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entrar no ônibus, há muita coisa a ser feita. O primeiro passo é
divulgar a caravana pelos jornais, rádios e pela televisão, e para isso
são escolhidos um ou dois componentes da torcida. Diariamente, eles
se dirigem aos repórteres que cobrem o clube, vão às redações, às
estações, com o maior entusiasmo, pois para eles essa é uma missão
sagrada. Feito isso, eles permanecem o dia inteiro nos postos de
venda, procuram os dirigentes em busca de todo o tipo de ajuda,
inclusive financeira, o que não é difícil de obter. Paralelamente, os
líderes de diversas alas se reúnem, marcam um ponto comum para a
saída, esquecendo suas diferenças e unidos em torno do mesmo ideal:
o clube para o qual torcem. É bem verdade que até a hora da saída,
cada líder disputa com o outro o privilégio de ser o que mais ônibus
lotou. Mas isso faz parte somente do que denominam ‘disputa
interna’, já que contra as outras torcidas, todas se unem. Com os
pedidos de reserva de passagens, já se pode então fazer uma previsão
de quantos estão dispostos a integrar a caravana. É aí que os líderes se
reúnem, vão a uma empresa e alugam os ônibus necessários, sem
jamais se esquecerem de deixar pelos menos mais um de reserva, já
que na hora do embarque chegam os que deixam tudo para a última
hora. E a pior coisa é deixar um torcedor, geralmente com a bandeira
do time, frustrado por não poder viajar. Em pé não se pode viajar, já
que as empresas não permitem. Chega a hora de polir os instrumentos,
verificar os arreios, recolher as bandeiras, que a viagem já está
marcada. Começa, então, toda uma nova emoção, que só quem vive
sua intensidade pode sentir. E eu senti quando, comprando por Cr$
47,00 uma passagem reservei um lugar num dos ônibus da Torcida
Unifogo – a ala mais recente – e continuei acompanhando o trabalho
de seu líder na formação da caravana. O destino, São Paulo, para o
jogo com o Corinthians.
A Saída – Muito antes da hora marcada para a saída – meia-noite de
sábado, dia 6 de outubro, em frente ao portão principal do Mário Filho
(o da estátua do Belini), muitos torcedores do Botafogo, com seus
bumbos e bandeiras, já estavam lá em sua febril atividade. Nem
davam a maior importância para os torcedores do Fluminense que
chegavam para ver seu time jogar com o Esporte de Recife. Às 23
horas chegaram os ônibus alugados pela ‘Unifogo’ e pela ‘Força
Fogo’ que se uniram também para a viagem, enquanto os ônibus da
Torcida Jovem e da Organizada estavam em frente ao Portão 18.
Manuel, líder da ‘Unifogo’, e Jorge Mau Mau, da ‘Força Fogo’,
colocavam as bandeiras e instrumentos nos ônibus, distribuíam os
lugares, que embora previamente marcados, sempre acabavam
servindo para discussões, já que sempre há um que quer ir ao lado do
outro. Mas no fim, depois de muito bate-boca, de muita agitação, tudo
se ajeita, todos estão em seus lugares, aguardando ansiosamente a hora
de sair. Até mesmo um garoto que, por não encontrar lugar em mais
nenhum ônibus, conseguiu se esconder no vão que separa um banco
do outro. Ficou ali, todo encolhido, com a cabeça entre as pernas de
um outro rapaz que o encobria com um casaco, para que o motorista,
atento a qualquer tentativa de um excesso na lotação, não pudesse vê-
lo. Apesar do incômodo, do enorme calor, ele não reclamou e
aguardou paciente e ansiosamente a partida. Finalmente, com um
pequeno atraso, os seis outros ônibus se juntaram ao nosso, com todos
cantando o hino do Botafogo, ‘Cidade Maravilhosa’ e agitando suas
bandeiras fora das janelas. O meu companheiro de banco era um
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