nível das relações estabelecidas. As várias famílias reunidas, vivendo agrupadas findaram por
estabelecer, convencionalmente, “um idioma comum”.
Tudo começa a mudar de aspecto. Até então errando nos bosques, os
homens, ao adquirirem situação mais fixa, aproximam-se e por fim formam,
em cada região, uma nação particular, própria nos costumes e caracteres,
não por regulamentos e leis, mas, sim, pelo mesmo gênero de vida e de
alimentos e pela influência comum do clima. (Inégalité, p.553/554)
Além de promover o desenvolvimento da língua, a aproximação das famílias resulta
numa acomodação de pessoas e posteriormente de outras famílias. Esse agregar passa a
estabelecer trocas, contatos e reuniões por conta da ociosidade comum. Surgem as danças, os
cantos e com eles a idéia de mérito, beleza e a necessidade de “estima pública”, o desejo de
ser visto, de ter apreço e ser reconhecido pelos outros. Desse desejo, nada sadio segundo
Rousseau, brotam sentimentos que levarão às desigualdades e aos vícios:
À medida que as idéias e os sentimentos se sucedem, que o espírito e o
coração entram em atividade, o gênero humano continua a domesticar-se,as
ligações se ampliam e os vínculos se estreitam. Os homens habituaram-se a
se reunir diante das cabanas ou ao redor de uma grande árvore: o canto e a
dança, verdadeiros filhos do amor e do lazer, tornaram-se a distração e,
sobretudo a ocupação dos homens e das mulheres ociosas arrebanhados.
Cada um começou a olhar os outros e a desejar se olhado, e a estima pública
passou a ter valor. Aquele que cantava ou dançava melhor, o mais belo, o
mais astuto ou mais eloqüente, passou a ser o mais considerado, e foi esse o
primeiro passo tanto para a desigualdade, quanto para o vício; dessas
primeiras preferências nasceram, de um lado, a vaidade e o desprezo, e de
outro, a vergonha e a inveja. A fermentação determinada por esses novos
germes produziu, por fim, compostos funestos à felicidade e à inocência.
(Inégalité, p.554)
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Sentimentos aparentemente pequenos, mas que convergem por um caminho difícil, no
qual o homem passa a ser vítima de si mesmo. Com a necessidade de ser reconhecido, cada
homem pretende de alguma forma ser aceito. O olhar de um homem sobre outro traz à tona a
comparação e o desejo de também ser visto, marcando a ruptura da simplicidade natural, de
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Começa aqui as comparações mais fortes, o desejo de olhar e ser visto e o conflito, que será
permanente, de ser o mais apreciado que incidirá na problemática entre ser e parecer.