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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Departamento de Educação
AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE PROFESSOR/ALUNO NA
“ESCOLA DEMOCRÁTICA” NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE
BETIM - MG
Jeovani Casagrande
Belo Horizonte
2008
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JEOVANI CASAGRANDE
AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE PROFESSOR / ALUNO NA
“ESCOLA DEMOCRÁTICA” NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE
BETIM - MG
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial à obtenção do título de Mestre
em Educação.
Área de concentração: Sociologia e História da
Profissão Docente e da Educação Escolar.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury
Belo Horizonte
2008
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FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Casagrande, Jeovani
C334r As relações de poder entre professor / aluno na “escola democrática” na rede
municipal de ensino de Betim - MG / Jeovani Casagrande. Belo Horizonte, 2008.
233f. : Il.
Orientador: Carlos Roberto Jamil Cury
Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Educação
1. Poder. 2. Professores e alunos. 3. Escola pública – Betim (MG). 4.
Educação. 5. Cultura. 6. Conscientização. I. Cury, Carlos Roberto Jamil. II.
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa e Pós-Graduação
em Educação. III. Título.
CDU: 37.064
AGRADECIMENTOS
Uma conquista não pode ser solitária, as angústias, dúvidas, alegrias, surpresas e
realizações são sempre fruto de muita partilha. Assim, agradeço a Deus, fonte de
nossa vida, de nossas utopias, nossas indagações e medos...
À Nossa Senhora de Guadalupe e Nossa Senhora Aparecida, mãe e padroeira do
povo latino-americano e brasileiro, povo excluído e marginalizado historicamente que
encontram na devoção uma esperança de um mundo melhor.
À memória de minha mãe, Sebastiana Oliveira Casagrande que me deu vida, amor,
dignidade e coragem para enfrentar as batalhas da vida.
À direção, funcionários, professores e alunos da Escola Municipal Capela Nova de
Betim, objeto dessa pesquisa, que me receberam sem reservas e preconceitos e
sempre prontos a contribuir.
Aos meus familiares e amigos que sempre acompanharam minhas batalhas e
conquistas, pois, do nosso lado permanecem apenas os que nos amam
verdadeiramente.
AGRADECIMENTO ESPECIAL
Ao professor Carlos Roberto Jamil Cury, pela paciência e sabedoria com que me
orientou nesta pesquisa. Se um aluno só aprende quando quer, por prazer, eu
aprendi muito, e sentindo prazer e encantamento com suas aulas e orientações.
A evolução da humanidade depende da existência
de seres verdadeiramente preocupados com o
humano. Quando esses passam por nossas vidas,
sentimo-nos fortalecidos para continuar acreditando
em um mundo melhor. Dedico este trabalho à
existência de duas pessoas especiais em minha
vida: Neide Moreira Machado e Carlos Henrique
Soares da Silva.
RESUMO
Esta pesquisa constitui-se em um estudo de caso que tem como objetivo
analisar as relações de poder entre professores e alunos do último ano do ensino
fundamental de uma escola pública da periferia do município de Betim MG, dentro
da denominada “Escola Democrática”, estruturada no modelo de ciclos de formação
humana. A pesquisa trabalha à luz do pensamento de Paulo Freire, e ficou
estruturada da seguinte forma: em primeiro lugar, procurei fazer uma breve
contextualização histórica da educação e da legislação educacional. Procurei,
também, em breves e resumidas palavras, contextualizar o município de Betim e sua
história educacional, e, por fim, localizar a escola pesquisada e a realidade social
dos alunos por ela atendidos. Num segundo momento, busquei conceituar os
termos: poder, educação, cultura, e relacioná-los com as práticas curriculares, com o
intuito de direcioná-los para o tema desta pesquisa. Depois, num terceiro momento,
procurei evidenciar as contradições existentes entre os modelos de organização dos
tempos escolares: seriação e ciclo de formação humana. Percebendo que são
maneiras diferentes de estruturar a escola, aponta-se a organização pedagógica em
ciclos, contendo maiores possibilidades de propiciar uma emancipação educacional
junto aos alunos das escolas, especialmente os provindos das classes
trabalhadoras. Num quarto momento, registrei um pouco da trajetória de Paulo
Freire, sua vida, sua experiência educacional, seu método de ensino, as
contradições entre a educação bancária e a educação como prática da liberdade. O
quinto e último momento refere-se à pesquisa realizada na Escola Municipal Capela
Nova de Betim, onde, através de observações e entrevistas, analisei a prática
cotidiana de professores e alunos, procurando compreender como se dão as
relações de poder existentes no interior da escola. Percebi que os conteúdos ainda
são passados de forma mecânica, e que os professores têm dificuldades para
substituir os todos tradicionais, seriados, pelos métodos novos, do ciclo de
formação humana, ficando o poder ainda hoje condicionado a nota e a ameaça de
reprovação.
Palavras chave: Poder, cultura, educação, seriação, ciclo, emancipação, educação
bancária e educação como prática da liberdade.
ABSTRACT
That search is a study of a case and has as an objective to analyze the
relationship of power between teachers and students of the last year of elementary
grade of the public school in the poor neighbor in the city of Betim MG. Inside the
denomination of “Democratic School”, structure in the model of cycles for human
formation. The search work in the light of thinking of Paulo Freire and was based as
follow: in first place, I will look for make a brief history education conceptualization
and its legislations. I will look for, in brief and resume words, conceptualization of the
city of Betim and its education history, too, and finally put the search school and the
reality of their students. In a second moment I was try to concept the terms, power,
education, culture and make the relationship with the practice curriculum with the
purpose to direct them to the theme of this search. After that, in a third moment, I was
try to evidence the problems between the models of organization in the school time,
grades and cycles of formation. When I find out that they are different forms of
structure the school, I point the school cycles as the best possibility the proper a
freedom education its methodology of teaching for the students in the school,
specially those that come from work classes. In a forth moment, I register a little
trajectory of Paulo Freire, his life, his educational experience, and his methodology of
teaching, The contractions between bank education and education practice with
freedom. And in the last and fiftieth moment refer to a search made in the Municipal
School “Capela Nova“ in Betim, where, through the observations and interviews
among the teachers and students try to understand in the day by day living, how
works the relationship of powers inside the school. I find out that the curriculums are
passed in the traditional forms, mechanically, in series, with new methodology for
cycle of human formation, leave the power in our days conditioned to a grade and the
fear of reprobation.
Key words: Power, Culture, Education, Sequence, Cycle, Liberty, Bank Education
and Freedom in The Education.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APG – Atendimento a Pequenos Grupos
BR 381, BR 262, BR 040 – Rodovias Federais
CETAP – Centro de Treinamento de Professores de Artes Práticas (nome de origem)
CETAP – Centro Educacional Técnico e Artes Profissionais (hoje)
DF – Distrito Federal
FHEMIG – Fundação Hospitalar de Minas Gerais
IBGE – Instituto Brasileiro de Pesquisas e Estatisticas
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MCP – Movimento de Cultura Popular
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização
MOVA-SP – Movimento de Alfabetização da Cidade de São Paulo
MG- Minas Gerais
MG 060, MG 050 – Rodovias Estaduais de Minas Gerais
PAN – Projeto que a escola desenvolveu tendo como referência os jogos PAN
AMERICANOS.
PCCV – Plano de Cargos, Carreira e Vencimentos
PT – Partido dos trabalhadores
PTB – Bairro de Betim, próximo à FIAT-Automóveis
PUC – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerias
RJ – Rio de Janeiro
RN – Rio Grande do Norte
SAFFRAN – Empresa de Cerâmica localizada em Betim, MG desde 1954
SEED – Sigla adotada pela Secretaria Municipal de Educação de Betim em 1998.
SEMED – Secretaria Municipal de Educação – Betim, MG
SESI – Serviço Social da Indústria
Sind-Ute – Sindicato Único dos Trabalhadores Em Educação (subsede Betim)
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
UninCor – Universidade Vale do Rio Verde de Três Corações
UNIPAC – Universidade Presidente Antônio Carlos
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Números de matrículas, aprovação, reprovação, transferência e
abandono de alunos do ensino fundamental por série, segundo a região geográfica e
unidade da Federação em 1991............................................................................. 84
TABELA 2 – Os mesmos dados da tabela 1, em porcentagem. ............................ 84
TABELA 3 – Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa, segundo a região
geográfica e unidade da Federação em 1991........................................................ 84
TABELA 4 – Os mesmos dados da tabela 3, em porcentagem ............................. 85
TABELA 5 – Números de matrículas, aprovação, reprovação de alunos do ensino
fundamental por série, segundo a região geográfica e unidade da Federação em
2005 ....................................................................................................................... 85
TABELA 6 – Os mesmos dados da tabela 5, em porcentagem ............................. 85
TABELA 7 – Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa, segundo a região
geográfica e unidade da Federação em 2005........................................................ 86
TABELA 8 – Os mesmos dados da tabela 7, em porcentagem ............................. 86
TABELA 9 – Números de matrículas, aprovação, reprovação, transferência e
abandono de alunos do ensino fundamental por série, no estado de Minas Gerais
em 1991 ................................................................................................................. 88
TABELA 10 – Os mesmos dados da tabela 9, em porcentagem ........................... 89
TABELA 11 – Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa no estado de Minas
Gerais em 1991...................................................................................................... 89
TABELA 12 – Os mesmos dados da tabela 11, em porcentagem ......................... 89
TABELA 13 – Números de matrículas, aprovação, reprovação de alunos do ensino
fundamental por série no estado de Minas Gerais em 2005.................................. 90
TABELA 14 – Os mesmos dados da tabela 13, em porcentagem ......................... 90
TABELA 15 – Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa no estado de Minas
Gerais 2005............................................................................................................ 90
TABELA 16 – Os mesmos dados da tabela 15, em porcentagem ......................... 91
TABELA 17 – Conceito dos alunos da turma “08A” no primeiro trimestre de 2007 130
TABELA 18 – Conceito em porcentagem da turma 08A – 29 alunos..................... 131
TABELA 19 – Conceito dos alunos da turma “08B” no primeiro trimestre de 2007 131
TABELA 20 – Conceito em porcentagem da turma 08B – 29 alunos..................... 132
TABELA 21 – Conceito dos alunos da turma 08C no primeiro trimestre de 2007.. 132
TABELA 22 – Conceito em porcentagem da turma 08C – 28 alunos..................... 133
TABELA 23 – Conceito em porcentagem das três turmas no primeiro trimestre de
2007 ....................................................................................................................... 133
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 13
1.1 Focalizando o objeto de pesquisa................................................................ 17
1.2 Metodologia.................................................................................................... 23
2 APROXIMAÇÕES HISTÓRICAS DA EDUCAÇÃO ESCOLAR.......................... 27
2.1 Breve histórico da educação......................................................................... 28
2.2 Breve histórico da educação brasileira........................................................ 33
2.3 Breve histórico de Betim – MG ..................................................................... 41
2.4 Breve histórico da educação de Betim......................................................... 46
2.5 Breve histórico da Escola Municipal Capela Nova de Betim...................... 52
3 PODER, CULTURA E PRÁTICAS CURRICULARES........................................ 56
3.1 O poder............................................................................................................ 57
3.2 A cultura.......................................................................................................... 65
3.3 Poder, cultura e currículo escolar ................................................................ 70
4. CONTRADIÇÕES ENTRE SERIAÇÃO E CICLO DE FORMAÇÃO HUMANA. 76
5. PAULO FREIRE E A PEDAGOGIA DIALÓGICA.............................................. 100
5.1 A pedagogia dialógica ................................................................................... 107
5.1.1 Etapas de formação .................................................................................... 109
5.1.2 As fases de aplicação da pedagogia dialógica......................................... 110
5.1.3 Educação bancária...................................................................................... 111
5.1.4 A concepção problematizadora e libertadora da educação.................... 113
6 AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE PROFESSOR/ALUNO NA ESCOLA
MUNICIPAL “CAPELA NOVA” DE BETIM........................................................ 118
6.1 A avaliação das três turmas na visão dos professores.............................. 135
6.2 As práticas educacionais: ciclo e seriação, na visão dos professores..... 141
6.3 As três turmas do último ano do ensino fundamental................................ 157
6.3.1 A turma 08A ................................................................................................. 162
6.3.2 A turma 08B ................................................................................................. 168
6.3.3 A turma 08C ................................................................................................. 173
6.4 Uma alternativa possível ............................................................................... 180
CONCLUSÃO........................................................................................................ 186
REFERÊNCIAS...................................................................................................... 202
ANEXOS................................................................................................................ 206
Anexo 01 - Mapa do Município de Betim com a identificação de todas as Escolas
Municipais e Estaduais........................................................................................... 207
Anexo 02 - Escolas Municipais de Betim, MG........................................................ 208
Anexo 03 - Escolas Estaduais localizadas no Município de Betim, MG................. 209
Anexo 04 - Questionário aplicado aos alunos da Escola Municipal Capela Nova de
Betim...................................................................................................................... 210
Anexo 05 - Resultado do Questionário aplicado a 72 dos 86 alunos das três turmas
do ultimo ano do ensino fundamental da Escola Municipal Capela Nova de
Betim...................................................................................................................... 212
Anexo 06 – Empréstimos de livros para a turma 08A ............................................ 214
Anexo 07 – Empréstimos de livros para a turma 08B ............................................ 215
Anexo 08 – Empréstimos de livros para a turma 08C............................................ 216
Anexo 09 – Quadro de horários das aulas das três turmas do ultimo ano do ensino
fundamental............................................................................................................ 217
Anexo 10 - Boletim de desempenho escolar aplicado a todos os alunos da Rede
Municipal de Ensino de Betim................................................................................ 218
Anexo 11 – Fotos da Escola Municipal Capela Nova de Betim.............................. 220
11. 1 – Foto da entrada da Escola Municipal Capela Nova de Betim..................... 220
11. 2 – Foto do pátio onde os alunos merendam e ficam durante o recreio e intervalo
das aulas................................................................................................................ 220
11. 3 – Foto do pátio onde os alunos merendam, próximo ao barzinho onde
compram merenda ................................................................................................. 221
11. 4 – Foto da biblioteca da Escola Municipal Capela Nova de Betim.................. 221
11. 5 – Foto do acesso a quadra poli esportiva onde os alunos fazem as aulas de
Educação Física..................................................................................................... 222
11. 6 – Foto da quadra onde professores e alunos desenvolveram o projeto Pan-
Americano.............................................................................................................. 222
Anexo 12 – Dados do INEP para o ensino fundamental, matrículas, aprovação,
reprovação e abandono no ano de 1991................................................................ 223
Anexo 13 – Dados do INEP para o ensino fundamental, matrículas, aprovação,
reprovação e abandono no ano de 2005................................................................ 228
13
1 INTRODUÇÃO
Os modelos educacionais aplicados nas escolas brasileiras m sendo
motivo de debates e constantes reflexões por parte de educadores. Todos os
que se preocupam com os caminhos da educação das nossas crianças,
adolescentes e jovens por todo o Brasil, principalmente as crianças oriundas
das camadas populares que estudam nas escolas públicas, vêm tomando
ciência e consciência dos fatores externos e internos que coexistem nos
estabelecimentos escolares. A tradição no Brasil, quanto à organização
pedagógica das escolas, vincula-se ao modelo seriado. O modelo seriado,
aplicado pela maioria das redes de ensino público no Brasil vem sendo objeto
de muitos questionamentos, pois não se pode ignorar a quantidade de alunos
excluídos durante todo o processo de aprendizado, seja por abandono, seja por
reprovação. Muitas crianças ficaram e ainda ficam no meio do caminho escolar
como que devendo assumir, sozinhas, a responsabilidade pelo fracasso escolar.
Muitos são os dados estatísticos sobre o assunto (INEP Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Estudos e pesquisas que
demonstram a ainda baixa taxa de permanência e de escasso desempenho dos
alunos e alunas. Dados, pesquisas e estudos como esses exigem uma resposta
gestioria, que impliquem administradores e docentes comprometidos com a
educação e novas propostas com a finalidade de reverter essa situação
excludente em que nossas crianças estavam e ainda estão submetidas.
Com a promulgação da Constituão Federal de 1988 e com a Nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação, Lei 9.394/96, outros modelos educacionais
ganham destaque e passam a ser implementados pelas redes estaduais e
municipais de educação. Os ciclos de formação humana, com uma nova
metodologia e uma nova maneira de organizar os tempos e saberes escolares,
surgem como uma esperança de resgatar da exclusão uma grande parte dos
alunos oriundos, principalmente das escolas públicas onde o sistema seriado
mais reprova. Sua implantação e efetivação encontram resistências de todos os
lados, por parte de pais e alunos, de gestores, governos e professores que não
acreditam que uma escola que não reprova possa ensinar alguma coisa. O
desafio de tornar esse modelo parte da cultura educacional brasileira depende
14
de muito esforço por parte de seus defensores em pesquisar, escrever, discutir
e convencer os que ainda defendem um modelo fracassado de educação.
Estudei em escolas estaduais de Minas Gerais até o ensino dio na
minha cidade natal, Muzambinho MG, e tenho poucas recordações de prazer
que tive dentro da sala de aula. Dentre elas, na quinta rie, um professor de
ciências levou uma piranha para embalsamar na sala de aula, ou, quando, nas
speras do dia das mães, um professor de educação física pediu a cada aluno
que, no caminho de casa, apanhasse uma flor para presentear nossas mães, ou
ainda, quando uma professora de biologia no primeiro ano do ensino médio fez
os testes em que descobri que o meu tipo sangüíneo é “O positivo. Na grande
maioria dos momentos de que me recordo, estudei foadamente para tirar nota
e passar de ano. Nunca tive muita facilidade em matemática, e tive uma
experiência traumática no último ano do ensino médio, um ano em que minha
mãe sofreu com ncer, e veio a falecer no final de outubro e eu fui reprovado
em matemática por fórmulas e contas, de cuja importância não duvido, mas que,
até os dias de hoje, não tive a oportunidade de apli-las em minha vida
cotidiana.
Após minha formação em ensino superior, comecei a lecionar filosofia
para alunos do ensino médio em 1996 em uma escola estadual em Betim, MG.
Na verdade quando ainda cursava filosofia na PUC Minas e sempre procurei
conquistar os alunos para o prazer de conhecer, o encantamento do saber, sem
valorizar tanto esse processo mecânico de reproduzir conhecimentos, avaliar e
aprovar ou reprovar. Em agosto de 1997 comecei a dar aulas em uma escola da
rede municipal de Betim que, no ano seguinte, começava a implantar os ciclos
de formação humana, substituindo, gradativamente, o modelo seriado. Em 1999,
fui lecionar história em uma outra escola da rede municipal. No ano seguinte, fui
eleito vice-diretor para o mandato de dois anos. Posteriormente, fui eleito diretor
por duas vezes, de 2002 a 2005. Todas as experiências seja como aluno,
professor ou como gestor escolar provocavam-me indagações a respeito dos
processos educacionais. Certa vez, conversando com um aluno de sete anos,
ouvi dele a seguinte afirmação: “você gosta da escola porque é professor se
fosse aluno o ia gostar não”. Esse aluno não sabe o quanto sua afirmação
incomoda-me até hoje.
15
A vida é um processo dinâmico e transformador, as experiências vividas,
as pesquisas realizadas e as relações construídas ao longo de 18 anos de vida
escolar e acadêmica e ainda de 11 anos como professor de ensino fundamental,
médio e universitário, enfim, todos os espaços de socialização experimentados
por mim até então, na sala de aula, muito contribuíram para o surgimento desta
pesquisa.
Profundamente incomodado, comecei a utilizar minhas aulas para
provocar nos alunos o interesse pelas questões políticas, sociais e econômicas
do nosso país. Como tornar possível a emancipação do aluno enquanto
cidao; como um educador em condições precárias pode se sentir valorizado e
dar um real valor ao seu trabalho; nessas condições a relação ensino-
aprendizado é uma relação libertadora ou uma relação opressora?
Partindo das experiências vividas, nas escolas estaduais e municipais de
Betim, da minha formação filosófica, de um profundo incômodo diante de uma
estrutura educacional em que o aluno pobre não vê na escola uma ponte para
sua realização profissional, econômica e política, surge este projeto, com a
finalidade de aprofundar a discussão sobre o papel da escola nos meios
populares. Refletir sobre as relações de poder entre professores e alunos,
compreender até que ponto essas relações contribuem para emancipar ou para
alienar esses alunos, avaliar se as condições estruturais dos professores são
instrumentos de libertação ou de opressão, e como se posicionam diante dessa
relação.
Minhas experiências ocorreram em escolas do eno denominado
segundo grau, hoje ensino médio no estado, com o regime seriado, onde a
transmissão de conteúdos dá-se de forma compacta e cumulativa, visando à
seleção e à progressão em série. Os alunos preocupam-se em acumular
conhecimentos para o vestibular, para passar em concursos e para o mercado
de trabalho.
Atuei, também, em escolas municipais de ensino fundamental, em que a
implantação dos ciclos de formação humana ocorrera de forma gradativa,
visando a uma formação mais completa do aluno, onde o saber organizado é
parte do processo, e não o fim. Portanto, a formação em ciclos é um
instrumento mais justo, e é através dele que as relações de poder são
reconstruídas numa perspectiva democrática, pelo menos deveriam ser.
16
Como educador, sempre me incomodou a relação mecânica entre aluno,
ensino, avaliação, chamada, nota, aprovação/reprovação. Algumas vezes, ao
chegar na escola para dar aulas, eu ouvia um aluno perguntar: o que o senhor
veio fazer aqui hoje, professor, por que não ficou em casa descansando?. Em
todas as atividades vinha a pergunta, isso vai valer ponto?A motivação para a
realização de tarefas era a nota. Adquirir conhecimento por prazer o era uma
prática constante, que se via com freência, porque o professor acostumou-se
a orientar-se pela reprodução mecânica do conteúdo e porque o aluno se
acostumou a se orientar pela nota, pois precisa dela para passar de ano.
Como gestor escolar por seis anos (dois como vice-diretor e quatro como
diretor), pude experimentar uma outra face do poder, aquela que fica entre o
poder do professor e o poder da administração pública do Município, sem me
esquecer de que, entre eles, existiam os alunos que careciam de poder, o poder
do conhecimento. Assim, como gestor, não podia me limitar a fazer as
ocorncias dos alunos problema, registrar as faltas dos funcionários, ser um
fiscal da Secretaria de Educação dentro da escola, administrar os recursos
financeiros, ouvir reclamações dos pais, enfim cuidar das questões burocráticas
que muitas vezes anulam a função pedagica da educação. Não sabia o que
era pior, ser aluno, professor ou gestor escolar.
Certa vez, ganhei de uma amiga um livro que, ao ler, levar-me-ia a uma
profunda reflexão sobre minha prática como educador. O livro vinha com o título
de Pedagogia da autonomia, de Paulo Freire. O que é pedagogia, o que vem a
ser autonomia, qual seria, de fato, o meu papel como educador de uma escola
pública de periferia, quem o os meus alunos, quais as suas reais
necessidades de aprendizado, como deve ser uma relação entre professor/
aluno que verdadeiramente contribua para a autonomia desse aluno?
Pretendo, dentro do meu objeto de investigação, fundamentar-me na
concepção educacional do pensamento de Paulo Freire, em cuja pedagogia se
põe a proposta de libertar o ser humano da dominação excludente de uma
educação autoritária, educação essa que sempre privilegiou a formação das
elites do nosso País. Hoje o acesso à escola do ensino fundamental já atingiu
quase 100% das crianças brasileiras de 7 a 14 anos, mas ela o garantiu nem
a permanência adequada e nem a desejada qualidade de ensino, principalmente
para as camadas mais pobres da população. Do sucesso da e na educação
17
básica dependerá o acesso à própria universidade, a um emprego digno e,
finalmente, à sua emancipação.
A concepção educacional de Paulo Freire revela situações, aponta
alternativas, mostra caminhos, contribui para que, pelo menos os professores,
pela via de uma pedagogia dialógica e antiautoritária, possam ser construtores
de uma sociedade melhor e mais justa. O aluno carente precisa de uma
educação de qualidade, portanto, a escola oferecida a ele não pode ser uma
escola carente de quase tudo, desde as condões físicas e pedagógicas
necessárias para sua formação até a plenificação de um direito deste e um
dever do poder público.
Como Professor não me é possível ajudar o educando a superar sua
ignorância se não supero permanentemente a minha. Não posso ensinar o
que não sei. Mas, este, repito, não é saber de que apenas devo falar e
falar com palavras que o vento leva. É saber pelo contrário, que devo viver
concretamente com os educandos. O melhor discurso sobre ele é o
exercício de sua prática. É concretamente respeitando o direito do aluno
de indagar, de duvidar, de criticar que falodesses direitos. A minha pura
fala sobre esses direitos a que o corresponda a sua concretização não
tem sentido. (FREIRE, 1996, p. 95)
Comecei, eno, a ler mais livros de Paulo Freire e outros autores que
tratavam da educação como ptica da liberdade, como um exercício
emancipario e o reprodutivista. Percebi em mim a necessidade de
aprofundar esse tema tão complexo: a educação como exercício de poder.
Como me sinto, quando me vejo submetido a esse poder, e como me comporto
exercendo esse poder, como educador devo usar meu poder com a finalidade
de formar meus alunos, não só no aspecto cognitivo, mas na constrão ctica
de sua cidadania?
1.1 Focalizando o objeto de pesquisa
Esta pesquisa tem por objetivo o estudo das relações de poder entre
professor/aluno, que permeiam o cotidiano escolar, buscando compreendê-las,
interpretá-las em sua dinâmica em face das perspectivas de autonomia que
emergem na escola. O modelo educacional seriado predomina, ainda hoje, na
18
maioria das escolas públicas brasileiras, e mesmo naquelas em que a
organização dos tempos escolares é ciclada, existe resisncia por parte dos
educadores que acreditam ter perdido o poder de domínio em sala de aula com
a nova organização escolar. Muitos educadores, preocupados com as relações
entre professores e alunos, têm pesquisado esse tema. A professora Magali de
Castro, em sua tese de doutorado, tratou das relações de poder na escola
pública do ensino fundamental, sob a luz de Pierre Bourdieu e Max Weber, em
um enfoque sociológico. Segundo ela:
Portanto, para compreender as relões de poder, na instituição
escolar, é necessário olhar para além dela; é preciso analisar como o
poder se manifesta, identificando os elementos que interna e
externamente determinam estas relações. (CASTRO, 1994, p. 3)
O professor Paulo Roberto Vidal de Negreiros, em sua dissertação de
mestrado, de 2004, trata da seriação como organização dos tempos escolares
da rede privada de ensino no município de Belo Horizonte. Para ele, as relações
de poder são manifestas através do controle, da disciplina, a avaliação com
caráter classificatória, acumulativa e discriminatória, os alunos são divididos
entre os que aprendem e passam para a série seguinte, e os que o aprendem
e são condenados a permanecer na mesma série por mais um ano. Para ele,
Em uma sociedade que se proclama democrática não podemos perder
de vista que a máxima igualdade é aquela que permite o exercício das
diferenças. Inversamente a esta situão, o tempo pode adquirir uma
dimensão cida. Voltado para a formão dos sujeitos, respeitando
as diferenças e dando a todos as mesmas oportunidades. O tempo
pode ter uma dimensão de historicidade, onde as múltiplas
possibilidades de vivências dão aos sujeitos a consciência de sua
existência hisrica, do seu sentido de viver. O tempo pode ter uma
dimensão de morte e de vida. Quando atropelado pelo ritmo do
relógio, em decorrência de uma vida que prioriza apenas a produção,
o fazer, o ter, o tempo sufoca, provoca doenças, escraviza, mata.
Quando vivenciado na perspectiva da qualidade de vida, fortalece as
relações, cria espos de oportunidade para todos, liberta, traz prazer,
ressignifica o sentido da vida. (NEGREIROS, 2004, p. 104)
Outra pesquisa que me ajudou foi a dissertação de mestrado de Roberto
Márcio Gomes de Rezende, em 1993, com o tema disciplina na escola. Ele
demonstra que o poder disciplinador da escola e do professor provoca a
passividade e a conformação dos alunos com uma realidade dada. Ele diz:
19
O poder disciplinar manifesta-se, sobretudo, pelo controle e
manipulação do corpo. A coerção sobre o corpo, de forma a aumentar
a produtividade, é uma das formas mais sutis de violência, cuja
relação com a docilidade é difícil de ser negada. (REZENDE, 1993,
p.123)
Também busquei inspiração nas pesquisas realizadas por Vitor
Henrique Paro, que trabalha as relações existentes no interior da escola,
demonstra que a faculdade que o professor tem de reprovar um aluno é um
instrumento de poder injusto, pois a causa do fracasso fica apenas no aluno e o
restante dos agentes do processo de ensino, tais como o poder público, os
gestores escolares, os professores com seus métodos de ensino, as condições
físicas da escola e os recursos didáticos, as condições históricas, sociais e
econômicas dos alunos, tudo isso fica eximido de avaliação. Para ele, o aluno
se apropria da cultura quando seu desejo pelo saber é trabalhado pelo
professor. Portanto, a mera transmissão de conteúdos remete-me à educação
bancária explicitada por Paulo Freire, que é o modelo de educação autoritária,
onde a relação de poder aparece como dominação daquele que sabe sobre
aquele que não sabe. Todos os autores que pesquisei reforçam a necessidade
de um modelo educacional dialógico, problematizador, capaz de formar
cidaos críticos e emancipados, e, para isso, é necessária a universalização
de uma educação pública de qualidade para todos.
Segundo PARO (2008),
a concepção de educação do senso comum que costuma orientar a
prática pedagógica em nossas escolas desconhece ou resiste
fortemente à iia do educando como detentor de poder. Para o
ensino tradicional, existe uma espécie de estrada de mão única que
vai do professor, que ensina, para o aluno, que aprende passivamente
o que lhe é ensinado. Ignora-se, assim, o complexo processo pelo qual
os componentes da cultura se incorporam na personalidade viva de
cada ser humano e o necessário envolvimento do educando como
sujeito nesse processo. (PARO, 2008, p. 46-47)
A nova LDB formaliza a universalização da educação, ou seja, para todos
e de qualidade. Todas as crianças devem freqüentar o ensino fundamental, é
dever do Estado, da escola, da família e direito subjetivo da criança. Junto a
isso, constata-se a existência deltiplos projetos político-pedagicos que
visam a acolher os educandos, especialmente aqueles que antes fracassavam,
agora se definindo não só pela sua inclusão, como para a sua formação de
20
maneira mais ampla, visando à sua cidadania. Tudo isso demandam mudanças
nas políticas educacionais e na ptica docente.
Dentro dessa universalização de acesso e de formação qualitativa, situa-
se a proposta da “Escola Democrática no Sistema Municipal de Betim. É nela
que pretendo centrar esta pesquisa e focalizar as relações de poder nela
existentes. Pensar como se dão as relações de poder entre professores e
alunos do ensino fundamental de uma escola pública de periferia é o eixo
central dessa proposta de pesquisa. Para tanto, será necessário refletir sobre:
qual é a proposta da Escola Democtica, como se dá o processo ensino-
aprendizado e as relações de poder dentro desse contexto?
A rede municipal de Betim vem, desde 1998, implantando os ciclos de
formação humana visando a universalizar o acesso e melhorar a qualidade do
ensino no município. Aqui, pretendo focar a pesquisa observando a ptica
desse projeto educacional. A escolha de uma escola que atenda alunos das
classes trabalhadoras é parte importante desse processo de observação das
relações de poder entre professor/aluno.
O movimento de universalização da educação escolar na etapa do ensino
fundamental é uma demanda histórica no Brasil, e que ganhou subsídios
jurídicos importantes, com a Constituição Federal de 1988 e com a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação LDB de 1996. Eles dão importância à
formação para cidadania, o que permite pensar e, quiçá, empreender novas
dimensões para a escola pública em nossa sociedade. No sentido dessa
universalização e no desejo de ampliar o conceito de educar, a LDB permite e
até induz a flexibilização do sistema de ensino e da construção curricular, por
meio das diretrizes curriculares nacionais e dos projetos pedagógicos, em
função do atendimento das demandas locais de um país de dimensões
continentais, plural e diversificado, econômica e culturalmente.
Isso vem levando a que a escola, em redes municipais e estaduais,
elabore projetos político-pedagógicos para o ensino fundamental, visando a
oferecer um ensino de qualidade. Em Betim, nesse processo, o que mais tem
sido constatado como uma nova situação para a escola é a presença de alunos
muito diferenciados entre si nas condições de vida e de escolarização.
Esse contexto de diferenciação define uma nova relação entre sociedade-
escola-educação, colocando para a comunidade escolar a necessidade de
21
discutir-se a re-significação do espo, do tempo e dos saberes escolares. Para
tanto, devem-se partir de saberes culturalmente constituídos pelos agentes
sociais e com os quais a escola deve interagir até para poder cumprir as
funções próprias da escola como a constituição de saberes pelo
ensino/aprendizagem e a socialização para a cidadania. Para tanto, o educador
precisa conhecer a realidade social da escola onde trabalha.
Dentro desse conjunto de urgências e redefinições, encontram-se as
relações entre professor/aluno, que o relações de poder, podendo ser
democráticas ou autoritárias. As relações de poder podem estar ligadas a jogos
de interesses que não acontecem sem conflitos. As decisões resultantes desse
jogo podem favorecer alguns e prejudicar outros.
Construir um currículo considerando essas novas demandas é um desafio
para os educadores do munipio, que se propuseram, partindo dos debates que
ocorreram nos congressos e conferências educacionais, a construir um modelo
mais democrático de educação. Vale a pena ressaltar que as pessoas e também
as categorias envolvidas no cenário educacional têm paradigmas diferentes
para verem a realidade, seus valores, crenças, metas e níveis de moralidade, o
que interfere na construção do currículo escolar.
Outra mudança importante é a retomada de outra função tradicional da
escola. Essa função, a de ser o lugar de transmissão do conhecimento
científico, quanto a de ser um lugar de socialização, em que se pode fazer a
discuso de temas como: desemprego; sexualidade; violência; os direitos e
deveres; arte; cultura; drogas; enfim, vários temas relacionados à vivência da
comunidade escolar. Tais temas não permitem à escola manter uma posão de
neutralidade em face das questões relativas às profundas desigualdades sociais
e econômicas e também das diferenças culturais.
A tentativa de construir uma nova postura da/na escola tem colocado para
os professores a necessidade de repensar as relações no interior da mesma,
deixando claro que a democracia consagra os direitos individuais iguais para
todos e sua constante atualização. Numa ordem democrática, fundada no direito
à igualdade e à diferença no debate público e livre a respeito das concepções
que orientam os fatos sociais, prioriza-se, dentro da concepção freireana, a
razão dialógica, e enfatiza-se o entendimento intersubjetivo.
22
Esse entendimento, contudo, necessita de uma gestão democrática que
não é ausência de regras, mas, antes, possibilidade de construção interativa de
uma disciplina que se configure, tanto como uma aceitação das regras do jogo,
como as condições de possibilidade para o exercício consciente dessas regras.
Assim, a vida democrática inclui rituais democticos, a busca de uma formação
cultural de personalidades abertas ao dlogo.
Pensar o processo educacional numa escola pública de periferia, e como
nela se dão as relações de poder, e, principalmente, como essas relações
podem contribuir para a formação de um cidadão ctico, contribuir também na
construção de uma sociedade melhor e mais justa, com mais oportunidades de
trabalho, mais distribuição de renda, onde o educando acredite que o processo
educacional vai conduzi-lo à emancipação política e social.
Paulo Freire, em sua concepção educacional, afirma que sempre
acreditou nas relações democráticas entre professor/aluno, e que essa é a
principal via para uma formação emancipadora. Para ele o são os alunos e
nem os professores que produzem essas desigualdades: eles são timas de um
sistema alienante. Para ele,
os que inauguram o terror não são os débeis, que a eles são submetidos,
mas os violentos que, com seu poder, criam a situação concreta em que
se geram os demitidos da vida”, os esfarrapados do mundo. Quem
inaugura a tirania não são os tiranizados, mas os tiranos. (FREIRE, 2005,
p. 47)
Como estabelecer uma relação de poder democrática que visa à
emancipação dos alunos, no interior de uma escola pública de periferia, como
essa escola pode abrir caminhos para a construção da cidadania plena de todos
os agentes do processo ensino/aprendizado. Essas são algumas das
indagações que me motivaram a realizar essa pesquisa.
Com o foco central nas relações de poder entre professores e alunos do
último ano do ensino fundamental de uma escola pública da periferia do
município de Betim MG, à luz de Paulo Freire, esta pesquisa ficou estruturada
da seguinte forma: em primeiro lugar, procurei fazer uma breve contextualização
histórica da educação e da legislação educacional; procurei, também, em
breves e resumidas palavras, contextualizar o município de Betim e sua história
educacional, e por fim, localizar a escola pesquisada e a realidade social dos
23
alunos por ela atendidos. Num segundo momento, procurei conceituar os termos
poder, educação, cultura e relacioná-los com as pticas curriculares com o
intuito de direcioná-los para o tema da desta pesquisa. Depois, no terceiro
momento busquei evidenciar as contradições existentes entre os modelos de
organização dos tempos escolares: seriação e ciclo de formação humana.
Percebendo que são maneiras antagônicas de estruturar a escola, posicionei-
me a favor do ciclo, por acreditar que este possibilita a emancipação das
classes trabalhadoras. No quarto momento, registrei um pouco da trajetória de
Paulo Freire, ele que me inspirou nessa pesquisa, sua vida, sua experiência
educacional, seu método de ensino, seu legado que me provoca a fazer da
educação uma prática libertadora de todos os cidadãos. O quinto e último
momento refere-se à pesquisa realizada na Escola Municipal Capela Nova de
Betim, onde a prática cotidiana de professores e alunos expressam como se dão
as relações de poder existentes no interior da escola.
1.2 Metodologia
O objeto de estudo desta pesquisa pretende focar, dentro de uma escola
pública de periferia da rede municipal de Betim, as relações de poder existentes
entre professores e alunos após a implantação dos ciclos de formação humana,
a partir de 1988. Estando presente nessa escola, com a devida nia dos
gestores e professores, pude observar os docentes e alunos de três turmas do
último ano do ensino fundamental. Estes sujeitos foram o foco principal da
pesquisa, embora todo o cotidiano escolar contribua para o desenvolvimento
dessas relações.
Esta pesquisa, portanto, insere-se no quadro das pesquisas qualitativas.
Segundo BOGDAN (1994),
O objetivo dos investigadores qualitativos é o de melhor compreender
o comportamento e experncia humanos. Tentam compreender o
processo mediante o qual as pessoas constroem significados e
descrever em que consistem estes mesmos significados. Recorrem à
observação empírica por considerarem que é em função de instâncias
concretas do comportamento humano que se pode reflectir com maior
24
clareza e profundidade sobre a condição humana. (BOGDAN, 1994, p.
70)
A intenção foi estabelecer uma relação direta entre o pesquisador e o
objeto pesquisado, e também realizar a coleta de dados por meio de
observações do cotidiano escolar, nas quais se procurou apreender a forma
como ocorrem as relações de poder entre professor/aluno, captando as
situações conflituosas. Nesse sentido, freentei uma escola da rede municipal
de Betim por quatro meses, de março a junho de 2007, no turno da manhã,
onde estão inseridas as ts turmas do último ano do ensino fundamental e os
oito professores por mim pesquisados. Ao freqüentar a escola, conversei em
rios momentos com o diretor, com a vice diretora, com as duas pedagogas do
turno, com as auxiliares da secretaria, que me forneceram informações sobre os
alunos. Freqüentei a biblioteca estando em contato com as duas biblioterias
que forneceram dados das leituras dos alunos, com as auxiliares de serviço,
com os professores em sala de aula e na sala de professores, enfim, com todos
os funcionários e com os alunos em sala de aula e notio no horário do
recreio.
Outro instrumento de coleta de dados utilizado foram as entrevistas semi-
estruturadas, com professores e alunos, buscando levantar os problemas e as
dificuldades enfrentadas por esses atores sociais no cotidiano escolar, bem
como verificar se há espaços de explicitação, discussão e propostas de solução
ou encaminhamento. Também foram aplicados questionários para os alunos das
três turmas de alunos em questão.
Assim, tendo em vista que a pesquisa atua num ambiente natural, o
contato entre pesquisador e pesquisado é direto, por meio de observações,
questionários e entrevistas semi-estruturadas, pois se trata de um grupo
específico, localizado dentro da realidade de uma unidade escolar. Posso
afirmar, então, que, dentro dessa metodologia qualitativa, a abordagem indicada
é o estudo de caso.
Portanto, essa pesquisa se dá dentro de uma escola pública de periferia
de Betim, esse projeto de Escola Democrática, apresentado pela Lei Ornica
do Município, no art. 150. Pretende-se, aqui, aprofundar, nas relações de poder
entre professor/aluno, o estudo das características democráticas a que ela se
propõe, e que, necessariamente, deve, como conseqüência da democracia,
25
formar os alunos para a cidadania, o que coopera significativamente para a sua
emancipação.
Meu foco são as relações de poder dentro de uma experiência vivida já há
dez anos, na rede municipal de Betim, com a implantação dos ciclos de
formação humana. Aqui, pretendo observar se as relações democticas
consolidam-se na prática, uma vez que, teoricamente, a dimica de ensino
aprendizado já mudou.
Minha proposta fundamenta-se na metodologia de Paulo Freire, que trata
diretamente da construção da emancipação do aluno. Assim, de dentro de uma
realidade teoricamente em ciclos, partindo de observações de experiências
vividas por professores e alunos é que pretendo construir essa pesquisa.
Paulo Freire proe uma mudança de paradigma, considerando todos
os seres humanos como seres pedagicos, incompletos e
inacabados. Os seres humanos se completam, convivendo com os
outros e trabalham o seu inacabamento pela educação permanente,
ao longo de toda a vida. E porque somos seres acabando-se,
completando-se e conscientes desse inacabamento e incompletude,
somos seres esperançosos, precisamos de sonho e da utopia para
viver plenamente. (ROMÃO, 2002, p. 14)
A relação dialógica, proposta por Freire em toda a sua obra, é, na
verdade, o referencial desta pesquisa. Verificar como se o as relações de
poder entre professor/aluno, numa perspectiva democrática, emancipadora, será
meu foco principal. Entender a educação como um processo de busca, de
formação, de construção do conhecimento, um confronto constante com a
realidade, numa reflexão ctica sobre a mesma, provocando uma pxis
transformadora da realidade. O próprio FREIRE (2005) aponta o caminho desta
pesquisa:
Não posso investigar o pensar dos outros referido ao mundo se não
penso. Simplesmente não posso pensar pelos outros nem para os
outros, nem sem os outros. A investigação do pensar do povo não
pode ser feita sem o povo, mas com ele, como sujeito de seu pensar.
(FREIRE, 2005, p. 117)
Uma educação verdadeiramente democrática luta, constantemente,
contra a desigualdade das diferenças, tomando cuidado para não homogeneizar
as pessoas, respeitando as diferenças, devolvendo aos alunos das classes
26
trabalhadoras a capacidade de aprender, partindo de suas pprias
necessidades.
Paulo Freire foi um crente convicto na capacidade do ser humano de
transformar a realidade. Acreditava que a educação podia ser uma forte aliada
nesse processo: a prática pedagógica deveria ser diagica, e não alienadora. O
papel do educador dialógico deveria comprometer-se com a práxis libertadora,
partindo da realidade social em que se encontram seus alunos. Sua opção abre
caminhos, alternativas, forma cidadãos conscientes de sua condição de
explorados.
Segundo Gadotti (2005), “o objetivo da educação é ajudar a tornar as
pessoas mais livres, menos dependentes do poder econômico, político e social.
A profissão de ensinar tem essa obrigação intrínseca (GADOTTI, 2005, p. 28).
Portanto, lancei um olhar investigativo para a experncia de ciclos de
formação humana na rede municipal de ensino de Betim, na proposta da
Escola Democrática, dentro da realidade de uma comunidade escolar,
marcada por dificuldades econômicas e sociais, onde a implantação de uma
escola verdadeiramente democrática pode gerar a formação de cidadão críticos,
preparados para o mundo, conscientes de seu papel transformador na história.
Assim, acreditando na proposta dos ciclos, na proposta da Escola
Democtica”, essa pesquisa pretende observar, à luz do pensamento de Paulo
Freire, a realidade local de uma unidade escolar. Observar as relações de poder
no cotidiano escolar, não como conflito, mas como prática libertadora
revolucionária, tornando o processo ensino-aprendizagem uma âncora para a
construção de uma sociedade melhor para aqueles que se situam à margem do
processo potico e ecomico do nosso País.
27
2 APROXIMÕES HISTÓRICAS DA EDUCAÇÃO ESCOLAR
A história foi sempre ambígua, apesar das aparências, já que deu
sempre respostas diversas conforme quem a interrogava e as
circunstâncias em que o fazia. (BOBBIO, 2004, p. 141)
Ao escolher realizar uma pesquisa qualitativa, um estudo de caso, mais
especificamente, fez-se necessário contextualizar o objeto pesquisado. Aqui,
coube-nos a tarefa de observar, coletar dados, interagir com os agentes
pesquisados. Fez-se necessário, também, participar da realidade de um
município, de uma comunidade, de uma escola, e, principalmente de alunos e
professores. E é assim que começo a narrar o contexto em que se insere esta
pesquisa.
Aqui, pretendo mostrar um pouco da história das assimetrias existentes
no interior de uma escola pública, tendo como foco a relação de poder entre
professores e alunos. Esse recorte investigativo mostrou que tal relação
revestida de autoritarismo reforça a já restrita igualdade de oportunidades para
os alunos advindos das classes trabalhadoras. Uma ponte entre esse histórico
de exclusão e os dados coletados nessa escola far-se-á dentro de um contexto
situando minha proposta de trabalho.
Pretendo apenas fazer uma breve abordagem histórica para situar meu
objeto de pesquisa, as relações de poder entre professor e aluno, numa
perspectiva do ciclo de formação humana, como se deram os processos de
construção e universalização da educação. Farei uma breve abordagem global
para apresentar alguns elementos importantes do processo histórico da
educação no Brasil, Minas Gerais, chegando a Betim, onde se concretiza esta
pesquisa.
Aqui, também, se possível mostrar a importância da construção de uma
relação assimétrica e não autoritária entre professor e aluno, pois, somente
nessa perspectiva é que se torna possível a construção da emancipação do
aluno, ou seja, a formação de cidadãos críticos capazes de problematizar a
história e contribuir para uma crescente diminuição das desigualdades sociais,
econômicas e culturais existentes no País.
28
Segundo Paulo Freire, quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende
ensina ao aprender(FREIRE, 1996, p. 23). É nesse processo que se inicia a
relação dialógica entre professor e aluno. Não existe aqui um que sabe tudo e
outro que não sabe nada; um que só manda e outro que só obedece; um ser
ativo e outro passivo no processo ensino/aprendizagem; ao contrário, existe o
respeito pelo ser que aprende e que ensina, ao mesmo tempo. Assim, faz-se
necessária uma compreensão dos processos hisricos das desigualdades
educacionais, na tentativa de construir uma relação de poder que seja
emanciparia de ambos os agentes do processo.
2.1 Breve histórico da educação
A educão como um direito do cidadão e um dever do Estado, foi se
construindo ao longo da história, e foi principalmente na Era Moderna que vimos
nascer esse direito como um direito positivo. A escola primária, enquanto forma
de socialização privilegiada e lugar de passagem obrigatória para todas as
crianças, é uma instituição recente, cujas bases administrativas e legislativas
contam com pouco mais do que um século de existência. De fato, a escola
pública, gratuita e obrigatória foi instituída no final do século XIX e início do
século XX, apesar de ter origens mais remotas. Ela converteu os professores
em funcionários do Estado e adotando medidas concretas para tornar efetiva a
aplicação da regulamentação que proibia o trabalho infantil antes dos dez anos.
Para Thomas Marshall, a educão das criaas está
diretamente relacionada com a cidadania, e, quando o Estado garante
que todas as criaas serão educadas, estes tem em mente, sem
sombra devidas, as exigências e a natureza da cidadania. Es
tentando estimular o desenvolvimento de cidadãos em formação. O
direito à educação é um direito social de cidadania genuíno porque o
objetivo da educão durante a infância é moldar o adulto em
perspectiva. Basicamente, deveria ser considerado não como o direito
da criaa freqüentar a escola, mas como o direito do cidadão adulto
ter sido educado. E, nesse ponto, não há nenhum conflito com os
direitos civis do modo pelo qual são interpretados numa época de
individualismos. Pois os direitos civis se destinam a ser utilizados por
pessoas inteligentes e de bom senso que aprenderam a ler e escrever.
A educão é um pré-requisito necessário da liberdade civil.
(MARSHALL, 1967, p. 73)
29
Ainda segundo o mesmo autor, as lutas pelos direitos sociais foram muito
mais prolongadas do que pelos direitos civis e políticos, e que a educação é um
pré-requisito para a cidadania. O indivíduo que não tem acesso à educação não
alcaa uma série de requisitos significativos para avançar em sua cidadania. A
construção da cidadania é um caminho para a igualdade entre os homens, e
ainda não chegou a todos os indivíduos de todos os povos e em igual medida,
ou melhor, em igualdade de condições, pois os direitos sociais ainda são
desconhecidos por grande parte da população mundial seja pela sua não
efetivação, seja por não constarem de códigos jurídicos nacionais.
No caso da educão escolar em quase todos os países do mundo,
existem leis com garantias de sua oferta para todas as crianças em idade
escolar. Sabemos também que as condições econômicas e culturais de muitos
países são variáveis de acordo com a realidade local. Por isso, enquanto alguns
países garantem na prática uma educação de qualidade para suas crianças, em
muitos outros até mesmo o acesso ainda se faz restrito. Assim, o direito à
educação não garante uma diminuição das desigualdades sociais entre classes
dentro de um mesmo país e mesmo entre nações ricas e nações pobres.
Não posso falar de cidadania, sem uma profunda preocupação em
diminuir as desigualdades sociais, nem mesmo sem mencionar as constantes
lutas pelos direitos humanos como a Revolução Francesa em 1789 e a
Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, e outras que marcaram
nossa história de lutas pela igualdade entre os homens e pelos direitos dos
cidaos. Não posso falar de cidadania, sem me comprometer com a garantia a
todos os cidadãos do mundo as condições mínimas de sobrevivência, como o
direito à vida, à saúde, à moradia, à segurança, ao trabalho digno e a uma
educação de qualidade. Segundo MARSHALL (1967),
A cidadania exige um elo de natureza diferente, um sentimento direto
de participação que é um patrimônio comum. Compreende a lealdade
de homens livres, imbdos de direitos e protegidos por uma lei
comum. Seu desenvolvimento é estimulado tanto pela luta para
adquirir tais direitos quanto pelo gozo dos mesmos, uma vez
adquiridos. (MARSHALL, 1967, p. 84)
O direito à educação é discuso antiga que a humanidade travou ao
longo da sua história, e que vem se consolidando na Era Moderna. Após os
30
crimes provocados pela Segunda Guerra Mundial, uma grande preocupação era
a de garantir os direitos dos cidadãos. E foi a partir dessa realidade que as
Nações Unidas, reunidas em 1948, deram voz à Declaração Universal dos
Direitos Humanos. O art. 26 trata do direito que todos os cidadãos, em todas as
nações do mundo, têm a educação:
1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita,
pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino
elementar é obrigatório. O ensino cnico e profissional deve ser
generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos,
em plena igualdade, em função do seu mérito.
2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao
reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais, e deve
favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações
e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das
actividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.
3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de
educação a dar aos filhos.
Com essa declaração, houve um reconhecimento pelas nões
signatárias de que a educação tornou-se um direito universal de todos os
cidaos. A grande dificuldade é perceber esse direito efetivamente garantido, é
ver todas as crianças dentro de instituições de ensino que lhes garantam uma
educação de qualidade. Segundo BOBBIO (2004),
Partimos do pressuposto de que os direitos humanos são coisas
desejáveis, isto é, fins que merecem ser perseguidos, e de que, apesar
de sua desejabilidade, não foram ainda todos eles (por toda a parte e
em igual medida) reconhecidos. (BOBBIO, 2004, p. 35-36)
A escola nem sempre existiu; daí a necessidade de determinar suas
condições históricas de existência no interior de minha formação social. Aqui se
pretende fazer uma pida abordagem histórica para refletir o passado a partir
de uma perspectiva que me ajude a decifrar o presente, tornando possível
minha compreensão da realidade, das causas da construção das diferenças
31
educacionais ao longo da sua história, enfim, para tornar possível a
compreensão das nossas condições atuais de existência.
A partir do século XVII, começa a chamada escolarização, as crianças
deixam de aprender entre os adultos e passam a ser formadas nas escolas. As
crianças passam a ser separadas por grupos de idades e a terem aprendizados
diferenciados. De qualquer modo, o adestramento para os ofícios, a moralização
e a fabricação de ditos virtuosos o os pilares sobre os quais se assenta a
política de recolhimento dos pobres. Segundo Adam SMITH (1996),
o Estado pode facilitar, encorajar e até mesmo impor a quase toda a
população a necessidade de aprender os pontos mais essenciais da
educação. (SMITH, 1996,
p. 246)
Parece ser de interesse dos governantes a universalização da educação
primária, talvez até mesmo como elemento de mediação para as trocas no
mercado econômico.
Segundo CURY (2002a),
tanto a Inglaterra, como a Fraa, a Alemanha e outros pses
europeus, no século XIX, fizeram reformas educacionais nas quais se
cruzam as idéias do pensamento liberal como a ação intervencionista
do Estado e com o controle inicial do trabalho infantil. Acreditava-se
que a instrução primária seria uma vacina contra o despotismo já
vivido por muitos países tanto quanto uma forma de questionar a
dominância do trabalho manual, entre os adultos, e a presença de
crianças no regime fabril.
Na verdade, para as classes dirigentes européias, colocar o
Estado como provedor de determinados bens próprios da cidadania,
como a educação primária e a assistência social, representava a
necessidade da passagem progressiva da autoprotão contra
calamidades e incertezas para a solução coletiva de problemas
sociais. Para contar com as classes populares no sentido da solução
de muitos problemas, não era mais posvel nem deixar de satisfazer
algumas de suas exigências e nem ser um privilégio, o que, a rigor,
era direito de todos e não só de uma minoria. (CURY, 2002a, p. 6)
Os interesses de classes, antanicos entre si, dentro dos contextos
sociais, tornaram a educação um pilar da sociedade, pilar contraditório. De um
lado, os donos dos meios de produção desejavam formar o-de-obra, seres
passivos e domesticados, desejavam direcionar a educação das classes
operárias para a subserviência, enquanto os trabalhadores viam na educação
32
uma ferramenta de emancipação, o caminho para a rao de sua condição, e, a
partir daí, construir uma sociedade mais justa e menos desigual.
Instituir as escolas obrigatórias com a finalidade de controlar as classes
populares era fundamental para uma ordem social pacífica, e assim se controlar
o operário para torná-lo honrado produtor e neutralizar e impedir que a luta
social transborde, pondo em perigo a estabilidade política. A educação, por
outro lado, passa a ser um caminho institucional para tirar as classes populares
da ignorância, uma condição para a construção da cidadania, e, enfim, um
caminho para a emancipão das classes mais desprovidas de cultura, e de
todos os meios para uma subsistência mais digna.
A cidadania caminha nessa contradão e é condição para que todos
tenham no conhecimento um dos mecanismos de luta, a diminuição das
desigualdades sociais, culturais e econômicas.
Cury diz que
a importância do ensino primário tornado um direito imprescindível do
cidadão e um dever do Estado impôs a gratuidade como modo de
torná-lo acessível a todos. Por isso, o direito à educão escolar
primária inscreve-se dentro de uma perspectiva mais ampla dos
direitos civis dos cidadãos. (CURY, 2002a, p. 3)
A hisria da educação escolar mostra a busca pela construção de direitos
ligados à cidadania, o que me permite afirmar que esses processoso se
deram de forma linear e nem com a mesma intensidade em todos os países. O
direito à educação nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, de
uma forma especial na América Latina, eso ligados à evolução dos processos
políticos, econômicos, sociais, e ficaram comprometidos por regimes autoritários
e pelos interesses particulares das elites.
Cury avalia que
a realidade demonstra que o caminho europeu, no sentido das
conquistas de direitos consagrados em lei, nem sempre foi o mesmo
dos países que conheceram a dura realidade da colonização. E,
mesmo no meio dos países colonizados, ainda resta avaliar o impacto
sociocultural da colonização quando acompanhada de escravatura. A
conquista do direito à educão, nestes pses, além de mais lenta,
conviveu e convive ainda com imensas desigualdades sociais. Neles,
à desigualdade se soma a herança de preconceitos e de
discriminações étnicas e de gênero incompatíveis com os direitos
civis. Em muitos destes países, a formalização de conquistas sociais
33
em lei e em direito não chega a se efetivar por causa desses
constrangimentos herdados do passado e ainda presentes nas
sociedades. (CURY, 2002a, p. 9)
2.2 Breve histórico da educação brasileira
A hisria da educação no Brasil teve seu início com a Coroa Portuguesa,
comandada pela Igreja, mais precisamente pelos jesuítas. Ela tinha um caráter
catequético, seus princípios eram os valores religiosos. Apenas os filhos
homens dos grandes proprietários de terras tinham acesso à cultura. o havia,
portanto, uma preocupação com a educação escolar, e muito menos uma
política educacional no período colonial brasileiro.
No período imperial, a educação primária aparece pela primeira vez como
responsabilidade do Estado, mas apenas alguns cidadãos tinham acesso a essa
educação, escravos e mulheres eram excluídos. Foi a partir da Constituição de
1824 que os Direitos Civis e Poticos dos brasileiros começaram a ser
construídos. Nesse peodo, a educação escolar aparece como um direito dos
cidaos, mas cabe aqui apontar quem era considerado um cidadão, pois os
negros, considerados propriedade de outrem, não podiam ter acesso aos
bancos escolares. As mulheres, devido aos bitos hierárquicos do
mandonismo, tinham acesso muito limitado ao conhecimento, e, quando esse se
dava, dava-se no âmbito doméstico. Os o católicos, os padres enclausurados
e as mulhereso tinham direito ao voto, portanto, não eram considerados
cidaos. Apenas os homens brancos e de posses podiam votar e exercer
funções próprias da cidadania. As proncias eram responsáveis pelo ensino
primário, e, a corte, responvel pela educão das elites. Nesse período, era
muito forte a formação dentro de casa. As famílias cuidavam da formação livre
dos seus filhos, a formação calica também se destacava na educação dos
índios e nos colégios.
A Igreja Católica permanece, em todo esse período, como a grande
responvel pela educação. Nessa época, o ensino era ministrado em escolas
isoladas, igrejas, e até mesmo nas casas dos mestres, onde os alunos que
podiam pagar recebiam os ensinamentos.
34
O processo histórico do Brasil mostra que o acesso à educação
permaneceu por séculos um privilégio das classes mais ricas, enquanto as
classes mais pobres eram apenas catequizadas, transformadas em seres
obedientes aos mandos dos que estavam no poder, poder que, no seu início,
pertenceu aos colonizadores e que, mais tarde, seriam substituídos pelas elites
da República.
Com o Estado Republicano e a promulgação da Constituição de 1891, um
conjunto de mudanças políticas, econômicas sociais e culturais torna possível a
busca de um modelo educacional mais aberto no Brasil. Com a abolição da
escravatura, a instituição de um Estado Laico tornando leigo o ensino público,
permitindo a continuidade da oferta de uma educação privada no País, haveria
maiores oportunidades de acesso. O ensino primário tornou-se responsabilidade
dos Estados, e o ensino secundário e superior compencias compartilhadas
entre Estados e a União.
Surgem as escolas públicas, agora mantidas pelos Estados, que
lentamente o se espalhando por todo o território nacional. Com elas, intenta-
se o novo modelo educacional republicano de universalização da educação
popular. Surge a escola graduada, ou seja, a escola que chamamos de seriada,
que segmentou os tempos escolares, instituiu as disciplinas, criou a sistemática
de provas e exames como instrumento de avaliação para efeito de promoção ou
exclusão, e, por fim, os alunos são divididos em grupos homogêneos.
Após a Revolução de Trinta, o poder do Estado Nacional fortalece-se, e
ele vai se tornando intervencionista em rios campos da atividade social.
Nesse sentido, aparece pela primeira vez, no art. 5º, inciso XIV, a competência
privativa da União em “traçar as diretrizes da educação nacional. A educação
torna-se direito de todos e obrigação dos poderes públicos, inclusive com
financiamento obrigatório até para assegurar a gratuidade na obrigatoriedade.
Com o golpe que implanta no Brasil a ditadura do Estado Novo em 1937,
a educação sofre censura potica, a educação passa a reforçar dimensões
próprias de um adestramento, inculcando patriotismo, a disciplina moral, e
oferecendo um ensino destinado à formação técnica profissional aos filhos das
classes populares. Mas o Estado Novo também deu continuidade a algumas
garantias institucionais como a obrigatoriedade do ensino primário e certa
autonomia dos Estados na organização dos sistemas de ensino.
35
Em 1961, sob a égide da nova Constituição Federal, promulgada em
1946, foram aprovadas as Diretrizes de Bases da Educação Nacional, Lei n.
4.024/61. A primeira LDB estatui avanços importantes na educação, tais como:
dá mais autonomia aos óros estaduais, diminuindo a centralização do poder
no MEC; regulamenta a existência dos Conselhos Estaduais de Educação e do
Conselho Federal de Educação; garante então o empenho de 12% do
orçamento da União e 20% dos municípios com a educação; obrigatoriedade de
matrícula nos quatro anos do ensino primário; formação de professores para o
ensino primário no ensino normal de grau ginasial ou colegial, e de nível
superior para o ensino médio, e ano letivo de 180 dias.
Em 1964, as instituições democticas, mais uma vez, são golpeadas no
Brasil. Dessa vez, os militares tomam diretamente o poder e fazem profundas
mudanças na legislão, o que afeta, diretamente, a educação em que muitas
garantias constitucionais o suspensas. A educação é afetada, principalmente,
com a extinção da vinculação constitucional de recursos para a área a partir dos
impostos.
O Regime Militar estabeleceu, em 1971, a Lei n. 5.692 que tratava das
novas diretrizes e bases da educação nacional. A nova Lei tinha as seguintes
caractesticas: manter um núcleo comum obrigatório em âmbito nacional para o
currículo de 1º e 2º graus, e uma parte diversificada das necessidades e
possibilidades concretas, às peculiaridades locais, aos planos dos
estabelecimentos e às diferenças individuais dos alunos; inclusão da educação
moral e cívica, educação física, educação artística e programas de saúde como
matérias obrigatórias do currículo, am do ensino religioso facultativo; ano
letivo de 180 dias; ensino de grau obrigatório dos 7 aos 14 anos, cabendo
aos municípios a fiscalização direta; formação preferencial do professor para o
ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª ries, em habilitão específica no 2º grau e de
nível superior de graduação para professor para o ensino de 1º e 2º graus; os
recursos públicos, destinados à educão, seriam aplicados, preferencialmente,
na manutenção e desenvolvimento do ensino oficial; os municípios deviam
gastar 20% de seu orçamento com educação, não previa dotação oamentária
para a União ou os Estados. Foram muitos os decretos que, ao longo da história
do Brasil, modificaram os caminhos da educação, e, ainda no Regime Militar,
podemos citar a Lei n. 7.044 de 18 de outubro de 1982. Essa Lei altera
36
dispositivos da Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971, referentes à
profissionalização do ensino de 2º grau, de modo a que a profissionalização no
ensino de 2º grau deixasse de ser compulsória.
Com o fim da ditadura militar em 1984, o país começou o processo de
redemocratização das suas instituições. A Constituição de 1988 teve uma
significativa participação de educadores, o que garantiu avanços importantes na
garantias de direitos fundamentais, como a universalização e a melhoria da
qualdiade da educação nacional. A Constituição Federal estabelece garantias
fundamentais para a educação:
A educão, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaborão da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho. (CONSTITUÃO
FEDERAL, art. 205)
Os direitos à educação, reconhecidos em lei, vão ganhando força no
Brasil, a partir da década de 80. Segundo CURY (2005), será, pois, no
reconhecimento da educação como direito que a cidadania como capacidade de
alargar o horizonte da participação de todos nos destinos nacionais ganha
espaço na cena social(CURY, 2005, p. 21).
Em 1996, sob a égide da Constituição Federal de 1988, foi sancionada a
atual LDB (Lei 9394/96) pelo eno presidente Fernando Henrique Cardoso e
pelo então ministro da educação Paulo Renato de Souza, em 20 de dezembro
de 1996, tendo como fundamentos os seguintes principios e fins:
A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho (LDB, art. 2º).
O ensino será ministrado com base nos seguintes princípíos:
I. igualdade de condições para o acesso e permanência na
escola;
II. liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a
cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III. pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas;
37
IV. respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V. coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
VI. gratuidade do ensino público em estabelecimentos
oficiais;
VII. valorização do profissional da educação escolar;
VIII. geso democrática do ensino público, na forma desta
Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
IX. garantia de padrão de qualidade;
X. valorização da experiência extra-escolar;
XI. vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
práticas sociais.
Além dos princípios mencionados acima, a LDB de 1996 trouxe outras
mudanças em relação às leis anteriores, tais como: a autonomia pedagica e
administrativa das unidades escolares; ensino fundamental obrigatório e gratuito
para as pessoas de 07 a 14 anos; ampliação da carga horária mínima para 800
horas distribuídas em 200 dias na educação sica; previa um núcleo comum
para o currículo do ensino fundamental e dio e uma parte diversificada em
função das peculiaridades locais; formação de docentes para atuarem na
educação básica em curso de nível superior, sendo aceito para a educação
infantil e as quatro primeiras ries do ensino fundamental, formação em curso
Normal do ensino médio; formação dos especialistas da educação em curso
superior de pedagogia ou s-graduação. A Uno deveria gastar, no mínimo,
18%, e os estados e municípios, no mínimo, 25% de seus respectivos impostos
na manutenção e no desenvolvimento do ensino público; dinheiro blico pode
financiar escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas; prevê a criação
do Plano Nacional de Educação.
A atual legislação educacional brasileirao ignora os problemas que
sempre provocaram as desigualdades entre classes, e a excluo da maioria da
população ao acesso à informação. Pode-se afirmar que o país tem uma Lei que
garante igualdade de oportunidades entre os estudantes, uma Lei que propugna
o acesso à qualidade e a valorização profissional do docente. Mas, quando volto
meu olhar para a ptica, a realidade das escolas públicas por todas as partes
38
do país, vejo, com freqüência, o resultado de culos de descaso do poder
público com a educação.
As escolas blicas sofrem, em todos os estados do País, com a falta de
investimentos de infra-estrutura, recursos materiais e didáticos, qualificação dos
profissionais da educação e de salários mais justos. Am disso, a história da
educação no Brasil é marcada pelas desigualdades existentes no processo de
formação das crianças das classes ricas e das classes trabalhadoras, essas
últimas sempre ansiando por uma estrutura e uma oferta de qualidade. Um
modelo histórico, seletivo e elitista que ignora a realidade concreta dos grupos
sociais majoritários. Esse modelo reproduz interesses concretos das elites e
aumenta o abismo social entre os grupos sociais.
A reflexão que faço, aqui, é: a quem interessa esse modelo educacional
que forma uns em detrimento de muitos? Por que o fracasso escolar é muito
maior entre as classes populares do que nas classes mais favorecidas da
sociedade? Por que esse fracasso acontece em maior proporção em escolas
públicas de periferia e, justamente, onde carece de um maior investimento e
atenção por parte do poder público e dos professores?
A história da educação no Brasil mostra que o fracasso escolar, nas
camadas mais pobres da população, justamente onde o poder público deveria
intervir com mais recursos, é exatamente onde carece desses recursos. As
escolas, localizadas nas periferias das grandes cidades, carecem não só de
recursos financeiros, mas também de recursos humanos e de infra-estrutura
adequada ao bom aprendizado desses alunos. Demonstra, também, que os
professores procuram as “melhores escolas para se efetivarem, e que,
finalmente, o resultado final, que é a promoção dos alunos, demonstra um
índice maior nas escolas médias, deixando, portanto, a retenção maior por
conta das escolas periféricas.
A LDB de 1996, em seu art. 23, estabelece que as escolas tenham
autonomia para organizarem seus tempos e processos de aprendizagem. Os
educadores, incomodados com o fracasso do modelo seriado nas escolas
públicas, onde havia grande evasão e repetência, caracterizando a exclusão,
apresentaram alternativas, entre elas o projeto de ciclos de formação humana
que não visa apenas ao acúmulo de conhecimentos. O sistema em ciclos de
formação humana procurava organizar os tempos e espaços, saberes, as
39
experiências de socialização, enfim, a escola passava a ser pensada como um
espaço de encontro, do fazer educativo.
Uma proposta de construção de uma educação verdadeiramente
dialógica, capaz de transformar as relações entre professores e alunos em
sujeitos no processo de aprendizado, sem os equívocos da relação autoritária
ou assistencialista que invadiu o sistema seriado de ensino, ganha cada vez
mais espaço na educação brasileira, e Paulo Freire foi um dos grandes
responveis por esse processo. Segundo ele, “estudar não é um ato de
consumir idéias, mas de criá-las e recriá-las (FREIRE, 2006a, p. 13).
E o autor continua mais adiante:
aprender a ler e escrever se faz assim uma oportunidade para que
mulheres e homens percebam e que realmente significa dizer a
palavra: um comportamento humano que envolve ão e reflexão.
Dizer a palavra, em um sentido verdadeiro, é o direito de expressar-se
e expressar o mundo, de criar e recriar, de decidir, de optar. Como tal,
não é o privilégio de uns poucos com que silenciam as maiorias. É
exatamente por isso que, numa sociedade de classes, seja
fundamental à classe dominante estimular o que vimos chamando de
cultura do silêncio, em que as classes dominadas se acham
semimudas ou mudas, proibidas de expressar-se autenticamente,
proibidas de ser. (FREIRE, 2006a, p. 59)
Assim, pretendi evidenciar que as relações de poder existentes entre
professor e aluno, ao longo da história da educação nacional, tiveram uma forte
expressão de autoritarismo, pois uma educação assimétrica é uma educão
em que prevalece o comando sobre o dlogo, o autoritarismo sobre uma
relação diagica. É um grande desafio para uma educação que sempre
legitimou as desigualdades sociais e econômicas, construir um processo de
construção do conhecimento que seja mais justo com os alunos das camadas
populares, estabelecer uma relação dialógica é um desafio num país marcado
pela legitimação constante das desigualdades.
No Estado de Minas Gerais, os direitos fundamentais relacionados à
educação estão previstos na Constituição Estadual promulgada em 1989. Ela
assegura conquistas importantes que merecem aqui um destaque especial
explicitados nos arts. 195 e 196 onde citarei apenas alguns dos XI princípios
estabelecidos:
Art. 195 - A educação, direito de todos, dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, com vistas ao
40
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho.
Art. 196 - O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e freência à escola e permanência
nela;
II - liberdade de aprender, ensinar e pesquisar, e de divulgar o pensamento, a
arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções filosóficas, políticas, estéticas,
religiosas e pedagógicas, que conduza o educando à formação de uma postura
ética e social próprias;
IV - preservação dos valores educacionais regionais e locais;
V - gratuidade do ensino público;
VI - valorização dos profissionais do ensino, com a garantia, na forma da lei, de
plano de carreira para o magistério público, com piso de vencimento profissional
e com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos,
realizado periodicamente, sob o regime jurídico único adotado pelo Estado para
seus servidores;
VII - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
X - garantia do padrão de qualidade, mediante:
a) avaliação cooperativa periódica por órgão próprio do sistema educacional,
pelo corpo docente e pelos responsáveis pelos alunos;
b) condições para reciclagem periódica pelos profissionais de ensino;
Parágrafo único - A gratuidade do ensino a cargo do Estado inclui a de todo o
material escolar e a da alimentação do educando, quando na escola.
Conhecer e reconhecer o processo histórico da educação no Brasil é um
compromisso que deve ser assumido por todos os agentes envolvidos com ela,
ou seja, alunos, pais, a comunidade e, principalmente, os educadores que não
podem se acomodar com as conquistas já alcançadas e, menos ainda, se
conformar com as coisas como estão. São muitos os desafios, como: a melhoria
na qualidade da educação no processo ensino aprendizado, investimentos no
patrimônio físico das escolas públicas, valorização dos profissionais da
educação, investimentos sociais para diminuir as desigualdades dando
41
dignidade as famílias para garantir os filhos na escola. Portanto, o processo de
emancipação da educação brasileira já alcançou muito no que diz respeito à Lei,
mas a efetivação da Lei na vida prática das escolas públicas educacionais ainda
deixa a desejar. um longo caminho para a emancipação de todas as crianças
brasileiras na construção de sua cidadania.
Procurei assinalar alguns elementos ligados ao processo histórico do
ponto de vista do direito à educação, pois esse é o meu foco principal: tratar das
relações de poder, e este, quando configurado em Lei, torna-se direito, torna-se
dever, é letimo. A Lei garante poderes aos professores para ensinar e aos
alunos para aprender; ela imprime poderes específicos a cada um dos agentes
que participam da construção dos saberes necessários à cidadania. Uma vez
garantidos em Lei, o direito e o dever de ensinar, de construir cidadania, resta-
nos saber se esse direito é respeitado e vivido nas inúmeras escolas blicas
de periferia espalhadas pelo território brasileiro.
De acordo com CURY (2005),
se considerarmos que a educação é constituinte da dignidade da
pessoa humana e elemento fundante da democratização das
sociedades, se considerarmos o quanto educadores e educadoras se
emprenharam em prol da educação como direito, se considerarmos a
importância da Constituição como pacto fundante da coexistência
social, certamente o capítulo da educão na nossa atual Constituição
é avançado e contém bases e horizontes pra uma vertente processual
de alargamento da cidadania e dos direitos humanos (CURY, 2005, p.
28).
2.3 Breve histórico de Betim - MG
Esta pesquisa foi realizada dentro do município de Betim, cidade
localizada na zona metalúrgica, Região Metropolitana de Belo Horizonte, a 26
km da capital. A história do município começa a ser escrita a partir de 1711,
quando Joseph Rodrigues Betim escreveu à coroa portuguesa, fazendo uma
petição de doação de carta de sesmaria situada na bacia do Ribeio Betim.
Em 1889, com as reformas do regime republicano, surgiu o Estado de
Minas Gerais, antes Proncia, com 11 grandes municípios. Um deles era o
município de Santa Quitéria, atual Esmeraldas, formado pelos terrenos de
42
Capela Nova de Betim, Contagem e Várzea Pantana. Capela Nova de Betim se
tornaria, em 1801, um distrito do município de Santa Quitéria. E, por fim, em
1938, ocorre uma nova reforma político-administrativa no Estado de Minas
Gerais, onde são criados 71 municípios, através do decreto do governador
Benedito Valladares Ribeiro. Nessa reforma, Betim passa à condição de
município.
Na década de 1930, foi criada no município de Betim, quando ainda era
distrito de Santa Quiria (Esmeraldas), a Colônia Santa Isabel, destinada ao
tratamento da hanseníase. Sua administração ficou aos cuidados da Fundação
Hospitalar de Minas Gerais FHEMIG. O local afastado da vida urbana tinha o
propósito de isolar os doentes do convio social, evitando o congio da
doença. Na cada de 1980, a Colônia foi aberta para a formação de moradia
de funcionários, familiares dos doentes, transformando mesma em um bairro,
embora o preconceito e a discriminação dos doentes e até mesmo com relação
aos moradores do bairro sempre ficou muito evidente. A Colônia Santa Isabel
atende hoje 420 hansenianos e conta com melhorias na sua infra-estrutura,
como escolas, posto de saúde, comércio local, etc.
Em 1947, foi instalada, no município, a mara de Vereadores, com nove
parlamentares. Seu primeiro presidente foi Luiz da Cunha. Logo no ano
seguinte, em 1948, os vereadores deram posse ao primeiro prefeito eleito,
Sylvio Lobo, pois, até eno, os prefeitos eram nomeados pelo governador do
estado. A mara de Vereadores de Betim encontra-se hoje na 15ª legislatura e
é composta por 16 vereadores.
No início do século XX, o município é cortado pela construção da ferrovia
que ligava Belo Horizonte a Divinópolis. Isso iria contribuir para o crescimento
do comércio e da indústria na região. A economia do munipio era
principalmente agropecuária, até a década de 1940, data da instalação das
primeiras indústrias.
Com a valorização da Região Metropolitana e com o início da construção
do distrito industrial de Contagem, e, posteriormente, de Betim, o município é
beneficiado, na década de 1950, pela implantação de uma rede de rodovias
federais como a Fernão Dias, BR 381, que liga ts regiões importantes do País.
Ela inicia no município de São Mateus no Estado do Espírito Santo, corta o
Estado de Minas Gerais, passando por Belo Horizonte e Betim, terminando na
43
cidade de São Paulo. A BR 262, que começa em Vitória, no Espírito Santo,
passa por cidades importantes de Minas Gerais, como Belo Horizonte, Betim,
Uberaba e termina no estado do Mato Grosso do Sul, a BR 040 seu ponto inicial
fica na cidade de Brasília (DF), e o final, no Rio de Janeiro (RJ). Passa pelos
estados de Goiás, Minas Gerais (Sete Lagoas, Belo Horizonte, Betim, Juiz de
Fora, etc.) e Rio de Janeiro, também servem ao município as rodovias MG 060 e
MG 050.
Segundo a professora e pesquisadora Teresinha Assis, a cidade de
Betim, até meados da década de 1960, foi uma cidadezinha do interior com
caractesticas próprias de um lugarejo onde todas as pessoas se conheciam;
os pontos de encontro das famílias eram a igreja católica, os campos de futebol
e a praça Tiradentes e a antiga matriz de Nossa Senhora do Carmo, que estava
edificada na praça Milton Campos. Lá era o lugar de grandes festas religiosas: a
semana santa, a festa do Divino, a festa da padroeira, Nossa Senhora do
Carmo, além das missas dominicais que reuniam todas as famílias da cidade.
Os campos de futebol dos clubes: Vera Cruz, onde hoje está construída a
escola Clóvis Salgado, e Industrial, que ficava na margem esquerda do rio
Betim, próximo da ponte da ferrovia, no fundo da Cerâmica Saffran. Os times
dividiam as pessoas em dois grupos ou duas torcidas rivais e apaixonadas. A do
Industrial era considerada mais popular e a do Vera Cruz que era considerada
de elite. A praça Tiradentes era o local onde funcionava o cinema, a sede social
do Clube Industrial e ponto de encontro da juventude, principalmente nos finais
de semana. Depois da missa as pessoas se dirigiam para a praça, alguns iam
ao cinema e outros iam para as tradicionais horas dançantes dos clubes. A vida
na cidade era pacata e tranila. As crianças brincavam pelas ruas durante o
dia e ficavam até o anoitecer. Havia poucos carros circulando pelas ruas; a
prioridade do espaço público era para o pedestre.
A partir de meados da mesma década, alguns fatos começaram a mudar
os rumos da pequena cidade. Um planejamento estatal que ocorreu na União e
no Estado de Minas Gerais procurou atrair indústrias para se instalarem no
Estado. Foi neste contexto que veio para Betim a Refinaria Gabriel Passos que
começou a ser construída em meados da década de 1960, e foi inaugurada em
1968. Durante a cada de 1970, a cidade consolidou sua vocação industrial
com um novo planejamento do Estado para instalar distritos industriais na
44
Região Metropolitana. Em Betim, foi instalado o principal Distrito Industrial, o
Paulo Camilo Pena”, que fica na região do PTB. A partir de meados dessa
década, a cidade passou a sofrer profundas transformações em seu tecido
urbano. O afluxo de migrantes era constante, a expansão urbana transformava
rias fazendas em bairros populares, muitos terrenos eram invadidos, dando
origem às vilas e favelas. A cidade cresceu, principalmente, no eixo leste,
próximo da área que estavam se instalando as indústrias. A região do
Terepolis foi a primeira que se transformou rapidamente, devido à invasão
dos terrenos próximos da rodovia. Ali surgiam barracos da noite para o dia,
criando vilas e favelas com alta densidade demográfica. Muitos terrenos que
estavam aprovados como loteamentos, sem nenhuma infra-estrutura, foram
rapidamente vendidos para imigrantes que estavam vindo na esperança de uma
nova terra prometida. A partir da segunda metade da década de 1970, algumas
grandes indústrias multinacionais começaram a se instalar em Betim. Nesse
período, a principal empresa instalada que colocou seu produto no mercado
brasileiro foi à montadora Fiat Automóveis. Nos anos que se seguiram, a cidade
passou por uma verdadeira explosão demogfica e urbana. Betim deixou de ser
uma cidadezinha do interior e passou a integrar, efetivamente, a Região
Metropolitana de Belo Horizonte. Essa mudança trouxe também os grandes
problemas sociais e urbanos.
Com uma localização privilegiada, o munipio tem uma história marcada
pela crescente instalação de indústrias, a partir da década de 1940, as
indústrias de Cemicas e posteriormente de sabão, curtume, móveis, biscoitos,
confecções, asfalto. E hoje, o município de Betim é considerado um dos
principaislos de concentração industrial do Estado de Minas Gerais, com
destaque para a implantação da Refinaria Gabriel Passos, da Petrobrás, em
1968, e a Fiat Automóveis S/A em 1976. O Sao do Encontro, que foi criado em
1971 por Frei Estanislau e Noemi Gontijo, uma indústria artesanal de tecelagem,
carpintaria, cerâmica e móveis sticos que oferece educação e trabalho para a
comunidade, uma importante obra de assistência social do município onde
crianças aprendem o cognitivo, a arte e a socialização e os adultos criam a arte
nas peças produzidas.
Betim faz fronteira com os municípios de Contagem, Ibirité, Juatuba,
Mário Campos, Sarzedo, Igarapé, o Joaquim de Bicas e Esmeraldas. Sua
45
extensão territorial é de 346,8 km
2
. Sua população aproxima-se de 412.000
habitantes (IBGE, 2006), e tem hoje uma dia anual de crescimento
populacional de 7,78%. Esse crescimento atrai muitos olhares e pessoas em
busca de emprego. O grande crescimento populacional é inferior à oferta de
empregos que vem acompanhado dos problemas e desafios das grandes
cidades. Crescem as periferias, as desigualdades sociais, as favelas, tornando
Betim um dos municípios com maior índice de vioncia de Minas Gerais.
A história de Betim é marcada pela fé de seu povo, desde as suas
origens. Em 1753, moradores ergueram uma capela nas margens do Rio Betim
e a chamaram de Capela Nova de Betim. A capela pertencia à paróquia do
Curral d’El-Rei. Em 1773, os moradores da região ganham licença para
construir uma nova capela que seria inaugurada em 1735, e receberia o nome
de Santa Quitéria. Em 1754, iniciam a nova construção da nova Capela Nova de
Betim, que esperaria mais de 50 anos para ser inaugurada. A primeira paquia
é instituída em 1851, e seu primeiro vigário foi o padre Manoel Roberto da Silva
Diniz.
O município faz parte da Arquidiocese de Belo Horizonte, e está dividido
em 17 paquias, com destaque para os mais antigos centros católicos, como as
igrejas: Nossa Senhora do Carmo, São Francisco e a Igrejinha do Rosário,
construída para atender a religiosidade negra no município. Somente em
meados do século XX é que outras denominações religiosas ganham espo em
Betim: a Igreja Metodista em 1962, a Igreja Batista em 1966, a Igreja
Presbiteriana em 1967, a Igreja Adventista do 7º dia em 1976, a Igreja do
Evangelho Quadrangular em 1973, e muitas outras que vieram posteriormente.
O seu comércio é muito influente na Região Metropolitana, principalmente
com os pequenos municípios vizinhos. Betim conta com uma rede de comércio
atacadista e varejista que chega a 2000 estabelecimentos comerciais. Destaco
o Mercado Municipal de Betim e o Betim Shopping, que atendem a comunidade
local.
O município também se destaca na cultura e lazer. A barragem Várzea
das Flores que possui um grande espelho dágua e uma bela natureza, que é
freentada pela comunidade local; a fazenda Vale Verde que, além de ser uma
importante indústria de aguardente, possui um parque ecológico preocupado
com a preservação de espécies ameaçadas de extinção; a Casa de Cultura
46
destaca-se pela construção colonial e principalmente porque é um importante
centro de apoio às manifestações artísticas e culturais de Betim, o Parque de
Exposições David Gonçalves Lara que realiza, entre outros dois grandes
eventos culturais, que são o Betim Rural e a Feira da Paz e o Centro
Poliesportivo Divino Braga, que recebe grandes eventos esportivos nacionais e
internacionais.
2.4 Breve histórico da educação de Betim
O primeiro grupo escolar criado em Betim é datado de 1910, quando
Betim ainda era um distrito de Santa Quitéria, e recebeu o nome de grupo
escolar Conselheiro Afonso Pena. O prédio era uma construção modesta,
composta por apenas quatro salas, um gabinete, dois alpendres e banheiros.
Nos primeiros meses de funcionamento, o grupo escolar recebeu 216 alunos
que cursavam as primeiras séries do ensino fundamental. Com a construção do
novo prédio, a Escola Estadual Conselheiro Afonso Pena funciona em outro
prédio. Em 1963, o prédio torna-se sede do Colégio Comercial Betinense. Hoje
o pdio foi restaurado e deu lugar ao Museu Municipal Paulo Araújo Moreira
Gontijo.
As escolas que atendiam as crianças na área urbana eram de 1ª à 4ª
séries, e se restringiam a poucos estabelecimentos, dentre eles o Grupo Escolar
Clóvis Salgado”, O Grupo Escolar Dr. Silvio Lobo, O Grupo Escolar
Conselheiro Afonso Pena. Todos da rede estadual de ensino. Na área rural,
existiam algumas escolas espalhadas por pequenos lugarejos, que eram da
rede municipal. Naquela época, a área rural era muito maior, porque a área
urbana restringia-se ao que hoje é o centro comercial, com alguns bairros no
seu entorno.
As criaas tinham muitas dificuldades em continuar seus estudos, após a
4ª série, porque não havia escola pública além deste nível de ensino. Quem
conseguiu estudar foi no antigo Ginásio Nossa Senhora do Carmo, que
começou a funcionar no início da década de 1960, e era particular. Algumas
poucas pessoas iam para Belo Horizonte ou Ibirité, que tinha uma escola normal
47
onde as alunas ficavam em internato. Até aquele momento, os professores que
ensinavam na cidade, estudavam fora de Betim, porque o ensino ali restringia-
se ao curso primário.
Atras das pesquisas realizadas pela professora Teresinha Assis, pude
perceber que a cidade de Betim tem uma história curta de ensino de 5ª à 8ª
séries e 2º grau. O primeiro curso ginasial da cidade foi implantado pelo
professor Vicente de Almeida Barbosa e sua esposa Amélia Santana Barbosa.
O primeiro ano de funcionamento foi 1958, de forma itinerante Os primeiros
alunos a se formarem, num curso ginasial em Betim, foram os desse curso do
professor Vicente. O antigo Ginásio Nossa Senhora do Carmo, que funcionou no
prédio do CETAP (Centro de Treinamento de Professores de Artes Pticas), a
partir do ano de 1960, deu continuidade a esse nível de ensino. Os primeiros
jovens que tiveram a oportunidade de estudar, além da 4ªrie, na cidade,
foram matriculados no referido curso, e, segundo relatos, muito felizes de serem
os primeiros a terem oportunidade de continuarem seus estudos, mesmo sendo
em cursos pagos e escola particular, o que excluía muita gente dos estudos.
O prédio do CETAP, local onde atualmente funciona uma escola
municipal, uma oficina escola que produz carteiras para toda a rede municipal
de ensino, a biblioteca pública, e rios outros órgãos ligados à Prefeitura
Municipal de Betim. Ele foi construído no final da década de 1950, num terreno
doado pela prefeitura através da lei número 250, de 28 de novembro de 1957,
na gestão do prefeito Raul Saraiva Ribeiro. A beneficiária da doação foi uma
entidade religiosa sediada na cidade de Lagoa Santa, cujo nome era Legião dos
Oblatos de Cristo Sacerdote e Nossa Senhora das Virias. O reitor da entidade
era o padre Januário Baleeiro de Jesus e Silva. Um ano depois, 28/11/1958, foi
firmado um connio entre a entidade e o MEC (Ministério da Educação e
Cultura), na gestão do ministro Cvis Salgado, para a construção de uma
escola industrial que deveria ser concluída em 24 meses. O convênio
assegurava o repasse de recursos financeiros, do órgão federal, para a entidade
construir o prédio, comprar o maquinário e móveis, equipar e colocar em
funcionamento uma escola avançada voltada para o setor secunrio da
economia.
Um suntuoso prédio foi erguido na região do Angola, pximo à praça do
Óleo, local simlico da cidade onde havia uma imensa árvore, cuja copa
48
redonda formava um telhado verde sobre a praça. A área construída do prédio
era de 5.254,70 metros quadrados, distribuídos em seis pavilhões. A construção
foi edificada numa vertente de um morro arredondado de declividade suave. A
topografia do local contribuiu para destacar ainda mais o prédio que, à sua
volta, só tinha casas baixas. A inauguração foi no dia 28 de janeiro de 1960.
Nessa época, deveria iniciar o funcionamento de uma escola destinada à
formação de professores de artes práticas. Foi daí o nome de CETAP. Logo
após a inauguração, o curso que começou a funcionar foi o ginasial, atual à
8ª séries ou 3º ciclo, que funcionou até o ano de 1964.
Em 1965, foi inaugurado oficialmente o CETAP, com a finalidade de
formar professores em licenciatura em grau. No período de funcionamento, o
CETAP preparou professores para todo o País. Hoje o CETAP é o Centro
Educacional Técnico e Artes Profissionais e atende alunos de todo o ensino
básico (ensinos fundamental e médio). No mesmo prédio, funciona a Biblioteca
Pública Municipal e a Oficina Escola Rosalino Felipe que atende alunos das
Escolas Municipais e Estaduais na faixa etária de 13 a 17 anos para receber
orientações pedagógicas, esportivas e aprenderem um ofício de serralheria e
carpintaria, onde é reformada grande parte do mobiliário das pprias escolas
do município.
No dia 6 de maio de 1965, o novo colégio, hoje denominado de Escola
Estadual Amélia Santana Barbosa, iniciou suas atividades com alunos do antigo
curso ginasial, atualmente 5ª à 8ª séries ou 3º ciclo; curso Normal, destinado a
formar professoras para trabalhar com alunos de 1ª à 4ª séries. E, por fim, foi
criado o curso Científico. Esse, equivalente ao grau ou ensino médio atuais.
Ele se destinava a preparar os alunos para ingressar na universidade.
O Governo do Estado iniciou uma política de municipalização do ensino,
na década de 1990, a proposta, na época, foi de passar para a responsabilidade
dos municípios o ensino de 1ª à 8ª ries. Nesse período, a Secretária
Municipal de Educação discutiu com o governo estadual a ampliação de vagas
para esse nível de ensino, mas, em contrapartida, o Estado ampliaria as vagas
para o ensinodio. Esse acordo garantiria que as escolas do estadoo
ficassem ociosas e atendessem a uma grande demanda de vagas que existia na
cidade. Várias escolas estaduais implantaram o ensino médio e mandaram seus
alunos do ensino fundamental para as escolas municipais. Muitos bairros
49
distantes passaram a ter escolas com ensino médio. Anteriormente, elas
estavam mais concentradas nos bairros mais próximos do centro da cidade.
Betim, ainda hoje, sofre com o forte crescimento populacional que exige
da Secretaria Municipal de Educação uma constante ampliação de sua rede de
escolas, que hoje conta com 67 unidades de ensino fundamental, sendo que
quatro delas também oferecem ensinodio e profissional. Em 2006 foram
matriculados, somente na Rede Municipal de Ensino, 51.269, a média salarial
dos professores PII que atendem as turmas do último ano do ensino
fundamental é de 20,24 h/a, o que pode ser variável dependendo da progreso
do PCCV (Plano de Cargos, Carreira e Vencimentos) (Fonte: SEMED Secretaria
Municipal de Educação). A rede estadual de educação, com 30 escolas
estaduais, atendem, principalmente, o ensino médio. O município conta,
tamm, com um conjunto de escolas particulares e uma grande estrutura de
ensino superior, sendo destaque para a Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais (PUC-Minas), a Universidade Vale de Rio Verde de Ts Corações
(UninCor) e A Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC).
A Lei Ornica do Município de Betim, promulgada em 21 de março de
1990, no seu Capítulo Sobre a Educação, no art. 150, estabelece alguns
princípios para gerir a educação. Entre eles podemos destacar:
- Gestão democtica do ensino público.
- Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.
- Liberdade de aprender, ensinar e pesquisar, e de divulgar o pensamento,
a arte e o saber.
- Pluralismo de idéias e de concepções filosóficas, políticas, estéticas,
religiosas e pedagicas, que conduza o educando à formação de uma
postura ética e social pprias.
A rede municipal de educação de Betim tem um único regimento para
todas as escolas do município. Esse regimento tem como finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. Com relação ao ensino fundamental, ele tem os
seguintes objetivos:
50
- desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o
pleno domínio da leitura, da escrita e do lculo;
- a compreeno do ambiente natural e social, do sistema potico, da
tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
- desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição
de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;
- fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e
de tolerância recíproca em que se assenta a vida social.
Em Betim, os ciclos de formação humana vêm sendo implantados
gradativamente. Em 1993, o município passa a ser administrado pelo PT
(Partido dos Trabalhadores). A prefeita Maria do Carmo Lara Perpétuo procurou
construir uma nova política pedagica no município. Nesse período,
importantes educadores foram convidados para conferências e palestras, dentre
eles: Paulo Freire, Miguel Arroyo, Ester Grossi e Cipriano Luckesi. O objetivo
era construir, junto aos educadores, uma nova proposta de educação para o
município. Em 1997, toma posse o prefeito Jésus Mário de Almeida Lima
tamm do PT, dando continuidade ao processo de mudanças na Rede
Municipal de Educação de Betim. No dia 02 de fevereiro de 1998 é assinada a
Resolução SEED (Sigla adotada pela Secretaria Municipal de Educação de Betim
em 1998) n. 01/98, pelo então secretário de educação, convertendo a seriação
em ciclos de ensino/aprendizagem em regime de progressão continuada, com
implantação gradativa. Esse projeto tem como meta assegurar condões para o
desenvolvimento integral da pessoa, em suas múltiplas dimensões, visando ao
pleno exercício da cidadania, com garantia de acesso, permanência e qualidade
escolar e educacional para todos, dever do Estado e da família, em co-
responsabilidade com a sociedade. (Betim, 2007, p. 84-85)
Este salto político pedagógico exprime, em última análise toda uma
dinâmica histórica de ruptura/continuidade que, ultrapassando o
racionalismo e o empirismo subjacentes aos modelos tradicionais de
pedagogia, conduz ao reordenamento dos processos de
ensino/aprendizagem, à luz de novos paradigmas ético-científicos, de
natureza construtiva, e democrática. (BETIM, 1998a, p. 2)
Nesse contexto, são desenvolvidas jornadas pedagógicas de
atualização profissional dos trabalhadores em educação. São também
reformulados os preceitos jurídicos relativos à estrutura e ao
51
funcionamento da educação municipal, e aos cargos, carreiras,
vencimentos e valorização dos profissionais da educão. Algumas
ações decorrentes foram: implantação de processos de eleições
diretas de diretores, vice-diretores e colegiados; reorientação da
metodologia de trabalho em sala de aula,a luz dos princípios da
democracia, da teoria construtivista e de suas matrizes; elaboração
de propostas curriculares por disciplina; instauração gradual da
avaliação qualitativa processual do ensino e da aprendizagem;
construção de formas de atualização teórica e prática, como grupos de
estudo, frentes de trabalho e cursos. (BETIM, 1998a, p. 7)
Em 2001, a Prefeitura muda de mãos. É eleito Carlaile Jesus Pedrosa, do
PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), que é reeleito em 2004.
Contudo, a proposta pedagógica dos ciclos teve continuidade no município, e o
processo de substituição do modelo seriado para os ciclos continua, com o
apoio da maioria dos educadores.
Sendo assim, o processo de mudança para ciclos foi gradativo, iniciando,
em 1998, para alunos de 6, 7 e 8 anos. Em 1999, para os alunos com 9 anos, e
em 2000, para alunos de 10 anos. Em 2001, completou-se a implantação total
do segundo ciclo em todas escolas e deu-se a implantação do terceiro ciclo em
26 escolas. Em 2002, ocorreu a implantação facultativa do terceiro ciclo,
condicionada à disponibilidade dos profissionais para o cumprimento da carga
horária semanal de 24 horas/aula. Em 2003 ainda havia escolas com estrutura
seriada em Betim, com alunos de 12, 13, e 14 anos. Somente no final de 2004,
através do Decreto n. 20.316, de 16 de dezembro de 2004, extinguiu-se o
sistema de seriação anual nas escolas municipais, mesmo naquelas em que se
havia optado pela manutenção do sistema seriado, e depois se estendendo a
todas as turmas do ensino fundamental. Uma das conquistas dos professores foi
o coeficiente de 1,3 professores por turma de alunos, contribuem para uma
formação e planejamento maior por parte dos educadores. (Betim, 2007, p. 90-
91)
Hoje, o ensino fundamental que é de nove anos, no município de Betim
está totalmente estruturado em ciclos de formação humana, que se dividem em
quatro etapas de ciclos, a saber:
a. 1º ciclo 6, 7 e 8 anos.
b. 2º ciclo 9 e 10 anos.
c. 3º ciclo 11 e 12 anos.
52
d. 4º ciclo 13 e 14 anos.
Organizar a Educação Básica Fundamental por ciclos, em sua
fundamentação significa romper com a fragmentação do saber e alargar os
tempos de aprendizagem, possibilitando a convivência com a diversidade e até
mesmo com a singularidade de cada aluno. Hoje, depois de dez anos em que o
ciclo de formação humana foi implantado no município, volto meu olhar para as
relações entre professor/aluno, numa tentativa de observar o quanto esse
processo de formação contribuiu para a democratização dessas relações.
A escola pública de periferia, que abriga os alunos oriundos das camadas
mais pobres da sociedade, precisa ser repensada, a fim de oferecer uma
formação humana que promova a emancipação desse aluno. A lógica perversa
e excludente do sistema escolar precisa ser reestruturada. É preciso entender
que a qualidade de um projeto de educação é definida por um conjunto de
fatores: condições de trabalho, estrutura física, sarios, material pedagico,
formação continuada dos profissionais, investimentos por parte do poder
público, acompanhamento dos pais, motivação por parte dos alunos que
vislumbram da escola seu futuro acadêmico e profissional.
2.5 - Breve histórico da Escola Municipal Capela Nova de Betim
Esta pesquisa foi realizada em uma Escola Municipal, localizada no bairro
Taquaril, um bairro de periferia pximo do centro, zona urbana de Betim MG.
Os moradores, na sua maioria oriunda das classes trabalhadoras, são
funciorios das indústrias, funcionários públicos, construção civil, empregadas
domésticas, trabalhadores autônomos, trabalhadores do comércio e outros
existentes nas redondezas. O bairro possui boa infra-estrutura, grande parte das
ruas é asfaltada, possui energia elétrica, água e esgoto, erias linhas de
ônibus que levam ao centro de Betim e à estação do metrô, no Eldorado, em
Contagem.
Em uma consulta, autorizada pelo diretor da escola, observei os históricos
escolares dos alunos pesquisados. Ali, pude observar o baixo grau de
53
escolaridade dos pais. Apenas um pai entre 168 consultados possui curso
superior, 11 possuem o ensino dio completo e dois incompletos, 28 possuem
o ensino fundamental completo e 36 incompletos, 31 pais estudaram até a 4ª
série do ensino fundamental e 14 deixaram de estudar antes de completarem a
4ª série. Esses pais foram vítimas de uma educação excludente que marcou a
história da educação no Brasil, e motivos não faltaram para justificar a ausência
de escolaridade: falta de oportunidades, falta de condições financeiras, falta de
vagas nas escolas, freqüentes reprovações, necessidade de trabalhar para
ajudar a família, abandono por sucessivas notas baixas e intolerância de
professores. Uma hisria que certamente esses pais desejam que permaneçam
no passado e não se repitam com seus filhos e filhas.
Para preservar a identidade da escola e de meus entrevistados, criei um
nome fantasia para a escola, homenageando a cidade, pois esse foi o primeiro
nome dado a essas terras e confirmado na sua elevação a Distrito Capela Nova
de Betim. A construção da escola foi uma conquista da comunidade através do
Orçamento Participativo, e as obras começaram em 1994. A escola foi
instituída pelo Decreto Municipal n. 11.587/95, de 14/03/1995, para atender a
demanda escolar do bairro e adjancias. O pdio, de construção moderna,
conta com uma excelente estrutura composta por 14 salas de aula, laboratório,
biblioteca, área administrativa, quadra poliesportiva coberta, refeitório e demais
depenncias. A escola recebeu, em 2007, uma média mensal de 6.300,00 da
Secretaria Municipal de Educação para a manutenção de gastos, como: luz,
água, telefone, material de limpeza e material pedagico.
A Escola Municipal Capela Nova atende hoje toda a demanda de alunos
dos nove anos do ensino fundamental, e, ainda, o ensino noturno para jovens e
adultos do bairro e de toda a região próxima à sua localização. Em 2007, a
escola contavas com um efetivo de 91 funcionários sendo 35 somente no
primeiro turno, nos três turnos foram matriculados 945 alunos sendo 356 apenas
no primeiro turno. O diretor e as duas vices-diretoras foram eleitos pelo voto
universal de funcionários, alunos acima de 11 anos, e pais, para um mandato de
dois anos, podendo se reeleger por mais um mandato. Eles, a secretária e a
tesoureira cumprem uma carga horia semanal de 40 horas; as agentes de
serviços gerais (cantineiras) cumprem uma carga horia semanal de 30 horas,
as auxiliares de biblioteca e secretária cumprem uma carga horária de 20 horas
54
semanais, e os professores cumprem uma carga horária semanal de 24 horas/
aula, distribuídas em sala de aula, momentos de estudo e atendimentos a
pequenos grupos. Esta pesquisa é realizada com oito professores que atendem
seis turmas, dentre elas as três turmas do último ano do ensino fundamental
que tamm são objetos de desta pesquisa.
A pesquisa foi realizada com três turmas do último ano do ensino
fundamental do primeiro turno da Escola Municipal Capela Nova, e posso
constatar que a grande maioria dos 86 alunos pesquisados o são naturais de
Betim. Trinta e dois alunos são naturais de Contagem, 22 de Belo Horizonte,
oito de Esmeraldas, 12 de outras cidades do Estado de Minas Gerais, dois de
outros Estados do Brasil e apenas sete alunos são naturais de Betim.
Portanto, os alunos pesquisados o oriundos de famílias que vieram de
outras cidades e regiões para Betim, provavelmente em busca de trabalho e
condições melhores de vida. Pessoas que vieram, atraídas pelo grande lo
industrial que representa o município trazendo na bagagem os sonhos da
grande maioria dos brasileiros, condições dignas de sobrevincia.
O que pretendo, com toda essa contextualização histórica, é participar
das experiências de um grupo de pessoas inserido no processo educacional
público brasileiro. Meu olhar atento volta-se para a prática concreta de
educadores no processo de ensino aprendizado. Será que os direitos garantidos
pela Constituição Federal e pela LDB, em 1996, estão presentes de forma
concreta nas experiências aqui pesquisadas? Nossos professores m
condições de trabalho, eles ganham um salário justo? As condições gerais da
escola contribuem para uma formação digna desses alunos, os processos
pedagógicos são verdadeiramente democráticos e as relações entre professores
e alunos são realmente emancipadoras?
Esta pesquisa não tem a pretensão de dar respostas prontas; ela tem o
desejo de refletir a educação brasileira a partir de uma experiência concreta,
inserida dentro da realidade da educação pública do país. Pode ser vista como
mais um contributo para que a gestão da educação pública em Betim a
considere em vista de uma maior democratização da escola blica. Meu olhar
volta-se para a garantia de direitos que, segundo BOBBIO (2004),
55
A existência de um direito, seja em sentido forte ou fraco, implica
sempre a existência de um sistema normativo, onde por existência
deve entender-se tanto o mero fator exterior de um direito histórico ou
vigente quanto o reconhecimento de um conjunto de normas como
guia da própria ão. A figura do direito tem como correlato a figura da
obrigação. (BOBBIO, 2004, p. 94)
Conforme já citado, a atual legislação educacional brasileira trouxe,
depois de toda uma história marcada pela exclusão, garantias fundamentais
para a formação das classes populares. O desafio é perceber se, na prática do
Município de Betim, nessa escola, tem havido, por parte dos gestores
educacionais e dos educadores, ões emancipatórias capazes de formar
cidaos críticos tendo também como inerente a essa realidade uma herança de
uma educação seletiva, classista e preconceituosa.
56
3 PODER, CULTURA E PRÁTICAS CURRICULARES
Este trabalho tem como tema central as relações de poder entre
professores e alunos no interior da escola. Essas relações eso inseridas em
um contexto social específico, com seus avanços e contradições, seus valores,
a diversidade cultural, a pluralidade de expressões políticas, sociais, religiosas,
de nero, de orientação sexual, tornando plural também o currículo escolar.
Não trato, aqui, dessas relações de um modo geral, mas situadas,
contextualizadas, localizadas na realidade brasileira, mais especificamente em
uma escola pública de periferia da cidade de Betim - MG. O poder e a cultura
tamm estão inseridos em uma sociedade específica e em um processo
cultural que caracteriza os grupos sociais pprios dessa sociedade. Assim, a
cultura dominante que vem se mantendo hegemônica, utiliza o currículo escolar
como ferramenta ideogica para a perpetuação de seus valores. Pretendo aqui,
sem generalizações, tratar desses dois temas, poder e cultura, para melhor
compreender as pticas educacionais, e, principalmente, as propostas
curriculares que estão a serviço da dominação e as que se comprometem com a
transformação social.
Poder e cultura o conceitos que, na formação crítica de um cidadão ou
de uma sociedade emancipada, estão sempre em sintonia. Busquei conceituar
poder e cultura com a intenção de melhor compreen-los no contexto hisrico
da educação brasileira. Diversos pensadores trataram desses temas ao longo
da história. Poder e cultura eram privilégios de alguns ao longo da história, e
ainda hoje em países como o Brasil o acesso à cultura como instrumento de
poder ainda está longe de se ver universalizado. Pensadores que se
preocuparam em apontar alguns caminhos nessa relação poderão me auxiliar
na tentativa de conceituar e compreender o poder no interior das relações
sociais. Junta-se ao poder a importância de trabalhar o conceito de cultura, pois
a ela também é atribuída uma grande quantidade de significados e
interpretações. Precisamos considerar esses termos na ptica da sociedade e,
principalmente, dentro das escolas públicas brasileiras, tentando compreender
como os processos de ensino aprendizado legitimam o poder e a autoridade.
Perguntamo-nos que poderes são esses. Sendo a educação, de fato, um
57
momento da apreensão da cultura pelos sujeitos do seu processo continuo a
me interrogar até que ponto nós, educadores, legitimamos um poder
autoritário e conservador? Até que ponto o currículo por mim utilizado, nas
escolas, está a serviço da reprodução social vigente, e não a serviço de um
compromisso crítico com as classes menos favorecidas, com as culturas
minoritárias e desprezadas pelos interesses dominantes. Tratarei, a seguir, de
conceituar o poder, a cultura, e, por fim, suas implicações nos currículos das
escolas brasileiras.
3.1 O poder
Segundo STOPPINO (1999),
poder em seu significado mais geral designa a capacidade ou a
possibilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto pode ser referida a
indivíduos e a grupos humanos como a objetos ou a fenômenos
naturais (como na expressão Poder calorífico, Poder de absorção).
(STOPPINO, 2007b, p. 933)
O poder é a potência, a capacidade de dar uma ordem que se cumprida
por outros, ou até mesmo a influência exercida por alguns indivíduos sobre
coisas ou pessoas. O poder, portanto, é uma relação o necessariamente
coercitiva, mas também consentida por aqueles que obedecem. Ter poder é
dispor da capacidade de agir, da capacidade de conduzir, de influenciar nas
ações de outros.
Se o entendermos em sentido especificamente social, ou seja, na
sua relação com a vida do homem em sociedade, o poder torna-se
mais preciso e seu espaço conceptual pode ir desde a capacidade
geral de agir, até a capacidade do homem em determinar o
comportamento de outrem: poder do homem sobre o homem. Desse
modo, os homens em suas relações nãoo apenas sujeitos, mas
também objetos do poder social. É poder social, por exemplo, a
capacidade que um pai ou uma mãe tem para dar ordens a seus filhos
ou a capacidade de um Governo de dar ordens aos cidadãos.
(STOPPINO, 2007b, p. 933)
58
No contexto social, podemos entender o poder como a capacidade que
um homem tem de agir sobre os outros, de determinar o comportamento dos
outros, de transformar outros homens, segundo seus interesses, e até mesmo
de terceiros. Na relação entre professor e aluno, o poder que o primeiro tem
sobre o segundo manifesta-se no processo de construção do conhecimento, ou
na transmiso de um determinado conhecimento. O professor tem poder de
ensinar, de transmitir conhecimentos, de contribuir para que o aluno se aproprie
de cultura; tem poder para avaliar, para aprovar ou reprovar, para permitir que o
aluno caminhe ou permaneça no mesmo lugar. Segundo Stoppino (2007), não
existe poder, se não existe, ao lado do indiduo ou grupo que o exerce, outro
indivíduo ou grupo que é induzido a comportar-se tal como aquele deseja. O
poder social não é uma coisa ou uma posse: é uma relação entre pessoas.
Stoppino (1999) distingue o poder de duas formas: o poder atual e o
poder potencial. O poder em ato é uma relação existente entre comportamentos,
e consiste no exercício efetivo do poder. o poder potencial é a possibilidade
desse exercício, a capacidade que um indivíduo tem de exercer o poder sobre
outro. O exercício do poder implica, necessariamente, ter a possibilidade de
exercê-lo, isto é, da passagem do potencial para o em ato.
O poder potencial leva-me ao conceito de poder estabilizado e
institucionalizado.
O poder estabilizado ocorre quando há uma alta probabilidade de que
B realize com continuidade os comportamentos desejados por A, ou
por outro lado, corresponde a uma alta probabilidade de que A execute
ações contínuas com o fim de exercer poder sobre B. O poder
institucionalizado se quando a relação de poder estabilizado se
articula numa pluralidade de funções claramente definidas e
estavelmente coordenadas entre si. (STOPPINO, 2007b, p. 937)
O poder estabilizado e institucionalizado pode permitir a inovação
permanente das regras, mas podem tamm conservar e legitimar um poder
opressor no interior da escola. Se as relações de poder conservadoras estão
estabilizadas, ou seja, se as mesmas práticas pedagicas permanecem por
muito tempo, seo há uma constante avaliação dos processos de ensino
aprendizado, temos aí um sistema que não se permite renovar, portanto,
estabilizado. Se as mesmas pticas eso articuladas, definidas atras dos
regimentos internos que estabelecem os direitos e deveres dos alunos e os
59
cririos para avaliação, aprovação e reprovação, eno o aluno aparece apenas
como objeto passivo desse processo, vemos aqui um poder conservador
institucionalizado.
Consideremos também os modos do poder ser exercido. Os homens
podem fazer uso do poder por meio da coerção, ou seja, pela foa, pela
imposição, sem depender da vontade do que obedece, exercido por meio
repressivo. Nesse caso, os interesses são conflitantes. Sendo o poder exercido
pela foa, ela pode ser definida como um alto grau de constrangimento,
ameaça de privações ou por meio da violência. A relação de poder entre
professores e alunos pode ser exercida de maneira coercitiva, ou seja, o
professor pode usar da ameaça de punição para manter a disciplina na sala de
aula.
O poder pode ser exercido por meio da manipulação, ou seja, A provoca
um comportamento em B, sem que o mesmo seja manifestado claramente, o
mesmo pode ser forjado, o homem pode ser levado a agir de uma maneira sem
conhecer as reais intenções de suas ões, A provoca o comportamento de B,
mas suas inteões permanecem camufladas. O conflito é apenas potencial,
que B não está consciente de suas ações. Manipular é o mesmo que manejar e
somente os objetos são suscetíveis de manejo de coisas que estão à mão.
Posso manipular um tecido para minhas finalidades, fazer uma calça, uma
bermuda, uma camisa. Posso fazer isso porque se trata de um objeto. Como
professor, não posso manipular o aluno, pois, ao fazer isso, estou tratando-o
como se fosse objeto, a fim de dominá-lo facilmente. Essa forma de tratamento
significa um rebaixamento do outro como interlocutor.
E outro modo de o poder ser exercido é pela persuasão. Nesse modo não
existe conflito na relão de poder: A exerce poder sobre B por meio do
convencimento, sem que o mesmo sofra constrangimentos. Aqui, B foi induzido
a agir em conformidade com o desejo de A. A persuasão não admite a coação e
nem a manipulação. Nos tempos atuais, tanto na vida pessoal quanto na vida
profissional, a capacidade de transmitir suas idéias e sutilmente dar sugestões,
a fim de convencer pessoas, atras de argumentos sólidos e baseados em
fatos concretos, fizeram com que a persuasão ganhasse importância cada vez
maior no cenário político, profissional e social.
60
O poder compreende força, força vinda de alguém investido de autoridade
sobre outras pessoas.
Um primeiro modo de entender a autoridade como uma espécie de
poder seria o de defini-la como uma relação de poder estabilizado e
institucionalizado em que os súditos prestam uma obedncia
incondicional. Praticamente todas as relações de poder mais duráveis
e importantes são, em maior ou menor grau, relões de Autoridade: o
poder dos pais sobre os filhos na família, o do mestre sobre os alunos
na escola, o poder do chefe de uma igreja sobre os fiéis, o poder de
um empresário sobre os trabalhadores, o de um chefe militar sobre os
soldados, o poder do Governo sobre os cidadãos de um Estado.
(STOPPINO, 2007a, p. 88-89)
Algo similar se dá com o pensamento de Thomas Hobbes. No
pensamento desse filósofo da política, para se promover um Estado forte, justo
e pacifico, é necessário que todos os cidadãos renunciem ao poder em favor do
soberano. A ele são atribuídos todos os direitos, sem que precise
necessariamente se submeter às mesmas leis, ele é a fonte legisladora e
criadora de toda lei. Até mesmo a autoridade religiosa deve ser entregue ao
soberano para que nenhum conflito o impeça de promover a justa e a paz. Em
Hobbes, a força está toda concentrada na pessoa do soberano, a relação de
poder é compensada com a proteção oferecida aos ditos.
Compreendendo que o poder pode ser exercido de formas diferentes, e
que, ao exercer tal poder, provocamos reações diferentes naqueles que sofrem
esse poder, que o professor tem poder para transmitir conhecimentos ao aluno
e que esse, por sua vez, ao se apropriar do conhecimento, adquire poder.
Vemos, portanto, que a relação entre professor e aluno é uma relação de poder,
e o exercício do poder se dá nas relações. Mas esse poder, para se tornar
legítimo, necessita do consentimento, da participação voluntária e livre daqueles
que obedecem.
O poder se manifesta nas relações entre os homens desde que esses
vivem em sociedade. Aristóteles definia cidadania como apropriação do poder:
Cidao, segundo a nossa definição, é o homem investido de um certo poder.
Ora, do momento que ele tenha um poder na mão, passa a ser cidadão, como
dissemos (A Política, Livro III, cap. 1, § 10). Podemos perceber que poder e
cultura caminham juntos desde a Gcia antiga, eram vias essenciais para se
alcaar a cidadania. Para ele, o poder era justo quando exercido por todos os
61
iguais (cidadãos, servos, mulheres, trabalhadores livres). O tirano busca coagir
os homens livres, privando-os da liberdade. Para ele, são três coisas que a
tirania se propõe: primeiro, o aviltamento dos súditos: aquele que possui um
espírito baixo e pusilânime jamais será tentado a conspirar; depois, a
desconfiança que nutrem os cidadãos entre si, porque a tirania só pode ser
derrubada quando os homens tiverem entre si uma confiança recíproca; e a
terceira é a impossibilidade de agir, porque ninguém empreende o impossível;
por conseguinte, não se toma a tarefa de abolir a tirania, quando não se possui
o poder de fa-lo. Assim, se constitui um poder tinico, aquele que é
personalizado no indivíduo que o deseja ser destituído do poder.
Para que o professor exerça um poder sobre seus alunos, é necessário
que ele tenha a possibilidade para exercê-lo; antes de agir, ele tem a
possibilidade de agir; antes de dar uma aula, ele tem a possibilidade de dar uma
aula; antes de ensinar, ele tem a possibilidade de ensinar; antes de avaliar, ele
tem a possibilidade de avaliar; antes de aprovar ou reprovar, ele tem a
possibilidade de aprovar ou reprovar.
1
Assim, ele pode fazer escolhas, rever
posições e métodos didáticos, construir saberes ou transmitir conceitos, e essas
escolhas eso condicionadas ao seu próprio processo de formação, ao lugar de
sua inserção profissional, ao ordenamento legal, cujo conjunto i interferir
diretamente no destino escolar do aluno.
O aluno também deve ser considerado um sujeito dotado de poderes,
principalmente do poder potencial, e é nas relações que ele experimenta o
poder, o poder dos pais, o poder econômico, o poder do Estado e o poder da
escola. É através das experiências vividas que o poder potencial se transforma
em poder de fato.
Ao desejar conhecer, o aluno vai ganhar conhecimento, e, para isso, ele
depende do poder persuasivo do professor. É na escola, na relação entre
ambos, que o poder potencial do conhecimento, que o exercício das
potencialidades se torna poder de fato.
Numa segunda definição de autoridade, Stoppino (2007) afirma que nem
todo poder estabilizado é autoridade, mas somente aquele em que a disposição
1
No Brasil, essa capacidade é dada por meio de um docente com diploma de licenciado, cuja entrada
no sistema de ensino se na área pública pelos concursos, e, no âmbito do ensino privado, por
contrato. É claro que se deve respeitar o conjunto do ordenamento legal a esse respeito.
62
de obedecer de forma incondicional baseia-se na crença da legitimidade do
poder. Como poder letimo, a autoridade pressupõe um juízo de valor positivo
em sua relação com o poder. Para tanto, o autor destaca duas características
do mesmo: o poder deve ser considerado letimo por parte de indivíduos ou
grupos que participam da mesma relação de poder. Em segundo lugar, devem
se considerar os aspectos do próprio poder: conteúdo das ordens, o modo ou
processo como as ordens são transmitidas ou a própria fonte de onde provêm
as ordens. A legitimidade do poder, em uma democracia, sugere a aceitação,
por parte dos governados, da autoridade do governante, e pressupõe a
rotatividade dos indivíduos no poder.
Abbagnano divide a autoridade em três doutrinas fundamentais, a
primeira se fundamenta na natureza dos homens de Aristóteles.
Segundo essa teoria, a autoridade deve pertencer aos melhores e é a
natureza quem se incumbe de apontar quem o os melhores. Platão
divide os homens em duas classes: os que são capazes de se
tornarem filósofos e os que não o são. Os primeiros são movidos
naturalmente por uma tendência irresistível à verdade (os filósofos), os
segundos são naturezas vis e iliberais que nada têm em comum com a
filosofia. A segunda teoria fundamental é a de que a autoridade se
baseia na divindade, todo poder vem de Deus, o soberano é o
representante de Deus na Terra. Tal doutrina teve larga vigência
durante a Idade dia até mesmo em certas monarquias na
Modernidade. E a terceira teoria a autoridade não consiste na posse
de uma força, mas no direito de exercê-la; tal direito deriva do
consenso daqueles sobre quem ela é exercida. Seu pressuposto
fundamental é a negação da desigualdade entre os homens. Todos os
homens receberam da natureza razão, isto é, a verdadeira lei que
comanda e proíbe retamente; por isso, todos são livres e iguais por
natureza. (ABBAGNANO, 2000, p. 98-99)
Um grande defensor da autoridade soberana do povo foi Jean-Jacques
Rousseau, quando afirmou que a liberdade é um direito inalienável e natural de
todos os homens. Para ele, o poder vem da vontade soberana de todos os
cidaos. O ser humano é o sujeito de todo o direito e a fonte de toda a lei. Para
ele, os objetivos da educação são, basicamente, o desenvolvimento das
potencialidades naturais da criança e seu afastamento dos males sociais,
combatendo o individualismo competitivo e defendendo uma formação com
princípios coletivos e morais.
Para Rousseau, o principio da desigualdade entre os homens nasce com
a propriedade privada, e é legitimado por uma educação que promove o
individualismo, as disputas e a corruão entre os homens. A escola passa a
63
ser reprodutora de uma cultura corrompida e egoísta, que contribui para o
aumento da desigualdade social e a decadência sica e moral da humanidade.
Para pôr fim a esse processo, faz-se necessária uma educação que estimule a
colaboração coletiva, democrática e fraterna entre os indivíduos. Assim, todos
colaboram com os valores éticos e buscam o bem comum.
Aqui se fundamenta o poder da autoridade legítima, na vontade livre e
soberana de todos os cidaos, a autoridade se funda no consentimento
daqueles que o seguem, pois, quando o poder não é letimo, surge o direito à
resistência. Resistir é um direito daqueles que se em oprimidos pelo poder
autoritário de um indivíduo ou grupo dominante, mas, para resistir, é preciso ter
razão, e é aqui que aparece o poder da educação, poder para formar cidadãos
passivos e conformados com os poderes estabelecidos, ou cidadãos
conscientes no seu potencial transformador da realidade.
Michel Foucault no seu livro Vigiar e punir, fala das relações de poder
com a finalidade de compreender os todos e meios coercitivos e punitivos
adotados pelo poder público na repressão da delinqüência, principalmente nos
séculos XVII e XVIII. Ele explica o uso do suplício como punição aos crimes
cometidos. A aplicação da pena era lenta e pública, de maneira que os cidadãos
acompanhassem a condenação e a tomassem como exemplo. O suplício
segundo ele, é um fenômeno inexplicável; a extensão da imaginação dos
homens para a barbárie e a crueldade é um ritual aplicado para marcar as
timas e demonstrar o poder que pune. No antigo sistema, o corpo dos
condenados se tornava coisa do rei, sobre o qual o soberano imprimia sua
marca e deixava cair os efeitos de seu poder. Agora, ele será antes um bem
social, objeto de uma apropriação coletiva e útil.
A disciplina fabrica, assim, corpos submissos e exercitados, corpos
dóceis. A disciplina aumenta as forças do corpo, tornando-os mais
úteis e diminui essas mesmas forças tornando-os mais obedientes. Em
uma palavra: ela dissocia o poder do corpo; faz dele, por um lado, uma
aptidão, uma capacidade que ela procura aumentar; e inverte, por
outro lado, a energia, a potência que poderia resultar disso, e faz dela
uma relação de sujeição estrita. Se a exploração econômica separa a
força e o produto do trabalho, digamos que a coerção disciplinar
64
estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e
uma dominação acentuada. (FOUCAULT, 2007, p. 119)
A disciplina vai moldando os indivíduos, para torná-los submissos; ela é a
técnica específica de um poder que toma os indivíduos seres dóceis e
obedientes. o é um poder triunfante que, a partir de seu próprio excesso,
pode-se fiar em seu superpoderio; é um poder modesto, desconfiado, que
funciona a modo de uma economia calculada, mas permanente. A escola deve
ser um aparelho de adestramento, próprio pra vigiar. O exame supõe um
mecanismo que liga um certo tipo de formação de saber a uma certa forma de
exercício do poder. O indiduo é sem dúvida o átomo fictício de uma
representação ideológica da sociedade; mas é também uma realidade fabricada
por essa tecnologia específica de poder que se chama disciplina (FOUCAULT,
2007, p. 161)
O poder moderno o é mais, essencialmente, uma instância
repressiva e transcendente (o rei não mais se encontra acima dos
seus súditos e o Estado não é superior à lei), mas uma instância de
controle, que envolve o indivíduo mais do que o domina abertamente.
Podem diminuir as proibões, abole-se a pena de morte, abranda-se o
regime das prisões, etc..., porém o sistema disciplinar, a que nos
vemos submetidos até em nossa vida privada, cresce, discreta, mas
continuamente. O Estado moderno tende a ser menos abertamente
dominador, e mais manipulador; preocupa-se menos em reprimir a
desobediência do que em preveni-la. É feito menos para punir do que
para disciplinar. (LEBRUN, 2007, p. 85)
As manifestações do poder modificam-se, ao longo da história. Sempre
houve aqueles que desejaram e lutaram contra o poder estabelecido, sempre
houve aqueles que desejavam a continuidade do poder estabelecido. Se o
poder é uma relação onde um ou mais indivíduos exercem influência sobre
outros, é bem verdade que este é cobado e motivo de disputas desde que os
homens vivem em sociedade. Conhecer os processos onde se desenvolvem
essas relações é fundamental para compreender o poder, suas características e
o lugar de cada indiduo na escola de poder social onde vive. A escola é um
lugar privilegiado onde as relações de poder se manifestam e se constituem
como reprodução ou transformação da cultura, o professor ensina o somente
através do conhecimento que tem, mas também das experiências herdadas por
ele culturalmente, onde o poder se aprendeu nas relações vividas.
65
Nossa sociedade está marcada pela diversidade do exercício do poder;
assistimos o uso do poder pelos meios de comunicação de massa que manipula
a opinião pública, o poder das religiões para submeter seus seguidores a uma
submiso total aos seus interesses, o poder das elites proprietárias dos meios
de produção para coagir os trabalhadores a produzirem sempre mais, ganhando
cada vez menos. Assim, aqueles que detêm o poder tornam-se cada vez mais
fortes, enquanto os que são submetidos a esse poder ficam cada vez mais
desprovidos de poderes mínimos e necessários. As relações de poder
modificam-se através dos tempos e lugares, mas permanecem nas mãos das
elites poderosas de cada nação.
3.2 A cultura
As mais diversas manifestações culturais que os homens produziram na
vida em sociedade são também a ppria história dos indiduos e tudo aquilo
que caracteriza sua existência. A cultura é o resultado das relações sociais
entre os indiduos no interior do seu grupo social e se relacionando e
convivendo com outros grupos sociais. Para compreender a cultura, é
necessário compreender os contextos em que essas manifestações culturais
são produzidas. A riqueza de formas culturais produzidas por cada grupo social
faz-nos compreender que a cultura é dinâmica, não é estática; ela se manifesta,
ensina e transforma, de tempos em tempos. Importante também é relacionar
essas manifestações com as diferentes classes sociais que a constituem. A
cultura, portanto, reflete as experiências vividas pelos grupos humanos nas
artes, religião, esporte, costumes, alimentação, família, política, e,
principalmente, na transmiso de todo esse conhecimento, através da
educação, para as futuras gerações.
Cultura é palavra de origem latina e em significado original está ligada
às atividades agrícolas, donde procede agricultura. Vem do verbo
latino coleo, colere, que quer dizer cultivar. Pensadores romanos
antigos ampliaram esse significado e a usaram para se referir ao
refinamento pessoal, e isso está presente na expressão cultura da
alma. Como sinônimo de refinamento, sofisticação pessoal, educação
66
elaborada de uma pessoa, cultura foi usada constantemente desde
então e o é até hoje quando dizemos tal pessoa é culta. (SANTOS, J.
2007, p. 27)
Cultura segundo Abbagnano tem dois significados básicos. No
primeiro e mais antigo, significa a formação do homem, sua melhoria e
seu refinamento. No segundo significado, indica o produto dessa
formação, ou seja, o conjunto dos modos de viver e de pensar
cultivados, civilizados, polidos, que também costumam ser indicados
pelo nome de civilização. A cultura designa um ideal de formação
humana completa, a realização do homem em sua forma autêntica ou
em sua natureza humana. Compencias específicas, habilidades
particulares, destreza e precisão no uso dos instrumentos, materiais
ou conceituais, são coisas úteis, aliás, indispensáveis, à vida do
homem em sociedade e da sociedade no seu conjunto, mas não
podem, nem de longe, substituir a cultura entendida como formão
equilibrada e harmônica do homem como tal. (ABBAGNANO, 2000, p.
225)
Essa noção de cultura é bastante específica de Werner Jaegger, em seu
clássico Paidéia
.
De qualquer forma, o problema fundamental da cultura contemporânea
é sempre o mesmo: conciliar as exigências da especialização
(inseparáveis do desenvolvimento maduro das atividades culturais)
com a exigência de formão humana, total ou, pelo menos,
suficientemente equilibrada.
O homem culto é, em primeiro lugar, o homem de espírito aberto
e livre, que sabe entender as idéias e as crenças alheias ainda que
não possa aceitá-las ou reconhecer sua validade. Em segundo lugar
uma cultura viva e formativa deve estar aberta para o futuro embora
ancorada no passado. Nesse sentido, o homem culto é aquele que não
se desarvora diante do novo nem foge dele, mas sabe considerá-lo em
seu justo valor, vinculando-o ao passado e elucidando suas
semelhanças e disparidades. (ABBAGNANO, 2000, p. 227-228)
Vemos, portanto, que a cultura como refinamento é a formação dos
indivíduos dentro do seu grupo social, é a soma das habilidades cultivadas por
homens e mulheres para que possam conhecer e contribuir para o
desenvolvimento dos costumes do seu povo. Mas a cultura diz respeito a todo o
grupo; ela é parte da história de um povo, e foi a apropriação da cultura por
parte de alguns com fins pprios, nos quais oprimiam a maioria é que a cultura
se tornou ferramenta de dominação, de poder para explorar, e assim não
poderia ser dominada por todos. Podemos dizer que a cultura diz sobre toda a
conjuntura social de um povo, sobre a arte, a religião, sobre a educação, mas
sobre a política e a forma de conduzir os destinos da economia de um País.
67
Cultura é uma dimensão do processo social, da vida de uma
sociedade. Não diz respeito apenas a um conjunto de práticas e
concepções como, por exemplo, se poderia dizer da arte. Não é
apenas uma parte da vida social como por exemplo se poderia falar da
religião. Não se pode dizer que cultura seja algo independente da vida
social, algo que nada tenha a ver com a realidade onde existe.
Entendida dessa forma, cultura diz respeito a todos os aspectos da
vida social, e o se pode dizer que ela exista em alguns contextos e
não em outros.
Cultura é uma construção histórica, seja como concepção, seja
como dimensão do processo social. Ou seja, a cultura não é algo
natural, o é uma decorrência de leis físicas ou biológicas. Ao
contrário, a cultura é um produto coletivo da vida humana. Isso se
aplica não apenas à perceão da cultura, mas tamm à sua
relevância, à importância que passa ter. Aplica-se ao conteúdo da
cada cultura particular, produto da história da cada sociedade. Cultura
é um território bem atual das lutas sociais por um destino melhor. É
uma realidade e uma conceão que precisam ser apropriadas em
favor do progresso social e da liberdade, em favor da luta contra a
exploração da uma parte da sociedade pro outra, em favor da
superação da opressão e da desigualdade. (SANTOS, J. 2007, p. 44-
45)
Unindo a cultura em seu conceito primitivo e em seu conceito moderno,
podemos dizer que a cultura é o cultivo, o afloramento, o aprendizado que o
indivíduo adquire de toda a riqueza das produções sociais que seu grupo
humano fez, ao longo da história. Ele se apropria da cultura, compreende os
processos em que ela se forma, sabe que é parte dinâmica dela. A educação dá
ao indivíduo o poder de contribuir na construção da cultura na qual está
inserido; ele pode adaptá-la às novas necessidades de seu tempo para que
todos vivam de maneira melhor.
Podemos, ainda, dividir a cultura entre as classes sociais. A primeira é a
cultura erudita, apropriada pelas elites: social, econômica, potica e cultural, e
seu conhecimento é originário de um pensamento elaborado cientificamente
através dos livros, das pesquisas universitárias ou do estudo sistemático. Em
geral, erudito significa aquele que tem instrução vasta e variada adquirida,
sobretudo, pela leitura de clássicos e por um conhecimento variado, inclusive
nas artes. A segunda é a cultura popular relacionada ao povo, às classes mais
pobres. Muitas elaborações eruditas partiram de conteúdos ou situações
advindas da cultura popular. A cultura popular é uma forma de expressão que,
por o estar diretamente ligada ao conhecimento científico, pode se manifestar
como conhecimento vulgar ou espontâneo, ao senso comum. Isto não quer dizer
que sempre o senso comum seja equivocado. Rigorosamente, o senso comum é
68
um conhecimento que se adquire sem se necessitar do esfoo e da disciplina
que o conhecimento científico exige pelo seu método. A educação escolar, ao
menos formalmente, pretende, não só transmitir sistematicamente
conhecimentos válidos, como também fazer do acesso ao conhecimento
científico e elaborado um modo de presença de cada indivíduo na cultura em
que ele está inserido.
Entendo educação como esse processo de desenvolvimento que, desde a
tenra idade, os seres humanos o orientados para o desenvolvimento de suas
potencialidades, para a apreeno de conhecimentos e valores para que todos e
cada um possam conhecer e se apropriar criticamente da cultura. Para
ABBAGNANO (2000),
Educação em geral, designa a transmissão e o aprendizado das
técnicas culturais, que são as técnicas de uso, produção e
comportamento, mediante as quais um grupo de homens é capaz de
satisfazer suas necessidades, proteger-se contra a hostilidade do
ambiente físico e biológico e trabalhar em conjunto, de modo mais ou
menos ordenado e pafico. Como o conjunto dessas técnicas se
chama cultura, uma sociedade humana não pode sobreviver se sua
cultura não é transmitida de geração para geração; as modalidades ou
formas de realizar ou garantir essa transmissão chamam-se educação.
(ABBAGNANO, 2000, p. 305)
Segundo PARO (2007),
Na linguagem comum, educação é normalmente associada a ensino,
quer para servir-lhe de sinônimo, quer para dele diferenciar-se. O uso
diferenciado se dá, em geral, no senso comum, quando se associa a
educação ao campo dos valores e das condutas, aquela por meio da
qual se propicia ao educando formação moral e disposição à prática
dos bons costumes e associa o ensino à passagem de conhecimentos
e informões, contidos nas disciplinas teóricas ou nas cncias de um
modo geral e que são úteis para a vida em geral ou para o exercício
de uma ocupação. (PARO, 2007, p. 1)
A educação e a cultura o dois processos indispensáveis na formação
do ser humano, na construção da sua identidade cidadã. Quando a cultura se
torna propriedade de uma classe como instrumento de dominação de outras
classes, o que vemos é uma educação passiva, autoritária, antidialógica, que
não permite a emancipação das classes trabalhadoras, pois não existe ali a
aproprião de uma cultura, e sim, a assimilação de técnicas de produção, onde
os indivíduos se preparam para atender as necessidades do mercado.
69
A educação como apropriação da cultura é dialógica, é transformadora da
realidade. A relação de poder entre professor e aluno se faz atras do dialogo
que, problematizado, produz conhecimento. Para Freire, o dlogo é o encontro
amoroso dos homens que, mediatizados pelo mundo, o pronunciam’, isto é, o
transformam, e, transformando-o, o humanizam para a humanidade de todos
(FREIRE, 1977, p. 43).
Uma educação humanizadora o se faz com professores autoritários. É
preciso, antes de tudo, humanizar a educação, os espaços físicos, os gestores,
e, principalmente, os professores que se formaram e reproduzem uma educação
autoritária. Uma práxis educacional verdadeiramente democrática nasce das
relações democráticas praticadas no cotidiano escolar. A história da educação
pública brasileira está marcada pela tradição elitista e reprodutivista de
contdos determinados que não interagem com o contexto e a vida cotidiana
dos educandos. Apropriar-se dessa história para transformá-la é um desafio
para o educador do século XXI, que precisa compreender a cultura para torná-la
melhor, principalmente nas escolas freentadas pelos alunos mais carentes.
O homem faz hisria, portanto, ao produzir cultura. E ele o
produz como sujeito, ou seja, como detentor de vontade, como autor.
A necessidade da educão se coloca precisamente porque, embora
autor da história pela produção da cultura, o homem ao nascer
encontra-se inteiramente desprovido de qualquer traço cultural.
Nascido natureza pura, para fazer-se homem à altura de sua hisria,
ele precisa apropriar-se da cultura historicamente produzida. A
educação como apropriação da cultura apresenta-se, pois, como
atualização histórico-cultural. Atualização aqui significa a progressiva
diminuição da defasagem que existe em termos culturais entre seu
estado no momento em que nasce e o desenvolvimento histórico no
meio social em que se dá seu nascimento e seu crescimento. Significa
que ele vai-se tornando mais humano (histórico) à medida que
desenvolve suas potencialidades, que à sua natureza vai
acrescentando cultura, pela apropriação de conhecimentos,
informações, valores, crenças, habilidades artísticas etc., etc. É pela
apropriação dos elementos culturais, que passam a constituir sua
personalidade viva, que o homem se faz humano-hisrico. (PARO,
2007, p. 4)
Entender a educação como apropriação da cultura é permitir que o aluno
seja dono da própria história, descubra-se como parte de uma sociedade em
construção, que a realidade não é acabada, pronta, estática. A luta contra a
homogeneização cultural, a exclusão social e a ignorância política passa pela
construção de currículos que propõem um dlogo constante entre o professor e
70
o aluno, entre o conteúdo e a realidade vivida por seus agentes, como afirma
Moreira (2001), a escola atras do currículo precisa mostrar aos alunos que as
coisas o são inevitáveis, que a desigualdade social pode ser modificada e que
cada professor, em cada sala de aula, pode ser um agente dessa
transformação. Trataremos, a seguir, de sintetizar a relação entre poder, cultura
e o currículo escolar, principalmente na atualidade da escola pública brasileira.
3.3 Poder, cultura e currículo escolar
Retomamos, portanto, a idéia de educação como apropriação da cultura,
do aluno como sujeito do processo de ensino aprendizado, um sujeito histórico
que se apropria da cultura como constituinte da sua existência. Pensemos,
tamm, na imporncia de um currículo crítico, capaz de promover a dignidade
cultural e social do educando. Quando o aluno é pensado e considerado como
sujeito no processo de ensino aprendizado, o poder não é centralizado no
professor; ele é compartilhado e torna-se propriedade de ninguém, pois o seu
lugar numa educação progressista é o da relação dialógica entre professor e
aluno.
Para Freire, a educação é comunicação, é diálogo, na medida em que
não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que
buscam a significação dos significados (FREIRE, 1977, p. 69).
E quando o aluno apropria-se da cultura, ele aprende de fato, ele se torna
capaz de problematizar o mundo à sua volta, ele se apropria por meio da rao
das ferramentas que o levam a sua emancipação, da sua dignidade. A avaliação
é constante, e o aluno é sujeito do processo avaliativo junto do professor e da
instituição; ele não aparece apenas como um ser passivo, sujeito a aprovação
ou reprovação. Aprender torna-se objeto de desejo do aluno e, dessa forma, ele
se apropria do conhecimento e constrói a base da sua cidadania. Uma cidadania
crítica depende de uma educação igualmente crítica.
Na produção hisrica de sua existência, os homens produzem
conhecimentos, instrumentos, cnicas, valores, crenças,
comportamentos, tudo enfim que se configura na cultura humana. A
71
apropriação dessa cultura pelos indivíduos é que constitui a educação.
Esta é entendida, assim, como atualização histórico-cultural do
homem, por que é pela apropriação da cultura (produção histórica) que
o indivíduo se faz homem (no sentido histórico, não meramente
biológico), diferenciando-se da natureza (que é o nível no qual ele se
encontra no momento do nascimento) e transcendendo-a. Ou seja, a
cultura se transmite não por hereditariedade biológica, mas
historicamente. Em qualquer época e em qualquer sociedade, os
indivíduos nascem igualmente desprovidos de qualquer atributo
cultural. É pela educação que cada indivíduo integra-se ao estágio de
desenvolvimento histórico do meio sociocultural onde nasce e cresce.
(PARO, 2001, p. 35)
Mencionamos, anteriormente, que a apropriação da cultura é um
poderoso instrumento de poder. As classes dominantes utilizam-se das
manifestações culturais para aumentar ainda mais o seu controle sobre as
classes populares. Os meios de comunicação de massa, as religiões, o trabalho
são ferramentas poderosas que têm a finalidade de conduzir uma cultura, seja
para os interesses das elites quanto para os interesses dos trabalhadores. Criar
uma sociedade homonea, diminuir os conflitos existentes, criar hábitos de
comportamento em conformidade com os interesses dos poderosos é o papel da
cultura em uma sociedade de classes.
Para SANTOS (2007),
hoje em dia os centros de poder da sociedade se preocupam com a
cultura, procuram defini-la, entende-la, controla-la, agir sobre seu
desenvolvimento. Há instituições públicas encarregadas disso; da
mesma forma, a cultura é uma esfera de atuação econômica, com
empresas diretamente voltadas para ela. Assim, as preocupações com
a cultura são institucionalizadas, fazem parte da própria organização
social. Expressam seus conflitos e interesses, e nelas os interesses
dominantes da sociedade manifestam sua força. (SANTOS, J. 2007, p.
82)
Na sociedade atual, o poder tem nome. As elites, os donos dos meios de
produção, os poderosos dos países ricos, esses são detentores de uma cultura
que se diz “hegemônica everdadeira”; as demaiso culturas periféricas.
Essa ideologia é transmitida aos estudantes freqüentadores das escolas que
atendem as massas populares por meio derios elementos, dentre eles o
currículo escolar. Segundo MOREIRA (1997),
O currículo constitui significativo instrumento utilizado por diferentes
sociedades tanto para desenvolver os processos de conservão,
transformação e renovação dos conhecimentos historicamente
72
acumulados como para socializar as criaas e os jovens segundo
valores tidos como deseveis. (MOREIRA, 1997, p. 11)
O currículo escolar é a ferramenta que reflete todas as experiências, em
termos de cultura, que são proporcionados aos alunos durante a vida escolar.
Assim, ele precisa ser encarado como um elemento fundamental do processo
educacional. Assistimos, ainda hoje, em muitas escolasblicas do País, o
distanciamento entre o conteúdo presente no currículo e a realidade vivida pelos
alunos. A utilização do currículo como reprodução de uma realidade dada, não
problematizada, formando pessoas obedientes às regras estabelecidas, leva os
alunos à conformação, com condição de exploração de uns poucos sobre a
grande maioria das pessoas. O currículo o pode ser apenas um instrumento
ideológico capaz de reproduzir o status quo. SANTOS (2005) diz que:
Não basta criar um novo conhecimento, é preciso que alguém se
reconheça nele. De nada valerá inventar alternativas de realização
pessoal e coletiva, se elas não são aprováveis por aqueles a quem se
destinam. Se o novo paradigma aspira a um conhecimento complexo,
permeável a outros conhecimentos, loca e articulável em rede com
outros conhecimentos locais, a subjetividade que lhe faz jus deve ter
características similares ou compatíveis. (SANTOS, B., 2005, p. 333)
Entendendo que o currículo escolar pode ser um instrumento de
dominação e de excluo ainda maior dos excluídos da política, da economia,
do trabalho, e, portanto, do poder cultural. Ao compreender essa realidade,
precisamos verificar como se dá a aplicação do currículo nas escolas
brasileiras. Segundo Moreira (1999), nas décadas de 70 e 80, a influência norte-
americana nos modelos curriculares brasileiros foi grande. Esse processo,
conhecido como transferência educacional, foi perdendo força na década de 90.
Nesse processo as escolaso vistas como instrumentos de reprodução da
ideologia dominante, a política neoliberal transforma o currículo em uma
ferramenta do mercado, centrada na produtividade e na manutenção do domínio
imperialista dos países centrais sobre os países periféricos.
Moreira (1997) apresenta como alternativa ao reprodutivismo neoliberal
da chamada pós-modernidade uma utopia possível e necessária, capaz de
confrontar o estabelecido com o possível, e criar novas perspectivas para um
mundo social mais justo. Para isso, é preciso que o teórico denuncie o caráter
reprodutor da escola e apresente alternativas de renovação. É preciso, também,
73
a promoção de um ambiente favorável ao desenvolvimento de novas
concepções de conhecimento, e, por fim, merece a atenção o planejamento e o
desenvolvimento do currículo voltado para os excluídos; Moreira (1997) parece
concordar com SANTOS (2005) nessa questão:
A utopia é a exploração de novas possibilidades e vontades humanas,
por via da oposão da imaginação à necessidade do que existe, só
porque existe, em nome de algo radicalmente melhor que a
humanidade tem direito de desejar e por que merece a pena lutar. A
utopia é uma chamada de atenção para o que não existe como
(contra)parte integrante, mas silenciada, do que existe. Pertence à
época pelo modo como se aparta dela. Por outro lado, a utopia é
sempre desigualmente utópica, na medida em que a imaginação do
novo é composta em partes por novas combinações e novas escalas
do que existe. Uma compreensão profunda da realidade é assim
essencial ao exercício da utopia, condição para que a radicalidade da
imaginação não colida com o seu realismo. (SANTOS, B. 2005, p. 323)
Educadores críticos acreditam nessa utopia, sabem que podem contribuir
para a construção de uma sociedade mais justa. Sabem que não podem ignorar
a realidade vivida por seus alunos. O educador é parte de uma comunidade
escolar que, unida, problematiza o real, e luta para transformá-lo. As
desigualdades sociais são refletidas na cultura de um povo, a exploração de
uma minoria sobre a maioria da população, como é o caso do Brasil, geram
conflitos, porque, nem a cultura e nem a sociedade são estáticas, inertes, elas
são dinâmica, sente os resultados dessas desigualdades e luta contra elas. A
sociedade brasileira luta contra a violência, contra o desemprego, a favor de
uma saúde blica de qualidade, a sociedade sabe da importância da
aproprião da cultura, e, por isso, luta por uma educação pública de qualidade
capaz de formar cidadãos cticos, participantes da dinâmica que conhece,
compreende, interage e transforma a cultura. Concordo com MOREIRA (2001),
quando ele diz:
A meu ver, a escola brasileira, neste final de século, também marcada
por nossa situão de marginalidade cultural e pela indiferea com
que muitas de nossas autoridadesm tratado a educação, precisa
procurar, por meio de suas atividades curriculares, mostrar ao aluno
que as coisas não são inevitáveis. Deve, prioritariamente, aju-lo a
perceber que a realidade social que o cerca é resultado de ações
sociais cujo poder não é absoluto: o dado é condição de uma ação
futura, não seu limite (BEATRIZ SARLO, 1999, p. 10). Os
questionamentos, nesse enfoque, devem visar a perturbar, a provocar
tensões, a esgarçar as justificativas, celebratórias ou cínicas, do
74
existente. Podem não mudar o mundo, mas deixam uma porta
entreaberta. (MOREIRA, 2001, p. 6)
Na escola, o poder está presente em todas as relações; o poder do
Estado sobre o currículo escolar, o poder econômico sobre o Estado, e,
conseentemente, sobre as metas curriculares, e esse poder se manifesta
visivelmente entre professores e alunos. O professor tem o poder de ensinar, o
aluno tem o poder de aprender. Essas relações estão inseridas na realidade
onde o processo de ensino aprendizado se dá. As condições históricas
determinam o tipo de poder que aí se apresentam. Nossas experncias de
democracia, liberdade, autoritarismo, disciplina e medo são condicionantes das
relações de poder entre professor e aluno. Sobre o desafio da desarticulação e
rearticulação do currículo e suas conseqüências na vida da sociedade,
MOREIRA (2001) diz:
Sustento, em outras palavras, o ponto de vista de que na escola tudo
pode e deve ser posto em questão, tudo pode e deve ser desconstruído.
Ao mesmo tempo, muito pode e deve ser inventado, no desafio e no
processo de forjarmos uma realidade social com menos desigualdades,
privilégios e injustas, na qual seja possível viver e conviver
condignamente, na qual se avolume a esperança preservada por
Bourdieu, na qual sejam posveis a utopia, a democracia, a
solidariedade, indispensáveis tanto ao questionamento do existente
como ao anúncio d que Buarque (1999) chama de modernidade ética.
(MOREIRA, 2001, p. 6)
A elaboração de propostas curriculares que atendam não somente as
demandas do mercado, mas, principalmente, as necessidades dos estudantes, é
o desafio que se coloca para os educadores na pós-modernidade. O currículo
presente nas escolas não pode ser apenas um instrumento reprodutor da
ideologia dominante a serviço do mercado. O conteúdo explicitado pelos
professores, nas salas de aula, em todas as escolas públicas brasileiras, podem
conter valores implícitos que atendam apenas a cultura dominante, mas o poder
de resistência está presente nesses agentes do processo de ensino
aprendizado (professores e alunos). Confrontar os antagonismos ideológicos
presentes na educação é uma forma de resistir e buscar alternativas mais justas
e que atendam as classes trabalhadoras. Assim, as escolas podem ser
instrumentos ideológicos a serviço da reprodução de uma realidade dada,
conformista e conservadora, mas ela pode ser um espaço de confronto, de
75
resistência, de luta pela emancipação de todas as culturas. APPLE (1989)
descreve essa relação:
Entretanto, não devemos nos engajar apenas na ação relativa ao
longo e lento processo de possibilitar que os professores e
professoras compreendam sua situação. Há também uma grande
necessidade de ação curricular. Neste ponto não direi muito mais do
que foi dito por outras pessoas que tiveram que lutar muito e
duramente para introduzir materiais honestos, controvertidos e, racial,
sexual e economicamente progressistas nas escolas. Se podemos
encontrar resistências, se mesmo apenas num nível informal podemos
encontrar homens e mulheres em nossas empresas,bricas e em
outros locais lutando para manter seus conhecimentos, humanidade e
dignidade, então a ação curricular pode ser mais importante do que
imaginamos. Pois os estudantes necessitam ver a hisria e a
legitimidade dessas lutas. O ensino da história séria do trabalho,
organizado em torno das normas de oposição produzidas por homens
e mulheres que resistiram a cumprir o currículo oculto, pode constituir
uma estratégia efetiva para a ação educacional neste caso. Como
Raymond Williams nos faz lembrar, a superação do que ele chamou
de a tradição seletiva é essencial para a prática emancipatória hoje.
(APPLE, 1989, p. 102)
O educador progressista deve ser humanista, contribuir para a
humanização racional dos homens em sociedade, deve, antes de tudo,
despertar nos alunos o desejo pelo saber. O aluno dever refletir sobre sua
condição histórica, deve estar inserido e comprometido com a realidade
concreta em que vive. A educação deve ser a problematizão do mundo real,
deve estar comprometida com a liberdade e com a dignidade dos seres
humanos. Tanto o currículo formal, o currículo em ação e o currículo oculto o
uma interação a serviço da dignidade de todos os cidadãos.
Conhecer a cultura brasileira através da educação, compreender como se
construíram as relações de poder ao longo da história do País, ter o poder de
transformá-la é um direito previsto em lei no Brasil (art. 205. Constituição
Federal). Preparar os indivíduos para a cidadania é um dever da escola, e isso
se faz com uma práxis emancipadora, onde o aluno tem o poder de participar do
processo educativo durante toda a sua formação, o espaço da sala de aula é
democrático, diagico onde professor e aluno o sujeitos do aprendizado, co-
responveis pela garantia dos direitos subjetivos de cada aluno, em cada
escola pública brasileira.
76
4 CONTRADIÇÕES ENTRE SERIÃO E CICLO DE FORMÃO
HUMANA
O exercício do poder por parte do professor vem do seu histórico escolar
em sua formação inicial, não apenas aqueles registrados nos históricos
escolares, mas dos processos pelos quais ele passou durante sua formação,
das experiências vividas por ele no interior da escola, vem do poder que ele
conheceu vindo dos professores que teve. Mas esse professor não é apenas
fruto da sua história escolar. Ele como sujeito, pode intervir no processo, fazer e
refazer a história dos processos escolares, os meios que ele vai utilizar para,
não transmitir conhecimentos, mas cultura, manter a disciplina na sala de
aula, avaliar seus alunos, -los crescer. Essas escolhas vão dizer que tipo de
cidao ele pretende formar, acomodado e passivo ou consciente e crítico. Esse
é o seu poder potencial, que se transforma em poder de fato na prática
cotidiana escolar.
Por outro lado, essa formação fica condicionada, de modo geral, ao
domínio ideogico de quem se mantinha no poder, seja o Estado, a Igreja ou as
elites de cada sociedade e, de modo específico, ao projeto pedagico de sua
instituição formadora. De um lado, organizar o sistema educacional sempre foi
um jogo de poder, poder político. Decidir que tipo de educação se pretende
oferecer significa dar uma direção para o perfil social pretendido. De outro lado,
do ponto de vista da organização pedagógica da escola ou mesmo de um
sistema de ensino participantes do sistema educacional brasileiro podem-se
confrontar dois modelos básicos, o seriado e o ciclado.
O modelo de organização pedagógica seriado é caracterizado por
períodos bem determinados. Anualmente, possui um caráter seletivo, pela
transmissão de conteúdos distribuídos de forma fragmentada, disciplina rígida,
pela reprovação daqueles que não acumularam os conteúdos, e pela aprovação
para o pximo ano como recompensa. Nesse modelo, o aluno aparece apenas
como objeto do trabalho do professor. O professor Paulo Roberto Vital de
Negreiros conceitua o sistema seriado da seguinte forma:
77
Nesta concepção de tempo escolar, a função da escola é de transmitir
o saber acumulado pela humanidade de forma sistemática. Para tanto,
a lógica de organização estrutura-se num modelo seqüencial que
estabelece pré-requisitos para o processo de aprendizagem. Valoriza-
se a capacidade do aluno em reter ensinamentos e a figura do
professor como transmissor. Os conteúdos se dividem em disciplinas,
distribuídas em uma grade curricular e operacionalizada no horário
das aulas. A avaliação caracteriza-se por uma lógica classificatória,
acumulativa e discriminatória. As provas identificam os melhores, os
médios e os fracos. Mecanismo de controle de sucesso, fracasso e
disciplina. Aprova e reprova. O tempo escolar está organizado em
séries anuais que permite o ajustamento ou a classificação dos
alunos. Aqueles que aprendem, mudam de série, os reprovados
repetem. (NEGREIROS, 2004, p. 19)
Já a organização pedagógica por ciclos remete-nos às fases da vida
humana: infância, adolescência, juventude e fase adulta. Os tempos escolares
respeitam as fases da vida do aluno. As etapas do processo ensino/aprendizado
são mais flexíveis partindo das experiências da vida do aluno. Esses peodos
acompanham os ciclos do desenvolvimento humano. No ciclo, os processos de
desenvolvimento coletivo o anulam o processo individual de cada um, este é
considerado e tratado de forma específica com a intenção de construir o objetivo
comum que é o desenvolvimento de todos. O ciclo surge como uma alternativa
de se organizarem os tempos escolares, compreendendo as mais variadas
etapas do processo formativo de cada educando.
Os ciclos compreendem os seres humanos, não apenas no que o ou
que possam produzir, mas, principalmente, no que podem vir a ser. Nesse
processo, os conteúdos abrem espaços para os problemas da vida dos
indivíduos, como: dignidade, trabalho, ética, desigualdade, distribuição de
renda, violência, fome, etc., são questões problematizadas e que devem
conduzir a uma pxis verdadeiramente transformadora do real. Ainda segundo
Negreiros, nos ciclos de formação humana:
Os conhecimentos o se desenvolvem desconectados do
desenvolvimento integral dos indivíduos. O tempo de viver é sempre
tempo de possibilidades de aprendizado. Infância ou vida adulta são
igualmente tempos de formação e de vivência de direitos plenos.
(NEGREIROS, 2004, p. 28)
O modelo de escola seriada no Brasil tornou-se um exemplo de poder
estabilizado e institucionalizado. Sua linguagem está muito presente na cultura
do nosso povo, suas regras o aceitas quase como naturais pela maioria da
78
população. Se perguntarem a um aluno em que rie ele estuda, e ele
responder 5ª série, todos saberiam identificar, mas se perguntarem em que ano
do ciclo ele está, e ele responder no 1º ano do segundo ciclo, teria dificuldades
em entender o período escolar desse aluno. Se a professora de uma turma de
30 alunos da 5ª rie reprovou dez alunos no final do ano e questionada pelos
motivos das reprovações, ela responderia: porque não sabem nada e foram
muito mal nas provas, isso também seria aceito com naturalidade pela
sociedade.
Poderia dar vários exemplos para justificar a estabilidade do poder do
modelo seriado na prática escolar em nosso País. Se meu filho o sabe nada,
não aprendeu, é melhor tomar bomba e fazer tudo de novo; no ano que vem,
quem sabe ele aprende”, parece comum ouvir isso de uma mãe de aluno. Seu
filho brincou o ano inteiro, não fez os exercícios, chegava todo dia atrasado,
fazia perguntas fora de hora, tirou nota baixa nas provas e por isso deve ficar
mais um ano na 5ª série, diz a professora.
O modelo educacional seriado tem suas raízes no capitalismo industrial
do culo XIX, quando a produção em série exigia uma o de obra qualificada
para o mercado. O modelo taylorista propunha uma organização dos
trabalhadores nas fábricas de maneira que pudessem dividir melhor as etapas
do processo produtivo, este absorvido pelo fordismo, que organizou os
trabalhadores para diminuir o tempo de produção, com o menor custo de
matéria-prima, aumentando a capacidade de produção. Mas, nos séculos
anteriores, havia a preocupação em controlar as ações dos indivíduos, de
educá-los para uma prática conforme os interesses do Estado e das elites,
como demonstra FOUCAULT (2007) a respeito do sistema educacional no
século XVIII, em seu livro Vigiar e punir:
Filas de alunos na sala, nos corredores nos pátios; colocão atribuída
a cada um em relação a cada tarefa e cada prova; colocação que
obtém de semana em semana, de mês em mês, de ano em ano;
alinhamento das classes de idade uma depois da outra; sucessão dos
assuntos ensinados, das questões tratadas segundo uma ordem de
dificuldade crescente. E nesse conjunto de alinhamentos obrigatórios,
cada aluno segundo sua idade, seus desempenhos, seu
comportamento, ocupa ora uma fila, ora outra; ele se desloca o tempo
todo numa série de casas; umas ideais, que marcam uma hierarquia
do saber ou das capacidades, outras devendo traduzir materialmente
no espo da classe ou do colégio essa repartição de valores ou dos
méritos. Movimento perpétuo onde os indivíduos submetem uns aos
79
outros, num espaço escondido por intervalos alinhados. (FOUCAULT,
2007, p. 126)
A sociedade era vigiada pelo Estado. Precisava ser controlada,
domesticada, manipulada e a educação era um meio para esse fim. Ensinar,
desde a tenra idade, as crianças e os jovens para serem obedientes, submissos
aos interesses daqueles que estão no poder. Os modelos educacionais
implantados pelo Estado brasileiro ao longo de sua história acompanharam essa
tendência. Os trabalhadores, os mais pobres quando o excluídos dos
sistemas de ensino, deveriam ser treinados para a obediência e a submissão
aos interesses das elites, ou seja, uma educação fraca para os pobres e uma
educação de qualidade para os ricos.
Para Saviani (2007), com a implantação dos sistemas nacionais de
educação noculo XIX, o Brasil adotou o modelo tradicional de educação
focada nos conhecimentos dos professores e na transmissão de conteúdos. A
escola tradicional no Brasil organizou a educação para ser transmissora de
contdos prontos, elaborados cientificamente por especialistas, e passados
aos alunos por professores tecnicamente preparados, que, por sua vez, foram
educados por outros professores tradicionais, que aprenderam que educação se
faz na sala de aula, com disciplina rigorosa, assimilação de conteúdos,
preparação de alunos para concursos e para o vestibular, avaliação do
contdo, aprovação como mérito e reprovação como punição.
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 institui, no País,
um modelo revolucionário de educação, por considerar o modelo tradicional
ineficiente e excludente. Esse proe uma escola mais focada no aluno e
menos nos conteúdos do professor. Para a Escola Nova, o aluno marginalizado
não é o ignorante, mas o rejeitado. O professor agiria como um estimulador e
orientador da aprendizagem cuja iniciativa principal caberia aos pprios alunos
(SAVIANI, 2007, p. 9).
O que distingue da escola tradicional a escola nova, não é, de fato, a
predominância dos trabalhos de base manual e corporal, mas a
presença, em todas as suas atividades, do fator psicobiológico do
interesse, que é a primeira condão de uma atividade espontânea e o
estímulo constante ao educando (criaa, adolescente ou jovem) a
buscar todos os recursos ao seu alcance, "graças à força de atração
das necessidades profundamente sentidas. (MANIFESTO DOS
PIONEIROS DA EDUCÃO NOVA DE 1932, p. 9)
80
Mas a Escola Nova, apesar de sua metodologia ativa centrada no aluno,
acabou por contribuir para a exclusão dos considerados “marginalizados”,
pois sua aplicação privilegiou os meios burgueses. Dentre outros modelos,
destaco também o tecnicista, focado no modelo fabril, entende a educação
como preparação técnica do aluno para o mercado de trabalho.
Em todos esses modelos, o poder da educação de desenvolver
competências e habilidades nos alunos para o exercício da rao reduz-se a um
complexo grupo de conteúdos divididos em disciplinas por área de
conhecimento em que o aluno se obrigado a decorar fórmulas e conceitos,
com o simples propósito de tirar boas notas e passar de ano. Não se vê a
preocupação da educação de tornar o aluno um sujeito participativo do processo
ensino aprendizado. Ao contrário, a escola contribui para a formação passiva e
conformista do aluno diante da realidade. Embora a Escola Nova tenha
caminhado nessa direção, ela não chegou às camadas populares, nas escolas
púbicas freqüentadas pelos mais pobres. Na verdade, todos esses modelos
reproduziram uma educação autoritária, antidialógica.
O característico da organização das escolas para finalidades seletivas
é o menosprezo às diferenças individuais, ou a utilização das
diferenças individuais, apenas para eliminar os reputados incapazes. A
escola fixa os seus graus ou séries de ensino, os padrões a que
devem atingir os alunos capazes de seguir o curso. Os que não se
revelarem capazes são reprovados ou repetentes excluídos. Nessa
organização cabe ao aluno adaptar-se ao ensino e o o ensino ao
aluno. Nada mais legítimo se a escola visa realmente a selecionar
alguns alunos para determinados estudos. E nada mais ilegítimo se a
escola se propõe a dar a todos uma habilitação mínima para a vida, a
promover a formação possível de todos os alunos de acordo com suas
aptidões. (TEIXEIRA, 1999, p. 100)
O modelo educacional brasileiro conduzido pelas elites, na forma como se
deu a seriação, foi implacável com o aluno provindo das classes populares que
tem dificuldades de aprendizado, de assimilação de conteúdos. Sua gica
seletiva e homogeneizadora exclui aqueles que não conseguem acompanhar
seus métodos de ensino, daí o grande número de alunos evadidos, reprovados,
excluídos das escolas brasileiras. E a culpa do fracasso acaba recaindo sobre o
aluno que não consegue se concentrar na aula, não presta atenção, não estuda
em casa, portanto precisa repetir de ano para aprender melhor.
81
Na década de 60, no afã de pôr um fim no analfabetismo no Brasil e, ao
mesmo tempo, tornar o ato pedagico um momento de conscientização, surge
o modelo de educação popular de Paulo Freire. Esse modelo compreende um
método humanista de alfabetização de adultos, no qual a relação dialógica entre
professores e alunos parte de temas geradores tirados da vida dos alunos e
provocando uma pxis transformadora. A esse respeito dedico o pximo
capítulo, pois trata do meu referencial teórico.
O método Paulo Freire acabou se constituindo num contraponto ao
caráter classista, seletivo e excludente que marcou minha história da educação.
A essa seletividade se junta o caráter punitivo e reprovador que aparecem com
mais foa.
Em certa medida, esse método cooperou para trazer à tona o
questionamento ao modelo seriado que, associado à reprovação, se impusera à
educação brasileira. Daí nascem alternativas como, por exemplo, os ciclos de
formação humana e de aprendizagem, os quais preem uma formação
diferenciada do modelo seriado, incluindo, além da apropriação de conteúdos, a
valorização de habilidades, atitudes e o respeito aos valores culturais e
artísticos.
A partir da cada de 70, a problematização da repetência e evasão
escolar ganhou um novo impulso com as teorias da reprodução. A
organização do sistema escolar, imbricada da exclusão começou a ser
repensada a partir da função social da escola. O centro da polêmica
era saber até que ponto a escola ajudava na transformação ou
reprodução da sociedade. Nesta perspectiva, o regime seriado
começou a ser duramente questionado. Foi acusado de ser um dos
principais elementos responsáveis pelos autos índices de fracasso
escolar a reprovação. E neste aspecto era fator de manutenção de
um modelo de sociedade elitista, conservadora e injusta.
(NEGREIROS, 2004, p. 22)
Educar é um gesto radical de transformar, de permitir que o outro se
aproprie da cultura. A educação está associada a ensinar, a transferir
conhecimentos. Quando se diz que a escola do seu bairro é ruim, quer dizer que
o ensino não é bom, mas, quando se diz que tal escola é boa, a associação ao
ensino de qualidade é imediata. A escola boa é aquela democrática, em que o
aluno deseja o saber, e, por isso, apropria-se dele. A escola ruim é aquela
autoritária, em que o aluno decora um determinado saber, e, por isso, não se
apropria dele. Mas a tradição escolar brasileira mostra o contrário.
82
Os ciclos de formação humana são uma nova proposta de fundo para a
organização escolar. Seu horizonte es voltado para a educação em todas as
suas dimensões, não somente no conteúdo, no cognitivo, mas numa
compreensão do mundo, da realidade concreta. Os ciclos buscam o
desenvolvimento cultural dos alunos, o desenvolvimento de habilidades
artísticas e filosóficas, compreende uma maior flexibilidade na organização dos
tempos escolares. A avaliação compreende o aprendizado do aluno, mas
tamm tudo à sua volta, ou seja, tudo o que contribuiu para o aprendizado ou
que prejudicou o aprendizado, e as propostas de melhorias do processo devem
ser uma constante. Nessa proposta, ficam excluídas: a avaliação punitiva, a
coação, a exclusão, o medo, e a reprovação.
Uma educão que possibilite ao homem a discussão corajosa de sua
problemática. De sua inserção nesta problemática. Que o advertisse
dos perigos de seu tempo, para que consciente deles ganhasse a
força e a coragem de lutar, ao invés de ser levado e arrastado à
perdição de seu próprio eu”, submetido às prescrições alheias.
Educação que o colocasse em diálogo constante com o outro. Que o
predispusesse a constantes revisões. À análise ctica de seus
achados. À uma certa rebeldia, no sentido mais humano da
expressão. Que o identificasse com métodos e processos científicos.
(FREIRE, 2006c, p. 97-98)
O problema é que o modelo seriado, associado à reprovação, está na
base da cultura tradicional da escola e dos professores, e a passagem para um
novo modelo demanda tempo e paciência por parte de seus idealizadores e de
educadores progressistas. Em uma consulta aos dados do INEP, comparei
informões obtidas em dois períodos diferentes: em 1991, portanto cinco anos
antes da nova LDB de 1996, e em 2005 nove anos após a implantação da nova
lei que permite uma nova forma de organização dos espaços e tempos
escolares.
Em uma outra consulta aos dados do INEP, realizada em 2003 pelo
professor Paulo Roberto Vidal de Negreiros, verificou-se que a grande maioria
das escolas brasileira adota o modelo seriado de educação, sendo 81,1%
seriadas, e apenas 11% do total das escolas brasileiras adotam o modelo de
ciclos, e 7,9 adotam mais de um modelo de organização escolar. Nas redes
municipais de ensino brasileiras, 84,9% das escolas são seriadas, 8,3% ciclos, e
6,7% adotam mais de um modelo. Nas redes municipais do estado de Minas
83
Gerais, 67,3% adotam o modelo seriado, 28,9% ciclos, e 3,8% mais de um
modelo. Dentre os municípios que adotam o modelo de ciclos de formação
humana está Betim, onde realizei esta pesquisa.
As tabelas abaixo têm o objetivo de mostrar o ensino fundamental
brasileiro, em números. Nelas, encontramos os meros de matculas, índice
de aprovação, reprovação, transferências e abandono de alunos em dois
períodos diferentes, em 1991, e treze anos depois, em 2005. Essas tabelas me
permitem um olhar sobre a educação. Elas o o reflexo das políticas
educacionais e das práticas dos professores nas escolas brasileiras.
Para PERRENOUD (2004),
o fracasso escolar nasce, em larga medida, do que Bourdieu (1966)
chamou de indiferença às diferenças”. A escola trata todos os alunos
como iguais em direitos e em deveres, ao passo que eles estão muito
desigualmente dispostos e preparados a tirar partido de uma formação
padrão. Alguns já sabem ler quando chegam à escola, outros estão
bem longe disso. Isso não impede o sistema educacional de fixar para
eles os mesmos objetivos, dentro dos mesmos prazos. O nimo
seria, então, diferenciar o atendimento dessas crianças. A reprovação
é uma diferenciação rudimentar, que degrada a auto-imagem e se
mostra globalmente pouco eficaz. (PERRENOUD, 2004, p. 19)
Os demonstrativos do censo escolar realizado pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em 1991,
comparados com os mesmos dados em 2005, tornam possíveis uma avaliação
das desigualdades escolares no Brasil. Esses dados mostram, principalmente,
que o caráter excludente da reprovação continua sendo um elemento marcante
da escola pública em nosso País. Esta pesquisa mostra os números de
matrículas, aprovação e reprovação de alunos em todo o Brasil nas ries de 5ª
à 8ª do ensino fundamental, como mostra a tabela 1, e os mesmos números por
unidade da federação, considerando os alunos matriculados em todas as séries
do ensino fundamental.
84
TABELA 1
Números de matrículas, aprovação, reprovação, transferência e abandono de
alunos do ensino fundamental por rie, segundo a região geográfica e unidade
da Federação em 1991
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 3.696.099 2.616.660 1.985.609 1.521.635
Aprovados 2.055.669 1.636.356 1.327.162 1.123.283
Reprovados 841.209 490.194 303.671 156.592
Transferência
e/ou
abandono
799.221
490.110
354.776
241.760
TABELA 2
Os mesmos dados da tabela 1, em porcentagem
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 55.6% 62.5% 66.8% 73.8%
Reprovados 22.8% 18.8% 15.3% 10.3%
Transferência
e/ou
abandono
21.6%
18.7%
17.9%
15.9%
TABELA 3
Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa, segundo a região
geogfica e unidade da federação em 1991
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 95.536 16.716.816 8.773.360 3.618.012
Aprovados 23.481 10.136.665 5.234.329 2.971.640
Reprovados,
transfencias
ou
abandonos
72.055
6.580.151
3.539.031
646.372
85
TABELA 4
Os mesmos dados da tabela 3, em porcentagem
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 24.6% 60.6% 59.7% 82%
Reprovados,
transfencias
ou
abandonos
75.4%
39.4%
40.3%
18%
TABELA 5
Números de matrículas, aprovação, reprovação de alunos do ensino
fundamental por série, segundo a região geográfica e unidade da Federação em
2005
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 4.520.875 3.891.386 3.476.179 3.180.616
Aprovados 3.244.392 2.962.114 2.706.038 2.520.553
Reprovados 732.447 524.000 386.222 343.108
Transferência
e/ou
abandono
544.036
405.272
383.919
316.955
TABELA 6
Os mesmos dados da tabela 5, em porcentagem
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 71.8% 76.1% 77.9% 79.2%
Reprovados 16.2% 13.5% 11.1% 10.8%
Transferência
e/ou
abandono
12%
10.4%
11%
10%
86
TABELA 7
Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa, segundo a região
geogfica e unidade da Federação em 2005
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 25.728 12.145.494 17.986.570 3.376.769
Aprovados 21.936 9.476.729 13.687.978 3.130.328
Reprovados 2.113 1.554.723 2.633.387 110.839
Transferência
e/ou
abandono
1.679
1.114.042
1.665.205
135.602
TABELA 8
Os mesmos dados da tabela 7, em porcentagem
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 85.2% 78% 76.1% 92.7%
Reprovados 8.2% 12.8% 14.6% 3.3%
Transferência
e/ou
abandono
6.6%
9.2%
9.3%
4%
Em 1991, dos 3.696.099 alunos matriculados na 5ª série, apenas
2.055.669, ou seja, 55.6% dos alunos matriculados na 5ª série em todo o Brasil
foram aprovados. Em 2005, foram matriculados 4.520.875 alunos na 5ª série, e,
destes, 3.244.392 foram aprovados, perfazendo um total de 71.8% de alunos
aprovados, isto é, um aumento de 16.2% em comparação com 1991. Em 1991,
24.6% dos alunos matriculados em escolas federais foram aprovados. Em 2005,
o índice subiu para 85.2%, ou seja, todas as tabelas mostram que aumentou o
índice de aprovados em todas asries do ensino fundamental. As escolas
particulares têm os maiores índices de aprovação, e, conseqüentemente, os
índices mais baixos de reprovação, transferência e evao. As redes de
87
educação blica diminuíram os índices de reprovação, evao e transferências
na comparação entre 1991 e 2005.
A preocupação de educadores e governos com a exclusão escolar tem
provocado mudanças de postura com relação à mesma. As novas formas de
organização dos tempos escolares, a formação permanente de educadores, a
melhoria nas políticas salariais, os investimentos na educação sica, as
políticas orientadas para a diminuição das desigualdades sociais, são
apontados como caminhos a serem percorridos para a melhoria da qualidade da
educação no Brasil. Mas encontrei, com freência, professores que defendem
a reprovação como instrumento de avaliação da qualidade dos alunos.
As tabelas não deixam dúvidas que o modelo seriado, reprovador e
excludente é o preferido por nossos professores. Nossas escolas continuam
reprovando, excluindo milhões de alunos. Em 2005, foram 4.301.062 alunos
reprovados no ensino fundamental, em todas as escolas brasileiras, de um total
de 33.534.561 alunos matriculados, ou seja, 12.82% dos nossos alunos tiveram
que repetir a série. Não consideramos, aqui, os alunos que abandonaram a
escola durante o ano letivo, o que aumentaria esse percentual de alunos
excluídos do processo de ensino aprendizado.
O índice de reprovação nas escolas brasileiras vem caindo através dos
anos. Transferências e evasão nas escolas públicas brasileiras evidenciam que
a escola construída para os pobres é uma escola pobre. O que promove o
sucesso escolar dos alunos oriundos das classes média e alta é,
conseentemente, o que gera o fracasso dos alunos oriundos das classes
populares. Portanto, a escola não é uma instituição neutra, ela reproduz as
desigualdades, o sucesso ou o fracasso não pode ser entendido apenas como
algo natural, ou como mérito apenas do aluno, mas as condões sociais,
culturais e econômicas contribuem para esse processo.
Assim, podemos argumentar que o sucesso escolar, no Brasil, es ligado
a um recorte de classe social. Os alunos de classe dia e alta que freqüentam
as escolas privadas e as escolas públicas de melhores condões passam de
nível escolar com uma maior regularidade do que os alunos das camadas
populares que freqüentam as escolas públicas de periferia, ou mesmo as
escolas privadas que, porventura, aí estejam. O fracasso escolar dos alunos das
escolas públicas é demonstrado pela falta de regularidade dos alunos, pela
88
reprovação e abandono que acontecem numa proporção maior do que nas
escolas privadas. Tal fracasso expressa-se nos produtos das avaliações de
rendimento escolar.
Para Vitor Paro, a eliminação da reprovação como recurso didático
apresenta-se assim, como exigência de um ensino de qualidade. Para
Lauro de Oliveira Lima, se a escola é séria e os processos didáticos
eficientes, a promoção automática é menos um sistema de promoção
que a conseência lógica da eficncia. Porque, queiramos ou não, a
reprovação é sempre sinal de ineficiência do sistema escolar e de
incapacidade do magistério, salvo se estivermos nos limites da
anormalidade. (PARO, 2001, p. 51 apud LIMA, 1962, p. 361)
A reprovação utilizada historicamente nas escolas brasileiras como
recurso didático para a classificação de alunos em bons e maus, ainda se vê
muito utilizada e defendida por educadores que parecem o se incomodar em
responsabilizar somente alunos pelo seu fracasso. Entender que o fracasso do
aluno é também o fracasso do Estado, da escola e do professor é fundamental
para uma avaliação dos processos de avaliação e abrir novas possibilidades,
como a proposta dos ciclos de formação humana.
Vejamos agora as mesmas tabelas com dados do estado de Minas
Gerais. Esse olhar pode ajudar-nos a problematizar a educação em nosso
estado, verificando o que osmeros falam-nos da evolução dos processos
educacionais num estado considerado tradicional dentro Federação.
TABELA 9
Números de matrículas, aprovação, reprovação, transferência e abandono de
alunos do ensino fundamental por rie, no estado de Minas Gerais em 1991
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 417.934 280.386 207.646 155.521
Aprovados 206.440 158.064 128.495 110.298
Reprovados 118.434 70.238 43.215 22.603
Transferência
e/ou
abandono
93.060
52.084
35.936
22.620
89
TABELA 10
Os mesmos dados da tabela 9, em porcentagem
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 49.4% 56.4% 61.9% 70.9%
Reprovados 28.3% 25% 20.8% 14.5%
Transferência
e/ou
abandono
22.3%
18.6%
17.3%
14.6%
TABELA 11
Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa no estado de Minas
Gerais em 1991
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 2.352 2.322.427 621.212 221.854
Aprovados 1.601 910.036 391.394 187.272
Reprovados,
transfencias
ou
abandonos
751
1.412.391
229.818
34.582
TABELA 12
Os mesmos dados da tabela 11, em porcentagem
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 68% 39.2% 63% 84.4%
Reprovados,
transfencias
ou
abandonos
32%
60.8%
37%
15.6%
90
TABELA 13
Números de matrículas, aprovação, reprovação de alunos do ensino
fundamental por série no estado de Minas Gerais em 2005
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 431.555 407.670 387.158 379.940
Aprovados 325.898 312.518 303.174 278.104
Reprovados 71.573 57.795 46.525 55.431
Transferência
e/ou
abandono
34.084
37.357
37.459
46.405
TABELA 14
Os mesmos dados da tabela 13, em porcentagem.
Alunos 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 75.5% 76.6% 78.3% 73.2%
Reprovados 16.6% 14.2% 12% 14.6%
Transferência
e/ou
abandono
7.9%
9.2%
9.7%
12.2%
TABELA 15
Números de matrículas, aprovação e reprovação dos alunos do ensino
fundamental, por localização e dependência administrativa no estado de Minas
Gerais em 2005
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 2.771 1.695.968 1.470.839 238.405
Aprovados 2.518 1.355.865 1.226.759 227.254
Reprovados 162 203.912 166.931 7.771
Transferência
e/ou
abandono
91
136.191
77.149
3.380
91
TABELA 16
Os mesmos dados da tabela 15, em porcentagem
Alunos Federal Estadual Municipal Privado
Matrículas 100% 100% 100% 100%
Aprovados 90.9% 80% 83.4% 95.3%
Reprovados 5.8% 12% 11.3% 3.3%
Transferência
e/ou
abandono
3.3%
8%
5.3%
1.4%
Minas Gerais, de uma forma geral, acompanha as estatísticas nacionais.
Em 1991, as tabelas mostram que o estado aprovou um pouco menos e
reprovou mais do que a média nacional. Usando a 5ª série tamm como
refencia para comparações, vemos que, de um total de 417.934 alunos
matriculados, 206.440 foram aprovados, uma média de 49.9%, enquanto a
média nacional ficou em 55.6%. Comparando somente as redes estaduais de
ensino, enquanto estas como um todo aprovaram 60.6% dos seus alunos, a
rede estadual de Minas Gerais aprovou apenas 39.2%, muito abaixo da dia
nacional.
Em 2005, o estado melhorou o seu índice de aprovação acima da média
nacional. Vejamos os índices: 431.555 alunos foram matriculados na 5ª rie, e,
destes, 325.898 foram aprovados, perfazendo uma média de 75.51%, enquanto
a média nacional ficou em 71.8%. Enquanto as escolas das redes estaduais
como um todo aprovaram 78% dos seus alunos, a rede estadual de Minas
Gerais aprovou 80%, estando acima da média nacional.
Em Minas Gerais, como em todo o País, as tabelas mostram que o
modelo seriado, reprovador e excludente é o preferido por nossos professores.
Nossas escolas continuam reprovando, excluindo milhões de alunos. Em 2005,
foram 378.776 alunos reprovados em todas as séries do ensino fundamental,
nas escolas de Minas Gerais, de um total de 3.407.983 alunos matriculados, ou
seja, 11.11% dos nossos alunos tiveram que repetir a série.
Enfim, as tabelas mostram que a escola seriada vem perdendo foa,
tanto em âmbito nacional quanto no Estado de Minas Gerais. Num intervalo de
92
13 anos, o Brasil ganhou uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, que possibilitou outras formas de organizar os tempos escolares, os
modelos de avaliação, e os métodos didáticos. O Brasil hoje tem 97% de nossas
crianças freqüentando a escola, diminuiu o analfabetismo. O desafio continua
sendo repensar a qualidade, o aluno sair da escola porque aprendeu, adquiriu
conhecimento, apropriou-se da cultura.
Por isso é que se pode dizer que ensino e aprendizado são duas faces
de uma mesma moeda. Não pode existir uma, se não existe a outra.
Não ensino, se não se deu o aprendizado. D o absurdo em se
afirmar que determinada aula (processo de ensino) é boa ou que o
ensino de determinada escola é de qualidade, mas os alunos não
aprendem. (PARO, 2001, p. 37)
Muitos dos professores, hoje autoritários e conservadores, passaram pela
experiência dessa escola incentivadora da passividade e da obedncia, sem
contestação. Reproduzi a educação que tive, uma educação que avalia os
alunos pelo resultado das provas bimestrais, semestrais ou anuais. O mérito
do aluno é a nota, o boletim azul é o prêmio no final do ano. Aos que não
alcaaram dias, tiveram um boletim todo vermelho, resta esperar o pximo
ano para tentar decorar tudo de novo. A culpa do fracasso escolar é jogada toda
em cima do aluno: ele o prestou atenção, faltou às aulas, o fez o dever, fez
bagunça, não estudou para a prova e, portanto, foi reprovado.
2
O modelo de avaliação seriada é apenas um diagnóstico da assimilação,
por parte do aluno, dos conteúdos transmitidos pelo professor durante um
determinado período. Elas são testes que classificam os alunos em bons e
maus, os que estudaram e os que não estudaram durante aquele peodo. A
avaliação não pode se reduzir a classificar, avaliando apenas o conhecimento
adquirido ou não pelo aluno, para sua promoção ou não para a pxima série. A
avaliação deve ser contínua e compreender todos os aspectos que interferem
diretamente no processo ensino aprendizado.
Segundo PARO (2001),
2
Desde a minha infância, ouvia dizer que tal professor era muito bom porque era bravo, sua
matéria era difícil, que muitos alunos eram reprovados com ele. O bom professor era o que
dava medo nos alunos, uma espécie de terrorista da educação. A escola era avaliada da
mesma forma: uma escola boa era aquela onde seus professores eram bravos, as matérias
difíceis de aprender, a disciplina era rigorosa, somente bons alunos eram aprovados, os maus,
se não desistissem no meio do caminho, tinham como certa a reprovação.
93
a rao de ser da avaliação educativa não é a classificação ou a
retenção de alunos, mas a identificação do estágio de compreensão e
assimilação do saber pelo educando, junto com as dificuldades que
este encontra, bem como os fatores que determinam tais dificuldades,
com vistas à adoção de medidas corretivas da ação. (PARO, 2001, p.
39-40)
A avaliação o pode ser apenas uma verificação de resultados para se
decidir se o aluno está ou o apto para prosseguir nos estudos. A avaliação
deve ser permanente e constante do aprendizado do aluno, mas também de
todos os processos que contribuem para esse fim. A avaliação compreende
tamm a auto-avaliação da instituição, dos meios pedagicos, das práticas
dos professores, das poticas educacionais. Não podemos esperar o fracasso
do aluno para jogar nele toda a responsabilidade e puni-lo com a reprovação.
PARO (2001) diz
que os problemas da avaliação a posteriori apresentam-se de forma
ainda mais séria quando se considera que, em nossa realidade, o
período que, a rigor, efetivamente conta para efeito de avaliação
acaba sendo anual, pois, com a seriação adotada na imensa maioria
de nossos sistemas de ensino, apenas de ano em ano é que se
procura verificar o aprendizado, com vistas a decidir sobre o destino
do educando. Em qualquer processo produtivo do sistema econômico
seria considerado um total absurdo esperar-se um período tão longo
para proceder-se à verificação dos resultados e tomar decisões quanto
aos êxitos, perdas e correções de rumo. Para piorar a situação, a
verificação escolar, geralmente, sequer tem o propósito de corrigir
rumos da escola, mas apenas separar os que podem e os que não
podem continuar na próxima série. Os que são reprovados devem
repetir o mesmo processo no ano seguinte, em geral, com o mesmo
professor (ou professores) e com a utilização dos mesmos recursos e
métodos do ano anterior. Para os reprovados, o absurdo da situação
não é apenas que se espera todo um ano para se verificar que o
processo não deu certo (o que já não é pouca gravidade); o absurdo
consiste também em que nada se faz para identificar e corrigir o que
andou errado. Não se trata propriamente de uma avaliação, mas de
uma condenação do aluno, como se só ele fosse o culpado pelo
fracasso. Como se do processo não fizessem parte o aluno, o
professor (ou professores) e todas as condões em que se o
ensino na escola. (PARO, 2001, p. 41-42)
O exercício da auto-avaliação é o permanente diálogo reflexivo, ou seja,
consigo mesmo (a escola, os professores e os alunos), a prática dessa auto-
avaliação prepara os alunos para o exercício da liberdade, para o exercício da
democracia tão distante da vida cotidiana dos brasileiros, constantemente
interrompida por grupos autoritários que conquistavam o poder. Avaliar é
problematizar todo o processo de ensino aprendizado, o que de fato é positivo e
94
o que precisa ser melhorado no processo, e, acima de tudo, ter a coragem de
tomar decisões, mudar o rumo do que não contribui para uma cidadania plena.
Para FREIRE (2006c e 1977),
A educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode
temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão
criadora, sob pena de ser uma farsa. (FREIRE, 2006c, p. 104)
Esta é a rao pela qual, para nós a educação como prática da
liberdade não é a transferência ou a transmissão do saber nem da
cultura; o é a extensão de conhecimentos técnicos; não é o ato de
depositar informes ou fatos no educandos; não é a perpetuação dos
valores de uma cultura dada; o é o esforço de adaptação do
educando a seu meio.
Para nós, a educão como prática da liberdade é, sobretudo e
antes de tudo, uma situação verdadeiramente gnosiológica. Aquela em
que o ato cognoscente não termina no objeto cognoscível, visto que se
comunica a outros sujeitos, igualmente cognoscentes. (FREIRE, 1977,
p. 78)
A educação, como prática da liberdade, compreende, entre professores e
alunos, uma relação de poder dialógica, portanto, livre e comprometida com a
verdade. A educão, como ptica da liberdade, não se utiliza da avaliação
para punir os alunos; ela não precisa da ameaça da reprovação para forçar o
aluno à disciplina e ao estudo.
As práticas educacionaiso democráticas legitimam o poder de uma
classe sobre a outra, são ferramentas para a perpetuação de uma ideologia que
privilegia uns em detrimento da maioria. Para GADOTTI (2005),
Nesse sentido, podemos chamar de ideologiatodo pensamento, todo
discurso que, interpretando o mundo, o representa de maneira falsa,
distorcida, cujos componentes essenciais ocultam suas raízes, suas
origens econômicas, políticas, sociais. (GADOTTI, 2005, p. 32)
O ato de educar é um ato potico, e pode estar a serviço da dominação,
da perpetuação das desigualdades ou pode estar a serviço de transformação de
uma realidade dada. Assim, uma educação que transmite uma visão distorcida
da realidade é aquela que imobiliza a razão dos seus alunos, o permite uma
vio crítica da realidade. Essa educação ideológica não permite uma ação
transformadora, não dá espaço para uma educação verdadeiramente
emancipadora. Essa é uma educação a serviço das classes dominantes, onde
95
os alunos das classes trabalhadoras são transformados em ferramentas do
processo produtivo.
Estou cada vez mais convencido de que os educadores falharam
muitas vezes porqueconfundiram educão com obedncia. São
obedientes e tentam formar gente obediente, submissa. Educar é fazer
ato de sujeito, é problematizar o mundo em que vivemos para superar
suas contradições, comprometer-se com esse mundo, para recr-lo
constantemente. Não é consumir idéias, nem obedecer. (GADOTTI,
2005, p. 90)
Uma educação democrática, dialógica, reflexiva e problematizadora tem o
poder de recriar a sociedade, de transformar uma realidade dada, conservadora,
a serviço das elites, em uma sociedade mais humana, menos desigual, onde o
educando das classes populares tem a oportunidade de aprender a cultura e
interferir nos rumos da potica, da economia, nos preços dos produtos, no valor
do seu trabalho, enfim, ele pode ser sujeito de sua história, e não apenas um
ser manipulado pelas forças dominantes.
Para Gadotti, ao novo educador compete refazer a educação,
reinventá-la, criar as condões objetivas para que uma educação
democrática seja possível, criar uma alternativa pedagica que
favoreça o aparecimento de um novo tipo de pessoas, solidárias,
preocupadas em superar o individualismo criado pela exploração
capitalista do trabalho, preocupadas com um novo projeto social e
política que construa uma sociedade mais justa, mais igualitária.
(GADOTTI, 2005, p. 82)
O conhecimento a serviço da ideologia dominante não deixa de ser uma
vioncia praticada por professores aos alunos das classes trabalhadoras. É
uma educação assistencialista e conservadora. O aluno agredido por suas
condições sociais, não encontra na escola a esperança de que precisa para
buscar alternativas, para se tornar sujeito de sua hisria. Pelo contrário, por
não sentir prazer e sentido no que lhe é ensinado, ele não aprende, não se
interessa pela escola, ela representa apenas mais um espaço de opressão e
não de libertação na sua vida.
O conhecimento a serviço da verdadeira humanização é dialógico, o
professor é parceiro do aluno no processo de formação, ele não mascara a
realidade, seu conteúdo es a serviço da cidadania. O aluno sente prazer em
aprender, pois é despertado para isso, o conhecimento parte de uma realidade
96
concreta em que ele está inserido, realidade que, uma vez problematizada,
pode ser transformada e estar a serviço de todos e não apenas de uma minoria
opressora. Aqui o assistencialismo dá lugar à rao crítica. Para FREIRE
(2006c):
O grande perigo do assistencialismo está na violência do seu
antidiálogo, que, impondo ao homem mutismo e passividade, não lhe
oferece condições especiais para o desenvolvimento ou a abertura
de sua consciência que, nas democracias autênticas, há de ser cada
vez mais críticas. (FREIRE, 2006c, p. 65)
Então, o que dizer da reprovação? Reprovar é recusar, rejeitar, censurar
severamente, criticar, condenar, julgar inabilitado. Ser reprovado é uma
demonstração de fracasso, alguém que o atingiu as metas exigidas para
alcaar a aprovação. O que dizer dos 4.301.062 alunos reprovados no ensino
fundamental em 2005? Eles tiveram 200 dias letivos para aprender, e não
aprenderam; tiveram 800 horas para aprender, e não aprenderam; foram
considerados incompetentes e, por isso, foram excluídos. Seu processo foi
interrompido, tiveram que passar mais 200 dias e/ou 800 horas na mesma
escola, nas mesmas salas de aula, vendo tudo de novo quase que imputando a
si o fracasso, como se a mudança tivesse que vir deles.
Se servir de consolo, algm deve ter dito a eles: não se preocupe vo
vai recuperar o tempo perdido, vai aprender melhor, isso se estudar mais, e se
comportar direitinho. No pximo ano vamos comprar uma mochila nova, um
caderno novo, vamos renovar tudo e até comprar uma camisa de uniforme
nova. Assim, parece até que o trauma da reprovação pode ser amenizado.
Um número tão grande de alunos reprovados é um sinal do poder da
escola, dos professores, do modelo excludente da escola seriada. Essa escola
insiste em transmitir apenas conhecimentos, em treinar seus alunos para o
vestibular, para concursos, para o mercado de trabalho, para reproduzir uma
cultura dominante a serviço das elites. Não percebem que o fracasso é de
todos, dos alunos, mas também do Estado, das políticas educacionais, da
escola e dos professores.
Para PARO (2007),
o poder-fazer da escola que temos, em termos potenciais, é muito
menor do que ela oficialmente declara ter. As causas desse fracasso
são muito variadas e, em sua maioria, m sido denunciadas das mais
97
diversas formas quer pela academia quer pelos grupos sociais
interessados em sua solução. Mas uma importante causa muito pouco
discutida e que parece estar na base de todo o problema do baixo
desempenho do ensino é precisamente essa timidez de sua ambição
no provimento de cultura. Ao pretender passar apenas conhecimentos
e ao se ater aos estreitos limites da comunicação verbalista, deixa de
lado os componentes da cultura que, articulados com o conhecimento,
dariam razão de ser a este e tornariam mais efetiva sua apreensão
pelos educandos. Nossa escola e seus responsáveis parecem o ter
percebido ainda que uma das maneiras mais certeiras de dificultar a
transmissão às criaas e jovens dos conhecimentos de que
necessitam para a vida é precisamente pretender passar só
conhecimento. (PARO, 2007, p. 16)
Esse poder autoritário da escola faz os alunos estudarem por medo;
medo de tirar notas baixas nas provas, medo de ser reprovado. Eles devem
obedecer, ficarem calados, prestarem atenção, serem submissos. A esses
alunos, não é dado o poder para pensarem, refletirem, participarem,
perguntarem, duvidarem, conhecerem, e, principalmente, apropriarem-se da
cultura. A reprovação é um instrumento repressivo que em nada contribui para a
formação de cidadão críticos e emancipados.
As relações de poder em uma escola verdadeiramente democrática são
dialógicas, participativas. Aqui, o professor provoca no aluno o desejo pelo
saber. O mecanismo utilizado é a persuasão e não a coação. Na escola
democrática, o professor procura conhecer a realidade concreta de seus alunos,
percebe suas necessidades e ajuda a superá-las. Constrói uma relação de
afeto, amizade, respeito e de troca com os alunos, não uma relação
paternalista, mas consciente e crítica. Paro (2007) diz que o professor só exerce
seu poder, só se faz efetivamente educador, só se faz competente em sua
profiso, isto é, só cumpre sua função social de construir personalidades
humano-históricas, quando, por uma relação de risco, isto é, pela persuasão,
logra construir em seu aluno um valor que permeia todo o seu aprendizado: o
desejo de aprender.
Sobre a implantação dos ciclos de formação humana no Brasil,
PERRENOUD (2004) diz:
propugnava-se, em contraposão, uma outragica de organização
curricular, centrada no aluno enquanto ser social em formação, atenta
ao princípio de desenvolvimento pleno do educando. À dimensão
cognitiva se agregaram a social, a afetiva e a atitudinal, permitindo-se
que a hisria de vida e os percursos particulares de cada aluno
fossem levados em conta no trato pedagógico. A gica dos conteúdos
98
cedeu lugar a uma lógica de formão do aluno a partir de
experiências educativas em que se articulavam conhecimentos já
adquiridos por vivências pessoais, conhecimentos provenientes dos
diferentes campos do saber e temas de relevância social, em um
processo de contextualização e integração que visava ao
desenvolvimento de individualidades capazes de pensamento crítico e
autonomia intelectual. (PERRENOUD, 2004, p. 206)
A avaliação não pode ser uma ferramenta de ameaça de que o professor
se utiliza para manter a disciplina na sala de aula. As provas bimestrais não
podem ser a única forma de avaliação do processo ensino aprendizado para
dizer se o aluno deve seguir para o ano seguinte. Nem mesmo a progressão
contínua exclui a avaliação desse processo, ela não pode ser a responsável
pelo fracasso escolar porque a avaliação se dá de forma contínua durante o
processo de formão, e inclui todos os agentes do processo ensino/
aprendizado.
Para Perrenoud, os ciclos não eliminam de forma definitiva a
necessidade de avaliar regularmente as progressões, mas dispensam
o professor de prestar contas sobre elas ao final de cada ano letivo,
apenas para provar que fez seu trabalho e para não ser recriminado
pelos pais, pela administração ou pelos colegas que vão acolher seus
alunos no ano seguinte. (PERRENOUD, 2004, p. 16)
Na escola democtica, o aluno deseja participar do processo de ensino
aprendizado, o sente medo e nem é coagido pela escola e pelo professor. Ele
no conhecimento um caminho para a sua emancipação. Na escola
democrática, os alunos são sujeitos de sua própria hisria, o medo da
reprovação é abolido e a avaliação ocorre durante todo o ano letivo e
compreende todos os agentes do processo de ensino aprendizado. Na escola
democrática, não resta alternativa ao Estado, à escola e ao professor do que
oferecer uma educação de qualidade. Mas é preciso lembrar que a escola
verdadeiramente democrática é um projeto em construção que, lentamente, vai
sendo construído na prática educacional onde os agentes do processo
acreditam em uma educação diagica e emancipadora. PERRENOUD (2004)
alerta para os desafios da construção desse modelo educacional dentro da
realidade brasileira:
O grande desafio é exatamente o de fazer emergir o novo em meio a
um aparato escolar que tem grande poder de regulação e que funciona
99
a partir de princípios contraditórios. Tudo indica, pois, que os ciclos
demandarão muito tempo ainda para serem consolidados, já que o
tempo de mudar no papel é muito diferente do tempo de transformar
corações e mentes, e daquele requerido para moldar a nova face da
escola. (PERRENOUD, 2004, p. 226)
Com base na historia da educação brasileira, nos números que
demonstram o fracasso escolar dentro do modelo seriado, onde os alunos,
principalmente os oriundos das classes trabalhadoras, não aprendem, são
freentemente reprovados, onde a evasão sempre foi muito grande, onde a
relação entre professores e alunos é uma demonstração de força do primeiro
sobre o segundo, onde seu poder é usado para reprovar e excluir aqueles que
mais carecem de uma educação de qualidade. Esses fatos me provocam a
buscar alternativas para a melhoria da educação nacional. Os ciclos de
formação humana aparecem como uma alternativa de inverter esse processo,
de estabelecer uma outra forma de relação entre professores e alunos, atras
do diálogo, de conteúdos inseridos na realidade concreta dos educandos, de
avaliações contínuas envolvendo o processo de ensino aprendizado.
Precisamos romper as barreiras de resistência, os equívocos que se
construíram acerca da progressão continuada, dos reagrupamentos, da perda
de poder do professor, da falta de conteúdo nos currículos. Precisamos ensinar
com qualidade e aprender com as diferenças, respeitando os tempos de cada
aluno, e aceitando o desafio de construir um modelo mais justo de educação
para todos.
100
5 PAULO FREIRE E A PEDAGOGIA DIALÓGICA
Uma teoria do conhecimento e/ou uma Filosofia da Educação
Esta pesquisa tem como referencial teórico o educador Paulo Freire, sua
metodologia de ensino, sua teoria emanciparia e sua práxis revolucionária.
Ambas articuladas à sua experiência política e à sua problematização das
relações sociais, atras de uma educação dialógica. Esse pernambucano,
profundamente marcado por suas raízes nordestinas e por uma profunda fé
cristã, encontra na educação uma nova forma de pronunciar o mundo.
Democracia, justiça, liberdade, emancipação, revolução não são apenas
palavras, o instrumentos de transformação de uma realidade dada. Partindo
de uma educação autoritária, conformista que produz uma massa de explorados
e marginalizados, Freire (2005) cria sua teoria diagica que se realiza na práxis
libertadora de todos os homens.
Alfabetizar conscientizando, ensinar a ler e a escrever, e também a
interpretar o mundo, põem a educação como ferramenta indispensável para a
prática da liberdade. Para Paulo Freire, não basta ensinar alguém a escrever a
palavra tijolo, é preciso que o educando compreenda a imporncia de um tijolo
para construir sua casa, o importante é problematizar a palavra ensinada dentro
do contexto histórico em que o aluno está inserido. A palavra geradora tijolo
torna-se não apenas um objeto de alfabetização, mas uma ferramenta de luta
contra a exclusão social. Educar é um gesto de amor, não de caridade e nem de
paternalismo, mas de respeito pelo aprendizado do aluno. Esta pesquisa
observa a relação de poder entre professores e alunos de uma escola pública
da periferia de Betim, à luz do método desenvolvido por Paulo Freire.
A contradição entre a educação bancária e a educação dialógica é o eixo
central da pesquisa. Sua teoria educacional pretende tornar o educando sujeito
do processo de ensino aprendizado juntamente com o educador como pessoas
emancipadas para uma presença diferenciada no mundo capitalista. A relação
pedagógica o é autoritária; ela permite ao educando apropriar-se da cultura
para poder transformá-la. Para Freire (2006c), a relação dialógica faz da
101
educação uma ptica libertadora. O aluno não aprende apenas a ler e a
escrever textos, mas a ler e a interpretar a realidade na qual es inserido; ele
se torna capaz de fazer uma leitura do mundo para transformá-lo em vista de
novos pades nas relações sociais.
Contrapondo uma educação autoritária que impunha aos alunos uma
cultura dominante, não permitindo uma interação entre ele o conteúdo ensinado,
Paulo Freire propõe uma educação como ptica da liberdade, unindo
alfabetização e conscientização da realidade vivida pelos educandos. As
palavras geradoras têm vida, pois dizem respeito às experiências vividas por
eles. Essa prática provoca uma ruptura com o conformismo de uma educação
bancária levando os indivíduos a compreenderem a liberdade como um princípio
existencial, uma ferramenta de luta contra a exclusão social. O importante, nos
círculos de cultura, é que os educandos se apropriem da cultura, denunciem seu
caráter elitista e excludente, assumam a responsabilidade de transformá-la em
beneficio de todos.
O ponto de partida para uma análise, tanto quanto possível
sistemática, da conscientização, deve ser uma compreensão crítica
dos seres humanos como existentes no mundo e com o mundo. Na
medida em que a condição básica para a conscientização é que seu
agente seja um sujeito, isto é, um ser consciente, a conscientização,
como a educação, é um processo específica e exclusivamente
humano. É como seres conscientes que mulheres e homens estão não
apenas no mundo, mas com o mundo. Somente homens e mulheres,
como seres abertos, são capazes de realizar a complexa operação
de, simultaneamente, transformando o mundo através de sua ação,
captar a realidade e expressá-la por meio de sua linguagem criadora.
E é enquanto são capazes de tal operação, que implica em tomar
distância do mundo, objetivando-o, que homens e mulheres se fazem
seres com o mundo. Sem esta objetivação, mediante a qual
igualmente se objetivam, estariam reduzidos a um puro estar no
mundo, sem conhecimento de si mesmos nem do mundo. (FREIRE,
2006a, p. 77)
Paulo Reglus Neves Freire nasceu na cidade de Recife, em Pernambuco,
no dia 19 de setembro de 1921. Vindo de uma família de classe média, seu pai,
Joaquim Temístocles Freire, potiguar, era sargento do Exército; sua mãe,
Edeltrudes Neves Freire, pernambucana, era dona de casa e bordadeira. Freire
foi alfabetizado na sua ppria casa com as experncias do cotidiano. Suas
primeiras palavras vinham da vivência da infância, o que, certamente,
influenciou seu trabalho como educador. Ele teve que enfrentar as dificuldades
102
da vida pobre durante a depressão de 1929. Com 13 anos perdeu seu pai,
aumentando as dificuldades financeiras da família e as condições de estudo,
entrou no ginásio (5ª série) com 16 anos. Era um aluno que tinha dificuldades
para assimilar os conteúdos formais, as experiências da adolescência
marcariam sua vida e torná-lo-iam mais sensilvel com a causa dos mais pobres.
Queria muito estudar, mas não podia porque nossa condão
econômica não o permitia. Tentava ler ou prestar atenção na sala de
aula, mas não entendia nada, porque a fome era grande. Não é que eu
fosse burro.o era falta de interesse. Minha condição socialo
permitia que eu tivesse uma educação. A experiência me ensinou,
mais uma vez, a relação entre classe social e conhecimento. Eno,
devido aos meus problemas, meu irmão mais velho comou a
trabalhar e nos ajudar, e eu começei a comer mais. Naquela época,
estudava no segundo ou terceiro ano do colegial, sempre com
dificuldades. À medida que comia melhor, comecei a compreender
melhor o que lia. Foi aí, precisamente, que comecei a estudar
gramática, porque adorava os problemas da linguagem. Eu estuava
filosofia da linguagem por conta ppria, preparndo-me, aos 18 ou 19
anos, para entender o estruturalismo e a linguagem. Comecei, então, a
ensinar gramática portuguesa, com amor pela linguagem e pela
filisosfia, e com a intuição de que deveria compreender as
expectativas dos estudantes e fazê-los participar do diálogo. Em
algum momento, entre os 15 e os 23 anos, descobri o ensino como
minha paixão. (FREIRE apud GADOTTI, 2004, p. 23-24)
Paulo Freire começou a dar aulas muito cedo, quando ainda cursava o
segundo grau. Entrou para a Universidade do Recife em 1943, para cursar
Direito, mas também se dedicou aos estudos de Filosofia da Linguagem. Apesar
disso, nunca exerceu a profissão; desistiu logo na primeira causa e preferiu
trabalhar como professor numa escola de segundo grau, ensinando a língua
portuguesa. Em 1944, casou com a professora primária Elza Maia Costa de
Oliveira. Paulo Freire tinha 23 anos e dava aulas; eles tiveram cinco filhos. Elza
foi companheira, amiga e namoarda em todos os 42 anos em que viveram
juntos, contribuindo para o pensamento pedagógico de Freire; ela veio a falecer
em 1986. Freire casou-se novamente em 1988 com a ex-aluna e também
professora Ana Maria Araújo Hasche, com quem viveu e partilhou seus projetos
pedagógicos até seus últimos dias.
Em 1946, Freire foi trabalhar no SESI Serviço Social da Indústria, onde
se tornou diretor do setor de educação; ali permanceu por 8 anos. Nesse
período, Freire aprendeu a dialogar com a classe trabalhadora, a compreender
sua forma de apreender o mundo, através da sua linguagem. Foi aí, aprendendo
103
na prática, que se tornou um educador. (Gadotti, 1991) Uma das experiências
que marcaram sua vida foi o MCP Movimento de Cultura Popular do Recife,
onde surgiram os círculos de cultura e os estudos sobre linguagem popular e
erudita que fez enquanto professor de língua portuguesa. Freire foi fundador e
diretor do Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife, onde
elaborou um novo método de afabetização de adultos. Em 1959, escreveu a
tese que concorreria à cadeira de História e Filosofia da Educação, na Escola
de Belas-Artes do Recife. O título da tese era: “Educação e atualidade
brasileira”. Com ela, obteve o grau equivalente ao de doutor.
O círculo de cultura é uma unidade de ensino que substitui a escola
tradicional. É formado por um grupo de pessoas que se reúne para
discutir seu trabalho, a realidade local e nacional, sua vida familiar etc.
Nele, não há lugar para o professor tradicional bancário”, que tudo
sabe, nem para o aluno que nada sabe. Assim, ao mesmo tempo que
aprende a ler e a escrever, o educando aprende a ler, isto é, a
analisar sua prática e a atuar sobre ela. (GADOTTI, 2004, p. 147)
Freire teve sua educação influenciada pelo catolicismo. Seu engajamento
com movimentos progressistas da Igreja deu-se desde a mais tenra idade, com
a Ação Católica, Comunidades Eclesiais de Base e a Teologia da Libertação,
que é uma
concepção progressista da teologia e do papel social e político da
Igreja, desnvolvida sobretudo na América Latina, que defende o
engajamento dos cristãos na luta pela libertação. Opõe-se à teologia
dogmática, que estabelece um rígido código de conduta para os
cristãos, baseado na defesa da tradição, da falia e da propriedade
privada. A Teologia da Libertação adota o método diatico para a
análise da realidade. (GADOTTI, 2004, p.158)
Segundo Gadotti (2004), o método freireano deve ser entendido dentro do
contexto histórico em que nasceu, o nordeste brasileiro, onde, na década de
1960, metade dos seus 30 milhões de habitantes vivia na cultura do silêncio,
isto é, eram analfabetos. Era preciso “dar-lhes a palavra para que
transitassem para a participação na costrução de um Brasil, dono de seu
próprio destino, que superasse o colonialismo. Seu trabalho ganhava destaque
mesmo, em 1962, quando ele aplicou publicamente seu método na cidade de
Angicos (RN), onde, em 45 dias, alfabetizaram-se 300 trabalhadores rurais.
João Goulart, presidente na época, chamou Paulo Freire para organizar uma
104
Campanha Nacional de Alfabetização. Essa campanha tinha como objetivo
alfabetizar 2 milhões de pessoas, em 20.000 círculos de cultura. (Gadotti, 2004,
p. 32)
O Brasil vivia uma disputa de poder entre as elites conservadoras (os
militares, industriais e proprierios de terras) e os políticos populistas que
manipulavam as massas. Mas o primeiro grupo foi mais forte e tomou o poder
pela força, com o Golpe de 1964. Nesse momento, todo tipo de mobilização
social foi reprimida, e o projeto educacional de Paulo Freire foi abandonado. Em
seu lugar, surgiu o MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), uma
iniciativa para a alfabetização, porém, visceralmente distinta dos ideais
freirianos.
Nestes últimos anos, o fantasma do comunismo, que as classes
dominantes agitam contra qualquer governo democrático da América
Latina, teria alcaado feições reais aos olhos dos reacionários na
presença potica das classes populares. O movimento de educão
popular, solidário à ascenção democrática das massas, o poderia
deixar de ser atingido. Desde antes do golpe de Estado seu trabalho
se constituía num dos alvos preferidos dos grupos de direita. Todos
sabiam da formação católica de seu inspirador e de seu objetivo
básico: efetivar uma aspirão nacional apregoada, desde 1920, por
todos os grupos políticos, a alfabetização de povo brasileiro e a
ampliação democrática da participação popular. Não obstante, os
reacionários não podiam compreender que um educador católico se
fizesse expressão dos oprimidos e menos ainda podiam compreender
que a cultura levada ao povo pudesse conduzir à dúvida sobre a
legitimidade de seus privilégios. Preferiram acusar Paulo Freire por
idéias que o professa a atacar esse movimento de democrátização
cultural pois percebiam nele o gérmem da revolta. (WEFFORT apud
FREIRE, 2006c, p. 19)
Paulo Freire foi preso por 70 dias, acusado de subversivo e traidor de
Cristo e do povo brasileiro. Em seguida, passou por um breve elio na Bovia,
onde teve dificuldades com a altitude. Esse país também sofreu um Golpe de
Estado, forçando Freire a transferir-se para o Chile, onde permaneceu por
quatro anos e meio. Nesse país, ele trabalhou para o Movimento de Reforma
Agrária da Democracia Cris, deu aulas na Universidade Católica de Santiago,
e também trabalhou para a Organização de Agricultura e Alimentos da
Organização das Nações Unidas. Ali, dedicou-se, principalmente, à formação de
adultos camponeses. Em 1967, Freire publicou seu primeiro livro, Educação
como prática da liberdade. O livro é a apresentação da pedagogia dialógica, a
105
liberdade como um modo de ser do homem, portanto, uma educação
libertadora.
Conscientizar não significa, de nenhum modo, ideologizar ou propor
palavras de ordem. Se a conscientização abre caminho à expressão
das insatisfações sociais é porque estas são componentes reais de
uma situão de opressão; se muitos dos trabalhadores recém-
alfabetizados aderiram ao movimento de organização dos sindicatos é
porque eles próprios perceberam um caminho ligítimo para a defesa
de seus interesses e de seus companheiros de trabalho; finalmente, se
a conscientização das classes populares significa radicalização
política é simplesmente porque as classes populares são radicais,
ainda mesmo quando não o saibam.
O saber democrático jamais se incorpora autoritariamente, pois
só tem sentido como conquista comum do trabalho do educador e do
educando. Não é possivel, diz Paulo Freire, dar aulas de democracia
e, ao mesmo tempo, considerarmos como ‘absurda e imoral a
participação do povo no poder”. A democracia é, como o saber, uma
conquista de todos. Toda a separão entre os que sabem e os que
não sabem, do mesmo modo que a separação entre as elites e o povo,
é apenas fruto de circunstâncias históricas que podem e devem ser
transformadas. (WEFFORT apud FREIRE, 2006c, p. 20)
A alfabetização das massas incomodou as elites brasileiras que se
sentiram ameçadas. As organizações populares, os movimentos sindicais e
religiosos, os círculos de cultura não eram bem vindos e precisavam ser
eliminados, combatidos, mesmo que para isso fosse usada a força. Era preciso
manter a ordem nacional, eliminar a ameaça comunista, manter os privigios
dos poucos afortunados do País. Mesmo os políticos populistas não tinham
interesse em conscientizar, mas em manipular as massas, multiplicando o
número de eleitores. Seus equívocos levaram-nos ao fracasso e à perda do
poder para os violentos poderosos e armados membros das elites brasileiras. A
emancipação popular foi adiada, seus líderes foram presos ou expulsos do País,
dentre eles o criador dotodo que apontava a educação como prática da
liberdade. Paulo Freire perdeu a liberdade de ensinar e de viver no Brasil.
Freire ja era conhecido nos quatro cantos do planteta. Seu todo de
ensino fazia escola. Foi convidado para ser professor visitante da Universidade
de Harvard, em 1969, onde permaneceu por menos de um ano, transferindo-se
para Genebra, na Suíça. No ano anterior, ele escrevera seu mais famoso livro,
Pedagogia do oprimido, que foi publicado em várias línguas, como o espanhol, o
inglês (em 1970), e até o hebraico (em 1981). Por causa da situação política do
País, ele não foi publicado no Brasil até 1974, quando o general Geisel tomou o
106
controle do Brasil e iniciou um processo de liberalização cultural. Em Genebra,
Freire trabalhou como consultor educacional para o Conselho Mundial de
Igrejas. Durante esse tempo, atuou como um consultor em reforma educacional
em colônias portuguesas na África, particularmente em Guiné Bissau e em
Moçambique.
Depois de 15 anos de exílio, Paulo Freire retornou ao Brasil, em mao de
1980. Lecionou na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na
Pontifícia Universidade Calica de São Paulo (PUC-SP). À sua maneira, foi
reaprendendo o Brasil, engajando-se sempre mais nos debates educaionais,
participando de palestras, cursos e conferências. Filiou-se ao Partido dos
Trabalhadores na cidade de São Paulo, e atuou como supervisor para o
programa do Partido para alfabetização de adultos, de 1980 até 1986. Em 1987,
foi reintegrado como professor da Universidade Federal de Pernambuco, por um
ato do governo da Nova República, pois havia sido destituído pelo Regime
Militar em 1964. Quando a candidata do PT à prefeitura de São Paulo, Luiza
Erundina, foi eleita, ela convidou Freire para a Secretaria Municipal de
Educação, onde ele ficou de 1989 à 1991. Como Secretário de Educação do
Município de São Paulo, Freire valorizou a formação permanente dos
professores, criou junto com os movimentos populares o projeto chamado
MOVA-SP (Movimento de Alfabetização da Cidade de o Paulo), esse projeto
era um programa de alfabetização de jovens e adultos, voltado para o resgate
da cidadania, com o objetivo de formar multiplicadores de uma ação social
libertadora. Por último, podemos destacar a prática interdisciplinar como um
elemento fundamental na construção de uma escola participativa e decisiva na
formação do sujeito social.
Em 1991, o Instituto Paulo Freire foi fundado em São Paulo para estender
e elaborar suas teorias sobre educação popular. O instituto mantém os arquivos
de Paulo Freire.
Freire foi internado com fortes dores no peito na manhã do dia 1º de maio
de 1997, no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Morreu após o segundo
ataque cardíaco, na manhã do dia 2 de maio de 1997, com 75 anos de idade.
Freire escreveu mais de 40 livros, traduzidos em 28 idiomas. Cidadão honorário
de nove cidades brasileiras. Condecorado diversas vezes com medalhas,
comendas e pmios de vários países. Doutor honoris causa, em 28
107
Universidades. Convidado oficial de mais de 50 países dos cinco continentes.
Homenageado com uma estátua em Estocolmo, capital da Suécia, Paulo Freire
foi o educador brasileiro mais conhecido e respeitado em todo o mundo. Entre
as suas principais obras podemos destacar: Educação como ptica da
liberdade (1967), Extensão ou comunicão (1971), Pedagogia do oprimido
(1974), Ação cultural para a liberdade o outros escritos (1976), Cartas à Guiné-
Bissau (1977), A importância do ato de ler (1982), Pedagogia da esperança
(1992), Professora sim, tiao (1993), Essa escola chamada vida (1994) e
Pedagogia da autonomia (1996).
5.1 A pedagogia dialógica
Paulo Freire deixou um legado pedagico importante para todo educador
que deseja uma educão libertadora, ctica e revolucionária. Seu gosto pela
liberade denuncia o autoritarismo da educação tradicional brasileira que despeja
conceitos e fórmulas sobre os alunos sem nenhuma problematização. A
educação atras da conscientização é uma alternativa educacional capaz de
formar a consciência crítica dos alunos, e, assim, possibilitar uma transformação
social. A pedagogia diagica é uma ferramenta de trabalho de que o educador
humanista se utiliza para emancipar seus alunos, dar a eles a palavra capaz de
interpretar a realidade por eles vivida. Essa relação dialógica entre professor/
aluno se constrói na pxis que une a teoria e a ptica, ou seja, o conteúdo e a
vida concreta dos alunos. Portanto, uma prática educacional autoritária impede
a emancipação dos alunos, tornando-os seres dóceis e passivos diante de sua
própria condição social. Nossa educação o tem sido, de modo geral, um
processo que possibilita, a boa parte de nossas crianças, o direito de se
apropriar da cultura e muito menos de transformá-la. A leitura de Paulo Freire,
nesse início do século XXI, leva-me a refletir sobre a minha ppria prática em
sala de aula. Seu método de ensino continua provocando governantes, gestores
escolares e educadores para uma ptica educacional que desperte em nossas
crianças o desejo pelo saber, que elas não somente freqüentem uma sala de
108
aula, mas que se apropriem veradeiramente do conhecimento, tornando-se
sujeitos desse processo.
A pedagogia de Paulo Freire surge das experiências vividas por ele, do
contexto político, econômico e social em que o Brasil se encontrava na cada
de 1960. Nesse momento, surgem osrculos de cultura que consistem na
alfabetização pela conscientização. É uma proposta para a alfabetização de
adultos. Eles eram uma alternativa ao sistema tradicional que utilizava a cartilha
como ferramenta central da didática para o ensino da leitura e da escrita. As
cartilhas ensinavam pelo método da repetição de palavras soltas ou de frases
criadas de forma forçosa, que comumente se denomina como linguagem de
cartilha. Por exemplo: Eva viu a uva, o boi baba, a ave voa, dentre outros. Não
existe nesse método uma contextualização, as frases não dizem nada a respeito
da realidade dos alunos. Os círculos de cultura partiam do saber social dos
educandos para alfabetizá-los. Freire é um educador profundamente humanista,
um homem do diálogo e do conflito. Para ele, uma educação verdadeiramente
libertadora une a teoria com a ação transformadora da realidade. É por isso que
seu método de ensino pode ser conhecido, também, como uma teoria do
conhecimento ou uma filosofia da educação.
A visão da liberdade tem nesta pedagogia uma posão de relevo. É a
matriz que atribui sentido a uma prática educativa que só pode
alcançar efetividade e eficácia na medida da participação livre e crítica
dos educandos. É um dos princípios essenciais para a estruturação do
círculo de cultura, unidade de ensino que substitui a escola,
autoritária por estrutura e tradão. Busca-se no círculo de cultura,
peça fundamental no movimento de educação popular, reunir um
coordenador a algumas dezenas de homens do povo no trabalho
comum pela conquista da linguagem. O coordenador, quase sempre
um jovem, sabe que não exerce as funções de professor e que o
diálogo é condição essencial de sua tarefa a de coordenar, jamais
influir ou impor. (WEFFORT apud FREIRE, 2006c, p. 13)
A riqueza de suas obras ensinam-nos muito mais que uma teoria, um
método de ensino. Elas nos ensinam que uma educação emancipadora se
consti na prática educativa cotidiana, na relação dialógica entre professores e
alunos. Um processo onde as contradições o evidenciadas para serem
superadas numa perspectiva humanista. Uma verdadeira relação de poder
compartilhada entre os agentes do processo ensino aprendizado. Um
109
conhecimento que não é compartilhado, que é apenas transmitido, não pode ser
problematizado, não é uma práxis verdadeiramente cidadã.
5.1.1 Etapas de formação
A investigação: nessa etapa, são levantadas as palavras e os temas mais
significativos e com uma maior riqueza silábica da vida concreta dos alunos,
dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde eles vivem.
A tematização: essa é a etapa de tomada de consciência do mundo,
através da alise dos significados sociais dos temas e palavras.
A problematização: nessa etapa, evidencia-se a necessidade de uma
ação concreta sobre o real; o professor desafia e inspira o aluno a superar a
vio mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada.
As palavras geradoras: o processo de alfabetização inicia-se pelo
levantamento do universo vocabular dos alunos. Através de conversas
informais, o educador observa os vobulos mais usados pelos alunos, e,
assim, seleciona as palavras que servio de base para as lições. Depois de
composto o universo das palavras geradoras, elas se apresentam em cartazes
com imagens. Eno, nos círculos de cultura, inicia-se uma discuso onde os
alunos o incentivados a expressar-se para significá-las na realidade daquela
turma.
A silabação: uma vez identificadas, cada palavra geradora passa a ser
estudada, através da divisão silábica, semelhantemente ao método tradicional.
Cada sílaba desdobra-se em sua respectiva família silábica, com a mudança da
vogal. Exemplo: la, le, li, lo, lu.
As palavras novas: o passo seguinte é a formação de palavras novas.
Usando as famílias silábicas agora conhecidas, o grupo forma palavras novas.
110
A conscientização: esse é o processo de formação da consiência crítica,
onde se busca uma relação entre a teoria e a prática, entre o conteúdo e a vida
concreta dos alunos. Aqui se faz a discussão sobre os diversos temas surgidos
a partir das palavras geradoras. Para Paulo Freire, alfabetizar não pode se
restringir aos processos de codificação e decodificação. Dessa forma, o objetivo
da alfabetização de adultos é promover a conscientização acerca dos problemas
cotidianos, a compreensão do mundo e o conhecimento da realidade social.
5.1.2 As fases de aplicação da pedagogia dialógica
1ª fase: Levantamento do universo vocabular dos grupos com quem se
trabalhará. Nessa fase, ocorrem as interações de aproximação e conhecimento
mútuo, atras de encontros informais, bem como a anotação das palavras da
linguagem dos membros do grupo, respeitando as expressões típicas de cada
povo.
2ª fase: Escolha das palavras selecionadas do universo vocabular
pesquisado, seguindo os critérios de riqueza fonêmica, dificuldades fonéticas
numa seqüência gradativa das mais simples para as mais complexas, do
comprometimento pragmático da palavra na realidade social, cultural, potica do
grupo.
3ª fase: Criação de situações existenciais características do grupo. São
situações-problemas inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com
o intuito de abrir perspectivas para a análise ctica consciente de problemas
locais, regionais e nacionais.
4ª fase: Elaboração das fichas-roteiro que funcionam como roteiro para os
debates, as quais deveo servir como subsídios, nunca como uma prescrição
rígida a ser seguida.
111
5ª fase: Criação de fichas de palavras para a decomposição das famílias
fonéticas correspondentes às palavras geradoras.
Essa trajetória da pedagogia dialógica continha, ao mesmo tempo, uma
crítica radical ao que ele chamaria de educação bancária e uma proposta de
educação emanciparia como prática de liberdade em vista de maior igualdade
sócio-cultural.
5.1.3 Educação bancária
Paulo Freire não acreditava na educação tradicional. Para ele, ela era
responvel pelo fracasso de tantos alunos nas escolas brasileiras. Para
alfabetizar, principalmente jovens e adultos, era preciso uma metodologia que
partisse da realidade concreta em que o educando se encontrava. O educador
não pode ser aquele que apenas se ocupa em transmitir um conhecimento
pronto, definido por um currículo fechado, era preciso pensar a realidade,
partindo dos problemas vividos pelos educandos. Para Freire, a pedagogia, o
currículo e a vida social e política precisam passar por uma revolução, aquela
capaz de emancipar o educando e torná-lo sujeito de sua história.
A educação bancária é aquela exercida como ptica de dominação,
apenas o educador é sujeito, aquele que sabe, o aluno objeto, aquele que o
sabe, são vasilhas a serem enchidas, o educador deposita comunicados que
estes recebem, memorizam e repetem. Não existe ali uma relação dialógica,
mas uma imposão de saberes determinados, a ptica educacional é
totalmente verbalista, dirigida para a transmissão e avaliação de conhecimentos
abstratos, numa relação vertical, o saber é dado, fornecido de cima para baixo,
uma relação autoritária, pois, na educação bancária, manda quem sabe. Nesse
processo, o educando é um ser passivo, um objeto que recebe a doação do
saber do educador, sujeito único de todo o processo. Esse tipo de educação
pressupõe um mundo harmonioso, no qual o há contradições, daí a
conservação da ingenuidade do oprimido, que, como tal, se acostuma e
acomoda no mundo conhecido, o mundo da opressão.
112
A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à
memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narrão
os transforma em vasilhas, em recipientes a serem enchidos pelo
educador. Quanto mais vá enchendo os recipientes com seus
depósitos tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem
docilmente encher, tanto melhores educados serão. Desta maneira, a
educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os
depositários e o educador o depositante.
Em lugar de comunicar-se, o educador faz comunicados e depósitos
que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente,
memorizam e repetem. Eis a concepção bancária da educação,
em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de
receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem
colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. No fundo,
porém, os grandes arquivados são os homens, nesta (na melhor das
hipóteses) equivocada concepção bancária da educão.
Arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis, os homens não
podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que,
nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há
criatividade, não há transformão, não há saber. Só existe saber na
invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente,
que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros.
Busca esperançosa também. (FREIRE, 2005, p. 66-67)
Na concepção “bancária que estou criticando, para a qual a educação é
o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não se
verifica, nem pode verificar-se, essa superação. Pelo contrio, refletindo a
sociedade opressora, sendo dimensão da “cultura do silêncio, a “educação
bancáriamantém e estimula a contradição.
Daí, então que nela:
a) o educador é o que educa; os educandos, os que são educados;
b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;
c) o educador é o que pensa; os educandos os pensados;
d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam
docilmente;
e) o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;
f) o educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que
seguem a prescrição;
g) o educador é o que atua; os educandos, os que m a ilusão de que atuam,
na atuação do educador;
h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos
nessa escolha, acomodam-se a ele;
113
i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, o
que oe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se
às determinações daquele;
j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.
Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada
sabem, cabe àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos
segundos. Saber que deixa de ser de experiência feito para ser de
experiência narrada ou transmitida.
Na verdade, o que pretende os opressores é transformar a
mentalidade dos oprimidos e o a situação que os oprime”, e isto
para que, melhor adaptando-os a situão, melhor os dominem.
A questão está em que pensar autenticamente é perigoso. O
estranho humanismo desta concepção bancária se reduz à tentativa
de fazer dos homens o seu contrário o autômato, que é a negação
de sua ontológica vocação de ser mais. (FREIRE, 2005, p. 68-70)
A educão bancária é a educão em que o professor é quem dá a
última palavra, devendo os alunos aceitar passivamente o que ele diz.
Dessa forma, o único que pensa é o professor, cabendo aos alunos
apenas receber os depósitos que o professor faz dos conhecimentos
que possui (como sucede num banco quando se deposita dinheiro). A
educação bancária é domesticadora porque busca controlar a vida e a
ação dos alunos, proibindo-os de exercer seu poder criativo e
transformador. (GADOTTI, 2004, p. 151)
5.1.4 A concepção problematizadora e libertadora da educação
Para Freire, a educação não é neutra, mas sim uma ação cultural que
resultaria numa relação de dominação ou de liberdade entre os seres humanos.
Certo de que o Brasil era dividido em classes com interesses vitais antagônicos,
ele identificava, aqui, a existência de uma educação voltada para a dominação.
Nela, a seu ver, o processo educativo seria rígido, autoritário e avesso ao
diálogo com os educandos. Formava educadores empenhados na formação da
docilidade e passividade dos educandos, uma educação formal e distante da
realidade social da maioria dos jovens brasileiros. A educação bancária era de
interesse das elites brasileiras, mas, do outro lado estavam as classes
trabalhadoras que careciam de uma pedagogia libertadora que poderia dar
conhecimentos e suscitar reflexões que lhes possibilitassem tomar consciência
de serem explorados e de que poderiam mudar tal situação. Necessariamente,
114
essa pedagogia teria de ser flexível, participativa e incentivar ao máximo o
diálogo entre educadores e educandos.
Um educador humanista, revolucionário, não há de esperar esta
possibilidade. Sua ação, identificando-se, desde logo, com a dos
educandos, deve orientar-se no sentido da humanização de ambos.
Do pensar autêntico e não no sentido da doação, da entrega do saber.
Sua ão deve estar infundida da profunda crença nos homens.
Crença no seu poder criador.
Isto tudo exige dele que seja um companheiro dos educandos, em
suas relações com estes.
É que, se os homens são estes seres da busca e se sua vocação
ontológica é humanizar-se, podem, cedo ou tarde, perceber a
contradição em que a educação bancária pretende mantê-los e
engajar-se na luta por sua libertação. (FREIRE, 2005, p. 71)
Uma educação como ptica da liberdade toma como referência a própria
história dos educandos, problematiza as relações de exploração existentes na
sociedade, conscientiza a todos que a realidade o é algo dado, imutável, mas
dinâmico e capaz de transformar-se. Uma educação libertadora enfrenta as
contradições sociais, posiciona-se diante dela, propõe uma pxis libertadora.
Alfabetizar é conscientizar eo manipular seres dóceis e passivos, ela se
torna expressão da luta dos homens por uma cidadania plena: política, social,
religiosa, econômica e cultural.
A educão bancária, em cuja prática se dá a inconciliação
educador-educandos, rechaça este companheirismo. E é lógico que
seja assim. No momento em que o educador bancário vivesse a
superação da contradão já não seria bancário. Já não faria
depósitos. Já o tentaria domesticar. Já não prescreveria. Saber com
os educandos, enquanto estes soubessem com ele, seria sua tarefa.
Já não estaria a servo da desumanização. A serviço da opressão,
mas a servo da libertação. (FREIRE, 2005, p. 71)
Uma pedagogia dialógica exige que o educador assuma uma postura de
respeito pelo educando, pela sua história. Ela parte da realidade vivida para
uma realidade transformada. Segundo Freire, para passar da consciência
ingênua à conscncia crítica, é necessário um longo percurso, no qual o
educando rejeita a hospedagem do opressor dentro de si, que faz com que ele
se considere ignorante e incapaz. É o caminho de sua auto-afirmação enquanto
sujeito. A educação problematizadora exige um constante diálogo entre o
educador e o educando, uma relação dialética, transformadora e revolucionária.
Esse dlogo permite ultrapassar o imediato vivido, permite uma visão das
115
contradições, ambos, educador/educando, buscam a transformação através da
consciência crítica.
”Uma educação problematizadora baseia-se na criatividade e possibilita
uma reflexão e uma ação crítica sobre a realidade, comprometidas com a
transformação social (GADOTTI, 2004, p. 151).
Na cada de 1990, Freire dedicou-se, em seus livros, aos problemas da
sociedade pós-moderna, preocupado com a diversidade cultural, e com o
respeito pelo diferente, com a intolencia que provocava a vioncia na
sociedade contemporânea, ele propunha uma educação para a diversidade,
uma ética da diversidade e uma cultura da diversidade. Para ele, uma
sociedade multicultural deve educar o ser humano multicultural, capaz de ouvir,
de prestar atenção ao diferente, respeitá-lo. Nesse novo cenário da educação,
será preciso reconstruir o saber da escola e a formação do educador.o
haverá um papel cristalizado, tanto para a escola quanto para o educador. Em
vez da arrogância de quem se julga dono do saber, o professor deverá ser mais
criativo e aprender com o aluno e com o mundo. Numa época de vioncia, de
agressividade, o professor deverá promover o entendimento com os diferentes,
e a escola deverá ser um espaço de convivência, onde os conflitos são
trabalhados, não camuflados.
A educação verdadeiramente humana compreende o cidao na sua
totalidade, não apenas no cognitivo escolar tradicional. O olhar da escola está
sempre voltado para o educando em toda a sua humanidade, em todas as suas
necessidades. Ela conduz o aluno ao conhecimento da sua realidade, do saber
que transforma, que o permite se apropriar da cultura. A relação dialógica entre
educador/educando é o único caminho para derrubar o autoritarismo da
educação tradicional banria. Uma educação libertadora respeita a
diversidade cultural, o pluralismo de idéias, ela é reflexiva e crítica, portanto,
revolucionária. Enquanto em nossas escolas encontrarmos alunos passivos,
dóceis, conformados com as relações de dominação, é porque nessas escolas
encontramos educadores autoritários, que, mesmo sem saber, prestam serviço
para as elites que o desejam mudanças. Paulo Freire foi um porta-voz da
esperança. Ele acreditava na educação como uma ferramenta política a serviço
da transformão social. Em seu livro Pedagogia da autonomia, ele proclama a
verdadeira vocação do educador progressista:
116
Sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da
liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade,
da democracia contra a ditadura de direita ou de esquerda. Sou
professor a favor da luta constante contra qualquer forma de
discriminação, contra a dominação econômica dos indivíduos ou das
classes sociais. Sou professor contra a ordem capitalista vigente que
inventou esta aberração: a miséria na fartura. Sou professor a favor da
esperança que me anima apesar de tudo. Sou professor contra o
desengano que me consome e imobiliza. Sou professor a favor da
boniteza de minha própria prática, boniteza que dela some se não
cuido do saber que devo ensinar, se não brigo por este saber, se não
luto pelas condões materiais necessárias sem as quais meu corpo,
descuidado, corre o risco de se amofinar e de já o ser o testemunho
que deve ser de lutador pertinaz, que cansa más o desiste. Boniteza
que se esvai de minha prática se, cheio de mim mesmo, arrogante e
desdenhoso dos alunos, não canso de me admirar. (FREIRE, 1996, p.
102-103)
Ao escolher Paulo Freire como referência para esta pesquisa, assumi o
desafio de investigar o nível de presença de uma pedagogia na qual uma
educação autoritária que tudo sabe em detrimento do aluno que nada sabe”.
Assumi, com a perspectiva freireana, uma postura político-pedagógica em prol
de uma escola pública e de qualidade que faça do educando um sujeito do
processo ensino/aprendizado. Sabe-se do quanto a pedagogia da repetência
joga sobre o aluno a responsabilidade do fracasso escolar. Sabe-se, por outro
lado, o quanto a educação escolar pode propiciar aos membros das classes
populares uma via para a sua emancipação, pela mudança radical de um
sistema econômico que deixa milhões de cidadãos na miséria, enquanto uns
poucos gozam de todo conforto e privilégios. Tomar esse referencial é insistir na
dinâmica em que a educação escolar, ao emancipar as pessoas, coloca-as em
posição de combater as desigualdades sociais e suas conseqüências. No dia 19
de setembro de 1983, Paulo Freire recebeu uma carta de uma turma de alunos
da primeira série de ensino fundamental, nela, as crianças foram incisivas:
estamos escrevendo-lhe para pedir-lhe que continue sempre amando as
crianças”. Em sua resposta ele reafirma seu compromisso de querer bem aos
meninos e as meninas, e conclui: eu amo muito a vida. Em seus escritos,
sempre afirmou que educar é um gesto de amor, um amor comprometido com
aqueles que aprendem, compromisso que se renova a cada cidadão
alfabetizado, capaz de fazer uma leitura do mundo. Uma educação onde o
professor é o sujeito e o aluno objeto do processo de ensino/aprendizado forma
cidaos passivos, não permite aos alunos exercer seu poder criativo e
117
transformador da realidade por eles vivida. Ensinar a ler e a escrever é
importante, na medida que acompanha uma reflexão crítica sobre o que se lê e
o que se escreve. Um conteúdo contextualizado e problematizado produz um
processo verdadeiro de conhecimento, e um educador dialógico contribui para a
formação de educandos emancipados. Parece ecoar, nos ouvidos de todos os
educadores e educadoras do Brasil: continuem sempre amando as crianças.
118
6 AS RELÕES DE PODER ENTRE PROFESSOR/ALUNO NA
ESCOLA MUNICIPAL “CAPELA NOVA” DE BETIM
As relações sociais o-se dentro de uma realidade vivida por sujeitos
concretos nela inseridos. A divisão da sociedade em classes interessa àqueles
que lucram apropriando-se dos meios de produção. Nessas relações, existe
uma grande maioria de pessoas que são orientadas, ao longo da sua formação,
para se tornarem mão-de-obra. São aqueles que vendem sua capacidade de
trabalho em troca dos bens de que necessita para a sua sobrevivência. Apenas
uns poucos são formados para sustentar a ordem vigente. São os donos dos
meios de produção. A educação o é, e não pode ser neutra nessas relações.
Ou ela reproduz a ordem vigente ou ela busca transformá-la. Uma educão
voltada para os interesses das classes dominantes legitima e contribui para se
perpetuar a situação de dominação de uma classe sobre a outra. Mas, uma
educação diagica, problematizadora e conscientizadora, tem o poder de
preparar a classe dominada para a transformação da sua realidade.
Paulo Freire acredita que a vocação verdadeira da educação é a de
humanizar os homens para transformar o mundo, ou seja, ao despertar a
curiosidade no educando para a compreensão da realidade, ele se torna capaz
de reiventar o mundo à sua volta, e, portanto, provocar uma reordenação social.
O aprendizado só ocorre quando o aluno se apropria do conhecimento, da
cultura à sua volta, e, a partir disso, compreender sua existência concreta para
provocar mudanças de ordem política, cultural, social, religiosa e econômica.
Uma educação bancária, o problematizadora, transforma os educandos em
objetos passivos nas mãos do mercado, das elites dominantes. Ela não provoca
uma reflexão verdadeira capaz de incomodar uma situação dada, pois ela
interessa à manutenção do poder dominante que não deseja mudanças
estruturais em uma sociedade desigual como a nossa.
O conhecimento, pelo contrário, exige uma presença curiosa do sujeito
em face do mundo. Requer sua ação transformadora sobre a
realidade. Demanda uma busca constante. Implica em invenção e em
reinvenção. Reclama a reflexão crítica de cada um sobre o ato mesmo
de conhecer, pelo qual se reconhece conhecendo e, ao reconhecer-se
assim, percebe o como de seu conhecer e os condicionamentos a
que está submetido seu ato. (FREIRE, 1977, p. 27)
119
A realidade encontrada nas relações entre os professores e os alunos
aqui pesquisados está inserida num contexto histórico que pode me ajudar a
compreender as dificuldades que os professores m, até os nossos dias, de
estabelecer uma relação diagica de dominação quanto da hisria da evolução
da educação escolar no Brasil submetida às várias formas de poder autoritário,
desde os jesuítas até as formas mais recentes da ideologia neo-liberal. Embora
os professores tenham tido uma formão em escolas que destilaram esse
ethos de dominação, a educação também sofreu contornos próprios de uma
concepção democrática e emancipatória.
Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito e
somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer.
Por isto mesmo é que, no processo de aprendizagem, só aprende
verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido, transformando-
o em apreendido, com o que pode, por isto mesmo, reinventa-lo;
aquele que é capaz de aplicar o aprendido-apreendido a situações
existenciais concretas. (FREIRE, 1977, p. 27-28)
Procurei, aqui, explicitar o olhar que tive diante de um grupo de
professores e alunos. Esse olhar vem das observações, dos questionários e
entrevistas que fiz. Procurei compreender as relações entre esses agentes,
buscando perceber se ambos são sujeitos do aprendizado, e se o conhecimento
é capaz de contribuir para a formação de sujeitos emancipados ou se é apenas
reprodutora de conteúdos prontos; se o currículo vindo de um modelo
progressista, como o ciclo de formação humana implantado há 10 anos nessa
instituição, produziu efeitos na vida escolar e cotidiana dos alunos. As
observações, os conceitos obtidos pelos alunos no primeiro trimestre do ano
letivo, os questiorios aplicados aos alunos, e, principalmente, as entrevistas,
expressão da realidade vivida por professores e alunos dentro da escola
pesquisada.
Esta pesquisa, que tem como um de seus objetivos verificar o conflito
entre esse ethos e uma outra concepção, foi realizada com três turmas do
último ano do ensino fundamental na rede municipal da cidade de Betim. O
trabalho de campo utilizou-se de métodos qualitativos para analisar as relações
de poder existentes no interior da escola, mais especificamente um estudo de
caso. A pesquisa consistiu de observações do cotidiano da escola: sala de aula,
recreio e merenda, sala de professores, reuniões pedagógicas, pesquisas
120
realizadas pelos alunos e professores na biblioteca, realizei também um
questionário que foi aplicado nas ts turmas, e, por fim, realizei entrevistas do
tipo semi-estruturadas com sete professores e seis alunos, sendo um casal de
cada turma.
A rede municipal de Betim adotou, a partir de 1998, o ciclo de formação
humana como seu modelo de educação, gradativamente todas as escolas da
rede vão conhecendo e modificando seu curculo para atender às novas
necessidades. O novo modelo recebe o nome de “Escola Democtica.
Baseado na teoria construtivista, ele surge com o projeto de acabar com o
modelo reprodutivista e excludente da seriação, diminuir a evasão, acabar com
a reprovação, melhorar a qualidade do ensino oferecido à comunidade de Betim.
Nesse modelo o educador ctico é o articulador do processo ensino/
aprendizado, dentre suas funções podemos destacar:
I. O professor (“pedagogo), neste processo, é guia e orientador da
atividade construtiva do aluno, garante que este se aproxime de forma
progressiva do conteúdo escolar. O professor atua como o mediador
entre a atividade construtiva do aluno e o conhecimento escolar.
II. O educador é o agente responsável pela coordenação da dinâmica
de ensino / aprendizagem e pela organização e ampliação da
produção cultural no espaço escolar.
III. O conhecimento e o saber social, em geral, são contdos culturais
coletivamente constrdos e historicamente acumulados, portanto,
aluno e professor são sujeitos ativos, inteligentes e autônomos que se
relacionam dialogicamente no processo de ensino / aprendizagem.
IV. As ações pedagógicas, am de propiciarem a potencialização de
competências e habilidades cognitivas, devem promover: o
fortalecimento da motivação, a elevação da auto-estima, o prazer de
estudar, a formação de atitudes morais, o estímulo à criatividade, a
intesificação de atividades lúdicas, o exercício pleno e consciente da
cidadania e do trabalho produtivo. (BETIM, 1998a, p 39-41)
Hoje, as escolas municipais de Betim estão integradas, e m em comum,
além do sistema de ciclo, um único regimento. A rede é dividida em três
Regionais Pedagicas, que, dentre outras coisas, promovem encontros entre
diretores, pedagogas, professores para aprofundar a reflexão sobre o currículo,
a avaliação, evasão, reprovação, formação continuada, etc.
A escola Capela Nova faz parte desse sistema, e, nela, todos os
profissionais parecem estar conscientes da imporncia do ciclo na formação
dos seus alunos. Mas o processo de passagem do sistema seriado para o
sistema de ciclo, que vem se concretizando há 10 anos na rede, o se dá da
121
noite para o dia, nem de um ano para outro. Uma mudança como essa parece
levar tempo para ser assimilada por todos os agentes envolvidos no processo.
As frases usadas com mais freqüência no cotidiano escolar lembram-me o
sistema seriado. Dentre elas, posso destacar: em qual rie vo está? O
exercício vale ponto professora? Quem não estudar vai tomar bomba no final do
ano...”. A prática cotidiana de meus professores remete-nos, com mais
freência, a um modelo tradicional, seriado, e, em nossa cultura escolar, bem
marcado por reprovações e punões.
No ciclo de formação humana, a avaliação dos processos é contínua e
não compreendem apenas o conhecimento cognitivo dos alunos, mas todos os
agentes e processos do ensino aprendizado. O sistema de avaliação não se
utiliza de notas, mas de conceitos que classificam os alunos em O timo), B
(Bom) e AD (A Desejar). Existe um boletim de desempenho escolar que a
Secretaria Municipal de Educação manda para todas as escolas utilizarem para
avaliação dos alunos (ver Anexo). Ele segue com as seguintes orientações: o
ensino fundamental da rede municipal de Betim está organizado em Ciclos de
Formação Humana, de acordo com a seguinte distribuição: 1º ciclo: 6, 7 e 8
anos; ciclo: 9 e 10 anos; 3º ciclo: 11 e 12 anos; 4º ciclo: 13 e 14 anos.
A partir das idéias construtivistas incorporadas pela pedagogia, a
avaliação escolar passa a ser considerada componente pedagógico
processual, abrangendo toda a experiência escolar: planejamento,
desenvolvimento e verificação do ensino e da aprendizagem; ou seja,
a avaliação precisaria levar em conta todas as dimensões da formação
humana, tendo em vista o acompanhamento, a análise e a
interpretação cotidianas das ações individuais e coletivas dos
educandos, face às suas características e demandas socioculturais e
aos objetivos didáticos da escola. Seria um processo avaliativo
formativo e diagnóstico, tributário dos seguintes critérios
metodológicos principais: contextualização sócio-temporal e
sociocultural dos educandos; elaborão de memoriais ou registros
históricos de vida; registro sistemático de pareceres/relatórios
descritivos, individuais e coletivos; constituição de conselho
pedagógico para debate e deliberação coletiva a respeito da avaliação
final de cada aluno/turma/ciclo, pelo menos bimestralmente; reunião,
por etapa, dos membros da comunidade escolar para avaliação do
processo de ensino/aprendizagem. (BETIM, 1998a, 45-46. In: BETIM,
2007, p. 88)
O boletim orienta as escolas para uma avaliação constante, qualitativa,
visando a apontar os avanços e as novas necessidades dos alunos.
Considerando a avaliação, a escola deverá oferecer sempre novas e diversas
122
oportunidades de aprendizagem aos alunos, a fim de atender às necessidades
apontadas. A escola poderá apresentar à família outros critérios de avaliação,
de acordo com as propostas do coletivo. o 26 itens a serem avaliados nos
três trimestres do ano letivo, e os conceitos utilizados por toda a rede o os
mencionados acima: O (Ótimo), B (Bom), AD (A Desejar). Dentre os aspectos
avaliados, podemos destacar: a freqüência e a pontualidade dos alunos, a
participão nas aulas, o cumprimento de tarefas, a cooperação, o respeito, a
compreensão de textos, o conhecimento de operações matemáticas, a
participão em atividades interdisciplinares e o reconhecimento dos valores
culturais e sociais das instituições de que participa.
A escola municipal Capela Nova valoriza a organização, atras da
disciplina dos alunos nas mais diversas características: o uso adequado do
uniforme, o cumprimento de horários de chegada e de intervalos de aulas, o
cumprimento de tarefas, o respeito aos professores e demais funcionários, a fila
de merenda. Não é permitido o uso de boné dentro das salas de aula. Nas
aulas, os alunos são organizados em filas indianas. As pedagogas convocam
reuniões periódicas com os pais dos alunos, entre outras dimensões. Todas as
sextas-feiras, no início da aula, os alunos e professores o convidados pelo
diretor para cantarem juntos, no pátio, o Hino de Betim e o Hino Nacional
Brasileiro. Esse espaço é também utilizado para dar orientações para as turmas
e passar informações sobre eventos e lembrar os alunos das normas da escola.
Os alunos com problemas de disciplina são advertidos pelos professores.
Alguns escrevem bilhetes nos cadernos dos alunos e pedem para rever o
mesmo assinado pelos pais no outro dia. Os alunos são encaminhados para a
direção onde são aconselhados e advertidos. Faz-se um registro da ocorrência,
a direção convida os pais para participar do ocorrido, e, nos casos mais graves,
os alunos sofrem penalidades como a suspensão de aulas por tempo
determinado. Os alunos com dificuldades de aprendizado têm sua situação
avaliada nas reuniões pedagógicas, nelas participam as duas pedagogas e os
professores. Das duas reuniões acompanhadas por nós, o professor de
educação física não participou. Não participaram, também, representantes da
direção nem dos alunos ou pais. Nas reuniões, são avaliadas, turma por turma,
aluno por aluno, os principais problemas apresentados pelos professores o
relacionados com a disciplina e com a dificuldade de aprendizado (falta de
123
atenção nas aulas, falta de interesse com a matéria, o fazem as atividades
em casa, tiram notas baixas nas avaliações).
Esta pesquisa teve como foco principal 86 alunos do último ano do ensino
fundamental (8ª rie). Eles foram divididos em três turmas que estudam no
período da manhã na escola que chamamos de Capela Nova de Betim. Cada
turma recebe um título simbólico. Para cada ano do ciclo, existe um número e
para cada turma do mesmo ano uma letra do alfabeto (Ex: ts turmas da quinta
série, 89J, 89K, 89L). Para a minha identificação, classificarei as ts turmas em
08A, 08B, 08C.
As aulas no turno da manhã começam as 7:00 horas e terminam as 11:25
horas. o quatro aulas por dia: de primeira aula, de 7:00 às 8:05; segunda
aula, de 8:05 às 9:10; intervalo (recreio e merenda), de 9:10 às 9:25; terceira
aula, de 9:25 às 10:25; quarta e última aula, de 10:25 às 11:25. São 20 aulas
semanais, divididas em oito disciplinas, ministradas por oito professores (ver
quadro em anexo). Nesta pesquisa, entrevistei sete professores e seis alunos
(um casal de cada uma das ts turmas). Todos tiveram seus nomes alterados,
bem como os demais alunos das três turmas. O ano letivo é dividido em três
períodos avaliativos, ou seja, ts trimestres (1º trimestre: fevereiro, março e
abril, 2º trimestre: maio, junho e agosto, 3º trimestre: setembro, outubro e
novembro). No final de cada peodo, o conselho de classe, formado pelos oito
professores e duas pedagogas, reúne-se e avalia o rendimento dos alunos.
Os oito professores formam um coletivo na escola que atendem seis
turmas, todos eles atendem as três turmas do último ano do ensino fundamental
aqui pesquisadas. Eles cumprem uma carga horária de trabalho semanal de 24
h/a semanais. Essa carga horia é distribuída em aulas, planejamento,
estudos, atendimento a pequenos grupos de alunos e reunes. Durante a
pesquisa, consegui acompanhar a rotina de todos os oito professores em sala
de aula, onde procurei observar como se dá a relação de poder aí existente.
Foram feitas entrevistas com sete dos oito professores; apenas com o professor
de Educação Física não foi possível, pois, nos dias marcados para a entrevista,
não consegui encont-lo.
Esses professores estão na rede municipal de Betim, num período médio
de 11 anos, e há 5 anos, também num peodo médio, na escola pesquisada.
Todos os professores têm um histórico com a educação em Betim. Tem-se uma
124
professora que está na rede há 23 anos, e os mais novos há 6 anos. Temos
professores que estão lotados na Escola há 11 anos e até um rem chegado
no ano de 2007. Essa diversidade forma o coletivo de professores que atendem
às turmas do último ano do ensino fundamental por nós pesquisadas.
Ao observar a ptica dentro da sala de aula, percebi que ela é focada no
contdo, no cognitivo. Os professores parecem acompanhar um programa de
atividades, mas essas atividades dizem respeito apenas ao conteúdo
programático. Para o professor, o aluno não aprende porque não presta a
atenção na aula, não faz o dever de casa, os pais o acompanham, e vêm
com defasagem anterior. Os professores usam, com freqüência, o quadro que é
de pincel, para exposição do conteúdo. As avaliações m notas. As notas das
avaliações o a principal referência do professor para classificar o aluno. Os
professores transformam as notas em conceito, e levam para a reunião
pedagógica onde os alunos serão avaliados e classificados como bons ou maus
alunos. Isso significa que a ptica cotidiana dentro da sala de aula reflete, em
muito, o modelo seriado.
Durante a pesquisa, observei, com freência, a falta de interesse de
grande parte dos alunos das três turmas com as aulas, nas mais diversas
disciplinas. Alunos que não faziam o dever de casa, não levavam material
adequado para a aula, não acompanhavam o raciocínio do professor, em
algumas aulas os professores interromperam o raciocínio rias vezes para
pedir silêncio, prestem atenção isso vai cair na prova, dizia o professor, mas
sem muito sucesso. Alunos pareciam não compreender a relação entre o
contdo das disciplinas e sua vida cotidiana. Os conteúdos pareciam muito
distantes dos desejos dos alunos, e o resultado disso apareceu nas notas, no
resultado dos alunos no primeiro trimestre de 2007.
Durante a explicação do conteúdo, a professora de inglês Flávia
pergunta: por que aprender esse ‘saco de verbo To Be? Ela procura usar fatos
do cotidiano dos alunos para explicar a importância do verbo to be, mas, ainda
assim, muitos alunos ficam dispersos. Em uma aula com a turma 08C, a
professora organiza a turma em filas indianas. O tema dessa aula era simple
present tense. Flávia procura manter a disciplina, e, no decorrer da aula, até
encaminha dois alunos para a direção por causa da conversa. Depois disso, os
alunos amedrontados ficam em sincio o resto da aula. No fim da aula, a
125
professora passa o resultado das provas para os alunos; diz que a prova vale 20
pontos dos 30 pontos do trimestre, e diz, ainda, que os alunos devem atingir
60% da nota para ficar na média.
Em aulas de inglês com as outras turmas, 08A e 08B, a professora
procura acompanhar os alunos, dando visto nos cadernos daqueles que fazem
as atividades. Explica o conteúdo, pedindo a participação dos alunos, usando
fatos do cotidiano para atrair a atenção de todos na aula. Ela pede a todos que
refaçam a prova no caderno. Orienta os alunos para fazer as questões que
acertaram a caneta, e, as que erraram, fazer a lápis para serem corrigidas em
aula.
Cada professor, a seu modo, com sua metodologia, em sua disciplina
isolada, tenta transmitir contdos para os alunos, mas todos reclamam da falta
de compromisso dos mesmos. Marlene, professora de ciências, ao comentar o
resultado das provas com a turma 08B diz: os alunos estão perdidos por falta
de compromisso, mas Deus existe, há salvação”. Os resultados são
desanimadores, a grande maioria dos alunos não teve notas boas; 68% dos
alunos das três turmas ficaram com o conceito mais baixo AD (A Desejar), 31%
dos alunos tiveram o conceito B (Bom), e apenas um aluno das três turmas teve
o conceito O timo). O assunto do dia é sobre átomos, e esse parece não
prender a atenção dos alunos que conversam muito, não param quietos em
seus lugares. Em outra aula, com a mesma turma, a professora percorre as
carteiras dando visto nos cadernos. Alguns alunos não fizeram os exercícios, e
o levar bilhete para os pais assinarem.
Em uma aula de ciências com a turma 08C, Marlene passa de carteira em
carteira, conferindo a prova colada no caderno e assinada pelos pais, prova que
reflete o resultado da turma no primeiro trimestre, em que 82% dos alunos
tiraram o conceito AD, esse foi o resultado mais negativo de uma turma em uma
disciplina no período avaliado; 18% tiraram B e nenhum aluno tirou o conceito O
no primeiro trimestre de 2007. Aqui, comecei a justificar porque classifiquei as
turmas em 08A, 08B e 08C, se é que o resultado do peodo pode classificar
alguma das três turmas em A. Ciências foi a disciplina em que os alunos das
três turmas mais foram classificados com o conceito AD (A Desejar), 57 dos 86
alunos.
126
Mirian, professora de geografia, procura usar de recursos didáticos mais
atrativos em suas aulas. Ela buscou, nos temas atuais, um documentário sobre
o aquecimento global chamado Uma verdade inconveniente, que retrata os
problemas conseqüentes do aquecimento global. Após o vídeo, organiza os
alunos em forma de U para um debate que parece que desperta a preocupação
dos alunos com o clima do Planeta. Ela pede aos alunos para responderem
algumas questões no caderno, a respeito do documentário sobre o aquecimento
global, um aluno pergunta: valendo quantos pontos professora? Os alunos
brincam e conversam muito, e a professora encaminha um aluno para continuar
suas atividades na biblioteca.
Em uma conversa informal, Mirian afirmou que a turma 08C tem uma
defasagem de aprendizado e dificuldades de disciplina, e que, o fosse o ciclo,
a não retenção, esses alunos já teriam abandonado a escola, a seriação os teria
excluído. Em uma reunião pedagógica, foi proposto deixar a turma
permanentemente no formato de U para facilitar o aprendizado e o contato
direto dos professores com os alunos, proposta essa que não deu certo.
Na observação em uma aula de história do professor Júlio com a turma
08C, o professor passa no quadro um trabalho para os alunos fazerem
extraclasse. Os alunos conversam muito enquanto copiam do quadro as
orientações para o trabalho. O tema do trabalho era “A unificação da Itália e
Alemanha”. O trabalho deveria ser todo manuscrito e teria o valor de 10 pontos.
A turma permanece muito agitada, conversa e brinca muito, e, de certa forma,
até faltando o respeito uns com os outros. Em uma aula com a turma 08A, lio
pede aos alunos para produzirem uma redação com base nas informações nos
textos trabalhados em sala de aula, onde os alunos imaginam como seriam suas
vidas no Brasil do século XIX. O texto deveria ser produzido em sala, ter no
mínimo de 20 linhas e teria o valor de 10 pontos. Os alunos permanecem
agitados, conversam muito, alguns não muito interessados em fazer a atividade
proposta. O professor adverte os alunos, informando o valor da atividade e que
iria recolher a redação naquela aula.
Júlio também desenvolve um projeto de jogos de xadrez na escola, onde
é escolhido, a cada período, um grupo de quatro alunos de cada turma em que
o mesmo trabalha para aprender e desenvolver a concentração, o raciocínio
lógico e a disciplina que o jogo exige. Os alunos selecionados são
127
principalmente aqueles com dificuldades de aprendizado e problemas com a
disciplina, e que m o desejo de melhorar o seu desempenho e a sua
capacidade de concentração. Segundo o professor, são 28 alunos envolvidos no
projeto, divididos em quatro horas/aula por semana, período de atendimento dos
mesmos.
Em cada aula, os processos se repetem. Alguns professores conseguem
prender mais a atenção dos alunos, seja pelo conteúdo, pela empatia com a
turma, seja pela autoridade, seja pelo dlogo. Roberta, professora de artes,
parece ser bem próxima dos alunos. Nas aulas observadas, foi possível
perceber um afeto entre a professora e os alunos das três turmas. Essa boa
relação afetiva refletiu nos resultados, e o conceito dos alunos das ts turmas
em artes foi melhor do que em outras disciplinas. Quase a metade dos alunos
ficou com o conceito O. Roberta também procura participar e promover projetos
junto aos alunos. Ela organizou, junto com a professora de portugs, uma
excursão com as turmas para ir ao cinema ver o filme do Homem Aranha. Em
uma aula com a turma 08A, ela passa um texto sobre o expressionismo com
algumas questões para os alunos responderem. Afirma que esse faz parte de
um projeto que culmina com a pintura em tela, que será feita por alunos das três
turmas.
Na maioria das aulas, existe uma distância entre o conteúdo e o desejo
dos alunos em aprender. Os professores até percebem essa distância e
justificam-na com a falta de compromisso dos alunos com os estudos. Nas
reuniões pedagógicas que acompanhei, as discussões eram sempre em torno
da falta de compromisso dos alunos. A todo o momento, os professores pediam
às pedagogas que chamassem os pais de alunos para cobrar mais compromisso
dos filhos com relação aos estudos. Em nenhuma reuno, em nenhum
momento, foi feita uma auto-avaliação, ou seja, avaliaram-se os processos de
ensino aprendizado, o modelo que mais se aproxima da seriação que do ciclo,
em nenhum momento os conteúdos foram avaliados, os métodos de cada
professor foram avaliados.
Nas aulas de matemática com o professor Renato, os alunos fazem
muitos exercícios para aprender o conteúdo. Em uma aula com a turma 08A,
passa 10 questões no quadro de equações do segundo grau, permite que os
alunos respondam em duplas e circula pela sala dando orientações. Renato, em
128
uma aula com a turma 08C, passa seis questões e começa a resolver uma no
quadro, na tentativa de os alunos acompanharem seu raciocínio. Ele fala aos
alunos: quem o trouxer a prova assinada pelos pais na próxima aula vai para
a direção. O professor circula pela sala dando orientações para a turma que
conversa muito e parece ter dificuldades em responder as questões.
A professora de português Marta é considerada muito brava pelos
alunos. Ela tem 23 anos de rede e seis anos leciona na escola. Em todas as
aulas observadas, a professora manm a disciplina rigorosa dentro de sala e
envolve os alunos o tempo todo com atividades. Em uma aula com a turma 08C,
diante do desinteresse da turma que, em sua maioria, não fez as atividades,
afirma: “porque não fizeram as atividades, não trazem os livros, porque não
valorizam, é porque é de graça, se tivesse que pagar talvez vocês valorizassem
mais”. Ela divide um texto em cinco partes, e seleciona alunos para lerem em
voz alta, todos os alunos acompanham a leitura em silêncio. Marta mantêm um
controle constante da disciplina na sala. Ao ouvir uma conversa, ela interrompe
a leitura e manda calar a boca. Não consigo dar aula com barulho, diz ela. Em
sua aula com a turma 08B, a professora distribui as provas que valeram 20
pontos, esses transformados em conceito ficam da seguinte forma: de 0 a 7
pontos = MC (muito crítico) conceito o muito usado; de 8 a 11 pontos = AD;
de 12 a 15 pontos = B; e de 16 a 20 pontos = O. Numa turma de 29 alunos,
apenas um tirou nota correspondente ao conceito O.
Na Escola Capela Nova de Betim, tem duas quadras poliesportivas, uma
coberta e outra não coberta. O professor Luiz começa as aulas reunindo os
alunos para dar orientações. Ele adverte os alunos a respeito do uso adequado
do uniforme de educação física, depois pede a todos que façam alongamentos,
correm em volta da quadra, e, por fim, são liberados para os jogos. Os meninos
jogam futsal em uma das quadras e as meninas jogam lei na outra quadra.
Luiz divide seu tempo entre ambos e até joga uma partida de futsal com os
meninos e outra de vôlei com as meninas. Nessa disciplina, 72% dos alunos
tiveram o conceito O. Essa é uma aula em que o desejo de participar está
sempre presente, e os alunos parecem envolvidos pela aula e reclamam quando
chega a hora de parar, de sair da quadra. Nas aulas de educação física não tem
matéria para a prova, não tem a prova, não tem nota, e os alunos gostam de
participar.
129
Acompanhei duas reuniões pedagicas no período de pesquisa. Em
ambas as reuniões, sete, dos oito professores, participaram; apenas o professor
Luiz, de educação física, não participou de nenhuma das duas. O objetivo das
reuniões era o de avaliar o desempenho dos alunos durante o período letivo,
todos os professores fazem suas avaliações e as pedagogas anotam para
possíveis encaminhamentos: conversar com alunos indisciplinados, resolver
problemas de alunos com dificuldades de aprendizado, chamar os pais para
uma reunião. Os professores escolhem, no final de cada etapa, um aluno de
cada turma como destaque, aquele que se comportou melhor em sala, fez as
atividades, cumpriu horário, tirou notas boas nas provas, enfim, o destaque é
aquele aluno que teve um melhor desempenho em todas as disciplinas.
Na segunda reuno pedagógica observada, que se realizou no dia 16 de
maio, os professores e as duas pedagogas analisam a situação dos alunos das
três turmas no primeiro trimestre de 2007. A avaliação é feita turma por turma e
aluno por aluno. A reunião se ocupa em avaliar o desempenho dos alunos.
Entre os bons alunos de cada turma, escolhe-se um “destaque da turma. Entre
os alunos com resultados ruins, as mais diversas avaliações: conversa muito em
sala e não presta a atenção, falta muito, chega sempre atrasado na sala, o
faz atividades extraclasse, falta de compromisso com os estudos, aluno fraco e
com dificuldades de aprendizado, aluno indisciplinado (mal educado, agressivo,
problemático), aluno que não faz nada em sala e deve ser retido no final do ano,
a turma 08C é homogênea negativa, não tem refencia positiva na turma,
comenta uma professora. No final da reuno, o resultado: uma lista de nomes
de alunos com problemas para as pedagogas convocarem os pais para uma
reunião. Os pais devem cobrar dos filhos um maior compromisso com os
estudos.
O fraco desempenho dos alunos parece ser esperado, e é tratado com
naturalidade por todos, ninguém faz qualquer reflexão a respeito do grande
número de alunos que teve um desempenho ruim no período. O fracasso,
segundo os docentes, é todo dos alunos, pois foram eles que não se
comportaram bem, brincaram, não estudaram como deveriam. Em nenhum
momento, a reunião direciona a sua reflexão sobre os métodos de ensino, sobre
os fins do ciclo de formação humana, sobre outras possíveis causas do fracasso
dos alunos no primeiro trimestre desse ano. Para ser aprovado, ele precisa
130
saber o mínimo de conteúdo, se ele não sabe ler bem, o sabe interpretar, e
não saber fazer operações gicas, ele precisa ser retido. O problema é que o
há uma refleo dos motivos dessa deficiência, não se fazem encaminhamentos
no sentido de sanar essas deficiências. O desinteresse dos alunos pelos
contdos é tratado com rigor, pois, se o melhorarem, serão retidos no final
do ano.
Quando se fala no perigo de o aluno passar de ano sem ter
aprendido em virtude da inovão introduzida (passar de ano), parece
que o problema é muito mais, ou exclusivamente, que ele passe de
ano e não que ele não aprenda. Isto aparece claramente na
argumentação (altamente recorrente entre os contrários à promoção)
de que, com a progressão continuada, o aluno tem chegado (ou pode
chegar) à oitava série sem nada saber. Até aqui, parece não
considerarem, essas pessoas, que o grave de um aluno chegar à
oitava série sem aprender seja o fato de ele não ter aprendido, não o
fato de ele chegar à oitava série; e que isto é uma questão
pedagógica, não mera queso de passar ou não de ano. (PARO,
2001, p. 113)
Nas três tabelas abaixo temos o resultado do primeiro trimestre desse ano
dos alunos das três turmas do último ano do ensino fundamental pesquisadas
por nós. Os nomes de todos os alunos foram alterados, e os alunos em itálico
são alunos que foram entrevistados nesta pesquisa.
TABELA 17
Conceito dos alunos da turma 08Ano primeiro trimestre de 2007
ALUNO (A)
08ª
PORT.
INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG. HIST. MAT. CIÊNC
01 Adalberto B O O O AD AD B B
02 Bruno AD AD B O AD AD B AD
03 Luiz B B B O B AD B AD
04 Fabrício AD B AD B AD- B AD AD
05 Leandro AD B AD O AD B AD AD
06 César B AD AD O AD AD AD AD
07 Fábio O B O O AD B B AD
08 Marcos ? AD AD B AD- AD AD AD
09 Julio B B B O B B B AD
10 Paulo B B O O B B B AD
11 Ricardo AD AD AD O AD AD AD AD
12 Henrique B O O O B B O O
13 Vitor AD AD AD B AD- AD AD AD-
14 Maria B O O O B B AD B
15 Raquel B O B O B B B B
16 Rubia B O O B B B B B
17 Carolina O O O O O B O B
18 Juliana O O O O B B B AD
131
ALUNO (A)
08ª
PORT.
INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG. HIST. MAT. CIÊNC
19 Carina B O O O B B B B
20 Ludmila O O O O O B O B
21 Silvana B O O B O B B B
22 Luciana B B O O B B O B
23 Alice B B B O B B B B
24 Heliana B O O O B B B B
25 Fernanda B O B O O B B B
26 Paula O O O O O O O B
27 Marta B O O O B B B B
28 Luana B O O O O B B B
29 Carolina B O O O B AD B B
TABELA 18
Conceito em porcentagem da turma 08A 29 alunos
DISCIPLINA Conceito O Conceito B Conceito
AD
Português 05a 18% 18ª 64% 05a 18%
Ings 16a 55% 08ª 28% 05a 17%
Artes 17a 58% 06ª 21% 06a 21%
Ed. Física 24a 83% 05ª 17% 00a 00%
Geografia 06a 21% 14ª 48% 09a 31%
Hisria 01a 03% 20ª 69% 08a 28%
Matemática 05a 17% 17ª 59% 07a 24%
Ciências 01a 03% 16ª 55% 12a 41%
TABELA 19
Conceito dos alunos da turma 08Bno primeiro trimestre de 2007
ALUNO (A)
08B
PORT.
INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG. HIST. MAT. CNC.
01 Gláucio B O O AD B B O B
02 Gustavo AD AD AD O B B B AD
03 Carlos B O O O O O O B
04 Leonardo B AD B O B AD B AD
05 Felipe AD AD AD O AD AD AD AD
06 Henrique B B O O B B O B
07 Ricardo B AD O O AD AD B AD
08 Paulo AD - AD O AD AD - -
09 Milton B AD B B B B B AD
10 Julio AD AD AD O AD B AD AD
11 Gilberto AD AD B O AD AD AD AD
12 Marcos AD AD B O B B AD AD
13 Sandro AD AD AD AD AD AD AD AD
14 Fernanda AD AD B B AD B B AD
15 Camila B AD B O AD- AD AD AD
16 Alice AD AD B O AD AD B AD
17 Luciana B B O O B B B AD
18 Leandra B B O O B B B B
19 Vanda B B O O AD AD AD AD
132
ALUNO (A)
08B
PORT.
INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG. HIST. MAT. CNC.
20 Neide AD AD AD O AD B AD AD
21 Maria B O O O AD B B AD
22 Bruna B AD B O AD B B AD
23 Vanessa B B O O B B B AD
24 Bruna AD - - - - AD - -
25 Michele B O O B B B B AD
26 Otávia AD B O O AD AD AD AD
27 Laura AD AD B B AD- AD AD AD
28 Silvia AD ? B O AD B AD AD
29 Kenia B O O B B B O B
TABELA 20
Conceito em porcentagem da turma 08B 29 alunos
DISCIPLINA Conceito O Conceito B Conceito
AD
Português 00a 00% 15a 52% 14a 48%
Ings 05a 19% 06a 23% 15a 58%
Artes 12a 43% 10a 36% 06a 21%
Ed. Física 21a 75% 05a 18% 02a 07%
Geografia 01a 04% 11a 39% 16a 57%
Hisria 01a 03% 16a 56% 12a 41%
Matemática 04a 15% 12a 44% 11a 41%
Ciências 00a 00% 05a 19% 22a 81%
TABELA 21
Conceito dos alunos da turma 08Cno primeiro trimestre de 2007
ALUNO (A)
08C
PORT. INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG HIST. MAT. CIÊNC
01 - Augusto B AD O O O B O B
02 Luiz AD AD AD AD AD- AD AD- AD
03 Gabriel AD B B O AD AD AD- AD
04 Carlos AD AD AD AD AD- AD ? AD
05 Sandro B B B O ? - B AD
06 Walisson B O O O B AD B AD
07 Gustavo AD AD B O AD B AD AD
08 Paulo AD B O O AD B B B
09 Leonardo B O O O AD B B B
10 Vinícius AD B B AD AD AD B AD
11 Deivisson AD B B B AD AD AD- AD
12 César AD B B O B AD B B
13 Rafael AD B B O B AD O AD
14 Jairo AD B B O AD AD AD B
15 João AD AD AD AD AD- AD AD- AD-
16 Carolina B B O O B B B AD
17 Maria AD AD AD AD AD AD- AD
18 Aparecida AD O AD AD AD B AD
19 Rafaela AD B AD AD AD AD AD
20 Juliana B O O AD AD AD AD
133
ALUNO (A)
08C
PORT. INGL. ARTES ED.
FÍS.
GEOG HIST. MAT. CIÊNC
21 Gisele AD AD O AD AD AD AD
22 Patrícia AD O AD AD AD B AD
23 Cristina O O B B B AD AD
24 Laura B B O AD B O AD
25 Roberta B O O B B O AD
26 Paula B O B B AD B AD
27 Cássia B B B AD B AD AD
28 Marilene AD B O AD AD AD- AD
TABELA 22
Conceito em porcentagem da turma 08C 28 alunos
DISCIPLINA Conceito O Conceito B Conceito
AD
Português 01a 04% 10a 36% 17a 60%
Ings 02a 12% 09a 56% 05a 32%
Artes 11a 39% 12a 43% 05a 18%
Ed. Física 16a 57% 04a 14% 08a 29%
Geografia 01a 04% 06a 23% 19a 73%
Hisria 00a 00% 09a 33% 18a 67%
Matemática 04a 15% 10a 37% 13a 48%
Ciências 00a 00% 05a 18% 23a 82%
TABELA 23
Conceito em porcentagem das três turmas no primeiro trimestre de 2007 86
alunos
DISCIPLINA Conceito O Conceito B Conceito
AD
Português 06a 07% 43a 51% 36a 42%
Ings 23a 32% 23a 32% 25a 36%
Artes 40a 47% 28a 33% 17a 20%
Ed. Física 61a 72% 14a 16% 10a 12%
Geografia 08a 10% 31a 37% 44a 53%
Hisria 02a 02% 45a 53% 38a 45%
Matemática 13a 16% 39a 47% 31a 37%
Ciências 01a 01% 26a 31% 57a 68%
As tabelas mostram que os resultados dos alunos no primeiro trimestre de
2007 não foram bons. Nas ts turmas, houve um grande número de alunos que
não teve bons resultados. As disciplinas em que os alunos mais tiveram
dificuldades e ficaram com o conceito AD foram ciências e geografia, com mais
134
de 50% dos alunos A Desejar. O conceito Ótimo não foi alcançado por mais de
10% dos alunos em quatro disciplinas: ciências, hisria, português e geografia.
Isso revela um alto grau de dificuldade que os alunos tiveram em aprender os
contdos de cada disciplina, durante os meses de fevereiro, março e abril de
2007.
Comparando as três turmas, podemos perceber que a turma 08A teve os
melhores resultados ou os resultados menos ruins. A turma teve o maior índice
de O e o menor índice de AD, e, ainda assim, em hisria e cncias, apenas um
aluno alcançou o conceito O; em português e matemática, 5; e em geografia, 6
dos 29 alunos da turma alcançaram o conceito O. Em todas as disciplinas, essa
foi a turma que teve o menor índice de AD. Mesmo assim, 12 alunos ficaram
com esse conceito em ciências, pouco se comparado com as duas outras
turmas. Em todas as minhas conversas com os professores, nas entrevistas e
reuniões pedagicas, essa era a turma mais elogiada, ou seja, os alunos
melhor conceituados das três turmas do último ano do ensino fundamental.
A turma 08B, considerada intermediária, boa de aprendizado, mas que
conversa muito, a maioria dos alunos é desinteressada, não faz atividades e
não tem compromisso com os estudos. Eles também o tiveram bons
resultados no período avaliado. Em português e ciências, nenhum aluno
alcaou o conceito O, e, em geografia e história, apenas um aluno alcançou o
conceito O, e em educação física um grandemero de alunos alcançou o
conceito O; 21 alunos, e, em artes, 12 alunos. Já o conceito AD atingiu um
grande número de alunos, na maioria das disciplinas. Vinte e três dos 29 alunos,
ficaram com AD em ciências, ou seja, 81% da turma, 58% em inglês e 57% em
geografia.
A turma 08C é considerada a mais fraca das ts turmas do último ano do
ensino fundamental, os alunos o os de mais baixo nível econômico, são os
que têm maior dificuldades de aprendizado, carregam um histórico escolar cheio
de problemas, alguns alunos são agressivos e indisciplinados. Os resultados
foram os piores no período avaliado. Conceito O parece ser uma raridade entre
os alunos, dos 28 alunos, 16 em educação física e 11 em artes; em inglês, a
maior parte da turma teve o conceito intermediário B. Nas outras cinco
disciplinas o que prevaleceu mesmo foi o conceito AD: 23 alunos em cncias,
19 alunos em geografia, 18 alunos em história, 17 em português e 13 em
135
matemática. Como uma professora comentou em reuno, essa é uma turma
homonea negativa. Veremos, a seguir, como os professores demonstram as
contradições existentes entre as três turmas.
6.1 A avaliação das três turmas na visão dos professores
A professora Flávia, de inglês, numa avaliação das turmas diz: a turma
08A indiscutivelmente é a melhor, extremamente agitada, fala demais, eu acho
que eles desperdiçam muito esse potencial que eles tem por causa dessa
conversa, de algumas picuinhas, por brigas entre si, o relacionamento entre eles
as vezes é muito agressivo, então as vezes você tem que intervir, mais eles tem
um potencial enorme, muito grande mesmo. A turma 08B é uma turma que eu
chamo de preguiçosa, eu só vou pensar se me apertar’, mas que eles dão
conta, eles dão conta ainda, inclusive é a turma que teve o pior rendimento
apesar de ser melhor do que a 08C, eles relaxaram um pouco e eu chamei a
atenção deles. A turma 08C esse ano me surpreendendo porque sempre foi
uma turma com dificuldades, faz ts anos que eu trabalho com eles. Como o
inglês o dois professores, a minha proposta de trabalho é a seguinte: ir com
eles até o final, se eu comecei com eles na quinta e eles passam para a sexta
eu também vou dar aulas na sexta, quando eles passarem para a sétima eu vou
para a sétima, isso quer dizer que eu vou ter um trabalho único, um processo de
quatro anos, quinta, sexta, sétima e oitava, ou seja, terceiro e quarto ciclos,
vendo a gente nem consegue falar ciclo ainda, a gente só fala seriação mesmo,
então tem alunos que eu conheço há três anos, quando a gente senta para fazer
um conselho de classe algum professor fala, aquele aluno é isso e isso, eu falo
que é porque você não o conheceu há três anos, há ts anos ele era muito
diferente e talvez no seu conceito muito pior, ele evoluiu sim, evoluiu como
pessoa, ficou mais maduro. Eu tô achando a 08C muito mais madura, brinca
menos, fala de coisas mais sérias, a 08B ainda não tem essa maturidade, mas
eles estão preocupados com a oitava rie que é o último ano, tem retenção,
então eles estão suando a camisa para recuperar esse tempo, essa dificuldade,
eles são alunos que têm dificuldade. A turma 08A não se preocupa com isso,
136
eles sabem que o passar, às vezes o grande problema da turma 08A é esse,
eles sabem que eles podem, eles sabem que eles conseguem, e às vezes o
relacionamento deles com as outras turmas não é um relacionamento bom por
causa disso, eles se acham os melhores, eles são bons, eles o os melhores,
mas não precisa ser uma coisa para humilhar o colega, para subjugar o colega
não, mas eles estão aprendendo.
Na avaliação feita pela professora Flávia, vemos a distião entre as três
turmas. A turma A tem um rendimento melhor; a turma 08B, um rendimento
fraco; e a turma 08C teve um rendimento ruim. Com essa opinião parecem
concordar todos os professores. A avaliação da professora Marta, de português,
é: dos cinco anos que eu estou aqui, essas o as turmas mais fracas que eu
já tive, são as turmas com mais dificuldades cognitivas, dificuldades em
interpretação, leitura, escrita, eles tem preguiça de ler, não gostam de ler, são
apáticos, de todos esses anos eu achei que essas turmas são as mais fracas.
Agora eu tive também um problema de tempo com redução de módulo, projetos,
feriados, eu sinceramente eu fui olhar no meu caderno o que eu dei até agora
nesse primeiro trimestre é exatamente a metade do que eu dei no ano passado,
eu fiquei muito chateada com isso, eu falei não é possível, então tem vários
fatores, eu não falto, eu estou aqui todos os dias, mas eu não consigo, por mais
que a gente tente os meninos são mais lentos, e talvez a a gente também, não
vamos falar que são só eles, o sei o que está acontecendo, mas o
desempenho deleso foi bom, foi bem fraco mesmo, achei terrível. Antes,
quando a gente ia fazer um conselho da turma 08A, a gente pegava só uns três
alunos com B por isso apenas, que era no ano passado a gente tinha uma turma
que a gente chamava de turma 08A, esse ano a gente não tem mais, tem que ir
aluno por aluno e tem alguns conceitos A naquela turma o restante foi tudo B,
então é uma coisa de se estranhar, eu acho que eu poderia ter rendido muito
mais, eu como professora, eu tentei variar nas atividades, tirei rios xerox, fiz
vários debates, sentei em rodinhas, na hora da gratica eu fiz tudo
contextualizado, peguei muita atividade do diagnóstico que eles fizeram da
regional, erraram, apliquei de novo e mesmo assim o rendimento foi muito
baixo, eu vou ter que me reavaliar no segundo semestre e ver como eu vou
conduzir essas aulas porque foi muito fraco, foi terrível.
137
A constatação dos maus resultados dos alunos, de uma maneira geral, na
etapa avaliada, aparece nas entrevistas de todos os professores. A professora
de geografia, Mirian, faz uma reflexão sobre a dificuldade de os alunos
aprenderem na sala de aula: “Essa é uma questão muito grande do
desinteresse do aluno, eu acho que a competição tá muito grande com os meios
de comunicação, os alunos tem acesso a televisão, computador, internet, essa
dia toda aí que realmente passa as informações de uma maneira muito mais
prazerosa do que o professor. Então, a escola deixou de dar prazer para o
aluno, até é um caso para se pensar de novas estratégias de aula para ver se
há um interesse do aluno, mas há um desinteresse muito grande. Vários
colegas falam que tem que voltar como era antigamente e dar nota, tirar
vermelho o aluno queo pegoudia. Eu até acho queo, acho que é
retroceder, a gente tem que estar evoluindo, a gente tem que de alguma forma
tá chamando a atenção desse aluno, tá fazendo ele se interessar, na maioria
das vezes é porque ele não sabe, se ele não sabe ele não vai ter interesse,
como que ele vai fazer uma avaliação de matemática se ele não aprendeu, o
entendeu e não sabe, vai haver um desinteresse realmente, eu acho que tem
que arrumar outras estratégias, eu acho que o grande numero de AD foi isso,
mais a falta de interesse do aluno.
Para o professor Renato, de matemática, o diagnóstico não é diferente.
Ele aponta características das três turmas: “A turma 08A é uma turma com
muita energia né, a maioria porque tem alguns que não, mas a maioria esfoa,
tem energia e transmite essa energia para o conteúdo, alem de transmitir essa
energia para outras coisas, como um pouco de indisciplina, bagunça, também a
relação de um aluno com o outro que é um pouco agressiva, então é uma turma
mais agitada, por eu ter dado aula nas oitavas nos anos passados essa não é
uma turma das melhores, mais é uma turma que investe. Agora a 08B é uma
turma mais apática, vo vê que os alunos m potencial, alguns tem potencial
mais não tem aquela energia, não tem aquele interesse de querer avançar, de
querer saber mais, prefere ficar mais quieto, então é muito apática, né. E a 08C
tamm é diferente, ela tem dificuldade mesmo de disciplina e dificuldade de
aprendizagem, considerada apática eu acho que não, mas ela tem muita
dificuldade, então se torna mais difícil , querem aprender, mas tem muita
dificuldade, eu falo isso de um modo geral da turma, não 100%.
138
A professora Roberta, de artes, traça um pouco do perfil de cada uma das
turmas: com a turma 08A no início do ano, eu tive muitos problemas, eles são
imaturos, mas a gente sentou muito, conversou muito, discutiu. Tinha dia que eu
não dava aula porque eu tirava aquele horário para sentar com eles, olha não
está bom, não é assim, não esta rendendo. Eles o capazes, é uma turma
muito capaz, mas muito imatura e agora eu vejo que no final do semestre eles
amadureceram, melhoraram demais, as minhas aulas melhoraram muito, o
nosso relacionamento melhorou muito, é a turma que eu mais gosto de levar.
Agora a turma 08B, eles caíram muito de produção, é uma turma que conversa
muito, que não leva muito a sério, que não era assim para quem acompanha
desde o ano passado. Essa turma tem perfil de projeto, então às vezes eu
penso que ela não rende porque muitos professores, dois ou ts, é o nimo,
não são a favor de projeto, e eu como gosto de projeto, como o perfil da turma é
de projeto, lá naquela sala eu tenho uma turma, um grupo, né, que a gente fez
um grupo de percuso e de coral, então no tempo que eu trabalhei com eles no
ano passado eles renderam muito. Esse ano, como a gente não trabalhou muito
essa queso de grupo, eles apresentaram duas vezes só e a gente não
conseguiu ensaiar maissicas, não conseguiu criar por falta de tempo na
escola, eu acho que eles caíram. Agora a 08C é uma turma que tem muitos
problemas, eles não acreditam em si, auto-estima muito baixa, vo tem que
estar o tempo todo incentivando, eles precisam de incentivo o tempo todo para
estudar, e eu sou madrinha de turma lá, então tudo o que acontece, eles dizem,
o professora me ajuda, eu estou sempre à disposição deles, mas é muito difícil
lidar, quando o aluno chega ao ponto de achar que a nossa turma é a pior, a
nossa turma não consegue, nós somos fracos, lá o lema deles é esse, nós o
conseguimos, nós não vamos conseguir. No início do ano, o coletivo dos
professores fez um combinado de estar trabalhando mais individual e agora no
finalzinho do semestre eles deram uma melhorada muito boa, que a gente
conseguiu levantar a auto-estima com recadinhos, atividades, com excursões
que nós fizemos com eles, com atividades diferentes que eu fiz em sala,
atividade prática, trabalhei muito a questão da criatividade, da habilidade, que
eles fizeram e viram que são capazes, que eles conseguem, então eles
melhoraram muito. O meu relacionamento com as três turmas é muito bom”.
139
As opiniões sobre cada uma das turmas são bem semelhantes entre os
professores. Para o professor lio, de hisria, fazer uma avaliação é difícil
quando os alunos o querem contribuir. Ele diz o seguinte: Difícil, a turma 08A
é uma turma com maior facilidade de aprendizagem, conversam ao extremo,
mas ultimamente tem ocorrido uma melhora de maneira que eu consiga até dar
aulas. A 08B apresentou uma melhora, mas lá alem da queso da conversa tem
a questão do desinteresse, então os meninos precisariam ter um pouco mais de
interesse. E na 08C, acho muito complicado porque os meninos simplesmente
não entendem, não conseguem acompanhar a matéria e aí ficam
desinteressados mesmo, conversam, você esta explicando e eles estão
conversando, estão trocando ofensas, a questão da higiene pessoal de repente
o menino entra com um mau cheiro danado de CC e aí todo mundo começa a
encher a paciência do menino então é muito complicado.
A professora de cncias, Marlene, fez, após o diagnostico ruim das
provas, uma auto-avaliação com as ts turmas: Na 08A, o resultado não foi
novidade porque lá tem alunos com um potencial melhor, eles m uma
capacidade no nível da idade deles né, foi bom, muito bom, quando eu falei com
eles, eu tava blefando, minha aula até o fim do ano vai ser assim, porque é
assim que tem que ser e é assim que vai ser, eu blefei usei o poder de
professora, mas foi assim que eu consegui, no dia que eu vejo que o pessoal tá
assim eu vou e releio pra eles o que eles propuseram, nessa sala foi assim que
resolveu, eu levei a sério como eles também levaram muito a rio essa auto-
avaliação, porque foi uma avaliação que eu pedi para eles justificar o porque do
resultado ruim da prova e se eles estavam pondo a culpa em alguém, na turma,
no colega que eles justificassem também isso, na professora, eno tá, porque
que a culpa é da professora, o que a professora tá deixando a desejar, então
eles foram muito francos, falaram mesmo, teve aluno que falou da professora e
eu o levei para caso particular, não convoquei nenhum pai para vir a escola e
vieram cinco pais por espontânea vontade dessa turma, então funcionou eu
acho que foi um ponto muito positivo no meu trabalho. Na 08B, eu fiz a mesma
coisa, só que na 08B já é, não veio nenhum pai para reclamar do resultado da
prova e os resultados foram muito parecidos com a turma 08C. Lendo a
avaliação, eu percebi que eles o levam muito a sério, eles justificam assim, o
ruim sou eu, eu vou melhorar, eu prometo melhorar, aquela coisa vaga sem
140
comprometimento mesmo, o que você vai melhorar, o que você vai fazer para
melhorar, a turma 08A fez assim, a 08B deixou a desejar. A turma 08C que,
Nossa Senhora, o negócio assim, não adiantou absolutamente nada, porque eu
pedi, eles me entregaram em pedaços de papel rasgado, eu pedi para eles
escrever de pprio punho o precisava ser digitado, numa folha de caderno,
que eu ia grampear na prova cujo resultado foi ruim, o que desencadeou todo
esse processo de auto-avaliação. Aí, na turma 08C, a mesma orientação que eu
dei nas três turmas , me entregaram papel rasgado, essa turma tem que ser
feito um trabalho diferente, uma linha , nossa é ruim mesmo, não teve nem
como tabular, eu desisti, voltei lá na sala e justifiquei, gente não tem como tá
lendo isso aí, o que alguns fizeram, aquele papel rasgado eles simplesmente
pegaram a mesma frase escreveram numa folha limpinha do caderno e me
entregaram, não era só a estética, da formalidade da entrega, eu queria que
eles melhorassem, enriquecesse aquilo, mas eu não consegui, não foi possível
naquela sala.
Os depoimentos dos professores são unânimes em afirmar que os alunos
são os grandes responsáveis pelo fracasso que tiveram no primeiro trimestre de
2007. A falta de interesse e de dedicação dos alunos aos estudos são as
grandes causas apontadas pelos professores, e a solução parece simples:
estudar mais, prestar a atenção nas aulas, cumprir todas as tarefas, fazer
silêncio quando o professor estiver explicando a matéria. Apenas a professora
Mirian, de geografia, faz uma refleo sobre os métodos de ensino. Ela acredita
que é preciso despertar no aluno do desejo pelo saber. Para ela, o uso da nota,
a volta à seriação seria um retrocesso que prejudicaria os alunos.
PARO (2006), ao tratar dos conselhos de classe, diz:
por isso, a preocupação com o provimento de um ensino de qualidade
para a população deve priorizar formas eficazes de se proceder à
avaliação do processo escolar. Os conselhos de classe, por exemplo
não podem continuar sendo instâncias meramente burocráticas, onde
se procura apenas justificar o baixo rendimento do aluno, colocando a
culpa em fatores externos à escola. É preciso prever instrumentos
institucionais que avaliem não apenas o rendimento do aluno, mas o
próprio processo escolar como um todo, com a presença de alunos e
de pais, pois eles são os usuários da escola e a eles compete apontar
problemas e dar sugestões de acordo com seus interesses. (PARO,
2006, p. 80-81)
141
Nos conselhos, as avaliações voltavam-se sempre para as dificuldades
dos alunos; eles eram os responsáveis pelos maus resultados que tiveram no
primeiro trimestre. Os professores afirmavam que se os alunos não
melhorassem, muitos seriam retidos no final do ano. Não houve, nas duas
reuniões observadas, uma avaliação dos processos de ensino/aprendizado.
Pais e alunos que não participaram das reunes deveriam ser chamados
posteriormente para serem informados sobre o resultado das reuniões.
6.2 As práticas educacionais: ciclo e seriação, na visão dos professores
Voltamos, então, aos princípios do ciclo de formação humana, reforçados
no boletim de desempenho escolar que orienta que a avaliação é constante,
qualitativa, e visa a apontar os avaos e as novas necessidades dos alunos.
Considerando a avaliação, a escola deverá oferecer, sempre, novas e diversas
oportunidades de aprendizagem aos alunos, a fim de atender as necessidades
apontadas. Nossos professores encontram dificuldades para concretizarem a
passagem da seriação para o ciclo. Emrios momentos, misturam os dois
modelos educacionais, parecem ter criado uma terceira via adaptando ciclo e
seriação, não perceberam que não existe aprendizado sem prazer; sem o
desejo dos alunos de aprender, essa seria uma batalha sem vencedores. Sem
rever os métodos e sem pensar nas necessidades de cada uma das ts turmas,
os objetivos certamente não seriam alcançados. O que fazer com esse
diagstico, como melhorar o conceito dos alunos, como despertar o desejo
pelo saber, como diminuir e/ou eliminar as diferenças de aprendizado entre as
três turmas, uma vez que a formação da maioria deles vem da mesma escola,
com os mesmos professores? As respostas vêm dos depoimentos dos
professores entrevistados.
No depoimento da professora de Flávia, ela mostra sua iniciativa isolada
com relação aos resultados dos alunos: “depois da prova, eu o espero o fim
do trimestre, a prova foi um fracasso, eno vamos ver tudo de novo, porque
então talvez eu não soube passar, ou explicar de uma forma que eles
conseguissem compreender, então vamos tentar de novo de outra forma, eu não
142
espero chegar até o final do trimestre, eu espero ver o resultado, o resultado
não foi bom, agora eu sempre olho pela quantidade, se tem uma turma que tem
30 alunos, 28 foram bem e dois não foram, esses dois alunos, eu tento trabalhar
com eles separadamente mas eu não posso excluir o meu aluno que tá
caminhando, porque é dois tipos de exclusão, a exclusão por saber e por não
saber, então por exemplo eu tenho duas aulas de APG na sexta feira, são
alunos com dificuldades, às vezes eu combino, olha me procura nesse horário,
pede licença ao seu professor para me procurar aí eu ensino algumas ticas,
algumas estratégias para ele estudar. Uma aluna fez um caderno de verbo, por
exemplo, porque ela não sabia os verbos em inglês, o outro me procurou, só
que isso também deixando a desejar, infelizmente nós temos um grande
problema de falta aqui, eu também faltei um tempo porque eu tive um problema
de saúde, falta de professores, eu fiquei 9 ou 11 dias de licença médica então
alguém me cobriu, se alguém falta eu cubro também, então nós fazemos 24
horas e 4 horas são de estudo, mas essas 4 horas o pagas para que, se faltar
um professor, o aluno não fique sem aula. Então o que vai prevalecer, o APG ou
é a aula, é a aula, eu tive dois momentos de APG nesse primeiro semestre,
sexta feira é geralmente o dia que mais falta professor. Na semana passada,
faltaram 4. Isso prejudica, o queses pessoais, questão de saúde, mas não é
da minha aada julgar, mas tá previsto que a minha obrigação é em sala.
A professora Marta faz uma avaliação dos processos formativos, como é
a ptica da escola com relação ao diagnóstico dos alunos: “Olha, a prática da
escola é assim, no conselho pedagógico a gente faz assim, pega os alunos que
nós mesmos vamos conversar, porque às vezes uma simples conversa com o
menino, uma dica de estudo já resolve, alguns mais críticos a gente anotou para
chamar os pais colocando para eles, talvez tirar do aluno o que ele mais gosta e
dar para ele um horário de estudo. A gente propõe também para que ele faça
amizade com alguém que conta dos conteúdos para ele interagir com o
colega, a gente incentiva assim, mas eu dos meninos que falei que ia conversar,
eu conversei só com dois, eu falei que ia conversar com cinco e conversei só
com dois e os dois mudaram muito, eu fiquei muito feliz, foi a Maíra da 08C ela
faltava demais e depois que eu conversei com ela, ela vem todos os dias e
melhorou muito e conversei com outro que não é das turmas 08 não, mas os
outros eu não conversei ainda, os pais a gente liga, eles não podem, eles o
143
vêm, eles vão vir no final do ano porque os meninos o ser retidos, aí eles vêm
e choram, mais a maioria dos pais que a gente anotou não vem. Agora na sala
de aula eu, não é um trabalho coletivo, é um trabalho individual, eu chego perto
do menino, converso com ele, eu chego até a arrancar as folhas do caderno
dele que eu não gostei, arranco e agora vai começar de novo, eu tento assim
dessa forma e sempre no início do ano eu passo algumas regras básicas para
eles, se você pegar o caderno da turma 08A do início do ano, aí você vai ver
na primeira folha tá lá, como você deve estudar, que horas você vai fazer o
dever, que vo tem que ler, eu chamo assim, 10 dicas para começar o ano 10,
esse ano eu dei esse titulo para esse incentivo, aí há uns 10 dias ats, eu voltei
na página 1 do meu caderno, falei pra eles vamos voltar na gina 1 no primeiro
dia de aula, dia 27 de janeiro, volta aí para ver o que a gente tem que fazer, lá
tamm tem a relação com o professor, sou eu, o que a gente tem que
melhorar, o que tem que fazer para vocês melhorar, estudar em casa, ah Marta
eu tenho uma pregua, eu chego em casa e quero só dormir, ah eu tenho
que trabalhar, ah eu o gosto de estudar, eu detesto estudar eu vou mexer
com cavalo, para que eu vou estudar se eu vou mexer com cavalo, o essas
respostas que a gente ouve, mas eu sinto que o incentivo para melhorar é muito
individual, é cada professor defendendo a sua área, não é aquele interesse de
incentivar os alunos, eno você tem que estudar história e geografia, a gente
fala isso mais muito superficialmente porque cada um se preocupa com a sua
área, a gente não preocupa com os colegas não, muito triste”.
As propostas parecem vir das reuniões de conselho de classe, onde os
professores apontam as dificuldades, mas não existe um trabalho coletivo de
recuperação dos alunos, é cada professor que decide individualmente os
caminhos a percorrer no sentido de melhorar o desempenho dos alunos, isso
aparece na fala da professora Mirian: ӎ feito um conselho de classe, muitos
professores mudam o conceito lá na hora, não realmente foi só na minha
maria que ele foi assim eu vou dar uma chance, alguns até mudam, mas
depois disso aí, então a turma tal a gente vai tomar essas atitudes, a 08C, por
exemplo, vamos trabalhar em forma de Upara eles ficarem mais juntos, mais
próximos, a gente tenta tomar algumas atitudes, mas depois não é feito um
gráfico, um levantamento disso para ver qual disciplina o aluno está melhor,
porque, será que as aulas o mais interessantes, o aluno gosta mais, não é
144
feito um levantamento em cima disso não. E aqui a gente faz a um simulado, o
provão, eu não sou a favor porque eu tenho escutado dos alunos,eu vou
estudar muito professora porque eu vou tirar um conceito muito bom no provão,
então gera aquela expectativa do aluno estudar para a prova, eu acho que não
é assim, mas em cima do provão é feito um gráfico, eles fazem um
levantamento que vê em quais disciplinas o aluno se saiu melhor”.
Pergunto à professora Mirian se existe um processo de recuperação
contínua dos alunos em dificuldades. Segundo ela, não existe. “Às vezes nós
professores fazemos o seguinte, o aluno não foi bem, vamos dar uma chance,
vamos repetir a avaliação, vamos repetir a maria, eu faço muito isso, quando
eu vejo que a dificuldade não foi sanada eu não passo para a frente, até
atrapalha um pouquinho os alunos que avançam mais pido, eu falo que é um
mal necessário porque as turmas não o homogêneas, são bem
heterogêneas”.
Todos os professores apresentam o APG (Atendimento a Pequenos
Grupos) como o caminho para diminuir as dificuldades dos alunos em relação
ao aprendizado, porém, todos eles afirmam que os APGs não estão
funcionando, não acontecem regularmente. Nesse período letivo, os professores
apontam as seguintes dificuldades para a realização dos APGs: falta constante
de professores, as paralisações reivindicatórias, o projeto PAN (Projeto que a
escola desenvolveu tendo como referência os jogos Pan-Americanos), que ocupou
muito tempo, enfim, os APGs não aconteceram nos quatro meses de pesquisa,
não consegui acompanhar nenhum professor fazendo atendimento a pequenos
grupos. Todos os professores trabalham 24 h/a por semana, comoo oito
professores para atenderem seis turmas, teríamos sempre dois professores
estudando, fazendo reuniões ou trabalhando com pequenos grupos de alunos,
mas isso não ocorre, segundo os pprios professores, também por causa do
grande número de falta dos colegas.
A enturmação dos alunos segue o modelo seriado, os melhores na turma
08A, os intermediários na turma 08B e os alunos mais fracos na turma 08C, isso
tudo com o consentimento e até mesmo defendido por professores como
Renato, de matemática, que, em sua entrevista, diz: Eu acredito no seguinte,
você tem que ter turma homogênea, talvez não, por exemplo, uma turma só de
alunos bons e outra só de alunos ruins, eu o acredito nisso, mas eu acho que
145
a gente não pode ficar no extremo, você tem na turma 08A um aluno que é
excelente e na 08C um aluno que mal sabe ler, se você colocar um aluno desse
com o outro numa sala só, você vai ter uma dificuldade extrema de dar aula,
realmente tem que ter uma separação, o totalmente homonea, mas você
acaba que dificulta um aluno com o outro. Quando o aluno é ruim de mais, não
porque ele quer, mas porque ele tem dificuldades, a gente vê isso aqui, não
porque ele quer, mas porque ele tem dificuldades mesmo, ele é ruim por
natureza de tantas dificuldades que ele tem, e outro aluno que é bom com
facilidade, então você tem que estar trabalhando a mesma aula com os dois
juntos, você esta atrapalhando um dos dois, ou você esta trabalhando uma aula
mais devagar, uma aula mais lenta pra ajudar aquele aluno que tem
dificuldades, ou você está atrapalhando o aluno que é bom que podia estar
evoluindo muito mais. Se você dando uma aula que você pode evoluir, uma
aula mais avançada o aluno que tem dificuldades não vai conseguir fazer, eno
eu acho que tem que fazer essa separação sim não totalmente homogênea, tem
muitos professores que falam que o aluno bom ajuda o aluno que tem
dificuldade, ajuda mais só que esse aluno bom não vai avançar, vai avançar em
que, vai ficar só ajudando o outro, isso é nossa fuão e não desse aluno que é
bom. Eu como pai eu digo que eu não queria meu filho ou minha filha apenas
ajudando o seu colega evoluir na aula.
O professor lio, de história, defende um projeto para a turma mais
fraca, ele é contra a enturmação da maneira como foi feita. Vejamos o que ele
diz: “Bom, nós temos aqui na escola o atendimento a pequenos grupos, eu
trabalho com quatro alunos no xadrez eu pequei alunos com mais dificuldades
de aprendizado e conseguiram aprender, de maneira que até comigo a relação
melhorou bastante, agora no segundo semestre eu vou pegar quatro novos
alunos e farei questão de pegar aqueles que têm dificuldades de aprendizagem
ou disciplinar, então o APG nesse sentido ajuda, no meu caso especifico,
inclusive tem outros atendimentos e outros alunos o retirados da turma, agora
com a quantidade de paralisações, campeonato, etc., eu acho que o trabalho de
uma maneira geral ficou prejudicado, e é um trabalho muito individualizado em
pequenos grupos mesmo, dois, três e no máximo quatro por vez de cada sala.
Eu acho que deveria acontecer um projeto um pouco mais diferenciado com
essa turma, mas não há não. Por exemplo, você pegar realmente a questão de
146
produção de texto, de correção ortográfica, cada professor tirar uma aula da sua
maria, por exemplo e trabalhar com essa questão de produção de texto, com a
interpretação de texto na sala, ajudaria bastante. Isso para a história é fácil né,
trabalhar a interpretação de texto e leitura, só que a gente teve poucas aulas de
flexibilização em função desses questões ditas, paralisações, campeonatos e
tudo mais, as minhas aulas são justamente nas quintas e sextas-feiras depois
do recreio aí complicou, não teve um projeto para a turma e deveria ter tido.
Uma coisa que eu acho que, eu não sei porque eu não peguei a formação da
turma, eu particularmente não sou muito favorável a enturmação que existe,
esses alunos da 08C. Eles deveriam estar divididos, não deveria ser uma turma
tão ruim como é a 08C em termos de aprendizagem não.
Para a professora Roberta, não existe um projeto específico para diminuir
as dificuldades de aprendizado dos alunos, mas um combinado onde os
professores fazem atendimentos individuais com os alunos em dificuldades: um
projeto especifico não, existe um combinado, existe um olhar diferente para
aquela turma com relão ao coletivo existe sim, mais especificoo. Esse
combinado tem contribuído para diminuir a diferença entre essa turma e as
outras? Tem melhorado muito, eu acredito que comigo tem, eu acredito que sim,
que eles estão mais atentos, antes quem não fazia, agora faz, a gente tem
experiência de dois alunos, que eram alunos que davam muito trabalho no ano
passado para a gente, eles renderam muito, eles não deixam de fazer uma
atividade minha, isso pra mim é um questão de que eles melhoraram muito,
então esses alunos no ano passado eles criaram um Repp para esse grupo que
eu tenho de projeto os dois fazem parte e alguns alunos da B fazem parte, a
partir desse Repp que eles fizeram, eles ficaram mais valorizados, a escola
valorizou muito porque a gente apresentou em dois congressos, apresentaram
em outras escolas, esse ano eu não pude levar eles na escola que eu estou
trabalhando, mas nós combinamos que no segundo semestre eles iriam lá
porque a gente vai tá valorizando o aluno, a gente vai valorizando o que eles
sabem fazer, e a partir do que eles sabem fazer você vai estar investindo neles
e aí vo vê o aproveitamento em sala”.
A professora Marlene, de ciências, reconhece que os processos utilizados
por eles não são de ciclo, e seguem um modelo seriado. Ela diz: eu faço rias
avaliações, a primeira delas é que eu trabalho com química e infelizmente por
147
que não é ciclo, é uma rie , a gente ainda trabalha com contdos bem
fixos para aquelas turmas, então a química chega de repente no final do quarto
ciclo e chega com um vocabulário todo particular, muito peculiar, muito diferente
e eles levam um susto, outra coisa é eu preciso de uma base de matemática,
eles tiveram uma base de matemática difícil, não é legal a divisão com número
decimal então a base deles chega no final ruim, eles levam esse susto porque a
maria para eles é novidade e realmente fica sendo um pouco mais difícil e a
falta de compromisso deles mesmo sabe, chega no início do ano a 08A isso
ficou muito claro é início de ano, eles estavam querendo saber de auê, era
camisa, era formar, eles estavam muito nesse clima de auê, o os últimos da
escola, isso infelizmente todo ano se repete com as turmas que chegam no
final, aí o compromisso, o querendo paquerar, namorar, são os donos da
escola, são os mais poderosos, os melhores da escola e o compromisso com os
estudos fica muito a desejar e uma coisa que eu avaliei por ser química e
chegar num ano diferente avaliar a mim, o que eu enquanto professora posso tá
fazendo diferente, então eu comecei a pensar num trabalho diferenciado com
química principalmente para a turma 08C, mas passo a passo para facilitar o
entendimento deles, isso eu fiz durante um tempo, aí eu parei, trabalhando na
frente de novo do mesmo jeito, porque foi uma avaliação que nós fizemos no
conselho nessa turma tem que trabalhar diferente, nem que você fique para
trabalhar diferente lá, então eu comecei a trabalhar diferente, mas que
desestimula tanto a gente que nada que você faz você vê retorno e isso cansa,
aí voltei a trabalhar do mesmo jeito.
Vi, a aqui, que as ferramentas utilizadas pelos professores para
transmitir conhecimentos para os seus alunos seguem o modelo seriado, e isso
não é inconsciente, todos os professores reconhecem e alguns defendem o
modelo por eles seguido, outros vêem com pesar o resultado da sua prática
educativa. O acúmulo de matéria, a pressão para fazer as atividades, a
ocupação exclusiva com o cognitivo, a avaliação apenas dos contdos, a
ameaça de que as atividades valem ponto e que na oitava série tem reprovação,
a convocação constante de pais para forçar os alunos a estudarem mais. Não
existe uma relão entre conteúdo e desejo de aprendizado, a escola é um
ambiente ruim para o aluno, ele é obrigado a fazer tudo isso sob a ameaça de
ser retido no final do ano.
148
As grandes dificuldades dos alunos é um incômodo para todos os
professores. Todos lamentam o resultado negativo no primeiro trimestre desse
ano. As causas dessas dificuldades inúmeras vezes foram apontadas nas
entrevistas: o fracasso do APG, que não aconteceu como deveria, a constante
falta de professores, as paralisações reivindicatórias, a interrupção das aulas
para o projeto PAN, a falta de interesse dos alunos, a falta de dedicação dos
alunos para com os estudos, alunos que não sabem ler, interpretar, que não têm
um raciocínio lógico, o pedagico que não funciona como deveria, etc.
As relações entre professores e alunos das três turmas do último ano do
ensino fundamental, da Escola Municipal Capela Nova de Betim, aparecem
acima muito bem descritas. A relação de poder continua sendo a mesma a que
fomos submetidos 10, 20, 30 ou há 50 anos ats. O poder do professor
sobre o aluno continua na avaliação (prova trimestral, provão), na nota, na
ameaça de chamar os pais, no poder de reprovação, o fracasso continua sendo
apenas do aluno. A Escola Democrática encontra dificuldades para democratizar
as relações entre professores e alunos no cotidiano escolar. Essa prática torna
o currículo tão autoririo quanto na escola tradicional, que é opressora e
excludente, porque o aluno chega no último ano do ensino fundamental sem
saber, vai ser retido, e vai concluir o ensino fundamental sem ter o direito de
saber. No olhar pessimista a Escola Democrática (ciclo) aprova o aluno sem o
saber cognitivo necesrio, isso porque não tem reprovação; isso porque sem a
ameaça da reprovação, o professor não consegue ensinar e o aluno não
consegue aprender.
Uma escola autoritária não promove a formação de uma personalidade
livre, consciente e cidadã, uma escola que reprova põe a culpa de todo o
fracasso escolar apenas nos alunos. Uma escola autoriria ensina uma relação
de poder injusta, onde o mais forte sempre vence o mais fraco. Aqui, o poder é
dominação, e essa dominação significa poder mandar o aluno calar a boca,
manda quem pode obedece quem tem juízo, dar uma prova em que poucos
alunos alcançam a média, significa reprovar muitos alunos no final do ano em
nome da qualidade do ensino. PARO (2001) faz uma reflexão sobre essa
situação:
149
No ensino brasileiro, a manifestação desse componente cultural da
competitividade mostra-se com toda sua foa na valorização do
credencialismo acima dos próprios objetivos educativos da escola. É
muito marcante, na população de modo geral, a imporncia conferida
às notas escolares, aos diplomas e às promoções de série ou de grau.
Do diálogo-padrão de um pai ou e com seus filhos estudantes a
respeito de seu desempenho escolar, pode-se facilmente depreender
que as crianças e jovens vão à escola não para aprender, mas para
passar de ano, já que a preocupação do adulto é quase sempre com a
nota e com a promoção e não com o aprendizado e com a formação
da personalidade por meio da educão. A nota boa e a promão
funcionam, assim, de modo bastante significativo, como o
reconhecimento do mérito do estudante, produto de seu esforço, na
competição pela vida. Mas a ideologia do mérito e da competição está
presente na própria escola. Contra ela Lauro de Oliveira Lima já disse
que o sistema de verificação que consiste em comparar os alunos
entre si não só é profundamente injusto (dadas as difereas
individuais), como provoca hostilidade e desavenças, quebrando a
desejável solidariedade que deve ser cultivada na juventude. (lima,
1962, p. 330-331) Disse tamm que os alunos devem ser educados
para a solidariedade e o trabalho em equipe característico das novas
tendências da civilização, e não para a desenfreada competição
característica de um liberalismo obsoleto e injusto. (PARO, 2001, p.
78-79 apud LIMA, 1962, p. 331-332)
Vejamos, por fim, o pensamento dos nossos professores entrevistados a
respeito do ciclo de formação humana. A professora Fvia pensa da seguinte
maneira: olha, a proposta do ciclo é muito boa, eu acho que ela é mal
interpretada, eu acredito que eu sou fruto da escola tradicional, estudei em
escolas públicas tradicionais e eu acho que tinha coisas que davam certo e não
é simplesmente tirar totalmente um sistema e implementar outro. Eu acho que a
gente tem que pegar o que deu certo em um e vir com outro, fazer uma coisa
híbrida mesmo, pegar o que deu certo no tradicional e trazer para o ciclo e
renovar mesmo, e eu vejo, por exemplo, o ciclo hoje é a bola da vez, todo
mundo diz que o ciclo é lindo e maravilhoso, o projeto do ciclo é muito bonito,
mas existe pouco investimento no ciclo, por exemplo escola de tempo integral
não tem em Betim, então se o aluno tem um tempo maior para aprender e se a
gente tá levando em consideração as individualidades, o aluno enquanto
indiduo que tem seu tempo diferente do outro, então cadê esse outro tempo
que ele precisa para se desenvolver que não tem. Então me remete a outra
coisa, se o aluno não tem um tempo a mais na escola para suprir esse tempo
maior que ele precisa, então ele precisa ficar na escola mais um ano, mais dois
anos, então o ciclo várias interpretações nesse sentido. Eu acho que falta
investimento no ciclo para dar certo.
150
Na verdade, a idéia de mesclar o ciclo com a seriação parece o ser de
apenas um professor. A defesa quase sempre é a mesma, tem muita coisa boa
na formação que eu tive, e isso o pode acabar assim, de uma hora para
outra. Vejamos a opinião do professor Júlio: “eu acho que essa discussão não
pode ser colocada nesse ponto de vista, não, porque dentro do ciclo você tem
que fazer algumas pticas seriadas, um feijão com arroz mesmo, por exemplo,
essa questão do provão hoje, tem determinadas concepções que não aceitam
provão, semana de provas, eu acho que uma semana de provas e um proo é
estimulante para que o aluno estude, para que o aluno reveja a maria dada,
acho que isso é fundamental. Da mesma forma que, por exemplo, uma aula
passar matéria no quadro, eu fo isso, acho que é importante fazer isso,
porque você passa matéria no quadro verifica se o aluno esta copiando, verifica
se o aluno tem um caderno organizado, verifica se o aluno pulando linhas
entre parágrafos, se ele abre pagrafos, se não abre, então o táticas ditas
tradicionais relativas à questão do seriado, mas são práticas que devem ser
feitas, acho que o que se deve colocar é, qual ptica que vai permitir que o
aluno aprenda, é um quadro negro com matéria, então é um quadro negro com
maria, isso ajuda na aprendizagem do aluno, então vamos fazer, é uma sala
de informática ligada à internet com banda larga. Então vamos ter uma sala de
informática com banda larga, agora se a prática é ciclo ou se a ptica é seriado
eu acho que sinceramente isso não vem ao caso, por exemplo, se o menino
aprende matemática decorando tabuada ou se aprende a matemática de outra
maneira, aprendeu então beleza, uns o aprender de uma maneira e outros
vão aprender de outra, o que a gente tem que ter é justamente esses recursos
para ter variedade de maneiras de trabalhar porque aí você pega todos os
alunos, o que vai aprender com a tabuada o que vai aprender com aquele
material dourado que eles falam se tem o material beleza”.
O professor Renato tamm comunga com essa opinião; o ciclo é bom,
mas existem distorções. Vejamos seu pensamento: eu acredito no ciclo, mas
tem certas partes que o muito distorcidas, eno eu não acredito muito na
aprovação automática, eu acho que o aluno tem que saber pelo menos o
nimo pra passar, então acontece que tem muitos alunos que estão passando
sem saber nem esse mínimo. Uma avaliação por exemplo um término do ciclo
que é a antiga oitava rie é estipulado um percentual para reprovação, você
151
pode reprovar 10% dos alunos, então se eles não cobram nota, o querem que
a gente dá nota pra aluno, tem que ser conceito, eles mesmos estipulam
valores, números como reprovar 10%, se você tem 30% que não sabem nem o
nimo, você tem que deixar 20% passar sem saber”.
Perguntei a todos os professores entrevistados como viam o ciclo de
formação humana, qual era a sua avaliação sobre ele. A professora Mirian diz:
eu acho que para alguns alunos é muito bom, é fundamental, mas falta uma
preparação dos educadores, quando eu entrei já havia implantado tudo, eu
peguei o bonde andando, mas acho que falta preparação, tem resistência de
alguns profissionais, eu trabalho com alguns que tem resistência ao ciclo, não
aceitam. Acho que a maioria das escolas trabalha em regime de seriação, mas
com nome de ciclo, ainda não perdeu o caráter de seriação e alguns entraves
que tem no ciclo, eu mesmo nas escolas que eu trabalhei, nenhuma o ciclo é
totalmente assumido, que trabalha ciclo realmente, o ciclo de formação humana
como deveria ser, deixa a desejar sim na rede como um todo. Então você acha
que as dificuldades vêm da estrutura da rede, da preparação profissional? Deixa
eu te dar um exemplo, eu trabalho em uma escola que não tem a estrutura
adequada ao ciclo, eu vou trabalhar com APG eu levo os alunos para o
refeirio, eu não tenho espaço para ficar com esses alunos de APG então falta
até isso, a estrutura e a escola é muito grande e com uma demanda muito
grande de alunos e eu trabalho com alunos portadores de necessidades
especiais, eu não tenho preparação para isso e meus alunos não tem um
monitor, não tem um estagrio acompanhando, dificulta muito o trabalho.
Mas alguns professores defendem a proposta do ciclo de formação
humana, como a professora Roberta, que considera a proposta positiva.
Vejamos: positiva e com algumas falhas ainda. Positiva em relação professor/
aluno, algumas falhas porque tem professores que ainda o praticam o ciclo,
porque o ciclo é uma ptica, enquanto não houver uma prática não existe
resultado. Aqui nessa escola o ciclo funciona melhor porque existe uma
colaboração maior entre o coletivo, entre os alunos também em relação aos
projetos que são desenvolvidos na escola, então eu acho que aqui funciona
melhor, tem outra escola da rede municipal que eu trabalho à tarde, então eu
acho que o funcionamento aqui é melhor, parece que o andamento, a
colaboração, existe tudo isso. Eu sou a favor do ciclo, eu prefiro o ciclo, eu acho
152
que é diferente, porque a proximidade com os alunos é diferente, porque eu
acredito que o aluno tem que ter oportunidade, e na seriação eu não vejo isso,
eu acho que a seriação causa trauma, traz problemas, eu acho que o ciclo é
melhor mesmo com o que dizem por aí , não acreditando, falando que não
existe reprovação, que o aluno tem que ser reprovado, eu acho que todo mundo
tem que ter uma segunda chance, e o tempo do aluno, tem que entender isso,
todo mundo tem um tempo, eno às vezes ele não está naquele tempo, e as
vezes você tem que respeitar o tempo dele.
As diverncias de opiniões continuam, na medida que nossos
entrevistados dão sua opinião. A professora Marta diz: eu acho que a proposta
do ciclo super interessante, ela proporciona a todos os alunos um grau ‘igual de
aprendizagem, forma o menino tanto na parte humana quanto na parte
cognitiva, então a proposta do ciclo para mim é muito boa, eu gosto muito da
proposta do ciclo. A parte teórica do ciclo eu acho que nós vencemos muito,
acho que nós passamos por essa etapa da teoria, tem que estudar muito
ainda, mas essa parte teórica eu acho que a gente já avançou bastante, mas a
parte ptica do ciclo na rede municipal não tá muito boa, eu acho que o
processo de aprendizagem, o processo de avaliação, essa condução do ciclo
ainda não tá boa, a infra-estrutura da escola, vo não pode atender o menino
em turmas flexíveis porque o tem quem fica no seu lugar, você não pode
fazer o APG porque tem que substituir professor, eno essa estrutura física da
escola não muito boa não. Eu gosto muito do ciclo, acho que avançou muito,
os alunos passaram a raciocinar mais, todos tem a mesma oportunidade, eno
eu gosto muito da proposta do ciclo, eu acho que a gente poderia estar mais
avançado, mas estamos no caminho certo, eu defendo o ciclo de formação
humana”.
E aqui na escola, Marta, nesses seis anos que você está aqui, como
vo avalia o processo de implantação do ciclo de formação humana?
Lentíssima, cada professor com o seu conteúdo, a gente tenta se integrar com
os outros e tem dificuldades, todas essas que eu já te falei mais a má vontade
mesmo, da gente, dos professores, você não divide com o colega o que esta
fazendo eu percebo isso aqui, os projetos que a gente faz para interagir todas
as áreas, uns professores puxam mais, outros puxam menos, uns participam,
outros não participam, eno essa parte do ciclo na escola está muito a desejar,
153
eu não gosto, não gosto acho que tem que melhorar muito, a integração dos
professores tá muito aquém do que poderia ser.
A professora Marlene diz: “eu acho que a implantação foi positiva,
inclusive quando aqui na escola começou em 2000 tinha essa possibilidade de
escolher, implantar o ciclo ou continuar seriado e ir implantando aos poucos, aí
nós optamos por implantar de uma vez a questão dos ciclos porque a gente se
prepararia no dia-a-dia, a gente não acredita que, por exemplo, ia estudar para
fazer o ciclo no ano que vem, não a gente ia no dia-dia tentando implantar o
ciclo, na verdade desde então há mais ou menos seis anos aqui na escola, aqui
na escola eu estou há 11 anos.
Como você, Marlene a atuação do administrativo e do pedagógico
aqui na escola? Acho que foram os dois os responsáveis, o administrativo e o
pedagógico, o administrativo é o professor, quando a gente falou vamos fazer o
ciclo todo mundo tava muito interessado em fazer sim, que ele acontecesse na
prática, o pessoal tava se dedicando, os professores estavam interessados,
tinha assim, o pessoal tava mais quente com o ciclo, depois o teve muito
curso, hoje o pessoal tá participando de curso pra ganhar PCCV, não é para
mudar a sua prática na escola, e aí deu uma esfriada, eu acho que a direção e o
pedagógico, principalmente o pedagógico aqui na escola ele deixa a desejar, ele
não consegue amarrar, ele não consegue atuar, ele não consegue puxar o
carro, ele fora de sala pra isso também, ele não consegue aqui na escola
não. Então isso deu uma esfriada, eu nunca vi como esse ano a escola tão
alheia a tudo, eu estava conversando com a Marta (professora de português)
colega de turma, como os colegas estão alheios, esse ano o está tendo nada,
entendeu, tem o projeto do PAN mais muito solto, isso quando eles ficam na
quadra, não é isso que justifica o ciclo, eno o pessoal esse ano muito
alheio.
Na sua opino, Marlene, a Secretaria Municipal de Educação investe na
formação do professor? Eu acho que a rede, você fala Secretaria, eu mesmo
tive um curso no s passado, feito pela rede, eu acho que a Prefeitura está
investindo muito lentamente, ela poderia investir mais, ela melhorou alguma
coisa, eu acho que em termos de ciclo para efetivar, para concretizar o ciclo na
escola mesmo eu acho que ela melhorou, tem mais curso, pessoal mais
embasado, mas ainda fica muito a desejar, mas ela melhorou, esse curso sobre
154
ciclo que eu fiz foi muito bom, eu fiz com uma equipe que é muito boa, essa
equipe que acredita no ciclo e isso da uma injeção na gente de ânimo, mas a
Secretaria em si poderia fazer mais, ela poderia investir mais na formação do
professor.
O que você pensa sobre o ciclo de formação humana? “Sou plenamente a
favor do ciclo, eu estava assim balançada, eu fiz esse curso, foram 60 horas né,
eu achei muito legal, como eu te falei, o grupo que está na frente ele conseguiu
mostrar, justificar pra gente que a questão do ciclo está na postura, não é eu
tendo um módulo de aula diferente, ter projeto, não é isso que justifica o ciclo é
a postura da gente em sala, com nossos colegas, nesse sentido, então é isso
que eu acho que fica difícil aqui na escola, porque a gente não tem esse
momento, por exemplo, atendimento a pequenos grupos eu nunca vi uma coisa
tão falha aqui na escola, tanto aluno precisando e ela não acontece, não existe,
realmente não está ajudando o menino, porque não tem um acompanhamento
pedagógico, não tem assim, vamos avaliar, vamos fazer uma reflexão a cada
s, a cada ts encontros gente vamos ver, como é que está, atendendo, se
o aluno falta então você não atende ninguém, não tem essa cobrança e aí vai
indo vai ficando assim”.
O ciclo, aqui na escola, ele está fazendo diferença no processo de ensino
aprendizado do aluno? Não, nenhuma, é seriado do mesmo jeito, inclusive eu
enquanto professora de cncias trabalhando química é o mesmo trabalho como
se fosse seriado é o mesmo, aqui está o nome de ciclo, mas é como se fosse
seriado então o faz diferença nenhuma, eno não contribui e nem diminui
entende, ficou do mesmo jeito, a gente o esta vivendo o ciclo porque tem
esse momento de estudo, eu acho às vezes até que piorou porque eu tinha mais
aula em sala, porque não tinha os APGs, distribuía mais aula para os
professores, então por exemplo matemática tinha mais aula em sala, a gente
tava mais ou menos equilibrado três, três, três , eno eu acho que houve
nesse sentido uma perda, porque os APGs não consegue atender, esse
momento desse ao professor para que ele atenda APG pequenos grupos, eno
se ele não esta atendendo pequenos grupos eu acho que es sendo pior.
Vi, nas entrevistas, que os professores acreditam no modelo de ciclo de
formação humana. Vi, tamm, que a prática de sala de aula é uma mistura
entre os modelos ciclo e seriado, prevalecendo o seriado. Percebi, em cada
155
professor, o desejo de acertar, de encontrar a melhor maneira de ensinar seus
alunos. Todos eles se mostram preocupados com os maus resultados dos
alunos na primeira etapa do ano letivo de 2007. Seria possível reunir aspectos
do ciclo com a seriação, esse seria mesmo o melhor caminho para a formação
dos alunos da Escola Capela Nova de Betim. Parece-nos impossível qualquer
alternativa dar certo enquanto os alunos não participarem da escolha, enquanto
eles forem apensas objetos passivos do processo, enquanto eles forem
considerados apenas recipientes vazios a serem enchidos de conteúdos de
cada disciplina isoladamente. Enquanto os pais forem lembrados apenas nos
conselhos de classe relacionados aos alunos problemas”, escolhidos apenas
para ouvir reclamões sobre seus filhos, eles precisam participar do processo,
fazer escolhas, contribuir para a qualidade da escola, precisam ser ouvidos.
Pais e alunos precisam avaliar, e, não somente, serem avaliados pelo esforço
que fazem ou deixam de fazer. Professores, direção e pedagogas precisam
ouvir, ser avaliados pelos alunos e pelos pais, numa relação dialógica onde
todos contribuem para uma escola de qualidade. Vitor Henrique Paro fala da
falta desse diálogo democtico necessário na escola pública brasileira:
Mas sem dúvida nenhuma, hoje a principal falha da escola com
relação a sua dimensão social parece ser sua omissão na fuão de
educar para a democracia. Sabendo da gravidade dos problemas e
contradições sociais presentes na sociedade brasileira injusta
social, violência, criminalidade, corrupção, desemprego, falta de
consciência ecogica, violação de direitos, deterioração de serviços
públicos, dilapidação do patrimônio social, privatização dos bens
públicos e do Estado etc. -, que só se fazem agravar com o decorrer
do tempo, e considerando que uma sociedade democrática só se
desenvolve e se fortalece politicamente de modo a solucionar seus
problemas se contar com a ação consciente e conjunta de seus
cidadãos, não deixa de ser paradoxal que a escola blica, lugar
supostamente privilegiado do diálogo e do desenvolvimento crítico das
consciências, ainda resista tão fortemente a propiciar, no ensino
fundamental, uma formação democrática que, ao proporcionar valores
e conhecimentos, capacite e encoraje seus alunos a exercer de
maneira ativa sua cidadania na construção de uma sociedade melhor.
(PARO, 2007, p. 18, 19)
Conceber a educação apenas como transmissora de conteúdos, sem
considerar a formação política, filosófica e humana de cada aluno, é reproduzir
as contradições sociais que se perpetuam no interior do Estado brasileiro. O
professor que trabalha para uma práxis libertadora está atento para as
necessidades que cada grupo social tem de aprender a realidade social e
156
cultural do meio onde vive, enquanto uma prática conservadora ignora aspectos
importantes da realidade vivida pelos alunos, a prática libertadora conscientiza e
liberta. Para FREIRE (2005),
A existência, porque humana,o pode ser muda, silenciosa, nem
tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras
verdadeiras, com que os homens transformam o mundo. Existir,
humanamente, é pronunciar o mundo, é modifica-lo. O mundo
pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos
pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar. (FREIRE, 2005, p. 90)
Para Moacir Gadotti (2004b),
o educador é aquele que não fica indiferente, neutro, diante da
realidade. Procura intervir e aprender com a realidade em processo. O
conflito, por isso, está na base de toda a pedagogia. Mais adiante ele
afirma que, a pedagogia da práxis pretende ser uma pedagogia para a
educação transformadora. Ela radica numa antropologia que considera
o homem um ser criador, sujeito da história, que se transforma na
medida em que transforma o mundo. (GADOTTI, 2004b, p. 29-30)
Parece urgente um processo contínuo de dialetização da educação em
todos os níveis e em todas as instituições de ensino, principalmente nas escolas
públicas onde o poder continua centrado na figura do professor, que tudo sabe
sobre o aluno que nada sabe, este que permanece sendo um recipiente vazio
engolindo conteúdos predeterminados que nem sempre contribuem de fato para
a sua emancipação. Para GADOTTI (2004a), a educação que copia modelos,
que deseja reproduzir modelos, o deixa de ser práxis, só que se limita a uma
práxis reiterativa, imitativa, burocratizada. Ao contrário desta, a práxis
transformadora é essencialmente criadora, ousada, crítica e reflexiva
(GADOTTI, 2004a, p. 31). Nossos professores, na Escola Capela Nova,
continuam reproduzindo uma escola conservadora, antidialógica, burocratizada,
e, com isso, produzindo alunos desestimulados, passivos, acríticos, que não
desenvolveram a capacidade criadora capaz de transformar a realidade vivida
por eles. Nessas relações de poder, fica evidente que, uma coisa é ver
professores acreditando na educação como meio para os alunos serem alguém
na vida, e outra é ver professores fazendo da educação uma ferramenta de luta
contra as relações de exploração impostas pelas elites dominantes do país. A
157
pedagogia da práxis está na ação transformadora, difícil, mas importante para
mudar a realidade social brasileira.
6.3 As três turmas do último ano do ensino fundamental
As três turmas de alunos por s pesquisadas são formadas por 86
alunos oriundos das classes trabalhadoras: operários, empregadas domésticas,
funciorios blicos, pequenos comerciantes, etc. Mas embora o nível social e
econômico entre os alunos serem bem próximos, no interior da escola as
divergências entre as ts turmas o grandes. A organização das turmas
parece seguir o modelo seriado. A turma 08A, com 29 alunos, é uma turma
homonea dos melhores alunos. A turma 08B, com 29 alunos, é uma turma
homonea dos alunos intermediários. E a turma 08C, com 28 alunos, é uma
turma homonea dos alunos mais fracos.
Embora omero total de alunos matriculados seja de 86, emrios
momentos da pesquisa esse número aparece variável em fuão da ausência
de alunos em aula. Nas consultas às fichas de matrículas dos alunos,
autorizadas pela secretaria da escola, fiz algumas observações interessantes. A
maioria dos alunos não é natural de Betim; 32 são alunos naturais de
Contagem, 22 de Belo Horizonte, oito de Esmeraldas, 12 de outros municípios
de Minas Gerais, três não constavam a naturalidade e apenas sete alunos
nasceram em Betim. A grande maioria dos pais não concluiu o ensino
fundamental, 11 pais concluíram o ensino médio, e apenas um tem curso
superior. Outro dado muito importante para esta pesquisa é o tempo que nossos
pesquisados estudam na Escola Capela Nova. Dos 86 alunos pesquisados, 48
estudam na escola há oito anos, ou seja, desde o primeiro ano do ensino
fundamental, e apenas um aluno matriculou-se nesse ano de 2007. Se
começarmos a contar a partir da quinta rie, teremos 81% dos alunos há
quatro anos estudando na escola. Isso tudo significa que a maioria dos alunos
pesquisados construíram seu histórico escolar na escola pesquisada.
Como citei anteriormente, as condiçõessicas da escola são boas; o
prédio é novo, as salas são bem distribuídas, o refeitório é bom, a merenda é de
158
boa qualidade, a quadra é coberta, as condições financeiraso boas para
atender as necessidades da escola, o número de alunos por turma de 29, no
caso das três turmas pesquisadas, não é muito grande. No primeiro turno o
atendimento em setores como a biblioteca, que é bem equipada e espaçosa,
conta com duas atendentes para atender a demanda, três auxiliares de
secretaria somente no turno da manhã, duas pedagogas para conduzir o
pedagógico com as 14 turmas, oito professores trabalhando 24 h\a por semana
para atender seis turmas, ou seja, dois professores a mais para atendimento a
pequenos grupos, pesquisas e reuniões. A média salarial dos profissionais da
educação em Betim pode ser considerada boa para as redes blicas nacionais.
Enfim, as condições físicas e pedagógicas da escola parecem-nos em
condições de realizar um bom trabalho de ensino/aprendizado com os alunos.
É bem verdade que as condições da educação em Betim se são boas,
isso se deve também à organização da categoria atras do sindicato que os
representa (Sind-Ute), também é verdade que todas essas condições podem
melhorar, principalmente no tocante à autonomia pedagógica e administrativa
das escolas uma vez que me parecem muito centralizadas, pois o regimento é
único em toda a rede e os destinos da educação são centralizados na SEMED,
não havendo uma constante participação dos agentes envolvidos no processo,
profissionais da educação, pais e alunos.
É fato também que as conquistas feitas pela educação em Betim dariam
condições aos educadores de oferecer uma educação de qualidade para os
alunos. Se o sistema adotado pela rede é o ciclo de formação humana, este
deveria ser abraçado livremente por todos os agentes envolvidos, o que não
acontece, segundo aponta esta pesquisa: os professores da Escola Municipal
Capela Nova acreditam no ciclo, alguns lamentam as dificuldades para praticá-
lo, mas a ptica em sala de aula ainda é muito tradicional, conteudista, utilizam
métodos reprodutivistas, como a ameaça da reprovação, usam notas nas provas
para depois transformar em conceito, as avaliações consideram apenas o
conhecimento cognitivo. Os alunos estudam para tirar nota e passar de ano. As
entrevistas realizadas com professores e alunos mostram que, na sua maioria,
as relações de poder são autoritárias. Percebemos a dificuldade em estabelecer
uma relação dialógica, própria de uma educação democrática, onde o
aprendizado adquire-se pelo prazer de se apropriar da cultura.
159
Apliquei um questionário para as três turmas do último ano do ensino
fundamental. Nesse dia, participaram do questionário 72 alunos; os outros 14
alunos haviam faltado à aula. O questionário tinha 13 questões a respeito da
vida escolar dos nossos alunos. Perguntamos o motivo de estudarem nessa
escola; 76% dos alunos responderam que era porque a escola fica perto de
casa. Isso me mostra que a maioria dos alunos que estudam na escola o da
própria comunidade onde a escola es localizada, pois essa informação foi
confirmada em uma consulta que fiz na ficha de matcula dos alunos, consulta
autorizada pela direção da escola. Nela, percebi que os 86 alunos pesquisados
nessa consulta estão divididos em sete bairros próximos da escola, 25% mora
no bairro onde a escola está localizada e 52% mora em outro bairro que faz
divisa com o anterior, ou seja, 78% dos alunos moram em apenas dois bairros,
os mais pximos da escola.
Perguntei aos alunos sua opinião a respeito da qualidade do ensino da
escola em que estudam; 86% dos alunos dividiram-se entre bom e muito bom.
Nossos alunos demonstram que acreditam na qualidade do ensino da escola em
que estudam. Perguntei o que os professores fazem para manter a disciplina na
sala de aula, e 69% dos alunos afirmaram que os professores conversam com a
turma, 17% afirmam que os professores mandam o aluno para a direção da
escola. Os professores procuram conversar, convencer os alunos que devem
respeitar as normas da escola, que não existe aprendizado com bagunça, com
muita conversa. Perguntei a eles se os alunos participam da escolha de temas
para as aulas; 57% dos alunos responderam que participam poucas vezes, 22%
responderam que participam muitas vezes ou sempre, e 21% afirmam que
nunca participam da escolha dos temas das aulas. No ciclo de formação
humana, o conteúdo é flexível e a participação dos alunos é um fator
determinante no processo de ensino/aprendizado. Já no sistema seriado, o
contdo é algo pronto, determinado pelo currículo programático, e cabe ao
professor seguir esse conteúdo.
Apesar dos resultados ruins que os alunos tiraram no primeiro trimestre
desse ano, eles acreditam que a escola é boa, que as ações dos professores é
para seu bem, e se responsabilizam pelos maus resultados, afirmando que não
estudaram direito, fizeram bagunça na sala, não fizeram o dever de casa,
acreditam que o resultado é justo. O olhar desses alunos sobre a realidade
160
escolar em que estão inseridos é conformista e passiva. Eles não conseguem
fazer uma reflexão crítica da sua ppria realidade escolar. Assim, não
conseguem se libertar dos conteúdos autoritários que foram depositados em
suas consciências ao longo dos anos escolares. Por não se sentirem
emancipados nesse processo, não sentem prazer em participar dele, daí a falta
de interesse pelos estudos, o que acarreta abandono da escola, reprovação,
consecutivas aprovações sem a devida apropriação do conhecimento, ou seja,
um processo onde o aluno é penalizado e excluído do direito à cidadania.
A Escola Municipal Capela Nova de Betim, para estimular seus alunos a
estudar, faz, a cada etapa, a escolha do destaque da turma, o aluno que melhor
desenvolveu as habilidades educacionais. Perguntei, então, aos alunos, como é
feita a escolha do destaque da sala, e 45% responderam que é o aluno mais
disciplinado e com maior nota; 26% responderam que é o aluno que melhor
desenvolveu as habilidades educativas. No final do semestre letivo, a escola faz
um provão, uma prova simulada com questões de todas as disciplinas para
testar os conhecimentos dos alunos. Perguntei a eles qual é a importância da
prova simulada: 57% responderam que era para preparar o aluno para o
vestibular e para concursos; 24% responderam que era para dar uma melhor
compreensão dos conteúdos. Perguntei, por fim, o que mais motivava os alunos
a participarem das aulas: 43% responderam que era o valor em pontos de cada
atividade, e 25% responderam que eram os temas da realidade e do cotidiano.
Esse questionário ajudou-me a conhecer um pouco mais da percepção
que nossos alunos pesquisados m da escola em que estudam. Recapitulando
as informações, vemos que: apenas sete dos 86 alunos pesquisados são
naturais de Betim, que 66% dos pais o concluíram o ensino fundamental, e
apenas um tem curso superior. Verifiquei, também, que 77% dos alunos moram
nos dois bairros mais próximos da escola, e que os outros 23% moram em
bairro próximos; 86% dos alunos consideram bom o ensino na escola apesar
dos maus resultados no primeiro trimestre de 2007.
Nenhum dos nossos 86 alunos estudou em escolas tradicionais seriadas.
Todos tiveram toda a sua vida escolar já no ciclo de formação humana, e, ainda
assim, parece achar normal não participar da escolha dos temas das aulas, que
os conteúdos devem ser esses programados. Nossos alunos do ciclo conhecem
nota, conhecem o valor de uma prova, sabem quanto vale um trabalho em
161
grupo, consideram importante um provão simulado para estudarem melhor os
contdos de cada disciplina, eles sabem muito bem que, se não estudarem
mais, podem ser retidos no final do ano, ou seja, podem ser reprovados no final
do ciclo.
Nas observações em sala de aula, verifiquei que os alunos das três
turmas do último ano do ensino fundamental têm algumas características em
comum: eles moram nos mesmos bairros próximos da escola. Não existe uma
variação de turma para turma entre a escolaridade dos pais, não existe
diferenças grandes na situação econômica e social entre as turmas, ou seja,
todos os alunos das ts turmas são oriundos das classes trabalhadoras. As
principais diferenças acontecem no interior da escola, onde os alunos foram
divididos em três turmas, e essa enturmação não é aleatória, ela divide os
alunos em bons, médios e ruins consecutivamente nas turmas 08A, 08B e 08C.
A escola, ao classificar os alunos em bons, médios e ruins, dividindo-os
em turmas homogêneas 08A, 08B e 08C, reproduz o sistema ideogico
capitalista da divisão da sociedade em classes. Essa divio, defendida por
alguns professores que afirmam que o desejariam ver seus filhos em turmas
como a 08C, é incoerente com a ptica do ciclo de formação humana adotado
pela escola, e que, na verdade, distante da ptica em sala de aula. Os alunos
aceitam passivamente as regras impostas pela escola, as relações de poder são
autoritárias, pois am de o contarem com a participação livre dos alunos, o
produzem os efeitos esperados. Como justificar que alunos de três turmas
estudam na mesma escola por um períododio de oito anos, chegam ao
último ano do ensino fundamental com grandes dificuldades de aprendizado, ou
melhor, de reprodução de conteúdos. Essa ptica reprodutivista, contribui para
legitimar a divisão da sociedade em classes, e a conformidade dos menos
favorecidos que se vêm excluídos dos benefícios de uma educação dialógica.
Para Moacir GADOTTI (2005),
a pedagogia reacionária, pedagogia do colonizador, é uma pedagogia
que forma gente submissa, obediente, incapaz de participar. Esse
pedagogo esconde-se, hoje, atrás de uma pseudo-o-diretividade. É
uma pedagogia da omissão que faz o jogo da ideologia dominante,
cujo objetivo fundamental é a não-participação, a docilidade, a
subserviência. Nesse ponto a pedagogia conservadora tem cumprido
com êxito a sua tarefa de cimentar a ideologia da classe dominante. A
escola tem servido, pelos seus programas, pela sua política, pela sua
162
prática, para legitimar o poder totalitário, constituindo-se, portanto,
num empecilho para o avanço em direção a uma sociedade
democrática, simplesmente democrática (sem adjetivos). (GADOTTI,
2005, p. 62)
GADOTTI (2005) também aponta para a necessidade de uma educação
que tenha como função social a conscientização dos alunos:
No plano social, é ato pedagógico desvelar as contradições existentes,
evidenciá-las com visas à sua superão. O educador, nesse sentido,
não é o que cria as contradições e os conflitos. Ele apenas os revela,
isto é, tira os homens da inconsciência. Educar passa a ser
essencialmente conscientizar. Conscientizar sobre o nada. Não. Sobre
a realidade social e individual do educando. Formar a conscncia
crítica de si e da sociedade. (GADOTTI, 2005, p. 70)
6.3.1 A turma 08A
A turma 08A tem 29 alunos matriculados, a freqüência média nas aulas
observadas era de 27 alunos, esses são considerados pelos professores, pela
direção e pedagogas e a por eles mesmos, os melhores alunos do último ano
do ensino fundamental. Eles até aparentam ter um nível social melhor do que a
turma 08C, mas, até onde eu pesquisei, nenhuma informação confirma isso. As
diferenças econômicas e sociais o pequenas se comparadas com as
diferenças que existem entre eles no interior da escola. A turma 08B é
intermedria, ou seja, alunos com o perfil da turma 08A e alunos com o perfil da
turma 08C. Isso na classificação feita na escola, classificação que fica evidente
na ppria fala dos alunos que, na turma A têm uma auto-estima elevada se
comparados com as outras duas turmas.
Nas entrevistas com os professores, todos parecem concordar que a
turma 08A é mesmo a melhor das três. São alunos que têm mais facilidade de
aprendizado, capacidade de concentração, são considerados alunos críticos,
participam das aulas, fazem perguntas, fazem as atividades extra-classe, são
mais estudiosos e preocupados com as notas, os pais freqüentam a escola a fim
de acompanhar os estudos dos filhos. Na reuno pedagica, os professores
avaliaram que a turma é boa, mas conversa muito, brincam, o prestam
atenção nas aulas, que alguns alunos não tinham compromisso com os estudos,
163
outros com dificuldades de aprendizado e precisavam melhorar, a escola
deveria chamar os pais para conversar com as pedagogas. Aliás, sempre que
se apontava um problema com algum aluno, a solão mais apontada era
sempre a de chamar os pais, os pais deveriam se responsabilizar junto aos
alunos pelo mau comportamento ou mau rendimento escolar dos alunos.
O professor Renato, considerado um professor que explica bem a
matéria, querido pelos alunos, avalia a turma 08A da seguinte forma: essa é
uma turma com muita energia né, a maioria, porque tem alguns que não, mas a
maioria esforça, tem energia e transmite essa energia para o conteúdo, além de
transmitir essa energia para outras coisas, como um pouco de indisciplina,
bagunça, também a relação de um aluno com o outro, que é um pouco
agressiva, então é uma turma mais agitada, por eu ter dado aula nas oitavas
nos anos passados essa não é uma turma das melhores, mas é uma turma que
investe. A professora Fvia também muito querida pelos alunos diz: “a turma
08A, indiscutivelmente é a melhor, extremamente agitada, fala de mais, eu acho
que eles desperdiçam muito esse potencial que eles tem por causa dessa
conversa, de algumas picuinhas, por brigas entre si, o relacionamento entre eles
às vezes é muito agressivo, então às vezes você tem que interceder, mas eles
tem um potencial enorme, muito grande mesmo.
Com a professora Roberta, a turma 08A teve alguns problemas no início,
que já foram superados. Segundo a mesma, com a 08A no início do ano eu tive
muito problema, eles são imaturos, mas a gente sentou muito, conversou muito,
discutiu, tinha dia que eu o dava aula porque eu tirava o dia, aquele horio
para sentar com eles olha não está bom, não é assim, não esta rendendo, eles
são capazes, é uma turma muito capaz mais muito imatura e agora eu vejo que
no final do semestre eles amadureceram, melhorou demais, as minhas aulas
melhoraram muito, o nosso relacionamento melhorou muito, é a turma que eu
mais gosto de levar. Para o professor Júlio essa é uma turma boa mas que
conversam muito em sala: “difícil, a 08A é uma turma com maior facilidade de
aprendizagem, conversam ao extremo, mas ultimamente tem ocorrido uma
melhora de maneira que eu consiga até dar aulas”.
As relações que foram se construindo entre os professores e as turmas
do último ano do ensino fundamental o-se de maneiras diferentes. Com a
turma 08A, a disposição para ensinar parte da disposição observada pelos
164
professores que a turma tem para aprender, o que não ocorre com as outras
duas turmas. Eles acreditam que essa turma tem um potencial maior para
aprender, isso interfere na ptica em sala de aula, pois os professores
acreditam que podem exigir mais da turma 08A que os resultados por parte dos
alunos, no período das avaliações seo melhores que as outras duas turmas.
Isso de fato acontece, mas de uma forma muito tímida. Na demonstrão dos
conceitos, a turma 08A realmente foi melhor do que as turma 08B e 08C, mas o
grande número de AD aparece em todas as turmas.
A professora Marlene é uma professora exigente. Podemos considerar
sua prática bem tradicional, ela faz uma avaliação da turma 08A, e, ao mesmo
tempo, das outras turma 08B e 08C. Vejamos o que ela diz: olha eu tive
problema com a turma A que é assim com todo mundo, o que eu consegui com
a 08A foi através dessa auto-avaliação eu mostrei para eles o resultado, tive
uma conversa muito séria, eu chamei a atenção rio mesmo, eles nunca me
viram daquele jeito, eles falam dessa forma, aí eu mostrei para eles, ó, esse é o
resultado que vocês tiraram, é o que vocês vão colher no final do ano, aí eu falei
mesmo, vos são sérios candidatos a reprovar, vocês eso no final do ciclo,
realmente é uma ameaça, eu faço uma ameaça sim, por exemplo eu sempre
mostrando para eles a questão do resultado por eles estarem no final, é um
feed-back, gente esse é o resultado, eu chamo a atenção, eu evito gritar, esse
tipo de coisa, se eu estou numa sala depois do recreio, eu o deixo aluno
entrar depois de mim, e tem outra coisa que eu faço, funciona mais nas 08A e
08B, na 08C não está funcionando o, por exemplo eu passo atividade de
casa, e o aluno não fez dever eu dou bilhete para o pai ou a mãe ter
conhecimento que ele não fez trazer assinado para mim e ele sai de sala e vai
lá para a biblioteca fazer o exercício sozinho, eu fico na sala discutindo o
exercício com os que fizeram, aí eu justifico para eles, não faz sentido você ficar
aqui porque eu vou te pedir exercício que o pessoal tentou, que o pessoal tem
dúvidas, tem dificuldades, você que não fez nada não faz sentido ficar na sala
copiando, aí ele fica na biblioteca e tem que voltar, então isso na 08A e na 08B
surtiu um efeito legal, porque a quantidade de alunos que deixaram de fazer
diminuiu drasticamente, agora na 08C não adiantou nada, já parei de mandar
bilhete na 08C porque ficava a aula inteira escrevendo vinte e sete bilhetes
(total de alunos da turma) é assim.
165
Embora sejam considerados bons alunos, os resultados do primeiro
trimestre de 2007 como vimos no capítulo anterior não foram bons, nem
mesmo para a turma 08A, para a maioria dos alunos, o conceito que prevaleceu
em seus boletins foi mesmo o B, que foi o campeão em cinco disciplinas,
seguido pelo conceito O em três disciplinas, embora o conceito AD tenha
superado o conceito O em quatro disciplinas, lembrando que em ciências e
história, apenas um aluno alcançou o conceito O. Esses resultados mostram
que, embora a turma 08A seja considerada a melhor das três turmas, as
dificuldades de aprendizado ficaram evidentes no final da etapa, pois, de uma
maneira geral, os conceitos não foram muito bons.
Em todos os depoimentos dos professores, vi que o foco da avaliação é a
nota, o aprendizado do conteúdo, da matéria trabalhada no período, todos os
aspectos avaliados pelos professores dizem respeito muito mais a uma escola
tradicional do que o ciclo de formação humana. Os alunos que fazem bagunça,
não prestam atenção na aula, conversam durante as explicações, não
conseguem uma boa nota nas provas, e, com isso, podem ser retidos no final do
ano. O aprendizado aqui é entendido apenas como assimilação de conteúdos.
Ao avaliar apenas o cognitivo, os professores deixam de considerar outros
aspectos importantes da avaliação que estão inclusos no boletim de
desempenho escolar, como: a socialização, a solidariedade, o dico, a
democracia, etc.
Nessa primeira turma, foram entrevistados dois alunos, que aqui chamarei
de Adalberto e Carina. Nessas conversas, procurei ouvi-los acerca das
experiências da vida escolar de cada um deles. Adalberto nasceu em 1993, é
natural de Contagem MG, mora no bairro Taquaril, onde a escola está
localizada, ele estuda na Escola Capela Nova, desde 2005, ele afirma que gosta
de ler, mas no período de março de 2006 até junho de 2007, Adalberto pegou
sete livros na biblioteca da escola. Seu pai é metargico e cursou até a 8ª série,
e sua e é dona de casa e cursou até a 7ª série. Carina nasceu em 1992, é
natural de Belo Horizonte MG, mora no mesmo bairro que Adalberto. Ela
estuda na Escola Capela Nova desde 2000, e parece mesmo gostar de ler, pois,
de março de 2006 até junho de 2007, Carina pegou 23 livros na biblioteca da
escola. Seu pai é abastecedor de produção e cursou a a 8ª rie, e sua mãe é
cabeleireira e cursou até a 6ª série.
166
Conversei primeiro com Adalberto, que se sentiu muito à vontade para se
manifestar. Perguntei a ele como avalia o ensino na escola, e ele diz: acho que
a escola é boa, que não é o bom por causa das paralisações, semana de
jogos igual tá tendo, acho que isso atrapalha mais o ensino, sempre a aula de
inglês, toda quinta-feira ou quarta-feira tá tendo jogos e aí a gente perdeu
bastante aula de ings, aula de inglês a gente não tendo, a gente tem uma
ou duas vezes por mês por causa dos jogos, agora que acabou que a gente vai
pegar tudo o que a gente perdeu no trimestre passado aí. Acho bastante
importante mesmo a gente estudar para formar e ser alguém na vida, até para
essas pessoas gari aí que fica trabalhando no caminhão de lixo tá precisando
de estudo, todo mundo tá pedindo segundo grau, aí se o estudar não terá um
bom salário, fica aí na rua vagabundando e pedindo esmola, eu falo assim, é
uma ajuda pra sua vida”.
Adalberto comenta a importância do provão (simulado) aplicado pela
escola: quando passar para outra escola já tá sabendo mais, igual vai ter o
simulado aí agora, isso aí já tá fazendo a gente saber como é que vai ser as
provas do vestibular como vai ser os negócios todos, isso aí está ajudando
bastante no aprendizado. São quatro a cinco questões por matéria, são
marcado no gabarito, o gabarito é entregue e você fica com a prova, no final da
aula eles pregam o gabarito com as respostas já pronta de cada turma na
parede a gente vai marcando o que a gente acertou e a que errou e a nota que
foi dada no simulado vai para o boletim.
O aluno parece concordar com a relação de poder estabelecida na
escola. Para ele, os alunos precisam estudar mais para serem alguém na vida,
ele gosta mais do sistema de notas do que do de conceitos. Quando perguntei a
ele porque foi mal em algumas disciplinas, ele se culpou dizendo que foi por que
brincou muito e não estudou como deveria. Perguntei também o que os
professores fazem para manter a disciplina na sala de aula, e ele respondeu:
uai, sempre conversam, conversam com a gente, quando a sala mesmo
extrapola do normal aí que ela apela para a dirão, manda chamar os pais pra
ver se dá um jeito, outras coisas assim não atrapalha tanto assim não.
Na entrevista com a aluna Carina, perguntei se ela gosta da escola que
estuda: é bom, mas tem vezes que é meio fraco, porque eu conheço várias
pessoas que estudam em outras escolas da mesma idade que eu, aí eu vejo, a
167
gente olha o caderno o que es estudando e aqui está bem atrás de outras
escolas, mais pouca coisa. O que Carina parece avaliar é o conteúdo, o que ela
comparou o seu caderno com suas colegas que estudam em outras escolas.
Você gosta do sistema de ciclos que tem na escola? “Gosto, mas eu preferia
quando era rie. Por quê? Por que confunde muito esse trem de ciclo, eu tô no
quarto ano do quarto ciclo entendeu. Então você prefere nota a conceito?
Prefiro. Por quê? Porque o conceito tem que fazer porcentagem, então no meu
caso quando eu tiro nota é boa, só que em números, quando vai fazer a
porcentagem é menos entendeu, dá menos então eu prefiro números. “Como
funciona o conceito aqui na escola? O conceito aqui é o seguinte: eles
corrigem e aí dá um valor pra cada atividade né, na prova de inglês, vamos
supor, tem 5 questões, aí a primeira vale 2, a segunda vale 3, entendeu, mais
ou menos assim. Uma prova de 10 pontos, como que se divide? Aqui na escola
é o seguinte, eles fazem, depende da atividade, pra eles dar um número maior
de pontos, aí depois eles pegam uma prova de 10 eu levei 8 eles fazem a
porcentagem de 100%, que eu o sei o que acontece que não fica a mesma
coisa, entendeu. Eu acho melhor nota.
O sistema de ciclo de formação humana, adotado por toda a rede
municipal de Betim, na Escola Capela Nova parece confundir os alunos, fazendo
que eles não estejam entendendo como funciona, não conhecendo seus
objetivos, também não gostem do sistema. Tanto Carina quanto Adalberto
preferem o sistema de notas a conceitos, eles acreditam que saem perdendo
quando suas notas o transformadas em conceitos. Na prática, os alunos são
avaliados o tempo todo com notas, apenas no final do trimestre elas são
transformadas em conceitos, pois, na Escola Capela Nova, as avaliações valem
nota, os trabalhos valem nota, os vistos no caderno valem nota, os alunos o
avaliados de forma quantitativa o tempo todo, esses números são transformados
em conceitos (O, B, AD) para o boletim de desempenho escolar no final de cada
trimestre letivo.
Na turma 08A também houve muitos alunos que ficaram com o
conceito AD. Como você, Carina avalia isso? Muito, por que a minha sala é
uma sala muito agitada, ela é considerada uma turma boa por que esses dois
últimos anos nós ficamos praticamente todo mundo junto, teve um desempenho
maior que as outras turmas, só que a nossa sala é uma sala que o tem, sabe,
168
ningm pra escutar as atividades, muito difícil todo mundo entender, todo
mundo ficar calado pra entender, a sala é muito agitada. A culpa não é dos
professores é nossa mesmo, entendeu. O que os professores fazem para
manter a disciplina? Primeiro eles conversam com a gente né, conversam várias
vezes, e depois, se não resolver, eles mandam chamar os pais, comunicam a
direção, a direção chama o aluno, o aluno conversa com a pedagoga, depois em
último caso eles chamam os pais, se não resolver. E quando uma turma vai mal
a uma avaliação o que é feito para melhorar? Quando é a turma toda, igual a
professora Marlene no início do ano, a prova dela foi péssima, todo mundo, ela
fez o seguinte, ela mandou um bilhete para os pais, todos os pais assinaram a
prova e assinaram o bilhete, ela corrigiu questão por questão com a gente e fez
a gente fazer outra prova, outra atividade avaliativa bem dizer baseada nas
mesmas questões que a primeira, aí todo mundo foi melhor nessa.
Carina é uma aluna preocupada com o seu futuro. Ela pretende estudar
para ser alguém na vida: “olha eu espero estudar muito, até agora que
dificultando mais , eu acho assim, de vez em quando eu fico com preguiça eu
acho meio chato, mas eu gosto de estudar, eu pretendo fazer um segundo grau
numa escola boa, e depois fazer uma faculdade né, de medicina, alguma coisa
parecida, uma educação física, mas não pra ser professora não. Não gosta
não? Não, quero fazer educação sica só se for pra ter uma academia, pra ser
professora de uma escola não”. Você não gostaria de ser professora? ”Não, eu
acho que, eu fico olhando para os meus professores, eles sofrem querendo falar
e ninguém deixa, eu não tenho pacncia pra isso, eu não, nosso Deus, tenho
paciência nenhuma.
6.3.2 A turma 08B
A turma 08B tem 29 alunos matriculados. A freência média nas aulas
observadas era de 25 alunos. Essa é uma turma considerada intermediária,
alunos desinteressados, não fazem as atividades, alunos fracos. O professor
Renato define a turma da seguinte forma: Agora a 08B é uma turma mais
apática, você vê que os alunos têm potencial, alguns têm potencial, mas não
169
têm aquela energia, não têm aquele interesse de querer avançar, de querer
saber mais, prefere ficar mais quieto, então é muito apática né. A professora
Flávia, que é a madrinha da turma, comenta: a turma 08B é uma turma que eu
chamo de preguiçosa, eu só vou pensar se me apertar’, mas que eles dão
conta, eles dão conta ainda, inclusive é a turma que teve o pior rendimento
apesar de ser melhor do que a 08C, eles relaxaram um pouco e eu chamei a
atenção deles porque eu fui madrinha deles nas olimpíadas, nos PAN
Americanos, eu acho que eles confundiram, ela é nossa madrinha e vai nos dar
nota boa’, e não foi o que aconteceu eu fui madrinha e a nota ficou ruim, então
eu acho que eles não entenderam muito, a gente teve que sentar e conversar, o
fato de eu ser madrinha, de gostar de vocês, de participar dos momentos na
quadra não quer dizer que eu vá protegê-los”.
Nessa turma, foram entrevistados dois alunos, que aqui chamarei de
Ricardo e Luciana. Nessas conversas, procurei ouvi-los acerca das experiências
da vida escolar de cada um deles. Ricardo nasceu em 1993, é natural de Belo
Horizonte MG, mora no bairro Bom Retiro, pximo da escola, ele estuda na
Escola Capela Nova desde 2000. Ele demonstra não gostar muito de ler; de
março de 2006 até junho de 2007, Ricardo pegou três livros na biblioteca da
escola. Seu pai é funcionário público e cursou até a série, e suae é
professora, ele é considerado um aluno problema pelos professores, não faz
dever e conversa muito em sala. Luciana nasceu em 1993, é natural de
Contagem MG, mora no mesmo bairro que Ricardo, ela estuda na Escola
Capela Nova desde 2000. É considerada uma boa aluna; de março de 2006 a
junho de 2007, Luciana pegou oito livros na biblioteca da escola. Seu pai é
encanador industrial e cursou até o segundo grau; sua mãe é doméstica e
cursou até a 4ª série.
O aluno Ricardo interessou-se por esta pesquisa desde a primeira
observação que fiz com sua turma em sala. Durante os quatro meses da minha
presença na escola, ele buscava informação sobre o andamento da pesquisa
com a sua turma. Na entrevista, manteve-se muito à vontade e respondeu as
nossas perguntas prontamente e com muita espontaneidade. Ele começa
falando do que acha da escola que estuda: a escola é boa, o problema é os
professores, eles enchem o saco pra caramba, fica no pé do aluno mesmo, eles
não tem dó o, é perigoso, dá medo, a escola é boa, o ensino é bom, só que
170
se o professor marca você, não tem jeito mais não, fica marcado. Ricardo
parece um aluno que tem problemas com alguns professores, pergunto a ele
como é o seu comportamento em sala, ele responde: eu fiquei brincando muito,
eu fiz muita bagunça na sala, assim quando passavam atividade na sala eu
fazia, que o dever eu o fazia não, eu esquecia mesmo. Pergunto se as
atividades avaliativas tem notas, e como ele se saiu: as provas tem, quer
teve uma prova, de três que eu fiz eu peguei média em uma, eu acho que a de
português, de história e de inglês e a de ciências eu não fiz, nem na aula eu não
vim. Você gosta do sistema de ciclo na escola? Gosto, eu não gosto daquele
necio tipo assim, de sexta a oitava não da bomba, da bomba só na oitava, o
aluno fica muito manso, fica muito manso mesmo aí quando chega à oitava ele
quer estudar, eu acho que isso é errado.
Pergunto ao aluno como que funciona o processo de recuperação das
aulas, dos conteúdos? Eles ensinam né, só que falta interesse dos alunos
tamm, de todos os alunos, não tem nenhum que, eu mesmo já precisei de
ajuda, mas os alunos o gostam de estudar o, ninguém gosta de estudar e
isso vacaia muito, o professor quer ensinar que na hora todo mundo
começa a brincar e se um começar todo mundo brinca né, aí falta interesse de
estudar, e aí por isso que a gente fica com dúvida nas coisas e acaba ficando
com vergonha de perguntar ao professor, aí depois quando você que tá mal
mesmo se pede ao professor aí eles vão e ajudam, tanto que tem vez que o
professor fica chato demais, tanto que tem uns que pedir ajuda pra eles é osso,
igual aquele Júlio mesmo eu não gosto daquele cara o. Por quê? A o, o
cara é chato demais, ele virou para nós outro dia e disse assim, o negócio é o
seguinte eu vim aqui pra dar aula não quero ser amigo de ninguém não, falou
desse jeito na sala, vacaia a gente , falou pra turma toda, todo mundo, aí a
gente fica chateado né. a gente nem faz pergunta para o professor, depois os
professores o essas tiradas boba na gente”. “Isso prejudica eno o
relacionamento entre professor e aluno? Prejudica”. Como que ficou a relação
da turma com o professor depois disso? A foi tipo assim né, uns faz atividade
dele porque tá precisando de nota mesmo né, só que tem gente que não faz
nada na aula dele, porque o cara é muito chato, ele zoa todo mundo, ele coloca
apelido nos outros né, aí vai colocar apelido nele, ele acha ruim, aí a gente toma
171
antipatia dele, aí não faz nada depois não, nem melhorar com ele não melhora,
aí fica ruim na matéria dele”.
Ricardo é um aluno que gosta de dar suas opiniões, pergunto a ele como
os professores fazem para manter a disciplina em sala e ele responde: “Quem
mais consegue é a Marta, a mulher é brava demais nossa, ela briga demais, a
gente fica com medo só, ela gosta de botar medo na gente mesmo porque ela
faz uma cara de mau véio, ela transforma na hora, ela muda a cara toda, numa
hora ela boazinha e acontece alguma coisinha a mulher dá um surto nela que
ela vira outra pessoa, a gente fica com medo dela assim e fica quieto. Quer
ver quem mais, o Renato não, ele conversa na maior moral e os meninos ficam
calados né, porque ele é o seguinte, quanto mais o professor xinga mais os
alunos faz bagunça, o Renato fala ‘vocês querem fazer bagunça então faz mais
depois não reclama que não passou de ano o’, aí os meninos ficam quietos
na aula dele, ele é o único também que consegue, o Júlio também não
consegue, a Flávia consegue mais ou menos, porque ela conversa com a gente,
a Marlene mais ou menos, ele é o seguinte, ela explica direitinho, mas se ela
cismar com você assim, nossa vo tem que andar na rédea curta com ela.
Ricardo também comenta os motivos dos resultados ruins da sua turma
no primeiro trimestre de 2007 em uma das disciplinas: “o que mais conta é o
dever, ela tá mandando até bilhete agora para os pais, o bilhete vem com a
parte em branco para escrever o que o aluno fez, se tiver desrespeitado ela, se
não tiver feito o dever, não levou o caderno, fez bagunça e o pai tinha que
assinar e trazer para a escola, e depois de três deveres que não tiver assinado,
aí os pais tinham que vir na escola, aí se o melhorasse tomava suspensão
porque não tinha feito o dever e não trouxe o caderno.
Ricardo é um aluno muito ctico com relação à escola, os professores,
mas também soube avaliar seu próprio desempenho nas disciplinas. Seus
comentários refoam a iia que os professores mais pximos dos alunos, que
criam uma relação de afeto, aqueles que conquistam os alunos também
despertam neles um interesse maior por sua disciplina, isso me pareceu bem
claro nas respostas de Ricardo. Já o professor mais distante dos alunos, aquele
que o estabelece um dlogo, cria também uma distância entre o seu
contdo e o interesse dos alunos. A empatia ou a antipatia que os alunos criam
com relação aos professores estão relacionadas ao tipo de relação que o
172
professor estabelece em sala com os alunos. Ao estabelecer uma relação de
diálogo com os alunos, o professor conquista o mesmo para aprender sua
disciplina.
Luciana, aluna da mesma turma que Ricardo, é mais contida nas
palavras. Ela diz que gosta da escola, de estudar, mas ela gosta das disciplinas
em que os professores o amigos dos alunos: Tem sim, a professora Flávia e
a professora Roberta, por que elas conversam com a gente, alem de dar a aula,
de falar com a gente o que é certo e o que é errado eles ainda conversam com
a gente, brincam com a gente, tem um relacionamento como se fossem amigos
da gente mesmo. Pergunto se tem algum professor que a turma tem mais
dificuldades, e ela diz: Acho que sim, o professor Júlio, acho que os meninos
não se interessam pelas aulas dele, acho que é isso. Por que você acha que
tem mais dificuldades nessa disciplina? Por que nas aulas o professor xinga
muito na sala sabe, fala que vocês não estudam, e muita gente tirou nota baixa
na disciplina dele, nas provas muita gente tirou nota baixa”.
Pergunto o que os seus professores fazem para manter a disciplina em
sala, ela diz: ah, eles conversam com a gente, olha isso vai valer ponto, aí
quem o tem muito interesse passa a fazer as coisas por que os professores
falam que vai valer ponto. A gente vamos fazer isso por que vai dar isso pra
vocês, um dia vos podem precisar disso que eu estou passando. Como vocês
são avaliados pelos professores? Tem alguns professores que dão ponto de 0 a
10 e outros de 0 a 20 e outros dão o O, B, AD, cada um faz de um jeito, mas
quando chega lá na hora eles todos põe o O, B, AD. Você prefere a nota ou o
conceito? Acho que eu prefiro o conceito. Por quê? Por que na nota você fica,
acho que tirei tanto, muita preocupação, no conceito não, no conceito é
mais tranqüilo. Vo acha que aprende melhor no sistema de conceito? Por que
eu acho que a nota pressiona muito as pessoas, nossa eu preciso tirar nota,
nota, nota, e aí vai ficando muito nervosa na hora da prova e acaba tirando nota
baixa de tanto ficar pensando, preciso de tanto... e agora no conceito não, você
tirou tanto fica por isso.
173
6.3.3 A turma 08C
A terceira turma pesquisada foi a 08C. Nela, estão matriculados 28
alunos. A freência média nas aulas observadas era de 22 alunos. Essa é uma
turma considerada fraca, nas palavras de uma professora, em uma das
reuniões, essa é uma turma homonea negativa. Em abril, ouvi professores
afirmando que nessa turma tinha alunos sem condições de serem aprovados, e
deveriam ser retidos. Como já constatei, não percebi um nível social e
econômico diferente entre os alunos das três turmas, mas aparentemente essa
é uma turma bem diferente das duas turmas anteriores. Os sete professores
entrevistados são unânimes em apontar as dificuldades de aprendizado da
turma 08C.
A professora Marta fala da defasagem de aprendizado da turma: a turma
08C tem uma defasagem antiga, como eu trabalhei com eles a partir desse ano,
tem só teoricamente quatro meses eu percebi que a defasagem deles é lá de
trás, eles têm uma defasagem muito antiga de ler, interpretar e fazer as quatro
operações, eles o o conta. Agora o porquê eu acho que um ponto é isso,
eles foram turma de ciclo, então devia ter aproveitado essa época deles lá ats
e fazer turma de flexibilização, o fazer uma turma do jeito que tá, todo mundo
é fraco, aí um incentiva o outro, mas não tem incentivo, todo mundo é fraco
mesmo então nós vamos só até aqui, aqueles meninos só rendem isso, aí vo
não passa disso com eles, eles tem uma defasagem de aprendizado muito
grande, o Lucas por exemplo foi meu aluno no ano passado, ele tem mais
capacidade, ele desenvolveu muito do ano passado para cá, ele precisava
dessa paradinha, no ano passado ele parou, ele foi retido, e esse não ele tá
aqui de novo, esse ano o Lucas é outro, ele já fala mais, ele argumenta mais,
ele consegue fazer uma redação, então eu vejo que aquela turma tem uma
defasagem muito grande de aprendizagem, eles não conseguem, são muito
espertos também, eles não fazem bagunça, eu não tenho problema de disciplina
naquela turma, muito pelo contrário, o problema ali é que eles são apáticos de
mais, eles tem dificuldades demais, todas as respostas são incoerentes.
Perguntei, então, à professora Marta, se é feita alguma coisa para
diminuir essa defasagem de aprendizado da turma 08C: Não é feito nada, olha
174
só nós tivemos uma reunião com o diretor tem aproximadamente dois meses,
depois do conselho, hoje eu falei com o professor Júlio, o que nós vamos fazer
com a turma 08C, nós fizemos as seguintes sugestões, reunes de pais,
colocar os alunos em formato de ‘Una sala de aula para ver se diminuía um
pouco porque aí um ajudava o outro, pegar os alunos que realmente têm
dificuldades para fazer APG, então nós anotamos tudo, tá tudo anotado, se você
quiser copiar, vo pode copiar, mas sabe o que a gente fez disso tudo, nada.
Eu particularmente tenho um APG que é hoje, na segunda-feira, todas as
segundas-feiras eu subi para substituir alguém que tinha faltado, então eu não
fiz o APG, não fiz, eu Marta não fiz nada com eles, s tentamos colocá-los em
forma de U’, no segundo dia tinha voltado tudo ao normal, não deu certo
porque eles acharam que o eram crianças mais, que daquele jeito a sala o
ia dar certo, tava bagunçado, que eles não estavam acostumados, houve uma
resistência tão grande que quando eu cheguei para dar a minha aula já estavam
em fila indiana, eu perguntei por que, eles falaram que aquilo é bobeira, eles
não deram conta e nós também não demos conta disso, eu só dei uma aula em
U, quando eu cheguei à segunda que tava em fila indiana, quer dizer a
pessoa que chegou antes de mim, como eu, também não deu conta de conduzir
aquele trabalho em U que seria um trabalho diferente, a Marlene até falou
assim, s poderíamos fazer uma entrevista com eles, ver o que eles desejam
mais, nós não fizemos nada disso Jeovani, nada foi feito até agora, e hoje na
hora do recreio eu falei, olio nós tínhamos combinado tanta coisa e ele
respondeu, é a gente tinha combinado mais a gente não realizou, eu fico o
triste com essas coisas, mas a gente não realizou nada, aí fica assim, cada um
dá a sua aula, acaba o horário você sai, o outro não sabe o que você fez”.
Não estou falando, aqui, de alunos que apareceram do nada, cheios de
dificuldades de aprendizado, os alunos da turma 08C, na sua grande maioria,
estudam na Escola Capela Nova desde o primeiro ano do ensino fundamental.
Dos 28 alunos matriculados, 15 estudam na escola há oito anos, e 23 estão na
escola desde a 5ª série. Isso me mostra que todo o histórico de dificuldades
desses alunos foi vivenciado na mesma escola. Para Mirian, nada foi feito para
diminuir as dificuldades da turma. Ela diz: não, só no conselho de classe que
nós decidimos trabalhar com eles em forma de ‘U, a foi uma tentativa mais
não deu certo, os professores não trabalharam, as intervenções que foram feitas
175
são os atendimento a pequenos grupos APG, alguns professores nos seus
horários pegam um ou dois alunos e trabalham com eles, e a grande
dificuldade porque com o coletivo nosso faltando, porque está um grande
numero de faltas, aí nesse horário, acaba indo para a sala cobrir o colega, então
todo o material que eu preparei para trabalhar com o aluno naquele dia vai por
água abaixo, eu o posso trabalhar, aí eu espero na outra semana, aí na outra
semana acontece a mesma cosia, aí eu não consigo, até acho que deve rever
essa questão do APG porque o está funcionando, eu já cobrei muito isso do
pedagógico, sempre eu falo, sempre eu coloco essa questão, mas nunca que dá
tempo, sempre tem outros assunto, esse assunto não é discutido”.
A professora Flávia trabalha com essa turma ts anos, e comenta: a
turma 08C esse ano tá me surpreendendo porque sempre foi uma turma com
dificuldade, faz três anos que eu trabalho com eles, como o inglês o dois
professores, a minha proposta de trabalho é a seguinte, ir com eles a o final,
se eu comecei com eles na quinta e eles passam para a sexta eu também vou
dar aulas na sexta, quando eles passarem para a sétima eu vou para a sétima,
isso quer dizer que eu vou ter um trabalho único, um processo de quatro anos,
quinta, sexta, sétima e oitava, ou seja, terceiro e quarto ciclos, vendo a gente
nem consegue falar ciclo ainda, a gente fala seriação mesmo, então tem
alunos que eu conheço ts anos, quando a gente senta para fazer um
conselho de classe algum professor fala, aquele aluno é isso e isso, eu falo que
é porque você não conheceu ele ts anos ats, três anos ats ele era
muito diferente e talvez no seu conceito muito pior, ele evoluiu sim, evoluiu
como pessoa, ficou mais maduro, eu tô achando a turma 08C muito mais
madura, brinca menos, fala de coisas mais rias, a turma ainda o tem essa
maturidade, mas eles estão preocupados com a oitava série que é o último ano,
tem retenção então eles estão suando a camisa para recuperar esse tempo,
essa dificuldade, eles são alunos que têm dificuldade.
A professora Roberta é a madrinha da turma 08C, e avalia a turma da
seguinte forma: “a turma 08C é uma turma que tem muito problema, eles não
acreditam em si, auto-estima muito baixa, você tem que estar o tempo todo
junto, você tem que estar o tempo todo incentivando, eles precisam de incentivo
o tempo todo para estudar, e eu sou madrinha de turma , eno tudo o que
acontece, eles dizem, ô professora, me ajuda, eu estou sempre à disposição
176
deles, mais é muito difícil lidar, quando o aluno chega ao ponto de achar que a
nossa turma é a pior, a nossa turma não consegue, s somos fracos, o lema
deles é esse, nós não conseguimos, s o vamos conseguir. No início do ano
o coletivo dos professores fez um combinado de estar trabalhando mais
individual e agora no finalzinho do semestre eles deram uma melhorada muito
boa, que a gente conseguiu levantar a auto-estima com recadinhos, atividades,
com excursões que nós fizemos com eles, com atividades diferentes que eu fiz
em sala, atividade prática, trabalhei muito a questão da criatividade, da
habilidade, que eles fizeram e viram que são capazes, que eles conseguem,
então eles melhoraram muito”.
A professora Marlene comenta sobre a reunião e os encaminhamentos
acerca dos problemas da turma 08C: “teve um conselho de classe dessa turma
entre os professores, aí eu propus fazer um trabalho diferenciado, os meninos
sentarem diferente, ter um olhar diferenciado para essa turma, mas aí eu não
sei se coincidiu, vou falar a verdade com você, coincidiu a campanha do
sindicato, aquela redução de módulo, paralisação, ficou aquele poço entre a
proposta que se tirou naquele dia, foi o diretor que anotou tudo o que a gente
propôs para fazer com essa turma especificamente, aí teve esse momento e
depois morreu, eu por exemplo propus que a turma sentasse em U para todos
ficar se vendo porque é uma turma que tem menos alunos, aí algumas vezes
eles sentaram, mas eu cobrei, os outros não cobraram então não funcionou,
aí vendo já caiu no esquecimento, então não tem sido feito nada, eu tenho
APG lá, tenho três alunos lá de APG , mas como é uma vez por semana, não
tem toda semana, ou tem jogos, excursão ou tem feriado nem isso de eu
acompanhar não está funcionando, então não tem trabalho nenhum sendo feito
com a 08C, não tem horio diferenciado com a turma, olha só tem proo, tem
prova mensal, eles fazem as mesmas provas que as outras turmas sinal que
não tem trabalho diferenciado”.
Perguntei também ao professor Júlio, o que se faz para diminuir as
dificuldades de aprendizado da turma 08C: Bom, nós temos aqui na escola o
atendimento a pequenos grupos, eu trabalho com quatro alunos no xadrez eu
peguei alunos com mais dificuldades menos a Gessei e a Lucília e o Gabriel tem
muitas dificuldades conseguiram aprender, de maneira que até comigo a relação
melhorou bastante, agora no segundo semestre eu vou pegar quatro novos
177
alunos e farei questão de pegar aqueles que tem dificuldades de aprendizagem
ou disciplinar, então o APG nesse sentido ajuda, no meu caso espefico,
inclusive tem outros atendimentos e outros alunos o retirados da turma, agora
com a quantidade de paralisações, campeonato, etc. eu acho que o trabalho de
uma maneira geral ficou prejudicado, e é um trabalho muito individualizado em
pequenos grupos mesmo, dois, três e no máximo quatro por vez de cada sala.
Eu acho que deveria acontecer um projeto um pouco mais diferenciado com
essa turma, mas não há não, por exemplo vo pegar realmente a questão de
produção de texto, de correção ortográfica, cada professor tirar uma aula da sua
maria, por exemplo, e trabalhar com essa queso de produção de texto, com
a interpretão de texto na sala, ajudaria bastante. Isso para a história é fácil
né, trabalhar a interpretação de texto e leitura, que a gente teve poucas aulas
de flexibilização em função desses questões ditas, paralisações, campeonatos e
tudo mais, as minhas aulas são justamente nas quintas e sextas-feiras depois
do recreio aí complicou, não teve um projeto para a turma e deveria ter tido.
Uma coisa que eu acho que, eu o sei por que eu o pequei a formação da
turma, eu particularmente não sou muito favorável à enturmação que existe,
esses alunos da 08C eles deveriam estar divididos, não deveria ser uma turma
tão ruim como é a 08C em termos de aprendizagem não.
O professor Renato, que, em sua entrevista, defendeu a divisão das
turmas por níveis de conhecimento (turmas homogêneas), comenta o que é feito
com a turma 08C: a gente tem aqui é a flexibilização, os APG, regência
compartilhada ou atendimento a pequenos grupos, então alguns professores
que têm esse atendimento trabalham com alunos particular, só que lá são
muitos né, eu acho que não satisfaz, além da falta de muitos professores, então
o APG fica muito comprometido por falta de professores na escola, eu te falo
que não esta sendo muito bem aproveitado.
O que existe de comum na fala de todos os professores, e que fica
evidenciado aqui, é que a turma 08C tem dificuldades de aprendizado, e
nenhum projeto que possa diminuir suas dificuldades deu certo. Durante esta
pesquisa na escola, o vi nenhum atendimento de professor com alunos dessa
turma (APG), realmente as paralisações, o projeto PAN, a falta de professores
são algumas das causas que não permitiram os atendimentos a pequenos
grupos. Quais seriam os motivos que não permitiram que uma turma de 28
178
alunos que, na sua maioria, estudam na escola desde o primeiro ano do ensino
fundamental, chegasse ao 8º ano sem os conhecimentos básicos para sua
idade escolar? O pior disso tudo é que os alunos são os únicos penalizados, os
fracassados, os excluídos, os reprovados.
Nessa turma, foram entrevistados dois alunos, que aqui chamarei de
Rafael e Laura. Nessas conversas, procurei ouvi-los acerca das experiências da
vida escolar de cada um deles. Rafael nasceu em 1993, é natural de Contagem
MG, mora no bairro Bom Retiro, pximo da escola. Ele estuda na Escola
Capela Nova desde o 2000. Demonstra ter uma resistência com a leitura, pois
de mao de 2006 até junho de 2007 Rafael não pegou nenhum livro na
biblioteca da escola. Seu pai é pedreiro, e sua mãe é dona de casa. Ela cursou
apenas a primeirarie do ensino fundamental. Rafael é considerado pelos
professores um aluno que apresenta muitas dificuldade de aprendizado. Laura
nasceu em 1992, é natural de Esmeraldas MG, mora no mesmo bairro que
Rafael. Ela estuda na Escola Capela Nova desde 2005. Ela também parece o
gostar de ler, pois, de março de 2006 a junho de 2007, Laura pegou ts livros
na biblioteca da escola. Seu pai é assessor de vereador, e cursou até a 8ª série,
sua mãe é dona de casa e cursou até a 8ª série. Laura é considerada uma aluna
rebelde e agressiva pelos professores.
Conversei com o aluno Rafael, e perguntei a ele se gosta da escola, das
aulas e dos professores: “A escola é boa, sempre gostei de estudar aqui, só que
às vezes tem alguns problemas, mais isso não é motivo pra deixar de gostar da
escola, a escola não é ruim, é boa”. Que tipo de problema você tem aqui na
escola? Ah, os professores, assim, eles gostam que a gente respeita eles, só
que às vezes vem tirando a gente, não respeitam a gente direito, não é todos,
alguns professores que vem com ignorância, só que depois pedem desculpa, aí
fica tudo bem. O motivo também é que na sala de aula eu não agüento ficar
quieto assim não, eu gosto de brincar com todo mundo, aí quando eu brinco, o
professor vem falando alguma coisa comigo, aí eu não gosto e começa a
discuso, mas isso não é motivo pra não gostar da escola o”. “Vo foi bem
nas atividades do primeiro trimestre?” Só três resultados que o foram muito
bons. Em português no caderno eu faço tudo, mas as atividades eu não vou
bem, na prova eu não estudo e não dei conta de fazer a prova, esse foi um dos
motivos porque eu tirei nota ruim. Quando eles dão as coisas, na hora eu
179
faço, às vezes tiro nota boa, às vezes não tiro nota muito boa. Por isso eu não
estudo. História eu não gosto muito, e ciências eu não consigo entender nada,
ela explica mas eu entendo mais ou menos, aí eu peço pra explicar de novo,
que na terceira vez eu tenho vergonha de pedir de novo, eu não sei se eu pedir
eles vão xingar. Como os professores fazem para manter a disciplina em sala?
Alguns mandam pra diretoria, eles avisam primeiro, se continuar do mesmo
jeito, aí levam pra diretoria. Tem professor que chama lá fora e conversa com
calma, não vem xingando, na ignoncia, tem professor que grita em sala de
aula, bate em cima da mesa. Aconteceu na aula do professor Júlio, tinha uma
colega lendo e dois alunos conversando aí ele deu um tapa na mesa, aí todo
mundo assustou na hora, tava todo mundo distraído com o texto. Aí ele gritou
depois pediu desculpas. Esse foi um caso que aconteceu ontem. O professor
Renato, todo horário dele, a gente o chama na carteira, ele explica a matéria pra
gente sem reclamar, sem falar nada. É o professor, o que mais ajuda é ele,
tamm tem a professora Marta que explica muito.
A aluna Laura, que também estuda na turma 08C, diz que gosta da
escola, dos colegas de sala e dos professores, mas nem todos; tem alguns que
ela não gosta porque eles brigam com a turma, vejamos o que ela diz: meu
relacionamento com a Marlene, porque ela veio falar um monte de coisas
comigo e eu sou muito topetuda e eu não aceito, ela vem falar um monte
de coisas e eu não aceito e a gente acaba brigando, toda aula dela a gente
briga, aí eu não gosto dela o, dos outros professores eu gosto, com a turma
tamm, ela é muito ignorante, a gente pergunta ela a explicação e ela não ”.
Quais atividades você mais gosta de fazer? Eu gosto de português, porque a
aula dela é diferente sabe e ela é muito boa pra dar aula, explica bastante aí é
por isso que eu gosto mais de português, eu gosto tamm da professora,
matetica também, o professor é meu primo, eu gosto dele, mais ele
explica muito bem a maria. Só ciências e história que eu não gosto também
não, é que as vezes ele estressa porque nós conversamos demais, mas ciência
eu não gosto mesmo. O que os professores fazem para manter a disciplina em
sala?” ”Eles conversam bastante com a gente, pedem silencio, e se não resolver
aí eles gritam, e se não resolver mandam para a diretoria, mas na maioria das
vezes os professores são amigos eles chegam e conversam e a gente pega e
ouve. Quando vocês o mal em alguma atividade o que é feito para melhorar?
180
Eles mandam a gente corrigir a avaliação o que a gente errou a prova toda e aí
o que a gente tiver mais dificuldade eles pede pra gente estudar e da outra
avaliação e sempre na segunda a gente melhora, a gente já passou pela
primeira, já corrigiu, estudou de novo e acaba dando certo”. Como vocês são
avaliados nas disciplinas? Os trabalhos que eles o vale 10 pontos, aí se
você tirar menos de 5 aí você tira AD, se tirar mais tira B e aí se tirar quase o
valor de 10 tira O, aí eles estimulam a quantia da nota, o ano, o semestre, aí o
semestre vale 30 pontos, aí eles vão dando atividades, trabalhos, aí você tem
que conseguir 30 pontos para ficar bem no semestre.
A turma 08C é considerada a mais fraca das três turmas, e isso é sentido
pelos alunos. Eles se sentem inferiores, são tratados de forma diferenciada, o
que a eles um tratamento inferior. Fica presente, tanto no depoimento de
professores quanto no de alunos, que esses o ainda mais excluídos do
processo de ensino/aprendizado do que os alunos das outras duas turmas. E
essa exclusão aparece também na resistência deles com o conteúdo, com a
escola e com os professores. São adolescentes que cursam o último ano do
ensino fundamental, e parece que sempre ficaram à margem do conhecimento,
da cultura, e, se nada for feito, ficarão também à margem da sociedade, de
direitos fundamentais como a dignidade e a qualidade de vida, expressa por um
bom emprego, um bom salário, bons conhecimentos. São pessoas que, além de
excluídas serão exploradas pelo sistema capitalista. O que podem esperar
esses alunos do futuro, que sonhos eles têm, que esperanças eso sendo
construídas, que possibilidades a escola está oferecendo para eles? Torna-se
urgente a problematização das relações entre os professores e os alunos, das
três turmas, mas principalmente da turma 08C.
6.4 Uma alternativa possível
É bem visível que o aluno só aprende se quiser, se houver desejo para
aprender, se o professor despertar no aluno esse desejo pelo saber. Mas é
igualmente evidente que o professor só ensina se quiser, e, mais ainda, o que
quiser e como quiser. O ciclo de formação humana é um modo de ensinar que
181
modifica a relação entre o professor e o aluno, a relação de poder é, antes de
tudo, democrática, participativa, a sua implantação depende do poder blico,
mas a sua efetivação no interior da escola depende da vontade livre de gestores
e professores e da aceitação por parte de pais e alunos. Não é possível gostar
daquilo que não se conhece, daquilo que não se experimentou. Enquanto aluno,
fui educado no sistema seriado, e o reproduzi como se fosse a única forma de
levar os alunos a prestar a atenção na aula, a fazer as atividades, a estudar,
como se fosse a única forma possível de levar o aluno a adquirir conhecimento.
É igualmente importante lembrar que o querer ensinar do professor e o querer
aprender do aluno dependem de fatores, como: ambiente geral da escola e
condições apropriadas de trabalho. Os professores da Escola Municipal Capela
Nova de Betim encontram dificuldades na implantação total do ciclo, talvez por
medo de perder o controle sobre os alunos, por falta de compreensão do ciclo
ou por falta de apoio administrativo. Por isso, concordam em parte com o ciclo.
Esses problemas dificultam a construção de uma relação de poder dialógica,
não autoritária, o conhecimento não chega até ao aluno através do desejo de
aprender, ele continua vindo através da ameaça da reprovação. A função do
aluno aqui é apenas de memorizar e repetir o que foi transmitido, os conteúdos
não são problematizados, e, nesse sentido, o aluno não se apropria do
conhecimento. Segundo FREIRE (2005),
O educador, que aliena a ignoncia, se mantém em posições fixas,
invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão
sempre os que não sabem. A rigidez destas posições nega a
educação e o conhecimento como processo de busca. (FREIRE, 2005,
p. 67)
Podemos chamar de educação bancária toda aquela que se preocupa
apenas em transmitir o conhecimento cognitivo aos seus alunos. Esse é
importante como parte de um todo muito maior, sozinho, sem considerar outros
aspectos do conhecimento a serem adquiridos, que transforma os alunos em
vasilhas em que os professores enchem de conteúdos. A educação dialógica,
ao contrio, vem do afeto, do respeito, da preocupação do educador com todas
as dimenes do aprendizado dos alunos. Ela acontece quando os alunos se
apropriam da cultura, através do conhecimento filosófico, político, social,
religioso, da experncia democrática vivida na sala de aula com os colegas e
182
com o professor. Uma formação voltada para a cidadania compreende uma
vio crítica da realidade por parte de todos os agentes envolvidos no processo
ensino/aprendizado.
Para Freire (2006b), uma educação bancária é contraditória, não liberta,
oprime e aliena os cidadãos. Ao contrio, uma educação dialógica é
libertadora, ela está a servo de uma verdadeira democracia. Diz ele:
Pensávamos numa alfabetização direta e realmente ligada à
democratização da cultura, que fosse uma introdução a esta
democratização. Numa alfabetização que, por isso mesmo, tivesse no
homem, não esse paciente do processo, cuja virtude única é ter
mesmo pacncia para suportar o abismo entre sua experncia
existencial e o conteúdo que lhe oferecem para sua aprendizagem,
mas o seu sujeito. Na verdade, somente com muita paciência é
possível tolerar, após as durezas de um dia de trabalho ou de um dia
sem trabalho, lições que falam de asa Pedro viu a Asa A Asa é
da Ave”. Lições que falam de Evas e de uvas a homens que às vezes
conhecem poucas Evas e nunca comeram uvas. Eva viu a uva”.
Pensávamos numa alfabetização que fosse em si um ato de criação,
capaz de desencadear outros atos criadores. Numa alfabetização em
que o homem, porque não fosse seu paciente, seu objeto,
desenvolvesse a impaciência, a vivacidade, característica dos estados
de procura, de invenção e reivindicação. (FREIRE, 2006c, p. 112)
Assumir uma concepção de educação emancipadora deve considerar a
relação dialógica entre os agentes envolvidos no processo ensino/aprendizado.
Somente uma educação problematizadora e dialética é capaz de enfrentar as
contradições e buscar alternativas para um modelo que deseja conservar a
ideologia dominante. Assim, o aluno é capaz de se apropriar dos saberes
necessários para se tornar um cidadão crítico capaz de transformar a realidade
opressora na qual se vê inserido. Mas o descaso por uma educação pública e
de qualidade parece tomar conta dos governantes brasileiros, nas três
instâncias (federal, estadual e municipal), até os dias de hoje, a falta de infra-
estrutura, de investimentos, de salários justos, de capacitão profissional, das
condições adequadas para que o aluno se torne sujeito do seu próprio saber
fazem parte da lista de impedimentos desde o Brasil Império até os dias de hoje.
Como já demonstrei anteriormente, os alunos entrevistados estudam em
uma rede de educação que adotou o modelo de ciclos de formação humana,
mas a ptica existente no interior da escola parece reproduzir um modelo
seriado, onde os conteúdos são depositados nos alunos sem uma
problematização da realidade vivida por eles. Os professores dizem que unem o
183
que existe de bom de cada modelo, seriação e ciclo, e adotam em suas
metodologias de trabalho. Se existem mesmo elementos bons em ambos os
modelos que devem se unir, os resultados não apareceram nos alunos
pesquisados. O aproveitamento refletido nos conceitos dos alunos parece
demonstrar o fracasso dessa suposta uno. O grande número de alunos com o
conceito AD (A Desejar) revela um fracasso que esses se vêem obrigados a
assumir a responsabilidade sozinhos. Ao longo de toda a pesquisa, percebi a
preocupação de alguns professores com ostodos utilizados no processo
ensino/aprendizado, pom são convencidos por aqueles que não querem
mudanças, que acreditam que o problema está na falta de interesse dos alunos.
O controle ideológico sofrido pela educação, ao longo dos anos, vem
formando, nas escolas públicas, cidadãos sem cultura própria, preparados
apenas para se tornarem mão-de-obra barata para os donos dos meios de
produção. A educação vê-se distante do seu papel, que é o de formar cidadãos
emancipados, principalmente no meio das classes trabalhadoras onde é
oferecida uma educação de qualidade inferior àquela oferecida às classes
médias e altas, impedindo que os mais pobres possam concorrer em iguais
condições no mercado de trabalho, na vida política, na distribuição da renda, no
processo de decisão dos destinos do país. A educação blica e de qualidade,
que visa a uma formação integral do educando (profissional, cnica, cognitiva,
lúdica, ética, potica, filosófica e emancipadora) é um desafio para educadores
e educadoras que vêem na educação uma via para uma sociedade melhor e
mais justa.
Se aman uma educação revolucionária for possível é apenas
porque, hoje, no interior de uma educação conservadora e reacionária,
os elementos de uma nova educação, de uma outra educação,
libertadora, se formaram dentro de uma educação conservadora e
reacionária. Essa mudança de espaço dominado para o espaço
dominante o se fará nem espontaneamente, nem de um momento
para outro; por isso, é necessária uma verdadeira pedagogia do
conflito que evidencie as contradões em vez de camuflá-las, com
paciência revolucioria, consciente do que historicamente é possível
fazer, mas sem se omitir. O progresso não é o massacre das teorias e
práticas precedentes, mas o resultado de um esforço comum. A
educação sempre foi necessária. Viver é sempre tomar lugar num
certo espaço. A educação é uma linguagem pela qual eu tomo assento
neste lugar, ascendo a uma certa comunidade, a uma sociedade, onde
não estou sozinho. Mas essa educação não pode caminhar, libertar-se
do seu passado reacionário, a o ser na medida em que os
educadores a ponham fundamentalmente em questão. Assim, o que
184
eu chamo de a educação contra a educação é essa tensão, esse
conflito que deve ser mantido para que ela não se transforme, em
nenhum sistema social, num mecanismo de opressão de classe.
(GADOTTI, 2005, p. 64)
Meu desejo inicial era observar como se dão as relações de poder em
uma escola de periferia que adota o sistema de ciclo de formação humana como
prática pedagica, mas, ao acompanhar a rotina da escola, percebi que a
prática pedagica dos professores em sala ainda está inserida em um modelo
seriado e tradicional. As características do ciclo de formação humana aparecem
apenas nas questões burocráticas; criticada pelos professores, como
transformar notas em conceitos, não pode reprovar aluno. Isso aparece,
inclusive, na avaliação dos professores entrevistados que afirmam que o ciclo,
no seu início, era mais forte do que hoje, que existem falhas de ordem
administrativa vindas da Secretaria Municipal de Educação, dos diretores e do
pedagógico no acompanhamento do cotidiano escolar. Os educadores desejam
oferecer uma educação de qualidade, planejam estratégias de recuperão dos
alunos, mas as dificuldades, ao longo do ano letivo, vão impedindo esses
projetos de se concretizarem, como eles mesmos demonstraram, as
paralisações, as faltas dos colegas, a falta de motivação por parte de alguns,
tudo isso impediu os professores de dar uma atenção maior para as dificuldades
dos alunos, e, assim, eles não fizeram os atendimentos a pequenos grupos e
essas, dentre outras dificuldades, resultaram no fracasso quase total dos alunos
no primeiro trimestre de 2007.
Durante toda a pesquisa realizada na Escola Capela Nova de Betim,
encontrei sinais de uma educão bancária na prática cotidiana de professores
e alunos. Os professores trabalham com conteúdos programados, sem
considerar a realidade vivida pelos alunos, as atividades valem ponto, dando
uma iia de mérito para quem fizer bem feito, exigem uma disciplina que inibe
a iniciativa e a participação dos alunos nas aulas, ameaçam os alunos
constantemente de reprovação, e, por fim, culpam os alunos pelo pprio
fracasso. Os alunos, por sua vez, embora sua trajetória escolar seja toda
ciclada, são passivos e conformistas dentro do processo ensino aprendizado,
acreditam mesmo que, se o professor não der nota, não der prova, o aluno não
185
estuda e não aprende, ele se considera responsável pelo fracasso nas
disciplinas em que não foi bem.
É preciso dar uma atenção especial para os resultados dos alunos no
primeiro trimestre de 2007. Em disciplinas como cncias, apenas um aluno dos
86 alcançou o conceito “O”; em história, dois alunos; e, em português, seis
alunos; enquanto na outra ponta da tabela os números são muito grandes, em
ciências, 57 alunos ficaram com “AD”; em geografia, 44; e, em português, 36
alunos. Esses meros devem me dizer alguma coisa, causar ao menos um
inmodo, diante da dificuldade encontrada pelos alunos de apreender o
contdo das disciplinas. Precisamos ao menos buscar as causas desse
fracasso. Isso não pode ser encarado como uma fatalidade da realidade em que
os alunos estão inseridos, pois seríamos preconceituosos em considerá-los
menos capazes, por serem oriundos das classes populares. É preciso que
educadores assumam o compromisso de emancipar esses alunos, de fazer com
que eles aprendam o conteúdo, mas, além disso, oferecer uma educação que
dê a eles a esperança necessária para melhorar sua condição de vida, de le-
los a uma consciência crítica diante do real, conduzindo a uma vida mais digna.
Sem compreender o antagonismo presente nesse modelo educacional, sem a
devida problematização, os conteúdos são apenas depósitos e os alunos
recipiente vazios, desumanizados. Muitos desses alunos chegaram ao último
ano do ensino fundamental sem compreender que, acima de preparar o aluno
para o vestibular e para o mercado do trabalho, a principal fuão da escola era
dar-lhe condições de se apropriar da cultura, de se tornar um cidadão crítico
capaz de problematizar a realidade vivida. É preciso que ele tenha um acesso
digno ao ensino superior e ao mercado de trabalho, é preciso que ele reconheça
o seu lugar na sociedade na qual es inserido, e, assim, contribuir para a
construção de uma sociedade menos desigual.
186
7 CONCLUSÃO
A história das lutas pelos direitos sociais é mais recente do que a luta
pelos direitos civis e políticos, e sua efetivação nasce da consciência livre dos
indivíduos em se organizarem e lutarem por seus direitos. Nos últimos 100
anos, muito se discutiu sobre os direitos sociais e humanos, direitos
imprescindíveis para a construção da cidadania. A essa luta, junta-se a busca
pela institucionalização de uma educação pública e de qualidade. Na pauta dos
debates, a preocupação em garantir esse direito subjetivo a todos os indivíduos,
pois a educação é um pré-requisito para a construção da cidadania, e,
conseentemente, de uma sociedade menos desigual.
A hisria da educação no Brasil é marcada pela forte presença da Igreja
que, desde o início da colonização, se fez presente para educar os índios e os
africanos, segundo a cartilha dos europeus. Com o surgimento da instria, era
preciso treinar os trabalhadores, que antes produziam de forma artesanal, e
agora precisavam aprender a produzir em rie. Tornou-se necessário o
surgimento de uma educação que atendesse essa demanda. O trabalhador
precisava aprender as técnicas da produção em série. O acesso a uma
educação de qualidade por séculos foi um privilégio das classes dominantes. A
educação das classes trabalhadoras era vista pelas elites apenas como o
treinamento de mão-de-obra para suas fábricas, comércio e grandes
propriedades de terras. Não era necessária nem desejável uma
conscientização das massas populares; essas precisavam ser obedientes e
dedicadas às tarefas que lhes eram impostas.
Hoje, em quase todos os países do mundo, existem leis garantindo
escolarização a todas as crianças em idade escolar. Mas o reconhecimento
desse direito e sua prática -se de maneira adversa em cada parte do mundo.
Nos países mais pobres, a educação de qualidade ainda é um privigio de
poucos, contribuindo ainda mais para as desigualdades entre as classes sociais
existentes nessas regiões. Parece-nos evidente que a existência de leis deve vir
acompanhada pelo seu reconhecimento e com os meios para sua aplicação no
seio da sociedade. A Constituição Federal de 1988 deu um grande passo para a
universalização da educação no Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
187
(LDB) de 1996 caminha na direção da garantia de uma escola pública e de
qualidade para todas as crianças em idade escolar, gestão democrática das
escolas e a valorização dos profissionais da educação. Mas a garantia desses
direitos ainda esta distante das escolas públicas brasileiras, que refletem ainda
o impacto secular da desigualdade e o desinteresse das classes dominantes em
assegu-los. A oferta de uma educação de qualidade acaba sendo destinada
para as classes mais ricas, enquanto uma educação preria e de qualidade
duvidosa fica voltada para as classes trabalhadoras. A herança da colonização,
das ditaduras e de rios governos autoritários e subservientes às elites
nacionais e internacionais, parece, ainda hoje, ecoar em nossas escolas. Assim,
não podemos falar em cidadania, sem uma preocupação constante em diminuir
as desigualdades sociais e aumentar o potencial cultural das classes
trabalhadoras.
O modelo educacional tradicional e seriado. É, ainda hoje, a prática mais
comum nas escolas públicas brasileiras. Um modelo caracterizado pela
reprodução dos conteúdos, pela classificão dos alunos em aqueles que
sabem e aqueles que não sabem, uma escola que reprova o aluno e exclui os
outros agentes do processo de avaliação.
Em Minas Gerais, a Constituição Estadual de 1989 caminha na direção da
União, dando mais espaço e abertura para a flexibilização dos modelos
pedagógicos e possibilitando novas experiências.
Em Betim MG, um município industrial de apenas 70 anos de
emancipação, mas com uma educação com características tradicionais, vem
buscando novas alternativas metodológicas, desde 1993, quando um governo
popular de esquerda assumiu a Prefeitura. Em 1998, após muitos debates com
os educadores, são implantados os ciclos de formação humana no município. O
novo modelo recebe o nome de Escola Democrática. Sua implantação foi
ocorrendo gradativamente até 2004, data de sua instituição definitiva para todo
o ensino fundamental em todas as escolas da rede municipal de ensino.
A Escola Municipal Capela Nova de Betim, localizada na periferia do
município, atende os alunos oriundos das classes trabalhadoras desde 1995, e
adotou o modelo de ciclos logo na sua implantação, pela rede municipal em
1998. Essa possui um pdio novo e em boas condições para atender a
comunidade. Ali realizei um estudo de caso com as três turmas do último ano do
188
ensino fundamental, juntamente com seus oito professores no turno da manhã.
Meu objetivo era observar as relões de poder existentes entre professores e
alunos na ptica escolar cotidiana a partir do novo modelo educacional
implantado pela rede municipal e pela própria escola.
Entendendo o poder como a capacidade que um ser humano tem de agir
sobre outros seres, de determinar a ação de outros seres, o poder é, portanto,
uma relação entre aquele que decide e o outro que executa. O professor tem o
poder sobre seus alunos; ele determina, faz escolhas que podem contribuir para
a formação dos seus alunos. Ele pode exercer seu poder por meio da coerção,
impondo suas escolhas aos alunos sem que estes participem do processo,
sendo apenas agentes passivos na reprodução dos conhecimentos. O professor
pode exercer seu poder por meio da manipulação dos seus alunos, impondo, de
maneira camuflada, sem que eles percebam suas reais intenções. E o professor
pode, ainda, exercer seu poder por meio da persuao, conquistando os alunos
para que esses desejem e sintam prazer em se relacionar com o conteúdo
lecionado.
Sem despertar nos alunos o desejo pelo saber, o professor consegue
apenas que estes decorem os conteúdos para tirar boas notas nas provas, sem
que haja uma relação diagica entre professores e alunos, conteúdo e
aprendizado. Uma escola autoritária, seriada, que se preocupa apenas com o
cognitivo, que exerce seu poder a fim de disciplinar os alunos a regras pouco
emanciparias, não cumpre sua função principal que é a transmissão da cultura
através dos conhecimentos acumulados históricamente. Um professor
tradicional e autoririo disciplina seus alunos para reproduzirem idéias prontas,
educa-os para a submissão e para o conformismo.
As classes dominantes utilizam-se do poder econômico para propagar
uma cultura que serve aos seus interesses, a cultura do silêncio, da exploração,
da disciplina, a cultura de trabalhadores submissos e conformados com a
realidade, ela não permite manifestações culturais que possam ameaçar seus
interesses. Dizem que é necessária sua cultura hegemônica para a pacificação
da sociedade. O currículo presente nas escolas públicas brasileiras, muitas
vezes, reproduzem essa cultura do silêncio que cala o desejo de emancipação
dos alunos. Esses que estudam sem prazer tornam-se, mais tarde, mão-de-obra
189
barata nas mãos dos meios de produção, e trabalham a vida inteira apenas para
sobreviver.
Outro caso, também possível, -se quando o professor usa seu poder
para persuadir seus alunos a fim de conscientizá-los, de torná-los cidadãos
críticos diante da realidade social em que estão inseridos.
Os homens fazem história produzindo cultura, apropriando-se dela e
transformando-a quando necessário. A cultura é o resultado das relações dos
indivíduos em sociedade. A educação, como apropriação da cultura, é condição
fundamental para a construção da cidadania. O reconhecimento de que todos
temos o direito de participar da construção da história, através da manifestação
cultural, é condição importante para que a cultura o se torne propriedade de
alguns em detrimento da maioria dos indiduos. Quando isso ocorre, o
resultado é sempre a dominação, a exploração de uns sobre os outros. Uma
educação humanizadora reconhece os alunos como portadores de cultura,
considera sua história e parte dela para a problematização do mundo real. Um
professor humanizador parte da práxis libertadora capaz de contribuir para a
formação crítica de seus alunos.
O currículo escolar aplicado nas escolas, no interior da sala de aula
precisa se aproximar da realidade dos alunos, em cada bairro, em cada
município, em cada estado do Brasil. Se essa aproximão o ocorre, se os
professores não consideram em seus currículos a história vivida pela
comunidade onde estão inseridos, ele deixa de cumprir seu dever de educador,
e seus alunos não se apropriam da cultura.
Uma educação comprometida com a emancipação de seus alunos não é
autoritária, não faz da escola um funil para o mercado de trabalho, sem
considerar suas necessidades individuais e sociais. Ela é comprometida com
uma práxis capaz de conscientizar seus alunos, e, fazendo isso, ela o só
educa, mas poderes aos alunos, poderes de busca de transformação da
realidade, de apropriação da cultura. Essa escola constrói seu curculo partindo
da realidade social em que está inserida, considera os problemas vividos pelos
alunos. Aqui, ele não está a serviço de uma realidade dada, hegemônica e
excludente; ele está a serviço da formação de cidadãos conscientes de seu
papel social e político.
190
A realidade das escolas públicas brasileiras mostra que, historicamente, o
currículo vem cumprindo uma função de controle social, de dominão por parte
das elites sobre a grande massa de trabalhadores. O acesso de todas as
crianças à escola é uma conquista recente em nosso país, mas isso não garante
que essas crianças tenham uma educação de qualidade, entendida como
aproprião da cultura, e não reprodutora de conceitos e fórmulas. O modelo
seriado é caracterizado pela fragmentação dos conteúdos, pela disciplina, pela
seletividade, pela recompensa. O aluno não é sujeito do processo de ensino/
aprendizado. Esse modelo tende a preparar o aluno para a produção em rie,
para o vestibular, para o mercado de trabalho, não considerando sua dimensão
humana, social e cultural.
A escola, ao preparar seu currículo baseado em um modelo educacional
reprodutivista, não forma cidadãos, forma peças para o mercado. Uma
educação humanista prepara os alunos para a vida, para o exercício da
cidadania, para a conscientização da realidade vivida. É isso que,
historicamente, a educação brasileira não ofereceu a nossos alunos. Assim, era
mais fácil manter o poder de uma cultura hegemônica e dominar as classes
trabalhadoras.
Mas muitos segmentos de nossa sociedade o ficaram indiferentes a
essa situação e ao modelo excludente de educação praticado em nossas
escolas. Muitos foram os educadores e críticos da educação que escreveram e
lutaram para que a escola enxergasse no aluno não apenas um agente passivo,
mas um sujeito ativo do processo de ensino/aprendizado. Como demonstrei
acima, a Constituição Federal de 1988 e a LDB de 1996 muito contribuíram para
a flexibilização dos modelos educacionais, com a renovação dos currículos, com
a autonomia pedagógica das redes de ensino e das escolas.
O modelo de ciclos de formação humana surge como uma esperança
revolucionária capaz de possibilitar ao aluno que seja sujeito e não mais objeto
passivo do processo de ensino aprendizado. Esse modelo é caracterizado pela
flexibilização dos tempos escolares, respeitando as fases da vida do educando,
considera as experiências vividas pelos alunos e parte delas para construir seu
currículo. Ele acompanha os ciclos do desenvolvimento humano, o
desenvolvimento coletivo não anula o individual, mas contribui para o
desenvolvimento de todos.
191
Para o ciclo de formação humana, o indivíduo é compreendido na sua
totalidade, em todas as dimensões do seu desenvolvimento, não apenas no
cognitivo, no que possam produzir, mas principalmente no que possam vir a ser,
no cidadão que possa ser formado. Os conteúdos abrem espaços para o
cotidiano dos alunos. O debate democrático envolve a dignidade, a
solidariedade, a cidadania, a potica, a violência, o desemprego, as causas da
pobreza, e todos os aspectos que envolvem o cotidiano escolar.
Embora o modelo de ciclos seja uma opção, hoje, melhor e mais justa
para os alunos das escolas públicas brasileiras, ele vem encontrando
resistências para sua implantação e efetivação na prática em sala de aula. A
grande justificativa, segundo vários autores pesquisadores e educadores é que,
sem nota, o aluno o estuda. Se a atividade não vale ponto, o aluno pouco faz,
sem a ameaça da reprovação o professor não consegue mais manter a
disciplina e a atenção do aluno em suas aulas. Ou seja, o que prende o aluno
em sala de aula não é o prazer pelo conhecimento, e, sim, acumular pontos
suficientes e ir para a série seguinte.
Nossos professores, educados num protótipo de modelo seriado
enraizado no autoritarismo, encontram dificuldade para renovar. O modelo
seriado está ancorado na cultura do nosso País, e mudar a cultura não é algo
muitocil, principalmente quando ela interessa àqueles que detêm o poder
econômico. Estamos acostumados com um modelo reprodutivista, nosso
planejamento de aulas segue as regras que me foram passadas. Desde os
tempos de escola, fomos acostumados a preparar a aula, passar o conteúdo no
quadro, ditar os exercícios, passar o dever de casa, dar visto no caderno, punir
o aluno que conversa e atrapalha a aula, tirar pontos de quem não cumpre as
tarefas, dar provas, avaliar os alunos, aprovar os bons e reprovar os ruins, essa
vem sendo a lógica da educação brasileira há muitos anos, e mudar isso não
parece uma tarefa fácil.
O fracasso escolar o está apenas na quantidade de alunos reprovados
a cada ano, na quantidade de alunos que saem das escolas, sem adquirir os
conhecimentos necessários. O fracasso escolar está presente no grande
número de professores que consideram esse fracasso apenas dos alunos, sem
avaliar seus próprios métodos de ensino, sem aproximar o conteúdo da
realidade desses alunos, sem despertar neles o desejo pelo saber. O fracasso
192
escolar está presente na falta de significado e de rao de ser de um modelo
educacional que condena o aluno ao fracasso escolar, humano e profissional.
A educação como prática da liberdade é, antes de tudo, diagica. Nela, a
avaliação é contínua e compreende todos os elementos e agentes do processo
de ensino/aprendizado. Não existe um único culpado pelo fracasso e nem um
único responsável pelo sucesso. O ato de educar é um ato político, e suas
escolhas podem contribuir para a transformação da realidade ou para a
manutenção da dominação de uns poucos sobre a maioria da população. Nossa
prática em sala de aula não é neutra, ela pode caminhar na direção da
conscientização de nossos alunos para a cidadania ou contribuir para a
manutenção das desigualdades existentes entre as classes sociais. Podemos
recriar a sociedade ou conservar a exploração econômica, pois, a formação da
dignidade de cada aluno também passa pelas escolhas curriculares do estado,
da escola e de cada professor.
Esta pesquisa observou as relações de poder entre professores e alunos
de uma escola pública de periferia, que adota como modelo educacional os
ciclos de formação humana, considerando que, nesse modelo, o poder deve ser
assumido de forma compartilhada entre ambos. Nesse sentido, orientei-me pelo
método de Paulo Freire, sua pedagogia dialógica humanista. Oriundo de uma
vida simples no nordeste brasileiro, encontrou dificuldades para realizar seus
estudos, começou cedo a carreira de professor, sua hisria e experiências. Sua
convivência com alunos em dificuldades de aprendizado ajudaram a construir
seu método de ensino, era necessário falar a linguagem dos educandos, mas
ainda era urgente dar-lhes a palavra, não apenas fazer comunicados, mas
pronunciar a palavra viva da história social em que ambos vivem. A experiência
de Angicos (RN), em 1962, onde, em 45 dias, 300 trabalhadores rurais foram
alfabetizados, caracteriza o início de um novo conceito de alfabetização de
jovens e adultos no Brasil. Seu método só o se espalhou por todo o Brasil
porque, em 1964, os militares derrubaram a democracia e instalaram no País
um regime autoritário. Paulo Freire foi expulso do País, acusado de subversão,
no exterior ganha respeito e notoriedade, seu método de alfabetização é
copiado em rios países dos quatro continentes. Paulo Freire é convidado para
conferências, palestras, e até para lecionar por rias universidades espalhadas
pelo mundo. Ficou 15 anos no elio, e retornou ao Brasil no início da década de
193
80. Foi convidado a lecionar em universidades, foi Secretário de Educação do
município de São Paulo, no governo da prefeita Luiza Erundina, publicou vários
livros em diversos Países onde foi premiado e homenageado.
O método Paulo Freire de alfabetização de jovens e adultos, enfim,
ganhou espaço no seu País de origem. Ensinar partindo da realidade em que os
educandos estão inseridos usando as experncias do cotidiano para
conscientizar, e, assim, emancipar os alunos era o objetivo principal do seu
método. Para ele a escola deve educar para a liberdade, para a
problematização do real, os conteúdos não são escolhidos e transmitidos de
forma mecânica, mas contextualizados, provocando uma mudança de
comportamento em direção à transformação da realidade. A pedagogia diagica
torna-se uma ferramenta de conscientização, e, conseqüentemente, de
emancipação das classes trabalhadoras. Ela substitui o método tradicional,
caracterizado pela transmissão de conteúdos prontos que provoca a
passividade nos alunos.
Uma educação tradicional, que reproduz uma realidade desigual, é
denominada por Paulo Freire de Educação Bancária, aquela na qual o professor
transmite os conteúdos de forma mecânica, onde os alunos o considerados
recipientes vazios onde os conteúdos e as fórmulas são depositados. Nesse
processo, somente o professor é sujeito, aquele que tudo sabe, e o aluno é
objeto, aquele que nada sabe. O professor deposita nos alunos as informações
consideradas necessárias para sua memorização. A relação é autoritária, pois
há ali uma imposição dos saberes determinados, fornecidos de cima para baixo,
sem que o aluno compreenda sua rao de ser, sua relação com o mundo que o
cerca. Nesse processo, o há explicitação das contradições; há uma espécie
de conformismo diante da realidade. O aluno permanece na ingenuidade, sem
ação, diante da condição social em que está inserido, ele permanece oprimido
sem que a educação o conduza a uma práxis transformadora do real. O
professor reduz sua atividade ao aspecto cognitivo apenas, sem inseri-lo ao
universo do aluno. A educação torna-se apenas um ato de depositar, de
transferir conteúdos, onde o professor é o depositante e os alunos os
recipientes vazios a serem enchidos.
Para Paulo Freire, a educação não é neutra, ou ela deposita conteúdos
programados, tornando os alunos submissos e dóceis, sem consciência ctica,
194
ou ela é uma prática libertadora, uma ação cultural humanista e revolucionária,
capaz de confrontar-se com as contradições presentes na sociedade,
contribuindo para a sua transformação. Uma educação libertadora parte da
história dos educandos, explicita seus antagonismos e constroem propostas
para a emancipação dos explorados. Ela não es neutra, e, menos ainda,
comprometida com a manutenção das desigualdades sociais, não está atrelada
aos interesses do mercado, o manipula os alunos para torná-los uma massa
trabalhadora e explorada pelos donos dos meios de produção. Uma educação
dialógica exige um educador crítico, comprometido com a libertação de seus
alunos; ele parte de uma realidade vivida em direção a uma realidade
transformada, que exige um diálogo permanente entre educador e educando, na
construção permanente de um currículo comprometido com a cidadania, com a
dignidade de todos os indivíduos. Uma educação humanizadora está atenta às
necessidades da comunidade na qual está inserida.
As relações de poder entre professores e alunos precisam refletir uma
educação como ptica da liberdade, reconhecer os direitos dos alunos de se
apropriarem da cultura. Ela precisa assumir uma postura potico-pedagica
que está comprometida com a construção de uma sociedade mais justa e
humana. Em uma sociedade desigual como a nossa, precisamos reconhecer o
direito à educação, o direito de emancipação de todos os cidadãos, o direitos de
os alunos se encantarem pelo saber, tornando o processo de ensino
aprendizado ser uma coisa prazerosa. As reflees propostas por Paulo Freire
aos educadores convoca-me para o grande desafio de me comprometer com
uma educação dialógica e libertadora. Para ele, educar é um gesto de amor, de
compromisso com a emancipação de todos os seres humanos.
A realidade brasileira mostra-nos que a sociedade está dividida em
classes antanicas, com interesses diferentes e que também se divergem, mas
as elites sempre determinaram os rumos da economia, das relações de
trabalho, da divio da renda, dos todos de ensino existentes em nossas
escolas. Mesmo após a implantação da nova LDB que abriu caminho para
novas perspectivas e métodos de ensino, como o ciclo de formação humana, o
modelo tradicional, reprodutivista e precário continua predominando nas práticas
escolares, continua sendo uma opção de nossos professores que não
195
reconheceram ainda no ciclo uma alternativa mais justa, principalmente com
alunos das escolas públicas constantemente punidos pelo modelo seriado.
A Escola Municipal Capela Nova de Betim vem implantando o modelo de
ciclos há dez anos, e seus professores encontram muitas dificuldades para
compreender e praticar esse novo modelo.
Esta pesquisa permaneceu por quatro meses na escola, fazendo
observações, freqüentando as aulas das três turmas do último ano do ensino
fundamental, alternando entre as oito disciplinas. Conversei com a direção,
funciorios, professores e alunos, apliquei um questionário para os alunos,
entrevistei seis alunos, sendo dois de cada turma e sete dos oito professores
que trabalham nas três turmas. Esta pesquisa é o olhar que tive, partindo dos
dados que recolhi, das relações de poder existentes entre os professores e
alunos que observei.
A implantação dos ciclos pela rede municipal de Betim deu-se com as
seguintes características: avaliação qualitativa, contínua dos processos,
abrangendo toda a experiência escolar; rompimento com a fragmentação do
saber; reconhecimento do aluno como sujeito do processo de ensino
aprendizado. As ões pedagicas devem considerar não apenas o cognitivo,
mas também promover a auto-estima, o comportamento ético, as manifestações
artísticas e o exercício pleno da cidadania. A rede municipal tem um boletim de
desempenho escolar aplicado em todas as escolas. Os conceitos aplicados o:
O (Ótimo), B (Bom) e AD (A Desejar). São avaliados aspectos como a
freência, a pontualidade, a participação nas atividades, respeito às normas e
compreensão dos conteúdos. A rede municipal também mantém um regimento
único para todas as escolas do município.
Nas observações que fiz das aulas, percebi que os professores valorizam
mais o cognitivo, passam a matéria no quadro, ditam os exercícios, olham os
cadernos, dão nota para as atividades, valorizam as avaliações bimestrais,
classificam os alunos em bons e ruins e ameaçam os alunos de reprovação no
final do ano. No primeiro trimestre de 2007, os resultados, as avaliações
bimestrais dos alunos das três turmas foram muito ruins, no conselho de classe
os professores limitaram-se a responsabilizar os alunos pelo fracasso, falaram
de cada aluno apontando seus problemas, e o foram poucos os selecionados
para uma conversa das pedagogas com os pais.
196
Analisamos os conceitos das ts turmas do último ano do ensino
fundamental no primeiro trimestre de 2007, o fracasso dos alunos aumenta a
cada turma analisada. A turma 08A, considerada a melhor das ts, com alunos
aparentemente mais dedicados aos estudos, alcançou os melhores conceitos, e
mesmo assim, em história e ciências, apenas um aluno alcançou o conceito O.
Em cncias, 12 alunos tiveram o conceito AD, demonstrando as dificuldades de
assimilação dos conteúdos por parte dos alunos. A turma 08B, considerada uma
turma intermediária, as dificuldades de assimilação dos conteúdos foram
maiores do que na turma 08A. Em geografia e história, apenas um aluno
alcaou o conceito O, e em português e ciências, nenhum aluno alcançou esse
conceito. Do outro lado da tabela, vemos o aumento do conceito AD, 14 em
português, 15 em inglês, 16 em geografia, e 22 em ciências. Esse seria motivo
suficiente para uma reavaliação do processo de ensino aprendizado, se os
resultados da turma 08C o fossem ainda piores. A turma 08C é considerada o
patinho feio das três turmas do último ano do ensino fundamental. Parece que
foram colocados juntos os alunos com maior índice de dificuldades na mesma
turma, pois os resultados foram muito ruins, e, segundo o conselho dos
professores, eles são os responsáveis pelo fracasso. Nessa turma, dos 28
alunos, apenas em duas disciplinas vemos um número razoável de alunos com
o conceito O: 16 em educação física e 11 em artes. Nas outras seis disciplinas,
a dia ficou entre 4 e 0 alunos com O. Já o conceito AD atingiu uma dia de
17 a 23 alunos em cinco das oito disciplinas. Segundo os professores, essa
turma tem um histórico de dificuldades de aprendizado que vem de anos
anteriores, lembrando que a grande maioria dos alunos estuda na escola desde
os seis anos, ou seja, o problema está na escola desde o seu início. Segundo
uma das professoras, se não fosse a implantação do ciclo, o histórico escolar
desses alunos estaria marcado pela reprovação; muitos não estariam no final do
ciclo.
Pedi aos professores que avaliassem a implantação dos ciclos na rede
municipal e na Escola Capela Nova. Pedi, também, que se posicionassem sobre
o mesmo. As respostas dos sete entrevistados apresentam muitas
semelhanças. Todos acreditam que a implantação do ciclo na rede municipal e
na escola trouxe benefícios para a educação, tais como o coeficiente de 1,3
professores por turma de aluno, os momentos de estudo, a flexibilização, os
197
projetos, os atendimentos a pequenos grupos, mas afirmam que falta preparo
dos professores para trabalhar com o ciclo. Os atendimentos a pequenos grupos
não funcionam por causa do grande número de faltas dos colegas, em função
das paralisações e dos projetos. Faltam investimentos para oferecer uma
estrutura adequada e condições físicas e materiais da escola e da rede
municipal para a prática ciclada. Alguns professores discordam da metodologia
dos ciclos, tais como: o modelo de avaliação, a substituição das notas por
conceitos, a promoção automática alegando que os alunos ficam muito soltos e
sem compromisso com os estudos. Na prática em sala de aula, todos os
professores utilizam elementos do ciclo e da seriação, e justificam essa postura,
alegando que é preciso pegar os elementos da seriação que sempre deram
certo, e unir com os aspectos positivos do ciclo. Nas entrevistas, todos afirmam
a importância do cognitivo, das avaliações, da nota e da retenção de alunos que
não conseguem assimilar o conteúdo, mas consideram os projetos
interdisciplinares, como o Pan-Americano, importantes para desenvolver outras
habilidades nos alunos como a socialização, a solidariedade e a divisão de
tarefas. Há aqueles que afirmam que o ciclo não acrescentou nada e que a
prática na escola é seriada mesmo.
Diante dos resultados ruins dos alunos, no primeiro trimestre de 2007,
perguntei aos professores o que era feito para melhorar o aprendizado dos
alunos e recuperar o conceito ruim. Todos responderam que suas iniciativas
para solucionar o problema são isoladas, cada um age de uma maneira, faz
revisão do conteúdo, dá mais exercícios, manda chamar os pais, exige uma
maior responsabilidade dos alunos. Houve até uma tentativa de organizar a
turma 08C em forma de U, que não deu certo. Não é feito um processo de
recuperação contínua, os atendimentos não funcionam, os colegas faltam com
freência, são feitas paralisações em prol das lutas da categoria, e nada disso
apareceu nas avaliações do conselho de classe, e a justificativa para penalizar
os alunos é a falta de compromisso com os estudos. E os alunos, o que dizem?
Eles concordam que o gostam muito de estudar, que a maria é chata, que
os professores o muito exigentes, mas consideram importante estudar para
ser alguém na vida, ter um bom trabalho e uma vida melhor. Eles parecem
concordar com as relações de poder estabelecidas no interior da escola, ou
198
seja, estão conformados com a condição de objetos passivos do processo de
ensino aprendizado.
Os alunos da turma 08A preferem o modelo seriado por causa da nota.
Acham que saem perdendo quando essa é transformada em conceito. Os
alunos da turma 08B reclamam muito da falta de diálogo dos professores,
afirmam que eles brigam e ameaçam tirar ponto, mandar o aluno para a direção
para tomar ocorrência, más preferem o ciclo porque acham que os alunos
aprendem com mais calma, sem a pressão da nota. Na turma 08C, os alunos
demonstram ter conflitos com alguns professores, sentem-se inferiorizados e
reagem discutindo com os professores. Eles também se sentem menos
pressionados com o ciclo.
Tanto nas observações, conversas e entrevistas, pude perceber que as
relações de poder entre professores e alunos das ts turmas do último ano do
ensino fundamental da Escola Municipal Capela Nova de Betim, são relações
coercitivas e não persuasivas, os professores impõem os contdos que são
transmitidos de forma mecânica, sem uma adesão do aluno, ameaçam tirar
ponto, mandar o aluno indisciplinado para conversar com a direção, vigiam os
cadernos dos alunos, dividem os alunos em bons e ruins, e ameaçam de
reprovação aqueles que não melhorarem o comportamento e as notas nas
provas. Eram comuns, nas aulas, a dispersão dos alunos, conversas,
brincadeiras, e a falta de interesse parecia dominar o ambiente escolar, mesmo
porque poucas vezes vimos o professor relacionar o conteúdo e a vida cotidiana
dos alunos. Tudo parecia distante, o professor sujeito, o aprendizado, e o aluno
objeto passivo. E todos os problemas se agravavam quando os alunos eram da
turma 08C, pois eram considerados alunos com um grande grau de dificuldade
de aprendizado, indisciplinados, desinteressados, ou seja, um caso perdido.
Vemos, portanto, que as relações aqui estudadas não são dialógicas. Os
professores não exercem seu poder para conquistar os alunos, para despertar
neles o desejo pelo saber. Os conteúdos são distribuídos e passados aos
alunos de forma menica, e o provocam os alunos para conhecerem e muito
menos se apropriarem da cultura. A maioria dos alunos está na escola desde o
início do ensino fundamental, e as perspectivas de emancipação parecem se
distanciar cada vez mais, principalmente dos alunos da turma 08C com as
maiores dificuldades de aprendizado.
199
A implantação do ciclo, na escola, pouco mudou nas relações entre
professores e alunos que continuam exercendo papéis bem definidos no
processo de ensino aprendizado. Um continua sendo aquele que tudo sabe e
precisa ensinar; o outro continua sendo aquele que nada sabe e precisa
aprender. A reflexão do modelo de ciclo na perspectiva freireana, como prática
da liberdade, precisa ser retomado, a compreensão do aluno como sujeito do
processo de ensino aprendizado não pode ficar fora das reuniões de
professores.
A história da educação é caracterizada pelo exercício do poder político,
econômico e cultural de uns sobre a maioria da população. As conquistas das
classes trabalhadoras vêm da conscientização e de constantes lutas pelos
direitos sociais. Em uma sociedade onde o direito à educação de qualidade é
negado, a construção da cidadania fica comprometida, os indivíduoso se
apropriam da cultura, o podem exercer o poder, pois de fato não o m. A
ideologia das classes dominantes proporciona uma educação reprodutivista,
pouco conscientizadora das classes trabalhadoras. O modelo seriado atende as
necessidades do mercado, pois prepara uma mão-de-obra barata e conformada
com a condição dada. Somente um modelo educacional que atenda as
necessidades das classes trabalhadoras, que olhe para sua realidade de forma
crítica, pode libertar os trabalhadores da condição de explorados. Uma
educação diagica e emancipadora é capaz de provocar uma práxis
revolucionária e diminuir as desigualdades educacionais e sociais presentes na
realidade brasileira.
Esta pesquisa limitou-se a buscar compreender as relações de poder
entre professores e alunos, no interior de uma escola pública da periferia de
Betim MG. Certamente, ela pode ser confrontada com a experiência de outros
municípios. Mas muitos dos resultados dessa investigação focada parecem
ser homólogos aos de muitos outros lugares. Sabemos que o poder tem rias
faces, tais como: o poder econômico, o poder da administração blica, o poder
dos gestores escolares, o poder da comunidade local, o poder dos pais sobre a
escola, o poder do currículo, dos livros didáticos. Ou seja, as dimensões de
pesquisas acerca do poder são muitas, variadas e não menos importantes do
que esta a que me proponho. A educação como apropriação da cultura também
abre caminhos diversos para novas pesquisas, como as contradições entre a
200
cultura erudita e popular na educação brasileira, e, por fim, os modelos
educacionais como prática escolar, os antagonismos entre seriação e ciclo
possibilitam muitas reflexões que merecem ser abordadas. O que não podemos
é esgotar a discussão e a pesquisa, e, menos ainda, deixar de buscar
alternativas para os conflitos que impedem a formação plena de nossos alunos,
principalmente os oriundos das escolas públicas.
Os ciclos de formação humana são, ainda, uma novidade nas escolas
brasileiras. Na rede municipal de Betim, m sendo implantado há dez anos, e
seu sucesso depende do conhecimento e do reconhecimento, por parte do
poder blico, dos gestores, educadores, pais e alunos, e de recursos
financeiros e pedagógicos. Ao lado de uma melhor redistribuição da renda, é
preciso provocar mais debates, cursos e encontros com os agentes do processo
de ensino/aprendizado com a perspectiva de conquistá-los para a adeo livre
ao ciclo. É preciso mais investimento por parte do poder público na estrutura
física das escolas, material didático e pedagico, e oferecer acesso à
informática aos alunos, embora seja preciso reconhecer que a rede municipal já
caminha nessa direção. As lutas dos trabalhadores em educação por melhorias
de condições de trabalho contam com um sindicato ativo no município. Essas
lutas precisam considerar uma oferta de uma qualidade de ensino melhor, por
parte do poder público municipal, da Secretária Municipal de Educação, das
Regionais Pedagógicas, dos gestores escolares, mas, principalmente, dos
educadores que não podem se omitir diante do fracasso escolar dos alunos,
transferindo a responsabilidade para o aluno ou para os professores de anos
anteriores que não ensinaram direito.
Nossos alunos do ensino fundamental da rede municipal de Betim têm
direito a uma educação de qualidade, e ela pode ser garantida pelo poder
público e pelos professores, desde que haja condições para isso com as
conseentes exigências para tal. Os professores afirmam ser favoráveis ao
ciclo de formação humana, mas, no fundo, o contra, pois sua ptica em sala
de aula é autoritária e excludente.
Um município com características industriais, como é o caso de Betim,
com indústriaso ricas e uma massa de trabalhadoreso pobres, precisa
estar em constante diálogo com os educadores, e estes precisam conhecer
sempre mais a respeito da realidade social dos seus alunos, aproximar seus
201
contdos da história local, despertar nos alunos o desejo pelo saber, fazer com
que nossas crianças e jovens vejam na educação uma perspectiva real de
emancipação. Nesses dez anos de implantação dos ciclos no município, apesar
de todas as dificuldades enunciadas, muitas lutas foram travadas, muitas
conquistas foram feitas pelos educadores, conquistas que precisam continuar
caminhando na direção de uma educação como prática da liberdade. Os
educadores precisam assumir o desafio de fazer da educação uma verdadeira
soma de constantes gestos de amor.
202
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PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 13. ed. Brasília: UnB, 2007a. V. 1,
p. 88-94.
STOPPINO, Mario. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO,
Gianfranco. Dicionário de política. 13. ed. Brasília: UnB, 2007b. V. 2, p. 933-943.
TEIXEIRA, Anísio. A escola brasileira e a estabilidade social. In: TEIXEIRA, Anísio.
Educação no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999. p. 99-132.
VARELA, Julia; ALVARES-URIA, Fernando. A maquinaria escolar. In: Teoria e Educação,
Dossiê: História da Educação. 1992.
206
A N E X O S
207
BETIM, MG
Anexo 01 - Mapa do Município de Betim com a identificação de todas as Escolas
Municipais e Estaduais.
208
Anexo 02 - Escolas Municipais de Betim, MG
209
Anexo 03 - Escolas Estaduais localizadas no Município de Betim, MG.
210
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Pró-Reitoria de Pesquisa e de Pós-Graduação
Comitê de Ética em Pesquisa
ESCOLA MUNICIPAL CAPELA NOVA DE BETIM
QUESTIONÁRIO PARA ALUNOS DAS TRÊS TURMAS DO ÚLTIMO
ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
01- Há quantos anos você estuda nessa Escola:
( ) 1 a 2 anos. ( ) 5 a 6 anos.
( ) 3 a 4 anos. ( ) 7 a 9 anos.
02- Por que você estuda nessa escola?
( ) Perto de casa. ( ) Meus amigos estudam aqui.
( ) Qualidade do ensino. ( ) Não consegui vaga em outra escola.
03- Como é a qualidade do ensino na sua escola?
( ) Bom. ( ) Muito bom.
( ) Fraco. ( ) Ótimo.
04- Seus professores:
( ) São amigos e ensinam bem. ( ) São rigorosos na
execução das tarefas.
( ) Explicam o conteúdo e avaliam as atividades. ( ) Se preocupam com o
aprendizado dos alunos.
05- Seus pais são chamados na escola para:
( ) Participar da vida escolar. ( ) Informar-se de problemas de
notas.
( ) Saber de problemas de disciplina. ( ) Receber elogios a seu respeito.
06- Como você se saiu nas provas:
( ) Ótimo. ( ) bem.
( ) Muito bem. ( ) Mau.
07- O que o professor(a) faz para manter a disciplina:
( ) Procura envolver os alunos nas atividades. ( ) Manda o aluno para a
direção.
( ) Ameaça tirar pontos. ( ) Conversa com a turma.
08- Os alunos participam da escolha dos temas das aulas:
( ) Sempre. ( ) Poucas vezes.
( ) Muitas vezes. ( ) Nunca.
211
09- Os conteúdos estão relacionados com o dia-dia dos alunos:
( ) Sempre. ( ) Poucas vezes.
( ) Muitas vezes. ( ) Nunca.
10- Quem é escolhido o destaque da turma:
( ) O aluno mais freqüente e pontual.
( ) Mais disciplinado e com maior nota.
( ) O que desenvolveu melhor as habilidades educativas.
( ) O que mais participa das atividades propostas.
11- Qual é a importância da prova simulada:
( ) Preparar o aluno para concursos e para o vestibular.
( ) Para uma melhor compreensão dos conteúdos.
( ) Para desenvolver habilidades e resolver situações-problemas.
( ) Para valorizar a integração entre as disciplinas.
12- Em que aspectos você é mais avaliados nas disciplinas:
( ) Na presença e pontualidade. ( ) Na sua participação
nas atividades educativas.
( ) No conteúdo programático de cada disciplina. ( ) No desenvolvimento
de habilidades significativas.
13- O que mais te motiva a participar das aulas:
( ) Os trabalhos em grupo. ( ) Os temas da realidade e do
cotidiano.
( ) O valor em pontos de cada atividade. ( ) O conteúdo de cada disciplina.
Anexo 04 - Questionário aplicado aos alunos da Escola Municipal Capela Nova de
Betim.
212
RESPOSTAS DOS QUESTIONÁRIOS APLICADOS À
72 ALUNOS DAS TRÊS TURMAS DO ÚLTIMO ANO DO ENSINO
FUNDAMENTAL
01- Há quantos anos você estuda nessa Escola:
1 a 2 anos: 6
3 a 4 anos: 17
5 a 6 anos: 8
7 a 9 anos: 41
02- Por que você estuda nessa escola?
Perto de casa: 54
Qualidade do ensino: 7
Meus amigos estudam aqui: 8
Não consegui vaga em outra escola: 3
03- Como é a qualidade do ensino na sua escola?
Bom: 40
Muito bom: 22
Ótimo: 5
Fraco: 5
04- Seus professores:
São amigos e ensinam bem: 13
Explicam o conteúdo e avaliam as atividades: 20
São rigorosos na execução das tarefas: 3
Se preocupam com o aprendizado dos alunos: 36
05- Seus pais são chamados na escola para:
Participar da vida escolar: 40
Saber de problemas de disciplina: 12
Informar-se de problemas de notas: 9
Receber elogios a seu respeito: 11
06- Como você se saiu nas provas:
Ótimo: 2
Bem: 40
Mau: 14
Muito bem: 16
07- O que o professor (a) faz para manter a disciplina:
Procura envolver os alunos nas atividades: 7
Manda o aluno para a direção: 12
Ameaça tirar pontos: 3
Conversa com a turma: 50
08- Os alunos participam da escolha dos temas das aulas:
Sempre: 6
Poucas vezes: 41
Muitas vezes: 10
213
Nunca: 15
09- Os conteúdos estão relacionados com o dia-dia dos alunos:
Sempre: 22
Poucas vezes: 30
Muitas vezes: 17
Nunca: 3
10- Quem é escolhido o destaque da turma:
O aluno mais freqüente e pontual: 9
Mais disciplinado e com maior nota: 32
O que desenvolveu melhor as habilidades educativas: 19
O que mais participa das atividades propostas: 12
11- Qual é a importância da prova simulada:
Preparar o aluno para concursos e para o vestibular: 41
Para uma melhor compreensão dos conteúdos: 17
Para desenvolver habilidades e resolver situações-problemas: 6
Para valorizar a integração entre as disciplinas: 8
12- Em que aspectos você é mais avaliados nas disciplinas:
Na presença e pontualidade: 18
Na sua participação nas atividades educativas: 22
No conteúdo programático de cada disciplina: 27
No desenvolvimento de habilidades significativas: 5
13- O que mais te motiva a participar das aulas:
Os trabalhos em grupo: 8
Os temas da realidade e do cotidiano: 18
O valor em pontos de cada atividade: 31
O conteúdo de cada disciplina: 15
Anexo 05 - Resultado do Questionário aplicado a 72 dos 86 alunos das três turmas
do último ano do ensino fundamental da Escola Municipal Capela Nova de Betim.
214
BIBLIOTECA DA ESCOLA MUNICIPAL CAPELA NOVA DE BETIM.
EMPRÉSTIMO DE LIVROS PARA OS ALUNOS DAS TRÊS TURMAS
DO ÚLTIMO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL.
TURMA 08A
ALUNO (A) 08ª DATA INICIAL Nº LVROS
01 – Adalberto 01/11/2006 07
02 – Bruno 27/03/2007 01
03 – Luiz 31/03/2006 07
04 – Fabrício 05/04/2006 58
05 – Leandro 25/10/2006 06
06 – César 01/11/2006 04
07 – Fábio 25/10/2006 11
08 – Marcos 27/03/2007 02
09 – Julio 18/09/2006 09
10 – Paulo 31/03/2006 09
11 – Ricardo 03/04/2006 08
12 – Henrique 03/04/2006 28
13 – Vitor 03/04/2006 07
14 – Maria 25/10/2006 05
15 – Raquel 25/10/2006 06
16 – Rubia 25/10/2006 05
17 – Carolina 31/04/2006 14
18 – Juliana 31/03/2006 52
19 – Carina 31/03/2006 23
20 – Ludimila 31/03/2006 03
21 – Silvana 31/03/2006 25
22 – Luciana 22/08/2006 19
23 – Alice 21/08/2006 16
24 – Heliana 25/10/2006 04
25 – Fernanda 01/11/2006 04
26 – Paula 03/05/2006 07
27 – Marta 31/03/2006 07
28 – Luana 21/08/2006 07
29 – Carolina 03/05/2006 03
Média da turma de março de 2006 à junho de 2007, 12,31 livros por aluno.
Anexo 06 – Empréstimos de livros para a turma 08A.
215
TURMA 08B
ALUNO (A) 08B DATA INICIAL Nº LVROS
01 – Gláucio 11/04/2006 09
02 – Gustavo 26/03/2006 01
03 – Carlos 03/04/2006 03
04 – Leonardo 26/10/2006 03
05 – Felipe 26/10/2006 05
06 – Henrique 31/03/2006 06
07 – Ricardo 13/10/2006 03
08 – Paulo não leu 00
09 – Milton 12/04/2006 13
10 – Julio 26/10/2006 02
11 – Gilberto 26/10/2006 03
12 – Marcos 14/08/2006 08
13 – Sandro 26/10/2006 03
14 – Fernanda 29/05/2006 13
15 – Camila 12/04/2006 29
16 – Alice 05/04/2006 07
17 – Luciana 29/03/2006 27
18 – Leandra 26/10/2006 08
19 – Vanda 26/10/2006 05
20 – Neide 26/10/2006 05
21 – Maria 08/05/2006 16
22 – Bruna 29/05/2006 13
23 – Vanessa 29/05/2006 13
24 – Bruna Saiu ---
25 – Michelle 11/04/2006 08
26 – Otávia 11/04/2006 10
27 – Laura 05/04/2006 05
28 – Silvia 24/05/2006 05
29 – Kenia 29/05/2006 12
Média da turma de março de 2006 à junho de 2007, 8,39 livros por aluno.
Anexo 07 – Empréstimos de livros para a turma 08B.
216
TURMA 08C
ALUNO (A) 08C DATA INICIAL Nº LVROS
01 – Augusto Não leu 00
02 – Luiz 30/03/2007 01
03 – Gabriel 30/03/2007 02
04 – Carlos Não leu 00
05 – Sandro ---- ----
06 – Walisson 30/03/2006 01
07 – Gustavo Não leu 00
08 – Paulo 05/04/2006 01
09 – Leonardo 05/04/2006 02
10 – Vinícius 22/08/2006 08
11 – Deivisson 27/04/2007 02
12 – César Não leu 00
13 – Rafael Não leu 00
14 – Jairo 18/05/2007 01
15 – João 27/04/2007 01
16 – Carolina 11/09/2009 06
17 – Maria 31/03/2006 07
18 – Aparecida 20/04/2006 25
19 – Rafaela 11/09/2006 11
20 – Juliana 06/04/2006 19
21 – Gisele 30/03/2007 01
22 – Patrícia 03/05/2006 29
23 – Cristina Não leu 00
24 – Laura 30/03/2007 03
25 – Roberta 20/04/2006 06
26 – Paula 29/05/2006 08
27 – Cássia 31/03/2006 04
28 – Marilene 12/04/2006 12
Média da turma de março de 2006 à junho de 2007, 5,55 livros por aluno.
OBS: A média de leitura das três turmas de março de 2006 à junho de 2007 foi de
8,75 livros por aluno. Os nomes dos alunos foram alterados, foram mantidos o
número de alunos por turma e o sexo de cada um deles.
Anexo 08 – Empréstimos de livros para a turma 08C.
217
ESCOLA MUNICIPAL CAPELA NOVA DE BETIM
QUADRO DE HORÁRIO DOS ALUNOS
DIA HORÁRIO 08A 08B 08C
SEG
Ciências Matemática Artes
SEG
Matemática Arte Português
SEG
História Geografia Inglês
SEG
Geografia Inglês Ciências
TER
Matemática Ed. Física Geografia
TER
Ed. Física Geografia Matemática
TER
Português Ciências Inglês
TER
Ciências Inglês Português
QUAR
Inglês Português Ciências
QUAR
Ed. Física Ciências Português
QUAR
Artes Matemática Ed. Física
QUAR
Matemática Ed. Física Artes
QUIN
Português Artes Matemática
QUIN
Inglês Matemática Geografia
QUIN
Geografia História Ed. Física
QUIN
Artes Português História
SEX
Português Geografia Matemática
SEX
História Português Ciências
SEX
Geografia Ciências História
SEX
Ciências História Geografia
HORÁRIO DE AULAS:
Início da primeira aula: 7:00 horas.
Início da segunda aula: 8:05 horas.
Início do recreio: 9:10 horas.
Início da terceira aula: 9:25 horas.
Início da quarta aula: 10:25 horas.
Final da aula: 11:25 horas.
Anexo 09 Quadro de horários das aulas das três turmas do último ano do ensino
fundamental.
218
Anexo 10 - Boletim de desempenho escolar aplicado a todos os alunos da Rede
Municipal de Ensino de Betim.
219
220
Anexo 11 – Fotos da Escola Municipal Capela Nova de Betim.
11.1. Foto da entrada da Escola Municipal Capela Nova de Betim,
11.2. Foto do pátio onde os alunos merendam e ficam durante o recreio e intervalo
das aulas.
221
11.3. Foto do pátio onde os alunos merendam, próximo ao barzinho onde compram
merenda.
11.4. Foto da biblioteca da Escola Municipal Capela Nova de Betim.
222
11.5. Foto do acesso à quadra poliesportiva onde os alunos fazem as aulas de
Educação Física.
11.6. Foto da quadra onde professores e alunos desenvolveram o projeto Pan-
Americano.
223
Anexo 12 – Dados do INEP para o ensino fundamental, matrículas, aprovação,
reprovação e abandono no ano de 1991.
224
225
226
227
228
Anexo 13 – Dados do INEP para o ensino fundamental, matrículas, aprovação,
reprovação e abandono no ano de 2005.
229
230
231
232
233
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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