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A naturalização da epistemologia não descarta a normatividade e se acomoda com a
indiscriminada descrição de procedimentos em curso. Para mim, a epistemologia é um ramo
da engenharia. É a tecnologia da busca-da-verdade, ou com um termo epistemológico mais
cuidadoso, predição. Como qualquer tecnologia, ela faz um uso livre de quaisquer
descobertas científicas que poderiam servir a seu propósito. Ela extrai da matemática a
computação de padrões de desvios e erros prováveis e o patrulhamento da falácia do
apostador. Ela extrai da psicologia experimental o patrulhamento de pensamentos
desejosos. Ela extrai da neurologia e da física, de modo geral, o desprezo pelo testemunho
de fontes ocultas ou parapsicológicas. Não há aqui questão de valores últimos, como na
moral; é uma questão de eficácia para um fim, verdade ou predição ulterior. A
normatividade aqui, como na engenharia, se torna descritiva quando o parâmetro final é
expresso
139
.
À medida que a epistemologia teórica é naturalizada em um capítulo da ciência teórica, a
epistemologia normativa é naturalizada em um capítulo da engenharia: a tecnologia de
antecipar a estimulação sensória. A mais notável norma da epistemologia naturalizada
coincide efetivamente com aquela da tradição epistemológica: nihil in mente quod non prius
in sensu. Este é um primeiro espécime de naturalização, porque é uma descoberta da ciência
natural mesma, embora falível, que nossa informação sobre o mundo vem somente através
do impacto nos nossos receptores sensórios. E o ponto ainda é normativo, avisando-nos
contra telepatas e adivinhadores
140
.
139
“Naturalization of epistemology does not jettison the normative and settle for the indiscriminate
description of ongoing procedures. For me epistemology is a branch of engineering. It is the technology of
truth-seeking, or in a more cautiously epistemological term, prediction. Like any technology, it makes free use
of whatever scientific findings may suit its purpose. It draws upon mathematics in computing standard
deviation and probable error and in scouting the gambler’s fallacy. It draws upon experimental psychology in
scouting wishful thinking. It draws upon neurology and physics, in a general way, in discounting testimony
from occult or parapsychological sources. There is no question here of ultimate value, as in morals; it is a
matter of efficacy for an ulterior end, truth or prediction. The normative here, as elsewere in engineering,
becomes descriptive when the terminal parameter is expressed.” Quine. Reply to Morton White. Pg. 664-665
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“Insofar as theoretical epistemology gets naturalized into a chapter of theoretical science, so normative
epistemology gets naturalized into a chapter of engineering: technology of anticipating sensory stimulation.
The most notable norm of naturalized epistemology actually coincides with that of tradition epistemology:
nihil in mente quod non prius in sensu. This is a prime specimen of naturalized, for it is a finding of natural
science itself, however fallible, that our information about the world comes only through impacts on our
sensory receptors. And still the point is normative, warning us against telepaths and soothsayers.”
Quine. Pursuit of Truth. Pg 19