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falas vão acontecendo, as crianças dialogam com o livro e com o grupo. Os fragmentos
registrados dão uma idéia da interação das crianças com a proposta do autor, nesta obra:
Esse livro não tem palavras [...] “(EU). “É para ler? Eu ainda não sei
ler!”(THIAGO). “Esse livro todo mundo pode ler, mesmo quem ainda não
sabe, é o livro chamado: Ida e Volta do Juarez Machado” (EU). “Ida e
Volta?” repete o Elton, em tom interrogador, ele pede: “vire, quero ver
atrás!”. “Deixa eu ver” (ISAAC). “Quero ver” (MARIANY). “Deixa eu ver”
(PAMELA). O Josué afirma: “Ah! Esse livro eu vi no prézinho”. Eu pergunto:
você conhece esse livro? “Sim, mas eu não li” (JOSUÉ). À medida que
vamos folheando as páginas ilustradas, as crianças verbalizam a história:
“Saiu do banho, sem secar o pé!” (VITOR). “Sapato, roupas do Super-
homem” (JOSUÉ). “Roupas do Superman [...] tocando música” (KENNEDY).
“Ele está dançando! Dançando rock.” (ISAAC). “Pegando a sombrinha, o
guarda chuva” (JOSUÉ). “Saiu... saindo, tem cachorro, olha as pegadas
dele (ISAAC) “O cachorro está indo atrás dele!”(KAROLINE). “É o cachorro
está indo atrás dele” (ELTON). “A porta fica aberta?” (BRUNO
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) “Não é
cachorro é gato!” (ELTON). “A maçã” (WILLIAN). “Olhe a curvinha, a
curvinha do pé dele” (LUIZ FILIPE
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). “O caroço ele jogou no lixo”
(BRUNO). “Ele tem que jogar no lixo senão é...” (BRUNO). “Pegadas do
cachorro, o cachorro faz xixi...” (KENNEDY). “Tem que achar um poste para
fazer xixi?”(EU), “é pra se esconder [...]” (JOSUÉ). “O cachorro chegou em
casa” (PAMELA). “Lendo jornal, o personagem lê jornal” (KAROLINE). “É
uma mulher?”(JOSUÉ). “Como é que ele é?”(KAROLINE). “Quem
é?”(MARIANY). “O nosso personagem continua caminhando, vocês já
imaginaram como que ele é?” (EU). “Eu acho que ele é por aqui”
(STEFANI)
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. “Girando e quebrando a janela” (BRUNO). “Depois você vai
mostrar tudo de novo, não é?” (RODRIGO)
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“Fazendo embaixadinha, eu
sei como que é” (JOSUÈ) (O menino explica como se faz embaixadinha,
chutando a bola, sem sair do lugar ou deixá-la cair). “Eu só quero saber
como ele é?”(KAROLINE). “A história não mostra as pessoas, mostrou o
pezinho, a maçã, mas não mostrou o homem...” (SARAH). “Pegadas de
bicicleta” (KENNEDY). “Ah! Ele morreu!!!” (ISAAC) [...].
Esses fragmentos verbalizados dão uma idéia do enredo que vai se
estruturando, que, evidentemente é muito mais amplo do que se pode registrar apesar do
apoio da câmera e do gravador. Pude capturar o que foi dito, em parte, pois não foi possível
transcrever todas as falas das crianças que são simultâneas e paralelas, mas fico pensando
na riqueza dos pensamentos das crianças, inclusive daquelas que não falaram, mas que
acompanharam cada página do livro, andando por suas entranhas. Registrei aquelas falas
que se destacam, por estarem mais próximas do gravador, pois as crianças falam ao
mesmo tempo enquanto olham atentas o virar de cada página. Elas “caminham” atrás do
personagem que, nesse livro, não se mostra, oferecendo a oportunidade propicia para que
cada leitor construa o “seu” personagem ideal para a narrativa que se apresenta. Quanto à
ilustração, as crianças repetem o tempo todo: “deixa eu ver...deixa eu ver” elas querem e
precisam de mais tempo para ver.
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Bruno Teixeira da Rosa.
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Luiz Filipe Alano da Silva.
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A menina refere-se a um personagem do seu tamanho e assinala com a mão.
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Nós estávamos na metade do livro e o Rodrigo já perguntava se eu poderia mostrar “de novo” a mesma
história. Mais adiante, me reporto a esse gesto das crianças de ler ou contar “a mesma” história como sendo
sempre uma nova experiência. Walter Benjamim nos ajuda a compreender esse fato.