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CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO
PROGRAMA DE MESTRADO ACADÊMICO EM ORGANIZAÇÕES E
DESENVOLVIMENTO
THALITA MAYUME SUGISAWA
A INSERÇÃO INTERNACIONAL DAS CIDADES E A PARADIPLOMACIA COMO
FERRAMENTAS PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL
CURITIBA
2008
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CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO
PROGRAMA DE MESTRADO ACADÊMICO EM ORGANIZAÇÕES E
DESENVOLVIMENTO
THALITA MAYUME SUGISAWA
A INSERÇÃO INTERNACIONAL DAS CIDADES E A PARADIPLOMACIA COMO
FERRAMENTAS PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL
Orientador: Prof. Belmiro Valverde Jobim Castor, PhD
CURITIBA
2008
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado Acadêmico em Organizações e
Desenvolvimento do Centro Universitário
Franciscano do Paraná - UniFAE, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Mestre em Organizações e Desenvolvimento.
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TERMO DE APROVAÇÃO
Thalita Mayume Sugisawa
A INSERÇÃO INTERNACIONAL DAS CIDADES E A PARADIPLOMACIA COMO
FERRAMENTAS PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL
Esta dissertação foi julgada e aprovada pelo Curso de Mestrado Acadêmico
Multidisciplinar em Organizações e Desenvolvimento da UniFAE - Centro Universitário
Franciscano do Paraná.
________________________________________________
Prof. Belmiro Valverde Jobim Castor, PhD (Orientador)
________________________________________________
Prof. Dr. Antoninho Caron (Membro)
________________________________________________
Prof. Carlos-Magno Esteves Vasconcellos, PhD (Membro)
________________________________________________
Prof. Dr. José Edmilson de Souza-Lima (Suplente)
Dedico esta dissertação
À minha mãe, Rose pelo apoio incondicional.
Gratidão sincera...
À Deus e seus planos que são perfeitos.
Mamãe, Rose pelo exemplo de vida, pelo amor e compreensão... a
melhor amiga que eu poderia ter.
Pai, Nelson pelo seu suporte e por acreditar em mim ainda que
seja difícil entender a minha escolha pela academia.
Fábio Heitor, por todos seus esforços e dedicação.
Paulo Jurec, pela amizade maravilhosa que fez esse período pesar
menos do que poderia.
Matheus Duarte, pela inspiração e motivação todos os dias, seja
ao meu lado, seja a mais de mil quilômetros de distância.
Birgit, por sua doação constante à manutenção da nossa
amizade.
Taciana Kelly, minha eterna companheira de trabalho.
Prof. Edmilson, pelas conversas encorajadoras.
Professores Caron, Lafaiete e Lúcia, pelo apoio nas salas e
corredores.
Prof. Belmiro, pela honra de tê-lo como orientador e pelas aulas
recheadas e experiências e sabedoria contagiantes.
RESUMO
SUGISAWA, Thalita M. A Inserção Internacional das Cidades e a Paradiplomacia como
Ferramentas para o Desenvolvimento Local. Curitiba, 2008. Dissertação (Mestrado
Acadêmico em Organizações e Desenvolvimento) Programa de Pós-Graduação
Multidisciplinar UniFAE.
Esta dissertação foi desenvolvida com o objetivo principal de verificar a relação entre
desenvolvimento local e relações internacionais. A cidade e suas instituições de
gestão são os atores e o cenário global com todas suas peculiaridades, o palco.
Dentro da perspectiva de que as cidades através de sua sociedade (governo,
empresas e população) o responsáveis por promover o desenvolvimento de sua
região, de que possuem uma porção de autonomia e independência para tal
assegurada pela Constituição Federal, e que os princípios do desenvolvimento
endógeno ou desde baixo são eficientes, as relações internacionais com outras
cidades seriam como mais um canal para alcançar este objetivo. Na busca pela
promoção do desenvolvimento, a inserção internacional através de intercâmbios com
outras cidades amplia as possibilidades de, não somente, investimentos sócio-
econômicos, mas também, aperfeiçoamento da gestão local. Neste contexto entram
ainda uma análise das correntes clássicas e contemporâneas que visam explicar as
relações internacionais, porém possuem limitações em abranger os novos
fenômenos como a Paradiplomacia. A realidade mundial converge para a
descentralização do poder e a tendência de atuação internacional das cidades, e
sendo assim essa pesquisa dedicou-se tamm em abordar as situações em
diversos países incluindo uma análise das capitais brasileiras.
Palavras-Chaves: Paradiplomacia, desenvolvimento local, cidades, autonomia,
relações internacionais.
ABSTRACT
SUGISAWA, Thalita M. Cities International Insertion and Paradiplomacy as Tools for
Local Development. Curitiba, 2008. Dissertation (Academic Master‟s in Organizations and
Development) Post Graduation Program UniFAE.
This dissertation was developed under the main objective of verifying the relation
between local development and international relations. The city and its management
institutions are the actors and the global scenario, the stage. In a perspective where
cities need to promote its regional development, that they own a certain autonomy
and independence to do so, assured by a federal constitution, and that the principles
of endogenous development are efficient, the international relations among cities
would be another channel to achieve this goal. The efforts towards the development
promotion can be optimized by international insertion through exchanges, increasing
not only social and economical investments but also improving local management. In
this context it is also analyzed classical and contemporaneous theories that aim to
explain the international relations, however lack in new phenomenon as
Paradiplomacy. The world reality converges to power decentralization and taking into
consideration the tendency of cities going abroad this dissertation also includes
examples and description of how this process is being held in several countries and
in the Brazilian capital cities.
Palavras-Chaves: Paradiplomacy, local development, cities, autonomy, international
relations.
Ao serem analisadas as transformações que
ocorrem no local é preciso compreender como o
mundo está se transformando e como o local
incorpora e participa das transformações mundiais,
mas também pensar como o global absorve as
contribuições do local.
(Antoninho Caron)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 9
Metodologia ......................................................................................................................................10
Estrutura da Pesquisa .......................................................................................................................11
1. DELIMITAÇÃO TEÓRICA .........................................................................................................14
1.1. Os Campos Epistemológicos no Estudo das Relações Internacionais ....................................14
1.2. Teorias das Relações Internacionais .....................................................................................23
1.2.1. Clássicas ...........................................................................................................................24
1.2.1.1. Idealismo Moderno e Liberalismo ...................................................................................25
1.2.1.2. Realismo Moderno e Neorealismo .................................................................................29
1.2.1.3. Neomarxismo sob os prismas das teorias da Dependência e Sistema Mundial Moderno 32
1.2.1.4. Neoliberalismo: Interdependência Complexa e Transnacionalismo .................................34
1.2.2. Contemporâneas ...............................................................................................................36
1.2.2.1. Pós-Modernismo nas Relações Internacionais ...............................................................37
1.2.2.2. Teoria Crítica .................................................................................................................40
1.2.2.3. Construtivismo ...............................................................................................................41
2. DELIMITAÇÃO HISTÓRICA ......................................................................................................43
2.1. A Origem das Cidades ...........................................................................................................43
2.1.1. As Cidades-Estados ..........................................................................................................46
2.2. Surgimento dos Estados Nacionais: Unificação e Centralização ............................................47
3. O ESTADO MODERNO E ATORES DA NOVA ORDEM GLOBAL ............................................52
3.1. Federalismo ..........................................................................................................................53
3.2. Soberania e Globalização ......................................................................................................56
3.3. Os Atores na Ordem Global ...................................................................................................59
4. TRANSNACIONALISMO ...........................................................................................................61
4.1. Neofuncionalismo e Integração Regional ...............................................................................66
5. DESENVOLVIMENTO LOCAL NAS CIDADES ..........................................................................68
5.1. A Dialética Local-Global ........................................................................................................73
5.2. O Papel das Políticas Públicas ..............................................................................................74
6. A INSERÇÃO INTERNACIONAL DAS CIDADES E A PARADIPLOMACIA ................................77
6.1. Sujeitos e Conceitos ..............................................................................................................79
6.2. As Cidades Globais ...............................................................................................................85
6.3. As Redes Internacionais de Cidades .....................................................................................88
6.3.1. Redes Mundiais .................................................................................................................90
6.3.2. Redes Regionais ...............................................................................................................92
6.3.3. Redes Inter-Regionais .......................................................................................................94
6.4. Cidades Irmãs .......................................................................................................................96
6.5. O Exercício da Paradiplomacia Exemplos no Mundo ..........................................................98
6.6. As Iniciativas no Brasil .........................................................................................................101
6.6.1. Região Norte ...................................................................................................................104
6.6.2. Região Nordeste ..............................................................................................................104
6.6.3. Região Centro-Oeste .......................................................................................................106
6.6.4. Região Sudeste ...............................................................................................................107
6.6.5. Região Sul .......................................................................................................................108
CONCLUSÃO .................................................................................................................................111
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................115
DIAGRAMAS
Diagrama 1 Desenvolvimento Local e Relações Internacionais ........................................................... 13
Diagrama 2 Estrutura da rede mundial de cidades UCLG ................................................................... 91
TABELAS
Tabela 1 Imagens das Relações Internacionais ................................................................................... 24
Tabela 2 Transnacionalismo e suas modalidades ................................................................................ 62
Tabela 3 Redes Temáticas da Urb-AL ................................................................................................. 96
SIGLAS
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
FAMSI - Foundation for the Advancement of Mesomerican Studies, Inc
GaWC - Globalization and World Cities Research Network
MNC Multinational corporations (Empresas multinacionais)
NAFTA North American Free Trade Agreement
NERI - Núcleo de Estudos em Relações Internacionais
OI Organização Internacional
OMC Organização Mundial do Comércio
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
UCCI Union of Capital Cities of Ibero-America
UCLG United Cities and Local Governments
OTAN Organização do Tratado Atlântico Norte
SMRI Secretaria Municipal de Relações Internacionais
TNC Transnational corporations (Empresas transnacionais)
9
INTRODUÇÃO
A finalidade desta pesquisa é analisar a inserção das unidades
subnacionais, as cidades, no cenário internacional com especial atenção ao
fenômeno da Paradiplomacia. O mundo está constantemente passando por diversas
mudanças, e atualmente testemunhamos transformações e realinhamentos como
conseqüências do aprofundamento da globalização. Isso inclui o surgimento de
novas agendas e novos atores num âmbito que até recentemente era
majoritariamente liderado pelos Estados nacionais. Faz-se necessário reconhecer
que este é um assunto embrionário tanto na academia quanto na própria prática. A
literatura sobre a inserção internacional das cidades via Paradiplomacia encontra-se
tamm em estágio inicial e sua consolidação, ainda que este tema esteja com
grande apelo, ainda não está completa. Contudo, esta pesquisa trata de mais uma
tentativa em compreender este novo fenômeno e o quadro em que se insere, além
disso, visa retratar, dentro de fatores teóricos e históricos, perspectivas empíricas e
conceituais, como esse tema tem se desenvolvido. As análises partirão de diversos
espaços, mas sempre trazendo uma espécie de comparativo com a situação ou
posicionamento do Brasil.
A premissa para a atuação internacional está na autonomia concedida às
unidades subnacionais dentro da discussão sobre o federalismo. Em um Estado
federalista a autonomia dos entes é um dos fatores de maior destaque assim como
sua responsabilidade em promover o desenvolvimento do território em todas as
esferas (econômica, social, ambiental, política). Para que essa autonomia entre as
esferas seja exercida se faz necessário certo nível de descentralização e de
independência na gestão pública, principalmente quando se trata de promover o
desenvolvimento. E nesse sentido, o da busca pelo desenvolvimento, tem-se em
vista que é a sociedade local (população, governo e empresas) quem melhor
entende suas necessidades, bem como quem possui maior conhecimento sobre
suas potencialidades. Sendo assim, é a partir dela que devem surgir alternativas e
sugestões para criação e aplicação de Políticas Públicas que beneficiem o local de
acordo com suas características. É também da sociedade local, num esforço
conjunto, que surgem iniciativas que extrapolam as fronteiras nacionais.
Esta pesquisa propõe analisar a busca deste desenvolvimento por meio da
Paradiplomacia, nome dado ao relacionamento entre duas ou mais unidades
10
subnacionais de diferentes países. Serão utilizadas três bases teóricas: Relações
Internacionais, Desenvolvimento Local e Políticas Públicas Locais. A base de
relações internacionais se a mais abrangente, destacando os paradigmas
clássicos e contemporâneos que nortearam e norteiam o relacionamento entre os
países. A descrição das teorias tem como visa compreender em que pontos são
congruentes e em que pontos são limitantes para compreender o fenômeno da
Paradiplomacia. Além disso, a discussão teórica mostra o desenvolvimento do
pensamento analítico em Relões Internacionais como campo de pesquisa
singular. O Desenvolvimento Local norteará a pesquisa como o objetivo a ser
alcaado através da ação interna, endógena das unidades subnacionais ao
lançarem-se no cenário global. Em Políticas Públicas locais buscar-se-á a
compreensão de seus conceitos, características, objetivos e meios de aplicação.
Metodologia
A presente pesquisa é classificada como uma Dissertação. A ABNT -
Associação Brasileira de Normas Técnicas em sua NBR 14724 de 2001 define que
Dissertação é:
Documento que representa o resultado de um trabalho experimental ou
exposição de um estudo científico retrospectivo, de tema único e bem
delimitado em sua extensão, com o objetivo de reunir, analisar e interpretar
informações. Deve evidenciar o conhecimento de literatura existente sobre o
assunto e a capacidade de sistematização do pesquisador.
Essa dissertação é uma pesquisa bibliográfica e descritiva que busca
compor uma nova hipótese dentro de duas perspectivas, a de relações
internacionais com o fenômeno da Paradiplomacia e o desenvolvimento local nas
cidades. A investigação utilizou-se majoritariamente de fontes secundárias para a
construção do marco teórico e do resgate histórico. As fontes primárias destinaram-
se principalmente a composição dos últimos capítulos para os quais foi necessário
acessar material oficial das prefeituras e organizações internacionais. Tendo em
vista que as duas variáveis, fator (Paradiplomacia) e efeito (desenvolvimento local)
são analisados dentro do mesmo período histórico, o horizonte da pesquisa é
definido como transversal.
A investigação teórica e empírica será norteada por duas perguntas: As
unidades subnacionais, as cidades, podem ser consideradas atores das relações
11
internacionais? A inserção internacional e a Paradiplomacia podem ser ferramentas
ou um canais alternativos para a promoção do desenvolvimento local?
A fundamentação pautada na descrição e análise do cenário global, do
desenvolvimento epistemológico na área de Relações Internacionais e dos aspectos
referentes ao desenvolvimento local endógeno permite eleger as seguintes
hipóteses: a) o desenvolvimento local endógeno é mais efetivo porque identifica as
reais necessidades e potencialidades; b) o ativismo internacional das cidades é uma
tendência no cenário global; c) a inserção internacional das cidades e a
Paradiplomacia contribuem para a promoção do desenvolvimento local.
Nessa dissertação, „local‟ refere-se à sociedade de uma cidade, composta
por governo, empresas e pessoas.
Estrutura da Pesquisa
A Dissertação está dividida em seis capítulos principais acompanhados por
conclusões parciais. Após a descrição das principais teorias de Relações
Internacionais, a delimitação histórica pretende resgatar o processo de formação das
cidades, sua origem, enfatizando a autonomia e a descentralização dessas
unidades, como no caso das Cidades-Estado. Ainda dentro de um contexto histórico,
será descrito o processo de unificação e formação dos Estados nacionais, fenômeno
que estruturou o modelo político centralizador e o chamado Estado Moderno. Em
geral, desde sua concepção o Estado passou e está passando por diversas
adaptações frente às mudanças, progressos e retrocessos do mundo. O
Federalismo, forma de governo que prima pela descentralização, dentro de seus
conceitos pode legitimar a emancipação das cidades no cenário global. O
Neofuncionalismo e a Integração Regional são aspectos contemporâneos que
tamm desafiam o Estado Moderno a se adaptar de acordo com as suas
necessidades, concedendo parte de sua soberania a uma esfera supranacional ou
aumentando a autonomia de suas unidades subnacionais, nas redes de cidades. O
objetivo dessa seção descritiva será compreender os aspectos políticos estruturais e
conjecturais do Estado Moderno e das relações internacionais.
A partir do quarto capítulo, a abordagem se aproximará do objeto de estudo
com a referência ao Transnacionalismo, fenômeno no qual a Paradiplomacia está
inserida. O Transnacionalismo introduzirá a questão de atores paralelos ao Estado-
12
nação transcenderem suas fronteiras na busca por oportunidades no cenário global.
Tanto a iniciativa privada quanto a pública serão descritas, tendo em vista que o foco
será a atuação pública através dos governos locais. Neste ponto haverá um
aprofundamento nos temas de Desenvolvimento Local Endógeno e o papel das
Políticas Públicas e suas ligações com a Paradiplomacia.
Tendo suprido as descrições propostas no campo teórico e histórico, com a
base de fundamentação concluída, inicia-se o debate em torno do fenômeno central
da pesquisa. A Paradiplomacia é descrita a partir da escassa, porém, excelente
bibliografia existente sobre o tema. A divisão em sub-capítulos tem como objetivo
revelar as características, conceituar, identificar os atores, analisar exemplos e
estabelecer, enfim, a ligação final com a questão do desenvolvimento local. O
propósito é tamm o de identificar as vantagens e as limitações da inserção das
cidades no âmbito internacional e do relacionamento entre elas.
Adentrando ao cenário internacional propriamente dito, duas situações
extremamente relevantes ao objeto central serão apresentadas: o das cidades
globais, que atualmente são os exemplos mais tradicionais de autonomia
subnacional, as redes de cidades, que formam um exemplo nítido da iniciativa
endógena e os convênios irmamento que estabelecem as cidades-irmãs. Para
concluir, serão expostos alguns exemplos de como a Paradiplomacia tem se
desenvolvido ao redor do mundo e no Brasil, destacando a posição do governo
federal e as iniciativas do governo local.
A proposta dessa dissertação é compreender que através da inserção
internacional e da Paradiplomacia uma nova ferramenta na busca pela promoção,
aperfeiçoamento e gestão moderna do desenvolvimento local pode ser concebida.
Ademais, visa mostrar o novo posicionamento das cidades como possíveis atores
das relações internacionais.
O diagrama planifica a idéia central:
13
Diagrama 1 Desenvolvimento Local e Relações Internacionais
14
1. DELIMITAÇÃO TEÓRICA
A delimitação teórica nesta pesquisa tem como primeiro objetivo debater
sobre o estudo das Relações Internacionais dando ênfase em sua complexidade.
Após a introdução epistemológica, buscar-sepassar pelas teorias das Relações
Internacionais partindo do cenário clássico até o contemporâneo. O objetivo é
possibilitar a visualização do desenvolvimento científico nesta área e principalmente
visualizar como as teorias embasam ou não o tema central. A abordagem será feita
com o levantamento das obras de destaque referentes às subseções, citando
autores que contribuíram significativamente para o desenvolvimento das correntes
teóricas.
O fenômeno da Paradiplomacia por ser um fenômeno recente pode o ser
facilmente encaixado dentro de uma corrente teórica, portanto as descrições que se
seguirão visam identificar tanto pontos de congruência como perspectivas
embrionárias referente à inserção internacional das cidades. A partir desta discussão
„evolutiva‟, pretende-se traçar um quadro geral do campo teórico que está
sedimentado, buscando compreender algumas lacunas referentes à pesquisa sobre
a Paradiplomacia.
1.1. Os Campos Epistemológicos no Estudo das Relações Internacionais
O objetivo desta seção é compreender a complexidade, a multi e
interdisciplinaridade envolvida nas pesquisas em Relações Internacionais,
procurando identificar algumas analogias com os campos epistemológicos em
termos de períodos históricos e conteúdo teórico. A partir de uma descrição breve
das idéias centrais de alguns epistemólogos buscar-setraçar um paralelo com o
campo das Relações Internacionais e assim, perceber a complexidade, a multi e a
interdisciplinaridade embutida nas pesquisas nesta área.
Apesar do estudo das Relações Internacionais ter seu marco inicial no
século XVII, mais precisamente com a Paz de Westfália em 1648 quando
reconhece-se a soberania dos Estados Nacionais envolvidos na Guerra dos Oitenta
Anos
1
, a academia demorou mais três séculos para formalizar e materializar as
1
A Guerra dos 80 anos ou Revolta Holandesa de 1568 a 1648, foi a guerra de secessão na qual o
território englobando aquilo que é hoje os Países Baixos se tornou um país independente frente à
Espanha.
15
atividades científicas, sendo contemplada como uma disciplina. As Relações
Internacionais emanciparam-se como campo de estudo individual dentro das
ciências sociais somente em 1919, no Reino Unido, na Universidade de Wales. Um
dos primeiros professores a lecionar sobre Política Internacional foi Alfred Zimmern e
sua principal missão, diante de vasta experiência com assuntos internacionais dentro
do governo britânico, era a de explicar por que as guerras ocorrem e como evi-las
(Sarfati: 2005, p. 23).
Antes da delimitação de seu campo específico, as discussões sobre as
Relações Internacionais eram feitas por indivíduos de diversas formações, como
filósofos, juristas, pensadores, sociólogos, economistas e políticos. Diante desse
quadro, percebe-se que é um campo com surgimento a partir de uma origem de
debate multidisciplinar e complexo. Multidisciplinar pela gama de visões articuladas
na análise de um fato e complexo pelo nível de interdependência e conexões entre
os fatores que norteiam as relações internacionais.
Ao se analisar uma guerra, por exemplo, pode-se perceber a diferença entre
os diversos prismas: alguns economistas poderão entender que a guerra será
necessária para a conquista de novos espaços para dar continuidade à produção
industrial e expansão das riquezas das nações. Por outro lado, um sociólogo de
base weberiana poderá explicar a guerra pelo conceito de dominação, característica
do ser humano já enraizado em algumas culturas. E, um sociólogo com fortes
influências marxistas possivelmente compreenderia que a guerra é gerada devido ao
monopólio de violência dos Estados e que a contrapartida seria a união da
população na tentativa de retomada deste poder.
Os atores políticos poderão tentar compreender que a manutenção do
balanço do poder implica em guerra e que em muitas vezes, esta pode ser
considerada como justa, principalmente quando uma motivação de defesa está
impressa. Por sua vez, os juristas geralmente colocam-se numa posição de análise
dos motivos, atos, conseqüências procurando enquadrar culpados e inocentes
dentro da guerra, seja de acordo com os direitos humanos, seja de acordo com os
tratados internacionais.
Ainda dentro deste exemplo da guerra, a complexidade também é
perceptível, pois a guerra se analisada somente por uma ótica provavelmente teria
muitas insuficiências, afinal, não é o resultado de uma simples relação de causa e
efeito. Diante dessas características, o campo das Relações Internacionais surgiu e
16
se iniciou por meio da adaptação de teorias clássicas, a construir suas próprias
teorias, capazes de posicionarem parâmetros de análise únicos e exclusivos desta
área de pesquisa. A produção do conhecimento vem se desenvolvendo e
solidificando o estudo das Relações Internacionais como uma ciência de múltiplas
abrangências.
O foco principal de estudo desta dissertação está na prática da
Paradiplomacia, seus desdobramentos, histórico, características e limitações
envolvendo questões de Políticas Públicas locais e desenvolvimento endógeno. A
Paradiplomacia é um fenômeno contemporâneo onde as unidades subnacionais
emergem de suas esferas superiores e projetam-se internacionalmente. Para
Keating (2004, p. 58) a Paradiplomacia é “parte de uma ampliação no âmbito dos
assuntos internacionais no qual os Estados não os únicos atores”. Assim como o
guarda-chuva das Relações Internacionais, o aprofundamento sobre Paradiplomacia
trará uma gama de fatores envolvidos, sendo igualmente importante compreender as
características epistemológicas da pesquisa.
A ciência da pesquisa, a epistemologia, tem sua origem ligada a Platão, no
período Antes de Cristo. Seu objetivo principal é explicitar o conceito de ciência
abrangendo questões como crença, verdade, conhecimento, método, hipóteses,
problemas e justificações.
A epistemologia é uma referência importante a ser integrado no estudo de
qualquer objeto nas mais diversas áreas. O entendimento do conhecimento anterior
para a formulação de um novo saber pode ser analisado não somente em conteúdo,
mas tamm pela perspectiva de sua construção. Essa construção do conhecimento
pode vir de diferentes bases que cabem a epistemologia abranger. Do positivismo às
teorias da complexidade, a compreensão sobre os campos epistemológicos permite
que o pesquisador analise o modo de produção de determinada ciência e a origem
de relevâncias que norteiam uma teoria, uma afirmação ou o até mesmo o resultado
de um experimento. Em outros termos, ao ler um artigo científico, é importante
identificar qual a origem e as ramificações do conhecimento do autor, pois,
conhecendo os fundamentos espistemológicos do autor a possibilidade de
compreender suas afirmações é maior. Identificando estes campos epistemológicos
e seus fundadores, será possível identificar o porquê de determinadas afirmações e
crenças.
Na mesma época do início do debate das Relações Internacionais, século
17
XVII destacou-se o trabalho de René Descartes que primava pela linearidade do
método na investigação. Descartes inspirou diversos outros pensadores a questionar
mais sobre o modo de produção do conhecimento e a busca da verdade.
Em sua obra O Discurso do Método (1987), Descartes apresenta seu modo
de condução da produção científica destacando que a verdade é manifesta e
absoluta cabendo as pessoas desvelá-la. Seu relato particular sugere também um
desdobramento do objeto ou a separação em partes, partindo do mais simples ao
complexo como numa progressão e o distanciamento do sujeito com o objeto
analisado. Este paradigma foi revolucionário no momento de sua concepção dado o
grande poder da Igreja sobre o conhecimento e o acesso a ele. Tanto a Filosofia
quanto a Ciência desenvolveram-se baseados nesses princípios - sendo a filosofia
um campo de reflexão interna e a Ciência algo que necessitasse a ausência de
subjetividade.
Apesar dos questionamentos em torno da mecanicidade do método
cartesiano, ele ainda é hegemônico e dominante nos meios acadêmicos,
empresariais e governamentais. Algumas pesquisas em Relações Internacionais
possuem uma grande carga cartesiana quando se limitam em analisar aspectos
isolados sob apenas uma dimensão, como por exemplo, no estudo exclusivo das
conseqüências políticas de um governo ditatorial desconsiderando outros
desdobramentos como as repercussões econômicas e sociais.
No período em que as Relações Internacionais foram formalizadas como
campo acadêmico, em 1919 a epistemologia contava com a inserção de Karl Popper
e sua nova visão anti-positivista e pró racionalismo crítico. As observações de
Popper vão contra a supremacia das epistemologias e das fontes do conhecimento
critica o empirismo, o historicismo, o dogmatismo, o relativismo e todas as outras
espistemes que são aplicadas de maneira isolada. No caso do historicismo é
interessante considerar sua crítica para as pesquisas em relações internacionais,
que a história é uma grande base exploratória. Popper considera que o historicismo
é prejudicial ao progresso do conhecimento que atribuiu um valor pré-determinado
à história, o passível de alterações pelos indivíduos, sendo tudo guiado por um
simples processo de causa-efeito e o presente como uma definição do passado,
assim como o futuro será uma definição do presente (Popper, 2003).
O ideal para o pensador seria a interpretação da história à luz da
complementação de teorias e empirismo, sendo este conjunto uma forma mais
18
consistente e catalisador para o desenvolvimento do conhecimento sobre
determinado fato. Em suas próprias palavras: toda a observação envolve
interpretação à luz do nosso conhecimento teórico e “o conhecimento puramente
observacional, não adulterado pela teoria, seria, imaginando que tal era possível,
absolutamente estéril e inútil” (Popper, 2003).
No estudo das Relações Internacionais encontra-se um paralelo para os
apelos de Popper na sedimentação de diversas teorias originadas a partir de fatos
empíricos interpretados por indivíduos de idéias e concepções diferentes. Um
exemplo real e interessante são as diversas análises sobre a entrada dos Estados
Unidos na Segunda Guerra Mundial enquanto uma corrente entende que foi um
passo estratégico na manutenção do poder e dos mercados consumidores, outro
grupo, os adeptos da Teoria da Conspiração, compreendem que a entrada na guerra
contra o fascismo foi uma escolha a priori planejada e legitimada pela opinião
pública após o ataque japonês à Pearl Harbour que, segundo essa corrente, os
Estados Unidos tinham ciência e o deixaram sobrevir. São visões completamente
diferentes sobre o mesmo fato.
É necessário verificar que essa teoria, assim como praticamente todas as
teorias, renova-se a cada acontecimento como no ataque terrorista às torres gêmeas
que conseqüentemente legitimaram a ofensiva ao Iraque e ao Afeganistão. Ainda
dentro deste exemplo, outras teorias também se renovam como a do Realismo
Clássico que, infere aos Estados um poder supremo e compreende as ações
ofensivas e defensivas como racionais dentro da visão interna de cada Estado. Cada
país age racionalmente em prol de seu interesse, benefício e segurança. Cabe
ressaltar que o Realismo nas relações internacionais é uma teoria adaptada da
ciência política cssica e seus precursores, dos quais se destacam Túcidides,
Hobbes e Maquiavel.
As teorias cssicas das Relações Internacionais tomaram caráter
paradigmático. Thomas Kuhn em seu livro, A Estrutura das Revoluções Científicas
explica que “paradigmas são realizações científicas universalmente reconhecidas
que, durante muito tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma
comunidade de praticantes da ciência”. Nas Relações Internacionais destacam-se os
tradicionais paradigmas do Idealismo (Liberalismo) Moderno, compreendendo que
os “Estados formam uma „comunidade internacional‟, assentada sobre um „contrato
moral‟ baseado na noção de justiça” somente; e o Realismo, que conceitua o Estado
19
nacional como o principal e central ator, tendo as questões de poder e segurança
como primordiais. (Magnoli: 2004, p. 27).
Para Kuhn um paradigma deixa de orientar os debates teóricos na medida
com que são revistos e substituídos por outros, ocorrendo assim uma mudança nos
prismas de análises de determinado objeto. Pode-se fazer uma ponte com os
paradigmas ou imagens mais contemporâneas das Relações Internacionais, o
Pluralismo e o Globalismo. Ambos inovam a interpretação do cenário mundial
classicamente analisado pelo ponto de vista do realismo ou idealismo. Com
referência em Sarfati (2005, p.39) o Pluralismo fundamenta-se na diversificação dos
atores nas relações internacionais, considerando os atores não-estatais de maneira
mais elevada, bem como a relevância de sua influência direta, desfocalizando a
unidade estatal. Conseqüentemente, a agenda de temas relativos às relações
internacionais é também desfocalizada da segurança nacional e ampliada para
outros campos, como o do direito internacional, economia, cooperação e política,
com graus de importância similares.
Ainda baseado em Sarfati (2005, p.40), a imagem do Globalismo está
pautada na percepção das relações internacionais através de análises da formação
dos Estados a partir de seu histórico internacional político e econômico
principalmente. Implica ainda que todas as outras áreas, como segurança e política,
estão subordinadas ao desempenho das relações econômicas exteriores e seu grau
de dominação, ou seja, grande parte do comportamento das unidades do sistema
internacional poderia ser entendida a partir da compreensão do papel do Estado
dentro do sistema econômico internacional”.
Na imagem globalista e também pluralista, observa-se a nova ordem
internacional, com a atuação e interação de diversos atores conjeturando em
múltiplos cenários. Observando a contribuição de Thomas Kuhn ao afirmar que os
paradigmas não co-existem, mas sim se substituem na medida em que a ciência
progride, nas pesquisas em Relações Internacionais nota-se que os paradigmas
contemporâneos pouco diferem dos clássicos. Apesar da ascensão de novas
crenças, grande parte é parecida com a anterior a ponto de poder utilizar elementos
dela, portanto não existe efetivamente uma mudança paradigmática. Portanto, em se
tratando da análise de fenômenos recentes, como a Paradiplomacia, verifica-se que
muitas das teorias postas são insuficientes para abordar a problemática do tema. De
acordo com Ferrero (2006, p. 7) as práticas dos governos locais nas relações
20
internacionais não são cópias dos processos tradicionais de política exterior. Na
realidade, os estilos e estratégias de atuação estão marcados por objetivos e
motivações muito mais concretas.
Diante dos breves exemplos citados, constata-se a carga multidisciplinar e
de complexidade embutida no estudo das relações internacionais. O físico Fritjof
Capra tornou-se um referencial em teoria da complexidade e pensamento sistêmico
na ciência, questionando padrões cartesianos e inserindo o debate universal sobre o
meio ambiente e a sociedade. Capra acredita ter mostrado algumas insuficiências
das teorias convencionais em explicar a crise contemporânea em função do
aumento da complexidade de todas as dimensões. Em sua visão, o resultado de um
fato se muito mais pelas conexões ocultas entre os atores e a integração das
ações do que pelas intervenções diretas. Propõe, então, uma visão integradora dos
sistemas natureza e sociedade para produzir conhecimento.
Essa integração é diferente do que propunha Descartes ao sugerir que as
pesquisas devem ser setorizadas em partes. A concepção sistêmica visa agrupar os
sistemas para buscar uma análise do todo. A teoria acerca da análise sistêmica das
relações internacionais foi sedimentada por Immanuel Wallerstein e é tamm
chamada de Teoria do Sistema Mundial Moderno (modern world-system theory).
Assim como Capra é desfavorável a separação dos objetos, Wallerstein (1975)
defende que a unidade de análise apropriada para a compreensão dos fenômenos
contemporâneos não se pauta somente nos Estados, mas que deve ser considerado
um cenário mais amplo abrangendo os sistemas sociais, fronteiras, estruturas,
blocos, regras e concepções internas. A pesquisa sobre Paradiplomacia, foco
principal desta dissertação, desafia o “pensar” em novas teorias que sejam capazes
de incluir as unidades subnacionais na análise das relações internacionais como um
ator de relevância.
Hocking (2004, p. 79) afirma que:
[...] essa visão „estatocêntrica‟ das relações internacionais vê os Estados-
Nação como entidades amplamente distintas, cujos relacionamentos são
mediados por governos nacionais. Desse ponto de vista, as características
internas dos estados, como, por exemplo, alocação territorial de poder,
encerram-se na „caixa preta‟ dos sistemas nacionais e permanecem, na
melhor das hipóteses como fatores secundários das principais
preocupações da política internacional.
Outro ponto em comum com as relações internacionais em sua obra
21
Conexões Ocultas (2002) é a abordagem sobre as redes do capitalismo global, que
ressalta a necessidade da consideração dos custos ambientais e sociais na corrida
de expansão econômica e industrial dos países.
Cabe destacar tamm neste discurso o trabalho do epistemólogo Edgar
Morin. Além de sua identificação com a complexidade, ressalta a importância da
transdisciplinaridade e da criação de novos campos de pesquisa. A
transdisciplinaridade pode ser entendida através da química, demonstrando que o
oxigênio e o hidrogênio por si sós já compreendem suas análises e pesquisas
específicas, porém quando combinados formam a água (H2O) que é outro elemento
diferente de seus componentes isolados (Souza-Lima, 2007).
Se for traçado um paralelo com a formação das Relações Internacionais
como campo acadêmico singular, seria como se fosse a água, tendo seus
componentes principais isolados as disciplinas de: Política, História, Economia,
Direito e Sociologia, não necessariamente nesta ordem. Dada a recente formação
deste campo, menos de 100 anos, o resultado da transdisciplinaridade proposto por
Morin, que seria a criação de um elemento totalmente diferente de seus
componentes, ainda o é efetivo em todas as localidades. Além da concepção
recente, em muitos casos os docentes o oriundos de formações acadêmicas e
visões unilaterais, o que acaba sendo um fator limitante. Morin é categórico ao
afirmar que:
[...] “Sabemos cada vez mais que as disciplinas se fecham e não se
comunicam umas com as outras. Os fenômenos são cada vez mais
fragmentados, e não se consegue conceber a sua unidade. É por isso que
se diz cada vez mais: ‟Façamos interdisciplinaridade‟. Mas a
interdisciplinaridade controla tanto as disciplinas como a ONU controla as
nações. Cada disciplina pretende primeiro fazer reconhecer sua soberania
territorial, e, à custa de algumas magras trocas, as fronteiras confirmam-se
em vez de se desmoronar”. (p.135)
Contudo, o campo das relações internacionais identifica-se como um campo
complexo, multi e interdisciplinar, e em busca da transdisciplinaridade. É uma área
com múltiplos níveis de análise que são interdependentes entre si. Por exemplo,
pode-se pesquisar sobre um ícone político, como Adolf Hitler, e, essa seria uma
pesquisa de nível individual; numa investigação sobre a Polônia, o nível seria
nacional; sobre as relações entre dois ou mais países e sobre os órgãos
internacionais, seria de nível internacional; e na pesquisa sobre uniões entre países,
como a União Européia, nível supranacional. Contudo, os níveis de análise
22
dificilmente conseguem ser isolados podem sobrepor-se umas as outras, serem
enfocadas, mas sempre terão um caráter de inter-relação.
Vasconcelos (2002, p. 112) explica que as práticas interdisciplinares
“promovem mudanças estruturais, gerando reciprocidade, enriquecimento mútuo,
com tendência à horizontalização das relações de poder entre os campos
implicados”. Sendo assim, interdisciplinaridade é mais similar ao pensamento
complexo do que aos modelos cartesianos e lineares.
Morin (2000, p. 134) esclarece que a complexidade é um desafio e não uma
solução. Além de reunir o parcial ao global, elementos antagônicos e aplicar lógica a
este processo, a complexidade necessita ainda de uma compreensão ampla para
organizar todo esse conhecimento interligado. Vasconcelos (2002) concorda ao
enfatizar que as tentativas de homogeneização epistemológica foram desastrosas,
pois reduziram a complexidade dos fenômenos e produziram movimentos
expansivos de fortalecimento de um único paradigma.
De acordo com a Universidade de Brasília, pioneira neste curso no Brasil, o
objeto do estudo de Relações Internacionais é “a análise de fenômenos complexos,
cuja influência se estende direta ou indiretamente a todos os países.” A atuação
nesta área compreende a articulação com diversos atores como as organizações
públicas, privadas, governo local, estadual e federal; universidades e empresas de
vários gêneros e tamanhos que em muitas vezes estão conectados entre si.
A teoria da complexidade explica a necessidade de que ao mesmo tempo,
que os elementos de uma pesquisa possam ser separados, eles tamm possam
ser associados, concebendo “os níveis de emergência da realidade sem reduzir às
unidades elementares e às leis gerais”. É o caminho para uma exploração mais
abrangente (Morin: 2003, p. 138).
Por fim, observa-se que o avanço da epistemologia enquanto cncia que
busca compreender a ciência em si e seus modos de produção é uma ferramenta
imprescindível para o processo de pesquisa em qualquer área. Para as Relações
Internacionais, o entendimento epistemológico possibilita avaliar com mais
profundidade o conhecimento anterior, as observações empíricas, as teorias e os
paradigmas para a construção de um novo saber ou de um saber alternativo.
Para a pesquisa com foco na Paradiplomacia, a teoria da complexidade e a
atenção aos fatores da interdisciplinaridade são essenciais uma vez que é um
fenômeno bastante contemporâneo que necessita ser explorado em suas
23
características, vantagens e limitações.
1.2. Teorias das Relações Internacionais
As teorias podem ser descritas como conjuntos de associações, leis e regras
que visam explicar um fato empírico. Todas as ciências possuem suas teorias
básicas que dão suporte ao debate sobre os acontecimentos dos fenômenos. Köche
(2002) referencia o surgimento das leis e teorias pela necessidade de encontrar
explicações para os fenômenos da realidade. A teoria é mais abrangente, com um
caráter mais explicativo, a lei é mais direcionada a um fenômeno, sendo testável
em experiências de algum fenômeno. Em um processo de investigação, torna-se
essencial basear-se em teorias e leis que suportem tal discurso e sistematizem o
conhecimento dentro de uma constante auto-correção.
No estudo das Relações Internacionais as teorias podem ser divididas em
duas seções: as clássicas ou tradicionais - consideradas positivistas e desenvolvidas
antes do final da Guerra Fria; e as contemporâneas denominadas teorias pós-
positivistas por serem desenvolvidas no cenário pós Guerra Fria. Conforme discutido
brevemente no capítulo anterior, ambos os grupos teóricos são relevantes para a
discussão do tema central desta pesquisa. Como a bibliografia disponível sobre a
Paradiplomacia não estabelece formalmente nenhuma teoria que reja este
fenômeno ou que subsidie a atuação internacional das cidades, é interessante
analisar as principais correntes teóricas e verificar em quais modelos se enquadram.
Descrever as teorias que tentam explicar o mundo e suas interações nesta pesquisa
tem como objetivo principal situar a progressão analítica, ainda que o tema, muito
provavelmente, o se encaixe perfeitamente em uma teoria. A fundamentação
teórica trará conceitos centrais das teorias ressaltando os principais autores de cada
paradigma.
Viotti e Kauppi (1999, p. 6) elegeram três imagens como os guarda-chuvas
para todas as teorias das relações internacionais, são elas: Realismo, Pluralismo e
Globalismo. Dentro de cada uma dessas imagens, que possuem características
singulares, é que as correntes que visam explicar as relações internacionais se
desenvolvem. O quadro abaixo expressa as características principais de cada uma:
24
Tabela 1 - Imagens das Relações Internacionais
Pluralista
Globalista
Unidade (s)
de Análise
Estado e atores não estatais são
importantes
Classes, Estados, sociedade,
e atores não estatais agem
como parte do sistema
capitalista mundial
Visão sobre
Atores
Estado desagregado em
componentes, sendo que alguns
podem operar transnacionalmente
Relações Internacionais
vistas a partir da perspectiva
histórica, especialmente sob o
contexto do capitalismo
mundial
Dinâmica
Política internacional e processos
transnacionais envolvem conflito,
barganha, coação e compromisso
resultados não são
necessariamente positivos.
Foco nos padrões de
dominação dentro e entre as
sociedades.
Assuntos
Agendas múltiplas com assuntos
cio-econômicos ou de bem-
estar, tão ou mais importantes
quanto questões de segurança
nacional.
Fatores econômicos são
prioritários.
Fonte: Viotti e Kauppi (1999, p. 10) Tradução livre.
1.2.1. Clássicas
As teorias cssicas são também chamadas de paradigmas clássicos das
relações internacionais. São as primeiras teorias formadas, a partir da combinação
de teorias políticas, sociológicas e econômicas, para o entendimento e debate
científico dos fatos no sistema internacional.
Com base no mapa teórico das relações internacionais de Sarfati (2005,
anexo), as teorias clássicas são consideradas positivistas e descendem das teorias
políticas e econômicas. Nesta seção, serão abordadas as seguintes teorias:
a) Idealismo Moderno e Liberalismo: influenciada pelo Idealismo
(Liberalismo) Clássico de Rousseau, Grotius e Kant está dentro da
imagem Pluralista;
b) Realismo Moderno: influenciado pelo Realismo Clássico de Tucídides,
Hobbes e Maquiavel, está dentro da imagem Realista;
c) Neomarxismo sob os prismas das teorias da Dependência e Sistema
Mundial Moderno: influenciado pelo Marxismo de Karl Marx, está
dentro da imagem Globalista.
d) Neoliberalismo: Interdependência Complexa e Transnacionalismo:
influenciado pelo Idealismo Moderno e Liberalismo, e Realismo
Moderno, está dentro da imagem Pluralista;
25
Por serem paradigmas construídos a partir de conceitos positivistas, notar-
se-á que existem certas insuficiências no que tange ao fenômeno da
Paradiplomacia. Fronzaglia (2005, p. 24) reforça esta premissa, afirmando que o
conjunto de escolas tradicionais nos estudos de relações internacionais não seria
suficiente para dar conta da participação das cidades como atores internacionais”.
Contudo, dentro do que se objetiva essa pesquisa, cabe demonstrar a abrangência
de cada uma dessas teorias e principalmente notar o desenvolvimento desta ciência,
buscando identificar os aspectos congruentes com o tema central.
1.2.1.1. Idealismo Moderno e Liberalismo
O Idealismo (Liberalismo) Moderno como teoria das relações internacionais
teve como influência os princípios de pensadores políticos como Rousseau e
Grotius. Tradicionalmente, o idealismo consiste na iia central de evitar as guerras
através da construção de sociedades ideais e democráticas, as quais deveriam ser
regidas por um sistema normativo de princípios éticos e morais. O idealismo
moderno possui muitos pontos em comum com as idéias liberais, portanto cabe
descrevê-las na mesma seção. Sarfati (2005, p. 101) afirma que apesar do idealismo
ter desaparecido no debate das relações internacionais, “não existe uma barreira
clara e inequívoca entre as duas teorias” e o pacifismo democrático de Immanuel
Kant é um dos pontos principais compartilhados entre as duas teorias. Na obra A
Paz Perpétua de 1795, Kant defendia uma forma relativamente democrática de
governo, dentro de um contexto republicano de atuação política. Ressaltava ainda a
necessidade urgente do desenvolvimento de um novo Direito Internacional, o qual
formaria um conjunto de normas superiores que regeriam os Estados.
Por outro lado, Griffiths (2005, p. 51) aponta que os trabalhos dos
percussores do liberalismo como Norman Angell, Thomas Woodrow Wilson e Alfred
Zimmern foram rotulados como idealista ou utópico pela corrente teórica contrária na
época, o realismo moderno. Sendo assim, em sua concepção o idealismo é somente
um rótulo à corrente liberal dado seus princípios. Contudo, esta seção seguirá o
raciocínio a partir do ponto de vista sedimentado no meio acadêmico de relações
internacionais, distinguindo uma da outra e mostrando os pontos em comum. Cabe
destacar que os princípios liberais ainda são bastante ativos no cenário mundial,
tanto sob o aspecto econômico quanto político, e, portanto nas relações
26
internacionais. O liberalismo se encaixa na imagem pluralista, o que é pertinente
fenômeno da Paradiplomacia, tema central desta pesquisa.
O idealismo moderno regia os discursos sobre a ordem internacional até a
ecloo da Segunda Guerra Mundial. Um dos principais líderes deste pensamento
foi o presidente americano Thomas Woodrow Wilson. Seus pensamentos e
sugestões de ações foram sumariamente descritos em quatorze pontos, os quais
são considerados base para o pensamento idealista moderno. Em resumo, os
pontos específicos de ação consistiam na evacuação ou retificação de territórios,
como a evacuação e restabelecimento da Bélgica (ponto 7). Seu pensamento
idealístico pode ser compreendido pelas propostas de acabar com a diplomacia
secreta, trazendo transparência nas relações internacionais; livre navegação nos
oceanos tanto em tempos e paz quanto em tempos de guerra; queda das barreiras
alfandegárias; o desarmamento; criação de uma sociedade de nações destinada a
garantir a segurança da coletividade internacional; a independência política e a
integridade territorial de todos os Estados.
De acordo com Magnoli (2004, p. 27) a escola idealista baseia-se na noção
de uma comunidade de valores universais, rejeitando a política de poder e
exacerbando a idéia de sociedade internacional. Cita ainda que a fonte [do
idealismo] é a noção do direito natural que, aplicada ao sistema internacional,
implica a definição de justiça como arcabouço das relações entre os Estados”.
Dentro deste contexto teórico de garantir a paz internacional através da
observação de princípios normativos do Direito Internacional, éticos e morais, é que
surge a Liga das Nações em 1919, que após a Segunda Guerra Mundial renasceu
com um novo formato, a ONU Organização das Nações Unidas. Cabe mencionar
que neste mesmo ano, foi assinado o Tratado de Versalhes, onde os Estados
europeus oficializaram o fim da Primeira Guerra Mundial impondo severas sanções e
reparões aos derrotados, especialmente à Alemanha. Apesar dos esforços de
Thomas W. Wilson, o Senado norte-americano não aprovou a entrada dos Estados
Unidos na Liga das Nações assim como os derrotados da Primeira Guerra Mundial
não participaram. Outros países como o Jao e o próprio Brasil, ingressaram e
retiraram-se posteriormente.
Quando se deu o primeiro conflito antecipador da Segunda Guerra Mundial
em 1931 com a invasão japonesa na Manchúria, a Liga das Nações não obteve
sucesso em detê-los e conter a explosão da guerra. Frente ao fascismo e a
27
exacerbação do nacionalismo, a Liga das Nações se desfaleceu assim como a
proeminência do debate idealista, que passou a ser considerado extremamente
utópico.
Por sua vez, o liberalismo em relações internacionais foca a atenção nas
questões da paz, do comércio, do republicanismo e das instituições. Para Silva e
Gonçalves (2005, p. 123) no liberalismo os alicerces das relações entre os Estados
estão na moralidade, no direito internacional e nas organizações internacionais, e de
acordo com Reis (2006), a visão liberal direciona-se para “o papel das idéias e das
normas que regem a sociedade internacional, do direito internacional à OMC.”
Sarfati (2005, p. 107) define que os liberais entendem que o poder está baseado na
disposição dos Estados em utilizar seus recursos ou abrir mão de algo de acordo
com suas preferências e interesses, formando uma concepção voltada à barganha e
a negociação. A essência do liberalismo em relações internacionais resgata os
conceitos básicos da sociologia política, sob o prisma de liberdade individual do
homem, e da economia com a mínima ação ou intervenção do Estado no mercado.
Sua origem está ligada ao iluminismo do século XVII.
Um dos maiores clássicos deste pensamento é Adam Smith (século XVIII)
na defesa do liberalismo econômico e liberalismo internacional. Se posicionamento é
claro quanto ao favoritismo do livre comércio, do laissez-faire (não interferência) e do
Estado mínimo. Apesar de estar ligado primordialmente às questões de ordem
econômica, Neuman e Clark (1999, p. 144) ressaltam que o trabalho de Adam Smith
é um referencial analítico do ponto de vista liberal sobre a relação de poder e
riqueza nas relações internacionais.
Por citações como "Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas
pelo seu próprio interesse egoísta (self-interest), é levado por uma mão invisível
a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da
sociedade." Adam Smith foi mais tarde rotulado como utópico ou idealista.
Griffiths (2005) separa alguns dos principais pensadores liberais em relações
internacionais, dentre eles estão: Michael Doyle, Francis Fukuyama e David Held.
Tendo em vista a contemporaneidade dos autores citados, torna-se interessante
traçar um resumo das principais idéias que os ligam a corrente liberal. O primeiro,
Michael Doyle aborda o liberalismo em sua obra separando-o em categorias e
acrescentando análises históricas de grandes impérios, como Roma. Doyle (2004, p.
28
3) descreve que o liberalismo pacifista sugerido por Schumpeter associa democracia
e capitalismo ao alcance da paz, uma vez que a construção de uma sociedade
capitalista democrática, preocupada com seus interesses individuais, seria capaz de
evitar guerras. O liberalismo imperialista, baseado em Maquiavel, é caracterizado
pela ambição envolta na satisfação das necessidades da população que poderá
tomar uma forma de dominação de outros povos. Por sua vez, o liberalismo
internacionalista está ligado à vertente de Kant no triângulo: republicanismo
democrático, união dos Estados liberais via federação e promoção da paz. Esta é a
hipótese que Doyle mais se identifica conforme se observa em sua citação
conclusiva no artigo Liberal Internationalism: Peace, War and Democracy (2004, p.
9):
Unlike Machiavelli‟s republics, Kant‟s republics are capable of achieving
peace among themselves because they exercise democratic caution and are
capable of appreciating the international rights of foreign republics. These
international rights of republics derive from the representation of foreign
individuals who are our moral equals. Unlike Schumpeter‟s capitalist
democracies, Kant‟s republics – including our own remain in a state of war
with nonrepublics.
2
Francis Fukuyama define que o liberalismo democrático ocidental teve seu
apogeu no final século XX sendo a ordem dominante, e pondo fim então aos
históricos debates ideológicos, como com o comunismo ou o fascismo. Seu forte
posicionamento quanto hegemonia do capitalismo liberal enquanto modelo de
governo predominante, legítima e praticamente inquestionável por outras ideologias
políticas repercutiu em diversos campos acadêmicos. Para explicar a supremacia da
corrente liberal, Fukuyama utiliza como base a concepção Hegeliana de evolução e
progresso da sociedade chegando à implementação de uma idéia única e absoluta.
Explicitamente expõe que a democracia liberal é “a melhor das alternativas
disponíveis para organizar as sociedades humanas” (Fukuyama, 1995, p. 29) e
concomitantemente, descarta a possibilidade de êxito de governos que sejam
diferentes.
Em uma posição mais moderada e contrária a de Fukuyama, David Held é
2
Diferente das repúblicas de Maquavel, as repúblicas de Kant eram capazes de alcançar a paz entre
elas porque exerciam a precaução democrática e eram capazes de respeitar os direitos de repúblicas
estrangeiras. Esses direitos internacionais das repúblicas derivavam da representação de indiduos
estrangeiros os quais são nossa moral semelhante. Diferente das democracias capitalistas de
Schumpeter, as repúblicas de Kant incluindo a nossa permanecem em estado de guerra com não-
repúblicas.
29
classificado como um pensador liberal de idéias um tanto quanto diferentes. Griffiths
(2005, p. 75) explica que Held, nos anos de 1980, sugere um diálogo entre as
correntes liberais e marxistas. Sua proposta é uma composição de vantagens de
cada uma. Na década seguinte, Held foca-se na questão da democracia
cosmopolita, indicando que o exercício da democracia liberal deve ser ampliado do
contexto nacional tendo em vista a inserção global e as redes de poder (político,
econômico e social) que atuam neste âmbito.
Com base nas breves descrições acima, verifica-se que apesar de clássicas,
ambas as teorias são bases para o desenvolvimento de outros paradigmas que
visam explicar as relações internacionais de acordo com a progressão dos fatos. O
entendimento tanto o idealismo quanto o liberalismo contribuem para o objetivo
desta pesquisa que centra-se no fenômeno emergente das cidades como atores das
relações internacionais.
1.2.1.2. Realismo Moderno e Neorealismo
A teoria do realismo moderno descende da influência do realismo clássico,
reconhecido nos trabalhos de Tucídides, Maquiavel e Hobbes na área da sociologia
e da ciência política (Sarfati, 2005, p. 364). Foi construído por vários cientistas
sociais também de destaque, como Raymond Aron, Edward H. Carr, Robert Gilpin,
Stephen D. Krasner e Hans Morgenthau, dos quais seguirão algumas das principais
idéias sobre o realismo moderno. Conforme destaca Viotti e Kauppi (1999, p. 11)
cada um desses autores contribuiu significativamente para a construção da teoria
realista em relações internacionais, mas o necessariamente de maneira igual. Os
focos destes principais autores variaram de acordo com as perguntas que se
propunham a responder. Enquanto Gilpin e Krasner analisam as mudanças na
distribuição de poder entre os Estados e como isso reflete no sistema econômico
mundial (comércio), por outro lado Morgenthau foca-se nos determinantes da teoria
realista a partir do balanço do poder no contexto da segurança.
Mesmo com detalhes de concentração e abordagem, encontram-se pontos
congruentes entre os autores citados. Esses pontos formam as bases do realismo
moderno. A primeira grande premissa é a de que os Estados são os principais atores
das relações internacionais. Sendo assim, as unidades básicas de análise são os
Estados e a agenda majoritária é a segurança nacional. Além disso, existe uma
30
grande separação entre política interna e externa, sendo que a segunda é onde es
baseado o poder de sobrevivência.
Guzzini (1998, p. 32) explica que o realismo surgiu no debate das relações
internacionais sendo a corrente que iria contra as premissas idealistas (e
consequentemente as liberais) que perduraram como paradigma até o começo da
Segunda Guerra Mundial. Enquanto o idealismo praticamente desconsiderava a
supremacia do poder em si, crendo numa harmonia entre os interesses dos Estados,
o realismo contra-ataca a partir dos conceitos de anarquia, interesse nacional,
balanço do poder e o poder, propriamente dito. A análise dos fatos, ações e
conseqüências através da teoria realista é pragmática e evitar uma guerra é
resultado do gerenciamento de conflitos (os quais o podem ser evitados) através
do balanço do poder aliado a um sistema normativo.
Edward H. Carr define que o poder é o agente central das relações entre os
Estados, portanto sua tese focaliza-se sobre este prisma. Em sua obra mais notável,
Vinte anos de crise: 1919 1939, além de separar e definir os tipos de poder sob os
termos high politics, para o poder militar e low politics, para o poder econômico,
ressaltou a importância do poder sobre a opinião pública como instrumento de
persuasão e complementação dos outros poderes. Carr (2001, p. 62) define-se como
um defensor do realismo político e ressalta trechos de Maquiavel onde se opõe a
utopia política, nomeando-o como o primeiro importante cientista político realista. Em
toda sua obra, destaca a importância de entender as ações dos Estados de maneira
racional e lógica, e ainda, rebate as críticas sobre a imoralidade na política. Na
prática, o realismo como Carr defende pode ser visto quando um país entra em
conflito com outro por razões econômicas, pois ainda que pareça imoral existe um
racionalismo político a frente das ações.
Stephen D. Krasner (1982, p. 498) ilustra o paradigma realista através de
duas metáforas: das bolas de bilhar, presente até o final da década de 1960, e das
placas tectônicas, que surgiu nos anos de 1970. No primeiro cenário, que teve como
pano de fundo as pressões entre Estados Unidos e União Soviética, os Estados o
os únicos atores dentro do sistema internacional, como as bolas de bilhar disposta
em uma mesa. O objetivo fundamental de cada Estado é maximizar seu poder e
conseqüentemente diminuir o poder de outros, sendo que, as práticas econômicas
são apenas um meio de aumento de poder, e não um fim em si.
Na metáfora das placas tectônicas, os Estados também são os atores
31
principais, porém o poder não é o único alvo, e a economia pode ser considerada
isoladamente com outros propósitos. Através da interação entre os Estados o poder
é distribuído, não igualmente, mas diferentemente da metáfora das bolas de bilhar, a
dinâmica no sistema internacional é reconhecida. Pressões são possíveis de
acontecer com as diferenças que surgem desta interação assim como o seu alívio
através do encontro de pontos congruentes.
O realismo moderno descrito sobre o ponto de vista da manutenção da paz e
da eclosão de guerras é tradicionalmente ligado a Raymond Aron e sua obra Paz e
Guerra entre as Nações (1966). Sua linha se desenvolve na legitimidade das ações
dos Estados em prol de sua segurança e interesses nacionais, ou a chamada
legitimidade da violência isso tamm durante o período das tensões entre
Estados Unidos e União Soviética, no período da Guerra Fria. Para Aron, a
diplomacia é estratégica e racional, e limita-se ao Estado. O poder no âmbito
internacional é compreendido como a capacidade de um Estado impor sua vontade
sobre outros, sugerindo a seguinte distinção: a) poder defensivo, quando uma
unidade política consegue manter-se inerte às pressões exteriores; b) poder
ofensivo, capacidade de um Estado impor sua vontade sobre outro; c) recursos e
força militar de uma sociedade, a matéria/armas em si; d) o poder de força, o que vai
além dos instrumentos e armas distingue-se política de força de política de poder.
Uma de suas afirmações mais diretas reflete a base do paradigma realista:
All international politics involves a constant collision of wills, since it consists
of relations among sovereign states which claim to rule themselves
independently. So long as these units are not subject to external law or to an
arbiter, they are, as such, rivals, for each is affected by actions of the others
and inevitably suspects their intentions. (p.47)
3
O realismo moderno se auto-determina como a teoria que visa explicar o
mundo tal como ele é com foco nas questões da violência, falsas pretensões e
intenções dos Estados na interação com outros e na diplomacia estratégica.
O neorealismo surge na década de 1970 como uma corrente alternativa
advinda do realismo moderno, mas com vertentes diferentes. Um dos principais
autores sobre tal teoria é Kenneth Waltz e seu trabalho Theory of international
3
Todas as políticas internacionais envolvem uma colisão constante de interesses, já que consiste em
relações entre Estados soberanos os quais requerem governar-se independentemente. Sendo que
essas unidades o estão sujeitas a leis internacionais ou a arbitragens, eles são, então, rivais, pois
cada um é afetado pelas ações dos outros e inevitavelmente suspeitam suas intenções. (Tradução
Livre).
32
politics (1979). Segundo Sarfati (2005, p. 143) enquanto o realismo moderno foca-se
somente no Estado, o neorealismo foca-se na análise do sistema internacional. A
chamada visão sistêmica das relações internacionais é o modo de análise através da
concepção do todo, oposto da visão analítica cartesiana que divide e reduz os
objetos de estudo. Waltz define que para compreender a dinâmica internacional
deve-se partir da estrutura, do sistema internacional como um nível individual de
análise. Apesar de reconhecer que existam atores não-estatais, não os consideram
importantes ou influentes, uma vez que o sistema é composto e gerido pelas
unidades majoritárias, os Estados. Conforme Silva e Gonçalves (2005, p. 208)
explicam, o sistema internacional é anárquico e os Estados em busca da
sobrevivência buscam balancear o poder para garantir sua segurança. A teoria
neorealista foi bastante criticada por limitar a ver o sistema mundial como um quadro
estático e pré-determinado.
Desenvolveram-se novas versões do realismo como o realismo estrutural,
mas que como destaca Viotti e Kauppi (1999, p. 83) as conclusões são praticamente
as mesmas prescrições para os governantes com base nas mesmas premissas e
no conhecimento de fatos históricos. Para que se destina esta pesquisa, a teoria do
realismo moderno contribui na medida em que direciona a atenção para uma
realidade mais fria do que a apresentada pelos idealistas, porém fica em débito na
questão da diversidade de atores internacionais, agendas de debate e a própria
importância da cooperação. o neorealismo ao introduzir a versão sistêmica das
relações internacionais sugere uma alternativa diferente de análise, o que pode ser
compreendido como um avanço no modo de pesquisa na área.
1.2.1.3. Neomarxismo sob os prismas das teorias da Dependência e
Sistema Mundial Moderno
O paradigma neomarxista nas relações internacionais está diretamente
ligado às teorias da Dependência e do Sistema Mundial Moderno. Cabe citar como
grandes nomes dessas duas vertentes: Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto,
sobre dependência e Immanel Wallerstein, com a Teoria do Sistema Mundial
Moderno brevemente citado no primeiro capítulo. Conforme o nome sugere ambas
as vertentes estão sob a influência dos conceitos marxistas, muito embora não
sejam réplicas em conteúdo.
33
Conforme Sarfati (2005, p. 142) destaca a Teoria da Dependência pode ser
considerada como a visão dos Países em Desenvolvimento sobre as relações
internacionais. Seu surgimento é praticamente um contraponto à hegemonia norte-
americana e está diretamente ligado à CEPAL (Comissão Econômica para a
América Latina estabelecida pela ONU). O principal objetivo é explicar a questão
do subdesenvolvimento econômico de alguns Estados, classificados como pses
periféricos, e sua forte ligação com os Estados mais desenvolvidos
economicamente, classificados como países centrais. Sendo assim, o
desenvolvimento econômico da periferia se deu de maneira dependente e associado
ao capital internacional nos moldes do modelo agro-exportador.
Para Singer (1998, p. 119) a dependência surge a partir de um jogo
complexo de conflitos e acordos. Com referência a dependência dos países latinos
americanos, o autor afirma que é consentida, caracterizada pelo período agro-
exportador da economia, e tolerada, caracterizada pelo período das substituições de
importação em que era necessário importar tecnologia e capital externo. Na
seqüência uma nova forma surge pela expansão de empresas transnacionais e
ampliação das negociações de abertura comercial no âmbito do acordo geral de
tarifas e comércio.
Quando os países deixaram de ter uma postura intervencionista para adotar
uma postura neoliberal que permitisse maior expansão e circulação dos capitais na
década de 1980, foi necessário que as economias periféricas atingissem uma
estabilidade econômica e monetária. Era uma alternativa para atração de capital
internacional com objetivo de promoção do desenvolvimento econômico. Ainda de
acordo com Singer (1998, p. 130) essa nova fase chama-se de dependência
desejada, onde a fonte esta no capital globalizado, “visto como um ingrediente
indispensável num mundo em que impera a liberdade de iniciativa das empresas e
dos indivíduos”.
Por sua vez, a Teoria do Sistema Mundial Moderno, primeiramente proposto
como modo de análise por Immanuel Wallerstein, define que a unidade apropriada a
ser considerada para a compreensão dos fenômenos contemporâneos não se pauta
somente nos Estados, mas sim em um cenário mais amplo abrangendo os sistemas
sociais, fronteiras, estruturas, blocos, regras e concepções internas. Conforme
ressalta Sarfati (2005, p. 141) essa teoria, difere-se da Teoria da Dependência, pois
inclui outro grupo de Estados, os semiperiféricos. Esses países seriam aqueles com
34
bom desenvolvimento em alguns setores, como tecnologia, porém péssimo grau em
outras áreas, como a social.
Em sua obra World Inequality: Origins and Perspectives on the World
System, Wallerstein (1975, p. 9) explica que o Estado Nação, com o fenômeno da
centralização do poder, não obteve êxito em ser uma unidade totalmente autônoma
de ações sociais, assim como o tem a possibilidade de se torná-lo. Sendo assim,
a saída para as desigualdades não está dentro das fronteiras do Estado, mas no
sistema mundial como um todo. Sua idéia sobre as relações internacionais é que
seria através delas que se entenderiam os problemas internos, suas causas e
possíveis soluções, já que a economia de um país não é isolada, mas sim uma parte
da economia mundial. Deixando de lado as especificidades e ideologias, a teoria do
Sistema Mundial Moderno pode ser compreendida como um afastamento do foco
individualista dos Estados proporcionando uma ampliação do campo de visão. O
sistema mundo em sua concepção (1974, p. 347) é composto de esferas sociais,
fronteiras, estruturas, grupos-membros, regras de legitimação e coerência.
Ambas as teorias são críticas à dominância do sistema capitalista que rege
todos os países e as relações entre eles tamm. A contribuição dessas análises
está na inclusão dos países chamados de periféricos ou semi-periféricos no contexto
global. Ademais, o foco na questão do desenvolvimento econômico e social como
fatores que são diretamente ligados a legados históricos de exploração e à
continuidade de padrões de relacionamento com outros países, representa a
mudança do paradigma de que a simples transferência de modelos resolveria a
questão da desigualdade.
Uma vez que o fenômeno da Paradiplomacia advém dos preceitos de
Desenvolvimento Local, é relevante conhecer as teorias que tratam do
desenvolvimento interno a partir de uma perspectiva internacionalista.
1.2.1.4. Neoliberalismo: Interdependência Complexa e Transnacionalismo
O neoliberalismo ou também denominado teoria neoliberal institucionalista
ou neoinstitucionalismo, surge como uma reconstrução do liberalismo a partir de
bases um pouco mais concretas. É necessário observar que alguns autores em
relações internacionais agregam o neoliberalismo ao liberalismo e o denominam
como pluralismo simplesmente. Porém, para esta pesquisa é interessante seguir o
35
modelo fragmentado apresentando os detalhes de acordo com o período de
desenvolvimento do paradigma.
Apesar de o neoliberalismo ser regularmente visto como uma teoria
econômica ligada aos fatores de privatização e minimização da ação do governo na
economia, sua vertente em relações internacionais é também bastante relevante.
Sua aderência ao fenômeno da Paradiplomacia se nas questões da
interdependência complexa e, principalmente, do transnacionalismo. A perspectiva
neoliberal considera o somente os Estados como atores no cenário global, mas
tamm outros agentes como as organizações internacionais intergovernamentais,
grandes empresas de atuação global (TNCs transnational corporations ou MNCs
multinational corporations), organizações não-governamentais (ONGs), e conforme
cita Sarfati (2005, p. 160) até mesmo as unidades subnacionais, por meio de suas
prefeituras, estão inserindo-se no contexto mundial de maneira independente. Este é
o primeiro paradigma que acrescenta outros atores e os reconhecem com certo grau
de importância. Cabe ressaltar que apesar desta agregação, os Estados nacionais
ainda são considerados os atores mais importantes na visão neoliberal.
Além da introdução da transnacionalidade e da interdependência dos atores
e fatores, as agendas o também desfocadas dos assuntos básicos de segurança,
política e economia, e, acabam por envolver assuntos sobre meio ambiente, direitos
humanos e desenvolvimento social.
Robert Keohane foi um dos mais importantes precursores deste pensamento
no campo internacional. Griffiths (2005, p. 185) descreve que a linha de raciocínio
neoliberal de Keohane centrava-se em entender as circunstâncias de cooperação
entre os Estados e o papel das instituições neste processo. A análise da chamada
interdependência complexa entre os Estados nacionais foi extremamente importante
para a compreensão acerca da composição da sociedade internacional bem como a
ênfase dada à cooperação mútua. De acordo com Keohane, os Estados m
sobrevivido, pois surgiu uma agenda internacional comum ao interesse de todos e
com mecanismos que possibilitam a atuação internacional conjunta. Com isso,
objetiva-se manter o diálogo e a cooperação entre todas as unidades políticas.
As instituições, segundo Keohane são conjuntos de regras, sejam elas
formais ou informais, interconectadas entre si definindo o comportamento dos
Estados, bem como suas expectativas e ações. Sarfati (2005, p. 157) sugere os
seguintes formatos de instituições: a) Formal intergovernamental ou organizações
36
não-governamentais internacionais, a primeira são aquelas formadas por Estados
com um propósito definido, como a ONU ou a OMC. A segunda seria neste mesmo
formato, porém formadas pela iniciativa popular; b) Regimes internacionais, acordos
com regras explícitas e específicas, como o regime monetário internacional (Bretton
Woods); c) Convenções, como regras informais que surgem espontaneamente e se
mantém como um costume ou a partir da idéia de reciprocidade entre os Estados.
Além do foco nas instituições, o neoliberalismo nas relações internacionais
insere o debate em torno da interdependência complexa, refutando os conceitos de
simples causa-efeito e historicismo. Brown (2001, p. 34) explica que o prisma da
interdependência complexa está no reconhecimento dos múltiplos canais de acesso
entre os atores, na redução da força como principal motor das relações
internacionais, e na desconstrução da hierarquia de assuntos da agenda
internacional. A conexão entre fatores e atores pode ser compreendida quanto a
crise de recursos naturais, como o petróleo a sua falta e conseqüentemente o
aumento do seu preço são fatores que são sentidos mais ou menos pelos países
dependendo de sua vulnerabilidade. A partir desta situação, os atores tendem a se
reposicionar, alguns Estados ou até mesmo iniciativas subnacionais podem começar
a procurar fontes alternativas através de pesquisa (Biodiesel) ou estabelecer novos
acordos comerciais (fornecedores alternativos, contratos renegociáveis).
De acordo com Viotti e Kauppi (1999, p. 203) o pensamento [neo]liberal
destaca vários conceitos que comem a imagem pluralista, como: a importância do
indivíduo e dos níveis de análise, a desagregação e fragmentação do Estado em
partes, a conexão íntima entre política e economia internacional, o papel da opinião
pública, a relevância do direito internacional e das organizações.
É neste contexto que o debate sobre a crise do Estado Nação se desenvolve
sob hipóteses de perda da soberania por conta da desfragmentação ou
descentralização do poder. A questão do transnacionalismo, que significa
transcender a fronteira Estatal, será descrita com maior profundidade adiante por ser
diretamente ligado ao tema desta pesquisa. Contudo, pode-se compreender que a
nova visão liberal das relações internacionais contribuiu para o avanço de novos
tipos de atores, diferentes análises das situões e reposicionamento de ações.
1.2.2. Contemporâneas
37
As teorias contemporâneas são tamm chamadas de teorias Pós-
Positivistas. São todas as teorias desenvolvidas a partir da década de 1990 e após o
final da Guerra Fria. O final da Guerra Fria em relações internacionais representou
uma grande mudança e sendo assim um importante marco, onde o mundo passou
de bipolar para o multipolar ou unipolar (hegemonia norte-americana), como alguns
autores afirmam.
Baseado no mapa teórico de Sarfati (2005, anexo) as seguintes teorias
serão abordadas nesta seção:
a) Pós-Modernismo nas Relações Internacionais: processo de
desconstrução dos discursos teóricos clássicos;
b) Teoria Crítica: sutilmente influenciada pelo Marxismo, visa reconstruir o
discurso teórico, está inserida na imagem Globalista;
c) Construtivismo: ponte entre as preocupações positivistas e pós-
positivistas;
Outras teorias contemporâneas tamm são citadas por Sarfati (2005) e por
outros autores tamm, como o Feminismo e o Realismo Estrutural, porém por
serem específicas ou apenas apresentarem leves mudanças das teorias originais,
não serão apresentadas nesta seção.
A importância das teorias contemporâneas para o tema desta pesquisa está
principalmente no fato de incluírem aspectos antes não abordados. São tamm
mais abrangentes no que tange as características, influências e atores das relações
internacionais. Como será visto a seguir, tratam de maneira mais reflexiva e menos
simplificada os fatos e a produção do conhecimento neste campo.
1.2.2.1. Pós-Modernismo nas Relações Internacionais
O pós-modernismo representa um movimento de contestação à ciência
classificada como fixa ou verdadeira, contra as correntes positivistas que dominaram
e ainda dominam a construção do conhecimento em diversas áreas. Assim como
abordado no primeiro capítulo, alguns autores como Capra, Morin e Vasconcelos
têm contestado a unilateralidade da ciência enquanto vias para busca de uma
síntese simplificada da realidade.
O pós-modernismo em relações internacionais surge como uma corrente
que visa desconstruir os paradigmas clássicos e positivistas a partir de abordagens
38
alternativas ontológicas e epistemológicas. A epistemologia na função de se analisar
o modo de produção do conhecimento e a ontologia trazendo a reflexão a respeito
do sentido abrangente do ser além do físico, num foco universal. A crítica central é
que nenhuma teoria foi capaz de prever o final da Guerra Fria tal como foi,
principalmente pelo fato de a maioria dos positivistas agirem como se o futuro fosse
um simples efeito de uma causa prevista na história, ou por „lógicas
instrumentalistas‟. Richard Ashley e Robert Walker são autores que se destacam
nesta vertente ao sugerirem uma espécie de desconstrução dos paradigmas
referentes às relações internacionais, uma vez que a previsibilidade teórica não
surtiu efeito na realidade.
Os argumentos de Ashley em sua obra The poverty of neorealism (1986)
mostram claramente como o pós-modernismo influenciou as relações internacionais
enquanto disciplina de estudo e produção do conhecimento. Primeiro o autor nota
que é impossível separar as ideologias de um pensador e sua teoria, ou seja,
nenhuma teoria é isenta de carga pessoal. Segundo ponto importante levantado por
Ashley é sobre a concepção de que algumas coisas em relações internacionais são
agentes fixos e então sempre parte-se desta premissa, como por exemplo, o Estado.
Dentro desta análise Ashley entende que o Estado surgiu posteriormente às
interações políticas e econômicas entre diferentes povos, e a sua constituição é
constante. Em sua visão, conforme Sarfati (2005, p. 242) ressalta, é a de que o
Estado não passa de um ente performático, uma formalização da identidade de uma
sociedade. As fronteiras são definidas e não estiveram sempre postas. Sendo assim,
a perspectiva positivista que parte das reflexões tendo o Estado como um dado fixo
é amplamente criticada pelos pós-modernistas que o classificam como uma unidade
em constante constituição.
Walker concentra-se na parte epistemológica, alegando que as relações
internacionais o seguem a lógica Popperiana de associação de teoria e prática, já
que a prática já carrega a teoria em si (theory-laden). De acordo com Griffiths (2005,
p. 212) o mundo das relações internacionais já é essencialmente conceitual - como
um mundo de significados - no qual as ações são filtradas e realizadas por
processos institucionalizados de interpretação baseado em movimentos do mundo
real.
Junto com esta nova visão, veio tamm um rótulo que é importante ser
mencionado: o chamado Terceiro Debate. O primeiro foi entre o Idealismo e o
39
Realismo, o segundo, chamado de neo-neo foi entre as correntes neorealista e
neoliberalista, por fim o terceiro surge através da proposta de desconstrução das
teorias sedimentadas, incluindo segmentos filosóficos, culturais, de gênero
(feminismo), geográficos e até mesmo lingüísticos.
Para Jarvis (2002, p. 17) o pós-modernismo é considerado pura crítica e a
função da crítica é desafiar o domínio estabelecido juntamente com suas premissas
de universalismo ou transcendência da história. Apesar dos ataques a este
movimento pelo alto grau de reflexão e aprofundamento das questões
epistemológicas, sua importância está na mudança do foco e da simplificação da
realidade proposta pelas teorias positivistas. Os precursores pós-modernistas nas
relações internacionais trouxeram o debate da complexidade e assim chamaram a
atenção para pontos que não eram considerados pela classe acadêmica, que
pareciam sempre buscar a aplicabilidade de suas teorias da maneira mais direta
possível.
Silva e Gonçalves (2005, p. 196) explicam que:
No âmbito das relações internacionais, o pós-modernismo denuncia o poder
das definições, das perspectivas ou abordagens teóricas e suas tentativas
de identificar sujeitos e objetos de análise, além de definir quais são as
questões relevantes e suas hipóteses apropriadas.
São ainda Silva e Gonçalves (2005, p. 197) que resumem em quatro pontos
sobre as características principais do movimento: a) toda e qualquer verdade
universal ou absoluta é inexistente; b) a relão e a manipulação entre
conhecimento e poder formam a base das construções sociais; c) revelar a farsa de
movimentos autodenominados como emancipatórios; e, d) reconhecimento de uma
base ética do pós-modernismo defendendo a pluralidade e das diferenças.
O avanço das unidades subnacionais no campo internacional é um exemplo
de que o cenário global não é imutável, nem mesmo os seus atores são únicos ou
fixos. Além disso, a Paradiplomacia representa uma quebra no padrão das relações
internacionais que desde a formação dos Estados nacionais estiveram dominadas
pela ação desses, sob o grande paradigma da soberania, o qual é profundamente
questionado pelos pós-modernistas. Portanto, esse movimento representa um
importante marco, além de subsidiar fenômenos que quebram a "rotina" fixada pelo
longo domínio positivista no campo.
40
1.2.2.2. Teoria Crítica
A teoria Crítica nas relações internacionais sugere a desconstrução dos
paradigmas dominantes e a construção de novos dentro do contexto da pós-
modernidade acadêmica. A principal representante desta corrente é a chamada
Escola de Frankfurt, onde começaram, ainda na década de 1920, a se desenvolver
os primeiros estudos no sentido de questionar os pressupostos de cada posição
bem como sua teorização. Nomes como Walter Benjamin, Hebert Marcuse e Jurgen
Habermas são os mais ligados a tal. Antunes e Ramos (2000) explicam que a escola
de Frankfurt concentra-se em analisar: a dialética da razão iluminista e a crítica da
ciência, a dupla face da cultura e a discussão da Indústria Cultural e a questão do
Estado e suas formas de legitimação. Viotti e Kauppi (1999, p. 19) revelam que o
desenvolvimento da Teoria Crítica foi feita sob a influência de correntes filosóficas,
como a de Rousseau no que diz respeito à liberdade ideológica, a de Kant sobre a
busca de princípios morais universais, a de Marx na observância das opressões
entre as classes e estruturas socioeconômicas e até mesmo a de Freud pela
inserção da psicologia para a compreensão das relações de domínio.
Para as relações internacionais, o ponto central está no entendimento de
que as leis que regem o sistema internacional não são imutáveis como diversos
teóricos buscaram proclamar dentro de uma perspectiva positivista. Assim como os
pós-modernistas, os adeptos da teoria Crítica tamm realizam o debate
epistemológico, sobre a produção do conhecimento e buscam resgatar e inserir no
debate as partes excluídas, como a visão da realidade a partir de prismas e
dimensões diferentes. Isso diz respeito tanto à necessidade de relevância de
assuntos que o além da segurança e da economia, como no entendimento da
constante mudança dos sistemas que comem o cenário global.
A denominada teoria Critica das relações internacionais tem seu surgimento
ligado ao trabalho de Robert Cox na década de 1980. Ao contrário das publicações
que reinavam no meio acadêmico, Cox introduziu conceitos que contrastavam o
historicismo sobre o surgimento do Estado Nação e a emergência da mudança no
entendimento do sistema internacional. Jones (2001, p. 4) comenta que os estudos
em relações internacionais e sua teorização estão sempre em busca da criação de
tipologias e categorias, e a teoria crítica por sua vez, apresenta certas vantagens na
contramão da simplificação da realidade. A idéia de que a soberania produz a
41
exclusão traz à tona a proposta de novas formas de organização política a partir do
reconhecimento da mobilidade situacional.
As considerações de Cox (1981, p. 129) a respeito do posicionamento
específico da teoria Crítica no campo em questão, ficam em torno da reflexão sobre
as origens e emergências das instituições que regem o sistema internacional, das
relações de poder, das ordens sociais, e principalmente quais são as forças que
impulsionam o potencial de mudança ou transformam a ordem atual. O debate está
em torno de formas alternativas de desenvolvimento para a criação de novas formas
de interação entre os atores internacionais. À medida que novas características são
estabelecidas nas relações de produção entre as sociedades, novas configurações
surgem, mudando o quadro geral. O Estado Nação, dentro desta perspectiva, é um
mosaico que muda e se adapta de acordo com os movimentos das pequenas peças
que o compõem, neste caso as sociedades.
A contribuição da teórica Crítica para o objeto principal desta pesquisa está
principalmente na reflexão de que o cenário global não é imutável, assim como o
existem regras e ação pré-estabelecidas que não possam ser revisadas. É como um
convite a olhar além do que parece fixamente instituído e indagar possibilidades de
mudança. O ingresso das cidades no âmbito internacional de maneira independente
visando interesses de Desenvolvimento Local é um fenômeno que para se tornar
realidade diversos paradigmas positivistas tiveram que ser contestados, como o da
soberania total do Estado, sua supremacia e controle sobre seus entes.
1.2.2.3. Construtivismo
Assim como a teoria Crítica, o Construtivismo tamm se origina nas
ciências sociais em geral e inclina-se para o campo das relações internacionais.
Silva e Gonçalves (2005, p. 29) citam Emanuel Adler para a definição do que
representa o Construtivismo: uma postura metafísica, uma teoria social e uma
perspectiva empírica. Está submerso nas vertentes sociológicas e filosóficas, mais
especificamente a hermenêutica. O Construtivismo nas relações internacionais,
tamm chamado de Construtivismo Social, está dentro da perspectiva s-
modernista. Essa teoria visa basicamente refletir e interpretar as relações entre
todos os atores entendendo que um constitui o outro. Sarfati (2005, p. 259) afirma
que “o construtivismo busca construir uma ponte entre preocupações positivistas
42
(explicar as relações internacionais) e pós-positivistas (entender do que são
constituídas as relações internacionais)”. Por esse motivo recebe a classificação de
via media.
Mais especificamente Viotti e Kauppi (2005, p. 217) esclarecem que o
Construtivismo propõe explicar que os atores agem de acordo com a visão que eles
possuem do mundo, a imagem dos outros atores envolvidos e como se enxergam
neste cenário. através da cooperação regulamentada os atores podem mudar seus
pontos de vista e crenças sobre seus papéis e sua ligação com o resto do sistema
internacional. Para os construtivistas todos os fatores e atores o construídos ou
constituídos socialmente e surgem para dar forma as identidades e interesses dos
atores. Além disso, um importante ponto a se ressaltar é a menção que é dada aos
atores não estatais, como as organizações sendo considerados agentes influentes
na criação e evolução das normas que regulam o âmbito global.
Um dos principais defensores desta corrente é Alexander Wendt e sua obra
Social theory of international politics do ano de 1999. Apesar de dar um formato mais
Estado cêntrico, o Construtivismo wendtiano, assim como a teoria Crítica não parte
do princípio em que o sistema internacional é imutável. Pelo contrário, entende que
cada agente é formado de acordo com os movimentos sociais que ocorrem dentro
dele. Os Estados são os principais atores do sistema mundial e no caso da
construção do Estado, a teoria Construtivista explica que foi possível a partir das
interações sociais. Essas interações, por suas vezes, concomitantemente formam os
interesses do Estado e então, delineiam sua identidade. Sarfati (2005, p. 261)
resume que “a identidade é a base da construção dos interesses e somente passa a
existir quando ambos começam a se relacionar”. Portanto, a conclusão é a de que
os Estados que possuem identidades afins são mais propensos a cooperarem,
enquanto o contrário geraria certas tensões e conflitos. Nestes casos, de acordo
com Copeland (2006, p.2), não é a anarquia ou o poder que definirá as ações entre
os Estados e como eles se comportam no sistema internacional, mas sim a carga de
cultura que é socializada através das interações.
Fazem críticas ao Neoliberalismo sobre a anarquia (ação mínima do Estado
versus liberdade do mercado capitalista), pois baseados na premissa de que tudo é
resultado de construções sociais, “a anarquia é o que os Estados fazem dela”,
citando a frase de destaque de Wendt. Por outro lado, dividem a crença no Direito
Internacional e nas regras e normas que regem as relações internacionais.
43
Diferentemente do Neorealismo, o Construtivismo defende a idéia de que os
interesses dos Estados são mutáveis e, sejam egoístas ou não, são formados pela
sua identidade interna e não por uma determinação exterior. Porém, compartilha da
idéia de que o Estado é o agente principal das relações internacionais.
Apesar das principais obras sobre a linha construtivista focarem-se no
debate em nível de Estado, considerando a existência de outros atores, porém não
os classificando como da mesma importância, ainda assim é possível identificar
pontos de congruência para o tema central desta pesquisa. O princípio de que um
agente se comporta da maneira como ele se aliado à sua identidade que é
resultado dos constantes movimentos sociais, é um ponto de partida interessante na
análise da Paradiplomacia. As cidades que se lançam no cenário global em busca
de atrair opções e alternativas que auxiliem na promoção do Desenvolvimento Local
podem ser consideradas exemplos de atores que se constituíram e se projetaram
além das fronteiras nacionais, criando uma nova identidade.
2. DELIMITAÇÃO HISTÓRICA
Nesta seção serão abordados os contextos históricos pertinentes ao
desenvolvimento da pesquisa. A descrição sobre a origem das cidades será pontual
para a visualização das raízes do objeto de estudo, bem como ao se tratar de
Cidades-Estados se possível verificar a autonomia e independência que as
cidades tinham antes da unificação estatal e centralização do poder. Em seguida,
serão descritos brevemente o processo de formação de alguns Estados nacionais. O
objetivo deste capítulo é compreender a trajetória da atuação das cidades no
contexto internacional a partir da história. É tamm importante constar essa
delimitação descritiva a fim de identificar a cronologia da ordem global que foi de
descentralizada a unificada, e a atual tendência tem sido de se buscar uma nova
descentralização.
Nas subseções a seguir, serão descritas as situações de descentralização e
centralização por meio da unificação. Cabe inserir essa base histórica para que os
movimentos contemporâneos sejam contextualizados e compreendidos dentro de
uma perspectiva mais abrangente.
2.1. A Origem das Cidades
Tendo em vista que o objetivo esta dissertação é tratar sobre as relações
44
internacionais entre cidades, fenômeno denominado Paradiplomacia, é relevante
traçar um breve histórico sobre o surgimento das cidades e os seus primeiros
estágios de desenvolvimento até o início da comunicação entre as diferentes
sociedades. Abordar-se-á tamm os aspectos das Cidades-Estados que remontam
uma estrutura de autonomia interessante para a análise que se seguirá adiante no
aprofundamento das características e nuances da prática da Paradiplomacia.
A literatura histórica não apresenta um consenso específico e exato sobre o
ano real surgimento das primeiras cidades. As datas variam de quinze a três mil
anos atrás, remontando o período AC. Por outro lado, existe bastante clareza quanto
ao local deste surgimento que é na região da Mesopotâmia onde situa-se o Iraque
atualmente, seguido da Ásia mais precisamente no território da atual China. O
desenvolvimento se deu como extensões do modelo de família e principalmente
baseado nas crenças das religiões dos povos agrupados. Coulanges (2004, p. 220,
217) as primeiras cidades eram bastante singulares e independentes. Possuíam
moeda, pesos, medidas, leis e costumes únicos sempre pautados na religião,
geralmente politeísta. Os governantes eram como os chefes das famílias e não
derivaram da força. A cidade representava a pátria de seus habitantes, os quais
eram exacerbadamente fiéis e devotos a todos os rituais e procedimentos
estabelecidos, sendo assim o interesse público raramente era diferente dos
interesses privados.
Ainda de acordo com Coulanges (2004, p. 220) as cidades por mais
próximas que fossem eram completamente distintas por causa das crenças e
religiões. Nem sequer casamentos eram permitidos entre cidadãos de cidades
diferentes, a não ser que houvesse uma convenção que permitisse tal uno. O grau
de soberania era alto e as conquistas mediante guerras entre as cidades não
resultavam em anexação, mas em expulsão (entenda-se tamm como extermínio)
da população local e a construção de uma nova população com os imigrantes da
cidade vencedora, como foi o caso entre Esparta e Messênia.
As cidades se formaram a partir do objetivo principal de sobrevivência
através do desenvolvimento da agricultura e o abandono das práticas nômades que
evitavam que os homens de fixarem-se em um local. Foi a chamada Revolução
Agrícola ou Revolução Neolítica, da caça e pesca para o cultivo e estocagem
(Bairoch, 1988, p. 3). Por serem sociedades fechadas, as cidades inicialmente
produziam somente para o seu consumo, mas logo percebeu-se que o excedente
45
poderia não somente ser doado ou feito como oferenda, mas tamm
comercializado. Conforme o relata o FAMSI (Foundation for the Advancement of
Mesomerican Studies, Inc):
Anthropologists tend to think of early cities as egalitarian societies who
restricted the accumulation of personal wealth by continually circulating food
and materials through reciprocal exchange networks. But while food-sharing
and gift-giving may have promoted trust and bound tribal members together,
the ability to generate surpluses with plant cultivation would have created
status differences. Ambitious individuals could begin capitalizing on a basic
primate condition [...]
4
Na América Latina, as primeiras cidades surgiram na atual região México
com as civilizações Maia e Asteca a aproximadamente 3000 AC. Friedmann (1995,
p. 73) relata que o alto grau de desenvolvimento quanto à dinâmica dos processos
necessários para o bem estar da sociedade relacionados à arquitetura, engenharia e
agricultura chamaram a atenção de todos os estrangeiros que por lá passavam.
Essas civilizações eram consideradas grandes impérios. Os Maias habitavam o
México e parte da América Central. Foram responsáveis pelo desenvolvimento da
escrita hieroglífica e um calendário com 360 dias. Na região que atualmente é
Bogotá a civilização de onde surgiram as primeiras cidades era chamada de
Chibchas e lidavam com ourivesaria e as técnicas com aço. Os Astecas também
chamados de Mexicas ou Teochtas, eram considerados bárbaros de guerra,
construíram o santuário Uitzicopochti e em volta formaram a cidade de Tenochtlitan.
A partir dessa perspectiva de desenvolvimento do comércio do excedente
produzido internamente e o fim do isolamento, as cidades foram se desenvolvendo
até o estágio que mais interessa a esta pesquisa nesta seção que é a de Cidade-
Estado. Coulanges (2004, p. 450) explica que as cidades antigas baseadas no
modelo familiar e com crenças próprias foram desaparecendo com o surgimento do
cristianismo: “o direito de propriedade transformou-se na sua essência; deixou de
derivar da religião, para provir do trabalho e as formalidades do velho direito
definitivamente foram postas de parte”.
Com a abertura das sociedades deu-se início as atividades de cooperação
4
Antropólogos tendem pensar que as primeiras cidades como sociedades igualitárias que restringiam
a acumulação de riquezas pessoais através da contínua circulação de alimentos e materiais em uma
rede recíproca de trocas. Porém, enquanto a divisão de alimentos e ofertas podem ter promovido
confiança e unido os membros tribais, a habilidade de gerar estoques com a agricultura teria criado
diferenças de status. Indivíduos ambiciosos poderiam ter começado a capitalizar em condições
primárias. Tradução livre.
46
entre as cidades no que tange a alimentos, irrigação, transporte e outras
necessidades e conseqüentemente atividades comerciais que mantinham as
cidades em contato com outros produtos e culturas.
2.1.1. As Cidades-Estados
As primeiras cidades-estados surgiram aproximadamente 3.200 anos AC
com a emergência da cultura mesopotâmica e desapareceram na metade do século
XVII (Bairoch, 1988 p. 25). Uma cidade-estado pode ser definida como um “estado
no qual existe apenas uma cidade ou no qual uma única cidade é tão superior em
termos de população e poder comparado a cidades menores sendo que a
superioridade no estado é indisputável”. (Toynbee, 1970 p. 44).
Uma das características mais destacada é a plena soberania potica. Esse
tipo de cidade foi o padrão do mundo Greco-Romano e os clássicos exemplos deste
modelo são Atenas e Esparta na Grécia, e, Roma, Florença e Veneza na Itália. É
interessante destacar neste ponto que a autonomia local existiu na história
mundial, dados os contextos e especificidades, as cidades-estados são ícones que
merecem serem comentados ao se tratar de gestão e Desenvolvimento Local.
Na Grécia, berço das mais famosas cidades-estados, a atuação de
Alexandre Magno no período Antes de Cristo, eliminou a independência das
cidades-estados, porém por outro lado, suas conquistas ao redor do mundo
resultavam e constituições de cidades cosmopolitas administradas por gregos. Era
praticamente como ter diversas cidades gregas fora da Grécia.
No contexto político, Adams et al (2000, pg. 123) cita a democracia de
Atenas como uma das primeiras formas de participação da população local nos
assuntos públicos, diferente de outras regiões, como na China, que seguiam o
modelo aristocrático. De fato não era uma democracia moderna com voto universal,
pois ainda excluíam-se mulheres e escravos, mas já havia o que pode se considerar
como uma participação direta. Os cidadãos a ocuparem os cargos eram escolhidos
aleatoriamente sob a premissa de que saberiam executar bem o trabalho e caso
contrário, severas punições poderiam ser aplicadas. Atenas também foi pioneira em
estabelecer julgamentos com júri popular.
Na clássica obra sobre a história das cidades, Cities on the Move de Arnold
Toynbee, o autor descreve que Roma durante seu imrio, impôs com sucesso uma
47
unidade política e legislativa em todo o perímetro do mar Mediterrâneo. Através das
conquistas, implementaram sob seu domínio o sistema organizado em cidades-
estados, processo que foi concluído no século 3 D.C. Apesar de serem classificadas
como cidades-estados, os membros do império Romano não eram soberanos, mas
eram self-governed ou seja, possuíam um governo próprio uma vez que
demonstravam eficiência e capacidade para tal (1970, p. 50). Os territórios eram
transformados em províncias e cada governante possuía poderes civis e militares.
Concentrava-se principalmente em disseminar a idéia de participação nos assuntos
de interesse público. Adams et al (2000, p. 124) assinala que apesar do senado
aristocrático ser a estrutura dominante, os cidadãos ordinários tamm tinham sua
assembléia. Com a tendência de centralização este sistema falhou e então somente
algumas cidades conseguiram manter seu status de cidade-estado, como Veneza.
2.2. Surgimento dos Estados Nacionais: Unificação e Centralização
Foi com o desenvolvimento do capitalismo mercantil que o Estado Moderno
surgiu em meados do século XV na Europa Ocidental (França, Inglaterra, Espanha e
Itália). Suas características centrais são a soberania, autoridade máxima das ações
e a distinção entre Estado e sociedade civil, com a ascensão da burguesia no século
XVII.
O surgimento do Estado-Nação está diretamente ligado ao conceito de
centralização do poder e historicamente ao final do feudalismo. Falcon e Rodrigues
(2006, p. 5) especificam que do século XVI ao XVIII correspondem a Idade Moderna
marcando a transição do feudalismo para o capitalismo e a expansão mercantil. Este
processo foi o início do estabelecimento do chamado sistema mundial capitalista
moderno.
O Estado nasce a partir de uma construção. Pode ser considerado como um
ator artificial, centralizador, institucionalizado, e na medida em que detém o
monopólio da força e da burocracia, se fortalece cada vez mais. Para Bobbio (1995,
p. 18) o Estado Nacional se consolida a partir do momento em que seu poder é
incontestável, pois é quem dita o Direito e também quem o positiva. Sendo assim, o
Estado se atribui e assume a obrigação jurídica bem como a função de dar tutela
jurisdicional, passa a harmonizar os conflitos, as tensões e as contradições da
48
sociedade, a estabelecer os parâmetros para a ordem, o direito, a justiça, a
segurança, a liberdade e a propriedade.
É a partir da formação dos Estados Nacionais que origina-se uma nova
estrutura de poder transitório com o fortalecimento da aliança entre rei e burguesia.
Para burguesia, este Estado com poder centralizado era de fundamental
importância, pois além de kpossibilitar a padronização monetária, e a criação de leis
e exércitos nacionais, representaria uma importante retaguarda para os
empreendimentos, tanto no estabelecimento do protecionismo alfandegário, como
para conquistar militarmente outros mercados. Para governantes, era tamm
importante estar ao lado da burguesia, pois esta representava a iniciativa privada
para o comércio, que ampliado, proporcionaria uma maior arrecadação de impostos
e o consequente fortalecimento do poder real.
Existem diversas correntes que explicam a formação dos Estados, como a
filosófica, sociológica, jurídica, mas por questões de delimitação nesta pesquisa a
abordagem será pela perspectiva histórica. Conforme apontado por Souza (2007, p.
3):
Autores modernos têm defendido a Teoria da Formação Hisrica do
Estado, defendendo a idéia de que são três os modos pelos quais
historicamente, se formam os Estados: Modo Originário, Modo Secundário e
Modos Derivados. Para Maluf
5
, “extinguiram-se os agrupamentos primitivos
oriundos de uma ordem natural primitiva e sobre seus escombros ergueram-
se os Estados do modo atual. Na sua maioria, representam estes o
renascimento ou a reformação dos velhos agrupamentos existentes,
extintos, mas conservando muitas vezes o nome e as tradições, porém,
ostentando nova configuração política”. Para estes pensadores, o Modo
Originário de surgimento de um Estado, se confunde com sua própria
formação social, mas se distingue em aspectos essenciais. Dar-se-ia
quando, sobre um território que não pertencia a nenhum Estado, uma
população se organizou politicamente, por impulso espontâneo de suas
forças sociais e psicológicas. Atenas e Roma seriam exemplos típicos desta
formação originaria. Evidentemente, no mundo atual é praticamente
imposvel este processo de formação. O surgimento pelo Modo Secundário
pode ocorrer de duas formas: quando um Estado se divide, o que permite a
formação de outros Estados (servem como exemplo os inúmeros Estados
surgidos com a dissolução da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
URSS), ou quando dois ou mais Estados se unem para formar um novo
Estado (como Zanzibar e Tangânica, que se uniram em 1964 formando o
Estado da Tanzânia). Como Modos Derivados, temos o exemplo dos
Estados Americanos que se formaram pela colonização da Espanha,
Inglaterra e Portugal, dos quais se independizaram
6
.
5
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 10ª ed. São Paulo: Sugestões Literárias. 1989.
6
Muitos autores, especialmente os internacionalistas, apresentam grande sub-divisão quanto aos
modos de surgimento histórico dos Estados. O modo secundário, que seria pela União ou Divisão,
essub-dividido em União Real, União Pessoal, Federação ou Confederação. A Divisão de Estados
49
A partir da base histórica, evidencia-se que os processos de unificação e
formação dos Estados Nacionais aconteceu com a premissa de centralização. Na
Europa, os Estados se consolidaram em tempos diferentes; enquanto a França e a
Inglaterra em meados do século XV possuíam fronteiras definidas e governo próprio,
a Itália e a Alemanha ainda eram fragmentadas, vindo a se tornar uma unidade
política somente na segunda metade do século XIX. Strayer (1970, p. 18) explica
que os Estados europeus conseguiram manter as virtudes dos impérios e das
cidades-estado, pois em termos de tamanho eram estrategicamente bem formados,
o que aumentavam as possibilidades de sobrevivência, e a manutenção da coesão.
Diante das características históricas da Europa com a presença de vários impérios
singulares, a formação do Estado Nacional deu-se através da unificação desses
territórios que eram independentes em diversos aspectos. Metaforicamente, foi
como transformar diversos pequenos panos de prato em uma toalha de mesa. Os
europeus foram tamm responsáveis pela colonização de vários territórios em
outros continentes devido à política mercantilista e a busca por matérias-primas. Na
Europa, os modelos políticos predominantes foram a monarquia e o absolutismo.
Apesar disso, o primeiro exemplo histórico de formação de um governo de caráter
popular, proletário, ocorreu no século XIX, na experiência conhecida como Comuna
de Paris. Aos poucos, a Europa foi mudando seu sistema, sendo que alguns países
aderiram ao Presidencialismo e outros ao Parlamentarismo criando uma estrutura
um pouco mais descentralizada.
Os Estados Unidos da América é um exemplo de colonização européia. A
Inglaterra era a metrópole das treze colônias que em 1776 se tornaram
independentes, formando um único país. A estrutura política original das Treze
Colônias era uma confederação, ratificada em 1781. Em 1789, os Estados Unidos
optaram em se tornar uma República Federal. A unificação norte-americana foi
concretizada no que é atualmente, quarenta e oito estados contíguos e outros
Estados mais distantes, como o Alaska e o Havaí, ao longo do século XIX e XX. A
filosofia do “Destino Manifesto” foi a corrente que encorajou a expansão em direção
ao Oeste no país. A entrada de imigrantes assim como o aumento populacional
tanto ao leste quanto a oeste, foram forçando a população nativa indígena a se
se sub-divide em Divisão Nacional ou Sucessoral, enquanto que os modos derivados se sub-dividem
em Colonização, Concessão de Direitos de Soberania ou Atos de Governo.
50
moverem para territórios em forma de reservas. A unificação dos Estados Unidos da
América foi realizada através de conquista de territórios e anexação. Apesar deste
processo ser em grande parte via iniciativas bélicas, o estabelecimento da ordem
política consistia na premissa de autonomia local. Uma característica de destaque é
que desde sua origem são os governos subnacionais que possuem a maior
influência sobre o cotidiano da população americana sendo que cada ente federado
possui sua própria Constituição. Possuem ainda o poder de aprovar suas próprias
regras e leis, em assuntos determinados como propriedade, crime, saúde e
educação. Este sistema político é a base do federalismo, que será explicado em
uma próxima seção.
Os vinte e três países da América Latina também foram exemplos de
colonização européia. As civilizações antigas existentes nessa área, como Maias e
Astecas, que formaram as primeiras cidades latinas, além da população indígena,
foram exterminadas com a chegada dos colonizadores europeus. Apesar de toda a
organização das sociedades mais avançadas e da alta demografia indígena, os
territórios foram dominados em forma de colônias de abastecimento para a Espanha
e Portugal. Muito embora o surgimento dos Estados Nacionais na América Latina
tenha como precedente a intervenção Européia, foi um processo diferente dos
Estados Unidos da América. Cabe destacar dois aspectos de diferenciação: o
primeiro remete ao tipo de colonização, pois a presença européia na América Latina
possuía um caráter muito mais típico exploratório do que de povoamento, dado as
condições e oportunidades de matéria prima; o segundo está na característica da
formação dos Estados Nacionais, literalmente. A partir do exemplo do Brasil, nota-se
essa diferença, uma vez que o território descoberto era um com diversas tribos,
porém sem delimitações políticas estabelecidas. Com a atuação portuguesa e
posteriormente com a independência, foram-se dividindo as áreas, criando fronteiras
e limites para as unidades subnacionais. Utilizando da mesma metáfora, o inverso é
verdadeiro para o caso brasileiro de uma toalha de mesa, fizeram-se vários panos
de prato. É importante mencionar que o processo luso-brasileiro se distinguiu do
processo hispânico, pois enquanto que o Brasil manteve a unidade nacional de todo
o antigo território português, nas colônias hispânicas houve uma fragmentação em
várias repúblicas pequenas.
Segundo Cervo e Bueno (2002, p. 26), o rompimento da independência
apresentou três dimensões como expressão original da política externa brasileira:
51
uma político-jurídica, outra militar e uma terceira diplomática; operando-se em duas
fases: a primeira nacionalista e a segunda contra-revolucionária. Dom Pedro I e José
Bonifácio, com o objetivo de firmar a soberania do jovem Estado e rejeitar a
autoridade das cortes portuguesas, tomaram diversas medidas, como a organização
dos ministérios de Estado, a criação do Conselho dos Procuradores-Gerais das
Províncias do Brasil e a exclusão de funcionários portugueses nomeados para
cargos públicos.
Portugal pretendia reconquistar o Brasil, retomar o sistema colonial através
de uma "guerra de reconquista", tendo por estratégia a união com o norte. O Brasil,
por vez, tinha planos defensivos, buscando alianças externas e criando o exército e
a marinha nacional. Durante a guerra, o lado brasileiro pode contar com a
participação espontânea popular, com o recrutamento de escravos e homens livres,
com a incorporação de soldados portugueses e a contratação de oficiais
estrangeiros (ingleses, franceses e norte-americanos). Portugal, apesar de sua
supremacia militar inicial o conseguiu manter-se no conflito, retirando-se em
agosto de 1823. Com a vitória brasileira, os efeitos foram diretos como a
consolidação da soberania, a uno das províncias, substituição de governos
coloniais por assembléias brasileiras e o confisco de propriedades portuguesas.
Tornando-se uma república, o Brasil é tamm federalista e após diversas
mudanças de sistema de governo desde a sua independência, atualmente é uma
democracia presidencialista. As unidades subnaconais possuem autonomia de
acordo com o princípio federativo, mas certamente não em estágio avançado como
na Europa ou nos Estados Unidos da América. Este fator ficará evidenciado quando
adiante forem expostas as realidades sobre a atuação internacional das cidades e a
Paradiplomacia.
Antes de avançar no estudo sobre o Estado Moderno e as relações
internacionais contemporâneas no próximo capítulo, é interessante ressaltar as
definições e conceitos que se positivaram na literatura sobre o Estado Nacional. De
acordo com o Dicionário de Direito Internacional Público, de Daillier e Pellet (1999, p.
406) o Estado Nacional é um fenômeno histórico, sociológico e político. A
composição de um Estado compreende a existência de uma população, território e
governo. A população de um Estado são todos os indivíduos que estão ligados a ele
por um vínculo jurídico, o vínculo da nacionalidade, estejam eles vivendo neste
Estado ou fora dele. A nacionalidade é a base da competência pessoal do Estado.
52
Cabe ressaltar que existe uma diferença entre população e Nação, pois um Estado
pode ser composto por mais de uma nação, como no caso de alguns países da
África.
O território nada mais é do que um espaço delimitado por fronteiras
devidamente estabelecidas, onde vive a população e sobre o qual é competente e
soberano o governo de tal Estado. Por sua vez, o governo é tão necessário à
existência de um Estado quanto uma população e um território, pois o Estado
necessita de órgãos que possam lhe representar e exprimir as suas vontades.
Tamm chamado de aparelho estatal, o governo deve possuir capacidade real para
exercer todas as funções, principalmente as ligadas à manutenção da ordem e da
segurança internas e o cumprimento dos seus compromissos internacionais.
Juridicialmente, o Estado é o único sujeito que possui uma característica
fundamental : a soberania ou a independência. Portanto, ele não é subordinado a
nenhum outro membro da Comunidade Internacional. Ele se submete ao Direito
Internacional, mas, como é o próprio Estado que cria as normas em Direito
Internacional, na verdade ele só se submete à sua própria vontade.
A formação e a unificação do Estado Nacional em todo o mundo deu-se de
maneiras diferentes, porém a centralização do poder foi presente em todos os casos.
Alguns de maneira mais branda outros de forma exacerbada. De qualquer forma,
cabe destacar que este processo vem sofrendo uma certa desconstrução com o
debate entre soberania e descentralização. Adiante, serão contemplados tópicos
político-teóricos que montam este cenário contemporâneo.
3. O ESTADO MODERNO E ATORES DA NOVA ORDEM GLOBAL
Este capítulo tem como objetivo descrever os adventos contemporâneos
dentro do contexto da pesquisa, delineando questões internas (nacionais) com
repercussões externas (internacionais). Analisar-se-á o papel do Estado Nacional
Moderno frente aos fatores que impulsionam a globalização e principalmente
assuntos pontuais que de alguma forma fazem referência à Paradiplomacia. Serão
descritos os conceitos e modus operandi do Federalismo, as características da
integração regional a partir da visão Neofuncionalista,
Antes de adentrar aos aspectos citados, deve-se ressaltar que o Estado
Moderno em questão deste ponto em diante da pesquisa refere-se ao Estado-Nação
53
atual, que segue os preceitos neoliberais: basicamente o aprofundamento do
capitalismo e o Estado mínimo. É tamm objetivo desta seção, compreender o
debate em torno da globalização e da soberania.
3.1. Federalismo
A noção antiga de federalismo consiste numa união provisória por acordos
com objetivos em comum, pelo tempo necessário. Apesar do dogma existente no
Ocidente, de que a forma centralizada do poder era a melhor administração para
grandes territórios (literatura clássica), assim que os Estados Unidos tornaram-se
independentes em relação à Inglaterra, acreditaram que seria melhor a unificação
dos 13 estados, lutando contra a instalação do absolutismo. Os Estados Unidos
foram os precursores do federalismo. James Madison, John Say e Alexandre
Hamilton, foram grandes nomes que escreviam artigos federalistas nos jornais na
época de 1770.
A federação moderna é a forma de administrar um Estado, tornando-o uma
Nação. A premissa central do federalismo é a da conjugação de vários centros
autônomos de poder político. Os critérios a serem mantidos nesta concepção seriam
o da não-subordinação do governo estadual ao governo nacional, autonomia dos
membros, igualdade e cooperação. É na Constituição Federal que se encontram as
limitações, direitos e deveres do poder nacional e a garantia de autonomia do
governo estadual. Ambos os poderes são iguais, apenas possuem funções
diferentes, e, estarão submetidos a princípios comuns inscritos na Constituição
Federal do país. A intenção do federalismo é a de eliminar a hierarquia entre os
governos (federal, estadual, municipal), através da distribuição constitucional de
competências. Em uma federação politicamente descentralizada, o presidente o
poderá governar sem que haja uma Assembléia ou Parlamento para ditar-lhe as
devidas leis. Dallari (1986, p. 254) explica que o Estado Federal tem se consolidado
desde o seu surgimento e por isso pode ser considerado como um modelo capaz de
corresponder às necessidades e aspirações fundamentais contemporâneas.
Numa federação, dentro de cada estado membro, a população elege seus
deputados que os representarão na Câmara, elaborando projetos, que serão
analisados pelos representantes dos estados que fazem parte do Senado, estes por
sua vez analisarão todos os projetos, verificando a possível existência de violação
54
do federalismo. De acordo com Bonavides (2004) a fisionomia jurídica de uma
federação consiste em forma republicana representativa; independência e harmonia
dos poderes; temporariedade das funções eletivas, limitada a duração a das funções
federais correspondentes; autonomia municipal; garantias do poder Judiciário e
prestação de contas da administração.
O Departamento de Estado dos Estados Unidos da América lista as
principais características do federalismo em um artigo chamado Princípios da
Democracia (2004):
a) O federalismo é um sistema de poder e tomada de decisão
compartilhados entre dois ou mais governos livremente eleitos, com
autoridade sobre as mesmas pessoas e a mesma área geográfica.
Garante e protege a capacidade de tomar decisões onde os resultados
são sentidos de forma mais imediata nas comunidades locais, bem
como nos níveis mais altos do governo.
b) O federalismo promove a responsabilidade do governo para com as
pessoas e incentiva a participação dos cidadãos e a responsabilidade
cívica ao permitir que os governos locais elaborem e administrem leis
locais.
c) Um sistema federal é reforçado por uma constituição escrita, que
concede autoridade e delinea o âmbito das responsabilidades
compartilhadas por cada nível de governo.
d) Embora se concorde, de um modo geral, que os governos locais devem
satisfazer as necessidades locais, algumas questões são deixadas para
o governo nacional. A defesa, os tratados internacionais, os orçamentos
federais e os serviços postais são, muitas vezes, citados como exemplos.
e) As leis locais refletem as preferências segundo as quais as comunidades
locais escolhem viver polícia e bombeiros, administração escolar,
saúde local e regulamentos sobre a construção são, com freqüência,
decididos e administrados localmente.
f) Relações intergovernamentais significam que vários governos num
Estado Federal (nacional, regional e local) trabalham juntos quando
questões de autoridade estatutária implicam na necessidade de tratar as
questões de forma cooperativa. O governo nacional tem muitas vezes a
autoridade para interceder em disputas entre regiões.
55
g) Num país geograficamente grande e economicamente diversificado, as
disparidades de renda e bem-estar social entre as regiões podem ser
tratadas pelo governo nacional através de políticas que redistribuem os
impostos arrecadados.
h) Um sistema federativo é receptivo e abrangente. Os cidadãos são livres
para se candidatarem a posições no governo em todos os níveis o
governo local e o nacional oferecem a maioria das posições e, talvez, a
melhor oportunidade de fazer diferença em suas comunidades.
i) O federalismo proporciona oportunidades múltiplas para os partidos
políticos servirem seus eleitores. Mesmo que determinado partido não
detenha a maioria no Parlamento ou no Executivo, lhe é permitido
participar nos níveis regional e local.
Ao que tange o objeto de estudo desta pesquisa, a Paradiplomacia, um dos
conceitos centrais relacionado ao federalismo é a autonomia municipal ou local.
Conforme abordado acima, os governos locais apesar de serem responsáveis pelo
desenvolvimento de seu território e comunidade, uma limitação nesta autonomia,
explicitamente declarado, que é a celebração de tratados internacionais. A partir
deste ponto, chega-se a um dos questionamentos centrais desta pesquisa.
Entendendo que o governo local possui responsabilidades para com o
Desenvolvimento Local e para tal possui autonomia, essa atuação o pode
ultrapassar as barreiras nacionais para a realização desta tarefa? A autonomia é
então limitada às fronteiras nacionais?
Prazeres (2004, p. 287) explica esse questionamento através da distinção
entre uma Confederação e uma Federação. A primeira forma é constituída por
unidades capazes de se relacionar com outros Estados soberanos, enquanto em
uma Federação, apesar de serem dotadas de autonomia, as unidades o
desprovidas da capacidade de relação com outros Estados. Em suas palavras ipsis
literis:
De forma geral, entende-se que o Estado federal é soberano, ao passo que
as unidades federadas que o compõem são tão-somente autônomas. Com
efeito, em se seguindo a orientação tradicional, segundo a qual a
manutenção de relações com outros Estados é uma prerrogativa de
soberania, tais subunidades não disporiam de capacidade de, per se,
assumir compromissos internacionais.
Contudo, a conjuntura empírica mostra que essa rigidez no conceito da
56
composição do Estado federal está passando por algumas adaptações. Ainda de
acordo com Prazeres (2004, p. 289) “muitos Estados com características federais
admitem a atuação externa de suas unidades componentes”. Certamente que
existem questões que o puramente nacionais no contexto das relações
internacionais, como o câmbio e a taxa de juros, porém as vantagens competitivas
são de cada cidade, de cada localidade. Será abordado mais profundamente
adiante, tanto teoricamente como empiricamente, como as cidades através da
inserção internacional podem promover seu desenvolvimento.
3.2. Soberania e Globalização
Conforme abordado na delimitação teórica, os Estados europeus iniciaram
seus processos de unificação ao tempo em que suas burguesias necessitavam de
novos mercados para escoar a produção. A partir da metade do século XVI, as rotas
comerciais portuguesas começaram a ser ameaçadas e os conflitos entre os novos
Estados foram inevitáveis. França, Inglaterra, Espanha e Holanda, unificadas,
iniciaram a disputa pelo poder econômico e, conseqüentemente, os conflitos por
novas rotas comerciais iniciaram-se.
Neste contexto, o princípio da soberania estatal começou a ganhar
importância entre os acadêmicos e a ser discutido pelos monarcas. O primeiro
teórico a discorrer sobre a soberania foi Jean Bodin no ano de 1576 em sua obra Os
seis livros da República, no qual afirmava que a soberania é o poder absoluto e
perpétuo de uma República. Para esse autor a soberania poderia se concentrar nas
mãos do povo ou de um pequeno grupo da sociedade. Contudo, para a manutenção
do poder e consecução dos objetivos estatais, o monarca seria o mais indicado para
concentrar este poder.
Hobbes foi outro teórico que discorreu sobre a soberania, entendendo que o
homem, por sua natureza era mal e pensava em seu interesse pessoal. Sendo
assim a vida em sociedade seria impossível, sem a existência de um poder que
garantisse o mínimo de ordem entre os indivíduos. Caberia então ao soberano
proporcionar aos súditos a segurança necessária para o convívio social e tamm
garantir-lhes a igualdade perante as leis. Ambos pensadores foram teóricos do
absolutismo e definiram a soberania como instrumento de concentração do poder no
âmbito da política interna, sem a preocupação em discutir o exercício da soberania
57
nas relações internacionais. Foi Hugo Grócio, em sua obra Direito da Guerra e da
Paz, quem desenvolveu a idéia da guerra justa, ou seja, o condicionamento dos atos
de guerra às regras do direito. A formulação desse conceito gerou o primeiro sistema
de direito entre os Estados europeus, no que diz respeito as suas relações externas.
Durante o processo de unificação nacional dos Estados europeus a
soberania ganhou duas faces, uma interna e outra externa. Internamente, significou
a concentração do poder político nas mãos do monarca e a conseqüente submissão
dos indivíduos ao ordenamento jurídico estatal. No plano externo, a soberania
significava a possibilidade de o Estado manter relações econômicas e políticas com
outros Estados, mesmo em casos de guerra, com base no direito.
No princípio a soberania significava o poder supremo, absoluto, perpétuo,
indivisível e alienável. Após as revoluções liberais e do surgimento do Estado de
Direito, a soberania passou a ser um poder da população de um determinado Estado
(nação) a ser exercido por seus representantes. Dupas (2005, p. 135) revela que
com a Revolução Industrial e a ascensão da política liberal o Estado absolutista
começou a ser contestado na medida em que a iniciativa privada dava chances de
mobilidade de classes. Aos poucos o poder deslocou-se das mãos dos monarcas e
passou aos Parlamentos, dando início ao processo que Kant chama de “direito das
gentes”, a idéia de soberania popular que amadureceu durante todo o século XIX.
No século XX, a soberania passa a ser vista como um conjunto de competências
que o Estado possui e que lhe é concedido pela ordem internacional.
Contudo, em função de fatores como o aprofundamento do capitalismo
liberal e a emergência da globalização, a soberania do Estado-Nação volta ao
debate recheado de questionamentos quanto a sua existência e efetividade. A
simples conotação de aldeia global ou sociedade mundial vem embutida com um
sentido de eliminação de fronteiras, de quebra da unidade singular. A globalização e
o crescimento dos fluxos de capital internacional formam um conjunto de fatores e
fatos que levam a descentralização do poder e conseqüentemente o
enfraquecimento da soberania absoluta. Ainda de acordo com Dupas (2005, p. 144)
entende-se que diante do quadro globalizado onde os Estados estão atualmente
inseridos, eles não mais possuem o monopólio da soberania jurídica uma vez que é
inevitável a convivência e tolerância com atores paralelos. Sarfati (2005, p. 318)
define que globalização é um processo no qual as barreiras tradicionais existentes
entre os Estados deixam de existir como resultado do avanço tecnológico que
58
possibilita a interação direta entre pessoas, empresas e governos. Esses atores, que
gradativamente vêm influenciando e inserindo-se efetivamente na ordem global,
colocam em questionamento a supremacia nacional de um Estado. Destacam-se as
Organizações Não Governamentais ONGs, as empresas multinacionais ou
transnacionais MNC ou TNC , instituições internacionais OIs e até mesmo os
governos locais ou subnacionais.
Esses atores, considerados secundários dentro dos paradigmas clássicos
das relações internacionais, estão aumentando sua atuação e poder de pressão
junto aos governos centrais. No caso das grandes corporações existe a questão de
crescimento econômico com a atração de investimentos, fluxos de capitais, geração
de emprego e renda; as ONGs atuam como agentes de pressão, em teoria,
representando essencialmente as preocupações da sociedade civil; as OIs como a
ONU, a OMC, o FMI, apesar de serem criadas e formadas a partir da vontade dos
Estados, são órgãos que regulam aspectos específicos acima da vontade individual
do Estado membro; por sua vez o governo subnacional (menos mencionado nas
literaturas como um ator dentro deste quadro) pode aproveitar-se de sua autonomia
federativa e obrigações em promover o desenvolvimento sócio-econômico de seu
território e independentemente buscar instrumentos que satisfaçam essa
necessidade. A Paradiplomacia pode ser um instrumento para o alcance deste
objetivo.
Na visão do pesquisador pioneiro sobre a atuão internacional das
unidades subnacionais, Soldatos (2001, p. 35), o Estado-Nação é uma unidade
política que será extinta no decorrer do século 21 sendo que sua soberania não é
mais absoluta, mas sim recortada e passível da necessidade de delegação. Ianni
(1994, p. 6) afirma que a globalização traz consigo fatores que desafiam a soberania
absoluta do Estado nacional e concomitantemente abala sua hegemonia:
O Estado-Nação, por exemplo, entra em declínio, como realidade e
conceito. Não se trata de dizer que deixará de existir, mas que está
realmente em declínio, passa por uma fase crítica, busca reformular-se. As
forças sociais, econômicas, políticas, culturais, geopolíticas, religiosas e
outras, que operam em escala mundial, desafiam o Estado-Nação, com a
sua soberania, como o lugar da hegemonia. Sendo assim, os espaços do
projeto nacional, seja qual for a sua tonalidade política ou econômica,
reduzem-se, anulam-se ou somente podem ser recriados sob outras
condições. A globalização cria injunções e estabelece parâmetros, anula e
abre horizontes. [...] As grandes e pequenas nações, centrais e periféricas,
dominantes e subordinadas, ocidentais e orientais, ao sul e ao norte, todas
se deparam com o dilema da reformulação das condições de soberania e
59
hegemonia.
Por outro lado, Magnoli (1999, p. 41) defende que apesar das tendências
integradoras e globalizadoras apresentarem novos desafios aos Estados nacionais,
não enfraquecimento da unidade. Para o autor, o Estado-Nação se reinventa
para posicionar-se dentro do processo de globalização moldando-se as novas
necessidades. Na verdade, o Estado passa por uma série de adaptações - de
assistencialista á regulatório relacionadas ao meio e às necessidades desde o seu
surgimento. Portanto suas funções não são engessadas. Cabe afirmar que a
globalização trouxe novas necessidades de adaptação, quer isso gere perda da
soberania, quer não. A realidade das últimas décadas são as privatizações de
empresas de domínio e administração governamental e nem sempre compradas por
empresas nacionais; redução e/ou nulificação de tarifas e impostos alfandegários;
políticas econômicas nacionais coordenadas em escala internacional ou atreladas a
algum órgão como o FMI; massificação cultural e acesso a informações e
transmissão de dados realizados em segundos.
Diante dessas duas visões sobre a perda da soberania em face da
globalização, pode ser o caso de que o próprio conceito de soberania precise se
reinventar frente à nova realidade mundial. Alinhado a essa idéia, Fronzaglia (2005,
p. 62) afirma que do mesmo modo que o Estado-Nação passa por transformações,
assim tamm ocorre com o conceito e o exercício da soberania”. O entendimento
clássico do termo então é ultrapassado tendo em vista que existe uma necessidade
não apenas mercadológica, mas de sobrevivência que existam novos atores
capazes de inserir-se no cenário global. E isso não deve ser visto como uma causa
para a perda da soberania do Estado nacional, mas sim como um efeito da nova
conjuntura. Cabe a todos os interessados alinhar-se e buscar seu lugar ao sol.
3.3. Os Atores na Ordem Global
A maior parte das correntes teóricas em relações internacionais defende que
os Estados nacionais são os únicos atores legítimos no cenário global. Contudo,
conforme visto no subcapítulo anterior, a nova ordem estabelecida com a
globalização reorganizou e realinhou o cenário internacional. Dupas (2005, p. 27)
considera que os atores desta cena podem ser agrupados em três categorias: a do
capital, que seriam os agentes da economia global como as corporações e os
60
acionistas; a da sociedade civil, incluindo indivíduos e ONGs; e, a do Estado,
envolvendo os poderes Executivo, Judiciário, Legislativo, partidos políticos e
organizações internacionais. Dentro de cada grupo existem ramificações que podem
ser chamados de subgrupos e os interesses de todos os envolvidos são múltiplos.
As cidades possuem representantes em cada uma dessas áreas e é por meio
desses agentes que acabam por participar do cenário global.
Ao tratar do papel que esses atores desempenham, encontra-se um quadro
de realinhamentos e interdependência. É possível visualizar que a sociedade civil
contemporânea passa por um reposicionamento principalmente pela atuação das
ONGs que têm exercido um forte papel social e de pressão frente à formulação de
políticas públicas. A inserção internacional da sociedade civil via essas organizações
são evidências da pluralidade global. Por sua vez, a categoria capital é o caso mais
evidente visto as mudanças que a globalização trouxe para o comércio mundial.
pouco tempo as corporações tiveram que mudar sua postura genuinamente
exploratória e vestir uma roupagem socialmente e/ou ecologicamente responsável.
Isso mostra a interdependência entre essas duas categorias. Um esboço simples
mostra a ligação tende ser cada vez menos indireta: uma ONG é patrocinada por
uma grande empresa que precisa de apoio da sociedade civil para continuar suas
atividades e expandir; por sua vez a ONG utiliza-se de sua crescente voz para
exercer pressões no Estado para que haja concessões ou parcerias sejam firmadas.
Conforme Dupas (2005, p. 279) afirma apesar da supremacia do capital ter se
consagrado, sobretudo nos últimos cinqüenta anos, ele tem se tornado cada vez
mais dependente da legitimação social e política.
No caso do Estado, por exemplo, e com referência ao subcapítulo anterior,
temos de fato um processo de reposicionamento. De um lado estão as exigências de
um Estado neoliberal, mínimo; e de outro os anseios da presença de um Estado
forte e regulador que minimize as diferenças sociais e ao mesmo tempo proporcione
condições para o crescimento econômico. Atentando para essa dicotomia, cabe
identificar onde se encaixa a atuação internacional das cidades por meio de órgãos
públicos. Se partirmos do ponto de vista de que a gestão municipal possui certas
responsabilidades quanto à promoção do desenvolvimento de sua sociedade, a
inserção internacional estaria dentro de um pacote de estratégias que induziriam ou
que ampliariam as oportunidades de desenvolvimento em diversas áreas. O
61
exercício da Paradiplomacia pode até ser, á grosso modo, associado ao
intervencionismo, porém, se encaixa muito melhor na condição de indutor.
De acordo com Guaragni (2006, p. 54) o papel do Estado indutor engloba
fundamentalmente as tarefas de: nortear as políticas públicas locais, nacionais e
globais; proteger o país dos valores externos impostos à sociedade; ser um escudo
de proteção às empresas oriundas de seu país, e ser uma „ponte de ligação‟ entre
os interesses locais e globais, para haver uma relação harmônica entre ambos. Esse
referencial é o que tange a atuação internacional das cidades, conforme será mais
aprofundado nos capítulos seguintes.
4. TRANSNACIONALISMO
O Transnacionalismo é o fenômeno dentro do qual a Paradiplomacia está
inserida. Portanto, dedicar uma seção ao debate da atividade transnacional é
essencial para a compreensão do quadro geral em que o cerne da pesquisa está
inserido. O objetivo deste capítulo é compreender as diferentes formas e áreas do
Transnacionalismo bem como identificar o enquadramento da Paradiplomacia.
É a partir do Transnacionalismo que se iniciam a identificação de aspectos
pertinentes a relação entre local e global. Sua classificação está tanto como uma
atividade política, teoricamente debatida quanto à soberania do Estado Nação,
quanto como um advento das relações internacionais dentro da visão pluralista. Silva
e Gonçalves (2005, p. 249) explicam que Transnacionalismo significa ultrapassar os
limites da nacionalidade e isso pode ser realizado em diversas áreas (comercial,
cultural, política, científica) e executado por unidades subnacionais, organizações
públicas, privadas e o governamentais e empresas. Portes et al (1999, p. 3)
estabelecem conceitualmente que este fenômeno pode ser delimitado a ações e
atividades que requerem contatos sociais regulares e sustentáveis ao longo do
tempo para além das fronteiras nacionais.
Esses mesmos autores (1999, p. 220) afirmam que a atividade transnacional
envolve indivíduos, suas redes de relacionamento (networks), suas comunidades e
estruturas institucionalizadas como os governos locais. Podem ser classificadas
dentro de três segmentos de acordo com seus propósitos, sendo a econômica ligada
a iniciativas corporativas com a mobilização de contatos no exterior em busca de
fornecedores, capital e mercado consumidor; a política vinculada a partidos e grupos
62
políticos, articuladores governamentais ou líderes comunitários que objetivam
principalmente o alcance de poder político e tamm o intercâmbio internacional. Em
uma terceira classificação estariam as iniciativas sócio-culturais orientadas em
reforçar a identidade nacional no exterior ou promover eventos culturais, como
shows e feiras.
Os autores ainda determinaram uma classificação quanto ao grau de
institucionalização das atividades transnacionais dentro de cada segmento,
conforme a tabela abaixo:
Tabela 2 Transnacionalismo e suas modalidades
Econômico
Político
Sócio-Cultural
Nível de Institucionalização
Baixo
Negócios informais entre
países
Comitês cíveis criados por
imigrantes
Jogos amadores entre times
de diferentes países
Pequenos negócios abertos
imigrantes retornados à
origem
Alianças entre comitês de
imigrantes e associações
políticas do país natal
Grupos de música folclórica
se apresentando em centros
de imigrantes
Migração circular ligadas à
trabalho
Levantamento de fundos para
candidatos a eleições no país
natal
Líderes religiosos da cidade
natal visitam e organizam
seus seguidores no exterior
Alto
Investimentos
multinacionais em países
em vias de
desenvolvimento
Oficiais consulares e políticos
representantes de partidos
nacionais atuando
externamente
Exposições internacionais
de arte nacional
Desenvolvimento para
mercado turístico em locais
estrangeiros
Concessão de dupla
nacionalidade pelo país natal
Performance de artistas
ícones no exterior
Agências de bancos do
país natal em centros de
imigrantes
Imigrantes eleitos para
legislaturas no país natal
Eventos culturais periódicos
organizados pelas
embaixadas estrangeiras
O Transnacionalismo é um fenômeno que se tornou possível de acontecer a
partir da formação do Estado Nação e tem se intensificado com o advento da
globalização e descentralização do poder. Portes et al (1999, p. 220) explicam que:
Grass-roots transnational activities were not initiated by actions or policies of
governments, national or local. Nor were they the brainchild of large
corporate managers. Instead, these activities commonly developed in
reaction to governmental policies and to the condition of dependent
capitalism fostered on weaker countries, as immigrants and their families
sought to circumvent the permanent subordination to which these conditions
63
condemned them (Portes and Guarnizo 1991; Roberts et al. 1998). State-
sponsored transnationalism emerged, for the most part, subsequently as
governments realized the importance of their expatriate communities and
sought to circumvent or co-opt their initiatives (Smith 1996).”
7
De acordo com Sarfati (2005, p. 319) o processo de globalização desafia os
paradigmas clássicos das relações internacionais, pois contribui majoritariamente
para a necessidade de reorganização de conceitos e diferenciações entre local,
nacional e global e entre assuntos domésticos e internacionais. Compreender o
transnacionalismo como um fator crescente em todas as esferas e realizado por
vários atores é de fato um desafio ao pensamente clássico, principalmente aquele
que expressamente considera somente o Estado-Nação um ator relevante no
cenário global. No caso do local, de uma cidade, a globalização funciona como um
catalisador, fazendo o global influenciar o local, assim como o local se molda dentro
de perspectivas mais amplas, de acordo com a conjuntura global. É importante notar
que os processos globais acontecem na maioria das vezes desvinculados de um
território nacional fixo, enquanto os processos transnacionais estão ancorados em
um local e transcendem de um Estado-Nação como uma empresa que opera no
mundo todo, mas é centrada num local.
Um exemplo prático de transnacionalismo, relacionado ao objeto desta
pesquisa, o os acordos de cooperação técnica entre cidades (governos
subnacionais) de países diferentes. Este tipo de acordo pode acontecer a partir da
promoção das Políticas Públicas locais e em diversas áreas, desde a cultural até a
industrial. Quando uma cidade possui um modelo de destaque em transportes, por
exemplo, e o promove com amplitude internacional, é possível que chame a atenção
de outras cidades com condições similares. A partir desta identificação, inicia-se um
processo independente do governo local para ser firmado algum acordo para
transferência de conhecimento ou parceria técnica. Outro exemplo mais habitual
dentro do Transnacionalismo é a atuação das grandes corporações chamadas de
7
As raízes das atividades transnacionais não foram iniciadas por ações ou políticas governamentais,
nacionais ou locais. Nem eram iniciativas de gerentes de grandes empresas. Pelo contrário, essas
atividades se desenvolveram em reação a políticas governamentais e a condições do capitalismo
dependente existente em países mais frágeis, com imigrantes e suas famílias não querendo aceitar a
conviver com subordinação permanente a essas condições. (Portes e Guarnizo 1991; Roberts et al.
1998). O transnacionalismo patrocinado pelo Estado emergiu, em grande parte, a medida quem que
os governos perceberam a importância das comunidades expatriadas e viram a necessidade de ir
contra ou cooperar com suas iniciativas. (Smith, 1996).” Tradução livre.
64
multinacionais e recentemente denominadas empresas transnacionais. Essas
empresas o aquelas que se classificam dentro do padrão de estabelecimento
produção e entrega de produtos e/ou serviços em pelo menos dois países. As MNC
ou TNC (Multinational corporations ou Transnational corporations) se tornaram
grandes atores da economia e tamm de maneira indireta a política global. Lacerda
(2006) em seu artigo Globalização e as empresas transnacionais afirma que o
crescente papel desempenhado pelas empresas transnacionais tem implicado uma
mudança no posicionamento global das principais entidades econômicas na medida
em que essas representam um novo ator, que têm suas próprias estratégias, que
nem sempre vão ao encontro dos demais atores no nível local.
Ao transcender as barreiras nacionais, o ator em questão, seja uma
organização, uma empresa ou um governo subnacional, passa a enfrentar algumas
situões complexas tanto no âmbito externo quanto no interno. Uma das grandes
interrogações em relão ao Transnacionalismo é o que concerne à soberania do
Estado Nação, pois conforme abordado na seção anterior, ao permitir a ação
independente de um ente federado ou de uma organização, é em teoria abrir mão de
parte de sua centralização e controle. Além disso, existe outro ponto levantado por
Viotti e Kauppi (1999, p. 210) que recai sobre o cruzamento de interesses. Os
autores consideram que as organizações ao transcenderem as fronteiras e formarem
parcerias e acordos podem concorrer com os interesses do Estado Nação e
principalmente com os líderes estatais que possuem autoridade formal para tomar
decies neste nível. A ação transnacional de uma ONG ambiental que protesta em
um país contra a construção de uma estrada pode ir contra interesses econômicos
dessa cidade, estado e país e de outros países vizinhos que poderiam se beneficiar
com uma integração logística terrestre.
de se mencionar também o que Keating (1999, p. 1) chama de regimes
transnacionais. Apesar de também serem chamados de regimes internacionais, o
autor considera que o conceito de transnacionalismo encaixa melhor em relação à
prática exercida. Na área militar destaca-se a OTAN que é uma organização político-
militar criada no prelúdio da Guerra Fria com o objetivo de institucionalizar a
oposição ao socialismo. Com a fim da guerra e o eminente desaparecimento da
ameaça comunista a OTAN realinhou-se e atualmente é o eixo da política de
segurança da Europa e da América do Norte. Na área comercial, tratados como o
NAFTA regulam o comércio entre três países (Estados Unidos, México e Canadá)
65
que comprometem-se seguir as regras ratificadas. Sem contar o exemplo claro da
União Européia, tamm chamada de regime supranacional, cabe citar a Convenção
Européia de Direitos Humanos que estabeleceu uma Corte judicial na qual qualquer
cidadão que sinta ter tido seus direitos violados poderá através de seu estado
peticionar uma ação nesta corte.
Remetendo a história antiga, observa-se que o Império Romano apresentou
forte característica de transnacionalidade ao ser governado, no auge de sua
expansão imperial (117 d.C.), por um imperador não nascido em Roma. O imperador
Trajano era de uma família da Espanha que na época era umas das províncias de
Roma. Mesmo considerando-se a conjuntura política e militar, é um exemplo que
ilustra um tipo de transnacionalismo. A própria atuação das nações Européias, ainda
que imperialistas, nas Américas e na África está dentro da perspectiva transnacional.
Voltando a conjuntura atual é possível identificar o transnacionalismo
facilmente dentro das três áreas de atuação. Nesta pesquisa, o foco é na vertente
política, em como os governos subnacionais podem transcender as fronteiras e
barreiras de níveis superiores de administração e inserirem-se no cenário global. A
pesquisadora sobre a inserção das cidades na economia mundial Saskia Sassen
(1998, p. 16) afirma que desde o início da integração financeira com a convenção de
Bretton Woods em 1944, as cidades tem desenvolvido um papel estratégico,
principalmente as chamadas cidades globais, que são sede de referências
financeiras mundiais. Para alcançar este patamar além do crescimento interno os
esforços para a divulgação e promoção dessas cidades não podem ser deixados de
lado.
À parte dos famosos e mais citados centros financeiros como Nova Iorque,
Londres e Tóquio, é interessante analisar o movimento realizado por Barcelona que
ao identificar a crise econômica nacional no final dos anos da década de 1980,
procurou transnacionalizar-se. Através de iniciativas do governo local, a cidade
iniciou sua promoção além das fronteiras nacionais até conquistar o privilégio de
sediar as Olimpíadas de 1992. As ações transnacionais de Barcelona fizeram com
que ela se tornasse “uma cidade com uma imagem internacional que explora seu
próprio modelo de cidade e suas práticas de gestão urbana”, conforme citado por
Salomon e Nunes (2007). O transnacionalismo pode ser visto como um fenômeno
que concede novas oportunidades aos que estão dispostos a mergulhar em novas
águas. No Brasil o número de cidades que se encaixam neste perfil ainda é limitado.
66
São Paulo por ser considerada uma cidade global e o centro financeiro do país é
sempre mencionado, porém de se dar crédito para o trabalho da SMRI a
Secretaria Municipal de Relações Internacionais que funciona como um catalisador
do transnacionalismo da cidade.
4.1. Neofuncionalismo e Integração Regional
A teoria Neofuncionalista que é a corrente que trata de analisar as
características de desenvolvimento da integração regional (blocos econômicos)
baseado no conceito de spill over (transbordamento), conforme citado por Fronzaglia
(2004, p. 27) é proveniente da teoria Funcionalista. O funcionalismo surgiu no
período entre guerras tendo como autor principal, David Mitrany. Sua proposta partia
da premissa de que devido ao crescimento da complexidade nas relações
internacionais seria necessário estabelecer uma cooperação estruturada em
algumas funções específicas dos Estados. Além da questão de facilitar alguns
processos pela abrangência de resolução, Mitrany afirmava tamm que a
integração regional seria um instrumento pacificador entre as nações, pois a cada
parcela de soberania cedida ao centro organizador, aumentava-se a intenção de
manter o bem comum.
O Neofuncionalismo tem se desenvolvido juntamente com as experiências
da integração européia. Um sistema de integração pode ser definido como um
processo nos quais os Estados se organizam e unem-se para aumentar o grau de
cooperação e difundir as tensões. Fugindo um pouco da soberania absoluta definida
pelo Tratado de Westfália em 1648, numa integração pressupõe-se a abertura de
parte da soberania individual de cada país para um centro político e econômico. Este
centro, conhecido como esfera supranacional, é formado por representantes de cada
país integrante e rege políticas gerais para todos os cidadãos da comunidade. O
exemplo mais claro deste processo é a União Européia, a qual se encontra num
estágio avançado, o da integração monetária.
A primeira fase da formação de um bloco econômico se pela constituição
de uma Zona de Livre Comércio, a qual promove a isenção de tarifas sobre produtos
comercializados entre os países membros, respeitando-se os limites sanitários
inidviduais e de legislações específicas. Assim que a Zona de Livre Comércio
alcaa um patamar satisfatório quanto a sua efetividade e funcionamento, passa-se
67
para a segunda fase que é chamada de União Aduaneira. Nesta segunda fase os
objetivos são mais amplos, incluindo a criação de regras comuns de comércio com
países exteriores ao bloco. Após a estruturação deste quadro, é possível passar
para o estágio determinado Mercado Comum. A constituição de um Mercado
Comum envolve mais profundidade nas relações entre os Estados membros, pois
inicia-se o processo de desenvolvimento de políticas comuns sobre o comércio com
liberdade de circulação dos três fatores de produção (recursos naturais, capital e
trabalho) e de iniciativa. Num estágio mais avançado, como o da Uniao européia na
atualidade, busca-se a unificação das economias, padronização das moedas e
instituições.
O Neofuncionalismo concentra-se no conceito de spill over, pois explica que
o processo de integração regional ganha abrangência e profundidade à medida que
as motivações iniciais são superadas e novas são criadas para serem alcançadas.
Sarfati (2005, p. 187) considera que:
A lógica do spill over é que cada passo de integração funcional dispara um
processo político que gera demandas por novos passos no processo de
integração, portanto, os governos nacionais, a cada passo, são forçados a
escolher entre ceder sua autonomia em mais uma função ou, em caso de
recusa, colocar em risco os esforços de integração setorial consolidados.
Assim, quanto mais setores são institucionalizados, cada vez se torna maior
a necessidade de novas institucionalizações e, a essa altura, se os
governos nacionais falharem em se mover para frente, tamm riscos
enormes do custo da interrupção desse processo.
Ernest Haas em sua obra The Uniting of Europe (1958) foi um dos pioneiros
desta teoria ao analisar o custo/benefício da inserção de um Estado em um sistema
de integração e ao concluir que esse passo é dado primordialmente pelas elites do
governo assim como pelos setores produtivos. O NERI (Núcleo de Estudos em
Relações Internacionais) resume em três pontos as características do
Neofuncionalismo: a) o ator opta por entrar ou não em um processo de integração
caso o lculo custos versus benefícios lhe seja favorável; b) o sistema de
integração é alterado quando há a desintegração de uma organização como a União
Européia ou o Mercosul, pois altera o equilíbrio do poder e a correlação de forças; c)
como a expectativa de ganhos econômicos em curto prazo (pragmáticos) não
reforça o compromisso ideológico, um processo de integração que estiver construído
nesses interesses será fraco e suscetível a anulação; d) quanto maior o nível de
estabilidade doméstica e a capacidade dos tomadores de decisão para responder a
68
demanda dos seus Estados, melhor estarão capacitados para participar de uma
integração.
Apesar de tratar somente o nível nacional, a importância de se abordar os
conceitos da Integração Regional e do Neofuncionalismo nesta pesquisa são os
pontos motivacionais para tal a busca de melhores condições para o
desenvolvimento econômico e social. Além disso, conforme Fronzaglia (2005, p. 29)
aborda, o Neofuncionalismo é a corrente teórica que melhor se encaixa para a
análise das redes de cidade, como a Mercocidades. A integração entre cidades é um
fenômeno que está inserido no guarda-chuva da Paradiplomacia uma vez que
transcendem as fronteiras das esferas superiores em busca de vantagens
competitivas e Desenvolvimento Local.
5. DESENVOLVIMENTO LOCAL NAS CIDADES
O capítulo anterior descreveu o que é Transnacionalismo e as motivações
que levam os atores a atravessarem as fronteiras nacionais e inserirem-se no
cenário global. No presente capítulo o objetivo é analisar o conceito de
Desenvolvimento Local dentro de uma perspectiva endógena. Além disso, buscar-
se-á conectar este tema às relações internacionais como forma de iniciar o
aprofundamento no tema principal.
O desenvolvimento local ou regional é um tema que surgiu a partir do
conceito de Endogenous Growth Theory ou crescimento econômico engeno na
década de 1980. Apesar de a teoria original fazer menção ao crescimento
econômico a partir dos recursos internos inicialmente de países, é pela abrangência
e diversificação de aplicações que surge o tema desenvolvimento local referente a
regiões, estados, cidades e até mesmo pequenas comunidades.
Mas qual a relação entre Desenvolvimento Local ou desenvolvimento
endógeno e as Relações Internacionais e a Paradiplomacia? A hipótese central
desta pesquisa responde esta pergunta. Tendo em vista que as cidades precisam
promover o desenvolvimento de sua região, que possuem uma porção de autonomia
e independência para tal, asseguradas pela Constituição Federal, e que os
princípios do desenvolvimento endógeno ou desde baixo são eficientes, as relações
internacionais com outras cidades seriam como mais um canal para alcançar este
objetivo. Ou seja, na busca pela promoção do desenvolvimento a inserção
69
internacional através de intercâmbios com outras cidades amplia as possibilidades
de, não somente, investimentos sócio-econômicos, mas tamm, aperfeiçoamento
da gestão local.
Conforme abordado na delimitação histórica, com o surgimento do Estado
nacional moderno houve uma tendência em maximizar os planos de
desenvolvimento, que na realidade eram planos de crescimento. Partindo de uma
estrutura vertical e centralizadora as diretrizes para o desenvolvimento econômico,
social, cultural e político são ditadas pelos governos nacionais e estes, muitas vezes,
não consideram as especificidades de cada região, de cada local. No Brasil, até o
final da década de 1980 os municípios tinham pouquíssima autonomia, não eram
formalmente entes da Federação e por isso não havia leis orgânicas que
regulamentassem seu papel. O esquema brasileiro de formação do Estado nacional
foi contrário ao da Europa, por exemplo, onde havia diversas regiões autônomas que
foram reunidas no Brasil o espaço se dividiu ao longo de seu desenvolvimento.
Porém, mesmo com o histórico diferente, observa-se que a tendência à
centralização do poder é similar. Na constituição do Estado Francês, optou-se pelo
absolutismo político agrupando as regiões sob um comando central.
Frente à história mundial discutir sobre o local não é uma tarefa simples
tanto do ponto de vista conceitual quanto das questões técnicas político-
administrativa. Para compreender os aspectos do desenvolvimento local é
necessário olhá-lo por um prisma diferente dos paradigmas dominantes que se
baseiam no crescimento econômico. De acordo com França et al (2004, p. 1):
O desenvolvimento local é um tema controverso sobre o qual não
consenso entre os especialistas, nem no Brasil em no debate internacional.
quem diga que as experiências de desenvolvimento local são apenas a
expreso espacial de um novo arranjo industrial “pós-fordista”. Para outros,
as experiências de desenvolvimento local tem dinâmicas próprias e são
mais que o reflexo da reorganização internacional do capital. Para outros,
ainda, o local seria um espaço privilegiado para experimentações contra-
hegemônicas.
Oliveira (2005, p. 2) aborda em seu trabalho os conceitos estipulados pelos
principais autores sobre o assunto os italianos (BECATTINI; GAROFOLIi) e os
californianos (SCOTT; STORPER). Para os primeiros, “a interação coletiva entre os
agentes locais (comunidade, empresas e instituições locais), com base na
cooperação e na concorrência, é que determina os rumos do crescimento local”. A
manutenção da região organizada para promover o desenvolvimento endógeno é
70
dada por uma rede de pequenas e médias empresas especializadas, que possuem
alta capacidade de inovação. Por outro lado, os autores californianos incluem à
noção de distrito industrial as metrópoles, que funcionam como fontes de viabilidade
econômica tanto para o crescimento local quanto para a constituição dos distritos.
Para eles, “a dinâmica do crescimento não é dada pela capacidade de inovação das
pequenas e médias empresas, mas sim, pela inovação que é gerada dentro das
grandes empresas.
Foram nos períodos das grandes guerras internacionais, quando as crises
econômicas assolaram os países, que as cidades se depararam com a necessidade
de promover seu próprio desenvolvimento. Desenvolvimento este, independente das
ações do estado e do país no qual estavam constituídas. Em face de um cenário
caótico, as alternativas não eram amplas. As cidades passaram a assumir posturas
mais pró-ativas e competitivas que pudessem garantir a sobrevivência de sua
comunidade. De fato, a autonomia das unidades subnacionais não foi somente um
simples repasse de responsabilidade por conta das esferas superiores, mas sim, sua
emancipação se deu por conta de esforços combinados em busca do
desenvolvimento local. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 consolidou a
autonomia municipal, formalizando o compromisso da gestão com todas as questões
locais.
Dentro de uma visão simplificada, compreende-se que as cidades são
associões de pessoas em um espaço físico, no qual convivem com interesses
interligados. Para Rezende e Castor (2006, p. 2) as cidades compreendem
ambientes onde as pessoas se protegem, trocam entre si produtos de suas
habilidades próprias, cumprem em conjunto tarefas e trabalhos que não podem ou
não querem realizar sozinhas. Ainda de acordo com os autores, o poder público
surge exatamente para mediar os interesses da sociedade, promovendo o equilíbrio
social e econômico e evitando circunstâncias de injustiça.
Opondo-se ao paradigma de “centro-abaixo” no qual as soluções são
providas pela esfera superior e com a idéia de que as abordagens e ações macros
refletiriam/beneficiariam todos os entes federados, o debate sobre a relevância do
desenvolvimento local está crescendo. Oliveira e Souza-Lima (2006, p. 32) traçam
um paralelo interessante em relação ao paradigma centro-abaixo: da mesma forma
que os europeus colonizadores viram a população local, como meros índios
selvagens, que deviam somente ser catequizados de maneira impositiva, a idéia de
71
que o desenvolvimento deve ser planejado e executado por um governo central é
não ouvir o que os “índios” m a dizer sobre o seu próprio bem estar. Sendo assim
os autores discorrem sobre um paradigma contemporâneo, baseado na perspectiva
de baixo para cima, o chamado “desde baixo”. Este conceito aborda a emergência
da criação de políticas macroeconômicas que levem em consideração as
especificidades locais procurando absorver plenamente os recursos humanos,
ambientais e institucionais. Parte-se tamm do entendimento de que a sociedade
local é a melhor conhecedora de suas potencialidades assim como de suas
limitações, e sendo assim, é pertinente que seja o protagonista das ações que
modificarão seu cenário.
A definição determinada por Buarque (1999, p. 9) é a de que
desenvolvimento local é um processo endógeno identificado em pequenas unidades
territoriais que buscam promover o dinamismo econômico e a melhoria da qualidade
de vida. O processo endógeno é o oposto do modelo em que as diretrizes,
planejamentos e ações são designadas de cima para baixo, ou do centro para a
periferia. Do ponto de vista econômico é um processo interno de ampliação contínua
da capacidade de acumulação de capital, assim como da capacidade de absorção
da região, criando possibilidades de reter o excedente da região e ainda atraí-lo de
outras regiões. Amaral Filho (1996, p. 3) complementa que “esse processo tem
como resultado a ampliação do emprego, do produto e da renda do local ou da
região, em um modelo de desenvolvimento regional definido”.
Por mais evidente que este processo pareça ser para entender o
desenvolvimento endógeno e aceitá-lo é necessário aceitar uma mudança de
paradigma onde o desenvolvimento é gerado a partir dos atores locais e não pelo
poder centralizado. Existem, portanto, divergências quanto a aplicabilidade deste
modelo. Assim como Boisier (1989) se destaca como um dos pioneiros a defender o
desenvolvimento endógeno, chamado pelo autor de desenvolvimento regional, o
contraponto está em Werlin citado por Caiden (1991, p. 253) que é categórico ao
afirmar que:
While the concepts of decentralization, development from below, freedom
from bureaucratic constraints, respect for public opinion and local
knowledge, participatory modes of operation, and learning by doing are very
attractive, they are also inadequate and misleading… the more impoverished
the community, the more it needs outside assistance… development from
72
below requires development from above… The solution… is not less
bureaucracy, but better bureaucracy.”
8
Apesar do domínio do pensamento centralizador existem iniciativas que têm
comprovado a eficácia do desenvolvimento endógeno ou desde baixo. O Instituto
Pólis publicou em 2002 uma coletânea de experiências de desenvolvimento local
ressaltando seus aspectos econômicos. Foram descritas atividades locais que
promoveram o desenvolvimento de uma cidade brasileira a partir de iniciativas
pública e privada. Vale destacar o caso da cidade de Blumenau em Santa Catarina,
região famosa por ser um pólo industrial têxtil viu-se em meio à crise nacional dos
anos 90 e resolveu buscar por soluções que amenizassem o reflexo na população
de aproximadamente 231 mil habitantes. Uma das ações foi criar o BLUSOL
Banco do Povo de Blumenau instituição que atua na geração de emprego,
ocupação e renda no município, além de conceder microcréditos e financiamentos
para os segmentos sociais que normalmente não são atendidos.
Na pesquisa de Caron (2003, p. 43-44) é destacada a relevância da pró-
atividade local uma vez que sua sociedade está preocupada tanto com o
desenvolvimento econômico quanto com o aumento da qualidade de vida. Em suas
palavras:
[...] o local está mais preocupado com o desenvolvimento da integralidade
do ser humano em toda sua potencialidade e com o aproveitamento dos
recursos disponíveis na região, sem destruição ou degradação que
deteriore a qualidade de vida. Ao contrário, o desejável é a incorporação de
valores que promovam a integração do local no nacional e no internacional.
[...] O local é o espaço de transformação sociopolítico-econômico, como
espaço para o exercício de novas formas de solidariedade, parceria,
cooperação, desenvolvimento de redes sociais como estratégia de enfrentar
os problemas globais e de inserção competitiva do local no global.
Atualmente a pesquisa sobre fatores locais implica a abordagem da
interferência de fatores externos como os novos desafios da ordem global. Sendo
assim, cabe discorrer sobre tal diatica.
8
Embora os conceitos de descentralização, desenvolvimento desde baixo, liberdade burocrática,
respeito pela opinião pública e pela sabedoria local, operações de modo participativo e o aprender
fazendo são muito atraentes, eles também são insuficientes e enganososquanto mais empobrecida
uma comunidade, mais ela necessita de assistência externa… desenvolvimento desde baixo requer o
desenvolvimento de cima... A solução não é menos burocracia, mas uma burocracia melhor.
Tradução livre.
73
5.1. A Dialética Local-Global
As cidades passam por um processo evolutivo constante. Desde a sua
origem até os dias atuais, são incontáveis as mutações físicas, políticas, econômicas
e culturais das cidades. Tradicionalmente, consideradas meras unidades de dois
níveis espaciais maiores, as cidades encontram-se num momento de grande
transposição de responsabilidades pela gestão de seu território, e principalmente
pela promoção do desenvolvimento local. Fischer (1997, p. 16) afirma que as
cidades contemporâneas defrontam-se com os desafios de uma economia
sustentada, aliado ao resgate da identidade local e com a urgência de promoção do
desenvolvimento. A conferência da ONU sobre Assentamentos Humanos, a
HABITAT II que aconteceu em 1996 foi o evento internacional que consagrou o
papel essencial e determinante do município para a gestão pública. Conforme
apontado por Trevas (2004, p. 3) a atuação das cidades foi considerada
imprescindível para “lidar com a crescente dimensão dos problemas urbanos, como
a exclusão social e a degradação do meio ambiente, e para o enfrentamento da
agenda de promoção do desenvolvimento econômico local e regional”.
Desde a década de 1990 principalmente, as cidades têm se inserido no
contexto da globalização, seja por meio de ações de organizações privadas, seja por
intermédio de Políticas Públicas que viabilizem a projeção internacional. Fischer
(1997, p. 13) retrata que devido aos desafios da economia sustentada e a
necessidade da promoção do desenvolvimento, atores locais começam a interagir
com outros, até mesmo em países distantes. Tendo em vista essa reformulação do
cenário global, as cidades tamm se re-configuraram seu papel está sendo
ampliado gradativamente apoiado por Políticas Públicas locais que suportem essa
nova tendência. Em 1994, A Conferência da ONU sobre a População reconheceu
pela primeira vez a importância de tratar questões socioeconômicas, políticas e
culturais com os governos subnacionais.
Na Europa, as cidades iniciaram este processo de independência das
esferas superiores a partir do final da década de 1970. Os governos locais
procuraram isoladamente alternativas para o desenvolvimento econômico enquanto
pairava uma recessão em toda a Europa. Assim, em 1989 surgia o movimento
Eurocidades, uma iniciativa de intercâmbio de conhecimento, práticas de Políticas
Públicas, planejamentos e gestão. Enfim, conforme Borja (1997, p. 47) aponta, “o
74
governo local capaz de dar resposta aos atuais desafios urbanos e de constituir um
projeto de cidade e liderá-lo, deve ser um governo que promove”.
O local começou a ser mais enfatizado a partir do momento em que a era da
“aldeia global” era um fato e suas conseqüências refletiam em todos os âmbitos.
Diante das crises financeiras da década de 1980 foram feitos os primeiros
movimentos em prol da autonomia e independência para resolução dos problemas e
a busca de desenvolvimento para o local. Com o Estado-Nação enfrentando novos
desafios vindos da globalização mundial, a descentralização já não era mais uma
questão opcional tanto o foi necessário que o governo federal aliviasse suas
responsabilidades ou as delegasse quanto foi necessário que os governos locais se
libertassem da “espera da solução” e ganhando a autonomia para lançar-se em
busca do desenvolvimento do seu território. Moura (1998, p. 1) afirma que os fatores
principais que fizeram com que a valorização dos governos locais fosse
impulsionada foram: a) a crise fiscal do Estado, associada aos processos de
descentralização; b) o processo de reconfiguração dos padrões de produção; e, c) o
aprofundamento da internacionalização dos fluxos de capital. A autora ainda aponta
que a partir do avanço das internacionalizações dos espaços e procedimentos as
cidades deparam-se ainda com a necessidade de se prepararem para a
concorrência além dos limites de seu território. Trata-se da concorrência global, onde
diversos atores estão inseridos além do tradicional Estado-Nação.
Caron (2003, p. 36) resume o ponto principal dessa dialética ao afirmar que
“o capital é global, mas a produção é local”. Na sua visão, as novas alternativas de
desenvolvimento local, como a inserção global surgem através da mobilização e
articulação da sociedade. É a própria base local que vai criar oportunidades de
participação competitiva e incorporações tecnológicas a nível global e será sua
capacidade de assimilar as dinâmicas deste cenário que manterá uma cidade dentro
desse jogo maior. Esse é o local frente ao global. O inverso também se relaciona já
que o processo de globalização não exclui o local, mas se consolida nele.
5.2. O Papel das Políticas Públicas
Antes de analisar o papel das Políticas Públicas no Desenvolvimento Local e
concomitantemente na Paradiplomacia cabe uma breve conceituação e descrição do
que são, de quem está envolvido e sua aplicação. Pelo senso comum, as Políticas
75
Públicas ações exercidas pelo governo em vigor para sanar ou melhorar alguma
condição ou situação. Para os pesquisadores sobre o assunto Cunha e Cunha
(2002, p. 12) as Políticas Públicas surgem a partir de demandas da sociedade ao
Estado e constituem num compromisso de atuação em uma determinada área ao
prazo de sua administração. Podem, ainda, serem conceituadas como instrumento
de distribuição ou redistribuição de bens e serviços à nação.
De acordo com Pereira (2004, apud Cunha e Cunha) a política pública não é
uma referência exclusiva ao Estado, mas sim ao que é de todos, debaixo de uma
mesma lei e com o apoio de uma comunidade de interesses. Deste modo, embora
as Políticas Públicas sejam reguladas e freqüentemente providas pelo Estado, elas
tamm envolvem preferências, escolhas e decisões privadas podendo (e devendo)
ser controladas pelos cidadãos. A política pública pode ser entendida como a
conversão de decisões privadas em decisões e ações públicas, que afetam uma
sociedade. Lourenço (2005, p. 41) afirma que os tomadores de decisões
governamentais durante o processo de formulação e implementação de políticas
públicas sofrem influências e pressões de grupos sociais que almejam ver
executadas as ações públicas de seu interesse. Isso quer dizer quando uma
necessidade ou oportunidade é identificada os interessados sugerem ou
simplesmente requerem uma ação no âmbito público. É uma constante troca entre
público, privado e sociedade.
O papel das políticas blicas no estabelecimento das relações
internacionais entre cidades é a de catalisador. A criação de políticas blicas
voltadas à promoção internacional da cidade no turismo, na indústria, nos aspectos
sócio-culturais funciona como agentes de viabilização para que se estabeleçam
contatos com cidades de diferentes países. A partir destes relacionamentos,
oportunidades surgem nos mais diversos campos contribuindo para o
desenvolvimento local da cidade. Ultimamente uma iniciativa bastante comentada é
o Marketing Municipal ou City-Marketing. Oriunda dos Estados Unidos da América,
disseminada na Europa Ocidental nos anos de 1980, e com aplicações em
praticamente todos os continentes, este projeto transfere os princípios de marketing
e publicidade do mundo corporativo para o âmbito da gestão pública. Os autores
Duarte e Czajkowski Jr (2007, p. 277) afirmam que essas novas políticas públicas de
promoção das cidades na esfera local, regional e global estão sendo adotadas em
diversos países. Ainda que alguns autores considerem que esta prática acaba por
76
gerar falhas sociais, como a criação de imaginários sociais e a pseudo-idéia de
cidade-modelo, esta pesquisa limita-se em citar o city-marketing como uma
ferramenta que antecede o estabelecimento das relações internacionais de uma
cidade. Oliveira (2005, p. 95) explica como o city-marketing pode ser eficiente:
[...] o city marketing tornou-se um importante instrumento das novas
políticas urbanas. Serve de apoio às políticas de atração de investimentos,
sendo muito utilizado pelas gestões urbanas e estaduais no Brasil e no
mundo. Atualmente, assiste-se a uma onda de propagandas de
municípios/Estados em todos os meios de comunicação (internet, rádio, TV,
revistas especializadas ou não, etc.), de slogans do tipo “Eu amo minha
cidade” e imagens-síntese como “A Capital da Tecnologia”. Porém, esta
estratégia de transformar uma determinada cidade numa localidade
“vantajosa” a investimentos externos não é um fenômeno novo.
Historicamente, vários governos com base em determinadas coalizões
produziram espaços “atraentes ao capital. A novidade está na
transformação do espaço (cidade) em mercadoria internacional. Dentro
desta lógica, o city marketing é muito importante para apresentar e
promover as cidades no mercado externo.
Cavalcanti e Neves (2004, p. 25) complementam conceituando que city-
marketing pode ser visto como uma reorganização do espaço urbano a fim de
garantir aos seus habitantes boa qualidade de vida e poder concorrer com outras
cidades na atração de investimentos e atividades terciárias através dos meios de
comunicação. Portanto, uma política pública como essa pode ser vista como o
primeiro passo para a internacionalização de uma cidade e esse processo pode ser
encaixado dentro de uma perspectiva de busca pelo desenvolvimento local.
Expandindo para um quadro mais amplo, Orozco (2004, p. 29) explica que “a
promoção internacional de um governo local está intrinsecamente ligada ao quadro
cognitivo dos atores.” A partir da premissa da psicologia cognitiva e dos regimes
internacionais vigentes, o autor sugere que para ter êxito na tarefa de inserção
internacional, os gestores de uma cidade devem estar atentos para como seus alvos
(instituições ou outras cidades) a vêem. Tanto políticas públicas e declarações
oficiais quanto notas publicitárias são ferramentas que podem influir no processo de
inserção uma vez que interferem na percepção cognitiva do interlocutor e sua
avalião quanto as vantagens em estabelecer ou não uma parceria internacional.
A cidade brasileira de Belo Horizonte por meio da prefeitura estabeleceu
oficialmente uma política de internacionalização da cidade. A base da justificativa
para tal iniciativa representa exatamente as colocações centrais dessa dissertação.
É interessante destacar a íntegra contida no site oficial:
77
A globalização no mundo contemporâneo trouxe mudanças significativas na
maneira de se relacionar. As barreiras caíram e as distâncias foram
diminuídas. Com isso, as grandes metrópoles vêm crescendo num ritmo
jamais visto antes e passaram a ter um relevante papel no desenvolvimento
de uma sociedade de dimensão internacional. A partir de 1993, Belo
Horizonte teve sensibilidade para perceber a importância do processo de
internacionalização e preparou-se para atuar com maior desenvoltura no
cenário instituído pela nova ordem internacional. Através das redes de
cidades, de acordos de cooperação, da realização de eventos
internacionais, da troca de missões empresariais, do intercâmbio de
experiências administrativas, de pesquisa e de capacitação profissional e da
divulgação do município no exterior, Belo Horizonte está aos poucos
projetando-se internacionalmente e criando novas oportunidades para
todos.
Sob esta ótica, os capítulos a seguir tratarão diretamente do fenômeno da
Paradiplomacia. Tendo concluído os assuntos preliminares, históricos e teóricos,
pertinentes ao objetivo da pesquisa, o aprofundamento da questão central neste
momento busca estabelecer a conexão com o conteúdo de base apresentado nas
seções anteriores.
6. A INSERÇÃO INTERNACIONAL DAS CIDADES E A PARADIPLOMACIA
Com base nas exposições anteriores, da abordagem teórica e o resgate
histórico aos conceitos, importância e objetivos dos temas relacionados à
Paradiplomacia nesta pesquisa, este capítulo visa apresentar os pontos centrais
sobre tal fenômeno. Buscar-se-á resgatar os pontos-chaves a fim de verificar
congruências, incompatibilidades e relações específicas com a Paradiplomacia tanto
através da descrição bibliográfica quanto por meio de exemplos e casos reais. Como
plano de fundo deste capítulo, as modificações e a conjuntura global.
As relações internacionais desde a concepção das civilizações estão
pautadas em uma base de formação complexa, pois compreendem vários temas,
aspectos e atores que são interdependentes e influentes entre si. De fato, esta
complexidade tomou maiores proporções ao longo do tempo e, no campo teórico,
conforme revisado na fundamentação um esforço contínuo em suprir a
necessidade de compreensão das conjunturas.
A Paradiplomacia pode ser considerada uma vertente da diplomacia
clássica. De acordo com o dicionário de política, o termo diplomacia significa “a arte
e a prática de conduzir as relações exteriores ou os negócios estrangeiros de um
determinado Estado ou outro sujeito de direito internacional.” A diplomacia é
realizada tanto para fins políticos e econômicos, de guerra e de paz, quanto para
78
manutenção de laços de amizade e promoção cultural. Contudo, uma primeira
observação feita na literatura sobre o tema é a distinção entre diplomacia e política
externa sendo que a primeira está inserida na última. Enquanto a política externa é
definida pela Chefia de Governo de um Estado ou pela alta autoridade política de um
sujeito de direito internacional; a diplomacia pode ser entendida como uma
ferramenta dedicada a planejar e executar a política externa, por meio de
diplomatas.
A pré-origem da chamada diplomacia cssica está ligada ao período em que
a descentralização ainda dominava a Europa com as Cidades-Estado,
principalmente com as unidades da Itália, conforme afirma Biancheri (2005, p. 5).
Contudo, era basicamente funcional com objetivos imediatos visando extrair o
máximo de vantagens possível em cada situação. Foi com o Tratado de Vestefália
marcando oficialmente o surgimento do Estado-Nação que a chamada diplomacia
clássica surgiu e, foi através do Congresso de Viena
9
que as principais regras foram
traçadas estabelecendo igualdade de todos os Estados soberanos, independente de
sua forma institucional.
Desde a concepção das primeiras cidades até a formação dos Estados
nacionais o mundo passou por diversas transformações e essas mudanças
aconteceram e acontecem em diversas áreas. Formas de governo evoluíram para
um modelo mais democrático (mesmo que por imposição, ironicamente); o poder
monetário de algumas empresas excedeu o PIB de determinados países; instituições
e organizações internacionais e transnacionais foram montadas; guerras por
recursos naturais, por ideologias e por território surgiram em praticamente todo o
mundo; a agenda internacional de debate entre os países agregou aos temas de
segurança e economia, o meio ambiente e outras questões sociais como assuntos
relacionados ao papel da mulher na sociedade e no mercado de trabalho; novos
atores surgiram no cenário internacional em conseqüência da globalização; uma
cidade, por meio de seus gestores, transcende as fronteiras nacionais e buscam
novas oportunidades e canais que auxiliem o desenvolvimento local.
9
O Congresso de Viena foi uma conferência entre embaixadores das grandes potências européias
que teve lugar na capital austríaca, entre 1 de Outubro de 1814 e 9 de Junho de 1815, cuja intenção
era a de redesenhar o mapa político do continente europeu após a derrota da França napoleônica na
primavera anterior, bem como restaurar os respectivos tronos às famílias reais derrotadas pelas
tropas de Napoleão Bonaparte e firmar uma aliança entre os signatários. Os termos de paz foram
estabelecidos com a assinatura do Tratado de Paris (30 de Maio de 1814), no qual se estabeleciam
as indenizações a pagar pela França aos países vencedores.
79
Bianchieri (2005, p. 43) faz uma relevante consideração pessoal ao discorrer
sobre desintegração e globalização:
A vida internacional tende, assim a se tornar mais complexa, não apenas
pela multiplicação dos sujeitos (...) e pela possibilidade de tal processo de
fragmentação produzir outros, mas porque de cada um dos sujeitos
internacionais provêm, nos limites de expressão que as autoridades centrais
lhes permitem, opiniões contrastantes que, muitas vezes, buscam afirmar, a
seu turno, uma subjetividade própria nas relações entre Estados ou até
mesmo influenciar a vida internacional para perseguir objetivos específicos.
O cenário global contemporâneo é propício e ainda, requer o envolvimento
de outras unidades políticas. Por sentirem que esta não somente é uma opção, mas
uma necessidade para a manutenção do desenvolvimento, as cidades dentro de
suas potencialidades iniciaram sua inserção internacional. A autora Débora Prado
(2006, p. 1) resume que:
À medida que os Estados tornaram-se parte do sistema global, os padrões
de interdependência se intensificaram e os problemas passaram a ser
discutidos em âmbito global. A reconfiguração das relações internacionais
com a emergência de atores regionais - dentre eles os governos locais, se
fez necessária, pois as dificuldades geraram novas demandas e o
enfrentamento destes problemas bem como a resposta às novas
necessidades não mais poderia partir de um único centro de poder.
Dentro deste contexto de mudanças constantes e intensificação da
interdependência complexa, surge nos anos 90 um debate sobre a atuação das
unidades subnacionais no âmbito internacional aliado às inquietações a respeito dos
reflexos da globalização. Enquanto as conseqüências em um quadro macro eram
mais claras, discutidas e até mesmo antecipadas, os efeitos causados no local, na
cidade, não tiveram o mesmo tratamento. Percebendo que a idéia de aldeia global
estava de fato se tornando real, com a economia mundial afetando o local guiado
pelas forças do mercado, as cidades buscaram se inserir nessa tendência dentro
dos limites de independência e autonomia. Aliado às iniciativas de transnacionalismo
e aos estudos sobre o federalismo e a atuação internacional dos seus entes, o
relacionamento formalizado entre cidades se consolidou na academia sob o termo
de Paradiplomacia.
6.1. Sujeitos e Conceitos
Assim como as teorias cssicas apontavam o Estado como o único ator das
Relações Internacionais, a diplomacia tradicionalmente é uma prática que está
80
originalmente ligada ao Estado-Nação. No início do debate acerca da diversificação
de atores das Relações Internacionais e conseqüentemente o transnacionalismo,
houve uma corrente, em sua maior parte de juristas, que afirmou ser impossível que
além do Estado, um sujeito do direito internacional por excelência, existissem mais
atores que pudessem exercer competências em âmbito externo iguais a este. O
direito internacional ainda não reconhece os governos subnacionais como sujeitos
do direito internacional público, sendo que esta denominação é dada a entes
dotados de soberania como os Estados nacionais e as Organizações
Intergovernamentais. Obviamente, este fator dificulta a coordenação política das
cidades que estão, juridicamente, em nível direto de dependência do Estado
nacional. Conforme Gelfeinstein (2004, p. 5) aborda, quando o governo central firma
um tratado com outro país, este compromete também as esferas abaixo de sua
administração, em muitos casos, sem considerar a problemática de cada região, pois
a vio é global.
Mesmo sem aptidão legal, ou seja, não havendo condições de uma unidade
subnacional assinar um tratado internacional, a iniciativa rumo à autonomia tem
aumentado. Os sujeitos da Paradiplomacia podem ser considerados todos aqueles
que não o Estado-Nação: os entes federados ou como adotado nessa pesquisa as
unidades subnacionais que compreendem todas as esferas abaixo da União. Os
sujeitos operam por meio de seus gestores e de instituições, constituídas por um
grupo de gestores públicos, próprias para o intercâmbio entre essas esferas.
Hocking (1999, p. 17) refere-se a esses sujeitos como NCG non-central
governments ou „governos não centrais‟.
Revisitando o passado, observa-se que as cidades possuem uma longa e
rica história de relações internacionais em diferentes períodos civilizacionais do
Ocidente. Rodrigues (2005, p. 7) resgata que desde as Cidades-Estado gregas até
as cidades medievais e da Renascença, com destaque para as associações de
cidades visando a facilitar o comércio internacional (como a Liga Hanseática), pode-
se identificar movimentos transterritoriais de cidades, com grande intensidade.
Contudo, o mundo centralizou-se e atualmente passa por duas correntes
que parecem ser opostas: a de integração regional, como a União Européia regida
por um poder supranacional e a corrente descentralizadora que diante da conjuntura
global respalda a entrada de novos atores no cenário internacional. Fronzaglia
(2005, p. 46) destaca que a efetiva participação das cidades como atores do cenário
81
global é crescente, principalmente no campo da cooperação internacional. A partir
da década de 1990 uma ênfase maior nessa atuação e surgem ligas de cidades
como a Eurocidades, na Europa e a Mercocidades, envolvendo os países
integrantes do Mercosul. Cabe ressaltar também que a integração regional tem
funcionado como um motor para a prática da Paradiplomacia, possibilitando
oportunidades de intercâmbios culturais, econômicas e de políticas públicas locais
como pode ser observado no Urb-AL e Urb-AN programas da Comissão Européia
que visa possibilitar a troca de experiências e estabelecimento de parcerias entre os
poderes locais das cidades da América Latina e da Ásia.
Uma vez definido o sujeito da Paradiplomacia nesta pesquisa, tendo em
vista sua limitação de atuação perante o direito internacional, cabe partir para a
conceituação do termo. Então, enfim, o que é Paradiplomacia?
Apesar de ainda existirem divergências em sua consolidação, Keating (1999,
p.185) afirma que a Paradiplomacia representa uma mudança estrutural na
diplomacia clássica, viabilizando mais oportunidades para cooperação e outras
atividades em conjunto além de estabelecer uma independência perante o Estado
nacional. O conceito de Paradiplomacia indica em teoria as ações internacionais
entre unidades subnacionais. Quando uma cidade ultrapassa as fronteiras das
esferas acima e estabelece um relacionamento com uma cidade em outro país em
busca de promover o desenvolvimento local, seja este econômico, social, cultural ou
político, essa prática recebe o nome de Paradiplomacia. É o relacionamento entre
cidades de diferentes países via transnacionalismo. De acordo com Fronzaglia
(2005, p.49) Paradiplomacia pode ser definida como:
[...] conjunto de atividades desenvolvidas pelas unidades subnacionais de
maneira isolada ou conjunta conforme seu grau de autonomia e que visam
sua inserção internacional podendo ser complementares, paralelas ou
conflitantes com a diplomacia conduzida pelo governo central.
Partindo de uma cidade, uma ação internacional complementar é o que o
governo central considera ideal, pois seria como somar esforços. Uma ação paralela,
se analisada no campo prático, não se mantém nesse status por muito tempo ou
abre oportunidades às esferas acima ou em algum ponto passa a conflitar. Um
exemplo bastante abordado quando se trata de transnacionalismo de cidades e
Paradiplomacia é o caso de Quebec província canadense que exerce ações
internacionais contrárias a diplomacia federal. Keating (1999, p. 5) cita alguns
82
exemplos que podem possibilitar esse tipo de conflito: o governo de Quebec procura
ligar-se à França procurando apoio no desenvolvimento de políticas, caso
eventualmente requeira sua independência do Canadá. No sul dos Estados Unidos,
a sociedade local de algumas cidades normalmente buscam apoio mexicano, assim
como comunidades étnicas na Europa procuram estar sempre conectadas com a
cidade ou o país natal.
Por outro lado, Prazeres (2004, p. 289-290) mostra através do exemplo da
Suíça que é possível evitar ações conflitantes. Em sua Constituição Federal consta
um artigo que cede direitos dos cantões
10
concluírem tratados desde que não sejam
opostos aos interesses da federação ou de outros cantões. Sua liberdade de
atuação não é ilimitada e na maioria dos casos as relações internacionais devem ter
o intermédio da federação. Praticamente nos mesmos moldes é a Argentina com
suas províncias, que possuem o direito constitucional de celebrar convênios
internacionais, uma vez que sejam compatíveis com os interesses da nação.
Seguindo com a conceituação do termo, na definição de Cornago Prieto
(2004, p. 251) a Paradiplomacia significa:
[...] o envolvimento de governo subnacional nas relações internacionais, por
meio do o estabelecimento de contatos, formais e informais, permanentes
ou provisórios (had hoc), com entidades estrangeiras públicas ou privadas,
objetivando promover resultados socioeconômicos ou políticos, bem como
qualquer outra dimensão externa de sua própria competência constitucional.
A origem deste fenômeno está diretamente ligada aos reflexos da
globalização e a consciência a respeito do desenvolvimento local endógeno.
Conforme abordado em capítulo anterior, uma vez que o Estado-Nação adquiriu
novos desafios impostos pela globalização, as responsabilidades no que diz respeito
à promoção do desenvolvimento tiveram que ser realinhadas. Keating (1999, p. 2),
considerado um dos percussores na pesquisa deste assunto, revela que as
unidades subnacionais identificam a necessidade de inserção no mercado global ao
mesmo tempo em que precisam administrar os efeitos da desintegração social
provocada por esse mercado. Portanto, a ação independente de unidades
subnacionais em âmbito internacional ainda que gere discussões em torno da
10
Divisão territorial e administrativa adotada em alguns países da Europa. A Suíça possui 26 cantões
dos quais 3 são subdivididos em semi-cantões. Historicamente, cada cantão era considerado um
Estado soberano com suas próprias fronteiras, exército e moeda até que a estrutura federal fosse
estabelecida em 1848.
83
soberania do Estado nacional é uma realidade que precisa ser encarada com
desprendimento dos velhos paradigmas. O mesmo autor conclui também que esse
fenômeno está diretamente ligado à ênfase que o Estado-Nação deu à
competitividade nacional, desprendendo a atenção na necessidade do equilíbrio
regional, ficando esta segunda tarefa para os governos subnacionais. Resultado: o
local vai até o global.
Hocking (1999, p. 31) complementa a idéia acima notando que uma das
mudanças mais significativas que o mundo tem testemunhado é a quebra dos
padrões tradicionais na gestão de políticas internacionais. Isso acontece a partir de
pressões internas que levam os NCGs buscar responder diretamente as pressões
que vêm de cima, dos movimentos da economia global e de outros atores como a
OMC Organização Mundial do Comércio uma vez que as agendas tratadas e
negociadas englobam os interesses e política subnacionais.
É importante ressaltar que, mesmo consolidado na academia, o termo
Paradiplomacia ainda é contestado. Para o Professor Gilberto M. A. Rodrigues
(2005, p. 2) o termo correto para explicar a atuação internacional dos governos
subnacionais é „Política Externa Federativa‟ pois, delimita que é uma política
exercida por entes federados. Em sua tese o foco foi o Brasil, uma república
federativa, no entanto, conforme Fronzaglia (2005, p. 47) ressalva o termo não
caberia para a ação de cidades situadas em países com uma forma de governo
diferente, como a Espanha ou a China. Além disso, o exercício da política externa é
uma obrigação de Estado enquanto a diplomacia ou a política internacional é uma
opção dotada de planejamento com viabilização de resultados positivos. Outro termo
ainda é citado nas bibliografias sobre o tema que é „Protodiplomacia‟, porém
Fronzaglia (2005, p. 49) explica que somente se aplica quando as políticas de
inserção internacional de uma unidade subnacional são planejadas e executadas
com a finalidade de independência, separação ou secessão. Portanto, no que diz
respeito ao ativismo internacional das cidades e sua inserção no cenário global por
meio do estabelecimento formal de relações com cidades em outros países, o termo
legitimado é Paradiplomacia.
Apesar das dificuldades formais, a Paradiplomacia torna-se um instrumento
de articulação para Desenvolvimento Local. A inversão do modelo tradicional que
impõe ações de cima para baixo é extremamente interessante tendo em vista o
conhecimento das lideranças de cada território. A Paradiplomacia atualmente é uma
84
prática destinada àquelas cidades que realmente conhecem suas necessidades e
potencialidades ao ponto de identificar oportunidades que agreguem para o deu
desenvolvimento. Cabe ressaltar que as vantagens advindas do intercâmbio entre
cidades não são somente econômicas, mas tamm espaço para agregação de
valores no campo social, cultural, ambiental e urbano-estrutural. As experiências de
uma cidade podem ser exemplos a serem seguidos por outras cidades, dadas as
devidas adaptações ao meio, criando a possibilidade de maiores acertos. Citando
mais uma vez Keating (1999, p. 9) compreende-se que as iniciativas de inserção
internacional possuem tipicamente uma base funcional baseada no desenvolvimento
econômico, promoção, infra-estrutura, meio ambiente ou cultura. As experiências
mais exitosas são aquelas em que as cidades possuem aspectos e recursos
complementares, onde existem interesses em comum em realizar determinado
projeto.
No ano de 2004 uma instituição foi formada com o intuito de ser o pilar
internacional dos governos locais. A United Cities and Local Governments (UCLG)
tem como missão advogar em nível global a favor da atuação do governo local de
maneira democrática e autônoma, promovendo seus valores, objetivos e interesses
através da cooperação entre o local e a comunidade internacional. O primeiro
relatório da organização, intitulado Decentralizalization and Local Democracy in the
World é um dos resultados da iniciativa de montar um Observatório Global, o qual se
propôs a observar regularmente os movimentos da democracia e descentralização
nos governos locais, identificando avanços e retrocessos. O contexto para a criação
tanto da organização quanto do relatório é paralelo ao apresentado nessa pesquisa
as cidades precisam buscar vias alternativas de desenvolvimento em face aos
reflexos da globalização de maneira autônoma e independente. O prefácio do
relatório traz a seguinte afirmação (2007, p. 9):
In a world where more than half of humanity now lives in cities, local
authorities are also the key to the solution of major contemporary challenges
of all kinds: democratic, as it is in the local sphere that the sense of
citizenship is reinforced and identities are constructed to deal with
globalization; environmental, since the preservation of our planet and the
fight against global warming depends to a great extent on finding sustainable
solutions to transform current models of production and consumption,
particularly in the urban areas; economic, given that large amounts of wealth
and opportunities, as well as extreme inequities are generated within the
cities and in their surroundings; and, social, as it is at the local level that the
foundations need to be laid for creating social inclusion, managing cultural
85
diversity and ensuring human security.
11
Para Rhi-Sausi (2001) o ativismo dos governos subnacionais é uma
tendência global, com destaque para o significativo impacto na cooperação
descentralizada em situações pós-conflitos. Complementando essa afirmação,
Trevas (2004, p. 3) destaca que a iniciativa local no exterior é uma realidade em
ascensão:
As cidades são cada vez mais protagonistas nas relações internacionais,
considerando tanto a cooperação entre cidades, quanto os projetos com as
agências bilaterais e multilaterais de desenvolvimento, que reconhecem
cada vez mais o dinamismo e o espaço de atuação existente na esfera
local.
O objetivo da Paradiplomacia é tão somente o desenvolvimento em todas as
áreas com o entendimento de que a ligação direta de governos locais possibilite a
troca direta de experiências e vantagens competitivas.
Apesar do debate em torno do declínio da soberania do Estado nacional, a
Paradiplomacia não deve ser classificada como o contra-peso desta
descompensação, mas sim, como um processo paralelo que visa auxiliar e otimizar
o desenvolvimento local. Conforme citado anteriormente, Ferrero (2006, p. 7) afirma
que as práticas dos governos locais nas relações internacionais não são cópias dos
processos tradicionais de política exterior. Na realidade, os estilos e estratégias de
atuação estão marcados por objetivos e motivações muito mais concretas, ou seja, é
uma política internacional, uma diplomacia planejada.
6.2. As Cidades Globais
É bastante comum que no primeiro momento em que mencionadas juntas as
palavras cidade e internacional, logo se faz uma ligação aos grandes centros
urbanos como Nova Iorque, Tóquio, Londres, Paris, etc. Essa associação é uma
11
Num mundo onde mais de metade da humanidade vive em cidades, as autoridades locais são
tamm a chave para a solução dos grandes desafios contemporâneos de todos os tipos:
democrática, pois é na esfera local que o sentimento de cidadania é reforçado e identidades são
construídas para lidar com a globalização; ambiental, uma vez que a preservação do nosso planeta e
a luta contra o aquecimento global depende, em grande medida, de encontrar soluções sustentáveis
para transformar os atuais modelos de produção e consumo, sobretudo nas zonas urbanas;
econômico, dado que grandes quantidades de riqueza e oportunidades, bem como as desigualdades
extremas são geradas dentro das cidades e nos seus arredores; e sociais, uma vez que é a nível
local que as fundações precisam ser estabelecidas para criar a inclusão social, a gestão da
diversidade cultural e garantir a segurança dos seres humanos. Tradução Livre.
86
característica básica do convencionado termo Cidade Global. O grande destaque
dado a essas cidades é a própria autonomia conquistada por meio de uma
independência econômica que também possibilitou o desenvolvimento da
Paradiplomacia. Portanto é relevante que esta pesquisa aborde o papel desses
atores.
As cidades globais se diferenciam das demais cidades, pois possuem um
razoável grau de influência no mundo. Suas características mais marcantes
englobam a familiaridade internacional, ou seja, é possível referir-se somente a
cidade sem citar o país integrante o exemplo clássico é que em geral citar somente
„Nova Iorque‟ basta para compreender a localidade, não sendo necessário
complementar com a informação de que a cidade fica nos Estados Unidos da
América. Além desse fator popular, destacam-se ainda as características quanto à
ativa participação em eventos internacionais, servir como base de grandes
organizações internacionais e empresas multinacionais; alta densidade demográfica;
existência de porto e/ou aeroporto internacional de capacidade elevada; sistema
avançado e eficiente de transportes; bolsa de valores com influência na economia
mundial; entre outros fatores secundários.
O conceito de cidade global surgiu no final dos anos de 1970 com referência
as metrópoles dos países líderes da economia mundial juntamente com o debate em
torno da globalização. De acordo com o estudo de Carvalho (2000, p. 71) o processo
que estabeleceu esse conceito engloba as transformações na economia mundial e a
conseqüente crise da centralidade econômica. Essa crise se deu basicamente pela
globalização que através do desenvolvimento de tecnologias de comunicação e
informação, passaram a dispor de maior flexibilidade para mudarem suas sedes de
acordo com o custo-benefício o que gerou uma centralização nessas cidades.
Segundo a definição de Saskia Sassen (2001, p. 3-4) o papel de uma cidade global
não é simples e acompanha a demanda do mundo globalizado. Elas têm de
funcionar como centros de comando para a organização da economia mundial; lócus
de mercado para os provedores de serviço corporativo financeiro e especializado; e
centros para a produção de inovações.
Uma cidade global deve ainda ter dupla função de gestão econômica e
política. A econômica é a disponibilidade de recursos e competências necessárias
para a gestão de operações globais relativas a empresas e mercados, quer sejam
nacionais ou internacionais. Porém, a autora salienta que esta funcionalidade não é
87
fácil de ser adquirida, nem mesmo de mantê-la, pois a gestão econômica tem de ser
produzida e reinventada, assumindo várias formas de liderança e diplomacia
econômica internacional para assegurar a sua existência. Por sua vez, a gestão
política envolve a criação e facilitação de culturas/identidades de administração e
profissionais principalmente num sentido especializado - que são, em parte,
desnacionalizadas, que facilitam o surgimento de elites profissionais e empresariais
nacionais e estrangeiras. As cidades globais podem ser consideradas como
importantes vetores da globalização, além de serem sedes de poder. É por meio
delas que a economia global é administrada, coordenada e planejada.
Ainda de acordo com a autora, que é uma sumidade neste assunto, a
compreensão dos assuntos relacionados à globalização e a formação do mercado
financeiro global não é adquirida através de sua análise desvinculada. Pelo
contrário, as cidades globais são territórios, campos de estudo que permitem a
análise desses fatores de acordo com que eles se materializam em cada local.
Carvalho (2000, p. 72) resume que uma cidade global seria, portanto, a cidade que
se configurasse como o ponto de ligação entre a economia nacional e o mercado
mundial. Sendo assim se faz necessário que o território possua um determinado
(leia-se: elevado) número das principais empresas transnacionais e que as
atividades econômicas se concentrem no setor de serviços especializados e de alta
tecnologia.
A Globalization and World Cities Study Group & Network (GaWC) organizou
uma lista classificando em três níveis (Alfa, Beta e Gama) as atuais cidades globais
bem como as em potencial de se tornarem. Essa classificação foi feita com base no
poder de provisão de serviços avançados de produção, tais como finanças, firmas de
advocacia, publicidade, e densidade demográfica. Destaque para as já mencionadas
Nova Iorque, Londres, Tóquio e Londres no primeiro escalão do grupo Alfa; as
cidades de Sidnei, Toronto e São Paulo no grupo Beta; e Caracas, Boston e Osaka
no terceiro grupo. Dentre as cidades em potencial para se tornarem globais estão
Rio de Janeiro, Atenas e Luxemburgo.
Ao se tratar da Paradiplomacia, é evidente a importância que as cidades
globais ocuparam no desenvolvimento deste fenômeno. Primeiro porque foram as
primeiras cidades a adquirirem, por meio de elementos econômicos, maior
independência das políticas centrais, e conseqüentemente, autonomia. Segundo
porque representam, são ícones e exemplos da possibilidade de internacionalização,
88
atração de investimentos e diversificação cultural. As relações internacionais das
cidades globais são formalizadas tanto através de secretarias específicas quanto
por meio de instituições que tem como objetivo o intercâmbio com outras cidades e o
estabelecimento de parcerias. No caso das redes de cidades, tópico próximo, as
cidades globais desempenharam um significativo papel na concepção e manutenção
dessas formas de aglutinação dos atores subnacionais.
6.3. As Redes Internacionais de Cidades
O conceito de redes, apesar de estar em alta em diversas áreas, não é uma
propriedade dos tempos recentes, pelo contrário, é uma forma de organização
antiga. A estrutura das ligas das cidades-estado gregas, que trabalhavam em torno
de um objetivo comum se assemelha o que atualmente é chamado de redes. O
trabalho em redes visa o alcance de um objetivo através da cooperação de diversos
atores envolvidos direta e indiretamente. De acordo com Gambini (2007, p. 7) redes
são estruturas abertas e dinâmicas com capacidades ilimitadas de expansão em sua
maior parte organizadas em um esquema horizontal, sem hierarquia. A
aplicabilidade do sistema de redes está atualmente em praticamente todos os
campos e esse resgate está ligado ao processo de globalização com a expansão da
tecnologia da informação e a necessidade de descentralização iniciada na década
de 1990.
A atuação em redes está no setor privado, onde se encontram as redes
organizacionais compostas por diversas empresas com o objetivo de facilitar o
acesso a produtos e serviços e amesmo os processos internos; está tamm no
terceiro setor com a estruturação cooperativa e de troca de informações entre as
Organizações Não-Gorvernamentais que possuem objetivos em comum. É
interessante mencionar tamm as redes de pesquisa que se desenvolvem nas
universidades em todo o mundo e foram fortemente impulsionadas com a
consolidação da internet. No caso das cidades, as redes eram, em princípio, dentro
das fronteiras nacionais que visavam compartilhar idéias e soluções para problemas
similares.
Tendo de um lado uma clara tendência de descentralização aliada à
globalização, a atuação das cidades em redes se expandiu para a esfera
internacional. Fronzaglia (2005, p. 124) revela que existem dois tipos de redes
89
internacionais, as mundiais que funcionam como canais para a discussão aberta
sobre os mais diversos assuntos referentes à gestão local, ao mesmo tempo em que
divulgam idéias e casos para análise. Nestes moldes funciona a citada United
Cities and Local Governments (UCLG). O outro tipo é a rede regional que reúne as
cidades de uma determinada região, normalmente reunidas por conta um tratado
multilateral assinado pelos Estados ou um bloco regional. No caso dos blocos
regionais, as redes de cidades m como objetivo diminuir as convergências que
possam existir entre os interesses locais e nacionais dentro do processo de
integração. Cabe adicionar, ainda, mais um tipo de redes que é a inter-regional,
quando uma rede é específica para cidades de regiões diferentes.
De um ponto de vista macro, as redes de cidades surgem a partir de uma
identificação em comum de objetivos e problemas. Trevas (2004, p. 5) afirma que as
atividades em redes englobam principalmente debates sobre modelos alternativos
de desenvolvimento local frente aos reflexos da mobilidade global, como meio
ambiente, segurança blica e desenvolvimento econômico e cultural. É muito claro
que o esquema de redes internacionais de cidades é um caminho para a inserção
internacional. A observação de Trevas (2004, p. 4) mostra que o trabalho em redes é
principalmente um trabalho de cooperação com um significado importante dentro de
um cenário tão individualista quanto o que foi construído desde a consolidação
capitalista.
[...] é necessário repactuar formas de inserção no mundo globalizado de
forma mais solidária, responsável e menos subalterna. Neste aspecto, as
redes internacionais de cidades cumprem um papel importante para uma
repactuação mundial dos governos locais, que reoriente os rumos da
humanidade para uma globalização mais solidária e inclusiva.
Referindo-se a realidade das redes de cidades, Meneghetti Neto (2002, p. 1)
afirma que a utilização desse instrumento como uma ferramenta de aperfeiçoamento
da gestão local e da inserção internacional é mais utilizada pelas cidades situadas
na Europa e nos Estados Unidos. Quanto a América Latina, o autor considera que
as iniciativas ainda o tímidas devido à falta de visão multidimensional dos
problemas urbanos por parte dos administradores públicos. Contudo, como se
tratado nas subseções, as iniciativas estão progredindo e as redes de cidades estão
ampliando tanto seus objetivos quanto sua atuação junto às esferas superiores.
90
6.3.1. Redes Mundiais
Redes de cidades mundiais são aquelas que objetivam ter participantes de
todos os continentes que reunidas levantem debates sobre problemas comuns e
diversas soluções. Devido às limitações da comunicação e transportes as iniciativas
que se levantaram antes da década de 1990 não tiveram tanto destaque no cenário
mundial. Contudo, os primeiros avanços no sentido de redes de cidades foram
realizados por elas: em 1913 foi fundada a International Union of Local Authorities
(IULA) visando estabelecer e monitorar a autonomia dos governos locais,
principalmente das novas cidades européias. Apesar de ter fechado duas vezes
durante as guerras mundiais, avançou em seus propósitos criando abraços
específicos para a América Latina, Ásia e América do Norte. Em 1952 surgiu a World
Federation of United Cities na França cujo objetivo principal era promover a amizade
e o intercâmbio cultural entre as cidades européias. Mais tarde, viu-se a necessidade
de expansão e então foram criadas unidades específicas para cada região. Em
1984, em uma reunião convocada pelo Conselho de Ile de France, os
representantes das cidades de Nova Iorque, Tóquio, Londres, Barcelona, Los
Angeles, Buenos Aires, Cairo, Colombo, d‟Abijan, Addis-Abeba e Turim, criaram a
World Association of Major Metropolises. A proposta dessa organização era
promover a troca de experiências referente à gestão e planejamento das grandes
cidades. Dentre as redes mundiais, essas foram as mais importantes, pois
constituem um primeiro passo rumo à autonomia e ao trabalho cooperativo em
redes. Em 2004, as três organizações fundiram-se dando origem a UCLG.
Por sua vez, a UCLG é atualmente a maior rede mundial. Conforme citado
em seção anterior, sua missão principal é advogar em nível global a favor da
atuação do governo local de maneira democrática e autônoma (self-government),
promovendo seus valores, objetivos e interesses através da cooperação entre o local
e a comunidade internacional. O trabalho estratégico da UCLG ficou centrado em
quatro diretrizes de ação que são prioridades de 2007 a 2010. De acordo com o
relatório Strategic Priorities as metas macro são: a) desenvolver o reconhecimento
da UCLG como o órgão principal de gestão local e regional dentro na comunidade
internacional; b) promover relações mais amplas ente atores e membros de todos os
tamanhos e culturas; c) advogar para que a visão dos governos locais seja incluída
91
na agenda internacional; d) aumentar a capacidade operacional da organização
através do desenvolvimento de secretarias.
Sua estrutura de funcionamento procura abranger todas as esferas de
maneira secularizada, porém em rede.
Diagrama 2 Estrutura da rede mundial de cidades UCLG
Fonte: http://www.cities-localgovernments.org
A UCLG é uma rede com estratégias em praticamente todos os campos que
sejam passíveis de preocupação urbana. Contudo, existem redes que se
especializam em atuar somente em uma área, como no caso da Sustainable Cities
Network. Essa rede foi criada em 1995 e visa potenciar a troca de idéias e
experiências no domínio da sustentabilidade urbana. Sua principal atuação foi o
estudo ambiental que gerou o relatório intitulado Towards Sustainable Cities
Programme. Procurando manter-se com uma atuação forte global e local, a
Sustainable Cities Network desenvolveu uma parceria com a revista Local
Environment e com o International Council for Local Environmental Initiatives (ICLEI)
de modo a que seu funcionamento se tornasse permanente. Além disso, anualmente
uma conferência sobre sustentabilidade urbana é organizada com a participação das
cidades aderentes ao programa de sustentabilidade.
Municípios
Cidades
Metrópoles
Regional
Mundial
África
Ásia-
Pacífico
Euro-
Ásia
Europa
Oriente
Médio e
Ásia
Oriental
América
Latina
América
do Norte
Seção
Metro-
politana
United Cities and Local Governments
Local
Sociedade
Associações Nacionais de Governos Locais
Nacional
92
6.3.2. Redes Regionais
Conforme exposto anteriormente, as redes de cidades regionais o
organizações que se formam a partir de um movimento ou da consolidação de um
processo de integração, como a União Européia e o Mercosul.
Eurocities ou Eurocidades foi formada em 1986 pelos prefeitos das cidades
de Barcelona, Birmingham, Frankfurt, Lyon, Milão e Roterdã os quais acreditavam
que reuniões periódicas para discutir problemas em comum, dividir conhecimento e
idéias poderiam beneficiar a gestão local. Ao identificar que passavam por desafios
similares, compreenderam que aprenderiam a lidar melhor com determinadas
situões uma vez que compreendessem experiências alheias. O objetivo principal
era o de constituir uma plataforma de comunicação com as instituições dos níveis
superiores e ser reconhecida como parceira essencial para a Comunidade Européia
e os Estados Membros, alocando os interesses das cidades dentro do processo de
formação de políticas públicas. Em 1992 foi aberto o primeiro escritório em Bruxelas
e em 1998 o relatório Eurocities for an Urban Policy foi publicado posicionando a
rede Eurocidades como um importante órgão de representação local em nível
nacional. No ano de 2004, com o processo de integração mais aprofundado, a
Eurocidades mudou sua estrutura introduzindo a possibilidade tornar autoridades
locais, empresas e outras organizações membros permanentes da rede auxiliando
as atividades dos membros principais. Conforme consta na gina oficial da
Eurocidades, esse é o único órgão que representa efetivamente os interesses das
cidades na Comissão Européia bem como em outras instituições de nível
supranancional. A rede funciona também como uma fonte de expertise sobre
políticas urbanas além de contribuir com o desenvolvimento e a implementação de
políticas européias e programas em diversas áreas.
É ainda interessante destacar que a ação estratégica da Eurocidades
concentra-se em cinco dimensões. Na dimensão social, o foco está nos mecanismos
de inclusão que inclui o combate a pobreza, garantia de educação para todos e
promoção de oportunidades iguais para todos. Na dimensão econômica, o primeiro
destaque é dado ao desenvolvimento sustentável, seguido de geração de emprego,
acesso por todos a serviços de qualidade e aperfeiçoamento da segurança urbana.
A dimensão ambiental traz claramente a ação cooperativa, pressuposto de todas as
redes de cidades, priorizando criar integração no planejamento ambiental e urbano,
93
além do aperfeiçoamento da qualidade do meio-ambiente e criar padrões de
consumo mais responsáveis. A dimensão cultural se preocupa em estabelecer o
reconhecimento generalizado de que a cultura local é um aspecto vital para a
crião de políticas públicas. Por fim, a dimensão de gestão (governance) ressalta
as características de democracia, descentralização e internacionalização, bastante
abordadas nessa dissertação, visando promover o envolvimento das cidades nos
níveis superiores de criação de políticas públicas e a cooperação internacional.
No âmbito do Mercosul foi criada a rede Mercocidades. O projeto dessa
composição se iniciou no ano de 1995 após a recomendação da União das Cidades
Ibero-Americanas, uma rede inter-regional, e com o seminário Mercosul:
Oportunidades e Desafios para as Cidades‟. No mesmo ano foi assinado o
Compromisso de Porto Alegre através do qual as cidades manifestaram a sua
vontade de acrescentar seu protagonismo no processo de integração regional. Em
novembro de 1995 os prefeitos de onze cidades fundam formalmente a rede
Mercocidades sob a premissa de que seria imprescindível ter a participação das
cidades na consolidação do Mercosul provendo uma visão mais autêntica partindo
das sociedades locais. As cidades fundadoras foram: Rosário, La Plata e Córdoba,
da Argentina; Assunção do Paraguai, Florianópolis, Porto Alegre, Curitiba, Rio de
Janeiro, Salvador e Brasília do Brasil, e Montevidéu do Uruguai.
O número de objetivos é bastante significativo e procura abranger todos os
aspectos do processo de integração. Como a maioria das redes a finalidade inicial é
que dentro da estrutura de redes sejam criados mecanismos que facilitem o
intercâmbio de experiências e informações, bem como ao acesso dos cidadãos aos
centros municipais de investigação, desenvolvimento tecnológico e cultural. Cabe
destacar ainda outras metas estabelecidas no Estatuto, como: estabelecer e
impulsionar convênios e serviços recíprocos entre as diversas prefeituras e as redes
que virem a se formar; potencializar os recursos humanos e as experiências
administrativas para gestões locais; coordenar a planificação e promoção de ações
vinculadas ao crescimento e progresso urbano das cidades; coordenar projetos e
desenvolver programas integrados; desenvolver e potencializar atividades comuns e
integradas vinculadas à cultura, recreação, esporte e turismo; efetuar o inventário do
patrimônio cultural e histórico das cidades do Mercosul através de unidades técnicas
de representação integrada, propondo medidas comuns que garantem sua
preservação e difusão; desenvolver e planejar o turismo regional; realizar estudos e
94
colaborar na elaboração de planos e estratégias na área urbana e ambiental, com o
objetivo de harmonizar e coordenar as ações nesta área; impulsionar a adoção de
políticas que adéqüem os projetos locais ao novo espaço regional; impulsionar a
crião de unidades cnicas intermunicipais, com representação integrada, para a
planificação e o desenvolvimento de projetos comuns e regionais; difundir uma
cultura democrática e democratizadora a nível regional e nacional, estabelecendo
uma relação mais estreita de cooperação para, através das prefeituras, definir
políticas sociais adequadas; e estudar e impulsionar, através das diversas
prefeituras, a implantação de políticas coordenadas que tornem os serviços públicos
acessíveis às parcelas mais pobres das cidades, integrando-as ao desenvolvimento
social e cidadão.
A rede Mercocidades traçou seus objetivos de maneira pontual e, sobretudo
preocupa-se em investir esforços no campo social e ambiental, movendo o foco
puramente econômico. Meneghetti Neto (2002, p. 6) explica que a rede dispõe de 12
unidades temáticas em que são designadas algumas cidades para desenvolverem
trabalhos nas áreas de ciência, tecnologia e capacitação, meio ambiente,
desenvolvimento social, cultura, gestão municipal e autonomia, planificação
estratégica, turismo, cooperação internacional, universidade, desenvolvimento
econômico local, educação e desenvolvimento urbano. Cada unidade temática tem
uma cidade coordenadora e diversas cidades colaboradoras sendo que o trabalho
deve ser conjunto para formular e propor políticas comuns para serem apresentadas
no âmbito das Mercocidades.
Existem outras redes na esfera regional como a Arab Towns Organiation
(ATO) e a East and Southeast Asia Regional Network for Better Local Governments
que praticamente seguem os mesmos passos, também funcionam como uma
ferramenta tanto para a inserção internacional das cidades quanto para a promoção
do desenvolvimento local, dentro de uma visão de integração regional.
6.3.3. Redes Inter-Regionais
As redes de cidades inter-regionar são aquelas que envolvem cidades
situadas em países de diferentes continentes ou regiões. Esse tipo de rede é
extremamente importante, pois o intercâmbio se enriquece uma vez que as
realidades das cidades membros podem não ser tão similares. Além disso, o número
95
de membros é menor do que em uma rede mundial facilitando assim a proximidade
entre todas as cidades bem como possibilita a produção de mais atividades
específicas.
A Urb-AL é um exemplo de rede inter-regional entre a Europa e a América
Latina. Na verdade, a rede faz parte do programa de cooperação externa
descentralizada da Comissão Européia que atualmente conta com redes
estabelecidas em vários continentes como a Ásia, Caribe, Oriente Médio e a parte
oriental da Europa. Por uma questão “geográfica”, será descrito apenas a Urb-AL.
Seguindo o padrão das redes de cidades, a Urb-AL tem como objetivo
central a aproximação de cidades, entidades e coletividades locais da América
Latina e União Européia, através da troca de experiências de políticas urbanas.
Criada em 1995 com a visão de ser o canal para o acesso a múltiplos contatos
internacionais, constituindo o primeiro passo para o estabelecimento de relações
duradouras entre sociedades locais européias e latino-americanas. Os objetivos
específicos, de acordo com o site oficial, são: reforçar as capacidades de ação das
coletividades locais no desenvolvimento social, econômico e cultural das zonas
urbanas, incluindo a implementação de equipamentos coletivos; desenvolver as
capacidades estruturais das autoridades locais, em particular, através da formação
de recursos humanos; promover parcerias entre coletividades locais e
representantes da sociedade civil; desenvolver a capacidade de ação das pequenas
e médias cidades (PMC) visando à internacionalização de suas relações; promover
as „boas práticas‟ européias e latino-americanas de desenvolvimento local,
respeitando suas especificidades locais.
A princípio os participantes se agrupavam livremente, segundo suas
afinidades, ao redor de um ou vários temas relacionados com a cidade. Contudo,
com o intuito de incrementar a efetividade da rede, foram criadas sub-redes
temáticas que são responsáveis pelo aprofundamento em determinado tema.
Atualmente são 13 sub-redes sendo que cada uma é coordenada por uma
prefeitura, conforme o quadro abaixo:
96
Tabela 3 Redes Temáticas da Urb-AL
Rede
Tema
Coordenador
1
Droga e Cidade
Municipio de Santiago
2
Conservação dos Contextos Históricos Urbanos
Provincia di Vicenza
3
A Democracia na Cidade
Ville de Issy-Les-Moulineaux
4
A Cidade como Promotora do Desenvolvimento Econômico
Ayuntamiento de Madrid
5
Políticas Sociais Urbanas
Intendencia Municipal de Montevideo
6
Meio-Ambiente Urbano
Ayuntamiento de Málaga
7
Gestão e Controle da Urbanização
Intendencia Municipal de Rosário
8
Controle da Mobilidade Urbana
Landeshauptstadt Stuttgart
9
Financiamento Local e Orçamento Participativo
Prefeitura Municipal de Porto Alegre
10
Luta Contra a Pobreza Urbana
Prefeitura Municipal de São Paulo
11
Promoção das Mulheres nas Instâncias de Decisão Locais
Diputación Provincial de Barcelona
12
Cidade e a Sociedade da Informação
Freie Hansestadt Bremen
13
Segurança do Cidadão na Cidade
Municipalidad de Valparaiso
Em um esquema horizontal de estrutura, as cidades membros desenvolvem
projetos de interesse comum e debatem o conteúdo destes trabalhos nos seminários
promovidos pelas redes. Além disso, a Comissão Européia co-patrocina estudos e
pesquisas para a formação de relatórios que servirão de base para o
desenvolvimento das ações estratégicas.
Outra rede dentro dos moldes inter-regional é a Union of Capital Cities of
Ibero-America (UCCI) fundada em 1982 na cidade de Madri. Apesar de possuir
características de uma rede de cidades, a UCCI se define como uma organização
internacional de caráter municipal, não governamental e sem fins lucrativos. Seu
objetivo principal é fomentar os vínculos e favorecer as relações e intercâmbios em
diferentes âmbitos entre grandes cidades ibero-americanas. Impulsionar o
municipalismo enfatizando as características de cada cidade e contribuir para a sua
inserção no processo de formação de políticas públicas são também metas da UCCI.
6.4. Cidades Irmãs
Atualmente tem se tornado cada vez mais comum que uma cidade
estabeleça laços de irmandade com uma cidade em outro país. Principalmente após
a Segunda Guerra Mundial as cidades que abrigaram imigrantes refugiados e as
cidades natais protagonizaram as primeiras iniciativas nesse sentido, através do
Transnacionalismo. Zelinski (1991, p. 1) revela que desde 1950 mais de onze mil
97
pares de cidades em 159 países firmaram acordos de irmamento. Levando em
consideração a data do levantamento, cabe considerar que esse número atualmente
tenha quase dobrado. Cremer et al (2001, p. 2) ressaltam que inicialmente o
objetivo era simplesmente desenvolver laços culturais e de amizade tendo em vista
as colônias de imigrantes ou então eram firmadas baseadas nas similaridades
econômicas de produção. Contudo os autores destacam que recentemente um
reconhecimento maior foi dado aos benefícios econômicos e políticos dessas
conexões. Ainda, o fenômeno de cidades-irmãs ilustra claramente a interface do
global com o local.
Como o programa da cidade brasileira de Joinville, a grande parte dos
programas de cidades-irmãs traz os seguintes objetivos: a) criar oportunidades de
intercâmbio cultural através da vivência com outros povos; b) estimular o
desenvolvimento e fortalecimento de oportunidades econômicas e comerciais; c)
possibilitar o diálogo e a troca de informações relacionadas a assuntos da
administração pública, da saúde, da educação, do meio ambiente, da cultura e
outros; desenvolver condições visando possibilitar encontros criativos de estudos e
trabalhos. Normalmente esses programas são criados através de decretos
municipais.
A Prefeitura Municipal de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de
Relações Internacionais qualifica que a irmamento entre cidades é um instrumento
diplomático que propicia a troca de conhecimentos sobre políticas públicas e
projetos em diversas áreas, tais como programas de saúde e prevenção à Aids,
programas de combate à discriminação racial e políticas culturais. Em sua página
oficial, afirmam que os convênios de cidades-irmãs representam base formal para a
realização de eventuais acordos e programas de intercâmbio e desenvolvimento
econômico, políticas públicas e atendimento à população. A Prefeitura Municipal de
Porto Alegre divide esse mesmo conceito, ressaltando que o foco está nas bases de
cooperação buscando a integração entre a cidade e demais municípios nacionais e
estrangeiros. Ademais, consideram que os convênios reafirmam a necessidade de
fraternidade e relacionamente pacífico.
De acordo com Zelinski (1991, p. 1) o processo de irmamento não é um
processo de escolha aleatória. Desde conexões históricas até mesmo similaridades
ideológicas são fatores levados em consideração:
98
The choice of country and specific community within it is not a random
process; historical connections, shared economic, cultural, recreational, and
ideological concerns, similar or identical place names, and, to a certain
extent, the friction of distance, all play meaningful roles. […] Although
twinning for the most part reinforces and humanizes the political and
economic interests of the participating nation-states, a significant minority of
these relationships promote ideological and humanitarian programs that may
be at odds with official policy.
12
Em bases práticas, no Brasil o processo de estabelecimento de convênios
de cidades-irmãs deve ser iniciado por um vereador via projeto de lei com uma carta
de exposição de motivos, para que seja debatida na câmara. Sendo este projeto
aprovado, então, torna-se este lei e o legislativo transfere ao executivo o poder de
firmar o irmanamento entre as cidades.
A ressalva que alguns autores fazem sobre a Paradiplomacia, conforme
exposto anteriormente, de que a atuação das unidades subnacionais possa ser
contrária aos interesses das esferas superiores dificilmente se aplica aos casos de
convênios de cidades-irmãs. Pelo contrário, a celebração da irmandade funciona
como um mais um canal positivo no exercício da diplomacia em nível nacional.
Principalmente porque os convênios priorizam as relões de amizade bem como o
intercâmbio cultural. A similaridade entre as partes beneficiam o diálogo e a troca de
experiências na gestão municipal nas mais diferentes áreas.
6.5. O Exercício da Paradiplomacia Exemplos no Mundo
O exercício de atividades em âmbito internacional pelas cidades é uma
realidade presente no mundo contemporâneo. Possibilitar que esse relacionamento
aconteça não depende somente das iniciativas locais, mas a abertura dada pela
esfera nacional é essencial. Os Estados nacionais têm percebido cada vez mais a
necessidade de delegar as responsabilidades de promoção do desenvolvimento nas
diversas áreas. Como visto anteriormente, isso acontece tanto por causa dos novos
desafios que a globalização trouxe para a esfera nacional quanto pela noção de que
12
A escolha do país e da comunidade específica, não é um processo aleatório; ligações históricas,
similaridades econômicas, culturais, recreativas e preocupações ideológicas, nomes de lugares ou da
cidade semelhantes ou idênticas, e, em certa medida, a distância, todos desempenhando papéis
significativos. […] Embora a irmandade reforce e humanize, em maior parte, a política e os interesses
econômicos dos Estados-Nação participantes, uma minoria significativa destas relações ideológicas e
humanitária promove programas que possam estar em contradição com a política oficial.
99
é o local o principal interessado e maior conhecedor de suas necessidades e
potencialidades.
O pesquisador Gilberto A. Rodrigues (2004, p. 15) reuniu em sua tese
exemplos de como alguns países federalistas administram a questão da
Paradiplomacia assim como Keating (1999, p. 11) discorre outros casos. Reunindo
as duas referências complementadas com outras secundárias, pretende-se exibir um
quadro geral da iniciativa subnacional em alguns países.
Começando com os Estados Unidos, considerados os fundadores do
federalismo, as unidades subnacionais que mais se inserem internacionalmente são
os estados que possuem pelo menos um escritório de representação em outro país.
As cidades também contam com sua autonomia, utilizando as universidades que
sediam para promoverem-se e firmarem acordos de cooperação. Os convênios de
irmandade entre cidades são bastante incentivados e agências exclusivas tratam de
assuntos internacionais. Um exemplo interessante é a Sister Cities International,
uma organização sem fins lucrativos dedicada a promover convênios de irmandade
entre cidades dos Estados Unidos e de outros países. A atuação dessa organização
por si mostra que o ativismo internacional norte-americano em nível municipal é
bastante efetivo.
Na Bélgica as unidades subnacionais bem (estados e cidades) possuem
competência internacional praticamente total, ficando restritos apenas de firmarem
acordos com estados e cidades integrantes de países que a Bélgica não possui
relações diplomáticas. Na Alemanha, dentro dos limites constitucionais, os Länder
(Estados) podem assinar tratados e as cidades são bastante ativas nos convênios
de irmandade tanto pela colônia alemã em outros países quanto pela via da
cooperação técnica e acadêmica. O Canadá é um exemplo bastante comentado na
bibliografia sobre Paradiplomacia por causa da polêmica do estado de Quebec e
suas práticas às vezes conflitantes com o governo central, conforme visto em seção
anterior. O Canadá em termos de autonomia subnacional é semelhante aos Estados
Unidos, porém operam em sistema parlamentar. Além de possuírem grande
ascendência na política externa, as unidades subnacionais são tradicionalmente
consultadas diante de toda mudança operada pelo governo federal. Rodrigues
(2004, p. 11) revela que para o Protocolo de Kyoto poder ser ratificado foi necessário
a realização de uma conferência interna para serem acordadas cotas entre as
100
Províncias, devido à produção de gás e petróleo ser assimétrica e o impacto do
Protocolo de Kyoto se dar nos estados mais a oeste do Canadá.
A Espanha, apesar de não ser federalista, possui um alto grau de
descentralização principalmente dos estados, tamm chamados pela própria
Constituição de regiões autônomas. A cidade de Barcelona é um caso consagrado
na literatura sobre ativismo internacional e desenvolvimento local devido a sua ação
efetiva e independente contra a crise européia da década de 1990. O ativismo
subnacional da Inglaterra também é bastante referenciado, principalmente no âmbito
da União Européia, sendo considerado por Keating (1999, p. 12) com maior grau de
atuação no continente. Diferentemente desses casos, é a Fraa. O processo de
descentralização ainda é muito lento e ainda baseiam-se na tradicional premissa de
que somente o Estado-Nação como um todo pode ser representado
internacionalmente. As iniciativas das cidades francesas são observadas de perto
pelo governo central a quem cabe autorizar ou não as ações independentes.
Na América Latina, a principal referência é feita à Argentina. Com a reforma
constitucional realizada em 1994, as províncias e o distrito federal (Buenos Aires)
ganharam autonomia de firmar convênios internacionais. Conforme Rodrigues (2004,
p. 12) ressalta foi à primeira experiência latino-americana de um constitucionalismo
que prevê a Paradiplomacia exercida pelas províncias. Contudo, alguns limites de
controle foram adicionados e antes da celebração do tratado faz-se necessário
comunicar o governo central, que poderá ou não pedir por meio jurídico um debate
em torno do conteúdo do tratado para efeitos de harmonização entre as esferas.
Um exemplo prático reportado por Prieto (1999, p. 259) e pouco comentado
na literatura é o relacionamento estabelecido entre a Ilha de Sakalina, território da
Rússia e a cidade de Hokkaido no Japão. Após a queda da União Soviética a ilha
sofreu um grande déficit econômico devido ao corte de subsídios, e assim o governo
local partiu para uma intensa exploração dos recursos marítimos resultando na
descoberta de campos de petróleo e gás. O acordo subnacional gira em torno da
promoção de cooperação técnica e pesquisa, beneficiando ambas as localidades.
A cidade chinesa de Beijing é um caso extremamente interessante de
ativismo internacional. Sede das Olimpíadas de 2008, o governo municipal não
mede esforços para promover internacionalmente a cidade bem como inserir-se no
cenário global. A cidade conta atualmente com quarenta convênios de cidades-irmãs
que começaram a ser firmados no final dos anos 1970, muito antes da oficial
101
abertura comercial da China com sua entrada para a OMC. Seguindo o caminho de
Beijing, diversas cidades chinesas estão engajadas na prática da Paradiplomacia.
No artigo sobre a comunidade empresarial chinesa em Portugal, Bongardt e Neves
(2005, p. 67) concluem que os governos municipais chineses são um dos mais
ativos internacionalmente no que tange a promoção de interesses econômicos
específicos de suas regiões. Os autores relatam que em Portugal alguns
empresários chineses, envolvidos no processo de inserção internacional da cidade e
conseqüentemente subagentes da Paradiplomacia, foram nomeados embaixadores
econômicos informais. Nesse sentido, é visível o engajamento e a contribuição que
as cidades dão no processo de integração e consolidação da posição da China na
economia global.
Evidências e exemplos da Paradiplomacia estão espalhados pelo mundo.
Ainda que a tendência seja clara, os passos dados em direção a autonomia
municipal para atuação internacional estão somente começando a se solidificar. E, o
mais importante, começando a receber o devido valor e importância.
6.6. As Iniciativas no Brasil
O ativismo internacional das cidades brasileiras e a prática da
Paradiplomacia ainda são incipientes. Neste capítulo pretende-se abordar a situação
atual brasileira quanto à questão cidades x autonomia x cenário internacional,
observando casos mais avançados, como da cidade de São Paulo e outras
iniciativas relevantes. Conforme abordado anteriormente, o Brasil como uma
república federativa nasceu de um sistema imperial com base em exploratórias
relações de metrópole e colônia. Diferente da maioria dos países europeus e dos
Estados Unidos da América que no ato de sua constituição os estados já existiam,
no Brasil o processo ocorreu de uma unidade singular para uma descentralizada.
Muitos percalços, progressos e retrocessos ocorreram até que a democracia e a
descentralização se materializassem em 1937, por exemplo, por conta da
decretação do Estado Novo, as bandeiras estaduais foram queimadas publicamente,
em referência a centralização do poder naquele momento. Portanto, os passos ainda
tímidos em relação a uma nova forma de diplomacia que remete à autonomia
individual são compreensíveis.
102
A Constituição Federal de 1988 em seu Art. 21 decreta que compete a União
manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações
internacionais e no Art. 84 que somente o Presidente da República possui
legitimidade na representação externa do país. Contudo, diante da realidade e dos
fatos que levam a tendência de descentralização, o Brasil está concedendo mais
abertura às cidades. Isso significa que o governo central aceita que as unidades
subnacionais estabeleçam contatos e relacionamentos com outros atores
internacionais, porém dentro do esquema de não poder entrar em conflito com as
esferas superiores e nem tampouco agir fora de suas competências estabelecidas
constitucionalmente. A pesquisadora Carmen Nunes (2005, p. 40), que se
aprofundou na análise da Paradiplomacia exercida pelo estado do Rio Grande do
Sul, acredita que “a União tem tentado estabelecer formas de coordenação com os
entes federados, procurando evitar o surgimento do fenômeno das „múltiplas vozes‟
na política externa do país”.
A descentralização brasileira ainda segue a passos tímidos e isso se deve,
em grande parte, ao legado histórico com Portugal. Ao analisar as características
peculiares do Brasil, Castor (2004, p. 56) afirma que existe uma grande incoerência
entre a estrutura federalista teoricamente descentralizada e a centralização de
poderes na administração federal. Cabe destacar a seguinte passagem que explica
a tendência de centralização:
A incoerência entre o federalismo ostensivo de nossa configuração político-
institucional e a centralização do poder político e administrativo em mãos do
governo federal têm explicações convincentes. No passado, a centralização
teria contribuído para que o país mantivesse sua unidade territorial,
lingüística, cultural e política, em oposição ao que ocorreu na América
Espanhola, fragmentada em repúblicas fracas e lutas internas fratricidas. E
modernamente, na medida em que, concentrando o poder efetivo em mãos
da União, os estrategistas do desenvolvimento brasileiro dotaram o Estado
de poderes e recursos suficientes para levar à frente um projeto de
construção nacional, contrapondo-se aos interesses particularísticos dessa
ou daquela região do país. Ao mesmo tempo, a manutenção das liturgias
políticas típicas de uma federação deu aos estados e municípios uma falsa
sensação de importância que neutralizou os ônus políticos da centralização
do poder real.
Em 2005 surgiu uma esperança de que o Brasil reconhecesse
constitucionalmente da Paradiplomacia. Por meio da Proposta de Emenda
Constitucional (PEC 475/2005) o deputado André Costa sugeriu que fosse
concedida a permissão a estados, distrito federal e municípios para celebrar acordos
ou convênios com entres subnacionais estrangeiros, mediante a autorização prévia
103
da União. Porém, em janeiro deste ano o processo foi arquivado após o parecer de
„inadmissibilidade‟ em abril de 2006. Em sua recusa o relator afirma os seguintes
pontos:
a) Nada no texto constitucional que impeça estados, Distrito Federal e
municípios de celebrar atos internacionais (com pessoas sicas ou
jurídicas, públicas ou privadas, contratos, acordos ou convênios, etc...).
b) A liberdade de celebrar atos é decorrente da autonomia declarada no
artigo 18 da Constituição da República e explicitada em outros artigos,
como o 30. Sua liberdade é ampla e submissível a apenas dois limites:
em casos onde o legislador constituinte deliberou restringi-la (vide artigo
52, inciso V); e, o próprio conjunto de competências atribuídas aos entes
estatais pela Constituição da República. Assim, parcela componente da
autonomia estatal o pode ser diminuída ou extinta, sob pena de
avançar sobre a própria natureza jurídica dos entes estatais.
c) Portanto, a esses entes estatais é possível celebrar atos internacionais,
sim, mas, naturalmente, dentro da esfera da respectiva competência.
d) Para a prática de tais atos, os entes estatais não precisam de
“autorização” da União, como sugerido na proposta. Autorizar, neste
caso, é exercer poder sobre a vontade de outrem, e a Constituição da
República não abriga muitos casos do exercício desse poder (um deles é
a autorização do Senado para operações externas financeiras). Assim, a
sugestão de “autorização” viola a autonomia reconhecida aos entes
estatais.
Apesar de algumas resistências e limitações existentes nas esferas
superiores e dentro da própria administração interna, as cidades têm a liberdade de
investir na abertura de um órgão específico de relações internacionais - esse órgão
pode ser uma Secretaria, uma Unidade Especial ou uma Coordenadoria. Se
considerarmos que a formalização e ainda a institucionalização dos planos, projetos
e ações internacionais de uma cidade é um termômetro que mede seu grau de
ativismo internacional, então é possível verificar em que nível se encontra as capitais
dos estados brasileiros. Dentro dessa perspectiva, a seguir, a exposição da situação
de cada região será abordada com base nos dados disponíveis na página oficial de
cada prefeitura. É sabido e cabe mencionar que muitas prefeituras administram
104
assuntos internacionais por meio da Secretaria de Indústria e Comércio ou do órgão
que é mais próximo do assunto tratado, contudo, por razões de limitação
metodológica, nesta pesquisa a direção será buscar a existência de órgãos
municipais específicos de relações internacionais. Essa delimitação não visa
descartar a relevância ou os méritos de outros órgãos, mas parte de uma
perspectiva de especialização do tratamento das questões internacionais e
integração com outras secretarias.
6.6.1. Região Norte
As capitais pesquisadas foram Rio Branco, Porto Velho, Manaus, Boa Vista,
Macapá, Belém e Palmas. A prefeitura de nenhuma dessas cidades possui uma
unidade específica para a gestão das relações internacionais. Contudo, as ações
internacionais não são nulas na região. Em Porto Velho, uma das funções da
Coordenadoria Municipal da Juventude é a de buscar parcerias junto a órgãos
internacionais públicos e privados que auxiliem a implantação de políticas públicas
para a juventude. Outro caso é da cidade de Belém que neste ano recebeu prefeitos
de cidades francesas com as quais firmaram um convênio de cooperação sob a
gestão da Coordenadoria de Turismo e pelo próprio gabinete da prefeitura.
O ativismo internacional das cidades na região norte ainda não se tornou
uma tendência ainda que o potencial e a necessidade estejam presentes. Os
programas e as secretarias mais novas dessas prefeituras incluem gestões
estratégicas para o desenvolvimento local em todas as esferas. O estabelecimento
de uma unidade de relações internacionais abriria mais uma possibilidade de
aperfeiçoamento deste desenvolvimento.
6.6.2. Região Nordeste
A região nordeste se sai um pouco melhor quanto à institucionalização
municipal das relações internacionais. Das nove capitais pesquisadas, seis não
possuem unidades específicas para assuntos internacionais (Teresina, Fortaleza,
Natal, João Pessoa, Maceió e Aracaju), duas possuem unidades subsidiárias (São
Luís e Recife) e uma, Salvador, possui a Secretaria de Relações Internacionais sob
a sigla SECRI.
105
A cidade de Teresina, apesar de não possuir uma unidade específica,
articulou-se por meio do próprio gabinete da prefeitura e co-organizou o I Seminário
Internacional de Agricultura com a participação de diversas organizações, dentre
elas a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), a
Universitá Degli Studi di Padova e uma comissão de representantes da região
italiana de Veneto. A presença de representantes internacionais demonstra que a
potencialidade da cidade bem como possibilita identificar necessidades similares no
exterior. Por sua vez, a prefeitura municipal de João Pessoa possui um plano de
enviar representantes para atenderem feiras algumas cidades européias outra
evidência de que uma unidade específica teria seu espaço de atuação,
possibilitando a ampliação das oportunidades. A cidade de Fortaleza não apresenta
em seu corpo municipal uma unidade específica, mas cabe ressaltar que o estado
do Ceará é bastante ativo.
Em São Luís, a unidade responsável para atuar junto a organismos
internacionais é a Secretaria de Articulação Institucional. A unidade assessora o
processo de articulação política e institucional do município procurando promover a
cooperação cnica e o intercâmbio com órgãos e entidades blicas e privadas,
contudo não provisão sobre ações que envolvam outras cidades. a cidade de
Recife conta com um aparato mais aperfeiçoado com uma Coordenadoria de
Relações Internacionais subordinada a Secretaria de Gestão Estratégica e
Comunicação Social. A função central é a de coordenar processos de relações
internacionais, na busca de intercâmbios, convênios de irmandade, investimentos e
participação nas redes internacionais de cidades que ampliem o desenvolvimento
turístico, cultural, social e econômico da cidade. Ainda que uma unidade
subordinada, a coordenadoria de Recife possui diversas atribuições, sendo que as
principais abrangem os pontos chaves da Paradiplomacia. São eles: a) definir o
potencial de relações bilaterais e cidades prioritárias; b) inserir o município nas redes
mundiais e regionais e cidades de autoridades locais; c) estabelecer relações com
as representações diplomáticas e comerciais de outros países presentes em Recife,
ONGs internacionais, instituições multilaterais e outras entidades internacionais
relevantes para a cidade e desenhar as ações necessárias para executar esse
plano; d) elaborar as propostas de processo jurídico complementar (leis municipais,
decretos, portarias, etc.) para ajustar o papel e as atribuições da Coordenadoria de
Relações Internacionais no âmbito municipal bem como sua relação com as demais
106
Secretarias e empresas do Município; e) seguir passo a passo o processo de
operacionalização de uma cooperação internacional: identificar e analisar o potencial
das cidades que queiram realizar Acordos de Cooperação ou Irmandade com a
Cidade do Recife; f) encaminhar as solicitações de Cooperação com a Cidade do
Recife para a Secretaria e aguardar aprovação da mesma; g) formalizar e
operacionalizar o processo de irmandade, Acordos de cooperação e convênios entre
a Cidade do Recife e outras Cidades Internacionais. Suas cidades irmãs são Cidade
do Porto em Portugal, Nantes na França e Guangzhou na China.
Em um estágio mais avaado, dentre os mais avançado do Brasil, está a
cidade de Salvador. Por meio de sua Secretaria de Relações Internacionais a
SECRI a missão é a de mobilizar parceiros internacionais para viabilizar projetos da
administração municipal em prol do desenvolvimento da cidade de Salvador. A
estrutura da unidade demonstra a seriedade com que são tratados os assuntos
internacionais e as iniciativas de Paradiplomacia. Além do Secretário, a secretaria se
divide em departamentos: Chefe de Gabinete, Coordenação de Atração de
Investimentos Internacionais, Coordenação de Cooperação Bilateral, Coordenação
de Cooperação Multilateral, Coordenação de Cooperação Descentralizada e
Relações Públicas.
É interessante observar como essa secretaria é dividida em departamentos
que abrangem as tendências globais de atuação das cidades. Esse investimento
gerou diversos acordos de cooperação e um fluxo de intercâmbio constante com
cidades de outros países. Atualmente, Salvador conta com dez cidades-irmãs e mais
de cinqüenta cidades parceiras com as quais são mantidas estreito relacionamento.
A região nordeste tende a concentrar seus esforços na área social e do
turismo e mais uma vez verifica-se a oportunidade de ampliar a visibilidade e buscar
o desenvolvimento local através das relações internacionais. Assim como o exemplo
de Salvador, as outras capitais possuem grande potencial para a inserção
internacional tendo em vista tanto suas necessidades quanto o que podem ofertar
em troca.
6.6.3. Região Centro-Oeste
Assim como a região norte, as capitais do centro-oeste do Brasil não
possuem um órgão específico para gerir os assuntos internacionais em nível
107
municipal. As secretarias dispostas não possuem a atribuição específica de relações
internacionais. Além do distrito federal, as capitais Cuiabá, Goiânia e Campo Grande
apesar do significativo potencial cultural, ambiental, econômico e político estão
praticamente fora do sistema internacional, pelo menos por vias formais do
município.
6.6.4. Região Sudeste
Na região sudeste as capitais que se destacam na institucionalização das
relações internacionais são Belo Horizonte e São Paulo. A prefeitura de Belo
Horizonte além de possuir a Secretaria Adjunta de Relações Internacionais montou
em 1998 o „Grupo de Internacionalização de Belo Horizonte‟ com o objetivo de
montar uma agenda de cooperação internacional. O grupo conta com a participação
de universidades, associações, consulados, agências de turismo, fundações e
outros órgãos governamentais. A Paradiplomacia exercida por Belo Horizonte desde
o final dos anos 1990 rendeu vários acordos, dentre eles cabe destacar:
a) Ottawa, Canadá: acordo para compartilhar experiências de planejamento
urbano, administração pública e desenvolvimento econômico.
b) Bolonha, Itália: acordo com objetivos de promoção do turismo,
cooperativismo e o desenvolvimento econômico.
c) Florença, Itália: cooperação econômica e cultural e busca conjunta de
novas oportunidades.
d) Cottbus, Alemanha: parceria voltada para a ação comum em defesa do
meio ambiente e do esporte.
e) Lisboa, Portugal: intercâmbio de experiências no domínio da preservação
e valorização ambiental e da qualidade de vida dos habitantes de ambas
as cidades.
Além desses acordos, Belo Horizonte, por meio da atuação dessas unidades
específicas de assuntos internacionais, tem conseguido manter um significativo
número e diversificação de convênios de irmamento. Atualmente, são mais de vinte
e cinco cidades-irmãs de diferentes continentes, dentre elas: Havana em Cuba,
Belém na Palestina, São Paulo de Loanda na Angola, Zahle no Líbano, Masaya na
Nicarágua, Tegucigalpa em Honduras, Homs na Síria, Trípoli na Líbia, Cuenca no
Equador, Milão na Itália, Daegu na Coréia do Sul, Nanjing na China, Boston nos
108
Estados Unidos e Toronto no Canadá. A participação efetiva nas principais redes
internacionais de cidades tamm é resultado da decisão pela forte atuação
internacional por meio das unidades municipais.
A cidade de São Paulo também é um exemplo de destaque no quesito
Paradiplomacia no Brasil. Contando, atualmente com doze convênios irmamento na
com cidades na Europa, dez na Ásia, duas na África e quatorze nas Américas, São
Paulo investe no ativismo internacional. A Secretaria Municipal de Relações
Internacionais criada no ano de 2001 tem como objetivos principais: a) assessorar o
Prefeito em contatos internacionais com governos e entidades públicas ou privadas;
b) estabelecer e manter relações e parcerias com organismos multilaterais,
organizações não governamentais internacionais, fundações, representantes
diplomáticos, empresas internacionais, cidades-irmãs de São Paulo, e outras
entidades afins; e, c) fornecer suporte técnico aos órgãos da Administração Direta e
Indireta de São Paulo em contatos internacionais, bem como no desenvolvimento e
elaboração de convênios e projetos de cooperação internacional.
O estudo de Fronzaglia (2005, p. 181) sobre a atuação de São Paulo traz
uma entrevista realizada em 2003 com o Coordenador da SMRI na qual ele explica
porque a institucionalizar as relações internacionais. De acordo com ele, uma
Secretaria abrange trabalhos de coordenação, implementação, execução e
articulação, e participa efetivamente da formulação de políticas blicas ao mesmo
tempo em que busca parcerias internacionais, enquanto uma Coordenadoria ou
Assessoria possuem um papel mais limitado. Ressaltou tamm a importância da
atuação conjunta com outras Secretarias e como isso ampliou as oportunidades para
a cidade.
Por outro lado, as capitais Rio de Janeiro e Vitória não possuem unidades
específicas. O Rio de Janeiro articula-se internacionalmente por meio de outras
secretarias como a do Turismo e do Esporte. Muito embora a cidade tenha grande
visibilidade turística e cultural, o ativismo internacional certamente contribuiria para a
maximização dos potenciais da cidade, trazendo relações mais promissoras.
6.6.5. Região Sul
A região sul conta com um ator de peso na Paradiplomacia. Dentre as três
capitais: Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre, a capital gaúcha é a que mais se
109
destaca pelo ativismo e experiência. Porto Alegre administra as relações
internacionais através de um órgão chamado CAPTARE, que é a sigla para o
Gabinete de Captação de Recursos e Investimentos. Na verdade, dentro do
CAPTARE existe uma unidade técnica de Relações Internacionais que é
responsável por dar suporte às ações internacionais do Gabinete do Prefeito, assim
como, de outros órgãos da Prefeitura. O objetivo principal é servir de ponte entre os
interesses das diversas secretarias da administração municipal na busca de
cooperação técnica ou divulgação do trabalho realizado para fora do país.
Seguindo o ativismo do governo estadual por meio da SEAI Secretaria
Especial para Assuntos Internacionais, Porto Alegre tornou-se uma referência em
termos de descentralização democrática municipal e conseqüentemente da
Paradiplomacia. Neste ano organizou junto com a prefeitura de Roma e sediou a
Conferência Mundial para o Desenvolvimento das Cidades com foco nos picos de
inovação democrática e transformação social para cidades inclusivas do século 21.
O evento contou com representantes locais de mais de trinta países que discutiram
inúmeros aspectos do desenvolvimento das cidades e apresentaram experiências no
âmbito da democracia e da inclusão social. A Conferência teve repercussão global e
reforçou a posição de Porto Alegre “no mapa das grandes discussões e
mobilizações internacionais em torno dos rumos da globalização”, conforme aponta
a página oficial do evento.
Porto Alegre participa ainda de diversas redes de cidades internacionais,
coordena a temática 9 da Urb-AL que se aprofunda sobre Financiamento Local e
Orçamento Participativo e atualmente possui mais de dez cidades irmãs.
A outra capital pesquisada foi Curitiba, uma cidade que conseguiu grande
visibilidade internacional através do marketing de programas, políticas públicas e
infra-estrutura. Além disso, recebeu diversos prêmios internacionais nas áreas de
planejamento urbano, qualidade de vida e meio ambiente. Contudo, o ativismo
internacional está nos primeiros passos com a abertura da Secretaria Extraordinária
de Relações Internacionais e Cerimonial no ano de 2005. A unidade foi constituída
às speras da Conferência da ONU para o Meio Ambiente, sediada pela capital
paranaense, e talvez por isso carregue ao lado dos assuntos internacionais questão
cerimonial. Em seu objetivo consta a “construção de uma política de relações
internacionais para Curitiba, atuando com as demais Secretarias, detectando
110
oportunidades de desenvolvimento e cooperação, em benefício da população
curitibana e da solidariedade entre os povos”.
De acordo com dados da prefeitura, a cidade recebe duas missões
estrangeiras por semana, mas isso e todas as outras características com potencial
são administradas com maior receptividade do que com pró-atividade. O city-
marketing resultou em um posicionamento de prestígio, porém a manutenção e o
aperfeiçoamento desse status necessita a institucionalização das relações
internacionais. Atualmente, a Curitiba conta com aproximadamente 14 convênios de
irmamento.
Por sua vez, Florianópolis possui uma Assessoria Especial para Assuntos
Internacionais, porém suas atividades não são divulgadas assim como seu objetivo.
Nota-se, porém que no estado catarinense o ativismo internacional fica mais por
conta de outras cidades, como Joinville.
111
CONCLUSÃO
O desenvolvimento dessa dissertação partiu de três hipóteses, a primeira
era de que o desenvolvimento local endógeno é mais efetivo porque identifica as
reais necessidades e potencialidades; a segunda era de que o ativismo internacional
das cidades é uma tendência no canário global; e a terceira de que a inserção
internacional e a Paradiplomacia contribuem para a promoção do desenvolvimento
local. Essas hipóteses foram implícita e explicitamente discutidas ao longo da
pesquisa procurando convergi-las com aspectos que em uma primeira vista
pareciam antagônicos, como a descentralização e a integração.
Como pano de fundo para as discussões das hipóteses argumentações
teóricas e empíricas foram apresentadas. Foi discorrido sobre o campo de estudo
das relações internacionais enfatizando sua característica de multi e interdisciplinar e
da co-relação entre as disciplinas verificou-se que o objetivo é a busca da
transdisciplinaridade, que significa a criação de um campo único de análise. Foi
possível constatar tamm que a complexidade no campo das relações
internacionais é alta devido à interação das disciplinas e variedades de atores.
Assim a análise de um fenômeno de maneira unidimensional é inviável, sendo
necessário considerar as influências diretas e indiretas que estão envolvidas em
uma relação complexa. A pesquisa se desenvolveu dentro dessa premissa da
complexidade, considerando a existência de múltiplos atores e levando em
consideração aspectos sociais, econômicos, ambientais, políticos e culturais.
Ainda como parte da fundamentação observou-se que tanto as teorias
clássicas quanto as contemporâneas não prevêem a atuação do local no global. Por
outro lado, foi possível constatar que a teoria que mais se aproxima do fenômeno da
inserção internacional das cidades e da Paradiplomacia é defendida por Keohane.
Em sua explicação acerca da interdependência complexa‟ o ponto principal recai
sobre a cooperação mútua. Dentro dessa teoria os Estados têm sobrevivido somente
por conta do surgimento de uma agenda internacional comum ao interesse de todos
e com mecanismos que possibilitam a atuação internacional conjunta. Sendo assim,
é possível manter o diálogo e a cooperação entre todas as unidades políticas.
Todavia, reconhece-se que a cada teoria, do idealismo clássico ao pós-modernismo,
dentro de sua perspectiva analítica das relões internacionais, traz uma
112
contribuição diferente para construir o entendimento sobre a atuação internacional
das cidades.
O breve resgate histórico objetivou descrever o desenvolvimento das
cidades e dos Estados nacionais, servindo como um referencial para as questões de
autonomia e descentralização. Ao discorrer sobre as Cidades-Estados foi possível
visualizar um quadro descentralizado que, resguardado as devidas diferenças de
atuação, remete aos objetivos de autonomia e potencialidade tanto das cidades
globais quanto das que iniciam a inserção internacional. Por outro lado, tamm
resgatou-se um período de alta concentração do poder, dentro da explicação sobre
a unificação e surgimento dos Estados Nacionais. O estudo de alguns casos de
formação dos Estados Nacionais possibilitou compreender na seqüência da
pesquisa porque alguns governos centrais são mais permissivos e avançados
quanto à inserção internacional das cidades enquanto outros ainda possuem
limitações quanto à prática da Paradiplomacia. A própria descrição do processo
brasileiro embasou a discussão adiante sobre sua postura ainda um tanto quanto
indefinida sobre a atuação internacional das cidades.
Como o Estado-Nação está atualmente organizado e a polêmica em torno
da soberania versus a globalização foram abordadas na seqüência, posicionando a
pesquisa dentro dos fatos atuais. A análise descritiva do sistema federal de governo
possibilitou a compreensão dos pontos ligados a descentralização e autonomia dos
entes federados enquanto debate em torno do conceito da soberania clássica
possibilitou compreender que esse novo movimento que une o local ao global não
deve ser visto como uma ameaça, mas uma tendência rumo à sobrevivência. A
pesquisa nessa seção tamm se direcionou a averiguar o quadro de reorganização
das responsabilidades e posicionamento dos Estados. Identificou-se que essa
reorganização aconteceu como conseqüência dos novos desafios apresentados pelo
advento da globalização, pelos processos de integração e pela liberalização
comercial. Com novos desafios a serem enfrentados pelo governo central ao mesmo
tempo em que ocorre uma vasta diversificação nos temas principais da agenda
mundial, o Estado nacional precisou afrouxar seu controle interno e permitir que as
unidades subnacionais desfrutem de sua autonomia. Sendo assim, a atuação
internacional das cidades em busca da promoção do desenvolvimento praticamente
se valida e novas formas de atuação são criadas. As cidades por meio
principalmente das instituições gestoras passam a compreender as vantagens de
113
investir nesse sentido e finalmente de que o local não é a antítese do global, pois as
influências são mútuas. O papel do governo foi reconhecido neste fenômeno como o
de indutor, sugerindo uma perspectiva mais mediana dentro dos extremos do
neoliberalismo e do assistencialismo intervencionista do Welfare State.
O aprofundamento na questão do Transnacionalismo mostrou que existem
formas distintas de transposição das fronteiras nacionais assim como motivações.
Os movimentos das cidades para além das fronteiras nacionais ficam inseridos
nessa corrente, assim como a prática da Paradiplomacia. Verificou-se que o
Transnacionalismo conecta governos locais de diferentes países para que a partir
desse primeiro contato desenvolvam uma atividade específica. Essas atividades
podem ter diversos objetivos, podendo ser culturais, econômicos, políticas, sociais
ou como regularmente vem acontecendo com objetivos de intercâmbio para troca de
experiências quanto ao meio ambiente e infra-estrutura. As cidades globais foram
um dos exemplos relacionados a esse fenômeno e tamm aos primeiros passos do
reconhecimento das cidades em âmbito mundial.
Diante do objetivo de compreender se a inserção internacional das cidades
poderia ser considerada uma ferramenta para a promoção do desenvolvimento local,
uma seção inteira foi considerada para o entendimento do conceito de
desenvolvimento local. Com base no levantamento bibliográfico compreendeu-se
que a sociedade (governo, empresas e pessoas) que compõe um território e está
envolvida com as atividades que mantém esse espaço „funcionando‟ é quem melor
sabe de suas potencialidades e necessidades. Constatou-se ainda que apesar da
necessidade do envolvimento de todos os setores da sociedade no que tange a
internacionalização, a iniciativa principal no caso da Paradiplomacia parte da gestão
municipal. A prefeitura por meio de políticas públicas que busquem visibilidade,
apoio e convênios de cooperação com cidades de outros países induz a inserção
internacional. O city-marketing foi identificado como uma aposta que tem atraído
diversas oportunidades de intercâmbio internacional.
Por sua vez, a descrição dos conceitos, sujeitos, peculiaridades, vantagens
e limitações da Paradiplomacia teve como objetivo reunir o que as principais
referências sobre o assunto ao ponto que fosse possível identificar a relação com o
desenvolvimento local. A terceira hipótese é diretamente tratada nessa seção
procurando estabelecer a partir da base conceitual a Paradiplomacia como
ferramenta para o desenvolvimento local das cidades. As evidências principais
114
sugeridas para tal foram os objetivos das redes internacionais de cidades e os
convênios de irmamento que funcionam como canais para a inserção internacional
com vistas à promoção do desenvolvimento local. Procurou-se verificar como
funcionam as redes de cidades em suas diferentes abrangências assim como suas
atividades. Essa seção propiciou compreender que esses mecanismos funcionam
como facilitadores para a internacionalização das cidades, bem como a prática da
Paradiplomacia.
Para concluir a pesquisa alguns exemplos foram permeados dentro de uma
discussão sobre autonomia municipal e posicionamento dos governos nacionais. As
situões apresentadas procuraram mostrar tanto casos em que a atuação
internacional das cidades se manteve paralela ou cooperativa aos desígnios das
esferas superiores quanto os que se opõem. A descrição mais detalhada sobre as
capitais brasileiras teve como objetivo compreender a pró-atividade das prefeituras
quanto à inserção internacional e a Paradiplomacia. Partindo da investigação da
existência de secretarias e órgãos específicos para a gestão da atividade
internacional foi possível constatar que essa prática ainda é incipiente no Brasil,
assim como o reconhecimento dessa atuação de maneira formal e oficial ainda não
aconteceu.
O desenvolvimento dessa dissertação teve diversas motivações que
partiram da identificação com o estudo das relações internacionais até a curiosidade
em torno do chamado desenvolvimento „desde baixo‟. Dentro dessa combinação de
local e global, a pesquisa se aprofundou em apresentar o quadro de uma realidade
muito embrionária, porém cada vez mais presente em diversos continentes. Foi
tamm desenvolvida com o intuito de contribuir para a literatura científica sobre o
ativismo internacional das cidades e a Paradiplomacia, analisando esses fenômenos
dentro de uma perspectiva local, porém posicionando-os globalmente.
Ao final deste trabalho, deve-se ressaltar que ainda um longo caminho a
ser percorrido até que evidências empíricas surjam e consolidem essas práticas que
claramente estão virando uma tendência tanto para a realidade local quanto para a
global.
115
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALDECOA, Francisco & KEATING, Michael (Eds). Paradiplomacy in Action. The Foreign Relations of
Subnational Governments. London: Frank Cass Publishers, 1999.
ALMONACID, Carlos. P. La Paradiplomacia de las Regiones en Tiempos de Globalización. 20 de outubro de
2004. Disponível em
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