Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
BALTASAR PENA ABAL
A CONSTRUÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE EM DISCURSOS PRODUZIDOS
PELA MÍDIA ELETRÔNICA ESPANHOLA
RIO DE JANEIRO
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
BALTASAR PENA ABAL
A CONSTRUÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE EM DISCURSOS PRODUZIDOS
PELA MÍDIA ELETRÔNICA ESPANHOLA
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Letras – Área de
concentração em Lingüística, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
como requisito parcial à obtenção do título
de mestre.
Linha de pesquisa: Práticas de linguagem e
discursividade: caminhos da Lingüística
Aplicada
Orientador: Prof. Dr. Maria del Carmen
Fátima González Daher
RIO DE JANEIRO
2007
ads:
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CEHB
A117 Abal, Baltasar Pena.
A construção da homossexualidade em discurso produzidos pela
mídia eletrônica espanhola / Baltasar Pena Abal . – 2007.
177 f.
Orientador : Maria del Carmen Fátima González Daher.
Dissertação (mestrado) Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Instituto de Letras.
1.Análise do discurso narrativo – Teses. 2. Casamento de
homossexuais - Espanha – Teses. 3. Mídia digital - Espanha - Teses.
I. González Daher, Maria del Carmen Fátima. II. Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Letras. III. Título.
CDU 82.085
3
Dissertação submetida ao Programa de Pós-graduação em Letras – Área de
concentração em Lingüística, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, como parte
dos requisitos necessários à obtenção do grau de mestre.
Banca examinadora:
Maria del Carmen Fátima González Daher – Orientadora
Doutora em Lingüística Aplicada
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
Profa. Dra. Vera Lucia de A. Sant´Anna
Doutora em Lingüística
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
Profa. Dra. Bethânia Mariani
Doutora em Lingüística Aplicada
Universidade Federal Fluminense – UFF
Suplentes:
Prof. Dr. Décio Rocha
Doutor em Lingüística Aplicada
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
Profa. Dra. Márcia Paraquett
Doutora em Lingüística Aplicada
Universidade Federal Fluminense - UFF
4
Dedico esta dissertação a todos os familiares e amigos
que souberam compreender minhas ausências nestes
dois anos de trabalho
e
a todos os homossexuais que dia-a-dia contribuem
para que diminua o preconceito e para que algum dia
todos tenhamos os mesmos direitos.
5
AGRADECIMENTOS
A Maria del Carmen Daher, pela orientação competente, pela relação amiga, pelas
palavras de ânimo, minha imensa gratidão.
A Erivaldo, pela paciência, pelo apoio, por tudo.
Aos amigos, próximos, queridos.
A todos os professores do Mestrado em Lingüística e, em especial, a Décio Rocha, Vera
Lúcia Sant’Anna e a Vanise Medeiros.
6
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo participar das discussões sobre o modo como a
imprensa espanhola, particularmente os jornais eletrônicos El País e elmundo.es, tratou
da mudança provocada pela divulgação da lei do casamento homossexual, inserindo-a
no processo de lutas pela igualdade de direitos sem discriminação sexual. Objetivamos
também refletir sobre os lugares de sentido instaurados nesses jornais e sobre efeitos
gerados no que se refere à homossexualidade. A partir desse novo acontecimento, a
divulgação por parte do governo espanhol da aprovação da lei do casamento
homossexual, é permitido ao homossexual um espaço para se dizer.
Apresentamos um breve panorama sobre a homossexualidade e os direitos os
homossexuais no mundo e traçamos um pequeno histórico da lei espanhola do
casamento homossexual. Tecemos breves considerações sobre questões de ordem
teórica como o sujeito, o poder e a mídia (FOUCAULT, 1979), focalizando neste último
aspecto a imprensa escrita. Abordamos outros aspectos relevantes na nossa pesquisa
como a circulação da informação e a tensão que se estabelece nas notícias entre opinar e
informar (SANT'ANNA, 2004). No capítulo metodológico, descrevemos o percurso da
pesquisa, que inclui os seguintes pontos: escolha dos jornais eletrônicos espanhóis,
como fonte dos discursos sobre o debate em questão, caracterização geral dos jornais,
delimitação do corpus e descrição das vozes presentes nas notícias. Nossa perspectiva
teórica é a da Análise do Discurso de base enunciativa, com ênfase nos conceitos de
dialogismo e gênero de discurso (BAKHTIN, 1978), discurso relatado (SANT'ANNA,
2004) e formação discursiva (FOUCAULT, 1969). Como resultado foi possível refletir
sobre posições enunciativas identificadas nesse corpus específico, sobre as
controvérsias que elas instauram e sobre sentidos que se depreendem desse embate.
Podemos observar também o lugar ocupado pelos homossexuais nas notícias.
Palavras-chave: análise do discurso; casamento homossexual; notícia;
acontecimento; discurso relatado.
7
RÉSUMÉ
L’ objectif de ces recherches est celui de participer aux discussions sur le
changement suscité après la divulgation de la loi concernant le mariage homosexuel
dans le procès des luttes pour l’égalité de droits sans discrimination sexuelle à travers la
presse espagnole, plus concrètement dans les journaux électroniques El País et
elmundo.es. Notre objectif est celui de réfléchir sur les sensi locus instaurés dans ces
journaux aussi que sur les sensi efectus entraînés sur l’homosexualité. À partir de ce
nouvel événement, la divulgation de la part du gouvernement espagnol de l’adoption de
la loi du mariage homosexuel, l’homosexuel aura un lieu pour dire. Nous présentons un
bref tour d’horizon sur l’homosexualité et les droits des homosexuels dans le monde
aussi qu’une brève histoire sur la loi espagnole du mariage homosexuel. Nous tissons
des brèves considérations sur des questions d’ordre théorique aussi que sujet, pouvoir et
médias (FOUCAULT, 1979) étant la presse écrite le nœud de notre recherche. Nous
abordons d’autres aspects relevants dans notre travail tels que l’information transmise et
la tension que l’on établit dans les nouvelles entre donner son opinion et informer tout
court (SANT’ANNA, 2004). Dans le chapitre concernant la méthodologie, nous décrivons
le parcours de notre travail y compris les points suivants: le choix des journaux
électroniques espagnols El País et elmundo.es, source des discours sur le débat en
question, description des voix présents dans les nouvelles composantes de notre corpus ;
délimitation du corpus proprement dit. Notre perspective théorique est celle de
l’Analyse du Discours de base énonciative, avec l’emphase sur les concepts de
dialogisme, discours rapporté (S
ANT’ANNA, 2004), le genre du discursif (BAKHTIN,
1978) et la formation discoursive (F
OUCAULT, 1969). Le résultat á été celui de pouvoir
faire des réflexions sur des positions énonciatives identifiées dans ce corpus spécifique,
sur les controverses instaurées et les sur sens que l’on apprend de ce combat. Nous
avons pu observer aussi le lieu occupé par les homosexuels dans les textes choisis.
Mots-clés: analyse du discours ; mariage homosexuel ; nouvelle ; événement ;
discours rapporté.
8
RESUMEN
Este trabajo tiene por objetivo participar en las discusiones sobre como la
prensa española, en concreto los periódicos electrónicos El País e elmundo.es, trató el
cambio provocado por la divulgación de la ley del matrimonio homosexual,
incluyéndolo en el proceso de luchas por la igualdad de derechos sin discriminación
sexual. Nuestro objetivo es reflexionar sobre los lugares de sentido instaurados en esos
periódicos así como sobre los efectos de sentido generados con respecto a la
homosexualidad. A partir de este nuevo acontecimiento, la divulgación por parte del
gobierno español de la aprobación de la ley del matrimonio homosexual, se le permite al
homosexual un espacio para decir. Presentamos un breve panorama sobre la
homosexualidad y sobre los derechos de los homosexuales en el mundo y trazamos un
pequeño historial de la ley española del matrimonio homosexual. Tejemos breves
consideraciones sobre cuestiones de orden teórico como sujeto, poder y medios de
comunicación (FOUCAULT, 1979), centrándonos en este último aspecto en la prensa
escrita. Abordamos otros aspectos relevantes en nuestro trabajo como la circulación de
la información y la tensión que se establece en las noticias entre opinar e informar
(SANT'ANNA, 2004). En el capítulo metodológico, describimos el recorrido de nuestro
trabajo, que incluye los siguientes puntos: elección de los periódicos electrónicos
españoles, El País y elmundo.es, como fuente de los discursos sobre el debate en
cuestión, caracterización general de los periódicos, descripción de las voces presentes
en las noticias que forman nuestro corpus, delimitación del corpus propiamente dicho.
Nuestra perspectiva teórica es la del Análisis del Discurso de base enunciativa, con
énfasis en los conceptos de dialogismo, discurso relatado (SANT’ANNA, 2004), género
de discurso (BAKHTIN, 1978) y formación discursiva (FOUCAULT, 1969). Como
resultado, fue posible reflexionar sobre posiciones enunciativas identificadas en ese
corpus específico, sobre las controversias que se instauran y sobre sentidos que se
aprehenden de este embate. Pudimos observar también el lugar ocupado por los
homosexuales en nuestro corpus.
Palabras clave: análisis del discurso; matrimonio homosexual; noticia;
acontecimiento; discurso relatado.
SUMÁRIO
Apresentação 12
I – A homossexualidade. Suas lutas e conquistas. 24
1.1 - Breve panorama acerca da homossexualidade e dos direitos dos
homossexuais.
24
1.2 – Dados sobre a homossexualidade no mundo 36
1.3 – Histórico da lei de casamento entre homossexuais 37
II - Considerações necessárias: os referenciais teóricos 41
2.1 – Uma certa concepção de histórica: o sujeito e o poder. 41
2.2 – O sujeito e o poder na mídia 43
2.3 – A imprensa escrita 45
2.3.1 – A circulação da informação 47
2.3.2 – Reflexões acerca da impossibilidade de informar objetivamente 50
2.4 – Contribuições da Análise de Discurso de orientação francesa 51
2.4.1. Os discursos constituintes 54
2.4.2. A noção de acontecimento 56
2.4.3 – O gênero discursivo notícia 58
2.4.4 – O discurso relatado 59
III – O homossexualismo em discurso: notícias sobre a lei do casamento gay 63
3.1 – A escolha e seleção do corpus de pesquisa 65
3.2 – As vozes presentes nas notícias 80
3.3 – O discurso dos diferentes lugares sociais. Uma pequena introdução 88
3.4 – As instituições representadas 92
3.4.1 – A Igreja 93
3.4.2 –O Governo 103
3.4.3 –O Partido Popular (PP) 109
3.4.4 – A “Ciência” 113
3.4.5 –O Foro Español de la Família 119
3.4.6 –Os representantes dos gays 127
3.4.7 –A Justiça 135
3.5 - A objetividade em questão: análise de duas notícias. 138
IV – Considerações finais 144
Referências bibliográficas 148
ANEXOS
Anexo 1: “El mundo no es de color rosa” 151
Anexo 2: Quadros de títulos de notícias 152
Anexo 3: Agrupando as vozes dos representantes das instituições 162
Anexo 4: Fragmentos de notícias nos quais “fala” algum representante da
Igreja
167
Anexo 5: Fragmentos de discurso dos representantes do Governo 169
Anexo 6: Notícias comentadas 170
LISTA DE QUADROS
Pag.
Quadro 1 Histórico da lei de casamento homossexual 39
Quadro 2 Notícias publicadas no El País e no elmundo.es em cada mês 75
Quadro 3 Distribuição das notícias por seções 75
Quadro 4 Títulos de notícias com a estrutura: sujeito + verbo dicendi +
complementos
81
Quadro 5 Ocorrências do lugares sociais nos títulos das notícias do El País e
do elmundo.es
82
Quadro 6 Quadro comparativo 84
Quadro 7 Quantidade de vozes de cada lugar social 87
Quadro 8 Diferentes visões da sociedade 89
Quadro 9 Presença do lugar social Igreja nas notícias do elmundo.es 93
Quadro 10 Presença do lugar social Igreja nas notícias do El País 94
Quadro 11: Ocorrências no elmundo.es de discurso religioso no discurso da
Igreja
94
Quadro 12 Ocorrências no El País de discurso religioso no discurso da Igreja 95
Quadro 13 Discursos constituintes no discurso da Igreja 97
Quadro 14 Fragmentos de discursos constituintes no discurso da Igreja 98
Quadro 15 A Constituição Espanhola no discurso do governo espanhol 106
Quadro 16 O discurso da Ciência no discurso do governo espanhol 108
Quadro 17 Diferentes lugares sociais remetem a estudos e informes para
justificar suas posições
115
Quadro 18 A voz do Foro Español de la Familia nas notícias de nosso corpus 125
Quadro 19 Ocorrências de vozes ligadas aos homossexuais nas notícias do
elmundo.es
128
Quadro 20 Ocorrências de vozes ligadas aos homossexuais nas notícias do El
País
128
Quadro 21 Os direitos sociais no discurso dos homossexuais 133
Quadro 22 Ocorrências de discurso relatado na notícia do elmundo.es 139
Quadro 23 Ocorrências de discurso relatado na notícia do El País 140
12
APRESENTAÇÃO
Recentemente, o governo espanhol decidiu aprovar uma reforma do Código
Civil que permite o matrimônio entre pessoas homossexuais com todos os efeitos
inerentes que essa situação legal permite, dentre eles a adoção. A Espanha é um país
marcado pela educação cristã católica, no qual a Igreja ditou, durante séculos, os
dogmas de moral relativos à família e às relações sexuais. Nesse mesmo país, a
educação heterossexista provocou um medo ao desconhecido que se converteu em
homofobia, estando ali penada a homossexualidade legalmente até 1978. No entanto, foi
lá que o governo de José Luís Rodríguez Zapatero propôs a reforma legal em 2004, e
que em poucos meses foi aprovada.
Depois de oito anos de governo do Partido Popular (doravante PP), 1996-2004,
uma das primeiras reformas sociais que o novo governo socialista espanhol propõe
executar, adiando outros compromissos assumidos durante a campanha eleitoral como o
desemprego, a moradia, a previdência social ou o atendimento a pessoas idosas, por
exemplo, é a reforma do Código Civil que aprova a união homossexual com as mesmas
garantias e direitos sociais que a heterossexual.
O novo governo espanhol pertence a um partido de esquerda, o Partido
Socialista Obreiro Espanhol (doravante PSOE), e isso poderia ter propiciado que
justamente neste momento e com estes protagonistas se tenha produzido esta mudança.
No entanto, se considerarmos a trajetória política desse país, essa explicação não parece
suficiente.
De fato, a história da homossexualidade na Espanha está marcada pela
permanente discriminação no amplo espectro político e social. Durante o franquismo
1
foi muito clara a rejeição aos homossexuais e o reforço das estruturas repressivas
policiais baseado na homofobia e suportado na legislação. Assim, segundo informação
extraída da reportagem intitulada De la cárcel al salón de bodas, publicada no El País
com data de 21 de abril de 2005, a Ley de Vagos y Maleantes (1954) incluía a
“homosexuales, rufianes y proxenetas”. O juiz podia basear seu veredito na roupa ou em
um gesto considerado efeminado. A Ley de Peligrosidad y Rehabilitación Social (1970),
1
Denominação dada ao período de 1939 até 1975 no qual Francisco Franco governou a Espanha
após a vitória militar na guerra civil (1936-1939).
13
a qual esteve em vigor até 1979
2
, estipulava que o homossexual e a lésbica teriam de ser
surpreendidos realizando atos homossexuais. Foram criados dois centros penitenciários,
um para homossexuais passivos e outro para homossexuais ativos, em Badajoz e em
Huelva, respectivamente. Nessa época, o fato de ser condenado por homossexualismo
implicava ter antecedentes penais, o que praticamente impedia a possibilidade de
conseguir um emprego legal. Este fato, ainda segundo a citada reportagem, fez com que,
perante a impossibilidade de conseguir emprego, muitos homossexuais jovens tivessem
que se dedicar à prostituição ou a outros delitos para sobreviver. Passada essa triste
etapa da história desse país as coisas não mudaram muito, já que em plena democracia
não faltaram exemplos de uma continuidade a essa não aceitação do homossexual
reforçada em parte pelos representantes dos diferentes grupos políticos. Assim, não
faltaram manifestações homofóbicas vindas do partido socialista e do comunista,
caracterizando ao homossexual como doente ou como alguém psicologicamente
desequilibrado. Durante os catorze anos em que o PSOE de Felipe González esteve à
frente do governo espanhol (1982-1996) os direitos dos homossexuais avançaram
menos do que nos cinco anos anteriores da Unión de Centro Democrático (UCD) de
Adolfo Suárez (1977-1981). Por outro lado, leis como a de “parejas de hecho”
3
ou a de
2
A ditadura militar na Espanha terminou em 1975.
3
As leis de “parejas de hecho” são instrumentos legislativos que regulam a situação jurídica das
uniões estáveis não casadas. A idéia de lei de “parejas de hecho” utiliza-se para descrever situações
diferentes, por esta razão é difícil oferecer una definição concisa. Três tipos de normas legais recebem na
atualidade o nome de lei de “pareja de hecho”:
–leis que regulam os efeitos derivados da convivência continuada, independentemente da
existência ou não de vínculos de afeto entre os membros do casal. Também são conhecidas como leis de
coabitação;
–leis que oferecem um marco regulador das situações nas que existe uma união afetiva não
matrimonial, mas nas quais não se quer questionar a supremacia do matrimônio sobre outra forma de
organização familiar. Poderíamos defini-las como leis de casais de mínimos;
–leis destinadas a eliminar as diferenças entre uniões casadas e não casadas, - desenhando um
panorama de organizações familiares radicalmente novo. Seriam leis de casais de máximos.
A união civil homossexual é uma figura próxima –mas não igual– ao matrimônio civil em quanto
a efeitos, direitos e obrigações, mas que está desenhada exclusivamente para a regulação dos casais
homossexuais. Assim, as leis de uniões civis não são de aplicação universal: as uniões heterossexuais não
podem aceder a elas porque a união civil nasceu como a alternativa homossexual ao matrimônio
heterossexual.
Ciudadanía y minorías sexuales: la regulación del matrimonio homosexual en España, de
Kerman Calvo Borobia, Texto extraído de
(http://www.felgt.org/_felgt/archivos/6634_es_Ciudadan%c3%ada%20y%20minor%c3%adas%20sexual
es.pdf). Consulta em 20 de novembro de 2006.
14
“uniones civiles” ficaram pendentes durante o felipismo e foram, paradoxalmente,
desenvolvidas pela direita liberal espanhola (1996-2004).
A esposa do ex-presidente espanhol José María Aznar (PP), falava sobre um
poderoso lobby homossexual em notícias publicadas nos jornais El Mundo e El País.
Este lobby envolveria um grupo secreto de cidadãos que pressionariam os poderes
públicos para que atendessem suas demandas, ou colaborassem com grandes
quantidades monetárias na promoção a diferentes partidos políticos, infiltrando-se assim
nos órgãos de poder. Isto teria, segundo ela, influenciado o governo a implementar a
medida. Tal afirmação parece bastante improvável em função da presença dos
homossexuais na sociedade espanhola historicamente.
Quem é ou são, então, os protagonistas dessa mudança ocorrida na Espanha?
O certo é que nos últimos anos vieram acontecendo pequenas mudanças que
foram criando aos poucos as condições de possibilidade. Os partidos políticos espanhóis
criaram departamentos específicos para tratar o tema das relações afetivas e
incorporaram em seus programas políticos propostas específicas de igualdade de
direitos para os homossexuais. Vários políticos afirmaram publicamente serem
homossexuais e a Igreja viu saírem de suas sacristias sacerdotes que assumiram sua
homossexualidade. Membros de corporações de Segurança do Estado, do Exército ou da
Guarda Civil, de alta e baixa graduação, declararam publicamente gostarem de pessoas
do mesmo sexo. Personalidades de relevância do âmbito cultural, empresarial, social e
econômico seguiram o mesmo caminho. As empresas passaram a considerar os
interesses dos homossexuais criando produtos específicos e voltando ou adaptando sua
publicidade para eles. Surgiram meios de comunicação que abordavam a temática
homossexual e que geram milhões de euros anuais. Proliferaram locais de ambiente gay
e lésbico em toda a Espanha que configuraram ao seu arredor espaços e mesmo bairros
homossexuais
4
. As redes televisivas espanholas contrataram gays para seus programas
de máxima audiência. A Real Academia de la Lengua Española manifestou-se em 2003,
determinando a prosódia correta do anglicismo “gay” e sinalando que se deve
pronunciar gái e não guéi, como vinha ocorrendo. É esse contexto gerado ao longo de
muitos anos e nessa proliferação de vozes que o governo espanhol decidiu aprovar o
4
Chueca, em Madri, por exemplo.
15
matrimônio homossexual, com a possibilidade de adoção de crianças, fato não existente
em nenhum outro governo do mundo.
A pesquisa do Centro de Investigações Sociológicas (CIS) de n°2568
5
, realizada
em junho de 2004, e considerada como o estudo mais sério e mais completo sobre o que
pensam os espanhóis a respeito do matrimônio entre pessoas do mesmo, segundo o site
de onde foi extraída a informação, oferece-nos dados importantes. O matrimônio
homossexual não se encontra, segundo a pesquisa, entre os 33 problemas mais
importantes nem entre as prioridades sociais dos espanhóis, nem com caráter geral
(problemas da sociedade), nem como pessoal (problemas que afetam à pessoa
perguntada). 88% dos informantes negam que se deva punir os homossexuais pelo fato
de sê-lo, 73% acreditam que é uma orientação tão respeitável quanto a heterossexual,
76% consideram que se trata simplesmente de uma sexualidade diferente da majoritária
e 75% pensam que não seja uma doença, nem deva ser tratada como tal.
À pergunta de se seria um problema grave o fato de um filho / uma filha ter
relações homossexuais, 30% responderam que seria um problema grave, contra 62%,
que afirmaram não sê-lo. Os dados são muito similares tanto para um filho quanto para
uma filha.
Aproximadamente dois terços das pessoas perguntadas posicionaram-se de
forma “mucho” ou “bastante” favorável a uma lei de união civil (“parejas de hecho”:
64,9% a favor e 11,6% contra), a outorgar aos casais homossexuais os mesmos direitos
que os dos matrimônios heterossexuais (67,7%, contra 23,7%) e a conceder aos casais
homossexuais o direito ao matrimônio (66,2% contra 26,5%).
Quanto à adoção por homossexuais, 48% posicionaram-se “mucho” ou
“bastante” de acordo (muito ou “bastante contra 44%). 47,6% estão “mucho” ou
“bastante” de acordo (contra 40% “poco” ou “nada” de acordo) com o fato de que os
casais heterossexuais podem garantir melhor bem-estar às crianças. Quer dizer, ainda é
maior o grupo que acredita ser melhor a adoção por casais heterossexuais. Só 9,6%
concordaram “mucho” ou “bastante” com situações nas quais a criança cuidada por um
casal homossexual é melhor atendida, afirmação com a que estão “pouco” ou “nada” de
5
A informação a seguir foi extraída do site:
http://www.unav.es/civil/nsd/nosindebate/mhquepensamos.doc
. Consultado em 20 de novembro de 2006.
Nesse site não se disponibiliza a pesquisa, apenas comentários sobre ela. Por isso não podemos informar
todas as possibilidades de resposta para cada pergunta.
16
acordo 76,8%. A formulação dessa pergunta não permitia as opções “são bons por
igual” ou “tanto faz, não afeta”, que deve ser considerado na interpretação da pesquisa.
A pesquisa concluiu que dos 66% favoráveis ao matrimônio de homossexuais,
um de cada 4 acreditam que os homossexuais não deveriam adotar filhos, um de cada
três admite que para a criança é melhor ser adotada por um casal heterossexual, três de
cada 4 negam que um casal homo seja melhor como adotante que um heterossexual,
porém todos pensam que o critério mais importante para permitir ou não a adoção seja o
do interesse do menor. Outro dado importante foi o aumento da aceitação da
homossexualidade e da disposição “formal” dos que admitem o casamento de
homossexuais. Segundo os resultados da pesquisa, a maioria dos que aceitam o
matrimônio entre homossexuais não compartilha, ou não interiorizara, ou não é
consciente das conseqüências que traz consigo a equiparação. Segundo o site de onde
foi extraída a informação, não se deve descartar que muitas das afirmações a favor do
matrimônio de homossexuais não tenham sido totalmente interiorizadas, sendo
consideradas produto do ambiente, da moda e da percepção do que seja politicamente
correto, um fenômeno, segundo o mesmo site, conhecido pela Sociologia
6
.
Seja como for, apesar de existir, a nosso entender, um panorama que propiciava
a aprovação do anteprojeto por parte do governo, seu trâmite não foi um caminho fácil
de ser percorrido desde outubro de 2004, data da divulgação da aprovação do
anteprojeto, até junho de 2005, data da aprovação definitiva no Congresso dos
Deputados. Assistimos, então, à enunciação de diferentes posições de sujeito em
embate. Os Papas, Juan Pablo II e Bento XVI pronunciaram-se várias vezes a esse
respeito condenando a proposta governamental do executivo espanhol. A Conferência
Episcopal Española em diversas ocasiões bateu de frente com os limites competenciais
e de intromissão na atuação do governo na sua argumentação contra a aprovação da lei.
Os juízes conservadores espanhóis posicionaram-se publicamente contra o projeto e
questionaram a constitucionalidade do mesmo. Algumas associações de família
organizaram campanhas de coleta de assinaturas. Os meios de comunicação divulgaram
profusamente depoimentos a favor e contra a homossexualidade e a sua equiparação
legal. O tema expandiu-se à Europa. No Conselho Europeu um candidato a comissário
fez declarações homofóbicas referindo-se ao que estava acontecendo na Espanha. Tal
6
O texto dá como exemplo o caso do racismo em USA por Andrew Hacker.
17
fato fez com que fosse demitido, além de ter gerado uma importante crise de governo no
seio da instituição européia.
A sociedade espanhola evoluiu socialmente e os homossexuais organizados ou
individualmente souberam repetir que possuem os mesmos direitos que qualquer outra
pessoa. Aos poucos fizeram visível a homossexualidade para diminuir as reações
homofóbicas da sociedade espanhola até conseguirem serem mais aceitos. Aos poucos
convenceram a sociedade, os políticos, e romperam estereótipos.
Esta apresentação visa situar o leitor com relação ao contexto em que se
produziu a aprovação da lei de casamento homossexual na Espanha, bem como orienta-
lo em acerca das diferentes partes que compõem esta pesquisa.
Conseguimos formular a pergunta de pesquisa que perpassa nossas análises e da
qual tentamos dar conta ao longo deste trabalho: Que vozes são trazidas pelo
enunciador-jornalista para as notícias dos jornais El País e elmundo.es que tratam o
tema da aprovação da lei do casamento homossexual? Qual lugar ocupam os
homossexuais no nosso corpus?. O espaço dos homossexuais é o da terceira pessoa?
Fala-se deles? Quem são os homossexuais em função dessas vozes que os falam? Ou
será que os homossexuais ocupam no nosso corpus uma posição de sujeito e podem,
portanto, falar-se? Se isto é assim, quais os sentidos instituídos?
A pesquisa que propomos realizar insere-se na área da Lingüística Aplicada e
tem como questão central refletir sobre a construção discursiva, na imprensa espanhola,
de sentidos para a homossexualidade, tendo como marco o evento empírico já referido.
Objetivamos neste trabalho participar das discussões sobre o modo como a
imprensa espanhola tratou dessa mudança inserindo-a no processo das lutas pela
igualdade de direitos sem discriminação sexual, por meio da análise de notícias dos
jornais El País e El Mundo. Além disso, pretendemos refletir sobre quais os lugares de
sentido instaurados nesses jornais e quais os efeitos de sentido gerados no que se refere
à homossexualidade.
O trabalho organiza-se em quatro capítulos. No primeiro capítulo tentamos dar
uma visão geral da situação da homossexualidade no mundo e da trajetória percorrida
pela lei do casamento homossexual desde a sua divulgação até sua aprovação. O
segundo está dedicado a algumas noções como história, sujeito, poder e sua articulação
com a mídia. Nesse capítulo expomos, ainda, reflexões acerca da relevância da
18
imprensa na socialização de saberes a respeito da orientação sexual e centramo-nos no
que se conhece como escola francesa de Análise do Discurso e, concretamente, na sua
visão da linguagem e em conceitos como dialogismo, formação discursiva, sujeito e
gênero de discurso. No terceiro capítulo, privilegiamos os critérios de escolha e seleção
do corpus de pesquisa e fazemos uma caracterização do discurso dos diferentes
representantes de instituições presentes em nosso corpus. O quarto capítulo está
dedicado, via análise de duas notícias, a explicitar algumas contradições acerca da
pretendida objetividade das notícias de nosso corpus.
Como já expusemos, em outubro de 2004 foi aprovado no Conselho de
Ministros da Espanha o anteprojeto de Lei que permite o matrimônio e a adoção, entre
outros direitos, de casais homossexuais. Esta aprovação garante a famílias com uma
identidade “marcada” o acesso a um “imaginário” que secularmente lhes foi negado.
Em março de 2004, o Congresso espanhol inicia a tramitação do projeto de lei,
rejeitando as emendas à totalidade apresentadas pelo PP, principal partido da oposição,
e pela Unió Democrática de Catalunha (UDC). A partir desse momento, o projeto de lei
percorre um longo caminho até ser aprovado definitivamente em junho de 2005: obteve
a aprovação no Congresso pela Comissão de Justiça, a aprovação pelo Congresso, a
rejeição do Senado dos vetos do Partido Popular e de UDC à lei, a inclusão no Senado
de um emenda conjunta do PP e da UDC que permita a autoridades e servidores
públicos a alegação do direito de abstenção, por razões de consciência, para a não
celebração de matrimônios entre homossexuais; o veto do Senado à lei com os votos do
PP, de Convergência i Unió (CiU) e do Partido Aragonesista (PAR) e, finalmente, a
aprovação definitiva da lei pelo Congresso, em junho de 2005, e sua entrada em vigor,
no 4 de junho desse ano.
A Espanha converteu-se no quarto país do mundo, depois da Holanda (2000), da
Bélgica (2003) e do Canadá (2005) a permitir a plena equiparação dos casamentos gays.
Essas uniões estão também legalizadas em cinco províncias canadenses e em
Massachusetts, nos Estados Unidos. Além disso, existe já a união civil na França, na
Alémanha, na Suécia, na Finlândia, na Noruega, na Dinamarca, na Islândia, na Suíça, na
África do Sul e em Buenos Aires.
19
A reforma que o Governo espanhol aprovou em outubro de 2004, no Conselho
de Ministros, modifica catorze artigos do Código Civil, nos quais constavam referências
unicamente aos casamentos heterossexuais.
O cerne da questão, segundo as informações publicadas no jornal El País
(2/10/2004), está na modificação do artigo 44 do Código Civil. Este artigo diz que:“o
homem e a mulher têm direito a contrair matrimônio conforme as disposições deste
Código”. Com o fim de incluir a possibilidade de que um homem se case com outro
homem, ou uma mulher com outra mulher, acrescentou-se ao texto o seguinte
parágrafo: “a identidade de sexo de ambos contraentes não impede a celebração do
casamento nem seus efeitos”. As demais mudanças afetaram outros treze artigos nos
quais as expressões “homem e mulher” ou “pai e mãe” são substituídas por
denominações como “cônjuges” ou “pais”. Dentre outros artigos a serem reescritos
figuram o 66 e 67, relativos aos direitos e deveres dos cônjuges; o 154 (primeiro
parágrafo), 160 (primeiro parágrafo), o 164, sobre a pátria potestade (segundo
parágrafo); o 637, sobre doações (segundo parágrafo), e oito artigos sobre o regime
econômico: 1323, 1344, 1348, 1351, 1361, 1365 (segundo parágrafo), 1404 e 1458.
A lei conferiu a plena equiparação aos matrimônios gays, incluindo-se o direito
ao casamento e ao divórcio; às pensões (alimentícias e de viuvez), à sucessão, quando
não exista testamento; à residência e à nacionalidade aos cônjuges estrangeiros; à tutela
ou direito ao cuidado do companheiro incapacitado; à licença de casamento,
maternidade própria ou do outro membro do casal; à permissão de não testemunhar
diante de um tribunal contra o cônjuge, entre outros. Tal e como publicado na primeira
página desse jornal (30/09/2004), essas mudanças baseiam-se “na promoção da
igualdade afetiva, na preservação da liberdade ideológica (...) e no desfrute dos direitos
sem discriminação alguma por questão de sexo em uma sociedade livre, pluralista e
aberta”.
Na mesma edição desse jornal, afirma-se ainda que a reforma pretende se
adaptar à “evolução social e reconhecer os diversos modelos de convivência”, já que
segundo o Presidente do Governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, “os
homossexuais têm todas as obrigações como cidadãos e, no entanto, têm negados alguns
20
direitos”. Segundo o El País de 1 de outubro de 2004
7
, o que o Governo pretende é que
“esses cidadãos que todos conhecemos, porque são amigos, parentes ou companheiros
de trabalho, deixem de ser de segunda e tenham plenos direitos, o que inclui que possam
formar uma família”.
O texto considera ainda que a convivência como casal entre pessoas do mesmo
sexo “baseada na afetividade” tem sido objeto de aceitação social crescente, “superando
arraigados preconceitos e estigmatizações”. “Hoje se admite sem dificuldade”, afirma o
texto, “que esta convivência de casal seja um médio por meio do qual se desenvolve a
personalidade de um amplo número de pessoas; (...) sem mais transcendência que a que
tem lugar numa relação privada”.
O caminho percorrido pela lei desde outubro de 2004 até junho de 2005 não
esteve livre de empecilhos e obstáculos. Membros de diferentes setores da sociedade
tiveram suas vozes incluídas nas notícias posicionando-se contra a lei do casamento
homossexual, criticando a conduta dos homossexuais e negando-lhes seus direitos,
alegando advertir para as supostas conseqüências negativas que traria consigo a
aprovação da lei etc. Assim, o PP apresentou, em 30 de setembro de 2004, uma
iniciativa parlamentar a favor de regulamentar a união civil (“parejas de hecho”), na
qual reconhecia as uniões homossexuais, mas não o seu caráter de matrimônio. Durante
os oito anos que esse partido conservador esteve no Governo (1996-2004) rejeitou
inúmeras iniciativas para regulamentar a união civil ou o casamento entre
homossexuais. Os populares defendiam que não existia necessidade objetiva dessa
regulamentação de casamentos entre gays e que o fato de não fazê-lo não implicava
discriminação. A respeito das adoções sempre declarou que deveria estar restrita a uma
só pessoa (qualquer que fosse o sexo) ou a casais formados por homem e mulher,
unidos em casamento ou de forma permanente por relação de afetividade análoga à
conjugal. Com isto, deixava fora a adoção conjunta de casais de gays e lésbicas.
Já a Asociación Profesional de la Magistratura (APM), majoritária e
conservadora na carreira judicial, posiciona-se dizendo que considera contrário à
Constituição espanhola o casamento entre homossexuais. Admite que se regulamentem
as uniões homossexuais “mas que não sejam chamadas de casamento” (El País,
7
El País, 1- 0ut-05: Zapatero afirma que con la ley del matrimonio los gays dejan de ser
ciudadanos "de segunda” .
21
1/10/2004). Por sua vez, na mesma edição desse jornal, mas em outra notícia o
responsável pela Família da Conferência Episcopal Espanhola, Inocente García, afirma
que com o projeto que concede o casamento e a adoção aos casais gays “a família fica
destruída”, acrescentando que “não nos resta nada da definição de matrimônio”. Em 3
de outubro de 2004, o mesmo jornal noticia as palavras do bispo de Mondoñedo-Ferrol,
José Gea Escolano, segundo o qual: “um homossexual não é normal”.
Como se pode ver, a questão é polêmica e provoca a circulação de discursos
procedentes de diferentes lugares sociais. Portanto, nosso trabalho tem como foco a
análise desse acontecimento, divulgado pela mídia, a partir de 1 de outubro de 2004.
Nosso interesse na aprovação do anteprojeto de lei que permite o matrimônio e a adoção
a casais homossexuais na Espanha deveu-se ao fato de considerarmos que este
acontecimento constitui um avanço em favor de uma sociedade plural, ao reconhecer
uma série de direitos a uma identidade sexual secularmente excluída. Acreditamos
também que estejam se instituindo novas verdades a respeito da homossexualidade e
que nessa instituição, bem com em sua divulgação, a mídia joga um papel muito
relevante. É por isso que escolhemos o jornal eletrônico como suporte.
Woodward (2001) nos orienta a respeito de como se produz esse processo de
reconhecimento de que falamos:
A política de identidade tem a ver com o recrutamento de sujeitos por
meio de processo de formação de identidades. Esse processo se
tanto pelo apelo às identidades hegemônicas – o consumidor
soberano, o cidadão patriótico – quanto pela resistência dos “novos
movimentos sociais”, ao colocar em jogo identidades que não têm
sido reconhecidas, que têm sido mantidas “fora da história”
(Rowbotham, 1973) ou que têm ocupado espaços às margens da
sociedade.
(WOODWARD, 2001, p.36)
Objetivamos neste trabalho promover a discussão e um maior conhecimento
sobre o modo como a imprensa espanhola tratou dessa mudança inserindo-a no processo
das lutas pela igualdade de direitos sem discriminação sexual, por meio da análise de
notícias dos jornais El País e El Mundo.
Como aponta Woodward
, (2001, p.33)
Todo contexto ou campo cultural tem seus controles e suas
expectativas, bem como seu “imaginário”; isto é, suas promessas de
prazer e realização. Como sugere Lorde, os pressupostos sobre
22
heterossexualidade e os discursos racistas negam a algumas famílias
o acesso a esse “imaginário”. Isso ilustra a relação entre o social e o
simbólico. (...) Toda prática social é simbolicamente marcada. As
identidades são diversas e cambiantes, tanto nos contextos sociais nos
quais elas são vividas quanto nos sistemas simbólicos por meio dos
quais damos sentido a nossas próprias posições. Uma ilustração disso
é o surgimento dos chamados “novos movimentos sociais”, os quais
têm se concentrado em lutas em torno da identidade.
A relevância dessa pesquisa que propomos desenvolver reside, a nosso modo
de ver, no fato de pretendermos com ela participar de um conjunto de reflexões voltadas
para a ampliação do perfil do lingüista, ou melhor, do analista do discurso, como
cientista social, em especial no que se refere a análises que se voltam para o
conhecimento de seu entorno sócio-histórico. Como Daher, Rocha, e Sant´anna (2004),
pensamos que tal perfil não só atende a novas demandas da sociedade, como também
permite a esse profissional aproximar-se de discussões teórico-metodológicas que até
pouco tempo não eram privilegiadas pelos estudos lingüísticos.
A pesquisa que propomos realizar insere-se na área da Lingüística Aplicada e
tem como questão central refletir sobre a construção discursiva, na imprensa espanhola,
de sentidos para a homossexualidade, tendo como marco o acontecimento já referido.
Pensamos que esse acontecimento provocou o embate de um conjunto de forças e que
uma análise das vozes privilegiadas pela imprensa que circulam nessa cojuntura
histórica (o governo, a igreja, os homossexuais etc.) trazidas pelo enunciador-jornalista
para o espaço discursivo nos permitirá, a partir da observação de certas marcas
lingüístico-discursivas, concluir os sentidos do que se nos apresenta como “informação
objetiva”, do que prolifera ou se permite que ocupe os espaços de divulgação midiática.
Além dessa questão central, outros pontos também serão abordados, de forma
periférica.
O corpus de nossa pesquisa está constituído por notícias extraídas dos jornais
espanhóis El País e El Mundo. Essa seleção considerou o fato de, entre os espanhóis, El
País ser considerado como um jornal que reflete um pensamento de esquerda e El
Mundo ter uma orientação mais de direita. Assim sendo, fazemos a hipótese de que o
relato dos trâmites e da aprovação da lei nesses jornais deverão ser diferentes. Ou seja, o
jornal El País estará comprometido com uma concepção da homossexualidade e dos
direitos dos homossexuais em concordância com as ideologias da esquerda e o El
23
Mundo com as ideologias de direita em relação à homossexualidade e aos direitos dos
homossexuais, ambos privilegiando vozes de diferentes agentes sociais da sociedade
espanhola.
Assim, nossa pesquisa articula questões de linguagem, identidade, política e
poder, buscando identificar elementos que dêem visibilidade a estas relações. Importa-
nos, dessa forma, refletir sobre quais os lugares de sentido instaurados nesses jornais e
quais os efeitos de sentido gerados no que se refere à homossexualidade.
Nossa opção considera, pois, uma reflexão voltada para a análise da
construção de sentidos para a homossexualidade nas notícias veiculadas nesses jornais
acerca da aprovação do anteprojeto de lei já mencionado, com o fim de verificar se o
tratamento dado nos textos ao tema da lei de casamento homossexual e à
homossexualidade se corresponde com a que para nós, enquanto leitores, pensamos
definir esses jornais. Esta reflexão integraria uma discussão maior acerca da
possibilidade ou não de “informar objetivamente”, da viabilidade de contar algo sem se
posicionar a partir de um ponto de vista determinado.
24
1. A HOMOSSEXUALIDADE: LUTAS E CONQUISTAS.
Neste capítulo, traçaremos um breve panorama acerca das lutas e conquistas dos
homossexuais nos EUA e na Grã Bretanha, onde surgiram os primeiros movimentos em
defesa dos interesses deste coletivo. A seguir, fazemos um pequeno comentário sobre a
perseguição que ainda sofrem os homossexuais em muitos países do mundo. Por último,
elaboramos um histórico da lei do casamento homossexual aprovada na Espanha desde
a sua divulgação até a aprovação definitiva no Congresso dos Deputados. Nosso
objetivo é contextualizar a polêmica surgida em torno da lei num contexto mais amplo
de conquista de direitos civis.
1.1. Breve panorama acerca da homossexualidade e dos direitos dos
homossexuais
De acordo com Nunan (2003), as primeiras organizações direcionadas para a
melhoria das condições de vida de gays e lésbicas surgiram nos Estados Unidos da
América, em 1924. Chasin (apud NUNAN, 2003) constata que esses grupos eram
denominados de organizações homófilas e atuavam de modo discreto para educar o
público a respeito da homossexualidade e para dar apoio aos homossexuais. Tais grupos
sobreviveram a muito custo até as décadas de 1950 e 1960.
O movimento homossexual que posteriormente se desenvolveu optou por uma
nova linguagem, mais politizada e radical, tendo rejeitado o termo homófilo, que não
voltou a ser usado.
No final dos anos 60, paralelamente à reconsideração, pelas
feministas, das identidades e papéis sexuais, alguns homossexuais
norte-americanos saem de seu silêncio forçado para pôr termo a uma
clandestinidade dolorosamente sentida como patologia. Para
começar, eles mudam de designação. Em vez de “homossexuais”, que
tem uma conotação médica ligada à perversão, eles preferem a
denominação de “gays” (que existe desde o século XIX), mais neutra,
que designa uma cultura específica e positiva. (B
ADINTER, apud
N
UNAN, 2003, p. 104)
A década de 1960 foi um marco histórico para os jovens de todo o mundo e para
certas minorias, como a dos homossexuais, uma referência.
Uma série de movimentos sociais surge nos Estados Unidos da América
(E.U.A.) reivindicando direitos civis para segmentos da sociedade há muito
25
estigmatizados: estudantes, negros, homossexuais, etc. Era uma conseqüência natural de
uma série de mudanças em curso mundo afora:
1. oposição da população norte-americana à guerra do Vietnã;
2. luta pelos direitos civis dos negros nos E.U.A.;
3. revolta estudantil de maio de 1968 em Paris (França);
4. surgimento do movimento hippie nos E.U.A. e Europa, cujo slogan era “faça
amor, não faça a guerra”;
5. surgimento do movimento ambientalista;
6. ascensão do rock no panorama musical mundial, graças ao sucesso de grupos
como Beatles, Rolling Stones e concertos ao ar livre como Woodstock;
7. surgimento do movimento feminista.
No seio dessas mudanças, ocorreu o episódio conhecido como Stonewall, em
Nova York (E.U.A.), em 1969. De acordo com Spencer (1996), a polícia da cidade
invadiu um bar gay, o Stonewall In, no bairro de Greenwich Village, alegando infração
da permissão para a venda de bebidas alcoólicas. Os gays que freqüentavam o bar, junto
com os demais gays que estavam nos bares vizinhos, contra-atacaram e enfrentaram a
polícia durante dias.
Nunan (2003) descreve da seguinte maneira o incidente de Stonewall:
Na noite de 28 de junho de 1969, alegando o descumprimento de leis
sobre a venda de bebidas alcoólicas, policiais tentaram mais uma vez
fechar a Stonewall Inn, bar freqüentado por homossexuais no
Greenwich Village, em Nova York. Com a desculpa de que o local
era propriedade da máfia italiana instalada na cidade, o bar vinha
sofrendo reiteradas invasões da polícia, que aleatoriamente prendia e
agredia seus freqüentadores. O que era para ser uma ação policial
rotineira, no entanto, suscitou uma reação inédita: embalados pelas
barricadas de maio de 1968 em Paris, os homossexuais atacaram os
policiais com garrafas e pedras e estes rapidamente tiveram de
chamar batalhões de reforço. Gritando frases como “Poder Gay” e
“Sou bicha e me orgulho disso”, os homossexuais acabaram
chamando a atenção da imprensa, e a cidade parou para ver o
desfecho da situação. A batalha, que se transformou em um marco da
luta gay, prolongou-se por cinco dias, sendo resolvida com a
intervenção do prefeito, que ordenou o fim da violência policial. A
partir de então, o dia 28 de junho é comemorado por mais de 140
países como Dia Internacional do Orgulho Gay, por meio da
realização de várias paradas no decorrer dos meses de junho e julho.
(N
UNAN, 2003, p. 105-106)
26
Teve início então uma fase de grande transformação no universo gay. Seus
integrantes começaram a falar abertamente sobre a sua condição gay, a comportarem-se
conforme a sua sensibilidade pedia e passaram a reivindicar o fim da opressão e da
discriminação.
Matthaei (apud Nunan, 2003), observa que a revolta de Stonewall favoreceu o
crescimento, a visibilidade e uma mudança de atitude no interior do movimento
homossexual, ou seja, anteriormente ligado a grupos de esquerda e ao feminismo
radical, logo após esse episódio, o movimento homossexual se mostrou centrado numa
política liberal que almejava direitos e proteção legal contra a discriminação de gays e
lésbicas. Nesta ótica, sendo o corpo uma propriedade privada e desde que a sexualidade
se restrinja à esfera doméstica, o que estaria em discussão, na lógica liberal, era o direito
do indivíduo à privacidade. Desse modo, o movimento homossexual advoga que o
direito à privacidade e, por conseguinte, à homossexualidade, deve ser conquistado na
esfera pública: leis, mídia e opinião pública.
Surge logo após, em Londres, a Frente de Liberação Gay (GLF), em 1970,
inspirada em Stonewall. Seus membros estavam na faixa etária de 24 a 35 anos e eram
artistas, estudantes, professores, sociólogos. Nas ruas adotavam atitudes como beijar,
abraçar, andar de mãos dadas, configurando uma nova modalidade de “sair da casca”.
O primeiro passo foi
(...) os gays se mostrassem para eles próprios (...) a fim de que se
sentissem capazes de encarar sua natureza e não ver nada de errado
nela, de que não enxergassem mais a si próprios por meio dos olhos
da sociedade. A partir do momento em que passaram a se orgulhar de
si mesmos, tornou-se possível falar com a família e com os colegas
sem sentir a vergonha e a humilhação freqüentemente imposta aos
jovens gays (S
PENCER, 1996, p.349)
A GLF lançou um manifesto em 1971, no qual é veiculada uma nova percepção
do que a sociedade havia feito aos homossexuais. A opressão, segundo o documento,
inicia-se com os papéis que os gêneros desempenham na instituição denominada
família: o macho é dominante, a fêmea é submissa e os filhos têm moldado o seu
comportamento pelos ensinamentos dos pais. O homossexualismo é excluído, sendo
percebido como perversão doentia. Os gays não tinham outra opção fora da estrutura
social heterossexual, a não ser dispor de relações sexuais breves e clandestinas. A
sociedade percebia os gays como indivíduos fracassados, doentes ou que sofriam
27
desvios psíquicos. Eram criticados e boicotados por colegas, quando não eram atacados
por gangues. Segundo se pode deduzir do dito até aqui, a década de 1960, o cotidiano de
um homem gay era um tormento, uma questão de sobrevivência.
Spencer (1996) relata que os homens gays desenvolveram técnicas para se
defenderem como o anonimato. Surgem códigos e linguagens diversos. Entretanto,
alguns desenvolveram um comportamento afetado e extrovertido, que provocaria risos e
ocupava um nicho social no seio da sociedade. Posteriormente, alguns gays
concordavam com a visão que a sociedade tinha a respeito deles, o que reforçava a
vergonha, a culpa e a auto-rejeição entre os mesmos.
Movimentos como a GLF foram muito importantes na vida dos gays ingleses
pois desafiavam os estereótipos homossexuais, os circuitos dos locais de encontros e os
valores do gueto, bares e pub gays. Mostravam à sociedade uma nova perspectiva do
homossexual, ao mesmo tempo em que denunciavam pubs que discriminavam clientes
gays. Surgem então discotecas cujos proprietários são gays, onde se pode encontrar
livremente um parceiro.
Nos Estados Unidos, surge em Nova York a Semana do Orgulho Gay, em 1970,
e o Dia de Orgulho Gay de Londres, na Grã-Bretanha, em 1972, marcos da luta em prol
dos direitos civis dos gays.
Na Grã-Bretanha surgem organizações gays que fazem campanhas contra filmes,
programas de televisão e livros que tinham uma postura homofóbica. Além disso,
organizavam palestras e eventos sociais. Até mesmo um jornal quinzenal, o Gay News
foi fundado, em 1972, com a finalidade de divulgar artigos sobre pessoas e temas
importantes para os gays, bem como crítica literária, de cinema e de TV.
Nos Estados Unidos, o movimento civil de direitos dos gays começava a ter uma
militância ativa, conseguindo, às vezes, evitar a adoção de leis restritivas aos
homossexuais, favorecendo a aceitação dos gays na família, no local de trabalho e na
mídia e a redução das sanções legais e sociais contra os gays. Desse modo, o
movimento gay modificou substancialmente a visão da sociedade sobre os gays.
Spencer (1996) observa que
Uma das maiores mudanças desencadeadas pela liberação foi
estimular a crença de que o amor entre pessoas do mesmo sexo era
natural e sadio. A nova definição de amor gay destruiu qualquer
conceito de desvio de gênero e, portanto, eliminou a necessidade de
artifícios, como maneiras afetadas e travestismo, gerando um novo
28
orgulho e um senso de integridade na inteireza do homem gay.
(S
PENCER, 1996, p.355)
O número de grupos homossexuais cresceu muito, a partir de então, no mundo
inteiro, especialmente nos Estados Unidos, no decorrer do período 1970-1980. Os novos
ativistas, abertamente, identificando-se como gays, demonstravam autoconfiança nunca
vista anteriormente. Surge então, no mundo, uma nova minoria, com identidade e
cultura própria bem como expressão política.
É importante assinalar o que diz Áries a respeito:
Doravante não são mais nem médicos nem padres que fazem da
homossexualidade uma categoria à parte, uma espécie: são os
próprios homossexuais que reivindicam sua diferença, e que assim se
opõem ao restante da sociedade, ao mesmo tempo em que exigem
seu lugar ao sol. (Á
RIES apud NUNAN, 2003, p. 107)
O movimento de libertação gay provocou uma mudança na visão que os
homossexuais tinham a respeito de si próprios. A maior mudança foi na crença de que o
amor gay era algo natural e sadio.
A nova definição de amor gay destruiu qualquer conceito de desvio
de gênero e, portanto, eliminou a necessidade de artifícios como
maneiras afetadas e travestismo, gerando uma novo orgulho e um
senso de integridade na inteireza do homem gay. (S
PENCER, 1996, p.
355)
A partir de então, os diversos locais de lazer (bar, restaurante, livraria etc)
começaram a aceitar a presença de gays, estimulando a formação de círculos de
relacionamento no interior destes grupos. Verdadeiras famílias se formaram, compostas
de gays de diferentes círculos. Tais locais formavam um circuito: os gays utilizavam a
mesma academia, jantavam em determinados restaurantes e freqüentavam os mesmos
bares.
Os gays destes circuitos tinham como modelo o ícone masculino cow-boy, do
comercial do cigarro Marlboro: uma imagem musculosa e dura. De acordo com Spencer
(1996) a moda predominante à época era composta de camisa de flanela xadrez, calças
jeans, botas, cabelo curto e bigode. Os bares reproduziram motivos western e os garçons
usavam chapéus e botas de cow-boy, e alguns bares exibiam filmes pornográficos em
salas pequenas. O ideal erótico dos gays eram homens fisicamente bonitos e fortes,
29
musculosos e de genitália proeminente. O sexo era bruto e desinibido, admitindo o
sadomasoquismo.
Spencer (1996) advoga que os gays copiavam o que os machos chauvinistas
tinham de pior, tratando os seus parceiros com crueldade e mesmo insensibilidade, ou
seja, os parceiros gays estavam ainda presos ao antigo sistema heterossexual,
representando os tradicionais papéis de marido e mulher. O autor reitera que
(...) a imagem de machão vigoroso e a aparência de normalidade
masculina eram posturas tão artificiais como o do travesti de antes.
Ao tentar criar um nicho numa sociedade que ainda negava sua
existencia, os gays de auto-impunham caricaturas dessa mesma
sociedade”. (S
PENCER, 1996, p. 356)
Nas grandes cidades, conseguir um amante duradouro era considerado a etapa
final de um relacionamento. Inicialmente, foi importante ter um círculo de amigos gays,
motivo de orgulho por demonstrar a capacidade de constituir um ambiente familiar.
Entretanto, surgiram problemas com a família, amigos e colegas de trabalho e os
amantes retornavam à convivência num ambiente misto.
O contexto de classe média dos bairros afastados dos grandes centros apenas
reforçava a devoção do indivíduo ao trabalho, a manutenção do lar, da propriedade e
uma ligação constante com o universo heterossexual. A maior parte dos homens
mostrava-se feliz ao conseguir ter uma rotina e convívio social diário, não considerando
a possibilidade de viabilizar uma rede social gay.
Uma união entre homossexuais não tendo apoio religioso ou legal, tem
dificuldades de estabelecer ligações com a comunidade, principalmente por não
existirem crianças, na maior parte das vezes. Não tendo crianças, os gays não mantêm
ligações com escolas, associações de pais ou pais de amigos dos filhos. A inexistência
de um casamento e de famílias convencionais levava os casais homossexuais a
supervalorizarem as amizades gays, formando uma espécie de família, que termina
unindo indivíduos de etnia, classe social e crenças diferentes, para o mencionado autor.
A consolidação do movimento gay está intimamente relacionada à criação de
uma identidade homossexual positiva frente à sociedade. O coming out of the closet, ou
seja, a “saída do armário”, expressão em voga a partir de então, pode ser traduzido na
acepção de Pollack como
30
O duplo processo de integração na comunidade homossexual e de
afirmação da homossexualidade para o exterior, não somente como
aprendizado e aceitação da homossexualidade, mas como a busca de
um estilo de vida. (P
OLLACK, apud NUNAN, 2003, p. 108-109)
O significado social de “sair do armário” também sofreu mudanças com o
movimento gay. Anteriormente o termo significava que o indivíduo aceitava o fato de
ser homossexual e revelava a sua orientação para alguns amigos íntimos e, às vezes,
para familiares.
A partir do movimento de liberação gay, “sair do armário” teve o seu significado
modificado para um processo eminentemente político “(...) por meio do qual o
indivíduo questiona, com orgulho e desafio, a hegemonia heterossexual, tornando-se ao
mesmo tempo visível e culturalmente inteligível.” (NUNAN, 2003, p.108)
Por último, o advento da AIDS na década de 1980, em função das perdas em
vidas que ocasionou, terminou contribuindo para que um crescente número de gays se
assumisse como homossexuais.
Na década de 1990, o movimento homossexual enfrenta novos desafios e
algumas conquistas são alcançadas. Entretanto, a luta pelos direitos de homossexuais
está apenas iniciando-se na Europa. Na atualidade, apesar de o continente contar com
alguns países que permitem o casamento entre homossexuais (Holanda, Bélgica e
Espanha), os europeus ainda discutem como lidar com questões complexas como a
união civil e a adoção de crianças.
A União Européia (UE) conta com 25 países e, destes, dez não dispõem de
nenhum instrumento oficial que assegure a união entre homossexuais de acordo com a
Associação Internacional de Gays de Lésbicas (ILGA), especialmente entre os novos
integrantes do leste europeu, países conservadores e de maior tradição católica.
No tocante à legalização da parceria entre os homossexuais, a ILGA estabelece a
seguinte distinção entre casamento e contrato de parceria (união civil) entre
homossexuais:
Casamento – quando os direitos, a responsabilidade e o reconhecimento legal
são os mesmos dados aos casais heterossexuais.
Contrato de parceria (união civil) – “onde direitos específicos e enumerados,
responsabilidades e reconhecimento legal, que podem ser idênticos, muito próximos
31
ou inferiores àqueles dos casais heterossexuais, são dados a casais que assinem um
contrato de parceria”.
A seguir, mostramos uma linha do tempo onde explicitamos os avanços
conseguidos até hoje nos direitos dos homossexuais em todo o mundo. Acima da linha
contemplam-se as datas relativas à instituição do casamento e, abaixo, as da união civil.
32
Linha do tempo dos avanços nos direitos dos homossexuais:
CASAMENTO
Stonewall Holanda Bélgica Espanha,
Canadá
1969 1989 1993 1994 1999 2000 2002 2003 2004 2005 2006
Suécia Alémanha Connecticut
(Estados
Unidos),
Reino Unido
Dinamarca
Vermont
(Estados
Unidos)
Massachusetts,
Nova York
(Estados
Unidos)
Luxemburgo
Suíça,
África
do
Sul
8
Noruega
França
Buenos
Aires
(Argentina)
UNIÃO CIVIL
8
Aprovado, mas não entrou em vigor por enquanto.
33
Na UE há um número reduzido de pesquisas disponíveis sobre a situação dos
homossexuais. Uma pesquisa do Instituto Eos Gallup, efetuada em 30 países europeus
em 2003, com 15.000 pessoas revela uma população dividida. Nos 15 países que
integravam a UE até 2004, mais da metade dos entrevistados eram favoráveis ao
casamento entre homossexuais, mas cerca de um terço eram totalmente contrários. A
maior aprovação ocorreu na Dinamarca (66%) e a maior rejeição, na Grécia (71%).
Entre os novos sócios a maior aprovação foi na República Tcheca (50%) e a menor no
Chipre (76%). Quanto à adoção de crianças, segundo a pesquisa do Eos Gallup, 55%
dos entrevistados são contrários à medida.
Por sua vez, a legislação relacionada aos direitos humanos deveria proteger
também os direitos individuais e coletivos das minorias. São reivindicados os mesmos
direitos que a maior parte das pessoas já desfrutam: ter uma vida privada, um lar e
objetos pessoais que lhe são caros (correspondência, fotografia, diário, etc). Os gays
têm direito à liberdade de expressão e à liberdade de reunião. O direito a não ser
discriminado. O direito de casar e constituir família.
Até o momento, os direitos de gays e lésbicas não têm proteção suficiente na
maior parte dos códigos reconhecidos dos direitos humanos. “Parece que isso não é
devido a deficiências textuais dos principais tratados, mas sim à sua interpretação sob
a ótica conservadora das pessoas investidas de autoridade”. (Spencer, 1996, 370)
Embora tenham se conseguido importantes avanços em prol dos direitos e da
aceitação dos homossexuais por parte da sociedade, continua a haver um forte
preconceito. Nunan (2003) aponta como medidas para diminuir este preconceito o
contato interpessoal positivo entre heterossexuais e homossexuais, sobretudo se este
ocorrer entre familiares e amigos próximos e se houver uma conversa aberta sobre
sexualidade. Isto permitiria, na opinião da autora, que os estereótipos causados por uma
experiência limitada fossem substituídos pelo reconhecimento do que significa ser gay.
Yang (apud Nunan, 2003) aponta que este contato aumenta a probabilidade de
heterossexuais se tornarem a favor da igualdade de direitos para os homossexuais. Outro
fator que contribui para diminuir o preconceito é a aceitação da família: se esta respeitar
a orientação sexual do indivíduo, a sociedade como um todo tenderá a encará-la de
forma mais natural.
O tratamento dado pela mídia aos homossexuais nos mostra claramente que o
preconceito se mantém ainda muito forte na nossa sociedade. No presente momento, é
34
maior a visibilidade dos homossexuais na mídia do que em qualquer outro período da
história. Entretanto, as imagens apresentadas ainda estão ligadas a estereótipos
negativos: vitimas (violência, preconceito) ou vilões, cujos papeis foram reforçados
pelo advento da Aids na década de 1980.
A afirmação de Gross, referenciado por Nunan (2003) demonstra bem a forma
como a mídia aborda a questão:
Não apenas eles quase sempre nos mostram como fracos e bobos, ou
maus e corruptos, mas eles excluem e negam a existência de gays e
lésbicas normais, não extraordinários. Gays comuns, em papeis que
não são centrados no seu desvio como uma ameaça à ordem moral
que deve ser contrarrestada por meio do ridículo ou da violência
física, raramente são apresentados na mídia. (...) A representação
estereotipada de gays e lésbicas como anormais e a supressão de
imagens positivas ou “não extraordinárias” serve para manter e
policiar as fronteiras da ordem moral (G
ROS, apud NUNAN, 2003, p.
98)
Por sua vez, Kushner, (apud NUNAN ,2003) observa que na mídia são reduzidas
as imagens de homossexuais bem sucedidos na vida, felizes e com uma vida “comum”.
Na década de 1990, esta situação começa a mudar. Surgem novelas, séries de
televisão, programas de entrevistas e filmes que mostram o homossexual como um
sujeito comum, ou seja, com família, dinheiro, dignidade e confiante.
É importante destacar:
O filme Philadelphia, do diretor Jonathan Deme, 1993, com Tom Hanks,
cuja abordagem da Aids ajudou a reduzir preconceitos contra a doença no
mundo.
O programa The Ellen Show, com a comediante Ellen de Generes, lésbica
assumida, que teve recorde de audiência nos Estados Unidos durante anos.
O seriado de TV inglês Queer as Folk, também produzido nos Estados
Unidos, mostrando o dia-a-dia de um grupo de amigos homossexuais.
O seriado de TV norte-americano Will & Grace, sobre o amor impossível
entre um advogado gay e a sua amiga decoradora heterossexual, ambientado
em Nova York.
O seriado de TV norte-americano Dawson’s Creek, que acompanha a
adolescência e o início da vida adulta de cinco personagens, um dos quais é
gay e protagonizou o primeiro beijo entre gays da televisão americana.
35
O seriado da MTV norte-americana, The Real Life, o qual acompanhava o
dia-a-dia de jovens norte-americanos numa grande cidade, os quais moravam
num mesmo apartamento durante semanas, aprendendo a conviver com suas
diferenças. Era comum a presença de um jovem homossexual em quase
todos os programas.
O seriado de TV norte-americana The L Word, sobre um grupo de lésbicas
glamourosas de Los Ángeles.
Os livros de Camile Paglia, escritora radical dos Estados Unidos e lésbica
assumida, que abordava temas polêmicos no âmbito do feminismo e da
cultura gay.
As músicas de sucesso de artistas assumidamente gays como Freddy
Mercury (Queen), Boy George, Erasure, George Michael, Elton John, K.D.
Lange, Melissa Etheredge, Pet Shop Boys ou bissexuais como Madonna.
A revista Out, nos Estados Unidos, voltada para o público homossexual.
As novelas da TV brasileira, exportadas para todo o mundo, que têm a
presença personagens homossexuais, como Mulheres Apaixonadas, Senhora
do Destino, América, etc.
É possível constatar que tais mudanças são mais perceptíveis na televisão, maior
caixa de ressonância do pensamento e dos hábitos do mundo contemporâneo.
A mídia hoje assume o papel de fonte valiosa de informação para os indivíduos
em qualquer lugar do mundo. Nunan (2003) observa que a veiculação de imagens
distanciadas da realidade dos indivíduos homossexuais tem um grande efeito nocivo na
percepção da sociedade sobre os gays: estes não demonstram emoções típicas do ser
humano (alegria, tristeza) e não têm problemas cotidianos. Além de mais, a falta de
imagens positivas que sirvam de modelo para os homossexuais, costumam ocasionar
sentimentos de alienação e inferioridade, prejudicando também seus projetos de vida.
É importante ressaltar que sendo estereotipada, ela tem efeitos nocivos sobre a
sociedade predominantemente heterossexual e os homossexuais, em particular,
especialmente quanto à imagem que estes têm de si mesmos.
A mídia tem um grande poder de modificar crenças arraigadas, estabelecendo o
debate e um diálogo franco sobre a sexualidade humana. Convém ressaltar que uma
presença maior de homossexuais na mídia não implica, necessariamente, uma melhora
das condições de vida dos mesmos.
36
Em pesquisa recente, Soares (2006), tendo analisado o discurso jornalístico em
revistas semanais sobre a homossexualidade e sua relação com a AIDS na segunda
metade da década de 1980, chega à conclusão de que não há resistência à formação
ideológica (interligada por formações discursivas médio-religiosa-legais) que afirma
haver uma relação direta entre homossexualidade e a AIDS durante a década de 1980 no
corpus de sua pesquisa. O autor acrescenta ainda que o sujeito homossexual não ocupa
uma posição-discursiva que possa se dizer de outra maneira, significando apenas a partir
dos já-ditos em relação à sua sexualidade e em relação à AIDS. Segundo Sousa (apud
S
OARES, 2006, p.213), “dir-se-ia que o homossexual nesse momento não tem discurso,
por isso tem de usar o discurso do médio, do jurista, do psiquiatra para referir-se a si”.
Qual a posição de sujeito que ocupa o homossexual em nosso corpus e como ele é
significado?
1.2. Dados sobre a homossexualidade no mundo: ainda um longo caminho
por percorrer.
Segundo o site de Amnistia Internacional
9
, há vários anos, a perseguição legal
por orientação sexual tem retrocedido no mundo. Hoje, nenhum país europeu penaliza
as relações homossexuais consentidas entre adultos. Segundo o próprio site, nos países
de língua espanhola, esse tipo de relações é delito unicamente na Nicarágua. Todavia,
em alguns países a homossexualidade ainda é castigada com a pena de morte e em
muitos outros é ilegal, como nos mostra o Mapa em anexo (Anexo I). Nesse mapa
podemos observar, além dos países onde a homossexualidade é legal, aqueles onde é
ilegal, aqueles onde embora seja legal é perseguida e, por último, aqueles onde a
homossexualidade pode ter como punição a pena de morte.
Segundo notícia publicada no El País, com data de 18 de maio de 2005,
intitulada “80 países castigan con cárcel las relaciones homossexuales”, e baseada em
um relatório
10
elaborado pela Liga Internacional de Gays y Lesbianas (ILGA) na Arábia
Saudita, Yemen, Iran, Chechenia, Mauritânia, Sudão, Afeganistão e Paquistão a
homossexualidade pode ser punida com a pena de morte. A notícia esclarece que o
relatório só recolhe as penas legais, não incluindo os países que perseguem as relações
homossexuais em algumas zonas (como, por exemplo, regiões muçulmanas de países
9
www.es.amnesty.org
10
O relatório refere-se só aos homossexuais masculinos. As relações lésbicas não estão permitidas
nem proibidas, “simplesmente porque as relações entre duas mulheres seguem sendo algo impensável
para muitos legisladores”, segundo o porta-voz da ILGA.
37
africanos e asiáticos donde se aplica a sharía ou estados de Estados Unidos onde o sexo
entre pessoas do mesmo sexo ainda é castigado).
No que diz respeito à Europa, e ainda segundo a mesma notícia, em países como
Bulgária, Liechtenstein e Romênia, as relações entre pessoas do mesmo sexo não são
punidas, mas consideradas um agravante de outros delitos, como escândalo público. O
Reino Unido figura na lista da ILGA porque define para os gays uma idade de
consentimento para manter relações superior à que se estabelece para os heterossexuais.
Também não se consideram países onde a homossexualidade e a transexualidade não
constituem delito, mas nos quais ações de grupos paramilitares ou de bandos contra eles
ficam quase sempre impunes, como o México ou o Brasil.
Nos próximos subitens apresentamos algumas considerações acerca da lei do
casamento entre homossexuais na Espanha e um pequeno histórico sobre a lei do
casamento homossexual.
1.3. Histórico da Lei de casamento entre homossexuais
O histórico da lei de casamento homossexual começa a se configurar durante o
período anterior às eleições de 11 de março de 2004. Durante a campanha eleitoral
imediatamente anterior a esta data, o candidato a presidente do governo espanhol pelo
Partido Socialista Obreiro Espanhol (PSOE), José Luís Rodríguez Zapatero, anunciou,
dentre as medidas sociais que pretendia implementar caso fosse eleito, a intenção de
equiparar os direitos dos homossexuais por meio do matrimônio civil. O projeto do
casamento homossexual, portanto, surge integrando um pacote de medidas sociais mais
amplo. O programa eleitoral do PSOE incluía as seguintes medidas sociais: ampliação
da lei do divórcio, criando a possibilidade de separação dos cônjuges após três meses de
matrimônio; reforma da lei de educação suprimindo a obrigatoriedade da disciplina
Religião, a qual passaria a ser eletiva; a autorização da pesquisa científica com embriões
humanos etc.
Trata-se, portanto, de um percurso longo e difícil, cheio de críticas por parte dos
lugares sociais contrários à reforma do Código Civil que supunha a aprovação da lei
(Conselho General do Poder Judicial – CGPJ, PP, a Igreja, o Foro Espanhol de la
Familia etc.) e cheio de iniciativas que visavam à anulação ou paralisação do processo
de aprovação (iniciativa parlamentar apresentada pelo PP para regulamentar as uniões
38
civis, a qual não reconhecia a união como matrimônio; apresentação de emendas, de
vetos, de coleta de assinaturas contra o matrimônio homossexual, manifestações etc).
A seguir apresentamos um quadro por meio do qual pretendemos mostrar o
caminho percorrido pela lei de casamento entre homossexuais desde a divulgação por
parte do Governo espanhol de sua intenção de implementar a lei até sua entrada em
vigor em 4 de julho de 2005. O quadro foi elaborado por nós a partir dos dados
publicados nas notícias dos dois jornais e nele explicitamos as etapas ou acontecimentos
mais relevantes no processo de aprovação da lei, bem como o dia, o mês e o ano em que
aconteceram.
39
Quadro 1.- Histórico da lei de casamento homossexual.
ANO MÊS DIA ACONTECIMENTO OU ETAPA
29 O PP apresenta uma iniciativa parlamentar para regulamentar as
uniões civis (reconhece as uniões homossexuais, mas não o caráter de
matrimônio).
Setembro
30 Divulgação da reforma do Código Civil para permitir o casamento
entre homossexuais.
Outubro 1 O Conselho de Ministros aprova o anteprojeto de lei.
Novembro
21 O Governo espanhol compromete-se a manter o nome de matrimônio
para as uniões homossexuais.
20
04
Dezembro
30 O Governo aprova em Conselho de Ministros a reforma legal que
permitirá os casamentos entre homossexuais.
Janeiro
Fevereiro
9 O PP apresenta uma emenda à totalidade contra os matrimônios entre
pessoas do mesmo sexo.
Março
17 O Congresso inicia a tramitação do projeto de lei sobre o matrimônio
homossexual e rejeita as emendas à totalidade do PP e Unió ao
projeto.
11 A Comissão de Justiça do Congresso aprova o projeto de lei.
17 O Foro de la Família apresenta 500.000 assinaturas contra o
matrimônio homossexual.
Abril
21 O Congresso aprova a lei.
Maio 24 O PP apresenta um veto à lei.
1 Primeira rejeição do Senado aos vetos do PP e Unió à lei.
14 A Comissão de Justiça do Senado inclui uma emenda conjunta do PP
e Unió para permitir autoridades e servidores públicos alegarem o
direito à abstenção por razões de consciência para não celebrar
matrimônios entre pessoas do mesmo sexo.
21 O Senado veta os matrimônios homossexuais com os votos de PP.
CiU e do PAR.
Junho
30 O Congresso aprova a lei do matrimônio homossexual.
20
05
Julho 4 A lei entre em vigor.
Segundo se pode observar a partir da leitura do quadro, trata-se de um percurso
conturbado, polêmico, ao que a mídia em geral deu especial atenção recolhendo em
centenas de páginas os embates que iam sendo produzidos. Nessas páginas nos
deparamos com uma polêmica que excede o campo dos direitos civis e na qual intervêm
diferentes setores da sociedade para se posicionar a favor ou contra a lei, a respeito de
se a designação de matrimônio era a mais adequada para a união civil de duas pessoas
do mesmo sexo, a favor e contra a adoção de crianças por parte de casais homossexuais
etc.
Acreditamos não excedermo-nos ao afirmar que a polêmica ultrapassa o terreno
dos direitos civis, já que após a leitura das notícias coletadas nos jornais El País e El
40
Mundo, ecoam especialmente três palavras pela sua recorrência: matrimônio, família e
sociedade; muito mais do que outras como: direitos civis, discriminação, cidadania,
equiparação etc
11
.
Chamou-nos também a atenção a enorme quantidade de vozes pertencentes aos
setores contrários à lei (a Igreja, o PP e partidos afins, o Foro Espanhol de la Família, o
Conselho Geral do Poder Judicial etc.) e os argumentos por eles defendidos em favor de
uma sociedade, de uma família e de um matrimônio acordes com sua visão do mundo.
Essas vozes fazem com que em alguns momentos nosso foco de atenção enquanto
leitores se desvie da questão dos homossexuais e de seus direitos e passe a focar outros
temas, sem dúvida relacionados, mas que não constituem, a nosso modo de ver, o
centro da polêmica.
Matrimônio, família e sociedade são, na visão dos setores contrários à lei acima
mencionados, realidades interligadas e interdependentes. Sem um não existe o outro.
Sem o matrimônio constituído por um homem e uma mulher, unidos com o objetivo
único de procriar, não existe a família, grupo social (“célula básica da sociedade”,
segundo alguns) formado por um homem (no papel de pai), uma mulher (no papel de
mãe) e os filhos que houver. Sem a família, assim configurada, a sociedade sofre
também as conseqüências, desaba e desaparece, porque a sociedade que se tenta
resguardar é uma sociedade constituída por famílias heterossexuais e não existe outra
possível.
11
Baseamo-nos para esta afirmação no levantamento feito por nós, auxiliados pelo programa
WordSmith, da ocorrência de algumas palavras nas notícias de nosso corpus, a partir do qual obtivemos
como resultado que “matrimônio (2065 ocorrências), sociedade (1037) e “família” (872) aparecem na
lista das dez palavras mais recorrentes. Outras palavras, talvez mais esperáveis, têm um número de
ocorrências muito menor: “derecho” (589), “ciudadanos” (220), “discriminación” (126), “homofobia”
(57).
41
2. CONSIDERAÇÕES NECESSÁRIAS: OS REFERENCIAIS TEÓRICOS
Neste capítulo, expomos a perspectiva teórica adotada que norteará nossas
análises. O capítulo divide-se em quatro partes. Na primeira, apresentamos a visão de
Foucault de história, de sujeito e de poder. Na segunda, levamos a discussão a respeito
do sujeito e do poder para o campo concreto da mídia. Na terceira, subdividida em duas,
fazemos uma caracterização da imprensa escrita prestando atenção em aspectos como a
circulação da informação e a possibilidade de informar objetivamente. Na última,
também subdividida em duas, centramo-nos no que se conhece como escola francesa de
Análise do Discurso e, concretamente, na sua visão da linguagem e em conceitos como
dialogismo, formação discursiva, sujeito e gênero de discurso.
2.1. Uma certa concepção de história: o sujeito e o poder.
Segundo a concepção foucaultiana de história, os discursos são históricos não só
porque se constroem num certo tempo e lugar, mas porque têm uma positividade
concreta, investem-se em práticas, em instituições, em um número infindável de
técnicas e procedimentos que, em última análise, agem nos grupos sociais, nos
indivíduos, sobretudo nos corpos.
Para Foucault (1975) a passagem do “poder soberano” (Idade Média) para o
“poder disciplinar” caracteriza-se pelo fato deste último consistir num poder que gera e
gere a vida dos corpos pessoais e sociais. Segundo o autor, este novo poder promoveu-
se mediante a mobilização de instituições disciplinares, tais como as escolas, as
famílias, as fábricas, os hospitais, as prisões, que se instalam, sobretudo, a partir dos
séculos XVII e XVIII. Essa passagem significou a aparição de um tipo de controle mais
sutil, menos agressivo, mas, possivelmente mais eficaz.
Os séculos XX e XXI, para Foucault, supõem a passagem do controle-repressão,
próprio da sociedade disciplinar, para o controle-estimulação das sociedades de
controle. Quando o autor nos apresenta sua análise acerca das diferentes épocas da
história está se referindo, sobretudo, às técnicas de poder que atuam sobre o corpo, a
língua e a arquitetura.
No último período analisado pelo autor, séculos XX e XXI, aparece a noção de
“feiúra” para o corpo e o de “incorreção” para a língua, como formas que inscrevem aos
indivíduos num “dentro” ou num “fora” da sociedade.
42
Foucault (1975), ao tentar estabelecer relações entre sujeito e poder, concorda
com a idéia nietzscheana de que, por trás de todo saber, de todo conhecimento, está em
jogo a luta do poder. Ele parte da hipótese de que a sociedade dispõe de meios para
controlar a produção dos discursos, ou seja, de que há restrições no ato de falar,
restrições estas tanto internas quanto externas. Nem tudo pode ser dito e o que ameaça a
ordem deve ser proibido. Atuam aqui procedimentos de exclusão que criam tabus. Na
lista de procedimentos de controle estão incluídos também aqueles elementos que
demarcam as fronteiras dos discursos, impondo regras à sua circulação. Foucault
preocupa-se em mostrar como o poder se exerce e como ele se apresenta na espessura
do discurso. “Não se tem o direito de dizer tudo, ... não se pode falar de tudo em
qualquer circunstância, ... qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa”
(Foucault, 1975). Para o autor, as regiões onde as proibições são mais visíveis, onde o
poder, portanto, mais atua, compreendem a sexualidade e a política.
Recorrendo-se ao poder disciplinar, segundo o autor, é possível explicar o
mecanismo de funcionamento do poder sobre os indivíduos. A disciplina incide sobre os
corpos dos indivíduos, exercendo sobre eles uma coerção. Visto desse modo, o
indivíduo é uma produção do poder, ou seja, o poder é formador de uma verdade sobre
o sujeito. Assim, o indivíduo é uma fabricação do poder e o elemento que torna possível
um conhecimento sobre ele. Foucault parte dessa idéia para acrescentar que as ações do
poder não são negativas, mas positivas, pois fazem parte das disciplinas e não só
produzem discursos sobre si próprias, como também são exercidas pela normalização
discursiva. É desse modo, por exemplo, que o surgimento da palavra homossexual no
século XIX delineia uma espécie, um grupo, e introduz uma ordem, enquadrando os
indivíduos e seus comportamentos, o que nos leva a perceber que a disciplina atua
também sobre a produção linguageira.
As ações do poder disciplinar também atuam sobre os corpos na medida em que
esses expõem seus desejos – nas regiões da sexualidade. Foucault considera que, nos
séculos XVIII e XIX, o sexo passou a ser alvo de ação do poder e campo de construção
de verdades sobre os indivíduos. Se antes se falava de sexo no confessionário, agora a
Psicanálise propicia falar dele nos moldes em que a sociedade o valoriza – no campo
científico, como lugar de produção de verdades valorizadas. O falar de sexo funciona
como dispositivo disciplinar que propicia conhecer a “interioridade” dos indivíduos e
classificar seus comportamentos em “normal” ou “desviante”. Assim, essa profusão
43
discursiva sobre o sexo não esgota a luta contra a repressão, mas serve também para
enquadrar o comportamento dos sujeitos.
Foucault prioriza o discurso científico na identificação do que seria a “verdade”
e destaca a existência de suas inúmeras formas de produção, difusão e consumo:
sistemas educacionais, redes de comunicação, campos institucionais etc.
Fischer (1996) faz duas considerações a esse respeito que julgamos relevantes
Em primeiro lugar, na mesma medida em que estes saberes são
valorizados como “verdade”, convive-se com uma gama imensa de
práticas “populares” que os negam, como se a elas resistissem;
segundo, cresce em quase todo o mundo a importância dos meios de
comunicação como lugar por excelência de circulação de saberes de
todos os campos, bem como de produção de um saber específico,
próprio da mídia. (F
ISCHER, 1996, p.48-49)
Acreditamos, como Fischer (1996), na condição da mídia como produtora de
verdade e de poder, uma vez que ocupar qualquer espaço nos jornais, nas revistas ou na
TV configura poder, produz efeitos específicos nas pessoas, constrói um tipo especial
de verdade.
Assim as relações de poder e a produção de saberes, portanto, estão presentes no
dia-a-dia das pessoas produzindo uma transformação técnica dos sujeitos e operando
sobre seus corpos.
É da produção, veiculação e consumo, através dos meios de comunicação, de
discursos sobre técnicas, procedimentos e “práticas de si”, que depende hoje a produção
de subjetividades.
2.2. O sujeito e o poder na mídia.
Segundo Foucault (1975), diante da crise das instituições disciplinares
tradicionais e, concretamente, do ensino tradicional, a mídia tem aspirado na sociedade
atual o preenchimento dos vazios deixados por este e vem desenvolvendo um trabalho
de controle sobre as práticas dos indivíduos, por meio dos quais estes se tornam
sujeitos, erigindo balizas rígidas (o corpo malhado, a heterossexualidade, a
manifestação lingüística na norma padrão do português etc).
Segundo esse autor, o sujeito (pós)moderno constitui-se no jogo midiático entre
a visibilidade radiante / impetuosa da beleza e a dissimulação constrangida / recalcada
da feiúra, entre a correção eloqüente / exuberante do “bem falar” e a imperfeição
emudecedora / intimidante do “falar errado”, na cisão urbana do “dentro” (da proteção,
44
da segurança, da inclusão / deferência) e do “fora” (da ameaça, do risco, da exceção /
elisão). A respeito das orientações sexuais, acreditamos que não tenha sido diferente.
Aqui o jogo estabelece-se entre a visibilidade e valorização da heterossexualidade e o
ocultamento ou caricaturização da homossexualidade.
O autor propõe que
diante dos exercícios de poder da sociedade de controle, nos
orientemos pelo princípio da diferença e pelo postulado da liberdade,
de acordo com os quais as maiores e mais difíceis lutas do tempo
presente são aquelas que consistem na permanente inquietação
filosófica do saber “Quem somos nós?”, empreendida pioneiramente
por Kant; ou, antes, na recusa do que somos, do que nos fizeram ser
ou do que querem que sejamos: temos de imaginar e construir o que
poderíamos ser. (F
OUCAULT, 1975, p. 239)
Tendo como base o trabalho de Fischer (1996), construímos as seguintes
hipóteses a respeito da mídia:
A mídia, nas sociedades contemporâneas, se coloca como fornecedor junto
ao grande público de informações a respeito dos mais diversos assuntos.
A mídia constrói uma posição de sujeito homossexual segundo uma
dinâmica de poder e saber muito específica de uma sociedade cujos
mecanismos de controle são ao mesmo tempo totalizantes e
individualizantes.
A mídia constrói uma posição de sujeito homossexual, por meio de uma
discursividade que traduz lutas entre diferentes formações discursivas,
especialmente na área médica, da psicologia, da justiça, da política, da
religião, da ciência...
Os meios de comunicação são também um lugar de produção de verdades
sobre a homossexualidade. A este respeito, vale salientar que embora a mídia
não prescinda das autoridades científicas para orientar os indivíduos a
respeito das diferentes orientações sexuais, quase sempre atribui a si mesma
o papel principal como nova autoridade pedagógico-sexual.
A mídia faz parte do jogo social de inclusão/exclusão de diferentes
orientações sexuais, transformando constantemente os textos referidos a
esses grupos, na própria medida das inclusões e exclusões.
Há uma supervalorização da importância de “ser heterossexual” em oposição
a tudo o que configura como “ser homossexual”, como se fosse atribuído um
poder específico a essa categoria de orientação sexual.
45
No próximo item, nossa atenção recairá sobre a imprensa escrita eletrônica em
particular, tendo em vista a natureza de nosso corpus de análise.
2.3. A imprensa escrita
Neste item pretendemos formular reflexões sobre a relevância da imprensa, em
particular a escrita e veiculada por meio de jornais eletrônicos diários, no fornecimento
de certos elementos de uma dada área de conhecimento.
Nossa pesquisa tem como foco a imprensa e opta como objeto pelo jornal
eletrônico, o qual, ao retrabalhar temas e assuntos dos mais variados, permite a um
determinado segmento de público ter acesso a tais informações.
Objetivamos também discutir a tensão existente entre opinar e informar como
constituintes naturais do texto jornalístico informativo, compreendendo a imprensa
como participante ativa dos movimentos sociais de um determinado grupo, no interior
do qual é produzida.
Buscamos compreender a homossexualidade enquanto objeto construído na
interseção de uma multiplicidade de discursos que sobre ela são produzidos. Para tanto,
assumimos a constatação de que, da confluência de discursos de diferentes procedências
presentes no gênero notícia, resultam diferentes efeitos de sentido que, ao serem postos
em diálogo, se redefinem ou até se apagam.
Problematizamos aqui uma determinada concepção de notícia como espaço
qualificado no qual a opinião está ausente, ou seja, como espaço no interior do qual é
possível “informar objetivamente”.
Vamos observar um conjunto de textos produzidos pela mídia eletrônica
espanhola por meio de um diálogo que se concretiza em dois níveis: o primeiro, envolve
o texto jornalístico e o publico leitor, que recorre a variados discursos e textos –
intertextos; o segundo o de um determinado conjunto criado por ela mesma, ora
apresentados ao longo do tempo, ora na publicação de mesma data – intratextos. Assim,
podemos enumerar produções em situação de intertextualidade como um conjunto que
articula as seguintes fontes:
Documentos oficiais e científicos:
- sobre a homossexualidade, a legislação a respeito (Constituição
Espanhola, Código Civil da Espanha etc.);
46
- manuais da área de Comunicação, cuja perspectiva é a de ensinar a fazer
jornalismo informativo;
- outros textos da mesma área que mostram o número de leitores de cada
um dos jornais foco de análise, assim como o nível de acesso tanto à
versão impressa quanto à versão eletrônica desses jornais;
Acontecimentos empíricos que geram a informação. (Sant’Anna, 2000)
Depois de tomar a mídia como fonte dos discursos a serem selecionados, um
passo importante é selecionar o suporte. Assim, escolhemos como suporte o jornal
eletrônico, dirigido a um público leitor de perfil mais ou menos passível de ser
conhecido, e que se caracteriza pelo acesso a diversas atualizações das notícias em
vários momentos ao longo do mesmo dia. Embora o jornal seja, segundo Sant´Anna
(2004), uma fonte já tradicional para os estudos discursivos, nossa escolha do jornal
eletrônico levou em conta, além de sua papel na divulgação de conhecimentos, o seu
modo de circulação; ou seja, a escolha que o leitor faz de acessar tal ou qual jornal
eletrônico, a possibilidade de ser lido nos mais diferentes momentos do dia e poder,
inclusive, ser localizado por meio dos sistemas de consulta desses jornais. Some-se
também a força expressiva do escrito e dos desdobramentos que esta inscreve sobre um
fato, tanto ao longo do tempo como no seu aprofundamento do mesmo, quando se trata
de assuntos candentes.
Outras questões, que também dizem respeito à imprensa escrita em geral,
merecem que se faça referência quanto ao estudo do jornal eletrônico como fonte dos
textos selecionados para nossa pesquisa. A primeira refere-se ao fato de que cada jornal
segue uma série de parâmetros; ou seja, é necessário considerar o seguinte: a) um
discurso tem origem provisória em um determinado lugar que define, mais ou menos
categoricamente, o que pode ou não ser dito, o que tem de ser dito, o que se deve
negar/rejeitar ou então ratificar/apoiar; b) a produção dos discursos se dá na inter-
relação entre o intertextual e o intratextual; c) esses discursos se submetem às restrições
impostas por determinada organização textual; em relação a isto, a consulta de manuais
de estilo oferecem uma entrada para verificar hipóteses sobre como cada jornal
apresenta sua visão do que considera adequado para a organização de seus textos.
A segunda questão se refere ao espaço do jornal como lugar privilegiado para o
embate de pontos de vista. A princípio, a produção de discursos da imprensa escrita
baseia-se na liberdade de expressão e pluralidade de visões sobre um mesmo objeto – as
47
obras de estilo consultadas criam essa imagem, como expomos adiante. Consideramos,
portanto, importante observar se o jornal se abre à exposição de discursos que
apresentam propostas originadas por pontos de vista diferentes quando se faz referência
à homossexualidade no processo de discussão/aprovação da Lei de matrimônio
homossexual.
Assim, o fato de observar um periódico como suporte, definido por parâmetros e
como espaço para embates de pontos de vista; remete-nos ao mundo de circulação dos
discursos. Participando do mundo dos discursos instituídos pelo jornal, o mundo da
homossexualidade no processo de discussão/aprovação da lei mencionada acima passa,
do estar restrito a um outro conjunto de lugares, a circular em outros lugares, atingindo
destinatários que antes não atingia.
2.3.1. A circulação da informação
A dinâmica da circulação da informação é explicada por Charaudeau (1994). A
parir da existência de um contrato de comunicação midiático que contém as regras
organizativas e discursivas da produção do discurso da imprensa escrita, que regem a
interação entre a instância de produção e a instância de recepção.
O contrato de comunicação ao que se refere Charaudeau é constituído por um
conjunto de elementos fixos que delimitam a “identidade das partes”, isto é, a
identidade da instância de produção e da instância de recepção; a “finalidade”, quer
dizer, informar e captar, e as “circunstâncias”: tempo, espaço e canal de transmissão.
Com esses elementos o autor formula seu “dispositivo da comunicação midiática”.
A instância de produção e a instância de recepção envolvidas numa situação de
transação de sentidos não são figuras do mundo social. Além delas, existem outros dois
elementos no circuito de informação que balizam a interação: o tempo e o espaço. Uma
informação circula nessas duas dimensões e possibilita sua observação da perspectiva
social e da discursiva. Portanto, podemos afirmar que a finalidade pragmática de
“informar” constrói-se, segundo Sant’Anna (2004) em dois eixos:
a) temporal: do ponto de vista empírico, refere-se à co-temporalidade
enunciativa que une as duas instâncias envolvidas, gerando o efeito de
atualidade que dá ao fato o estatuto de notícia. Do ponto de vista discursivo,
remete à descontinuidade, uma vez que o momento da enunciação é diferente do
tempo do fato e do da recepção, sendo posterior àquele e anterior a este. A este
48
respeito, é importante salientar que os jornais eletrônicos reduzem esse efeito
por meio das continuas atualizações da informação ao longo do dia;
b) espacial: o fato, do ponto de vista empírico, pode ter ocorrido num
espaço próximo ou distante da instância de recepção. Quando é distante no
espaço, a instância de produção utiliza-se de vários meios para diminuir a
sensação de que tal fato é alheio à realidade da instância de recepção. Esses
meios são agências de informação, correspondentes, fontes oficiais ou oficiosas,
testemunhos etc. A proximidade espacial entre o fato e a instância de recepção,
seja ela criada ou empírica, faz com que esta se interesse por aquele, já que se
cria uma ilusão de contato e se desfaz ou atenua a ausência da instância de
recepção do momento empírico em que ocorreu o fato. (SANT’ANNA, 2004)
Segundo essa autora, ainda (2004)
Poderíamos afirmar, então, que a finalidade da instância de produção,
ao valer-se da ilusão da co-temporalidade e da ubiqüidade, é captar a
instância de recepção para informar algo. As escolhas estratégicas do
enunciador devem, pois, estar apropriadas para captar o público-alvo
desejado (
SANT’ANNA, 2004, p. 87).
Devemos acrescentar a esse conjunto de elementos o fato de a imprensa escrita
apropriar-se de códigos diferentes – escrito (incluindo aqui os recursos tipográficos e de
titulação), gráfico, iconográfico – para a apresentação dos fatos. Segundo Sant’Anna
(2004) essa combinação de códigos cria efeitos de sentido complementares e faz parte
das estratégias disponíveis para que o enunciador estruture sua enunciação.
A seguir, apresentaremos as estratégias discursivas constitutivas da comunicação
midiática (SANT’ANNA, 2004), que estão relacionadas à necessidade de organização das
rubricas dos jornais como manifestações de domínios da experiência, que correspondem
a diferentes atividades sociais e à representação dos atores sociais que se movem no
espaço da mídia, chamados a dizer algo sobre o fato (políticos, representantes de grupos
diversos, um cidadão da rua, especialistas, a Igreja etc). Essas estratégias discursivas
das que passamos a tratar são a de ‘credibilidade’ e ‘captação
12
.
A busca de credibilidade lança mão de mecanismos que procuram efeitos de
autenticidade e de verdade. Quanto à autenticidade, podemos considerar:
12
Esta estratégia consiste na utilização de mecanismo que faça a mídia tocar a sensibilidade do
receptor.
49
1 a verificação empírica de seres e fatos, que almeja criar o efeito de uma
correspondência exata entre o escrito e o fato. Os procedimentos para conseguir esse
efeito são a precisão, a identificação de lugares e datas, o uso de fotos, de
documentos etc;
2 a personificação dos envolvidos, pois quanto mais identificáveis maior a
garantia de atender à instância de recepção. De aí o uso de nomes, cargos etc;
3 as provas de inocência do testemunho da pessoa chamada a relatar um fato. O
escolhido não pode ser suspeito de estar apresentando ponto de vista contaminado
por uma preferência pessoal (S
ANT’ANNA, 2004).
Para conseguir o efeito de verdade, o jornalista se utiliza dos seguintes recursos:
1 a explicação dada para a existência de determinado fato, para o qual chama ao
expert (cientistas, técnicos, conhecedores de um tema etc);
2 o jogo do desvelamento da verdade – que surge por meio de entrevistas, debates
etc;
3 o fato de o discurso relatado contextualizado fornecer todos os detalhes sobre
quem tem seu discurso trazido para o texto, evitando-se suspeitas de manipulação
(S
ANT’ANNA, 2004).
A estratégia discursiva de captação deverá provocar emoções ou recuperar
elementos do universo de crenças que circulam numa determinada comunidade. Ela
pode ser construída por meio de efeitos de dramatização
13
ou de ludismo.
Quanto ao efeito de dramatização é conseguido por meio da escolha de temas
ligados à ordem emocional e ao modo de descrever e relatar um fato, transformando os
atores sociais em personagens. O efeito de ludismo alcança-se com o recurso ao jogo de
palavras, por exemplo, em títulos de matérias; na composição da primeira página do
jornal; nas estratégias de escrita que buscam efeitos de ataque e de defesa; na utilização
de provérbios ou frases idiomáticas (SANT’ANNA, 2004).
Assim, interessa-nos a visão de Charaudeau (1994), a respeito do circuito de
comunicação midiática, no qual ambas as instâncias – de produção e de recepção - são
figuras do mundo discursivo que atuam sob a organização mais ou menos rígida
definida pelo discurso jornalístico, que, por sua vez, se inscreve enquanto tal, segundo a
presença de determinadas estratégias discursivas. Portanto, trata-se de captar para
13
A dramatização consiste na montagem de uma situação na qual se recuperam fatos e atores
sociais em uma situação determinada especialmente construída pela mídia.
50
informar, mas tendo a informação uma origem tomada como crível, podendo, logo, ser
consumida como verdade.
2.3.2. Reflexões acerca da possibilidade de informar objetivamente
O modo de operar da imprensa escrita baseia-se, segundo Sant’Anna (2004) “na
premissa de que ele deve (e pode) apresentar os fatos que narra como se estivesse fora
do evento. Seu esforço é expor objetivamente os fatos recolhidos no mundo empírico e,
ao mesmo tempo, participar dos processos sociais que ela quer objetivar” (p. 91).
Isto faz, segundo a autora, com que se crie
uma tensão entre esses dois pólos: por um lado, ela deve estar fora,
isto é transpor o fato social para o espaço discursivo do jornal,
mantendo a objetividade; por outro, deve estar dentro, isto é, ser
espaço discursivo que reenvia sentidos ao espaço social, abrindo-se a
posicionamentos ideológicos, já que ela mesma é integrante da
sociedade na qual ocorrem os fatos sociais. (
SANT’ANNA, 2004, p.
91).
O discurso nos permitirá descobrir traços dessa tensão, a qual pode apontar ora
para uma adesão ou oposição claras aos fatos, ora para uma omissão a certos detalhes
que poderiam denunciar aquele papel de participante no processo (situação de dentro),
que, sempre que possível, não deveria ser visível, salvo em determinados espaços dos
jornais especialmente destinados à apresentação de opinião, como as colunas de
opinião, por exemplo.
Nesta pesquisa, pretendemos observar formas da enunciação veiculadas pela
imprensa escrita, definida como corpus de pesquisa, que ora se posicionam fora do fato,
ora dentro dele. As marcas discursivas que utilizamos para proceder à análise dos textos
apontam tensões e contradições que se originam dessa forma de constituição da
enunciação na imprensa escrita.
Esse jogo torna-se relevante para nosso trabalho, porque consideramos a
imprensa como um dos elementos que participam do processo de equiparação de
direitos, não com as mesmas funções dos coletivos sociais de homossexuais e lésbicas,
mas como uma das unidades responsáveis pelo discurso de transmissão de
conhecimentos a respeito da homossexualidade, responsável pelo acesso mais ou menos
democratizado do que ocorre no âmbito da conquista de direitos numa sociedade. Esse
acesso, por sua vez, tem estreita relação com o que apontamos anteriormente, e com o
que se convencionou chamar a manipulação da informação.
51
A estratégia principal para atingir o efeito desejado na manipulação é, segundo
Sant’Anna (2004) a mais completa redução possível da margem de liberdade, de quem
ouve ou lê, de discutir ou resistir ao que se lhe propõe. Isto se explica pelo fato de que o
objetivo maior da manipulação é persuadir para conseguir a adesão.
2.4. Contribuições da Análise de Discurso de orientação francesa
Como embasamento teórico para a análise de nossos textos privilegiamos os
estudos da Análise do Discurso (AD) de base enunciativa. Segundo esta teoria, a
linguagem é a ação, produzida subjetivamente, num determinado espaço e tempo e,
portanto, única.
Todo enunciado, antes de ser fragmento de língua natural que o
lingüista procura analisar, é o produto de um acontecimento único,
sua enunciação, que supõe um enunciador, um co-enunciador, um
momento e um lugar particulares. Esse conjunto de elementos define
a situação de enunciação. (Maingueneau, 1996, p.5)
A linguagem para a AD é uma atividade essencialmente interativa, produto de
ações de sujeitos e os enunciados são produzidos em situações de interlocução também
constituídos pela história (Mariani, 1998). Segundo Mariani,
(...) o sentido não “pertence” a nenhum interlocutor, mas é
produzido, enquanto efeito, no discurso constituído pelos/nos
interlocutores em interação. Esse “dizer para alguém” é uma prática
social que funciona pelo imaginário: é o jogo de imagens constituído
em torno dos lugares de onde se fala que precisa ser observado no
processo histórico da produção de enunciados e sentidos. (M
ARIANI,
1998, p.31)
A comunicação é entendida nessa concepção teórica como processo de interação
verbal, no qual a palavra procede de alguém para alguém e não como mera transmissão
de informação.
Maingueneau acrescenta com relação à questão:
Com efeito, todo ato de enunciação é fundamentalmente assimétrico:
a pessoa que interpreta o enunciado reconstrói seu sentido a partir de
indicações presentes no enunciado produzido, mas nada garante que
o que ela reconstrói coincida com as representações do enunciador.
Compreender um enunciado não é somente referir-se a uma
gramática e a um dicionário, é mobilizar saberes muito diversos,
fazer hipóteses, raciocinar construindo um contexto que não é um
dado preestabelecido e estável. A própria idéia de um enunciado que
possua um sentido fixo fora de contexto torna-se insustentável.
(M
AINGUENEAU, 2001, p.20)
52
Um dos pressupostos fundamentais ao qual recorre a AD de base enunciativa é a
noção bakhtiniana de dialogismo: todo enunciado institui um EU que se dirige a um TU,
ao mesmo tempo em que um discurso dialoga com outro discurso. (Bakhtin, 1992,
1995).
Conforme (DAHER, ROCHA E SANT’ANNA, 2004):
Segundo a orientação bakhtiniana (1992; 1995), todo discurso é
dialógico, isto é, inscreve-se em dois tipos de relações: aquelas que
todo enunciado mantém com os enunciados do destinatário (real ou
virtual) da interlocução (relações interlocutivas); aquelas que todo
enunciado mantém com os outros enunciados que com ele se
articulam sobre o mesmo objeto (relações interdiscursivas).
Essa visão dialógica da linguagem é determinante para nossa análise,
considerando que o jornal constitui-se como espaço articulador que comporta um
diálogo em ação, remetendo-se e remetendo ao destinatário a outras notícias, ao
editorial, a documentos, a outros jornais nacionais e/ou internacionais etc. assim como a
fatos empíricos.
Concebemos o discurso enquanto ponto de articulação dos processos ideológicos
e dos fenômenos lingüísticos. Segundo Brandão (2004), o ideológico reside no
interstício entre a coisa e sua representação sígnica. A autora acrescenta que, para
Bakhtin, a palavra constitui o signo ideológico por excelência já que, como produto da
interação social, ela se caracteriza pela plurivalência. Daí o entendimento de que a
palavra seja o lugar privilegiado para a manifestação da ideologia, que retrate as
diferentes formas de significar a realidade, segundo vozes e pontos de vista daqueles
que a empregam. Dialógica por natureza, a palavra se transforma em arena de luta de
vozes que, situadas em diferentes posições, querem ser ouvidas por outras vozes.
Conseqüentemente, a linguagem dever ser encarada como o lugar em que a ideologia se
manifesta concretamente, em que o ideológico, para se objetivar precisa de uma
materialidade (BAKHTIN, VOLOSHINOV, 1979).
Segundo Bakhtin “(...) um enunciado absolutamente neutro é impossível. A
relação valorativa com o objeto de discurso (seja qual for esse objeto) também
determina a escolha dos recursos lexicais, gramaticais e composicionais do enunciado”.
(B
AKHTIN, 1979/2000, p.308)
Outra noção que consideramos relevante para nosso estudo é a de formação
discursiva, que representa na AD um lugar central na articulação entre língua e discurso.
53
A formação discursiva, noção introduzida por Foucault (1969) e retomada por Pêcheux
(1975/1997), determina “o que pode e deve ser dito” a partir de uma posição dada em
uma conjuntura dada, isto é, numa relação de lugares no interior de um aparelho
ideológico e inscrita numa relação de classes (GADET E HAK, apud SOARES, 2006).
Seguindo a Foucault, identificamos uma formação discursiva quando:
No caso em que se puder descrever, entre um certo número de
enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre
os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas
temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem,
correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos,
por convenção, que se trata de uma formação discursiva – evitando,
assim, palavras demasiado carregadas de condições e conseqüências,
inadequadas, aliás, para designar semelhante dispersão, tais como
“ciência”, ou “ideologia”, ou “teoria”, ou “domínio de objetividade”.
(FOUCAULT, 2005, p.43).
Várias formações discursivas que correspondem a uma mesma formação
ideológica podem entrar em relação de aliança, embate, contradição etc. E é só pela
referência à formação discursiva que o sentido pode ser compreendido, já que palavras
iguais podem ter significado outro segundo sua inscrição em formações discursivas
diferentes. Um outro sentido, portanto, vai caracterizar uma outra formação discursiva.
O sujeito do discurso produz a linguagem e ao mesmo tempo é nela produzido,
embora se tenha a ilusão de que o sujeito é fonte exclusiva de sua fala. A AD estabelece
que os enunciados que compõem seu discurso estão inseridos em determinadas
formações ideológicas e instituições das quais o sujeito é apenas porta-voz, numa certa
compreensão da AD. A mesma palavra ou o mesmo enunciado podem ter significados
diferentes se pertencerem a formações discursivas diversas. Portanto, o lugar ocupado
pelo sujeito determina muitas vezes o sentido da palavra, determinando também a
filiação deste a uma ou a outra formação discursiva.
Nem tudo pode ser dito, assim como não é qualquer um que pode dizê-lo ou
dizer o que quer. São as condições de produção as que permitem ou não que algo possa
ser “falado” e, conseqüentemente, instituir possíveis sentidos considerando a quem se
dirige e num determinado momento histórico.
As condições de produção caracterizam o discurso, o constituem enquanto
Lugares determinados na estrutura de uma formação social, lugares
dos quais a sociologia pode descrever o feixe de traços objetivos
característicos: assim, por exemplo, no interior da esfera da produção
econômica, os lugares do “patrão” (diretor, chefe da empresa, etc.),
do funcionário da repartição, do contramestre, do operário, são
54
marcados por propriedades diferenciais determináveis. (PÊCHEUX,
apud S
OARES, 2006)
A descrição da língua, para este autor, é insuficiente para dar conta de
determinados fenômenos nos quais ela está envolvida. A memória das significações de
um discurso e suas condições de produção são, segundo ele, constitutivas da própria
significação.
A seguir, apresentamos uma pequena caracterização dos discursos constituintes,
categoria relevante em nosso trabalho introduzida por Maingueneau (2000).
2.4.1. Os discursos constituintes
Neste subitem trataremos dos discursos constituintes, categoria que para
Maingueneau (2000) engloba o discurso filosófico, o religioso, o científico, o literário...,
embora o autor se recuse a propor uma lista desses discursos alegando que uma lista
“não [permite] definir exatamente as relações entre os diversos discursos constituintes”
(MAINGUENEAU, 2000, p. 3). Embora num primeiro momento tivesse cogitado a
possibilidade de o discurso jurídico pertencer a esta categoria, nos últimos trabalhos o
autor parece não ter uma posição definitiva a respeito e não o tem incluído na categoria.
Também o discurso político fica de fora desta categoria, pois, segundo o autor, “ele se
apóia sobre os discursos constituintes (invocando a ciência, a religião, a filosofia, etc.),
mas para fazê-los entrar em relação com os lugares comuns de uma sociedade”
(MAINGUENEAU, 2000, p. 7).
A importância hierárquica dos discursos constituintes em nossa sociedade é
indiscutível, já que, segundo Maingueneau (1999) esse tipo de discursos apresenta a
particularidade de fundar os sentidos de uma sociedade, trata de princípios
transcendentes para a comunidade e, por isso, se coloca no lugar de “autoridade”. Eles
fundam outros discursos e eles próprios, auto-legitimam-se. Segundo este autor, esses
discursos produzem textos dedicados a incorporar normas, garantir comportamentos de
uma coletividade, desenhar as fronteiras entre o bem e o mal, o falso e o verdadeiro etc.
No caso concreto de nosso corpus, a Igreja, conforme veremos no capítulo dedicado a
apresentar o discurso dos distintos lugares sociais, lança mão de diferentes discursos
constituintes para argumentar contra a aprovação da lei do casamento homossexual: o
discurso religioso, o discurso da antropologia, da psicologia, da biologia etc.; por isso
esta categoria tem demonstrado relevância em nossa pesquisa.
55
Cabe destacar que os discursos constituintes não são compartimentos estanques.
Mantêm relações complexas entre si e com os discursos dos quais dependem ou se
depreendem, conformando uma imbricada rede discursiva.
Os discursos constituintes pretendem legitimar (autorizar) a totalidade da
produção discursiva e constituem um domínio específico no seio da produção verbal de
uma sociedade que partilha um determinado número de propriedades no que se refere às
suas condições de emergência, de funcionamento e de circulação. Dito de outra forma,
tais discursos partilham numerosas propriedades ligadas à sua maneira específica de se
inscrever no interdiscurso, de fazer emergir seus enunciados e de fazê-los circular. Estes
discursos costumam aparecer quando há um debate social. Nesse contexto, e
particularmente no caso que nos ocupa neste trabalho, quer dizer, as notícias dos jornais
El País e El Mundo que tratam do tema da tramitação da lei de casamento homossexual,
são espaços constituídos pelo embate entre diferentes posições de sujeito, na medida em
que o jornalista traz para a notícia vozes de sujeitos que falam em nome da religião, da
ciência, da filosofia, o qual lhes confere autoridade. O jornalista, às voltas com o debate
a respeito da aprovação da lei acima mencionada recorre à autoridade desses sujeitos.
Acrescente-se ao dito, o fato de os discursos constituintes estarem destinados a servir de
norma e de garantia aos comportamentos de uma coletividade, a delimitar o lugar
comum das palavras que nela podem circular.
Os membros da Igreja, a partir de posições de sujeito em embate com outras
pertencentes a lugares sociais diferentes, à hora de se posicionar contra a lei de
casamento homossexual, recorrem ao apoio de discursos constituintes como o discurso
da psicologia, da antropologia, da biologia etc.; discursos estes rejeitados quando o tema
em discussão é outro. Dito de outra forma, a utilização de um determinado discurso
constituinte em detrimento de outro se dá em função da posição de sujeito que se ocupa
em determinado momento. Quanto aos membros da Igreja é a posição de sujeito
contrária ao casamento homossexual, assim como o fato de não estar dirigindo-se
exclusivamente aos seus fiéis, o que lhes permite lançar mão do discurso da biologia,
por exemplo. Já a posição de sujeito que ocupam ao tratar temas como o da utilização
do preservativo lhes permitirá utilizar outros discursos.
56
2.4.2. A noção de acontecimento
Em AD um acontecimento histórico é concebido como um evento, como um fato
empírico fundacional que será discursivizado por diferentes posições de sujeito, no
entanto, esse próprio acontecimento já é resultado de uma discursividade anterior
(CAZARIN, 2001)
Pêcheux (1990) entende que quando um acontecimento histórico estabelece uma
ruptura capaz de gerar uma outra formação discursiva, se está diante de um
acontecimento discursivo que rompe com a “estabilidade” anterior e inaugura uma outra
“estabilidade” discursiva. A ruptura, instaurada pelo acontecimento discursivo, é
fundacional, no sentido de que instaura o “novo”. Se por um lado o acontecimento
discursivo é conseqüência do acontecimento histórico que passa a ser discursivizado,
por outro, um acontecimento só é considerado histórico quando o mesmo se torna
discurso. Pêcheux (1990) observa, ainda, que o acontecimento discursivo é o ponto de
encontro de uma atualidade e uma memória, é ele que desestabiliza o que está posto e
provoca um novo vir a ser, reorganizando o espaço da memória que ele convoca. A este
respeito, Mariani (1998) afirma:
Entendemos por memória social (...) um processo histórico resultante
de uma disputa de interpretações para os acontecimentos presentes ou
já ocorridos, sendo que, como resultado do processo, ocorre a
predominância de uma de tais interpretações e um (às vezes aparente)
esquecimento das outras. (M
ARIANI, 1998, p.34)
Nora (apud S
IMÕES Jr., 2006) aponta que uma das formas de transposição da
memória do domínio individual para o domínio coletivo ou social dá-se no âmbito dos
acontecimentos. Um fato, muitas vezes simples, apenas notado no momento de sua
ocorrência, pode assumir maior importância no futuro, a ele sendo conferida a noção de
ato inaugural, tornando-se assim carregado de significado. Mesmo inserido em uma
ação considerada ínfima, apenas notada no momento, a esse ato o futuro confere a
grandiosidade das origens, a solenidade das rupturas inaugurais. Assim, determinados
acontecimentos podem ser “imediatamente carregados de sentido simbólico” e se
tornam “eles próprios, no instante de seu desenvolvimento, sua própria comemoração”.
(N
ORA, apud SIMÕES Jr, 2006)
57
O discurso jornalístico caracteriza-se por ser formador de sentidos, criador de
memórias, ato inaugural, já que apresenta a possibilidade de romper com discursos
anteriores e apontar outros ou dizê-los de outra forma. Segundo Mariani (2001),
enquanto prática social, o discurso jornalístico é capaz de captar, transformar e divulgar
acontecimentos, lendo o presente, organizando o futuro e legitimando o passado. A
seleção dos acontecimentos que serão lembrados no futuro engendra e fixa sentidos para
os mesmos, constituindo um modo possível de recordação desses fatos.
Nesse sentido, a divulgação do anteprojeto de lei do casamento homossexual
passa a constituir um lugar de memória à medida que atua como acontecimento
fundador, instaurando uma nova ordem de sentidos para o discurso homossexual do
momento: uma ruptura com o modelo de discurso homofóbico estabelecido.
Segundo Orlandi (2001), o discurso fundador cria uma nova tradição,
ressignifica o que veio antes e institui aí uma memória outra. É um momento de
significação importante, diferenciado.
O debate provocado pela divulgação do anteprojeto de lei surge em função da
existência de uma memória que vai de encontro com o que a nova lei está propondo,
acontecendo, portanto, a ressignificação dessa memória. Além disso, o evento
mencionado se constitui enquanto acontecimento porque o aparelho jurídico
(ALTHUSSER, 1985) responsável pela manutenção das estruturas se transforma
14
. O
aparelho jurídico dá a sustentação à forma sujeito dominante e é um dos aparelhos
responsáveis pelo processo de interpelação ideológica do indivíduo em sujeito, ele
contribui na construção das evidências e na simulação do teatro da consciência. Nesse
sentido, funciona, junto com a mídia, na produção de consensos.
O acontecimento histórico da divulgação do anteprojeto de lei do casamento
homossexual instaura um acontecimento discursivo nos moldes do formulado por
Pêcheux (1990), pois o sujeito enunciador do discurso socialista naquele momento
pontual do acontecimento identifica-se coma FD dos homossexuais espanhóis não
enunciando mais da mesma posição-sujeito e, ao mesmo tempo, desidentifica-se com a
forma-sujeito
15
dominante da moral cristã, católica e heterossexual.
14
Althusser (1985) distingue entre aparelho repressivo do Estado (AE), constituído pelo governo,
a administração, as prisões etc; e os aparelhos ideológicos do Estado (AIE), os quais se apresentam ao
observador imediato sob a forma de instituições distintas e especializadas. Estes AIE estão constituídos
pelos AIE religioso, o AIE escolar, o AIE familiar, o AIE jurídico, o AIE político, o AIE sindical, o AIE
de informação e o AIE cultural.
15
Pêcheux, a partir de Althusser, chama de forma-sujeito à forma dominante num determinado
período histórico.
58
Com a divulgação do anteprojeto de lei assistimos a um processo de migração do
discurso socialista de uma para outra posição-sujeito. O acontecimento histórico e
enunciativo da divulgação do anteprojeto de lei pelo governo espanhol provoca uma
ruptura interna nos saberes da FD dos socialistas espanhóis e instaura uma posição-
sujeito por meio da qual representantes do governo passam a enunciar. É a partir dela
que os mesmos resgatam, mobilizam e (re)significam saberes provenientes do
interdiscurso, delimitando assim, uma região de saber (uma posição-sujeito). É
justamente nesse momento de atualização e de (re)significação da memória que se
produz um efeito de sentido capaz de instituir uma posição-sujeito, pois esta não é
anterior à construção do efeitos de sentido, e sim se produz com eles (ORLANDI, 1993).
Essa posição-sujeito, então “inaugurada”, atualiza e (re)significa saberes que já estavam
lá, silenciados no âmbito do interdiscurso. Discursivamente, a compreensão é a de que,
pelo viés da memória discursiva, nessa nova reconfiguração da FD, saberes já
enunciados que materializaram as lutas dos homossexuais espanhóis em outra(s)
conjuntura(s) histórico-social(is) são rememorados e (re)significados, mobilizando
novos sentidos. Essa posição-sujeito na qual o discurso do governo espanhol se
inscreve, inicialmente, apresenta-se como representantiva dos saberes e das demandas
dos homossexuais espanhóis.
De outro ponto de vista, e ainda seguindo Pêcheux, o que se observa com a
divulgação do anteprojeto de lei é que a forma-sujeito dominante no franquismo e nos
períodos anteriores ao atual governo socialista, caracterizada como homofóbica, mudou,
assim como mudaram também os processos de identificação com a forma-sujeito
dominante: a posição-sujeito homossexual, tradicionalmente desidentificada com a
forma-sujeito dominante, e considerada por ela como mau sujeito, passa agora a estar
identificada em função da mudança da forma-sujeito e ser considerada como bom
sujeito. Em função da mudança da conjuntura política após as eleições do 14-M teria se
iniciado um processo de identificação e, portanto, uma alteração da forma-sujeito.
No subitem a seguir, apresentamos uma pequena caracterização da noção de
gênero de discurso.
2.4.3. O gênero discursivo notícia
Todo texto pertence a uma categoria de discurso, a um gênero discursivo, a um
dispositivo de comunicação que só pode aparecer quando certas condições sócio-
históricas estão presentes. Assim para Maingueneau, “as tipologias discursivas dos
59
gêneros de discurso se contrapõem às tipologias comunicacionais por seu caráter
historicamente variável” (2001, p.61).
Conforme enfatiza Bakhtin (apud MAINGUENEAU, 2001, p. 63):
Aprendemos a moldar nossa fala pelas formas do gênero e, ao ouvir a
fala de outro, sabemos logo, desde as primeiras palavras, descobrir
seu gênero, adivinhar seu volume, a estrutura composicional usada,
prever o final em outras palavras, desde o início somos sensíveis ao
todo discursivo (...) Se os gêneros do discurso não existissem e se
não tivéssemos o domínio deles e fôssemos obrigados a inventá-los
cada vez no processo de fala, se fôssemos obrigados a construir cada
um de nossos enunciados, a troca verbal seria impossível.
Portanto, os gêneros de discurso constituem atividades sociais que, por isso
mesmo, são submetidas a um conjunto de condições de êxito. Podemos dizer que o
gênero de discurso é um contrato que assinala seu caráter cooperativo, sendo regido por
determinadas normas. São o enunciador e o co-enunciador os que assumem o contrato
do gênero de discurso do qual participam. Cada gênero de discurso implica os parceiros
da comunicação sob a ótica de uma condição determinada e não de todas as
determinações possíveis. Além do mais, o gênero implica certo número de regras
preestabelecidas e mutuamente conhecidas, mas essas regras não são rígidas, possuem
zonas de variação que permite aos gêneros transformarem-se.
É desta forma que em nosso trabalho consideramos as notícias de jornal.
2.4.2.- O discurso relatado
Neste subitem, em primeiro lugar, focalizamos o discurso relatado como
organizador básico do gênero notícia, cuja base enunciativa é a tensão informar/opinar
(SANT’ANNA, 2004). O estudo das marcas desse espaço nasce da identificação das
vozes trazidas pelo enunciador-jornalista para seus textos, da definição de uma
hierarquia de vozes e da identificação dos verbos dicendi que pudessem auxiliar na
compreensão da força de ação dessas vozes. Como resultado desse processo traçamos
uma topografia do conflito instituído em cada um dos jornais.
A categoria do discurso relatado compreende os diversos modos de trazer para o
discurso, interpretando-as, as falas atribuídas a outros. No entanto, segundo Authier-
Revuz (1998), não é possível restituir a situação de enunciação original por mais
minuciosa e preciosista que seja a descrição. Essa restituição será sempre parcial e
subjetiva.
60
Há em DD uma ficção de apagamento, uma ostentação de objetividade
no “eu cito” (com valor de eu não intervenho) no momento mesmo em
que o enunciador L “puxa a linha” da interpretação de m (mensagem)
pela descrição que ele dá de e (situação de enunciação); esta sempre
será, inevitavelmente, parcial e subjetiva. (A
UTHIER-REVUZ, 1998,
p.149)
Como exemplo dessa limitação inerente ao discurso relatado, podemos citar o
exemplo do discurso direto (DD) como o discurso do relato do outro, o qual, em
verdade, não relata nem uma frase nem um enunciado, senão uma situação de
enunciação irresgatável.
A partir da concepção dialógica da linguagem proposta por Bakhtin e seu círculo
(1992) muitos autores se dedicaram ao tema partindo seja da noção de polifonia
desenvolvida por Ducrot (1987), seja da noção de heterogeneidade constitutiva e
heterogeneidade mostrada de Authier-Revuz (1990) e Maingueneau (1989).
Authier Revuz (1998) propõe uma complexa classificação de heterogeneidade
mostrada no discurso que vai de formas mais explícitas (com ruptura ou
heterogeneidade sintática; sintagma introdutor, verbo dicendi, recursos tipográficos etc.)
até as mais implícitas (homogeneidade sintática e formas interpretativas como é o caso
das alusões, discurso indireto livre e jogos de palavras) e que esbarram e se confundem,
segundo a autora, com a heterogeneidade constitutiva.
A autora chega a afirmar que, no intuito de desfazer a ilusão do sujeito como
fonte autônoma do sentido, “o sujeito é mais falado do que fala”.
Em ruptura com o EU, fundamento da subjetividade clássica
concebida como o interior diante a exterioridade do mundo, o
fundamento do sujeito é aqui deslocado, desalojado, “em um lugar
múltiplo, fundamentalmente heterônimo, em que a exterioridade está
no interior do sujeito”. Nesta afirmação de que, constitutivamente, no
sujeito e no seu discurso está o Outro, reencontram-se a concepção do
discurso, da ideologia, e do inconsciente, que as teorias da enunciação
não podem, sem riscos para a linguistica, esquecer. (
AUTHIER-
REVUZ, 1990, p.29)
Quando falamos, portanto, nossas falas estão habitadas por outros dizeres
produzidos em outro tempo e em outro lugar. O tema do discurso relatado vincula-se à
autoridade da voz trazida em função de sua posição.
O sujeito que enuncia a partir de um lugar definido não cita quem
deseja, como deseja, em função de sues objetivos conscientes, do
público visado, etc. São as imposições ligadas a esse lugar discursivo
que regulam a citação. (
MAINGUENEAU, 1989, p.86)
61
Pesquisas recentes aplicadas a matérias de jornais como a realizada por
Sant’Anna (2004, 2000) têm privilegiado a problemática das fronteiras entre as diversas
formas de trazer a palavra do outro.
Maingueneau (2001) apresenta como formas do discurso relatado o discurso
direto, o discurso indireto, a modalização em discurso segundo, as formas híbridas (ilha
textual ou enunciativa e discurso direto com “que”), o discurso indireto livre e o resumo
com citações.
O autor afirma que o discurso direto com “que”, do que encontramos vários
exemplos no nosso corpus, e cuja evolução na mídia talvez se deva à influência da
televisão, permite ao jornalista manter uma certa distância em relação aos indivíduos
que falam, e ao mesmo tempo “colar-se” à sua linguagem e ao seu ponto de vista; não
se contentam em comentar acontecimentos, descrever a realidade; eles pretendem
restituir o ponto de vista e as palavras dos atores.(MAINGUENEAU, 2001, p. 152)
As diversas formas de atribuição do que foi dito a um outro constituem um
continuum e variam segundo a história, os gêneros e os temas. A distância entre o
discurso que cita e o discurso citado pode estar marcada pela utilização de verbos
dicendi, pelo recurso tipográfico (negrito, itálico, aspas), pela pontuação e pelo uso de
estruturas impessoais. Num extremo, segundo Sant’Anna (2204), temos a entrevista,
como modo mais explícito de atribuir a palavra ao outro. No outro, o discurso
narrativizado, que constitui a forma mais apagada de atribuição do discurso a outro e, ao
confundir-se com a idéia de “informar objetivamente”, corresponde a uma forma
narrativizada máxima de um possível discurso indireto.
Interessa, portanto, no caso concreto de nossa pesquisa identificar as vozes
trazidas pelo enunciador-jornalista para a (re)construção das notícias a respeito da
aprovação da lei de casamento homossexual na Espanha. Compreendemos a matéria
informativa como o espaço no qual confluem a identificação mais ou menos precisa ou
apagada da fonte dos dizeres, a forma como o enunciador-jornalista as apresenta por
meio de sintagmas introdutores e verbos dicendi e sua hierarquização. A questão da
autoridade é crucial aqui por tratarem as notícias de tema relativo á equiparação de
direitos civis. Quem é trazido para falar nessas notícias? Sabemos que os gêneros de
discurso impõem coerções nesse nível. São trazidas vozes de falantes socialmente
instituídos, de membros da Igreja Católica, de partidos políticos, do governo, de juízes e
magistrados etc. A partir dessas vozes respaldadas pela autoridade de uma instituição
62
emanam suas verdades a respeito do que pensam sobre os homossexuais e sobre a
homossexualidade. Por isso a categoria de discurso relatado nos interessa.
63
III. O HOMOSSEXUALISMO EM DISCURSO: NOTÍCIAS SOBRE A LEI
DO CASAMENTO GAY.
Na tentativa de compreender os sentidos criados sobre a homossexualidade no
nosso corpus, buscaremos os lugares de sentidos que estão se formando, sedimentando
determinadas maneiras de interpretar e seus efeitos de sentido em relação a eles.
Compreender o que é efeito de sentidos é compreender que o sentido
não está (alocado) em lugar nenhum, mas se produz nas relações: dos
sujeitos, dos sentidos, e isso só é possível, já que sujeito e sentido se
constituem mutuamente, pela sua inscrição no jogo das múltiplas
formações discursivas (que constituem as distintas regiões do dizível
para os sujeitos). As formações discursivas são diferentes regiões que
recortam o interdiscurso (o dizível, a memória do dizer) e que
refletem as diferenças ideológicas, o modo como as posições dos
sujeitos, seus lugares sociais ai representados, constituem sentidos
diferentes. (ORLANDI, 2002, p.20)
Concordamos com Soares (2006) quando afirma que tudo o que hoje é dito sobre
a homossexualidade e sobre os homossexuais faz parte de um processo histórico e
discursivo construído, principalmente, nos dois últimos séculos.
Nesse sentido, cabe ressaltar a relevância do discurso jornalístico na atualidade,
na produção e divulgação de verdades. Este discurso tem como característica instituir
sentidos, entendendo por isto que ele contribui para a constituição do imaginário social
e para a cristalização da memória do passado, bem como para a construção da memória
do futuro. Para tanto, tentaremos explicitar se os já-ditos sobre a homossexualidade
(desvio, doença, pecado etc.) e sobre os homossexuais (doentes, pervertidos,
promíscuos etc.) estão presentes nas notícias de nosso corpus e quais são as posições-
sujeito que as mantêm. Além disso, interessam os novos sentidos, caso existam, que
estão sendo construídos, bem como os lugares de significância de onde partem.
Um outro aspecto que julgamos relevante no sentido de identificar imagens a
respeito dos homossexuais é o de conferir qual lugar ocupam os homossexuais no nosso
corpus. O espaço dos homossexuais é o da terceira pessoa? Fala-se deles? Quem são os
homossexuais em função dessas vozes que os falam? Ou será que os homossexuais
ocupam no nosso corpus uma posição de sujeito e podem, portanto, falar-se? Se isto é
assim, quais os sentidos instituídos?
O acontecimento que permite aos homossexuais o acesso a um lugar para “se
dizer” nas notícias do nosso corpus, é a divulgação por parte do governo espanhol da
64
iniciativa de reforma do Código Civil para permitir o matrimônio entre homossexuais e
com ele, a equiparação de direitos deste coletivo.
Temos que dizer que não é a primeira vez que aos homossexuais é permitido o
rompimento do silêncio. Embora em determinadas épocas da nossa história o
homossexual tenha carecido de um lugar para ter voz, não tendo outra opção que a de
ser dito pelos outros, como indica Soares (2006) para o caso da homossexualidade
masculina no Brasil, é a partir do acontecimento da AIDS (sigla em inglês para a
Síndrome de Imunodeficiência Adquirida), que ao homossexual “é permitido” um
espaço para se dizer, mas esse espaço é restrito às regiões discursivas oficiais sobre a
AIDS: sexualidade, contaminação, promiscuidade, estilo de vida.
Antes do acontecimento da AIDS, como indica Soares (2006), o que foi
apagado, censurado, foi simplesmente o sujeito/discurso homossexual, negando, dessa
forma, um lugar para a sua sexualidade (seu estilo de vida, sua história etc), um lugar
em que o sujeito desse discurso fosse ele mesmo e não o objeto de um outro discurso.
Como, no discurso, o sujeito e o sentido se constituem ao
mesmo tempo, ao se proteger desse modo se proíbe ao sujeito
ocupar certos “lugares”, ou melhor, proíbem-se certas
“posições” de sujeito. (ORLANDI, 2002, 78).
O sujeito homossexual só faria sentido, ou melhor, outro sentido se ele fosse o
sujeito de sua história, mas como ele era apenas falado de outro lugar (ou quando falava
reproduzia os sentidos desse lugar que não era o seu) e não falava, a sua posição-sujeito
simplesmente era a que a ele fosse atribuída (SOARES, 2006).
Para que o homossexual faça algum sentido é preciso que ele se mostre ou seja
mostrado de alguma forma e agora a divulgação da reforma do Código Civil permite de
novo aos homossexuais o acesso à posição-sujeito desde a qual podem se falar. Resta
verificar se a verdade dos já-construídos se mantém ou não. O homossexual nesta
ocasião, volta a sair do silêncio. Sobre isto Orlandi, referenciado por Soares (2006) diz:
Para nosso contexto histórico-social, um homem em silêncio é um
homem sem sentido. Então, o homem abre mão do risco da
significação, da sua ameaça e se preenche: fala. Atulha o espaço de
sons e cria a idéia de silêncio como vazio, como falta. Ao negar sua
relação fundamental com o silêncio, ele apaga uma das mediações
que lhe são básicas. (ORLANDI, 2002, 37)
65
Neste trabalho interessa saber como os homossexuais fazem sentido nesta nova
ruptura do silêncio.
3.1. A escolha e seleção do corpus de pesquisa
Neste subitem reunimos e explicitamos as diferentes etapas e critérios nos quais
nos pautamos durante o processo de seleção e recorte do corpus desta pesquisa.
A nossa proposta de escolha do corpus de pesquisa recai sobre dois jornais
eletrônicos espanhóis El País e El Mundo, como já apontamos. Centramos nossa
atenção nestes dois periódicos de âmbito nacional, levando em conta os seguintes
critérios: a força de influência desses jornais no pensamento do país; a tiragem que
garante um número de leitores bastante expressivo; a possibilidade de acesso à versão
eletrônica por meio da Internet, o que faz, por sua vez, aumentar ainda mais o número
de leitores, ao mesmo tempo em que aumenta o poder de abrangência de suas notícias.
Outros critérios que auxiliaram nossa escolha foram: a) a cidade de origem da
publicação – Madri -,capital da Espanha, sede do Governo espanhol e centro irradiador
de pensamento ao resto do país; b) a semelhança entre os segmentos de mercado
atendidos pelos jornais; c) a tiragem – ambos têm tiragem nacional; d) a possibilidade
de acessá-los via Internet; d) a disponibilidade de consulta de notícias já divulgadas por
meio dos procedimentos de consulta
16
; f) os propósitos institucionais, segundo
documentos emitidos pelos próprios jornais.
Na Espanha são publicados além dos jornais de âmbito nacional, outros de
âmbito autonômico
17
. Na escolha dos primeiros em detrimento dos segundos pesou o
fato de que a repercussão da lei que estava sendo discutida teria âmbito nacional e não
exclusivamente autonômico.
Resta agora justificarmos a escolha dos jornais El País e El Mundo em
detrimento de outros que também têm divulgação nacional como La Razón ou ABC.
Nesse sentido, o motivo que fez prevalecer nossa decisão foi que ao tentarmos acessar
as notícias do jornal ABC por meio da consulta, deparamo-nos com a exigência de
16
Embora a maioria dos conteúdos do El País fossem exclusivamente para assinantes, esta
situação mudou nos primeiros meses de 2005. Atualmente, a maior parte do jornal pode ser consultada
sem necessidade de assinatura.
17
A Espanha está dividida em 19 Comunidades Autônomas: Andalucía, Aragón, Asturias,
Canarias, Cantabria, Castilla y León, Castilla-La Mancha, Cataluña, Comunidad de Madrid, Comunidad
Valenciana, Extremadura, Galicia, Islas Baleares, Navarra, País Vasco, La Rioja, Región de Murcia,
Ciudad Autónoma de Ceuta, Ciudad Autónoma de Melilla.
66
pagamento por notícia acessada. No caso do jornal La Razón, o acesso também se viu
impossibilitado pela não disponibilização de um serviço de busca on-line.
Os documentos a que tivemos acesso apresentam alguns dados que contribuem
para explicar o porquê da escolha destes dos jornais para realizarmos esta pesquisa.
Segundo o Resumen General del Estudio de Medios (EGM) publicado no site da
Asociación para la Investigación de Medios de Comunicación (AIMC), referente ao
período de outubro de 2004 a maio de 2005, o jornal El País mantém-se como o
primeiro jornal de informação geral da Espanha com uma média diária de 2.186.000
leitores no período entre outubro e maio de 2005. O Resumo aponta também a segunda
posição ocupada pelo diário El Mundo, com 1.400.000 leitores de média diária.
Dentre os suplementos publicados no final de semana na Espanha, El País
Semanal registra 3.294.000 leitores, e ocupa a segunda colocação no ranking dos mais
vendidos cabendo ao jornal ABC o primeiro lugar. O suplemento do El Mundo,
intitulado Mundo Magazine, ocupa o quinto lugar com 1.314.000 leitores.
Segundo a notícia publicada em 30 de junho de 2005 no El País e intitulada EL
PAÍS lidera los diarios de información general con 2.186.000 lectores de media,
1.051.000 leitores desse jornal editado pelo Grupo PRISA não lê nenhum outro jornal, o
que contrasta com os 485.000 do El Mundo.
Quanto à idade dos leitores dos dois jornais, a mesma notícia mostra que os
leitores do El País apresentam praticamente o mesmo perfil (42,4 anos de média) que os
leitores do El Mundo (43,4 anos de média).
Quanto ao acesso à Internet, dado relevante levando em conta que nos pesquisa
tem como foco jornais eletrônicos, o Estudo General de Medios (EGM) indica que,
dentro de um cenário que aponta para um crescimento de 396.000 usuários, quatro webs
de Prisacom – empresa encarregada dos conteúdos do Grupo PRISA em suporte digital
-, EL PAÍS.es, CadenaSer.com, as.com e los40.com, encontram-se entre os dez sites
mais visitados. O ELPAIS.es lidera a imprensa on-line de informação geral, com
1.151.000 usuários. O Estudo aponta também para outros dados de interesse. 34% da
população espanhola é usuária da Rede. 61% dos usuários são homens, enquanto que as
mulheres representam 39% restantes. Quanto á idade, 30,3% dos usuários espanhóis de
Internet têm entre 25 e 34 anos; 20,7% pertence à faixa etária entre 35 a 44 anos; os
jovens entre 20 e 24 anos representam 15,4% e os de 14 a 19 anos 14,9%. O perfil
majoritário por classe social dos usuários é de classe média-média, com 42,2%; o de
67
média-alta, com 22,4%; o de classe alta, com 18,6% e o de classe média-baixa, com
15,4%.
Segundo dados da Oficina de Justificación de la Difusión (OJD)
18
, o elmundo.es
registrou 6.289.783 usuários únicos no mês de janeiro de 2005. Esse dado colocaria o
mencionado jornal como meio de informação mais consultado na Internet na Espanha e
líder mundial em castelhano e a grande distância do resto dos meios controlados por
OJD
19
.
Embora os dois jornais foco de pesquisa apresentem semelhanças de perfil
notáveis quanto aos parâmetros de aproximação expostos acima, diferem na opção
ideológica que representam. Assim, o El PAÍS é considerado como um jornal de
ideologia de esquerda, enquanto que o El Mundo, a uma ideologia de direita.
Interessava-nos verificar se esse contraste ideológico estaria presente também de
alguma forma no tratamento das notícias a respeito da lei de matrimônio homossexual.
O EL PAÍS.es está organizado em seções e suplementos. As seções são:
Internacional, España, Opinión, Sociedad, Tecnología, Economía, Deportes, Cultura e
Gente
20
.
Segundo informação extraída da homepage desse jornal, durante o final de
semana, disponibiliza-se ao leitor um jornal “diferente do que é publicado durante a
semana, completo e de caráter familiar”. Aos domingos, além das informações relativas
ao periódico do dia, incluem-se os suplementos Domingo, Negócios e Pequeño País.
Distribui-se, ainda, a revista a cores, El País Semanal, e colecionáveis culturais de
“grande aceitação”, segundo o jornal.
Aos sábados, publica-se a revista cultural Babelia, dedicada ao mundo da
literatura, ao pensamento, à arte e ao design, assim como El Viajero, suplemento sobre
viagens e automóveis.
18
A OJD é uma das 3 divisões de Información y Control de Publicaciones, sociedade mercantil
cujo objetivo é obter e facilitar informação útil e pontual da difusão e distribuição das publicações
periódicas e do tráfico em Internet dos médios eletrônicos de comunicação para uso de anunciantes,
agências de publicidade, editores e demais pessoas ou entes interessados. Na atualidade, controla a
tiragem e difusão e a distribuição de 840 publicações impressas, e o tráfico (páginas vistas, visitas e
usuários únicos) de 151 médios eletrônicos de comunicação.
19
Na notícia intitulada elmundo.es bate un nuevo récord con más de seis millones de usuarios
únicos em el mes de enero, publicada no elmundo.es em 14 e fevereiro de 2005, informa-se que EL
PAÍS.es não é controlado pela OJD.
20
Informação extraída da homepage do El País em 10 de julho de 2005.
68
A revista juvenil Tentaciones é distribuída às sextas-feiras junto com o jornal,
além do suplemento sobre moradia Propiedades.
Às quintas-feiras publica-se o suplemento semanal Ciberpa@is, que trata
assuntos relacionados à informática e a novas tecnologias. A edição de EL PAÍS na
Catalunha e no Levante também publica às quintas-feiras um suplemento cultural em
catalão, o Quadern.
Quanto ao elmundo.es, suas seções são: Última hora, España, Internacional,
Economía, Sociedad, Comunicación, Solidaridad, Deportes, Cultura, Ciencia/Ecología,
Tecnología, Madrid 24h, 60 segundos, Obituarios, Especiales
21
.
O web site elmundo.es é propriedade de MUNDINTERACTIVOS, S.A. Na
seção Preguntas más frecuentes, o jornal afirma que a edição em Internet é diferente da
edição impressa, baseando as diferenças no fato de as noticias do web serem atualizadas
as 24 horas do dia e virem acompanhadas de gráficos interativos, documentação,
fotografias etc. Além disso, na página web o leitor pode consultar os suplementos
Magazine, Crónica, Nueva Economia, Ariadna, Aula e Motor y Viajes, e uma série de
serviços e conteúdos que não é possível encontrar na versão impressa, como uma seção
de tecnologia (El Diario del Navegante), anuncios clasificados, pasatiempos, chistes,
programación televisiva, el tiempo, um traductor, buscador etc. Sempre segundo a
informação oferecida pelo próprio jornal, o elmundo.es disponibiliza a cada dia, a partir
das 05:00h da manhã (hora espanhola) uma versão próxima da edição impressa.
Acrescenta que as edições locais de Madri, Catalunha e Baleares também estão
disponíveis na web.
No intuito de uma melhor caracterização dos jornais espanhóis foco de nossa
pesquisa, passamos a seguir a informar outros aspectos que julgamos importantes. O
jornal EL PAÍS no seu Libro de Estilo ao falar de sua política editorial afirma:
1.1. EL PAÍS define-se estatutariamente como um jornal independente,
nacional, de informação geral, com uma clara vocação de europeu,
defensor da democracia pluralista segundo os princípios liberais e
sociais, e que se compromete a guardar a ordem democrática e legal
estabelecida na Constituição.
Neste sentido, acolhe todas as tendências, exceto as que propugnam
a violência para o cumprimento de seus fins
22
. (Grifos nossos)
21
Informação extraída do Mapa do site em 10 de julho de 2005. Tradução nossa. Texto original
22 Tradução nossa. Texto original em espanhol:
EL PAÍS se define estatutariamente como un periódico independiente, nacional, de información general,
con una clara vocación de europeo, defensor de la democracia pluralista según los principios liberales y sociales, y
69
Este jornal, portanto, se apresenta como livre de vínculos políticos e ao mesmo tempo
como um espaço onde todas as opiniões têm seu lugar. A respeito da informação
1.2. EL PAÍS esforça-se por apresentar diariamente uma informação
veraz, o mais completa possível, interessante, atual e de alta
qualidade, de maneira que ajude o leitor a entender a realidade e a
formar seu próprio critério
23
. (Grifos nossos)
Segundo o jornal, seu compromisso é com a verdade e com uma informação sem
lacunas que resulte atraente para o leitor, quem por meio da leitura estará capacitado a
compreender melhor o mundo que o rodeia, bem como formar sua própria opinião a
respeito do mesmo.
1.3. EL PAÍS rejeitará a pressão de pessoas, partidos políticos, grupos
econômicos, religiosos o ideológicos que tratem de pôr a informação
ao serviço de seus interesses. Esta independência e a não
manipulação das notícias são uma garantia para os direitos dos
leitores, cuja salvaguarda constitui a razão última do trabalho
profissional. A informação e a opinião estarão claramente
diferenciadas entre si
24
. (Grifos nossos)
Esses fragmentos expõem a visão do próprio jornal acerca da imprensa escrita
Apontam para algumas questões fundamentais a qualquer análise sobre textos
veiculados em jornais: a definição de informação geral e veraz e o propósito de ajudar o
leitor para que este possa entender a realidade e formar seu próprio critério, visando à
independência e à não manipulação das notícias. Além disso, pretende-se isolar a
informação e a opinião em espaços diferentes.
Na seção que se refere ao tratamento da informação o Libro de Estilo afirma
que se compromete a guardar el orden democrático y legal establecido en la Constitución. En este marco, acoge todas
las tendencias, excepto las que propugnan la violencia para el cumplimiento de sus fines. (Grifos nossos).
23
Fragmento em espanhol:
EL PAÍS se esfuerza por presentar diariamente una información veraz, lo más completa posible, interesante,
actual y de alta calidad, de manera que ayude al lector a entender la realidad y a formarse su propio criterio. (Grifos
nossos)
24
Fragmento em espanhol:
EL PAÍS rechazará cualquier presión de personas, partidos políticos, grupos económicos, religiosos o
ideológicos que traten de poner la información al servicio de sus intereses. Esta independencia y la no manipulación
de las noticias son una garantía para los derechos de los lectores, cuya salvaguardia constituye la razón última del
trabajo profesional. La información y la opinión estarán claramente diferenciadas entre sí. (Grifos nossos)
70
1.12. O jornalista transmite aos leitores notícias comprovadas, e abstém-se
de incluir em elas suas opiniões pessoais. Quando um fato não
tenha sido verificado suficientemente, o redator evitará nas notícias
expressões como ‘parece que, ‘poderia’, ‘é possível’ ou semelhantes.
Estas fórmulas só servem para acrescentar fatos não contrastados ou
rumores. Nesse caso deverá aportar os dados certos que o induzem a
crer que algo ‘poderia’ acontecer o que ‘parece que’ sucedeu
25
.
(Grifos nossos)
De novo se insiste na ausência de opiniões pessoais por parte do jornalista nas
matérias informativas, bem como se deixa ver o papel exercido pelo redator enquanto
revisor das mesmas.
1.14. As fontes. As informações de que dispõe um jornalista só podem ser
obtidas por duas vias: sua presença no lugar dos fatos ou a narração
por uma terceira pessoa. O leitor tem direito a conhecer qual das duas
possibilidades se corresponde com a notícia que está lendo. Para
tanto, citar-se-á sempre uma fonte quando o jornalista não tenha
estado presente na ação que transmite. Caso a informação proceda de
uma única pessoa, falara-se de ‘fonte’ no singular.
1.15. A atribuição da notícia a uma fonte o fontes não exime ao jornalista
da responsabilidade de tê-la escrito
26
.
Esses fragmentos apresentam a preocupação com o compromisso do jornal com
a veracidade das notícias publicadas pelo jornalista e o direito do leitor de conhecer as
fontes das mesmas.
O EL PAÍS.es define-se como a edição digital do periódico espanhol EL PAÍS e
como portal de informação geral do Grupo PRISA. Destaca dentre seus serviços
25
Fragmento em espanhol:
El periodista transmite a los lectores noticias comprobadas, y se abstiene de incluir en ellas sus opiniones personales.
Cuando un hecho no haya sido verificado suficientemente, el redactor evitará en las noticias expresiones como ‘al
parecer’, ‘podría’, ‘no se descarta’ o similares. Estas fórmulas sólo sirven para añadir hechos no contrastados o
rumores. En ese caso deberá aportar los datos ciertos que le inducen a creer que algo ‘podría’ ocurrir o que ha
sucedido ‘al parecer’. (Grifos nossos)
26
Fragmento em espanhol:
Las fuentes. Las informaciones de que dispone un periodista sólo pueden ser obtenidas por dos vías: su
presencia en el lugar de los hechos o la narración por una tercera persona. El lector tiene derecho a conocer cuál de
las dos posibilidades se corresponde con la noticia que está leyendo. Para ello, se citará siempre una fuente cuando el
periodista no hay estado presente en la acción que transmite. Si la información procede de una sola persona, se
hablará de ‘fuente’ en singular.
La atribución de la noticia a una fuente o fuentes no exime al periodista de la responsabilidad de haberla
escrito.
71
principais os conteúdos íntegros da edição impressa, assim como dos cinco cadernos
autonômicos
27
e a maioria dos suplementos
28
.
Esse jornal apresenta-se como “el diario español de mayor difusión e
influencia”
29
. Além disso, refere-se a outros valores:
Seus primeiros editoriais definem-no como um jornal independente,
de qualidade, de vocação européia e defensor da democracia
pluralista. Foi precursor na adoção de usos jornalísticos como o Libro
de Estilo, a figura do defensor do leitor e o Estatuto de la Redacción,
aprovado em 1980 e que regula as relações profissionais entre a
redação, a direção do jornal e a sociedade editora.
(...) o jornal está configurado para poder realizar uma leitura mais
rápida e de informação noticiosa durante a semana, e uma leitura
mais repousada e de lazer durante o final de semana, sem descuidar a
cobertura informativa
30
.
Percebemos, então, que o jornal se apresenta como líder de mercado no país,
auto-atribuindo-se no percurso desde a publicação do primeiro número em 1976 até
hoje a categoria de “símbolo da Espanha moderna em virtude de sua defesa das
liberdades e de seu apoio à mudança política e social”
31
O EL PAÍS tem sua sede social, sua redação, seus escritórios centrais e seus
locais de impressão em Madri. Em Barcelona possui uma estrutura similar, onde são
editadas e impressas a Edición Cataluña do diário, tendo redações também em Bilbao,
Sevilha e Valença. O jornal imprime suas distintas edições em Madri, Barcelona,
Valença, Lugo, Las Palmas, Burgos, Palma de Mallorca, além de outras quatro na
Alémanha, na Bélgica, no México e na Argentina.
27
Vid. nota nº 9.
28
Informação extraída da página: http://www.elpais.es/corporativos/prisacom/prisacom.html.
(Acesso em 22 de julho de 2005).
29
Informação extraída da página: http://www.elpais.es/corporativos/elpais/elpais.html. (Acesso em
22 de julhos de 2005)
30
Sus primeros editoriales lo definen como un diario independiente, de calidad, de vocación europea y
defensor de la democracia pluralista. Fue precursor en la adopción de usos periodísticos como el
Libro de Estilo, la
figura del defensor del lector y el Estatuto de la Redacción, que fue aprobado en 1980 y regula las relaciones
profesionales entre la redacción, la dirección del periódico y la sociedad editora.
(...) El periódico está configurado para poder realizar una lectura más rápida y de información noticiosa
durante la semana, y una lectura más reposada y de ocio durante el fin de semana, sin descuidar la cobertura
informativa.
31
Vid nota 24.
72
No que diz respeito ao processo de coleta de notícias nos dois jornais objeto de
pesquisa, percebemos que diferentes seções dos jornais tratavam do assunto da lei em
processo de aprovação, assim como de outros que tinham a ver direta ou indiretamente
com os direitos dos homossexuais. Rejeitamos num primeiro momento a seção
internacional por tratar assuntos que não diziam respeito aos direitos dos homossexuais
espanhóis, mas restava decidir em qual ou quais seções restantes focar nosso recorte.
Decidimos, então, que as seções Sociedad e España seriam as mais apropriadas para
atender a nossas expectativas e, dentro dessas seções, só nos interessaríamos por
notícias que tratassem direta ou indiretamente o tema da aprovação da lei. É importante
ressaltar aqui que dentro da seção Sociedade apareceram notícias que embora tratassem
a princípio temas relacionados aos homossexuais de outros países, faziam algum tipo de
ponte com a lei que estava sendo discutida na Espanha. Por essa razão, decidimos
coletá-las também.
Outro recorte feito no corpus de pesquisa (os dois jornais espanhóis El País.es e
El Mundo.es) diz respeito ao gênero jornalístico foco de nossa análise. Para este terceiro
recorte, então, levamos em conta nosso interesse inicial em contribuir para a discussão a
respeito da pretendida “informação objetiva” da notícia jornalística e focamos nossa
atenção nesse gênero jornalístico. Partindo de nosso interesse inicial, o anteprojeto de
lei que visa regulamentar o casamento homossexual, acompanhamos a repercussão do
assunto nos jornais eletrônicos espanhóis objeto de análise e conferimos que artigos de
opinião, entrevistas, perfis, reportagens, notícias nacionais e internacionais, etc.
tratavam do assunto nas diferentes seções dos jornais mencionadas acima. No entanto,
decidimos optar pelo gênero notícia baseando-nos no critério explicitado acima.
Até aqui tínhamos definido, portanto, nosso corpus de pesquisa como sendo
notícias das seções Sociedad e España dos jornais eletrônicos espanhóis El Pais.es e El
Mundo.es que tratassem direta ou indiretamente o tema a aprovação da lei de casamento
homossexual na Espanha. Para a coleta dessas notícias trabalhamos simultaneamente
coma versão eletrônica do jornal impresso e com as notícias disponibilizadas na página
inicial de cada um dos jornais eletrônicos. Mas surge neste ponto uma outra pergunta:
quais notícias nos interessam? A pergunta não resultou fácil de responder. Uma vez
feita a coleta de todas as notícias publicadas nessas seções, no período de 1 de outubro
de 2004, data de aprovação no Congresso espanhol do anteprojeto de lei, até 30 de
junho de 2005, data da aprovação da lei no Congresso, deparamo-nos com uma grande
quantidade de notícias. Ademais, esta coleta nos permitiu, ainda, verificar que as
73
notícias relacionadas à lei estendiam-se por um período bem maior do que o acima
mencionado. Verificamos que desde fevereiro de 2004
32
até julho de 2005 os jornais
deram atenção a este assunto veiculando-o em suas notícias. Passamos, então, a ter,
aproximadamente, 450 notícias no total
33
. Um corpus extenso de mais e que, sem
dúvida, exigiria outros recortes. Como recortá-lo?
Instituindo como parâmetro para o recorte o marco da polêmica surgida na
Espanha a partir da divulgação por parte do candidato do PSOE, José Luís Rodríguez
Zapatero, à presidência da Espanha, no contexto das eleições gerais celebradas nesse
país em março de 2004, foram recolhidos os jornais eletrônicos diários EL PAÍS.es e
elmundo.es ao longo de nove meses, de outubro de 2004 até junho de 2005. Embora
nosso período temporal de interesse continue sendo esse, nas tabelas e gráficos que
apresentamos nas páginas a seguir, incluímos as notícias publicadas entre fevereiro de
2004 até julho de 2005 porque consideramos que desse jeito pode ser melhor verificada
a relevância que o tema da lei em discussão teve para os jornais EL PAIS.es e
elmundo.es.
O critério para o recorte com base temporal não é aleatório. Ao longo desse
período assistimos ao processo percorrido pela Lei de matrimônio homossexual desde a
aprovação do anteprojeto de lei pelo Conselho de Ministros da Espanha, o 1 de outubro
de 2004, até sua aprovação pelo Congresso o 30 de junho de 2005.
Partimos, portanto, de uma situação de conflito que se instaura e que para
solucioná-la recorre-se ao debate com a participação de diferentes lugares sociais: a
Igreja, partidos políticos de orientações diversas, os homossexuais, a sociedade civil etc.
Estas vozes ocupam o espaço da mídia, posicionando-se a favor ou contra a aprovação
dessa lei, manifestando suas opiniões, muitas vezes em conflito com a de outros lugares
sociais, a respeito do direito ao matrimônio por parte dos homossexuais e lésbicas, a
respeito de se a designação de matrimônio para definir a união entre duas pessoas do
mesmo sexo era a mais apropriada ou sobre o fato de a homossexualidade ser ou não
uma doença, dentre outros aspectos.
A escolha dessa situação de conflito justifica-se pela nossa concepção da notícia,
enquanto discurso, isto é, “prática que forma os objetos que fala”, na concepção de
Foucault, como lugar por excelência dos investimentos de poder e saber. (Fischer, 1996)
32
Esta data refere-se ao período de campanha eleitoral anterior ás eleições, que aconteceram em
14 de março de 2004.
33
A contagem foi realizada manualmente, portanto, pode sofrer algumas variações.
74
Isto fez com que passássemos a olhar o nosso corpus de análise como discursos, em
cuja materialidade está inscrita a relação com a exterioridade (Orlandi, 2001). A autora
caracteriza o texto como sendo o vestígio mais importante dessa materialidade,
funcionando como unidade de análise. Unidade que se estabelece, pela historicidade,
como unidade de sentido em relação à situação. O texto é texto porque significa, daí que
o que interessa para a AD seja como o texto organiza a relação da língua com a história
no trabalho significante do sujeito em sua relação com o mundo. A natureza de sua
unidade é lingüístico-histórica.
A autora considera o texto enquanto “fato” discursivo, trazendo a memória para
a consideração dos elementos submetidos à análise. São os fatos, segundo a autora, que
nos permitem chegar à memória da língua: desse modo podemos compreender como o
texto funciona enquanto objeto simbólico. Compreender como um texto funciona é,
como ele produz sentidos, é compreendê-lo enquanto objeto lingüístico-histórico, é
explicitar como ele realiza a discursividade que o consitui.
O nosso corpus de análise constitui-se, assim, num conjunto de discursos a
respeito da lei de casamento homossexual, da homossexualidade e dos homossexuais,
cujos sentidos nos propomos a identificar.
Conseguimos todas as notícias veiculadas pelos jornais, como já dissemos, por
meio da coleta diária das notícias que iam sendo publicadas ou do sistema de busca
oferecido em cada um dos jornais. Os parâmetros de consulta para cada um dos jornais
foram o de palavra-chave (matrimônio homossexual) acrescida de data (01/01/04 até
02/06/05). Cabe ressaltar aqui que o jornal El País oferece também como parâmetro de
busca o local ( El País.es / en todo el artículo ) o formato (artículo o viñeta) e a seção do
jornal (no nosso caso, Sociedad e España), recursos não apresentados pelo jornal El
Mundo.
Pautados nesses procedimentos, conseguimos reunir as notícias publicadas pelos
dois jornais espanhóis a respeito da lei. A seguir, apresentamos duas tabelas que
mostram o universo de notícias coletadas. Reiteramos, aqui, que só levamos em conta
para sua elaboração as notícias que apareceram na seção ‘Sociedad’ e na seção
‘España’. Como já mencionamos, foi possível observar durante a coleta das notícias a
presença do tema Lei de casamento homossexual em outras seções, mas optamos por
restringir a nossa procura às duas seções mencionadas acima baseando-nos em critérios
igualmente já explicitados em outro ponto de nosso trabalho. Nas seções de Sociedad e
75
Espanha, o El PAIS.es publicou um total de 293 notícias relacionadas com o tema de
nosso interesse. O elmundo.es publicou 157.
A seguir, apresentamos as duas tabelas com o número de notícias publicadas em
cada mês por cada um dos jornais.
Quadro 2: Notícias publicadas no El País e no elmundo.es em cada mês
El PAÍS.es Elmundo.es
2004 2005
2004 2005
Janeiro 0 22
Janeiro 2 9
Fevereiro 5 4
Fevereiro 6 2
Mar
ç
o 2 11
Mar
ç
o15
Abril 5 29
Abril 4 21
Maio 8 25
Maio 2 18
Junho 13 62
Junho 5 39
Julho 16
Julho 9
A
g
osto 4
A
g
osto 3
Setembro 22
Setembro 7
Outubro 27
Outubro 13
Novembro 15
Novembro 3
Dezembro 23
Dezembro 8
Total 293
Total 157
A próxima tabela apresenta a distribuição das notícias por seções:
Quadro 3: Distribuição das notícias por seções
JORNAL
EL PAÍS.es elmundo.es
Sociedad 261 69
España 32 88
Podemos observar que enquanto o ELPAIS.es apresenta maior quantidade de
notícias publicadas na seção Sociedade, o elmundo.es publicou no mesmo período mais
notícias na seção España.
Os gráficos a seguir permitem visualizar a incidência das notícias no período
coletado. Mostramos em separado as notícias publicadas em 2004 e em 2005 nos dois
jornais visando a maior clareza dos mesmos.
76
Gráfico 1.- Notícias publicadas no jornal El País no 2004
elpais.es 2004
0
5
10
15
20
25
30
Janei
r
o
Fever
ei
ro
Ab
r
il
Maio
J
u
nho
J
ulho
A
gosto
S
eptem
b
ro
Outubro
Nov
em
br
o
Dez
em
br
o
mês
notícias coletadas
Seqüência1
Podemos observar nesse primeiro gráfico, que reproduz a quantidade de notícias
publicadas pelo jornal eletrônico EL PAÍS.es durante o ano 2004, uma concentração de
notícias no mês de outubro. Essa incidência é natural, se levarmos em conta que no 1 de
outubro o Conselho de Ministros da Espanha aprovou o anteprojeto de lei do
matrimônio homossexual. Durante esse mês, como mostra a tabela apresentada acima,
foram publicadas nas seções de Sociedade ou Espanha um total de 27 notícias
relacionadas direta ou indiretamente com esse anteprojeto de lei. As vozes dos
diferentes segmentos da sociedade: Igreja, partidos políticos, homossexuais, sociedade
civil, justiça etc.) começaram a ser trazidas em elevado número para as notícias. Vale
salientar também, segundo nos mostra o gráfico, que a partir do mês de junho e até o
final do ano, o tema do anteprojeto de lei de matrimônio homossexual e outros
relacionados com a homossexualidade, começam a ser foco de grande interesse para os
jornais e ocupam um grande espaço. Isto não aconteceu nos meses ou anos anteriores.
77
Gráfico 2.- Notícias publicadas no jornal El País desde janeiro até junho de
2005.
elpais.es 2005
0
10
20
30
40
50
60
70
Janei
r
o
F
e
v
ereiro
Abri
l
Maio
Ju
nho
mês
notícias coletadas
Seqüência1
Neste segundo gráfico, podemos observar que se mantém a dinâmica, só
interrompida nos meses de fevereiro e março, de dar mais espaço ao tema da lei de
matrimônio homossexual e às reações provocadas pela sua iminente aprovação nos
distintos segmentos da sociedade. É no mês de junho quando se produz a maior
presença de notícias no jornal EL PAÍS.es: 62 notícias nas seções Sociedade e Espanha.
No mês de junho, o projeto de lei já havia passado pelo Congresso e havia sido
aprovado, em 21 abril de 2005. Em seguida, o projeto de lei passa, de acordo com os
procedimentos regulares, para o Senado, onde o principal partido da oposição, o PP tem
maioria. Levando em conta que a lei foi definitivamente aprovada em 30 de junho,
podemos supor que se concentra nesse mês a última oportunidade para que os diferentes
lugares sociais pudessem se manifestar publicamente a favor ou contra a aprovação da
lei e para, dessa forma, tentar exercer pressão segundo seus interesses.
78
Gráfico 3.- Notícias publicadas no jornal El Mundo no ano 2004.
el mundo.es 2004
0
2
4
6
8
10
12
14
J
a
neiro
Fevereiro
Abril
Maio
J
u
nho
J
u
l
h
o
Ago
s
to
Septembro
Outubro
Novembro
Dezembro
mês
notícias coletadas
Seqüência1
Embora nossa hipótese inicial fosse a de que os dois jornais espanhóis
apresentassem semelhanças quanto à quantidade de notícias publicadas em cada um dos
meses, verificamos que não foi bem assim. A quantidade total de notícias publicadas
em ambos os jornais é bem diferente: EL PAÍS.es, 293 e elmundo.es 157) No caso do
elmundo.es, o mês de outubro volta a ser o mês de maior incidência de notícias (13 no
total). Acreditamos que as razões para explicar esse fato sejam as mesmas que as
expostas para o EL PAIS.es.
Gráfico 4.- Notícias publicadas no jornal El Mundo desde janeiro até junho
de 2005.
elmundo.es 2005
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Janei
r
o
F
e
v
ereiro
Abri
l
Maio
Ju
nho
mês
notícias coletadas
Seqüência1
Neste último gráfico, no qual podemos conferir a quantidade de notícias
publicadas pelo jornal elmundo.es no ano de 2005, vemos que o mês no qual se
publicam mais notícias volta a ser o mês de junho (39 notícias).
79
Temos, portanto, tanto no caso do EL PAIS.es como no caso do elmundo.es nos
meses junho de 2005 um volume maior de publicação de notícias a respeito do tema de
nosso interesse. Nesse mês foram publicadas um total de 101 notícias das 450 coletadas
ao longo de todo o período. Porém, se consideramos as necessidades de recorte e a
proposta de análise de nosso estudo, continuávamos tendo uma quantidade muito
elevada de notícias.
A polêmica gerada na Espanha à raiz da divulgação do projeto de lei por parte
do governo de José Luís Rodríguez Zapatero (30 de setembro de 2004) até a aprovação
da lei (30 junho de 2005), provocou como resposta, como já dissemos, que vozes
embate de diferentes lugares sociais fossem apresentadas nas notícias, posicionando-se
a favor ou contra a aprovação dessa lei.
Ao focar nossa atenção num primeiro momento nos títulos das notícias
coletadas, verificamos que entre as vozes contrárias à aprovação da lei estavam, entre
outras, a da Igreja, representada pelos Papas João Paulo II e Bento XVI, por seus porta-
vozes e membros da Conferencia Episcopal Española (bispos, arcebispos, cardeais etc.)
e até mesmo padres. Encontramos, também, as vozes de vários partidos da oposição ao
governo socialista, como a do PP e a da UDC; a do Consejo General del Poder Judicial
(CGPJ), a da Real Academia Española de las Letras (RAE), psicólogos da Universidade
de Sevilha, a de Valeria Mazza (ex-modelo), a de Ana Botella (cargo político na
prefeitura de Madri e esposa do ex-presidente do governo espanhol, José Maria Aznar),
a dos setores cristãos do PSOE, a do poeta Caballero Bonald, de José Maria Aznar, de
grupos de gays cristãos, de Francisco Vázquez (Prefeito da cidade de A Coruña e
Senador do PSOE).
De um modo geral, verifica-se uma grande homogeneidade quanto aos
posicionamentos das vozes segundo o lugar social ao que pertenciam. No entanto,
encontramos também outras vozes que quebravam essa dinâmica apresentando
posicionamentos contrários aos defendidos pela maioria das vozes do lugar social que
representam. As vozes favoráveis à aprovação da lei apresentadas nas notícias foram,
entre outras, as do PSOE, partido do governo, e as dos seus aliados políticos como
Llamazares (presidente do partido de esquerda Izquierda Unida). Outros lugares sociais
favoráveis cujas vozes estão presentes nas notícias coletadas são as dos Jueces para la
Democracia (FpD), associação progressista de juizes pertencentes ao Conselho Geral do
Poder Judicial (CGPJ), as dos homossexuais (gays e lésbicas), as de outros partidos
políticos como CIU (Convergencia i Unió) e PNV (Partido Nacionalista Vasco), etc.
80
Constatamos neste ponto, a maior concentração na ocupação do espaço de vozes
“contrárias” ora à aprovação da lei, ora à designação do casamento entre pessoas do
mesmo sexo como “matrimônio” etc. O número de notícias em que aparecem estas
vozes é bem maior do que o número de notícias nas quais se apresenta a voz dos
diferentes segmentos favoráveis à aprovação da lei. E neste último grupo, constatamos
também chama a atenção também o pouco espaço ocupado pelas vozes dos
homossexuais. Surprednde, portanto, que sendo a maioria de vozes em embate
contrárias à provação da lei, esta conseguisse ser aprovada.
Embora inicialmente a opção de adotar o critério pautado na observação das
vozes trazidas pelas notícias nos parecesse idôneo para realizarmos o recorte definitivo
de nosso corpus, a enorme quantidade de notícias coletadas exigia que recorrêssemos
um outro critério.
3.2 As vozes presentes nas notícias de nosso corpus
Bakhtin (1997/1995), ao afirmar que “o discurso de outrem” é inseparável do
conteúdo informativo, acrescenta que ele impõe coerções e só aquelas falas de pessoas
que ocupam lugares sociais legitimados como autorizados serão trazidos e
reformulados, de maneira mais ou menos explícita, pelo enunciador.
Baratta (apud, KOMAVLI DE SÁNCHEZ, 2006, p.27) afirma que “a mídia não é um
simples espelho da realidade, mas é uma verdadeira intervenção na realidade” e
estabelece entre a realidade e o imaginário uma relação de influência recíproca.
Por sua vez, Mariani (1998) outorga relevância à imprensa no papel de
institucionalizar sentidos, regatando e apagando (num movimento simultâneo) questões
da memória sócio-histórica de um grupo social.
Que vozes são, portanto, trazidas pelo enunciador-jornalista para as notícias de
dos jornais El País e elmundo.es que tratam o tema da aprovação da lei do casamento
homossexual?
Pretendemos, neste capítulo, dar resposta a esta pergunta, bem como analisar a
presença de cada grupo de vozes e sua repercussão na construção de sentidos a respeito
da homossexualidade. Para tanto, focaremos nossa atenção num primeiro momento nos
títulos das notícias passando, posteriormente, a analisar o corpo das matérias.
Durante o processo de leitura das notícias coletadas nos dois jornais, percebemos
que nos títulos dos mesmos se repetia freqüentemente a estrutura sintática: sujeito +
verbo dicendi + complementos. Esta estrutura possibilita ao enunciador-jornalista trazer
81
para o título da matéria uma das diferentes vozes que ao longo do período coletado se
posicionaram a respeito dos diferentes assuntos que envolvia a aprovação da lei
(constitucionalidade da norma, adoção, denominação da união homossexual etc.) e que
mereceram o destaque de estar no título da notícia, ou seja, o enunciador-jornalista
confere a essa voz um lugar de destaque e chama a atenção do leitor para essa voz e
para o que ela tem a dizer. Ao identificar essas vozes, percebemos o embate que se
produziu entre diferentes posições de sujeito: a Igreja Católica, o governo, diversos
partidos políticos (defensores ou detratores da lei), a Justiça, os represenantes dos
homossexuais etc. A seguir, expomos um quadro exemplificativo no qual aparecem os
títulos das notícias com a estrutura mencionada
34
. Nele indicamos também o jornal em
que foi publicada a notícia, assim como a seção à que pertence cada uma:
Quadro 4: Títulos de notícias com a estrutura: sujeito + verbo dicendi +
complementos
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
01/10/04 Sociedad Zapatero afirma que con la ley del matrimonio los gays
dejan de ser ciudadanos "de segunda"
02/10/04 Sociedad Los obispos dicen que el Estado no puede legislar sobre
"un derecho inexistente"
06/10/04 Sociedad El Poder Judicial pide al Gobierno que le remita el
anteproyecto de ley del matrimonio homosexual
06/11/04 Sociedad IU insta al Gobierno a que no ceda ante "las intromisiones
intolerables" de la Iglesia
20/01/05 Sociedad Rajoy dice que los gays no quieren el matrimonio y que el
Gobierno lo regula para "parecer moderno"
19/06/05 Sociedad Los colectivos gays acusan al PP y a la Iglesia de
manifestarse a favor de la discriminación
EL PAÍS
24/06/05 Sociedad El Foro de la Familia pide "respeto a la libertad de
expresión" de Polaino
JORNAL 06/10/04 España López Aguilar no pide al CGPJ su opinión sobre las bodas
gays 'porque no es un órgano consultivo'
06/10/04 Sociedad El Papa critica veladamente la decisión del Gobierno español
de permitir el matrimonio homosexual
07/10/04 España El CGPJ pide al Gobierno que le remita el anteproyecto de
ley que permitirá el matrimonio entre gays
06/11/04 Sociedad IU critica que la Iglesia pague con fondos públicos campañas
contra la eutanasia y los matrimonios gays
30/12/04 España Acebes: 'A lo mejor no entra en vigor porque el TC dice antes
que es inconstitucional'
17/06/05 España Los gays piden amparo a la Fiscalía para que no haya lemas
'vejatorios' en la manifestación del sábado
EL
MUNDO
28/06/05 España El Foro de la Familia pide un referéndum sobre las bodas
gays
34
Colocamos em anexo (Anexo II) quadros contendo títulos exemplificativos para cada lugar
social.
82
Por meio desses quadros, podemos observar já, além da grande quantidade, a
grande variedade de vozes que foram trazidas pelo enunciador-jornalista para os títulos
das notícias de cada um dos jornais no período coletado. Acreditamos que isto é um
bom indicador da incidência do tema na imprensa espanhola e, em particular, na
eletrônica. Membros de diversos lugares sociais tiveram seus dizeres levados para os
jornais na tentativa de (re)construir as notícias a respeito da lei de casamento
homossexual. No período de outubro de 2004 até junho de 2005 foram coletadas 218
notícias nas seções Sociedad e España no jornal El País. Dessas 218 notícias, mais do
60% apresentam no título palavras dicendi. Isto nos fez refletir sobre a importância
dessa categoria gramatical e começar a pensar nela como um fator a ser levado em conta
em nossa análise.
Cabe salientar também o fato de que nesses títulos mencionados o enunciador-
jornalista privilegia certos lugares sociais dando a eles um maior espaço. Assim, em 47
títulos o lugar social que aparece é a Igreja, em 25 títulos o Governo da Espanha, em 19
deles uma voz ligada ao pertencente ao Partido Popular etc. A seguir oferecemos o
quadro completo com o número de ocorrências de cada um dos lugares sociais nos
títulos das notícias de nosso corpus. O quadro comparativo permite observar quais
vozes apresentam maior número de ocorrências nos títulos das notícias dos dois jornais
foco de análise. Nele incluímos também as porcentagens correspondentes ao número
total de notícias coletadas nos dois jornais no período de outubro de 2004 até junho de
2005.
Quadro 5: Ocorrências dos lugares sociais nos títulos das notícias do El País e do
elmundo.es
El País Elmundo.es
Lugar social
Títulos nos
quais aparece
% Títulos nos
quais aparece
%
A Igreja 47 21,4% 19 16,1%
O Governo da Espanha 25 11,4% 15 12,7%
O Partido Popular (PP) 19 8,6% 8 6,7%
A Justiça 9 4,1% 5 4,2%
Os homossexuais 8 3,6% 4 3,38%
O Foro Español de la Familia 1 3 2,54%
Izquierda Unida (IU) 3 1,3% 1
83
É possível observar que tanto no EL PAIS quanto no EL MUNDO, os
representantes da Igreja, do governo da Espanha e do Partido Popular “falam” mais nos
títulos das notícias do que os outros atores sociais. Cabe ressaltar neste ponto que,
embora o número de ocorrências de cada uma dessas vozes, sobre tudo no diz respeito
aos lugares sociais Igreja, Governo e Partido Popular, seja bastante diferente em um e
em outro jornal, se calcularmos a porcentagem dessas ocorrências sobre o número total
de notícias coletadas no período de outubro de 2004 até junho de 2005, podemos
observar que essas porcentagens são muito semelhantes em ambos os jornais.
Os dois jornais dão preferência às mesmas vozes nos títulos das notícias e com
uma porcentagem de ocorrência bem similar entre um e outro, o que pode indicar a
priori uma visão de mundo, da sociedade espanhola, em concreto, bastante similar, que
garante o poder do espaço de fala a determinados lugares sociais em detrimento de
outros.
Outro aspecto que podemos observar nos títulos das notícias é que o enunciador-
jornalista vai dando uma visão da sociedade particular ao relacionar as vozes que
aparecem nas notícias a lugares sociais determinados, dando a sensação de que são
grupos fechados e homogêneos, cujos membros pertencem única e exclusivamente a
eles. A leitura dos títulos nos proporciona quais são esses grupos a que nos referimos. A
tabela nos mostra como a representatividade dos diversos lugares sociais é desigual nos
jornais já nos títulos das notícias.
84
Quadro 6: Quadro comparativo
QUADRO COMPARATIVO
LUGAR SOCIAL EL MUNDO EL PÁIS
Os Homossexuais: 8 13
O Governo 21 33
O Partido Popular: 22 31
Outros partidos
políticos
3 4
A Igreja 26 68
A Justiça 8 17
O Congresso 5 5
O Senado 2 3
Pessoas comuns 3 6
El Foro Español de la
Família
7
2
Outros
35
24 40
Vejamos nos próximos gráficos como se organizam os títulos dos jornais em
quanto aos grupos que aparecem:
35
Este grupo está formado por vozes de origem muito heterogênea (a modelo Valeria Maza, a
esposa do ex-presidente do governo espanhol, F. Rodríguez Adrados, secretário da Real Academia
Española de la Lengua etc.) Essa heterogeneidade impossibilitou que fossem agrupadas em subgrupos
conforme fizemos com as demais vozes presentes nas notícias.
85
Gráfico 5.- Vozes nos títulos do jornal El Mundo
NOTÍCIAS POR LUGAR SOCIAL EL MUNDO
0
5
10
15
20
25
30
Os
ho
m
ossexuais
O Gov
e
rno
O
Par
t
id
o
Popu
l
a
r
Out
r
o
s pa
rti
d
os
A Ig
rej
a
A
Ju
s
tiç
a
O Con
g
resso
O
S
enado
O
s e
s
p
a
nh
o
i
s
El Foro Espol de la Familia
O
u
t
r
o
s
LUGARSOCIAL
NÚMERO
NOTICIAS
Serie1
86
Gráfico 6.- Vozes nos títulos do jornal El País
NOTICIAS POR LUGAR SOCIAL EL PAIS
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Os homossexuais
O Governo
O
Pa
rtido
Po
pular
Outro
s
p
a
rt
i
dos
A
Igreja
A
Justiça
O
Co
n
g
re
sso
O
Se
n
a
do
Os
e
spa
n
h
o
is
El
F
o
ro Esp
a
ño
l
d
e
l
a F
a
mi
l
ia
O
u
t
ro
s
LUGAR SOCIAL
NÚMERO
NOTICIAS
EL PAÍS
O que podemos observar é que de novo os lugares sociais com maior
representatividade nos títulos das notícias de ambos os jornais são a Igreja, o Governo e
o Partido Popular. Por meio desses títulos percebemos uma visão da sociedade
espanhola divida em grupos perfeitamente definidos e independentes, dando a sensação
de que nenhuma das vozes pode pertencer a dois grupos ao mesmo tempo, como por
exemplo, a Igreja Católica, o PP, o Governo, os homossexuais etc.
Uma vez identificadas as vozes presentes nos títulos das notícias de nosso
corpus e feito um levantamento dos lugares sociais neles representados, nosso seguinte
passo foi conferir que vozes estavam presentes no corpo da notícia, bem como verificar
a representatividade de cada lugar social. Para tanto, elaboramos uma tabela auxiliados
pelo programa Excell em cuja coluna da esquerda colocamos os títulos das notícias e na
linha superior as vozes presentes no corpo de cada uma delas. Isto permitiu-nos uma vez
terminada a tabela verificar a incidência das diferentes vozes nas notícias.
36
Esta tabela
resultou ser muito produtiva para nosso trabalho porque nos permitiu localizar muito
facilmente todas as notícias nas quais aparecia uma determinada voz, além de organizar
as vozes presentes nas notícias segundo a seguinte classificação: vozes de
representantes da Igreja, do Governo, da Justiça, do Partido Popular, dos representantes
dos homossexuais, dos representantes da Ciência (psicólogos) e do Foro Español de la
Familia. Cabe destacar que nesta primeira aproximação, os homossexuais que não
36
A tabela a que nos referimos ganhou uma proporção muito grande, motivo pelo qual decidimos
não incluí-la no corpo de nossa dissertação.
87
representavam nenhuma associação de direitos dos gays (no sentido de não exercer
nelas nenhum cargo ou função) foram também levados em conta no levantamento.
No Anexo III, incluímos a relação de representantes de cada um dos lugares que
tiveram suas vozes trazidas para as notícias dos jornais. Cabe destacar que existe um
grupo de vozes, conforme mostramos nas listas anexas, que são trazidas para as notícias
de ambos os jornais, enquanto outro grupo só aparece em um deles. Acreditamos que
isto tenha a ver com a autoridade que cada um dos jornais confere a cada um desses
representantes. Embora todos eles sejam representantes de um determinado lugar social,
a autoridade que cada jornal lhe confere deve ser diferente. No caso em que os dois
jornais lhes concedem a mesma autoridade, são levados para as notícias dos dois
jornais. No caso contrario, não.
O quadro comparativo a seguir permite verificar quantas vozes de cada lugar
social foram trazidas para as notícias dos dois jornais.
Quadro 7: Quantidade de vozes de cada lugar social
Lugar social El País El Mundo
Igreja 45 21
Partido Popular 33 42
Governo 9 6
Justiça 18 6
Homossexuais 12 11
Ciência 7 3
Foro Español de la Familia 4 2
Chama a atenção nesse quadro a enorme quantidade de representantes da igreja,
do Partido Popular e da Justiça que foram trazidos para as notícias publicadas no jornal
El País se comparadas com as trazidas pelo jornal El Mundo. Antes de termos feito o
levantamento das vozes, poderíamos pensar, baseados na orientação ideológica de cada
um dos jornais, que o El Mundo privilegiaria as vozes de representantes de grupos
sociais mais conservadores (Partido Popular, Igreja etc.) e que o jornal El País faria o
mesmo com as vozes de representantes de grupos mais de esquerda (governo, por
exemplo). Cabe lembrar que o número de notícias publicadas pelo jornal El País a
respeito da lei de casamento homossexual é muito superior às publicadas pelo jornal El
88
Mundo, o que aponta um maior interesse desse jornal na divulgação de notícias sobre o
tema.
Um outro aspecto que não devemos esquecer é que a respeito do grupo de
representantes do governo só contabilizamos nas tabelas acima as vezes em que
aparecem membros que efetivamente formam integram o governo espanhol, deixando
de fora, portanto, todas as vozes pertencentes ao PSOE (senadores, deputados etc.) que
não fazem parte dele diretamente, caso contrário esse grupo formado pelas vozes do
PSOE ocuparia a terceira posição quanto ao número de ocorrências ao lado do Partido
Popular e da Igreja, equilibrando-se no diálogo com essas instituições.
O que o quadro acima confirma é que o enunciador-jornalista privilegia as vozes
dos mesmos lugares sociais que aparecem nos títulos das notícias (Igreja, Partido
Popular, Governo).
3.3. O discurso dos diferentes lugares sociais. Uma pequena Introdução.
Interessa-nos compreender os sentidos que ecoam sobre a homossexualidade e
os homossexuais. A este respeito chamou nossa atenção a quantidade de ocasiões em
que diferentes setores da sociedade como a Igreja, o Partido Popular, por exemplo, se
referiam à sociedade quando falavam a respeito das conseqüências negativas que
causaria a aprovação da lei do casamento homossexual. O governo espanhol à hora de
defender a lei do casamento homossexual também remete à sociedade, mas neste caso a
uma sociedade mais “justa”, mais “decente”, no sentido de uma sociedade que não
humilha aos seus membros por meio da discriminação
37
. A que sociedade se refere a
Igreja e o Partido Popular? Por que o homossexual se situa ao mesmo tempo dentro e
fora dessa sociedade, quem e por que o exclui e quem o coloca dentro?
Os homossexuais são banidos pelas posições de sujeito contrárias à aprovação da
lei, através de seus discursos, da sociedade da razão, da moral, da convivência
harmoniosa, da família formada para a sobrevivência biológica, dos bons costumes
(fidelidade, exclusividade, abertura aos filhos...), da ordem social. Essa sociedade, que
também tem como “célula básica” o matrimônio formado por homem e mulher, aparece
nas notícias dos jornais analisados como uma entidade abstrata que paira acima de todos
os interesses e à qual a Igreja, o PP, o governo, o Conselho General do Poder Judicial
remetem-se constantemente. Parece haver, segundo a posição-sujeito de que se fale,
37
El País, 30-jun-05: El Congreso aprueba el matrimonio entre personas del mismo sexo.
89
diferentes “sociedades”. A Igreja e o Partido Popular parecem falar em nome da
sociedade da moral, de Deus, da religião. O governo espanhol diz falar em nome da
sociedade para se referir à discriminação, à equiparação de direitos, assim como
também o fazem os representantes dos homossexuais.
Vejamos alguns exemplos:
Quadro 8: Diferentes visões da sociedade.
Periódico Data Título Responsável
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
8-ene-05 El arzobispo de
Pamplona vaticina
una ‘epidemia de
homosexualidad’
Sebastián
(arzobispo de
Pamplona)
Para Sebastián Para Sebastián, equiparar el
matrimonio a las relaciones
entre personas del mismo
sexo implica que éste ha
dejado de ser una “unión
permanente” entre un hombre
y una mujer, un lugar para la
“multiplicación” de la vida y
la “célula básica de la
sociedad”, así como que el
sexo de una persona es una
“realidad indeterminada que
cada uno puede dirigir y
orientar como le parezca
mejor”.
elmundo.es
21-abr-05 El Congreso
aprueba el
matrimonio entre
personas del mismo
sexo
La Conferencia
Episcopal
Española
Ha insistido en
que
La Conferencia Episcopal
Española ha insistido en que
la reforma aprobada supone
“introducir un peligroso
factor de disolución de la
institución matrimonial, y,
con ella, del justo orden
social”.
El País
2 out-04/12
E regidor pide a su
partido que
“estudie” la
adopción por
homosexuales
Gallardón
(alcalde de
Madrid - PP)
pidió Gallardón pidió más audacia.
“El PP no puede quedar al
margen de una realidad que
la propia sociedad española
acepta y valora, y sé que
tendrá la capacidad de debate
suficiente para estudiar
fenómenos nuevos pero de
indudable actualidad, como
la adopción de menores, de
acuerdo siempre con el
máximo interés de éstos”.
90
12-oct-04 Botella se muestra
en contra de que los
gays adopten, para
“proteger” a los
menores
Ana Botella
(concejal PP de
Empleo y
Servicios al
Ciudadano,
ayuntamiento
Madrid)
Manifestó
Sostuvo que
Dijo
Añadió que
argumentó
Botella manifestó su “total
respeto hacia los
homosexuales” y sostuvo que
“este país, y esta ciudad es
absolutamente tolerante”.
“Quien diga lo contrario
miente. Yo no encuentro que
exista discriminación ni en el
mundo laboral ni en la vida
social”, dijo, pero añadió que
“no se puede tratar de manera
igual lo que es diferente”.
“Un hombre y una mujer es
una cosa, dos hombres es
otra cosa y dos mujeres es
otra cosa, como supongo que
un trío también será otra
cosa”, argumentó.
1-oct-04 El Consejo de
Ministros aprobará
hoy la ampliación
del matrimonio a las
parejas
homosexuales
Zapatero
(presidente del
Gobierno)
Defendió
Argumentando
que
Zapatero defendió el jueves
la nueva regulación,
argumentando que hay que
erradicar la discriminación
que sufre este colectivo que
tiene las mismas
obligaciones que el resto de
los ciudadanos, y por el
contrario, se le niegan
algunos derechos.
30-jun-05 El Congreso
aprueba los
matrimonios entre
personas del mismo
sexo
Zapatero
El presidente
(Zapatero)
Ha destacado
que
Ha añadido
que
José Luíz Rodríguez
Zapatero ha destacado que
con esta ley se da “estricto
cumplimiento de un
compromiso electoral” para
construir “un país más
decente porque una sociedad
decente es la que no humilla
a sus miembros”. El
presidente ha añadido que la
victoria de la reivindicación
homosexual “nos hace
mejores a todos”.
O matrimônio é uma outra realidade que parece ter várias faces. Enquanto para a
Igreja é a “célula básica de la sociedad”
38
e evoca-se a tradição judaico-cristã para
mantê-la como sendo uma instituição exclusivamente heterossexual, os representantes
dos homossexuais e o governo oferecem a visão desta instituição como um salvo-
conduto para que os primeiros possam ter acesso a uma realidade da qual até agora
tinham sido banidos: adoção conjunta, herança, pensão de viuvez, autorização para
intervenção cirúrgica, etc.
38
El Mundo, 11-dic-2004: Los obispos lanzan una campaña en contra del matrimonio gay.
91
O que temos aqui é um exemplo de como dependendo da formação discursiva na
que se situe quem enuncia, são construídas visões diferentes de uma mesma realidade.
A Igreja e o Partido Popular partem do modelo heterossexual tido como padrão
em relação à sexualidade, à conduta, à convivência e o homossexual, nessa perspectiva,
é apresentado sempre como uma ameaça. Impõe-se a verdade de um heteroerotismo
obrigatório, como algo que sempre esteve aí
39
e, como conseqüência, cria-se também
um anti-homoerotismo necessário (SOARES, 2006).
Segundo KATZ, referenciado por Soares (2006), as categorias sexuais atuais
eram desconhecidas pelos gregos, por exemplo, e suas origens são recentes, bem como
sua história é cheia de conceitos variáveis e contestados:
A influência de Foucault está clara no amplamente lido “Sexual
Matters: On Conceptualizing Sexuality in History”(1979), de Robert
A. Padgug, que avisou: As categorias sexuais que são tão óbvias para
nós, as que dividem a humanidade em heterossexuais e homossexuais,
não parecem ter sido conhecidas pelos antigos gregos. Esse autor nos
preveniu de que precisamos evitar projetar as nossas categorias atuais
sobre as sociedades passadas, que organizavam as pessoas e a
sexualidade seguindo linhas muito diferentes. (KATZ, apud S
OARES,
2006).
Ainda segundo o autor, o discurso histórico sobre a heterossexualidade é uma
invenção moderna. O termo heterossexualidade, que pretendia descrever um sexo-amor
mais velho que Matusalém, é de origem bastante recente e tem uma história de
definições variáveis e contestadas. (KATZ, apud S
OARES, 2006)
Nas notícias coletadas há uma referência à necessidade de atenção muito
especial à família por parte das vozes pertencentes aos diferentes lugares sociais. Quase
todos eles, se não todos, falam em nome da família. Uns, a Igreja, o Partido Popular,
afirmam ser ela um bem que temos de preservar e outros, como o governo, os
representantes dos homossexuais, almejam-na como uma realidade a que se têm direito.
Tanto o PP quanto a Igreja ou o Foro Español de la Familia evocam constantemente a
concepção ocidental de família, caracterizada por três elementos que definem a moral
cristã quanto à sexualidade: a monogamia, a procriação e a desqualificação de prazer
(Foucault, 2004). Nós acrescentamos a estas características a da heterossexualidade.
39
Como indica Spencer, referenciado por Soares (2006), as relações homossexuais, enquanto mais
uma forma de expressão da sexualidade, estavam presentes nas sociedades pré-históricas e eram
fundamentais em rituais de passagem masculina. Na China, na Índia da antiguidade, na Grécia antiga, no
Império romano, no Império Islâmico, na Renascença os estudos antropológicos testemunham a presença
desta forma de relação entre iguais.
92
De modo geral, quando se quer caracterizar a moral cristã quanto à
sexualidade, e se quer opô-la à moral pagã, à moral grega ou romana,
se propõe as seguintes características: em primeiro lugar, o
cristianismo teria imposto às sociedades antigas a regra da
monogamia; em segundo, o cristianismo teria atribuído como função
exclusiva, como única função da sexualidade, a reprodução – somente
fazer amor com a finalidade de ter filhos. Finalmente, em terceiro
lugar – eu teria podido, aliás, começar por aqui -, há uma
desqualificação geral do prazer sexual. O prazer é um mal – mal que
precisa ser evitado e ao qual, conseqüentemente, é preciso atribuir a
menor importância possível. Atribuir ao prazer sexual apenas a menor
parcela possível de importância, apenas utilizar-se desse prazer, de
qualquer forma a despeito dele mesmo, para fazer filhos, e não fazer
esses filhos, ou seja, apenas praticar as relações sexuais e encontrar
nelas o prazer no casamento, no casamento legitimo e monogâmico.
Essas três características definiriam o cristianismo (F
OUCAULT, 2004,
p.63-64)
Do ponto de vista das posições de sujeito contrárias à aprovação da lei a relação
homossexual parece não ter outra função que a do prazer sexual, já que não está
orientada aos filhos, além do já-dito da promiscuidade relacionada com este coletivo
Fica, portanto, inviabilizado qualquer vínculo com a moral proposta.
A Igreja parece deslocar as conseqüências dos “atos de sodomia”
40
à aprovação
da lei do casamento homossexual. Se antes eram os atos sodomíticos os causantes das
grandes calamidades, agora a causa destas é aprovação da lei e a abertura do casamento
aos homossexuais.
3.4. As instituições representadas
A seguir, apresentaremos o discurso dos lugares sociais com maior presença nas
notícias dos jornais que compõem nosso corpus de pesquisa. Cabe salientar neste ponto
que para realizarmos esta tarefa subdividimos o total das notícias coletadas em grupos,
em função das vozes presentes no corpo das mesmas. Desse modo, tínhamos o grupo de
notícias em que estava presente o lugar social Igreja, o grupo de notícias do lugar social
Governo espanhol etc. Esta tarefa facilitou nosso trabalho porque permitiu-nos trabalhar
por separado o discurso de cada um dos lugares sociais. Nosso objetivo é identificar
referências aos homossexuais, à homossexualidade, bem como à lei de casamento
homossexual. Faremos um levantamento dos temas a respeito dos quais se posiciona
cada um dos representantes e de como o faz. Para localizar as notícias nas que aparecem
40
Segundo VAINFAS, referenciado por Soares (2006) a sodomia foi elevada ao cume dos pecados
da luxuria, máximo vicio contra a natureza em diversos estatutos sinodiais dos séculos XIII e XIV,
alternando com a bestialidade.
93
essas vozes, utilizamos as tabela criada em fase anterior de nosso trabalho, já
mencionada. Assim, pois, procedemos a agrupar as vozes nas seguintes setores: Igreja,
Governo, Partido Popular, Justiça, Homossexuais, Foro Español de la Família e Ciência.
Procuramos a seguir todas as notícias nas quais estavam presentes cada uma das vozes e
criamos uma tabela para cada grupo dos mencionados com as notícias nas que aparece
algum representante de cada lugar social.
3.4.1. A Igreja
Visando a analisar o discurso dos representantes ligados à Igreja, identificamos
em nosso corpus notícias nas quais essas vozes se inscreviam. Foram recortados os
fragmentos atribuídos a esses representantes, levando em conta que nosso objetivo era
identificar imagens de homossexuais, da homossexualidade, assim como referências à
lei que estava sendo discutida. No jornal El Mundo, coletamos 28 notícias e no El País
92. Cabe lembrar que as vozes dos representantes da Igreja, como já dissemos inúmeras
vezes, são recorrentes nos dois jornais ao longo de todo o período analisado (outubro
2004 até junho 2005). No entanto, no caso do jornal El Mundo sua presença é maior a
partir do mês de março de 2005, conforme nos mostra o quadro a seguir:
Quadro 9: Presença do lugar social Igreja nas notícias do elmundo.es
El Mundo
2004 2005
Outubro Novembro Dezembro Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho
2 1 2 2 1 1
6 7 6
Vemos no quadro que os meses de abril (6 notícias), maio (7) e junho (6)
acumulam um número maior de notícias do que as publicadas nos meses anteriores.
Lembremos que o 21 de abril o projeto de lei foi aprovado no Congresso e a partir desse
momento passou a ser discutido no Senado, onde o principal partido da oposição, o
Partido Popular, de direita, tem maioria. Parece-nos muito significativo o fato de que se
concentre nesse período uma elevada presença de vozes ligadas à Igreja tendo em vista
a presença desta instituição na Espanha. É nesse momento que a lei está sendo discutida
no Senado, com maioria da direita e que a disputa por “verdades” se acirra.
O jornal El País apresenta uma distribuição mais simétrica quanto ao número de
notícias publicadas por mês, mas destaca-se o mês de junho como o mês com maior
número de incidências:
94
Quadro 10: Presença do lugar social Igreja nas notícais do El País
El País
2004 2005
Outubro Novembro Dezembro Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho
12 11 9 9 3 4 8 12 24
Um outro aspecto que chama a atenção a respeito das vozes ligadas à Igreja
(católica, como veremos mais adiante) que são incluídas na notícia, além da quantidade,
é que muitos dos estamentos da Igreja estão representados nas notícias. O enunciador-
jornalista ao referir-se à lei do casamento homossexual, dá voz a bispos, arcebispos, ao
Papa, a cardeais, a padres etc. Todo aqueles que pertencem à Igreja têm algo a dizer a
respeito da lei, dos homossexuais etc.
Nas notícias analisadas, os membros ligados à Igreja vão se posicionar a respeito
de variados assuntos tais como o anteprojeto de lei, a adoção de crianças por
homossexuais, a orientação homossexual, a importância do matrimônio formado por
homem e mulher e até mesmo o custo econômico da reforma (aspecto este abordado
também pelo PP) etc. E nessas notícias os membros ligados à Igreja argumentam sobre
os tópicos mencionados recorrendo para tal a diferentes discursos. É interessante
observar como as vozes de membros da Igreja se apóiam em diferentes discursos na
defesa de sua visão do matrimônio, da homossexualidade, da adoção etc., além do
discurso religioso. Esses discursos são do campo da antropologia, da psicologia, da
biologia, da filosofia e, em menor medida, da religião. A este respeito, cabe observar
que só se recorre ao discurso religioso em duas ocasiões no jornal El Mundo, conforme
o quadro a seguir:
Quadro 11: Ocorrências no elmundo.es de discurso religioso no discurso da
Igreja
Data Título
Responsável
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento Assunto
6-out-2004 La Iglesia
católica exige a
Bono que sea
coherente con su
:
El prelado
(Gea
Escolano)
Recordando
que
(recordando que) San
Pablo, por su parte, aseguró
que en el Reino de Dios no
entrarían "impuros",
"idólatras", "adúlteros",
"afeminados",
"homosexuales", "ladrones",
"avaros", "ultrajadores" ni
"rapaces”.
Declaraciones
del ministro
de Defensa,
José Bono.
95
El mensaje Reitera que en el seno de la familia se
desarrolla "la vocación de
vida humana y cristiana" y
donde "se comparten los
gozos y expectativas en un
clima de comprensión y
ayuda recíproca"
41
Mensaje del
Papa
Benedicto
XVI, leído
por el Nuncio
en Zaragoza.
22-mai-05 Benedicto XVI
pide que la Iglesia
sea
´comprendida´ en
España y se
respte la ´libertad
de conciencia´
No se
especifica
añade Por eso, añade, el ser
humano, "que nace, crece y
se forma en la familia" es
capaz de "emprender sin
incertidumbre el camino del
bien sin dejarse desorientar
por modas o ideologías
alienantes de la persona
humana"
Por sua vez, no jornal El País, o discurso religioso aparece na notícia publicada
em 15 de novembro de 2004 e intitulada Los obispos harán campaña también contra el
aborto y las uniones gays:
Quadro 12: Ocorrências no El País de discurso religioso no discurso da Igreja
Data Título Responsável
pelo dito
Marca
introdutória de
DR
Fragmento Assunto
15-nov-
2004
Los obispos harán
campaña también
contra el aborto y
las uniones gays
El cardenal
de Madrid y
presidente de
la
Conferencia
Episcopal
Española
lanzar un reto
apocalíptico a
sus fieles y
contra los
infieles
“Si, llegará el día ardiente
como un horno, en el que
los malvados y perversos
serán la paja, en el que no
quedará de ellos ni rastro;
pero, en cambio, a los que
honran el nombre de Dios
los iluminará un sol de
justicia que lleva la salud
en las alas”.
Movilizaciones
de la
Conferencia
Episcopal
contra la
ampliación de
los supuesto del
aborto legal y
contra los
matrimonios de
homosexuales
Ou seja, os membros ligados à Igreja para se posicionar a respeito dos
homossexuais e de seu estilo de vida, para criticar o anteprojeto que o governo espanhol
pretende aprovar ou para negar o direito dos homossexuais ao matrimônio recorrem na
maioria das vezes a outros discursos que não o discurso religioso. Os discursos da
antropologia, da psicologia, da biologia e da filosofia são trazidos a campo pelos
membros da Igreja para defender a instituição do matrimônio como sendo formada por
homem e mulher, para falar das conseqüências negativas que implicaria abrir essa
instituição para pessoas do mesmo sexo (poligamia, epidemia de homossexualidade,
destruição da família e da sociedade, etc), para falar a respeito da adoção de crianças
41
Em negrito no original.
96
por homossexuais, para criticar a conduta homossexual, para pedir aos servidores
públicos que aleguem o direito à “objeción de conciencia”
42
para não casar
homossexuais, para justificar seu apoio à manifestação convocada para o 18 de junho
(doravante 18-J) pelo Foro Espanhol da Familia etc. Já o discurso religioso, como
vimos nos parágrafos selecionados acima, é muito pouco recorrente por parte da Igreja.
Este discurso da religião é utilizado, como podemos ver nos exemplos acima,
pelos representantes da Igreja para aconselhar aos fiéis e também sob a forma de
ameaça, quer dizer, quando a Igreja quer mostrar as punições que sofrerão aqueles que
não seguirem seus preceitos. Estas punições incluem a não entrada no reino de Deus e
até mesmo o aniquilamento total por meio do fogo justiceiro (discurso constituinte
católico, MAINGUENEAU, 2006).
A Igreja ao falar das conseqüências, todas elas negativas, da aprovação do
casamento homossexual e da conseqüente equiparação de direitos dos homossexuais,
recorre à crença de que a desobediência aos preceitos cristãos tem as suas
conseqüências.
Como nos diz Foucault (2004):
No cristianismo mérito absoluto é precisamente ser obediente. A
obediência deve conduzir ao estado de obediência. Manter-se
obediente é a condição fundamental de todas as outras virtudes. Ser
obediente em relação a quem? Obedecer ao pastor. Estamos aqui em
um sistema de obediência generalizada, e a famosa humildade cristã
é apenas a forma, de qualquer modo interiorizada, dessa obediência.
Sou humilde: isso significa que aceitei as ordens de qualquer um, a
partir do momento em que elas me forem dadas e que eu puder
reconhecer nessa vontade do outro – eu, que sou o último dos
homens – a própria vontade de Deus. (F
OUCAULT, 2004, p. 69)
No caso concreto das notícias de nosso corpus o fato de não estar em acordo
com os mandamentos e dogmas cristãos trará a destruição da família, da sociedade,
prejuízos demográficos (PP), danos para as crianças, etc. Trata-se de uma penalização
por meio do poder divino apresentada em forma de destruições como as de Sodoma e
Gomorra, segundo nos mostra o Antigo Testamento
43
. As conseqüências negativas não
nos afetarão só nossa vida neste mundo, mas também na do além.
42
O dicionário da Real Academia Española define assim a “objeción de conciencia”: 1. Negativa a
realizar actos o servicios invocando motivos éticos o religiosos, especialmente en el servicio militar.
43
Segundo relatam os capítulos 18 e 19 do Gênesis, as cidades de Sodoma e Gomorra foram
destruidas por Yahvé. O clero impulsou a crença de que a razão do castigo era a prática da
homossexualidade. No entanto, o versículo não descreve nenhuma relação homossexual, mas um estupro.
97
A seguir, apresentaremos fragmentos de notícias nos quais podemos observar os
discursos constituintes nos quais se apóiam os membros ligados à Igreja para falar a
respeito desses diferentes temas. É importante destacar que em 7 das 23 notícias
analisadas do jornal El Mundo, as vozes ligadas à Igreja recorrem a vários discursos
constituintes na sua argumentação, como nos mostra o quadro a seguir:
Quadro 13: Discursos constituintes no discurso da Igreja
Data da notícia Título Discurso constituinte
11-DIC-04 Los obispos lanzan una campaña en contra del
matrimonio gay
Antropologia,
psicologia e biologia
26-DIC-04 La Iglesia mantiene que los gays 'no tienen derecho' a
casarse y tacha de 'reprobable' su inclinación sexual
Filosofia e Biologia
8- ENE- 05 El arzobispo de Pamplona vaticina una 'epidemia de
homosexualidad'
Antropologia,
psicologia e biologia
27-ENE-05 Rouco asegura que la Iglesia española no está 'bajo
asedio' aunque haya 'algunos problemas'
Antropologia e
psicologia
3-MAY-05/2 El Vaticano considera que la adopción de niños parejas
homosexuales es ‘una tragedia’
Psicologia e Filosofia
6-MAY-05 La Conferencia Episcopal exige a los católicos
españoles una oposición 'clara e incisiva' al matrimonio
gay
Antropologia e
psicologia
10-JUN-05 La Conferencia Episcopal apoya la manifestación del
18-j en Madrid contra el matrimonio homosexual
Antropologia e
Biologia
Na tentantiva de exemplificar o conteúdo de quadro anterior, oferecemos a
seguir os fragmentos referentes às três primeiras notícias das quais falamos nas
seguintes tabelas
44
:
44
Os fragmentos das restantes notícias podem ser vistas no Anexo IV.
98
Quadro 14: Fragmentos de discursos constituintes no discurso da Igreja
Data Título Responsável pelo
dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
11-dic-04 Los obispos
lanzan una
campaña en contra
del matrimonio
gay
el secretario general
de la Conferencia
Episcopal, Juan
Antonio Martínez
Camino
Ha
manifestado
"Quien pretenda obnubilar esa
distinción entre el matrimonio y otras
formas de convivencia, y
desgraciadamente se pretende
obnubilar una distinción que es
evidente para todo el que tenga ojos
para ver, causa un grave daño a la
razón y a la convivencia de los seres
humanos", ha manifestado el
secretario general de la Conferencia
Episcopal, Juan Antonio Martínez
Camino, al presentar la jornada.
la Conferencia
Episcopal
según la
Conferencia
Episcopal
Para ello han diseñado un díptico con
el lema "Hombre y mujer los creó",
una frase del Génesis que, según la
Conferencia Episcopal, pone de
relieve "la base antropológica
fundamental" del matrimonio porque
"todo matrimonio adecuado a la razón
y a la naturaleza del ser humano tiene
esa característica fundamental" que
garantiza "la supervivencia biológica,
espiritual y moral de la Humanidad".
45
folleto se señala que En el folleto que servirá de base para
la celebración del 26 de diciembre,
fecha en la que desde hace cuatro años
se celebra la jornada "Familia y Vida",
se señala que "a través del padre y de
la madre el niño adquiere su identidad
personal y sexual como hombre o
mujer".
26-dic-04 La Iglesia
mantiene que los
gays ´no tienen
derecho´ a casarse
y tacha de
´reprobable´ su
inclinación sexual
Los obispos Afirman que los obispos afirman que "el
comportamiento homosexual es
siempre de por sí éticamente
reprobable" y reitera que "a dos
personas del mismo sexo no les asiste
ningún derecho a mantener
matrimonio entre ellas".
45
Em negrito no original.
99
La Iglesia Explica que Explica, no obstante, que los
homosexuales "tienen los mismos
derechos que las demás personas" y
subraya que "la inclinación
homosexual, aunque no sea en sí
misma pecaminosa, debe ser
considerada como objetivamente
desordenada, ya que es una tendencia,
más o menos fuerte, hacia un
comportamiento intrínsecamente
malo desde el punto de vista moral".
No se especifica Se asegura que Sobre la adopción por parejas del
mismo sexo se asegura que es
"rechazable" porque no constituye un
"referente adecuado", ya que la "figura
del padre y de la madre es
fundamental para la neta identificación
sexual de la persona".
Sebastián
(arzobispo de
Pamplona)
Para
(Sebastián)
Para Sebastián, equiparar el
matrimonio a las relaciones entre
personas del mismo sexo implica que
éste ha dejado de ser una "unión
permanente" entre un hombre y una
mujer, un lugar para la
"multiplicación" de la vida y la "célula
básica de nuestra sociedad", así como
que el sexo de una persona es una
"realidad indeterminada que cada uno
puede dirigir y orientar como le
parezca mejor".
El arzobispo de
Pamplona, obispo de
Tudela y secretario
de la Conferencia
Episcopal, Fernando
Sebastián
Ha asegurado
que
A su juicio
El arzobispo de Pamplona, obispo de
Tudela y secretario de la Conferencia
Episcopal, Fernando Sebastián, ha
asegurado que es posible que dentro
de poco se declare "una verdadera
epidemia de homosexualidad, fuente
de problemas psicológicos y de
frustraciones dolorosas". A su juicio,
"los homosexuales, si quieren, con
ayudas bien dirigidas, pueden
cambiar su situación".
8-ene-05 El arzobispo de
Pamplona vaticina
una ‘epidemia de
homosexualidad’
El arzobispo de
Pamplona, obispo de
Tudela y secretario
de la Conferencia
Episcopal, Fernando
Sebastián
Sostiene que Sostiene que es necesario decir esto
"con claridad" porque "si nos callamos
y dejamos que se vaya normalizando
eso de que da lo mismo ser homo que
hetero es posible que nos encontremos
dentro de poco con una verdadera
epidemia de homosexualidad, fuente
de problemas psicológicos y de
frustraciones dolorosas".
100
El arzobispo de
Pamplona, obispo de
Tudela y secretario
de la Conferencia
Episcopal, Fernando
Sebastián
Afirma que Prescindiendo de consideraciones
teológicas o religiosas, afirma que el
cuerpo sexuado, masculino o
femenino, no es pura genitalidad, sino
que necesita desarrollar sentimientos y
tendencias afectivas "congruentes" con
la propia biología.
El arzobispo de
Pamplona, obispo de
Tudela y secretario
de la Conferencia
Episcopal, Fernando
Sebastián
El arzobispo
Asegura que Así, asegura que las tendencias
propias del sexo contrario "se quiera o
no" responden a "una personal mal
configurada, psicológicamente mal
resuelta". "Por eso, lo 'homo' no es
igual que lo 'hetero', diga lo que se
diga", resuelve el arzobispo en la
última de sus 'Cartas desde la fe'.
Cabe lembrar que os comentários apresentados referem-se às notícias em que
analisamos as vozes ligadas à Igreja. Desse modo, talvez não seria arriscado demais
pensar que outras vozes ligadas ao governo, à direita, aos homossexuais, etc., possam
também recorrer nas mesmas notícias aos mesmos ou até a outros discursos
constituintes. Parece, portanto, uma característica própria dos discursos constituintes
não aparecerem isolados, mas sim com outros discursos constituintes.
Os representantes da Igreja recorrem ao discurso da antropologia baseando-se
em que “la problemática de los matrimonios homosexuales hay que discutirla desde el
punto de vista antropológico”
46
, em que “las razones que avalan estas proposiciones son
de orden antropológico, social y jurídico”
47
ou alegando que
“estamos actualmente en un debate centrado en cuestiones
antropológicas, las que hacen referencia a la vida humana, la
dignidad de la vida humana y la existencia como persona desde
la condición sexuada. Pero no estamos en un debate entre
cuestiones religiosas y políticas”
48
.
Para tanto, lançam mão deste discurso quando condenam o matrimônio
homossexual, para se referir à lei e à denominação mais adequada para este tipo de
união, na defesa do matrimônio formado por homem e mulher frente ao formado por
pessoas do mesmo sexo, para falar das conseqüências da aprovação do código civil que
permite a união legal de homossexuais e do próprio matrimônio entre gays.
46
El País, 27-ene-05: Rouco dice que la Iglesia española no está “bajo asedio” aunque existen
“algunos problemas”.
47
El País, 2-oct-04: Los obispos dicen que el Estado no pude legislar sobre “un derecho
inexistente”.
48
El País, 15-dic-04: Un obispo afirma que la educación sexual en las aulas se reduce a “exaltar
la homosexualidad”.
101
O discurso da psicologia entra em cena para defender as relações
heterossexuais frente às homossexuais, o matrimônio formado por homem e mulher,
para falar dos perigos que poderia trazer consigo a adoção de crianças por casais
homossexuais, para afirmar que os homossexuais podem deixar de sê-lo com ajuda ou
para falar dos homossexuais como pessoas “mal configuradas”. É importante chamar a
atenção sobre este último aspecto porque a Igreja continua associando
homossexualidade à doença. Para os representantes da Igreja, ignorando por completo a
situação atual da ciência, os homossexuais são pessoas doentes que com a ajuda
adequada podem deixar de sê-lo e, assim, sair dessa situação de anormalidade, de
desvio para entrar na normalidade que definiria a heterossexualidade e a moral cristã. A
Igreja ataca, também, a adoção por homossexuais, porque segundo seus representantes,
“si los gays adoptan niños en un 80% de las probabilidades éstos también lo serán”
49
.
Vemos, portanto, que em ocasiões a Igreja recorre a estatísticas que dão suporte a
“verdades”, mas sem indicar a fonte. Este argumento é também defendido por parte dos
psicólogos convocados a expor no Senado suas opiniões sobre a adoção por
homossexuais.
O discurso da filosofia aparece nas vozes ligadas à Igreja para falar do
comportamento homossexual como algo “éticamente reprobable”
50
, “intrínsecamente
malo desde el punto de vista moral”
51
, na tentativa do governo de aprovar a lei de
casamento homossexual que supõe um retorno ao “positivismo y relativismo y a la
separación total entre la dimensión moral y la jurídica”
52
. Está presente na crítica à
adoção de crianças por casais homossexuais, já que isto faz com que as crianças sofram
“uma violência moral”
53
. Finalmente, nos argumentos que descrevem a lei como
“injusta y contraria a la razón”
54
.
O discurso da biologia entra em cena na defesa do matrimônio heterossexual, já
que garante a “supervivencia biológica”
55
e é apresentado como o mais adequado à
49
El País, 19-oct-04: El prelado de Ávila sostiene que solo en “golpes de Estado” hubo tantos
cambios.
50
El Mundo, 26-dic-04: La Iglesia mantiene que los gays ‘no tienen derecho’ a casarse y tacha de
‘reprobable’ su inclinación sexual.
51
Idem.
52
El Mundo, 27-ene-05: Rouco asegura que la Iglesia española no está ‘bajo asedio’ aunque
haya ‘algunos problemas’.
53
El Mundo: 2-may.05: El Vaticano considera que la adopción de niños por parejas
homosexuales es ‘una tragedia’.
54
El Mundo, 10-jun-05: La Conferencia Episcopal apoya la manifestación del 18-J en Madrid
contra los matrimonios homosexuales.
55
El Mundo, 11-dic-04: Los obispos lanzan una campaña en contra del matrimonio gay.
102
razão e “a la naturaleza”
56
. Também é requisitado ao afirmar que o corpo sexuado não é
“pura genitalidad”, mas necessita desenvolver sentimentos e tendências afetivas
“congruentes con la propia biología”
57
.
Será que a Igreja não acredita nos argumentos que lhe oferece o discurso
religioso à hora de se referir aos temas acima mencionados? A razão seria a consciência
do descrédito pelo qual esta instituição passa nos dias atuais, devido à sua oposição a
temas como o uso do preservativo, por exemplo? A Igreja lança mão de outros discursos
que, sim, teriam crédito na sociedade: a psicologia, a antropologia, a biologia e até
mesmo a filosofia e cria uma situação interessante, já que se apresenta no nosso corpus
como a instituição que merece maior número de ocorrências de vozes nas notícias. Se o
descrédito de que falamos é real, por que o enunciador-jornalista dá tanta
representatividade em sua notícia às vozes ligadas à Igreja?
Pensemos na conjuntura histórica em que acontece a publicação das notícias que
compõem nosso corpus. O partido socialista no governo propõe a aprovação da lei do
matrimônio homossexual num momento no qual o principal partido da oposição ainda
se recompõe do trauma que supôs a perda das eleições de 14-M
58
e tenta lutar contra a
imagem negativa do partido gerada pela atuação do governo de José María Aznar com
ocasião dos atentados do 11-M, do desastre ecológico que provocou o afundamento do
petroleiro Prestige nas costas galegas etc. Nesse panorama parece razoável que o setor
chamado a exercer a oposição mais forte à aprovação do projeto do governo socialista
fosse a Igreja católica, religião majoritária na Espanha tradicionalmente.
É importante lembrar que, a pesar de que praticamente só foram trazidas para as
notícias vozes pertencentes à Igreja Católica, na Espanha existem outras religiões
embora minoritárias respeito a esta: a igreja evangélica, a ortodoxa, entre outras.
A respeito da religião, a Constituição Espanhola define, no seu artículo 16.3 que
a Espanha é um país aconfissional, embora se mencione a Igreja Católica,
tradicionalmente majoritária neste país
59
.
56
Idem.
57
Idem.
58
As últimas eleições na Espanha produziram-se no dia 14 de março de 2004, três dias após os
atentados em Madri.
59
http://noticias.juridicas.com/base_datos/Admin/constitucion.tl.html. (Acesso em 29 de outubro
de 2006)
103
Artículo 16.
3. Ninguna confesión tendrá carácter estatal. Los poderes públicos
tendrán en cuenta las creencias religiosas de la sociedad española y
mantendrán las consiguientes relaciones de cooperación con la
Iglesia Católica y las demás confesiones.
A presença constante do setor eclesiástico católico em questões como a lei do
casamento homossexual justifica-se pela presença dessa instituição na lei, e a presença
na lei está ancorada na força que essa instituição tem na sociedade espanhola. A
divulgação do anteprojeto de lei provocou que diferentes forças entrassem em embate.
Nesse embate a força da Igreja revela-se como muito forte em relação às outras. De
fato, as vozes da Igreja aparecem nos dois jornais objeto de análise como as que em
mais ocasiões são levadas para a notícia pelo enunciador-jornalista.
3.4.2.- O Governo
Visando dar continuidade a nosso objetivo de analisar o discurso dos
representantes dos diferentes lugares sociais presentes nas notícias do nosso corpus,
passamos a comentar as vozes de representantes do governo espanhol. Percebemos que
nem todos os membros do governo têm voz nas notícias, mas apenas uma pequena
parte. Assim, as vozes dos representantes do governo espanhol presentes nas notícias no
jornal El Mundo são: a do presidente do governo, José Luis Rodríguez Zapatero; a da
vice-presidente e porta-voz do governo, Maria Teresa Fernández de la Vega; a do
ministro da Justiça, Juan Fernando López Aguilar; a do ministro da Defesa, José Bono;
e a de José Caldera, ministro de Trabalho e Assuntos Sociais
60
. Acreditamos que seja
muito significativo o fato de o ministro da Justiça espanhol possuir muito mais espaço
do que o ministro de Assuntos Sociais, especialmente porque a lei que estava sendo
discutida relaciona-se com direitos civis. Talvez o fato de que uma das primeiras
polêmicas a respeito da lei tenha sido a da constitucionalidade do anteprojeto explique o
protagonismo ao ministro da Justiça em detrimento do de Assuntos Sociais. Em várias
ocasiões as vozes dos representantes do governo aparecem identificadas simplesmente
como: “el Consejo de Estado”, “el gobierno”, “el partido socialista obrero español”,
“fuentes del ministério de asuntos sociales” ou “el PSOE y otras formaciones políticas”.
Ao longo das notícias coletadas e analisadas, os representantes do governo se
posicionam a respeito de variados assuntos, tais como: o anteprojeto de lei, a
60
No jornal El País, além dos citados, o enunciador-jornalista traz também para as notícias as
vozes de José Blanco, secretario de Organização e Coordenação do PSOE, Elena Salgado, ministra de
Saúde e J. Montilla, ministros de Justiça.
104
constitucionalidade ou não desta iniciativa governamental (vários setores apontam a
inconstitucionalidade do anteprojeto, dentre eles, o CGPJ e o PP), a adoção de crianças
por homossexuais, a possibilidade de aderir ao direito de “objeción de conciencia” etc.
Cabe destacar neste ponto que o governo espanhol para defender a aprovação do
anteprojeto de lei recorre a dois discursos: o jurídico e o da ciência. O primeiro se faz
presente ao incluírem-se artículos da Constituição européia e da Constituição espanhola,
que pregam que ninguém pode ser discriminado por razão (dentre outros motivos) de
sua orientação sexual, e estabelecem a obrigação por parte dos poderes públicos de
eliminar as barreiras de desigualdade e discriminação. A Constituição espanhola no seu
Artigo 9 do Título Preliminar diz
61
:
Artículo 9.
1. Los ciudadanos y los poderes públicos están sujetos a la
Constitución y al resto del ordenamiento jurídico.
2. Corresponde a los poderes públicos promover las condiciones
para que la libertad y la igualdad del individuo y de los grupos en
que se integra sean reales y efectivas; remover los obstáculos que
impidan o dificulten su plenitud y facilitar la participación de todos
los ciudadanos en la vida política, económica, cultural y social.
3. La Constitución garantiza el principio de legalidad, la jerarquía
normativa, la publicidad de las normas, la irretroactividad de las
disposiciones sancionadoras no favorables o restrictivas de derechos
individuales, la seguridad jurídica, la responsabilidad y la interdicción
de la arbitrariedad de los poderes públicos. (Grifos nossos)
Por sua vez, o artigo 10 afirma:
Artículo 10.
1. La dignidad de la persona, los derechos inviolables que le son
inherentes, el libre desarrollo de la personalidad, el respeto a la Ley y
a los derechos de los demás son fundamento del orden político y de la
paz social.
2. Las normas relativas a los derechos fundamentales y a las libertades
que la Constitución reconoce se interpretarán de conformidad con la
Declaración Universal de Derechos Humanos
y los Tratados y
acuerdos internacionales sobre las mismas materias ratificados por
España.
61
http://noticias.juridicas.com/base_datos/Admin/constitucion.tl.html. (Acesso em 29 de outubro
de 2006)
105
Por sua vez, a Constituição Européia afirma o seguinte no Título 3 da parte II,
correspondente à Igualdade
62
:
ARTÍCULO II-80
Igualdad ante la ley
Todas las personas son iguales ante la ley.
ARTÍCULO II-81
No discriminación
1. Se prohíbe toda discriminación, y en particular la ejercida por
razón de sexo, raza, color, orígenes étnicos o sociales, características
genéticas, lengua, religión o convicciones, opiniones políticas o de
cualquier otro tipo, pertenencia a una minoría nacional, patrimonio,
nacimiento, discapacidad, edad u orientación sexual.
2. Se prohíbe toda discriminación por razón de nacionalidad en el
ámbito de aplicación de la Constitución y sin perjuicio de sus
disposiciones particulares. (Grifos nossos)
A respeito da igualdade a Constituição Espanhola diz no seu artículo 14 do
Capítulo Segundo (Derechos y Libertades)
Artículo 14.
Los españoles son iguales ante la Ley, sin que pueda prevalecer
discriminación alguna por razón de nacimiento, raza, sexo, religión,
opinión o cualquier otra condición o circunstancia personal o social.
Os membros pertencentes ao governo recorrem a esses artigos inúmeras vezes
para justificar sua intenção de equiparar os direitos dos homossexuais. Conforme
mostram os fragmentos a seguir
63
:
62
http://www.constitucioneuropea.es/servlet/noxmlba9d.pdf?id=mae20031218Contenido%20M227713666
11106759826975-EXTRACTO.pdf&mime=application/pdf (Acesso em 29 de outubro de 2006)
63
No anexo IV, os restantes fragmentos coletados.
106
Quadro 15: A Constituição Espanhola no discurso do governo espanhol
Data Título
Responsável
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
06-oct-
2005
López Aguilar
no pide al
CGOJ su
opinión sobre
las bodas gays
‘porque no es
un órgano
consultivo’
Juan
Fernando
López
Aguilar,
ministro de
Justicia
Según
Según explicó, sólo puede
declararse inconstitucional
“aquello que contradice de
manera frontal” sus preceptos y
precisamente el reconocimiento
del matrimonio a las personas
del mismo sexo “cumple un
mandato constitucional general,
el de hacer que los poderes
públicos remuevan barreras de
desigualdad para que la libertad
e igualdad sean cada vez más
reales y efectivas”, concluyó.
El ministro de
Justicia, Juan
Fernando
López
Aguilar
Consideró que
Estas formaciones apostaron por
regular las uniones
homosexuales a través de
fórmulas de parejas de hecho y
sin permitirles la adopción,
pero la mayoría apoyó la tesis
defendida por el ministro de
Justicia, Juan Fernando López
Aguilar, quien consideró que
permitir el matrimonio entre
personas del mismo sexo es
cumplir el mandato
constitucional de remover las
barreras de desigualdad y
discriminación.
17-mar-05
El congreso
rechaza las
enmiendas a la
totalidad de
PP y Unió al
proyecto del
matrimonio
homosexual
Julio
Villarrubia,
portavoz
socialista
Señaló que
En la misma línea de
argumentación del ministro,
señaló que la iniciativa responde
al artículo 9.2 de la
Constitución, que obliga a los
poderes públicos a eliminar los
obstáculos que impidan el
ejercicio real de la igualdad.
17-mar-05
López Aguilar
asegura que la
ley del
matrimonio
homosexual
obedece a un
mandato
constitucional
El ministro de
Justicia, Juan
Fernando
López
Aguilar
Ha afirmado
que
defendió
MADRID.- El ministro de
Justicia, Juan Fernando López
Aguilar, ha afirmado que el
proyecto de ley que legaliza los
matrimonios del mismo sexo
obedece al mandato
constitucional español y europeo
de remover las barreras de
desigualdad y discriminación,
y defendió el derecho de estas
parejas a la adopción.
107
López
Aguilar
Agregó
Argumentó
que
El proyecto de modificación del
Código Civil es “muy escueto”
sin embargo tiene una “enorme
potencia simbólica política y
social”, agregó López Aguilar,
quien argumentó que con este
cambio se “ensancha la libertad
y se remueven las barreras de
desigualdad”.
López
Aguilar
Tras recordar
que
Explicó que
Tras recordar que sólo Bélgica,
Holanda, cinco provincias de
Canadá y el estado de
Massachussets (EEUU)
permiten el matrimonio
homosexual, explicó que al
mandato de la Carta Magna
española se une el de la
Constitución europea, donde
también se consagra el derecho a
la igualdad y “de una forma más
explícita se prohíbe toda
discriminación por razón de
orientación sexual”.
López
Aguilar
dijo
“Sin lugar a dudas – dijo – este
mandato se abrirá paso en toda
la Unión Europea. Es la hora en
que, acogiéndose a la invitación
que nos señala la Constitución
española y europea, España de
un paso y lo haga además entre
las primeras sociedades
democráticas”.
El titular de
Justicia
Indicó
rechazó
Prohibir la posibilidad de la
adopción a este colectivo sería
“inconstitucional”, indicó el
titular de Justicia, quien rechazó
la orientación sexual como
factor para evaluar la idoneidad
del sujeto en este cometido.
López
Aguilar
De acuerdo
con
De acuerdo con López Aguilar,
“se trata de una extensión de la
libertad y de una consagración
de la igualdad y de remoción de
una barrera de desigualdad”, con
lo que se cumple con el mandato
de la Constitución a que los
poderes públicos eliminen los
obstáculos que lo pudieran
impedir.
O governo também se apropria do discurso da ciência para defender a adoção de
crianças por homossexuais, conseqüência imediata da equiparação de direitos, uma vez
aprovada a lei de casamento homossexual. Assim, o governo, baseando-se em “mais de
108
50 estudos”
64
defende que as crianças que são educadas por um casal homossexual não
apresentam diferenças com relação aos que crescem em famílias heterossexuais. O
interessante neste ponto é que os representantes da Igreja também utilizam o discurso da
ciência, mas neste caso o fazem para defender justamente o contrário, para se opor à
adoção de crianças por homossexuais já que, segundo eles, isso seria prejudicial a elas.
Assim, um mesmo discurso, o da ciência, é utilizado para se posicionar tanto a favor
quanto contra a adoção.
Quadro 16: O discurso da Ciência no discurso do goveno espanhol
Data Título
Responsável
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
1-oct-04
El Consejo de
Ministros
aprobará hoy
la ampliación
del
matrimônio a
las parejas
homosexuales
El jefe del
Ejecutivo
(José Luis
Rodríguez
Zapatero)
Agregó que
Recalcando
que
Agregó que hay estudios (uno
de ellos del Ruiz Gallardón)
que demuestran que la
evolución educativa y
formativa de los niños es
similar se trate de
homosexuales o de
heterosexuales, recalcando que
lo importante es que el niño
adoptado viva en una buena
familia que le dé condiciones
para su desarrollo, y eso no lo
determina la orientación
sexual”.
1-oct.-04
El Gobierno
aprueba el
derecho al
matrimonio de
los
homosexuales
La
vicepresidenta
primera del
Gobierno,
María Teresa
Fernández de
la Vega
ha manifestado
(en la rueda de
prensa
posterior a la
reunión) que
La vicepresidenta primera del
Gobierno, María Teresa
Fernández de la Vega, ha
manifestado en la rueda de
prensa posterior a la reunión
que “mas de 50 estudios”
coinciden en que los niños que
crecen en casas con padres
homosexuales no ofrecen
diferencias respecto a los que
lo hacen en familias
heterosexuales. Además,
subrayó que “ya hay miles de
niños que viven con padres
homosexuales”.
64
El Mundo, 1-oct-04: El Gobierno aprueba el derecho al matrimonio de los homosexuales.
109
Los estudios
la también
portavoz del
Gobierno
No observan
dijo
Tras referirse a los estudios
que no observan diferencias
respecto a los niños, la también
portavoz del Gobierno dijo:
“No hay pruebas de que los
padres homosexuales eduquen
peor a sus hijos; en la adopción
debe primar el bienestar del
niño con independencia de la
orientación sexual de los
padres”.
17-mar-05
El Congreso
rechaza las
enmiendas
El portavoz
socialista,
Julio
Villarrubia
Varios
informes
Señaló que
Defendió
Descartan que
El portavoz socialista, Julio
Villarrubia, señaló que la
finalidad de este proyecto es
luchar por la plena igualdad
jurídica de las personas y
defendió la adopción por parte
de las parejas del mismo sexo
tras esgrimir varios informes
que descartan alteraciones en
el desarrollo de la personalidad
del niño.
3.4.3- O Partido Popular (PP)
Antes de começarmos a falar a respeito dos temas abordados pelos
representantes do Partido Popular (PP), principal partido de oposição ao governo, cabe
destacar o elevado número de vozes pertencentes a este lugar social presentes nas
notícias dos dois jornais foco de análise. Assim, as notícias de nosso corpus
contemplam desde a voz do presidente do partido até do prefeito de diversos
municípios, passando pelo ex-presidente do governo, deputados, senadores, secretários,
etc.
O Partido Popular em seu discurso apela freqüentemente à Tradição para
defender o modelo de matrimônio constituído por um homem e uma mulher. Este
partido opõe-se à adoção por homossexuais, baseando-se no interesse superior da
criança, referido na Declaração de Direitos da Criança (1959) e argumentando que a
adoção é prejudicial para as crianças, já que estas precisam da referência masculina e
feminina durante sua criação. Assim, a lei é caracterizada na voz de seus representantes
como uma “involución en las costumbres”
65
e um “ataque a los valores tradicionales”
66
.
Essas vozes enumeram as conseqüências negativas que produzirá a aprovação da lei e o
65
El Mundo, 28-ene-05: Un diario publica una entrevista en la que Botella dice que por contentar
a los gays Zapatero traiciona al país.
66
Idem.
110
matrimônio de casais homossexuais. Dentre essas conseqüências, os representantes do
PP citam: “la quiebra social”
67
, o agravamento da crise demográfica
68
etc. A lei que
pretende equiparar os direitos dos homossexuais recebe uma série de qualificações tais
como innecesaria, precipitada, “errônea”
69
, “disparatada”
70
, “no es seria, ni razonable,
ni constitucional”
71
, “genera conflitos”
72
, bem como a atitude do governo socialista ao
propor a aprovação da lei: “un empeño, un desafio y uma provocación”
73
, “en contra del
sentido común, de la democracia”
74
, uma “irresponsabilidad”
75
, “Zapatero ha
traicionado al país por complacer a un lobby poderoso”
76
. Os representantes do Partido
Popular também defendem a possibilidade de que os servidores públicos encarregados
de celebrar os casamentos de homossexuais se acolham ao direito de “objeción de
conciencia” e justificam sua oposição à aprovação da lei baseando-se em critérios
constitucionais, bem como no ditame do Consejo de Estado e do Consejo General del
Poder Judicial (CGPJ). Chama a atenção neste ponto que do mesmo jeito que aconteceu
no caso da utilização do discurso da ciência por parte dos representantes do governo e
da Igreja (no primeiro caso para posicionar-se a favor da adoção de crianças por
homossexuais e no segundo para se opor a ela), também aqui nos deparamos com que
um mesmo discurso, no caso o discurso da Constituição espanhola, é utilizado pelo
Partido Popular para se opor à aprovação da lei, enquanto que os representantes do
governo lançam mão dele para defender tal aprovação. Existem, portanto, vários lugares
discursivos que se utilizam dos mesmos discursos (da Ciência, da Constituição) em
busca de um mesmo objetivo. Isto produz um efeito de homogeneidade, já que embora
exista um embate entre várias forças, estas podem se agrupar em formaçoes discursivas
em função desses discursos utilizados para se posicionar a respeito da lei do casamento
homossexual.
67
El Mundo, 30-dic-05/2: Acebes: ‘A lo mejor no entra en vigor porque el TC dice que es
inconstitucional’.
68
El Mundo, 3-may-05: Fraga asegura que el matrimonio gay ayudará a que España, pronto sea
el país más envejecido del mundo.
69
El Mundo, 27-abr-05: Los alcaldes de PP, ante la celebración de las bodas gays.
70
El Mundo, 30-dic-05/2.
71
Idem.
72
El Mundo, 27-abr-05: Discrepancias entre los alcaldes del Partido Popular por la celebracion
de los matrimonios homosexuales.
73
El Mundo, 14-jun-05: Rajoy mantiene la incógnita sobre su presencia em la manifestación
contra los matrimonios gays.
74
El Mundo, 16-jun-05: Acebes responde a Zapatero sobre la manifestación del sábado: ‘No
haremos lo del PSOE el 13-M’.
75
Idem.
76
El Mundo, 28-ene-05/2
111
Um fato que chama a atenção ao analisarmos o discurso dos representantes do
PP é que, ao contrário do que acontecia, por exemplo, no setor da Igreja que apresenta
uma grande homogeneidade no seu discurso, entre as vozes do Partido Popular podemos
escutar algumas vozes discordantes do discurso oficial desse partido, pelo menos no que
diz respeito a alguns temas. É o caso, por exemplo, do prefeito de Vitória, Alfonso
Alonso, que chamou de “miserables”
77
às pessoas que se manifestaram contra os
matrimônios homossexuais no 18-J em Madri. Outro exemplo é o de Célia Villalobos,
que votou a favor do anteprojeto de lei e, portanto, contra a política do partido, motivo
pelo qual recebeu uma sanção econômica.
Um outro aspecto que julgamos relevante é que nas notícias do jornal El Mundo
analisadas, pudemos observar que as vozes do PP se apropriam do dizer de outros
lugares sociais em várias ocasiões para defender suas teses respeito a diferentes
assuntos. Em um primeiro momento, tomam para si o dizer do Consejo do Estado, que
não concorda com a denominação de “matrimônio” para as uniões homossexuais, e
também o do Consejo General do Poder Judicial a respeito da suposta
inconstitucionalidade do projeto de lei defendido pelo governo espanhol. Num segundo
momento, os representantes do Partido Popular se apropriam do chamado da Igreja a
exercer o direito de “objeción de conciencia” por parte do servidores públicos
encarregados de celebrar os casamentos entre homossexuais. Nesse segundo caso, cabe
lembrar que a Igreja toma para si o discurso da Constituição espanhola e da
Constituição européia. Esta última no seu artículo II-70 da Parte 2 sobre as Liberdades
afirma o seguinte:
ARTÍCULO II-70
Libertad de pensamiento, de conciencia y de religión
1. Toda persona tiene derecho a la libertad de pensamiento, de
conciencia y de religión. Este derecho implica la libertad de cambiar
de religión o de convicciones, así como la libertad de manifestar su
religión o sus convicciones individual o colectivamente, en público o
en privado, a través del culto, la enseñanza, las prácticas y la
observancia de los ritos.
2. Se reconoce el derecho a la objeción de conciencia
de acuerdo con
las leyes nacionales que regulen su ejercicio.
77
El Mundo, 21-jun-05: Ana Pastor dice que no comparte la opinión del experto que consideró la
homosexualidad una ‘patología’.
112
Já a Constituição Espanhola diz no artículo 30 da Seção Segunda (De los
derechos y deberes de los ciudadanos) dentro do Capítulo Segundo (Derechos y
Libertades):
Artículo 30.
1. Los españoles tienen el derecho y el deber de defender a España.
2. La Ley fijará las obligaciones militares de los españoles y regulará,
con las debidas garantías, la objeción de conciencia, así como las
demás causas de exención del servicio militar obligatorio, pudiendo
imponer, en su caso, una prestación social sustitutoria.
3. Podrá establecerse un servicio civil para el cumplimiento de fines
de interés general.
4. Mediante Ley podrán regularse los deberes de los ciudadanos en
los casos de grave riesgo, catástrofe o calamidad pública.
Mais adiante, no artículo 52 do Capítulo Quarto (De las garantías de las
libertades y derechos fundamentales) afirma o seguinte:
Artículo 53.
1. Los derechos y libertades reconocidos en el Capítulo II del
presente Título vinculan a todos los poderes públicos.
Sólo por Ley
, que en todo caso deberá respetar su contenido esencial,
podrá regularse el ejercicio de tales derechos y libertades que se
tutelarán de acuerdo con lo previsto en el artículo 161,1 a)
.
2. Cualquier ciudadano podrá recabar la tutela de las libertades y
derechos reconocidos en el artículo 14 y la Sección primera del
Capítulo II ante los Tribunales ordinarios por un procedimiento
basado en los principios de preferencia y sumariedad y, en su caso, a
través del recurso de amparo ante el Tribunal Constitucional. Este
último recurso será aplicable a la objeción de conciencia reconocida
en el artículo 30
.
3. El reconocimiento, el respeto y la protección de los principios
reconocidos en el Capítulo III
, informará la legislación positiva, la
práctica judicial y la actuación de los poderes públicos. Sólo podrán
ser alegados ante la Jurisdicción ordinaria de acuerdo con lo que
dispongan las Leyes que los desarrollen.
O artículo 14, citado no parágrafo anterior diz:
Artículo 14.
Los españoles son iguales ante la Ley, sin que pueda prevalecer
discriminación alguna por razón de nacimiento, raza, sexo,
religión, opinión o cualquier otra condición o circunstancia personal
o social. (Grifos nossos)
113
Os homossexuais, por sua vez, se apóiam no discurso do Governo que, por sua
vez, recorre ao discurso da Constituição Espanhola, para defenderem a legalidade da lei
e a própria iniciativa do governo espanhol. Temos aqui pontos de vista semelhantes
entre o Governo e os gays que se apóiam num mesmo discurso nos mesmos dizeres,
mas resta pensar se esses mesmos dizeres que partem de lugares de sentido diferentes
significam da mesma forma, já que sabemos que dependendo do lugar de onde se
enuncia o sentido de um mesmo enunciado muda.
3.4.4.- A “Ciência”
As vozes ligadas à ciência são citadas nas notícias de nosso corpus a partir do
momento em que a lei passa a ser discutida no Senado, ou seja, uma vez aprovada no
Congresso dos Deputados. É nesse momento quando o Partido Popular, com maioria na
Câmara, propõe que sejam chamados especialistas para falarem à Comissão de Justiça
sobre os pros e os contras da adoção de crianças por casais homossexuais. A finalidade
é que cada um exponha seu ponto de vista em relação ao projeto de lei que modifica o
Código Civil e a Ley de Enjuiciamiento Civil em matéria de direito a contrair
matrimônio e, em particular, sobre os efeitos que tem no desenvolvimento dos menores
a convivência com casais homossexuais. Assim sendo, os diferentes partidos se fazem
representar no Senado pelos seus candidatos. O Partido Popular sugere Aquilino
Polaino, Catedrático de Psicopatologia da Universidade Complutense de Madri. A
Izquierda Unida (IU) indica Angel Bao, psicólogo e técnico de “acogimiento” familiar e
José Maria Gonzalo Casal, advogado e responsável por Berdindu. Maria del Mar
González Rodríguez, professora de Psicologia Evolutiva da Universidade de Sevilha é
proposta pelo Grupo Parlamentario Entesa Catalana de Progés. Convergência e Unió
(CIU) sugere Nuria Gispert Catalã, advogada e “exconsejera” de Justiça da Generalitat
de Catalunha. Coalição Canária indica Fernando Chacón Fuentes, decano do Colégio de
Psicólogos de Madri. Patricia Martínez Peroni e Mónica Fontana Abad, do
departamento de Pscilogia da Universidade San Pablo-CEU, são propostas pelo Grupo
Popular. José Luis Iglesias, catedrático de Psicologia Evolutiva da Universidade
Autônoma de Madri, informou aos senadores a pedido da Entesa Catalana de Progrés e
a pedido do Grupo Parlametario Socialista José Luis Pedreira Massa, doutor em
Medicina especializado em paidopsiquiatria. As intervenções foram fechadas com a
exposição, a pedido do Grupo Parlamentario Socialista, de Javier Pérez Royo,
catedrático de Direito Constitucional da Universidade de Sevilla.
114
Chama a atenção que nem todos os candidatos propostos pelos diversos partidos
políticos, têm suas vozes incluídas nas notícias dos jornais, somente uma pequena parte.
Assim, nas notícias do jornal El Mundo nos deparamos com a voz de Aquilino Polaino,
Fernando Chacón e Maria del Mar González Rodríguez . No jornal El País quem fala é
Aquilino Polaino, María del Mar González Rodríguez, Patricia Martínez Peroni, José
María Gonzalo, Nuria Gispert e Enrique Rojas. Os demais, embora tenham feito seus
depoimentos para os membros do Senado, não têm espaço nas notícias coletadas.
As vozes dos representantes da Ciência aparecem em nosso corpus num total de
6 notícias no jornal El Mundo e 10 no El País, sendo que a maioria foi publicada a partir
do 20 de junho de 2006, data em que o catedrático de Psicopatologia proposto pelo
Partido Popular, Aquilino Polaino, expõe suas “certezas” teóricas no Senado.
Precisamente esse depoimento provocou vários outros vindos de diversos setores sociais
(o Governo, psicólogos, membros do Partido Popular, os homossexuais etc.), criticando
ou apoiando as teorias de Aquilino Polaino a respeito da homossexualidade e da adoção
por homossexuais.
É interessante também sublinhar que as vozes dos diferentes lugares sociais
remetem em suas falas a informes ou estudos psicológicos para defender suas teorias a
respeito da adoção de crianças por homossexuais. Isto se verifica em notícias dos dois
jornais. Como exemplo, temos o caso do jornal El Mundo nas seguintes notícias: El
Congreso aprueba el matrimônio entre personas del mismo sexo, publicada em 21 de
abril de 2005 e na intitulada Asociaciones de homosexuales piden al Colégio de
Psicólogos que expulse al experto citado por el PP, publicada em 21 de junho do
mesmo ano.
115
Quadro 17: Diferentes lugares socias remetem a estudos e informes para
justificar suas posições.
Data Título
Responsável
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
21-abr-05 El Congreso
aprueba el
matrimônio
entre personas
del mismo sexo
Varios
informes
Acreditan que Ayer, la Federación Estatal de
Gays, Lesbianas y
Transexuales envió al
Congreso varios informes
-
entre ellos, uno de la
Asociación Americana de
Psicología y otro de la
Academia Americana de
Pediatría- que acreditan que la
adopción de menores por parte
de parejas homosexuales no
perjudica a los pequeños.
21-jun-05 Asociaciones
de
homosexuales
piden al
Colegio de
Psicólogos que
expulse al
experto citado
por el PP
estudios Se señala que Al margen de la intervención
de Polaino y de la otra experta
citada por el PP, Patricia
Martínez, de la Universidad
San Pablo CEU, todos los
especialistas que
comparecieron en el Senado
presentaron estudios en los que
se señala que no hay evidencia
empírica de que los niños
criados por homosexuales
presenten diferencias con
respecto a los de parejas
heterosexuales.
O que podemos observar a partir da leitura dos fragmentos em que aparece
alguma voz relacionada à Ciência é que os posicionamentos das vozes a respeito da
homossexualidade e da adoção por homossexuais são totalmente contrários. Assim,
num dos extremos da polêmica, há a voz de Aquilino Polaino, quem argumenta para
fundamentar sua oposição à adoção por homossexuais, que as crianças criadas por
casais formados por pessoas do mesmo sexo tendem a ser homossexuais quando
adultos, quer dizer, que existiria uma causalidade entre ser criado por homossexuais e
ser homossexual, já que, segundo ele, “los modelos de exposición social a los que esté
expuesto el niño o la niña a lo largo de su desarrollo psicoemotivo van a determinar en
algunos y a condicionar en todos los casos el desarrollo emocional de la persona
78
. O
catedrático de Psicopatologia afirma ainda que o que configura a identidade pessoal da
criança é o modelo de família a que esteja exposto, modelo que segundo ele deve ser o
78
El Mundo, 20-jun-05: El Congreso aprueba el matrimonio entre personas del mismo sexo.
116
formado por um homem e uma mulher. A respeito dos homossexuais, Polaino afirma,
referindo-se ao perfil psicopatológico destes que foram educados por pais “hostis,
alcoólatras, distantes”
79
e por mães “sobre protetoras” sobretudo, com os filhos
homens”. Tanto Polaino quanto outros especialistas chamados ao Senado insistem em
relacionar homossexualidade e doença.
Contra esses depoimentos se posicionam outros especialistas, bem como alguns
membros de outros setores como o Partido Popular (alguns membros deste partido
afirmam não compartir o ponto de vista do psicólogo), todos os membros do governo,
os representantes dos homossexuais etc. Dentro do próprio campo da Ciência, inúmeras
vozes de profissionais relutam em aceitar que determinados “modelos de família” (pais
ausentes e mães superprotetoras, por exemplo) constituam uma espécie de “receita” que
influencie a orientação sexual dos filhos. Segundo notícia publicada no jornal El País,
com data de 2 de outubro de 2004, intitulada “Un desarrollo sano para los niños”, um
relatório elaborado em 2002, pelo Colégio Oficial de Psicólogos de Madri e pela
Universidade de Sevilha, após analisar 28 famílias homoparentais, concluiu que as
únicas diferenças apreciáveis nos filhos criados por casais homossexuais são uma visão
mais ampla sobre os gêneros e uma maior flexibilidade quanto à orientação sexual. O
relatório conclui também que não há prevalência da homossexualidade entre os filhos
dos homossexuais, os quais dispõem da estabilidade e variedade requeridas para
propiciar um desenvolvimento sadio e harmônico.
Como já observamos quando analisamos o discurso de representantes da Igreja,
ratifica-se nas notícias do nosso corpus a associação homossexualidade e doença. Mas
neste caso este posicionamento é mantido por membros que falam como cientistas, o
que é muito mais interessante. A Ciência tem avançado muito e, concretamente, tem
feito isto em relação à homossexualidade, no entanto, há ainda vozes que insistem em
manter essa relação da homossexualidade como doença, desvio ou anormalidade.
Existe, portanto, uma repetição dos já-ditos sobre a homossexualidade nas notícias de
nosso corpus.
Como exemplo dessa visão sobre a homossexualidade como doença basta
lembrar o caso no Rio de Janeiro do deputado e pastor evangélico Edino Fonseca, quem
em 2003 apresentou um projeto de lei que previa a criação de um programa, financiado
com verbas públicas, de apoio à recuperação de homossexuais. Cabe ressaltar que
79
El Mundo, 20-jun-05: Un experto invitado por el PP al Senado dice que los gays son hijos de
padres ‘hostiles’ y ‘alcohólicos’.
117
embora tenha sido derrubado na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, por 30 votos
a seis, a proposta chegou a ser aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça.
Um outro caso é o do psicólogo americano Floyd Godfrey – que se diz ex-gay –
que “trata” os homossexuais em sua clínica no Arizona desde 2000.
A homossexualidade foi rejeitada como doença mental pela Associação
Americana de Psiquiatria em 1973 e foi retirada da lista de doenças em 1992 pela
Organização Mundial da Saúde (OMS).
Na atualidade, segundo Epstein (2006) mais que uma opção
80
entre hetero e
homossexualidade, especialistas defendem a existência de um “continuum” de
orientações possíveis determinadas por vários fatores tanto genéticos quanto ambientais.
O autor acrescenta que, do ponto de vista científico, não há evidência de que abusos
sofridos durante a infância ou o fato de ter pais ausentes ou uma mãe muito contraladora
e superprotetora, argumentos defendidos por alguns psicólogos, sejam desencadeantes
da homossexualidade. Segundo o autor, não é possível afirmar que a família produziu
neles a tendência de se interessar por pessoas do mesmo sexo.
Algumas pesquisas sugerem que a genética tem função na constituição da
sexualidade. Se os genes contribuem para que as pessoas se localizem, estatisticamente,
numa das extremidades do continuum da orientação sexual, são muito baixas as
possibilidades de um hetero eventualmente se interessar por alguém do mesmo sexo (ou
vice-versa, no caso dos homossexuais). Mas se um indivíduo se situar em algum lugar
entre esses dois extremos, o ambiente pode vir a ser uma influência determinante,
sobretudo quando a pessoa é jovem. Pelo fato de a sociedade privilegiar
relacionamentos entre homens e mulheres, na maioria dos casos o deslocamento se dará
em direção à heterossexualidade. (EPSTEIN,2006)
Já pensou ser discriminado por exibir alguma característica
determinada biologicamente como a cor dos olhos, ainda que você se
sinta bem com isso e não consiga imaginá-los de outra cor? Imagine
também se dezenas de teóricos e grupos militantes escrevessem livros
inteiros explicando como, por influência dos pais, para agradar aos
amigos ou por causa das más companhias, você “escolheu” tê-los
assim. Além de tentarem convencê-lo disso, exigem que você mude a
cor deles. Soa angustiante? Ao que tudo indica, isso é o que vem
acontecendo com boa parte de nós – não em relação à cor dos olhos,
claro, mas quanto à preferência sexual. (H
OUZEL, 2006)
80
Os termos “opção” sexual e “preferência sexual”, usados rotineiramente, parecem-nos
tendenciosos, pois sugerem que a orientação sexual é uma questão exclusivamente de escolha consciente,
o que não é assim. Portanto, neste trabalho privilegiaremos o termo “orientação sexual”.
118
Segundo Houzel (2006), a única razão que explica a heterossexualidade como
preferência normal da nossa espécie é o simples fato de ela ser encontrada na maioria da
população. Para esta autora a preferência sexual é determinada biologicamente e ainda
no útero. Para infelicidade de muitos religiosos, políticos e psicoterapeutas, não há
nenhuma evidência de que fatores sociais influenciem a preferência sexual. Há uma
coisa em comum nos que preferem se relacionar com homens (mulheres hetero e
homens homo), que é diferente naqueles que se sentem atraídos por mulheres (homens
hetero e mulheres homo): a maneira como o cérebro de um e outro reage aos
feromônios, substâncias usadas por inúmeras espécies com a finalidade última de
reproduzir-se (HOUZEL, 2006). Desde os anos 80, ainda segundo a autora, um número
cada vez maior de estudos mostram que a preferência sexual está associada a diferenças
no hipotálamo. Pesquisas recentes revelam que o hipotálamo do homo e do
heterossexual do mesmo sexo têm características diversas. O que faz com que o
hipotálamo responda diferentemente aos feromônios masculino e feminino parece ser
uma combinação de herança genética com fatores hormonais durante a gestação.
Concordamos com a autora quando afirma:
Se o 100% da população tem preferência sexual inata e
biologicamente determinada, somos todos iguais nesse quesito –
mesmo que o cérebro da maioria responda a feromônios do sexo
oposto. Tentar mudá-la é como insistir que uma pessoa troque a cor da
pele, torne-se menos alta ou mude a cor dos olhos. É inútil, inviável e
injusto. (H
OUZEL, 2006, p. 51)
Seria bom, portanto, que aqueles que pretendem que os homossexuais deixem
de sê-lo se somassem a essa forma de entender a homossexualidade, forma esta
amparada pela ciência. Sem dúvida, numa sociedade que se diz moderna ou decente,
segundo palavras do presidente do governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, no
sentido de não humilhar os seus membros, temos de acabar com teorias mais próprias
do passado que do século XXI.
Foucault afirma na sua História da sexualidade (1984) que a verdade sobre o
sexo é produzida fundamentalmente por meio de dois procedimentos: a ars erótica e a
scientia sexualis. No primeiro caso, as questões relativas ao sexo são vistas como arte:
a verdade é extraída do próprio prazer e o erotismo é encarado como prática e
experiência. É o que acontece em países como China, Japão, Índia e Grécia antiga. Já a
moderna scientia sexualis se apóia nos conceitos de normalidade e doença, ligados a
procedimentos que exercem seu poder sobre os comportamentos humanos. Pelo menos
119
à primeira vista a sociedade ocidental não possui a ars erótica. É porque médicos,
psiquiatras, pedagogos e sexólogos passaram a considerar os antigos prazeres como
crimes ou doenças, aberrações, atentados ao pudor e à moral pública que começaram as
tentativas de cura e de medicalização do sexo, produzindo no seio da comunidade
homossexual graves e confusos sentimentos de culpa, de vergonha e rejeição de si
relacionados ao desejo. Esta situação começou a mudar nos anos 60 no Ocidente
provocando uma revolução sexual. A visibilidade gay, lésbica, bissexual e transexual
ampliou-se; no fim do século XX surgiram em vários países reivindicações de homens
e mulheres pelo direito de viver livremente outra forma de sexualidade que não a
heterossexual-reprodutiva; o “consumo sexual” hoje corresponde às exigências do
mercado (bares, saunas GLS, turismo gay, festivais de cinema etc.); a parada GLBT,
realizada em muitas cidades, tem mais participantes a cada ano e leis que regulam a
união de pessoas do mesmo sexo já são realidade em muitos países.
Tem havido, portanto, importantes mudanças a respeito da questão sexual e
concretamente a respeito da homossexualidade, mas continuam o preconceito e as
teorias obsoletas a respeito do tema, talvez porque nossa sociedade permaneça regida
pela moral cristã fundamentada nos preceitos ditados pela Igreja Católica, que vêem
qualquer prática sexual não orientada à procriação em termos de desvio, de perversão e
de doença.
Isto é facilmente comprovável no nosso corpus de pesquisa, já que determinadas
posições de sujeito continuam reproduzindo nos seus dizeres já-ditos a respeito da
homossexualidade. A divulgação da aprovação do projeto de lei provocou um embate
de formações discursivas diferentes, mas o sentido produzindo desse embate de forças,
continua reproduzindo os já-ditos a respeito dos homossexuais, embora exista a brecha
que representa o discurso do governo espanhol e dos representantes dos homossexuais.
Acreditamos que a repetição dos já-ditos contribua para o efeito da homogeneidade
constatado em outros lugares desta pesquisa.
3.4.5.- O Foro Español de la Familia
No jornal El Mundo dos representantes do Foro Español de la Familia têm suas
vozes levadas para as notícias a partir do dia 21 de abril de 2005. Antes desta data não
encontramos nenhuma ocorrência relacionada com eles. O jornal El País publica antes
dessa data unicamente três notícias. É, portanto, uma data significativa, já que é nesse
120
dia 21 de abril de 2005 que o projeto de lei foi aprovado no Congresso dos Deputados,
passando a ser discutido e votado no Senado, onde a maioria estava em mãos dos
conservadores (Partido Popular). Mais uma vez, as vozes de representantes que se
posicionam contra a lei de casamento homossexual são trazidas em massa para as
notícias neste período tão importante no percurso percorrido pela lei desde a aprovação
do anteprojeto em outubro de 2004 até a aprovação definitiva em junho de 2005. Os
dois jornais publicaram a maior parte das notícias com vozes dos representantes do Foro
Español de la Familia no mês de junho, mês no qual a organização ganha protagonismo
pelo fato de convocar junto a outras organizações “familiares” como HazteOir, por
exemplo, uma manifestação pública em Madri contra os matrimônios homossexuais. A
manifestação foi apoiada pela Conferência Episcopal Española e pelo Partido Popular,
bem como por centenas, segundo os próprios organizadores, de outras organizações
familiares.
Ao fazer o levantamento das vozes relacionadas ao Foro Español de la Familia
no jornal El Mundo, chamou nossa atenção que das ocorrências registradas, na metade
delas o enunciador jornalista não atribui a fala a uma pessoa física e sim ao próprio
Foro. Temos, portanto, um número significativo de ocorrências, a metade do total, de
uma não-pessoa, de uma instituição que fala em nome de outra, a instituição familiar.
Além do Foro, quem fala nas notícias são Benigno Blanco e Ángel Trascasa,
vicepresidentes do Foro. O resto das ocorrências são atribuídas pelo enunciador-
jornalista a “fuentes del Foro Español de la Familia” e ao “manifesto do Foro Español
de la Familia”. Todas essas ocorrências foram recolhidas num total de 18 notícias no
jornal El Mundo e em 21 notícias nos jornal El País.
As vozes ligadas ao Foro Español de la Familia, que se auto-apresenta como
uma organização familiar “aconfesional” e “apolítica”
81
, falam dos perigos derivados da
adoção de crianças por parte de casais homossexuais, advertindo da incidência da
homossexualidade em crianças que crescem com casais homossexuais; criticam as
iniciativas do governo, entre as que se inclui a reforma do Código Civil para permitir o
matrimônio entre homossexuais. Estas iniciativas do governo (lei do casamento
homossexual, ampliação da lei do divorcio, legalização da pesquisa com embriões
humanos, reforma da lei de educação etc.) atentam, segundo o Foro Español de la
81
El Mundo, 10-jun-05: La Conferencia Episcopal apoya la manifestación del 18-J en Madrid
contra el matrimonio homosexual; El Mundo, 16-jun-05: Los organizadores de la marcha contra los
matrimonios gays estiman que irán más de 500.000 personas.
121
Familia “contra los fundamentos de la família
82
. Os representantes do Foro falam
também de novas medidas a serem tomadas caso não sejam recebidos pelo presidente
do governo, José Luis Rodríguez Zapatero, antes da data de aprovação definitiva da lei;
e fazem comentários a respeito de etapas que vai percorrendo a lei. O maior número de
ocorrências nas quais podemos ouvir a voz de um representante do Foro são aquelas nas
quais se fala a respeito da manifestação convocada por esta organização familiar contra
os matrimônios gays, no dia 18 de junho de 2005, em Madri. Algumas das
denominações utilizadas pelo enunciador-jornalista para referir-se a esta convocação,
cujo lema foi “La familia sí importa. Por el derecho a una madre y a un padre. Por la
libertad”; são: marcha contra los matrimônios gays / contra la ley de matrimônios
homosexuales / contra la ley para permitir el matrimônio entre homosexuales fonte. Na
tentativa de anular a iniciativa do governo, o Foro Español de la Familia apresenta
500.000 sinaturas em “defensa del matrimônio hetero y la infancia”
83
, solicita ao
governo que retire o projeto de lei, pede aos partidos contrários à reforma um recurso de
inconstitucionalidade e requisita ao governo que este faça um referendum para saber a
opinião dos espanhóis a respeito da proposta governamental.
O (suposto) direito da criança a ter um pai e uma mãe, quer dizer, a ser educado
no seio de uma família heteroparental, além de fazer parte do lema da manifestação
organizada pelo Foro Español de la Familia, está presente também nos dizeres dos
membros dessa organização ao longo das notícias que conformam nosso corpus. Estes
exigem do governo que regule a adoção de crianças de modo a garantir à criança o
(suposto) direito de ser educado por um casal heterossexual e descrevem a reforma do
Código Civil pretendida pelo governo como um atentado contra esse mesmo direito. Em
outra ocasião, os membros do Foro vaticinam que as crianças vão ficar desprotegidas
caso seja aprovada a citada lei e pedem que o governo faça um referendum para
conhecer a opinião dos espanhóis a respeito.
Como já vimos quando nos referimos aos dizeres dos representantes da Igreja e
do Partido Popular, mais uma vez se invocam os direitos da criança, no caso o (suposto)
de ter de serem educados por casais heterossexuais, como argumento para se opor à lei
que pretender aprovar o governo espanhol. Além da família, da sociedade como um
todo, são as crianças, portanto, o alvo principal do sofrimento causado pela ruptura dos
preceitos morais cristãos que supõe abrir o casamento aos homossexuais.
82
EL Mundo, 18-jun-05: Pancartas, música y confeti contra los matrimonios entre homosexuales.
83
El País, 21-abr-05: 500.000 firmas para frenar la iniciativa.
122
Os direitos das crianças que vigoram na Espanha estão recolhidos na
Constituição Espanhola (1978), na Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pela
Assembléia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1959 e na Convenção dos
Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, mediante
resolução 44/25, de 1989 e ratificada pela Espanha em 6 de dezembro de 1990
84
.
A Constituição Espanhola declara em seus artigos 12 e 39:
"Los españoles son mayores de edad a los dieciocho años."
"1. Los poderes públicos aseguran la protección social, económica y
jurídica de la familia.
2. Los poderes públicos aseguran asimismo, la protección integral de
los hijos, iguales éstos ante la ley con independencia de su filiación, y
de las madres, cualquiera que sea su estado civil. La ley posibilitará la
investigación de la paternidad.
3. Los padres deben prestar asistencia de todo orden a los hijos
habidos dentro o fuera del matrimonio, durante su minoría de edad y
en los demás casos en los que legalmente proceda.
4. Los niños gozarán de la protección prevista en los acuerdos
internacionales que velan por sus derechos."
Como podemos observar, dos quatro itens que compreendem o artigo 39 da
Constituição Espanhola deduzem-se quatro questões relevantes para a proteção da
família, tantas vezes invocada pelos representantes do Foro, da Conferencia Episcopal e
mesmo do Partido Popular: a) a proteção da família em sentido geral, b) a proteção dos
filhos e as mães, c) os deveres de assistência dos pais com os filhos e d) a proteção da
infância de conformidade com os acordos internacionais. Mas em nenhum deles se
menciona o suposto direito da criança a ser educada por um casal heterossexual.
A Convenção dos Direitos da Criança das Nações Unidas, de 1989, trata o tema
da adoção de crianças nos artigos 3, 20 e 21 da Parte I do Preâmbulo
85
, mas nada fala a
respeito do direito da criança a ter pais heterossexuais.
A Declaração dos Direitos da Criança
86
, aprovada em 1959 pelas Nações Unidas
também nada especifica a respeito de adoção e quando se refere ao tema da educação da
criança declara no seu Princípio 6:
84
Esta informação foi extraída do site:
http://209.85.135.104/search?q=cache:A2_0AuPJu3cJ.www.mae.es/ga/MenuPpal/Asuntos/Derechos%2B
Humanos/+Consituci%C3%B3n+espa%C3%B1ola+522derechos+del+ni%C3%B1o%22&hl=pt-
BR&gl+br&ct=clnk&cd=5&1r=lang_es Derechos de los niños. Segundo este site, além da Convenção
citada, existem vários Protocolos Facultativos relativos à participação de crianças em conflitos armados
(2002), ratificado pela Espanha em 2002; e à venda de crianças, à prostituição infantil e à utilização de
crianças em pornografia (2002), ratificado em 2001.
85
http:www.unhchr.ch/spanish/html/menu3/b/k2crc_sp.htm
123
El niño, para el pleno y armonioso desarrollo de su personalidad,
necesita amor y comprensión. Siempre que sea posible, deberá crecer
al amparo y bajo la responsabilidad de sus padres y, en todo caso, en
un ambiente de afecto y de seguridad moral y material; salvo
circunstancias excepcionales, no deberá separarse al niño de corta
edad de su madre. La sociedad y las autoridades públicas tendrán la
obligación de cuidar especialmente a los niños sin familia o que
carezcan de medios adecuados de subsistencia. Para el mantenimiento
de los hijos de familias numerosas conviene conceder subsidios
estatales o de otra índole.
Já, o Princípio 7 diz que a criança tem direito a receber educação gratuita e
obrigatória pelo menos nas etapas elementares. Será uma educação que favoreça sua
cultura geral e lhe permita em condições de igualdade de oportunidades desenvolver
suas aptidões e seu juízo individual, seu sentido de responsabilidade moral e social e
chegar a ser um membro útil da sociedade. Acrescenta-se que o interesse superior da
criança deve ser o princípio reitor de quem tem a responsabilidade de sua educação e
orientação e que a citada responsabilidade incumbe em primeiro término a seus pais.
O Princípio 10 acrescenta ao anterior que a criança deve ser educada em um
espírito de compreensão, tolerância, amizade entre os povos, paz e fraternidade
universal, e com plena consciência de que deve consagrar suas energias y aptidões ao
serviço de seus semelhantes. Portanto, nada se diz nesse três textos a respeito desse
pretendido direito das crianças de ser educado no seio de uma família heterossexual.
Assim como também não se impossibilita a adoção por casais homoparentais.
Vejamos o caso da proteção à família, tantas vezes invocada pelos membros
representantes da Conferência Episcopal, do Partido Popular e do Foro Español de la
Familia. Os textos citados acima sim recolhem esse direito à proteção da família, mas
que família é essa? É a mesma invocada pelos representantes acima citados? Que
família é essa que o Partido Popular, a Conferência Episcopal e o Foro tanto querem
proteger? Os homossexuais afirmam que eles também formam famílias. Quem é
responsável pela afirmação de que a família não importa para que o lema da
organização familiar convocante da manifestação do 18-J exiba como lema “La familia
sí importa”? O conceito de família defendido pelo Foro, pela Conferência e pelo PP por
estar ameaçado pela lei que o governo pretende aprovar, bem como por outras
iniciativas que o executivo pretende implementar como o direito ao divórcio unilateral
depois de três meses de casamento, é aquele constituído por um pai, uma mãe e as
86
http:www.unhchr.ch/spanish/html/menu3/b/24_sp.htm
124
crianças que houver. Quer dizer, o modelo ditado pela moral cristã. Ficam de fora,
portanto, dessa proteção que os poderes públicos devem garantir, as famílias onde só há
um pai ou uma mãe, aquelas nas quais não existe nem pai nem mãe e as crianças são
educadas por avôs, tios ou outros parentes, as famílias com crianças em adoção e, por
suposto, as famílias formadas por homossexuais em todas as suas possibilidades e
variantes.
Segundo Álvarez (2003)
87
, embora seja um fato sociologicamente constatável
que existe uma estreita relação entre família e matrimônio, no entanto, o que se
desprende da regulamentação constitucional espanhola é que o que realmente identifica
uma família é a existência de vínculos paterno filiais ou, pelo menos, um núcleo de
convivência parental, e não o estado civil dos pais. O fato de estarem casados ou não,
portanto, não significa que estejamos falando de uma família. Isto leva o autor a rejeitar
por estarem afastadas da Constituição, aquelas posições doutrinais que viam o
matrimônio como a única forma de constituição da relação familiar. No caso concreto
de nosso corpus, essa posição seria a mantida pelo Foro Español de la Família, pelo
Partido Popular e pela Conferência Episcopal Española (assim como pelos demais
representantes da Igreja: o Papa, distintos cardeais estrangeiros etc.). Para Álvarez
(2003) também seriam discutíveis aquelas outras teorias para as quais, embora
aceitando que existem famílias não resultantes do matrimônio, a família originada pela
relação matrimonial tem de ter constitucionalmente um trato preferente. O autor
acrescenta ainda que a proteção jurídico constitucional da família enquadra-se dentro do
catálogo dos denominados direitos sociais e como tais sua chegada aos textos
constitucionais e às declarações internacionais está temporalmente localizadas no século
XX
88
.
A seguir mostramos as seqüências discursivas encontradas no nosso corpus nas
quais aparece a voz de algum representante do Foro Español de la Familia:
87
Esta informação foi extraída do site:
http://www.congreso.es/constitucion/constitucion/indice/sinopsis/sinopsis.jsp?art=39&tipo=2
88
O autor cita como precedente na história constitucional espanhola o artículo 43 da Constituição
republicana de 1931. E acrescenta ainda que essa proteção aparece também regulada nas constituições
européias de nossa órbita jurídico-política: artículo 36 da Constituição portuguesa de 1976; artículo 6 da
Lei Fundamental de Bonn de 1949; artículo 29 da Constituição italiana de 1948 ou os parágrafos nonos e
décimos do Preâmbulo da Constituição francesa de 1958. Também, nas Declarações Internacionais:
artículo 24 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, artículo 10.3 do Pacto Internacional de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, e a Declaração dos direitos da criança, proclamada pela
Assembléia Geral das Nações Unidas de 20 de novembro de 1959.
125
Quadro 18: A voz do Foro Español de la Familia nas notícias de nosso corpus
Data Título
Responsável pelo
dito
Marca
introdutória de
DR
Fragmento
21-abr-05 El Congreso aprueba el
matrimonio entre
personas del mismo sexo
el Foro Español de
la Familia
Ha asegurado que Sin embargo, el Foro Español de la Familia ha asegurado que la
incidencia de homosexualidad en los niños que crecen con parejas de
homosexuales está por encima del 30%, "cifra muy superior a la media".
8-JUN-2005
Diputados del PP
mantienen la presión en
la calle y acudirán a la
marcha contra el
matrimonio gay
El Foro de la
Familia
espera El Foro de la Familia espera reunir en Madrid más de 500.000 personas
bajo el lema 'La familia sí importa'
10-jun-05 La Conferencia
Episcopal apoya la
manifestación del 18-J
en Madrid contra el
matrimonio homosexual
El Foro de la
Familia
subraya El Foro de la Familia, que subraya su carácter “aconfesional” y
“apolítico”, ha conseguido para la manifestación el respaldo de más de
150 asociaciones y entidades, a las que se une ahora el visto bueno de la
Conferencia Episcopal y de numerosos episcopados. No obstante, el
cardenal de Sevilla, Carlos Amigo Vallejo, ha anunciado que no asistirá
a la marcha.
16-jun-05/2 Los organizadores de la
marcha contra los
matrimonios gays
estiman que irán más de
500.000 personas
Vicepresidente
(Foro Español de la
Familia), Benigno
Blanco
Reiteró que El convocante de la manifestación del sábado es el Foro Español de la
Familia, cuyo vicepresidente, Benigno Blando, reiteró que se trata de
una plataforma “civil, no confesional ni partidista”. Relató que los
manifestantes de otras provincias españolas llegarán a Madrid
repartidos en 600 autobuses, cuatro trenes procedentes de Cataluña,
Valencia y Galicia y algún otro tren de Andalucía, además de los tres
aviones fletados al efecto procedentes de Canarias, Baleares y Melilla.
126
17-jun-05
Los gays piden amparo a
la Fiscalía para que no
haya lemas 'vejatorios'
en la manifestación del
sábado
manifiesto
Insta al Gobierno
a
Los objetivos de la marcha están recogidos en un manifiesto que insta al
Gobierno a retirar el proyecto de ley que permite el matrimonio entre
personas del mismo sexo y a regular la adopción de forma que garantice
“el derecho de un niño a tener una madre y un padre”.
18-jun-05/2 Pancartas, música y
confeti contra los
matrimonios entre
homosexuales
Cristina López
Schlichting,
periodista
Tras leer un
manifiesto en
contra de las
iniciativas del
Gobierno
Refiriéndose a
Una vez finalizado el trayecto, los representantes del FEF y Cristina
López Schlichting se dirigirán a los asistentes. Concretamente, la
periodista cerrará la manifestación tras leer un manifiesto en contra de
las iniciativas el Gobierno “que atentan contra los fundamentos de la
familia como espacio ecológico de la vida y fuente de la solidaridad más
eficaz”, refiriéndose a la “equiparación de las uniones de personas del
mismo sexo con el matrimonio, permitiendo además la adopción
conjunta”, que “suponen un atentado contra la institución matrimonial y
contra el derecho del menor a una madre y un padre”.
23-jun-05/2 Para el Foro, la familia es “un hombre, una mujer, unos niños y todo
el parentesco de consanguinidad que se configura alrededor”, por lo que
“lo que no es un familia es la unión de homosexuales, porque le falta esa
apertura a la vida”.
127
3.4.6.- Os representantes dos gays
Antes de referirmo-nos ao discurso dos representantes dos homossexuais,
gostaríamos de fazer uma série de considerações a respeito da presença das vozes desse
coletivo no nosso corpus. Nos dois jornais foco de nossa pesquisa, a presença de vozes de
homossexuais, principais beneficiários da lei em debate, é reduzida, é menor do que a dos
outros setores: Igreja, governo, Partido Popular etc. Um outro aspecto interessante é a
forma como os homossexuais que falam nessas notícias são apresentados pelo enunciador-
jornalista, o que marca, a nosso entender, um tratamento diferenciado com respeito às vozes
de outros setores. Assim, temos um grupo de homossexuais cujas vozes são trazidas para a
notícia e que são apresentados pelo nome, sobrenome e o cargo. No jornal El Mundo:
Beatriz Gimeno, presidenta da Federación Estatal de Gays, Lesbianas y Transexuales
(FELGT), Boti García, ex presidenta de (COGAM
89
), Arnaldo Gancedo, presidente de
COGAM, Carlos Biendicho, presidente da Plataforma Popular Gay, Txema Madrazo,
presidente de HEGOAK
90
, Francisco Javier Gómez, coordenador do grupo de Gays y
Lesbianas do PP, Pedro Zerolo, concejal socialista na Prefeitura de Madrid e Felipe del
Baño, deputado do PP nas Cortes Valencianas. No El País, além dos mencionados: M.
Angel Sánchez, presidente da Fundación Triángulo, S. Rubio, do Coletivo Gays y
Lesbianas Colegas-Andalucia, P. Pujol, presidente da Asociación de Famílias Lesbianas y
Gays, Enric Vilá, de la Asociación Cristiana de Lesbianas y Gays de Cataluña, Carla
Antonelli, da FELGT y Ximo Cádiz, secretario da FELGT.
Trata-se, como se pode observar, de representantes de associações ou organismos
em defesa dos interesses de diferentes coletivos. O tratamento dado a estas vozes pelo
enunciador-jornalista coincide com o dado às vozes pertencentes aos demais setores (Igreja,
Governo, Partido Popular etc.), dos quais nos são fornecidos o nome, o sobrenome e o
cargo que ocupam dentro do correspondente partido, associação ou coletivo que
representam. No entanto, cabe ressaltar que em algumas notícias do nosso corpus os
homossexuais que falam não o fazem em representação de nenhum coletivo, são pessoas
comuns, e nesse caso o enunciador-jornalista só nos indica o nome, a idade e, em alguns
casos, o vínculo afetivo que une essa pessoa à que a acompanha no momento em que se
89
Colectivo de lesbianas, gays, transexuales y bisexuales de Madrid.
90
Asociación de gays, lesbianas, transexuales y bisexuales de Euskadi.
128
produz a entrevista. Diferentemente do que acontece com as vozes de outros setores, estes
homossexuais não têm informada a profissão nem nenhum outro dado diferente aos
mencionados. Este grupo de homossexuais é visto pelo enunciador-jornalista, reproduzindo
uma situação costumeira no nosso dia-a-dia, em função exclusivamente de sua sexualidade.
O que estiver além disso, da sexualidade do homossexual, (emprego, orientação política
etc.) simplesmente não é relevante. Em nosso trabalho privilegiamos o discurso dos
representantes dos homossexuais, levando em conta que a quantidade de ocorrências de
vozes de “homossexuais comuns” é muito reduzida nos dois jornais.
Continuando com nosso objetivo de identificar as imagens construídas a respeito
dos homossexuais ao longo do período analisado (outubro 2004 – junho 2005) nos jornais
El Mundo e El País, analisamos as notícias nas quais estava presente alguma voz ligada aos
homossexuais e conferimos que estas vozes estão presentes no jornal elmundo.es em vinte e
uma notícias, distribuídas do seguinte modo:
Quadro 19: Ocorrências de vozes ligadas aos homossexuais nas notícias do
elmundo.es
El Mundo
2004 2005
Outubro Novembro Dezembro Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho
2 0 0 0 2 0 5 1 11
O que podemos observar a partir desse quadro é que a maior parte das ocorrências
de vozes de representantes de homossexuais encontra-se no mês de junho. Esse é o mês no
qual ocorrem as polêmicas declarações do experto em psicopatologia, Aquilino Polaino, no
Senado; bem como a mobilização organizada contra o matrimônio homossexual (18-J) pelo
Foro Español de la Familia e outras associações “familiares” como HazteOir.
No jornal El País, as vozes dos homossexuais aparecem em 39 notícias distribuídas
da seguinte forma:
Quadro 20: Ocorrências de vozes ligadas aos homossexuais nas notícias do EL País
El País
2004 2005
Outubro Novembro Dezembro Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho
2 1 6 4 1 2 6 8 9
129
Como podemos observar, os meses de abril, maio e junho apresentam, junto ao mês
de dezembro, a maior quantidade de notícias publicadas com presença de vozes de
homossexuais.
Interessa-nos saber sobre que falam os homossexuais e como o fazem. Vimos que
os membros ligados à Igreja, por exemplo, se posicionaram ao longo do período analisado a
respeito de vários assuntos: o anteprojeto de lei, a adoção de crianças por homossexuais, a
orientação homossexual, a relevância do matrimônio heterossexual na sociedade e as
conseqüências que provocaria admitir dentro dessa instituição os casamentos
homossexuais, a possibilidade de aderir o direito de “objeción de conciencia” por parte dos
servidores públicos para não terem de realizar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo
etc. Portanto, interessa agora conhecer os temas sobre os que falaram as vozes ligadas aos
homossexuais nas notícias publicadas nos jornais El Mundo e El País, visando a identificar
as imagens que sobre eles foram criadas.
As vozes dos representantes dos homossexuais são trazidas para as notícias de nosso
corpus indicando posicionamentos a respeito de diferentes temas. Assim, expressam sua
satisfação diante das diferentes etapas percorridas pela lei desde a aprovação do anteprojeto
de lei no Congresso dos deputados em outubro de 2004 até a aprovação definitiva da lei em
junho de 2005. Posicionam-se acerca do chamado dos diferentes estamentos eclesiásticos
(Vaticano, Conferencia Episcopal Española, etc.) a exercer o direito de “objeción de
conciencia” por parte dos servidores públicos e até mesmo dos juizes. Criticam as
declarações de diferentes políticos anunciando sua intenção de votar contra a aprovação da
lei, bem como as de membros de outros setores diante do que os homossexuais chamam de
“insultos para miles de ciudadanos cuyo gran error es amar de manera distinta a la
mayoría”
91
. Mostram sua oposição à mobilização do 18-J organizada pelo Foro Español de
la Familia contra o casamento entre homossexuais, criticando pelo seu apoio à Igreja e ao
Partido Popular. Opõem-se às declarações de Aquilino Polaino, especialista em
psicopatologia da Universidade Complutense de Madrid no Senado a respeito da
homossexualidade e da adoção por homossexuais, quem insistiu em associar a orientação
homossexual com uma doença, bem como se opôs a adoção por homossexuais pela alta
incidência de homossexualidade que, segundo ele, se observava nas crianças educadas por
91
El País, 28-abr-05: “Miles de gays murieron em campos como Auschwitz”.
130
casais homossexuais. Reagem contra o que eles mesmos denominam setores mais
reacionários e conservadores da judicatura, da Igreja e do Partido Popular para defender a
mesma denominação para as uniões homossexuais, baseando-se em que si formamos
parejas que se quieren, se ayudan y sacan a sus hijos adelante como los demás, lo lógico en
términos jurídicos es que el nombre legal sea el mismo”
92
.
Cabe lembrar que aos representantes dos homossexuais cabe como espaço de fala
nas notícias dos dois jornais o último parágrafo da maioria das notícias, o que demonstra
um trato desigual com respeito às outras vozes por parte do enunciador-jornalista. O
homossexual tem voz, mas é quase sempre o último a falar. O que ele tem a dizer é menos
importante? Resulta, a nosso entender, muito significativo que na notícia publicada no
jornal El País, de 22 de abril de 2005, intitulada El Congreso aprueba el matrimonio
homosexual, os principais beneficiários desta conquista em favor dos direitos civis
simplesmente não apareçam.
O discurso dos representantes dos homossexuais está marcado por léxico próprio
dos movimentos que lutam a favor dos direitos dos oprimidos: igualdade, dignidade,
justiça, visibilidade, diversidade, pluralidade social, discriminação, homofobia, direitos
humanos, direitos sociais, ódio, intolerância etc.
Dentro do grupo de representantes dos homossexuais, chamou nossa atenção a
presença de duas vozes, concretamente a de Pedro Zerolo, secretário socialista na Prefeitura
de Madrid e a de Felipe del Baño, deputado do PP nas Cortes Valencianas. Os dois são
homossexuais, mas ao mesmo tempo ocupam cargos dentro de partidos políticos. Isto
contrasta com a maioria das vozes presentes nas notícias, as quais unicamente estão
vinculadas a uma única instituição, sem que se destaque sua orientação sexual. Quer dizer,
os representantes dos demais setores são apresentados simplesmente pela sua função ou
cargo, como se não tivessem orientação sexual, como dando por compreendido que um
membro do PP, por exemplo, é heterossexual por definição sem caber outra possibilidade.
Há, portanto, uma brecha aqui. Estes personagens que estão sendo apresentados como
homossexuais e como membros de partidos políticos estão significando duplamente em
função dessa dupla identificação. A homossexualidade destas duas pessoas deixa de ser o
único traço definidor de suas personalidades, como acontece geralmente com os
92
El País, 1-dic-05: López Aguilar replica que el texto solo sufrirá cambios técnicos.
131
homossexuais na vida real, e entra em jogo um outro aspecto: sua filiação política, sua
religião etc. Há, portanto, políticos homossexuais, religiosos homossexuais, atores
homossexuais como há políticos heterossexuais, religiosos heterossexuais e atores
heterossexuais etc.
Estes exemplos são muito interessantes, já que, são os únicos casos nos quais
homossexuais podem falar de outro lugar que não o da sua orientação sexual. A ruptura
provocada pelo acontecimento da divulgação da aprovação do projeto de lei por parte do
governo espanhol, no que diz respeito à forma sujeito dominante e à transformação do
homossexual em bom sujeito frente aos períodos anteriores, possibilita agora que o
homossexual possa ocupar lugares diferentes.
Como dissemos acima, nas notícias de nosso corpus encontramos vozes de
homossexuais identificados com muitos poucos dados, excluindo-lhes a profissão, a
orientação política etc., diferente do que se faz com os membros de outros setores sociais.
Foucault (1988) oferece-nos uma possível explicação para isto e confirma o fato de
que a imprensa tenta manter o status quo do homossexual na sociedade como alguém que
só é visto em função da sua sexualidade, não interessando outros aspectos de sua biografia
(emprego, orientação política etc.) Esta é uma forma de manter os pré-construídos sobre os
homossexuais.
O homossexual do s.XIX torna-se uma personagem: um passado, uma
história, uma infância, um caráter, uma forma de vida; também é
morfologia, com uma anatomia indiscreta e, talvez, uma fisiologia
misteriosa. Nada daquilo que ele é, no fim das contas, escapa à sua
sexualidade. Ela está presente nele todo: subjacente a todas as suas
condutas, já que ele é o princípio insidioso e infinitamente ativo das
mesmas; inscrita sem pudor na sua face e no seu corpo já que é um
segredo que se trai sempre. É-lhe consustancial, não tanto como pecado
habitual porém como natureza singular. É necessário não esquecer que a
categoria psicológica, psiquiátrica e médica da homossexualidade
constituiu-se no dia em que foi caracterizada – o famoso artigo de
Westphal em 1870, sobre as “sensações sexuais contrárias” pode servir
de data natalícia – menos como um tipo de relações sexuais do que
como um certa qualidade da sensibilidade sexual, uma certa maneira de
interverter, em si mesmo, o masculino e feminino. (FOUCAULT, 1988,
p.43)
O homossexual é identificado como sendo só o seu sexo, suas práticas sexuais, sua
conduta e nada mais além disso.
132
Um outro aspecto que podemos observar a partir do levantamento das notícias em
que estão presentes os homossexuais é que estes não falam ou não são trazidos para a
notícia para se posicionar a respeito do fato de ser homossexual, da adoção de crianças e de
outros temas que lhes afetam diretamente, mas a respeito dos quais se posicionam os
membros de outros setores sociais (a Igreja, o Partido Popular, os psicólogos, etc.). Chama
a atenção, portanto, que os homossexuais não falam de si mesmos, mas são falados. As
imagens dos homossexuais que se constroem nas notícias são imagens criadas a partir do
que dizem os representantes da Igreja, do Partido Popular, os psicólogos citados no Senado
etc. a respeito do que significa ser homossexual, da orientação e da conduta homossexual, e
a partir do que os homossexuais falam a respeito dos temas listados acima, mas não sobre si
próprios.
Um outro aspecto que interessa salientar neste ponto é que enquanto os
representantes da Igreja ou do Partido Popular, por exemplo, lançam mão de discursos de
procedência diversa (filosofia, psicologia, religião, psicologia, direito...) para defender suas
teses a respeito dos diferentes temas, as vozes ligadas aos homossexuais recorrem
unicamente ao discurso jurídico ou o que chamaremos de discurso dos direitos sociais.
Poderia considerar-se um só? Discurso jurídico? Vejamos os exemplos que encontramos:
133
Quadro 21: Os direitos sociais no discurso dos homossexuais
Data Título
Responsável pelo
dito
Marca
introdutória de
DR
Fragmento
1-oct-04
El defensor madrileño del
Menor pide una moratoria
para que las parejas gays
puedan adoptar
La Federación
Estatal de
Lesbianas, Gays,
Transexuales y
Bisexuales
Calificó la
jornada de
La Federación Estatal de Lesbianas, Gays, Transexuales y
Bisexuales, calificó la jornada de “día histórico para la la lucha
por la dignidad y la igualdad” de estos colectivos al arranque
de la regulación del matrimonio entre personas del mismo
sexo.
2-10-05
Cientos de homosexuales
celebran en Madrid la
aprobación de su derecho
al matrimonio
La ex presidenta
de COGAM, Boti
García
En palabras de
Los homosexuales han alcanzado en este su día histórico una
meta que no es, en palabras de la ex presidenta del COGAM,
Boti García, “un fin”, sino que sigue siendo “el camino de una
lucha por la igualdad de derechos”
21-04-05
El Pleno del Congreso
apoyará hoy el proyecto de
ley sobre el matrimonio
entre homosexuales
Beatriz Gimeno,
presidenta de la
Federación
Estatal de
Lesbianas, Gays y
Transexuales.
Ha dicho
“Será un día histórico para todos los ciudadanos que creen en
la igualdad, la justicia y el estado de derecho”, ha dicho Beatriz
Gimeno, presidenta de la Federación Estatal de Lesbianas,
Gays y Transexuales.
la FELGT,
Expresa su
rechazo absoluto
ante
Por su parte, la FELGT, Federación Estatal de Lesbianas, Gays,
Transexuales y Bisexuales, expresa su rechazo absoluto ante
este “nuevo ataque del Vaticano aa la igualdad y la dignidad
para gays y lesbianas”.
Beatriz Gimeno,
presidenta de la
FELGT
Responde al
Vaticano que
Beatriz Gimeno, presidenta de la FELGT responde al Vaticano
que “no existe objeción de conciencia para los funcionarios a la
hora de aplicar las normas civiles, las leyes que emanan de la
soberanía popular representada en el Parlamento”. “Con esta
declaración el Vaticano trata, una vez más, de imponer su
doctrina moral al poder político y expresa su falta de respeto
por el colectivo homosexual y por el sistema democrático”.
134
30-06-05 De ‘paso histórico’ hacia la
libertad a una agresión a la
familia
La presidenta de
la Federación
Estatal de
Lesbianas y Gays
(FELGT), Beatriz
Gimeno
Gimeno
señaló entre
lágrimas que
A su juicio
Mostró su
esperanza en que
recordó
La presidenta de la Federación Estatal de Lesbianas y Gays
(FELGT), Beatriz Gimeno, señaló entre lágrimas que siente
“protagonista” de un cambio histórico, tras la aprobación de la
ley que permite el matrimonio entre personas del mismo sexo.
A su juicio, tienen que estar “satisfechos todos aquellos que
son amantes de la libertad y e la igualdad”, y mostró su
esperanza en que un “avance” como el que se ha producido “se
extienda por toda Europa, ya que un continente no puede seguir
permitiendo la discriminación”. “Llevamos años luchando por
que se nos reconozca la igualdad”, recordó Gimeno.
El presidente de
la Plataforma
Popular Gay,
Carlos Biendicho
Biendicho
Felicitó al
presidente
Afirmó
A su juicio
Señaló que
Señaló
El presidente de la Plataforma Popular Gay, Carlos
Biendicho, felicitó hoy al presidente del Gobierno, José Luis
Rodríguez Zapatero, “por haber cumplido sus promesas” con la
aprobación de matrimonios homosexuales, una media con la
que España “gana en libertad, democracia y respeto”, afirmó. A
su juicio, ahora es necesario un esfuerzo para terminar con la
homofobia existente, como lo demuestra el Foro de la Familia”.
Asimismo, Biendicho señaló que el PP “debía haber dado
libertad de voto a sus diputados para votar hoy la ley en el
Congreso” ya que, señaló, “esto hubiera evitado que muchos
hayan votado contra su conciencia”.
135
Temos, pois, que enquanto a Igreja e o Partido Popular (PP), por exemplo, utilizam
como argumentos para defender suas teses discursos constituintes como o da filosofia, o da
psicologia, o da religião e outros como o da antropologia ou o direito; as vozes ligadas aos
homossexuais não utilizam nenhum desses discursos. Cabe pensar que o ponto de partida
de cada lugar (Igreja, Governo, Partido Popular,...) permite ou condiciona o uso desses
discursos. A modo de exemplo: a Igreja parte da consideração da homossexualidade como
desequilíbrio psicológico ou biológico. Portanto, é lógico que utilize o discurso da
psicologia ou da biologia para defender suas teses. Os homossexuais, por sua vez, não
considerando a homossexualidade enquanto doença, não precisam lançar mão de nenhuma
disciplina do tipo das acima mencionadas. Os representantes dos homossexuais só se
apropriam do discurso jurídico e do que chamamos discurso dos direitos sociais para falar,
enquanto outros setores sociais têm de se apropriar de uma variedade mais ampla de
discurso para defender suas teses.
3.4.7.- A Justiça
As vozes dos representantes da Justiça aparecem no nosso corpus ao longo de
praticamente todo o período coletado. No entanto, o jornal El País publicou um número
maior de notícias nas que aparecem as vozes deste setor social (25 no total). O jornal El
mundo publicou apenas 12. Conseqüentemente, o número de vozes é também maior no
primeiro jornal mencionado. Chama a atenção que ao contrário do que acontece nas
notícias do jornal El Mundo, nas quais unicamente nos deparamos com vozes pertencentes
ao Conselho General do Poder Judicial (CGPJ), no jornal El País, além dessas vozes,
encontramos as vozes de membros da Associação Profissional da Magistratura (APM), de
Juizes para a Democracia (JpD) e da Francisco de Vitória (PV). Para as notícias do jornal
El País também são trazidas vozes do presidente da Associação de Advogados da Família,
Luis Zarraluqui, e do presidente do Tribunal Superior de Justiça da Comunidade
Valenciana.
Nas notícias, nos deparamos com a polêmica surgida entre o CGPJ e o governo. Os
membros do CGPJ e das associações de juizes e magistrados mencionados posicionam-se a
favor ou contra a petição deste organismo de envio do anteprojeto de lei por parte do
governo espanhol com a finalidade de emitir um relatório a respeito do mesmo. O governo
136
espanhol opõe-se por considerar que o CGPJ não é um órgão consultivo do Executivo, além
de que a reforma do Código Civil prevista no anteprojeto não afeta questões sobre as que a
Lei Orgânica do Poder Judicial (LOPJ) estabelece que é preceptivo o ditame do Conselho.
A leitura das notícias deixa muito evidente para o leitor o fato de que os posicionamentos
contrários ou favoráveis a respeito desse tema estão baseados na filiação política dos
membros do CGPJ. Assim, o embate estabelece-se entre os membros do Conselho
propostos pelo Partido Popular, que constituem maioria dentro deste organismo, e os
membros da minoria progressista propostos pelo Partido Socialista Obrero Espanhol
(PSOE). Os membros da maioria conservadora baseiam sua oposição ao anteprojeto
argumentando que abrir o matrimônio aos casais homossexuais “desnaturaliza” e “adultera”
o conteúdo esta instituição, já que, segundo eles, o matrimônio é uma união heterossexual
orientada à procriação, do que os homossexuais estariam excluídos. Este setor do CGPJ
argumenta também a suposta inconstitucionalidade do projeto baseando-se no artículo 32
da Constituição Espanhola, o qual reconhece o direito de contrair matrimônio ao homem e
à mulher. Para justificar sua oposição à denominação de matrimônio para as uniões
homossexuais, afirma também que nomear assim este tipo de uniões seria o mesmo que
chamar de matrimônio à união de uma pessoa e um animal
93
. A princípio, o CGPJ não se
oporia à regulação das uniões homossexuais, desde que essa união recebesse outro nome
diferente ao de matrimônio. Os membros do CGPJ contrários ao anteprojeto apontam como
possível conseqüência da aprovação do mesmo a poligamia e pedem, caso seja aprovado,
que se exclua o direito de adoção, baseando-se no interesse superior da criança, recolhido
nos tratados internacionais e também na “inestabilidad psicológica” dos casais
homossexuais.
Assistimos, portanto, a um duplo embate. O primeiro é o que se estabelece no
interior do próprio CGPJ entre os membros que apóiam a decisão do governo e os membros
contrários a ela. O segundo é o que se estabelece entre o governo e os membros do CGPJ
contrários à aprovação do anteprojeto baseando-se nos critérios mencionados acima:
suposta inconstitucionalidade, denominação diferente da de matrimônio etc. Critérios estes
nos quais se apóia o Partido Popular, a Igreja e o Foro Espanhol da Família.
93
El Mundo, 15-ene-05: EL CGPJ pide que se paralice la reforma que permitirá los matrimonios
entre homosexuales.
137
O único aspecto no qual todos os membros representantes da Justiça parecem estar
de acordo é com o fato de que o juiz não pode se negar a oficiar matrimônios entre
homossexuais como solicitou a Igreja católica. Segundo informações extraídas de nosso
corpus, o fato de os juizes negarem-se a celebrar estes matrimônios constituiria delito.
Antes de fechar este capítulo, gostaríamos de fazer algumas considerações que
julgamos importantes. Existe em nosso corpus de pesquisa, segundo temos visto nessa
apresentação do discurso dos diferentes lugares sociais, um embate constituído entre
diferentes forças. Nesse embate os lugares sociais com maior representatividade nas
notícias de nosso corpus são a Igreja, o governo espanhol, o PP, o Foro Español de la
Familia, a justiça, a ciência e os homossexuais. No embate entre as diferentes forças
estabelecem-se dois bandos em oposição. O primeiro está constituído basicamente pela
Igreja, o PP, o Foro Español de la Familia e o setor conservador do Consejo General del
Poder Judicial. Este grupo de vozes apresenta argumentos contrários à aprovação da lei de
casamento homossexual e defende os preceitos da moral cristã que dita a Igreja católica. O
segundo grupo defende a aprovação da lei e está representado basicamente pelos seguintes
lugares sociais: o governo espanhol, os representantes dos homossexuais e o setor
progressista do Consejo General del Poder Judicial. A cada bando haveria que acrescentar
ainda as vozes de representantes da ciência que, como vimos no subitem correspondente,
apresentam posicionamentos opostos, sobretudo no que se refere ao tema da adoção de
crianças por homossexuais.
Com relação o ao primeiro grupo, o discurso da Igreja, lugar social com maior
representatividade quanto ao número de vozes em nosso corpus, caracteriza-se pela
manutenção dos já-ditos a respeito da homossexualidade, sobretudo no que diz respeito à
relação feita pelos seus representantes entre homossexualidade e doença. A essa
manutenção dos já-ditos contribui também de maneira importante o discurso do PP e das
vozes da ciência contrárias à adoção de crianças por homossexuais. Outro aspecto que cabe
destacar é a utilização de diferentes discursos constituintes nas suas argumentações.
Os diferentes lugares sociais, embora possam ser classificados em dois grupos em
embate, utilizam os mesmos discursos para se posicionar a favor ou contra a aprovação da
lei de casamento homossexual. Dentre estes discursos ocupam lugar de destaque o discurso
jurídico e o discurso da ciência. Todos os lugares sociais remetem ao discurso da ciência
138
para se posicionar a respeito da adoção de crianças por homossexuais. O discurso jurídico é
utilizado pelos representantes dos homossexuais, pelo governo, pelo PP e pelo Foro
Español de la Familia. Assim, há uma presença constante de referências a textos como o da
Constituição Espanhola, da Constituição Européia ou da Declaração dos Direitos da
Criança. Acreditamos que o fato de os diferentes lugares sociais apoiarem-se nos mesmos
discursos para se posicionar a respeito dos diferentes temas contribui de maneira decisiva
para criar o efeito de homogeneidade surgido do embate constatado nas notícias de nosso
corpus.
Antes de entrar no capítulo das Considerações finais, gostaríamos de fazer algumas
considerações a respeito da tensão opinar/informar que caracteriza o gênero notícia. Para
tanto, analisaremos duas notícias de nosso corpus.
3.5. Objetividade em questão. Análise de duas notícias
A seguir analisamos duas notícias publicadas no jornal El País e no El Mundo com
motivo da manifestação convocada pelo Foro Español de la Família, no dia 18 de junho de
2005
94
. Escolhemos estas duas notícias porque nos parece um exemplo claro de que a
pretendida objetividade informativa não se cumpre conforme se quer fazer crer. Além do
mais, serviu-nos de critério de escolha para esta análise o fato de terem sido ambas
publicadas no mês de junho, o qual nos dois jornais se apresenta como o mês de maior
quantidade de notícias publicadas a respeito da lei de casamento homossexual. O mês de
junho é também o mês no qual foi identificada uma maior incidência de vozes do Foro
Español de la Familia e da Igreja nas notícias.
Nos quadros a seguir, mostramos as ocorrências de discurso relatado:
94
Ver notícias completas no Anexo
139
Quadro 22: Ocorrências de discurso relatado na notícia do elmundo.es
Data Título Responsable
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
Una multitud
de
manifestantes
la periodista
Cristina López
Schlichting
Pidió ayer en
Madrid al
Gobierno que
calificó estas
uniones como
(1) Una multitud de manifestantes,
encabezada por miembros del PP y una
veintena de obispos, pidió ayer en Madrid al
Gobierno que retire la ley que autoriza los
matrimonios homosexuales. La marcha,
convocada por el Foro de la Familia,
terminó con un manifiesto leído por la
periodista Cristina López Schlichting, quien
calificó estas uniones como un atentado
contra la “institución familiar”
El Foro
Español de la
Familia
ha exigido (2) El Foro Español de la Familia ha
exigido ya, durante el transcurso de la
marcha, una reunión urgente con el
presidente del Gobierno, José Luís
Rodríguez Zapatero, en vista del éxito de
convocatoria.
Schlichting Ha cifrado (3) Schlichting ha cifrado en millón y
medio el número de personas participantes
en la marcha.
La Delegación
del Gobierno
Asegura que (4)La Delegación del Gobierno asegura que
han sido 166.000 los manifestantes.
El Manifiesto dice que (5) El Manifiesto dice que el Gobierno
español promueve iniciativas que atentan
contra los fundamentos de la familia.
se plantea
(impersonal)
(6) También se plantea en este texto una
regulación sobre la adopción que garantice
el “derecho del niño a tener una madre y un
padre”.
el Foro de la
Familia
expresa (7) En este texto, el Foro de la Familia
expresa su “honda preocupación” por
cuestiones como “la banalización legal del
compromiso matrimonial mediante el
divorcio unilateral y sin causa desde los tres
meses de la boda; el progresivo menoscabo
del derecho a la vida; la limitación del
derecho de los padres a decidir sobre la
educación de sus hijos; y la exclusión de las
expresiones y convicciones morales y
religiosas de la vida pública.
El
mu
nd
o.e
s
19-jun-05 Una
multitud
pide que se
retire la ley
del
matrimonio
homosexual
Los
manifestantes
han coreado
gritos
(8) Los manifestantes han coreado gritos
como ‘La familia es fuerte’ o ‘Solidaridad’
y otros portan pancartas con citas de Juan
Pablo II como ‘Dios es solidaridad’, o
‘Solidaridad es compartir hasta lo necesario
para sobrevivir’.
140
Isabel Rubio
Arévalo
aspas (9) Isabel Rubio Arévalo tiene 77 años y ha
llegado a Madrid procedente de Carbonero
el Mayor en uno de los ocho autobuses que
han partido desde la provincia de Segovia.
“Quiero un matrimonio verdadero, católico
y apostólico, como ha sido siempre en
España”.
Joaquín Aspas
Según dice
Para él
(10) Como ella, Joaquín, un madrileño de
65 años, ha acudido a la manifestación
“para apoyar a la familia”. Según dice, no
tiene nada contra los gays y ni siquiera le
importa que adopten pero que se llame
matrimonio, para él, es una ofensa.
Teresa
L
No está de
acuerdo con
Cuenta que
Les pregunta si
(11) Teresa de 65 años, casada un madre de
tres hijos, ha llegado a Madrid desde
Valencia con otras 5000 personas en un tren
sin aire acondicionado. No está de acuerdo
con el matrimonio de los gays pero sí con
que se registren como parejas de hecho.
Cuenta que dos de sus hijas viven en EEUU
y que allí la gente les pregunta si en España
“están locos o qué”.
Los
manifestantes
cantan (12) Los manifestantes han compuesto un
‘rap’ que cantan al presidente del Gobierno:
“Zapatero mentiroso, de la Iglesia eres
moroso, mentiroso Zapatero, la familia es lo
primero”.
la
vicepresidenta
primera del
Gobierno,
María Teresa
Fernández de
la Vega
Había
expresado
Pidió que
(13) Horas antes de la manifestación, la
vicepresidenta primera del Gobierno, María
Teresa Fernández de la Vega, había
expresado el respeto del Ejecutivo al
derecho de manifestación de quienes
decidieran asistir a la convocatoria del Foro
de la Familia pero pidió que quede claro
que “los que se manifiestan hoy lo hacen
para exigir que un derecho se le niegue a
otros”.
Quadro 23: Ocorrêncais de discurso relatado na notícia do El País
Data Título Responsable
pelo dito
Marca
introdutória
de DR
Fragmento
El
Paí
s
18-jun-06 La marcha
contra las
bodas gays
reúne en
Madrid a
la Conferencia
Episcopal
expresó (14) Aunque la Conferencia Episcopal
expresó esta semana su apoyo explícito a la
marcha, algunos de sus miembros más
importantes se han desmarcado de la
protesta.
141
No se
especifica
se ha instado a
(impersonal)
(15) En la Puerta del Sol ha tomado la
palabra el presidente del Foro, José
Gabaldón, y el vicepresidente, Benigno
Blanco. La periodista de la COPE Cristina
López Schlichting ha sido la encargada de
leer un manifiesto. En él, se ha instado al
Gobierno a retirar la ley que permite el
matrimonio entre personas del mismo sexo
y a regular la adopción de forma que
garantice ‘el derecho de un niño a tener una
madre y un padre”
La
vicepresidenta
del Gobierno,
María Teresa
Fernández de
la Vega
ha reiterado
ha pedido que
(16) La vicepresidenta del Gobierno, María
Teresa Fernández de la Vega, ha reiterado
hoy el respeto del Ejecutivo al derecho de
manifestación de quienes asistan hoy a la
convocatoria del Foro de la Familia, pero ha
pedido que quede claro que “los que se
manifiestan hoy lo hacen para exigir que un
derecho se le niegue a otros”.
Gimeno
(Beatriz
Gimeno,
presidenta de
la FELGT)
La presidenta
del colectivo
de gays y
lbi
ha subrayado
que
ha recordado
ha destacado
que
(17) Gimeno ha subrayado durante el acto
que “la familia sí importa, y las nuestras
también”, y ha recordado las décadas de
luchas de los coletivos gays para que los
hijos de padres y madres de orientación
homosexual tengan los mismos derechos
que los hijos de familias heterosexuales. La
presidenta del colectivo de gays y lesbianas
ha destacado que “lo que nos parece
preocupante es que la jerarquía de la Iglesia
católica y el PP se hayan prestado a posar
en esa foto revival en blanco y negro del
nacionalcatolicismo, de una época
felizmente superada por todos”.
Gimeno pidió (18) Gimeno pidió ayer a la Fiscalía
General del Estado que actúe de oficio en el
caso de que los manifestantes contra la
regulación del matrimonio gay profieran o
enarbolen pancartas y lemas ofensivos para
los homosexuales.
Nas duas notícias nos deparamos com que existem algumas diferenças quanto às
vozes que foram chamadas pelo enunciador-jornalista. As escolhas que cada jornal faz no
que se refere às vozes levadas para a notícia refletem a visão particular que cada jornal tem
do mundo e concretamente da sociedade espanhola. Acreditamos que este é já um primeiro
fator que bota por terra a pretendida objetividade do gênero notícia. Na notícia do El País
142
aparece a voz da Conferência Episcopal (não-pessoa), da vice-presidenta do Governo,
María Teresa Fernández de la Vega e a da presidenta da Federación Estatal de Lesbianas,
Gays y Transexuales, Beatriz Gimeno. Na notícia do El Mundo o enunciador-jornalista dá
voz à vice-presidenta do governo, à jornalista Cristina López Schlichting, ao Foro Español
de la Familia, à Delegação do Governo, a Isabel Rubio Arévalo, a Joaquín e a Teresa
(também manifestantes). Cabe destacar que em várias ocasiões é atribuída a voz nesta
notícia aos manifestantes (fragmento1, 8 e 12), à gente (11), quer dizer, à voz do grupo, o
que acreditamos confere mais força ao dito. É a voz da “multitud de manifestantes” quem
pede ao governo espanhol que retire a lei que autoriza os casamentos homossexuais na
notícia do El Mundo. No entanto, no jornal El País esta ação é expressa através da estrutura
impessoal “se ha instado” (fragmento 15), que ao não atribuir a ação a uma pessoa concreta
ou a um grupo faz com que o significado do verbo perca força
95
. Na notícia do EL Mundo
também aparece a voz de uma não-pessoa: o manifesto (5), a quem se lhe atribui a ação de
“dizer”.
Um outro aspecto que cabe destacar é a quantidade de vezes que o jornalista do El
Mundo recorre às quantificações, o que mostra o grande peso argumentativo dos números.
Assim, fala de uma “multitud de manifestantes”, contabilizando-os (166.000), fala da
temperatura (“30 grados”), de “ocho autobuses”, das “500 personas” que chegaram a Madri
desde Valencia etc. Acreditamos que todos esses dados numéricos são utilizados pelo
jornalista para mostrar a importância do evento que está descrevendo. A relevância da
manifestação do 18-J foi tanta que fez com que uma multidão de pessoas se deslocassem de
diferentes pontos da Espanha, superando empecilhos como a distância ou a idade (77 e 65
anos têm as pessoas entrevistadas) e ainda tivessem que suportar uma temperatura
asfixiante.
O jornalista do El Mundo se esforça por (re)criar na notícia o “ambiente festivo” ou
“lúdico” em que, segundo ele, transcorreu a manifestação. Assim se refere a um ambiente
com “globos, pancartas e banderas españolas”, afirma que os “asistentes han coreado
gritos” e até “han compuesto un rap”. Acreditamos que este dado seja relevante porque o
jornalista parece querer convencer o leitor de que embora os assistentes à manifestação,
fossem “famílias enteras, ancianos y niños” vindos de muitos lugares da Espanha, baixo um
95
D.R.A.E: Instar: intr. Apretar o urgir la pronta ejecución de una cosa.
143
calor asfixiante, a relevância do evento dava forças a todos para fazer suas reivindicações
num ambiente de festividade.
Esse jornalista da notícia do El Mundo identifica textos religiosos, já que reconhece
entre os gritos da multidão, citações de Juan Pablo II (“Dios es solidaridad”, “Solidaridad
es compartir hasta lo necesario para sobrevivir”).
Todos estes dados que acabamos de oferecer compõem uma imagem do enunciador-
jornalista do El Mundo como alguém que compartilha das idéias defendidas na
manifestação do 18-J ou pelo menos simpatiza com elas. Já o enunciador-jornalista da
notícia do El Pais se mostra mais “objetivo”, como alguém que enxerga o evento relatado à
distância. Parece significativo neste sentido, por exemplo, o fato de que inclua na notícia a
voz da representante dos homossexuais, Beatriz Gimeno, coisa que não acontece na notícia
do El Mundo. Esta voz cria uma brecha no discurso dos manifestantes, que se referem
constantemente à família (heterossexual), afirmando que as famílias que formam os
homossexuais também são famílias: “la familia sí importa, y las nuestras también”. Temos,
pois um exemplo, de como dependendo do lugar de sentido em que se situe o sujeito que
fala, muda a visão de uma mesma realidade.
Acreditamos que estas duas notícias possam servir de exemplo para mostrar como a
imprensa, e concretamente o gênero notícia, embora se apresente como espaço qualificado
no qual a opinião está ausente, ou seja, como espaço no interior do qual é possível
“informar objetivamente”, participa dos processos sociais que ela quer objetivar.
A seguir, no capítulo das Considerações finais tecemos algumas outras
considerações a respeito da participação da imprensa nos processos sociais e concretamente
do processo de equiparação de direitos.
144
IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Espanha continua sendo um país marcado pela educação cristã católica no qual a
Igreja ainda dita os dogmas de moral relativos à família e às relações sexuais. A força desta
instituição é visível na menção feita a ela na própria Constituição Espanhola. O
acontecimento histórico e discursivo da divulgação da aprovação do anteprojeto de lei do
casamento homossexual constitui uma ruptura da hegemonia da Igreja Católica, já que
modifica o modelo de família heterossexual e orientado à procriação defendida por esta
instituição. Ao mesmo tempo, modifica o aparelho jurídico ao criar uma nova norma e
possibilita a aparição de novos discursos por parte dos homossexuais ao modificar os
saberes de sua formação discursiva.
O enunciador-jornalista para tratar o tema da aprovação da lei do casamento
homossexual traz para as notícias as vozes da Igreja, do governo espanhol, do PP, do Foro
Español de la Familia, da Justiça, da Ciência e dos representantes dos homossexuais, dentre
outras. No embate que se produz entre essas forças, o espaço ocupado pelo homossexual é
o da terceira pessoa, já que os homossexuais não falam de si mesmos: são falados. As
imagens sobre eles são construídas a partir do que é dito sobre eles desde outros lugares
sociais, tendo um papel muito importante neste item o discurso da ciência, invocado por
quase todos os lugares sociais para argumentar seus posicionamentos.
O discurso da Igreja, do PP, do Foro Español da Família, ao se opor ao matrimônio
homossexual por não estar orientado à procriação, parece resgatar as teses populacionais
em vigor até meados do século XVIII, as quais relacionavam diretamente desenvolvimento
econômico, riqueza e aumento da população. Segundo essas teses, quanto maior fosse a
população do país, maior seria a sua riqueza, já que “um país deveria ser povoado se
quisesse ser rico e poderoso” (F
OUCAULT, 2003, p.28)
No que se refere especificamente ao discurso da Igreja, cabe ressaltar que, a pesar
de as vozes pertencentes a este lugar social afirmarem que a problemática do casamento
homossexual tem de ser discutida desde o ponto de vista antropológico, a análise de nosso
corpus revelou que, dentre os discursos nos quais as vozes pertencentes à Igreja se apóiam,
o discurso antropológico tem um peso muito menor que, por exemplo, o discurso da
psicologia e da biologia, nos quais sim muito frequentemente se apóiam essas vozes.
145
O homossexual, anteriormente silenciado, com o acontecimento histórico e
discursivo da divulgação do anteprojeto de lei por parte do governo espanhol passa a falar,
mas isto não quer dizer que as vozes dominantes entrem em silêncio. O que se produz é um
embate entre formações discursivas e nesse embate é ao representante dos homossexuais a
quem é dada voz (em número muito menor que as outras vozes), não ao homossexual
advogado, ao homossexual professor etc. Quer dizer, a presença do homossexual na
sociedade continua estando restrita à sua orientação sexual. É a orientação sexual do
homossexual que define sua participação na sociedade. O homossexual só pode falar desse
lugar de representante do coletivo homossexual, ficando de fora outros lugares que ele
ocupa: professor, advogado, pai etc. O homossexual continua situando-se ao mesmo tempo
dentro e fora dessa sociedade.
Pedro Zerolo, no PSOE e Felipe del Baño, no PP, constituem as únicas vozes
homossexuais às quais lhes é permitido falar de outro lugar diferente ao da orientação
sexual. Eles se posicionam nas notícias de nosso corpus do lugar do homossexual, mas
também do lugar do político, coisa que não acontece com as demais vozes homossexuais.
Os representantes dos homossexuais e os membros do governo e Izquierda Unida
contribuem a criar novos saberes sobre os homossexuais e nesse sentido constituem uma
ruptura na dinâmica de perpetuação dos já-ditos sobre os homossexuais. Quer dizer, em
nosso corpus convivem as representações dos homossexuais como vítimas, doentes etc.,
com as representações dos homossexuais como membros da sociedade que têm os mesmos
direitos que os heterossexuais. A construção de sentidos para a homossexualidade, nos
jornais eletrônicos El País e elmundo.es, está ancorada basicamente na manutenção dos já-
ditos, embora exista espaço para novos saberes.
Quanto aos efeitos de sentido gerados a respeito da homossexualidade, o tratamento
dado pela mídia aos homossexuais nos mostra claramente que o preconceito se mantém
ainda muito forte na sociedade, ao repetir conceitos e esquemas do passado, e ao dar voz,
como já apontamos, quase exclusivamente aos representantes dos homossexuais, não aos
homossexuais professores, advogados, pais etc. As únicas ocasiões em que é dada voz ao
homossexual comum é para reforçar estereótipos negativos como o de vítima, como
146
acontece na notícia intitulada Un homosexual denuncia a un cura de Jaén por negarle la
comunión, publicada no El País o 1 de fevereiro de 2005
96
.
O discurso jornalístico tem papel importante nessa construção de sentido entre
homossexualidade e doença, pois difunde, sob uma pretensa ilusão de neutralidade e
veracidade etc., os discursos da Igreja, do PP, do Foro Español de la Familia etc., que
sustentaram a relação citada, bem como as ameaças que pairam sobre a sociedade como
conseqüência da aprovação da lei.
Consideramos a imprensa como um dos elementos que participam do processo de
equiparação de direitos, no sentido de constituir uma das unidades responsáveis pelo
discurso de transmissão de conhecimentos a respeito da homossexualidade. Neste sentido, a
imprensa reproduz um embate entre diferentes formações discursivas, especialmente na
área da política, da psicologia, da justiça, da religião etc. Este embate ultrapassa o terreno
dos direitos civis ao focar a atenção da discussão nas repercussões que a decisão do
governo espanhol teria para a noção de matrimônio, família e sociedade, aspectos estes
constantemente invocados pelas vozes em conflito.
Quanto à opção ideológica que define a cada um dos jornais eletrônicos foco de
análise, cabe salientar que existe uma grande homogeneidade no tratamento do tema em
debate por parte dos dois jornais. Esta homogeneidade é produzida através de uma série de
procedimentos que passamos a descrever. Os dois jornais privilegiam os mesmos lugares
sociais, havendo poucas diferenças quanto às vozes levadas para as notícias em cada um
deles. Os dois jornais também dão o mesmo tratamento às vozes dos homossexuais,
colocando-as na maioria das vezes no último parágrafo do corpo da notícia, contribuindo,
desse modo, a manter a imagem de escassa representatividade dos homossexuais na
sociedade.
Outro aspecto que contribui para essa homogeneidade a que nos referimos é o fato
de que os dois jornais privilegiam as vozes dos mesmos lugares sociais, concretamente da
Igreja, do Partido Popular e do governo, sendo a Igreja o lugar social representado por um
número maior de vozes. Isto mostra que os dois jornais, embora inicialmente possam ser
96
Esta mesma notícia é também recolhida pelo jornal elmundo.es com o título Un párroco se niega a
viva voz a dar la comunión a un feligrés gay.
147
caracterizados por defenderem posicionamentos ideológicos diferentes, apresentam uma
visão de mundo e concretamente da sociedade espanhola muito semelhante.
Contribui também ao efeito de homogeneidade o fato de que todos os lugares
sociais se apresentam como sendo muito homogêneos no que diz respeito aos
posicionamentos defendidos, havendo poucos momentos de ruptura. No caso do PP esta
ruptura está representada pelo prefeito de Vitória, Alfonso Alonso, que chamou de
“miserables” às pessoas que se manifestaram contra os matrimônios homossexuais no 18-J
em Madri. O outro caso é o de Celia Villalobos, que votou a favor da aprovação do
anteprojeto de lei e, portanto, contra a política de seu partido.
Cabe destacar também que os diferentes lugares sociais se apóiam nos mesmos
discursos para se posicionar. Especialmente no discurso da ciência e no discurso jurídico,
como já vimos.
O corpus que serviu de ponto de partida para esta pesquisa tem se mostrado muito
rico, pelo qual somos conscientes de que outras hipóteses e vertentes seriam possíveis,
como estudar os efeitos de sentido gerados a partir da imbricação dos diferentes códigos –
escrito (incluindo aqui os recursos tipográficos e de titulação), gráfico e iconográfico – dos
que os jornais eletrônicos analisados se apropriam para a representação dos fatos. Outra
possibilidade seria acompanhar os temas relacionados aos homossexuais nos jornais
eletrônicos espanhóis El País e elmundo.es visando conferir se novos sentidos a respeito da
homossexualidade são criados a partir da equiparação legal de direitos dos homossexuais.
A sociedade ainda apresenta resistências a modelos considerados “diferentes”
daquilo que se considera “normal”. O discurso dominante ainda determina as regras de
quem e o que deve ou não ser aceito, quem tem direito a falar e quem deve ser silenciado.
O movimento homossexual tem percorrido um longo caminho deste Stonewall até
hoje e leis como a aprovada na Espanha têm ajudado a conseguir em alguns países os
diretos e a proteção legal almejada pelos homossexuais. No entanto, resta muito por fazer
até conseguir a eliminação total do preconceito, até mesmo nos países onde já existe
equiparação de direitos. Acreditamos que leis como a aprovada na Espanha são o ponto de
partida para conseguir a equiparação legal e efetiva dos direitos das minorias em geral e dos
homossexuais em particular.
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos Idelológicos de Estado: notas sobre os aparelhos ideológicos
de Estado (AIE). Rio de Janeiro: Edicções Graal,1985.
AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Heteogeneidade(s) enunciativa(s). In. Cadernos de Estudos
Lingüísticos, nº 19. Campinas, Unicamp, 1990, pp. 25-42.
_____________. Palavras incertas – As não-coincidencias do dizer. Campinas, SP.
Unicamp, 1998.
BAKHTIN, Mikhail. A estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
________. (Voloshinov, 1929). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo. HUCITEC,
1979.
BRANDÃO, Helena. Introdução à análise do discurso. Campinas, SP, Unicamp, 2004.
CAZARIN, Ercília Ana. “A migração do discurso de Lula para uma nova posição-sujeito”.
Online: disponível na Internet via: www.geocities.com7gt_ad/ercilia.doc.
CHARAUDEAU, p. “Lê contrat de communication de l’information médiatique”. In: Le
français dans le monde: Médias, faits e effets. Paris, Hachette, número especial, juillet,
1994.
DAHER, ROCHA, SANT’ANNA. “Greve no ABC”. 2004 (no prelo)
EPSTEIN, Robert. “Ser ou não ser”. In: In: Viver. Mente e Cérebro. Revista de Psicologia,
Psicanálise, Neurociências e Conhecimentos. Ano XIV, nº165. São Paulo: Ediouro, 2006,
p. 40-46.
F
ISCHER, Rosa Maria Bueno. “A paixão de “trabalhar com” Foucault”. In: Caminhos
Investigativos. Novos olhares na pesquisa em educação. Costa, Marisa V. (Org.). Porto
Alegre: Editora Mediação, 1996.
______. “Verdades em suspenso: Foucault e os perigos a enfrentar”. In:. Caminhos
investigativos II: outros modos de pensar e fazer pesquisa em educação. Costa, Marisa
Vorrager (org.). Rio de Janeiro: DP&A editora, 2002.
F
OUCAULT, Michel. Historia da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro, Edições
Graal, 1988.
______________. A arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 4ª
ed.,1969/2005.
_____________. Ética, Sexualidade, política. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2004.
149
___________. Vigilar y castigar – nacimiento de la prisión. México: Siglo XXI,
1975/2000.
GREGOLIM, M. DO R. Foucault e Pêcheux na AD. Diálogos & Duelos. São Carlos: Claraluz,
2004.
HOUZEL, Suzana Herculano. “O cérebro homossexual”. In: Viver. Mente e Cérebro. Revista
de Psicologia, Psicanálise, Neurociências e Conhecimentos. Ano XIV, nº165. São Paulo:
Ediouro, 2006, p. 46-52.
MAINGUENEAU. Dominique. Novas tendências em Análise do Discurso. Campinas, SP:
Pontes, 1989.
____________. Elementos de lingüística para o texto literario. São Paulo: Martins Fontes,
1996.
____________. Analisando discursos constituintes. Universidade de Paris XII. Revista do
GELNE, vol. 2, n 2, 2000.
____________. Self- constituting discourses. 1999. Online: disponìvel na Internet via
http://perso.wanadoo.fr/dominique.maigueneau/conclusion l.html
____________. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, 2001.
____________. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, 2001.
MARIANI, Bethânia. O PCB e a imprensa – os comunistas no imaginário dos jornais 1922-
1989. Rio de Janeiro, Revan, 1998.
____________. Os primórdios da imprensa no Brasil (Ou: de como o discurso jornalístico
constrói memória) In: Orlandi, Eni (org). Discurso Fundador: A formação do país e a
construção da identidade nacional. Campina, SP: Pontes, 2001.
N
AVARRO-BARBOSA, P. “O acontecimento discursivo e a construção da identidade na
História”. In: Foucault e dos domínios da Linguagem: discurso, poder e subjetividade.
N
UNAN, Adriana. Homossexualidade: do preconceito aos padrões de consumo. Rio de
Janeiro, Caravansaral, 2003.
ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP, Pontes,
2001.
____________. As formas do silêncio. Campinas, Unicamp, 2002.
P
ÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Trad. Eni Orlandi, Campinas,
SP: Pontes, 1990.
150
KOMAVLI de SÁNCHEZ, Beatriz Adriana S. A construção da criminalizacao no jornal: Uma
abordagem discursiva. Tese de dissertação. Rio de Janeiro, UERJ, 2006.
SANT’ANNA, Vera Lucia de Albuquerque. O trabalho em notícias sobre o Mercosul. São
Paulo: Educ, 2004.
SILVA, Tomás Tadeu da. “A produção social da identidade e da diferença”. In: SILVA,
Tomás Tadeu da (org.). Identidade e Diferença. A perspectiva dos Estudos Culturais.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
SIMÕES JR, Almerido C. ‘... E havia um lampião na esquina’ – Memórias, identidades e
discursos homossexuais no Brasil de fim da ditadura. (1978-1980). Dissertaçõo de
Mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ, 2006.
SOARES, A Homossexualidade e a AIDS no Imaginário de Revistas Semanais (1985-1990).
Tese de Doutorado. Niterói, UFF, 2006.
SPENCER, Colin. Homossexualidade: Uma história. Rio de Janeiro, Record, 1996.
VIVONI, Renata L. Moutinho. Interlocução seletiva: análise de provas para seleção de
docentes – A construção do perfil do profissional professor. Rio de Janeiro, 2003.
Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
WOODWARD, Kathryn. “Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual”. In:
SILVA, Tomás Tadeu da(org.). Identidade e Diferença. A perspectiva dos Estudos
Culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
Anexos.
LIBRO DE ESTILO – EL PAÍS (----). Madrid.
http://www.aimc.es/aimc.php (Acesso: 22 jul. 2005)
http://www.ojodinteractiva.ojd.es/actas/acta_elmundo_200506.pdf (Acesso: 22 jul. 2005)
http://www.noticiasdot.com/pubicaciones/2004/0704/0707/noticias070704-15.htm
151
Anexo I: Mapa “El mundo no es de color rosa”
Accessível em:
http://www.es.amnesty.org/fileadmin/user_upload/documentos/mapa_lgbt.pdf
152
Anexo II: Quadros de títulos de notícias.
Jornal EL PAÍS:
Quadro I: Lugar social representado: Os homossexuais
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
01/02/05 Sociedad Un homosexual denuncia a un cura de Jaén por negarle la
comunión
1
02/02/05 Sociedad Un gay denuncia a un cura de Jaén por negarle la
comunión
28/04/05 Sociedad
"Miles de gays murieron en campos como Auschwitz"
20/05/05 Sociedad Gays y lesbianas celebran un congreso para analizar los
"históricos avances" de sus derechos
20/05/05 Sociedad Los gays cristianos reivindican su lugar en la Iglesia
católica
17/06/05 Sociedad "La igualdad es completa o no es igualdad" afirman los
colectivos homosexuales
19/06/05 Sociedad Los colectivos gays acusan al PP y a la Iglesia de
manifestarse a favor de la discriminación
EL PAÍS
19/06/05 Sociedad "El PP y la Iglesia están divididos, pero la sociedad, no",
dicen los gays
Quadro II: Lugar social representado: o Governo da Espanha:
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
01/10/04 Sociedad Zapatero afirma que con la ley del matrimonio los gays
dejan de ser ciudadanos "de segunda"
02/10/04 Sociedad El Gobierno afirma que el matrimonio gay "acaba con
siglos de discriminación"
06/10/04 Sociedad Caldera dice que no envía la ley del matrimonio al CGPJ
por su "urgencia"
14/10/04 España El ministro de Justicia recuerda al Consejo que no puede
pronunciarse sobre el proyecto de bodas gay
21/10/04 Sociedad El PSOE descarta equiparar las parejas de hecho a los
matrimonios
07/11/04 España El presidente le dice a la Iglesia que el Gobierno no
admite interferencias
23/11/04 Sociedad El PSOE acepta hablar, pero "desde la verdad de las
cosas"
29/11/04 Sociedad El PSOE ofrece diálogo a la Conferencia Episcopal, pero
le pide que no caiga en la "agitación preventiva"
18/12/04 Sociedad López Aguilar replica que el texto sólo sufrirá cambios
técnicos
19/12/04 Sociedad De la Vega insiste en que los matrimonios entre gays son
constitucionales
19/12/04 Sociedad Fernández de la Vega subraya la constitucionalidad de las
uniones gays
EL PAÍS
02/03/05 Sociedad El Gobierno y los obispos se muestran dispuestos a
mantener un "diálogo fluido y abierto"
1
Grifos nossos.
153
15/03/05 España Zapatero: "Después de ocho años de derechas hemos
tenido un año de derechos"
21/04/05 Sociedad
Zapatero: "Si el nuevo Papa dice algo, estoy preparado
para respetarlo"
24/04/05 España El presidente defiende su gestión y asegura que tiene más
apoyo que hace un año
25/04/05 España El presidente alardea de un Gobierno firme capaz de
"aguantar las presiones"
26/04/05 Sociedad El Gobierno advierte de que no cabe la objeción de
conciencia frente al matrimonio gay
27/04/05 Sociedad Justicia afirma que negarse a celebrar bodas gays será un
"incumplimiento flagrante" de la ley
07/05/05 Sociedad El PSOE considera inconstitucional la petición de la
Iglesia a sus fieles de "desobedecer la ley"
11/05/05 España Zapatero se compromete a llevar al Parlamento un
hipotético proceso de paz con ETA*
2
17/06/05 Sociedad El Gobierno espera aprobar la nueva ley el 30 de junio
Sociedad Zapatero califica de sorprendente el apoyo del PP a la
marcha
18/06/05 Sociedad El Gobierno recuerda que "no se quita ningún derecho a
nadie"
19/06/05 Sociedad De la Vega afirma que la marcha sólo busca negar un
derecho a los gays
20/06/05 Sociedad El Gobierno elude pronunciarse sobre la marcha contra las
bodas homosexuales
Quadro III: Lugar social representado: a Igreja:
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
02/10/04 Sociedad Los obispos dicen que el Estado no puede legislar sobre
"un derecho inexistente"
01/10/04 Sociedad Los obispos consideran que los homosexuales "no tienen
derecho" a casarse
05/10/04 Sociedad El cardenal Rouco niega al Estado capacidad para regular
los matrimonios gay
07/10/04 Sociedad El Papa critica las bodas que no están "destinadas a la
fecundidad"
11/10/04 Sociedad El arzobispo de Toledo equipara la mayoría que apoya las
bodas gays y la que respaldó a Hitler
18/10/04 Sociedad El obispo de Vitoria acusa al Gobierno de anteponer los
votos a la familia
19/10/04 Sociedad El prelado de Ávila sostiene que sólo en "golpes de
Estado
"
hubo tant
os cambios
25/10/04 Sociedad El Vaticano reitera su rechazo a la guerra preventiva, el
terrorismo y la pena muerte *
26/10/04 Sociedad El Vaticano condena en su catecismo social el condón, la
homosexualidad y la clonación
EL PAÍS
17/11/04 Sociedad El obispo de Girona dice que no quiere ser "recadero" de
la Conferencia Episcopal
2
As notícias marcadas com asterisco embora nao tenham referência direta no título à problemática
suscitada pela lei, contem sim referência a ela no corpo da notícia, motivo pelo qual decidimos mantê-las no
nosso corpus.
154
Sociedad Los obispos catalanes opinan que la adopción por los gays
causará "daños graves" a los niños
20/11/04 Sociedad El Arzobispo de Valladolid considera exagerado hablar de
persecución a la Iglesia católica
22/11/04 Sociedad Rouco niega que los obispos busquen la confrontación y
ofrece diálogo al Gobierno
23/11/04 Sociedad Rouco ofrece diálogo al Gobierno si el legislador se atiene
al "orden moral"
30/11/04 Sociedad Los obispos consideran "gravemente falso" sostener que el
preservativo evita
el sida
15/12/04 Sociedad Un obispo afirma que la educación sexual en las aulas se
reduce a "exaltar la homosexualidad"
16/12/04 Sociedad El obispo de Castellón dice que los homosexuales "no
promueven el bien común"
24/12/04 Sociedad El obispo de Mondoñedo compara la práctica homosexual
con el crimen
26/12/04 Sociedad Los obispos llaman a una oposición "clara e incisiva" a las
uniones gays
31/12/04 Sociedad El obispo de Mondoñedo afirma que el matrimonio entre
gays abre la puerta a la poligamia
08/01/05 Sociedad El vicepresidente de los obispos carga contra la "epidemia
de homosexualidad"
11/01/05 Sociedad El Papa reitera sus críticas a la ley que permitirá los
matrimonios entre personas del mismo sexo
24/01/05 Sociedad El Papa cree que en España se difunde un laicismo que
lleva a "restringir la libertad religiosa"
25/01/05 Sociedad El Papa ataca el "laicismo" del Gobierno que "ignora y
cercena" la libertad religiosa
27/01/05 Sociedad Rouco dice que la Iglesia española no está "bajo asedio"
aunque existen "algunos problemas"
08/03/05 Sociedad El nuevo presidente de la Conferencia Episcopal expresa
su deseo de diálogo con el Gobierno
19/03/05 Sociedad Blázquez afirma que nadie puede ser discriminado por su
orientación sexual
22/04/05 Sociedad El Vaticano pide a los funcionarios que no casen a los
gays "aunque pierdan su trabajo"
23/04/05 Sociedad El Vaticano pide a los funcionarios españoles que no
casen a los gays
30/04/05 Sociedad El Vaticano acusa a España de "totalitaria" por negar la
objeción en el matrimonio gay
03/05/05 Sociedad El Vaticano insiste en reclamar la objeción de conciencia
para bodas gays
06/05/04 Sociedad Los obispos niegan el "carácter de una verdadera ley" a la
regulación del matrimonio homosexual
07/05/05 Sociedad Los obispos piden a los parlamentarios que voten contra
las bodas homosexuales
10/05/05 Sociedad El episcopado dice que la ley de matrimonios gays acabará
ante el Constitucional
16/05/05 Sociedad Rouco dice que la familia pasa "los momentos más
difíciles de la historia"
22/05/05 Benedicto XVI espera que la Iglesia católica sea
"comprendida" y "aceptada" en España
23/05/05 Sociedad Los obispos piden el fin de las "ofensas y desprecios" al
matrimonio
155
30/05/05 Sociedad Rouco ve en peligro "derechos fundamentales" de la
persona
30/05/05 España El arzobispo de Toledo niega que apoyara el diálogo con
ETA *
30/05/05 España El vicepresidente de la Conferencia Episcopal pide a Dios
que aliente las iniciativas de diálogo
01/06/05 Sociedad Los obispos llaman a manifestarse contra la ley que
legaliza el matrimonio gay
07/06/05 Sociedad El obispo de Calahorra rezará para que Zapatero rectifique
sobre el matrimonio gay
Sociedad El Papa dice que las uniones gays son expresión de una
"libertad anárquica"
09/06/05 Sociedad La Conferencia Episcopal respalda la marcha contra las
bodas gays porque la causa es "justa"
16/06/05 Sociedad La Iglesia, contra el matrimonio gay porque "es un desafío
único en la historia de la humanidad"
17/06/05 Sociedad Los obispos dicen que no se ha vivido "nada igual en 2000
años" como las bodas gays
20/06/05 Sociedad La Conferencia Episcopal afirma que la protesta del
sábado sólo es "el comienzo"
Quadro IV: lugar social representado: a Justiça:
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
02/10/04 Sociedad La mayoría del Poder Judicial critica que Justicia no le
permita informar sobre la futura ley
06/10/04 Sociedad El Poder Judicial pide al Gobierno que le remita el
anteproyecto de ley del matrimonio homosexual
07/10/04 Sociedad El Poder Judicial requiere al Gobierno la ley del
matrimonio gay
17/01/05 Sociedad El CGPJ considera de dudosa constitucionalidad permitir
los matrimonios entre homosexuales
18/01/05 Sociedad La mayoría del Poder Judicial duda de la
constitucionalidad del matrimonio gay
19/01/05 Sociedad El Poder Judicial compara la boda gay con la unión de "un
hombre y un animal"
27/01/05 Sociedad La mayoría del Poder Judicial afirma que las bodas gays
abren camino a la "poligamia"
27/04/05 Sociedad Carles: "Obedecer la ley antes que la conciencia lleva a
Auschwitz"
EL PAÍS
12/05/05 Sociedad Requero, vocal del Poder Judicial, sugiere al Rey que no
sancione la ley de bodas gays
Quadro V: lugar social representado: o PP.
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
02/10/04 España El regidor pide a su partido que "estudie" la adopción por
homosexuales
3
12/10/04 Sociedad Botella se muestra en contra de que los gays adopten, para
"
proteger
"
a los menor
es
EL
PAÍS
15/12/04 Sociedad Fraga dice que ser gay es una "anomalía" de los cromosomas
3
“El regidor” é Alberto Ruiz-Gallardón, prefeito de Madri.
156
29/12/05 Sociedad Fraga, sobre los homosexuales: "Algo les pasa para ser como
son. Les estoy defendiendo"
20/01/05 Sociedad Rajoy dice que los gays no quieren el matrimonio y que el
Gobierno lo regula para "parecer moderno"
21/01/05 Sociedad Rajoy afirma que el matrimonio homosexual responde a "la
manía del Gobierno de parecer moderno"
09/03/05 Sociedad PP y PNV rechazan llamar matrimonio a las uniones gays
27/04 Sociedad Rajoy: "Que nadie se dedique a amenazar"
28/04/05 Sociedad Ana Botella dice que Zapatero legisla para complacer al
"poderoso 'lobby' gay"
06/05/05 Sociedad Aznar dice que la "minoría" gay no puede "imponer sus
criterios a los demás"
14/05/05 España Fraga entrega fármacos en hospitales de Buenos Aires y niega
que la visita sea para pedir votos
19/05/05 España Concejales del PP impiden que dimita el alcalde que llamó
"tarados" a los gays
24/05/05 Sociedad PP y CiU proponen en el Senado que jueces y alcaldes
puedan negarse a casar gays
04/06/05 España Fraga dice que Galicia corre el riesgo de acabar como Euskadi
si cambia de Gobierno *
14/06/05 Sociedad El PP pide a sus votantes y militantes que se manifiesten
contra las bodas gays
17/06/05 Sociedad
"La legalización es una estrategia internacional del 'lobby'
homosexual"
19/06/05 Sociedad Rajoy dice que es "mentira" que el PP esté contra los
homosexuales
21/06/05 Sociedad El alcalde de Vitoria, del PP, cree "miserable" manifestarse
contra los gays
30/06/05 Sociedad Rajoy anuncia que el PP estudia un recurso al Constitucional
Quadro VI: lugar social representado: o Izquierda Unida (IU).
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
06/11/04 Sociedad IU insta al Gobierno a que no ceda ante "las intromisiones
intolerables" de la Iglesia
07/11/04 Sociedad IU critica que la Iglesia pague con fondos públicos su
campaña contra la eutanasia *
EL
PAÍS
07/05/05 Sociedad Llamazares: "La Iglesia se sitúa fuera de la democracia"
Quadro VII: lugar social representado: o Foro Español de la Familia.
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
EL PAÍS 24/06/05 Sociedad El Foro de la Familia pide "respeto a la libertad de
expresión" de Polaino *
157
Quadro VIII: títulos de notícias que nos trazem outras vozes.
JORNAL DATA SEÇAO TÍTULO
18/10/04 Sociedad Más del 70% de los españoles cree que la Iglesia debe
autofinanciarse *
19/10/04 Sociedad El 72% de los españoles quiere que la Iglesia católica no
reciba dinero público *
01/11/04 El Sindicato de Estudiantes pide a Educación que no ceda al
"chantaje" de la Iglesia *
22/11/04 Sociedad Los propagandistas católicos aclaman a Buttiglione como a
un "héroe de la fe" *
02/12/04 Sociedad Asociaciones cristianas de Mallorca critican con dureza a las
autoridades eclesiásticas *
18/12/04 Sociedad El Consejo de Estado pide que la unión gay se regule fuera
de la "institución del matrimonio"
20/12/04 Sociedad 3.000 católicos se concentran en Sevilla para demostrar que
son "una realidad" *
29/12/04 Sociedad Los Verdes piden el procesamiento de los obispos por incitar
al odio contra los gays
22/01/05 Sociedad Peces-Barba dice que los ponentes constitucionales abrieron
la puerta a las bodas gays
28/01/05 Sociedad Los genes influyen en la orientación sexual masculina, según
un estudio
05/02/05 Sociedad La Real Academia acepta llamar “matrimonio” a las bodas
gays
21/04/05 Sociedad Los representantes de cuatro confesiones se unen para pedir
la protección del matrimonio heterosexual
04/06/05 Peces-Barba dice que los acuerdos España-Vaticano no tiene
“ninguna justificación”. *
09/06/05 Una asociación premiada por Aguirre afirma que es corriente
que los padres gays abusen de sus hijos
11/06/05 Sociedad Grupos de católicos de base anuncian que no obedecerán a
los obispos por las bodas gays
19/06/05 Sociedad Dos de cada tres españoles apoyan el matrimonio
homosexual
20/06/05 Sociedad El psicólogo citado por el PP en el Senado califica la
homosexualidad de "patología"
21/06/05 Sociedad El PP lleva un experto al Senado que afirma que ser gay es
una enfermedad
23/06/05 Sociedad El PP se desmarca ahora del experto que dijo que ser gay es
una patología
EL
PAÍS
23/06/05 Polaino ya había hecho públicas sus tesis antes de ir al
Senado
158
Jornal EL MUNDO:
Quadro IX: lugar social representado: os homossexuais.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
04/06/05 España La Federación de Gays responde al ataque de Fraga tachando
de 'asqueroso' el currículum del político
17/06/05 España Los gays piden amparo a la Fiscalía para que no haya lemas
'vejatorios' en la manifestación del sábado
21/06/05 España Asociaciones de homosexuales piden al Colegio de
Psicólogos que expulse al experto citado por el PP
EL
MUND
O
24/06/05 España Ezker Batua y una asociación de gays se querellan contra
Polaino por sus declaraciones 'homófobas'
Quadro X: lugar social representado: o Governo da Espanha.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
06/10/04 España López Aguilar no pide al CGPJ su opinión sobre las bodas
gays 'porque no es un órgano consultivo'
14/1004 España López Aguilar cree que el CGPJ se extralimita al opinar sobre
los matrimonios entre homosexuales
17/12/04 España El Gobierno destaca el aval constitucional del Consejo de
Estado a los matrimonios homosexuales
19/01/05 España El Gobierno tacha de 'inadmisibles' las opiniones del CGPJ
sobre el matrimonio homosexual
25/01/05 Sociedad Bono recuerda al Vaticano que 'la fe no pertenece al Estado'
26/01/04 España El Gobierno se reúne con el nuncio del Vaticano para
expresarle su 'extrañeza' por la crítica del Papa
09/03/05 España El Gobierno y la Iglesia se muestran dispuestos a dialogar con
'claridad', 'amabilidad' y 'sin interferencias'
17/03/05 España pez Aguilar asegura que la ley del matrimonio
homosexual obedece a un mandato constitucional
23/04/05 España Fernández de la Vega afirma que la objeción de conciencia
no exime a los funcionarios de oficiar bodas
24/04/05 España Zapatero pide al PP que mire a los homosexuales a la cara y
les diga que son 'españoles de segunda'
26/04/05 España pez Aguilar recuerda que todos los poderes públicos están
obligados a cumplir la ley
28/04/05 España El PSOE podría hacer 'algún cambio' en la ley del
matrimonio homosexual para lograr un mayor 'consenso'
06/05/05 Sociedad El PSOE pide a la Conferencia Episcopal que 'rectifique'
porque es 'inconstitucional' desobedecer la ley
11/05/05 España pez Aguilar dice que quien intenta que el Rey no firme el
matrimonio gay no le hace 'un buen servicio'
EL
MUND
O
18/06/05 España De la Vega advierte que 'los que se manifiestan hoy lo hacen
para exigir que se niegue un derecho'
159
Quadro XI: lugar social representado: Igreja.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
09/03/05 España El Gobierno y la Iglesia se muestran dispuestos a dialogar con
'claridad', 'amabilidad' y 'sin interferencias'
06/10/04 Sociedad El Papa critica veladamente la decisión del Gobierno español
de permitir el matrimonio homosexual
06/10/04 España La Iglesia católica exige a José Bono que sea coherente con su
fe
22/11/04 Sociedad Rouco Varela ofrece diálogo al Gobierno sobre los problemas
que afectan a la 'sociedad y a la Iglesia'
26/12/04 Sociedad La Iglesia mantiene que los gays 'no tienen derecho' a casarse
y tacha de 'reprobable' su inclinación sexual
08/01/05 Sociedad El arzobispo de Pamplona vaticina una 'epidemia de
homosexualidad'
25/01/05 Sociedad El Papa denuncia que el laicismo del Gobierno de Zapatero
‘promueve el desprecio hacia lo religioso’
28/01/05 España Rouco asegura que la Iglesia española no está 'bajo asedio'
aunque haya 'algunos problemas'
22/04/05 España El Vaticano llama a los empleados municipales a negarse a
celebrar matrimonios entre homosexuales
25/04/05 España El Camarlengo criticó el matrimonio homosexual ante López
Aguilar tras la cena en la Embajada española
27/04/05 España El cardenal Amigo reconoce que las bodas gays suponen un
‘problema’ serio entre Iglesia y Gobierno
03/05/05 Sociedad El Vaticano considera que la adopción de niños por parejas
homosexuales es 'una tragedia'
06/05/05 Sociedad La Conferencia Episcopal emitirá hoy una nota sobre el
reconocimiento a los matrimonios homosexuales
06/05/05 Sociedad La Conferencia Episcopal exige a los católicos españoles una
oposición 'clara e incisiva' al matrimonio gay
11/05/05 España La Iglesia estima que el Rey no debe sancionar la ley del
matrimonio gay
22/05/05 Sociedad Benedicto XVI pide que la Iglesia sea 'comprendida' en
España y se respete la 'libertad de conciencia'
07/06/05 Sociedad El cardenal de Sevilla anuncia que no asistirá a la
manifestación contra el matrimonio de homosexuales
15/06/05 España El arzobispo de Granada confirma su asistencia a la
manifestación contra el matrimonio homosexual
EL
MUND
O
18/06/05 España Rouco Varela: 'La familia quedaría absolutamente
desprotegida con la ley del matrimonio homosexual'
Quadro XII: lugar social representado: a Justiça.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
07/10/04 España El CGPJ pide al Gobierno que le remita el anteproyecto de
ley que permitirá el matrimonio entre gays
15/01/05 España El CGPJ pide que se paralice la reforma que permitirá los
matrimonios entre homosexuales
18/01/05 España La Comisión de Estudios del CGPJ avala el informe contrario
a los matrimonios homosexuales
EL
MUND
O
19/01/05 España El CGPJ retirará la referencia a las uniones con animales en
su informe sobre el matrimonio homosexual
160
08/05/05 Sociedad Los jueces advierten a la Iglesia de que están obligados a
cumplir la ley del matrimonio homosexual
Quadro XIII: lugar social representado: PP.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
30/12/04 España Acebes: 'A lo mejor no entra en vigor porque el TC dice
antes que es inconstitucional'
26/04/05 España El alcalde de Ávila elogia la 'hombría' del regidor 'popular' de
Valladolid por no casar a gays
27/04/05 España El diputado del PP en las Cortes valencianas Felipe del Baño
reconoce su homosexualidad
28/04/05 España Un diario publica una entrevista en la que Botella dice que por
contentar a los gays Zapatero traiciona al país
03/05/04 España Fraga asegura que el matrimonio gay ayudará a que España
'pronto sea el país más envejecido del mundo'
16/06/05 España Acebes responde a Zapatero sobre la manifestación del
sábado: 'No haremos lo del PSOE el 13-M'
21/06/05 Ana Pastor dice que no comparte la opinión del experto que
consideró la homosexualidad una 'patología'
EL
MUND
O
30/06/05 España Rajoy: 'El PP estudia presentar un recurso ante el
Constitucional'
Quadro XIV: lugar social representado: Izquierda Unida.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
EL MUNDO 06/11/05 Sociedad IU critica que la Iglesia pague con fondos públicos
campañas contra la eutanasia y los matrimonios gays
Quadro XV: lugar representado: o Foro Español de la Familia.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
16/06/05 España Los organizadores de la marcha contra los matrimonios gays
estiman que irán más de 500.000 personas
23/06/05 España El Foro de la Familia anuncia más movilizaciones si Zapatero
no les recibe antes del 30 de junio
EL
MUND
O
28/06/05 España El Foro de la Familia pide un referéndum sobre las bodas gays
Quadro XVI: títulos de notícias que nos trazem outras vozes.
JORNAL DATA SEÇÃO TÍTULO
01/10/04 Sociedad El defensor madrileño del Menor pide una moratoria para que
las parejas gay puedan adoptar
27/11/04 España Jordi Pujol defiende la familia tradicional frente a la que
puedan formar los homosexuales
26/04/05 España Francisco Vázquez: 'Garantizo que se cumplirá la ley, pero
yo no voy a votar a favor en el Senado'
12/05/05 España La Zarzuela descarta que el Rey se niegue a sancionar el
matrimonio entre personas del mismo sexo
EL
MUND
O
13/05/05 España Don Juan Carlos, sobre el matrimonio gay: 'Soy el Rey de
España y no el de Bélgica'
161
16/06/05 España 'Por la libertad. Ven el sábado al Carnaval de Carlinhos con tu
bandera arco iris. Pásalo'
20/06/05 España Un experto invitado por el PP al Senado dice que los gays son
hijos de padres 'hostiles' y 'alcohólicos'
20/06/05 España Una multitud pide que se retire la ley del matrimonio
homosexual
21/06/05 España Dirigentes del PP discrepan del experto citado por su partido
que tachó de enfermos a los gays
30/06/05 España De 'paso histórico' hacia la libertad a una agresión a la
familia
162
ANEXO III
A) AGRUPANDO AS VOZES EL PAIS
Representantes da Igreja
Inocente García, responsable de Familia de la CEE
4
Antonio Maria Rouco Varela, presidente CEE
Juan Pablo II
Antonio Cañizares, arzobispo de Toledo
Miguel Asurmendi, obispo de Vitória
Jesús García Burillo, obispo de Ávila
Jesús Catalá, obispo de Alcalá de Henares
Renato Martino, presidente del Consejo Pontificio Justicia y Paz, Vaticano
J. A. Martínez Camino, portavoz de la CEE
F. Perales, rector parroquia Sant Ot de Barcelona
J. M. Uriarte, obispo San Sebastián
Stanislaw Rylko, obispo polaco
Carles Soler Perdigó, obispo de Girona
B. Rodríguez Plaza, arzobispo de Valladolid
C. Valenti, portavoz de Movimiento Cristianos profesionales de Mallorca
Xavier Delgado, Acción Católica Obrera
J. A. Reig Pla, obispo Segorbe-Castellón
J. Gea Escolano, obispo de Mondoñedo-Ferrol
Fernando Sebastián, arzobispo de Pamplona
Jaume Pujols, arzobispo de Tarragona
Jesús Sanz, obispo de Jaca
Demetrio Fernández, obispo Tarazona
D. García Dobao, párroco Guarromán (Jaén)
Ricardo Blázquez, presidente CEE
A. López Trujillo, presid. Consejo Pontificio para la Familia
A. López Portillo, presidente del Pontificio Consejo para la Familia
Ricardo María Carles, cardenal arzobispo emérito Barcelona
Alberto Aza, CEE
Ratzinger, cardenal
Papa Benedicto XVI
Elías Yanes, arzobispo Zaragoza
J. Centeno, Somos Iglesia
5
Fidel Herráez, obispo auxiliar del cardenal Rouco
Antonio Dorado, obispo
Juan José Omella, obispo de Calahorra
Carlos Amigo Vallejo, cardenal obispo Sevilla
Tommaso Stenico, teólogo y jefe de la Oficina Catequistica del Dicasterio Vaticano para el Clero
J. Martínez, arzobispo de Granada
S. García Aracil, arzobispo Mérida
C. Benavente, prelado Coria-Cáceres
A. Rdez. Magro, prelado de Plasencia
Ptv. Prelado de Orihuela-Alicante
J. Carrea, obispo auxiliar Barcelona
Portavoz del obispado Bilbao
Manuel Ureña, arzobispo Zaragoza
4
Conferencia Episcopal Española
5
La Corriente “Somos Iglesia” nace en Austria-Alemania en 1995.
163
Representantes do Governo
José Luís R. Zapatero - presidente Gobierno
M. T. Fernández de la Vega, vicepresidente 1º Gobierno
J. F. López Aguilar, ministro Justicia
A. Valcarce, secretaria de Estado de Servicios Sociales, Familias y Discapacidad
J. Caldera, ministro de Trabajo y Asuntos Sociales
J. Blanco, secretario de Organización y Coordinación del PSOE
Elena Salgado, ministra de Sanidad
José Bono, Ministro de Defensa
J. Montilla, ministro de Industria
Representantes do Partido Popular (PP)
Ana Torme, ptv. parlamentaria adjunta PP
Alberto Ruiz Gallardón, alcalde de Madrid PP
Ana Botella, concejal Empleo y Servicios al Ciudadano del ayuntamiento de Madrid
Manuel Cobo, vicealcalde de Madrid
Mario Mingo, portavoz PP Comisión Sanidad Congreso
M. Fraga Iribarne, presidente de la Xunta de Galicia
M. Angel Acebes, secretario general del PP
Mariano Rajoy, presidente Partido Popular
E. Zaplana, portavoz del PP en el Congreso
J. León de la Riva, alcalde Valladolid PP
M. A. García Nieto, alcalde Ávila
L. F. Caldentey, alcalde Pontons PP
Catalina Cirer, alcaldesa Palma (PP)
Fco. De la Torre, alcalde Málaga (PP)
Alfonso Alonso, alcalde Vitoria (PP)
Mario Amilivia, alcalde León (PP)
F. Vandrell, portavoz del PP en el Parlamento catalán
J. Piqué, presidente del PP de Cataluña
Rita Barberá, alcaldesa de Valencia (PP)
J. M. Aznar, ex presidente del Gobierno PP
Rosa Vindel, senadora PP
Agustín Conde, portavoz popular
J. Luis Baltar, presidente del PP de A Coruña
A. Conde, portavoz del PP en la Comisión
Javier Arenas, presidente del PP de Andalucía
Esperanza Aguirre, presidenta de la Comunidad Madrid
Mercedes Coloma, senadora PP
Pio García Escudero, portavoz del PP en el Senado
Ana Pastor, ex ministra Sanidad PP
Celia Villalobos, PP
J. M. Lasalle, diputado PP por Cantabria
Francisco. Villar, jefe gabinete de Rajoy
Felipe del Baño, diputado PP Cortes Valencia
M. Castañeda, Director general de Coordinación Territorial del Ayuntamiento de Madrid
Representantes dos homossexuais
Beatriz Gimeno , presidenta FELGT
6
Jordi Petit, veterano militante gay
M. Ángel Sánchez, presidente de la Fundanción Triángulo
Arnaldo Gancedo, presidente de COGAM
Juan Diego Fuentes, homosexual
Ángel García, pareja de Juan Diego Fuentes
6
Federación Estatal de Lesbianas, Gays, Transexuales y Bisexuales
164
S. Rubio, Colectivo Gays y Lesbianas Colegas-Andalucía
P. Pujol, presidente Asociación de Familias Lesbianas y Gays
Enric Vilá, Associació Cristiana de Lesbianes y Gays de Catalunya
Carla Antonelli, FELGT
Ximo Cádiz, secretario de la FELGT
Felipe del Baño, diputado PP en las Cortes Valencianas
Pedro Zerolo, concejal PSOE en el ayuntamiento de Madrid
Representantes da Justiça
José Manuel Suárez Robledano – portavoz de APM
7
Edmundo Rodríguez. Achúlegui - portavoz de JpD
8
Manuel Torres-Vela - presidente de FV
9
Enrique López, portavoz del CGPJ
J. L. Requero, miembro de la Comisión de Estudios e Informes del CGPJ
F. Salinas, vocal del CGPJ propuesto por el PSOE
10
J. A. López Tena, vocal CGPJ propuesto CIU
Enrique López, portavoz del CGPJ, propuesto por PP
Javier Laorden, vocal CGPJ, propuesto por PP
Adolfo Prego vocal CGPJ, propuesto por PP
M. Comas, minoría progresista CGPJ, propuesta por PSOE
Félix Pantoja, vocal CGPJ propuesto por Izquierda Unida (IU)
Luis Aguilar, vocal minoría progresista CGPJ, propuesto por el PSOE
Luis Zarraluqui, presidente de la Asociación Abogados de la Familia
Francisco José Hernando, presidente del CGPJ
Ángeles García, vocal CPGJ, propuesta por el PSOE
J.L. de la Riva, presidente del Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana
Edmundo Rodríguez, portavoz de Jueces para la Democracia
Representantes do Foro Español de la Familia
J. Gabaldón, presidente del Foro Español de la Familia María Luengo, portavoz del Foro Español de la
Familia
B. Blanco, vicepresidente del FEF
Ignacio García, portavoz del FEF
Julián Contreras, presidente de CONCAPA (FEF)
Representantes da “Ciencia”
Aquilino Polaina, director del Departamento de Psiquiatría de la Universidad Complutense de Madrid.
Patricia Martínez Peroni, del departamento de Psicología de la Universidad San Pablo-CEU
María del Mar González, Universidad de Sevilla
B) AGRUPANDO AS VOZES EL MUNDO
Representantes da Igreja:
Juan Antonio Martínez Camino, secretario General de la Conferencia Episcopal Española (CEE)
Fernando Sebastián, arzobispo de Pamplona, obispo de Tudela e secretario da CEE.
Antonio María Rouco Varela, presidente da CEE e arzobispo de Mardrid.
Ricardo Blázquez, Presidente da CEE
Alfonso López TRujillo, cardenal colombiano y presidente del Pontifício Consejo para la família del Vaticano.
Javier Martínez, arzobispo de Granada
Juan Pablo II
7
Asociación Profesional de la Magistratura
8
Jueces para la Democracia
9
Asociación de Jueces y Magistrados Francisco de Vitoria
10
CGPJ: Consejo General del Poder Judicial
165
Benedicto XVI
J. Gea Escolano, obispo de Mondoñedo-Ferrol.
D. García Dobao, párroco de Guarromán (Jaén)
J. Mantero, párroco de Valverde del Camino (Huelva)
E. Martínez Somalo, camarlengo en el Vaticano
C. Amigo Vallejo, arzobispo de Sevilla
Ricardo María Carles, cardenal emérito de Barcelona
J. A. Reig, obispo de Segorbe-Castellón
J.J. Omella, obispo de Calahorra, presidente de la Comisión Episcopal de Pastoral Social
J. Martínez, arzobispo de Granada
Antonio Cañizares, arzobispo de Toledo y Vicepresidente de la CEE
Demetrio Fernández, obispo de Tarazona
J. Sanz, obispo de Huesca y Jaca
Tadeusz Kondruxiewicz, arzobispo de Moscú.
Representantes do Governo
José Luis Rodríguez Zapatero, presidente del Gobierno
María Teresa Fernández de la Vega, vicepresidenta primera y portavoz del Gobierno
Juan Fernando López Aguilar, Ministro de Justicia
José Bono, Ministro de Defensa
José Caldera, Ministro de Trabajo y Asuntos Sociales
Luis Calvo, subsecretario de Asuntos Sociales
Representantes do Partido Popular
I. González., diputado del PP en el Congreso
Eduardo Zaplana, portavoz del PP en el Congreso
Ana Torme, portavoz parlamentaria adjunta
Angel Acebes, secretario general del PP
Alberto Ruiz-Gallardón, alcalde de Madrid ¿??
M. A. García Nieto, alcalde de Ávila
J. León de la Riva, alcalde de Valladolid
Lluis Fernando Caldentey, alcalde de Pontons (Barcelona)
Jospe Piqué, presidente del PP de Cataluña
Mariano Rajoy, presidente del PP
Felipe del Baño, diputado del PP por las Cortes Valencianas
A. Castro, diputada
Mario Amilibia, alcalde de León
M. Domínguez, teniente de alcalde de Valencia
Josefa Luzardo, alcaldesa de las Palmas
L. R. Rodríguez Comendador, alcalde de Almería
Francisco de la Torre, alcalde de Málaga
P. Rodríguez, alcalde de Huelva
J. M. Molina, alcalde de Toledo
M. A. Cámara, alcalde de Murcia
Corina Porro, alcaldesa de Vigo
J. Torres Hurtado, alcalde de Granada
Catalina Cirer, alcaldesa de Palma de Mallorca
Alfonso Alonso, alcalde de Vitoria
Gabino de Lorenzo, alcalde de Oviedo
Julio Revuelta, alcalde de Logroño,
E. Redondo, alcaldesa de Soria
C. Gomis, concejal de Elda
Y. Barcina, alcaldesa de Pamplona
Ana Botella, concejal de Empleo y Servicios Sociales en el Ayuntamiento de Madrid
Pio García Escudero, portavoz en el Senado
Manuel Fraga Iribarne, presidente de la Xunta de Galicia
R. Vindel, senadora
J. E. Azpiroz, portavoz Comisión de Trabajo
A. Pintado, portavoz adjunto en Medio Ambiente
E. Nasarre, portavoz Comisión Educación
A. Pintado, diputado por Huesca
C. A. Biendicho, presidente Plataforma Popular Gay
166
A. Conde, senador
J. María Aznar, ex presidente del Gobierno
Francisco Granados, secretario General el PP en Madrid
Ana Pastor, ex ministra de Sanidad
Esperanza Aguirre
Ana Pastor
Representantes dos homossexuais
Arnaldo Gancedo, presidente de COGAM
Ana y Reme
Marta
Álvaro, José, Daniel y Jorge
Boti García, ex presidenta de COGAM
Juan Diego y Ángel
Beatriz Gimeno, presidenta de la FELGT
Txema Gonzalo, presidente de HEGOAK
Carlos Biendicho, presiente de la Plataforma Popular Gay
Mamen Fernández
Felipe del Baño, diputado del Partido Popular en las Cortes Valencianas
Pedro Zerolo, concejal del PSOE en el ayuntamiento de Madrid
Representantes da Justicia
Enrique López, portavoz
M. Comas, vocal
J.C. Campo, vocal minoría progresista
Francisco José Hernando, presidente
J. Pablo González, vocal
J. l . Requero, vocal
Representantes do Foro Español de la Familia
Benigno Blanco, vicepresidente
Ángel Trascasa, vicepresidente
Representantes da “Ciencia”:
Aquilino Polaino,
Fernando Chacón,
María del Mar González Rodríguez
167
ANEXO IV.- Fragmentos de notícias nos quais “fala” algum representante da Igreja.
Periódico Data Título Responsável pelo
dito
Marca
introdutória de
DR
Fragmento
27-ene-05 Rouco asegura que la
Iglesia española no
está ‘bajo asedio’
aunque haya ‘algunos
problemas’
No se especifica
El arzobispo
Señaló que
Para el arzobispo
Repecto a los matrimonios entre homosexuales, señalõ que “es
un problema que va más allá de las relaciones institucionales
Gobierno-Iglesia”. Para el arzobispo, el matrimonio entre
homosexuales “es una problemática que se vive en toda
Europa” y es necesario discutirlo desde “el punto de vista
antropológico”.
11
El cardenal Añadió que
Consideró
necesario que
El cardenal añadió que lo que se vive es una vuelta “al
positivismo y relativismo y a la separación total entre la
dimensión moral y la jurídica”, por lo que consideró necesario
que “los cristianos asuman la responsabilidad social de lo que
significa ser cristianos, evitando vivirlo sólo en el interior de
sus casas sin efectos en lo que les rodea”.
3-may-05/2 El Vaticano considera
que la adopción de
niños por parejas
homosexuales es ‘una
tragedia’
López Trujillo
(cardenal
colombiano)
Afirmó “Algunos dicen que los niños adoptados por parejas del mismo
sexo son felices. Tal vez sea así, mientras tienen uno o dos
años. Pero cuando crecen y son capaces de pensar por sí
mismos, qué tragedia cuando al preguntarles se ven obligados a
responder:’Mis papás son dos hombres, o dos mujeres’. Su
personalidad y su equilibrio se ponen en peligro”, afirmó
López Trujillo en una entrevista a la agencia de noticias del
Vaticano, FIDES.
El cardenal
colombiano
En opinión de En opinión del cardenal colombiano, la adopción por parte de
parejas de gays y lesbianas “destruye el futuro de los niños y
les hace sufrir una violencia moral”.
elmundo.e
s
6-may-05 La Conferencia
Episcopal exige a los
católicos españoles
una oposición ‘clara e
incisiva’ al
matrimonio gay
Los obispos Califican (la
nueva definición
de matrimonio)
como
Con el título ‘Acerca de la objeción de conciencia ante una
ley radicalmente injusta que corrompe la institución del
matrimonio’, los obispo califican la nueva definición de
matrimonio, que incluye a parejas del mismo sexo, como “una
auténtica subversión de los principios básicos de la sociedad”.
11
Em negrito no orginal.
168
Esta institución según Según esta institución, “no es verdad que esta normativa
amplíe ningún derecho” sino que corrompe “la institución del
matrimonio” y constituye un “perjuicio” a “los niños
entregados en adopción a esos falsos matrimonios”.
10-jun-05 La Conferencia
Episcopal apoya la
manifestación del 18-J
en Madrid contra el
matrimonio gay
El arzobispo Señaló que El arzobispo señaló que, tanto él como diversas instancias del
Magisterio de la Iglesia, han manifestado “reiteradamente” su
disconformidad con ese “inicuo y burlón proyecto de ley que
discrimina a los matrimonios verdaderos, destruye un bien
social sagrado y ofende a la inteligencia”.
No se especifica A su juicio A su juicio, el proyecto de ley ignora “el bien precioso que es
el matrimonio para cualquier sociedad”, por lo que su eventual
puesta en práctica causará “un daño inmenso y será fuente de
destrucción y de sufrimientos sin fin en la sociedad española”.
No se especifica En su opinión En su opinión, la causa que da lugar a la manifestación es “no
sólo justa, sino de una gravedad extrema” porque en este
asunto “están en juego derechos y verdades fundamentales
sobre el hombre y la mujer y sobre la vida, que conocen
también muchas personas de otras tradiciones religiosas o que
no son miembros de la Iglesia”.
No se especifica Agrega Esas raíces, agrega, “tienen mucho que ver con una aceptación
de la primacía de los intereses económicos y políticos sobre
las cuestiones del significado de la vida y del bien moral”,
aceptación que “viene destruyendo la dignidad de la mujer y
del matrimonio y daña irremediablemente la vida familiar,
laboral, y social”.
169
Anexo V.- Fragmentos de discurso dos representantes do Governo.
Periódico Data Título Responsável pelo
dito
Marca
introdutória de
DR
Fragmento
24-abr-05 Zapatero pide al PP
que mire a los
homosexuales a la cara
y les diga que son
‘españoles de segunda’
No se especifica aspas “Hemos dado un avance sustancial en algo que constituye una
piedra angular en nuestro proyecto político para el bienestar,
para el futuro de España: hemos luchado y avanzado en la
igualda de derechos entre los españoles, entre las mujeres y
entre los hombres, como un principio esencial de una sociedad,
madura, justa y avanzada”.
26-abr-05 López Aguilar
recuerda que todos los
poderes públicos están
obligados a cumplir la
ley
El ministro Hizo hincapié en
que
El ministro hizo hincapié en que el artículo 9 de la Constitución
vincula a todos los ciudadanos, y especialmente a los titulares
de poderes públicos, con el resto del ordenamiento jurídico.
6-may-05 El PSOE pide a la
Conferencia Episcopal
que ‘rectifique’ porque
es ‘inconstitucional’
desobedecer la ley
El secretario general
del Grupo Socialista,
Diego López
Garrido
Ha exigido a la
Conferencia
Episcopal que
Según recalcó
MADRID.- El secretario general del Grupo Socialista, Diego
López Garrido, ha exigido a la Conferencia Episcopal que
“rectifique” la petición que ha hecho a los católicos para que se
opongan de manera clara al matrimonio entre homosexuales, ya
que, según recalcó, es “inconstitucional” solicitar “desobedecer
la ley”.
López Garrido Calificó de
Según dijo
López Garrido calificó de “totalmente inaceptable” las
declaraciones de la Conferencia Episcopal, ya que, según dijo,
“se arroga facultades y potestades que son sólo competencia
del pode legislativo” y crea una “objeción de conciencia que no
está reconocida en la Constitución”.
elmundo.e
s
No se especifica Señaló “Me parece totalmente inaceptable porque lo que está
planteando es algo directamente inconstitucional, que se
desobedezca la ley y por tanto que se desobedezca el principio
de legalidad que es un elemento vertebral de la Constitución
Española”, señaló.
170
ANEXO VI.- Notícias comentadas
A)
EL País 18 junio 2005 5
EL MATRIMONIO HOMOSEXUAL
La marcha contra las bodas gays reúne en Madrid a
familias, obispos y líderes del PP
El Foro de la Familia asegura que un millón y medio de personas han secundado
la protesta contra el proyecto del Gobierno
ELPAIS.es / AGENCIAS - Madrid
ELPAIS.es - Sociedad - 18-06-2005
La manifestación en defensa de la familia y contra los matrimonios entre personas
del mismo sexo ha culminado su recorrido en la Puerta del Sol con la lectura de un
comunicado en el que se ha exigido al Gobierno que retire la ley que regula estos
matrimonios y la posibilidad de adopción. El Foro de la Familia, organización que
convocaba el acto, ha dicho que la participación ha llegado al millón y medio de
personas.
La dirección del PP, que el lunes pasado apoyó la protesta, ha estado representada por
Ángel Acebes, secretario general, Eduardo Zaplana, portavoz en el Congreso, Ana
Pastor, responsable de asuntos de educación y familia, y Miguel Arias Cañete, también
miembro de la dirección popular. Además, por iniciativa propia, han participado en la
marcha Jaime Mayor Oreja, portavoz del PP en el Parlamento Europeo, Ana Botella,
concejal del Ayuntamiento de Madrid, y Federico Trillo y otros diputados del primer partido
de la oposición.
Además de políticos, un total de 18 obispos han acudido al acto de rechazo al proyecto de
ley que permite las bodas gays y la adopción para estas parejas. Aunque la Conferencia
Episcopal Española (CEE) expresó esta semana su apoyo explícito a la marcha, algunos
de sus miembros más importantes se han desmarcado de la protesta. Este es el caso de
su presidente, el obispo de Bilbao, Ricardo Blázquez, y del arzobispo de Sevilla, Carlos
Amigo. No han faltado a la cita el cardenal y arzobispo de Madrid, Antonio María Rouco
Varela, y el actual vicepresidente de la Conferencia Episcopal, Antonio Cañizares.
171
El acto ha dado comienzo a las 18.00 en la Plaza de Cibeles, adonde han ido llegando
cientos de personas, en su mayoría familias, portando banderas de España de diferentes
tamaños. La marcha, que ha discurrido sin incidentes y en medio de un ambiente festivo,
ha estado encabezada por una pancarta con el lema
La familia importa
, sujetada por
representantes del Foro de la Familia, muchos de ellos con sus hijos. Tras una segunda
pancarta, ligeramente distanciada de la primera, con el lema
Por la libertad y la familia
, se
han situado dirigentes del PP, encabezados por Ángel Acebes. Unos 20 obispos han
marchado entre estas dos primeras pancartas.
En la Puerta del Sol ha tomado la palabra el presidente del Foro, José Gabaldón, y el
vicepresidente, Benigno Blanco. La periodista de la COPE Cristina López Schlichting ha
sido la encargada de leer un manifiesto. En él, se ha instado al Gobierno a retirar la ley
que permite el matrimonio entre personas del mismo sexo y a regular la adopción de
forma que garantice "el derecho de un niño a tener una madre y un padre".
La vicepresidenta primera del Gobierno, María Teresa Fernández de la Vega, ha reiterado
hoy el respeto del Ejecutivo al derecho de manifestación de quienes asistan hoy a la
convocatoria del Foro de la Familia, pero ha pedido que quede claro que "los que se
manifiestan hoy lo hacen para exigir que un derecho se le niegue a otros".
Manifiesto del colectivo gay
Horas antes de la manifestación, concretamente a las 12.00 horas, la Federación Estatal
de Lesbianas, Gays y Transexuales (FELGT) ha leído un manifiesto a los medios de
comunicación ante el monumento a la Constitución (en la confluencia del Paseo de la
Castellana y la calle Vitrubio) en defensa de la ley y para animar a los ciudadanos a
participar el 2 de julio en la marcha del
Orgullo
gay.
Gimeno ha subrayado durante el acto que "la familia sí importa, y las nuestras también", y
ha recordado las décadas de luchas de los colectivos gays para que los hijos de padres y
madres de orientación homosexual tengan los mismos derechos que los hijos de familias
heterosexuales. La presidenta del colectivo de gays y lesbianas ha destacado que "lo que
nos parece preocupante es que la jerarquía de la Iglesia católica y el PP se hayan
prestado a posar en esa foto
revival
en blanco y negro del nacionalcatolicismo, de una
época felizmente superada por todos".
172
Gimeno pidió ayer a la Fiscalía General del Estado que actúe de oficio en el caso de que
los manifestantes contra la regulación del matrimonio gay profieran o enarbolen pancartas
y lemas ofensivos hacia los homosexuales.
Carnaval de Carlinhos Brown
Un multitud -300.000 personas, según el Ayuntamiento de Madrid y un millón según los
organizadores- ha vivido esta tarde la magia del carnaval de Brasil con el cantante
Carlinhos Brown en una fiesta que, durante cuatro horas, ha recorrido dos kilómetros del
Paseo de la Castellana, desde la Plaza de Castilla a Nuevos Ministerios. Los participantes
han recibido con gritos, aplausos y banderas de Brasil al popular músico bahiano, quien
ha definido este evento como "una manifestación de alegría, paz, amor, fraternidad,
libertad y respeto a la diferencia". Brown también hizo un llamamiento a favor de la
erradicación de la pobreza.
Sin cesar de bailar, el músico ha querido insistir en un mensaje de tolerancia en un día en
el que se han visto muchas banderas del arco iris, representantivas de los colectivos de
homosexuales.
"No cabe un alfiler"
"No cabe un alfiler". "No pongamos cifras a esta manifestación masiva, tranquila, de
familias unidas y alegres. Una manifestación en defensa del matrimonio de toda la vida,
no contra los homosexuales". Expresiones como éstas han trufado la cobertura que ha
dado esta tarde Telemadrid del arranque de la manifestación contra los matrimonios gays
convocada por el Foro de la Familia y apoyada por la Iglesia católica y el PP.
En un claro ejemplo de parcialidad informativa, el periodista José Antonio Ovies ha hecho
suyos los postulados de los organizadores de la marcha y ha descrito la protesta como
una “manifestación alegre, donde se han juntado niños y abuelos, de todas las edades y
de todos los sexos […] Los niños felices jugando con sus globos en un día soleado en
Madrid”.
Después de subrayar que la reforma aprobada por el Congreso ha sido posible gracias al
apoyo recibido por el PSOE de "los grupos nacionalistas e independentistas", Ovies ha
173
recordado que han sido "numerosísimas" las firmas llegadas al Parlamento en contra de
"la equiparación del matrimonio entre un hombre y una mujer con el de homosexuales".
Sin entrar en cifras sobre la asistencia a la marcha, Ovies ha insistido reiteradamente en
que la participación ciudadana estaba siendo "masiva". Su entusiasmo ha llegado a tal
nivel que se ha permitido comentarios como: "Si me lo permiten, [la protesta] no da más
de sí […] las calles de Madrid están llenas".
174
B)
El Mundo 19 junio
MASIVA MANIFESTACIÓN EN MADRID
Una multitud pide que se retire la ley del
matrimonio homosexual
El Foro de la Familia, organizador de la marcha, pide una reunión urgente
con Zapatero en vista de lo que califican una convocatoria de éxito
MARTA ARROYO | AGENCIAS
MADRID.- Una multitud de manifestantes, encabezada por miembros del PP y una
veintena de obispos, pidió ayer en Madrid al Gobierno que retire la ley que autoriza
los matrimonios homosexuales. La marcha, convocada por el Foro de la Familia,
terminó con un manifiesto leído por la periodista Cristina López Schlichting, quien
calificó estas uniones como un atentado contra la "institución familiar".
La marcha se ha desarrollado en un ambiente lúdico con globos, pancartas y banderas
españolas. El secretario general del PP, Ángel Acebes, y el portavoz 'popular' en el
Congreso, Eduardo Zaplana, encabezan la representación de su partido.
El Foro Español de la Familia ha exigido ya, durante el transcurso de la marcha, una
reunión urgente con el presidente del Gobierno, José Luis Rodríguez Zapatero, en vista
del éxito de convocatoria.
Schlichting ha cifrado en millón y medio el número de personas participantes en la
marcha. La Delegación del Gobierno asegura que han sido 166.000 los manifestantes.
El Manifiesto dice que el Gobierno español promueve iniciativas que atentan contra los
fundamentos de la familia.
También se plantea en este texto una regulación sobre la adopción que garantice el
"derecho del niño a tener una madre y un padre".
Otros puntos del Manifiesto piden una política integral de protección a la familia;
el respeto y el apoyo a la libertad de los padres para decidir sobre la educación de
sus hijos; un ordenamiento jurídico que garantice el respeto a la vida humana en su
integridad; una valoración positiva del hecho religioso en libertad.
175
En este texto, el Foro de la Familia expresa su "honda preocupación" por cuestiones
como la "banalización legal del compromiso matrimonial mediante el divorcio unilateral
y sin causa desde los tres meses de la boda; el progresivo menoscabo del derecho a la
vida; la limitación del derecho de los padres a decidir sobre la educación de sus hijos;
y la exclusión de las expresiones y convicciones morales y religiosas de la vida pública.
El pasado mes de abril, el Congreso de los Diputados dio luz verde a la ley que
permitirá que las parejas del mismo sexo se casen en España. La norma se tramita en
el Senado en estos momentos y se espera que el próximo 30 de junio se produzca su
aprobación definitiva.
'La familia sí importa'
La marcha contra los matrimonios entre homosexuales ha estado encabezada por la
pancarta 'La familia sí importa', secundada por dirigentes y representantes de
asociaciones familiares y sus familias. Tras el lema 'Por el derecho a una madre y a
un padre', se han situado destacados dirigentes del PP como el secretario general del
PP, Ángel Acebes, el eurodiputado Jaime Mayor Oreja, los ex ministros Federico
Trillo, Ana Pastor y Miguel Arias Cañete y el portavoz parlamentario Vicente
Martínez Pujalte. También han estado el ex alcalde de Madrid José María Álvarez
del Manzano, el ex director general de la Policía Juan Cotino y el sociólogo Amando
de Miguel.
Los representantes de las asociaciones familiares han llevado una tercera pancarta con
el lema 'Por la libertad'. El cardenal y arzobispo de Madrid, Antonio María Rouco
Varela, ha sido recibido con una gran ovación a su llegada a la manifestación. Ha
acudido acompañado por tres obispos auxiliares, se ha situado entre la segunda y la
primera pancarta, acompañado de miembros del arzobispado y también del Arzobispo
de Granada, Francisco Javier Martínez, y ha sido saludado por varios fieles.
Aunque ningún miembro de la jerarquía católica se ha situado en primera línea de
ninguna de las pancartas, han asistido a la manifestación el arozbispo de Toledo y
vicepresidente de la Conferencia Episcopal, Antonio Cañizares, el arzobispos de
Granada, Javier Martínez; los arzobispos de Castellón, Juan Antonio Reig; Jaca,
Rafael Higuero, así como el portavoz episcopal, Juan Antonio Martínez Camino.
También han acudido otros representantes católicos entre los que se encuentran el
fundador del Camino Neocatecumenal, Kiko Argüello; el presidente de la Universidad
Católica de Murcia, José Luis Mendoza, y el presidente de la Fundación San Pablo
CEU, Alfonso Coronel de Palma.
176
Desde primeras horas de la tarde, los alrededores de la Plaza de Cibeles han
comenzado a llenarse de personas dispuestas a sumarse a la manifestación del Foro
Español de la Familia. En un ambiente festivo y con más de 30 grados de temperatura,
muchas personas han acudido con carteles y pancartas con los más diversos lemas,
como por ejemplo 'La familia es lo que importa', 'Zapatero se te ve el plumero,
'Cómo se nota que el niño no vota', y 'Obispos sed valientes, no estáis solos'.
Lemas y pancartas
Los asistentes han coreado gritos como 'La familia es fuerte' o 'Solidaridad' y otros
portan pancartas con citas de Juan Pablo II como 'Dios es solidaridad', o 'Solidaridad
es compartir hasta lo necesario para sobrevivir'.
La pancarta que más ha abundado es la que, con la bandera española de fondo, lleva
impreso el siguiente lema: 'Matrimonio verdadero = Hombre y Mujer'. Quienes
han recorrido el trayecto entre Cibeles y Sol han sido familias enteras, ancianos y
niños. Isabel Rubio Arévalo tiene 77 años y ha llegado a Madrid procedente de
Carbonero el Mayor en uno de los ocho autobuses que han partido desde la provincia
de Segovia. "Quiero un matrimonio verdadero, católico y apostólico, como ha sido
siempre España", señala.
Como ella, Joaquín, un madrileño de 65 años, ha acudido a la manifestación "para
apoyar a la familia". Según dice, no tiene nada contra los gays y ni siquiera le importa
que adopten pero que se llame matrimonio, para él, es una ofensa.
Teresa, de 65 años, casada y madre de tres hijos, ha llegado a Madrid desde Valencia
con otras 500 personas en un tren sin aire acondicionado. No está de acuerdo con el
matrimonio de los gays pero sí con que se registren como parejas de hecho. Cuenta
que dos de sus hijas vivien en EEUU y que allí la gente les pregunta si en España
"están locos o qué".
Los manifestantes han compuesto un 'rap' que cantan al presidente del Gobierno:
"Zapatero mentiroso, de la Iglesia eres moroso, mentiroso Zapatero, la familia es lo
primero".
Ya había finalizado la lectura del comunicado en la Puerta del Sol y cientos de
manifestantes seguían parados en Cibeles.
Horas antes de la manifestación, la vicepresidenta primera del Gobierno,
María
Teresa Fernández de la Vega, había expresado el respeto del Ejecutivo al derecho
de manifestación de quienes decidieran asistir a la convocatoria del Foro de la Familia
177
pero pidió que quede claro que "los que se manifiestan hoy lo hacen para exigir que un
derecho se le niegue a otros".
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo