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ELIANE OLIVEIRA MENDES QUINHONE
LETRAMENTO ESCOLAR E FORMAÇÃO DO LEITOR
CRÍTICO: UM ESTUDO SOBRE A REDE MUNICIPAL DE
CUIABÁ
Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT
Instituto de Linguagens - IL
Cuiabá
2008
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ELIANE OLIVEIRA MENDES QUINHONE
LETRAMENTO ESCOLAR E FORMAÇÃO DO LEITOR
CRÍTICO: UM ESTUDO SOBRE A REDE MUNICIPAL DE
CUIABÁ
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Estudos de Linguagem do Instituto
de Linguagens da Universidade Federal de Mato
Grosso, como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Estudos de Linguagem.
Área de concentração: Estudos Lingüísticos
Orientadora: Profª Drª Simone de Jesus Padilha
Co-orientadora: Profª Drª Cláudia G. Paes de
Barros
Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT
Instituto de Linguagens - IL
Cuiabá
2008
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ELIANE OLIVEIRA MENDES QUINHONE
LETRAMENTO ESCOLAR E FORMAÇÃO DO LEITOR
CRÍTICO: UM ESTUDO SOBRE A REDE MUNICIPAL DE
CUIABÁ
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Estudos de
Linguagem da Universidade Federal de Mato
Grosso, como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Estudos de Linguagem.
Orientadora: Profª Drª Simone de Jesus
Padilha
Co-orientadora: ProDrª Cláudia G. Paes de
Barros
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________________
Profª. Drª. Raquel Salek Fiad
Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP
__________________________________________________________
Profª. Drª. Cláudia Graziano Paes de Barros
Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT
____________________________________________________________
Profª. Drª. Simone de Jesus Padilha
Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT
4
Dedico este trabalho ao meu esposo, Luís, pelo grande
incentivo e apoio ao longo de mais essa jornada.
À minha mãe, que sempre me acolheu com carinho e
generosidade nos momentos mais difíceis.
Ao meu pai (in memoriam), doce presença em meu coração.
5
AGRADECIMENTOS
A Jesus, por estar sempre ao meu lado, iluminando meu caminho;
À minha orientadora, Professora Dra. Simone J. Padilha, pela doçura com a qual me
guiou através do universo bakhtiniano, obrigada por confiar no meu trabalho e pelo
respeito às minhas idéias;
À Prof.ª Acenil S. Prado Rosa, diretora da EMEB. Filogônio Correa, à prof.ª Marta, à
prof.ª Laudisséia, aos alunos do ano, ao Adão e aos demais profissionais da
citada escola, que sempre me receberam com carinho e atenção, disponibilizando
todas as informações que foram solicitadas;
Às professoras Doutoras Raquel Salek Fiad (UNICAMP-SP) e Claudia G. Paes de
Barros (UFMT), pela leitura de meu trabalho e sugestões valiosas nos exames de
qualificação;
Às professoras Judith, Marlene e Lílian (Instituto de Educação/ UFMT), pelo apoio e
pela confiança em meu trabalho;
À prof.ª Dr.ª Maria Rosa Petroni e aos demais docentes do Programa de Mestrado
em Estudos em Linguagem, pelas significativas contribuições teóricas que foram
dadas durante o curso;
À Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá, pela concessão do afastamento de
minhas funções docentes durante a realização dessa pesquisa.
Aos meus amigos da Secretaria Municipal de Educação: Ivone, Célia, Vanilda,
Edilene, Valderes e Enedir, pelo incentivo nos momentos difíceis;
À Eliane Albuquerque, Daniela Ambrósio, Moisés Dias e demais colegas da Diretoria
de Recursos Humanos/ SME/ Cuiabá, por acreditar na minha competência
profissional e por torcerem pelo meu sucesso;
Aos colegas de pós-graduação: Dalva, Marcos, Maribel, Marilena e Cristiane,
obrigada pela parceria durante este período de crescimento intelectual e,
principalmente, pelas relações de amizade que se fortaleceram a partir desse
processo;
À Silma, pelo exemplo de profissional, obrigada pela grande amizade que nos uniu,
que Jesus a proteja e abençoe sempre;
6
À Tânia, amiga e companheira na “jornada bakhtiniana”, obrigada pelo carinho e
pela paciência durante “nosso” período de “conflito cognitivo”;
À Edilene Queiroz, amiga de longa data, obrigada por estar sempre disposta a me
ajudar e que Jesus a conserve assim;
Às acadêmicas de Pedagogia/ UFMT, Débora Müller, Daniela, Fabiana, Sabrine e
Niciléia, pelo acesso aos dados do relatório de pesquisa por elas elaborado;
Aos meus alunos do Curso de Pedagogia, pelas mensagens de incentivo e pelo
imenso carinho.
À minha mãe, minha tia Nailza, meus avós maternos e aos meus irmãos, Elieth e
Ocimar, por acreditarem em mim e me apoiarem incondicionalmente;
Aos meus filhos Melisa e Christian, por trazerem alegria e amor à minha vida,
principalmente nos dias mais cansativos;
Ao Luís, meu esposo, pela admiração e pelo amor que sempre me dedicou.
Obrigada por acreditar na minha capacidade profissional, pela eterna paciência e por
estar sempre disposto a ajudar.
A todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta
pesquisa.
7
Eu vivo em um mundo de palavras do outro. E toda a minha vida é uma orientação
nesse mundo; é reação às palavras do outro (uma reação infinitamente
diversificada), a começar pela assimilação delas (no processo de domínio inicial do
discurso) e terminando na assimilação das riquezas da cultura humana (expressas
em palavras ou em outros materiais semióticos).
Mikhail Bakhtin
8
RESUMO
Esta pesquisa, fundamentada na teoria da enunciação bakhtiniana, discute a
influência das práticas de letramento escolar no processo de formação do leitor
proficiente. Assim, através da análise das capacidades de leitura demonstradas por
alunos do ano (3ª série) do Ensino Fundamental, de uma escola da rede
municipal de Cuiabá/MT, pretendemos contribuir para a melhoria da qualidade do
processo de ensino-aprendizagem de leitura. Constitui-se, portanto, em um trabalho
de natureza qualitativa que enfoca, principalmente, as noções bakhtinianas de
compreensão ativa, dialogismo e exotopia, as quais norteiam nossas reflexões
acerca das práticas de leitura realizadas na escola pesquisada, desvelando as
relações interdiscursivas entre a política educacional implementada pela Secretaria
de Educação e a situação encontrada no ambiente escolar. Os dados foram
coletados através da aplicação de questionários para investigar a formação da
professora e o letramento não-escolar de seus alunos, e de um instrumento
avaliativo para diagnosticar as capacidades de leitura construídas pelos discentes.
Em consonância com os demais estudos realizados acerca do mesmo tema, a
análise realizada mostrou que as práticas escolares de leitura pouco têm contribuído
para a construção das capacidades de leitura e, conseqüentemente, para a
formação de leitores críticos, uma vez que os discentes pesquisados demonstraram
grande dificuldade para compreender a unidade temática de gêneros textuais que
são comumente utilizados em sala de aula, como as tirinhas e as fábulas. Diante
desse contexto, acreditamos que a escola deveria deixar de utilizar a leitura como
estratégia didática e passar a visualizá-la como um objeto que possui conteúdos
específicos a serem ensinados, a saber, as capacidades de leitura. Além disso,
compreendemos que o tratamento didático dado aos textos poderia ser modificado,
incorporando o trabalho com os gêneros discursivos ao cotidiano escolar. Ao tratar
de uma realidade específica, a da rede municipal de Cuiabá, a pesquisa
desenvolvida poderá fornecer subsídios para que as propostas pedagógicas das
unidades escolares sejam repensadas, a fim de que possam incluir, efetivamente,
ações voltadas para a formação de leitores proficientes.
Palavras-chave: compreensão ativa, capacidades de leitura e letramento escolar.
9
ABSTRACT
This research, based on the theory of bakhtinian enunciation, discusses the influence
of the educational literacy practices in the process of formation of proficient reader.
Thus, by analysis of the reading skills demonstrated by students in the 4 th year of
the elementary school, in the municipal system in Cuiaba / MT, we intend to
contribute to improving the quality of the teaching-learning reading process. It is
therefore a work of qualitative nature that focuses mainly, the bakhtinian concepts of
active understanding, dialogism and exotopia, which guide our thinking about the
practice of reading held in the school searched, exposing discursive relations
between educational politics implemented by the Secretary of Education and the
situation found in the school environment. Data were collected using questionnaires
to investigate the formation of the teacher and non-school literacy of their students,
and evaluative test to diagnose the capabilities of reading constructed by students. In
line with other studies about the same subject, the analysis showed that the school
practices of reading have contributed too little to the building of the capacities of
reading and, consequently, for the formation of critical readers: the students
demonstrated a lot of difficulties to understand the thematic unit of discursive genres
that are commonly used in the classroom, such as comics (tirinhas) and fables. In
this context, we believe that the school should stop using the reading process as a
teaching strategy and move to view it as something that has specific content to be
taught, namely, the capacity of reading. Moreover, the treatment given to teaching
texts should be changed, incorporating work with the discourse genres to routine
school. As we are dealing with a specific reality, of a municipal school in Cuiabá, the
research developed could provide subsidies for the proposed teaching of the schools
is reconsidered so that may include, effectively, actions directed to the training of
readers.
Keywords: active understanding, skills of reading and educational literacy.
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................13
CAPÍTULO 1 – LETRAMENTO, LEITURA E PRÁTICA ESCOLAR........................19
1.1. Letramento (s).....................................................................................................20
1.1.2. Modelo Autônomo............................................................................................23
1.1.3. Modelo Ideológico............................................................................................24
1.2. Letramento Crítico...............................................................................................26
1. 3. Letramento Escolar............................................................................................28
1.4. Práticas de Leitura: das reflexões teóricas à leitura na escola...........................31
1.4.1. Modelo Ascendente ou bottom-up...................................................................32
1.4.2. Modelo Descendente (top-down) ou psicolingüístico.......................................33
1.4.3 Modelo Interativo...............................................................................................34
1.5. A leitura para a vertente enunciativo-discursiva (ancorada em Bakhtin)............37
1.5.1 As capacidades de leitura ................................................................................43
CAPÍTULO 2 ENSINO DE LEITURA: O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS
OFICIAIS....................................................................................................................49
2.1. O PCN de Língua Portuguesa (1º e 2º Ciclos)....................................................49
2.2. A Escola Sarã......................................................................................................63
2.2.1. Surge um novo registro avaliativo na rede municipal de Cuiabá: um olhar
sobre o “Dossiê Acadêmico”..................................................................................... 76
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA DE PESQUISA.....................................................81
11
3.1. Metodologia de Coleta de Dados........................................................................82
3.2. Descrição do locus .............................................................................................86
3.2.1. A biblioteca escolar..........................................................................................89
3.3. Os sujeitos da pesquisa......................................................................................90
3.3.1. A professora.....................................................................................................91
3.3.2. Os alunos do 4º ano.........................................................................................93
3.4. Os instrumentos de coleta de dados...................................................................95
3.4.1. Investigando o processo de formação da professora......................................96
3.4.2. Investigando o processo de letramento “não-escolar” dos alunos...................97
3.4.3. Investigando as capacidades de leitura dos alunos.........................................98
3.5. Metodologia de análise dos dados....................................................................101
CAPÍTULO 4 – EXERCITANDO O OLHAR EXOTÓPICO.....................................105
4.1. Algumas reflexões sobre a proposta pedagógica da rede municipal de Cuia
para o ensino de Leitura...........................................................................................106
4.1.2 Algumas reflexões sobre o Projeto Político Pedagógico da escola
pesquisada...............................................................................................................116
4.2. A importância do professor em uma práxis voltada para a formação do leitor
crítico........................................................................................................................122
CAPÍTULO 5 LETRAMENTO ESCOLAR E NÃO-ESCOLAR: EM BUSCA DE UM
DIAGNÓSTICO DA REALIDADE............................................................................128
5.1. Conhecendo um pouco das práticas de letramento construídas pelos alunos fora
do ambiente escolar.................................................................................................129
5.2. O diagnóstico das capacidades de leitura e o processo de letramento
escolar......................................................................................................................144
5.2.1. Um olhar exotópico acerca dos “erros” dos alunos pesquisados...................148
5.3. A formação do leitor e o letramento escolar......................................................157
12
CAPÍTULO 6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................166
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................175
APÊNDICES ............................................................................................................182
ANEXOS..................................................................................................................201
13
INTRODUÇÃO
Atualmente, no cenário educacional brasileiro, acentuaram-se as discussões acerca
da necessidade da elaboração de políticas públicas que visem à formação de
leitores proficientes. Essas reflexões se intensificaram na medida em que os
resultados de algumas avaliações institucionais (Prova Brasil e SAEB
1
) foram
divulgados, principalmente porque estes apontam para a dificuldade que os alunos
têm em interpretar textos de diferentes gêneros discursivos.
Segundo Relatório do SAEB/ 2005,
após quatro anos de escolarização, a média
mínima satisfatória seria de 200 pontos e, para estar próximo a este índice, o aluno
deveria demonstrar compreensão de textos de gêneros variados (anedotas,
pequenas narrativas, fábulas, textos informativos, histórias em quadrinhos); localizar
informações explícitas, identificar as personagens dos textos, distinguir fato de
opinião, compreender as relações de causa e conseqüência; perceber efeitos de
sentido a partir de sinais de pontuação e outras formas de notações. Assim, a média
brasileira de proficiência em Língua Portuguesa na série do Ensino Fundamental,
que era de 188,3 em 1995, após várias oscilações, caiu para 172,3 em 2005, sendo
que a rede municipal de Cuiabá, neste mesmo período e série, obteve resultado
inferior ao nacional, a saber: 165,1, denominado de nível crítico, no qual se
encontram os estudantes que não são leitores competentes e lêem de forma
truncada, apenas frases simples.
Nesse sentido, ao analisar o nível de letramento da população, os indicadores do
INAF/ 2005
2
também refletem essa realidade: apenas 26% dos 2002 sujeitos
entrevistados têm domínio pleno
3
das capacidades de leitura avaliadas.
1
A Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica/ SAEB foram criados pelo
MEC para avaliar o desempenho dos discentes que estão concluindo a e a séries do Ensino
Fundamental, nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática. Os dois são exames complementares,
pois enquanto o SAEB avalia por amostragem, a Prova Brasil é aplicada em todas as escolas
públicas localizadas em área urbana.
2
Indicador de Alfabetismo Funcional, criado pelo Instituto Paulo Montenegro, que avalia o nível de
letramento de jovens e adultos. O citado instituto é uma organização sem fins lucrativos que pertence
ao Grupo IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), tendo como foco a realização
de pesquisas na área educacional.
14
Sabemos que esses problemas são resultantes do processo sócio-histórico de
constituição do sistema educacional brasileiro e que, mesmo com a efetivação de
políticas públicas para a democratização do ensino, há, ainda, grandes dificuldades
para melhorar a qualidade da prática pedagógica desenvolvida nas escolas, pois
para a implementação de “novas” metodologias, faz-se necessário maior
investimento na formação dos professores.
Por outro lado, para sujeitos pertencentes às classes sociais mais desfavorecidas, a
escola, às vezes, pode ser a única “agência”
4
de letramento capaz de inseri-los na
cultura letrada. Desse modo, espera-se que o processo de escolarização forneça
instrumentos para que todos os cidadãos possam participar, autonomamente, de
situações nas quais a escrita e a leitura sejam necessárias.
Ao analisarmos os dados das pesquisas oficiais (SAEB e Prova Brasil), podemos
inferir que a escola não está conseguindo realizar essa tarefa, visto que grande
parte dos jovens ainda abandona os estudos sem concluir o Ensino Fundamental ou
mesmo sem ter consolidado algumas “capacidades” que permitam o domínio da
leitura e da escrita
5
.
Na década de 80, o problema era que os alunos não gostavam de ler ou não tinham
acesso a livros. Hoje, esta realidade está mudando e isto pode ser comprovado por
meio dos dados coletados na pesquisa do INAF/2005 (p. 18):
Quase 90% dos entrevistados pelo INAF têm a bíblia ou outros
livros religiosos em suas casas. Além dos livros escolares e
infantis, o dicionário também já está na casa de pelo menos ¾
da população.
A relação entre o nível de escolaridade e o bito de leitura também foi comentada
no referido documento, visto que somente entre pessoas alfabetizadas no nível
pleno, foi encontrada uma maioria de leitores que diversifica seus interesses (33%
costumam ler dois gêneros e 34% três ou mais).
3
Isso significa dizer que somente 26% da população avaliada conseguem ler textos mais longos,
localizar e relacionar mais de uma informação, comparar vários textos, identificar fontes.
4
As agências podem ser consideradas como “espaços” nos quais ocorrem formas de interação do
indivíduo com o mundo, sejam estas por meio da leitura e/ou da escrita. A principal agência de
letramento é a escola, mas ao seu lado temos a família e outras instituições de caráter social, político
ou religioso.
5
Dados coletados do Relatório do INAF/2005.
15
Todavia, ainda que o índice de analfabetismo tenha diminuído e que o brasileiro
esteja passando mais tempo na escola, os resultados das avaliações (Prova Brasil,
SAEB, INAF) têm demonstrado que os alunos não conseguem interpretar
6
, de fato, o
que estão lendo, fixando-se apenas em informações que estiverem explícitas no
texto.
Diante desses pressupostos, preocupa-nos a situação da rede municipal de ensino
de Cuiabá, afinal, boa parte da nossa trajetória profissional se mistura à história do
sistema municipal, a saber, em 1991
7
, passamos a ser professora das séries iniciais
na citada rede e, portanto, pudemos vivenciar grande parte do processo que
culminou com a mudança do regime seriado para a organização por Ciclos de
Formação.
no período de 1995 a 2005, exercemos diversas funções na Secretaria Municipal
de Educação de Cuiabá, atuando, ora como assessora pedagógica, ora como
formadora, ministrando cursos na área de Linguagem. Conseqüentemente, essas
experiências serviram como base para consolidar nossa formação continuada e para
nos dar uma ampla visão da rede.
Desse modo, pensamos ser pertinente esclarecer que, nos últimos 07 anos,
posteriores à implantação dos Ciclos de Formação, ocorreram várias mudanças,
principalmente de gestores na Secretaria de Educação e isso acabou por repercutir
negativamente na efetivação das políticas educacionais, pois, como houve uma
descontinuidade nos projetos de formação continuada, a situação das escolas
acabou se agravando. Um bom exemplo disso foi o surgimento de movimentos,
dentro do sistema municipal, a favor do “retorno” ao regime de seriação.
Em face dessa situação, considerando as avaliações realizadas pelo MEC e os
dados do INAF, acreditamos ser relevante investigar algumas questões relacionadas
a essa realidade específica:
6
O Relatório do INAF/ 2007 mostra que, dentre os entrevistados que cursaram da à séries,
apenas 20% pode ser considerado plenamente alfabetizado, enquanto que a maioria se enquadra no
nível básico de alfabetismo e cerca de 26% dos que completaram esse nível de ensino ainda
permanecem no nível rudimentar, com sérias limitações tanto em suas habilidades de leitura/escrita,
quanto em Matemática.
7
Neste mesmo ano, recém saída do curso de Magistério, a pesquisadora começou a cursar Letras,
na Universidade Federal de Mato Grosso.
16
Qual a proposta da rede municipal de Cuiabá para o ensino de leitura nos
anos iniciais do Ensino Fundamental?
Como a concepção de ensino-aprendizagem de leitura expressa no PCN de
Língua Portuguesa (1º e Ciclos) se reflete nos documentos oficiais da
Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá e no Projeto Político-
pedagógico da escola pesquisada?
Quais são as capacidades de leitura construídas pelos discentes? Quais
capacidades são priorizadas pela escola?
Quais as relações existentes entre: as capacidades de leitura demonstradas
pelos alunos e o letramento não escolar?
A proposta de ensino de leitura implementada pela rede municipal de Cuia
está voltada para a formação do leitor crítico?
Desse modo, para termos uma “amostra” da realidade, o estudo foi centralizado em
uma única escola, selecionada, entre outros motivos, por ter participado de um
programa
8
de formação continuada que enfatiza o trabalho com os gêneros textuais.
Destacamos, ainda, que o citado programa foi coordenado pela pesquisadora, fato
este que a aproximou ainda mais da realidade do locus da pesquisa.
No entanto, se por um lado, isso facilitou o acesso ao material de pesquisa, por
outro, trouxe também alguns problemas, pois em várias interações realizadas no
ambiente escolar, percebemos que nossa imagem
9
estava imbricada à da Secretaria
de Educação e que algumas vezes as pessoas se sentiam obrigadas a fornecer as
informações solicitadas.
Outro fator importante foi o esforço despendido pela pesquisadora para se distanciar
da realidade estudada e buscar uma “nova” forma de olhar a rede municipal.
Reconhecemos que isso não foi uma tarefa fácil, pois, em diversos momentos, a
fonte de informações foi a própria pesquisadora, principalmente no relato acerca da
“caminhada” histórica da rede municipal. Tendo em vista essas peculiaridades no
percurso da pesquisa, organizamos nosso trabalho da seguinte forma:
8
Implantado em parceria com o MEC, o Programa de Gestão da Aprendizagem Escolar/ Séries
Iniciais/ Gestar I atendeu 07 escolas municipais, no período de 2001 a 2003.
9
Ao longo da dissertação, exemplificaremos melhor como isso ocorreu durante a coleta de dados.
17
Capítulo 1: constitui-se de um breve resgate histórico acerca das concepções
de leitura e letramento que fundamentam as práticas de ensino-
aprendizagem de leitura implementadas pelas escolas. Além disso, nele,
explicitaremos alguns conceitos bakhtinianos que serão utilizados na análise
dos dados;
Capítulo 2: apresenta uma análise dos documentos oficiais que norteiam o
processo de ensino-aprendizagem de leitura nas escolas municipais de
Cuiabá: o PCN de ngua Portuguesa (1º e Ciclos), os Referenciais
Curriculares da Escola Ciclada/ Cuiabá e o Dossiê Acadêmico do Aluno
10
;
Capítulo 3: aborda a metodologia utilizada tanto para a coleta, quanto para a
análise dos dados e descreve os instrumentos elaborados para a realização
da pesquisa de campo, apresentando, também, o locus e os sujeitos
estudados.
Capítulo 4: trata-se da análise dos dados coletados acerca da política
educacional da Secretaria Municipal/ Cuiabá e da Proposta Político
Pedagógica da escola pesquisada, a fim de situarmos o trabalho
desenvolvido em sala de aula no que se refere à formação de leitores
proficientes;
Capítulo 5: expõe os dados que se referem ao letramento não escolar e às
capacidades de leitura construídas pelos alunos;
Capítulo 6: delineia as considerações finais sobre a realidade estudada e
indica algumas sugestões para os possíveis problemas que forem
detectados.
Após o referido capítulo, elencamos as diversas referências bibliográficas
consultadas durante a elaboração dessa dissertação.
Isto posto, ainda que os contextos analisados sejam distintos, ressaltamos que o
presente trabalho mantém estreito diálogo com os diversos estudos realizados
acerca do ensino de leitura no Ensino Fundamental, atendo-se, aqui, à situação
específica da rede municipal de ensino de Cuiabá. Nesse aspecto, a tentativa de
mapear e desvelar a realidade do sistema municipal objetiva contribuir, de alguma
10
Instrumento utilizado para registro avaliativo dos alunos.
18
forma, para a construção de propostas pedagógicas voltadas para a formação do
leitor crítico.
Assim, as possíveis críticas irão assumir um caráter construtivo, pois ao partirem
tanto da nossa experiência dentro da própria rede, como da análise dos dados, as
reflexões aqui suscitadas fornecerão subsídios concretos para a elaboração de
ações educativas que visem à melhoria da qualidade do ensino oferecido pela rede
municipal.
19
Capítulo 1: Letramento, Leitura e Prática Escolar
No contexto educacional brasileiro, a partir da década de 70, ocorreram muitas
transformações nas concepções de linguagem e de ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa, uma vez que muitas pesquisas na área das Ciências Lingüísticas
passaram a direcionar seu foco para as práticas desenvolvidas em sala de aula.
Assim, de modo geral, podemos afirmar que tivemos dois períodos de mudança de
paradigma:
período - teve início na década de 80 com a publicação do livro “O texto na
sala de aula”, organizado por Geraldi. A citada obra pode ser considerada como
marco inicial do trabalho com a diversidade textual, pois com linguagem
“acessível” aos professores, estimulava a utilização de textos (de diversas
tipologias) como objeto para o ensino de ngua e não como pretexto para
exercícios gramaticais;
período: ainda em curso, começou na década de 90 e se caracterizou por um
aumento na divulgação dos estudos de Lingüística Aplicada ao ensino de
línguas, os quais influenciaram diretamente na elaboração dos PCN de Língua
Portuguesa (1997/ 1998)
11
, provocando grandes mudanças ao trazer diversos
conceitos como: gênero discursivo, variedade lingüística, competência discursiva,
letramento, análise lingüística
12
, etc., para a sala de aula. Essas pesquisas
também têm influenciado os livros didáticos, logo, seria natural que o estudo
desses temas fizesse parte da formação dos professores que atuam na
Educação Básica (1º, 2º, 3º e Ciclos). Todavia, ao que nos parece, a maioria
dos cursos de graduação oferecidos (Letras e Pedagogia, principalmente) ainda
11
Em 1997, foram divulgados os PCN de 1º e 2º Ciclos e, em 1998, o de 3º e 4º Ciclos.
12
Ao longo desta pesquisa, iremos explicitar alguns destes conceitos.
20
apresenta problemas para articular essa formação inicial com as teorias atuais e
sua respectiva transposição didática.
Nesse contexto, buscaremos refletir sobre os pressupostos teóricos que permeiam o
processo de letramento, uma vez que estes se encontram imbricados aos temas
centrais desta pesquisa (o processo de ensino-aprendizagem de leitura e o
letramento escolar).
Sabemos que a concepção de letramento é complexa, principalmente se a
analisarmos em seus aspectos políticos e ideológicos. Portanto, como forma de
aprofundar e ampliar as discussões acerca desse termo e analisar criticamente as
práticas escolares de leitura, utilizaremos como contraponto as teorias enunciativo-
discursivas, em sua vertente bakhtiniana.
Consideraremos ainda uma aproximação entre o modelo ideológico de letramento e
a visão bakhtiniana de linguagem, principalmente no que se refere à relevância que
o contexto sócio-cultural assume no ato de produção e compreensão de enunciados.
Dessa forma, poderemos entender melhor as práticas escolares de letramento e
como estas interferem no processo de formação do leitor.
1.1 Letramento (s)
Atualmente, um dos grandes desafios das sociedades modernas é a universalização
do acesso às práticas sociais de leitura e escrita, visto que os índices de
analfabetismo vêm diminuindo gradativamente em diversos países, inclusive no
Brasil, conforme demonstra o trecho que extraímos do relatório do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística/ IBGE (2003):
O aumento da escolarização das crianças e adolescentes vem
contribuindo para a redução do analfabetismo e elevação do
nível de instrução da população. Em todo o país, a taxa de
analfabetismo das pessoas de 10 anos ou mais de idade caiu
de 15,6%, em 1993, para 10,6%, em 2003. Na faixa etária de
10 a 14 anos de idade, em que se espera que a criança esteja
pelo menos alfabetizada, a taxa de analfabetismo baixou de
11,3% para 3,5%, nesses dez anos. No Nordeste, no entanto,
este indicador estava em 26,7%, em 1993, e decresceu para
8,1%, em 2003. Apesar da expressiva melhoria na região, este
último resultado ainda ficou muito distanciado do patamar
21
alcançado pelas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste: 0,8%,
1,0% e 1,3%, respectivamente.
Ainda segundo o citado relatório, esses índices coincidem com a diminuição do
percentual (de 21,8% para 8,8%, em todo Brasil) de crianças e adolescentes com
idades entre 5 e 17 anos que não freqüentavam a escola.
Esse mesmo processo de erradicação e/ou diminuição dos índices de analfabetismo
ocorreu em diversos países, os quais, a partir da década de 80, começaram a
perceber que a condição de “estar alfabetizado” não garantia às pessoas o uso da
leitura e da escrita enquanto práticas sociais, ocorridas nos mais variados contextos
interacionais. Assim, países como França, Portugal, Inglaterra e Estados Unidos
passaram a se preocupar com os usos sociais da escrita, ocasionando, de certo
modo, a “invenção” do termo letramento e, nesse sentido, concordamos com Soares
(2004: p.06):
É curioso que tenha ocorrido em um mesmo momento
histórico, em sociedades distanciadas tanto geograficamente,
quanto socioeconomicamente e culturalmente, a necessidade
de reconhecer e nomear práticas sociais de leitura e de escrita
mais avançadas e complexas do que as práticas do ler e do
escrever resultantes da aprendizagem do sistema de escrita.
É claro que o contexto e as causas que provocaram esse surgimento são diferentes
em cada país, visto que na França, Inglaterra e Estados Unidos, por exemplo, o foco
do problema era o não domínio das competências de uso da leitura e da escrita;
no Brasil, a dificuldade centrava-se no processo inicial de aprendizagem do sistema
de escrita, ou seja, no processo de alfabetização. A preocupação principal era a de
encontrar uma forma alfabetizar de maneira significativa, fugindo da simples
decodificação e criando possibilidades de uso concreto da leitura e da escrita. Diante
disso, retornamos a Soares (2004: p.07):
No Brasil, porém, o movimento se deu, de certa forma, em
direção contrária: o despertar para a importância e necessidade
de habilidades para o uso competente da leitura e da escrita
tem sua origem vinculada à aprendizagem inicial da escrita,
desenvolvendo-se basicamente a partir de um questionamento
do conceito de alfabetização. (...), no Brasil os conceitos de
alfabetização e letramento se mesclam, se superpõem,
22
freqüentemente se confundem. Esse enraizamento do conceito
de letramento no conceito de alfabetização pode ser detectado
tomando-se para análise, fontes como os censos demográficos,
a mídia, a produção acadêmica.
Destacamos, também, que, no Brasil, o termo letramento surgiu, pela primeira vez,
em um livro de Mary Kato (1986)
13
, “No mundo da escrita: uma perspectiva
psicolingüística”, situando a linguagem escrita enquanto prática social. Todavia, foi
somente a partir da década de 90 que o termo letramento tornou-se necessário em
qualquer discussão ou estudo cujo foco estivesse direcionado às práticas de leitura,
escrita e alfabetização. Assim, diversas pesquisas foram realizadas a fim de
compreender melhor as especificidades do processo de letramento, sua influência
na prática escolar e sua interface com as vertentes teóricas que tratam da
alfabetização. Logo, como “fruto” de todo esse processo, o conceito de letramento
ganhou novas dimensões: primeiramente, como vimos, centrava-se nas práticas
sociais de escrita e depois passou a incluir, também, as práticas de leitura.
Atualmente, letramento pode ser definido como o processo de utilização da leitura e
da escrita nas práticas sociais realizadas em contextos espeficos, com objetivos
específicos.
Nesta perspectiva, podemos afirmar que existem diferentes “tipos” de letramento, ou
seja, para cada prática social (de leitura ou de escrita) existente, haverá um “tipo” de
letramento a ser adquirido pelo sujeito, sendo que, para análise dos dados coletados
durante a pesquisa de campo, tomaremos como base o processo de letramento
escolar
14
e a esse respeito, concordamos com Rojo (2001: p.235):
(...) As práticas letradas escolares passam, então, a ser apenas
um tipo de prática social de letramento, que, embora continue
sendo, nas sociedades complexas, um tipo dominante
relativamente majoritário e abrangente -, desenvolve apenas
algumas capacidades e não outras.
13
Kato (1986: p.07) declarou: Acredito ainda que a chamada norma-padrão, ou língua falada culta é
conseqüência do letramento, motivo por que, indiretamente, é função da escola desenvolver no
aluno o domínio da linguagem falada institucionalmente aceita.
14
Devido à sua relevância para esse trabalho, detalharemos o conceito de letramento escolar nas
próximas páginas.
23
Todavia, para compreendermos melhor como as diferentes concepções de
letramento influenciam no trabalho pedagógico, pensamos ser necessário
comentarmos sobre os aspectos teóricos presentes nos atuais modelos de
letramento propostos por Street (1984) e que serão descritos abaixo.
1.1.2 Modelo Autônomo:
Neste modelo, a escrita é vista como um produto acabado, pois seu funcionamento
é orientado pela lógica e não pelo contexto e, portanto:
(...) pressupõe que há apenas uma maneira de o letramento ser
desenvolvido, sendo que essa forma está associada quase que
causalmente com o progresso, a civilização, a mobilidade
social. (...) A característica de “autonomia” refere-se ao fato de
que a escrita seria, nesse modelo, um produto completo em si
mesmo, que não estaria preso ao contexto de sua produção
para ser interpretado; o processo de interpretação estaria
determinado pelo funcionamento lógico interno ao texto escrito
(...). (KLEIMAN, 1995: p.21-22)
Autores como Luria (1976), Goody (1977), Havelock (1989) e Olson (1994) são
considerados representantes dessa abordagem que, como podemos perceber, não
considera os aspectos sociais e culturais envolvidos no processo de letramento,
associando o desenvolvimento cognitivo à aquisição da escrita. Portanto, a
responsabilidade pelo fracasso no processo de escolarização é do indivíduo que,
geralmente, pertence às classes sociais mais desfavorecidas.
A partir dessa lógica, surgem vários problemas, pois ao compararmos grupos não-
letrados com grupos letrados, estes últimos podem ser determinados como o padrão
ideal a ser alcançado por todos os demais. Lembramos que isso contribui para
reforçar o preconceito, “chegando até a criar duas espécies, cognitivamente
distintas: os que sabem ler e os que não sabem” (Kleiman, 1995: p.27).
Ao entender o processo de letramento como independente das práticas discursivas
às quais a escrita estiver integrada, corre-se o risco de privilegiar somente as
situações que levem à produção do texto escrito, o que resultará na dicotomização
entre oralidade e escrita.
24
No entanto, se partirmos do pressuposto que a prática social é constitutiva da
linguagem, perceberemos que a dimensão interpessoal não pode ser
desconsiderada durante o processo de produção e interpretação de enunciados.
Assim, concordamos com Kleiman (1995: p.28):
(...) as diferenças são bem mais relativas quando o foco não
está nas diferenças e quando a concepção não é polar. Em
primeiro lugar, porque nem toda escrita é formal e planejada,
nem toda oralidade é informal e sem planejamento. As cartas
pessoais, por exemplo, têm mais semelhanças com a
conversação do que a conversação tem com uma palestra
inaugural, pois esta última, muitas vezes, parece ter apenas a
modalidade isto é, o fato de ser falada em comum com
outras formas orais.
Neste sentido, as pesquisas desenvolvidas acerca do letramento escolar têm
demonstrado a grande ênfase dada às práticas que envolvem a escrita, em
detrimento das atividades que envolvam a leitura ou o estudo dos gêneros orais.
Conseqüentemente, como poderemos comprovar, mais adiante, é o modelo
autônomo que parece permear as práticas de ensino desenvolvidas nas unidades
escolares, tanto públicas como privadas, fato este que irá determinar as
características que os eventos de letramento assumirão no ambiente escolar.
1.1.3 Modelo Ideológico:
Nesta vertente, as práticas de letramento somente podem ser compreendidas em
relação ao contexto sócio-cultural que as originaram, imbricadas às estruturas de
poder estabelecidas na sociedade, assumindo, desse modo, significados específicos
a determinados contextos; o que nos leva a constatar que não uma relação de
causa e consequência entre letramento e progresso, ascensão social ou
modernidade. Portanto, ao invés de dividir a sociedade em dois grupos, os que
sabem e os que não sabem ler, aumentando as desigualdades sociais, neste
modelo as práticas de letramento realizadas por grupos específicos são investigadas
a partir de suas relações com as estruturas culturais e de poder existentes na
sociedade. Conseqüentemente, a cada situação interacional, teremos tipos
diferentes de “eventos de letramento”, ou seja, situações nas quais a escrita e a
25
leitura serão os instrumentos utilizados na construção e/ou negociação de sentidos
entre os interlocutores.
Isto posto, o “sujeito letrado” seaquele que se apropriou da leitura e da escrita,
utilizando-as, eficientemente, nas práticas sociais das quais participa. Por isso,
mesmo aqueles que não dominam o código lingüístico, mas se envolvem em
práticas que demandam a leitura ou a escrita, adquirem determinados tipos e/ou
níveis de letramento. Ao considerarmos essas reflexões, podemos concluir que o
conceito de letramento vai além do simples uso da leitura e da escrita para atender
às exigências da sociedade e, neste aspecto, concordamos com Soares (1998: p.
74):
(...) letramento não pode ser considerado um “instrumento”
neutro a ser usado nas práticas sociais quando exigido, mas é
essencialmente um conjunto de práticas socialmente
construídas que envolvem a leitura e a escrita, geradas por
processos sociais mais amplos, e responsáveis por reforçar ou
questionar valores, tradições e formas de distribuição de poder
presentes nos contextos sociais.
Como podemos perceber, no cerne das concepções que constituem o modelo
ideológico, encontramos as teorias enunciativo-discursivas, as quais buscam romper
com a dicotomia entre oralidade e escrita, concebendo a linguagem o um sistema
autônomo de regras, mas como constituinte e constituidora dos sujeitos. Portanto,
língua e linguagem estão vinculadas às práticas sociais, sendo que destas não
podem ser dissociadas e somente em relação a estas podem ser analisadas.
Vislumbramos nesse arcabouço teórico uma aproximação com as idéias de Bakhtin
e seu círculo, pois, como vimos, a linguagem passou a ser compreendida enquanto
fenômeno social, histórico e ideológico, sendo assim, os enunciados o podem ser
compreendidos fora desse vínculo com uma situação concreta de comunicação, ou
ainda, conforme o autor (1929: p.99):
A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um
sentido ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos
as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em
nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.
26
Em resumo, o processo de construção dos significados ocorre somente através da
relação dialógica entre os interlocutores, nas mais variadas situações comunicativas
ou em eventos de letramento, sócio-historicamente situados.
Assim, considerando essa fundamentação epistemológica, o modelo ideológico de
letramento está presente, também, nos estudos de Gee (1990), Graff (1979), Street
(1984), Kleiman (1995), Rojo (1994), Schneuwly (1994) Scribner & Cole (1981) e
Signorini (1995).
1.2 Letramento Crítico:
Atualmente, compartilhando do mesmo arcabouço teórico que o modelo ideológico,
uma terceira visão - o letramento crítico, que vem ganhando espaço nos
estudos acadêmicos e nas pesquisas
15
sobre o ensino de línguas, principalmente de
língua estrangeira.
Esta abordagem está fundamentada em autores como Freire (1987), Fehring e
Green (2001) e busca ampliar os pressupostos do modelo ideológico, pois além de
considerar os aspectos acima descritos, preocupa-se em estudar a influência das
relações de poder em eventos de letramento, discutindo a questão política, social e
cultural que envolve esses processos.
No bojo desses pressupostos, ressaltamos a forte influência de Paulo Freire,
especialmente das idéias expressas em seu livro Pedagogia do Oprimido (1987), no
qual o autor ressalta que homem deve aprender a ser “dono” da sua própria palavra
e não repetir, simplesmente, a do outro. Nesse sentido, a palavra será o instrumento
através do qual o homem se tornará, plenamente, sujeito e por meio de situações
concretas de comunicação, permeadas pelo diálogo, o indivíduo se transformará em
criador e sujeito de sua própria história. Isto posto, toda ação educativa deve ser
problematizadora e, por isso, flexível, participativa e dialógica.
15
Já existem vários grupos desenvolvendo pesquisas sobre letramento crítico, principalmente no IEL/
UNICAMP.
27
Diante disso, constatamos que o modelo ideológico e o letramento crítico não se
opõem: ao contrário, se complementam, sendo difícil estabelecer uma diferença
concreta entre ambos, a não ser a de que, neste último, as práticas de letramento
devem estar necessariamente voltadas para a transformação da sociedade. Logo, o
objetivo maior do processo de escolarização seria ampliar a visão de mundo dos
alunos para além de suas comunidades lingüísticas, possibilitando a construção da
autonomia, da reflexão crítica com vistas à transformação de seu ambiente social.
O mencionado objetivo (formar cidadão críticos
16
) norteia, também, os Parâmetros
Curriculares Nacionais/ MEC e, na área de Língua Portuguesa, se reflete na adoção
dos gêneros discursivos como objeto de ensino e como meio para alcançar a
competência discursiva
17
.
Assim, como dissemos, este fato contribuiu para disseminar as teorias que, até o
momento, circulavam apenas nas esferas acadêmicas. No entanto, embora o
conceito de gêneros já apareça nos PCN de 1º e 2º Ciclos
18
(1997), foi somente com
a publicação dos PCN de Língua Portuguesa/ e Ciclos (1998) que as
discussões acerca de sua “didatização” se ampliaram, passando, inclusive, a
modificar a organização de muitos livros didáticos, por conta das exigências do
Programa Nacional de Avaliação do Livro Didático (PNLD), o que acabou por afetar,
também, os professores.
Acreditamos que o trabalho pedagógico com os gêneros permite a inserção da
concepção de letramento nas práticas escolares, atenuando a polarização entre
oralidade e escrita, as quais, segundo Kleiman (1995: p.30), passariam a ser
consideradas sob:
(...) Um olhar que veja a linguagem oral e a escrita não através
das diferenças formais, mas através das semelhanças
constitutivas, permitindo que pensemos a aquisição da escrita
como um processo que continuidade ao desenvolvimento
lingüístico da criança, substituindo o processo de ruptura, que
subjaz e determina a práxis escolar.
16
A dissertação de Mestrado de Laura Figueiredo (2005), intitulada Gêneros discursivos/ textuais e
cidadania: um estudo comparativo entre os PCN de Língua Portuguesa e os Parâmetros em Ação,
discute com profundidade o conceito de cidadania presente nos referidos documentos.
17
A definição desse termo será abordada nas próximas páginas.
18
Ao longo dos PCN de Língua Portuguesa/ e 2º Ciclos, a proposta de gêneros parece ter sido
reduzida ao trabalho com diversidade textual.
28
Um fato, entretanto, desperta a atenção: se a escola possui a função de promover a
formação de sujeitos “capazes de se posicionar de maneira crítica, responsável e
construtiva nas diferentes situações sociais (...)”, segundo consta nos PCN (in
Objetivos para o Ensino Fundamental, p. 07), surge o seguinte questionamento:
como fazer com que a escola perceba a inconsistência existente entre seus
objetivos e as práticas de letramento que ela oferece aos alunos?
Ao longo desta dissertação, refletiremos, também, acerca dos efeitos que as práticas
de letramento escolar têm provocado no processo de escolarização.
1.3 Letramento Escolar:
Sabemos que as práticas de letramento têm início antes mesmo do processo de
escolarização formal, no momento em que as crianças participam de diferentes
eventos de letramento, ou seja, de situações nas quais o uso efetivo da leitura e da
escrita é fundamental para a construção de sentido, por exemplo, quando os pais
levam seus filhos ao supermercado, estes são estimulados a “ler” os rótulos das
embalagens, passando, com o tempo, a identificar os produtos consumidos pela
família, mesmo sem saber decodificar o que está escrito na embalagem.
Isso faz com que a escola, ainda que desempenhe papel fundamental nesse
processo, não seja a única “agência” responsável pelo letramento dos alunos.
Todavia, para grande parte dos professores, o pensamento corrente é aquele que
vincula alfabetização, letramento e escolarização como processos interdependentes
e indissociáveis, isto é, permanece a idéia de que tanto o processo de letramento,
quanto o de alfabetização são decorrentes da escolarização.
No cerne destas discussões, temos a assertiva de que cabe à escola
(fundamentalmente) a tarefa de proporcionar aos alunos a aquisição inicial do
sistema de escrita, ou melhor, promover a alfabetização, propriamente dita. Este fato
se confronta com a realidade, pois, como dissemos, a escola é apenas uma das
instâncias onde podemos aprender a “ler e escrever”, assim como ocorre no caso do
processo de letramento. No entanto, embora existam relações entre alfabetização e
letramento, devemos ter clareza de que ambos possuem naturezas distintas e a
esse respeito, nos reportaremos a Soares (1998: p.95):
29
Do processo de alfabetização pode-se esperar que resulte, ao
fim de determinado tempo de aprendizagem, em geral pré-
fixado, um “produto” que se pode reconhecer, cuja aquisição ou
não, atesta ou nega o processo de escolarização; ao contrário,
o processo de letramento jamais chega a um “produto” final, é
sempre e permanentemente um “processo”, e não há como
decidir em que ponto do processo o iletrado se torna letrado.
Diante disso, a alfabetização, muitas vezes, se restringe à aquisição da escrita e das
habilidades necessárias à decodificação. no processo de letramento, destacam-
se as práticas sociais mediadas pela escrita e pela leitura, para as quais nem
sempre é necessário o domínio do sistema de escrita.
Face a estas reflexões, podemos constatar o nível de complexidade presente nas
relações entre letramento, alfabetização e escolarização, o que nos levou ao estudo
de um “tipo” de letramento, em especial - o escolar. Assim, concordamos com Rojo
(2001: p. 244):
Escola é letramento e dele decorre, quer suas práticas sejam
orais ou escritas; quer haja ou não texto escrito sendo utilizado
na sala de aula. Logo, é admitida a forma composicional
adjetiva: “letramento escolar”. Ou seja, não cabe investigar qual
é a “variável dependente” escola ou letramento mas cabe
enfocar o funcionamento e a tessitura particular do letramento
na escola, seus processos e produtos.
A autora destaca, ainda, que o processo de escolarização brasileiro não tem
possibilitado a formação da competência discursiva
19
dos alunos, pois as práticas de
leitura no letramento escolar enfatizam apenas algumas (poucas) capacidades
exigidas nas práticas sociais, concentrando-se naquelas necessárias ao “ler para
estudar”, o que pode ser considerado como um processo de repetir, de revozear
falas e textos de autor (idade) escolar, científica que devem ser entendidos e
memorizados para que o currículo se cumpra” (Rojo, 2004: p.1).
Desperta-nos a atenção o fato de que os referidos procedimentos o comuns e
ocorrem em todas as disciplinas curriculares, através de atividades direcionadas à
19
É a capacidade de utilizar a linguagem, oral ou escrita, em diversos ambientes discursivos,
manejando os diferentes gêneros discursivos, de acordo com a necessidade de interação social.
(Baltar, 2004: p. 5).
30
localização de informação, as quais devem ser repetidas ou copiadas em
questionários, orais ou escritos.
Logo, parece haver uma contradição entre a função da escola enquanto agência de
letramento, o objetivo expresso nas propostas pedagógicas (educar para a
cidadania) e as práticas letradas construídas nesse espaço educativo ou, de acordo
com Barbosa, (2001: p.70):
(...) Isso gera uma contradição interna ao papel da escola,
atribuído socialmente, como uma agenciadora de letramentos,
pois, nesse caso, a escola cobraria algo o domínio de certas
práticas letradas sem efetivamente “ensiná-las” a todos os
seus alunos (apenas colaboraria para o desenvolvimento
daqueles que possuem contato com essas práticas), o que
deveria ser um dos seus objetivos principais, numa perspectiva
democratizante.
Por exemplo: a escola se propõe a formar alunos críticos, no entanto as atividades
de interpretação de texto, geralmente, se restringem a questões de localização de
informação, não exigindo maiores reflexões acerca do que foi lido. Todavia, nas
diversas áreas do conhecimento, exige-se que os discentes compreendam gráficos,
mapas, tabelas, etc., ações estas que requerem capacidades de leitura distintas e
que, muitas vezes, não são trabalhadas pela escola.
Esse tipo de prática pedagógica não estimula o desenvolvimento das capacidades
de leitura e escrita necessárias à participação efetiva em eventos de letramento
relacionados ao exercício da cidadania. Todavia, conforme dissemos antes, a
escola parece atribuir mais valor à linguagem escrita, deixando em segundo plano,
tanto o ensino de leitura, quanto o trabalho com a oralidade ou, mais propriamente,
com os gêneros orais. Além disso, continua priorizando os conhecimentos
gramaticais “transmitidos” de modo fragmentado e descontextualizado, chegando,
no máximo a trabalhar com a noção de tipologia textual.
Nesse sentido, confirma-se o que já havíamos abordado, ou seja, em decorrência de
uma visão “tradicional” de educação e de linguagem, ainda predominantes, ao longo
dos séculos, no sistema de ensino brasileiro, instituiu-se um “tipo” de letramento
escolar que se fundamenta no modelo autônomo. Esses pressupostos teóricos
fazem com que a maioria das práticas pedagógicas desenvolvidas nas escolas
enfatize a leitura como decodificação de signos lingüísticos, uma vez que a
31
capacidade de compreender textos é entendida como mera repetição dos
significados literais. Desse modo, dentro desta lógica, ao final do processo, o aluno
que chegar à interpretação autorizada pelo autor e/ou pelo professor terá sucesso
em sua vida escolar.
As práticas pedagógicas implementadas a partir desta visão de ensino acabam por
reforçar a manutenção das desigualdades sociais, contribuindo para a formação de
sujeitos passivos, habituados a não discordar e a aceitar opiniões alheias sem
refletir ou se posicionar diante delas.
Acreditamos que grande parte desses problemas seja produto da falta de
continuidade nos programas de formação oferecidos aos docentes pelo governo.
Portanto, mesmo com o aumento do número de pesquisas acerca dos processos de
alfabetização, letramento e leitura, o conhecimento por elas produzido parece não
chegar
20
à sala de aula. Por outro lado, se considerarmos que, muitas vezes, o
próprio professor também é fruto do “ensino tradicional”, podemos compreender os
motivos pelos quais muitos resistem às mudanças, afinal é mais fácil reproduzir
práticas cristalizadas, sem a devida reflexão, do que se “aventurar” com a
utilização de “novas” metodologias.
Nesse contexto, para compreender melhor o trabalho desenvolvido pelas escolas,
pensamos ser oportuno discutirmos, também, as concepções de ensino-
aprendizagem de leitura e suas interfaces com os modelos de letramento.
1.4 Práticas de leitura: das reflexões teóricas à leitura na escola.
O ensino de leitura esteve durante muito tempo vinculado ao processo de
alfabetização e, somente a partir da década de 70, conseguiu alcançar o “status” de
campo de investigação metodológica. Nesse período, segundo Mary Kato (1986), as
pesquisas realizadas sobre leitura instrumental em Língua Inglesa contribuíram
bastante para a compreensão dos processos cognitivos envolvidos no ato de ler,
20
Ou ainda, as teorias podem chegar de modo incipiente e/ou fragmentado, sem produzir efeitos
concretos na práxis educativa desenvolvida pelas escolas.
32
pois comprovaram que as dificuldades de leitura dos alunos não se referiam
especificamente ao desconhecimento do idioma e, sim, a uma dificuldade de
interação com o texto escrito. Paralelamente a esses estudos, desenvolveu-se a
concepção de língua enquanto código e do sujeito como “sujeito cognitivo”, dando
origem aos modelos cognitivos de leitura, que:
Em comum, sustentam a idéia da mente humana como um
processador de informações que recebe, armazena, recupera,
transforma e transmite informação, variando nos modos de
descrever esses processamentos quanto aos usos e hierarquia
de regras explícitas que determinam a manipulação de
símbolos ou de maneira serial ou de modo paralelo ou de modo
circular, a que correspondem respectivamente os modelos de
leitura ascendente (bottom up), descendente (top down) e
interativo. (JURADO, 2003: p.66)
Como o próprio nome já revela, no bojo dos citados modelos estão as Teorias
Cognitivistas, as quais têm como objeto de estudo os processos mentais
subjacentes ao comportamento humano, tendo como fundamentação principal a
Psicologia Cognitiva, em sua abordagem de processamento de informações. Esta
corrente teórica define a língua como um sistema de sinais, mobilizado através de
processos mentais durante a transmissão de mensagens, concepção esta que a
aproxima dos pressupostos da Teoria da Comunicação.
Alguns dos trabalhos de Kato (1985), Kleiman (1992) e Koch (2002) abordam, com
maiores detalhes, os modelos cognitivos de leitura e suas implicações na prática
pedagógica desenvolvida nas escolas. Portanto, considerando que nosso objeto de
estudo é o ensino de leitura, torna-se necessário conhecermos as concepções que
envolvem o processo de ensino-aprendizagem dessa área. Assim sendo,
iniciaremos nosso percurso teórico a partir dos modelos cognitivos de leitura.
1.4.1 Modelo Ascendente ou bottom-up:
Compreende a leitura como processo de percepção e decodificação (fonema e
grafema), partindo das unidades lingüísticas mínimas para, gradativamente, chegar
33
ao texto. Assim, considerando a opção pelo modelo autônomo de letramento, a
escola parece privilegiar esse tipo de processamento, pois centraliza sua atenção
nos elementos lingüísticos num percurso que vai das unidades menores às maiores
(fonemas, sílaba, palavra, frase, texto).
Acreditamos que a opção por métodos sintéticos de alfabetização (soletração e
silabação) está embasada nestes pressupostos, uma vez o texto é visto como um
conjunto de elementos (letras, sílabas e palavras) que devem ser decodificados
pelos alunos. Logo, a leitura em voz alta é essencial para que o aluno tenha fluência
e rapidez no processo de decodificação, servindo como garantia de compreensão do
que foi lido. Entretanto, percebemos que essa assertiva é falsa, pois ao analisarmos
algumas práticas escolares de leitura, constatamos que, devido ao esforço realizado
na “decifração” das letras em fonemas, às vezes, os alunos chegam ao final da
leitura sem compreender o sentido da frase ou do texto que acabaram de ler.
Esse modelo está baseado na identificação das palavras e não em sua
compreensão ativa
21
, fato este que implica na desconsideração do caráter
polissêmico da língua, do contexto de produção dos enunciados, dos aspectos
dialógicos e responsivos que permeiam o ato da leitura, do conhecimento prévio do
leitor, etc.
A prática de leitura embasada no modelo ascendente é, portanto, monológica e
autoritária, visto que ao leitor cabe, apenas, a assimilação do que a escola ou o
professor estabelecem como “única” leitura possível (autorizada e permitida).
1.4.2 Modelo Descendente (top- down) ou psicolingüístico:
O modelo descendente enfatiza a utilização das estratégias de leitura no ato de
processamento do texto:
(...) para a compreensão, é preciso que o leitor realize
previsões, antecipações que partem de seu conhecimento de
mundo.(...) ler significa empregar um amplo esquema voltado à
21
Para Bakhtin (1929) a compreensão somente se concretiza se produzir uma resposta
(contrapalavra), sendo por isso chamada de ativa e responsiva (grifos nossos).
34
obtenção, avaliação e utilização das informações contidas no
texto, possível, apenas, através do uso de estratégias que são
desenvolvidas e modificadas no próprio processo de leitura: 1.
estratégia de seleção; 2. estratégia de predição; 3. estratégia
de inferência; 4. estratégias de confirmação ou rejeição das
predições prévias. (Paes de Barros, 2005: p. 20)
O leitor ainda é um decodificador, porém passou a ter uma participação “mais ativa”
no ato de ler, que será com base em seus conhecimentos prévios que será obtida
a fluência durante a leitura.
O ato de ler é considerado como um processo individual, ou melhor, é uma ação
puramente cognitiva. Desse modo, além da importância atribuída ao conhecimento
prévio, para compreender o significado do texto, o leitor deverá mobilizar as
estratégias de seleção, predição e inferência, criando hipóteses sobre as palavras a
partir do contexto lingüístico no qual estiverem inseridas.
Desse modo, o foco do processo desloca-se do texto (modelo bottom-up) para o
leitor (modelo top-down). Conseqüentemente, a leitura não pode ser ensinada e o
leitor “aprende a ler, lendo”, através da mobilização dos conhecimentos prévios. No
entanto, devido ao apagamento do autor, uma vez que a compreensão depende
apenas de esquemas mentais, o texto permanece como “produto autônomo”.
1.4.3 Interativo:
Este modelo pressupõe a interatividade entre os dois anteriores (ascendente/
descendente), ou seja, o leitor deverá utilizar diversos níveis de conhecimento
durante a leitura, sendo que esta passa a ser considerada como uma atividade de
produção de sentidos, realizada com base nos elementos lingüísticos e estruturais
presentes na superfície do texto.
Esta atividade, segundo Jurado (2003), requer a mobilização de vários níveis de
conhecimentos, tais como: lingüísticos (implícitos, não-verbalizados, nem
verbalizáveis) - que vão desde a fonologia-grafêmica, o vocabulário e as regras da
língua, chegando ao conhecimento sobre o uso; textuais - que são o conjunto das
noções (conhecimento sobre as estruturas expositiva, narrativa, descritiva, etc.) e
conceitos sobre o texto (os tipos de textos, considerando as “intenções” do autor
35
narrar, argumentar, etc.); enciclopédicos ou de mundo - que seriam os
conhecimentos armazenados na memória (composta por esquemas de
conhecimentos sobre assuntos, eventos ou situações típicos).
Como podemos perceber, a figura do autor reaparece, pois, através da interação
com o texto, o leitor deverá “reconstruir o sentido do texto”, procurando interpretar os
objetivos e intencionalidades do escritor. Todavia, o texto continua sendo uma
“entidade” autônoma, que as intenções do autor devem ser marcadas,
formalmente, no texto, constituindo-se em “pistas”, as quais devem ser seguidas
pelo leitor, a fim de que este possa, finalmente, interpretar o que leu. Em resumo, o
processo de compreensão tem como ponto de partida e de chegada o próprio texto,
enquanto unidade formal, ainda que, de certo modo, o aspecto interacional entre
autor/leitor seja considerado para a atribuição de significado.
Segundo Lodi (2004), o modelo interativo aparece nos livros didáticos utilizados
pelas escolas desde o final da década de 90. No entanto, ainda que seja clara a
intenção de se estabelecer um processo de interação no ato da leitura, podemos
constatar que as atividades propostas nos livros, geralmente, o permitem a
ampliação de leituras “possíveis”, pois as hipóteses levantadas pelos alunos devem
ser comprovadas a partir de aspectos formais presentes no texto.
Destacamos, ainda, a relevância das discussões sobre as estratégias de leitura
(cognitivas e meta-cognitivas) e a transposição desses pressupostos para a sala de
aula, uma vez que tiveram ampla divulgação nos cursos de formação oferecidos aos
professores, principalmente nas últimas décadas. Porém, isso parece ter ocorrido
de maneira bastante incipiente, uma vez que a maioria dos professores parece
priorizar, talvez inconscientemente, apenas algumas estratégias de leitura, como por
exemplo: levantamento de conhecimento prévio e inferência a partir de marcas
formais do texto.
entre as diversas capacidades de leitura existentes, a de localização de
informação parecer ter a preferência absoluta dos docentes e, face ao exposto, nos
reportaremos a Jurado (2003, p. 70):
Podemos verificar que todas essas práticas reforçam as críticas
que Bakhtin faz em relação ao estudo dos enunciados. Essas
práticas estão relacionadas ao ensino-aprendizagem da leitura
entendido como a aquisição do código, baseada no modelo
bottom-up. Compreender o texto é ler em voz alta, mapear
36
informação gráfica, extrair informação palavra a palavra,
reconhecer aspectos morfológicos e sintáticos do texto.
Sabemos que essas ações pedagógicas não são suficientes para a construção do
leitor proficiente e os dados da avaliação do SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino
Básico) / MEC/ 2005 demonstram isso:
Considerando que nossa pesquisa está direcionada às séries iniciais do Ensino
Básico, comentaremos, brevemente, sobre os resultados da série, cuja média
mínima (satisfatória) estabelecida no SAEB (nesta série) é de 200 pontos e, para
atingir esse nível de desempenho, os alunos devem demonstrar as seguintes
habilidades
22
:
Compreender textos de gêneros variados, tais como: anedotas, pequenas
narrativas, fábulas, textos de caráter informativo, tirinhas e histórias em
quadrinhos;
Ser capaz de localizar informações explícitas;
Identificar as personagens dos textos;
Distinguir fato de opinião;
Compreender as relações de causa e conseqüência;
22
Descritores extraídos do livro Avaliação da educação básica: em busca da qualidade e eqüidade
no Brasil”, publicado pelo INEP em 2005.
Série Disciplinas 1995 1997 1999 2001 2003 2005
Português 188.3 186.5 170.7 165.1 169.4 172.3
Matemática 190.6 190.8 181.0 176.3 177.1 182.4
Português 256.1 250.0 232.9 235.2 232.0 231.9
Matemática 253.2 250.0 246.4 243.4 245.0 239.5
Português 290.0 283.9 266.6 262.3 266.7 257.6
Matemática 281.9 288.7 280.3 276.7 278.7 271.3
(b) Não inclui rurais, inclui federais em 1995, 2003 e 2005
Tabela 1 - Brasil - Proficiências do SAEB 1995 - 2005
(a) Inclui escolas federais e rurais. As federais nos anos de 1995, 2003 e 2005. As rurais em todos os anos, pom em 1997o
inclui as da Região Norte e em 1999 e 2001 apenas as dos Estados do Nordeste, Minas Gerais e Mato Grosso
4ª Ensino
Fundamental
(a)
8ª Ensino
Fundamental
(b)
3ª Ensino
Médio
(b)
37
Compreender os efeitos de sentido a partir da pontuação e de outras formas
de notações.
Como podemos constatar ao analisarmos a Tabela 1, a média nacional está abaixo
do mínimo satisfatório (200 pontos), sendo que, em 2005, a rede municipal urbana/
Cuiabá obteve 165,1
23
de média, índice inferior à média nacional (172,3).
Lembramos, novamente, que, segundo o relatório do SAEB, isso significa que os
alunos da 4ª série lêem de forma truncada, apenas frases simples.
Esses dados servem de alerta para as instituições que definem as políticas públicas
de Educação, em todas as esferas: municipal, estadual ou federal, pois demonstram
que o processo de escolarização não está cumprindo com uma de suas funções,
que é a de formar leitores críticos.
1.5 A leitura para a vertente enunciativo-discursiva (ancorada em Bakhtin):
Para Bakhtin, a língua é dinâmica e a enunciação resulta do processo de interação.
Portanto, o homem, assim como a língua, são produtos sócio-históricos que se
constituem através da relações sociais.
A linguagem, nessa perspectiva, surge como mediadora entre o sujeito e o meio,
concretizando-se, durante o ato de interação, através da relações dialógicas
estabelecidas entre os interlocutores, pois, segundo Bakhtin (1929: p.111):
(...) Na verdade, a língua não se transmite; ela dura e perdura
sob a forma de um processo evolutivo contínuo. Os indivíduos
não recebem a língua pronta para ser usada; eles penetram na
corrente da comunicação verbal; ou melhor, somente quando
mergulham nessa corrente é que sua consciência desperta e
começa a operar.
Esse fato nos leva a inferir que fazemos parte de uma mesma cadeia discursiva, na
qual os enunciados se materializam por meio de gêneros (discursivos), assumindo
formas diversas, de acordo com a esfera de atividade humana na qual circulam e
refletindo, também, as condições que demandaram a sua produção. Assim, em
23
Nível denominado de crítico, conforme dados extraídos do Relatório do SAEB 1995-2005.
38
outras palavras, o conteúdo temático, o estilo e a construção composicional o
partes constituintes dos gêneros discursivos. A partir dessa base teórica, o processo
de leitura passa a ser concebido como prática social e, conforme Paes de Barros
(2005: p.30):
(...) a leitura é vista como um processo de compreensão ativa
no qual os diversos sentidos em circulação no texto são
instituídos a partir da relação dialógica estabelecida entre autor
e leitor, entre leitor e texto, e entre a multiplicidade de
linguagens sociais que permeiam essas instâncias. Assim,
pode-se afirmar que a leitura, nessa concepção, é um processo
dialógico que promove um encontro entre discursos e
enunciados que acabam por construir conjuntamente os
sentidos dos textos.
Como resultado dessas reflexões, acreditamos que o ato de ler implica em
compreensão ativa e o deve ser reduzido à identificação de signos lingüísticos
(decodificação), uma vez que este se caracteriza, principalmente, pela interação
entre o sujeito/autor e o sujeito/ leitor, em um processo dialógico de construção de
significados, ou, como declarou Bakhtin (1929: p. 137):
(...) Compreender a enunciação de outrem significa orientar-se
em relação a ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto
correspondente. A cada palavra da enunciação que estamos
em processo de compreender, fazemos corresponder uma
série de palavras nossas, formando uma réplica. Quanto mais
numerosas e substanciais forem, mais profunda e real é a
nossa compreensão.
Desse modo, para Bakhtin, a compreensão somente se concretiza se produzir uma
resposta, pois “compreender é opor à palavra do locutor uma contrapalavra” (1929:
p. 137), sendo por isso chamada de ativa e responsiva.
Portanto, compreender um enunciado significa adotar uma atitude responsiva ativa,
que pode se materializar em uma resposta verbal, através de uma ação ou, ainda,
permanecer “muda” por certo tempo, mas que a qualquer momento poderá se
manifestar, tanto no comportamento como no discurso do interlocutor, sendo que em
determinadas interações face a face, o fato de “permanecer mudo” também pode ser
uma forma de resposta.
39
Nessa perspectiva, o processo de compreensão não é resultante apenas da
interação entre os interlocutores, mas também é fruto das relações dialógicas que se
estabelecem entre os mesmos em um determinado contexto sócio-histórico: “(...) A
compreensão é uma forma de diálogo; ela está para a enunciação assim como uma
réplica está para a outra no diálogo” (1929: p. 137).
Ainda segundo Bakhtin, a enunciação é dotada de dois elementos: o tema e a
significação. O primeiro pode ser definido como o “sentido” construído pelos
interlocutores em determinada situação comunicativa concreta. Logo, o tema “surge”
a partir do contexto no qual os enunciados foram produzidos. Em síntese, podemos
dizer que todo enunciado possui um tema, o qual se caracteriza por ser concreto,
individual e não reiterável, pois depende de uma situação histórica concreta.
Quanto ao segundo, ou seja, a significação, esta é constituída pelos elementos da
enunciação que são reiteráveis e idênticos cada vez que são repetidos” (Bakhtin,
1929: p. 134), isso faz com que significação possa existir no interior do tema,
unindo os interlocutores, afinal, apenas poderá se concretizar durante o processo de
compreensão ativa.
Isto posto, para que fique mais claro, tomemos o clássico exemplo dado pelo autor
acerca do enunciado “Que horas são?”, o qual, de acordo com a situação
comunicativa na qual for “pronunciado”, poderá ter várias possibilidades de tema -
em uma sala de aula, com um aluno perguntando ao professor, o tema poderá ser:
está na hora do intervalo ou do término da aula; em uma festa - pode expressar
impaciência com o atraso de alguém.
a significação da enunciação “Que horas são?” será a mesma em todas as
interações, pois ela se compõe das significações de todas as palavras que fazem
parte dela, das formas de suas relações morfológicas e sintáticas, da entonação
interrogativa, etc.,” (Bakhtin, 1929: p.134).
Todavia, além disso, no ato de compreensão, devemos considerar, ainda, a
entoação expressiva, a qual pode ser entendida como o acento apreciativo (de valor)
atribuído pelo falante/ escritor aos enunciados. Portanto, o modo como as palavras
são pronunciadas (entoadas) também se constitui como um dos recursos usados
pelos interlocutores para expressar sentidos e atribuir “valor” aos enunciados
produzidos durante as interações.
40
Como exemplo, vejamos a seguinte situação: o marido chegou de madrugada em
casa e a esposa perguntou “Você sabe que horas são?”, podemos inferir que a
entoação empregada estará imbricada à apreciação valorativa atribuída pela mulher
e, certamente, o marido compreenderá que esta não deseja saber as horas e sim
“está exigindo” explicações acerca dos motivos que o levaram a chegar tarde em
casa.
Nesse aspecto, percebemos que tanto a entoação expressiva como o acento
apreciativo contribuem diretamente para a apreensão do tema de um enunciado,
pois, segundo Bakhtin (1929: p.140):
(...) a significação objetiva forma-se graças à apreciação; ela
indica que uma determinada significação objetiva entrou no
horizonte dos interlocutores - tanto no horizonte imediato como
no horizonte social mais amplo de um dado grupo social. Além
disso, é à apreciação que se deve o papel criativo nas
mudanças de significação.
Esses elementos atuam “em conjunto” durante o processo de compreensão ativa e
responsiva dos discursos, contribuindo diretamente para a efetivação da construção
de significados. Entretanto, em oposição a esse processo, temos a compreensão
passiva que se caracteriza pela percepção do signo como objeto-sinal” (Bakhtin,
1929: p. 99), sendo que esta última nada acrescenta aos conhecimentos que o
interlocutor já possui, gerando apenas a reprodução do discurso do outro.
Assim, conforme foi mencionado, podemos constatar que é na relação dialógica
ocorrida entre os interlocutores que as significações são produzidas e/ou
reformuladas, ou seja, ler não significa “descobrir” as intenções do autor e, sim,
dialogar com ele (replicando ou concordando), uma vez que o tema do texto irá se
concretizar de diferentes modos para cada leitor e nesse processo está a riqueza do
ato interlocutivo.
Portanto, ler é se envolver em práticas sociais, participando ativamente de um
processo contínuo e dialógico de construção de significados. Com isso, retomamos
a assunção da interface entre o modelo ideológico de letramento e a abordagem
bakhtiniana de linguagem: a concepção da linguagem enquanto prática social
discursiva, pois, segundo Bakhtin (1929: p.117):
41
(...) A situação social mais imediata e o meio social mais amplo
determinam completamente e, por assim dizer, a partir do seu
próprio interior, a estrutura da enunciação.
Nesse contexto, as práticas escolares de leitura precisam avançar para além das
consagradas atividades de ler em voz alta (quando utilizada exclusivamente para
“treinar a dicção”), localizar informações explícitas no texto (Ex.: Juca estava na
floresta/ Pergunta: onde estava Juca? Ou: Quem estava na floresta?) ou utilizar
estratégias para que todos os alunos compreendam o texto do mesmo modo, como
se este tivesse um sentido único, o qual, na maioria das vezes, se restringe àquele
que aparece no livro didático do professor.
De modo geral, o essas atividades que parecem predominar na maioria das
escolas, por isso, torna-se primordial que a comunidade escolar repense e reveja
suas práticas, visto que, se o texto é, por natureza, dialógico, como atividades
descontextualizadas poderiam estimular a compreensão ativa dos alunos? Se ler é
produzir sentidos, como a imposição de uma interpretação “única” poderá formar
leitores críticos?
Acreditamos que, dentre os desafios com os quais a escola se defronta atualmente,
está o de propor atividades de leitura, significativas e contextualizadas, que atuem
na zona de desenvolvimento proximal
24
do aluno, possibilitando que o mesmo seja
autor do próprio discurso e não apenas “ventríloquo” do professor. Desse modo, ao
assumir uma atitude responsiva (dialógica) diante do discurso alheio, o aluno poderá
compreender, efetivamente, a realidade sócio-cultural em que vive, atuando sobre
ela e transformando-a, quando necessário.
Conforme dissemos, vários fatores relevantes que contribuíram para a
construção do conceito de leitura enquanto ato social, a saber, as reflexões
propostas pelo modelo ideológico de letramento, a abordagem bakhtiniana da
linguagem e a adoção dos gêneros discursivos como objeto de ensino da área de
Língua Portuguesa.
24
Conceito elaborado por Vygotsky, grosso modo, refere-se à distância entre o nível de
desenvolvimento real, determinado pela capacidade de resolver um problema sem ajuda, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através de resolução de um problema sob a orientação de
um adulto ou em colaboração com outro companheiro.
42
Assim, entendemos que tanto o estudo das teorias enunciativo-discursivas e das
práticas de letramento, como o acesso às pesquisas desenvolvidas na área do
ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, podem auxiliar os docentes na
compreensão ativa da própria prática educativa, percebendo-se enquanto agentes
sociais e ideológicos.
Nesse bojo, o trabalho de pesquisa desenvolvido nesta dissertação pretende
analisar as práticas de leitura implementadas por uma determinada escola da rede
municipal de Cuiabá, a partir dos pressupostos teóricos bakhtinianos. Acreditamos
que estes irão facilitar a compreensão acerca das condições sócio-historicas que
constituem a escola e que, de certa forma, norteiam o trabalho realizado pelos
docentes.
No entanto, sabemos que os conceitos bakhtinianos ainda não foram assimilados
pela grande maioria das escolas, embora apareçam de modo mais explícito, desde
1998, nos PCN de e Ciclos. Assim, não se trata de constatarmos o óbvio (que
a escola não trabalha com esta concepção de linguagem), o que nos move é o
desejo de contribuir, através dos estudos de Bakhtin, para a melhoria do processo
de ensino-aprendizagem de leitura efetivado em nosso locus de pesquisa.
Isto posto, destacamos, ainda, outros conceitos bakhtinianos que poderiam estar
presentes no modo como o professor trata as práticas de leitura e produção de texto,
que são: o dialogismo, a alteridade e a exotopia.
O termo dialogismo refere-se ao princípio dialógico constitutivo da linguagem, uma
vez que, como dissemos, os enunciados são produzidos durante processos
interacionais estabelecidos entre os interlocutores, de acordo com as condições
contextuais. Assim, ao considerarmos a importância do papel do outro na construção
de sentido, podemos concluir que a concepção de alteridade norteia as atividades
discursivas, ou seja, a palavra do outro influencia, continuamente, a construção dos
enunciados.
Quanto à questão da alteridade e da exotopia, concluímos que o outro sempre será
aquele que observa e analisa “de fora”, pois está em uma posição que ele pode
ocupar, entretanto, em situações de interação face a face, temos uma contínua
alternância nas relações entre o “eu e o outro”, em um processo contínuo de
alteridade.
43
Isso reforça, mais uma vez, o que comentamos: o ato de ler não é tão simples
quanto pode parecer, vários processos e procedimentos que estão a ele
imbricados e devem ser considerados para que a leitura, de fato, possa ser
ensinada.
A partir desses pressupostos, torna-se necessário que a escola comece a refletir
acerca do modelo de letramento que tem pautado a grande maioria das práticas de
leitura e escrita por ela desenvolvidas e que, efetivamente, não têm contribuído para
o desvelamento da realidade e a construção da cidadania.
As atividades didáticas implementadas a partir do modelo autônomo de letramento
colocam o professor como único interlocutor dos textos dos alunos, modelo de autor
e de norma padrão, aquele que detém o poder de permitir ou não determinadas
“leituras”, aumentando, assim, as desigualdades sociais.
Esses procedimentos didáticos podem trazer sérias conseqüências para o processo
de aprendizagem do aluno, que poderiam gerar o seguinte comportamento: ao
invés de refletir sobre o texto lido e tentar compreendê-lo, os discentes passarão a
esperar que o professor lhes mostre qual a “leitura correta”, chegando ao extremo de
transpor este tipo de atitude para outros contextos interacionais e,
conseqüentemente, ao assumir a palavra do outro como sua, assimilarão, também,
sem a devida reflexão, as formações ideológicas presentes nestes discursos.
Diante disso, o ambiente escolar deve estimular a diversidade de posicionamentos,
fugindo da tentação de padronizar o pensamento dos alunos. Logo, a escola deve se
constituir como espaço privilegiado para que as reflexões acerca do processo de
ensino-aprendizagem de leitura e de escrita se consolidem, trazendo avanços
concretos para a prática pedagógica em desenvolvimento nas unidades escolares e
melhorando, significativamente, a qualidade do ensino oferecido aos discentes.
1.5.1 As capacidades de leitura
Nesse aspecto, torna-se necessário destacarmos, também, a importância de se
considerar as capacidades de leitura (Rojo, 2004) como primordiais para a
44
construção da competência discursiva. Portanto, no decorrer deste capítulo,
exploraremos com mais detalhes os conceitos de competência e capacidade.
Atualmente, o termo competência voltou à discussão no cenário educacional,
aparecendo, inclusive, nos documentos oficiais como os PCN e os Referenciais
Curriculares da rede municipal de Cuiabá, nos quais podemos perceber a influência
de Perrenoud (1999) que propõe a organização de um currículo por competências
25
.
Para o citado autor (1999: p.7), competência é a “capacidade de agir eficazmente
em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-
se a eles”. Ele afirma, ainda, que a competência vai além da simples mobilização de
esquemas mentais e deve estar sempre relacionada a algum tipo de prática social e,
nesse aspecto, aproxima-se do conceito de competência discursiva utilizado na área
da Linguagem.
No bojo dessas discussões, tentamos situar o referido termo sob o olhar da vertente
bakhtiniana, ou seja, ao associarmos competência a discurso e instituições sociais,
podemos definir competência discursiva como a capacidade de inserir-se em
práticas sociais de leitura e escrita, em determinados contextos e com objetivos
específicos. Isto posto, podemos constatar que este conceito está, intrinsecamente,
associado ao significado “ser letrado” para o modelo ideológico de letramento. Por
isso, concordamos com Baltar (2004: p. 224):
Assim, parece que esta concepção de competência discursiva
nos permite (...) transitar de uma instituição a outra, uma vez
que se aperceba a diversidade dos gêneros textuais que
predominam nesses diversos ambientes discursivos das
diversas instituições sociais. Esse conceito talvez se aproxime
do que Perrenoud tem se referido como a capacidade de
transferência, que deveria ser o objetivo do fazer pedagógico. A
capacidade de organizar e de atualizar saberes desenvolvidos
dentro do ambiente discursivo escolar, nas mais variadas
situações de prática social que ocorrem na sociedade, portanto
dentro dos diversos ambientes discursivos.
O conhecimento sobre as várias capacidades envolvidas no ato de ler tem avançado
à medida que as pesquisas e teorias sobre o tema são desenvolvidas. Isto é
primordial para facilitar a compreensão do processo de leitura, ampliando sua
25
Para maiores informações, ver Perrenoud (1999), Construir as competências desde a escola, livro
no qual descreve as vantagens em se optar por uma organização curricular a partir de competências.
45
dimensão, pois, atualmente, sabemos que ler envolve diversos procedimentos e
capacidades, os quais atuam, em conjunto, de acordo com o gênero discursivo a ser
utilizado.
O termo “capacidade” será muito utilizado nesta pesquisa e, quase sempre, estará
associado ao termo “habilidade”. É claro que seria possível falar das capacidades de
leitura utilizando o termo “competência”. Todavia, optamos por “capacidades”, uma
vez que este parece se tratar de um termo bastante amplo, que pode abranger
desde os procedimentos mais mecânicos (ler de cima para baixo, etc.), até a
capacidade discursiva (como a de elaborar apreciações éticas e políticas, entre
outras).
Isto posto, podemos concluir que o processo de leitura abarca tanto o uso de
procedimentos quanto a mobilização de diversas capacidades adequadas ao
contexto situacional e às finalidades da leitura. Logo, nenhuma das teorias
existentes nega a anterior, ao contrário, contribui para o aprofundamento das
discussões. Assim, com base nas diversas abordagens, podemos concluir que
“diferentes tipos de letramento, diferentes práticas de leitura, em diversas situações,
vão exigir diferentes combinações de capacidades
26
de rias ordens” (Rojo, 2004:
p. 4-7), as quais serão expostas a seguir:
a) Capacidades de decodificação:
Referem-se às habilidades básicas para a aquisição do código escrito, relacionando-
se, portanto, ao processo inicial de alfabetização. Nesse sentido, notamos que é
esse é um aspecto importante, pois permite, tanto ao leitor iniciante quanto ao leitor
maduro, a leitura de palavras que nunca foram vistas antes, mesmo sem
compreender o seu significado e, além disso, contribui para a construção da
consciência fonológica. Entretanto, constituem apenas a parte inicial do processo de
leitura e, conforme Rojo (2004: p. 4), “não se dão por si sós, sem a contribuição de
outras capacidades de compreensão, apreciação e réplica”.
26
As capacidades aqui elencadas foram extraídas de materiais elaborados pelo Centro de
Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) e dos critérios utilizados na avaliação dos Livros Didáticos
de Língua Portuguesa (5ª a 8ª séries, PNLD/2005).
46
Exemplos:
Compreender diferenças entre escrita e outras formas gráficas (outros
sistemas de representação);
Conhecer o alfabeto;
Compreender a natureza alfabética do nosso sistema de escrita;
Dominar as relações entre grafemas e fonemas;
Saber decodificar palavras e textos escritos;
Saber ler, reconhecendo globalmente as palavras e demonstrando fluência e
rapidez de leitura.
b) Capacidades de compreensão:
Estão diretamente associadas às estratégias de leitura discutidas nos modelos
cognitivos de leitura, são utilizadas na compreensão da estrutura de superfície do
texto e/ou enunciados. Nesse contexto, ler significa, basicamente, demonstrar a
compreensão linear, a produção de inferências, a compreensão global, etc.
Lembramos que o trabalho com as capacidades de compreensão pode e deve ser
iniciado antes mesmo que as crianças tenham aprendido a decodificar e a
reconhecer globalmente as palavras.
Exemplos:
Ativação de conhecimento prévio;
Antecipação ou predição de conteúdos ou propriedades dos textos;
Checagem de hipóteses;
Localização e/ou cópia de informações;
Comparação e generalização de informações;
Produção de inferências locais e globais;
47
c) Capacidades de apreciação e réplica do leitor em relação ao texto
(interpretação, interação):
O desenvolvimento das capacidades de interpretação está relacionado ao trabalho
com os gêneros discursivos. Logo, é importante que o professor proporcione aos
alunos a leitura de textos pertencentes aos mais variados gêneros (narrativas
ficcionais, poemas, trovas, canções, parlendas, listas, agendas, propagandas,
notícias, cartazes, receitas culinárias, instruções de jogos, regulamentos, etc.).
Outro aspecto a ser tratado com os alunos refere-se às características gerais desses
gêneros (do que eles costumam tratar, como costumam se organizar, que recursos
lingüísticos costumam usar, para que servem, onde circulam, etc.), auxiliando no
trabalho de interpretação, pois orientam adequadamente as expectativas do leitor
diante do texto.
Ressaltamos, ainda, a importância de situar o texto no contexto em que foi
produzido, ampliando as possibilidades de leitura, além de contribuir para a
formação de um leitor cada vez mais proficiente. Portanto, ser capaz de fazer
extrapolações pertinentes, aumenta a capacidade de réplica e estimula o processo
de compreensão ativa.
Exemplos:
Recuperação do contexto de produção do texto;
Definição de finalidades e metas da atividade de leitura;
Percepção de relações de intertextualidade (no nível temático e no discursivo);
Percepção de outras linguagens (imagens, som, imagens em movimento,
diagramas, gráficos, mapas etc.) como elementos constitutivos dos sentidos dos
textos e não somente da linguagem verbal escrita.
Elaboração de apreciações estéticas e/ou afetivas;
Elaboração de apreciações relativas a valores éticos e/ou políticos.
Nesse contexto, ao analisarmos as práticas escolares de leitura sob o olhar do
modelo ideológico de letramento, ampliando, também, nossa percepção com base
nas teorias enunciativo-discursivas, teremos um panorama bastante complexo do
48
processo de escolarização: a escola, como principal agência de letramento, parece
não estar cumprindo sua função de formar leitores críticos.
A instituição escolar deveria criar espaços nos quais a crítica, a contradição e o
antagonismo presentes nas relações sociais também fossem discutidos, ampliando
a visão de mundo dos alunos e dando voz a eles para concordar ou discordar,
analisar, refletir, criticar e propor soluções. A vertente bakhtiniana pode contribuir
muito nesse processo, pois, segundo Goulart (2000: p.110):
(...) A necessidade de formação de leitores e autores críticos
pode ser adensada pelos estudos de Bakhtin, na medida em
que as noções desenvolvidas pelo autor dão suporte teórico
para compreender aspectos que determinam muitas
possibilidades de interpretar enunciados e a relação entre o
conteúdo temático, a seleção de recursos expressivos e a
construção textual.
No entanto, embora a maioria das escolas públicas se declare comprometida com a
realidade de seus alunos, continua organizando o currículo em disciplinas isoladas e
adotando metodologias que reforçam a exclusão e nesse aspecto nos reportamos a
Kleiman (1996: p. 16):
As práticas desmotivadoras, perversas até, pelas
conseqüências nefastas que trazem, provem, basicamente, de
concepções erradas sobre a natureza do texto e da leitura, e,
portanto, da linguagem. Elas são práticas sustentadas por um
entendimento limitado e incoerente do que seja ensinar
português, entendimento este tradicionalmente legitimado tanto
dentro como fora da escola.
Assim, os temas discutidos neste capítulo ganham relevância ao nos apontarem
para o fato de como o letramento escolar parece não contribuir, efetivamente, para a
formação de leitores críticos, o que amplia a função social da escola e a coloca
diante de um novo desafio: como implementar práticas pedagógicas destinadas a
“alfabetizar letrando”, considerando a leitura como algo que pode e deve ser
ensinado, em todas as áreas do conhecimento, garantindo, assim, não a
formação do leitor crítico, mas também a construção de um processo educacional
voltado para o exercício da cidadania?
Nesse sentido, não respostas definitivas e “milagrosas” a esta questão, mas,
tentaremos encontrar alguns caminhos durante a trajetória da nossa pesquisa.
49
Capítulo 2: Ensino de Leitura - O que dizem os documentos
oficiais
Embora as Diretrizes Político-Pedagógicas da Rede Municipal de Cuiabá (1999)
tenham sido “gestadas” em um período bem próximo à produção e divulgação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais de e Ciclos (1997), podemos verificar uma
influência deste último na elaboração das referidas diretrizes, principalmente na
parte que trata dos referenciais curriculares. Por conta disso, acreditamos ser
importante, para esse trabalho, a análise das concepções teóricas que fundamentam
os PCN de Língua Portuguesa (1º e 2º Ciclos).
Além disso, considerando que nosso estudo está direcionado às práticas de leitura
desenvolvidas em uma escola da rede municipal de Cuiabá, faremos, também, um
breve histórico do processo que levou o município a adotar o regime de ciclos.
Descreveremos, também, alguns fatos marcantes que ocorreram no período de
1993 a 2005 e que originaram mudanças na organização escolar, a fim de
compreendermos melhor a situação atual do locus da nossa pesquisa.
2.1 Os PCN de Língua Portuguesa (1º e 2º Ciclos):
Como dissemos anteriormente, o desenvolvimento de pesquisas e teorias em
algumas áreas da Lingüística como a Sociolingüística e a Lingüística Textual,
principalmente, trouxe grandes contribuições para repensarmos o processo de
ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa e, a partir do arcabouço teórico
bakhtiniano, chegamos à concepção de linguagem como discurso, ou seja, esta é
produto das relações entre os sujeitos, constituindo-os e sendo por eles constituída,
em um processo contínuo, afetado pelas condições sociais e históricas de sua
utilização.
Influenciados pelas mudanças epistemológicas que ocorreram na citada área, os
PCN de Língua Portuguesa de 1º e 2º Ciclos (2001: p. 24) assumem que:
50
(...) a língua é um sistema de signos histórico e social que
possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim,
aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os
seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as
pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade
e a si mesmas. (...) A linguagem, por realizar-se na interação
verbal dos interlocutores, não pode ser compreendida sem que
se considere o seu vínculo com a situação concreta de
produção. É no interior do funcionamento da linguagem que é
possível compreender o modo desse funcionamento.
Produzindo linguagem, aprende-se linguagem.
Nesse contexto, como mencionamos, e por se tratar de um documento norteador
de políticas educacionais para todo o país, a proposta apresentada nos PCN
provocou mudanças efetivas na organização dos livros didáticos da referida área,
principalmente, através do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).
27
Sabemos que isso ocorreu gradualmente, pois somente após a criação do PNLD
foram estabelecidos certos parâmetros a serem observados pelos autores/editoras.
Este fato favoreceu a “entrada”, nas escolas públicas, de diversos e novos conceitos
estudados nas esferas acadêmicas, como por exemplo: discurso, intertextualidade,
letramento, gênero discursivo, variação lingüística, análise lingüística, etc.
No entanto, grande parte das pesquisas realizadas acerca dos livros didáticos de
Língua Portuguesa tem demonstrado que tais conceitos parecem figurar apenas no
manual do professor, sem serem efetivados, de fato, na proposta metodológica dos
livros, em toda a sua plenitude. Os autores, assim como os professores, estão em
fase de conhecimento e aprendizagem. Talvez os cursos de formação continuada
tenham contribuído mais eficazmente, mas uma pesquisa sobre o tema poderá
confirmar essa hipótese.
Assim, em consonância com os pressupostos teóricos assumidos e, entendendo que
a linguagem está vinculada a situações concretas de uso, os PCN propõem que os
conteúdos da área de Língua Portuguesa sejam organizados a partir dos seguintes
eixos (PCN, 2001: p.44).
27
Ambos, os PCN e o PNLD trabalham com os mesmos pressupostos teóricos e, por isso, coincidem
em vários aspectos, contudo, parece não haver uma transposição “literal” do primeiro para o
segundo.
51
Todo o tratamento didático a ser dado aos conteúdos deve considerar esses eixos
(reflexão uso), logo o ensino deve ocorrer através de situações didáticas nas
quais as práticas de uso da linguagem sejam compreendidas em sua dimensão
histórica/ social. Assim, as atividades de análise e sistematização teórica dos
conhecimentos lingüísticos devem surgir dessas mesmas práticas. Lembramos,
ainda, que o quadro acima toma como base os trabalhos de Geraldi.
28
Conseqüentemente, percebemos também a influência de autores como Bakhtin,
Bronckart e Schneuwly, através do conceito de gênero exposto nos PCN
29
. O gênero
discursivo alcança, assim, o “status” de objeto de ensino da área de Língua
Portuguesa, conforme PCN (2001: p. 26):
Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero. Os
vários gêneros existentes, por sua vez, constituem formas
relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura,
caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e
construção composicional. Pode-se ainda afirmar que a noção
de gêneros refere-se a “famílias” de textos que compartilham
algumas características comuns, embora heterogêneas, como
visão geral da ação à qual o texto se articula, tipo de suporte
comunicativo, extensão, grau de literariedade, por exemplo,
existindo em número quase ilimitado.
Os gêneros são determinados historicamente. As intenções
comunicativas, como parte das condições de produção dos
discursos, geram usos sociais que determinam os gêneros que
darão forma aos textos.
28
Essa organização articula propostas de João Wanderley Geraldi para o ensino de Língua
Portuguesa, apresentada em Unidades básicas do Ensino de Português (in O texto na sala de aula -
1984) e em Portos de Passagem (1993).
29
No texto dos PCN, encontramos a seguinte nota de rodapé: O termo “gênero” é utilizado aqui como
proposto por Bakhtin e desenvolvido por Bronckart e Schneuwly.
52
A definição de gênero proposta pelos PCN tenta unificar duas perspectivas
complementares: a discursiva e a textual, visto que Schneuwly e Bronckart partiram
dos estudos de Bakhtin para constituir uma abordagem teórica acerca dos gêneros
textuais que, em alguns aspectos, aproxima-se e em outros se afasta da vertente
bakhtiniana (principalmente na preocupação com a estrutura composicional do
gênero). Todavia, os PCN ainda demonstram certa dificuldade na utilização desse
conceito, pois ao mesmo tempo em que propõem um trabalho a partir dos gêneros
discursivos, embasado, principalmente em Bronckart e Schneuwly, destacam,
continuamente, a utilização da diversidade textual, abordagem esta que ganhou
projeção nacional a partir de Geraldi (1984), em seu livro “O texto na sala de aula:
leitura e produção”.
30
Exemplo:
Um leitor competente pode constituir-se mediante uma
prática constante de leitura de textos de fato, a partir de um
trabalho que deve se organizar em torno da diversidade de
textos que circulam socialmente. (PCN,
2001: p.54)
Desse modo, ao longo do documento, podemos constatar que a concepção de
diversidade textual prevalece sobre a de gêneros, fato este que irá ocasionar
mudanças significativas no tratamento didático a ser dado ao texto em sala de aula,
tais como, os aspectos discursivos e dialógicos inerentes às práticas de leitura e
escrita são postos de lado, a simples exposição à diversidade textual existente seria
capaz de fornecer modelos para a produção escrita, sem que seja necessária a
mediação do professor; a prática de leitura tem o objetivo de buscar elementos que
possam auxiliar na fixação da estrutura textual.
Outro fator que merece destaque é a valorização da linguagem oral e das
variedades lingüísticas, como conteúdos a serem tratados nas aulas de Língua
Portuguesa. em relação ao ensino de leitura, nota-se que a preocupação
principal expressa no documento (PCN, 2001: p. 53) parece ser:
(...) a formação de leitores competentes e, conseqüentemente,
a formação de escritores, pois a possibilidade de produzir
30
Destacamos que estas abordagens não excluem uma à outra, pois partem de concepções teóricas
semelhantes.
53
textos eficazes tem sua origem na prática de leitura, espaço de
construção da intertextualidade e fonte de referências
modelizadora.
Nessa visão, a leitura deve contribuir para a formação de modelos sobre o “como
escrever”, o que parece divergir da concepção exposta em outro lugar do citado
documento (PCN, 2001: p. 53), a saber:
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho
ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus
objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor,
de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero,
do portador, do sistema de escrita, etc. (...) Trata-se de uma
atividade que implica, necessariamente, compreensão na qual
os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura
propriamente dita.
No cerne desses pressupostos, encontramos o modelo interativo de leitura, o que
pode ser confirmado através da opção pelo trabalho com a diversidade textual e com
a análise do agrupamento de gêneros propostos para o trabalho com linguagem oral
e escrita
31
. Assim, ao deixar a critério do professor quais gêneros selecionar para o
ensino de leitura, os PCN (2001: p. 109) não esclarecem que, de acordo com o
gênero, são exigidas diferentes capacidades de leitura.
Embora não se tenha, neste documento, estabelecido
exatamente quais gêneros seriam adequados para o trabalho
específico com a leitura e com a produção de textos, isso não
significa que devam ser utilizados indiscriminadamente. (...) No
entanto, o critério de seleção de quais textos podem ser
abordados e em quais situações didáticas, cabe, em última
instância, ao professor.
Esse trecho parece reforçar a idéia de que o objetivo central da leitura é fornecer
modelos de escrita para a produção de texto, uma vez que os aspectos dialógicos
presentes no ato de ler, “aparentemente”, ficaram em segundo plano. Este fato se
repete no item Tratamento Didático (Prática de Leitura/ 1º Ciclo, p. 54):
Como se trata de uma prática social complexa, se a escola
pretende converter a leitura em objeto de aprendizagem deve
31
Um trabalho que aprofunda esta questão é o de Barbosa (2001), “Trabalhando com os gêneros
discursivos: uma perspectiva para o ensino de Língua Portuguesa” - tese de doutorado/ LAEL/ PUC
SP.
54
preservar sua natureza e sua complexidade, sem
descaracterizá-la. Isso significa trabalhar com a diversidade de
textos e de combinações entre eles. Significa trabalhar com a
diversidade de objetivos e modalidades que caracterizam a
leitura, (...) Eis a primeira e talvez a mais importante estratégia
didática para a prática de leitura: o trabalho com a diversidade
textual. Sem ela pode-se até ensinar a ler, mas certamente não
se formarão leitores competentes.
A utilização das estratégias de leitura (mobilização de conhecimento prévio,
localização de informação, levantamento e verificação de hipóteses, antecipações,
inferências, etc.) é estimulada continuamente e reforçada através de citações
recorrentes, em detrimento das demais capacidades necessárias ao processo de
compreensão ativa (vertente enunciativo-discursiva/ bakhtiniana). Exemplo (PCN,
p.55):
O conhecimento atualmente disponível a respeito do processo
de leitura indica que não se deve ensinar a ler por meio de
práticas centradas na decodificação. Ao contrário, é preciso
oferecer aos alunos inúmeras oportunidades de aprenderem a
ler usando os procedimentos que os bons leitores utilizam. É
preciso que antecipem, que façam inferências a partir do
contexto ou do conhecimento prévio que possuem, que
verifiquem suas suposições tanto em relação à escrita,
propriamente, quanto ao significado. É disso que se es
falando quando se diz que é preciso “aprender a ler, lendo”
32
.
Ao refletirmos sobre essas idéias, parece-nos que o pensamento teórico subjacente
ao “aprender a ler, lendo”, “aprender a escrever, escrevendo” se insere em uma
visão “natural” da língua, embasada no Construtivismo e na Pedagogia de Freinet
33
(1976), os quais enfatizam as relações entre desenvolvimento cognitivo e
aprendizagem e estão presentes no modelo interativo de leitura. Essas concepções
foram criticadas por Schneuwly (2004), pois compreendem o processo de ensino-
aprendizagem dos gêneros como algo espontâneo e, conseqüentemente, distante
de suas relações discursivas e sócio-históricas.
32
Ênfase adicionada.
33
As técnicas desenvolvidas por Freinet têm o objetivo de favorecer o desenvolvimento dos métodos
naturais da Linguagem (desenho, escrita, gramática), da Matemática, das Ciências Naturais e
Sociais, organizando as atividades curriculares a partir de Centros de Interesse.
55
Diante disso, percebemos mais uma vez os conflitos existentes no documento.
Portanto, de modo geral, parece-nos que os PCN privilegiam apenas a capacidade
de compreensão
34
, o que parece demonstrar certa incoerência com o objetivo
estabelecido para a área de Língua Portuguesa, que é possibilitar a construção da
competência discursiva, uma vez que este processo requer a utilização das várias
capacidades de leitura e escrita, pois, segundo Rojo (2001: p. 2):
(...) ser letrado e ler na vida e na cidadania é muito mais que
isso: é escapar da literalidade dos textos e interpretá-los,
colocando-os em relação com outros textos e discursos, de
maneira situada na realidade social; é discutir com os textos,
replicando e avaliando posições e ideologias que constituem
seus sentidos; é, enfim, trazer o texto para a vida e colocá-lo
em relação com ela. Mais que isso, as práticas de leitura na
vida são muito variadas e dependentes de contexto, cada um
deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras.
Ainda no capítulo concernente ao Ciclo, foram elencadas algumas sugestões de
propostas didáticas para a formação de leitores, a saber, leitura diária, colaborativa;
projetos de leitura; atividades seqüenciadas de leitura; atividades permanentes de
leitura; leitura feita pelo professor.
A maioria das propostas prevê a fixação de objetivos para a realização das
atividades, além, é claro, da utilização das estratégias de leitura como forma de
garantir a compreensão do texto. O outro aspecto que merece destaque é a
ressignificação da leitura em voz alta, recomendada, nos PCN, em situações
contextualizadas e com objetivos funcionais. No entanto, percebemos um “pequeno”
deslize ao tratarem da leitura feita pelo professor, conforme demonstrado nos PCN
(p. 64):
A leitura em voz alta feita pelo professor não é uma prática
muito comum na escola. E, quanto mais avançam as séries,
mais incomum se torna, o que não deveria acontecer, pois,
muitas vezes, são os alunos maiores que mais precisam de
bons modelos de leitores.
35
Com isso, os PCN acabam voltando à visão de leitura apenas como “oralização” da
escrita, o que pode suscitar os seguintes questionamentos: nesse contexto, o que
34
Considerada sob a visão cognitivista.
35
Ênfase adicionada.
56
significa “bons modelos de leitores”? Os alunos devem “imitar” a forma como o
professor (em voz alta)? E se a variedade lingüística falada pelo professor for
diferente da que os alunos utilizam?
A prática da leitura em voz alta deve ser utilizada, em sala de aula, de modo mais
significativo, como por exemplo, para despertar a sensibilidade dos alunos em
relação aos recursos lingüísticos utilizados na construção de um poema (aliteração,
sonoridade, etc.). Esta passaria a ser, então, um recurso didático muito importante
para auxiliar o discente durante o processo de compreensão e interpretação.
Outro aspecto fundamental é a entoação, que se “mescla” ao enunciado,
favorecendo a construção do sentido. Sabemos que, muitas vezes, o contexto pode
determinar a entoação utilizada, entretanto, as escolhas lingüísticas feitas pelos
interlocutores também interferem nesse processo, pois trazem em seu bojo outras
relações discursivas que, aparentemente, não estão explicitas no contexto de
produção do enunciado. Estas reflexões nos levam novamente a Bakhtin (1929:
p.117):
(...) A situação social mais imediata e o meio social mais amplo
determinam completamente e, por assim dizer, a partir do seu
próprio interior, a estrutura da enunciação.
Logo, a leitura em voz alta, tão privilegiada pelas escolas, e da qual os PCN
propõem que o professor seja “o modelo”, não é algo tão simples quanto aparenta,
visto que abarca uma série de valores sociais e ideológicos que interferem,
diretamente, no processo de atribuição de sentidos.
Considerando que nossa pesquisa tem como sujeitos alunos do Ciclo (4º ano)
36
,
analisaremos com maior profundidade os itens direcionados a esse ciclo:
Objetivos da área de linguagem para o ensino de leitura (PCN, 2001: p. 124):
Compreender o sentido nas mensagens orais e escritas de
que é destinatário direto ou indireto, desenvolvendo sensibilidade
para reconhecer a intencionalidade implícita e conteúdos
36
Na rede municipal de Cuiabá, o 2º Ciclo abarca a 3ª, 4ª e 5ª séries.
57
discriminatórios ou persuasivos, especialmente nas mensagens
veiculadas pelos meios de comunicação;
37
Ler autonomamente diferentes textos dos gêneros previstos para o
ciclo, sabendo identificar aqueles que respondem às suas
necessidades imediatas e selecionar estratégias adequadas para
abordá-los;
38
Podemos identificar, nos trechos acima, a influência do modelo interativo de leitura:
“reconhecer a intencionalidade” e “selecionar estratégias”. Além disso, percebe-se
também a presença da Teoria da Comunicação, através do uso dos termos
“mensagens” e “destinatários”, fato este que deixou exposta não a concepção de
linguagem assumida inicialmente
39
, mas sim a que a língua como instrumento
para comunicação.
Tratamento didático:
Neste item, os PCN (2001: p. 125) propõem que as atividades pedagógicas
realizadas em sala sejam conduzidas de modo que, ao final do Ciclo, os alunos
possam:
(...) utilizar autonomamente estratégias de leitura decifrar,
antecipar, inferir e verificar e coordenar, mesmo que com ajuda, os
diferentes papéis que precisam assumir ao produzir um texto: planejar,
redigir rascunhos, revisar e cuidar da apresentação.
Isto nos remete, novamente, à presença marcante dos modelos cognitivos de leitura,
para os quais a língua é vista como um código (Teoria da Comunicação), sendo que
o processo de interpretação depende, principalmente, da utilização de esquemas
mentais acionados através da mobilização de estratégias cognitivas (comparar,
inferir, antecipar, confirmar, etc.). Esse trecho ocasiona mais um ponto de conflito no
37
Ênfase adicionada.
38
Ênfase adicionada.
39
A língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a
realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados
culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a
realidade e a si mesmas (PCN, 2001: p. 24).
58
texto dos PCN, reforçando a contradição entre a concepção de língua declarada e a
que, concretamente, se efetiva ao longo do documento.
Conteúdos gerais do ciclo (PCN, 2001: p. 126):
Com o objetivo de subsidiar nossa análise e considerando a importância desse item
na organização da práxis pedagógica, retomaremos o conceito de conteúdo que,
anteriormente, estava associado exclusivamente às Áreas do Conhecimento,
priorizando os aspectos cognitivos. Nos dias atuais, com o desenvolvimento das
teorias educacionais, essa concepção foi ampliada, conforme esclarece Zabala
(1998: p. 30):
Devemos nos desprender desta leitura restrita do termo
“conteúdo” e entendê-lo como tudo quanto se tem que
aprender para alcançar determinados objetivos que não apenas
abrangem as capacidades cognitivas, como também incluem
as demais capacidades. Deste modo, os conteúdos de
aprendizagem não se reduzem unicamente às contribuições
das disciplinas e matérias tradicionais. Portanto, também serão
conteúdos de aprendizagem todos aqueles que possibilitem o
desenvolvimento das capacidades motoras, afetivas, de
relação interpessoal e de inserção social.
Assim, diante da complexidade dos fenômenos que envolvem o processo de
classificação e seleção dos conteúdos, Coll
40
(1986), ancorado na abordagem
construtivista, propõe os seguintes agrupamentos:
Conteúdos factuais: são aqueles que se referem a conhecimento de fatos,
acontecimentos, situações e dados concretos e singulares: a localização ou a
altura de uma montanha, os nomes dos rios que compõem uma determinada
bacia hidrográfica, datas e nomes de acontecimentos históricos, etc.
40
Lembramos, ainda, que Cesar Coll, psicólogo espanhol, orientou a reforma educacional na
Espanha e atuou como consultor na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais.
59
Conteúdos conceituais
41
: destinam-se à aprendizagem de conceitos e
princípios, porém não se trata apenas de repetir definições e sim de saber
utilizar o conhecimento construído para a interpretação, compreensão ou
exposição de um fenômeno ou situação. Uma das características dos
conteúdos conceituais é que a aprendizagem não pode ser considerada
acabada, que sempre existe a possibilidade de ampliar ou aprofundar o
conhecimento, de fazê-lo mais significativo.
Conteúdos atitudinais: abarcam uma série de conteúdos que por sua vez
podemos agrupar em valores, atitudes e normas. De modo geral, a
aprendizagem desses conteúdos supõe um conhecimento e uma reflexão
sobre os possíveis modelos, o que implica na análise dos fatores positivos e
negativos, na tomada de posição e avaliação da própria situação em
discussão na sala de aula.
Conteúdos procedimentais: incluem, entre outras coisas, as regras,
técnicas, os métodos, as habilidades, as estratégias, os procedimentos, ou
seja, um conjunto de ações dirigidas para a realização de um determinado
objetivo. São conteúdos procedimentais: ler, desenhar, observar, calcular,
recortar, inferir, etc. Assim, segundo Zabala (1998: p.44), as estratégias de
leitura podem ser classificadas neste grupo.
Ao analisarmos a classificação acima, percebemos, novamente, a influência de Coll
e do Construtivismo na forma como os conteúdos foram agrupados na área de
Língua Portuguesa. Logo abaixo, selecionamos os que se referem ao ensino de
leitura:
41
Embora isso não esteja explicitado no texto dos PCN, podemos inferir que os gêneros discursivos
estivessem mais próximos do que se estabelece como conteúdos conceituais. Todavia, devido aos
problemas teóricos subjacentes à questão, entendemos porque os autores do documento optaram
pela não inclusão do gênero em uma das categorias propostas por Cesar Coll.
60
Conteúdos gerais do ciclo:
Valores, Normas e Atitudes
Os conteúdos gerais são iguais para os dois ciclos e, como sugere o título em
destaque, temos apenas uma lista de conteúdos atitudinais, em detrimento dos
conceituais e procedimentais, os quais poderiam estar mais relacionados ao trabalho
com as capacidades de leitura.
Diante disso, ao refletirmos sobre a organização dos diferentes conteúdos nas
escolas públicas ou privadas, percebemos diferenças nos tipos de conteúdos a
serem privilegiados, conforme os níveis e modalidades de ensino a que se destinam.
Todavia, acreditamos que o equilíbrio na distribuição seria mais adequado, visto que
o conhecimento não é construído de forma fragmentada e que uma relação de
interdependência entre os diferentes tipos de conteúdo; além de que, de acordo com
a faixa etária, as necessidades e interesses dos alunos se modificam.
Esse fato se repete na escolha dos gêneros discursivos sugeridos nos PCN
42
e que
são, basicamente, os mesmos para os dois ciclos, sem considerar a complexidade
natural que o trabalho didático deve assumir a cada ano de escolarização. Isso nos
42
No texto dos PCN (1º e 2º Ciclos) os termos gênero discursivo e diversidade textual são utilizados
como equivalentes, fato este que além das implicações teóricas já comentadas, pode provocar
confusões e interpretações equivocadas por parte dos professores.
Valorização da leitura como fonte de fruição estética e
entretenimento.
Interesse, iniciativa e autonomia para ler, especialmente
textos literários e informativos.
Interesse por compartilhar opiniões, idéias e preferências
sobre leituras realizadas.
Interesse em tomar emprestados livros do acervo da
classe e da biblioteca escolar.
Manuseio cuidadoso de livros e demais materiais escritos.
Interesse no uso e conhecimento das regras de utilização
de bibliotecas, centros de documentação e redes de
informação.
Sensibilidade para reconhecer e capacidade de
questionar, com ajuda do professor, conteúdos
discriminatórios, veiculados por intermédio da linguagem.
Atitude crítica diante de textos persuasivos dos quais é
destinatário direto ou indireto.
61
leva a deduzir que, talvez, os gêneros sejam considerados como conteúdo
conceitual, mas o como confirmar essa inferência, pois isso também poderia
gerar outros problemas de ordem teórica, afinal o documento não traz marcas
lingüísticas que possam confirmar essa análise. Assim, constata-se a dificuldade em
manter a coerência teórica na utilização do termo gênero discursivo, conforme
podemos comprovar neste exemplo transcrito da página 108:
Posteriormente, sob o título Gêneros discursivos”, em
coerência com o princípio didático que prevê a
organização das situações de aprendizagem a partir da
diversidade textual
43
, estão especificados gêneros adequados
para o trabalho com a linguagem oral e com a linguagem
escrita.
Conteúdos específicos para a prática de leitura no Ciclo (PCN, 2001: p.
130):
Atribuição de sentido, coordenando texto e contexto.
Utilização de indicadores para fazer antecipações e inferências em relação
ao conteúdo (tipo de portador, características gráficas, conhecimento do
gênero ou do estilo do autor, etc.) e à intencionalidade.
Emprego dos dados obtidos por intermédio da leitura para confirmação ou
retificação das suposições de sentido feitas anteriormente.
Uso de recursos variados para resolver dúvidas na leitura: seguir lendo em
busca de informação esclarecedora, deduzir do contexto, consultar
dicionário, etc.
Utilização de diferentes modalidades de leitura adequadas a diferentes
objetivos: ler para revisar, para obter informação rápida, etc.
Uso de acervos e bibliotecas:
Busca de informações e consulta a fontes de diferentes tipos (jornais,
revistas, enciclopédias, etc.), com orientação do professor;
Leitura de livros na classe, na biblioteca e empréstimo de livros para leitura
em casa;
Socialização das experiências de leitura;
Rastreamento da obra de escritores preferidos;
Formação de critérios para selecionar leituras e desenvolvimento de
padrões de gosto pessoal.
43
Ênfase adicionada. Lembramos que o termo diversidade textual está embasado no trabalho de
Geraldi (1984), em seu livro “O texto na sala de aula”.
62
Quanto aos conteúdos específicos, percebemos um equilíbrio maior entre os
procedimentais (estratégias de leitura) e os atitudinais (uso de acervos e
bibliotecas). Entretanto, ressaltamos que, ao enfatizar o ensino das capacidades de
compreensão (estratégias de leitura), os PCN deixam de lado as capacidades de
apreciação e réplica (interpretação e interação), as quais são primordiais para a
formação do leitor proficiente e devem ser trabalhadas em conjunto com as demais.
Talvez um dos motivos para a existência desta lacuna seja o fato de que, quando os
PCN foram elaborados, os estudos sobre as capacidades de leitura ainda estavam
incipientes. No entanto, nos últimos anos, o crescente interesse pelo processo de
leitura está ampliando este campo de estudo e aumentando as possibilidades de
pesquisa.
Critérios para avaliação no 2º Ciclo (PCN, 2001: p. 134-135):
Demonstrar compreensão de textos ouvidos por meio de
resumo das idéias
Espera-se que o aluno realize, oralmente ou por escrito, resumos
de textos ouvidos, de forma que sejam preservadas as idéias
principais.
Coordenar estratégias de decodificação com as de
antecipação, inferência e verificação, utilizando
procedimentos simples para resolver dúvidas na
compreensão.
Espera-se que o aluno, ao realizar uma leitura, não se limite à
decodificação: que utilize coordenadamente procedimentos
necessários para a compreensão do texto. Assim, se ele antecipou
ou inferiu uma informação, é necessário que busque no texto, pela
decodificação, por exemplo, pistas que confirmem ou não a
antecipação ou a inferência realizada;
Utilizar a leitura para alcançar diferentes objetivos: ler para
estudar, ler para revisar, ler para escrever.
Espera-se que o aluno seja capaz de ajustar sua leitura a
diferentes objetivos utilizando os procedimentos adequados a cada
situação.
63
Como podemos ver, apenas três tópicos que se referem, mais especificamente,
ao processo de ensino-aprendizagem de leitura, sendo que a ênfase dada aos
modelos cognitivos de leitura é mantida durante todo o texto dos PCN. Apenas
desejamos destacar outras “lacunas”, considerando que os estudos acerca do
modelo de leitura de viés bakhtiniano estavam em fase inicial, na época em que os
PCN foram elaborados, verificamos que o processo de compreensão ativa
44
não
aparece de modo consistente no referido documento; no último item, os objetivos
elencados para a prática de leitura relacionam-se, exclusivamente, a situações
escolares, desconsiderando os que se referem ao cotidiano do aluno.
No bojo dessa assertiva, temos outro aspecto que está em desacordo com a
concepção de linguagem assumida: se a linguagem é vista como prática social,
histórica e culturalmente situada, as situações de aprendizagem devem avançar
para além das práticas de leitura e escrita específicas do ambiente escolar. Logo, se
concentrarmos a avaliação apenas nesses aspectos, o tipo de ensino ministrado
pouco contribuirá para o uso efetivo da leitura em outras práticas de letramento.
2.2 A Escola Sarã
45
Em 1993, a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá (SME), através de
convênio estabelecido com a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), deu
início ao Projeto de Reorganização Curricular das Escolas da Rede Municipal,
mobilizando as unidades escolares para a discussão de uma proposta curricular que
atendesse às necessidades da comunidade. A parceria com a UFMT resultou na
realização de vários cursos, encontros e seminários, nos quais foram tratados temas
44
O termo compreensão ativa é utilizado somente uma vez nos PCN (1º e Ciclos), todavia não
com o mesmo sentido proposto por Bakhtin, visto que ao longo do texto esse termo se equivale a
recepção e escuta ativa.
45
Denominação atribuída à escola ciclada da rede municipal de ensino de Cuiabá: sarã é o nome de
uma vegetação típica da margem do rio Cuiabá.
64
relacionados às concepções teóricas de Educação, Currículo e Áreas do
Conhecimento. Nesse contexto, como produto das discussões e estudos realizados,
a rede municipal optou pela construção de uma proposta curricular fundamentada na
Pedagogia Crítica
46
e organizada por Temas Geradores
47
, conforme poderemos
verificar nos Referenciais da Escola Sarã (1999: p.14):
Todo esse processo gerou mudanças e reformulações no fazer
pedagógico, tais como: a diminuição gradual dos sistemas
tradicionais de avaliação, a ruptura com os conteúdos
fragmentados ideologizados e sua substituição por conteúdos
práticos, pautados em uma realidade social, cultural e política
que emergem dos saberes que os educandos já possuem.
Essas mudanças contribuíram para que as escolas repensassem sua forma de
organização: qual seria o sistema mais adequado Seriado ou Ciclado? Assim, até
para manter a coerência teórica com os pressupostos da Pedagogia Crítica, seria
natural a opção pelos Ciclos de Formação (Escola Sarã, 1999: p.15):
48
Garantir a aprendizagem passa a ser a meta fundamental
quando pensamos em uma sociedade sem exclusão. Nessa
perspectiva, a escola por ciclos está sendo pensada, buscando
dar uma nova organização aos tempos e espaços para
aprender, tornando-se um instrumento necessário e
fundamental na construção de uma sociedade crítica, justa e
solidária.
A SME/ Cuiabá, em 1997, criou uma comissão, composta por técnicos da Secretaria
e representantes das escolas municipais, com o objetivo de pesquisar e estudar
propostas de outros de outros municípios/ estados que trabalhavam em sistema
46
Corrente teórica representada por Giroux e McLaren, comprometida com os interesses do sujeito
das camadas economicamente desfavorecidas, na qual a escola se organiza como espaço de
negação da dominação e não como simples instrumento para reproduzir a estrutura social vigente;
47
O currículo é organizado em temas geradores (fundamentado em Paulo Freire), os quais podem
ser definidos como situações de desafio apresentados aos alunos sobre a realidade em que estão
inseridos; geralmente é a análise de problemas nacionais ou regionais e, a partir desses temas,
seriam selecionadas as “palavras geradoras”, sempre levando em consideração o nível maior de
compromisso social, cultural e político dessas palavras visando sempre às mudanças.
48
Segundo Arroyo (1999), trabalhar com ciclos de formação é uma procura, nada fácil, de organizar o
trabalho, os tempos e espaços, os saberes, as experiências de socialização da maneira mais
respeitosa para com as temporalidades do desenvolvimento humano.
65
de Ciclos. Desse trabalho, surgiu o Projeto Saranzal, o qual, após a realização de
fóruns e seminários com a participação de toda a comunidade escolar, deu origem à
Escola Sarã, denominação escolhida pelos profissionais da educação à “sua” escola
ciclada (1999: p. 16):
As propostas de alterações enviadas pelas unidades escolares
foram sistematizadas pela comissão do projeto e apresentadas
para discussão e deliberação no Fórum Deliberativo do Projeto
Saranzal, com a participação de delegados representantes de
todos os segmentos das escolas, do SINTEP e do Colegiado
de Diretores. Nesta oportunidade os pontos polêmicos foram
debatidos e colocados em votação, sendo sistematizados no
documento definitivo, denominado Escola Sarã.
Nesse contexto, de 1993 a 1999, a rede municipal de Cuiabá passou por diversas
mudanças que culminaram na opção pelos Ciclos de Formação. Esse também foi
um período produtivo, pois, em 1999, a SME/ Cuiabá publicou o primeiro livro
contendo as novas diretrizes político-pedagógicas do sistema municipal e, em 2000,
foi feita outra edição do mesmo documento.
Diante do exposto, a partir de 1999, a maioria das escolas municipais,
gradativamente, foi aderindo aos Ciclos, os quais, até 2004, foram estruturados
conforme quadro abaixo:
Ciclo
Etapas/ Idade
Fase do
Desenvolvimento
1º Ciclo 1ª etapa: 6 anos
2ª etapa: 7 anos
3ª etapa: 8 anos
Infância
2º Ciclo 1ª etapa: 9 anos
2ª etapa: 10 anos
3ª etapa: 11anos
Pré-adolescência
3º Ciclo 1ª etapa: 12 anos
2ª etapa: 13 anos
3ª etapa: 14 anos
Adolescência
Quanto à adesão ao citado sistema, ainda que o processo tivesse um caráter
coletivo, destacamos que este, até 2007, não atingiu a totalidade das escolas
municipais, a saber:
66
De 1999 até os dias atuais: cerca de 06 unidades escolares permaneceram
seriadas;
De 1999 a 2007: 05 unidades escolares cicladas, aproximadamente, optaram
pelo retorno ao regime seriado, sendo que esta parece ser a tendência atual
na rede municipal.
De 1999 a 2006: várias escolas funcionavam em regime “misto”, ou seja,
possuíam Ciclo completo, Ciclo até a etapa (4ª série) e 5ª, 6ª, 7ª e 8ª
séries. Outra possibilidade era: 1º e 2º Ciclos, completos, e 6ª, 7ª e 8ª séries.
Em 2005, houve uma mudança na nomenclatura oficial, talvez com o objetivo de
compatibilizá-la com a utilizada pelo Ministério da Educação: anos iniciais e anos
finais. Portanto, todas as escolas municipais, independente do regime adotado
(ciclado ou seriado), passaram a ter a seguinte estrutura:
Como podemos constatar, talvez como reflexo do que está ocorrendo nas escolas, a
nova organização proposta parece reforçar a intenção de retorno à seriação.
Vejamos: nos Ciclos de Formação, a lógica da enturmação
49
dos alunos é a fase do
desenvolvimento cognitivo (Escola Sarã, p. 94) e na Seriação, o que prevalece é a
separação entre os antigos “primário” e “ginásio”, ou seja, a 5ª série (atual ano),
que fazia parte do 2º Ciclo (3ª etapa), agora faz parte dos “anos finais”.
A atual nomenclatura parece não ter sido totalmente assimilada pelas unidades
escolares, que provocou vários transtornos no processo de registro de matrícula
dos alunos, por exemplo: estudantes que cursaram a 7ª série em 2004 foram
matriculados no ano em 2005, quando deveria ser assegurada a terminalidade no
49
Nome utilizado pela rede municipal para se referir ao processo pedagógico que organiza os alunos
em grupos, considerando a faixa etária e a fase de desenvolvimento (infância, pré-adolescência e
adolescência).
Anos Iniciais
Anos finais
1º ano: 6 anos
2º ano: 7 anos
3º ano: 8 anos
4º ano: 9 anos
5º ano: 10 anos
6º ano: 11 anos
7º ano: 12 anos
8º ano: 13 anos
9º ano: 14 anos
67
sistema de 8 anos, conforme prevê a legislação vigente; crianças que estavam na
Educação Infantil em 2004, com a idade de 05 anos, foram matriculadas, em 2005,
no ano (sala para as crianças de 07 anos) - “pularam” o ano, pois este, de
modo equivocado, é associado à Pré-escola.
Esses problemas geraram lacunas no histórico escolar
50
dos alunos, pois não
como justificar o porquê de o aluno não haver cursado determinada série e, por
isso, o citado documento não pode ser expedido sem que isso seja resolvido. Em
outras palavras, a instituição estará impedida de expedir o documento de
transferência do aluno, caso este o solicite.
Segundo informações obtidas em conversas com alguns diretores de escolas
municipais, a Secretaria ainda não conseguiu solucionar, definitivamente, essas
questões e, à medida que surgem os casos, solicita-se ao Conselho Municipal de
Educação de Cuiabá que auxilie a encontrar mecanismos legais para que os alunos
não sejam prejudicados.
Assim, desde 2006, a SME/Cuiabá e o Conselho Municipal de Educação estão
atuando em parceria para regularizar a vida escolar dos alunos. No entanto, apesar
do esforço que a atual gestão da Secretaria vem fazendo para reorganizar o
sistema municipal, há ainda outro ponto de conflito - as matrizes curriculares
51
.
Em 2006, a rede municipal chegou a trabalhar com cerca de 18 matrizes diferentes,
nas quais criavam-se “novas” disciplinas, aparentemente, sem preocupação com a
continuidade da proposta pedagógica a ser desenvolvida. em 2007, buscando
respeitar as propostas educativas em andamento, houve uma tentativa, por parte da
SME, de reestruturar as matrizes existentes, sintetizando-as em outros modelos
mais adequados à legislação e ao sistema de ciclos.
Por outro lado, para termos uma visão mais ampla da prática educativa efetivada
nas escolas municipais, torna-se necessário, ainda, investigarmos o processo de
50
Documento oficial no qual são registradas as séries que o aluno cursou ou está cursando, no
caso de uma transferência de escola ou de conclusão de um nível de ensino.
51
Matriz curricular é o documento que sistematiza a forma de organização dos conteúdos escolares:
por disciplina, área do conhecimento, ambiência, sala temática, etc., de acordo com o Projeto Político
Pedagógico de cada escola e a legislação vigente. A cada ano letivo, as unidades escolares devem
encaminhar a matriz para análise e aprovação da Secretaria de Educação.
68
formação continuada oferecido aos docentes
52
. Isto posto, de acordo com
informações da Assessoria Pedagógica da SME/ Cuiabá, no início dos anos 90, os
cursos de formação eram feitos com base em listas de conteúdos “mínimos” a serem
trabalhados durante cada bimestre, sendo que na área de Linguagem se falava
sobre o texto como ponto de partida para o ensino de língua (diversidade textual).
a partir de 93, as discussões sobre Tema Gerador e as idéias de Paulo Freire
embasaram a prática docente nesse período, como tentativa de superar a
fragmentação existente na rede. Assim, os cursos de formação (mesmo que
pontuais) tratavam, prioritariamente, de temas como reorganização curricular,
planejamento globalizado, gestão democrática e avaliação, os quais eram de
interesse coletivo, visto que a rede municipal estava em fase de definição de suas
diretrizes político-pedagógicas. na área de Linguagem, os cursos abordavam
questões direcionadas à utilização da tipologia textual, porém, na prática em sala de
aula, os textos eram utilizados apenas como recurso para a discussão dos temas
geradores
53
.
No período de 1998 a 2000, o amadurecimento das discussões sobre a política
educacional da rede municipal resultou na iniciativa de se organizar as escolas por
Ciclos de Aprendizagem. Assim, a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá
implantou um novo programa de formação continuada, a fim de preparar os
professores para atuar no Ciclo, envolvendo-os na elaboração dos novos
referenciais curriculares. Nesse momento, foram realizadas “oficinas de formação”
sobre as fases de desenvolvimento da criança, relatórios avaliativos, tema gerador,
etc. Na área de Linguagem, discutia-se a função social da Língua Portuguesa, o
trabalho com a diversidade textual e o modelo interativo de leitura, além disso, sob
influência dos PCN, alguns cursos abordavam o processo de ensino-aprendizagem
das habilidades lingüísticas, porém ainda de modo muito incipiente.
52
Pensamos ser pertinente esclarecemos que a pesquisadora também é funcionária da SME/ Cuiabá
e, portanto, participou de todo o processo de formação descrito acima, atuando, inclusive, em alguns
momentos, como ministrante dos cursos em questão. Portanto, parte do que foi relatado, constitui a
própria sócio-história da pesquisadora que também passa a ser “fonte” de dados.
53
Os textos utilizados em sala eram selecionados de acordo com o tema gerador a ser estudado,
servindo apenas como pretexto para o levantamento do conhecimento prévio do aluno acerca do
tema em questão.
69
O ano de 2000 foi marcado pela entrada, no sistema municipal, de um grande
número de docentes (aprovados no concurso público/ 99). Esse fato gerou uma
nova demanda de formação continuada, pois os “novos professores” que
desconheciam toda a caminhada histórica da rede somavam-se, então, aos que
estavam no processo, necessitando de auxílio para superar as dificuldades
vivenciadas nos primeiros anos de implantação do Ciclo.
Diante desse panorama, seria natural que a Secretaria Municipal de Educação de
Cuiabá repensasse suas ações, programas e projetos, para enfrentar mais esse
desafio, pois como afirmou Dalben (2004: p. 05),
Os inúmeros nculos estabelecidos em projetos de formação
continuada são mediados por uma noção de conhecimento.
Assim, aqueles que assumem a noção clássica de
conhecimento estarão organizados segundo perspectivas
bastante diferentes daqueles que tomam por base o paradigma
do conhecimento como uma produção social, localizado e
produzido na relação dos sujeitos com a construção da própria
vida.
Todavia, segundo informações da Assessoria/ SME, isso não ocorreu, pois, em
2001, após mudança de gestor na SME/ Cuiabá, os cursos de capacitação
relacionados aos Ciclos deixaram de ser priorizados e a formação continuada dos
professores voltou a ser realizada em grandes eventos ou através da implantação de
programas e projetos isolados que atendiam a pequenos grupos de escolas.
Portanto, podemos inferir que, a partir desse período, a rede municipal de Cuiabá
começou a perder sua característica de sistema com uma proposta educacional
coletivamente construída.
As escolas foram, então, divididas em 03 grupos:
1. As que aderiram à proposta do Secretário de Educação para se
organizarem em Ambiências e/ou Salas Temáticas, trabalhando com a
Pedagogia de Projetos (08 unidades): possuíam um consultor exclusivo
para atendê-las e atuar na formação de seus professores, além, é claro, de
investimentos financeiros na estrutura física do prédio escolar;
2. As que participavam do Programa de Gestão da Aprendizagem Escolar/
Gestar/ FNDE (07 unidades): durante 02 anos e seis meses, os professores
dessas escolas participaram de oficinas pedagógicas nas áreas de Língua
70
Portuguesa, Matemática e Psicopedagogia e eram acompanhados
semanalmente pela equipe do citado programa. A escola municipal escolhida
como locus dessa pesquisa fez parte desse grupo, sendo este um dos
motivos pelos quais a selecionamos para a realização desse estudo.
3. As demais escolas cicladas e/ou seriadas que o recebiam orientação
pedagógica específica (87 unidades): participavam apenas da formação
realizada através dos “grandes eventos”, palestras ocasionais ou de alguns
dos projetos de atividades sócio-educativas.
Talvez isso possa explicar a diversidade de matrizes curriculares existentes na rede
em 2007, visto que, de 2001 a 2004, as prioridades da SME parecem ter se
modificado e as diretrizes político-pedagógicas elaboradas para dar suporte aos
ciclos, juntamente com os programas de formação em andamento, foram
parcialmente “esquecidos”. Assim, aqueles problemas detectados no período de
implantação dos Ciclos de Aprendizagem foram se agravando gradativamente,
culminando na problemática que descrevemos inicialmente: escolas fragmentadas e
sem um eixo político pedagógico consistente. Por conta disso, aos poucos, o retorno
ao regime seriado está voltando à pauta na maioria das reuniões promovidas pelo
sindicato que representa a classe.
Essa breve contextualização contribuirá para entendermos as causas que levaram à
descontinuidade, tanto no trabalho desenvolvido nas escolas, como nos programas
de formação continuada implantados, tornando compreensível o fato de que os
cursos oferecidos pela SME/ Cuiabá, na área de Língua Portuguesa, não tenham
acompanhado os estudos desenvolvidos pelas ciências da linguagem, ficando
restritos a temas como diversidade textual e modelo interativo de leitura.
Isto posto, como seria previsível, os Referenciais Curriculares de Escola Sarã
54
,
elaborados em 1999, também apresentam alguns conflitos teóricos semelhantes aos
dos PCN de Língua Portuguesa (1º e Ciclos). Todavia, os que aparecem no
documento da rede municipal parecem mais contundentes, como por exemplo, ao
54
Em 2000, foi publicada uma nova edição das diretrizes educacionais do município de Cuiabá, o
livro intitulado: Escola Sarã Cuiabá nos ciclos de formação. Entretanto, como se tratou de uma
“quase” paráfrase da edição e devido à densidade dos problemas de ordem teórica e até mesmo
gramatical existentes no documento, optamos por centrar nossa análise na edição de 1999, inclusive
por ser esta a mais utilizada pelas escolas municipais até o ano de 2004.
71
mesmo tempo em que afirmam ter considerado os PCN na produção dos
referenciais, acabam por subvertê-los, visto que fazem opção pela organização
curricular através de Temas Geradores.
O texto introdutório da área de Língua Portuguesa aborda a evolução dos estudos
lingüísticos, mas de forma bem superficial, sem explicitar sua afiliação teórica. Em
outras palavras, não aparecem marcas lingüísticas de posicionamento do autor,
sendo que, apenas no último parágrafo, podemos inferir que uma preferência
pela concepção cio-interacionista de linguagem. Vejamos o trecho abaixo (Escola
Sarã, 1999: p.55):
É fundamental colocarmos em foco a discussão sobre a
linguagem como atividade constituidora dos sujeitos e por eles
constituída. O ser humano se faz, historicamente, através da
linguagem. As perspectivas de ampliação de suas
possibilidades, nesta área, estão intrinsecamente ligadas à
educação, no sentido amplo, cabendo à escola parte
substancial no desenvolvimento desse processo, que é
permanente.
Na seqüência, foram elencadas algumas “habilidades”
55
que deveriam ser
trabalhadas em cada ciclo e, nesse momento, percebe-se a quebra na coerência
entre a concepção de linguagem supostamente assumida e as habilidades
propostas: verificamos várias alusões ao termo tipo e tipologia, sendo que a
palavra gênero foi utilizada apenas 02 vezes, porém em sua acepção mais clássica.
Como exemplo, citaremos alguns trechos nos quais essa contradição se torna mais
visível:
Ciclo: Conhecer as diferentes tipologias textuais de acordo com seu nível
de desenvolvimento (sic), (p. 56);
Ciclo: Localizar e retirar informações de diversos tipos de texto (p. 57);
produzir diferentes tipos de texto (p.58);
55
O conceito de habilidade adotado na rede municipal está embasado em Perrenoud (1999) saber
fazer algo específico, em uma determinada situação concreta. Entretanto, ao analisarmos o
documento, verificamos que, em muitas vezes, o que foi registrado como habilidade, na realidade,
trata-se de objetivo educacional. Acreditamos que, à época da elaboração dos Referenciais
Curriculares, a abordagem de competências/ habilidades ainda não tinha sido amplamente discutida
na rede, tanto que o citado documento possui as mais variadas influências teóricas. Até o atual
momento, como podemos verificar no Dossiê Acadêmico, ainda persiste a confusão entre habilidade
e objetivo, sendo que ambos são, freqüentemente, utilizados como sinônimos.
72
Ciclo: Ler diferentes gêneros, tanto do universo cotidiano quanto do
específico (técnico, científico e literatura), (p. 58);
Quanto à prática de leitura, constatamos a existência de apenas dois itens que
poderíamos relacionar à leitura, sendo que a palavra compreensão aparece apenas
uma vez no e no Ciclos; outro fator relevante é que alguns desses itens foram
“parafraseados” dos PCN/ Língua Portuguesa/ e Ciclos. Vejamos os exemplos
abaixo:
1º Ciclo:
1. Relacionar o texto com o contexto: compreensão e interpretação (p. 56);
Nos PCN (p.114) temos: Atribuição de sentido, coordenando texto e contexto com
ajuda;
2. Emitir opiniões a partir do texto lido, ampliando seus conhecimentos (p.57);
Lembramos que este objetivo se repete no 2º Ciclo, visando mais o exercício da
oralidade que o processo de compreensão ativa;
2º Ciclo:
1. Localizar e retirar informações de diversos tipos de texto (p. 57).
Dentre todas as capacidades leitoras, apenas este aspecto foi privilegiado,
ainda que de forma isolada e sem uma finalidade concreta;
3º Ciclo:
1. Ler diferentes gêneros, tanto do universo cotidiano quanto do específico (técnico,
científico e literatura) (p. 58);
2. Realizar compreensão global de um texto, fazendo comparações com o mundo
que o cerca (p. 58);
Nos PCN (p.120) aparece: Demonstrar compreensão do sentido global de textos
lidos em voz alta.
73
Diante do exposto, podemos notar a dificuldade, por parte da Secretaria de
Educação, de realizar uma reflexão teórica mais profunda sobre o conteúdo dos
PCN/ Língua Portuguesa. Além disso, houve uma “mistura desorganizada” dos
modelos cognitivos de leitura (ascendente ou bottom-up e descendente ou top-
down), que as estratégias de leitura e as capacidades leitoras não são citadas
explicitamente nos referenciais curriculares e apenas uma ou outra aparece de
modo indireto e descontextualizado, sendo também abordadas de modo incipiente e
superficial. Percebe-se, também, que alguns termos específicos da área de Língua
Portuguesa carecem de aprofundamento teórico: gênero e tipologia, compreensão e
interpretação, etc.
Uma concepção de currículo em espiral, como era a proposta do município,
pressupõe que deve haver uma gradação no nível de complexidade das habilidades
lingüísticas, considerando também as relações existentes entre estas, em cada ciclo,
e a prática social. Entretanto, tem-se a impressão de que as “habilidades” elencadas
não se relacionam à prática social e parecem ter um fim em si mesmas.
Sabemos que diferentes instituições participaram da elaboração do documento
(UFMT, UNIC, SME/ Cuiabá e SINTEP
56
), portanto o texto apresenta indícios das
tensões políticas que permearam esse processo, o que poderia justificar a variedade
de aportes teóricos utilizados na fundamentação das diretrizes. Nesse sentido,
partindo de um olhar bakhtiniano, podemos perceber a ação de forças conflitantes
ao tentarmos agrupar essa diversidade teórica
57
, por exemplo:
1. Ao se fundamentar na Pedagogia Crítica e no trabalho com Temas
Geradores, a proposta se aproxima da concepção de Letramento Crítico e
de uma política educacional voltada para as camadas populares, para a
intervenção e transformação da realidade; o que direcionaria para a
concepção do currículo em espiral e para uma visão sócio-interacionista
de educação. Logo, parece haver o desejo de implementar uma política
educacional engajada com os ideais de mudança social.
56
As siglas significam, respectivamente: Universidade Federal de Mato Grosso; Universidade de
Cuiabá; Secretaria Municipal de Educação e Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público.
57
Faremos apenas uma análise superficial, pois essa questão requer uma discussão mais
aprofundada das teorias da Educação, o que nos distanciaria do foco da pesquisa.
74
2. Por outro lado, a opção pela organização em Ciclos de Formação foi
justificada apenas com base nas teorias de desenvolvimento humano,
através de um referencial teórico centrado em diversos autores da
Psicologia (Piaget, Wallon, Feizi, Vygotsky)
58
.
Desse modo, o texto não traz registros que relacionem estas concepções à proposta
de organização do tempo curricular
59
em sua interface com o tema gerador. Isso
contribuiu para que fossem retomados alguns pressupostos construtivistas que,
associados à visão de competência enquanto processo cognitivo e individual,
provocaram um movimento contrário ao anterior e que, implicitamente, enfatizam o
modelo autônomo de letramento.
Diante do exposto, podemos concluir que, embora os objetivos educacionais
apontem para a construção do leitor proficiente, são as práticas pedagógicas
inerentes ao letramento escolar que, geralmente, prevalecem e predominam no
sistema de ensino.
Essas discussões demonstram a importância da existência de programas de
formação continuada para a consolidação das políticas públicas. No entanto, quanto
à rede municipal, percebe-se que, mesmo no período em que havia um programa
instituído (1997 a 2000), as discussões teóricas sobre a área de Linguagem
continuavam reduzidas a aspectos da estrutura textual, resultantes de uma visão
dicotômica de linguagem, na qual não há imbricamento entre os processos de leitura
e escrita. Esses problemas parecem ter se agravado com o tempo, devido à
descontinuidade das políticas públicas implantadas na rede municipal.
Esses fatos, aliados à falta de um programa de formação articulado com as
necessidades das escolas municipais, provocaram um “corte” no processo de
avanço das práticas pedagógicas desenvolvidas na rede municipal e, por isso,
concordamos com Figueiredo (2005: p. 190):
Assim, onde se esperava a continuidade de projetos que
pudessem levar a uma verdadeira transformação da escola,
encontramos o continuísmo. A cada interrupção e retomada de
58
O texto da Escola Sarã traz uma diversidade de aportes teóricos, muitas vezes conflitantes.
59
Conceito importantíssimo em uma organização por ciclos, pois permite maior interação entre
envolvidos no ato educativo, favorecendo a participação em atividades coletivas e respeitando os
diferentes ritmos de aprendizagem.
75
forma descontinuada, é como se o passado sobre o qual
atuamos no presente e construímos o futuro fosse negado.
Assim, é a desconsideração do passado que leva à
estagnação.
Diante disso, iniciou-se o processo de fragmentação na rede municipal e, ao
fazermos uma análise situacional do problema, podemos levantar a seguinte
hipótese: desconsiderar os programas de formação em andamento parece ser uma
prática comum dos governantes em início de mandato, assim como ignorar as
necessidades demandadas pelo grupo docente, dando vazão a projetos individuais,
fato este que pode provocar o desinteresse dos profissionais da educação quanto à
implementação de mudanças na prática pedagógica.
Além disso, a desarticulação entre as políticas públicas e as necessidades
elencadas pelas unidades de ensino acabam gerando, da mesma forma, uma
indiferença por parte dos docentes.
Estas constatações nos levam a pensar que, talvez, não haja desejo real (por parte
de alguns gestores) de transformações no setor educacional, pois a cada mudança
de governo, todo o processo de construção iniciado é, geralmente, descartado
e/ou ignorado. Isso traz sérias conseqüências, principalmente ao setor educacional,
das quais citaremos apenas uma: com o passar do tempo, os professores se
“acostumam” a essa dinâmica e se tornam indiferentes a qualquer proposta de
mudança, portanto, preferem o se envolver, efetivamente, nas discussões acerca
de “novas” práticas pedagógicas.
Grande parte dos profissionais que atuam na formação de professores ouviu a
seguinte frase: “Não vamos nos preocupar em entender isso, quando acabar essa
gestão, vai mudar tudo de novo”; por isso, acreditamos que é imprescindível
distinguirmos “política pública que nasce do engajamento legítimo dos cidadãos
com as transformações sociais , de política de governo ou de gestão(Figueiredo,
2005: p.190).
O caso do município de Cuiabá parece ilustrar muito bem esta questão, pois,
atualmente, a rede está de volta ao ponto de partida, tentando se reorganizar para
retomar a caminhada. Portanto, acreditamos que esse é o momento ideal para
reavaliar e repensar a organização do sistema.
76
De acordo com informações da unidade escolar pesquisada, em 2005, a SME
implementou algumas medidas para se reestruturar, como por exemplo, a definição
de parâmetros avaliativos comuns para todas as unidades escolares, através da
criação do “Dossiê Acadêmico do Aluno”, instrumento utilizado para registro
avaliativo das competências construídas pelos discentes durante os Ciclos de
Formação.
Todavia, antes de resolver algumas questões primordiais, como a necessidade de
redefinir as diretrizes político-pedagógicas expressas no documento da Escola Sarã,
com a adoção do citado dossiê, a SME/ Cuiabá acabou criando outro problema.
Até 2005, a formação continuada
60
oferecida aos professores não discutia a
Abordagem de Competências
61
, sua didatização e implicações para a prática
educativa desenvolvida nas áreas do conhecimento. Esse fato se reflete na própria
elaboração do conteúdo do Dossiê, documento que, na prática, passou a substituir
os Referenciais Curriculares da Escola Sarã.
2.2.1. Surge um novo registro avaliativo na rede municipal de Cuiabá: o
“Dossiê Acadêmico”
O Dossiê Acadêmico é composto por várias matrizes de “competências e
habilidades”
62
, organizadas em Áreas do Conhecimento e divididas em ciclos,
sendo que as habilidades elencadas deverão ser trabalhadas pelos professores ao
longo do triênio, logo, torna-se imprescindível refletirmos sobre o citado documento.
No entanto, focalizaremos apenas os pressupostos teóricos relacionados ao
processo de ensino-aprendizagem de leitura:
60
Na realidade, foram apenas duas palestras sobre esse tema, proferidas por Celso Antunes, teórico
da área educacional, ambas insuficientes quanto ao fornecimento de subsídios para a transposição
didática e, segundo alguns diretores de escolas municipais, o conteúdo abordado foi o mesmo, nos
dois eventos.
61
Também denominada de Pedagogia de Competências, esta abordagem ainda provoca muitas
discordâncias na esfera acadêmica. E, para maiores detalhes acerca de sua organização e
pressupostos, recomendamos a leitura de autores como Perrenoud, (1998) e Lucie Tanguy (1997).
62
Como já foi dito anteriormente, parecia haver um grande desejo de mudança na rede municipal, por
isso a mesma se apropriou dos discursos que circulavam na esfera educacional, mesclando-os em
suas propostas pedagógicas: abordagem de competências, tema gerador, metodologia de projetos,
etc. Isso resultou na união de teorias, por vezes contraditórias, provocando sérios problemas.
77
1º Ciclo:
1. Ler pequenos textos destacando o que entendeu;
2. Valorizar a leitura como fonte de fruição estética e entretenimento.
Já nos PCN (p. 110) aparece: Valorização da leitura como fonte de fruição
estética e entretenimento.
2º Ciclo:
1. Identificar as informações relevantes em diferentes tipos de texto;
2. Relatar oralmente fatos de textos lidos e ouvidos;
3. Expressar a compreensão de uma história lida e/ou ouvida;
4. Trocar impressões e informações com outros leitores a respeito de temas
diversos;
5. Ler diferentes gêneros textuais (compreensão/ paráfrase interpretação/
polissemia);
6. Ler e oralizar o texto;
3º Ciclo:
1. Parafrasear idéias explícitas de um texto e explicar idéias implícitas;
2. Reproduzir e transmitir com fidelidade diferentes tipos de mensagens:
ouvidas, lidas, transmitidas por vários meios de comunicação;
Como podemos verificar, os avanços foram pouco significativos (o Ciclo passou a
ter uma quantidade maior de objetivos relacionados à leitura) e ainda persistem os
problemas teóricos. Quanto ao processo de ensino-aprendizagem de leitura, temos
agora uma maior ênfase no modelo cognitivo/ bottom-up, ou seja, a leitura é
considerada como um processo de decodificação, cabendo ao leitor realizar a
apreensão do significado literal do texto escrito.
Esta constatação não nos causou estranhamento, pois se formos pesquisar os
métodos de alfabetização utilizados na rede municipal, veremos a predominância
78
dos sintéticos (soletração e silabação), os quais estão embasados nestes
pressupostos.
Destacamos, ainda, que uma das conseqüências do trabalho com os citados
métodos é que, geralmente, o aluno leva muito tempo tentando decodificar as letras
em fonemas, assim, quando chega ao final da leitura, não consegue compreender o
sentido da frase ou do texto que acabou de ler.
Diante dessas reflexões, ao compararmos este documento com os Referenciais
Curriculares/ Ciclos de Formação, nos quais aparecia, ainda que de maneira
“tímida”, uma certa preocupação com o contexto na atribuição de sentido ao texto,
veremos que isso não apareceu, nem de modo implícito, no referido dossiê.
Os indicadores avaliativos se restringem a aspectos superficiais de algumas das
capacidades leitoras, chegando mesmo a possuir problemas de coesão (ou
coerência?). Exemplo: Ler e oralizar o texto; a que “tipo” de leitura essa
“habilidade” se refere? Saber ler em voz alta e com entonação? Inferimos que, talvez
isso seja reflexo da concepção de leitura enquanto “oralização” do texto escrito.
Quanto ao Ciclo, temos a impressão de que, para demonstrar compreensão do
que leu, o aluno deverá apenas repetir (parafrasear) o texto ou, ainda, reproduzir
com fidelidade a mensagem lida/ ouvida, transformando-se em “ventríloquo” do
professor e dos autores, assim como ocorreu nos PCN e, por isso, concordamos
com Rojo (2001: p. 253):
Em suma, quando o texto está empiricamente presente em sala
de aula e é objeto de leitura por parte dos alunos e professores,
é desta leitura plana, descontextualizada, unívoca, monofônica,
tão comum nas práticas de leitura escolares em ngua
Portuguesa, mas também em outras áreas do conhecimento
que se trata. Leituras de localização e de “copiação
(Marcuschi, 1996) da informação, para efeitos de controle
escolar, em vez de réplica ativa e crítica da significação, que
seria de se desejar no letramento cidadão. Ler é, aqui, localizar
e repetir informação, julgada relevante pela instituição para
controle dos sentidos, de maneira monofônica, monológica,
impositiva, controladora e inflexível (Signorini, 1995). Ler é
reconhecer e aceitar acriticamente a significação do autor (ou
do leitor, autorizado o professor), na melhor tradição da
palavra autoritária (Bakhtin, 1935-35/ 1988).
79
Assim, diante desse modelo de letramento escolar, ressaltamos que a formação
continuada em serviço é peça fundamental para a melhoria da qualidade do ensino
em qualquer área do conhecimento e, para que ela efetivamente aconteça,
necessitamos de programas de formação que se articulem com as propostas
pedagógicas das escolas, oferecendo possibilidades de respostas aos anseios da
comunidade escolar. Estes programas deveriam considerar, também, o processo
sócio-histórico de constituição de cada rede (municipal ou estadual), possibilitando
aos envolvidos a construção da autonomia, que se refletirá na valorização da função
docente e na criação de espaços para o estabelecimento de compromissos com as
ações educativas planejadas e discutidas coletivamente.
Diante do exposto, acreditamos que o simples acúmulo de palestras, seminários,
cursos, etc., não garante a transposição didática dos conhecimentos e técnicas
adquiridas para a realidade da sala de aula. Por isso, os programas de formação
continuada devem ser compostos, também, por mecanismos de acompanhamento e
avaliação da prática docente dos cursistas, além, é claro, de estarem articulados
com os Projetos Político-Pedagógicos das unidades escolares.
Lembramos, ainda, que qualquer que seja o programa de formação continuada a ser
implantado na rede municipal, este tem de estar em consonância com os
Referenciais Curriculares vigentes e, conseqüentemente, os instrumentos
elaborados para a sistematização dos registros avaliativos deveriam ser produto
desse documento. Portanto, a reestruturação das diretrizes educacionais deve
repercutir em um programa de formação, na área de Linguagem/ Língua
Portuguesa, que contemple as seguintes questões:
Quais as contribuições das pesquisas lingüísticas mais atuais sobre o
processo de ensino-aprendizagem de leitura e escrita?
Como o conceito de letramento pode afetar as ações pedagógicas
desenvolvidas, principalmente nas séries/ etapas iniciais do Ensino Básico?
O que são gêneros discursivos? Como utilizá-los em sala de aula?
Como o trabalho com as capacidades de leitura e de escrita contribui para a
construção da competência discursiva?
80
Destacamos, também, que, ao reavaliar a política educacional implantada e as
ações desenvolvidas, os gestores das Secretarias de Educação devem ter em
mente que, para formarmos cidadãos críticos e atuantes, é imperativo que cada
elemento da prática educacional esteja articulado: desde as propostas de governo e
os programas federais de formação docente, passando pelos conteúdos
curriculares, até as posturas docentes em sala de aula.
Sabemos que essa tarefa é muito complexa, pois depende de fatores políticos,
sociais e econômicos. Contudo, ao criarmos espaços para que os docentes
participem de discussões acerca de seu próprio fazer pedagógico, poderemos
estimular o processo de reflexão, trazendo, assim, avanços concretos, tanto para a
práxis desenvolvida em sala de aula, quanto para a construção, por parte dos
alunos, de outros tipos de letramento.
81
Capítulo 3: Metodologia de Pesquisa
Neste capítulo, abordaremos os fatores relacionados à metodologia adotada no
desenvolvimento da pesquisa, quais sejam: a contextualização dos sujeitos, os
instrumentos utilizados para a coleta de dados e a delimitação de categorias de
análise, sendo que a interpretação dos dados se constituirá no tema do capítulo
subseqüente.
Assim, em consonância com os fundamentos teóricos que norteiam esse estudo
(teorias enunciativo-discursiva de base bakhtiniana), optamos por realizar uma
pesquisa de natureza qualitativa, partindo do percurso metodológico proposto por
Bakhtin/ Volochinov (1929: p.129):
1. As formas e os tipos de interação verbal em ligação com as
condições concretas em que se realiza.
2. As formas das distintas enunciações, dos atos de fala isolados,
em ligação estreita com a interação de que constituem os
elementos, isto é, as categorias de atos de fala na vida e na
criação ideológica que se prestam a uma determinação pela
interação verbal.
3. A partir daí, exame das formas da língua na sua interpretação
lingüística habitual.
Portanto, ao situarmos nosso olhar de pesquisador, imbricado na vertente
bakhtiniana, esperamos que a análise documental, associada aos dados coletados,
possa nos fornecer subsídios para respondermos às seguintes questões:
Qual a proposta da rede municipal para o ensino de leitura nos anos iniciais
do Ensino Fundamental?
Como a concepção de ensino-aprendizagem de leitura expressa nos PCN de
Língua Portuguesa (1º e Ciclos) se reflete nos documentos oficiais da
Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá e no Projeto Político-
pedagógico da escola pesquisada?
Quais são as capacidades de leitura construídas pelos discentes do ano
pesquisado? Qual o tipo de capacidade priorizada pela escola?
82
Quais as relações existentes entre: as capacidades de leitura demonstradas
pelos alunos e o letramento não escolar?
Qual a importância do professor no processo de formação do leitor crítico?
Temos clareza de que a “amostragem” utilizada nessa pesquisa é pouco significativa
em relação ao número de escolas municipais existentes em Cuiabá e que a
ampliação de sujeitos nos permitiria compor um “retrato” mais fiel da rede municipal.
No entanto, insistimos na relevância deste estudo, enquanto instrumento de reflexão
sobre o ensino de leitura, visto que o locus da pesquisa parece representar a
realidade de muitas outras unidades escolares pertencentes ao mesmo sistema,
conforme o que demonstram as condições que iremos descrever.
Desse modo, na busca de elementos que nos auxiliem a compreender melhor a
situação atual da rede municipal, selecionamos a EMEB Filogônio Corrêa que, por
ser uma das mais antigas, vivenciou todo o processo histórico relatado no capítulo
anterior. Além disso, a escola participou, durante 02 anos e 06 meses, do Programa
de Gestão da Aprendizagem Escolar
63
/ Gestar/ MEC, direcionado às séries iniciais
e, a professora Marta
64
, um dos sujeitos da pesquisa, também freqüentou as oficinas
pedagógicas realizadas nesse período.
A seguir, contextualizaremos nossos sujeitos de pesquisa e detalharemos cada um
destes instrumentos.
3.1 Metodologia de Coleta de Dados
Considerando que a abordagem metodológica utilizada fundamenta-se na vertente
enunciativo-discursiva (bakhtiniana), tanto os sujeitos, quanto o contexto e os
fenômenos estudados, devem ser compreendidos em seus aspectos sócio-
históricos. Nesta perspectiva, a pesquisa em Ciências Humanas deve ser concebida
63
De 2002 a 2004, esse programa oferecia oficinas pedagógicas semanais de ngua Portuguesa e
Matemática aos professores das séries iniciais. Na área de Linguagem, o material do curso enfatizava
o trabalho com as capacidades de leitura e escrita a partir dos gêneros textuais. também outra
versão do programa, destinada ao 3º e 4º Ciclos e que foi implantada apenas na rede estadual.
64
Nome fictício atribuído à professora pesquisada.
83
não como um simples ato de cognição por parte do pesquisador, mas como um
processo dialógico, uma vez que o sujeito, objeto do conhecimento, sempre irá
assumir uma atitude responsiva, podendo, inclusive, alterar o “rumo” da pesquisa.
Nesse sentido, concordamos com Amorim (2001: p. 29):
(...) O próprio fato de que todo objeto de pesquisa é um objeto
construído e não imediatamente dado, já implica um trabalho
de negociação com os graus de alteridade que podem suportar
a pesquisa e o pesquisador. O desejo de alteridade enquanto
motor da pesquisa em Ciências Humanas não é primário nem
inanalisável.
Assim, conforme dissemos no capítulo 1, o dialogismo e a alteridade assumem
papel de extrema importância na construção de sentido acerca do nosso objeto de
estudo, pois permeiam todo o processo de coleta e análise dos dados. E, refletindo
sobre esses pressupostos, nos remeteremos a Bakhtin (1952-1953/ 1979: p. 381):
A palavra do outro deve transformar-se em minha-alheia (ou
alheia-minha). (...) No processo da comunicação dialógica com
o objeto, este se transforma em sujeito (o outro eu).
Desse modo, em determinados momentos, a própria pesquisadora constituiu-se em
fonte de pesquisa, principalmente no que se refere ao resgate do processo sócio-
histórico da rede municipal de Cuiabá. Já em outros, as interações ocorridas durante
a pesquisa de campo, acabaram por transformar as questões de pesquisa que foram
traçadas inicialmente. Em síntese, no campo de pesquisa, o outro
65
e o pesquisador
se constituem dialogicamente através das relações estabelecidas durante as
interações, fazendo com que os dados coletados neste contexto específico sejam
representativos e significativos. Esses procedimentos, por sua vez, possibilitarão a
compreensão tanto do objeto, quanto das relações interdiscursivas existentes na
esfera em estudo.
Todavia, sabemos que as relações de alteridade se instituem, diferentemente, de
acordo com o lugar/ função que ocupamos, portanto, de certa forma, a diferença que
65
Devido à proximidade entre contexto estudado e a própria pesquisadora, ao longo deste trabalho o
outro, em alguns momentos, deixa de ser a comunidade escolar analisada e passa a ser a Instituição/
SME e, assim, sucessivamente.
84
permeia o ato de pesquisa continuará existindo e transformará o sujeito em “outro”.
Por isso, concordamos com Amorim (2001: p.31):
Colocar esse sujeito no lugar de objeto de estudo instaura entre
o sujeito cognoscente e o sujeito a conhecer uma relação de
alteridade fundamental que emerge de uma diferença de lugar
na construção do saber. O outro se torna estrangeiro pelo
simples fato de eu pretender estudá-lo.
Destacamos, ainda, que a abordagem metodológica adotada nos auxiliará a
compreender, mais facilmente, as relações de poder que se instauram no ato
dialógico, principalmente, a partir das funções sociais que os interlocutores ocupam,
institucionalmente ou não, o que, muitas vezes, poderá expor elementos de
assimetria existentes nas interações, transformando a linguagem em um “campo”
natural de confronto ideológico, o que nos remete, novamente, a Amorim (2001:
p.71):
Se, de um lado, a boa percepção exige certa familiaridade, uma
vez adquirida, é necessário empreender um movimento em
sentido inverso para manter a exterioridade do objeto em
relação ao sujeito. É importante que o equilíbrio se mantenha,
pois se o sujeito se torna mais forte que o objeto, ele absorve o
outro sem que este imprima suas marcas; se o objeto domina,
é o sujeito que corre o risco de renunciar a seu próprio ser.
Nesse aspecto, há, ainda, a questão da exotopia: o outro sempre será aquele que
observa e analisa “de fora”, pois está em uma posição que ele pode ocupar,
entretanto, nas situações de interação face a face, temos uma contínua alternância
nas relações entre o “eu e o outro”. Isso traz, para o processo de pesquisa, a
diversidade de vozes que permeiam tanto o objeto a ser estudado, como cada
experiência construída na relação com o outro.
Ressaltamos, ainda, que, no caso específico desse trabalho, o exercício de
dialogismo, de alteridade e de exotopia não foram tarefas fáceis
66
. No entanto,
procuramos “dar voz” aos nossos sujeitos, deixando que os dados nos guiassem no
66
Lembramos ao leitor que a pesquisadora trabalhou durante 11 anos, como assessora pedagógica,
na Secretaria Municipal de Educação.
85
processo de compreensão, pois concordamos com Bakhtin (1952-1953/ 1979:
p.366):
(...) A cultura do outro se revela com plenitude e
profundidade (mas não em toda a plenitude, porque virão
outras culturas que a verão e compreenderão ainda mais) aos
olhos de outra cultura. Um sentido revela as suas
profundidades encontrando-se e contactando com o outro, com
o sentido do outro: entre eles começa uma espécie de diálogo
que supera o fechamento e a unilateralidade desses sentidos,
dessas culturas.
Diante desses pressupostos e considerando que a relação inicial da pesquisadora
com a escola se deu, primeiramente, em nível institucional
67
, optamos por organizar
nossa inserção no locus de estudo, de modo gradativo e cuidadoso, a fim de não
comprometer a coleta de dados. Conseqüentemente, como forma de “mapear” a
realidade da unidade escolar, o trabalho de campo foi dividido em dois momentos:
1º - contemplou a coleta e análise de alguns documentos, tais como:
a) Diretrizes Político-Pedagógicas da Escola Sarã (referencial teórico que
fundamenta o sistema de ensino da rede municipal de Cuiabá);
b) O Dossiê Acadêmico do Aluno
68
elaborado pela Secretaria de Educação;
c) O Projeto Político Pedagógico (PPP) desenvolvido pela escola
pesquisada;
d) Os modelos de matrizes curriculares utilizados na rede municipal;
e) O planejamento da professora pesquisada;
f) Relatórios de observação direta
69
em sala de aula de alunos do ano do
curso de Pedagogia/ UFMT.
67
No período de 2001 a 2003, lembramos ao leitor que a pesquisadora coordenou o Programa
Gestar/ MEC na rede municipal de Cuiabá, sendo que EMEB. Filogônio Correa foi uma das unidades
beneficiadas pelo programa.
68
Conforme já mencionamos, esse documento registra as habilidades a serem desenvolvidas pelos
alunos em cada ciclo.
69
Os estudantes de Pedagogia observaram, durante uma semana no mês de abril/2007, as aulas de
diferentes professores que atuam no 3º ano (2ª série).
86
2º - consistiu na aplicação de:
a) Questionários um para a professora (acerca de seu processo de
formação continuada e concepções de linguagem) e outro para os alunos
(direcionado a verificar quais práticas de letramento são realizadas pelos
discentes fora do espaço escolar);
b) Instrumento avaliativo documento elaborado especialmente para
realizarmos o diagnóstico das capacidades de leitura construídas pelos
alunos.
c) Entrevistas informais com a equipe gestora da unidade escolar, a fim de
conhecermos quais as orientações pedagógicas dadas aos docentes, o
Projeto Político-pedagógico desenvolvido, etc.
Lembramos, novamente, que a amizade existente entre a equipe gestora da escola
e a pesquisadora facilitou o acesso ao locus e a coleta de materiais. Entretanto, isto
aumentou a carga de responsabilidade sobre o sujeito/ pesquisador, uma vez que foi
gerada grande expectativa
70
quanto aos resultados desse estudo e sua contribuição
para a melhoria das ações educativas desenvolvidas no ambiente escolar.
Em face ao exposto, convidamos o leitor a “mergulhar” conosco na corrente
interdiscursiva tecida pelos dados coletados para, finalmente, compreendermos o
que, de fato, acontece em nosso locus de pesquisa, no que diz respeito ao processo
de ensino-aprendizagem de leitura.
3.2 Descrição do Locus
A pesquisa foi realizada na Escola Municipal de Ensino Básico Prof. Filogônio
Correa, situada no bairro Campo Velho, em uma região próxima ao centro de Cuia
(MT). Quanto à estrutura física, notamos que a necessidade de algumas
reformas, principalmente dos banheiros utilizados pelos alunos e da quadra
70
Por conta dessa situação, alguns dos resultados obtidos já foram “repassados” à direção da
unidade escolar. Todavia, esse assunto será abordado, com maiores detalhes, nos capítulos
subseqüentes.
87
esportiva. A escola possui, também, 09 salas de aula que funcionam em dois
períodos (matutino e vespertino); 01 biblioteca; 01 sala para os professores; 01
secretaria; 01 diretoria; 01 espaço para a Sala de Apoio à Aprendizagem
71
; 01
cozinha; 01 almoxarifado; 01 pátio coberto; 01 quadra esportiva.
outro fator que merece atenção: algumas salas são muito prejudicadas pelo
excesso de barulho externo, o que dificulta a compreensão, pois quase não se pode
ouvir com clareza o que a professora está dizendo, mesmo que os alunos fiquem em
silêncio. A diretora nos informou que esses problemas estruturais são decorrentes
do fato de que esta escola é uma das mais antigas da rede municipal: foi inaugurada
em 25 de janeiro de 1971, fruto da luta dos moradores contra lideranças políticas da
época, as quais desejavam a desapropriação do terreno onde hoje se situa a escola,
para a manutenção de um cemitério:
Os moradores, (...), fundaram uma associação com o propósito
de lutar por melhorias na comunidade. Com a associação
criada, os moradores puderam reivindicar o traslado do
cemitério e construíram no local, um barracão para o
funcionamento de uma escola. (Projeto Político Pedagógico,
2007: p. 08).
O nome da unidade foi escolhido pelos vereadores, como forma de homenagear o
professor Philogônio de Paula Correa, figura destacada na sociedade cuiabana, pois
exerceu as funções de Catedrático de História Geral do Liceu Cuiabano, além de ter
sido, também, jornalista, vereador e deputado estadual.
Contando com 36 anos de existência, verificamos que a escola passou por todos os
momentos descritos no capítulo anterior e que culminaram com a reorganização da
rede municipal em Ciclos de Formação, ao qual a comunidade escolar também
aderiu no ano 2000, passando a atender a modalidade de Educação Infantil, e
Ciclos.
71
Na Sala de Apoio são atendidos os alunos que possuem dificuldade de aprendizagem, em horário
oposto ao que estes estudam: os discentes são distribuídos em grupos de 10, os quais participam de
duas aulas semanais. Ressaltamos que somente os alunos de unidades cicladas, a partir do ano/
Ensino Fundamental, são beneficiados pela Sala de Apoio e na medida em que as dificuldades
apresentadas forem superadas, os grupos iniciais são substituídos por outros.
88
Na estrutura ciclada
72
da rede municipal estão distribuídos, de modo geral, 04
professores para cada turma, a saber: 01 professor referência, que atua nas áreas
de Conhecimento Lingüístico, Conhecimento Lógico-matemático, Ciências Naturais
e Ciências Sociais; 01 professor de Educação Física; 01 professor de Artes para o 1º
Ciclo e 01 professor de Língua Estrangeira para o Ciclo; 01 professor da Sala de
Apoio à Aprendizagem.
Atualmente, a escola possui 528 alunos, sendo que a maior parte destes é residente
no próprio bairro ou nos circunvizinhos. Segundo a diretora, os moradores preferem
a escola municipal às estaduais que se localizam nas proximidades. Portanto, as
salas de aulas estão com o número máximo de alunos permitido pela legislação
municipal, a saber: 25 para o 1º Ciclo e 35 para o 2º Ciclo.
Segundo o PPP (2007: p. 10), a maior parte da clientela da escola (52%) nasceu em
Cuiabá; 16% em outras cidades de Mato Grosso e 32% oriundos de outros estados.
quanto ao grau de escolaridade dos pais dos alunos: 37% cursam ou cursaram o
Ensino Médio; 36% concluíram o Ensino Fundamental; 18% cursaram da a
série; 8% cursaram ou estão cursando o Ensino Superior e 2% não são
alfabetizados.
Nesse contexto, a maioria da comunidade escolar pertence à classe média baixa,
apresentando renda familiar de até 1 salário mínimo (43%); 1 a 5 salários mínimos
(54%); 5 a 10 salários mínimos (1%); apenas 2% não declararam a renda familiar.
Desse modo, considerando a diversidade da realidade sócio-cultural e econômica
dos alunos, a unidade escolar busca desenvolver uma proposta educativa que vá ao
encontro dos anseios e necessidades da comunidade, ou conforme exposto no PPP
(2007: p. 10):
A expressiva clientela advinda de bairros circunvizinhos (49%),
de realidade e história de vida distintas torna a escola um
espaço onde a diversidade sócio cultural e econômica deva ser
trabalhada, buscando um currículo e uma filosofia que atenda
às diferenças, oportunizando a construção de conhecimentos
para todos os alunos.
72
Esta é a estrutura “padrão” de organização das escolas cicladas.
89
Entretanto, a diretora da escola declarou que , ainda, muita dificuldade para a
concretização dos objetivos educacionais expostos no PPP
73
. Um dos problemas
destacados foi a falta de participação efetiva da comunidade nas atividades
escolares, o que tem prejudicado o trabalho realizado e, atualmente, embora a
situação já tenha melhorado, ainda está longe de ser a ideal.
3.2.1 A biblioteca escolar
A biblioteca da EMEB. Filogônio Correa funciona em uma sala de tamanho médio e
conta com um pequeno acervo, com cerca de 500 exemplares de livros, entre os
quais temos a predominância dos livros de literatura infantil (293), seguido pelos
didáticos (207), ambos pertencentes a diversas coleções, umas recebidas através
de doações particulares e outras encaminhadas pelo MEC.
O espaço também funciona como sala de vídeo, sendo que lá estão: 01 televisão, 01
DVD e 01 retro-projetor. Notamos que o ambiente é agradável e os alunos, tanto
podem pegar livros emprestados para ler em casa, como podem ler na própria
biblioteca.
A rede municipal possui cnicos específicos para “cuidar” das bibliotecas e, para
exercer esta função, os servidores participaram de um curso profissionalizante,
voltado para o trabalho de bibliotecário, oferecido pela própria instituição através de
um programa de formação, destinado às demais categorias profissionais que atuam
nas unidades escolares, a saber, vigilante, auxiliar de serviços gerais, merendeiras e
oficiais administrativos.
A EMEB. Filogônio Correa possui uma funcionária para cuidar do acervo e do
material tecnológico e esta optou por trabalhar apenas no período matutino, de
acordo com a sua carga horária (30h); em conseqüência disso, a biblioteca fica
fechada no período vespertino. Assim, das 13:00 às 17:00h, caso alguém necessite
de algum livro ou tenha de fazer alguma pesquisa, deverá solicitar permissão da
diretora.
73
Esclarecemos que o Projeto Político Pedagógico da EMEB. Filogônio será objeto de uma análise
mais detalhada no próximo capítulo.
90
A equipe gestora nos informou que segundo a Instrução Normativa . 01/2007/
SME, a escola tem direito somente a um TMD
74
, uma vez que é considerada como
unidade de porte (tamanho) médio.
Nesse aspecto, destacamos que, ao utilizar como critério o porte das unidades, a
SME/ Cuiabá acabou criando uma situação, no mínimo, curiosa: algumas escolas
não possuem biblioteca, mas contam com um TMD em seu quadro funcional.
A diretora afirmou que, embora o acervo seja pequeno, é suficiente para atender a
demanda dos alunos, pois dos 528 alunos matriculados, apenas 30% utiliza a
biblioteca com certa freqüência. Citou, ainda, a iniciativa de uma das professoras do
ano (4ª rie): a docente estabeleceu que todos os seus alunos deveriam ler 10
livros durante o ano, sem compromissos avaliativos, mas com a “obrigação” de
contar aos colegas sobre o que leram. Esta atividade é feita com os livros de
literatura que estão na biblioteca e parece ter mobilizado os alunos do ano, visto
que estes são os que mais utilizam o espaço.
Diante do exposto, acreditamos que a escola poderia aproveitar melhor a biblioteca,
seja através do desenvolvimento de projetos direcionados à leitura, ou mesmo
interdisciplinarmente, com a inclusão dessa questão no projeto semestral
75
implementado pelos professores durante o ano letivo.
3.3 Os sujeitos da pesquisa
Conforme dissemos, a pesquisa foi realizada na EMEB. Filogônio Correa e teve
como sujeitos a professora Marta
76
e seus 27 alunos do ano/ Ensino
Fundamental.
74
Técnico em Multi-meio Didático, esta sigla se refere cargo exercido pelos funcionários que cuidam
da biblioteca e do material tecnológico (vídeo, televisão, DVD, entre outros). Segundo informação do
setor de Recursos Humanos da SME/ Cuiabá, a maioria dos “TMDs” entrou na rede municipal como
Auxiliar de Serviços Gerais, atuando nesta função até o término do curso profissionalizante, após o
qual eram “enquadrados” como técnicos e passavam a exercer esta nova função.
75
Lembramos ao leitor que a unidade escolar organiza o conteúdo a ser trabalhado através de
projetos semestrais.
76
Lembramos ao leitor que este é o nome fictício atribuído à professora pesquisada.
91
Embora tivéssemos uma relação amistosa com a professora pesquisada,
percebemos que esta manteve certa reserva quanto a mostrar seu planejamento ou
permitir a observação direta das aulas. Em face do exposto, procuramos não insistir,
a fim de que nossos pedidos não assumissem caráter de “ordem”, pois, como
dissemos, para a docente, a imagem da pesquisadora ainda estava imbricada à da
SME.
Acreditamos que, de certo modo, este aspecto parece ter permeado a maioria das
interações ocorridas no ambiente escolar, por exemplo, invariavelmente, ouvíamos,
como se fosse uma saudação, a seguinte frase: o que você está “mandando” hoje?
Mesmo com essa dificuldade inicial, ao explanarmos acerca dos objetivos dessa
pesquisa, conseguimos obter o apoio da equipe gestora para realizarmos a coleta de
dados, sem maiores problemas.
3.3.1 A professora
Marta se tornou professora da rede municipal no ano de 2000, após ser aprovada
em concurso público
77
para atuar nas ries iniciais do Ensino Fundamental. E,
portanto, não participou do movimento descrito no capítulo 2, que culminou com a
implantação dos Ciclos de Formação.
Todavia, a partir dos registros da escola, verificamos que a educadora trabalha na
citada unidade desde 2001, com carga horária de 20h/ semanais
78
. Este fato
demonstra que a mesma estabeleceu vínculos com o grupo docente da unidade e
que já conhece e é conhecida pela comunidade escolar.
A sua entrada na rede municipal coincidiu com o início de sua formação acadêmica,
visto que, em 2005, a mesma concluiu o curso de Pedagogia na UFMT e, em 2007,
concluiu o curso de Especialização em Docência Universitária promovido pelo
Instituto de Educação/ UFMT.
77
Em 1999, foi realizado o último concurso público promovido pela prefeitura de Cuiabá para o cargo
de professor.
78
No ano letivo de 2007, a profª. Marta es trabalhando em regime de 40h na mesma unidade
escolar pesquisada: 4º ano/ matutino e Sala de Apoio à Aprendizagem/ vespertino.
92
Percebe-se que, nos últimos sete anos, a educadora teve de administrar seu tempo
para conciliar as demandas de sua vida pessoal, seu trabalho como professora, a
formação acadêmica e a continuada.
Ressaltamos, ainda, que o período da graduação coincidiu com a sua participação
nas oficinas do Programa Gestar/ MEC, sendo que, nesta mesma época, a turma na
qual atuava era monitorada pelo citado projeto, através de avaliações sistêmicas
79
.
Assim, como parte do processo de formação, a profª. Marta tinha “tarefas” a cumprir,
como por exemplo, utilizar em sala de aula os conteúdos estudados nas oficinas
pedagógicas, com acompanhamento das formadoras
80
/ SME.
Em relação a esse processo, a docente comentou:
Esse curso contribuiu muito com a minha formação: desenvolvi
noções básicas sobre diferentes tipos de textos, processos de
leitura e interpretação de textos, compreensão sobre variações
lingüísticas. Na produção de texto, aprendi a importância da
coerência e dos elementos coesivos. Esses conhecimentos de
leitura e produção têm sido fundamentais na minha prática em
sala. (trecho extraído do questionário)
Além disso, de 2006 e 2007, a docente participou de outro programa de formação
promovido pelo MEC, o Praler, com duração de 02 anos, sendo que as oficinas
foram ministradas na própria escola, contemplando temas relacionados ao processo
de alfabetização. Destacamos, ainda, que o material do Praler se fundamenta na
concepção de letramento, propondo que a alfabetização seja feita a partir do
trabalho com os gêneros textuais, dando ênfase, também, ao desenvolvimento da
linguagem oral.
Segundo informações da profª. Marta, dentre os diversos cursos dos quais
participou, estes foram os mais significativos, pois lhe deram noções de como
trabalhar com habilidades/ competências e com os gêneros textuais. Entretanto,
reconhece que necessita de mais estudo sobre estes temas, a fim de que possa
organizar melhor o trabalho realizado em sala de aula. Sobre isso, a educadora
declarou que:
79
Os alunos passaram por uma avaliação inicial, de entrada no programa, e a cada ano, verificava-se
a progressão dos mesmos, em relação às habilidades de Leitura e Produção de Texto.
80
As formadoras pertenciam ao quadro funcional da SME e acompanhavam tanto o planejamento
das aulas, quanto a aplicação do material proposto pelo programa.
93
(...) necessito de um aprofundamento. Mesmo conhecendo
pouco sobre essa forma de ensinar, procuro colocar em prática.
Organizo as atividades com o objetivo de desenvolver as
habilidades que são necessárias à faixa etária dos meus
alunos. É mais complexo trabalhar dessa forma porque requer
mais conhecimento e mais tempo para organizar as atividades
de aprendizagem. (trecho extraído do questionário)
Sabemos que a observação direta das aulas da educadora poderia aprofundar
nosso olhar. Todavia, dois fatores que nos fizeram repensar essa estratégia:
primeiro, o tempo disponível para a pesquisa de campo, registro, sistematização e
análise dos dados teria de ser maior; segundo, a resistência da professora
pesquisada diante da possibilidade de ser observada em sala.
Portanto, preferimos restringir nossa fonte de dados, concentrando-nos nas
capacidades de leitura demonstradas pelos alunos do ano/ Ensino Fundamental
da EMEB Filogônio Correa e, mais especificamente, da turma na qual a profª. Marta
atuou em 2007.
3.3.2 Os alunos do 4º ano
Conforme estabelecem os documentos oficiais da SME/ Cuiabá, no 4º ano do
Ensino Fundamental, espera-se que os discentes possuam as habilidades
relacionadas à capacidade de decodificação, apresentando relativo domínio da
escrita alfabética e a faixa etária predominante deve ser a de 9 anos, sendo que a
turma pesquisada não está muito distante deste perfil, pois a maioria consegue
decodificar
81
e, segundo a professora, gostam muito de ler em voz alta, utilizando a
biblioteca da escola, com certa freqüência, tanto para pesquisas escolares como
para leitura de fruição.
Nos momentos em que estivemos na sala de aula, notamos que os discentes, de
modo geral, são participativos e durante a aplicação dos instrumentos, não tiveram
81
Esta era a situação em maio/2007, quando aplicamos o instrumento avaliativo: de 25 alunos
freqüentes, apenas três apresentavam problemas relacionados ao processo inicial de alfabetização,
em outras palavras: estavam no nível silábico-alfabético, conforme classificação de Ferreiro e
Teberoski.
94
receio de esclarecer as dúvidas existentes. Alguns até fizeram perguntas sobre a
Secretaria de Educação, sobre a UFMT e se a pesquisadora iria “dar aula para eles”,
demonstrando, então, que não ficaram tímidos com nossa presença.
De acordo com informações do questionário, a maior parte dos alunos está na faixa
etária entre 9 a 10 anos
82
e mora com seus pais, sendo que apenas um deles
trabalha
83
.
Destacamos, ainda, que dos 27 alunos matriculados, 20 responderam ao
questionário sobre letramento e 25 ao instrumento avaliativo. Logo, ao cruzarmos
esses dados, verificamos que apenas 20 discentes participaram desses dois
momentos e, portanto, para o processo de análise, tivemos de “descartar” cinco
avaliações.
No entanto, para contextualizarmos melhor a “situação” de aprendizagem dos
alunos, torna-se importante relembrarmos alguns aspectos da organização dos
Ciclos, a saber, a retenção de alunos somente poderá ser feita ao final de cada
Ciclo. Desse modo, podemos saber quem “passou de ano” através do sistema de
progressão, que se subdivide em dois tipos: o simples (PS), utilizado para alunos
que não possuem dificuldades de aprendizagem; progressão mediante plano
didático de apoio (PPDA), para aqueles que apresentarem dificuldades, geralmente
relacionadas ao processo de alfabetização.
Nesse contexto, os discentes que possuírem em seus registros avaliativos a sigla
PPDA, freqüentaram a Sala de Apoio à Aprendizagem, em período oposto ao que
estavam estudando. Contudo, com as recentes mudanças nos diários de classe, as
siglas acima o utilizadas apenas para o resultado final, como forma de delimitar
quais alunos avançaram nas etapas do Ciclo, sem necessidade de começar o
próximo ano letivo assistindo aulas de apoio. no que se refere à turma da profª.
Marta, atualmente
84
, dos 27 alunos, 20 são considerados PS e 07 PPDA.
Considerando que a docente, no período vespertino, atua na Sala de Apoio,
conseqüentemente, também está atendendo a seus próprios alunos do matutino.
82
Apenas um aluno possui 11 anos.
83
Este aluno trabalha ajudando a mãe que vende pamonha.
84
Dados atualizados em outubro/2007.
95
Segundo a diretora, muitos alunos superaram suas dificuldades e foram
dispensados das aulas de apoio, sendo que da citada turma, apenas 07 devem ser
atendidos no último bimestre. No entanto, ao analisarmos os registros avaliativos
dos alunos, verificamos que estes aparecem com “habilidades em construção”
(marcado pelo uso da sigla EC).
Ressaltamos, também, pelos poucos momentos em que observamos a interação em
sala, que o relacionamento entre professor/ aluno e aluno/aluno parece ser bom,
sem maiores conflitos.
Nos capítulos subseqüentes, quando analisarmos os questionários dos alunos,
poderemos ampliar nossa visão acerca do modo como estes lidam com as práticas
de leitura.
3.4 Os instrumentos de coleta de dados
Como havíamos mencionado, além de uma relação profissional, desde 1998,
estabelecemos vínculos com a equipe gestora da EMEB. Filogônio Correa, visto que
nos conhecemos durante aquele período
85
de preparação da rede municipal para a
mudança do sistema seriado para o ciclado. É obvio que isso facilitou o acesso à
professora, com a qual, até o momento, mantínhamos apenas uma relação
profissional
86
, influenciando, também, diretamente, na escolha do locus.
Portanto, em março/2006, contatamos a diretora da unidade e expusemos,
detalhadamente, qual era a proposta da pesquisa a ser desenvolvida. Além disso,
conversamos, também, com a professora, a qual concordou em participar das
aplicações dos instrumentos, abrindo o espaço de sua sala de aula para que
pudéssemos coletar nossos dados. Todavia, no que se refere às interações entre
sujeito/professora e a pesquisadora, voltamos a comentar sobre o caráter
assimétrico que esse processo acabou assumindo em alguns momentos, pois para a
docente, a imagem constituída acerca da pesquisadora estava imbricada à da
85
Esse período compreende os anos de 1998 a 2000, conforme já foi dito no capítulo 2.
86
Lembramos, novamente, que a pesquisadora coordenava o programa de formação do qual a profª
Marta era cursista.
96
instituição (SME/ Cuiabá), mesmo que o “papel social” ocupado pelos interlocutores,
naquela situação específica, fosse muito distinto das interações anteriores.
Isto posto, por mais que nos esforçássemos, esta imagem foi reforçada através do
modo como nos apresentaram aos demais funcionários e alunos da unidade: “... ela
é da SME e está fazendo uma pesquisa, aqui, na nossa escola”.
Isso foi o suficiente para transformar os olhares de curiosos a cautelosos, como se
tentassem desvendar as reais intenções da pesquisadora, como se nossa presença
fosse mais uma estratégia da Secretaria para inspecionar o trabalho desenvolvido
na unidade escolar. Exemplos
87
de falas: “Não diga isso na frente dela!”; “O que ela
vai pensar da gente?”, “Aqui todo mundo trabalha duro!”, entre outras.
Conforme dissemos, isso trouxe algumas vantagens (todas as solicitações feitas
eram prontamente atendidas), mas, em compensação, as pessoas se sentiam pouco
à vontade para responder às nossas indagações, o que fez com que desistíssemos
de realizar entrevistas gravadas, optando pelo registro escrito das conversas, como
recurso para manter a “informalidade” nas interações.
Assim, a pesquisa de campo foi desenvolvida no período de fevereiro a maio/ 2007 e
consistiu em sucessivas visitas à unidade escolar para a aplicação alguns
instrumentos de coleta (dois questionários e um instrumento avaliativo acerca das
capacidades de leitura), os quais serão descritos a seguir.
3.4.1 Investigando o processo de formação da professora:
Com o objetivo de obter informações sobre a formação profissional do nosso sujeito
e sobre aspectos didáticos e metodológicos que envolvem o seu trabalho,
elaboramos um questionário
88
organizado em três partes distintas, a saber:
87
Essas frases foram ditas por vários funcionários da escola durante nossas visitas.
88
Ver Anexos.
97
A corresponde a 6 questões que tratavam da formação acadêmica,
continuada e da concepção teórica acerca do processo de ensino-
aprendizagem de leitura;
A 2ª abarca 4 questões relacionadas à implementação do PPP e ao sistema
de avaliação utilizado pela escola;
A propõe 7 questões que abordam elementos da prática pedagógica
desenvolvida em sala de aula, especialmente os relacionados ao processo de
ensino-aprendizagem de leitura.
Acreditamos que o instrumento ficou um pouco extenso, com 17 perguntas, uma vez
que a educadora precisou levá-lo para casa, a fim de concluir o preenchimento.
Durante as visitas que fizemos à escola, tivemos oportunidade de conversar várias
vezes com a profª. Marta e, nesses momentos, conforme comentamos, quando
indagávamos sobre a possibilidade de gravarmos uma entrevista ou filmarmos uma
aula, a mesma demonstrava desconforto com a situação, mesmo quanto à
observação direta, sem aparato tecnológico, a docente chegou a comentar: “Eu não
conseguiria dar aula direito com você me olhando do fundo da sala”.
Assim, considerando a imagem atribuída pela escola à pesquisadora, preferimos
utilizar uma abordagem mais sutil, de modo que a docente não se sentisse obrigada
a participar da pesquisa e colaborasse, de forma mais espontânea possível, com a
aplicação dos instrumentos.
3.4.2 Investigando o processo de letramento “não-escolar” dos alunos:
Considerando nosso interesse em saber como os alunos do ano lidam com as
práticas de leitura fora do espaço escolar, adaptamos o modelo de questionário
utilizado nos levantamentos do INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional),
adequando-o para a coleta de informações dos citados alunos. Isso resultou em um
instrumento composto por 22 questões de múltipla escolha, sendo que a aplicação
do mesmo transcorreu normalmente, sem causar transtornos ao cotidiano dos
alunos.
98
Todavia, antes desse processo, explicamos aos discentes os objetivos do nosso
trabalho e, para não caracterizar aquele momento como uma situação formal
89
,
saímos da sala e deixamos que a professora efetuasse a aplicação.
Ressaltamos, também, que algumas questões tiveram de ser respondidas em casa,
visto que necessitavam de informações relacionadas aos pais dos alunos.
3.4.3 Investigando as capacidades de leitura dos alunos:
Com base nas mais recentes fundamentações epistemológicas que discutem o
processo de ensino-aprendizagem de leitura através do trabalho com as
capacidades de leitura (Kleiman, 1998; Rojo, 2001; Cafiero, 2005, entre outros),
elaboramos um instrumento
90
com 20 questões de interpretação, a fim de verificar
quais habilidades de leitura foram construídas pelos alunos do 4º ano e quais as que
necessitam de um trabalho pedagógico mais sistemático.
O processo de aplicação foi executado sem problemas, sendo que a maioria dos
alunos demonstrou, inicialmente, certa agitação, porém esta logo cedeu espaço à
tranqüilidade. Portanto, o tempo médio de resolução das questões pode ser
considerado normal, pois variou entre 1hora e 30 minutos a 2 horas.
A educadora recebeu recomendações para não auxiliar os alunos durante a
aplicação, uma vez que isto poderia afetar os dados coletados e, nesse sentido,
obtivemos total colaboração de sua parte.
Esclarecemos algumas dúvidas dos discentes sobre o instrumento, no entanto,
como das outras vezes, não permanecemos na sala pelos mesmos motivos já
elencados anteriormente.
Quanto à estrutura da avaliação propriamente dita, necessário se faz tecermos
alguns comentários, antes de detalharmos as habilidades presentes nas questões.
Exemplos:
89
Lembramos ao leitor que a pesquisadora foi apresentada aos alunos como técnica da Secretaria de
Educação.
90
O instrumento avaliativo pode ser visto no Apêndice B.
99
1. Os gêneros discursivos selecionados estavam previstos nos descritores
91
de
habilidades do Ciclo, a saber, narrativos ficcionais (fábula, histórias em
quadrinhos e tirinhas), informativos (texto didático e verbete de dicionário);
2. Partindo do pressuposto que os alunos do ano possuem o domínio das
habilidades relacionadas à capacidade de decodificação, procuramos
elaborar questões que envolvessem as capacidades de compreensão e de
apreciação e réplica (interpretação);
3. Para a aquisição de uma capacidade
92
, torna-se necessária,
conseqüentemente, a construção de diversas habilidades, as quais podem
variar de acordo com a situação de comunicação e o gênero discursivo
utilizado. Diante disso, as questões propostas no instrumento estão
relacionadas somente às capacidades “avaliadas”.
Nesse contexto, buscamos manter o equilíbrio entre as capacidades avaliadas: 06
questões se referem à de compreensão e outras 06 à de apreciação e réplica.
Assim, cada questão pode (ou não) requerer a mobilização de várias habilidades,
com níveis diferentes de relevância
93
.
O instrumento apresentou, então, a seguinte seqüência: parte, texto 1 - fábula;
texto 2 - informativo (refere-se ao autor da fábula); texto 3 verbete de dicionário
(esclarece o significado de um termo presente na fábula); parte, texto 4 tirinha
e 5 – história em quadrinhos.
Considerando as diversas habilidades que compõem as capacidades de
compreensão e de apreciação e réplica, juntamente com as que constam no PPP da
91
Conforme foi mencionado: para a elaboração da avaliação, utilizamos como base os descritores
previstos no PPP da unidade escolar pesquisada e não os adotados, de modo mais amplo, pelo
sistema municipal.
92
Diante da diversidade de definições acerca do termo capacidade, optamos por utilizá-lo como
equivalente ao de competência proposto por Perrenoud (1998), adotando assim a mesma base
teórica que tem fundamentado os atuais programas de formação de professores implantados pelo
MEC e elaborados pelo CEALE/ UFMG.
93
Em outras palavras, dentre as habilidades necessárias para dar resposta a uma determinada
questão, uma delas poderá ser a “predominante” em relação às demais.
100
unidade escolar pesquisada, tivemos de delimitar algumas para utilizar na
elaboração das questões.
O principal critério que norteou a escolha das habilidades foi o imbricamento entre
estas e os gêneros discursivos selecionados, pois, conforme dissemos, de acordo
com o contexto situacional, o gênero e o objetivo da leitura realizada, mobilizamos
diferentes habilidades, conhecimentos e saberes. Exemplo: para interpretarmos uma
história em quadrinhos, a relação entre as imagens e o texto verbal assume grande
importância. Todavia, para a leitura de um artigo de opinião, a habilidade de elaborar
apreciações referentes a valores éticos e/ou políticos alcançará maior “status” que
as demais.
Nesse contexto, esclarecemos que, durante o ato da leitura, não existe nenhum tipo
de hierarquia entre as capacidades ou mesmo uma ordem pré-determinada para que
sejam mobilizadas, portanto, somente para efeitos didático-metodológicos,
exporemos, separadamente, cada uma com as respectivas habilidades avaliadas:
1. Capacidade de compreensão:
Identificar informações relevantes para a compreensão do texto (fábulas,
texto informativo, verbete de dicionário, tirinha e história em quadrinhos).
Mobilizar conhecimentos prévios para auxiliar no processo de atribuição de
sentido ao texto.
Utilizar informações oferecidas por um verbete de dicionário, glossário ou
texto informativo na compreensão do texto.
Reconhecer a unidade temática do texto.
Perceber a coesão estabelecida no texto por meio de pronomes, sinônimos,
advérbios e da ordem das palavras na frase.
Reconhecer causas e conseqüências de determinados fatos.
101
2. Capacidade de apreciação e réplica (interpretação):
Relacionar as características textuais do gênero e os indicadores de suporte
ao sentido atribuído ao texto.
Caracterizar personagens a partir de descrições apresentadas, de ações por
ela realizadas ou do modo como se expressam.
Reconhecer a relação entre imagem e texto verbal na atribuição de sentido ao
texto.
Reconhecer o efeito de sentido de recursos gráficos como cores, fonte,
tamanho e formato de letras, imagens, etc.
Interpretar com base no texto, inferindo uma idéia implícita nele.
Elaborar apreciações relativas a valores éticos e/ou políticos.
Depois de concluído o processo de aplicação do instrumento, entregamos tanto à
professora como à equipe gestora da escola, uma cópia da avaliação com sua
respectiva matriz analítica
94
, a fim de que todos tivessem conhecimento sobre quais
foram as habilidades e as capacidades avaliadas em cada questão.
Aproveitamos a oportunidade para informar-lhes, mais uma vez, sobre os objetivos
da pesquisa que estava sendo desenvolvida e da importância daquele diagnóstico
para a prática pedagógica.
Destacamos, ainda, que cada instrumento de pesquisa utilizado representará uma
peça do “quebra-cabeça” denominado EMEB Filogônio Correa, colaborando para
aprofundar a reflexão acerca dos processos educativos implementados pela escola.
3.5 Metodologia de análise dos dados
Em consonância com a abordagem enunciativo-discursiva bakhtiniana e
compreendendo o processo de leitura com um fenômeno discursivo, sócio-
94
Essa matriz foi elaborada pela pesquisadora para facilitar a análise das capacidades de leitura
demonstradas pelos alunos e foi descrita no item 3.4.3, deste capítulo.
102
historicamente situado, buscamos analisar as interfaces entre nossos sujeitos e as
práticas de leitura desenvolvidas no ambiente escolar.
Isto posto, organizamos a análise dos dados a partir dos itens elencados no método
sociológico para o estudo da língua (Bakhtin, 1929: p.129), sendo que para sua
efetiva utilização nesta pesquisa, o mesmo teve de ser adaptado, a fim de que
pudéssemos relacioná-lo aos nossos objetos de estudo: capacidades de leitura e
letramento escolar.
Alguns importantes conceitos bakhtinianos também serão utilizados no processo de
análise dos dados, tais como, compreensão ativa, discurso, gênero discursivo,
dialogismo e exotopia.
Além da referida fundamentação teórica, tivemos de estabelecer critérios para a
correção e análise minuciosa do instrumento avaliativo, que isso poderia interferir
no levantamento das habilidades de leitura construídas pelos alunos. Portanto:
Será considerada como habilidade construída, quando o aluno responder
corretamente pelo menos 75% das questões relacionadas ao respectivo
indicador;
Algumas questões foram respondidas parcialmente, ou seja, não
contemplaram todos os aspectos solicitados no enunciado; assim, no quadro
de acertos, aparecem com a letra P
95
, sendo consideradas durante o
processo de verificação da habilidade (construída ou não);
A nomenclatura utilizada será: HC (habilidade construída) e NC (não
construída); preferimos não utilizar termos como “em construção”, uma vez
que isso implicaria em um acompanhamento mais sistemático e por um tempo
mais longo das práticas de leitura realizadas pelos alunos no ambiente
escolar.
95
Para as respostas corretas utilizamos a letra C, conforme quadro de correção que poderá ser visto
nos Anexos.
103
Quando houver apenas duas questões
96
que se referem à determinada
habilidade, o discente deverá acertar ambas;
Na seqüência, poderemos visualizar o quadro utilizado para análise das habilidades:
HABILIDADES
Questões
1. Identifica informações relevantes para a compreensão do
texto (fábulas, texto informativo, verbete de dicionário, tirinha
e histórias em quadrinhos).
4, 6, 12, 15
2. Mobiliza conhecimentos prévios para auxiliar no processo de
atribuição de sentido ao texto.
1, 10, 11
3. Utiliza informações oferecidas por um verbete de dicionário,
glossário ou texto informativo na compreensão do texto.
2, 8, 9
4. Reconhece a unidade temática do texto.
2, 5, 14
5. Relaciona as características textuais do gênero e os
indicadores de suporte ao sentido atribuído ao texto.
11, 17, 19
6. Caracteriza personagens a partir de descrições apresentadas,
de ações por ela realizadas ou do modo como se expressam.
7, 20
7. Percebe a coesão estabelecida no texto por meio de
pronomes, sinônimos, advérbios e da ordem das palavras na
frase.
8, 18
8. Reconhece a relação entre imagem e texto verbal na
atribuição de sentido ao texto.
12,13
9. Reconhece causas e conseqüências de determinados fatos.
6, 15, 20
10. Interpreta com base no texto, inferindo uma idéia implícita
nele.
2, 5, 7, 14
11. Reconhece o efeito de sentido de recursos gráficos como
cores, fonte, tamanho e formato de letras, imagens, etc.
13, 17, 19
12. Elabora apreciações relativas a valores éticos e/ou políticos.
3, 16
Considerando a necessidade de formularmos critérios para a correção da avaliação
feita pelos alunos, principalmente no que diz respeito às questões abertas,
delimitamos, também, alguns parâmetros
97
para verificar quais as possibilidades de
resposta que seriam consideradas corretas.
Desse modo, após todo esse processo, com o auxílio dos instrumentos aqui
descritos, buscaremos detectar as relações existentes entre os dados coletados
96
Ou pelo menos uma resposta correta e uma parcial.
97
Os referidos parâmetros podem ser encontrados no Apêndice D.
104
acerca da formação profissional da professora, do letramento extra-escolar
apresentado pelos alunos e das capacidades de leitura por eles construídas.
O foco de nossa análise se concentrará, principalmente, na interface entre esses
fatores, os quais, como sabemos, são importantíssimos para o processo de
letramento dos alunos e a construção das capacidades de leitura. No próximo
capítulo, veremos como o outro acabou interferindo no projeto inicial de pesquisa e,
principalmente, na forma que este assumiu após o trabalho de pesquisa de campo.
105
Capítulo 4: Exercitando o olhar exotópico
Para compreendermos melhor os sujeitos da nossa pesquisa, tentamos visualizar o
sistema municipal a partir do ponto de vista da escola, pois de acordo com Bakhtin
(1952-1953/ 1979: p.21):
Quando nos olhamos, dois diferentes mundos se refletem na
pupila dos nossos olhos. Assumindo a devida posição, é
possível reduzir ao mínimo essa diferença de horizonte, mas
para eliminá-la inteiramente, urge fundir-se em um todo único e
tornar-se uma só pessoa.
Assim, lembramos que a história da rede municipal de Cuiae a da pesquisadora
se mesclaram durante vários anos,
98
afetando-se mutuamente, fato este que fez
com que fossem redobrados os esforços para a construção do estranhamento
necessário à efetivação da pesquisa, deixando de lado o olhar institucional que, até
bem pouco tempo (2005), se fazia presente nas relações entre os sujeitos e a
pesquisadora.
Além disso, esse aspecto tornou ainda mais relevante a inserção do conceito de
exotopia no desenvolvimento desse estudo e na análise dos dados, pois a própria
pesquisadora também se converteu em fonte de dados, uma vez que foi
observadora privilegiada (e também agente) do processo cio-histórico da rede
municipal de Cuiabá, período no qual esteve lado a lado com os sujeitos
pesquisados, ora ocupando posições sociais semelhantes, ora representando a
própria Instituição (SME).
Conseqüentemente, isso contribuiu para o estabelecimento de relações de
alteridade em diversos níveis, ampliando nossa visão acerca do objeto de estudo e
enriquecendo o processo de análise, o qual será descrito no presente capítulo.
98
Como dissemos, a pesquisadora participou de todo o processo que culminou com a adoção dos
Ciclos de Formação: primeiramente, enquanto professora da rede municipal e, posteriormente, como
formadora dos docentes, representando a Instituição/ SME.
106
4.1 Algumas reflexões sobre a proposta pedagógica da rede
municipal de Cuiabá para o ensino de Leitura
Neste item, iremos responder a seguinte questão de pesquisa: qual a proposta da
rede municipal para o ensino de leitura nos anos iniciais do Ensino Fundamental?
De acordo com o que foi exposto com capítulo 2, tanto o documento inicial, de 1999,
quanto o mais recente - “Escola Sarã: Cuiabá nos Ciclos de Formação” (2000), não
apresentam, efetivamente, diretrizes para o ensino de leitura, tratando a questão de
modo superficial, ainda fundamentado na Teoria da Comunicação, como poderemos
perceber no trecho abaixo:
Nesta fase (1º Ciclo), ampliam-se gradativamente as
possibilidades de comunicação e expressão. (...) Falar, ouvir,
ler e escrever são atividades essenciais. Os exercícios de
copiar repetidas vezes uma palavra em nada contribui (sic)
para o desenvolvimento da aprendizagem, pois a leitura é a
fornecedora dos elementos da escrita. (Escola Sarã, 2000: p.
91)
Portanto, de modo geral, no texto aparecem poucas referências ao processo de
leitura, sendo que as mais expressivas se referem à alfabetização
99
, propriamente
dita. No entanto, não poderíamos deixar de mencionar a conceituação de “bom
leitor” apresentada no documento de 2000, o qual manteve o caráter grafocêntrico,
já analisado na versão de 1999. Vejamos o exemplo:
Associada a isto boa escrita), está a formação do bom
leitor, no sentido do desenvolvimento do hábito e da
fluência na leitura com entendimento das idéias centrais e
das intenções do texto lido.
100
(Escola Sarã, 2000: p. 91)
99
A proposta para alfabetização es fundamentada em Emília Ferreiro e Ana Teberosky
(Psicogênese da Língua Escrita).
100
Ênfase adicionada.
107
Percebe-se, ainda, a influência dos modelos cognitivos de leitura (entender “as
intenções do autor”) e a crença de que a formação de hábito e a fluência (oralização)
são suficientes para garantir a interpretação do texto; também se torna visível o
diálogo que os Referenciais Curriculares da Escola Sa mantêm com o PCN de
Língua Portuguesa de 1º e Ciclos: ambos apresentaram dificuldade no que se
refere à formulação de propostas para a formação do leitor crítico.
Nesse contexto, na proposta da rede municipal de Cuiabá, os pressupostos
construtivistas parecem predominar, pois, como não são estabelecidos “conteúdos”
para o ensino de leitura, podemos inferir que o discurso subjacente é o de que esse
tipo de aprendizagem ocorre naturalmente, afinal, segundo Freinet, “aprende-se a
ler, lendo” e a “escrever, escrevendo”
101
.
A própria pesquisadora participou da elaboração dos referenciais de 1999
102
e, de
1997 a 2001, ministrou muitos cursos sobre as estratégias de leitura para os
professores da rede municipal. Assim, se por um lado foi difícil “olhar”,
exotopicamente, aquela produção como se o tivéssemos feito parte do processo
de construção da mesma, para analisá-la a partir de outro lugar social; por outro, foi
interessante perceber aspectos que não pareciam tão visíveis naquele período,
como por exemplo, compreender o conflito existente entre a diversidade de aportes
teóricos que permeiam o documento.
Segundo informações da Assessoria Pedagógica da SME, a publicação de 2000 foi
uma tentativa de atender ao desejo das escolas em delimitar quais as competências
necessárias em cada ano do Ensino Fundamental, contudo, esse objetivo parece
não ter sido alcançado, pois esta versão é quase uma paráfrase da primeira (1999).
Portanto, o documento de 2000 não trouxe avanços significativos quanto à resolução
de alguns problemas do Ciclo e muito menos na área de ensino-aprendizagem de
Língua Portuguesa. Essa dificuldade de aprofundamento teórico pode ser um dos
motivos pelos quais a rede municipal de Cuiabá não contemple, em suas diretrizes
101
Lembramos ao leitor que isso foi comentado no Capítulo 2, aparecendo também nos PCN de
Língua Portuguesa de 1º e 2º Ciclos.
102
A parte de Língua Portuguesa foi coordenada por outra professora, uma vez que a pesquisadora
teve que assumir a elaboração dos Referenciais de Língua Estrangeira que constam na publicação
de 1999.
108
político-pedagógicas, os aspectos que deveriam ser trabalhados para a construção
do leitor crítico.
Acrescente-se a isso, os problemas resultantes da implantação do Dossiê
Acadêmico
103
, agravados pela fragmentação no processo de formação continuada
(de 1991 a 2005)
104
, tanto na área de Língua Portuguesa, quanto acerca do trabalho
com a Abordagem de Competências. Assim, ao considerarmos esse contexto,
passamos a entender melhor a situação dos docentes, pois, embora não tenham
sido preparados para lidar com os indicadores avaliativos que constam no Dossiê,
são forçados a utilizá-los sem compreender, realmente, quais as implicações
teóricas e metodológicas desse ato para o processo de ensino-aprendizagem.
Acreditamos que essa situação foi provocada pela descontinuidade na
implementação das políticas educacionais propostas para a rede municipal e que
retomar esse processo é algo que demanda um tempo maior.
Reconhecemos, também, que a padronização dos critérios avaliativos era
necessária e, inclusive, recomendável, dada a fragmentação existente na rede.
Entretanto, com base nos depoimentos de diversos docentes, constatamos que o
preenchimento do citado documento é feito, na maioria das vezes, de modo aleatório
e que, portanto, este não pode ser considerado como fonte confiável de dados sobre
o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem dos alunos.
Em face disso, poderíamos levantar a hipótese de que esta monologização do
discurso acerca dos procedimentos e instrumentos avaliativos se constituiria como
um meio para ocultar a real situação do sistema. Contudo, como não elementos
para sustentar tal afirmação, as reflexões aqui expostas servem apenas como alerta
para que as unidades escolares repensem, a forma de utilização do Dossiê
Acadêmico, criando espaços junto à SME/ Cuiabá para discussão acerca do sistema
de avaliação implantado na rede.
Destacamos, ainda, que o Projeto Político Pedagógico da escola pesquisada
apresenta os mesmos conflitos teóricos existentes nos PCN de Língua Portuguesa/
103
Em 2007, a SME/ Cuiabá deixou de utilizar o termo Matriz de Habilidades e Competências,
transformando-o em “Indicadores Avaliativos”; o que na prática, parece ser inócuo, pois o problema
não parece ser a nomenclatura em si, mas sim como utilizar esses critérios para analisar o
desempenho dos alunos.
104
Período no qual a SME produziu os documentos analisados nessa pesquisa.
109
e Ciclos, e nos Referenciais da Escola Sarã. Portanto, embora a unidade
possua uma proposta bem estruturada para o ensino de leitura, como veremos mais
adiante, fundamentada no trabalho com as capacidades,
105
os dados coletados
demonstraram que os docentes estão com sérias dificuldades para implementá-la.
Isso pode ser confirmado através das descrições
106
das aulas observadas por
acadêmicos do curso de Pedagogia/ UFMT, em turmas do 3º ano (2ª série):
Trecho 1 - Professora A:
Após ela corrigir os cadernos dos alunos, começou a fazer as
atividades do livro que eram acerca do texto. Na primeira atividade, os
alunos tiveram dificuldade para responder, então a professora pediu
para que cada aluno indicado por ela lesse em voz alta, e perguntava
para o aluno assim: “O que? Você entendeu? Entendeu! Não!?
Então, de novo!”
107
, e isso ela fazia – aluno por aluno. Esse
processo demorou muito tempo, e alguns alunos nem abriram o livro
para ler. (trecho extraído do Relatório de Observação, 2007: p. 04)
Trecho 2 - Professora A:
Depois de copiarem o texto, os alunos deveriam responder 05
perguntas. Percebemos que poucos lêem o texto, eles passavam
várias vezes pelas respostas, porém não conseguiam entender. As
perguntas tinham respostas evidentes no texto, como por exemplo:
Texto: “... Os índios constroem ocas para morarem...” Pergunta: “Onde
os índios moram?”.
A professora passava pelas cadeiras dos alunos auxiliando-os nas
tarefas. Notamos que uma das alunas não sabe ler, mas mesmo
assim fez a cópia do texto; entretanto, esta não tem nem idéia do que
está escrevendo. As áreas do conhecimento trabalhadas são
Português, Matemática e Artes, pois segundo a professora, a área de
Ciências Naturais não é trabalhada pelo fato de que: nem todas as
crianças sabem ler”. (trecho extraído do Relatório de Observação,
2007: p. 07)
105
O conteúdo da área de linguagem está organizado em habilidades de leitura e de escrita,
específicas para cada ciclo (ver Anexos).
106
Coincidentemente, alunas do curso de Pedagogia/ UFMT estiveram, em abril/2007, observando a
prática pedagógica desenvolvida na escola pesquisada, como parte das atividades da disciplina de
Projetos Integrados. Assim, como a pesquisadora está desenvolvendo um trabalho junto ao Instituto
de Educação/ UFMT, tivemos acesso ao Relatório de Observação por elas produzido e este se
constituiu, também, em fonte complementar de informações para nossa pesquisa.
107
Ênfase adicionada.
110
Os relatos acima nos mostram que profª. A parece conduzir a maior parte das
interações sem se preocupar em estimular a compreensão ativa dos alunos e
muito menos em criar estratégias para instigá-los a pensar a respeito do que
estão lendo. Conforme nossa compreensão teórica, suas atitudes deixam
transparecer uma visão de leitura na qual os significados não precisam ser
construídos e não relações dialógicas a serem percebidas e estabelecidas
entre os interlocutores.
A ênfase dada à oralização do texto, além de não favorecer a aquisição das
capacidades de leitura, nega o acesso dos discentes a conceitos importantes da
área de Ciências Naturais (meio ambiente, desenvolvimento sustentável, etc.),
sob a alegação de que apenas alguns, os que dominam o código lingüístico,
podem “compreender” conceitos de outras áreas do conhecimento.
Sob a influência do modelo autônomo de letramento, a prática pedagógica
implementada atua no sentido de excluir do processo de ensino-aprendizagem
aqueles alunos que ainda não aprenderam a decodificar. Todavia, o caráter
monológico presente nas aulas dos trechos 1 e 2 não necessariamente
pressupõe “passividade” por parte dos alunos, que acabam encontrando um
meio para agir “responsivamente” à rotina escolar: (...) e alguns alunos nem
abriram o livro para ler”. (trecho extraído do relatório/ UFMT/ Pedagogia).
Trecho 3 - Professora B:
Ao entrarem em sala de aula, a professora Rose solicitou que os
alunos pegassem o livro de Português, porém esta não fazia idéia de
onde havia parado a matéria. Com a ajuda dos alunos, que fizeram a
indicação da página e em qual exercício da matéria havia parado, ela
pôde dar continuidade à aula. Ao se localizar e verificar a matéria
percebeu que seriam exercícios que necessitariam o uso do dicionário
e que estes não estavam condizentes com as capacidades de leitura
dos alunos, devido a isso não os executou. (...) A professora começou
a leitura do texto intitulado “Como se fosse dinheiro”, da autora Ruth
Rocha. (...) Fez, então, uma rodada de leitura com os alunos, porém
pela presença estranha, segundo a professora, eles estavam tímidos e
liam em um tom de voz muito baixo, audível apenas pelos mais
próximos. Pela demora em fazer a leitura os alunos se dispersaram.
(...) Após esta rodada de leitura a professora prosseguiu com os
exercícios de interpretação do texto, fazendo apenas os mais técnicos,
deixando os exercícios que necessitavam de respostas e discussões
mais aprofundadas sobre o texto para um outro momento, sem
maiores explicação sobre a razão de tal decisão. (trecho extraído do
Relatório de Observação, 2007: p. 16)
111
Trecho 4 - Professora B:
(...) ela entregou-lhes um desenho mimeografado da Boneca Emilia,
do tio do Pica-Pau Amarelo, obra de Monteiro Lobato. Disse que
eles iriam pintar este desenho, pois era uma data comemorativa: O
Dia do Livro Infantil. Enquanto os alunos faziam esta atividade, a
professora preparava os exercícios que seriam oferecidos aos alunos
no dia seguinte.
Quando a maioria dos alunos havia terminado de pintar, a
professora pediu a atenção de todos e disse que os alunos que liam
melhor iriam fazer a leitura de parte de um samba-enredo que falava
sobre a Independência do Brasil. Nesse dia ela não deu maiores
explicações sobre o que significavam estas datas comemorativas.
Apenas seis alunos foram selecionados e os demais ficaram inquietos
o resto da aula, pedindo “um pedaço do texto pra ler”. (trecho extraído
do Relatório de Observação, 2007: p. 04)
Os trechos 3 e 4 também podem ser considerados como exemplo de práticas típicas
do modelo de letramento escolar, fundamentado em uma concepção tradicional de
ensino, visto que os turnos de fala são controlados pela professora de modo a não
abrir espaço para a réplica dos discentes, inclusive o permitindo que estes
ampliem suas capacidades de leitura, visto que as atividades “mais complexas”,
segundo avaliação docente, são deixadas de lado.
As atividades desenvolvidas contribuem para que os alunos aprendam a argumentar
e/ou a se posicionar diante do que lêem; as datas comemorativas o tratadas de
modo dissociado da realidade e parece não haver preocupação com a seqüência do
conteúdo que deveria ser trabalhado na aula. Logo, esses fragmentos indicam que a
escola precisa rever suas ações, principalmente se tiver, como uma de suas metas,
a formação de leitores críticos.
No trecho 01, parece-nos que a concepção dominante é a de que ler em voz alta
garante ao aluno a compreensão de qualquer gênero discursivo, logo, o ato de ler
não é visto como processo de construção de sentido, no qual o estabelecimento de
relações interdiscursivas assume papel importante.
Notamos que, no trecho 2, diante das dificuldades dos alunos em decodificar (alguns
aprenderam apenas a fazer cópia), interpretar textos e/ou utilizar algumas
estratégias de leitura (como a de localização de informações), temos a impressão de
112
que a professora parece não se preocupar em implementar atividades diversificadas
para auxiliar os alunos.
nos trechos 3 e 4, nota-se que o texto continua sendo tratado como “pretexto”
para trabalhar datas comemorativas e exercícios de gramática, de modo
fragmentado e descontextualizado. Verificamos, também, que o texto não é tratado
enquanto gênero e que os conhecimentos prévios dos alunos acerca dos assuntos
abordados em sala parecem não ser considerados. Além disso, as atividades
realizadas parecem impedir que os alunos “dialoguem com os textos e que os
compreendam ativamente, expressando suas opiniões e expondo suas dúvidas
sobre o que estão lendo.
Ao ouvirmos a frase: “Não ensino Ciências porque os alunos não sabem ler” ou “não
dou esta atividade porque está acima da capacidade de leitura dos alunos”, tem-se a
impressão de que aos alunos cabe a tarefa de copiar e reproduzir os conceitos
“transmitidos” pelos autores dos livros didáticos e pelos professores, pois não se
espera nenhuma responsividade por parte dos discentes.
A História da Educação nos auxilia na compreensão de que as práticas pedagógicas
atuais se cristalizaram ao longo do processo de constituição da Escola (instituição),
solidificada em uma concepção de ensino-aprendizagem centrada no professor
como “detentor do conhecimento” e, mesmo com a formulação de novas teorias,
todo um aparato sócio-ideológico que parece “segurar” os avanços nessa área, por
exemplo, entre outros, a descontinuidade na implementação de políticas públicas, a
implementação de programas de formação continuada desvinculados da realidade e
da necessidade do grupo a que se destina.
Em síntese, ainda que os governos (federal, municipal e estadual) afirmem ter como
meta a formação de cidadãos críticos, a realidade encontrada na maioria das
escolas contraria os discursos oficiais e, nesse aspecto, os dados do relatório
elaborado pelas acadêmicas de Pedagogia/ UFMT são preocupantes e nos
surpreenderam, pois conforme quadro abaixo, a escola pesquisada obteve uma
classificação razoável nas avaliações feitas pelo SAEB e Prova Brasil (2005), visto
113
que sua média para o IDEB
108
/ 2005 foi de 4,1
109
(séries iniciais), maior inclusive que
a da rede municipal, a saber: 3,7.
IDEB 2005 e Projeções para Rede Municipal - CUIABA
Ensino
Fundamental
2005
(Observado)
Projeção do IDEB
2007
2009
2011
2013
2015
2017
2019
2021
Anos Iniciais 3,7 3,7 4,1 4,5 4,8 5,0 5,3 5,6 5,9
Anos Finais 3,2 3,2 3,3 3,6 4,0 4,4 4,7 4,9 5,2
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006.
IDEB 2005 e Projeções para a escola Municipal - EMEB FILOGONIO CORREA
Ensino
Fundamental
2005
(Observado)
Projeção do IDEB
2007
2009
2011
2013
2015
2017
2019
2021
Anos Iniciais 4.1 4.1 4.5 4.9 5.1 5.4 5.7 6.0 6.2
Anos Finais - - - - - - - - -
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006.
Nesse contexto, torna-se necessário esclarecermos que os alunos participantes das
citadas avaliações, em 2005, são os mesmos que foram monitorados pelo Programa
Gestar/ MEC, quando ainda estavam no 1º Ciclo (2001 a 2003).
Nessa época, os professores recebiam acompanhamento sistemático das
formadoras do programa, o que nos leva a considerar que isso possa ter
influenciado no resultado alcançado pela escola.
Entretanto, em 2007, diante do modo como as aulas de Língua Portuguesa estão
sendo ministradas nas turmas de ano, acreditamos que, ao contrário da projeção
108
Indicador de Desenvolvimento da Educação Básica é calculado pelo INEP (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), com base em informações do censo escolar e
das avaliações institucionais realizadas pelo MEC (Prova Brasil e SAEB).
109
Aproximadamente 61,73% dos alunos demonstraram desempenho compatível à “escala” de 150 a
200 e, para maiores detalhes recomendamos verificar a tabela da Prova Brasil que consta nos
Anexos.
114
apresentada no quadro acima, a expectativa é de diminuição da média do IDEB. Em
outras palavras, é provável que a média de 173,05
110
para a série, obtida na
Prova Brasil/2005, irá diminuir consideravelmente, uma vez que, em 2009, o referido
processo avaliativo focalizará os alunos do atual 3º ano, os mesmos que hoje
participam das “aulas de leitura” descritas no Relatório de Observação/ Pedagogia/
UFMT.
Segundo a escala de avaliação utilizada na Prova Brasil/ 2005, uma média de 150 a
175 pontos indica que os alunos, além das habilidades do nível anterior (125 a 150),
demonstraram que:
localizam informações explícitas em textos narrativos mais longos, em
textos poéticos, informativos e em anúncio de classificados;
localizam informações explícitas em situações mais complexas, por
exemplo, requerendo a seleção e a comparação de dados do texto;
inferem o sentido de palavra em texto poético (cantiga popular);
inferem informações, identificando o comportamento e os traços de
personalidade de uma determinada personagem a partir de texto do
gênero conto (de média extensão), de texto não-verbal ou expositivo curto;
identificam o tema de um texto expositivo longo e de um texto informativo
simples;
identificam o conflito gerador de um conto de média extensão;
identificam marcas lingüísticas que evidenciam os elementos que
compõem uma narrativa (conto de longa extensão);
interpretam textos com material gráfico diverso e com auxílio de elementos
não verbais em histórias em quadrinhos, tirinhas e poemas, identificando
características e ações dos personagens.
110
De acordo com o relatório do SAEB/2005, a média nacional para proficiência em Língua
Portuguesa, na 4ª série foi de 172,3.
115
Ao analisarmos os descritores acima, podemos constatar que, para manter ou
mesmo melhorar o nível alcançado, o trabalho pedagógico com as capacidades de
leitura não deve ser limitar às turmas que serão avaliadas e, sim, ser incorporado ao
cotidiano de todas as salas, beneficiando os alunos matriculados desde a Educação
Infantil até o último ano do 2º Ciclo.
No entanto, quando submetemos os discentes a atividades de repetição de
conteúdos fragmentados e descontextualizados, desestimulando o processo de
compreensão ativa (afinal todas as respostas foram dadas pelo professor),
estaremos negando aos alunos o direito de participar, plenamente, em eventos de
letramento que exijam a mobilização de capacidades de leitura mais complexas; o
direito de compreender ativamente as relações que se estabelecem entre os
enunciados, enquanto elementos constituintes de uma mesma cadeia discursiva,
restringindo, assim, o ato de ler à mera decodificação de grafemas em fonemas.
Outra conseqüência dessa opção metodológica se refere ao tipo de individuo que, a
longo prazo, pode vir a ser “(de) formado” através dessas práticas: este poderá se
transformar em um sujeito passivo, que acredita não ter capacidade para pensar
sozinho, pois se acostumou a depender de alguém para lhe dizer o que fazer e/ou
dizer.
Com isso, retornamos ao modelo autônomo de letramento que, de modo geral, tem
fundamentado as práticas desenvolvidas no ambiente escolar, e para o qual a culpa
do fracasso no processo de escolarização é do próprio indivíduo, como vimos no
Trecho 1: ao constatar que um aluno não conseguia entender o que havia lido, a
professora apenas disse: “O que? Você entendeu? Entendeu! Não!? Então, de
novo!”.
Lembramos que essa atitude parece se sedimentar na crença de que o ato de ler
(em voz alta) implica em compreender e mais uma vez, de que “aprende-se a
ler, lendo”.
Diante do exposto, decidimos antecipar alguns dos resultados desse estudo à
equipe gestora da escola pesquisada, principalmente acerca do risco de manter
práticas pedagógicas que não priorizam a formação de leitores e os problemas que
isso pode acarretar, tanto na vida dos alunos, quanto para a unidade escolar.
116
Para evitar que os problemas detectados assumam proporções maiores, a diretora e
a coordenadora pedagógica, em face da situação encontrada nas turmas do ano,
estão tomando algumas providências, por exemplo, a didatização das
capacidades de leitura e de escrita será acompanhada mais sistematicamente,
sendo que os discentes das turmas mencionadas receberão atenção especial.
Desse modo, ao refletirmos sobre o processo de ensino-aprendizagem de leitura nas
turmas do ano (2ª rie), tendo como base os dados do citado relatório,
percebemos que estes deveriam ser incluídos no bojo da pesquisa, embora isso não
estivesse previsto inicialmente, o que reforça a importância da efetivação de estudos
acerca da prática educativa desenvolvida no ambiente escolar e, indo mais além, a
necessidade de auxiliar a escola a analisar a sua práxis, buscando a melhoria da
qualidade do ensino.
4.1.2 Algumas reflexões sobre o Projeto Político Pedagógico da escola
pesquisada
A reestruturação do Projeto Político Pedagógico (PPP) da EMEB. Filogônio Correa
foi concluída no início do semestre/2007, mas, de acordo com informações da
Coordenação Pedagógica da unidade, não houve mudanças significativas entre o
documento anterior e o atual. Assim, destacaremos apenas os itens que interferem
diretamente nessa pesquisa, a saber, a metodologia adotada, a proposta para o
ensino de leitura, o sistema avaliativo, entre outros.
Como mencionamos, a escola atende alunos que, em sua maioria, são oriundos
de classes socioeconomicamente desfavorecidas e, portanto, esse fator direciona
todo o trabalho desenvolvido.
Diante desse panorama, a coordenação pedagógica e os docentes estabeleceram a
seguinte “filosofia”, expressa no PPP (2007: p. 10):
Realizar uma prática pedagógica socialmente comprometida
com a construção de saberes necessários para a formação
integral do aluno, adequando-as (sic) aos problemas,
117
expectativas e necessidades específicas da comunidade,
garantindo o desenvolvimento de cidadãos ativos, conscientes,
capazes de tomar decisões e transformar sua realidade pela
ação, contribuindo assim para a construção de uma sociedade
mais justa, com valores éticos, sociais e igualdade para todos.
Em outras palavras, a escola se propõe a desenvolver um tipo de educação
comprometida com os ideais das classes mais desfavorecidas, voltada para a
construção da cidadania. Isto aproxima o PPP de outros documentos oficiais
analisamos anteriormente: os PCN e as diretrizes da SME/ Cuiabá.
O diálogo entre os referidos documentos se explicita, objetivamente, nos seguintes
itens: por ser uma unidade organizada em ciclos, destaca-se a preocupação com as
fases do desenvolvimento humano, embasada em autores como Piaget, Wallon e
Vygotsky; opção pela Pedagogia Crítica (McLaren) e por uma teoria dialética do
conhecimento, uma vez que organizam o currículo através de temas geradores.
Nesse sentido, apresentam o mesmo conflito existente nas diretrizes da SME/
Cuiabá, a saber, trabalham ao mesmo tempo com Tema Gerador (Paulo Freire) e
Abordagem de Competências (Perrenoud).
Isto posto, sob a influência do Programa Gestar/ MEC, desde 2002, a escola passou
a organizar os conteúdos em habilidades, adaptando os descritores propostos no
citado programa e criando outros para as demais áreas do conhecimento, sempre
embasados nos PCN.
Destacamos que as fichas avaliativas de habilidades elaboradas pela coordenação
pedagógica serviram de modelo para outras escolas da rede municipal, inclusive
aquelas que nunca participaram de nenhum estudo mais aprofundado sobre o tema.
Outro fator interessante é a resistência da unidade escolar em adotar o modelo de
registro avaliativo proposto pela SME/ Cuiabá, a saber, o Dossiê Acadêmico.
Entendemos a necessidade de documentos padronizados para o registro do sistema
de avaliação dos alunos, uma vez que eles são expedidos para outras instituições,
todavia, a causa deste conflito parece ser o modo como isso ocorreu, pois segundo
informações coletadas em nosso locus de pesquisa, não houve uma ampla
discussão acerca do tema em questão.
Portanto, conforme dissemos anteriormente, o Dossiê se tornou um problema
para grande parte das unidades escolares, visto que, além dos equívocos que
118
relacionamos, a maioria dos professores ainda não têm idéia de como este
documento deveria ser utilizado.
111
Desse modo, a EMEB. Filogônio Correa preferiu continuar com a “sua” ficha
avaliativa, ignorando as recomendações oficiais.
Em outras palavras, ainda que a SME procurasse estabelecer, enquanto instituição
representante do poder, um discurso monofônico, centralizando o controle dos
processos pedagógicos desenvolvidos na rede municipal, as diversas “vozes” que
compõem o referido sistema insistem em assumir posicionamentos, por vezes
contraditórios: concordando, ignorando e/ou discordando das “vozes oficiais”.
Nesse contexto, tem-se a impressão de que a escola está se esforçando para
recuperar sua identidade e retomar seu processo de crescimento, interrompido em
2001.
Isso pode ser visto como uma tentativa de “re-significar” a própria realidade,
alcançando a autonomia necessária para organizar e desenvolver os processos
educativos que estão sob sua responsabilidade.
Portanto, conforme comentamos, ainda que a escola esteja buscando a
superação de suas dificuldades, no que se refere ao seu Projeto Político
Pedagógico, este acaba por reproduzir os conflitos presentes nos demais
documentos oficiais aqui analisados (PCN e Diretrizes da SME), o que de certo
modo pode ser considerado normal em um processo de mudanças educacionais.
Assim, no que diz respeito à área de Linguagem, a mesma aparece no PPP dividida
em habilidades de leitura e de produção de textos
112
, e, considerando que o foco
da nossa pesquisa é uma turma de ano, destacaremos as que se referem a esta
série e ao ensino de leitura (PPP, 2005: 52):
111
Até julho de 2007, a SME/ Cuiabá ainda não havia oferecido cursos formação destinados à
implementação da Abordagem de Competências ou mesmo sobre como transpor as habilidades
propostas no Dossiê para a prática de sala de aula.
112
As habilidades relacionadas neste item foram extraídas pela escola pesquisada do Guia Geral do
Programa GESTAR de a séries/ MEC/ 2002, sendo também utilizadas nesse estudo para a
elaboração do instrumento avaliativo.
119
Utilizar indicadores de suporte, de organização gráfica e de identificação de
autoria na atribuição do sentido do texto;
Interpretar com base no texto, inferindo uma idéia implícita nele;
Reconhecer a unidade temática;
Comparar textos, considerando tema, características textuais do gênero,
organização das idéias, suporte e finalidade;
Observar no texto narrativo a separação entre discurso do narrador e o discurso
direto dos personagens e as marcas dessa separação (travessão e dois
pontos);
Reconhecer o valor expressivo dos recursos da língua (repetição de termo,
recursos gráficos, sinais de pontuação);
Reconhecer as variedades de uso da língua e o prestígio do padrão culto da
língua (sic);
Utilizar informações oferecidas por um glossário, verbete de dicionário ou texto
informativo na compreensão do texto;
Relacionar as características textuais do gênero e os indicadores de suporte e
de autoria ao sentido ao texto;
Identificar, no texto, os personagens e o modo como são apresentados;
Identificar marcas de oralidade em um texto escrito e/ou características do
registro formal, informal;
Identificar falas de personagens (narrativas), de entrevistados (notícias) e
recursos empregados para assinalar a transcrição dessas falas;
Caracterizar personagens a partir de descrições apresentadas, de ações por
elas realizadas ou do modo como se expressam;
Reconhecer a relação entre imagem (propaganda, notícia) e texto verbal na
atribuição de sentido ao texto;
Identificar informações relevantes para a compreensão do texto: narrativas,
notícias, classificados e propaganda, história em quadrinhos, informativo,
poemas, jornalísticos (sic);
Associar dados presentes na notícia a organizadores do tipo quem, como, onde,
por quê;
Reconhecer causas e conseqüências de determinados fatos;
Reconhecer o efeito de sentido obtido com o emprego de recursos expressivos,
tais como repetição de palavras ou de estruturas sintáticas, rimas, aliteração,
onomatopéia;
Perceber a coesão estabelecida no texto por meio de frases, sinônimos,
advérbios, e da ordem das palavras na frase.
Podemos observar a presença dos pressupostos teóricos da Lingüística Textual e da
Abordagem de Gêneros Textuais, uma vez que o processo de interpretação está
imbricado a aspectos da estrutura textual, o que nos direciona a um modelo
cognitivo de leitura (o interativo). No entanto, parece não haver predominância das
estratégias de leitura e podemos verificar a inclusão de algumas capacidades de
apreciação e réplica (interpretação), o que em si, representou um grande avanço,
como por exemplo:
120
Relacionar as características textuais do gênero e os indicadores de suporte e
de autoria ao sentido ao texto;
Reconhecer o efeito de sentido obtido com o emprego de recursos
expressivos, tais como repetição de palavras ou de estruturas sintáticas,
rimas, aliteração, onomatopéia;
Destacamos, também, as fases que se seguem à elaboração do PPP (seu percurso
até a sala de aula): definição de um tema gerador
113
(considerando o diagnóstico da
realidade feito para a elaboração do PPP); elaboração de um organograma para
mapear o tema gerador e estabelecer os eixos temáticos
114
relacionados ao tema;
o tema gerador e os eixos temáticos norteiam a elaboração de projetos
115
semestrais a serem desenvolvidos em cada ano/ série; elaboração dos planos de
aula considerando tema gerador, eixo temático, projeto e habilidades elencadas
tanto no PPP, quanto na ficha avaliativa do aluno.
Lembramos, ainda, que não tivemos oportunidade de observar diretamente a prática
pedagógica desenvolvida nas salas de aula, porém tivemos acesso a relatórios de
estagiárias do curso de Pedagogia/ UFMT.
Os descritores que compõem o dossiê elaborado pela escola foram, literalmente,
transcritos do PPP, no qual se encontravam distribuídos de acordo com o ano/ série.
Desse modo, para incluí-los no citado documento, a escola precisou uni-los em um
único bloco, o que resultou em algumas confusões quanto à gradação na
complexidade
116
entre o que foi estabelecido para o ano e o que “se espera” ao
final do ciclo. Exemplos:
a) Habilidades que se referem ao reconhecimento dos mecanismos de coesão como
elementos que auxiliam na atribuição de sentido ao texto:
113
O tema escolhido para 2007 foi: “O homem vivenciando valores diante das transformações
universais”;
114
A escola fez uma adaptação: uniu a Abordagem Metodológica do Tema Gerador (Paulo Freire) à
de Complexo Temático (Pistrak);
115
Cada ano/ série trabalha com um projeto diferente. O ano pesquisado desenvolveu, no 1º
semestre, o projeto denominado: ”Eu, pessoa humana, em minha individualidade e coletividade”.
116
Conforme já mencionamos, as habilidades utilizadas pela escola foram extraídas do Guia Geral do
Programa Gestar/ MEC (2001), destinado às séries iniciais. Entretanto, necessário se faz
esclarecermos que, no guia, as mesmas foram organizadas da seguinte forma: habilidades de
entrada, as do 1º Semestre e as do 2º Semestre.
121
2 Percebe a coesão estabelecida no texto por meio do uso de
conjunções, pronomes, e expressões que marcam temporalidade e
causalidade e da correlação dos tempos verbais (PPP, 2007: p. 73).
13 Reconhece a coesão estabelecida no texto por meio do uso de
conjunção, pronomes expressões que marcam temporalidade e causalidade
e da correlação dos tempos verbais, (sic) causas ou conseqüências de
determinados fatos (PPP, 2007: p. 74).
27 Percebe a coesão estabelecida no texto por meio de pronomes,
sinônimos, advérbios, e da ordem das palavras na frase (PPP, 2007: p. 75).
b) Habilidades que implicam na associação entre as características do gênero, ao
suporte e à autoria durante o processo de construção do sentido do texto:
Nº 6 – Relaciona as características textuais do gênero ao sentido atribuído ao
texto (narrativas, cartas, história, (sic) em quadrinhos, poema). (PPP, 2007:
p. 74).
10 - Relaciona as características textuais do gênero às características
gráficas do tipo de texto e os indicadores de suporte e de autoria ao sentido
atribuído ao texto (PPP, 2007: p. 74).
14 - Utiliza indicadores de suporte, de organização gráfica e de
identificação de autoria, na atribuição do sentido do texto (PPP, 2007: p. 74).
Contudo, de modo geral, podemos verificar que as habilidades selecionadas pela
escola apresentam certa coerência, sendo que apenas uma delas está inadequada
à perceptiva teórica adotada para o ensino de leitura: a de nº11, que está
direcionada a aspectos gramaticais, próprios da escrita
117
:
“Transformar estruturas gramaticais, observando as
conseqüências dessas transformações (singular / plural;
masculino / feminino; frases declarativas, interrogativas,
exclamativas; adjetiva; advérbio por locução adverbial)” (PPP,
2007: p. 74).
117
No dossiê elaborado pela escola, as habilidades de produção de texto estão separadas das que se
destinam ao trabalho de leitura.
122
Assim, podemos afirmar que a maioria das 27 habilidades propostas está
relacionada às capacidades de compreensão e às de apreciação e réplica (cf. Rojo,
2001) e, conseqüentemente, em consonância com o objetivo de formar leitores
proficientes. Este fato torna o documento produzido pela unidade escolar mais
próximo dos mais recentes estudos sobre o processo de ensino-aprendizagem de
leitura, das discussões sobre o trabalho com os gêneros discursivos.
Em face ao exposto, compreendemos a decisão da escola em continuar com a sua
ficha avaliativa, deixando de lado os indicadores propostos no dossiê elaborado
pela SME/ Cuiabá
118
.
O quadro situacional da rede municipal nos aponta para a necessidade do
estabelecimento de políticas educacionais mais “duradouras”, que proporcionem
aos profissionais da educação o tempo necessário para que estas sejam
consolidadas, independente de questões político-partidárias, pois a cada ruptura, o
processo de recuperação do sistema se torna mais penoso e difícil.
A descontinuidade nas políticas educacionais, além de prejudicar a consolidação de
qualquer mudança na prática educativa desenvolvida pelas escolas, possui outro
efeito, ainda mais contundente: faz com que os sujeitos se tornem indiferentes
quanto às reais possibilidades de transformação da práxis.
4.2 A importância do professor em uma práxis voltada para a formação do
leitor crítico
Conforme comentamos anteriormente, os cursos de graduação direcionados para a
formação de professores, principalmente Pedagogia e Letras, ainda estão
“assimilando” as novas propostas de trabalho para o ensino de leitura. Logo, isso
criou lacunas que devem (ou deveriam) ser preenchidas através dos cursos de
formação continuada em serviço.
118
No segundo semestre/ 2007, o Dossiê Acadêmico sofreu algumas alterações, a SME/ Cuiabá
substituiu os termos habilidade e competência por indicadores avaliativos e, além disso, corrigiu
alguns problemas gramaticais existentes no texto em questão.
123
Nesse sentido, outro aspecto relevante é a formação leitora do professor, pois um
educador que não demonstre interesse pela prática da leitura, conseqüentemente,
terá mais dificuldade, tanto para compreender as mudanças ocorridas nas
concepções teóricas, como para implementar ações educativas que visem à
formação de alunos leitores.
Assim, embora alguns cursos de formação comecem a enfatizar a utilização das
estratégias de leitura, considerando que o ato de ler é um fenômeno complexo, as
atividades propostas pela escola parecem não sofrer quaisquer alterações,
mantendo-se “enraizadas” às bases epistemológicas do modelo autônomo de
letramento.
Uma das possíveis explicações para esse problema poderia ser a união de dois
fatores: a precariedade da formação inicial e continuada e a existência de docentes
não-leitores.
Sabemos que transformar essa realidade não é uma tarefa simples, pois ao retornar
de um curso de formação, ainda que tenha recebido uma gama de informações a
respeito de “como ensinar leitura”, o professor acaba retomando sua prática
cotidiana, sem implementar modificações significativas e, em alguns casos, tentando
incluir apenas pequenas alterações na rotina da sala de aula. Estas modificações,
quando realizadas sem o devido embasamento teórico e sem um diagnóstico das
capacidades de leitura construídas pelos alunos, irão provocar frustrações no
professor, uma vez que os resultados alcançados se distanciarão, e muito, dos
esperados.
Em resumo, as dificuldades demonstradas pelos docentes, quanto à formação de
alunos-leitores, perpassam, muitas vezes, pelo fato de que eles próprios não
possuem várias das habilidades de leitura que deveriam ensinar.
Isto posto, se adicionarmos a estas questões o fato de que, na sociedade atual, para
exercermos a cidadania plena, torna-se imprescindível a construção de práticas de
letramento cada vez mais complexas, teremos, então, uma pequena idéia acerca da
gravidade dos problemas pelos quais as escolas públicas estão passando,
especialmente em relação ao ensino de leitura e produção de texto.
Sabemos que as avaliações do SAEB ou Prova Brasil exigem diversas capacidades
de leitura, as quais, em sua maioria não são trabalhadas nas unidades escolares,
124
pois, de acordo com nossos dados, isso acontece, muitas vezes, porque os
professores desconhecem as propostas oficiais para o ensino de leitura ou não
tiveram formação suficiente para implementá-las. Essas reflexões nos fazem
indagar: Como romper esse ciclo: formação deficitária + professor não-leitor =
alunos não- leitores?
Nesse contexto, pensamos que a coordenação pedagógica assume um papel muito
importante, uma vez que sua função principal é a de subsidiar e orientar os
professores na implementação de metodologias diversificadas.
Além disso, a reestruturação dos cursos de licenciatura e o estabelecimento de
políticas concretas
119
para a formação continuada poderiam atenuar os efeitos que
certas práticas pedagógicas trazem para a vida dos alunos, posto que estas
reproduzem e aumentam as desigualdades sociais existentes (modelo autônomo
de letramento). Esses fatos revelam a importância do professor como mediador no
processo de construção do leitor crítico, uma que vez a metodologia por ele adotada
será um dos fatores determinantes do sucesso ou fracasso dos alunos nos eventos
de letramento dos quais venha a participar.
Embora a expectativa da pesquisadora fosse diferente, que a escola pesquisada
participou de um programa sistemático de formação continuada, acabamos por
encontrar, em nosso locus de pesquisa, muitos dos problemas aqui levantados,
principalmente no trabalho desenvolvido com as turmas do 3º ano (2ª série).
Quanto à profª Marta
120
, embora tenha concluído o curso graduação em 2005 e o de
pós-graduação em 2007 e seja participante assídua dos cursos de formação
oferecidos pela SME/ Cuiabá, percebemos que ela ainda não conseguiu se apropriar
das teorias estudadas, como poderemos ver no trecho abaixo, extraído do
questionário:
A leitura é uma prática social que deve ser proporcionada ao
aprendiz desde a Educação Infantil. (...) a interação com
119
Os programas de formação instituídos deveriam ser vistos com política educacional e não como
política de um governo específico, pois a cada troca de governo, a rede blica de ensino parece
estar, continuamente, de volta ao ponto de partida.
120
A docente pesquisada cursou Pedagogia na Universidade Federal de Mato Grosso, onde,
atualmente, está concluindo a pós-graduação.
125
diversos tipos de texto, desenvolve nele (no aluno)
diferentes tipos de leitura
121
. (Questionário do Professor)
Constatamos, desse modo, que uma tentativa de compreender o processo de
leitura enquanto prática social. No entanto, persiste ainda uma mistura entre a
abordagem construtivista e a de Freinet (aprende-se a ler lendo), uma vez que fica
exposta a crença de que a somente a interação com diversos tipos de texto seria
suficiente para transformar o aluno em leitor.
Esse é um problema bastante comum e, até certo ponto, fácil de ser superado,
desde que o professor esteja disposto a estudar e que tenha acompanhamento da
coordenação pedagógica. Temos conhecimento de que esses procedimentos seriam
mais proveitosos se a unidade escolar tivesse um acompanhamento mais efetivo por
parte da SME/ Cuiabá
122
.
Em nossos encontros com a docente pesquisada, percebemos seu interesse em
melhorar seu trabalho. Constatamos, também, a educadora parece conhecer os
PCN de Língua Portuguesa/ e Ciclos, pois detectou a influência deste no PPP
da unidade escolar, afirmando que ambos partem da mesma concepção de
linguagem. Todavia, não soube esclarecer, de modo explícito, a relação existente
entre estes e o trabalho que desenvolve em sala de aula.
Conforme relato da professora, esta “toma leitura” dos alunos uma vez por semana.
Assim, ao lado das atividades de leitura em voz alta e compartilhada, estão as de
interpretação (oral e escrita) de textos pertencentes a vários gêneros, tais como:
narrativo (fábulas, história em quadrinhos, tirinhas, parábolas, entre outros),
jornalístico, poético, epistolar, informativo e instrucional, sendo que o livro didático é
utilizado apenas para leitura oral.
Todavia, embora tenha participado de cursos acerca do trabalho com os gêneros
textuais, ao descrever sua metodologia em sala de aula, a professora usa várias
vezes o termo “tipos de texto”, sendo que a alusão a gêneros textuais ocorre apenas
uma vez. Isto nos leva a inferir que, mesmo com os estudos oferecidos nos cursos
121
Ênfase adicionada.
122
Após tomar conhecimento das questões levantadas em nosso estudo, a equipe gestora percebeu
que, sozinha, não conseguirá fazer muita coisa e que, portanto, necessita de auxílio para resolver os
problemas, antes que estes assumam proporções maiores.
126
de formação, a educadora ainda não assimilou o conceito de gênero e de como este
poderia ser transposto para a prática pedagógica.
Destacamos, ainda, outra atividade por ela realizada, o “momento da leitura
prazerosa”, realizado uma vez por semana e que consiste em possibilitar aos alunos
que escolham, livremente, os textos que desejam ler, sem cobranças ou
compromissos avaliativos.
Considerando o exposto e os relatos feitos pela profª. Marta, percebemos a tentativa
de modificar sua prática em sala de aula, principalmente, em virtude dos cursos de
formação continuada dos quais tem participado nos últimos anos. Entretanto, talvez
devido à força da tradição presente no modelo de letramento escolar, ainda
podemos encontrar alguns indícios dessa abordagem na fala da professora. Por
exemplo, quando indagada sobre quais as dificuldades apresentadas pelos alunos
em relação ao ensino de leitura e o que faz para resolvê-las, a mesma declarou:
Uma das dificuldades é respeitar os sinais de pontuação
123
.
Então faço atividades de pontuar corretamente o texto. Faço
leitura compartilhada e junto vou trabalhando cada pontuação
apresentada no texto.
Isso nos traz a seguinte reflexão: se o trabalho pedagógico na área de Língua
Portuguesa se concentra em habilidades de leitura e produção de texto,
esperávamos que as dificuldades dos alunos estivessem relacionadas ao não
domínio desta ou daquela habilidade. Portanto, a resposta dada pela professora
deixa transparecer, aparentemente, uma visão de ensino de leitura enquanto
oralização do texto.
De modo geral, temos a impressão de que a profª. Marta está passando por um
período de transição, no qual correntes teóricas conflitantes norteando sua
prática pedagógica, a saber:
Modelo Autônomo de Letramento e modelos cognitivos de leitura (ascendente
ou top-down): embasa a permanência de certas atividades cristalizadas,
123
Ênfase adicionada.
127
como, por exemplo, a leitura em voz alta sem função aparente, a não ser
exercitar a entonação e o ritmo;
Modelo Interativo de leitura: seu desejo de aprender mais sobre o processo
de ensino-aprendizagem das capacidades de leitura, a fim de possibilitar a
formação de leitores críticos. A docente, por exemplo, demonstra ter
consciência de que lemos com diferentes objetivos, tanto que criou o
momento da leitura sem compromisso, no qual os alunos são estimulados a
ler, socializar suas leituras uns com os outros e fazer apreciações valorativas
acerca do que foi lido, sem “cobranças” didáticas.
Assim, o processo pelo qual a educadora está passando é necessário para que a
mesma possa reformular suas crenças e concepções sobre o ensino de leitura, a
partir da “re-significação” das teorias que estudou nos cursos de formação, ou seja,
ao transformar palavra alheia em sua, poderá ter mais autonomia sobre os
processos educativos que desenvolve, compreendendo ativamente as implicações
da sua função, enquanto docente, na vida de seus alunos.
Entretanto, conforme foi mencionado, tanto a unidade escolar, como a educadora
pesquisada estão necessitando de ajuda, uma vez que nossos dados indicam, de
modo geral, que o corpo docente da escola chegou a um determinado “ponto”, do
qual não conseguirá avançar sem auxílio externo.
O interesse manifestado pela equipe gestora e pela professora em melhorar a
qualidade do ensino oferecido, aliado ao reconhecimento das dificuldades
existentes, podem se constituir em ações concretas para a implementação de
mudanças significativas no processo de ensino-aprendizagem de leitura e produção
de texto realizado na escola pesquisada.
Em face ao exposto e considerando, também, as relações existentes entre a equipe
gestora da unidade e a pesquisadora, acabamos nos comprometendo em colaborar
na formação continuada dos professores, principalmente após a conclusão desse
estudo.
128
Capítulo 5: Letramento escolar e não-escolar: em busca de
um diagnóstico da realidade
Sabemos que as práticas escolares de letramento consideram a linguagem como
um código neutro, independente do contexto sócio-cultural, conseqüentemente, o
trabalho desenvolvido pela escola tende a caminhar em direção oposta àquela que
culminaria com a formação do leitor crítico.
Isso ocorre porque as atividades realizadas (de leitura ou escrita), ao se inserirem no
modelo autônomo, deixam de fornecer subsídios para que os discentes atuem, de
modo crítico, na sociedade em que vivem e, terminam por afastar a escola dos
objetivos delineados no PPP (2007: p. 10), como por exemplo o de:
Realizar uma prática pedagógica socialmente
comprometida com a construção de saberes necessários para
a formação integral do aluno, adequando-as (sic) aos
problemas, expectativas e necessidades específicas da
comunidade, garantindo o desenvolvimento de cidadãos
ativos, conscientes, capazes de tomar decisões e
transformar sua realidade pela ação, contribuindo assim
para a construção de uma sociedade mais justa, com
valores éticos, sociais e igualdade para todos.
124
Como mencionamos no capítulo anterior, o PPP da unidade escolar está mais
próximo da base teórica que fundamenta o Letramento Crítico, pois implica em
propor ações educativas que instrumentalizem os discentes para a intervenção e
transformação da própria realidade.
Entretanto, conforme verificamos, isso não está acontecendo e os dados coletados
acerca das turmas do ano comprovam essa situação. Já em relação aos alunos
do ano, ressaltamos que não coletamos dados concretos sobre a prática
pedagógica desenvolvida em sala de aula pela profª Marta, uma vez que não
pudemos assistir às aulas ministradas. Logo, somente poderemos inferir como isso
se concretiza ao cruzarmos os dados do questionário sobre letramento não-escolar
com os do instrumento avaliativo/ capacidades de leitura. Desse modo, nas
124
Ênfase adicionada.
129
próximas páginas, tentaremos “mapear” as práticas de letramento não-escolar das
quais os alunos participam e as capacidades de leitura demonstradas na avaliação.
5.1 Conhecendo um pouco das práticas de letramento construídas pelos
alunos fora do ambiente escolar
Conforme mencionamos no capítulo 3, o questionário utilizado teve como base o do
INAF Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional e, desse modo, iremos
comparar os dados coletados com alguns índices nacionais expostos no Relatório
do INAF/ 2005, a fim de descrevermos o universo de letramento não-escolar dos
alunos do ano (3ª rie), sujeitos do nosso estudo. A pesquisa do INAF foi
realizada pelo IBOPE, que utilizou uma amostra nacional de 2002 pessoas,
representando a população brasileira com faixa etária de 15 a 64 anos e, embora
tanto a quantidade (20 alunos), quanto a idade (9 a 11 anos), sejam bem distintas,
acreditamos que o roteiro por eles proposto nos auxiliará na investigação e na
interpretação dos dados coletados. Iniciaremos nossa análise pelo contexto familiar
dos discentes: a tabela 1 nos mostra que, em relação às mães, 65% concluíram ou
estão cursando o Ensino Médio, sendo que apenas uma possui escolaridade abaixo
da 4ª série, diferente dos índices apresentados pelos pais:
Tabela 1: Escolaridade dos pais
Mãe
Quantidade
%
Ensino Médio completo 9 45%
Superior incompleto 4 20%
Superior completo 2 10%
Ensino Médio/ até ao 2º ano 2 10%
Ensino Fundamental incompleto/ até a 7ª série 2 10%
Menos de 4ª série 1 5%
Ensino Fundamental completo/ até a 8ª série 0 0%
Nenhuma 0 0%
Total 20
130
Ao analisarmos os dados referentes aos pais, veremos a comprovação de uma
tendência nacional, a de que as mulheres têm, em geral, mais escolaridade que os
homens:
Tabela 1.2: Escolaridade dos pais
Pai
Quantidade
%
Ensino Médio completo 4 20%
Ensino Médio/ até ao 2º ano 4 20%
Menos de 4ª série 4 20%
Ensino Fundamental incompleto/ até a 7ª série 3 15%
Superior incompleto 2 10%
Não respondeu 2 10%
Nenhuma 1 5%
Superior completo 0 0%
Ensino Fundamental completo/ até a 8ª série 0 0%
Total 20
Já na tabela abaixo, observamos que 63% dos alunos citaram as mães como
responsável pela prática de contar histórias, sendo que o nível de escolaridade da
figura materna também influencia nesse processo. No entanto, o que nos chamou a
atenção, foi o fato de que grande parte dos alunos citou mais de uma pessoa da
família como participante desses eventos de letramento.
Tabela 2: Quando ainda não sabia ler, quem lia para você?
Respostas
Quantidade
%
Mãe 19 63%
Pai 2 7%
Avô 2 7%
Avó 2 7%
Irmã mais velha 2 7%
Tia 1 3%
Outra pessoa 1 3%
Não respondeu 1 3%
Total 30
131
Segundo Relatório do INAF/2005 (p. 17):
A influência dos pais, e especialmente da mãe, nos hábitos de
leitura dos entrevistados também se revela nas suas respostas
sobre quais foram as duas pessoas que mais influenciaram seu
gosto pela leitura. A mãe é mencionada por 41% dos
entrevistados, enquanto professor ou professora é indicado por
33% e o pai por 31%.
Em nossos dados, isso também se confirma, todavia uma diferença maior: 63%
mencionam a mãe e 17%, além desta, mencionam um professor ou professora, o
que reforça ainda mais a importância da família na construção do letramento não-
escolar. Vejamos esses dados na tabela abaixo:
Tabela 3: Pessoas que mais influenciaram o gosto pela leitura
Respostas
Quantidade
%
Mãe ou responsável do sexo feminino 19 63%
Algum professor 5 17%
Pai ou responsável do sexo masculino 4 13%
Padre/Pastor ou líder religioso 1 3%
Outro parente 1 3%
Total 30
Desse modo, percebemos que algumas crenças a respeito dos alunos de escolas
públicas estão equivocadas, pois constatamos, através dos questionários, que não
os pais incentivam a leitura, como também se utilizavam de certa variedade de
gêneros discursivos no momento em que liam para seus filhos:
Tabela 3.1: O que costumavam ler para você
Respostas
Quantidade
%
Livros infantis 15 42%
Gibis, revista em quadrinhos 9 25%
Bíblia, livros sagrados ou religiosos 6 17%
Jornais e revistas 3 8%
Outros tipos de livros 2 6%
Não respondeu 1 3%
Total 36
132
Todavia, sabemos que a formação do leitor crítico não se limita à formação de
hábitos e que a escola possui papel importante no processo de ensino-
aprendizagem das capacidades de leitura.
Isto posto, percebemos que a família dos alunos do ano deu os primeiros
passos nesse processo, restando à escola a tarefa de dar continuidade a esse
trabalho. Também verificamos a presença da Literatura Infantil como elemento vital
para despertar o gosto pela leitura, principalmente nesse período que antecede o
processo de escolarização formal, uma vez que, para 42% dos alunos, os livros
infantis eram, preferencialmente utilizados.
Portanto, antes de serem alfabetizados, os alunos participavam, ativamente, de
eventos de letramento realizados no ambiente familiar, tendo contato com a leitura
de diversos materiais, além do livro infantil. Desse modo, ao indagarmos a respeito
de suas preferências quanto a material de leitura, 05 crianças marcaram duas
opções:
Tabela 4: Tipos de material que você mais gosta de ler
Respostas
Quantidade
%
Gibis, revista em quadrinhos 10 40%
Bíblia, livros sagrados ou religiosos 7 28%
Livros 5 20%
Revistas 2 8%
Outros 1 4%
Total 25
Considerando a idade das crianças (9 a 11 anos), é claro que as tirinhas e as
histórias em quadrinhos deveriam estar entre os gêneros discursivos preferidos
pelos discentes e, nesse sentido, necessário se faz destacarmos a Bíblia, como
segundo material mais lido, o que demonstra, novamente, a importância da
influência dos pais no processo inicial de formação do leitor.
Contudo, no outro extremo, verificamos que a maioria dos alunos não costuma ler
jornal (60%), o que revela a necessidade proporcionar o acesso a esse tipo de
material e, além disso, de iniciar um trabalho com os gêneros da esfera jornalística.
133
Tabela 5: Freqüência com que lê jornal
Respostas
Quantidade
%
Não costuma ler jornal 12 60%
De vez em quando 5 25%
Algumas ou uma vez por semana 3 15%
Total 20
Podemos inferir que, talvez, os 60% que não costumam ler jornais não o façam
devido à dificuldade de acesso, pois no item materiais escritos que possui em casa,
apenas 08 o mencionaram. Observamos, ainda, que a Bíblia
125
é o livro encontrado
com maior freqüência, além de ser o segundo mais lido pelos alunos.
Tabela 6: Materiais escritos que possui na residência
Respostas
Quantidade
%
Bíblia, livros sagrados ou religiosos 14 16%
Álbum de família, fotografias 13 15%
Calendários e folhinhas 10 12%
Livros didáticos 10 12%
Agenda de telefone/endereços 8 9%
Dicionário 7 8%
Livros infantis 7 8%
Jornais 8 9%
Livros de receitas de cozinha 5 6%
Enciclopédia 4 5%
Livros de literatura/romances 4 5%
Guias, listas e catálogos 2 2%
Livros técnicos 1 1%
Total 93
Diante disso, verificamos que uma grande diversidade nos materiais escritos com
os quais o aluno tem contato no ambiente familiar e sabemos o quanto isso é
importante para crianças que estão em período de aquisição do sistema de escrita.
Logo, pensamos que a escola poderia aproveitar melhor essa vivência dos
125
Na pesquisa INAF/2005, esse índice chegou a 89% dos entrevistados.
134
educandos para tornar as atividades de alfabetização, leitura e escrita, mais
contextualizadas e significativas.
Nossos dados indicam que, fora do ambiente escolar, 95% dos alunos do ano
costumam ler vários gêneros discursivos: 70% lêem revistas, de vez em quando;
sendo que 43% destas revistas o de histórias em quadrinhos; 47% lêem, de vez
em quando, livros de literatura infantil. Isso poderá ser comprovado logo abaixo:
Tabela 7: Tipos de revista que costuma ler
Respostas
Quantidade
%
Quadrinhos, gibis, humor 13 43%
Fofocas e novelas (Contigo, etc.) 6 20%
De informação (Veja, Época, etc.) 5 17%
De religião 4 13%
Outros 1 3%
Nenhuma 1 3%
Total 30
Tabela 7.1: Tipos de livros que costuma ler, ainda que de vez em quando
Respostas
Quantidade
%
Infantil, contos, fábulas, poemas 14 47%
Bíblia, livros sagrados ou religiosos 9 30%
Livros didáticos 5 17%
Outros 1 3%
Não costuma ler livros 1 3%
Total 30
Desse modo, constatamos que a maioria dos educandos, em situações o
escolares, não tem acesso, mas também pelo menos dois gêneros discursivos
diferentes, fator este que irá contribuir para a formação do leitor proficiente, pois,
segundo Relatório do INAF/2005 (p. 19):
Não a disponibilidade de livros em casa, mas também a
leitura de uma maior variedade de gêneros têm um efeito
positivo na habilidade de leitura. A maioria dos alfabetizados no
nível rudimentar e básico não costuma ler livros (29% e 16%)
135
ou só lêem um tipo de livro (42%), geralmente, a bíblia ou livros
religiosos. Só entre pessoas alfabetizadas no nível pleno temos
uma maioria de leitores que diversifica seus interesses (33%
costumam ler dois gêneros e 34% três ou mais gêneros).
Assim, podemos inferir que, considerando as condições familiares, os discentes do
ano estão expostos a um ambiente que favorece a construção do hábito de
leitura. Por outro lado, chegamos a uma questão: o que os alunos costumam ler na
escola também está colaborando para a formação do leitor proficiente?
Vejamos:
Tabela 7.2: O que você costuma ler na escola?
Respostas Quantidade
%
Livros didáticos 13 25%
Textos ou exercícios no quadro negro 9 17%
Livros de histórias infantis 8 15%
Seus próprios textos ou dos colegas 6 12%
Dicionários 4 8%
Revistas em quadrinhos 4 8%
Folhetos e cartazes 3 6%
Enciclopédias 2 4%
Textos e exercícios em folhas avulsas 2 4%
Revistas 1 2%
Jornais 0 0%
Sites ou páginas na Internet 0 0%
Total 52
Obviamente, o livro didático se sobressaiu, com 25%, seguido pelos textos ou
exercícios no quadro negro (17%) e os livros infantis (15%). Portanto,
aparentemente, parece não haver a inserção de diferentes gêneros discursivos,
como, por exemplo, inferimos que ainda não foram trabalhados os gêneros da esfera
jornalística
126
, previstos no PPP da unidade escolar. Acreditamos que os aspectos
levantados demonstram a necessidade de se organizar um trabalho mais
126
Todavia, devemos levar em conta que os dados analisados foram coletados em abril/ 2007, no
início do ano letivo.
136
sistemático com a leitura de textos do gênero jornalístico, uma vez que estes estão
presentes nos mais diversos eventos de letramento.
Destacamos, ainda, que embora o universo de nossa pesquisa seja “modesto”,
podemos observar que os educandos também têm livros à sua disposição e, a
maioria, em quantidade razoável:
Tabela 8: Quantidade de livros que possui em sua residência
Respostas
Quantidade
%
De 15 a 50 livros 12 60%
Menos de 10 livros 6 30%
De 51 a 100 livros 2 10%
Não tem livros em casa 0 0%
Total 20
Talvez o acervo não apresente grande variedade de gêneros discursivos, mas
ressaltamos que este é outro elemento importante para a formação do leitor.
No entanto, o fato que mais nos surpreendeu se refere à utilização da linguagem
escrita em situações informais: 19 alunos declararam que costumam escrever em
seu tempo livre, sendo que destes, 08 produzem (ou copiam com objetivos
pessoais) pelos menos dois gêneros discursivos.
Tabela 9: O que costuma escrever, criando ou copiando, em seu tempo livre?
Respostas Quantidade
%
Histórias reais ou inventadas 9 32%
Receitas 5 18%
Letras de músicas 5 18%
Poesia 3 11%
Diário íntimo 2 7%
Álbuns familiares 1 4%
Cartas e e-mails 1 4%
Outros 1 4%
Não costuma escrever 1 4%
Total 28
137
Podemos observar que o maior índice se relaciona à produção de textos do gênero
narrativo
127
(32%); os outros mais citados são receitas culinárias e músicas, os
quais, certamente, são utilizados para cópia, que, nesse sentido, são realizadas a
partir de um determinado objetivo (exemplo: colecionar as letras de suas músicas
preferidas ou auxiliar as mães na busca de receitas diferentes), sem assumir o
caráter de obrigatoriedade, como muitas vezes acontece em situações escolares.
Nesse aspecto, fora do ambiente escolar, as atividades de leitura, produção ou cópia
de textos se tornam mais significativas para os discentes, pois se inserem em
situações de prática social. Em oposição a isso, temos práticas de leitura com as
que foram relatadas no capítulo anterior (ocorridas nas turmas do ano),
descontextualizadas e voltadas somente para objetivos escolares.
Esse tratamento didático prejudica a construção de outros tipos de letramento e não
contribui para a formação do leitor crítico, uma vez que, a nosso ver, o enfatiza o
processo compreensão ativa.
Essa situação poderia se modificar se o texto fosse considerado como gênero
discursivo, pois, segundo Bakhtin (1952-1953/ 1979: p. 401):
O texto tem vida contatando com outro texto (contexto).
no ponto desse contato de textos eclode a luz que ilumina
retrospectiva e prospectivamente, iniciando dado texto no
diálogo. Salientamos que esse contato é um contato dialógico
entre textos (enunciados) e não um contato mecânico de
“oposição”, possível no âmbito de um texto (mas não do
texto e dos contextos) entre os elementos abstratos (os signos
no interior do texto) e necessário apenas na primeira etapa da
observação (da interpretação do significado e não do sentido).
Assim, considerando nosso enfoque teórico, os educandos deveriam ser
estimulados a ir além do significado literal das palavras, percebendo as relações
dialógicas que permeiam os textos, avaliando o conteúdo temático destes e se
posicionando, criticamente. Nesse aspecto, destacamos um dado interessante: - a
importância da participação dos pais: 18 alunos mencionaram que seus pais têm o
hábito de ler em casa.
127
Provavelmente sob influência das histórias infantis (contos de fada) lidas em casa ou na escola,
que este é um gênero muito utilizado pelos professores nas séries iniciais.
138
Tabela 10: O que seus pais ou parentes costumam ler?
Respostas Quantidade %
Ler a Bíblia ou livros religiosos 14 32%
Ler revistas 8 18%
Ler folhetos 6 14%
Fazer trabalhos escolares 5 11%
Ler jornais 4 9%
Ler ou escrever tarefas do trabalho 3 7%
Ler ou escrever receitas 2 5%
Não sabe 1 2%
Não respondeu 1 2%
Ler ou escrever cartas 0 0%
Total 44
Confirmando os dados apresentados na pesquisa do INAF/2005, a Bíblia (32%) foi a
mais citada, seguida por revistas e folhetos e quanto aos jornais, a média de 9%
está em consonância com o pouco interesse que os discentes demonstraram pela
leitura do mesmo
128
.
Novamente, podemos inferir que os alunos do ano pesquisado têm, no ambiente
familiar, algumas fontes de leitura. Entretanto, parece-nos que isso não está
exercendo influência no uso da biblioteca
129
, ou seja, 45% dos alunos, às vezes,
utilizam a biblioteca para ler e consultar livros; sendo que a média dos que nunca o
fazem é igual à de quem sempre utiliza esse serviço.
Tabela 11: Com que freqüência você utiliza a biblioteca para ler ou consultar livros?
Respostas
Quantidade
%
Às vezes 9 45%
Sempre 5 25%
Nunca 5 25%
Não respondeu 1 5%
Total 20
Se unirmos a porcentagem de “às vezes” à de “sempre”, teremos um resultado mais
significativo (70%), porém isso não poderá ter um efeito tranqüilizador, pois “às
128
Na tabela 07, podemos comprovar que 60% dos alunos não costumam ler jornal.
129
Tanto da biblioteca escolar com outra qualquer.
139
vezes” pode representar tanto uma vez por mês, quanto quatro por ano. Vejamos
outra tabela relacionada a essa questão:
Tabela 11.1: Com que freqüência você utiliza a biblioteca para ler ou consultar
revistas e jornais?
Respostas Quantidade
%
Às vezes 14 70%
Sempre 3 15%
Nunca 3 15%
Não respondeu 0 0%
Total 20
Verificamos que, para o ano da profª. Marta, o jornal e as revistas podem se
apresentar como uma possibilidade interessante de leitura e pesquisa e, portanto,
poderiam ser mais aproveitados, principalmente no caso do primeiro. Contudo, o que
nos preocupou foi a média de alunos que nunca utilizou a biblioteca para retirar
livros, a saber: 40%.
Tabela 11.2: Com que freqüência você utiliza a biblioteca para ler ou retirar livros?
Respostas Quantidade %
Às vezes 11 55%
Nunca 8 40%
Sempre 1 5%
Não respondeu 0 0%
Total 20
Esses índices nos alertam para a necessidade do desenvolvimento de projetos que
estimulem o uso da biblioteca, transformando-a em um espaço que “movimente” a
escola e mobilize os alunos para a prática de leitura.
A coordenação pedagógica da escola pesquisada deveria criar projetos para que a
biblioteca se tornasse um espaço mais atrativo, utilizado por toda a comunidade
escolar, afinal o acervo disponível é suficiente para atender a maioria dos alunos.
Diante dos fatos expostos no relatório das acadêmicas de Pedagogia e
considerando as características do letramento escolar, torna-se compreensível que a
maior parte das atividades realizadas pelos discentes seja de cópia, leitura em voz
140
alta, responder a questionários e preparar-se para as avaliações, itens que,
somados, perfazem um total de 52%.
Tabela 12: Atividades que realiza na escola
Respostas Quantidade
%
Copiar matérias, textos e exercícios do quadro negro
15 13%
Estudar e preparar-se para provas e avaliações 12 11%
Ler em voz alta 11 10%
Copiar textos dos livros 10 9%
Responder a questionários ou fazer exercícios 10 9%
Fazer perguntas de esclarecimento ao professor 8 7%
Consultar quadros de horários 8 7%
Escrever textos ditados pelo professor 7 6%
Fazer redação ou trabalhos 6 5%
Participar de debates ou discussões 6 5%
Controlar suas próprias notas ou conceitos e faltas 5 4%
Participar de reuniões para tomar decisões 4 4%
Agendar provas e entrega de trabalhos 4 4%
Apresentar trabalhos oralmente 3 3%
Fazer resumos de textos 2 2%
Fazer relatórios 2 2%
Fazer anotações sobre as aulas 1 1%
Total 114
Como podemos observar, os dois itens relacionados à cópia correspondem a 23%,
média inferior à das atividades direcionadas à produção de texto (5%) e que também
é menor do que a de leitura em voz alta (10%).
Esses dados nos trazem as seguintes inferências
130
: o trabalho com linguagem oral
parece ser pouco explorado; as atividades de leitura em voz alta estão apresentando
freqüência maior do que as de produção de texto; alguns gêneros escolares (resumo
e relatório), aparentemente, foram abordados superficialmente; no espaço escolar,
poucos alunos utilizam a leitura com outra finalidade que não seja a de estudar, por
exemplo, consultar quadros, controlar suas notas, entre outras.
Diante dessa problemática, pensamos que a professora pesquisada poderia
reorganizar a distribuição do tempo em sala de aula, buscando maior equilíbrio entre
as atividades de linguagem (leitura e produção de texto).
130
Lembramos ao leitor que, como não tivemos oportunidade de observar, diretamente, as aulas da
profª Marta, apenas levantamos algumas hipóteses acerca do que os dados coletados nos “dizem”.
141
Já em relação à participação dos alunos em eventos de letramento fora do ambiente
familiar, percebemos que o acesso a determinados espaços culturais ainda é
restrito, por exemplo, 70% dos discentes nunca foram ao teatro e 55% nunca
assistiram a shows.
Por outro lado, cerca de 60% dos alunos costuma, às vezes, freqüentar o cinema e
65% vai a feiras ou exposições:
Tabela 13: Com que freqüência você vai ao cinema?
Respostas Quantidade
%
Às vezes 12 60%
Nunca 7 35%
Sempre 1 5%
Não respondeu 0 0%
Total 20
Tabela 13.1: Com que freqüência você vai a exposições ou feiras?
Respostas Quantidade
%
Às vezes 13 65%
Nunca 4 20%
Sempre 3 15%
Total 20
em relação aos meios de comunicação mais utilizados, comprovamos a presença
da televisão na vida dos alunos. Além disso, esta parece ser a principal fonte de
informação para os discentes:
Tabela 13.2: Com que freqüência você assiste a televisão?
Respostas Quantidade
%
Sempre 16 80%
Às vezes 3 15%
Não respondeu 1 5%
Nunca 0 0%
Total 20
142
Tabela 14: Como se mantém informado sobre assuntos da atualidade?
Respostas Quantidade
%
Televisão 18 46%
Rádio 6 15%
Conversas com parentes, amigos e colegas 4 10%
Reuniões na Igreja 4 10%
Internet 4 10%
Jornal 3 8%
Total 39
Sabemos que a diversificação na utilização destas fontes contribui para a construção
das capacidades de leitura, segundo o Relatório do INAF/2005 (p.26):
A televisão e o rádio confirmam ser as fontes mais populares,
que atingem também os que têm nível de alfabetização mais
baixo. Mas as pessoas que buscam mais de uma fonte de
informação são as que demonstram melhor desempenho de
leitura, assim como as que costumam ler mais de um gênero
de livro, já foram a mais de um tipo de biblioteca.
A possibilidade de acessar diversas fontes e formas de
conhecimento se revela como uma condição necessária para
promover a compreensão e a capacidade de operar com a
informação.
Outro fator relevante é que, atualmente, o computador se constituiu como uma
ferramenta fundamental, tanto para a construção de diversos “tipos” de letramento,
quanto para a aprendizagem escolar.
Nesse sentido, embora a escola
131
não possua laboratório de informática, poderia
elaborar um projeto de inclusão digital e solicitar à SME/ Cuiabá
132
alguns
computadores que poderiam ser utilizados pedagogicamente.
Reconhecemos, ainda, que as questões socioeconômicas se refletem no acesso e
uso do computador, afetando também a participação dos alunos em cursos de
educação continuada:
131
A escola possui 02 computadores: um é utilizado para os serviços administrativos e outro para
que os professores possam fazer pesquisas.
132
Atualmente, a prefeitura está disponibilizando, através de valores simbólicos, um computador para
cada professor efetivo da rede municipal, desde que esteja atuando em sala de aula.
143
Tabela 15: Atividades fora da escola (participação em cursos)
Respostas
Quantidade
%
Não 13 65%
Sim 7 35%
Total 20
Essa realidade também parece nos dados do INAF/2005 (p. 21):
A realização de cursos, para além do ensino formal, também é
um fator potencial de promoção das habilidades de leitura e
escrita. A educação continuada é um setor em que os países
desenvolvidos têm feito grandes investimentos, conscientes de
que, na sociedade contemporânea, é essencial renovar
constantemente os conhecimentos. Segundo o INAF, a
freqüência a cursos vem aumentando lentamente, mas ainda é
uma prática muito restrita.
Em face ao exposto, os dados acerca do letramento não escolar dos alunos
pesquisados nos mostram que antes da escolarização formal, os discentes foram
iniciados em diversas práticas de letramento; os pais, independente do nível de
escolaridade, estão exercendo influência na formação leitora de seus filhos; grande
parte dos alunos, em seu tempo livre, gosta de ler e produzir textos.
Contudo, ao analisarmos as práticas não escolares vivenciadas pelos alunos,
comparando-as com as que ocorrem na unidade escolar, temos a impressão de que
as primeiras não estão sendo aproveitadas, satisfatoriamente, como elemento
fundamental para a construção de outros tipos de letramento e, muito menos, no
processo de ensino-aprendizagem das capacidades de leitura, talvez até por
desconhecimento de como isso pudesse ser utilizado em sala de aula.
A seguir, veremos como esses pressupostos se configuraram ou até mesmo
afetaram os resultados obtidos através do instrumento avaliativo acerca das
capacidades de leitura.
144
5.2 O diagnóstico das capacidades de leitura e o processo de letramento
escolar
Conforme destacamos, anteriormente, grande parte dos alunos pesquisados
demonstrou que gosta de ler, principalmente, histórias em quadrinhos e, além disso,
possui livros em casa. Observamos, ainda, que o nível de escolaridade das mães
133
tem contribuído positivamente para estimular o interesse das crianças pela leitura,
enquanto fonte de fruição.
Por outro lado, parece-nos que não muita diversificação nas práticas de leitura
desenvolvidas em sala de aula, à exceção do “momento da leitura livre”, instituído
por iniciativa da profª. Marta, o que predominam são as atividades de cópia e leitura
oral, típicas do modelo de letramento escolar adotado pela unidade escolar
134
, as
quais não irão contribuir para resolver os problemas de interpretação de texto
demonstrados pelos discentes no instrumento avaliativo.
A realização, uma vez por semana, de atividades em grupo para a socialização de
algumas leituras feitas pelos alunos (o momento da leitura prazerosa), parece não
ser suficiente para garantir a construção das capacidades de leitura, mesmo para
leitores iniciantes.
Isso ocorre, conforme já mencionamos, porque o tratamento didático dado aos
textos não consideram as relações discursivas que se instauram durante o ato de
ler, nem os aspectos inerentes ao gênero discursivo selecionado para a leitura.
Diante do exposto, iremos analisar o desempenho dos alunos quanto às
capacidades de leitura expressas, tanto no Projeto Político Pedagógico (PPP),
quanto na ficha avaliativa/ Dossiê Acadêmico.
Ressaltamos, ainda, que as habilidades verificadas são equivalentes às que os
discentes deveriam apresentar após ter cursado os três anos do Ciclo, no início
133
Lembramos que 55% das mães estão cursando ou concluíram o Ensino Médio e segundo o
INAF/2005, o nível pleno de Alfabetismo é majoritário (57%) entre pessoas que concluíram este
nível de escolaridade.
134
O Projeto Político Pedagógico da escola pesquisada está fundamentado, principalmente, nos
ideais de Paulo Freire, portanto, as atividades educativas desenvolvidas deveriam contemplar os
pressupostos do Letramento Crítico. No entanto, notamos, ainda, a forte presença do modelo
autônomo de letramento.
do 2º Bimestre/ 4º ano. Assim, não constituíam algo complexo ou “inatingível”, acima
do nível cognitivo de crianças na faixa e
Além disso, o instrumento foi aplicado pela própria professora da sala, a fim de
deixar os educandos mais à vontade, sem gerar qualquer tipo de tensão, comum às
situações formais de avaliação.
De modo geral, a maioria dos alunos ac
que, à primeira vista, poderia ser considerado como um bom desempenho. Todavia,
somente ao analisarmos as relações entre erros, acertos e capacidades de leitura,
poderemos ter uma visão mais ampla da situação.
Esc
larecemos, novamente, que mesmo as respostas classificadas como parciais
foram consideradas no processo de análise, sendo que, nos Anexos,
disponibilizamos um quadro síntese, no qual estão marcadas as questões que
obtiveram respostas parciais, corretas e/
visualizar melhor os índices alcançados em cada um desses itens:
Gráfico 1. Média de acertos dos alunos na resolução das questões:
135
Consideramos parciais as respostas que não contemplaram todos os aspectos solicitados nos
enunciados das questões.
do 2º Bimestre/ 4º ano. Assim, não constituíam algo complexo ou “inatingível”, acima
do nível cognitivo de crianças na faixa e
tária dos 9 a 10 anos.
Além disso, o instrumento foi aplicado pela própria professora da sala, a fim de
deixar os educandos mais à vontade, sem gerar qualquer tipo de tensão, comum às
situações formais de avaliação.
De modo geral, a maioria dos alunos ac
ertou mais de 50% das questões, fato este
que, à primeira vista, poderia ser considerado como um bom desempenho. Todavia,
somente ao analisarmos as relações entre erros, acertos e capacidades de leitura,
poderemos ter uma visão mais ampla da situação.
larecemos, novamente, que mesmo as respostas classificadas como parciais
foram consideradas no processo de análise, sendo que, nos Anexos,
disponibilizamos um quadro síntese, no qual estão marcadas as questões que
obtiveram respostas parciais, corretas e/
ou erradas, o que permitirá ao leitor
visualizar melhor os índices alcançados em cada um desses itens:
Gráfico 1. Média de acertos dos alunos na resolução das questões:
Consideramos parciais as respostas que não contemplaram todos os aspectos solicitados nos
145
do 2º Bimestre/ 4º ano. Assim, não constituíam algo complexo ou “inatingível”, acima
Além disso, o instrumento foi aplicado pela própria professora da sala, a fim de
deixar os educandos mais à vontade, sem gerar qualquer tipo de tensão, comum às
ertou mais de 50% das questões, fato este
que, à primeira vista, poderia ser considerado como um bom desempenho. Todavia,
somente ao analisarmos as relações entre erros, acertos e capacidades de leitura,
larecemos, novamente, que mesmo as respostas classificadas como parciais
135
foram consideradas no processo de análise, sendo que, nos Anexos,
disponibilizamos um quadro síntese, no qual estão marcadas as questões que
ou erradas, o que permitirá ao leitor
visualizar melhor os índices alcançados em cada um desses itens:
Gráfico 1. Média de acertos dos alunos na resolução das questões:
Consideramos parciais as respostas que não contemplaram todos os aspectos solicitados nos
146
Ao analisarmos o gráfico acima, constatamos que as questões nas quais os
educandos obtiveram maior êxito podem ser divididas em 04 grupos:
1º grupo - as que avaliam a habilidade de caracterizar personagens a partir
de descrições apresentadas, de ações por elas realizadas ou do modo como
se expressam (nº 07 e nº 20).
a) Verificamos que todos os alunos acertaram a questão nº 07, o que parece
indicar contatos anteriores com a leitura de fábulas, ou mesmo de contos
de fada, nos quais a raposa, geralmente, simboliza a astúcia e a
inteligência.
b) na 20, acreditamos que o interesse demonstrado pelos alunos em
relação ao gênero história em quadrinhos, contribuiu bastante para a
aquisição da citada habilidade.
grupo - as que se referem à habilidade de identificar informações
relevantes para a compreensão do texto (nº 04, 06 e 15);
a) A média de erros foi mínima, por exemplo: a 04 e a 06 alcançaram
5%, cada uma; a nº 15, ficou com 15%;
b) Apenas 03 alunos, os que tiveram desempenho abaixo de 50%,
marcaram a opção errada na questão 15; fato este que nos causou
estranheza, visto que o texto base era uma tirinha, gênero muito
utilizado na escola pesquisada e que está presente em grande parte
dos livros didáticos.
3º grupo: focalizam a habilidade de mobilizar conhecimentos prévios para
auxiliar no processo de atribuição de sentido ao texto (Nº 01, 10 e 11), sendo
que 90% dos educandos marcaram a alternativa correta, fato este que
parece demonstrar certo conhecimento acerca das histórias da Turma da
Mônica.
a) Destacamos que dentre as respostas dadas à questão 01, oito
foram consideradas como parciais, uma vez que alguns alunos não
souberam citar títulos de fábulas escritas por Esopo;
147
b) Quanto à 10, a maioria dos discentes demonstrou dificuldade para
falar sobre o autor (Maurício de Souza), limitando-se a comentar sobre
os personagens
136
. Exemplos:
1. AC (9anos): Eu conheço que ele fabrica gibi.
2. ID (anos): Eu sei que a Monica e o Cebolinha brigam muito.
3. MV (anos): A Monica vive batem em Cebolinhia e Cascão, Magali vive
comemdo.
grupo: avaliam a habilidade de perceber a coesão estabelecida no texto por
meio de pronomes, sinônimos, advérbios e da ordem das palavras na frase (Nº
08 e 18). É interessante perceber que grande parte dos discentes pesquisados
reconhece alguns dos mecanismos de coesão, visto que essa habilidade será
muito útil nas atividades de produção textual e de análise lingüística. Entretanto,
embora 75% dos alunos tenham demonstrado a citada habilidade, percebemos
que estes estavam inseguros, uma vez que marcaram várias opções e depois
apagaram, deixando apenas a correta
137
.
Isso indica que essa habilidade precisa ser retomada pela professora, através de
atividades nas quais os alunos possam perceber, também, o valor dos elementos
coesivos no processo de atribuição de sentido. Em face dessas reflexões, podemos
constatar que a maioria das questões, nas quais os alunos obtiveram êxito, está
diretamente relacionada à capacidade de compreensão (estratégias de leitura), o
que pode ser visto como positivo, pois indica um avanço na prática pedagógica da
profª. Marta.
Todavia, lembramos que somente o domínio das estratégias de leitura não é
suficiente para garantir a compreensão ativa e estimular a formação de leitores
críticos, conforme já discutimos no Capítulo 2.
136
Ainda que alguns alunos não tenham falado sobre o autor, somente sobre os personagens, essas
respostas também foram consideradas corretas, pois houve a mobilização do conhecimento prévio.
Nesta questão, verificamos 06 respostas parciais, 09 corretas e 05 erradas.
137
Encontramos sinais desses procedimentos, pois, nesta fase, os alunos “apertam” o pis para
escrever e mesmo quando apagam o que estava escrito, as marcas permanecem.
5.2.1 Um olhar exotópico acerca dos “erros” dos alunos pesquisados
Consideran
do as relações interpessoais entre os sujeitos de pesquisa (professora e
equipe gestora da escola) e a pesquisadora, torna
observações e comentários, aqui registrados, têm como foco fornecer elementos
para a reflexão crítica
acerca do trabalho desenvolvido pela unidade escolar, a fim
de melhorar a qualidade do ensino oferecido.
Nesta perspectiva, entendemos os problemas detectados como parte do processo
de ensino-
aprendizagem, fundamentais tanto para a realização de um diagn
concreto em relação às dificuldades de leitura, quanto para a sistematização de
propostas de intervenção didática.
Isto posto, passaremos a analisar as questões com maior média de erros, refletindo
sobre as causas e tentando encontrar algumas soluçõ
Contudo, as maiores dificuldades parecem se concentrar em algumas perguntas que
tinham como base uma tirinha, gênero este que, conforme comentamos há pouco,
pertence ao cotidiano dos alunos fora do ambiente escolar e que também aparece,
com muita freqü
ência, nos livros didáticos. Como exemplo, destacamos a questão nº
14
138
(95% de erros):
Leia a tirinha abaixo:
14. Qual o objetivo do Cebolinha ao propor à Mônica que resolvessem suas
diferenças
“com um tabuleilo de xadlez
138
A tirinha da Turma da Mônica serviu como texto base para responder as questões de nº 12, 13, 14
e 17.
5.2.1 Um olhar exotópico acerca dos “erros” dos alunos pesquisados
do as relações interpessoais entre os sujeitos de pesquisa (professora e
equipe gestora da escola) e a pesquisadora, torna
-
se necessário esclarecer que as
observações e comentários, aqui registrados, têm como foco fornecer elementos
acerca do trabalho desenvolvido pela unidade escolar, a fim
de melhorar a qualidade do ensino oferecido.
Nesta perspectiva, entendemos os problemas detectados como parte do processo
aprendizagem, fundamentais tanto para a realização de um diagn
concreto em relação às dificuldades de leitura, quanto para a sistematização de
propostas de intervenção didática.
Isto posto, passaremos a analisar as questões com maior média de erros, refletindo
sobre as causas e tentando encontrar algumas soluçõ
es.
Contudo, as maiores dificuldades parecem se concentrar em algumas perguntas que
tinham como base uma tirinha, gênero este que, conforme comentamos há pouco,
pertence ao cotidiano dos alunos fora do ambiente escolar e que também aparece,
ência, nos livros didáticos. Como exemplo, destacamos a questão nº
Leia a tirinha abaixo:
14. Qual o objetivo do Cebolinha ao propor à Mônica que resolvessem suas
“com um tabuleilo de xadlez
?
A tirinha da Turma da Mônica serviu como texto base para responder as questões de nº 12, 13, 14
148
5.2.1 Um olhar exotópico acerca dos “erros” dos alunos pesquisados
do as relações interpessoais entre os sujeitos de pesquisa (professora e
se necessário esclarecer que as
observações e comentários, aqui registrados, têm como foco fornecer elementos
acerca do trabalho desenvolvido pela unidade escolar, a fim
Nesta perspectiva, entendemos os problemas detectados como parte do processo
aprendizagem, fundamentais tanto para a realização de um diagn
óstico
concreto em relação às dificuldades de leitura, quanto para a sistematização de
Isto posto, passaremos a analisar as questões com maior média de erros, refletindo
Contudo, as maiores dificuldades parecem se concentrar em algumas perguntas que
tinham como base uma tirinha, gênero este que, conforme comentamos há pouco,
pertence ao cotidiano dos alunos fora do ambiente escolar e que também aparece,
ência, nos livros didáticos. Como exemplo, destacamos a questão nº
14. Qual o objetivo do Cebolinha ao propor à Mônica que resolvessem suas
A tirinha da Turma da Mônica serviu como texto base para responder as questões de nº 12, 13, 14
149
Apenas um aluno respondeu satisfatoriamente, sendo que os demais não
conseguiram inferir qual era a real intenção do Cebolinha ao propor à nica que
jogasse xadrez com ele. Alguns exemplos:
1. JT (anos): Os dois não semhentenderam.
2. JV, JA, PD e WM: Para jogar xadrez.
3. ID: Bateu nele.
4. MP: Para mudar de pancada e não bater mas de ursinho.
5. PJ: A Monica ficol patendo na capeça do Cebolinha.
Desse modo, podemos observar que 95% dos discentes pesquisados demonstraram
sérias dificuldades para compreender a unidade temática do texto lido, mesmo que
este pertença a gêneros discursivos do seu cotidiano.
Além disso, esta questão também abarca outro aspecto: a produção de inferências
acerca do que está implícito no texto, como meio para auxiliar no processo de
compreensão ativa.
Entretanto, não esperávamos que os alunos tivessem tanta dificuldade quanto à
leitura de tirinhas, pois os dados coletados junto à equipe gestora parecem indicar
que este é um gênero comumente trabalhado na escola.
Os dados coletados atestam que o fato de os alunos estarem familiarizados com um
determinado gênero (fábula, tirinha e história em quadrinhos), na prática, não
garante a compreensão dos sentidos ali concentrados. Este fato torna ainda mais
relevante o processo de ensino-aprendizagem da leitura e da escrita, no qual a
escola deveria assumir seu papel como agência “fomentadora” de diversos tipos de
letramento, ampliando as possibilidades de aprendizagem dos alunos.
Verificamos que o gênero tirinha está presente nos livros didáticos utilizados pelos
docentes da unidade pesquisada, desde o início do processo de alfabetização. Logo,
embora este seja considerado complexo, se a escola organizasse a prática
pedagógica, na área de Língua Portuguesa, a partir dos neros discursivos,
certamente, os problemas encontrados pelos alunos na resolução das questões
seriam menores.
Nessa perspectiva, surge a necessidade da organização de programas consistentes
para a formação continuada dos professores que atuam a partir das séries iniciais;
programas estes que, de fato, instrumentalizem os docentes a trabalharem com os
150
gêneros discursivos e não apenas com enfoque em suas formas composicionais, o
que também não irá garantir a apreensão/construção dos sentidos possíveis e nem
a formação do leitor proficiente.
A seguir, comentaremos a respeito das demais questões:
a) Questão nº 17 (85% de erros):
17. No quadrinho, algumas palavras usadas pelo Cebolinha aparecem em
negrito (estão mais escuras que as outras): “PELAÍ, LESOLVER e
DIFELENÇAS”. Em sua opinião, o autor usou esse recurso para mostrar que o
Cebolinha:
a) ( ) queria que a Mônica parasse para escutá-lo, assim ele poderia convencê-
la a desistir de bater nele.
b) ( ) queria assustar a Mônica.
c) ( ) queria convidá-la para jogar xadrez.
d) ( ) queria demonstrar que não tinha medo dela.
Após constatarmos que os discentes não reconheceram a unidade temática implícita
na tirinha, tornou-se compreensível que também demonstrassem dificuldade para
resolver a referida questão: a maioria dos alunos marcou a alternativa c, pois
acreditaram que o Cebolinha realmente estava com vontade de jogar xadrez.
Este é mais um indício de que a leitura feita pelos alunos foi superficial e que o
trabalho realizado em sala deveria explorar os textos enquanto gêneros que circulam
em determinadas esferas de atividade humana
139
, inseridos em práticas sociais de
leitura ou escrita. Assim, como a escola pode cobrar dos alunos a habilidade de
reconhecer o efeito de sentido de recursos gráficos como cores, fonte, tamanho e
formato de letras, imagens, etc., uma vez que os enunciados não são explorados
como um todo em sala de aula?
140
Lembramos, ainda, que essa habilidade consta
no Dossiê Acadêmico utilizado pela unidade pesquisada.
Há, ainda, outro aspecto que nos incomodou: Por que alunos, leitores de gibis, nos
quais circulam histórias em quadrinhos e tirinhas, apresentaram sérios problemas na
leitura desses gêneros?
139
Temos a impressão de que não é prática comum na escola pesquisada o fato de considerar o
suporte textual como elemento que contribui para o processo de atribuição de significado.
140
Esses recursos gráficos são muito utilizados em tirinhas e histórias em quadrinhos.
151
Com isso retomamos a importância de se tratar a leitura como objeto de ensino,
visto que, apenas proporcionar o contato com gêneros diferentes (fábula e tirinha -
como parece que foi feito em nosso locus de pesquisa) ou a familiarização com
textos de um determinado gênero (histórias em quadrinhos - em eventos de
letramento fora da escola) não é suficiente para garantir a apreensão/construção dos
sentidos.
Sabemos que o instrumento foi aplicado com tranqüilidade, sem causar estresse ou
qualquer tipo de pressão e, por isso, acreditamos que o problema detectado serve
para despertar nossa atenção em relação ao equívoco implícito na expressão
“aprende-se a ler, lendo”.
Parece-nos que, sem a mediação pedagógica adequada, há o risco de que o
significado construído se vincule somente à estrutura superficial do texto, sem
possibilitar aos educandos o exercício da compreensão ativa e criadora,
“bakhtinianamente” falando.
b) Questão nº 12 (70% de erro, sendo que apenas 6 alunos responderam
satisfatoriamente):
12. No 2º quadrinho, aconteceu algo inesperado. O que foi?
Inicialmente, tínhamos a impressão de que essa questão não traria dificuldades para
os alunos, pois estes poderiam mobilizar a habilidade de identificar informações
relevantes para a compreensão do texto. No entanto, os discentes também deveriam
relacionar a imagem ao texto verbal e isso causou um problema:
75% o conseguiram responder adequadamente, restringindo-se à
descrição da cena, sem refletir sobre a sua relação com o todo da história:
1. GV (anos): O Cebolinha queria fazer a nova amisade.
2. JT (anos): O Cebolinha vai conversar com a Monica.
3. JV (anos): Falou diferente, inteligente.
4. AJ (anos): O Cebolinha parrou a Monica e falo não é melhor Bater
com o jogo de xadrez.
5. AC (anos): Ele parol e valou Monica me perdoe e ela valou tabom.
152
As respostas de AJ e AC parecem demonstrar uma tendência dos alunos a dar
continuidade à história (produção de texto), o que pode revelar que esta é uma
atividade comum em sala e que os discentes interpretaram a questão 12 da
mesma forma. Todavia, se lembrarmos que o houve a compreensão da unidade
temática, conseqüentemente, a citada pergunta também seria afetada.
c) Questão nº 13 (40% de erro):
13. Observe a expressão da Mônica no quadrinho, você acha que ela concordou
totalmente com a sugestão do Cebolinha? Justifique.
Mesmo que a porcentagem de erro tenha ficado abaixo de 50%, a análise da
questão acima apenas nos fornece mais indícios a respeito da dificuldade que os
alunos demonstraram para ir além dos aspectos explícitos no texto, uma vez que
das 12 respostas ditas como “corretas”: 10 foram consideradas parciais
141
e apenas
02 como satisfatórias.
Isso merece destaque, afinal esta é uma das habilidades primordiais para a leitura
de tirinhas (reconhecer a relação entre texto e imagem verbal na atribuição de
sentido) e, como os discentes pesquisados são leitores iniciantes, acreditamos o
trabalho didático com o citado gênero deve ser considerado, também, a partir de
uma visão de ensino-aprendizagem em espiral, de modo que ao longo do processo
de escolarização, os estudantes possam compreender ativamente o que estão
lendo.
Destacamos, também, que a vivência dos educandos, fora do ambiente escolar,
deve ser o ponto de partida para “novas leituras” e o professor possui um papel
muito importante nesse processo, visto que ele é o mediador mais experiente,
aquele que deve criar situações nas quais seja possível o aprofundamento e a
ampliação do olhar acerca dos aspectos discursivos presentes no texto.
Vejamos alguns exemplos de respostas dadas pelos alunos:
1. VS (anos): Ela não concordo porque ela tavan jogando até o Sebalia sair
correndo.
141
Vários alunos escreveram “não”, sem justificar quais os elementos que subsidiavam a resposta
dada.
2. WM (anos):
Sim.
3. JT (anos):
Não, ela não concordou.
4. GV (anos):
Sim por que ele concordou a amizade.
5. MP (anos):
Sim porque no quarto quadrinho mostra ela com um tabuleiro.
6. ID (anos):
É a cara dela.
entre os que justificaram a resposta, verificamo
na expressão do rosto da Mônica e outros utilizaram a seqüência de fatos da
história.
Outro fator que merece destaque se refere à sistematização escrita das respostas,
pois, como podemos observar, poucos alunos conseguiram r
modo claro e objetivo, considerando o leitor virtual, fato este que pode indicar a
existência de problemas quanto à produção de texto.
d)
Questão nº 02 (55% de erro):
2. A intenção do autor ao escrever esta fábula foi:
a) ( ) falar
sobre a briga entre o leão e o urso.
b) ( ) mostrar a esperteza da raposa.
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
sobre os outros.
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
Considerando que o
nero bula está previsto como conteúdo a ser trabalhado
desde o Ciclo, que o mesmo é muito utilizado pelos docentes por ser um texto de
curta extensão e que este também aparece com certa recorrência nos livros
didáticos, pensamos que os discentes não a
processo de interpretação, principalmente porque, antecedendo à questão, havia um
texto informativo que poderia ser utilizado para auxiliar na resolução:
Saiba mais sobre as bulas de Esopo:
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas, lebres, raposas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
sociedade de sua época, para mostra
http://criancas.uol.com.br/historias/fabulas/esopo.jhtm
Sim.
Não, ela não concordou.
Sim por que ele concordou a amizade.
Sim porque no quarto quadrinho mostra ela com um tabuleiro.
É a cara dela.
entre os que justificaram a resposta, verificamo
s que alguns o fizeram com base
na expressão do rosto da Mônica e outros utilizaram a seqüência de fatos da
Outro fator que merece destaque se refere à sistematização escrita das respostas,
pois, como podemos observar, poucos alunos conseguiram r
egistrar suas idéias de
modo claro e objetivo, considerando o leitor virtual, fato este que pode indicar a
existência de problemas quanto à produção de texto.
Questão nº 02 (55% de erro):
2. A intenção do autor ao escrever esta fábula foi:
sobre a briga entre o leão e o urso.
b) ( ) mostrar a esperteza da raposa.
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
nero bula está previsto como conteúdo a ser trabalhado
desde o Ciclo, que o mesmo é muito utilizado pelos docentes por ser um texto de
curta extensão e que este também aparece com certa recorrência nos livros
didáticos, pensamos que os discentes não a
presentariam muitas dificuldades no
processo de interpretação, principalmente porque, antecedendo à questão, havia um
texto informativo que poderia ser utilizado para auxiliar na resolução:
Saiba mais sobre as bulas de Esopo:
A fábula é uma das mais an
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas, lebres, raposas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
sociedade de sua época, para mostra
r o que é certo e o que é errado.
http://criancas.uol.com.br/historias/fabulas/esopo.jhtm
)
153
Sim porque no quarto quadrinho mostra ela com um tabuleiro.
s que alguns o fizeram com base
na expressão do rosto da Mônica e outros utilizaram a seqüência de fatos da
Outro fator que merece destaque se refere à sistematização escrita das respostas,
egistrar suas idéias de
modo claro e objetivo, considerando o leitor virtual, fato este que pode indicar a
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
nero bula está previsto como conteúdo a ser trabalhado
desde o Ciclo, que o mesmo é muito utilizado pelos docentes por ser um texto de
curta extensão e que este também aparece com certa recorrência nos livros
presentariam muitas dificuldades no
processo de interpretação, principalmente porque, antecedendo à questão, havia um
texto informativo que poderia ser utilizado para auxiliar na resolução:
A fábula é uma das mais an
tigas
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas, lebres, raposas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
r o que é certo e o que é errado.
(Fonte:
154
No entanto, vários alunos marcaram a opção b, uma vez que não conseguiram
compreender a unidade temática do texto lido. Em face do exposto, ressaltamos,
novamente, a importância de utilizar os gêneros discursivos
142
como objeto de
ensino, como forma de situar o texto sócio-historicamente, reconhecendo as
relações dialógicas que o permeiam.
Ainda que nossas reflexões possam trazer certo nível de complexidade a uma
questão, aparentemente simples, que seria a de “entender qual a intenção do autor”,
sabemos que a mobilização de várias capacidades
143
para responder a uma
determinada situação-problema, não se constitui como um desafio cognitivo
insuperável para discentes do ano de qualquer escola, desde que as mesmas
estejam adequadas ao nível de desenvolvimento esperado para determinada faixa
etária (de 9 a 10 anos, no caso dessa pesquisa).
No cerne dos problemas detectados, encontramos as capacidades de leitura que
deveriam ser ensinadas nas escolas, pois são inerentes ao processo de
compreensão ativa e necessárias para a formação do leitor proficiente. Assim, nesse
aspecto, concordamos com Kleiman (1996: p: 94):
Para criar condições para o aluno paulatinamente ir
desenvolvendo sua capacidade de perceber a relação entre a
função do elemento textual e a intencionalidade, é importante
um trabalho de conscientização lingüística crítica. Isto é, não é
suficiente analisar como a linguagem funciona, mas também
como a linguagem está a serviço das intenções do autor. A
tarefa é complexa, mas pode ser facilitada fornecendo
exemplos de análise que ajudarão ao aluno a perceber
elementos que depois ele passará a perceber em outros textos.
e) Questão nº 03 (50% de erro):
Como você pode perceber, toda bula traz uma mensagem para reflexão: a
moral da história. Vamos relembrar a moral da história que acabamos de ler:
“Algumas vezes acontece de alguém fazer todo trabalho pesado e outro
levar todo o lucro.”
142
De acordo com nossos dados, parece-nos que a professora não trabalha na perspectiva dos
gêneros e, desse modo, pensamos que os 45% de alunos que acertaram a questão, o fizeram a partir
do texto informativo.
143
No que se refere à questão 2, os alunos deveriam recorrer às seguintes habilidades: Utilizar
informações oferecidas por textos de outros gêneros (informativo), a fim de compreender a unidade
temática e interpretar com base no texto, inferindo uma idéia implícita nele.
155
a) O que você pensa sobre a frase acima? Como isso pode ser aplicado à sua
vida?
Embora a questão acima possa ser classificada como “de resposta pessoal”
144
,
constatamos a dificuldade dos educandos para elaborarem apreciações valorativas,
posicionando-se e estabelecendo relações entre o conteúdo temático do texto lido e
as situações vivenciadas no cotidiano (somente dois alunos responderam a questão
de modo, relativamente, satisfatório):
1. EJ (anos): Sim. Você trabalha pesado depois outra pesoa levar o lucro
isto é errado não pode deixar augem lucrar no trabalho pesado que você
faz.
2. MP (anos): Eu penso que ningem deve pegar as coisas dos outros sem
pedir. Pode ser explicado como roubar ou furtar as coisas.
Percebemos que os dois avaliam o tema da fábula em sua dimensão ética, tentando
situar a moral da história de acordo com suas experiências de vida. Dentre os 10
alunos que acertaram a questão, 8 o fizeram parcialmente, que não conseguiram
explicitar, objetivamente, a relação entre o conteúdo temático do texto e a sua
vivência, fazendo com que inferíssemos qual o seu posicionamento diante do tema
abordado. Exemplos:
1. WM (anos): porexempro quando eu pego uma água e algem vai e bebe a
minha água e acho ruim.
2. ID (anos): Eu acho que é errado uma pessoa fazer o trabalho pesado e
outra levar todo o tuclo. - (vários discentes apenas comentaram que
“acham errada esse tipo de atitude”).
3. PJM (anos): Eu penso que isso pode ser uma boa lição. E que isso pode
ser aplicado na minha vida como uma lição.
144
Foram consideradas todas as respostas nas quais os alunos expressavam seu posicionamento,
tentando avaliar eticamente a situação proposta.
156
Percebemos que 50% educandos se limitaram a repetir a moral da fábula, sem
definir um posicionamento e, às vezes, escrevendo frases, aparentemente, sem
sentido. Exemplos:
1. JT (anos): A frase ai em cima dis que agem tem que faz todo o trabalo e
as pessoas leva o lugro.
2. JA (anos): Eu penso que esse homem pega um bichinho Só pra fazer essa
voz. Eles mesmo pega o gato dele a arara e faz.
3. TX (anos): Tem a vem com a minha vida.
4. MV (anos): quando nois faz o trabalho duro e os outros que levam todo o
lucro.
Ao relacionarmos os resultados das questões 2 e 3, podemos constatar que as
causas das dificuldades demonstradas pelos educandos, conforme discutimos,
parecem estar relacionadas ao fato de que as práticas de leitura realizadas na
escola ainda se fundamentam, de modo geral, no modelo autônomo de letramento.
Por isso, deixam de considerar aspectos importantes, tais como, as relações
dialógicas existentes entre os elementos (conteúdo temático, estrutura
composicional e estilo) que constituem o “todo” discursivo que se “materializa” como
texto, pertencente a um determinado gênero discursivo.
Diante disso, verificamos que 55% dos alunos pesquisados o conseguiram
reconhecer a unidade temática, tanto da fábula quanto da tirinha, gêneros comuns
nas séries iniciais e no processo de letramento não escolar de grande parte dos
discentes. Isso indica a necessidade urgente de se repensar o processo de ensino-
aprendizagem de leitura, afinal, se este tem como função contribuir para a formação
do leitor crítico, parece-nos que sérios problemas no percurso entre os objetivos
educacionais e a prática, efetivamente, desenvolvida em sala de aula.
Lembramos, novamente, que os resultados aqui expostos apenas fornecem indícios
acerca do trabalho desenvolvido pela profª. Marta, pois não tivemos oportunidade de
observar as aulas por ela ministradas. Outro fator relevante diz respeito ao período
de coleta de dados, que ocorreu no início do Bimestre. Logo, mais do que as
práticas de leitura vivenciadas em 2007, os dados mostram como foi o processo de
escolarização dos discentes pesquisados, ou seja, expõem a práxis implementada
nos anos anteriores (durante o Ciclo) e, além disso, desvelam a distância
existente entre esta e a Proposta Político Pedagógica da unidade escolar.
157
5.3 A formação do leitor e o letramento escolar
O processo de reflexão, acerca dos acertos e erros dos alunos, contribuiu para
percebermos quais as habilidades que ainda não estão consolidadas e precisariam
ser retomadas, quais alunos apresentaram mais dificuldades e em quais situações
isso ocorreu, ou seja, permitiu que fizéssemos um diagnóstico detalhado das
capacidades de leitura avaliadas. Isto posto, mesmo diante dos problemas
detectados, podemos afirmar que a maioria dos discentes obteve um desempenho,
relativamente satisfatório, pois das 12 habilidades avaliadas, em 07 a média
alcançada foi superior a 50%. Vejamos o gráfico:
Gráfico 2. Média de habilidades de leitura demonstradas
Ressaltamos que o índice foi maior em habilidades relacionadas à capacidade de
compreensão (estratégias de leitura), a saber:
01 (75%): Identificar informações relevantes para a compreensão do texto
(fábulas, texto informativo, verbete de dicionário, tirinhas e histórias em
quadrinhos).
02 (85%): Mobilizar conhecimentos prévios para auxiliar no processo de
atribuição de sentido ao texto.
Hb1 Hb2 Hb3 Hb4 Hb5 Hb6 Hb7 Hb8 Hb9 Hb10 Hb11 Hb12
Média de habilidades de leitura demonstradas
Total
158
03 (85%): Utilizar informações oferecidas por um verbete de dicionário,
glossário ou texto informativo na compreensão do texto.
Nº 07 (75%): Perceber a coesão estabelecida no texto por meio de pronomes,
sinônimos, advérbios e da ordem das palavras na frase.
Nº 09 (85%): Reconhecer causas e conseqüências de determinados fatos.
Ressaltamos, nesse momento, a presença das estratégias de leitura como algo
positivo, uma vez que também são necessárias para a formação do leitor proficiente.
Contudo, temos de enfatizar que estas não são suficientes para a construção da
compreensão ativa e, conseqüentemente, para que ocorra a interpretação do texto.
Constatamos que apenas uma das habilidades referentes à capacidade de
compreensão obteve média abaixo de 50% (reconhecer a unidade temática do texto,
com 45%), fato este que expõe a fragilidade do ensino ministrado em nosso locus de
pesquisa, visto que os gêneros selecionados para a avaliação estão presentes, tanto
no universo do cotidiano (HQ), quanto nas práticas escolares (fábula e tirinha).
Diante desses pressupostos, podemos inferir que o modelo de letramento adotado
pela escola pesquisada não está contribuindo, significativamente, para a formação
do leitor crítico, uma vez que parece deixar de lado habilidades importantes para a
efetivação desse processo, tais como:
Reconhecer a relação entre imagem e texto verbal na atribuição de sentido ao
texto (nº 8, com média de 15%).
Interpreta com base no texto, inferindo uma idéia implícita nele (nº 10, com
média de 45%).
Reconhecer o efeito de sentido de recursos gráficos como cores, fonte,
tamanho e formato de letras, imagens, etc. (nº 11, com média de 5%).
Elaborar apreciações relativas a valores éticos e/ou políticos (nº 12, com
média de 30%).
Todavia, ainda em relação à capacidade de apreciação e réplica, encontramos as
habilidades:
159
a) Caracterizar personagens a partir de descrições apresentadas, de ações por
ela realizadas ou do modo como se expressam (nº 06, com 90%, maior índice
alcançado na avaliação).
Acreditamos que esse resultado seja fruto do letramento não escolar, uma vez que
nos gêneros HQ e tirinhas, geralmente, as características dos personagens são
inferidas pelo leitor a partir das ações por eles realizadas ou pelo modo como se
expressam.
b) Relacionar as características textuais do gênero e os indicadores de suporte
ao sentido atribuído ao texto (nº 07, na qual os alunos alcançaram 55%).
Mesmo que a média esteja acima de 50%, constatamos que a citada habilidade
ainda está em processo de construção, pois os alunos demonstraram muita
dificuldade na resolução das questões 17 e 19 (com 85% e 45% de erro,
respectivamente), à exceção da nº 11 (com 90% de acerto) e, novamente, nesse
caso, observamos a contribuição da leitura não escolar de HQ e tirinhas: a pergunta
11 recupera o enredo das histórias da Turma da Mônica e a 19, as funções de
determinado tipo de balão.
Considerando o fato de que os alunos do 4º ano pesquisado são leitores em
formação (e iniciantes), enfatizamos a importância desses resultados, uma vez que
estes reforçam a necessidade tanto da realização de diagnósticos acerca do
processo de ensino-aprendizagem de leitura, quanto da mediação pedagógica, visto
que os discentes avaliados ainda apresentam problemas para reconhecer a unidade
temática, habilidade esta essencial para a interpretação de qualquer gênero
discursivo.
Nesse sentido, pensamos que a escola deve ser organizar para implementar uma
proposta de ensino de leitura que as necessidades de todos os discentes, afinal,
uma das metas do processo de escolarização é a de possibilitar a formação do leitor
proficiente.
Logo abaixo, estudaremos o desempenho individual de alguns educandos, com o
objetivo de exemplificar melhor as situações observadas:
160
1) PJM (9 anos, 92% de aproveitamento/ habilidades demonstradas):
Os pais de PJM possuem curso superior incompleto e sua mãe exerceu
grande influência no desenvolvimento de seu gosto pela leitura;
Em período anterior ao de sua alfabetização, além de sua mãe, outros
familiares também costumavam ler para PJM;
O aluno gosta de ler revistas sobre jogos (videogame e computador),
televisão, fofocas ou de informação; gibis, livros infantis e didáticos; a Bíblia.
Assim, como podemos constatar, PJM (fora do ambiente escolar) não tem
acesso, mas lê uma boa diversidade de gêneros discursivos;
Além disso, fora do espaço escolar, ele costuma escrever histórias reais ou
inventadas;
Utiliza computador todos os dias e, de vez em quando, vai à biblioteca
145
, ao
cinema e ao teatro; possui de 15 a 50 livros em casa; a televisão e a internet
são suas principais fontes de informação.
Quanto às atividades que realiza na unidade escolar, PJM citou
146
:
Copiar matérias, textos e exercícios do quadro negro;
Copiar textos dos livros;
Fazer redação ou trabalhos;
Responder a questionários ou fazer exercícios;
Escrever textos ditados pelo professor;
Participar de debates ou discussões;
Fazer perguntas de esclarecimento ao professor;
Consultar quadros de horários;
Estudar e preparar-se para provas e avaliações;
Participar de reuniões para tomar decisões.
Investigamos, também, os registros avaliativos do aluno e verificamos que todas as
habilidades elencadas no Dossiê Acadêmico aparecem marcadas com a sigla EC
145
Tanto para ler como para consultar ou retirar livros.
146
Percebemos que o aluno não assinalou a leitura em voz alta.
161
(em construção), desde o até o 4º Bimestre
147
. Talvez este tenha sido o meio
utilizado pela professora para não se “comprometer”, ou seja, como não possuía
segurança para avaliar os discentes a partir dos critérios presentes no referido
documento, optou por registrar, do mesmo modo, o desenvolvimento de todos.
Contudo, ao analisarmos os resultados obtidos por PJM, inferimos que:
a) O discente havia construído várias das habilidades avaliadas em nossa
pesquisa, as quais, em sua maioria, também compõem o mencionado dossiê
(exemplo: identifica informações relevantes para a atribuição de sentido,
mobiliza conhecimentos prévios, entre outras);
b) A habilidade de reconhecer o efeito de sentido de recursos gráficos (cores,
fonte, tamanho e formato de letras, imagens, etc.) em textos dos gêneros HQ
e tirinhas, precisa receber atenção especial, pois das três questões a ela
relacionadas, o educando respondeu parcialmente a 13, errou a 17 e
acertou apenas a nº 19;
c) Quanto à habilidade de elaborar apreciações relativas a valores éticos e/ou
políticos, permanecem as dificuldades, pois o aluno respondeu parcialmente a
questão nº 3;
d) As habilidades de reconhecer o efeito de sentido de recursos gráficos e
relacionar imagem e texto verbal na atribuição de sentido parecem estar em
processo de construção (a questão nº13 também foi respondida
parcialmente).
2) TX (11anos, não obteve nenhum aproveitamento/ habilidades demonstradas):
Ainda que tenha acertado algumas questões, estas não foram suficientes
para “constituir” nenhuma das habilidades avaliadas.
A mãe possui Ensino Médio completo, sendo que o incentivo à leitura não foi
motivado pela família e, sim, por um professor, pois, segundo informações do
147
De acordo com informações obtidas em outubro/2007, através da diretora da unidade escolar, o
fato se repetiu nos dossiês de todos os demais alunos do 4º ano.
162
aluno, antes que ele aprendesse a ler, não havia ninguém que fizesse isso
para ele.
Tem a Bíblia como leitura preferida e, de vez em quando, também revistas
sobre (fofocas/ televisão) e jornais. Desse modo, chamou-nos a atenção o
fato de que o aluno não mencionou nenhum dos materiais de leitura, mais
comuns, na fase da infância (livros infantis e gibis); o que nos leva a inferir
que TX tem pouco acesso a texto de diversos gêneros;
As atividades de produção escrita que realiza, fora da escola, são de cópia
(receitas culinárias e letras de música); nunca utilizou o computador e possui
menos de 10 livros. Além disso, nunca foi à biblioteca e nem ao teatro, sendo
que a televisão, o rádio e as conversas com os amigos são as suas principais
fontes de informação.
TX trabalha ajudando sua mãe a fazer pamonha para vender.
Quanto às atividades que realiza na unidade escolar, TX citou
148
:
Copiar matérias, textos e exercícios do quadro negro;
Copiar textos dos livros;
Responder a questionários ou fazer exercícios;
Participar de debates ou discussões.
Os registros avaliativos apresentados no Dossiê Acadêmico nos mostram que TX
obteve um desempenho igual ao dos demais alunos, ou seja, todas as habilidades
estavam marcadas como “em construção” (EC do 1º até o 4º Bimestre).
No entanto, o discente foi encaminhado pela profª. Marta à Sala de Apoio, a fim de
receber atendimento específico para resolver dificuldades de aprendizagem. Este
fato fez com que refletíssemos, pois, de acordo com os dados oficiais da escola
pesquisada, ambos (PJM e TX) apresentam desenvolvimento similar, no qual todas
as habilidades estão em construção. Então, ousamos perguntar: por que TX foi
indicado para a Sala de Apoio e PJM não?
148
TX também não assinalou a leitura em voz alta.
163
Diante dos dados dessa pesquisa, parecem óbvios os motivos pelos quais o aluno
necessita de atendimento específico: TX não alcançou nenhuma das habilidades
avaliadas em nosso instrumento
149
. Entretanto, essa realidade não podeser vista
se tomarmos como objeto de análise somente o referido dossiê, o qual, oficialmente,
deveria mostrar o desenvolvimento cognitivo do aluno:
Tabela 16: Quadro de habilidades de leitura/ alunos - 4º ano
ALUNO (A)
H/1
H/2
H/3
H/4
H/5
H/6
H/7
H/8
H/9
H/10
H/11
H/12
Total
%
PJM
x x x x x x x x x x - x 11
92%
KK
x x x x x x x x x x x - 11
92%
MP
x x x x x x x x x x 10
83%
PD
x x x x x x x x x x 10
83%
JA
x x x x x x x x x 9
75%
LR
x x x x x x x x x 9
75%
EJ
x x x x x x x x 8
67%
ID
x x x x x x x x 8
67%
GV
x x x x x x x 7
58%
JV
x x x x x x x 7
58%
VS
x x x x x x x 7
58%
WM
x x x x x x x 7
58%
AJ
x x x x x x 6
50%
JT
x x x x x x 6
50%
KC
x x x x x x 6
50%
MV
x x x x x x 6
50%
DC
x x x x 4
33%
AC
x x x 3
25%
PJ
x x x 3
25%
TX
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0%
%
75%
85%
85%
45%
55%
90%
75%
15%
85%
45%
5%
30%
Como podemos observar na tabela acima, cada um dos discentes avaliados
demonstrou habilidades diferentes, as quais, ao serem analisadas minuciosamente,
desvelaram níveis também diversos de aprendizagem, a saber, algumas habilidades
já foram consolidadas e outras devem ser retomadas.
Acreditamos que o processo de construção das capacidades de leitura deve ser
mediado e acompanhado pelo professor e este deve estar atento à heterogeneidade
do grupo de alunos com o qual trabalha. Esses procedimentos facilitarão a
149
Ele acertou as questões 4, 6, 7 e 8; respondeu parcialmente a 1 e a 9; errou a 2, 3, 5 e 10;
deixou sem fazer da nº 12 até a 20.
164
implementação de estratégias didáticas mais eficientes na resolução das
dificuldades de aprendizagem, em qualquer área do conhecimento.
A distância entre os registros avaliativos oficiais e o desempenho real dos alunos
traz sérios problemas para a rede municipal de Cuiabá, pois parece não se restringir
somente ao nosso locus de pesquisa
150
. Isso acaba expondo a ineficiência do
sistema avaliativo implantado na rede municipal de Cuiabá, afinal são as
informações do Dossiê Acadêmico que serão utilizadas para nortear as políticas
públicas de formação dos docentes. Além disso, demonstra também uma lacuna no
processo de formação dos próprios assessores pedagógicos da SME/ Cuiabá,
coordenadores pedagógicos e, conseqüentemente, dos professores que atuam em
sala de aula.
Em consonância com as demais pesquisas desenvolvidas acerca do letramento
escolar, esta dissertação demonstra o impacto que a prática educativa
fundamentada no modelo autônomo pode trazer para o sucesso e/ou fracasso do
aluno em seu processo de escolarização. Lembramos que os jovens PJM e TX são
exemplos clássicos dessa situação:
PJM parece possuir todos os recursos para construir vários tipos de
letramento, pois em seu contexto sócio-cultural, tanto a leitura quanto a
escrita são valorizadas. Porém, como as capacidades de leitura que
constituem o que denominamos de leitor crítico não são construídas
espontaneamente, o educando necessita que a escola atue nesse processo;
No caso de TX, temos a impressão que seu ambiente familiar não oferece
estímulos para que se torne leitor e, além disso, a participação dele em
outros tipos de evento de letramento parece ser muito restrita (uso de
biblioteca, visitas a museus, teatros, cinemas, etc.). Esses fatores aumentam
a responsabilidade da unidade escolar na formação leitora de TX e de outros
discentes que, assim como ele, apresentam as mesmas condições sócio-
culturais.
150
Conforme mencionado no capítulo 2, em conversas informais com diversos diretores e
coordenadores de escolas municipais, percebemos que a maioria dos docentes tem dificuldade para
compreender a que se referem os indicadores avaliativos do Dossiê Acadêmico.
165
Nesse sentido, mesmo vivenciando realidades opostas, ambos se aproximam em
um aspecto: dependem da escola para se tornarem leitores proficientes e, ao negar-
lhes isso, a referida instituição os condena a ser parte das estatísticas que circulam,
atualmente, na sociedade brasileira (Prova Brasil, SAEB, Provinha Brasil), as quais
afirmam que nossos alunos não entendem o que lêem e possuem um nível de
letramento muito baixo.
166
Capítulo 6: Considerações finais
Ao contrário das expectativas iniciais, o processo de coleta de dados e de
elaboração desta dissertação se tornou um grande desafio para a pesquisadora,
principalmente tendo em vista a proximidade entre esta e o contexto estudado.
Afinal, durante 14 anos (1991-2004), atuamos na rede municipal de Cuiabá, ora
como professora das séries iniciais, ora na função de assessora pedagógica,
acompanhando as escolas e, muitas vezes, ministrando cursos de formação
continuada aos docentes.
Desse modo, para estabelecermos relações de alteridade com nossos sujeitos de
pesquisa, tivemos de mudar o olhar institucional com o qual, até então,
visualizávamos a realidade escolar, para tentar analisar os processos educacionais
a partir do ponto de vista de nossos sujeitos.
Esse “exercício exotópico” produziu efeitos interessantes, pois passamos a ver
nosso papel na constituição do que hoje se tornou a rede municipal através das
informações dos sujeitos pesquisados, ampliando nossa percepção sobre o modo
como a escola nos e de como pensamos ser nossa imagem externa e, nesse
aspecto, concordamos com Bakhtin (1952- 1953/ 1979: p. 27), pois:
Podemos tentar imaginar a nossa própria imagem externa,
perceber-nos de fora, traduzir-nos da linguagem da auto-
sensação interna para a linguagem expressiva externa: nem de
longe isso é fácil, requer um esforço inusitado; essa dificuldade
e esse esforço não se parecem em nada com aquele que
vivenciamos ao memorizarmos o rosto pouco conhecido e meio
esquecido de outra pessoa; aqui não se trata de insuficiência
da memória de nossa imagem externa, mas de certa
resistência de principio que oferece a nossa imagem externa.
Essa troca de posições sociais fez com que percebêssemos a real dimensão das
mudanças ocorridas na rede municipal no período de 1994 a 2000, pois pudemos
compreender, efetivamente, qual a nossa função nesse processo e as
responsabilidades resultantes dessa ação.
Assim, conforme mencionamos anteriormente, as críticas aqui tecidas se destinam a
suscitar reflexões acerca do processo de letramento escolar e das práticas de
167
ensino-aprendizagem desenvolvidas pelos docentes em sala de aula, contribuindo
para a melhoria da qualidade do ensino, pois os dados coletados, além de
demonstrarem essa necessidade, indicam que a escola pesquisada necessita de
auxílio externo para elaborar e implementar situações didáticas que favoreçam a
construção das capacidades de leitura.
Considerando que essa não é uma demanda localizada, ou seja, específica do
nosso locus, acreditamos que a SME/ Cuiabá poderia se organizar para encontrar
formas mais eficientes de articular avaliação, formação continuada e
acompanhamento da prática educativa desenvolvida em sala de aula, a fim de que
possamos visualizar melhorias concretas na qualidade do ensino oferecido pela rede
municipal.
Nessa perspectiva, verificamos que os dados coletados neste estudo apontam para
problemas semelhantes aos detectados por outras pesquisas ou mesmo pelas
avaliações oficiais realizadas pelo MEC (Prova Brasil e SAEB), a saber, os alunos
conseguem apreender apenas os significados mais superficiais do texto e, por isso,
apresentam dificuldade para utilizar a leitura, tanto em situações escolares, como
não escolares.
Portanto, reavaliar a função da escola no processo de formação de leitores críticos e
criar mecanismos para que os docentes compreendam a importância de “ensinar
leitura”, em uma sociedade na qual as práticas de letramento estão cada vez mais
complexas, exigindo a construção de novas capacidades de leitura e/ou escrita,
deveria se constituir como prioridade para todos os profissionais que atuam na área
da Educação, principalmente nos Ensinos Fundamental e Médio.
Todas essas questões apenas reforçaram nosso interesse em estudar o processo
de ensino-aprendizagem de leitura e mesmo que nosso universo de sujeitos possa
ser considerado “pequeno”, este parece representar a realidade de várias escolas da
rede municipal
151
.
Assim, pensamos que os dados coletados poderão nos subsidiar nas respostas às
seguintes questões:
151
Segundo informações coletadas junto às equipes gestoras de outras unidades escolares,
percebemos que os problemas constatados em nosso locus estão se repetindo em outras escolas da
rede.
168
1) Como a concepção de ensino-aprendizagem de leitura expressa nos PCN de
Língua Portuguesa (1º e Ciclos) se reflete nos documentos oficiais da
Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá e no Projeto Político-
pedagógico da escola pesquisada?
vimos que o Construtivismo parece ser o denominador comum entre os PCN, os
Referenciais Curriculares da Escola Sarã e o PPP da unidade escolar pesquisada.
Ainda que em todos eles apareçam “sinais” oriundos de diversas fontes teóricas
(Interacionismo, Sócio-interacionismo, Teoria da Comunicação, entre outras),
percebemos que os modelos cognitivos de leitura acabaram predominando nos
citados documentos. Diante disso, dois fatores nos chamaram a atenção:
a) Os Referenciais Curriculares/ SME/ Cuianão estabelecem diretrizes e
nem conteúdos específicos para o ensino de leitura, fato este que
demonstra a concepção de leitura existente no sistema municipal:
“aprende-se a ler, lendo” (Freinet). Logo, esta é uma ação que não
compreende mediação pedagógica, pois requer apenas que os alunos
tenham acesso à diversidade de gêneros discursivos, fato que seria
suficiente para que estes se tornassem leitores (esses pressupostos
também aparecem nos PCN de 1º e 2º Ciclos);
b) Ao contrário da situação institucional, a escola pesquisada possui uma
proposta pedagógica
152
concreta para o ensino de leitura, fundamentada
nas capacidades de leitura e comprometida com o pensamento de Paulo
Freire. Assim, como forma de resistência às diretrizes estabelecidas pela
SME, a comunidade escolar preferiu elaborar seu próprio Dossiê
Acadêmico, contrariando as orientações oficiais.
No entanto, lembramos que, segundo os dados coletados durante a pesquisa, a
unidade escolar se encontra com sérios problemas para implantar a proposta
delineada no PPP, uma vez que esta ainda não foi totalmente internalizada pelos
152
O Programa Gestar/ MEC, implantado na escola de 2001 a 2003, influenciou nesse processo,
principalmente na seleção das habilidades de leitura que deveriam ser trabalhadas em cada Ciclo.
169
docentes e, conseqüentemente, os mesmos apresentam dificuldades para colocá-la
em prática.
2) Quais são as capacidades de leitura construídas pelos discentes do ano
pesquisado? Qual o tipo de capacidade priorizada pela escola?
A análise do instrumento avaliativo indicou que a maior média de habilidades
demonstradas pelos alunos está relacionada à capacidade de compreensão
(estratégias de leitura). Exemplos: quanto a reconhecer relações de causa e
conseqüência, mobilizar conhecimento prévio e utilizar informações oferecidas por
verbete de dicionário, glossário ou texto informativo, os alunos obtiveram 85% de
aproveitamento, chegando a 75% nas que se referem à identificação de informações
relevantes para a compreensão do texto e à percepção de alguns mecanismos de
coesão (por meio de pronomes, sinônimos, advérbios e da ordem das palavras na
frase).
Lembramos que apenas duas das seis habilidades relacionadas à capacidade de
apreciação e plica alcançaram índice superior a 50%: a de relacionar
características textuais do gênero e os indicadores de suporte ao sentido atribuído
ao texto e a de caracterizar personagens a partir de descrições apresentadas, de
ações por elas realizadas ou do modo como se expressam.
Os dados coletados nos indicam que, fora do ambiente escolar, o gibi é a leitura
preferida pela maioria dos alunos. Esse fator parece ter contribuído bastante para a
aquisição desta habilidade, pois tanto nas tirinhas, como nas histórias em
quadrinhos, as características das personagens são, geralmente, inferidas pelo leitor
ao longo do texto.
Outro fator que deve ser considerado está relacionado ao texto selecionado, a
saber, uma tirinha e uma história em quadrinhos da Turma da Mônica, cuja esfera de
circulação é o gibi, material bastante presente no cotidiano dos alunos. Isso faz com
que os alunos reconheçam algumas características do gênero (tipos de balão, por
exemplo, e sua relação com o texto verbal) e associem esses elementos ao enredo
típico de algumas das histórias criadas por Maurício de Souza. Exemplo: o
Cebolinha pega o coelhinho da Mônica para dar nós nas suas orelhas, no entanto,
170
quando esta descobre e o recupera, o menino acaba levando várias “coelhadas” na
cabeça.
Destacamos que durante a seleção dos textos que fariam parte do instrumento
avaliativo, preferimos o utilizar tirinhas que circulam em jornais, visto que, no
questionário aplicado, a freqüência de leitura desse meio de comunicação é muito
baixa entre os alunos.
Todavia, mesmo com todos esses cuidados, conforme explanamos no capítulo 5, os
discentes apresentaram vários problemas na interpretação de textos dos gêneros
fábula, tirinha e história em quadrinhos, principalmente, quanto às habilidades que
se referem à capacidade de apreciação e réplica, tais como: reconhecer o efeito de
sentido de recursos gráficos como cores, fonte, tamanho e formato das letras, etc.
(5%); reconhecer a relação entre imagem e texto verbal na atribuição de sentido ao
texto (15%); elaborar apreciações relativas a valores éticos e/ou políticos (30%),
entre outras.
Assim, diante desses dados e considerando as entrevistas realizadas com a equipe
gestora, percebemos certa tendência, por parte da escola, em priorizar o ensino da
capacidade de compreensão (estratégias de leitura), isso ficou mais visível no
trabalho desenvolvido pela professora pesquisada, o que de certa forma é
significativo, porém não é o suficiente para efetivar um dos objetivos da proposta
pedagógica, a saber, formar leitores críticos.
Conforme já dissemos anteriormente, os estudos bakhtinianos podem contribuir
bastante para que os alunos compreendam ativamente o que lêem, pois ao
considerarmos esses pressupostos teóricos, ressalta-se a importância de tratarmos
o texto, em sala de aula, como gênero discursivo (constituído por tema, estrutura
composicional e estilo) e que, portanto, deve ser considerado a partir das relações
dialógicas que este estabelece com seus interlocutores e com o seu contexto de
produção. Assim, concordamos com Goulart (2003: p. 110):
(...) A necessidade de formação pela escola de leitores e
autores críticos pode ser adensada pelos estudos de Bakhtin
na medida em que as noções desenvolvidas pelo autor dão
suporte teórico para compreender aspectos que determinam as
muitas possibilidades de interpretar enunciados e a relação
171
entre o conteúdo temático, a seleção de recursos expressivos e
a construção textual.
A melhor compreensão dessa relação pode contribuir também
para se investigar e repensar o trabalho tradicional com a
gramática na escola sem que a correlação dos três aspectos
seja rompida. Pode contribuir ao mesmo tempo, para que os
alunos, conhecendo cada vez mais a língua, tornem suas falas
mais livres e comprometidas.
Diante do exposto, voltamos nosso olhar para as aulas de leitura ministradas nas
turmas do ano
153
, as quais, devido à gravidade da situação detectada, merecem
atenção especial da coordenação pedagógica da escola.
Os fatos narrados no relatório das acadêmicas de Pedagogia fizeram com que
antecipássemos os resultados dessa pesquisa para a equipe gestora
154
da unidade,
no mês de novembro/2007 e para toda a comunidade escolar, em fevereiro/2008.
3) Quais as relações existentes entre: as capacidades de leitura demonstradas
pelos alunos e o letramento não escolar?
Os alunos pesquisados, em sua maioria, participam de eventos de letramento fora
do ambiente escolar, são leitores de livros infantis e gibis, e, justamente por isso,
nossa expectativa era a de que estes não apresentariam grandes dificuldades para
compreender a unidade temática de textos dos gêneros fábula e tirinha, ambos
bastante comuns, especialmente, na esfera escolar, uma vez que também aparecem
com certa freqüência nos livros didáticos destinados às séries iniciais.
Embora a habilidade de reconhecer a unidade temática do texto esteja relacionada à
capacidade de compreensão, acreditamos que esta é fundamental no processo de
atribuição de sentido, pois contribui para que os alunos percebam quais as
possibilidades de temas que fazem parte do universo discursivo de determinado
gênero. Nesse sentido, o fato de não entender a unidade temática interfere na
habilidade de “interpretar com base no texto, inferindo uma idéia implícita nele”,
153
Para maiores detalhes, ver o Anexo D.
154
A diretora e a coordenadora pedagógica já estão tomando providências para reverter a situação.
172
diminuindo a probabilidade de os educandos compreenderem ativamente o que foi
lido, ou melhor, de que os mesmos se posicionem criticamente acerca do texto.
Conforme mencionamos, grande parte das habilidades demonstradas pelos
alunos está relacionada à capacidade de compreensão e podemos inferir que sua
aquisição também sofre influência dos eventos de letramento não escolar dos quais
os alunos participam. Por exemplo, sabemos que a escola não trabalha com a
abordagem de gêneros discursivos, no entanto, como os educandos são leitores
assíduos de gibis, os mesmos mobilizaram, com certa facilidade, os conhecimentos
prévios que possuíam acerca das personagens da Turma da Mônica.
Contudo, podemos inferir que a mobilização de estratégias de leitura e o
envolvimento em práticas de letramento fora do ambiente escolar não são
suficientes para garantir a construção da capacidade de apreciação e réplica e, por
conseguinte, a formação do leitor proficiente.
Nesse sentido, a função da escola se amplia, pois, considerando a heterogeneidade
dos grupos que atende, teremos as seguintes situações: para alguns discentes, ela
será a única agência de letramento responsável pela sua formação de leitor, como
no caso de TX
155
, já para outros, a mesma teria de complementar a formação
iniciada fora do ambiente escolar, atuando de modo mais efetivo na criação de
situações didáticas que possibilitem o desenvolvimento de leitores críticos.
Acreditamos que o trabalho com os gêneros discursivos poderia auxiliar a unidade
escolar na implementação de uma proposta pedagógica voltada para a formação do
leitor proficiente, uma vez que o texto passaria a ser estudado a partir de suas
relações dialógicas e de sua interface com outros discursos, cio-historicamente
situados, possibilitando a construção de sentidos e a apreciação valorativa.
Finalmente, lembramos que a escola precisa refletir acerca das ações que
desenvolve, pois o modelo escolar de letramento, como declarou Rojo (2001), não
propicia a formação do leitor e, para romper com essa situação, é imprescindível que
os profissionais da educação superem algumas de suas crenças sobre a prática
educativa, especialmente quanto ao processo de ensino-aprendizagem de leitura.
155
Aluno com menor índice de aproveitamento da turma pesquisada (não conseguiu demonstrar
nenhuma das habilidades avaliadas).
173
As pesquisas realizadas nessa área atestam que a leitura não deve ser vista apenas
como uma estratégia didática e, sim, como um “objeto” a ser ensinado.
4) Qual a importância do professor no processo de formação do leitor crítico?
Ao longo desta pesquisa, comentamos várias vezes que o acesso aos livros, sem a
mediação pedagógica adequada, não assegura a formação do leitor proficiente. Isso
aumenta a responsabilidade dos docentes, pois, muitas vezes, devido a problemas
socioeconômicos, a escola pode se tornar a única possibilidade de acesso à cultura
letrada para alunos oriundos das classes sociais mais desfavorecidas.
Assim, para trabalhar com esses alunos (ou com outros), auxiliando-os no processo
de construção das capacidades de leitura, a escola deve investir na formação
continuada dos professores, criando momentos de reflexão coletiva, através dos
quais sejam discutidas estratégias para a implementação de novas metodologias e
socializadas as experiências realizadas.
Nessa perspectiva, surge a necessidade de se criar situações didáticas nas quais os
alunos possam vivenciar práticas concretas de leitura e escrita, nas quais estes
possam perceber que sempre lemos para alcançar algum objetivo e que um texto
pode abarcar um “universo” de significações.
Portanto, ao fundamentarmos nossa práxis em uma visão bakhtiniana de linguagem,
poderemos perceber que educar não é “homogeneizar”, é considerar a diversidade
existente em sala de aula, é abrir espaço para a réplica, para diferentes
possibilidades de leitura, de modos de pensar e de construir o conhecimento,
criando oportunidades para que o aluno seja autor de sua própria palavra e não um
simples “revozeador” da palavra alheia, ou como declarou Freitas (1996: p: 173):
Educar é levar o aluno a ser autor, a dizer a própria palavra, a
interagir com a língua, a penetrar numa escrita viva e real. O
professor precisa também ser autor: penetrar na corrente da
língua, recuperar sua palavra, sua autonomia, sem fazer dela
uma tribuna para o poder, mas um meio de exercer uma
autoridade que se conquista no conhecimento partilhado.
Nesse sentido o professor pode ser visto como um
orquestrador de diferentes vozes.
174
Isso faz com que o processo de ensino-aprendizagem também seja considerado
uma prática social, um ato dialógico no qual os papéis de professor e aluno possam
ser permeados por relações de alteridade, uma vez que ambos são agentes sociais
que, nas interações em sala de aula, compartilham o mesmo ato educativo.
Acreditamos que esses pressupostos teóricos podem auxiliar os docentes a
repensar, também, as práticas escolares de leitura, ampliando sua visão acerca do
processo de formação do leitor proficiente e do que significa, de fato, ensinar leitura.
Ao longo desta pesquisa, verificamos que a rede municipal de Cuiabá, até 2007, não
possuía diretrizes específicas para o ensino de leitura e o mesmo ocorre no que diz
respeito à formação do leitor proficiente e, muito embora a SME desenvolva alguns
projetos de formação continuada, entre estes não parece haver articulação que
possa resultar em modificações concretas da prática educativa. Percebemos, ainda,
que a escola pesquisada apresenta sérias dificuldades para implementar sua
proposta pedagógica.
Nesse contexto, disponibilizamos nossa pesquisa como mais um elemento a ser
utilizado tanto pela SME/ Cuiabá, quanto pela unidade escolar, no processo de
análise e reflexão acerca do trabalho que está sendo desenvolvido na área de
Linguagem/ Ensino de Leitura.
No entanto, para que haja avanços significativos, destacamos que a SME e as
escolas municipais deveriam se reconhecer como interlocutores, parceiros em um
mesmo processo educativo, uma vez que ambos possuem metas semelhantes, a
saber, melhorar a qualidade do ensino oferecido à população cuiabana.
Acreditamos, ainda, que esta pesquisa, aqui concretizada, poderá contribuir para
uma releitura sócio-histórica das ações da rede municipal de ensino, por meio da
qual seria possível visualizar algumas soluções para os problemas enfrentados
pelas escolas, tendo como base a contribuição da visão bakhtiniana de linguagem.
175
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182
APÊNDICES
183
APÊNDICE A – Modelo do Questionário de Letramento: destinado aos alunos.
Pesquisa sobre Leitura
Escola:________________________________________________________
Nome__________________________________________________________
Série/ Ano_____________ Idade________
Endereço_______________________________________________________
Bairro:_______________________; Telefone_____________________
Profª ________________________
1. Nome do Pai ou responsável do sexo masculino: _____________________
Idade_________; Profissão____________________
local de trabalho ____________________
Grau de instrução
( ) Nenhuma ( ) Menos de 4ª série
( ) Ensino Fundamental incompleto/ até a 7ª série
( ) Ensino Fundamental completo/ até a 8ª série
( ) Ensino Médio/ até ao 2º ano ( ) Ensino Médio completo
( ) Superior incompleto ( ) Superior completo
→Nome da Mãe ou responsável do sexo feminino_______________________
Idade_________; Profissão____________________
local de trabalho ____________________
Grau de instrução
( ) Nenhuma ( ) Menos de 4ª série
( ) Ensino Fundamental incompleto/ até a 7ª série
( ) Ensino Fundamental completo/ até a 8ª série ( ) Ensino Médio/ até ao 2º ano
( ) Ensino Médio completo ( ) Superior incompleto ( ) Superior completo
2. Renda familiar _____________________________________________
3. Quando ainda não sabia ler, alguém lia textos para você?
Sim ( ) Não ( ) Não sei ( )
Em caso positivo, responda: Quem lia?
184
( ) Mãe ou responsável do sexo feminino
( ) Pai ou responsável do sexo masculino
( ) Irmão mais velho ( ) Irmã mais velha
( ) Avô ( ) Avó
( ) Tio ( ) Tia
( ) Outra pessoa
4. O que costumava ler?
( ) Livros infantis ( ) Bíblia, livros sagrados ou religiosos
( ) Outros tipos de livros ( ) Gibis, revista em quadrinhos
( ) Jornais e revistas
5. Tipos de material que mais gosta de ler:
( ) Revistas ( ) Jornais
( ) Bíblia, livros sagrados ou religiosos ( ) Livros
( ) Gibis, revistas em quadrinhos ( ) Outros
6. Pessoas que mais influenciaram o gosto pela leitura:
( ) Mãe ou responsável do sexo feminino ( ) Outra pessoa
( ) Pai ou responsável do sexo masculino ( ) Ninguém
( ) Algum amigo ( ) Algum professor
( ) Outro parente ( ) Padre/Pastor ou líder religioso
7. Freqüência com que lê jornal:
( ) Todos os dias ( ) Algumas ou uma vez por semana
( ) De vez em quando ( ) Não costuma ler jornal
8. Freqüência com que lê revistas:
( ) Pelo menos uma vez por semana ( ) De vez em quando
( ) Não costuma ler
9. Tipos de revista que costuma ler:
( ) De informação (Veja, Época, Isto É etc.)
( ) Fofocas e novelas (Caras , Contigo, Amiga etc.)
( ) De religião ( ) Quadrinhos, gibis, humor
( ) Nenhum ( ) Outros. Quais?__________________
10. Tipo de livro que costuma ler, ainda que de vez em quando:
185
( ) Bíblia, livros sagrados ou religiosos ( ) Infantil, contos, fábulas, poemas
( ) Enciclopédias ( ) Livros didáticos
( ) Não costuma ler livros ( ) Outros
11. O que costuma escrever, criando ou copiando, no tempo livre?
( ) Receitas ( ) Letras de músicas
( ) Poesia ( ) Cartas e e-mails
( ) Histórias reais ou inventadas ( ) Álbuns familiares
( ) Diário íntimo ( ) Outros
( ) Não costuma escrever
12. Freqüência de uso do computador:
( ) Todos os dias da semana ( ) Quase todos os dias da semana
( ) Um ou dois dias da semana ( ) Eventualmente/de vez em quando
( ) Nunca utilizou computador
13. Materiais escritos que possui na residência:
( ) Calendários e folhinhas ( ) Álbum de família, fotografias
( ) Bíblia, livros sagrados ou religiosos ( ) Agenda de telefone/endereços
( ) Dicionário ( ) Livros de receitas de cozinha
( ) Livros didáticos ( ) Livros infantis
( ) Guias, listas e catálogos ( ) Livros de literatura/romances
( ) Enciclopédia ( ) Livros técnicos
14. Quantidade de livros que possui na residência:
( ) Menos de 10 livros ( ) De 15 a 50 livros
( ) De 51 a 100 livros ( ) Não tem livros em casa
15. O que seus pais ou parentes costumam ler?
( ) Ler a Bíblia, livros sagrados ou religiosos ( ) Ler jornais
( ) Ler ou escrever cartas ( ) Ler revistas
( ) Ler ou escrever receitas ( ) Ler folhetos
( ) Ler ou escrever tarefas do trabalho ( ) Fazer trabalhos escolares
( ) Nenhum tipo de texto ( ) Não sabe
186
Com que freqüência você:
16. Assiste à televisão: 17. Ouve rádio:
( ) Sempre ( ) Sempre
( ) Às vezes ( ) Às vezes
( ) Nunca ( ) Nunca
18. Vai a exposições ou feiras: 19. Vai a shows:
( ) Sempre ( ) Sempre
( ) Às vezes ( ) Às vezes
( ) Nunca ( ) Nunca
20. Vai ao cinema: 21. Vai ao teatro:
( ) Sempre ( ) Sempre
( ) Às vezes ( ) Às vezes
( ) Nunca ( ) Nunca
Com que freqüência você utiliza a Biblioteca para:
22. Retirar livros: 23. Ler e consultar livros:
( ) Sempre ( ) Sempre
( ) Às vezes ( ) Às vezes
( )Nunca ( ) Nunca
24. Ler e consultar revistas e jornais:
( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Nunca
25. O que você costuma ler na escola?
( ) Livros didáticos ( ) Dicionários
( ) Livros de histórias infantis ( ) Revistas em quadrinhos
( ) Revistas ( ) Folhetos e cartazes
( ) Textos e exercícios em folhas avulsas ( ) Enciclopédias
( ) Textos ou exercícios no quadro negro ( ) Jornais
( ) Sites ou páginas na Internet ( ) Seus próprios textos ou dos colegas
( ) Nenhum destes ( ) Outros. Quais?________________
187
26. Atividades que realiza na escola:
( ) Copiar matérias, textos e exercícios do quadro negro
( ) Copiar textos dos livros ( ) Fazer anotações sobre as aulas
( ) Fazer resumos de textos ( ) Fazer redação ou trabalhos
( ) Responder a questionários ou fazer exercícios
( ) Escrever textos ditados pelo professor ( ) Fazer relatórios
( ) Ler em voz alta ( ) Apresentar trabalhos oralmente
( ) Participar de debates ou discussões
( ) Fazer perguntas de esclarecimento ao professor
( ) Consultar quadros de horários ( ) Agendar provas e entrega de trabalhos
( ) Controlar suas próprias notas ou conceitos e faltas
( ) Estudar e preparar-se para provas e avaliações
( ) Participar de reuniões para tomar decisões ( ) Nenhuma destas
27. Como se mantém informado sobre assuntos da atualidade?
( ) Televisão ( ) Rádio
( ) Jornal ( ) Internet
( ) Conversas com parentes, amigos e colegas
( ) Reuniões na Igreja ( ) Nenhuma destas
28. Atividades fora da escola
Trabalha?____ Atividade que realiza no trabalho: _______________________
Freqüenta algum curso?_____________ Qual(is)?______________________
Por que escolheu fazer esse(s) curso(s)?______________________________
Faz teatro?______________________________________________________
Caso trabalhe, responda à seção a seguir:
29. O que você lê no trabalho?________________________________________
30. Tipos de material que escreve no trabalho:
( ) Bilhetes e recados ( ) Pedidos
( ) Nenhum destes ( ) Outros. Quais? _________
188
APÊNDICE B – Modelo do instrumento avaliativo utilizado.
EMEB.______________________________________________________
Aluno (a):____________________________________________________
4º Ano/ mat./ Profª __________________; Data:_________________
ATIVIDADES
Leia o texto com atenção:
O Leão, o Urso e a Raposa
Um leão e um urso capturaram um cervo e, em feroz luta, disputavam o
direito de posse da presa.
Após terem lutado bastante, cansados e feridos, eles caíram no chão,
completamente exaustos.
Uma Raposa que estava nas redondezas, a uma distância segura e observando
a tudo, vendo ambos caídos no chão, e o cervo abandonado entre eles, correu
entre os dois. Agarrou o cervo e desapareceu no meio do mato.
O leão e o urso vendo aquilo, mas incapazes de impedir, disseram:
- Ai de nós! Ferimos um ao outro apenas para garantir o jantar da raposa!
Autor: Esopo
Moral da História:
Algumas vezes acontece de alguém fazer todo trabalho pesado e outro levar
todo o lucro.
Fonte: Fábulas Ilustradas: O Leão, o Urso e a Raposa –
© Copyright 2000-2006/ http://www.sitededicas.com.br
Agora responda às perguntas com atenção:
1. Você já ouviu falar em um autor chamado Esopo? Leu algumas das
fábulas escritas por ele? _______________________________________
_________________________________________________________
Saiba mais sobre as Fábulas de Esopo:
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
sociedade de sua época, para mostrar o que é certo e o que é errado. (Fonte:
http://criancas.uol.
2.
A intenção do autor ao escrever esta fábula foi:
a) ( ) falar sobre a briga entre o leão e o urso.
b) ( ) mostrar a esperteza da raposa.
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
sobre os outros.
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
3.
Como você pode perceber, toda fábula traz uma mensagem para reflexão:
a moral da história. Vamos relembrar a moral da história que acabamos de
ler:
“Algumas vezes acontece de al
levar todo o lucro.”
a)
O que você pensa sobre a frase acima? Como isso pode ser aplicado à sua
vida? __________________________________________
______________________________________________________
4. Qual o
motivo da luta entre o leão e o urso? ________________
______________________________________________________
5. Qual a intenção da raposa ao ficar observando a luta entre o leão e o urso?
_________________________________________________
6. O leão e o
urso não conseguiram impedir a raposa de levar o cervo porque
estavam:
a) ( ) cansados e feridos.
c) ( ) com medo da raposa.
7. Considerando as atitudes da raposa, podemos afirmar que ela é:
a) ( ) preguiçosa.
c) ( ) orgulhosa.
Saiba mais sobre as Fábulas de Esopo:
A fábula é uma das mais antigas
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
sociedade de sua época, para mostrar o que é certo e o que é errado. (Fonte:
http://criancas.uol.
com.br/historias/fabulas/esopo.jhtm)
A intenção do autor ao escrever esta fábula foi:
a) ( ) falar sobre a briga entre o leão e o urso.
b) ( ) mostrar a esperteza da raposa.
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
Como você pode perceber, toda fábula traz uma mensagem para reflexão:
a moral da história. Vamos relembrar a moral da história que acabamos de
“Algumas vezes acontece de al
guém fazer todo trabalho pesado e outro
levar todo o lucro.”
O que você pensa sobre a frase acima? Como isso pode ser aplicado à sua
vida? __________________________________________
______________________________________________________
motivo da luta entre o leão e o urso? ________________
______________________________________________________
5. Qual a intenção da raposa ao ficar observando a luta entre o leão e o urso?
_________________________________________________
urso não conseguiram impedir a raposa de levar o cervo porque
a) ( ) cansados e feridos.
b) ( ) com preguiça.
c) ( ) com medo da raposa.
d) ( ) com sono.
7. Considerando as atitudes da raposa, podemos afirmar que ela é:
b) ( ) esperta.
d) ( ) briguenta.
189
A fábula é uma das mais antigas
maneiras de se contar uma história. O autor grego Esopo usava muitos bichos
como personagens de suas fábulas, como tartarugas,
lebres, raposas,
formigas e cigarras. Através das histórias ele criticava os valores da
sociedade de sua época, para mostrar o que é certo e o que é errado. (Fonte:
c) ( ) alertar os leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem
d) ( ) mostrar que devemos ter cuidado ao andar pela floresta.
Como você pode perceber, toda fábula traz uma mensagem para reflexão:
a moral da história. Vamos relembrar a moral da história que acabamos de
guém fazer todo trabalho pesado e outro
O que você pensa sobre a frase acima? Como isso pode ser aplicado à sua
vida? __________________________________________
______
______________________________________________________
_
motivo da luta entre o leão e o urso? ________________
__
______________________________________________________
_
5. Qual a intenção da raposa ao ficar observando a luta entre o leão e o urso?
_________________________________________________
urso não conseguiram impedir a raposa de levar o cervo porque
b) ( ) com preguiça.
d) ( ) com sono.
7. Considerando as atitudes da raposa, podemos afirmar que ela é:
Agora, vamos conhecer alguns dos significados do substantivo
8. Assim, no 1º parágrafo, o termo
a) ( ) leão.
b) ( ) raposa. c) ( ) cervo.
9. Analise as frases abaixo e escreva em qual “sentido” a palavra
usada:
a) O veterinário estava cuidando da águia que estava com as
machucadas. _______________________________________________
b)Várias presas
ficaram machucadas durante a r
Pascoal Ramos.
______________________________________________________
c) Por medida segurança, os leões do Circo Nicolau não possuem mais
presas
.____________________________________________________
10.
Você conhece Maurício de Souza e a Turma da Mônica? Escreva o que
você sabe sobre eles: __________________________________
_______________________________________________________
11. As cenas que aparecem na tirinha retratam uma situação bastante comum
nas histórias da Mônica:
Presa(sf)
: 1. ato de apresar ou apreender; 2. Aquilo de que o
animal se apodera para comer; 3. Dente canino; 4
de rapina; 5. Mulher em prisão. Fonte: Michaelis/ Dicionário.
Agora, vamos conhecer alguns dos significados do substantivo
8. Assim, no 1º parágrafo, o termo
presa
está substituindo a palavra:
b) ( ) raposa. c) ( ) cervo.
d) ( ) urso.
9. Analise as frases abaixo e escreva em qual “sentido” a palavra
a) O veterinário estava cuidando da águia que estava com as
machucadas. _______________________________________________
ficaram machucadas durante a r
ebelião na Penitenciária do
______________________________________________________
c) Por medida segurança, os leões do Circo Nicolau não possuem mais
.____________________________________________________
Leia a tirinha abaixo:
Você conhece Maurício de Souza e a Turma da Mônica? Escreva o que
você sabe sobre eles: __________________________________
_______________________________________________________
11. As cenas que aparecem na tirinha retratam uma situação bastante comum
nas histórias da Mônica:
: 1. ato de apresar ou apreender; 2. Aquilo de que o
animal se apodera para comer; 3. Dente canino; 4
. Garra de ave
de rapina; 5. Mulher em prisão. Fonte: Michaelis/ Dicionário.
190
Agora, vamos conhecer alguns dos significados do substantivo
PRESA:
está substituindo a palavra:
d) ( ) urso.
9. Analise as frases abaixo e escreva em qual “sentido” a palavra
presa foi
a) O veterinário estava cuidando da águia que estava com as
presas
machucadas. _______________________________________________
ebelião na Penitenciária do
______________________________________________________
c) Por medida segurança, os leões do Circo Nicolau não possuem mais
.____________________________________________________
Você conhece Maurício de Souza e a Turma da Mônica? Escreva o que
você sabe sobre eles: __________________________________
____
_______________________________________________________
11. As cenas que aparecem na tirinha retratam uma situação bastante comum
: 1. ato de apresar ou apreender; 2. Aquilo de que o
. Garra de ave
de rapina; 5. Mulher em prisão. Fonte: Michaelis/ Dicionário.
191
a) ( ) o interesse da Mônica e do Cebolinha pelo jogo de xadrez.
b) ( ) o diálogo como meio para resolver os problemas que existem entre eles.
c) ( ) o Cebolinha fugindo da Mônica, pois tem medo de apanhar.
12. No 2º quadrinho, aconteceu algo inesperado. O que foi? _______
______________________________________________________
13. Observe a expressão da Mônica no 3º quadrinho, você acha que ela
concordou totalmente com a sugestão do Cebolinha? Justifique. ______
______________________________________________________
14. Qual o objetivo do Cebolinha ao propor à Mônica que resolvessem suas
diferenças “com um tabuleilo de xadlez”? ______________________
15. Assim, a Mônica decidiu usar o tabuleiro de xadrez de outro modo. Qual
foi?
a) ( ) como bandeja para servir chá e brincar de casinha.
b) ( ) transformou em leque porque estava calor.
c) ( ) usou como guarda-chuva, pois já estava começando a chover.
d)( ) usou para bater no Cebolinha, já que ainda estava zangada com ele.
16. Em nosso dia-a-dia, como você acha que devemos resolver nossas
“difelenças” com as outras pessoas? _____________________________
______________________________________________________
17. No quadrinho, algumas palavras usadas pelo Cebolinha aparecem em
negrito (estão mais escuras que as outras): “PELAÍ, LESOLVER e
DIFELENÇAS”. Na sua opinião, o autor usou esse recurso para mostrar que
o Cebolinha:
a) ( ) queria que a Mônica parasse para escutá-lo, assim ele poderia
convencê-la a desistir de bater nele.
b) ( ) queria assustar a Mônica.
c) ( ) queria convidá-la para jogar xadrez.
d) ( ) queria demonstrar que não tinha medo dela.
Vamos ler
18. No 1º quadrinho, o pronome
a) ( ) Mônica.
c) ( ) Páscoa.
Vamos ler
mais
uma história da Turma da Mônica:
18. No 1º quadrinho, o pronome
ela se refere à:
b) ( ) raposa.
d) ( ) Magali.
192
uma história da Turma da Mônica:
193
19. Observe o e o quadrinhos. Quais são os elementos que indicam que o
Coelhinho da Páscoa está falando baixo e tentando se esconder:
_________________________________________________________
_________________________________________________________
_________________________________________________________
20. O Coelhinho da Páscoa estava com medo da Magali. Parece que ele
conhecia uma característica especial da menina. Você sabe qual é ?
a) ( ) Ser gulosa. b) ( ) Trocar o r pelo l.
c) ( ) Ser forte. d) ( ) Não gostar de tomar banho.
194
APÊNDICE C Modelo de matriz analítica acerca das habilidades/ capacidades
de leitura.
MATRIZ ANALÍTICA DAS CAPACIDADES DE LEITURA AVALIADAS
4º Ano/ 3ª série
HABILIDADES Questões
1.
Identifica informações relevantes para a
compreensão do texto (fábulas, texto informativo,
verbete de dicionário, tirinhas e histórias em
quadrinhos).
4, 6, 12, 15
2. Mobiliza conhecimentos prévios para auxiliar no
processo de atribuição de sentido ao texto.
1, 10, 11
3.
Utiliza informações oferecidas por um verbete de
dicionário, glossário ou texto informativo na
compreensão do texto.
2, 8, 9
4.
Reconhece a unidade temática do texto.
2, 5, 14
5.
Relaciona as características textuais do gênero e
os indicadores de suporte ao sentido atribuído ao
texto.
11, 17, 19
6.
Caracteriza personagens a partir de descrições
apresentadas, de ações por elas realizadas ou do
modo como se expressam.
7, 20
7.
Percebe a coesão estabelecida no texto por meio
de pronomes, sinônimos, advérbios e da ordem
das palavras na frase.
8, 18
8.
Reconhece a relação entre imagem e texto verbal
na atribuição de sentido ao texto.
12,13
9. Reconhece causas e conseqüências de
determinados fatos.
6, 15, 20
10. Interpreta com base no texto, inferindo uma idéia
implícita nele.
2, 5, 7, 14
11. Reconhece o efeito de sentido de recursos
gráficos como cores, fonte, tamanho e formato de
letras, imagens, etc.
13, 17, 19
12. Elabora apreciações relativas a valores éticos
e/ou políticos.
3, 16
Obs.: Habilidades extraídas do Projeto Político Pedagógico/ 2006 da EMEB. Filogônio Correa.
(Considerou-se também o Dossiê Acadêmico do Aluno/2007.)
195
APÊNDICE D– Parâmetros para a correção do Instrumento Avaliativo.
Questão 1: Você já ouviu falar em um autor chamado Esopo? Leu algumas das
fábulas escritas por ele?
Observações: Caso o aluno responda afirmativamente, deverá citar algumas
fábulas escritas por Esopo, tais como: “O leão e o rato”; “A raposa e as uvas”; “A
cigarra e a formiga”, entre outras. Embora a pergunta não solicite exemplos, durante
a aplicação foi recomendado aos discentes que colocassem os títulos de algumas
das histórias lidas.
Questão 2: A intenção do autor ao escrever esta fábula foi:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra c (alertar os
leitores a respeito de pessoas que gostam de levar vantagem sobre os outros).
Questão 3: Como você pode perceber, toda fábula traz uma mensagem
para reflexão: a moral da história. Vamos relembrar a moral da história
que acabamos de ler:
“Algumas vezes acontece de alguém fazer todo trabalho pesado e outro
levar todo o lucro.”
O que você pensa sobre a frase acima? Como isso pode ser aplicado à sua
vida?
Observações: Considerar correta se a resposta produzida apresentar sentido
coerente com as possibilidades de interpretação do tema da fábula, demonstrando o
posicionamento ético do aluno.
Questão 4: Qual o motivo da luta entre o leão e o urso?
Exemplos de respostas possíveis:
Disputar o direito de posse sobre a presa;
Porque não queriam dividir a presa (ou o cervo);
Brigavam por cauda de comida;
Pelo cervo;
Porque só tinha um cervo e eles não queriam dividir.
196
Questão 5: Qual a intenção da raposa ao ficar observando a luta entre o
leão e o urso?
Exemplos de respostas possíveis:
Esperar que os dois ficassem cansados, para poder roubar a presa sem
correr riscos;
Esperar para ver o que ia acontecer e depois pegar a presa/ o cervo;
Pegar a presa (o cervo ou a comida);
Questão 6: O leão e o urso não conseguiram impedir a raposa de levar o
cervo porque estavam:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra a (cansados e
feridos).
Questão 7: Considerando as atitudes da raposa, podemos afirmar que ela é:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra b (esperta).
Questão 8: Assim, no 1º parágrafo, o termo presa está substituindo a
palavra:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra c (cervo).
Questão 9: Analise as frases abaixo e escreva em qual “sentido” a palavra
presa foi usada:
Respostas possíveis:
a) Garra de ave de rapina; unhas;
b) Mulher em prisão; mulheres que estão presas;
c) Dente canino; dentes.
Observações: Serão desconsideradas as respostas que não estiverem de acordo
com o sentido expresso na frase.
Questão 10: Você conhece Maurício de Souza e a Turma da Mônica?
Escreva o que você sabe sobre eles:
Observações: Considerar correta as respostas que situem o Maurício de Souza
enquanto autor das histórias da turma da Mônica; ou até mesmo se apenas
comentarem sobre os personagens.
197
As repostas que não apresentarem sentido coerente com o tema, serão
desconsideradas.
Questão 11: As cenas que aparecem na tirinha retratam uma situação
bastante comum nas histórias da Mônica:
Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra c (O Cebolinha fugindo da
Mônica, pois tem medo de apanhar).
Questão 12: No 2º quadrinho, aconteceu algo inesperado. O que foi?
Respostas possíveis:
O Cebolinha tentando resolver suas diferenças com a Mônica, sem brigas,
através de um jogo de xadrez;
O Cebolinha convida a Mônica para jogar xadrez;
O Cebolinha faz a Mônica para de correr atrás dele e a convida para jogar
xadrez;
O Cebolinha fez a Mônica parar para escutá-lo.
Questão 13: Observe a expressão da Mônica no quadrinho, você acha
que ela concordou totalmente com a sugestão do Cebolinha? Justifique.
Respostas possíveis:
Não, porque estava com cara de zangada;
Não, porque depois ela bateu nele com o tabuleiro de xadrez;
Não, porque mesmo dizendo que estava tudo bem, ela estava com cara de
brava;
Não, porque estava com cara de raiva/ brava.
Questão 14: Qual o objetivo do Cebolinha ao propor à Mônica que
resolvessem suas diferenças “com um tabuleilo de xadlez”?
Respostas possíveis:
Não apanhar da Mônica;
Fazer com que a Mônica se esquecesse de bater nele;
Distrair a Mônica para que ela não batesse nele.
Questão 15: Assim, a Mônica decidiu usar o tabuleiro de xadrez de outro
modo. Qual foi?
198
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra d (usou para
bater no Cebolinha, já que ainda estava zangada com ele).
Questão 16: Em nosso dia-a-dia, como você acha que devemos resolver
nossas “difelenças” com as outras pessoas?
Observações: Considerar correta se a resposta produzida apresentar sentido
coerente com as possibilidades de sugestões “pacíficas” para resolver os problemas,
demonstrando o posicionamento ético do aluno.
Questão 17: No 2º quadrinho, algumas palavras usadas pelo Cebolinha
aparecem em negrito (estão mais escuras que as outras): “PELAÍ,
LESOLVER e DIFELENÇAS”. Em sua opinião, o autor usou esse recurso
para mostrar que o Cebolinha:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra a (queria que
a Mônica parasse para escutá-lo, assim ele poderia convencê-la a desistir de bater
nele).
Questão 18: No 1º quadrinho, o pronome ela se refere à:
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra d (Magali).
Questão 19: Observe o 1º e o quadrinhos. Quais são os elementos que
indicam que o Coelhinho da Páscoa está falando baixo e tentando se
esconder:
Respostas possíveis:
O balão pontilhado e o fato de o coelho estar atrás de um arbusto, como se
estivesse com medo de alguém;
O balão com risquinhos e a cara de medo do coelho;
O balão com pontilhados e porque ele estava atrás da moita;
O balão pontilhado.
Questão 20: O Coelhinho da Páscoa estava com medo da Magali. Parece
que ele conhecia uma característica especial da menina. Você sabe qual
é?
Observações: Considerar correta se o aluno assinalar apenas a letra a (ser gulosa).
199
APÊNDICE E – Modelo do Questionário utilizado com o professor.
1. Formação profissional e concepção teórica:
a) Formação Acadêmica:
Curso de Graduação:_____________________________________
Instituição:______________________________________________
Ano de Conclusão:________________
b) s-Graduação:_______________________________________
Instituição:______________________________________________
Ano de Conclusão:________________
Efetiva da rede municipal desde:__________________________
Trabalha nesta escola desde:_____________________________
c) Formação Continuada (comente sobre os cursos que já fez na área da
linguagem, se foram significativos, se está fazendo algum no momento, quais
os temas que mais lhe interessam):
_____________________________________________________
_____________________________________________________
d) Concepção de ensino-aprendizagem de leitura, língua e texto:
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
e) Qual sua opinião sobre os PCN de LP/ 1º e 2º Ciclos?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
f) Qual sua opinião sobre o ensino a partir de competências e habilidades?
Você fez algum curso sobre isso? Comente como você trabalha com isso
em sala de aula.
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
g) O que você entende por “organizar a escola em Ciclos de Formação”?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
h) Voparticipa dos cursos de formação oferecidos pela SMEDEL? Isso tem
ajudado em sua prática de sala de aula? Como?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
2. Projeto Pedagógico da Escola:
200
a) Como foi o processo de construção do PPP?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
b) Qual a concepção de linguagem expressa no PPP?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
c)Como é feito o planejamento a partir do Tema Gerador?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
e) Como é feita a avaliação dos alunos? Como são utilizados os registros
avaliativos (dossiê acadêmico)?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
3. A Prática em Sala de Aula:
a)Como você utiliza os “novos” conhecimentos, construídos no processo de
formação continuada?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
b) Como a coordenadora pedagógica acompanha o seu trabalho?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
c) Quais as competências/habilidades que estão sendo trabalhadas, atualmente,
na área de Linguagem?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
d) Como você organiza o ensino de Leitura em sala de aula? Que gêneros
textuais são utilizados?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
e)Como você avalia as habilidades de Leitura construídas pelos alunos? Que
instrumentos utiliza para este fim?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
f) Quais as dificuldades apresentadas pelos alunos em relação à Leitura? Que
estratégias você utiliza para superar esses problemas?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
201
ANEXOS
202
ANEXO A – Dossiê Acadêmico do Aluno (documento elaborado pela SME/ Cuiabá).
1º Ciclo:
Ano escolar
1º Ano 2º Ano 3º Ano
___ Ano
R
T
ÁREAS
Bimestres
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
Linguagens
Conhecer o valor sonoro e gráfico de todas as letras, estabelecendo relação com a
figura, a palavra e o texto; (relação grafema e fonema)
Apreciar prodões artísticas presentes em sua cidade, bem como, aquelas que
fazem parte da herança cultural da humanidade;
Experimentar diversas técnicas de desenhos, pinturas e/ou colagens,
Demonstrar estabilidade para escrever: o próprio nome, o das pessoas com quem
convive, palavras-chaves e palavras propostas nas diversas atividades;
Recontar oralmente uma história ouvida, observando início, meio e fim;
Apresentar movimentos de destreza, de acordo com suas possibilidades
individuais, durante os jogos, lutas, danças, esporte e ginástica;
Relatar aproximando, o melhor posvel, da forma gica e seqüenciada as
experncias vivenciadas, tais como: filmes, músicas, passeios, palestras,
descrição de objetos;
Ler pequenos textos destacando o que entendeu,
Produzir pequenos textos espontâneos, escrevendo de modo level, observando
as convenções ;
203
Reescrever o texto, priorizando o sentido, utilizando a ngua padrão (letra
mascula no início de frase, títulos e nomes próprios, pontuação, virgulação e
ortografia);
Utilizar a escrita em situão real ou simulada: bilhetes, lista de compras, convites
e recados;
Reconhecer que a cooperação e o sentimento comunitário o mais importantes
que a luta competitiva;
Produzir mesmo que seja não na escrita alfabética, textos coerentes com o
gênero solicitado. (bilhetes, relatórios, histórias, etc.), considerando o
destinatário;
Criar, imitar e recriar gestos, expressões, coreografias, seqüências de
movimentos corporais;
Valorizar a leitura como fonte de fruição, estética e entretenimento;
Pesquisar, em diferentes fontes, temas diversificados, compartilhando
opiniões, idéias e preferências (ainda que com ajuda);
Diferenciar os portadores de texto (embalagens, outdoors, etc.) e suas
funções.
Síntese-processo de construção das Aprendizagens da área nos
bimestres.
204
ANEXO A – Dossiê Acadêmico do Aluno (documento elaborado pela SME/ Cuiabá - continuação).
2º Ciclo:
Ano escolar
4º Ano 5º Ano 6º Ano
___ Ano
R
T
Bimestres
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
LINGUAGENS - Língua Portuguesa
Identificar as informações relevantes em diferentes tipos de textos;
Relatar oralmente fatos de textos lidos e ouvidos;
Expressar a compreensão de uma história lida; e/ou ouvida;
Pesquisar em várias fontes o mesmo tema, registrando a idéia principal e
identificando os diferentes pontos de vistas ( livros, entrevistas, internet), etc.;
Trocar impressões e informações com outros leitores a respeitos de temas diversos;
Identificar as características dos diferentes gêneros textuais (poesias, noticias,
músicas, propagandas, parlendas, fábulas);
Criar histórias, enriquecendo-as com a descrição;
Registrar o assunto de uma situação presenciada (palestra, filme, teatro, excursão,
visita);
Elaborar diferentes gêneros textuais utilizando dados e informações relevantes de
assuntos variados (cartazes, relatórios, gráficos, poesias);
Reelaborar, com ajuda do professor, do colega, da gramática, do dicionário, o próprio
texto em função do leitor e dos objetivos pretendidos;
205
Ler diferentes gêneros textuais (compreensão/paráfrase-interpretação/polissemia);
Ler e oralizar o texto;
Empregar adequadamente a língua padrão no cotidiano escolar ( oral e escrito).
ntese
processo de construção das Aprendizagens da sub
-
área nos
bimestres.
206
ANEXO A – Dossiê Acadêmico do Aluno (documento elaborado pela SME/ Cuiabá - continuação).
3º Ciclo/ ANO ESCOLAR
7º Ano
8º Ano
9º Ano
___ Ano
RT
Bimestres
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
LINGUAGENS
-
Língua Portuguesa
Expor oralmente suas idéias, aproximando o melhor possível da forma lógica e
seqüenciada;
Relatar experiências vivenciadas e narrativas criativas incluindo: descrição, viés,
intertextualidade, conotação, metáfora, pressuposição, argumentação, conforme
a função do texto;
Transformar um texto em registro informal para o registro formal, explorando as
relações entre as linguagens coloquial e formal.
Refazer o próprio texto e outros textos identificando os problemas de conteúdo
e forma ( sentido e gramática);
Analisar as funções da linguagem no texto, identificando marcas de variantes
lingüísticas de natureza sociocultural, regional, de registro ou de estilo;
Produzir os diferentes gêneros textuais observando sua estrutura (tipologia);
Traduzir elementos não verbais em verbais;
Fazer síntese de um discurso ouvido;
Parafrasear idéias explícitas de um texto e explicar idéias implícitas;
Reproduzir e transmitir com fidelidade diferentes tipos de mensagens: ouvidas,
lidas, transmitidas por vários tipos de meios de comunicação.
Síntese
processo de construção das Aprendizagens da sub
-
área nos
bimestres.
207
ANEXO B – PROVA Brasil 2005: resultados da EMEB. Filogônio Correa.
208
ANEXO C – Mapa detalhado de acertos no instrumento avaliativo.
MAPA DE RESPOSTAS CORRETAS E PARCIAIS/ 4º ANO/ EMEB. FILOGÔNIO CORREA
A
luno (a)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
A.C. P C C C C P C P C
A.J. P C C C C P P C P C C C
D.C. P P C C C C C C C
E.J. C C C C C C C C P C C C C C C
G.V. P C C C C C P P C C C C C
I.D. P P C C C C C C C C C C C C C
J.V. P C C C C C C C C P C C C C
J.A. C C C C C C C P C C P C C C C C
J.T. C C C C C P P C P C C C C
K.C. C P C C C C C C C C C C C P C
K.K. C P P C C C C P C C C C C C P C C C C
L.R. C C P C C C C C P C C P C C C C C
M.V. C C C C C C P C C C C C C C
M. P. C C C C C C C C P P C C C C C C C
P. D. C C P C C C C C P P C P C C C C C
P.J. P C C C C P C C C C
P. J.M. C C P C C C C C C C C C P C C C C C
209
T.X.
P C C C C P C
V.S. C C C C C C P C C C C C C
W.M. C P C C C C C C C P C C C C
Total/
Parciais
08
0
08
01
0
0
0
0
12
06
0
01
09
0
0
01
0
0
01
0
Total/
Corretas
11
08
02
18
16
19
20
18
05
09
18
05
03
01
16
13
03
17
10
18
Total/
Erros
01
12
10
01
04
01
0
02
03
05
02
14
08
19
04
06
17
03
09
02
Legenda:
C – respostas corretas
P – respostas parciais
Respostas erradas
210
ANEXO D Trechos do Relatório de Observação de acadêmicas do
ano/ Pedagogia/ UFMT/ IE (transcrição das aulas observadas em
turmas do 3º ano (2ª série), no mês de abril/2007.
Descrição das aulas da profª A:
Dia 16/04/2007 (segunda)
Turma: 3º ano matutino
Professora: A
14 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Português e Matemática
No primeiro momento da observação da sala de aula, percebemos que é bem
arejada com quatro ventiladores sendo que, apenas dois funcionavam, bem
iluminada, limpa, dois armários, mesa com cadeira para os alunos, abecedário
visível na parede, em cima do quadro negro. Lista feita em papel cartão com nomes
dos alunos, destacando as letras iniciais, tabuada feita em papel pardo de 02 a 10,
também localizada a cima do quadro, fotos ilustrativas do Sistema Solar. Cantinho
do aniversariante, varal para exposição dos trabalhos e duas caixas com revistas e
livros para que os alunos utilizassem em algumas atividades.
Ao entrarmos na sala de aula do ano do 1° ciclo a professora A, diz bom
dia, pergunta se eles fizeram as tarefas e a maioria dos alunos disse que não. Então
ela falou para quem não tivesse feito era para fazer durante a aula.
Na segunda feira teve somente aula de português, que foi realizada através
do livro da página 49 a página 51. Após uma aluna perguntar quem eram as
pessoas que estavam em sala, nós nos apresentamos para os estudantes.
A coordenadora foi até a sala para levar o livro da Nova Escola, e ficou um
tempo na porta conversando com a professora, enquanto isso as crianças ficaram
agitadas pela a sua ausência.
A professora pediu para que os alunos lessem o texto em voz baixa e com os
olhos. Enquanto isso ela corrigia as tarefas do caderno de matemática e pedia para
que os alunos que não acertaram refizessem os exercícios.
Após ela corrigir os cadernos dos alunos começou a fazer as atividades do
livro que eram a cerca do texto. Na primeira atividade os alunos tiveram dificuldade
para responder, então à professora pediu para que cada aluno indicado por ela lesse
em voz alta, e perguntava para o aluno assim: “o que você entendeu? Entendeu!
Não! Então lê de novo!”, e isso ela fazia aluno por aluno individualmente.
Esse processo demorou muito tempo, e alguns alunos nem abriram o livro
para ler.
Durante o tempo de observação do primeiro dia, percebemos que as crianças
gostam de apontar seus lápis apenas para levantarem das suas cadeiras e irem a
a lixeira para conversarem e escorregarem no chão liso e encerado da sala.
211
O recreio geralmente é realizado 09h00min da manhã na sala de aula, eles
vão à cozinha, pegam as merendas e retornam para a sala de aula, na saída para o
lanche formam-se duas fileiras um de meninos e outra de meninas.
Nesse intervalo a professora deixa os alunos livres e, vai até a secretária para
pegar o xerox dos exercícios de uma outra turma.
Ao término do lanche, sumiu a borracha de uma aluna, e ela falou para a
professora e a mesma respondeu: “só podia ser você, sempre é você!”
, os alunos
ajudaram a procurar a borracha, mas só no fim da aula que a encontrou.
A professora ajuda os alunos a terminarem de fazer os exercícios do livro.
Após isso ela passa alguns exercícios no quadro tendo como conteúdo de
português: monossílaba, dissílaba, trissílaba e polissílaba.
Observamos que um aluno está sempre disperso nas aulas, ele jogou o
caderno velho fora e com isso ele não faz nenhuma das atividades e apresenta
problema na visão. outro aluno tem caderno novo, mas aparenta não gostar de
escrever, mas lê bem e gosta de ficar conversando em sala com os outros colegas.
Quando a professora está ocupada os alunos começam a brincar e a
escorregar no chão, e com isso surge uma confusão entre dois alunos os quais
começaram a se agredir verbalmente e fisicamente, quem separou a confusão foi
um outro aluno, que dizia: “aqui não é lugar de brigar é lugar de estudar”
. Mas
mesmo assim os dois alunos continuaram brigando, depois de algum tempo a
professora veio e interveio na briga.
Em uma conversa informal com um aluno, perguntei para ele se ele gostava
da professora? Ele me respondeu que: “é mais ou menos
eu perguntei para ele por
que: “ela grita muito
”, ele respondeu.
A professora começa a passar as atividades de matemática para casa no
quadro, tendo como conteúdo: ordem crescente e decrescente, adição, escrever por
extenso os nomes dos números; português: palavras com cha, che, chi, cho, chu. A
professora diz que é para eles copiarem e fazerem em casa, mas nem todos dão
conta de terminar de copiar os exercícios do quadro, então bate o sino às 10: 45 h
da manhã, as crianças que terminavam ficavam na sala copiando e a professora se
encaminhava para a sala dos professores.
Dia 17/04/2007 (terça)
Turma: 3º ano matutino
Professora: A
17 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Matemática e Artes
Chegamos à escola e fomos para o tio, as crianças estavam sentadas,
esperando que a coordenadora fizesse a oração, ela chegou e fez a oração do pai
nosso, quando terminou cada um foi para a sua sala.
A professora chegou à sala, passou exercícios de Matemática no livro, e
enquanto alguns bagunçam apenas três faziam à lição, ela passou em cada carteira
212
para dar visto nos cadernos dos alunos. Os alunos estavam dispersos e,
escorregavam no piso da sala.
E assim passou uma aula inteira. Logo em seguida entrou a professora Rose,
e explicou que dia 15 de abril foi comemorado o dia da conservação do solo e que
“este tem que ser conservado porque é ele que nos traz a comida”
, logo entregou
desenho mimeografado de um menino mexendo no solo e pediu que as crianças
pintassem, algumas vezes ela sugeria as cores para eles.
Enquanto algumas crianças pintavam, outras passeavam pela sala. Muitas
não têm lápis de cor então se sentam em dupla. A professora pegou alguns
cadernos novos de Artes com as crianças e sentou em sua mesa para fazer as
aberturas. À medida que foram terminando colavam a atividade da pintura no
caderno.
Na sala tem muito barulho, ao lado tem um pátio onde outras crianças fazem
Educação Física, e pelo que dá de escutar estão fazendo algum grito de guerra.
A aula de Artes acabou e, as crianças pegaram a merenda e fizeram a
refeição na sala de aula, pois não há intervalo. Logo em seguida retornou a aula de
Matemática. A professora pediu para que pegassem os livros para resolverem os
exercícios sobre números pares e ímpares. Mas, percebemos que as crianças ainda
desconhecem os números, alguns bagunçam e outros fazem os exercícios.
Enquanto isso a professora está mimeografando outros exercícios em sua mesa.
Passado alguns minutos, ela passa outra atividade de gica, sendo que, muitas
crianças ainda não haviam terminado a anterior. Logo em seguida, começou a fazer
ditado de números, ela ditou alguns números e então bateu o sinal para que as
crianças fossem embora.
Dia 18/04/2007 (quarta)
Turma: 3º matutino
Professora: A
22 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: História, Ed. Física e Ed. Artística.
Chegamos à escola e as crianças estavam no pátio rezando, depois foram
para a sala. Quando entramos, os alunos nos deram as boas vindas e, sentamos no
fundo da sala.
Neste dia as maiorias dos alunos estavam uniformizados. A primeira aula foi
de História, na qual o tema tratado foi: O Dia do Índio, que no dia seguinte seria
comemorada a data. Os alunos deveriam copiar do quadro o texto passado
pela professora, mas pelo menos 07 alunos não conseguiram copiar no período da
aula de História. Ficaram durante a aula de Ed. Física e mesmo assim não
acabaram.
Depois de copiarem o texto os alunos deveriam responder 05 perguntas.
Percebemos que, poucos lêem o texto, eles passavam várias vezes pelas respostas,
porém não conseguiam entender. As perguntas tinham respostas evidentes no texto,
como por exemplo:
213
Texto: “... Os índios constroem ocas para morarem...” Pergunta: “Onde os índios
moram?”.
A professora passava pelas cadeiras dos alunos auxiliando-os nas tarefas.
Uma aluna que o sabe ler fez a cópia do texto, mas não tem nem idéia do
que está escrevendo.
Segundo a professora “ela não é interessada, tem muita preguiça, está
matriculada na aula de Apoio, que é realizada no período vespertino, mas falta
muito”. A professora afirma que ela ficará retida no terceiro ano, por não ter a
mínima condição de seguir em frente sem saber ler.Apesar dessa afirmação, não
preocupação em encontrar uma solução para o desenvolvimento do aprendizado
desta aluna.
Outro aluno tem problemas sérios de visão e não consegue escrever,
segundo informações da professora, foi conversado com os pais deste, que é
imprescindível levá-lo ao oftalmologista, mas até agora não foi tomada nenhuma
atitude. Apesar de termos a informação de que a escola é receptiva a alunos com
deficiências visuais, não compreendemos por quais motivos a escola o tomou
providencias quanto ao caso deste aluno.
Os alunos falam muitos palavrões e se agridem fisicamente, principalmente
as meninas.
Conversando com a professora, ela nos falou que pediu a aposentadoria e
está muito desanimada com a falta de participação dos pais na escola, do desânimo
dos alunos e, não concorda de forma alguma com o sistema de ciclo.
Ela argumenta que boa parte dos alunos chegam ao terceiro ano sem
saberem ler e, isso atrapalha o processo de ensino e de aprendizagem dos demais
alunos que estão “aptos” a estarem no terceiro ano, já que os mesmos precisam que
a professora sente junto com eles e ela tem que atender toda a turma.
O processo de aprendizagem é avaliado por meio de um relatório, com
questões objetivas e a resposta é equivalente à aprendizagem do aluno. Não
tivemos acesso a este documento, apensa nos foi relatado.
Logo após a aula de História começou a de Educação Física. A professora
teve uma postura autoritária, conversava pouco com alunos, apenas o suficiente
para passar informações das atividades que seriam desenvolvidas, sentada ela
observava os alunos, mas, não interagia nas atividades. Trabalhou figuras
geométricas em forma de “amarelinha”, utilizou cabos de vassouras e o pátio da
escola. A aula foi de 15 m.
A próxima aula foi de Educação Artística. A professora entregou aos alunos
desenhos mimeografados, de alguns o desenho era a figura de um índio e de outros
a de um livro, que dia 18 de abril foi comemorado o dia do Livro Infantil. Não
houve uma introdução sobre essas datas comemorativas. As crianças gostam muito
de pintar, todas fizeram a atividade e os trabalhos ficaram expostos no varal dentro
da sala de aula.
Assim que terminaram a atividade, bateu o sinal e as crianças foram embora.
214
Dia 19/04/2007 (quinta)
Turma: 3º matutino
Professora: A
22 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: História, Ed. Física e Artes.
A primeira aula neste dia foi de Educação Física. Ao retornarem a sala de
aula, a professora entregou a eles a figura mimeografada de um índio para que
colorissem.
O inspetor entrou na sala para conferir se um aluno estava fazendo as tarefas
corretamente. Conversou em voz alta com a professora, dizendo que “o sistema
estava louco para reprová-lo”. Ao sair da sala, disse que se esse ano ele o se
esforçar “vai ficar para trás, que nem um João Bobo”.
As crianças brigam muito, falam muito palavrão e a professora não consegue
controlá-los.
Com relação ao planejamento das aulas, quando ele é feito, a professora
disse que planeja as aulas conforme o conteúdo que é passado pela coordenação,
todo início do ano, baseando-se em xérox.
As áreas do conhecimento trabalhadas são Português, Matemática e Artes,
segundo a professora A não trabalha Ciências naturais pelo fato: nem todas as
crianças sabem ler”.
A coordenadora do colégio é ex-aluna do curso de Pedagogia da UFMT. Ela
nos informou que “os pedagogos formados pela Universidade Federal de Mato
Grosso saem muito mal preparados para a sala de aula” e também: que o curso
oferecido pela instituição é muito básico para a realidade da sala de aula”.
Com relação à estrutura do colégio, os ambientes são bem distribuídos,
sendo que algumas salas possuem ar refrigerador. refeição para alunos e
professores no intervalo.
Descrição das aulas da profª B:
Dia 16/04/2007 (segunda)
Turma: 3º ano matutino
Professora: B
17 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Matemática e Artes
Ao chegarmos à escola fomos bem recebidas pela diretora, entregamos o
oficio e pedimos para ficar na sala de segunda série e, ela nos explicou que a escola
é ciclada e ficaríamos em sala que corresponde a tal.
215
A secretária levou-nos ao pátio onde as crianças estavam em fila e sentadas
rezando. Havia uma professora contando uma passagem bíblica e ao terminar os
alunos rezaram o Pai Nosso e foram para a sala.
Ficamos na sala do terceiro ano do primeiro ciclo, que agora corresponde à
segunda série. A professora nos apresentou para a sala como sofredoras (devido à
profissão), as crianças não entenderam a expressão usada.
Inicialmente observamos o espaço físico da sala de aula que é estreita e com
pouca iluminação, têm janelas altas e, em apenas uma das paredes. A mesa do
professor e o armário ficam no fundo da sala. O quadro já está bem gasto. A
ventilação da sala é boa, tem ar condicionado e ventiladores. cartazes com o
alfabeto em letras maiúsculas e minúsculas, os numerais, as regras de
comportamento e as famílias silábicas, que estão distribuídos pelas paredes da sala.
Após nos apresentar, a professora falou para os alunos pegarem os livros de
Matemática e explicou os números ordinais, pediu que as crianças copiassem no
caderno os exercícios do livro.
Nestes exercícios havia o desenho de uma tartaruga, e a professora
aproveitou este desenho para contar a fábula da Festa no céu, na versão em que ela
contou a tartaruga e o urubu eram os protagonistas.
A professora passou de carteira em carteira para ver se estavam fazendo
certo o exercício. Percebemos que algumas escrevem em letra bastão e outras em
letra cursiva. Nem todas conseguem acompanhar os exercícios, umas estão no
começo e outras terminando. A professora chama a atenção dos alunos para
corrigirem suas posturas quando estão sentados.
Eles fizeram exercícios sobre os números ordinais e colocaram o nome dos
colegas em ordem no qual estão sentados nas carteiras. Algumas crianças já sabem
escrever bem, outras ainda não e, principalmente elas têm muita dificuldade em
utilizar letras maiúsculas. Logo após a professora passou contas de efetuações
matemáticas.
Em seguida iniciou a aula de Educação Artística, a professora deu desenhos
mimeografados sobre o dia da conservação do solo para que eles pintassem com as
cores que ela indicava aos poucos as crianças foram terminando e colando no
caderno de desenho.
O horário da aula havia terminado e seria aula de Educação Física, porém a
professora havia faltado, e para que os alunos não ficassem dispersos por meio de
recortes de papéis e, fez vários desenhos como chapéu de chinês, borboleta,
coração e etc.
Ao tocar o sino de saída as crianças terminaram os recortes, coloram no
caderno e foram embora.
Dia 17/04/2007 (terça feira)
Turma: 3° ano Matutino
Professora: B
20 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Artes, Educação física, Português.
216
A professora cumprimenta os alunos dizendo, Bom dia”
e começa a aula de
Educação Artística, durante esta aula a professora preparou no mimeografo o
desenho de um índio para que as crianças colorissem.
Discretamente pedimos o caderno de arte para uma aluna e ela nos cedeu.
No caderno havia somente duas folhas escritas: uma tratava das cores primárias e
secundárias e na outra havia um desenho livre, porém não fazia parte das atividades
propostas pela professora.
Após a aula de Educação Artística teve inicio a Educação física, a professora
apareceu na porta e disse para que as crianças se encaminhassem para a quadra.
Fizeram alongamento e, depois brincaram de “morto vivo”, essa brincadeira
se repetiu por três vezes. Neste entremeio uma aluna machucou a boca, a
professora a orientou que fosse o banheiro para levar o local machucado. Os
meninos jogaram futebol, com uma bola velha e sem revestimento, mas mesmo
assim, pareciam gostar muito. Enquanto isso a professora brincava com as alunas
do “mês”, da seguinte maneira: formava-se uma dupla, na qual cada uma escolhia
um sonho e, as demais participantes tinham que descobrir qual era esse sonho,
quem acertasse substituiria uma das que formava a dupla, e começava uma nova
brincadeira.
Outra atividade foi uma roda de cantiga com a música do “galo e da galinha”,
em que um (a) aluno (a) ficava dentro da roda, cantava a música e, assim que
terminasse era escolhida uma outra criança para prosseguir a brincadeira.
Brincaram ainda de “passa meu bom vaqueiro...” e, “corre cutia”.
Após o termino da aula as crianças foram merendar (arroz, feijão e ovo).
A aula de português foi realizada através do livro. A leitura das atividades era
feita em voz alta. A professora o tempo todo relaciona as atividades do livro com a
realidade dos alunos, por exemplo, ao falar sobre o lixo, ela dizia que o “lixo não é
para ficar no chão”, que a “sala deve permanecer sempre limpa” e assim por diante.
Os alunos fizeram cópias das atividades do livro no caderno e, nesse intervalo
a professora elaborava a aula do dia seguinte. Depois que os alunos terminaram de
responder as questões, a professora vai à frente da sala e dita as respostas,
segundo o livro, para os alunos escreverem no quadro.
O aluno R apresenta boa leitura, mas sempre está no meio da bagunça, a
aluna H que veio transferida de uma escola de SP, tem uma narrativa muito boa e
sempre termina as atividades antes de outros alunos, e para essa aluna, a
professora passa mais exercícios e sempre pede para que ela escreva um texto de
acordo com a sua imaginação.
Logo em seguida a professora passa exercícios de caligrafia, porque segundo
ela os alunos estão tendo dificuldade em aprender maiúscula e minúscula”
. Depois
dá visto no caderno de quem já terminou.
A professora passa as atividades para casa, que tinham como conteúdo:
contas de adição. Os alunos copiam todas as tarefas e vão saindo da sala, enquanto
isso a professora organiza a sala e guarda os exercícios de caligrafias para no dia
seguinte colar no caderno.
217
Dia 18/04/2007
Turma: 3° ano Matutino
Professora: B
17 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Português
Os alunos estão aprendendo a utilizar a letra maiúscula e minúscula. Para
começar, a professora utilizou um texto de Marco Antônio Abilar, chamado
“Passeando pela cidade”.
Texto:
“Passeando pela cidade”
_ Vrumm, vrum...
Entro no carro, saio para a rua.
_ Vrum, vrum...
Acelero bem o motor
Vou passear na cidade, fazer compras, me divertir.
Na esquina tem a farmácia.
_ Cof, cof...
Vou comprar remédio para tosse.
Logo ali, um supermercado.
_ Que enorme!
Vou buscar arroz e feijão.
Passo lá na padaria, pra pegar o leite e o pão.
Na praça como pipoca, encontro os amigos.
Conversar, como é bom!
O conteúdo trabalhado foi à utilização de letras maiúsculas e minúsculas, uso
da pontuação, cópia do texto passado no quadro negro, interpretação e, correção do
exercício de casa, na área do conhecimento de Matemática.
Exercícios de sala sobre o texto:
1. Como você costuma passear na cidade: de carro, de ônibus, à pé?
2. Como é o barulho do carro?
3. Quais os lugares por onde a personagem vai passear?
4. Por que a personagem vai à farmácia?
218
5. O que ela pega na padaria?
6. O que ela quer comprar no supermercado?
7. O que ela faz na praça?
8. Desenhe como você imagina a historinha do livro.
9. Junte as sílabas.
__daria=
pa __ pai =
__ macia =
far __ da =
__versa =
con __ curso =
Ela também fez uma aula de leitura por intermédio do texto passado no quadro, com
todos os alunos, sendo que uma aluna recusou-se a ler. A professora exaltou-se
mediante a recusa da aluna, de modo que a menina se envergou para dentro da
carteira, com vergonha. Após as atividades, ela deu uma cópia para os alunos
colorirem. Segundo a professora a pintura, é o momento em que elas mais se
socializam e acalmam.
A escola não exige que os professores façam o plano de aula, tanto que a
professora não pôde nos mostrar todos os conteúdos apresentados por o estar
com os planos de todas as aulas em mãos.
Dia 19/04/2007
Turma 3º matutino
Professora: B
22 alunos presentes
Disciplinas desenvolvidas: Português. Educação física, Matemática.
Ao entrarem em sala de aula, a professora B solicitou que os alunos
pegassem o livro de Português, porém esta não fazia idéia de onde havia parado a
matéria. Com a ajuda dos alunos, que fizeram a indicação da página e em qual
exercício da matéria havia parado, ela pôde dar continuidade à aula. Ao se localizar
e verificar a matéria percebeu que seriam exercícios que necessitariam o uso do
dicionário e que estes não estavam condizente com as capacidades de leitura dos
alunos, devido a isso não os executou.
A professora pulou algumas páginas do livro, tanto que uma das alunas
comentou “Credo professora, pra que pular tantas páginas?” (sic
). Ao encontrar uma
matéria que estivesse condizente com as capacidades dos alunos a professora
indicou a gina em que os alunos deveriam abrir o livro. Quando a maioria
219
estava com o livro aberto a professora começou a chamar a atenção de alguns por
terem esquecido o livro ou por não estarem na página correta do livro.
Quando todos já estavam com seus livros abertos nas páginas corretas,
exceto os alunos que esqueceram os seus e não participaram da atividade proposta.
A professora começou a leitura do texto intitulado “Como se fosse dinheiro”, da
autora Ruth Rocha. Este texto trata do direito do consumidor em receber seu troco
em dinheiro e não em mercadorias. Fez-se então uma rodada de leituras com os
alunos, porém pela presença estranha, segundo a professora, eles estavam tímidos
e liam em um tom de voz muito baixo, audível apenas pelos mais próximos. Pela
demora em fazer a leitura os alunos se dispersaram, conversando e andando pela
sala. A professora pediu apenas que sentassem e continuou a leitura
individualmente, mesmo com a conversa dos demais atrapalhando o
desenvolvimento da atividade. Após esta rodada de leituras a professora prosseguiu
com os exercícios de interpretação do texto, fazendo apenas os mais cnicos,
deixando os exercícios que necessitavam de respostas e discussões mais
aprofundadas sobre o texto para um outro momento, sem maiores explicação sobre
a razão de tal decisão.
Aproveitando um exercício do livro a professora fez uma leitura da capa do
livro de Português com os estudantes, explicando onde ficava cada informação
sobre o livro, como nome dos autores, nome do livro e explicando a utilidade dessas
em nosso cotidiano. Os exercícios do livro eram respondidos no caderno da mesma
matéria, colocando a numeração da página onde estava o exercício e as respostas
eram passadas no quadro, copiadas do livro pela professora.
Os alunos alegaram que estava na hora do intervalo, então foram liberados e
lembrados de que após o intervalo deveriam permanecer no pátio, pois teriam aula
de Educação Física.
Após o intervalo os alunos aguardaram a professora de Educação Física,
Maria, no pátio. Ao chegar ela solicitou que as meninas e os meninos fizessem duas
filas e entre elas colocou uma fileira de colchonetes. Ensinou então a posição para
que as crianças fizessem cambalhotas, chamando sempre a atenção de quem não
seguia suas instruções.
A segunda atividade foi a seguinte: as meninas deveriam deitar nos
colchonetes e um menino por vez deveria rolar sobre elas. Quando todos os
meninos haviam feito a atividade, trocaram os papéis, os meninos deitaram e as
meninas rolavam sobre eles, uma por vez. A nosso ver o objetivo de desenvolver
uma atividade de integração não existiu, que os alunos fizeram a atividade por
obrigação e pela professora ser muito autoritária Neste momento a professora teve
um pouco de dificuldade em convencê-los a fazer a atividade. Ela também explicou
que a Educação Física era feita ali, pois a quadra por não ser coberta, poderia
oferecer algum risco a saúde das crianças.
Alguns alunos que estavam bagunçando durante a aula eram colocados de
castigo, um mais disperso foi retirado do pátio, levado até a sala dos professores e
obrigado a fazer a leitura de um livro, selecionado pela professora na biblioteca da
escola. Outro que estava dispersando a turma a professora colocou em um canto do
pátio em pé e este ficou lá durante todo o resto da aula.
A próxima atividade foi a brincadeira “coelhinho sai da toca”. As tocas eram os
colchonetes e as crianças deveriam aos trios trocar de toca, sempre correndo em
220
sentido horário. A brincadeira não transcorreu muito bem, pois as crianças contrárias
se batiam e caiam no chão. Ao chamar à atenção das crianças a professora sempre
utilizava apelidos como “Gaúcho”, “Criatura”, “Maria Joaquina”, etc. A professora
acabou desistindo da aula e, pediu que todos fossem ao banheiro, bebessem água
para retornarem à aula.
Ao chegarem à sala a professora Rose pediu que todos sentassem e se
acalmassem, pois a aula de Educação Física havia passado. Os alunos
comentavam com a professora quem havia ficado de castigo na aula anterior e o
porquê da punição. A professora, então, chegou junto aos alunos que ficaram de
castigo e conversou com eles, explicando que a aula de Educação Física é pra
brincar, se divertir, mas sem abusar, pois como eram muitos alunos, acabavam por
atrapalhar o trabalho da professora e isso não era bom pra eles próprios.
Após a conversa com os alunos ela entregou-lhes um desenho mimeografado
da Boneca Emilia, do Sítio do Pica-Pau Amarelo, obra de Monteiro Lobato. Disse
que eles iriam pintar este desenho, pois era uma data comemorativa: O Dia do Livro
Infantil. Enquanto os alunos faziam esta atividade, a professora preparava os
exercícios que seriam oferecidos aos alunos no dia seguinte.
Quando a maioria dos alunos havia terminado de pintar, a professora pediu
a atenção de todos e disse que os alunos que liam melhor iriam fazer a leitura de
parte de um samba-enredo que falava sobre a Independência do Brasil. Nesse dia
ela não deu maiores explicações sobre o que significava esta data comemorativa.
Apenas seis alunos foram selecionados e os demais ficaram inquietos o resto da
aula, pedindo “um pedaço do texto pra ler”.
A professora aproveitou a última meia hora de aula e passou alguns cálculos
de matemática, de multiplicação e subtração, no formato “arme e efetue”, avisando
aos alunos que não haviam terminado a pintura para guardá-lo e copiar as contas,
podendo trazê-lo pintado no dia seguinte, juntamente com as contas feitas.
Conforme iam terminando de copiar, as crianças eram dispensadas.
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