Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
Katya Rizzon
ANÁLISE DA LINGUAGEM MATEMÁTICA RELACIONADA À GEOMETRIA ANALÍTICA DO ENSINO MÉDIO
Porto Alegre
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
KATYA RIZZON
ANÁLISE DA LINGUAGEM MATEMÁTICA RELACIONADA À
GEOMETRIA ANALÍTICA NO ENSINO MÉDIO
Porto Alegre
2008
ads:
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Alessandra Pinto Fagundes
Bibliotecária
CRB10/1244
R627a
Rizzon, Katya
Análise da linguagem matemática à geometria analítica
do ensino médio. Porto Alegre, 2008.
73 f.
Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e
Matemática) - PUCRS, Fac. de Física.
Professor orientador: Dr. Maurivan Güntzel Ramos.
1. Educação - Matemática 2. Geometria analítica –
Ensino Médio. I.Título.
CDD: 372.7
516.3
KATYA RIZZON
ANÁLISE DA LINGUAGEM MATEMÁTICA RELACIONADA À
GEOMETRIA ANALÍTICA NO ENSINO MÉDIO
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre
pelo Programa de Pós-graduação da
Faculdade de Educação em Ciências e
Matemática da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovada em ___ de ___________________ de 2008
BANCA EXAMINADORA
Profª. Dr. Claudia Lisete Oliveira Groenwald
Prof
a
. Dr. Ruth Portanova
Prof. Dr. Maurivan Güntzel Ramos
Dedico o presente trabalho à minha família, em especial
ao meu marido Jeferson, que me incentivou e participou
do meu crescimento intelectual, e a meus filhos Tanise e
José Dinarte, que me apoiaram com suportes
tecnológicos e afetivos e que são a principal razão do
meu viver.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus professores, que foram modelos referenciais na minha
formação educacional e na prática da sala de aula. Em especial, aos professores do
curso de Mestrado, pela dedicação e inspiração para reconstruir minha formação
profissional e atualização da minha prática educativa. O encaminhamento das
reflexões qualificadas dos temas da educação direcionou-me a novas descobertas
sobre os valores da linguagem matemática na aprendizagem da sala de aula.
Ao meu orientador Dr. Maurivan ntzel Ramos, agradeço de modo especial,
pelo incentivo e dedicação, bem como pela compreensão das minhas limitações na
construção deste trabalho. Sua competência, seu conhecimento, sua simplicidade e
sua objetividade foram fatores que contribuíram para incentivar a conclusão deste
trabalho. Os comentários e encaminhamentos críticos sobre este estudo e o
compartilhar da sua experiência e seu conhecimento influenciaram
significativamente minha maneira de pensar a educação. Assim, devo-lhe todo meu
respeito e admiração para sempre. O privilégio de ter realizado este trabalho de
investigação na educação matemática é o resultado da dedicação, do empenho e do
compartilhar idéias com meu orientador.
Não poderia deixar, também, de agradecer:
– pelo grande incentivo de meu pai, minha mãe, irmãs, cunhados, compadre e
comadres que apoiaram este momento de aperfeiçoamento intelectual, com muita
paciência e respeito;
pelo apoio dos colegas de mestrado, que contribuíram nas discussões de
temas da educação, durante dois anos. Dois colegas, em especial, destacam-se
nesta trajetória: Gláucia, pelo incentivo nos momentos difíceis, e Ambrósio, por
acreditar na conclusão deste trabalho.
Da mesma maneira, manifesto profundo agradecimento aos meus
coordenadores, que me ouviram, apresentaram sugestões e possibilitaram a coleta
dos dados para esta investigação.
Este singelo agradecimento estende-se também aos alunos com os quais tive
a grata satisfação de conviver ao longo da minha atividade docente e que
influenciaram o caráter epistêmico cunhado em minha investigação sobre a
linguagem matemática na sala de aula. Eles propiciaram a aplicação de uma
5
metodologia que valorizasse a relação horizontal professor–aluno, a partir dos
conhecimentos tácitos dos educandos, agregando uma linguagem acessível aos
conteúdos matemáticos, a fim de construir e reconstruir o conhecimento científico no
processo de aprendizagem.
Muitas outras pessoas poderiam estar aqui relacionadas, por isso, peço
perdão a todos aqueles que não foram citados neste singelo espaço.
RESUMO
Este estudo teve como objetivo investigar os conteúdos matemáticos aprendidos
pelos alunos de três turmas do 3
o
ano do Ensino Médio de uma escola particular, da
cidade de Porto Alegre/RS, após a realização de uma Unidade de Aprendizagem
(UA) sobre geometria analítica. O problema desta pesquisa tem por base a seguinte
pergunta: Como os alunos aplicam a linguagem matemática na interpretação de
questões sobre geometria analítica em uma escola do ensino médio? Por
conseqüência, o objetivo central do trabalho foi identificar e analisar conteúdos
matemáticos lembrados e não lembrados pelos alunos após a realização da UA
sobre geometria analítica, bem como compreender o modo como aplicam a
linguagem matemática na resolução de questões. Para isso, foram analisados os
dados coletados por meio de relatórios elaborados pelos alunos sobre a resolução
de questões sobre geometria analítica, identificando os conteúdos presentes e
comparando-os com os esperados pelo professor. A meta foi desenvolver uma
metodologia para o desenvolvimento do conteúdo de geometria analítica,
identificando após os conteúdos matemáticos presentes em questões relacionadas
ao tema, extraídas de concursos vestibulares. Ao término do trabalho, foi possível
identificar que conteúdos estão mais presentes na aprendizagem dos alunos, bem
como quais são os mais complexos, principais responsáveis pelas dificuldades de
aprendizagem. Foi possível também constatar que, após a UA, os alunos passaram
a utilizar linguagem matemática com maior autonomia e com mais significado na
resolução de outras questões de conteúdos matemáticos.
Palavras-chave: Educação Matemática. Geometria Analítica. Conteúdos
Matemáticos. Linguagem Matemática.
ABSTRACT
The purpose of this study is to investigate the Mathematical concepts learned by
three groups of students attending the 3rd grade in a private high school in Porto
Alegre, Rio Grande do Sul, after performing a Learning Unit (LU) about Analytic
Geometry. The problem of this research is based on the following question: What are
the students’ main leaning difficulties in Analytic Geometry related to Mathematics
Language? How do the students apply the mathematical language in the
interpretation of questions about analytical geometry in a school of the medium
teaching? As a result, the main objective of this project was to identify and analyze
mathematical concepts that students remind and the ones they don’t, after a
Learning Unit about Analytic Geometry, in order to understand the main learning
difficulties related to Mathematics language applied by students and teachers in
class. Then, the collected data were analyzed based on reports written by the
students about problem solutions, identifying the present concepts and comparing to
the ones expected by the teacher. The aim was to develop a methodological
approach to the Analytic Geometry content, identifying after the mathematical
concepts presented in questions from College entrance examinations related to the
subject. It was possible to identify the most presented concepts in the students
learning as well as the most complex ones, the main responsible for learning
difficulties. After a Leaning Unit, it was also possible to notice that students started
applying Mathematics language with more autonomy and significance to solve other
mathematical problems.
Keywords: Mathematical education. Analytical Geometry. Mathematical Concepts.
Mathematical Language.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 08
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO ................................... 10
3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS .................................................................. 14
3.1 MODELOS METODOLÓGICOS ............................................................... 15
3.1.1 Modelo Tradicional ..................................................................................... 15
3.1.2 Modelo Comportamentista ......................................................................... 16
3.1.3 Modelo Humanista ..................................................................................... 17
3.1.4 Modelo Cognitivista .................................................................................... 17
3.1.5 Modelo Sociocultural .................................................................................. 18
3.2 PROCESSO DE APRENDIZAGEM E LINGUAGEM ................................ 19
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................. 25
4.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA DA PESQUISA ................................... 25
4.2 CONTEXTO E SUJEITOS DA PESQUISA ............................................... 27
4.3 A UNIDADE DE APRENDIZAGEM (UA) ................................................... 29
4.4 DIFICULDADES NA UNIDADE DE APRENDIZAGEM .............................. 35
4.5 PROCEDIMENTOS DA COLETA DE DADOS ......................................... 37
5 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS .................................................... 41
5.1 ANÁLISE DA PRIMEIRA QUESTÃO ......................................................... 41
5.2 ANÁLISE DA SEGUNDA QUESTÃO ......................................................... 48
5.3 ANÁLISE DA TERCEIRA QUESTÃO ........................................................ 54
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 62
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 64
APÊNDICES ......................................................................................................... 68
APÊNDICE A – I ÀREA DO TRIÂNGULO ........................................................... 68
APÊNDICE B – II ÁREA DO TRIÂNGULO .......................................................... 69
8
1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa está relacionada à Educação Matemática e trata sobre os
principais problemas de aprendizagem no que tange ao tema geometria analítica,
associado à linguagem matemática no Ensino Médio. Os problemas de
aprendizagem o analisados a partir de dados coletados durante etapas da
Unidade de Aprendizagem (UA) sobre esse tema. São identificados conteúdos
matemáticos mais lembrados e os não lembrados pelos alunos comparados aos
esperados pelo professor.
O contexto desta pesquisa é uma escola particular de Ensino Médio, do
Município de Porto Alegre, no qual estão envolvidos a responsável pela pesquisa e
três turmas de 3
o
ano, totalizando em torno de cem alunos.
Para o desenvolvimento deste trabalho, foram pesquisados autores e
estudiosos dos fundamentos teóricos sobre a UA, os conteúdos da geometria
analítica, os processos associados à aprendizagem e às dificuldades em relação ao
tema referido. O estudo teórico contribuiu para a compreensão do objeto de estudo.
A presente pesquisa está constituída dos seguintes capítulos: o primeiro,
“Contextualização e Problematização”, versa sobre breve narrativa e justificativa das
observações vivenciadas pelo trabalho docente, a partir da averiguação dos
conteúdos matemáticos desenvolvidos na sala de aula e das dificuldades de
interpretação e de aplicação em novas situações escolares do Ensino Médio; o
segundo, ”Fundamentos Teóricos”, busca dar sustentação à pesquisa; o terceiro,
”Procedimentos Metodológicos”, descreve os procedimentos aplicados para a coleta
dos dados, contextualiza o ambiente pesquisado e os sujeitos envolvidos, bem como
descreve os momentos de cada etapa da UA desenvolvida com os grupos; o quarto,
”Análise dos Dados”, apresenta o resultado na análise de três questões
desenvolvidas pelos alunos; o quinto, ”Considerações Finais”, apresenta respostas
ao problema de pesquisa.
Para efetivar a pesquisa, foram desenvolvidas etapas que envolvem a UA
sobre geometria analítica em sala de aula e, a partir dessa Unidade, foram coletados
dados relativos à aprendizagem dos alunos com base em questões sobre o tema.
9
Desse modo, a análise dos relatórios dos alunos, organizados em grupos,
indicou os principais modos empregados, por meio da linguagem matemática, na
interpretação das questões de geometria analítica no Ensino Médio.
10
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO
Desde muito cedo eu ouvia falar da escola como o meio mais seguro e
importante para nos tornarmos cidadãos capazes de participar da sociedade de
maneira responsável e autônoma. Foi no ambiente escolar que a inspiração da
figura do professor competente, singelo e responsável fez-se modelo do que escolhi
seguir. Esse modelo é o referencial maior que caracteriza a escolha da minha
caminhada profissional.
Escolher modelos e determinar metas para o futuro é o que todo jovem
precisa internalizar, tanto na família quanto no ambiente escolar ao qual pertence e
que freqüenta por muitas horas de seu dia-a-dia durante alguns anos da vida. No
meu caso, a imagem de professor ideal estava fortemente ligada ao prazer e à
dedicação com que explicava os conteúdos, às atitudes docentes e à simplicidade
com que se relacionava com seus alunos. Esse modelo de professor, a meu ver,
orientava uma organização de estudos e aplicações das aprendizagens em nossa
vida futura, pois era responsável por nossa formação naquele momento. Essas
orientações motivaram-me para a resolução de problemas, pois, desde aquela
época, muitos colegas apresentavam dificuldades nas aprendizagens dos conteúdos
de Matemática, disciplina repleta de conteúdos, definições e teoremas, que são
aplicáveis em diversas problematizações. Observava a atitude, as linguagens e os
procedimentos metodológicos utilizados pelo professor para, posteriormente, repeti-
las aos colegas do melhor modo possível. Dessas repetições ou ensaios foi
desenhado um perfil de professora de Matemática, que demonstra cada vez mais
preocupações com as aprendizagens e não aprendizagens dos alunos. Esses
extremos são fontes de motivação e desafio a cada momento em que me encontro
em uma sala de aula, pois a relação do professor no processo ensino-aprendizagem,
por meio da linguagem falada e escrita, deve ser refletida e repensada. Acredito na
existência de uma linguagem matemática com implicações históricas, políticas e
afetivas constituídas de maneira clara, consistente e objetiva, capaz de contribuir
para a resolução de problemas do cotidiano dos estudantes.
Nesse sentido, a linguagem, como fundamental recurso do professor para
interagir com os alunos na sala de aula, é instrumento social de grande relevância
no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Desse modo, as definições
11
dos conteúdos matemáticos e o desenvolvimento desses conteúdos necessita ser
orientado por meio de uma linguagem e de uma metodologia adequada para que
sejam efetivamente aprendidos. O contrário acarreta sérios problemas para os
alunos. Refiro-me ao modo de tratamento dos conteúdos de Matemática quando de
forma expositiva e acompanhada de uma linguagem excessivamente técnica e
formal, descontextualizada e inacessível ao aluno, pela qual o professor apresenta a
fórmula e diz como deve ser feito. O que é criticável é o professor que apresenta o
exemplo de forma genérica e utiliza variáveis para demonstrar o cálculo, cercando-
se de um formalismo exagerado, reforçando o seu poder de centralizador do saber.
Tal situação expõe a possibilidade do surgimento de várias dificuldades de
aprendizagem por parte dos alunos, uma vez que se trabalhou com grupos
heterogêneos em sala de aula, tanto em relação à idade cronológica quanto às
estruturas mentais que deles se esperavam, nas quais demonstraram que, por
vários motivos, não se encontravam preparados para desenvolvê-las.
Presenciei o relato de um colega de Matemática que ministra aulas para um
grupo de alunos que se preparavam para o vestibular de 2007 o qual menciono
neste texto por ser de interesse para uma reflexão. Mostrando-se envaidecido em
ser o centralizador do saber, comentou que um dia entrara na sala de aula de
maneira séria e com um livro de Matemática bastante pesado. Abrira o material e
indagara os alunos: “Paramos a revisão no momento em que eu comentaria sobre o
Teorema de D’Alembert
1
. É isso?”. Recebera a confirmação e seguira sua exposição
“séria” e “segura”, ressaltando que, como alunos que haviam concluído o Ensino
Médio, não poderiam ter dúvidas quanto à aplicação desse teorema. Então,
questionara os alunos se seria possível revisar o conteúdo sobre Probabilidade.
Relatou que o silêncio respondera por si, começando, assim, a revisão de
Probabilidade, pois estava atrasado com a seqüência dos conteúdos propostos.
Com esse exemplo, espero contribuir para a reflexão da atitude do professor
como detentor do saber e que está condicionado a reprimir qualquer inspiração de
participação ou incentivo à aprendizagem de conteúdos matemáticos atitude com
a qual não compartilho. Por isso, acredito em processo metodológico que oportunize
a participação e valorize os conhecimentos empíricos dos alunos, a fim de
1
Refere-se ao conteúdo “polinômios”.
12
encaminhá-los para uma aprendizagem significativa, que parta dos conhecimentos
prévios em direção a novos conhecimentos, mais complexos.
Assim, os novos conteúdos explorados por meio de explicações são
processos de interpretações dos fenômenos, transformados em representações
internas. Essas interpretações deveriam ser possivelmente aplicadas em situações
relacionadas ao contexto. Quando sofrem rupturas, em algumas das etapas,
conduzem o aluno a dificuldades de aprendizagem. Se o processo não é
interrompido, oportuniza aprendizagem com significado. Essas rupturas no processo
de aprendizagem podem ter relação com a linguagem ou com a atitude inadequada
do professor. Isso dificulta a interpretação das mensagens. Nesse caso, o professor
não está cumprindo com o seu papel de mediador do processo e não está sendo
competente, segundo a definição de Demo (2002)
2
.
Para buscar essa competência, tenho procurado momentos de qualificação e
buscado observar as dificuldades de cada grupo de trabalho. Essas situações
enriquecem a minha vida profissional, explicam o comportamento epistêmico que
assumo e confortam a mim e a outros professores que tenham sido despertados
para investigar as dificuldades dos alunos na aprendizagem da Matemática com
suas possíveis causas. Essas “reflexões” estão diretamente relacionadas com a sala
de aula, pois, de acordo com as minhas observações, os alunos que participam de
novas propostas metodológicas demonstram dificuldades menores de
aprendizagem, em relação aos alunos que o passaram por essas vivências. O
professor, no entanto, deve estar preparado, sentindo-se competente para orientar
os alunos por meio de uma linguagem adequada ao contexto, tendo objetivos de
trabalhos bem definidos na tentativa de diminuir sua insegurança e a de seus
alunos. Isso se na interação com o aluno em um ambiente próprio e com uma
linguagem acessível ao processo de aprendizagem.
O professor que repensa a sua prática está refletindo sobre o processo de
ensino e de aprendizagem. Ele procura pesquisar, reconstruir e organizar os
conhecimentos inserindo-os em um contexto, pois o feixe de informações e
conhecimentos fragmentados que “transmitimos” pode levar o aluno ao processo de
não aprendizagem, uma vez que “[...] os conhecimentos fragmentados servem
2
Demo (2002) afirma que o professor competente não é aquele que acredita no conhecimento
estocado e centralizado, mas aquele que se envolve em desafios de saber pensar e do aprender a
aprender: “O profissional, portanto, não é aquele que apenas executa sua profissão, mas sobretudo
que sabe pensar e refazer sua profissão.” (DEMO, 2002, p. 68)
13
para usos técnicos”, como afirma Morin (2003, p.17). Não será dessa forma que
oportunizaremos o ambiente de repensar e o de aprender a aprender. Assim,
refletimos, com Morin, que afirma ser necessário “alimentarmos” nossos
pensamentos, a fim de participarmos com consciência da vida, do mundo, do nosso
saber e de enfrentarmos os desafios que ainda estarão por vir.
Contudo, compreender as implicações históricas, políticas, afetivas e
cognitivas da linguagem na interpretação de conteúdos matemáticos aplicados na
resolução de questões é o que proponho pesquisar, assumindo o seguinte
problema: Como os alunos aplicam a linguagem matemática na interpretação
de questões sobre geometria analítica em uma escola do ensino médio?
Desse modo, o objetivo central do trabalho é identificar e analisar conteúdos
matemáticos lembrados e não lembrados pelos alunos após a realização de uma UA
sobre geometria analítica, com vistas a compreender as principais dificuldades de
aprendizagem associadas à linguagem matemática empregada pelos alunos em
comparação com a do professor.
Os objetivos específicos da investigação são:
desenvolver uma UA sobre geometria analítica;
propor aos alunos a análise de problemas matemáticos para identificar
conteúdos dessa área;
averiguar os relatórios dos alunos sobre o trabalho realizado com os
problemas matemáticos;
identificar os conteúdos que são mais lembrados pelos alunos e os que
não são lembrados, comparados aos conteúdos esperados pelo
professor; e
analisar os resultados.
O desenvolvimento deste trabalho e as conseqüentes reflexões sobre o tema
contribuem para indicar melhorias necessárias em relação ao ensino desse
conteúdo de Matemática no Ensino Médio.
14
3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS
A aprendizagem em Matemática relaciona-se à leitura e à interpretação de
conteúdos matemáticos que estão implícitos nos enunciados dos problemas
escolares ou de situações do dia-a-dia. A linguagem é, pois, um dos instrumentos
que o professor e o aluno utilizam para pesquisar e estabelecer relações entre
conteúdos matemáticos e a reconstrução do conhecimento. O conhecimento
empírico somado aos conteúdos que são estudados pelo aluno contribui para a
interpretação de signos e termos específicos.
Nesse sentido, para Vygotsky (1987, p. 44) “o desenvolvimento do
pensamento é determinado pela linguagem, isto é, pelos instrumentos lingüísticos do
pensamento e pela experiência sociocultural da criança.” O crescimento intelectual
depende, pois, do “domínio dos meios sociais do pensamento” que é a linguagem,
complementa Vygotsky.
Esse recurso lingüístico é vital para todo o ser humano, pois, desde criança
até a idade mais avançada, a linguagem é necessária nas relações. É de se
imaginar a relevância da linguagem nos processos educativos. Questionamentos
organizados logicamente, por meio de processos comunicativos, em ambientes
apropriados, com a mediação adequada do professor favorecem aprendizagens
significativas para os alunos.
O principal protagonista do processo de aprendizagem é o próprio aluno, que
pensa e é capaz de iniciativas, quando participa integralmente das atividades
propostas pelo professor. É importante que este valorize a autonomia dos alunos por
meio da ação, da argumentação e da reflexão permanente sobre as aprendizagens.
A UA pode ser entendida como um procedimento metodológico, por meio da
pesquisa, que pode ser empregado para o ensino e a aprendizagem de conteúdos
matemáticos, entre os quais os relacionados à geometria analítica. A pesquisa na
sala de aula ocorre por meio do questionamento, da reconstrução de argumentos e
da comunicação dos novos conteúdos (MORAES et al., 2004). Desse modo, pode-
se potencializar a participação do aluno, a fim de problematizar uma situação real,
questionar por meio de uma linguagem adequada e encaminhar para a reconstrução
dos argumentos matemáticos e de sua comunicação ao grupo. O professor, no
15
entanto, aplica a UA a partir de suas teorias pessoais, que caracterizam a sua ação
profissional.
Sendo assim, segundo Bocchese (2002), o modo como o professor realiza
seu trabalho, seleciona os conteúdos, desenvolve os procedimentos de ensino e de
avaliação tem a ver com seus pressupostos teóricos e metodológicos, embora,
muitas vezes, eles não sejam claros para os docentes.
As ações do professor são orientadas por teorias pessoais que se aproximam
de modelos metodológicos Esses modelos nem sempre são assumidos pelo
professor, pois, em geral, o professor não tem consciência deles. Na medida em que
o professor reflete sobre a sua prática, vai tendo essa consciência, e pode-se
observar uma evolução de sua prática, de modelos mais simples para mais
complexos. Isso ocorre com desde aquele professor que recentemente saiu dos
“bancos acadêmicos” até aquele que já repensa seu trabalho e procura outra
maneira de contribuir para o processo de aprendizagem.
A seguir, são apresentados os modelos metodológicos, também denominados
de didáticos, à luz, principalmente, dos autores Mizukami (1987) e Porlán (1996).
3.1 MODELOS METODOLÓGICOS
Os modelos metodológicos não são meras receitas ou técnicas puras de
como desenvolver e mediar os conteúdos. Esses modelos metodológicos integram-
se com a história de vida, com as ideologias e as posições epistemológicas dos
professores. Refletem a profissionalização e o desenvolvimento de competências
docentes. O professor possui o discurso, a linguagem e suas teorias implícitas, que
são fatores que influenciam as tendências pedagógicas utilizadas por ele na sala de
aula.
3.1.1 Modelo Tradicional
Segundo Mizukami (1987), a abordagem tradicional tem a pretensão de
conduzir o aluno ao contato com as grandes realizações da humanidade.
Privilegiam-se o especialista e os modelos. Nesse caso, o professor é elemento
16
imprescindível na transmissão de conteúdos, utilizando uma linguagem formal e
pouco acessível ao aluno.
O aluno adquire o conhecimento, executa o que lhe é indicado e memoriza
definições, enunciados de leis, sínteses e resumos que lhe são oferecidos. A
linguagem estimula a repetição das definições memorizadas em aula expositiva e
nas demonstrações do professor para os alunos.
Segundo Porlán (1996), o modelo tradicional se caracteriza pela transmissão
direta dos conteúdos, explicação do professor, estudo do livro-texto e realização de
exercícios. O tempo é determinado, e são utilizados poucos recursos didáticos. A
aula é expositiva e dialogada, e a ênfase é dada ao trabalho individual. A linguagem
formal é pouco acessível aos alunos. Valoriza a cópia, não fomenta o raciocínio e
contempla a reprodução de idéias. Especificamente em Matemática, os alunos
utilizam a mecanização, por meio de vários exercícios de sistematização com
mesmo nível de compreensão, não possibilitando o desenvolvimento da abstração.
É um modelo pedagógico que fomenta a centralização do saber no professor
e de ser o foco do processo ensino-aprendizagem, não se preocupando com a
compreensão do aluno. Incentiva a cópia e a repetição dos conteúdos
desenvolvidos.
3.1.2 Modelo Comportamentista
Para Mizukami (1987), essa abordagem tem, nos comportamentistas ou
behavioristas e os positivistas lógicos, considerações na experiência ou a
experimentação planejada como a base do conhecimento. Segundo Skinner,
idealizador dessa teoria, “é quase impossível ao estudante descobrir por si mesmo
qualquer parte substancial da sabedoria de sua cultura” (SKINNER, In Mizukami
1968, p. 110).
Nessa abordagem, a aprendizagem é garantida pela sua programação de
objetivos, controle de comportamentos, feedback constante, fornecendo elementos
que indiquem o domínio de habilidades. ênfase na instrução programada, que é
passada por meio de unidades de exercícios para o desenvolvimento de habilidades
culturais.
Segundo Porlán (1996), que denomina essa metodologia de modelo
tecnológico, ela se caracteriza pela investigação rígida do método científico
17
empirista. seqüência escalonada de atividades, e o tempo é determinado. A
linguagem é instrumento de orientação dos passos rígidos para resolver as
atividades. Os recursos apresentados são impostos, e não preocupação com a
adequação do conteúdo à realidade dos alunos. Não incentiva a compreensão, pois
a linguagem é formal e técnica. Os conteúdos são apresentados, fazendo com que
os alunos os decorem. Exigindo a apresentação dos conteúdos, por meio da aula
expositiva e com uma linguagem formal e genérica, não se preocupa com a
compreensão significativa dos conteúdos e definições explorados.
3.1.3 Modelo Humanista
Mizukami (1987) afirma que a abordagem humanista propõe que o aluno
desenvolva seu conhecimento sem intervenções, dando ênfase às relações
interpessoais e ao crescimento que delas resulta. A linguagem é acessível,
respeitando as experiências dos sujeitos e as relações interpessoais. É centrado no
desenvolvimento da personalidade do indivíduo, em seus processos de construção
cultural, no qual expressa sua linguagem própria como fator de relação entre aluno e
professor. O professor assume a função de facilitador da aprendizagem. Com
linguagem adequada e própria para o contexto escolar, incentiva a descoberta de
novos conhecimentos. Isso implica aceitar o aluno tal como ele é e compreender os
sentimentos que possui. Valoriza a troca de experiências por meio da linguagem
contextualizada, favorecendo a aprendizagem significativa.
Porlán (1996), que denomina esse modelo como espontaneísta, afirma que é
baseado no erro. Predomina o trabalho em grupo, para estimular a integração de
conhecimentos, por meio da linguagem. Não se preocupa com o tempo do
aprendizado. Vários recursos são apresentados de forma natural, ou seja, laissez-
faire. É um modelo em que os educandos ficam muito livres, podendo interagir por
meio de diferentes níveis de linguagens para buscar novos saberes. As descobertas
são a partir de questões colocadas pelo grupo. E, assim, a linguagem torna-se um
dos instrumentos fundamentais para a comunicação entre os integrantes dos grupos
e de suas explorações culturais.
18
3.1.4 Modelo Cognitivista
Segundo Mizukami (1987), a abordagem cognitivista tem como característica
fundamental a inteligência que se constrói a partir da troca do aluno com o meio, em
um processo ativo. Tem, portanto, como centro, a ação do indivíduo. Assim,
destaca-se o fator social ou educativo que constitui uma condição para o
desenvolvimento do educando. Essa abordagem a linguagem como uma ação
utilizada para efetuar as trocas entre os grupos. A linguagem empregada é
acessível, pois deve propiciar a troca e incentivar novas ações.
Na abordagem cognitivista, a ênfase é para o conhecimento: tudo o que se
aprende é assimilado por uma estrutura existente e provoca uma reestruturação
na aprendizagem.
3.1.5 Modelo Sociocultural
Segundo Mizukami (1987), nessa abordagem, o conhecimento está
relacionado ao processo de conscientização, elaborado e criado a partir da mútua
relação entre pensamento e prática. Essa abordagem tem o objetivo de provocar e
criar condições para que se desenvolva uma atitude de reflexão crítica,
compreendida como a ação estimulada por meio de um contexto. No processo, o
professor é também aluno; e, por sua vez, o aluno é também professor. A relação
professor-aluno é horizontal e não imposta, estando o professor no papel de
orientador do processo ensino-aprendizagem. A linguagem é adequada e acessível,
a fim de compartilhar experiências e contribuir na compreensão, interpretando a
resolução do resultado obtido com a aprendizagem.
Segundo Porlán (1996), esse modelo é chamado de investigativo e se
caracteriza pela perspectiva construtivista. As atividades o flexíveis, com
mediação planejada, trabalho individual e grupal. vários recursos didáticos,
muitos dos quais partem dos alunos, pois é incentivada a participação e a discussão
em grupo. Esse modelo valoriza o crescimento intelectual de alunos e professores.
Incentiva aos alunos que desenvolvam algoritmos próprios, procurando educar de
forma humanista e oportunizando um reconstruir expressivo.
19
O professor contribui, portanto, para o desenvolvimento intelectual do aluno,
reestruturando modelos metodológicos que considerem o contexto ao qual esse
aluno pertence, seus conhecimentos empíricos e seu interesse pelo conhecimento
científico.
3.2 PROCESSO DE APRENDIZAGEM E LINGUAGEM
Os pressupostos teóricos deste estudo em relação ao processo de
aprendizagem têm base no pensamento de Vygotsky e colaboradores (1988, 1997),
na abordagem sócio-histórica que envolve os seguintes aspectos: mediação,
processos elementares e superiores, zona de desenvolvimento proximal e formação
de conteúdos.
Segundo Vygotsky (1997), o processo de internalização de significados é
mediado, cultural e simbolicamente. Ele conduz à formação de conteúdos de
naturezas diferentes daqueles aprendidos na vida cotidiana. Nela, o processo de
internalização ocorre em etapas de aprendizagem mediadas por uma linguagem que
provoca transformações nos sujeitos.
A mediação interpreta intervenções para auxiliar na aprendizagem, sendo a
linguagem um elemento importante nesse processo. Na mediação em sala de aula,
o professor utiliza a linguagem como instrumento nas interferências que realiza no
grupo de alunos. Essas interferências também estão associadas a modelos
metodológicos assumidos, que refletem suas atitudes subjetivas na escolha do
conteúdo, nas orientações e no planejamento dos conteúdos a serem trabalhados.
La Rosa (2003), no entanto, ressalta que, “para Vygotsky, os seres humanos se
relacionam com o mundo por meio de uma relação mediada, e não direta” (LA
ROSA, 2003, p.132), dando a entender que, para cada relação estabelecida, há uma
ação mediadora.
As relações professor-aluno e aluno-aluno pautam-se por meio das ações,
isto é, as mediações do professor o desenvolvidas em processos que instigam o
aluno a repensar ou refletir sobre novos conteúdos. Esses processos desenvolvem-
se na Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), que é “a distância entre o nível real
(da criança) de desenvolvimento determinado pela resolução de problemas
independentemente e o nível de desenvolvimento potencial determinado pela
20
resolução de problemas sob a orientação de adultos ou em colaboração com
companheiros mais capacitados” (VYGOTSKY, 1984, p. 97).
Esses estímulos interferem em zonas nas quais são processados e
interpretados os conhecimentos. As zonas se desenvolvem por meio da linguagem,
em processos culturais e sociais entre as pessoas. Como instrumento, a linguagem
estimula positiva ou negativamente o aprendizado do aluno, respectivamente
associada ao nível que está sendo utilizada, conforme as palavras de Malta (2004):
[...] em Matemática, o aprender a ler e se expressar são elementos da zona
de desenvolvimento proximal que precede o desenvolvimento real do
pensamento e do conhecimento matemático. (MALTA, 2004, p. 49)
Nesse contexto, a escola que se mostra como espaço para integração e
desenvolvimento dos estímulos nas zonas de desenvolvimento proximal, por meio
da linguagem, integra professor-aluno e aluno-aluno em uma estrutura de respeito e
desenvolvimento na busca da significação dos saberes.
A ação do professor, como mediador nos processos elementares e
superiores, visa a oportunizar ao aluno situações de aprendizagem. Os processos
mentais são elementares quando são controlados pelo meio (atenção involuntária,
memória de reconhecimento) e os superiores, quando são resultados das forças
sociais (regulação voluntária e processo mental consciente estimulado pelas ações
da mediação).
No exercício do aprender a aprender, as relações entre professor-aluno e
aluno-aluno buscam aprendizagens significativas durante os processos elementares
e, principalmente, superiores. “Aprender a aprender envolve a curiosidade,
característica que revela uma inteligência aberta à realidade, a qual é inesgotável,
seja ela física, biológica ou sóciocultural.” (LA ROSA, 2003, p. 19). Por exemplo, se
o aluno reconhece o sistema cartesiano
3
por ações mediadoras, desenvolve o
conteúdo matemático de ponto (x, y), que corresponde aos eixos orientados desse
plano cartesiano.
As ações mediadoras orientam o processo de aprendizagem. O professor
observa os enunciados e interpretações para auxiliar na compreensão dos termos
3
Plano Cartesiano é um sistema composto por um par de retas perpendiculares. A reta horizontal é
chamada de eixo x, eixo das abscissas ou Ox. A reta vertical é o eixo y, eixo das ordenadas ou Oy. A
origem do sistema cartesiano é o ponto O, que tem abscissa e ordenada zero. Os eixos x e y dividem
o plano em quadrantes, no sentido anti-horário. A origem do sistema cartesiano é o ponto O, que tem
abscissa e ordenada zero.
21
matemáticos e nos movimentos seguintes voltados à pesquisa, ao aprender e à
aplicação em outras situações. Os avanços em termos de conhecimentos e atitudes,
nos processos de comunicação e na capacidade de argumentação, bem como nas
relações socioculturais consistem em aprendizagens significativas.
O ambiente escolar onde se desenrola a integração social entre professor-
aluno e aluno-aluno, por meio da linguagem, incentiva e motiva as relações
interpessoais, buscando o equilíbrio entre a utilização adequada de linguagens e as
aprendizagens significativas no contexto escolar. Libâneo (2003) sustenta que os
valores éticos e o envolvimento em questões solidárias são fundamentais no
ambiente e no currículo escolar: “a escola precisa ajudar os alunos a pensar
metodicamente sobre valores, os alunos podem aprender e vivenciar conteúdos
morais e modos de agir” (LIBÂNEO, 2003, p. 26).
Para que haja mudanças significativas em termos de aprendizagem, é
necessário que o aluno se sinta respeitado no seu ritmo, com vontade e desejo de
aprender, pois a aprendizagem só ocorre se o aluno também estiver envolvido com o
conhecimento e valorizado em sua atuação.
Oferecer um ambiente com boa iluminação, acomodações e boa ventilação
podem também contribuir para uma boa aprendizagem. É importante que os
aspectos físico, psíquico, ambiental e social também estejam em equilíbrio para que
ocorram aprendizagens significativas, o que, em geral, não se evidencia.
A linguagem, tanto falada quanto escrita, é uma ferramenta imprescindível na
relação entre professor e aluno, nas mediações na sala de aula. Vygotsky e
colaboradores esclarecem a importância da linguagem como meio de interação:
Inicialmente, os aspectos motores e verbais do comportamento são
misturados. A fala envolve os elementos referenciais, a conversação
orientada pelo objeto, as expressões emocionais e outros tipos de fala
social. Em virtude de a criança estar cercada de membros mais velhos da
família, a fala começa, cada vez mais, a adquirir traços demonstrativos, o
que permite que a criança indique o que está fazendo e quais são suas
necessidades. Após algum tempo, a criança, fazendo distinções para os
outros com auxilio da fala, começa, internamente, a fazer distinções para si
mesma. Desta forma, a fala deixa de ser apenas um meio para dirigir o
comportamento dos outros e começa a desempenhar a função de
autodireção. (VYGOTSKY; LURIA; LEONTIEV, 1988, p. 30)
evidências, no modelo metodológico investigativo, segundo Porlán (1996),
de que aspectos afetivos permeiam a linguagem, sejam eles positivos ou negativos.
22
Os sentimentos regulam a espontaneidade da linguagem, pois definem a relação
entre o professor-aluno e aluno-aprendizagem.
Assim, a pluralidade de sentimentos faz com que o professor reflita, busque
outros processos metodológicos nos quais possam juntos, professor e aluno,
“aprender a aprender” em um ambiente que favoreça a pesquisa e todo tipo de
mediação por meio da interpretação, leitura e linguagem.
Para Vygotsky (1997), a linguagem falada é a comunicação com o mundo
externo, no qual professor e aluno demonstram suas ações e liberam as tensões nas
interações sociais. Morin (2001) amplia o espectro da linguagem:
Polivalente e polifuncional, a linguagem humana exprime, constata,
transmite, argumenta, dissimula, proclama, prescreve. Está presente em
todas as operações cognitivas, comunicativas, práticas. É necessária à
conservação, transmissão e inovações culturais. (MORIN, 2001, p. 197).
Morin (2001) complementa explicando que a linguagem é instrumento
essencial de interação social e cultural. Envolve, com responsabilidade e reflexão,
tudo que está sendo transmitido, imaginado ou escrito e possui uma força ambígua,
pois pode ser compreendida como um estímulo positivo ou negativo durante as
intervenções sociais.
A linguagem, quando é empregada no processo ensino-aprendizagem com
excessivo formalismo, em um ambiente inadequado, no entendimento de Mazzei
(2004), simplesmente reforça o sentimento de acúmulo do saber e estimula
negativamente o aluno na sua significação do contexto no qual está inserido. O autor
refere que o “uso, por parte dos professores, de uma linguagem que os alunos não
compreendem mantém o poder centralizado nas mãos deles, professores” (MAZZEI,
2004, p. 25).
Ser detentor dos saberes não é mais sinônimo de professor competente. É
competente o professor que se preocupa com a interpretação do aluno, preparando-
o para uma aprendizagem autônoma e significativa. Essa aprendizagem é um
processo complexo, porque interfere em concepções que os professores trazem
cristalizados, de acordo com a formação que receberam.
Refletir sobre as próprias competências é romper com o paradigma de que o
professor é o detentor dos saberes. Perceber que estamos sempre repensando e
reconstruindo o conhecimento e questionando toda a informação é um processo que
23
exige maturidade profissional, pois implica ver cada aluno como sujeito do processo
ensino-aprendizagem.
A abordagem de Ramos (2003) acerca do tema contribui para o
esclarecimento da atitude epistemológica que o professor precisa assumir no
repensar da sua prática na sala de aula.
Quando o sujeito analisa, estuda e pensa, criticamente, sobre o (seu)
conhecimento acerca de alguma coisa, no sentido de buscar a consciência
de como aquele conhecimento foi e continua sendo constituído, qual a sua
validade, qual foi o seu processo histórico, o porquê deste conhecer e
outros, este sujeito está fazendo uma reflexão epistemológica e apresenta
uma postura epistemológica. (RAMOS, 2003, p. 32)
O professor que assume uma atitude epistemológica em relação ao seu
trabalho valoriza a relação professor-aluno e intensifica a idéia de conhecer e
qualificar a sua função, buscando o saber pensar e o aprender a aprender,
constantemente. Demo (2002) reforça esse princípio quando afirma tratar-se
[...] da própria definição de competência, que encontra na capacidade de
permanente recuperação seu dinamismo maior e típico. Engloba por isso os
desafios do saber pensar e do aprender a aprender. (DEMO, 2002, p. 67).
Então, professor competente utiliza a linguagem como instrumento social e
cultural, oportuniza aos alunos o desenvolvimento dos processos internos de
organização das funções psíquicas superiores, buscando um nível de abstração e
formalismo necessário ao contexto da sala de aula. Isso é bastante evidente quando
se trata do estudo em Matemática.
A linguagem matemática tem um formalismo próprio. Os conteúdos
matemáticos envolvem signos necessários para a sua compreensão no contexto
escolar e social. Malta (2002) propõe o esclarecimento desse processo, expresso a
seguir.
Em Matemática, a capacidade de expressar com clareza o raciocínio é
equivalente à capacidade de entender os resultados matemáticos. Em
particular, o desenvolvimento da capacidade de expressão do próprio
raciocínio promove o desenvolvimento da capacidade de compreensão em
Matemática. O desenvolvimento da capacidade de expressão está
acoplado ao desenvolvimento da capacidade de leitura, isto é, da
capacidade de aquisição de conhecimentos sem intermediários. (MALTA,
2002, p. 216)
24
Observa-se que sem o desenvolvimento do domínio da linguagem necessária
à compreensão de conteúdos abstratos, nos diferentes níveis, dificilmente ocorrerá o
desenvolvimento do pensamento matemático. A compreensão dos conteúdos e
definições matemáticas precisa extrapolar a sala de aula para expressar a
autonomia da linguagem matemática em um universo científico e social. Da mesma
forma, a interpretação e a compreensão dos conteúdos básicos são necessários ao
desenvolvimento do nível de abstração e a autonomia na aprendizagem.
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Neste capítulo, apresento a abordagem metodológica, o contexto e os sujeitos
da pesquisa, bem como descrevo a UA desenvolvida e os procedimentos de coleta
dos dados.
4.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA DA PESQUISA
A metodologia aplicada para a coleta de dados envolveu o desenvolvimento
de uma UA (Unidade de Aprendizagem) sobre o conteúdo de geometria analítica,
seguida de análise de questões pelos alunos com a elaboração de relatórios. A
análise dos relatórios é o procedimento da investigação que permite apresentar
respostas ao problema de pesquisa.
A UA oportuniza e valoriza as relações interpessoais e encaminha o aluno
para uma autonomia no processo de aprendizagem. A reestruturação dos modelos
metodológicos, adequando-os ao contexto da sala de aula, à proposta da escola e à
motivação dos alunos são princípios que norteiam a construção da UA. Adequar
uma proposta metodológica ao contexto, caracterizado por constantes mudanças, é
assumir um perfil epistemológico, integrando ação, linguagem e ambiente da
aprendizagem.
A UA está sendo proposta como forma de pesquisa de conteúdos
matemáticos, que visa a estimular o espírito pesquisador do professor e do aluno.
Constitui uma proposta que tem a intenção de desacomodar o aluno, pois ele
participa como protagonista das atividades. A participação do aluno acontece desde
o momento em que é motivado a repensar sobre situações do dia-a-dia,
relacionando-as com os conteúdos matemáticos estudados. Quando a relação com
esses conteúdos é estabelecida, o aluno necessita das ações mediadoras do
professor para ajudá-lo nas atividades que ainda não consegue realizar sozinho.
Desse modo, o professor orienta o processo de aprendizagem de maneira flexível,
procurando integrar os conhecimentos tácitos dos alunos à pesquisa em sala de
aula, contribuindo para a interpretação da linguagem matemática.
Assim, o aluno tem sua participação valorizada pelas ões mediadoras
desenvolvidas ao longo da UA, que é um processo de natureza sociocultural,
26
baseado nas proposições de Demo (2002) e de Moraes, Galiazzi e Ramos (2004).
Sobre isso, Galiazzi, Garcia e Lindemann (2004) também dispõem:
Uma UA, embora tenha início, meio e fim, também é uma construção que
na recursividade agrega complexidade à sua estrutura, sempre flexível e
em questionamento. A cada aula, ou mesmo a cada diálogo, se reestrutura,
se amplia, se reduz, se transforma. (GALIAZZI; GARCIA; LINDEMANN,
2004, p. 67-68)
Portanto, como afirmam esses autores, uma UA é uma proposta metodológica
que o professor organiza conforme o contexto, envolvendo os alunos, considerando
a complexidade do conteúdo de estudo, a linguagem na relação entre os sujeitos
participantes e o ambiente e seus condicionantes. Como afirma Albuquerque (2006)
em sua dissertação de mestrado, a UA é uma forma de desenvolver no aluno a
organização do seu material, questionar propostas, sugerir alternativas, criticar e
reconstruir argumentos. Assim, colabora para a construção da autonomia e contribui
para a aprendizagem significativa do aluno envolvido nesse processo.
A UA prioriza a linguagem como instrumento mediador do professor nos
aspectos históricos, políticos, afetivos e cognitivos, a fim de fortalecer a relação
professor-aluno e os conhecimentos científicos.
Neste estudo, a UA desenvolveu-se em quatro etapas, todas no ambiente
escolar, com alunos de três turmas do 3
o
ano do Ensino Médio, instigados a
refletirem sobre situações que simulam ações reais do cotidiano, envolvendo a
geometria analítica.
Os alunos, organizados em grupos, interpretaram e exploraram cada etapa,
lembrando conteúdos estudados e relacionando-os às situações propostas,
construindo novos conteúdos. Esse procedimento de ensino desenvolve a
participação, interesse, autonomia e contribuiu para a ressignificação dos
conhecimentos científicos dos envolvidos no processo de aprendizagem.
A partir do desenvolvimento da UA, foram coletados dados por meio de
relatórios elaborados pelos alunos em pequenos grupos, nos quais eles deveriam
identificar conteúdos matemáticos presentes em problemas fornecidos pelo
professor, selecionados das provas de vestibulares dos anos de 1998 até 2006 das
universidades privadas, estaduais e federais do Estado do Rio Grande do Sul e
categorizadas pelos alunos em tópicos de estudos da geometria analítica. Mesmo
tendo sido desenvolvidos em aula muitos problemas, para fins desta pesquisa foram
27
selecionadas três questões, cujos relatórios foram analisados, destacando-se os
principais conteúdos matemáticos que os alunos lembravam e os que não
lembravam comparados aos conteúdos esperados pelo professor. Essa análise é
apresentada no próximo capítulo por meio de tabelas e de resoluções extraídas dos
relatórios, comparando-se os termos matemáticos identificados pelos grupos de
trabalho com aquelas resoluções esperadas pelo professor. Durante a análise dos
relatórios, foram destacados os conteúdos matemáticos mais lembrados pelos
alunos, após as pesquisas deles quando do estudo do conteúdo de geometria
analítica e também foi possível identificar os conteúdos não lembrados. Destaco
também, para fins de análise, os conteúdos não esperados pelo professor, durante
as interpretações das questões. Entendo por conteúdos não esperados aqueles que
não são os mais relevantes ao desenvolvimento e à interpretação das questões, mas
que são destacados pelos alunos. Por fim, também foram analisadas as resoluções
criativas dos grupos, que envolveram outros conteúdos matemáticos o esperados
pelo professor.
4.2 CONTEXTO E SUJEITOS DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida com alunos do 3
o
ano do Ensino Médio de uma
escola particular de Porto Alegre, RS. A escolha desse grupo deu-se pela
preocupação da pesquisadora, de longa data, em observar problemas de
aprendizagem relacionados com a linguagem matemática nesse nível de ensino.
Esses problemas envolvem estratégias para a aplicação dos conhecimentos prévios
(anteriores), que são as teorias pessoais dos alunos, em novas situações-problema
e na resolução de questões, pois os alunos que estão concluindo o Ensino Médio
necessitam demonstrar seu raciocínio num nível de aplicação com maior
complexidade do que já haviam estudado.
A decisão sobre quais seriam os sujeitos desta pesquisa deu-se também pela
possibilidade de realização da investigação com os estudantes sob responsabilidade
da pesquisadora no semestre em que a mesma foi realizada.
28
São alunos entre 16 e 18 anos, e o nível de interpretação, de estabelecimento
de relações e de aplicação conceitual em questões matemática requer justamente
um maior aprofundamento dos conteúdos em relação ao que costumam demonstrar
ao comunicarem suas conclusões matemáticas. Além disso, existe a problemática
referente à atitude e aos estímulos do professor quanto ao uso de uma linguagem
adequada, que também são aspectos que dificultam a significação da aprendizagem
dos conteúdos matemáticos. O professor deve preocupar-se em observar cada
grupo, em cada contexto, para desenvolver o procedimento metodológico que
melhor se adapta ao grupo para favorecer a aprendizagem, assim como elaborar
estratégias que valorizem a utilização de uma linguagem matemática adequada,
destacando a comunicação na sala de aula. É importante que essa comunicação
inclua e desafie constantemente o pensamento do aluno nas diferentes situações
apresentadas e encaminhadas para um aprofundamento dos conhecimentos
científicos.
Essa complexificação do conhecimento científico ocorre por meio da
linguagem, pelas interpretações dos diversos materiais de leitura, manuseio que
possam contribuir para o desenvolvimento intelectual e interpretações de signos.
Esse aprofundamento interliga a leitura-análise-interpretação, relacionando-as com a
ação de aprender a ler e a se expressar.
Tais ações são corroboradas por Heredia, quando afirma não ser
[...] justo sonegar ao aluno a oportunidade de desenvolver capacidades por
falta de informações, a começar pelas explicações da sala de aula que são
as mais preciosas, é claro, se aliadas à vontade e ao entusiasmo do
mestre. Faz-se necessário o comprometimento da família e um alerta
especial à escola, pois será que aquele boletim cheio de notas ou
conteúdos altos reflete o verdadeiro conhecimento do educando? Nome e
tradição não garantem futuro. (HEREDIA, 2006, p. 15)
O autor reforça a necessidade de oportunizar ao aluno um processo que
equilibre o seu interesse e a sua atitude em questionar, em interpretar, em
argumentar com fundamento e em aprofundar seu conhecimento empírico, a fim de
transformá-lo em científico, por meio de uma linguagem adequada ao contexto
familiar, social e escolar. Essa linguagem adequada só terá significação para a
aprendizagem do aluno se contribuir no desenvolvimento da capacidade de leitura e
de expressão, organizando o próprio raciocínio e a argumentação.
29
Por essas preocupações, envolvi os alunos das três turmas do 3
o
ano em uma
UA, oportunizando a participação, o interesse e o aprofundamento necessários ao
desenvolvimento intelectual desta clientela no contexto escolar.
O contexto da pesquisa é de uma escola privada, confessional católica, que
espera que os alunos desejem continuar estudando e participando de maneira
responsável e consciente em relação ao seu papel na sociedade, tornando-se capaz
de aprender a ser e aprender a conviver, aprender a pensar e aprender a fazer.
Nessa escola, em função de sua proposta pedagógica, busca-se vivenciar o
princípio do acolher e ouvir o outro, procurando o despertar para a alegria de
aprender e participar, oportunizando vivências fraternas, dentro de um espírito de
verdade, justiça e paz, favorecendo a aprendizagem e a formação de pessoas
solidárias, responsáveis e comprometidas. Esse cenário contribui para contextualizar
o ambiente da coleta dos dados, pois o sentimento, o comprometimento e o respeito
que a escola e sua comunidade têm pelo seu aluno também são compartilhados
pelo pesquisador e professor titular das turmas do 3
o
ano do Ensino Médio.
4.3 A UNIDADE DE APRENDIZAGEM (UA)
Este tópico descreve a Unidade de Aprendizagem realizada na investigação.
A UA envolveu quatro etapas, relacionadas entre si: etapa exploratória, etapa de
organização dos conteúdos, etapa da investigação e comunicação, e etapa da
aplicação e de aprofundamentos.
Essas etapas foram organizadas e aplicadas nessa seqüência, pois o grupo
do 3
o
ano do Ensino Médio da escola apresentava dificuldades em relação ao hábito
de refletir sobre os conteúdos necessários para resoluções e aplicações dos
conteúdos matemáticos, pesquisá-los e repensá-los. A linguagem associada aos
termos (signos e mbolos), às características dos processos de resolução de
problemas (destacando as hipóteses e a tese) e à interpretação do resultado obtido,
precisou ser desenvolvida ao longo do processo. Isso foi sendo percebido,
porém, ao longo do trabalho.
O registro das etapas desenvolvidas deu-se em relatórios dos alunos,
destacando os conteúdos matemáticos fundamentais das questões, destacando as
30
hipóteses e teses de cada exercício, a fim de encaminhá-los à interpretação e à
significação do conteúdo e dos termos matemáticos envolvidos, para aplicar em
outras situações. Os alunos destacaram os conteúdos matemáticos que conheciam.
Foi possível também identificar os que não conheciam ou não lembravam. A
linguagem matemática aplicada na conceituação dos termos conhecidos e
desconhecidos deveria ser empregada corretamente e com adequada formalização
pelos grupos.
A atitude do professor no trabalho era de orientação para o uso da linguagem
adequada, pois seria preciso atender às necessidades do componente curricular em
questão – a Matemática –, e, portanto, fazer uso de seus símbolos e signos corretos.
O grupo sentia a necessidade de escrever e falar as conceituações
apropriadas para serem interpretados corretamente. Para isso, foram utilizados os
ambientes da biblioteca e do laboratório de informática. O professor organizou os
espaços e orientou os alunos para retomar o foco sobre o que haviam proposto
investigar, pois, em pesquisa, são sempre necessárias a disciplina e a organização
do ambiente. Assim, ao retornar para sala de aula, cada grupo apresentou a sua
listagem com uma linguagem matemática em conformidade com os conteúdos
investigados. A comunicação dos resultados, na volta para a sala de aula, atendeu
ao que prioriza Moraes, Galiazzi e Ramos (2004).
É importante que a pesquisa em sala de aula atinja um estágio de
comunicar resultados, de compartilhar novas compreensões, de manifestar
novo estado do ser, do fazer e do conhecer, o que contribui para a sua
validação na comunidade em que esse processo está se dando.
(MORAES, GALIAZZI, RAMOS, 2004, p. 19)
Sistematizando o processo de pesquisa, os grupos receberam livros didáticos,
provas de concursos e vestibulares de universidades particulares e públicas,
analisaram as linguagens utilizadas na escrita das questões, a fim de destacarem e
interpretarem os conteúdos matemáticos envolvidos e as hipóteses e teses de cada
problema. Categorizaram as questões selecionadas por eles, e cada grupo buscou a
solução por meio de cálculos, bem como de interpretações associadas à linguagem
usual, descrevendo os processos e realizando os encaminhamentos necessários. O
professor mediou e orientou os alunos, usando as linguagens formais dos signos e
símbolos matemáticos.
31
Na seqüência, cada grupo comunicou suas resoluções e interpretações sobre
as questões de sua responsabilidade. O conteúdo de geometria analítica foi
abordado em sua totalidade, por meio de uma UA. A partir disso, com uma atitude
reflexiva e pesquisadora, o professor e os alunos fizeram uma análise do processo.
A seguir, é apresentado o desenvolvimento mais detalhado da UA
desenvolvida na pesquisa.
No início do 3
o
trimestre letivo, desenvolvi a UA, a qual passo a descrever a
seguir, apresentando as etapas, os momentos de mediação do professor aos grupos
de alunos. Algumas informações complementares são apresentadas por meio dos
apêndices A e B.
A primeira etapa da UA pode ser caracterizada como a exploração dos
conhecimentos prévios. Ela aborda os conhecimentos empíricos ou tácitos dos
alunos, por meio de uma linguagem do senso comum. Ela envolve ainda a distância
realizada por eles para chegarem até a escola, a partir de um problema apresentado
pelo professor.
Muitas idéias eram expressas, pois a integração dos grupos favorecia, e
constrangimentos sobre estar certo ou errado eram pouco evidenciados. Pôde-se
observar que o grupo havia sido desacomodado, realmente provocado a refletir
sobre uma simples ação do dia-a-dia, mas que encaminharia à exploração da idéia
de distância entre dois pontos do conteúdo de geometria analítica e a diferença
sobre a trajetória descrita.
Deu-se continuidade às orientações, para que se descrevesse a distância
entre esses dois pontos por meio da linguagem matemática, sempre utilizando
signos e conteúdos adequados.
Organizados em grupos de no máximo quatro colegas, começaram a discutir
as idéias. Com papel na mão, era representada a distância entre os dois pontos
utilizando um par ordenado para cada ponto registrado no plano cartesiano.
Alguns questionamentos orientaram a etapa de exploração da distância entre
dois pontos. Assim, a linguagem do senso comum, com interferências voltadas para
a linguagem matemática, encaminhava os alunos à reconstrução dos conteúdos
conhecidos em níveis anteriores.
Mesmo com essas interferências sobre os conteúdos matemáticos, alguns
grupos sentiram a necessidade de pesquisar sobre outros conteúdos matemáticos
32
retomados, encaminhando-se para a segunda etapa que enfatizava a busca, a
investigação, a pesquisa dos conteúdos, teoremas e axiomas matemáticos.
A linguagem na sala de aula é um instrumento importante para o professor,
pois, por meio dela, interferimos nos aspectos cognitivos, afetivos e sociais pessoais
dos alunos. Esses aspectos influenciam na significação da aprendizagem e
oportunizam ao aluno a autonomia em relação ao conhecimento científico. Entende-
se autonomia do aluno no processo de aprendizagem como a busca de alternativas
além das expectativas do professor e dele próprio.
Ampliamos a problematização, envolvendo pontos não alinhados.
Questionamentos a situação apresentada foram encaminhadas aos grupos de
alunos. Foram feitos questionamentos sobre a figura formada com os pontos
marcados: Qual a classificação da figura quanto aos lados? Qual é o seu perímetro?
Qual é a sua área?
Estabeleceu-se um profundo silêncio na sala de aula. Alguns grupos sentiram
a necessidade de pesquisar sobre os termos utilizados pelo professor, pois a
classificação quanto aos lados envolve conteúdos sobre triângulo, triângulo
eqüilátero, isósceles e escaleno. A definição de perímetro, que é conteúdo
desenvolvido desde as séries iniciais, também precisou ser pesquisada. Mas a
investigação da área do triângulo oportunizou o repensar sobre muitos outros
conteúdos matemáticos estudados. A pesquisa sobre a área do triângulo indicou
alguns destaques sobre as dimensões, como a base e a altura, e as áreas
referentes aos triângulos eqüilátero, retângulo e isósceles. Os alunos encontraram
diversos problemas que envolviam área de triângulo, mas com informações
diferentes. Os alunos foram, então, orientados a observar a figura descrita no plano
cartesiano com pontos indicados e, assim, deveriam determinar um triângulo
retângulo e, em outro plano, por meio de outros pontos, um triângulo eqüilátero,
pois, assim, as dimensões da base e da altura seriam identificadas com o auxílio dos
eixos coordenados. Ao final, foi possível determinar a área de cada triângulo.
Como conseqüência dessa exploração, foi calculado o determinante
envolvendo os três vértices que formam cada triângulo. Os alunos observaram que a
resposta correspondia ao dobro do valor encontrado anteriormente e ficaram atentos
ao sinal, pois estavam calculando a área. Perceberam que é possível determinar a
área de um triângulo, quando indicados seus vértices, utilizando o cálculo do
determinante, conforme exemplo constante nos apêndices A e B. Todos os grupos
33
retomaram o seu triângulo, e foi possível completar o valor correspondente à área do
triângulo que cada grupo possuía.
O momento da comunicação dos resultados, das sistematizações e das
interpretações de questões foi realizado, para aplicarem os conteúdos analisados
nas situações-problema encaminhadas em aula aos alunos.
Na seqüência, foi apresentado um móbile formado por triângulos suspensos e
equilibrados. Foi sugerido que cada grupo observasse o objeto e descrevesse os
conteúdos matemáticos envolvidos nos triângulos. Os grupos explicaram que cada
lado do triângulo foi dividido em duas partes do mesmo tamanho e que o encontro
das três marcas que partiam do vértice até o meio do lado oposto era o ponto de
equilíbrio do triângulo. Quando, no entanto, os grupos retomaram os conteúdos
matemáticos, utilizando uma linguagem mais adequada, descreveram como ponto
médio aquele referente ao meio do lado do triângulo; as marcas que partiam do
vértice ao ponto médio do lado oposto, como mediana; e o ponto de equilíbrio do
triângulo, como ponto gravitacional ou baricentro.
Outros desafios foram apresentados para os grupos, a fim de reverem e
aprofundarem os conteúdos a partir de novas abordagens, tais como condição de
alinhamento e equação da reta geral, reduzida e seus termos matemáticos.
Interpretar o termo de abscissa e ordenada e associar às referências sobre cada
eixo eram ações fundamentais para a comunicação oral e escrita da continuidade do
conteúdo de geometria analítica.
A comunicação escrita envolveu a demonstração dos conteúdos retomados
da simulação dos três pontos que determinavam um triângulo para contrapor à
situação do alinhamento dos pontos. Os alunos concluíram que não havia área entre
esses pontos, sendo o determinante nulo.
A apresentação de listas de exercícios para sistematizar os conhecimentos
reconstruídos foi o procedimento realizado com os grupos. Assim, foram retomados
os conteúdos de funções polinomiais do primeiro grau, sistemas de equações do
primeiro grau com duas variáveis, coeficiente angular e linear, valores da tangente
do ângulo de inclinação da reta com o eixo das abscissas e transformações de
radianos em graus.
Os alunos, ao receberem as listas de exercícios, eram orientados sobre o
tempo e o local de pesquisa, que se restringia ao contexto escolar, isto é, à sala de
aula, à biblioteca, ao laboratório de informática e às dependências da escola para
34
estudos em grupo, pois, assim, o professor conseguiria mediar e encaminhar os
problemas que surgissem.
Cada grupo assumiu a responsabilidade pela comunicação de resultados de
uma questão, escolhida por meio de sorteio, pois todos os grupos deveriam
responder a todas elas. Assim, cada grupo poderia participar e expressar
contribuições pertinentes durante as apresentações das questões.
Nas apresentações, cada grupo deveria comunicar corretamente o enunciado
da questão; a interpretação, destacando a hipótese e a tese; e a resolução da
questão, por meio da linguagem matemática adequada escrita e falada.
Na interpretação, os alunos deveriam destacar os conteúdos matemáticos
conhecidos e os que precisaram ser pesquisados.
Complementos sobre os conteúdos matemáticos que não eram lembrados
pelos alunos, e outros não abordados, foram retomados durante cada apresentação.
As interseções de conteúdos e complementos aos argumentos que foram expressos
na demonstração da resolução, e as que o professor sentiu necessidade de
acrescentar durante as apresentações, foram recebidas com atenção pelos alunos.
Esses complementos foram necessários para tornar mais claras as hipóteses e
teses associadas às questões. As atitudes de comprometimento dos grupos e o nível
de linguagem utilizado nas comunicações possibilitaram ao professor propor o
desafio, que consistiu em categorizar as questões dos últimos vestibulares (de
universidades estaduais e federais e faculdades particulares) envolvendo novas
abordagens sobre o conteúdo de geometria analítica. As novas abordagens
envolveram a posição entre duas retas, o estudo do ângulo formado por duas retas,
a distância entre ponto e reta, equação da circunferência e posições entre ponto e
circunferência, entre reta e circunferência e entre duas circunferências no plano
cartesiano.
Desse modo, ocorreu o desenvolvimento e aplicação da UA. Essa etapa do
procedimento metodológico encaminhou a solução da questão de pesquisa sobre os
principais problemas de aprendizagem em geometria analítica relacionados à
linguagem matemática no Ensino Médio.
35
4.4 DIFICULDADES NA UNIDADE DE APRENDIZAGEM
Algumas dificuldades no processo de desenvolvimento da UA foram
observadas e contornadas a fim de encaminhar todos os grupos à identificação dos
conteúdos matemáticos nas questões de geometria analítica. O propósito era
reconstruir esses conteúdos por meio de uma linguagem adequada.
Os obstáculos que o professor observou nos grupos de alunos foram de
caráter afetivo e cognitivo. O caráter afetivo corresponde à motivação de alguns
alunos frente ao desafio de desacomodar o aluno, passando de uma atitude passiva
para uma atitude participante e autônoma em relação à sua aprendizagem. A
passividade foi uma dificuldade a ser superada ao longo do ano letivo, pois, somente
no terceiro trimestre, houve participação mais expressiva dos grupos de alunos.
Essa passividade é resultado de vários anos de práticas pedagógicas bastante
próximas de modelos metodológicos que colocam o aluno como ouvinte, e o
professor no papel de comunicador de informações e de resultados prontos e
verificados. Daquele modelo que valoriza a cópia, não estimula o raciocínio e
contempla a reprodução de idéias, como afirma Mizukami (1987) no modelo
metodológico tradicional. Porlán (1996), em relação ao modelo tradicional, também
afirma que a linguagem utilizada pelo professor é formal e pouco acessível ao aluno.
Desse modo, a passividade de alguns alunos permaneceu ao longo do trimestre da
coleta de dados e desenvolvimento da UA, pois expressavam idéias como “Agora no
último ano, por que mudar?” ou “Diz como se faz e qual a rmula é bem mais fácil
do que pesquisar e remexer em conteúdos matemáticos anteriores”.
Foi difícil estimular e desacomodar esses grupos. Encontrar argumentos que
provocassem motivações para uma reflexão acerca de conteúdos matemáticos foi
um desafio para o professor. O argumento que parecia realmente estimular e motivar
a participação no desenvolvimento da UA foi o de não precisar decorar relações
algébricas fórmulas. Nos processos avaliativos da escola, os alunos o
receberiam os formulários, bem como em outras seleções que fossem questionados
sobre esses conteúdos de geometria analítica. Assim, a passividade passou a ser
comportamento antigo, e a participação nas atividades de pesquisa para relacionar a
geometria com as relações algébricas ganhou espaço, mas, mesmo assim, os
36
alunos ainda não demonstravam autonomia na busca de conteúdos matemáticos
anteriores.
A pesquisa dos conteúdos prévios para interpretar as questões indicadas foi
outro caráter de dificuldade observada pelo professor em termos cognitivos. A
atitude dos alunos era bastante influenciada pelo modelo metodológico tradicional,
no qual estão fortemente presentes o pensamento mecânico e a memorização,
dificultando o desenvolvimento da abstração.
Alguns alunos sentiam-se perdidos, pois não sabiam por onde começar. A
falta de conteúdos prévios para interpretarem as questões foi fator de dificuldade,
como, por exemplo, não saber o que era par ordenado ou que os eixos do plano
cartesiano são orientados (x e y), o que denunciava a falta de conteúdos básicos
para interpretarem as questões. Além disso, não relacionavam a álgebra aplicada
com a figura geométrica descrita. Pôde-se perceber também que o entendiam
como poderiam estudar os conteúdos matemáticos sem que tivessem que
memorizá-los, decorá-los, gravá-los mecanicamente. Diante desse cenário,
desenvolvi com os alunos outras atividades e uma UA paralela sobre os conteúdos
anteriores e de orientações de como estudar matemática, o que ocorreu
concomitantemente ao desenvolvimento da UA de geometria analítica. As
mediações foram realizadas durante as aulas e por e-mail, a para que conseguissem
acompanhar as interpretações e as comunicações dos grupos de colegas. Alguns
alunos resistiram e, somente após algumas avaliações, integraram-se aos
desenvolvimentos das unidades.
Essa dificuldade de integração dos conteúdos, principalmente em relação à
UA de geometria analítica, também é uma dificuldade de natureza cognitiva. Ela
pode envolver falta de maturidade em assumir a atitude de estudante pesquisador e
autônomo da sua aprendizagem, mas pode apontar apenas para o fato de alguns
alunos não demonstrarem nível de abstração das relações matemáticas
abordadas. A dificuldade de abstração foi observada quando alguns alunos que
estavam engajados no processo, participando das pesquisas e contribuindo nos
resultados interpretados das questões, ainda assim, não relacionavam as estruturas
algébricas conhecidas com as situações descritas. Esse desafio foi encaminhado
pelo professor com a intenção de respeitar e buscar valorizar as contribuições e as
inteligências de cada aluno.
37
As dificuldades em relação à liberdade que os alunos sentiram foram
contornadas com os encaminhamentos da comunicação que cada grupo realizou
aos colegas sobre o tema estudado. De acordo com o plano pedagógico da escola,
a avaliação do conteúdo de geometria analítica seria elaborada com a participação
dos alunos. Após cada comunicação, os grupos eram solicitados a responder os
conteúdos matemáticos abordados na apresentação, pois assim caracterizou-se a
avaliação dos grupos no decorrer da UA, o que vale ressaltar não foi objeto da
coleta de dados da pesquisa.
A partir do desenvolvimento da UA descrita, foram coletados os dados, cujo
processo é relatado a seguir.
4.5 ROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS
Os dados foram coletados a partir da realização de uma UA sobre geometria
analítica. Após a UA, os alunos analisaram três questões de provas de concursos
vestibulares de universidades do Rio Grande do Sul. A partir disso, deveriam
elaborar um relatório com suas resoluções.
O desenvolvimento da UA e a coleta dos dados ocorreram durante o mês de
setembro de 2007, em cinco períodos semanais, totalizando 20 períodos de aulas.
Foram também realizados encontros extras em horários de livre escolha pelos
alunos. Nesses encontros, os alunos puderam discutir e aprofundar conteúdos sobre
o tema.
A UA possibilitou a reconstrução de conteúdos matemáticos relevantes por
parte dos alunos. Para analisar essa reconstrução foram observadas e analisadas
pelo professor as situações nas quais cada grupo de alunos empregou linguagem
matemática específica para a sua interpretação e para expressar a resolução das
questões por meio da fala e da escrita. Portanto, o modelo predominante na UA
desenvolvida é o sociocultural, conforme Mizukami (1987), evidenciado pela ênfase
dada à valorização do contexto e da linguagem, e pela participação dos alunos e do
professor e ainda pelo desenvolvimento do senso crítico e da autonomia. Para as
coletas dos dados, foram apresentadas aos alunos três questões de recentes provas
de concursos vestibulares. Eles as classificaram de acordo com categorias
propostas pelo professor, tais como a posição entre duas retas, o estudo do ângulo
38
formado por duas retas, a distância entre ponto e reta, equação da circunferência e
posições entre ponto e circunferência, entre reta e circunferência e entre duas
circunferências no plano cartesiano.
Foi necessário encaminhar os alunos a uma pesquisa sobre essas categorias
para que compreendessem os significados dos conteúdos implicados. Ao final, os
grupos tinham que apresentar uma comunicação sobre as categorias pesquisadas e
o resultado da classificação das questões propostas para análise.
Assim, integram a coleta de dados da pesquisa os registros dos conteúdos
matemáticos identificados na interpretação das questões pelos alunos em relação
aos resultados da categoria sobre equação da circunferência. Optei por essa
categoria em função da relevância do tema em geometria analítica, que tem por
objetivo conciliar os fatos geométricos com as relações algébricas. A relação da
álgebra com a geometria possibilita estudar de modo sistemático as figuras
geométricas e, assim, interpretar geometricamente as relações algébricas que foram
identificadas pelos grupos de alunos. Por isso, o professor necessita observar o nível
de compreensão que os alunos desenvolvem e relacionam aos conteúdos
matemáticos básicos explorados e desenvolvidos que fundamentam as
interpretações das questões da categoria selecionada.
As questões envolviam conteúdos a serem identificados, relacionando, assim,
o contexto geométrico com as relações algébricas estruturadas com a linguagem
matemática adequada. As relações matemáticas estruturadas envolviam os
conteúdos desenvolvidos, necessários para as interpretações e significação da
situação descrita geometricamente. Dessa maneira, esperava-se que os alunos
interpretassem os conteúdos matemáticos básicos para a construção e reconstrução
de conteúdos explorados na categoria sobre a equação da circunferência.
Os conteúdos esperados pelo professor tiveram por base as definições usuais
dos livros didáticos mais utilizados nas escolas particulares de Porto Alegre. As
definições relacionam-se à interpretação gráfica que envolve os conteúdos de
sistema cartesiano, par ordenado, eixos orientados, origem, quadrantes e as
bissetrizes. O sistema cartesiano descreve o sistema de coordenadas ortogonais
com eixos orientados (x e y), no qual cada ponto corresponde um par ordenado (x, y)
de números reais. Os eixos orientados (x e y) dispostos ortogonalmente dão origem
ao plano em quatro partes, as quais se denominam de quadrantes. Estes são
numerados no sentido anti-horário; e os eixos orientados das abscissas (x) e das
39
ordenadas (y) m sua intersecção a origem (O) do sistema de coordenadas. A reta
que divide ao meio os quadrantes ímpares é chamada de primeira bissetriz, e a que
divide ao meio os quadrantes pares de segunda bissetriz.
A análise dos relatórios permite identificar outros conteúdos apresentados pelos
alunos, como os destacados a seguir:
[...] dados dois pontos distintos do plano cartesiano, chama-se distância
entre eles a medida do segmento de reta que tem os dois pontos por
extremidades.
[...] é única a reta que passa por dois pontos distintos no plano cartesiano. A
notação da equação da reta reduzida que utilizamos foi baxy
+
=
, na qual
a e b são números reais.
[...] a representa a tangente do ângulo formado entre a reta e o eixo das
abscissas, no seu sentido positivo. a é denominado coeficiente angular (ou
declividade, inclinação) da reta.
“[...] b representa a ordenada do ponto em que a reta corta o eixo das
ordenadas e é denominado de coeficiente linear.
[...] x e y são coordenadas de um ponto genérico da reta, são variáveis que
representam qualquer número real que pertença à reta.
[...] duas retas são paralelas quando possuem coeficiente angular e formam
com o eixo das abscissas ângulos congruentes.
[...] duas retas são concorrentes quando possuem coeficientes angulares e
esses são diferentes.
[...] duas retas são perpendiculares quando possuem coeficientes angulares
e um coeficiente é o oposto do inverso do outro, isto é, o produto entre eles
é igual ao oposto do número real um.
[...] a equação reduzida da circunferência ou a equação normal da
circunferência ou simplesmente equação da circunferência é determinada
por um ponto fixo referente ao centro. Os pontos que possuem a mesma
distância desse ponto fixo é denominado de raio. Assim a distância entre
dois pontos seja o ponto fixo (centro) e um dos pontos que possua a mesma
distância desse ponto fixo forma uma igualdade que denominamos de
equação.
Essas definições fundamentam os conteúdos matemáticos envolvidos nas
questões sobre a equação da circunferência. o definições que orientam a
interpretação do aluno, de modo consensual, em relação ao significado dos
conteúdos explorados nas três questões descritas na análise de dados. Além disso,
essas definições orientam o olhar do professor quando da análise dos relatórios
referentes aos conteúdos identificados pelos grupos em relação às interpretações
dos conteúdos esperadas pelo professor. Essa informação foi obtida por meio de
40
entrevistas informais e conversas com colegas que lecionam em escolas de
diferentes realidades e situações em diversos bairros da cidade de Porto Alegre
Cabe destacar que, nas três turmas, os alunos foram organizados em grupos
de três ou quatro alunos, originando os 25 grupos. Em relação à categoria sobre a
equação da circunferência, foram desenvolvidas 62 questões, com esses grupos de
alunos. Na seqüência, foram analisadas, como exemplo, três questões que
envolviam interpretações relevantes para a categoria, as quais abrangiam conteúdos
esperados e não esperados pelo professor. Alguns conteúdos matemáticos, que
foram identificados pelos alunos e esperados pelo professor, foram fundamentais
para a significação do conteúdo de geometria analítica e a relação algébrica
envolvida no contexto.
41
5 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS
Foram analisados os conteúdos mais lembrados e os não lembrados pelos
alunos das três turmas, organizados em 25 pequenos grupos. Ressalta-se que os
conteúdos lembrados pelos alunos são os utilizados, com adequação, na solução do
problema. Os conteúdos não lembrados pelos alunos são os estudados em anos
anteriores, mas não aplicados no desenvolvimento da solução ao problema, mesmo
sendo necessários.
Os conteúdos lembrados foram comparados aos conteúdos esperados pelo
professor, que haviam sido anotados previamente, ou seja, hipóteses que integram
os objetivos deste trabalho, explicitados na análise de cada questão estudada.
Buscando contribuir para a interpretação dos dados, o apresentadas tabelas no
decorrer deste capítulo. Assim, procuro responder à problemática da pesquisa que
envolve as principais dificuldades de aprendizagem em geometria analítica,
relacionados à linguagem matemática no Ensino Médio, envolvendo a leitura e a
interpretação de conteúdos matemáticos estudados. Malta (2002) explica que o
aluno não é alfabetizado em Matemática se não consegue realizar a leitura e a
interpretação da linguagem simbólica adequada nas situações propostas. Lidar com
os termos científicos é uma das dificuldades dos alunos. Dessa maneira, é papel do
professor propor metodologias para orientar seus alunos a enfrentar as dificuldades
relacionadas aos símbolos e signos dos conteúdos matemáticos. O professor que
reconhece e valoriza as diferentes linguagens presentes na sala de aula encaminha
seus alunos a estabelecerem relações entre a linguagem do cotidiano e a linguagem
científica.
A seguir, é apresentada a análise em relação a três questões escolhidas para
essa discussão. Os temas referem-se à identificação da equação da circunferência,
interpretando cada termo do desenvolvimento da equação normal da circunferência,
na leitura desta no sistema cartesiano. Além disso, a leitura de temas dos conteúdos
abordados anteriormente, como distância entre dois pontos, equação da reta, entre
outros, também é necessária na categoria sobre a equação da circunferência.
42
5.1 ANÁLISE DA PRIMEIRA QUESTÃO
A primeira questão selecionada foi a seguinte:
1. A equação da circunferência representada pelo gráfico é
(A) 0166
22
=++ xyx
(B) 03
22
=+ xyx
(C) 043
22
=++ yxyx
(D) 04
22
=++ yx
(E) 0166
22
=+ xyx
A questão acima estimula a interpretação gráfica, pois, a partir da
circunferência descrita no plano cartesiano, o aluno tem a possibilidade de
interpretar os conteúdos fundamentais para demonstrar a tese do problema. Os
conteúdos que são interpretados, por meio da figura descrita, são o par ordenado
que corresponda ao centro da circunferência e a distância do centro a um ponto
qualquer pertencente à circunferência, que define o raio. A interpretação gráfica, na
análise da questão, refere-se à identificação dos eixos coordenados com os pontos
correspondentes e à identificação algébrica do esboço gráfico da questão. Espera-
se que o aluno, quando identifica o esboço de uma circunferência no sistema
cartesiano, localize o ponto, por meio de seu par ordenado, que representa o centro,
compreendendo as devidas características. As características estão associadas à
localização, pois, como o centro da circunferência está localizado no eixo das
abscissas, esse par ordenado tem valor nulo para a ordenada. Portanto, a equação
da circunferência não possui o termo cuja parte literal é a variável y, no
desenvolvimento. Assim, poderia ser descartada a alternativa (C), pois sua
equação apresenta este termo (
043
22
=++ yxyx
). O centro, no entanto, possui a
abscissa e com a mesma interpretação do desenvolvimento da questão a equação
da circunferência deve apresentar o termo com a parte literal com a variável x. Como
a alternativa (D) não apresenta nem com y e nem com x, pois algebricamente o
representa uma equação da circunferência centralizada na origem e raio negativo, a
alternativa não é plausível. Portanto, das alternativas restantes, e apenas com
43
referência à interpretação do par ordenado que represente o centro da
circunferência descrita no plano cartesiano da questão, o termo que deve
acompanhar a variável x é (-6). Logo, a única que descreve esse termo é a
alternativa (E) 0166
22
=+ xyx .
Além disso, espera-se que o aluno não se deixe envolver com a
representação do raio dado pela questão, mas o interprete, entendendo que raio é a
distância do centro a qualquer ponto pertencente à circunferência, descrita no plano
cartesiano, sendo preciso identificar os pontos nos quais a circunferência intercepta
o eixo das ordenadas. Como o par ordenado sob o eixo das ordenadas possui a
coordenada das abscissas nula, interpretamos que o raio descrito é a hipotenusa do
triângulo formado com o eixo das ordenadas, que registra o ponto de abscissa nula
e ordenada quatro. O centro localiza-se no eixo das abscissas, isto é, descreve o par
ordenado de abscissa três e ordenado nula, que forma um triângulo retângulo.
O triângulo retângulo formado pelo raio e pelos eixos possui dimensões três e
quatro para os catetos que, conseqüentemente e pelo teorema de Pitágoras, gera o
raio (hipotenusa) igual a cinco. Na equação correta, descrita pelas alternativas, o
termo independente que se refere ao total entre os termos semelhantes é a soma
dos quadrados das coordenadas do centro diminuindo o quadrado do raio. Portanto,
após esses dados da interpretação gráfica, depreende-se que a equação correta
descrita é da alternativa (E).
Entre as resoluções apresentadas pelos alunos, destaco a de um grupo
(Figura 1) que apresentou os conteúdos, a interpretação e a resolução da questão
como se conversasse com alguém, relatando cada passo do seu pensamento. É
possível perceber que a linguagem é considerada tanto como um sistema para fazer
significações quanto ferramenta essencial envolvida no processo de construção e
organização do processo de aprendizagem.
Assim, como afirma Demo (2002), o exercício de aprender a aprender
encaminha o aluno para a autonomia no processo de aprendizagem, por meio de
exercícios que não centralizam saberes em apenas um foco do conteúdo ou de uma
pessoa, mas que valorizam a experiência, a interpretação e as relações
estabelecidas entre os conteúdos explorados e a linguagem matemática adequada.
44
Figura 1. Resolução da questão 1 apresentada por um dos grupos.
Na resolução da primeira questão, o referido grupo relata todos os passos
que realizou para interpretar e apresentar a tese da questão. Utiliza uma linguagem
matemática adequada para os conteúdos destacados na hipótese da questão e
demonstra relacionar os conteúdos anteriores para apresentar a tese. Como
Machado e Bicudo (2006) referem, existem conteúdos matemáticos que necessitam
de uma escrita bem elaborada para terem significados ao contexto empregado.
No primeiro passo, é apresentada a interpretação gráfica, isto é, a leitura dos
conteúdos envolvidos no gráfico descrito na hipótese. O plano cartesiano é descrito,
abordando o centro como sendo um par ordenado. Não é destacada a importância
de esse centro pertencer ao eixo das abscissas, o que é relevante na visão do
professor. No entanto, são localizadas e interpretadas as coordenadas do centro e
do raio, e elas são ainda relacionadas com os lados de um triângulo retângulo. O
Teorema de Pitágoras é utilizado em relação à distância entre o centro e o ponto
que pertence à circunferência e é determinada a medida do raio demonstrando o
45
triângulo retângulo por meio dos números pitagóricos. Assim, é concluído o primeiro
passo, determinando o centro da circunferência e o raio.
No segundo passo, o grupo apresenta um problema de linguagem
matemática, referindo-se à “fórmula da circunferência” e escrevendo, na mesma
frase, a equação da circunferência analiticamente, a fim de substituir os valores
correspondentes do centro e raio. A dificuldade que se pode destacar é a falta da
distinção entre o conceito de circunferência e o de equação da circunferência.
Observe-se que o grupo identifica e aplica o conteúdo de produto notável no
desenvolvimento da equação de circunferência, destaca o termo que se refere à
abscissa do centro, mas não faz comentários sobre a falta do termo da equação que
deveria estar acompanhando a variável y. Destaca também o termo independente,
mas não o ressalta, usando-o apenas como decorrência da simplificação de termos
semelhantes.
Além dessa análise de um dos grupos em relação à primeira questão, que
demonstra aplicação de conteúdos de que se lembram e de conteúdos que foram
pesquisados na UA desenvolvida em sala de aula, apresento uma tabela com os
principais conteúdos identificados pelos 25 grupos ao interpretarem a primeira
questão da categoria, referente à equação da circunferência, bem como os
conteúdos esperados pelo professor na aprendizagem dos alunos após a realização
da UA.
Tabela 1 - Conteúdos identificados pelos grupos
Conteúdos esperados Número de
grupos que
identificaram os
conteúdos
% dos grupos
que
identificaram os
conteúdos
Interpretação Gráfica
23 92
Eixos coordenados 14 56
Par ordenado 25 100
Ponto a que pertence 12 48
Ponto no eixo das abscissas 17 68
Ponto no eixo das ordenadas 17 68
Origem 1 4
Teorema de Pitágoras
22 88
Distância entre dois pontos 22 88
Equação da Circunferência
23 92
Centro 25 100
Termo com a x 16 64
Termo com a y 16 64
Raio 12 48
Termo independente 12 48
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
46
Os dados da tabela 1 mostram os conteúdos matemáticos que os grupos
indicaram na resolução da primeira questão. Destaca-se que esses dados foram
extraídos dos relatórios elaborados pelos 25 grupos, nos quais apresentam a
interpretação do problema e a tese para a sua solução. Os conteúdos esperados
pelo professor são citados na primeira coluna da tabela. Na segunda coluna, são
apresentadas as freqüências dos números de grupos que identificaram cada um dos
conteúdos esperados e, na terceira coluna, são apresentados os porcentuais
relativos à segunda coluna, para o total de 25 grupos que resolveram a questão.
A identificação dos conteúdos relativos à interpretação gráfica envolve a
interpretação dos eixos coordenados, o par ordenado, o ponto pertencente à
equação descrita no sistema cartesiano, o ponto sobre os eixos das abscissas e das
ordenadas, bem como a identificação da origem. Esses conteúdos matemáticos
foram identificados de modo satisfatório, pois apresentaram um índice percentual
alto. São conteúdos estudados pelos alunos em situações vivenciadas em anos
anteriores. No Ensino Fundamental, utilizam o conteúdo de par ordenado para
representar a solução de sistemas de equações de 1
o
grau com duas variáveis. Os
alunos também construíram o espaço orientado do sistema cartesiano, no qual
exploraram o conteúdo de função do 1
o
grau e, desse modo, utilizam os conteúdos
sobre os pontos nos eixos coordenados, ressaltando suas características. Cabe
lembrar que essas são características fundamentais para a formalização referente
aos pontos pertencentes aos eixos do sistema cartesiano. A leitura e a interpretação
das hipóteses encontram-se no esboço gráfico apresentado. O percentual sobre a
identificação pelos grupos do par ordenado é de 100%, pois, muito provavelmente,
esse conteúdo foi estudado nos anos anteriores. Os conteúdos sobre os pontos
nos eixos coordenados foram identificados em 68% dos grupos, o que demonstra os
aspectos relevantes da identificação dos dados que a figura descreve na questão.
Mas, além da identificação desse conteúdo, 48% dos grupos relacionaram esses
pontos com pontos que pertencem à equação da circunferência, tornando possível
interpretá-lo e relacioná-lo à medida do raio, identificada por 48% dos grupos. A
relação desses pontos com a medida do raio é referida por 88% dos grupos, que o
determinam por meio do teorema de Pitágoras e, do mesmo modo, utilizam a
relação algébrica da distância entre dois pontos para defini-lo.
47
A equação da circunferência, tese da questão, é identificada com o porcentual
expressivo de 92% dos grupos, quando o tópico relaciona um dos pares ordenados
como o centro, identificado por todos os grupos. No entanto, é baixo o percentual de
grupos que não identificam os termos com as variáveis x e y (64%) no
desenvolvimento da equação da circunferência. Uma das explicações para o fato de
esse percentual ser baixo são as dificuldades apresentadas pelos alunos ao
relacionar cada termo da equação normal da circunferência com as alternativas
descritas na questão. Também é baixo o percentual de identificação do termo
independente (48%). Ele parece também ser reflexo da falta de domínio dos
conteúdos na interpretação sobre os termos do desenvolvimento da equação da
circunferência e as alternativas apresentadas.
Portanto, na análise da primeira questão, pôde-se identificar que, em geral, os
alunos lembram de conteúdos estudados na UA, mas alguns deixam a desejar.
Na tabela 2, são apresentados conteúdos lembrados durante o
desenvolvimento da tese da questão como o produto notável e redução de termos
semelhantes, que não eram esperados pelo professor, pois sua compreensão
deveria ser decorrência de um conteúdo mais amplo presente na demonstração da
tese da questão. Foram, no entanto, lembrados por alguns grupos os conteúdos
apresentados a seguir.
Tabela 2 - Conteúdos identificados pelos grupos, mas não esperados pelo
professor
Conteúdos não esperados
Número de grupos
que identificaram
os conteúdos
% dos grupos que
identificaram os
conteúdos
Produto Notável 5 20
Redução de termos semelhantes 8 32
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
No desenvolvimento da UA, um dos grupos responsabilizou-se pela
comunicação aos demais colegas da turma dos conteúdos matemáticos
identificados na primeira questão. Durante essa apresentação, foram permitidas
interferências de outros grupos para que os demais colegas pudessem expressar
48
as diferentes interpretações das hipóteses e comprovações da tese. O professor
orientou as discussões, resgatando os significados de cada conteúdo expresso no
sistema cartesiano e promoveu a leitura das alternativas propostas para a
demonstração da tese. Os grupos retomavam os conteúdos e complementavam
suas anotações, para identificar os conteúdos em outras situações. Como enfatiza
Demo (2002), quando o professor e o aluno o envolvidos no contexto da
pesquisa, segue uma parceria de trabalho ativo, participativo, produtivo e
reconstrutivo do processo de aprendizagem, no qual o aluno demonstra
autonomia.
5.2 ANÁLISE DA SEGUNDA QUESTÃO
A segunda questão selecionada foi a seguinte:
2. A equação da reta que passa pelo centro da circunferência
064
22
=++ yxyx e é paralela à reta x - y = 0 é
(A) 4x – 6y = 0
(B) 2x – 3y +6 = 0
(C) 3x – 2y +6 = 0
(D) x – y + 5 = 0
(E) 4x + 6y = 0
A segunda questão estimula a atenção e a concentração do aluno, pois a
linguagem matemática implícita nas hipóteses da questão é fundamental para a
interpretação e o encaminhamento da tese. A linguagem matemática implícita nas
hipóteses, como se refere Machado e Bicudo (2006), é um elo no processo de
interpretação, necessitando-se da assistência da codificação dos termos para que
compreendamos sua forma e seus conteúdos.
A questão oferece como hipótese a equação da circunferência, na qual o
aluno precisa interpretar, a partir dos termos da equação, o par ordenado que
corresponda ao centro. Outra hipótese é a equação geral da reta, que o aluno
precisa apresentar na forma reduzida, para identificar o coeficiente angular e linear.
Esses conteúdos são importantes para interpretar as hipóteses e, dessa maneira,
apresentar a tese. Nessa pergunta sobre a equação geral da reta que passa pelo
centro, o par ordenado correspondente ao centro pertence a uma das retas
apresentadas nas alternativas ou, simplesmente, o ponto (o centro) pertence à reta
49
em questão. Além disso, a reta deve ser paralela, isto é, ter o mesmo coeficiente
angular que a reta geral dada na hipótese.
Portanto, nessa questão os grupos precisavam identificar conteúdos que não
são referências diretas da categoria da equação da circunferência. As hipóteses
encaminham os alunos a buscar conteúdos anteriores e a interpretar de modo
significativo cada termo da equação normal da circunferência, a fim de relacioná-los
e não comprometer a tese. Em um caso como esse, é importante que os alunos
relacionem o coeficiente angular identificado na equação reduzida da reta com a
inclinação (declividade) da reta em relação ao eixo das abscissas, isto é, o ângulo,
que a reta forma com o eixo das abscissas no sentido anti-horário, é interpretado
como a razão entre os catetos oposto e adjacente. Assim, para apresentar a tese da
questão pela identificação do coeficiente angular como a razão entre os catetos que
são interpretados com a aplicação do centro da equação da circunferência, esse
significado é necessário e o se trata de uma simples aplicação de resultados
algébricos prontos, por meio de fórmulas.
A seguir, são apresentados os conteúdos indicados por um dos grupos para a
segunda questão, para que se possa compreender o modo usado para descrever as
hipóteses e as interpretações dos conteúdos matemáticos. Esse grupo descreveu
três passos e, após, representou o problema de maneira sintética, apresentando
mais linhas de lculos e reduzindo a linguagem do senso comum para explicar a
resolução da questão. Assim, identificou os conteúdos, justificou-os como passos da
resolução, mas não apresentou o conteúdo matemático do termo ou o motivo pelo
qual aplicou os procedimentos algébricos.
Esse grupo, em especial, conseguiu transpor um obstáculo da linguagem,
pois, para esses conteúdos terem sentido, é importante que sejam identificados e
interpretados com significados na linguagem comum, conforme Machado e Bicudo
(2006). A linguagem comum foi utilizada como uma descrição do seu pensamento,
relacionado com o contexto da questão proposta.
50
Figura 2. Relatório de um dos grupos para a segunda questão.
Após a leitura da descrição referente à segunda questão pelo grupo, passo a
analisar a descrição dos passos da resolução.
51
O relatório revela que o grupo apresenta dificuldades em relação à aplicação
de conteúdos matemáticos em situações posteriores, pois as descrições e a
identificação dos termos matemáticos da questão, desenvolvidos pelos alunos do
grupo, não apresentam justificativa em relação ao conteúdo matemático e são
apresentados apenas na forma algébrica. Desse modo, conforme Machado e
Bicudo (2006, p. 113), “a escrita expõe a Matemática para o sujeito e, por meio dela,
ele se expõe para a comunidade”. Como o grupo não compreendeu os conteúdos
matemáticos e as estratégias possíveis para as interpretações referentes às
hipóteses, descreve relações algébricas que fundamentam suas linhas de raciocínio,
mas não enriquecem o processo de aprendizagem significativa.
A tabela 3 apresenta os conteúdos identificados pelos grupos na resolução da
segunda questão, em comparação com os conteúdos esperados pelo professor
após o desenvolvimento da UA.
Tabela 3 - Conteúdos identificados pelos grupos em relação aos esperados
pelo professor
Conteúdos esperados Número de
grupos que
identificaram os
conteúdos
% dos grupos
que
identificaram os
conteúdos
Equação Geral da reta
20 80
Equação reduzida da reta 23 92
Coeficiente angular 25 100
Inclinação 0 0
Coeficiente linear 10 40
Coef. ang =
adjacentecateto
opostocateto
tg =
α
0 0
Ponto que pertence à reta 23 92
Retas paralelas 18 72
Equação da Circunferência
25 100
Centro 25 100
Termo com x 25 100
Termo com y 25 100
Raio 2 8
Termo independente 0 0
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
A tabela 3 mostra os conteúdos matemáticos que os grupos identificaram na
resolução da segunda questão. Esses conteúdos são citados nos relatórios dos
grupos. Pela análise da tabela 3, pode-se verificar que o conteúdo de coeficiente
52
angular foi identificado por todos os grupos, Na resolução dessa questão, no
entanto, nenhum dos grupos relacionou esse conteúdo com o ângulo de inclinação
que essa reta faz com o eixo das abscissas no sentido anti-horário e,
conseqüentemente, sobre o coeficiente angular ser o valor da tangente do ângulo
formado entre a reta e o eixo das abscissas. Também não foi relacionado o
conteúdo com o coeficiente angular, que é a razão da distância entre os valores das
ordenadas dos pontos e a distância dos valores das abscissas desses pontos (0%).
Esses pontos determinam geometricamente os lados do triângulo retângulo formado
com os eixos e o ponto referente ao centro da equação da circunferência. Essas
interpretações e relações sobre o coeficiente angular com os termos indicados nas
hipóteses reúnem significados que contribuem para a reflexão dos professores e
para conduzir estratégias matemáticas de aplicações.
O ponto que corresponde ao centro da equação da circunferência foi
conteúdo identificado por todos os grupos, mas é apresentado como um ponto que é
determinado por um procedimento algébrico, por meio dos termos com a variável x
e, o outro, com a variável y, ambos identificados por todos os grupos. A equação da
circunferência também foi identificada pelos grupos na sua totalidade. A
interpretação dos termos da circunferência o foi destaque dos grupos nas
informações referentes ao raio (identificado por 8% dos grupos), pois, como a tese
prioriza o centro, foram deixadas de lado as contribuições de que o raio e o termo
independente (esse não são identificados por nenhum grupo) poderiam encaminhar
para a tese. Essas contribuições nas interpretações dos dados das hipóteses e nos
desenvolvimentos são abandonadas ou esquecidas pelos alunos. Assim, parecem
mostrar que os conteúdos ainda não foram internalizados para serem processados e
aplicados em outras situações matemáticas.
O conteúdo da equação geral da reta foi identificado por 80% dos grupos, e o
da equação reduzida da reta, por 92% dos grupos, indicando informações
compreendidas pelos alunos que auxiliam na demonstração da tese. O auxílio que a
equação reduzida da reta indica é plenamente interpretado pelos grupos, pois o
coeficiente angular é identificado por todos os grupos, sendo identificados por
grande parte dos grupos também o conteúdo de paralelismo entre retas (72% dos
grupos). Entretanto, o conteúdo de coeficiente linear foi pouco indicado (40% dos
grupos), mostrando a pouca importância para a tese. Os grupos apontam ter
53
significado a testagem referente ao ponto que pertence à reta (92% dos grupos), o
que influenciou a baixa freqüência no conteúdo de paralelismo.
Outros conteúdos não eram esperados pelo professor na resolução da
segunda questão, mas foram indicados pelos grupos, conforme a tabela 4.
Tabela 4 - Conteúdos identificados pelos grupos e não esperados pelo
professor
Conteúdos não esperados Número de
grupos que
identificaram
os conteúdos
% dos grupos
que
identificaram
os conteúdos
Sistema cartesiano 2 8
Quadrantes do sistema cartesiano 2 8
Origem 10 40
Bissetriz 1 4
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
Esses conteúdos não eram esperados pelo professor. No entanto, são
conteúdos que contribuem na significação dos conteúdos matemáticos pelos alunos,
pois os grupos que os identificaram apresentaram a interpretação geométrica dos
dados da hipótese da questão. Os grupos esboçaram a reta (x y = 0), passando
pela origem (40% dos grupos) e como bissetriz (4% dos grupos) dos quadrantes
ímpares do sistema cartesiano (8% dos grupos). Destaca-se que essas
demonstrações, mesmo sendo relevantes, não foram concluídas pelos grupos.
No caso dessa questão, a representação da reta que passa pela origem
(coeficiente linear nulo) e que divide em partes de mesma medida os quadrantes
ímpares foi sugerida por meio de uma intervenção oral do professor durante a
apresentação do grupo aos colegas. Assim, aproveitando o que os grupos haviam
apresentado em seus relatórios sobre o coeficiente angular e a relação algébrica
aplicada na demonstração da tese, os alunos foram orientados na busca de
significados sobre os conteúdos e a visualização das hipóteses. Pode-se perceber
que, pelos conteúdos matemáticos representados no sistema cartesiano, a tese é
comprovada sem aplicações algébricas, isto é, sem as fórmulas descritas nos
relatórios.
Por isso, o papel do professor como mediador no processo de aprendizagem
é o de observar e orientar os alunos para o uso de uma linguagem matemática
54
adequada e com significado para a reconstrução dos conhecimentos científicos
explorados na sala de aula, como indica Vygotsky ao descrever o papel do professor
na sua teoria.
5.3 ANÁLISE DA TERCEIRA QUESTÃO
A terceira questão é a seguinte:
3. Os pontos em que a reta 3x + 2y + 12 = 0 intercepta a circunferência de
equação 064
22
=+++ yxyx determinam um segmento de
comprimento igual a
(A) 2 5
(B) 2 13
(C) 5 2
(D) 5 13
(E) 13 2
Na terceira questão, a leitura dos conteúdos e a representação gráfica que a
hipótese sugere são importantes para a interpretação da linguagem matemática
envolvida. O enunciado da questão descreve uma equação geral de uma reta, que é
interpretada na forma reduzida para destacar o coeficiente angular (define a
inclinação ou declividade da reta) e o coeficiente linear (define o ponto que a reta
intercepta o eixo das ordenadas). É importante representar essa reta no sistema
cartesiano, pois a resolução da questão exige o comprimento do segmento que essa
reta determina ao passar pela circunferência. Essa circunferência é representada
pela equação informada no enunciado, sendo que, a partir dela, podemos destacar o
ponto que corresponde ao centro. Pode-se verificar que o centro é um ponto que
pertence às extremidades do segmento e está alinhado a elas. Essas extremidades
são os pares ordenados que definem o ponto que a reta dada na hipótese intercepta
o eixo das abscissas e o eixo das ordenadas. E o comprimento do segmento é,
simplesmente, o diâmetro da circunferência dada na hipótese. A interpretação dessa
questão é também fundamentada pela representação no sistema cartesiano, que
encaminha a significação dos conteúdos da hipótese para a comprovação da tese.
55
Para auxiliar na análise dessa questão, são apresentadas duas soluções.
Uma trata da identificação dos conteúdos matemáticos e da interpretação desses
conteúdos no sistema cartesiano. A outra apresenta a interpretação envolvendo
conteúdos não esperados pelo professor. Nesta, para a identificação dos conteúdos
matemáticos, foi utilizado o sistema de equações, envolvendo a interpretação de
ponto de intersecção para responder sobre o comprimento do segmento
determinado pela reta ao interseccionar a circunferência.
O primeiro grupo descreve as hipóteses representando-as geometricamente.
Figura 3. Relatório de um dos grupos para a terceira questão.
Nesses passos do relatório, o grupo apresenta os conteúdos relacionados às
hipóteses da questão. Sobre a equação da circunferência, são identificados os
termos com as variáveis x e y, para determinar as coordenadas do centro por um
procedimento algébrico.
É apresentada, ainda, a aplicação de outro resultado algébrico para
determinar o raio. O grupo o justificou, por meio de uma linguagem matemática
56
adequada e escrita, as relações algébricas. Justificou, entretanto, os conteúdos
identificados na hipótese quando comunicou aos demais colegas as suas
conclusões, e, quando da demonstração da tese no instante de representar
graficamente no sistema cartesiano as hipóteses e demonstrar a tese, o que foi
constatado após serem feitas as intervenções do professor. O professor orientou os
alunos no sentido de lerem e de relacionarem ao sistema cartesiano os dados
apresentados no enunciado. A partir daí, os alunos puderam relacionar que o
diâmetro correspondia à tese, isto é, ao comprimento do segmento da intersecção
da reta com a circunferência. O grupo complementou, durante a comunicação, que o
centro era um ponto que pertencia à reta. Apresentou os dois pontos, que são as
extremidades do segmento, bem como os pontos de intersecção com os eixos
coordenados.
Esses conteúdos são apresentados na tabela 5.
Tabela 5 - Conteúdos identificados pelos grupos em relação aos esperados
pelo professor.
Conteúdos esperados pelo professor Número de
grupos que
identificaram
os conteúdos
% dos grupos
que
identificaram
os conteúdos
Equação Geral da reta
24 96
Equação reduzida da reta 23 92
Coeficiente angular 25 100
Inclinação 0 0
Coeficiente linear 25 100
Coef. ang =
adjacentecateto
opostocateto
tg =
α
0 0
Ponto que pertence à reta 22 88
Ponto que pertence ao eixo das abscissas 20 80
Ponto que pertence ao eixo das ordenadas 20 80
Segmento 25 100
Equação da Circunferência
25 100
Centro 25 100
Termo com x 25 100
Termo com y 25 100
Raio 18 72
Teorema de Pitágoras
2 8
Distância entre dois pontos 6 24
Termo independente 1 4
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
57
A tabela 5 mostra a comparação, objetivamente, entre a identificação de
conteúdos matemáticos pelos grupos e os esperados pelo professor, quando
refletiram sobre essa questão. Os grupos apresentaram um percentual de 100% na
identificação dos conteúdos que envolvem diretamente as hipóteses e a
demonstração da tese. O conteúdo da equação geral da reta foi identificado nos
relatórios de 96% dos grupos. A equação reduzida da reta também foi bem
identificada por um número próximo de grupos (92%). Os conteúdos de coeficiente
angular e coeficiente linear foram identificados por todos os grupos, que se
mostraram capazes de ler e interpretar a questão. No entanto, o coeficiente angular
em suas outras representações e relações com a inclinação (declividade) e a
tangente não faz parte das resoluções de nenhum dos 25 grupos, indicando
dificuldades desses alunos na aprendizagem de tais conteúdos. Os conteúdos
relacionados a conhecimentos prévios esperados apresentam excelente
identificação pelos grupos, como, por exemplo, segmento (100% dos grupos). Esse
conteúdo foi identificado com significado para os alunos, pois os grupos, além de
definirem o conteúdo, também o representaram geometricamente. A equação da
circunferência também foi identificada com segurança por todos os grupos, bem
como seus termos, o centro. Este também foi identificado por meio de relações
algébricas, e o com os fundamentos do produto notável. Os termos do
desenvolvimento da equação normal da circunferência com as variáveis x e y,
aplicados com propriedade, como extremos do segmento, foram identificados em
todos os relatórios. O raio foi identificado em relatórios de grande parte dos grupos
(72%), mas a relação feita por meio da relação algébrica com o termo independente
pode ser identificada em apenas 4% dos grupos; o Teorema de Pitágoras, em 8%
dos grupos; e a relação algébrica da distância entre dois pontos, em 24% dos
grupos, o que não era fundamental para a tese.
A verificação sobre os pontos que pertencem à reta, relacionando-os ao
centro, foi identificada em 88% dos relatórios; e os pontos dos eixos coordenados,
como extremos do segmento, em 80% dos relatórios dos grupos. No entanto, os
grupos poderiam ter acrescentado nos argumentos sobre o ponto referente ao
centro o fato de ele pertencer a essa reta, considerando que a reta referida no
enunciado da questão possuía declividade decrescente. Assim, não haveria
necessidade de constar o conteúdo sobre o raio, pois as extremidades do segmento,
isto é, os pontos que pertence à reta com os eixos coordenados foram identificados
58
por 80% dos grupos. Esse segmento, que é a tese da questão, apresenta-se como
hipotenusa de um triângulo retângulo, se tais dados forem registrados no sistema
cartesiano, sendo os eixos coordenados os seus catetos. A aplicação do Teorema
de Pitágoras, indicado na resolução de 8% dos relatórios também apresenta a tese.
Porém, percebe-se que os alunos ainda preferem modelos algébricos prontos,
selecionados durante as pesquisas.
Na segunda solução, um dos grupos encaminhou a interpretação da questão
por meio do conteúdo do ponto de intersecção, apresentando a tese e a
identificação dos conteúdos da hipótese, utilizando o conteúdo de sistema de
equações com duas variáveis. A aplicação desse conteúdo surpreendeu e valorizou
a discussão de como são importantes os conteúdos que aprendemos anteriormente,
para aplicá-los quando necessário.
A figura 4 representa a resolução da terceira questão, por meio do sistema de
equações, no método de substituição, utilizado por um grupo. No desenvolvimento
do sistema, os valores das abscissas dos pontos de intersecção ou das
extremidades do segmento, que determinaram as raízes por fatoração do termo
comum foi descrito e salientado pelo grupo e pelo professor no momento da
comunicação para o restante da turma.
59
Figura 4. Equações em que se utiliza o método da substituição, elaborado pelos alunos.
O relatório apresenta o sistema de equações utilizando o método de
substituição. No desenvolvimento do sistema, os valores das abscissas dos pontos
de intersecção ou das extremidades do segmento são as raízes de uma equação do
segundo grau incompleta. Através dele, os alunos conseguiram determinar as raízes
por fatoração do termo comum. Na segunda equação, os alunos substituíram os
valores correspondentes das abscissas, determinando as ordenadas, identificando,
assim, os pontos de intersecção da reta com a circunferência. Tendo os pontos das
extremidades, por meio da distância entre dois pontos, apenas o conteúdo algébrico,
não utilizaram a representação no plano cartesiano, respondendo ao enunciado da
questão.
No final do relatório, o grupo apresenta graficamente a interpretação sobre as
posições entre uma reta e a circunferência, envolvendo o conteúdo de reta secante,
reta tangente e reta externa a uma circunferência.
A tabela 6, apresentada abaixo, mostra os conteúdos matemáticos que os
grupos empregaram em seus relatórios e que surpreenderam o professor.
Tabela 6 - Conteúdos identificados pelos grupos e não esperados pelo
professor
Conteúdos não esperados Número de
grupos que
identificaram
os conteúdos
% dos grupos
que
identificaram
os conteúdos
Sistema de equações 2 8
Equação do 2
o
grau 2 8
Fatoração: termo comum em evidência 1 4
Fórmula de Bhaskara 1 4
Diâmetro 1 4
Fonte: Dados obtidos na pesquisa.
Os conteúdos destacados nas tabelas 1, 3 e 5 eram esperados pelo
professor, pois foram tratados no desenvolver do conteúdo de geometria analítica
durante a pesquisa e categorização de questões retiradas de provas de concurso
vestibular. As tabelas foram organizadas para oportunizar uma visão objetiva dos
conteúdos lembrados pelos alunos no desenvolvimento e na interpretação das
61
questões selecionadas na categorização. Esses conteúdos foram comparados
àqueles esperados pelo professor. Portanto, pretendeu-se com essa análise
identificar os conteúdos mais lembrados, mas também os não lembrados na
interpretação da hipótese e na demonstração da solução da questão pelos grupos,
envolvendo a linguagem matemática adequada na escrita dos relatórios. A análise
sobre cada uma das questões demonstra como são importantes os conteúdos
matemáticos necessários à interpretação das situações-problema, expressos por
uma linguagem adequada. Os conteúdos esperados pelo professor foram baseados
em autores de livros didáticos utilizados por muitos dos professores das escolas
particulares de Porto Alegre/RS.
Algumas resoluções foram desenvolvidas por meio de conteúdos não
esperados pelo professor e foram apresentadas nas tabelas 2, 4 e 6. As tabelas e as
análises dos relatórios direcionaram o professor para orientar e discutir com os
alunos o fato de identificarem conteúdos, mas não aplicarem como estratégias com
significado próprio. Os conteúdos nos relatórios foram citados e identificados, mas
não justificados com a significação adequada à linguagem matemática de alunos
que estão concluindo o Ensino Médio e conhecem, ou deveriam conhecer,
conteúdos matemáticos que justifiquem a interpretação dos identificados. Por isso, o
processo de leitura-análise-interpretação de conteúdos matemáticos consiste em um
conjunto de ações para identificar conteúdos matemáticos, por meio do ato de ler e
de expressar o raciocínio lógico-matemático, buscando interpretar as questões
matemáticas.
Portanto, se alunos executarem somente uma ação, conseguirão interpretar
de modo efetivo os problemas e construir significados em relação aos conteúdos
matemáticos identificados nas questões? Se exercitarem a habilidade da pesquisa
no dia-a-dia, conseguirão aplicar estratégias de resoluções com aplicações de
conteúdos não esperados pelo professor? O espírito pesquisador auxilia os alunos a
relacionarem conteúdos matemáticos? Esses foram alguns dos questionamentos,
acerca dos quais, após a análise dos dados coletados no desenvolvimento da UA
sobre o conteúdo de geometria analítica, creio ter conseguido refletir. Assim, penso
ter podido encaminhar algumas respostas, o que me permitiu dar continuidade à
reconstrução epistemológica da minha prática profissional na sala de aula e
apresentar situações para a reflexão de outros docentes sobre o foco deste estudo,
no qual a linguagem matemática é o centro.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Unidade de Aprendizagem é um é um modo de organizar o ensino que tem
por finalidade oportunizar ao aluno, e também ao professor, o “aprender a aprender”.
Esse modo de organização curricular tem por base a pesquisa e valoriza a
linguagem e os processos de comunicação, como a fala, a leitura e a escrita. Por
isso, empregar a UA como um modo de contribuir para a aprendizagem de
geometria analítica pelos alunos foi um dos objetivos deste trabalho. Além disso, foi
intenção proporcionar um espaço ao professor para refletir sobre o seu trabalho,
reconsiderando-o e, principalmente, desenvolvendo uma atitude de repensar o modo
como os alunos aprendem os conteúdos matemáticos de geometria analítica,
identificando as dificuldades que os alunos apresentam nesse processo.
A pesquisa desenvolveu-se na sala de aula pela mediação do professor e
pela interação entre o conhecimento cotidiano e o conhecimento científico.
Quando a aprendizagem se desenvolve desse modo compartilhado, é
possível observar que o conhecimento reconstruído pelos alunos torna-se mais
consistente, mais complexo, mais científico, mais duradouro. Além disso, o aluno
torna-se mais capaz de interpretar o problema proposto e aplicar os conhecimentos
reconstruídos em novas situações-problema. A vivência com a UA contribui para a
mudança na concepção do que seja ser professor, pois se opõe à atitude de “dar
aula”, que não considera a alternativa de tornar o aluno protagonista do processo de
aprendizagem. A UA torna o aluno mais participativo, pois promove a relação
interpessoal na sala de aula. A “mudançametodológica desacomoda o aluno e o
professor no sentido de uma construção dos conteúdos e conhecimentos
matemáticos mais consistentes, qualificada e contextualizada.
Portanto, com esse trabalho pretendi colaborar com o processo de reflexão
por parte dos professores que ainda questionam a falta de interesse dos alunos em
suas aulas, desenvolvida através de metodologias tradicionais. Ressalto, assim, a
proposta da UA como uma metodologia sociocultural, baseada em Mizukami (1987),
ou investigativa, conforme designação de Porlán (1996), que valoriza a ação
coletiva, a pesquisa e o desenvolvimento da autonomia do aluno em relação à
aprendizagem.
63
No desenvolvimento da pesquisa foram analisados relatórios com a resolução
dos alunos para três questões sobre geometria analítica, com objetivo de identificar
conteúdos matemáticos lembrados e não lembrados em relação aos conteúdos
esperados pelo professor. Foi possível também identificar conteúdos e soluções o
previstas pelo professor, mostrando a capacidade de alguns alunos de criar soluções
novas para os problemas propostos. Esse exercício favorece a interpretação e a
aplicação de soluções em outras situações.
Os conteúdos mais lembrados pelos grupos foram: a equação da
circunferência; o centro; os termos do desenvolvimento da equação normal da
circunferência, com a variável x e o termo com a variável y; o ponto que pertence à
equação analítica e aos eixos coordenados; o par ordenado; e a equação reduzida
da reta que destacava os coeficientes angular e linear. Os menos lembrados foram:
o raio da circunferência; o termo independente da equação normal da circunferência;
a inclinação (declividade); o coeficiente angular interpretado como a tangente do
ângulo correspondente ou razão entre os catetos oposto e adjacente; e o conteúdo
do par ordenado correspondente à origem. Isso mostra a importância de buscar
modos de trabalhar mais intensamente esses conteúdos menos lembrados.
Também é preciso trabalhar na escola com situações do cotidiano, da
realidade e das relações interpessoais. É necessário ouvir os alunos, deixando que
expressem suas experiências e seus conhecimentos sobre os assuntos propostos,
pois, partir do conhecimento tácito dos alunos possibilita o surgimento de estratégias
para o desenvolvimento de aprendizagens significativas e duradouras.
Após a análise dos relatórios, foi possível perceber nos argumentos utilizados
pelo corpo discente o uso da linguagem matemática com mais significado. Dessa
maneira os alunos demonstraram maior compreensão com a linguagem formal da
matemática para a linguagem natural que interpreta e comunica as estratégias de
resolução da situação-problema apresentada. Por isso, é importante que o professor
assuma, em sua prática na sala de aula, uma atitude de repensar permanentemente
seus procedimentos de ensino, procurando estar atento à forma como o aluno
interpreta e expressa sua aprendizagem. Dito de outro modo é importante que o
professor tome consciência do papel da linguagem na aprendizagem dos alunos.
Percebeu-se que o respeito ao ritmo de cada aluno para a compreensão de
conteúdos de diferentes níveis de complexidade e aplicação dos conteúdos
matemáticos em resoluções é algo que necessita ser observado e valorizado pelo
64
professor no dia-a-dia do ano letivo. Desta maneira, fica evidente que o professor
pode oportunizar caminhos mais produtivos e agradáveis para a reconstrução de
saberes matemáticos no tempo em que o aluno se envolve com os conteúdos da
disciplina. Além disso, o professor pode contribuir para a qualificação da relação
professor-aluno-aprendizagem em sala de aula.
Este estudo não pretende esgotar as discussões sobre aprendizagem em
relação ao tema geometria analítica e sobre a Unidade de Aprendizagem como
ferramenta metodológica de ensino. Muito menos, sobre o papel da linguagem na
reconstrução do conhecimento e na constituição do sujeito. Constitui-se, pois, em
mais uma contribuição para a reflexão dos educadores que se sentem insatisfeitos
com a aprendizagem seus alunos. A atitude de “aprender a aprender” é intrínseca à
atividade docente, pois os professores necessitam sempre estar redimensionando e
qualificando o seu trabalho.
65
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Fernanda Medeiros de. Unidade de Aprendizagem: uma
alternativa para professores e alunos conviverem melhor. Porto Alegre: PUCRS
Faculdade de Física (Dissertação de Mestrado), 2006.
ANTUNES, Celso. Vygotsky,quem diria?! Em minha sala de aula. 3. ed.
Petrópolis,RJ: Vozes, 2002.
BECKER, Fernando. A epistemologia do professor. 10. ed. Petropólis, RJ: Vozes,
1993.
BOCCHESE, Jocelyne da Cunha. O professor e a construção de competências.
ENRICONE, Délcia (Org.). Ser professor. 2. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002.
DEMO, Pedro. Educar pela Pesquisa. 5. ed. Campinas, SP: Autores Associados,
2002.
______. Pesquisa e construção do conhecimento. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
GALIAZZI, Maria do Carmo; GARCIA, Fabianne Ávila; LINDEMANN, Renata
Hernandez. Construindo Caleidoscópio: organizando unidades de aprendizagem. In:
MORAES, Roque; MANCUSO, Ronaldo (Org.). Educação em Ciências. Ijuí: Editora
Unijuí, 2004.
HEREDIA, Carlos Alberto Vianna. Zero Hora: E a matemática, como vai? Porto
Alegre, 13, janeiro, 2006. p. 15.
IEZZI, Gelson; DOLCE, Osvaldo; DEGENSZAJN, David; RIGO, Roberto;
ALMEIDA, Nilze de. Matemática: ciência e aplicações. São Paulo: Atual. 2001. v. 3.
JABLONSKI, Eduardo. Zero Hora: indisciplina em Pauta. Porto Alegre, 21, maio,
2007. p. 13.
JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 3. ed.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.
LA ROSA, Jorge. Psicologia e Educação: o significado do aprender. 7.ed. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2003.
66
LIBÂNEO, JoCarlos. A escola que sonhamos é aquela que assegura a todos a
formação cultural e científica para a vida pessoal, profissional e cidadã. In: Costa,
Maria V. (Org.). A escola tem futuro? Rio de Janeiro: DP & A, 2003, v. 1, p. 23-52.
MACHADO, Antônio Pádua; BICUDO, Maria Aparecida Viggini. Significados da
escrita da Matemática. In: MENEGHETTI, Renata Cristina Geromel (Org). Educação
Matemática: vivências refletidas. São Paulo, SP: CENTAURO, 2006.
MALTA, Iaci. Linguagem, Leitura e Matemática. In: CURY, Helena Noronha (Org.).
Disciplinas Matemáticas em Cursos Superiores: reflexões, relatos, propostas.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. p. 41-62.
MAZZEI, Luiz Davi. Dificuldades de Ensino e de Aprendizagem do
Conhecimento Matemático: analisando a linguagem empregada por professores e
alunos. Porto Alegre: PUCRS (Dissertação de Mestrado), 2004.
MORAES, Roque; LIMA, Valderez Marina do Rosário (Orgs.). Pesquisa em sala de
aula: tendências para a educação em novos tempos. 2. ed. Porto Alegre, RS:
EDIPUCRS, 2004. p. 27.
MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do Carmo; RAMOS, Maurivan Güntzel.
Pesquisa em sala de aula: fundamentos e pressupostos. In: MORAES, Roque;
Valderez Marina do Rosário Lima (Orgs.). Pesquisa em sala de aula: tendências
para a educação em novos tempos. 2. ed. Porto Alegre, RS: EDIPUCRS, 2004. p. 9-
24.
MORIN, Edgar. Cabeça Bem-Feita: repensar a reforma, repensar o pensamento. 8.
ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
______. O Método 4. As idéias: habitat, vida, costumes, organização. 2. ed. Porto
Alegre: Sulina, 2001.
MORTIMER, Eduardo Fleury. Linguagem e Formação de Conteúdos no Ensino
de Ciências. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2000.
MOYSÉS, Lúcia. Aplicações de Vygotsky à Educação Matemática. Campinas,
SP: Papirus, 1997.
MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. As abordagens do processo: temas básicos
de educação e ensino. São Paulo: EPU - Editora Pedagógica e Universitária, 1987.
PORLÁN, Rafael; RIVIERO, Ana. El conocimiento de los professores. Madrid:
Sevilla, 1996.
67
RAMOS, Maurivan Güntzel. Epistemologia e ensino de Ciências: compreensão e
perspectivas. In: MORAES, Roque (Org.) Construtivismo e ensino de ciências:
reflexões epistemológicas e metodológicas. 2. Ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.
p. 13-36.
______. Educar pela pesquisa é educar para a argumentação. In: MORAES, Roque;
Valderez Marina do Rosário Lima (Orgs.). Pesquisa em sala de aula: tendências
para a educação em novos tempos. 2. ed. Porto Alegre, RS: EDIPUCRS, 2004. p.25-
50.
REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação.
15. ed. Petrópolis,RJ: Vozes, 2003.
SPINK, Mary Jane. Linguagem e Produção de Sentidos no Cotidiano. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2004.
TOLDO, Cláudia Stumpf. Questões de Lingüística. Passo Fundo: UPF, 2003.
VIVEIRO, Tânia Cristina Neto G.; CORRÊA, Marlene Lima Pires. Minimanual
Compacto de Matemática: teoria e prática ensino médio. São Paulo: RIDEEL,
1999.
VYGOTSKY, Lev Semenovich, Alexander Romanovich Luria, Alex N. Leontiev.
Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: EDUSP, 1988.
______. Pensamento e Linguagem. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
APÊNDICES
69
APÊNDICE A - I ÁREA DO TRIÂNGULO
12)000()0120(
104
100
130
.6
2
12
2
34
2
=++++===== ouau
x
A
bxh
A
auA .6
2
12
12.
2
1
det
2
1
====
Dobro do
valor da
área do
triângulo
70
APÊNDICE B - II ÁREA DO TRIÂNGULO
12)006()006(
102
130
102
.6
2
12
2
34
2
=++++=
==== ouau
x
A
bxh
A
auA .6
2
12
12.
2
1
det
2
1
====
Dobro do
valor da
área do
triângulo
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo