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1. OS PRIMÓRDIOS DA LUTA CONTRA A TUBERCULOSE NO BRASIL
Datas. Mas o que são datas? Datas são pontos de icebergs. O
navegador que singra a imensidão do mar bendiz a presença
dessas pontas emersas, sólidos geométricos, cubos e cilindros
de gelo visíveis a olho nu e a grandes distâncias. Sem essas
balizas naturais que cintilam até sob a luz noturna das estrelas,
como evitar que nau se espedace de encontro às massas
submersas que não se vêem?
Alfredo Bosi
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1.1. A tuberculose chega ao Brasil com as missões
A existência, ou não, da tuberculose
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na América pré–colombiana foi durante
muitos anos um tema controverso. Em 1971, o mistério começou a ser desvendado
com a descoberta, na Província de Nazca, da múmia de uma criança Inca do sexo
masculino que, pela datação com o carbono-14, era do ano 700 d.C. Na referida
múmia foram encontradas evidencias do Mal de Pott (tuberculose da coluna
vertebral), tuberculose pulmonar, pleural, hepática e do rim direito, com visualização
de bacilos álcool-ácido resistentes.
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BOSI, Alfredo. “O tempo dos tempos”. In: Tempo e História. São Paulo, Companhia das Letras, 1996, p. 19.
7 A Tuberculose é doença infecto-contagiosa, milenar, causada por um bacilo. Os gregos a descreveram como supuração
pulmonar, Hipócrates classificou seus sintomas. Esqueletos com lesões ósseas compatíveis com a tuberculose têm sido
encontrados em várias regiões do mundo, datando o mais antigo de cerca de 5.000 anos a.C. (datação com o carbono 14). A
transmissibilidade da tuberculose foi controvérsia secular, pois a doutrina hipocrática da hereditariedade chegou a constituir
dogma. Somente em 1865, Villemin provou sua transmissibilidade inoculando material de animais tuberculosos em outros
sadios, tuberculisando-os. Em 1882, Robert Koch identificou seu agente causal, o Mycobacterium tuberculosis, conhecido como
bacilo de Koch. A tuberculose se propagou no mundo pelo contágio inter-humano. Seu caráter epidêmico é de evoluir em ciclos
lentos, com sua maior incidência nas aglomerações humanas. Do continente europeu propagou-se às demais regiões da terra.
Sua transmissão se dá através da tosse, canto, fala, espirro do tuberculoso que expele gotículas microscópicas carregadas de
bacilos que após ressecadas são inaladas, sendo a via respiratória a porta de entrada mais freqüente. Entretanto, outras vias
são possíveis como: digestiva, cutânea, ocular, genital, amigdaliana, auditiva, todas, enfim, que possam ter contato direto com
o bacilo. Os sintomas mais comuns da tuberculose são: tosse, expectoração, dores torácicas, escarros sanguíneos, febre,
astenia e emagrecimento. Nas formas iniciais, a doença é quase sempre assintomática.
ROSEMBERG, José e TARANTINO, Affonso Berardinelli. “Tuberculose”. Op. cit., pp. 294-380.
Sobre este assunto ver também: MELO, Fernando Augusto Fiúza de. “Tuberculose” In: VERONESI, Ricardo e FOCACCIA,
Roberto. Tratado de Infectologia. São Paulo, Atheneu, 1996, pp. 914-924; ROSEMBERG, José. Tuberculose. Panorama Global.
Óbices para o seu Controle. Fortaleza, Ed. Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, 1999; BETHLEM, Newton. “Tuberculose”.
In: BETHLEM, Newton. Pneumologia. Rio de Janeiro, Atheneu, 1973, pp. 185-226; PAULA, Aloysio de. “Tuberculose
Pulmonar”. In: PAULA, Aloysio de. Pneumologia. São Paulo, Sarvier, 1984, pp. 236-245 e FRAGA, Clementino. Tuberculose
Pulmonar – Etiopathogenia, Estudo Clinico, Therapeutica e Prophylaxia. Rio de Janeiro, Calvino Filho Editor, 1931.
8 ALLISON, M.J., MENDOZA, D., PEZZIA, A. “Documentation of a case of tuberculosis in Pré-Columbian América” In: Amer.
Rev. Resp. Dis. 107:985-991, 1973; HIJJAR, Miguel Aiub. Aspectos do Controle da Tuberculose numa população favelada –
Favela do Escondidinho-Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado, UFRJ-RJ, 1985, p. 10 e NOGUEIRA, Péricles Alves.