O teatro com dimensão realista, que surgia no alvorecer dos oitocentos, integrou
as diversas práticas de instaurar o novo no que se referiam as normas da produção
artística. O objetivo era buscar a “cor local”, mostrando a variedade e as especificidades
de cada povo dentro do país.
Esse novo gênero teatral rompeu com o classicismo, sua racionalidade e
funcionalidade. Assuntos delicados de serem tratados em público, até então, passaram a
ser explorados pelo teatro romântico. O adultério, o estupro, o incesto escandalizaram,
num primeiro instante, aquelas pessoas que assistiam aos espetáculos. Porém, a lotação
dos teatros demonstrou que a poética romântica, sem princípios ou normas rígidas,
estava sendo entendida. Permitia-se que o teatro tocasse em assuntos proibidos. O
Romantismo não defendeu, mas também não condenou nenhum dos assuntos tratados,
deixando no ar as possibilidades perturbadoras, as sugestões tentadoras e maléficas
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Martins Pena foi um grande representante desse romantismo mais realista, e
como tantos outros que se disseram românticos, buscava um teatro essencialmente
nacional. Sobre ele, José Veríssimo diria:
“E Martins Pena não é senão isto, um escritor de teatro. Do autor dramático
possui em grau de que se não antolha outro exemplo na nossa literatura, as qualidades
essenciais ao ofício e ainda certos dons, que as realçam: sabe imaginar ou arranjar
uma peça, combinar as cenas, dispor os efeitos, travar o diálogo, e tem essa espécie de
observação fácil, elementar, corriqueira e superficial, mas no caso preciosa, que é um
talento do gênero. Não raro tem o traço psicológico do caricaturista, e o jeito de
apanhar o rasgo significativo de um tipo, de uma situação, de um vezo. Possui veia
cômica nativa, espontânea e ainda abundante, infelizmente, porém (defeito desta
mesma virtude) com facilidade de se desmandar na farsa. Martins Pena e Manuel de
Almeida, o singular e malogrado autor das “Memórias de um sargento de milícias”,
são porventura os melhores, senão os únicos, exemplos de espontaneidade literária que
apresenta a literatura brasileira. A maior parte das peças de Martins Pena são antes
farsas que comédias. Independentemente dessa denominação, que ele próprio lhes deu,
a sua feição e estilo é de farsa. Ele exagera o feitio cômico das situações e
personagens, acumula o burlesco sobre o ridículo, manifestamente no intuito de melhor
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PRADO, Décio de Almeida. O teatro romântico: a explosão de 1830. Apud: GUINSBURG, J. . O
Romantismo. 2 edição. São Paulo: Editora perspectiva, 1985, p. 178.