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CONSTRUINDO SENTIDOS PARA A INCLUSÃO
DAS CRIANÇAS DE SEIS ANOS DE IDADE
NO ENSINO FUNDAMENTAL:
UM DIÁLOGO COM PROFESSORES.
Rita de Cássia Barros de Freitas Araújo
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
RITA DE CÁSSIA BARROS DE FREITAS ARAÚJO
CONSTRUINDO SENTIDOS PARA A INCLUSÃO DAS CRIANÇAS DE SEIS ANOS
DE IDADE NO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS:
UM DIÁLOGO COM PROFESSORES
Juiz de Fora
2008
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RITA DE CÁSSIA BARROS DE FREITAS ARAÚJO
CONSTRUINDO SENTIDOS PARA A INCLUSÃO DAS CRIANÇAS DE SEIS ANOS
DE IDADE NO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS:
UM DIÁLOGO COM PROFESSORES
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal de Juiz de Fora, na
linha de pesquisa Linguagem,
Conhecimento e Formação de
Professores para obtenção do título de
Mestre em Educação.
Orientadora: Profª. Drª. Déa Lúcia
Campos Pernambuco
Co-orientadora: Profª. Drª. Maria Teresa
de Assunção Freitas
Juiz de Fora
2008
TERMO DE APROVAÇÃO
RITA DE CÁSSIA BARROS DE FREITAS ARAÚJO
CONSTRUINDO SENTIDOS PARA A INCLUSÃO DAS CRIANÇAS DE SEIS ANOS
DE IDADE NO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS:
UM DIÁLOGO COM PROFESSORES
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no
Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Juiz de Fora, pela seguinte banca examinadora:
______________________________________________
Profª. Drª. Déa Lúcia Campos Pernambuco – Orientadora
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFJF
___________________________________________________
Profª. Drª. Maria Teresa de Assunção Freitas – Co-orientadora
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFJF
___________________________________________
Profª. Drª. Cecilia Maria Aldigueri Goulart
Programa de s-Graduação em Educação da UFF
Juiz de Fora, 03 de abril de 2008.
Dedico este trabalho aos meus pais, meus
eternos professores, à minha amada e
incansável a e ao meu esposo,
Marcelo, por seu amor, compreensão e
companheirismo.
AGRADECIMENTOS
Sonho que se sonha só é um sonho, mas
sonho que se sonha junto é realidade.
RAUL SEIXAS
Agradeço a Deus por seu amor incondicional e por sua divina sabedoria capaz de
iluminar meus caminhos e de orientar-me, sempre na hora certa, em direção a
realização de meus sonhos.
Aos meus Pais, Darci e Márcia, por serem meus maiores exemplos, por terem
insistido e nunca desistido de me incentivarem na continuidade dos meus estudos e,
acima de tudo, por oportunizarem a realização de meus sonhos.
À minha Avó, Terezinha, por fazer parte da minha vida, por acreditar em meus
sonhos e por me apoiar sempre. “Vó, sem vo a realização deste sonho não teria
sido possível!
Ao meu marido, Marcelo, por seu amor, carinho, eterna alegria e compreensão. Por
seu ombro amigo nas horas de angústia, por seu companheirismo e auxílio sempre
e, principalmente, por ter feito do meu sonho o seu sonho.
Aos meus irmãos de sangue e de coração, Ricardo, Eliane e Deise. Obrigada por
existirem e por fazerem parte da minha vida.
Aos meus sobrinhos amados por tornarem minha vida mais alegre e a todos os
meus familiares pelo apoio e respeito as minhas intermináveis horas de estudo.
Às minhas amigas Ana e viam, companheiras de jornada. Obrigada por
compartilharem comigo este momento, obrigada pelas horas alegres que tivemos,
pelo incentivo constante, pelo apoio nas horas difíceis e por permitirem que esta
caminhada fosse menos solitária.
À professora co-orientadora, Drª. Maria Teresa de Assunção Freitas, por sua
atenção, por sua orientação, paciência e amizade, mas, acima de tudo, por seu
exemplo de garra, coragem, determinação e profissionalismo.
À professora orientadora, Drª. Déacia Campos Pernambuco, por ter acreditado na
minha capacidade de construir este trabalho.
À professora Drª. Cecilia M.A. Goulart por seu carinho, por sua leitura cuidadosa e
por suas contra-palavras.
À professora Drª. Léa Stahlschmidt Pinto Silva pelos diálogos, atenção, carinho e
amizade.
À professora Drª. Wanda M. J. Aguiar que muito contribuiu, com seus estudos e
sugestões de leitura, para a construção deste trabalho.
Às quatro professoras, Margarida, Cris, Sofia e Valéria, que construíram comigo este
trabalho e que permitiram a construção compartilhada do conhecimento. A vocês
meu muito obrigada, meu respeito e admiração.
Às duas professoras que possibilitaram a realizão do estudo piloto.
A todos os professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em
Educação e aos colegas de mestrado por tornarem esta caminhada mais prazerosa.
Aos diretores das escolas onde realizei a pesquisa por terem tão bem me recebido.
Aos colegas de trabalho que sempre somaram e contribuíram com discussões
pertinentes.
Às crianças que sempre me instigaram.
Enfim, a todos aqueles que estiveram a me incentivar e colaborar para que esse
sonho se tornasse realidade o meu eterno agradecimento!
RESUMO
O presente trabalho constituiu-se como uma pesquisa qualitativa de cunho histórico-
cultural, tendo como objetivo compreender, através dos discursos, os sentidos que
os professores do ano do Ensino Fundamental estão construindo para a inclusão
das crianças de seis anos de idade nesse segmento de ensino. Os construtos
teóricos de Lev Semenovich Vygotsky e Mikhail Bakhtin, principais representantes
da perspectiva histórico-cultural, apresentaram-se como fundamentos teóricos
capazes de oferecer um sólido embasamento para a realização de tal pesquisa.
Participaram como sujeitos quatro professoras do primeiro ano do Ensino
Fundamental de duas escolas da Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, sendo
uma escola reconhecida como de Ensino fundamental e outra reconhecida como de
Educação Infantil. Além dos dados levantados em entrevistas com as professoras,
foram realizadas leituras dos Projetos Político - Pedagógicos das duas escolas e
algumas observações in loco, registradas em um diário de campo. A análise dos
dados baseou-se nos estudos de Aguiar (2000, 2001, 2005) e Aguiar & Ozella
(2006) e esorganizada em três cleos de significação: (i)a nova formatação do
ensino: impactos e desafios; (ii)infância, desenvolvimento e aprendizagem;
(iii)reflexões sobre dicotomias. Nesta pesquisa, concluiu-se que os sentidos
construídos para a inclusão das crianças de seis anos de idade no Ensino
Fundamental de nove anos foram-se constituindo a partir do imaginário pedagógico
a respeito do trabalho a ser exercido na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e
no trabalho a ser realizado com as crianças de seis anos. Constatou-se ainda a falta
de apoio pedagógico às professoras, o desconhecimento dos documentos oficiais
que orientam o trabalho com as crianças de seis anos, a necessidade de
fundamentação teórica mais consistente por parte das docentes e o movimento
coerente e positivo de construção de sentidos e de busca de conhecimentos que se
estabeleceu a partir da nova formatação do ensino. Ressaltou-se tamm a
importância da realizão de pesquisas que dêem continuidade a este trabalho.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino Fundamental de nove anos. Educação Infantil.
Crianças de seis anos. Construção de sentidos.
ABSTRACT
The present work was a result of a qualitative research under a historical cultural
perspective aimed at understanding the different meanings first-year primary school
teachers are providing through their discourse for including six-year-old children in
this school grade. The theories by Lev Semenovich Vygotsky and Mikhail Bakhtin,
who were the major representatives of the historical cultural perspective, proved to
be a solid basis for carrying out the research. Four first-year primary school teachers
from two schools of the Municipal School Network of Juiz de Fora were selected as
subjects, one school being ranked as Primary School and the other as Secondary
School. Apart from data collecting by means of interviews with the teachers, the
educational policy guidelines from these schools were analysed, and some in loco
observations were made and recorded as field work. Data analysis was based on the
works by Aguiar (2000, 2001, 2005), and Aguiar & Ozella (2006) and was divided up
into three meaninful blocks: (i) the new educational arrangement: impacts and
challenges; (ii) childhood, development and learning; and (iii) reflections on
dichotomies. In this research the meanings constructed for the inclusion of six-year-
old children in the nine-year school schedule were found to be built through the
pedagogical imagery about the work to be done in both primary and secondary
schools and the work to be done with six-year-old children. Lack of pedagogical
support and knowledge about official documents guiding the work with six-year-olds
were also found, apart from the need for more thorough theoretical framework on the
teachers´ part and for a consistent process of meaning construction and knowledge
search which was established by the new educational arrangement. The importance
of carrying out continued research in this area was also highlighted.
Key words: Nine-year Schooling. Primary School. Six-year-old Children. Meaning
Construction.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................
10
1 SEGUINDO AS PISTAS DA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ..............................
17
2 CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS À LUZ DA PERSPECTIVA HISTÓRICO-
CULTURAL .........................................................................................................
36
3 CAMINHOS METODOLÓGICOS .....................................................................
43
3.1 Revelando a metodologia e os instrumentos utilizados ..........................
43
3.2 O estudo piloto ............................................................................................
48
3.3 A entrada no campo de pesquisa ..............................................................
52
3.3.1 Conhecendo as escolas investigadas ........................................................ 54
3.3.2 Conhecendo as professoras sujeitos da pesquisa ..................................... 62
3.3.3 Conhecendo o projeto da Secretaria de Educação de Juiz de Fora:
“O Ensino Fundamental de nove anos” ...............................................................
68
3.4 O processo utilizado para organização e a análise dos dados ...............
69
4. APRESENTÃO E ANÁLISE DOS DADOS CONSTRUÍDOS ....................
74
4.1 A nova organização do ensino: impactos e desafios ..............................
74
4.1.1 Objetivos da mudança no discurso das professoras .................................. 74
4.1.2 Emões frente à mudança ........................................................................
81
4.1.3. O foco na alfabetização ............................................................................. 88
4.2 Infância, desenvolvimento e aprendizagem ..............................................
96
4.3 Reflees sobre dicotomias .......................................................................
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................
115
REFERÊNCIAS ...................................................................................................
123
APÊNDICES ........................................................................................................
132
10
INTRODUÇÃO
Uma proposta é um caminho, não é um lugar...
Toda proposta contém uma aposta. Nasce de uma
realidade que pergunta e é também uma busca de
uma resposta. É, pois, um diálogo. Toda proposta
é situada: traz consigo o lugar de onde fala e a
gama de valores que a constitui, traz também as
dificuldades que enfrenta, os problemas que
precisam ser superados e a direção que a orienta.
KRAMER
Reconhecendo que toda proposta nasce de uma realidade que pergunta,
trazendo consigo o lugar de onde fala e a gama de valores que a constitui,
apresento neste primeiro momento o nascedouro da minha proposta.
Sou filha de professores: mãe professora das séries iniciais do Ensino
Fundamental (EF) e de Português para o Ensino Médio, e pai professor de
Matemática Financeira, o que me oportunizou um convívio bem direto com as
mazelas e com as belezas originadas no cerne das instituições escolares. Nesse
contexto comecei a construir minha identidade de educadora, acompanhando meus
pais em suas preocupações com a qualidade
1
do ensino, com o processo de
ensino/aprendizagem, e, acima de tudo, com a busca de formação contínua.
Fiz o curso de Magistério no Instituto Estadual de Educação de Juiz de Fora e
logo em seguida fiz o curso de Graduação em Pedagogia na Universidade Federal
de Juiz de Fora.
Minha incursão pelos meandros da pesquisa ocorreu no período de minha
graduação em Pedagogia na Universidade Federal de Juiz de Fora, no ano de 1997,
enquanto bolsista da FAPEMIG, atuando no Núcleo de Estudos Sociais do
Conhecimento e da Educação, na pesquisa “Perfil e Desempenho de Professores e
Alunos da Rede de Ensino de Primeiro Grau do Município de Juiz de Fora”. Essa
experiência permitiu-me direcionar o olhar, aguçando-o para além do senso comum,
tornando-o um pouco mais científico.
Iniciei minha carreira no Magistério logo após passar no concurso da
Prefeitura de Juiz de Fora, no ano de 1999, época em que ainda era estudante de
1
Qualidade é um conceito subjetivo que deve ser explicado à luz do contexto em que estiver inserido.
Considero aqui, qualidade em educação, como aquela que seja democrática, que reconheça as
peculiaridades de cada fase e que possibilite a formação crítica, assegurando a formação de
cidadãos e cidadãs plenos de direitos e também deveres.
11
Pedagogia. Desde meu início como professora trabalhei com turmas de Educação
Infantil (EI- crianças de 4, 5 e 6 anos) e com turmas de primeira série do Ensino
Fundamental (EF- crianças de 7 anos). No início, trabalhar com essas faixas etárias
foi um “acaso”, pois ainda era contratada e, sempre que chegava às escolas pegava
as turmas que estavam sobrando. Mas, frente ao “acaso” fui aprendendo mais sobre
o trabalho com essas crianças e fui aos poucos me identificando com ele. Assim,
quando fui efetivada na Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, no ano de 2002,
tive a oportunidade de optar por trabalhar em uma escola de EI, onde estou até hoje.
No ano de 2004, trabalhando com uma turma do período da Educação
Infantil
2
recebi a notícia da ampliação do EF de oito para nove anos, incluindo nesse
segmento as crianças de seis anos de idade. Na Rede Municipal de Ensino de Juiz
de Fora - MG, assim como na Rede Estadual de Educação de Minas Gerais, a
reformulação do EF teve início no ano de 2004 a partir da Resolução 001/2003
3
. As
escolas Municipais, que até então atendiam as crianças de quatro a seis anos na EI,
passaram a atender as crianças de seis anos no ano do EF. as escolas
Municipais de EF, que atendiam crianças a partir dos sete anos, comaram a
atender as crianças de seis anos no 1º ano do EF, de acordo com a demanda
expressa no cadastro escolar
4
.
Foi exatamente neste novo cenário de mudanças que me senti “no olho do
furacão”, participando dos debates na escola e compartilhando com os demais
professores os sentimentos de angústia, ansiedade e medo. Mas, foi também nesse
cenário, que me percebi como uma das protagonistas desta história, como um dos
milhares elos da corrente dessa mudança, que luta em prol da educação neste país,
buscando considerar a criança, o jovem, o adolescente, o adulto o como aluno
apenas, mas como sujeito de sua aprendizagem, como cidadão pleno de direitos e
deveres. Ao me perceber como uma das protagonistas da mudança e compreender
que meus sentimentos de medo, angústia e ansiedade estavam relacionados ao
meu desconhecimento do processo de efetivação da ampliação do EF, procurei
2
Crianças de seis anos.
3
Resolução 001/2003- Art 1º - O Ensino Fundamental, no Município de Juiz de Fora, terá a duração
de 9 (nove) anos e poderá ser organizado em ciclos de formação ou em séries anuais de acordo com
a Proposta Político-Pedagógica da escola.
Art 2º- A ampliação do Ensino Fundamental para 9 (nove) anos dar-se-á de forma gradativa,
iniciando nas escolas que já mantém o Ensino Fundamental e Educação Infantil, entrando em vigor a
partir do ano letivo de 2004, desde que a escola tenha condições físicas para este atendimento.
Parágrafo 1º. A matrícula inicial no Ensino Fundamental dar-se-á a partir de 6(seis) anos de idade,
completos até 30 de abril do ano letivo em curso.
4
Informações cedidas pela Secretaria de Educação de Juiz de Fora.
12
estudar e entender tal processo. Era a minha realidade perguntando!”. Comecei
então a estudar o tema, a ler os documentos oficiais elaborados para a
implementação do EF de nove anos e para a orientação do trabalho com as crianças
de seis anos.
Reconhecendo que uma proposta é um diálogo, julguei ser pertinente
compartilhar, nesta pesquisa, o que compreendi naquele momento sobre o
movimento referente à ampliação do EF, a partir da vivência enquanto professora de
crianças de seis anos e das leituras e estudos empreendidos então.
Compreendi que a Lei Federal nº. 11.114/2005
5
que tornou obrigatória a
matrícula de crianças com seis anos de idade no EF e a Lei Federal nº.
11.274/2006
6
que ampliou o EF obrigatório de oito para nove anos vieram legitimar
um movimento crescente em busca da ampliação da educação obrigatória no Brasil.
Um movimento que pode ser percebido desde 1961, com a Lei de Diretrizes e Bases
(LDB) nº. 4.024/61
7
, que estabelecia quatro anos de ensino obrigatório. Nesse
período, o Brasil assumia a ampliação para seis anos, até 1970, quando então, no
ano seguinte, a LDB nº. 5.692/71
8
definia oito anos para o ensino obrigatório.
em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9.394
9
,
sinalizava para um EF obrigatório de nove anos, a iniciar-se aos seis anos de idade.
Em 2001 esse indicativo tornou-se meta no Plano Nacional de Educação, na Lei nº.
10.172
10
e, a partir dessa meta, muitos Estados, assim como Minas Gerais
11
,
5
"Art. 32 - O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola
pública a partir dos seis anos, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]”
6
Art. 32 - O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola
pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]”
7
(LDB) nº 4.024/61: Art. 26 - O ensino primário será ministrado, no mínimo, em quatro séries anuais.
Parágrafo único. Os sistemas de ensino poderão estender a sua duração até seis anos, ampliando,
nos dois últimos, os conhecimentos do aluno e iniciando-o em técnicas de artes aplicadas,
adequadas ao sexo e à idade.
8
LDB nº 5.692/71: Art. 18 - O ensino de 1º grau terá a duração de oito anos letivos e compreenderá,
anualmente, pelo menos 720 horas de atividades.
Art. 19 - Para o ingresso no ensino de 1º grau, deverá o aluno ter a idade mínima de sete anos.
§ As normas de cada sistema disporão sobre a possibilidade de ingresso no ensino de primeiro
grau de alunos com menos de sete anos de idade.
9
LDB 9.394/96: Art. 87, parágrafo Cada Município e, supletivamente, o Estado e a União,
deverá:
I - matricular todos os educandos a partir dos sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis
anos, no ensino fundamental.
10
PNE - Lei nº 10.172
10
: 2.3 Objetivos e Metas
2. Ampliar para nove anos a duração do ensino fundamental obrigatório com início aos seis anos de
idade, à medida que for sendo universalizado o atendimento na faixa de 7 a 14 anos.
11
Decreto nº 43.506 de 06/08/03: Art 1º- Fica instituído o ensino fundamental de nove anos de
duração nas escolas da rede estadual de ensino de Minas Gerais, com matrícula a partir dos seis
anos de idade/ Resolução SSE nº 430 de 07/08/03: Art 1º- O ingresso no ensino fundamental de
13
iniciaram o processo de ampliação do EF de oito para nove anos. Em 2005 e 2006
esta meta foi alcançada através das Leis 11.114/2005 e 11.274/2006.
Entendi ainda que a reformulação do EF visou qualidade do processo
educacional, mesmo que tenha sido uma decisão unilateral do governo sob a qual
existam, como metas, entre outras, o percentual educacional mais positivo em
relação à oferta de vagas e o aumento de verbas referentes ao mero de alunos
atendidos no EF
12
. Mas, tamm compreendi, que para que a qualidade fosse
garantida, seria necessário que nós, professores e pesquisadores, zessemos por
isso.
De acordo com os primeiros documentos oficiais elaborados para a
orientação da nova formatação do ensino, “Orientações para a Organização do Ciclo
Inicial de Alfabetização”
13
(Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, 2004) e
“Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis
anos de idade”
14
(MEC, 2006), a ampliação do EF para nove anos de duração, com a
inclusão das crianças de seis anos de idade, visa a assegurar a todas as crianças
um tempo mais longo de convívio escolar e com maiores oportunidades de
aprendizagem, diminuindo o fosso existente entre os que freqüentam a escola desde
a EI, e aqueles que ingressam nesta instituição, pela primeira vez, apenas aos sete
anos. Sendo assim, o que era para alguns, passou a ser direito de todos. Entretanto,
cabe ressaltar que a aprendizagem não depende apenas do aumento do tempo de
permanência na escola, mas tamm do emprego mais eficaz desse tempo.
Diante desse novo cenário e referendada pelo artigo 23 da LDB
15
a Educação
Básica poderá se organizar das seguintes formas: (i) séries; (ii) períodos; (iii) ciclos;
nove anos de duração na rede estadual de ensino de Minas Gerais, com matrícula a partir dos seis
anos de idade, ocorrerá no ano de 2004, nas escolas que ofereçam as séries iniciais desse nível de
ensino.
12
“[...] A antecipação da matrícula no Ensino Fundamental de crianças de seis anos, com
reconhecidas exceções, em muitos sistemas municipais, não visou necessariamente à melhoria da
qualidade, mas de fato, aos recursos do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do
Ensino Fundamental) , uma vez que o aluno passou a ser considerado como ‘unidade monetária’ [...]”
– CEB 24/2004 – Relator: Murilo de Avelar Hingel.
13
Coleção constituída, atualmente (2006), por seis cadernos elaborados pelo Centro de Alfabetização
Leitura e Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais. Esta coleção foi lançada no ano de 2004
tendo como objetivo principal discutir, com os educadores do Estado de Minas Gerais, instrumentos
pedagógicos a serem compartilhados entre as escolas para a elaboração, a execução e a avaliação
de seus projetos para o ensino inicial da língua escrita, da alfabetização.
14
Documento lançado pelo MEC, no ano de 2006, tendo como foco principal orientações
pedagógicas que respeitem as crianças como sujeitos da aprendizagem.
15
LDB 9394/96: Art. 23 - “A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos
semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na
idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o
interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar”.
14
(iv) alternância regular de períodos de estudos; (v) grupos o-seriados; (vi) com
base na idade; (vii) com base na competência; (viii) com base em outros cririos;
(ix) por forma diversa de organizão, sempre que o interesse do processo de
aprendizagem assim o recomendar. Em apêndice apresento um quadro com as
possibilidades de organizões (APÊNDICE A).
A implantação do EF de nove anos no Estado de Minas Gerais, de acordo
com as “Orientações para a Organizão do Ciclo Inicial de Alfabetização” (UFMG,
2004) e o Documento “Ensino Fundamental de nove anos: Orientações para a
Inclusão da Criança de seis anos de Idade” (MEC, 2006), foi organizado com ênfase
na alfabetização e no letramento.
Na coletânea organizada pela UFMG (2004) é apresentada a justificativa para
a reorganização do EF no Estado e para a ênfase atribuída ao processo de
alfabetização e letramento devido à constatação de que a escola vem produzindo
analfabetos e analfabetos funcionais, ou seja: “pessoas que, embora dominem as
habilidades básicas do ler e do escrever, não são capazes de utilizar a escrita na
leitura, na escrita e na produção de textos na vida cotidiana ou na escola, para
satisfazer as exigências do aprendizado”. (UFMG, 2004, p.13)
Tamm, nessa coleção, são apresentadas sugestões de atividades,
orientações de avaliação processual e diagnóstica, propostas de objetivos e
currículos para cada fase do ciclo inicial de alfabetização. Ela apresenta-se,
portanto, como rica fonte de estudos, análises e críticas para todos que pretendem
trabalhar nos anos iniciais do EF.
O documento “Ensino Fundamental de nove anos: Orientões para a
Inclusão da Criança de seis anos de Idade” (MEC, 2006), é constituído por nove
capítulos que têm como foco principal fortalecer o debate com os professores e
gestores sobre a infância na Educação Básica e sobre o papel do professor frente às
crianças.
Em dezembro de 2005, foi repassado às escolas o “Documento Introdutório
das Diretrizes Educacionais para a Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora:
escola com compromisso social”. Esse documento teve como objetivo orientar a
organização das Escolas Municipais enquanto espaço de promão de uma
significativa aprendizagem dos alunos, compreendendo e superando
qualitativamente barreiras como as taxas de repetência e multirepetências. Porém,
as questões referentes à ampliação do EF e ao atendimento das crianças de seis
15
anos nesse segmento do ensino foram apresentadas superficialmente,
demonstrando que muito ainda teria que ser estudado e discutido mesmo entre os
gestores.
Tais considerações, realizadas a partir de minhas leituras, discussões com os
colegas de trabalho e de minha prática pedagógica, levaram-me a sentir como se
estivesse no momento exato em que um processo de mudança começava a ocorrer
no cenário da educação brasileira. Desta forma, percebi-me em um rico momento, o
de começar a rever o papel do sistema educacional brasileiro, bem como o papel
dos professores, da EI e do EF. O momento de (re)pensar os problemas da
segmentação do ensino, as perspectivas e concepções de infância,
desenvolvimento, aprendizagem, alfabetização, letramento, avaliação, tempo e
espaço escolares. Enfim, nenhum minuto antes e nenhum minuto depois,
simplesmente o momento exato de pensar, conhecer e compreender os impactos e
os desafios emergidos com a ampliação do EF para nove anos a iniciar-se aos 6
anos de idade. Mobilizada por esse desejo, acreditando na possibilidade de fazer
algo que efetivamente contribuísse com a busca pela qualidade do ensino e
acreditando na necessidade de estudar sempre, enveredei pelos caminhos do
Mestrado em Educação.
Percebendo que não só eu, mas que todos os professores são elos desta
corrente, protagonistas capazes de auxiliar no sucesso e/ou fracasso do processo de
ensino/aprendizagem e no processo de implementação da ampliação do EF, tive
como objetivo, neste trabalho de pesquisa, compreender, através dos discursos, os
sentidos que os professores do 1º ano do EF estão construindo para a inclusão das
crianças de seis anos de idade nesse segmento de ensino. Ao realizar esta
pesquisa, procurei contribuir com o movimento em prol de uma educação de
qualidade para todos. Além disto, busquei fomentar o debate entre os sujeitos desta
pesquisa, acreditando na possibilidade de mobilizá-los a se perceberem também
protagonistas desta história, elos da corrente.
Para alcançar tal objetivo formulei as seguintes questões: (i) Como os
professores do 1º ano do EF estão compreendendo a ampliação desse segmento do
ensino? (ii) Como os professores do ano do EF estão compreendendo a inclusão
das crianças de seis anos nesse segmento do ensino? (iii) O professor do ano do
EF teve algum contato com os documentos elaborados para subsidiar a
implementação do EF?
16
Na introdução compartilhei um pouco da minha hisria, do problema, dos
objetivos e do próprio tema a ser pesquisado. Esbocei algumas questões relevantes
sobre a ampliação do EF e a inclusão das crianças de seis anos neste segmento.
Tudo isso visando situar o leitor, tamm um co-autor, à medida que pensando nele
escrevo e dele dependerá a interpretação do que aqui será exposto.
No capítulo 1, apresento como refinei meu objetivo de pesquisa e construí as
questões norteadoras a partir das pistas da revisão da literatura, que mostrou como
o objeto desta pesquisa estava sendo tratado na literatura e nas pesquisas
acadêmicas. Em seguida, no capítulo 2, apresento o arcabouço teórico que
fundamentou todo o processo de realização da pesquisa. No capítulo 3, apresento a
metodologia e os instrumentos utilizados, o processo de realização das entrevistas,
bem como descrevo o estudo piloto, a minha entrada no campo de pesquisa, o
contexto e os sujeitos da pesquisa, e o processo utilizado para a construção e a
análise dos dados. O capítulo 4 foi destinado à apresentação e discussão dos dados
construídos. Por último, nas considerações finais, reconhecendo que um caminho
não é um lugar, apresento um breve resumo do caminho percorrido na realização
desta pesquisa, as considerações emergidas desse caminho, bem como os novos
caminhos possíveis.
17
1 SEGUINDO AS PISTAS DA REVISÃO BIBLIOGFICA
Relacionar as descobertas feitas durante o estudo
com o que existe na literatura é fundamental
para que se possa tomar decisões mais seguras
sobre as direções em que vale a pena concentrar
o esforço e as atenções.
LÜDKE & ANDRÉ
Na busca de orientações que me guiassem na tomada de decisões mais
seguras sobre as direções que deveria seguir para percorrer o caminho desta
pesquisa, procurei, através da revisão bibliográfica, dialogar com trabalhos
existentes os quais, de alguma maneira, discutissem queses referentes à
ampliação do EF de oito para nove anos, incluindo, nesse segmento do ensino, as
crianças de seis anos de idade.
Ao iniciar o processo de revisão bibliográfica, analisando teses, dissertações
e livros publicados nos últimos anos, percebi que o tema EF aparece em número
relevante. Os trabalhos, em sua maioria preocupados em entender os problemas
enfrentados pela escola pública, discutem a gestão escolar, os aspectos
metodológicos e curriculares, o fazer pedagógico, a organização em ciclos, o
processo de avaliação, o processo de alfabetizão e outros mais gerais. Segundo
Arelaro (2005), o EF tem sido o vel de ensino mais pesquisado nos últimos 15
anos, representando quase a metade do total das publicações acadêmicas na área
da educação neste período.
Entretanto, constatei que, por se tratar de um tema relativamente novo,
estudos sobre a ampliação do EF e a inclusão das crianças de seis anos nesse
segmento do ensino eram praticamente inexistentes, começando a aparecer em
publicações de periódicos (científicos ou não) e em eventos científicos, a partir de
2003. Digo que este tema é relativamente novo porque, apesar de já estar sinalizado
desde 1996, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9.394 e de ter
se transformado em meta em 2001, através da Lei nº. 10.172, somente em 2005 e
2006, através da promulgação das Leis nº. 11.114/2005 e nº. 11.274/2006, a
ampliação do EF obrigatório de nove anos, a iniciar-se aos seis anos de idade,
passou a se efetivar em âmbito nacional.
Sendo assim, diante da falta de dissertações, teses e livros concluídos e
publicados sobre o tema proposto, concentrei meus esforços em procurar trabalhos
18
publicados em eventos e artigos de periódicos a partir do ano de 2003. Portanto,
organizei a apresentação deste capítulo seguindo uma lógica de ordem crescente,
apresentando os trabalhos de acordo com a época em que foram publicados.
Saliento ainda que compreendi a revisão bibliográfica como um processo, portanto,
embora o tenha iniciado em meados de 2006, tive o cuidado em continuar buscando,
durante toda a construção da pesquisa, artigos e trabalhos com os quais pudesse
dialogar.
A compreensão da revisão como um processo acabou por me proporcionar o
encontro com os dois primeiros livros que apresentaram discuses sobre a
ampliação do EF, e sobre o trabalho com as crianças de seis anos, lançados na 30ª
reunião da Associação Nacional de s-Graduação e Pesquisa em Educação
(ANPED out. de 2007), período em que acreditava ter concluído esta revisão.
Portanto, a discussão sobre estes dois livros foi incluída no final deste capítulo,
seguindo a ordem cronológica já proposta para esta apresentação.
Os Artigos publicados em periódicos não científicos e na imprensa escrita
foram os primeiros a abordar a amplião do EF, incluindo neste as criaas de seis
anos. A maioria desses artigos se restringia a militar contra ou a favor desta
mudança no sistema educacional, apresentando argumentos de várias origens para
fundamentar suas posições.
Ao fazer um levantamento em sites de jornais por meio de busca a partir das
palavras-chave “ensino fundamental de nove anos”, encontrei na Folha de São
Paulo e na Folha Dirigida as seguintes manchetes: “Aluno pode ser prejudicado com
a ampliação do ensino, diz especialista(08/06/2003); “Alunos mais ricos têm pré-
escolas” (08/06/2003); “Ensino fundamental de nove anos beneficia estudantes mais
pobres” (06/02/2006); “11,5% das crianças de seis anos do país estão fora da sala
de aula” (07/02/2006); “Novo ensino fundamental ‘rebatiza’ pré-escola sem alterar
currículo” (07/02/2006); “Ministro diz que MEC não indicará método pedagógico”
(24/04/2006); “Criança de seis anos: educação infantil ou ensino fundamental?”
(31/08/2006).
Todos os textos referentes a essas manchetes seguiram a tendência das
preocupações sobre benefícios e prejuízos da ampliação do EF. Os argumentos
encontrados nestes textos, para justificarem o posicionamento contra a mudança
anunciada, dizem respeito ao despreparo do professor; ao risco da não adaptação
das criaas de seis anos nessa nova modalidade de ensino, antecipando assim o
19
fracasso escolar; ao problema da idade de corte entre EI e EF; ao perigo de as redes
de ensino adotarem a repetência na primeira série, aos seis anos e, ainda, ao
desrespeito às etapas do desenvolvimento, as quais não se alteram via decretos e
Leis Federais.
Os argumentos que advogam a favor referem-se à possibilidade de todas as
crianças do Brasil terem a mesma oportunidade, sejam pobres ou ricas; ao aumento
do tempo para o processo de aprendizagem; ao início antecipado do processo de
alfabetização que contribui para uma melhor qualificação do aluno no futuro.
Tais artigos, publicados nos jornais, apresentam tanto problemas políticos
quanto preocupação da população e dos especialistas mediante as mudanças no
cenário educacional. Além disto, revelam as diversas concepções de aprendizagem,
desenvolvimento, alfabetização, infância, criança, aluno e escola que permeiam os
discursos veiculados. Esses discursos, construídos histórica e culturalmente,
revelam o caleidoscópio que constitui os saberes humanos; saberes muitas vezes
paradoxos, mas complementares na construção do conhecimento. Segundo Goulart
(2007), apoiamos-nos em concepções, em pressuposições e em verdades
provisórias, com as quais vamos construindo concretamente conhecimentos e
práticas. Construímos também castelos, que muitas vezes percebemos serem de
areia, mas que fazem parte de qualquer processo.
A revista “Pátio: educação infantil”, embora não seja considerada científica, é
uma produção bastante veiculada entre os profissionais da educação. Ela veicula
temas atuais e relevantes discutidos por estudiosos e pesquisadores de renome da
área educacional, tanto que, foi uma das primeiras, se não a primeira, a apresentar a
discussão sobre a ampliação do EF de nove anos. Nela encontrei os artigos de
Barbosa (2003, 2006), Baptista (2003) e Fernandes (2006), tamm preocupados
em advogar contra ou a favor da ampliação do EF e da inclusão nele das crianças
de seis anos. Para tanto, partem de discussões sobre avanços e perigos de se
implementar tal mudança.
Barbosa (2003, 2006) destaca que, do ponto de vista teórico, não uma
posição hegemônica sobre matricular ou não as crianças de seis anos na escola
fundamental, sendo a idade basicamente uma prática social que se instituiu em um
determinado contexto e não uma verdade cientificamente estabelecida.
No que concerne à alfabetização, Barbosa (2003, 2006) também não
encontrou referencias relevantes a respeito da faixa etária, parecendo não ser esta
20
uma variável determinante do sucesso da criança nesse processo, além de não ser
novidade, nem mesmo considerado prejudicial, iniciar a alfabetização aos seis anos.
Sabe-se que o processo de letramento inicia-se muito antes disso, principalmente
para as crianças de meios urbanos e de famílias que têm experiências de ações
cotidianas de leitura e escrita. Entretanto, Barbosa (2003, 2006) preocupa-se com a
realidade pedagógica das turmas de seis anos de idade nas escolas de EF, isto
porque muitas vezes, estas são segregadas espacialmente do restante da escola; os
profissionais não são especializados; os serviços de supervisão e orientação não
assumem a orientação metodológica; inexiste articulação entre essas turmas e as
demais do EF e, ainda, a existência de concepções compensatórias e de preparação
para a escrita.
Além disso, para esta autora, a preocupação com a diminuição do tempo
da infância, visto que, geralmente, quando uma criança entra na escola
convencional, ela deve abrir mão da brincadeira e passa a ter que levar tudo a sério.
Ademais, há o aumento da expectativa quanto à alfabetizão.
Diante dessas questões, a autora afirma que se o ingresso aos seis anos no
EF significar um projeto pedagógico voltado para a ludicidade, para o
desenvolvimento das diversas linguagens, para a interação social, para o jogo, para
a brincadeira, vivenciando a infância, ele será ótimo. Mas, se ao contrário, significar
o “massacre dos inocentes”, como tem sido para as crianças de sete anos que estão
na primeira série do EF, será necessário repensar a proposta. Para a autora, se
estamos vivendo em sociedades longevas, o justifica que dedicar dez por cento
do tempo total da vida para a pequena infância seja visto como tempo perdido.
Baptista (2003) trata da questão sob a ótica do direito das crianças, evitando
argumentos de caráter normativo sobre o desenvolvimento infantil e sobre conteúdos
a serem transmitidos. Para a autora, as crianças, como sujeitos competentes, têm
direito ao conhecimento e, se as melhores condições para a garantia desse direito
estiverem no EF, seja pela atual política de financiamento ou por outros motivos,
deve-se então garantir que isto aconteça e que seja em uma escola de qualidade.
Baptista (2003), tanto quanto Barbosa (2003, 2006), afirma a necessidade de
se garantir o tempo da infância e de se compreender esta mudança como ampliação
do direito à educação em termos qualitativos, o um arranjo para solucionar
problemas de vagas ou ausência de políticas para a EI.
21
Para Fernandes (2006, p. 50), então secretário da educação básica do Brasil,
“atender as crianças a partir dos seis anos é uma forma de colocar na escola uma
população que permaneceria à margem do processo de escolarização”. Desta
forma, a ampliação do EF se apresenta como uma política comprometida com a
inclusão e a eqüidade, sendo a escolaridade compulsória, a partir dos seis anos de
idade, percebida como aquela que pode aumentar as chances de sucesso escolar
nos anos seguintes do EF.
Fernandes (2006) ressalta que a proposta de ampliação do EF não é
antecipar o currículo da primeira série tradicional para as crianças de seis anos, mas
assegurar o desenvolvimento de aspectos relacionados à socializão, à linguagem
oral e escrita como processo inicial de alfabetização, bem como outras linguagens.
Cada um destes artigos, em sua medida, mesmo que de maneira exploratória,
reflete sobre questões pertinentes, entretanto, discutir sobre ser contra ou a favor da
implementação da ampliação do EF é algo que não cabe mais, pois, desde 2005,
esta mudança esassegurada por lei. Sendo assim, é fato que muito ainda
que ser feito, analisado, pesquisado, mudado, mas com intuito de tornar o
atendimento das crianças de seis anos, no EF, um atendimento de qualidade e não
de boicotar ou ir contra esta ação.
Em publicações de periódicos com base científica, encontrei nas revistas
Educação e Sociedade e Presença Pedagógica os artigos de Arelaro (2005), Santos
& Vieira (2006), Kramer (2006) e Goulart (2007). Para esse levantamento recorri
ainda, através da Internet, aos Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas,
mas nada encontrei de específico a partir das seguintes palavras chaves: “escola de
nove anos; ampliação do ensino fundamental; criança de seis anos no ensino
fundamental; ensino fundamental de nove anos”.
O artigo de Arelaro (2005) apresenta um breve diagnóstico sobre a situação
do EF no Brasil, apontando os impasses que esse nível de ensino vem enfrentando.
A implantação da escola fundamental de nove anos é um dos pontos discutidos pela
autora, que volta seu olhar para os debates sobre períodos, ritmos “pedagógicos”,
sistemática centralizada de avaliação educacional, processo acelerado de
municipalização, sistemática de financiamento, e ainda, processo de
(des)valorizão dos trabalhadores da educação.
Tendo como refencia o Estado de São Paulo, Arelaro (2005) remete a
questões potica, econômica, histórica e social, que envolvem as mudanças no
22
âmbito do EF e cita, como motivação principal para a ampliação desse segmento, a
busca de alternativas de recursos financeiros superiores aos atuais, que vêm se
mostrando insuficientes.
Quanto aos impasses enfrentados pelo EF, apresenta a febre estatística de
alterar positivamente resultados educacionais nacionais que acabam por priorizar a
quantidade em detrimento da qualidade. Além dessa febre, Arelaro (2005) apresenta
como impasses a incorporação das crianças de seis anos, até então atendidas em
sua maioria na Rede Municipal, pela Rede Estadual, que não necessariamente
possui vagas e material pedagógico adequados e, ainda, a falta de justificativas
pedagógicas e a falta de discussões com os profissionais da escola, com os alunos
e com os pais, sobre as mudanças na organização do sistema educacional. Por fim,
o problema da lógica de tipo empresarial que vem sendo incutida na educação.
Frente à consulta a diversos estados da arte, Arelaro (2005), pontua ainda a
importância da realizão de estudos com maior fôlego teórico e consistência
metodológica, tendo em vista a superação desses impasses.
Santos & Vieira (2006) apresentam um estudo preliminar sobre a amplião
do EF em Minas Gerais, procurando identificar quais condições possibilitaram sua
emergência e quais as conseqüências de sua implementação para o EF e para a EI.
Além disso, procuram ressaltar os grandes temas tratados na produção normativa
que regula a organização e o funcionamento do EF com nove anos de duração nas
escolas estaduais de Minas Gerais. Para a realizão desse estudo, basearam-se
em leituras de documentos oficiais, depoimentos de dirigentes e especialistas
veiculados na imprensa falada e escrita e nas informões estasticas demográficas
e educacionais.
Para as autoras, assim como para Arelaro (2005), a implementação do ensino
de nove anos em Minas Gerais teve como razões não aspectos financeiros, mas
também demográficos, políticos e pedagógicos. As razões demográficas se referem
à diminuição de alunos devido à redução das taxas de fecundidade, gerando, assim,
capacidade ociosa na rede física escolar e professores excedentes. Já o aspecto
político gira em torno da possibilidade da realização imediata dessa medida, com
previsão de recepção positiva, sobretudo por parte de famílias mais pobres,
tornando-se assim, um forte apelo de caráter eleitoral. As razões pedagógicas dizem
respeito à possibilidade de mais um ano para socializar e promover a inserção da
criança em um universo cultural novo, com maiores oportunidades de aprendizado;
23
ao benefício das políticas blicas voltadas para o EF oferecidas a uma parcela
maior da população escolar; às repercussões positivas na continuidade da
escolaridade e, a não dispersão entre EI e EF de esforços para a alfabetizão.
Como ões para a efetivação dessa implementação Santos & Vieira (2006)
apresentam a produção dos textos normativos e dos Cadernos de Orientações para
a organização do ciclo inicial de alfabetização, elaborados pela Secretaria Estadual
de Educação de Minas Gerais em parceria com o Centro de Alfabetizão Leitura e
escrita da Universidade Federal de Minas Gerais (CEALE/UFMG).
No que competem às conseqüências dessa implementação, as autoras
apontam problemas de infra-estrutura, currículo, formação docente, corte etário,
risco de uma educação compulsória na EI e dificuldades de interpretação e
apropriação dos dispositivos legais. Quanto a esse aspecto, a partir de depoimentos
coletados, além da experiência pessoal, discutem que medidas dessa natureza não
o de fácil assimilação, pois incidem sobre culturas estabelecidas e sobre
expectativas, provocando reações diversas e gerando efeitos que precisam ser
conhecidos, previstos e acompanhados. Encontro aqui uma pista relevante para os
caminhos de minha pesquisa.
Outra dica, dada por Santos & Vieira (2006), diz respeito à necessidade de
estudos avaliativos longitudinais do sucesso de alunos que ingressaram com seis
anos no EF ou de acompanhamento de diferentes práticas de inclusão dos
pequenos nos sistemas educacionais brasileiros. Para as autoras, é de suma
importância tratar o ingresso das crianças de seis anos no EF ampliado como objeto
de pesquisa e fenômeno a ser interrogado na perspectiva de uma análise política,
sociológica e pedagógica, objetivando avançar na busca de uma educação
fundamental de qualidade para todos.
Kramer (2006) situa a EI no contexto político nacional, aborda a formação de
profissionais para esta área da educação e trata da EI e EF como insncias
indissociáveis do processo de democratização da educação brasileira, destacando a
importância desta articulação no que se refere às crianças e ao trabalho pedagógico.
Com relação à inclusão das crianças de seis anos no EF, deixa claro que considera
uma conquista importante para as populações infantis e para suas famílias, visto que
um imenso contingente de crianças de seis anos passará agora a ser reconhecido, à
medida que a EI o é obrigatória.
24
A autora tem consciência de que a inclusão das crianças de seis anos no EF
representa muito trabalho de mudança. Representa também, entre outras coisas, a
necessidade da compreensão de que o tempo da infância é o tempo de aprender e
de aprender com as crianças. E, um dos aprendizados a ser construído a partir delas
é, justamente, o da não fragmentação entre o EF e a EI, pois, embora esses dois
segmentos do ensino sejam freqüentemente separados, do ponto de vista da criança
não há esta fragmentação.
Como bakhtiniana, Kramer (2006), salienta o fato de que os maus-tratos que
muitas crianças sofrem, a falta de alternativas saudáveis, a ausência de alegria e de
bem-estar nas crianças e nos adultos refletem nela e se refratam como o tanto que
a fazer. Este tanto, segundo ela, relaciona-se ao muito que é preciso pesquisar,
estudar, indagar, ver e escutar, propor, subsidiar com teorias, metodologias e
práticas.
Goulart (2007) reporta-se à reflexão sobre a linguagem na dimensão das
práticas culturais orais de leitura e escrita, focalizando mais especificamente a
ampliação do EF para nove anos. Inicialmente, destaca o fato de ser preciso muito
mais de sentido para a vida e para a educação do que de informação. Nesse
aspecto, julgo pertinente recorrer às palavras da autora: “o sentido está vinculado à
construção significativa, concreta, de conhecimentos, modificando nossas formas de
ser e de agir socialmente” (GOULART, 2007, p. 16).
Assim como Kramer (2006), no que tange a ampliação do EF, incluindo as
crianças de seis anos, Goulart (2007), evidencia que, embora desejo antigo, esta
mudança gera reflexões e preocupações de muitas naturezas. Além disto, reflete
que, apesar de todas as críticas que possam ser feitas, esta nova organização do
ensino impulsiona a rever caminhos, conceitos, espaços e tempos escolares;
organização das redes de ensino, das escolas e das salas de aula de modo geral.
Tamm como bakhtiniana, Goulart (2007), concebe a linguagem como
constitutiva dos sujeitos que a produzem social e historicamente, tendo esta, um
espaço relevante nas discussões sobre as condições de aprendizagem, sobre a
necessidade de encontrar na criança o outro, e não a ilusão ou o modelo de criança.
E, ainda, comungando com as idéias de Kramer (2006), toca na questão de que é
preciso ouvir muito as crianças nas suas interações para conhecer seus saberes,
suas origens, seus modos de pensar, seus valores, seus medos, suas histórias e
25
seus desejos” (GOULART, 2007, p. 21), sendo necessário aprender e ensinar com
elas.
Goulart (2007) constata ainda, a partir de suas reflexões e de pesquisas
realizadas, que o espaço da narrativa, da fantasia, das realidades, da criação e do
aprender precisa ser mantido nos anos iniciais do EF, através de brincadeiras, jogos,
rodinhas, leitura, produção de texto, passeios e demais atividades.
Partindo para a pesquisa em publicações de eventos, realizados a partir de
2003, à procura de mais trabalhos sobre a amplião do EF, encontrei nas
publicações do Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE) os
textos de Duran (2006), Alves (2006), Callegari (2006) e Martins (2006). Dentre
esses quatro trabalhos encontrados, os de Duran (2006), Alves (2006) e Callegari
(2006) tiveram sua origem nas discussões sobre a implementação da escola de
nove anos em Taboão da Serra, Prefeitura da Grande São Paulo. Os três textos
demonstram como, a partir da promulgação das leis nº. 11.114/2005 e nº.
11.274/2006, as discussões e (re)formulações no âmbito da educação básica se
intensificaram visando a adequação dos Estados e Municípios à nova estruturação
do ensino. O texto de Martins (2006), por sua vez, contribui para o debate
problematizando as necessidades e prioridades impostas por essas leis,
principalmente no que concerne à necessidade da formão inicial e continuada.
O trabalho de Duran (2006) reflete sobre os sentidos atribuídos nas
discussões de uma proposta para o EF de nove anos. A autora defende a idéia de
que a proposta da escola fundamental de nove anos não vem ocorrendo como
construção formal de um conhecimento e, sim, como inserção orgânica em um
pensamento já construído.
Através de recursos como a análise de depoimentos de professores,
pesquisadores e administradores públicos, levantados em jornais e revistas de
circulação nacional a respeito da implantação da escola de nove anos, Duran (2006)
evidenciou que os depoimentos atribuem à escola de nove anos sentidos que se
inscrevem sobre um sistema de idéias pré-existentes, no qual a incorporação da
novidade está atrelada à familiarização do estranho. Sendo assim, concluiu que as
professoras pensam a escola de nove anos num quadro tradicional.
Outros sentidos que estão estruturando a apreensão dessa política pela
comunidade acadêmica, segundo Duran (2006), dizem respeito ao cumprimento com
a responsabilidade social de incluir as crianças das camadas mais pobres da
26
população; de responder aos desafios de transformar a estrutura e a cultura da
escola, reconhecidas como anacrônicas e descontextualizadas; de permitir que as
crianças de seis anos entrem em contato explícito e interajam com a leitura e a
escrita; da busca de uma escolarização mais construtiva. Existe, ainda, a
preocupação de alguns municípios com o financiamento, ou seja, com a
oportunidade de receber a verba do FUNDEF (Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do EF e de Valorizão do Magistério) referente ao atendimento
das crianças de seis anos, visto que, estando na EI não teriam direito a essa verba.
Com relação à escolarização, Duran (2006, p. 344) apresenta o que chama
de “um quase paradoxo” imposto pelo EF de nove anos: a dicotomia entre o EF e a
EI. Frente a isso, discute as possíveis relações entre a EI e o EF a partir da análise
das concepções de educação formal e educação não formal.
Quanto ao processo de alfabetizão, a autora menciona duas possíveis
armadilhas, a antecipação da iniciação da leitura e da escrita através de práticas
ligadas ao ensino da mecânica do ler e do escrever e, o oposto disso, a procura em
evitar que a criança entre em contato com a língua escrita a partir de uma visão
estreita sobre o alfabetizar.
Mediante todas as questões levantadas, Duran (2006) enfatiza a necessidade
de o EF de nove anos ancorar-se em outra organização da escola, sendo esta mais
aberta, mais flexível, mais participativa, mais desafiadora e criativa, ou seja, uma
escola mais comprometida com o conjunto da população escolar.
Alves (2006) apresenta em seu artigo a discussão sobre três princípios
norteadores do documento preliminar para um EF de noves anos em Taboão da
Serra, a saber: (i) fabricar vidas, entendendo este princípio como aquele capaz de
criar condições objetivas para que todas as crianças da escola se integrem ao
mundo letrado;(ii) fazer do EF de nove anos um espaço de articulação das mentes,
das emoções e dos desejos das crianças, estabelecendo uma relação concreta
entre a cultura da escola e a cultura local; e (iii) acreditar que toda criança é capaz
de aprender, dependendo da forma como é conduzido o processo de ensino.
A partir das discussões sobre estes três princípios, Alves (2006) enfatizou a
importância da compreensão de que mudar a escola deve significar mudar os
tempos e espaços escolares, rompendo com uma organização seriada e adotando a
perspectiva de ciclos, percebendo a escola como uma obra em construção em que
cotidianamente se pensa e se produz o conhecimento. Para tanto, constata
27
importância da formão continuada dos professores e de uma administração
pautada na gestão participativa.
O texto de Callegari (2006), Secretário de Educação de Taboão da Serra,
dialoga com as idéias dos textos anteriormente apresentados, ampliando a
discussão concernente ao sentido do projeto político que sustenta a proposta da
escola de nove anos e problematizando os principais argumentos que se colocam
como obsculos à sua implementação.
Callegari (2006) assinala que um dos sentidos da escola de nove anos,
implementada no município de Taboão da Serra, é a possibilidade de produzir uma
mudança relevante na estrutura da escola. Tal mudança rompe com a cultura de
exclusão que tem marcado o afastamento dos setores populares da escola. Ele
ressalta que propostas desse fôlego não acontecem somente pela aplicação de
novas legislações, mas sim pelo comprometimento dos professores e das
comunidades, além do respeito às especificidades históricas e políticas de cada
região. Diante de tais colocações, justifica um pedido feito a Duran (2006) e a Alves
(2006) para elaborarem um documento capaz de fomentar as discussões e reflexões
com os professores da rede municipal de ensino de Taboão da Serra.
O artigo de Martins (2006) contribui, assim como os demais, para a reflexão
de que a partir da promulgação da lei nº. 11.114 ocorreram razoáveis modificações
na estrutura e funcionamento do EF, apontando o fato de todo instrumento
normativo criar um movimento de mudanças, mas estas nem sempre vêm
acompanhadas de subsídios necessários para sua efetivação. Isso acarreta uma
distância considerável entre o discurso oficial e a realidade do cotidiano das redes
de escolas.
A autora, assim como Santos & Vieira (2006) e Duran (2006), preocupa-se
com as várias interpretações e decorrências que podem emergir de uma proposta
dessa natureza. Ela percebe, a partir de suas observações, a existência de
problemas na compreensão e análise do material geralmente utilizado na divulgação
de diretrizes de governo. Os professores se defrontam com uma linguagem muitas
vezes sofisticada, propondo programas e projetos que desafiam suas bases de
aprendizagem, conquistadas na ptica do cotidiano e/ou em cursos de qualidade
duvidosa.
Martins (2006) percebe ainda que os órgãos gestores sobrepõem orientações
às escolas, provocando desorientações e que, as secretarias estaduais e municipais
28
passam, elas próprias, por uma aprendizagem institucional nesses processos de
mudança, configurando, muitas vezes um vácuo normativo.
Tendo como base todas as reflexões mencionadas, Martins (2006) considera
que culturas organizacionais constituídas e constituintes do setor público operam
mudanças mais lentamente do que o setor privado, assim, a implementação da
escola de nove anos deve ter a flexibilidade necessária para que um novo ritmo seja
estruturado. Além disto, torna-se necessário que a escola se abra para novas idéias,
para a participação da comunidade que está em seu entorno, para novos conteúdos
e procedimentos didáticos e, ainda, para novas possibilidades de avaliação,
constituindo-se em um espaço comum onde projetos possam ser gestados
coletivamente a fim de que crianças, jovens e professores sintam-se acolhidos neste
espaço público.
Esses trabalhos, que tiveram suas origens nas discussões sobre a
implementação das Leis nº. 11.114/2005 e nº.11.274/2006, apontam para a
relevância de se estudar o tema da ampliação do EF a partir de seus diversos
prismas: histórico, político, social, ideológico e pedagógico. Eles remetem à
problematização da interlocução entre a EI e o EF; das concepções de
alfabetização; da importância das discussões nos Municípios e/ou Estados, visando
implementar uma proposta de acordo com sua realidade e necessidades; da
preocupação com as diversas formas de interpretação e sentidos que uma Lei e
suas orientações podem gerar; da importância da formão de professores; e das
mudanças geradas a partir de um instrumento normativo.
Entretanto, embora discutam e se preocupem com as questões referentes aos
possíveis sentidos atribuídos e às várias interpretações decorrentes da proposta
para o EF de nove anos, não aprofundam os estudos e investigações sobre os
sentidos que os professores do ano do EF estão construindo para esta nova
organização do ensino.
Duran (2006) chega a discutir a questão a partir da análise dos discursos que
circulam nacionalmente em jornais. Martins (2006) analisa a literatura da área, os
documentos e discursos oficiais e percebe que, em geral, problemas de
compreensão, por parte dos professores, em relação ao material de divulgação das
diretrizes de governo. Contudo, nenhum deles dialogou com os professores do
ano do EF, no contexto escolar, objetivando compreender com eles os sentidos que
estão construindo para a amplião do EF e para a inclusão das crianças de seis
29
anos nesse segmento do ensino. Portanto, esta foi uma pista que reforçou a direção
de meus esforços e de minha atenção nesta pesquisa.
Ainda no levantamento feito a partir de publicações de eventos, localizei no
Congresso Paulista de Educação Infantil (COPED), no Congresso de Leitura do
Brasil (COLE) e no Congresso Nacional de Psicologia Escolar (CONPE) artigos
científicos completos e resumos de mesas redondas, de relatos de experiências e de
trabalhos de pesquisa em andamento, que discutem questões sobre ampliação do
EF, do atendimento às crianças de seis anos e das práticas de alfabetização no
ano do EF. Esses trabalhos confirmam a efervescência e a relevância do tema.
Morgado & Martin (2006), em resumo publicado nos anais do COPED
realizado no ano de 2006, relatam a proposta da Escola de Aplicação da Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Ela objetiva garantir uma prática
pedagógica que incorpore o brincar em sua dimensão cultural, atrelada ao processo
de construção do conhecimento e constituição de formação do sujeito. As atividades
reúnem na rotina diária de sala de aula momentos de ludicidade, incluindo nesse
contexto, a utilização da Brinquedoteca do Laboratório de Brinquedos e Materiais
Pedagógicos da Faculdade de Educação da USP.
Mendes & Nascimento (2006), também na publicação do COPED, relataram a
proposta do curso de formação direcionado aos professores que atuam com
crianças de seis anos. O objetivo do curso foi propiciar ao professor um espaço de
ão-reflexão-ação sobre desafios do cotidiano escolar, sobre a concepção de
criança, seu desenvolvimento, suas necessidades e relações.
Freitas (2006), Aguiar (2006) e Luce (2006) debateram em mesa redonda a
incorporação da criança de seis anos no EF de nove anos, voltando o foco para a
formão docente, para os desafios de (re)organizar tempos e espaços escolares,
para a necessidade de potencializar a formação humana integral das crianças,
(re)pensar concepções de infância e organização curricular, tanto no que concerne
às turmas do ano do EF, quanto aos cursos de formação docente. Debateram
ainda, sobre os motivos de ordem política, estratégica e pedagógica que
sustentaram esse dispositivo legal.
O debate encaminhou para a relevância de pesquisas realizadas sobre
experiências dos estados e municípios que já consolidaram uma política pública de
EI com qualidade, assim como daqueles precursores na implantação do EF de
noves anos. Além disto, foi pontuada por Luce (2006), a expectativa nos resultados
30
a serem alcançados com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação
Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, reconhecendo o momento atual
como tempo de avançar nas orientações curriculares nacionais para que floresçam
os projetos pedagógicos institucionais de cada uma e do conjunto das etapas da
Educação Básica.
A participação de Goulart (2007) em uma mesa redonda, discutindo sobre a
criança de seis anos na escola de nove anos e sobre a cultura lúdica e a cultura da
escrita sem antagonismos é mencionada na publicação do COLE -2007
16
. Além
desta menção, havia na publicação de 2007 os resumos dos trabalhos de Cruz &
Albuquerque, Moraes, Almeida & Teixeira, Bordignon, Yamamoto & Silva, Brotto,
Bragagnolo & Santos, Mello e Vidal, todos também discorrendo sobre a temática da
ampliação do EF e do atendimento das crianças de seis anos.
Nos resumos referentes aos trabalhos de Cruz & Albuquerque (2007), Moraes
(2007), Bordignon (2007), Brotto (2007), Yamamoto & Silva (2007) e Bragagnolo &
Santos (2007) é possível notar o grande interesse e preocupação nas questões que
dizem respeito ao processo de alfabetização e letramento das crianças de seis anos
no contexto do 1º ano do EF, bem como nas concepções que permeiam esses
termos e as práticas utilizadas para a formão de crianças letradas.
O trabalho de Almeida & Teixeira (2007) privilegia uma faceta outra que ainda
não havia aparecido neste levantamento, embora mencionada como importante.
Partem para a pesquisa com as crianças de primeira série refletindo sobre como
elas percebem a EI, a nova realidade de chegar à primeira série e como enfrentam
essa transição.
Outro estudo que também se constitui como novidade neste panorama é o de
Mello (2007), que problematiza a implementação de programas públicos de
avaliação destinados aos primeiros anos do EF.
Vidal (2007) desvela a preocupação dos profissionais da educação em ter em
mãos algum material que subsidie sua prática. Assim, descreve a experiência da
elaboração de um material didático específico para o ano do EF de nove anos.
Material este que vem acompanhado de um guia didático ao professor, justamente
16
No período da realização desta revisão, os anais do 16º COLE-2007 ainda não haviam sido
prensados em CD-ROM, por isso utilizei os trabalhos publicados nos cadernos de resumos e
atividades (impressos), tendo como referência o ISBN - 978-85-7713-056-6.
31
com o objetivo de subsidiar teórica e metodologicamente o trabalho a ser realizado
pelos professores.
Na publicação do CONPE (2007), no resumo de Rocha et al., a tônica do
lúdico reaparece na mesma linha do trabalho de Morgado & Martin (2006), mas a
discussão é ampliada no que tange a necessidade de materiais e infra-estrutura
adequada para o atendimento às crianças de seis anos. As autoras apresentam
parte da pesquisa que tem como objetivo estudar as condições oferecidas para o
desenvolvimento das crianças de seis anos de idade a partir da nova proposta do
EF. A partir da análise dos dados empíricos, concluíram que existe extrema
escassez de infra-estrutura das escolas, principalmente no que diz respeito ao
material lúdico. Concluíram ainda que as professoras se esforçam em superar tal
escassez, produzindo jogos de regras, especialmente os de conteúdo pedagógico.
Constataram, portanto, a necessidade de refletirem sobre a importância dos
recursos e da mediação para a realização de atividades lúdicas, especialmente as
de faz-de-conta, pelo fato de não terem encontrado nenhum material típico para o
desenvolvimento destas.
Ressalto que também pesquisei as publicações da Associação Nacional de
Pós Graduação e Pesquisa (ANPED), buscando trabalhos sobre a amplião do EF
e sobre o atendimento das crianças de seis anos neste segmento do ensino. Para
tanto, entrei nas páginas do Grupo de Trabalho (GT)7 – Educação da criança de 0 a
6 anos, GT10 –Alfabetização, Leitura e Escrita e GT13 Educação Fundamental.
Através desta pesquisa, encontrei apenas os trabalhos de Pereira e Correia, ambos
publicados nos anais da 30ª reunião da ANPED, evento realizado em outubro de
2007. O Texto de Pereira (2007) foi publicado no GT13 Educação Fundamental,
enquanto o de Correa (2007) foi apresentado no GT7 Educação da criança de 0 a
seis anos, fato que demonstra a intrincada relão existente entre EF e EI.
Pereira (2007) apresentou seu trabalho no formato Pôster, no qual teve como
objetivo discutir a implantação do EF de nove anos na rede municipal de ensino de
Lages, Santa Catarina. Sua maior preocupação foi demonstrar a importância da
discussão no âmbito do GT de Educação Fundamental, problematizado questões
referentes à necessidade de reformas pedagógicas, à oportunidade de se repensar
a cultura escolar destinada a crianças na faixa etária que compreende os seis anos
e à busca pela reversão de resultados negativos frente a avaliações internas e
externas no âmbito das escolas municipais, mais especificamente o caso de Lages.
32
Para tanto, Pereira apresenta o histórico da implementação da Lei que legitimou a
ampliação do EF e a inclusão das crianças de seis anos nesse segmento, seguindo
da apresentação das discussões realizadas no Município de Lages, salientando que
a implementação dessa Lei está longe de ser um consenso. Entretanto, a autora não
especifica se o trabalho é parte de alguma pesquisa ou se trata de um ensaio a
partir de suas observações empíricas. Fato que o tira o mérito de suas
discussões, principalmente em se tratando de uma breve apresentação em formato
de Pôster, mas, que deixa dúvidas em relação à sua origem metodológica e à
profundidade das discussões.
Correa (2007), por sua vez, deixa claro que seu trabalho trata-se de um
ensaio com objetivo de apontar desafios para o alcance de uma educação de
qualidade, quer na EI, quer no EF. A autora, que teve seu trabalho apresentado na
sessão de comunicação oral, descreve em seu texto uma breve revisão sobre a
legislação da EI a partir de 1988 a 2006. Nele discute o que considera as principais
recomendações do MEC para a nova disposição do EF de nove anos e faz
indagações com intuito de apontar para a necessária atenção a ser dirigida à
organização do EF de nove anos, a fim de que o ganho de mais um ano de
escolaridade não se torne na prática prejuízo.
Minha participação como ouvinte na 30ª reunião da ANPED, em outubro de
2007, rendeu-me frutos valiosos. Nesse evento me deparei com o lançamento dos
dois primeiros livros constituídos por discussões que envolvem a questão da
ampliação do EF para nove anos e do atendimento às crianças de seis anos de
idade nesse segmento do ensino. No livro “Quem tem medo de ensinar na educação
infantil?: em defesa do ato de ensinar”, organizado por Arce e Martins (2007),
encontrei, entre os oito capítulos do livro, três que discutem questões emergidas a
partir das discussões sobre a ampliação do EF, são eles: “A educação Infantil e o
Ensino fundamental de Nove anos(ARCE e MARTINS, 2007), “Especificidades do
Desenvolvimento afetivo-cognitivo de crianças de 4 a seis anos(MARTINS, 2007) e
“A educação infantil e a alfabetização” (STEMMER, 2007).
Arce e Martins (2007) apresentam em seu texto as implicações da Lei nº.
11.274/2006, que amplia o EF obrigatório para nove anos de duração a iniciar-se
aos seis anos de idade. As autoras confirmam tudo o que foi sendo discutido até
aqui sobre os imeros questionamentos suscitados por essa Lei. Entretanto,
ampliam as discussões em direção à compreensão das implicações da Lei para o
33
atendimento da infância na educação básica, considerando esse momento como
bastante oportuno para a análise da EI tanto quanto do EF. As autoras, apoiadas na
perspectiva histórico-cultural, avaam também em relão à reflexão sobre a
importância dos professores terem clareza acerca do destinatário de seu trabalho,
ou seja, das crianças. Ressaltam tamm, a importância desses profissionais terem
conhecimento do processo de aprendizagem e desenvolvimento dessa faixa etária,
pois só assim compreenderão seu papel frente às crianças e reconhecerão a escola
como contexto de aprendizagem e desenvolvimento, sustentados pelo planejamento
de conteúdos e procedimentos de ensino adequados à faixa etária a que se destina.
O texto de Martins (2007) assevera as questões apresentadas no texto
anterior apresentando as propriedades gerais do desenvolvimento psíquico de
crianças de quatro a seis anos. Entretanto, coerente com o referencial teórico
adotado histórico-cultural ressalta que reconhece os marcos cronológicos
apenas como referências gerais, pois nenhuma criança é idêntica a outra, posto que
o substrato de seu desenvolvimento assenta-se, sobretudo, nas condições concretas
de vida. O texto apresentou, portanto, uma rica discussão sobre uma das questões
que mais se tem levantado a partir da implementação da Lei 11.274/2006: as
especificidades das crianças de seis anos.
O artigo de Stemmer (2007), por sua vez, traz para o debate, tamm a partir
da perspectiva hisrico-cultural, o tema da alfabetização na EI. A autora salienta
que a alfabetização é primordialmente a aprendizagem da leitura e da escrita e que,
apoiada nos estudos de Luria, compreende que a história da escrita na criança se
inicia muito antes da primeira vez em que o professor coloca um lápis em sua mão e
lhe mostra como formar letras. Para refletir sobre tais questões e relacionar a
educação infantil à alfabetização a autora apresenta algumas considerações sobre a
história da escrita e discute a importância do lúdico no processo de ensino e
aprendizagem da leitura e da escrita. Stemmer (2007), finaliza seu artigo enfatizando
o dever de se ensinar às crianças a linguagem escrita e não enfatizar
mecanicamente o ler e o escrever.
No livro “Alfabetização no Brasil: questões e provocações da atualidade”,
organizado por Ezequiel Theodoro da Silva (2007), encontrei o artigo de Frade
(2007), “Alfabetizão na escola de nove anos: desafios e rumos”. Segundo a
autora, o artigo foi organizado para dar respostas a duas vertentes de
questionamentos: (i) retomar demandas em curso nas últimas décadas e (ii)
34
concentrar-se nos desafios e impactos da implementação da política de nove anos.
Sua questão central girou em torno do processo de alfabetização, considerando sua
repercussão a partir da introdução da criança de seis anos no ciclo inicial do EF. A
autora percebe a escola como agência de letramento e como uma das
representantes da cultura escrita, mesmo com todas as críticas sobre os modos de
letramento escolares. O artigo aprofunda ainda questões referentes à cultura da EI e
a cultura do EF, aborda a estruturação de conteúdos e discorre sobre as
instabilidades geradas com a nova disposição do ensino.
Além do contato com esses dois livros, a participação na 30º Reunião da
ANPED (2007) oportunizou-me o encontro com um grupo de pesquisadores que,
mobilizado por iniciativa da pesquisadora Lisete Arelaro, pretende fomentar as
discussões e pesquisas sobre o EF de nove anos em todo Brasil. Ou seja, de fato a
participação neste evento rendeu efetivamente frutos valiosos.
Embora, ainda, incipientes, com a surpresa da publicação dos dois livros e da
mobilização de um grupo de pesquisadores, estes trabalhos demonstraram como a
discussão sobre o tema da ampliação do EF vem se desenvolvendo, aprofundando
e ampliando em diversas vertentes. É interessante observar o movimento da
discussão que se desloca de artigos, antes limitados em advogar contra ou a favor
da implementação desta mudança, para relatos de experiências que já estão sendo
vivenciadas. um avanço também na direção da realização de pesquisas que
possam contribuir com a qualidade dessa nova formatação do ensino.
Iniciei esta revisão, mencionando a existência de um mero bastante
relevante de trabalhos que discutem a respeito do EF e que estes, em sua maioria,
não estavam preocupados em discutir a ampliação desse segmento. Porém, durante
o período que compreendeu o processo de realizão desta revisão, o mero de
trabalhos referentes à nova organização do EF foi-se ampliando, não apenas em
relação à quantidade, mas principalmente em qualidade. Esse processo de
ampliação quantitativa e qualitativa das produções demonstra como o caminho
percorrido em direção ao conhecimento vai sendo construindo.
O processo de ampliação do EF, a inclusão das crianças de seis anos nesse
segmento e todos os trabalhos com os quais dialoguei nesta revisão, inserem-se no
contexto histórico de lutas por uma educação pública brasileira de melhor qualidade
para todos, envolvendo profissionais, pesquisadores e militantes de toda a educação
básica e não do EF.
35
O defrontamento direto com tais trabalhos possibilitou situar minha pesquisa
no atual cenário educacional brasileiro. Ademais, foi possível perceber que, através
desta, poderei continuar o dialogo com os trabalhos aqui apresentados e, assim,
contribuir com as discussões sobre o tema, seja confirmando, ampliando ou
discordando de algumas proposições já apresentadas, ou seja, construindo “contra-
palavras”. Segundo Lüdke e André (1986, p.1), este é o papel do pesquisador, “o de
servir como vculo inteligente e ativo entre o conhecimento acumulado na área e as
novas evidências que serão estabelecidas a partir da pesquisa.”
Como anunciado no capítulo anterior, foi seguindo as pistas desta revisão
bibliográfica que refinei meu objetivo de pesquisa: compreender, através dos
discursos, os sentidos que os professores do 1º ano do EF estão construindo para a
inclusão das crianças de seis anos de idade neste segmento de ensino.
Para alcançar tal objetivo organizei as seguintes questões norteadoras: (i)
Como os professores do 1º ano do EF estão compreendendo a ampliação desse
segmento do ensino? (ii) Como os professores do ano do EF estão
compreendendo a inclusão das crianças de seis anos nesse segmento do ensino?
(iii) O professor do 1º ano do EF teve algum contato com os documentos elaborados
para subsidiar a implementação do EF? (iv) A prática dos professores do ano do
EF se modificou frente à inclusão das crianças de seis anos neste segmento do
ensino? Como e por quê?
36
2 CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS À LUZ DA PERSPECTIVA HISTÓRICO-
CULTURAL
Sobre os sentidos...
Ao contrário do que em geral se crê, sentido e
significado nunca foram a mesma coisa, o
significado fica-se logo por aí, é directo, literal,
explícito, fechado em si mesmo, unívoco, por
assim dizer; ao passo que o sentido não é capaz
de permanecer quieto, fervilha de sentidos
segundos, terceiros e quartos, de direcções
irradiantes que se vão dividindo e subdividindo em
ramos e ramilhos, até se perderem de vista, o
sentido de cada palavra parece-se com uma
estrela quando se põe a projectar marés vivas pelo
espaço fora, ventos cósmicos, perturbações
magnéticas, aflições.
JOSÉ SARAMAGO
Como o objetivo desta pesquisa é compreender, através dos discursos, os
sentidos que os professores do 1º ano do EF estão construindo sobre a inclusão das
crianças de seis anos nesse segmento de ensino, encontrei nos estudos histórico-
culturais fundamentos teóricos capazes de oferecer um sólido embasamento para o
seu desenvolvimento, principalmente no que concerne à discussão sobre construção
e compreensão de sentidos.
A pesquisa fundamentada na perspectiva histórico-cultural é percebida como
relação dialógica entre sujeitos, na qual o pesquisador, junto com os sujeitos
pesquisados, busca construir sentidos para os fenômenos pesquisados. Além disso,
a partir dessa perspectiva, muito mais do que simplesmente realizar uma análise
factual, o que se pretende é compreender o processo de construção de sentidos
marcado pela totalidade, pela integração do social com o individual, através do
encontro com discursos que refletem e refratam a realidade dos sujeitos nela
envolvidos, compreendendo, assim, a constituição dialética do homem.
Portanto, o intuito deste capítulo é fazer uma breve apresentação dos
principais representantes da perspectiva histórico-cultural e delinear os principais
construtos teóricos que serviram de base para compreensão dos sentidos aqui
construídos. No entanto, ao longo do trabalho, de acordo com a necessidade de
cada discussão e análise, essas e outras questões, com base na perspectiva
histórico-cultural, serão aprofundadas.
37
Lev Semenovich Vygotsky
17
(1896-1934) e Mikhail Bakhtin (1895-1975),
pesquisadores russos, são os principais representantes dessa perspectiva.
Vygotsky, nascido em de Orscha, cidade da região nordeste da república Bielorussa,
localizada dentro dos limites ocidentais da porção européia da (antiga) União
Soviética, empreendeu estudos e pesquisas sobre a relação entre pensamento e
linguagem, a natureza do processo de desenvolvimento da criança e o papel da
aprendizagem para o desenvolvimento, elaborando a teoria da construção social do
conhecimento. Bakhtin, nascido na cidade de Oriol, pequena cidade ao sul de
Moscou, foi considerado o instaurador das queses do discurso, tendo sido o
primeiro a falar no assunto em meados de 1929, elaborando o que ficou conhecido
como teoria enunciativa da linguagem. Ambos são considerados autores da grande
temporalidade visto que suas discussões permanecem atuais até os dias de hoje.
Os dois autores, Vygotsky e Bakhtin, a partir de estudos fundamentados no
materialismo dialético e utilizando o método da dialética, percebem o homem como
ser histórico, constituído nas relações sociais, não podendo, portanto, ser explicado
como objeto, mas sim, como sujeito, compreendido em suas relações. Ambos
compreendem a centralidade da linguagem que, como signo por excelência, tem a
função de gerar e organizar os processos psicológicos mediando a relação dialética
entre o social e o individual. Diante disso, Vygotsky e Bakhtin, percebem a
ubiqüidade social da palavra, compreendendo-a como instrumento semiótico mais
poderoso no contato social e na regulação interpessoal da conduta (FREITAS,
2005), sendo capaz de evocar contextos, confrontar valores sociais contraditórios,
conflitos, relações de poder, entre outros.
Para Bakhtin/Volochinov (1988 [1929]) a palavra é um femeno ideológico
18
,
o modo mais puro e sensível da relação social, funcionando também como material
semiótico da consciência. Para Vigotski (2001 [1934]), o pensamento não se exprime
em palavra mas nela se realiza, desta forma, a palavra desempenha papel central na
consciência, sendo a expressão mais direta da natureza histórica da consciência
humana.
17
Existem na literatura variadas grafias para o nome do autor, eu optei utilizar ”Vygotsky”, mas
indicarei outras grafias nas citações e referências, de acordo com as fontes bibliográficas.
18
Para Bakhtin/ Volochinov (1988) ideologia é o espo de contradição, é um produto que faz parte
de uma realidade natural ou social, que reflete e refrata uma realidade que lhe é exterior.De acordo
com suas idéias “tudo o que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si
mesmo”, assim, “tudo o que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia” (BAKHTIN/
VOLOCHINOV, 1988, p. 31).
38
A consciência se reflete na palavra como o sol em uma gota de água. A
palavra está para a consciência como o pequeno mundo está para o grande
mundo, como a célula viva está para o organismo, como o átomo para o
cosmo. Ela é o pequeno mundo da consciência. A palavra consciente é o
microcosmo da consciência humana.(VIGOTSKI, 2001 [1934], p. 486)
A palavra, reconhecida então como constitutiva do homem, como meio de
contato deste com o mundo exterior e com ele mesmo, torna-se instrumento
fundamental para a apreensão do ser, para o pensar e o agir do sujeito. Assim, de
acordo com Aguiar e Ozella (2006), para que se possa compreender o pensamento
é necessário analisar o seu processo de transição para a palavra e, para isso, é
necessário a compreensão das categorias de significado e sentido das palavras.
Essas categorias, assim como o pensamento e a linguagem, embora não se
confundam, não podem ser compreendidas isoladamente à medida que uma
constitui a outra.
Bakhtin/Volochinov (1988 [1929]) afirma que, para construir uma cncia
lida da significação é importante distinguir bem entre o tema (sentido) e
significão (significado), além de compreender bem a sua inter-relação. Essa
distinção adquire clareza em conexão com o problema da compreensão, que deve
ser ativa, ou seja, uma compreensão que, através da relação dialógica entre
sujeitos, possui o germe da resposta, permitindo assim a apreensão do tema, a
elaboração de contra-palavras.
O autor considera os significados como “elementos da enunciação que são
reiteráveis e idênticos cada vez que o repetidos(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1988
[1929], p.129), ou seja, são elementos abstratos fundados em uma convenção, não
apresentando, portanto, existência própria, mas um potencial, uma possibilidade de
significar no interior de um tema concreto. A significão é compreendida, portanto,
como um aparato técnico para a realização do tema, como um estágio inferior da
capacidade de significar.
Vigotski (2001 [1934]), por sua vez, salienta que o significado da palavra é um
fenômeno histórico e social que só se torna fenômeno do pensamento à medida que
o pensamento esrelacionado à palavra e nela materializado, e vice-versa. Assim,
embora Vigotski (2001 [1934], p. 465) reconheça o significado como uma das zonas
do sentido que a palavra adquire no contexto dos discursos, ou seja, como sendo
apenas “uma pedra no edifício do sentido”, a mais estável, precisa, dicionarivel,
que não pode ter a sua natureza psicológica interior modificada, ele considera que o
39
significado das palavras também é passível a mudanças quantitativas e externas.
Esse autor encontra no significado da palavra a unidade que reflete da forma mais
simples a unidade do pensamento e da linguagem, desta maneira, a palavra sem
significado não pode ser considerada uma palavra, mas apenas um som vazio.
o sentido é compreendido por Bakhtin/Volochinov (1988 [1929]) como a
própria enunciação, individual e não reiterável, sendo determinado pelo contexto
histórico, pelas condições de uma enunciação concreta, pelas formas lingüísticas e
igualmente pelos elementos não verbais. O sentido constitui, portanto, para este
autor, o estágio superior real da capacidade lingüística de significar.
Para Vigotski (2001 [1934]), o sentido da palavra também é adquirido no
contexto em que surge, o que faz com que, em contextos diferentes, os sentidos das
palavras se alterem. Então, reconhecido como a soma de todos os fatos psicológicos
que a palavra desperta na consciência, o sentido é aqui compreendido como uma
formão dinâmica, fluida e complexa, apresentando várias zonas de estabilidade
variada, ou seja, o sentido é inconstante e inesgotável. O autor ressalta, ainda, que
muito se sabia poderem as palavras mudar de sentido, mas que há relativamente
pouco tempo havia sido observada a necessidade de se estudar como os sentidos
mudam as palavras, como os conceitos mudam de nome.
Possenti (1995, p. 12) comunga com as idéias de Bakhtin e Vygotsky a
compreensão de que “o sentido não é universal, não é atemporal, não é
convencional, não é uvoco, não é necessariamente expresso em sua totalidade”,
sendo papel do pesquisador observar as condições de produção de um discurso (os
interlocutores, a situação, o contexto histórico-social e ideológico) para então
compreender o sentido do que se pretende dizer. Compreender, para este autor,
significa saber como um objeto simbólico produz sentidos. Orlandi (2002, p. 20), por
sua vez, tamm compreende que “as palavras simples do nosso cotidiano
chegam até s carregadas de sentidos que não sabemos como se constituíram e
que no entanto significam em nós e para nós”, assim, segundo esta autora, o
homem, ser racional, escondenado a significar (ORLANDI, 2002).
Bakhtin/Volochinov (1988 [1929], p. 132), toda palavra usada na fala real
possui significação, sentido e um acento de apreciativo, ou seja, “quando um
conteúdo objetivo é expresso (dito ou escrito) pela fala viva, ele é sempre
acompanhado por um acento apreciativo determinado”. Esse acento apreciativo
consiste na entoação expressiva, que, na maioria dos casos, é determinada pela
40
situação imediata e freqüentemente por suas circunstâncias mais efêmeras. Vigotski
(2001 [1934]), tamm percebe que por trás de toda frase viva, dita por um homem
vivo, existe um subtexto, um pensamento por trás e que, por trás de todo
pensamento existe uma tendência afetivo-volitiva. Assim, compreende-se que,
Para entender o discurso do outro, nunca é necessário entender apenas
umas palavras; precisamos entender o seu pensamento. Mas é incompleta
a compreensão do pensamento do interlocutor sem a compreensão do
motivo que o levou a emiti-lo. De igual maneira, na análise psicológica de
qualquer enunciado chegamos ao fim quando descobrimos esse plano
interior último e mais encoberto do pensamento verbal: a sua
motivação.(VIGOTSKI, 2001 [1934], p. 481)
De acordo com Aguiar (2000), embora Vygotsky não tenha desenvolvido
estudos sistemáticos sobre as emões, aparecendo como sua primeira inquietação
em Psicologia da Arte e, em outros momentos posteriores, quando discute sobre os
processos motivacionais e sobre o próprio pensamento, ele percebe que
pensamento e emão não podem ser compreendidos de forma dicotomizada, uma
vez que o processo cognitivo não existe descolado da emão. Assim, o
pensamento é concebido como emocional e a linguagem como algo sempre
emocionado. Ainda segundo Aguiar e Ozella (2006), para González Rey,
pensamento é um processo psicológico, não por seu caráter cognitivo, mas por
seu sentido subjetivo, pelas significações e emões que se articulam em sua
expressão. Neste caso, a separação entre pensamento e afeto jamais poderá ser
feita, sob o risco de fechar-se definitivamente o caminho para a explicação das
causas do próprio pensamento (Aguiar e Ozella, 2006)
Por esse motivo concordo com Freitas (2005), quando diz que contentar-se
em compreender e explicar uma obra (eu diria também um fenômeno, um sujeito), a
partir das condições de sua época, é condenar-se a jamais penetrar em seu sentido
profundo. Concordo tamm com Aguiar e Ozella (2006) que menciona não ser cil
apreender o processo constitutivo dos sentidos bem como os elementos nele
engendrados. O próprio Bakhtin/Volochinov (1988 [1929]) reconheceu que o
problema da significação se apresenta como um dos mais difíceis da lingüística.
Portanto, julgo ser importante reiterar que, embora distintas, as categorias
pensamento e linguagem, sentido e significado, pensamento e afeto, não existem
isoladamente, elas se constituem. Julgo ainda ser importante comentar alguns
41
conceitos bakhtinianos, compreendidos como fundamentais na relação dialógica em
busca da compreensão e construção de sentidos.
O conceito de dialogicidade, princípio constitutivo da linguagem e de todo
discurso, é compreendido para além das réplicas que ocorrem no diálogo face a
face, independente do tempo e do espaço, entendendo o diálogo não como
consenso, mas como um tenso combate onde podem aparecer tanto convergências
e ampliações como divergências. Somente assim, através da interação dialógica, é
que o sujeito poderá avançar na compreensão dos fenômenos históricos e sociais,
ou seja, a dialogicidade é a condição do sentido do discurso, e a existência do outro
é a condição para esta dialogicidade.
Nesse ponto encontra-se o conceito de polifonia, multiplicidade de vozes e
consciências. Eles não se justapõem, mas se entrecruzam, convivem e interagem
produzindo sentidos, uma vez que o sujeito é constituído por diferentes vozes sociais
que fazem dele um sujeito histórico e ideológico, um sujeito considerado produto e
produtor da história.
Diante destes conceitos de dialogicidade e polifonia é possível compreender
que o eu só existe com o outro em relações dialógicas e dialéticas, constituindo e
sendo constituído no/pelo discurso, na/pela interação entre sujeitos. Sendo assim, é
possível perceber que as ideologias, os sujeitos e as palavras são inacabados, estão
sempre em construção, em processo de re-significação, não havendo limites para o
discurso dialógico e seus sentidos, assemelhando-se a um Círculo no qual não
existe começo ou fim.
Os conceitos de exotopia e alteridade tamm auxiliam no processo de
compreensão da construção dos sentidos existentes nos discursos. Através da
exotopia, compreendida como excedente de visão, é que se torna possível ver do
sujeito algo que ele mesmo nunca poderia ver, ou seja, quando estranhamos e
questionamos o sujeito pesquisado o fazemos a partir de nossa visão, a partir de um
lugar exterior a ele, e, somente assim novos sentidos podem ser produzidos
(Amorim, 2001). Esse processo é que permite a materializão da alteridade, da
autocompreensão, pois, através do excedente de visão de um outro é que passamos
a nos conhecer cada vez melhor, ou seja, para constituir-me preciso pensar no
outro, porque é através do outro que me vejo e me compreendo.
Sendo assim, para compreender os sentidos dos discursos das professoras
tenho que me aproximar delas, conhecê-las e, depois, me distanciar, retornando ao
42
meu lugar de pesquisadora. É necessário que eu seja capaz de lançar um olhar
excedente, percebendo como elas me vêem e como as vejo. Somente assim poderei
me (re)conhecer nesse processo e contribuir, realizando reflexões e produzindo
novos sentidos.
A partir dos conceitos apresentados e reconhecendo Bakhtin como
instaurador das questões do discurso, acrescento o pensamento de Brait (2006, p.
9), que ressalta:
Ninguém, em sã consciência, poderia dizer que Bakhtin tenha proposto
formalmente uma teoria e/ou análise do discurso, no sentido em que
usamos a expressão para fazer referência, por exemplo, à Análise do
Discurso Francesa. Entretanto, também o se pode negar que o
pensamento bakhtiniano representa, hoje, uma das maiores contribuições
para os estudos da linguagem, observada em suas manifestações artísticas
como na diversidade de sua riqueza cotidiana. Por esta razão, mesmo
consciente de que Bakhtin, Voloshinov, Medvedev e outros participantes do
que atualmente se denomina Círculo de Bakhtin jamais tenham postulado
um conjunto de preceitos sistematicamente organizados para funcionar
como perspectiva teórico-analítica fechada, arrisca-se a sustentar que o
conjunto das obras do Círculo motivou o nascimento de uma análise/teoria
dialógica do discurso, perspectiva cujas influências e conseqüências são
visíveis nos estudos lingüísticos e literários e, também, nas ciências
humanas.
Diante de todas as questões delineadas neste capítulo, concordo com Aguiar
e Ozella (2006, p. 5), quando afirmam que
A apreensão dos sentidos não significa apreendermos uma resposta única,
coerente, absolutamente definida, completa, mas expressões do sujeito
muitas vezes contraditórias, parciais, que nos apresentam indicadores das
formas de ser do sujeito, de processos vividos por ele.
Além disto, também compreendi com estes autores que a apreensão dos
sentidos não é fácil, pois ele não se revela facilmente, não esna aparência, uma
vez que, em algumas instâncias, o próprio sujeito o desconhece ao não se apropriar
de suas vivências.
Porém, mesmo reconhecendo as dificuldades, esse foi o caminho que escolhi
para trilhar. Assim, a partir desta base teórica, fundamentada nos pressupostos da
perspectiva histórico-cultural, compreendo ser possível, por meio do diálogo com os
sujeitos co-autores desta pesquisa, construir e apreender com eles os possíveis
sentidos para a inclusão das crianças de seis anos no EF.
43
3. CAMINHOS METODOLÓGICOS
Inspirando-me na raiz grega do termo método, que
evoca caminho, e atentando para a evolução da
própria concepção de metodologia, que hoje se
preocupa muito mais com o percurso que levará o
pesquisador à construção do conhecimento do seu
objeto de estudo, do que com regras que ele
deverá seguir, gostaria de compartilhar com os
colegas as lições de um caminho feliz.
MENGA LÜDKE
Apropriando-me das palavras de Lüdke (1992), compartilho, nesta seção, as
lições de um caminho feliz a busca, através dos diálogos, pela compreensão dos
sentidos que os professores do 1º ano do EF estão construindo para a inclusão das
crianças de seis anos nesse segmento de ensino. Descrevo, portanto, no texto que
se segue, todo percurso deste caminho.
Na primeira seção revelo a metodologia e as técnicas utilizadas. Na segunda,
descrevo o estudo piloto, através do qual pude definir quais seriam as melhores
formas de construir e registrar os dados, am de tomar rias decisões, dentre elas
a de que desenvolveria esta pesquisa em duas escolas da Rede Municipal de
Ensino de Juiz de Fora, sendo uma de EI e uma de EF, e que, para o rigor da
pesquisa, seria interessante realizar este trabalho com quatro professoras. Na
terceira seção apresento a minha entrada no campo de pesquisa e apresento os
contextos e os sujeitos desta. Na última seção, desvelo o processo utilizado para a
construção e análise dos dados.
3.1 Revelando a metodologia e os instrumentos utilizados
Objetivando a coencia com o enfoque teórico assumido apoiei-me, para
percorrer este caminho, na abordagem qualitativa de cunho histórico-cultural, que,
segundo Freitas (2003), representa um caminho significativo para uma forma outra
de produzir conhecimento no campo das ciências humanas, através de alternativas
metodológicas que superem as dicotomias externo/interno, social/individual, opondo-
se aos limites estreitos da objetividade.
44
Com base nessa perspectiva, compreendo a pesquisa como uma atividade
humana e social. A este respeito, Lüdke e André (1986) nos lembram que, como
atividade humana e social, a pesquisa traz consigo, inevitavelmente, a carga de
valores, preferências, interesses e princípios que orientam o pesquisador. Sendo
assim, o pesquisador, como membro de um determinado tempo e de uma específica
sociedade, reflete em seu trabalho de pesquisa os valores e os princípios
considerados importantes naquela sociedade e naquela época. Portanto, reconheço
que, enquanto pesquisadora, apoiada na pesquisa qualitativa com abordagem
histórico-cultural, não foi possível abrigar-me em uma posição de neutralidade, mas
me foi exigido uma atitude responsiva e uma compreensão ativa diante do trabalho
de análise.
Tendo como referência os estudos de Bakhtin, entendo por compreensão
ativa aquela capaz de produzir contra-palavras, aquela que transforma o ouvinte
também em locutor. Para Freitas (2003) somente esse tipo de compreensão ativa é
que permite a apreensão dos sentidos enunciados. Essa é uma atitude responsiva
pois considera o contexto e os sujeitos da pesquisa, compreendendo a linguagem
em todo o seu processo de interação discursiva, dialética, dialógica, ideológica,
histórica e cultural, prenhe de sentidos em suas palavras.
Segundo Bakhtin/Volochinov (1988 [1929], p. 41),
As palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e
servem de trama a todas as relações sociais em todos os domínios. É
portanto claro que será sempre o indicador mais sensível de todas as
transformações sociais, mesmo daquelas que apenas despontam, que
ainda não tomaram forma, que ainda não abriram caminho para sistemas
ideológicos estruturados e bem formados. A palavra constitui o meio no qual
se produzem lentas acumulações quantitativas de mudanças que ainda não
tiveram tempo de engendrar uma forma ideológica nova e acabada. A
palavra é capaz de registrar as fases transitórias mais íntimas, mais
efêmeras das mudanças sociais.
Frente ao exposto, gostaria de salientar que foi justamente a partir da
compreensão da ubiqüidade da palavra, vista como arena onde se confrontam
valores sociais, e do conceito ampliado de discurso, percebido como a língua em
sua integridade viva, que escolhi os discursos dos professores pesquisados como
fonte de minhas análises.
De acordo com essa premissa, encontrei nas entrevistas dialógicas
recorrentes, o instrumento potencialmente capaz de auxiliar-me na busca da
45
compreensão ativa, junto com os professores, dos sentidos construídos para a
ampliação do EF e para a inclusão das crianças de seis anos nesse segmento do
ensino.
Compreendo entrevistas dialógicas como uma produção de linguagem,
marcada por sua dimensão social, viva, na qual entrevistador e entrevistado
interagem verbalmente construindo conhecimentos sobre o fenômeno estudado,
portanto, entendo que os dados da pesquisa são construídos nessa relação
dialógica, nesse contexto.
Sendo assim, reconheço as quatro professoras
19
, sujeitos desta pesquisa,
como co-autoras do processo de construção do trabalho que ora se apresenta.
Saliento ainda que, com Freitas (2003), percebo o diálogo para além da relação face
a face, implicando tamm uma relação do texto com o contexto, estabelecendo
sentidos entre os enunciados. Segundo esta autora,
Os sentidos são criados na interlocução e dependem da situação
experienciada, dos horizontes espaciais ocupados pelo pesquisador e pelo
entrevistado. As enunciões acontecidas dependem da situação concreta
em que se realizam, da relação que se estabelece entre os interlocutores,
depende de com quem se fala. Na entrevista é o sujeito que se expressa,
mas sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a realidade de seu
grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social. (FREITAS, 2003, p.
36-37).
As entrevistas foram realizadas individualmente e aconteceram nos espaços
das escolas de atuação das professoras, fato que possibilitou a realizão de
algumas observações referentes a esses espaços. Os horários e os tempos de
duração de cada entrevista variaram de acordo com a disponibilidade de cada
professora e do desenrolar dos diálogos. Mas, na maioria das vezes as entrevistas
aconteceram ao término do horário das aulas, ou, de acordo com a disponibilidade
da escola, durante o horio das aulas, mediante a substituição da professora
regente pela professora eventual
20
. A duração média de cada entrevista foi de 1 hora
e meia.
Procurei conduzir as entrevistas orientando-me no sentido da compreensão
dos fenômenos, utilizando para isso o desenrolar de conversas a partir do tema da
19
Dediquei a seção 3.3.2 para apresentar estas professoras. Fiz isso por acreditar, coerentemente
com o enfoque utilizado, que sem conhecê-las mais profundamente não conseguiria compreendê-las.
20
Professora efetiva ou contratada que permanece na escola para fins de substituição de ausências
de professores por motivos eventuais.
46
ampliação do EF e do trabalho realizado com as crianças de seis anos. Assim,
parafraseando Clarice Lispector, posso dizer que os instantes iam me levando
insensivelmente a outros e o tema atemático ia se desenrolando sem plano, mas
geométrico como figuras sucessivas num caleidoscópio (LISPECTOR, 1973). Diante
da compreensão da importância do pesquisador saber ouvir e saber estimular o fluxo
natural do diálogo, percebi a necessidade de gravar as entrevistas, não precisando
assim ficar preocupada em realizar extensas anotações durante o processo, ficando
livre para desenvolver o diálogo. As gravações foram posteriormente transcritas para
a realização do processo de análise.
No início, os diálogos eram meio midos, principalmente pela presença do
gravador, mas durante o processo, e frente à idéia de realizar uma conversa inicial
sobre as histórias de vida, o “gelo foi-se quebrando”.
Aguiar e Ozella (2006), preocupados com o rigor da pesquisa, indicam que
para a consistência das entrevistas elas devem ser recorrentes. Seguindo a
indicação desses autores, como mencionado anteriormente, trabalhei com
entrevistas dialógicas recorrentes. Portanto, após a primeira leitura das transcrições
de cada entrevista, um novo encontro era realizado, tendo como objetivo eliminar
vidas, aprofundar questões e realizar uma quase análise conjunta do processo
utilizado pelo sujeito para a produção de sentidos e significados” (AGUIAR e
OZELLA, 2006, p. 6).
Ainda zelando pelo rigor da pesquisa, reconhecendo que a gravação das
entrevistas dialógicas recorrentes registraria apenas as expressões orais e
compartilhando das sugestões de Lüdke e André (1986) sobre a importância do
pesquisador registrar as suas observações, sentimentos e especulações ao longo do
processo de pesquisa, visto que, estes podem ser substanciais à elucidação das
questões investigadas, preocupei-me em ir construindo o que chamei de diário de
campo. Assim, nesse diário, construído após cada sessão de entrevista, fui
registrando tudo o que observava, sentia e especulava. Anotava tamm, os
episódios que entrecruzavam os momentos de entrevistas, que marcavam o
processo para além do diálogo face a face com as professoras.
Segundo Kramer (2005), a partir de seus estudos bakhtinianos, para entender
o que é dito é preciso conhecer não o enunciado, mas fundamentalmente o
contexto da enunciação. Assim, tendo como objetivo a contextualização das
47
instituições
21
envolvidas nesta pesquisa, bem como a compreeno de sentidos
construídos a partir do diálogo com os professores investigados, senti a necessidade
de conhecer os Projetos Político-Pedagógicos (PPP) dessas instituições. Segundo
Goulart (2006, p. 88),
Um projeto político-pedagógico é como uma radiografia do movimento que a
escola realiza e pretende realizar para alcançar seu objetivo mais
importante: educar, promovendo a produção de conhecimentos e a
formão de pessoas integras e integradas à sociedade por meio da
participação cidadã, de forma autônoma e crítica .
Embora não tenha realizado uma análise de documento compreendida como
tal, a leitura cuidadosa dos PPP’s ampliou a gama de conhecimentos sobre cada
instituição, sobre sua história, sua localização, sua comunidade, seu espaço físico,
seus profissionais e, ainda, sobre algumas de suas concepções e dificuldades.
A opção por não realizar a análise documental, através de um estudo
aprofundado do conteúdo simbólico contido nos PPP’s, foi feita principalmente por
compreender, com Lüdke e And(1986), a partir das discussões de Krippendorff,
que essa opção, ao sugerir a necessidade de consenso sobre o conteúdo do
material analisado, apresenta-se inadequada para as abordagens qualitativas de
pesquisa que visam à compreensão.
Para a realização da análise dos dados construídos ao longo da pesquisa
empreguei os núcleos de significação
22
, compreendidos, a partir de Aguiar (2005),
como unidades de significação, idéias em torno das quais giram outras idéias,
tópicos através dos quais são explicitados emoções, desejos, sentimentos,
concepções, crenças, vozes sociais, culturais e conteúdos ideológicos, interpretados
como emergentes e contundentes pelo que anunciam, portanto, facilitadores da
apreensão dos significados e sentidos. Ainda segundo a autora, a criação dos
núcleos de significação representam uma saída para a preocupação fundamental da
perspectiva histórico-cultural, que é a busca da historicidade e das contradições
constitutivas dos sujeitos para além das aparências.
Menciono ainda que, diante da necessidade inicial de uma definição mais
precisa de minha questão de pesquisa, realizei, como parte integrante da
21
Dediquei à seção 3.3.1 a apresentação destes contextos, justamente por perceber que conhecer os
contextos é essencial para a realização e compreensão desta pesquisa.
22
O processo de construção e análise dos dados a partir dos núcleos de significação será abordado
na seção 3.4.
48
metodologia deste trabalho, o estudo piloto. Este estudo, reconhecido como fase
exploratória, se apresentou como fundamental para o estabelecimento dos contatos
iniciais, para a elaboração dos critérios de escolha dos sujeitos da pesquisa e, ainda,
para a reflexão sobre a metodologia e os recursos mais adequados a serem
utilizados.
3.2 O estudo piloto
Iniciar uma nova caminhada não é nada fácil, embora fascinante. Não
sabemos exatamente qual dos caminhos apontados devemos seguir, temos apenas
noção da direção em que queremos ir.
Para, a partir da teoria, avançar em direção ao campo de pesquisa e comar
a caminhada é necessário dar os primeiros passos, ou seja, é necessário especificar
as questões ou pontos críticos, estabelecer contatos iniciais para a entrada no
campo de pesquisa e, localizar os informantes e as fontes de dados necessários
para o estudo (LÜDKE E ANDRÉ, 1986). Frente a essa necessidade de dar os
primeiros passos, realizei o estudo piloto, o qual passo a descrever agora.
Optei por realizar este estudo na escola municipal onde trabalhava,
justamente por ter sido esse o local de origem de minhas inquietações. Além disto,
sabia que, nesta instituição, reconhecida pela comunidade como Escola Municipal
de Educação Infantil (EMEI)
23
, encontraria professores que estavam discutindo
sobre a ampliação do EF e sobre a inclusão das crianças de seis anos nesse
segmento do ensino e que esses professores não hesitariam em me ajudar nesta
pesquisa, principalmente por reconhecerem que ela poderia de algum modo ajudá-
los.
No período da realização do estudo piloto, mês de abril de 2006, funcionavam
nessa escola, em turnos diferentes, duas turmas de ano do EF. Sendo assim,
23
Menciono o fato de ser reconhecida pela comunidade como EMEI, porque em vias de fato, a partir
da LEI N.º 10.075 de 30 de outubro de 2001, que dispõe sobre a reestruturação da nomenclatura
das escolas da rede municipal e outras providências, as Escolas Públicas da Rede Municipal de
Ensino de Juiz de Fora passaram a ser identificadas como Escola Municipal seguido do nome
instituído em Lei que denomina cada uma, incluindo nesse artigo as Escolas de Educão Infantil
identificadas por Lei com nomenclatura de EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) e/ou Pré-
Escolar.
49
após autorização da direção da escola, convidei as duas professoras regentes de
turmas a participarem comigo desta fase da pesquisa.
As professoras convidadas, ao aceitarem o convite, solicitaram que seus
nomes fossem resguardados, pois desta maneira se sentiram mais livres e seguras
para falar o que pensavam, a partir deste acordo, assinamos juntas o consentimento
informado e o termo de compromisso
24
. Ficou também acordado que as entrevistas
seriam individuais e seriam gravadas, para que pudessem ser transcritas, na íntegra,
posteriormente.
Com o objetivo de não atrapalhar a rotina de vida das professoras, bem como
a rotina de aula das turmas, optamos por realizar as entrevistas na própria
instituição, nos horários em que as crianças estivessem na aula de Educação Física,
visto que, esse horário é destinado a estudos e preparação de material do professor
regente.
Diante de minha insegurança, de entrevistadora principiante, fui ao encontro
das professoras com um pequeno roteiro contendo as questões que deveriam
conduzir a entrevista, no intuito de compreender o que as professoras estavam
pensando sobre a ampliação do EF e sobre o atendimento das crianças de seis
anos nesse segmento do ensino.
Ao iniciar o processo de entrevistas, tendo o roteiro em mente e “em mãos”,
pude perceber, em primeiro lugar, que a utilização de roteiros não funcionaria,
porque a cada questão colocada, surgia a necessidade de outra que nem de longe
aparecia no roteiro. A cada nova pergunta uma nova possibilidade de diálogo surgia.
Outro problema foi o fato de que, sempre que tentava olhar para este roteiro, a
procura da próxima pergunta, acabava me perdendo e perdendo movimentos que
não poderiam ser gravados por um gravador de áudio.
Em segundo lugar, percebi que o tempo das entrevistas, 50 (cinqüenta
minutos) referentes ao horário de Educação Física, não era suficiente, nem mesmo
adequado, pois, diante da necessidade da professora re-assumir a turma, entregue
pelo professor de Educação sica, questões importantes ficavam em aberto, não
podendo ser concluídas. Além disto, as interrupções durante as entrevistas eram
constantes, visto que, este era o único horário que as professoras tinham para
resolverem questões pendentes com a direção, coordenação, pais, entre outros.
24
Apresento nos APÊNDICES B, C, D e E os modelos desses documentos.
50
Frente a isso, o que era para ser uma entrevista individual semi-estruturada,
transformou-se em três momentos de conversas, com cada uma delas. As
conversas, de aproximadamente 50’ (cinqüenta minutos), interrompidas e
entrecortadas por vários episódios extras, transformaram-se em momentos valiosos
para o direcionamento metodológico desta pesquisa. Então, foi a partir dessa
experiência, e apoiada no arcabouço teórico da perspectiva histórico-cultural, que
optei por abandonar as entrevistas semi-estruturadas e partir para as entrevistas
dialógicas recorrentes.
Além disto, reconhecendo que perdia muitos fatos importantes, para além do
diálogo face a face, passível de ser gravado por um gravador de áudio, tais como
sentimentos, expressões e especulações, decidi pela construção de um diário de
campo, onde anotaria todas essas observações. Outro ponto que precisou ser
revisto foi o horário de realizão das entrevistas, visto que o horário de Educação
Física dos alunos o se apresentou como o mais adequado.
As conversas com as professoras, além de possibilitarem a revisão da
metodologia e dos instrumentos a serem utilizados, também possibilitaram algumas
compreensões a respeito da questão a ser investigada e dos critérios para a escolha
dos sujeitos da pesquisa.
Percebi que, embora a ampliação do EF e a inclusão das crianças de seis
anos nesse segmento do ensino tivessem ocorrido, no Município de Juiz de Fora -
MG, no ano de 2004, as professoras ainda não estavam seguras dos efeitos dessa
mudança para sua prática. Nas conversas, surgiram questões do tipo, concordar ou
não com a nova estrutura do EF; alfabetizar ou não as crianças de seis anos;
trabalhar com conteúdos da primeira série ou do terceiro período; como avaliar estas
crianças; falta de apoio pedagógico; cobrança por parte dos pais, do sistema e das
escolas de EF para que as crianças saiam alfabetizadas no 1º ano; a importância
do dico no trabalho com as crianças de seis anos e, ainda, sobre o ritmo dos
trabalhos: acelerar para explorar o potencial máximo das crianças ou respeitar o
ritmo evitando massacrá-las ou bloqueá-las? Foi então que compreendi que, nesses
momentos de conversa, existia, de fato, uma multidão de fios ideológicos
(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1988 [1929]). Na tensão dos diálogos se confrontavam
valores, concepções e crenças. Entendi ainda que é justamente, a partir dessa
tensão que os sentidos vão se construindo.
51
Mediante tais questões, apresentadas pelas professoras, e analisando a
revisão bibliográfica, confirmei minha questão de investigação, qual seja:
compreender, através dos discursos, os sentidos que os professores do ano do
EF estão construindo para a inclusão das crianças de seis anos nesse segmento de
ensino.
Quanto aos critérios de escolha dos sujeitos da pesquisa, ao perceber, a
partir deste estudo piloto, a preocupação em relação à transição dos alunos de uma
escola de EI para uma escola de EF, optei por realizar as entrevistas com
professores destas duas instituições. Decidi também por realizar entrevistas com
quatro professores, sendo dois de cada instituição escolhida, acreditando que, desta
forma, ampliaria meu universo empírico e as possibilidades de discussão.
Outra decisão tomada foi a de convidar professores efetivos, que atuassem
nas escolas escolhidas por mais de um ano e que, frente ao objetivo desta pesquisa,
estivessem atuando no ano do EF de nove anos, ou seja, com crianças de seis
anos de idade. A opção por professores efetivos justifica-se pela tentativa de evitar
interrupções no processo de pesquisa mediante rescisão de contrato e
transferências. Quanto à justificativa para que sejam professores que atuem na
escola há mais de um ano, esta se deve ao fato de que esses professores,
provavelmente, estarão mais adaptados a este contexto, conhecendo melhor a
dinâmica das instituições. Ressalto que, a percepção da necessidade desses
critérios para a escolha dos professores teve sua origem também neste estudo
piloto, haja vista, uma das professoras participantes ser contratada e ter
apresentando profundo desconforto em comentar algumas situações, justamente
pelo ônus de não ser efetiva e por estar se sentido “um peixe fora d’água”, alguém
que pegou o “bonde andando”, achando muito difícil trabalhar numa escola
diferente, com filosofia diferente e sem auxílio pedagógico”.
A partir das reflexões originadas no estudo piloto, com intuito de dar
prosseguimento às minhas investigações, iniciei a caminhada em direção ao campo
de pesquisa. A seguir, passo a descrever esta caminhada, bem como os
companheiros de jornada.
52
3.3 A entrada no campo de pesquisa
Com intuito de localizar Escolas Municipais de EI e Escolas Municipais de EF
que trabalhassem com as crianças de seis anos no ano do EF de nove anos
recorri ao auxílio da Secretaria de Educação de Juiz de Fora, que me enviou uma
lista com todas as escolas que apresentavam essas características. De posse desta
lista, procurei por duas escolas que eu já tivesse tido algum contato e que se
localizassem em uma mesma região da cidade.
A opção por escolas conhecidas teve como objetivo a possibilidade de maior
receptividade em relação a minha presença e a efetivação da pesquisa, sentimento
que pude perceber durante a realizão do estudo piloto na escola em que eu
trabalhava. Quanto à localização das escolas, o fato de serem próximas facilitaria
meu deslocamento entre uma e outra, economizando tempo, algo tão caro neste
processo de pesquisa. A proximidade possibilitaria tamm uma contextualização
mais profunda destas duas instituições, as quais provavelmente atenderiam crianças
das mesmas comunidades ou de comunidades bem próximas.
Ao procurar na lista escolas com estas características, descobri que havia
uma, que apresentava uma característica bastante peculiar. Era uma escola seriada
de EF, que nunca havia trabalhado com as crianças de seis anos, e, passaria a
atendê-las, pela primeira vez, no 1º ano do EF, no ano de 2007.
A possibilidade de realizar uma pesquisa com duas escolas de contextos
percebidos historicamente como diferentes, sendo uma de EI e uma de EF, incluindo
aí, o fato de que esta última estaria realizando pela primeira vez o trabalho com as
crianças de seis anos, foi algo que me instigou. Diante dessa possibilidade, entrei
em contato com a direção da referida escola de EF, que autorizou a realizão da
pesquisa a partir do ano de 2007, quando estaria recebendo as crianças de seis
anos.
Então, a partir da localização da escola Municipal “F”, cheguei à escola
Municipal “I”, ambas localizadas na Zona Norte da cidade de Juiz de Fora. A
utilizão das letras I e “F” teve como objetivo a identificação da escola Icomo a
escola de EI e da escola “Fcomo escola de EF. A opção por não utilizar os nomes
verdadeiros das escolas, bem como das professoras que aceitaram o convite de
53
construir comigo esta pesquisa, surgiu da necessidade de preservá-las,
possibilitando assim, que os dados fossem construídos com maior fluidez.
Como na escola I, o trabalho com a as crianças de seis anos no 1º ano do EF
estava sendo realizado não precisaria aguardar o próximo ano letivo para iniciar a
pesquisa. Assim, o pximo passo, foi convidar as professoras dessa escola para
participarem comigo da construção desta pesquisa.
Na escola I havia apenas duas turmas de ano, fato que me deixou um
pouco apreensiva, visto que, se alguma das professoras o aceitasse o convite eu
teria que re-iniciar o processo, escolhendo uma nova escola, onde houvesse dois
professores interessados em participar da pesquisa. No entanto, quão imensa foi
minha surpresa, quando as professoras, ao receberem o convite, não só o aceitaram
como também mostraram imensa satisfação em poder construir comigo esta
pesquisa, acreditando que ela poderia contribuir para a elucidação de várias
questões que surgiram a partir desta nova formatação do ensino.
No início do ano letivo de 2007, tendo iniciado a pesquisa na escola I,
retornei à escola F e, ao verificar com a direção que duas turmas do ano do EF
foram montadas, confirmei a autorização para a realização da pesquisa. Com esta,
parti para o convite às professoras as quais também o aceitaram prontamente,
principalmente por reconhecerem a contribuição desta com a nova jornada que
estavam iniciando.
Após os contatos iniciais, percebi a necessidade de conhecer um pouco mais
sobre cada uma das escolas, acreditando que,
Na produção dos discursos, os lugares que as pessoas ocupam interferem
no significado produzido, ou seja, o contexto é importante para o
entendimento do texto. Na enunciação, os lugares e as condições em que
são proferidas as palavras produzem sentidos (KRAMER, 2005, p. 33-34).
Então, apresento a seguir o que pude conhecer e compreender sobre as
escolas participantes da pesquisa a partir das informações fornecidas pela direção
das escolas, dos dados encontrados nos PPP´s e de minhas observações durante o
período em que as freqüentei.
54
3.3.1 Conhecendo as escolas investigadas
A escola “I”
A Escola Municipal I atendia, até o ano de 2003, crianças de quatro a seis
anos de idade na EI. No ano de 2004, a partir da resolução 001/2003
25
, as crianças
de seis anos de idade passaram a integrar, nessa escola, o 1º ano do EF.
No ano letivo de 2006, ano em que iniciei a pesquisa de campo na escola I,
ela estava atendendo 195 alunos, porém, antes da ampliação do EF e do
atendimento às crianças de seis anos no 1º ano desse segmento, o número era bem
maior, em média, 250 alunos. Esse fato, analisado junto com a direção da escola,
sugere que muitos alunos saíram desta escola municipal, reconhecida pela
comunidade como EMEI, para freqüentarem uma escola de EF.
Na região da escola I, existem duas escolas de EF as quais recebem os
alunos oriundos da escola I, sendo uma Estadual, que desde 2004 passou a atender
as crianças de seis anos e uma Municipal, que passou a atender as crianças de seis
anos, pela primeira vez, no ano de 2007, ano em que passou a fazer parte desta
pesquisa, na qual foi batizada como escola F. As crianças que freqüentam estas
escolas apresentam características sócio-econômicas-culturais bastante
diversificadas, sendo a maioria proveniente da classe menos favorecida.
A escola I possui oito turmas, sendo quatro no período da manhã e quatro no
período da tarde. Dessas turmas, duas do turno da manhã são do 1º ano do EF, com
um total de 34 alunos, o que representa um mero muito baixo de alunos. Como
dito anteriormente, muitos alunos foram fazer o 1º ano do EF nas escolas Estaduais
da região. As justificativas das famílias, segundo a diretora da escola, são: (i) o fato
de que na escola Estadual as crianças terão continuidade no EF até o nono ano; (ii)
o fato de que na outra escola o horário das aulas são no turno da tarde, e (iii) o fato
25
Resolução 001/2003: Art 1º - O Ensino Fundamental, no Município de Juiz de Fora, terá a duração
de 9 (nove) anos e poderá ser organizado em ciclos de formação ou em séries anuais de acordo com
a Proposta Político-Pedagógica da escola.
Art 2º- A ampliação do Ensino Fundamental para 9 (nove) anos dar-se-á de forma gradativa,
iniciando nas escolas que já mantém o Ensino Fundamental e Educação Infantil, entrando em vigor a
partir do ano letivo de 2004, desde que a escola tenha condições físicas para este atendimento.
§ 1º. A matrícula inicial no Ensino Fundamental dar-se-á a partir de 6 (seis) anos de idade, completos
até 30 de abril do ano letivo em curso.
55
de que lá, na escola Estadual, as crianças vão para a 1ª série, “onde o ensino é mais
sério”. Este último aspecto sugere a compreensão do espaço de EI ainda como
assistencialista e não educacional, o espaço da brincadeira em oposição ao espaço
da aprendizagem, o espaço da alegria, do movimento em oposição à seriedade e a
responsabilidade do processo ensino/aprendizagem e, ainda, a grande confusão em
relação à nomenclatura do ensino, terceiro período da EI que atendia as crianças
de seis anos, 1º ano do EF que passou a atender as crianças desta idade e,
primeira série – que atendia as crianças de sete anos.
Historicamente a primeira série do EF tem sido considerada o marco da
entrada no processo de escolarização e, por conseguinte, na alfabetizão,
enquanto o terceiro período da EI tem sido reconhecido como o período de preparo
para a alfabetizão e a entrada no EF, tanto que em muitas instituições havia e
ainda a “famosa formatura”, marcando o final do período da EI, o rmino do
tempo para a brincadeira.
A freqüência dos alunos tem sido também um problema na escola I. A diretora
salienta justamente que, um dos fatores prejudiciais ao desenvolvimento dos alunos
tem sido a baixa freqüência às aulas. Os motivos desse fenômeno, ainda segundo a
diretora, referem-se à idéia que os pais/responsáveis têm da EI como sendo o lugar
para brincar e ao fato de as aulas serem no turno da manhã e muitas crianças,
até mesmo os responsáveis, apresentarem dificuldades para acordar. O primeiro
motivo relatado nos remete ao fato de que algumas famílias não compreendem a
importância da EI e o papel do brincar, o que nos leva a refletir sobre a importância
da escola integrar cada vez mais a família em seu espaço.
Diante da percepção da importância da integração comunidade e escola a
instituição I tem promovido o projeto “Família”. Esse projeto, conforme descreve a
direção da escola, é composto por momentos em que a comunidade, juntamente
com todos os profissionais da instituição, é chamada a tornar-se parte integrante da
escola e responsável tanto por ela como pelo desenvolvimento dos alunos. Com
esse objetivo, a escola organiza palestras com profissionais diversos, apresenta as
atividades que estão sendo realizadas na escola e os seus objetivos. Ainda segundo
a direção da escola, após o projeto “Família”, a comunidade escolar tem estado mais
participativa, o que gera expectativas frente à compreensão do papel da EI, do
atendimento do 1º ano do EF e da importância da freqüência dos alunos às aulas.
56
Além disto, os professores se reúnem mensalmente, junto com a diretora da
escola, para fins de estudos. Dentre os temas desses estudos aparece a questão do
atendimento às crianças de seis anos no EF, bem como sobre as especificidades
das crianças dessa faixa etária.
No que concerne ao espaço físico, prevalecem, na escola I, as características
de um espaço para o trabalho com a EI. Nesta instituição existem cinco salas de
atividades, todas espaçosas e com carteiras adequadas ao tamanho das crianças.
As carteiras possuem quatro lugares, facilitando, entre outras coisas, o
desenvolvimento de atividades em grupo e a relação entre as crianças. Além das
carteiras, as salas possuem cantinhos de leitura, organizados pelas professoras com
objetivo de criar um espaço onde diversas atividades de contato com a leitura
possam ser realizadas e, ainda, o quadro negro, a mesa e o armário da professora,
os cartazes com os ajudantes do dia, os aniversariantes e o calendário anual.
Na escola I, também há um parquinho, localizado em um espaço bem
pequeno e cimentado. Nele existe um escorregador, duas gangorras, alguns
brinquedos diversos, pneus e duas casinhas, sendo uma de plástico e outra de
alvenaria. Observando esse espaço, foi possível perceber que os poucos brinquedos
existentes estavam todos em condições bastante precárias. Nos momentos em que
as crianças o freentavam, uma vez por dia com duração média de quinze minutos,
as professoras tentavam contornar a falta de brinquedos para todos, propondo
algumas brincadeiras e organizando o tempo de uso de cada material, para que
assim, todas as crianças pudessem brincar onde queriam.
A ida ao parquinho era, portanto, um momento tenso, onde muitas discussões
ocorriam pela posse de um determinado brinquedo ou pela participação em alguma
brincadeira, por vezes, algumas crianças eram chamadas a sentar para acalmar e
“pensar”, pois estavam brigando, correndo ou gritando muito. Embora tenso, o
momento do parquinho se apresentava como um tempo muito rico, no qual percebi,
entre outras coisas, que as crianças estavam aprendendo a se articular, a respeitar e
utilizar os espaços que possuíam, a respeitar a vez do outro, a cuidar do pouco
material que ainda tinham e, acima de tudo, divertiam-se, criavam, fantasiavam,
mesmo que para isto precisassem subverter as ordens estabelecidas pelas
professoras. Em certas ocasiões, subvertiam inclusive o momento de sentar para
“pensar”. Por rias vezes, percebi que tudo o que estava ao redor do local onde a
criança estava sentada se transformava em brinquedo, uma pedrinha solta ou uma
57
tampinha viravam carrinhos e, não raro, outras crianças que não precisavam sentar
para “pensar”, solidarizavam-se com o(a) colega, sentavam-se tamm e criavam
jogos e brincadeiras que pudessem realizar ali, sem sair do lugar. Às vezes as
professoras interrompiam as brincadeiras, lembrando que a criança estava ali para
“pensar” e não para brincar, mas, em outros momentos, deixavam a brincadeira
passar despercebida, apresentando certo avio por ver as crianças realizando
atividades mais calmas do que as constantes correrias e gritarias.
Os banheiros da escola, para uso das crianças, são em número de quatro,
sendo dois para os meninos e dois para as meninas. Os bebedouros, assim como os
banheiros, o todos adaptados ao tamanho das crianças.
Existe ainda, na escola I, a secretaria, a sala de professores, a despensa, a
cozinha, o banheiro dos funcionários, o almoxarifado e uma quadra aberta onde
pude presenciar algumas aulas de Educação Física e os ensaios para as
festividades de fim de ano. A sala dos professores, local onde as entrevistas foram
realizadas, era bastante espaçosa. Nela continham as estantes com livros de
formão e livros didáticos, o mimeografo, a caixa onde os professores depositavam
os seus modelos de atividades rodadas no mimeografo e uma mesa bem grande,
onde os professores sentavam para ler o jornal do dia e para conversarem sobre
assuntos diversos. Havia também um quadro onde se fixavam comunicados e
circulares da escola. Compreendi esse espaço como muito importante no cotidiano
da escola, pois nele a interação entre os professores era privilegiada, conhecimentos
diversos eram construídos e as vozes da escola se encontravam.
Enfim, encontrei na escola I, uma escola com características sicas do
atendimento a EI, na qual a Diretora fazia o possível para integrá-la à comunidade, a
fim de se fazer compreender o processo de implementação da lei nº. 11.274/2006 e,
ainda, auxiliar e incentivar os professores nas discussões a esse respeito. Mas é
uma escola que tamm apresenta problemas, dos quais, além dos mencionados,
apresento o fato de a Diretora estar exercendo sozinha, há alguns anos, o papel de
diretora e coordenadora. No início do ano letivo de 2006 foi encaminhada uma
coordenadora para a escola, entretanto esta coordenadora necessitou tirar licença e
até o final do ano letivo não havia ocorrido substituição, ficando a diretora
novamente sozinha nos trabalhos de articulação entre o administrativo e o
pedagógico. Esse fato surge, em certa medida, como justificativa dada pela diretora
em relação à dificuldade apresentada em socializar, estudar e discutir com os
58
professores os Documentos e textos que lhes são enviados, bem como construir um
PPP consistente com o coletivo da escola.
Aliás, no que concerne ao PPP propriamente dito, fui avisada pela diretora da
escola I que ele se encontrava em fase de construção, mas mesmo assim pude
fazer alguns apontamentos. Dentre eles, percebi o quanto a idéia de ser uma escola
de EI está enraizada na escola I, visto que, em momento algum aparece o fato de as
crianças de seis anos estarem no EF e ser recorrente a menção à referência ao seu
trabalho enquanto escola de EI. Todos os itens mencionados no PPP estão ainda
descritos de forma bastante superficial e, em momento algum aparecem questões
referentes ao trabalho com a alfabetização. Também não aparecem referências aos
conteúdos a serem trabalhados em cada série ou aos métodos e técnicas a serem
utilizados.
Embora em fase inicial de sua construção e apresentar superficialmente seus
itens principais, é possível dizer, a partir de minhas observações, que a escola I tem
buscado ampliar seu PPP e tem se esforçado muito para isto, haja vista suas
reuniões de estudo. utiliza termos apropriados para se referir ao reconhecimento
da infância enquanto categoria social, bem como à educação da infância da criança
pequena como aquela que envolve dois processos indissociáveis e complementares:
o cuidar e o educar. Tamm encontrei várias referências à importância da
brincadeira e à possibilidade de a criança aprender brincando.
A escola “F”
A Escola Municipal F foi criada no ano de 1979 com objetivo de oferecer as
séries iniciais do EF. Quando criada possuía apenas cinco salas de atividades, mas
atualmente é considerada uma das maiores escolas de Rede Municipal de Ensino
de Juiz de Fora, possuindo quatorze salas de atividades, atendendo
aproximadamente 1.200 alunos entre o ano do EF de nove anos (a partir de
2007), o Ensino Médio (EJA) e o Projeto Caminhar (Suplência). Os alunos atendidos
o, em sua maioria, provenientes de classe sócio-econômica muito baixa.
Além das salas de aula a escola F possui a sala de professores, a sala da
coordenação, um anfiteatro, uma biblioteca, a secretaria, a sala da direção, uma
59
quadra poliesportiva pavimentada e coberta, uma sala de informática, a cozinha, o
refeitório, os banheiros de alunos (masculino e feminino), um banheiro para
professores e os bebedouros adaptados com degraus para o atendimento das
crianças menores. As características físicas e materiais são de uma escola
culturalmente reconhecida como sendo de EF, visto que não possui banheiros ou
carteiras adaptadas para os alunos menores, bem como não possui um parquinho.
O atendimento às crianças de seis anos no ano do EF começou a ser
pensado nessa escola no ano de 2006 como uma das estratégias para a diminuição
dos índices de repetência no ano (crianças de 7 anos). A equipe diretiva
considerou o fato de que alguns alunos entravam na escola pela primeira vez aos
sete anos e que outros vinham de escolas menores e demoravam a se adaptar ao
sistema da escola. Assim, entrando aos seis anos, no ano do EF, as crianças
teriam um prazo maior para se adaptarem a escola e para desenvolverem suas
aprendizagens. Outro fator que ponderaram foi o de que seria interessante que as
crianças fizessem todo o EF em uma mesma escola, evitando a ruptura entre o e
o 2º ano do EF, dilema há muito vivenciado entre operíodo da EI e 1º série EF.
Frente à possibilidade do atendimento às crianças de seis anos na escola F a
partir do ano de 2007, uma das professoras da referida escola se inscreveu no
projeto O Ensino Fundamental de nove anos”, organizado pela SE, com intuito de
compreender melhor como seria esse trabalho e, assim, caso essa turma realmente
passasse a existir na escola, ela estaria mais preparada para trabalhar com as
crianças de seis anos.
De fato, no ano de 2007 o atendimento às crianças de seis anos foi iniciado
na escola F. Foram abertas três turmas no turno da tarde, com aproximadamente 20
alunos cada uma. A professora que participou do projeto da SE durante o ano de
2006 ficou responsável por uma das turmas e, além de continuar participando do
projeto e concordar em ser a multiplicadora deste na escola, aceitou ser um dos
sujeitos desta pesquisa.
Convidei as outras duas professoras responsáveis pelas turmas do ano a
participarem também, mas, por motivos de incompatibilidade de horios para a
realização das entrevistas, apenas uma aceitou o convite. Como já estava previsto
na metodologia que realizaria a pesquisa com quatro professores do 1º ano este fato
não prejudicou o andamento da investigação.
60
Durante minha estada na escola F pude observar que as crianças pareciam
estar bem adaptadas ao novo espaço sico, bem maior do que as escolas de origem
da maioria que havia freqüentado a EI. Observei também que, na tentativa de
compensar a falta do parquinho, as professoras trabalhavam com atividades livres
e/ou dirigidas, fora da sala, utilizando jogos e brinquedos confeccionados por elas ou
pelas próprias crianças. Outra atividade que parecia buscar compensar esta falta era
a ida ao espaço da biblioteca, onde as crianças realizavam atividades diversas. A
falta de carteiras adaptadas ao atendimento às crianças menores era compensada
pelas próprias crianças que, em alguns momentos, ajoelhavam-se nas carteiras para
dar altura. O fato das carteiras serem individuais o se apresentou como problema,
pois as professoras realizavam trabalhos em grupos juntando as carteiras. Presencie
também algumas atividades realizadas no chão da sala, como rodinhas de conversa
e ensaios de músicas.
Ressalto que, embora a escola I apresentasse características físicas mais
adequadas ao atendimento das crianças menores e embora a escola F estivesse
fazendo o possível para adequar seu espaço a este atendimento, o espaço de
ambas estava muito aquém do que realmente atenderia a demanda dessa faixa
etária.
O recreio das turmas de 1º ano era realizado em horário diferente das demais
turmas, uma tentativa de resguardar as crianças menores de acidentes em
brincadeiras com as crianças maiores. Durante o recreio, que durava em média
quinze minutos, as crianças merendavam os lanches que traziam de casa,
brincavam de pique, corriam, gritavam, sentavam em rodinhas para brincarem com
alguns brinquedos, tamm trazidos de casa. Devido ao excesso de correria, muitas
vezes as crianças eram chamadas à atenção e convidadas a sentarem-se para
acalmar um pouquinho. Acredito que a falta de brinquedos e do parquinho contribuía
muito para essa agitação no recreio.
Outra observação que julgo pertinente é o fato de que as professoras do
ano, exceto a que estava participando do grupo da SE, o tinham conhecimento
dos documentos sobre a ampliação do EF, fato gerado provavelmente por ser uma
escola maior, o que tem dificultado a articulação de encontros para estudos e
divulgões de materiais entre os professores. Observei ainda que o atendimento às
crianças de seis anos nessa escola o foi uma decisão unânime, pois em
conversas informais com alguns professores da instituição ouvi declarações contra o
61
atendimento, por acreditarem que a escola, principalmente em termos de espaço
físico e material, não estava preparada para realizá-lo. Além disto, observei por parte
de alguns profissionais da escola um tom pejorativo ao se dirigirem às turmas de
seis anos como as “Turmas do Prézinho” ou se dirigirem às professoras como as
“Meninas do Pré. Conforme indaga Kramer (2005): será que na EI temos mesmo
meninas no lugar de professoras? Tais fatos me levaram novamente a pensar sobre
a importância da articulação de encontros e estudos pelo corpo docente da escola e
sobre a importância da integração entre seus profissionais.
Assim como na escola I, senti falta de um PPP mais consistente e coeso com
as decisões do coletivo da escola, mas, também fui avisada, pelo seu diretor que o
PPP es em fase de construção e que algumas mudanças estavam sendo
realizadas mediante solicitação da SE (como, por exemplo, a explicitação da
concepção de infância e de aprendizagem defendida pela escola, o esclarecimento
dos critérios de organização das turmas e organização curricular, a especificação
dos critérios de avaliação e das metodologias utilizadas).
A questão central apresentada no PPP da escola F se refere à eliminação da
cultura da repetência através de um ensino de qualidade para todos, mas o que
consideram como qualidade não foi especificado, assim como não havia nenhuma
menção ao atendimento às crianças de seis anos no EF, nem mesmo como sendo
uma das formas de amenizar os índices de repetência, como foi sugerido pela
equipe diretiva. Também não encontrei questões mais específicas sobre como
deverá ocorrer o trabalho referente ao processo de alfabetizão e como este será
avaliado.
Enfim, as questões também estavam colocadas ainda de forma superficial,
mas como fui informada a respeito de estar o PPP em fase de construção e revisão
quero acreditar que essas e outras questões ainda serão discutidas pelos
profissionais da escola e contempladas em seu PPP.
62
3.3.2 Conhecendo as professoras sujeitos da pesquisa
Tendo em mente o objetivo proposto para esta pesquisa, bem como sua
fundamentação na perspectiva histórico-cultural, após conhecer um pouco mais as
escolas, procurei conhecer também o perfil das professoras que aceitaram participar
e construir comigo esta pesquisa.
Saber que eram efetivas, que trabalhavam na escola há mais de um ano e
que atuavam com as crianças de seis anos no ano do EF, o era o suficiente
para alguém que queria compreendê-las e compreender os sentidos que estavam
construindo para a ampliação do EF e para a inclusão das crianças de seis anos
nesse segmento do ensino. Para compreender é preciso muito mais que
simplesmente conhecer e descrever. Para compreender, segundo Aguiar (2003), é
preciso estabelecer relações que até então o haviam sido feitas, detectar a
gênese de alguns fatos e afastar-se de explicações naturalizantes.
Além disto, estou realizando uma pesquisa com seres humanos, com pessoas
que se constituíram através das relações dialéticas estabelecidas com seu meio
histórico e cultural. Portanto, são pessoas únicas, singulares e, ao mesmo tempo,
históricas. De acordo com Aguiar e Ozella (2006, p. 2),
O homem, constituído na e pela atividade, ao produzir sua forma humana de
existência, revela – em todas as suas expressões –, a historicidade social, a
ideologia, as relações sociais, o modo de produção. Ao mesmo tempo, esse
homem expressa a sua singularidade, o novo que é capaz de produzir, os
significados sociais e os sentidos subjetivos.
Ressalto ainda que conversar sobre a história de vida de cada uma, também
foi uma das formas que encontrei para “quebrar o gelo” inicial, pois, mesmo que
todas tenham aceitado com certo entusiasmo participar deste estudo, o início é um
tanto quanto constrangedor. De acordo com Lüdke e And (1986, p. 34) “Na medida
em que houver um clima de estímulo e de aceitação mútua, as informações fluirão
de maneira novel e autêntica”.
Por tudo isso e por concordar com Kramer (2005) que as histórias de vida são
como a memória coletiva do passado, consciência crítica do presente e premissa
operativa do futuro, julguei ser importante conhecer um pouco da história de cada
uma das professoras desta pesquisa. Com este intuito marquei um primeiro encontro
63
com cada uma das quatro professoras. Nestes encontros, realizados em horários
alternados de acordo com a disponibilidade de cada professora, contei um pouco da
minha história e da história desta pesquisa, em seguida, disse que tamm gostaria
de saber um pouco sobre suas histórias.
Apresentarei, então, a partir de agora, um pouco sobre cada uma das
professoras. Mas, antes de qualquer coisa, gostaria de salientar que, todas elas, ao
serem solicitadas a falar um pouquinho de si, um pouquinho de sua historia pessoal
e profissional, fizeram-no naturalmente, mas de forma bastante direta, pida e muito
voltada para as referências profissionais, exceto a professora “Valéria - F”
26
.
Essa professora foi a que mais resistiu inicialmente. Embora tenha aceitado
prontamente o convite, sempre que marcávamos para conversar acontecia algum
imprevisto. Ou ela tinha que ir embora para resolver problemas pessoais, ou
esquecia de marcar com a professora que deveria substituí-la enquanto
conversávamos, dentre outros motivos. Até que um dia, fiquei na escola até o final
da aula e, quando ela saiu para ir embora fui ao seu encontro. Como esvamos
indo na mesma direção, perguntei se poderia fazer-lhe companhia. Frente à resposta
positiva, percebi minha grande oportunidade de aproximação. Fomos conversando
informalmente até o ponto de ônibus, os assuntos eram variados, até que ela
comou a falar sobre sua correria diária e sobre sua ansiedade com relação ao seu
trabalho com as crianças de seis anos. A partir daí, ela perdeu três ônibus, porque
não queríamos parar de conversar. E, para minha surpresa, ela marcou para que eu
fosse na escola conversar com ela no dia seguinte. Assim, nossa relação foi se
estreitando e esta professora foi a que apresentou sua história com maior
intensidade. Descobri que isso só foi possível porque ela percebeu que o que eu
queria era conversar, refletir e construir conhecimentos juntas e não tinha a intenção
de julgar seu trabalho ou fazer perguntas sobre fatos que ela nem mesmo estava
certa de que saberia responder. Aprendi muito com ela, principalmente sobre a
importância do primeiro contato e da importância do sentimento de aceitação e
cumplicidade.
Agora sim, vamos às apresentações.
26
Por motivos já comentados na metodologia desta pesquisa, combinei, com as professoras, que
seus nomes seriam resguardados. Porém, com intuito de que elas se reconhecessem neste
processo, utilizei nomes fictícios escolhidos por elas. Além disto, para que fosse possível identificar,
ao longo da pesquisa, quais professoras representavam a escola de EI e quais representavam a
escola de EF, acrescentei aos nomes escolhidos a letra da escola, qual seja I” ou “F”.
64
As professoras da escola “I”
Cris I é Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF) e é Especialista em Psicopedagogia. Atua no magistério desde 1996, sendo
que, no ano de 2000 foi efetivada na Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora e,
desde 2003 trabalha na escola “I” como professora efetiva. Com crianças de seis
anos começou a trabalhar em 2003, tendo feito esta opção por gostar do trabalho
com a EI, com o início da vida escolar, quando considera encontrar as crianças mais
empolgadas e, ainda, por conseguir trabalhar com o processo de alfabetização de
forma mais lúdica, por meio de jogos, brincadeiras, cantigas e contos de fadas.
Margarida I, por sua vez, é graduada em Letras pelo Centro de Ensino
Superior de Juiz de Fora (CES). É Mestre em Literatura, tendo obtido o título
também pelo CES. Começou a trabalhar no magistério no ano de 1991, com EF e
Ensino Médio. Foi efetivada na Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora em 2000,
e, no ano seguinte, foi trabalhar na escola “I”. Dos seis anos em que estava
trabalhando nessa escola, três foram dedicados ao trabalho com as crianças de seis
anos. A opção pelo trabalho com crianças menores surgiu por gostar de atuar na EI
e por acreditar que essa fase é muito importante para a realização de atividades com
a literatura.
As professoras da escola “F”
Sofia F é formada em Pedagogia pela Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF), Especialista em Psicopedagogia pela Faculdade Estácio de e Mestranda
pelo Programa de Pós-Graduação em Educação pela UFJF.
Entretanto, sua primeira opção de formação foi Psicologia, da qual desistiu
após não passar em seu primeiro vestibular. A partir daí, comou a procurar outro
curso, com o qual sentisse afinidade e que pudesse fazer no turno da noite, uma vez
que durante o dia trabalhava em um escritório. Foi então que optou pelo curso de
Pedagogia, acreditando que nele tamm teria algum contato com temas da
Psicologia.
65
Durante o Curso de Pedagogia viveu um grande conflito, pois, embora
gostasse de criança e estivesse gostando da parte teórica do curso não conseguia
se imaginar atuando em uma sala de aula. Porém, após o término do curso e frente
à necessidade de trabalhar, Sofia F participou do concurso para professores da
Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora. Tendo sido aprovada, Sofia F foi atuar
como professora, iniciando suas atividades como contratada em uma turma de EI e,
segundo ela, teve uma grande surpresa ao se apaixonar pela atividade, mesmo
tendo enfrentado muitas dificuldades no início devido sua inexperiência Chorei
muito indo embora para casa, mas comecei a me apaixonar”.
No ano seguinte saiu a efetivação e Sofia F foi trabalhar na escola onde esta
pesquisa foi realizada. Ela está atuando no magistério há quatro anos, sendo que há
três é efetiva nesta escola da Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora. Nesses
últimos três anos trabalhou com uma turma de ano (crianças de sete anos), uma
turma de terceiro ano (crianças de oito anos) e, atualmente, estrabalhando com
uma turma de 1º ano (crianças de seis anos).
Trabalhar com as crianças de seis anos foi uma opção de Sofia F por se
identificar mais com o trabalho voltado às criaas menores, inclusive pela disciplina.
Segundo ela, esta questão é mais difícil em relação às crianças maiores e, embora
as crianças menores falem muito, brinquem, andem pela sala, isto é muito diferente
de indisciplina. Outro fator que auxiliou a opção foi a insegurança frente ao trabalho
com os conteúdos apresentados nas demais séries e o fato de não existir, no 1º ano,
a carga da reprovação.
De acordo com Sofia F, trabalhar com as crianças de seis anos, foi mesmo
uma opção, “por gosto mesmo, diferente da maioria que fica com o 1º ano por falta
de opção”. Por este motivo, estava, desde o ano passado, participando do projeto da
SE –“O Ensino Fundamental de Nove anos”, buscando preparar-se para o trabalho
com essas crianças assim que as turmas de 2007 fossem montadas. Tamm com
esse objetivo, dedicou um bom tempo à procura de materiais que pudessem auxiliá-
la na nova caminhada, no novo desafio.
Valéria F fez magistério por indicação da e, visto que este curso lhe daria
uma profissão e lhe possibilitaria ajudar em casa financeiramente. Logo que se
formou começou a trabalhar com uma turma de EI em uma escola particular
identificando-se com a atividade. Porém, ainda não estava certa de que era o que
queria para sua vida profissional, o que a levou a estudar para o concurso da Polícia
66
Federal. o passou no concurso e nesse meio tempo descobriu que realmente
gostava de dar aulas. Acabou passando no concurso da Rede Municipal de
Educação de Juiz de Fora e foi dar aulas para turmas de Educação de Jovens e
Adultos (EJA). Embora tivesse enfrentado dificuldades devido a pouca idade e a
inexperiência, acabou gostando e se envolvendo muito com esse trabalho,
exercendo a atividade por cinco anos.
Justamente por se envolver com as turmas da EJA e por ter-se deparado com
uma turma que considerou “dicil”, constituída por adolescentes com dificuldades
econômicas muito grandes, alguns ex-detentos ou saídos de internatos para
menores infratores, entre outras, Valéria F resolveu dedicar-se mais aos estudos.
Passou então a participar do grupo de estudos da SE que discutia sobre o trabalho
com a EJA e decidiu retornar a faculdade, não para estudar sobre práticas
pedagógicas, pois considerava ter aprendido muito com sua própria prática, mas
para estudar algo que a fizesse compreender essas questões sociais problemáticas
vivenciadas na turma da EJA. Desta forma, optou por fazer faculdade de Serviço
Social. Adorou o curso e não consegue imaginar sua prática pedagógica
desvinculada de tudo o que estudou, assim como não consegue ver objetivo no
curso que fez sem sua sala de aula. Valéria F fez ainda especializão em Arte e
Educação.
Valéria F acabou vindo para a escola de EF participante desta pesquisa por
problemas de vaga. A turma em que atuava fechou e ela teve que escolher outra
escola para trabalhar. Inicialmente trabalhou tamm com uma turma da EJA, mas
como esta também fechou e ela não queria mais mudar de escola optou em mudar
de turno e trabalhar com as crianças de seis anos, pois também se identifica com o
trabalho nessa faixa etária. Afinal, seu início profissional foi com as crianças
menores, além disso, caso a turma não abrisse talvez Valéria F tivesse que mudar
de escola novamente. Outro motivo que levou Valéria a optar pelo trabalho com as
crianças de seis foi a oportunidade de se sentir mais próxima de seu filho, segundo
ela, o seu maior sonho sempre foi ser mãe e agora que realizou este sonho diz que
passou a ver seus alunos como se fossem seus filhos, querendo para eles o mesmo
que quer para o seu filho.
Ao conversar com as professoras percebi que a opção pelo magistério nem
sempre foi opção, mas, em alguns casos, a falta dela. E ainda, ou a necessidade de
trabalhar, ou a necessidade de adequar-se a um curso que oportunizasse a dupla
67
jornada estudo e trabalho e/ou ainda a vocação e a proximidade do papel de
mãe. Quanto à opção pelo trabalho com crianças menores e com crianças de seis
anos, observei várias tendências: o gosto em atuar com crianças menores, a
insegurança em trabalhar com conteúdos das séries mais avançadas, a queso
referente a disciplina (por ser considerada menos complicada), o processo de
aprovação e reprovação, o sentir-se mais à-vontade em realizar um trabalho que
envolva o lúdico, a fantasia, as atividades livres e as atividades com literatura de
forma mais prazerosa.
Outra questão observada diz respeito ao fato de que três, entre as quatro
professoras entrevistadas, estavam participando do projeto “O Ensino Fundamental
de nove anos” organizado pela Secretaria de Educação. Fato que considero
importante, pois revela tanto o interesse das professoras em adequar seu trabalho à
nova realidade, bem como a busca de respostas frente às inseguranças originadas
com a nova estruturação do ensino. Percebendo a pesquisa como um processo
dinâmico, no qual a metodologia e os instrumentos devem adequar-se aos
acontecimentos que vão despontando, achei que minha participação nesse projeto
poderia me auxiliar na construção e compreensão de dados importantes sobre os
sentidos que as professoras estavam construindo para a ampliação do EF e para a
inclusão das crianças de seis anos nesse segmento, mesmo que esta participação
não estivesse programada inicialmente. Além disso, como professora efetiva da
Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, atuando na EI e nos anos iniciais do EF,
fui convidada pela direção da escola em que trabalho a participar de tal projeto como
uma das representantes da instituição.
Portanto, mediante autorização da Secretária de Educação, descrevo a seguir
os objetivos e algumas das principais características do referido projeto “O Ensino
Fundamental de nove anos”.
68
3.3.3 Conhecendo o projeto da Secretaria de Educação de Juiz de Fora: “O Ensino
Fundamental de nove anos”
Este projeto, iniciado no segundo semestre do ano de 2006, aberto a todos os
professores do EF, tem como objetivo discutir as propostas pedagógicas dos
professores que atuam nos anos iniciais do EF. As reuniões são mensais,
organizadas como um espaço de (re)significações do ensinar e aprender nas etapas
iniciais do EF. Nelas o grupo iniciou o processo de construção do documento
norteador para a organização do trabalho das escolas da Rede Municipal de ensino
de Juiz de Fora em relação ao trabalho nos anos iniciais do EF
27
.
Durante o segundo semestre do ano de 2006 foram realizados quatro
encontros, mediados por uma equipe da Secretaria de Educação, do Departamento
do EF, que versaram sobre: (i) a infância no contexto do EF de nove anos; (ii) a
organização do espaço e do tempo no contexto do EF de nove anos; (iii) a
concepção de alfabetização/letramento no contexto do EF de nove anos; e (iv) a
avaliação no contexto do EF de nove anos.
Ao final dos quatro encontros realizados no ano de 2006 foi elaborada uma
primeira versão do documento “O Ensino Fundamental de nove anos: orientações
iniciais”. Essa primeira versão foi construída a partir das discussões realizadas nos
encontros tendo sido discutida e revisada, em conjunto, pelo grupo de professores
participantes do projeto e pelas mediadoras responsáveis pelo mesmo. Os próximos
passos serão a revisão e posteriormente a publicação e divulgação da versão final.
Ao longo do ano letivo de 2007, em continuidade ao projeto, foram realizados
encontros com objetivos de compreender e aprofundar as questões referentes ao
processo de alfabetização/letramento, uma vez que este foi o tema de maior
polêmica nos encontros anteriores, e, ainda, de construir com o grupo de
professores os eixos orientadores do trabalho pedagógico. Ao final do ano de 2007,
foi apresentada e discutida pelo grupo a versão preliminar dos eixos norteadores,
denominada pelo grupo de “Alfabetizão e Letramento: pensando os eixos
orientadores do trabalho pedagógico”. A apresentação e discussão de tal versão foi
considerada pelo grupo como de suma importância, pois será transformada em um
27
Informações fornecidas pela equipe responsável pelo projeto na Secretaria de Educão de Juiz de
Fora.
69
documento da Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora. Por esse motivo o grupo
solicitou que fosse dada continuidade da revisão de tal versão no ano letivo de 2008
e a solicitação foi acatada pela equipe responsável pelo desenvolvimento do projeto.
A dinâmica dos encontros foi bastante diversificada, aliando apresentações,
relatos de experiências, debates sobre o que tem ocorrido na prática cotidiana das
salas de aula aliados a discussões teóricas, com base em autores que têm discutido
o tema da ampliação do EF. Minha participação oportunizou-me observar o
desenvolvimento do projeto “O Ensino Fundamental de nove anos” e compreender a
importância da organizão de grupos de estudos, da formação continuada e em
contexto, como espaços de aprendizagens, discussões teóricas e práticas. Estando
articulados os professores podem exigir condições melhores de trabalho e construir
juntos uma educação de qualidade para todos.
3.4 O processo utilizado para organização e a análise dos dados
As transcrições das conversas empreendidas nas três entrevistas realizadas
com cada uma das quatro professoras, no período referente aos anos letivos de
2006 e 2007, possibilitaram a reflexão sobre vários aspectos do atendimento das
crianças de seis anos no EF. Esses aspectos, organizados e entrecruzados com os
dados das anotações do diário de campo, com as leituras dos PPP’s e com a teoria
estudada, geraram núcleos de significação. Eles possibilitaram a construção de
conhecimentos e reflexões sobre a prática das professoras do primeiro ano, bem
como o vislumbre de alguns pontos passíveis de modificação frente ao trabalho com
estas crianças.
Os procedimentos utilizados para a realização da análise através dos cleos
de significação se pautaram nos estudos de Aguiar (2005) e Aguiar e Ozella (2006).
Assim, a partir das contribuições desses autores, empreendi inicialmente uma leitura
flutuante das transcrições das entrevistas e das anotações do diário de campo,
procurando me familiarizar com o conteúdo destas. A partir dessa primeira leitura
inicial, fui destacando o que era recorrente em suas falas e o que mais chamava a
atenção. Assim, fui organizando os pré-indicadores para a construção dos núcleos,
quais sejam: objetivos da mudança; sentimentos frente à mudança (medo,
70
angústias, insegurança, revolta, desamparo por falta de apoio, pressão, cobrança,
falta de autonomia); dicotomia e divergência entre EI e EF; diferentes concepções
sobre desenvolvimento e aprendizagem; contradições e ambigüidades sobre o papel
do professor; o papel da escola de EF e da escola de EI; a opção em ser professor
nesse segmento de ensino; desconhecimento das orientações oficiais; falta de
materiais de apoio; preocupação com a alfabetização (se alfabetiza ou não); como
trabalhar alfabetização com as crianças de seis anos; opção por mais conteúdo
menos brincadeira; importância da formação continuada; importância de grupos de
estudo.
Após a organizão dos pré-indicadores empreendi uma segunda leitura, a
fim de reuni-los e agrupá-los em um conjunto de indicadores, que apresento no
quadro a seguir:
INDICADORES
CONTEÚDOS
Os objetivos da
mudança na voz do
professor
1. Político.
2. Social.
3. Econômico.
4. Pedagógico.
5. Aspectos positivos.
6. Aspectos negativos.
O Professor frente
à nova organização
do ensino: desafios
e impactos
1. Desestabilização necessária/ Zona de instabilidade.
2. Resistência velada.
3. Medos.
4. Angústia.
5. Insegurança.
6. Desamparo.
7. Desconhecimento do material legal e oficial.
8. Pressões e cobranças.
9. Revolta.
10. Alívio voltado para o próprio umbigo-(não perder a
vaga na escola).
11. Percepção da dicotomia, divergências e polarizações
entre culturas arraigadas da EI e cultura do EF.
71
O papel do
professor-como se
reconhecem-
(re)significando
papéis
1. Opção pela profissão ou profissão por falta de opção.
2. Motivo da opção pelo trabalho com as crianças
pequenas (contradições e ambigüidades).
3. Professores/ educadores/ mediadores/ garçons/
jardineiros/ alfabetizadores/ pipoqueiros/ cuidadores /
tarefeiros/ etc.
(Re)organização do
trabalho
1. Concepção de EI (não sistematizada/ informal/
socialização/ experimentação/ período preparatório/
abordagens mais naturalísticas).
2. Concepção de EF (sistematizado/ formal/ transmissão
de conteúdos/ abordagens mais diretivas).
3. Concepção de desenvolvimento e aprendizagem.
4. O papel da educação escolar na perspectiva dos
professores.
5. Concepção de infância e de criança.
6. Relação entre o lúdico e a aprendizagem.
7. Alfabetização em foco (problema ou solução, melhor
idade para ser alfabetizado, discussões sobre métodos e
metodologias).
Quadro 1 - Conjunto de indicadores organizados a partir dos artefatos da pesquisa
A partir da organização desses indicadores empreendi uma nova leitura,
considerando agora o conjunto de indicadores formados e iniciando um processo de
organização e nomeação dos núcleos de significação.
Mesmo reconhecendo que todo processo desta pesquisa foi
construtivo/interpretativo, compreendi, com Aguiar e Ozella (2006), que neste
momento estava avançando, mais profundamente, do empírico para o interpretativo.
Verificando as transformações e contradições que ocorreram no processo de
construção dos sentidos, indo além do aparente, considerei as condições subjetivas,
contextuais e históricas. No quadro 2 apresento como os núcleos de significação
ficaram organizados.
72
NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO
CONTEÚDOS
1- Compreendendo a nova organização
do ensino: impactos e desafios.
1. Objetivos da mudança.
2. Sentimentos surgidos.
3. Desestabilizações.
4. O foco na alfabetização.
2- Refletindo sobre infância,
desenvolvimento e aprendizagem.
1. Concepção de infância.
2. Concepção de desenvolvimento
e aprendizagem.
3. O papel da escola e do professor.
3- Pensando sobre dicotomias.
1. EI x EF.
2. ano x 2º ano.
3. Lúdico x Aprendizagem.
4. Município x Estado.
Quadro 2 - Organização e nomeação dos núcleos de significação
Assim, a partir dos núcleos de significação estabelecidos e nomeados, iniciei
as análises, em um movimento de articulação entre as falas das entrevistadas, as
anotações do drio de campo, a leitura dos PPP´s, o contexto histórico-cultural e a
teoria estudada. Busquei compreender o sujeito em sua totalidade, procurando
construir junto com eles os sentidos para a ampliação do EF e para o atendimento
das crianças de seis anos nesse segmento do ensino. Nos próximos itens desta
dissertação apresentarei as análises empreendidas a partir de cada um desses
núcleos.
Ressalto que a análise de dados qualitativos é um processo criativo que exige
rigor intelectual e muita dedicação, não existindo forma melhor ou mais correta.
Requer sistematizão e coerência com o referencial teórico adotado e com o
objetivo do estudo (PATTON apud LÜDKE e ANDRÉ,1986).
Portanto, julgo pertinente explicitar que esta pesquisa foi se delineando de
forma “artesanal”, a partir da relação intrínseca entre os dados empíricos e a base
teórica. Ou seja, ela foi se constituindo em um intenso diálogo entre o que emergia
das entrevistas, das notas de campo, das leituras dos Projetos Político-Pedagógicos
com os estudos teóricos. Esse diálogo intrínseco e intenso entre a teoria e os dados
73
empíricos, ao longo do processo de pesquisa, foi realizado com objetivo de
proporcionar análises mais consistentes, menos desarmadas.
Após ter-me apresentado, ter apresentado a forma como o tema tem sido
abordado pela literatura, ter apresentado o referencial teórico adotado, a
metodologia adotada, os instrumentos utilizados, os contextos, os sujeitos e o
processo utilizado para a construção e análise dos dados, seguem nos próximos
itens as considerações realizadas a partir de cada núcleo de significação
organizado. Para isso aprofundarei questões teóricas transpassando-as às falas das
professoras e aos artefatos construídos ao longo da pesquisa.
74
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS CONSTRUÍDOS
Compreendendo que todo processo histórico é marcado por contradições,
gerando interpretações variadas que influem diretamente na transposição da
prescrição para a prática, dediquei-me a dialogar com quatro professoras do ano
do EF, buscando compreender, através dos discursos, os sentidos que elas estariam
construindo para a inclusão das crianças de seis anos neste segmento do ensino.
A partir dos diálogos com essas professoras, pude organizar três núcleos de
significão, através dos quais se apresentam as compreensões dessas professoras
a respeito da nova organização do ensino e como estas foram se constituindo.
Assim, neste capítulo, apresento as discussões, as análises e as interpretações
empreendidas a partir das três categorias organizadas, a saber: (i) a nova
organização do ensino: impactos e desafios; (ii) infância, desenvolvimento e
aprendizagem; e (iii) reflees sobre dicotomias.
4.1 A nova organização do ensino: impactos e desafios
Nesta primeira seção apresento a compreensão das professoras a respeito
dos objetivos desta mudança no cenário educacional brasileiro, bem como as
emoções que surgiram frente a ela e o foco que foi dado ao processo de
alfabetização.
4.1.1 Objetivos da mudança no discurso das professoras
A obrigatoriedade da matrícula de crianças a partir dos seis anos de idade no
EF, de acordo com os documentos do MEC (2004/2006) e com a coletânea da
UFMG (2004), é reconhecida como estratégia de equalizão cultural, oportunizando
a todos o que era possível somente para alguns e relacionando o aumento do
75
número de anos de educação escolar a maiores oportunidades de aprendizagem,
principalmente para aqueles pertencentes aos setores populares.
Para Batista (2006, p. 2), a ampliação do EF vem, tamm, para tentar
superar o atraso do qual padece a educação brasileira, afinal,
A duração da escolarizão obrigatória brasileira era uma das menores da
América Latina [...] o Brasil era o único país da América Latina cuja
educação obrigatória se iniciava aos sete anos. Na maioria dos países
latino-americanos (assim como na Arica do Norte e Europa), ela começa
aos seis anos, embora as crianças argentinas, colombianas e equatorianas
ingressem aos cinco.
Entretanto, está bem claro nos documentos do MEC (2004/2006) que o
desenvolvimento da aprendizagem com qualidade dependerá não somente deste
aumento de tempo de permanência na escola, mas principalmente de como esse
tempo será aproveitado.
Como expus, no capítulo referente à revisão bibliográfica, alguns autores
como Santos & Vieira (2006), Martins (2006) e Duran (2006), mencionaram
preocupações com as várias interpretações que podem emergir de uma proposta
desta natureza, analisando, a partir de suas observações, que geralmente
problemas de compreensão na análise de materiais utilizados na divulgação de
diretrizes de governo, por parte dos professores. Além disto, na própria coletânea da
UFMG (2004) referências ao fato de que, mudanças no âmbito educacional
podem apresentar problemas quando são implantadas apenas como solução para
diminuição das taxas de reprovação, sem uma efetiva preocupação com a
aprendizagem. Isso ocorre muitas vezes quando as mudanças acontecem sem a
devida adesão e compreensão dos professores.
Reconhecendo que a qualidade do aproveitamento do tempo destinado à
educação escolar depende, em grande parte, da prática das professoras e que esta,
por sua vez, vai depender do que as professoras estão compreendendo como
objetivo da implementação da obrigatoriedade escolar aos seis anos, busquei refletir
com elas tais questões. Assim, com este intuito, dialoguei com cada uma das
docentes, mobilizando reflexões sobre os possíveis motivos que teriam gerado a
ampliação do EF e sobre os objetivos da obrigatoriedade da matrícula das crianças
de seis anos neste segmento do ensino.
76
Logo de início, em uma conversa com a professora Margarida I, pude
confirmar a multiplicidade de sentidos que estavam sendo suscitados pela inclusão
das crianças de seis anos no EF, quando esta fez o seguinte relato: “Existem
diferentes perspectivas de como trabalhar com estas crianças, para alguns foi
mudança de nomenclatura, para outros foi transposição do trabalho da primeira série
para o terceiro período”.
A partir da afirmão de Margarida I, compreendi que, o contexto em que as
professoras estavam atuando, de fato, influenciaria suas análises a respeito da
mudança na organização do sistema de ensino brasileiro, o que corrobora o
arcabouço teórico desta pesquisa, baseado na perspectiva hisrico-cultural. A partir
desse referencial, compreendo que o sujeito que se revela na linguagem não é
individual, mas sim coletivo. O outro que se revela pelo discurso apresenta uma
multiplicidade de vozes que, para além de suas experiências individuais, revela suas
experiências coletivas.
Assim, embora as quatro professoras tenham relacionado como objetivos
principais das Leis nº. 11.114 (BRASIL/MEC, 2005) e 11.274 (BRASIL/MEC, 2006)
questões políticas e financeiras, visando minimizar as estatísticas relacionadas às
taxas de analfabetismo, ampliar vagas e arrecadar verbas, sem a devida
preocupação com a qualidade deste atendimento, foram também apresentadas
questões mais relacionadas às suas experiências práticas. Enquanto para Margarida
I e Cris I, que estavam atuando em uma escola que atendia as crianças de seis
anos, a mudança inicialmente não afetou muito, parecendo apenas uma mudança
de nomenclatura, para Sofia F e Valéria F, que estavam pela primeira vez
trabalhando com as crianças de seis anos em uma escola de EF, essa mudança
gerou novas possibilidades e reflexões mais particulares a respeito de seus
objetivos. Tais questões podem ser percebidas nas seguintes falas:
Tudo é velho, mas veio com estrutura diferente que faz parecer que é novo. Tudo continua
como antes, a diferença é que o Estado não dava esta prioridade e agora dá. A ampliação
do EF foi uma questão política mesmo, de propaganda, porque na mídia todo tempo que
o Estado de Minas Gerais agora atende às crianças de seis anos mais cedo na escola. Mas
não mostra como está sendo este atendimento. o houve investimento na melhora deste
atendimento. (MARGARIDA I)
77
No início achei que era só financeiro, o que chegou para a gente é que com a ampliação, os
alunos da EI, que não recebiam a verba do FUNDEF, passariam a receber. Então, quando
chegou esta proposta achei que era só isto uma questão de dinheiro e uma questão
eleitoreira. (CRIS I)
Na minha turma de vinte alunos, tem três que nunca estudaram, então, se não tivesse essa
obrigação, talvez eles iriam estudar pela primeira vez com sete anos, na primeira série.
Pode até ser uma questão política, mas acho que foi válida para oportunizar mais um ano
para estas crianças. [...] A função do primeiro ano é oportunizar a todos este contato com a
escola, acho que o ganho principal é a obrigatoriedade, por que tinha escola, mas nem todo
mundo vinha. Tem também a questão da alfabetização, acho que este um ano que eles
entram antes vai ajudar neste início do processo. [...] Começar no segundo ano seria
estranho, se temos espaço vamos começar desde o primeiro ano, encaixou a reforma da
escola com a questão da ampliação. (SOFIA F)
Acho que tudo começou aqui porque olhamos muito para o nosso umbigo. Não pensamos
se seria bom ou não para as crianças, se estas crianças já estavam na escola ou não. Isto é
o que eu penso, não sei se foi realmente assim. Mas pensamos que para nós, que éramos
novatas, foi muito bom, porque se estas turmas não abrissem teríamos talvez que sair da
escola. Então, na verdade, foi uma forma de ampliar a escola, aumentar o número de alunos
e não perder professores, mas não pensamos, o grupo da escola, em uma proposta de
trabalho. (VALÉRIA F)
A partir de meu olhar exotópico, pude compreender que o que parecia ser
uma nova roupagem para o trabalho que Margarida I e Cris I já realizavam, era para
Sofia F e Valéria F uma novidade. Novidade esta que logo de início seria boa para
elas, pois lhes daria a oportunidade de continuarem a trabalhar na escola e numa
turma com a qual se identificavam. Além dessa circunstância favorável, Sofia F
percebeu a importância da obrigatoriedade do ensino aos seis anos de idade como
forma de garantir que todas as crianças tivessem a mesma oportunidade. Ela
percebeu ainda que seria interessante a seqüência dos estudos em uma mesma
escola. Valéria F tamm fez uma reflexão interessante sobre algo que, segundo
ela, ainda não havia parado para pensar: a falta de discussão pelo grupo da escola a
respeito da proposta de trabalho com as crianças de seis anos.
78
A reflexão feita por Sofia F, a respeito da importância da obrigatoriedade
escolar mediante o fato de existirem escolas, mas nem todo mundo freqüentá-las,
remetem às discussões empreendidas por Faria Filho & Gonçalves (2004) em seus
estudos sobre o movimento da obrigatoriedade escolar em Minas Gerais que, ao
longo da história, apresentou-se como um movimento “bumerang”, cheio de idas e
vindas, com argumentos defensores e opositores.
Dentre os vários argumentos defensores da obrigatoriedade escolar que
existiram ao longo dos tempos, aparecia justamente o fato de nem todos
reconhecerem a importância da freqüência à instituição escolar, principalmente as
populações mais carentes e excldas. Nesse caso, no período estudado pelos
autores – decurso do Período Imperial – a obrigatoriedade do ensino se apresentava
como forma de reverter o quadro de baixas matrículas e freência que se
apresentava como escandaloso aos olhos de parte das elites. Além disso,
apresentava-se como forma de legitimar o saber escolarizado; de vencer a
resistência dos pais, obrigando a infância a aproveitar-se dos meios que lhe eram
oferecidos; de disciplinar a população carente, ensinando-a a ler a partir da
constituição; enfim, como forma de atender as prerrogativas do Estado Moderno,
acompanhando algumas referências de países europeus. Assim, segundo os
autores, o que era para ser considerado um direito legitimado pela gratuidade,
passou a ser um dever mantido pela obrigatoriedade.
As questões apontadas por Faria Filho & Gonçalves (2004) parecem não se
distanciar muito dos objetivos aqui apresentados para a obrigatoriedade do ensino
aos seis anos de idade, principalmente pelo fato de se apresentarem como uma
tentativa de corresponder às necessidades impostas pela sociedade. A opção por
relacionar o que acontece hoje com os fatos históricos teve origem na compreensão
de que
[...] vivemos num mundo social que tem uma história. Os repertórios
interpretativos que nos servem de referência foram histórica e culturalmente
constituídos. Trabalhar no nível da produção de sentidos implica retomar
também a linha da história, de modo a entender a construção social dos
conceitos que utilizamos no métier cotidiano de dar sentido ao mundo
(SPINK e MEDRADO, apud SPINK, 2004, p. 49).
Além disto, segundo Faria Filho & Gonçalves (2004), estudar questões
referentes à obrigatoriedade escolar é jogar luz tamm em aspectos importantes da
79
história da infância como nas formas de sua socialização, no seu lugar dentro da
família e da sociedade, na noção de educabilidade da infância e da idade escolar,
bem como na produção cultural das diversas infâncias no Brasil.
Quanto à reflexão de Sofia F a respeito da oportunidade de que todo o EF
pudesse ser realizado em uma mesma escola, acredito que, de fato, seria uma
questão positiva, à medida que, possivelmente, essa situação amenizaria a ruptura
entre o 1º e oano do EF, dilema há muito vivenciado entre o 3º período da EI e 1º
série EF. Entretanto, questionei-me se esta ruptura o seria delegada às crianças
de cinco anos que vierem do último ano da EI. Questão esta que mereceria o
espaço de uma outra pesquisa para ser respondida. Perguntei-me, ainda, se esta
ruptura, frente à falta de discussões pelo grupo da escola, questão apontada por
Valéria F, não continuaria acontecendo dentro da ppria escola, mobilizada por
noções arraigadas a respeito do atendimento às crianças de seis anos. Esta última
questão foi respondida por um episódio que pude presenciar no momento em que
estava na escola conversando com as professoras do primeiro ano sobre as
questões que havia refletido até então (devolução). Registrei tal episódio da seguinte
maneira em meu diário de campo:
As professoras, em acordo com a direção da escola, juntaram as turmas em uma atividade
na biblioteca. A atividade seria realizada pela professora eventual, assim, eu poderia
conversar com as duas professoras ao mesmo tempo para que pudéssemos discutir juntas
as questões que estavam aparecendo na pesquisa. Conversamos por um bom tempo, em
uma sala ao lado da biblioteca. Muitas coisas interessantes emergiram de nossa conversa,
principalmente o fato de que a pesquisa em si mesma havia mobilizado as professoras
para uma prática mais reflexiva. Nossa conversa fluiu bem solta, tanto que o tempo passou
e nem percebemos. Porém, fomos despertadas com os gritos da coordenadora na sala da
biblioteca:
Oh professora! Oh professora! Cadê as meninas do p? O portão vai abrir e elas ainda
não voltaram com as turmas do pré pra sala!
As professoras que estavam conversando comigo ficaram indignadas, o semblante de cada
uma delas era um misto de susto, vergonha e indignação. Tanto que se desculparam pela
situação e falaram:
80
vendo! Meninas do pré! O tom dela é assim, foi muito pejorativo, como se o pré fosse
menos do que as outras turmas. E nós nem somos do p, somos do primeiro ano do EF.
(SOFIA F)
Mas tem gente que vê mesmo como uma coisa menor, menos importante, a gente tem uma
dificuldade danada de estar quebrando isso dentro da própria escola. (VALÉRIA F).
Tivemos então que encerrar nossa conversa. Conversa esta que para mim foi muito
importante pela oportunidade de observar o quanto esta escola, que mencionou em seu
projeto que o atendimento das crianças de seis anos seria uma forma de integrá-las mais
cedo a este espaço, oportunizando-as a se adaptarem melhor e a terem mais tempo para
desenvolverem suas aprendizagens e assim diminuírem o índice de reprovação no primeiro
ano, ainda tem muito que estudar com todo o grupo da escola, e, na própria fala de Sofia F:
Acho importante compreendermos isso como um processo e que a realizão de um
trabalho deve ser realizado pela escola, porque o aluno é da escola.
A partir de minhas conversas com as professoras, a respeito dos objetivos da
inclusão das crianças de seis anos no EF e, de minhas observações, compreendi
que para elas eles foram significados como questões políticas, econômicas, sociais
e pedagógicas, bem como solução para problemas particulares, como a abertura de
turmas na escola e a possibilidade de darem continuidade a seu trabalho na
instituição.
Entretanto, o mais importante de tudo, foi a oportunidade de refletirmos sobre
a influência da compreeno dos objetivos da inclusão das crianças de seis anos no
EF para o desenvolvimento do trabalho das professoras. E, ainda, o reconhecimento
deste momento como uma grande oportunidade de refletirem sobre suas práticas,
sobre seu papel e o papel da escola, frente a estas crianças. Além disto,
reconhecemos que pensar na mudança, pensar nos objetivos e pensar no papel a
ser exercido nos levou a pensar sobre vários sentimentos e emoções frente a tudo
isso. Por esse motivo, dediquei a próxima seção para discutir as emoções
suscitadas nas professoras pela inclusão das crianças de seis anos no EF.
81
4.1.2 Emões frente à mudança
As emoções são verdadeiras unidades que
mostram a ecologia complexa em que se
desenvolve o sujeito, e as mesmas respondem a
todos os espaços constituintes dessa ecologia.
Nesse sentido, as emoções representam um dos
registros mais importantes da subjetividade
humana, o que requer explicitar as possíveis vias
de seu caráter subjetivo.
FERNANDO GONZÁLEZ REY
Na perspectiva adotada para esta pesquisa, não é possível separar
pensamento e emão pois, de acordo com Aguiar e Ozella (2006), fazer esta
separação seria fechar definitivamente o caminho para a explicação das causas do
próprio pensamento e, de acordo com Gozález Rey (2003, p. 242) “a emão
caracteriza o estado do sujeito ante toda ação, ou seja, as emões estão
associadas às ações, por meio das quais caracterizam o sujeito no espaço de suas
relações sociais, entrando assim, no cenário da cultura.” Spinosa (apud vigotski
[1933], 2004, p. 16) também apresenta a importância dos afetos para a ação,
afirmando que “[...] afetos são estados corporais que aumentam ou diminuem a
capacidade do corpo para a ação, favorece-na ou limitam-na, assim como as idéias
que se tem sobre este estado.
Reconhecendo, portanto, que toda mudança gera novas emões e que as
emoções são disparadoras de ações, achei relevante dedicar um tempo para
conversar com as professoras sobre as emões, os sentimentos que tiveram frente
à nova estrutura do ensino. Acreditei, também, que essa reflexão junto com as
professoras pudesse proporcionar o que Frade (2007) reconheceu como zona de
instabilidade produtiva, ou seja, aquela capaz de gerar ações promotoras de
mudanças positivas em relação à proposta de inovação.
Ao conversar com as professoras percebi que a mudança no sistema
educacional brasileiro gerou sentimentos diversos e até mesmo contraditórios,
mesmo para as docentes que inicialmente relataram acreditar que tudo continuava
como antes. Essa situação confirma o fato de que “o sujeito representa um momento
de contradição e confrontação não somente com o social, mas também com sua
própria constituição subjetiva que representa um momento gerador de sentido de
suas práticas” (GONZÁLEZ REY, 2003, p. 240) e que,
82
A reflexibilidade é uma característica do sujeito com o qual está
comprometida a produção de sentidos subjetivos em todas as esferas da
vida. Portanto, o sujeito produz verdadeiros desenhos mentais por meio de
seu pensamento que o levam a reassumir posições e a definir
constantemente novas posições dentro dos contextos sociais em que se
desenvolve. (GONZÁLEZ REY, 2003, p. 240)
Assim, quando Margarida I fez a seguinte afirmação:
Você sabe que vai ser cobrado que vai ter comparação. Cobrança geral, dos pais, da outra
escola que vai logo perguntando de quem a criança era aluna, etc. (MARGARIDA I)
E, ainda, mencionou o sentimento de angústia e ansiedade em relação ao
trabalho que estava desenvolvendo com as crianças de seis anos, no seguinte
relato:
Por causa da mudança eu estava fazendo um trabalho diferente do que eu fazia, um
trabalho que eu não acreditava. Estava dando atividades mais sistematizadas, trabalhando
mais com leitura, escrita, cópia [...].
Refleti com ela sobre o início de nossa conversa, onde ela havia mencionado
que nada havia mudado e questionei o fato de ela utilizar o verbo no passado para
se referir ao trabalho que estava realizando com as crianças. Sobre este último
obtive a seguinte resposta:
Depois das participões nos encontros do Projeto do Ensino Fundamental de Nove anos,
promovido pela Secretaria, eu vi que não era eu que estava com estas preocupações,
com esta ansiedade. Mas mesmo assim, com as reuniões de estudo da Prefeitura, deixa-se
de fazer um trabalho em que se acredita por termos medo da cobrança de não realizar a
alfabetização do jeito que está sendo esperado. (MARGARIDA I)
A partir dessa resposta, analisamos juntas o quanto esta mudança no sistema
educacional havia influenciado sua prática, embora ela tivesse inicialmente
acreditado que seria apenas uma mudança de nomenclatura “tudo velho com
estrutura nova”. Refletimos tamm sobre a importância da formão continuada,
pois os sentidos que estava dando para a ampliação do EF começaram a ser
83
ressignificados a partir de sua participação no projeto da SE. Outra questão é a
importância deste grupo continuar as discussões relativas ao processo de
alfabetização, como es previsto, auxiliando as professoras a exercerem um
trabalho em que, de fato, acreditem.
Refletimos, ainda, sobre uma questão que muito estava me intrigando a
quem, ou a que, ela estava se referindo quando mencionou o fato de não conseguir
realizar a alfabetização do jeito que está sendo esperado? Foi justamente a partir
desta reflexão que percebi que Margarida I não conhecia os documentos que foram
elaborados para orientarem o trabalho com as crianças de seis anos. Juntas,
percebemos o quanto isso estava fazendo falta para que ela pudesse refletir melhor
sobre os objetivos de seu trabalho. Percebi também que o que a estava mobilizando
para modificar sua atuação com as crianças era o sentimento de cobrança, uma
cobrança exercida, segundo ela, pelos pais dos alunos, pelo governo frente às
avaliações e pesquisas, mas, acima de tudo, pela outra escola que receberia estas
crianças no segundo ano. De acordo com essa professora e a professora Cris I, a
referida escola é do Estado e, estaria avaliando o nível de alfabetização das
crianças que chegavam para, a partir desta, definir quais crianças deveriam fazer
novamente o primeiro ano e as que deveriam seguir para o ano. Essa é uma
questão muito polêmica que segundo a direção da escola, já estaria sendo verificada
pela SE para que os devidos esclarecimentos fossem feitos.
Enfim, a conversa com Margarida I confirmou o quanto as mudanças, por
menor que elas possam parecer, geram emoções, o quanto as emões nos
mobilizam para as ações e o quanto nossas reflexões nos levam a produzir sentidos
para as nossas ações.
As questões apresentadas por Margarida I a respeito da ansiedade, da
angústia, do sentimento de cobrança e da falta de conhecimento sobre o material de
orientação para o atendimento das crianças de seis anos também foram reveladas
nos discursos das outras professoras, mesmo que suscitadas por outras
necessidades e motivos. Além disto, as outras professoras também relataram não
conhecerem, ou conhecerem apenas superficialmente, o material de orientação para
a inclusão da criança de seis anos no EF.
As necessidades são aqui entendidas, a partir dos estudos de Aguiar e Ozella
(2006) e Gonzáles Rey (2003), como um estado de carência do indivíduo que leva a
sua ativação com vistas a sua satisfação, dependendo das suas condições de
84
existência. As necessidades são constituídas a partir das relações sociais e de forma
não intencional, tendo nas emoções um componente fundamental.
Os motivos, por sua vez, se constituem somente no momento em que o
sujeito o configurar como possível de satisfazer sua necessidade. O motivo se
configura como formão psíquica geradora de sentido presente em toda atividade
humana, ele é o elo existente entre a necessidade e seu objeto de satisfação, e isto
acontece quando o sujeito significa algo no mundo social que seja capaz de
satisfazer suas necessidades.
Cris I, que trabalha na mesma escola que Margarida I, também afirmou
acreditar, inicialmente, ser a nova estrutura do ensino apenas uma questão
“eleitoreira”, confirmou a sensação de cobrança por causa da exigência feita pela
escola do Estado:
Me sinto pressionada a dar mais coisas, a alfabetizar, porque a escola do Estado está
reprovando os alunos. (CRIS I)
Segundo ela, foi justamente esse sentimento que a mobilizou a realizar
mudanças em seu trabalho. Refletimos então, que a mudança em sua forma de
atuar estava sendo motivada pela necessidade de ajudar no melhor desempenho de
seus alunos na avaliação a ser realizada na próxima escola em que freqüentariam e,
assim, minimizar a sua sensação de pressão, mesmo que para isso tivesse que
realizar um trabalho no qual não acreditava. Esta situação a fez perceber que, a
inclusão das crianças de seis anos no EF seria mais do que simplesmente uma
questão política, ela traria em seu bojo mudanças estruturais, pedagógicas e,
principalmente, a necessidade de estudos e reflexões. Por esse motivo ela justificou
o fato de ter utilizado o verbo no passado ao se referir ao que pensava ter sido o
objetivo da ampliação do EF.
Outras emoções emergiram mobilizadas pelo imaginário pedagógico de Cris I,
construído ao longo de sua formação e prática como professora de EI e reforçadas
pelo desconhecimento da proposta oficial elaborada pela UFMG (2004) e pelo MEC
(2006). A revolta foi uma delas:
Fiquei revoltada, porque vim trabalhar aqui por gostar de trabalhar com a EI, sempre gostei
de trabalhar com o terceiro período, aí, de repente, o terceiro período virou primeiro ano do
85
EF. [...] Depois fiquei revoltada porque tinha que alfabetizar, aí eu achei que era para botar a
1ª série para os meninos de seis anos da educação infantil. (CRIS I)
A referência feita ao desconhecimento do material oficial como reforço do
sentimento de revolta foi feita a partir do reconhecimento de que nestes materiais da
UFMG (2004) e do MEC (2006), embora seja dada ênfase à alfabetização
28
, fica
bem claro que ela é reconhecida como um processo a ser realizado ao longo dos
três primeiros anos do EF e não no ano. Além disto, tamm fica claro, que a
proposta não é transferir os conhecimentos trabalhados na “antiga 1ª série(crianças
de 7 anos) para o atual 1º ano (crianças de seis anos), nem mesmo manter o
currículo dado no período da EI. A proposta é aproveitar o momento para a
realização de estudos e reflexões a fim de constrrem um curculo que contemple
as características, especificidades e necessidades das crianças, não só das crianças
de seis anos, mas, de todas as crianças que freqüentam as séries iniciais do EF, ou
seja, é o momento de instabilidade produtiva.
Sofia F, por sua vez, fez interessantes reflexões sobre as emões e sobre o
fato de elas se configurarem de forma diferente em contextos diferentes:
Eu acho que esta angústia é pelo fato de ser novo, acho que diferente de quem estava na
EMEI, que era a angustia da mudança, aqui é a angústia da novidade. [...] São duas
perspectivas diferentes, a gente, entre aspas, ganha e as EMEIS, entre aspas, perdem.
Entre aspas porque eles acham que vão perder alunos pra gente, que vão ter que fechar
turmas e perder professores. A EMEI estava com medo de perder alunos, sei que ainda
funciona a turma de seis anos lá, mas não sei se vai continuar funcionando. [...] Acho que
agora vamos ter que rever muita coisa, aliás toda a escola vai ter que se rever e planejar
esse processo, se não vai ficar todo mundo trabalhando a mesma coisa. (SOFIA F)
De acordo com tudo o que foi apresentado e estudado até aqui, confirmo as
palavras de Sofia F com as de Goulart (2006, p. 86), ao fazer a seguinte afirmão:
“Dúvidas, apreensões e desejos mobilizam todos os que se envolvem em novas
experiências.”
Quanto ao sentimento de ganho, Sofia F es se referindo ao fato de as
matrículas na escola de EF terem aumentado e da oportunidade de continuar
28
Discutirei na próxima seção a ênfase dada ao processo de alfabetização.
86
trabalhando nesta escola justamente por não terem tido que fechar turmas e sim
abrir:
Achei a ampliação do EF uma proposta excelente, a nível pessoal, para poder continuar
trabalhando aqui na escola e trabalhando com as crianças de seis anos. (SOFIA F)
Em relação ao sentimento de perda, Sofia F esse referindo ao fato dos
alunos estarem deixando de fazer o ano nas escolas reconhecidas ainda como
EMEIS. Os pais, como pude observar, m tirado estas crianças das EMEIS” por
motivos diversos, dentre eles o fato de as crianças poderem realizar todo o EF em
uma mesma escola, garantir a vaga no EF logo no primeiro ano em uma escola
próxima à residência, e, ainda, por acharem que na escola de EF o ensino é mais
sério, mais “puxado”, com menos brincadeiras como acontece nas EMEI’s
29
. Sendo
assim, as matrículas de crianças de seis anos no EF em escolas menores, antigas
EMEI’s, m diminuído, fazendo com que as escolas sintam como se estivessem
perdendo, pois, em alguns casos, têm corrido o risco de fecharem turmas e
colocarem professores à disposição da SE. Esta é uma questão que, de fato,
desestabiliza a estrutura de uma escola, mas a faz rever seu papel, suas
características, suas concepções, seu trabalho, a fim de buscar soluções para esta
nova realidade.
O que percebo, tanto em minha posição de pesquisadora sujeito desta
pesquisa, como em minha posição de professora, é que cada vez mais as escolas
de EI têm-se tornado escolas de passagem, principalmente em nosso contexto onde
as crianças com menos de 4 anos eso sob a responsabilidade da assistência.
Assim, as escolas de EI têm atendido crianças de 4, 5 e 6 anos, mas, aos poucos,
as crianças de 6 eso indo para as escolas de EF. Não considero que seja errado o
fato de as crianças irem para as escolas de EF, mas considero a grande importância
das instituições de EI e EF se articularem para juntas exercerem um trabalho de
qualidade com todas as crianças que as freqüentam, para poderem discutir sobre o
que cada uma das escolas pode oferecer de positivo, para que seu tempo seja
promotor de aprendizagem e desenvolvimento e, principalmente, que respeitem os
tempos e espaços das infâncias
30
. Portanto, concordo com Sofia F quando
29
Discutirei esta questão na seção referente a dicotomias.
30
Discutirei esta questão na seção referente à infância, desenvolvimento e aprendizagem.
87
menciona a responsabilidade de a escola toda ter que se rever e planejar. Mas,
sugiro que as discussões e planejamentos ultrapassem os muros das escolas,
possibilitando a articulação entre as escolas na busca da compreensão do papel de
cada uma e, ainda, na busca pela possibilidade de se ajudarem, como uma equipe.
Goulart (2006) afirma que, se por uma questão organizativa, e eu diria histórica,
estabelecemos a divisão entre EI e EF, nossas propostas de trabalho o devem
apresentar fraturas. Acredito que a integração entre as EI e EF, além da integração
destas com suas comunidades escolares, auxiliaria para que o sentimento de ganho
fosse estendido a todos, principalmente para as crianças.
É muito ruim quando realizamos um trabalho aqui que não será reconhecido na outra
escola. Eles não poderiam nem mesmo criticar nosso trabalho, porque não o conhecem.
Seria muito interessante se conseguíssemos realizar um seminário de discussão entre as
escolas, possibilitando uma fusão. (MARGARIDA I)
Juntas, a partir das reflexões, percebemos tamm que muitas dúvidas
apresentadas por elas, mesmo pelas que já estavam participando das discussões do
grupo da SE, estavam relacionadas ao desconhecimento da proposta oficial e das
orientações para a inclusão das crianças de seis anos no EF. Esta percepção foi
uma grande conquista, pois, a partir dela, as professoras começaram a buscar mais
informações. Valéria F fez a seguinte afirmação:
Ainda não parei para ler nada sobre a ampliação do EF. Mas confesso que agora percebo o
quanto isto está me fazendo falta, tanto para entender esta mudança como para
argumentar, ter base, para questionar ou explicar porque eu faço tal coisa.
Tamm refleti, a partir dessa questão, que os autores que mencionaram
preocupações com as várias interpretações que podem emergir da implementação
de uma Lei estavam certos em suas preocupações. Porém, se por um lado, Martins
(2006) percebeu a partir de suas observações a existência de problemas de
compreensão na análise do material geralmente utilizado na divulgação de diretrizes
de governo, por parte dos professores, que se defrontam com uma linguagem muitas
vezes sofisticada, propondo programas e projetos que desafiam suas bases de
aprendizagem, conquistadas na ptica do cotidiano e/ou em cursos de qualidade
88
duvidosa, por outro lado, nós (eu e as professoras envolvidas na pesquisa)
percebemos que, no nosso caso, o problema era o desconhecimento do material,
que embora estivesse nas escolas não havia sido lido ou discutido pelo corpo
docente por motivos diversos, dentre eles a não divulgação de sua existência na
instituição.
Além de tudo isto, percebi que o sentimento de angústia, relatado no discurso
das professoras, estava intimamente ligado ao trabalho com a alfabetização, por
esse motivo dediquei o momento seguinte a esta questão.
4.1.3. O foco na alfabetização
Quando questionei as professoras sobre os objetivos da obrigatoriedade da
matrícula das crianças de seis anos no EF, a questão da alfabetização foi
mencionada. Em seguida, quando discutimos sobre as emoções, sobre os
sentimentos originados pela nova organização do ensino, a alfabetização tamm
esteve em voga como motivadora de sentimentos como angustia, ansiedade,
sensação de preso, entre outros. Por esse motivo, começamos a refletir sobre o
processo de alfabetizão e sobre o foco que foi dado a ele a partir da inclusão das
crianças de seis anos no EF.
De acordo com a colenea elaborada pela UFMG (2004), a ampliação do EF
no Estado de Minas Gerais tem como foco principal o processo de alfabetização. A
prioridade dada a esse processo foi motivada por resultados de pesquisas que
apontaram o grande número de estudantes que não aprendem a ler nas escolas
brasileiras, bem como o elevado índice de alunos que chegam à quarta série no
estágio crítico ou muito crítico de construção de competências de leitura, e o grande
número de analfabetos funcionais
31
.
Frente a este objetivo e, compreendendo a natureza instrumental da
alfabetização para o aprendizado dos demais conteúdos escolares, é indicado nessa
31
Reconhecidos na coletânea da UFMG (2004) como pessoas que, embora dominem as habilidades
básicas do ler e do escrever, não são capazes de utilizar a escrita na leitura e na produção de textos
na vida cotidiana ou na escola, para satisfazer às exigências do aprendizado (vol. 1, p. 13).
89
coletânea que o processo de alfabetização seja trabalhado de forma contínua nos
dois ciclos do primeiro segmento do EF (crianças de 6, 7 e 8 anos).
Os conceitos de alfabetização e letramento tamm são discutidos no volume
1 da coletânea, ficando claro que o termo alfabetização é compreendido de forma
ampliada, ou seja, a alfabetização é mais do que a habilidade técnica de codificar e
decodificar as letras; é, tamm, a capacidade de saber utilizar a língua escrita em
práticas sociais.
No documento produzido pelo MEC (2006), encontrei dois textos dedicados a
discussão sobre o processo de alfabetização, a saber: Letramento e alfabetização:
pensando a prática pedagógica”, escrito por Leal, Albuquerque e Morais (2006) e A
organização do trabalho pedagógico: alfabetizão e letramento como eixos
orientadores”, de autoria de Goulart (2006). Porém, os demais textos apresentados
na coletânea, embora não dedicados especificamente ao processo de alfabetização
e letramento, também fazem menções a essas práticas escolares, ou seja, a
alfabetização e o letramento são reconhecidos como processos que devem
acontecer ao longo dos anos iniciais do EF de forma não desvinculadas das demais
aprendizagens, a partir da construção das concepções de infância, criança,
aprendizagem, ensino e desenvolvimento. Como mencionado no icio da
dissertação, esse documento se apresenta como excelente ponto de partida para as
discussões a respeito do trabalho a ser desenvolvido nas séries iniciais do EF.
A compreensão da alfabetização como processo é algo bem marcante nas
duas propostas, tanto da UFMG (2004) como do MEC (2006). Em ambos os casos,
evidencia-se a compreensão de que é um processo que se inicia antes mesmo da
entrada da criança na escola, fato que deve ser considerado na prática pedagógica.
Considerar a criança como sujeito de sua aprendizagem, respeitar suas
especificidades, realizar atividades planejadas com o coletivo da escola e
compreender o lúdico como forma de possibilitar modos de entender e agir sobre
sua realidade, tamm foram queses evidenciadas como forma de realizar um
trabalho de qualidade.
Frade (2007, p. 74) tamm discute o processo de alfabetização na escola de
nove anos. Para a autora,
[...] os problemas que temos enfrentado nos resultados da alfabetização
são, em parte, conseqüências das desigualdades sociais, culturais e
econômicas que nos levam a fazer a permanente pergunta: Como
assegurar a todos os brasileiros a igualdade de acesso a bens econômicos
e culturais, envolvendo aí o direito a participar da cultura escrita?
90
Entre outras respostas a essa pergunta, Ribeiro, Vóvio & Moura (apud
FRADE, 2007), mostram que dados da pesquisa Indicador Nacional de Alfabetismo
Funcional (INAF) indicam que a variável tempo de escolarização tende a reduzir
desigualdades de desempenho em leitura e escrita entre grupos sociais, fato que
justificaria a ampliação do EF. Sendo assim, segundo Frade (2007), o próximo passo
seria discutir as formas que a escola encontra para lidar com os fatores externos e
os modos que m construído para transmitir e dar mais sentido à transmissão dos
saberes da cultura escrita.
Outra questão apontada por Frade (2007) diz respeito ao impacto imposto
pela mudança. Segundo ela, essa política de cunho estrutural repercute, de maneira
geral, nas questões de financiamento, na abertura de vagas, na construção de
novas salas de aula, na compra de mobiliário, na demanda por material didático e
numa mudança da cultura pedagógica e na estrutura curricular. Mas, será que
aconteceria todo este impacto no sistema se tivessem sido discutidas, mais uma
vez, mudanças de paradigmas sobre como se aprende, ou como se alfabetiza, ou
sobre os efeitos do letramento?
Concordo com a autora que o ponto mais positivo desta mudança foi trazer à
tona tantas discussões, principalmente aquelas que acreditávamos estarem
esgotadas, mas que continuavam sendo o grande “gargalo” da educação brasileira,
como é o caso do processo de alfabetização, o processo de aprendizagem e
desenvolvimento, as concepções de infância e suas especificidades, entre outras.
Pude perceber isto nitidamente no seguinte episódio descrito no diário de campo:
Hoje fui abordada no corredor pela diretora da escola EI, ela me perguntou se eu poderia
conversar com as professoras a respeito das especificidades das crianças de seis anos,
porque todo mundo estava falando que o trabalho com o primeiro ano deveria considerar as
especificidades das crianças de seis anos, mas ninguém falava quais eram estas
especificidades e as professoras estavam querendo saber mais sobre isso. Assim, hoje,
mais do que em qualquer outro dia, percebi o quanto o pesquisador interfere no contexto da
pesquisa asseverando a perspectiva metodológica deste trabalho, frente a esta situação
apresentada, não me contive e acabei questionando a diretora:
Mas vocês não trabalham com estas crianças há muito tempo? Então! Como vocês m
trabalhado? A diretora não hesitou e me deu a seguinte resposta:
91
Bem, é verdade, mas muitas vezes o trabalho é realizado por tanto tempo que parece que o
piloto automático está ligado. Muitas vezes pára-se para pensar e resolver vários problemas
e situões do dia-a-dia. Mas algumas questões, assim como esta, é preciso que alguém
venha e desestabilize para que se perceba a necessidade de estudar e aprender mais
coisas, para então, melhorar o trabalho ou até mesmo para confirmar se o que está sendo
feito es de acordo. Esta mudança mexeu com todo mundo e agora es todo mundo
querendo saber mais coisas.
Concordei com a fala da diretora e minha fisionomia não era mais de susto, era de reflexão.
Disse a ela que tinha toda razão e que poderia contar comigo para conversar com as
professoras sobre o que eu estava estudando sobre o assunto, disse também, que no
documento do MEC (2006) tinha textos interessantes para estas discussões. Neste
momento percebi também que este era o meu papel e meu compromisso dentro daquela
escola que possibilitou a realização desta pesquisa, ajudar a desestabilizar tanto quanto
refletir com as professoras sobre todas estas queses.
Essa situação me deixou meio embaraçada, mas me fez refletir muitas coisas,
dentre elas o que Frade (2007) mencionou a respeito do impacto desta mudança no
sistema educacional brasileiro e, ainda, o impacto dialético entre pesquisador e
pesquisado, construindo juntos novos saberes e novos significados. Aqui pude
sentir como de fato os discursos refletem e refratam nos sujeitos.
Feitas estas considerações, comecei a analisar com elas seus discursos
sobre a alfabetizão, percebendo que para todas elas, inclusive para as que
haviam dito que era só mudança de nomenclatura, esse era o maior “tabu” da
mudança. Percebemos que as falas estavam relacionadas ao que Sofia F declarou
ser medo do novo e medo da mudança”, associado ao desconhecimento do
material publicado para orientação do trabalho, a falta de base teórica sobre
aprendizagem e desenvolvimento infantil, a falta de reflexão sobre concepções de
infância, alfabetização e letramento, a falta de reflexão sobre as dicotomias
aprendizagem x lúdico e sobre a própria prática exercida, reconhecido pela diretora
da escola EI como trabalhar no “piloto automático”. Percebi ainda, o quanto a
participação no grupo de estudos da SE estava sendo importante para que as
professoras investigadas compreendessem melhor o atendimento das crianças de
seis anos no EF e, o quanto as reflexões feitas por nós, durante as entrevistas,
92
também as estavam mobilizando. Essas questões foram denotadas a partir das
seguintes falas:
Mas com esta ansiedade, de ter que alfabetizar e ter que dar tudo o que tem que ser
trabalhado, muita etapa acaba sendo queimada. (MARGARIDA I)
Achei um crime esta obrigatoriedade da alfabetização. Até porque eu achava que
alfabetizava, só que de outra maneira, não nestes moldes mais sistematizados. (CRIS I)
Tem muito tempo que eu não trabalho assim de forma tradicional, com letras sílabas, grupo
silábico, sons, palavras, estou tendo dificuldades e estava com muito medo de não
conseguir, mas muitos estão lendo e alguns quase lendo, estão por um estalo. [...] Os
projetos deste ano para as crianças de seis anos está mais sistematizado para o objetivo da
alfabetização, como o trabalho com grupos de letras, e antes era mais livre, a partir da
vivência da criança. Deixa de ter o prazer da leitura para trabalhá-las sempre presas ao
objetivo da alfabetização.(MARGARIDA I)
Chega no final do ano você tem que ter alfabetizado e isso não depende de você,
depende da família, depende do estímulo que tem em casa, do estimulo que se na
escola. Tem criança que a língua escrita só existe na escola. [...] Muitas coisas que eu fazia
antes deixei de fazer, Com a preocupação de ter que alfabetizar, de ter que dar atividades
mais sistematizadas de leitura e escrita, não tenho tido muito tempo de dar atividades fora
de sala, de dar jogos, cantar musiquinhas. Para dar um exemplo, nos dias que tem
educação física eu não levo mais as crianças ao pátio, porque elas já ficaram fora uma hora
e aí eu tenho que repor este tempo.(CRIS I)
Senti angústia em relão à alfabetização mesmo. Até que ponto devemos, temos ou não
que alfabetizar. Dúvidas mesmo até com relação à utilização dos métodos, teve professor
questionando o tipo de letra que deveríamos usar, se vamos usar labas, seguir o alfabeto,
trabalhar intercalado e essa duvidada mesmo, se alfabetiza ou não. [...] Mesmo com toda
ansiedade, que envolve a questão da alfabetização, se alfabetiza ou não, depois que
participei dos encontros da Prefeitura eu entendi melhor, entendi que era um processo.
de saber que estou iniciando o processo, que eu não tenho que dar conta de alfabetizar
todos os alunos, facilita, tranqüiliza. (SOFIA F)
93
Minha angústia era em relação à questão da alfabetização, se alfabetiza ou não, porque a
gente não tem isso firmado e, tamm, saber se nossa escola está diferenciando das outras
escolas que também receberam esses meninos de seis anos, se estamos na mesma
linha.Mas, a partir de nossas conversas pensei: Você vai esperar ou vai correr atrás? Então
vou correr atrás dessas questões, vou começar a estudar. (VALÉRIA F)
Questionadas sobre o fato de compreenderem que a partir de agora teriam
que alfabetizar e que a alfabetização teria que acontecer neste primeiro ano a partir
de práticas mais sistematizadas, de práticas menos lúdicas, as professoras
apresentaram as seguintes respostas:
Essa compreensão de que agora tem que alfabetizar surgiu quando implantou essa questão
das crianças de seis anos irem para o ano. A gente recebeu a propaganda na TV Seu
filho agora não fica mais na rua, fica na escola. Que escola? Sempre teve escola!
Entendeu? Esta chamada na TV mais uma vez reforçou o que os pais acham, que na
escola de EI os alunos só brincam, não aprendem, entendeu. (CRIS I)
Acho que a angústia com relação à alfabetizão surgiu com esta nova modalidade de
ensino. Mas acho que sempre percebi esta angústia dos professores com relação à
alfabetização, mas acho que isso tomou forma com essa questão do primeiro ano fazer
parte do EF, de ser obrigatório. [...] No final do ano passado, nós, as professoras que
pegariam o primeiro ano, começamos a pensar no nosso trabalho, se a gente ia alfabetizar,
que espaço daríamos para a brincadeira, como dividiríamos o tempo, que espaços iamos
utilizar. Mas não chegamos a fazer nada organizadinho por escrito não, mas fizemos um
esboço de nossas rotinas na sala de aula. (SOFIA F).
A coordenadora veio atrás da gente, depois de uma reunião, dizendo que tinha esquecido
de dizer para a gente algo muito importante, que a Secretaria de Educação disse que não
era para alfabetizar no primeiro ano. Mas a Sofia, que está participando das reuniões na
Secretaria, disse que não tem nada disso, que a alfabetização é um processo, que começa
muito antes do aluno entrar na escola e que nosso papel aqui é começar a sistematizar de
forma inicial, lúdica e prazerosa esta alfabetização. (VALÉRIA F)
Tais respostas confirmam as conclusões a respeito do problema do
desconhecimento e da falta de bases teóricas mais sólidas. Ampliam, ainda, a
discussão em relação à construção de sentidos a partir de um imaginário
94
pedagógico construído ao longo de suas práticas educativas em escolas de EI e EF,
reconhecendo que o papel do primeiro ano do EF é o de alfabetizar. De acordo com
Frade (2007), parece estar implícita nessas posturas a idéia de que só há uma forma
mecânica de ensinar a ler e escrever e, historicamente, essa função tem sido
reconhecida como sendo da 1ª série do EF.
ainda a questão da fala da coordenadora que agravou as dúvidas em
relação ao trabalho da alfabetizão. Não tive como saber o que levou a
coordenadora a ter esta compreensão da proposta da SE. O que sei é que ela não
está participando do Projeto da SE e que Sofia F tem razão em dizer que isto não foi
afirmado no grupo. Mas esta questão só confirma a importância da participação
efetiva em grupos de estudos, como o da SE, e a importância das discussões serem
realizadas por todos os profissionais da escola, principalmente pelos responsáveis
em articular suas informões e seus projetos. Inclusive, esse fato explica, em certa
medida, o motivo de as professoras não terem tido acesso aos materiais em suas
escolas. Na escola EI a diretora estava sozinha tentando articular as questões
administrativas e pedagógicas, pois estava sem coordenadora e, na escola EF, a
coordenadora pedagica, que deveria ser a principal divulgadora do material e
articuladora das discussões, pelo visto, tamm não tinha conhecimento dele.
A participação no projeto da SE possibilitou que Sofia F ressignificasse suas
questões em relação ao trabalho com a alfabetização e divulgasse tais questões
para suas colegas de trabalho. Esse fato pode ser percebido a partir das seguintes
falas:
A gente sabe que não tem razão para esta angústia, porque se eles não se alfabetizarem a
gente sabe que no próximo ano, eles vão ter mais um ano. Até porque a gente sabe que a
proposta é que a alfabetização ocorra ao longo dos 6,7 e 8 anos, aliás, acho que ela vai por
muitos anos pela frente, não é? [...] Tento trabalhar a alfabetização de forma diferente,
através do lúdico, a lógica do EF não contaminou o primeiro ano. [...] O lúdico é importante
por causa da fase mesmo, que eles estão não é! Este tempo mesmo da infância, desta
idade que deve ser respeitada. Não só para eles (de seis anos), mas para todo mundo como
eu disse. Ter o prazer de estar na escola, de estar aprendendo. Acho que fica melhor para
eles. [...] Lúdico para mim é brincar mesmo, sair do tradicional para ensinar a leitura e a
escrita. Ensinar através de jogos, da brincadeira, da fantasia, de criar. Oportunizar a criaa
a aprender a partir dessas atividades. Às vezes terão momento que não serão tão
direcionados, que ele vai participando com os grupos, com os colegas, que ele vai
95
usando mais a criatividade dele, ele vai participando mais, Enfim, respeitando mesmo
esta questão da infância, do brincar. (SOFIA F)
Não existe isso de não alfabetizar se você está num ambiente alfabetizador. Você
entendeu? eu não concordo quando alguém vira e fala É sem alfabetizar heim!- Então eu
acho que vai estar favorecendo muito. No segundo ano dele ele vai estar mais
despertado. [...] Acho que alfabetização é tudo isso aqui (mostrando toda a sala decorada
com cartazes escritos de aniversariantes, ajudantes, calendário, alfabeto, etc.). Para mim
este ambiente é alfabetizador, á medida que o menino está aqui e esvivenciando isso ele
está em processo de alfabetização. Aliás, este contato da criança com a escrita já começa
muito antes de ele entrar na escola. Mas aqui é o lugar de sistematização deste processo.
[...] Nós iniciamos um processo que vai se estender ainda por muitos anos. As crianças não
sairão daqui todas lendo e escrevendo, mas, já vão ter tido esse contato mais sistematizado.
Daí os professores dos próximos anos têm que continuar com este trabalho até que a
criança consiga se alfabetizar. (VALÉRIA F)
É importante lembrar que, das quatro professoras que participaram desta
pesquisa, apenas Valéria F não estava participando do projeto da SE, mas ela
estava todo o tempo apresentando Sofia F como referência em suas discussões.
Isso demonstra que Sofia F estava exercendo a função de divulgar o que se discutia
no grupo. Porém, quando realizei as entrevistas com Cris I e Margarida I, no ano
letivo de 2006, o grupo de estudos sobre projeto da SE ainda estava iniciando,
enquanto que, quando conversei com Sofia F, ano letivo de 2007, ela estava no
grupo um ano. Lembrar disso torna-se muito importante para compreender que,
provavelmente, algumas questões estariam mais claras para Sofia F, pela
oportunidade de estar mais tempo participando de discussões sobre essas
questões.
A partir de tudo o que foi analisado, compreendi que, dentre os vários
objetivos da ampliação do EF a iniciar-se aos seis anos de idade, está realmente o
foco na alfabetização. Este foco tem sido o maior gerador de angústias, ansiedades,
medos e dúvidas, mas tamm tem sido o maior motivador para a instabilidade
produtiva, levando as professoras a desligarem “os pilotos automáticos e a
buscarem melhores formas de pilotar, com mais compreensão, segurança, e
conhecimento. Este, possivelmente, será o maior desafio das professoras frente aos
impactos da nova organização do ensino.
96
4.2 Infância, desenvolvimento e aprendizagem
Como foi possível perceber até agora, uma das tensões geradas com a nova
disposição do EF diz respeito ao trabalho com as especificidades das crianças de
seis anos, até então atendidas em escolas de EI. Esta teno tem-se mostrado
positiva à medida que vem mobilizado gestores, professores e pesquisadores a
refletirem sobre a importância da discussão a respeito das reais especificidades das
crianças, não só das de seis anos, mas das crianças de 0 a 10 anos.
Para além disto, essa tensão tem mobilizado para a busca da não
segmentação do atendimento escolar para essa faixa etária, concebendo a infância
como uma categoria social e entendendo as crianças como sujeitos da história,
como produtoras de cultura, sujeitos ativos de seu desenvolvimento e aprendizagem,
bem como carentes de cuidados. Diante dessas questões e percebendo que as
concepções de infância, desenvolvimento e aprendizagem medeiam as atividades
escolares e as práticas docentes, dediquei esta seção a reflexões sobre tais
concepções e, sobre o papel da escola e do professor a partir destas. Portanto,
discutirei a partir de agora os dados organizados no segundo núcleo de significação.
Ressalto que a compreensão da infância como categorial social, e das
crianças como sujeitos da história é recente, por isso reafirmo que as discussões
sobre a nova estruturação do ensino tenha trazido à tona discussões importantes
para o processo de atendimento escolar a essa faixa etária.
Segundo Àries (1973), no mundo das fórmulas românticas e até o fim do
século XIII, não existiam crianças caracterizadas por uma expressão particular e sim
homens de tamanho reduzido. Ainda segundo o autor, o sentimento de infância
surgido a partir do século XIII e ampliado nos séculos XV e XVI não significava o
mesmo que afeição pelas crianças e sim à conscncia da particularidade infantil.
Essa particularidade é que distinguia essencialmente a criança do adulto, mesmo
jovem. Nos séculos XVI e XVII esse sentimento de infância de ser melhor
percebido através das reações críticas que provocou.
Algumas pessoas consideravam insuportável a atenção que se dispensava
então às crianças, reconhecido como sentimento de paparicão surgido no meio
familiar. Havia também o sentimento de moralização, oposto ao sentimento de
paparicação, que provinha de meios externos à família, preocupados com a
97
disciplina e a racionalidade dos costumes. Mais tarde este sentimento passou
também para o seio da família. No século XVIII era possível perceber no meio
familiar, além do sentimento de paparicação e moralização, a preocupação com a
higiene e a saúde (ARIÉS, 1973). Nos séculos posteriores, XIX e XX, as crianças
eram consideradas todas iguais, correspondendo a um ideal de criança abstrato que
se concretizava na criança burguesa. No final do século XX começaram a surgir
orientações para as singularidades das infâncias, para uma Sociologia da Infância e
para a consideração da infância enquanto categoria social.
Aparecem, também no final do século XX, autores sugerindo o
desaparecimento da infância, como Neil Postman (1999), que mencionou ter escrito
seu livro a partir da percepção de que a idéia de infância está desaparecendo numa
velocidade espantosa, e que, assim como a imprensa tipográfica criou a infância, a
mídia eletrônica tem-na feito “desaparecer”.
Entretanto, no século XXI autores como Kuhlmann Jr. & Fernandes (2004),
Kohan (2004) e Lopes & Vasconcellos (2005), de maneira bastante ética, trazem a
reflexão sobre o fato de ser um pouco pretensioso achar que é possível criar ou
fazer desaparecer a infância, principalmente quando considerada uma categoria
social construída histórica e ideologicamente. Lopes & Vasconcellos (2005)
ressaltam que as diferenciações sociais no trato à criança são fatos presentes na
história da sociedade ocidental, ou seja, a mesma noção de infância apresenta
diferentes apropriações de acordo com o interesse de quem a utiliza. Além disto,
uma leitura simplificada da obra de Ariès pode levar à conclusão de ter sido na
Europa o surgimento do primeiro sentimento de infância, entretanto, já existem
pesquisas etnográficas, como a de Nunes (apud LOPES & VASCONCELLOS,
2005), que demonstram a existência, em diversas comunidades fora deste
continente, da demarcação de um lugar diferenciado dos adultos para suas crianças.
Portanto, segundo Lopes e Vasconcellos (2005, p. 27),
[...] a pretensa universalidade, pressuposta no pensamento de Ariès para o
ser criança no mundo ocidental, na verdade, esconde uma variedade de
dimensões de infância que variam de localidade para localidade e
constituem uma diversidade de marcas sociais.
Corroborando com a perspectiva adotada neste trabalho, Kuhlmann Jr. &
Fernandes (2004) apresentam a diversidade de designação reservada à criança ao
98
longo da história e demonstram a evolução do sentido da palavra infância, ou seja,
como esta, em novos contextos, ganharia significações inéditas. De acordo com
Bakhtin/Volochinov (1988 [1929], p. 134) “A mudança de significação é sempre, no
final das contas, uma reavaliação: o deslocamento de uma palavra determinada de
um contexto apreciativo para outro”. Ainda, segundo o autor, “a evolução semântica
da língua é sempre ligada à evolução do horizonte apreciativo de um dado grupo
social e a evolução do horizonte apreciativo”.(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1988 [1929],
p. 135). Desta forma, compreende-se que,
[...] não nada na composição do sentido que possa colocar-se acima da
evolução, que seja independente do alargamento dialético do horizonte
social. A sociedade em transformação alarga-se para integrar o ser em
transformação. Nada pode permanecer estável nesse processo.
(BAKHTIN/VOLOCHINOV 1988 [1929], p. 136)
Kuhlmann Jr. & Fernandes (2004) abordam também, em seu trabalho,
questões referentes à definição da duração do tempo da inncia. Desse trabalho, foi
possível depreender que o tempo da inncia tamm variaria de acordo com os
contextos histórico-culturais. Este período, ao longo da historia, oscilou entre sete,
dez, doze e quatorze anos. Atualmente, em nossa sociedade, compreende-se que a
infância se refere ao período da história de cada um, se prolongando até
aproximadamente os doze anos de idade.
Kohan (2004) aponta que, de acordo com o pensamento filosófico
educacional da tradição chamada Ocidental, a infância é entendida em primeira
instância como potencialidade, como matéria-prima das utopias, dos sonhos
políticos dos filósofos e educadores, ou seja, entende que as crianças serão os
adultos do amanhã e, portanto, os artífices das futuras sociedades. Desta feita,
educar a infância torna-se a melhor e mais sólida maneira de introduzir mudanças e
transformações sociais.
Entretanto, para o autor, é preciso ampliar os horizontes da temporalidade e,
para ampliar essa discussão ele se apóia nos gregos. Segundo ele, em grego
clássico há mais de uma palavra para referir-se ao tempo, sendo que a mais
conhecida entre nós é chrónos, que designa a continuidade de um tempo sucessivo.
O tempo é, nessa concepção, a soma do passado, presente e futuro, sendo o
presente um limite entre o que já foi e não é mais (o passado) e o que ainda não foi
e, portanto, também não é, mas será (o futuro). Outra palavra grega usada para
99
designar o tempo, embora menos conhecida e utilizada entre nós, é Kairós, que
significa medida, porção, e, em relação com o tempo significa momento crítico,
temporada, oportunidade. Uma terceira palavra é Aión que designa a intensidade do
tempo da vida humana, um destino, uma duração, uma temporalidade não
numerável nem sucessiva, intensiva. Citando Heráclito, Kohan (2004, p. 54-5) afirma
que, aión é uma criança que brinca (literalmente, criançando), seu reino é o de uma
criança”. De acordo com Kohan (2004), este fragmento parece indicar, entre outras
coisas, que o próprio da criança não é ser apenas uma etapa, uma fase numerável
ou quantificável da vida humana, mas um reinado marcado por outra relação-
intensiva – com o movimento.
A partir do que foi exposto, é possível compreender, com Kuhlmann Jr. &
Fernandes (2004), que a modernidade faz da denominação infância um guarda-
chuva a abrigar um conjunto de distribuições sociais, relacionadas a diferentes
condições: as classes sociais, os grupos etários, os grupos culturais, a raça, o
gênero; bem como a diferentes situações: a deficncia, o abandono, a vida no lar,
na escola (a criança e o aluno) e na rua (como espaço de sobrevivência e/ou de
convivência/brincadeira). E, que, a análise da evolução das representações da
infância tenta destrinçar as coordenadas de uma infância que é um objeto histórico
plural e não ontológico singular, ou seja, não existe uma infância apenas, mas
infâncias possíveis.
Sendo assim, é possível compreender que, a infância modifica-se,
transforma-se, hibridiza-se, pode ter sido como nunca se imaginou e pode
transformar-se naquilo que nem é sonhado. O que não desmerece em qualquer
hipótese os trabalhos Áries (1973) e Postman (1999), pelo contrário, como diria
Bakhtin/Volochinov (1988 [1929]) são as multiplicidades de vozes e de críticas
amorosas que constroem os nossos discursos.
A partir destes estudos e da compreensão de que, por ser a infância uma
construção histórica, as professoras não estariam isentas de construírem suas
concepções de acordo com o corpus de idéias e sentidos que foram armazenando
ao longo de suas vidas pessoal e profissional. Portanto, procurei refletir, a partir de
suas falas, sobre o que estavam compreendendo por infância. Outro motivo para
realizar essa reflexão foi o fato de compreender que somente a partir desta teria
bases para analisar as questões referentes à aprendizagem, ao desenvolvimento e o
papel da escola e do professor frente às crianças.
100
Para Margarida I, a inclusão das crianças de seis anos no EF representou, de
certa forma, um problema para as crianças, isto porque, segundo ela,
As crianças continuam as mesmas e agora eu tenho que forçá-las a fazer coisas que ainda
não estão preparadas, ler sílabas, forçar a ler palavras. [...] Mas com esta ansiedade de ter
que alfabetizar e ter que dar tudo o que tem que ser trabalhado, muita etapa acaba sendo
queimada.
Além disto, diz que frente à cobrança dos pais em relação à alfabetização dos
filhos ela lhes explica que,
A flor, a semente, têm o tempo certo de se desenvolver, assim como uma criança e, quando
forçamos uma criaa a um monte de coisas para as quais ainda não está preparada,
estamos forçando a natureza dela. (MARGARIDA I)
Portanto, Margarida I, demonstra sua percepção de natureza infantil, do
desenvolvimento desta, realizado em etapas sucessivas e lineares (Chrónos),
acontecendo da mesma forma para todas as crianças, ou seja, uma visão normativa
que pressupõe uma seqüência fixa e universal de estágios que deve evoluir
progressivamente (ALMEIDA e CUNHA apud MARCOLINO, 2006). Por este motivo
mencionei que a concepção que se tem de infância está dialeticamente relacionada
à compreensão que se tem de desenvolvimento e aprendizagem e, por
conseqüência está tamm relacionada à prática pedagógica.
Cris I, por sua vez, demonstra o fato de que trabalhar com a educação infantil
foi uma opção e que esta se deveu à percepção de que trabalhar com esta faixa
etária seria mais gostoso, pois as crianças, ainda na fase inicial da vida escolar, se
apresentam mais tranqüilas e mais aptas a aprender o que ela ensina, adaptam-se
mais fácil ao jeito dela trabalhar. Assim compreende-se uma infância moldável, mais
flexiva. Além disto, Cris I menciona que,
Muitas coisas eles ainda não estão preparados para fazer.Biologicamente está comprovado
que é difícil para a criança de seis anos fazer o movimento de pinça. Então? Como vou
exigir que escrevam letra cursiva e façam estes movimentos. Às vezes eles até querem,
mas eu não dou porque eles ainda não estão preparados para isso. Muita coisa ainda está
além do desenvolvimento deles.
101
Questionada sobre o fato de estar comprovado que biologicamente as
crianças de seis anos o conseguem fazer determinados movimentos, Cris I ficou
confusa, me respondendo da seguinte maneira:
Ah... está comprovado pelas teorias que estudamos nos cursos de graduão, não está?!
Cris I revela o quanto sua concepção de infância como uma etapa da vida que
precisa ser preservada e respeitada naquilo que lhe falta e nas suas limitações
biológicas e cognitivas está relacionada à sua prática pedagógica e à sua concepção
de desenvolvimento e aprendizagem. Além disto, Cris I revela a relação de poder
existente entre professor e aluno, na qual ela, enquanto professora, é quem
determina o que as crianças podem ou o aprender, aliada à sua compreensão de
que o desenvolvimento é pré-requisito para a aprendizagem, necessitando que os
conhecimentos sejam dosados de acordo com o que a criança está pronta para
receber naquele momento, naquele estágio do desenvolvimento. Para ela, a
professora leva o conhecimento aos alunos, os quais devem aproveitar o máximo
daquilo que está sendo oferecido. Esta questão pode ser confirmada quando Cris I
menciona que seu papel frente às crianças é o de
[...] gaom, estou aqui para servir cada um e tentar que eles aproveitem o que eu dou a
eles o máximo possível.
No discurso de Valéria F, a infância aparece como uma etapa da vida onde
impera a fragilidade e a pureza infantil, despertando nela seu instinto maternal.
Porém, ela reconhece que esse sentimento não deveria ser a base de seu trabalho,
pois se envergonha de mencioná-lo. Mas ao reconhecer, a partir de nossas
discussões, que nossas concepções se pautam em nossas histórias de vida, sentiu-
se um pouco mais tranqüila, entretanto, reconheceu que está sentindo falta de mais
embasamento teórico para fundamentar sua prática.
Como eu disse, vim para este turno para não sair da escola. Além disso gosto de desafios e
resolvi encarar este. Mas, acima de tudo, você vai rir de mim...agora estou até vermelha,
mas vou falar a verdade. Vir trabalhar no primeiro ano foi uma forma, quer dizer, eu me
identifico muito com os menores, eu iniciei na educação infantil, acho que trabalhando aqui
102
eu me sinto mais perto do meu nenê. Eu vejo nos meus alunos o meu filho, eu me identifico
muito com eles, uma questão mesmo de empatia. [...] Tenho feito meus planejamentos com
base na minha prática mesmo, trabalhei muito tempo com alfabetização, mesmo que de
adultos é alfabetização e também, aprendi muito na minha especialização em Arte e
Educação na UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora). [...] Não é de trás da orelha,
mas confesso que estou precisando rever muitas coisas, você hoje reascendeu minha veia
de lutadora, de estudante, de autônoma. (VALÉRIA F)
No discurso de Sofia F, participante mais tempo do grupo de estudos da
SE, o qual vem discutindo as questões referentes à infância como categoria social,
pude perceber o conflito entre os conceitos construídos ao longo de sua vida e os
novos conceitos que estava elaborando a partir de seus estudos. Esta situação
permitiu confirmar a assertiva de Spink e Frezza (2004, p. 27)
[...] dificilmente ‘des-construímos’ o que foi construído. Criamos espaços,
sim, para novas construções, mas as anteriores ficam impregnadas nos
artefatos da cultura, constituindo o acervo de repertórios interpretativos
disponíveis para dar sentido ao mundo.
Diante de tudo o que foi apresentado, posso dizer que, nos discursos das
professoras, mesmo que em alguns momentos apresentassem a preocupação com
o contexto das crianças, a concepção que se apresentou mais enraizada foi a da
infância como uma etapa da vida, com características bem específicas e lineares,
sendo considerada o tempo das possibilidades, onde o sujeito ainda é bastante
moldável e flexível, capaz de apreender com maior facilidade aquilo lhe é ensinado,
ou seja, assim como no pensamento filosófico educacional da tradição chamado
Ocidental, apresentado por Kohan (2004), a infância es sendo entendida em
primeira instância como potencialidade, como matéria-prima das utopias, dos
sonhos.
Diante das falas das docentes concordei com Charlot (apud DELGADO, 2004)
ao dizer que as pedagogias tradicional e nova, apoiadas na idéia de natureza
infantil, influenciaram o corpus de representões acerca das crianças. Isso leva a
representá-las ora como reis, ora como vítimas, incapazes de percebê-las como são
de fato. Segundo Delgado (2004), as crianças costumam ser pensadas enquanto
alunas e alunos, geralmente em escolas ou espaços educativos formais, bem como,
a educação é pensada como algo institucionalizado e vivido em espaços escolares.
103
Asseverando esta discussão, Marcolino (2006) apresentou em seu trabalho
uma breve revisão bibliográfica sobre pesquisas que procuraram identificar os
conceitos dos professores a cerca do desenvolvimento humano e como estes
conceitos se articulam com a prática pedagógica. Dentre esses estudos a autora cita
os de Becker (1993), Góes e Tunes (1990) e Almeida e Cunha (2003). A partir dessa
breve revisão a autora concluiu que o pensamento do professor a respeito do
desenvolvimento infantil fundamenta sua prática pedagógica e que os professores
participantes das pesquisas não relacionaram o desenvolvimento humano à
educação escolar e, ainda, que as concepções de desenvolvimento subjacentes ao
trabalho pedagógico estavam calcadas na iia de natureza humana. “Desde as
concepções predeterministas até as interacionistas prevalece a idéia de natureza
humana”. (MARCOLINO, 2006, p. 117)
Sobre esta questão, Arce e Martins (2007) pontuam que, no âmbito
educacional, rios modelos tricos estiveram em voga. Ora despontavam os
modelos que se pautavam em determinantes biológicos e ora aqueles que
privilegiavam determinantes sociais. De acordo com estas autoras, os modelos
teóricos pautados em determinantes biológicos partem do pressuposto de que as
propriedades básicas do ser humano se encontram garantidas no nascimento,
portanto, são fatores hereditários e maturacionais. Sendo assim, para esses
modelos teóricos, a aquisição dos conhecimentos encontra-se na dependência da
prontidão espontaneamente alcançada pela criança, sendo o desenvolvimento pré-
requisito para a aprendizagem.
Como foi possível perceber, estes modelos teóricos, apresentados por Arce e
Martins (2007), foram os que mais apareceram nas falas das docentes participantes
desta pesquisa, o que confirma as conclusões de Marcolino (2006).
Frente a tudo isso, compartilho com Arce e Martins (2007) a idéia de que os
preceitos histórico-culturais, baseados nos estudos de Vygotsky, vieram para dar
uma valiosa contribuição, superando esses modelos que fragmentam o social e
individual e que desconsideram o papel da aprendizagem para o desenvolvimento
humano.
Os estudos de Vygotsky (1991) enfatizam a natureza social do
desenvolvimento psicogico, assumindo que o sujeito se constitui nas relações
sociais. Para este autor, o psicológico deve ser entendido nas suas funções sociais e
104
individuais e a construção do conhecimento pelo sujeito determinada pelas suas
interações que são mediadas socialmente.
Pino (2000) apontou que em termos mais amplos, as contribuições de
Vygotsky para a psicologia se devem à compreensão de que o desenvolvimento
psicológico é um processo histórico e que o psiquismo é de natureza cultural.
Nesta perspectiva, arcaboo teórico da pesquisa aqui apresentada, o
desenvolvimento está ligado a processos de mudanças e de transformações que
ocorrem ao longo da vida do sujeito e em cada uma das múltiplas dimensões de seu
funcionamento psicológico. Como tal, o desenvolvimento é percebido de forma
entrelaçada às práticas culturais e educativas. O processo de desenvolvimento
inclui, necessariamente, o processo de aprendizagem. Ambos dizem respeito às
experiências do sujeito no mundo com base nas interações, assumindo o
pressuposto da natureza social do desenvolvimento e do conhecimento
especificamente humano. E, considera-se o sujeito como concreto, situado, datado,
e privilegia-se o papel da mediação, da linguagem, do contexto, das relações sociais
e da Zona de Desenvolvimento Proximal (BRANCO e SMOLKA, 2004).
Ao abordar a questão da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), Vygotsky
(1991) amplia e grande importância ao papel do ensino no processo de
desenvolvimento dos sujeitos. A ZDP é compreendida como a disncia entre ovel
de desenvolvimento real, ou seja, aquilo que a criança é capaz de fazer de forma
independente e o nível de desenvolvimento potencial, aquilo que é capaz de realizar
a partir da colaboração de companheiros mais experientes.
Segundo Pino (2005), para Vygotsky, a originalidade do desenvolvimento da
criança reside no fato de que as funções naturais, regidas por mecanismos
biológicos, e as funções culturais, regidas por leis históricas, fundem-se entre si,
constituindo um sistema mais complexo. De um lado, as funções biogicas
transformam-se sob a ação das culturais e, de outro lado, as funções de natureza
cultural têm nas funções biológicas o suporte de que precisam para constituir-se. Em
condições normais de desenvolvimento biológico, as funções culturais vão se
constituindo seguindo um ritmo até mesmo previsível.
Desse modo, o desenvolvimento ocorre do social para o individual, em planos
diferentes, embora intrinsecamente relacionados. Suas etapas passam a ser
compreendidas levando em conta os aspectos histórico-sociais e o lugar singular
onde as pessoas se encontram. Perceber o desenvolvimento desta forma permite
105
refletir sobre as diferenças referentes ao ritmo do desenvolvimento e da
aprendizagem perante a diversidade social, cultural e econômica dos sujeitos, o que
confirma as reflexões anteriores sobre a infância ser reconhecida como categoria
social e sobre a exisncia de infâncias e não de infância.
Considera-se, nesta perspectiva, que o sujeito ao nascer ainda não es
“pronto” e que ele será aquilo em que se transformará a partir de suas interações
sociais nos mais diversos contextos. Portanto, a aprendizagem precede o
desenvolvimento. Nesse aspecto, pontuo o papel primordial do educador como
mediador, uma vez que ao interagir com o educando o auxilia a internalizar,
paulatinamente, o que vai sendo construído nessa relação.
Esta perspectiva confere, então, grande importância ao papel da escola e da
mediação do professor possibilitada pela linguagem. Assim, a aprendizagem é
concebida como um processo de construção compartilhada, uma construção social,
na qual o papel do professor é o de sempre atuar no desenvolvimento potencial do
aluno para levá-lo, através da aprendizagem, a um desenvolvimento real. Com base
em Vygotsky (1991), acredito que só a boa aprendizagem promove o
desenvolvimento e que o bom ensino é aquele que apresenta uma orientação
prospectiva, dirigida ao que o aluno ainda não é capaz de fazer sozinho, mas é
capaz de fazer com auxilio de um outro mais experiente. O bom ensino é o que
relaciona os conceitos científicos (conceitos construídos em situação formal de
aprendizagem) aos conceitos esponneos (conceitos construídos em situações
cotidianas, não sistematizadas) e auxilia o educando a internalizar os conceitos
científicos em um movimento espiralado, no qual vai aprendendo novos conceitos e,
por conseguinte, se desenvolvendo.
Diante disto, é possível compreender que, para que ocorra a assimilação dos
conceitos científicos, é necessário que haja um tecido conceitual amplamente
elaborado e desenvolvido por meio da atividade espontânea do pensamento. A
assimilação dos conceitos científicos se através dos conceitos espontâneos
anteriormente elaborados por atos de pensamentos diversos. Portanto, crianças
menores, que apresentam menor vivência, ao chegarem à escola com os conceitos
espontâneos ainda restritos para a aprendizagem da leitura, escrita e para as
operações aritméticas fundamentais, necessitam de um trabalho que valorize esses
conhecimentos espontâneos.
106
Vygotsky (1991) apresenta o fato de que as crianças iniciam seu aprendizado
antes de entrarem para a escola, justamente o aprendizado dos conceitos
espontâneos. Qualquer situação de aprendizado apresenta uma história prévia e,
conseqüentemente, as crianças possuem suas primeiras hipóteses sobre os
conteúdos a serem trabalhados. Desta forma, para o autor, o aprendizado e o
desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro dia de vida.
Como mencionei anteriormente, acredito que os preceitos hisrico-culturais,
baseados nos estudos vygotskyanos, vieram para dar uma valiosa contribuição.
Mas, reconheço que para que isto se efetive é necessário que os professores a
conheçam e a estudem profundamente, porque na grande maioria dos casos esta
perspectiva não foi vivenciada pelos professores enquanto alunos e, pelo que pude
perceber, através dos discursos das docentes, elas pouco estudaram na graduação
os preceitos desta perspectiva, visto que nos cursos foram enfatizados os
conhecimentos da teoria piagetiana.
Assim, quando Sofia F, que está participando do grupo de estudos da SE, diz
que,
Temos sim que oportunizar o início desse processo que terá seqüência nos próximos anos.
e, logo em seguida, se corrige dizendo,
Início não ne?! Porque quando chegam aqui as crianças já sabem muita coisa.
Ela demonstra que está construindo novos sentidos para seu trabalho com as
crianças de seis anos.
Quando Margarida I diz que
O projeto da SE é muito bom, principalmente nas questões referentes a não ruptura entre o
desenvolvimento biológico com a questão da aprendizagem e também porque mostrando
a ansiedade de todos os professores que trabalham com as crianças de seis anos,
principalmente das escolas que passaram a atender agora.
Ela também demonstra que está construindo novos conceitos a partir de seus
estudos. Mas, acima de tudo, os discursos dessas duas professoras confirmam a
107
importância dos estudos, da participação em grupos de estudos e discussões, da
fundamentação teórica, para que seja possível uma prática que reconheça que “os
marcos cronológicos são apenas referencias gerais, pois nenhuma criança é idêntica
a outra, posto que o substrato de seu desenvolvimento assenta-se sobretudo, nas
condições concretas de vida” (MARTINS, 2006, p. 63). Ou seja, uma prática que
reconheça a criança como sujeito histórico e social que se desenvolve a partir de
suas experiências e aprendizagens em relação com outros sujeitos mais
experientes, sejam eles outras crianças ou adultos.
4.3 Reflexões sobre dicotomias
Tendo como base todas as reflexões empreendidas até aqui, e percebendo
que, durante a realização das entrevistas, estiveram sempre presentes menções às
dicotomias lúdico versus aprendizagem”, “EI versus EF”, “1º ano versus ano do
EF”, “escolas do Município versus escolas do Estado”, julguei pertinente dedicar este
terceiro momento para discutir tais dicotomias. Considero relevante ressaltar que
discutirei estas questões de forma entrelaçada pois foi assim que elas apareceram
nos discursos das professoras pesquisadas.
Ao longo da realizão desta pesquisa, percebi a existência de uma grande
preocupação com o rompimento brusco das atividades mais espontâneas, mais
lúdicas, menos sistematizadas, reconhecidas culturalmente como sendo da EI, para
que seja realizada a entrada na cultura do EF, reconhecida como mais séria, mais
formal, mais sistematizada. Porém, percebi que, embora existisse esta preocupação,
do rompimento com a brincadeira, as professoras, em sua maioria, não souberam
explicar porque julgavam ser importante o papel da brincadeira no ambiente escolar.
Inclusive, a brincadeira foi apontada em vários discursos como atividade antagônica
ao processo de aprendizagem e desenvolvimento, fato que está intimamente
relacionado à concepção de infância, desenvolvimento e aprendizagem que
apresentaram, bem como à falta de uma base teórica sólida que as auxilie justificar a
importância da brincadeira no espaço da instituição escolar. Tais questões
apareceram, entre outros, nos seguintes termos:
108
Tento trabalhar a alfabetização de forma diferente, através do lúdico. A lógica do EF não
contaminou o primeiro ano. [...] Temos que provar, que contaminar toda a escola de que
os espaços da brinquedoteca (que está para ser criada), da brincadeira,do dico, não é
importante só para o primeiro ano. (SOFIA F)
Muitas coisas que eu fazia com os alunos eu não tenho tido mais tempo de fazer com a
preocupação de alfabetizar. Acho que atividades com jogos e fora de sala de aula eu deixei
de fazer, para dar mais atividades sistematizadas de leitura e escrita. (MARGARIDA I)
Minha angústia agora é ir atrás disso (estudos, leituras dos documentos, etc.), para ter
argumentos, contagiar não é?!, tentar mostrar o trabalho que es sendo feito. Porque
brincamos muito, saímos da sala, estamos felizes e as crianças tamm, aí, pode dar
impressão que a gente não tá fazendo nada, e... espero que o ano que vem ninguém mais
antigo queira pegar esta sala achando que é mais fácil. (VALÉRIA F)
Depois desta mudança estava mudando também meu jeito de trabalhar. Por exemplo, tinha
dia de Educação Física que eu não levava as crianças para o tio para atividades livres
porque já tinham ficado uma hora fora de sala, aí tinha que repor aquele tempo. (CRIS I)
Estas citações asseveram resultados de pesquisas que se debruçaram a
analisar as concepções e práticas dos professores em relação à brincadeira. De
acordo com Araújo (2008) é possível encontrar no banco de dados da CAPES 12
pesquisas realizadas no período de 2002 a 2006 sobre este tema. Dentre elas
destaco, a seguir, a de seis pesquisadores.
Lamb (apud ARAÚJO, 2008) concluiu que os professores não reconhecem
qual o seu papel no brincar, encontrando dificuldades de sistematizar a importância
dessa atividade para a criança. Schoffel (apud ARAÚJO, 2008), por sua vez,
concluiu que na perspectiva das professoras investigadas o brincar encontra-se em
oposição ao trabalhar. O trabalho de Leal (apud ARAÚJO, 2008) mostra que embora
as professoras saibam da importância do brincar na educação infantil, nem sempre
compreendem a essencialidade dessa atividade, o que denota a falta de
embasamento teórico a respeito do tema e a necessidade de investimento na
formão de professores. Lima (apud ARAÚJO, 2008) através de seu trabalho,
apontou que enquanto o trabalho escolar é concebido como núcleo central do
processo ensino-aprendizagem e meio para o desenvolvimento infantil, o jogo é visto
109
como secundário, prescindível e descartável. Capistrano (apud ARAÚJO, 2008)
também observou através de sua pesquisa que a brincadeira nas instituições
pesquisadas apresentou conotação de perda ou ocupação do tempo, sendo utilizada
muitas vezes para o aprendizado de conceitos matemáticos e da língua materna.
Silva (apud ARAÚJO, 2008), assim como Leal (apud ARAÚJO, 2008), ressaltou a
necessidade de melhor formação dos professores de EI, e eu diria tamm dos
professores das séries iniciais do EF, no que diz respeito à ludicidade. A autora
chegou a esta conclusão após perceber a partir de sua pesquisa que o brinquedo é
valorizado pelos professores somente como atividade pedagógica dirigida à
aquisição de conteúdos.
Para a perspectiva histórico-cultural o brincar é considerado um importante
processo psicológico possibilitador da aprendizagem e do desenvolvimento.
Vygotsky (1991) afirma que o brincar é uma atividade humana criadora, a qual
permite às crianças elaborarem novas possibilidades de interpretação, de
expressão, de ação e de relações sociais com outros sujeitos, a partir da interação
entre imaginação, fantasia e realidade. Para Leontiev (1991 [1930]), parceiro de
trabalho de Vygotsky, a brincadeira é um tipo de atividade não instintiva e
precisamente humana que se apresenta como atividade principal das crianças.
Neste caso o termo principal é utilizado não para demonstrar a quantidade de tempo
destinado a esta atividade, mas pela sua conexão com “as mais importantes
mudanças no desenvolvimento psíquico da criança e, dentro da qual se
desenvolvem processos psíquicos que preparam o caminho da transição da criança
para um novo e mais elevado nível de desenvolvimento”.(LEONTIEV, 1991 [1930], p.
122).
A compreensão da importância da brincadeira para o desenvolvimento e
aprendizagem bem como a compressão da importância do papel do professor como
mediador desses processos reforça, ainda mais, a necessidade dos professores em
reconhecerem-na como atividade principal; reforça a necessidade dos professores
saberem respeitar os tempos e espaços destinados a tais atividades, sem considerá-
los perda de tempo. Esta refleo reforça a necessidade desses profissionais
terem uma base teórica sólida para fundamentarem sua prática pedagógica.
Além disto, como apresentado na seção anterior, o bom ensino, para esta
perspectiva, é aquele que relaciona os conceitos científicos (conceitos construídos
em situação formal de aprendizagem) aos conceitos espontâneos (conceitos
110
construídos em situações cotidianas, não sistematizadas), sendo assim, é possível,
depreender que o termo espontâneo utilizado para se dirigir a atividades praticadas
dentro da EI, não deve ser utilizado em tom pejorativo como se estivesse
relacionado a atividades menos importantes a serem trabalhadas pela escola. Muito
pelo contrário, o bom ensino, aquele que de fato é sério, parte dos conceitos
elaborados pelas crianças em suas atividades espontâneas para então se dirigir aos
conceitos científicos trabalhados sistematicamente pela escola. Esta concepção
confere, entre outras, grande importância aos momentos destinados ao que as
professoras chamam de tempo de atividades livres, mas, sem deixar de lado a
mediação dos conceitos científicos. Pensar assim revela ser falsa a dicotomia entre
brincadeira, desenvolvimento e aprendizagem, bem como revela que é equivocado
pensar que trabalhar com as crianças menores é mais fácil do que trabalhar com
crianças maiores porque no primeiro caso o trabalho parece ser mais solto, mais
livre, menos sistematizado. Segundo Sofia F, esta é a visão que se tem do trabalho
na EI e que esta, acaba fundamentando, em certa medida, o trabalho pedagógico
direcionado a esta etapa.
A visão que se tem da EI é que ela é mais fácil, aí acaba se tornando mais solta. (SOFIA F)
Vimos que não é bem assim, todo trabalho realizado pelo professor, seja ele
destinado a crianças menores ou a crianças maiores, tem que ser planejado e muito
bem fundamentado. Enfatizo ainda que, ao relacionar seriedade ao bom ensino não
estou dizendo que este não deva ser alegre, muito pelo contrário, de acordo com
Freire (1992), o ensino deve ser sério, maso precisa ser sisudo, ou seja, também
é falsa a dicotomia existente entre seriedade e alegria. Valéria F revela em sua fala
como isto é posvel, além de apresentar um novo sentido para o termo facilidade:
Quando digo mais fácil é no sentido de estar fazendo algo, de estar trabalhando com algo
com que me identifico mais, então, como gosto muito de trabalhar com essas crianças e
como teria a oportunidade de realizar um trabalho com o qual eu acredito, pensei ser mais
fácil, é nesse sentido. [...] Quando a gente tem afinidade e gosta do que fazendo parece
que é mais fácil. Ao tempo que eu vejo que no ano passado a essa altura do campeonato eu
estava um caco e este ano eu não estou. Eu estou bem disposta, estou animada, eu
estou gostando. É cansativo porque a gente tem que planejar atividades diversificadas, é
111
mais dinâmico do que no quarto ano que fica dando atividades escritas, aqui dá muito
trabalho mas estamos gostando. É incrível estamos num rendimento incrível! [...] As
crianças estão gostando de vir para a escola, a gente vê o prazer deles. Tinha um aluno que
faltava um dia por semana para ir na fono, agora ele sai mais cedo para o deixar de vir a
aula.
A última fala de Valéria F é reforçada por Quinteiro (2004, p. 176) que
apresenta a importância de
Reorganizar o tempo e o espaço escolares no sentido não apenas de
garantir o acesso, mas principalmente transformar a escola num lugar
agravel, aonde a criança goste de ir e permanecer o por obrigação,
mas também porque se encontra mobilizada para participar do seu próprio
processo formativo. Este parece ser o desafio do presente!
Como mencionado no início deste capítulo, além das questões apresentadas
até aqui, também estiveram presentes nos discursos das professoras a questão das
ambigüidades, dicotomias e rupturas relacionadas ao trabalho realizado em espaços
reconhecidos culturalmente como diferentes: o da EI e o do EF. Essa discussão,
como foi apresentado no decorrer deste trabalho, o é nova. muito se discute
com preocupação a ruptura existente entre essas duas etapas do ensino. Porém, a
ampliação do EF para nove anos e a incluo das crianças de seis anos nesse
segmento do ensino, provocou novas discussões. Agora, para além do divórcio entre
EI e EF, vieram à tona o divórcio entre a Rede Municipal e Estadual e o divórcio
entre o primeiro e o segundo ano do EF, mesmo sendo essas etapas/séries
realizadas na mesma escola. Tais situações emergiram em falas como as seguintes:
Você sabe que vai ser cobrado, que vai ter comparação. Cobrança geral, dos pais, da outra
escola que vai logo perguntando de quem a criança era aluna, etc. (MARGARIDA I)
Esta questão de como o segundo ano vai trabalhar vamos ter que conversar. Por ser o
primeiro ano que isto está acontecendo na escola precisamos conversar, pensar em como
fazer isto sem quebrar o trabalho, para ter uma seqüência. Porque a gente acomentou
isso, a gente acha que vai chegar o ano que vem e as crianças vão levar um susto, que tudo
vai mudar, mesmo sendo na mesma escola. (SOFIA F)
Agora as professoras estão com essa coisa de mudar o seu trabalho, a forma de ensinar, de
apressar as coisas, por causa da cobrança de quem recebe as crianças de sete anos para
112
que elas estejam alfabetizadas, já estejam lendo. Esta cobrança é mais da escola do
Estado. (CRIS I)
As questões do espaço físico aqui atrapalham um pouco, mas estamos providenciando uma
brinquedoteca, mas o para o primeiro ano mas para toda escola, porque todas as
crianças devem brincar, pensamos em contaminar toda a escola. Porque aqui a gente vê
criança brincando fora da sala e toda criança deve brincar. (SOFIA F)
Eu estava rodando uma atividade, chegou uma professora do segundo ano e perguntou:
Ué? você vai dar isto? Se você está trabalhando isto o que eu vou trabalhar depois, no
ano que vem? Eu nem respondi por que não valia a pena e não era o momento para isto.
Mas agora, com esta nossa conversa e pensando mais sobre isto, acho que temos que ter
um tempo para conversarmos sobre isto. (VALÉRIA F)
É verdade, aqui é tudo assim. Conversamos pelos corredores porque nunca temos tempo
para conversar. Nas reuniões sempre tem assuntos mais importantes para serem
conversados. Mas agora estou vendo que não tem essa de assunto mais importante, este
assunto do primeiro ano é muito importante e não está bem resolvido pela escola e todos
têm que discutir junto, porque tem professores do segundo ano que não concordam em ter
aqui o primeiro ano. Não sei por que, mas talvez, exatamente, por acharem que vamos aqui
fazer o trabalho deles. Tem também a questão da avaliação, não sabemos ainda como e o
que vamos avaliar. (VALÉRIA F)
As meninas (do segundo ano) nem sonham com o tipo de aluno que vão estar recebendo
entendeu? Porque assim, quando começa reclamam - há aquele menino nem sabe pegar no
lápis! Entendeu? esses meninos que estão (no primeiro ano) praticamente vão estar
fechando o segundo ano no ano que vem. então todos já terão passado pela escola e, então
isso vai acabar. (VALÉRIA F)
Eu sinto isso, sinto que eles (alunos do primeiro ano desta escola) indo para esta turma,
turma do segundo ano, eles não vão poder ser tratados como se nunca tivessem estado na
escola, nesta escola (se referindo à impossibilidade dos professores reclamarem da escola
de origem dos seus alunos). Mas eu acredito que... mesmo assim vai ter uma quebra.
(VALÉRIA F)
113
Percebo que a dificuldade em reintegrar estes los(EF e EI, 1º e 2ºano,
lúdico e aprendizagem) es intimamente relacionada ao fato de sermos muito
marcados histórica e culturalmente por estas cisões. E, ainda, a falta de espaços
para discussões nas escolas e entre escolas. Essas questões também se
relacionam a tudo o que foi considerado até agora, (concepção de infância,
aprendizagem, desenvolvimento, papel da escola e do professor, papel da
brincadeira como promotora de desenvolvimento e aprendizagem).
Portanto, para que, aos poucos, essas cisões e falsas dicotomias possam ir
tomando outros rumos há necessidade de bases teóricas bem fundamentadas;
necessidade de investimento na formação do professor, possibilitando que cada vez
mais tenham condições de participar de cursos, grupos de estudos e grupos de
discussões; necessidade de interação entre escolas; e que, acima de tudo, os
professores e todos os profissionais das escolas se percebam como protagonistas
desta história, tendo o apoio dos gestores por meio de sua articulação e incentivo,
subsidiando esse processo.
Segundo Sarmento (2002) o trabalho docente não pode ser um trabalho
solitário do professor na sala de aula, ele tem que ser o trabalho de uma equipe.
Mas, uma equipe que se coordena, que se articula, que se combina e que atua em
conjunto. Ampliando esta discussão, Azzi (2002, p. 57) afirma que,
A formação de professores para a escola básica constitui, pois, fator
relevante na melhoria da qualidade da escola pública, mas não considerada
de forma isolada, e sim no bojo de decisões políticas mais amplas que
apontem a melhoria das condições de trabalho docente.
De acordo com Sofia F
Seria muito bom que esta contaminação do primeiro ano ocorresse com todo mundo e que
depois as crianças continuassem a ter o espaço da brincadeira, que isso não acabasse, que
não quebrasse, que não acontecesse como antes, quando a criança vinha do pré para a
primeira série, para romper com isso, agora você não é mais criança, não tem mais
brincadeira, não tem mais música na sala.
Eu amplio a questão e digo que seria muito bom que os professores, as
turmas de etapas/séries diferentes, as escolas de EI e EF e as escolas de Redes
114
diferentes se “contaminassem” mutuamente com tudo o que cada um(a) tem a
apresentar de bom.
115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entre nós, mulheres e homens, a inconclusão se
sabe como tal. Mais ainda, a inconclusão que se
reconhece a si mesma implica necessariamente a
inserção do sujeito inacabado num permanente
processo social de busca. Histórico-sócio-culturais,
mulheres e homens nos tornamos seres em que a
curiosidade, ultrapassando os limites que lhe são
peculiares no domínio vital, se torna fundante da
produção do conhecimento.
PAULO FREIRE
Em consonância com a perspectiva adotada neste trabalho e com o
desenrolar de todo processo de realização da pesquisa, compreendi que as
conclusões são essencialmente provisórias e inconclusas. À medida que são
datadas e contextualizadas carregam consigo uma enorme gama de valores
construídos no processo de interlocução com o outro, desvelando o singular, o
contraditório, as incoerências, o irrepetível e mostrando a vocação estrutural para a
mudança. Sendo assim, as reflexões empreendidas e as conclusões a serem aqui
apresentadas não podem ser reconhecidas como um sistema fechado e acabado de
signos para sempre disponíveis, prontos e reconhecíveis, mas sim como
possibilidades que permanecem em aberto, como [...] permanente processo social
de busca” (FREIRE, 2007, p.57) .
Reconhecer que as conclusões o inconclusas não significa dizer que falta
rigor na pesquisa, pelo contrário, reconhecer a inconclusão apenas reitera meu
compromisso com a perspectiva adotada. Assim compreendo que o caminho desta
não é um lugar, mas um fluxo de movimento; seus sujeitos não foram “objetos” de
pesquisa, foram essencialmente “sujeitos”. Portanto, esta seção apresenta um breve
resumo do caminho percorrido e as conclusões inconclusas que construí ao longo do
processo da pesquisa em interação com as quatro professoras, sujeitos desta, e
com todos os autores estudados.
A partir de minha realidade que insistia em perguntar, embrenhei pelos
caminhos do Mestrado em Educação, ou seja, pelos caminhos da pesquisa, a fim de
compreender o processo de ampliação do EF para nove anos de duração a iniciar-se
aos seis anos de idade. Logo no início desse caminho senti necessidade de
conhecer como este tema estava sendo tratado pela literatura e pelas pesquisas,
motivo pelo qual realizei a revisão bibliográfica.
116
Ao constituir tal revisão me deparei com o interessante movimento da
construção do conhecimento a cerca de um novo fenômeno. Embora a ampliação do
EF estivesse sinalizada desde 1996 na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº. 9.394 e em 2001, esse indicativo tenha-se tornado meta no Plano
Nacional de Educação na Lei nº. 10.172, somente a partir do final de 2003, quando
alguns Estados efetivaram a mudança no EF é que comaram a aparecer
publicações sobre o tema.
Inicialmente o assunto apareceu em meios de comunicação não científicos e
de forma muito superficial. Porém, em um movimento crescente, estas publicações
comaram a aparecer em maior mero e a melhorar em qualidade de discussão e
aprofundamento, principalmente a partir da promulgação da Lei Federal
nº.11.274/2006 que tornou o processo de ampliação do EF obrigatório em âmbito
nacional e com prazo de adequação ao sistema até o ano de 2010. Esse processo
crescente de discussões, apresentado no capítulo de revisão, culminou com a
apresentação da publicação de dois livros constituídos por capítulos que discutem o
tema e com a deflagração da organização de grupos de pesquisa.
Justamente a partir da construção dessa revisão, em diálogo com os vários
autores e trabalhos apresentados, é que consegui refinar meu objetivo, qual seja,
compreender, através dos discursos, os sentidos que os professores do ano do
EF estão construindo para a inclusão das crianças de seis anos de idade nesse
segmento de ensino. Além disto, também a partir da revisão bibliográfica,
(re)elaborei as questões norteadoras capazes de me auxiliarem a alcançar o objetivo
pretendido, são elas: (i) Como os professores do ano do EF estão
compreendendo a amplião desse segmento do ensino? (ii) Como os professores
do 1º ano do EF estão compreendendo a inclusão das crianças de seis anos nesse
segmento do ensino? (iii) O professor do ano do EF teve algum contato com os
documentos elaborados para subsidiar a implementação do EF?
A partir do refinamento do objetivo e da (re)elaboração das questões
norteadoras debrucei-me na construção do referencial teórico e metodológico,
encontrando nos estudos histórico-culturais fundamentos capazes de oferecer um
lido embasamento para desenvolver a pesquisa. O encontro com os estudos
histórico-culturais ocorreu em minha participação nas disciplinas Processos de
Pensamento e Linguagem e Construção do Conhecimento na Escola, ministradas
pela professora Maria Teresa de Assunção Freitas. Diante dos diálogos, das
117
discussões empreendidas nessas disciplinas compreendi que o melhor caminho
para a realização desta pesquisa seria mesmo o da abordagem qualitativa,
fundamentada na perspectiva histórico-cultural, mesmo tendo sido alertada inúmeras
vezes que este não seria um caminho fácil, pois, trabalhar com essa perspectiva,
considerada ainda recente, exigiria de mim muito rigor, coerência e, acima de tudo,
responsabilidade. Responsabilidade com a pesquisa, com os estudos e
fundamentalmente com os sujeitos da pesquisa.
Essas considerações acerca do trabalho fundamentado na perspectiva
histórico-cultural levaram-me a buscar, cada vez mais, encontros e diálogos com
outros pesquisadores que tamm utilizassem este referencial. Por esse motivo,
procurei, além das leituras, participar de eventos onde encontraria tais
pesquisadores. Assim, poderia dialogar com eles sobre o que estava sendo
construído a partir da perspectiva histórico-cultural e, ainda, teria a oportunidade de
apresentar meu trabalho para que eles pudessem dar suas contribuições sobre o
que estava sendo realizado.
Foi justamente na minha participação em um desses eventos, mais
precisamente o VIII Congresso Nacional de Psicologia Escolar realizado em 2007 na
Cidade de São João Del Rei, que me deparei com os estudos realizados por Wanda
Junqueira Aguiar, os quais, vieram se apresentar como base fundamental para a
construção do processo de análise, a saber: a construção de núcleos de significação
a partir dos discursos das professoras pesquisadas.
Trilhar este caminho também o foi fácil, como vimos durante toda a
apresentação desta pesquisa, o novo gera medo, insegurança, ansiedade, mas
também gera os sentimentos de desafio e desejo que motivam a sair do lugar.
Considerei então que este caminho tenha sido muito gratificante pois, ao decidir, a
partir dos estudos de Aguiar (2000, 2001 e 2005) e Aguiar e Ozella (2006), trabalhar
com oscleos de significação e com entrevistas dialógicas recorrentes, compreendi
que realizei uma análise quase conjunta do processo utilizado pelas quatro
professoras participantes da pesquisa para a produção de sentidos e significados.
Este caminho me permitiu, portanto, apreender coisas novas e, me permitiu,
coerentemente com o arcabouço teórico, considerar de fato todos os participantes
da pesquisa como sujeitos e co-autores dessa situação, permitindo sentir-me menos
solitária no processo de realização das análises e até mesmo da escrita da
pesquisa.
118
Ao elaborar este breve resumo do caminho que trilhei para construir esta
pesquisa pude perceber o quanto aprendi neste processo, o quanto cresci como
pesquisadora, como ser humano, como profissional da educação. Mas acima de
tudo, deparei-me frente a frente com minhas limitações, com a limitação do tempo
destinado a uma pesquisa de mestrado, com meu inacabamento, com as inúmeras
aprendizagens que ainda tenho pela frente e, portanto, com a impossibilidade de
colocar ponto final em qualquer coisa que se pretenda concluir. O tempo deste
mestrado se esgotou mas as questões se ampliaram...
Compreendi, a partir dos artefatos construídos no desenrolar desta pesquisa,
que os sentidos construídos para a inclusão das crianças de seis anos de idade no
EF de nove anos foram-se constituindo a partir do imaginário pedagógico a respeito
do trabalho a ser exercido na EI e no EF e no trabalho a ser exercido com as
crianças de seis anos. Compreendi ainda que esse imaginário pedagógico foi sendo
elaborado ao longo da vida destas professoras, nas relações familiares, na
construção da identidade profissional de cada uma, no enfrentamento de suas
dificuldades, no encontro com as necessidades e possibilidades, na própria prática
docente, no contexto de trabalho e no encontro com o “outro” (colegas de trabalho,
estudos realizados, alunos, pais, filhos, etc.).
Assim, perceber a inclusão das crianças de seis anos de idade no EF de nove
anos como uma questão apenas política, financeira e de ampliação de vagas, além
de perceber que esta mudança traria prejuízos para as crianças, para, em seguida
perceber que esta mudança poderia se apresentar tamm como uma situação
positiva, passível de promover reflexões sobre os processos de desenvolvimento e
aprendizagem sobre as especificidades da infância, sobre o processo de
alfabetização, entre outros, pareceu-me um movimento bastante coerente com o
processo de construção do conhecimento, visto o movimento apresentado na
revisão bibliográfica deste trabalho.
Em relação aos sentimentos que surgiram frente à nova disposição do ensino,
compreendi com as professoras e por experiência própria, que a angústia, o medo e
a insegurança são sentimentos compreensíveis frente ao novo, ao desconhecido.
Porém, esses sentimentos não devem ser causadores de paralisia, mas sim, de
movimento de busca, afinal, segundo Freire (2007), ensinar exige conscncia do
inacabamento. Falando sobre sua ppria experiência, o autor nos uma grande
lição:
119
Como professor crítico, sou um “aventureiro” responsável, predisposto à
mudança, à aceitação do diferente. Nada do que experimentei em minha
atividade docente deve necessariamente repetir-se. Repito, porém, como
inevitável, a franquia de mim mesmo, radical, diante dos outros e do
mundo. Minha franquia ante os outros e o mundo mesmo e a maneira
radical como me experimento enquanto ser cultural, histórico, inacabado e
consciente do inacabamento. (FREIRE, 2007, p. 50, grifo do autor)
Outra questão relevante a ser apresentada diz respeito à falta de apoio às
professoras por parte do que chamamos de coordenação pedagógica. Apoiada nos
estudos que realizei permito-me fazer a seguinte relação:
De acordo com Freire (2007, p. 50) Quanto mais cultural é o ser maior a sua
infância, sua dependência de cuidados especiais”.Khoan (2004), por sua vez,
apresenta a palavra grega Aión que, segundo ele, designa a intensidade do tempo
da vida humana, um destino, uma duração, uma temporalidade não numevel nem
sucessiva, mas, intensiva, indicando, entre outras coisas, que o pprio da criança
não é ser apenas uma etapa, uma fase numerável ou quantificável da vida humana,
mas um reinado marcado por uma relação intensiva com o movimento. Khoan
(2004), discute ainda, com base nos estudos de Deleuze que as crianças obtêm
suas foas do devir molecular que fazem passar as entre idades, que saber
envelhecer não é manter-se jovem, mas extrair os fluxos que constituem a juventude
de cada idade. Devir – criança é, assim, segundo os estudos desse autor, uma força
que extrai, da idade que se tem, do corpo que se é, os fluxos e as partículas que dão
lugar a uma “involução criadora”, a uma força que irrompe sem ser convidada.
Compreender essas questões significa poder ajudar a encontrar um novo modo de
pensar a educação, um novo início para a educação. Seria algo assim como a
infância da educação e não apenas uma educação da infância.
Sendo assim, diante de toda esta discussão, considero que, embora “adultas”,
profissionais da educação algum tempo, estas professoras, sujeitos histórico-
culturais, franquiadas a si mesmas, ao mundo e aos outros, enfrentam agora um
momento em que são vistas em sua infância e na infância da educação. Desta
forma, sentem-se carentes de cuidados especiais, de apoio pedagógico e de trocas
com outros colegas e profissionais.
Acredito, que a percepção dessa necessidade de apoio e a confrontação com
a falta de apoio dentro da escola foi o que mobilizou as professoras a procurarem
por estudos e grupos de pesquisas, como, por exemplo, o grupo de estudos da SE.
Entretanto, aquela que não procurou por este apoio extra-escolar, extra prática
120
docente, não o fez justamente por falta de apoio, por desconhecer as possibilidades
de formão em contexto e principalmente por falta de estímulo. Essa conclusão
teve origem no fato de que, mobilizada pelos diálogos que empreendemos, esta
profissional se mostrou instigada a avançar em seus estudos, a avançar na busca de
novos conhecimentos e principalmente na busca de reencontrar sua autonomia que,
segundo ela, estava adormecida algum tempo, talvez pelo comodismo ou pelo
que a diretora da escola EI chamou de “piloto automático”.
A falta de apoio na escola e de articulação e integração entre os profissionais
da instituição tamm deu origem ao desconhecimento ou a não discussão dos
materiais oficiais destinados a orientação do atendimento das crianças de seis anos
no EF de nove anos. Fato que contribuiu para a conclusão de que a compreensão
das professoras sobre esta mudança, os sentidos que estavam construindo,
estavam de fato calcados em seus (des)conhecimentos prévios, em seu imaginário
pedagógico.
Frente ao desconhecimento das propostas, ressalto que a prática docente,
segundo os discursos das professoras participantes da pesquisa, estava justamente
calcada em seus estudos de formão na graduação, em seus estudos de
especializações e na própria prática docente. Mas, concluímos juntas que esta
formão não estava sendo suficiente para sanar suas dúvidas em relação ao
trabalho com as crianças de seis anos, mesmo por aquelas professoras que
estavam a mais tempo trabalhando com estas crianças. Sendo assim nos
encontramos no que Frade (2007) reconheceu como zona de instabilidade produtiva,
ou seja, reconhecemos a defasagem da fundamentação teórica na prática docente e
percebemos a importância de que houvesse o aprofundamento nos estudos.
Associada à questão da defasagem teórica, do desconhecimento de alguns
estudos, como, por exemplo, os estudos sobre a infância, seu tempo, seu espaço,
suas especificidades e a falta de apoio e estímulo, estavam o que denominei de
falsas dicotomias. As dificuldades em perceber a importância da não ruptura entre a
brincadeira, o lúdico e o desenvolvimento e a aprendizagem; entre a EI e o EF; entre
o 1º e o 2º ano do EF, até mesmo na própria escola e, entre escolas, principalmente
entre escolas do Município e do Estado, estiveram presentes todo o tempo nas falas
das professoras.
Existem ainda duas questões que embora pertinentes, mas frente às
impossibilidades e ao processo de inacabamento, o foram discutidas de forma
121
aprofundada, mas que merecem destaque neste momento. Estas questões dizem
respeito aos espaços físicos das escolas e a percepção das próprias crianças sobre
sua entrada na escola de EF.
Percebi que a questão do espaço físico tem sido tratada como argumento
para a viabilidade ou como entrave para o atendimento das crianças de seis anos no
EF. Para os professores que trabalham em escolas de EI o fato de as crianças irem
para uma escola de EF seria prejudicial porque os espaços físicos desta não estão
adaptados ou adequados para o atendimento a essas crianças. Para os professores
que estão recebendo essas crianças na escola de EF o fato de a escola não estar
ainda preparada para este atendimento não significa que este não possa se efetivar,
pois dentro do possível a escola está se adaptando e os professores estão se
organizando para realizar o trabalho, eso (re)organizando os espaços que têm.
Segundo Sofia F, se ficarem esperando adaptar a escola para depois atender as
crianças, nunca esse atendimento será realizado, pois a escola nunca esta
totalmente adequada. Além disto, segundo Valéria F as crianças estão se adaptando
muito bem ao novo espaço, não apresentado problema algum em relação a isso e,
inclusive, têm ido para escola aparentemente com muito prazer.
A questão das crianças é o segundo ponto que quero discutir, mas, antes de
entrar nela, quero salientar que, a partir de meu olhar exotópico de pesquisadora, e
de minha experiência enquanto professora de EI e séries iniciais do EF, percebi que
nenhum dos dois espaços sicos encontra-se adequado ao atendimento das
crianças, sejam elas de 4 anos ou 10 anos de idade. Compreendi tamm, como
Sofia F, que o podemos ficar esperando que estes espaços sejam adequados
para podermos realizar nosso trabalho. O que devemos fazer é adequar nosso
trabalho para que ele possa acontecer com qualidade nos espaços de que
dispomos. Porém, dizer isso não significa aceitar o que temos, pelo contrário,
precisamos provar que, se conseguimos realizar um trabalho de qualidade nesse
espaço, poderíamos realizá-lo ainda melhor em outro mais adequado.
Nossa luta tem que partir da qualidade e não da falta dela. Se cruzarmos os
braços e o realizarmos bem o nosso trabalho dizendo que não o fazemos porque
não temos condições materiais e físicas para isto, estaremos contribuindo para que
a culpa dos baixos índices de aprovação, de desenvolvimento e de aprendizagem
nas escolas brasileiras recaia sobre nossos ombros. Situação que se inverteria caso
conseguíssemos provar que somos capazes de realizar um trabalho de qualidade,
122
responsável, e, por este motivo, temos o direito e o dever de exigir condições para
bem realizá-lo.
Voltando ao item referente às crianças, menciono que este ficou como minha
grande questão, como a efetivação da impossibilidade de colocar um ponto final
nesta concluo. Será que realmente as crianças estão se adaptando a estes novos
espaços? Ou será que estão se sentido prejudicadas como sugeriram as
professoras da escola de EI? Como será que as crianças sentem-se quando saem
de uma escola de EI para entrarem em uma escola de EF? Quais serão seus medos
e suas expectativas? O que será que esperam da nova escola?
O que as professoras sentem, os sentidos que estão construindo, eu
consegui desvelar algumas pistas a partir de seus próprios discursos. Agora gostaria
de descobrir um pouco mais sobre as crianças. Mas, gostaria de descobri-las com
elas e não com o que os “adultos” dizem delas. Portanto, acredito que este seja o
meu próximo desafio. O meu novo caminho a ser construído e trilhado.
Finalizo sem colocar ponto final, mas declarando que além de aprofundar
meus conhecimentos e de começar a construir minha identidade de pesquisadora, a
construção desta pesquisa abriu-me novos caminhos, permitiu-me novos olhares e,
acima de tudo, permitiu-me lidar comigo mesma. Conhecer-me melhor, minhas
limitações, meus desejos, meus medos, minha inconclusibilidade, meu
inacabamento e, portanto, minha sede de continuar buscando, de continuar
aprendendo. Além de tudo isso, não poderia deixar de mencionar a oportunidade de
encontrar com tantos “outros” que me ajudaram e me permitiram chegar até aqui,
que construíram comigo esta pesquisa e que me oportunizaram o encontro comigo
mesma e a percepção das múltiplas possibilidades que surgem a partir deste
trabalho. Enfim... Gosto de ser gente porque a História em que me faço com os
outros e de cuja feitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de
determinismo. Daí que insista na problematização do futuro e recuse sua
inexorabilidade.” (FREIRE, 2007, p. 53)
123
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Paulo, 2007.
132
APÊNDICES
133
APÊNDICE A
134
APÊNDICE B
CONSENTIMENTO INFORMADO
Eu, ______________________________________________, professora da
Escola ________________________________________ autorizo à mestranda Rita
de Cássia Barros de Freitas Araújo a realizar entrevistas comigo e gravações em
áudio destas.
Estou consciente de que os dados coletados nessas entrevistas serão usados
como elementos de análise para a dissertação da referida mestranda, assim como
podem vir a ser usados também em futuros trabalhos acadêmicos.
Será resguardado o anonimato dos sujeitos da pesquisa, usando-se
pseudônimos para referir-se a eles na redação do relatório final da pesquisa.
Juiz de Fora, ______ de ________________ de 2006.
__________________________________________
Assinatura da professora
135
APÊNDICE C
TERMO DE COMPROMISSO
Eu, Rita de Cássia Barros de Freitas Araújo, Mestranda em Educação da
Universidade Federal de Juiz de Fora, realizarei entrevistas com a
professora__________________________________________________da Escola
_______________________________________e gravações em áudio destas
entrevistas.
Estou consciente de que os dados coletados nessas entrevistas serão usados
como elementos de análise para minha dissertação, assim como podem vir a ser
usados tamm em futuros trabalhos acadêmicos.
Será resguardado o anonimato dos sujeitos da pesquisa, usando-se
pseudônimos para referir-se a eles na redação do relatório final da pesquisa.
Juiz de Fora ______ de ________________ de 2006.
____________________________________________________
Rita de Cássia Barros de Freitas Araújo
____________________________________________________
Professora Doutora Déa Lúcia Campos Pernambuco
Professora Orientadora
136
APÊNDICE D
CONSENTIMENTO INFORMADO – PROJETO DA SE/JF
Eu, ______________________________________________, responsável
pelo Projeto:“O Ensino Fundamental de nove anos”, realizado pela Secretaria
Municipal de Educação de Juiz de Fora, autorizo a mestranda Rita de ssia Barros
de Freitas Araújo a fazer menções ao referido projeto, com intuito de contextualizá-lo
no âmbito de sua pesquisa.
Estou ciente de que os dados serão utilizados como elementos de análise
para a dissertação de mestrado realizada pela estudante no Programa de Pós-
Graduação da Universidade Federal de Juiz de Fora, assim como podem vir a ser
utilizados também em futuros trabalhos acadêmicos.
Juiz de Fora, ______ de ________________ de 2007.
__________________________________________
Assinatura da(o) responsável
137
APÊNDICE E
TERMO DE COMPROMISSO
Eu, Rita de ssia Barros de Freitas Araújo, mestranda do Programa de Pós-
Graduação da Universidade Federal de Juiz de Fora, farei meões ao Projeto:“O
Ensino Fundamental de nove anos”, realizado pela Secretaria Municipal de
Educação de Juiz de Fora.
Comprometo-me a utilizar as referências somente como elemento de análise
para a minha dissertação de mestrado e em futuros trabalhos acadêmicos,
ressaltando que não serão utilizadas referências pessoais.
______________________________________
Mestranda
____________________________________________________
Professora Doutora Déa Lúcia Campos Pernambuco
Professora Orientadora
Juiz de Fora, ______ de ________________ de 2007.
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