6
A ESTRUTURA DE USO, POSSE E PROPRIEDADE DA TERRA
NO BRASIL .......................................................................................... 6
1.1. Período Colonial à Proclamação da República ............................. 6
1.2. O direito de propriedade nas constituições brasileiras .................. 11
CAPÍTULO 2 ......................................................................................... 20
AS CIÊNCIAS SOCIAIS E O DEBATE SOBRE A REFORMA
AGRÁRIA NO BRASIL.......................................................................... 20
2.1. O modelo de desenvolvimento e a modernização da agricultura .. 22
v
Página
2.2. Do modelo de desenvolvimento sustentável ................................. 26
2.3. A atuação dos movimentos sociais na luta pela reforma agrária... 30
2.3.1. A ULTAB, a CONTAG e a FETAEMG ..................................... 36
2.3.2. O MST ..................................................................................... 39
2.3.3. Os movimentos sociais após a década de 1990 ..................... 41
CAPÍTULO 3 ......................................................................................... 42
A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA REFERENTE À RE-
FORMA AGRÁRIA ................................................................................ 42
3.1. Órgãos ambientais nacionais e mineiros ....................................... 44
3.1.1. SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente ................... 44
3.1.2. CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente.................. 45
3.1.3. IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recur-
sos Naturais Renováveis ......................................................... 47
3.2. Órgãos ambientais em Minas Gerais.............................................. 47
3.2.1. COPAM – Conselho Estadual de Política Ambiental................ 48
3.2.2. Órgãos municipais ................................................................... 50
3.3. A legislação ambiental sobre reforma agrária ............................... 50
3.3.1. Resolução 237 do CONAMA ................................................... 52
3.3.2. Resolução 289 do CONAMA ................................................... 53
3.3.3. Resolução 318 do CONAMA ................................................... 55
3.3.4. Deliberação Normativa 44 do COPAM .................................... 56
3.3.5. Deliberação Normativa 74 do COPAM .................................... 59
3.3.6. Deliberação Normativa 88 do COPAM .................................... 60
CAPÍTULO 4 ......................................................................................... 64
O IMAGINÁRIO SOCIAL .................................................................. 64
vi
Página
CAPÍTULO 5 ......................................................................................... 68
A IDEOLOGIA E A REFORMA AGRÁRIA ........................................ 68
5.1. O direito como fenômeno ideológico ............................................. 72
5.2. Meio ambiente e propriedade: direitos fundamentais .................... 75
CAPÍTULO 6 ......................................................................................... 81
A PESQUISA DE CAMPO ................................................................ 81
6.1. As representações sociais e o memorial da reunião para criação
da DN 44 ....................................................................................... 82
6.1.1. Reforma agrária ....................................................................... 89
6.1.2. Agricultura familiar x agricultura patronal ................................ 90
6.1.3. Legislação ambiental ............................................................... 91
6.1.4. Licenciamento ambiental ......................................................... 93
6.2. A situação da reforma agrária no Estado de Minas Gerais ........... 95
6.3. As representações coletadas nas entrevistas................................ 103
6.3.1. O INCRA/SR06 ........................................................................ 103
6.3.2. O IEF – Instituto Estadual de Florestas.................................... 107
6.3.3. O MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra ... 110
6.3.4. A FETAEMG Federação dos Trabalhadores Rurais de Mi-
nas Gerais ............................................................................... 113
6.4. Análise dos dados coletados na pesquisa ..................................... 115
2. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 122
REFERÊNCIAS ..................................................................................... 126
APÊNDICE ........................................................................................... 132
vii
LISTA DE FIGURAS
Página
1 A reforma agrária e os discursos das instituições presentes
na reunião de 22 de outubro de 1999 ...................................... 85
2 Posicionamentos sobre os impactos advindos da agricultura
patronal e da agricultura familiar, segundo as instituições
presentes na reunião de 22 de outubro de 1999 ..................... 86
3 Representações sobre a legislação ambiental das instituições
presentes na reunião de 22 de outubro de 1999 ..................... 87
4 Representações sobre o licenciamento ambiental das institui-
ções presentes na reunião de 22 de outubro de 1999 ............ 88
viii
LISTA DE GRÁFICOS
Página
1 Fase do licenciamento ambiental e número de PAs, em maio
de 2005 .................................................................................... 96
2 Licenças ambientais e número de famílias nos assentamen-
tos rurais .................................................................................. 99
3 Licença de Operação Corretiva e fase do procedimento para
sua concessão – maio de 2005 ................................................ 101
ix
LISTA DE SIGLAS
AAF – Autorização Ambiental de Funcionamento.
ABBIO-MG – Associação de Biólogos de Minas Gerais.
AESCA – Associação Estadual de Cooperação Agrícola.
AMDA – Associação Mineira de Defesa do Ambiente.
APEF – Autorização Ambiental para Exploração Florestal.
ATES – Assessoria Técnica Social e Ambiental da Reforma Agrária.
CAP – Câmara de Atividades Agrossilvopastoris Vinculada ao COPAM.
CEPAL – Comissão de Estudos para América Latina.
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente.
CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais.
COPAM – Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais.
CPA – Câmara de Política Ambiental.
CPB – Câmara de Proteção à Biodiversidade.
CPT – Comissão Pastoral da Terra.
CR/88 – Constituição da República de 1988.
DN – Deliberação Normativa.
EIA – Estudos de Impacto Ambiental.
EMATER-MG Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do
Estado de Minas Gerais.
ET – Estatuto da Terra.
FCEI – Formulário de Caracterização do Empreendimento Integrado.
x
FEAM – Fundação Estadual do Meio Ambiente.
FETAEMG – Federação dos Trabalhadores Rurais de Minas Gerais.
FOB – Formulário de Orientações Básicas.
GEAT – Grupo Especial de Acesso à Terra.
GEMAD – Gerência de Meio Ambiente e Desenvolvimento.
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis.
IEF – Instituto Estadual de Florestas.
IGAM – Instituto Mineiro de Gestão de Águas.
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
ITER-MG – Instituto de Terras de Minas Gerais.
ITR – Imposto Territorial Rural.
LAS – Licença Ambiental Simplificada.
LC – Lei Complementar.
LI – Licença de Instalação.
LIO – Licença de Instalação e Operação
LO – Licença de Operação.
LOC – Licença de Operação Corretiva.
LP – Licença Prévia.
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.
MSTR – Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais.
ONG – Organização Não-Governamental.
PA – Projeto de Assentamento Rural.
PBA – Projeto Básico de Assentamento Rural
PCB – Partido Comunista Brasileiro.
PDA - Plano de Desenvolvimento do Assentamento.
PNMA – Política Nacional de Meio Ambiente
PFA – Projeto Final de Assentamento.
RIMA – Relatório de Impacto Ambiental.
RVA – Relatório de Viabilidade Ambiental.
SEMAD Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável de Minas Gerais.
SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente.
ULTAB – União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil.
xi
RESUMO
BRANDÃO, Cândice Lisbôa, M.S., Universidade Federal de Viçosa, março de
2006. Assentamentos rurais e licenciamento ambiental em Minas
Gerais. Orientador: José Ambrósio Ferreira Neto. Conselheiros: Sheila Maria
Doula e Francisco de Paula Neto.
A reforma agrária é tema bastante conhecido e controvertido, podendo
ser analisada por vários ângulos, cabendo destaque aos acontecimentos
políticos que, ao longo da história, justificam os momentos de arrefecimento e
maior mobilização social. Dentre esses ângulos, o presente estudo abordou a
relação entre a reforma agrária e o meio ambiente, sendo importante salientar
que a origem desse encontro se deu em 1997, com a promulgação da
Resolução 237 do CONAMA, que tornou obrigatório o licenciamento ambiental
para diversas atividades, dentre as quais se destacam os projetos de
assentamentos rurais, alertando para o fato de que apenas no ano de 2001
houve a promulgação de norma federal específica para tal tema: a Resolução
289 do CONAMA, que entrou em vigor em 19 de dezembro de 2004. Em Minas
Gerais, entretanto, logo após a Resolução 237, foi elaborada uma legislação
específica para disciplinar tal situação, de forma que em 2000 foi elaborada a
Deliberação Normativa 44 do COPAM, estabelecendo a obrigatoriedade do
licenciamento ambiental para os projetos de assentamento rural mineiros, em
xii
vigor desde o dia da publicação, em 25 de novembro de 2000. Em razão desse
novo requisito para a reforma agrária, começaram a surgir problemas
referentes ao procedimento para obtenção das licenças ambientais. O objetivo
deste trabalho foi realizar um estudo de como a norma ambiental interferiu na
criação e implementação dos assentamentos rurais, analisando-se as
instituições que lidam diretamente com a questão, assim como o mecanismo
ideológico que o Direito, enquanto campo de conhecimento, se utiliza para
justificar a reforma agrária em Minas Gerais.
xiii
ABSTRACT
BRANDÃO, Cândice Lisbôa, M.S., Universidade Federal de Viçosa, March
2006. Rural establishments and environmental licensing in Minas
Gerais. Adviser: José Ambrósio Ferreira Neto. Committee Members: Sheila
Maria Doula and Francisco de Paula Neto.
The agrarian reform is theme quite controverted, could be analyzed by
several angles, falling prominence to the political events that, along the history,
they justify the moments of cooling and larger social mobilization. Among these
angles, the present study will point out the relationship between the agrarian
reform and the environment, being important to point out that the origin of this
encounter was in 1997 with the promulgation of the Resolution 237 of
CONAMA, that turned obligatory the environmental licensing for several
activities, among which stand out the projects of rural establishments, being
alerted that just in the year of 2001 there was the promulgation of specific
federal norm for such a theme, which is, the Resolution 289 of CONAMA, that
went into effect on December 19, 2004. In Minas Gerais, however, soon after
the Resolution 237, a specific legislation was elaborated to discipline such
situation, so that in 2000 the Normative Deliberation 44 of COPAM was
elaborated, establishing the compulsory environmental licensing for the projects
of rural establishments in Minas Gerais, in effect since the day of the
xiv
publication, on November 25, 2000. In function of this new requirement for the
agrarian reform, problems began to appear referring to the procedure for
obtaining the environmental licenses, being the objective of this work to
accomplish a study on the form as the environmental norm interfered in the
creation and implementation of the rural establishments, being analyzed the
institutions that work directly with the subject, as well as the analysis of the
ideological mechanism that the Right use to justify the agrarian reform in Minas
Gerais.
xv
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo trata da reforma agrária e do licenciamento
ambiental em Minas Gerais, enfocando, em especial, a tensão hoje evidente,
que coloca de um lado os anseios pela reforma agrária e, de outro, a
dificuldade de sua implementação no Estado, devido à obrigatoriedade do
licenciamento ambiental para os assentamentos rurais.
A norma federal que tornou exigível o licenciamento ambiental foi a
Resolução 237 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), no ano de
1997. Em Minas Gerais, entretanto, tal necessidade se fez sentir desde a
promulgação da DN (Deliberação Normativa) 44 do COPAM (Conselho
Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais), em 2000. Deve ser ressaltado
que a legislação federal mencionada tratou de regulamentar os aspectos de
licenciamento ambiental estabelecidos na Política Nacional do Meio Ambiente
(PNMA), valendo tais disposições para todas as atividades que se sujeitassem
ao licenciamento ambiental de forma genérica, enquanto a DN 44 do COPAM
disciplinou especificamente o licenciamento ambiental para os projetos de
assentamento rural de reforma agrária feitos pelo INCRA (Instituto Nacional de
Reforma Agrária) no Estado de Minas Gerais.
De antemão, deve-se ter em mente que o tema em tela está inter-
relacionado com acontecimentos históricos que, por momentos, puderam
favorecer o seu desenvolvimento e, em outros, apenas serviram como
instrumento para obstacularizar a sua implementação, como é o caso da Lei de
1
Terras de 1850 e da Constituinte de 1988, além de outros eventos, a serem
analisados no primeiro capítulo desta dissertação, os quais são imprescindíveis
para que a questão da terra no Brasil possa ser compreendida.
A luta pela mudança na estrutura fundiária do país teve nas últimas
décadas do século XX um período de grande efervescência, momento em que
diversos segmentos sociais se associaram para pleitear junto ao governo a
realização da reforma agrária. Nesse sentido, é oportuno lembrar da atuação
das Ligas Camponesas no final dos anos de 1950 e de outros mediadores
institucionalizados, como a CONTAG (Confederação Nacional dos
Trabalhadores Rurais) e seus sindicatos de trabalhadores rurais, a CPT
(Comissão Pastoral da Terra), bem como de movimentos sociais, como o MST
(Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra), que, ao se engajarem na
luta, atribuíram a ela uma significação maior do que apenas o acesso à terra: a
busca pelo ingresso dos excluídos na apropriação da riqueza gerada pelo país,
trazendo-lhes a dignidade.
Uma questão relevante é que a reforma agrária, ao longo da segunda
metade do século XX, apresentou vários significados diferentes, iniciando-se,
nas décadas de 1950 e 1960, como agente fomentador do progresso do país,
segundo a tese da funcionalidade da pequena produção, tendo também como
incumbência ser mecanismo de segurança alimentar. nas décadas de 1970
e 1980, as discussões sobre a reforma agrária não mais possuíam um viés
produtivista, porque estudos já haviam demonstrado a falácia de tal postura;
ela foi considerada uma das alternativas para os problemas sociais,
principalmente a exclusão social, bastante evidenciados devido à
modernização da agricultura, que, ao priorizar insumos e maquinários aliados
ao desenvolvimento do pólo industrial do país, provocou concentração
fundiária, desemprego e êxodo rural. Mais adiante, na década de 1990,
como nos anos 2000, as discussões sobre reforma agrária alargaram ainda
mais a sua significação, tendo ela a função de ser (ou dever ser) vetor de
desenvolvimento sustentável e de proteção ao meio ambiente do país, além de
continuar desempenhando o papel de instrumento de combate à exclusão
social, visando a justiça social.
Essa última mudança tem sua origem nos movimentos ambientalistas
que, após a década de 1970, ecoaram pelo mundo. Como conseqüência disso,
2
houve inúmeros encontros e conferências internacionais, dos quais resultaram
tratados e convenções, todos no sentido da regulamentação do uso do meio
ambiente, almejando a uma ação mundial conjunta para a adoção dos
princípios da sustentabilidade, que podem ser sintetizados no uso racional dos
recursos naturais, de forma a preservá-los para as gerações futuras.
Adequando-se a essa postura, no Brasil foram promulgadas normas
jurídicas disciplinando a obrigatoriedade do licenciamento ambiental para o
desenvolvimento de atividades poluidoras, efetiva ou potencialmente, dentre as
quais houve previsão para aquelas relacionadas à implementação da reforma
agrária. Nesse sentido, em 1997 veio à lume a Resolução 237 do CONAMA,
norma jurídica com grande amplitude, porque tornou obrigatório o
licenciamento ambiental para uma gama diferenciada de atividades. Assim, o
licenciamento ambiental apenas foi disciplinado de forma específica para a
reforma agrária, no âmbito federal, no ano de 2001, através da Resolução 289
do CONAMA.
Em Minas Gerais, as normas referentes ao licenciamento ambiental
nos projetos de assentamentos rurais floresceram antes do disciplinamento
federal, visto que em novembro de 2000 foi promulgada a DN 44 do COPAM,
que tornou obrigatório aos projetos de assentamentos rurais o licenciamento
ambiental no Estado mineiro. Essa obrigatoriedade, tal qual consignada em lei,
pelas exigências que lhe são inerentes, acabou se mostrando como entrave à
maior agilidade de implantação e implementação dos assentamentos rurais
neste Estado, motivo pelo qual a legislação estadual sobre o tema
recentemente foi revogada, tendo entrado em vigor novo disciplinamento a
esse respeito, em dezembro passado. O que a mudança de legislações trouxe
consigo foi uma tentativa de tornar o procedimento de licenciamento ambiental
mais célere, tendo sido mantida a sua obrigatoriedade, mudando apenas a
forma de se obterem as licenças, o que poderá ser observado com mais
detalhes no capítulo 3 deste estudo.
Tendo em vista o panorama apresentado, o objetivo deste trabalho foi
investigar como o processo de licenciamento ambiental interfere na criação e
operacionalização dos projetos de assentamentos rurais no Estado de Minas
Gerais. Partiu-se da hipótese de que um entrave no processo de
licenciamento ambiental dos projetos de assentamento rural, cogitando-se da
3
possibilidade de que este esteja relacionado ou com a aplicabilidade da
legislação ambiental nos projetos de assentamento rural de Minas Gerais.
Para tal fim, no primeiro capítulo, foi analisada a história da
regulamentação da propriedade, do uso e da posse da terra, sob o prisma do
direito de propriedade no Brasil. Nesse sentido, foi feito um levantamento
histórico-jurídico sobre a propriedade em vários instrumentos normativos, até
se chegar à previsão da reforma agrária no Estatuto da Terra, em 1964, e à
Constituição da República de 1988, em vigor na atualidade.
No segundo capítulo foi analisado o debate sobre a reforma agrária na
perspectiva da sociologia rural, o que inclui os discursos políticos da época,
representados pelos mediadores sociais da luta pela terra, como a ULTAB
(União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), a CONTAG e a
FETAEMG (Federação dos Trabalhadores Rurais de Minas Gerais), e também
dos movimentos sociais.
O terceiro capítulo abordou a legislação ambiental referente à reforma
agrária no âmbito federal, e também em Minas Gerais de forma específica,
analisando tanto os órgãos que compõem o SISNAMA (Sistema Nacional do
Meio Ambiente) quanto as normas ambientais específicas sobre reforma
agrária. Foi priorizada a competência de Minas Gerais, sendo discutidos os
principais instrumentos legais referentes aos assentamentos rurais, quais
sejam as DNs 44, 74 e 88 do COPAM.
No quarto capítulo foi feito um estudo conceitual das representações
sociais sobre o licenciamento ambiental no Estado de Minas Gerais, utilizando
como objeto da análise o posicionamento e o discurso das instituições sociais
envolvidas na implementação da reforma agrária do Estado.
Fez-se no quinto capítulo um estudo sobre a ideologia e a
contraposição que existe entre o direito à reforma agrária e o direito ao meio
ambiente; também foi enfocada a função ideológica do Direito no que diz
respeito à justificação das ações e opções políticas do governo.
No sexto capítulo foram analisados os dados obtidos na pesquisa de
campo, buscando traçar um retrato do processo de criação dos projetos de
assentamentos rurais sob a perspectiva do licenciamento ambiental,
analisando-se os discursos das instituições INCRA, IEF (Instituto Estadual de
Florestas), MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) e
4
FETAEMG quanto ao atual procedimento de licenciamento ambiental que
ocorre no Estado. Na pesquisa de campo foram feitas entrevistas semi-
estruturadas com representantes das instituições envolvidas no procedimento
de licenciamento ambiental dos projetos de assentamento rural de Minas
Gerais, realizadas na cidade de Belo Horizonte, durante os meses de abril a
maio de 2005. Também foi analisada a memória da reunião realizada em 22 de
outubro de 1999, que teve por objetivo a formulação da DN 44 do COPAM.
Nas considerações finais, foram tecidas algumas inferências colhidas
dos dados analisados, bem como de outros utilizados como subsídios para
este estudo.
5
CAPÍTULO 1
A ESTRUTURA DE USO, POSSE E PROPRIEDADE DA TERRA NO BRASIL
Segundo Silva (1990, p. 22), para a compreensão do processo
produtivo na agricultura é fundamental analisar a forma de distribuição da terra,
porque “a propriedade fundiária é o que separa os trabalhadores dos meios de
produção na agricultura brasileira”. Para se analisar a origem dessa
propriedade, sua concentração e o processo de exclusão dela decorrente,
necessário se faz rever a forma de colonização aqui levada a efeito pelos
portugueses desde o Descobrimento do Brasil, em 1500.
1.1. Período Colonial à Proclamação da República
A análise da concentração da propriedade, hoje recorrente no Brasil,
está associada ao tipo de colonização aqui implantada e, assim, ao modo como
a Coroa Portuguesa concebeu a ocupação das terras brasileiras.
É importante, de antemão, que se frise que, mesmo que a propriedade
da terra tenha se revestido de títulos jurídicos diferentes (capitania hereditária,
domínio, posse, etc.), durante todo o curso da história, o Brasil teve como
característica a concentração fundiária.
6
Antes mesmo de adentrar no histórico da propriedade, é indispensável
relembrar que entre Espanha e Portugal foi pactuado no ano de 1494 o Tratado
de Tordesilhas, confirmado no ano de 1504 pelo Papa Júlio II, que avençou
que a titularidade das terras brasileiras pertencia a Portugal; por ser este o
instrumento legal, conferiu o domínio das terras descobertas à Coroa
Portuguesa.
Uma vez reconhecida a titularidade do domínio lusitano sobre as terras
brasileiras, é importante estudar a forma como Portugal idealizou a ocupação
das novas terras através do regime das sesmarias. Também é importante
advertir que, logo após a descoberta do Brasil, o regime legal vigente em
Portugal passou a ser exercido também nas terras brasileiras. Assim, a
primeira legislação lusa a ser adotada foram as Ordenações Afonsinas
(aproximadamente do ano de 1450 a 1521), após as Ordenações Manuelinas,
seguidas pelas Filipinas, que perduraram mesmo após a Proclamação da
Independência, em 1822.
Para implantação do sistema de sesmarias, a Metrópole enviou ao
Brasil Martim Afonso de Souza, munido de cartas régias que lhe conferiam
poder para doar terras sob o regime de sesmarias, com a cláusula de que os
novos proprietários, tal qual ocorrido no regime de sesmarias de Portugal,
deveriam lavrar a terra por período mínimo de dois anos. O cultivo, entretanto,
poderia ser exercido direta ou indiretamente, pois o que importava à Coroa era
a produção em si e não a forma como esta viria a acontecer, se feita
diretamente pelo sesmeiro ou por empregado seu.
Cabe destacar que, chegando ao Brasil, os portugueses encontraram
os povos indígenas, que não concebiam a propriedade do mesmo modo que os
lusitanos. Ao contrário, os indígenas possuíam uma forma comunal de
trabalhar a terra, assim como os demais recursos naturais aqui existentes,
acreditando que os bens naturais pertenciam a todos, sem cogitar de sua
apropriação privada por quem quer que fosse, o que criou atrito entre os
indígenas e os lusitanos, impossibilitando inclusive a utilização do trabalho
indígena como gerador principal de riqueza, devido à concepção de trabalho
peculiar dos nativos, conforme explica Liberato (2004).
Passado esse primeiro momento, que perdurou de 1500 a 1530, os
portugueses, visando melhor explorar as terras brasileiras, bem como impedir
7
os ataques das piratarias das nações européias que haviam sido alijadas do
Tratado de Tordesilhas, implantaram o Sistema de Capitanias Hereditárias, o
que não modificou a estrutura da ocupação que vinha sendo levada a efeito.
Do ponto de vista jurídico, a implantação do regime de sesmarias
significou a transformação das terras públicas em terras privadas, porque, até a
implantação das sesmarias, conforme dito anteriormente, os indígenas é que
detinham a posse e a propriedade da terra e a concebiam como “propriedade”
de todos. Contudo, a partir do momento em que Portugal dividiu o solo
brasileiro em porções e as entregou a donatários lusos, a terra passou a
ganhar os foros de “propriedade de alguém”, ou seja, nasceu a propriedade
privada no Brasil. O regime de sesmarias deu origem não à propriedade
privada, como também à concentração dessa propriedade, ou seja, aos
latifúndios, tendo ainda como sistema produtivo a monocultura, primeiramente
o extrativismo do pau-brasil e, em seguida, a produção de cana-de-açúcar, esta
sim sob o regime da monocultura.
Liberato (2004) afirma que as sesmarias trouxeram para o Brasil
resquícios do sistema feudal
1
, embora na Europa este sistema houvesse
sido substituído. Em suas palavras:
Talvez o ponto mais importante a se considerar sobre o período sesmarial seja a
implementação de um sistema marcado pela monocultura extrativista e
predatória, com a valorização do detentor de grandes extensões de terra ainda
que improdutivas, da formação de uma cultura latifundiária, onde se cultua o
senhor, o proprietário, que nunca poderia trabalhar manualmente e se
descrimina o trabalho, paga-se pouco por ele, às vezes nada, mantendo um
abismo social presente até os dias atuais. Como conseqüência, houve a
implementação de um verdadeiro sistema semi-feudal, fora da Europa e em uma
época onde este havia desintegrado. Os senhores eram verdadeiros semi-
deuses, tendo o poder de vida e de morte sobre os habitantes do sesmo,
possuíam engenho, as terras e os escravos (LIBERATO, 2004, p. 37).
Esse trecho retrata a formação dos primeiros excluídos sociais do
Brasil, pessoas de quem foram expurgadas as terras, antes consideradas de
ninguém (pelo governo luso) ou de todos (pelos indígenas). Entretanto, com a
chegada da Coroa, tornaram-se terras (propriedades) lusas, cuja principal
finalidade era reserva de valor para os portugueses, bem como mecanismo de
garantir uma balança comercial favorável, através do estabelecimento do
exclusivo metropolitano, mecanismo que garantia à Coroa a compra exclusiva
1
Existe ampla controvérsia sobre a existência ou não do feudalismo no Brasil; essa polêmica, no
entanto, não será objeto deste trabalho. Para maiores esclarecimentos, consultar Furtado, Leal, Prado
Júnior, etc.
8
dos produtos oriundos do Brasil e, em contrapartida, estipulava que apenas
poderiam ser adquiridos aqui produtos manufaturados se a origem destes fosse
lusitana. Nesse momento, aqueles que não possuíssem terras, e dependessem
do seu trabalho para sobreviver, teriam que se sujeitar aos preços injustos
estipulados pelos senhores de engenho.
Após esse momento ocorre o chamado período de posses, que
perdurou durante o interregno de 1822 a 1850, que pode ser conceituado como
um fenômeno fático, e não jurídico, de ocupação de parcela das terras públicas
por homens livres. Isso significa dizer que aqueles que se apossaram da terra e
nela passaram a labutar não modificaram o sistema da propriedade em si (que
continuava sob a denominação e critérios típicos das públicas ou particulares),
apenas se beneficiaram de uma das características da propriedade: sua posse.
Esse período pode ser explicado pelo fato de grande parte das terras
do país se encontrar desocupada, enquanto número expressivo de homens
livres não possuía emprego, razão pela qual se deslocavam para o campo com
a intenção de ocupar porções de terra “de ninguém” e nela trabalharem. Esse
fenômeno, entretanto, foi insuficiente para modificar a estrutura fundiária do
Brasil, já bastante concentrada, nas palavras de Pinto:
Tivemos um breve período em que homens livres passaram a ocupar pequenas
áreas de terras devolutas... Na realidade, durante estes 28 anos, que alguns
autores chamam de era das posses, o mero de posseiros que se assentam
em terras públicas foi relativamente pequeno, não alterando o perfil da estrutura
agrária do país, que continuava assentado no latifúndio monocultor (agora
estamos na época do café, em plena expano), utilizando mão de obra escrava
e voltada para o exterior (PINTO, 1995, p. 65).
O regime das posses perdurou até o ano de 1850, quando o governo
promulgou o Decreto 601 do Império, que teve a função política de possibilitar
a perpetuação do latifúndio, uma vez que determinava que apenas poderiam
ser adquiridas terras por meio da compra e venda e que as posses antes
conseguidas deveriam se legitimar através de processo judicial, sob pena de os
posseiros perderem todos os direitos relativos a ela. Entretanto, nem todas as
posses poderiam ser legitimadas. No art. 5.°, do Decreto 601 de 1850, havia
uma séria restrição, sendo possível a legitimação apenas dos casos em que
houvesse “posse mansa e pacífica, adquiridas por ocupação primária, ou
havidas do primeiro ocupante, que se acharem cultivadas, ou com princípio de
cultura e morada habitual do respectivo posseiro ou de quem o represente”.
9
Nascimento (1985), dissertando sobre o ato de legitimação das posses dos
homens livres, afirma que o conteúdo de posse não passa apenas pela noção
de ocupação: “era além: ocupação mais morada habitual mais cultura
efetiva” (NASCIMENTO, 1985, p. 14).
Também no art. 5.° foi inserido o conceito de terra devoluta, que
abarcou as seguintes situações:
- terras que não estivessem sob uso público do Estado;
- terras que não estivessem em domínio particular por título legítimo
(sesmarias);
- terras que não estivessem sob o título das sesmarias regularizadas
(domínio da terra) ou regularizáveis através do Decreto 601 (até então
havia posse por falta de cumprimento de alguma das exigências do título); e
- terras que não estivessem sob a posse amparada para legalização pela Lei
de Terras.
Outra questão que tal legislação tentou solucionar foi aquela relativa à
mão-de-obra para a lavoura, estipulando que o montante advindo da compra
das terras seria utilizado pelo governo para financiar a vinda de colonos da
Europa (SILVA, 1990, p. 25). Nesse mesmo sentido, vieram inseridas no art. 18
do Decreto 601 de 1850 as seguintes emanações:
O Governo fica autorizado a mandar vir anualmente à custa do Tesouro certo
mero de Colonos livres para serem empregados, pelo tempo que for marcado,
em estabelecimentos agrícolas copas ou nos trabalhos dirigidos pela
Administração Pública, ou na formação de colônias nos lugares em que estas
mais convierem, tomando antecipadamente as medidas necessárias para que
tais colonos achem emprego logo que desembarquem (Decreto 601 do Império,
art. 18).
A análise dessa passagem reflete que a intenção do governo não era a
de possibilitar a melhor distribuição de terras para os cidadãos brasileiros, mas
a de fornecer aos latifundiários a garantia da oferta de mão-de-obra para
labutar nas lavouras nacionais.
O Estado, com as normas contidas na Lei de Terras, criou uma grande
massa de excluídos, visto que a maior parte dos posseiros não teve condições
de legitimar sua posse, ao mesmo tempo em que não possuíam numerário
suficiente para adquirirem terras via compra e venda. Nas palavras de Liberato:
A perversidade do sistema evidencia-se no fato de as terras devolutas serem
concessões onerosas, ou seja, além de o Estado deslegitimar as ocupações dos
trabalhadores livres, retirava os mesmos de suas terras e lhes propiciava o
10
acesso através do pagamento de altos preços para readquiri-las. Através deste
sistema houve a expulsão de um contingente de comunidades tradicionais que
se transformavam em mão-de-obra escrava, sob o estertipo do trabalho livre.
Este sujeito, agora denominado trabalhador livre, passou a ter acesso às terras
outrora de sua “propriedade” através da compra e venda do justo título
(LIBERATO, 2004, p. 42).
Para que a Lei de Terras pudesse de fato cumprir seu papel, o governo
iniciou o processo de discriminação das terras brasileiras, a fim de mapear a
real situação do território nacional, explicitando a classificação das terras em
particulares e públicas e impedindo que alguns posseiros conseguissem
legitimar sua situação por meio da aquisição do justo título da propriedade da
terra. Isso ocorreu porque a legislação trouxe uma série de requisitos para
legitimação da posse, o que dificultou, e por vezes impossibilitou, o
reconhecimento da situação fática do posseiro, ocasionando a venda de mais
mão-de-obra, cada vez mais barata, aos latifundiários.
1.2. O direito de propriedade nas constituições brasileiras
Antes de adentrar na maneira como as constituições positivaram o
direito de propriedade ao longo dos tempos, é necessário relatar que, segundo
o Direito, todas as positivações refletem os valores dominantes em cada época
acerca de determinado tema
2
. Reportando ao direito de propriedade, é
observado que este surge na Revolução Francesa e na Primeira Constituição
da França, sob a égide de um direito absoluto, o que implica dizer que ele não
poderia ser contestado. Dizer que um direito é absoluto significa afirmar que
sobre ele não podem incidir quaisquer tipos de sujeições, uma vez que ele está
protegido de forma plena, o que correspondeu aos anseios liberais do século
XVIII, que buscava o desenvolvimento econômico e tecnológico a qualquer
custo, esquecendo-se do desenvolvimento social e priorizando as perspectivas
econômicas e políticas.
Essa fase de proteção absoluta, entretanto, cedeu espaço a um direito
mais voltado à proteção dos bens da coletividade, em decorrência do momento
2
Nesse momento é importante salientar que o Direito, na sua acepção pura, deveria refletir os valores de
toda a sociedade quanto a determinado tema. Entretanto, o que se vislumbra é que o Direito positiva as
aspirações da classe dominante, vez que é esta que, na maior parte das vezes, está no poder e pode,
dessa forma, positivar as aspirações de sua classe, ainda que sob o regime da democracia. Mas aqui
cabe outra dissertação sobre o tema. Nesse sentido, consultar Wolkmer (2003).
11
histórico pelo qual passou o mundo no pós-Segunda Guerra Mundial (século
XX), visto que os países se viram solapados por problemas sociais, que
demandavam ações efetivas do governo. O número dos proletários aumentava
a taxas jamais vistas e junto a eles a pobreza de grande contingente
populacional, ocasionando outros problemas daí decorrentes, como violência,
fome e criminalidade. Assim, surgiu na Alemanha e no México o conceito da
função social da propriedade, que foi propagado pelo restante do mundo e
passou a integrar o universo jurídico brasileiro na Constituição de 1934, de
uma forma um pouco tímida, escondida sob o manto do interesse social, mas já
modificando a concepção de propriedade para o direito pátrio. Após essa breve
explanação, que, grosso modo, explicita a transformação do direito de
propriedade, serão analisadas as Constituições do governo brasileiro, bem
como o tratamento dado por elas à propriedade.
Em 1824 foi promulgada a primeira Constituição brasileira, no
período do Império, outorgada pelo príncipe regente Dom Pedro I. Nesse
instrumento, que teve como inspiração a Revolução Francesa, em 1789, a
propriedade foi resguardada como direito absoluto. Conforme Godoy (1998),
nesta primeira Carta Constitucional se admitia desapropriação por utilidade
pública, segundo o art. 179 da Constituição. Interessante destacar o fato de
que, embora prevista na Constituição, a propriedade deveria ser
regulamentada em legislação ordinária, o que ocorreu com a promulgação
do Código Civil de 1916. Nesse período de 1824 a 1916, as normas lusitanas
ordinárias continuaram vigendo no país, apesar de em 1858 ser promulgada a
Consolidação das Leis Civis, elaborada por Teixeira de Freitas (GODOY,
1998).
A próxima Constituição foi promulgada em 1891, após a Proclamação
da República. Este instrumento legal seguiu os ditames do anterior com relação
à propriedade privada, ou seja, protegeu-a de forma robusta, admitindo apenas
a desapropriação por utilidade pública e após prévia indenização.
Logo a seguir foi promulgado o Código Civil de 1916, que entrou em
vigor em primeiro de janeiro de 1917 e vigeu até 31 de dezembro de 2001. Tal
instrumento jurídico foi elaborado nos anos próximos ao de 1889, tendo como
ideologia o espírito oitocentista, condizente com a estrutura política e
econômica do século XIX, que “elegeu a família, baseada no casamento, o
12
contrato, baseado na autonomia privada das partes, e a propriedade, como
direito individual, seus pilares fundamentais” (GODOY, 1998, p. 42). No Código
Civil de 1916, a propriedade, mais uma vez, foi fortemente protegida.
Entretanto, conforme também assevera Godoy (1998), sobre ela poderiam ser
feitas algumas limitações de natureza cível, administrativa ou cuja origem fosse
o direito econômico. No âmbito cível, a propriedade poderia sofrer restrições no
sentido de compatibilizar interesses privados divergentes, como, por exemplo,
com o direito de vizinhança. no âmbito administrativo, deve-se considerar
que sempre a sobreposição do interesse público sobre o particular; assim,
foram previstos alguns casos, como os de desapropriação, requisição,
tombamento e servidão administrativa. na seara do direito econômico,
houve a previsão de proibição “do domínio de mercado e eliminação da
concorrência e aumento arbitrário de lucros” (GODOY, 1998, p. 44).
Deve-se ressaltar que no corpo do Código Civil apenas vem a previsão
da desapropriação por necessidade ou utilidade pública, e essa necessidade
veio taxativamente prevista no art. 590 do referido instrumento legal.
Nos anos de 1934 e 1937 foram promulgadas outras duas
Constituições. A primeira durante o primeiro governo de Getúlio Vargas, e a
segunda, após o golpe militar de 10 de novembro de 1937 e conseqüente
implantação do Estado Novo. Comparando as duas Consolidações, pode-se
observar que houve um retrocesso com relação ao direito à propriedade, uma
vez que na Constituição de 1934 a propriedade vinha vinculada ao interesse
público, conforme art. 17, que afirmava que “é garantido o direito de
propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo,
na forma que a lei determinar”. na Constituição de 1937 a alusão à utilidade
social da propriedade foi extirpada, restando apenas a salvaguarda ao direito
individual de propriedade e a prerrogativa de indenização para os casos de
desapropriação cujo interesse público pudesse justificar.
É importante ressaltar que a Constituição de 1934 coaduna com o
momento histórico de reavaliação dos valores liberais, cujo principal marco foi a
Constituição Francesa de 1791, calcada no individualismo como valor máximo
que deu origem às normas jurídicas. no ano de 1934, após a crise de 1929,
os valores atrelados ao capitalismo começavam a tomar feições diferenciadas,
sobressaindo em todo o mundo os valores sociais. Nas palavras de Rocha:
13
A desagregação provocada pelas massas proletárias às condensações sociais
anteriores e os problemas emergentes com a nova estrutura ecomico-social,
notadamente os problemas dos trabalhadores assalariados interferindo na
sociedade e no Estado, trouxeram como conseqüência uma evolução conceitual
no que concerne à liberdade e à propriedade. Emergiram então as chamadas
questões sociais. O Estado, sob pena de submergir, teve que assumir um novo
posicionamento a fim de restabelecer pontos de equilíbrio e resguardar a
segurança e a harmonia social. Nessa tarefa mediadora entre o individualismo
egoístico e as aspirações dos assalariados em luta pelo reconhecimento de seus
direitos contra a opressão econômica resultante do novo contexto teve que opor
limitações à liberdade e, por conseqüência, à propriedade (ROCHA, 1992, p.
32-33).
Peters (2005) atribui à Constituição de 1934 o germe da função social
da propriedade, já que nesta Consolidação é mencionado o interesse social.
Certo é que a concepção de propriedade, por força da nova disposição legal,
mudou seus contornos e conteúdos, passando a adotar uma feição social que
se sobrepõe ao antigo caráter absoluto da propriedade.
Nova Constituição é promulgada em 1946, ocasião em que havia
sido restabelecida a democracia no país. Nela novamente vêm expressos
valores sociais, de forma mais incisiva e direta, o que pode ser vislumbrado nos
artigos 141 e 147 do texto legal, a seguir transcritos:
Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à
segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§16. É garantido direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por
necessidade ou utilidade pública ou por interesse social, mediante prévia e justa
indenização em dinheiro (...)
Art. 147. O uso da propriedade será condicionado ao bem estar social.
Godoy (1998) cinge outro acontecimento importante à Constituição de
1946: a Emenda Constitucional n10, promulgada em 1964, que deu ensejo à
posterior elaboração do Estatuto da Terra. A Emenda Constitucional n.° 10 é
considerada por alguns doutrinadores como marco da autonomia do Direito
Agrário, “principalmente por instituir o imposto territorial rural progressivo e a
desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, com a
indenização sendo paga em títulos da dívida agrária” (GODOY, 1998, p. 49).
Em 1967 novamente houve a promulgação de texto constitucional, que
seguiu a mesma esteira do anterior, consagrando o direito à propriedade,
porém esta subordinada à sua função social, admitindo os casos de
desapropriação por interesse público mediante prévia e justa indenização.
14
Assim, seguindo as emanações do Estatuto da Terra, a função social da
propriedade ficou definitivamente consagrada em nosso Direito pátrio.
Merece destaque, nesse resgate histórico aqui traçado, a análise dos
instrumentos jurídicos acerca da propriedade que estão em vigor na atualidade,
quais sejam a Constituição da República de 1988 e o Código Civil de 2002.
A Constituição da República de 1988 tratou da propriedade privada
como direito fundamental
3
, estando tipificada no seu art. 5.°. É interessante
destacar que, apesar da proteção constitucional dada à matéria, esta não foi
absoluta, como acontecia com as constituições anteriores. Ao contrário, a
Constituição de 1988, por estar em um contexto histórico em que os direitos
sociais a cada dia ganhavam maior força política, condicionou a proteção à
propriedade privada ao cumprimento da função social. A conseqüência direta
de tal postura foi a possibilidade da desapropriação para fins de reforma
agrária nos casos em que a propriedade não estivesse de acordo com os
parâmetros determinantes da função social, que vieram explícitos no art. 186
da Constituição da República de 1988.
Posteriormente à Constituição da República de 1988, foi promulgado o
Código Civil de 2002, que, novamente, disciplina a propriedade não de forma
absoluta ou plena, mas sujeitando-a aos valores sociais e coletivos,
consagrados no Direito brasileiro. Aqui novamente se percebe a mudança de
perspectiva do direito de propriedade, visto que a propriedade não mais é
percebida como uma existência independente, mas passa a ser cingida aos
valores sociais, ambientais e culturais que estão atrelados a ela. Isso significa
afirmar que a sociedade não mais se contenta com a mera proteção da
propriedade em si, mas almeja que todos os direitos materiais ou imateriais
relacionados ao bem (propriedade) também estejam sob a proteção do Estado.
Nesse sentido vêm as emanações gerais sobre a propriedade no Código Civil
de 2002, quais sejam:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o
direito de rea-la de poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha.
§1.° O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas
finalidades ecomicas e sociais e de modo que sejam preservados, de
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como
evitada a poluição do ar e das águas.
3
Os direitos fundamentais serão tratados com mais detalhes no quinto capítulo desta dissertação.
15
(...)
§3.° O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por
necessidade ou utilidadeblica ou interesse social, bem como no de requisição,
no caso de perigo blico iminente. (...)
Tal norma, na verdade, rompe com as positivações anteriores, na
medida em que alarga o conceito de proteção à propriedade, incutindo nele o
dever de salvaguardar não o bem em si, mas o meio em que está inserido, seja
ele material ou imaterial, incluindo necessariamente a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio artístico e cultural. Uma forma de
vislumbrar melhor essa postura estatal seria pensar em uma comunidade rural
localizada, por exemplo, no sul do país, cuja colonização tenha se dado em
1840, por suíços. A conseqüência direta deste alargamento dado à proteção da
propriedade implica dizer que não basta que apenas a terra onde houve a
colonização seja protegida, mas que toda a construção histórica e cultural
dessa suposta comunidade também seja preservada e protegida, o que
constituiu um grande avanço quanto às antigas concepções do direito de
propriedade como sendo absoluto e restrito ao valor do bem em si mesmo. O
que essas considerações querem dizer é que a terra passa a incorporar a
noção de patrimônio, natural ou construído, o que atenua o caráter de
mercadoria, dominante até então.
Com relação à normatização da reforma agrária, é importante ter como
marco o Estatuto da Terra, Lei. 4.504/64, primeira lei brasileira a determinar de
forma específica as regras sobre a política de reforma agrária a ser seguida
pelo governo brasileiro, o que significa dizer que muitas das determinações
hoje correntes na nossa legislação sobre reforma agrária têm sua origem no
Estatuto da Terra.
O ET (Estatuto da Terra) foi promulgado no dia 30 de novembro de
1964, e seu objetivo veio transcrito no art. 1.° da legislação como sendo o de
regular os “direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para os
fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola”. Nesse
sentido, o Estatuto da Terra prescreveu em seu art. 1.°, §2.°, o conceito de
reforma agrária como “o conjunto de medidas que visem a promover melhor
distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a
fim de atender aos princípios de justiça social e aumento da produtividade”,
bem como conceituou, no §2.°, do art. 1.°, a política agrícola como sendo
16
conjunto de providências de amparo à propriedade da terra, que se destinem a
orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no
sentido de garantir-lhe o pleno emprego, seja no de harmonizá-las como
processo de industrialização do país.
Pode-se inferir dos conceitos anteriormente transcritos que a política de
reforma agrária, segundo a descrição da própria lei, teria por finalidade a
resolução dos problemas de produtividade rural, conjuntamente com a
demanda social dos excluídos da terra, e que a política agrícola teria por
finalidade amparar os proprietários de terra no sentido de orientá-los e inseri-
los na perspectiva da economia rural, o que inclui a proteção ao emprego e a
adequação das propriedades rurais ao processo de industrialização do país.
O fundamento jurídico para a desapropriação para fins de reforma
agrária seria o descumprimento da função social da propriedade, o que remete
ao conceito de justiça social, alicerce ideológico da discussão do período
analisado. Com relação ao significado da locução função social, pode-se inferir
da análise da legislação que significa o uso condicionado ao bem-estar
coletivo, ou seja, a propriedade que gere melhorias para a coletividade, e não
apenas sirva de reserva de valor. Dessa forma, os requisitos elencados pela
legislação para que a propriedade se visse protegida da desapropriação
seriam, simultaneamente:
a) A exploração que favoreça o bem-estar social, tanto dos proprietários
quanto dos empregados do imóvel rural, que acontece quando “o
atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra,
observam as normas de segurança do trabalho e não provocam conflitos e
tensões sociais no imóvel”, de acordo com o art. 9.°, §5.°, da Lei 8.629/93.
b) A conservação dos recursos naturais, o que inclui a “preservação do meio
ambiente e a manutenção das características próprias do meio natural e da
qualidade dos recursos ambientais”, buscando-se o equilíbrio ecológico da
propriedade rural, bem como a saúde e qualidade de vida da comunidade
vizinha, conforme estipula o art. 9.°, §3.°, da Lei 8.629/93.
c) Níveis satisfatórios de produtividade, conforme os índices de grau de
eficiência e exploração das terras, prescrito na Lei 8.629/93.
d) Observância das justas relações de trabalho entre aqueles que possuem o
imóvel e aqueles que ali trabalham, o que ocorre quando o respeito às
17
leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, assim como às
disposições acerca das parcerias e arrendamentos rurais.
Pode-se observar, entretanto, que, embora a desapropriação por
descumprimento da função social estivesse prevista desde 1964, no texto do
Estatuto da Terra ficou consignado que a forma de desapropriação seria aquela
estabelecida na Constituição Federal; contudo, esta forma, que corresponde ao
procedimento a ser adotado com relação ao rito da ação desapropriatória, não
veio descrita no Estatuto ou na Constituição de 1988, mas apenas no ano de
1993, com a LC (Lei Complementar) 76, que traz o procedimento pertinente ao
ajuizamento das ações de desapropriação, modificado pela Lei Complementar
88, de 23 de dezembro de 1996. o direito material sobre a desapropriação
foi definido na Lei 8.629/93, e, assim, a matéria é regida por quatro normas
jurídicas: a Constituição da República de 1988, a LC 76, a LC 88 e a Lei
8.629/93. Até essas promulgações, a desapropriação obedecia aos ditames do
Decreto-lei 3.365/41, que era a lei geral das desapropriações, cujo
procedimento, por regulamentar desapropriações de uma forma genérica, é
incompatível com a desapropriação pelo descumprimento da função social.
Justamente por essas vicissitudes é que o ET pode ser interpretado
como óbice à reforma agrária, visto que as normatizações nele contidas
necessitavam de regulamentação, o que ocorreu anos após sua
promulgação. Outros fatores se constituíram em entrave, entre eles a proteção
dada às empresas rurais, justificada pelo processo de modernização da
agricultura que estava em fase de implementação, o qual será tratado com
maior vagar no capítulo que se segue. À medida que os latifúndios se
transformavam em empresa rural, eles estavam imunizados da desapropriação,
impedindo, dessa maneira, a reforma agrária. Outro aspecto interessante diz
respeito à previsão feita pelo ET sobre a política de colonização dirigida, que,
na realidade, foi a ação efetiva adotada pelo governo brasileiro e que acabou
deixando a reforma agrária em segundo plano, tendo a política de
assentamentos rurais durante tal período ocorrido de forma pontual e em
quantidade muito aquém das necessidades sociais, e também das promessas
do governo.
Posições no sentido contrário, porque, se o ET for analisado sob a
perspectiva eminentemente legal, sua promulgação foi um avanço, no sentido
18
de ser a primeira norma jurídica a tocar no assunto da política pública acerca
da reforma agrária, embora isso não tenha efetivamente ocorrido até o
presente momento. Uma outra visão, de caráter processual, foi positiva, visto
que algumas questões, antes indeterminadas, puderam ser esclarecidas, como
a competência da União sobre a matéria referente à reforma agrária, a forma
de pagamento das terras e das benfeitorias, assim como o estabelecimento de
que o imposto sobre os imóveis rurais (ITR) seria utilizado no sentido de
possibilitar a reforma agrária. Na visão de Rocha (1992), pelos argumentos
anteriormente descritos, pode-se avaliar o Estatuto da Terra como positivo para
a reforma agrária do país.
Não obstante as disposições presentes no Estatuto da Terra, o
disciplinamento da reforma agrária sofreu modificações com a promulgação da
Constituição da República de 1988 e demais normas posteriores (LC 76, LC 88
e Lei 8.629/93). Todavia, de modo geral, as emanações do ET continuam
presentes, pois na Constituição da República foi novamente prevista a
desapropriação oriunda da função social da propriedade para fins de reforma
agrária, em seu art. 184. Quanto à desapropriação, apenas ficaram
resguardadas a propriedade produtiva e a pequena e média propriedades
rurais (nesses últimos dois casos necessidade de que o proprietário não
possua outras propriedades rurais).
As definições de pequena e média propriedade foram fixadas pela Lei
8.629/93, sendo a pequena propriedade definida pelo seu tamanho, que deve
ser entre um e quatro módulos fiscais, e a média propriedade aquela que
abarca entre 4 e 15 módulos fiscais, estando o tamanho desses módulos
disciplinados por lei específica, variando para cada parte do país. a
propriedade produtiva é aquela descrita no art. 6.° da Lei 8.629/93, ou seja,
aquela em que a exploração é econômica e racional, atingindo
simultaneamente grau de utilização da terra superior a 80% e grau de eficiência
na exploração da terra superior a 100%. A forma de cálculo desses índices
vem descrita na mesma legislação, mas não será pormenorizada, vez que é
dispensável tal tarefa para o presente estudo, que possui objetivo diverso.
19
CAPÍTULO 2
AS CIÊNCIAS SOCIAIS E O DEBATE SOBRE A REFORMA AGRÁRIA
NO BRASIL
Quando se analisa um tema como a reforma agrária, é necessário
tentar vislumbrá-lo por ângulos que às vezes se encontram revestidos por
discursos políticos, ou mesmo pela orientação oficial do governo, que se
exterioriza nas políticas públicas ou no direito vigente da época. Diante desse
fato, no presente capítulo foram analisados os principais acontecimentos
históricos que dizem respeito ao debate sobre a reforma agrária, como o
modelo de desenvolvimento das décadas de 1960 e 1970 e a modernização da
agricultura, bem como a proposta de sustentabilidade ambiental e sua relação
com a política de reforma agrária que se almeja implantar na atualidade. A
noção de desenvolvimento e posteriormente de sustentabilidade é
imprescindível para a análise da política de reforma agrária, visto que
hodiernamente o meio ambiente saudável e protegido é nãorequisito para a
criação e operacionalização dos assentamentos rurais, como, caso não esteja
resguardado, motivo para a desapropriação que ensejo à criação dos
projetos de assentamentos rurais.
Uma primeira questão a ser definida é a diferenciação entre os
conceitos de reforma agrária e de assentamento rural, que, muitas vezes são
usados como sinônimos, situação que pode ser percebida, inclusive, neste
20
trabalho, muito embora possuam significados diferenciados.Talvez a origem de
tal confusão seja o texto do Estatuto da Terra, que apenas menciona de forma
não muito específica o fato de que o assentamento rural é uma das
possibilidades de se fazer reforma agrária. Ferreira (1994, p.39), entretanto,
propõe uma diferenciação entre as duas expressões, afirmando que a reforma
agrária pode ser pensada “como fundiária, no sentido de torná-la mais
equânime”. Neste sentido, a reforma agrária deve dizer respeito à questão
fundiária de todo o país, um conjunto de medidas destinadas a possibilitar a
transformação da concentração fundiária, incluindo, dessa maneira, políticas
públicas específicas para essa necessidade. o termo assentamento rural,
nas palavras também de Ferreira (1994, p. 39), refere-se a “ações práticas”,
cujo marco inicial seria a seleção dos futuros beneficiários, passando-se à
inserção dessas pessoas nos lotes a elas destinados e, na visão de hoje,
incluindo as medidas necessárias à fixação dos beneficiários à terra, que
abarcam os momentos necessários à transformação do beneficiário da reforma
agrária em proprietário da terra. Essas conceituações permitem perceber que a
reforma agrária é uma concepção ampla, envolvendo as questões de política
pública que possibilitem a desconcentração das terras no país. Já o
assentamento rural é um processo, um instrumento de realizar a reforma
agrária, mas que não engloba toda a extensão que a reforma agrária tem ou
poderia ter. Assim, mesmo que em determinadas áreas do país ocorram com
mais freqüência os projetos de assentamentos rurais, o fato de eles
existirem não é suficiente para que se possa afirmar que as características
fundiárias da região chegaram a se modificar significativamente, ou que a
reforma agrária, como um todo, ocorreu. Nessa esteira, analisando os debates
sobre a reforma agrária do país, pode-se afirmar que no Brasil ocorreu, no
início, a política da colonização, que posteriormente foi substituída pela política
de assentamentos rurais; nenhuma delas pode ser considerada política de
reforma agrária, que a estrutura fundiária do Estado continua praticamente
sem alterações.
Tendo em vista a diferenciação feita anteriormente, é necessário alertar
que este capítulo analisará o papel dos mediadores nos embates em prol do
acesso à terra, sendo ressaltadas as ações dos sindicatos (FETAEMG, em
especial) e também dos movimentos sociais (particularmente a atuação do
21
MST) na luta pela modificação da concentração fundiária. Para isso, foi
utilizada como referência a construção teórica dos cientistas sociais que
estudaram os temas referidos.
2.1. O modelo de desenvolvimento e a modernização da agricultura
A noção de “subdesenvolvimento” surgiu no contexto mundial a partir
do discurso do presidente Truman em 1949, quando este propôs ajudar os
países “subdesenvolvidos” a se desenvolverem. Com essas palavras, inseriu-
se no contexto mundial a noção de subdesenvolvimento e a promessa do
desenvolvimento para aqueles países que não apresentavam o progresso
econômico equiparado aos ditos desenvolvidos
4
, seguindo-se sempre os
padrões ocidentais para conceituar o desenvolvimento (McMICHAEL, 2000).
Diante dessas concepções acerca do que seria o desenvolvimento, a
agricultura era percebida, desde os tempos de Adams Smith e seus estudos
sobre a divisão social do trabalho, com um papel secundário ao
desenvolvimento econômico que gerava riquezas. Nesse sentido, alguns
autores a percebem como um obstáculo ao desenvolvimento (ABRAMOVAY,
2004). Esse pensamento ficou conhecido como tese feudal, e pode ser
sintetizado pela passagem de Abramovay:
Dominada pelo latifúndio, a agricultura é incapaz de se desenvolver
tecnicamente e de contribuir para a elevão permanente da produção. Tanto
mais que a maior parte dos trabalhadores rurais, não tendo acesso à terra, não
pode participar do processo social de progresso técnico. Assim, estes
trabalhadores se encontram à margem do mercado: pouco produzem e pouco
consomem. Isto é um obstáculo ao desenvolvimento econômico como um todo,
pois, se os trabalhadores rurais tivessem acesso à terra, passariam a gerar
renda através da qual poderiam incorporar-se ao mercado interno nacional e
contribuir, assim, ao próprio desenvolvimento capitalista do país (ABRAMOVAY,
2004, p. 96).
Ainda de acordo com Abramovay (2004) e a abordagem sobre o papel
empírico da agricultura no processo de desenvolvimento econômico, surgem
discussões em torno principalmente de duas dimensões: a primeira dizia
respeito à ligação do homem à terra, por alguns sociólogos denominada de
imobilização do trabalho, que os unia em algumas relações clientelísticas,
marcadas por exemplo pela presença do barracão, cambão, colonato, entre
4
EUA, países da Europa, entre outros.
22
outras. a segunda dizia respeito à falta de integração desses trabalhadores
rurais ao mercado capitalista. Assim, percebe-se que, nessas duas dimensões,
o trabalhador rural não se via em condições de promover o desenvolvimento
econômico do país.
Nesse contexto, tanto a CEPAL (Comissão Econômica para a América
Latina) quanto o PCB (Partido Comunista do Brasil) lutavam pelo fim dessas
relações denominadas de feudais, o que ocorreria, na visão dessas
instituições, quando houvesse o incremento de uma classe de produtores
próspera, que traria o desenvolvimento para o país via agricultura. Assim, o
PCB pregava a reforma agrária, tendo como um dos pontos-chave o
desenvolvimento da própria agricultura do país, o que daria ensejo ao
desenvolvimento capitalista de cunho nacionalista.
Nessa época também se trabalhou com a teoria da funcionalidade da
pequena produção, que apregoava a importância da agricultura familiar no
contexto do desenvolvimento, onde se argumentava que:
O pequeno produtor contribuía para a acumulação de capital, à medida que,
oferecendo produtos a preços relativamente baixos, possibilitava um
rebaixamento do custo da força de trabalho, portanto dos salários, e, ainda, o
aumento da taxa de lucros (ABRAMOVAY, 2004, p. 98).
As teses da funcionalidade também não perduraram por longo tempo,
sendo rebatidas por sérias críticas, que se alicerçavam no fato de que seria
improvável que o valor dos salários do país pudesse ser determinado por um
segmento como o da agricultura, bastante fraco na época. Nesse ambiente de
disputa ideológica sobre a importância da produção familiar, a principal
bandeira pró-reforma agrária se embasava na importância dos produtos
agrícolas dela oriundos. Nas décadas de 1970 e 1980, entretanto, a defesa da
reforma agrária passou por um momento de redefinições, porque trabalhos de
autores como Graziano da Silva e também de Abramovay demonstravam que:
À medida que a pequena prodão perdia importância na oferta agrícola, a
própria justificativa econômica da reforma agrária perdia o sentido: não era
preciso reforma agrária para elevar a prodão de alimentos. O problema
alimentar brasileiro perdia toda relação com a questão agria para se
transformar exclusivamente numa questão de renda (ABRAMOVAY, 2004, p.
99).
Ao lado das mudanças de perspectivas anteriormente apontadas, é
preciso realçar o papel do desenvolvimento da agricultura e seu impacto nos
23
caminhos ideológicos e fáticos pelos quais se delineou a questão da reforma
agrária do país. Não se pode perder de vista que, ao lado do descrédito por
setores da elite política econômica no papel da pequena produção no país,
houve a valorização do setor industrial e agroindustrial e, junto a eles, a
importância do trabalho assalariado. Também se deve considerar que houve
nesse período uma espécie de simbiose entre a agricultura e a indústria,
possibilitada pela modernização da agricultura com a incorporação de
inovações tecnológicas, o que evidencia que os setores agrícolas patronais
eram capazes de abastecer o mercado consumidor interno e de gerar excessos
para a exportação, não dependendo da produção familiar para a geração dos
gêneros alimentícios ou de matéria prima.
A modernização da agricultura foi um fenômeno que ocorreu desde o
princípio da década de 1950, prolongando-se pelas décadas de 1960, 1970 e
1980. Durante esse período houve incremento na política tecnológica do setor
rural, que pôde ser sentida de forma mais efetiva após a década de 1970,
momento em que se encontravam em funcionamento as agências de
geração e difusão de tecnologia para o setor rural, juntamente com uma série
de créditos rurais sistematizados no Sistema Nacional de Crédito Rural
(SNCR), destinados à propagação das inovações tecnológicas no setor, a
taxas de juros muitas vezes negativas.
Delgado (1985), na esteira de Graziano da Silva, divide as inovações
que impulsionaram o desenvolvimento rural em mecânicas, físico-químicas e
biológicas. As mecânicas relacionam-se à forma de organização do trabalho e,
principalmente, ao ritmo da jornada de trabalho, que foi dominada tanto por
empreendimentos nacionais como multinacionais e se encarregou de
inovações como tratores, implementos, máquinas, colhedeiras, etc. As
inovações físico-químicas se encarregaram da melhoria das condições naturais
do solo, o que aumentou a produtividade do trabalho, que tem como exemplo o
grande desenvolvimento dos adubos e fertilizantes químicos. Por fim, as
inovações biológicas se encarregaram da alteração da “rotação do capital
adiantado no processo produtivo, através da redução do período de trabalho e
da potencialização das inovações mecânicas e físico-químicas” (DELGADO,
1985, p. 92).
24
A modernização da agricultura, como se percebe, ocorreu devido ao
desenvolvimento da indústria relacionada à agricultura brasileira e envolveu
todas as inovações supracitadas, possibilitando a incorporação dos princípios
da Revolução Verde, que “combina as inovações físico-químicas e mecânicas
com a criação de variedades vegetais altamente exigentes em adubação
química e irrigação” (DELGADO, 1985, p. 96). Diante desses progressos
técnicos, segundo esse autor, a difusão de tecnologia ocorrida no Brasil se
apoiou na adaptação das inovações biológicas às inovações físico-químicas, à
vinculação da adoção de tecnologia ao crédito rural e às inovações em geral
apoiadas na energia derivada do petróleo.
Conseqüência desse progresso técnico, bem como das políticas de
crédito rural fundamentadas na adoção das novas tecnologias, foi que a
agricultura familiar, mais uma vez, deixou de ser visualizada como a solução
para os problemas de produtividade.
Também é importante mencionar que a modernização da agricultura
modificou todo o mecanismo produtivo, o que inclui a forma de organização do
trabalho, bem como as condições de vida do meio rural. Nas palavras de
Navarro (2001):
Com a disseminação de tal padrão na agricultura, desde então chamado de
“moderno”, o mundo rural (e as atividades agrícolas, em particular) passou a
subordinar-se, como mera peça dependente, aos novos interesses, classes e
formas de vida e de consumo, majoritariamente urbanas, que a expano
econômica do período ensejou, em graus variados, nos diferentes países. Esse
período, que coincide com a impressionante expansão capitalista dos “anos
dourados” (1950-1975), é assim um divisor de águas tamm para as atividades
agrícolas e o mundo rural (re)nasceria fortemente transformado, tão logo os
efeitos desta época de transformações tornaram-se completos.
Junto à promessa de desenvolvimento que estava atrelada à
modernização da agricultura havia a expectativa de melhoria das condições de
vida do meio rural; afinal, a industrialização tinha como pressuposto a idéia de
progresso, que inclui um significado de melhoria generalizada. Entretanto, o
resultado da modernização da agricultura no meio rural brasileiro não foi
animador, trazendo uma série de problemas sociais em seu bojo, como o
êxodo rural, o aumento da pobreza dos trabalhadores rurais, a violência e a
criminalidade no meio agrário do Brasil, uma vez que, com a utilização de
maquinaria na agricultura, houve grande número de trabalhadores rurais que
perderam seu emprego, abandonando o campo rumo às cidades, ou se
25
aglomerando em torno de movimentos sociais que lutavam em prol do acesso
à terra para os trabalhadores rurais sem terra.
2.2. Do modelo de desenvolvimento sustentável
A idéia do desenvolvimento, em voga principalmente durante as
décadas de 1950, 1960 e 1970, sofreu grande impacto no seu significado, bem
como em seus desdobramentos práticos, a partir da década de 1970, quando o
conteúdo das ações que visavam ao progresso econômico
5
começou a ser
questionado. As dúvidas e considerações apontadas rumo ao conceito de
desenvolvimento foram sintetizadas de maneira elucidativa por Guimarães
(2003), que anunciou incongruências relacionadas com a noção de progresso,
a questão social, os benefícios do progresso e a perspectiva ecológica.
A primeira incongruência mencionada pela autora aponta para o
significado da própria noção de progresso e de moderno, que domina a idéia
de desenvolvimento, visto que tais expressões professam um caminho
evolutivo a seguir, tendo como referencial a sociedade ‘desenvolvida’, aquelas
que estão no centro do sistema capitalista” (GUIMARÃES, 2003, p. 84). No
entanto, o progresso propagado e almejado sempre possui uma mesma
trajetória, poder-se-ia dizer retilínea, que vai no sentido da absorção da
tecnologia e da mudança da forma de organização do trabalho de toda e
qualquer sociedade, devendo todas as sociedades se adequarem ao sistema
típico do modo de produção capitalista americano. E essa forma de
organização do trabalho utilizada como referência, denominada modelo
desenvolvimentista, “prima pelos interesses privados (econômicos) frente aos
coletivos (meio ambiente), consubstanciando-se em uma visão antropocêntrica
de mundo, gerador de fortes impactos ambientais” (GUIMARÃES, 2003, p. 84).
A adoção plena deste modelo desenvolvimentista, que se alicerça na
produção e industrialização constante, seria, para os adeptos de tal
posicionamento, ilimitada, malgrado os recursos naturais necessários para a
produção sejam, por sua natureza, restritos. Assim, aparece o primeiro óbice à
busca desenfreada de progresso pelo modelo desenvolvimentista, porque
5
A palavra progresso econômico foi utilizada como sinônimo de desenvolvimento, porque no contexto
das décadas de 1960 e 1970 os significados eram coincidentes.
26
pesquisas apontam para o fato de que, se todos os países do mundo agissem
nos mesmos moldes dos Estados Unidos, o planeta entraria, em um espaço de
tempo muito curto, em um colapso ambiental. Tanto é que Cavalcanti (2001)
afirmou que, após a publicação do Relatório Brundtland
6
, um dos marcos da
discussão sobre sustentabilidade, a postura adequada com relação à produção
deveria ser antagônica ao estilo americano, pautando-se em um
distanciamento no consumo desenfreado e mais próximo à sobriedade e
austeridade.
Outra incongruência do modelo de desenvolvimento é que o
fundamento do modelo defendido é o modo de produção capitalista, e este, em
sua essência, busca o acúmulo de capital e o lucro, que não é repartido de
forma igualitária entre todos os que participam da produção, mas, ao contrário,
se acumula nas mãos do capitalista, aumentando, via de conseqüência, as
desigualdades sociais. Dessa forma, pode-se inferir que o desenvolvimento
acaba produzindo exclusão social.
A última incongruência apontada por Guimarães (2003) diz respeito
diretamente ao meio ambiente, a uma situação denominada por alguns autores
como insustentabilidade ambiental, mencionada anteriormente, mas que
merece destaque, e que quer dizer que não como pensar na produção de
forma infinita, uma vez que os recursos são escassos; assim, a única
alternativa possível à sociedade atual é tentar coadunar a produção com o uso
racional dos recursos naturais. Justamente pensando nessa relação de
produção com recursos naturais, que Krause adverte ser necessário, tendo em
vista a sustentabilidade:
Reconhecer (e nem por isso desanimar diante do fato) que a viabilidade da
efetiva ação transformadora tem como obstáculo as contradições que colocam
frente a frente a nova racionalidade em formação e a predominante racionalidade
de acumulação a qualquer preço, arraigada nos sistemas de prodão e
legitimadora dos processos políticos (KRAUSE, 2001, p. 17).
O que Krause explicitou é exatamente o embate no qual a sociedade
capitalista se vê, que coloca em contraposição a idéia da acumulação irrestrita
de bens de consumo e a da emergência da racionalidade na utilização dos
recursos naturais. Nesse confronto, a sustentabilidade seria o princípio que
6
O Relatório Brundtland foi um documento elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, em 1987, assinalando a preocupação quanto ao uso dos recursos naturais, segundo
o conceito de sustentabilidade, o que significa dizer que os recursos naturais devem ser utilizados de
forma racional, visando a sua preservação para as gerações futuras.
27
buscaria a conciliação dos dois sistemas, ou seja, garantiria a continuidade do
processo produtivo, porém este se veria condicionado e sujeitado às próprias
imposições naturais que fazem parte do processo, o que poderia exigir alguns
cuidados específicos, mas que não obstaria o processo produtivo em si,
apenas mudaria a perspectiva da acumulação a qualquer preço, porque a
baliza seria exatamente a preservação do meio ambiente.
No mesmo sentido, Cavalcanti (2001), dissertando sobre o
desenvolvimento sustentável, afirma que não se trata apenas de como usar os
recursos naturais, mas sim de abranger uma política pública que defina e
modifique os critérios que regem o sistema produtivo, ou seja:
A idéia de sustentabilidade, por sua vez, implica uma limitação definida nas
possibilidades de crescimento. É sobre esse fundamento que é indispensável
agregar preocupações ecológicas (ou ecossociais) às políticas blicas do país.
É preciso mostrar que o progresso ecomico não pode continuar impune, se
violar as regras que dirigem a natureza para eficiência xima (quanto ao uso
de matéria e energia), para mínimos de estresse e perdas, para frugalidade e
prudência ecológica (CAVALCANTI, 2001, p. 24).
Cavalcanti (2001), na verdade, apenas condicionou a forma de
produção a um patamar, que é exatamente a proteção do meio ambiente. E
esta deve ser realizada através de políticas públicas com definições claras
acerca das regras a serem seguidas pelas atividades produtivas, bem como
das sanções respectivas, porque, uma vez que existam normas disciplinando
as atividades produtivas, estas devem necessariamente ser obedecidas,
preservando o meio ambiente e evitando o stress ambiental.
Como conseqüência das observações anteriores, principalmente da
necessidade de política pública sobre meio ambiente, o Brasil, tentando se
adequar ao desenvolvimento sustentável, elaborou normas jurídicas com o
intuito de fomentar uma política pública de amparo à proteção ambiental. Essa
atitude brasileira foi um mecanismo de o país se adequar às exigências de
proteção ao meio ambiente, que se tornaram latentes diante dos movimentos
ambientalistas que desde a década de 1970 se expandiram pelo mundo,
gerando uma série de Declarações com cunho ambientalista, todas elas
visando ao uso racional dos recursos naturais frente ao desenvolvimento da
atividade produtiva.
A primeira Declaração com cunho ambientalista foi a de Estocolmo,
resultado de uma Conferência realizada na Suécia no ano de 1972. Esta
28
Conferência teve ampla repercussão nos países subdesenvolvidos, visto que,
enquanto o movimento ambientalista tentava obstar a continuidade da poluição
decorrente da busca desenfreada pela industrialização, os países
subdesenvolvidos acreditavam que suas preocupações deveriam se centrar no
combate à “pobreza e suas seqüelas, ou seja, a fome, a falta de moradia, etc.,
e achava-se que essa Conferência era uma tática diversionista tendente a
relegar os programas de desenvolvimento a um plano secundário” (MIRANDA,
2003, p. 101). Durante esse período, o Brasil era regido pelo governo militar e
também não aderiu a um retardamento na produção industrial; para isso, se
valeu da Lei de Segurança Nacional, reprimindo os movimentos ambientalistas,
tachando seus líderes de subversivos (PETERS, 2005).
A principal decorrência da Conferência de Estocolmo foi servir de
precursora para os debates políticos acerca das preocupações com o meio
ambiente, bem como firmar a responsabilidade dos Estados pelas atividades
desenvolvidas em seu território, para que estas não afetassem os territórios
vizinhos.
Outra Conferência relevante ocorreu no Rio de Janeiro no ano de 1992,
sendo denominada de Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
e Desenvolvimento, que contou com a participação de 178 países, da qual
resultou a Agenda 21, formada por 27 princípios que buscam a cooperação
internacional para a proteção ambiental, através da criação por parte de cada
Estado de normas ambientais, assim como pela tomada de consciência dos
governos de que é necessária a criação de instituições para a proteção
ambiental, bem como de construção de parcerias com a sociedade civil, o que
acontece em vários países através das ONGs (Organizações Não-
Governamentais). Apesar de a Agenda 21 não ter a força jurídica de um tratado
ou convenção, regidos pelo Direito Internacional, ela foi um compromisso
político assumido pelos países no sentido da adoção de mecanismos de
fomento ao desenvolvimento sustentável, ou seja, do uso racional e moderado
dos recursos naturais junto às atividades industriais.
Após essas conferências aconteceram outras, sendo importante
destacar a realizada no Japão no ano de 1997, na cidade de Kyoto, cujo
desdobramento foi o Protocolo de Kyoto, que estabelecia a redução das
emissões de gases tóxicos que provocam o efeito estufa. Em cada uma das
29
conferências sobre o meio ambiente os países que delas participam reafirmam
o compromisso político de preservarem o meio ambiente, o que necessita da
implementação administrativa por parte de cada Estado, e que acontece no
Brasil desde o ano de 1981, ocasião em que foi promulgado o Plano Nacional
de Meio Ambiente (PNMA).
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, novamente veio
à tona a questão ambiental, com uma proteção mais expressiva, uma vez que
o meio ambiente foi previsto nos capítulos referentes aos direitos fundamentais
e da ordem econômica, sendo certo que, por ter sido consagrado como direito
fundamental, sua amplitude acaba ultrapassando a de outros direitos, o que
será tratado com maior vagar no próximo capítulo. Uma das formas de a
proteção ambiental se efetivar é através do licenciamento ambiental,
necessário para a implementação de atividades potencial ou efetivamente
poluidoras, que exigem atualmente a chancela do Estado através das licenças
ambientais, o que também será analisado de forma adequada no capítulo 3.
2.3. A atuação dos movimentos sociais na luta pela reforma agrária
Desde o início do século XX
7
, a reforma agrária passou a ser tema
recorrente no debate político e também na academia, isso porque ambos os
setores se preocuparam com as pressões sociais que eclodiam através dos
conflitos no campo. Esse século, inclusive, é marcado por uma série de
transformações na forma de organização da produção, que refletiram em
transformações nas relações de trabalho relacionadas à agricultura, sendo de
importância ímpar a modernização da agricultura ocorrida nas décadas de
1960 e 1970 e, com ela, o modelo de desenvolvimento proposto para os países
subdesenvolvidos. Também desempenharam papel relevante os movimentos
populares que lutaram pelo acesso à terra, como a Encruzilhado Natalino, no
Rio Grande do Sul, e de Trombas e Formoso, em Goiás, ao longo dos anos 50,
do século passado. Após esses acontecimentos, merece destaque a ação dos
movimentos sociais, que agiram de forma mais expressiva na última metade do
7
Apesar de os conflitos fundiários terem assumido maior amplitude a partir da segunda metade do
século XX, eles são recorrentes na história do Brasil, como se pode observar nas origens de
movimentos como Balaiada, Canudos e Contestado.
30
século XX, dentre eles se destacando a ação do MST, que será abordada logo
adiante.
no século XX, os conflitos no campo passaram a ser mais
recorrentes, o que pode ser explicado pelas modificações introduzidas nesse
século nas relações de trabalho e pela modernização da agricultura que
implicou um processo de ampliação da fronteira agrícola e concentração
fundiária. Também deve ser ressaltado que, com a libertação dos escravos,
ocorrida em 1888, o número de excluídos também aumentou, uma vez que
estes se viram sem terra e sem trabalho; também não lhes foi destinada
nenhuma política pública de reinserção na sociedade.
Uma consideração interessante tecida por Liberato refere-se ao fato de
que os conflitos agrários teriam como pano de fundo primordial a questão da
apropriação das terras por número pequeno de proprietários, o que “acabou
por transformar os confrontos em resistência de classe, isto é, os conflitos
agrários passaram a ser baseados muito mais na contraposição capital versus
trabalho do que no acesso à terra propriamente dito” (LIBERATO, 2004, p.
113). Com isso, a autora desejou ponderar que não é em todos os conflitos do
campo que a tônica pertence realmente à questão da terra em si, mas abarca,
na maioria das vezes, uma dimensão que ultrapassa a posse da terra, tentando
alcançar a dimensão da exclusão social, que deriva da contradição existente
entre o capital e o trabalho, uma vez que a ótica das relações do campo é a
mesma do capitalismo, que almeja o lucro, em detrimento das noções de
igualdade de oportunidade, emprego ou divisão de lucros (que podem ser
consideradas, no mundo atual, uma utopia).
no século XX, as lutas que se passam no meio rural envolvem, em
grande parte, a ação dos movimentos sociais, que buscam, segundo
Grzybowski (2004), resistir ao processo econômico e político que veio junto
com a modernização da agricultura, o que o autor chamou de sucesso do
modelo de desenvolvimento aplicado na agricultura. Explicando esse
posicionamento, afirma que, “na verdade, a desigualdade e exclusão no campo
existiam desde antes do processo de modernização, mas através deste
processo reproduziram-se em escala ampliada” (GRZYBOWSKI, 2004, p. 290).
Nesse contexto, a função dos movimentos sociais seria a de lutar pela inserção
do trabalhador do campo no processo de criação e apropriação da riqueza
31
produzida no trabalho na terra, principalmente após o aparato tecnológico que
foi inserido no meio rural.
Os movimentos sociais, advertiram Melucci (2001) e Gohn (1997),
são um fenômeno de difícil conceituação, pois tanto o meio acadêmico quanto
o senso comum possuem uma representação a seu respeito, apesar de as
definições apresentarem certa diversidade de significados. Tendo como
referência os dois autores, após longo estudo, optou-se pelo conceito descrito
por Gohn (1997) embora não seja sucinto e, por isso, auto-explicativo –, que
será transcrito a seguir:
Movimentos sociais são ações sociopolíticas construídas por atores sociais
coletivos pertencentes a diferentes classes e camadas sociais, articuladas em
certos cenários da conjuntura sócio-econômica e política de um país, criando um
campo político de força social na sociedade civil. As ações se estruturam a partir
de repertórios criados sobre temas e problemas em conflito, litígios e disputas
vivenciados pelo grupo na sociedade. As ações desenvolvem um processo social
e político cultural que cria uma identidade coletiva para o movimento, a partir dos
interesses em comum. Essa identidade é amalgamada pela força do princípio da
solidariedade e construída a partir da base referencial de valores culturais e
políticos compartilhados pelo grupo, em espaços coletivos não-
institucionalizados. Os movimentos geram uma série de inovações nas esferas
blica (estatal e não-estatal) e privada; participam direta ou indiretamente na
luta política de um país, e contribuem para o desenvolvimento e a transformação
da sociedade civil e política. Estas contribuições são observadas quando se
realizam análises de períodos de média ou longa duração histórica, nos quais se
observam os ciclos de protestos delineados. Os movimentos participam portanto
da mudança social histórica de um país e o caráter das transformações geradas
poderá ser tanto progressista como conservador ou reaciorio, dependendo das
forças sociopolíticas a que estão articulados, em suas densas redes; e dos
projetos políticos que constroem com suas ações. Eles têm como base de
suporte entidades e organizações da sociedade civil e política, com agendas de
atuão constrdas ao redor de demandas sócio-econômicas ou político-
culturais que abrangem a problemática conflituosa da sociedade onde atuam
(GOHN, 1997, p. 251-252).
A partir desse conceito, é possível perceber que os movimentos sociais
possuem uma série de características e formas de atuação política que
modificam a sociedade da qual fazem parte. Segundo Melucci (2001),
configurariam princípios de um movimento social: ser a expressão de um
conflito; ser a manifestação de uma ação coletiva, que comporta solidariedade
e busca romper os limites da compatibilidade do sistema vigente; e possuir um
pluralidade de significados analíticos. Ambos os autores, embora de forma
diversificada, mencionam atributos coincidentes para a configuração do
movimento social, que se inicia com a descoberta de um conflito em que os
atores são antagônicos e, por isso, almejam o rompimento do sistema, ou seja,
32
mudanças efetivas do estado anterior da situação. Para se configurarem
enquanto movimento, é necessário que exista entre os membros um
componente simbólico que mantenha a união do grupo, porque não
homogeneidade entre os integrantes, ao contrário, grande diversidade,
possibilitando assim a solidariedade entre os componentes, que nada mais é
que os laços de união que identificam as pessoas como pertencentes àquele
grupo e perpassam, dessa maneira, os objetivos do grupo. O espaço em que
atuam é a sociedade, por isso podem se direcionar mais para a área
econômica, política ou mesmo social; assim, o resultado de suas ações pode
repercutir em todas as dimensões da vida em sociedade, dependendo do
contorno que o movimento irá desenhar para suas atuações, uma vez que os
movimentos sociais fazem parte da história político-social na qual estão
inseridos e buscam modificar determinado aspecto da vida que consideram
desajustado à sua demanda, seja ela qual for.
No Brasil, os movimentos sociais, no âmbito agrário, começaram a
atuar durante a década de 1950, ocasião em que trabalhadores rurais e
camponeses reivindicam a distribuição da terra e os direitos trabalhistas para
essa classe social (SANTOS, 1995). Nesse sentido, destaca-se a formação da
ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), em 1954,
e das Ligas Camponesas, em 1955, em que Francisco Julião, advogado e
deputado estadual, assumiu a defesa dos trabalhadores, os quais, através de
marchas, comícios, congressos, denunciavam o conflito social instaurado na
Zona da Mata nordestina. Esse movimento lutava pela melhoria das condições
de trabalho dos lavradores da Zona da Mata, tendo, posteriormente, aderido à
causa da Reforma Agrária (MEDEIROS, 2004).
na cada de 1960, pode-se destacar a atuação oficial do
sindicalismo, legalizado com a promulgação do Estatuto de Trabalhador Rural,
em 1963, ocasião em que foi fundada a CONTAG, com aproximadamente 440
sindicatos reunidos em 14 federações.
O sindicalismo oficial, novo artefato jurídico, entretanto, pode ser
analisado como um dos fatores responsáveis pela transformação de
trabalhadores rurais em temporários (bóias-frias), porque sobre estes últimos
não poucos encargos, referentes aos direitos trabalhistas recém-adquiridos
(MINC, 1985). Não se pode olvidar de considerar que talvez o fator
33
preponderante para essa transformação seja a modernização da agricultura,
visto que o incremento de maquinaria na produção rural modificou a
necessidade de trabalho humano no campo, bastando, às vezes, ao
proprietário a contratação temporária de trabalhadores rurais para períodos
específicos, como o plantio e a colheita, porque nas demais épocas do ano se
mostra desnecessária a permanência de grande número de trabalhadores à
disposição do dono da terra. Com relação ao sindicalismo, Brumer e Santos
(2000) fazem consideração interessante, que merece ser transcrita:
Como resultado, a formão do sindicalismo rural apresentou, desde sua origem,
duas faces contraditórias: por um lado representa os interesses dos
trabalhadores, que contestam a grande propriedade improdutiva e as relações de
dominação patrimonialista no campo: por outro, expressa uma estratégia de
cooptação política por parte do Estado, visível ao longo dos anos 60, e,
principalmente, logo após a aprovação do Estatuto da Terra (BRUMER;
SANTOS, 2000, p. 49).
Com tal afirmação, os autores se referem ao fato de que, logo após a
legalização dos sindicatos de trabalhadores rurais, estes se viram controlados
pelo Estado, o que acontecia com os outros sindicatos, além do fato de que
grande parte dos sindicatos, ainda não legalizados, acabaram sendo fechados.
Essa década também é marcada pela promulgação do Estatuto da
Terra e pelo Golpe de Estado, ambos em 1964. O objetivo do Estatuto da Terra
era, ao mesmo tempo, resolver o problema da produtividade do país e da
concentração de terra, atendendo ainda a anseios sociais. Esse pensamento
compactua com a época em que tal diploma veio a lume, ou seja, no período
do projeto de desenvolvimento, em que o Brasil, logo após o incentivo à
industrialização, pensava na reforma agrária como ator relacionado tanto a
fatores econômicos quanto humanos, porque em fins da década de 1950 e
início da de 1960, logo após a modernização da agricultura, ocorreu grande
desemprego e êxodo rural, provocando problemas sociais no campo
(BERGAMASCO; NORDER, 1996).
Entretanto, deve-se ressaltar que, embora juridicamente venham
explícitos os termos necessários à reforma agrária no Estatuto da Terra, no
âmbito político o que se fez foi um movimento contra a reforma agrária, uma
vez que o enfoque do governo eram os projetos de colonização e o esforço
modernizante, destacando-se a tentativa de incorporação econômica da
Amazônia, via incentivos fiscais e criação de agências federais, como a
34
SUDECO (Superintendência da Região da Fronteira Sudoeste), o Sistema
Nacional de Crédito Rural, o Banco da Amazônia e a SUDAM
(Superintendência do Banco da Amazônia), e estabeleceu-se a Amazônia
Legal (SANTOS, 1995).
na década de 1970, quando a modernização da agricultura se
encontrava em processo final de implementação, os conflitos sociais no campo
se tornaram mais aparentes porque, nas regiões de média e grande produção,
houve uma proletarização dos trabalhadores rurais em bóias-frias, que agora
lutavam por maior inserção no mercado. Por outro lado, os resquícios dos
projetos de colonização, que apregoavam a dimensão do “progresso” e do
“moderno”, apareciam como um paradoxo, uma vez que os colonos viam-se
enclausurados pelas relações de poder presentes na colonização, fossem elas
oriundas da autoridade ou do clientelismo (SANTOS, 1995). Assim, os conflitos
agrários se multiplicaram, principalmente após 1974, quando começou a
abertura democrática do governo. Nesse contexto é criada a CPT (Comissão
Pastoral da Terra), em 1975, oriunda da organização de limitantes católicos
formados pelo trabalho das CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) junto a
trabalhadores rurais camponeses.
Em 1985, dois eventos importantes marcaram a história da reforma
agrária no país: a formulação do Programa Nacional de Reforma Agrária
(PNRA) e a criação oficial do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra
(MST). O primeiro, elaborado no governo Sarney, foi uma tentativa de tornar
efetiva a reforma agrária, mas, tantas foram as resistências apresentadas pela
bancada ruralista que, três meses após sua aparição, já havia sido modificada
de forma tão substancial que o PNRA deixa de ser uma proposta de estímulo à
mudança social e transforma-se num obstáculo jurídico à reforma agrária.
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra), criado
também em 1985, trouxe à baila as contradições da modernização da
agricultura, demandando acesso a terra, usando para tanto o lema “ocupar,
resistir e produzir”, única forma vislumbrada pelo movimento social para lutar
pela reforma agrária e provocar reações no governo, além de ganhar
visibilidade na imprensa através de caminhadas e manifestos pela reforma
agrária.
35
Durante os governos de Sarney, Fernando Collor de Melo e Itamar
Franco, a política de reforma agrária não ocorreu de forma animadora. Poucas
famílias foram assentadas, a maioria na Amazônia, o que demonstra a
continuidade do pensamento dos militares. Acrescente-se a isso o fato de que
não foram feitas desapropriações decorrentes da função social da propriedade
(BERGAMASCO; NORDER, 1996), defendida tanto pelo Estatuto da Terra
quanto pela Constituição da República.
2.3.1. A ULTAB, a CONTAG e a FETAEMG
A luta pelo acesso à terra foi acompanhada pela atuação dos
sindicatos de trabalhadores rurais, não só no Estado de Minas Gerais como em
todo o país. Em Minas Gerais, de forma específica, Sgrecia e Gadelha (1987)
afirmam que até a década de 1970 os conflitos pela posse e uso da terra não
foram acompanhados pela ação do MSTR (Movimento Sindical dos
Trabalhadores Rurais). Esse posicionamento reflete a característica do
sindicalismo rural do país, que, embora possa ser percebido desde o início do
século XX, apenas após a década de 1950 se mostrou mais atuante,
principalmente após a promulgação do Estatuto do Trabalhador Rural, Lei
4.214, de 1963. Deve-se advertir, entretanto, que em 1963 já existiam, segundo
a CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais), 475 sindicatos
fundados e 220 sindicatos reconhecidos.
Acontecia que, embora os sindicatos de trabalhadores rurais
existissem, na década de 1950, o governo federal não reconhecia todos eles,
motivo pelo qual foi criada a ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores
Agrícolas do Brasil), resultado da II Conferência Nacional de Camponeses, no
ano de 1954.
Posteriormente a esse fato, veio a criação da CONTAG, em dezembro
de 1963, que foi a primeira organização sindical, em nível nacional, dos
trabalhadores rurais do Brasil, reconhecida pelo governo federal através do
Decreto presidencial de n.° 53.517. Quando da criação da CONTAG, esta
contava com 14 federações e 475 sindicatos, exercendo o papel de agente de
conscientização nos trabalhadores rurais através das federações, presentes
nos Estados do país.
36
Sgrecia e Gadelha (1987, p. 26) também afirmam que, na concepção
do movimento sindical, a reforma agrária sempre foi percebida como sendo a
solução definitiva para os conflitos de terra, de forma que a CONTAG instituiu a
reforma agrária como “bandeira unificadora das lutas travadas no campo”.
Em Minas Gerais, seguindo a trajetória sindical rural do país, em 1963,
foram criadas três federações: Federação dos Trabalhadores Autônomos da
Lavoura, Federação dos Assalariados Rurais e Federação dos Assalariados na
Extrativa Rural. Apenas no ano de 1968 foi criada a FETAEMG (Federação dos
Trabalhadores Rurais de Minas Gerais). É importante ressaltar que o governo
federal, embora soubesse da existência de inúmeros sindicatos de
trabalhadores rurais, não reconhecia todos os existentes, mesmo depois da
aprovação da Lei dos sindicatos rurais.
Após o golpe militar de 64, muitos sindicatos foram fechados e o
governo se negou a conferir a eles capacidade para representação dos
trabalhadores rurais, cabendo exclusivamente à FETAEMG o papel de
“interlocutora legalmente reconhecida como representante dos trabalhadores
rurais” (FERREIRA NETO; DOULA, 2003, p. 7). Inclusive, conforme consta no
histórico da FETAEMG:
Com o golpe de 64, as três Federações de Minas e outras do país foram
fechadas. Dos cerca de 50 STRs mineiros existentes até essa época, apenas
quatro sobreviveram: Centralina, Poté, Santana do Deserto e Araçuaí. As
seelas do golpe foram tão negativas que sindicatos que voltaram a se
organizar recentemente e outros que nunca mais conseguiram se organizar. A
violência se abateu sobre líderes sindicais rurais, diretores das Federações e
sindicatos foram perseguidos, sendo muitos presos, torturados, exilados e até
mesmo assassinados (www.fetaemg.org.br).
Paralelamente ao cerceamento político feito pelo Estado nos sindicatos
durante a década de 1970, houve incremento econômico nesse segmento, uma
vez que o governo passou a transmitir à Federação o repasse das verbas
públicas destinadas aos trabalhadores rurais, transmitindo também a ela a
competência para atuar na saúde, assistência social e previdência. Essa
acumulação de recursos possibilitou, posteriormente, a atuação da FETAEMG
na luta pelo acesso à terra em Minas Gerais. Nas palavras de Ferreira Neto e
Doula (2003, p. 9):
A promulgação em março de 1971 da Lei Complementar n.º 11, que instituía o
Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL), como executor do
Programa, garantia ao MSTR grande presença junto a sua base, à medida que
respondia a questões emergenciais de saúde, assistência social e previdência,
37
bem como proporcionava grande estabilidade financeira ao movimento. Dessa
forma, o avanço no processo de sindicalizão, juntamente com o grande
volume de recursos financeiros, provenientes principalmente do imposto sindical
recolhido diretamente pelo governo federal, iria possibilitar ao sindicalismo
mineiro se apresentar, após a abertura política nos anos 80, como o principal
mediador da luta pela terra em Minas Gerais.
Ainda sobre a FETAEMG, afirma Pompermayer (1987) que:
A FETAEMG é levada a desempenhar, face à sua composição institucional
como mediadora entre as propostas do governo e a mobilização dos
trabalhadores, procurando manter, dentro de limites aceitáveis pelo primeiro, as
pressões originárias dos segundos, e acabando por fortalecer, por isso mesmo,
as funções mais propriamente burocráticas e desmobilizadoras da Federação.
Decorrência também do golpe foi a atuação dos STRs como agente
assistencialista e não com um engajamento mais prático em relação à reforma
agrária do país. Correlatamente, nas décadas de 1960 e 1970, o país vivencia
a modernização da agricultura e a promulgação do Estatuto do Trabalhador
Rural, já mencionado, que, aliado à nova tecnologia incrementada à agricultura,
provoca uma sazonalidade no setor rural, refletindo nos trabalhadores rurais,
que se vêem afastados, forçadamente, do sindicalismo da época.
Em 1979 acontece o III Congresso da CONTAG, em que esta se
propõe a acompanhar a luta pela reforma agrária e pelos melhores salários no
meio rural; contudo, novamente a CONTAG não usa de instrumentos efetivos
destinados a alcançar seu objetivo.
A FETAEMG, ao voltar deste congresso, também modificou sua
postura de atuação no Estado de Minas Gerais, principalmente por meio da
descentralização política, com a criação de delegacias e pólos regionais.
Ferreira Neto e Doula (2003, p. 23), ao analisarem a luta pela terra em
Minas Gerais, asseveram que:
Até meados da década de 80, a luta pela terra em Minas Gerais, apesar de estar
oficialmente presente na agenda de lutas da Federão dos Trabalhadores na
Agricultura, era, na verdade, produto de uma articulação entre as ações e as
demandas da base sindical, um enorme contingente de trabalhadores rurais sem
terra e, ironicamente, sem trabalho, e a intervenção pessoal de determinadas
lideraas que, estrategicamente, ocupavam certos espaços na estrutura do
MSTR e de outras vinculadas à Comissão Pastoral da Terra, e a partir de ações
pontuais de alguns Sindicatos de Trabalhadores Rurais, organizavam e
conduziam a luta pela terra no estado.
Consideração importante a ser feita se refere ao fato de que, logo após
o Golpe Militar, as manifestações populares, bem como o movimento dos
trabalhadores rurais, foram cerceados, sendo algumas organizações de
38
trabalhadores rurais perseguidas (MEDEIROS, 2004), situação que também
aconteceu em outros sindicatos de classes diferentes. A finalidade dessa
atitude perpetrada pelos militares, no caso específico dos trabalhadores rurais,
era a de silenciar as reivindicações pela reforma agrária.
Ainda hoje os sindicatos tomam frente das reivindicações pela terra,
existindo no Estado cerca de 20 movimentos, entre eles alguns sindicatos de
trabalhadores rurais, estando a CONTAG, por assim dizer, afastada da frente
de batalha.
2.3.2. O MST
Posterior ao regime militar, na Nova República, o contexto da
reforma agrária e da luta pela terra modificou-se, principalmente em função de
mediadores, entre eles os movimentos sociais, que, a partir de fins da década
de 1970 e início da de 1980, começaram a ganhar destaque no cenário político
do país, mobilizando os excluídos da terra a lutarem por ela. Assim, no sul do
país surgiu o MST, inicialmente no Estado do Rio Grande do Sul, que
posteriormente teve seu campo de atuação expandido para todo o território
brasileiro.
Um dos fatores que contribuíram para a criação do movimento foi o
aumento da violência no meio rural, mormente em fins da década de 1970, o
que se relaciona com a modernização da agricultura e com o êxodo rural, sua
conseqüência. Isso ocorreu porque o pacote tecnológico trazido pela
modernização da agricultura, associado à legislação trabalhista atinente aos
trabalhadores rurais, fez com quem grande parte desses trabalhadores
deixasse de ser mão-de-obra regular e passasse ao estado de bóia-fria (MINC,
1985), contingente humano que desembocou nos centros urbanos,
transportando para a cidade um exército de mão-de-obra mal-remunerado do
meio rural, trazendo consigo a exclusão social do campo, que apenas se
consolidou nas cidades, provocando inquietações e violência.
Outro fator contributivo para o nascimento do movimento foi a tradição
organizativa dos estados do sul, bem como a influência da Igreja nesta região,
especialmente a CPT (Comissão Pastoral da Terra).
39
Em seus primeiros anos, o MST contou com a atuação de mediadores
da CPT e de outras instituições no seu corpo constitutivo; assim, o movimento
apresentava como característica ações de mediação, evitando confrontos
diretos, tendo por lema de ação “terra para quem nela trabalha”, principalmente
devido à presença da Igreja (NAVARRO, 2001, p. 203).
Posteriormente, até aproximadamente o ano de 1993, a dinâmica do
movimento foi alterada, passando sua ação a ser de confronto direto, tendo
como lema “ocupar, resistir, produzir”. O MST reivindicava ações efetivas do
governo para a promoção da reforma agrária (BERGAMASCO; NORDER,
1995, p. 180), ao mesmo tempo em que questionava o Estado em si,
apregoando o enfrentamento dos proprietários rurais, contestando a legislação
agrária e os programas de reforma agrária. Mais adiante, estruturado
plenamente, o MST trouxe para sua luta a pretensão de substituição do
sistema econômico para o socialismo, o que pode ser percebido pelos objetivos
do movimento, a seguir transcritos:
1. Construir uma sociedade sem exploradores e onde o trabalho tem supremacia
sobre o capital.
2. A terra é um bem de todos. E deve estar a serviço de toda a sociedade.
3. Garantir trabalho a todos, com justa distribuição da terra, da renda e das
riquezas.
4. Buscar permanentemente a justiça social e igualdade de direitos ecomicos,
políticos, sociais e culturais.
5. Difundir os valores humanistas e socialistas nas relações sociais.
6. Combater todas as formas de discriminação social e buscar a participão
igualitária da mulher.
8
A Igreja, que antes ocupava os quadros diretivos, com a mudança de
concepção do movimento, passou a ocupar postos secundários;
posteriormente, permaneceram apenas os setores mais radicais da Igreja.
De 1995 até os dias atuais, o MST vem pautando sua conduta ainda na
política de confronto direto, contando com a comoção social como arma para
se fortalecer e abarcar o público, chamando-o a lutar pela reforma agrária.
Na sua organização interna, o MST é marcado, segundo Zander
Navarro (2001), por uma doutrinação que apregoa nos componentes a idéia de
hierarquia e subordinação. Todo o controle é exercido pela diretoria, e os
valores socialistas são ensinados nas escolas de base, que têm, inclusive, uma
estrutura curricular diferenciada. As escolas do movimento são também
8
Objetivos extraídos da página oficial do MST. Disponível em: <http://www.mst.org.br/historico/objetivos.
html>. Acesso em: 18 out. 2005.
40
responsáveis pela construção política do jovem militante, que mais adiante
exercerá uma função de liderança no próprio grupo.
2.3.3. Os movimentos sociais após a década de 1990
Os movimentos sociais na década de 1990, a conjuntura econômica e
a conjuntura política do país reforçaram a luta pela reforma agrária, que, nesta
década, não representava mais apenas a luta dos camponeses, mas abarcava
uma grande gama de excluídos urbanos, com o objetivo de solucionar a
pobreza e miséria, que a cada dia se tornavam mais evidentes. Conforme
ressalta Grzybowski (2004, p. 292), o principal mérito dos movimentos sociais é
o papel positivo das resistências desempenhadas por eles, que ocasionam
“mudança de um padrão de ação dos trabalhadores rurais e das comunidades
em que vivem” e, assim, contribuem para o “processo de constituição de uma
sociedade civil de cara nova no Brasil”. A explicação para essas mudanças
associa-se à nova feição atribuída aos trabalhadores, que passaram da
posição de meros excluídos para a de agentes políticos que lutam por
melhores condições de vida e possibilidade de acesso à terra, de forma ampla.
Nesse diapasão, a luta pela reforma agrária atualmente abrange não
o acesso à terra, mas inclui os mecanismos de produção, preços mínimos,
comercialização, assistência técnica e redistribuição dos lucros advindos da
produção relacionada à terra; nas palavras de Silva (1990, p. 93), seria uma
“mudança na estrutura política do campo, sob a qual se assenta o poder dos
grandes proprietários da terra”. O autor afirma que agora se discute não mais o
processo de desenvolvimento ou a questão da produtividade, como proposto
pelo Estatuto da Terra, mas as conseqüências do desenvolvimento, advertindo
também que a questão da reforma agrária perpassa pela democracia,
necessitando, portanto, de implementos para lograr êxito. Uma das maneiras
de possibilitar a democracia no âmbito agrário inclui necessariamente a
proteção ambiental, pois o homem do campo necessita dos recursos naturais
para que possa utilizá-los e, então, dar ensejo à produção agrária.
41
CAPÍTULO 3
A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA
REFERENTE À REFORMA AGRÁRIA
A legislação ambiental sobre assentamentos rurais reflete o histórico
político e ideológico sobre a reforma agrária do país, bem como o conteúdo
que o governo atribuiu a ela. Dessa forma, no Estatuto da Terra havia
determinações específicas no sentido de propiciar a proteção ao meio
ambiente; tanto é assim que um dos critérios necessários para que a
propriedade cumprisse sua função social era que fosse assegurada a
conservação dos recursos naturais, consignado no art. 2.°, §1.°, c, da norma
estudada. Essa determinação foi a precursora da proteção ambiental na
reforma agrária e corresponde, hoje, ao conceito de desenvolvimento
sustentável.
Já na década de 1980 veio a lume importante instrumento normativo na
proteção ao meio ambiente, a Lei n.° 6.938/81, que determinou a Política
Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Após esse primeiro momento, é por meio
da promulgação da Constituição da República de 1988 que as normas
ambientais ganham relevância ímpar e acabam modificando decisivamente a
concepção de reforma agrária do país, engajando a função ambiental dentro da
função social da propriedade e, assim, conseqüentemente, imputando o
licenciamento ambiental aos projetos de assentamento rural do país.
42
Cabe relatar que a elaboração das legislações acerca do meio
ambiente no Brasil tem como pano de fundo os movimentos ambientalistas
surgidos na década de 1970 em todo o mundo. Entretanto, apenas nos anos 80
é que afloraram as primeiras normatizações a esse respeito; deve-se ressaltar
que somente na década de 1990 é que medidas efetivas começaram a ser
tomadas no sentido de fazer cumprir a legislação existente e, assim, proteger o
meio ambiente – uma delas foi o Decreto 99.274/90, primeira legislação a tratar
especificamente do licenciamento ambiental, após sua menção na Política
Nacional de Meio Ambiente, de 1981. A respeito do decreto mencionado, é
interessante destacar o seguinte artigo referente ao licenciamento ambiental:
Art. 17. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimento
de atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou
potencialmente poluidoras, bem assim os empreendimentos capazes, sob
qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio
licenciamento do órgão estadual competente integrante do SISNAMA, sem
prejuízo de outras liceas legalmente exigíveis.
Da leitura do texto supracitado pode ser percebido que a atual
legislação sobre licenciamento ambiental teve sua origem em mencionado
instrumento, estando consignadas nesse mesmo decreto as modalidades de
licenças também constantes na Resolução 237 do CONAMA, vigente nos dias
atuais, que estabelece a necessidade da LP (Licença Prévia), LI (Licença de
Instalação) e LO (Licença de Operação) para que os empreendimentos que
são potenciais ou efetivamente poluidores possam exercer suas atividades.
Também merece ser lembrado, de antemão, que, embora existam
normas sobre proteção ambiental na Constituição da República de 1988, nela
não foram determinados os parâmetros ambientais que possibilitassem a
efetiva proteção ao meio ambiente; assim, como dito anteriormente, as normas
válidas sobre licenciamento ambiental são as inscritas na Resolução 237 do
CONAMA, do ano de 1997. Transportando essa proteção para os projetos de
assentamentos rurais de reforma agrária, no ano de 2001 foi promulgada a
Resolução 289, também do CONAMA, seguida da Resolução 318, ambas
versando especificamente sobre o licenciamento ambiental em projetos de
assentamentos rurais.
Para entender a questão ambiental na reforma agrária, e
principalmente seu funcionamento, é necessária uma análise da estrutura
43
administrativa dos órgãos públicos responsáveis pela confecção das normas
ambientais e sua fiscalização, para, posteriormente, a análise compreensiva
dos instrumentos legais referentes ao meio ambiente e à reforma agrária de
Minas Gerais, foco desta pesquisa. Assim, o presente capítulo trata da
estrutura administrativa do país e do Estado de Minas Gerais quanto ao meio
ambiente e da legislação ambiental pertinente à reforma agrária, também
analisando a dimensão federal e a estadual.
3.1. Órgãos ambientais nacionais e mineiros
Tendo em vista a Lei 6.938/81, que instituiu no Brasil a Política
Ambiental Brasileira, restou estabelecido que a proteção ao meio ambiente se
exterioriza numa hierarquia de instituições públicas criadas justamente para
essa finalidade. Assim, a fim de entender as implicações das normas
ambientais do Brasil, é necessário o conhecimento da hierarquia institucional
ambiental para a compreensão da competência e amplitude de cada órgão
público relacionado ao meio ambiente, o que se fará a seguir.
3.1.1. SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente
O primeiro órgão que merece menção é o SISNAMA (Sistema Nacional
do Meio Ambiente). Esta instituição foi criada pela Lei 6.938/81, que, no art. 6.°,
dispõe dos demais órgãos e instituições públicas que fazem parte do
SISNAMA.
Esquematicamente, o SISNAMA pode ser representado da seguinte
maneira:
1) Órgão superior (CSMA – Conselho Superior do Meio Ambiente), cuja função
é assessorar o presidente da República.
2) Órgão consultivo e deliberativo: o CONAMA (Conselho Nacional do Meio
Ambiente).
3) Órgão Executor: IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos
Naturais Renováveis), cuja função vem expressa no art. 6.°, §IV, da
mencionada lei, como sendo a de “executar e fazer executar, como órgão
44
federal, a política e diretrizes governamentais fixadas para o meio
ambiente”.
4) Órgãos seccionais: órgãos estaduais responsáveis pelo cumprimento da
legislação federal.
5) Órgãos locais: órgãos em nível municipal também responsáveis pelo
cumprimento e pela fiscalização da política ambiental nacional, porém em
nível municipal.
Tendo em vista a hierarquia supracitada, é importante ressaltar a
possibilidade de os órgãos seccionais e locais criarem normas supletivas e
complementares relacionadas com o meio ambiente, desde que sejam
compatíveis com as determinações do CONAMA. Essa possibilidade vem
expressa no art. 6.°, §1.° a 3.°, da Lei 6.938/81.
A competência concorrente, anteriormente mencionada, tem grande
importância no desenvolvimento da política ambiental do país, visto que, para a
implementação efetiva das políticas ambientais nas entidades da Nação, ou
seja, nos Estados, Distrito Federal e Município, é necessário um ajustamento
das necessidades peculiares de cada entidade federativa.
3.1.2. CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente
O CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) é o órgão
consultivo e deliberativo do SISNAMA, tendo sua competência estabelecida
pelo art. 8.° da Lei 6.938/81.
No tocante à competência do CONAMA, cumpre destacar que é esta
instituição a responsável pela inserção das normas destinadas à manutenção
do desenvolvimento sustentável e à preservação ambiental do país, seja
através de estabelecimento de critérios adequados ao licenciamento ambiental
de todo o território brasileiro (poder regulamentar), visando controlar as
atividades consideradas poluidoras ou potencialmente poluidoras, seja por
meio dos estudos ambientais necessários à recuperação do meio ambiente.
O CONAMA, portanto, é uma entidade dotada de poder regulamentar,
em razão de expressa determinação legal. Ele pode e deve estabelecer os
padrões federais e as normas tidas como normas gerais a serem observadas
pelos Estados e Municípios. Evidentemente que Estados e Municípios, no uso
45
de suas competências legislativas e administrativas, poderão estabelecer
outros critérios que complementem as exigências do CONAMA, mas tais
entidades devem atentar para o fato de que os padrões regionais e locais não
poderão ser mais permissivos que o padrão fixado em âmbito federal.
Conforme adverte Antunes (2005), os patamares e padrões máximos de
poluição tolerada são os federais.
Deve-se atentar para o fato de que, embora seja da competência do
CONAMA a feitura da política ambiental, inclusive para os assentamentos
rurais, ficou resguardada aos Estados e Municípios a competência para a
elaboração de normas supletivas e complementares e padrões relacionados
com o ambiente, observadas as diretrizes do CONAMA. Essa possibilidade de
a União e os Estados poderem disciplinar a mesma matéria advém da
competência concorrente
9
, mas deve-se realçar que as políticas estabelecidas
pelo Estado não podem colidir com as disposições da União. Acrescente-se
ainda o fato de que a própria legislação justifica essa concorrência de
competência, tendo em vista que os critérios de exigibilidade e de
implementação do licenciamento devem levar em consideração as
peculiaridades do empreendimento ou da atividade, sendo iss
o mais facilmente alcançado quando legislação específica para uma
área restrita, ou seja, quando é feita por Estados ou Municípios.
O CONAMA também desempenha a função de órgão responsável pelo
julgamento dos recursos administrativos referentes às penalidades aplicadas
pelo IBAMA, tendo como presidente o Secretário do Meio Ambiente do país.
As emanações de vontade do CONAMA são feitas através de
resoluções
10
“quando se tratar de deliberação vinculada a diretrizes e normas
técnicas, critérios e padrões relativos à proteção ambiental e ao uso
sustentável dos recursos ambientais”; moções; “quando se tratar de
manifestação, de qualquer natureza, relacionada com a temática ambiental”;
recomendações, “quando se tratar de manifestação acerca da implementação
de políticas, programas públicos e normas com repercussão na área ambiental,
9
Competência, segundo Silva (2000, p. 479), é a “faculdade juridicamente atribuída a uma entidade ou a
um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões”. a competência concorrente, segundo o
mesmo autor, compreenderia duas dimensões “(d.1) possibilidade de disposição sobre o mesmo
assunto ou matéria por mais de uma entidade federativa; (d.2) primazia da União no que tange à fixação
de normas gerais” (p. 481).
10
Os trechos realçados nesta página estão disponíveis em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/estr.
cfm>. Acesso em: 8 set. 2005.
46
inclusive sobre os termos de parceria de que trata a Lei n.
o
9.790, de 23 de
março de 1999”; e proposições e decisões, referentes à análise de multas e
outras penalidades administrativas aplicadas pelo IBAMA.
3.1.3. IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Na-
turais Renováveis
O IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis) é o órgão que atua junto ao CONAMA, delineando a
política ambiental do país. No Brasil, é o órgão que tem legitimidade para
propor ao CONAMA “normas e padrões para implantação, acompanhamento e
fiscalização do licenciamento ambiental”
11
e outras.
Além da competência para propor as normas para o licenciamento
ambiental, o IBAMA tem autonomia para atuar nos órgãos estaduais e
municipais, na fiscalização dos cumprimentos das normas ambientais do país,
estabelecendo, inclusive, punições para o desrespeito à legislação pátria.
3.2. Órgãos ambientais em Minas Gerais
Conforme dito anteriormente, os Estados devem se organizar
administrativamente para proteger e fiscalizar as normas ambientais nacionais
dentro do seu respectivo território. Nesse sentido, os Estados, por meio das
secretarias, autarquias ou fundações, exercem a atividade de proteção
ambiental.
Em Minas Gerais, o órgão responsável pela referida fiscalização é o
COPAM (Conselho Estadual de Política Ambiental), que tem como
competência a “formulação de normas técnicas e padrões de qualidade
ambiental, a autorização para implantação e operação de atividades
potencialmente poluidoras e a aprovação das normas e diretrizes para o
Sistema Estadual de Licenciamento Ambiental”
12
.
11
Conforme disposto no art. 11 da Lei 6.938/81.
12
A competência da instituição foi transcrita do site do IEF. Disponível em: <www.ief.mg.gov.br>.
47
3.2.1. COPAM – Conselho Estadual de Política Ambiental
Tendo em vista que o problema de pesquisa aqui estudado diz respeito
à operacionalização da legislação ambiental nos projetos de assentamentos
rurais do Estado de Minas Gerais, tornam-se necessárias maiores informações
sobre o plano hierárquico-administrativo dos órgãos públicos mineiros voltados
à proteção e fiscalização do meio ambiente.
Inicialmente, é preciso ressaltar que a criação do COPAM, segundo
Lopes et al. (2004), se deu em 1977 e que a instituição foi pioneira como órgão
de “participação direta”, preconizado na Constituição da República de 1988,
para a confecção da política ambiental nacional. O COPAM derivou de um
contexto político do Estado de Minas Gerais, em que o governador Rondon
Pacheco (1970-74) elaborou o Plano Mineiro de Desenvolvimento, apoiado no
desenvolvimentismo da década de 1970, coincidindo com a chegada ao Estado
de grandes fábricas, como a Fiat e a Usimec.
Outro ponto de destaque da política ambiental mineira foi a criação do
CETEC (Centro Tecnológico de Minas Gerais) em 1975, que tinha o objetivo de
“desenvolver pesquisas tecnológicas direcionadas para a transferência de
tecnologia, com ênfase nos setores econômicos mais representativos da
economia mineira: mineração, minerais não-metálicos e alimentos de origem
animal” (LOPES et al., 2004).
O que não se deve perder de vista é que o potencial mineral de Minas
Gerais trouxe para este Estado um grande número de empresas com grande
potencial poluidor, como a Acesita e a Açominas, provocando a preocupação
ambiental, não despida de intenções, mas em sua essência preocupada com
os recursos naturais que davam vazão às indústrias, como, por exemplo, o
carvão mineral usado nos altos-fornos.
Correlato a essas transformações no panorama industrial do Estado, a
população começou a se mobilizar, reivindicando melhores condições de vida,
devido ao mau cheiro vindo das fábricas e aos primeiros vestígios de poluição,
sendo marcante a mobilização dos moradores contra a fábrica de cimento Itaú,
em Contagem, no ano de 1975.
Em 1992, com a mobilização brasileira pela RIO-92, o COPAM adere
ao seu discurso a preocupação com a sustentabilidade ambiental, passando a
48
ser a instituição mineira responsável pela elaboração e fiscalização das normas
e padrões ambientais de Minas Gerais, além da atividade de concessão das
licenças ambientais.
Para o exercício dessas funções, o COPAM conta com o desempenho
de dois órgãos executivos e de assessoramento técnico: IEF (Instituto Estadual
de Florestas) e FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Além destes
órgãos, existe no Estado o IGAM (Instituto Mineiro de Gestão das Águas),
responsável pelo planejamento hídrico do Estado. Os dois primeiros órgãos,
dentro da divisão proposta pelo SISNAMA, são considerados órgãos
executivos seccionais.
Cada um dos órgãos mencionados tem por finalidade propor medidas
voltadas à proteção ambiental, assim como executá-las e trabalhar na
fiscalização do cumprimento da política ambiental do Estado. Entretanto, a
cada uma das instituições foi designada determinada área de atividades para o
exercício de suas atribuições.
O IEF (Instituto Estadual de Florestas) cuida da concessão das
licenças ambientais dos empreendimentos relacionados às atividades
agrícolas, pecuárias e florestais.
A FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente) realiza a política
ambiental do Estado, tendo em vista as atividades industriais, minerárias e de
infra-estrutura, assim como a realização de pesquisas e estudos sobre a
melhoria da qualidade do ar, do solo, da água e da poluição.
Por seu turno, o IGAM (Instituto Mineiro de Gestão de Águas) é o
instituto mineiro criado em 17 de julho de 1997 pela Lei 12.584 que tem
como finalidade o “planejamento e administração de todas as ações
direcionadas à preservação da quantidade e da qualidade das águas de Minas
Gerais”
13
.
O COPAM está organizado em seis câmaras técnicas, que são as de
Atividades Agrossilvopastoris, Bacias Hidrográficas, Proteção da
Biodiversidade, Mineração, Política Ambiental e Poluição Industrial.
Cada uma dessas câmaras tem competência para elaboração de
normas técnicas para a proteção ambiental da sua respectiva atividade. Entre
essas funções encontra-se a concessão das licenças ambientais.
13
Disponível em: <www.igam.mg.gov.br/historico.php>. Acesso em: 8 set. 2005.
49
3.2.2. Órgãos municipais
Em cada município podem ser estabelecidas secretarias, órgãos ou
autarquias para dar cumprimento à legislação ambiental do país. Mais uma
vez, é válido lembrar que tais órgãos terão competência concorrente em
matéria ambiental, não podendo as determinações se atritarem com as
determinações superiores do CONAMA.
3.3. A legislação ambiental sobre reforma agrária
É importante relembrar que os debates sobre a reforma agrária do
nosso país não se mantiveram distantes da preocupação com o uso racional
dos recursos naturais, que passou a fazer parte das preocupações de todo o
contexto mundial. Ao contrário, desde a publicação da Constituição da
República de 1988, a reforma agrária ganhou atributos de agente propulsor da
preservação do meio ambiente, bem como da recuperação das áreas
degradadas.
Assim, o que se pode constatar é que o CONAMA confeccionou uma
série de resoluções com o intuito de propor os padrões ambientais necessários
para a execução de atividades produtivas que efetiva ou potencialmente
causassem poluição ou degradação ambiental, incluindo as atividades
relacionadas aos projetos de assentamento rural de reforma agrária.
O mecanismo utilizado para que os padrões ambientais considerados
como referência para as atividades produtivas fossem de fato seguidos e
pudessem ser fiscalizados é o licenciamento ambiental, concedido pelas
instituições públicas responsáveis pela proteção ao meio ambiente de cada
ente da federação. Em Minas Gerais existem duas instituições responsáveis
pela concessão das licenças, que são o IEF ou a FEAM, dependendo da
atividade produtiva.
O conceito de licenciamento ambiental e de licença ambiental vem
expresso na Resolução 237 do CONAMA, que assim os define:
I Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão
ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação
de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais,
50
consideradas efetivas ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob
qualquer forma, possam causar degradão ambiental, considerando as
disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso;
14
II Licença ambiental: ato administrativo pelo qual o órgão ambiental
competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental
que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para
localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras
dos recursos ambientais consideradas efetivas ou potencialmente poluidoras ou
daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradão ambiental
15
.
Dos conceitos supracitados, infere-se que o licenciamento ambiental é
uma atividade administrativa, concedida pelo poder público, que visa à
adequação das atividades produtivas aos padrões de referência estabelecidos
pelo próprio Estado.
Com relação à reforma agrária, o licenciamento ambiental desta
atividade vem previsto nas Resoluções 237, 289 e 318, todas do CONAMA.
no âmbito do Estado de Minas Gerais, as normas legais que definem e
regulamentam o licenciamento ambiental nos projetos de assentamento rural
são as Deliberações Normativas 74 e 88 do COPAM. Anteriormente à
Deliberação Normativa 88 do COPAM, que foi referendada em 10 de dezembro
de 2005, vigorava a Deliberação Normativa 44 do mesmo órgão, de forma que,
embora tenha sido revogada com a DN 88, a DN 44 será estudada, visto que
foi na vigência desta que os problemas que deram origem a esta pesquisa
puderam ser observados, e ainda se encontram bastante evidentes.
Todos esses instrumentos legais serão analisados a seguir,
destacando-se as principais imposições para os projetos de assentamento rural
de reforma agrária.
14
Art. 1.°, I, da Resolução 237 do CONAMA.
15
Resolução 237, CONAMA; art. 1.°, II.
51
3.3.1. Resolução 237 do CONAMA
A Resolução 237 do CONAMA, promulgada
16
em 19 de dezembro de
1997, foi criada para regulamentar o licenciamento ambiental mencionado no
PNMA de 1981, bem como complementar as estipulações feitas no Decreto
99.274/90. Deve-se mencionar que tal legislação foi publicada
17
em 22 de
dezembro de 1997, data do início de sua vigência
18
.
O contexto da Resolução 237 do CONAMA era de uma instabilidade
quanto ao procedimento de licenciamento ambiental ocorrido no Brasil, uma
vez que, devido à competência concorrente, os Estados estavam tomando
posturas muito diferenciadas quanto ao licenciamento, fazendo-se necessária
uma legislação de âmbito nacional que padronizasse o licenciamento ambiental
no Brasil, sendo este o conteúdo da Resolução 11, de 1994, o de criar um
grupo de trabalho com o objetivo de reavaliar o licenciamento ambiental do
país.
Fruto das discussões ocorridas no grupo de trabalho foi a confecção da
Resolução 237 do CONAMA, que apregoa a obrigatoriedade do licenciamento
ambiental para as atividades produtivas, preocupando-se em definir o
procedimento e as exigências de cada fase do licenciamento ambiental de todo
o território brasileiro.
no artigo primeiro da resolução são definidos os conceitos de
licenciamento ambiental, licença ambiental, estudos ambientais e impacto
ambiental. No art. 2.° é transcrito o art. 17 do Decreto 99.274/90, que impõe a
obrigatoriedade do licenciamento para atividades que se utilizem dos recursos
naturais e sejam potencial ou efetivamente poluidoras.
Nos artigos 4.°, 5.°, 6.° e 7.° foi definida a competência para o
licenciamento, distribuída entre o IBAMA e os órgãos estaduais e municipais,
dependendo da localização do empreendimento a ser licenciado, ressalvado
16
Uma lei, quando de sua inserção no mundo jurídico, deve ser promulgada, que, segundo Pereira
(1999, p.64), é “o ato pelo qual adquire a lei força obrigatória e traduz uma atestação da sua existência
formal, ou a autenticação da sua regularidade”.
17
Publicação, segundo Pereira (1999, p.64), é “a sua divulgação, de forma a torná-la conhecida pelos
que têm de aplicá-la ou obedecer a seus ditames. Publicada a lei com sua inserção no Diário Oficial da
União, torna-se conhecida, ou adquire a presunção de que o é”.
18
A vigência de uma lei, segundo Pereira (1999), é a data em que a mesma começa a exercer sua
faculdade impositiva. Para reconhecê-la é necessário verificar se houve estipulação de data certa para
início do cumprimento da legislação ou se a lei não se manifestou, caso em que interpreta-se existir um
tempo de vacatio legis para seu cumprimento, que é um lapso temporal de 45 dias entre a publicação
da legislação e sua exigibilidade, determinado pela Lei de Introdução ao Código Civil.
52
que os empreendimentos devem ser licenciados em uma única competência,
ou seja, ou no órgão federal, ou no estadual ou no municipal.
No art. 8.° foram definidos os tipos de licença necessários às atividades
que se utilizam de matérias-primas, no mesmo sentido do Decreto 99.274/90,
ou seja, LP, LI e LO. Aqui cabe a observação de que as licenças poderiam ser
requeridas isolada ou sucessivamente, dependendo da natureza da atividade.
Com relação aos prazos, restou consignado que o órgão ambiental
teria 6 (seis) meses para analisar e dar uma posição sobre a licença
pretendida, e que tal prazo apenas poderia ser prorrogado para 12 (doze)
meses quando houvesse EIA (Estudos de Impacto Ambiental) e RIMA
(Relatório de Impacto ao Meio Ambiente) e, ou, audiência pública.
quanto à validade das licenças, a LP seria de no máximo dois anos.
a LI não pode ser superior a seis anos. Por fim, a LO tem validade entre 4
(quatro) e 10 (dez) anos e deve ser requerida sua renovação com antecedência
mínima de 120 (cento e vinte) dias da data do seu vencimento.
3.3.2. Resolução 289 do CONAMA
Com o intuito de disciplinar as diretrizes para o licenciamento
ambiental, tornado obrigatório aos assentamentos rurais, foi promulgada e
publicada a Resolução 289 do CONAMA, em 25 de outubro de 2001, entrando
em vigor nesta mesma data. Neste instrumento legal ficou clara a preocupação
do governo brasileiro com a adequação dos projetos de assentamento rural ao
plano de gestão ambiental
19
, de forma que esses empreendimentos estivessem
de acordo com as diretrizes de uso adequado dos recursos naturais,
efetivando-se a proteção ao meio ambiente, segundo o princípio da
precaução
20
.
Questão que merece realce é a definição de reforma agrária contida no
parágrafo primeiro da Resolução, que é transcrito a seguir:
19
Segundo exposição de motivos da Resolução estudada, a gestão ambiental seria efetivada através da
proteção ao meio ambiente, de forma sustentável, através de diretrizes e procedimentos que
orientassem e disciplinassem o uso e a exploração dos recursos naturais nos projetos de
assentamentos rurais de reforma agrária.
20
O princípio da precaução estabelece que somente são admitidas intervenções ao meio ambiente se
existe a certeza de que tais intervenções não causarão adversidade ao mesmo. Antunes (2005, p. 36)
esclarece que o conteúdo deste princípio “está relacionado ao lançamento no ambiente de substâncias
desconhecidas ou que não tenham sido suficientemente estudadas”.
53
Reforma agrária: conjunto de medidas que visem a promover a melhor
distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim
de atender ao princípio de justiça social, ao aumento de produtividade e ao
cumprimento da fuão cio-ambiental da propriedade.
Por meio deste conceito se constata que a concepção de reforma
agrária até então vigente ganha um contorno diferenciado, enquadrando-se no
conceito de função socioambiental da propriedade expresso pelo art. 186, I e II,
da Constituição da República de 1988, ou seja, mostra-se relevante e
imprescindível o cumprimento da função ambiental da propriedade diante da
proposta de reforma agrária do país.
A Resolução mencionada reforçou o texto da Resolução 237 do
CONAMA através da delimitação das licenças cabíveis ao licenciamento nela
tratado, fazendo uma pequena modificação, porque para os assentamentos de
reforma agrária seriam cabíveis apenas duas licenças: a licença prévia (LP) e a
de instalação e operação (LIO), ambas definidas no art. 2°, da Resolução
estudada. Com relação à concessão de tais licenças, ficou estabelecido que
estas poderiam ser requeridas de forma isolada ou sucessiva, dependendo da
natureza, característica, localização e fase de implantação do projeto de
assentamento rural, conforme se percebe no art. 3°, § 2°.
Com relação à primeira licença, a LP, esta deveria ser um documento
obrigatório para a obtenção das terras, e somente após sua concessão é que o
projeto de assentamento rural poderia ser criado
21
, tendo como exigência o
estudo de viabilidade ambiental, situação que nunca chegou a acontecer na
prática. Seu objetivo seria o de aprovar a localização e concepção do
assentamento rural, bem como sua viabilidade ambiental, e estabelecer
requisitos básicos para a próxima etapa do licenciamento, ou seja, a LIO,
conforme descrito no art. 2.° da legislação.
a segunda licença, a LIO, teria como exigência o PBA (Projeto
Básico do Assentamento). Quanto a esta licença, devem ser feitas algumas
considerações. A primeira delas é que ela pode ser requerida isoladamente em
duas situações: a primeira diz respeito aos assentamentos rurais em fase de
implantação quando da vigência da norma comentada; a segunda, àqueles
assentamentos implantados antes, também, da vigência da norma. O
objetivo desta fase do licenciamento é conceder a autorização para
21
Conforme art. 3.°, §2.°, da Resolução 289 do CONAMA.
54
implantação dos PAs de acordo com o PBA, ficando estabelecidas nesta
licença as condicionantes e medidas de controle ambiental que deveriam ser
tomadas em cada assentamento rural, conforme art. 2.° da norma.
Outra consideração é que, de acordo com as diretrizes constantes no
art. 3.°, §4.°, todo assentamento rural deveria ser criado somente após a
concessão da LP e que a LIO deveria ser requerida até 120 dias após a criação
do PA, tendo prazo de expedição máximo de 120 dias após seu requerimento.
Ou seja, todo projeto de assentamento rural estaria licenciado no máximo em
300 dias, menos de um ano, o que não aconteceu até a presente data, porque,
embora as normas sejam claras, elas se mostraram ineficazes, ainda mais
quando se relembra que apenas em Minas Gerais o licenciamento dos PAs
está em curso.
Na resolução foram previstos outros aspectos do licenciamento, como
possibilidade de autorização, em caráter excepcional, para supressão de
vegetação ou uso alternativo do solo para atividades agrícolas de subsistência,
antes da concessão da LIO, em área restrita e previamente identificada (art.
4.°); possibilidade de o órgão supletivo analisar o licenciamento em caso de o
órgão competente não o fazer em tempo hábil (art. 3.°, §7.°); possibilidade de
os projetos de assentamento se submeterem à licença simplificada, nos casos
em que o projeto de assentamento representar baixo impacto ambiental (art.
11); e prioridade nos órgãos ambientais para a análise dos projetos de
assentamento rural, tendo em vista sua urgência e relevância social (art. 13).
3.3.3. Resolução 318 do CONAMA
Questão interessante diz respeito à exigibilidade das diretrizes
estabelecidas pela Resolução 289 do CONAMA, que entrou em vigor no
mesmo dia de sua publicação, ou seja, dia 25 de outubro de 2001.
Acontece que no art. 15, da Resolução 289, foi estabelecido que, após
um ano de sua publicação, seria feita uma avaliação pelo Plenário do
CONAMA sobre os procedimentos necessários ao efetivo cumprimento das
disposições da Resolução. No dia 4 de dezembro de 2002, entretanto, o
governo promulgou nova legislação específica sobre este artigo, qual seja a
Resolução 318 do CONAMA, cuja finalidade foi a de prorrogar a data prevista
55
no art. 15 da Resolução 289 do CONAMA por dois anos, a contar da data da
publicação da Resolução 318, que ocorreu em 19 de dezembro de 2002. Ou
seja, o prazo estabelecido para a avaliação do cumprimento das medidas
referentes ao licenciamento ambiental nos projetos de assentamentos rurais de
reforma agrária passou de 25 de outubro de 2002 para 19 de dezembro de
2004.
Tal atitude, por si só, é um indício de que o governo brasileiro percebeu
que as normas sobre o licenciamento ambiental para assentamentos rurais de
reforma agrária ainda não estavam em implantação no país, motivo que levou o
Estado a adiar a avaliação. Deve-se considerar que até a presente data mais
de um ano em que as normas ambientais sobre reforma agrária deveriam ter
sido avaliadas não notícias sobre uma atitude a esse respeito, nem
previsão para que aconteça.
3.3.4. Deliberação Normativa 44 do COPAM
O Estado de Minas Gerais, pioneiramente, elaborou legislação
ambiental específica para definir e tornar obrigatório o licenciamento ambiental
para os projetos de assentamentos rurais do Estado, qual seja a Deliberação
Normativa 44 do COPAM, promulgada em 20 de novembro de 2000 e
publicada em 25 de novembro de 2000, data em que entrou em vigor. Portanto,
a DN 44 entrou em vigor antes da existência da Resolução 289 do CONAMA,
que, conforme já se viu, datou de 25 de outubro de 2001.
Mesmo tendo sido originada antes das diretrizes para o licenciamento
ambiental para projetos de assentamentos rurais (Resolução 289 do
CONAMA), a legislação mineira encontra-se em consonância com a Resolução
237 do CONAMA, vindo justamente para definir os critérios de exigibilidade e
detalhamento que caberia a cada ente da federação, segundo o art. 2.°, §2.°, e
também de acordo com o anexo 1 da Resolução 237 do CONAMA. Assim, a
antecedência da legislação mineira quanto à Resolução 289 do CONAMA não
trouxe qualquer divergência ou inviabilidade jurídica
22
. Dessa forma, a partir de
22
É válido lembrar que em matéria ambiental os Estados possuem competência concorrente, podendo
confeccionar normas ambientais para seu território, e que estas normas estaduais apenas não podem
ser incompatíveis com as normas federais ou mais permissivas que as determinações expressas nas
resoluções do CONAMA.
56
25 de novembro de 2000 a exigência ambiental do licenciamento nos projetos
de assentamento rural de reforma agrária transformou a maneira de
implementação e implantação dos assentamentos rurais no Estado de Minas
Gerais.
Essa Deliberação trouxe consigo foi uma nova concepção de projetos
de assentamento rural, agora com utilidade que ultrapassa a clássica
concepção de reforma agrária (divisão da terra), passando a significar também
a garantia, conservação e preservação ambiental. Essa afirmação pode ser
aferida de parte da epígrafe da legislação mencionada, que assim se
manifesta:
Considerando que os assentamentos rurais para fins de reforma agrária devem
constituir um dos instrumentos operacionais de reabilitação do território e da
difuo de práticas de controle ambiental adequadas aos contextos
geoambientais e sociais das áreas de implantação.
A legislação mineira definiu, antes mesmo do padrão estabelecido pela
Resolução 289 do CONAMA, o licenciamento ambiental com base nas três
licenças disciplinadas pela Resolução 237 do CONAMA, que não foram
recepcionadas pela Resolução 289, conforme já se viu. Assim, a DN 44 passou
a exigir a LP, a LI e a LO
23
.
Para a concessão de cada licença são necessários estudos
ambientais, que são exaustivamente elencados nos anexos da legislação. É
preciso que se alerte para o fato de que o órgão empreendedor desses
licenciamentos é o INCRA (art. 1.°, parágrafo único), de forma que todas as
licenças são pedidas por esta instituição ao órgão estadual competente, ou
seja, ao IEF. Algumas considerações importantes podem ser inferidas após o
estudo da Deliberação Normativa 44:
a) As licenças necessárias ao licenciamento ambiental mineiro são
sucessivas, ou seja, enquanto ainda pendente o processo de
requerimento da anterior, a posterior não pode ser requerida (art.
2.°).
b) Para os assentamentos rurais já iniciados antes da publicação da
Deliberação, houve a dispensa da LP e da LI, sendo necessária
apenas a LO (art. 5.
o
, §3.°). A LO deveria, segundo o art. 5.°, §4.°,
23
Art. 2.° da Deliberação Normativa 44 do COPAM.
57
ser requerida até 60 (sessenta) dias após a publicação da DN 44 e
implementadas no prazo de 24 (vinte e quatro) meses.
c) Para o requerimento de cada licença é necessário que se
apresente um estudo ambiental determinado no anexo da
legislação: para a LP é necessário o RVA (Relatório de Viabilidade
Ambiental); para a LI, o PBA (Projeto Básico de Assentamento); e
para a LO, o PFA (Projeto Final de Assentamento).
d) Os assentamentos rurais formados por menos de 25 famílias ficam
submetidos ao licenciamento simplificado, de acordo com o
entendimento do art. 9.°.
Ficou advertido, ainda, que as demais exigências ambientais, como a
outorga da água, deveriam ser requeridas junto ao órgão competente – no caso
mineiro, o IGAM.
O mais importante desta legislação é que, através dela, todo e
qualquer projeto de assentamento rural deveria se submeter ao licenciamento
ambiental, que poderia exigir as três modalidades de licença, com exceção
daqueles formados por 25 (vinte e cinco) famílias, caso da licença simplificada,
ou nos casos de assentamentos já iniciados antes da vigência da DN 44.
Também deve ser lembrado que o desmate para plantio e ocupação
definitivos apenas poderia ser feito após a concessão da LI e LO. Foi previsto
no anexo itens 2.f, 3.e e 4.f que poderia ser concedida autorização para
exploração florestal após a concessão da LI, a critério do órgão ambiental.
Comparando a Deliberação Normativa 44 do COPAM com a Resolução
289 do CONAMA, percebe-se que a legislação mineira é mais rigorosa do que
a federal, principalmente pelo fato de que em Minas Gerais há três
modalidades de licenças e que estas são sucessivas, fato que tem como
conseqüência a impossibilidade de se requerer uma licença posterior, uma vez
que a anterior por que motivo seja encontra-se com seu processo
pendente, o que não ocorre na tipificação da legislação federal.
Com o passar do tempo e a tentativa de implementação da legislação
mineira estudada, foram sendo apontadas uma série de dificuldades com
relação à operacionalização do licenciamento ambiental não no referente
aos projetos de assentamento rural, como aos das demais atividades
58
produtivas; por esse motivo, foi promulgada a Deliberação Normativa 74 do
COPAM, datada de 9 de setembro de 2004.
Antes de passar ao item anterior, é importante que se observe que o
licenciamento proposto pela DN 44 apenas abrange os projetos de
assentamentos rurais para fins de reforma agrária cujo empreendedor seja o
INCRA, não abarcando, por via de conseqüência, os antigos assentamentos
feito pelo Banco da Terra, que hoje são realizados pelo Banco Mundial através
do crédito fundiário.
3.3.5. Deliberação Normativa 74 do COPAM
A DN 74 do COPAM, publicada em 9 de setembro de 2004, tem a
função de estabelecer critérios para a classificação das atividades produtivas
segundo o seu potencial poluidor e, assim, determinar quais devem se
submeter ao licenciamento ambiental no Estado de Minas Gerais, bem como
determinar como se o procedimento para a concessão das licenças
pertinentes.
A publicação de tal instrumento normativo, por si só, é um indício de
que o licenciamento ambiental que vinha ocorrendo no Estado não se mostrava
adequado a todas as atividades produtivas aqui realizadas. Nesse sentido, a
legislação previu uma série de novas possibilidades para o licenciamento:
a) A primeira inovação veio positivada no parágrafo único do art. 1
da Deliberação: a possibilidade de duas licenças (a LP e a LI)
serem requeridas concomitantemente, a critério do órgão ambiental,
no caso dos empreendimentos enquadrados ns classes 3 e 4 do
anexo da legislação.
b) Outra inovação diz respeito ao fato de que algumas atividades,
enquadradas nas classes 1 e 2 do anexo da Deliberação, não
necessitam do licenciamento ambiental da forma tradicional (LP, LI
e LO). Para tais atividades basta a AAF (Autorização Ambiental de
Funcionamento) pelo órgão estadual competente. Junto com a
autorização o empreendedor assina um termo de responsabilidade,
em que se compromete a respeitar toda a legislação ambiental,
bem como se anota o responsável técnico pelo empreendimento.
59
c) Para a concessão da AAF é necessário que se comprove que o
empreendedor está obedecendo à APEF (Autorização Ambiental
para Exploração Florestal), que é necessária para fazer exploração
florestal, para a alteração do uso do solo, catação, aproveitamento
de material lenhoso e limpeza, conforme esclarece o IEF.
Transportando as considerações anteriormente feitas para os projetos
de assentamento rural, tem-se que os empreendimentos de reforma agrária
cujo número de famílias é inferior a 50 não necessitam mais do licenciamento
ambiental, mas apenas da autorização de funcionamento concedida pelo IEF,
nos termos fixados pela norma. Também deve ser observado que a DN 74
revogou as disposições da DN 1, de 22 de março de 1990, que era a norma
que disciplinava os requisitos do licenciamento ambiental para Minas Gerais.
3.3.6. Deliberação Normativa 88 do COPAM
Tendo em vista as dificuldades e, às vezes, mesmo a inviabilidade de
operacionalização do licenciamento ambiental nos projetos de assentamento
rural do Estado de Minas Gerais, foi formado um grupo de trabalho com a
finalidade de confecção de uma nova Deliberação Normativa referente ao
licenciamento ambiental para os projetos de reforma agrária do Estado. Este
grupo de estudos contou com a participação de representantes das seguintes
instituições: INCRA, IEF, FETAEMG, EMATER, ITER, IGAM e SEMAD
(Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de
Minas Gerais).
O resultado dos estudos e discussões levados a efeito pelo grupo de
trabalho foi a Deliberação Normativa 88 do COPAM, promulgada em 13 de
setembro de 2005 e referendada em 10 de dezembro de 2005. As principais
diretrizes da referida legislação são as seguintes:
a) O licenciamento ambiental continua sendo composto de três
licenças: LP, LIO (Licença de Instalação e Operação) e LOC
(Licença de Operação Corretiva); ainda a previsão da AAF
(Autorização Ambiental de Funcionamento), para os casos de
assentamentos rurais com menos de 50 famílias, conforme
estipulado pela DN 74, de 2004.
60
b) O prazo concedido ao IEF para o procedimento administrativo
necessário à concessão da AAF é de 20 (vinte) dias, prorrogáveis
por mais 10 (dez), conforme se percebe no art. 4.°.
c) O prazo de validade da LP é de 2 (dois) anos (art. 5.°).
d) A concessão da LP permite a medição e o parcelamento do imóvel
pelo empreendedor, assim como as atividades de subsistência (art.
5.°, §4.°).
e) O prazo máximo da LIO e da LOC é de 8 (oito) anos.
f) O prazo para a concessão das licenças (LP, LIO e LOC) é de 90
(noventa) dias, prorrogáveis por igual período.
g) O IEF poderá, excepcionalmente, conceder APEF (Autorização Para
a Exploração Florestal), nos casos dos assentamentos em que a LP
tenha sido concedida, respeitando-se as áreas de reserva legal e
preservação permanente. As hipóteses dessa concessão abrangem
duas situações: as áreas de uso coletivo em que a implantação do
cultivo de subsistência, antes do parcelamento, não ultrapasse 20%
(vinte por cento) da área total do imóvel; para mais de 20% (vinte
por cento), somente após a concessão da LIO e LOC.
h) As atividades potenciais e efetivamente poluidoras, assim como o
uso de recursos hídricos, devem ser objeto de licenciamento
específico ou outorga, conforme a natureza e o porte do
empreendimento.
i) A concessão da AAF, bem como das licenças ambientais, se
condiciona à inexistência de débitos ambientais.
j) Todas as licenças devem ser acompanhadas dos documentos e
estudos correspondentes que m elencados nos anexos da
legislação, sendo certo que para a concessão da LP continua sendo
necessário o RVA, para a concessão da LIO é necessário o PDA e
para a concessão da LOC deverá ser feito o PFA.
De acordo com as considerações anteriormente feitas, deve-se
enfatizar que os projetos de assentamentos rurais anteriores à DN 44 deverão
requerer a concessão da LOC, estando dispensados da LP e da LIO, nos
mesmos moldes das diretrizes estipuladas na própria DN 44.
61
Outra questão que merece ser comentada diz respeito à nomenclatura
e tipo de licenças elencadas na DN 88, que rompeu com as determinações da
Resolução 237 do CONAMA na qual ficou estabelecido que o procedimento de
licenciamento ambiental padrão baseava-se em três licenças: LP, LI e LO, que
eram, na maior parte dos casos, sucessivas. Entretanto, a DN 88 seguiu a
esteira das determinações da Resolução 289 do CONAM, comentada
anteriormente, que estabeleceu apenas dois tipos de licenças para os PAS: LP
e LIO. Uma pequena ressalva deste ser feita nesse assunto em particular, que
se refere ao fato de que a DN 88 utiliza-se de outro tipo de licença não
regulamentada na Resolução 289 do CONAMA, que é a LOC, porém esta
apresenta as mesmas características da LIO, sendo apenas utilizada para os
casos específicos de PAs cuja implantação antecedesse a vigência da DN 44.
Assim, quanto aos objetivos das licenças, pode-se afirmar que a LP continua
sendo usada para estabelecer a localização e viabilidade dos assentamentos
rurais e que a LIO e a LOC são instrumentos de controle ambiental, bem como
instrumentos em que o Estado autoriza a implantação do PA, segundo o estudo
de PDA, no caso da LIO, e do PFA, no caso da LOC.
Outro ponto modificado se relaciona às atividades de subsistência
feitas pelos assentados, que, de acordo com a DN 44, poderiam ser praticadas
desde que houvesse a autorização para exploração florestal, cujo requisito era
a concessão da LI, além do entendimento do órgão ambiental quanto à sua
necessidade e adequação. na DN 88, as atividades de subsistência podem
ser praticadas após a LP, que é também requisito para a medição e
parcelamento do solo, outra inovação trazida pela DN 88, que na DN 44
apenas poderia ser realizado o parcelamento após a concessão da LI. Aqui
novamente se deve perceber que a dinâmica dos assentamentos teve uma
modificação substancial com relação às licenças ambientais: com a DN 44 os
assentamentos se submetiam às três licenças (LP, LI e LO), com a DN 88
existem praticamente duas licenças (LP e LIO), isso porque apenas os
assentamentos já criados antes de novembro de 2000 se submetem à LOC; no
caso daqueles que possuem menos de 50 famílias, estes necessitam tão
somente da AAF. Assim, se com a DN 44 apenas se poderia parcelar o solo
após a concessão da LI, na vigência da DN 88 esse parcelamento pode ser
62
realizado com a concessão da LP, comprovando que a dinâmica das licenças
foi alterada substancialmente nesse quesito.
63
CAPÍTULO 4
O IMAGINÁRIO SOCIAL
Os temas que neste capítulo serão tratados são essenciais para uma
análise mais aprofundada sobre a reforma agrária em Minas Gerais,
principalmente quando se analisam os impactos resultantes da necessidade do
licenciamento ambiental nos projetos de assentamento rural.
Assim, urge salientar que o imaginário social é um tema recorrente na
academia, de forma que sua discussão não é mais uma tarefa isolada ou de
menor importância. Ao contrário, hodiernamente, o imaginário e, junto a ele, as
representações sociais são maneiras de tentar explicar o mundo, tendo em
vista as particularidades de um indivíduo, uma classe ou uma categoria social.
Da mesma forma que, em história e na seara da antropologia, o
imaginário permeia os debates na academia, no âmbito do direito, da sociologia
e de outras áreas afins, discute-se a questão ambiental, bem como a reforma
agrária. Entretanto, o papel da ideologia como mentor do desdobramento dos
acontecimentos sociais não vem sendo tratado com igual ordem de
importância, embora se possa compreender, sob um enfoque mais acurado, a
relação entre licenciamento ambiental e reforma agrária quando se analisa o
discurso do direito do país, representante, por excelência, da ideologia do
governo do Brasil. Essa análise se torna ainda mais precisa quando, junto à
64
análise da ideologia, se vislumbra o papel do imaginário social na confecção da
legislação ambiental.
O que se pode tomar como premissa é o fato de que não existem
estudos específicos que associam o meio ambiente à reforma agrária,
tampouco que os conceba tendo em vista as representações sociais que os
envolvem, ou a ideologia que vem implícita neles, motivo pelo qual este
capítulo tentará abordar os temas anteriormente apresentados.
É preciso, de antemão, alertar que a análise do imaginário social sobre
a reforma agrária se fundou na memória de reunião realizada em 22 de outubro
de 1999, na SEMAD, em que ocorreram as discussões para a proposta de
Deliberação Normativa sobre o licenciamento ambiental nos assentamentos
rurais, assim como nas discussões do grupo de trabalho criado pela SEMAD
para modificação da DN 44, ocorridas em maio de 2005.
Novamente, aqui o pressuposto para a análise proposta é a
promulgação da Deliberação Normativa 44 da COPAM (Conselho Estadual de
Política Ambiental), do ano de 2000, que trouxe ao universo jurídico a
normatização da exigência do licenciamento ambiental nos projetos de
assentamento rural deste Estado. Desde então, a questão ambiental uniu-se à
questão agrária de forma explícita e permanente. Embora haja esse elo, as
entrelinhas desse relacionamento ainda não foram abordadas, tendo em vista o
conteúdo da norma e seus diversos significados.
O instrumento para apreensão das representações sociais e da
ideologia da mencionada norma legal serão as representações sociais das
instituições que fizeram parte da proposta da Deliberação Normativa 44 do
COPAM, bem como dos discursos das entidades que participaram da reunião
em que foi debatida a questão do licenciamento ambiental nos projetos de
assentamento rural.
O imaginário social é uma forma de representação social em que as
pessoas reproduzem sua forma de perceber o mundo, assim como as
sensações que possuem sobre os acontecimentos, tendo em vista sua
subjetividade. Nas palavras de Trindade e Laplatine (1997, p. 24), seria a
“faculdade originária de pôr ou dar-se, sob a forma de apresentação de uma
coisa, ou fazer aparecer uma imagem e uma relação que não são dadas
diretamente na percepção”.
65
Outro conceito de imaginário sucinto, porém preciso, é fornecido por
Japiassú e Marcondes (1996): “conjunto de representações, crenças, desejos,
sentimentos, através dos quais um indivíduo ou grupo de indivíduos a
realidade e a si mesmo”.
O imaginário, como forma de conceber o mundo, vem marcado pela
afetividade (TRINDADE; LAPLATINE, 1997, p. 25), porque é através dele que
as pessoas dão sentido aos acontecimentos que fazem parte da existência,
não apenas da própria vida, mas dos fatos que ocorrem no mundo. Isso
significa que o imaginário possui uma fluidez, não sendo imposto ou
obrigatório, mas configurando-se como forma natural de as pessoas
construírem sua rede de significados, o que coincide com a forma como Geertz
concebe a cultura, ou seja, uma teia de significados que os próprios homens
tecem e que possui significados que devem ser analisados e interpretados
(GEERTZ, 1987, p. 14).
Assim, o conceito de imaginário se complementa com o conceito de
cultura de Geertz, principalmente quando o autor associa a cultura de um povo
com um conjunto de textos que devem ser lidos e interpretados, tal qual o
imaginário, que é um conjunto de significados atribuídos pelas pessoas aos
acontecimentos, a fim de lhes dar a coerência que a própria afetividade da
pessoa determina.
A cultura pode ser definida, segundo Japiassú e Marcondes (1996, p.
61), como tendo dois aspectos; em suas palavras:
Em oposição a natura (natureza), a cultura possui um duplo sentido
antropológico: a) é o conjunto das representações e dos comportamentos
adquiridos pelo homem enquanto ser social. Em outras palavras, é o conjunto
histórica e geograficamente definido das instituições características de
determinada sociedade...; b) é o processo dinâmico de socializão pelo qual
todos esses fatos de cultura se comunicam e se impõem em determinada
sociedade, seja pelos processos educacionais propriamente ditos, seja pela
difuo das informações em grande escala, a todas as estruturas sociais,
mediante os meios de comunicação de massa. Nesse sentido, a cultura
praticamente se identifica com o modo de vida de uma população determinada,
vale dizer, com todo o conjunto de regras e comportamentos pelos quais as
instituições adquirem um significado para os agentes sociais e através dos quais
se encarnam em condutas mais ou menos codificadas.
Ainda que o conceito supracitado pareça estar relacionado
exclusivamente com a antropologia, outros autores de áreas diversas
concordam com a amplitude do termo cultura, significando que a cultura de um
povo abrange todos os dados históricos valorativos que se fazem presentes
66
nesse mesmo povo, ou seja, o conjunto de signos e significados que permeiam
todas as dimensões do ser social.
O imaginário, fazendo parte da cultura de um povo, necessita de
instrumentos para cumprir sua função de representação da realidade. Esses
instrumentos são os símbolos, signos e imagens, que possuem conceitos
diversos. Os signos representam determinado objeto, forma ou imagem, seja
ela abstrata ou concreta, porém caminha em um sentido único de
interpretação, não dando margem a outra possibilidade de leitura (TRINDADE;
LAPLATINE, 1997, p. 22). Por sua vez, os símbolos são “polissemânticos e
polivalentes, amparando-se também no referencial significante que lhes
propicia os sentidos, os quais contêm significações afetivas e são
mobilizadores dos comportamentos sociais”
24
. a imagem se apresenta como
uma construção baseada nas informações que possuímos, advindas das
nossas percepções, ou seja, é uma “representação mental que retrata um
objeto externo percebido pelos sentidos” (JAPIASSÚ; MARCONDES, 1996, p.
138).
Tendo em vista os conceitos supracitados, a pesquisa procurou
apreender, diante dos atores sociais entrevistados, quais as significações
atribuídas a símbolos previamente definidos no caso, a reforma agrária e o
licenciamento ambiental –, almejando enfocar principalmente as dificuldades
enfrentadas pelos atores no procedimento de licenciamento ambiental nos
quais se viam envolvidos. Essa análise, entretanto, será realizada no próximo
capítulo, junto com os resultados da pesquisa.
O imaginário, necessário advertir, não deve ser confundido com a
ideologia, porque esta tende a incutir no homem determinada forma de
vislumbrar a realidade, pelo fato de ser um “conjunto de idéias, princípios e
valores que refletem uma determinada visão de mundo, orientando uma forma
de ação, sobretudo uma prática política” (JAPIASSÚ; MARCONDES, 1996, p.
136). Por sua vez, conforme ressaltado, o imaginário não tende a um local
determinado, apenas funciona como forma de organizar os acontecimentos
através das representações dos grupos sociais.
24
Trindade e Laplatine, op. cit., p. 22.
67
CAPÍTULO 5
A IDEOLOGIA E A REFORMA AGRÁRIA
A ideologia, ao longo da história, foi vislumbrada de maneira
diferenciada, desde o seu nascedouro, de origem marxista, chegando até os
dias atuais, com contornos um pouco diferentes.
Segundo Wolkmer (2003), as ideologias se fazem sentir desde a
Revolução Francesa, quando as “proposições políticas (foram) classificadas
em de esquerda e de direita”; essa diferenciação teve como parâmetro o
enfoque dado a assuntos relativos à organização do Estado, incluindo as
posições sobre a distribuição da riqueza e a forma de se comportar diante da
política de um país.
A palavra ideologia se origina da junção lingüística da raiz grega eidos
(idéia) com logos (estudo, conhecimento), sendo então, no seu nascedouro, a
ciência das idéias, aquela que se encarregaria do estudo da origem e da
formação das idéias. Posteriormente, a palavra ideologia passou a significar
uma forma de dominação feita pela burguesia aos demais cidadãos, tendo em
vista a imposição que a burguesia exerce quanto aos seus hábitos e padrões
de comportamento.
De acordo com Wolkmer (2003), um dos marcos do termo ideologia é o
pensamento de Marx, que se exteriorizou no texto A ideologia alemã, momento
em que o autor insere o termo dentro de uma conjuntura histórica determinada.
68
Para Marx, a história exerce papel central na construção da realidade social,
que desemboca na forma de construção do pensamento da época, e, assim, a
conjuntura histórica seria imprescindível para a análise da vida social, razão
pela qual usa como método o materialismo histórico. Para Marx, nas palavras
de Marilena Chauí (2004, p. 47), a história seria:
A história não é, portanto, o processo pelo qual o esrito toma posse de si
mesmo, o é a hisria das realizações do Espírito. A hisria é história do
modo real como os homens reais produzem suas condições reais de existência.
É história do como se reproduzem a si mesmos (pelo consumo direto ou
imediato dos bens naturais e pela procriação), como produzem e reproduzem
suas relações com a natureza (pelo trabalho), do modo como produzem e
reproduzem suas relações sociais (pela divisão social do trabalho e pela forma
de propriedade, que constituem as formas das relações de prodão). É também
história do modo como os homens interpretam todas essas relações, seja numa
interpretação imaginária, como na ideologia, seja numa interpretação real, pelo
conhecimento da história que produziu ou produz tais relações.
Segundo Chauí (2004), Marx atribui o nascimento da ideologia ao
momento da divisão social do trabalho, que separou o trabalho material ou
manual do intelectual. O início desse processo coincidiria com o surgimento da
propriedade privada dos meios de produção e, conseqüentemente, com a
separação entre os proprietários dos bens de produção daquelas outras
pessoas que apenas vendem sua força de trabalho (proletariado). Junto com
essa divisão vem o conceito de consciência (percepção da realidade) e
alienação, exercendo nos homens uma tentativa de naturalização dos
fenômenos históricos, como se a realidade fosse uma decorrência natural da
vontade de um “Outro” superior, que arquitetou a divisão das classes sociais.
Ou seja, o homem não se reconhece como criador das condições sociais que
possibilitaram as desigualdades sociais, ao contrário, as percebe como sendo
uma emanação de uma entidade superior. A burguesia, que ocuparia posição
privilegiada nesse contexto (afinal, possui os meios de produção), exerceria o
papel de propagar esta ideologia de separação entre força de trabalho e
capital, dando ensejo à permanência das desigualdades sociais. Para explicitar
esse pensamento de Marx, Chauí usa o seguinte exemplo:
Assim, por exemplo, faz parte da ideologia burguesa afirmar que a educação é
um direito de todos os homens. Ora, na realidade sabemos que isto não ocorre.
Nossa tendência, então, será dizer que uma contradição entre a idéia de
educação e a realidade. Na verdade, porém, essa contradição existe porque
simplesmente exprime, sem saber, uma outra: a contradição entre os que
produzem a riqueza material e cultural com seu trabalho e aqueles que usufruem
dessas riquezas, excluindo delas os produtores. Porque estes encontram-se
excluídos do direito de usufruir dos bens que produzem, estão excluídos da
69
educação, que é um desses bens. Em geral, o pedreiro que faz a escola e o
marceneiro que faz as carteiras, mesas e lousas são analfabetos e não têm
condições de enviar seus filhos para a escola que foi por eles produzida. Essa é
a contradição real, da qual a contradição entre a idéia de “direito de todos à
educação” e uma sociedade de maioria analfabeta é apenas o efeito ou a
conseqüência (CHAUÍ, 2004, p. 63).
Segundo Chauí (2004, p. 65), Marx continua seu pensamento
afirmando que o Estado não é mais que uma forma “pela qual os interesses da
parte mais forte e poderosa da sociedade (a classe dos proprietários) ganham
a aparência de interesses de toda a sociedade”. Assim, o Estado representa a
dominação da classe dominante, vez que é construído já com o objetivo de
regular a vida em sociedade; contudo, essa regulação preserva o interesse da
classe dominante, exteriorizando e preservando no plano político as
desigualdades econômicas. Assim:
O Estado não poderia realizar sua função apaziguadora e reguladora da
sociedade (em benefício de uma classe) se aparecesse como realizão de
interesses particulares, ele precisa aparecer como uma forma muito especial de
dominação: uma dominação impessoal e anônima, a dominão exercida
através de um mecanismo impessoal que são as leis ou o Direito Civil (CHAUÍ,
2004, p. 66).
Com isso, Marx queria dizer que a ideologia acontece justamente
porque os homens não possuem uma visão da realidade que guarde uma
relação estreita com a história, com o conhecimento dos fatos. No entanto, os
homens são ensinados a adotar determinadas posturas, ou defender
determinadas posições (como, por exemplo, ser pobre e estar afastado do
poder), tendo em vista o discurso que lhes é ensinado por toda a vida. E
justamente por não guardar uma relação com a realidade em si, e sim com um
discurso, é que a ideologia continua justificando as desigualdades sociais e,
por conseguinte, possibilitando que essa desigualdade permaneça, uma vez
que:
A ideologia não é um processo subjetivo consciente, mas um fenômeno objetivo
e subjetivo involuntário produzido pelas condições objetivas da existência social
dos indivíduos. Ora, a partir do momento em que a relação indivíduo com sua
classe é a de submissão a condições de vida e de trabalho pré-fixadas, essa
submissão faz com que cada indivíduo não possa se reconhecer como fazedor
de sua própria classe. Ou seja, os indivíduos não podem perceber que a
realidade da classe decorre da atividade de seus membros. Pelo contrário, a
classe aparece como uma coisa em si e por si e da qual o indivíduo se converte
numa parte, quer queira, quer não. É uma fatalidade do destino. A classe
começa, então, a ser representada pelos indivíduos como algo natural (e não
histórico), como um fato bruto que os domina, como uma “coisa” que vivem
(CHAUÍ, 2004, p. 72).
70
Historicamente, a ideologia tem o papel de “justificar uma realidade que
cerca o homem, mas também permite desenvolver uma relação mais direta e
dinâmica entre os homens e a comunidade” (WOLKMER, 2003, p. 110). Nesse
sentido, esse autor, segundo a interpretação de Ricoeur, propõe uma divisão
das funções da ideologia: a de integração, de deformação e de dominação.
A função de integração estaria relacionada à integração do homem à
sociedade em que ele vive e deve justificar o modus operandi dessa sociedade,
fazendo com que o indivíduo acredite que o Estado em que ele vive é
exatamente aquele em que deveria viver e que as ações praticadas pelo
governo são as mais acertadas e corretas; seria o governo justificando, ao
mesmo tempo em que afirma, que ele é o que realmente deveria ser. Assim, se
insere nessa função o papel de motivação que o Estado deve proporcionar ao
indivíduo, dando-lhe confiança na organização social em que está inserido, ao
mesmo tempo em que se percebe um código interpretativo (as pessoas
interpretam os símbolos da sociedade como o governo deseja que sejam
percebidos).
A função de dominação significa dizer que a ideologia serve para
justificar as ações das autoridades e, principalmente, a autoridade em si, a
relação de poder presente em um país. Nesse sentido, o autor relembra Weber
para demonstrar a importância da ideologia na justificação da hierarquia
presente na sociedade.
A última função, a de deformação, seria a possibilidade de a ideologia
distorcer a realidade, dando a ela a feição que interessa ao agente que exerce
a dominação. Assim, “(...) o processo de vida real deixa de constituir a base
para ser substituído por aquilo que os homens dizem, se imaginam, se
representam. A ideologia é esse menosprezo que nos faz tomar a imagem pelo
real, o reflexo pelo original” (RICOER, citado por WOLKMER, 2003, p. 113).
Após esse apanhado de significados atribuídos à ideologia, cabe
explicitar o conceito de Chauí (2004, p. 108), que busca definir o conteúdo da
ideologia nos dias atuais, estando vinculado às representações sociais:
A ideologia é um conjunto gico, sistemático e coerente de representações
(idéia e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem
aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que
devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sentir e como devem
sentir, o que devem fazer e como devem fazer. Ela é, portanto, um corpo
explicativo (representações) e prático (normas, regras, preceitos) de caráter
71
prescritivo, normativo, regulador, cuja função é dar aos membros de uma
sociedade dividida em classes uma explicação racional para as diferenças
sociais, políticas e culturais, sem jamais atribuir tais diferenças à divisão da
sociedade em classes a partir da divisão na esfera da produção. Pelo contrário, a
função da ideologia é a de apagar as diferenças como de classes e fornecer aos
membros da sociedade o sentimento da identidade social, encontrando certos
referenciais identificadores de todos e para todos, como, por exemplo, a
Humanidade, a Liberdade, a Igualdade, a Não, ou o Estado.
A função da ideologia, conforme os conceitos supracitados, é a de
justificar as posições e opções políticas do país, com relação às políticas
públicas deste. Dessa forma, ao se pensar em meio ambiente e em reforma
agrária, é necessário perquirir se o que está acontecendo no país, mais
especificamente no Estado de Minas Gerais, é realmente a única opção
coerente ou se é uma escolha política que se reveste da ideologia de estar
protegendo o meio ambiente. Nesse sentido, o papel do Direito é de
fundamental importância, uma vez que está nas normas jurídicas todo o
arcabouço ideológico do Estado que sustentação e direcionamento às
funçõesblicas desenvolvidas por ele. Além disso, é através das normas que
o Poder Público pode deformar ou justificar a realidade, conforme proposição
de Wolkmer (2003), e ao mesmo tempo se isentar de qualquer
responsabilidade, que as atitudes do governo, uma vez que exista norma
jurídica impondo certa conduta, não é uma escolha da Administração blica,
mas a única possibilidade de ação diante da relevância do interesse público,
que deve sempre estar em sobreposição ao particular.
5.1. O direito como fenômeno ideológico
O Direito, por definição, é a manifestação estatal através da qual é
realizada a regulamentação da conduta social, que tem por objetivo realizar
uma função preventiva, ou seja, busca evitar que na sociedade aconteçam
conflitos de interesses entre os cidadãos. Caso a função preventiva não
consiga alcançar seu fim, entra em cena a segunda função do Direito, que é a
compositiva, e significa dizer que o Estado, por ter o monopólio da força, irá
resolver o conflito de interesses através de uma decisão judicial, a qual deverá
ser obedecida, sob pena de uma represália do Estado contra o particular que
não a acatar.
72
O que o Direito busca é assegurar a paz social, através da
normatização das condutas consideradas saudáveis pela sociedade, ou
daqueles fatos considerados um ultraje aos cidadãos, sendo estes últimos
punidos com uma sanção previamente definida por lei. Essa construção jurídica
tem por objetivo tutelar o maior número de interesses possíveis, evitando-se,
assim, os conflitos de interesse, ou a lesão ao patrimônio de qualquer cidadão,
além dos seus direitos imateriais.
A jurisdição tem por característica básica a anterioridade da lei, o que
significa dizer que a população sabe previamente quais condutas são
rechaçadas pelo Direito; assim, não existe a possibilidade da argüição do
desconhecimento da lei ante um ato lesivo que prejudique um cidadão, visto
que as emanações do Estado referentes ao Direito devem ser publicadas
fenômeno em que é dado conhecimento à população sobre o teor das
normatizações.
Essas emanações do Estado, por sua própria definição, são escolhas
normativas feitas pelo governo de um determinado grupo social, implicando
juízos de valor, que buscam sempre atingir os princípios ideológicos que regem
o Direito, quais sejam a segurança e certeza jurídica.
Chauí (2004, p. 82), analisando a relação entre Estado, dominação e
Direito, segundo a perspectiva de Marx, faz observação interessante:
Através do estado, a classe dominante monta um aparelho de coerção e de
repressão social que lhe permite exercer o poder sobre toda a sociedade,
fazendo-a submeter-se às regras políticas. O grande instrumento do Estado é o
Direito, isto é, o estabelecimento das leis que regulam as relações sociais em
proveito dos dominantes. Através do Direito, o Estado aparece como legal, ou
seja, como “Estado de direito”. O papel do Direito ou das leis é o de fazer com
que a dominação não seja tida como uma violência, mas como legal, e por ser
legal e não-violenta deve ser aceita. Ora, se o Estado e o Direito fossem
percebidos nessa realidade real, isto é, como instrumentos para o exercio
consentido da violência, evidentemente ambos não seriam respeitados, e os
dominados se revoltariam. A função da ideologia consiste em impedir essa
revolta, fazendo com que o legal apareça para os homens como legítimo, isto é,
como justo e bom. Assim, a ideologia substitui a realidade do Estado pela idéia
do Estado ou seja, a dominão de uma classe é substituída pela idéia de
interesse geral encarnado pelo Estado. E substitui a realidade do Direito pela
idéia do Direito ou seja, a dominação de uma classe por meio das leis é
substituída pela representação ou idéias dessas leis como legítimas, justas, boas
e válidas para todos.
É dentro do contexto explicitado por Chauí que se pode perceber a
relação existente entre o licenciamento ambiental e os assentamentos rurais de
reforma agrária no Estado de Minas Gerais, ou seja, a partir do momento em
73
que as normas jurídicas se revestem de dominação, elas passam a mascarar
problemas que, se analisados sob a ótica dos atores sociais participantes da
reforma agrária, poderiam dar ensejo (e às vezes dão) ao descrédito do
Estado, porque nem todas as normas jurídicas são tidas por boas ou justas,
haja vista os conflitos de interesses implícitos na própria lógica do capitalismo
(por um lado se encontram os donos dos meios de produção, que querem
manter seu poder, e de outro se encontram os proletários, que lutam para
poder participar da distribuição das riquezas produzidas).
Assim, infere-se que, para que o Direito seja aceito, respeitado e
eficaz, é necessário que ele se coadune com a realidade social do grupo para o
qual o este foi legislado. Isso significa dizer que o Direito guarda relações
estreitas com o conteúdo político da época em que está condicionado; por isso,
Wolkmer (2003, p. 156) afirma que “as ideologias jurídicas tem reproduzido, em
cada época e em cada lugar, fragmentos parcelados, montagens e
representações ticas que revelam a retórica normativa e o senso comum
legislativo de um modo de produção predominante”. O autor continua,
afirmando que:
o será demais ressaltar que todo Direito, enquanto pretensão de formar um
direito justo, exige ser universalmente válido e perene. Entretanto, nenhum
direito está de fato à altura desta reivindicação, todo o Direito é particular, não
realiza o verdadeiro interesse geral, mas apenas o interesse médio uma classe
minoritária; todo Direito é temporário, apenas transitoriamente constitui a
expressão legitima das condições adequadas de desenvolvimento da sociedade.
Todo Direito é ideológico, porque na sua reivindicação desconhece sempre seu
condicionamento social e histórico (WOLKMER, 2003, p. 156).
A ideologia se expressa no Direito de duas formas básicas: a primeira
relaciona-se às escolhas legislativas que são por excelência valorativas,
estando impregnadas da ideologia que melhor convier ao momento histórico;
a segunda diz respeito à exegese jurídica, ou seja, sua interpretação,
principalmente quando existir uma expressão normativa ou quando o próprio
texto da lei chamar à baila o discernimento do magistrado. Nesse sentido,
Wolkmer (2003, p. 156) ensina que:
Tanto a hermeutica jurídica quanto os diversos todos de interpretação
tornam-se campo privilegiado dos discursos ideológicos que objetivam ocultar as
dimenes reais da lei, pautando por sua suposta neutralidade e objetivação.
No caso deste estudo, não será considerada a segunda vertente, a da
interpretação, porque pretende-se realçar que é o Direito o primeiro obstáculo à
74
consecução da reforma agrária em Minas Gerais, em decorrência direta da
vontade legislativa que confeccionou as normas ambientais mineiras com as
restrições nelas existentes, de forma que os entraves práticos presentes no
procedimento de licenciamento ambiental no Estado de Minas Gerais são
resultantes diretos do próprio texto da lei e da ideologia presente nele.
5.2. Meio ambiente e propriedade: direitos fundamentais
Por meio da análise dos direitos fundamentais, tem-se uma perspectiva
de que a ideologia do país, ou melhor, do corpo político do país, aponta para a
proteção absoluta do meio ambiente, tendo no texto constitucional sua maior
justificação.
Quando se compara o direito à reforma agrária com o direito ao meio
ambiente saudável, a princípio poderia aparentar certa eqüidade com relação à
ordem de importância desses direitos, tendo em vista que ambos foram
consagrados como princípios esculpidos na Carta Constitucional de 1988,
fazendo, ainda, parte dos chamados direitos fundamentais. Entretanto, com
uma análise mais acurada, constata-se que há diferenças substanciais quanto
aos direitos analisados, principalmente no plano ideológico.
Conceitualmente, Silva (2000, p. 182) afirma, em se tratando de direito
fundamental, que:
Constitui a expressão mais adequada a este estudo, porque, além de referir-se a
princípios que resumem a conceão do mundo e informam a ideologia política
de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito
positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de
uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualitativo
fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as
quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo
sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem
ser, o apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente
efetivados.
Os direitos fundamentais são aqueles direitos atinentes à pessoa
humana que são inderrogáveis, estando atrelados às condições históricas dos
indivíduos e às necessidades imprescindíveis destes, sendo originados das
lutas dos homens pelo reconhecimento de tais pretensões como direitos
positivados pelo Estado
25
, o que derruba a afirmação de que tais direitos
25
Nesse sentido, esclarece José Afonso da Silva que “São direitos positivos, que encontram seu
fundamento e conteúdo nas relações sociais materiais em cada momento histórico. Sua historicidade
75
seriam inatos, ou seja, próprios da natureza do homem, uma vez que a
necessidade humana se modificou ao longo dos anos, tendo sido formados
direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira geração, como se verá a
seguir.
Os direitos fundamentais têm sua origem nos movimentos
revolucionários do século XVIII, quais sejam nas Revoluções Francesa, Inglesa
e Americana, quando foram consagrados na Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão, de 1789, na Declaração da Virgínia, primeira declaração
com tal conteúdo, proclamada em 1776.
No nascedouro dos direitos fundamentais, ficou configurado um caráter
mais individualista, representando o repúdio dos homens daquela época à
dominação exercida pelo Estado absolutista. Os homens pretendiam com as
declarações a positivação de direitos por eles considerados naturais e
irrenunciáveis, como o direito à vida, à propriedade e à liberdade. Segundo
Ferreira Filho (1999, p. 282):
O caráter individualista é o traço fundamental das declarações dos séculos XVIII
e XIX e das editadas até a Primeira Guerra Mundial. Marca-as a preocupação de
defender o indivíduo contra o Estado, este considerado um mal, embora
necessário.
O fruto das declarações deu origem aos primeiros direitos
fundamentais, chamados de primeira geração, estando incluído aqui, como se
vê, a questão da propriedade privada. Ressalte-se que, durante o surgimento
desses primeiros direitos fundamentais, a sociedade passava por uma
profunda transformação social, porque, desde a Revolução Francesa até a
Revolução Industrial, o homem passou a ser colocado como centro do mundo
(antropocentrismo), e a natureza, que outrora era considerada anterior ao
homem, passou a ser encarada como meio que serve ao homem para este
realizar sua produção, tão somente instrumento (OLIVEIRA; GUIMARÃES,
2004, p. 64). Por isso, os direitos fundamentais de primeira geração
transparecem essa retomada do homem como precursor da história,
consagrando as principais bandeiras das revoluções burguesas: propriedade,
igualdade e fraternidade. Isso significa dizer que os direitos fundamentais aqui
mencionados tinham por característica uma busca de abstenção do Estado
repele, por outro lado, a tese de que nascem pura e simplesmente da vontade do Estado, para situá-lo
no terreno político da soberania popular, que lhes confere o sentido apropriado na dialética do processo
produtivo” (SILVA, 2000, p. 180).
76
daquelas atividades que diziam respeito à particularidade do indivíduo, o que
corresponde ao momento histórico que representou a queda do Antigo Regime
e ascensão do Estado Liberal.
Após esse momento, os direitos fundamentais abarcaram novas
prerrogativas relacionadas ao princípio da igualdade, dando ensejo ao pleito
por justiça e bem-estar social, sendo buscados junto ao próprio Estado. Essas
normas, então, são aquelas atinentes aos direitos sociais, como o direito à
educação, à saúde, à previdência social e outros, consagrados principalmente
pelo art. 5.º da Constituição da República de 1988.
Essa busca por direitos mais abrangentes também pode ser explicada
tendo em vista os acontecimentos históricos vivenciados em meados do século
XIX, quando a grande luta da população era para equiparar o desenvolvimento
social ao progresso econômico ocorrido. Isso significa dizer que “instaura-se,
depois da Primeira Guerra Mundial, o primado da Sociedade sobre o Estado e
sobre o indivíduo” (OLIVEIRA; GUIMARÃES, 2004, p. 67); complementando
sua explanação, a autora afirma que “os direitos sociais, contrapondo-se aos
direitos de liberdade, demandam uma ampliação dos poderes do Estado para
que haja uma passagem do seu mero reconhecimento formal para sua
realização prática”. O que a autora afirma nada mais é do que a necessidade
de o Estado não mais estar encarregado da confecção de normas de caráter
social, mas, principalmente, de proporcionar condições efetivas para que a
sociedade possa se beneficiar dos direitos sociais consagrados nas
Constituições, que, após a década de 1950, passaram a abordar
necessariamente a questão da proteção social da pessoa. No cerne dessa
inquietação por justiça social surge a crítica quanto aos direitos individuais,
porque “essas liberdades seriam iguais para todos, é certo; para a maioria,
porém, seriam sem sentido porque a ela faltariam os meios de exercê-
las” (FERREIRA FILHO, 1999, p. 283).
Os direitos de terceira geração ampliam a perspectiva do ser social,
abarcando um bem-estar que ultrapassa a pessoa individual, dizendo respeito
à coletividade e, por isso, sendo considerados direitos difusos
26
. Seriam eles o
“direito à paz, ao desenvolvimento, ao respeito ao patrimônio comum da
humanidade, ao meio ambiente” (FERREIRA FILHO, 1999, p. 286). São
26
O conceito de direito difuso será tratado logo a seguir.
77
também conhecidos por direito de fraternidade e solidariedade (CAMPOS
JÚNIOR, 2004, p. 32).
Voltando aos dois direitos tutelados o da propriedade e da higidez
ambiental –, é importante ressaltar de antemão que um dos critérios para que a
propriedade atenda à sua função social é a preservação do meio ambiente,
segundo o uso racional de seus recursos, conforme expresso no art. 186 da
Constituição de 1988.
No entanto, talvez a questão mais relevante sobre esse tema seja a da
conceituação dos direitos difusos, que têm como características principais,
segundo Oliveira e Guimarães (2004), a indeterminação dos sujeitos (tais
direitos dizem respeito a um número indeterminado de sujeitos), a
indivisibilidade do objeto (os interesses tutelados não podem ser repartidos em
cotas e entregues aos seus sujeitos) e a sua litigiosidade interna (as situações
jurídicas controvertidas não são unânimes e bem definidas). Referidas
características se visualizam com exatidão quando se analisa o meio ambiente,
uma vez que este bem não pode ser repartido e tampouco pode ser deferido
em partes para qualquer sujeito que o pleiteie. Da mesma forma, segundo sua
terceira característica, o meio ambiente ainda não possui um conteúdo
determinado; tanto é assim que diuturnamente surgem novas legislações
ambientais com o fim de tutelar uma nova realidade ambiental.
A propriedade foi um dos primeiros direitos reconhecidos como
fundamentais ao ser humano, porém, nas primeiras positivações, era
considerada como absoluta, o que coincidiu com a definição de propriedade
antes positivada pelo Código Civil Brasileiro de 1917, que vigeu até o ano de
2002. Dizer que a propriedade era considerada absoluta significa dizer que,
uma vez que ela fosse adquirida, ao Estado não caberia qualquer ingerência
nesta, podendo seu proprietário utilizá-la, ou não, da maneira como fosse de
sua vontade.
No entanto, a conceituação de propriedade mudou de significado, uma
vez que a demanda social e, principalmente, o problema da exclusão social
pressionaram o governo a buscar alternativas para a concentração fundiária do
país, o que foi debatido no capítulo 1 desta dissertação. O que se percebe
com esse alargamento do caráter da propriedade foi uma transformação de
uma perspectiva antropocêntrica em uma social, também denominada de
78
“visão antropocêntrica mais alargada” sobre a propriedade, que inclui a questão
social. Essa inserção de novo conteúdo faz com que “a propriedade seja
erigida à categoria de direito fundamental de segunda geração” (OLIVEIRA;
GUIMARÃES, 2004, p. 76). Nas palavras deste autor:
Substitui-se, dessa forma, a visão antropocêntrica clássica por uma visão
antropocêntrica alargada. Na primeira, o homem é o centro da natureza. Na
segunda, o homem é vislumbrado como um elemento da natureza. Por isso, ela
deve ser protegida pelo seu valor intrínseco e não apenas pela utilidade que dela
pode advir para o homem. (...) (OLIVEIRA; GUIMARÃES, 2004, p. 77).
Continuando a transmutação do significado da propriedade, o que se
percebeu foi que no contexto mundial a questão ambiental passou a interferir
na maneira de organização da produção, o que inclui, necessariamente, a
relação com a propriedade. Nesse momento, a produção deixou de ser
percebida como valor absoluto e passou a abranger a questão dos recursos
naturais, e a visão do homem no processo de produção modificou-se,
passando de proprietário a gestor de recursos naturais.
Nesse sentido, estando a produção relativizada, sendo condicionada
pelo meio que a cerca, este meio também resta condicionado, não pela
produção, mas pela relação harmônica que deve existir entre o homem e o
meio ambiente, de modo a fomentar o bem-estar social.
A propriedade passa, neste contexto, a ter uma nova função, a fuão ambiental.
o se pode mais encará-la apenas como um meio de resolver os problemas
sociais e ecomicos, mas também como requisito indispensável para se
garantir uma vida saudável a todos os indivíduos. Neste sentido, o direito de
propriedade sofre mais uma limitação, passando a ter uma terceira dimensão
(OLIVEIRA; GUIMARÃES, 2004, p. 78).
Assim, constata-se nos dias atuais que o meio ambiente interfere de
forma decisiva em todas as questões referentes à propriedade, mormente na
questão da reforma agrária. Essa intervenção já veio de forma incipiente no
Estatuto da Terra de 1964, sendo consagrada na Constituição da República de
1988 e também no Código Civil de 2002.
O que de fato ocorre é uma tentativa de conciliação entre o interesse
social pela reforma agrária e o interesse coletivo pelo meio ambiente saudável.
Essa tentativa pode ser explicada, ainda, pelo princípio norteador de toda a
Carta Constitucional, que é o da dignidade da pessoa humana, consagrado
pelo art. 1.° de dito instrumento.
79
Pelo princípio da dignidade da pessoa humana, o Estado brasileiro se
compromete a defender robustamente a vida humana, não podendo prescindir
de qualquer aspecto importante para a higidez psíquica, física ou moral da
pessoa, e, por isso, não podendo relegar a segundo plano a proteção ao bem-
estar social, representado pelas condições adequadas do meio ambiente.
Tal predileção, manifestada pela interpretação da norma constitucional,
pode ser percebida no plano fático, uma vez que hoje é impossível realizar
qualquer atividade produtiva e às vezes mesmo as não-produtivas sem
estar em conformidade com a legislação ambiental. Esse posicionamento
fora previsto por José Afonso da Silva em 1999, quando relatou:
As normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida,
como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que de
orientar todas as formas de atuão no campo da tutela do meio ambiente.
Compreendeu que ele é um valor preponderante, que de estar acima de
quaisquer considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao
direito de propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são
garantidos no texto constitucional, mas, a toda evidência, não podem primar
sobre o direito fundamental à vida, que está em jogo quando se discute a tutela
da qualidade do meio ambiente, que é instrumental no sentido de que, através
desta tutela, o que se protege é um valor maior: a qualidade da vida humana
(SILVA, 2000, p. 818).
Na prática, essa interferência do meio ambiente, no âmbito da reforma
agrária, se faz sentir através da obrigatoriedade do licenciamento ambiental
nos projetos de assentamento rural, além de toda a exigência da legislação
ambiental quanto à área de preservação permanente, reserva legal e outros
requisitos que não cabe nesse momento discutir.
80
CAPÍTULO 6
A PESQUISA DE CAMPO
A pesquisa de campo realizada neste trabalho foi feita com
profissionais das instituições envolvidas no procedimento de licenciamento
ambiental dos assentamentos rurais de reforma agrária do Estado de Minas
Gerais. Assim, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas nas seguintes
instituições: INCRA, representado por um agrônomo, perito federal, e técnico
lotado na GEMAD (Gerência de Meio Ambiente e Desenvolvimento), agente da
SR06 (Superintendência Regional), cuja sede se localiza em Belo Horizonte;
IEF/COPAM, representado por um engenheiro florestal responsável pela
Coordenadoria de Apoio às Câmaras Técnicas do COPAM; FETAEMG,
representada por um economista, assessor da reforma agrária, e conselheiro
do COPAM; e MST, representado pela AESCA (Associação Estadual de
Cooperação Agrícola), braço jurídico do movimento em Minas Gerais, onde foi
entrevistada uma bióloga responsável pelos estudos relativos à criação de
projetos de assentamentos rurais (PDA), relacionado ao licenciamento
ambiental e à prestação de serviços do programa da ATES (Assessoria
Técnica Social e Ambiental da Reforma Agrária).
Para todos os representantes das instituições pesquisadas foi proposta
a mesma trajetória de perguntas que se relacionaram com a implementação
dos projetos de assentamentos rurais, tendo em vista o procedimento de
81
licenciamento ambiental. Para cada entrevistado foram feitas perguntas
direcionadas à sua atividade precípua no procedimento geral de
implementação dos assentamentos rurais, dando-se ênfase a aspectos
práticos, como o prazo das licenças, a expedição destas, o custo, e ao aspecto
social desse procedimento.
A primeira instituição a ser entrevistada foi o INCRA, seguida pelo
MST, IEF e FETAEMG. As pessoas entrevistadas representantes do INCRA,
do IEF e da FETAEMG participaram de um grupo de trabalho, que se reuniu de
maio a junho de 2005 para discutir a proposta de modificação das diretrizes da
DN 44. Fruto deste grupo foi a confecção da DN 88, legislação que veio para
substituir a DN 44, buscando solucionar os problemas que advinham da
legislação. Também deve ser frisado que o entrevistado do IEF e da FETAEMG
participam da CAP (Câmara de Atividades Agrossilvopastoris) do COPAM.
Correlato aos dados numéricos aqui apresentados, a pesquisa buscou
identificar as representações sociais de cada instituição entrevistada a respeito
da reforma agrária em Minas Gerais e do licenciamento ambiental, às vezes
tomando os temas como uma unidade indissociável, e por outros momentos
como atividades distintas, para instigar o entrevistado a emitir sua opinião
sobre a questão da pesquisa.
É importante destacar, novamente, que foi fonte de pesquisa a
memória da reunião realizada em 22 de outubro de 1999 na SEMAD
(Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável),
ocasião em que instituições relacionadas à reforma agrária e à proteção
ambiental discutiram a proposta normatização, que veio regulamentar a
obrigatoriedade do licenciamento ambiental em Minas Gerais, dando origem à
DN 44. Também foram fonte de pesquisa as atas das reuniões do grupo de
trabalho, que se reuniu entre maio e junho de 2006 para discutir a DN 44 e
propor novos dispositivos normativos que substituíssem a referida Deliberação.
6.1. As representações sociais e o memorial da reunião para criação da
DN 44
Em 22 de outubro de 1999 foi realizada uma reunião no Plenário da
Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, em
82
Belo Horizonte, para discussão da proposta de DN que estabeleceria a
obrigatoriedade do licenciamento ambiental para assentamentos rurais do
INCRA em Minas Gerais. Nesta reunião compareceram representantes das
principais instituições envolvidas com a reforma agrária e com a proteção
ambiental do Estado, entre elas a ABBIO-MG (Associação de Biólogos de
Minas Gerais), a AMDA (Associação Mineira de Defesa do Ambiente), a
FETAEMG, o GEAT (Grupo Especial de Acesso à Terra), a CPA (Câmara de
Política Ambiental), a CPB (Câmara de Proteção à Biodiversidade), além do
INCRA, IEF, FEAM e MST.
A finalidade desta reunião foi a de subsidiar os trabalhos do relator
nomeado pela CPA, de forma que as diretrizes da minuta sobre a proposta da
DN/COPAM definidas pudessem ser discutidas com as partes interessadas
no procedimento. Para isso, cada instituição levou as informações e
documentos que julgou pertinentes para a discussão, devendo ser ressaltado
que o INCRA encaminhou as etapas relacionadas com a criação dos projetos
de assentamentos rurais, os procedimentos técnicos para levantamento de
dados e informações de imóveis rurais e o projeto de reformulação da reforma
agrária, em discussão no governo federal, chamado de o novo mundo rural; a
CPB encaminhou uma proposta sobre a DN discutida, bem como um parecer
sobre a minuta apresentada pela CPA; a AMDA apresentou modificações
sugeridas à proposta de DN da CPA; e a ABBIO-MG, parecer relativo aos
documentos do INCRA e IEF que tratam do licenciamento ambiental dos
projetos de reforma agrária.
Durante as discussões se pôde perceber que cada instituição
possuía uma visão diferenciada relacionada a temas comuns, que diziam
respeito ao mecanismo a ser adotado para licenciar as atividades dos
assentamentos rurais em Minas Gerais.
Para facilitar a análise das representações, a opção escolhida foi
relacionar as representações de cada instituição em torno de temas
selecionados: a reforma agrária, a agricultura familiar e a agricultura patronal, a
legislação ambiental e o licenciamento ambiental. As representações
manifestadas pelas instituições foram sistematizadas nas figuras que se
seguem, e, logo após estas, serão descritos os principais posicionamentos
institucionais sobre os temas debatidos.
83
Deve ser esclarecido que todas as instituições apresentam em seu
discurso de forma evidente a ideologia da própria instituição relacionada tanto à
reforma agrária quanto ao procedimento de licenciamento ambiental,
esclarecendo-se que, até o momento desta discussão, a necessidade do
licenciamento ambiental para a reforma agrária apenas havia sido mencionada
na Resolução 237 do CONAMA, ou seja, não havia no Brasil norma específica
que determinasse as diretrizes a serem seguidas no licenciamento dos PAs, e
era justamente essa a função da DN 44: ser a pioneira na regulamentação da
exigência federal. O que se quer dizer com a afirmação anterior é que, até a
promulgação e vigência da DN 44, os temas reforma agrária e licenciamento
ambiental eram percebidos como realidades separadas, independentes e
distantes, cogitando-se no mecanismo de uni-los, mas sem a percepção que
hoje se tem do processo, por isso cada instituição trouxe para discussão sua
experiência como uma das partes do processo: ou reforma agrária (caso do
INCRA e MST) ou licenciamento ambiental (caso do IEF, FEAM, CPA e CPB) .
Por isso, as discussões presentes na reunião estudada são perspectivas de
futuro, que, diante do grupo de trabalho para revisão da DN 88, formam uma
espécie de visão conjunta do procedimento total: uma imaginava como seria o
mecanismo adequado a ser implantado em 1999, a outra tenta reparar os
equívocos consignados na primeira norma (DN 44), e da união das duas pode-
se perceber a importância da análise delas, como sendo a explicação para a
forma como a reforma agrária vem ocorrendo, desde dezembro de 2000, no
Estado de Minas Gerais.
84
Figura 1 – A reforma agrária e os discursos das instituições presentes na reunião de 22 de outubro de 1999.
85
Agricultura
familiar
GEAT/INCRA
Desenvolvimento rural
sustentável
INCRA/IEF/CPA/FEAM
Dívida social
INCRA/FEAM
Questão social
INCRA
REFORMA
AGRÁRIA
Figura 2 Posicionamentos sobre os impactos advindos da agricultura patronal e da agricultura familiar, segundo as institui-
ções presentes na reunião de 22 de outubro de 1999.
86
Dependência dos
recursos naturais
INCRA
Terra como espaço de
vida, local de onde
advém o sustento e o
excedente
INCRA
Agricultura
patronal
INCRA
Voltada para o
mercado
INCRA
Terra como
mercadoria
INCRA
Agricultura
familiar
GEAT/INCRA
Não gera impacto, se
gerar é mínimo,
comparativamente
INCRA
Não acredita que não
gere impactos
CPB
Convivência com as
limitações ambientais
INCRA
Homogenidade do
espaço – lógica da
redução das limitações
ambientais
INCRA
Segurança alimentar
INCRA
Figura 3 – Representações sobre a legislação ambiental das instituições presentes na reunião de 22 de outubro de 1999.
87
Necessidade de regulamentação
da apropriação privada dos bens
naturais
FEAM
Diferença entre atividades
desenvolvidas por um
capitalista e pelo
assentamento rural
FEAM
Questão do uso da tecnologia
e o impacto ambiental.
Monsanto...
MST
As normas devem levar
em consideração o
estado da pessoa: sua
fome, sua pobreza
MST
Deveriam ser criadas leis e
normas para disciplinar a reforma
agrária e não para impedi-la
MST
Muitas leis são entiecológicas:
não levam em consideração o
desenvolvimento da natureza
CPA/INCRA
Dificuldade do geral
(licenciamento) se adequar ao
particular (reforma agrária)
INCRA
Primeiro é preciso pensar em
política para depois pensar em
norma
MST
O objetivo da lei não deve ser agir como um
estorvo na agilidade do processo e buscar
extinguir as situações que provocam sua
necessidade.
CPA
Leis são inflexíveis
INCRA
Transformação da
questão ambiental de
artesanal para
profissionalizada.
Desconsideração das
peculiaridades do
processo
FEAM
Resolução 237: Lei do
atacadão. Põe tudo no
mesmo barco.
FEAM
Questão da burocracia do
processo: conservar as mesmas
categorias: LP, LI, LO.
FEAM
A forma de interpretar a
legislação vai ter de ser diferente.
FEAM
LEGISLAÇÃO
AMBIENTAL
Figura 4 – Representações sobre o licenciamento ambiental das instituições presentes na reunião de 22 de outubro de 1999.
88
LICENCIAMENTO
AMBIENTAL
Redesenho das categorias
(LP, LI, LO)
FEAM
Diferença do
licenciamento para a
reforma agrária
FEAM/CPA/INCRA
Unidades de produção devem
ser mantidas em harmonia
com o ecossistema
FEAM
Licenciamento
simplificado, mas
responsável
INCRA
Necessidade de
se pensar a
autorização para
utilização da
água junto com
o licenciamento
ambiental.
Requisito para a
LI.
IGAM
Questão ambiental: os assentados
passando fome enquanto
acampados. Deveria ser centrado
no homem, senão, este não
consegue enxergar o meio
ambiente
MST
Impacto depende da
tecnologia e da
localização da
atividade
CPB
6.1.1. Reforma agrária
A Figura 1 mostra os debates a respeito das representações sobre a
reforma agrária e seu significado para as instituições que se reuniram no dia 22
de outubro de 1999, visando deliberar sobre as diretrizes a serem seguidas no
procedimento de licenciamento ambiental da reforma agrária de Minas Gerais.
De forma geral, o primeiro ponto da análise parte da proposta de
definição de como é o uso da terra nos projetos de assentamentos rurais feitos
pelas instituições, ou seja, se neles o trabalho será elaborado segundo a ótica
da propriedade familiar ou da agricultura patronal, para então se pensar em
como deveriam ser as exigências do licenciamento ambiental.
Nesse sentido, tanto o GEAT quanto o INCRA defendem que a reforma
agrária é associada à agricultura familiar, o que implica a adequação do
procedimento a este tipo de atividade, especificamente. Nesse sentido, tais
instituições asseveram que, para fins de licenciamento ambiental, a reforma
agrária pode ser vislumbrada como sinônimo de agricultura familiar.
O INCRA, o IEF, a CPA e a FEAM, entretanto, ultrapassam a definição
de agricultura familiar, engajando a reforma agrária em um contexto maior,
percebendo-a como instrumento de desenvolvimento rural sustentável,
devendo esta se adequar tanto aos padrões de sustentabilidade quanto
promovê-la. Com tal posicionamento, o INCRA, o IEF, a CPA e a FEAM deixam
claro que não são contrários ao licenciamento, mas que este deve, novamente,
ser compatível com a forma de produção específica dos PAs. A FEAM,
complementando seu posicionamento, argumenta que deve haver harmonia
entre as unidades de produção e o ecossistema em que ela está localizada.
Também afirma que a questão da biodiversidade é mais bem trabalhada nas
unidades de trabalho familiar, porque eles precisam da matéria-prima para o
próprio sustento.
Outra forma de conceber a reforma agrária é, para o INCRA, associá-la
a uma questão social, atrelando-a à dívida social que a sociedade teria para
com os excluídos; nesse contexto, a função da reforma agrária estaria
associada à reinserção desses excluídos. Aqui é oportuno mencionar que o
INCRA é a instituição que a reforma agrária por número maior de
perspectivas, ou seja, para a instituição a reforma agrária é uma forma de
89
agricultura familiar, que tem por função resgatar uma dívida social anterior, e
que, para tanto, não deve se descuidar da preocupação com o meio ambiente,
ao contrário, deve ser instrumento de desenvolvimento rural sustentável. Por
este posicionamento se percebe que a ideologia do INCRA está relacionada
com os diversos conceitos atribuídos à reforma agrária, que, ao longo dos
anos, modificou os seus contornos, iniciando como resgate social e
produtividade (Estatuto da Terra) e abarcando, atualmente, um viés
ambientalista, implícito, inclusiva, na Constituição da República de 1988.
6.1.2. Agricultura familiar x agricultura patronal
Considerando que a reforma agrária é associada pela maioria das
instituições como agricultura familiar, surge um novo posicionamento do
INCRA: o de que esse tipo de atividade não gera impacto ambiental; essa
afirmativa é rebatida pela CPB, que discorda da ausência de impacto
ambiental, argumentando que a mensuração do impacto é feita pela análise da
localização e do tipo de tecnologia que envolve a atividade produtiva. Assim,
apenas se poderia averiguar se há, ou não, impacto depois que estas variáveis
fossem analisadas (tecnologia e localização).
Para defender seu posicionamento, o INCRA afirma que o modo como
a terra é trabalhada e a dependência que os assentados possuem quanto aos
recursos naturais os impedem de causar danos consideráveis ao meio
ambiente. Este é visto como fonte das rendas dos assentados, garantindo,
inclusive, a segurança alimentar; portanto, os assentados devem conviver
harmonicamente com o meio que os cercam.
Outro argumento utilizado pelo INCRA para defender a agricultura
familiar e mostrar que seus impactos (se existirem) são mínimos é
comparando-a à agricultura patronal. Esta se volta para o mercado, vendo a
terra como mercadoria, e, assim, a homogeniza com tratores, agrotóxicos e
demais instrumentos adequados a esse fim, para que a produtividade seja
aumentada, não importando as limitações ambientais da região. Nesse sentido,
o INCRA afirma que a agricultura patronal, pela sua dinâmica de utilização da
terra, é que gera impacto ambiental.
90
No mesmo sentido, o MST afirma que o que deveria ser licenciado são
as atividades de empresas como a Monsanto, que refletem a política
econômica e tecnológica, da qual resulta degradação e imperialismo
econômico.
Nesse momento, o INCRA e o MST realçaram a diferença da ótica
produtiva da agricultura que se baseia na ótica familiar daquela que se volta
para o mercado. Com tal atitude, presume-se, as instituições pretendem
desestabilizar os argumentos em prol do licenciamento padrão para os PAs,
mostrando que a relativização da forma de conceber a produção deve ser o
parâmetro para o estabelecimento de diretrizes para o licenciamento nos
assentamentos rurais.
6.1.3. Legislação ambiental
No momento em que as instituições discorreram sobre a legislação
ambiental, pôde ser observado que cada observação expressou um modo
particular de perceber como a legislação atingia os fins precípuos do trabalho
desempenhado por cada entidade.
O representante da FEAM, nesse sentido, vislumbrou que a Resolução
237 do CONAMA desempenhava o papel de “lei do atacadão”, porque colocou
todas as atividades “no mesmo barco”. A entidade, ao tecer este comentário,
faz alusão ao fato de que a Resolução 237 do CONAMA, de 1997, foi a norma
que tornou o licenciamento ambiental obrigatório para diversas atividades
poluidoras efetiva ou potencialmente, bem como para aquelas aptas a causar a
degradação ambiental. Como as atividades previstas na legislação são
completamente diferentes, sendo, entretanto, tratadas da mesma forma
(mesma legislação e submetendo-se à mesma espécie de licenciamento), a
FEAM atribui à legislação a denominação de “lei do atacadão”. Acrescenta que
a burocracia do processo está associada à determinação de instituição
hierarquicamente superior a ela (FEAM), a qual instruiu que as licenças
necessárias à reforma agrária fossem mantidas semelhantes às categorias da
Resolução 237 (LP, LI e LO). Esse posicionamento, segundo o representante
da instituição, engessou o processo e o resgate da dívida social que, segundo
a instituição, cabe à sociedade cumprir. Afirmou que essa forma de
91
regulamentação transformou a questão ambiental de artesanal, em que cada
caso é analisado separadamente, em profissionalizada, sendo uma forma de
colocar todos os assentamentos rurais na mesma condição, sem analisar as
especificidades de cada um. Devido à inadequação técnica (uma legislação
para várias atividades), a entidade acredita que a forma de interpretar a
legislação terá de ser diferente para a questão da reforma agrária.
O INCRA, taxativamente, acredita que as leis são inflexíveis, e
acrescenta que é muito difícil o geral se adequar ao particular, referindo-se ao
fato de o licenciamento ambiental de forma genérica não se mostrar adequado
para a questão específica da reforma agrária. Somado a isso, o INCRA e o
CPA alertam para o fato de que muitas leis são antiecológicas, não levando em
consideração o desenvolvimento da natureza.
O CPA afirmou que a lei não deve ser um estorvo para a agilidade do
processo de licenciamento; ao contrário, ela deveria buscar extinguir as
situações que provocam sua necessidade.
Por sua vez, o MST afirmou que, antes de se pensar em normas,
dever-se-ia pensar em política, e que, uma vez que se pensasse em leis, elas
deveriam servir para disciplinar a reforma agrária e não para impedi-la. Assim,
as leis deveriam levar em consideração, antes de tudo, a fome e a pobreza da
pessoa. Nessa esteira, o MST afirma que o problema fundamental da reforma
agrária deveria ser o próprio homem: sua fome, suas necessidades essenciais,
sua dignidade, porque, se tais temas não forem considerados, torna-se
impossível ao assentado que ele consiga enxergar o meio ambiente. Também
alerta para a necessidade de cuidado ao criar as normas, para que estas não
sejam um mecanismo de inviabilizar a reforma agrária.
Com essas ilações, percebe-se mais uma vez que, enquanto a FEAM e
a CPA discutem tecnicamente o tema, o MST volta seu discurso para questões
humanísticas, sem acrescer dados técnicos ou práticos para uma possível
solução do problema. O INCRA, por seu turno, também não discorreu sobre o
assunto, limitando-se a ressaltar a inflexibilidade das normas, como se esta
fosse uma verdade absoluta.
92
6.1.4. Licenciamento ambiental
O licenciamento ambiental, assim como as locuções anteriores, variou
de significados, alternando seu sentido desde uma concepção técnica até
questões humanísticas.
Assim, a FEAM afirmou a necessidade do licenciamento ambiental
para que se regule a apropriação privada de bens naturais de forma a se evitar
que “a produção capitalista apropriasse apenas os benefícios da natureza e
socializasse os prejuízos advindos da produção”. A entidade também defendeu
o redesenho das categorias de licenciamento, de modo que o licenciamento
necessário à reforma agrária coadunasse com as características desse tipo de
produção, que é bem diferente daquelas referentes à produção capitalista. A
entidade deixou claro que o licenciamento para a reforma agrária deveria ser
peculiar, vez que não era o objetivo dessa medida “tratar igualmente os
desiguais porque senão vamos aumentar a desigualdade”. Por fim, a FEAM fez
uma observação muito atualizada a respeito do licenciamento ambiental,
colocando a questão de o processo não poder ser reificado, que está em
vias de transformação, de forma que se apresentam alguns erros e alguns
acertos.
O IEF, por seu turno, afirmou que não bastaria que se liberasse o
desmate, porque, se assim o fosse, não se levariam em consideração questões
relacionadas aos fatores bióticos, como as relações com as bacias
hidrográficas, entre outros. Além disso, a instituição ressaltou a preocupação
existente com os assentamentos já criados, em relação à qualidade de vida, e
com a forma como estes interagem com o meio ambiente, afirmando que,
quando uma área está sob litígio, o maior dano quem sofre é o próprio meio
ambiente. Afirmou a preocupação da instituição com relação à divisão das
terras nos PAs, porque depende disso a liberação dos créditos para a reforma
agrária. De acordo com o órgão, se o assentamento tem um plano de
desenvolvimento que abrange todas as atividades ali desempenhadas, o órgão
ambiental pode fiscalizar o cumprimento de tal plano, caso contrário, nada
poderia ser feito. Concluindo, afirmou a importância do licenciamento como
sendo um mecanismo de os assentados firmarem um compromisso de
recuperação das áreas degradadas e de preservação do meio ambiente.
93
O INCRA continuou defendendo um licenciamento diferenciado para a
reforma agrária, que, segundo sua convicção, deveria ser simplificado, porém
responsável. O CPB fez uma breve explanação, afirmando que o licenciamento
deve ser prévio para poder se concretizar e deve abordar tanto a localização
quanto a tecnologia a ser utilizada nos assentamentos.
O MST ressaltou a questão referente ao uso da tecnologia pela
MONSANTO e o impacto ambiental que ela causa, sua política econômica, seu
imperialismo e a degradação que vem atrelada a esse comportamento. Afirmou
ainda que um problema ambiental que deveria ser levado em consideração é a
questão do homem, principalmente a sua fome, porque, sem analisar o
homem, não se chegará ao meio ambiente. Acrescentou que a entidade
acredita ser um problema ambiental as 85.000 famílias que estão acampadas e
passando fome.
O IGAM ressaltou a importância de a outorga de água ser prevista no
licenciamento ambiental, indicando-a como requisito para a LI.
Com essas observações, notou-se que desde outubro de 1999 as
questões relativas à reforma agrária e ao licenciamento ambiental vêm sendo
discutidas, não pelos órgãos técnicos, mas como pelos segmentos da
sociedade civil que lidam com o acesso à terra, buscando se chegar a um
consenso a respeito do procedimento mais compatível à reforma agrária. As
discussões, como se afirmou no início da análise das representações sociais,
na reunião do dia 22 de outubro de 1999, vieram marcadas pela ideologia de
cada instituição, que reflete a forma como elas desempenham seu papel no
licenciamento ambiental, nas questões relativas à proteção ambiental ou à
reforma agrária, o que não seria diferente. Entretanto, ao considerar os
problemas pelos quais o licenciamento dos PAs vem passando na atualidade,
infere-se que a maior parte deles havia sido prevista nas discussões de
outubro de 1999, quando sequer existia norma ambiental específica para
assentamentos rurais. Assim, quando relacionadas tais discussões com as
modificações trazidas pela DN 88, nota-se, invariavelmente, que as colocações
feitas pela maior parte das instituições foi pertinente, faltando uma
sensibilidade para adequá-las à norma ambiental.
94
6.2. A situação da reforma agrária no Estado de Minas Gerais
De antemão, é preciso esclarecer que as entrevistas aplicadas às
instituições aconteceram entre os meses de maio e junho de 2005 e que os
dados utilizados neste estudo têm sua origem nas tabelas
27
fornecidas pelos
agentes do INCRA e do IEF, sendo que nelas consta o controle feito
institucionalmente do procedimento de licenciamento ambiental, relacionando
número de PAs criados, fase em que cada um se encontra com relação ao
procedimento de licenciamento ambiental (qual licença; se a licença já foi
concedida; se pendente; e, por vezes, até o motivo da pendência) e número de
famílias em cada projeto de assentamento rural.
Uma primeira observação a ser feita é que a tabela fornecida pelo IEF
mostrou-se mais completa e de fácil compreensão, já que nela a classificação
dos PAs foi elaborada de acordo com o requerimento de licença, ao contrário
do INCRA, onde se encontra uma listagem de PAs apenas em ordem
alfabética, portanto não separando os assentamentos que estão em situações
diferenciadas quanto ao licenciamento ambiental, o que dificulta a tabulação
dos resultados.
Voltando aos dados da pesquisa, pode-se constatar que em Minas
Gerais existem entre 146
28
(cento e quarenta e seis) e 174 (cento e setenta e
quatro) projetos de assentamentos rurais em processo de licenciamento
ambiental. O número que será utilizado como referência é o de 174 (cento e
setenta e quatro), fornecido pela tabela do IEF, em maio de 2005. Tal
divergência numérica se deve ao fato de que o IEF analisa a totalidade dos
pedidos de licenças dos projetos de assentamentos rurais do Estado, enquanto
o INCRA/ SR 06 tem jurisdição sobre 849 (oitocentos e quarenta e nove)
municípios do Estado, ficando outros quatro municípios (Arinos, Unaí, Formoso
e Buritis) sob a jurisdição da SR 28 (Superintendência Regional do Distrito
Federal e Entorno), sediada em Brasília, Distrito Federal. Assim, no número
fornecido pelo INCRA/SR 06 não constam os assentamentos em que a SR 28
dá assistência, motivo da diferença numérica apontada.
27
As tabelas utilizadas constam do Apêndice deste estudo.
28
Número oriundo da tabela fornecida pelo INCRA/SR06, em maio de 2005.
95
É importante, antes de visualizar a situação do licenciamento ambiental
dos projetos de assentamentos rurais em Minas Gerais, explicitar que toda a
trajetória para a requisição das licenças, assim como os documentos e estudos
necessários a cada uma delas, está relatada no anexo da DN 88, que também
consta do Apêndice deste trabalho. Contudo, para que os dados se tornem
claros, é imprescindível ter em mente que para cada licença ambiental é
necessário um estudo preestabelecido em lei e que deve ser realizado por uma
equipe multidisciplinar. Assim, para a LP é necessário o RVA (Relatório de
Viabilidade Ambiental). Para a concessão da LIO é necessário o PDA (Plano
de Desenvolvimento do Assentamento). Para a LOC é necessário o PFA
(Projeto Final de Assentamento) e o diagnóstico ambiental.
Com relação à situação geral dos assentamentos rurais em Minas
Gerais, traçou-se o Gráfico 1, contendo a quantidade de assentamentos com a
fase do procedimento ambiental em que estes se encontravam em maio de
2005.
0
20
40
60
Número de
PAs
Licenças ambientais
Número de PAS em relão ao
tipo de licença
58
36
6
16
48
10
AAF
LAS
LP
LI
LOC
Consolid
ados
Fonte: Dados obtidos do IEF, em maio de 2005.
Gráfico 1 Fase do licenciamento ambiental e número de PAs, em maio de
2005.
96
O Gráfico 1 resume a situação do licenciamento ambiental nos projetos
de assentamento rural de reforma agrária do Estado de Minas Gerais. Os
números mostrados na tabela e no gráfico correspondem às informações
obtidas em maio de 2005, ocasião em que foi realizada a entrevista com o IEF/
COPAM. Também é necessário ressaltar que, segundo a tabela fornecida pelo
IEF, em Minas Gerais existem 174 (cento e setenta e quatro) projetos de
assentamentos rurais, estando 58 (cinqüenta e oito) requerendo AAF; 37 (trinta
e sete) já com a concessão da LAS; 6 (seis) sob a espera da concessão da LP;
16 (dezesseis) aguardando a concessão da LI; e 48 (quarenta e oito)
esperando a concessão da LOC.
Analisando a tabela, nota-se que a maior parte dos PAS está
aguardando a concessão da AAF ou possui a LAS, o que corresponde a 95
(noventa e cinco) dos 174 (cento e setenta e quatro) PAs, equivalendo a 57%
(cinqüenta e sete por cento) dos assentamentos rurais. Para entender tais
números é necessário ter em mente que a maior parte dos assentamentos
rurais é formada por menos de 50 (cinqüenta) famílias, situação prevista pela
DN 74, de 2004, como sendo o requisito para o pedido de AAF, cujo
procedimento é mais célere do que o requerimento das outras licenças, visto
que basta ao INCRA preencher o FCEI (Formulário de Caracterização do
Empreendimento Integrado) e o FOBI (Formulário de Orientações Básicas
Integrado), assim como proceder ao pedido da APEF (Autorização Ambiental
para Exploração Florestal) e anotar o responsável técnico pelo
empreendimento. Essa possibilidade trouxe grande avanço para o
licenciamento ambiental dos PAs, porque o procedimento é menos exigente
conforme consta na DN 88, tem o prazo de 20 (vinte) dias, prorrogáveis por
outros 10 (dez), a contar do pedido no IEF, para sua concessão.
Deve ser mencionado que os PAs que requereram a LAS fizeram tal
pedido ainda quando da vigência da DN 44, a qual estipulava que os
assentamentos com menos de 25 (vinte e cinco) famílias deveriam se submeter
à licença ambiental simplificada. Todos os 36 (trinta e seis) assentamentos que
se encontram nessa situação tiveram as licenças concedidas entre agosto de
2003 e novembro de 2004. Tal ocorrência se explica quando se relembra que a
DN 74, que instituiu a AAF, apenas entrou em vigor no dia 2 de dezembro de
2004, portanto, após a concessão de todas as LAS aqui relacionadas. No que
97
diz respeito ao prazo para concessão desta licença, é importante registrar que,
após a FCEI, a concessão da licença, na maior parte dos assentamentos, não
demorou mais que 15 dias.
Com relação à LOC, percebe-se que 48 (quarenta e oito)
assentamentos rurais estão pleiteando sua concessão. Tendo em vista as
diretrizes da DN 44, de 2000, e da DN 74, de 2004, infere-se que a LOC, até a
promulgação da DN 74, independia do número de famílias, porque todos os
projetos de assentamentos rurais já implantados ou em fase de implantação
antes da vigência da DN 44 deveriam se submeter a esse tipo de
licenciamento. Com a promulgação da DN 74, em 2004, os projetos de
assentamentos rurais iniciados e que possuíam entre 25 (vinte e cinco) e 49
(quarenta e nove) famílias puderam requerer a AAF, que a DN 74, ao
contrário da DN 44, previa a possibilidade da AAF para os PAs que tivessem
menos de 50 (cinqüenta) famílias. Dentre estes 48 (quarenta e oito)
assentamentos, nota-se que 9 (nove) deles são compostos de menos de 50
(cinqüenta) famílias, mas todos já efetuaram alguma das fases de requerimento
da LOC no IEF antes da vigência da DN 74, portanto, acredita-se que estes,
tão logo pratiquem outro ato no IEF, serão migrados para a AAF, que esta
tem requisito objetivo para a sua concessão: número de famílias. Estas
considerações são inferências que partiram da análise das DNs do COPAM
sobre reforma agrária e também da tabela fornecida pelo IEF, que já fez a
migração de 40 PAs que anteriormente haviam requerido a LOC para a
concessão da AAF.
Dentre os 6 (seis) PAs que requereram a LP, nota-se que em 5 (cinco)
deles a licença foi concedida; dentre estes, 2 (dois) assentamentos se
apresentam com menos de 50 (cinqüenta) famílias, mesma situação
comentada anteriormente, que, imagina-se, deverá ser alterada para a AAF
quando os PAs tiverem que requerer a LIO, relembrando que o prazo de
validade da concessão da LP é de 2 (dois) anos. Ainda sobre os casos de
requerimento da LP, percebe-se aceleração no procedimento de concessão,
principalmente após março de 2004; isso significa dizer que, se antes o
procedimento perdurava mais de dois anos, a partir da DN 74 de 2004 ele se
prolongou por menos de seis meses.
98
Também deve ser mencionado que, dos 16 (dezesseis) assentamentos
que requereram a LI, 6 (seis) deles já obtiveram a licença entre os meses de
maio e setembro de 2004. Havia ainda 9 (nove) assentamentos em que os
estudos do PBA se encontravam em elaboração, dentre os quais 6 (seis)
possuem menos de 50 (cinqüenta) famílias, devendo se adequar à DN 74.
Nota-se também que existem 10 (dez) assentamentos rurais
consolidados, que foram criados durante a década de 1980, nos quais o INCRA
já aplicou todos os recursos que lhe foram destinados, tendo investido em infra-
estrutura, cessando, dessa maneira, suas obrigações junto a esses
assentamentos rurais.
Para sistematizar as fases do licenciamento ambiental tendo como
referência o número de famílias dos assentamentos rurais, tem-se o gráfico a
seguir (Gráfico 2).
25
25
26
49
50
49
50
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Número de
famílias nos
PAs
LAS LOC LP AAF LP AAF LP
DN 44 (2000) DN
74(2004)
DN 88
(2005)
Tipos de licenças
Fonte: IEF, maio de 2005.
Gráfico 2 Licenças ambientais e número de famílias nos assentamentos
rurais.
99
O Gráfico 2 demonstra que o tipo de licença ambiental a ser requerida
guarda relação com o número de famílias presentes nos assentamentos rurais,
e essa relação pode ser esclarecida quando se tomam por referência as
determinações das DNs 44 e 74, referentes à reforma agrária em Minas Gerais.
Tomando por marco o ano de 2000, época em que entrou em vigor a
DN 44, nota-se que os assentamentos rurais com menos de 25 (vinte e cinco)
famílias deveriam se submeter à LAS. No caso dos PAs com 25 (vinte e cinco)
ou mais famílias, estes deveriam requerer a LP e as outras licenças
sucessivamente (LI e LO). Há, entretanto, uma exceção, que diz respeito aos
assentamentos criados antes da vigência da DN 44, os quais deveriam se
submeter à LOC, necessariamente, em função das disposições da legislação
analisada.
Esse panorama perdurou até a vigência da DN 74, de 2004, ocasião
em que surgiu a possibilidade de a AAF, cujo requisito objetivo é o PA, ser
composta por até 49 (quarenta e nove) famílias. Nos casos em que os
assentamentos são formados por 50 (cinqüenta) ou mais famílias, eles
deveriam requerer a LP, LI e LO, seqüencialmente.
A promulgação da DN 88, de dezembro de 2005, não alterou as
diretrizes que relacionaram o número de famílias nos projetos de
assentamentos rurais às licenças ambientais, de forma que o número de
famílias da DN 74 continuou sendo critério para a AAF; quanto às demais
licenças, podem ser repetidas as considerações anteriores quanto à sua ordem
de pedido, devendo ser destacado que a DN 88 modificou o nome da LI para
LIO, e da LO para LOC. O critério para o requerimento da LOC é o mesmo
estipulado na DN 44, ou seja, que os assentamentos rurais tenham sido
criados antes da promulgação da DN 44, porém que ainda não estejam
emancipados.
Uma licença em especial merece que sejam feitos maiores comentários
a seu respeito, pois ela é a que demanda, até a data atual, maior lapso de
tempo e apresenta grande número de condicionantes; assim, ela se
representada pelo Gráfico 3, que estabelece a relação entre o requerimento da
LOC e as fases de cada condicionante.
100
10
10
2
10
8
2
6
Protocolo Retorno para ajustes dos estudos Consolidado
Aguarda protocolo PFA não contratado PFA em execão INCRA
PFA sendo analisado
Fonte: IEF, maio de 2005.
Gráfico 3 Licença de Operação Corretiva e fase do procedimento para sua
concessão – maio de 2005.
A primeira observação quanto ao Gráfico 3 é que a LOC foi
mencionada pela DN 44 e hoje, após a entrada em vigor da DN 88, permanece
com a mesma nomenclatura e abarca as mesmas situações estabelecidas pela
norma anterior, que diz respeito à criação do assentamento rural antes da
entrada em vigor da DN 44, ou seja, 25 de novembro de 2000. Deve também
ser esclarecido que o gráfico esboçado se refere a 48 (quarenta e oito)
assentamentos rurais, que correspondem a 29% (vinte e nove por cento) dos
PAs do INCRA existentes no Estado mineiro.
Como dito anteriormente, a LOC tem por objetivo regularizar a
situação dos projetos de assentamentos rurais criados antes de novembro de
2000, de forma que estes, por determinação legal, ficaram dispensados da LP
e da LIO, devendo se submeter apenas à LOC. Para a concessão desta licença
deverá ser encaminhado junto com o requerimento de pedido o estudo do PFA,
que relatará a localização e dados gerais sobre o assentamento rural, a
situação do passivo ambiental, a apresentação de medidas corretivas e o termo
de compromisso dos assentados, todos expressos no anexo IV da DN 88.
101
Analisando a tabela que expressa os dados relativos à LOC, percebe-
se que esta é a modalidade de licenças com maior número, proporcionalmente,
de obstáculos, sendo certo que os principais entraves à concessão da LOC,
relatados pelas entrevistas aplicadas aos representantes do INCRA e do IEF e
explicitados na tabela fornecida pelo IEF, são: a falta do protocolo pelo INCRA;
a elaboração
29
e adequação do PFA (Plano Final do Assentamento); a
contratação do PFA; e o retorno dos estudos (PFA) para ajustes.
Com relação aos estudos necessários à elaboração do PFA, é preciso
relatar que as universidades, que firmaram convênios com o INCRA/SR06 para
elaborar tais estudos, encontraram grande dificuldade nesta tarefa, porque não
havia no ano de 2001 critérios precisos para os estudos exigidos pelo órgão
ambiental; por isso, tais estudos retornavam às universidades, para que estas
fizessem as adequações exigidas pelo IEF. Novamente se deve ressaltar que
as Universidades não tinham uma recomendação precisa dos requisitos do
PFA, vez que o IEF/COPAM não estabeleceu um roteiro claro sobre ele. Assim,
somente após o retorno de alguns PFAs é que as instituições contratadas
passaram a conhecer o posicionamento do órgão ambiental sobre o estudo
necessário, e, como conseqüência, os PFAs começaram a se adequar às
exigências do IEF.
Nessa fase do procedimento ambiental, percebe-se que um dos
principais condicionantes é a falta de recursos financeiros por parte do INCRA,
o que se traduz em 18 (dezoito) assentamentos aguardando o protocolo ou a
contratação do PFA. Esse número, considerando os 48 (quarenta e oito) PAs
nesta mesma fase de licença, corresponde a 37% (trinta e sete por cento)
número considerável. A entrevista aplicada ao INCRA/SR06 confirma que
falta de recursos para os estudos ambientais, e esse quadro se agrava porque,
para que as licenças possam ser analisadas pelo IEF/COPAM, junto com o
requerimento de pedido de concessão das licenças, o INCRA deve apresentar
o pagamento de uma taxa pública, sendo tal pagamento requisito para o
protocolo e a posterior concessão da licença. O que se notou nos dados
29
Em função da falta de capacidade operacional para a execução dos estudos exigidos para o
licenciamento ambiental, o INCRA/SR06 convidou, a partir do maio de 2001, as Universidades do
Estado para que elaborassem os referidos estudos. Nessa convocação, mostraram interesse a UFV
(Universidade Federal de Viçosa), a UFU (Universidade Federal de Uberlândia), a UNIMONTES
(Universidade Estadual de Montes Claros) e a UFMG (Universidade Federal de Minas Geais), por meio
do NCA (Núcleo de Ciências Agrárias).
102
apresentados foi que tanto os PAs que aguardavam protocolo quanto aqueles
que não têm seu PFA contratado estavam nessa situação de inércia perante o
licenciamento ambiental por falta de disponibilidade financeira do INCRA/SR06.
6.3. As representações coletadas nas entrevistas
Antes de adentrar nas representações sociais sobre o procedimento de
licenciamento ambiental dos projetos de assentamentos rurais de Minas
Gerais, manifestadas pelos entrevistados das instituições pesquisadas, é
preciso alertar que essas informações foram retiradas dos discursos dos
agentes das instituições, por meio da análise das entrevistas semi-estruturadas
que foram aplicadas durante os meses de abril e maio de 2005.
Durante as entrevistas ficou clara a posição de cada instituição diante
da necessidade de licenciamento ambiental para os projetos de assentamento
rural, não escapando algumas contradições observadas no discurso dos
entrevistados, perceptíveis quando contrastados uns com os outros.
Para melhor compreensão do trabalho, cada instituição foi analisada
separadamente em dois momentos: o primeiro quando foi feita uma análise do
memorial das discussões para confecção da DN 44, em outubro de 1999, e o
segundo, que se segue, diz respeito às entrevistas aplicadas em maio de 2005.
Após ambos os momentos, as representações serão comparadas para se
inferir algumas conclusões acerca do imaginário das instituições que fazem
parte do procedimento de licenciamento ambiental dos PAs e dos problemas
que a reforma agrária vem enfrentando neste Estado.
6.3.1. O INCRA/SR06
A primeira percepção sobre o INCRA/SR06, visível, foi o grande
volume de trabalho da instituição, que pôde ser observado tendo em vista a
quantidade de PAs do Estado, contrastado com o baixo número de
funcionários: apenas quatro servidores do INCRA fazem parte da GEMAD,
embora o volume de trabalhos seja grande, uma vez que essa gerência é
responsável pelo licenciamento ambiental de todos os assentamentos sob
jurisdição da SR 06, além de cuidar, também, do programa de ATES e dos
103
RVAs realizados em áreas em processo de desapropriação ou aquisição pelo
órgão.
quando da entrevista, o discurso do agente da instituição, de forma
geral, é muito claro e objetivo, transmitindo sempre a opinião de que o
procedimento de licenciamento ambiental nos PAs não está adequado à
demanda social pela reforma agrária e que o INCRA não possui número
suficiente de funcionários para o volume de procedimentos em andamento na
instituição.
Também foi ressaltada a inadequação do procedimento de
licenciamento ambiental para a reforma agrária, uma vez que, segundo o
entrevistado, as licenças necessárias para a operacionalização e criação dos
PAs são as mesmas requeridas para outras atividades produtivas que exercem
efetivamente um potencial poluidor mais significativo, como, por exemplo, as
hidrelétricas. Como a legislação é semelhante quanto ao tipo das licenças,
ainda que uma seja da competência do IEF/COPAM e a outra da
FEAM/COPAM, os órgãos responsáveis pela concessão das licenças aplicam a
lei sem considerar as particularidades de um projeto de assentamento rural,
que, na visão do INCRA, exerce um potencial poluidor mínimo.
Outro problema apontado, reiteradamente, é a falta de recursos
financeiros para o procedimento de licenciamento ambiental, que é arcado pelo
INCRA, visto ser esta instituição a empreendedora da reforma agrária do país.
Assim, todas as taxas referentes às licenças ambientais são pagas pela
instituição, não tendo ficado claro se esta recebe ou não dotação orçamentária
para essa finalidade.
O entrevistado ressaltou que para cada pedido de licença deve ser
paga uma taxa e que, se faltam recursos, o INCRA não pode protocolar os
pedidos de licença no IEF. Também atrelada à questão financeira vem uma
nova realidade que, na percepção do INCRA, impede o prosseguimento do
licenciamento ambiental: as autuações que o IEF aplica ao INCRA.
Um exemplo da autuação do INCRA acontece quando os assentados
antes da obtenção das licenças e do parcelamento do solo
30
, na fase do
acampamento, não se abstêm de praticar atos por eles considerados naturais,
30
A DN 44 impõe que apenas após a LI o solo poderá ser parcelado e, então, os assentados poderão
labutar a terra, situação que foi modificada pela DN 88.
104
como o corte de madeira. Contudo, o INCRA, ao ser integrado na posse da
terra, assina junto ao IEF um termo de compromisso, afirmando que respeitará
a legislação ambiental do país, postura esta poucas vezes acatada pelos
assentados, como dito anteriormente; esse contexto acaba desembocando na
autuação do INCRA pelo IEF, o que impede que ele consiga a concessão das
licenças ambientais. Esse impedimento se deve ao fato de que um dos
requisitos para a concessão das licenças é uma certidão negativa de débitos
fornecida pelo IEF; havendo multa, não é possível a concessão de nenhuma
licença, mesmo que para assentamento diferente do que causou o
desacatamento à lei ambiental, porque todos eles têm o mesmo
empreendedor, que é o INCRA.
Foi mencionado também que o IEF/COPAM, quando da análise dos
documentos necessários ao pedido das licenças, pode entender necessárias
algumas condicionantes a serem realizadas pelo INCRA, fixando prazo certo
para o cumprimento delas. Entretanto, o INCRA, por ser uma autarquia federal,
se vincula ao direito administrativo, e não pode burlar as normas públicas para
cumprir uma determinação do IEF. Assim, se a condicionante estiver
relacionada à contratação de pessoal para estudos ambientais ou outra
dimensão que envolva contratação de pessoal ou compra de material, o INCRA
deve se submeter às normas pertinentes, o que requer prazo, às vezes maior
do que o estabelecido pelo IEF. Com relação aos prazos, várias considerações
devem ser feitas sobre o procedimento do licenciamento:
a) O órgão responsável pela execução da política de reforma agrária do país é
o INCRA; isso implica que, uma vez desapropriadas as terras, elas passam
ao domínio do Estado, ficando sua titularidade transferida ao INCRA.
b) Como o INCRA é o proprietário da terra, todos os requisitos ambientais
devem ser cumpridos por esta instituição, desde o pedido das licenças
ambientais, passando pelo pagamento correspondente das taxas, bem
como pelo compromisso firmado entre ele, INCRA, e o IEF, que determina
seja respeitada toda a legislação ambiental. Nesse instante se funda um
problema: os assentados estão nas terras de forma não definitiva
(acampados), ocupando-as, e, por isso, algumas vezes agem em
desconformidade com o estipulado na legislação ambiental, o que dá ensejo
à autuação no INCRA.
105
c) Outras vezes, muito embora os estudos ambientais necessários a cada
licença estejam prontos e pagos, acontece a falta de recursos para o
protocolo do pedido de licença; assim, o processo se mantém inerte até que
a verba para o pagamento das taxas se regularize.
d) Questão importante é que, para que o requerimento das licenças possa
prosperar, é necessário que junto com o pedido sejam encaminhados
alguns documentos, como os estudos ambientais necessários, e também a
certidão negativa retirada no próprio IEF. Entretanto, uma vez que o INCRA
esteja autuado, esta certidão somente é conseguida após o pagamento da
multa estipulada pelo IEF, o que novamente paralisa o procedimento.
Com relação à desapropriação das terras a serem utilizadas pelo
INCRA para a reforma agrária, o entrevistado relatou que tais áreas encontram
um passivo ambiental pequeno, porque no laudo agronômico de vistoria,
realizado por profissional do INCRA antes da desapropriação, que mostra as
situações inadequadas à reforma agrária, observa-se que estão sendo
desapropriadas apenas terras em que a configuração de recursos naturais
que podem levar à produtividade efetiva ou potencialmente. Também relatou
que, na maior parte dos casos em que o INCRA faz a vistoria, as terras não
são desapropriadas, por não se mostrarem propícias à implantação dos
assentamentos rurais.
De forma geral, o representante do INCRA informou a disposição da
instituição em cumprir com sua função de trabalhar em prol da reforma agrária
do país, acreditando que o licenciamento ambiental é importante para o
contexto da reforma agrária. No entanto, argumentou que o licenciamento
ambiental deveria ser adequado à reforma agrária, e não uma mera
transposição de um instituto jurídico que tem sua origem em atividades
realmente poluidoras para um contexto diferenciado, como é a reforma agrária
do país. Outro fato bastante debatido foi a insuficiência de dotações
orçamentárias e de pessoal para conseguir dar maior agilidade e efetividade ao
procedimento de criação e operacionalização dos assentamentos rurais do
Estado de Minas Gerais. Afirmou, ainda, que o Estado criou muitas restrições à
atividade agrária, de forma que os órgãos públicos acabaram se tornando
deficientes no atendimento dessas exigências, e, no caso do INCRA/SR06,
este acaba, devido à obrigatoriedade do licenciamento ambiental e sua falta de
106
indumentária para o cumprimento dos requisitos impostos pela norma jurídica,
sendo reiteradamente autuado. Assim, de acordo com a perspectiva expressa
pelo entrevistado, parece que o objetivo da legislação ambiental volta-se mais
para a arrecadação de recurso do que para o desenvolvimento da sociedade.
O entrevistado que representou o INCRA/SR06 mostrou que bom
relacionamento com as demais instituições envolvidas no procedimento de
licenciamento ambiental dos PAs, apesar das dificuldades existentes na
implementação deste procedimento, ressaltando que falta de adequação da
própria legislação ambiental. Nesse sentido, assevera que o IEF, ao autuá-los,
está apenas cumprindo sua função institucional e que, se não o fizer, o
Ministério Público Federal poderá cobrar daquela instituição informações
quanto ao licenciamento ambiental do Estado.
6.3.2. O IEF – Instituto Estadual de Florestas
O IEF/COPAM é o órgão que analisa os pedidos e defere as
concessões de licenças ambientais relativas aos assentamentos de reforma
agrária do Estado de Minas Gerais, fiscalizando tais empreendimentos logo
após a concessão das licenças. O IEF, como órgão seccional, que suporte
técnico e jurídico ao COPAM, está vinculado à CAP (Câmara de Atividades
Agrossilvopastoris), que se encarrega dos assuntos que dizem respeito às
atividades florestais, agrícolas e pecuárias. A instituição, quando da entrevista,
foi representada por um engenheiro florestal, encarregado também da
Coordenadoria Especializada de Apoio às Câmaras Técnicas do COPAM.
O entrevistado afirmou que o problema relativo ao licenciamento
ambiental nos assentamentos rurais, na verdade, não pode ser encarado como
um problema, e sim como uma exigência da legislação ambiental, que ocorre
não exclusivamente com os projetos de assentamento rural, mas com todas as
atividades que potencial ou efetivamente causem poluição, e que o papel do
IEF, nesse contexto, é o de fiscalizar o cumprimento das exigências
ambientais, tanto para conceder as licenças quanto após a concessão, para
que o meio ambiente seja resguardado de atuações desregradas. Com essas
afirmações, o representante do IEF tentou transmitir a isenção da instituição
em relação ao procedimento investigado, postura que apenas reflete o
107
posicionamento do IEF frente ao licenciamento ambiental, de forma genérica,
demonstrando a preocupação com o bom cumprimento da função pública que
é de sua competência.
Nesse sentido, afirmou que após a DN 74, de 2004, os projetos de
assentamento rural com até 49 famílias não precisam mais de licenças, mas
tão-somente da autorização para funcionamento, e que esta é concedida com
no máximo 10 dias, bastando ao INCRA que assine o termo de compromisso
ambiental, colocando a questão de uma forma sobremaneira simplista, o que
não corresponde exatamente à impressão geral do sistema, principalmente à
do INCRA.
Segundo o entrevistado do IEF, para a instituição o fato de o INCRA
ser o requerente das licenças ambientais é indiferente, ou seja, para qualquer
pessoa o tratamento dispensado é o mesmo, porque a função do IEF é tão-
somente a de cumprir as formalidades e requisitos da lei. Por esta última
colocação se percebe uma grande distância entre o discurso do INCRA e o
do IEF, visto que, enquanto o INCRA busca um tratamento diferenciado, em
razão da peculiaridade dos projetos de assentamentos rurais e da função social
implícita nas ações que envolvem a reforma agrária, o IEF, a seu turno,
desconsidera esse discurso, acreditando que apenas deve se limitar à
aplicação da legislação ambiental pertinente, independentemente de outras
questões, que não cabem ser discutidas por ele. É como se o IEF estivesse
afirmando uma total isenção de valores, de forma que, se as reivindicações do
INCRA passassem a ser positivadas pelas Deliberações do COPAM, o IEF
passaria a acatá-las sem quaisquer restrições, numa versão legalista das
funções administrativas da competência da instituição, sem espaços para
colocações subjetivas, sejam de qual natureza for.
O entrevistado relata que o grande entrave ao licenciamento dos PAs
acontece dentro do próprio INCRA, uma vez que nos casos em que falta algum
documento para as licenças (estudos ambientais, marcações de terras, por
exemplo) o INCRA extrapola os prazos para juntá-los, o que acarreta a
extensão do prazo despendido no procedimento. Corroborando o
posicionamento do IEF, ele cita como exemplo o caso das condicionantes
31
,
31
Com a palavra condicionantes o IEF quer dizer todo e qualquer requisito que condicione a concessão
da licença ambiental, desde um estudo que não tenha sido feito adequadamente a um documento que
tenha faltado, ou outro fator qualquer que impeça a concessão das licenças.
108
que não são cumpridas pelo INCRA no prazo legal; então, por
descumprimento, o INCRA é autuado. Essas autuações tanto podem vir tanto
na forma de multas quanto na de advertências.
Outra observação atine à comunicação entre os órgãos. O IEF afirma
que o INCRA por vezes não responde aos ofícios enviados pelo IEF, que
pedem explicações sobre determinada situação referente a um pedido de
licença. Devido à inércia do INCRA, este mais uma vez é autuado,
demonstrando que não uma comunicação eficiente entre as instituições,
pelo menos no que se refere às comunicações formais, consubstanciadas por
ofícios e documentos oficiais. Contudo, no geral, o entrevistado assegura que
não são tantas as autuações, advertindo que elas poderiam ser reduzidas se o
INCRA respondesse aos questionamentos do IEF, ou seja, a causa das
autuações é atribuída exclusivamente à conduta ou falta de atividade do
INCRA.
Perguntado sobre o papel da instituição no processo de licenciamento,
o entrevistado deixou claro que o IEF apenas deseja dar cumprimento à lei e
que, caso não desempenhe seu papel, o Ministério Público Federal pode abrir
procedimento administrativo com o intuito de averiguar o desempenho das
funções da instituição. Também ressaltou que o IEF não é mais exigente com a
reforma agrária do que é com qualquer outra atividade e que o fato de, por
exemplo, um sítio ao lado do PA não se submeter à mesma norma ambiental
se deve ao tamanho da propriedade e do potencial poluidor como um todo. Um
PA é visto como a propriedade total na qual se implantarão (ou está sendo
implantada) os assentamentos, e, enquanto a propriedade não for dividida e
emancipada do INCRA, sua poluição é verificada tanto pelo tamanho da área
quanto pelo número de famílias a serem assentadas, que é completamente
diferente de um sitiante de área confrontante com o PA; por isso, não se pode
tratar situações diferentes como se iguais fossem um raciocínio, a princípio
muito lógico. Aqui, o risco que se corre é de o licenciamento ambiental estar
servindo para licenciar o tamanho da propriedade e não as atividades a serem
desenvolvidas na propriedade; contudo, revendo os requisitos do licenciamento
ambiental, explícitos principalmente nos anexos das Deliberações do COPAM,
nota-se que nos estudos de impactos ambientais, necessários, principalmente,
para autorizar a divisão dos lotes e as atividades a serem implantadas, o IEF
109
considera o número de famílias e as condições próprias do local, ou seja,
analisa as atividades a serem desenvolvidas e não somente o tamanho da
propriedade.
Por fim, o entrevistado asseverou que um dos grandes problemas do
INCRA é que ele recebe, no geral, áreas bastante degradadas e que os
assentados, assim que chegam, acabam degradando mais, sem se importar
com qualquer norma ambiental mais uma das razões de o INCRA receber
autuações. Nesse ponto, é preciso advertir que discordância do
INCRA/SR06, que afirmou que as terras desapropriadas não são marcadas por
grande passivo ambiental, uma vez que o laudo de vistoria agronômico não
permite tal situação.
6.3.3. O MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra
A primeira observação a ser feita é que a entrevistada que representou
o MST é uma bióloga que faz parte da AESCA (Associação Estadual de
Cooperação Agrícola) e também da ATES (Assessoria Técnica Social e
Ambiental da Reforma Agrária), estando engajada ideologicamente com a
militância do MST.
Sob a perspectiva da entrevistada, os assentados sofrem muitos
reveses com a forma como são concebidos os assentamentos rurais de
reforma agrária, e agora ainda mais, com o licenciamento ambiental necessário
neste Estado. Duas questões foram bastante debatidas: o tempo em que os
assentados ficam sob a lona esperando o parcelamento da terra; e a
degradação ambiental da propriedade destinada à reforma agrária.
Para a representante do movimento, concordando com o afirmado pelo
técnico do IEF/COPAM, e ao contrário do relatado pelo INCRA/SR06, os locais
desapropriados para a reforma agrária já vêm com grande passivo ambiental, o
que gera problemas na operacionalização dos projetos de assentamento rural.
Tal afirmação, segundo a entrevistada, deriva da realidade por ela constatada
quando da elaboração dos estudos que faz através da ATES aos assentados.
A bióloga relatou que o MST, para tentar aproximar os projetos de
assentamento rural à demanda de seus componentes, acredita que uma boa
alternativa seja a assessoria técnica (ATES) composta por militantes, porque
110
isso proporciona que o contorno do assentamento seja feito com o “o olhar do
movimento”, ganhando mais legitimidade.
Afirma também que o MST orienta os assentados a não alterarem as
condições da terra enquanto estiverem na condição de acampados, mas, ainda
assim, eles plantam nos lugares que haviam sido devastados, como em
áreas de pastagem, ou em lugares em que anteriormente havia plantações;
ao redor do acampamento, fazem o que é necessário para se manterem, até
que aconteça a divisão dos lotes (parcelamento). Isso porque para um
assentado é muito difícil compreender as determinações da norma ambiental,
mais ainda é conceber que em uma área de pastagem degradada não se
possa plantar alguma roça que servir para a sobrevivência do grupo,
enquanto não ocorre o parcelamento do solo. Ou seja, ainda que se considere
que os assentados conheçam o conteúdo das normas ambientais que proíbem
a utilização do solo sem a autorização do IEF
32
, eles não conseguem
internalizar o seu conteúdo proibitivo e, por isso, não se importam em agir em
desconformidade com os ditames legais, mesmo que decorra de tal atitude
uma sanção legal, até porque a sanção referida, como exemplo uma autuação
ao INCRA, não é sentida diretamente pelos assentados, uma vez que quem
paga o valor das multas é o INCRA, muito embora indiretamente essa situação
se reflita nos assentados, visto que as autuações atrasam o procedimento de
licenciamento como um todo.
Relatou que durante longo período os assentados ficam sob lona, o
que torna a vida dessas pessoas muito precária; por isso, elas não entendem
algumas determinações, como não poder cortar uma árvore para pegar a
lenha, ou não poder plantar uma roça para comer. caso de acampados que
ficaram mais de sete anos vivendo sob a lona, o que não é raridade.
Afirmou que o tempo médio para a obtenção da LI demora mais de um
ano após a LP, e sem a LI não acontece o parcelamento do solo, que por sua
vez impede a concessão de recursos do governo, numa visão panorâmica
muito simplista do procedimento, sem atribuir considerações específicas para
os requisitos de cada fase do licenciamento, ou qualquer informação adicional
ao procedimento.
32
Esta autorização pode ser conferida via APEF, nas situações estipuladas pela DN 88, e que foram
discutidas anteriormente. Para maiores esclarecimentos, consultar art. 8.° da referida norma.
111
Continuou sua fala asseverando que os assentados entendem que
devem preservar a natureza, porém as condições de vida em que se
encontram nem sempre permitem a isenção de atos por ele considerados
necessários à sua sobrevivência. Também compreendem que isso é uma
questão de “lei” e que não podem interferir diretamente nesse assunto.
Com as considerações feitas pela entrevistada quanto à liberação dos
créditos voltados para a reforma agrária, é importante esclarecer que o
licenciamento, segundo seus requisitos, estabelece que sem a concessão da
LI
33
não a possibilidade de parcelamento do solo, e que este parcelamento,
por sua vez, impede a liberação e utilização do crédito para habitação, bem
como a liberação e utilização do crédito de investimento, relacionado com a
produção.
Em relação ao discurso da representante do MST, nota-se que ele se
desviou do licenciamento ambiental para se focar nas dificuldades da luta pela
reforma agrária, pela qual passam os assentados, desviando as respostas das
questões ambientais, tema central das perguntas feitas. Esse posicionamento é
um indício de que, ideologicamente, o MST utiliza como fonte de seu discurso a
figura do homem, com todas as suas necessidades humanas, inclusive a
dignidade, e que o movimento talvez ainda não tenha assimilado as questões
ambientais em seu discurso de luta pela terra, tanto é que não foram
apresentadas informações substanciais que travassem um sério embate entre
o meio ambiente e a reforma agrária, tampouco que associasse as duas
realidades de forma positiva. Simplesmente ainda não há resposta.
33
É preciso esclarecer que a LI era requisito para o parcelamento do solo na DN 44 e que, com a
promulgação da DN 88, o requisito para o parcelamento é a LP. Entretanto, ainda não informações
de como a DN 88 está sendo aplicada com relação à liberação dos créditos destinados à reforma
agrária em Minas Gerais.
112
6.3.4. A FETAEMG Federação dos Trabalhadores Rurais do Estado de
Minas Gerais
A FETAEMG foi criada em 1969 e conta atualmente com
aproximadamente 482 (quatrocentos e oitenta e dois) sindicatos filiados.
Durante a aplicação da entrevista foi representante da instituição um
economista, assessor da reforma agrária, que representa a Federação junto à
CAP e ao plenário do COPAM.
Com relação à reforma agrária do Estado, o entrevistado relatou que
acredita existir aproximadamente 186 (cento e oitenta e seis) projetos de
assentamento implantados, os quais correspondem a cerca de um por cento da
terra agricultável de Minas Gerais, conferindo à reforma agrária um caráter
pontual, não alterando a estrutura do Estado. Segundo ele, a FETAEMG
acompanha cerca de 90 (noventa) desses assentamentos.
O preposto da FETAEMG, quando argüido sobre a relação entre
reforma agrária e licenciamento ambiental, demonstrou uma postura muito
positiva quanto ao procedimento de reforma agrária no país: acredita ser
indispensável a adequação ao licenciamento ambiental, por uma questão
simples a lei do mercado. E esse posicionamento, frise-se, não foi
mencionado por nenhuma, outra instituição entrevistada.
Explicando esse posicionamento, o preposto da instituição afirmou que
o mercado tem regras próprias quanto à produção, entre elas, com destaque, a
proteção ao meio ambiente, que pode ser facilmente constatada nos requisitos
para as importações e exportações. A reforma agrária, fazendo parte do
mercado, não poderia se eximir de participar e se adequar a esses requisitos.
Continuou seu discurso afirmando que a questão ambiental é uma parte do
processo, e não o processo em si, portanto não poderia ser a responsável pelo
fracasso do sistema. Ainda, ressalta duas questões importantes quanto ao
licenciamento ambiental nos projetos de assentamento rural: uma referente ao
mercado e às suas exigências (estando adequada ao mercado, os produtos
cuja origem seja dos assentamentos rurais seriam mais facilmente integrados
ao mercado) outra de consciência (a partir do momento em que as pessoas
tiverem consciência da necessidade de preservação, sua atitude independeria
do licenciamento). Nesse sentido, afirmou que o licenciamento ambiental
113
trouxe conseqüências positivas para os assentamentos rurais, que estão
relacionadas com o respeito ao meio ambiente, à consciência ambiental, à
cidadania e à economia do assentamento.
Assim, foi reforçado que, da perspectiva da FETAEMG, não que se
falar em licenças ambientais como óbice à consecução da reforma agrária em
Minas Gerais; se se buscasse um agente responsável pela demora e demais
transtornos à reforma agrária, ele imputaria ao próprio governo, através do
procedimento de arrecadação das terras, considerado pela instituição como
lento. Sobre esse assunto, inclusive, afirmou que grande parte das terras
desapropriadas advém de antigos latifúndios, trazendo consigo grande
degradação ambiental, sendo necessário que se faça um trabalho ambiental no
sentido de recuperar tais terras, para que estas produzam. Aqui, mais uma vez,
deve ser mencionado que, com relação à degradação ambiental, apenas o
representante do INCRA/SR06 afirmou que as terras destinadas à reforma
agrária não são degradadas; as demais instituições vão no sentido do grande
passivo ambiental que marca as áreas onde serão implantados os
assentamentos rurais.
Afirmou também que os assentados recebem um programa de
segurança alimentar durante a fase em que estão acampados; que uma das
grandes responsáveis pela demora da concessão das licenças ambientais
seriam as universidades, as quais sempre extrapolam os prazos para os
estudos necessários às licenças, principalmente Lavras
34
e Viçosa; que nos
projetos de assentamento com menos de 49 famílias não mais a
necessidade da licença, e sim de uma autorização do IEF no caso, se
referindo à AAF.
Por fim, afirmou que os principais problemas relacionados à
exigibilidade do licenciamento para os PAs seriam resolvidos com a
promulgação da DN 88 e que tais assuntos haviam sido discutidos no grupo
de trabalho criado para tal finalidade, do qual o entrevistado fez parte. Assim,
relatou que o prazo para concessão das licenças havia sido fixado em 180
(cento e oitenta) dias, independentemente do tipo de licença, contados do
34
É preciso esclarecer que Lavras não elabora os estudos ambientais necessários ao processo de
licenciamento ambiental e que, revisando as anotações feitas durante a entrevista, foi confirmado que o
entrevistado realmente mencionou tal nome. Na verdade, no lugar de Lavras deveria ter sido
mencionada a UFU, de Uberlândia.
114
protocolo do pedido; que os PAs poderiam ser parcelados com a concessão da
LP, diferentemente do que dispunha a DN 44; e que o INCRA/SR06 participou
de toda a discussão e aceitou todos os critérios e prazos estipulados para as
licenças ambientais.
Analisando as informações obtidas por meio do entrevistado, percebe-
se que, assim como fez o MST, a FETAEMG desviou o foco das perguntas e
se concentrou na “lei do mercado”, pelo entrevistado considerado o cerne de
toda a questão produtiva, não dos assentamentos rurais como de toda a
atividade do país, inclusive importação e exportação. Também deve ser
relatado que em determinado momento da entrevistada, quando questionado
sobre sua opinião a respeito do aumento de tempo gasto para que os
assentados pudessem trabalhar na terra e sobre os desgastes sociais que
evidenciaram com o procedimento do licenciamento ambiental, o entrevistado
respondeu de forma firme que não respondia questões em tese, apenas casos
concretos, fechando de maneira brusca quaisquer possibilidades de
questionamentos abstratos sobre os desgastes apresentados nos
assentamentos rurais e retornando aos efeitos positivos da proteção ao meio
ambiente.
6.4. Análise dos dados coletados na pesquisa
Diante dos dados colhidos, ou seja, da análise das representações
oriundas da reunião do dia 22 de outubro de 1999, das entrevistas aplicadas
durante os meses de maio e junho no INCRA, IEF, FETAEMG e MST e das
tabelas fornecidas pelo INCRA e IEF a respeito da situação dos assentamentos
rurais em relação ao procedimento de licenciamento ambiental, é necessário
tecer algumas considerações. A primeira delas diz respeito às representações,
devendo estar claro que durante a exposição dos discursos tentou-se guardar
fidelidade a algumas palavras ou expressões utilizadas pelos agentes das
instituições, com o objetivo de que o discurso permanecesse o mais fidedigno
possível.
Ainda quanto às representações, nota-se que, confirmando a parte
teórica trabalhada, elas se apresentaram marcadas pela ideologia da
instituição (manifestado através da pessoa entrevistada) com relação ao
115
procedimento de licenciamento ambiental para reforma agrária em Minas
Gerais.
Nesse sentido, percebeu-se que o IEF, tanto na entrevista aplicada em
maio de 2005 quanto em seu posicionamento na reunião de 22 de outubro de
1999, tem uma preocupação com o aspecto pragmático do procedimento, ou
seja, se preocupa com as determinações da legislação e a forma de possibilitar
seu cumprimento. Nesse sentido, percebe-se que a colocação feita pelo
representante da instituição a respeito do parcelamento do solo, na reunião de
1999, é tão pertinente e atual que foi uma das modificações trazidas pela DN
88, e ela reflete exatamente a política do IEF/COPAM, de fazer cumprir as
normas legais. Também pode ser verificado que todas as observações desta
instituição se voltam ou para as licenças ambientais de forma específica ou
para o processo de licenciamento, que esta é a atividade precípua do órgão.
Assim, com relação à reforma agrária, e principalmente, ao posicionamento do
INCRA, que defende a peculiaridade das atividades dos assentamentos rurais,
ou ao resgate social proposto pela FEAM e pelo próprio INCRA, o IEF se
mostrou indiferente, que, na sua concepção, deve tratar todos da mesma
maneira.
Com relação às representações da FEAM, colhidas apenas na
memória da reunião de 22 de outubro de 1999, verifica-se que ela rompeu com
o posicionamento do IEF, embora as duas instituições façam parte do mesmo
órgão, que é a SEMAD, e licenciem atividades em Minas Gerais. A FEAM
demonstrou uma percepção crítica em relação ao contexto geral do
licenciamento ambiental, rebatendo, em primeira instância, a utilização da
Resolução 237 do CONAMA, porque ela, com propriedade, afirma a instituição,
trata de situações completamente diferenciadas, como é o caso de uma
indústria de mineração e dos projetos de assentamentos rurais. Abordou
também a determinação das instituições superiores relacionadas ao
licenciamento, supondo-se que se referiu ao IBAMA ou ao CONAMA, e como
elas preferiam que fossem adotadas as mesmas licenças ambientais (LP,LI e
LO), porque assim o procedimento seria o mesmo situação rebatida pela
instituição. Deve ser frisado que foi justamente essa padronização que levou a
DN 44 a ser revista, porque o procedimento tornou-se marcado por mazelas e
entraves, ou seja, bastante acertadas foram as ponderações da FEAM. Em
116
especial, deve-se mencionar a necessidade de não se reificar o processo,
inspiração que possibilitou o redesenho das licenças através do grupo de
trabalho que criou a DN 88. Também foi mencionada a profissionalização do
licenciamento ambiental, que deixou para trás as características específicas
dos PAs para torná-los um dado numérico que se reflete institucionalmente nos
critérios de eficiência dos trabalhos das instituições, nem sempre
correspondentes às necessidades dos casos concretos.
O MST, tanto no discurso de 1999 quanto na entrevista de 2005,
apregoou uma visão humanista da reforma agrária, afastando-se de afirmações
técnicas em relação ao licenciamento ambiental. Em tal postura, e também no
conteúdo do discurso proferido, é possível notar a ideologia do movimento, que
contesta a forma de apropriação da terra, sem ter inserido no seu campo de
atuação as questões ambientais, ainda que mencione a importância de se
preservar o meio ambiente, mas sem definir como. Ou seja, mesmo que o
movimento reconheça a adequação de a questão ambiental se inserir na
política de acesso à terra, não discursos prontos a esse respeito, como
existe com relação a outros fatores, como globalização, política agrária,
propriedade privada, entre outros. A conseqüência dessa falta de política
definida é que, ao ser abordado sobre o licenciamento ambiental, o MST
apenas menciona a situação das pessoas acampadas, sem, por exemplo,
afirmar a pertinência de cada licença, ou mesmo de determinado estudo
ambiental.
Com relação à FETAEMG a situação se inverte, porque o
representante desta instituição, quando da entrevista em 2005, não quis se
alongar nas questões relativas aos assentados, e sim na visão mercadológica
que envolvia a reforma agrária. Na forma de expressar seu posicionamento, a
instituição foi coerente, desenvolveu as idéias e apresentou argumentos que
defendiam a necessidade do licenciamento ambiental para que os produtos dos
PAs pudessem se agregar ao mercado. Deve ser relembrado, nesse momento,
que o entrevistado da FETAEMG possui assento no COPAM e que isso, de
certa forma, pode ter influenciado na sua forma de perceber a realidade. Assim,
a representação da instituição se mostrou em sintonia com as modificações
que a legislação vinha sofrendo, principalmente porque o entrevistado foi uma
das pessoas que participaram do grupo de trabalho que estava, naquele
117
momento, revendo as disposições da DN 44, razão pela qual todas as
considerações feitas pelo entrevistado puderam ser confirmadas assim que a
DN 88 foi publicada. Outra questão relatada pelo entrevistado, ao ser
questionado sobre o problema ambiental relacionado à reforma agrária, foi que
tal problema se relaciona à forma de arrecadação da terra, no momento da
desapropriação do imóvel, e, por esse motivo antecede o licenciamento, razão
pela qual não pode ser atribuído ao licenciamento ambiental.
O INCRA, a seu turno, também proferiu discurso em que defendeu
como pôde a atuação da instituição perante a reforma agrária do Estado,
porém é importante revelar que foi percebida certa resistência por parte da
instituição no momento de marcar entrevistas e também na prestação de
informações, situação surpreendente, que em matéria de instituições
públicas, estas devem se submeter ao princípio da publicidade (típico do direito
administrativo), o que significa dizer que todos os fatos não-sigilosos da
instituição podem ser vistos e informados a qualquer cidadão. Essa dificuldade
se tornou ainda maior quando foram solicitadas as atas de reunião do grupo de
trabalho criado para modificar a DN 44, visto que, quando foram aplicadas as
entrevistas, a DN 88 ainda estava em fase de discussão por um grupo de
trabalho, do qual o entrevistado fazia parte. Nesse grupo, todas as reuniões
foram transcritas em atas, e estas, quando solicitadas, não foram fornecidas
pelo entrevistado, sendo obtidas junto a um assessor jurídico da SEMAD, e não
do INCRA.
Ainda quanto ao INCRA/SR06, notou-se que foi a única instituição a
revelar que as terras desapropriadas para fins de reforma agrária não
possuíam um passivo ambiental considerável, situação afirmada pelas demais
entrevistadas. As demais informações prestadas pela instituição foram
analisadas nos itens anteriores, relacionando-se, principalmente, a falta de
recursos financeiros para arcar com a reforma agrária e a falta de mão-de-obra
especializada, além das autuações já mencionadas, justificadas pelo IEF.
Também deve ser esclarecido que a legislação utilizada como
referência para a pesquisa, que era o cerne das indagações quanto aos
problemas relacionados ao licenciamento ambiental em Minas Gerais, se
modificou ao longo do estudo, o que, a princípio, veio confirmar que existia
algum obstáculo ao procedimento de licenciamento ambiental neste Estado,
118
que, segundo cada uma das instituições, possui uma origem ou
desdobramento peculiar, não havendo consenso a respeito. Nessa diferença é
que residiu a riqueza das representações.
Relembrando os discursos, percebe-se que a primeira reunião para
discutir o mecanismo de licenciamento a ser adotado em Minas Gerais
previu todos os entraves que, posteriormente, vieram a se confirmar. Nesse
sentido, o discurso do INCRA em 1999 era bastante esclarecedor, mas,
diante da promulgação da DN 44, em 2000, também se nota que o discurso da
FEAM e do IEF foi o que preponderou.
Assim, logo após a DN 44 entrar em vigência começaram a se
evidenciar as mazelas do processo de licenciamento, que, numa primeira
análise promovida pelo INCRA-MG, diziam respeito principalmente ao tempo
despendido pelo licenciamento ambiental, assim como pelo custo do processo
e pelas várias divergências existentes entre as instituições, principalmente
quanto ao que o IEF entendia ser necessário para os estudos de RVA, PDA e
PFA. Dessa forma, como análise do licenciamento ambiental apresentado pelo
INCRA, havia a seguinte situação em maio/junho de 2004:
Tipo de licença Prazo Custo
Licença prévia 487 dias R$ 14.508,57
Licença de instalação 779 dias R$ 47.446,58
Licença de operação corretiva 765 dias R$ 27.441,39
Fonte: INCRA SR06, junho de 2004.
Hoje a situação se modificou, e as instituições, de uma maneira ou
de outra, estão chegando a um consenso quanto aos requisitos dos estudos
ambientais, o que provocou uma aceleração no tempo necessário para a
concessão das licenças. Outro fator que auxiliou nesse processo de mudança
foi a nova DN 88, principalmente os encontros dos órgãos envolvidos no
licenciamento ambiental, discutindo critérios e deixando claro o contorno que
esse procedimento deveria apresentar. Afora esses fatores, as universidades,
principais instituições contratadas para a feitura dos estudos, se
119
acostumaram com o processo de confecção e suas exigências, o que diminuiu
bastante o tempo despendido.
Uma última observação deve ser feita com relação à representação da
FETAEMG, bem específica. Segundo o entrevistado, representante da
instituição, a nova DN 88 desembolará o procedimento de licenciamento
ambiental, uma vez que o prazo para a concessão das licenças passará a ser
de 180 dias. Na Resolução 237 do CONAMA havia previsão semelhante,
visto que no art. 14 do diploma consignava prazo máximo de seis meses
para a análise das licenças ambientais. Da mesma forma, a Resolução 237 do
CONAMA previu um procedimento simplificado para situações especiais, em
que o empreendimento gerasse pequeno potencial poluidor, no art. 12, §1°.
Na mesma esteira de raciocínio, se analisada a Resolução 289 do
CONAMA, que trata especificamente do licenciamento ambiental para
assentamentos rurais de reforma agrária no país, será verificada uma grande
discrepância quanto às exigências da legislação mineira. Em primeiro lugar, a
Resolução 289 apenas prevê duas licenças, a LP e a LIO, e para estas são
regulamentados prazos diferentes da DN 88. A primeira diferenciação é que a
LP deveria anteceder à criação do PA, e haveria o prazo de até 90 dias após o
seu requerimento para ser expedida. Já a LIO deveria ser requerida em até 180
dias após a criação do PA, tendo prazo de expedição de até 120 dias,
conforme art. 3.°, §2.° e 3.° da Resolução do CONAMA. Afora essas
considerações, todas as principais dificuldades que de fato ocorreram no
processo de implantação dos assentamentos rurais de Minas Gerais já haviam
sido previstas pela Resolução 289, que se mostrou menos severa para com os
assentados e mais exigente com a Administração Pública (órgãos envolvidos
no procedimento ambiental). Contudo, Minas Gerais não seguiu esse caminho.
Essas informações sobre as Resoluções do CONAMA são importantes
para que se possa perceber que o procedimento de licenciamento ambiental
em Minas Gerais se mostrou tão complicado devido a uma escolha um
posicionamento daqueles que elaboraram a legislação do próprio Estado que
contrariou todas as advertências das instituições sociais sobre suas
representações acerca da necessidade e adequação do procedimento de
licenciamento ambiental a ser empregado na reforma agrária; assim, foi
utilizado o Direito como instrumento fomentador de óbices à consecução da
120
reforma agrária. Não se perca de vista que a norma de direito ambiental em
nível federal, repise-se, mostra-se mais sensível à demanda social por reforma
agrária do que a opção estadual. No entanto, a verdadeira ideologia de tal
escolha não pôde ser comprovada, porque nem mesmo as representações
sociais das instituições envolvidas na confecção da DN 88 puderam explicar o
posicionamento mineiro, que, de acordo com elas, o licenciamento ambiental
deveria ter sofrido uma flexibilização, o que na prática não aconteceu, pelo
menos de forma substancial.
Um outro ponto que merece menção diz respeito ao fato de que a DN
88 praticamente transcreveu a Resolução 289 do CONAMA, o que não
encontra razão de ser. Ora, o mecanismo encontrado para a solução de todos
os transtornos apresentados ao longo do trabalho sobre o procedimento de
licenciamento ambiental nos projetos de assentamento rural se restringiu à
repetição da legislação federal, sem qualquer inovação ou olhar particularizado
sobre o tema. O que surpreende é que nãomotivo aparente para tal atitude,
que parece ter como único objetivo revogar a DN 44 e possibilitar, de forma
legal, que os assentados possam se utilizar da terra antes da concessão da
LIO, porém até isso estava previsto na Resolução 289 do CONAMA. Outra
inovação é a estipulação de prazos para a análise das licenças; nesse aspecto,
resta alertar que a DN 44 não se manifestou a esse respeito, mas que a
Resolução 289 do CONAMA também previu a matéria, que foi em parte
modificada, mas não substancialmente, visto que o CONAMA previa 180 dias
para a concessão da LP e que o COPAM previu 90 dias prorrogáveis por
outros 90. quanto à LI, o CONAMA previu 120 dias, e o COPAM, o mesmo
prazo da LP (ou seja, 90 dias prorrogáveis por outros 90), que é o mesmo para
a LOC, não prevista na Resolução 289 do CONAMA.
121
2. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto durante o presente estudo, a história da reforma agrária no
Brasil está diretamente relacionada à história da propriedade da terra, mais
ainda, à maneira como o poder público e os atores sociais interpretam e agem
no sentido de alavancar ou obstar essa política pública. É ainda importante
destacar a importância do Direito nessa análise, uma vez que, sem dúvida
alguma, um dos mecanismos de o Estado possibilitar ou impedir a reforma
agrária no Brasil é se utilizando do Direito, agente ideológico que justifica a
ação ou falta de atividade do governo quanto à descentralização fundiária do
país.
Nas considerações finais desta pesquisa, de antemão, é importante
salientar que a análise do procedimento de licenciamento ambiental nos
projetos de assentamentos rurais em Minas Gerais é complexa, por inúmeros
motivos, sobressaindo o fato de tal assunto ser novidade, estando em
aplicação quase que unicamente em Minas Gerais. A segunda grande
dificuldade é que o rumo do procedimento está em constante transformação,
tanto é que ao iniciar a pesquisa vigia uma legislação (DN 44) no Estado de
Minas Gerais, e já ao final do estudo a norma tomada como referência havia
sido revogada e substituída por outra (DN 88). Entretanto, o que poderia ser
interpretado como fator complicador deve ser analisado como comprovação da
122
pesquisa e, mais, do procedimento em si de licenciamento ambiental nos
projetos de assentamentos rurais no Estado de Minas Gerais, apontando no
sentido de que tal procedimento se encontra em fase de ajustamentos, uma
vez que várias mazelas se evidenciaram nesses cinco anos de exigibilidade
(desde a vigência da DN 44, em 2000).
Nesse sentido, a pesquisa demonstrou que as instituições envolvidas
com a reforma agrária e o licenciamento ambiental em Minas Gerais sofreram
vários impactos com a nova legislação que veio a lume em 2000, tanto de
natureza administrativa quanto política e, principalmente, econômica, cabendo
ainda acrescer os impactos sociais que o prolongamento inicial do prazo de
criação e operacionalização dos projetos de assentamentos rurais causou nos
assentados beneficiados pela reforma agrária no Estado. As adequações
advindas da mudança de exigência para a reforma agrária até a presente data
não foram concluídas, sendo certo que ao longo desses cinco anos cada vez
mais a celeridade e efetividade do procedimento de licenciamento ambiental
nos PAs se mostravam como anseio das instituições envolvidas no
procedimento.
A maior das dificuldades surgidas talvez tenha sido a falta de infra-
estrutura do próprio Estado para realizar uma exigência criada pela legislação
estadual; nesse sentido, as representações apresentadas pelo INCRA
encontram-se em consonância com as descobertas feitas pela pesquisa, ou
seja, o Estado passou a requerer estudos ambientais, além de outros
documentos, para que uma licença ambiental pudesse ser expedida, porém
não aparelhou suas instituições para que esses requisitos pudessem ser
atendidos, faltando mão-de-obra e também numerário para esse fim.
Outro ponto que merece ser realçado refere-se à legislação mineira
que trata do tema aqui debatido, devendo ser relembrado que a norma
estadual é mais severa que a federal, sem que haja uma justificativa aparente
para isso. Outro fato relacionado à norma que causa espanto diz respeito ao
seu conteúdo, porque foi criado um grupo de trabalho para estudar as
deficiências da DN 44 e propor nova Deliberação mais próxima da demanda
social pela reforma agrária. Para isso, representantes das principais instituições
relacionadas à reforma agrária foram convocados, no sentido de cada um
contribuir para o aprimoramento do procedimento, tendo estes se manifestado
123
no sentido de amenizar os critérios da DN 44 para que a reforma agrária
acontecesse mais rapidamente. Todavia, a nova legislação (DN 88) se
restringiu a inserir prazos e à possibilidade de os assentados utilizarem a terra
antes da concessão da LIO, segundo critérios fixados na própria legislação.
Entretanto, essa “inovação” constava de lei anterior (Resolução 289 do
CONAMA); justamente por isso, conclui-se que a legislação mineira buscou se
aproximar da legislação federal, que, após uma análise minuciosa, mostra-se
mais adequada à demanda da reforma agrária no país. Assim, a título de
recomendação, os órgãos envolvidos na reforma agrária de Minas Gerais
deveriam repensar, de forma crítica e reflexiva, as legislações mineiras e a
motivação do seu maior rigor no Estado, buscando, de forma clara e explícita,
substituir as DNs do COPAM pela legislação federal, que é perfeita para a
demanda da reforma agrária do país. Talvez possa ser feita uma nova
pesquisa nesse sentido.
Parece que a inovação trazida pela DN 88 tem pouca chance de mudar
o atual quadro da reforma agrária em Minas Gerais. Além disso, levando em
consideração não a norma em si (DN 88), mas o fato de tanto a reforma agrária
quanto o meio ambiente serem direitos fundamentais do homem, a situação se
torna ainda mais complicada, uma vez que, conforme ensinamento de José
Afonso da Silva (SILVA, 2000), o meio ambiente recebe tratamento privilegiado
em relação aos demais direitos fundamentais, pois a Constituição brasileira tem
como cerne o princípio da dignidade da pessoa humana e, para este, é
indispensável que todo cidadão possa desfrutar do meio ambiente saudável.
Nesse momento, resta relembrar que uma das funções ideológicas do
Direito é a de justificar as opções políticas do Estado, através de restrições e
sanções por parte de quaisquer dos entes federados. Assim, uma vez que
exista norma tornando obrigatório o licenciamento ambiental em
assentamentos de reforma agrária e estabelecendo critérios rígidos para sua
obtenção, ainda que a demanda social relate o desconforto dos assentados e
todos os transtornos pelos quais eles passam ao longo da transformação de
sua condição em assentados “formais”, o governo tem uma justificativa
plausível e objetiva para o contexto: está garantindo o meio ambiente saudável
para todos os cidadãos brasileiros e atendendo ao princípio da igualdade
presente na Constituição. Dessa forma, ainda que a realidade pareça mais
124
importante que a formalidade procedimental, o Direito é o principal instrumento
para justificar o novo óbice colocado à reforma agrária.
Tendo em vista a observação feita anteriormente, conclui-se que o
licenciamento ambiental pode ser analisado como instrumento legal e
ideológico que retarda a criação e operacionalização dos assentamentos rurais
em Minas Gerais e que as instituições públicas que lidam com a execução da
reforma agrária no Estado não estão aparelhadas para atenderem às
exigências das normas ambientais estatais, fazendo com que, de forma geral, o
procedimento se mostre lento e não atenda aos anseios sociais pelo acesso à
terra.
125
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131
APÊNDICE
APÊNDICE
Deliberação Normativa COPAM N.º 44, de 20 de novembro de 2000
Estabelece normas para o licenciamento ambiental
dos projetos de assentamento para fins de reforma agrária e
outras providências.
(Publicação - Diário do Executivo - "Minas Gerais" - 25/11/2000)
O CONSELHO ESTADUAL DE POLÍTICA AMBIENTAL COPAM, no
uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei n.º 12.585, de 17 de julho
de 1997, regulamentada pelo Decreto n.º 39.490, de 13 de março de 1998,
tendo em vista o disposto no seu regulamento interno e, com base no art. 1.º e
§ 1.º do art. 2.º da Resolução CONAMA n.º 237, de 19 de dezembro de 1997,
Considerando a indiscutível importância e interesse social do Programa
Nacional de Reforma Agrária que se constitui em atribuição do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA e dos órgãos
competentes do Governo do Estado;
Considerando que a reforma agrária é uma intervenção apta a garantir
a função social da propriedade, ao mesmo tempo em que abre oportunidades
de resgate social do cidadão, proporcionando condições de melhoria da
qualidade de vida dos trabalhadores rurais assim como, do meio ambiente;
Considerando que a reforma agrária é um instrumento de política
pública cuja execução deve ser compartilhada pelo Governo Federal, Estadual
ou Municipal;
Considerando o convênio firmado entre o Governo do Estado de Minas
Gerais, através da Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral
133
de Minas Gerais SEPLAN, e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária – INCRA;
Considerando que qualquer intervenção no meio ambiente tem de ser
precedida de estudos e proposição de medidas que garantam a proteção e
conservação dos ecossistemas e a mitigação dos impactos negativos e
maximização dos impactos positivos;
Considerando que os assentamentos rurais para fins de reforma
agrária devem constituir um dos instrumentos operacionais de reabilitação do
território e da difusão de práticas de controle ambiental adequadas aos
contextos geoambientais e sociais das áreas de implantação;
Considerando que o assentamento precocemente implantado,
atendidas as exigências desta Deliberação Normativa, pelos dados e
informações essenciais que proporciona, constitui em si fator decisivo para a
maior eficácia econômica, social e ambiental do Projeto Final de
Assentamento, resolve:
Art. 1.º - Os projetos de assentamento para fins de reforma agrária
serão objeto de licenciamento ambiental, de acordo com as condições desta
Deliberação Normativa.
Parágrafo único. Para os fins desta Deliberação Normativa, entende-se
por empreendedor, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
INCRA ou, ainda, pessoa física ou jurídica por ele autorizadas.
Art. 2.º - O processo de licenciamento objeto desta Deliberação
Normativa é composto, sucessivamente, da Licença Prévia, da Licença de
Instalação e da Licença de Operação.
Art. 3.º - O requerimento da Licença Prévia (LP) deve ser
acompanhado das exigências constantes do Anexo I desta Deliberação
Normativa.
Art. 4.º - O requerimento da Licença de Instalação (LI) deve ser
acompanhado das exigências constantes do Anexo I desta Deliberação
Normativa.
Parágrafo único. O Projeto Básico de Assentamento, que acompanha o
requerimento da Licença de Instalação, deverá contemplar, no mínimo, as
exigências constantes do Anexo II desta Deliberação Normativa.
Art. 5.º - O requerimento da Licença de Operação (LO) deve ser
acompanhado das exigências constantes do Anexo I desta Deliberação
Normativa.
§1.º - O requerimento da Licença de Operação deve ser encaminhado
num prazo mínimo de 18 (dezoito) meses e máximo de 30 (trinta) meses,
contados a partir da concessão da Licença de Instalação.
134
§2.º - O Projeto Final de Assentamento, que acompanha o
requerimento da Licença de Operação, deverá contemplar, no mínimo, as
exigências constantes do Anexo III desta Deliberação Normativa.
§3.º - Para os assentamentos instalados antes da vigência da presente
Deliberação Normativa e ainda não emancipados, o empreendedor fica
dispensado da Licença Prévia e da Licença de Instalação e obrigado a requerer
Licença de Operação, com base nas exigências constantes do item 4 do Anexo
I.
§4.º - Na hipótese do § 3.º deste artigo, o empreendedor deverá
submeter o cronograma de protocolização dos pedidos de licenciamento
ambiental junto ao COPAM até 60 (sessenta) dias após a publicação desta
Deliberação Normativa, os quais deverão ser implementados no prazo máximo
de 24 (vinte e quatro) meses.
§5.º - O prazo máximo de validade da Licença de Operação a que se
refere este artigo é de 8 (oito) anos.
Art. 6.º - Das autorizações para exploração florestal, a que se referem
os itens 2.f, 3.e e 4.f do Anexo I desta Deliberação Normativa, constará a
ressalva de que o desmate para fins de plantio e ocupação definitivos
poderá ser realizado após a concessão da Licença de Instalação ou da Licença
de Operação.
Art. 7.º - A implantação de atividades potencial ou efetivamente
poluidoras, bem como o uso de recursos hídricos, deverão ser objeto de
licenciamento ambiental específico e outorga, respectivamente, consoante a
sua natureza e porte.
Art. 8.º - O assentamento emancipado e seus sucessores individuais
obrigam-se, perante o órgão ambiental, ao cumprimento das metas constantes
do Roteiro de Acompanhamento Ambiental, conforme item 2.i do Anexo IV
desta Deliberação Normativa, respondendo pelo não cumprimento e por danos
ambientais causados.
Art. 9.º - Fica acrescido o seguinte item à Tabela A-3 do Anexo I da
Deliberação Normativa n.º 01, de 22 de março de 1990:
“92.15.00-9 - Projetos de assentamento para fins de reforma agrária
Potencial Poluidor/Degradador: Ar: P Água: M Solo: P Geral: P
Porte: 25 £ NF < 50 :Pequeno
50 £ NF < 200 :Médio
NF ³ 200 :Grande”
Parágrafo Único: Os assentamentos de que trata essa Deliberação
Normativa, para fins de incidências dos custos relativos ao licenciamento
ambiental, são considerados equivalentes aos empreendimentos de Classe I -
135
pequeno potencial poluidor/degradador e pequeno porte, de acordo com o
Anexo I da Deliberação Normativa COPAM n.º 01, de 22 de março de 1990.
Art. 10 - Fica acrescentada à legenda constante do Anexo I da
Deliberação Normativa n.º 01, de 22 de março de 1990 a sigla NF, significando
Número de Famílias.
Art. 11 - Esta Deliberação Normativa entra em vigor na data de sua
publicação e revoga as disposições em contrário.
Belo Horizonte, 20 de Novembro de 2000.
Paulino Cícero de Vasconcellos
Secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável
Presidente do COPAM
136
Anexo I da Deliberação Normativa
Documentos necessários para obtenção das licenças
Tipo de licença/Documentos necessários
1. Licença Prévia (LP) (fase de avaliação de viabilidade ambiental do
assentamento)
1.a - Formulário de Caracterização do Empreendimento (FCE).
1.b - Requerimento da LP.
1.c - Cópia da publicação do requerimento da LP.
1.d - Declaração municipal relativa às suas leis e regulamentos (Resolução
COPAM 01/92).
1.e - Relatório de viabilidade ambiental encaminhado pelo empreendedor.
1.f - Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento.
1.g - Certidão negativa de débitos financeiros de natureza ambiental
(Resolução COPAM 01/92).
2. Licença de Instalação (LI) (fase de implantação do assentamento)
2.a - Requerimento da LI.
2.b - Cópia da publicação do pedido da LI.
2.c - Cópia da publicação da concessão da LP.
2.d - Certidão atualizada do cartório de registro de imóveis.
2.e - Projeto Básico de Assentamento.
2.f - Cópia da autorização para exploração florestal expedida pelo órgão
competente, quando for o caso.
2.g - Outorga do órgão gestor de recursos hídricos, quando for o caso.
2.h - Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento.2.i - Certidão
negativa de débitos financeiros de natureza ambiental (Resolução COPAM
01/92).
3. Licença de Operação (LO)(fase de emancipação do assentamento)
3.a - Requerimento da LO.
3.b - Cópia da publicação do pedido da LO.
3.c - Cópia da publicação da concessão da LI.
3.d - Projeto Final de Assentamento.
3.e - Cópia da autorização para exploração florestal expedida pelo órgão
competente, quando for o caso.
3.f - Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento.
3.g - Certidão negativa de débitos financeiros de natureza ambiental
(Resolução COPAM 01/92).
4. Licença de Operação (assentamentos implantados anteriormente à vigência
desta Deliberação Normativa e ainda não emancipados)
4.a - Formulário de Caracterização do Empreendimento (FCE).
4.b - Requerimento da LO.
4.c - Cópia da publicação do requerimento da LO.
4.d - Certidão atualizada do cartório de registro de imóveis.
4.e - Diagnóstico Ambiental da Área e Projeto Final de Assentamento.
137
4.f - Cópia da(s) autorização(ões) para exploração florestal concedida(s)
pelo órgão competente, quando for o caso.
4.g - Outorga do órgão gestor de recursos hídricos, quando for o caso.
4.h - Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento.
4.i - Certidão negativa de débitos financeiros de natureza ambiental
(Resolução COPAM 01/92).
138
Anexo II da Deliberação Normativa
Termo de Referência para a elaboração do Relatório de Viabilidade Ambiental
1. Componentes essenciais para o Relatório de Viabilidade Ambiental
1.a - Caracterização do empreendimento: identificação e localização do
imóvel, denominação, área, perímetro, distrito, município/UF, coordenadas
geográficas, mesorregião/microrregião FIBGE e Região Administrativa de
Minas Gerais, sub-bacia hidrográfica, planta do imóvel georeferenciada, vias de
acesso, número aproximado de famílias beneficiadas, situação dominial, limites
(propriedades confrontantes/ atividades desenvolvidas, presença de UC’s,
APA’s etc.). Características do município de localização do imóvel
(apresentação de mapas e plantas): delimitação cartográfica, localização do
município no estado, municípios limítrofes, aspectos físicos, bióticos e sócio-
econômicos;
1.b - Características da área diretamente afetada: histórico do imóvel,
diagnóstico expedito descritivo do meio sico: clima, geologia/formações
superficiais, geomorfologia/relevo, solos, recursos hídricos, capacidade de uso
do solo, uso atual do solo (mapas legendados em escala adequada);
diagnóstico expedito descritivo do meio biótico: vegetação nativa, fauna
silvestre; diagnóstico expedito descritivo do meio antrópico (sócio-econômico)
priorizando saúde, educação, transporte; levantamento do passivo ambiental:
água, solo, reserva legal, áreas de preservação permanente com apresentação
através de mapas temáticos;
1.c - Perspectivas de uso do imóvel: justificativa e embasamento legal,
módulo ideal, número de famílias, potencialidades e limitações da área,
possíveis obras necessárias, incluindo as não previstas em orçamento;
1.d - Apresentação de medidas mitigadoras/compensatórias a serem
obedecidas na etapa de implantação;
1.e - Equipe técnica: anotação de responsabilidade técnica e registro
dos profissionais participantes.
139
Anexo III da Deliberação Normativa
Termo de Referência para Elaboração do Projeto Básico de Assentamento
1. Equipe
O Projeto Básico de Assentamento, que tem como órgão executor o
INCRA conveniado com o Governo do Estado de Minas Gerais, será elaborado
por equipe multidisciplinar composta por, no mínimo, três profissionais cujo
espectro de habilitações envolva os campos dos meios físico, biótico e
socioeconômico, e por um representante da associação dos assentados, a
serem beneficiados pelo empreendimento, e um representante de outras
entidades por eles indicadas. A equipe multidisciplinar poderá fazer-se
assessorar por especialistas de perfis ajustados a características peculiares da
área de implantação e do grupo beneficiado.
2. Componentes Essenciais do Projeto Básico de Assentamento
2.a - Adequação e, ou, complementação dos estudos apresentados no
relatório de viabilidade ambiental, agregando-lhes informações
complementares sobre os fatores da sustentabilidade fundamental, conduzindo
ao correspondente zoneamento;
2.b - Elaboração de pesquisa sobre o estado socioeconômico, cultural,
escolaridade, e de habilitação técnica, saúde e percepção ambiental das
pessoas integrantes do grupo a ser beneficiado;
2.c - Elaboração de estudos, levando em consideração as informações
geradas nas atividades anteriores e as características geoeconômicas e sociais
de inserção da área no plano regional.
3. Escopo Geral do Projeto Básico de Assentamento
No Projeto Básico de Assentamento devem estar adequadamente
contempladas as seguintes atividades e resultados ou produtos:
3.a - Projeto conceitual de reabilitação de áreas em estado de
degradação acentuada;
3.b - Projeto básico de exploração e reabilitação das áreas de coleta de
materiais necessários a construções e aplicações em vias internas;
3.c - Projeto de malha viária, contendo as vias existentes, sua
caracterização técnica e ambiental, vias que deverão ser abertas e as
respectivas medidas de mitigação dos impactos ambientais;
3.d - Definição dos locais de construção de moradias e outras
instalações, para implantação durante a elaboração do projeto final, e para
ampliações e construções futuras;
3.e - Apresentação de instruções básicas relacionadas à construção,
visando evitar a geração de situações de risco ou insalubridade e impactos no
ambiente;
3.f - Apresentação de projeto de abastecimento de água adequado às
disponibilidades locais e necessidades, incluindo recursos das águas pluviais e,
sempre que possível, subterrâneas;
3.g - Apresentação de projetos básicos adequados à área, como
cisternas, valas e bacias de infiltração; sanitário seco, fossas e assemelhados,
de acordo com as características dos locais de construção;
140
3.h - Definição das áreas de plantio visando à subsistência e
comercialização, e para a criação doméstica, fixando os controles ambientais
mínimos a serem observados e ocupando preferencialmente áreas não
florestadas;
3.i - Mapa com definição de áreas com cobertura fllorestal possível de
exploração e respectivo projeto de manejo sustentado, visando o fornecimento
de lenha, carvão e madeira, até que os bosques comunitários previstos no item
“3.j” sejam passíveis de exploração;.
3.j - Projeto de implantação de bosques comunitários, utilizando
espécies de rápido crescimento, visando eliminar a pressão sobre os
remanescentes nativos ;
3.k - Apresentação do projeto de sementeira e viveiros de mudas para
os bosques familiares e para a reimplantação da vegetação nativa nas áreas a
serem definidas no Projeto Final de Assentamento;
3.l - Apresentação do projeto integrado de saúde, educação geral,
educação ambiental e convívio social e das respectivas instalações modulares,
passíveis de ampliação decorrente dos estudos detalhados do Projeto Final de
Assentamento;
3.m - Projeto de educação ambiental que aborde a defesa do meio
ambiente, contemplando a proteção e conservação à fauna e flora, destinação
de resíduos, manuseio de agrotóxicos, adubos e outros produtos químicos;
3.n - Apresentação do projeto técnico-econômico e ambiental do
empreendimento para o período de implantação, do qual constará o manual de
procedimentos fundamentado, circunstanciado, e acompanhado de ata da
reunião de aprovação do grupo beneficiado. Este projeto deverá dar especial
atenção à destinação de resíduos domésticos e embalagens de agrotóxicos.
141
Anexo IV da Deliberação Normativa
Termo de Referência para Elaboração do Projeto Final de Assentamento
1. Equipe
O Projeto Final de Assentamento será elaborado preferencialmente
pela equipe responsável pelo Projeto Básico de Assentamento, à qual serão
agregados representantes adicionais do grupo beneficiado, e será
desenvolvido em processo de regular apropriação dos dados e informações
resultantes das atividades de implantação e produtivas em curso.
2. Escopo Geral do Projeto Final de Assentamento
2.a - Acompanhamento e supervisão, com intervenções corretivas, da
execução das vias locais, das moradias, da lavra de materiais de construção,
da fabricação de telhas e tijolos; da construção e funcionamento da serraria e
carpintaria; das instalações básicas e organização do serviço social; da
sementeira e viveiro de mudas; de terrário; de tanques de piscicultura; de
fossas e cisternas de infiltração; de captação de água; elaboração dos registros
correspondentes;
2.b - Acompanhamento e supervisão, com intervenções corretivas, da
implantação das atividades de produção, beneficiamento, conservação,
embalagem e comercialização, onde couber; elaboração dos registros
correspondentes;
2.c - Acompanhamento e supervisão da implantação dos controles
ambientais fixados no Projeto Básico e dos resultados alcançados; elaboração
dos registros correspondentes;
2.d - Delimitação final das áreas de preservação permanente e em
especial das faixas envolventes de reservas legais consoante a sua natureza;
2.e - Delimitação final das áreas degradadas, por natureza do processo
de degradação, e elaboração dos respectivos projetos de reabilitação, sempre
que possível implantando as correspondentes intervenções de reabilitação
como experimentos a serem monitorados quanto à sua eficácia ambiental e
economicidade (exemplificadamente reimplantação de vegetação de
características naturais, plantas forrageiras, correção de erosão linear, etc.);
2.f - Delimitação final das áreas de plantio, pastoreio, de extração de
materiais de construção, de atividade extrativista sustentada, e fixação dos
processos, limites e controles;
2.g - Supervisão e acompanhamento da implantação dos serviços
básicos de atenção à saúde e dos controles regulares, individuais e
estatísticos; elaboração dos registros correspondentes;
2.h - Supervisão e acompanhamento da implantação dos serviços de
educação; produção dos dispositivos e material didático, ajustado ao contexto
geoambiental local, de apoio à educação geral e ambiental; implantação do
processo de práticas educacionais complementares nas diversas instalações
em fase de implantação;
2.i - Elaboração do Projeto Final de Assentamento, com base nos
resultados colhidos, do qual constará a versão final do manual de
procedimentos, fundamentado, circunstanciado e da ata da reunião de
aprovação do grupo beneficiado (acompanhada do termo de compromisso de
cada assentado, quanto às delimitações do processo de licenciamento). Deste
manual de procedimentos constará o Roteiro de Acompanhamento Ambiental
142
com indicadores de desempenho e metas correspondentes a serem atendidas
em cronograma específico.
143
Deliberação Normativa COPAM n.º 74, de 9 de setembro de 2004
Estabelece critérios para classificação, segundo o
porte e potencial poluidor, de empreendimentos e atividades
modificadoras do meio ambiente passíveis de autorização
ambiental de funcionamento ou de licenciamento ambiental no
nível estadual, determina normas para indenização dos custos de
análise de pedidos de autorização ambiental e de licenciamento
ambiental, e dá outras providências.
(Publicação - Diário do Executivo - "Minas Gerais" - 02/10/2004)
(Retificação - Diário do Executivo - "Minas Gerais" - 05/02/2005)
O Conselho Estadual de Política Ambiental COPAM, no uso das
atribuições que lhe confere o art. 5.º, item I, da Lei n.º 7.772, de 08 de
setembro de 1980 e art. 4.º, incisos II e VIII do Decreto n.º 43.278, de 22 de
abril de 2003,
DELIBERA:
Art. 1.º - Os empreendimentos e atividades modificadoras do meio
ambiente sujeitas ao licenciamento ambiental no nível estadual são aqueles
enquadrados nas classes 3, 4, 5 e 6, conforme a lista constante no Anexo
Único desta Deliberação Normativa, cujo potencial poluidor/degradador geral é
obtido após a conjugação dos potenciais impactos nos meios físico, biótico e
antrópico, ressalvado o disposto na Deliberação Normativa CERH n.º 07, de 04
de novembro de 2002.
Parágrafo único - As Licenças Prévia e de Instalação dos
empreendimentos enquadrados nas classes 3 e 4 poderão ser solicitadas e, a
critério do órgão ambiental, expedidas concomitantemente.
Art. 2.° - Os empreendimentos e atividades listados no Anexo Único
desta Deliberação Normativa, enquadrados nas classes 1 e 2, considerados de
impacto ambiental não significativo, ficam dispensados do processo de
licenciamento ambiental no nível estadual, mas sujeitos obrigatoriamente à
autorização ambiental de funcionamento pelo órgão ambiental estadual
competente, mediante cadastro iniciado através de Formulário Integrado de
Caracterização do Empreendimento preenchido pelo requerente, acompanhado
de termo de responsabilidade, assinado pelo titular do empreendimento e de
Anotação de Responsabilidade Técnica ou equivalente do profissional
responsável.
§1.° - A autorização ambiental de funcionamento somente será
efetivada se comprovada a regularidade face às exigências de Autorização
ambiental para Exploração Florestal APEF e de Outorga de Direito de Uso de
Recursos Hídricos.
§2.º - Os órgãos ambientais competentes procederão à verificação de
conformidade legal nos empreendimentos a que se refere o caput deste artigo,
conforme critérios definidos pelo COPAM.
144
§3.º - O termo de responsabilidade de que trata o caput deste artigo
deverá expressar apenas as questões da legislação ambiental pertinente à
autorização ambiental de funcionamento em foco.
§4.º - O órgão ambiental fará a convocação do empreendedor nos
casos em que considerar necessário o licenciamento ambiental de
empreendimentos e atividades enquadrados nas classes 1 e 2.
§5.º - Os prazos de vigência da autorização ambiental de
funcionamento de que trata o caput deste artigo serão definidos pelo COPAM
[1].
Art. 3.º - Nos casos de empreendimentos ou atividades do setor
industrial ou do setor de serviços que se enquadrarem apenas nos códigos
genéricos, fica reservada ao órgão seccional competente a prerrogativa de,
uma vez de posse do Formulário Integrado de Caracterização do
Empreendimento – FCEI, solicitar ao empreendedor detalhamento descritivo do
empreendimento ou atividade para, se necessário, arbitrar porte e potencial
poluidor específicos, em função das peculiaridades do empreendimento ou
atividade em questão.
Parágrafo Único - Em qualquer caso, o empreendedor poderá, uma vez
de posse do Formulário de Orientação Básica Integrado FOBI, solicitar ao
órgão seccional competente, mediante requerimento fundamentado, a revisão
do enquadramento de porte e, ou, potencial poluidor do empreendimento ou
atividade objeto do licenciamento que tenha sido enquadrado em código
genérico, ficando assegurado o direito de recurso à Câmara Especializada ou
Unidade Regional Colegiada competente.
Art. 4.° - Os empreendimentos e atividades modificadoras do meio
ambiente não passíveis de licenciamento no nível estadual poderão ser
licenciados pelo município na forma em que dispuser sua legislação,
ressalvados os de competência do nível federal.
Parágrafo único Os empreendimentos a que se refere o caput deste
artigo não estão dispensados, nos casos exigíveis, de Autorização para
Exploração Florestal e, ou, Outorga de Direito de Uso de Recursos hídricos.
Art. 5.° - Os custos de análise de autorização ambiental de
funcionamento e de pedido de licenciamento ambiental, por meio da Licença
Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO), assim
como de revalidação de Licença de Operação e de autorização ambiental de
funcionamento de empreendimentos e atividades modificadoras do meio
ambiente, serão previamente indenizados ao órgão seccional competente, pelo
requerente.
§1.° - Os empreendimentos com início de implantação anteriores a 1.°
de junho de 1983, data de vigência do Decreto Federal 88.351, ficam
dispensados da parcela correspondente a LP.
145
§2.° - Os empreendimentos com início de implantação anteriores a 10
de março de 1981, data de vigência do Decreto Estadual 21.228, ficam
dispensados das parcelas correspondentes a LP e LI.
Art. 6.° - Isentam-se do ônus da indenização dos custos de análise de
licenciamento e de autorização ambiental de funcionamento as micro-empresas
e as unidades produtivas em regime de agricultura familiar, assim definidas,
respectivamente, em lei estadual e federal, mediante apresentação de
documento comprobatório atualizado emitido pelo órgão competente.
Art. 7.° - A indenização dos custos de análise dos pedidos de
licenciamento poderá ser dividida em a 6 (seis) parcelas mensais e
consecutivas de valor não inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais), ficando o
julgamento e a emissão da licença condicionados à quitação integral das
parcelas.
Art. 8.º - A indenização dos custos de análise será feita pela parcela
correspondente a cada tipo de licença solicitada, quando esta se fizer através
de cada etapa em seu devido tempo, ou em parcela correspondente ao total
das modalidades de licença não requeridas, nos demais casos.
§1.º - Em caso de modificação e, ou, ampliação em empreendimento
licenciado, o enquadramento em classes, para efeito de indenização de custos
de análise, será feito considerando-se o porte e o potencial poluidor
correspondentes à modificação e, ou, ampliação a ser implantada.
§2.º - Na hipótese prevista no §1º e, desde que o empreendimento
comprove o cumprimento das obrigações da licença original, inclusive de suas
condicionantes, os custos de análise serão reduzidos em 30% (trinta por
cento).
Art. 9.º - A modificação e, ou, ampliação de empreendimentos
licenciados serão prévia e obrigatoriamente analisadas no órgão ambiental
responsável pelo licenciamento do empreendimento principal.
§1.º - Para os empreendimentos licenciados, as modificações e, ou,
ampliações serão enquadradas de acordo com as características de porte e
potencial poluidor de tais modificações e, ou, ampliações, podendo ser objeto
de autorização ou licenciamento.
§2.º - Quando da revalidação da licença de operação ou da autorização
ambiental de funcionamento, o procedimento englobará todas as modificações
e ampliações ocorridas no período, podendo inclusive indicar novo
enquadramento numa classe superior.
§3.º - Para os empreendimentos com autorização ambiental de
funcionamento, as modificações e, ou, ampliações serão enquadradas de
acordo com as características de porte e potencial poluidor de tais
modificações e, ou, ampliações e das já existentes, cumulativamente.
146
§4.º - O órgão ambiental fará a convocação do empreendedor nos
casos em que considerar necessário o licenciamento ambiental de
modificações e, ou, ampliações enquadradas nas classes 1 e 2.
Art. 10 - Os empreendimentos que se constituírem pela conjugação de
duas ou mais atividades listadas pelo Anexo Único desta Deliberação
Normativa indenizarão os custos de análise correspondentes ao valor da
atividade de maior classe (conjugação de porte e potencial poluidor).
Parágrafo único. Os empreendimentos que se constituírem pela
conjugação de atividades das listagens “A” a “F” com a listagem “G” do Anexo
Único desta Deliberação Normativa indenizarão os custos de análise
correspondentes ao valor de cada uma das atividades, separadamente. [2]
Art. 11 - Quando o licenciamento se fizer mediante apresentação de
Estudos de Impacto Ambiental - EIA e Relatório de Impacto Ambiental - RIMA,
conforme legislação aplicável, serão indenizados pelo requerente os custos de
análise do EIA/RIMA, de acordo com os valores estabelecidos em Resolução
da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável,
sem prejuízo do valor correspondente à licença.
Parágrafo único - Nos casos de realização de Audiência Pública, os
respectivos custos correrão por conta do empreendedor, desde que cumpridas
todas as disposições da Deliberação Normativa n.º 12, de 13 de dezembro de
1994.
Art. 12 - A indenização dos custos da análise do licenciamento não
garante ao interessado a concessão da licença requerida e nem o isenta de
imposição de penalidade por infração à Legislação Ambiental.
Art. 13 - Quando a verificação das condições ambientais de
empreendimentos e atividades modificadoras do meio ambiente, a qualquer
tempo, exigir a realização de amostragens, análises laboratoriais ou a adoção
de medidas emergenciais para controle de efeitos ambientais, os custos em
que incorrerem os órgãos seccionais de apoio ao COPAM serão a eles
reembolsados pelo empreendedor, independentemente da indenização dos
custos de licenciamento.
Art. 14 - A análise de EIA/RIMA de atividades de extração e tratamento
de minerais em áreas contíguas, com características ambientais semelhantes e
com processos diferentes junto ao Departamento Nacional de Produção
Mineral - DNPM será indenizada por um único custo.
Parágrafo único - O disposto pelo caput deste artigo ocorre se o
EIA/RIMA tiver abordado todas as áreas contíguas quanto aos diagnósticos e
prognósticos, incluindo as propostas de medidas mitigadoras.
Art. 15 - Poderá ser admitido pelo COPAM um único processo de
licenciamento ambiental para empreendimentos e atividades similares ou
complementares e vizinhos ou para aqueles integrantes de planos de
147
desenvolvimento aprovados previamente pelo órgão governamental
competente, desde que estejam legalmente organizados, identificando-se o
responsável pelo conjunto de empreendimentos ou atividades.
Parágrafo único. A análise dos pedidos de licenciamento a que se
refere o caput deste artigo será indenizada por um único custo.
Art. 16 - As normas estabelecidas pelo COPAM referentes à
classificação de empreendimentos conforme a Deliberação Normativa n.º 1, de
22 de março de 1990 passam a incidir segundo a seguinte correspondência:
I – Pequeno porte e pequeno ou médio potencial poluidor: Classe 1;
II – Médio porte e pequeno potencial poluidor: Classe 2;
III Pequeno porte e grande potencial poluidor ou médio porte e médio
potencial poluidor: Classe 3;
IV – Grande porte e pequeno potencial poluidor: Classe 4;
V Grande porte e médio potencial poluidor ou médio porte e grande
potencial poluidor: Classe 5;
VI – Grande porte e grande potencial poluidor: Classe 6.
Art. 17 - As alterações do porte e do potencial poluidor ou degradador
promovidas por esta Deliberação Normativa implicam a incidência das normas
pertinentes à nova classificação, desde que:
I - quanto ao licenciamento ambiental, inclusive o corretivo e a
revalidação, a licença não tenha sido concedida ou revalidada;
II - quanto à aplicação de multas, não tenha havido decisão
administrativa definitiva;
§1.º - No caso de empreendimento com Licença de Operação
concedida e no de multas com decisão administrativa definitiva, aplicar-se-ão
as normas pertinentes à classificação original.
§2.º - As normas pertinentes à nova classificação incidirão quando da
revalidação das licenças.
§3.º - Os empreendimentos dispensados do licenciamento ambiental
por esta Deliberação Normativa e que já possuem Licença de Operação
deverão cumprir o Plano de Controle Ambiental PCA e demais
condicionantes estabelecidas no processo de licenciamento dentro do prazo de
validade da licença. Ao final do prazo de validade da licença, o
empreendimento de classe 1 ou 2 deverá ser objeto de autorização ambiental
de funcionamento junto ao órgão ambiental nos termos desta Deliberação
Normativa.
§4.º - A indenização dos custos de análise dos processos de
licenciamento não será creditada ou devolvida aos interessados caso sua
análise já tenha sido iniciada ou seja verificada a constituição de débito de
natureza ambiental.
§5.º - O órgão ambiental responsável pelo licenciamento terá 180
(cento e oitenta) dias, a partir da data da entrada em vigência desta
148
Deliberação Normativa, para concluir a análise dos processos formalizados e
que, em função desta Deliberação Normativa (Deliberação Normativa n°74, de
9 de setembro de 2004), passem a ser dispensados do licenciamento
ambiental, sob pena de arcar com a devolução ao empreendedor dos valores
pagos a título de indenização dos custos de análise. [3]
Art. 18 - Os casos omissos serão resolvidos pelo Presidente do
Conselho Estadual de Política Ambiental, "ad referendum" do Plenário.
Art. 19 - Esta Deliberação entra em vigor no prazo de 60 (sessenta)
dias após a data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário,
em especial a Deliberação Normativa COPAM n.º 1, de 22 de março de 1990.
Belo Horizonte, 09 de setembro de 2004.
José Carlos Carvalho
Secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável e Presidente do COPAM.
149
Anexo Único [4]
Classificação das Fontes de Poluição
1 - Os empreendimentos e atividades modificadoras do meio ambiente
são enquadradas em seis classes que conjugam o porte e o potencial poluidor
ou degradador do meio ambiente (1, 2, 3, 4, 5 e 6), conforme a Tabela 1A.
Tabela 1A Determinação da classe do empreendimento a partir do potencial
poluidor da atividade e do porte
Potencial poluidor/degradador geral da atividade
P M G
Porte do P 1 1 3
Empreendimento M 2 3 5
G 4 5 6
2 - O potencial poluidor/degradador da atividade é considerado
pequeno (P) médio (M) ou grande (G), em função das características
intrínsecas da atividade, conforme as listagens A, B, C, D, E, F e G. O potencial
poluidor é considerado sobre as variáveis ambientais: ar, água e solo. Para
efeito de simplificação inclui-se no potencial poluidor sobre o ar os efeitos de
poluição sonora, e sobre o solo os efeitos nos meios biótico e sócio-
econômico.
O potencial poluidor/degradador geral é obtido da Tabela 2A abaixo:
Tabela 2A – Determinação de potencial poluidor/degradador geral
Potencial Poluidor/Degradador Variáveis
VariáveisAmbientaisAr/Água/Solo
P P P P P P M M M G
P P P M M G M M G G
P M G M G G M G G G
Geral P P M M M G M M G G
3 - O porte do empreendimento, por sua vez, também é considerado
pequeno (P), médio (M) ou Grande (G), conforme os limites fixados nas
listagens.
Listagem de atividads
1 - Os empreendimentos e atividades foram organizados conforme a
lista constante deste Anexo Único nas seguintes listagens:
- Listagem A – Atividades Minerárias
- Listagem B – Atividades Industriais/Indústria Metalúrgica e Outras
- Listagem C – Atividades Industriais/Indústria Química
- Listagem D – Atividades Industriais/Indústria Alimentícia
150
- Listagem E – Atividades de Infra-Estrutura
- Listagem F – Serviços e Comércio Atacadista
- Listagem G – Atividades Agrossilvipastoris
Cada empreendimento e atividade recebeu uma codificação da
seguinte forma:
N-XX-YY-Z
em que N Letra relativa a listagem onde o empreendimento e atividade foi
enquadrado; XX Número do item da tipologia; YY Número do sub-item da
tipologia; Z – Dígito verificador da codificação do empreendimento/atividade.
Listagem A – atividades minerárias
A-01 Lavra subterrânea
A-01-01-5 Lavra subterrânea sem tratamento ou com tratamento a seco
(pegmatitos e gemas)
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: G Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 1.200 m³/ano : Pequeno
1.200 < Produção Bruta £ 12.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 12.000 m³/ano : Grande
A–01-02-3 Lavra subterrânea com tratamento a úmido (pegmatitos e gemas)
Pot. Poluidor/Degradador: Ar : M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 1.200 m³/ano : Pequeno
1.200 < Produção Bruta £ 12.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 12.000 m³/ano : Grande
A–01-03-1 Lavra subterrânea sem tratamento ou com tratamento a seco,
exceto pegmatitos e gemas
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: G Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 100.000 t/ano : Pequeno
100.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A–01-04-1 Lavra subterrânea com tratamento a úmido exceto pegmatitos e
gemas
Pot. Poluidor/Degradador: Ar : M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 100.000 t/ano : Pequeno
100.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02 Lavra a céu aberto
151
A–02-01-1 Lavra a céu aberto sem tratamento ou com tratamento a seco -
minerais metálicos, exceto minério de ferro
Pot. Poluidor/Degradador: Ar : M Água: M Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 50.000 t/ano : Pequeno
50.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02-02-1 Lavra a céu aberto com tratamento a úmido minerais metálicos,
exceto minério de ferro
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 50.000 t/ano : Pequeno
50.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02-03-8 Lavra a céu aberto sem tratamento ou com tratamento a seco
minério de ferro
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: G Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 300.000 t/ano : Pequeno
300.000 < Produção Bruta £ 1.500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 1.500.000 t/ano : Grande
A-02-04-6 Lavra a céu aberto com tratamento a úmido – minério de ferro
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 300.000 t/ano : Pequeno
300.000 < Produção Bruta £ 1.500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 1.500.000 t/ano : Grande
A-02-05-4 Lavra a céu aberto ou subterrânea em áreas cársticas com ou sem
tratamento
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 100.000 t/ano : Pequeno
100.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02-06-2 Lavra a céu aberto com ou sem tratamento rochas ornamentais e
de revestimento (granitos, mármores, ardósias, quartzitos e outras)
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 1.000 m³/ano : Pequeno
1.000 < Produção Bruta £ 4.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 4.000 m³/ano : Grande
A-02-07-0 Lavra a céu aberto sem tratamento ou com tratamento a seco
minerais não metálicos, exceto em áreas cársticas ou rochas ornamentais e de
revestimento
152
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 50.000 t/ano : Pequeno
50.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02-08-9 Lavra a céu aberto com tratamento a úmido minerais não
metálicos, exceto em áreas cársticas ou rochas ornamentais e de revestimento
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Produção Bruta £ 100.000 t/ano : Pequeno
100.000 < Produção Bruta £ 500.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 500.000 t/ano : Grande
A-02-09-7 Extração de rocha para produção de britas com ou sem tratamento
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 30.000 t/ano ou £ 12.000 m³/ano : Pequeno
30.000 < Produção Bruta £ 200.000 t/ano ou 12.000 < Produção Bruta
£ 80.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 200.000 t/ano ou >80.000 m³/ano : Grande
A-02-10-0 Lavra em aluvião, exceto areia e cascalho
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: P Água: G Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 12.000 m³/ano : Pequeno
12.000 < Produção Bruta £ 100.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 100.000 m³/ano : Grande
A-03 Extração de Areia, Cascalho e Argila, para utilização na construção civil
A-03-01-8 Extração de areia e cascalho para utilização imediata na construção
civil
Pot. Poluidor/Degradador: Ar:P Água: G Solo: M Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 30.000 m³/ano : Pequeno
30.000 < Produção Bruta £ 100.000 m³/ano : Médio
Produção Bruta > 100.000 m³/ano : Grande
A-03-02-6 Extração de argila usada na fabricação de cerâmica vermelha
Pot. Poluidor/Degradador: Ar:M Água: M Solo: G Geral: M
Porte:
Produção Bruta £ 12.000 t/ano : Pequeno
12.000 < Produção Bruta £ 50.000 t/ano : Médio
Produção Bruta > 50.000 t/ano : Grande
A-04 Extração de água mineral ou potável de mesa
A-04-01-4 Extração de água mineral ou potável de mesa
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: P Água: G Solo: P Geral: M
153
Porte:
[5] Vazão Captada £ 6.000.000 litros /ano: Pequeno
6.000.000 litros/ano < Vazão Captada £ 15.000.000 litros/ano: Médio
Vazão Captada > 15.000.000 litros/ano: Grande
A-05 Unidades Operacionais em área de mineração, inclusive unidades de
tratamento de minerais
A-05-01-0 Unidade de tratamento de minerais – UTM
Pot. Poluidor/Degradador: o mesmo da atividade mineraria pertinente
Porte:
aplicam-se as mesmas faixas de porte definidas para a atividade
mineraria pertinente
Observação: Para fins de enquadramento de empreendimentos
relativos às instalações ou ampliações de unidades de tratamento de minerais,
localizadas dentro da área de direito minerário ou de servidão, serão adotados
os critérios de potencial poluidor e de porte do empreendimento definidos nos
itens anteriores desta DN, referentes a “Extração e Tratamento de Minerais”,
correlacionando a matéria-prima mineral a ser tratada ou beneficiada e a
capacidade instalada da unidade de tratamento com a produção bruta.
A-05-02-9 Obras de infra-estrutura (pátios de resíduos e produtos e oficinas)
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: P Água: M Solo: M Geral: M
Porte:
Área útil £ 5,0 ha : Pequeno
5,0 < Área útil £ 20,0 ha : Médio
Área útil > 20,0 ha : Grande
A-05-03-7 Barragem de contenção de rejeitos / resíduos
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: P Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
categoria Classe I : Pequeno
categoria Classe II : Médio
categoria Classe III : Grande
As categorias de classe das barragens para o enquadramento de porte
nesta Deliberação Normativa são aquelas da Deliberação Normativa COPAM
n.º 62, de 17 de dezembro de 2002.
A-05-04-5 Pilhas de rejeito / estéril
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: P Água: G Solo: G Geral: G
Porte:
Área útil £ 5,0 ha : Pequeno
5,0 < Área útil £ 40,0 ha : Médio
Área útil > 40,0 ha : Grande
A-05-05-3 Estradas para transporte de minério / estéril
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: G Geral: M
Porte:
154
Extensão £ 5,0 km : Pequeno
5,0 < Extensão £ 10,0 km : Médio
Extensão > 10,0 km : Grande
Listagem B - atividades industriais/indústria metalúrgica e outras
B-01 Indústria de Produtos Minerais Não-Metálicos
B-01-01-5 – Britamento de pedras para construção, inclusive mármore, ardósia,
granito e outras pedras
Pot. Poluidor/Degradador: Ar:G Água:P Solo:P Geral:M
Porte:
1 £ Área Útil < 5 ha e Número de Empregados < 30 :Pequeno
1 £ Área Útil < 5 ha e 30 £ mero de Empregados £ 300 ou 5 £ Área
Útil £ 20 ha e Número de Empregado £ 300 :Médio
Área Útil > 20 ha ou Número de Empregados > 300 :Grande
B-01-02-3 Fabricação de cal virgem, hidratada ou extinta.
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: G Água: M Solo: P Geral: M
Porte:
5.000 < Capacidade Instalada < 30.000 t/ano : Pequeno
30.000£ Capacidade Instalada £ 100.000 t/ano : Médio
Capacidade Instalada > 100.000 t/ano : Grande
B-01-03-1 Fabricação de telhas, tijolos e outros artigos de barro cozido,
exclusive de cerâmica.
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: P Solo: P Geral: P
Porte:
2.400 < Matéria Prima Processada < 12.000 t de argila/ano : Pequeno
12.000 £ Matéria Prima Processada £ 50.000 t de argila/ano : Médio
Matéria Prima Processada > 50.000 t de argila/ano : Grande
B-01-04-1 Fabricação de material cerâmico.
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: M Água: M Solo: P Geral: M
Porte:
Capacidade Instalada < 4.000 t de argila/ano : Pequeno
Capacidade Instalada > 20.000 t de argila/ano : Grande
Os demais : Médio
B-01-05-8 Fabricação de cimento.
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: G Água: P Solo: M Geral: M
Porte:
Capacidade Instalada < 200.000 t/ano : Pequeno
Capacidade Instalada > 1.000.000 t/ano : Grande
Os demais : Médio
B-01-06-6 – Fabricação de peças, ornatos e estruturas de cimento ou de gesso
Pot. Poluidor/Degradador: Ar:P Água:P Solo:P Geral:P
Porte:
155
0,04 £ Área Útil < 1 ha e Número de Empregados < 20 :Pequeno
0,04 £ Área Útil < 1 ha e 20 £ Número de Empregados £ 100 ou 1 £
Área Útil £ 5 ha e Número de Empregados £ 100 :Médio
Área Útil > 5 ha ou Número de Empregados > 100 :Grande
B-01-07-4 Fabricação de peças, ornatos e estruturas de amianto.
Pot. Poluidor/Degradador: Ar: G Água: M Solo: G Geral: G
156
Deliberação Normativa COPAM n.
o
88, de 13 de setembro de 2005
Dispõe sobre normas para o licenciamento ambiental
nos projetos de assentamento para fins de reforma agrária e
outras providências.
(Publicação - Diário do Executivo - "Minas Gerais" - 14/09/2005)
(Referendada - Diário de Executivo – “Minas Gerais” - 10/12/2005)
O CONSELHO ESTADUAL DE POLÍTICA AMBIENTAL COPAM, no
uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei n.º 12.585, de 17 de julho
de 1997, regulamentada pelo Decreto n.º 43.278, de 22 de abril de 2003, tendo
em vista o disposto no seu regulamento interno e, com base no art.e §1º do
art. 2.º da Resolução CONAMA n.º 237, de 19 de dezembro de 1997,
Considerando a indiscutível importância e interesse social do Programa
Nacional de Reforma Agrária que se constitui em atribuição do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA e dos órgãos
competentes do Governo do Estado;
Considerando a reforma agrária é uma intervenção apta a garantir a
função social da propriedade, ao mesmo tempo em que abre oportunidades de
resgate social do cidadão, proporcionando condições de melhoria da qualidade
de vida dos trabalhadores rurais assim como, do meio ambiente;
Considerando que a reforma agrária é um instrumento de política
pública cuja execução deve ser compartilhada pelo Governo Federal, Estadual
ou Municipal;
Considerando o convênio firmado entre o Governo do Estado de Minas
Gerais, através da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão – SEPLAG,
e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA;
Considerando que qualquer intervenção no meio ambiente tem de ser
precedida de estudos e proposição de medidas que garantam a proteção e
conservação dos ecossistemas e a mitigação dos impactos negativos e
maximização dos impactos positivos;
Considerando que os assentamentos rurais para fins de reforma
agrária devem constituir um dos instrumentos operacionais de reabilitação do
território e da difusão de práticas de controle ambiental adequadas aos
contextos geoambientais e sociais das áreas de implantação;
Considerando que o assentamento plenamente implantado, atendidas
as exigências desta Deliberação Normativa, pelos dados e informações
essenciais que proporciona, constitui em si fator decisivo para a maior eficácia
econômica, social e ambiental do Projeto Final de Assentamento,
DELIBERA, “ad referendum” do Plenário do COPAM:
157
Art. 1.º - Os projetos de assentamento para fins de reforma agrária
serão objeto de licenciamento ambiental, de acordo com as condições desta
Deliberação Normativa.
Art. 2.º - O processo de licenciamento objeto desta Deliberação
Normativa é composto pelos seguintes instrumentos:
I - Licença Prévia;
II - Licença de Instalação e Operação;
III - Licença de Operação Corretiva.
Parágrafo único Será concedida autorização ambiental de
funcionamento nos casos especificados nesta Deliberação Normativa.
Art. 3.º - Para efeito desta Deliberação Normativa são adotadas as
seguintes definições:
I - Autorização Ambiental de Funcionamento AAF: é a autorização
fornecida aos empreendimentos de assentamento considerados de impacto
ambiental não significativo nos quais o número de famílias assentadas não
exceda a cinqüenta, conforme o Anexo I da Deliberação Normativa 74/04, em
seu item G-05-03-07 – Projeto de Assentamento para Fins de Reforma Agrária;
II - Licença Prévia LP: licença concedida na fase preliminar do
planejamento dos projetos de assentamento de reforma agrária aprovando sua
localização, concepção e sua viabilidade ambiental;
III - Licença de Instalação e Operação LIO: licença que autoriza a
implantação e operação dos projetos de assentamento de reforma agrária, de
acordo com as especificações constantes no Plano de Desenvolvimento do
Assentamento – PDA, que deverá incluir as medidas de controle ambiental;
IV - Licença de Operação Corretiva LOC: licença fornecida aos
projetos de assentamento instalados nos termos do art. 12 do Decreto
39.424, de 5 de fevereiro de 1998.
Art. 4.º - O prazo do IEF para os procedimentos administrativos da
Autorização Ambiental de Funcionamento será de vinte dias, com prorrogação
máxima de 10 dias.
Art. 5.º - O requerimento da Licença Prévia deve vir acompanhado das
exigências constantes do Anexo II desta Deliberação Normativa.
§1.º O Relatório de Viabilidade Ambiental que acompanha o
requerimento da LP deverá contemplar, no mínimo, as exigências constantes
do Anexo II desta Deliberação Normativa.
§2.º - O prazo máximo de validade da Licença Prévia a que se refere
este artigo é de 2 (dois) anos.
§3.º - O prazo para concessão da Licença Prévia será de 90 (dias),
com prorrogação por no máximo igual período.
§4.º - Concluída a análise, o prazo de envio dos Pareceres Técnico e
Jurídico à Câmara de Atividades Agrossilvopastoris será de 45 dias.
158
§5.º - A concessão da Licença Prévia requerida pelo empreendedor
permite inclusive a medição e o parcelamento do imóvel, bem como, a
realização das atividades de subsistência.
Art. 6.º - O requerimento da Licença de Instalação e Operação deve vir
acompanhado das exigências constantes do Anexo III desta Deliberação
Normativa.
§1.º O Plano de Desenvolvimento do Assentamento que acompanha
o requerimento da LIO deverá contemplar, no mínimo, as exigências
constantes do anexo III desta Deliberação Normativa.
§2.º - O prazo máximo da Licença de Instalação e Operação a que se
refere este artigo é de 8 (oito) anos.
§3.º - O prazo para concessão da Licença de Instalação e de Operação
será de 90 (dias), com prorrogação por no máximo igual período.
Art. 7.º - O requerimento da Licença de Operação Corretiva deve vir
acompanhado das exigências constantes no Anexo IV desta Deliberação
Normativa.
§ 1.º O Diagnóstico Ambiental e o Projeto Final de Assentamento que
acompanha o requerimento da LOC deverão contemplar, no mínimo, as
exigências constantes do Anexo IV desta Deliberação Normativa.
§2.º - Para os assentamentos instalados antes da vigência da DN
COPAM n.º 44/00 e ainda não emancipados, o empreendedor fica dispensado
da Licença Prévia e da Licença de Instalação e Operação e obrigado a
requerer a Licença de Operação Corretiva, com base nas exigências
constantes do Anexo IV.
§3.º - O prazo máximo da Licença de Operação Corretiva a que se
refere este artigo é de 08 (oito) anos.
§4.º - O prazo para concessão da Licença de Instalação e de Operação
Corretiva será de 90 (dias), com prorrogação por no máximo igual período.
Art. 8.º - Fica autorizada, excepcionalmente, a concessão, pelo IEF, de
exploração florestal, nos casos de assentamentos com Licença Prévia,
respeitadas as áreas de Reserva Legal e Preservação Permanente e aquelas
que o órgão ambiental julgar conveniente.
Parágrafo único. O IEF poderá conceder autorização para exploração
florestal nas seguintes hipóteses:
I em área de uso coletivo, para possibilitar a implantação de cultivos
de subsistência antes do parcelamento, em no máximo 20% da sua área total
do imóvel;
159
II - para mais de 20%, inclusive nas glebas individuais, somente após
concessão da Licença de Instalação e Operação.
Art. 9.º - A implantação de atividades potenciais ou efetivamente
poluidoras, bem como, o uso de recursos hídricos, deverão ser objeto de
licenciamento ambiental específico e outorga, respectivamente, consoante a
sua natureza e porte.
Art. 10 - Os assentamentos de que trata essa Deliberação Normativa,
para fins de incidências de custos relativos ao licenciamento ambiental, são
considerados equivalentes aos empreendimentos Classe III pequeno
potencial poluidor/degradador e pequeno porte, de acordo com o Anexo I da
Deliberação Normativa COPAM n.º 74, de 09 de setembro de 2004.
Art. 11 - A concessão da Autorização Ambiental de Funcionamento,
bem como dos diversos tipos de licenças a serem concedidos pelo IEF fica
condicionada à inexistência de débitos ambientais.
Art. 12 - Esta Deliberação Normativa entra em vigor na data de sua
publicação.
Art. 13. Fica revogada a Deliberação Normativa n.º 44, de 20 de
novembro de 2000.
Belo Horizonte, 13 de setembro de 2005.
Shelley de Souza Carneiro
Secretário-Adjunto de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável
Secretário Executivo do Conselho Estadual de Política Ambiental
COPAM
160
Anexo I
Documentos necessários para obtenção das licenças
1. Autorização Ambiental de Funcionamento AAF (para imóveis com
capacidade de assentamento para até 50 famílias)
1.a – Formulário de Caracterização do Empreendimento Integrado – FCEI
1.b – Requerimento da AAF
1.c – Termo de Responsabilidade
1.d Declaração municipal relativa às suas leis e regulamentos (Resolução
COPAM 01/92)
1.e – Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento
1.f Anotação de Responsabilidade Técnica ART (pelas informações
prestadas)
1.g – Cópia da imissão na posse do imóvel
2. Licença Prévia – LP
2.a – Formulário de Caracterização do Empreendimento Integrado – FCEI
2.b – Requerimento da LP
2.c – Cópia da publicação do requerimento da LP
2.d Declaração municipal relativa às suas leis e regulamentos (Resolução
COPAM 01/90)
2.e – Relatório de Viabilidade Ambiental (Anexo II)
2.f – Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento
3. Licença de Instalação e Operação – LIO
3.a – Requerimento da LIO
3.b – Cópia da publicação do requerimento da LIO
3.c – Cópia da publicação da concessão da LP
3.d – Plano de Desenvolvimento do Assentamento (Anexo III)
3.e – Outorga do órgão gestor de recursos hídricos, quando for o caso
3.f. – Comprovante do custo de licenciamento
4. Licença de Operação Corretiva – LOC
4.a – Formulário de Caracterização do Empreendimento Integrado - FCEI
4.b – Requerimento da LOC
4.c – Cópia da publicação do requerimento da LOC
4.d – Diagnóstico Ambiental e Projeto Final de Assentamento (Anexo IV)
5.e – Outorga do órgão gestor de recursos hídricos, quando for o caso
5.f – Comprovante do recolhimento do custo de licenciamento
161
Anexo II
RELATÓRIO DE VIABILIDADE AMBIENTAL
1 - Caracterização sucinta da área de influência do imóvel, a partir de
dados secundários, mapas temáticos e outros recursos:
1.a. Localização do(s) imóvel(is) no(s) município(s) onde está inserido
(apresentação de mapas e plantas): delimitação cartográfica, localização do(s)
município(s) no estado, municípios limítrofes, presença de Unidades de
Conservação e outras áreas protegidas por regras jurídicas. Em caso da
existência de zoneamento econômico-ecológico do Estado, da microrregião ou
do município, identificar e enumerar as características da zona onde está
inserida a área do imóvel.
1.b. Diagnóstico descritivo do meio sico: geomorfologia/relevo, solos,
geologia, recursos hídricos (identificação e representação cartográfica da bacia
ou sub-bacia hidrográfica e descrição analítica de suas condições de
conservação/degradação ambiental), clima.
1.c. Diagnóstico descritivo do meio biótico: vegetação (descrever os
grandes aspectos fitofisionômicos da vegetação nativa e as principais espécies
endêmicas já identificadas e fauna silvestre).
1.d. Diagnóstico descritivo do meio sócio-econômico e cultural:
recursos institucionais, compreendendo infra-estrutura de serviços de saúde (e
acesso da população da região ao sistema de saúde existente), educação
(verificar a existência de rede oficial e, ou, particular de ensino nas zonas
urbanas e rurais, as séries atendidas e cursos de educação para adultos),
transporte, comercialização e armazenamento, eletrificação, comunicação,
saneamento básico e abastecimento da água (existência de água encanada,
rede de esgoto, fossas sépticas, etc.), habitação (características gerais das
habitações da região e, quando possível, indicar os materiais mais utilizados),
entidades creditícias e órgãos de apoio- pesquisa e assistência técnica- ;
discriminar as principais atividades econômicas existentes- destacar se
extrativismo e especificar o tipo; projetos/programas de desenvolvimento
regional e municipal, existência de Conselho e, ou, Plano Municipal de
Desenvolvimento Rural e Ambiental, etc; estrutura fundiária, indicar os animais
domésticos mais encontrados, caracterização da região conforme restrições de
zoneamento Federal, estadual e municipal, projetos de assentamentos
existentes na região, verificar se existem doenças endêmicas na região
(esquistossomose, doença de Chagas, malária, leishmaniose, febre amarela,
entre outras.), verificar a ocorrência de locais de interesse turístico (cavernas,
cachoeiras, lagoas naturais, áreas de relevante beleza cênica), verificar a
ocorrência de locais de interesse cultural (sítios de interesse arqueológico,
histórico, recreativo etc.). Registrar se o imóvel objeto de licenciamento
ambiental está localizado em município inserido nos territórios definidos pelo
Conselho Estadual de Desenvolvimento Territorial.
2 - Identificação do Imóvel
Denominação, área, perímetro, distrito, município, U.F., coordenadas
geográficas, bacia/ sub-bacia hidrográfica, planta do projeto georreferenciada,
número de módulos fiscais, fração mínima de parcelamento, código no SNCR,
162
vias de acesso, número aproximado de famílias beneficiadas, limites das
propriedades confrontantes, atividades desenvolvidas.
3 - Caracterização da área do imóvel
3.a. Vegetação: descrever as características da vegetação existente na
área do imóvel, destacando as espécies de potencial valor econômico, bem
como as protegidas pela legislação vigente. Deverá ser descrito o estado atual
de conservação da vegetação nativa existente e se está ocorrendo
regeneração das áreas alteradas. Registrar a ocorrência de Reserva Legal, seu
estado de conservação e distribuição. Informar sobre a existência de vegetação
de preservação permanente (matas ciliares ao longo dos cursos d’água, topos
de morros, etc.) e seu estado de conservação.
3.b. Fauna: Espécies animais predominantes, inclusive ictiofauna e
potencial de utilização, principais problemas de sobrevivência da fauna com
respectivas causas. Ressaltar espécies endêmicas, espécies predadoras e as
que estão com risco de extinção.
3.c. Recursos Hídricos: expressar a distribuição dos cursos d’água
existentes, além de explicitar características como perenidade, parâmetros
físico-químicos básicos (quando for o caso) e potencial de irrigação. Verificar a
existência de nascentes e olhos d’água na área do imóvel, especificar seu uso
e estado de conservação. As restrições de uso quanto à necessidade de
proteção de nascentes existentes na área do imóvel, as peculiaridades do uso
de solos hidromórficos e a outorga de uso da água devem ser considerados
neste tópico. Relatar as potencialidades de uso das águas subterrâneas (no
caso da existência de poços informar o número, a vazão e a profundidade).
Tipos de uso da água existentes a montante e a jusante do imóvel e, quando
possível, os previstos. Indicar as principais formas de abastecimento de água.
Verificar a existência de matadouros, frigoríficos e, ou, indústrias poluidoras
nas proximidades do imóvel.
3.d. Relevo: Deverão ser descritas as formas de relevo predominantes
(colinas, morros, platôs, outros). Tecnologias como o Sistema de
Posicionamento Global-GPS, cartas planialtimétricas, fotos aéreas, imagem de
satélite e outros materiais disponíveis deverão ser utilizados para ilustração. A
classificação do relevo deverá ser apresentada discriminando-se a classe de
relevo, o percentual do imóvel correspondente àquela classe e a área
aproximada (em hectare) conforme Quadro 1.
Quadro 1 – Classes de relevo e de declividade existentes no imóvel
Classes de Relevo Classes de Declividade Percentagem da
Área do Imóvel
Descrição Em percentual Em graus
Plano 0 – 5 0 - 2,9
Suave Ondulado 5 – 10 2,9 - 5,7
Ondulado 10 – 15 5,7 – 8,5
Muito Ondulado 15 – 25 8,5 – 14
Forte Ondulado 25 – 47 14 – 25
Áreas de Uso Restrito 47 – 100 25 – 45
Área de Preservação Permanente > 100 > 45
163
Caso não seja possível elaborar o mapa de classes de declividade,
pode-se digitalizar as curvas de nível e produzir mapa com as mesmas, de
modo a ter-se idéia do relevo da área ou, ainda, produzir um mapa com as
classes de relevo.
3.e. Solos: Classificação do solo (tipos e porcentagens de ocorrência),
em nível de ordem.
3.f. Uso da Terra: Deverá ser apresentada a classificação da
capacidade de uso das terras realizada descrevendo-se as potencialidades e
os fatores limitantes de cada classe existente na área do imóvel, podendo ser
utilizado o quadro abaixo:
Quadro 2 - Classes de capacidade de uso
Classe de Capacidade de Uso das Terras (I a VIII) I II III IV
V VI VII VIII
Área (%)
Classificação do solo
FATORES LIMITANTES Fertilidade Natural
Profundidade Efetiva
Drenagem Interna
Deflúvio Superficial
Pedregosidade
Risco de Inundação
Declividade %
Erosão
Textura
Seca Edafológica
Restrição Legal de Uso
3.g. Uso da área do imóvel: Deverá ser apresentada a distribuição de
uso da terra, quantificando as áreas conforme a sua utilização, considerando
também as áreas protegidas ou com restrições de uso. Deve-se apresentar o
Mapa de Uso Atual da Terra e Cobertura Vegetal.
4 Passivo ambiental observado visualmente, na área do imóvel,
anterior à desapropriação do imóvel.
( ) Compactação de solos;
( ) Assoreamento. Especificar local, causa e intensidade;
( ) Obstrução de cursos d’água (observar se efeitos sobre a intensidade de
inundações , pesca, navegação e sobre os padrões de drenagem;
( ) Diminuição da vazão do corpo d’água em níveis críticos;
( ) Conflito por uso da água a montante ou a jusante;
( ) Ocorrência de vetores (caramujos, mosquitos)
( ) Ocorrência de doenças endêmicas.
( ) Desmatamento de Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal;
( ) Exploração florestal sem plano de manejo aprovado;
( ) Plantio no sentido do declive , sem adoção de prática conservacionista
adequada;
164
( ) Ausência de práticas adequadas de adubação e calagem mantenedoras ou
recuperadoras da qualidade do solo;
( ) Uso inadequado das terras em relação a sua vocação;
( ) Uso de queimadas sem controle;
( ) Ocorrência de extrativismo vegetal, caça e pesca predatória;
( ) Morte de animais silvestres(terrestres ou aquáticos) por contaminação com
agrotóxicos;
( ) Intoxicação humana por agrotóxicos;
( ) Destinação inadequada de embalagens de agrotóxicos e resíduos
agrotóxicos e lixo
( ) Outros. Especificar:
5 Descrição sucinta da situação do passivo ambiental, anterior à
criação do assentamento, relacionada ao solo, água e ar.
165
Anexo III
PLANO DE DESENVOLVIMENTO DO ASSENTAMENTO
1. Apresentação
2. Identificação
2.1. Do empreendedor
2.2. Da entidade responsável pela elaboração do PDA
2.3. Da constituição da equipe responsável pela elaboração do PDA
3. Metodologia
3.1. Da elaboração do Plano
3.2. Dos Serviços de Acompanhamento e Implantação do Plano
4. Informações gerais do assentamento
Denominação do imóvel
Denominação do assentamento
Data do decreto de desapropriação
Data da imissão na posse
Data da criação do PA
Distância da(s) sede(s) municipal(is)
Área total
Área requerida na lei de reserva legal
Área requerida na lei de preservação permanente
Capacidade de assentamento do imóvel em termos de famílias
Área média das parcelas
Entidade(s) representativa(s) dos assentados (nome, CNPJ, endereço,
telefone, fax, e-mail, etc.)
5. Localização e acesso
6. Contexto sócio-econômico e ambiental da área de influência do projeto de
assentamento
Descrição das condições climáticas dominantes na microrregião da área
do assentamento
Identificação da bacia ou sub-bacia hidrográfica na qual está inserida a
área do projeto de assentamento; descrição das características
ambientais presentes na sub-bacia
Informações sócio-econômicas e de infra-estrutura do município ou da
microrregião
Em caso da existência de zoneamento econômico-ecológico do Estado
ou da microrregião ou do município, identificar as características da zona
onde está inserida a área do projeto de assentamento.
166
7. Diagnóstico do projeto de assentamento
7.1. Diagnóstico do meio natural
Informação sobre: Solos, Relevo, Recursos hídricos, Flora,
Fauna, Uso do solo e cobertura vegetal, Reserva Legal e Área de
Preservação Permanente, Estratificação Ambiental dos
Agroecossistemas, Capacidade de Uso da Terra.
Apresentar análise sucinta dos potenciais e limitações dos
recursos naturais e da situação ambiental do assentamento
7.2. Organização territorial atual
Apresentar a demarcação do perímetro e do parcelamento a
distribuição de famílias na área e a infra-estrutura existente,
sistematizando tais informações, obrigatoriamente em um mapa.
7.3. Diagnóstico do meio sócio-econômico e cultural
a) Histórico do projeto de assentamento
b) População e organização social
c) Infra-estrutura física, social e econômica
d) Sistema(s) produtivo(s)
e) Serviços de apoio à produção
- Assistência técnica e pesquisa
- Crédito
f) Serviços sociais básicos
- Educação
- Saúde e saneamento
- Cultura e lazer
- Habitação
- Outros programas governamentais e não-governamentais
7.4. Síntese das limitações, potencialidades e condicionantes (prognóstico
ambiental)
Síntese do diagnóstico, caracterizando a dimensão ambiental,
institucional, econômica e social do assentamento, numa visão
abrangente, e sintetizando as principais limitações, potencialidades e
condicionantes que podem influenciar no desenvolvimento sustentável.
8. Plano de ação para o desenvolvimento sustentável (medidas mitigadoras e
compensatórias)
O PDA deve conter o planejamento da implantação das infra-
estruturas e do desenvolvimento do assentamento, bem como deve
considerar as variáveis e dimensões em termos da organização territorial, do
sistema produtivo, dos serviços sociais, do meio ambiente, do
desenvolvimento organizacional e da implantação do plano.
Deverão ser definidas as atividades com maior potencial de impacto
e as ações necessárias ao enfrentamento dos problemas ambientais
diagnosticados, assim como de mitigação dos eventuais impactos
ambientais potenciais para os novos investimentos propostos no PDA.
8.1. Objetivos e diretrizes gerais
167
8.2. Programas
a) Programa de organização territorial (mapa do projeto de parcelamen-
to)
b) Programa social
- Educação
- Saúde e saneamento
- Cultura, lazer e esporte
- Habitação
c) Programa produtivo
- Produção agropecuária e uso econômico da biodiversidade
- Agroindústrias
- Atividades produtivas não-agrícolas
- Mercado, comercialização e abastecimento
- Segurança alimentar
d) Programa ambiental
e) Programa de desenvolvimento organizacional e de gestão do plano
f) Programa dos serviços de acompanhamento à implantação do plano
g) Programa de capacitação e formação profissional
8.4. Análise de viabilidade econômica
8.5. Investimentos totais e usos/fontes de financiamento
9. Mapas ou croquis a serem apresentados
- Mapa da bacia ou sub-bacia de localização do projeto de assentamento
- Mapa de uso atual da terra e cobertura vegetal
- Mapa/croqui da estratificação ambiental dos (agro) ecossistemas:
- Mapa do parcelamento incluindo áreas reserva legal, preservação perma-
nente e infra-estrutura existente e projetada
- Mapa/croqui da parcela média
10. Termo de compromisso dos assentados
Deverá constar do Plano de Desenvolvimento do Assentamento a
ata de assembléia dos assentados contendo a aprovação e
comprometimento dos assentados para com as medidas previstas.
168
Anexo IV
PROJETO FINAL DO ASSENTAMENTO
1. Informações gerais do Projeto de Assentamento (PA)
- Denominação do PA
- Data de criação
- Distrito e município/UF, mesorregião/microrregião FIBGE e região adminis-
trativa de Minas Gerais
- Número de famílias
- Identificação, localização do imóvel e vias de acesso (mapa 1localização
do imóvel no município)
- Área
- Perímetro
- Coordenadas geográficas
- Sub-bacia hidrográfica
- Planta do imóvel georreferenciada (mapa 2 – planta do imóvel)
- Limites (propriedades confrontantes/atividades desenvolvidas, presença de
UCs, reservas indígenas, etc.)
- Histórico do PA
2. Características da área do PA
2.1. Diagnóstico expedito descritivo dos meios físico e biótico
- Clima
- Geologia/formações superficiais
- Geomorfologia/relevo
- Solos e ambientes (Mapa 3 – unidades ambientais da área)
- Recursos hídricos (superficiais e subterrâneos)
- Vegetação nativa (Mapa 4 – uso da terra e cobertura vegetal)
- Fauna silvestre
2.2. Diagnóstico do uso atual dos recursos naturais e dos sistemas de
produção e comercialização
- Organização territorial atual (mapa 5 organização territorial atual)
projeto de parcelamento, vias locais, infra-estrutura, etc.
- Descrição dos atuais sistemas de produção e do uso e manejo dos
recursos naturais (se relaciona também com mapa 3) água, solo e
biodiversidade.
- Descrição dos sistemas de processamento (se houver) e
comercialização da produção
2.3. Diagnóstico expedito descritivo do meio antrópico (sócio-econômico)
- População
- Moradia e saneamento
- Captação e abastecimento de água e energia
- Saúde
- Estradas e transporte
169
- Educação
- Organização social e econômica
- Aspectos culturais
3. Levantamento do passivo ambiental
Descrever os impactos ambientais decorrentes:
- da organização territorial;
- da construção de infra-estrutura;
- dos sistemas produtivos e de uso e manejo dos recursos naturais
4. Apresentação de medidas corretivas (planos e programas)
Intervenções corretivas referentes às obras e edificações, tais
como: estruturas de produção (agroindústrias e instalações rurais - currais,
pocilgas, aviários etc.) infra-estrutura básica (estradas, sistemas de
abastecimento de água e eletrificação rural) e social (escolas, sedes sociais,
áreas de recreação, posto de saúde, etc.).
Intervenções corretivas referentes à implantação das atividades de
produção, beneficiamento, conservação, embalagem e comercialização.
Elaboração do plano de ações para reabilitação das áreas
degradadas.
Delimitação final das áreas de plantio, pastoreio, de extração de
materiais de construção, de atividade extrativista sustentada, da reserva
legal e áreas de preservação permanente e fixação dos processos, limites e
controles (mapa 6 – organização territorial final).
Medidas relativas à implantação dos serviços básicos de atenção à
saúde e saneamento, a cargo da FUNASA e das Secretarias de Saúde
Municipal e Estadual.
Medidas relativas à implantação dos serviços de educação, de
responsabilidade do MEC e das Secretarias de Educação Municipal e
Estadual.
5. Termo de compromisso dos assentados
Deverá constar do Projeto Final de Assentamento a ata de
assembléia dos assentados contendo a aprovação e comprometimento dos
assentados para com as medidas previstas.
170
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