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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
TECNOLOGIA
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Natal, RN
2008
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1
Loreta Melo Bezerra Cavalcanti
Beleza e Poder na Ginástica Rítmica:
reflexões para a Educação Física
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da UFRN, linha de pesquisa
“Estratégia de pensamento e produção do
conhecimento”, como requisito para obtenção do
título de mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Karenine de Oliveira
Porpino.
Natal – RN
Março de 2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
TECNOLOGIA
A comissão abaixo-assinada aprova a dissertação intitulada
Beleza e Poder na Ginástica Rítmica:
reflexões para a Educação Física
Elaborada por
Loreta Melo Bezerra Cavalcanti
Banca examinadora
___________________________________
Profa. Dra. Karenine de Oliveira Porpino (UFRN) - Orientadora
___________________________________
Profa. Dra. Elaine Melo de Brito Costa Lemos (UEPB)
___________________________________
Profa. Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega (UFRN)
___________________________________
Profa. Dra. Larissa Kelly de Oliveira Marques Tibúrcio (UFRN)
Suplente
Natal – RN
Março de 2008
3
Ao meu vovô querido, Pedro Freire (in
memorian), pela vivacidade e amor pela
cultura que o acompanhou até o último
suspiro. Ele se eternizou em nossos
corações e em seus escritos tão sábios.
4
“Depois de algum tempo você descobre
que as pessoas com quem você mais se
importa na vida são tomadas de você
muito depressa (...) Por isto, sempre
devemos deixar as pessoas que amamos
com palavras amorosas, pode ser a última
vez que as vejamos.”
Wiliam Shaekespeare
5
AGRADECIMENTOS
“Os homens esqueceram a verdade,
disse a raposa.
Mas tu não a deves esquecer.
Tu te tornas eternamente responsável
por aquilo que cativas".
Antoine de Saint-Exupéry
Ao longo do processo de elaboração deste trabalho cativei e fui cativada.
Acredito que muitas dessas linhas foram inspiradas por relações e distâncias, casos e
acasos, discussões e silêncios, ambigüidades que se entrelaçaram para
posteriormente nortear nossas reflexões.
No entanto, desde os primeiros traçados, o sentido propulsionador deste
trabalho foi o de compreender o fenômeno da beleza. Esse sentido se projetou como
um filme nos meus pensamentos quando resolvi agradecer às pessoas que me
cativaram, pessoas que comportam o significado deste fenômeno, pessoas belas,
presentes em cada etapa de um dos percursos mais envolventes da minha existência.
A criação e recriação do texto me remetia a vocês, que estiveram comigo nesse
momento tão importante: a gestação dupla, de um filho, Davi, e desta minha filha.
Primeiramente, agradeço a Deus pela força nos momentos difíceis, pelas
alegrias nos momentos de realização, pelas dádivas da vida.
A toda minha família, todos aqueles com os quais mantenho laços de sangue
ou de união, sem exceção, em nome dos meus pais Lourival e Tânia.
Aos meus dois amores: meu pequenino Davi e meu companheiro Alexsandro.
Vocês são meu “porto-seguro”, meu tudo, meu horizonte.
À orientadora querida, Karenine Porpino. Se pudesse resumi-la em uma
palavra seria: SENSIBILIDADE. Espero compartilhar muitos outros momentos com
você, na Academia, na maternidade, na vida! Muito obrigada por tudo, sobretudo
6
pelo carinho nas nossas conversas, por todas as sábias palavras que acalmavam meu
coração em tempos difíceis e fizeram-me aprender muito.
Agradeço às professoras leitoras Petrucia e Larissa pelas contribuições atentas
e desveladoras nos seminários de dissertação, sem seus olhares este trabalho não
teria o mesmo significado. Além disso, não perderei a oportunidade se expressar o
meu carinho e admiração profissional e humana, pois, enquanto uma me inspira
fortaleza, outra me inspira compreensão.
Ao Grupo de Estudos Corpo e Cultura de Movimentos, pela aprendizagem,
amizades, ampliação de olhares, pelo orgulho de participar de um grupo tão
envolvente, comprometido e competente.
Aos amigos da Licenciatura em Educação Física, dignos dessa formação, com
quem compartilho, desde a primeira aula de anatomia, vivências extremamente
significantes da formação acadêmica: Anna Paulla, Analwik, Allyson, Augusto,
Laíse e João Carlos.
Às amigas de infância, as irmãs que escolhi, por toda força, por me provarem,
mesmo sem que eu pedisse, disponibilidade, companheirismo, preocupação, afeto,
carinho, abrigo, respeito, coisas do coração que jamais esquecerei: Aline e família,
Alinne, Andréa, Jeane, Isabelle e Karine.
Ao Grupo Parafolclórico da UFRN, em nome da professora Rita Luzia, pelas
experiências maravilhosas, que se processaram tanto no dia-a-dia com bailarinos e
professores quanto nos palcos. Agradeço também a amizade firmada com alguns
bailarinos, em especial: Rosie Marie, Raquel, Paula, Gevaldo, Molusco e Acácia.
Ao programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN, em nome de todos
os professores e funcionários.
A todos aqueles que de forma direta e indireta contribuíram para a minha
formação e para as idéias deste trabalho.
7
RESUMO
A beleza na Ginástica Rítmica (GR) se esboçou como condição de sua
existência. Para indagá-la tomamos o discurso sobre poder de Foucault (1971, 1979,
1987, 1988, 1997, 2003) e sua relação com a produção de saberes. Com base nessa
compreensão refletimos sobre as relações de poder na GR que se mediaram e
consolidaram pela regulamentação de sua prática, cujo Código de Pontuação tem
papel preponderante. Sendo assim, a GR construiu sua beleza através dos tempos
por meio de jogos de forças em que preponderaram a gestualidade de corpos
performáticos, através da disciplina. Esta configurou sentidos atrelados à coerção-
resistência dos corpos: a produção de discursos. Por isso, pensando a beleza como
uma trama de discursos construídos por essas relações de poder-saber dos
investimentos do corpo na Ginástica Rítmica questionamos: Como o Código de
Pontuação regulamenta a Ginástica Rítmica para a construção da beleza? Qual a
relação entre poderes e saberes implicados nessa regulamentação? Para tanto, temos
como objetivos: Investigar a beleza na Ginástica Rítmica como saber produzido a
partir das relações de poder circunscritas nas regras da modalidade; e, Discutir a
beleza a partir da relação poder/saber como reflexão para o âmbito da Educação
Física. Como recurso metodológico utilizamos a técnica de Análise de Conteúdo
(BARDIN, 1977) para analisar o digo de Pontuação de GR na versão 2005-2008.
Também fizemos uso de imagens de ginastas como recurso analógico para ampliar o
sentido das discussões. A leitura flutuante nos permitiu selecionar unidades
significativas e pautar nossas discussões em três eixos temáticos que compõem o
primeiro capítulo intitulado “A beleza regulamentada”. Neste, discutimos as
especificidades da GR, as prescrições dos usos do tempo e espaço e a configuração
do gesto técnico a partir da análise do Código. No segundo capítulo “O corpo belo
transcende a regra” realizamos algumas reflexões relacionadas à Educação Física,
8
partindo da discussão do capítulo anterior, com enfoque em três tópicos: Poderes e
Saberes, Técnica e Estilo e Beleza e Educação. Constatamos assim, que a beleza da
Ginástica Rítmica contemporânea é permeada pelas suas regulamentações, mas foi e
continua sendo desenhada por mecanismos de poder-saber ao longo de sua
trajetória histórica. Mesmo o Código de Pontuação ditando condições para a beleza
na GR, esta se na possibilidade da criação do estilo próprio pela ginasta, na
possibilidade de viver o improviso e o imprevisto, de sensibilizar o público – porque
o poder cria saberes e o corpo como suplantador, sempre criará novas formas de ser
belo. A constatação de que o Código de Pontuação produz a beleza e a ginasta a
reconstrói, continuamente, reatualizando as regras é uma reflexão importante para a
Educação Física no sentido de reafirmar que o corpo nunca é somente submisso,
pois mesmo na submissão é capaz de produzir saber, ser belo e criar novos sentidos
para a Cultura de Movimento.
Palavras-chave: Ginástica Rítmica, beleza, poder, Educação Física.
9
RÉSUMÉ
La beauté dans la Gymnastique Rythmique (GR) s’est esquissée comme
condition de son existence. Pour son analyse, nous avons eu recourt au discours sur
le pouvoir de Foucault (1971, 1979, 1987, 1988, 1997, 2003) et à sa relation avec la
production de savoirs. Basés sur cette compréhension, nous avons réfléchi sur les
relations de pouvoir dans la GR qui se sont établies et consolidées grâce à la
réglementation de sa pratique, dans lequel le Code de Pointage a un rôle
prépondérant. Ainsi, la GR a construit sa beauté à travers les temps au moyen de
jeux de force la gestualité de corps performatiques, à travers la discipline, a été
prépondérant. Cette dernière a configuré des sens attelés à la coercition-résistence
des corps: la production de discours. C’est en pensant à une beauté comme ume
trame de discours construits par ces relations de pouvoir-savoir des investissements
du corps dans la Gymanstique Rythmique que nous nous posons les questions :
Comment le Code de Pointage réglemente la gymanstique rythmique et sportive au
sujet de la construction de la beauté ? Quelle est la relation entre les pouvoirs et les
savoirs impliqués dans cette réglementation ? Nous avons donc pour objectifs de
rechercher la beauté dans la Gymnastique Rythmique comme savoir produit à partir
des relations du pouvoir circonscrites dans les règles de la modalité et de discuter la
beauté à partir de la relation pouvoir/savoir comme réflexion pour le milieu de
l’éducation physique. Nous avons utilisé comme méthodologie la technique de
l’analyse de contenu (Bardin, 1977) afin d’analyser le Code de Pointage de la GR
dans sa version 2005-2008. Nous avons également fait usage des images de
gymnastes comme moyen analogique pour amplifier le sens des discussions. La
lecture fluctuante nous a permis de sélectionner des unités significatives et
d’organiser nos discussions en trois axes thématiques qui composent le premier
chapitre intitulé « La beauté réglementée ». Dans ce chapitre, nous discutons les
10
spécificités de la GR, la prescription de l’utilisation du temps et de l’espace et la
configuration du geste technique à partir de l’analyse de son code de ponctuation.
Dans le deuxième chapitre, « Le corps beau transcende la règle », nous réalisons
quelques réflexions destinées à l’éducation physique à partir de la discussion du
chapitre antérieur en prenant pour cible trois sujets : Pouvoirs et Savoirs, Technique
et Style, Beauté et Éducation. Nous avons ainsi constaté que la beauté de la
Gymnastique Rythmique contemporaine est entourée par sa réglementation, mais a
été et continue à être dessinée par des mécanismes de pouvoir-savoir tout au long de
sa trajectoire historique. Malgré l’existence de conditions pour la beauté dans le
Code de Pointage de la GR, il existe la possibilité de la création du propre style par
la gymnaste, par la possibilité de vivre l’improvisé et l’imprévu, de sensibiliser le
public, parce que le pouvoir crée des savoirs et le corps, qui se dépasse, créera
toujours de nouvelles formes d’être beau. La constatation que le Code de Pointage
produit une beauté et que la gymnaste la reconstruit continuellement en en
réactualisant les règles est une réflexion importante pour l’éducation physique : elle
réaffirme que le corps n’est jamais seulement soumis, que même dans la soumission
il est capable de produir du savoir, d’ être beau et de créer de nouveaux sens pour la
Culture de Mouvements.
Mot-clef : la Gymnastique Rythmique, la beauté, le pouvoir, l’éducation physique.
11
SUMÁRIO
Lista de imagens 12
Motivações e intenções 15
1 Introdução 19
2 A beleza regulamentada 31
3 O corpo belo transcende a regra 72
4 Considerações finais 103
Referências bibliográficas ___________ 108
Glossário __________ 114
Anexos _________________ _________ 117
12
LISTA DE IMAGENS
Imagem 1 Seleção brasileira de conjuntos de Ginástica Rítmica, série de 3 arcos
e 2 bolas, Jogos Olímpicos de Athenas, 2004, capa.
Imagem 2 Ginasta russa Alina Kabaeva, série de corda, Campeonato Mundial
de Paris 2000, p. 14.
Imagem 3 Ginasta bielorussa Larissa Lukyanenko, série de maças Olimpíadas
de Atlanta, 2000, p. 18.
Imagem 4 Ginasta russa Alina Kabaeva, série de bola, Gran prix de Moscou,
2006, p. 30.
Imagem 5, 6 e 7 Ginasta brasileira Vera Miranda, série com arco, 1972. Ginasta
russa Amina Zaripova. Ginasta russa Olga Kapranova, rie de corda,
Campeonato mundial de Patras, 2007, p. 35.
Imagem 8 e 9 – Conjunto de arcos, Grupo Unido de Ginastas, 1972. Seleção
brasileira de conjunto de GR, Pan-americano do Rio de Janeiro, 2007, p. 37.
Imagem 10 e 11 - Artista do Cirque du Soleil com fita, espetáculo Alegria, ginasta
russa Alina Kabaeva com fita no mundial de Budapeste, 2003, p. 40.
Imagem 12 Ginasta brasileira Larissa Barata, série de fita no Pan-americano de
Santo Domingo, 2005, p. 43.
Imagem 13 Conjunto ucraniano, série de cinco pares de maças, Campeonato
Europeu, 2001. p. 45.
Imagem 14 - Conjunto de Fitas, China, p. 46.
Imagem 15 – Seleção brasileira de conjunto, série de arco e maças no Campeonato
mundial de Patras, 2007, p. 47.
Imagem 16 e 17 Seleções ucranianas de conjunto, série de 5 cordas e série de 5
arcos nos campeonatos europeus de 2001 e 2003, respectivamente, p. 50.
13
Imagem 18 Ginasta búlgara Maria Petrova, série de arco, Campeonato Mundial
de Paris, 1994, p. 54.
Imagem 19 – Ginasta russa Irina Tchachina – série de arco, 2004, p. 56.
Imagem 20 e 21 GUG, conjunto de bola, Rio de Janeiro, 1972, e, Seleção
brasileira de conjunto, série de arco e maças, Campeonato Mundial de Baku.
2005, p. 58.
Imagem 22 – Ginasta com fita, p. 60.
Imagens 23 e 24 Bailarina de Ballet Clássico executando um grand jeté e ginasta,
série de bola, p. 61.
Imagem 25 Ginasta ucraniana Elena Vitrichenko, série de bola, Jogos Olímpicos
de Atlanta, 1996, p. 62.
Imagem 26 Ginasta búlgara Teodora Alexandrova, série de bola, Campeonato
Mundial de Osaka, 1999, p. 67.
Imagem 27 - Seleção brasileira de conjunto, série de 5 fitas, Jogos Olímpicos de
Sydney, 2000, p. 69.
Imagem 28 – Ginasta espanhola Almudena Cid, série de maças, p. 71.
Imagens 29 e 30 Ginasta, série de bola. Ginasta ucraniana Anna Bessonova,
série de fita, 2006, p. 76.
Imagens 31 e 32 Ginasta soviética Marina Lobatch, série de fita. Ginasta búlgara
Iliana Raéva, série de bola. Década de 1980, p. 81.
Imagem 33 Ginasta ucraniana Ana Bessonova, série de arco no mundial de
Budapeste em 2003, p. 84.
Imagem 34 Ginasta russa Alina Kabaeva, série de arco, mundial de Budapeste,
2003, p. 85.
Imagem 35 Seleção brasileira de conjunto, série de 5 pares de
maças,Campeonato dos 4 continentes, Curitiba, 2003, p. 98.
Imagem 36 – Ginasta russa Amina Zaripova, série de bola, p. 103.
14
MOTIVAÇÕES E
INTENÇÕES
15
Construir essa dissertação significou mais que a escrita de um trabalho
acadêmico, trata-se da expressão de muitos sentidos no percurso de uma vida, pois
para mim, a Ginástica Rítmica (GR) exprime algo que determinou grande parcela de
minhas escolhas.
Na infância vivi a GR sem esse nome, nas brincadeiras de corda, bola,
bambolê, nas brincadeiras com um corpo coincidentemente flexível, nas
apresentações com minhas amigas. Não havia preocupação em denominar aquela
prática, nem precisava ter, ora era circo, ora era dança, ora era ginástica.
O início da adolescência foi marcado pela prática da Ginástica Rítmica
Desportiva
1
, que definitivamente me enfeitiçou. Seria possível que algo pudesse
resumir tão bem todos os meus sonhos, todos os meus brinquedos? Parecia que ia
transbordar de tanto encantamento, eu não pensava em mais nada! Treinava GR na
escola, mas brincava em casa e na rua, qualquer objeto se transformava em aparelho,
qualquer música servia para montar apresentações.
Porém, o meu prazer esvaía-se na medida em que a competitividade aparecia.
Enquanto as apresentações eram motivadoras, as competições eram catastróficas. Os
conflitos de um corpo de ginasta que jamais chegaria ao podium eram cruéis. Os
traumas passaram e foram se transformando numa enorme vontade de buscar. Hoje,
adulta, sinto o desejo de resgatar os primeiros sentidos da GR em minha vida e de
repensar os sentidos seguintes.
Entretanto, tenho consciência de que os acontecimentos nos contextos citados
é que geraram pensamentos de busca por outras significações na GR, e vieram como
1
Nomenclatura da Ginástica Rítmica até a década de 1990.
16
tentativa de sobrepujar as angústias (paradoxalmente não maiores que as alegrias)
diante das vivências nos mais diferentes setores da modalidade: ginasta na escola,
árbitra de linha, secretária de arbitragem, árbitra regional e nacional, chefe de
delegação em equipe de campeonato brasileiro, técnica esportiva, professora da rede
particular de ensino, diretora técnica da Federação Norte-riograndense de Ginástica
e, finalmente, pesquisadora e professora da rede estadual de ensino. Além da
pretensão de verticalizar estudos propulsionados pelo trabalho final da licenciatura
em Educação Física, a monografia intitulada: Ginástica Rítmica, Corpo e Estética:
elementos para pensar o esporte na escola, orientada pela professora Dra Petrucia
Nóbrega. Naquela oportunidade, investigamos as compreensões sobre corpo e
estética na GR, bem como, suas implicações em âmbito escolar, partindo da análise
de imagens e de entrevistas de ginastas escolares, refletindo acerca dessas
implicações e buscando articular alternativas pedagógicas para a abordagem do
corpo e da estética na GR enquanto conteúdo da Educação Física Escolar
(CAVALCANTI, 2005).
As angústias, suscitadas anteriormente, maquiaram-se de esperanças, e
depois, metamorfosearam-se em vontades, em perspectivas, em pensamentos, em
buscas e em esperanças ainda maiores. A paixão arrebatadora que cultivo pela
Ginástica Rítmica obriga-me a pensá-la numa grandeza maior do que a da simples
apreciação de um espetáculo ou a cópia desse espetáculo para quaisquer contexto.
Creio nessa manifestação como capaz de prover intensas contribuições à Educação
Física. Educação para o desafio, a criatividade, a beleza, a emoção, a sensibilidade,
para o ser humano que sente, quer sentir, atribui importância a esse sentir, e que
pode ser capaz de mirar criticamente o dilúvio de dados que chega a ele numa
contemporaneidade abarrotada de informações.
Mais do que a pretensão de firmar um projeto de vida, a pós-graduação em
Educação nos faz nadar contentemente contra uma maré de ressaca, nos faz sonhar,
sonhar com o dia em que as pesquisas realizadas na academia chegarão à escola, e
17
mesmo não havendo uma semente efetivamente plantada, que se prepare a terra!
Para que, dali a alguns anos, esta possa estar fértil ao invés de desértica, revigorada
e acreditada para já se permitir receber mudas.
Mudas de uma Educação que assuma sua condição de ordem perceptiva, cuja
é matriz corporal, una nas linguagens racionais e sensíveis (NÓBREGA, 2000)
almejamos regar para a Educação Física, sementes plantadas por inúmeros
estudiosos da área, mas que neste estudo enfoca a análise da percepção da beleza na
GR, motivo pelo qual dedicamos esse trabalho, norteado para um acesso vivo ao
nosso sonho maior: uma Educação crítica e justa para todos.
18
1INTRODUÇÃO
19
Ginástica: denominação primeira das práticas corporais sistematizadas,
desvelou-se em gestos e apropriou-se de linguagens, passando a intitular-se
Educação Física, aos tempos e aos poucos desenhou seus próprios feitios.
Abarcando uma enorme gama de práticas corporais, o termo
Ginástica, pertence ao gênero feminino, de designação feminina, e
historicamente se constrói a partir de atributos culturalmente
definidos como masculinos: força, agilidade, virilidade,
energia/têmpera de caráter, entre outros, passa a compreender
diferentes práticas corporais. São exercícios militares de preparação
para a guerra, são jogos populares e da nobreza, acrobacias, saltos,
corridas, equitação, esgrima, danças e canto (SOARES, 1998, p. 20).
Com trajetória histórica plantada no Movimento Ginástico Europeu do século
XIX e alicerces delineados de forma complexa, assim como o curso de qualquer
conhecimento produzido pelo ser humano através dos tempos, a ginástica criou
galhos, folhas e floresceu. A prática ginástica criada no intuito de ser a mais bela das
flores denominou-se Ginástica Moderna (GM), depois Ginástica Rítmica Desportiva
(GRD), hoje, Ginástica Rítmica. Essa “orquídea” germinou como um presente às
mulheres, buscando enaltecer seus valores tidos como mais femininos, sua
gestualidade, seus movimentos “naturais
2
”. Conforme o desenrolar do século XX,
2
Os movimentos naturais desconsideram os aspectos histórico-culturais inerentes ao se
movimentar. A concepção positivista da ciência do século XVII ao XIX tinha o homem como
ser biológico, produtivo para as forças de trabalho. Essas concepções influenciaram e
influenciam a Educação Física até hoje (SOARES, 2001). Por sua vez, também são alvo de
críticas em diversas abordagens históricas e pedagógicas da nossa área (SOARES, 1998;
2001;COLETIVO DE AUTORES, 1992; KUNZ, 2004 etc.).
20
essa prática necessitava de adornos que exaltassem seus movimentos e admitissem
novas propriedades para ilustrar o seu surgimento. E, surgem os aparelhos
portáteis, apanhados das brincadeiras de rua: corda, arco e bola, seguidos dos pares
de maças e da etérea fita, enquanto continua a galante caminhada. Que sinuosidades
percorreriam a Ginástica Rítmica?
A preocupação outrora centrada na formação educativa de mulheres
delicadas e procriadoras, adjetivadas como “naturalmente” belas, transformou-se,
no percorrer do século XX, numa busca multifacetada pela perfeição técnica. A
construção de qualidades como exuberância, graciosidade e provocações de encanto
dos corpos e movimentos formativos das moças desbravadoras da Ginástica
Moderna seriam, em porções dosadas inicialmente (até meados da década de 1950),
e em tempestades de mudanças conforme a esportivização, sendo permutados pela
construção de mais exuberâncias, mais graciosidades, e de ainda mais encantos,
associados desta vez a específicos padrões corporais e de movimento pautados pelas
performances dos corpos. A beleza da GR teimou em quantificar-se, categorizar-se,
pormenorizar-se em décimos e centésimos de pontos impreteríveis para o sonho da
medalha dourada. A beleza preexistente, objetivo primeiro a ser contemplado nesta
prática, persistiu, tornando-se critério de julgamento.
Nessa perspectiva de transformações, consideramos que os caminhos da
beleza na GR esboçaram uma construção de relações de poder-saber, pois se
constituíram a partir dos mecanismos de coerção-resistência dos corpos ante os
objetivos pedagógicos e militares primordiais e as regulamentações esportivas. É
preciso então refletirmos sobre a forma com que incidem-se essas relações de poder-
saber que balizam a compreensão da GR como prática fadada à beleza e quais os
discursos que enxertam e constroem esse entendimento.
Tomamos algumas das reflexões sobre poder de Foucault (1971, 1979, 1987,
1988, 1997, 2003) e sua relação com a produção de saberes, pois acreditamos na
perspectiva de uma intervenção corporal que não acontece flutuando em um plano
21
ideológico, que o poder não é dado em hierarquia, de cima para baixo, do detentor
para os detentos, pois todos somos ao mesmo tempo “vítimas” e “réus” das relações
de poder, delas nos inteiramos em proporções diferenciadas. Ou seja, o poder se
inscreve no corpo, que o denuncia e ao mesmo tempo o exerce.
Tecendo uma crítica às análises marxistas, cujo entendimento do poder
privilegia sua condição ideológica, Foucault (1979, p. 147-148) esclarece:
Na verdade, nada é mais material, nada é mais físico, mais corporal
que o exercício do poder... Qual é o tipo de investimento do corpo
que é necessário e suficiente ao funcionamento de uma sociedade
capitalista como a nossa? Eu penso que, do século XVII ao início do
século XIX, acreditou-se que o investimento do corpo pelo poder
devia ser denso, rígido, constante, meticuloso. Daí esses terríveis
regimes disciplinares que se encontram nas escolas, nos hospitais,
nas casernas, nas oficinas, nas cidades, nos edifícios, nas famílias...
Foucault (1979) nos clarifica, explicitando que o poder está disseminado na
sociedade, nas várias relações, pois quem se sujeita não é sempre submisso, produz
poder também. Ressalvamos que as observações sobre poder foucaultianas, não são
argüidas de concepções maniqueístas, ocorrem em uma rede complexa nas relações
sociais, não sendo possível aferir com nitidez seus benefícios ou malefícios.
É no corpo onde ocorrem os controles da sociedade, as relações de poder, não
por ideologias “sobrevoantes” (FOUCAULT, 1979), mas por um discurso visceral,
que adequa, expande, endireita, amplia, poda e produz conhecimento.
O corpo, tornando-se alvo dos novos mecanismos de poder, oferece-
se a novas formas de saber. Corpo do exercício mais do que da física
especulativa; corpo manipulado pela autoridade mais do que
atravessado pelos espíritos animais; corpo de treinamento útil e não
da mecânica racional, mas no qual por essa mesma razão se
anunciará um certo número de exigências de natureza e de
limitações regionais (FOUCAULT, 1987, p. 132).
22
Portanto, o campo de incidência e projeção do poder é o corpo. As pedagogias
corporais, por sua vez, são as práticas sociais, históricas e datadas que são
responsáveis por produzir os sentimentos, as aparências e a fisiologia dos nossos
corpos.
O corpo é resultado provisório de diversas pedagogias que o
conformam em determinadas épocas. É marcado e distinto muito
mais pela cultura do que por uma presumível essência natural.
Adquire diferentes sentidos no momento em que é investido por um
poder regulador que o ajusta em seus menores detalhes, impondo
limitações, autorizações e obrigações, para além de sua condição
fisiológica, um poder que não emana de nenhuma instituição ou
indivíduo ou muito menos se estabelece pelo uso da força, mas sim
pela sutileza de sua presença nas práticas corporais da vida
cotidiana (FRAGA, 1999, p. 213).
Assim, as pedagogias corporais correspondem às formas com que os seres
humanos paulatinamente esculpem os gestos através dos tempos, culminando numa
composição constante e inacabada da cultura de movimento. Tomamos aqui o termo
Cultura de Movimento como “conceito que expressa diferentes compreensões e usos
do corpo em uma determinada cultura ou sociedade” (NÓBREGA, 2003, p. 134), e
como forma de entendermos a Ginástica Rítmica em suas interconexões com a
história, os costumes, as necessidades humanas e as crenças de um determinado
povo.
As técnicas de exercício do poder que nortearam os conhecimentos do corpo
voltado a si mesmo foram as disciplinas (FOUCAULT, 1987). Estas configuraram
sentidos atrelados à coerção-resistência dos corpos: a produção de discursos.
Pensamos a beleza a partir da trama de discursos construídos pelas relações de
saber-poder dos investimentos do corpo na ginástica.
Para aferir o quão um discurso é penetrado na vida social é preciso observar a
naturalidade com que ocorre sua inscrição nos corpos, pois quanto mais natural,
mais seus efeitos são imperceptíveis e maior é sua força do ponto de vista do
23
mecanismo de poder que o induziu (FRAGA, 2000). Tal fato abre a perspectiva para
pensarmos os efeitos do poder na forma com que percebemos a beleza, pois
concepções que norteiam nossos “gostos” e não nos damos conta disso. A GR, por
exemplo, é uma modalidade que nasceu para ser bela, beleza pré-concebida, e assim
segue seu dever. A beleza é uma condição, está posta, é “natural” à GR, mesmo que
o termo nem sempre esteja explicitado nos seus diversos discursos.
Consideramos que o exercício notoriamente corporal do poder é evidenciado
de forma material pela constituição das regulamentações esportivas. No âmbito da
Ginástica Rítmica, a construção do Código de Pontuação, documento que determina
as regras da modalidade no mundo, procede de uma observação minuciosa de um
grupo de sete senhoras (denominadas madames), dedicadas à ginástica,
componentes do comitê técnico da Federação Internacional de Ginástica (FIG). Estas
o revisam periodicamente avaliando e reatualizando as regras da modalidade de
acordo com as necessidades e níveis das performances das ginastas.
Com base na compreensão de poder foucaultiana passamos a refletir sobre as
relações de poder na GR, sendo estas mediadas e consolidadas pela regulamentação
de sua prática. E, imersa nessas relações de poder, cujo Código de Pontuação tem
papel preponderante, a GR, através dos tempos, legitimou a beleza como resultado
de jogos de forças em que preponderam os corpos performáticos, corpos que podem
sempre mais.
A partir dessas compreensões, questionamos: Como o Código de Pontuação
regulamenta a Ginástica Rítmica para a construção da beleza? Qual a relação entre
poderes e saberes implicados nessa regulamentação?
Com base nas questões supracitadas temos como objetivos investigar a beleza
na Ginástica Rítmica a partir das relações de poder circunscritas nas regras da
modalidade, refletir sobre as relações entre poderes e saberes na GR, tendo o corpo
como produto e produtor da beleza, bem como, discutir implicações dessas reflexões
para o âmbito da Educação Física.
24
A tarefa de nos determos a este âmbito da GR, em que buscamos desvendar e
questionar a sua constituição estética com fins de reflexões para a Educação Física é
algo recente para as produções que versam sobre essa manifestação. Buscamos, nas
linhas que se seguem, situar algumas dessas referências da GR no Brasil.
As primeiras obras que versam sobre a Ginástica Feminina Moderna no Brasil
datam da década de 70, e uniformemente expressam preocupações com os aspectos
formativos da mulher da época: Saur (1970), Peuker (1974 e 1976), Pallarés (1979).
Constatamos a preocupação com o belo nessas referências, entretanto, a beleza
evidenciada não continha o caráter útil da técnica esportivizada, visava sim, o
desenvolvimento do corpo da mulher a partir de seus movimentos belos
“naturalmente”.
Na década de 80 as obras de GR, respaldadas pela esportivização da
Educação Física vigente no Brasil, assumem características de “manuais de
exercícios”, submissas às regras determinadas pelos Códigos de Pontuação: Vieira
(1972), São Paulo (1980), Bizzochi e Guimarães (1985), Bott (1986), Róbeva (1981).
Com este fenômeno, inicia-se a evocação do belo útil, quantitativo. Executa-se
determinado movimento para atingir, de forma laqueada, um padrão de
movimento, que por sua vez é belo, porque alcança um modelo pré-estabelecido, e
que é quantificado.
A GR da década de 90, em suas produções, permanece com as características
da década anterior, com algumas expansões voltadas à ginástica escolar, a exemplo
das obras de Gaio (1996) e de Pereira (1999). Todavia, com espectros evidentes do
Código de Pontuação como basilar referência.
Uma das mais importantes obras nacionais trata sobre o treinamento de alto
rendimento da GR. Em Laffranchi (2001) a beleza utilitarista não se basta, os
exercícios, além de se encaixarem em moldes, precisam ser executados sem falhas. O
belo atrela-se a todo o processo de treinamento, ou seja, aos usos do corpo neste
esporte, da coreografia às preparações. A autora arquiteta o caminho da beleza,
25
conseqüentemente do sucesso, nos campeonatos, através de vias metrificadas, nas
quais todos os domínios (cognitivo, motor, afetivo etc) e preparações (física, técnica,
tática e psicológica) devem estar milimetricamente previstos. A beleza é produto de
um trabalho árduo.
Diante da reflexão sobre as referências
3
supracitadas, nos colocamos o desafio
de ampliar as produções que versam sobre GR para além das abordagens que
enfocam o aperfeiçoamento técnico centrados nos modelos de beleza pré-codificados
no âmbito do esporte de alto rendimento.
Nessa perspectiva evidenciamos outras publicações, a exemplo dos estudos
de Porpino (2003, 2004) que em um dos seus artigos realça a estética através de uma
abordagem epistemológica, discutindo as interfaces entre corpo e estética no
contexto da Educação Física; e refletindo sobre a estética no treinamento da GR,
enquanto produto e processo através da análise de um vídeo que retrata a rotina
diária de treinamento da Seleção brasileira de conjuntos em outro artigo.
A investigação proposta neste trabalho questiona algo que se supõe inerente à
GR a beleza para desvendar algumas das implicações que se escondem nesse
conceito e possibilitar sua crítica. No sentido de ampliar os estudos que investigam
3
Investigamos o Núcleo Brasileiro de Teses e Dissertações (NUTESES), ambicionando
localizar mais publicações que abordassem a Ginástica Rítmica. Encontramos onze
dissertações, das quais, quatro tratam da GR em sua abordagem pedagógica: Antunes
(1991), Alonso (1990), Tibeau (1988) e Pereira (2003), enquanto que as demais tratam dos
aspectos técnicos e performáticos. Contudo, Vieira (1989) trata da expressão, enfatizando o
caráter cênico da GR, sendo assim, a única das onze que trata a GR considerando sua
abordagem artística. No Banco de teses da CAPES, encontramos quinze dissertações, e uma
tese sobre GR, as que tratavam da perspectiva pedagógica somavam cinco, incluindo a tese:
Alonso (1990), Pereira (2003), Segura (2004), Gaio (1994) e Alonso (2003). Das outras, oito
tratavam de aspectos técnicos, tais como performance, música-movimento, julgamento etc,
duas tratavam de aspectos históricos e uma refletia sobre a GR no ensino superior. Em
relação aos aspectos estéticos da modalidade, Santos (2004) faz um estudo sobre os
processos de composição coreográfica na GR, da importância do respeito à individualidade
da atleta, através do trabalho em conjunto: técnica e ginasta. Já Rossete, em sua dissertação
sobre o julgamento da GR, aponta para o fato de que os problemas de julgamento são dados
pela subjetividade do esporte, pelo seu forte ligamento a arte.
26
especificidades estéticas, a exemplo das referências citadas anteriormente, pensamos
que podemos contribuir para fomentar reflexões dessa natureza não somente com
relação à GR, mas na Educação Física, campo de intervenção pedagógica tão
representativo no que se refere à valorização de modelos de rendimento e de beleza
nem sempre questionados e contextualizados.
Com efeito, esta pesquisa dá continuidade a outras pesquisas que já têm como
enfoque Foucault e sua compreensão de intervenção corporal do poder. Portanto,
contribui para uma reflexão sobre o corpo não apenas submisso, que não
sucumbe à regra, mas é capaz de recriá-la, de produzir saberes a partir dela.
Partimos, agora, para o nosso percurso metodológico, ou seja, os caminhos de
elaboração do nosso trabalho.
PERCURSO METODOLÓGICO
Com a ânsia de entremear os sentidos requeridos pelas linhas anteriores: as
relações saber-poder que definem a construção da beleza na GR, buscamos
inaugurar nosso olhar mais atento, desbravando sentidos e entrelinhas através da
análise das regulamentações da Ginástica Rítmica contemporânea.
Trilhar caminhos para discutir o belo nessa manifestação ginástica nos
motivou a analisar o instrumento mais emblemático de persuasão do corpo da
ginasta: o Código de Pontuação. Assim, o delimitamos como corpus de análise em
sua última versão referente ao período mais atual, o ciclo 2005 – 2008, o qual recebeu
a última revisão no início de 2007.
O Código de Pontuação acompanhou a esportivização da GR no início da
década de 1970, quando a FIG publicou sua primeira versão. A segunda só foi
revisada em 1977, vigorando em 1978, e foi revisada mais uma vez em 1982. Em
1984, o esporte foi incluso nos Jogos Olímpicos de em Seul, dessa forma, a cada ciclo
27
olímpico (Llobet, 1996), as regras da Ginástica Rítmica são (re) visitadas na íntegra,
acometendo por vezes em mudanças estruturais tão abruptas que modificam não
as composições das coreografias, mas também a estrutura de treinamento de todas
as equipes do mundo.
Na versão atual, o Código, em suas mais de cem páginas, subdivide-se em
quatro partes principais: As Generalidades, parte na qual as regras da GR
sistematizam elementos gerais de uma competição de GR; Os Exercícios Individuais,
compreendem as definições dos parâmetros Execução, Artístico e Dificuldade; A
terceira parte discorre sobre os Exercícios de Conjunto, englobando todos os aspectos
abordados anteriormente acrescidos das particularidades dessa vertente da GR; e a
última diz respeito à simbologia necessária ao julgamento.
Optamos por compreender os mecanismos que balizam a constituição da
beleza na GR através de Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977), que se caracteriza
como uma técnica na qual retiram-se indicadores e fazem-se inferências, buscando o
não-dito, o latente, o aparente e não aparente nas mensagens, supondo elementos
objetivos e subjetivos. Consideramos esse não-dito a forma com que o Código é
capaz de interferir na construção da beleza, embora não encontremos essa palavra
nas regras impressas, o Código é capaz de garantir muitos ajustamentos estéticos na
GR.
A Análise de Conteúdo é aplicável a discursos diversificados, uma
hermenêutica controlada baseada na dedução, sua interpretação deve oscilar entre o
rigor da objetividade e a fertilidade da subjetividade. Apelar para esta técnica de
análise é ao mesmo tempo negar as transparências dos fatos sociais e afastar-se das
compreensões espontâneas, perpassando dois pólos: a ultrapassagem da incerteza,
numa verificação prudente e o enriquecimento da leitura, numa interpretação
cuidadosa (BARDIN, 1977). Nas palavras da autora, a Análise de Conteúdo consiste
em:
28
Um conjunto de técnicas de análise visando obter, por
procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam
inferências de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens
(BARDIN, 1977, p. 42).
A leitura flutuante nos permitiu perceber os ditames da beleza em diversas
partes do Código e intuir que seria possível praticar uma análise temática. O passo
seguinte foi a seleção de trechos que contivessem prescrições diretas ou indiretas
sobre elementos que caracterizassem a beleza na GR, apesar de reconhecermos que
as partes analisadas não se referem diretamente à beleza. A partir dos trechos
contemplados, as unidades de registro temático, elaboramos os núcleos de sentido,
ou seja, interpretações que justificam, explicam e identificam mais claramente a
utilização dos trechos. Para organizar essa análise, elaboramos fichas de conteúdo
subdivididas de acordo com as partes do próprio Código, considerando a presença
dessas prescrições no texto.
Durante esse processo, agrupamos núcleos de sentido em três eixos temáticos:
“As especificidades da ginástica”, “Os usos do tempo e espaço” e “A configuração
do gesto técnico”. A partir desses eixos buscamos conduzir toda a análise sobre a
beleza na GR, pautando-nos nas relações de poder-saber. Porém, é preciso explicitar
que a separação dos eixos ocorre apenas do ponto de vista didático, para facilitar e
tornar mais compreensível as análises, pois encontramos diversas intersecções e
pontos em comum, discutíveis por mais de um eixo.
Complementamos a análise do digo com o recurso analógico das imagens
de ginastas, a fim de buscar dados que pudessem descortinar significados estéticos.
Ao mencionarmos a apreciação estética das fotografias, nos ativemos ao olhar da
experiência estética que compõe inevitavelmente essa ação. Pensamos ainda na
extração de significados, num olhar minucioso e entrelaçado às palavras dos textos.
Uma apreciação imbuída de uma concepção de mundo, interpretação do objeto
29
sensível no contexto dos tempos atuais, capaz de se (re) significar no presente
(VIEIRA, 2005).
As imagens serviram para municiar-nos com maiores perspectivas contatos
sensíveis com nossos estudos. Analisamos as fotografias buscando um olhar que
abarcasse não o mais apariscente, mas tentando extrair significados expressos nos
textos do digo. Após uma apreciação inicial, uma leitura de exercício de
identificação, a fotografia admite a interpretação resultante de um esforço analítico,
dedutivo e comparativo. “O texto verbal e o visual são polissêmicos e
complementares, sendo cada um mais adequado a determinadas utilizações”
(LEITE, 1998, p. 43). Assim, foi possível vislumbrar a materialização das regras e
suas rupturas pelo entrecruzamento das informações textuais e imagéticas.
A dissertação está estruturada em dois capítulos: no primeiro intitulado “A
beleza regulamentada” discutimos as especificidades da GR, as prescrições dos usos
do tempo e espaço e a configuração do gesto técnico a partir da análise do Código de
Pontuação da Ginástica Rítmica. No segundo capítulo “O corpo belo transcende a
regra” realizamos algumas reflexões relacionadas à Educação Física, partindo da
discussão do capítulo anterior com enfoque em três tópicos: Saberes e Poderes,
Técnica e Estilo e Beleza e Educação.
30
2A BELEZA
REGULAMENTADA
31
AS ESPECIFICIDADES DA GINÁSTICA RÍTMICA
Na Análise de Conteúdo do digo de Pontuação, compreendemos como
aspecto marcante as delimitações sobre suas especificidades, aspectos que fazem a
GR ser GR e não outra prática.
Tomamos como especificidades alguns elementos aparentes no texto do
Código de Pontuação que a caracterizam como essa manifestação que conhecemos e
compactuam para garantir sua beleza. Características próprias que guardam em si
algumas afinidades com a dança e outras manifestações ginásticas, mas não se
confundem com ela. Assim destacamos: o julgamento, os aparelhos, a música, a
vestimenta, a eminente espetacularização, o princípio de coletividade dos conjuntos,
os movimentos autorizados e não-autorizados do corpo e dos aparelhos, a constante
recriação, o discurso motor unitário do exercício, a criação coreográfica direcionada.
Para que os aspectos apresentados fossem se constituindo, a Ginástica
Rítmica percorreu uma trilha norteada pela sua mais emblemática vertente: a
estética. Esta, sempre foi contemplada na ginástica, carregada pela disciplina
coercitiva dos corpos (FOUCAULT, 1979), pela retidão, pela higiene, pela harmonia
de formas, pela simetria. Por um conjunto de prescrições necessárias para se extrair
um resultado esperado, para produzir, através do corpo um conhecimento sobre ele
mesmo. A produção da beleza teve, sobretudo, a ingerência artística como
fundamento para sua criação, a exemplo da dança, do teatro e da música.
Com isso, temos uma ginástica que se pauta no modelo, mas se afirmou nas
concepções da Arte Moderna, movimento em que os modelos são criticados; se
32
pautou na expressão do sexo feminino, mas procria diferenciações entre os sexos; se
pautou na beleza dos movimentos naturais, mas se afirma na performance enquanto
categoria dessa beleza. Caráter ambíguo, como o poder expresso por Foucault
(1979), que ao mesmo tempo em que se exerce, cria mecanismos de fuga, cria um
contra-poder.
Esse caráter ambíguo do poder pode ser percebido na organização do
julgamento da GR, que é um ponto que especifica sua prática e garante sua beleza. O
julgamento ocorre da seguinte maneira: dois grupos de juízes avaliam a Composição
do exercício, vislumbrando a forma com que a coreografia da ginasta foi construída,
tanto de maneira mais quantitativa, no caso do parâmetro Dificuldade, quanto de
forma mais quantitativa e qualitativa, no caso do Artístico. O terceiro parâmetro, a
Execução, avalia a qualidade com que a ginasta demonstra a sua composição, embora
o aspecto qualitativo seja extremamente preponderante nos três parâmetros (FIG,
2007).
Apesar de a banca de Execução julgar através de um grupo de quatro árbitros
e a banca de Composição julgar através de dois grupos (Artístico e Dificuldade), os
pesos são iguais. Isso ocorre pela dificuldade que é apresentada em se julgar
parâmetros dependentes da subjetividade humana, tais como a criação e a beleza
coreográfica, a interpretação da série pela ginasta, e a identidade fornecida pelo
gesto. Por isso, oito árbitros se preocupam com uma metade da nota, enquanto
apenas quatro com a outra metade.
Nos Torneios internacionais, deve haver um juiz superior que não participa
efetivamente do júri para esclarecer possíveis dúvidas de julgamento (FIG, 2007).
Isso mostra que mesmo o olhar direcionado de 13 pessoas atentas pode não dar
conta de um julgamento “justo”, sendo necessária a presença de um árbitro
renomado e experiente que possui uma sensibilidade mais “trabalhada” e que
enxergue com mais afinco a performance ginástica.
33
Da pontuação do parâmetro Artístico, que pode atingir até 10 pontos, 7 são
destinados às Características Artísticas Particulares (CAPs), bonificações específicas
que devem ser prescritas numa ficha através de símbolos para que o árbitro possa
verificar e avaliar as CAPs válidas (FIG, 2007). de se observar que mesmo os
árbitros de Artístico, realizam seu julgamento da série por padrões
predominantemente fechados. A subjetividade do olhar parece perpassar somente a
validez do exercício que especifica a beleza de tal, já que a relação de reciprocidade
entre sujeito e objeto é impossível de ser prescrita em um código de 100 páginas.
Entretanto, o julgamento fundamentado na modelização não é uma
característica que decorre o momento competitivo, ocorre em todo processo de
aquisição da forma esportiva, em todo o processo de inserção da menina ao universo
ginástico, através de uma sistematização própria. O olhar que julga, surge na escolha
de campeãs, perpassa as quadras de treino e culmina nos campeonatos. O primeiro
se dá através da adequação ao modelo, o segundo pela disciplinarização desse
corpo, o olhar que cobra e molda e o terceiro por uma infinidade de olhares,
apreciadores e julgadores.
Essa trama de inspeções nos remete ao sistema de registros permanentes
exposto por Foucault (1987), os quais alicerçavam o controle das cidades
pestinolentas no fim do século XVII. Uma vigilância constante, medida e obstinada
que compreendia todos os espaços das cidades, do micro ao macro, das casas às
ruas, determinações e isolamentos determinados de cima para baixo.
Esse espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos,
onde os indivíduos estão inseridos num lugar fixo, onde os menores
movimentos são controlados, onde todos os acontecimentos são
registrados, onde um trabalho ininterrupto de escrita liga o centro e
a periferia, onde o poder é exercido sem divisão, segundo uma
figura hierárquica e contínua, onde cada indivíduo é constantemente
localizado, examinado e distribuído entre os vivos, os doentes e os
mortos – isso tudo constitui um modelo compacto do dispositivo
disciplinar (FOUCAULT, 1987, p. 163).
34
Esse dispositivo disciplinar é caracterizado por Foucault (1987, p. 169) como
nicho onde o poder se torna presente e visível em toda parte “inventa novas
engrenagens; compartimenta, imobiliza, quadricula”.
O processo pelo qual a ginasta é julgada passa pela semelhança do dispositivo
disciplinar assinalado por Foucault, por compreender justamente duas das
características básicas do mecanismo disciplinar: a vigilância e o registro
(FOUCAULT, 1979).
A disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os sistemas de
poder vão ter por alvo e resultado os indivíduos em sua
singularidade. É o poder de individualização que tem o exame como
instrumento fundamental. O exame é a vigilância permanente,
classificatória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-
los, localizá-los e, por conseguinte, utilizá-los ao máximo
(FOUCAULT , 1979, p. 107).
A Ciência do Treinamento Esportivo compele uma periodização do
treinamento da ginasta determinando períodos, ciclos, horários, quantidades,
intensidades, testes e intervalos (LAFFRANCHI, 2001), que são devidamente
registrados a cada dia e avaliados através de gráficos. Sendo assim, ao passar do
estado de treinamento para o competitivo, os registros continuam, e, ao sair da
quadra após uma apresentação, a ginasta terá todo o mapeamento dos seus
movimentos descritos nas fichas de avaliação da arbitragem.
Outro aspecto que caracteriza a GR são as relações corpo/aparelhos. A ligação
entre estes e a ginasta deve expressar-se desde a posição de início do exercício,
evitando ao máximo que corpo e objeto, foco da série, estejam separados. O sentido
de uma coreografia de GR é dado pela íntima junção música/ginasta/aparelho,
portanto, é preciso que o público e, principalmente, os árbitros possam enxergar um
só (FIG, 2007).
Essa dependência com a música distingue a GR, e a diferencia das outras
modalidades ginásticas. É bela a ginasta e a série que conseguem conciliar
35
perfeitamente música e movimentos, visto que, os movimentos de um exercício de
GR estão presos aos ditames da rítmica e a ginasta pode se expressar a partir de
sua música. Diferente de alguns espetáculos de Dança Contemporânea, por
exemplo, em que a música pode servir apenas como “pano de fundo” ou inexistir.
As malhas ginásticas também delimitam características próprias, dependentes
do vislumbre dos exercícios pelos árbitros e público, como também das
possibilidades de variação criativa das formas. É possível adequar uma infinidade
de modelos e cores ao gosto e às características da coreografia. As transformações
das vestimentas ginásticas denunciam a espetacularização dos exercícios, que cada
vez mais solicitam a atenção do público. Acreditamos que a otimização dos
ornamentos (lantejoulas, paetês, vidrilhos, strass etc), inserção da saia e permissão
de tecidos brilhosos, transparentes e de várias texturas, corroboraram para uma
maior visibilidade da GR, inclusive nos meios de comunicação, com o passar dos
tempos.
Nas fotografias a seguir temos ginastas das décadas de 1970, 1990 e 2000. A
utilização da malha tradicional com pernas à mostra e mangas compridas expandiu
para utilização de malhas compridas e depois com a superlativação de enfeites nas
malhas, bordadas e brilhosas; maquiagens e aparelhos mais enfeitados, fatores que
também exprimem a espetacularização da GR.
Imagens 5, 6 e 7 - As transformações das malhas ginásticas – Décadas de 1970, 1990 e 2000.
36
Apesar da espetacularização da GR na atualidade alcançar maiores
proporções, o cunho espetacular desta manifestação da cultura de movimento não é
algo recente e pode ser exemplificado tomando o contexto brasileiro. O Brasil
manteve esse espírito espetacular pelo constante intercâmbio de professoras
européias em meados da década de 1950, estando assim em consonância com os
acontecimentos mundiais da modalidade.
No período do surgimento da GR no Brasil, se manifestava uma tendência
pedagogicista suscitadora de uma nova forma de a sociedade encarar a Educação
Física, com uma visão de prática voltada à Educação (ROMERO, 1994).
Aliada à perdura firme da concepção biológica mencionada, “baseada na
abordagem positivista de ciência e no seu método de observação e comparação de
resultados” previsto concomitantemente pelo ideário escolanovista (SOARES, p. 132,
2001), a concepção pedagogicista tomava a Educação Física como algo útil e bom
para a sociedade, o que atribuía uma nova importância ao professor desta disciplina,
que teria agora o papel de organizar a espetacularização das práticas corporais em
eventos que culminavam, conseqüentemente, na propaganda da escola (ROMERO,
1994).
Tal contexto faz com que a Romero (1994) reporte-se ao Grupo Unido de
Ginastas (GUG), quando este divulgou a GR, até então GM, através de
apresentações em eventos cívicos e esportivos.
Assim, é possível ousar algumas reflexões no sentido de que a
propaganda desta modalidade, voltada, essencialmente, para o
“aspecto espetáculo”, induziu falsos conceitos, distanciando-a da
visão pedagógica favorável à escolarização (ROMERO, 1994, p. 185).
Esses preceitos são fundamentais para compreender a espetacularização da
GR, os quais implicaram na busca insistente das performances, pois era necessário
prover visibilidade a uma prática que continha tantas significações voltadas às
37
características de uma época. Dessa forma, a intensa visibilidade da GR no Brasil se
repetia mais densamente fora do país.
No contexto mundial, as regras foram se constituindo e admitindo
perspectivas que congregassem uma gama maior de possibilidades coreográficas, e
portanto, um perfil mais voltado para o espetáculo. As imagens a seguir são de
conjuntos, do Grupo Unido de Ginastas em 1972, apresentando uma coreografia
com arcos, e na seqüência a série da Seleção Brasileira de conjuntos nos Jogos Pan-
americanos do Rio de Janeiro em 2007. Observamos a diferenciação tanto no
aprimoramento das posições corporais e das regras, conforme o número de ginastas
e o objetivo competitivo, quanto à atenção dada aos figurinos.
Imagens 8 e 9 - Conjuntos brasileiros, 1972 e 2007.
A diferenciação das modalidades de GR (individual e conjunto) também pode
ser tomada como exemplo deste processo de reelaboração para o espetáculo, pois
38
cada uma dessas vertentes se expressa com especificidades próprias que se notam
imediatamente ao folhear o Código de Pontuação, já que suas regulamentações
encontram-se separadas.
O foco das séries individuais, como dito anteriormente, se dá nas qualidades da
ginasta, suas performances corporais com aparelhos em consonância com a música,
as séries de conjunto guardam essas características, mas, acima de todas, guardam
princípios de cooperação, para que a elaboração coreográfica se pelas qualidades
do todo, pela interação entre ginastas e aparelhos. Ao contrário das séries
individuais, tolera-se que a ginasta inicie e/ou possa ter momentos em que fique sem
aparelho, ou que uma ou mais ginastas portem mais de um aparelho, desde que
sejam momentos passageiros que realcem a colaboração entre as atletas. A
preocupação em delimitar os movimentos específicos da Ginástica Rítmica ocorre
inúmeras vezes no texto do Código. E, mesmo que estes possam significar princípios
de trabalho coletivo, tais como apregoados no conjunto, alguns são proibidos, por
exemplo, carregar uma ginasta, caminhar sobre uma ou várias ginastas que são
considerados elementos mais característicos da Ginástica Geral ou da Dança. Ainda
assim, autorizam-se elementos em que as ginastas dêem um impulso inicial e
passageiro a suas companheiras. Dessa forma, as acrobacias, que não caracterizam
esta modalidade, são parcialmente autorizadas, para realçar ainda mais o teor
espetacular da série (FIG, 2007).
Contudo, os novos exercícios ginásticos exprimem a capacidade das ginastas
de transgredir as delimitações das formas de movimento descritas pelas regras, e
suscitam caracterizações que nos remetem ao grotesco através da alusão ao circo.
Porém, a alusão não é aos espetáculos populares retomados e rejuntados embaixo da
velha lona do circo que ronda as cidades, e sim às perspectivas estéticas constituídas
a exemplo das concepções propagadas pelo “Cirque du Soleil”, que vem se
difundindo pelo mundo com sucesso absoluto nestes últimos anos. Mas, a
apropriação é mútua. Do mesmo modo que enxergamos ginastas da GR nos
39
espetáculos do Cirque du Soleil, observamos músicas, figurinos e movimentos
dignos dos mais dobráveis” contorcionistas e dos mais bem-preparados
malabaristas e acrobatas nas quadras de GR mundo afora.
Soares (2001) apresenta reflexões pertinentes acerca dessa temática,
intersecções circo/ginástica. Ela caracteriza o acrobata como um ser compreendido
dentro do sutil limite entre o grotesco e o sublime, pois brinca com o nosso medo e
extrapola as condições de um corpo “reto”. A ginasta de GR também situa-se nesse
limiar, quando lança-se ao ar, ao chão, à troca de eixos, dobra seu corpo, arremessa
seu aparelho e o recupera de diversas formas num tempo exato. “E o espectador
então um misto de tensão e equilíbrio, de balanceamento e alternância, contraste,
variação, encantamento, desprendimento, solução” (SOARES, 2001, p. 35). Dessa
maneira, ao nosso ver, a ginasta da GR também transcorre o grotesco do acrobata,
quando expõe movimentos que deixam a duvidar qualidades humanas, contornos
que oscilam entre uma normalidade e anormalidade anatômica, quando enxergamos
corpos dotados de uma precariedade de formas, corpos insustentáveis,
assombrosamente magros e flexíveis.
As imagens a seguir são de uma artista circense e de uma ginasta
internacional, a semelhança não é mera coincidência e se mostra aos nossos olhos
como uma assimilação recíproca dessas práticas corporais: movimentos, corpos e
utilização de aparelhos.
40
Imagens 10 e 11 - Uso da fita, artista do Cirque du Soleil e ginasta da GR.
A necessidade de se garantir uma manifestação ginástica que exale beleza,
consequentemente arte, é uma das razões das inumeráveis e velozes produções de
saberes na GR, pois a criação configura-se como fator condicionante para o
progresso dessa prática. É ainda mais bela a ginasta que consegue se diferenciar de
todas as outras, que consegue criar novas possibilidades de movimento.
Ressaltamos que a composição dos exercícios na GR, as séries, o formato com
que são criados, também são elementos que permitem caracterizar suas
especificidades, pois ao observar as nuances dos movimentos e da criação destes,
somos capazes de identificá-la.
Para incitar nossa discussão acerca da criação coreográfica na GR,
apresentamos um trecho da biografia da percussora dessa modalidade no Brasil,
Ilona Peuker, retirado da página da internet que descreve sua trajetória. O texto se
refere à importância da criação nos processos de ensino da Ginástica Moderna, que
se iniciou conforme sua chegada ao Brasil em meados da década de 1950.
Sua trajetória profissional foi determinada por seu amor ao
movimento e à expressão artística. Suas alunas tiveram o privilégio
41
de dividir com ela o mágico momento da criação de suas
coreografias. Dona Ilona foi antes de tudo uma arquiteta do
movimento. Seu processo de criação era determinado por uma rara
noção e visão espaciais. No espaço, ela esboçava o trajeto de suas
coreografias. Suas alunas preenchiam esse trajeto imaginário com
movimentos que eram selecionados por ela, dentre os tantos
realizados pelas ginastas. Para as ginastas, esses momentos de
criação eram inigualáveis, elas tinham contato com um prazer único
(FROSSARD, [2005?]).
Na atualidade, o Código de GR permite perspectivas para a criação de
movimentos e de nuances coreográficas, porém uma criação completamente
direcionada. A elaboração de uma série de Ginástica Rítmica deve atender às
características técnicas e artísticas dessa manifestação congregada à utilização
correta dos movimentos corporais e com aparelhos e a escolha do tema da
coreografia, expresso pela música.
Uma série de GR deve ser pensada a partir de um discurso motor unitário: o
encadeamento de movimentos do início ao fim (FIG, 2007). Cada movimento é
dependente do seu antecessor e sucessor, e a idéia-guia é a história que a ginasta
conta, sem interrupções. Ao mesmo tempo em que o digo exerce a “poda” de
tudo aquilo que é excessivo, exige que o exercício da ginasta contenha variações de
diversas naturezas, convidando à criação. Sendo assim, a criação de movimentos
também é condicionada a relações de poder-saber, ou seja, o Código que determina
e a ginasta que transcende.
O corpo na GR é regulado pelo Código, disciplinado pelo treinamento, mas é
criativo, uma criação pautada em um fim pré-determinado. Não deve exceder gestos
inúteis à série, com esse pensamento podemos nos remeter ao princípio de utilidade
das primeiras manifestações ginásticas européias. Porém, a utilidade que permanece
não é mais a mesma, não se pauta somente na potencialização das forças dos corpos
para fins de saúde, militares, de qualidade de vida etc., o corpo útil contemporâneo
serve para a melhoria dos desempenhos esportivos. Com efeito, a ginástica atual
42
vem assumidamente se apropriando de outras práticas para moldar sua finalidade
utilitária.
Os Movimentos Ginásticos europeus no final do século XIX caracterizaram-se
por sistematizações das relações cotidianas: festas e divertimentos de rua e da
aristocracia, circo e exercícios militares. Gradativamente, os princípios de ordem e
disciplina coletiva iam sendo incorporados. Porém, o cerne das manifestações
primeiras, contido na diversão deveria ser abandonado, pois era necessário que se
reconhecesse a ginástica como prática útil e potencializadora segundo uma nova
mentalidade científica construída a partir do século XIX, baseada na ciência e na
técnica como saberes específicos (SOARES, 1998). A ginástica contemporânea, em
detrimento daquela do século XIX, circunda, por exemplo, os saberes do circo
porque atualmente este é performático também, ambos buscam o espetáculo, a
extrapolação dos limites corpóreos, a perfeição do gesto e ambos transgridem muito
os objetivos de suas origens.
As forças que esboçaram a ginástica, atual Educação Física, desembocaram na
Europa ao longo do século XIX em países como Alemanha, Suécia, Inglaterra e
França e corroboraram para a visualização de um modelo que detinha a idéia de
aquisição de saúde e moral, de formação estética e formação do soldado (SOARES,
1998). Ou seja, um conjunto de atributos conseguidos pelo estudo meticuloso do
corpo pelas ciências médicas, com estimulações previamente dosadas, com a
finalidade de lapidar e potencializar os gestos de forma mais econômica possível.
Tal condição desconsiderava e excluía as manifestações artísticas populares tidas
como dispendiosas e inúteis. Atualmente, a estética ginástica pode apropriar-se de
outras práticas, porém a forma ginástica precisa ser resguardada. Por exemplo, um
determinado salto característico da capoeira pode ser utilizado num exercício de GR
desde que as características de base do elemento salto estejam presentes: um salto
precisa ter altura, forma definida e fixada durante o o, amplitude na forma (FIG,
2007).
43
Seguindo veementemente as tendências ginásticas dos últimos dois séculos, a
criação de elementos com o corpo e os aparelhos na GR é pré-determinada por
técnicas que lhe são específicas. A ginasta deve saber dominá-las para que a
coreografia possa conter uma gama ampla de movimentações que ao mesmo tempo
sejam criativas e corretas. O Código de Pontuação até permite a criação de elementos
não-técnicos com os aparelhos, porém essa situação deve ser passageira, pois cada
aparelho deve ser caracterizado segundo uma natureza técnica própria (FIG, 2007).
Numa série de fita
4
, por exemplo, o aparelho deve ser “desenhado” pela ginasta a
todo tempo, pois situações em que este aparelho permaneça parado ou enrolado por
um tempo prolongado diminuem o valor do exercício. Da mesma maneira, arco,
bola, maças e corda têm seus movimentos específicos, os grupos técnicos, de acordo
com as formas desses aparelhos.
Imagem 12 - Coreografia com fita
4
Os Grupos técnicos da fita são os espirais (desenhos de pequenos círculos), as serpentinas
(desenhos de pequenas ondas), os lançamentos e recuperações, as passagens por dentro do
desenho, as escapadas (pequenos lançamentos em que o estilete uma volta completa no
ar), os lançamentos boomerangs (em que se segura a ponta da fita para o estilete, vara que a
segura, retornar) e os manejos (circunduções, movimentos em oito, balanceios e impulsos).
44
O Código de Pontuação prescreve todos os elementos possíveis com os
aparelhos, novos manejos ou devem ser contabilizados como originalidade, ou
devem aparecer de forma restrita na série. Dessa forma, as possibilidades de criação
são sempre originadas por elementos existentes, o novo se pelas possibilidades
de extrapolar a prescrição, guardado seus limites.
Além dos Grupos Técnicos, de cada aparelho, há Elementos Corporais específicos
das quais as coreografias devem sucumbir, sendo a criação da série refém do Grupo
Corporal Obrigatório. Nas séries com bola devem aparecer mais flexibilidades e
ondas, nas de corda os saltos, nas de maças os equilíbrios, nas de fita os pivots e nas
de arco todos os grupos equilibradamente (FIG,2007).
A abertura para o novo, para o original até existe no atual Código de
Pontuação, porém restrita e pontuada quando se tratam de novos elementos que
se consideram Dificuldades ou novas relações com os aparelhos ou novas relações
entre as ginastas e aparelhos do conjunto. Ou seja, elementos originais que não se
enquadrem nos quatro Grupos Fundamentais ou em novos movimentos e relações
entre ginastas e aparelhos não são originalidades contabilizáveis.
Apesar dessas restrições, podemos observar séries em que se instituem novas
formas de se utilizar os aparelhos. A imagem, a seguir, mostra o conjunto da
Ucrânia no Campeonato Europeu de 2001. Com inspiração no tema do filme
“Matrix”, a maneira com a qual a ginasta do centro segura todos os pares de maças
nos parece inusitada, dado que não é um novo manejo, portanto não recebe
pontuação de movimento original.
45
Imagem 13 - Novos usos dos aparelhos.
Nos Exercícios de conjunto a idéia-guia da série, a história que deve ser
contada, parte da união das cinco ginastas e de todas as relações possíveis entre elas
e entre os aparelhos. Essa perspectiva prediz uma nova perspectiva para o
julgamento das séries e uma nova perspectiva para a beleza destas, que não está
somente nas proezas que uma ginasta é capaz de realizar com o seu aparelho, mas
também, e principalmente, na capacidade de o conjunto realizar um espetáculo
dependente do papel de cada uma que expressa um todo, ou seja, maneiras novas
de uso de cinco corpos e cinco aparelhos nos conjuntos. Corpos e aparelhos que se
projetam nos espaços do tablado competitivo e criam uma matriz do belo que
concebe um deslumbre coletivo, como na imagem do conjunto de fitas das chinesas
a seguir.
46
Imagem 14 - Corpos que desenham figuras
A imagem anterior nos alerta para o fato de que não é mais a performance de
um corpo que impressiona, pois pouco importa qual a ginasta que eleva mais a
perna. A figura que se forma com a variação das alturas das pernas das cinco
ginastas é que determina a beleza do movimento. Dessa forma, pensamos que as
séries de conjunto instituem uma beleza que difere das composições individuais.
A beleza de uma série de Conjunto é dada, sobretudo, pela maneira com que
as ginastas elaboram o trabalho coletivo, além do virtuosismo que cada ginasta deve
apresentar tal qual nos exercícios individuais. Na imagem a seguir visualizamos o
caráter coletivo, a dependência de cada ginasta para o funcionamento da
coreografia, fator que atribui beleza aos conjuntos de GR.
47
Imagem 15 - Salto por cima das companheiras do conjunto.
Esse caráter coletivo do Conjunto implica na utilização de duas denominações:
as relações e as colaborações entre as ginastas. As relações são as formas com que os
movimentos corporais e do aparelho são organizados: sincronismo, cânon, sub-
grupos, coral etc. e as colaborações são as ações que são possíveis pelo empenho
de cada ginasta: passar por dentro dos aparelhos de outras ginastas passar por cima
de outra ginasta saltando etc., como na imagem. Do princípio ao fim do exercício, a
todo momento, as ginastas do conjunto precisam caracterizar relações e colaborações
(FIG, 2007).
Porém, a margem criativa que se ascende com a perspectiva do trabalho em
grupo também é direcionada, razão pela qual se faz necessário resguardá-la de
elementos que fujam dos manejos característicos dos aparelhos e das características
da GR, que expressem manifestações notoriamente divergentes (ex: demonstrar um
jogo de futebol com as bolas, construir pirâmides humanas etc).
Essas são algumas das especificidades que tratamos nesse estudo,
especificidades que se recriam a todo tempo através dos saberes produzidos pelos
corpos e que são registradas e (re) configuradas conforme a transcendência das
necessidades de verdade da GR, porém, é importante reconhecer que não se
48
esgotam nos aspectos abordados. Adentraremos, a seguir, na verificação das
regulações do tempo e dos espaços que também implicam na caracterização da
beleza da Ginástica Rítmica.
OS USOS DO TEMPO E ESPAÇO
Partimos para uma análise do tempo e espaço no digo de Pontuação de
Ginástica Rítmica norteando-nos pelo elenco de pontos da disciplina
5
apresentados
por Foucault (1987). Ainda que nesta oportunidade o autor foque suas reflexões para
o contexto das práticas punitivas em Vigiar e Punir, ele deixa claro que,
similarmente, outras instituições se pautavam nas características das instituições
penais, tais como escolas, hospitais, quartéis, pois coligavam entre si as relações de
poder sobre os corpos.
Um capítulo da história do corpo foi constituído junto à história da
penalidade do século XIX, retratada pela interrogação das idéias morais, pela
história da moral. “O corpo não precisa mais ser marcado; deve ser adestrado,
formado e reformado; seu tempo deve ser medido e plenamente utilizado; suas
forças devem ser continuamente aplicadas ao trabalho” (FOUCAULT, 1997, p. 42).
Além da história dos corpos, alia-se a história das relações entre os corpos e o
poder político, controle, sujeição, poder direto ou indireto. Cria-se uma nova ótica,
mecânica, fisiológica, disciplinadora e normalizadora (FOUCAULT, 1997).
Na GR, as técnicas de disciplinarização do corpo belo seguiram as
normatizações do tempo e dos espaços do treinamento, além da normatização de
suas especificidades como vimos anteriormente e da normatização dos gestos como
veremos mais tarde.
5 A disciplina controla, por princípios, a produção dos discursos. Fixa-lhe limites e
reatualiza permanentemente suas regras (FOUCAULT, 1971).
49
Os espaços de treinamento simulam os espaços competitivos, registrados no
código como um quadrado de 13m², os deslocamentos para além da área permitida -
o tablado - são vetados desde as sessões diárias. Em uma quadra de treino é possível
observar a cerca, um lugar heterogêneo, com várias funções (FOUCAULT, 1987), o
âmbito do clube, mas fechado em si mesmo, e as localizações funcionais
(FOUCAULT, 1987), com lugares isolados e utilitários, ou seja, local para as aulas de
Ballet, local para o treino de flexibilidade, local para treinamento de força etc. O
corpo, durante o treinamento, sofre quadriculamento (FOUCAULT, 1987) numa área
de 13 x13 metros, e não extrapola esses limites. Nas competições ocorre o mesmo,
sendo que desta vez o corpo adestrado não se permite passar do quadrado, a não
ser por um erro imprevisto. Corpo e o aparelho não devem, sob nenhuma hipótese,
ultrapassar os limites regulamentares, sendo que essa ultrapassagem é validada
ao tocar o solo, porque o corpo da ginasta é treinado, desde a elaboração do seu
exercício, para não exceder as normatizações dos espaços.
Os espaços do corpo, prescritos pelos movimentos, obedecem à classificação
da variabilidade, incorporados pela técnica característica. O Código reza que os
movimentos precisam ser em diferentes níveis (alto, médio e baixo), diferentes
trajetórias (reta, curva), diferentes planos (frontal, transversal e sagital) e diferentes
modalidades (formas de deslocamento) (FIG, 2007).
Nas Séries de Conjunto as variações espaciais são inúmeras, as cinco ginastas
compõem figuras, desenhos e formas em todos os momentos do exercício. No
entanto, essa caracterização espacial precisa ser nítida. Por exemplo, em uma reta
formada pelas ginastas deve ser resguardada a forma exata de uma reta com
distâncias iguais entre as ginastas. Nas imagens a seguir, visualizamos figuras
definidas.
50
.
Imagem 16 - Figura em V.
Imagem 17 - Cada corpo em seu lugar determinado no tablado competitivo.
O cerne do espaço competitivo, a área de competição, é reservada para as
ginastas em competição, portanto estas não podem se atrasar nem se adiantar, nem
permanecer antes nem depois de competir em suas proximidades (FIG, 2007). Os
horários precisam ser respeitados a todo o tempo pois na ginástica existe tempo e
local para tudo. E, para que não ocorra veiculação do exercício antes do momento
propriamente dito da série, que o julgamento ocorre estritamente durante os dois
51
minutos e meio da série de conjunto, a entrada no tablado competitivo não pode ser
coreografada. Aquele espaço e aquele tempo devem ser resguardados até o
momento da competição propriamente dita.
Porém, não basta a ginasta demonstrar-se virtuosa apenas durante seu
exercício na área regulamentar, outros fatores, que podem ocorrer inclusive em
outros momentos ou que independam do seu domínio também podem interferir no
seu julgamento, tais como suas condutas ou de sua equipe fora do tablado. Por
exemplo, as ginastas numa prova de conjunto não devem se comunicar entre si, nem
com a técnica, nem com os membros da arbitragem durante o exercício (FIG, 2007).
O tempo e a regulamentação da série é que determinam o tempo de
amoldamento da ginasta. Os horários são previstos para atividades das sessões de
treinamento e para além deste. A vida da ginasta é um ciclo rotineiro regrado pelo
tempo, que é controlado para garantir a qualidade da sua profissão, e inclui treino,
alimentação, sono, estudos e tempo livre. Este último serve para realizar todas as
outras atividades da vida de uma jovem normal, namoros, amizades, passeios,
família etc. Porém, mesmo no tempo livre não é permitido se exceder, a fim de que o
corpo esteja pronto para produzir bem nos momentos “úteis” da vida da ginasta.
A estética da performance sobrepuja a estética da vida. Ou seja, há “a negação
de outras estéticas corporais e vivências estéticas da própria ginasta, presentes por
exemplo nas ações cotidianas relativas à alimentação, ao convívio familiar, às formas
de perceber e aceitar o próprio corpo” (PORPINO, 2004, p. 129). É o que reflete esta
autora em artigo que disserta sobre as concepções estéticas do treinamento esportivo
da GR. E complementa referindo-se à relação paradoxal entre essas estéticas, pois,
“ao mesmo tempo em que o sacrifício é justificado pela concretização de uma
estética esperada é na negação de uma estética de vida que esse sacrifício é
realizado” (PORPINO, 2004, p. 128). A ginasta “abandona” sua vida para garantir
sua (re) significação por meio da dor, do uso de um corpo constantemente utilitário
em prol do sonho de se tornar uma campeã.
52
Sobre o tempo útil, Foucault (1987, p. 129), ilustra o controle do tempo dos
funcionários de uma indústria no início do século XIX: “O tempo medido e pago
deve ser também um tempo sem impureza nem defeito, um tempo de boa
qualidade, e durante todo o seu transcurso, o corpo deve ficar aplicado a seu
exercício”.
A repetição da seqüência coreográfica de um minuto e quinze segundos a um
minuto e meio da GR acaba sendo a própria medição temporal dos movimentos e
que determina todo o processo de treinamento. Um movimento, seqüenciado pelo
outro recebe uma interpelação determinada pelo corpo e pela métrica musical, que
se (re) significa conforme a melhoria da performance, pois em um intervalo musical
é possível executar um maior número de movimentos com o decorrer do processo
de treinamento. “O tempo penetra o corpo, e com ele todos os controles minuciosos
do poder” (FOUCAULT, 1987, p.129).
Quanto mais se fraciona o tempo, mais é possível extrair mais tarefas dele.
Antes e após a duração regulamentar da série, o corpo da ginasta deve apresentar
imobilização completa para que se possa enxergar a duração exata do exercício (FIG,
2007). Nesses segundos a ginasta ou conjunto de ginastas devem manifestar o
melhor de suas virtudes corporais mais excepcionais. Um minuto e trinta segundos,
dois minutos e trinta segundos, tempo máximo regulamentado para que uma
ginasta em séries individual e de conjunto apresentem o melhor, a seleção dos
melhores movimentos com o corpo e aparelhos, melhor música e coreografia, a mais
bela, a mais original, o encadeamento mais perfeito das composições. Inversamente
proporcional ao tempo cronometricamente contado da série é o tempo dos
treinamentos, também contados, mas se valendo da extensão: horas, horas e horas
que se resumirão a um minuto e meio, uma previsão intensa e detalhada de como o
corpo irá responder no momento e no tempo exato da competição.
Outra perspectiva do aspecto temporal está em executar certo número de
vezes a série sem erros, que pode ter uma duração de quinze minutos ou de várias
53
horas. Isso vai depender do aperfeiçoamento dos gestos. Essa é uma fase do
treinamento em que infere-se que a ginasta, adequada àqueles gestos, seja capaz
de executar seus exercícios sem falha (LAFFRANCHI, 2002). “Um corpo
disciplinado é a base de um gesto eficiente” (FOUCAULT, 1987, p.130). Ou seja,
eficiência e rapidez precisam caminhar juntas, o gesto disciplinado confere à ginasta
uma atitude corporal voltada ao movimento eficiente.
Dessa forma, o tempo determina a construção do corpo belo ou da beleza na
Ginástica Rítmica quando é proveitoso, não enquanto a ginasta projeta os
movimentos mais belos em um minuto e meio de exercício, mas quando o faz em
razão de um processo árduo, útil e meticuloso, um tempo capitalizado, como diria
Foucault (1987, p. 133):
Como capitalizar o tempo dos indivíduos, acumulá-lo em cada um
deles, em seus corpos, em suas forças e capacidades, e de uma
maneira que seja susceptível de utilização e de controle? Como
organizar durações rentáveis? As disciplinas, que analisam o espaço,
que decompõem e recompõem as atividades, devem ser também
compreendidas como aparelhos para adicionar e capitalizar o tempo.
Porpino (2004, p. 127) demonstra que na preparação técnica “além da
obtenção da maior eficiência do movimento ginástico com o mínimo de esforço,
objetiva-se também o virtuosismo dos movimentos realizados”. Dessa forma, as 200
repetições dos exercícios de conjunto descritos por Porpino (2004), do vídeo que
narra o dia-a-dia das ginastas da seleção brasileira, resultam de ciclos diários,
sacrificantes, porém necessariamente virtuosos das sessões de treino.
Outro elemento que dita o tempo e a forma do gesto é a música. A perda de
ritmo prejudicial à ginasta é ocasionada tanto pela montagem de sua série em um
tempo equivocado ao da música como por erros que interfiram no encadeamento da
coreografia. Por exemplo, a ginasta que perde um aparelho e sai correndo, ou que
demora mais num determinado Elemento Corporal perde várias vezes o ritmo da
54
coreografia. Contudo, existe ainda uma penalização de discordância entre música e
movimento no fim do exercício, que demonstra o controle do tempo da coreografia
determinado pelo tempo de música, qualquer imprevisto pode levar ao erro (FIG,
2007).
Uma das séries mais lembradas da GR mundial é o exercício com arco da
ginasta búlgara Maria Petrova no Campeonato Mundial de Paris em 1994. Naquela
competição, Petrova parecia desafiar o tempo e o espaço requerido para uma
coreografia de Ginástica Rítmica, pois, após marcar cada batida da música com
precisão minuciosa através de seus movimentos, Petrova, na fase final, na apoteose
dos segundos anteriores ao fechamento da série, empenha uma movimentação
extremamente lenta, que empreende longos doze segundos da sua coreografia, que
por sua vez, dá um belo efeito ao som da cantata Carmina Burana.
Imagem 18 - A “câmera lenta” que estabelece novos sentidos de tempo e espaço.
Guardadas as exceções, a exemplo de Petrova, observamos que o tempo e o
espaço na GR obedecem estritamente os controles estabelecidos pelo Código, sendo
considerados durante todo o processo de formação e preparação da ginasta,
55
determinando inclusive a conformação da regulação do gesto, a qual, discutiremos a
seguir.
A CONFIGURAÇÃO DO GESTO TÉCNICO
É possível, através da leitura do gesto perceber diferentes formas de
controle, proibições e interdições. Nesse sentido, o conjunto de
normas, a instituição de pedagogias corporais fortificadoras da alma
e a elaboração de estratégias coercitivas e disciplinadoras do corpo
surgidas na época renascentista que formam o ideal do corpo
moderno tendem a desenhar um corpo ideal, reto, sóbrio, moderado,
assexuado, impassível. Esse modelo de corpo revela-se nos
comportamentos sociais de cortesia e de etiqueta, regularizando as
aparências e o pertencimento a uma determinada classe social,
nobre, aristocrática (NÓBREGA, 2003, p. 135).
Movimentos resguardados em retidão de segmentos e extremamente amplos,
grandiosos em relação aos ângulos articulares. As pernas atingem alturas
inacreditáveis. Joelhos, pés, quadril concentram-se no mais puro alinhamento. Cada
movimento é gesto porque implica num envolvimento de todo o organismo sempre,
e expressam um significado, e exprimem linguagem (NÓBREGA, 2000), uma vez
que todas as partes compõem e determinam a ação. A ginasta não realizará um
exímio salto se seu olhar ou mãos se direcionam ou se posicionam em locais não
determinados. Saltar, em Ginástica Rítmica é mais que uma explosão de força dos
membros inferiores, tal ação não se basta, porque todo o corpo precisa estar belo
durante todas as fases do salto: na partida, vôo e chegada.
56
Imagem 19 - As partes que embelezam o todo.
É nos gestos realizados pelos corpos na ginástica que se incidem as operações
mais ferrenhas. O caminho perseguido por uma ginasta, da preparação à
apresentação, é bombardeado por minúcias capazes de podar milimetricamente os
movimentos em nome da beleza prevista e almejada, em nome do primeiro lugar ao
pódio.
Ressalvamos o fato de a regulação das minúcias dos gestos da GR
contemporânea terem se originado de uma prática que teve suporte nos movimentos
femininos “naturais” da Ginástica Moderna ligados às nuances rítmicas, artísticas e
pedagógicas. Pressupomos com isso que as transcendências dos gestos dos corpos
caracterizaram essa modalidade ginástica desde as primeiras demonstrações,
principalmente no que concerne aos objetivos que a ginástica apresentava na sua
origem, um corpo não-performático, mas que permaneceu naturalizado até hoje.
Uma naturalização que não engloba apenas a caracterização das nuances
expressivas do movimento, mas a potencialização dos movimentos através de
investimentos em forma de intervenções corporais no âmbito do mais alto
rendimento esportivo.
57
A naturalização de outrora implicava numa forte atribuição aos movimentos
do corpo na GM como sendo orgânicos ou naturais, que mantinham viva a ligação
da ginástica às ciências biológicas, e reforçava a reflexão de movimento inerente,
pré-idealizado, conseqüentemente adequado a um modelo.
Fruto da biologização e naturalização que dirige a construção da
nova sociedade a Educação Física foi utilizada pelos médicos
higienistas como instrumento de aprimoramento da saúde física e
moral, acoplada aos ideais eugênicos de regeneração e purificação
da raça. Ela se fez protagonista de um corpo saudável, robusto,
disciplinado, e de uma sociedade asséptica, limpa, ordenada e
moralizada, enquadrada, enfim, nos padrões higiênicos de conteúdo
burguês. Podia ser a “receita” e o remédio” da cura de todos os
males que afligiam a caótica sociedade brasileira capitalista em
formação (SOARES, 2001, p. 136).
Laffranchi (2001), ressalva a forma de trabalho com base nos movimentos
orgânicos e naturais da Ginástica Moderna no Brasil, que procurava explorar as
qualidades estéticas e rítmicas da mulher. Observamos que essas observações,
mesmo que atuais, acerca da Ginástica Moderna não problematizam os aspectos
naturais dos movimentos chamados “orgânicos”, nem se referem aos seus aspectos
culturais.
Nas referências do surgimento da GM, expressas na introdução desta
pesquisa, encontramos a utilização dessas expressões (movimentos orgânicos e
naturais) com freqüência. Esses dois termos referem-se à concepção biológica,
evidente na época, que proclamava uma naturalização dos movimentos, ou seja,
estes eram considerados inatos e precisavam ser trabalhados para fins utilitários
determinados. A GR convive com a configuração de gestos retidos na naturalização
performática e imersos na criação, sendo admissível enxergar essa convivência
conceitual entre natural e artístico desde as primeiras manifestações da Ginástica
Moderna em nosso país. Ilustramos essas evidências com uma imagem do GUG
seguida por uma da atual Seleção.
58
Imagem 20 - Movimentos naturalizados.
Imagem 21 - Corpos naturalmente espetaculares.
A imagem da Seleção Brasileira de conjuntos apesar de também caracterizar
padrões de movimento e de corpo, institui outros modelos pautados nas
performances de corpos flexíveis, longilíneos, potentes e idênticos. E, talvez, menos
“livres” tais como os modelos apregoados nas primeiras referências brasileiras
6
.
O belo, sempre contemplado nesta prática, persiste veementemente em
arquétipos estipulados pelas próprias ginastas através dos tempos, tornando-se,
após a esportivização, critério de julgamento, que por sua vez é firmado pelo Código
de Pontuação. Os corpos e gestos das ginastas revelam as concepções estéticas da
6
Peuker (1974 e 1976).
59
GR, incorporando mecanismos de poder e saber. E ainda, o gesto tão evidenciado
como natural assume a qualidade de excepcional.
A ginasta obedece a sua tarefa de ser bela, ajustada às formas requeridas pelo
Código. Mas, a beleza do gesto não se basta, este precisa parecer fácil, perfeito, sem
necessidade de retoque. A beleza envolve todo o corpo, dos cabelos às pontas dos
pés, é preciso que tudo esteja envolto harmonicamente, que cada segmento
evidencie intensamente o gesto.
Não basta ter um corpo perfeito ou esteticamente apropriado para a
modalidade. É preciso submeter esse corpo ao treinamento, para
que a ginasta seja capaz de realizar as proezas mais difíceis e
também mais belas. As preocupações estéticas estão presentes no
treinamento da GR desde a escolha das atletas para a composição
das equipes, até o momento em que a atleta se apresenta. Tais
preocupações mantêm-se presentes durante as diversas fases do
treinamento (PORPINO, 2004, p. 125).
Dessa forma, o Código de Pontuação veta todos os movimentos que
desarmonizem o exercício, sobretudo os erros. São considerados erros tudo aquilo
que pressuponha o imprevisto, que não se enquadre nos padrões exatos, portanto,
devem ser penalizados a cada vez que ocorram, para que as notas de Execução da
ginasta que menos erre sejam as mais altas. O olhar do árbitro que observa este
parâmetro precisa ser minucioso e calculista para julgar a mínima falha, perceptível
ou imperceptível aos olhos do espectador comum, pois nesse esporte de alto nível, o
que diferencia a Execução de uma ginasta para outra é a minúcia, pois quanto mais
perceptível ao público não-especialista maior o grau de falta. As partes do digo
que concernem à Execução do exercício são as principais responsáveis pela regulação
da qualidade do gesto, tanto da ginasta como na manipulação com os aparelhos.
O parâmetro de julgamento Execução pauta-se nos mínimos desvios dos
padrões requeridos pelo Código através da apropriação de modelos. Os modelos,
provavelmente, se estabeleceram a partir das experimentações expressivas de
60
movimento, afirmando moldes estéticos que, posteriormente, foram refinados e
reformulados.
Para argumentar as fundamentações dos modelos, temos que, na década de
1960, com os primeiros campeonatos mundiais, a Ginástica Rítmica acabou por
render-se à técnica do Ballet Clássico apesar da forte vinculação à Dança Moderna, já
tradicional na Europa. O Ballet trouxe para a GR técnicas emancipadas, maneiras
de uso do corpo na dança “fechadas” em movimentações firmemente estipuladas.
Imagem 22 - Arabesque: movimento em comum da GR e do Ballet.
Constatamos a forte influência do Ballet Clássico ao observar que os mesmos
desequilíbrios e faltas de amplitudes dos gestos a serem corrigidos no Ballet são
condenados pelo Código de Pontuação. Por exemplo, para que uma ginasta possa
executar um pivot, giro de 360 graus ou mais na meia-ponta
7
de um dos pés, com
uma das pernas sem contato com o solo, exige-se o mesmo tônus do corpo vertical
de uma bailarina que executa uma pirueta, movimento do Ballet análogo ao pivot.
Então, qualquer “frouxidão” na musculatura do abdome, qualquer inclinação
desnecessária do tronco condena esses movimentos em ambas manifestações, sendo
7
Flexão dorsal do pé, associada à flexão do metatarso.
61
que na GR o Código classifica como pivot sem forma definida e fixada. Na imagem
anterior a ginasta executa um movimento comum entre a GR e o Ballet, o arabesque.
Consideramos também as semelhanças na exímia técnica de bailarinas e
ginastas ao longo da trajetória da GR, bem como, a postura exigida para a ginasta
atual que muitas vezes retoma a postura da bailarina clássica.
Imagens 23 e 24 - Saltos que denunciam referenciações.
As harmonias simetrificadas do Ballet Clássico emergem na Ginástica
Rítmica, dissimulando, através das levezas e supostas facilidades das
bailarinas/ginastas na execução das coreografias/séries, aspectos de usos do corpo
moderados pela disciplinarização, enrijecimento, ajustes e uniformização de
movimentos, de formas corporais, de performances metrificadas. Como reflete
Foucault (1987), reflexos residuais da docilidade de um corpo imerso na
disciplinarização, nas relações de poder.
No entanto, é preciso considerar que a apropriação da técnica do Ballet
contribuiu para construir a GR, porém os movimentos livres e expressivos
suscitados por outras danças não foram completamente extintos. Numa série de GR
ainda deparamo-nos com mobilidades do tronco, ondulações, passagens pelo solo,
contrações e solturas, formas de exercícios equivalentes aos da Dança Moderna
8
.
Essa manifestação não contradizia frontalmente os vocabulários estipuladas pelo
8
“a dança moderna reflete o contexto histórico que a gerou: a de um mundo governado por
máquinas, no qual o ser humano se debate em busca de novas relações consigo mesmo e
com a sociedade” (PORTINARI, 1989, p. 133).
62
Ballet, e sim os (re) configuravam em nuances mais expressivas de movimentos,
libertando a dança dos maneirismos exagerados (PORTINARI, 1989).
Essas movimentações mais “onduladas” são consideradas, inclusive, parte
dos Grupos Fundamentais: as ondas e as flexibilidades, que por sua vez, são os
movimentos mais exigidos para as séries com bola, como na imagem a seguir.
Imagem 25 - Ginasta ao solo.
A partir dessas evidências, refletimos que o gesto técnico da GR, tal qual
evidenciado pelas ginastas que seguem o Código, parecem ser fruto de uma hibridez
de referências, tendo inicialmente a Dança Moderna como foco e, posteriormente,
incorporando as minúcias técnicas do Ballet Clássico, elementos das danças
populares, arte circense e outras manifestações ginásticas.
Essa hibridez parece garantir uma preocupação com o caráter expressivo e
técnico do gesto, bem como sua especificidade que caracteriza a executante como
ginasta de GR e não como bailarina ou ginasta de outra modalidade. Esses pontos
são fundamentais na construção da beleza do gesto técnico da GR.
Segundo o Código de Pontuação os gestos na GR podem ser classificados,
quanto ao seu julgamento, de forma qualitativa ou quantitativa. Quando nos
63
remetemos aos aspectos qualitativos do movimento nos referimos a como esses
movimentos ocorrem segundo os modelos especificados pelo Código. os aspectos
quantitativos do julgamento são aqueles em que os árbitros contam, somam ou
diminuem os valores totais dos elementos, se tal movimento é válido ou não.
Exemplificando: se quantifica um movimento quando este atende ou não
determinado parâmetro, e se qualifica quando se observa se o movimento ou a
coreografia se aproximam ou se distanciam dos parâmetros determinados pelo
Código. Essa separação ocorre apenas nas divisões da banca de árbitros, pois
enquanto os árbitros de Dificuldade avaliam a quantidade, os árbitros do Artístico
avaliam quantidade e qualidade, e os árbitros de Execução avaliam a qualidade dos
movimentos.
A regulação dos gestos, segundo sua qualidade e para sua quantificação,
aproxima-se do padrão de movimento e distancia-se do “erro”. Dentre os erros mais
perceptíveis em GR temos a perda de aparelhos pela ginasta, causada por uma
imprecisão qualquer do movimento. Aparelho perdido demonstra claramente o erro
da ginasta e desqualifica a beleza do seu exercício. A perda do aparelho durante uma
série de Ginástica Rítmica é considerada uma falta grave em qualquer circunstância
porque é uma falha perceptível ao espectador comum. Sendo assim, é necessário
diferenciar bem a execução de uma atleta que perde o aparelho de outra que não o
perde.
Ainda que a ginasta recupere seu aparelho, este deve ter um tempo certo de
ação de vôo que não permita que esta um passo sequer para a sua recuperação.
Por ser elemento menos perceptível, as penalizações de trajetória imprecisa são
menores que as de perda (FIG, 2007).
A manipulação de aparelhos na GR nos evoca os sentidos da beleza
conseguida através dos instrumentos em diversas épocas, tendo este tema da
instrumentalização do corpo sido abordado por Vigarello (1995), ou seja, a maneira
como se processou a regulação dos gestos: primeiro os aparelhos exercendo forças
64
sobre o corpo, depois o corpo exercendo um conjunto de forças sobre aparelhos,
sobre ele mesmo, e dessa forma obtendo os resultados requeridos e, por último, o
corpo trabalhado por técnicas detalhistas a manipular aparelhos e com a aquisição
dessas habilidades ser considerado belo. Com isso, observamos que a regulação dos
gestos na GR segue a normatização dos aparelhos, ou seja, manipulá-los de acordo
com as especificidades estipuladas e com destreza, é o gesto eficiente que interessa à
beleza do movimento.
Além de eficiente, o corpo da ginasta na Ginástica Rítmica é
instrumentalizado por si próprio, pois se utiliza de suas próprias forças para
alcançar performances, ou para exprimir esse controle pode fazer uso de outros
instrumentos. Nessa forma de pensar, o poder incide na operacionalização
instrumental, não apenas na visibilidade do produto. Visualizando este ponto na
Ginástica Rítmica seria fátuo pensar apenas nos aparelhos portáteis, pois eles já
implicam um manusear codificado que brinca de manipulado e manipulador com a
ginasta no momento da competição e nos treinamentos. Aparelhos como plintos,
colchonetes, bancos suecos, espaldares, barras e o próprio tablado expõem melhor
essa operacionalização pois é preciso manejar com propriedade e método esses
objetos em situação de treinamento (LLOBET, 1996) para se conseguir o
desempenho desejado.
Cada aparelho específico da GR possui mais que características específicas,
também assinalam um Grupo Corporal Obrigatório. Dessa forma, cada série tem um
formato diferenciado e uma concepção que deve permear os usos de determinado
aparelho (FIG, 2007). A ginasta excepcional do rendimento esportivo de GR precisa
executar bem todos os grupos corporais dessa modalidade, para ser exímia nas séries
com todos os aparelhos.
Os Grupos Fundamentais ou Dificuldades (saltos, equilíbrios, pivots,
flexibilidades e ondas) de forma geral, são aqueles que contam pontos num exercício
de GR, são os movimentos mais codificados, mais exatos, mais padronizados. Caso
65
não se enquadrem em qualquer característica de base, serão desconsiderados. São
principalmente esses movimentos que determinam o desempenho da ginasta, por
isso a maior parte do treinamento esportivo em GR é direcionado para o alcance das
dificuldades em consonância com os aparelhos. Sobre esse aspecto, Laffranchi (2001)
atenta para as bases do treino de Ginástica Rítmica, que é a excelente execução da
série.
Para uma ginasta, não é satisfatório que apreenda as formas dos
movimentos corporais, é preciso fazê-lo executando os movimentos dos Grupos
Técnicos dos aparelhos, uma vez que o domínio do corpo confunde-se com o domínio
de implementos. Para tanto, os gestos da série têm um ritmo, uma forma, um tempo,
um espaço e uma intencionalidade de acordo com a coreografia, que devem ser
treinados.
A tríade ginasta, aparelho e música, conciliados, caracterizam os gestos e
qualificam a beleza do exercício. Desse modo, é preciso que estejam enquadrados
em pré-definições com alinhamentos de alta precisão, pois é possível, em uma
ação motora da ginasta, penalizá-la por faltas do corpo e dos aparelhos. Portanto, é
necessário que a ginasta esteja “consciente” da posição de cada segmento corporal e
do aparelho na hora do exercício. Além disso, o árbitro, com seu olhar clínico, pesa,
a cada segundo, a forma adequada do corpo para cada ação, sendo possível
penalizar a ginasta por várias falhas ao mesmo tempo. Por exemplo, uma mínima
falha com o aparelho ou com um segmento corporal deve ser notada pelo árbitro de
Execução que deduzirá as devidas penalizações (FIG, 2007).
Também consideradas graves são as falhas por perda de equilíbrio, que
sofrem penalizações ascendentes, desde as menos perceptíveis sem deslocamento do
corpo, expressas por uma mínima imprecisão do eixo corporal, até o desequilíbrio
total finalizado pela queda (FIG, 2007). Essas faltas podem ser minimizadas através
de um extremo controle dos movimentos, de todos os músculos, de todo corpo, que
se envolvem na ação.
66
Um controle minucioso do movimento executado sobre uma parte reduzida
de apoio ou sobre a recuperação do apoio de movimentos dinâmicos como saltos,
acrobacias e giros são de suma importância. Para esses elementos específicos são
previstas penalizações maiores que as prescritas para os elementos corporais em
geral, pois as ações de saltar, girar e girar através do eixo vertical (elementos
acrobáticos), são de categoria mais dinâmica e as recuperações do equilíbrio durante
e após esses movimentos são mais passíveis de erros visíveis pelo público não
especialista, pois distinguem uma quase queda.
A ginasta búlgara Teodora Alexandrova marcou época na GR, por chegar aos
pódios nos campeonatos internacionais apresentando movimentos com limites de
flexibilidade bastante modestos em relação às concorrentes. No entanto, suas
coreografias eram assinaladas com um manejo de aparelhos e movimentações de
giros com alto grau de dinamismo, fatores que sanavam suas possíveis limitações.
Na série de bola do campeonato mundial de Osaka, em 1999, a ginasta apresenta
quatro seqüências de pivots, uma com duas voltas completas, outra com cinco, outra
com seis voltas e a última com dez giros completos. No Código atual isso não seria
permitido, pois os grupos corporais obrigatórios da bola são as flexibilidades e ondas, e
só se permite a utilização de outros grupos por, no máximo, duas vezes.
67
Imagem 26 - Qualidades que superam os limites.
Com essa tática, Teodora sempre utilizou na série seus melhores movimentos,
transgredindo as tendências de hiper-flexibilidade da GR da década de 1990.
O erro apariscente, causado tanto por uma série composta por movimentos
inadequados ao melhor desempenho da ginasta, tanto por erros ocasionais e
momentâneos, desvaloriza mais a Execução do exercício. Entretanto, a ginasta não
perde pontos por errar, perde por deixar de ganhar. Enquanto um árbitro penaliza a
ginasta por uma eventual queda, o outro desconsidera um elemento corporal não
executado por causa da queda, nesse caso, a ginasta perde pela qualidade e
quantidade.
O Código de Pontuação, além de regular os movimentos, determina quais
podem ser utilizados numa série, a qual deve conter até 18 que contam pontos: as
dificuldades ou grupos fundamentais (FIG, 2007). A escolha dessas dificuldades e a ordem
com que aparecem na série são fundamentais para a performance da ginasta e para o
68
desenrolar do exercício. O digo determina uma longa lista, e a escolha desses
elementos deve ser ajustadas às possibilidades corporais da ginasta, ou seja,
suficiente para minimizar a possibilidade de erros.
A ordem dos elementos de uma série de GR devem ser descritos numa ficha
de julgamento através de uma simbologia própria que ilustra todo o exercício
ginástico. Deve ser respeitada a sucessão dos movimentos e suas formas (FIG, 2007),
mais uma vez encontramos a técnica disciplinar do registro (FOUCAULT, 1987).
Uma série de GR não permite improviso que não seja ocasionado pelo erro. O bom
improviso, tido como um atributo de inteligência necessário à ginasta, é aquele que
minimiza ao máximo o erro ou a perda de pontos. Numa fração de segundos,
quando a ginasta perde o aparelho, por exemplo, as decisões precisam ser tomadas
rapidamente para que os árbitros e o público fiquem com a sensação de que nada
aconteceu, sem alterar a ordem da série.
Nos Exercícios de Conjunto, as falhas concernentes à técnica corporal, aparelho
e música, idênticas aos Exercícios Individuais, são penalizadas à medida que
aparecem na série, sendo as pequenas falhas a cada vez, e as grandes falhas a cada
vez e somadas a cada ginasta (FIG, 2007). Complementar a essas falhas são as falhas
próprias do conjunto. São erros que ocorrem a partir da desarmonização do todo,
mesmo que o erro não seja uma falta técnica. Por exemplo, a altura aceitável de uma
perna em determinado exercício: se uma ginasta mais flexível eleva ainda mais essa
perna, o exercício será penalizado porque sofre de falta de sincronismo na
amplitude do movimento, como podemos observar na próxima imagem. A
incidência do controle se também pela igualdade de corpos, de aparelhos, e até
pela diferença nas expressões faciais das ginastas.
69
Imagem 27 - Pernas em diferentes alturas.
a obrigatoriedade de todas as ginastas do conjunto executarem bem os
grupos corporais. Caso uma ou mais delas não atenda os critérios necessários para
expressar a dificuldade tal qual o Código anuncia, esta será invalidada para todo o
grupo. Ao mesmo tempo em que no conjunto o senso coletivo é valorizado, o erro
individual também é tido como erro coletivo. Ou seja, todas as ginastas comemoram
juntas suas virtudes e pagam juntas pelas suas falhas.
Outra particularidade da regulação do gesto no Código que nos chamou
atenção foi o controle do corpo numa série de GR que incide, inclusive, na
habilidade com ambas as mãos, aguçando ainda mais a sua técnica. Neste caso, é
preciso que todas as ginastas submetidas ao Código sejam praticamente
ambidestras.
Percebemos que a regulação dos gestos na GR ocorre de forma a vetar a
expressão do movimento que além dos seus ditames, porém a ginasta o subverte.
Visualizar o código unilateralmente é pensar que a ginasta de alto rendimento
pode ser capaz de exprimir os sentidos artísticos de uma coreografia, resguardando
as linearidades do julgamento aos movimentos da técnica específica. Nesta linha de
70
pensamento, as mais espetaculares ginastas seriam aptas a atravessar as
regulamentações e produzir mais. Entretanto, para transpor nossos pensamentos
para a GR na Educação é preciso ampliar essa visão constatando que o corpo é
sempre capaz de produzir saber a partir das relações de poder, neste caso, não um
saber que suplante às performances, mas um saber que as transcenda, um saber que
considere os elementos mais importantes da GR para a Educação Física. E é sob essa
ótica que trabalhamos no capítulo seguinte.
71
3O CORPO BELO
TRANSCENDE A REGRA
72
Reflexão 1 – PODERES E SABERES
Transcender é ultrapassar a capacidade de conhecer, extrapolar a norma,
exceder, ir além. Tal conceito nos leva a intuir que as transcendências alcançadas
pelas ginastas instituíram novos conhecimentos sobre o corpo na GR.
A rede de relações que perpetua os conhecimentos do corpo não dimensiona
um sistema desencadeante linear entre saberes e poderes, mas sim um inacabamento
caótico de arrolamentos passíveis de serem lidos leitura multidimensional - por
meio das escrituras do corpo e dos saberes produzidos por este. Um caos ordenado,
uma totalidade corporal capaz de expressar, transcender, mascarar, simular e
maquiar sentidos que se revelam em saberes. Sentidos que se constroem e se
reconstroem, pois aliam-se constantemente a outros sentidos. Uns perduram, uns
resistem, estes para (re) significar os que perduraram e para transcrever
modestamente - não invisivelmente suas pequenas, mas legíveis marcas sempre
consideradas nos textos da construção do conhecimento.
Os conhecimentos da ginástica configuram claramente as relações de poder
focadas nos próprios corpos. A denominação “corpos dóceis” de Foucault (1987) é
adequada para expressar essa condição do corpo da ginasta. Conforme tal autor,
durante a época clássica, a partir da segunda metade do século XVIII, o corpo foi
descoberto como alvo do poder, dos regulamentos, treinamentos e inúmeros tipos
de amoldamentos expressos pelos preceitos escolares, hospitalares, militares e
outros procedimentos que cuidavam de controlar e corrigir as operações corporais.
Não seria a primeira vez que o corpo era alvo de investimentos, no entanto, em tal
73
oportunidade, o corpo foi controlado por um poder invisível, detalhado, sem folga,
nas minúcias, como uma máquina: exímia economia e máxima eficácia.
Nesse período do século XVIII houve uma inversão das técnicas de
intervenção corporal, que os instrumentos ortopédicos externos, tais como
espartilhos, tutores etc., submeteram-se à utilização do próprio arcabouço muscular
como instrumento de correção (VIGARELLO apud FRAGA, 1999). É a partir dessa
pedagogia que ocorre a estruturação da ginástica, racionalizando os movimentos e
compreendendo uma regulação moral dos mesmos em virtude de “benefícios e
malefícios” ao organismo (FRAGA, 1999).
Essa regulação, por sua vez, não era idêntica aos sexos. Para os meninos era
preciso preservar a virilidade e os corpos robustos. “Às meninas, o vigor necessário
para superar os obstáculos impostos pela maternidade, mas sem perder o ‘encanto’
feminino: ser forte em sua ‘missão’, mas, ao mesmo tempo, graciosa em seus gestos”
(FRAGA, 1999, p. 215).
A atenção dispensada à educação física feminina não representava
nenhum tipo de privilégio social para as mulheres daquele tempo;
pelo contrário, esses cuidados se justificavam em razão dos alegados
benefícios sanitários transmitidos à prole masculina. De certa forma,
defender os exercícios como meio de fortalecer os corpos femininos
significava muito mais um aprofundamento da subordinação das
mulheres a um modo masculino de se movimentar que qualquer
tipo de emancipação social (SOARES, 2003, p.83).
A Ginástica Moderna, herdeira dessa forma de pensar o corpo e a mulher,
nasceu no início do século XX, envolvida tanto pelos alinhamentos corporais, quanto
pelas particularidades da representação do sexo feminino na sociedade (LLOBET,
1996). Talvez a GR ainda seja uma das maiores expressões caricaturadas da
representação da mulher: o sexo belo. Isso se torna evidente nos regulamentos, que
se referem sempre a uma ginasta, nunca a um ginasta, pois, a GR prevalece até hoje
como um esporte que não admite a prática masculina.
74
A beleza, segundo esses preceitos, torna-se imprescindível à educação da
mulher, resultando de esforços, de uma pré-disposição a torturas (SOARES, 2003).
Compreendemos o poder na ginástica, com fins de definição de
conformações, inerentes ao “desenvolvimento” da própria manifestação, com isso,
Foucault (1987) nos esclarece que as estruturas de poder balizaram toda a formação
do conhecimento e que a disciplina, na medida em que aumenta as forças dos
corpos, em sua utilidade e economia, diminui em termos políticos de obediência.
Esse brilhante pensamento nos faz avançar e refletir que as transformações do
Código de Pontuação que desembocaram em sua versão atual alavancaram
exercícios ginásticos muito mais complexos e milimetrados, iniciando um processo
de laqueadura de técnicas que canalizaram as variantes criativas de movimento, o
que forçou e força a recriação constante de movimentos e de formas de pensar os
aspectos que definem a beleza da GR, como visto no capítulo anterior. Desse modo,
os corpos das ginastas revelam sentidos da beleza da GR, incorporando, através do
Código, mecanismos de poder que se propagaram nessa constituição através dos
tempos.
Pensar sempre em sujeitos como pólos excludentes constituintes da trama
histórica torna-se um equívoco quando falamos da produção de discursos, cabe, de
acordo com Foucault (1997), livrar-nos desta crença, porque o sujeito seria
constituído pela trama histórica. Ou seja, vale focar uma análise histórica que possa,
sem ter de se referir a um sujeito, dar conta das constituições dos saberes, dos
discursos e dos domínios de objeto, o que dimensiona o conceito de genealogia dado
por este autor.
As práticas discursivas caracterizam-se pelo recorte de um campo de
projetos, pela definição de uma perspectiva legítima para o sujeito de
conhecimento, pela fixação de normas para a elaboração de conceitos
e teorias, cada uma delas supõe, então, um jogo de prescrições que
determinam exclusões e escolhas (FOUCAULT, 1997, p.11).
75
Importante compreender o corpo como construção discursiva, que vem sendo
vivido através de investimentos vários: tecnologias, meios de controle, produção e
consumo, prazer e dor (GALLAGHER e LAQUER apud FRAGA, 2000). O corpo no
esporte de rendimento, inclusive na GR, é produto dessas intervenções, que no
nosso caso, dimensionam a compreensão da beleza que faz ganhar títulos.
Sendo um desporto que objetiva alcançar, dia a dia, a perfeição
técnica, horas de treinamento são utilizadas para a formação de uma
ginasta. E todos os esforços despendidos dentro de uma estrutura de
treinamento são dirigidos praticamente para um único fim: a vitória
em competições, a formação de ginastas capazes de performances até
então consideradas inatingíveis (LAFFRANCHI, 2001, p.3).
A ginástica perpassou e perpassa discursos vários (médicos, pedagógicos,
artísticos), e produz através destes, os seus. O Treinamento Esportivo, ciência
comum a todas as práticas competitivas, principalmente olímpicas, se afina às
particularidades da Ginástica Rítmica, que o toma como referência produzindo
especialidades que procuram reduzir as possibilidades de imprevisão ocasionada
pela técnica que se funda na criação subjetiva. Dessa forma, o mesmo leque aberto
que sucumbe a GR a uma prática artística e expressiva, filtra saberes necessários e
determina outros, direciona as imensas possibilidades de movimento à medição
matemática das performances dos corpos, como percebemos na análise das
especificidades da GR e da configuração do gesto técnico.
Conforme o desenvolvimento da nossa análise, conjecturamos que os
discursos dos corpos das ginastas são permeados por relações de poder, as quais
foram constituindo saberes do corpo através da ginástica, da exaltação do corpo
belo, que conduziram ao desejo do próprio corpo por uma cautela obstinada,
insistente e meticulosa (Foucault, 1979).
O poder, longe de impedir o saber, o produz. Se foi possível
constituir um saber sobre o corpo, foi através de um conjunto de
76
disciplinas militares e escolares. É a partir de um poder sobre o
corpo que foi possível um saber fisiológico, orgânico. O
enraizamento do poder, as dificuldades que se enfrenta para se
desprender dele vem de todos esses vínculos. É por isso que a noção
de repressão, à qual geralmente se reduzem os mecanismos do
poder, me parece muito insuficiente, e talvez até perigosa
(FOUCAULT, 1979, p. 148-149).
Constatamos ainda que a resistência é uma condição essencial para que o
poder possa existir e, principalmente para que, em contrapartida, haja a construção
de conhecimento. Na GR, por exemplo, os movimentos extremamente difíceis
requeridos pelas mudanças do Código encontram resistências corporais por parte
das ginastas, resistências que por vezes são vencidas, e por vezes o resignificadas,
instituindo novas formas de saber. As ginastas das próximas fotos, por exemplo,
estão executando o mesmo salto, no entanto, a da direita estabelece uma forma de
saltar que extrapola bastante os 180 graus de angulação das pernas requeridos pelo
Código de Pontuação.
Imagens 29 e 30 - Classificação igual para movimentos com diferentes limites.
Vale ressaltar, tal como reflete Foucault (1979), que a resistência não resulta
da repressão, pois o poder não é absolutamente repressivo, pois seria impossível
aceitar somente a negação. O que faz com que o poder seja aceito é sua
permissividade, sua produção de discursos, sua indução ao prazer. “Deve-se
considerá-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais
do que uma instância negativa que tem por função reprimir” (FOUCAULT, 1979,
p.8). Por isso, compreendemos o Código de Pontuação da GR como um documento
77
que não reprime, mas que produz o corpo belo da ginasta, possibilita a
construção de uma gestualidade bela.
Até se considerarmos a consolidação mais contemporânea das relações de
poder na Ginástica Rítmica, que é o esporte performance, existem muitas
justificativas prazerosas que fazem com que praticantes destinem grande parte de
suas vidas à dedicação nessa atividade. Não nos referimos necessariamente à
ascendência da vida profissional, mas a um aspecto maior que faz até um atleta
amador se doar completamente àquela causa: o esporte, o desafio. Sobre essa relação
prazer-poder Foucault (1988, p. 48) reflete: “Prazer e poder não se anulam; não se
voltam um contra o outro; seguem-se, entrelaçam e relançam. Encadeiam-se através
de mecanismos complexos e positivos de excitação e incitação”.
A plasticidade do corpo o faz, em razão da resistência, produzir mais. Ao
folhear o atual Código de Pontuação de Ginástica Rítmica, encontramos inumeráveis
mudanças nas regras desde a versão publicada no Brasil em 1978 pela Confederação
Brasileira de Desportos. A começar pelos níveis de dificuldades dos exercícios que
na década de 1970 recebiam duas graduações: nível médio e superior, e que
atualmente têm dez graduações: dificuldades de A a J. Em vários pontos da
trajetória de revisão do Código este se tornou obsoleto pela produção do corpo
através da adequação nele mesmo. É assim que as vias do poder brotam
materializadas aos nossos olhos: o Código constrói e reconstrói a ginasta e a ginasta
constrói e reconstrói o Código.
Segundo Foucault (1997), o sistema de comunicação, registro, acumulação e
deslocamento, que são formas de poder, são essenciais para a formação de saberes.
Nessa perspectiva, nenhum poder se pratica sem o acúmulo, apropriação e
distribuição de um saber, existindo, dessa maneira, formas do poder-saber. Dessa
forma, compreendemos que da versão de 1978 à versão de 2005 2008 dos Códigos
de Pontuação, muitos registros, acumulações e formações de saberes foram
compartilhados. Basta expor que o número de páginas na primeira versão não
78
passava de 53 e que na última passa das 132 sem contar os anexos e erratas
explicativas, documentos rotineiros que esclarecem o texto do Código.
A constante superação das linhas escritas do Código de GR compõe sua
trajetória estética de acordo com a necessidade de reafirmação desta prática. A
vontade de saber surge de acordo com as necessidades de verdade de cada época
(FOUCAULT, 1971), e os discursos são originários dessa vontade. Vontade de reaver
ou romper, os discursos surgem de forma a contestar ou complementar o
conhecimento preexistente.
Foucault (1971), no texto supracitado, “A ordem do discurso” supõe que a
produção do discurso em toda sociedade é construída por diversos procedimentos
que têm o papel de amenizar perigos e poderes e disfarçar sua materialidade,
refreando o acontecimento aleatório.
Os discursos são produzidos por mecanismos de controle, que fixam-lhe
limites pelo jogo de uma identidade que reatualiza permanentemente as regras
(FOUCAULT, 1971). Esses mecanismos, intitulados por Foucault (2003) como poder,
estão imbricados a todo o processo de construção do conhecimento: dos discursos à
verdade.
Produz-se verdade. Essas produções de verdades não podem ser
dissociadas do poder e dos mecanismos de poder, ao mesmo tempo
porque esses mecanismos de poder tornam possíveis, induzem
essas produções de verdades, e porque essas produções de verdades
têm, elas próprias, efeitos de poder que nos unem, nos atam
(FOUCAULT, 2003, p. 229).
As concepções estéticas da GR foram sendo constituídas por diversos
discursos ao longo dos tempos, dos quais, elegemos os que consideramos os mais
emblemáticos no Código de Pontuação, considerado por nós como um dos mais
influentes discursos do corpo da Ginástica tmica contemporânea, para explicitar
as relações poderes saberes existentes nesse contexto.
79
Reflexão 2 – A TÉCNICA E O ESTILO
Reconhecemos o legado das técnicas corporais, compreendidas por Mauss
(2003) pelos usos do corpo das sociedades. A leitura dessas técnicas torna possível
uma análise estética a partir da historicidade, pois são adequadas aos contextos das
sociedades e às épocas em que se expressam. Portanto, enxergamos uma relação de
análise permissiva pela via da historicidade que remete às técnicas, e pelas técnicas
que evocam a historicidade.
Sendo assim, a leitura dos gestos, tidos como impreteríveis na história da
humanidade (MAUSS, 2003) nos coligam à essencialidade de se compreender a
ginástica, pois, os hábitos, movimentos e posições variam não somente com os
indivíduos e imitações, mas com “as sociedades, as educações, as conveniências, as
modas, os prestígios” (MAUSS, 2003, p. 404). Ler os gestos na ginástica, assim como
o texto do Código que os determinam, é mais que fazer análise de movimento ou da
gramática textual, é compreender sua construção, sobretudo estética. Visto que,
“gestos aparentemente insignificantes, transmitidos de geração em geração, e
protegidos por sua insignificância mesma são testemunhos geralmente melhores que
jazidas arqueológicas ou monumentos figurados” (MAUSS, 2003, p. 15).
O termo técnica é compulsivamente utilizado no universo das práticas
corporais, sobretudo dos esportes institucionalizados, pois engloba todos os
movimentos, suas formas específicas e todo o processo de obtenção do gesto de uma
determinada manifestação. Esses modos acabam por se universalizarem e
aperfeiçoarem, conforme se a disseminação da prática. Embora, segundo os
argumentos de Mauss (2003), no mundo, sempre ocorram contribuições originais de
se empreender possibilidades e métodos de construção de técnicas corporais,
compreendidos por nós como os enriquecimentos dados pelas peculiaridades das
culturas. A análise dos gestos poderia, então, ser um patrimônio comum e acessível
à humanidade.
80
A técnica, em Ginástica Rítmica, também recebe conceituação própria,
agregada à realização do movimento ginástico com o máximo de economia e
eficiência, e o mínimo de esforço, expressos pelo virtuosismo corporal na execução
das séries (LAFFRANCHI, 2001). Enxergamos esta compreensão nas entrelinhas do
texto do Código de Pontuação.
Para se alcançar a perfeição do gesto desportivo e o automatismo
correto da execução dos movimentos, a ginasta tem que passar por
um caminho de infindáveis repetições durante sua preparação e
suportar extenuantes e exigentes correções detalhadas de cada
movimento (LAFFRANCHI, 2001, p.85).
O conceito de técnica na GR, como visto anteriormente, ainda permeia-se
pelos preceitos positivistas da disciplina pautados na utilidade e economia dos
gestos, como nos mostrou Foucault (1979).
Compuseram a emancipação e universalização das técnicas corporais de
Ginástica Rítmica, diversos contextos de países, situados, em sua maioria, na
Europa. Tal fato forneceu à região propriedades pioneiras dos gestos mais
significativos dessa modalidade ginástica. Duas nações, todavia, sobrepuseram-se: a
Rússia e a Bulgária, constituindo duas vertentes com características bem definidas
da GR.
A escola russa exibia uma forma de trabalho toda fundamentada pelo Ballet
Clássico, familiar às suas tradições, o que imprimia aos movimentos uma grande
amplitude no espaço e expressividade. a escola búlgara caracterizou-se por uma
forma de trabalho que explorava a originalidade, a variedade de elementos, o
dinamismo e a estonteante expressividade de suas ginastas. Embora divergentes no
que chamamos de estilo, os pódios das décadas de 1970 e 1980 de competições de
Ginástica Rítmica foram compartilhados por esses países. Um terceiro estilo se
mostrou (década de 1960, primeiras competições internacionais), dotado de
81
acrobacias, a Coréia que foi vetada por esboçar uma ginástica mais acrobática
(LLOBET, 1996).
Imagens 31 e 32 - Estilos divergentes que culminaram numa mesma manifestação,
ginasta russa e búlgara.
As escolas búlgara e russa estruturaram-se por caminhos divergentes, mas
que culminaram numa manifestação única, consideradas irretocáveis e
imprescindíveis na escultura da GR. Esses dois estilos nos interligam ao pensamento
de Merleau-Ponty (2002), na Prosa do Mundo, sobre a arte clássica e moderna, pois
estamos compreendendo estes dois movimentos como íntimos às expressões da GR.
Nas palavras do filósofo: “Enquanto os clássicos eram eles próprios sem que o
soubessem, os pintores modernos procuram primeiro ser originais, e seu poder de
expressão confunde-se com sua diferença individual” (MERLEAU-PONTY, 2002,
p.80). Esse filósofo da fenomenologia, embora exemplifique na obra citada sua
análise através das pinturas, refere-se às diferenciações das artes clássica e moderna
como dois mundos percebidos em que constavam pintores, escritores, filósofos e
pesquisadores (MERLEAU-PONTY, 2004), ou seja, os personagens que pronunciam
uma época.
82
Constatamos as aproximações da escola russa com a arte clássica, dotada de
segurança e dogmatismo (MERLEAU-PONTY, 2004), pautada pela
proporcionalidade, harmonia de formas, perfeição técnica, predizendo uma
utilização do corpo voltada à repetição extenuante de gestos, comum ao Ballet
clássico, a fim de se chegar a um objetivo pré-determinado. A escola búlgara,
todavia, caminhou por outros rumos, da originalidade, criatividade, desbravando
riscos e desafios, explorando as qualidades individuais do sujeito, características que
se coligam às ambigüidades e incompletudes da arte moderna (MERLEAU-PONTY,
2004).
Considerando que a GR é uma manifestação que se originou por cunhos
pedagógicos e artísticos nos movimentos ginásticos europeus, e reconhecida como
Ginástica Moderna, compactuaremos, pela aproximação de raízes, aos movimentos
artísticos suscitados pelo filósofo Merleau-Ponty (2002), que tão bem conceitua o
termo anteriormente referendado: estilo.
O estilo é o que torna possível toda a significação. Antes do
momento em que os signos ou emblemas serão em cada um e no
artista mesmo o simples índice de significações que ali estão, é
preciso que haja este momento fecundo em que eles deram forma à
experiência, em que um sentido que era apenas operante ou latente
encontrou os emblemas que haveriam de liberá-lo e torná-lo
manejável para o artista e acessível aos outros. Se quisermos
realmente compreender a origem da significação - e se não o
fizermos, não compreenderemos nenhuma criação, nenhuma
cultura, voltaremos à suposição de um mundo inteligível onde tudo
está significado de antemão -, precisamos aqui nos privar de toda
significação instituída e voltar à situação de partida de um
mundo não significante que é sempre o do criador, pelo menos no
que toca àquilo justamente que ele vai dizer (MERLEAU-PONTY,
2002, p. 84-85).
A obra artística referendada pelo presente estudo é o próprio corpo em
movimento, que constitui sua atmosfera pelas suas formas, aparências, oscilações no
espaço e implementos. A ginasta em seu exercício é objeto estético, fundada pela
83
concepção de sua coreografia entremeada a sua expressão. Porém, vale considerar
que a ginasta pendula entre dois extremos, o da expressão pessoal e o da técnica
inerente à GR, ao mesmo tempo em que não pode se desviar da técnica pode criar e
se expressar dentro desta. Os estilos constituídos pelos países, técnicas e ginastas, se
expressam como os modos com que os moldes da GR foram transgredidos e
transformados, o que por sua vez caracterizaram a constituição da própria GR. Esse
fenômeno é comum a outras práticas corporais sistematizadas, como os esportes, e
se constitui como de suma importância para o enriquecimento da Cultura de
Movimentos e produção saberes na área da Educação Física.
A ex-técnica da seleção campeã mundial búlgara das décadas de 1980 e 1990,
e fundadora de um estilo inventivo e inédito que fez história, Róbeva (1981), nos
esclarece que cada ginasta tem seu estilo próprio, e que as músicas, as coreografias,
as aparências (roupas e adornos) devem necessariamente respeitar essa linguagem,
pois são capazes de potencializar o seu talento. As ginastas da Bulgária apareciam
como “caixinhas de surpresa” aos campeonatos mundiais, chegavam às competições
com novidades que garantiam as primeiras colocações e mobilizavam o público,
considerado por Róbeva como o árbitro número um.
Rússia e Bulgária carimbaram suas marcas nos anos 80 e 90, mas após a
aposentadoria de beva e da presença ordinária das ginastas russas nos pódios
europeus, mundiais e olímpicos, o estilo búlgaro perdeu forças e o estilo russo se
redesenhou.
Nossa apreciação nos permite identificar outros estilos de GR que se
conformam atualmente: os estilos alegres e plásticos grego e bielo-russo, o estilo
clássico ucraniano, o estilo circense russo etc. Tomaremos os dois últimos para
descrevê-los pelo exame de duas ginastas.
A ginasta ucraniana Anna Bessonova, apresenta movimentos virtuosíssimos,
sem falhas, sem sobressaltos, saltos de amplitudes inacreditáveis, movimentos e
manejos com aparelhos milimetrados, execução exímia dos exercícios, interpretação
84
e ritmo marcado conforme a música. Bessonova parece ter saído dos palcos dos
grandes balés de repertório, é uma ginasta bailarina que impressiona pela sua
precisão e pela bela história que conta durante a série pelos movimentos do seu
corpo.
Imagem 33 - O cisne.
A série de arco com a música do espetáculo Lago dos Cisnes apresentada no
campeonato mundial de Budapeste em 2003 transcende o tempo e espaço quando
lentamente a ginasta executa uma seqüência de movimentos de braços sem se
deslocar para ilustrar o tema da coreografia, conforme o cisne interpretado pela
personagem principal desse Ballet de repertório, Odete. Esse exercício exprime o
teor clássico dessa ginasta.
Outra ginasta que destacamos é a russa Alina Kabaeva. Seus movimentos são
marcos para a Ginástica Rítmica contemporânea. É uma ginasta de tamanha ousadia
corporal, tanto que isso lhe rendeu um mundo de críticas ao estilo considerado
circense, mas simultaneamente, lhe garantiu as primeiras colocações nos
campeonatos em que participou. Kabaeva realiza proezas com os aparelhos e
contorcionismos com o corpo exibindo um largo sorriso de facilidade. Seu corpo
hiperflexível parece incontrolável. Não bastasse a amplitude absurda dos
85
movimentos de pernas e tronco, sua potência para saltos a eleva a alturas e ângulos
espetaculares. Destacamos as performances de Kabaeva como rupturas nos
movimentos da GR, sobretudo do ponto de vista estético.
Ilustramos a série do aparelho arco do Campeonato mundial de Budapeste
em 2003, interpretação de uma música espanhola, trazendo movimentos
impressionantes de plasticidade e vigor.
Imagem 34 - A circense.
As atletas de Ginástica Rítmica de cada país imprimem estilos peculiares às
suas coreografias. Esses estilos resultam de maneiras próprias de usos do corpo, as
pedagogias de movimento, inerentes à manifestação e contornadas por cada cultura.
Os limiares de excitabilidade, os limites de resistência são diferentes
em cada cultura. O esforço “irrealizável”, a dor “intolerável”, o
prazer “extraordinário” são menos função de particularidades
individuais que de critérios sancionados pela aprovação ou
desaprovação coletiva do que função de particularidades
individuais. Cada técnica, cada conduta, tradicionalmente
aprendida e transmitida, funda-se em certas sinergias nervosas e
musculares que constituem verdadeiros sistemas, solidários com
todo um contexto sociológico (LÉVI-STRAUSS, 2003, p. 14).
86
Os dizeres de Lévi-Strauss, na introdução da obra de Mauss, reforçam a idéia
de que a beleza na GR, ou seja, as concepções estéticas predominantes são balizadas
por mecanismos sociais construídos culturalmente. Isso não impede, ao nosso ver,
ocasiões de transcendência, do despertar para categorias estéticas como o feio ou o
grotesco durante a apreciação de uma série por um espectador, provocado pela
busca de movimentos que desafiam a normalidade instituída pelas formas dos
corpos. Ao mesmo tempo, tem-se a impressão de que a GR se reaproxima dos
espetáculos circenses, como mencionado, desde o rompimento das origens
ginásticas com as práticas populares, no culo XIX, quando necessita do elemento
surpresa, além dos prescritos pelo Código, para transcender a normatização, para
despertar no público novas sensações.
Reflexão 3 – BELEZA E EDUCAÇÃO
Ao avaliar o traçado estético da GR percebemos alguns discursos fundantes,
outros que sofreram rupturas. Discursos provenientes da arte, desde suas origens,
que tratavam de estabelecer a estética da beleza, e, concomitantemente, uma
padronização disciplinar, semente da criação da ginástica, mas que também
objetivava o belo, pelo corte dos excessos, pela medida. Discursos provenientes da
pedagogia que imitava a ciência, pela nova forma de se pensar o homem,
naturalizado, biologizado, do qual se extrairia o máximo de produção com o mínimo
de esforço: a economia (SOARES, 1998). Discursos da nova medicina, empírica, que
se preocupava com a visibilidade das doenças, “ver para crer(FOUCAULT, 2001),
dissociando-se das analogias criativas para centrar-se num estudo aprofundado
sobre o corpo, para conhecê-lo mais. Discursos sobre a condição natural da mulher:
a reprodução. Discursos do treinamento esportivo, no qual existe a preocupação em
espetacularizar esse corpo e dele arrancar as melhores performances. Enfim, as
conformações estéticas das especificidades, do tempo e espaços e dos gestos da
87
Ginástica Rítmica foram construídas sob uma trama complexa de relações de
poderes durante todo o seu curso.
Fica, portanto, o desafio da transcendência do gesto controlado, do tempo e
espaço regulado e de características fechadas. O corpo sempre nos diz algo, desafio
maior é dizer além da beleza de um exercício dentro de padrões, comunicar mais
que o movimento virtuoso. Feito possível para ginastas e coreografias campeãs do
mundo, corpos que tudo podem, e também possível para corpos menos agraciados
pelas qualidades de movimento requeridas pelo alto rendimento da GR, pois a
transcendência acaba por ser uma condição da prática dessa modalidade, é preciso
transcender para se apropriar da GR e poder identificá-la em outros contextos.
Vimos então que a amplitude estética da GR, formada pelas transcendências
dos corpos e imposições do código, é demasiadamente grande. A Ginástica Rítmica
é uma modalidade que propõe diversas facetas que extrapolam as fechadas formas
de movimento requeridas pelas regulamentações, capaz de estar sempre se
transformando, seja pela transcendência, seja pela retomada das idéias que a
constituíram.
Por isso, consideramos que a abordagem de nuances educacionais nessa
modalidade seja possível, reconhecendo a prioritária fixação da GR ao Código de
Pontuação, mas enxergando sempre a possibilidade de fazer diferente nos pequenos
espaços da originalidade dos gestos, inovações e transformações.
Vale ressaltar que a experiência da beleza ou experiência estética configura-se
como uma porta aberta à possibilidade de ampliação do olhar estético, para um
transcender do corpo na GR, isso considerando que essa manifestação ginástica
fundou-se à luz da estética, à luz da beleza.
Durante os primeiros encaminhamentos, no final do século XIX, início do
século XX, as orientações daquilo que chamamos hoje de Ginástica Rítmica
engatinhavam à procura de uma identificação estética frente às demais
manifestações surgidas em movimentos e momentos cronológicos próximos (Dança
88
Moderna, por exemplo), desse modo, pensamos sobre o que fez com que esta viesse
a tomar o rumo do objetivismo estético e da performance em detrimento das suas
características subjetivamente rítmicas, artísticas e pedagógicas da origem. Quando
denunciamos o objetivismo estético, nos referimos ao enquadramento da GR ao
ideal clássico de beleza, evidenciado pelas performances dos corpos e,
principalmente, ao observarmos, a partir das análises, que o belo na Ginástica
Rítmica tem seus padrões regulados pelo Código de Pontuação.
A concepção clássica do belo, pautada na proporcionalidade, na
medida, na simetria e na harmonia de formas, está relacionada a um
modelo de beleza preconcebido ou a um princípio supremo. A
beleza está nos objetos belos, e para serem considerados belos, estes
devem se enquadrar em predefinições (PORPINO, 2003, p. 148-149).
Porpino (2003), aliada às idéias de Nietzsche, aprovisiona ao deus grego
Apolo a representação da beleza clássica, da medida, da ordem, da proporção, da
simetria, do equilíbrio e da harmonia de formas tão preponderantes na maneira de
se perceber o corpo e a beleza na Educação Física.
O ideal apolíneo encontra-se no cerne das preocupações com o corpo
na Educação Física, que, imbuída deste pensamento, procura beleza
nas simetrias, nas proporcionalidades e nas medidas atribuídas a
modelos de performance e a modelos corporais, ambos articulados,
gerando novos Apolos. (...) A beleza, em sua concepção clássica,
propicia-nos a experiências estéticas significativas. Basta que
lembremos dos muitos corpos "esculpidos" pelo fitness ou pelas
práticas esportivas à incrível semelhança de Apolo (...) Também
poderíamos lembrar uma série de Ginástica Rítmica Desportiva cujos
gestos nos propiciam uma experiência indescritível em que o
movimento realizado pode ser apreciado em sua mais exuberante
harmonia, amplitude e graça, em sua meticulosa e minuciosa
capacidade de desafiar a lei da gravidade com sua leveza, deixando-
nos ciente de que um corpo metodicamente treinado é capaz de
tal realização (PORPINO, 2003, p. 149 /151-152).
89
Entretanto a autora contrapõe, mostrando que na percepção da beleza as
verdades apolíneas não reinam sozinhas, opostas e complementares a elas as
dionisíacas: Dionísio, deus do vinho, que desafia o belo posto pela representação de
Apolo através das emoções, da embriaguez dos sentidos. Dionísio é suscitado por
Isadora Duncan, personagem influente no movimento da Ginástica Moderna em
suas danças, em seu rompimento com as “rígidas convenções de uma época em que
a dança teatral era apreciada pelo seu virtuosismo técnico (...) Fez da dança o êxtase
dionisíaco, dissipado pelas verdades apolíneas do balé clássico” (PORPINO, 2002, p.
2).
Para além dessa concepção objetivista clássica, já desafiada pelo duplo caráter
da arte retomado por Porpino (2003), temos a concepção genuinamente subjetivista.
Nesta perspectiva, o olhar é voltado para o sujeito, exclusivamente para o seu gosto
próprio. Porém, alicerçamos nossos pensamentos acreditando que beleza não está
situada no objeto, nem no sujeito, mas é gerada a partir da reciprocidade entre os
dois, pela mobilização dos sentidos, através do conhecimento de outros códigos e,
principalmente, no caráter de inacabamento da leitura estética (PORPINO, 2006).
De acordo com Dufrenne (2004), o belo não pode ser considerado somente
como uma idéia ou um modelo, é a singularidade de certos objetos que nos são
dados à percepção, traduz-se em plenitude, mesmo que para perceber o objeto
estético se necessite de longa aprendizagem e familiaridade. Qualquer idéia de
retoque é desencorajada, pois a perfeição do sensível é uma necessidade.
O objeto belo me fala e ele só é belo se for verdadeiro. Mas o que me
diz? Ele não se dirige à inteligência, como objeto conceitual
algoritmo lógico ou raciocínio -, nem à vontade prática como objeto
de uso sinal ou ferramenta -, nem à afetividade como objeto
prático ou amável: primeiramente ele solicita a sensibilidade para
arrebatá-la. E o sentido que ele propõe também não pode ser
justificado nem por uma verificação lógica nem por uma verificação
prática; é suficiente que ele seja experimentado, como presente e
urgente, pelo sentimento. Esse sentido é a sugestão de um mundo.
Um mundo que não pode ser definido nem em termos de coisa,
90
nem em termos de promessa de alma, mas promessa de ambos; e
que pode ser nomeado pelo mundo de seu autor: o mundo de
Maczart ou de Cézanne (DUFRENNE, 2004, p. 45 – 46).
Dufrenne (2004) pauta sua compreensão do belo, a partir da estética
fenomenológica, considerada, na introdução da edição brasileira de sua obra, como
uma das correntes de maior consistência no âmbito da Estética. A partir dessa
fundamentação nos congregamos aos pensamentos de Porpino (2002; 2003; 2004;
2006) e Nóbrega (2003), autoras em quem nos fundamentamos para pensar a
experiência estética na Educação Física.
Algumas práticas corporais, a exemplo da Ginástica Rítmica, cravaram suas
concepções de beleza em modelos pré-concebidos. A leitura do Código de
Pontuação nos traz essa compreensão. Porém, refletimos que a beleza pode ser
pensada também como experiência do ser no mundo, pois, a partir desta o indivíduo
é capaz de transfigurar o digo, (re) significá-lo, fazendo fluir conhecimentos e
repensar arquétipos, sobretudo no âmbito da Educação.
Compactuamos com Porpino (2004) quando se refere ao enquadramento da
GR a técnicas e padrões como aspecto que contribui para o ajuste da Ginástica
Rítmica ao protótipo de estética objetivista já mencionado, que veio e continua sendo
edificado. Isso se comprovou nos resultados da nossa análise, quando vimos que o
texto do Código de Pontuação delimita claramente a GR enquanto prática que
possui uma sistematização própria que permite um julgamento quantificável e
qualificável. Pensamos que a GR tomada desta forma, além de canalizar por demais
nosso modo de percebê-la, faz com que tenhamos um deslumbre de prática
fantástica, inatingível, predestinada a seres privilegiados com dotes corporais
especiais, e com o acesso restrito a um tipo privativo e “alucinado” de treinamento.
O que por sua vez, não se traduz como uma visão distorcida, considerando os
exemplos mais recentes, os de índice olímpico da GR. Distorção seria crer na
imobilidade desses padrões quando a tomamos para outros contextos, quando não
91
admitimos suas reconfigurações, adequações que não descaracterizem suas
particularidades estéticas, ou mesmo apropriação de alguns de seus elementos.
Pensamos que a GR é pautada por concepções estéticas constituídas por
mecanismos de poder-saber preponderantes em toda sua historicidade, que
definiram e, principalmente, transformaram seus devaneios artísticos em podas. Ao
mesmo tempo em que foi possível criar, as originalidades mais emblemáticas se
transmutaram em restrições. Um movimento idealizado por uma ginasta, por
exemplo, deixa de ser criação e passa a ter normatizações próprias para que possa se
adequar a essa modalidade ginástica.
Cada vez que se atingem índices extraordinários, estes são tomados como
parâmetro para o alto rendimento, e posteriormente, para o âmbito da escola ou de
qualquer outro. O fenômeno ocorre da seguinte forma: se uma ginasta realiza as
mais formidáveis proezas em uma olimpíada, dali a quatro anos todas as outras
também o farão, e assim, as tendências temporárias ou permanentes de movimentos,
figurinos, acompanhamentos musicais, vão preponderando até rechear os mais
diferentes níveis e contextos de prática da Ginástica Rítmica.
Entretanto, de acordo com Campelo (1996), o ser humano possui uma
comunicação gestual própria, que esculpe sua identidade através dos textos dos seus
movimentos. Esse esculpir é aquilo que denominamos de estilo e que a autora
ressalta como “todo quadro de referência corporal que compõe determinada pessoa”
(CAMPELO, 1996, p. 78). A ginasta, quando se apresenta, comunica aos
espectadores, aos árbitros e às outras ginastas através de seu corpo, movimentos,
adereços e música, uma mensagem estética única imbuída de relações de poder,
configurações próprias das especificidades da ginástica, dos usos do tempo e do
espaço, e dos gestos técnicos. A ginasta transcende o Código, que em hipótese
nenhuma é capaz de regulamentar seu estilo pessoal.
Embora a GR, como visto no decorrer das análises, exiba seus contornos
estéticos com propriedade, suas concepções precisam ser ponderadas em outros
92
contextos, levando em conta que ao nos referirmos a esta modalidade pensamos no
seu patamar mais expressivo: o esporte de alto rendimento. É preciso lembrar que
essa maneira de pensar a estética, a concepção de beleza pré-concebida, é particular
à GR, constitui-se como a possibilidade mais forte de idealizá-la, mas que não é a
exclusiva. Pensar a beleza em sua perspectiva objetivista no âmbito da Educação
pode significar uma atitude não inclusiva que define e valoriza padrões de gosto e
de gesto em detrimento de outros (PORPINO, 2003).
Portanto, pensarmos a GR no contexto educacional implica redimensionar as
concepções estéticas retratadas pelos modelos olímpicos e considerar que mesmo a
mais prodigiosa ginasta é capaz de vivenciar a experiência da beleza como uma
vivência sensível em que todo o indivíduo encontra-se engajado com sua história,
seu contexto social e suas predileções pessoais (PORPINO, 2003).
Cabe, para tanto, discutirmos as configurações da beleza universalizada pela
vertente olímpica da GR para pensá-la como experiência do vivido, uma vez que, ao
apreciarmos uma ginasta olímpica somos tomados pelo seu deslumbramento
porque essa experiência, para nós, transcende a ditadura do modelo da ginasta
perfeita para se ancorar no nosso mundo sensível. Retomamos aqui uma concepção
fenomenológica do belo, já explicitada anteriormente.
O belo, não sendo idéia ou modelo, precisa ser experimentado,
vivido, solicitando assim, a sensibilidade, como convite à
contemplação. Na descrição fenomenológica, o belo não é uma forma
idealizada ou uma redução ao gosto exclusivo do sujeito, mas uma
articulação que acontece na percepção como interpretação dos
sentidos proporcionados pelos jogos expressivos do corpo. Realiza-se,
pelo logos estético, a leitura da dimensão poética e plástica do gesto
(NÓBREGA, 2003, p. 139-140).
Consideramos, antes de tudo, que os conteúdos da cultura de movimento
devem passar por transformações, críticas e reflexões antes e durante sua
permanência no contexto educacional “O estético é útil enquanto, na relação sujeito-
93
objeto, corresponde, satisfaz necessidades profundamente humanas” (VÁSQUEZ,
1999, p.165).
As exacerbações retratadas na técnica e na padronização dos gestos ainda não
foram capazes de extrair o brilho do olhar de quem experiencia, ou até mesmo
aprecia a GR na contemporaneidade, pois a beleza, reproduzida, arquitetada ou não,
construiu-se como fundamento dessa manifestação, e, porque a experiência estética,
experiência que se exclusivamente no corpo, ocorre “a partir de uma relação de
imanência entre sujeito e objeto(PORPINO, 2003 p. 145). Dessa forma, o olhar do
sujeito é fruto de sua existência, que, tatuada de significações de sua historicidade,
cultura e vivências sensíveis, estabelece suas próprias relações estéticas.
Ao identificarmos na GR um cunho estético pautado no objetivismo do ideal
clássico de beleza, mesmo acreditando que a experiência estética, a experiência da
beleza ocorra de forma muito mais ampla, e, considerando concomitantemente sua
inserção em nosso país, onde a cultura do povo é extremamente polissêmica, mesmo
não compartilhando sempre com a semelhança com os caracteres fundamentalmente
definidos que acompanharam o desenvolvimento da ginástica, pensaremos em
inumeráveis possibilidades de problematizar e questionar os padrões estéticos da
Ginástica Rítmica no contexto educacional, além de enriquecê-la com elementos da
nossa cultura. Desta forma, é possível intuir que a GR pode contribuir para
viabilizar uma educação que alargue compreensões estéticas, olhares e vivências
nessa manifestação.
Também foi possível perceber, através de nossas análises, que as concepções
estéticas construídas a partir da historicidade de uma prática corporal consideram as
incidências culturais. Para tanto, nos utilizamos do conceito, anteriormente
referendado, de cnicas corporais de Mauss (2003, p.401) visando reafirmar essa
idéia: “maneiras pelas quais os homens, de sociedade a sociedade, de uma forma
tradicional, sabem servir-se de seu corpo”. Sendo as técnicas reluzidas pelas
culturas, como definir padrões iguais para sociedades diferentes? Não estamos aqui
94
para discutir a universalização do fenômeno esportivo, mas para problematizar a
criação desses padrões, para pensar nessa racionalização do sensível. Pois, sendo a
GR um esporte-performance dominado pelas européias, é recriado e reinventado
pelo resto do mundo com identidades variadas para que essa universalização
ocorra, porque é preciso transcender e transformar o repertório gestual de cada
cultura para adequar-se à GR estereotipada e emancipada.
Acreditamos que refletir sobre a beleza da GR possa contribuir para
aprofundar nossos pensamentos, ansiar significações e repensar e/ou retomar
objetivos na Educação Física. O pensamento de questionar as concepções estéticas de
uma manifestação que, de forma generalizada, possui delimitações firmemente
torneadas, mas pouco protestadas, é, a priori, um desafio. Porém, esse diálogo crítico
torna-se urgente aos questionamentos e reflexões sobre as transposições de
experiências do esporte de alto rendimento para o contexto educacional.
Nós compreendemos o digo de Pontuação de Ginástica Rítmica como a
materialização das relações de poder que adequam os corpos, mas que foram
produzidos por estes. E mais, responsabilizamos essa produção pela busca
incessante do belo embasado pelas performances desses corpos. Nessa perspectiva, é
possível perceber também que essa beleza é conquistada cada vez mais a partir da
técnica criada através dos tempos que é pormenorizada pela capacidade das
próprias ginastas.
Mais uma vez citamos Foucault (2003, p. 25), quando este parece nos dizer da
necessidade de se experimentar o novo, as novas experiências estéticas para além
das previsões da metrificação da beleza.
Devemos nos liberar desse conservantismo cultural, tal como
devemos nos liberar do conservantismo político. Devemos
desmascarar nossos rituais e fazê-los aparecer como são: coisas
puramente arbitrárias, ligadas ao nosso modo de vida burguês. É
bom – e isso é o verdadeiro teatro – transcendê-los através do modo
do jogo, através de um modo lúdico e irônico; é bom ser sujo e
barbudo, ter cabelos compridos, parecer uma moça quando se é um
95
rapaz (e vice-versa). É preciso pôr “em cena”, exibir, transformar e
derrubar os sistemas que nos ordenam pacificamente.
Mas, como lançar um olhar crítico ao padrão a partir do próprio padrão? Para
desmistificar padrões é preciso desencarná-los. Foucault (1987) afirma que quanto
menos perceptível for a incidência do poder mais encarnado ele estará. Educar o
olhar é enxergar onde não se explicitam evidências, para que não tomemos uma
escolha desconhecendo as demais possibilidades. Talvez apenas conhecer não basta,
é preciso apaixonar-se, desapaixonar-se, aprofundar-se nos sentidos, corporificar de
uma vez por todas a aprendizagem, pois vivenciar é a chave.
O exemplo das produções de performances em larga escala criadas no esporte
de rendimento é que fazem com que as práticas institucionalizadas sejam recriadas a
partir dos padrões, a exemplo da GR, e são uma expressão do contra-poder
apresentado por Foucault (1979). A Educação Física precisa se referenciar nesse
aspecto e não tomar as práticas de alta performance como modelo único, sem
reconstituí-las, deve sim, criar sentidos próprios adequados a cada contexto. No
entanto, não estamos expressando que essa “cópia” do esporte de rendimento no
âmbito educacional ocorre em total igualdade, pois, naturalmente, nos parece
improvável reproduzir tais e quais todas as intervenções corporais do rendimento
na escola. É certo que já existe uma adequação, porém, esta não tem sido eficiente na
GR brasileira, basta observar o grande número de equipes escolares inscritas em
campeonatos brasileiros, eventos que guardam os maiores desempenhos ginásticos
do nosso país.
Cabe ressaltar que as vivências dos movimentos específicos da GR podem
significar alternativas de reluzir sua transcendência, tanto nas especificidades,
quanto nos gestos.
As formas de movimentos específicos da GR constituem duas terminações: os
Grupos Fundamentais que são os saltos, equilíbrios, pivots, flexibilidades e ondas, e os
96
outros grupos que servem de ligação para esses movimentos: os deslocamentos,
corridas, caminhadas, saltitos, passos rítmicos e giros (FIG, 2007).
Apesar de alguns desses movimentos
9
coincidirem as habilidades motoras
básicas, na GR eles predizem formas próprias que supõem maneiras codificadas de
se executarem, ou seja, não se corre na prática da GR como se corre na rua para
alcançar um veículo em movimento, nem se salta na GR como se pula qualquer
objeto, ambos são praticados a partir de uma postura e de um controle minucioso de
todo o corpo, como visto em nossas análises. Destacamos aqui, a compreensão das
dinâmicas e movimentos que sustentam as ações motoras, pois antes de caminhar ou
equilibrar de tal forma é preciso entender o que fundamenta esses gestos.
Dessa forma, acreditamos que a compreensão do movimento pela descoberta
deve preceder a aprendizagem da forma, através de pequenos desafios, pois a
exigência da forma a qualquer custo implica em adestramento, ocasionando uma
aprendizagem limitada.
Importante destacar que, assim como na dança, campo pesquisado por
Porpino (2006), a apreensão da GR implica na aquisição de técnicas, de formas de
movimentos, através de repetições e do treinamento, para que os movimentos
possam se mostrar como expressão do estético, que não descaracterizem a ginástica,
nem neguem o Código.
Porpino (2006) também afirma que a dicotomia entre forma e sentimento é
inexistente, pois mesmo que uma dança seja extremamente codificada, numa
situação de um Ballet de repertório, por exemplo, a interpretação e a forma da
bailarina é que expressarão o sentido coreográfico adequado. “A dança é um ir e vir
9
Pudemos vivenciar os Grupos Fundamentais e os outros grupos sob esse aspecto na
disciplina de GR da licenciatura em Educação Física, no primeiro semestre de 2004 e na
docência assistida em 2006. Nas duas oportunidades experenciamos os movimentos a partir
de situações cotidianas, da variabilidade, segundo os espaços, os ritmos etc. para depois
experimentarmos movimentos específicos da GR.
97
de formas impregnadas de sentidos e sentidos impregnados de formas que são
recriados a cada momento de sua realização” (PORPINO, 2006, p. 106).
Dessa maneira somos capazes de enxergar beleza e reconhecer outras
manifestações e outras linguagens que extrapolam as decodificações da GR, a
exemplo do maracatu, forró e frevo numa série de GR, como na série de maças
apresentada pela Seleção Brasileira de conjuntos nos Jogos Olímpicos de Sydney em
2000.
Imagem 35 - Maracatu, frevo e forró.
Frisamos que, na imagem anterior, além de compreender elementos de
manifestações culturais populares pelas quais as ginastas coligam bem os sentidos
requeridos à série ginástica, esta é bem delimitada no que concerne às formas
exigidas pelo Código.
Contudo, exprimimos que a busca das formas de movimento em si não
anulam a condição educacional da GR, porém, a negação destas a descaracterizam.
Portanto, torna-se necessário dosar as vertentes forma e expressão
concomitantemente, aprovisionando à prática pedagógica liberdade de expressão
98
aos educandos e uso de outras linguagens de movimento que possam dialogar com
a GR, permitindo que a aprendizagem seja mais envolvente e prazerosa.
a transcendência do olhar sob modelos pré-concebidos na Educação Física
pode ser alcançado através da apreciação de práticas corporais, nesse caso, da
Ginástica Rítmica.
O olhar em si, imbuído de concepções já nos diz muito. No entanto, devemos
compreender que não alunos tipo “páginas vazias”. Muitas vezes os deos de
alto rendimento da GR causam diversas sensações que atravessam a estranheza, a
experiência da beleza, o incômodo ou até mesmo o desinteresse. As intervenções
podem partir das sensações e do debate destas, do questionamento das
compreensões que estaremos assumindo.
Nesse sentido, a observação direcionada ao contexto espacial, gestos, cores,
sons e formas nos fazem conhecer um pouco mais sobre as linguagens pelas quais a
GR opera. Por outro lado, a decodificação dos movimentos tanto pode abrir margem
para a mais sutil leitura dos gestos quanto para a análise do julgamento da
modalidade.
De qualquer forma, a apreciação com enfoque na aprendizagem necessita de
suportes diretivos. Precisamos de um vislumbre que busque extrair algo mais do
espetáculo, um olhar de criticidade que pode variar e se aproximar segundo um
contexto determinado, pois, a maneira com que uma turma de Educação Física
escolar, ou uma equipe de GR, ou escolinha de GR, ou até mesmo uma turma da
graduação em Educação Física da universidade enxergam o mesmo vídeo será
muito divergente, e essa diversidade se ramificará ainda mais entre cada uma das
pessoas.
Uma Educação que reafirme a experiência estética na realidade da Educação
Física escolar é de tamanha significância, que deve pretender afrouxar uma
Educação que desconsidera o corpo, pois quando esta reafirmação é negada, ao
mesmo tempo em que busca consolidar os cuidados com um corpo físico, biológico,
99
natural, higiênico e disciplinado, abandona-o nas práticas ditas como
exclusivamente cognitivas. A tarefa é árdua e o desafio gigante, porém, a partir do
momento em que as práticas corporais puderem ser tomadas pelas suas nuances
mais ricas, como a vivência crítica dos seus mais diversificados conteúdos, as
relações estéticas se efetivarão de forma mais ampla e as amarras dissipar-se-ão.
Nóbrega (2000) nos aponta a ação motora do ser humano como linguagem
que se apreende invariavelmente por ordem perceptiva cuja matriz é corporal,
independente da predominância sensível ou lógica. Ela justifica que “essa percepção
revela-se na contemplação estética, onde o todo é apreendido de forma una, não
havendo cisão na apreensão da linguagem racional ou sensível” (NÓBREGA, 2000,
p. 76). A abordagem do sentido estético dessa autora nos reporta a algo mais
aprofundado que a contemplação de um objeto estético, revelando o envolvimento
mais perceptivo, uma ação corporal que solicita os sentidos e que diz respeito à ação
motora.
Do mesmo modo, a solicitação dos sentidos permeia a criação e transgride as
imposições de tempos e espaços e as imposições gestuais do Código de Pontuação.
Róbeva (1981), em sua obra Escola de Campeãs, destina um capítulo para a
criação do novo na GR, pois, para garantir uma composição que fosse original e que
conseguisse chamar à atenção do público as ginastas deveriam realizar façanhas
singulares com seus corpos e aparelhos, sendo essas façanhas buscadas por elas
mesmas. Naquela época, década de 1980, isso ainda seria válido porque a
coreografia não era toda quantificada, e mesmo no rendimento esportivo havia a
possibilidade de as ginastas intervirem nas suas séries.
A composição de séries prevista pelo Código segue agora uma normatização
tão rígida que impossibilita às ginastas participarem da composição de seus
exercícios - a não ser que estas busquem um conhecimento aprofundado de
arbitragem - fazendo com que a tarefa das técnicas esteja muito além de nuances
“estratégicas” da beleza, ou seja, estas não podem escolher os movimentos
100
simplesmente porque são os mais belos executados pela ginasta, é necessário que
esses movimentos sejam validados e somem pontos, numa complicada operação
matemática.
Pensamos na validade deste processo no meio educacional, que consegue ser
ainda mais difícil. Por exemplo, eleger os melhores, mais belos e mais valiosos
movimentos de uma ginasta com possibilidades corporais múltiplas se mostra
como uma tarefa árdua, imagine ter que arrancar movimentos que somem pontos
suficientes para uma série competitiva de meninas que vivenciam a GR
despretensiosamente no ambiente escolar?
No entanto, cair no espontaneísmo também seria um erro, seria como
fornecer brinquedos para crianças e pedi-las para fazer qualquer coisa. Acreditamos
que para garantir a apropriação de características estéticas da GR o processo de
composição de séries precisa de direcionamento.
Situações bastante significativas vivenciamos na docência assistida da
disciplina de GR, quando solicitamos aos alunos a criação de uma série de conjunto
e listamos os movimentos e critérios de julgamento para as coreografias, que
coincidiam com os conteúdos trabalhados nas aulas até então. Dessa forma,
estipulamos a duração do exercício, as variações espaciais de figuras, planos,
direções e trajetórias, os movimentos específicos dos grupos fundamentais e não-
fundamentais (saltos, equilíbrios, pivots, acrobáticos, caminhadas, saltitos, corridas,
passos rítmicos, movimentos em 8, circunduções e balanceios), a organização dos
movimentos (sincronizado, cânom, em espelho, em contraste, subgrupos e coral), a
relação e a colaboração entre eles durante o exercício e a utilização das variáveis
rítmicas (lento, rápido etc.). Esses parâmetros foram estipulados segundo as
possibilidades corporais heterogêneas da turma. O resultado foi surpreendente!
Além de todos os grupos terem contemplado as exigências apontadas por nós, eles
surpreenderam em outros aspectos como figurino, maquiagem, cabelos,
estabeleceram temas para suas composições, sugeridos pelas músicas, colocaram
101
passos de dança e ainda foram cuidadosos com o momento da apresentação
procurando manter posturas e expressões ginásticas.
Sendo assim, pensamos que para serem significativas para os alunos, as
vivências e composições da GR na Educação devem adequar-se às suas
possibilidades corporais, garantirem íntima identificação e compreenderem teores
de desafio. Entretanto, a possibilidade de efetivação desse processo é mais viável nas
composições não-competitivas
10
.
Esse tipo de evento em que a GR pode ser abordada através da participação
de todos e por meio do qual o público pode apreciar outras possibilidades de
movimento e de composição, nós destacamos como extremamente ricos para a
perspectiva da criação.
Portanto, concluímos com a pretensão de acreditarmos que é preciso
reconhecer a manifestação no alto nível sim, pois é onde se guarda a mais pura
caracterização estética da modalidade, e onde se definem os padrões de beleza, e
que problematizá-la é elaborar maneiras de ampliar o leque de possibilidades de
vivências estéticas na Educação Física, é reconhecer o corpo como território crítico
capaz de transcender as amarras de uma Educação que o desconsidera.
10
Os momentos mais significativos da minha trajetória como professora de Ginástica
Rítmica na escola, foram a criação de apresentações de grandes grupos, com a participação
de todas as meninas que praticavam GR. Partíamos de um tema, e a partir dele
desenvolvíamos uma estória. Mesclávamos os aparelhos oficiais a aparelhos construídos por
nós. Eram nesses momentos que a participação de todas se efetivava, cada ginasta tinha um
papel muito importante na coreografia, mesmo as menos agraciadas com flexibilidade,
graça, magreza, protótipos picos da GR. Meninas com deficiência auditiva também
participaram das apresentações.
102
4CONSIDERAÇÕES
FINAIS
103
Mergulhar nas águas da Educação é labuta de eterno recomeço, eterno
recriar. São caminhos que nutrem o educador e que mesclam o cotidiano escolar aos
pontos de interrogação no enclausuramento solitário do pesquisador, porém, para
que os avanços aconteçam, essas vertentes devem caminhar juntas.
Nessa perspectiva entendemos que interrogar a beleza é mexer com a
sensibilidade, com a inerência humana de apreender as coisas do mundo através dos
sentidos e com a necessidade genuína de se emocionar, e, discutir acerca da beleza
da Ginástica Rítmica é provocar seus ditames, transcorrer uma infinidade de pontos
históricos, pedagógicos, estéticos e sociais no decorrer de sua prática através dos
tempos.
Constatamos, com esse estudo, que a beleza da Ginástica Rítmica
contemporânea é permeada pelas suas regulamentações, sendo desenhada por
mecanismos de poder-saber ao longo de sua trajetória histórica. Um poder que se
impõe e se inscreve nos corpos das ginastas, que por sua vez, também exercem
poder, pois instituem permanentemente novos saberes. Essa circularidade
caracteriza a produção de novos conhecimentos acerca dessa prática ginástica, e se
expressa com força nas suas regulamentações.
Vale ressaltar que a caracterização da beleza espetacular na GR é capaz de
provocar apreciações arrebatadoras no público que, admirado, passa a não aceitar
algo menor que o virtuoso, simétrico, harmônico, predicados comuns à Estética
Clássica, pautada em modelos pré-concebidos, como vimos, tão presente na GR.
A constante produção de conhecimentos no âmbito do alto rendimento
esportivo da GR tem afirmado uma prática voltada à sua espetacularização. Esse
104
fenômeno implica numa corrida incessante pela busca de padrões de movimento
demasiadamente precisos. São as vias do poder produzido pelos corpos das ginastas
e que incidem sobre eles mesmos. O Código de Pontuação produz a ginasta, e a
ginasta o constrói, pensamento em consonância com as idéias de Foucault (1979),
expressas por Roberto Machado na introdução da Microfísica do poder:
De fato o poder produz; ele produz real; produz domínios de
objetos e rituais de verdade. O poder possui uma eficácia produtiva,
uma riqueza estratégica, uma positividade. E é justamente esse
aspecto que explica o fato de que tem como alvo o corpo humano,
não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para aprimorá-lo, adestrá-lo
(MACHADO, 1979, p. XVI)
Todavia, o poder que incide e é representado pelos corpos das ginastas não se
observa integralmente no texto do Código, uma vez que a disciplina perpassa o
silêncio das linhas e das entrelinhas, dessa forma, as relações de poder estão
disseminadas em todas as instâncias da ginástica. Entretanto, apontamos o discurso
da GR demonstrado pelo Código como o que melhor retrata as redes de poder
materializadas nessa manifestação.
Consideramos, a partir da nossa Análise de Conteúdo do Código de
Pontuação, que as normas contidas no seu texto constituem a GR como uma
modalidade ginástica que se diferencia de todas as outras, apesar de se apropriar de
gestos e técnicas de outras práticas dando-lhes uma qualificação que a caracteriza
como prática bela. Constatamos também que as prescrições sobre o tempo e os
espaços afunilam uma técnica pautada nas minúcias e na utilidade, ou seja, tempo e
espaços regularmente medidos e quantificados pelos preceitos do dispositivo
disciplinar.
Ressaltamos ainda que as configurações dos gestos da GR ocorreram e
ocorrem através de uma hibridação de técnicas que especificam gestos pautados nas
performances, na extrapolação de limites corporais de flexibilidade, potência,
105
habilidade corporal e com aparelhos, e, que por esses aspectos a GR se constitui
como uma prática que se diferencia de todas as outras.
Por último, constatamos que as formas de controle, regulamentações,
descritos no texto do Código são extrapoladas de diversas maneiras pelas
praticantes, em estilos e instituição de novas técnicas, e que, por vezes, essas
transgressões implicam numa potencialização dos graus de dificuldade e na
exacerbação das técnicas existentes. Entretanto, as transcendências não ocorrem
somente na linha da acentuação do alto rendimento esportivo. As ginastas
conseguem estilizar seus movimentos e exercícios tornando o Código insipiente
quanto à capacidade de aferir a qualidade das apresentações de ginastas e conjuntos.
Sendo assim, o Código contém elementos que delimitam a beleza na GR,
elementos que se instituem a partir das realizações corporais das ginastas, no
sentido da espetacularização que dá visibilidade a essa manifestação, um saber
produzido pelas intervenções corporais, corpos que produzem saberes. Mesmo
assim, o Código jamais dará conta de mensurar a totalidade da beleza de uma
apresentação de Ginástica Rítmica, isso porque a beleza não é apenas qualidade que
se constitui pela modelação de um objeto, e sim provém da relação de reciprocidade
entre sujeito e objeto.
A Educação Física, enquanto área na qual a Estética Clássica impera, carece
de indagações dos modelos vigentes e das formas pelas quais a beleza é
compreendida. Essas reflexões evitariam certamente os fracassos da busca incessante
de padrões corporais inatingíveis para a maioria; evitariam provavelmente a
marginalização da cultura popular, exemplo de manifestação em que não se
prepondera os ideais clássicos de beleza, evitariam possivelmente os usos e abusos
dos corpos tidos como extensão dos laboratórios de performance humana,
principalmente corpos distantes das práticas esportivas institucionalizadas, corpos
adolescentes em prol de modelos improfícuos.
106
Mesmo o Código ditando condições para a beleza na GR, esta se dá na
possibilidade da criação do estilo próprio, na possibilidade de viver o improviso e o
imprevisto, na possibilidade de ser original, de sensibilizar o público porque o
poder cria saberes e o corpo como extrapolador sempre criará novas formas de ser
belo. Isso implica dizer que, mesmo regrada, a ginasta pode criar, ser original e bela
à sua maneira, e mostra que a Educação Física, campo de intervenção pedagógica,
pode conviver com essas regulamentações, pois o corpo nunca é somente submisso.
A beleza do alto rendimento encanta e suscita a produção de novos encantos.
Entretanto, para a Educação Física não é possível transplantar os modelos, mas
aprender com o corpo que recria, subverte, faz diferente, é original apesar da regra.
Portanto, é preciso lidar com o determinado e com ele produzir outros saberes.
Transcender é uma necessidade da Educação. O incidir do poder sobre o
corpo arranca frutos que transcendem essa incidência, dessa forma, saberes são
produzidos. Por isso, acreditamos que as contribuições da ginástica, Ginástica
Rítmica no nosso caso, para a Educação Física, ocorram a partir dessa linha de
pensamento. Na ginástica aprendemos pela ultrapassagem de limites, pela aceitação
de desafios, somos convocados a suplantar sempre aquilo que fomos capazes de
produzir. A perfeição é uma qualidade requerida, mas não é condição para a prática
da GR. É presumível que, com a ampliação do olhar sobre essa modalidade,
proposta por este trabalho, qualquer um, numa intervenção pedagógica, possa
apreendê-la a partir de suas próprias possibilidades, a partir dos seus alcances.
Dada a impossibilidade de uma pesquisa incluir a totalidade de um objeto,
lembramos que uma infinidade de aspectos que, propulsionados por este
trabalho, poderão ser analisados ou revisitados em outros momentos: aspectos da
intervenção pedagógica da GR, da Educação Estética na GR e na Educação Física, da
reformulação de regras que considerassem as oficiais, mas fossem mais adequadas
ao contexto educacional, aspectos de uma GR que pudesse abordar suas inerências
mais expressivas, mais ricas no âmbito da escola.
107
Importante afirmar que a beleza na GR não se esgota nas possibilidades
abordadas, pois as relações de poder-saber que a garantem ocorrem numa
complexidade indizível numa dissertação. Com isso, ressalvamos o nosso intuito
de exemplificar o fenômeno da beleza, não de abarcar sua totalidade, pois isto seria
impossível, dado que beleza é movimento, é construção e reconstrução.
Finalmente, cabe ressaltar que as esperanças de uma educadora do ensino
público não se exaurem nas perspectivas desse trabalho, recomeçam e se expandem
para a atuação na Academia, na formação de professores também sonhadores. Que a
problematização da GR possa alavancar este ideal. Que por este viés estes
professores sonhadores possam, um dia, se dedicar com afinco à formação de seus
alunos e transformar a Educação Física numa área mais acreditada.
108
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114
GLOSSÁRIO
Aparelhos portáteis Objetos oficiais específicos da Ginástica Rítmica: bola, corda,
arco, maças e fita.
Artístico Critério de julgamento que avalia o valor artístico da composição:
acompanhamento musical e coreografia (escolha dos elementos corporais e com
aparelhos, manejo com aparelhos, utilização do corpo, maestria e originalidades)
(FIG, 2007).
Banca de arbitragem Júri responsável pela avaliação das séries de exercícios,
subdividido em três grupos: execução, artístico e dificuldade, sendo assistidos por
um juiz coordenador que controla o funcionamento da área de competição e o
julgamento dos três grupos de juízes (FIG, 2007).
Características Artísticas Particulares (CAP’s)São as bonificações que somam até
7,00 pontos no parâmetro Artístico, subdivididos em utilização dos aparelhos,
maestrias e originalidades, nos conjuntos também existem bonificações para
colaborações entre ginastas. Essas bonificações são descritas previamente ema fichas
de julgamento, cabendo aos árbitros validá-las ou não conforme o desempenho das
ginastas ou conjuntos (FIG, 2007).
Características de base Critérios primordiais para que elementos corporais
específicos da Ginástica Rítmica sejam validados. Por exemplo, um equilíbrio é
considerado dificuldade se for executado sobre meia-ponta ou joelho, for mantido
por um tempo prolongado, tiver uma forma definida, fixada e ampla e for
coordenado com dois movimentos do aparelho.
Composição É a coreografia que a ginasta traz pronta para a competição,
compreendendo o julgamento das Dificuldades que a ginasta ou conjunto executam,
e do Artístico.
115
Dificuldade Critério de julgamento que avalia o valor técnico da composição
(número e nível das dificuldades do grupo corporal obrigatório e dos outros
grupos). Os movimentos específicos da Ginástica Rítmica que contam pontos numa
série também são chamados dificuldades.
Discurso motor unitário É a linha de movimentos representados pela ginasta no
momento da série. Cada movimento é dependente do seu antecessor e determina o
seu sucessor.
Elementos Acrobáticos Elementos corporais em que inversões do centro de
gravidade corporal (anterior, posterior ou lateral), sem tempo de suspensão, parada
na vertical ou perda de contato com o solo (FIG, 2007).
Elementos corporais Qualquer movimento intencional e aparente do corpo que
componha parte de um exercício de Ginástica Rítmica.
Execução – Critério de julgamento que avalia as faltas técnicas (FIG, 2007).
Exercícios de conjunto São as séries de Ginástica Rítmica apresentadas
oficialmente por cinco ginastas e que possuem regulamentação própria.
Exercícios individuais Exercícios de solo apresentados segundo as regras oficiais
da Ginástica Rítmica.
Grupo Corporal Obrigatório São grupos de movimentos que devem caracterizar
cada um dos aparelhos oficiais. Nas séries de corda devem aparecer mais saltos, nas
de bola, flexibilidades e ondas, nas de maças, equilíbrios, nas de fita, pivots, e nas de
arco devem aparecer todos esses grupos de forma equilibrada (FIG, 2007).
Grupos fundamentais – Saltos, equilíbrios, pivots, flexibilidades e ondas.
Grupos Técnicos dos aparelhos São grupos de movimentos específicos de cada
aparelho. Por exemplo, nos exercícios com bola a ginasta deve executar quicadas,
lançamentos e recuperações, rolamentos pelo corpo e pelo solo, impulsos, inversões,
movimentos em oito, circunduções e balanceios (FIG, 2007).
Série ou exercício Coreografia da ginasta ou conjunto, seqüência de movimentos
ginásticos com acompanhamento musical e aparelhos oficiais.
116
Trajetória imprecisa Ocorre quando o aparelho é lançado de forma incorreta
impedindo a recuperação no local e tempo preciso.
117
ANEXOS
Fichas de conteúdo – Código de Pontuação 2005 – 2008 (versão 2007)
LEGENDA:
As especificidades da GR
Os usos do tempo e espaço
A configuração do gesto técnico
PARTE 1 -
GENERALIDA
DES
Títulos
Subtítulos
Unidades de registro temático
Núcleos de sentido
1. Concursos y
programa
1.3 Programa para
las gimnastas
individuales.
1.4 Programa para
los conjuntos
1.5 – Cronometraje
“La duración de cada ejercicio es de 1’15’’ a
1’30’’.”
“La duración de cada ejercicio es de 2’15’’ a
2’30’’.”
“El cronômetro es activado com la puesta
em moviemento de la gimnasta o la primera
ginmnasta del conjunto y parado com la
inmovilización completa de la gimnasta o de
la última gimnasta del conjunto”
A duração total da seqüência de
movimentos não deve ser
extrapolar nem não atingir a
margem de tempo regulamentar.
Antes e após a duração
regulamentar, o corpo da ginasta
deve apresentar imobilização
completa para que se possa
enxergar a duração exata do
exercício.
Nesses segundos a ginasta ou
conjunto devem manifestar o
melhor de suas virtudes
corporais mais excepcionais.
2. Jurados
2.1 Composición de
los jurados
Campeonatos y
competiciones
oficiales
“Cada jurado, de individuales y conjunto
será compuesto de 3 grupos de jueces:
Ejecución (4 jueces) (...); Artístico (4 jueces)
(...) e Dificuldade (4 jueces)”
“Cada jurado es asistido por uma juez (Juez
Coordinador) que aplica las penalizaciones
relativas a salidas del praticable, duración
del ejercicio e todas las demás
penalizaciones que respectam a la disciplina
(aparato, maillot, colocacíon em la pista
etc.)”
12 pessoas subdivididas em 3
grupos, 1 para cada parâmetro
de julgamento, de 4 observam
atentamente o exercício da
ginasta ou conjunto. Além desses
grupos de juízes um juiz
coordenador vai avaliar tudo o
que ocorre fora dos limites do
tablado.
2 grupos de juízes avaliam a
composição do exercício,
vislumbrando a forma com que a
coreografia da ginasta foi
construída, tanto de maneira
118
2.2 Torneos
internacionales
2.4 Instrución de las
jueces
“La presencia de uma juez neutra com la
función de jurado superior es obligatoria”
“Antes de cada compeonato e competición
oficial FIG, será organizada uma reunión
por el Comitê Técnico com el fin de informar
a las jueces participantes sobre la
organización del juicio. Antes de cada
torneo, uma reuníon análoga será
organizada por el comitê de organización”
mais quantitativa, no caso da
Dificuldade, quanto de forma
mais qualitativa, no caso do
conjunto. O terceiro parâmetro, a
execução, avalia a qualidade com
que a ginasta demonstra a sua
composição. Embora o aspecto
qualitativo seja extremamente
preponderante nos 3 parâmetros.
Porém, o basta a ginasta
demonstrar-se virtuosa apenas
durante seu exercício na área
regulamentar, outros fatores, que
podem ocorrer inclusive em
outros momentos ou que
independam do seu domínio
também podem interferir no seu
julgamento, tais como suas
condutas ou de sua equipe.
Nos Torneios internacionais,
deve existir um juiz superior que
não participa efetivamente do
júri para esclarecer possíveis
dúvidas de julgamento.
Isso reflete que mesmo o olhar
direcionado de 13 pessoas
atentas pode o dar conta de
um julgamento “justo”, sendo
necessária a presença de um
árbitro renomado e experiente.
O código supõe que o olhar de
julgamento da arbitragem seja
todo embasado pelo seu texto, o
que afirmaria uma avaliação
igual, não necessitando de outras
reuniões de discussão.
3. Modalidades
de pontuación
3.2 Distribución e e
calculo de las notas
“La nota viene dada por: 1. La nota de
execución: nota media de las 2 notas
centrales (...) máximo 10 puntos; 2. Más la
nota final de composición (A+D) dividida
por 2”
Embora a execução julgue
através de 1 grupo de árbitros e a
composição por 2 grupos, os
pesos são iguais. Isso ocorre pela
dificuldade que é apresentada
em se julgar parâmetros
dependentes da subjetividade
humana, tais como a criação e a
beleza coreográfica, a
interpretação da série pela
ginasta, e a identidade cultural
fornecida pelo gesto. Por isso que
8 árbitros se preocupam com
uma metade da nota, enquanto
apenas 4 com a outra metade.
119
4. Praticable
4.1 Salidas de
Praticable
“todo rebasamento del praticable com uno o
dos pies o com outra parte do cualquiera del
corpo que se apoye más allá de los limites
reglamentarios será penalizado”
“todo aparato que toque el solo fuera do los
limites reglamentarios o que salga fuera del
praticable y vueva por si mesmo, será
penalizado”
“Cada ejercicio debe ser realizado, em su
totalidad, sobre el mismo praticable”
O corpo e o aparelho não devem,
sob nenhuma hipótese,
ultrapassar os limites
regulamentares durante o
exercício. Sendo que essa
ultrapassagem só é validada ao
tocar o solo.
O corpo da ginasta é treinado,
desde a elaboração do seu
exercício, para não exceder esses
limites.
5. Aparatos
5.1 Normas
control
5.3 Perdidas e
recuperaciones del
aparato
5.4 Aparato roto o
aparato colgado em
las vigas del techo
“Todos los aparatos utilizados por um
conjunto deben ser idênticos (peso,
dimensión y forma); solo su cor puede ser
diferente”.
“Toda caída involuntária del aparato será
penalizada”
“Ninguna gimnasta o conjunto estará
autorizado a continuar su ejercicio com um
aparato roto. De lo contrario el valor es 0,00”
Os aparelhos não podem
expressar diferenças entre si no
conjunto, pois a diferença entre
os aparelhos desarmoniza a
coreografia de conjunto.
O aparelho o pode ser perdido
durante o desenrolar do
exercício. Aparelho perdido
demonstra claramente o erro da
ginasta e desqualifica de beleza o
seu exercício.
Caso o aparelho quebre a ginasta
pode cessar seu exercício ou
utilizar um aparelho reserva que
estará, caso opte por isso, situado
nos limites do tablado.
O aparelho quebrado altera sua
forma e impede os movimentos
da série, tornando impossível o
julgamento de seus movimentos
específicos.
6. Atuendo de
las gimnastas
6.1 Gimnastas
individuales y de
conjunto
“Maillot de gimnasta correcto y no
transparente”
“El escote de delante e de la espalda del
maillot debe ser correcto”
“Los maillots de danza de tirantes finos non
están autorizados”
“La escotadura del maillot arriba de las
piernas no debe sobrepasar el pliegue de la
ingle”
“El maillot debe amoldarse bien al cuerpo
para dar la possibilidad a las jueces de
evaluar la posición correcta de todas las
partes diferentes del cuerpo”
Os figurinos devem ser,
sobretudo, compostos por todo o
tronco, e aderentes.
A vestimenta da ginasta de GR
apresenta características próprias
dependentes do vislumbre dos
exercícios pelos árbitros e
também das possibilidades de
variação criativa das formas. É
possível adequar uma infinidade
de modelos e cores ao gosto e as
características da coreografia.
7. Disciplina
7.1 Disciplinas de
“Las gimnastas individuales y de conjunto
A área de competição é
120
las gimnastas
7.2 Disciplinas de
los entrenadores
deben presentarse em el área de competición
solamente trás haber sido llamadas, o por
médio del microfono, o por la Juez
Cordinador o al acenderse la luz verde”
“Las gimnastas del conjunto no están
autorizadas a comunicarse verbalmente
entre ellas durante la ejecución del ejercicio”
“Durante la ejecución de um ejercicio, el
entrenador (...) de la gimnasta o del conjunto
o el músico no está autorizado a
comunicarse com la gimnasta o el conjunto o
el músico de cualquiera de las maneras que
fuera”
reservada para as ginastas em
competição, portanto estas não
podem se atrasar nem se
adiantar, nem permanecer antes
nem depois de competir em suas
proximidades.
Os horários precisam ser
respeitados a todo o tempo pois
na ginástica existe tempo e local
para tudo.
A comunicação entre as ginastas
do conjunto é considerada uma
falta de disciplina. O exercício de
conjunto tem a característica
principal de colaboração, e essa
característica deve ser expressa
através de toda a coreografia,
não pela fala.
A comunicação entre os outros
membros da equipe e as ginastas
é considerada uma falta de
disciplina.
A comunicação com os outros
membros da equipe durante o
exercício jamais poderá ser feita,
pois todas as possibilidades de
erro deverão ser estudadas
durante o treinamento.
PARTE 2-
EJERCICIOS
INDIVIDUAL
ES
Títulos
Subtítulos
Unidades de registro temático
Núcleos de sentido
1. Ejecución del
ejercicio
Nota
“Las faltas de ejecución se deben penalizar
cada vez y por cada elemento em falta, salvo
em caso de penalizaciones globales.”
São considerados erros tudo
aquilo que pressuponha o
imprevisto, que o se enquadre
nos padrões exatos, portanto,
devem ser penalizados a cada
vez para que a nota de execução
da ginasta que menos erre seja
mais alta. O olhar do árbitro que
observa esse parâmetro precisa
ser minucioso e calculista para
que julgar a mínima falha,
imperceptível aos olhos do
espectador comum, pois no alto
nível, o que diferencia a execução
de uma ginasta para outra é a
minúcia.
121
1 – Técnica com el
aparato.
2 – Técnica corporal
Perdida del aparato
Penalizacione: 0,30 “Perdida y
recuperación inmediata o trás pequeno
desplazamiento (1 paso)”.
Penalizacione: 0,50 “Perdida y
recuperación trás desplazamiento (más de 1
paso) o salida del praticable”.
Penalizacione: 0,50 “Perdida del aparato al
final del ejercicio”.
Técnica com el aparato
Penalizacione: 0,20 Trayectoria imprecisa
y recuperación al vuelo com 1 paso”.
Penalizacione: 0,30 Trayectoria imprecisa
y recuperación al vuelo com 2-3 pasos”
Generalidades
Penalizacione: 0,10 “Movimiento
incompleto”
Técnica de base
Penalizacione: 0,10 “Postura incorreta de
um segmento durante un movimiento”.
Penalizacione: 0,10 Forma no definida e
fijada durante las dificultades”.
Penalizacione: 0,10 – “Falta de amplitude em
la forma”.
Penalizacione: 0,20 “Pérdida de equilíbrio:
movimiento suplementario sin
desplazamiento”.
Penalizacione: 0,30 “Pérdida de equilíbrio:
movimiento suplementario 121ãs
desplazamiento”.
Penalizacione: 0,40 “Pérdida de
equilíbriocon apoyo de uma o dos manos o
apoyo sobre el aparato”.
Penalizacione: 0,50 “Pérdida total del
equilíbrio com caída”.
Saltos
Penalizacione: 0,20 “Pequena falta de
elevación”.
Penalizacione: 0,20 “Llegada pesada al
suelo”.
Giros
Penalizacione: 0,20 “Apoyo del talón
durante la rotación”.
Penalizacione: 0,30 “Eje del cuerpo no
vertical y terminar trás um paso”.
Elementos acrobáticos
Penalizacione: 0,20 “Imprecisión en el
A perda do aparelho durante
uma série de Ginástica tmica é
considerada uma falta grave em
qualquer caso porque é uma
falha perceptível a qualquer
espectador. Sendo assim é
necessário diferenciar a execução
de uma atleta que perde o
aparelho de outra que não perde.
Mesmo que a ginasta recupere
seu aparelho, este deve ter um
tempo certo de ação de vôo que
não permita que se sequer um
passo para a sua recuperação.
Por ser elemento menos
perceptível, as penalizações de
trajetória imprecisa são menores
que as de perda.
É possível, em uma ação
motora da ginasta, penaliza-la
por todas essas faltas. É preciso
que a ginasta esteja “consciente”
da posição de cada segmento
corporal na hora do exercício,
além disso, o árbitro, com seu
olhar clínico, pesa, a cada
segundo a forma adequada do
corpo para cada ação.
As perdas de equilíbrio são faltas
que, dependendo da gravidade,
sofrem penalizações ascendentes,
desde as menos perceptíveis sem
deslocamento do corpo, expressa
por uma mínima imprecisão do
eixo corporal, até o desequilíbrio
total finalizado pela queda. Essas
faltas podem ser minimizadas
através de um extremo controle
dos movimentos, de todos os
músculos, de todo corpo, que se
envolve na ação.
Para esses elementos específicos
(saltos, giros e elementos
acrobáticos) o bastam as
penalizações previstas para os
elementos corporais em geral
pela técnica de base, pois as
ações de saltar, girar e girar
através do eixo vertical
(elementos acrobáticos), são de
natureza mais dinâmica e as
recuperações do equilíbrio
122
3 Musica e
movimiento
plano o direción”.
Penalizacione: 0,20 “Técnica de ejecución
incorrecta”.
Penalizacione: 0,20 “Llegada pesada al
suelo”.
Penalizacione: 0,10 Pérdida del ritmo
durante la ejecución”.
Penalizacione: 0,30 “Falta de concordância
entre música-movimiento al final del
ejercicio ”.
durante e após esses movimentos
são mais passíveis de erro.
A perda de ritmo neste caso é
ocasionada por erros que
interfiram no encadeamento da
coreografia, por exemplo, a
ginasta que perde um aparelho e
sai correndo atrás dele, perde
várias vezes o ritmo da
coreografia.
Essa penalização de discordância
entre música e movimento no
fim do exercício demonstra mais
uma vez o controle do tempo da
coreografia determinado pelo
tempo de música, qualquer
imprevisto interfere nesse tempo
de série e leva ao erro.
2. Artístico
1 – Música
2 – Coreografia
“Todos los ejercicios deben ser ejecutados
em su totalidad com acompañamiento
musical. Se permitem paradas voluntárias
muy breves, motivadas por la composicion”.
“Es obrigatória uma harmonia muy estricta
entre el carácter y el ritmo de la musica e los
del ejercicio y de sus movimientos”
Composición de base
“La coreografia está caracterizada por uma
‘idea-guia’ realizada por um discurso motor
unitário de principio a fin, com la utilización
de todos los movimientos posibles del
cuerpo y del aparato”
Elección de los elementos aparato
“Deben ser elegidos, equilibradamente,
entre todos los grupos de elementos técnicos
de cada aparato...”
Uma coreografia de GR tem
todos os movimentos
acompanhados pela música.
Essa dependência com a música
é o que caracteriza a GR, e a
diferencia das outras
modalidades ginásticas. É bela a
ginasta e rie que consegue
harmonizar perfeitamente
música e movimentos. Os
movimentos de um exercício de
GR estão presos aos ditames da
rítmica, a ginasta pode se
expressar a partir de sua música.
O discurso motor unitário
denuncia o encadeamento de
movimentos de uma série de GR,
cada movimento é dependente
do seu antecessor e sucessor, a
idéia guia é a história que a
ginasta conta, sem interrupções.
As técnicas de utilização com
cada aparelho são pré-
determinadas, chamadas de
grupos técnicos. A ginasta deve
saber domina-las para que a
coreografia possa conter uma
123
“El aparato debe estar siempre em
movimiento durante el ejercicio:
movimientos técnicos com uma gran
variedade de formas, de amplitudes, de
direcciones, de planos, de velocidades. Si la
gimnasta utiliza varias veces el aparato
simplesmente apoyado em el suelo o sobre
uma parte del cuerpo excepto em los casos
tolerados por el código (2 ó 3 veces según la
duración de la parada del aparato), el
manejo del aparato se considera
insuficiente”.
“Los aparatos no serán utilizados como
decoración sino que, al contrario, deberán
estar integrados a los movimientos del
cuerpo: la relación entre la gimnasta y el
aparato debe ser constante. Sin enbargo,
también es possible efectuar elementos
originales, estéticos e coreográficos
diferentes hasta 2 veces como máximo para
cada composición, com la condición que
estos elementos tengan uma duración muy
breve y que no conlleven uma interrupción
em la continuidad de los movimientos de lo
aparato”.
“El aparato no podrá estar sujeto por más de
um movimiento sin que ejecute um
movimiento próprio o sin estar em
equilíbrio inestable nin dejarse posarse
inmóvil sobre el suelo. (estatismo)”.
Elección de los elementos corporales
“Ningún grupo corporal diferente del grupo
obrigatório del aparato debe ser
predominante em la composición (abuso de
um grupo corporal no obrigatório)”.
“La composición debe ter um carácter
gimnástico”.
“La posición del comienzo del ejercicio debe
gama ampla de movimentações
que ao mesmo tempo sejam
criativas e tecnicamente corretas.
O código “abre” a perspectiva da
criação de elementos o
técnicos com os aparelhos,
porém essa situação deve ser
passageira, pois cada aparelho
deve ser caracterizado segundo
sua natureza técnica.
Em todo momento da série a
ginasta deve manipular o
aparelho, pois o sentido de uma
coreografia de GR é dado pela
íntima junção
música/ginasta/aparelho, é
preciso que o público e,
principalmente, os árbitros
possam enxergar um só.
Para cada aparelho um
elemento corporal específico da
qual a coreografia deve
sucumbir, a criação da rie é
refém de tal grupo obrigatório.
Significa que outras
manifestações não podem
caracterizar um exercício de GR,
por exemplo, uma série jamais se
assemelhará aos movimentos de
um espetáculo de Ballet Clássico,
mesmo contendo elementos
iguais, porque a ginástica tem
sua delimitação própria.
A ligação entre ginasta e
124
estar justificada e ser utilizada para los
movimientos iniciales del aparato”
Equilíbrio entre el trabajo mano
izquierda/derecha
“Cada ejercicio debe comportar um
equilíbrio entre el trabajo de la mano
izquierda e de la mano derecha”.
Elementos acrobáticos
“Todos los grupos de elementos acrobáticos
autorizados, e los elementos que no se
consideran como acrobáticos, pueden
formar parte del ejercicio com la condición
de: que se ejecutem de forma pasajera, sin
parada em la posición y sin interrupción em
la continuidad del ejercicio, que se realicen
em la relación com um elemento técnico del
aparato”.
Variedad
“La variedad debe incluir también todos los
aspectos seguientes: a. El dinamismo
(velocidad e intensidad de los movimientos)
. b. La utilización del espacio: direcciones,
trayectorias, niveles, modalidades”.
Características Artísticas Particulares (CAPs)
“(...) 7,00 puntos, (...) Utilización de los
aparatos,(...) Maestria, (...) Originalidad”.
aparelho deve expressar-se
desde a pose de início, evitando
ao máximo que o foco da série
esteja separado, o sentido da
coreografia deve ser sempre
ginasta/aparelho/música.
O controle do corpo numa série
de GR intercede inclusive na
habilidade com ambas as mãos,
aguçando ainda mais a técnica.
As acrobacias o caracterizam
esta modalidade ginástica, sendo
autorizadas apenas para
valorizar a série.
Ao mesmo tempo em que o
código exerce a “poda” de tudo
aquilo que é excessivo,
consequentemente erro, exige
que o exercício da ginasta
contenha variações de diversas
naturezas, convidando à criação.
Da pontuação do parâmetro
Artístico, que pode atingir até 10
pontos, 7 são destinados às
características artísticas
particulares, bonificações
específicas que devem ser
prescritas numa ficha através de
símbolos para que o árbitro
possa verificar e avaliar as CAPs
válidas. de se observar que
mesmo os árbitros de Artístico,
realizam seu julgamento da série
por padrões predominantemente
fechados. A subjetividade do
olhar deve perpassar somente a
validez do exercício e não a
beleza de tal, que essa relação
de imanência entre sujeito e
objeto é impossível de ser
125
Critério de maestria
“(...) La gran altura debe tener más o menos
el doble de la estatura de la gimnasta
medida a partir de su cabeza”.
Originalidad
“Por cada nueva dificultad aislada (um solo
impulso inicial y movimientos originais
hasta el final, ejecutados al miesmo tiempo):
0,30; Por cada nueva relación gimnasta-
aparato: 0,10”.
prescrita em um código de 100
páginas.
A cada ginasta um julgamento
diferente, do mesmo modo que
um grande lançamento de 3
metros acima da cabeça de uma
ginasta de 1,50m seria validado,
não seria (literalmente) validado
para outra de 1,60m. A medida é
exata, individualizada, mas
exata. Esse critério implica num
afiamento absurdo do olhar do
árbitro e na justa medida no
treinamento de uma ginasta.
A abertura para o novo, para o
original existe no atual código de
pontuação, porém restritos e só
pontuados quando se tratam de
novos elementos que se
consideram dificuldades ou
novas relações com o aparelho.
Ou seja, elementos originais que
não se enquadrem nos quatro
grupos fundamentais (saltos,
equilíbrios, pivots e
flexibilidades/ondas) não são
originalidades contabilizáveis.
3. Aparatos
Nota válida para
todos los aparatos
“2. Todos los elementos que no se dan por el
CODIGO 2005 e 2007 no tienen ningún valor
para el Artístico”
O código prescreve todos os
elementos possíveis com os
aparelhos, novas possibilidades
ou devem ser utilizadas como
originalidade, ou devem
aparecer de forma restrita na
série. Dessa forma, as
possibilidades de criação são
sempre originadas por elementos
existentes. O novo se pelas
possibilidades de extrapolar a
prescrição.
126
4. Dificuldad
1 – Generalidades
2 Valor de las
dificultades
”Cada ejercicio individual puede tener 18
dificultades como máximo para um valor de
10,00 puntos”.
“Cada dificultad debe ser escrita sobre la
ficha en su casilla según el orden de
sucesión”.
“El valor total de las dificultades corporales
es dado por la suma del valor de las
dificultades pertenecientes al grupo
corporal obrigatório (6 como mínimo) del
aparato utilizado, más eventualmente el
valor de 2 dificultades, como máximo, por
cada grupo corporal no obrigatório, si los
hay”.
“Los grupos obligatorios de cada aparato
son: Cuerda: saltos, Aro: 4 grupos, Pelota:
flexibilidad y ondas, Mazas: Equilíbrios,
Cinta: giros”.
“El valor de la dificultad viene dado por el
elemento corporal. Sin embargo, todas las
dificultades corporales realizadas sin
relación con el aparato no cuentan como
dificultades”.
“Una dificultad es válida com la condición
de que sea ejecutada sin las faltas técnicas
seguientes: grave alteración de 126ãs
características de base propias de cada
grupo corporal; Pérdida del aparato durante
la dificultad (...); Pérdida de equilíbrio
durante la dificultad, com apoyo de uma o
dos manos sobre el suelo o sobre el aparato,
o caída”.
“Uma dificultad que no se realiza tal y como
se anuncia em la ficha, em lo que respecta al
elemento corporal, debe ser registrada e
evaluada por la juez según el orden de
ejecución. Las dificultades que son
ejecutadas con un valor más bajo que o
anunciado em la ficha no cuentan; Las
dificultades ejecutadas con un valor major
guardan el valor declarado em la ficha”.
Uma série de GR deve conter até
18 movimentos que contam
pontos, a escolha dessas
dificuldades e a ordem com que
elas aparecem na série são
fundamentais para a
performance da ginasta e para o
desenrolar do exercício. O código
determina uma longa lista e a
escolha desses elementos deve
ser adequada as possibilidades
corporais da ginasta, ou seja,
suficientes para que os erros não
aconteçam.
Cada aparelho guarda, além de
suas características específicas
um grupo corporal próprio.
Dessa forma cada série tem um
formato próprio, e uma
concepção diferente. A grande
ginasta de GR precisa executar
bem todos os grupos corporais.
Não basta apreender as formas
dos movimentos corporais, é
preciso faze-los executando os
movimentos dos grupos técnicos
dos aparelhos. O domínio do
corpo confunde-se com o
domínio de implementos.
O erro apariscente desvaloriza
muito mais que a execução do
exercício, a ginasta não perde
por errar, mas perde por deixar
de ganhar. Enquanto um árbitro
estará penalizando a ginasta por
uma eventual queda, o outro
estará desconsiderando uma
dificuldade.
A ficha contém a descrição de
todo o exercício ginástico, e deve
ser respeitada sua ordem e forma
das dificuldades. Uma série de
GR o permite improviso que
não seja ocasionado pelo erro.
A série de GR é prevista, pois
todos os seus movimentos são
direcionados pelo código.
127
5 Grupos de
elementos
corporales
6 – Saltos
7 – Equilíbrios
8 – Giros
9 Flexibilidades y
ondas
Grupos fundamentales (válidos para las
dificultades)
“saltos, equilíbrios, giros,
flexibilidade/ondas”
Otros grupos (válidos para os enlaces)
“desplazamientos, saltitos, balanceos y
circunducciones, vueltas, pasos rítmicos”
“Todas las dificultades de saltos deben tener
las características de base siguientes: una
buena altura (elevación) de salto; una forma
definida y fijada durante el vuelo; uma
buena amplitud em la propia forma”.
“Todas las dificultades de equilíbrio deben
tener las características de base siguientes:
ser ejecutado sobre media-punta o sobre
una rodilla; ser mantenida larga e
claramente; tener una forma bien definida y
fijada (sin movimientos de la pierna em
suspensión o del pie de apoyo, durante la
dificultad); tener uma forma amplia; ser
coordinado, trás haber tomado la posición
del equilíbrio, com dos movimientos del
aparato, como mínimo”.
“Todas los giros deben tener Las
características de base siguientes: ser
ejecutado sobre media-punta (talón bien
levantado); tener una forma bien definida
y fijada durante la rotación hasta el final;
tener uma forma amplia”.
“Todas las dificultades de flexibilidad y
ondas deben tener Las características de
base siguientes: ser ejecutadas em apoyo
sobre uno o dos pies o sobre outra parte del
cuerpo; tener una forma bien definida y
fijada (com parada visible em la posición);
tener uma forma amplia”.
Os Grupos fundamentais, de
forma geral, são aqueles que
contam pontos num exercício de
GR, e por isso são os
movimentos mais codificados,
mais exatos, mais padronizados.
Caso não se enquadrem em
qualquer característica de base,
serão desconsiderados. São
principalmente esses
movimentos que determinam o
desempenho da ginasta, por isso
que a maior parte do
treinamento esportivo em GR é
direcionado para o alcance
desses movimentos em
consonância com os aparelhos.
PARTE 3
EJERCÍCIOS
DE
CONJUNTOS
Títulos
Subtítulos
Unidades de registro temático
Núcleos de sentido
GENERALIDA
DES
1. Gimnastas
1.2 Gimnastas de
reserva
“Si um el transcurso del ejercicio uma
gimnasta abandona el conjunto por um
motivo válido: la gimnasta puede ser
Esse é o paradoxo do código de
pontuação. A situação é prevista,
mas ao mesmo tempo é
128
reemplezada por uma gimnasta de reserva
(...)”
“La presencia de las gimnastas de reserva
em la sala de competición durante la
ejecución del ejercicio sin embargo no está
autorizada”
desencorajada para que não se
abra margem de se acontecer em
campeonatos oficiais, que a
desistência de uma ginasta no
decorrer do exercício abalaria a
harmonia deste.
2. Entrada
2.1 Colocación
sobre el praticable
“La colocación sobre el praticable debe
hacerse: rapidamente e sin acompañamiento
musical; Las 5 gimnastas em posesión cada
um um aparato, o uma o varias gimnastas
sujetando los 5 aparatos”.
Para que não ocorra
espetacularização do exercício
antes do momento propriamente
dito da série, que o julgamento
ocorre estritamente durante os
dois minutos e meio da série de
conjunto, a entrada no tablado
competitivo não pode ser
coreografado.
3. Aparatos
3.1 Contactos com el
aparatos
Principio del ejercicio
“Al principio del ejercicio, cada gimnasta
puede tener um aparato y estar em contato
com él, o bien uma o varias gimnastas
pueden tener los 5 aparatos que enviarán o
darán a sus compañeras”
Durante el ejercicio
“Salvo indicación particular, la composición
conllevará um solo aparato por gimnasta.
Em el curso del ejercicio, se tolera que um o
varias gimnastas estén em posesión de 2
aparatos o más, quedando sus compañeras
desprovidas de ellos, siempre y quando: esta
situación sea pasajera; que los aparatos sean
realmente manejados por las gimnastas que
los posean y no simplemente sujeto”
Al final del ejercicio
“Cada gimnasta debe obligatoriamente
sujetar o estar em contato com uno de los 5
aparatos; está permitido que um aparato sea
sujetado por várias gimnastas o que uma
gimnasta sujete o este em contato com vários
aparatos”
Aqui começa a alusão ao
princípio de cooperação
priorizado nas séries de
conjunto. Ao contrário das séries
individuais tolera-se que a
ginasta inicie e/ou possa ter
momentos em que fique sem
aparelho, desde que sejam
momentos passageiros que
realcem a colaboração entre as
atletas. A beleza de uma série de
conjunto é dada, sobretudo pela
maneira com que as ginastas
elaboram o trabalho coletivo no
momento da apresentação, além
do vistuosismo individual que
cada ginasta deve apresentar tal
qual nos exercícios individuais.
EJECUCIÓN
DEL
EJERCICIO
1. Faltas de
conjunto
Sincronización y
armonia
Formaciones e
desplazamientos
“Falta de sincronización um la velocidad o
la amplitud o la intensidad de la expresión,
penalizacione: 0,20”.
“Alteración de la formación, penalizacione:
0,10”
Além das falhas concernentes à
técnica corporal, aparelho e
música que são idênticas aos
exercícios individuais que são
penalizadas a medida que
aparecem na série, sendo as
129
Nota
“Imprecisión em la forma de los
desplazamientos, penalizacione: 0,10”
“Colisión entre las gimnastas (más 129ãs
consecuencias) penalizacione: 0,30”
“La ausência de amplitud de um elemento
corporal o la diferencia um la forma de um
movimiento del aparato de um o varias
gimnastas causa um alteración em la
arminia general o em la sincronización. De
modo que, indepiendentemente de uma
falta técnica o no, hay uma penalización”
pequenas falhas a cada vez e as
grandes falhas por cada ginasta,
o conjunto tem essa característica
de possuir falhas próprias. São
erros amplos que ocorrem a
partir da desarmonização do
todo. Mesmo que o erro o seja
uma falta técnica, como, por
exemplo, a altura aceitável de
uma perna em determinado
exercício, se uma ginasta mais
flexível eleva ainda mais essa
perna o exercício será penalizado
porque sofre de uma
desigualdade.
ARTÍSTICO
2. Coreografia
2.1 Composición de
base
“La coreografia está caracterizada por um
‘idea-guia’ realizada por um discurso motor
unitário de principio a fin, con la utilización
de todos los movimientos posibles del
cuerpo y del aparato y todas las relaciones
posibles entre las gimnastas, las gimnastas e
los aparatos, entre los aparatos”.
Relación e colaboración entre las gimnastas
El caráter típico del ejercicio de conjunto es
la participación de cada gimnasta em el
trabajo del conjunto de manera homogênea
y um espíritu de coletividad. La
composición debe ser concebida de um
modo tal que la idea de colaboración de
todas las gimnastas, um todas las partes del
ejercicio sean bien visible”.
“Cada composición debe tener diferentes
elementos de relación entre las gimnastas y
trabajo de grupo además de la relación el
intercâmbio de aparato, e diferentes tipos de
organización de trabajo colectivo”
“Los elementos que conlleven uma relación
entre la gimnasta deben elegirse respetando
las características esenciales de la Gimnasia
Rítmica, a saber: el manejo de los aparatos;
la estética gimnástica”.
Critérios generales para juzgar elementos
proibidos
A história que deve ser contada
agora parte da união das 5
ginastas e de todas as relações
possíveis entre elas e entre os
aparelhos. Essa perspectiva
prediz uma nova perspectiva
para o julgamento das séries de
conjunto e uma nova perspectiva
para a beleza da série, que agora
não está somente nas proezas
que a ginasta é capaz de realizar
com o seu aparelho, mas também
e principalmente na capacidade
do conjunto realizar um
espetáculo dependente do papel
de cada uma que expressa um
todo.
O caráter coletivo do conjunto
implica na utilização de duas
denominações: as relações entre
ginastas e as colaborações entre
as ginastas. As relações das
formas com que os movimentos
corporais e do aparelho são
organizados: sincronismo, canon,
sub-grupos, coral etc. e as
colaborações são as ações
dependentes de cada ginasta
para que possam ocorrer: passar
por cima de outra ginasta
saltando, passar por dentro dos
aparelhos de outras ginastas etc.
Do princípio ao fim do exercício,
a todo momento, as ginastas do
conjunto precisam caracterizar
relações e colaborações.
Porém, a margem criativa que se
abre com a perspectiva do
130
“Todas las aciones ejecutadas o las
posiciones mantenidas em apoyo sobre um
o varias compañeras, sin contacto um el
suelo por um tiempo prolongado”.
“Sin enbargo están autorizados: a) Los
elementos de colaboración donde uma o
varias gimnastas dan, directamente o por
médio de los aparatos, el impulso inicial al
movimiento de um o de varias compañeras
(movimiento de rotaciones, saltos etc)”.
Formaciones
“Cada ejercicio de conjunto debe comportar
6 formaciones diferentes, mínimo”.
“La composición del ejercício de conjunto
debe utilizar toda la superfície del praticable
com la variedade de las formaciones, com su
diferencia de amplitud (formaciones
cerradas e formaciones amplias), com su
emplazamiento sobre el praticable, um la
utilizacion de las diversas direcciones”.
Elección de los elementos aparatos
“Los aparatos no podrán utilizarse como
decoración sino que al contrario, deben ser
integrados a los movimientos del cuerpo: los
elementos no técnicos y de decoración
autorizados para las gimnastas individuales
no están autorizados para el conjunto. Sin
enbargo es possible efectuar elementos
originales, estéticos e coreográficos
diferentes, um la condición de que estos
elementos tengan uma duración breve, um
um eventual estatismo de las gimnastas o de
los aparatos com uma duración de no más
de 3 movimientos y que se coordinen um
trabalho em grupo também é
direcionada, é necessário
resguarda-la de elementos que
fujam dos manejos característicos
dos aparelhos e das
características da GR, que
expressem manifestações
notoriamente divergentes (ex:
fazer a corda de cabo de guerra,
demonstrar um jogo de futebol
com as bolas etc).
sempre no código essa
preocupação de delimitar os
movimentos específicos da
Ginástica Rítmica, mesmo que
signifiquem princípios de
trabalho coletivo, tais como
apregoados no conjunto.
Carregar uma ginasta, caminhar
em uma ou várias ginastas,
construir pirâmides, por
exemplo, o elementos que
caracterizam mais a Ginástica
Geral ou a dança que a GR.
Mesmo assim, autoriza-se
elementos em que as ginastas
dêem um impulso inicial e
passageiro a suas companheiras.
As formações são as maneiras
com que as ginastas se colocam
na quadra e sua utilização
variada também compõem as
características dos exercícios de
conjunto.
A parada momentânea de
ginastas ou de aparelhos no
conjunto só é permitida caso
explicitem o trabalho do grupo, e
reduzida a 3 vezes. Aqui a
palavra estética é utilizada como
sinônima de beleza.
131
2.2 Características
Artísticas
Particulares
2.4 Utilización de
los aparatos
Originalidad
um trabajo de grupo e de colaboración”.
Elección de los elementos corporales
“El grupo corporal obligatorio no es exigido
para el ejercicio de conjunto”
“Utilización de los aparatos, colaboración
entre las gimnastas, maestria, originalidad”
“Definición de la colaboración: Gimnastas,
em su totalidad o em parte, em contacto
directo o por médio de los aparatos, se
desplazan em direcciones, formaciones o
diferentes tipos de desplazamientos”.
“Por cada nueva dificultad, com o sin
intercambio: 0,30”
“Por cada nueva relación y colaboración
gimnasta-aparato y entre lãs gimnastas: 0,10
ó 0,20/0,30)”
“Por cada nueva manera de se organizar um
intercambio: 0,10”
Como visto nos exercícios
individuais, cada aparelho
possui um grupo corporal
obrigatório, no conjunto isso não
se aplica por possuir suas
delimitações, e permitir melhores
condições na composição das
séries.
As colaborações entre as ginastas
são as bonificações que
valorizam o conjunto em relação
aos exercícios individuais.
A definição de colaboração não
expressa a totalidade de ações
em que uma ginasta precise da
outra para que determinada ação
ocorra.
As originalidades do conjunto
divergem das séries individuais
pois priorizam o trabalho
coletivo.
DIFICULTAD
1. Generalida
des
2. Valor de la
dificultad
2.2 Nivel y valor de
las dificultades com
“Cada ejercicio de conjunto puede tener 18
dificultades como máximo, para um valor
de 10,00 puntos”
“Este debe contener como mínimo 6
dificultades de intercambio”
“Los grupos corporales obligatorios para los
aparatos de las gimnastas individuales no
son obligatorios para el conjunto”.
“Si todas las 5 gimnastas no realizan uma
dificultad, sea cual sea el motivo, la
dificultad no cuenta”
“Las dificultades pueden ser del mismo tipo
y del mismo nível para las 5 gimnastas o de
tipo y nível diferentes. Sin enbargo, es la
gimnasta que ejecuta a dificuldad más fácil,
la que determina el valor de la dificultad del
conjunto”.
“Solamiente los intercambios por
lanzamientos son considerados dificultades
Na dificuldade o trabalho
coletivo também é valorizado,
por isso o enfoque da pontuação
de exercícios sai especificamente
dos grupos corporais para as
trocas de aparelhos por
lançamentos.
Porém, além do risco da
dificuldade ser invalidada por
não atender as especificidades de
cada grupo obrigatório, a
obrigatoriedade de todas as
ginastas executarem as
dificuldades. Caso uma ou mais
delas não atenda os critérios
necessários para expressar a
dificuldade tal qual o digo
anuncia, esta será invalidada
para todo o grupo.
Trocas de dificuldade são trocas
realizadas por lançamentos em
132
intercambio de intercambio”.
“Um intercambio puede ser ejecutado por
subgrupos y por 5 gimnastas, pero se
considera como tal solamente si todas las
gimnastas participan em las 2 acciones de
um intercambio, es decir: lanzar su aparato,
recibir el aparato de uma compañera”
“Si uno o vários aparatos caem durante um
intercambio, el intercambio ya no es valido y
hay, además, la o las penalizaciones de
ejecución”.
que todas as ginastas executam
as ações de lançar seu aparelho e
receber o aparelho de outra
ginasta. Caso um dos aparelhos
seja perdido durante este
processo toda a troca é
invalidada. Ao mesmo tempo em
que no conjunto o senso coletivo
é valorizado, o erro individual
também é tido como erro
coletivo. Ou seja, todas as
ginastas pagam juntas pelas suas
virtudes e pelas suas falhas.
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