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banco. Desta, resulta a chamada “acumulação primitiva” que deu origem ao capitalismo.
Quando a acumulação se destina à satisfação das necessidades, quer no celeiro quer no banco,
não contraria o Sermão da Montanha, não é “acumulação de riqueza na terra”. Eis o drama
dos puritanos. Se o capital inicial saiu da exploração das colônias, do ouro acumulado das
minas de Potosi, ou do trabalho dos puritanos, como diz Weber, o impulsionador é sempre o
mesmo: o trabalho.
A acumulação começou com a sedentarização do homem, não, com um excedente de
produção que é o início das trocas, do comércio. Já o trabalho, como falam Louis-René
Nougier e Serge Sauneron: “Um milhão de anos de humanidade, um milhão de anos que o
trabalho reina sobre a terra., que o homem é trabalhador” (1959, pg.11) (25). Não há dúvida
que a grande revolução muito bem descrita por Weber foi a mudança radical em relação ao
trabalho humano, o que ele chama “organização capitalista racional do trabalho” (2005,
pg.42). Negado e desprezado pela nobreza que via nele uma atividade vil, digna de escravos e
dos servos, o trabalho legal assumiu o papel de motor da mudança ética e moral (em sentido
weberiano) que hoje faz parte da rotina. Ao nobre era proibido o trabalho, não podia exercer
qualquer atividade, mesmo aquelas agora consideradas mais “nobres”. Toulouse-Lautrec
rejeitou o filho aleijado, é verdade, contudo nem mesmo a esse era permitido o trabalho: ser
pintor era ofender a nobreza, e não só pelos temas escolhidos. A burguesia ascendente,
“parvenus” que, trabalhando, conseguiu amealhar dinheiro, sem dúvida porque alijada do
processo político, como geralmente ocorre, bem descrito por Weber, não pretendia outra coisa
senão igualar-se aos nobres. A nova moral, no sentido weberiano parece não ter realmente
nascido do ressentimento, como pretendido por Nietzsche, negado por Weber, mas também
não do sofrimento, como quer Weber, mas da inveja, pois foi essa que triunfou. Basta ver, nos
dias de hoje, quanto ódio é destilado contra a burguesia dirigente, quando na oposição.
Assumindo o poder, aquilo que demonstrava ser ódio, revela-se que na verdade era inveja,
pois passam a agir da mesma maneira.
A exceção foi na França, onde os nobres foram guilhotinados, essa sim, moral do
ressentimento, de cuja revolução parece ter saído a idéia de Nietzsche. Talvez assim se
explique a diferença de moral (em sentido weberiano) entre a civilização católica e a
protestante. Mesmos fundamentos, mesma economia, mesmas éticas, porém com morais
diferentes. Pode-se dizer, com Weber, que o homem não gosta de trabalhar “por natureza”, o
homem não nasceu para trabalhar. Todos pretendem enriquecer para deixar de trabalhar, ainda
hoje. O paraíso católico é um lugar onde não se precisa trabalhar. A máxima ética “o trabalho
enobrece o homem”, porque contradição histórica foi substituída por outras, como “o homem