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JOSÉ CARLOS GONÇALVES FAYA
CONCEITO DE ÉTICA NO LIVRO A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO
CAPITALISMO DE MAX WEBER.
Dissertação apresentada à Universidade
Presbiteriana Mackenzie como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre
em Ciências da Religião.
Orientador: Prof. Dr. João Clemente de Souza Neto.
São Paulo
2008
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F282c Faya, José Carlos Gonçalves
Conceito de ética no livro A Ética Protestante e o
Espírito do
Capitalismo de Max Weber / José Carlos Gonçalves
Faya - 2008.
68 f. ; 30 cm
Disserta
ção (Mestrado em Ciências da Religião) Universidade
Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008.
Bibliografia: f. 66-68.
1.
Ética 2. Moral 3. Religião 4. Weber, Max I. Título
BR115.C3
CDD 330.155
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JOSÉ CARLOS GONÇALVES FAYA
CONCEITO DE ÉTICA NO LIVRO A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO
CAPITALISMO DE MAX WEBER.
Dissertação de Mestrado apresentada à
Universidade Presbiteriana Mackenzie como um
dos requisitos para obtenção do grau de mestre no
Curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião.
Aprovado em
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________________
Prof. Dr. João Clemente de Souza Neto - Orientador
Universidade Presbiteriana Mackenzie
__________________________________________________________
Profa. Dra. Márcia Mello Costa de Liberal
Universidade Presbiteriana Mackenzie
__________________________________________________________
Prof. Dr. Francisco Donizete Pereira.
Centro Universitário FIEO
AGRADECIMENTOS
A todos os professores do Curso de Pós-
Graduação
em
Ciências da Religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie e
particularmente ao meu orientador Dr. João Clemente de Souza Neto.
A minha esposa Liliane, pela paciência.
Em algum remoto rincão do universo
cintilante que se derrama em um sem número
de sistemas solares, havia uma vez um astro,
em que animais inteligentes inventaram o
conhecimento. Foi o minuto mais soberbo e
mais mentiroso da
história universal: mas
também foi somente um minuto. Passados
poucos fôlegos da natureza congelou-se o
astro, e os animais inteligentes tiveram que
morrer.
Assim poderia alguém inventar uma
f
ábula e nem por isso teria ilustrado
suficientemente quão lamentável, quão
fantasmagórico e fugaz, quão sem finalidade e
gratuito fica o intelecto humano dentro da
natureza. Houve eternidades, em que ele n
ão
estava; quando de novo ele tiver passado, nada
ter
á acontecido. Pois não há para aquele
intelecto nenhuma missão mais vasta, que
conduzisse além da vida humana. Ao
contrário, ele é humano, e somente seu
possuidor e genitor o toma tão pateticamente,
como se os gonzos do mundo girassem nele.
NIETZSCHE, 1873.
RESUMO
A presente Dissertação de Mestrado, cujo tema aborda os sentidos que a palavra ética recebe
na interpretação de Max Weber em seu livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo,
mostra a grande divergência que há, tanto na acepção comum quanto na filosófica, na
conceituação da palavra ética. Ela analisa os diversos usos que se faz da palavra, desde a sua
origem grega até os dias de hoje, mostrando que a ética não pode ser definida, a não ser que se
leve em consideração sua diversidade. A abordagem do livro de Max Weber é feita a partir
dessa visão multifacetada, detendo-se primeiro na problemática do livro e sua solução, sem a
qual não seria possível interpretar o texto do autor. Antes da análise do tema central das
pesquisas, é feita uma comparação entre as palavras ética e moral, com a conclusão de que
Max Weber faz uma nítida distinção entre as duas. Só a partir de então é que se pode entrar no
assunto propriamente dito, com a conclusão de que ética para Max Weber é um regulamento
racional metodológico, uma sistematização de meios em relação a fins. Sem qualquer relação
com bem e mal, liberdade, ou outra entidade metafísica. O que conta são as influências da
regulamentação na formação dos traços intrínsecos e permanentes do caráter, disposições
psicológicas que determinam o agir humano.
Palavras-chave: ética, moral, religião.
ABSTRACT
This work, which is a research about the meanings of the word ethic according to the
interpretation of Max Weber, in his book A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo,
demonstrates the great divergence of meanings in the usual as well as philosophical sense of
ethic. It is an analysis of its uses, since its Greek origin until the current days, in order to
prove there is not specific definition for it, unless all its multiplicity of meanings are taken
into consideration. Initially, the focus is in the problematic of Weber´s book and its solutions,
otherwise it could not be understood. However, before inquiring the main subject, there is a
comparison between the terms ethics and moral, and the conclusion that Max Weber makes
an evident and clear distinction between them. Then, bearing this in mind, the subject matter
itself can be mentioned. The conclusion is that, according to Max Weber, ethic is a
methodological rational regulation, a systematization of means in relation to ends, without
any connection with goodness or badness, freedom or any other metaphysical entity. What
must be considered is the influence of regulation in the formation of permanent and intrinsic
characteristics of character, psychological disposition which determines the human act.
Keywords: ethic, moral, religion.
SUMÁRIO
Introdução...........................................................................................................08
I
CONCEITO DE ÉTICA
1 Etimologia...............................................................................................................11
1.1 Sentidos da palavra ética.....................................................................................14
1.1.1 Ética como crítica................................................................................................17
1.1.2 Ética como filosofia (sistema).............................................................................18
1.1.3 Ética como história..............................................................................................20
1.1.4 Ética como Código..............................................................................................20
1.1.5 Ética como summum bonum...............................................................................22
1.1.6 Ética como julgamento........................................................................................25
1.1.7 Ética como conduta.............................................................................................26
II
CONCEITO DE ÉTICA EM MAX WEBER
2 O problema..............................................................................................................28
2.1 A solução..............................................................................................................30
2.2 Diferença entre ética e moral................................................................................35
2.3 Conceito de ética....................................................................................................44
III
CONCLUSÃO
3 Conclusão.................................................................................................................56
Notas.......................................................................................................................62
Referências Bibliográficas....................................................................................66
8
INTRODUÇÃO
A presente Dissertação de Mestrado resulta do projeto de pesquisa que tem por título
Conceito de ética no livro ¨A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo¨ de Max Weber. O
tema da pesquisa surgiu de uma preocupação ocorrida no momento da leitura do livro, a
saber, a percepção de que não se sabia exatamente a que o autor se referia cada vez que as
palavras ética ou moral eram mencionadas. Em um exame mais minucioso sobre o assunto na
literatura em questão, constatou-se que a dúvida aparece em várias obras, estando, por
conseguinte, presente nos textos de muitos outros autores. Existe uma diversidade de
interpretações sobre as duas palavras, tanto no âmbito da filosofia quanto no entendimento
comum. Quando se pergunta o que é ética, o mais comum é ter uma resposta tautológica: ética
é a moral. Por sua vez, no questionamento sobre o que é moral, obtém-se: é a ética. É evidente
que não se pode dar continuidade ao assunto a partir dessas definições. Outra maneira de
resolver o problema, como foi dito por um professor ao iniciar um curso, é avisar que, para
que não haja confusão, fica definido que ética é a ciência da moral.
Atualmente, no entanto, com as preocupações ambientais em voga, levantaram-se
várias vozes no ramo empresarial clamando serem suas empresas portadoras de uma ética dita
social. As expressões foram intituladas preocupação ou responsabilidade social. Pelo que se
percebe no dia a dia, com os fabulosos lucros anunciados pelas empresas, em todos os setores
da economia, tem-se a impressão que realmente a ética é um grande negócio e fonte de lucros.
Metaforicamente, todas essas possibilidades poderiam ser vistas como uma espécie de pizza,
já que possuem massa grossa ou fina e podem ser pequenas, médias ou grandes, tudo à
escolha do freguês. Qual a relação entre pizza e ética numa visão não filosófica? Elas têm
muito em comum. Em qualquer lugar aonde se vá, encontra-se pizza para comer e ética para
falar. Existem pizzas de todos os tipos e para todos os gostos, como, por exemplo: de quatro
queijos, berinjela, queijo e tomate e espinafre. Da mesma forma ocorre com a ética: dos
advogados, médicos, publicitários, psicólogos e até mesmo, imaginem, dos deputados. Talvez
exista mesmo a ética das pizzas; ou quem sabe, a pizza das éticas. Isso sem incluir a palavra
moral, que por sua vez, faz surgir outras tantas determinações, dúvidas, novas formulações e
manipulações. Contudo, na visão filosófica, o tema apresenta-se de forma diferente ou, em
outras palavras, a coisa toma outro rumo, uma vez que, a filosofia não se interessa por pizza.
Quanto à ética, a confusão é a mesma. Por isso toda obra clássica tem diferentes
possibilidades de interpretação. Como diz G.H.Moore: Consideremos o que dizem os
9
filósofos. Deve-se notar, antes, que eles não estão de acordo entre eles. Não somente eles
dizem que eles têm razão sobre o que é o "bem", mas eles se esforçam de provar que os
outros, que dizem que o bem é outra coisa, estão errados (MOORE. 1998, pg.51). A
discussão sobre ética é sempre justificada em si mesma, principalmente numa sociedade como
a brasileira, não exclusivamente, na qual ética e pizza andam sempre de mãos dadas.
O intuito desta dissertação não é resolver o problema. A intenção é mostrar que a
pergunta o que é ética? não pode ser respondida, a não ser que se comece respondendo que
a ética tem vários sentidos, enumerando-os em seguida. Toda vez que se pretende estudar
um autor que trate de ética, deve-se primeiro saber qual o sentido que ele dá à palavra. Aliás,
é o que muitos já fazem. Não seria uma expressão exagerada a seguinte afirmação: nunca
ninguém se preocupou em saber em que sentido Max Weber usou a palavra ética. Pode ser
que alguém o tenha feito, porém, nas pesquisas realizadas, não foi encontrado nenhum
trabalho a respeito do tema. Sendo assim, porque se acredita que o assunto seja importante? A
resposta é obvia: se cada pessoa tem um conceito particular de ética, o livro de Weber será
analisado sob óticas divergentes, tendo como resultado entendimentos diferentes. Pois é isso
mesmo o que acontece. Quando se lê um crítico de Weber, percebe-se que há uma falta de
sintonia com o que é entendido, e, entre as diversas críticas, é possível encontrar a
contradições. Espera-se munir o leitor deste trabalho com uma arma (no sentido de recurso)
que é considerada indispensável para um bom entendimento das idéias apresentadas por Max
Weber, através do qual se poderá compreender a sociedade moderna com seus desafios,
marcada por relações impessoais, anéticas, tanto no campo público como no privado,
incluindo-se ai não o político e o religioso, mas também as relações de mercado. Se esse
objetivo for alcançado, o autor da presente dissertação dar-se-á por satisfeito e estará certo de
que valeu a pena o esforço despendido.
O método de pesquisa utilizado foi o bibliográfico, consultando-se primeiramente as
obras de alguns intelectuais que escreveram sobre ética, para ter uma visão geral do problema,
e a partir daí acessar o livro de Max Weber. Quanto ao método de exposição, decidiu-se,
algumas vezes, usar citações como ponto de apoio para as afirmações, outras vezes,
interpretar o pensamento do autor, sempre indicando o texto original. Todas as citações
oriundas de livros em língua francesa foram traduzidas pelo próprio mestrando e os textos
originais encontram-se transcritos no capítulo Notas. Além disso, ao usar a expressão
como fala..., teve-se a intenção de trazer os autores de volta à realidade, como se vivos
estivessem.
10
No primeiro capítulo, além da visão geral do sentido atribuído à palavra ética pelos
intelectuais e pelo senso comum, iniciando pela sua origem grega antiga, abordou-se também
aquilo que se chama SUMMUN BONUM, ou bem absoluto, que é a finalidade a ser
alcançada, de fundamental importância para a problemática em questão, mostrando que quase
todas as éticas são eudomonistas ou hedonistas, mesmo as que dizem que tratam da vida.
Com o segundo capítulo, entra-se diretamente no livro de Max Weber, tratando-se
primeiramente o problema que o levou a escrever, a saber, o fenômeno que ocorria na
sociedade de seu tempo, o fato de os protestantes ocuparem, predominantemente, as funções
mais importantes na economia alemã. Foram analisadas também as razões apresentadas como
solução. Sendo este capítulo o ponto central da Dissertação, há um aprofundamento na
questão da psicologia na obra de Weber, mostrando a relação entre ética determinadora do
caráter, moral, como disposição psicológica, que são traços intrínsecos e permanentes. Após
analisar e mostrar que há uma diferença entre moral e ética em Max Weber, chega-se,
finalmente, ao sentido que ele atribui à palavra, fazendo uma comparação com as noções
gerais levantadas no primeiro capítulo, concluindo que ética, para Max Weber, mesmo tendo
sentido próprio, cuja fonte, quase sem dúvida alguma, é o Sermão da Montanha, se encaixa
dentro de um dos conceitos lá levantados.
Na conclusão há uma revisão geral do livro, abordando as principais idéias e algumas
dificuldades que suas explicações encontram, principalmente relativas ao sistema capitalista e
ao papel desempenhado pelos protestantes na consolidação de algumas das nações mais
importantes do mundo, do ponto de vista capitalista. Menciona-se também uma questão
importante que mereceria uma pesquisa mais ampla: o SUMMUN BONUM da ética
calviniana seria a vida? As dificuldades foram muitas. A maior delas foi entender a
diferenciação que Max Weber faz entre ética e moral devido à falta de acessibilidade, como
paradigma, a qualquer outro trabalho que tratasse do assunto. De qualquer modo,.espera-se
que o objetivo principal seja alcançado.
11
I
CONCEITO DE ÉTICA
1 ETIMOLOGIA
Tratando-se de analisar o emprego da palavra ética no livro A Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo, de Max Weber, deve-se ter primeiro uma compreensão geral de seu
sentido, sem a qual não seria possível sequer iniciar o assunto. Pode parecer que não
relação alguma com o livro de Max Weber, por abordar a ética leiga, enquanto neste se
aborda, principalmente, a ética religiosa. Esse simples fato demonstra a dificuldade que
existe na determinação de um conceito geral que englobe os dois específicos. A sua função
principal seria: fornecer conceitos básicos da palavra. Afinal, o que está em discussão é o
livro de Max Weber que trata, fundamentalmente e à primeira vista, da ética chamada
religiosa, e não da leiga, estudada pelos autores que serão apresentados. Não como fazer
uma aproximação entre as concepções apresentadas e o conceito de ética em Weber sem essa
fase preliminar. Somente após o estudo das diversas possibilidades pode-se fazer uma análise
comparativa. Á princípio, uma solução simples que seria a consulta a um dicionário geral ou
filosófico, o se revelou satisfatória, face à complexidade da questão. A alternativa mais
pertinente foi recorrer aos autores que a empregaram através os tempos, iniciado com a
filosofia grega antiga, precisamente Aristóteles, que apresentou o significado da palavra em
sua cultura, finalizando com os sentidos comuns que lhe são atribuídos atualmente. Não se
trata, absolutamente, de uma valorização comparativa, tampouco de uma análise crítica. Não
está se buscando uma verdade dogmática.
A intenção é mostrar os sentidos que cada autor dá à palavra, indicando a diversidade
de conceituações que ela assume e, de outro lado, a questão do bem absoluto. Não se procura
aprofundar as éticas desses autores e criticar conteúdos. Trata-se, simplesmente, de uma
questão conceitual. Ao reunir-se nove pessoas pertencentes à mesma cultura, com grau
mediano de entendimento, e ao ser pronunciada a palavra cavalo, é quase certo que todos
entenderão o que está sendo dito, apesar de existirem vários tipos de cavalos: baio, alazão,
castanho, de trote, de galope, árabe, puro sangue inglês etc. Se houver três brasileiros, três
ingleses e três franceses, cada grupo conhecendo só sua língua materna, e pronunciar-se
12
cavalo, horse, cheval, igualmente todos compreenderão. Mas se a palavra pronunciada
for ética, ethics ou éthique certamente não haverá unanimidade, tratando-se de pessoas
de mesma cultura ou não, afora a certeza comum de que ética é algo pertencente ao bem:
pessoa ética é uma boa pessoa. Por outro lado, antiética, ou o ética, é o mal. Entre as nove
pessoas, poderia ser encontrado, em sua maioria, as que definiriam, em concordância, o
conceito de cavalo, como: é um animal.... Quanto à ética, o resultado seria outro, pois,
existiriam respostas variadas e divergentes. Tratando-se de filósofos, não há dúvida que
teriam nove definições diferentes.
Tomando como exemplo dois filósofos, Adolfo Sanches Vasquez e Enrique Dussel,
podemos verificar que eles têm conceitos totalmente díspares do que seja ética. Enquanto o
primeiro considera ética como a ciência da moral, o segundo a toma como crítica filosófica. É
apenas esta definição que será mais interessante no presente trabalho, pois é isto que se
procura em Max Weber, de modo que, o intuito não é fazer uma crítica ou estudo comparativo
entre as duas. Em Dussel, a ética desempenha um duplo papel: crítica da sociedade capitalista
e formadora da consciência crítica do trabalhador (a consciência de classe e revolucionária);
exerce o papel de intelectual orgânico: é uma ética totalmente comprometida com o marxismo
como filosofia do proletariado. Por essa razão, o autor foi perseguido e sua casa foi
incendiada, já que se trata de um perigo para o sistema. Por outro lado, em Vasquez, sendo
ciência, necessariamente tem que ser neutra. O seu conceito de ética é eterno, em qualquer
lugar do mundo que se vá, ou fora dele, a ética será sempre a ciência da moral. Muda-se a
moral, mudam-se os valores, os costumes, o modo de produção e a infra-estrutura econômica
e a ética terá sempre a mesma definição. Espera-se que, toda vez que se leia um de seus livros,
encontrando a palavra ética, saiba-se ao que ele está se referindo, em nome da coerência:
ciência da moral. Em Dussel o comprometimento da ética se até a superação das classes. A
aproximação que se poderia fazer entre os dois não se dá no conceito de ética, mas na
comparação do conceito de ética em Dussel com o de práxis filosófica em Vasquez. Este
nunca poderia ser perseguido por seu conceito de ética; quanto ao seu conceito de práxis
filosófica, a situação é outra. Mas isto seria assunto para uma nova pesquisa.
Na presente análise, um aprofundamento apenas em Max Weber, uma vez que a
tarefa está bem delimitada conforme título da Dissertação. Afinal de contas porque chamar
uma exegese bíblica de ética? Quem autoriza a chamar o Sermão da Montanha de Ética ou
ética da convicção? Por acaso Jesus Cristo falou em ética? E Calvino por acaso chamou suas
Instituições da Religião Cristã de Ética? Deus chamou ética a lei dada ao povo de Israel?
Teólogos o intérpretes da palavra de Deus, e não éticos. Não é à toa que se divide a ética
13
em leiga e religiosa: o conceito é exterior à religião. São como lentes usadas para ler, sobre
um determinado ponto de vista, um objeto escolhido. Da mesma forma, Karl Marx intitulou
algum de seus trabalhos de ética? Existe uma ética no marxismo? Não é uma dúvida
freqüente? Para elucidar a questão, primeiramente, se deve saber o que é ética, para não haver
o risco de confundir o marxismo com uma pizza. Poderia-se titular o livro de Max Weber
como, ao invés de Ética Protestante, ¨Ética Científica da Moral Protestante¨, no caso de
Vasquez ou: ¨Filosofia Crítica do Protestantismo¨, no de Dussel? Se houvesse alguma outra
pretensão com o presente trabalho, não seria, certamente, a de desempenhar o papel de
intelectual orgânico. Também não teria a função de falar o que os outros querem ouvir. Muito
menos uma crítica do calvinismo ou do protestantismo. O objetivo seria chamar a atenção dos
filósofos engajados, como Dussel e Vasquez, que pretendem fazer do mundo um lugar de
gente feliz, equiparado ao paraíso católico, para um detalhe pouco observado, devido, talvez,
ao desprezo pela ética religiosa, tido como alienadora: o fato de Calvino ter dado um novo
sentido à ética religiosa, ou seja, à vida. O Peregrino não exclama ¨felicidade, felicidade
eterna¨, mas: ¨vida, vida eterna!¨, fato muito bem observado por Max Weber. Na leitura
deste trabalho, que deve-se considerar que todas as referências a Calvino, calvinismo e
protestantismo, enfim todas as idéias religiosas são derivadas da visão de Weber, cujo livro é
aqui estudado, e não das fontes às quais se referem.
Assim sendo, a investigação será iniciada pela origem da palavra, que remonta à
língua grega antiga, cuja forma era èthos ou éthos, através do latim ethica. Èthos significava
costume, moradia, hábito enquanto por éthos se entendia caráter, modo de ser. Aristóteles em
sua obra Les Grands Livres dÉthique diz:
Mas eis de onde vêm as palavras que designam a virtude ética se for
verdade que seja preciso levar em consideração as letras de uma palavra
para examinar a verdade tal qual ela é; e provavelmente é necessário.
Palavra ética (èthos) tira seu sentido dos hábitos (éthos). Ela é chamada
ética pelo fato de que se adquire hábitos. Segue-se também esta evidência:
não é por natureza que nasce em nós alguma das virtudes da parte
irracional. (1995, pg. 54) (1)
Como j
á salientado, não interesse em discutir o conteúdo da ética de Aristóteles,
ou, se aceitava ou não a pederastia ou a escravidão, se significou um avanço ou retrocesso em
relação a outras éticas. O que interessa é o conceito de ética. Na Ética a Nicômaco, ele volta a
14
afirmar a origem da palavra, mostrando que há duas espécies de virtudes: a intelectual e a
ética
1
. A primeira é ensinada, requerendo experiência e tempo; a virtude ética é adquirida
através do costume, de onde seu nome derivou por uma pequena modificação da palavra. Esse
fato demonstra que a virtude ética não nos é dada pela natureza.
Ela apenas nos dá a capacidade de apreendê-las, que é aperfeiçoada pelo hábito.
(2007, pg.40).
A passagem desses dois sentidos que a palavra tinha do grego antigo para o latim é
explicada na obra de Marciano Vidal Moral de Atitudes¨, começando com uma advertência
para aqueles que pretendem adentrar o campo da ética: deve-se ter todo cuidado e atenção
com a variedade de expressões que envolvem o tema. É verdade que tal variedade pode
significar uma riqueza expressiva, mas pode também constituir-se em um campo minado onde
pode perder-se o menos avisado. (2000. pg. 17)
A seguir, explica que no latim traduziu-se o ethos grego em sua forma lingüística de
èthos caráter e de éthos costume pelo vocábulo latino mos. A partir dai começou-se a usar
excessivamente o significado do éthos para a idéia de costume, uma vez que a palavra
mos em latim significava costume. (2000. pg.20). Vidal vale-se dos ensinamentos de São
Tomás de Aquino para reforçar seus argumentos, para o qual mos pode significar duas
coisas: às vezes costume, outras vezes uma quase inclinação natural para fazer alguma coisa.
Enquanto os gregos tinham duas palavras, em latim há uma só, usada nos dois sentidos. Note-
se que Marciano Vidal também não está preocupado com o conteúdo da ética, mas apenas
com seu significado semântico. (2000. PG.17)
As duas palavras derivadas de ¨mos¨ latino e do grego ¨èthos¨ passaram para as
diversas línguas, particularmente as latinas: francês ¨morale¨ e ¨éthique¨, português ¨morae
¨ética¨. O Dicionário de Língua Portuguesa Aurélio deixa claro: ¨Ético (do grego ethikós, pelo
latim ethicu)¨.
1.1 SENTIDOS DA PALAVRA ÉTICA
Essa é a primeira grande dificuldade para se estabelecer um sentido preciso para a
palavra. Alguns, como Monique Canto-Sperber por exemplo, usam as duas palavras como
sinônimas: Eu vou decepcionar o leitor sublinhando que em geral eu me sirvo dos termos
moral e ética como sinônimos (2001, pg.25) (2). Outros, como André Comte-Sponville,
1
Geralmente os tradutores e comentadores escrevem moral
15
preferem dar sentidos diferentes: [...] entender por moral tudo o que se faz por dever e por
ética tudo o que se faz por amor¨. (2005, pg.67). Marciano Vidal é a favor do uso como
sinônimas para expressar o genuíno e rico significado da palavra grega: O ético ou moral
designa a personalidade ética ou moral expressando o significado caráter ou modo de ser
adquirido.(2000, pg.20). Um dos casos mais radicais é o de Adolfo Sanches Vasquez, que
prega que a ética deva constituir-se em ciência autônoma, cujo objeto seria a moral. O autor
dá como exemplos o fato de a psicologia e a sociologia, que antes pertenciam à filosofia,
tornaram-se ciências autônomas. Pensa assim resolver o sentido das duas palavras:
A ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em
sociedade. Ou seja, é ciência de uma forma específica do comportamento
humano. [...] De acordo com essa abordagem, a ética se ocupa de um objeto
próprio: o setor da realidade humana que chamamos moral, constituído
como já dissemos- por um tipo peculiar de fatos ou atos humanos. [...] A
moral não é a ciência, mas objeto da ciência...
(2000, pg.12)
Como ciência da moral a ética teria o mesmo rigor, a mesma coerência e
fundamentação como qualquer outra ciência.
Antonio Marchionni também tem uma definição de ética comparativamente com a
arte e a ciência, afirmando que ela torna bom aquilo que é feito pelo seu autor, chamando-a,
assim, arte do Bom. No mesmo sentido a ética é uma arte, um hábito (ethos), pois é o esforço
repetitivo que possibilita o aprimoramento, o bem agir. O virtuoso é um artista que fez muitos
exercícios. (1999, pg. 34).
Erich Fromm mostra as dificuldades, dizendo que a palavra ética vem de uma raiz
que significa, na origem, costume, e chegou a significar ciência que trata dos ideais de
relações humanas. Às vezes, diz ele, a ética se refere ao comportamento e pode ser entendida
como um código. O autor concorda que é possível dividir a ética em médica, comercial,
militar etc. Tratando-se de filosofia ou religião, o se trata mais de um código, mas é uma
questão de consciência. (1967, pg. 129)
Interessante é a idéia de G.H.Moore, exposta em seu famoso livro Principia Ethica,
na qual utiliza a palavra ética com um sentido muito mais amplo que o normalmente
abrangido pelos filósofos, confessando, todavia que a função de tratar as questões de
significado das palavras pertence ao domínio dos autores de dicionários e demais especialistas
em literatura e não aos filósofos:
16
[...] eu direi que pretendo utilizar Ética para cobrir um domínio mais
amplo que aquilo. Ele me serve para designar uma pesquisa pela qual, em
todo caso, não existe outra palavra: o exame geral do que é o bem. (1998,
pg.40) (3).
Esse uso da palavra ética por falta de opção foi muito bem descrito por Monique
Canto-Sperber, afirmando que ser ético ou não, é uma injunção contemporânea. Comprar e
vender com ética, falar de ética, governar com ética é questão de moda. Quanto ao significado
de ética, ninguém se interessa de precisar. Todos dão a entender que sabem o seu significado,
escondendo-se por trás de um silêncio sepulcral:
O termo ética viu-se progressivamente privado de seu conteúdo por ser, à
força, utilizado de maneira indiferenciada. A natureza do referente, o
conteúdo do sentido que recobre o termo ética, tornou-se secundário, o
essencial é o que se faz dizendo ética.
(2001, pg.85) (4)
Ética ou moral? O intuito não é enfocar e prender-se apenas ao problema. No
momento, o que será feito é examinar a obra de Max Weber para, então, tentar entender em
que sentido ele usa a palavra ética, finalidade da pesquisa, e, conseqüentemente, o exame da
palavra moral será certamente obrigatório.
Álvaro L.M.Valls, em seu livro O que é ética?, fala da dificuldade de entender o
sentido da palavra:
A ética é daquelas coisas que todo mundo sabe o que são, mas que não são
fáceis de explicar quando alguém pergunta. Tradicionalmente ela é
entendida como um estudo ou uma reflexão científica ou filosófica, e
eventualmente até teológica, sobre os costumes ou as ações humanas.
(2006, pg. 7)
Por que tal dificuldade? Respeitando e deixando de lado o sentido que a palavra tinha
no grego antigo, como já foi explicitado anteriormente, sabe-se que, apesar das controvérsias,
ela é usada com vários outros significados como se espera demonstrar. Porém, todos eles têm
pontos em comuns, que seriam: a conduta humana e a maneira de agir. Evidentemente, não se
pode, nesta ocasião, analisar toda a infinidade de sentidos possíveis para o termo. Vamos
estudar aqueles que são os mais empregados do ponto de vista popular e intelectual,
preferencialmente filósofos e sociólogos, tendo em vista a finalidade a que se destina: uma
chave para adentrar, interpretando, ou entendendo, a sociologia de Max Weber. Isso já
17
significa que não se pretende ir ao fundo de cada sentido apresentado mas apenas apontá-
los. Dentre eles poderiam ser citados os seguintes:
1.1.1. Ética como crítica
1.1.2 Ética como Sistema.
1.1.3 Ética como história.
1.1.4 Ética como Código.
1.1.5 Ética como SUMMUM BONUM.
1.1.6 Ética como julgamento.
1.1.7 Ética como conduta..
1.1.1 Ética como crítica
A palavra ética é usada para designar a crítica que se faz da sociedade. Para se
entender exatamente o que significava para os gregos a palavra ética, segundo Aristóteles, é
necessário entender também os conceitos de cidade e o de política. O caráter é formado no dia
a dia, no agir diário, no convívio político, que hoje chamamos de social. Em última análise é a
cidade, como conjunto dos cidadãos, que é a base de toda a ética. A função da política era
formar bons cidadãos. O que se esperava era que o bom cidadão, o virtuoso, possuidor de
virtudes éticas, agisse corretamente, pois, é praticando ações justas, que a pessoa se torna
justa. As virtudes éticas por si não tinham valor: era no campo prático e no agir, que ficava
demonstrada a sua validade. O hábito se adquire e se repassa exemplarmente. Sócrates bebeu
cicuta para não servir de mau exemplo e para mudar o hábito de exílio que era costume em
caso de condenação. (Kant o concorda absolutamente que o exemplo possa servir como
fundamento da ética: Não se poderia também prestar pior serviço à moralidade do que extraí-
la de exemplos. (1980, pg.120)) A ênfase era, portanto, subjetiva-objetiva. O que ocorreu foi
uma desvalorização de pólo subjetivo em detrimento do objetivo, ou seja, do ¨éthos¨ para o
¨èthos¨. Não se trata mais de discutir as virtudes éticas como domínio de si, controle dos
vícios, paixões, sentimentos e inclinações da alma, bases da ação, como ocorria com
Aristóteles, Descartes, Hobbes ou Espinosa, que tratavam de como elevar a consciência à
consciência de si, residência da moral.
Esse papel foi relegado aos livros de auto ajuda. O fil
ósofo agora se preocupa não
com as virtudes, consigo próprio, mas com o outro. Mas o outro trazido à consciência não
18
foi o outro como amor, relação intersubjetiva de fraternidade, que já é história antiga, e sim o
outro como inferno, que o faz enxergar a miséria, que o incomoda, que o desafia do interior
de sua desgraça, vítima de seu próprio ou coletivo inconsciente, vítima do sistema capitalista
de produção, vítima da globalização. O sacerdote ascético, cultivador de virtudes, tem novo
deus, transformou-se em intelectual orgânico, encarna a ética do ressentimento, como muito
bem viu Nietzsche e antes dele Espinosa de cuja Ética Gilles Deleuze afirma que A Ética
traça o retrato do homem do ressentimento, para quem toda alegria é uma ofensa e que faz da
miséria e da impotência sua única paixão (2003, pg.38) (5), e agora é um denunciador das
condições sociais e materiais que formam o caráter, apontador de culpados, sacerdote
absolvente de culpa subjetiva: o culpado é o outro do outro, o inimigo, não no sentido de ser
amado, mas odiado e eliminado. Renato Janine Ribeiro vê nisso uma marca distintiva,
afirmando que o mundo moderno nasceu da substituição das virtudes pelos interesses. A
antiga idéia medieval de que bons cidadãos e bons reis fazem uma boa sociedade e um bom
Estado, resultando daí a xima econômica que de vícios privados resultam os benefícios
públicos. o se parte mais da virtude, mas do vício, se não tanto, pelo menos do interesse.
(2006, pg.141)
1.1.2 Ética como filosofia (sistema)
A palavra ética é usada para designar o sistema ético de um determinado filósofo. A
primeira providência para quem quer entendê-la é separar a filosofia ética do seu objeto que é
a ética. A palavra é usada indistintamente num e noutro sentido. Usando a definição de
Aristóteles, pode-se perceber que A Ética a Nicômaco não é uma ética e sim uma filosofia
ética. Quer dizer uma filosofia (uso do saber em proveito do homem) de um determinado
objeto. Kant afirma:
Toda filosofia é seja teórica seja prática; a primeira concerne a
regra do conhecimento; a segunda, a regra da conduta em relação
com o livre arbítrio. A diferença entre as duas reside no seu
objeto, a filosofia teórica tendo por objeto a teoria, a filosofia
prática, a práxis.
(1997. pg.69)
Na Cr
ítica da Razão Pura diz: A filosofia da natureza estuda aquilo que é; aquela
dos costumes somente aquilo que deve ser (1973, pg.69). A ¨ética¨ pertence ao domínio do
ser, já a ¨filosofia ética¨ refere-se ao dever ser. O primeiro é estudado pelo sociólogo, assim
19
como, o passado é analisado pelo historiador, o porquê pelo psicólogo e o ¨dever ser¨ pelo
filósofo. Tal divisão é arbitrária, evidentemente. o raramente confundem-se. Alguns
intelectuais não se enquadram perfeitamente em nenhuma destas qualificações; Max Weber,
por exemplo, ora é chamado historiador, ora filósofo, em outros momentos psicólogo ou
sociólogo.
Nesse sentido, pode-se dizer que o sistema de filosofia ética de Aristóteles se
compõe de três obras: ¨Ética a Eudemo¨, ¨Ética a Nicômaco¨ e ¨Os grandes Livros de Ética¨.
Quando Jacques Maritain fala em A ética de Aristóteles ( 1973, pg.56) não está se
referindo, com certeza, ao caráter do filósofo grego, porém à reflexão que ele faz sobre um
objeto chamado ética. Desta maneira, a ética de Aristóteles significaria caráter de Aristóteles.
O próprio Jacques Maritain afirma, no Prefácio de seu livro A Filosofia Moral, que tem como
subtítulo: ¨Exame histórico e crítico dos grandes sistemas¨:
O presente volume é consagrado ao exame histórico e crítico de
certo número de grandes sistemas que são, a meu ver, os mais
significativos quanto à evolução e às aventuras da filosofia moral
.(1973,
pg. 15)
Marciano Vidal aponta diversos sistemas éticos:
- A ética do vitalismo (Bérgson), do imanentismo (Blondel) e do agir
vital (Ortega e Gasset).
- A ética dos valores: Hartmann, Scheler, Le senne, Frondizi etc.
- A ética existencialista: Heidegger, Sartre, Camus, Marcel etc.
- A ética do neotomismo e da escolástica revisionista: Maritain, De
Finance, Reiner, etc.
- A ética da fenomologia, do compromisso paternalista.
- A ética da filosofia reflexiva francesa: Bastide, Nabert, Jankélévitch
Levinás, Ricoeur etc. ( 2000, pg.80)
20
1.1.3 Ética como História dos sistemas éticos
A palavra ética é usada para designar a história dos sistemas éticos. alguns livros
que, embora não tenham sido citados, por respeito a seus autores, trazem por título Ética,
mas que na realidade são de história dos sistemas éticos. É preciso ainda aqui estabelecer uma
diferença entre história de sistemas éticos e história da ética. Esta seria a história do caráter de
cada povo e aquela a história das éticas dos filósofos, embora, no caso de Aristóteles, haja
uma aproximação, talvez uma equivalência, pois as virtudes descritas por ele são as que a
cidade elogia e os vícios os que ela recrimina. Já no caso da ética de Espinosa a coisa se passa
diferentemente, não podemos afirmar que seu panteísmo trata da ética de um determinado
povo ou época. Sua ética na verdade é um sistema que expõe o seu pensamento sobre a
maneira como os homens se comportam ou devem se comportar. Essa, aliás, é a tarefa da
filosofia prática, sempre lembrando que o ser não gera o ¨dever ser¨.
1.1.4 Ética como código.
A palavra ética é usada para designar um Código ou regulamento, por exemplo:
Código de Ética dos Advogados, dos Médicos, dos Deputados e assim por diante. Mais uma
vez, aparece uma nova classificação para ela: absoluta ou relativa. Nesse sentido a ética se
torna especializada de acordo com cada área de atuação do homem. Dom Cândido Padin
nos diz o que esperar de um Código Profissional:
Ora, a ética profissional [...] tem por fundamento o conceito do bem e do
mal relacionado com a realização dos valores da pessoa humana. A
profissão, por sua vez, deve ser conceituada como a atividade especializada,
geralmente técnica, que oferece algum produto ou serviço destinado a trazer
algum benefício ao usuário ou cliente dessa profissão.
(1999, pg.940)
O esquema abaixo apresenta como
ética, o Código de Ética e Disciplina dos
Advogados que dá uma visão clara do uso da palavra:
21
--------------------------------------------------------------------------------------------------
Tribunal de Ética } Julgamento (ético)
Qualquer do povo}
Bem absoluto------ Código de Ética------------------------Conduta (ética)
SUMMUN BONUM
-------------------------------Filosofia Ética----------------------------------------------------------------
Pode-se ver que existem quatro possibilidades para conceituar a palavra: como
Código ou regulamento, como conduta, como julgamento ou como bem absoluto. Uma quinta
hipótese é uma ética envolvendo o código, a conduta, o julgamento e o bem absoluto. Seria a
filosofia ética ou filosofia prática. Mas, qualquer que seja o enfoque, teremos sempre uma
ética duplamente relativa: abrange somente os advogados, e também relativa no sentido de
que só regula as ões praticadas no exercício da profissão. É uma ética profissional e do
trabalho. A finalidade (SUMMUN BONUM), que pode ser considerada um bem absoluto, é o
prestígio da categoria dos advogados, sua respeitabilidade e interesse de classe. Mas deve
haver também uma visão de proteção do cliente contra os maus profissionais que porventura
visem somente seus interesses. O próprio Código de Ética e Disciplina da Ordem dos
Advogados prevê outras éticas: Artigo - O exercício da advocacia exige conduta
compatível com os preceitos deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos
provimentos e com os demais princípios da moral individual, social e profissional
(destaque nosso). Quando a Ordem dos Advogados recebe uma denúncia sobre uma atitude
supostamente antiética, o Tribunal de Ética da entidade é convocado para pronunciar-se. O
adjetivo bom ou mau vai ser aplicado à relação entre a conduta e o Código, portanto
julgamento ético. As penalidades, em caso de conduta, não estão previstas no Código de
mas no Estatuto da Ordem dos Advogados e vão desde a advertência à exclusão. O problema
maior da ética como código ou regulamento é a questão da liberdade. Todo regulamento de
uma maneira ou de outra interfere na tomada de decisão do indivíduo. Tratando-se de questão
de difícil solução e que, por essa razão, não será abordada no âmbito deste trabalho.
22
1.1.5 Ética com Summum Bonum (Bem absoluto)
A palavra ética é usada para designar o bem absoluto da conduta humana. A questão
do SUMMUN BONUM é o fundamento de todos os sistemas éticos dos antigos. Elas se
distinguem de acordo com a resposta a esta questão, assim como diz Kant (1997, pg.76) ¨
diversas maneiras de classificar a ética segundo o bem absoluto que elas defendem¨. A
principal delas é a que as classifica em hedonistas ou eudomonistas, segundo colocam o
prazer ou a felicidade como bem soberano, fim absoluto da conduta humana. Existem também
aquelas que têm, ou dizem ter, a vida como bem absoluto. Quanto às hedonistas, é o
utilitarismo que mais se destaca, por sua persistência até os dias de hoje, com variantes, é
verdade, mas com o mesmo princípio. Respeitando todos os antecessores, desde Aristippus de
Cirene, no Século V a.C. e Epicuro, um século depois ainda na Grécia, e até os ingleses
Richard Cumberland, século XVII, Francis Hucheson, David Hume, Joseph Priestley, o
francês Claude-Adrien Helvetius e o italiano Cesare Beccaria, e os também ingleses David
Ricardo, e os Stuart Mill, pai e filho, seria apropriada a ênfase em Jeremy Bentham, que foi o
principal introdutor do utilitarismo na modernidade em sua obra ¨Introdução aos Princípios da
Moral e da Legislação¨, na qual afirma que o princípio da utilidade reconhece a sujeição do
gênero humano ao fundamento do sistema que tem por finalidade a busca da felicidade
através da razão e da lei:
A natureza colocou o gênero humano sob o domínio de dois senhores
soberanos: a dor e o prazer. Somente a eles compete apontar o que devemos
fazer, bem como determinar o que na realidade faremos. Ao trono desses
dois senhores está vinculada, por uma parte, a norma que distingue o que é
reto do que errado, e, por outra, a cadeia da causa e seus efeitos
(1979,
pg.3)
Eis aí a ata de fundação do utilitarismo moderno. Como é possível ver, a felicidade é
construída a partir do prazer. O próprio Bentham é quem diz: Ora, a felicidade consiste
naquilo que já vimos, ou seja, desfrutar prazeres e estar isento de dores. (1979, pg.19).
Diferentemente de Aristóteles, para quem a função dos políticos é formar virtuosos cidadãos,
aqui a função dos governantes é promover a felicidade da sociedade, punindo e
recompensando. (1979, pg.19). Enquanto o indivíduo deve procurar sua própria felicidade, a
legislação deve proporcionar a maior felicidade para o maior número, princípio primeiro do
utilitarismo, desenvolvido principalmente por John Stuart Mill, seguidor de Jeremy Bentham.
23
No fundo, como se pode observar, o utilitarismo hedonista também é eudomonista, pois são
os momentos de prazer que levam à felicidade.
A maior parte dos sistemas éticos adota a felicidade como Bem Absoluto. Sua
origem também é a Grécia, principalmente com Sócrates, Platão e Aristóteles, como descreve
Darrin M. MacMahon em seu livro Felicidade- Uma história. Ele conta que Sócrates
enfatizou a importância da conduta humana ao perguntar como devemos viver melhor nossa
vida. Os poetas épicos e dramaturgos acreditavam que a felicidade humana era determinada
pela sorte ou pelos deuses. Sócrates inverteu a questão, admitindo que a felicidade estava ao
alcance do homem e só dele dependia. No Diálogo de Platão, Eutidemo, pergunta: quem não
deseja ser feliz? Se todos o desejamos como podemos ser felizes? (2006, pg. 41).
Jacques Maritain faz uma grande exposição sobre o descolamento do pensamento
imanentista na Grécia, para o atual, que é o discursivo. O pensamento mítico vai sendo
substituído gradativamente até o aparecimento do pensamento transcendental. Entre as
primeiras idéias dessa nova maneira de pensar estão a noção de Bem, Fim e Felicidade. O que
nos interessa propriamente, no caso a felicidade, vai sendo interiorizada. Ser feliz se torna
uma arte, que depende, portanto, do próprio homem. Conhece-te a ti mesmo. Conhece tua
essência. A felicidade não depende da saúde nem da riqueza. Ser feliz é ter alma boa, como
expõe Jacques Maritain:
A felicidade e a boa conduta são uma e mesma coisa. Por mais que a
experiência pareça desmentir esse axioma, mas heroicamente o afirma o
sábio. o insensato julga que a experiência o desmente. Felicidade e Bem
são identificados, mas insistindo antes de tudo no Bem. É o bem que
constitui a felicidade. A felicidade não consiste nas coisas precárias do
exterior. Consiste nos bens que convém à alma e à essência do homem, cujo
poder de conhecimento e de discernimento racional é a marca específica e a
sua própria força.
(1973, pg. 35)
O mesmo processo ocorreu com a palavra virtude, que consiste no saber agir bem.
Agir mal significa ser ignorante. O Bem absoluto, para Platão, assim como para Sócrates,
também é a felicidade. Mas com a teoria das Idéias ou das Formas, a felicidade terrena,
segundo Jacques Maritain, é apenas o retrato muito mal traçado da felicidade transcendente
A ética é a arte de se preparar para uma felicidade que transcende a vida humana, pois desde
a existência terrestre, e depois dela, a verdadeira vida es para lá da vida, a verdadeira
felicidade para lá da felicidade (1973, pg.41).
24
Aristóteles volta à terra. A felicidade é ação conforme a virtude. o adianta ser
virtuoso, é necessário agir. Ela pode ser alcançada com estudo e esforço. Confirmando o papel
da vida política como o melhor dos fins e que o seu principal empenho deve ser no sentido de
fazer com que os cidadãos sejam bons e capazes de nobres ações. A felicidade é uma
atividade da alma conforme a virtude. Mas ela também precisa de bens externos para sua
perfeição pois é impossível, ou pelo menos não é fácil, praticar ações nobres sem os devidos
meios. Os amigos, a riqueza e o poder político são usados como meios para a prática de boas
ações. Em contrapartida, a estirpe, a descendência e a feiúra empenam a felicidade.
(2007, pg. 30, 31).
Darrim M. McMahon, analisando Aristóteles, salienta que, aparentando coerência e
simplicidade, a afirmação de que a felicidade humana é conseqüência da virtude é
monumental. Embora a idéia tenha sido levantada por Sócrates e Platão, Aristóteles a
aborda mais diretamente. Ademais vê ali uma noção de teleologia: cada ser humano é feito
para cumprir a sua missão. Verdade já não bem evidente em nossos dias. (2006, pg.60).
Espinosa vê na Alegria e na Tristeza o bem supremo da conduta humana. Nós
fazemos tudo para evitar a tristeza e procurar a alegria. (1965, pg. 146 e sgts.)
Kant, concordando que a riqueza e os bens exteriores ajudam, introduz um novo
bem. A única coisa boa sem limitação, no mundo ou fora dele, que pode ser pensado é uma
boa vontade. Não adianta todos os dons do espírito como discernimento, argúcia, capacidade
de julgar, e os demais talentos ou as qualidades do temperamento tais como coragem, decisão,
constância de propósito sem uma boa vontade. Mesmo sendo coisas boas e desejáveis podem
tornar-se extremamente maus e prejudiciais se a boa vontade, cuja constituição particular se
chama caráter, que deve fazer uso destes dons naturais, não for boa. A boa vontade é a
condição indispensável para sermos dignos da felicidade. (1980, pg. 109)
A vontade, isto é, a boa vontade, é o bem absoluto, a condição de tudo, formadora do
bom caráter e mesmo da felicidade. Enquanto em Aristóteles o caráter está ligado às virtudes,
o que poderia ser interpretado com o significado de que a ausência de virtudes levaria à
ausência de caráter, em Kant, a vontade, se não for boa, não gera a ausência, mas o mau
caráter.
Falando sobre o dom
ínio de si, Aristóteles afirma que o se pode fazer mau uso das
virtudes. Quando a razão domina as paixões, dizemos que o homem tem domínio de si.
Quando as paixões dominam a razão, há falta de domínio de si. Se a razão não estiver em bom
estado fará mau uso das virtudes. A idéia é a mesma da boa vontade kantiana com uma
pequena diferença:
25
[...] Em conseqüência, se a razão estiver em más condições e as paixões em
boas, não haverá virtude. (...) Não se pode conceber um mau uso das
virtudes.
(1995, pg. 180) (7)
Já Kant, em sua Fundamentação da Metafísica dos Costumes, afirma, ao contrário,
que na falta da boa vontade, as virtudes podem se tornar más:
:
Moderação nas emoções e paixões, autodomínio e calma reflexão não são
somente boas a muitos respeitos, ma parecem constituir até parte do valor
íntimo da pessoa; mas falta ainda muito para as podermos declarar boas sem
reservas (ainda que os antigos as louvassem incondicionalmente). Com
efeito, sem os princípios duma boa vontade, podem elas tornar-se
muitíssimos más.
(1980. pg.110)
Quanto às filosofias que têm, ou dizem ter, a vida como bem absoluto, encontra-se a
de Espinosa, que, segundo Gilles Deleuze, visa demonstrar todos os empecilhos e os valores
transcendentes contrários à vida, devido às ilusões e condições de nossa consciência; as
categorias de bem e mal, pecado e perdão, culpa e o culpa, envenenam a vida através da
raiva, muitas vezes contra si próprio; além disso, afirma ainda que Espinosa denunciou antes
de Nietzsche as falsidades da vida, todos os falsos valores, o que faz da vida uma imitação da
vida, levando a sonhar em evitar a morte: a nossa vida é um culto à morte. (2003, pg.39) (5).
Enrique Dussel também defende a vida como bem absoluto, mas vida material,
empírica, quer dizer, não em sentido metafísico e universal: Esta é uma ética da vida.A
negação da vida humana é agora nosso tema. (2002, pg.313 A crítica que ele faz refere-se a
essa negação da corporalidade que se expressa no sofrimento das vítimas do sistema, dos
dominados cujo exemplo são os índios, os operários, os escravos africanos, os asiáticos
explorados, as mulheres, as raças não brancas, nossos descendentes que sofrerão as
conseqüências da destruição da natureza, velhos sem rumo nem esperança de amparo,
crianças abandonadas e imigrantes estrangeiros refugiados. É necessário que se tome
conhecimento desta negação do outro. (2002, pg.313).
1.1.6
Ética como julgamento
A palavra
ética é usada para designar o julgamento sobre determinada conduta.
Henry Sidgwic, em seu livro Methods of Ethiks, dedica-lhe um capítulo, ao qual dá o nome de
Ethical Judgments,(1962, pg.23) mostrando como estamos habituados a esperar que os outros
26
se comportem de determinada maneira, por dever. O comportamento esperado, todavia, deve
ser o aguardado não por uma pessoa, mas pelo grupo ou opinião pública. Ao julgar o
comportamento de outro homem, não se tem em vista a finalidade a que se destina, isto é, não
se trata de uma percepção de inadequação entre meios e fins. O agir esperado pode ser devido
a uma imposição da lei positiva, sabendo-se que há uma sanção em caso de descumprimento,
mas o que de fato se julga é o descumprimento ético, baseado no dogma de que todos devem
cumprir a lei, ou que ela foi feita para ser cumprida. O imoral ou não ético é deixar de cumprir
a lei. Quando a pessoa descumpridora é sancionada, cessa a indignação moral: é o sentimento
de justiça que se levanta. Mas outros comportamentos esperados que o se referem a lei
positiva alguma. Nessa situação julga-se o comportamento errado, não racional ou mesmo
irracional. Geralmente atribui-se a uma falta de controle dos sentimentos, falta de domínio de
si, o fato do agir errado. É a questão do bem ou mal nas ões humanas. Outros
comportamentos são aguardados em virtude de condições especiais. Isto pode ser visto na
ética relativa dos advogados ou no caso dos políticos: todos esperam que os parlamentares e
governantes se comportem dentro de padrões éticos. Sendo um parlamentar absolvido por
uma suposta conduta não ética e estando a opinião pública convencida da culpabilidade, o
julgamento recai sobre os que o inocentaram. Isso se deve ao que nós chamamos de ética
relativa ou absoluta. Na absoluta o julgamento é feito pela sociedade. Sendo as virtudes a
subjetivação dos valores nela imperantes cabe a esta o julgamento da conduta dos cidadãos. É
recorrente, tanto na Ética a Nicômaco como nos Grandes Livros de Ética de Aristóteles, uma
preocupação com o elogio ou a reprovação da conduta. Além do julgamento externo, o
julgamento interno: a consciência. Aqui o julgamento é feito pelo próprio ator que se
arrepende de seu ato, remorso ou julgamento moral.
1.1.7 Ética como conduta
A palavra ética é usada para designar um tipo de conduta. Conduta significa ação,
agir. Toda ética qualquer que seja o nome dado, tem como objeto a conduta humana.
Marciano Vidal nos lembra que a conduta humana tem vários níveis, o que demonstra
complexidade e riqueza, do ponto de vista psicológico. Problemas como Que devo fazer,
como posso agir?, Quais são meus limites? e tudo o mais derivam do estudo da conduta
do homem. Conceitos de liberdade, responsabilidade, são enfocados na conduta. Uma nova
visão da conduta, teleológica, chamada ética da responsabilidade, defendida entre outros por
27
Hans Jonas, pretende criticar não os princípios da ética tradicional como também o seu
alcance, espacial e temporal:
(6) Todos os comandos e todas as máximas da ética tradicional,
qualquer que seja a diferença de seus conteúdos, apresentam esta
restrição ao alcance da ação (1990, pg.28).
Como se pode deduzir, explicar o que é ética não é cil, conforme defende com
razão Álvaro L.M. Valls, caso não se leve em consideração todas as possibilidades levantadas
e outras tantas possíveis. Poderiam ainda ser levantadas questões relativas à liberdade,
natureza humana, finalidade, comumente atribuídas à ética. Kant chama sua filosofia como
¨Metafísica dos Costumes¨. (1980, pg.105) Caberia à filosofia especulativa fornecer o Bem
Absoluto de toda ética? Nesse primeiro capítulo não foi feita, propositadamente, nenhuma
referência à ética religiosa. Ela será o tema do próximo. Foram apresentadas as idéias de três
autores católicos: São Tomás de Aquino, Marciano Vidal e Jacques Maritain. Não tendo
ocorrido nenhuma referência a autores protestantes. Nada relacionado a Lutero ou Calvino. O
motivo é obvio: eles fazem parte da pesquisa sobre Max Weber, embora seja defendido que o
assunto levantado, isto é, o sentido da palavra ética, se aplica, indistintamente, tanto ao
cristianismo católico quanto ao protestante e, diga-se a qualquer outra religião, pois, como diz
Émile Durkheim, resta a questão fundamental: ¨A moral não será mais a moral se ela não tiver
nada mais de religião¨ (1951, pg.101) (7). Isto é, não se trata de introduzir a ética na religião,
mas a religião na ética.
28
II
CONCEITO DE ÉTICA EM MAX WEBER
2 O PROBLEMA
Agora que já se tem uma visão geral dos sentidos atribuídos à palavra ética, será
verificado em qual, ou quais sentidos, Max Weber utiliza a palavra, ou se há algum deles que
específicamente pode ser chamado sentido forte e outros secundários ou sentidos fracos.
Graças à sua riqueza, a obra de Max Weber pode ser estudada sob diversos pontos de vista.
Quando o nome do autor é digitado num sitio de busca na internet, aparecem mais de 17
milhões de possibilidades, o que mostra o interesse despertado pelo assunto e as mais
desencontradas opiniões a respeito. Entre os intelectuais comentadores e críticos (quantidade
também considerável), como nos diz Jean-Pierre Grossein, na Apresentação que ele faz do
livro Sociologie des Religions:
(8)
A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo é, em diversos sentidos,
um texto altamente paradoxal. Malgrado sua estreiteza e seu caráter
inacabado, sublinhado com ênfase pelo próprio Weber em vista de seus
detratores, esta tese, cuja estrutura argumentativa é particularmente
complexa e difícil de resumir, tornou-se um texto canônico das ciências
sociais ao menos da sociologia da religião, em todo caso - engendrando
uma massa considerável de comentários, exegeses e controvérsias.
(1996,
pg.52)
Evidentemente, todos esses comentários e interpretações não podem ser examinados.
Destarte, serão averiguados apenas os três livros que seriam mais pertinentes, são os
autores: Michel Istas e Wilhelm Hennis, que tratam do conjunto da obra de Max Weber e,
Annette Disselkamp, que se ocupa somente da Ética Protestante. Contudo, também serão
levados em consideração, mas de maneira subsidiária, outros comentadores e tradutores como
Jean-Pierre Grossein, Julien Freund, Antônio Flávio Pierucci e Adolfo Sanches Vasquez. Será
iniciada pela verificação de sinonímia ou não entre os sentidos de ética e moral, como
prometido, o que demonstra ser motivo de grandes confusões e enganos.
29
Antes, porém, convém falar sobre o tema de que trata o autor na Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo. O sociólogo Max Weber inicia sua pesquisa a partir de um problema
social, como explicitamente afirma no início de seu livro:
Uma panorâmica da estatística profissional de um país pluriconfessional
costuma mostrar com uma freqüência significativa um fenômeno por várias
vezes vivamente discutido na imprensa, literatura e congressos católicos da
Alemanha: o fato de os dirigentes das empresas e os detentores de capitais,
bem como as camadas superiores da mão-de-obra qualificada e, mais ainda,
o pessoal técnico e comercial altamente especializado das empresas
modernas serem predominantemente protestantes.
(2005, pg.27)
Essa constatação óbvia, por vezes esquecida por seus comentadores, é o ponto de
partida da pesquisa, pelo menos no ensaio publicado em 1904, completado em 1905.
Devemos salientar que na Introdução, escrita em 1920, aparece um outro problema, que
parece mais uma justificação da pesquisa:
O filho da moderna civilização européia tratará os problemas da história
universal tendo em conta, inevitável e legitimamente, a seguinte questão:
que encadeamento particular de circunstâncias levou a que no ocidente, e
só aqui, tenham aparecido fenômenos culturais que como pelo menos
gostamos de pensar se situaram numa direção evolutiva de significado e
valor universais?
(2005, pg.11)
Após mostrar os fenômenos culturais, ciência e arte (arquitetura, música) e o Estado
com sua burocracia, acrescenta: E o mesmo acontece com a força mais decisiva da nossa
vida moderna: o capitalismo.(2005, pg.11).
Antonio Flávio Pierucci, que traduziu a primeira edição do livro de Max Weber para
o português, por ocasião de seu centenário, acoplado com as inserções feitas pelo próprio
autor em 1920, nada diz sobre a Introdução. Mas, no entanto, ele salienta bem, na dobra da
capa, essa dupla preocupação, escrevendo que o livro de Max Weber faz parte daquela
categoria de livros que se tornaram fundamentais para o pensamento científico moderno: A
ética protestante e o espírito do capitalismo procura compreender um fenômeno observado
na passagem do século XIX para o XX: A seguir afirma que o maior desenvolvimento
capitalista nos países de confissão protestante e a maior projeção dos protestantes no mundo
econômico são os fatos apontados. (2005).
30
Na Apresentação que faz do livro, afirma que o objeto estudado por Max Weber não
era o capitalismo como sistema econômico ou modo de produção, mas o capitalismo enquanto
espírito, quer dizer, a cultura capitalista moderna, capitalismo vivenciado pelas pessoas na
condução metódica do dia a dia, o que significa que o espírito do capitalismo é como a
conduta de vida. (2005, pg.7).
Annette Disselkamp, no livro publicado a partir da tese defendida na Sorbonne,
apresenta a visão de outro sociólogo, A.O. Hirschmann, autor do livro As Paixões e os
interesses, comparando-a com a de Max Weber, para entender o problema a que procura
responder a Ética Protestante: [...] como uma atividade apenas tolerada pela moral pode se
transformar em vocação no sentido de Benjamim Franklin? Hirschmann reformulou a
questão perguntando como foi que nós chegamos, num determinado momento da época
moderna, a considerar honrosas atividades lucrativas, tais como a comercial ou a bancária,
que durante séculos foram desprezadas e odiadas por serem a encarnação da ganância, do
lucro desmedido e da avareza?¨ (1994, pg. 71) (9).
Esses e outros problemas, talvez dezenas, de fato, podem ser levantados na obra que
pesquisamos, o que demonstra a sua grandiosidade e já referida riqueza. Mas não podemos, e
não se deve esquecer que o próprio Max Weber coloca, como título do primeiro capítulo, um
fato social como problema que, aliás, era assunto na sociedade de seu tempo.
2.1 A SOLUÇÃO
Após considerar vários fatores, tais como posse de riqueza transmitida
hereditariamente, escolaridade e a situação política, que, embora pertinentes, não solucionam
o problema, Max Weber afirma:
A explicação dessa diferença de atitude deve ser pois procurada nos
traços de caráter intrínsecos e permanentes das duas confissões e não apenas
nas respectivas situações histórico-políticas, temporárias e exteriores.
(2005, pg.30)
Quais serão esses traços de caráter intrínsecos e permanentes? Max Weber não
pretende utilizar-se da psicologia por razões que ele mesmo denuncia ao analisar o aspecto
antropológico do problema:
31
E só depois, e na medida em que a neurologia e a psicologia das raças
tiverem progredido para além da fase rudimentar em que se encontram
aliás, promissoras em muitos aspectos -, poderíamos talvez esperar obter
resultados satisfatórios para esses problemas.
(2005, pg.23)
Já em nota sobre o calvinismo (116), reafirma os motivos para deixar de considerar
as relações psicológicas dos conteúdos religiosos da consciência, no sentido científico da
palavra, não querendo mesmo utilizar a respectiva terminologia devido à falta de segurança
dos conceitos, tanto da psicologia quanto da psiquiatria, que poderiam comprometer a
objetividade da investigação histórica, no que di\z respeito a seus objetivos. (2005, pg.162).
Falando sobre a excitação emocional metodista, em seu caráter patológico,
comparativamente à sensibilidade dos pietistas, além de motivos históricos e publicitários,
acredita que há nele uma penetração ascética da vida, de modo mais forte. Mas decidir sobre
isso seria tarefa da neurologia, dando a entender que esta teria conceitos mais seguros que
aquelas. (Nota 167) (2005, pg.169)
Na Anticrítica de 1910, a propósito do espírito do capitalismo, como resposta a
Rachfahl, parece, colocando entre aspas a palavra, que tem uma interpretação particular do
que seja psicologia. Seria uma psicologia em sentido formal e não científico o que, na época,
não era nada absurdo:
(10)
Aquele que não estiver interessado por toda esta psicologia, mas so-
mente pelas formas exteriores dos sistemas econômicos, eu lhe rogo de o
ler meus ensaios. E eu lhe rogarei também de ter a bondade de me deixar
livre de querer me interessar justamente por este aspecto psíquico do
desenvolvimento econômico moderno, tal como se revelam, no seio do
puritanismo, as grandes tensões e os grandes conflitos interiores entre a
profissão, a vida (como nos dizemos hoje em dia), e a ética, a isto
dando um equilíbrio singular, que não existia dessa maneira nem antes e
nem depois.
(2003, pg. 369)
A opinião de Jean-Pierre Grossein sobre o assunto, na apresentação da Ética
Protestante e o Espírito do Capitalismo por ele traduzida para o francês, também vai no
sentido aqui proposto, isto é, que o recurso que Weber faz às análises psicológicas ao mesmo
tempo em que recusa a psicologia, parece indicar que trata-se de uma diferenciação entre
psicologia e psicologismo no sentido de creditar à psicologia uma explicação última da
realidade social, seja ligando o desenvolvimento a leis psicológicas seja decompondo os
fenômenos sociais em processos psíquicos elementares, como na psicologia experimental.
32
Segundo ele, quando Weber pode explicar o sentido da ação social em termos de meios e de
fins, não vê necessidade de recorrer à psicologia. (2003, pg L)
Hoje que o leque dos conceitos da psicologia já está bem mais seguro, as palavras
utilizadas por Max Weber são interpretadas cientificamente como o faz, por exemplo,
Wilhelm Hennis:
(11)
Os puritanos conseguiram coordenar o íntimo da personalidade e
o cotidiano das obrigações profissionais. Quais são as conseqüências para a
humanidade se as ordens racionalizadas da vida cotidiana não permitem
mais esta coordenação? Eu penso que é esta a questão capital que Weber
pôs ao mundo onde s estamos jogados, depois de Marx.
(1996,
pg.114)
A seguir, afirma que a impossibilidade de uma interpretação ética das relações
sociais percorre toda a obra de Weber devido ao fato dessas relações terem se tornado
impessoais, isto é, o empregado agora trabalha para uma pessoa jurídica sem rosto, sem
consideração e sem coração. (1996, pg. 116).
Vem, a partir daí, uma longa explicação na qual são mostradas que as relações na
sociedade moderna se tornaram anéticas, impossíveis de avaliação ética. A preocupação de
Max Weber seria, assim, a formação da personalidade. Embora não seja apoiada a
interpretação de autores antigos a partir de conceitos modernos, por exemplo, falar em
moral de Aristóteles quando é quase certo que ele não conhecia essa palavra, que causa
confusão, será considerado e verificado se ele se aplica ao livro, objeto de presente pesquisas.
O comentário de Hennis, se referindo ao conjunto da obra de Max Weber, deve incluir,
evidentemente, A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, mesmo que, seja reconhecido
que há dificuldades, face à complexidade e abrangência de seu pensamento. Julien Freund diz
que, sendo a dispersão metodológica, científica e filosófica uma das características de seu
pensamento, ao lado do espetáculo de todos os antagonismos possíveis e irredutíveis, em
princípio, a qualquer sistema, não seria uma infidelidade a Weber conferir uma aparência de
harmonia a essa dispersão intencional, simplesmente porque dispersão o significa
incoerência nem confusão de gêneros ou mesmo ecletismo. (2003, pg.9).
Aceitando que não haja incoerência e tamm se acredita nisso, pode-se mencionar
Jean Delay e Pierre Pichot para saber o que é personalidade e se pode ser aplicada a Max
Weber, como faz Wilhelm Hennis:
33
(12)
O termo personalidade deriva do latim persona que designa a máscara
do ator, de onde saiu igualmente a palavra pessoa. Uma das características
da máscara do teatro antigo era sua permanência durante toda a peça. O
aspecto permanente foi apreendido pela psicologia clássica que na
personalidade a função psicológica pela qual um indivíduo se considera
como um eu, um e permanente. Na psicologia atual, a personalidade é
definida como a organização dinâmica dos aspectos cognitivos
(intelectuais), afetivos, conativos (pulsionais e volitivos), fisiológicos e
morfológicos do individuo.
(1990, pgs. 317/318)
A personalidade é integrada por fatores biológicos e psicológicos. Os biológicos são
reunidos sobre o nome de temperamento e os psicológicos ou sociais recebem o nome de
caráter quando se refere aos aspectos cognitivos, afetivos e conativos. A personalidade
também pode ser definida em termos de traços. Delay e Pichot dizem que essa noção de traço
tem sua origem no sentido comum, pois a linguagem sempre utilizou adjetivos para distinguir
o indivíduo do ponto de vista de suas disposições psicológicas, tais como corajoso,
indeciso, ansioso, violento, etc. Essas qualificações exigem duas coisas: que haja
independência entre o indivíduo e uma situação específica, podendo se classificar o indivíduo
por esse tipo de reação. (1990, pg.330).
Assim, traço corresponde a disposição psicológica o que leva a crer que realmente
Max Weber se referia à psicologia em sentido formal, como ele afirma, falando do
protestantismo ascético:
Quer isto dizer, na linguagem que temos usado: o ascetismo puritano
como qualquer ascetismo racional trabalhava para tornar o homem apto
a afirmar, face às suas emoções, os seus motivos constantes, em particular
aqueles que o ascetismo lhe inculcava. Trabalhava, por assim dizer, na
firmação da sua personalidade, no sentido formal e psicológico do termo.
Ao contrário do que o vulgo imaginava, o objetivo do ascetismo era poder
levar uma vida desperta, consciente, clara.
(2005, pg.102).
Como o número de adjetivos na linguagem é imenso, a personalidade pode ser
qualificada de diversas maneiras, e o caráter, em seus aspetos afetivos e principalmente nos
conativos, não tem limites de qualificação. Pode-se concluir que Max Weber está realmente
preocupado com a formação da personalidade, mas, sobretudo, com a formação do caráter,
nos domínios intelectual, afetivo e conativo, não incluindo fatores biológicos inatos ligados ao
temperamento. Marianne Weber fala: Toda a vida, Weber rejeitou com veemência a noção
de que a natureza nos pré-forma de acordo com leis inevitáveis¨ (2003, pg.103); Quanto ao
34
domínio do cognitivo, será visto mais adiante. Daí, então, sua veemência ao falar que: Deste
modo, a diferença o reside no grau de desenvolvimento de qualquer sede de dinheiro¨ (
2005, pg. 41). Antônio Flávio Pierucci e Jean-Pierre Grossein falam em pulsão, o que
aparenta ser o mais correto. Enquanto o uso da palavra caráter é freqüente, o do termo
personalidade é esporádico. Eis o quadro, usando o mesmo critério observado para a palavra
ética, como será visto:
Caráter.................................................... 76
Característico/a/s................................... 56
Caracterizar.............................................19
Caracteriológico..................................... 03
Caracteristicamente............................... 03
Caracterizações....................................... 01
Total............. 158
Contando-se a Introdução, poderia ser acrescentada mais 06 vezes a palavra caráter e
08 vezes característico/s, perfazendo, no mínimo, um total de 172 ocorrências. Verificando-se
uma hipótese também real, a existência de um espírito do capitalismo, entendido como uma
disposição, um traço de caráter, o sustentáculo do capitalismo, ou seja, ganhar dinheiro pelo
dinheiro e que se revela uma falsa hipótese na explicação do problema, Max Weber mostra
que católicos e protestantes têm comportamentos diferentes devido a outro traço de caráter
permanente: a profissão como vocação e o trabalho como dever, que já é anunciado no início
de seu ensaio, sendo, na realidade, o espírito do capitalismo uma conseqüência daquele e,
portanto, sem valor explicativo:
O ganho do dinheiro é na medida em que se processar de formas legais-
na ordem econômica moderna o resultado e a expressão da capacidade
profissional, e esta capacidade é, como atualmente se pode constatar sem
dificuldade, o alfa e ômega da moral de Franklin, tal como se nos apresenta
no passo citado, bem como em todos os escritos, sem exceção.
(2005, pg.
39).
Deve-se ainda assinalar que tanto o trabalho como vocação quanto o espírito do
capitalismo são traços de caráter de origem social-psicológica e não de temperamento, quer
dizer que não são produtos da natureza; podem ser conseguidos seja aumentando-se ou
diminuindo-se os salários, tudo dependendo de um longo processo educativo. Trabalho
efetuado como se fosse um objetivo absoluto, uma vocação profissional, como um dever. O
ganho do dinheiro, como exemplo de tradicionalismo, é enfatizado por Weber: [...] o
35
homem não deseja por natureza ganhar cada vez mais dinheiro. Prefere viver como está
habituado, ganhando apenas o necessário para viver comodamente. (2005, pg.43/44).
2.2 DIFERENÇA ENTRE ÉTICA E MORAL
Antes, ainda, da análise do sentido atribuído à palavra ética, convém verificar se
uma diferença entre moral e ética, o que nos possibilitaria dar um passo importante na
elucidação do problema. Assim, conforme foi observado que em Psicologia, caráter e
personalidade não são exatamente coincidentes, sendo o primeiro um domínio da segunda,
também foi ressaltado que, para alguns, moral e ética têm sentidos diferentes, ao passo que
para outros são coincidentes. Existem ainda aqueles que consideram o primeiro como teoria e
o segundo como objeto, caso de Adolfo Sanches Vasquez. E para Max Weber? Ele usa
profusamente as duas palavras, embora ética apareça mais vezes. Ao contrário de ética, a
palavra moralo aparece na Introdução:
Eis o quadro: ·
Moral......................................................... 49
Imoral....................................................... 03
Moralmente.............................................. 10
Moralidade............................................... 08
Moralistas................................................. 06
Total...................... 76
Usos da palavra moral:
1. Todas as asserções morais de Franklin. (pg.38)
2. Alfa e ômega da moral de Franklin. (pg.38)
3. Qualquer norma moral. (pg.41)
4. Moral para o exterior. (pg.41)
5. Indignação moral. (pg.49)
6. Naufrágio moral. (pg.49)
7. Qualidades morais pessoais. (pg.49)
8. Sentimentos morais. (pg.52)
9. Uma visão moral como a de Franklin. (pg.52)
10. Caráter exterior à moral. (pg.53)
11. Muito tolerada pela moral. (pg.53)
12. Sente uma obrigação moral. (pg.53)
13. Ação moral. (pg.56) (pg.100)
36
14. Mandamentos morais. (pg.56)
15. Superação da moral temporal. (pg.56)
16. Qualificação moral. (pg.58)
17. Acento moral. (pg.58)
18. Superação da moral. (pg.67)
19. Indiferente à moral. (pg.68)
20. Valor moral da contemplação. (pg.83)
21. Degradação moral. (pg.85)
22. Conduta moral. (pg.89)
23. Prática moral. (89)
24. Renovação moral. (pg.89)
25. Tolerância moral. (pg. 103)
26. Superação da moral laica. (pg.103)
27. Preceitos morais. (pg.105)
28. Moral puritana. (pg.106)
29. Submetia Deus è lei moral. (pg.106)
30. Moral profissional. (pg.110)
31. Polícia moral das seitas. (pg.122)
32. Ponto de vista moral. (pg.124)
33. Contra a moral burguesa. (pg.130)
34. Contra a moral de classe. (pg.130)
35. Moral burguesa. (pg.138)
36. Inferioridade moral. (pg.150)
37. Indignidade moral individual. (pg.150)
38. Ações meramente morais. (pg.154)
39. A contabilidade moral. (pg.158)
40. Tônica moral. (pg.158)
41. Código moral. (pg.173)
42. Teórico da moral. (pg.178)
43. Da moral que animava. (pg.181)
44. A mesma moral para os jesuítas. (pg.181)
45. Bem moral positivo. (pg.181)
46. Bastante morais. (pg.188)
47. Benefícios morais. (pg.188)
48. Aprendizagem moral. (pg.194)
Como está sendo levada em consideração a tradução portuguesa da Editorial
Presença, 6ª. edição, é possível que em outras traduções, justamente por não haver essa
distinção entre ética e moral, haja divergência quanto ao número tanto da palavra ética como
da palavra moral. O exemplo é a passagem onde Weber fala:
Com a consciência de estar em estado de graça e com a benção de Deus, o
empresário burguês, no caso de se manter nos limites da correção formal, de
a sua ação ética não revelar manchas e de o uso da riqueza não ser
37
inconveniente, podia (e era obrigado) a prosseguir os seus interesses
econômicos.
(2005, pg. 136)
Antônio Flávio Pierucci traduz a frase em negrito como: ¨de ter a sua conduta
moral irrepreensível¨ [...]. (2005, pg.161), Jean-Pierre Grossein também fala: ¨se a sua
conduta moral fosse irrepreensível¨ [...]. (2003, pg. 244) (13). No original, em alemão, -
se: ¨sein sittlicher Wandel¨ (2004, pg. 197). Nesse caso, considera-se a palavra como ética e
não como moral, respeitando, desta forma, o tradutor de Portugal, que é base das análises
realizadas, embora a preferência seja concordar com Pierucci e Grossein.
Os três autores que tratam do assunto, já assinalados, não se referem explicitamente
ao assunto, dando a entender, especialmente Annette Dusselkamp, que são sinônimos. Michel
Istas, por exemplo, apresenta uma opinião confusa: não se sabe exatamente o que ele quer
dizer com as Les Morales selon Weber (As Morais segundo Weber). Na língua francesa, a
palavra morale significa, segundo o Petit Larousse, Conjunto de regras de ação e de valores
que funcionam como normas numa sociedade. a palavra moral: Conjunto de faculdades
mentais da vida psíquica ou Que concerne as regras de conduta em uso numa sociedade. O
certo é que ele traduz com o título de ¨La morale économique des grandes religions¨ aquilo
que Jean-Pierre Grossein traduz por ¨Léthique économique des religions mondiales¨. Ana
Falcão Bastos e Luís Leitão na tradução da Introdução portuguesa da Editorial Presença
também usam, quando se referem àquela obra, ética e não moral para o título. Trata-se de
um capítulo do livro Ensaios Reunidos de Sociologia que em alemão recebe o título ¨Die
Wirtschaftsethik der weltreligionem¨. O fato de traduzir por moral o que outros traduzem por
ética, induz o leitor a entender que tratam-se de sinônimos. Em português do Brasil, só
Antonio Flávio Pierucci fala em ¨Ensaios Reunidos de Sociologia¨, pois outros preferem
¨Ensaios de Sociologia¨. Um exemplo seria o da Zahar Editores, que dão ao capítulo o título
A psicologia Social das Religiões Mundiais ao invés de ética ou moral. Estas
observações não ocorrem por acaso, uma vez que se acredite que Max Weber faz uma
diferenciação entre ética e moral. No capítulo chamado ¨O espírito do capitalismo¨, após
apresentar a pregação de Benjamin Franklin como exemplo daquele espírito, afirma:
Todas as asser
ções morais de Franklin têm um cunho utilitário: (...)
Não apenas o próprio caráter de Benjamin Franklin (...) o alfa e o
ômega da moral de Franklin. (...) E muito menos se deve pensar que,
para o capitalismo atual, seja a condição de existência a apropriação
subjetiva desta máxima ética pelos seus únicos portadores, os
empresários ou os trabalhadores das modernas empresas capitalistas.
(2005, pg, 39)
38
O que é aqui apresentado é uma diferenciação entre ética e moral, sendo a moral
interna e a ética externa. A moral de Franklin e o espírito do capitalismo o subjetivos, além
dos seus traços do caráter e disposições psicológicas. Quando Franklin prega, sua moral torna-
se ética (particular) e, se for apreendida e transformada em moral, tornando-se traços de
caráter, tornar-se-á ética. uma interação entre ética e moral: Quase pareceria adequado
ignorar as bases dogmáticas éticas, para nos atermos apenas à prática moral, na medida em
que possa ser constatada. (pg.89) Max Weber nomeia ética e moral aquilo que Adolfo
Sanches Vasquez afirma como moral, dividindo-a em planos: a) o normativo, constituído
pelas normas ou regras de ação e pelos imperativos que enunciam o que algo deve ser; b) o
fatual, ou plano dos fatos morais, que se constituem de certos atos humanos efetivamente
realizados e são independentes de como pensemos que deveriam ser. No primeiro plano, ou
normativo, as regras pedem determinado tipo de comportamento ama teu próximo como a ti
mesmo, ¨respeita teus pais, não mintas, não te tornes cúmplice de uma injustiça etc. Já
no segundo, ou fatual, pertencem as ações concretas, isto é, o ato pelo qual uma pessoa se
mostra solidário com outra, trata os pais respeitosamente, denuncia injustiças etc. (1999.
pg.63).
Coincide, no plano normativo, àquilo que Weber chama ética. Mas no plano factual,
a coisa se passa diferentemente, pois, como vemos, esse plano elimina completamente a
noção de traços de caráter intrínsecos e permanentes defendidos por Max Weber e os
Psicólogos Jean Delay e Pierre Pichot, citados. Não existiria assim um homem corajoso,
mas atos de coragem praticados em determinadas situações. No plano normativo, a regra
ama teu próximo como a ti mesmo é externa ao sujeito, a não ser que, como dizem Jesus
Cristo, Hegel, (como veremos) e Max Weber, fosse apreendida subjetivamente,
transformando-se em um traço de caráter, transformando-se em devo amar meu próximo. É
exatamente nesta questão que se encontra a chave de toda a problemática que está sendo
pesquisada por Weber: a diferença de comportamento entre católicos e protestantes, em
relação à ocupação de funções na sociedade, se deve a esta diferença nos traços de caráter
intrínsecos e permanentes.
Esta é a resposta para a pesquisa de Weber:
39
Chegamos, assim, a um ponto muito importante da nossa exposição. Esta
maneira de pensar, que se foi desenvolvendo cada vez mais nas igrejas e
seitas reformadas, era criticada pelos luteranos como santificadora das
obras. E por mais justificado que fosse o protesto dos acusados contra a
identificação da sua posição dogmática com a doutrina católica não
faltava alguma razão aos acusadores se se pensar nas conseqüências práticas
de uma tal atitude para o quotidiano do cristão mediano da Igreja
reformada. É que talvez nunca tenha havido forma de valoração religiosa
da ação moral mais intensa que a de Calvino e seus discípulos. Mas o que é
importante para o sentido prático desta santificação das obras é a
compreensão das qualidades que caracterizam o modo de vida que lhe
correspondia e o que as diferencia do quotidiano de um cristão mediano da
Idade Média. Pode tentar formulá-las do seguinte modo: o leigo católico
comum da Idade Média vivia, de um ponto de vista ético, por assim dizer,
no dia-a-dia , cumprindo, antes de mais, as suas obrigações tradicionais
com consciência. Todas as boas ações que realizasse, para, além disso,
não constituíam uma série de ações necessariamente ligadas a um sistema
de vida racionalizado. Eram antes uma sucessão de atos isolados que
cumpria ao sabor das circunstâncias para redimir certos pecados, ou sob
influência pastoral, ou ainda nas proximidades da morte, para garantir uma
espécie de prêmio de seguro. É evidente que a ética católica era uma ética
de intenção. Mas a intentio concreta de cada ação decidia do seu valor.
(2005, pg.101)
Como é possível observar, existem traços de caráter intrínsecos e permanentes em uns
e ocasionais e extrínsecos em outros (a rigor não se pode falar em traços). Intrínsecos no
sentido de valor interno ao caráter. Extrínsecos na seguinte acepção: o valor depende da
conseqüência da ação. Justamente a diferença entre católicos e protestantes. Homem virtuoso
pratica ações virtuosas. O dever da profissão-vocação é intrínseco e permanente, a simples
troca de profissão não é bem vista, pois caracteriza inconstância e não-permanência. Por isso,
quando Weber fala em moral de Benjamim Franklin, manifestada em sua pregação, não
depende de seu comportamento num dado momento apenas, mas é uma revelação de seu
caráter. Trata-se da manifestação de um ¨ethos¨, entendido como conjunto de traços de
caráter: honestidade, pontualidade, aplicação ao trabalho e a retidão etc., que Antônio Flávio
Pierucci assim analisa no glossário de seu livro:
Ethos- No movimento de definir o espírito do capitalismo, Weber o
classifica como um ethos, para logo adiante definir o que é isso nos
seguintes termos: um determinado estilo de vida regido por normas e
folhado a ética. Evidentemente, uma definição dessas confere um sentido
forte à palavra ethos. Em sentido fraco, ethos é termo genérico que vem
usado frouxamente para designar um conjunto impressionístico de traços
tidos como característicos de um grupo social ou mesmo de um povo.
(2005, pg.283)
40
Como Max Weber diz explicitamente, ao se referir a Franklin: o se trata aqui
apenas de lições sobre esperteza para o negócio o que, de resto, é freqüente encontrar
mas de um ethos que se expressa, e que interessa precisamente nesta qualidade, conclui-se
que poderia ser uma característica individual também. Esta idéia é a mesma contida no
Sermão da Montanha, obsessão de Weber: obedecer a lei interna e não a externa, que, em
outras palavras significa: transformar a ética em moral, isto é, apropriação pela moral da
máxima ética. É o exemplo já analisado por Hegel: (1983, pg. 60)
A intenção de Jesus era de acordar o sentido de moralidade, de agir sobre a
atitude interior; é por isso que ele apresentava, às vezes em forma de
parábola, exemplos de maneiras corretas de agir, particularmente daquelas
que estavam em oposição com aquilo que um Levita legalista devia fazer;
depois ele deixava ao sentimento dos ouvintes de julgar se aquela maneira
de agir era suficiente. Em particular, ele mostrava o contraste entre o que
exigia a lei civil ou ainda os mandamentos religiosos que se tornaram leis
civis, e o que exigia a moralidade (especialmente no Sermão da Montanha)
das leis.
(1983, pg. 60) (14).
Weber transformou o èthos aristotélico (o costume), em ética e o éthos (caráter), foi
modificado para moral. As virtudes morais pregadas por Franklin, que em Aristóteles são
virtudes quando exercitadas na práxis, como em Vasquez no plano factual, aparecem como
traços permanentes e intrínsecos e, por isso, são virtudes, meios para atingir determinados
fins. Eis a diferença entre código de ética e código moral. E isto tem muita importância:
A razão natural nada sabe de Deus (Barclay,op.cit.,p.102). Com isso se
alterava a posição que de resto a lex naturae ocupa no protestantismo. Não
podia haver em princípio general rules, um código moral, porquanto a
vocação profissão que cada qual tem, e que é individual de cada um, Deus
a mostrou através da consciência. Não se trata de fazer o bem - no
conceito generalizante de razão natural -, mas de fazer a vontade de Deus.
Tal como numa nova aliança foi escrita em nosso coração e se expressa na
consciência (Barcley,PP.73ss e 76). Essa irracionalidade ética resultante
da antítese exacerbada entre o divino e a criatura exprime-se nas seguintes
frases, fundamentais para a ética quaker: o que um homem faz em
discordância com sua fé, mesmo que essa fé esteja equivocada, não é
aceitável a Deus (...) mesmo que aquilo possa ser lícito a outrem
(Barclay,
pg. 487). (2005, pg.244).
41
A idéia de que Deus escreve no coração do homem a vocação profissão vem
também expressa na famosa figura de coração de carne e coração de pedra de Calvino, citada
por Max Weber:
Capítulo X (da vocação eficaz), 1: Todos aqueles que Deus
predestinou à vida, e somente esses, aprouve-Lhe chamá-los
eficazmente [...] por Sua palavra e Seu espírito, na hora apontada e
aprazada, retirando-lhes o coração de pedra e dando-lhes um coração
de carne; renovando-lhes a vontade e, por Sua onipotência,
determinando-os para o que é bom [...] (2005, EPB, pg. 92)
A expressão dando-lhes um coração de carne, que aparece na tradução de Antônio
Flávio Pierucci, para o português, e em Jean-Pierre Grossein, para o francês, é substituída, na
tradução de Ana Falcão Bastos e Luís Leitão, pela expressão tirando-lhes o coração de pedra,
renovando-lhes a vontade e destinando-lhes pela sua vontade onipotente o que é bom(2005,
pg.91).
Tudo leva a crer, todavia, que devemos aceitar as traduções brasileira e francesa que
transmitem a idéia mencionada antes, de que a moral é escrita por Deus nos corações dos
homens. Falando sobre o ganho do dinheiro Max Weber assim se expressa:
O ser humano em função do ganho como finalidade de vida, não mais
o ganho em função do ser humano como meio destinado a satisfazer
suas necessidades materiais. Essa inversão da ordem, por assim dizer,
natural das coisas, totalmente sem sentido para a sensibilidade
ingênua, é tão manifestamente e sem reservas um Leitmotiv do
capitalismo, quanto é estranha a quem não foi tocado por seu bafo.
(2005, pg. 46)
Embora também haja uma diferença na tradução da edição de Portugal que fala em
aos homens que não são movidos por ele, enquanto a francesa diz o sopro do capitalismo
não tocou, a idéia geral é a mesma, a saber, o homem é tocado por um sopro, talvez num
sentido divino, como o que lhe deu vida. Na religião pneumática, Deus fala diretamente à
consciência, já na predeterminação, na qual o dever está gravado na consciência, o homem
só não consegue entendê-lo devido a seu estado de pecado, bastando, todavia, um sopro para
afastar a penumbra que o envolve. Num caso, o homem é receptáculo do divino, unyo mística,
como no catolicismo ou no luteranismo, no outro o homem é instrumento: o Deus do
42
protestante é um Deus absconditus. Prenuncia talvez o aparecimento de um novo homem,
uma quebra do tradicionalismo, do imobilismo, o empresário novo estilo. O espírito do
capitalismo, como prova da certeza da salvação, é uma benção de Deus reservada aos
escolhidos. Annette Dusselkamp, que dá a um capítulo de seu livro o nome de Espírito do
Capitalismo como Ética, às vezes defende um sentido contrário ao proposto neste trabalho;
outras vezes o apóia: Eu sublinhei atrás que Weber (...) no espírito do capitalismo uma
ética, e não a simples valorização das atividades lucrativas. (1994, pg.76) (15). Todavia,
falando da inovação que representa o espírito do capitalismo, afirma: Ela explica porque, em
Weber, este espírito não pode ser senão o produto de uma ética específica (1994, pg.77) (16).
Portanto, ou o espírito do capitalismo é uma ética ou é produto de uma ética. Essa aparente
contradição pode ser devida ao não esclarecimento do que Weber entende por moral e
ética, embora ela fale também:
Em Weber, o espírito do capitalismo, produto exclusivo de um interesse
religioso, a saber, do desejo nutrido por cada indivíduo da salvar sua alma,
parece, falando propriamente, cair do céu.
(1994, pg.73) (17 ).
O espírito do capitalismo o é uma ética: é uma moral. Espírito é coisa humana. Se
espírito há, deve estar encarnado, não é uma entidade que anda à solta incorporando-se
neste ou naquele sujeito. Como Weber bem assinala, é um sujeito individual histórico, um
tipo ideal construído a partir de traços de caráter selecionados com finalidade determinada.
Escolhendo-se traços de caráter diferentes, surgiriam outros espíritos do capitalismo ou do
socialismo, dependendo da finalidade. Há uma certeza: o espírito do capitalismo não é
natural. Deve-se lembrar que, ao falar de Benjamin Franklin, Max Weber apresenta o espírito
do capitalismo como um dever; é justamente neste ponto que, pela primeira vez, aparece a
diferenciação entre ética da convicção e ética da responsabilidade. Quem age por dever não
tem outra escolha, só a responsabilidade intrínseca de agir de acordo com seu dever, seu
caráter, sem se preocupar com as conseqüências de seus atos. O agente, ao proceder desta
maneira, não tem ética alguma em vista, a não ser que, como no caso de Franklin, ele assuma
a função de pregador, quando sua moral se torna ética. A ética do dever afasta totalmente
qualquer possibilidade utilitarista, no sentido de Jeremy Bentham. A falta de compreensão
desta premissa foi que levou Annette Dusselkamp a afirmar:
(18)
Weber concede, ele mesmo, que Franklin não invoca essas qualidades
a título de virtudes, mas de métodos de aquisição: Não se poderá negar que
todas que todas as exortações morais de Franklin revestem um sentido
43
utilitarista. (...) Com efeito: quando se lê em sua autobiografia a receita de
sua conversão a estas virtudes, ou ainda as passagens expondo a utilidade
de manter a aparência de modéstia, de se aplicar em diminuir seus próprios
méritos a fim de obter a aprovação de todos, se chegará necessariamente à
conclusão que estas virtudes, e todas as outras igualmente, não são, segundo
Franklin, virtudes senão na medida em que são realmente úteis ao
indivíduo.
( 1994, pg.78)
Realmente, é possível encontrar essas palavras em Weber quando ele está
descrevendo o que se poderá entender das palavras de Franklin, Todas as asserções de
Franklin têm um sentido utilitário: a honestidade é útil, dado que traz crédito: o mesmo se
passa com a pontualidade, a aplicação ao trabalho e a frugalidade, por, isso são virtudes.
Poderiam ser interpretadas não no sentido de que não sejam virtudes, mas que só são virtudes
porque são úteis. Mas a ilustre escritora não percebe que Weber está afirmando que, numa
primeira leitura, tem-se a impressão que seria essa a conclusão. Logo, porém, afirma: Porém,
na realidade, as coisas não são assim tão simples. A partir daí, apresenta sua opinião.
Franklin percebeu a utilidade da virtude devido a uma revelação de Deus, que o queria
deste modo destiná-lo à virtude (...), na página 38 (Reafirma-se aqui a idéia de que é Deus
quem grava na consciência do homem). O que Weber afirma, tratando da aparência, não é
que fingir ser honesto é o mesmo que realmente ser. O que se deduz é que não basta ser
honesto, é preciso que todos saibam que não se pode ser com soberba, mas modestamente.
Como se pode dar preferência a um comerciante se não se souber que ele é honesto? A
palavra ERSCHEINEN em alemão, que pode ter ocasionado mal entendidos, tem vários
significados: aparecer, mostrar-se, aparentar, parecer, parecer-se, destacar-se, expor, expor-se
comparecer, destacar-se etc. A edição portuguesa a traduziu por te reveles. Já a brasileira de
Antonio Flávio Píerucci por pareças. A francesa de Grossein fala em te done à voir (se dar a
ver). Pensamos que a que traduz melhor a idéia de Weber é a portuguesa de Ana Falcão
Bastos e Luis Leitão que é: revelar-se. O honesto é que tem que se revelar, no sentido que os
ingleses usam show up, mostrar-se, e não ser revelado, ser descoberto. Daí a máxima moral,
que se transforma em ética: honestidade é a melhor política.
44
2.3 CONCEITO DE ÉTICA
Após mostrar que ética e moral não são coincidentes, para Max Weber, é preferível
começar a tratar do conceito de ética a partir das afirmações muito generalizadas de que Max
Weber não se interessaria pelos tratados de ética, críticas baseadas nas afirmações contidas na
Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo e repetidas na Sociologia das Religiões:
Com efeito, não nos interessa o que era ensinado teórica e oficialmente nos
compêndios da ética do tempo apesar da sua importância prática devido à
influência da educação da igreja, ao acompanhamento espiritual e à
pregação -, mas sim algo completamente diferente: o rastreio das
motivações psicológicas criadas pela crença e pela prática religiosas, que
indicavam a orientação da vida e mantinham o indivíduo ligado a ela. Estas
motivações brotavam em larga medida da peculiaridade das crenças
religiosas.
(2005, pg. 89)
Na Introdução da Ética Econômica das Religiões Mundiais, volta a afirmar:
A noção de ética econômica de uma religião será esclarecida
progressivamente, nós esperamos, no curso mesmo de nossa análise. O que
nós temos em vista, não é a teoria ética contida nos tratados de teologia, que
pode servir somente de instrumento de conhecimento (sem dúvida
importante, às vezes), mas as incitações práticas às ações enraizados dentro
das articulações psicológicas e pragmáticas das religiões.
(1996, pg. 332).
Essas afirmações levaram Michel Istas a escrever que para Weber, não moral
senão aquelas praticadas, não levando em consideração morais teóricas, elaboradas pelos
pensadores. (1986, pg.23)
Prova evidente de que o autor trata como sinônimos, em Max Weber, as palavras
ética e moral. Annette Dusselkamp fala também sobre o tema. (1994, pg. 53). Entretanto, não
se encontra em nenhum dos autores, qualquer outra afirmação importante de Weber quando
ele trata da relação entre ascetismo e espírito do capitalismo:
Para compreender as ligações das concepções religiosas básicas do
protestantismo ascético com as máximas econômicas da vida quotidiana é
necessário recorrer sobretudo aos textos teológicos mais importantes da
prática sacerdotal. É que numa altura em que o outro mundo era a coisa
mais importante na vida, em que a posição social do cristão se media pela
45
possibilidade de participar da celebração da comunhão, a influência do
sacerdote através do acompanhamento espiritual e da disciplina eclesiástica
e da prédica era de uma importância tal que nós, homens modernos, não
podemos fazer dela a menor idéia; uma simples vista de olhos sobre as
recolhas de consilia, de casus conscientiae, etc. chega para nos convencer.
As forças religiosas que se exprimem nessa prática são os elementos
constitutivos do caráter nacional dos povos.
(2005, pg.123)
Para falar sobre o assunto, o autor avisa que vai centrar-se em Richard Baxter,
Spener, Robert Barclay, Bunyan e outros. Como se pode conciliar essas duas afirmações
contraditórias? Weber não quer saber das teorias e sim da prática. Não lhe interessa discutir
senão as influências deixadas, não a teoria em si mesma. Não resta dúvida sobre a importância
que ele dá ao dogma da predestinação como fator determinante do comportamento dos
puritanos e do aparecimento do espírito do capitalismo através da vocação-profissão. Esse
simples fato, o de só se interessar pelos autores que tratam da cura das almas que, na
realidade, é cura da moral, do caráter dos fiéis, demonstra, desta maneira, aquela afirmada
diferenciação entre ética e moral. Weber não se interessa por teólogos éticos e sim por
teólogos morais.
Max Weber, como Aristóteles, embora não o defina expressamente, parte da ética
como costume, a que dá o nome de tradição ou tradicionalismo que, segundo Marianne
Weber, é um tipo ideal:
Criou conceitos de tipo ideal centrais, como o espírito do capitalismo
ou o seu oposto, tradicionalismo. Eles não são definidos, mas
compostos, isto é, suas características não deduzidas, mas derivadas da
realidade, surgem aos poucos da pesquisa histórica.
(2003, pg.401)
Sendo assim, as pessoas agem segundo o costume ou a tradição:
Mas, se olharmos para o espírito que enformava o empresário, tratava-se de
uma economia tradicional: o modo de vida tradicional, o montante
tradicional de lucro, a quantidade tradicional de trabalho, o modo
tradicional de condução dos negócios, as relações com os trabalhadores e
com os círculos clientes, essencialmente tradicionais, bem como a obtenção
de clientes e de mercados, dominavam a atividade empresarial e estavam
subjacentes digamos assim ao ethos desse tipo de empresários.
(2005,
pg. 48)
46
Nota-se a palavra ¨enformar¨, colocar numa forma, que bem uma idéia de como o
costume regrava a vida das pessoas. A palavra ¨ethos¨ também tem o significado de costume e
moral. Não podemos nos esquecer que na práxis, na acepção comum, como bem fala Adolfo
Sanches Vasquez, (¨Filosofia da Práxis¨, 1977, pg. 4) o existe reflexão, não se cria um
objeto exterior ao sujeito, o que não quer dizer que seja burra, como às vezes se diz, mas as
pessoas agem sem refletir, simplesmente porque estão habituadas. Hábito, costume, tradição,
ética são a mesma coisa. Explicações sobre a possibilidade de organizar o trabalho de uma
forma mais fácil e sobretudo mais lucrativa esbarram com a sua total incompreensão e o
aumento das taxas de remuneração à peça revela-se ineficaz contra a força do hábito. (grifo
meu) (2005, PG.45) Subitamente acontece um fato novo, a rotina é quebrada, aparece alguém
com novas idéias, usos e costumes são questionados. A inovação recebe ataques de todos os
lados. Como e porque isso acontece? Max Weber contesta o materialismo histórico que vê na
mudança da infra-estrutura econômica, a causa única, de toda mudança na superestrutura.
Entre as diversas causas das mudanças, o autor na religião uma das mais importantes,
especialmente o protestantismo de Lutero e a igreja reformada de Calvino. A tradução de uma
única palavra, Beruf, com conotação laica, foi o suficiente para, certo, com a força que
adquiriu no puritanismo, causar um grande terremoto no comportamento moral dos homens.
Um homem, uma palavra:
E, tal como o sentido da palavra, também a idéia é nova e um produto da
reforma.
[...]
uma coisa era indubitavelmente nova: considerar o cumprimento
do dever no quadro da atividade temporal como a ação moral mais elevada.
(2005, pg.56)
Marianne Weber confirma o que significava ética para o marido, afirmando que em
uma série de estudos chamados Die Wirtschaftsethic (A ética econômica das religiões
mundiais) por ética Weber queria dizer, como na Ética Protestante e o Espírito do
Capitalismo, [...] não teorias teológicas éticas, mas os impulsos práticos para a ação
derivados da religião (2004, pg.396).
Eis o que nos diz Max Weber, na Introdução da obra citada:
Por religiões mundiais, nos entendemos aqui, sem nenhum julgamento de
valor, os cinco sistemas de regulamentação da vida, religiosas ou
47
determinadas pela religião, que souberam reunir em torno delas massas
particularmente importantes de fiéis: a ética religiosa confuciana, hindu,
budista, cristã, islâmica.
(1996, pg.332)
Fica evidente que Weber define como ética um sistema de regulamentação da vida:
Mas dever-se-á ter aqui em conta algo que hoje é freqüentemente
esquecido: o fato de a Reforma ter significado não tanto a eliminação da
dominação da Igreja sobre a vida como, sobretudo, a substituição da sua
forma anterior por uma outra. A substituição de uma dominação altamente
acomodada, que na altura praticamente não se fazia sentir e era muitas
vezes quase apenas formal, por uma regulamentação pesada e severa de
toda a vida, que invadia numa medida quase inimaginável todas as esferas
da vida privada e pública.
(2005, pg. 28).
Na Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Max Weber emprega a palavra
ética no mínimo 154 vezes, incluídas as notas de rodapé. Levando-se em conta a Introdução
que faz parte da tradução na edição da Editorial Presença de Lisboa, na qual nos baseamos, e
da Ed. Pioneira de São Paulo, escrita por Max Weber em 1920, e que Jean-Pierre Grossein, na
tradução francesa, afirma que foi escrita para os Gesammelte Aufsätze zur Religiossoziologie
preferindo inseri-la na tradução daquela obra que tem como título Sociologie des Religions,
teríamos que acrescentar mais cinco vezes a palavra ética.
Considerando-se todas as derivações, seria obtido o seguinte quadro:
Ética........................................................... 154
Ético/s........................................................ 30
Eticamente................................................. 09
Ponto de vista ético.................................... 09
Total............. 202
Não obstante, os usos da palavra seriam:
1. Idéia ética do dever (pg.20)
2. Ética racional do protestantismo ascético.(pg.20)
3. Ética econômica das religiões universais. (pg.20) (pg.183) (pg.189)
4. Elementos da ética econômica das religiões ocidentais. (pg.21)
5. Conexões da ética religiosa. (pg. 22)
6. Ética protestante. (pg.25)
48
7. História universal da ética do cristianismo ocidental. (pg.26)
8. Uma ética particular. (pg.37)
9. Summum Bonum dessa ética. (pg.38)
10. ética social. (pg. 39)
11. Máxima ética. (pg.39)
12. Qualquer justificativa ética. (pg.42)
13. Surgido no quadro de uma ética. (pg.42)
14. Limitações da ética. (pg. 42)
15. Justificação ética. (pg. 42)
16. Surgido no quadro de uma ética. (pg.42)
17. Qualquer máxima ética. (pg.49)
18. Base ética da conduta. (pg.53)
19. Ética religiosa da Idade Média. (pg.60)
20. Fundamentos psicológicos de uma ética racional da profissão. (pg.60)
21. Características éticas. (pg.61)
22. Antiga ética protestante. ( pg.62)
23. Reforma ética. (pg.62)
24. Sociedades para Cultura ética. (pg.62)
25. Ética profissional. (pg.64) (pg.88) (112) (113)
26. Desconfiança ética. (pg.65)
27. Ética de Benjamin Franklin. (pg.67) (pg. 69)
28. Qualidades éticas. (pg.68)
29. Proveniente da ética monástica. (pg.70)
30. ... a par da ética e da... (pg.70)
31. ... e não de ética. (pg.70)
32. Ética fundada na religião. (pg.71)
33. Ética cristã tradicional. (pg.71)
34. Esta ética exerça. (pg.71)
35. Ética de Wyclif. (pg.71)
36. Qualidades éticas do trabalhador. (pg.72)
37. Ética capitalista. (pg.73) (121)
38. Éticas religiosas do mundo. (pg.74)
39. Entre as éticas católica e protestante. (pg. 74)
40. Ética econômica dos escotistas. (pg. 75)
41. Ética econômica do catolicismo. (pg. 75)
42. Ética monástica. (pg.75) (76)
43. Doutrina ética. (pg. 75) (89)
44. Ética religiosa. (pg.76) (82) (180)
45. Ética cristã. (pg.76) (pg.173)
46. Acepção ética. (pg.77)
47. Conotação ética. (pg.77)
48. Ética dos Lolandos. (pg.81)
49. Ética social de Lutero. (pg. 85)
50. Traços profundos na ética. (pg.89)
51. Ética do tempo. (pg.89)
52. Atitude ética. (pg.95)
53. entre o indivíduo e a ética. (pg.96)
54. Ética calvinista. (pg.96) (pg.186) (pg.187)
55. Ética católica. (pg.101)
56. Ética da intenção. (pg.101)
57. A prática ética do homem comum. (pg.101)
49
58. à luz desta ética. (pg.102)
59. Ética sistemática. (pg. 103)
60. com a adesão de sua ética à...(pg.104)
61. Conduta ética. (pg.105) (106)
62. Metodologia ética da conduta. (pg.105)
63. Debilidade ética. (pg.107)
64. Organização ética. (pg.107)
65. A ética destes (pg.110)
66. a ligação entre ética...(pg.112)
67. esta ética foi... (pg.113)
68. Ética ascética. (pg.114) (pg.124) (pg.169)
69. Ética metodista. (pg.116)
70. a ética do metodismo. (pg.116)
71. Ética prática. (pg.117)
72. ...cuja ética. (pg.117)
73. Ética batista. (pg.120) (pg.168) (pg.171)
74. Ética dos batistas. (pg.120)
75. Ética dos puritanos. (pg.120)
76. Ética política. (pg.121)
77. Influência ética. (pg.121)
78. Ética puritana. (pg.123) (pg.147) (pg.148) (pg.174) (pg.179) (pg.184)
79. Literatura ética. (pg.124)
80. Obrigação ética. (pg.126)
81. a ética dos Quakers. (127) (pg.183)
82. Ética do Antigo Testamento. (pg.128)
83. Determinações éticas fundamentais. (pg. 129)
84. Ética econômica. (pg.129) (pg.145) (pg.154) (pg.171) (pg.179)
85. Ética Judaica. (pg.130) (pg.183) (pg.185)
86. Base ética adequada. (pg.132)
87. Ética do protestantismo. (pg.132)
88. Inibições da ética. (pg.133)
89. Valorização ética das boas ações. (pg.133)
90. Ação ética. (pg.136)
91. Ética medieval. (pg.137)
92. Ética social. (pg.137) (pg.152) (172) (pg.173)
93. Ética secular. (pg.139)
94. Ética político-social. (pg.140)
95. Ética israelita. (pg.146)
96. Em matéria de ética. (pg.146)
97. Qualquer ética ascética. (pg.147)
98. A ética de Port Royal. (pg.148)
99. Atividade ética. (pg.157)
100. Teoria ética do Luteranismo. (pg.158)
101. Ligação da ética com a fé. (pg.158)
102. Lei ética natural. (pg.159)
103. Teoria ética. (pg.159)
104. Ética Quaker. (pg.173)
105. Consideraram a sua ética. (pg.173)
106. Ética profissional. (pg.173) (pg.181)
107. Por razões éticas. (pg.177)
108. Glorificação ética. (pg.177)
50
109. Ética do trabalho. (pg.177)
110. Impregnação espiritual e ética. (pg.178)
111. Ética hindu. (pg.179)
112. Teorias éticas. (pg.181) (pg.181)
113. Ética herética. (pg.181)
114. Das duas éticas. (pg.181)
115. Normas éticas. (pg.183)
116. Ética Talmúdica. (pg.184)
117. Dupla ética. (pg.185)
118. Motivações éticas. (pg.193)
Comparando seu uso com o da palavra moral, pode-se verificar que só em uma
ocasião são igualmente adjetivadas: ética puritana e moral puritana. Mas a diferença entre os
dois significados fica esclarecida na frase em que a segunda é usada:
Movimentamo-nos até agora no terreno do calvinismo, pressupondo a
doutrina da predestinação como pano de fundo dogmático da sua moral
puritana, no sentido de uma conduta ética metodicamente racionalizada.
(2005, pg.106)
Ética e moral estão em dois campos diferentes, em dois domínios da personalidade: a
moral pertence ao domínio do afetivo, conativo e do caráter; já a ética pertence ao domínio do
cognitivo e intelectual. Devido à importância que a psicologia formal assume para Max
Weber, convém reforçar a argumentação através da visão de outro especialista, agora no
campo da psiquiatria. Isto não significa que a personalidade seja composta de domínios
independentes, Lúcia Maria Sálvia Coelho, substituindo o termo domínios por setores, afirma
que os três setores da personalidade não se constituem em conjuntos isolados e independentes
de funções psíquicas. Estão de tal modo inter-relacionadas que não se pode distinguir, em
cada ato realizado, a participação de cada uma isoladamente. abstratamente ou através de
estudos de comportamentos desviantes se pode compreender essa integração funcional e a
participação de cada uma delas no psiquismo do indivíduo. (2008, pg.34).
Sobre o setor ou dom
ínio do conativo, ela mesma informa que Silveira utiliza o
termo conação, já usado por MacDougall, para expressar as funções subjetivas da atividade.
MacDougall inclui nesse conceito a intenção e a espontaneidade do indivíduo executante da
51
ação, não considerando o trabalho mental, como o fazem Comte e seus discípulos. O termo
conação, latim conatus, significa executo, isto é, realizar a partir da intenção é adequado para
traduzir esse setor da personalidade. (2008, pg.25).
A autora afirma que em todos os atos humanos pode-se distinguir o plano objetivo ou
de execução e o subjetivo ou de conação. O primeiro representa a exteriorização do
movimento e depende do aparelho periférico da motilidade. O segundo, as disposições
conativas, os fatores subjetivos e resultam de funções cerebrais. Na conação diz-se que
Silveira distingue elementos extrínsecos ou móveis afetivos motivações que estimulam a
ação, incluindo os instintos e os sentimentos, e elementos intrínsecos que constituem as
funções conativas propriamente ditas. Em seguida, retoma:
Distingue, também na esfera conativa, três funções: em primeiro lugar, a
que permite a iniciativa para a ação, constituindo, portanto o elemento
subjetivo que desencadeia a ação explícita ou estimula a percepção e o
raciocínio. Em seguida, a função conativa responsável pelo bloqueio ou pela
moderação da exteriorização explícita. E finalmente a função psíquica que
preside a estabilidade, quer dando continuidade aos atos, quer mantendo o
raciocínio, ou a observação que se traduz na atenção. Assim, quando o
indivíduo toma uma decisão e resolve agir, precisa inicialmente estar
motivado afetivamente para realizar o ato, e, além disso, utilizar os recursos
intelectuais para adaptá-lo à realidade: são ambos aspectos extrínsecos, que
interferem na conação. Mas, o que permite iniciar o comportamento
(estímulo) e refrear ao mesmo tempo os impulsos inadequados (inibição)
são as funções conativas.
(2008, pg.26)
Destarte, pode-se entender porque Max Weber está interessado em rastrear as
motivações psicológicas criadas pela crença e pela prática religiosas que indicavam a
orientação da vida, e mantinham o indivíduo ligado a ela, (2005, pg.89) ou, como fala em
outro texto, já citado, as incitações práticas às ações, enraizadas dentro das articulações
psicológicas e pragmáticas das religiões. Marianne Weber, sobre a vida particular de Weber,
afirma:
Qualquer que tenha sido a atitude de Max Weber quanto a esses
ensinamentos, a liberdade intelectual e moral, a autodeterminação da
personalidade por uma obrigação moral (Soll) permaneceu para ele uma lei
básica durante toda sua vida, como uma lei a que conscientemente se
submetia e da qual constantemente se assegurava testando sua observância
prática dela. (sic)
52
Outra convicção que permaneceu com Weber durante toda sua vida também
foi expressa por Kant e pelo jovem Fichte e também adotada por Channing
ou derivada independentemente por ele ou seja, que o propósito das
instituições políticas e sociais é o desenvolvimento de uma personalidade
autônoma.
(2003, pg.107)
Neste trecho, encontram-se informações importantes não só da diferença de domínios
intelectual e moral com a autodeterminação da personalidade, mas também as funções que
devem desenvolver tanto estado como sociedade. Aristóteles fala que a função da política é
formar cidadãos virtuosos; aqui se trata de formar a personalidade autônoma. A função, ou
não função, dada ao estado parece ser uma resposta a Tocqueville, em A Democracia na
América, que pretende que a função do estado seja fazer os cidadãos felizes, princípio contido
na Declaração de Independência nos Estados Unidos o que levou alguns cidadãos a
processarem o estado por serem infelizes. Max Weber é absolutamente contra essa posição,
tendo-se manifestado diversas vezes. Marianne Weber, explica:
Não estamos nos engajando em política social para criar felicidade
humana. O discurso da noite passada do pastor Naumamm refletiu uma
infinita aspiração pela felicidade humana e estou seguro de que todos nos
comovemos. Mas nossa atitude pessimista nos leva, e a mim em particular,
a um ponto de vista que me parece de importância incomparavelmente
maior. Creio que devemos abandonar a criação de um sentimento positivo
de felicidade no curso de qualquer legislação social. Desejamos alguma
coisa a mais e só podemos desejar alguma a mais. Queremos cultivar e
apoiar o que nos parece valioso no homem: sua responsabilidade pessoal,
seu impulso básico para coisas superiores, para os valores intelectuais e
morais da humanidade, mesmo quando esse impulso nos confronte em sua
forma mais primitiva. Até onde está em nosso poder, desejamos dispor as
condições externas não com vistas ao bem-estar do povo, mas de modo tal a
preservar face à inevitável luta pela existência, com seus sofrimentos
aquelas qualidades físicas e espirituais que gostaríamos de sustentar pára a
nação.
(2003, pg.166)
A ética racional do puritanismo ascético procurou eliminar o lado afetivo e
sentimental. É o domínio de si, domínio da razão sobre a emoção e sobre o mundo. Isto
significa que a ética racional não pode ter como bem absoluto um sentimento, muito menos
um bem material. Ao se dizer, por exemplo, que a ética calvinista é uma ética do trabalho,
estamos condicionando esse bem absoluto a uma categoria jurídica, já que o trabalho válido
53
para o puritano é o trabalho legal. Submetido à legalidade o trabalho fica dependente de
alguém ou alguma coisa que decida o que é trabalho legal, não sendo, portanto, bem absoluto,
metafísico ou transcendente. O que valor ético ao trabalho é o dever decorrente de uma
missão divina ¨beruf¨ ou ¨calling¨. O homem deve trabalhar para aumentar a glória de Deus. O
bem absoluto é Deus. Sem essa relação o trabalho não tem valor algum, nem deve dar alegria
alguma. Não sinais de que a ética puritana fale em trabalhar como empregado embora
cada qual deva aceitar a condição em que se encontra. Annette Disselkamp, analisando o
pensamento de Biéler, explica:
Da mesma maneira, Weber exagera, aos olhos de Biéler, a paixão ascética
do trabalho do Calvinismo. Se é verdade que Calvino deu ao trabalho
cotidiano um valor próprio, ele jamais glorificou a ação pela ação. Ao
contrário, ele se irrita e se levanta contra a dominação do trabalho sobre a
vida; porque Deus e seu Reino devem guiar a procura e a esperança
cotidianas do crente; e nenhum valor humano, nem mesmo a mais alta
virtude deve tomar o seu lugar.
(1994, pg.51) (19)
Não se pode concordar que Weber exagere, pois é precisamente isso que ele fala.
Além do mais, o puritano devia se afastar do prazer mundano, hedonismo e eudomonismo não
podiam ser objetivos de sua ação. O que Weber diz é isso: o racionalismo ascético puritano
transformou o amor ao próximo numa prestação de serviço da vocação profissão. A
desconfiança em relação aos homens, aos amigos e mesmo ao pastor não permite a
manifestação de outro tipo de amor, sob pena de adoração da criatura. O isolamento do
cristão, que só pode contar consigo mesmo, é resultado de uma crença. Toda ética, para gerar
determinado comportamento, tem que criar uma crença, ou partir de uma já estabelecida,
modificando-a. Essa atuação da ética não se dá, todavia, no sentido conativo, mas no
intelectual. É justamente isso que interessa a Max Weber: por que em determinado momento
da história aparece alguém, ou alguma coisa acontece que modifica a história e o costume,
operando uma nova ética e inculcando, psicologicamente, novos traços de caráter, nova
crença, novos impulsos conativos, que, apesar da repulsa inicial, acabam se afirmando, até
tornarem-se nova rotina? Religião e crença também fazem parte do costume. E o mais
importante: por que o homem aceita a ética existente e sempre um mal estar quando
aparece um fato novo? O homem age simplesmente como todos agem.
De tudo que foi dito pode-se deduzir que está totalmente descartada a possibilidade
de se entender a palavra ética, na Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, com o sentido
54
de crítica que lhe Enrique Dussel. Embora não sendo um dos tópicos deste trabalho, fica
também afastado qualquer entendimento da palavra como significando ciência da moral,
como em Adolfo Sanches Vasquez. À página 103 da obra estudada aparece a expressão ética
sistemática cujo sentido é totalmente diferente do tópico apresentado. Não se trata de sistema
filosófico de ética, mas como conjunto sistematizado de normas. Também não se pode
entender como significando história dos sistemas éticos, no sentido evolucionista, e muito
menos a história da ética, como nós lhe atribuímos.
A ética para Max Weber tem sentido de um regulamento metodológico
estabelecendo meios para alcançar determinado fim: decreto regulamentar, mais
administrativo que forense. Não exatamente o regulamento, mas o constrangimento
psicológico que ele provoca na determinação do caráter. Porém, deve-se salientar que só é
ética quando transformada em moral. É o caso típico do fariseu, que cumpre a lei sem
interiorização, ou seja, por interesse. O exemplo é mostrado por Weber no caso de Benjamim
Franklin: não se trata de uma ação isolada, mas de um ethos. O Sermão da Montanha,
também um Decreto regulamentar, (não vim abolir a Lei), teria mais um caráter forense, às
vezes um Decreto-Lei. Tanto a Lei quanto o Decreto-Lei e o Decreto são chamados ética,
formadora da moral, do caráter, que Wilhelm Hennis chama de personalidade. A formação, a
influência se dá em relação ao intelecto, a sistematização da conduta de vida se faz através das
crenças. Regulamentar, disciplinar a vida significa constranger a liberdade. Max Weber, como
vimos, não é um metafísico, não discute a liberdade. Mas fala sobre a educação da criança que
tem seu caráter moldado pelas determinações que encontra ao nascer. Não tendo ainda suas
crenças, a criança tenta reproduzir o comportamento dos pais. Com o processo de socialização
ela vai formando suas convicções até se tornar independente: A ordem econômica capitalista
dos nossos dias é um universo de grandes proporções, que os indivíduos encontram ao nascer,
e que constitui para cada um deles, pelo menos enquanto indivíduo, um contexto que não se
pode modificar e onde se terá de viver, diz Weber (2005, pg.39). Nesse sentido, só existe um
tipo de ética: o costume, a tradição que inclui a religião. Max Weber fala poucas vezes em
ética social, como ficou demonstrado, e nenhuma em ética elaborada por pensadores, como
diz Michel Istas. Seu tema exigia dedicação às éticas religiosas, cujos SUMMUM BONNUN
são: a salvação, no catolicismo e no luteranismo, enquanto no calvinismo é a glória de Deus.
Já no espírito do capitalismo, ganhar dinheiro por dinheiro não é um fim absoluto, mas é
como se fosse o bem absoluto de uma ética. Na realidade é um meio de comprovação da
eleição. O sucesso equivale à certeza de ser um dos eleitos. O espírito do capitalismo não é
resultado da ética puritana: O que eu disse sobre os traços do espírito do capitalismo, para
55
cuja determinação a ascese protestante em nada contribuiu [...] (2003, pg.408) (20) O
catolicismo, apesar da sua maior tolerância moral, não deixou de afirmar que, com uma vida
desprovida de qualquer ética sistemática era impossível atingir os ideais mais elevados que
propugnava, mesmo na vida secular (2005, pg.103). Finalmente é preciso dizer que a ética
ascética puritana é a racionalização metódica da conduta de vida, mais não tem sentido de
conduta de vida, apesar de Weber utilizar esta expressão 83 vezes, o que mostra a sua
importância. Está superada a teodicéia e a procura de uma finalidade para a vida. A ética em
Max Weber não trata da questão do bem e do mal, o trata do julgamento: A eliminação
completa do problema da teodicéia e de todas essas questões sobre o sentido do mundo e
da vida, sobre os quais outros se preocuparam, eram evidentes para os puritanos como por
razões diferentes -- para os judeus. (2003, pg.115) (21).
56
III
3 CONCLUSÃO
A obra de Max Weber é tão vasta e abrange tantas variáveis, que seria necessário, e
certamente há os que o fazem, estudá-la por anos e anos para poder compreendê-la. Procurou-
se apenas estudar um ponto específico, que é analisar o significado da palavra ética.
Propositadamente, não houve referência àqueles pontos que mais causaram polêmica através
dos anos, dentre os quais, poderiam ser citados três: primeiro, a relação de causa e efeito entre
protestantismo e capitalismo; segundo, uma possível negação do materialismo histórico,
oposição a Karl Marx; terceiro, o processo de racionalização do mundo, com o seu
conseqüente desencantamento. Esses são geralmente os assuntos mais debatidos, contestados
e criticados das idéias de Max Weber, além, é claro, do espírito do capitalismo.
Não na Ética Protestante como nas críticas e anticríticas, Weber desmentiu
categoricamente que pretendeu dizer que o capitalismo é uma conseqüência do
protestantismo. O autor escolheu certos traços do caráter em função de suas necessidades
teóricas, como, por exemplo, os inculcados e sistematizados pela ética religiosa, no caso,
calvinista. Surgiriam outros resultados se fossem escolhidos outros traços. Mas o que não era
pretendido da conduta no cumprimento do dever da vocação profissão, como a perseverança e
a obstinação, foi o espírito do capitalismo e o ganho do dinheiro pelo dinheiro, supostamente
querido por Deus e que é o sinal da comprovação da eleição. Aqueles que fazem uma ligação
direta entre protestantismo e espírito do capitalismo, sem a intermediação do trabalho como
dever da vocação-profissão e a restrição ao consumo, cometem erro: caso de Annette
Dusselkamp e todos os autores por ela citados. O espírito do capitalismo é um filho bastardo
da ética protestante. O segundo ponto também é explicado no livro que foi analisado, o qual
deixa claro que as condições econômicas influenciam sem dúvida alguma o dia a dia dos
homens: o que ele não aceita é a idéia de causa única. Embora nos dias atuais, essas críticas já
não sejam levadas em grande conta pela maior parte das pessoas que se aprofundam em sua
obra, alguns, geralmente os de primeira leitura, sentem um mal estar, principalmente os
fundamentalistas religiosos ou os marxistas ortodoxos. Quanto ao desencantamento do
mundo, embora existam vários livros sobre o assunto, há ainda os que o confundem com
desencantamento com o mundo, caso de André Comte-Sponville, salvo erro de tradução.
(2005, pg. 36) Uma quarta e quinta controvérsias, entre tantas outras, o calvinismo com ética
57
do trabalho, ou a expressão jaula de aço, tradução americana, já foram também amplamente
discutidas. Embora haja consciência de que todos eles estejam ligados ao tema abordado,
procurou-se afastar de tal assunto por tratar-se de pontos difíceis e analogicamente,
semelhante a um campo movediço.
O hoje, que não é o mesmo de Max Weber, mas que está relacionado, quando o
protestantismo faz parte da rotina, dos usos e costumes, só com muito esforço e estudo,
principalmente graças a Max Weber, pode-se perceber as influências deixadas por aquele
processo de mudança nos hábitos e idéias. Qualquer pessoa que estude a revolução industrial
inglesa não pode negar o importante papel desempenhado pela Reforma na história da
humanidade. A partir de um evento negativo, o despejo de milhares de servos nas cidades do
Reino Unido ocasionado pelo cercamento das terras comuns, face à necessidade de aumentar
a produção para atender ao consumo ocasionado pelo incremento da população européia e a
exportação para as colônias que, graças à dupla moral, tinham suas indústrias destruídas pela
armada inglesa, o protestantismo ajudou a construir algumas das maiores nações do mundo,
em termos capitalistas. Essa era a dura realidade. Basta ler Leo Hubermman, A História da
Riqueza do Homem ou Paul Mantoux, A Revolução Industrial no Século XVIII para entender a
situação precária e insalubre dos trabalhadores naquela época: trabalho era mortificação.
Ascese intramundana significava sofrimento, martírio. Como criar um tipo ideal baseado na
conduta de vida dos puritanos a partir desse mundo? Não através de historiadores, nem de
corpo presente, nem dos tratados éticos, mas sim dos relatos dos religiosos que estavam em
contato direto com os cristãos, no seu dia a dia, ouvindo suas lamentações. Pois foi isto que
Weber fez, embora trate do capitalismo como espírito, como assinala Pierucci, mas não
metafísico, como fala Julien Freund: Depois que eu freqüento a obra de Weber, procuro
encontrar as razões da repulsão, quase constante, que ele manifesta em relação à metafísica.
(1990. pg.03) (22). O próprio Weber afirma na anticrítica final: [...] uma construção
espiritualista que eu mesmo recusei nos meus estudos. (2003, pg.416) ( 23).
Deste modo, a cultura capitalista é bem real: destruição do mundo, poluição,
derretimento da calota polar devido à destruição da camada de ozônio com suas
conseqüências trágicas, inclusive com a possibilidade de extinção da vida na terra. Mas se
todos os habitantes da Inglaterra pretendessem ganhar dinheiro e não consumir, como
indicava sua moral, o sistema certamente não funcionaria, quer dizer, seria outro, pois
capitalismo sempre existiu, independentemente do que Weber chama espírito do capitalismo.
Sem consumo não haveria capitalismo moderno, nem real nem ideal. Aquela mão dupla
explicaria também a doutrina weberiana que é válida quanto ao problema da acumulação
58
primitiva, mas não como sucesso do capitalismo, pois este se sustenta na sociedade de
consumo, contra as exigências da ética puritana. Deve-se dizer que nunca foi intenção de
Weber explicar o capitalismo moderno:
[...]
com efeito, meu interesse central não se refere ao encorajamento da
expansão capitalista, mas sobre o desenvolvimento de um tipo de
homem que foi criado pela conjunção de componentes de origem
religiosa e de origem econômica
, (2003, pg.417) ( 24).
Isso, dá razão a Hennis. Poderia-se pensar na solução mais simples para o problema,
não citado por Weber, bem entendido como: o protestante produz, ganha dinheiro e o
entesoura: o católico consome. Mas logo essa saída se revelaria falsa. O exemplo típico são os
Estados Unidos: país majoritariamente protestante e maior consumidor mundial. Como
explicar o espírito do consumo? Que traços de caráter escolheríamos para construí-lo?
Teríamos um espírito diferente para países de origem protestante e o de origem católica?
Talvez a razão possa ser encontrada na racionalização da ética puritana, não como causa, mas
em sua relação de afinidade eletiva com o capitalismo. Ambos se pretendem racionais com
razões invertidas: o puritanismo ascético procura dominar os sentimentos para afastar suas
influências nefastas que representam o aspecto do homem como criatura, que leva à
desobediência.
O capitalismo tem a mesma pretensão, com finalidade contrária: dominar para
explorar. A ética capitalista do consumo explora os sentimentos, as emoções e paixões, os
lados afetivo e conativo do caráter, enquanto a ética protestante opera sobre os lados
intelectivo e conativo. Se tivéssemos que escolher traços de caráter para formar o espírito do
consumo, seriam certamente a arrogância e a inveja, os aspectos considerados negativos do
caráter. Acumulação e consumo são opostos: o consumo pode ser analisado do ponto de vista
da necessidade, é o consumo sóbrio, pregado pelos religiosos, no caso os puritanos, e o
consumo como impulso gerado pela ética capitalista (no sentido weberiano de regulamento
que determina o caráter do homem). Um é natural: o homem precisa comer, beber e se
proteger das condições adversas. O outro é gerado pelo hábito. A acumulação obedece ao
mesmo princípio: quando se vive em condições geográficas com seis meses de neve por ano,
o homem tem que acumular para não morrer de fome. Quem não tiver o celeiro cheio para dar
de comer a sua família terá pouca chance de sobreviver. Quem mora na cidade, não tendo
celeiro para encher, tem que fazer a acumulação na única forma possível: em dinheiro no
59
banco. Desta, resulta a chamada acumulação primitiva que deu origem ao capitalismo.
Quando a acumulação se destina à satisfação das necessidades, quer no celeiro quer no banco,
não contraria o Sermão da Montanha, não é acumulação de riqueza na terra. Eis o drama
dos puritanos. Se o capital inicial saiu da exploração das colônias, do ouro acumulado das
minas de Potosi, ou do trabalho dos puritanos, como diz Weber, o impulsionador é sempre o
mesmo: o trabalho.
A acumulação começou com a sedentarização do homem, não, com um excedente de
produção que é o início das trocas, do comércio. o trabalho, como falam Louis-René
Nougier e Serge Sauneron: Um milhão de anos de humanidade, um milhão de anos que o
trabalho reina sobre a terra., que o homem é trabalhador (1959, pg.11) (25). Não dúvida
que a grande revolução muito bem descrita por Weber foi a mudança radical em relação ao
trabalho humano, o que ele chama organização capitalista racional do trabalho (2005,
pg.42). Negado e desprezado pela nobreza que via nele uma atividade vil, digna de escravos e
dos servos, o trabalho legal assumiu o papel de motor da mudança ética e moral (em sentido
weberiano) que hoje faz parte da rotina. Ao nobre era proibido o trabalho, não podia exercer
qualquer atividade, mesmo aquelas agora consideradas mais nobres. Toulouse-Lautrec
rejeitou o filho aleijado, é verdade, contudo nem mesmo a esse era permitido o trabalho: ser
pintor era ofender a nobreza, e não só pelos temas escolhidos. A burguesia ascendente,
parvenus que, trabalhando, conseguiu amealhar dinheiro, sem dúvida porque alijada do
processo político, como geralmente ocorre, bem descrito por Weber, não pretendia outra coisa
senão igualar-se aos nobres. A nova moral, no sentido weberiano parece não ter realmente
nascido do ressentimento, como pretendido por Nietzsche, negado por Weber, mas também
não do sofrimento, como quer Weber, mas da inveja, pois foi essa que triunfou. Basta ver, nos
dias de hoje, quanto ódio é destilado contra a burguesia dirigente, quando na oposição.
Assumindo o poder, aquilo que demonstrava ser ódio, revela-se que na verdade era inveja,
pois passam a agir da mesma maneira.
A exceção foi na França, onde os nobres foram guilhotinados, essa sim, moral do
ressentimento, de cuja revolução parece ter saído a idéia de Nietzsche. Talvez assim se
explique a diferença de moral (em sentido weberiano) entre a civilização católica e a
protestante. Mesmos fundamentos, mesma economia, mesmas éticas, porém com morais
diferentes. Pode-se dizer, com Weber, que o homem não gosta de trabalhar por natureza, o
homem não nasceu para trabalhar. Todos pretendem enriquecer para deixar de trabalhar, ainda
hoje. O paraíso católico é um lugar onde não se precisa trabalhar. A máxima ética o trabalho
enobrece o homem, porque contradição histórica foi substituída por outras, como o homem
60
se realiza no trabalho, é transformando a natureza que o homem se transforma, o trabalho
dignifica o homem etc. O valor trabalho foi incorporado à rotina, ao costume. A verdadeira
jaula de o, o homem tem que trabalhar para o morrer de fome, adquiriu valor
intrínseco. Não se faz uma diferenciação entre trabalho e trabalho capitalista ou entre o
trabalho legal puritano da profissão vocação e trabalho capitalista. Trabalhar não quer dizer
trabalhar para outro. O trabalho de coleta do homem pré-histórico não pode ser comparado ao
trabalho após a sedentarizão.
O papel pedagógico que foi desempenhado pelos protestantes para acabar com a
promiscuidade, a miséria, a fome e a violência nas cidades inglesas e foi uma maneira gentil
de dizer: a coisa mudou, você não pode mais ser sustentado pela Igreja, costume da época,
trabalha ou morrerás de fome transformou-se em cláusula pétrea da organização social. Karl
Marx diria: mudou a infra-estrutura econômica, mudou a superestrutura ideológica. Ninguém
tem dúvida: o homem deve trabalhar. Ao contrário do dado levantado por Max Weber sobre
os protestantes preferirem o ensino técnico, hoje não se trata de preferência, faz parte da
rotina: as escolas são profissionalizantes, a escolha é feita segundo a profissão que se quer
exercer, não como realização pessoal, mas com finalidade mamonista. Naquele tempo era
uma ética: hoje é uma moral, um hábito (sempre em sentido weberiano). Ao nascer, a criança
já vai sendo educada para o trabalho numa profissão: o que você quer ser quando crescer?
Não que tipo de homem você quer ser, mas que profissão você quer exercer? Geralmente a
resposta dada é a infantil sem pretensão salarial; mas a escolhida na adolescência é a que
melhor recompensa financeiramente, afinal, ele quer vencer na vida. Esse é o costume, a
tradição, a ética imposta pelo capitalismo: ser vencedor é acumular riquezas na terra. Mas, e o
Sermão da Montanha?
Sermão da Montanha que, já já foi dito anteriormente, era a obsessão de Max Weber,
face ao número de vezes que é citado em sua obra. Ali está simbolizada a parábola do coração
de carne e coração de pedra. Fariseu é o que cumpre a lei sem intermediação da moral.
Fariseu é o ético, o crente é o moral. Marianne Weber, na biografia do marido, não deixou de
assinalar, em diversas passagens essas referências. os santos, como diz Weber, podem
obedecê-lo? Como conciliar a ética da convicção do Sermão da Montanha com a ética da
responsabilidade? Eis o que Max Weber se pergunta em Política como Vocação. Mas qual é
o fundamento da responsabilidade? A quem devemos responder? À Glória de Deus ou da
criatura?
Ao finalizar esta Disserta
ção considera-se que o ponto forte do ensaio de Max Weber
e, espera-se, também deste trabalho, está ligado àquilo que pode-se chamar de segunda linha
61
da investigação, paralelo ao conceito de ética. Trata-se do SUMMUM BONUM da ética
calvinista, cujas conseqüências e motivações psicológicas foram magistralmente descritas por
Max Weber, ficando a causa um tanto camuflada, ou pouco salientada, subjacente em sua
pregação. As palavras com que descreve o sentimento de angústia dos puritanos que se
encontram sozinhos no mundo, abandonados, não podendo contar com ninguém, mesmo com
o pastor para a salvação, dá a idéia da grande revolução que foi o calvinismo com o dogma da
predestinação e o decretum horribile. Weber salienta bem o fato de os cristãos viverem em
função do além. De fato, os cristãos católicos tinham, e têm até hoje, uma certeza absoluta:
são imortais. Aconteça o que acontecer, sua alma sobreviverá, é indestrutível. Em matéria de
salvação eles m uma tríplice possibilidade: céu, inferno e purgatório. Tudo depende dele, de
seu comportamento no mundo: mas sempre há a possibilidade da confissão dos pecados e da
absolvição, coisa que Weber também salienta muito bem.
O catolicismo é uma religião eudomonista. A felicidade futura está ao alcance de
qualquer um, basta agir bem. O que deve ser evitado a todo custo é o inferno, onde a alma
queimará para sempre, não havendo retorno, e em cuja porta esescrito em letras grandes:
deixai de fora todas as esperanças. O purgatório, como o nome diz, é a lavagem dos pecados
com alguma chamuscação, o sofrimento passageiro. O paraíso para onde vão as boas almas é
o lugar da felicidade eterna, onde, já disse, não há trabalho nem sofrimento, anjos, música
harpônica, riachos de águas sonolentas e pradarias tranqüilas sem formigas. Essa certeza
absoluta, que Weber chama recompensa, a esperança do paraíso, foi retirada do cristão. A
salvação agora o é mais uma questão de escolha entre felicidade e infelicidade. O problema
é: quem vai viver eternamente e quem vai morrer eternamente. A certeza na imortalidade foi
abalada, restou angústia: ¨será que vou morrer?¨. O vazio, a aniquilação, o nada absoluto, o
ser ou não ser, o existir ou o existir, o se mover ou não se mover, eis a questão. O nada é a
náusea. Tirou-se-lhes o chão dos pés. O homem nada pode fazer para evitar a morte ou
preservar a vida, tudo já está decidido. Impotência. resta procurar indícios, comprovação
da eleição para a vida. O bem estar psicológico dado pela certeza do dever cumprido e a paz
de espírito obtida pela comprovação da eleição é a imortalidade. O cérebro não entende essa
aniquilação. Ele tem uma determinação, uma função: manter a vida. Todo o conhecimento
que o homem pode adquirir se destina a manter a sua própria vida. Senão, para que serve o
conhecimento? Nietzsche tinha razão. Quem tem muito conhecimento morre, quem não tem
morre também. A sabedoria o é ser mais feliz, mas viver mais tempo. Ser feliz é estar vivo.
Quer dizer estar vivo é ser feliz.
62
NOTAS DE REFERÊNCIAS
1. Mais voilà dviennent les mots qui désignent la vertu éthique sil
est vrai quil faille tenir compte de la lettre dun mot pour examiner la
verité telle quelle est; et il faut probablement. Le caractère éthique (èthos)
tire son appellation de lhabitude (éthos). Il sensuit aussi cette évidence: ce
nest pas par nature que naît em nous aucune des vertus de la partie
irrationelle. (1995, pg.54)
2. Je vais décevoir le lecteur em soulignant quen général je me sers des
termes morale et éthique comme des synonymes.(2002, pg.25)
3. (...) je dirais que jentends utiliser Éthique pour couvrir un domaine plus
vaste que cela usage qui a pour lui, je crois, une autorité déjà suffisante. Il
me sert à designer une recherche pour laquelle, em tou cas, il nexiste pas,
dautre mot> lexamem général de ce que est bien (1998, pg. 40).
4. Le terme éthique sest vu progressivement privé de son contenu à force
dêtre utilisé de façon indifferérenciée. La nature du férent, le contenu de
sens que recouvre le terme éthique, est devenue secondaire, lessentiel est
ce quon fait en disant éthique. (2001, pg.85)
5. LÉthique trace le portrait de lhomme du ressentiment, pour qui tout
bonheur est une offense, et qui fait de la misère ou de limpuissance son
unique passion (2003, pg. 38).
6. Tous les commandements et toutes les maximes de léthique traditionnelle,
quelle que soit la différence de leurs contenus, présentent cette restriction à
environnement immédiat de laction (1990, pg 28).
7 LÉthique protestant et lesprit du capitalisme est, à plus dun titre, um texte
hautement paradoxal. Malgré son étroitesse et son caractère inachevé,
soulignés, avec force par Weber lui-même face à ses détracteurs, cette
thèse, dont la structure argumentative est particulièrement complexe et
retive à tout resume, est devenue un texte canonique des sciences sociales
de la sociologie des religions, em tout cas - , engendrant une masse
considérable de commentaires, exegeses et controverses.(1996, pg. 52)
8. Comment une activité au mieux tolérée par la morale a-t-elle pu se
transformer en vocation au sens de Benjamin Franklin? Hirschmann la
reformule en ces termes: Comment se fat-il quon en soit venu, à tel
moment de lépoque moderne, à considérer comme honorables des activités
lucratives telles que le commerce et la banque, alors même quelles avaient
été réprouvées et honnies durant des siècles, parce quon y voyait
63
lincarnation de la cupidité, de lamour du gain et de lavarice? (1994, pg.
71)
9. Celui qui nest pas intéressé par toute cette psychologie, mais seulement
par les formes extérieures des systèmes économiques, je le prierai de ne pas
lire mes essais. Et je le prierai aussi davoir la bonté de me laisser libre de
vouloir, moi, mintéresser justement à cet aspect psychique du
développement économique moderne, tel que le révèlent, au sein du
puritanisme, les grandes tensions e les grands conflits intérieurs entre la
profession et la vie (comme nous disons volontiers de nos jours),
léthique, et cela à um point déquilibre singulier , qui na existé de cette
manière ni avant ni après (2003, pg. 369).
11. Les puritains ont pourtant jadis réussi à coordonner le noyau intime de la
personnalité et le quotidien des obligations professionnelles. Quelles sont
les conséquences pour lhumanité si les ordres rationalisés de la vie
quotidienne ne permettent pas plus cette coordination? Je pense que cest
cela la question capitale que Weber a posée au monde nous sommes
jétés, à la suíte de Marx (1996, pg 114).
12. Le terme personnalité rive du latin persona qui désigne le
masque de lacteur, dont est issu également le mot personne. Un des
caractères du masque du théâtre antique est sa permanence, et fixité. Le
même masque est porté par lacteur pendant toute la pièce. Laspect de
permanence a été repris par la psychologie classique qui voit dans la
personnalité la fonction psychologique par laquelle un individu se
considere comme un Moi un et permanent. Dans la psychologie actuelle,
on définit la personnalité comme lorganisation dynamique des aspects
cognitifs (cest-à-dire intellectuels), affectfs, conatifs (cest-à-dire
pulsionnels et volitionnels), physiologiques et morphologiques de
lindividu.(1990, pgs. 317 e 318)
13. (...) si sa conduite morale était irréprochable (...) (2003, pg. 244)
14. Le but de Jésus était de réveiller le sens de la moralité, dagir sur lattitude
intérieure; cest pourquoi il présentait, et pour une part en paraboles, des
exemples de droites manières dagir, tout particulièrement de celles qui
étaient en opposition avec ce quum Levite simplement légaliste se devait
de faire; puis il laissait au sentiment des ses auditeurs le soin de juger si la
manière du Levite était suffisante. Em particulier, Il montrait le contraste
entre ce quexigeaint les lois civiles, ou encore les commandements
religieux devenus par la suíte lois civiles, et ce quexigeait la moralité
(spécialement dans le Sermon sur la Montagne ce complementun des lois
lattitude morale. (1983, pg 60).
64
15. Jai souligné plus haut que Weber (...) voit dans l’”esprit du capitalisme
une éthique, et non la simple valorisation des activités lucratives. (1994, pg
76).
16. Elle explique pourquoi, chez Weber, cet esprit ne peut être que le produit
dune éthique spécifique. (1994, pg. 77)
17 Chez Weber, l esprit du capitalisme , produit exclusif dun intérêt
religieux, à savoir du désir nourri par chaque individu de sauver son âme,
semble, à proprement parler, tomber du ciel.(1994, pg. 73).
18 Weber concède lui même que Franklin ninvoque pas ces qualités à titre de
vertus, mais de méthodes dacquisition: On ne pourra nier que toutes les
exhortations morales de Franklin revêtent um sens utilitariste (...) Em effet:
quando on lit son autobiographie Le récit de sa conversion à ces vertus,
ou encore les passagens exposant lutilité du strict maintien de lapparence
de la modestie, de lapplication à abaisser son propre mérite afin dobtenir
lapprobation de tous, on aboutira nécessairement à la conclusion que ces
vertus, et toutes les autres également, ne sont selon Franklin, des vertus que
dans la mesure ou elles sont réellement utiles à lindividu.(1994, pg.108).
19 De la même façon, Weber exagere, aux yeux de Biéler, la passion ascétique
du travail du calvinisme. Sil est vrai que Calvin a accordé au travail
quotidien une valeur propre, 1l na toutefois jamais glorifié laction pour
laction. Au contraire, il sirrite et sélève contre lemprise du labeur sur
la vie; car Dieu seul et son Royaume doivent guider la recherche et
lespérance quotidiennes du croyant; et aucune valeur humane, fût-elle la
plus haute vertu, ne doit prendre leur place. (1994, pg.51)
20 Ce que jai dit sur les traits de l’”esprit capitaliste, à la détermination
desquelles lascèse protestante na pas contribué (...) (2003, pg. 408)
21 Lélimination complète du problème de la théodicée et de toutes ces
questions sur les sens du monde et de la vie, sur lesquelles dautres
sétaient échinés, allait tout à fait de soi pour les puritains tout comme
pour des raisons toutes différentes pour le juif. (2003, pg. 115).
22 Dupuis que je freqüente loeuvre de Weber je cherche à saisir les raisons de
la répulsion, presque constante, quil manifeste à légard de la
métaphysique. (1990, pg. 03).
65
23 (...) une construction purement spiritualiste que jai moi- même récusée
dans mes études. (2003, pg. 416)
24 (...) em effet, mon intérêt central ne portait pas sur le processus
dencouragement à lexpansion capitaliste, mais sur le veloppement du
type dhomme (Menschentum) qui a été créé par la conjonction de
composantes dorigine religieuse et de composantes dorigine économique:
cela était três nettement indique au terme de mon étude.(2003, pg. 417).
25 Um million dannées dHumanité, um million dannées que le travail règne
sur la terre, que lhomme est travailleur. (1959, pg. 11).
66
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____________ A Ética Protestante e o Espírito do Capiotalismo. 2ª. Ediçã Revista. Pioneira.
SP. 2001.
____________ LÉthique protestante et lesprit du capitalisme. Gallimard. Paris. 2003
____________ LÉthique protestante et lesprit du capitalisme. Plon. Paris. 1964.
____________ Sociologie des Religions. Gallimard. Paris. 1996.
____________ Ciência e Política-duas vicações. Cultrix. SP. 20
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Seja hedonismo, seja pessimismo, seja utilitarismo, seja eudomonismo: todas
estas maneiras de pensar, que se baseiam em prazer e dor, isto é, em estados
anexos e em acessórios, para medir o valor das coisas, são maneiras de pensar
de fachada, e ingenuidades, para as quais todo aquele que tem consciência de
forças afiguradoras e de uma consciência de artista olhará de cima, não sem
zombaria, e também não sem compaixão
.
Nietzsche - Para al
ém de bem e mal.
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