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UNIVERSIDADE FEDERAL DE O CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA
COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ DE CAMPOS POLINOMIAIS
Francisco Braun
O CARLOS
2007
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE O CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA
COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ DE CAMPOS POLINOMIAIS
Francisco Braun
Dissertação apresentada ao Pro-
grama de Pós-Graduação em Mate-
mática da Universidade Federal de
São Carlos, como parte dos requi-
sitos para a obtenção do Título de
Mestre em Matemática.
Orientador: Prof. Dr. José Ruidi-
val Soares dos Santos Filho.
O CARLOS
2007
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Para meus pais Inácio e Elice
U m p o u c o d e g e o m e t r i a :
A curva é o caminho mais agra-
vel entre dois pontos.”
(Mário Quintana)
Agradecimentos
Agradeço a Deus;
ao Inácio e à Elice meus pais —, p or terem sempre me incentivado e auxiliado
na minha formação;
ao Professor Ruidival meu orientador —, por ter me guiado até aqui e por ter
aceito me conduzir também na próxima etapa: o Doutorado;
a todos os professores que tive até agora (desde o primário);
à Camila;
aos demais amigos (em especial ao “Achoôm” meu colega de república —) e
familiares que me deram força;
e à Capes pelo apoio financeiro.
Resumo
Neste trabalho, apresentamos a Compactificação de Poincaré de campos vetoriais
polinomiais e provamos uma série de propriedades dela, principalmente para campos
vetoriais hamiltonianos.
Palavras-chave: Análise Matemática. Campos vetoriais. Campos polinomiais.
Abstract
In this work, we present the Poincaré Compactification of polinomial vector fields
and prove some properties of it, mainly to hamiltonian vector fields.
Keywords: Mathematical Analysis. Vector fields. Polinomial fields.
Sumário
0 Introdução 8
1 Preliminares 11
1.1 Variedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1.1 Primeiras definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1.2 O Teorema de Sard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.1.3 Variedades com fronteira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.1.4 Homotopia e Isotopia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
1.1.5 Variedades orienveis e o grau de uma transformação . . . . 24
1.1.6 O Teorema da “Esfera Cabeluda” . . . . . . . . . . . . . . . 28
1.2 Compactificações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2 A técnica da Compactificação de Poincaré 33
2.1 A Compactificação de Poincaré de um campo vetorial polinomial . . 33
2.2 Particularização para um campo vetorial polinomial hamiltoniano . 40
2.3 O fluxo no infinito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
2.4 Propriedades genéricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
3 Considerações finais e exemplos 54
3.1 Observações sobre a compactificação de Poincaré . . . . . . . . . . 54
3.2 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
3.2.1 O caso planar no infinito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
3.2.2 O caso monomial no infinito . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
3.2.3 Mais alguns exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Referências Bibliográficas 63
Capítulo 0
Introdução
A Compactificação de Poincaré de campos vetoriais polinomiais, segundo o artigo
“Poincaré compactification of Hamiltonian polynomial vector fields” de J. Delgado,
E. A. Lacomba, J. Llibre e E. Pérez([2]), surge pela primeira vez no trabalho [1], em
que ela é usada para dar uma classificação completa do comportamento no infinito
de campos polinomiais de grau três do plano cujas órbitas são limitadas. Devido
ao grande auxílio que essa técnica prestou neste e também em trabalhos posteriores
(como [3] e [4] da área de Mecânica celeste, onde os campos hamiltonianos têm um
grande papel), aparece então o citado artigo [2] para estudar mais especificamente
a Compactificação de Poincaré, extraindo propriedades dela, principalmente quando
aplicada a campos polinomiais hamiltonianos. É este artigo que seguiremos na maior
parte do trabalho.
Nosso intuito em estudar esta técnica é, principalmente, caracterizar pro-
priedades de campos de vetores de R
n
através da sua Compactificação de Poincaré
e, assim, procurar descrever formas normais globais que satisfazem uma dada pro-
priedade. Em especial, pretendemos observar quando campos polinomiais tais como
aqueles descritos em [9] são globalmente resolúveis. Tais campos aparecem quando
procuramos garantir injetividade global de aplicações.
Existem muitas fomas de acrescentando elementos “compactificar”
R
n
, fazendo com que ele se torne um espaço top ológico compacto. Talvez a forma
mais conhecida é, através da Projeção Estereográfica, identificar R
n
com S
n
menos o
pólo norte e depois unir um elemento a R
n
de tal forma que R
n
{} seja home-
omorfo a S
n
, sendo, portanto, um espaço compacto. Seguindo as idéias de Poincaré,
que trabalhou desta forma em R
2
, tomaremos uma compactificação de R
n
que é
homeomorfa ao hemisfério norte (hemisfério sul) unido com o equador da esfera S
n
,
sendo que este corresponde ao infinito de R
n
. Tal compactificação é naturalmente
obtida através da seguinte construção, a projeção central: Identificando R
n
com o
plano π, tangente ao pólo norte N de S
n
, formemos retas r passando pela origem
de R
n+1
. Cada reta r corta S
n
em dois pontos, e tais retas, quando não estiverem
contidas no plano y
n+1
= 0, cortam π em um ponto. Basta, então, identificarmos
o ponto de π com o ponto de S
n
que estiver no hemisfério norte e também com o
ponto que estiver no hemisfério sul (chamemos os respectivos difeomorfismos de Φ
+
8
CAPÍTULO 0. INTRODUÇÃO 9
e de Φ
). Observando a figura 0.0.1, fica natural de perceber o porquê do infinito
de R
n
corresponder ao equador de S
n
. Cada hemisfério unido com o equador S
n1
r
π
Φ
(x)
N
x
+
(x)
Φ
Figura 0.0.1: Projeção central.
de S
n
é homeomorfo a uma compactificação de R
n
. Agora, dado um campo polino-
mial X : R
n
R
n
, quando o levamos por Φ
+
(Φ
) para ser definido no hemisfério
norte (sul), ele não tem extensão contínua para o equador. O que fazemos então é
multiplicar o campo por uma função especial, obtendo assim um campo analítico
X não somente em cada hemisfério unido com o equador, mas em toda a esfera S
n
.
Dizemos que o campo
X é a Compactificação de Poincaré de X .
Veremos propriedades gerais do campo
X , como por exemplo: “Se X não
se anula em R
n
, então
X se anula em algum ponto do equador de S
n
(Proposi-
ção 2.1.3). Também daremos as expressões de
X em coordenadas lo cais. Depois,
restringindo-nos a campos polinomiais hamiltonianos, provaremos que se H : R
2d
R for a função que define o campo hamiltoniano X
H
, os níveis de energia {H = h}
se extendem a um mesmo conjunto invariante (pela Compactificação de Poincaré
X ) do equador. Mais ainda, mostraremos que, genericamente, na topologia fraca,
esse tal conjunto invariante é uma variedade de dimensão n 2 e, também generi-
camente, que todos os pontos singulares da Compactificação de Poincaré de X
H
são
hiperbólicos. Isso tudo é feito no Capítulo 2.
No Capítulo 3, daremos uma condição para que um campo polinomial defi-
nido no hemisfério norte da esfera S
n
seja múltiplo da Compactificação de Poincaré
de um campo polinomial em R
n
. Analizaremos como os campos polinomiais em S
n
podem, sob certas hipóteses, ser transformados em campos homogêneos, e daremos
uma série de exemplos da teoria desenvolvida.
No intuito de tornar o trabalho o mais auto-suficiente possível, apresenta-
mos uma grande quantidade de preliminares no Capítulo 1. A Secção 1.1 uma
introdução ao estudo das variedades sob o enfoque de [7], isto é, variedades mer-
gulhadas em R
n
. Nesta mesma secção, o conceito de grau de função é introduzido,
CAPÍTULO 0. INTRODUÇÃO 10
bem como toda a teoria necessária para fundamentá-lo (variedades com fronteira,
variedades orientáveis, homotopia e isotopia de aplicações entre variedades). Essa
teoria é essencial para uma demonstração rápida do Teorema da “Esfera Cabeluda”,
que será utilizado para a demonstração da Proposição 2.1.3. A Secção 1.2 introduz
os conceitos de compactificação de um espaço topológico: são apresentados alguns
resultados e alguns exemplos, culminando com a Compactificação de Stone-Čech.
Capítulo 1
Preliminares
1.1 Variedades
Procuramos nesta secção fazer um estudo auto suficiente da teoria de variedades
(pensadas aqui como mergulhadas em R
n
). Veremos as definições básicas, o conceito
de Valor Regular e o Teorema de Sard. Depois veremos Variedades com fronteira
e os conceitos de Homotopia e Isotopia. Por fim, veremos Variedades orientáveis
e definiremos o Grau de uma transformação, que, depois da definição de Campo
Vetorial, nos auxiliará na demonstração do Teorema da “Esfera Cabeluda”.
1.1.1 Primeiras definições
Daremos as definições básicas para o estudo de variedades.
Definição 1.1.1 Dizemos que uma função contínua f : U R
l
, com U R
k
aberto, é suave se
α
f existe e é contínua α N
k
tal que |α| = n, para todo
n N.
Mais geralmente, dizemos que f : X R
l
, com X R
k
um subconjunto qualquer, é
suave se existem U R
k
aberto e F : U R
l
suave, tais que F |
UX
= f |
UX
.
Observação: Se intX = , então
α
F é unicamente determinada em ∂X, α N
k
tal que |α| = n, para todo n N.
Definição 1.1.2 Dizemos que uma função f : X Y, com X R
k
e Y R
l
, é um
difeomorfismo se f é um homeomorfismo e f e f
1
são suaves.
Neste caso, dizemos que X e Y são difeomorfos.
Definição 1.1.3 (Variedade) Dizemos que M R
k
é uma variedade de dimen-
são m (ou uma m-variedade) se, para todo x M, existem uma vizinhança V
x
M
de x e um aberto U R
m
que são difeomorfos.
Se g : V
x
U é um difeomorfismo, dizemos que g é uma parametrização da vizi-
nhança V
x
e que o par (V
x
,g) é uma carta local de M.
11
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 12
Observação: M é uma variedade de dimensão zero se cada x M tem uma
vizinhança que consiste de x somente. Neste caso, tais vizinhanças são difeomorfas
a R
0
.
Exemplos:
1. A esfera S
2
=
(x, y, z) R
3
| x
2
+ y
2
+ z
2
= 1
é uma variedade de dimensão
2. De fato,
f (x, y) =
x, y,
1 x
2
y
2
mapeia o disco x
2
+ y
2
< 1 na calota superior z > 0 de S
2
. Notemos que f é
suave (pois 1 x
2
y
2
> 0). Além disso,
f
1
(x, y, z) = (x, y)
é suave (pois é a restrição da projeção no plano). Agora, colocando na terceira
coordenada
1 x
2
y
2
, mapeamos a calota inferior. Depois, basta trocar
os papéis de x, y e z, e obteremos 6 funções que “cobrirão” toda a esfera no
sentido da definição.
2. Mais geralmente, a esfera S
n1
R
n
é uma variedade de dimensão n 1.
Podemos mostrar isso generalizando a demonstração feita no exemplo anterior.
3. O conjunto
(x, y) R
2
| x = 0 e y = sen
1
x
é uma 1-variedade. Isto será
um caso particular do próximo exemplo.
4. Se A R
n
é aberto e f : A R
m
é suave, então
G
f
= {(x, y) R
n
× R
m
| x A e y = f (x)}
é uma n-variedade. De fato, F : A G
f
, definida por F (x) = (x, f (x)) é
suave (pois suas funções coordenadas são suaves). Além disso, F
1
(x, y) = x
é suave por ser a restrição a G
f
da função projeção π : R
n
×R
m
R
n
, que é
suave. Tal F faz com que G
f
e A sejam difeomorfos, provando que G
f
é uma
n-variedade.
5. Qualquer aberto A R
n
é uma n-variedade.
Vamos passar a definir espaços tangentes e derivadas de funções entre vari-
edades. Assumiremos os conhecimentos elementares de Cálculo Avançado.
Seja M R
k
uma variedade de dimensão m. Dado x M, a Definição
1.1.3 garante que existem V
x
vizinhança de x e U R
m
aberto que são difeomorfos.
Seja g : U V
x
um tal difeomorfismo (o inverso de uma parametrização de V
x
).
Como g é suave, podemos calcular sua derivada no ponto u = g
1
(x) U:
dg
u
(h) = lim
t0
g(x + th) g(x)
t
, h R
m
,
e teremos a
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 13
Definição 1.1.4 Definimos o espaço tangente de M no ponto x, denotado por TM
x
,
por
TM
x
.
= dg
u
(R
m
) .
Observação: TM
x
está bem definido e é um espaço vetorial m-dimensional. De
fato, devemos ver que a definição não depende da vizinhança V
x
e nem do difeomor-
fismo g. Se h : U
V
x
é outra parametrização (na verdade, o inverso de uma para-
metrização) de uma vizinhança V
x
de x, e v = h
1
(x), tomando A = g(U) h(U
),
L
1
= g
1
(A) e L
2
= h
1
(A), temos que g = g|
L
1
e h = h|
L
2
são inversas de parame-
trizações de A. Logo, h
1
g : L
1
L
2
é um difeomorfismo entre abertos de R
m
, e,
portanto, d(h
1
g)
u
é um isomorfismo em R
m
. Então, pela regra da cadeia,
dg
u
(R
m
) = d
h (h
1
g)
u
(R
m
) = dh
v
d(h
1
g)
u
(R
m
) = dh
v
(R
m
),
o que mostra que TM
x
está bem definido. Além disso, desde que g
1
: V
x
U é
suave, temos da Definição 1.1.1 que existe W, aberto de R
k
, contendo x, e F : W
R
m
suave, que coincide com g
1
em V
x
W. Sendo U
0
= g
1
(
W V
x
)
R
m
,
temos o seguinte diagrama comutativo:
W
F
''
N
N
N
N
N
N
N
N
N
N
N
N
N
U
0
g
OO
inclusao
//
R
m
,
e, tomando derivadas, ficamos com:
R
k
dF
x
''
O
O
O
O
O
O
O
O
O
O
O
O
O
R
m
identidade
//
dg
u
OO
R
m
,
o que mostra que dg
u
é injetora. Logo, dim
(
dg
u
(R
m
)) = m, o que encerra a
demonstração da observação.
Definiremos agora a derivada de funções entre variedades. Sejam M R
k
e N R
l
duas variedades de dimensões m e n, respectivamente, e f : M N uma
função suave. Sabemos então, da Definição 1.1.1, que existem W R
k
aberto e
F : W R
l
suave, tais que F |
MW
= f |
MW
. Se x M, seja y = f (x).
Definição 1.1.5 Definimos a derivada de f no ponto x M, df
x
: TM
x
TN
y
,
por
df
x
(v)
.
= dF
x
(v), v TM
x
.
Observação: df
x
está bem definida, isto é, não depende do aberto W e nem de
F , além disso, dF
x
(TM
x
) TN
y
. De fato, escolhendo funções g : U M e
h : V N como as inversas de parametrizações de vizinhanças g(U) e h(V) de x e
y, respectivamente, com u = g
1
(x) e v = h
1
(y), podemos assumir que g(U) W
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 14
e f (g(U)) h(V). Daí, teremos os seguintes diagramas, em que o segundo é obtido
tomando derivadas no primeiro:
W
F
//
R
l
U
g
OO
h
1
f g
//
V
h
OO
R
k
dF
x
//
R
l
R
m
d(h
1
f g)
u
//
dg
u
OO
R
n
dh
v
OO
.
Deles, notamos que
dF
x
(TM
x
) = dF
x
dg
u
(R
m
) dh
v
(R
n
) = TN
y
,
além disso, como dg
u
: R
m
TM
x
é invertível (como visto na observação anterior),
e, por definição, df
x
dg
u
= dh
v
d(h
1
f g)
u
, segue a independência na definição
de df
x
.
1.1.2 O Teorema de Sard
Aqui, daremos as definições de pontos e valores regulares de funções entre variedades.
Apresentaremos também o Teorema de Sard e um seu corolário. Por fim, com a
Proposição 1.1.5, aprenderemos a construir variedades como imagens inversas de
valores regulares.
Definição 1.1.6 Seja f : M N uma função suave entre variedades M e N de
mesma dimensão, n. Dizemos que x M é um p onto regular de f se a derivada
df
x
é não singular.
Observação: Se x M é um ponto regular, então f leva uma vizinhança de x em
M difeomorficamente em um aberto de N. De fato, como f é suave e M e N são
n-variedades, existem abertos W R
k
e W
R
l
, vizinhanças de x e de y = f (x),
respectivamente, bem como abertos U,V R
n
, tais que o seguinte diagrama é
comutativo (com tais abertos sutilmente modificados)
W
F
//
W
U
g
OO
h
1
f g
//
V
h
OO
,
onde F é uma função dada na Definição 1.1.1 e g e h são dadas na Definição
1.1.3. Pela regra da cadeia, tal diagrama é “transformado” no seguinte diagrama
comutativo
R
k
dF
x
//
R
l
R
n
dg
u
OO
d(h
1
f g)
u
//
R
m
dh
v
OO
,
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 15
onde u = g
1
(x) e v = h
1
(y). Desde que df
x
= dF
x
(
dg
u
(R
m
))
, segue que df
x
=
dh
v
d
h
1
f g
u
(dg
u
)
1
. Daí, segue que d
h
1
f g
u
é isomorfismo (pois
df
x
, dh
v
e (dg
u
)
1
o são). Logo, pelo teorema da função inversa, l : U R
m
,
definida por l = h
1
f g, é um difeomorfismo entre abertos U
e V
, vizinhanças
de u e v, respectivamente. Seguindo daí que f = h l g
1
é um difeomorfismo
entre os abertos g (U
) e h (V
).
Definição 1.1.7 Dizemos que y N é um valor regular de f se f
1
{y} contém
somente pontos regulares.
Se df
x
é singular, dizemos que x é um ponto crítico de f e y = f (x) é um valor
crítico de f
Proposição 1.1.1 Se M é compacto e y N é um valor regular, então f
1
{y} é
um conjunto finito (podendo ser vazio).
Demonstração: f
1
{y} é compacto, pois é um fechado dentro do compacto M.
Além disso, f
1
{y} é discreto, pois, como vimos na observação anterior, f é injetora
numa vizinhança de x.
Daí, sabendo que um conjunto compacto e discreto é finito, segue o resultado.
Proposição 1.1.2 Com as mesmas hipóteses da Proposição 1.1.1, a função
#f
1
{y} = “cardinalidade de f
1
{y}, definida somente em valores regulares de f , é
localmente constante.
Demonstração: Se y N é dado, seja {x
1
,x
2
, . . . ,x
s
} = f
1
{y}. Tomemos vizinhan-
ças U
1
,U
2
, . . . ,U
s
de x
1
,x
2
, . . . ,x
s
, respectivamente, de tal forma que sejam disjuntas
e sejam mapeadas difeomorficamente em V
1
,V
2
, . . . ,V
s
, vizinhanças de y, em N. De-
finamos V = (V
1
V
2
··· V
s
)
\f
(
M\(U
1
··· U
s
)), que é um aberto (uma vez
que M\(U
1
··· U
s
) é um compacto). Se y
V, então em cada U
i
existe um
único x
i
, tal que f (x
i
) = y
, i = 1,2, . . . ,s, seguindo que #f
1
{y} = #f
1
{y
}.
Consideremos agora uma função suave f : M N, em que M é uma
m-variedade e N é uma n-variedade.
Definição 1.1.8 Dizemos que
C =
x M | df
x
: TM
x
TN
f (x)
tem posto menor que n
é o conjunto dos pontos críticos de f .
Além disso, dizemos que f (C) é o conjunto dos valores críticos de f e N\f (C) é o
conjunto dos valores regulares de f .
Notemos que se m = n, essa definição coincide com a que demos anteriormente.
No caso particular de M = U, um aberto de R
m
, e N = R
p
, temos o
seguinte resultado:
Teorema 1.1.3 (Teorema de Sard) Seja f : U R
n
R
p
, com U aberto e
f suave. Se C é o conjunto dos pontos críticos de f , então f (C) tem medida de
Lebesgue nula.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 16
Demonstração: A demonstração será por indução em n (notemos que o resultado
faz sentido para n 0 e p 1). Para n = 0, o resultado é verdadeiro. Suponhamos
que o resultado valha para n 1 (com p qualquer). Seja f : U R
n
R
p
, suave.
Definamos C
1
.
=
{
x U | df
x
= 0
}
. Mais ainda, definamos:
C
i
.
=
x U |
α
f
r
(x) = 0, com α N
n
e |α| = j, j i, e r = 1, . . . ,p
.
Notemos que C C
1
C
2
··· C
i
···. Dividiremos a prova em três passos:
1. f (C\C
1
) tem medida nula;
2. f (C
i
\C
i+1
) tem medida nula;
3. k | f
(
C
k
)
tem medida nula.
Com isso, segue o resultado, pois
C = (C\C
1
)
.
C
1
= (C\C
1
)
.
(C
1
\C
2
)
.
(C
2
\C
3
)
.
···
.
(C
k1
\C
k
)
.
C
k
,
o que nos mostra que f (C) tem medida nula.
Demonstração do passo 1: Podemos tomar p 2, pois se p = 1, então C = C
1
.
Para cada z C\C
1
, vamos encontrar uma vizinhança V R
n
tal que f (V C)
tem medida nula. Daí, como C\C
1
é coberto por uma quantidade enumerável de
vizinhanças V, isto provará que f (C\C
1
) tem medida nula. Como z / C
1
, existe
uma derivada parcial, digamos f
1
/∂x
1
(sem perda de generalidade), que não se
anula em z. Consideremos h : U R
n
definida por h(x) = (f
1
(x),x
2
,x
3
, ···,x
n
).
Como dh
z
é injetora, pois
dh
z
=
f
1
∂x
1
(z)
f
1
∂x
2
(z) ···
f
1
∂x
n
(z)
0 1 ··· 0
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
0 0 ··· 1
,
o Teorema da Função Inversa garante a existência de uma vizinhança V de z que é
difeomorfa ao aberto V
= h(V) R
n
. A função composta g = f h
1
: V
R
p
é
suave, e vale o seguinte: C
, o conjunto dos pontos críticos de g é igual a h(V C).
De fato, x C
dg
x
é não sobrejetora df
h
1
(x)
é não sobrejetora (pois
dg
x
= df
h
1
(x)
d(h
1
)
x
e d(h
1
)
x
: R
n
R
n
é isomorfismo) h
1
(x) V C
(pois C é o conjunto de pontos críticos de f , e V é a imagem de V
por h
1
)
x h(V C). Donde segue que
g(C
) = g h(V C) = f (V C). (1.1.1)
Agora, para cada (t,x
2
, . . . ,x
n
) V
, g(t,x
2
, . . . ,x
n
) t × R
p1
. Isso porque
(t,x
2
, . . . ,x
n
) = h(y), com y V, mas h(y) = (f
1
(y),y
2
, . . . y
n
) = f
1
(y) = t,
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 17
daí g(t,x
2
, . . . ,x
n
) = f (y) = (t,f
2
(y), . . . ,f
p
(y)). Isto é, g leva hiperplano em hiper-
plano. Denotemos g
t
: (t × R
n1
) V
t × R
p1
, a restrição de g.
Afirmação: Um ponto de t × R
n1
é um ponto crítico para g
t
se e somente se o é
para g. De fato, basta observar que
dg
x
=
1 0 ··· ··· 0
g
2
∂x
1
(x)
g
2
∂x
2
(x) ··· ···
g
2
∂x
n
(x)
.
.
.
.
.
.
.
.
.
g
p
∂x
1
(x)
g
p
∂x
2
(x) ··· ···
g
p
∂x
n
(x)
=
1 0
# d(g
t
)
x
,
daí, dg
x
é não sobrejetora se e somente se d(g
t
)
x
é não sobrejetora (sobre R
p1
).
Agora, estamos com uma função de um aberto de R
n1
em R
p1
, o que, pela hipótese
de indução, nos que o conjunto de valores críticos de g
t
tem medida nula em t ×
R
p1
. Logo, o conjunto g(C
) intercepta cada hiperplano t ×R
p1
num conjunto de
medida nula. Utilizando o Teorema de Fubini-Toneli
1
, temos então que o conjunto
mensurável g(C
) tem medida nula. Então, de (1.1.1), segue que f (V C) tem
medida nula.
Demonstração do passo 2: Para cada z C
k
\C
k+1
, existe um certo r, um certo s e
um certo multi-índice α, com |α| = k, tal que
∂x
s
α
f
r
(z) = 0. Assim, a função
w(x)
.
=
α
f
r
(x)
se anula em z, mas w/∂x
s
não. Suponhamos, sem p erder a generalidade, que
s = 1, e definamos h : U R
n
, pondo h(x) = (w(x),x
2
, . . . ,x
n
). Tal função
leva uma vizinhança V U de z difeomorficamente sobre um aberto V
R
n
(para ver isso, podemos usar o mesmo argumento usado no passo 1). Notemos
que h(V C
k
) 0 × R
n1
, e consideremos g = f h
1
: V
R
p
. Denotemos
g :
0 × R
n1
V
R
p
a restrição de g. Pela hipótese de indução, o conjunto
dos valores críticos de g tem medida nula. Mas,
h(V C
k
) C
.
= Conjunto dos pontos críticos de g,
pois se x h(V C
k
), h
1
(x) V C
k
(significando que todas as derivadas até
ordem k de f são nulas em h
1
(x)) =dg
x
= dg
x
= df
h
1
(x)
dh
1
x
= 0. Portanto,
g(h(V C
k
)) tem medida nula. Mas g h(V C
k
) = g h(V C
k
) = f (V C
k
).
Seguindo que, com o mesmo argumento do passo 1, f (C
k
\C
k1
) tem medida nula.
Demonstração do passo 3: Seja I
n
U um cubo de lado δ. Se k >
n
p
1, provaremos
que f (I
n
C
k
) tem medida nula. Como C
k
pode ser coberto p or uma quantidade
enumerável de cubos, isso mostrará que f (C
k
) tem medida nula.
Pelo Teorema de Taylor
2
, a compacidade de I
n
e a definição de C
k
, vemos que
f (x + h) = f (x) + R(x,h), (1.1.2)
1
Ver o capítulo 7 de [10]
2
Olhar o Teorema 8”, página 58, de [5].
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 18
onde |R(x,h)| c|h|
k+1
, para x I
n
C
k
e x + h I
n
, e c uma constante.
Subdividamos I
n
em r
n
cubos de lado δ/r, onde r N. Se I
1
é um cubo da
subdivisão que contém x C
k
, temos que todo ponto de I
1
pode ser escrito como
y = x + h, com |h|
nδ/r. De (1.1.2), segue que f (I
1
) está num cubo de lado
a/r
k+1
, centrado em f (x), com a = 2c
k+1
. Daí, f (I
n
C
k
) está na união de,
no máximo, r
n
cubos de volume
a/r
k+1
p
cada, tendo, portanto, medida menor
ou igual a M = r
n
a/r
k+1
p
= a
p
r
n−(k+1)p
. Se k + 1 > n/p, como supomos,
M 0 se r . Logo, f (I
n
C
k
) tem medida nula.
Algo interessante no estudo de Variedades é o
Corolário 1.1.4 (Brown) Seja f : M N uma função suave entre variedades
de dimensões m e n respectivamente. Então o conjunto dos valores regulares de f ,
N\f (C), é denso em N.
Demonstração:
Passo 1: Dizemos que um espaço topológico X é um espaço de Baire se dada uma
coleção enumerável { A
i
}
i=1
de abertos densos em X, a interseção
i=1
A
i
também é
densa em X. O Teorema de Baire para espaços métricos
3
estabelece que todo espaço
métrico completo é de Baire. Desde que uma n-variedade é uma união enumerável
de abertos, cada um deles difeomorfos a R
n
, temos que variedades são espaços de
Baire (observando que a imagem por homeomorfismo de um espaço de Baire é de
Baire, e que a união enumerável de espaços de Baire é de Baire).
Passo 2: Dado y N, temos que existem V
y
uma vizinhança de y em N, um
aberto U de R
n
e um difeomorfismo h : U V
y
. Para cada x f
1
(V
y
), temos que
existem uma vizinhança de x, V
x
f
1
(V
y
), um aberto L de R
m
e um difeomorfismo
k : L V
x
(tudo isso pela definição 1.1.3 de variedade). A função composta
g = h
1
f k : L U R
n
é suave. Sendo C
x
= {z L | dg
z
não é sobrejetora}, o Teorema de Sard garante que
g(C
x
) tem medida nula em R
n
. Mas, C
x
= k
1
(C V
x
) (basta olhar a definição de
g acima), logo,
h
1
f (C V
x
) = h
1
f k
k
1
(C V
x
)
tem medida nula em R
n
. Agora, para cada a V
x
, conseguimos uma vizinhança V
a
tal que V
a
é compacto e V
a
V
x
4
. Segue que h
1
f (C V
a
) tem medida nula em
R
n
, e daí, que U\
h
1
f (C V
a
)
é denso em U. Conseqüentemente, N\f (CV
a
)
é denso em N. Mas, desde que conseguimos uma quantidade enumerável de vizi-
nhanças do tipo V
a
, cobrindo f
1
(V
y
), bem como uma quantidade enumerável de
vizinhanças do tipo V
y
, cobrindo N, temos uma quantidade enumerável de vizinhan-
ças do tipo V
a
que cobrem M. Isto é, existe uma coleção emumerável {a
i
}
iN
de
pontos de M tais que
i=1
V
a
i
= M.
3
Ver, por exemplo, [8], pág 294.
4
Ver, por exemplo, o lema 8.2 (página 185) de [8].
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 19
Temos, então, uma quantidade enumerável de conjuntos N\f (C V
a
i
), densos em
N. Como cada um deles é aberto (pois C V
a
i
é compacto = f (C V
a
i
) é
fechado), segue do passo 1 que
i=1
N\f (C V
a
i
)
é denso em N. Daí, as seguintes
igualdades encerram a demontração:
i=1
N\f (C V
a
i
)
= N\
i=1
f (C V
a
i
)
= N\f (C).
O último resultado desta subsecção nos permitirá definir variedades através
de valores regulares.
Proposição 1.1.5 Seja f : M N suave entre variedades de dimensões m n.
Se y f (M) N é um valor regular, então f
1
{y} M é uma variedade suave de
dimensão m n.
Demonstração: Seja x f
1
{y}. Como y é valor regular, df
x
é sobrejetora de
TM
x
em TN
y
. Do “Teorema do Núcleo e Imagem” de Álgebra Linear, temos que
Ker(df
x
) é um subespaço vetorial de dimensão m n. Se M R
k
, escolhamos
L : R
k
R
mn
linear, que seja injetora quando restrita a Ker(df
x
) (isso é possível
fazendo L levar uma base de Ker(df
x
) em uma base de R
mn
, e definindo L como
zero em R
k
\Ker(df
x
) ). Definindo F : M N ×R
mn
por
F (ξ) =
f (ξ),L(ξ)
,
temos que dF
x
(v) =
df
x
(v),L(v)
. Afirmamos que dF
x
é injetora. De fato, se
dF
x
(v) = 0, segue que v Ker(df
x
) e L(v) = 0 , seguindo que v = 0, uma vez que
L é injetora em Ker(df
x
). Como N ×R
nm
é uma m-variedade suave, segue que x é
ponto regular de F , e a observação após a Definição 1.1.6 garante que F mapeia uma
vizinhança de x difeomorficamente sobre uma vizinhança de
y,L(x)
. Tomando
F
f
1
{y}
, tal função mapeia uma vizinhança de x f
1
{y} difeomorficamente em
um aberto de y × R
mn
, que pode ser considerado como aberto de R
mn
. Isto
é, temos que uma vizinhança de x em f
1
{y} é difeomorfa a um aberto de R
mn
.
Fazendo x “percorrer” f
1
{y}, segue que f
1
{y} é uma m n-variadade.
Exemplo: Uma prova fácil de que S
n1
é uma (n 1)-variedade. Definamos
f : R
n
R por
f (x) =
n
i=1
x
2
i
,
e notemos que cada y = 0 é valor regular de f . Daí, é observar que S
n1
= f
1
{1}.
1.1.3 Variedades com fronteira
Definiremos nesta subsecção o conceito de variedade com fronteira (ou bordo), ex-
tendendo o conceito de variedade que tínhamos até agora. A Proposição 1.1.6 será
uma nova versão para a Proposição anterior
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 20
Seja H
m
= {(x
1
, . . . ,x
n
) R
m
| x
m
0}. Notemos que a fronteira de H
m
é
R
m1
× 0.
Observação: Se f : U H
m
V H
m
é um difeomorfismo entre abertos de
H
m
, então f levará pontos interiores de H
m
em pontos interiores de H
m
, e pontos
de ∂H
m
em pontos de ∂H
m
. De fato, se x intH
m
, então, p ela nossa definição
de difeomorfismo, existe um aberto de R
m
, A, e F : A V uma função suave
tal que F
AV
= f
AV
, e resultado análogo vale para f
1
numa vizinhança de
f (x). Diminuindo A até que A U segue, do teorema da função inversa, que
f : A f (A) é um difeomorfismo, com f (A) aberto de R
m
. Desde que f (A) V,
segue que f (A) intH
m
=f (x) intH
m
. Raciocinando por absurdo sobre pontos
de ∂H
m
, segue que pontos de fronteira são levados em pontos de fronteira.
Definição 1.1.9 Dizemos que X R
k
é uma m-variedade com fronteira se cada
x X tem uma vizinhança U
x
X que é difeomorfa a um aberto V
x
de H
m
.
Definimos a fronteira de X, ∂X, como sendo o conjunto dos pontos de X correspon-
dentes a ∂H
m
pelos difeomorfismos que definem X.
Observação: ∂X está bem definida, e, mais ainda: (i) se ∂X = , então ∂X é
uma m 1-variedade e (ii) intX é uma m-variedade. De fato, para ver que ∂X está
bem definida, ela deve ser independente de coordenadas, o que é verdade, pois se φ
é uma coordenada de uma vizinhança de p, com φ(p) ∂H
m
, temos que para toda
ψ que mapeia uma vizinhança U de p em H
m
, podemos diminuir U e a vizinhança
mapeada por φ para um aberto L de tal forma que ψ φ
1
: φ(L) ψ(L) seja
um difeomorfismo entre abertos de H
m
. Daí, p ela observação anterior, temos que
ψ(p) = (ψφ
1
)(φ(p)) ∂H
m
, mostrando que um ponto p estar em ∂X independe
de coordenadas. Para ver (i), basta observar que para qualquer ponto p de ∂X,
existe, pela definição anterior, uma vizinhança U
p
que é difeomorfa a um aberto de
H
m
. Daí, pelo que acabamos de ver, U
p
∂X é difeomorfa a um aberto de ∂H
m
, que
pode ser identificado como R
m1
, seguindo que ∂X é uma m 1-variedade. Agora,
se p intX, a vizinhança U
p
intX de p será difeomorfa a um aberto de intH
m
,
que é um aberto de R
m
, mostrando (ii).
Exemplo: Se M é uma m-variedade sem fronteira, então M é uma variedade com
fronteira. Sua fronteira é o conjunto vazio.
O epaço tangente TX
x
de X no ponto x será definido como antes: TX
x
=
dg
u
(R
m
), onde g é um difeomorfismo de um aberto de H
m
(vizinhança de u) em uma
vizinhança de x em X (notemos como podemos fazer tal definição mesmo num ponto
de fronteira, lembrando da observação logo depois da definição de difeomorfismo).
O próximo resultado nos ajudará a criar exemplos de variedades com fron-
teira e será essencial para a demonstração de uma versão da proposição 1.1.5 para
variedades com fronteira.
Lema 1.1.1 Sejam M uma m-variedade sem fronteira e g : M R uma função
suave que tem 0 como valor regular, com 0 g(M). Então A = {x M | g(x) 0}
é uma m-variedade com fronteira, sendo sua fronteira igual a g
1
{0}.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 21
Demonstração: Daremos aqui somente uma idéia da demonstração. Para x A,
com g(x) > 0, é fácil provar que uma vizinhança de x que é difeomorfa a um
aberto de R
m
. Se x for tal que g(x) = 0, mostrar que uma vizinhança que é
difeomorfa a um aberto de H
m
é praticamente seguir a demonstração da proposição
1.1.5.
Exemplo: O disco unitário D
m
=
x R
m
|
m
i=1
x
2
i
1
é uma m-variedade
com fronteira consistindo de S
m1
. De fato, se definimos g : R
m
R por g(x) =
1
m
i=1
x
2
i
, vemos que g
1
{0} = S
m1
e que 0 é valor regular de g. Logo, pelo lema
anterior, D
m
=
{
x R
m
| g(x) 0
}
é uma m-variedade com fronteira igual a S
m1
.
Proposição 1.1.6 Seja f : X N suave, onde X é uma m-variedade com fronteira
e N é uma n-variedade (com ou sem fronteira), com m > n. Se y f (X) N é
um valor regular para f , então f
1
{y} X é uma m n-variedade com fronteira.
Mais ainda, sua fronteira é igual a f
1
{y} ∂X.
Demonstração: O que devemos provar é local, daí basta provar para f : H
m
R
n
(pois X é localmente H
m
e M é localmente R
m
). Dado x f
1
{y}, se x intH
m
,
seja U
x
uma vizinhança de x tal que U
x
intX. Então, da proposição 1.1.5, segue
que f
1
{y} U
x
é uma variedade suave de dimensão m n. Se não pontos em
f
1
{y} ∂X, segue o resultado. Do contrário, se x ∂H
m
, precisamos fazer uma
construção: sabemos que existe g : U R
n
suave, onde U é uma vizinhança de x
em R
m
e g
UH
m
= f
UH
m
. Como f não tem pontos críticos em uma vizinhança de
x (por continuidade), podemos assumir (diminuindo U se necessário) que g não tem
pontos críticos, seguindo que g
1
{y} é uma m n-variedade (como “subvariedade”
de R
m
)(pela proposição 1.1.5). Seja π : g
1
{y} R a projeção
π(x
1
, . . . ,x
m
) = x
m
.
Afirmamos que π tem 0 como valor regular. De fato, seja z g
1
{y} tal que
π(z) = 0. Temos
z
= (0,0, . . . ,1) como uma função de T
g
1
{y}
z
em R. Devemos
mostrar que
z
não se anula completamente em T
g
1
{y}
z
, isto é, que existe
a T
g
1
{y}
z
tal que a
m
= 0, o que é verdade, pois T
g
1
{y}
z
é o Kernel
de df
z
= dg
z
: R
m
R
n
(isso ocorre pois se h : A R
mn
g
1
{y} for um
difeomorfismo que define g
1
{y} como variedade numa vizinhança h(A) de z, onde
A é um aberto, então T
g
1
{y}
z
= dh
u
(R
mn
), onde u = h
1
(z); e, calculando
dg
z
em T
g
1
{y}
z
, teremos dg
z
(dh
u
(v)) = d(g h)
u
(v) = 0 , v R
mn
, pois
g h = cte = y, seguindo que T
g
1
{y}
z
Ker(dg
z
); daí, por um argumento de
dimensão, segue a igualdade), e daí, se não existisse a tal que a
m
= 0 em T
g
1
{y}
z
,
T
g
1
{y}
z
R
m1
×{0}, seguindo que Ker(df
z
) = Ker(dg
z
) R
m1
×{0} = ∂H
m
,
o que significaria que y não seria valor regular de f
∂H
m
, um absurdo. Agora,
f
1
{y} U = g
1
{y} H
m
consiste dos pontos z g
1
{y} tais que π(z) 0,
seguindo da afirmação acima e do lema anterior que f
1
U é uma m 1-variedade
com fronteira, e sua fronteira consiste de Π
1
{0} = f
1
{y}U∂H
m
. Para terminar,
basta notar que f
1
{y} U é uma vizinhança de x em f
1
{y}, e “percorrer” f
1
{y}
com x.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 22
1.1.4 Homotopia e Isotopia
Seja f : M N suave, com M uma m-variedade compacta sem fronteira e N uma
m-variedade conexa. sabemos da Proposição 1.1.1 que #f
1
{y}, com y valor
regular de f , é finito. Mostraremos que a classe de resíduo dulo 2 de #f
1
{y}
não depende do valor regular y.
Definição 1.1.10 (Homotopia) Sejam X R
k
e y R
l
dois subconjuntos quais-
quer, e f ,g : X Y duas funções suaves. Dizemos que f é homotópica a g se existe
uma função suave F : X ×[0,1] Y tal que
F (x,0) =f (x)
F (x,1) =g(x) , x X .
Neste caso, dizemos que F é uma homotopia entre f e g.
Observação: A relação de homotopia é de equivalência. De fato, a reflexividade e
a simetricidade são óbvias. Para ver a transitividade, devemos usar a existência de
uma função suave ϕ : [0,1] [0,1] tal que ϕ(t) = 0 para 0 t 1/3, e ϕ(t) = 1
para 2/3 t 1. Para obtermos uma tal ϕ, seja
λ(t) =
0, t 0
e
1/t
, t > 0,
que é sabidamente suave, e ϕ(t) = λ(t 1/3)/
λ(t 1/3) + λ(2/3 t)
, para
t [0,1], faz o que queremos. Daí, se F é uma homotopia entre f e g, a função
L
1
(x,t) = F (x,ϕ(t)) é tal que
L
1
(x,t) = f (x), t [0,1/3]
L
1
(x,t) = g(x), t [2/3,1] .
Sendo G uma homotopia entre g e h, e tomando L
2
(x,t) = G(x,ϕ(t)), definimos
M (x,t) =
L
1
(x,2t), t [0,1/2]
L
2
(x,2t 1), t [1/2,1],
e teremos que M (x,0) = f (x) e M (x,1) = h(x). Além disso, M é suave, pois no
intervalo (1/2 1/6,1/2 + 1/6), M (x,t) = g(x), para todo x. Seguindo que f e h
são homotópicas.
Definição 1.1.11 (Isotopia) Sejam f,g : X Y difeomorfismos. Dizemos que f
é isotópica a g se existe uma homotopia F : X × [0,1] Y entre f e g tal que para
cada t [0,1], a correspondência
x −F (x,t)
é um difeomorfismo entre X e Y.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 23
Observação: Isotopia também é uma relação de equivalência.
Antes do próximo resultado, devemos ver primeiro a
Observação: Se M é uma m-variedade sem fronteira, M × [0,1] é uma m + 1-
variedade com fronteira M × 0 M ×1.
Além disso, precisaremos do seguinte
Lema 1.1.2 Toda 1-variedade compacta com fronteira sempre tem um número par
de pontos em sua fronteira.
5
Lema 1.1.3 (da Homotopia) Sejam f ,g : M N homotópicas, com M e N
variedades de mesma dimensão, e M compacta e sem fronteira. Se y é um valor
regular para f e para g, então
#f
1
{y} #g
1
{y} mod 2 .
Demonstração: Se #f
1
{y} = 0 = #g
1
{y}, então temos o resultado (isso é o que
acontece quando y não está na imagem nem de f e nem de g). Se um dos dois
números não for nulo, consideremos F : M ×[0,1] N uma homotopia entre f e g.
A prova seguirá em dois casos:
Caso 1: Suponhamos que y é um valor regular para F . Então, da observação
anterior e da Proposição 1.1.6 (as hipóteses da proposição estão satisfeitas pois
F
(M×[0,1])
ou é f ou é g), teremos que F
1
{y} é uma 1-variedade com fronteira
igual ao conjunto
F
1
{y} (M × 0 M × 1) = f
1
{y} × 0 g
1
{y} × 1.
Então o número de pontos na fronteira de F
1
{y} é
#f
1
{y} + #g
1
{y} .
Do lema 1.1.2, segue que esse número é par, isto é: #f
1
{y} #g
1
{y} mod 2.
Caso 2: Se y não é um valor regular de F . Temos da proposição 1.1.2 que existem
vizinhanças V
1
e V
2
de y, tais que
#f
1
{y
} = #f
1
{y}, y
V
1
e #f
1
{y

} = #f
1
{y}, y

V
2
. (1.1.3)
Mas, pelo corolário 1.1.4, temos que existe um valor regular z de F em V
1
V
2
(no-
temos que F
1
{z} não é vazio), seguindo do passo 1 que # f
1
{z} #g
1
{z} mod 2,
o que, juntamente com (1.1.3), mostra que #f
1
{y} #g
1
{y} mod 2.
Lema 1.1.4 Sejam y e z pontos arbitrários do interior de uma variedade conexa
N. Então existe um difeomorfismo h : N N que é isotópico à função identidade
e tal que h(y) = z.
Demonstração: Olhar a página 22 de [7].
Agora, o resultado principal desta subsecção:
5
Para uma demonstração ver o Apêndice de [7]
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 24
Teorema 1.1.7 Seja f : M N suave, com M compacta sem fronteira e N co-
nexa, M e N de mesma dimensão. Se y e z são valores regulares arbitrários de f ,
então
#f
1
{y} #f
1
{z} mod 2.
Mais ainda, tal classe comum, que denotaremos por deg
2
(f ), depende somente da
classe de homotopia de f .
Demonstração: Dados y e z valores regulares de f , temos do Lema 1.1.4 que
existe h : N N um difeomorfismo isotópico à identidade que leva y em z. Daí,
z é valor regular de h f (pois (h f )
1
{z} = f
1
{y}, e a sobrejetividade de df
x
garante a sobrejetividade de d(h f )
x
). Notemos que h f é homotópica a f (pois
se F : N × [0,1] N é uma função de isotopia entre h e a identidade, definamos
G : M × [0,1] M pondo G(x, t) = F (f (x),t); G é suave e G(x,0) = F(f (x),0) =
h f (x) e G(x,1) = F (f (x),1) = f (x) ), seguindo do Lema 1.1.3 da Homotopia que
#(h f )
1
{z} #f
1
{z} mod 2 .
Mas (h f )
1
{z} = f
1
{y}, seguindo que #f
1
{y} #f
1
{z} mod 2, o que mostra a
primeira parte do teorema, e nos permite definir deg
2
(f ) como a classe de #f
1
{y}.
Sendo g homotópica a f , temos do Corolário 1.1.4 que existe y um valor regular de f
e g, seguindo do Lema 1.1.3 que #f
1
{y} #g
1
{y} mod 2. Daí, do que acabamos
de mostrar, deg
2
(f ) = deg
2
(g).
Definição 1.1.12 Dizemos que deg
2
(f ) é o grau dulo 2 de f .
1.1.5 Variedades orienveis e o grau de uma transformação
Para definirmos o grau de uma função como um número inteiro, e não como uma
classe de resíduos, introduziremos nesta subsecção o conceito de orientação em nos-
sas variedades.
Definição 1.1.13 Seja A um espaço vetorial real n-dimensional. Dizemos que duas
bases ordenadas β
1
= {b
1
,b
2
, . . . ,b
n
} e β
2
= {a
1
, . . . ,a
n
} de A são equivalentes se a
matriz mudança de base de β
1
para β
2
tem determinante positivo.
Observação: A relação definida acima é de equivalência.
Definição 1.1.14 Dizemos que duas bases ordenadas β
1
e β
2
determinam a mesma
orientação se são equivalentes.
β
1
determina orientação oposta a β
2
se não são equivalentes.
Observação: Podemos dessa forma colocar uma orientação num espaço vetorial,
a orientação correspondente a uma dada base fixada. Dizemos, então, que o espaço
está com sua orientação positiva se tomarmos a orientação correspondente a essa
determinada base, e está com sua orientação negativa quando seguirmos bases que
não determinam a mesma orientação que a base fixada.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 25
Observação: A orientação positiva do R
n
nós a tomaremos correspondendo à
base canônica {e
1
, . . . ,e
n
}, onde e
i
= (0, . . . ,1

i
,0 . . . ,0).
Observação: Para um espaço vetorial de dimensão zero, adotaremos uma orien-
tação com os símbolos +1 ou 1 sempre que for necessário.
Definição 1.1.15 Dizemos que uma m-variedade M, com m 1, é orientável se é
possível definirmos uma orientação em cada espaço tangente TM
x
de tal forma que:
para todo x M, existe uma vizinhança U M e um difeomorfismo h mapeando
U em um aberto de R
m
, ou H
m
, que preserva orientação, no seguinte sentido:
y U, o isomorfismo dh
y
: TM
y
R
m
leva a orientação pré definida de TM
y
na orientação positiva de R
m
, significando que, se β é uma base de TM
y
com a
orientação escolhida em TM
y
, então a base α = dh
y
{β} tem a mesma orientação
da base canônica de R
m
.
Colocaremos a seguir uma orientação positiva na fronteira de uma variedade
orienvel M. Se M tem fronteira, podemos distinguir três tipos de vetores no espaço
tangente TM
x
, em um ponto de fronteira x:
1. os vetores tangentes à fronteira formando um espaço m 1-dimensional;
2. os vetores “interiores”, que formam um meio espaço aberto limitado por
T(∂M)
x
;
3. os vetores “exteriores”, que formam um meio espaço complementar.
Esses três tipos de vetores são os correspondentes a imagens por (dg
x
)
1
dos três
tipos de vetores em R
m
: vetores em ∂H
m
, vetores em intH
m
, vetores em R
m
\H
m
,
respectivamente, onde g é uma parametrização de uma vizinhança de x (observemos
a figura 1.1.1). Agora, se dimM 2, para cada x ∂M, seja {v
1
,v
2
, . . . ,v
m
} uma
R
n1
H
n
(dg
x
)
1
tipo 2
(dg
x
)
1
tipo 1
(dg
x
)
1
tipo 3
Figura 1.1.1: Os três tipos de vetores.
base de TM
x
, com a orientação positiva de TM
x
, tal que v
2
, . . . ,v
m
são tangentes à
fronteira (isto é, são do primeiro tipo) e tal que v
1
é exterior (sempre é possível fazer
isso através de rotações). Então, {v
2
, . . . v
m
} determina uma orientação para ∂M em
x. Se dimM = 1, para cada p onto x em ∂M, colocamos a orientação 1 ou +1,
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 26
de acordo com o vetor orientação em x ser interior ou exterior, respectiamente. Tal
orientação será sempre tomada como positiva para a fronteira de M, utilizá-la-emos
sempre para ∂M, salvo menção em contrário.
Passaremos a definir o grau de uma função como um número inteiro. Sejam
M e N variedades orienveis e sem fronteira de mesma dimensão n, com M com-
pacta e N conexa, e f : M N uma função suave. Seja x M um ponto regular de
f , então df
x
: TM
x
TN
f (x)
é um isomorfismo entre espaços vetoriais orientáveis.
Definamos o sinal de df
x
como +1 ou 1 se df
x
preserva ou não a orientação (isto
é, se df
x
leva bases com a mesma orientação fixada em TM
x
em bases com a mesma
orientação fixada em TM
f (x)
, ou não).
Definição 1.1.16 Seja y um valor regular de f . Definimos o grau de f em y,
deg(f ; y), por
deg(f ; y) =
xf
1
{y}
sinal df
x
6
.
Observação: deg(f ; y) está bem definido. Isso é claro pela compacidade de M e
a Proposição 1.1.1.
Observação: Além disso, notemos que quando y / f (M), deg(f ; y) = 0.
Observação: deg(f ; y) é localmente constante como uma função de y definida no
conjunto dos valores regulares de f . Isso segue da proposição 1.1.2 e da orientabili-
dade de M e N.
Teorema 1.1.8 O inteiro deg(f ; y) não depende da escolha do valor regular y.
Demonstraremos o teorema acima utilizando alguns resultados que ainda iremos
estabelecer. Agora, usando esse teorema, temos a seguinte
Definição 1.1.17 Definimos o inteiro dado no teorema anterior por grau de f , e
o denotamos por deg f .
Provaremos ainda o seguinte
Teorema 1.1.9 Se f é homotópica a g, então deg f = deg g.
Lema 1.1.5 Suponhamos que M é a fronteira de uma m-variedade orientável e
compacta X, e que M está orientada como a fronteira de X (de acordo com a ori-
entação positiva da fronteira). Se f : M N estende-se a uma função suave
F : X N, então deg(f ; y) = 0, para todo y valor regular de f .
Demonstração: Olhar o lema 1 da página 28 de [7].
Lema 1.1.6 Se as duas funções suaves f ,g : M N são homotópicas, então
deg(f ; y) = deg(g; y),
para todo valor regular y comum a f e a g.
6
Para a definição de grau de f em y não foi relevante a conexidade de N, porém o resultado
principal concernente ao grau sua independência em relação a y (teorema 1.1.8) utilizará tal
fato. Assim, assumimos isso previamente.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 27
Demonstração: A variedade X ×[0,1] pode ser orientada como um produto, onde a
fronteira M×0M×1 estará orientada com a orientação positiva que estabelecemos
ao orientarmos fronteiras. Mas daí, para que isso ocorra, as orientações de M × 0
e M × 1 precisam ser opostas (como podemos ver na figura 1.1.2). Se F for uma
v
1
v
2
1
v
2
v
1
0
Figura 1.1.2: Orientação da fronteira.
função de homotopia entre f e g, com F (x,0) = f (x) e F (x,1) = g(x), temos, por
definição, que o grau de F
(M×[0,1])
em um valor regular y é o número
deg(g; y) deg(f ; y) ou deg(g; y) + deg(f ; y) .
Pelo Lema 1.1.5, essa diferença é 0, seguindo que deg(g; y) = deg(f ; y).
Agora, se y e z são ambos valores regulares def : M N, seja h : N N um
difeomorfismo que leva y em z e é suavemente isotópico à identidade (a existên-
cia de h é garantida pelo Lema 1.1.4). Desde que dh
x
preserva a orientação (se
não preservasse, deg(h; y) = 1 em algum ponto y, seguindo do lema 1.1.6 que
deg(identidade; y) = 1, uma contradição), temos que d(h f )
x
= dh
f (x)
df
x
preserva a orientação se e somente se df
x
preserva, donde seque que
deg(f ; y) = deg(h f ; h(y)) . (1.1.4)
Mas como f é homotópica a h f , o Lema 1.1.6 que
deg(h f ; z) = deg(f ; z) (1.1.5)
Desde que h(y) = z, temos de (1.1.4) e (1.1.5) que deg(f ; y) = deg(f ; z), o que
mostra o Teorema 1.1.8. A prova do Teorema 1.1.9 é conseqüência direta do Teorema
1.1.8 e do Lema 1.1.6.
Observação: Convencionaremos que quando f não tem valor regular, deg f = 0.
Proposição 1.1.10 Um difeomorfismo f : M N tem grau +1 ou 1, conforme
df
x
preserva ou não a orientação em algum ponto x M.
Demonstração: A demonstração é imediata se utilizarmos o Teorema 1.1.8 e a
definição 1.1.17 de grau de f .
Seja r
i
: S
n
S
n
a função definida por
r
i
(x
1
, . . . ,x
n+1
) = (x
1
, . . . , x
i
, . . . ,x
n+1
) .
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 28
É fácil ver que r
i
é um difeomorfismo tal que dr
i
x
inverte a orientação. Daí, deg r
i
=
1. Assim, a função antipodal a(x) = x, definida em S
n
, tem grau (−1)
n+1
, uma
vez que a(x) = r
1
r
2
··· r
n+1
(x). Segue dessa argumentação que, se n é par,
a função antipodal não é homotópica à identidade, um fato que não era detectado
pelo grau dulo 2.
1.1.6 O Teorema da “Esfera Cabeluda”
Daremos a seguir a definição de Campo Vetorial. Além disso, utilizaremos os resul-
tados das subsecções anteriores para provar o Teorema da “Esfera Cabeluda”.
Definição 1.1.18 (Campo Vetorial) Seja M R
k
uma m-variedade. Dizemos
que uma função suave v : M R
k
é um Campo Vetorial se
v(x) TM
x
, x M .
Observação: No caso de M = S
n
, a condição de ser campo vetorial significa
v(x) x = 0 , x S
n
.
Teorema 1.1.11 (Teorema da “Esfera Cabeluda”) S
n
admite um Campo Ve-
torial que não se anula em nenhum ponto se e somente se n é ímpar. Em particular,
se n é par, todo Campo Vetorial em S
n
se anula em algum ponto.
Demonstração: Seja v um Campo Vetorial que não se anula em nenhum ponto de
S
n
. Podemos assumir que v(x) v(x) = 1, x S
n
, pois senão podemos tomar
v(x) = v(x)/|v(x)|. Isto é, v é uma função de S
n
em S
n
. Definamos F : S
n
×
[0,1] S
n
, pondo F (x,t) = cos(πt)x + sen(πt)v(x). Notemos que F (x,t) é suave
e “chega” em S
n
, pois F (x,t) F (x,t) = cos
2
(πt)|x|
2
+ 2 cos(πt)sen(πt)x v(x) +
sen
2
(πt)|v(x)|
2
= 1, além disso, F(x,0) = x e F (x,1) = x, o que mostra que a
função antipodal a(x) = x é homotópica à função identidade. Se n é par, o que
vimos no final da última subsecção garante que isso é impossível, demonstrando
uma afirmação do teorema isto é, v precisa se anular em algum ponto de S
n
.
Reciprocamente, sendo n = 2k 1, podemos definir v(x
1
, . . . ,x
2k
) = (x
2
, x
1
,x
4
,
x
3
, . . . ,x
2k
, x
2k1
), que é um Campo que não se anula em nenhum ponto de S
n
.
1.2 Compactificações
Veremos nesta secção uma introdução à teoria de compactificar espaços topológicos.
Veremos uma condição suficiente para compactificar um espaço topológico. Por fim,
veremos a compactificação de Stone-Čech, que é aquela em que toda função contínua
no espaço pode ser estendida continuamente para a sua compactificação.
Definição 1.2.1 Seja X um espaço topológico Hausdorff. Y é dito uma compacti-
ficação de X se Y é compacto e Hausdorff, X Y
7
e X = Y.
7
Aqui, a topologia de X deve coincidir com a topologia induzida por Y.
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 29
Exemplo: Se X = (0, 1), então Y = [0, 1] é uma compactificação de X.
Veremos alguns tipos de compactificações. Começaremos com a compacti-
ficação a um ponto. Para isso, precisaremos da
Definição 1.2.2 Um espaço topológico X é dito localmente compacto se, para todo
x X, existem C X um compacto e V X uma vizinhança de x, tais que
x V C.
Exemplo: R
n
é localmente compacto.
Seja X um espaço topológico localmente compacto e Hausdorff. Tomemos um ponto
/ X, e seja Y
.
= X {}. Definamos a seguinte topologia em Y:
τ
.
= {U X | U é aberto de X} {Y\C | C é compacto de X}
Vejamos que τ é uma topologia: τ, pois é aberto de X, Y τ, pois Y = Y\, e
é compacto. As interseções finitas de elementos de τ estão em τ, pois, se A,B estão,
então temos três casos: (i) Se A e B são abertos de X, então A B é aberto de X,
logo está em τ; (ii) Se A é aberto de X e B = Y\C, então A B = A (X\C), que
é um aberto de X, pois como C é compacto no espaço de Hausdorff X, segue que C
é fechado em X; (iii) Se A = Y\C
1
e B = Y\C
2
, então A B = Y\(C
1
C
2
), que
está em Y porque união finita de compactos é um compacto. As seguintes relações
mostram que uniões de elementos de τ estão em τ:
γ
U
γ
= U τ
γ
(Y\C
γ
) = Y\(
γ
C
γ
) = Y\C τ
(
γ
U
γ
)
γ
(Y\C
γ
)
= U (Y\C) = Y\(C\U) τ,
onde a última pertinência vale pois C\U é um fechado dentro do compacto C.
Proposição 1.2.1 Seja X Hausdorff e localmente compacto, mas não compacto.
Se Y for construído como acima, então Y é uma compactificação de X.
Demonstração: Mostremos primeiro que a topologia τ induz a topologia de X. De
fato, se A τ, então A X é aberto de X, pois: se A é aberto de X, A X = A;
se A = Y\C, A X = (Y\C) X = X\C, um aberto de X (pois C é fechado em
X). Por outro lado, se A for aberto de X, então A = A X (sendo um elemento da
topologia induzida, pois A está em τ). Além disso, vejamos que X é denso em Y.
De fato, qualquer vizinhança de é do tipo Y\C. Daí, como X não é compacto,
qualquer dessas vizinhanças intercepta X, e segue que X. Como X X, segue
que Y = X. Y é compacto, pois, se A é uma cobertura de Y por abertos, então existe
A A que contém , sendo por isso A = Y\C. Da compacidade de C, segue que
existem A
1
, A
2
, . . ., A
n
em A, que cobrem C. Logo, A, A
1
, . . ., A
n
constituem
uma subcobertura aberta e finita de Y. Por fim, vejamos que Y é Hausdorff: dados
x = y Y, se ambos estiverem em X, então são separados por abertos de X (pois X
é Hausdorff). Se y = , como X é localmente compacto, existem C compacto e V
x
vizinhança de x tais que x V
x
C. Tomando Y\C como vizinhança de y, temos
que (Y\C) V
x
= .
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 30
Definição 1.2.3 Y com a topologia τ é dito a compactificação a um ponto de X.
Exemplo: Via projeção estereográfica, é possível mostrar que a compactificação a
um ponto de R, R {} é homeomorfa a S
1
.
A proposição anterior pede que o espaço seja de Hausdorff, localmente com-
pacto, mas não compacto para admitir uma compactificação a um ponto. O Lema
1.2.1 a seguir fornece uma condição suficiente diferente para que o espaço admita
alguma compactificação: e esta é construída na demonstração do citado Lema. Ob-
servemos primeiro a
Definição 1.2.4 Sejam X e Y espaços topológicos. Uma função injetora e contínua
h : X Y é dita um mergulho se a restrição de h à sua imagem é um homeomor-
fismo
8
.
Lema 1.2.1 Seja X um espaço topológico Hausdorff. Se existem Z um espaço com-
pacto e Hausdorff e um mergulho h : X Z, então X admite uma compactificação
Y.
Demonstração: Sejam X
0
= h(X) Z e Y
0
= X
0
. Y
0
é compacto e Hausdorff, pois é
um subconjunto fechado de um espaço compacto e Hausdorff. Seja A um conjunto
disjunto de X, tal que existe k : A Y
0
\X
0
uma bijeção. Definamos Y
.
= X A e a
bijeção H : Y Y
0
pondo
H (x) =
h(x), x X
k(x), x A.
Coloquemos a seguinte topologia em Y:
U Y é aberto de Y se, e somente se, H (U) é aberto de Y
0
.
Dessa forma, H é um homeomorfismo. Afirmamos que Y é uma compactificação de
X. De fato, como H é homeomorfismo, segue que Y = H
1
(Y
0
) é compacto e Haus-
dorff, pois homeomorfismos preservam tais propriedades. Além disso, a seguinte
relação mostra que X é denso em Y:
H (X) = H (X) = X
0
= Y
0
= H (Y).
Resta ver que a topologia de X coincide com a topologia induzida por Y. De fato, se
L é aberto de X, então H (L) = h(L) é aberto de X
0
, seguindo que H (L) = M X
0
,
com M um aberto de Y
0
. Daí, N = H
1
(M) é aberto de Y, e L = N X. Por outro
lado, se L for aberto de Y, então H (L) é aberto de Y
0
. Daí, h(LX) = H (L)h(X) =
H (L) X
0
=h(L X) é aberto de X
0
=L X é aberto de X.
Observação: Y como na proposição é métrico quando Z for métrico, pois se d
Z
for a métrica de Z, basta tomar
d
Y
(y
1
, y
2
)
.
= d
Z
(H (y
1
), H (y
2
)),
8
Queremos dizer com isso que a função h
: X h(X), definida pala regra h
(x) = h(x), é um
homeomorfismo
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 31
que d
Y
é uma métrica que induz os abertos de Y.
Podemos colocar uma hipótese no espaço X para que ele sempre admita ser
mergulhado num espaço compacto e Hausdorff (e portanto, admitir uma compacti-
ficação):
Definição 1.2.5 Seja X um espaço topológico. Dizemos que X é completamente
regular se subconjuntos formados por somente um ponto são fechados, e se, dados
x
0
X e A X fechado tal que x
0
/ A, então existe f : X [0, 1] contínua com a
seguinte propriedade:
f (x
0
) = 1 e f (A) = {0}.
Corolário 1.2.2 Subespaço de espaço completamente regular é regular, e produto
cartesiano de espaços completamente regulares é completamente regular.
Observação: Se Γ for um conjunto de índices, denotaremos Y
Γ
como sendo o
produto cartesiano na topologia produto
γΓ
Z
γ
, com Z
γ
= Y, γ Γ .
Teorema 1.2.3 (Teorema do Mergulho) Seja X um espaço de Hausdorff. Su-
ponhamos que {f
γ
}
γΓ
é uma coleção de funções contínuas, f
γ
: X R, satisfazendo:
“para cada x
0
X e cada fechado A, com x
0
/ A, existe γ
0
Γ tal que
f
γ
0
(x
0
) > 0 e f
γ
0
(A) = {0} .
Então a função F : X R
Γ
, definida por
F (x)
.
=
f
γ
(x)
γΓ
é um mergulho de X em R
Γ
.
Demonstração: Ver página 220 de [8].
Corolário 1.2.4 Seja X completamente regular. Então existem um espaço de Haus-
dorff compacto Z e um mergulho h : X Z. Em particular, X tem uma compactifi-
cação.
Demonstração: Basta tomarmos a coleção {f
γ
}
γΓ
de todas as funções contínuas
da Definição 1.2.5 de completamente regular e notar que tal coleção satisfaz as
hipóteses do Teorema do Mergulho. Tomando então h = F , temos um mergulho
em [0,1]
Γ
. Além disso, o espaço de Hausdorff [0,1]
Γ
é compacto, pelo Teorema de
Tychonoff
9
. Em particular, pelo Lema 1.2.1, X admite uma compactificação.
Se X é um espaço de Hausdorff e Y é uma sua compactificação, nem sempre
é possível estender uma função real contínua definida em X para uma função que
seja contínua em Y. Como um exemplo, conseguimos estender uma função f
9
O Teorema afirma que o produto de espaços compactos é compacto. Ver a Secção 5.1 de [8]
CAPÍTULO 1. PRELIMINARES 32
definida em (0,1) para uma função contínua em [0,1] se existem lim
x0
+
f (x) e
lim
x1
f (x). Mas existe uma compactificação que tem essa propriedade (isto é,
toda função contínua em X é estendível continuamente à essa tal compactificação
de X). Sejam X completamente regular e {f
γ
}
γΓ
a coleção de todas as funções
contínuas e limitadas f
γ
: X R (notemos que as funções da Definição 1.2.5 de
completamente regular estão inclusas). Para cada γ Γ , seja
I
γ
.
= [ínff
γ
(X) , supf
γ
(X)] .
Definamos h : X
γΓ
I
γ
, colocando h(x)
.
=
f
γ
(x)
γΓ
. Pelo Teorema do
Mergulho, h é um mergulho, e, pelo Teorema de Tychonoff,
γΓ
I
γ
é compacto.
Assim, o Lema 1.2.1 e sua demonstração nos dão uma compactificação Y de X.
Definição 1.2.6 Dizemos que Y acima construída é a compactificação de Stone-
Čech de X. Denotaremo-la por β(X).
Teorema 1.2.5 Se X é completamente regular, então toda função contínua e limi-
tada, f : X R, pode ser unicamente estendida a uma função contínua em β(X).
Demonstração: β(X) é induzida pelo mergulho h : X
γΓ
I
γ
. Pelo que vimos,
h se estende a um mergulho H : β(X)
γΓ
I
γ
. Agora, dada uma função f real,
limitada e contínua em X, então f = f
γ
0
, para algum γ
0
Γ. Seja
π
γ
0
:
γΓ
I
γ
I
γ
0
a projeção no intervalo I
γ
0
. Definamos g
.
= π
γ
0
H . A função g é contínua e definida
em β(X). Além disso, x X, g(x) = π
γ
0
(h(x)) = f
γ
0
(x) = f (x), isto é, g estende
f . A unicidade vem do
Lema 1.2.2 Sejam A X e f : A Z uma função contínua de A num espaço de
Hausdorff Z. Então existe no máximo uma extensão contínua de f a uma função
contínua g : A Z
Demonstração: Suponhamos que g, g
: A Z são duas extensões de f , e que
exista x A\A tal que g(x) = g
(x). Como Z é Hausdorff, existem V e V
abertos
disjuntos contendo g(x) e g
(x), respectivamente. Seja U = g
1
(V) g
1
(V
). U é
um aberto de A, que contém x. Mas U intercepta A em um ponto y (pois x está
no fecho de A), daí, g(y) = f(y) = g
(y) V V
, uma contradição.
Capítulo 2
A técnica da Compactificação de
Poincaré
2.1 A Compactificação de Poincaré de um campo
vetorial polinomial
Introduziremos a Compactificação de Poincaré de um campo vetorial polinomial
qualquer e daremos as suas expressões em coordenadas locais. Por último, provare-
mos um resultado a respeito de campos que não se anulam em R
n
.
Seja X =
P
1
,P
2
, . . . ,P
n
um campo vetorial polinomial em R
n
. Iden-
tifiquemos R
n
com π =
y R
n+1
| y
n+1
= 1
, que é o plano tangente a S
n
no
pólo norte N. Tal identificação é dada pelo difeomorfismo dg
u
: R
n
TS
n
N
, onde
g : U R
n
V S
n
é a inversa de uma parametrização de uma vizinhança V
de N, e u = g
1
(N). Tomando uma projeção central, façamos duas cópias de π
em S
n
, uma em H
+
o hemisfério norte sem o equador e outra em H
o
hemisfério sul sem o equador —, da seguinte forma: considerando r uma reta que
passa por 0 R
n+1
e corta π no ponto x, temos que r corta S
n
em dois pontos y
1
e
y
2
, y
1
H
+
e y
2
H
. Daí, cada ponto x π será relacionado com um ponto em
H
+
e com um ponto em H
(observemos a figura 0.0.1 na introdução do trabalho).
Mais concretamente, definamos Φ
+
: R
n
H
+
e Φ
: R
n
H
por
Φ
+
(x) =
1
(x)
(x
1
, . . . ,x
n
,1) e Φ
(x) =
1
(x)
(x
1
, . . . ,x
n
,1),
com
(x) =
1 +
n
i=1
x
2
i
1/2
. (2.1.1)
Proposição 2.1.1 Φ
+
e Φ
são difeomorfismos.
Demonstração: Φ
+
é uma função C
de R
n
em H
+
R
n+1
. Basta, então, mostrar
que Φ
+
tem inversa C
de H
+
em R
n
. Para isto, notemos que
f
+
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n+1
)
.
=
z
1
z
n+1
, . . . ,
z
n
z
n+1
,
33
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 34
definida em H
+
, é a inversa de Φ
+
, pois
Φ
+
f
+
(z
1
, . . . ,z
n+1
) =
1
1 +
n
i=1
z
2
i
z
2
n+1
1
2
z
1
z
n+1
, . . . ,
z
n
z
n+1
,1
= (z
1
, . . . ,z
n+1
) e
f
+
Φ
+
(x
1
, . . . x
n
) = f
+
x
1
(x)
, . . . ,
x
n
(x)
,
1
(x)
= (x
1
, . . . ,x
n
).
Além disso, f
+
é de classe C
, pois para cada z H
+
, sempre uma vizinhança
V
z
de z tal que y
n+1
> 0, (y
1
, . . . ,y
n+1
) V.
Para Φ
, basta notar que f
(z
1
, . . . z
n+1
) = (z
1
/z
n+1
, . . . ,z
n
/z
n+1
), definida em H
,
é a sua inversa.
Observação: Notemos que S
n
\H
+
e S
n
\H
são homeomorfos a compactificações
(no sentido da Definição 1.2.1) de R
n
.
Com isso em mãos, podemos fazer X induzir um campo vetorial
^
X em
H
+
H
, definido por
^
X (y) =
+
x
(X (x)) , se y = Φ
+
(x)
x
(X (x)) , se y = Φ
(x),
(2.1.2)
que pode ser escrito como
^
X (y) =
+
(Φ
+
)
1
(y)
X
(Φ
+
)
1
(y)
, se y H
+
(Φ
)
1
(y)
X
(Φ
)
1
(y)
, se y H
,
(2.1.2
)
mostrando que
^
X está bem definido. Observemos que, de fato,
^
X é um campo
vetorial, pois é definido por derivadas, satisfazendo a Definição 1.1.18.
Lema 2.1.1
^
X (y) = y
n+1
1 y
2
1
y
1
y
2
··· y
1
y
n
y
2
y
1
1 y
2
2
··· y
2
y
n
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
y
n
y
1
y
n
y
2
··· 1 y
2
n
y
n+1
y
1
y
n+1
y
2
··· y
n+1
y
n
^
P(y),
onde
^
P =
^
P
1
, . . . ,
^
P
n
e
^
P
i
(y
1
, . . . y
n
,y
n+1
) = P
i
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
, i = 1, . . . ,n
Demonstração: Calculemos as matrizes
+
x
=
∂Φ
+
1
∂x
1
(x) ···
∂Φ
+
1
∂x
n
(x)
.
.
.
.
.
.
∂Φ
+
n+1
∂x
1
(x) ···
∂Φ
+
n+1
∂x
n
(x)
e
x
=
∂Φ
1
∂x
1
(x) ···
∂Φ
1
∂x
n
(x)
.
.
.
.
.
.
∂Φ
n+1
∂x
1
(x) ···
∂Φ
n+1
∂x
n
(x)
,
(2.1.3)
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 35
com x = ( Φ
+
)
1
(y), y H
+
, e x = (Φ
)
1
(y), y H
, respectivamente. Para
i = 1, . . . ,n, temos que
∂Φ
+
i
∂x
i
(x) =
(x) x
2
i
(x)
1
((x))
2
;
se x = (y
1
/y
n+1
, . . . ,y
n
/y
n+1
), (x) = 1/|y
n+1
|, e ficamos com
∂Φ
+
i
∂x
i
(x) = |y
n+1
|(1 y
2
i
) = y
n+1
(1 y
2
i
),
pois aqui, y
n+1
> 0. A mesma conta para
∂Φ
i
∂x
i
(x), com x = (Φ
)
1
(y) y H
—, mostra que
∂Φ
i
∂x
i
(x) = |y
n+1
|(1 y
2
i
) = y
n+1
(1 y
2
i
),
pois agora y
n+1
< 0; isto é, tanto para y H
+
como para y H
, temos a mesma
expressão para as entradas a
ii
das matrizes em (2.1.3). As entradas a
ij
, com i = j
e i n serão:
∂Φ
+
i
∂x
j
(x) =
x
i
x
j
(x)
1
(x)
2
= |y
n+1
|(−y
i
y
j
) = y
n+1
(−y
i
y
j
)
e a mesma expressão para
∂Φ
i
∂x
j
(x). Os elementos a
(n+1)j
serão y
2
n+1
y
j
, obtidos
com cálculos análogos. Agora,
X (x) =
X ((Φ
+
)
1
(y)), y H
+
X ((Φ
)
1
(y)), y H
=
=
P
1
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
, . . . ,P
n
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1

=
^
P(y).
Substituindo tudo isso em (2.1.2), segue o lema.
O equador S
n1
= {y S
n
| y
n+1
= 0} de S
n
corresponde ao “infinito” de
R
n
(uma vez que é limite de Φ
+
(x) quando |x| tende a ), e a propriedade chave
do campo
^
X , definido em S
n
\S
n1
, é poder de alguma forma ser estendido para
S
n
. Daí conseguiremos estudar as órbitas de X no infinito de R
n
. Seja, assim,
m = max
grau(P
1
), . . . ,grau(P
n
)
. Definamos
X (y)
.
= y
m1
n+1
^
X (y) . (2.1.4)
Daí, colocando
P
k
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m
n+1
^
P
k
(y
1
, . . . ,y
n+1
), k = 1, . . . n, (2.1.5)
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 36
teremos do Lema 2.1.1 que
X (y) =
1 y
2
1
y
1
y
2
··· y
1
y
n
y
2
y
1
1 y
2
2
··· y
2
y
n
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
y
n
y
1
y
n
y
2
··· 1 y
2
n
y
n+1
y
1
y
n+1
y
2
··· y
n+1
y
n
P
1
(y)
P
2
(y)
.
.
.
P
n
(y)
, (2.1.6)
que é um campo analítico em todo S
n
. Que a função
X é analítica em todo S
n
é
fácil de ver, uma vez que é polinomial e sua expressão garante sua suavidade em S
n
.
Para ver que é um campo vetorial, basta mostrar que
X (y) y = 0, y S
n1
(de
acordo com a Definição de campo vetorial 1.1.18), o que é fato pela continuidade
da função produto escalar (pois tal produto é 0 nos pontos de S
n
\S
n1
).
Definição 2.1.1 Dizemos que o campo
X é a Compactificação de Poincaré do
campo X .
Observação: Estudar o campo
X no hemisfério norte sem o equador, em termos
de órbitas, é o mesmo que estudar o campo
^
X , pois apenas multiplicamos
^
X pela
função sempre positiva y
m1
n+1
(resultando nas mesmas órbitas). Igualmente para
X
no hemisfério sul sem o equador (onde multiplicamos
^
X pela função sempre negativa
y
m1
n+1
).
Definição 2.1.2 Dado um polinômio P : R
n
R de grau l, a decomposição em
suas partes homogêneas é dada por
P = P
0
+ P
1
+ ··· + P
l
,
onde P
j
é seu termo homogêneo de grau j.
Observação:
P
k
(y
1
, . . . ,y
n+1
) definidos em (2.1.5) são polinômios homogêneos
de grau m. De fato, se P
k
= P
k
0
+ P
k
1
+ ··· + P
k
m
é a decomposição nas partes
homogêneas de P
k
,
P
k
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m
n+1
P
k
0
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
+ ··· + P
k
m
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1

,
daí, desde que o i-ésimo termo da soma acima é y
mi
n+1
P
k
i
(y
1
, . . . ,y
n
), segue que
P
k
é homogêneo de grau m.
Calcularemos agora
X considerando uma família de cartas locais de S
n
.
Cubramos S
n
com 2(n + 1) cartas locais (U
i
,Φ
i
), (V
i
,Ψ
i
) com i = 1, . . . ,n + 1, onde
U
i
.
= {y S
n
| y
i
> 0}
V
i
.
= {y S
n
| y
i
< 0} ,
e
Φ
i
: U
i
R
n
Ψ
i
: V
i
R
n
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 37
são definidas pela mesma regra
(y
1
, . . . ,y
n+1
) −
y
1
y
i
, . . . ,
y
i1
y
i
,
y
i+1
y
i
, . . . ,
y
n+1
y
i
.
Notemos que Φ
i
e Ψ
i
são difeomorfismos, pois as funções
(x
1
, . . . ,x
n
) −
1
(x)
(x
1
, . . . ,x
i1
,1,x
i
, . . . ,x
n
)
(x
1
, . . . ,x
n
) −
1
(x)
(x
1
, . . . ,x
i1
,1,x
i
, . . . ,x
n
),
definidas em R
n
, são suas inversas, respectivamente (os cálculos são análogos aos da
Proposição 2.1.1). Observemos que (Φ
+
)
1
= Φ
n+1
e H
+
= U
n+1
, e (Φ
)
1
= Ψ
n+1
e H
= V
n+1
. Escrevamos
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
) = Φ
i
(y
1
,y
2
, . . . ,y
n+1
) =
y
1
y
i
, . . . ,
y
i1
y
i
,
y
i+1
y
i
, . . . ,
y
n+1
y
i
as coordenadas locais em U
i
, observando que, para cada i, (z
1
, . . . ,z
n
) tem signifi-
cados distintos.
Calculemos
X em U
1
, nas coordenadas (z
1
, . . . ,z
n
). Seja y U
1
. Desde
que d(Φ
1
)
y
está definido em T (U
1
)
y
(= T (S
n
)
y
), o campo
X nas coordenadas
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
) será definido por d(Φ
1
)
y
X (y)
, com y = Φ
1
1
(z). Temos então
o
Lema 2.1.2 O campo
X em U
1
, nas coordenadas z = (z
1
,z
2
, . . . ,z
n
), tem a seguinte
expressão:
1
(z)
m1
z
1
P
1
+
P
2
, z
2
P
1
+
P
3
, . . . , z
n1
P
1
+
P
n
, z
n
P
1
,
onde
P
i
=
P
i
(1,z
1
, . . . ,z
n
)
Demonstração: Se y U
1
H
+
,
d(Φ
1
)
y
X (y)
= d(Φ
1
)
y
y
m1
n+1
^
X (y)
= y
m1
n+1
d(Φ
1
)
y
d(Φ
+
)
x
(X (x))
=
= y
m1
n+1
d(Φ
1
Φ
+
)
x
(X (x)), (2.1.7)
onde y = Φ
1
1
(z) = Φ
+
(x). Mas
Φ
1
Φ
+
(x) = Φ
1
1
(x)
(x
1
,x
2
, . . . ,x
n
,1)
=
1
x
1
(x
2
,x
3
, . . . ,x
n
,1),
donde segue que
d(Φ
1
Φ
+
)
x
=
x
2
/x
2
1
1/x
1
0 ··· 0
x
3
/x
2
1
0 1/x
1
··· 0
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
x
n
/x
2
1
0 0 ··· 1/x
1
1/x
2
1
0 0 ··· 0
,
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 38
e daí
d(Φ
1
Φ
+
)
x
(X (x))=
1
x
2
1
x
2
P
1
+ x
1
P
2
, x
3
P
1
+ x
1
P
3
, . . . , x
n
P
1
+ x
1
P
n
, P
1
,
(2.1.8)
onde P
i
= P
i
(x
1
,x
2
, . . . ,x
n
). Considerando (z
1
, . . . ,z
n
) = (y
2
/y
1
, . . . ,y
n+1
/y
1
), e
lembrando que (x
1
, . . . ,x
n
) = (y
1
/y
n+1
, . . . ,y
n
/y
n+1
)
, temos que
x
1
=
y
1
y
n+1
=
1
z
n
, x
2
=
y
2
y
n+1
=
z
1
y
1
y
n+1
=
z
1
z
n
, . . . , x
n
=
y
n
y
n+1
=
z
n1
z
n
,
o que, de (2.1.8), nos
d(Φ
1
Φ
+
)
x
(X (x))= z
n
z
1
P
1
+ P
2
, z
2
P
1
+ P
3
, . . . , z
n1
P
1
+ P
n
, z
n
P
1
,
onde P
i
= P
i
(1/z
n
,z
1
/z
n
, . . . ,z
n1
/z
n
). Substituindo a expressão acima em (2.1.7),
observando que
y
n+1
=
1
(x)
=
1
1 + 1/z
2
n
+
n1
i=1
z
2
i
/z
2
n
=
|z
n
|
1 +
n
i=1
z
2
i
=
z
n
(z)
, (2.1.9)
onde a última igualdade se porque z
n
= y
n+1
/y
1
> 0, segue que
d(Φ
1
)
y
(
X (y))=
z
m
n
(z)
m1
z
1
P
1
+ P
2
, z
2
P
1
+ P
3
, . . . , z
n1
P
1
+ P
n
, z
n
P
1
,
com P
i
= P
i
(1/z
n
,z
1
/z
n
, . . . ,z
n1
/z
n
).
Desde que
P
i
(1,z
1
, . . . ,z
n
) = z
m
n
P
i
(1/z
n
,z
1
/z
n
, . . . ,z
n1
/z
n
), segue que
d(Φ
1
)
y
(
X (y))=
1
(z)
m1
z
1
P
1
+
P
2
, z
2
P
1
+
P
3
, . . . , z
n1
P
1
+
P
n
, z
n
P
1
,
com
P
i
=
P
i
(1,z
1
, . . . ,z
n
).
Se y U
1
H
, teremos a mesma expressão que acima, que d(Φ
1
Φ
)
x
(X (x))
tem a mesma expressão, e
y
n+1
=
1
(x)
=
|z
n
|
(z)
=
z
n
(z)
, (2.1.10)
que agora z
n
= y
n+1
/y
1
< 0. Nos pontos y U
1
S
n1
, a expressão será a
mesma por continuidade.
Multiplicando a expressão de
X em coordenadas z
i
’s pela função positiva
(z)
m1
, temos uma expressão Z(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
), que definiremos como sendo o campo
X em U
1
, nas coordenadas (z
1
,z
2
, . . . ,z
n
).
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 39
Com cálculos semelhantes aos do Lema 2.1.2 para as demais cartas locais
(U
i
,Φ
i
), i = 2, . . . ,n + 1, chegamos às seguintes expressões do campo
X , multipli-
cado pela função (z)
m1
:
Em U
1
:
z
1
P
1
+
P
2
, z
2
P
1
+
P
3
, . . . , z
n1
P
1
+
P
n
, z
n
P
1
,
onde
P
i
=
P
i
(1,z
1
, . . . ,z
n
);
em U
2
:
z
1
P
2
+
P
1
, z
2
P
2
+
P
3
, . . . , z
n1
P
2
+
P
n
, z
n
P
2
,
onde
P
i
=
P
i
(z
1
,1, . . . ,z
n
);
em U
3
:
z
1
P
3
+
P
1
, z
2
P
3
+
P
2
, z
3
P
3
+
P
4
, . . . , z
n1
P
3
+
P
n
, z
n
P
3
,
onde
P
i
=
P
i
(z
1
,z
2
,1,z
3
, . . . ,z
n
);
.
.
.
.
.
.
em U
n
:
z
1
P
n
+
P
1
, z
2
P
n
+
P
2
, . . . , z
n1
P
n
+
P
n1
, z
n
P
n
,
onde
P
i
=
P
i
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
,1);
em U
n+1
:
P
1
,P
2
, . . . ,P
n
,
onde P
i
= P
i
(z
1
, . . . ,z
n
).
Notemos como a expressão em U
n+1
é diferente das outras. Seu cálculo foi feito
de uma forma bem fácil, pois U
n+1
= H
+
e Φ
n+1
= (Φ
+
)
1
, como tínhamos
observado antes. O que acontece é que o campo tem a mesma expressão que o
campo X . Trataremos com mais detalhes disso no Capítulo 3.
Agora, a expressão de
X na vizinhança V
i
é a mesma que em U
i
, multi-
plicada por (−1)
m1
. Isso ocorre pois Ψ
i
tem a mesma expressão que Φ
i
, e, em
V
i
,
y
m1
n+1
=
z
n
(z)
m1
= (−1)
m1
z
n
(z)
m1
,
onde a primeira igualdade pode ser provada refazendo os cálculos (2.1.9) e (2.1.10),
com y
1
< 0. Dessa forma, temos o campo
X escrito em cada uma das 2(n +
1) vizinhanças, nas coordenadas (z
1
, . . . ,z
n
), lembrando que em cada vizinhança
(z
1
, . . . ,z
n
)’s têm sigificados distintos, e que a expressão final está multiplicada pela
função (z)
m1
.
Definição 2.1.3 Dizemos pontos singulares finitos ( infinitos) de
X os pontos sin-
gulares que pertencem a S
n
\S
n1
(S
n1
).
Observação: Nas vizinhanças U
i
, V
i
, i = 1,2, . . . ,n, os pontos de S
n1
são
levados pelas respectivas parametrizações nas coordenadas (z
1
, . . . ,z
n
), com z
n
= 0.
Isso ocorre, pois z
n
= y
n+1
/y
i
, daí, se y
n+1
= 0 segue que z
n
= 0.
Definição 2.1.4 Seja Y : M R
m
um campo de vetores, onde M R
m
é uma
variedade. Dizemos que um conjunto A M é invariante pelo fluxo de Y , ou
invariante por Y , se dado um fluxo Φ(t) de Y tal que Φ(t
0
) A, então Φ(t)
A, t I, em que I é o intervalo maximal de definiçãp de Φ.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 40
Proposição 2.1.2 O infinito é invariante por
X .
Demonstração: Seja Φ um fluxo de
X , com Φ(t
o
) S
n1
(aqui, consideramos Φ
em coordenadas (Φ
1
, . . . ,Φ
n
) ). Isso significa que Φ satisfaz a equação diferencial
determinada por
X , o que nos dá, em particular, que (a menos de uma multiplicação
por uma função positiva), nas vizinhanças U
i
, i = 1, . . . ,n,
Φ
n
(t) = Φ
n
(t)
P
i
(Φ
1
(t), . . . ,Φ
i1
,1,Φ
i
(t), . . . ,Φ
n
(t)) , Φ
n
(t
0
) = 0,
que são EDO’s de solução Φ
n
(t) = 0, mostrando que Φ(t) S
n1
, t I. Nas
vizinhanças V
i
, os cálculos são análogos, a menos de uma multiplicação por (−1)
m1
.
Observação: Se m é ímpar, então
X é simétrico em relação à origem de R
n+1
.
Isso o corre pois se y U
i
, por exemplo, o simétrico de y pela origem é y V
i
;
daí, z
j
= y
j
/y
i
= (−y
j
)/(−y
i
) são os mesmos para y ou para y. Logo a única
coisa que muda na expressão de
X é uma multiplicação por (−1)
m1
(conforme as
considerações acima), daí, sendo m ímpar, ocorre a simetria. Vale observar também
que as órbitas (ou fluxos) de
X são simétricas, mudando a direção conforme m
é ou não par.
Um resultado bastante interessante que obtivemos é conseqüência do Teo-
rema 1.1.6 (da “Esfera Cabeluda”):
Proposição 2.1.3 Se X (p) = 0, p R
n
, então existe q S
n1
tal que
X (q) = 0.
Demonstração: De fato, temos que
X (y) = 0, y H
+
H
= S
n
\S
n1
(do
contrário, pela definição, X anular-se-ia em R
n
). Se n = 2d, o Teorema da “Esfera
Cabeluda” garante que
X precisa se anular em algum ponto de S
n
, seguindo que se
anula em algum ponto de S
n1
. Se n = 2d + 1, o mesmo Teorema garante que
X se
anula num ponto de S
n1
, pois, agora, n 1 = 2d (observemos que, da Proposição
2.1.2,
X
S
n1
continua um campo vetorial).
2.2 Particularização para um campo vetorial poli-
nomial hamiltoniano
Particularizaremos agora o estudo feito na secção anterior. Tomaremos um campo
específico.
Seja H : R
n
R uma função polinomial, com n = 2d. Nesse caso,
diremos que H é um polinômio hamiltoniano. Definamos o campo vetorial polinomial
hamiltoniano associado a H como
X
H
=
H
∂y
d+1
, . . . ,
H
∂y
2d
,
H
∂y
1
, . . . ,
H
∂y
d
. (2.2.1)
Como veremos a seguir, a Compactificação de Poincaré de X
H
será dada em termos
das derivadas de H . Antes, vejamos o
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 41
Lema 2.2.1 (Teorema de Euler) Se F : R
k
R é um polinômio homogêneo de
grau s, então
k
i=1
p
i
F
∂x
i
(p) = sF (p), p R
k
.
Demonstração: Da homogeneidade, temos que
F (γp
1
, . . . ,γp
k
) = γ
s
F (p
1
, . . . ,p
k
), γ R.
Derivando esta expressão em relação a γ, teremos
F
∂x
1
(γp
1
, . . . ,γp
k
)p
1
+ ··· +
F
∂x
k
(γp
1
, . . . ,γp
k
)p
k
=
s1
F (p).
Fazendo γ = 1 , segue o lema.
Proposição 2.2.1 Se H (x
1
, . . . ,x
n
) é um polinômio hamiltoniano de grau m + 1
em n = 2d variáveis, então:
(i) A Compactificação de Poincaré de X
H
,
X
H
, tem a seguinte expressão
H
∂y
d+1
+ λy
1
, . . . ,
H
∂y
2d
+ λy
d
,
H
∂y
1
+ λy
d+1
, . . . ,
H
∂y
d
+ λy
2d
,λy
n+1
,
onde
H
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m+1
n+1
H
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
,
e
λ =
d
i=1
y
i+d
H
∂y
i
y
i
H
∂y
i+d
.
(ii) O nível de energia {H
= 0}
.
=
y S
n1
| H
(y) = 0
é invariante por
X
H
.
Demonstração: Pelo que definimos em (2.1.5) e no Lema 2.1.1, bem como da
definição de H
, temos que
H
∂y
i
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m
n+1
H
∂y
i
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
=
H
∂y
i
(y
1
, . . . ,y
n+1
), (2.2.2)
para i = 1, . . . ,n, notando que o grau máximo dos polinômios H /∂y
i
é m. Da
definição da Compactificação de Poincaré (equação (2.1.6)), segue que a primeira
coordenada de
X
H
é
H
∂y
d+1
y
2
1
H
∂y
d+1
y
1
y
2
H
∂y
d+2
··· y
1
y
d
H
∂y
2d
+ y
1
y
d+1
H
∂y
1
+ ···+ y
1
y
2d
H
∂y
d
.
Colocando y
1
em evidência e observando a definição de λ, esta expressão torna-se
simplesmente
H
∂y
d+1
+ λy
1
.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 42
Fazendo cálculos análogos para as demais coordenadas, segue (i). Para ver (ii), seja
Φ uma curva integral do campo
X
H
, isto é:
Φ
i
(t) =
X
H
i
(Φ(t)) , t I , i = 1, . . . ,n + 1 ,
onde I é o intervalo maximal de definição de Φ. Considerando l(t) = H
(Φ(t)),
calculemos:
l
(t) =
d
i=1
H
∂y
i
Φ(t)
Φ
i
(t) +
H
∂y
i+d
Φ(t)
Φ
i+d
(t)
+
H
∂y
n+1
Φ(t)
Φ
n+1
(t) =
=
d
i=1
H
∂y
i
Φ(t)
H
∂y
i+d
Φ(t)
+ λΦ
i
(t)
+
+
H
∂y
i+d
Φ(t)
H
∂y
i
Φ(t)
+ λΦ
i+d
(t)

+
H
∂y
n+1
Φ(t)
λΦ
n+1
(t) =
= λ
n+1
i=1
H
∂y
i
Φ(t)
Φ
i
(t)
= λ(m + 1)H
Φ(t)
= λ(m + 1)l(t),
onde na última igualdade utilizamos o fato de H
ser um polinômio homogêneo de
grau m + 1 (o que é fácil de perceber observando a definição de H
) e o Lema 2.2.1.
Supondo Φ(t
0
) {H
= 0}, isto é, H
(Φ(t
0
)) = 0, a seqüência de igualdades acima
nos a seguinte EDO:
l
(t) = (m + 1)λ(t)l(t)
l(t
0
) = 0 ,
que tem solução única l(t) = 0 , t I, seguindo que Φ(t) {H
= 0}, t I.
Daremos, agora, as expressões de
X
H
nas cartas locais (U
i
,Φ
i
)’s e (V
i
Ψ
i
)’s
como na secção anterior. Comecemos os cálculos pela vizinhança U
1
. Da expressão
do campo
X em U
1
(calculada na secção anterior), e lembrando que
H
∂y
i
=
H
∂y
i
(como calculado em (2.2.2)), segue a expressão do campo
X
H
em coordenadas, na
carta U
1
:
z
1
H
∂y
d+1
+
H
∂y
d+2
, . . . , z
d1
H
∂y
d+1
+
H
∂y
2d
, z
d
H
∂y
d+1
H
∂y
1
, . . . ,
z
2d1
H
∂y
d+1
H
∂y
d
, z
2d
H
∂y
d+1
(1,z
1
,...,z
n
)
. (2.2.3)
Notemos que
H
1,
y
2
y
1
, . . . ,
y
n+1
y
1
=
y
n+1
y
1
m+1
H
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
=
1
y
m+1
1
H
(y
1
, . . . ,y
n+1
).
Daí, colocando
Γ(z
1
, . . . ,z
n
)
.
= H
(1,z
1
, . . . ,z
n
), (2.2.4)
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 43
e lembrando que z
i
= y
i+1
/y
1
, teremos
H
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m+1
1
Γ(z
1
, . . . ,z
n
),
o que, derivando em relação a y
1
, nos
H
∂y
1
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = (m + 1)y
m
1
Γ(z
1
, . . . ,z
n
) + y
m+1
1
n
i=1
y
i+1
y
2
1
∂Γ
∂z
i
(z
1
, . . . ,z
n
),
e, derivando em relação a y
i
, nos garante
H
∂y
i
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m
1
∂Γ
∂z
i1
(z
1
, . . . z
n
) , i = 2, . . . ,n.
Substituindo as duas últimas expressões em (2.2.3), segue a expressão do campo
X
H
em U
1
, nas coordenadas (z
1
, . . . ,z
n
):
z
1
∂Γ
∂z
d
+
∂Γ
∂z
d+1
, . . . , z
d1
∂Γ
∂z
d
+
∂Γ
∂z
2d1
, (m + 1)Γ +
n
i=1
i=d
z
i
∂Γ
∂z
i
,
z
d+1
∂Γ
∂z
d
∂Γ
∂z
1
, . . . , z
2d1
∂Γ
∂z
d
∂Γ
∂z
d1
, z
2d
∂Γ
∂z
d
.
Em U
2
, consideremos a função H
:
H
y
1
y
2
,1,
y
3
y
2
, . . . ,
y
n+1
y
2
=
1
y
m+1
2
H
(y
1
, . . . ,y
n+1
),
o que, definindo
Γ(z
1
, . . . ,z
n
)
.
= H
(z
1
,1, . . . ,z
n
), (2.2.5)
nos (com cálculos análogos aos que fizemos no caso de U
1
)
H
(y
1
, . . . ,y
n+1
) = y
m+1
2
Γ(z
1
, . . . ,z
n
).
(Utilizamos a mesma notação Γ em U
2
, embora tenha definição diferente de Γ usado
antes). Fazendo as contas como antes, temos que
H
∂y
1
=y
m
2
∂Γ
∂z
1
,
H
∂y
2
=(m + 1)y
m
2
Γ y
m+1
2
∂Γ
∂z
1
y
1
y
2
2
+
∂Γ
∂z
2
y
3
y
2
2
+ ··· +
∂Γ
∂z
n
y
n+1
y
2
2
H
∂y
i
=y
m
2
∂Γ
∂z
i1
, i = 3, . . . ,n + 1,
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 44
o que, substituindo na expressão de
X calculada na secção anterior (lembrando de
(2.2.2) que
H
∂y
i
=
H
∂y
i
), nos leva a
z
1
∂Γ
∂z
d+1
+
∂Γ
∂z
d
, z
2
∂Γ
∂z
d+1
+
∂Γ
∂z
d+2
, . . . , z
d1
∂Γ
∂z
d+1
+
∂Γ
∂z
2d1
, z
d
∂Γ
∂z
d+1
∂Γ
∂z
1
, (m + 1)Γ +
n
i=1
i=d+1
z
i
∂Γ
∂z
i
, . . . , z
2d1
∂Γ
∂z
d+1
∂Γ
∂z
d1
, z
2d
∂Γ
∂z
d+1
.
Em U
3
, U
4
, . . . , U
d1
temos expressões equivalentes, lembrando que sempre defini-
mos
Γ(z
1
, . . . ,z
n
) = H
(z
1
, . . . ,z
i1
,1,z
i+1
, . . . ,z
n
) . (2.2.6)
Em U
d
, a expressão fica:
z
1
∂Γ
∂z
2d1
+
∂Γ
∂z
d
, z
2
∂Γ
∂z
2d1
+
∂Γ
∂z
d+1
, . . . , z
d1
∂Γ
∂z
2d1
+
∂Γ
∂z
2d2
, z
d
∂Γ
∂z
2d1
∂Γ
∂z
1
, z
d+1
∂Γ
∂z
2d1
∂Γ
∂z
2
, . . . , (m + 1)Γ +
n
i=1
i=2d1
z
i
∂Γ
∂z
i
, z
2d
∂Γ
∂z
2d1
.
Em U
d+1
, a expressão muda um pouco de característica (mas os cálculos seguem a
mesma idéia de antes):
(m + 1)Γ
n
i=1
i=1
z
i
∂Γ
∂z
i
,z
2
∂Γ
∂z
1
+
∂Γ
∂z
d+1
, . . . ,z
d
∂Γ
∂z
1
+
∂Γ
∂z
2d1
,z
d+1
∂Γ
∂z
1
∂Γ
∂z
2
,
z
d+2
∂Γ
∂z
1
∂Γ
∂z
3
, . . . ,z
2d1
∂Γ
∂z
1
∂Γ
∂z
d
,z
2d
∂Γ
∂z
1
.
Em U
d+2
, . . . U
2d1
as expressões seguem a mesma idéia.
Em U
2d
, temos:
z
1
∂Γ
∂z
d
+
∂Γ
∂z
d+1
,z
2
∂Γ
∂z
d
+
∂Γ
∂z
d+2
, . . . ,z
d1
∂Γ
∂z
d
+
∂Γ
∂z
d1
,(m + 1)Γ
n
i=1
i=d
z
i
∂Γ
∂z
i
,
z
d+1
∂Γ
∂z
d
∂Γ
∂z
1
, . . . ,z
2d1
∂Γ
∂z
d
∂Γ
∂z
d1
,z
2d
∂Γ
∂z
d
.
Por fim, em U
2d+1
, ficamos com
∂Γ
∂z
d+1
, . . . ,
∂Γ
∂z
2d
,
∂Γ
∂z
1
, . . . ,
∂Γ
∂z
d
,
notemos que, aqui, Γ = H .
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 45
2.3 O fluxo no infinito
Estudaremos agora como os níveis de energia E
h
.
= H
1
(h) se comportam quando
levados na esfera, e tiraremos alguns resultados de invariância pelo campo
X
H
,
principalmente quando restrito a S
n1
. É em S
n1
que um conjunto invariante
especial é definido. Vamos mostrar que tal conjunto é uma variedade, sob certas
condições, e que todos os pontos singulares infinitos de
X
H
estão neste conjunto.
Teorema 2.3.1 Seja H : R
2d
R um polinômio hamiltoniano de grau m + 1
escrito em sua decomposição homogênea H = H
0
+H
1
+···+H
m+1
. Vale o seguinte:
(i) Consideremos E
0
= H
1
(0). Então os conjuntos
E
+
0
.
= Φ
+
(E
0
) hemisfério norte ,
E
0
.
= Φ
(E
0
) hemisfério sul
são invariantes pelo fluxo de
X
H
;
(ii) A restrição de
X
H
a S
n1
,
X
H
S
n1
, é dada por
H
m+1
∂y
d+1
+λy
1
, . . . ,
H
m+1
∂y
2d
+λy
d
,
H
m+1
∂y
1
+λy
d+1
, . . . ,
H
m+1
∂y
d
+λy
2d
,
onde
λ =
d
i=1
y
i+d
H
m+1
∂y
i
y
i
H
m+1
∂y
i+d
.
Aqui, consideramos y S
n1
y = (y
1
, . . . ,y
n
). Notemos ainda que a
última coordenada de
X
H
S
n1
, que é zero (como podemos ver em (2.1.6)),
foi retirada.
(iii) O conjunto
E
=
y S
n1
| H
m+1
(y
1
, . . . ,y
n
) = 0
=
=
y S
n1
| H
(y
1
, . . . ,y
n
,0) = 0
é invariante pelo fluxo de
X
H
.
(iv) As fronteiras
1
de E
+
0
e E
0
estão contidas em E
.
(v) Se 0 é valor regular de H
m+1
S
n1
, então E
é uma (n 2)-variedade.
(vi) Os pontos singulares de
X
H
S
n1
estão em E
.
1
Aqui é o conceito de fronteira de variedades, como na Definição 1.1.9.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 46
Demonstração de (i): Seja γ uma curva integral de
X
H
tal que γ(t
0
) E
+
0
. Mos-
tremos que γ(t) E
+
0
, t. Consideremos a função real s(t) = H
(Φ
+
)
1
(γ(t))
e
sua derivada:
s
(t) = dH
(Φ
+
)
1
(γ(t))
· d(Φ
+
)
1
γ(t)
· γ
(t) = dH
(Φ
+
)
1
(γ(t))
· d(Φ
+
)
1
γ(t)
·
X
H
(γ(t)) =
= dH
(Φ
+
)
1
(γ(t))
· d(Φ
+
)
1
γ(t)
·
γ
m
n+1
(t)
+
(Φ
+
)
1
(γ(t))
· X
H
(Φ
+
)
1
(γ(t))
=
= γ
m
n+1
(t)dH
(Φ
+
)
1
(γ(t))
· X
H
(Φ
+
)
1
(γ(t))
= 0 ,
onde na terceira igualdade utilizamos a definição de
X
H
(conforme (2.1.2
) e (2.1.4))
e, na última, a definição de X
H
(conforme (2.2.1)). Daí, desde que s(t
0
) = 0, segue
que s(t) = 0, t, o que significa que γ(t) E
+
0
, t. Um raciocínio análogo mostra
a invariância de E
0
.
Demonstração de (ii): Da definição de H
(conforme (i) da Proposição 2.2.1), temos
que
H
(y
1
, . . . ,y
n
,0) = H
m+1
(y
1
, . . . ,y
n
), (2.3.1)
daí, segue que
H
∂y
i
(y
1
, . . . y
n
,0) =
H
m+1
∂y
i
(y
1
, . . . y
n
) , i = 1, . . . ,n.
Substituindo em (i) da Proposição 2.2.1, segue o resultado desejado.
Demonstração de (iii): Notemos que de (2.3.1) a igualdade de conjuntos ocorre.
Como sabemos da Proposição 2.1.2 que S
n1
é invariante por
X
H
, e de (ii) da
proposição 2.2.1 que {H
= 0} também é invariante por
X
H
, segue o resultado.
Demonstração de (iv): Seja y E
+
0
. Então
y = Φ
+
(x) =
x
1
(x)
, . . . ,
x
n
(x)
,
1
(x)
,
com H (x) = 0. Aplicando H
, temos que
H
(y) =
1
(x)
m+1
H (x
1
, . . . ,x
n
) = 0.
Como H
é uma função contínua em S
n
, o raciocínio acima mostra que fazer y tender
a um ponto z ∂E
+
0
por pontos de E
+
0
, faz com que H
(z) = 0. Daí, H
(∂E
+
0
) = 0.
Desde que ∂E
+
0
S
n1
, isso mostra que ∂E
+
0
E
(por (iii)). Analogamente se
mostra que ∂E
0
E
.
Demonstração de (v): De (iii), é claro que
E
=
H
m+1
S
n1
1
{0} .
Então, como H
m+1
S
n1
: S
n1
R é uma função suave e 0 é um seu valor regular,
a Proposição 1.1.5 garante que E
é uma variedade de dimensão (n1)1 = n2.
Demonstração de (vi): De acordo com (ii), os pontos singulares infinitos satisfazem
H
m+1
∂y
d+i
(y) + λy
i
= 0 =
H
m+1
∂y
i
(y) λy
d+i
, i = 1, . . . ,d.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 47
Multiplicando a equação do lado esquerdo por y
i+d
e a do lado direito por y
i
, para
cada i, e somando, ficamos com
n
i=1
y
i
H
m
+
1
∂y
i
= 0 .
Como H
m+1
é homogêneo, o Lema 2.2.1 e a última equação garantem que (m +
1)H
m+1
(y) = 0. Seguindo, da definição de E
, que todo ponto singular infinito está
em E
.
Corolário 2.3.2 Dado H : R
2d
R polinomial, escrito em sua decomposição
homogênea H = H
0
+ H
1
+ ··· + H
m+1
, vale o seguinte:
(i) Se E
h
.
= H
1
(h), para h R, então
E
+
h
.
= Φ
+
(E
h
) e E
h
.
= Φ
(E
h
)
são invariantes por
X
H
.
(ii) As fronteiras de E
+
h
e E
h
estão contidas em E
Demonstração: Escrevendo H
= h + H
0
+ H
1
+ ··· + H
m+1
, temos que
(H
)
1
(0) = {x R
n
| H
(x) = 0} = {x R
n
| H (x) = h} = E
h
.
Daí, repetimos a demonstração de (i) do Teorema anterior para H
, observando que
o resultado não depende de h. Isso mostra (i). Para (ii), basta olhar a demonstração
de (iv) do Teorema anterior e observar que (H
)
S
n1
= H
S
n1
.
Corolário 2.3.3 Se H = h+H
1
+···+H
m+1
, o nível de energia {H
= 0} intercepta
o equador de S
n
no mesmo conjunto E
para qualquer valor de h
Demonstração: Trivial, uma vez que o conjunto E
depende de H
m+1
, como
podemos ver em (iii) do Teorema anterior.
2.4 Propriedades genéricas
Definição 2.4.1 Seja P uma propriedade sobre elementos de um conjunto A R
n
.
Dizemos que P é genérica , ou P vale genericamente, se o conjunto
{x R
n
| P(x) é verdadeira }
é denso em A.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 48
Exemplo: Seja Q uma propriedade em R
n
que vale q.t.p.. Então Q é genérica.
Isso é claro, pois o conjunto dos pontos onde Q vale tem complementar de medida
nula, logo é denso.
Mostraremos nesta Secção que, genericamente, o conjunto E
(definido em
(iii) do Teorema 2.3.1) é uma variedade de dimensão n 2 e que todos os pontos
singulares (finitos ou infinitos) de
X
H
são hiperbólicos. Genericamente, aqui, será
em relação à seguinte identificação:
Seja H
m+1
=conjunto dos polinômios hamiltonianos de grau exatamente m + 1 nas
variáveis (y
1
, . . . ,y
n
) . Identifiquemos H
m+1
com um conjunto aberto de R
N
, onde
N é o número máximo de coeficientes dos polinômios de H
m+1
. Mais precisamente,
seja Φ : H
m+1
R
N
uma função que associa cada polinômio de H
m+1
com seu
vetor de coeficientes numa pré-determinada ordem. Assim, cada polinômio H será
identificado com seu vetor de coeficientes Φ(H ) R
N
.
Observação 1: Não podemos identificar todo R
N
, uma vez que pelo menos um dos
coeficientes dos termos de grau m + 1 precisa ser não nulo.
Observação 2: Φ(H
m+1
) é aberto. De fato, se na parte homogênea de grau m + 1
tivermos k termos, então
Φ(H
m+1
) =
k
i=1
R × ··· × R

Nk
×R × ···× R ×R\{0}

i
×R × ··· × R ,
que é um aberto por ser união de abertos.
Coloquemos em H
m+1
a topologia fraca induzida por Φ, isto é, os abertos de H
m+1
são
Φ
1
(A) | A é aberto de Φ(H
m+1
) R
N
.
Provaremos que a propriedade H H
m+1
tal que E
é uma (n 2)-variedade”
vale genericamente em H
m+1
, identificando H
m+1
com Φ(H
m+1
) R
N
e usando a
Definição 2.4.1 neste conjunto.
O teorema seguinte mostrará mais, mostrará que o conjunto
G
m+1
=
H H
m+1
| E
é uma variedade suave
é tal que Φ
H
m+1
\G
m+1
R
1
(0), onde R : R
N
R é uma função polinomial
não nula. Como conseqüência, desde que R
N
\R
1
(0) é denso em R
n
, seguirá que
Φ(H
m+1
)\R
1
{0} será denso em Φ(H
m+1
), donde Φ(G
m+1
) será denso em Φ(H
m+1
).
Mostrando assim que E
é uma variedade genericamente.
Antes do teorema, vamos introduzir o conceito de resultante entre dois
polinômios, que nos será útil. Sejam P(x) e Q(x) dois polinômios na variável x e
coeficientes em R. A resultante entre P e Q, Res
x
(P,Q), será um número (obtido
como função polinomial dos coeficientes de P e Q), tal que se P e Q tiverem uma
raiz em comum, então Res
x
(P,Q) = 0. Precisamente, se
P(x) =a
0
x
n
+ a
1
x
n1
+ ··· + a
n1
x + a
n
Q(x) =b
0
x
m
+ b
1
x
m1
+ ··· + b
m1
x + b
m
,
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 49
definamos a matriz
A
x
(P,Q)
.
=
a
0
a
1
··· ··· a
n
a
0
a
1
··· ··· a
n
.
.
.
.
.
.
.
.
.
a
0
a
1
··· ··· a
n
b
0
b
1
··· ··· b
m
b
0
b
1
··· ··· b
m
.
.
.
.
.
.
.
.
.
b
0
b
1
··· ··· b
m
m linhas
n linhas ,
onde os espaços vazios são preenchidos com zeros. Coloquemos a seguinte
Definição 2.4.2 Definimos a resultante entre os polinômios P e Q como:
Res
x
(P,Q) = det
A
x
(P,Q)
.
Observação 1 (propriedade chave da resultante): Notemos que se t
é uma
raiz comum a P e Q, então
y =
t
n+m1
,t
n+m2
, . . . ,t
,1
é uma solução não trivial do sistema homogêneo A
x
(P,Q)y = 0. Garantindo-nos
que Res
x
(P,Q) = 0.
Observação 2: Se exigirmos que P tenha sempre grau n e Q tenha sempre grau
m, a função Res
x
(P,Q) (polinomial nos coeficientes a
o
, . . . ,a
n
,b
0
, . . . ,b
m
) não é
identicamente nula. Para ver isso, basta colocar P
0
(x) = x
n
e Q
0
(x) = x
m
+ 1 e
observar que Res
x
(P
0
,Q
0
) = 1.
Ainda, antes do teorema, estabeleceremos o
Lema 2.4.1 Dado H = H
0
+ H
1
+ ··· + H
m+1
, um polinômio hamiltoniano
decomposto em suas partes homogêneas de graus 0,1, . . . ,m + 1, respectivamente,
então
H
∂y
i
=
H
1
∂y
i
+ ··· +
H
m+1
∂y
i
,
onde H
j
/∂y
i
0, ou H
j
/∂y
i
é homogêneo de grau j 1. Além disso, existe i
0
tal que a segunda opção ocorre para j = m + 1 isto é, tal que H
m+1
/∂y
i
0
é
homogêneo de grau m.
Demonstração: Se H
j
tem y
i
em sua formação, então H
j
/∂y
i
é homogêneo de grau
j1, senão é 0. Além disso, se H
m+1
/∂y
i
= 0, i, H
m+1
é constante, contradizendo
o fato de ser um polinômio de grau m + 1.
Teorema 2.4.1 Existe R : R
N
R, uma função polinomial não identicamente
nula, tal que, se H H
m+1
\G
m+1
, então R
(
φ(H )) = 0.
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 50
Demonstração: Se H / G
m+1
, então de (v) do Teorema 2.3.1, segue que 0 não é valor
regular de H
m+1
S
n1
. Daí, da Definição 1.1.7, segue que existe um ponto crítico
de H
m+1
S
n1
, (y
1
, . . . ,y
n
) em S
n1
(notemos que, novamente, estamos olhando
y S
n1
S
n
sem a sua última coordenada que é zero ). Do Teorema dos
Multiplicadores de Lagrange
2
, temos que existe µ R tal que
H
m+1
∂y
i
(y
1
, . . . ,y
n
) + µy
i
= 0 , i = 1, . . . ,n (2.4.1)
(uma vez que estamos olhando um ponto crítico da função H
m+1
na esfera S
n1
, que
é obtida como no exemplo do final da Subsecção 1.1.2). Multiplicando a i-ésima
equação por y
i
, para cada i, e somando, teremos
n
i=1
y
i
H
m+1
∂y
i
+ µ
n
i=1
(y
i
)
2
= 0. (2.4.2)
Como H
m+1
é homogêneo de grau m + 1, o Lema 2.2.1 garante que
n
i=1
y
i
H
m+1
∂y
i
(y
1
, . . . ,y
n
) = (m + 1)H
m+1
(y
1
, . . . ,y
n
),
e daí, como (y
1
, . . . ,y
n
) S
n1
H
1
m+1
(0), segue de (2.4.2) que µ = 0. Dessa forma,
(2.4.1) nos que o sistema polinomial
H
m+1
∂y
1
(y
1
, . . . ,y
n
) = 0
.
.
.
H
m+1
∂y
n
(y
1
, . . . ,y
n
) = 0
(2.4.3)
tem uma solução não nula (y
1
, . . . ,y
n
) S
n1
. Tomando L
k
.
= H
m+1
/∂y
k
, k =
1, . . . ,n, definamos
R
k
(y
3
, . . . ,y
n
)
.
=Res
y
2
L
1
(1,y
2
,y
3
, . . . ,y
n
),L
k
(1,y
2
,y
3
, . . . ,y
n
)
k = 2,3, . . . ,n , (2.4.4)
onde Res
y
2
L
1
(1,y
2
,y
3
, . . . ,y
n
),L
k
(1,y
2
,y
3
, . . . ,y
n
)
= Res
y
2
P(y
2
),Q(y
2
)
, com
P(y
2
) =L
1
(1,y
2
, . . . ,y
n
) e
Q(y
2
) =L
k
(1,y
2
, . . . ,y
n
).
2
Ver página 171 de [6]
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 51
Mais ainda, definamos indutivamente
R
2k
(y
4
, . . . ,y
n
)
.
=Res
y
3
R
2
(y
3
, . . . ,y
n
),R
k
(y
3
, . . . ,y
n
)
k = 3,4, . . . ,n ,
R
23k
(y
5
, . . . ,y
n
)
.
=Res
y
4
R
23
(y
4
, . . . ,y
n
),R
2k
(y
4
, . . . ,y
n
)
k = 4,5, . . . ,n ,
R
234k
(y
6
, . . . ,y
n
)
.
=Res
y
5
R
234
(y
5
, . . . ,y
n
),R
23k
(y
5
, . . . ,y
n
)
k = 5, . . . ,n ,
.
.
.
R
23···n
.
=Res
y
n
R
23···(n2)(n1)
(y
n
),R
23···(n2)n
(y
n
)
.
Notemos que no último passo, R
23···n
é um número (na verdade, é uma função poli-
nomial nos coeficientes do polinômio H , pois, por construção, R
k
(y
3
, . . . ,y
n
) é um
polinômio em y
3
, . . . ,y
n
e nos coeficientes dos polinômios H
m+1
/∂y
1
e H
m+1
/∂y
k
,
que têm coeficientes como múltiplos dos coeficientes de H
m+1
. Daí, pode ser consi-
derado como polinomial em y
3
, . . . ,y
n
e nos coeficientes do polinômio H . Indutiva-
mente, chegamos que R
23···n
é polinomial nos coeficientes de H ). Afirmamos que se
a solução (y
1
, . . . ,y
n
) do sistema (2.4.3) for tal que y
1
= 0, então R
23···n
= 0. De
fato, se y
1
= 0, tomando y
k
= y
k
/y
1
, k = 2, . . . ,n, os polinômios
ξ −L
i
(1,ξ,y
3
, . . . y
n
) , i = 1, . . . ,n ,
têm ξ = y
2
como raiz comum, pois da homogeneidade de L
i
(que vem do Lema
2.4.1), segue que
L
i
(1,y
2
, . . . ,y
n
) = L
i
1
y
1
(y
1
,y
2
, . . . ,y
n
)
=
1
y
1
m
L
i
(y
1
, . . . ,y
n
) = 0.
Então, da propriedade chave de resultante (conforme a observação antes do teo-
rema), segue que R
k
(y
3
, . . . ,y
n
) = 0, para k = 2, . . . ,n. Daí, R
k
(ξ,y
4
, . . . ,y
n
), k =
2, . . . ,n têm a raiz ξ = y
3
em comum, seguindo que R
2k
(y
4
, . . . ,y
n
) = 0. Repetindo
tal argumento indutivamente, chegamos que R
23···n
= 0. Definamos
R
1
.
= R
23···n
,
que é uma função polinomial nos coeficientes de H , não identicamente nula (pela
observação 2 após a Definição 2.4.2), com a propriedade de que se H / G
m+1
e o
ponto crítico (y
1
, . . . ,y
n
) tiver a primeira coordenada não nula, então R
1
(Φ(H )) =
0. Mas nem sempre teremos y
1
= 0, a única garantia é que existe j tal que y
j
= 0
(pois y
S
n1
). Neste caso, basta definir R
j
de maneira análoga à R
1
, onde em
(2.4.4) devemos trocar L
k
(1,y
2
, . . . ,y
n
) por
L
k
(y
1
, . . . ,1

j
, . . . ,y
n
).
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 52
Por fim, basta definir
R
.
=
n
i=1
R
j
,
que é uma função polinomial não identicamente nula nos coeficientes dos polinômios
de H
m+1
, com a propriedade de que se H / G
m+1
, R(Φ(H )) = 0.
Definição 2.4.3 Seja Y : M R
n
um campo de vetores, onde M R
n
é uma
m-variedade. Dizemos que um ponto singular y de Y é hiperbólico se todos os
autovalores de dY
y
têm parte real não nula (com Y escrito em um sistema de
coordenadas).
Mais ainda, dizemos que y é um se tais autovalores têm parte real de mesmo
sinal: estável se o sinal for positivo e instável se o sinal for negativo.
Observação: Observemos que essa definição não depende do sistema de coorde-
nadas.
No mesmo sentido de antes, mostraremos agora que, genericamente em H
m+1
, todos
os p ontos singulares (tanto finitos como infinitos) de
X
H
são hiperbólicos. Isso será
consequência do próximo teorema. Antes, vejamos o
Lema 2.4.2 Dado um polinômio real q(x), definamos os polinômios reais q
1
(x) e
q
2
(x) por q(ix) = q
1
(x) + iq
2
(x). Então os coeficientes de q
j
(x), j = 1,2, são funções
polinomiais dos coeficientes de q(x), e, se q(x) tem uma raiz puramente imaginária
ib, então Res
x
(q
1
,q
2
) = 0.
Demonstração: Que q
1
e q
2
estão bem definidos e que seus coeficientes são funções
polinomiais dos coeficientes de q pode ser visto trivialmente decompondo o número
complexo q(ix) em suas partes real e imaginária. Se q(ib) = 0, então q
1
(b) +
iq
2
(b) = 0 q
1
(b) = q
2
(b) = 0, isto é, b é raiz comum entre q
1
e q
2
, seguindo
da nossa propriedade chave de resultante que Res
x
(q
1
,q
2
) = 0.
Seja
J
m+1
=
H H
m+1
| todos os pontos singulares de
X
H
são hiperbólicos
.
Teorema 2.4.2 Existe
R : R
N
R, uma função polinomial não identicamente
nula, tal que, se H H
m+1
\J
m+1
, então
R(Φ(H )) = 0.
Demonstração: Consideremos as equações que definem os pontos singulares de
X
H
na carta local (U
1
,Φ
1
), com as coordenadas (z
1
, . . . ,z
n
) (conforme a Secção 2.1):
Z
i
(z
1
, . . . ,z
n
) = 0, i = 1, . . . ,n ,
e seja q(t) o polinômio característico de dZ
z
(dependendo de z = ( z
1
, . . . ,z
n
)). O
Lema 2.4.2 nos q
1
e q
2
polinômios reais definidos em função de q. Consideremos,
CAPÍTULO 2. A TÉCNICA DA COMPACTIFICAÇÃO DE POINCARÉ 53
então, o novo sistema de equações, que tem coeficientes que são funções polinomiais
dos coeficientes de H :
Z
1
(z
1
, . . . ,z
n
) = 0
.
.
.
Z
n
(z
1
, . . . ,z
n
) = 0
q
1
(z
1
, . . . ,z
n
,t) = 0
q
2
(z
1
, . . . ,z
n
,t) = 0
(2.4.5)
Se H / J
m+1
, então existe um ponto singular de
X
H
, z
= (z
1
, . . . ,z
n
), que não
é hiperbólico. Se z
U
1
, isto significa que existe um autovalor λ de dZ
z
que é
da forma λ = ib. Do Lema 2.4.2 então segue que (z
1
, . . . ,z
n
,b) é uma solução do
sistema (2.4.5). Usando uma construção quase análoga à usada na demonstração
do Teorema 2.4.1, temos que existe uma função polinomial
R
1
, nos coeficientes dos
polinômios de H
m+1
, tal que
R
1
(Φ(H )) = 0. Os detalhes da construção seguem:
Chamando z
n+1
.
= t, L
i
.
= Z
i
, i = 1,. . . ,n e L
n+1
.
= q
1
e L
n+2
.
= q
2
, definamos
indutivamente
R
k
(z
2
, . . . ,z
n+1
)
.
=Res
z
1
L
1
(z
1
, . . . ,z
n+1
),L
k
(z
1
, . . . ,z
n+1
)
k = 2, . . . ,n + 2 ,
R
2k
(z
3
, . . . ,z
n+1
)
.
=Res
z
2
R
2
(z
2
, . . . ,z
n+1
),R
k
(z
2
, . . . ,z
n+1
)
k = 3, . . . ,n + 2 ,
R
23k
(z
4
, . . . ,z
n+1
)
.
=Res
z
3
R
23
(z
3
, . . . ,z
n+1
),R
2k
(z
3
, . . . ,z
n+1
)
k = 4, . . . ,n + 2 ,
.
.
.
R
234···(n+2)
.
=Res
z
n+1
R
23···n(n+1)
(z
n+1
),R
23···n(n+2)
(z
n+1
)
.
Basta colocar
R
1
.
= R
234···(n+2)
.
Daí, L
1
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
,b) e L
k
(z
1
,z
2
, . . . ,z
n
,b) olhados como polinômios em z
1
têm a
raiz z
1
em comum, seguindo que R
k
(z
2
, . . . ,z
n
,b) = 0, e assim sucesivamente até
que R
234···(n+2)
= 0. Logo,
R
1
(Φ(H )) = 0. Por fim, basta colocar
R
.
=
n+1
i=1
R
i
,
onde os
R
j
são construídos da mesma forma, considerando
X
H
em U
j
. Daí, se o
ponto crítico z
U
j
, segue que
R
j
(Φ(H )) = 0. Como a união dos U
i
’s cobrem S
n
,
segue o resultado.
Capítulo 3
Considerações finais e exemplos
3.1 Observações sobre a compactificação de Poin-
caré
A compactificação de Poincaré não é uma aplicação injetora, como podemos ver no
Lema 3.1.1 Seja X
k
= (x)
2k
P
1
, . . . ,P
n
, com os P
i
’s polinomiais e como em
(2.1.1). Então
X
i
=
X
j
, para todos i,j N.
Demonstração: Basta observar que o grau de X
k
é m + 2k, onde m é o máximo
dos graus dos P
i
’s, e que
(Φ
+
)
1
(y)
= 1/y
n+1
. Daí vemos que
X
k
=
P, onde
P =
P
1
, . . . ,P
n
. Isso porque de (2.1.2) e (2.1.4), temos
X
k
= y
m+2k1
n+1
1
y
n+1
2k
+
x
(P)
x
(P)
=
P.
O próximo teorema coloca uma condição suficiente em um campo definido
no hemisfério norte H
+
para que ele seja um múltiplo da compactificação de Poincaré
de um campo polinomial definido em R
n
:
Teorema 3.1.1 Seja Y =
Y
1
, . . . ,Y
n+1
um campo polinomial definido em H
+
S
n
com os graus das partes homogêneas de todos Y
i
’s côngruos dulo 2, isto é:
“os graus das componentes homogêneas não nulas de Y
i
são todos pares, para todo
i = 1, . . . ,n + 1, ou são todos ímpares”. Então existe um inteiro k 1 tal que
Y = y
k
n+1
X
H
+
,
onde
X é a compactificação de Poincaré de algum campo polinomial X de R
n
.
Demonstração: Utilizando a notação da demonstração da Proposição 2.1.1, temos
que
df
+
y
=
1/y
n+1
0 ··· 0 y
1
/y
2
n+1
0 1/y
n+1
··· 0 y
2
/y
2
n+1
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
0 0 ··· 1/y
n+1
y
n
/y
2
n+1
,
54
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 55
e, se y =
x
1
/(x), . . . ,x
n
/(x),1/(x)
, com definida em (2.1.1),
df
+
y
= (x)
1 0 ··· 0 x
1
0 1 ··· 0 x
2
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
0 0 ··· 1 x
n
. (3.1.1)
Agora, colocando
m = max
grau(Y
1
), . . . ,grau(Y
n+1
)
,
definamos
X (x
1
, . . . ,x
n
) = (x)
m1
df
+
y
(Y (y)) ,
com y = Φ
+
(x). Afirmamos que X é polinomial, com
l
.
= max
grau(X
1
), . . . ,grau(X
n
)
m + 1. (3.1.2)
De fato, se definirmos
A(x)
.
=
1 0 ··· 0 x
1
0 1 ··· 0 x
2
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
0 0 ··· 1 x
n
,
temos de (3.1.1) que
X (x) = A(x)
(x)
m
Y
x
1
(x)
, . . .
x
n
(x)
,
1
(x)
,
e, se Y
i
j
for a parte homogênea de grau j de Y
i
,
(x)
m
Y
i
j
x
1
(x)
, . . . ,
x
n
(x)
,
1
(x)
= (x)
mj
Y
i
(x
1
, . . . ,x
n
,1),
que é uma expressão polinomial (pois m j é par) com grau m, seguindo que X
é polinomial de “grau” l m + 1. Agora, compactificando, temos
X (y) = y
l1
n+1
+
x
(
X (x)) = y
l1
n+1
d(f
+
1
)
x
(x)
m1
df
+
y
(
Y (y))
=
= y
l1
n+1
(x)
m1
Y (y) = y
lm
n+1
Y (y),
(onde na última igualdade fizemos o seguinte cálculo: (y
1
/y
n+1
, . . . ,y
n
/y
n+1
) =
n+1
i=1
y
2
i
/y
2
n+1
= 1/y
n+1
, observando que estamos olhando somente y
n+1
> 0),
seguindo que Y (y) = y
ml
n+1
X (y). Chamando k = m l, temos de (3.1.2) que
k 1.
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 56
Observação: A compactificação de Poincaré de um campo X satisfaz a condição
colocada no teorema acima, isto é, os graus das partes homogêneas de todas as
coordenadas de X são côngruos dulo 2. Para ver isso, basta observar a expressão
(2.1.6).
Observemos ainda que um campo vetorial definido em S
n
pode não ter uma única
forma de escrita, por exemplo, em S
1
, seja o campo Y = (Y
1
,Y
2
), com
Y
1
= y
2
1
1.
Desde que vale y
2
1
+ y
2
2
= 1, podemos também escrever
Y
1
= y
2
2
.
Assim, a formulação do teorema acima depende fortemente da maneira em que
o campo está escrito. Além disso, quando analisamos a expressão de um campo
polinomial em S
n
, não podemos afirmar “à primeira vista” se ele tem ou não uma
representação homogênea, isto é, se ele tem uma representação em que todas as
suas coordenadas tenham mesmo grau. Desde que 1 y
2
i
=
n+1
i=j=1
y
2
j
, a expressão
(2.1.6) garante que a compactificação de Poincaré de um campo polinomial tem
uma representação homogênea. Dessa forma, se um campo satisfaz as hipóteses do
teorema acima, ele tem uma representação homogênea, ou tem uma representação
em que é homogêneo multiplicado por y
1
n+1
. Isso o seguinte
Corolário 3.1.2 Se Y for um campo polinomial em H
+
com a hipótese do Teo-
rema 3.1.1, então ele tem uma representação em que suas coordenadas são todas
homogêneas de mesmo grau, ou ele é da forma (y
1
n+1
× “homogêneo”).
3.2 Exemplos
Nesta secção apresentaremos alguns exemplos.
3.2.1 O caso planar no infinito
Consideraremos aqui polinômios hamiltonianos H : R
2
R, de grau m + 1. que
vamos considerar outro sistema de coordenadas em S
2
: as coordenadas cilíndricas.
Se (y
1
,y
2
,y
3
) S
2
, para cada 1 < y
3
< 1 fixo, consideremos a circunferência
1 y
2
3
cos θ,
1 y
2
3
senθ
que circunda S
2
na altura y
3
. Se π/2 < θ < π/2,
isso uma parametrização da vizinhança
A
1
= S
2
\ {(y
1
,0,y
3
) | 0 y
1
1 e 1 y
3
1} .
Mais precisamente, seja
B =
(θ,y
3
) R
2
|
π
2
< θ <
π
2
e 1 < y
3
< 1
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 57
e L : B A
1
, definida por
L(θ,y
3
) =
1 y
2
3
cos θ,
1 y
2
3
senθ,y
3
.
Desde que T : A
1
B definida por
T (y
1
,y
2
,y
3
) =
arctan
y
2
y
1
,y
3
é a inversa de L, segue que T é uma parametrização para a vizinhança A
1
. (Para
ver que uma é a inversa da outra, basta perceber que, em A
1
,
arccos
y
1
1 y
2
3
= arcsen
y
2
1 y
2
3
= arctan
y
2
y
1
,
pois, se y
1
=
1 y
2
3
cos θ, então y
2
=
1 y
2
1
y
2
3
=
(1 y
2
3
)(1 cos
2
θ) =
1 y
2
3
senθ, seguindo que θ = arcsen
y
2
/
1 y
2
3
e, dividindo adequadamente,
que θ = arctan (y
2
/y
1
) ). Trocando-se os papéis de y
3
com y
2
, por exemplo, e
tomando y
1
com cuidado, conseguimos outra vizinhança e cobrimos a esfera. Os
resultados a seguir serão feitos para a vizinhança A
1
(uma vez que somente uma
semi-circunferência é deixada fora), mas podem ser feitos analogamente para a outra
vizinhança.
Lema 3.2.1 O campo
X
H
escrito nas coordenadas (θ,y
3
) tem a seguinte expressão:
Z (θ,y
3
) =
y
3
R
∂y
3
(θ,y
3
) (m + 1)R(θ,y
3
), y
3
R
∂θ
(θ,y
3
)
,
onde
R(θ,y
3
) = H
T
1
(θ,y
3
) = H
1 y
2
3
cosθ,
1 y
2
3
senθ,y
3
, (3.2.1)
e H
(y
1
,y
2
,y
3
) é definida em (i) da Proposição 2.2.1.
Demonstração: Como fizemos anteriormente, o campo
X
H
nas coordenadas
(θ,y
3
) será calculado por Z (θ,y
3
) = dT
y
X
H
(y), com y = T
1
(θ,y
3
):
dT
y
X
H
(y) =
∂y
1
(arctan(y
2
/y
1
))
∂y
2
(arctan(y
2
/y
1
)) 0
0 0 1
y
1
y
2
y
3
,
onde
(y
1
,y
2
,y
3
) =
X
H
(y) =
H
∂y
2
+ λy
1
,
H
∂y
1
+ λy
2
,λy
3
,
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 58
com λ = y
2
H
/∂y
1
y
1
H
/∂y
2
, conforme (i) da Proposição 2.2.1. Seguindo daí
que
Z (θ,y
3
) =
y
2
y
1
1 y
2
3
+
y
1
y
2
1 y
2
3
, y
3
=
=
1
1 y
2
3
y
2
H
∂y
2
+ y
1
H
∂y
1
,y
3
y
2
H
∂y
1
y
1
H
∂y
2
. (3.2.2)
Agora, como
R
∂y
3
(θ,y
3
) =
H
∂y
1
· (1 y
2
3
)
1
2
y
3
cos θ
H
∂y
2
· (1 y
2
3
)
1
2
y
3
senθ +
H
∂y
3
=
=
y
1
y
3
1 y
2
3
H
∂y
1
y
2
y
3
1 y
2
3
H
∂y
2
+
H
∂y
3
,
usando o Lema 2.2.1 em H
, temos
y
3
R
∂y
3
(
m
+
1
)
R
=
1
1 y
2
3
y
1
y
2
3
H
∂y
1
+
y
2
y
2
3
H
∂y
2
+ y
3
H
∂y
3
1
1 y
2
3
y
1
(1 y
2
3
)
H
∂y
1
+ y
2
(1 y
2
3
)
H
∂y
2
y
3
H
∂y
3
=
=
1
1 y
2
3
y
2
H
∂y
2
+ y
1
H
∂y
1
. (3.2.3)
Além disso,
y
3
R
∂θ
= y
3
H
∂y
1
1 y
2
3
senθ
H
∂y
2
1 y
2
3
cos θ
=
= y
3
y
2
H
∂y
1
y
1
H
∂y
2
. (3.2.4)
Substituindo (3.2.3) e (3.2.4) em (3.2.2), temos que
Z (θ,y
3
) =
y
3
R
∂y
3
(θ,y
3
) (m + 1)R(θ,y
3
), y
3
R
∂θ
(θ,y
3
)
.
As propriedades de
X
H
no infinito estão resumidas no seguinte
Teorema 3.2.1 (i) O conjunto dos pontos singulares infinitos é E
.
(ii) Os pontos singulares infinitos são dados pelas raízes da função periódica de
período , R(θ,0).
(iii) Se (θ
,0) é um ponto singular, então (θ
+ π,0) também o é. O que significa
que os pontos singulares aparecem aos pares.
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 59
(iv) Se θ
é uma raiz simples de R(θ,0), então o ponto singular (θ
,0) é um nó.
Neste caso, temos duas possibilidades:
(a) se m + 1 é par e (θ
,0) é um estável, então (θ
+ π,0) também é
um estável;
(b) se m + 1 é ímpar e (θ
,0) é um estável, então (θ
+ π,0) é um
instável, e vice e versa.
Demonstração: sabemos do Teorema 2.3.1 que os pontos singulares estão em
E
. Se existe x E
que não é ponto singular de Z =
X
H
, então o fluxo Φ que
passa por x tem dimensão 1 e está em E
(uma vez que (iii) do Teorema 2.3.1
garante que E
é invariante por
X
H
). Mas isso é uma contradição, pois na Secção
2.4 mostramos que E
é uma variedade de dimensão n 2 = 0. Isso mostra (i).
Como E
= (H
)
1
(0) {(θ,0)}, a definição de R em (3.2.1) e o que acabamos de
ver garantem que os pontos singulares são todos dados por R(θ,0) = 0, provando
(ii). Da homogeneidade de H
, segue que
R(θ,0) = H
(cos θ,senθ,0) = (−1)
m+1
H
(
cos(θ + π),sen(θ + π),0
) =
= (−1)
m+1
R(θ + π,0), (3.2.5)
o que, juntamente com (ii), mostra (iii). Para provar (iv), observemos a matriz
jacobiana de Z =
X
H
num ponto singular (θ
,0) (a expressão de Z foi dada no
Lema 3.2.1 acima):
−(m + 1)
R
∂θ
(θ
,0) #
0
R
∂θ
(θ
,0)
.
Seus autovalores são −(m + 1)
R
∂θ
(θ
,0) e
R
∂θ
(θ
,0). Assim, se θ
é uma raiz
simples,
R
∂θ
(θ
,0) = 0, o que mostra que (θ
,0) é um ponto singular hiperbólico,
de fato, um nó, uma vez que os autovalores têm parte real de mesmo sinal. Mais
ainda, da relação (3.2.5), segue
R
∂θ
(θ
,0) = (−1)
m+1
R
∂θ
(θ
+ π,0).
Então, sendo m + 1 par e (θ
,0) um estável (instável), segue que (θ
+ π,0)
também é do mesmo tipo. Se m + 1 for ímpar, (θ
,0) e (θ
+ π,0) têm estabilidades
opostas, como podemos ver.
3.2.2 O caso monomial no infinito
Consideraremos aqui um polinômio hamiltoniano H : R
n
R, de grau m + 1, tal
que sua parte homogênea de maior grau tenha a forma
H
m+1
(x
1
, . . . ,x
n
) = x
α
1
1
x
α
2
2
···x
α
n
n
,
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 60
onde α
j
N, j = 1, . . . n, e
α
j
= m + 1. Daremos uma descrição completa de E
e do fluxo invariante em E
. Seja
S
n2
j
=
(y
1
, . . . ,y
n
) S
n1
| y
j
= 0
.
Proposição 3.2.2 (i) E
=
α
j
1
S
n2
j
.
(ii) Se α
j
2, então S
n2
j
consiste inteiramente de pontos singulares (isto é,
S
n2
j
P, onde P é o conjunto dos pontos singulares de
X
H
).
(iii) Se α
j
, α
k
1, j = k, e n 4, então S
n2
j
S
n2
k
é uma esfera formada por
pontos singulares.
(iv) Se α
j
= 1, então em S
n2
j
não mais pontos críticos do que os descritos
em (iii). Mais ainda:
(a) se α
j+d
1, então toda solução começa em alguma esfera de pontos
singulares S
n2
j
S
n2
j
e termina em S
n2
j
S
n2
j+d
;
(b) se α
j+d
= 0, então toda solução começa e termina em alguma esfera
de pontos singulares S
n2
j
S
n2
k
.
Demonstração: E
S
n1
está definido pela equação H
n+1
(y
1
, . . . ,y
n
) = 0, isto
é: y
α
1
1
···y
α
n
n
= 0, que tem solução exatamente em
α
j
1
S
n2
j
,
o que mostra (i). De (ii) do Teorema 2.3.1, temos que
X
H
S
n1
tem as seguintes
entradas
y
i
=
H
m+1
∂y
i+d
+ λy
i
y
i+d
=
H
m+1
∂y
i
+ λy
i+d
, (3.2.6)
para i = 1, . . . ,d, e
λ =
d
i=1
y
i+d
H
m+1
∂y
i
y
i
H
m+1
∂y
i+d
.
Se α
j
2, em H
m+1
/∂y
i
, para cada i = 1, . . . ,n, existe uma potência positiva de y
j
,
ou H
m+1
/∂y
i
= 0. Daí, se y
j
= 0, todas as entradas de
X
H
S
n1
se anulam, como
podemos observar nas equações acima. Portanto, se y S
n2
j
, segue que y é ponto
singular, o que mostra (ii). Para ver (iii), basta observar que em H
m+1
/∂y
j
existe
uma potência positiva de y
i
ou de y
k
(ou H
m+1
/∂y
j
= 0). Daí, se y
i
= y
k
= 0,
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 61
segue que
X
H
= 0. Para demonstrar (iv), vamos primeiro observar duas coisas. A
primeira delas é que k, com a
k
1, S
n2
k
é invariante, p ois para k d, se Φ é um
fluxo de
X
H
S
n1
, com Φ
k
(t
0
) = 0, de acordo com as equações (3.2.6), temos que
Φ
k
(t) = Φ
1
(t)
a
1
···Φ
k
(t)
a
k
···Φ
k+d
(t)
a
k+d
1
···Φ
n
(t)
a
n
+ λΦ
k
(t),
seguindo que Φ
k
(t) = 0, t, o que significa que Φ(t) S
n2
, t. O mesmo raciocínio
segue se k > d. A segunda coisa a ser vista é que se a
j
= 1, para j d, as expressões
do campo
X
H
S
n1
restrito a S
n2
j
são
y
j+d
=
1 + y
2
j+d
H
m+1
∂y
j
y
k
=y
j+d
y
k
H
m+1
∂y
j
, k = j + d, (3.2.7)
o que segue do seguinte: se y S
n2
j
, λ = y
j+d
H
m+1
/∂y
j
(como se facilmente
da definição de λ), seguindo de (3.2.6) que se k d, y
k
= y
j+d
y
k
H
m+1
/∂y
j
. Se
k = i + d, com i = j, segue que y
k
= y
j+d
y
k
H
m+1
/∂y
j
. Agora, se k = j +d, y
j+d
=
H
m+1
/∂y
j
+ y
j+d
H
m+1
/∂y
j
y
j+d
=
1 + y
2
j+d
H
m+1
/∂y
j
. Dessa forma, de
(3.2.7), os pontos singulares estão somente em alguma esfera S
n2
j
S
n2
k
. Mais
ainda, se temos um fluxo com condição inicial Φ(t
0
) / S
n2
j
S
n2
k
para todo k,
segue que no intervalo 1 < y
j+d
< 0 nenhuma coordenada Φ
k
(t) se anula (senão
Φ(t) S
n2
j
S
n2
k
, t, pela invariância vista acima). Daí, se a
j+d
= 0, a solução
não pára em S
n2
j
S
n2
j+d
, seguindo para S
n2
j
S
n2
k
(pois o campo será zero se
y
k
= 0, como podemos ver nas equações (3.2.7)). Se a
j+d
1, é fácil de ver que a
solução pára em S
n2
j
S
n2
j+d
.
3.2.3 Mais alguns exemplos
Exemplo (Compactificação de Poincaré para um campo gradiente): Seja
H : R
n
R um polinômio de grau m + 1. O campo gradiente de H é
H (x) =
H
∂x
1
, . . . ,
H
∂x
n
.
Utilizando a expressão (2.1.6), onde
P
i
(y) = y
m
n+1
H
∂x
i
y
1
y
n+1
, . . . ,
y
n
y
n+1
=
H
∂y
i
(y), i = 1, . . . ,n,
em que H
é como definido em (i) da Proposição 2.2.1, temos que a primeira coor-
denada da Compactificação de Poincaré de H ,
H , é
H
1
=
H
∂y
1
y
1
H
∂y
1
y
1
y
1
H
∂y
2
y
2
··· y
1
H
∂y
n
y
n
=
=
H
∂y
1
+ y
1
−(m + 1)H
(y) +
H
∂y
n+1
y
n+1
,
CAPÍTULO 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS E EXEMPLOS 62
onde utilizamos a homogeneidade de H
e o Teorema de Euler (Lema 2.2.1). Com
considerações análogas nas demais coordenadas, chegamos ao seguinte:
H =
H
∂y
1
+ λ
y
1
, . . . ,
H
∂y
n
+ λ
y
n
,λ
y
n+1
, (3.2.8)
onde
λ
= −(m + 1)H
+ y
n+1
H
∂y
n+1
.
Uma observação interessante que pode ser feita é que, embora em R
2
temos que
H =
0 1
1 0
X
H
,
não existe nenhuma transformação linear entre
X
H
e
H , como podemos ver to-
mando algum polinômio particular, ou mesmo para um H qualquer observando as
expressões destes dois campos em S
2
(em (i) da proposição 2.2.1 e em (3.2.8)).
Em (ii) da Proposição 2.2.1, provamos que {H
= 0} é invariante por
X
H
.
O próximo exemplo mostra que isso não ocorre para
H .
Exemplo: { H
= 0} não é invariante por
H , pois seja H (x
1
,x
2
) = x
1
. Temos
que H
(y
1
,y
2
,y
3
) = y
1
e λ
= y
1
, logo
H =
1 y
2
1
, y
1
y
2
, y
1
y
3
.
Mas, seja Φ(t) =
tanh(t),Φ
2
(t),Φ
3
(t)
, de tal forma que Φ seja fluxo de
H .
Notemos que Φ
1
(0) = tanh(0) = 0, seguindo que H
(Φ(0)) = 0, porém H
(Φ(t)) =
Φ
1
(t) = tanh(t) = 0 t = 0.
Observação: Este mesmo exemplo também nos diz que E
não é invariante por
H .
Com uma pequena variação neste exemplo, também segue que {H
= c} não é
invariante por
H para nenhuma constante c. Agora, mesmo para
X
H
, temos o
seguinte
Exemplo: Para toda constante c = 0, {H
= c} não é invariante por
X
H
, pois, em
R
2
, tomemos H (x
1
,x
2
) = x
1
. Aqui, H
(y
1
,y
2
,y
3
) = y
1
e λ = y
2
, seguindo que
X
H
=
y
1
y
2
, 1 + y
2
2
,y
2
y
3
. (3.2.9)
Se {H
= c} fosse invariante por
X
H
, um fluxo Φ = (Φ
1
,Φ
2
,Φ
3
) de
X
H
tal que
l(t
0
) = H
(Φ(t
0
)) = c (onde l = H
Φ), teria que manter l(t) = c, t. Daí
0 = l
(t) = λl(t) = Φ
2
(t)c, t (podemos ver a segunda igualdade com cálculos
análogos aos da prova de (ii) da Proposição 2.2.1), seguindo que Φ
2
(t) = 0, t.
Mas Φ(t) = (Φ
1
(t),0,Φ
3
(t)) não pode ser fluxo de
X
H
, como podemos ver em
(3.2.9).
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[3] DELGADO, J.; LACOMBA, E. A.; LLIBRE, J.; PÉREZ, E. Poincaré com-
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[6] LIMA, E. L. Curso de Análise Volume 2. Sexta Edição. Rio de Janeiro:
Instituto de Matemática Pura e Aplicada, CNPQ, 2000. 547p.
[7] MILNOR, J. W. Topology from the differentiable viewpoint. Seventh
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[8] MUNKRES, J. R. Topology: a first course. Englewood Cliffs, New Jersey:
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[9] DOS SANTOS FILHO, J. R. S. Injective mappings and solvable vector fields
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[10] RUDIN, W. Real and Complex Analysis. New York: McGraw-Hill, 1966.
412p.
63
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