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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PATRÍCIA PIEDADE ENNES
A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA UNIÃO ESTÁVEL NA CLASSE MÉDIA DO RIO
DE JANEIRO
RIO DE JANEIRO
ABRIL DE 2008
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1
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PATRÍCIA PIEDADE ENNES
A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA UNIÃO ESTÁVEL NA CLASSE MÉDIA DO RIO
DE JANEIRO
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro como requisito para obtenção do Título de Doutor
em Psicologia Social.
ORIENTADOR: PROFESSOR DOUTOR CELSO PEREIRA DE SÁ
RIO DE JANEIRO
ABRIL DE 2008
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2
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ / REDE SIRIUS / CEH/A
E 59 Ennes, Patrícia Piedade.
A representação social da união estável na classe média do
Rio de Janeiro / Patrícia Piedade Ennes. - 2008.
346 f.
Orientador: Celso Pereira de Sá.
Tese (doutorado) Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Instituto de Psicologia.
1. União estável Teses. 2. Casamento – Teses. 3.
Representões Sociais - Teses. I. Sá, Celso Pereira de. II.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de
Psicologia. III. Título.
CDU 392.5
3
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PATRÍCIA PIEDADE ENNES
A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA UNIÃO ESTÁVEL NA CLASSE MÉDIA DO RIO
DE JANEIRO
Rio de Janeiro, 29 de abril de 2008.
BANCA EXAMINADORA
PROFESSOR DOUTOR CELSO PEREIRA DE SÁ UERJ
ORIENTADOR
PROFESSORA DOUTORA ANGELA ALMEIDA UNB
EXAMINADORA EXTERNA
PROFESSORA DOUTORA TEREZINHA FÉRES-CARNEIRO PUC-RIO
EXAMINADORA EXTERNA
PROFESSORA DOUTORA HELOISA HELENA GOMES BARBOSA UERJ
EXAMINADORA INTERNA
PROFESSOR DOUTOR RICARDO VIEIRALVES DE CASTRO UERJ
EXAMINADOR INTERNO
PROFESSORA DOUTORA DENIZE CRISTINA DE OLIVEIRA UERJ
SUPLENTE
PROFESSOR DOUTOR RENATO CESAR MÖLLER FSMA
SUPLENTE
4
DEDICATÓRIAS
À minha aAmalin Ennes por tudo que representa para mim. Seu imenso amor e dedicação
integral em todos os momentos de minha vida a fizeram saber mais do que ninguém o significado
desse momento do qual participou intensa e amorosamente, apoiando-me e incentivando-me, do
início ao fim, a cada instante, em todas as suas etapas.
Ao meu aOctacílio Ennes (in memoriam) pelos valores e princípios que me deixou como
herança e, acima de tudo, pelo amor que tinha por mim. Sei que estaria muito feliz com esta
conquista.
5
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
Ao meu orientador, professor Celso Pereira de Sá.
Pelo aprendizado possibilitado com sua presença constante e amigável ao longo desses anos
apoiando-me e, ao mesmo tempo, impulsionando-me a trilhar caminhos independentes. Com a
certeza de que tive um grande mestre. Minha gratidão por ter sido sua orientanda e por tudo que
aprendi.
Ao professor Ricardo Vieiralves de Castro.
Pela importância em minha trajetória. Sua presença firme e afetiva foi, desde o início, um grande
estímulo para mim. As reflexões acerca do meu tema, suas aulas e idéias não somente fazem
parte desse trabalho, como também da minha história. Obrigada por sua ajuda, pelo incentivo em
todas as horas, pelo convívio acadêmico, por tudo.
6
AGRADECIMENTOS
À Deus pelo momento e pela maneira como iniciei essa trajetória tão desejada, e por ter me
permitido superar as dificuldades surgidas ao longo do caminho e chegar até aqui.
À professora Heloisa Helena Gomes Barbosa, pela forma sempre cordial e disponível com que
fez importantes esclarecimentos os quais muito facilitaram minhas incursões no mundo jurídico.
À professora Denize Cristina de Oliveira, pelas contribuições a esse trabalho e pela maneira
afetiva como sempre me acolheu.
Aos professores Ariane Patrícia Ewald, Eliane Mary de Oliveira Falcone, Helmuth Ricardo
Krüger, Jorge Coelho Soares e Leila Maria Torraca de Brito, com os quais muito aprendi.
Aos professores Angela Almeida, Heloisa Helena Gomes Barbosa, Ricardo Vieiralves de Castro,
Terezinha Féres-Carneiro, Denize Cristina de Oliveira e Renato Cesar Möller, por terem aceito
participar da banca examinadora.
Aos meus pais Celso Ennes e Sueli de Jesus Piedade Ennes, por minha vida e pelo carinho.
À uma linda família que faz parte da minha: Michelle da Costa Ennes, minha prima, pela nossa
proximidade e pela maneira como compartilhamos a vida; Alexander Ferreira, pela maneira como
se fez minha família”, pela sua alegria, e pelos momentos agradáveis que passamos todos juntos;
e Gabriela Ennes Ferreira, minha querida afilhada, que nascida no início dessa trajetória, tanto a
alegrou.
À minha prima Giselle da Costa Ennes, pela ajuda atenciosa e dedicada na aplicação dos
questionários.
7
Às minhas amigas Ana Rafaela Pecora, Alexandra Valéria, Carla Geraldo e Renata Vetere pelo
bom relacionamento construído ao longo desses anos e pela ajuda nos momentos em que precisei.
Foi bom poder contar com vocês.
À amiga Juliana Perez pela sua ajuda e boa vontade fundamentais na etapa final desse trabalho.
Ao Renato Möller, pelos gestos sempre gentis e socitos ao longo desses anos e pela atenção
carinhosa na fase final desse trabalho.
Ao Patrick Sampaio, pela maneira rara como sabe se fazer presente nos momentos importantes da
vida. Pelas demonstrões de amizade.
À Roberta Kehdi, pela dedicação e generosidade manifestas em vários momentos dessa jornada.
Ao professor Fernando Freitas, e à todos os amigos e ex-alunos que gentilmente me auxiliaram
na aplicação dos questionários.
À Loise Caetano pelas aulas de frans, essenciais para meu ingresso no doutorado, e pela versão
do resumo.
À equipe da secretaria do Programa de Pós-graduação em Psicologia Social, Aníbal Nina, Jussara
da Silva, Kátia Oliveira e Marcos Antônio da Silva, pela disponibilidade com que sempre me
recebeu.
À CAPES, pelo auxílio financeiro.
À todos os participantes dessa pesquisa, cuja disponibilidade tornaram este trabalho possível.
8
RESUMO
A união estável é uma forma de relação conjugal presente, como concubinato, em diversas
sociedades desde a antiguidade, constituindo uma opção de vida conjugal que tem se tornado
cada vez mais freente na atualidade. O novo Código Civil (2002), em coerência com as
mudanças introduzidas pela Constituição de 1988, confere a esse tipo de vínculo o título de
“entidade familiar, passando ele a compor o Livro de Família deste diploma legal. O tratamento
jurídico fez dessa forma de relação antiga um novo arranjo conjugal, fato com imeras
implicações no âmbito da vida privada. Como fato novo, a união estável gera estranhamentos,
provocando um processo de familiarização social através da sua ancoragem em forma de relações
conjugais já existentes: o casamento ou o concubinato. A partir desse entendimento, o presente
trabalho teve por objetivo descrever, analisar e comparar as representões sociais a respeito da
união estável produzidas por homens e mulheres, em quatro condições distintas: casados,
solteiros, em união estável, separados. A amostra da pesquisa empírica foi composta de 304
sujeitos, com 76 em cada situação conjugal considerada, sendo metade homens e metade
mulheres. O instrumento utilizado foi um questionário composto de 41 questões, sendo 21
fechadas e 19 abertas. Dentre elas, 40 são questões substantivas relativas à união estável, com
vistas à obtenção de dados que configurem circunstancialmente as representões sociais. O
questionário é iniciado por uma questão específica de evocação livre à descrição de uma relação
conjugal do tipo união estável, para identificação dos conteúdos temáticos básicos e da
estrutura das representões, de modo a permitir sua comparação. Finalmente, uma questão,
desmembrada em 6 itens, visa à caracterização sócio-demográfica do conjunto dos sujeitos. As
evocações foram analisadas através do software EVOC, permitindo identificar a estrutura das
representões sociais. As respostas às perguntas fechadas e abertas, estas as sua
categorização, foram objeto de um tratamento estastico descritivo simples. Os resultados
demonstraram que o núcleo central das representações sociais dos quatro grupos investigados
come-se basicamente pelos sentimentos de amor e respeito. Observou-se também um alto grau
de informação a respeito da união estável e posicionamentos predominantemente favoráveis tanto
a respeito da legalização quanto em relação a alguns de seus aspectos jurídicos considerados
polêmicos, como a conversão da união estável em casamento. Este estudo evidenciou ainda que a
representação social da união estável procede basicamente de uma ancoragem no casamento,
embora se tenha observado também a perpetuação da crença existente no senso comum de que “é
mais fácil se separar na união estável do que casamento.
Palavras-chaves: representões sociais, união estável, casamento.
9
ABSTRACT
The Common-law marriage is one kind of interpersonal relationships, as concubinage, existent in
many societies since the beginning of time. Besides being one option for couples who seek an
intimate relationship, it has become increasingly frequent nowadays. The new Civil Code (2002)
in agreement with the changes introduced by the 1988 Constitution statuses this type of union the
with the title of ‘Family Unitand establishes it as part of the Book of Family of this piece of
legislation. The legal recognition made this ancient kind of union a new possibility of marriage,
what leads to unlimited implications concerning people' private lives. As any new fact, common-
law marriage brings up strangeness, leading to a process of social familiarization basically
through the foundations of the existent kinds of wedlocks, the statutory marriage and
concubinage. From this understanding, the following paper had as objectives to describe, analyze
and compare the social representations concerning common-law marriage by men and women in
four different marital status: legally married, single, separated and living in a common-law
marriage. The sample of the empirical research was composed of 304 subjects, 76 in each marital
status considered, being half men and half women. The instrument used was a questionnaire
consisting of 41 questions, 21 of them were close and 19 were open questions. Among them, 40
were substancial questions related to common-law marriage in order to obtain data that would
define the social representations. The questionnaire starts with a descriptive brainstorming
question on common-law marriage to identify the basic content themes and the structure of the
representations, so that it would be possible to compare. Eventually, a question broken into 6
itens aimed to specify the subjects social-demographic status. The evocations were analyzed by
the software EVOC allowing to identify the structure of the social representations. After
categorization, the answers to both open and close questions were subject of a simple descriptive
statistical treatment. The results showed that the central core of the social representations in each
of the four groups investigated is composed mainly by the feelings of love and respect. In
addition, it was noticed a high level of information concerning common-law marriage and
predominantly favourable positions not only concerning legalization but also into some
controversial legal aspects such as the conversion of common-law marriage into statutory
marriage. This research pointed out that the social representation of common-law marriage stands
anchored basically into statutory marriage, although it was also observed the perpetuation of the
existing common sense belief that it is easier to separate when in a common-law marriage than
in a legal marriage.
Keywords: social representations, common-law marriage, marriage.
10
RÉSUMÉ
Lunion stable est une forme de relation conjugale présente, comme concubinage, dans plusiers
sociétes depuis 1Antiquité; elle constitue une option de vie conjugale qui devient de plus em
plus fréente dans le monde actuel. Le nouveau Code Civil (2002), cohérent avec les
changements introduits par la Constitution de 1988, attribue à ce tipe de lien le titre d“entité
familiare” et il passe ainsi à intégrer le Livre de la Famille de ce document légal. Ce traitement
juridique a fait um nouvel arrangement de cette forme ancienne de relation, ce qui a entraîné de
nombreuses implications dans le cadre de la vie privée. En tant que fait nouveau, lunion stable
étonne et provoque um pros de familiarisation sociale par son ancrage sur des formes de
relation conjugales déjà existantes: le marriage ou le concubinage. À partir de là, le present
travail a eu pour but déscrire, analyser et comparer les représentations sociales à pros de
lunion stable produits par des hommes et des femmes, en quatre conditions différentes: mariés,
libataires, em union stable, séparés. L´échantillon de la recherche empirique a été composé de
304 sujets, soit 76 dans chaque situation conjugale considérée, à savoir moitié hommes et moitié
femmes. Linstrument utilisé a éte um questionnaire de 41 questions, 21 fermées et 19 ouverts.
Parmi ces questions, il en a 40 substantives concernant lunion stable, en vue d´obtenir des
données qui caractérisent circonstantiellement les représentations sociales. Le questionnaire
commence par une question spécifique devocation libre de la description dune relation
conjugale du type “union stable, pour lidentification des contenus thématiques de base et aussi
de la struture des représentations, de fon à permettre leur comparaison. Finalement, une
question, divisée em 6 items, vise la caractérisation sócio-démographique de lensemble des
sujets. Les évocations ont été analysées à laide du logiciel (software) EVOC, et la structure des
représentations sociales a été identifiée. Les réponses aux questions fermées et ouverts, celles-ci
après leur classification en catégories, ont fait lobjet dun traitement statistique descriptif simple.
Les résultats ont montré que le noyau central des représentations sociales des quatre groupes
enquêtés est composé, essentiellement, par les sentiments damour et de respect. On a aussi
remarqué un degré élevé dinformation sur lunion stable et des positions plus particulièrement
favorables aussi bien par rapport à la légalisation quà certains de ses aspects juridiques
considérés polémiques, comme la conversion de lunion stable en mariage. Cette étude a encore
mis en évidence que la représentation sociale de lunion stable découle essentiellement dun
ancrage sur le mariage, quoiquon ait aussi remarqué la perpétuation de la croyance existante
dans le sens commun quil est plus facile de se séparer dans lunion stable que dans le
mariage”.
Mots-clés: représentation sociales, union stable, mariage.
11
SUMÁRIO
JUSTIFICATIVA/INTRODUÇÃO............................................................................................22
1. A CONJUGALIDADE.............................................................................................................29
1.1. A união estável no campo da conjugalidade............................................................29
1.2. A união estável e o namoro.......................................................................................44
1.3. A união estável e o ficar............................................................................................50
1.4.O individualismo e suas implicações na conjugalidade e na família.....................53
1.4.1. Individualismo e família.....................................................................................53
1.4.2. Individualismo e conjugalidade.........................................................................59
1.5. O antigo e o moderno nas famílias contemporâneas.............................................67
2. A UNIÃO ESTÁVEL...............................................................................................................73
2.1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA.................................................................73
2.1.1. Do concubinato à união estável: entrelaçamento dos fatores históricos,
demográficos e jurídicos...............................................................................................73
2.1.2. O concubinato no Império Romano...................................................................81
2.1.3. O concubinato na Grécia Antiga........................................................................86
2.1.4. O concubinato no Brasil Colonial......................................................................88
2.1.5. O concubinato e sua relação com o casamento ao longo da história..............92
2.1.6. O gênero e suas influências no concubinato, casamento e união estável......101
2.1.7. O concubinato na modernidade.......................................................................110
2.2.CONTEXTUALIZAÇÃO DEMOGRÁFICA........................................................117
2.2.1. Os arranjos familiares no Brasil......................................................................117
2.2.2. A nupcialidade no Brasil: panorama geral.....................................................128
2.2.3. A união estável no contexto nupcial brasileiro...............................................134
12
2.3. CONTEXTUALIZAÇÃO JURÍDICA...................................................................142
2.3.1. Considerações iniciais........................................................................................142
2.3.2. Características...................................................................................................148
2.3.3. Requisitos...........................................................................................................158
2.3.3.1. Requisitos objetivos..................................................................................158
2.3.3.2. Requisitos subjetivos................................................................................165
2.3.3.3. Requisitos: outras questões.....................................................................168
2.3.4. Direitos e deveres na união estável..................................................................171
2.3.4.1. Deveres......................................................................................................171
2.3.4.2. Efeitos jurídicos em relação à terceiros.................................................173
2.3.5. Relações patrimoniais entre os companheiros...............................................177
2.3.5.1. Regime de bens na união estável............................................................180
2.3.6 Direito sucessório...............................................................................................181
2.3.7. Outras questões de relencia.........................................................................183
3. A TEORIA DAS REPRESENTÕES SOCIAIS............................................................184
3.1. O conceito de representações sociais....................................................................184
3.2. O campo de estudos das representações sociais..................................................189
3.3. A explicação teórica das representações sociais e suas articulações.................192
3.4. A abordagem estrutural das representações sociais..........................................197
3.5. A legalização da união estável e suas implicações: uma casuística moderna..201
4. ESTUDO EMPÍRICO.........................................................................................................211
4.1. Objetivos................................................................................................................211
4.2. todo....................................................................................................................211
13
4.3. Resultados e sua discussão......................................................................................213
4.3.1. Resultados da evocação livre: a estrutura temática das representações
sociais............................................................................................................................213
4.3.2. Resultados das perguntas fechadas e abertas do questionário: os conteúdos
conhecimentos, afetos e juízos das representações sociais....................................221
4.3.2.1. A informação a respeito do reconhecimento jurídico da união estável e
suas fontes...............................................................................................................221
4.3.2.2. As denominações dadas à união estável e aos seus adeptos..................224
4.3.2.3. A união estável e o namoro......................................................................235
4.3.2.4. As características legais atribuídas à união estável...............................248
4.3.2.5. O regime de bens na união estável..........................................................261
4.3.2.6. O contrato constitutivo de união estável.................................................266
4.3.2.7. A conversão da união estável em casamento..........................................269
4.3.2.8. A aproximação da união estável com o casamento ou com o
concubinato............................................................................................................274
4.3.2.9. As diferenças entre viver junto e ser casado oficialmente....................278
4.3.2.10. Os termos aplicáveis àqueles que vivem em união estável..................280
4.3.2.11. O posicionamento frente à união estável..............................................283
4.3.2.12. A união estável e a extinção do casamento...........................................290
4.3.2.13. O privilégio das mulheres conviventes.................................................294
4.3.2.14. A facilidade de separação na união estável..........................................298
4.3.2.15. A satisfação conjugal..............................................................................302
5. CONCLUSÕES.......................................................................................................................310
6. REFERÊNCIAS......................................................................................................................331
7. ANEXOS..................................................................................................................................337
14
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos casados de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 7. Rio de Janeiro, 2008.......................214
Figura 2 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos solteiros de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 9. Rio de Janeiro, 2008.......................214
Figura 3 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos conviventes de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 6. Rio de Janeiro, 2008.......................215
Figura 4 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos separados de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 9. Rio de Janeiro, 2008.......................215
Figura 5 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos femininos de temas
associados à união estável. N = 152. Freência nima: 8. Rio de Janeiro, 2008.....................217
Figura 6 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos masculinos de temas
associados à união estável. N = 152. Freência nima: 7. Rio de Janeiro, 2008.....................218
Figura 7 – Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos em todas as situações
conjugais de temas associados à união estável. N = 304. Freência nima: 18. Rio de Janeiro,
2008..............................................................................................................................................219
15
LISTA DE GFICOS
Gráfico 1 – Média das idades ao casar no civil. Brasil, 1974-94.................................................123
Gráfico 2 – Taxas brutas de nupcialidade. Brasil, 1979-94.........................................................124
Gráfico 3 – Estrutura Etária dos Não - Casados. Brasil, 1995.....................................................128
Gráfico 4 – Proporção de uniões de pessoas de 10 anos ou mais de idade, por natureza da união –
Brasil 1980/2000..........................................................................................................................130
Gráfico 5 – Resumo Geral (casamentos, separões, dircios, etc.).........................................136
16
LISTA DE TABELAS (fundamentação teórica)
Tabela 1 – Pessoas de 15 anos ou mais de idade, casadas, segundo o tipo de união. Brasil, 1960-
95....................................................................................................................................................24
Tabela 2 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal, por tipo de união,
segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação...........................................................132
Tabela 3 – Percentual de pessoas de 10 anos ou mais de idade por estado conjugal e situação do
domicílio, Brasil 2000..................................................................................................................133
Tabela 4 – Proporção de uniões de pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em
companhia de cônjuge ou companheiro(a) por categorias de diferença entre as idades do homem
e da mulher...................................................................................................................................138
Tabela 5 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal, por tipo de união,
segundo o sexo e os grupos de idade Brasil..............................................................................139
Tabela 6 – Percentual de pessoas de 10 anos e mais de idade por estado conjugal e cor ou raça
Brasil 2000....................................................................................................................................141
17
LISTA DE TABELAS (resultados)
Tabela 1: Distribuição da amostra feminina a respeito do conhecimento relativo ao
reconhecimento jurídico da união estável....................................................................................221
Tabela 2 - Distribuição da amostra masculina a respeito do conhecimento relativo ao
reconhecimento jurídico da união estável....................................................................................222
Tabela 3: Distribuição das respostas das amostras sobre as fontes de informação relativas ao
reconhecimento jurídico da união estável....................................................................................223
Tabela 4: Distribuição da amostra masculina a respeito das concepções caracterizadoras da união
estável...........................................................................................................................................225
Tabela 5: Distribuição da amostra feminina a respeito das concepções caracterizadoras da união
estável...........................................................................................................................................225
Tabela 6: Distribuição das respostas da amostra masculina a respeito das outras” concepções
caracterizadoras da união estável..................................................................................................226
Tabela 7: Distribuição das respostas da amostra feminina a respeito das outras” concepções
caracterizadoras da união estável..................................................................................................227
Tabela 8: Distribuição da amostra feminina referente ao conhecimento de casais incluídos na
categoria legal de união estável....................................................................................................228
Tabela 9: Distribuição da amostra masculina referente ao conhecimento de casais incluídos na
categoria legal de união estável....................................................................................................228
Tabela 10: Distribuição da amostra masculina em relação ao entendimento acerca do sentimento
dos homens em união estável sobre sua própria condição...........................................................229
Tabela 11: Distribuição da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do sentimento
dos homens em união estável sobre sua própria condição...........................................................229
Tabela 12: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do
sentimento dos homens em união estável sobre sua própria condição (outra).............................230
Tabela 13: Distribuição da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do sentimento
das mulheres em união estável sobre sua própria condição.........................................................231
Tabela 14: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do
sentimento das mulheres em união estável sobre sua própria condição. (outra)..........................231
Tabela 15: Distribuição da amostra masculina em relação ao entendimento acerca do sentimento
das mulheres em união estável sobre sua própria condição.........................................................232
Tabela 16: Distribuição da amostra feminina que vive ou viveu em união estável acerca do seu
sentimento atual ou passado referente a essa condição................................................................233
Tabela 17: Distribuição da amostra masculina que vive ou viveu em união estável acerca do seu
sentimento atual ou passado referente a essa condição................................................................233
18
Tabela 18: Distribuição das respostas da amostra feminina que vive ou viveu em união estável
acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.(outra)..............................234
Tabela 19: Distribuição das respostas da amostra masculina que vive ou viveu em união estável
acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.(outra)..............................234
Tabela 20: Distribuição da amostra feminina a respeito da possibilidade do namoro” atual ser
considerado uma união estável.....................................................................................................235
Tabela 21: Distribuição da amostra masculina a respeito da possibilidade do namoro” atual ser
considerado uma união estável.....................................................................................................235
Tabela 22: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina a respeito da possibilidade
do namoro” atual ser considerado uma união estável.................................................................237
Tabela 23: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina a respeito da
possibilidade do namoro” atual ser considerado uma união estável...........................................238
Tabela 24: Distribuição da amostra feminina relativa à possibilidade de que, num casal, um dos
membros considere que esteja vivendo em união estável, enquanto o outro entenda que está
apenas namorando........................................................................................................................239
Tabela 25: Distribuição da amostra masculina relativa à possibilidade de que, num casal, um dos
membros considere que esteja vivendo em união estável, enquanto o outro entenda que está
apenas namorando........................................................................................................................239
Tabela 26: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra masculina em relação à
possibilidade de que, num casal, um dos membros considere que esteja vivendo em união estável,
enquanto o outro entenda que está apenas namorando.................................................................241
Tabela 27: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra feminina em relação à
possibilidade de que, num casal, um dos membros considere que esteja vivendo em união estável,
enquanto o outro entenda que está apenas namorando.................................................................242
Tabela 28: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação aos elementos necessários
à transformação do namoro em união estável...............................................................................243
Tabela 29: Distribuição das respostas da amostra masculina em relação aos elementos necessários
à transformação do namoro em união estável...............................................................................243
Tabela 30: Distribuição das respostas da amostra feminina relativa aos componentes necessários
para que a relação entre um homem e uma mulher seja considerada união estável.....................246
Tabela 31: Distribuição das respostas da amostra masculina relativa aos componentes necessários
para que a relação entre um homem e uma mulher seja considerada união estável.....................247
Tabela 32: Distribuição das respostas da amostra feminina referente às características legais
consideradas importantes para que uma relação a dois possa ser classificada como união
estável...........................................................................................................................................249
Tabela 33: Distribuição das respostas da amostra masculina referente às características legais
consideradas importantes para que uma relação a dois possa ser classificada como união
estável...........................................................................................................................................249
Tabela 34: Distribuição da amostra feminina em relação à não determinação legal que, para que
uma relação seja considerada união estável, o casal viva sob o mesmo teto................................250
19
Tabela 35: Distribuição da amostra masculina em relação à não determinação legal que, para que
uma relação seja considerada união estável, o casal viva sob o mesmo teto................................250
Tabela 36: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina à não determinação legal
referente à coabitação...................................................................................................................256
Tabela 37: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina à não determinação legal
referente à coabitação...................................................................................................................257
Tabela 38: Distribuição das respostas da amostra feminina a respeito dos direitos dos
conviventes...................................................................................................................................258
Tabela 39: Distribuição das respostas da amostra masculina a respeito dos direitos dos
conviventes...................................................................................................................................259
Tabela 40: Distribuição das respostas da amostra feminina referente aos deveres daqueles que
vivem em união estável................................................................................................................261
Tabela 41: Distribuição das respostas da amostra masculina referente aos deveres daqueles que
vivem em união estável................................................................................................................261
Tabela 42: Distribuição da amostra feminina a respeito do regime de bens vigente na união
estável...........................................................................................................................................262
Tabela 43: Distribuição da amostra masculina a respeito do regime de bens vigente na união
estável...........................................................................................................................................262
Tabela 44: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao posicionamento
adotado frente ao regime de bens na união estável.......................................................................264
Tabela 45: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao posicionamento
adotado frente ao regime de bens na união estável.......................................................................265
Tabela 46: Distribuição da amostra feminina referente ao conhecimento a respeito da existência
do contrato constitutivo da união estável.....................................................................................266
Tabela 47: Distribuição da amostra masculina referente ao conhecimento a respeito da existência
do contrato constitutivo da união estável.....................................................................................266
Tabela 48: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina a respeito do contrato
constitutivo da união estável.........................................................................................................268
Tabela 49: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina a respeito do contrato
constitutivo da união estável.........................................................................................................269
Tabela 50: Distribuição da amostra feminina frente a possibilidade de conversão da união estável
em casamento...............................................................................................................................270
Tabela 51: Distribuição da amostra masculina frente a possibilidade de conversão da união
estável em casamento...................................................................................................................270
Tabela 52: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra feminina em relação à
possibilidade de conversão da união estável em casamento.........................................................272
Tabela 53: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra masculina em relação à
possibilidade de conversão da união estável em casamento.........................................................273
20
Tabela 54: Distribuição da amostra feminina referente à aproximação da união estável ao
casamento ou ao concubinato.......................................................................................................274
Tabela 55: Distribuição da amostra masculina referente à aproximação da união estável ao
casamento ou ao concubinato.......................................................................................................274
Tabela 56: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina em relação à aproximação
da união estável ao casamento ou ao concubinato........................................................................276
Tabela 57: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina em relação à
aproximação da união estável ao casamento ou ao concubinato..................................................277
Tabela 58: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra feminina em relação ao
questionamento quanto as possíveis diferenças existentes entre viver junto e ser casado
oficialmente..................................................................................................................................278
Tabela 59: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra masculina em relação ao
questionamento quanto as possíveis diferenças existentes entre viver junto e ser casado
oficialmente..................................................................................................................................278
Tabela 60: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina às diferenças afirmadas
entre viver junto e ser casado oficialmente..................................................................................279
Tabela 61: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina às diferenças afirmadas
entre viver junto e ser casado oficialmente..................................................................................280
Tabela 62: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação aos termos considerados
apliveis a alguém que vive em união estável............................................................................282
Tabela 63: Distribuição das respostas da amostra masculina em relação aos termos considerados
apliveis a alguém que vive em união estável............................................................................283
Tabela 64: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra feminina frente ao
reconhecimento jurídico da união estável e suas implicações (direitos e deveres)......................284
Tabela 65: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra masculina frente ao
reconhecimento jurídico da união estável e suas implicações (direitos e deveres)......................284
Tabela 66: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao posicionamento
adotado em relação ao reconhecimento jurídico da união estável................................................288
Tabela 67: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao posicionamento
adotado em relação ao reconhecimento jurídico da união estável................................................289
Tabela 68: Distribuição da amostra feminina em relação à crença de que, com o advento da união
estável, o casamento irá acabar.....................................................................................................290
Tabela 69: Distribuição da amostra masculina em relação à crença de que, com o advento da
união estável, o casamento irá acabar...........................................................................................290
Tabela 70: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao entendimento referente
à extinção do casamento, a partir do surgimento da união estável...............................................292
Tabela 71: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao entendimento
referente à extinção do casamento, a partir do surgimento da união estável................................293
21
Tabela 72: Distribuição da amostra feminina em relação à avaliação a respeito do maior benefício
das mulheres na relação de união estável.....................................................................................294
Tabela 73: Distribuição da amostra masculina em relação à avaliação a respeito do maior
benefício das mulheres na relação de união estável.....................................................................294
Tabela 74: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina em relação ao privilégio
concedido às mulheres conviventes..............................................................................................296
Tabela 75: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina em relação ao privilégio
concedido às mulheres conviventes..............................................................................................297
Tabela 76: Distribuição da amostra feminina quanto à maior facilidade de separação na união
estável do que no casamento........................................................................................................299
Tabela 77: Distribuição da amostra masculina quanto à maior facilidade de separação na união
estável do que no casamento........................................................................................................299
Tabela 78: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina à maior facilidade de
separação na união estável do que no casamento.........................................................................301
Tabela 79: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina à maior facilidade de
separação na união estável do que no casamento.........................................................................302
Tabela 80: Distribuição da amostra feminina referente ao questionamento a respeito da maior
satisfação conjugal no casamento ou na união estável.................................................................303
Tabela 81: Distribuição da amostra masculina referente ao questionamento a respeito da maior
satisfação conjugal no casamento ou na união estável.................................................................303
Tabela 82: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina à atribuição de maior
satisfação conjugal ao casamento ou a união estável...................................................................307
Tabela 83: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina à atribuição de maior
satisfação conjugal ao casamento ou a união estável...................................................................308
22
JUSTIFICATIVA/INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como tema a representação social da união estável na classe média
do Rio de Janeiro. Como afirma Pereira (2002), a inserção do título união estávelno Livro de
Família do novo Código Civil brasileiro talvez tenha sido a grande mudança feita neste novo
diploma legal(p.225). Embora a união estável seja uma forma de relação conjugal existente no
plano social desde a antiguidade, seu reconhecimento como entidade familiar é um femeno
jurídico novo, que trouxe implicações substantivas para o âmbito da vida em comum. Podemos
afirmar que a legalização da união estável e, especialmente, as implicações decorrentes da nova
realidade social que ela passou a constituir representam uma das principais mudanças ocorridas
atualmente no âmbito da conjugalidade.
A partir das modificões instituídas pelo novo Código Civil observamos que os temas
referentes a esse arranjo e a conseente rediscussão em torno do que significa “viver junto
passaram a ser algo relevante dentro das cenas sociais. A existência de um debate relativo à união
estável, evidenciado através das diferentes posições manifestas pelos sujeitos sociais em relação à
mesma no decorrer de vários períodos históricos, demonstra a importância que essa modalidade
de relação conjugal teve no passado e continua a ter hoje, diante das mudanças jurídicas, para
todos aqueles que lidam com ela em sua vida cotidiana. A união estável é uma forma de interação
conjugal presente em várias culturas e épocas com um conteúdo afetivo e imaginário peculiar.
Entretanto, esse tipo de vínculo passou na atualidade constituir um femeno jurídico novo que,
como tal, gera, além de estranhamento, dificuldades tocantes à sua assimilação e incorporação na
vida cotidiana. Na tentativa de lidar com esse novo acontecimento são criadas, no âmbito público,
redes de compartilhamento que objetivam a construção de um consenso a seu respeito.
De tal forma, a união estável possui “espessura social ou relevância cultural, critérios
propostos por Sá (1998) para definir os objetos de estudo pertencentes ao campo das
representões sociais, na medida em que se encontra implicada de forma consistente nas práticas
de diversos grupos, as quais incluem as conversações e a exposição aos meios de comunicação de
massa. Ou seja, é um objeto que possui intensidade, força social e força simlica de
acontecimento. Sua escolha como objeto de pesquisa na abordagem das representões sociais
23
justifica-se, primeiramente, em razão do interesse que desperta nos vários setores sociais, gerando
um debate a seu respeito nos universos consensuais e reificados, bem como da questão da
alteridade, tema fundamental quando se trata de relões em geral e, particularmente, das
conjugais. A tematização inaugurada a respeito da união estável é responsável pelo
desenvolvimento de um saber gerado no senso comum e a manutenção de um saber cienfico
legitimado pelos especialistas, cuja presença na dia é freente.
Além disso, alguns aspectos referentes à caracterização jurídica da união estável, como a
não exigência legal do elemento filhos e da coabitação para sua definição como tal, apontam que
a mesma está estabelecendo novos problemas e incluindo novos dados na relação afetiva. Qual o
limite entre namoro e união estável, qual o grau de burocracia ou racionalidade que o
relacionamento conjugal permite caso sejam necessários no início da relação acordos contratuais
que estabeleçam a divisão patrimonial, etc, são algumas das muitas indagões suscitadas por
esse novo arranjo conjugal. A própria fluidez das fronteiras entre o que atualmente se entende
como namoro firme” e a união estável tem acarretado, inclusive para os juristas, uma série de
novos problemas relacionados à divisão de bens no momento da separação, como revela a
matéria publicada no jornal O Globo no dia 20 de junho de 2004, intitulada “Detalhes que fazem
o namoro virar união estável.
Na modernidade o enfraquecimento dos referenciais externos religiosos, familiares, etc.
– que impediam que as pessoas estabelecessem a conjugalidade de acordo com sua própria
vontade ou seus desejos, tornou cada vez mais freqüente pessoas viverem tal experiência sem
regulamentação oficial, como atestam os dados do IBGE. O novo Código Civil, reconhecendo a
existência dessa realidade fática, regulamentou a união estável, conferindo-lhe um novo estatuto
de entidade familiar. A união estável, acontecimento comum nas práticas afetivas cotidianas,
passou assim a ser algo novo como femeno jurídico. Essa forma de relação durante muito
tempo não reconhecida juridicamente, alvo de desamparo e de sanções legais e, em associação,
até mesmo de exclusão social, hoje, além de permitida socialmente, é reconhecida por lei como
um tipo de família. Entretanto, a definição de que tipo de arranjo está se estabelecendo como
união estável passou a ser atualmente um problema.
24
A promulgação do novo Código Civil, em 2002, fez com que, no que se refere ao tema do
casamento, de sua evolução e de suas modalidades, a união estável ressurja na qualidade de
forma institucionalizada de convívio entre homem e mulher como um problema psicossocial
fundamental da atualidade. É a união estável, de tal forma, um assunto de grande impacto social,
tendo chamado a atenção dos especialistas de diversos campos do conhecimento, sobretudo do
Direito de Família e da psicologia, devido às suas repercussões não somente na vida daqueles
mais próximos ao casal – os filhos, principalmente mas na sociedade como um todo.
Em função do exposto acima, podemos considerar a quantidade e a forma das
informões sobre o objeto em questão, assim como os meios pelas quais elas se tornam
acessíveis aos sujeitos, o grau de interesse intrínseco ou circunstancial que o mesmo desperta e a
necessidade mais ou menos presente de seu conhecimento como variáveis que afetam o conteúdo
e a estrutura de suas representações sociais (SÁ, 1998). Nesse sentido, embora a união estável
seja um tipo de arranjo conjugal já existente na história do casamento desde tempos muito
remotos, porém entendida e nomeada sob o rótulo de concubinato, a nova lei que a regulamenta
não é somente um meio de documentar e legitimar essa forma de relação, mas é também
reveladora da mesma enquanto um femeno psicossocial que estamos procurando estudar. Ou
seja, os textos jurídicos que tratam da união estável não são apenas uma produção sobre esse
arranjo conjugal, mas de certa maneira o reconstituem.
Diante, portanto, dos questionamentos acerca de se a promulgação da lei que reconhece a
união estável como uma espécie de família teria acarretado transformações da intimidade e de se
esse fato novo já teria sido introduzido no modo de vida da atualidade indaga-se de que maneira
ele é representado pelos membros dos diferentes grupos sociais.
Apesar das intensas mudanças sociais evidenciadas pelo enfraquecimento do conteúdo
tradicional e pelo significado particular da noção de estilo de vida no cotidiano, um dos motivos
pelos quais, em nosso entender, a união estável se tornou uma modalidade de relação comum
dentro das práticas sociais, não obstante, observamos na experiência contemporânea uma
conjugalidade por vezes ainda ligada a deveres e obrigões tradicionais. Nesse contexto
permanecem conflitos em torno da escolha do casar ou não casar e, por extensão, de fazê-lo ou
25
não oficialmente, o que se coloca como um impasse diante de uma lei que, legitimando a união
estável, retira em certo sentido a legalização das relões maritais do plano das escolhas.
A teoria das representões sociais favorece a investigação adequada do nosso problema,
visto que oferece uma articulação entre as dimensões cognitiva, afetiva e social (presentes na sua
própria noção), que em nível de realidade estão profundamente ligadas. A construção de
significação simlica em torno da união estável é concomitantemente um ato de conhecimento e
um ato afetivo, visto que, quando sujeitos sociais empenham-se em entender e dar sentido ao
mundo, o fazem cognitivamente, mas também com afeto, estando ambos os elementos presentes
nas representações construídas em torno desse objeto. Além disso, tendo em vista nosso objetivo
de analisar e comparar as representões sociais da união estável existentes em quatro grupos
distintos de sujeitos solteiros, casados, em união estável e separados pertencentes à classe
média do Rio de Janeiro –, identificando se nesse tipo de arranjo conjugal permanece a estrutura
de concubinato ou de casamento, optamos por utilizar como fundamentação teórica a perspectiva
psicossocial de Moscovici sobre as representões sociais, bem como de outros autores desse
campo de estudos que consideramos relevantes para a sustentação do trabalho. Este incorpora
ainda contribuições de autores que tratam do casamento e de outros que investigam a
contemporaneidade, além dos próprios textos jurídicos.
Na psicologia social, diversos autores têm procurado entender o casamento em nossa
época através da qualidade de vida conjugal. No entanto, no que se refere à união estável, nas
Jornadas Internacionais, Conferências Brasileiras e Encontros Regionais sobre Representações
Sociais, como também na revisão de literatura a respeito do tema, não encontramos nenhum
estudo que investigasse a união estável utilizando como referencial a teoria das representões
sociais, configurando, de tal modo, uma lacuna nessa área de estudos.
Portanto, considerando-se os problemas ligados à união estável e a posição malvel em
que esta se coloca, sendo ao mesmo tempo um femeno antigo, presente na memória social, e
novo, considerando-se as múltiplas modificações pelas quais vem passando ao longo do tempo,
no que se inclui o tratamento dado a ela no novo Código Civil, a teoria das representações sociais
oferece uma possibilidade proveitosa de se pensar sobre esse tipo de arranjo conjugal, a prática
26
que se desenvolve em torno dele e sua realidade social. Sendo a interação social a noção essencial
em torno da qual se constitui a abordagem da psicologia social, e uma vez que a união estável é
um tipo de interação conjugal evidente em diferentes contextos, acreditamos que a análise das
representões desse arranjo hoje em grupos distintos, incluindo como estas se estruturam e se
articulam com as práticas cotidianas, afigura-se relevante para compreensão do seu sentido na
experiência contemporânea. Acreditamos que dada a complexidade desse femeno e de suas
implicações na vida afetiva, é necessário uma produção teórica analítica que busque investigar
em profundidade os significados atribuídos a essa modalidade de relação e às práticas ligadas a
ela em nosso contexto social.
Enquanto objeto representacional, a união estável deve ser entendida em relação ao tempo
e ao contexto em que está inserida. No que se refere ao contexto no qual esse arranjo se situa, é
importante consideramos que as mudanças sócio-culturais ocorridas na modernidade levaram o
casamento e a família contemporâneos a uma situação de crise, caracterizada, entre outros
fatores, pelo alto índice de dircios e separões, tais como indicam as pesquisas de Jablonski
(1998), e pela busca de formas alternativas ao casamento tradicional. Observa-se nesse contexto
que as incompatibilidades e conflitos conjugais são temas constantes nas conversas cotidianas e
nos consultórios de psicologia. Não obstante, apesar da referida crise, permanece um desejo
intenso de encontrar um companheiro(a) aliado a um sentimento de mal-estar e solidão por não
tê-lo ainda encontrado.
O grande mero de dissoluções matrimoniais e a freente insatisfação associada à vida
conjugal atestam que o casamento está atravessando na atualidade um período que diversos
autores denominam de crise. De acordo com Giddens (2002), as relações pessoais oferecem
atualmente oportunidades de intimidade e de auto-expressão ausentes em muitos contextos
tradicionais. Simultaneamente, modos de comportamento e sentimentos ligados à conjugalidade
se tornaram móveis, instáveis e abertos. Da mesma forma que a solidão e os problemas de
relacionamento afetivo entre homens e mulheres, fonte de mal-estar subjetivo, são hoje
recorrentemente discutidos no âmbito social, onde casamento e o outro passaram muitas vezes a
ser vistos como ameaçadores, como estranhos, configurando o que Joffe (1998) denomina
padrão ocidental de resposta a crises, caracterizado pela degradação e desejo do objeto da crise.
27
O casamento definido como “ato solene de união entre duas pessoas de sexos diferentes,
capazes e habilitadas, com legitimação religiosa e/ou civil(FERREIRA, 1986, p.362) não hoje
é a única forma de relação conjugal possível dentro das práticas cotidianas, como atestam o
crescimento acentuado dos novos arranjos conjugais, nos quais se inclui a união estável. A Lei do
Dircio e o enfraquecimento da religião oficial trouxeram a possibilidade concreta de dissolução
do que antes era indissolúvel até mesmo por razões naturais, visto que até o século dezenove a
expectativa de vida era extremamente menor do que em nossos dias. Além desses fatores,
Jablonski (1998) aponta ainda o enfraquecimento do familismo com o surgimento da família
nuclear, sendo o ideal de amor romântico, a emancipação feminina e o individualismo como os
causadores do que esse autor denomina crise do casamento contemporâneo.
Tendo os critérios tradicionais se enfraquecido, os indivíduos são impelidos a escolher um
estilo de vida a partir de uma diversidade de opções, crescendo em larga escala o número de
pessoas que optam pelo que hoje se intitula união estável como forma de relação conjugal. Esse
tipo de arranjo existe na sociedade desde épocas antigas, independente do estado civil dos
conviventes, com o título de concubinato, expressão hoje somente aplicada juridicamente às
relões entre homem e mulher impedidos legalmente de casar. Dentre vários sentidos
semelhantes para a palavra concubinato, encontra-se no Vocabulário Jurídico (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1995, p.490) que “assim se diz da união ilegítima do homem e da mulher. É segundo o
sentido de concubinatus, o estado de mancebia, ou seja, a companhia de cama sem aprovação
legal. É interessante notarmos que certas expressões pejorativas presentes nos discursos das
pessoas no cotidiano, ao se referirem a este tipo união e a seus protagonistas, – especialmente à
mulher, como “amante, amásia, barregã” (BARBOSA, 1996), – parecem ser apropriões desses
termos jurídicos, evidenciando a dinâmica de criação e veiculação das representações sociais.
Em contrapartida, na atualidade, o cônjuge é freentemente definido como alguém com
quem se tem uma “relação pura, ou seja, que existe fundamentalmente pela retribuição que ela
própria pode oferecer (GIDDENS, 2002). Nesse contexto, o novo Código Civil afirma: “é
reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na
convivência pública, connua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de
família” (BRASIL, 2002, p.1.834). A definição da vivência em comum foi alterada por um
28
elemento jurídico, o qual, em sintonia com a Constituição da República de 1988, que utilizou a
expressão união estável em substituição ao termo concubinato (PEREIRA, 2002), retira a união
estável da categoria de concubinato e a introduz dentro de um conceito atual de família.
Nesse sentido, apesar da alteração de um modelo jurídico arraigado ser algo que necessita
de tempo para transformação e assimilação nas práticas cotidianas, o desconhecimento da
legalização da união estável e de suas conseências no cotidiano por grande parte dos sujeitos
sociais, especialmente no que se refere a implicações decorrentes do tempo de convivência do
casal, acarreta novos problemas ligados à conjugalidade. Diante das informações sobre a união
estável circulantes no social e das mudanças no plano jurídico, acreditamos ser importante a
investigação das representões sociais desse tipo de arranjo conjugal, visto que elas guiam o
modo de nomear interpretar e definir conjuntamente seus diferentes e múltiplos aspectos na
realidade diária, tomar decisões e de posicionar-se frente a ela na vida social (JODELET, 2001).
A união estável é ao mesmo tempo um fato antigo, como acontecimento social, e novo,
como femeno jurídico, no campo da conjugalidade. As mudanças na maneira como esse
arranjo é representado refletem a dinâmica própria desse campo e, em sentido mais amplo, do
social. Sua definição como objeto representacional faz, em nosso entender, com que seja
necessária a consideração da sua especificidade como relação conjugal. Assim, o primeiro
capítulo desse trabalho terá como tema a conjugalidade. A união estável juridicamente
reconhecida é, por assim dizer, um femeno psicossocial de nosso tempo, que deve ser
analisado de acordo com a época em que surge e em seu contexto específico. Sua
contextualização deve, de tal forma, abordar os aspectos históricos, demográficos, jurídicos que a
mesma envolve na sua constituição como tal. No segundo capítulo será feita a contextualização
histórica; no terceiro capítulo será abordada a contextualização demográfica; e, no quarto capítulo
será tratada a contextualização jurídica da união estável.
O quinto capítulo abrangerá a teoria das representações sociais, base teórica desse
trabalho. O sexto capítulo tratará dos objetivos do trabalho, da metodologia da pesquisa empírica
e dos resultados. O sétimo capítulo apresentará as conclusões dessa investigação.
29
1. A CONJUGALIDADE
1.1. A união estável no campo da conjugalidade
A união estável é um acontecimento que desde a antiguidade faz parte do cenário
cotidiano, sendo alvo de posições ora mais conservadoras, ora mais tolerantes a seu respeito por
parte dos sujeitos sociais. Tal variação na forma pela qual esse arranjo é representado nos
diversos contextos sociais se deve não somente ao momento histórico em que o mesmo está
situado, como também a uma série de outros fatores, tais como: classe social, idade, gênero, etc,
que influenciam na maneira como o conhecimento em relação a ele é construído e compartilhado
em grupos sociais específicos. Observamos através da história social do casamento e da família
que embora esse arranjo, conjugal hoje denominado união estável seja um fato antigo e, enquanto
tal, familiar no campo da conjugalidade, como novo arranjo conjugal constituído as o
reconhecimento jurídico, passou a gerar estranhamento, ensejando uma série de problemas
ligados, primeiramente, a sua própria definição.
A conjugalidade é, nesse sentido, importante por ser o elemento definidor da união
estável, assim como do casamento, e de qualquer relação que se proponha conjugal. Na união
estável tal conceito assume importância central por dizer respeito ao elemento subjetivo
constituinte dessa modalidade de relação aferido legalmente a partir de alguns elementos
objetivos, também fixados por lei. Embora esta estabeleça uma série de características e
requisitos determinantes em conjunto da união estável, observamos que existe na literatura
jurídica a respeito do tema uma concordância de que os mesmos são apenas indicadores, na
medida em que isoladamente não poderiam caracterizar esse novo arranjo, sendo a intenção de
vida em comum ou, em termos jurídicos, a convivência more uxorio, o affectio maritalis
(GAMA, 2001) o principal elemento caracterizador da união estável. Tais aspectos subjetivos
referem-se ao querer compartilhar a vida, ao desejo de construir uma vida em comum, conjugal.
Atualmente para que uma relação seja considerada união estável é preciso que haja um
elemento volitivo caracterizador desse novo arranjo conjugal. Esse investimento da vontade na
construção de uma vida conjugal é algo novo – assim como esse arranjo, do
ponto de vista
30
jurídico – que se expressa na publicidade ou, no termo usado por Gama (2001), em uma
notoriedade da relação. Essa característica aponta uma mudança social substantiva na forma de
representar e, por conseguinte, de lidar com essa modalidade de relação. Ao contrário do que
acontecia em outras épocas, em que o casamento era a única forma de relação conjugal entre
homem e mulher possível de aceitação social e a união estável, então considerada concubinato, e,
portanto, ilegítima, era mal vista socialmente, devendo por essa razão permanecer encoberta
ainda que contra a vontade de seus parcipes, atualmente há uma exigência legal de que essa
relação seja explicitada por seus integrantes no convívio social.
A publicidade da relação, antes não permitida pela sua ilegalidade, é hoje uma exigência
legal que, juntamente com outras características e requisitos, diferencia a união estável do
concubinato, categoria na qual somente se incluem aquelas pessoas que tendo constituído uma
nova relação conjugal – que não seja o casamento, pois nesse caso estariam cometendo bigamia
não desfizeram seus vínculos conjugais anteriores, permanecendo então casadas. A notoriedade é
também um indício importante na diferenciação entre a união estável e o namoro, limite por
vezes hoje difícil de ser estabelecido, uma vez que para que uma relação seja considerada união
estável a conjugalidade precisa ser notória, ou seja, aqueles que vivem em união estável precisam
ser reconhecidos socialmente como um casal.
A notoriedade é, assim como todo o dispositivo legal conjunto de características,
requisitos e atribuições legais referentes à união estável –, um aspecto fundamental na introdução
dessa forma de união como um fato novo no campo da conjugalidade. A consideração da união
estável como um novo arranjo conjugal nesse âmbito aponta o surgimento de uma maneira de
lidar com esse objeto diferente da que acontecia em outras épocas em que a relação conjugal
somente era aceita e reconhecida mediante oficialização, a qual, por sua vez, era somente
concedida ao casamento.
Enquanto exigência legal, ao mesmo tempo em que diferencia a união estável de outras
formas de relação amorosa, essa característica atende em sentido pleno a proposta impcita na
legalização que fez da união estável, acontecimento já existente no campo da conjugalidade, um
novo arranjo conjugal que, para ser reconhecido juridicamente, precisa de publicidade através da
31
explicitação da conjugalidade no convívio social. Legalizar uma relação conjugal como a união
estável implica, nesse sentido, retirá-la do anonimato, dando-lhe a visibilidade não existente
anteriormente em razão de sua ilegitimidade e, ao mesmo tempo, exigindo, quando necessário, a
notoriedade que permita caracterizá-la.
Atualmente a vontade se sobrepõe aos critérios externos oriundos da tradição que outrora
eram determinantes do reconhecimento do vínculo conjugal. Hoje, para que uma relação seja
considerada união estável é preciso que nela haja e isto seja notório dos pontos de vista dos
atores sociais e jurídico – comunhão de vida, ou seja, que seus membros partilhem a vida em
comum, que esta vida seja de fato, presente nas práticas cotidianas como acontecimento ou fato
social, e de direito, através do reconhecimento jurídico, conjugal.
A conjugalidade é, por assim dizer, o principal conceito impcito na comunhão de vida
exigida em termos legais para que uma relação possa ser considerada união estável
, na medida
em que, se constituindo de tal forma nas práticas, ela precisa ser reconhecida como uma relação
dotada dessa qualidade e, portanto, conjugal, no âmbito jurídico. Nesta acepção os conviventes
precisam ser vistos socialmente como um casal para que, primeiramente, a relação constituída por
eles seja considerada união estável no âmbito jurídico, e para que, posteriormente, em
decorrência desse reconhecimento, possam incidir sobre eles os direitos e deveres previstos por
lei.
O conceito de conjugalidade é também amplamente utilizado por diversos autores que se
ocupam do estudo do casamento e da família, nos enfoques cnico e psicossocial. No enfoque
cnico a conjugalidade é definida por diversos autores como laço conjugal, isto é, como aquilo
que efetivamente une, forma e define o casal (ALVARENGA, 1996; CALLIGARIS, 1994;
FÉRES-CARNEIRO, 1999). É, por assim dizer, o ser casal, o viver uma relação caracterizada
pela existência de uma aliança ou vínculo que nos aspectos objetivos e subjetivos se define como
marital. Na medida em que um casal é reconhecido como casado são atribuídos a seus membros
papéis sociais condizentes com tal posição específicos de cada cultura, e uma expectativa
também social ligadas a esses papéis, ou seja, de que vivam como casados.
32
Alvarenga (1996) esclarece que os teóricos da comunicação consideram que o ser humano
é um ser relacional cujo desenvolvimento acontecerá a partir das trocas estabelecidas com o
meio, priorizando em sua análise acerca da conjugalidade os efeitos da comunicação sobre o
comportamento humano e as manifestações observáveis de uma relação. Segundo ela, tais autores
consideram a interação a base da existência humana e definem o casal como:
[...] um sistema interpessoal, cujas seqüências interacionais são marcadas por um
complexo conjunto de regras funcionando, tanto como um sistema homeostático, com
uma relativa estabilidade, quanto como sistema aberto, com a capacidade de transformar
seus padrões de interação. Sistemas interpessoais como o casal são circuitos de
retroalimentação: o comportamento de cada um afeta e é afetado pelo comportamento do
outro; da mesma forma, o contexto no qual as interões ocorrem influencia e é
influenciado pelos seus participantes. (ALVARENGA, 1996, p. 63)
Alvarenga (1996) afirma ainda que, para os teóricos da comunicação, a constituição de
um casal atravessa uma série de acordos relacionais que lhe dão um estilo, uma singularidade,
definindo-o enquanto sistema, exigindo-se, porém, como condição fundamental ao seu
dinamismo, uma diferenciação entre seus membros. Dessa compreensão decorrem implicações
cnicas específicas na maneira de tratar o casal e suas demandas. É importante ressaltarmos,
entretanto, que, apesar dessa definição originar-se de um enfoque teórico distinto daquele com o
qual estamos trabalhando, alguns paralelos podem ser traçados com a teoria das representões
sociais e com a própria psicologia social, a começar pela ênfase na interação social, objeto de
estudo desta disciplina e lugar de produção e compartilhamento das representões sociais.
O destaque concedido à comunicação, a consideração do contexto social, e a relevância
dada à alteridade, expressas na necessidade de diferenciação entre os membros do casal, são
outros importantes pontos em comum com a teoria das representações sociais. A conjugalidade
está necessariamente referida ao contexto sócio-cultural e assume diferentes tipologias
construídas de acordo com as diversas formas de relação, como demonstra Féres-Carneiro
(1999). De acordo com a literatura analisada sobre o tema, a conjugalidade está ligada à idéia de
construção social. Não é um conceito pré-definido, mas refere-se a algo que, ao contrário, se
constitui em conjunto com a relação, perpassando desde a escolha do outro até o estabelecimento
e a organização da vida em comum.
33
Contudo, embora a conjugalidade seja construída pelo casal no decorrer da vida em
comum, está submetida ao contexto social que irá definir, a partir de uma série de crenças,
valores e representões vigentes em cada época, o que é conjugal, ou seja, qual o significado que
tal termo assume dentro de culturas específicas nas quais ocorrem diferentes tipos de arranjos
conjugais. Uma vez construído um sentido aplivel à conjugalidade em cada contexto social,
incidem sobre ele uma série de prescrições baseadas nas mesmas crenças, valores e
representões que determinam que tipos de relões podem se encaixar em tal conceito, ou seja,
naquilo que é considerado conjugal em cada cultura.
No que se refere à união estável há uma coincidência entre o aspecto legal e o senso
comum, visto que o reconhecimento jurídico desse arranjo foi possível em razão de uma mudança
na forma de representar e, conseentemente, de lidar com o mesmo socialmente. A união
estável, que antes da legalização era considerada concubinato, e, portanto, uma relação ilegítima,
imprópria para os padrões sociais vigentes na época, passou a ser vista como uma opção de vida
conjugal ligada ao estilo de vida daqueles que a adotam.
De acordo com Giddens (2002), na vida social moderna, a noção de estilo de vida assume
um significado particular. Segundo ele: quanto mais a tradição perde seu donio, e quanto mais
a vida diária é reconstituída em termos do jogo dialético entre o local e o global, tanto mais os
indivíduos são forçados a escolher a partir de uma variedade de opções(p.13). O autor
reconhece que existem influências padronizadoras, mas acrescenta, entretanto, que em razão da
abertura da vida social na atualidade, com a multiplicidade dos contextos e a diversidade de
autoridades, a escolha do estilo de vida assume uma importância cada vez maior na constituição
da auto-identidade e da vida diária.
Esse incremento da noção de estilo de vida está, em nosso entender, intimamente ligado à
união estável considerada como acontecimento social freente nas práticas cotidianas e,
atualmente, como femeno jurídico – favorecido por sua vez pelo aumento do número de
pessoas que optam por essa modalidade de relação conjugal –, uma vez que essa noção quando
assimilada pelo todo social permitiu que a vida conjugal fosse cada vez mais objeto de escolha
individual, ligada à identidade de cada indivíduo, que poderia adotar um estilo de vida conjugal
34
dentre as várias opções conjugais presentes no cotidiano. Nesse processo de escolha são
priorizados todos aqueles atributos sentimentos, cognições ligados à auto-identidade em
detrimento daqueles ligados aos referenciais tradicionais, já enfraquecidos. Visto que a auto-
identidade se sobrepõe aos critérios externos, tradicionais, é possível viver em união estável se
essa opção se adequar ao estilo de vida e ao modo de ser daqueles que optaram por esse arranjo
conjugal.
A permanência das influências padronizadoras, apontadas por Giddens (2002), pode ser
ainda observada em alguns segmentos sociais nos quais o casamento tem um peso
consideravelmente maior do que o viver junto, mesmo que isso aconteça mediante algum tipo
de contrato feito pelo casal. É interessante notarmos que, também na legislação, o tratamento da
união estável é feito em comparação com o casamento, havendo, inclusive, uma facilitação
prevista em lei para a conversão da união estável em casamento. Em meio a um aumento
significativo do número de separação e divórcios, de pessoas vivendo sozinhas, de alguns
casamentos ainda baseados em deveres obrigões, permanece o desejo cada vez mais atual de,
de algum modo, vivenciar a conjugalidade. Hoje, essa experiência não mais tem como condição a
oficialização conferida pelo casamento, opção que tem enfraquecido muito, principalmente se
considerarmos os meios sociais urbanos.
Entretanto, na medida em que existe um significado de conjugal presente em cada cultura
e uma prescrição ligada a esse conceito que determina quais atributos são necessários para que
uma relação seja considerada conjugal, tem origem uma espécie de sistema classificatório
complexo que, por sua vez, determina que tipos de arranjos podem ser considerados de tal forma.
Isso é particularmente importante nas sociedades atuais onde as transformões ocorrem a todo
momento, mudando inclusive a forma como determinado arranjo conjugal, como a união estável,
que muitas vezes não se encaixava dentro de uma noção de conjugalidade, é representado e,
conseentemente, a maneira como os sujeitos sociais lidam com os mesmos em suas práticas
cotidianas.
Os femenos de representação social são sempre produções contextualizadas resultantes
do tempo em que surgem. Como tal, a união estável é um femeno situado num contexto de
35
transformações ocorridas ao longo do tempo que precisa ser entendido referindo-o ao seu
contexto, lugar onde ocorrem as interações conjugais daqueles que vivem esse tipo de arranjo
conjugal. A maneira como a união estável é representada varia na época e na cultura, pois cada
época e cada cultura produz representões distintas em relação a um determinado femeno ou
objeto social.
A união estável surge como femeno jurídico em um momento social conturbado no
qual, ao mesmo tempo em que há um sentimento de descontentamento com as relões conjugais
como um todo, observa-se também uma queixa freqüente ligada ao fato de não se estar vinculado
a alguém por meio da conjugalidade. É a partir dessa contradição formada por uma extensa
queixa conjugal e pela busca incessante da conjugalidade que Calligaris (1994) se interroga se
casar não teria se tornado em nossa época algum tipo de dever. Em razão da importância
reafirmada pela presença constante dessa dimensão nos consultórios de psicologia, através das
queixas dos pacientes que apontam a conjugalidade como a razão que os fizeram procurar um
terapeuta, o autor propõe que a mesma seja pensada como uma realidade social.
Reconhecendo a importância do social no campo da conjugalidade, Silva e Chuster (1991)
afirmam que o casal possui uma estrutura psicossocial e que seus membros se unem para
satisfazer diversos tipos de necessidades, dentre as quais os autores citam as necessidades
sexuais, necessidades sócio-político-econômico-culturais, fantasias ligadas ao casamento dos pais
e desejo de crescimento mútuo, o que envolve a possibilidade de criar projetos em comum.
Torres (2000) aponta, nesse sentido, uma primeira dimensão da conjugalidade afirmando:
[...] a conjugalidade inscreve-se em relões e trajetórias sociais e de gênero. Isto é, ela
ocorre num dado momento do percurso pessoal de um significativo conjunto de
indivíduos, percurso esse social, cultural e ideologicamente marcado de forma
diferenciada, de acordo com as condições de existência e com o gênero, já que é
diferente também o que se considera ser o comportamento adequado para os dois sexos
em setores sociais distintos. (p.137)
Segundo a autora, a segunda dimensão da conjugalidade diz respeito à produção de
sentido e à identidade. A terceira dimensão se refere à afetividade, em seu amplo sentido, nela
36
tendo lugar de destaque o aspecto amoroso da relação e a concretização da sexualidade. A quarta
dimensão identifica a relação conjugal – o termo utilizado é casamento – como fonte produtora
de realidade, não no sentido simlico, mas das condições materiais. Torres esclarece que, uma
vez estabelecida, a conjugalidade cria uma situação nova em termos das condições materiais de
existência através, por exemplo, da divisão de recursos e despesas, fato freqüente em
relacionamentos que originam filhos e, com seu nascimento, novas relações afetivas. Segundo
ela, a realidade construída – vida em conjunto, relações familiares, filhos além de interpelar os
atores no sentido identitário, cria um sistema particular de possibilidades de limite e de ação.
Apesar da autora se referir ao casamento, na união estável, sendo ela uma relação conjugal,
observamos a emergência de todos os aspectos ligados a essas dimensões enumeradas,
destacando-se, em particular, a quarta dimensão, no que se refere à criação de uma situação nova
relativa aos bens adquiridos pelo casal durante a vigência da relação e dos problemas
relacionados à divisão patrimonial vivenciados na separação.
A quinta e última dimensão está ligada à primeira, na medida que se refere ao fato da
conjugalidade ser social e historicamente construída. Como afirma Torres (2000), parece assim
indiscuvel a necessidade de situar a conjugalidade nas coordenadas espaço/tempo para avaliar,
principalmente, de que forma as transformões de valores interpelam os atores sociais e que
efeitos têm sobre suas práticas e representões(p.140-141).
No tocante à união estável as representações sociais construídas a seu respeito em
contextos sociais específicos podem ser compreendidas como uma forma de conhecimento
compartilhada entre homens e mulheres integrantes de grupos sociais distintos a respeito desse
arranjo conjugal. Esse conhecimento possui um caráter prático que organiza e estrutura as
práticas de convivência e, no tocante ao casal que vive em união estável, poderá, em última
instância, implicar na manutenção e no rompimento do vínculo conjugal. O conhecimento
disponível e compartilhado a respeito dessa modalidade de vida conjugal é estruturado pelo
contexto social e, ao mesmo tempo, estruturante das práticas de convivência. Dentro desse
contexto a função da linguagem se destaca, tendo um papel fundamental no estabelecimento de
acordos mútuos entre o casal. Dizem ainda Silva e Chuster (1991) a esse respeito:
37
O casal possui mecanismos psíquicos que são traduzidos pela linguagem comum à
cultura que pertencem e à microssociedade que os educou e outorgou-lhes parte de sua
particularidade. Esta linguagem é particularmente complexa e possui a lógica de um
sentido que não apresenta regra de um simples discurso reduzido. Trata-se aqui não da
busca de um sentido como produto de causas, mas da busca de um sentido como a
criação de um sujeito na relação com o outro. (p.110)
Monteiro (2000) esclarece que no que se refere aos estudos sobre casamento os teóricos
denominados contextualistas defendem a importância das relões subjetivas, afirmando que,
assim como a história e a socialização particularizam a experiência dos indivíduos, a ngua
escolhida para descrições de realidades influi na composição única nesses mundos. A ngua
compartilha, diferencia e coletiviza simultaneamente as experiências dos indivíduos. Conforme o
autor, se aceitarmos que a convivência permite a co-experiência e a formação de uma linguagem
comum, o estudo de casais precisa contemplar as características específicas dessa linguagem.
A linguagem é também considerada por diversos autores como um aspecto intimamente
associado à satisfação conjugal, tendo um papel fundamental no estabelecimento de consensos
importantes para sua obtenção. A avaliação do relacionamento como algo satisfatório depende,
em grande parte, da percepção pelo casal da quantidade de diálogo existente entre ambos, o que
favorece a feitura de acordos e, por conseguinte, o estabelecimento de consensos. Observa-se,
através de informações oriundas do senso comum e da dia, que “discutir a relação” é
atualmente considerada uma prática essencial para que a mesma “dê certo, ou seja, traga a
felicidade esperada e, assim, não se dissolva.
Giddens (2002) atribui à linguagem um papel fundamental na mediação da experiência,
afirmando que:
[...] toda experiência é mediada pela socialização e em particular pela aquisição da
linguagem. A linguagem e a memória estão intrinsecamente ligadas, tanto ao nível da
lembrança individual quanto ao da institucionalização da experiência coletiva. Para a
vida humana, a linguagem é o meio original e principal de distanciamento no tempo e no
espo, elevando a atividade humana além da imediatez da experiência dos animais.
(p.28)
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A linguagem está, segundo o autor, ligada à capacidade de refletir reflexividade do eu –
e dar sentido à experiência. Citando Lévi-Strauss ele afirma que a linguagem “é uma máquina do
tempo, que permite a reencenação das práticas sociais através das gerações, ao mesmo tempo em
que torna possível a diferenciação de passado, presente e futuro(p.29). Para Giddens (2002), a
perda da oralidade teria tido como conseência nas sociedades um distanciamento da tradição.
É interessante notarmos, nesse sentido, que nas representações sociais construídas a
respeito de objetos socialmente valorizados existem elementos novos, indicadores de mudança
social, e também outros oriundos da tradição, formando uma espécie de “cleo duro
transmitido através dos tempos, pelos discursos, de geração em geração. Uma vez que as
representões sociais são construídas e compartilhadas nas conversões cotidianas, a linguagem
é aspecto considerado central também na teoria das representões sociais, o que evidencia-se na
vasta produção teórica existente nessa área.
É importante lembrar, nesse sentido, que Giddens (2002) aponta a reflexividade do eu
como uma das características da modernidade que, segundo ele, em conjunto com a influência
dos sistemas abstratos, afeta de maneira difusa o corpo e os processos psíquicos. Podemos dizer
que, assim como o corpo, a vida conjugal é hoje reflexivamente mobilizada, uma vez que passou
a funcionar dentro dos sistemas internamente referidos da modernidade, razão pela qual discuti-la
passou a ser algo importante. Essa discussão tem início no âmbito privado, especificamente com
casal, na análise de sua vida conjugal, passa algumas vezes pela família de ambos e grupos de
amigos, em comum ou não, e se estende ao âmbito público – ou social, em sentido mais amplo –
sendo, inclusive, apropriada pela dia que, através dos especialistas, reafirma o papel da
linguagem na solução de conflitos conjugais.
Esse caráter de mediação possuído pela linguagem é considerado pela psicologia,
especialmente nas terapias de casal, um importante instrumento na solução de problemas
conjugais existentes na permanência do vínculo conjugal, e até mesmo quando o casal se
encontra em processo de separação. A busca de consenso através do diálogo é também uma
possibilidade almejada pelo Direito de Família durante o processo de separação. Na união
estável, o rompimento do vínculo conjugal é muitas vezes complexo na medida em que além da
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presença daqueles sentimentos comuns na maioria das separões – decepção, frustração, tristeza,
etc. – há muitas vezes uma dificuldade emocional envolvida na partilha dos bens.
A sensação de mal-estar decorrente da necessidade de dividir o patrimônio em comum
com o companheiro, freqüente nos processos de separação, é agravada quando a união se finda
em razão da surpresa que essa imposição legal representa na vida daqueles que optam por esse
arranjo, uma vez que “viver juntosignifica muitas vezes para eles estar isento das obrigões
jurídicas, próprias do casamento. Em razão dessa idéia de liberdade desenvolveu-se uma crença
de que é mais fácil se separar na união estável do que no casamento. Viver em união estável
implica, muitas vezes, um grau menor de compromisso do que casar. Contudo, uma vez
legalizado, da mesma forma como acontece com o casamento, incidem sobre esse arranjo uma
série de direitos e deveres, sendo um deles a regra segundo a qual tendo findado a relação de
união estável, a menos que haja alguma disposição em contrário explicitada em contrato
constitutivo de união estável, o patrimônio comum é dividido entre o casal, ficando metade para
cada membro da díade conjugal.
Fatores como esse parecem, no momento de separação, trair o princípio de liberdade
impcito em uma relação não oficial que, com a promulgação do novo Código Civil (2003),
passou a ser oficial. Embora a consideração da união estável seja freqüente nas práticas
cotidianas, existe ainda nesse âmbito um grande desconhecimento dos pormenores ligados a sua
legalização. Os sujeitos sociais falam a respeito de algo que não conhecem em detalhes. Em geral
somente no momento da separação, quando é preciso provar que a relação existe, esse
conhecimento dos aspectos legais é adquirido, originando uma série de problemas para aqueles
que vivenciam essa modalidade de relação, como atestam os diversos processos de separação na
união estável encontrados nas varas de família.
A legalização da união estável tem originado uma série de problemas que ultrapassam a
objetividade dos fatos jurídicos, remetendo à esfera da subjetividade, aspecto cuja consideração é,
segundo o jurista Rodrigo da Cunha Pereira, primordial no tratamento das temáticas do Direito de
Família. Ele afirma que as questões colocadas em evidência nesse âmbito não se referem
exclusivamente a aspectos objetivos, mas são permeadas pelo afeto. Os assuntos que envolvem a
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conjugalidade aspecto para a qual, do ponto de vista legal, é preciso se estar atento para
comprovar a existência da união estável não podem ser tratados sem considerar a afetividade e,
por conseguinte, a subjetividade do casal.
Adotando uma perspectiva da psicologia social, Rey (2002) afirma que o tema da
subjetividade representa uma definição ontológica diferenciada dos processos psíquicos. O autor
considera a subjetividade como o sistema de significões e sentidos subjetivos no qual se
organiza a vida psíquica do sujeito e da sociedade, na medida em que a subjetividade não é uma
organização intrapsíquica que se esgota no indivíduo, mas um sistema aberto e em
desenvolvimento que caracteriza também a constituição dos processos sociais, assunto que
explica por meio da categoria da subjetividade social. O tema da subjetividade é adotado pelo
autor a partir de uma perspectiva dialógica, dialética e complexa em que, como afirma:
[...] a subjetividade não aparece coisificada” em nenhum tipo de entidade, nem de
invariante universal da natureza humana, mas que se expressa como um sistema
complexo em constante avanço, que constitui o sujeito concreto e, por sua vez, é
constituída por aquele de forma permanente, por meio dos diferentes sistemas da
subjetividade social em que desenvolve suas ões. (p.8)
Guareschi (1998) afirma que, enquanto a singularidade chama a atenção para o fato dos
seres humanos serem diferentes, a subjetividade ressalta o fato de que eles são também os
outros, ou seja, se constituem de relações, de experiências que estabeleceram e vão estabelecer a
cada dia, estando assim em constante mudança. O autor define o ser humano a partir dessa visão
psicossocial dizendo que:
[...] nós somos o resultado de milhões de relões que estabelecemos no decorrer de
nossa existência. Somos como que um ancoradouro para onde chegam milhões de naus.
Algumas apenas se aproximam de nós. Outras chegam até nós, deixam conosco alguns
de seus bens. Outras penetram no nosso ser, passam a morar conosco, quase que se
identificam com o nosso ser. E nós vamos nos construindo, quais seres humanos, como
resultado desses milhares de relões que estabelecemos cotidianamente. (p.153)
A partir dessa discussão da relação e de seu papel na constituição do sujeito, Guareschi
(1998) chega à questão da alteridade, tema fundamental no tratamento da relações conjugais e,
em particular, de nosso objeto – a união estável. O autor ressalta que, o que de fato importa dessa
41
compreensão do ser humano como um ser que se constitui a partir das relações estabelecidas em
seu meio social, é que ao se falar de “relões, necessariamente ao se falar de um, está se
falando também de outro. O autor prossegue dizendo ainda que ao se falar de relões está se
falando de condutas, de comportamentos que se originam e estão de acordo com as diferentes
concepções de ser humano. Nesse sentido o que assume importância serão as novas práticas ou as
diferentes relações que podem surgir dessas concepções.
Em resposta à própria indagação acerca de que conseências derivam do fato de pensar o
ser humano de uma ou outra maneira, e de que implicações práticas isso pode acarretar,
Guareschi (1998) afirma que podemos vislumbrar implicações práticas positivas quando o outro é
concebido como face-a face, abertura, relação. Diz ainda que na medida em que se começa a
pensar o outro a partir das relações, surge uma nova dimensão nas práticas: a dimensão da
alteridade, a qual traz novos elementos para se poder pensar um novo paradigma para a
compreensão do mundo, do ser humano, e para a criação e constituição de práticas sociais que
impliquem uma dimensão ética.
Guareschi traz uma importante contribuição ao estudo das relações interpessoais que se
estende ao âmbito das relações conjugais, ao propor a consideração da ética, aspecto muitas vezes
desconsiderado no tratamento da conjugalidade. O reconhecimento do outro, através da
alteridade, como aquele outro que está no mundo além do meu mundo(LEVINAS, apud
GUARESCHI, 1998, p.157) é muitas vezes comprometido e, até mesmo, impossibilitado na vida
conjugal atual. Embora na relação marido-mulher um implique necessariamente o outro, uma
série de fatores comprometem a possibilidade da vivência de relacionamentos centrados na
dimensão da alteridade. O individualismo é um desses fatores que dificultam o estabelecimento
de relações conjugais alteritárias.
A união estável, uma vez que se constitui como uma relação baseada na escolha
individual, estaria, em princípio, mais próxima da alteridade, visto que, dada a maneira como se
constitui é, em geral, o afeto e não os referenciais externos o que determina a sua existência. As
mudanças sociais ocorridas especialmente na segunda metade do século vinte permitiram que a
conjugalidade pudesse ser vivenciada em uma relação não oficial, fato que, se considerarmos que
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até o final do século dezenove a maioria dos casamentos acontecia por meio de arranjos entre
famílias dos noivos, representa um avanço substancial na vida privada e uma proximidade maior
com o princípio da alteridade. Entretanto, embora aceita pela maioria dos segmentos sociais, a
união estável passou, as a sua legalização, a, especialmente no momento de separação,
envolver uma série de problemas que comprometem essa dimensão.
A união estável é um tema antigo, considerando-se seu tempo de existência, e novo, em
razão de seu reconhecimento jurídico. Está inscrito num contexto social que não é fixo; ao
contrário, é móvel e dinâmico, no qual a conjugalidade vem, através dos tempos e, especialmente
hoje, assumindo diferentes formas. A análise da relatividade cultural e histórica dessa dimensão é
importante uma vez que, do ponto de vista jurídico, para que uma relação seja considerada união
estável ela precisa, antes, ser reconhecida nesse âmbito como uma relação conjugal.
A união estável deve ser compreendida como um femeno inserido num contexto de
mudanças profundas em diversos setores da vida social, inclusive nas formas de conceber e
vivenciar a conjugalidade e a família, as quais na atualidade não estão necessariamente referidas
uma a outra. Existem hoje diversas formas de organizões familiares diferentes daquelas
representadas tradicionalmente pela composição pai-mãe-filhos. Assim como a paternidade e a
maternidade se dissociaram da conjugalidade, esta pode ser vivenciada de múltiplas maneiras,
dentro ou fora do casamento.
As transformações sociais ocorridas no período cuja demarcação se estende do final do
século dezenove até a segunda metade do século vinte tiveram implicações profundas no campo
da conjugalidade, especialmente no que se refere ao rompimento da tradição e à possibilidade de
existência de formas múltiplas de vivenciar a conjugalidade que se diferenciam da concepção
hegemônica representada pelo casamento. Essa possibilidade de se vincular conjugalmente a
alguém de uma maneira diferente do padrão tradicional vigente em outrora, sem ter como
conseência uma perda do reconhecimento social, e podendo, inclusive, se identificar
socialmente com pares que vivem da mesma forma, significa um avanço substantivo na maneira
de lidar com a conjugalidade no plano social e remete ao tema da alteridade fundamental tanto na
área de estudos da conjugalidade quanto na teoria das representões sociais.
43
A união estável pode ser entendida como uma nova forma de viver a conjugalidade livre
das imposições da tradição que impunha uma série de regras prévias como valor a ser seguido,
sob risco de discriminação, para que alguém iniciasse e mantivesse uma relação conjugal com
outra pessoa. A primeira dessas regras era a legitimação civil e, muitas vezes religiosa,
acontecida somente através do casamento. As relões conjugais mantidas fora dessa instituição,
mesmo por pessoas solteiras, eram alvo de desaprovação social e, conseentemente, legal, por
não serem vistas como conjugais no sentido próximo ao do casamento. Nessa trajetória
alternaram-se elementos considerados mais tradicionais e outros mais modernos nas
representões existentes a seu respeito.
A legalização da união estável é hoje um fato novo no campo da conjugalidade cujo
surgimento aponta para uma mudança nas práticas cotidianas tocantes a esse objeto. Se esse
arranjo, antes visto como concubinato, hoje é reconhecido por lei como entidade familiar, a partir
de uma exigência da presença da conjugalidade, tal existência legal foi possível a partir de sua
ocorrência crescente nas práticas. Em meio às mudanças sociais aceleradas houve um incremento
nas práticas sociais do número de pessoas vivendo juntas como casadas sem oficialização, ao
mesmo tempo em que houve também uma alteração da própria concepção do ser casado, agora
não mais sujeita às obrigações e deveres impostos pela tradição.
Giddens (2002) afirma que “em contextos sociais pré-modernos a tradição tem um papel
fundamental na articulão dos referenciais ontológicas e de ação(p.50). Segundo o autor, os
membros de todas as culturas, inclusive daquelas indubitavelmente mais tradicionais, fazem uma
distinção entre o presente, o passado e o futuro, e avaliam as trajetórias de ação alternativas em
termos de suas conseências em um tempo futuro provável. Contudo, acrescenta que onde os
modos de prática tradicionais são dominantes o passado introduz uma larga escala do que
denomina “prática autenticada do futuro. Não há nesse sentido um esvaziamento do tempo e, em
seus termos, um modo de ser” consistente relaciona o futuro ao passado.
Além disso, de acordo com Giddens (2002), a tradição cria uma sensação de firmeza dos
acontecimentos, o que, em geral, acontece através de uma combinação de aspectos cognitivos e
morais. Ele afirma que, de tal forma, o mundo é como é porque é como deve ser(p.50). Em
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tempos em que a vida conjugal estava como um todo submetida à tradição essa era a justificativa
utilizada para explicar regras e comportamentos sociais pré-estabelecidos – por exemplo, todo o
conjunto de comportamentos atribuídos, inclusive por lei, como atesta o antigo Código Civil, à
mulher casada e, ao mesmo tempo, lidar com os sentimentos de insatisfação provocada pela
discordância em relação ao modelo vigente.
Ao mesmo tempo em que a tradição tem como contrapartida um movimento contrário no
sentido de tentar rompê-la, uma vez que deixa pouco espo para a manifestação da liberdade
pessoal, propicia um sentimento de segurança em relação ao mundo social. Giddens (2002)
afirma que em muitas culturas tradicionais e em praticamente todos os sistemas religiosos
racionalizados existem concepções ontológicas, embora as mesmas possam estar em tensão
significativa com a realização das próprias práticas tradicionais. No momento em que a tradição
impunha uma única maneira de vivenciar a conjugalidade, através do casamento, tinha-se uma
sensação de segurança em relação à vida conjugal ao futuro, inclusive e, ao mesmo tempo,
um desconforto suscitado pela falta de liberdade pessoal para experimentar a vida a dois de outras
maneiras não tradicionais que se adequassem à vontade e ao estilo de vida de cada casal. Essa
tensão ocorreu em meio a um processo connuo de mudança social, dentro do qual houve nas
práticas cotidianas um aumento acentuado do número de uniões conjugais não oficiais, dando
origem ao advento da união estável, femeno jurídico novo.
1.2. A união estável e o namoro
A mudança social é um tema fundamental no tratamento de nosso objeto, primeiramente,
em razão deste se constituir como um acontecimento já existente e, portanto, antigo, e novo, as
seu reconhecimento jurídico. A união estável foi transformada em um novo arranjo conjugal pela
mudança nas práticas sociais tocantes a esse objeto que propulsionaram a legalização de um fato
freente no cotidiano – as uniões conjugais informais, antes consideradas concubinato. No
Direito de Família há uma concordância de que as práticas impulsionam o surgimento de leis,
visto que o legislativo busca uma sintonia com as sociedades, as quais, por sua vez, estão em
constante mudança.
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Uma das principais transformações ocorridas nas sociedades contemporâneas que, em
nosso entender, influenciou as representões e as práticas em relação ao nosso objeto, diz
respeito ao rompimento da tradição. O enfraquecimento dos referenciais tradicionais fez com que
o casamento – maneira tradicional de vivenciar a conjugalidade fosse progressiva e
acentuadamente substituída por um arranjo informal a união estável. É importante lembrar,
entretanto, que nesse processo de mudanças marcado pelo surgimento de novos arranjos
conjugais, familiares e amorosos, o casamento tradicional também se modificou – especialmente
no que se refere aos papéis sociais, ou papéis de gênero, desempenhados pelo homem e pela
mulher no relacionamento – assim como o namoro, etapa que tradicionalmente o antecedia.
O namoro é um tema importante visto que, por definição, precede a construção da
conjugalidade. Como afirma Chaves (1994), se o namoro tradicional estava necessariamente
ligado ao casamento, hoje há uma desvinculação entre ambos. Além disso, devemos ressaltar que
o namoro atual comporta uma série de vivências de compartilhamento do cotidiano, inclusive
aspectos da vida conjugal, que em tempos anteriores seriam consideradas pertinentes somente no
casamento. É importante considerarmos que a união estável está inserida em um contexto social
em que o namoro se transformou em algo por vezes muito próximo daquilo que do ponto de vista
social e até mesmo legal a caracteriza, fator este que, muitas vezes, dificulta o estabelecimento de
limites entre ambas as formas de relacionamento amoroso e a própria definição – inclusive
jurídica, apesar da legislação estabelecer uma série de características e requisitos indicadores da
união estável – do que atualmente está se considerando como união estável.
Convém ressaltar, entretanto, que essa incorporação de experiências conjugais no namoro
é algo recente, visto que, enquanto uma etapa que conduzia necessariamente ao casamento, essa
experiência era vivenciada de uma maneira tradicional. Chaves (1994) descreve esse padrão
tradicional de namoro vigente no início do século vinte, afirmando que no início do namoro era
vetado ao rapaz entrar na casa de sua namorada. Como relata a autora, a primeira fase do namoro
acontecia em segredo apesar de transcorrer em torno do lar em geral no portão ou no jardim –,
cuja retratação podemos observar em imeras músicas, filmes e novelas. A moça procurava
esconder da família, em especial do pai e dos irmãos mais velhos, seu interesse e encontros com o
rapaz. Ambos permaneciam em sigilo, sendo o interesse da jovem compartilhado as algum
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tempo somente com a mãe e as empregadas domésticas, que naquela época eram uma espécie de
segunda-mãe ou mãe substituta, mantendo com a mesma uma relação de cumplicidade que se
revelava, em geral, muito distante da relação entre patrões e empregados observada nos tempos
atuais.
Curiosamente, a autora revela que havia nessa primeira fase do namoro, especialmente
por parte do pai daquela que se encontrava namorando, uma simulação do desconhecimento a
respeito do namoro de sua filha, não sendo esse assunto sequer mencionado dentro do convívio
familiar. Por conseguinte, a aceitação do rapaz na casa dos pais de sua namorada era
imprativel. Isso só acontecia quando havia entre o casal de namorados indícios de um
compromisso merecedor de confiança, um comprometimento, o que equivaleria a uma promessa
de casamento.
Havia nessa época descrita por Chaves (1994) uma moral social rígida vigente e uma
expectativa social ligada ao cumprimento de regras de comportamento sexual cabíveis
esperados e cobrados a uma “moça de família”. Os irmãos zelavam pela honra de suas irmãs, e
conseentemente pelo bom nome de sua família, afastando-as dos rapazes considerados mal-
intencionados. Ao pai, por sua vez, era permitido determinar o término do namoro da filha caso
julgasse necessário, o que acontecia muitas vezes por razões morais ou por diferenças sociais que
impedissem o futuro casamento. A obtenção de condições ecomicas para pedir a jovem em
casamento era o que determinava o fim da primeira fase do namoro – escondida – que estava
condicionada a esse fator. Essa fase poderia durar meses ou se alongar durante anos até que o
rapaz obtivesse tais condições financeiras. Somente um rapaz dotado de integridade moral e de
condições financeiras suficientes, indicadores de uma promessa de casamento, poderia pedir em
casamento sua escolhida, passando a freentar a sua casa (CHAVES, 1994).
Apesar do controle social exercido sobre o casal permanecer durante todo o namoro,
numa fase posterior, com o compromisso firmado, era possível desfrutar de um nível de prazer
maior do que no início do namoro, momento em que era recomendado à jovem estar atenta a
cautelas, ditadas pelo recato, pelo pudor e pela necessidade de avaliar as intenções do
pretendente. Ser cautelosa significava ter comedimento na relação com um rapaz, evitando uma
47
aproximação física imediata com o mesmo. O contato físico entre os namorados deveria
acontecer progressivamente e, mesmo assim, com cautelas, uma vez que a preservação da honra,
da reputação e da pureza representada pela virgindade eram o objetivo principal do controle
vigente na época (CHAVES, 1994).
De acordo com Chaves (1994), a virgindade constituía o bem supremo de troca para o
matrimônio(p.23). Isso implica que, ao mesmo tempo em que havia uma série de exigências a
serem cumpridas para que um rapaz fosse aceito como namorado de uma moça
, essa precisava,
em contrapartida, ser virgem, e permanecer assim até o casamento, para conseguir um bom
maridosegundo os valores vigentes na época. Aquela que não obedecesse a esse preceito moral
era discriminada socialmente, incidindo sobre ela o estereótipo de “moça oferecida, que em
decorrência dessa forma de ser tornava-se “falada” em seu meio social, dificultando a obtenção
de um namoro com um rapaz de boas intençõese, conseqüentemente, de um casamento.
O noivado era a fase posterior ao namoro e, assim como esse, podia durar meses ou anos.
Era, segundo Azevedo (apud CHAVES, 1994) o momento de “...ajustes e entendimentos entre os
futuros esposos ou entre suas famílias e, ainda, entre intermediários socialmente definidos
(p.24). A existência de um namoro ou de um noivado que não resultasse em casamento
acarretaria graves danos à reputação da jovem. O namoro e, posteriormente, o noivado, levavam
obrigatoriamente ao casamento. O caráter experimental do namoro, presente em nosso tempo não
existia, visto que o ato de namorar por namorarretirava-lhe o bom nome, assim como namorar
mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Não era bem vista, inclusive, a moça que tivesse tido
muitos namorados, ainda que sucessivamente, pois o namoro deveria ocorrer somente “para
casar.
Atualmente, entretanto, ainda que possam permanecer em determinados segmentos
sociais resquícios desse padrão tradicional de namoro vigente no início do século vinte, o namoro
é revestido de caráter vivencial, de experimentação, onde o casamento não é um fim obrigatório,
podendo todo o conjunto de experiências que ele comporta ser revestido de provisoriedade
(CHAVES, 1994). A fase de namoro passou, com o aval da própria psicologia, a ser considerada
um momento importante em toda a vida, marcando especialmente o período da adolescência.
48
Apesar de estar ainda relacionada à escolha conjugal, no que sem dúvida é fundamental, é uma
fase em si mesma importante sendo possível uma pessoa, mesmo jovem, ter várias experiências
de namoro e fazê-lo pelo prazer da relação.
Chaves (1994) atribui o fato do namoro atual ser vivido com maior liberdade à diminuição
da interferência familiar. Nos termos de Giddens (2002), poderíamos dizer que o namoro atual é
algo que, por se encontrar dentro de um projeto de reflexividade moderno, é sempre possível de
ser revisável. A liberdade de escolha é, nesse sentido, fundamental tanto na escolha dos pares
afetivos quanto na decisão de pôr fim ou dar continuidade à relação. Antes, além dos preceitos
morais, segundo Chaves (1994), era desejável que as famílias dos futuros cônjuges fossem
equivalentes em termos de educação, cultura, nível social, religião e identidade. Como afirma a
autora (1994), o namoro não tinha um fim em si mesmo e não era considerado passatempo ou
gozo de satisfações imediatas da afetividade” (p.24).
Esse namoro não era composto de nenhuma característica que permita caracterizá-lo como
conjugal. As etapas que compunham sua trajetória até o casamento eram bem definidas e
subseentes. Hoje, contudo, é possível, e até mesmo freqüente, a existência de um namoro
quase conjugal, no qual os namorados têm conta bancária conjunta, coabitam regularmente,
etc., elementos que, por sua vez, podem ser considerados indicadores legais da união estável.
Apesar da lei deixar claro que a união estável é um arranjo que, como o próprio nome diz, para
ser reconhecido necessita ter como característica a estabilidade, o que, a princípio a diferenciaria
do namoro, pois não poderia estar revestida de um caráter instável, a presença de aspectos ligados
à conjugalidade faz com que esse arranjo se situe muitas vezes numa posição fronteiriça com
namoro.
A dificuldade de definição de um limite entre o namoro e a união estável tem causado
uma série de problemas jurídicos ligados a esse arranjo. A existência de relações de tipologia
indefinida – que, em razão disso, não são sequer nomeadas é um femeno próprio de nosso
tempo que tem propiciado uma diferença de gênero na percepção do relacionamento vivenciado
pelo casal, seja ele união estável ou namoro. Em uma relação cujo caráter não esteja bem
definido, é possível um entendimento diferente por parte dos membros do casal quanto à sua
49
natureza, sendo comum como atestam alguns operadores do Direito (informação verbal)
1
, o
homem considerar que está namorando, e a mulher considerar que está vivendo em união estável.
Diferentemente do que acontece no casamento – forma de relacionamento conjugal
tradicional e bem definida, com um início marcado por um ritual civil e/ou religioso – a união
estável é atravessada por outra forma de relação amorosa – o namoro – trazendo um problema de
indefinição no qual o estabelecimento de limites entre ambas nem sempre é fácil. Algumas
relões, ao mesmo tempo em que escapam de uma definição de namoro compreendido como
uma relação amorosa que precede o estabelecimento do vínculo conjugal e, portanto, não o inclui,
são difíceis de serem encaixadas em uma definição de união estável, pois se, por um lado, têm
indícios de um relacionamento conjugal, por outro, fogem da definição de um homem e uma
mulher vivendo juntos, com reconhecimento social como se casados fossem.
Observa-se na atualidade a existência de alguns relacionamentos que ficam numa posição
fronteiriça entre o namoro e a união estável. Neles, concomitantemente, alguns elementos
indicadores desta forma de relação estão presentes e outros, não. Hoje é possível que um casal de
namorados viva sob o mesmo teto, o que em conjunto com outros elementos, é considerado um
indicador da existência da união estável. Por outro lado, é preciso considerar que o próprio
casamento se modificou, sendo possível hoje aos cônjuges mantê-lo vivendo em casas separadas.
Da mesma forma, é possível viver em união estável sem coabitar, o que, em uma análise parcial
poderia ser considerado namoro. Essas mudanças nas práticas tocantes ao namoro e ao
estabelecimento do vínculo conjugal no casamento e, em especial, na própria união estável,
tornam, em alguns casos, o estabelecimento de limites entre esse arranjo e o namoro algo bastante
complexo. O enfoque interdisciplinar especialmente no que se refere às abordagens do Direito
de Família e da Psicologia é, nesse sentido, de grande importância na tentativa de lidar com os
problemas trazidos por essa nova realidade social.
De acordo com Chaves (1994), o namoro atual comporta uma série de variões,
permanecendo nele, entretanto, um aspecto do namoro tradicional: o compromisso. Essa
1
FONTENELLE, C. Seminário Direito de Família Mudanças na Lei e nos Costumes: uma visão interdisciplinar.
Agosto, 2003.
50
afirmação nos permite fazer um paralelo com Giddens (2002), visto que, segundo este autor, as
relões puras, modelo das novas esferas da vida social, pressupõem o “compromisso, que é
uma espécie particular de confiança. Ele ressalta, entretanto, que o mesmo deve ser entendido
como um femeno do sistema internamente referido, ou seja, é um compromisso com a relação
enquanto tal, assim como com a outra ou as outras pessoas envolvidas.
1.3. A união estável e o ficar
Nesse processo de transformações sociais marcado pela emergência de novos arranjos
conjugais e amorosos, Chaves (1994) aponta, no final da década de oitenta, o surgimento do ficar,
um novo código de relacionamento ocorrido principalmente entre jovens que, segundo ela, não
pode ser definido como um namoro efêmero ou um pré namoro, uma vez que existe por si só e
independente de qualquer forma de vínculo existente entre os participantes da interação. O ficar
engloba uma variedade de usos e tipos e pode ser experimentado com várias finalidades. Todavia,
embora pareça escapar a qualquer definição próxima de formas de relacionamento amorosos já
conhecidas, segue alguns princípios.
Chaves (1994) afirma que o primeiro princípio presente no ficar é a falta de compromisso.
Diz respeito à possibilidade de aproximação física entre duas pessoas, de estar momentaneamente
com alguém, sem que isso implique um compromisso de qualquer espécie. Segundo a autora, o
segundo princípio que rege o ficar está ligado a essa falta de compromisso, sendo, entretanto,
mais importante do que ela. Diz respeito à ruptura entre prazer e compromisso introduzida por
essa forma de relacionamento. É importante lembrar nesse sentido que o namoro tradicional tinha
como objetivo o casamento e era composto de uma série de fases e regras em geral normas de
conduta, algumas gerais e outras específicas a cada fase – que progressivamente encaminhavam
os futuros cônjuges para assumir a condição de casados e os papéis sociais inerentes a tal posição.
As regras específicas de cada fase do namoro estabeleciam o que em cada uma delas era
permitido, especialmente à mulher, em termos de comportamento.
Chaves (1994) define o ficar como um ato relativamente mecânico desencadeado por
atração física, desejo, vontade, beleza. A autora ressalta que nem sempre o mesmo é originado a
51
partir de uma vontade inequívoca, de um desejo expcito. Esse comportamento pode, ocorrer
impulsivamente, por vontade superficial; como uma descarga de ordem biológica. É um ato mais
da ordem da ação do que da reflexão, algo que naturalmente acontece. Nele, o desejo, seja qual
for sua natureza, está prioritariamente ligado ao momento e implica uma ação.
No ficar o peso da transgressão é diminuído e a violação de regras e regulamentos é
valorizada. Nesse tipo de relacionamento não existem regras de comportamento bem delimitadas
e rígidas. Essas são flexíveis e fluidas. Tal fluidez das regras e regulamentos permite que essas
possam ser desatadas a qualquer momento, gerando, paradoxalmente, uma sensação de mal-estar
interior (CHAVES, 1994).
Outro princípio presente no ficar destacado por Chaves (1994) é a negão da alteridade,
isto é, a negação do outro como indivíduo singular. No ficar o sujeito não está voltado para o
outro como o ser dotado de peculiaridades, de uma identidade própria. O outro é alguém que tem
como função satisfazer um desejo inespecífico. Essa desconsideração do outro como pessoa
singular dá origem a um quarto princípio presente nessa forma de relacionamento: a possibilidade
de troca de pares sem dificuldades e a qualquer momento.
É interessante notarmos que a descartabilidade é uma prática cada vez mais comum
dentro das sociedades modernas. A velocidade das trocas ocorridas nesse cenário não se restringe
somente aos bens de consumo, mas atinge também plano da afetividade. Troca-se também de
relões com grande rapidez. Somando-se ao fato de não se ter atualmente referenciais externos
suficientemente fortes para sustentar uma relação conjugal como aponta Giddens (2002) – o
sentimento de permanência não é algo moderno, um dos fatores que torna cada vez mais difícil a
vida em comum. Ao invés da tentativa de solução de conflitos, a atitude mais comum adotada por
marido e mulher é descartar o companheiro(a).
O ficar, o namoro e todas as formas de relação amorosas e conjugais estão situadas dentro
de uma sociedade caracterizada, segundo Lipovetsky (2004), pelo movimento, pela fluidez e pela
flexibilidade. Assim, conforme Chaves (1994), é possível entender o ficar como distante da
corrente afetiva, preocupado com a quantidade e a variedade, visando aos prazeres imediatos e à
52
satisfação de desejos, visto como passatempos, o ficar comse insere no campo das
experimentões(p.36).
Embora, guardadas suas especificidades como arranjo conjugal, a união estável está, em
alguns casos, próxima do namoro, chegando a gerar, nas práticas e entre os operadores do
Direito, dificuldades concernentes à delimitação de ambas as formas de relação. Observamos que
a experimentação elemento componente do namoro atual e, de maneira ainda mais acentuada, do
ficar, também se faz presente nesse arranjo. Ainda que a escolha do companheiro seja algo, na
maioria das vezes, feita com base no sentimento amoroso, é preciso considerar que, algumas
vezes, ela também ocorre tendo por base a experimentação, o que flexibiliza o compromisso
necessário a uma relação que se proponha e, dessa forma, possa ser reconhecida como conjugal.
Dessa compreensão resultam imeros problemas no convívio do casal cujo desmembramento
ocorre na justiça.
Esse atravessamento da união estável por aspectos constituintes de outras formas de
relação remete à contextualização desse femeno necessária ao seu entendimento como
realidade psicossocial. Vale lembrar que ao longo de um percurso histórico a vida privada sofreu
uma série de transformões substanciais que imprimiram uma marca na subjetividade,
fornecendo uma forma compartilhada por determinados grupos sociais para as pessoas se
relacionarem afetivamente e estabelecerem a vida conjugal. Esse processo de transformões
atingiu as várias formas de relação amorosa tradicionais, como o casamento e o namoro, e fez
surgir outras contemporâneas, como o ficar. A união estável, acontecimento comum nas práticas
cotidianas, passou a ser um femeno jurídico novo. Esse arranjo, assim como as outras formas
de relação amorosa e conjugal, mescla em sua constituição elementos tradicionais e modernos, e,
por vezes, alguma característica que a aproxima de outros tipos de relação, uma vez que está
submetida ao contexto social que a fez emergir e lhe fornece uma conformação específica em
cada época e cultura.
53
1.4. O individualismo e suas implicações na conjugalidade e na família
1.4.1. Individualismo e família
O reconhecimento da união estável como entidade familiar torna necessário que no estudo
das representações sociais desse objeto se trate também da família. Nesse sentido, devemos
considerar, primeiramente, que a união estável se ancora sobre uma visão social do indivíduo que
encontra na família um lugar privilegiado de construção. Em diversas fontes teóricas
encontramos um reconhecimento – revelado através de um interesse principal ou secundário –
acerca do papel da família na constituição do sujeito e, conseentemente, do seu modo de “ser
e de agir no mundo. Na ótica das representações sociais podemos afirmar que esse funcionamento
do sujeito diz respeito ao modo como o mesmo representa os objetos sociais e, associado a esse
processo, constrói uma prática para lidar com os mesmos. Duveen (1998), ao examinar as
questões relacionadas à representação da alteridade sob a perspectiva do desenvolvimento ou sob
a perspectiva genética, demonstra o papel da família na construção das representações sociais.
Além disso, a união estável foi reconhecida como entidade familiar num momento social
em que, como afirmam Dias e Pereira (2002), tendo havido uma dissocião entre sexo,
casamento e reprodução – elementos estruturantes da família –, faz-se necessário que se repense
o conceito de família. Entretanto, os juristas ressaltam que, apesar do casamento ter passado a
não constituir o único meio de legitimar as relões afetivas, permanece irrefutável a premissa
de que a família ainda é o que sempre foi e será: a célula básica da sociedade, ponto de partida a
possibilitar o desenvolvimento das outras relações sociais(p.3).
Ao investigarmos como a união estável é representada pelos quatro grupos distintos
abordados em nossa pesquisa e onde ela se ancora se mais no concubinato ou mais no
casamento – é interessante observarmos se esse arranjo é visto como uma relação menos
comprometida até mesmo uma espécie de namoro, por exemplo – ou mais comprometida. E,
caso esteja mais próxima seja do concubinato ou do casamento, se ela é vista como família, como
prevê a lei. Acreditamos que em termos sociais mais globais possa haver uma variação nesse
sentido, uma vez que o próprio casamento não é hoje visto como algo que ocorre necessariamente
54
com o intuito de construção da família, ao mesmo tempo em que essa pode existir independente
do casal estar ou não casado. A idéia de família se distanciou do casamento a ponto de existirem
e serem reconhecidas por lei as ditas famílias afetivasformadas, como o próprio nome diz,
por pessoas unidas apenas por los de afeto.
A opção pela união estável como forma de relação conjugal teve seu incremento em meio
a um processo de transformões sociais em que, no tocante à conjugalidade, a idéia de escolha
individual prevalece sobre outras noções ditadas pela família, igreja e Estado, ainda que essas
possam estar – de maneira secundária ou periférica – presentes nessa escolha. Giddens (2002)
afirma que uma vez que a noção de estilo de vida implica em uma escolha dentro de uma
variedade de opções possíveis e é adotado, muito mais que outorgado, a mesma não era muito
aplivel em culturas tradicionais. Nessas havia uma forma hegemônica de representar e lidar
com a vida conjugal, não existindo um estilo de vida que sustentasse outras práticas diferentes do
casamento, uma das razões pela qual a união estável considerada então concubinato – era
discriminada. De acordo com diversos autores que tematizam acerca das relões amorosas e/ou
conjugais na atualidade especialmente Calligaris (1994), Costa (1998), Bauman (2004) e o
próprio Giddens (2002) a amorosidade parece, muitas vezes, suplantar a necessidade de
construir uma família no processo de busca ou, efetivamente, de construção da conjugalidade.
Em se tratando da vivência de uma relação amorosa ou conjugal, o sentimento de bem-estar
individual decorrente da satisfação com a mesma demonstra ser o aspecto fundamental.
Singly (2000) faz uma análise das conseências do nascimento do que denomina
indivíduo individualizadona vida conjugal e familiar. Ele aponta a necessidade da sociologia e
da antropologia buscarem uma interpretação dos femenos emergentes nas sociedades
contemporâneas, mantendo-se dessa forma fiéis ao seu objetivo, o qual não seria meramente
descritivo.
Singly (2000) afirma que, diante de mudanças que a família vem atravessando a partir da
segunda metade do século vinte, especialmente nas sociedades ocidentais, como o decréscimo
das famílias numerosas e dos casamentos, o crescimento das uniões consensuais – o termo
55
utilizado pelo autor é concubinagens –, dos dircios, das famílias pequenas ou nucleares, das
famílias monoparentais, das famílias recompostas e do ingresso da mulher no mercado de
trabalho, não é possível ao pesquisador contentar-se em observá-las e sim analisá-las através de
uma orientação teórica.
O autor busca assim compreender o funcionamento das famílias contemporâneas na
França e nos países ocidentais no que se refere a uma nova concepção dos indivíduos em relação
aos seus grupos de pertencimento, em especial, à família. É importante aqui destacar que o estudo
das representações sociais se faz em duas dimensões: de contexto e de pertencimento, ambas com
igual importância, sendo sempre uma ou outra priorizada nos estudos feitos nessa área. O
sentimento de pertencimento é originado pelas próprias representões sociais que, quando
construídas, são compartilhadas pelos grupos sociais dando um sentido comum aos objetos aos
quais se referem.
Singly (2000) afirma que, ao contrário do que parece, os indivíduos integrantes das
sociedades contemporâneas diferem dos indivíduos das gerões precedentes. Ele afirma que por
diversas razões simultaneamente ideológicas e objetivas as sociedades contemporâneas
impuseram o surgimento de um indivíduo original, isto é, que respeita sua verdadeira natureza.
Ele afirma que a crença de que no fundo de si mesmo, mais especificamente “nas profundezas do
ser, se esconde uma identidade pessoal, o eu verdadeiro – que ele denomina mito da
interioridade se construiu de forma lenta no Ocidente, até se tornar uma evidência normativa
para cada membro da sociedade. A esta exigência juntou-se ainda um outro imperativo: o de ser
autônomo.
É interessante atentarmos nesse sentido para o fato de que, se na modernidade esse
imperativo conduz ao modelo de autonomia, de emancipação e de liberdade, atualmente, exceto
nas sociedades coletivistas, os indivíduos vivem cada vez mais sozinhos. E, o sentimento
decorrente dessa consciência de estarem eminentemente sozinhos vem se tornando cada vez mais
lugar de sofrimento psíquico. A solidão se apresenta como um problema moderno que atinge as
pessoas em escala mundial, sendo alvo de estudos e nocias na maioria das sociedades, como
demonstra o artigo de Gautier (1996), no qual ele analisa as razões da solidão na França, e a
56
recente matéria publicada pelo Jornal O Globo, em 10 de junho de 2005, revelando os resultados
de uma pesquisa cujos dados demonstraram que, quanto maior a classe social e o nível de
escolaridade, maior o índice de mulheres vivendo sozinhas no Rio de Janeiro. Bauman (2004)
afirma a esse respeito que se em nossa época, a qual denomina “modernidade quida”, a solidão
produz insegurança, da mesma forma os relacionamentos também o farão. Segundo ele, ao
vivenciarem uma relação afetiva os sujeitos podem se sentir até mais inseguros do que estando
sozinhos. Viveriam, assim, a ansiedade em outro contexto, o da relação afetiva. O que mudaria
seriam as denominações dadas a esse sentimento.
É fundamental destacar que a solidão é um tema que está diretamente ligado a outro tema,
da conjugalidade. Na contemporaneidade, ainda que o individualismo tenha trazido
conseências positivas para vida social, como maior consciência dos direitos civis e da
cidadania, trouxe também para o âmbito da vida afetiva uma perda do suporte emocional e uma
dificuldade crescente de manter relões afetivas a longo prazo. Tal consideração permite
situarmos uma primeira acepção de individualismo, proposta por Guareschi (1998). Fazendo uso
do sentido etimológico do termo, o autor afirma que ...o indivíduo é o indivisum in se, sed
divisum a quolibet alio, isto é: indivíduo é alguém que é uno, indiviso em si mesmo, mas que é
separado, isolado de todo o resto(p. 152).
Singly (2000), contudo, entende esse processo como uma procura de si que não é algo
narcísico, mas, ao contrário, exige uma atenção do olhar dos outros. E, cita Bobin, que afirma que
na vida, só se tem a aprender a si mesmo. Nada mais há a conhecer. Mas, adverte: “é claro que
não se aprende sozinho. É preciso passar por uma outra pessoa para chegar às profundezas de si.
Por um amor, uma palavra, um rosto ...
(p.14).
Singly, então, prossegue afirmando:
O indivíduo precisa assim, para tornar-se ele mesmo, do olhar das pessoas a que ele
atribui importância e sentido. Esses outros significativos são, freqüentemente,
o cônjuge
ou o parceiro
para um homem ou uma mulher, os pais para os filhos (e reciprocamente),
ainda que outros próximos possam preencher tal função. (BOBIN, 1996 apud SINGLY,
2000, p.14, grifo nosso)
57
Essa afirmação, além de trazer a noção de outro significativo, amplamente utilizada em
psicologia, abre caminho para a associação entre individualismo e o sentimento amoroso tal
como concebido nas culturas ocidentais. Singly (2000) atribui uma função central assumida, ou
que deveria ser assegurada, pela vida privada na atualidade, momento em que, segundo ele, uma
grande parte da identidade dos indivíduos é construída no espo onde circula o amor. Ele afirma
que nas sociedades individualistas a família assume para si a função de tentar consolidar
permanentemente o eudos adultos e crianças.
É importante considerarmos que em sociedades mais coletivistas como as Hindus, por
exemplo, há uma ausência da noção de indivíduo e, portanto, no que se refere à conjugalidade
, a
escolha do outro – o cônjuge ou companheiro(a) acontece através de outros critérios e
fundamentos, não ligados a um sentimento amoroso, sendo o amor considerado um elemento
indesejável na situação conjugal. A organização do casamento e dos arranjos conjugais sobre essa
visão social do indivíduo, tal como ocorre em nossa cultura, torna-se impossível nessas
sociedades hierárquicas e hosticas.
Essa compreensão do individualismo como âncora dos processos sociais é importante
para a psicologia social. Aronson, Wilson e Akert (2004), ao analisarem a influência da cultura
sobre o erro fundamental de atribuição, encontraram evidências de que na avaliação de uma dada
situação social, no que podemos incluir situões de vida conjugal, sociedades mais coletivistas
tendem a considerar as variáveis do ambiente situacionais como responsáveis por aqueles
fatos, ao passo que culturas mais individualistas colocariam a responsabilidade por aquele evento
nas pessoas envolvidas.
De acordo com Singly (2000) a família mudou para produzir esses indivíduos. Ele afirma
que embora na França a dita “revolução dos costumesnão tenha começado em 1968 –
considerado por muitos como o período das grandes transformões sociais essa época está,
segundo ele, associada a mudanças significativas como a diminuição do casamento, o aumento da
coabitação e principalmente do dircio. Segundo Torres (1999), as intensas transformações
sociais estão relacionadas ao aumento do dircio, fazendo dele uma realidade comum nas
sociedades. Nesse sentido os dados estasticos apontam para uma “crise do casamento
58
contemporâneo(JABLONSKI, 1998), na qual o individualismo está entre as principais causas já
citadas anteriormente. Entretanto, em uma perspectiva diferente adotada também por grande parte
dos autores, inclusive pelo Direito de Família, Goldemberg (2002) interroga-se haveria de fato
uma crise da família ou o surgimento de “novasfamílias, na medida em que o conceito
tradicional de família se esvaziou em meio às mudanças sociais.
Singly (2000) aponta o final dos anos 60 como uma época importante para
compreendermos as problemáticas de nossa época, na medida em que na mesma evidencia-se um
compromisso entre as reinvidicações dos indivíduos em se tornarem autônomos e seus desejos de
continuarem a viver, na esfera privada, com uma ou várias pessoas próximas. Esse desejo
conflitante de liberdade, autonomia e, por vezes, não compromisso e, ao mesmo tempo, de
vivenciar a vida conjugal e/ou ter uma família constitui um dos principais dilemas subjetivos de
nossa época, revelado nos discursos cotidianos e nos resultados de pesquisas que os tomam como
base empírica. Singly denomina assim de família individualista e relacional aquela modalidade
existente do início do século vinte até os anos 60, cuja principal característica era a divisão
tradicional dos papéis de gênero. Nesse tipo de família existe a idéia de que a família feliz
permite a cada um dos membros ser feliz. A instituição do casamento é valorizada, uma vez que
ela é concebida como o melhor meio para garantir esses objetivos.
Nesse período, conforme demonstra a legislação – especificamente o antigo Código Civil,
datado de 1916 –, a união estável era ainda considerada concubinato e, portanto, enquanto uma
relação ilegítima, não era vista como um arranjo conjugal – no sentido atual, próximo ao
casamento – e, sobretudo, como família. Um sinal desse não reconhecimento evidenciava-se,
muitas vezes, através do casamento do casal que vivia em união estável a partir do nascimento de
um filho, prática que na atualidade tem diminuído significativamente. As transformões sociais
ocorridas a partir da segunda metade do século vinte propiciaram uma mudança nas
representões acerca da união estável que se refletiram no plano jurídico, onde modificou-se
também o enfoque dado à família, possibilitando, em conseência disso, o reconhecimento da
união estável como entidade familiar.
59
Dias e Pereira (2002) descrevem a família existente no início do século passado como
“constituída unicamente pelo casamento, verdadeira instituição, matrimonializada, patriarcal,
hierarquizada, e heterossexual(p.5). Os juristas afirmam que a legislação vigente regula esse
tipo de família, mas enfatizam que o moderno enfoque dado a essa entidade se volta
prioritariamente para a identificação dos vínculos afetivos que tecem e consubstanciam sua
formação. O reconhecimento da união estável entre homem e mulher como entidade familiar se
insere nessa proposta.
1.4.2. Individualismo e conjugalidade
Singly (2000) designa as famílias atuais pela denominação modernas 2. Nesse tipo de
família os cônjuges só ficam juntos sob a condição de se amarem. Esta família se distingue da
anterior pela maior importância dada ao processo de individualização. A família se transforma
em um espo privado a serviço dos indivíduos, como demonstram os indicadores do nível da
relação conjugal, com a maior independência das mulheres, a possibilidade do dircio por
consentimento mútuo (na França, em 1975), etc.
Essa definição de família vai ao encontro do conceito de relação pura, relação social que
é internamente referida, isto é, depende fundamentalmente de satisfações ou recompensas
genéricas dessa própria relação(GIDDENS, p.223). Nesse contexto viver junto pode ter um
caráter experimental não permitido em outras épocas e, caso essa tentativa não dê certo ou não
traga a satisfação almejada, a separação é solução encontrada em primeiro plano. Bauman (2004)
faz uma importante consideração a esse respeito ao afirmar:
Em nosso mundo de furiosa “individualizaçãoos relacionamentos são bênçãos
ambíguas. Oscilam entre o sonho e o pesadelo, e não há como determinar quando um se
transforma no outro. Na maior parte do tempo, esses dois avatares coabitam embora
em diferentes níveis de consciência. No quido cenário da vida moderna, os
relacionamentos talvez sejam os representantes mais comuns, agudos, perturbadores e
profundamente sentidos da ambivalência. É por isso que se encontram tão firmemente no
cerne das atenções dos modernos e quidos indivíduos-por-decreto, e no topo de sua
agenda existencial.
(p.8-9)
60
Singly (2000) também aponta na família “moderna 2, composta com a individualização,
um paradoxo que podemos considerar moderno: ela é forte, pois é desejável pela maioria das
pessoas, e frágil pois não há como prever a sua durabilidade. Essa constituição familiar deve,
segundo o autor, ser designada de “relacional e individualista”, tensão em que se constroem e se
desfazem as famílias contemporâneas.
Leis e Costa (2000) argumentam que, além das tensões decorrentes do conflito entre as
exigências da vida pública e as demandas pessoais-emocionais haveria uma tensão potencial
interna dentro da própria órbita privada, motivada pela transformação radical da mulher dentro da
família. A família nuclear teria se sustentado até os anos sessenta pelo sacrifício dos direitos da
mulher, colocados em segundo plano ou mesmo anulados e esquecidos em nome de uma suposta
felicidade familiar, ideal apontado anteriormente na família feliz. De acordo com os autores:
Quando a mulher emerge, entretanto, como sujeito de sua própria biografia, alguém que
também percebe um leque de possibilidades para a construção de sua própria trajetória
pessoal, as dificuldades de manutenção do matrimônio e da família: aquelas tensões mais
geral entre as exigência sistêmicas e as demandas emocionais-pessoais passam a ter na
família um universo particular de manifestação. (p. 113)
Não obstante, Leis e Costa (2000) afirmam que justamente são essas dificuldades de
sobrevivência da família contemporânea, que poderiam favorecer um descrédito dessa entidade e
reduzir sua importância, que fazem crescer o valor a ela atribuído. Tal afirmação está de acordo
com dados de pesquisas atuais na área do casamento e da família como as de Goldemberg
(2002) e Brito (2005) – os quais revelam que é a forma tradicional e não a vida conjugal e
familiar em si mesma que está sofrendo descrédito. Apesar da fragilidade do vínculo conjugal em
nossa época, revelada através do grande mero de separões e dircios e de pessoas vivendo
sozinhas, observa-se nas últimas décadas um aumento acelerado dos novos arranjos conjugais e
familiares.
O reconhecimento legal da união estável como entidade familiar acompanha as mudanças
sociais que, por seu turno, tiveram como conseência uma mudança das representões de
casamento e de família. Dentro desse cenário de mudanças reafirma-se a vontade de ter uma
61
família e a importância do amor como base das relações afetivas e familiares, razão principal de
sua existência. Citando Beck e Beck-Gersheim, Leis e Costa (2000) afirmam quanto à
importância do amor:
Ao lado do incremento do significado da família, cresceriam também o prestígio e a
aposta no amor. O contexto contemporâneo de riscos e incertezas levaria ao triunfo da
relação amorosa como depositária de todas as esperanças, o amor tornou-se ... nossa
alternativa à dúvida: é o lugar no qual esperamos encontrar segurança, o último refúgio.
(p.113)
Lipovetsky (2004) afirma que o amor, assim como todos os valores relacionais que, em
grande parte, constituem a riqueza da vida privada na “hipermodernidade” termo utilizado por
ele para se referir à terceira fase da modernidade iniciada a partir dos anos oitenta, a qual
denomina era do hiper –, é um donio que escapa à esfera do lucro. Segundo o autor, no mesmo
momento em que a relação com o mundo dos objetos e dos seres é revestida de um caráter
predatório, o amor se apresenta como um donio que funciona de forma desinteressada. O
donio do dinheiro não destruiria a afetividade, mas, ao contrário, daria a ela sua total
legitimidade, numa tentativa de resgatar alguma inoncia perdida num mundo cada vez mais
regido pela eficácia e pela racionalidade.
Os termos amor, paixão, enamoramento e outros correlatos são usados, muitas vezes,
como sinônimos, mas é importante que se faça, ao falarmos de amor, um esclarecimento acerca
de que tipo de sentimento estamos nos referindo, e de suas implicações na família e
conjugalidade contemporâneas. Pode-se afirmar que, mesmo na família individualista e relacional
a “família feliz–, o lo conjugal se ancora em algum tipo de sentimento que muito difere do
amor, cuja exigência se faz presente em qualquer projeto de relação concebido na atualidade.
De acordo com Bauman (2004), a definição romântica de amor ligada a um ideal de
manutenção da relação “até que a morte nos separe” está fora de moda, tendo deixado de existir
em função da radical alteração das estruturas de parentesco às quais servia de sustentação e de
onde extraía sua valorização e força. E, questionando o sentimento amoroso na atualidade,
ressalta:
62
[...] o desaparecimento dessa noção significa, inevitavelmente, a facilitação dos testes
pelos quais uma experiência deve passar para ser chamada de amor. Em vez de haver
mais pessoas atingindo cada vez os elevados padrões do amor, esses padrões foram
baixados. Como resultado, o conjunto de experiências às quais nos referimos com a
palavra amor expandiu-se muito. (p.19)
O amor é um aspecto considerado importante por muitos autores para a análise da
vivência conjugal na modernidade. Cabe destacar, entretanto, que quando nos referimos ao amor
podemos afirmar, com base em fontes teóricas distintas, que, na modernidade, o sentimento
amoroso que predomina é a paixão. Embora seja algo, na maioria das vezes, efêmero, a mesma é
entendida como uma espécie idealizada e intensa de amor, sendo denominada também amor-
paixão (JABLONSKI, 1998) ou amor-romântico (COSTA, 1998).
De acordo com Costa (1998), o mito do amor-romântico, nascido com o surgimento de
uma classe média na Europa ainda no século XIV, firmou-se como um molde imaginário de todo
o modo de amar do Ocidente moderno, fazendo do casamento e da família lugar de sua
culminância. O autor afirma que, através dele, o sentimento de insegurança constitutivo da
subjetividade moderna se ancora. E prossegue, definindo-o como uma forma de interação
emocional e de construção de identidades pessoais totalmente moderna, envolvendo idéias
específicas sobre sexo, gênero e casamento que começaram a se difundir e ganhar credibilidade a
partir do século dezenove.
Em relação à conjugalidade observamos, em termos sociais, a construção de uma teoria
em que a idéia de amor tem um papel central, chegando o mesmo a ser apontado como fator
fundamental para a realização e manutenção de um vínculo conjugal satisfatório (ENNES, 1996).
Conforme Costa (1998), podemos afirmar que tal emoção tem em comum com as crenças o seu
aspecto cognitivo, e com desejos e ações o fato de possuir finalidades estratégicas.
De acordo com Calligaris (1994), “a conjugalidade sofre de um sonho ou de um
imperativo moderno, pelo qual não estamos mais dispostos a escolher nossos parceiros mais
significativos a não ser por paixão...(p.2). A construção da conjugalidade moderna se ancora
sobre essa forma intensa de amor e, apesar das mudanças sociais e dos avanços cienficos e
tecnológicos, as pessoas aiam seus sistemas de valores e moralidade sobre ela. Ainda de
63
acordo com Calligaris (1994), a própria reprodução social e biológica aparece impossível se a
conjugalidade que a permite não for sustentada pelo amor(p.2).
Enquanto na modernidade o amor-paixão é fundamental, em outrora ele jamais fora
alicerce da estrutura social, sendo a própria conjugalidade construída em outras bases. Sabemos
que, embora o ideal do amor como pré-requisito essencial para o casamento seja hoje
constantemente reafirmado em muitos vetores sociais, inclusive no senso comum, até o século
dezenove as pessoas em geral não se casavam por amor e o que prevalecia, e efetivamente fazia
com que os casamentos se realizassem, eram interesses econômicos cuja finalidade era a
manutenção da ordem social. Em algumas sociedades os casamentos eram arranjados e havia a
existência do dote. Isso que atualmente pode parecer um inconcebível, na medida que atenta
contra a liberdade individual e o direito de escolha, era antes uma norma aceita como natural
dentro das práticas sociais.
Atualmente diversos teóricos entre eles Calligaris (1994), Costa (1998), Jablonski
(1998), etc. – analisam os malefícios da paixão, chegando alguns a atribuir de forma expcita a
esse sentimento a causa do insucesso e das dificuldades conjugais na modernidade. Tais autores
consideram a paixão, apesar de tão desejada, como um dos maiores oponentes ao estabelecimento
e à vivência satisfatória da conjugalidade, por suas implicações negativas na escolha dos futuros
pares conjugais e, posteriormente, na relação marido e mulher. Calligaris afirma:
[...] a conjugalidade vem se tornando lugar de sofrimento a partir do momento no qual
ela não é mais uma decisão de conveniência freqüentemente deixada à iniciativa das
famílias segundo os imperativos sociais e patrimoniais, mas começa a supor e a exigir
que seu fundamento seja o amor. Fenômeno, este, próprio à modernidade ocidental.
(p.2)
Na produção teórica referente à modernidade encontramos algumas reflexões importantes
acerca dos relacionamentos amorosos na atualidade. Nesse campo de estudos diversos autores
tomam a modernidade como pano de fundo nas questões amorosas vivenciadas em nossa época,
perpassando todos os tipos de relacionamentos – do ficar, namoro, casamento, à união estável e,
mais especificamente, na conjugalidade dentro dos múltiplos arranjos conjugais e familiares.
64
As idéias de Bauman (2003) acerca do amor nos tempos modernos oferecem um grande
auxílio na compreensão do tema da conjugalidade, em conjunto com outros autores já citados
anteriormente, cujas interpretões acerca desse femeno, apesar de, em alguns casos, serem
oriundas de enfoques teóricos distintos, guardam em comum a consideração da dimensão social
em suas análises. Nessa perspectiva, Torres (2000) afirma que a afetividade constitui uma das
dimensões das relações sociais e que o amor pode ser analisado como expressão específica dessa
dimensão. Para a autora:
[...] o amor não se trata apenas de um sentimento que pairaria acima ou fora da vida
social e que, como tal, só poderia ser analisado no quadro da psicologia ou do
inconsciente. Ele é considerado uma espécie de mola propulsora da ação, uma força que,
no quadro dos valores das sociedades contemporâneas, tem o poder suficiente para criar,
no sentido real e figurado, novas relões sociais. (p.147)
Os temas ligados à vida amorosa e conjugal, com destaque para os novos arranjos
conjugais e familiares, têm se constituído em lugar de convergência no qual várias abordagens se
encontram. Embora alguns autores, como Giddens (2002), Torres (2000) Jablonski (1998),
reconheçam que a paixão, elemento inicial de aproximação entre os membros de um casal possa,
ao longo da relação, se transformar em uma espécie de sentimento menos intenso e idealizado,
nos termos de Jablonski (1998), um “amor-companheiroconstruído no decorrer da vida em
comum e importante na sustentação do vínculo conjugal –, o que predomina na atualidade, em
termos das expectativas sociais e pessoais ligada à conjugalidade é a paixão. Costa (1999), em
sua análise acerca do amor-romântico, forma idealizada e abrasadora de amor que, segundo ele,
seria predominante em nossa época, traça um perfil dos relacionamentos atuais a partir desse
sentimento, afirmando:
Quando é bom não dura e quando dura já não entusiasma... Em suma, vivemos numa
moral dupla: de um lado, a sedução das sensões; de outro, a saudade dos sentimentos.
Queremos um amor imortal e com data de validade marcada: eis sua incontornável
antinomia e sua moderna vicissitude! (págs 11 e 21)
Bauman (2004) alerta para as mudanças sociais aceleradas vivenciadas nas sociedades
contemporâneas, definidas, segundo ele, como um mundo repleto de sinais confusos, propenso a
mudar com rapidez e de forma imprevisível(p.7). Nesse contexto de mudanças a não garantia de
65
permanência dos vínculos afetivos é algo presente a todo momento. O autor (2004) aponta,
contudo, uma intencionalidade de rompimento das relões afetivas, apesar do sofrimento
decorrente dessa dissolução. Segundo ele, a vinculação afetiva atual segue os padrões de
mudança e instabilidade presentes nos processos sociais da modernidade. De tal maneira, afirma
que, dadas as mudanças sociais aceleradas, os vínculos são frouxamente atados para serem
desfeitos sem delongas, quando os cenários sociais mudarem, o que ocorrerá com freqüência na
modernidade quida.
Bauman (2004) aponta assim algo problemático nas relações afetivas – presente em
queixas freentes destacadas por Calligaris (1994) na medida em que a fragilidade dos
vínculos humanos origina um sentimento de insegurança e desejos conflitantes estimulados pelo
mesmo. De acordo com Bauman, nesse mundo de extrema “individualizaçãoos relacionamentos
são assim bênçãos ambíguas, que oscilam entre um desejo intenso de vivenciá-los, mas também
são fonte de sofrimento psíquico. São, de tal forma, os representantes mais agudos,
perturbadores e profundamente sentidos da ambivalência”. E, por isso, se encontram tão
firmemente no cerne das atenções dos modernos e quidos indivíduos-por-decreto, e no topo de
sua agenda existencial(BAUMAN, 2004, p.8).
Bauman (2004) afirma ainda que as relões amorosas atuais não têm sido consideradas
plenas e verdadeiramente satisfatórias, gerando um mal-estar atual que, como revela Calligaris
(1994), aparece na cnica. Vale aqui relembrar o conceito de relação pura proposto por Giddens
(2002). Diz o autor: uma relação pura é uma relação em que os critérios externos se
dissolveram: ela existe somente pela retribuição que ela própria pode dar(p.14). Esse tipo de
relação é considerado pelo autor como um protótipo das novas esferas da vida social. Relões
puras pressupõem o “compromisso, que é uma espécie particular de confiança.
No entanto, como afirma Bauman (2004), atualmente as pessoas aprendem que o
compromisso, e em particular o compromisso a longo prazo, é a maior armadilha a ser evitada no
esforço de “relacionar-se”. Segundo o autor, diferentemente de “relões, parentescos,
parcerias” e noções similares, que ressaltam o engajamento mútuo ou omitem o seu oposto, a
falta de compromisso é ponto central de uma rede matriz para conectar-se e desconectar-se
66
afetivamente. Na modernidade o que predomina é, em ultima análise, a descartabilidade, o
efêmero. Troca-se de objetos carros, roupas, aparelhos eletrodomésticos, etc com grande
rapidez, e um movimento semelhante a esse observado no plano dos objetos materiais atinge
também o plano da afetividade. O sentimento de permanência não é moderno, ficando assim cada
vez mais difícil a vida em comum. Em uma época em que o novo é introduzido permanentemente
na vida social a atitude mais comum adotada por marido e mulher é, em casos de insatisfação,
descartar o cônjuge ou companheiro(a). Bauman (2004) faz a esse respeito uma afirmação quanto
às relações virtuais dizendo que elas:
[...] parecem feitas sob medida para o quido cenário da vida moderna, em que se espera
que as possibilidades românticas(e não apenas românticas) surjam e desaparam
numa velocidade crescente e em volume cada vez maior, aniquilando-se mutuamente e
tentando impor aos gritos a promessa de ser a mais satisfatória e a mais completa”.
(p.12)
Nesse contexto onde, segundo Bauman, vivencia-se ao mesmo tempo os prazeres do
convívio e horrores da clausura, Calligaris (1994) se interroga se casar não estaria se
constituindo num dever. Tais deveres, as a legalização da união estável, passaram a fazer parte
desse tipo de arranjo, que era muitas vezes associado a uma ética sem deveres, uma vez que era
uma opção de vida conjugal informal baseada no amor, na qual não se desejava deveres.
Acreditamos que a análise do sentimento amoroso é fundamental ao se tratar de temas
ligados à conjugalidade, uma vez que o mesmo está no centro de sua constituição nas sociedades
ocidentais. Estas concebem o amor como um sentimento individual que irá definir as escolhas
amorosas e conjugais e determinar o seu término. O amor é visto como algo que permanece no
indivíduo e ordena a relação social. Uma análise das relações conjugais em nossa época deve
incluir esses dois temas, amor e individualismo – ambos, especialmente esse último, amplamente
tematizados nas discussões acerca da modernidade – por serem indissociáveis dentro das culturas
ocidentais. A união estável se organiza sobre essa visão social de indivíduo e, de acordo com os
dados obtidos no estudo piloto realizado para nossa tese, é vista consensualmente como uma
relação de amor.
67
1.5. O antigo e o moderno nas famílias contemporâneas
Conforme afirma Almeida (1987), a família pode ser abordada sob diferentes enfoques
disciplinares e, mesmo que seu estudo parta de uma única disciplina, como a história, no interior
da mesma está sujeita a óticas distintas. A autora esclarece que ao utilizar o termo família nuclear
está se referindo àquela família intimista, cujas ões e movimentos estão circunscritos dentro do
espo privado, espaço este que se opõe ao público. Essa família, ao contrário da família do
século XIX que vivia em comunhão com a comunidade e era um lugar de produção, como
descreve Jablonski (1998), não se confunde a esfera da produção, mas caracteriza-se por ser
unicamente uma unidade de consumo.
Um importante elemento caracterizador dessa família é a idéia de natureza feminina e de
instinto materno, endossados durante muito tempo pela psicologia, que irão determinar as
atividades das mulheres, limitando-as aos afazeres domésticos e cuidados com a prole campo
do privado – enquanto ao homem estava destinada a esfera pública. A representação das mulheres
como donas do campo privado e dos homens como provedores sustentava uma divisão de papéis
somente questionada recentemente.
Almeida (1987) afirma que o mundanismo foi o ponto culminante do movimento de
secularização, que desde o Renascimento desconstruia a visão de mundo imposta pela igreja.
Segundo a autora o mundanismo constituía ao mesmo uma moda e um modo de vida que, no
século XVIII, representou uma popularização dos hábitos decadentes da aristocracia, assumidos
por alguns setores aristocratizados da burguesia. Estes hábitos tornaram-se modelos de
modernidadepara as populações urbanas. O modelo de modernidade no limiar do século XIX é
a família intimista, fechada em torno de si mesma, reduzida ao pai, mãe e alguns filhos que
vivem sozinhos. Nesse tipo de organização familiar não há criados, agregados ou parentes na
casa.
Nesse contexto a mulher, mãe por instinto e não por escolha, é abnegada e vive em
osmose com os bebês, sendo o elo de ligação de comunicação entre eles e o pai, cuja presença se
faz para o exercício da autoridade. Fala-se ainda, nesse período, de uma autoridade paterna,
68
presente inclusive na legislação vigente na época. A autora ressalta que essa família continua
patriarcal, na medida em que a mulher reina no lar dentro do privado e a ela é permitido decidir
acerca de questões mais imediatas do cotidiano dos filhos, mas a “última palavra é do pai, que
em última instância é quem comanda ou, em termos de uma desejabilidade social, deve comandar
a família.
Almeida (1987) aponta uma dificuldade na tentativa de traçar um percurso retrospectivo a
partir da família conjugal atual, cuja crise é tão tematizada, visto não haver no que se refere à
história da família no Brasil sequer uma aparente linearidade. A autora afirma que como ocorre
em todos os femenos de modernização na nossa história, a passagem do tradicional para o
moderno nos conduz da definição do moderno à redefinição do tradicional. Segundo a autora, a
chegada do moderno” através da importação de idéias gera um processo de assimilação dele
pelo tradicional” até que o modernose transforme em algo com sentido bastante diferente da
idéia original. Lipovetsky (2004) afirma: a hipermodernidade funciona mesmo segundo a lógica
da reciclagem permanente do passado, e nada parece escapar a seu donio(p.33).
Segundo Almeida (1987), inicialmente o aburguesamento das famílias constituiu mais um
verniz superficial, atingindo uma parcela dos hábitos das elites urbanas, mas sempre coexistindo
com o substrato da nossa formão engendrado antes do século dezenove, sendo desse casamento
ou dessa junção que teria nascido a nossa família conjugal atual. Assim como a família
contemporânea, que, apesar de se diferenciar em vários aspectos das organizões familiares que
a precederam, tem em sua composição elementos modernos e tradicionais, o casamento e os
múltiplos arranjos conjugais existentes em nossa época têm em sua composição elementos novos,
oriundos de mudanças nas práticas sociais, e outros mais antigos, menos sujeitos à mudança.
Szymanski (2000) alerta que o modelo de família adotado como referencial explicativo do
desenvolvimento infantil era a família nuclear composta de pai, mãe e filhos vivendo sob o
mesmo teto. No momento em que algum tipo de organização familiar se distanciava desse tipo de
estrutura fornecida pelo modelo era considerada “desestruturadaou incompleta. O que era
priorizado em termos de uma análise da família era a estrutura e não a qualidade das relões
entre seus membros. Apoiando-se no argumento da construção social, a autora ressalta que o não
69
entendimento da família nuclear burguesa como um modelo construído historicamente implicaria
na aceitação impcita de seus valores, crenças e padrões emocionais.
Szymanski (2000) se reporta a Áries, que afirma que até o século quinze a família era
muito mais uma realidade moral e social do que sentimental, chegando a quase não existir
sentimentalmente entre os pobres. E, entre aqueles de classe sócio-econômica mais favorecida o
sentimento guarda uma relação com aqueles evocados pelas antigas relões de linhagem.
A autora afirma que o discurso oficial sobre a família é transmitido e plenamente captado
pelas pessoas e expresso, por sua vez, nos seus próprios discursos. É interessante notarmos que
embora, como adverte Sá (1998), nem tudo o que é falado no ambiente social possa ser
considerado representões sociais, o discurso dos sujeitos a respeito de algum objeto social
constitui o principal viés de circulação dessas entidades. Outro ponto de encontro interessante
com a teoria das representações sociais é possível, visto que, com base em Gomes, Szymanski
(2000) afirma também a existência de um outro discurso impcito da incompetência, de
inferioridade, direcionado àqueles que não conseguem se adequar ao modelo de família imposto
pela sociedade nesse momento histórico. Ainda fazendo referência a Gomes, a autora afirma que
os discursos daqueles que se desviam da norma revelam a sensação de ser diferente”, menos
que” e incompetente. Tais discursos descritos por Szymanski trazem em seus conteúdos uma
marca da exclusão social através da negação da alteridade, como acontecia com as mulheres que
viviam em concubinato.
Moscovici descreve os universos consensuais como o donio do senso comum e os
reificados como o donio erudito, da ciência. Embora sejam distintos, o autor deixa claro que os
conhecimentos produzidos pelo primeiro migram para o segundo, o senso comum, no processo de
produção das representações sociais. Como salienta Szymanski (2000), o modelo de família fora
imposto pelo discurso das instituições, pela dia considerada por Jodelet como uma
importante instância na formação e disseminação das representões sociais e pelos
profissionais não somente como a forma correta de viver em família mas como um valor, estando
tal dimensão valorativa presente nas representações sociais predominantes. Não atender a essa
imposição pode gerar imeros problemas, inclusive escolares, divulgados na dia por
70
profissionais – pertencentes ao universo reificado –, reiterando as proposições do modelo
imposto, e, assim, a forma ideal de família para atender aos seus propósitos. A família assim
pensada é descrita numa citação de Gomes (1998) feita por Szymanski (2000), na qual ele diz
como a família pode ser definida:
Uma união exclusiva de um homem e uma mulher, que se inicia por amor, com a
esperança de que o destino lhes seja favorável e de que ela seja definitiva. Um
compromisso de acolhimento e cuidado com as pessoas envolvidas e de expectativa de
dar e receber afeto, principalmente em relação aos filhos. Isto, dentro de uma ordem e
hierarquia estabelecida num contexto patriarcal de autoridade máxima que deve ser
obedecida, a partir do modelo pai-mãe-filhos estável. (GOMES, 1998 apud
SZYMANSKI, 2000, p.25)
Encontramos alguns pontos em comum entre essa família e a união estável, na medida em
que a lei reconhece esse arranjo entre um homem e uma mulher como entidade familiar,
decorrendo desse fato direitos e deveres estabelecidos juridicamente. Entretanto, de acordo com a
lei, embora existam situões nas quais a caracterização de determinada relação seja difícil, para
que um arranjo conjugal seja considerado união estável é preciso que ele atenda a alguns
requisitos e características. Dentre os sinais evidenciadores importantes descritos por Gama
(2001) podemos citar as características de finalidade de constituição de família, estabilidade,
notoriedade, continuidade e os requisitos de
diversidade de sexos, ausência de impedimentos
matrimoniais, lapso temporal de convivência e comunhão de vida, como próximos, em certo
sentido, de um modelo tradicional de família, embora não mais se exija que ela seja definitiva.
Observa-se que o legislador, em sintonia com as práticas sociais, ao falar de estabilidade,
continuidade, lapso temporal de convivência, etc. entende um arranjo familiar como algo durável,
mas sujeito à dissolução. É o conjunto desses indicadores, e não cada elemento em separado, que
fará com que uma relação possa no entender da lei ser considerada união estável. A coabitação e
a presença de filhos, por exemplo, são considerados atualmente como indicadores e não
elementos definidores da união estável como se observava em outras épocas. Isso porquê mesmo
no casamento formal há casais que, dentro de um estilo de vida moderno, optam por não ter filhos
e/ou mesmo viverem em casas separadas. O informalismo ou ausência de formalidades parece
ser, em termos jurídicos, a característica que mais distancia a união estável do casamento, e a
71
comunhão de vida o requisito essencial para que esse arranjo conjugal seja considerado como
família. Nesse último requisito – a comunhão de vida – permanece a idéia da família como
espo afetivo reconhecida numa relação cuja base é o amor. Szymanski (2000) acrescenta:
Além disso, o mundo familial é palco de múltiplas interpretões. Produz teorias
ambíguas e incompletas que descrevem
aquele
mundo particular de relões. Exemplos
de tais generalizações: mulheres são...; homens são...; os filhos devem...; só
existe amor se...houver concordância irrestrita” ou, ...se o afeto for demonstrado da tal
ou tal maneira” ou, se eu for sempre boazinha, concedendo sempre”, casamento é..., e
assim por diante. (p. 25)
Essas teorias produzidas pelo universo familiar, as quais dizem o que é o casamento, são
fundamentais para compreensão do nosso objeto de estudo – a união estável –, uma vez que
temos como problematização o questionamento em torno do que é viver junto. Ou seja, de
como a união estável se tornou opção e onde se ancora: se mais para o concubinato ou mais para
o casamento. Szymanski (2000) aponta os grupos familiares como lugares de construção dessas
representões, na medida em que neles encontramos teorizões a respeito do casamento, das
relões de gênero, do amor, etc. que através de uma categorização produzem generalizões
encontradas nas representões chamadas hegemônicas a respeitos desses objetos. Essas teorias
podem ser entendidas como representões sociais, descritas por Moscovici (1981) como:
[...] um conjunto de conceitos, afirmões e explicações originado na vida cotidiana no
curso de comunicações interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa sociedade, dos
mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem também ser vistas como
a versão contemporânea do senso comum. (p. 181)
As representões sociais estão associadas à idéia de identidade, de diálogo, e por isso, de
compartilhamento. Embora nem tudo o que é falado possa ser considerado como representões
sociais, estas são encontradas principalmente nos discursos. A existência de objetos socialmente
valorizados especialmente um objeto novo, como a união estável faz com que sujeitos sociais
falem a todo momento sobre os mesmos, criando um terreno de identidade e convivência, lugar
de significação. A teoria das representões sociais institui ainda um outro lugar para o senso
comum, um lugar de estabelecimento de identidades sociais.
72
Esse tema – da identidade é comum às abordagens das representões sociais e da
modernidade. Bauman (2005) fala da impossibilidade de construção de um retrato definitivo do
homem moderno, o qual possui em sua constituição apenas o que denomina “kit identitário.
Aubert (2004) indaga qual é o aspecto do indivíduo contemporâneo e no que ele se difere de seus
precedentes nas suas formas de ser, de fazer e de sentir. E ainda, se seria possível falar de uma
metamorfose da identidade contemporânea, e mesmo de uma mutação antropológica, e quais
seriam as características dessa nova identidade. Segundo o autor, o indivíduo hipermoderno” é
um indívíduo flexível, no qual o deleite do sentir, a emoção compartilhada, suplanta a busca de
um engajamento nos sentimentos duráveis. A incorporação de tal reflexão é importante pra o
estudo das representações sociais da união estável, visto que tal arranjo se organiza sobre uma
visão social do indivíduo. Consideramos importante investigar se essa visão e a primazia do
deleite do sentir por via das emoções compartilhadas, apontada por Aubert, aparecem nas
representões sociais da união estável e de que maneira isso se manifesta.
Moscovici e Jodelet em várias de suas obras concebem as representões sociais como um
conhecimento compartilhado a respeito de objetos socialmente valorizados. Observa-se então a
importância do compartilhamento grupal como lugar de construção e mobilização das
representões sociais e, de tal forma, de construção de identidade, na medida em que, para que
os significados atribuídos a um objeto sejam considerados representões sociais, estes não
podem ser manifestões individuais, mas precisam ser compartilhados pelos integrantes de
grupos sociais específicos, formando assim uma identidade grupal.
É importante lembrar que no presente estudo estamos utilizando o termo modernidade em
sentido geral, tal como feito por Giddens (2002), autor que a define como uma ordem s-
tradicional cujo extremo dinamismo – característica que distingue essa era de qualquer período
que antecedente afeta de maneira ampla e profunda as práticas sociais e os modos de
comportamento, dentre os quais podemos incluir aqueles relacionados à união estável. Em se
tratando esse arranjo de um acontecimento antigo nas práticas cotidianas, que foi transformado,
através de seu reconhecimento jurídico, em um fato novo, cabe, na investigação das
representões sociais acerca desse objeto, uma consideração da modernidade para efeito de sua
contextualização espo-temporal.
73
2. A UNIÃO ESTÁVEL
2.1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
2.1.1. Do concubinato à união estável: entrelaçamento dos fatores históricos, demográficos e
jurídicos
Nesse capítulo faremos inicialmente algumas considerões quanto à origem da união
estável compreendida até o reconhecimento jurídico como concubinato – e suas possíveis
implicações nas representões sociais e práticas atualmente construídas a seu respeito. Tomando
como base os comentários acerca do antigo Código Penal brasileiro feitos pelo jurista Nelson
Hungria (1959), procuraremos demonstrar como na constituição desse objeto se entrelaçam
fatores históricos, demográficos e jurídicos. Para efeito de contextualização histórica da união
estável, optamos pela seleção de três contextos nos quais sua presença como concubinato
consideramos marcante em termos históricos: Império Romano, Grécia Antiga e, por se tratar de
nossa sociedade, Brasil Colonial. A seguir, percorreremos as relações do concubinato com o
casamento, tecidas ao longo da história, e a influência do gênero nessas duas formas de relação.
Por fim, chegaremos à modernidade, analisando o tratamento dado ao concubinato nesse período
em que a incidência demográfica dessa forma de relação aumentou de maneira significativa,
pressionando seu reconhecimento jurídico como união estável.
A união estável é um arranjo conjugal que não tem uma origem associada a tal
nomenclatura, visto que no transcorrer dos vários períodos históricos ela fora vista socialmente e
– no entendimento da justiça como concubinato. A denominação união estável” conferida às
uniões conjugais informais – ou consensuais, nos termos do IBGE é um fato recente ocorrido a
partir da Constituição de 1988 e, mais precisamente, do novo Código Civil, que reconheceu essa
modalidade de relação como entidade familiar, refletindo uma mudança da concepção e da
maneira de tratar esse objeto no ambiente social, cujos efeitos culminaram no plano jurídico.
Uma vez que a origem do que hoje denominamos união estável remonta à antiguidade, época na
qual essa modalidade de vida conjugal era considerada concubinato, é nele enquanto forma de
relação antiga correspondente em vários períodos históricos à união estável equivalência esta
que, do ponto de vista jurídico, somente se modificou recentemente com a legalização desse
74
arranjo – que devemos inicialmente buscar suporte para a adequada contextualização histórica da
mesma e o entendimento acerca de suas representões e práticas atuais, visto que, enquanto
objeto de representação social, a união estável é um acontecimento antigo e, atualmente, um
femeno jurídico novo, circunscrito no tempo historicamente determinado.
A união estável é um acontecimento presente nas práticas cotidianas desde a antiguidade
com o título de concubinato, suscitando representões diferenciadas a seu respeito ao longo do
tempo. As mudanças sociais fizeram seu incremento, o qual, por sua vez, propulsionou seu
reconhecimento jurídico. Assim, as uniões conjugais não oficiais deixaram de ser consideradas
concubinato – relação ilegítima e ganharam legitimidade a partir de seu reconhecimento
jurídico como união estável, adquirindo estatuto de entidade familiar. A trajetória atravessada por
esse arranjo e a sua existência como acontecimento antigo e novo – as o reconhecimento
jurídico nos leva à problematização acerca de quais as representões sociais acerca da união
estável e de onde elas se ancoram, se no casamento ou no concubinato.
A união estável demonstra ter se tornado uma opção de vida conjugal cada vez mais
freente e naturalizada, especialmente nos meios sociais urbanos, que em múltiplos aspectos se
assemelha casamento sendo, inclusive, considerada na maioria das vezes como tal por aqueles
que a ela aderem e pelos membros de diversos setores sociais. Podemos afirmar que é possível
que o reconhecimento jurídico da união estável como entidade familiar, sujeita, portanto, aos
direitos e deveres previstos em lei, tenha propiciado um fortalecimento dessa percepção da
relação como próxima ao casamento. Por outro lado, esse arranjo traz na sua história a marca do
concubinato, uma relação ilegal e não aceita, tendo sido seus membros em determinadas épocas
alvos de exclusão social. Alguns resquícios dessa maneira de conceber a união estável podem ser
ainda hoje encontrados nas representações sociais a seu respeito construídas por integrantes de
setores sociais mais tradicionais. Observamos, dessa forma, que as transformões ligadas à
união estável, as quais culminaram com seu reconhecimento jurídico, o qual teve como ponto
central a passagem dessa modalidade de relação de concubinato à entidade familiar, caminham
juntamente com as transformões ocorridas no casamento e na família.
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A história social do casamento e da família e a própria literatura jurídica referente à união
estável demonstram que as relões conjugais informais – denominadas até o reconhecimento
jurídico da união estável de concubinato – sempre estiveram presentes na vida social em meio à
instituição do casamento e da família. No Direito observamos uma preocupação com tema do
concubinato, expressa tanto no antigo quanto no novo Código Civil brasileiro – o primeiro
promulgado em 1916 e, o segundo em 2002 –, uma vez que o mesmo constituía uma relação que,
em razão sua ilegalidade assim como ainda ocorre nos dias atuais, salvo em se tratando de
exceções beneficiadas através de decisão jurisprudencial favorável –, era incapaz de gerar efeitos
jurídicos, sendo o casamento a única forma de relação conjugal legalmente aceita e em relação ao
qual o concubinato constituía uma ameaça, visto que em um grande mero de casos era comum
que um ou ambos os membros do casal que o compunham tivessem vínculo conjugal anterior
com outras pessoas, atentando contra o princípio da monogamia, norteador do Direito.
Hungria (1959) aponta, nesse sentido, uma mudança importante tocante ao adultério
ocorrida no Código Civil de 1916. O autor esclarece que de maneira divergente ao Código Civil
anterior, de 1890, o adultério passou constituir um crime contra o casamento, configurando, por
extensão, uma subespécie dos “crimes contra a família”, e não mais um crime sexual como
acontecia anteriormente. E prossegue, afirmando:
[...] O objeto jurídico que o adultério ofende é o interesse da fidelidade conjugal,
considerada esta, não como um fim em si mesma, mas como condição de segurança e
estabilidade da organização familiar, fundada na ordem jurídica do casamento. Não há
dúvida que, com o adultério, é também ofendida a moralidade social sob o ponto de vista
sexual; mas esta, em cotejo com o outro interesse jurídico lesado, passa para terreno
secundário. (p.110)
Observa-se através da afirmação de Hungria uma nítida preocupação jurídica e social com
a preservação do casamento e da família fundada no mesmo, e uma busca de afastamento
daquelas práticas que pudessem amear estas duas instituições consideradas pilares da
organização social –, propósito dentro do qual a rejeição ao concubinato, em especial ao
atualmente denominado concubinato impuro(GAMA, 2001), ou seja, aquele que envolve
infidelidade, se encaixa. O autor considera a prostituição, apesar de deplorável, uma “fatalidade
da vida social, um mal-necessário” à “entrosagem da máquina social” e à preservação da
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família, visto que, segundo ele, os homens não conseguem conter seus instintos sexuais dentro do
modelo monogâmico de casamento e esses instintos exercem pressão para sua satisfação
independente da idade ou do nível de aptidão para o casamento. A posição do autor a respeito de
uma funcionalidade preventiva dessa prática pode ser constatada nas seguintes afirmões:
Se há um fenômeno social cujo livre exame se acumula de irreduveis preconceitos é o
da prostituição. Quem quer que não reconheça nele um grave mal contra os costumes
arrisca-se a ser considerado um defensor da impudícia e do desapro à moral. Continua
sendo atrevido paradoxo o dizer-se que a prostituição é um mal-necessário, um
preventivo contra a corrupção generalizada, um meio indireto de salvar a pureza dos
costumes das famílias, um
substutivo
da criminalidade sexual [...]. (p.271)
Concordando com a afirmação de Weiniger de que “a mulher prostituta é a salvaguarda da
mulher mãe” (p.271), o autor sustenta que se fosse possível acabar com a prostituição esse ato
conduziria a imoralidade para o recesso dos lares e despertaria a libido para a prática de todos os
crimes sexuais. Em relão ao casamento, considera o que denomina “abstinência sexual extra
matrimonium, ou seja, a fidelidade conjugal, um argumento ingênuo para os que defendem o
término da prostituição, dada a sua impossibilidade por razões que ele considera de ordem
genética, instintivas. Esse posicionamento fica claro na afirmativa a respeito da funcionalidade
dessa prática – que segundo ele deve ser minimizada, mas não extinta – no tocante à preservação
do casamento e da família. Entre as muitas justificativas dadas por Hungria (1959) para que a
prostituição seja “tolerada no limite que a necessidade ime” (p.395-396) está a evitação do
adultério.
Em seus comentários Hungria (1958) ressalta que a consideração da família como
instituição pública, como “corporação do Estadoconferia ao legislador disposições especiais às
infrões que ferem diretamente sua autoridade(p.236). Hungria entende o adultério como um
ato imoral, mas que constitui, principalmente, o delito político da família” expressão tomada
de Garofalo – e defende sua punição para assegurar o núcleo dessa instituição, ou seja, o
casamento. Ainda na associação entre a prostituição e a preservação da família constituída
através deste, o autor esclarece quanto ao crime de rufianismo, que implica na retirada de algum
tipo de proveito material da prostituição alheia, que não será reconhecível o crime em questão
77
no fato, por exemplo, de prestar local para relões sexuais de um casal de amantes ou
desquitados arrependidos(p.291).
O termo amantes, também empregado usualmente como sinônimo de concubinos, é
utilizado pelo autor em oposição ao casamento, já que se refere a uma relação secreta cujo
desenrolar acontece em um local tomado de empréstimo para o encontro do casal assim nomeado.
Uma vez que se trata de uma relação que acontece em sigilo parece se tratar de uma relação
adulterina ou, nos termos de Gama (2001), de um concubinato impuro, embora, mesmo que não o
fosse, na época em que Hungria postulou tais formulações nos Comentários ao código penal,
cuja primeira edição foi publicada em 1948, existiam regras morais rígidas que impediam que
uma relação de concubinato puro (GAMA, 2001), isto é, existente entre pessoas desprovidas de
impedimentos matrimoniais – hoje considerada união estável tivesse notoriedade, ou seja, que
seus membros se pudessem se apresentar publicamente como casal. É importante destacarmos
que as mudanças sociais fizeram com que algo proibido àqueles que viviam como casados sem a
oficialização, a publicidade da relação, passasse a ser atualmente considerado uma exigência
legal para que um arranjo conjugal possa ser considerada juridicamente como união estável. Esse
fato ocorreu em razão da alta incidência demográfica desse tipo de arranjo, especialmente a partir
das últimas décadas do século XX, que pressionou o reconhecimento jurídico dessa prática,
criando um fato jurídico novo.
O reconhecimento jurídico da união estável é um fato novo circunscrito num cenário
social, cujas mudanças ocorridas ao longo de um percurso histórico fizeram dessa prática já
existente uma nova realidade social. Com base em Veyne (1989), Vainfas (1997), Giddens
(2002) e no próprio Moscovici (2003), quando trata da subjetividade social, podemos afirmar que
estas mudanças dizem respeito à transformação das mentalidades, ou da subjetividade social, que
permitiram a adoção de um estilo de vida dentro do qual a conjugalidade de ser estabelecida de
uma maneira diferente do padrão tradicional. Esse fato teve como conseência um decréscimo
do número de casamentos e um aumento do número de uniões conjugais não oficializadas,
arranjo conjugal hoje denominado união estável. Vale lembrar que Singly (2000), ao tratar da
influência do individualimo na vida conjugal e familiar, denominando inicialmente essa forma de
relação de concubinagem, registra seu aumento nas sociedades ocidentais. O autor demarca o
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final dos anos sessenta como um período associado às grandes transformões, dentre as quais
cita o trabalho assalariado das mães, o controle da fecundidade através da contracepção, o
aumento da coabitação e, principalmente, do divórcio. De fato, antes desse período e,
especialmente, na primeira metade do século XX, em razão dos valores sociais vigentes, era
praticamente impossível conceber a legalização de um arranjo conjugal diferente do casamento.
A tolerância ao novo era muito menor do que nos dias atuais, nos quais, estando, como afirma
Giddens (2002), os critérios tradicionais enfraquecidos, existe mais liberdade para o surgimento
não somente de uma diversidade de formas de vida conjugal, mas também de famílias.
Apesar de haver um consenso por parte de diversos autores a respeito das inegáveis
transformações ocorridas no período apontado por Singly (2000) final dos anos sessenta –, ao
tratar dos crimes contra os costumes, Hungria (1958) explicita uma rigidez moral existente nessa
época, afirmando com relação à mudança de comportamento feminino:
Com a decadência do pudor, a mulher perdeu muito do seu presgio e
charme.
Atualmente, meio palmo de coxa desnuda, tão comum nas saias modernas, já deixa
indiferente o transeunte mais
tropical
, enquanto outrora, um tornozelo feminino à mostra
provocava sensação e versos ricos. As moças de hoje, via de regra, madrugam na posse
dos segredos da vida sexual, e sua falta de
modéstia
permite aos namorados liberdades
excessivas. Toleram os contatos mais indiscretos e comprazem-se com anedotas e
boutades
picantes, quando não chegam a ter a iniciativa delas [...] Dada essa frouxidão
de pudícia, abre-se a porta à corrupção, e cada vez maior é a freqüência das infelicidades
sexuais. (p.93)
O autor postula uma associação entre a função sexual e o casamento, dizendo que a
primeira não é um simples fato natural, mas representa um meio social, estando sujeito,
portanto, às leis da ética social. E segue, afirmando que a garantia da normalidade sexual, de
acordo com essa ótica, é o casamento, base da família em função da ordem jurídico-social
(p.200-201).
As leis quando são criadas originam ou modificam representações e práticas existentes a
respeito dos temas da vida social, especialmente dos fatos novos. Podemos afirmar que, como
femeno jurídico novo – as a legalização –, a união estável suscita representões sociais e
práticas distintas daquelas existentes no período anterior ao reconhecimento jurídico, no qual essa
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relação era considerada concubinato. O contexto social impele a criação das leis pelo sistema
judiciário – a partir de representações e práticas já existentes as quais, por seu turno, quando se
referem a um fato novo, criam novas representações e práticas em uma espécie de sistema
complexo cujo funcionamento está ligado à dinâmica social.
Além das mudanças das representões sociais da união estável ocorridas ao longo do
tempo, a contextualização histórica do tema revela também uma mudança relacionada aos
direitos da mulher que vivencia esse arranjo, sendo o gênero um subtema fundamental no
tratamento desse objeto, dada sua influência nas representações sociais construídas acerca do
mesmo. Hungria (1958) relata uma tendência de libertação da mulher do poder marital,
fornecendo-lhe maior autonomia para o desempenho da profissão, protegendo-a contra os abusos
do marido na administrão dos bens do casal, assegurando-lhe alimentos. O autor ressalta, em
seguida, que esse direito era assegurado por lei contra quem a privara de alimentos mesmo no
caso de concubinato (acórdãos de Cassação de 1930, 1931 e 1934), tornando o exeível contra a
herança do cônjuge pré-morto (lei de 1891)(p.332). Entretanto faz a seguinte ressalva: “a
jurisprudência reconsiderou essa solução, quanto à concubina, porque o concubinato não lhe
confere interesse legítimo juridicamente protegido, como se vê dos numerosos acórdãos citados
em DALLOZ, Code Civil, 1950, nota 7 ao art. 1383(p.332).
Apesar de serem oriundos do Direito – campo do conhecimento especializado,
denominado por Moscovici (1978) de universo reificado – os comentários de Hungria refletem as
representões e práticas tocantes às uniões conjugais não oficializadas, hoje denominadas união
estável, na primeira e início da segunda metade do século XX no Brasil. Por outro, lado a
produção jurídica a respeito dessa forma de relação pode reiterar, transformar ou constituir novas
representões e práticas a seu respeito no cotidiano.
Ao falar de ética socialHungria (1958) abre perspectivas também para o tema da
justiça. Lembremos que, como afirma Guareschi (1998), ética é sinônimo de justiça. De acordo
com esse autor na visão do ser humano-indivíduo o outronão interessa, ou ao menos está em
segundo plano, subordinado...Ele é o índio, o negro, a mulher, o excluído. Eu o explico, eu o
domino, eu o exploro. E mais: sou eu que decido quando há dominação, quando há compreensão,
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quando há exploração(p.159-160). Em um contexto tradicional no qual o casamento era a única
forma de relação conjugal considerada legítima não havia amparo legal àqueles especialmente à
mulher, que, por diversas razões (inclusive culturais) é, em geral, quem requere direito à pensão
alimencia – que viviam em concubinato, como demonstra a revogação da decisão
jurisprudencial relatada anteriormente por Hungria.
Essa visão do que é ético ou justo, ao nosso ver, indissociada do tema das relões
conjugais, modifica-se em cada período histórico. Na época em que Hungria formulou seus
comentários acerca do Código Penal brasileiro então vigente, poderia ser discutido se era justo a
mulher concubina estar desprovida de qualquer tipo de amparo legal em casos de separação e de
morte de seu companheiro, mesmo que tivesse contribuído diretamente para a constituição de um
patrimônio comum. Atualmente, com a legalização da união estável, pode-se questionar se é justa
a decisão jurisprudencial favorável à partilha de um patrimônio que não é comum ao casal, caso a
relação constituída pelo mesmo seja uma espécie de namoro, como publicado na reportagem do
Jornal O Globo em 20 de junho de 2004, tendo como titulo detalhes que fazem namoro virar
união estável” e, como subtítulo, justiça já leva em consideração pequenas lembranças do
cotidiano para garantir direitos à partilha de bens. A legalização da união estável é um fato
jurídico novo que reconhecendo um acontecimento já existente nas práticas cotidianas desde a
antiguidade, cujo crescimento se demonstra cada vez mais acentuado na atualidade, introduz
novos elementos na relação entre o casal que vive esse arranjo e cria novos problemas ligados a
sua própria definição.
Nas representações sociais e práticas construídas a respeito da união estável existe uma
complexidade dada pelo fato de ser esse arranjo um femeno jurídico novo que traz mudanças
substanciais ao âmbito da vida privada e, ao mesmo tempo, um acontecimento antigo. A
historicização dessa forma de relação revela que, apesar de ser considerada um tipo de vínculo
moderno, a mesma existiu, como concubinato, em diversas épocas e culturas antigas. A
seguinte afirmação de Frigine (1992 apud GAMA, 2001) demonstra que o concubinato era
bastante comum entre homens na antiguidade.
81
Remonta a milênios a nocia da existência de concubinas na vida dos homens, mesmo
no tempo em que a poligamia era o regime natural dos casados, podendo-se afirmar que
possuir apenas uma mulher representava um comportamento vergonhoso, desonroso
para o homem. Não bastasse a existência das várias mulheres com quem se casavam, não
eram poucos os homens que mantinham suas concubinas. (FRIGINE, 1992 apud
GAMA, 2001, p. 96)
Com base em Dias (1984), Gama (2001) afirma que entre a comunidade localizada à
margem de Eufrates antes da criação da Babilônia existia o costume do dono da casa oferecer aos
visitantes além da hospedagem, que incluía leito e mesa, suas próprias mulheres. O jurista
esclarece que, segundo Dias (1984 apud GAMA, 2001), os Pastores moradores de outra parte da
Caldéia eram orientados pelas normas religiosas preconizadas nos cultos de Vênus e Milita
, as
quais impunham a eles uma vida sexual que o autor qualifica como totalmente desregrada e
envolta em concupiscência. E ainda que os Hebreus, descendentes dos caldeus, os quais viviam
sob a autoridade do pater familiae, tinham costumes que tiveram como conseência a
proliferação da poligamia.
A união estável é uma forma de relação cuja presença atravessa os vários períodos
históricos – desde antiguidade até a chamada modernidade – gerando representações e práticas
distintas em cada época e cultura. O fato de ser um acontecimento tão antigo pode fazer com que
as atuais representações desse arranjo se ancorem no concubinato, sua forma, pode-se dizer,
também mais antiga. Como já fora anunciado na abertura do capítulo, com intuito de
contextualizar historicamente esse objeto fizemos a seleção de três contextos nos quais sua
presença como concubinato consideramos historicamente importante: Império Romano, Grécia
Antiga e Brasil Colonial.
2.1.2. O concubinato no Império Romano
Veyne (1989) descreve a vida privada no período do Império Romano afirmando que
nessa época e cultura a preocupão fundamental dos juristas era o patrimônio, sendo a moral
deixada em segundo plano. O historiador menciona um relato de Quintiliano, feito com
naturalidade, a respeito de um jovem que antes de morrer fez da “amantetermo utilizado pelo
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autor sua herdeira. Ele define o casamento na Itália romana, um século antes ou depois da nossa
era, da seguinte forma:
O casamento romano é um ato privado, um fato que nenhum poder público deve
sancionar: ninguém passa diante de um juiz ou de um padre; é um ato não escrito (não
existe contrato de casamento, mas apenas um contrato de dote ... supondo que a
prometida possua um dote) e até informal: nenhum gesto simlico, por mais que se
diga era obrigatório. Em suma o casamento era um fato privado, como entre nós o
noivado. (p.46)
Veyne (1989) aponta um problema antigo atinente ao casamento em Roma que podemos
considerar aplivel, em certo sentido, hoje à união estável. Sendo o casamento romano um fato
privado e desprovido de registro, uma vez que não era mediado pelo Estado, em caso de litígio
por uma herança ele indaga como um juiz poderia decidir se um homem e uma mulher eram
legitimamente casados. Atualmente, embora a lei seja clara quanto aos requisitos e características
necessários para que uma relação se constitua como união estável, no processo de separação – em
se tratando da união estável, litigioso – a decisão judicial esbarra na dificuldade de ter-se que
provar que a mesma existe no momento em que ela se findou. Além disso, a fronteira algumas
vezes tênue entre a união estável e o namoro dificulta a distinção entre ambas as formas de
relação.
No Império Romano, esclarece Veyne (1989), na falta de gestos ou escritos formais, o
casamento era estabelecido como uma realidade fática que gerava efeitos legais através de
indícios que comprovassem a existência do vínculo conjugal. Eram considerados atos
inequívocos a constituição de dote, ou gestos que comprovassem a intenção conjugal. Ele afirma
ainda que o suposto marido sempre qualificava a mulher com que vivia maritalmente como
esposa, e que um outro sinal levado em consideração poderia ser o atestado de testemunhas de
que haviam assistido a uma pequena cerimônia de evidente caráter nupcial. Apesar dos
indubitáveis indícios buscados nos casos de litígio entre o casal que se encontrava em processo de
separação, o autor apresenta o casamento romano como algo de ordem muito mais subjetiva do
que jurídica, afirmando que “em última instância, somente os cônjuges podiam saber se, em seu
pensamento, estavam casados(VEYNE, 1989, p.46).
83
De acordo com Veyne (1989), tendo em vista que o casamento era uma instituição
privada, não escrita, e até mesmo não solene, que constituía uma situação de fato, a qual gerava
efeitos de direito tais como o reconhecimento dos filhos oriundos desse tipo de relação, a
determinação de se os cônjuges estavam unidas em justas núpciasou concubinato era
fundamental. De forma semelhante, na união estável antes do reconhecimento jurídico
considerada concubinato – em se tratando da necessidade de comprovação da existência de
elementos que permitam caracterizar esse arranjo, necessidade esta ocorrida em geral no
momento da separação, são buscados sinais de comunhão de vida alguns discuveis como a
coabitação – que atestem a existência de vínculo conjugal entre o casal, do qual uma das partes
pleiteia direitos dele decorrentes junto à justiça.
Veyne (1989) ressalta que no concubinato, também chamado de “justas núpcias, a
monogamia predomina como um valor, não tendo, entretanto, o mesmo significado do termo
casal. Ele esclarece tal afirmação dizendo que, no século I antes da nossa era, um romano devia
considerar-se um cidadão que cumpriu todos os seus deveres cívicos; um século depois, devia
considerar-se como bom marido e oficialmente respeitar a sua mulher. Ou seja, em um
determinado momento histórico essa instituição cívica e o casamento monogâmico passaram a
constituir uma “moral cívica, depois moral do casal, como diz Veyne (p.47). Quando se passou
de uma à outra moral o autor ressalta que, embora não tenha havido grandes transformões nas
condutas das pessoas ou mesmo no conteúdo das normas que se deveria seguir, mudou a
condição pela qual cada moral se atribuía o direito de ordenar e, simultaneamente, a maneira
como considerava as pessoas: soldados do dever cívico ou sujeitos morais responsáveis.
Como afirma Veyne (1989) a primeira moral dizia “casar é um dos deveres do cidadão. A
segunda: Quem quer ser um homem de bem só deve fazer amor para ter filhos; o estado do
casamento não serve aos prazeres venéreos(p.48). A primeira moral não questiona a
fundamentação das normas segundo as quais somente as justas núpcias ou concubinato permitem
gerar cidadãos de forma regulamentar, devendo-se, portanto, obedecê-las e casar. O casamento
era considerado um dos deveres do cidadão, uma obrigação cívica que, apesar de reconhecidos os
problemas a ele inerentes, devia ser cumprida. Ele não era considerado o fundamento de um lar,
mas uma das muitas decisões dinásticas que um senhor deve tomar, como entrar na carreira
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pública ou permanecer na vida privada a fim de aumentar o patrimônio dinástico, tornar-se
militar ou orador, etc. Nessa visão do casamento como dever a esposa, antes de ser a
companheira desse senhor, era considerada o objeto de uma de suas opções. Ela era apenas um
instrumento da sua função de cidadão e chefe de família. Esta esposa quando bem acompanhada
tinha o direito de visitar as amigas. Era considerada uma criança grande que deveria ser cuidada
por causa do dote pago ao seu marido e do nobre pai.
A segunda moral, segundo Veyne (1989), pretende descobrir um embasamento das
instituições; tendo em vista que o casamento existe e sua duração ultrapassa amplamente o dever
de gerar filhos, pensava-se que devia ter outra razão de ser que justificasse esse ato, que,
entendido pelo autor como um fato que fazendo com que “dois seres racionais, o esposo e a
esposa, vivam juntos durante toda a sua existência”, leva o mesmo concluir que “ele é, portanto,
uma amizade, uma afeição duradoura entre duas pessoas de bem, que só hão de fazer amor para
perpetuar a espécie(p.48). O historiador acrescenta que a nova moral pretendia fornecer
prescrições justificadas a pessoas racionais; sendo incapaz de arriscar criticar as instituições,
tinha como tarefa a descoberta de um fundamento também racional no casamento. Essa junção
que ele denomina de “mistura de boa vontade e conformismodeu origem ao mito do casal.
Nessa moral a mulher é uma amiga; tornou-se a companheira de toda a vida. Resta-lhe somente
continuar racional, ou seja, reconhecendo sua inferioridade natural, obedecer ao seu esposo que a
respeitará como um chefe respeita seus auxiliares devotados, que são seus amigos inferiores.
Veyne afirma, então, que a chegada do casal ao Ocidente aconteceu no momento em que a moral
passou a se perguntar por que razão um homem e uma mulher deviam passar a vida juntos, não
mais aceitando a instituição do casamento como um femeno natural.
Essa passagem de uma a outra moral representou uma mudança significativa no campo da
vida privada acontecida num momento histórico em que a forma de vida conjugal existente era o
concubinato ou as justas pcias(VEYNE, 1989), denominação que em si mesma indica um
reconhecimento dessa modalidade de relação como uma conjugalidade de fato e em certo sentido
próximo do que hoje denominamos união estável. De maneira semelhante ao que acontece na
atualidade, quando se pretende provar a existência desse arranjo eram buscados sinais
evidenciadores de vínculo conjugal que pudessem atestar que um casal se encontrava casado.
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Apesar de encontrarmos no Império Romano aspectos da vida conjugal que remetem à
atualidade, especialmente no que se refere ao reconhecimento de uma realidade fática que gera
efeitos de direito, por se tratar de um contexto sócio-histórico distinto, as razões que levavam
uma pessoa a casar e a própria concepção do casamento eram bastante distintas das existentes em
nossa época.
Veyne (1989) descreve o casamento romano como uma instituição privada, não escrita e
não solene, razão pela qual a cerimônia de nupcial implicava a presença de testemunhas, úteis em
caso de contestação. Segundo ele, de acordo com a antiga moral vigente em Roma as pessoas se
casavam para receber um dote e para ter, em justas bodas, filhos legítimos que as sucederiam e
perpetuariam o núcleo dos cidadãos, ou seja, o corpo cívico. A antiga moral afirmava que o
casamento é um dever a cumprir e a nova moral postulava quais eram os deveres de um homem
casado.
Estas duas concepções acerca da conjugalidade tiveram grande influência na maneira
como no transcorrer da história as sociedades representaram e lidaram com o casamento. Tal
influência não se restringe às pessoas em suas interações cotidianas, mas se estende também, e
indissociadamente, às instituições e campos especializados do conhecimento. Convém lembrar,
nesse sentido, a existência de formulões do atual Direito que remontam ao Direito romano.
Além disso, é importante considerarmos ainda que, apesar das mudanças substanciais ocorridas
no campo da conjugalidade inclusive no que se refere aos papéis de gênero – que fizeram com
que esta passasse a ser objeto de escolha individual motivada principalmente pelo sentimento
amoroso, como afirma Giddens (2002), existem ainda algumas relações conjugais baseadas nos
deveres e obrigações tradicionais.
Em paralelo, observamos nesse contexto a emergência de uma
produção cienfico-cultural que, mais do que buscar entender e explicar as razões que levam os
homens e as mulheres a procurarem estabelecer algum tipo de vínculo conjugal, abordam o tema
das infelicidades amorosas e conjugais.
86
2.1.3. O concubinato na Grécia Antiga
Partindo do papel da mulher é possível chegarmos à compreensão do concubinato na
Grécia antiga. Considerada como justas pciasno Império Romano, essa forma de relação
também era admitida na Grécia antiga. Tal aceitão estava, no entender de Gama (2001), ligada
ao culto de Vênus e Adônis, e a outros costumes como à exaltação dos sexos, à crença no amor,
nas preferências e excessos amorosos e na fala dos deuses. De acordo com o jurista, nessa
sociedade poligâmica não existia nenhuma diferença entre os filhos legítimos e ilegítimos. Por
essa razão, como afirma, posteriormente o rei-legista Licurgo buscando afastar as práticas
existentes entre os gregos editou leis, as quais foram concluídas por Sólon, que instituíram a
monogamia. As concubinas passaram então a constituir uma classe de mulheres à parte e sobre
ela incidia uma regulamentação específica.
Temos hetairas para o nosso prazer, concubinas para as nossas necessidades diárias e
esposas para nos darem filhos legítimos e administrarem a casa” (DEMÓSTENES, apud
TANNAHILL, 1983, p.107). Citando essa frase de Demóstenes, Tannahill (1983) descreve as
três categorias de mulheres existentes na Grécia no período clássico: as hetairas, as esposas e as
concubinas. Segundo o autor as hetairas eram as cortesãs de alto nível da época. Eram providas
de beleza, talento, inteligência, e muitas vezes tinham conhecimento da literatura clássica. O
autor ressalta que o atributo mais admirado nelas pelos homens atenienses era o fato de serem
profundamente capazes em tudo aquilo que eles próprios impediam que suas esposas
aprendessem. Ele afirma ainda que as hetairas foram o primeiro grupo de mulheres na história
registrada a alcançar um relacionamento pacífico com os homens. Tannahill (1983) afirma que as
sacerdotisas naditu, da Babilônia, eram aceitas pela qualidades de suas mentes; as prostitutas de
todos os países, por seus corpos. Entretanto, as hetairas faziam uso de ambos e por ambos eram
admiradas. Seu sucesso encorajou as esposas romanas a iniciarem seu processo de emancipação,
decurso difícil se considerarmos que seus direitos políticos e legais eram os mesmos dos
escravos.
Tannahill (1983) salienta que em Atenas as mulheres não tinham mais direitos políticos e
legais do que os escravos e cita Sócrates que, o Symposium, de Xenofonte, afirmou que “as
87
mulheres não são de modo algum inferiores aos homens, mas fez em seguida a ressalva: tudo
de que precisam é um pouco mais de força física e energia mental. Baseado nessa maneira pela
qual a mulher era vista socialmente, Tannahill diz que o conceito ateniense de boa esposa era
quase uma reprodução do ponto de vista hebreu. Ou seja:
Ela teria que ser casta e sensata, competente em fiar, tecer e costurar, capaz de distribuir
tarefas adequadas aos em pregados, ser econômica com o dinheiro e bens do marido,
gerar filhos e administrar a casa com sabedoria e virtuosamente. Se houvesse
necessidade urgente de um herdeiro, esperava-se que ela tivesse intercurso com o marido
pelo menos três vezes ao mês, até que a questão fosse resolvida. (p.103)
De acordo com Tannahil (1983), ao contrário das hetairas, não era permitido às esposas
fazerem refeições com seus maridos e usufruir dos debates sobre cultura e assuntos públicos ao
ponto de lhes permitir manter uma conversa que pudesse ser qualificada como inteligente, visto
que haviam sido criadas em um regime que ele denomina “filhos, cozinha e religião. As
hetairas, apesar de pertencerem a uma camada social menos favorecida, eram treinadas para o
convívio social e tinham uma vida melhor do que as esposas – que até mesmo seu conhecimento
a respeito do amor fora ensinado pelos maridos sendo na maioria das vezes bem-sucedidas em
um mundo masculino. Além disso, Tannahill afirma que os maridos gregos não eram em nada
românticos, tendo sido durante a última parte do século quatro a.c
. e, mais precisamente, no
século três – período em que, segundo ele, os homens gregos começaram a redescobrir o interesse
pelas mulheres – que o amor romântico entre homem e mulher passou a ser aceito no teatro,
embora os papéis femininos fossem ainda desempenhados por rapazes.
Conforme o autor, em termos de classificação na escala social, as concubinas se situavam
abaixo numa posição inferior às hetairas, ressaltando que há um silêncio em torno delas fazendo
com que pouco se saiba a seu respeito. Ele afirma que nas épocas clássicas o hábito de se manter
concubinas como esposas secundárias parece ter diminuído e atribui esse fato à competição dos
homossexuais – visto que o homossexualismo era acentuado na época –, das hetairas e das
jovens prostitutas. Em síntese, Tannahill afirma que “a situação da concubina não era das
melhores: ela não alcançara a independência da hetaira nem a caprichosa proteção legal
88
dispensada à esposa. Além do mais, quando o senhor se cansava dela, nada o impedia de vendê-la
para um bordel, se ele quisesse” (p.111).
Entretanto, apesar da difícil situação dessa categoria de mulheres na Grécia antiga, Gama
(2001) menciona registros históricos que, como afirma, atestam a existência de concubinas
lebres cuja atuação na cultura grega foi notável. O autor cita o exemplo de Aspásia que,
segundo ele, ministrou aulas particulares de retórica a numerosos alunos, inclusive gregos idosos.
Revela que por ser ela natural de Mileto não podia se casar com Péricles, vivendo então com ele
em concubinato público e notório. Antes dessa relação concubinária com Péricles, Aspásia havia
sido concubina de Sócrates, e, as sua morte, de Alcebíades.
2.1.4. O concubinato no Brasil Colonial
Vainfas (1997) aponta um paradoxo tocante à vida privada no Brasil colonial. Ao analisar
a intimidade nessa época o historiador revela seu caráter público, lugar onde segundo ele
aconteciam os encontros amorosos e as mancebias, pois, como afirma, citando uma expressão
comum nas pequenas comunidades da colônia, todos sabiam quem andava com quem. O autor
fala de um furor femeeiro do português, o qual teria se exercido sobre vítimas, e cita Alfredo
Bosi, que afirmou que a libido do conquistador teria sido antes falocrática do que democrática,
na medida em que se exercia quase sempre em uma só dimensão, a do contato físico(p.231).
Segundo Vainfas (1997), na ótica dos jesuítas a liberalidade sexual era prerrogativa dos
índios, vistos como sempre nus, poligâmicos, incestuosos. Dessas práticas a única reconhecida
foi o casamento na lei natural” entre os nativos, por Anchieta com muita dificuldade. Mesmo
esse era considerado inaceitável, pois estava em desacordo com as normas da igreja e contrariava
os impedimentos de parentesco consangüíneo até o quarto grau. Conforme o autor, havia também
uma reprovação em relação aos primeiros colonos, a começar por Nóbrega em sua vasta
correspondência reveladora do que denomina padrão concubinário nas relações amorosas e
sexuais da Colônia. Tal padrão e as críticas ao mesmo feitas por Nóbrega foram descritos por
Vainfas (1997) na seguinte afirmação:
89
Quase todos, dizia, não satisfeitos em fazer suas escravas de mancebas, lançavam-se às
livres, pedindo-as aos índios por mulheres. E se os padres ousassem admoestá-los para
que se casassem com uma só índia, como Deus mandava, eram ofendidos, ameaçados e
até perseguidos pelos escandalosos colonos. Nóbrega carregava nas tintas especialmente
contra João Ramalho, tido como o exemplo-mor do que faziam os portugueses no Brasil.
Sua vida, vituperava Nóbrega, corria solta à moda dos índios, rodeado de mulheres e da
filharada que estas lhe davam; e os meninos de Ramalho, mal atingiam a puberdade, não
hesitavam em seguir o exemplo do pai, unindo-se a várias mulheres , sem cuidar se eram
irmãs ou parentas. João Ramalho foi visto, pois, como
petra sacandali
da Colônia e
emblema do desconsolo de Nóbrega: a esta terra”, diria desalentado não vieram senão
desterrados da mais vil e perversa gente do Reino. (p.233)
De acordo com Vainfas (1997) esse padrão concubinário permaneceu inalterado durante
os séculos XVII e XVIII, exceto pela participação cada vez maior dos negros africanos e
crioulos –, e, conseqüentemente, dos mulatos e, tomando a expressão de Antonil, das mulatas
desinquietas, fruto dos amores entre os senhores ou homens livres e suas escravas ou forras
negras, que deram ao mesmo um novo formato. Segundo o autor o concubinato ultrapassou a
esfera do sexo pluriétnico ou das relações entre livres e escravos. Ele cita pesquisas realizadas
nos últimos dez anos considerando a data da publicação de seu artigo, 1997 – sobre as visitas
diocesanas em Minas, na Bahia e até no Mato Grosso, as quais revelaram uma quantidade
amplamente variada de relações amorosas que podiam ser classificadas como concubinato, em
grande parte envolvendo forros e pobres que se uniam entre si ou, como afirma, “andavam
juntos.
Entretanto, o autor é categórico ao afirmar que o concubinato guardou íntimo parentesco
com a escravidão, seja indígena, ou negra. Tomando por base a documentação das mesmas visitas
diocesanas, afirma que ela contém numerosos exemplos de senhores que, mesmo sendo casados,
possuíam nas escravas amantes habituais, das quais tinham filhos, dando esndalo público de
seus atos, conforme os depoentes contavam aos visitadores da igreja” (p.234). Tais práticas
concubinárias entre senhor e escrava não ficavam, segundo Vainfas (1997), circunscritas ao
círculo estreito dos grandes senhores do Nordeste ou das Minas Gerais, mas, ao contrário,
pareciam igualmente difundidas no seio da população de menor poder aquisitivo, havendo casos
em que até mesmo donos de uma única escrava mantinham com ela “amancebamento” e visando,
por vezes, aumentar suas rendas, colocavam-na na prostituição.
90
O hábito de considerar os escravos como bens pessoais fazia com que os senhores, mesmo
os pobres, estendessem seu senhorio à esfera sexual, de tal forma que leva Vainfas (1997) a
afirmar de maneira contundente: não seria exagero dizer que a escravidão não raro implicava a
possibilidade do concubinato, de chamego entre amos e cativas...(p.239). O autor relata que
havia, entretanto, manifestações contrárias à associação entre o concubinato e a escravidão e suas
conseências, como a do italiano Jorge Benci, jesuíta do século XVII, perseverante na
condenação do cortejo das negras por seus senhores, os quais além de presenteá-las prometiam-
lhes a alforria em troca de favores sexuais, fato este que, explicita, gerava grande humilhação
para as esposas legítimas.
Contudo, Vainfas afirma que a prática consagrou a parceria concubinato-escravidão de
maneira tão acentuada que tornou as pregões dos inacianos impotentes diante de um costume
arraigado no modo de vida colonial. Segundo o autor a própria igreja colonial se rendeu a esse
costume, como pode ser observado nas Constituições do sínodo baiano de 1707, que considerava
como prova de concubinato o fato de um homem manter em casa alguma mulher que dele
engravidasse, não sendo com ela casado e, ressalta-se, desde que a mesma fosse livre. Era assim
reconhecido silenciosamente o direito dos senhores engravidarem, com total liberdade, as
escravas da casa. Sexo pluriétnico, escravidão, concubinato formam um tripé fundamental na
Colônia.
O historiador alerta que a valorização e a difusão social do casamento cristão não deve
levar à conclusão de que a importância do concubinato foi exagerada pelos historiadores que o
abordaram. Ele aponta a necessidade de uma releitura do lugar que o concubinato ocupava na
sociedade colonial, desvinculando-o definitivamente da idéia de que era ele, necessariamente,
uma espécie de casamento informal, uma conjugalidade de fato que, como tal, podia substituir o
casamento legítimo. Tal afirmação marca uma diferença evolutiva alcançada nos tempos atuais,
nos quais foi exatamente o reconhecimento do concubinato – quando considerado puro – como
uma conjugalidade de fato, um casamento informal, o fator que propiciou sua elevação à
categoria de união estável, instituto jurídico novo com direitos e deveres previstos por lei. Vale
destacar que esse arranjo conjugal é representado na atualidade como uma espécie de
conjugalidade informal que, em muitos setores sociais vem substituir o casamento tradicional,
91
como atesta o seu crescimento acentuado nas últimas décadas, fator este que, por sua vez também
impulsionou seu reconhecimento jurídico.
De acordo com Vainfas (1997) estudos calcados nas visitas diocesanas indicam a
existência de imeros casos de casais chamados por ele de “amantes– que, embora não
sendo casados, viviam de portas adentro, viviam como se casados fossem, formando
verdadeiros cleos familiares com existência de filhos que eram por eles criados. Apesar dessa
forma de vida conjugal não substituir o casamento, na época considerado o único meio legítimo
de estabelecimento da mesma, o autor entende que o fato dos por ele nomeados “casais de portas
adentroserem apontados como concubinários ao visitante da Igreja indica que no julgamento da
comunidade esse arranjo não constituía uma falta grave. O historiador presume que, se não fosse
a presença do visitador da Igreja, tais casais não seriam importunados pela sua opção de vida
conjugal e a restrição à mesma ficaria limitada, quando muito, aos comentários sem grandes
conseências ancorados, podemos afirmar, nas representões sociais a respeito do concubinato
existentes nesse período. Isso nos permite considerar, com base no autor, que havia no Brasil
colonial um reconhecimento social da conjugalidade informal, embora com restrições morais,
jurídicas e religiosas próprias da época.
Vainfas (1997) salienta em certos casos a existência dos chamados tros ilícitosque
faziam com que tais situões, pela sua presença, em nada se assemelhassem a uma situação
conjugal, fosse ela legítima ou informal. Neles despontavam os imeros amancebamentos entre
senhores e escravas, os concubinatos de clérigos, as relões de adultérios que muitas vezes
tinham como resultado crimes passionais, e todo um conjunto de relações amorosas, duradouras
ou fugazes, que a comunidade quando interrogada pelo visitador não hesitava em classificar
como concubinato.
Estava-se, conforme Vainfas (1997), diante de relões que podiam conviver com o
matrimônio ou o estado clerical, embora fraudando o voto de fidelidade inerente ao primeiro ou o
voto de castidade que faziam os clérigos, sem que, em tais casos, essa convivência constituísse
qualquer forma de conjugalidade reconhecida socialmente. O historiador revela expressões do
vocabulário popular existente na época próprias para descrever situações semelhantes a essas:
92
“eram vistos entrar na casa um do outro, “costumavam andar juntos, mantinham conversações
desonestas, sendo todas indicativas de um estigma social que, apesar de existir independente da
ocorrência de visitas eclesiásticas, era estimulado por elas. Finalmente Vainfas (1997) esclarece o
lugar ocupado pelo concubinato no período colonial brasileiro e sua indissociável relação com o
casamento, dizendo:
Rival e cúmplice do casamento a um só tempo – e por vezes enlaçado com o estado
clerical , o concubinato moldava as relões extraconjugais da Colônia, relões em
boa medida pluriétnicas, não sendo comum naquele tempo a ocorrência de casamento
entre nubentes de posição social díspares. Casavam-se todos dentro da mesma igualha”,
ou quase, como que a seguir o conselho dos moralistas, ao menos quanto à cor e à
fortuna, deixando os amores e deleites para o mundo dos tros ilícitos. (p.238)
2.1.5. O concubinato e sua relação com o casamento ao longo da história
As relões conjugais não oficializadas consideradas concubinato até o seu
reconhecimento legal como união estável constituem uma prática que teve incremento a partir da
segunda metade do século vinte em paralelo à diminuição do número de casamentos e ao
surgimento da família nuclear, como demonstra Singly (2000). O autor ao mencionar o aumento
das “concubinagensdemonstra estar se referindo à união marital informal entre pessoas
solteiras, separadas ou divorciadas e não ao vínculo conjugal no qual um ou ambos os membros
se encontram na condição de casados com outras pessoas. Os dados do IBGE revelam, contudo,
que as uniões consensuais tiveram um aumento significativo especialmente nas últimas décadas
(a partir dos anos setenta), inclusive entre pessoas solteiras, se firmando como uma opção de vida
conjugal que se apresentava livre das formalidades próprias do casamento. Vale lembrar que a
união estável, embora ainda não tivesse sido reconhecida por lei, teve seu incremento como uma
modalidade de vida conjugal que pode se tornar pública e notória socialmente em um período
histórico em que, como afirma Giddens (2002), os critérios tradicionais haviam se enfraquecido e
o estilo de vida valorizado. Esses fatores permitiram que a vida em comum pudesse ser
estabelecida de várias maneiras, de acordo com o estilo de vida dos membros do casal e não mais
de critérios externos impostos pela tradição, como acontecia anteriormente.
93
Observamos, assim, uma mudança no que diz respeito às representações e às práticas
ligadas à união estável ao longo da história, que fizeram da mesma uma forma de relação
conjugal com acentuada incidência demográfica, fator este que, por sua vez, pressionou o
reconhecimento legal desse arranjo como entidade familiar, uma vez que, como ressalta Gama
(2001), o fato dele ter sido reconhecidoindica sua existência nas práticas sociais. Ou seja, a
legislação conferiu legitimidade a uma realidade social já existente, mas não reconhecida e,
portanto, não sujeita ao suporte da lei. O fato da união estável ter sido reconhecida como entidade
familiar é revelador da evolução histórica desse arranjo e do entrelaçamento entre os fatores
históricos, demográficos e jurídicos na sua constituição como objeto representacional socialmente
valorizado – em sentido positivo ou negativo – em cada época.
Se, por um lado, podemos entender que as mudança nas representões a respeito da
união estável propiciaram seu incremento nas práticas cotidianas e seu reconhecimento jurídico,
em outro sentido, o fato desse arranjo ter se tornado uma realidade tão freente fez com que
através de um processo de naturalização – o mesmo fosse encarado do ponto de vista dos
membros da sociedade como algo natural, passando a ser aceito, e em decorrência dessa
aceitação e presença irrefutável dentro da sociedade, alcançando estatuto legal de entidade
familiar. É pertinente, ainda, considerarmos que o próprio reconhecimento legal da união estável
é um fato novo que pode alterar as representões sociais e as práticas tocantes a esse objeto,
visto que, ao mesmo tempo em que garante legitimidade a esse arranjo, uma realidade já existente
há muito tempo na vida social dentro da qual tem se revelado cada vez mais aceita, a legalização
traz um novo elemento a essa forma de relação no que se refere à questão patrimonial,
introduzindo direitos, e também deveres, em uma modalidade de vida conjugal cujo
funcionamento está ligado a uma lógica em que aparentemente se está isento de deveres.
Não obstante, a maneira como a união estável se afirma como uma prática social cada vez
mais presente, haja visto seu aumento significativo atestado pelos dados estasticos oficiais, que
impulsionou seu reconhecimento jurídico, é um fator que a distancia do concubinato – termo
identifica sua origem – posto que na sociedade brasileira durante vários períodos históricos em
razão de critérios tradicionais era incomum e não aceito que um casal comasse uma relação
conjugal sem os ditames da tradição, da qual o único representante legítimo do ponto de vista
94
jurídico e social para efeito de estabelecimento da conjugalidade era o casamento. Então, o que
hoje denominamos união estável era uma relação que na sua origem, salvo exceções, acontecia
em sigilo entre duas pessoas casadas com outras, ou entre uma solteira e uma casada, e que
atentava contra valores religiosos e morais vigentes na época, apesar de ser uma prática comum,
especialmente por parte dos homens. Esse hábito chamado também de “casose manteve em
várias sociedades por muito tempo em virtude, inclusive, da indissolubilidade do casamento,
proibição que obrigava os cônjuges a se manterem “até que a morte os separasseunidos pelo
lo do matrimônio.
Gay (1988) faz a análise de uma vasta literatura íntima da classe média dos séculos XVIII
e XIX, afirmando que o casamento por si só não era a garantia de felicidade nesse período. Com
base em amostras de documentos privados descobertos em sótãos e arquivos, o autor retrata a
vida íntima dos casais na burguesia, citando o exemplo do relato autobiográfico da romancista
sueca Victoria Benedicts a respeito de seu enlace matrimonial, sobre o qual faz o seguinte
comentário:
Longe de se tratar de uma união feliz, esse casamento foi em parte o cumprimento de
uma promessa precipitada, em parte uma tentativa de se libertar dos pais, e em parte uma
repetição desesperada de seus esforços para conquistar o amor do pai. Tenho afeição
por ti, Chirstian, observa ela ao homem com quem viria se casar, porém jamais
vivenciei o que se chama de amor, e talvez jamais chegue a ter essa experiência” – o
que não constitui exatamente um como auspicioso. (p.89)
A descrição feita Gay (1988) evidencia que apesar de no período da burguesia o
casamento estar ancorado em critérios externos – destacando-se os interesses patrimoniais e,
associado a eles, as preocupações com a linhagem – o ideal de amor-romântico começou a surgir
como uma exigência para a efetivação da união conjugal, como afirmam também outros autores
que tratam do assunto, em particular Costa (1998). Contudo, mesmo no caso de relões
insatisfatórias, como a descrita acima por Gay, o casamento manteve-se durante vários séculos
como indissolúvel.
Além da impossibilidade de destituição do vínculo conjugal, os casamentos eram
arranjados em grande parte das sociedades, sendo, inclusive, o dote pago pelos pais da noiva à
95
família do noivo uma condição essencial para que a união se efetuasse. De acordo com Chaves
(1994), em torno do século X existia dois modelos antagônicos de casamento: o dos nobres e o da
igreja. Entre os primeiros o casamento era uma prática simultaneamente privado, vista que
transcorria nas casas, e pública, pois era um ato testemunhado por espectadores que a ele davam
sua aprovação. A autora afirma que o casamento existente nessa época “consistia num tratado
onde uma família dava uma mulher e a outra família a recebia em troca de um dote” (p.19-20).
Veyne (1989) esclarece, nesse sentido, que no Império Romano o dote era considerado um dos
meios honrosos de enriquecimento e uma das principais razões que levavam as pessoas a se
casarem ou contraírem justas núpcias, isto é, viverem em concubinato, realidade fática que na
época quando comprovada tinha efeitos legais de casamento.
O ideal do amor como base para a realização e manutenção do casamento é algo, como
demonstra Calligaris (1994), próprio da modernidade. Apesar do amor-romântico ter surgido no
final do século XIX na Europa, segundo Costa (1998), esse sentimento emergiu como uma
fantasia social termo utilizado pelo autor – positiva nessa época, uma vez que equilibrou os
interesses públicos e privados. Em suas próprias palavras:
O amor romântico quando se estabilizou como norma de conduta emocional na Europa,
respondeu a anseios de autonomia e felicidades pessoais inequivocamente criativos e
enriquecedores. Sua íntima associação com a vida privada burguesa o transformou em
um elemento de equilíbrio indispensável entre o desejo de felicidade individual e o
compromisso com os ideais coletivos. (COSTA, 1998, p.19)
Ou seja, apesar do amor-romântico não ser algo recente seu nascimento data do século
XIX – originariamente esse sentimento estava associado à ética, uma vez que, além do
compromisso com a felicidade pessoal, estava voltado também para os ideais coletivos, ou seja, o
bem comum. Essa visão se aproxima da proposta de Guareschi (1998), autor que afirma que a
ética não pode ser dissociada da questão da alteridade. O sentimento amoroso em sua forma
romântica esteve em vários períodos históricos ligado aos ideais de justiça social, sendo inclusive
esses próprios ideais e aqueles que os defendiam chamados algumas vezes, em sentido pejorativo,
de “românticos.
96
Entretanto, o romantismo se deslocou do cenário social para o estritamente privado. O
valor atribuído ao amor foi exacerbado e sua participação na dinâmica social praticamente se
extinguiu. A respeito desse processo de transferência do sentimento amoroso do âmbito público –
compreendido como social em sentido amplo – para o privado Costa (1998) afirma:
[...] à medida que refluía aceleradamente para o interior do privado, o romantismo
assumia a forma de moeda forte junto com o sexo e o consumo ...o amor se tornou
fantasmagoricamente onipotente, onipresente e onisciente. Deixou de ser um meio de
acesso à felicidade para tornar-se seu atributo essencial. (p.19)
Apesar de ter se tornado a condição essencial para o casamento, uma espécie de “sonho de
felicidade, o amor-romântico, não teve força suficiente para mudar uma situação social na qual a
conjugalidade era determinada por outros fatores de ordem, poder-se-ia dizer, muito mais prática
do que sentimental. A equivalência sócio-cultural entre os cônjuges era o aspecto considerado
central para o estabelecimento do vínculo conjugal.
Como afirma Chaves (1994), durante os séculos XI e XII houve uma intensificação da
intervenção da igreja no casamento com o intuito de controlar essa prática e torná-lo próximo do
modelo sacramental que estava sendo definido e estabelecido nesse período. Sendo regularmente
consentido o casamento passava a ser único e indissolúvel. A autora aponta um fato interessante
tocante à preocupação da igreja em relação ao casamento, que diz respeito à mudança do
interesse da primeira em relação à indissolubilidade e à monogamia aspectos já aceitos pela
aristocracia – para a natureza pública e institucional do casamento.
Assim, de acordo com Chaves (1994), a cerimônia de realização do casamento
, que
tradicionalmente era realizada em casa, foi transferida para as portas da igreja e o papel do padre,
até então circunstancial, passou a ser essencial. Ao desenvolver uma doutrina sobre o casamento
a igreja acentuou a importância do consentimento mútuo dos membros do casal. Esse
compromisso recíproco do casal representou, entre os séculos XIV e XVI, uma grande mudança
de mentalidade. Somente no século XVII as cerimônias de casamento foram transferidas da porta
da igreja para seu interior.
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Além do fortalecimento do papel do consentimento dos cônjuges, a igreja avigorou
também a diferença entre o amor no casamento e o amor fora do casamento, femeno que
persistiu até o século XVIII. De acordo com a moral cristã presente nas sociedades ditas
“antigas, o casamento não era a consagração de um relacionamento amoroso, mas a confirmação
de um negócio de família. Sua existência não se dava em função do prazer próprio dos esposos,
visto que era um contrato realizado entre duas famílias e, para que perdurasse por toda a vida,
fazia-se necessário a adoção de uma “regra de vida conjugal. Nesta se incluíam prescrições
morais que falavam de uma dívida conjugal e da não pertinência de um excesso de amor entre o
casal. Como afirma Chaves (1994): O amor no casamento exigia uma reserva, e o amor fora
do casamento era visto como amor-paixão(p.21).
Os teólogos construíram uma oposição entre o casamento, que tinha por objetivo a
procriação, e as relões amorosas, que foram associadas à busca de prazer excessivo. Havia um
receio de que um amor apaixonado pudesse prejudicar o relacionamento social e o amor devido a
Deus. Em conseqüência, esperava-se que o comportamento feminino fosse pautado pelo
comedimento e que sua entrega ao marido não fosse feita com paixão provocante, ato
considerado pico das cortesãs. Ao homem também era recomendado reserva no amor. O
sentimento amoroso deveria ser dispensado à esposa com discernimento e ele deveria controlar
seus desejos. Chaves (1994) cita Balzac para exemplificar essa forma comedida de amor
considerada ideal entre os cônjuges, a qual denomina amor-reserva. Ele afirma: “existe entre
amantes, uma igualdade que, a meu ver, jamais deve haver entre marido e mulher, sob a pena de
subversão social e de desgraças irreparáveis(BALZAC, apud CHAVES, 1994, p.21).
Observa-se em tal afirmação um reconhecimento da existência da relação de concubinato
ou de união estável cujos membros eram pelo autor denominados amantes. Embora, deve-se
ressaltar que o termo amante” era utilizado de maneira geral como sinônimo de concubina
como atestamos em Barbosa (1986) –, sempre em referência à mulher. Aos amantes ou
“concubinos” era permitido a vivência da paixão na medida em que não existia uma preocupação
de que a mesma causasse danos a esse tipo de relação ou à sociedade de forma geral, visto que o
término de uma união entre “amantesnão representava nenhuma ameaça social como acontecia
no casamento. Ao contrário, não era atribuída a essa forma de vínculo valor social que
98
justificasse uma preocupação com sua preservação, como acontecia com o casamento e a família,
já que era vista como uma prática amorosa ilegítima.
Paradoxalmente, Balzac afirma ainda que a relação entre amantes comporta uma
igualdade, ou seja, é mais simétrica do que aquela existente entre marido e mulher. Atualmente a
igualdade ou simetria entre o casal é compreendida pelos teóricos que abordam a conjugalidade
como “alteridade”, termo amplamente utilizado no campo de estudos das representações sociais
para tratar as relações interpessoais, ou seja, as relações com o outro. Sendo mais igualitária do
que o casamento e, ao mesmo tempo, um campo onde se podia viver a paixão desmesurada e
atender às demandas não preenchidas em relações conjugais consideradas insatisfatórias as
ligões amorosas eventuais e o concubinato perduraram desde a antiguidade de forma velada na
sociedade durante séculos. É importante esclarecer que, apesar do termo amante ser utilizado no
senso comum e até em setores especializados do conhecimento para se referir àqueles que
praticam o concubinato, esta forma de relação, quando vivenciada por homem e mulher livres de
impedimentos matrimoniais, diz respeito ao que hoje se denomina união estável e não a um
simples caso ou aventura. A relação entre um casal em que um ou ambos os membros tenha
vínculo conjugal anterior a mesma – qualificada muitas vezes de tal forma, ou seja, como um
caso ou aventura corresponde ao que a lei hoje denomina concubinato impuro. Apesar de
originar-se da literatura e mencionar a relação entre “amantes, a afirmativa de Balzac reflete
uma concepção tradicional presente na sociedade em diversas épocas de que na relação de
concubinato ou de união estável termo adotado a partir da Constituição de 1988 – existia uma
liberdade maior e, ao mesmo tempo, um menor grau de compromisso do que no casamento. Isso
teve como conseqüência uma outra idéia associada de que, em razão dessa liberdade, viver uma
relação de concubinato ou de união estável pode ser mais atraente do que casar.
Chaves (1994), ao citar as finalidades sociais e econômicas do casamento, afirma que até
o século XVII havia uma idéia associada ao casamento de que o amor era um sentimento que
surgiria e se desenvolveria naturalmente entre os cônjuges durante a vida conjugal. O contrato
nupcial determinava que a prática sexual entre o casal era legítima somente com o objetivo de
procriação. O casamento, nesse contexto, situava-se segundo a autora “em um vasto donio
público e um pequeno espo privado. (p.21)
99
Segundo a autora, somente a partir do século XVII se desenvolveu paulatinamente no
Ocidente um ideal de casamento no qual os cônjuges pudessem se abster da reserva tradicional
não mais desejável socialmente. O papel da criança na família passou a ser considerado central e
esta passou a circunscrever um maior espaço privado. Podemos considerar essa nova concepção
de casamento como precursora do ideal do amor-romântico, que começou a emergir nesse mesmo
século – tendo se intensificado no século XIX, sendo por esta razão que diversos teóricos (como
COSTA, 1998) demarcam esse como o período de seu nascimento –, inaugurando uma nova
concepção de indivíduo, um indivíduo que tem inclusive a liberdade de fazer escolhas amorosas.
De acordo com Chaves (1994) o amor romântico é baseado numa escolha realizada por
sentimentos individuais, e não mais em uma opção feita pelo grupo como resposta socialmente
desejável em função de interesses sócio-econômicos. A autora fala de uma resposta social. Nas
sociedades modernas o enfraquecimento dos critérios tradicionais fez com que o namoro e
conjugalidade pudessem acontecer indissociadamente e de acordo com a escolha dos cônjuges ou
companheiros e não mais da família, como acontecia nas sociedades tradicionais. Dotada de uma
pessoalidade outrora não existente essa escolha, como afirma Chaves (1994), passou a centrar-se
no indivíduo e não na situação, sendo o amor o aspecto mais importante e não a família.
Uma vez que os interesses patrimoniais eram, em geral, a base do casamento, a figura da
concubina aparece como uma alternativa às dificuldades enfrentadas num casamento no qual os
cônjuges, por razões sociais, religiosas, jurídicas, etc, não podiam se separar. Nesse contexto de
moral social rígida predominante até a segunda metade do século XX, “a outra– principalmente
e “a amante” são algumas das principais denominões atribuídas às mulheres concubinas cuja
moral era considerada indigna, em razão de seu relacionamento com um homem casado se tratar
de uma relação adulterina. Entretanto, o termo amante era também dado àquelas mulheres que na
época viviam em união estável, ou seja, que não sendo casadas mantinham uma relação com um
homem da mesma forma livre de impedimentos matrimoniais, o que também era considerado
concubinato. É importante ressaltar que a possibilidade legal de destituição do vínculo conjugal
aconteceu somente em 1977, com lei do Dircio no Brasil. Até essa data as pessoas não podiam
desfazer o casamento sendo apenas permitido em termos legais a separação oficial antigo
desquite –, prática que não foi aceita de imediato nos meios sociais. Uma vez que o casamento
100
era considerado indissolúvel, aqueles que se posicionavam contra esse preceito moral, jurídico e
religioso da indissolubilidade eram alvo de discriminação e até mesmo de exclusão social, assim
como os que viviam em união estável.
De acordo com Gama (2001) o casamento é concebido atualmente como instituição de
preocupação estatal. Tal concepção, segundo ele, é fruto da Revolução Francesa, embora tenha se
originado no movimento religioso da Reforma Luterana, que sempre se opôs à regulamentação
do casamento pela Igreja Católica, por considerar ser esse assunto do direito público, isto é, da
competência do Estado. Napoleão Bonaparte, através do Code Civil de 1804, atribuiu
características à estrutura familiar legal, com conotação hierarquizada, em torno do seu chefe,
seguindo o modelo patriarcal, autoritário e centralizador, retirando do modelo legal qualquer
forma de agrupamento familiar não constituído através do casamento civil. A união estável,
ressalta o autor, foi em um primeiro momento desconhecida do legislador frans que entendia
não ser direito da sociedade reconhecer essa forma de relação.
O jurista demarca esse momento histórico no qual ocorre a interferência do Estado no
casamento e na família aspecto fundamental no que se refere às implicações do reconhecimento
jurídico da união estável como entidade familiar citando Leite, que afirma:
A partir da interferência estatal na esfera familiar, até então caracterizada pela
predominância do particular sobre o público, a formação da família passou a ser
determinada por elementos predominantemente legais. Assim, a família legítima é
constituída por homem e mulher, livres, desimpedidos, que declaram solenemente sua
vontade diante da lei. (LEITE, 1997 apud GAMA, 2001, p.104)
Em decorrência da interferência do Estado a família passou a ser uma instituição
inaugurada pelo casamento formal, com predominância do público sobre o privado. Essa
definição da família a partir da lei teve implicações na união estável, então concubinato, na
medida em que essa forma de relação não atendia aos requisitos necessários à sua caracterização
como família. A partir do momento em que a família passou a ser definida em termos legais, as
uniões conjugais não oficiais, portanto ilegais, opunham-se a essa instituição. Isso gerou um
movimento em direção à regulamentação das relões conjugais não oficiais, cujos membros
101
envoltos nesse ideal legalista buscavam legitimidade em sentido estrito, da legalização, e
amplo, do reconhecimento social, até a primeira metade do século XX indissociados – para suas
práticas conjugais. Com o passar do tempo essa busca de legitimidade passou a não acontecer
através da legalização da união estável, tornando-a assim um casamento, mas, ao contrário, esse
arranjo conjugal passou a ser uma prática cada vez mais presente dentro dos diversos contextos
sociais. Tal incremento, como demonstrou Singly (2000), aconteceu de forma acentuada no final
dos anos sessenta e foi possível em virtude do enfraquecimento dos referenciais tradicionais ou
externos, fator que permitiu que a vida conjugal pudesse ser objeto de escolha individual, ou seja,
dos cônjuges ou companheiros, e não de critérios externos oriundos da Igreja, Escola e da própria
família, enfraquecidos com a chegada da modernidade. A respeito desse processo de legalização
da vida privada e suas implicações nesse arranjo Gama (2001) acrescenta:
Trata-se de um exemplo pico de que a relação de fato somente pode ser reconhecida
como relação jurídica de acordo com os valores históricos e locais que passaram a
predominar em determinado grupo, sob a imposição do poder político. Restou claro,
nesse particular, que apesar das divergências entre o Estado e a Igreja Católica havia
unanimidade em desqualificar o companheirismo de qualquer componente jurídico,
posto que existe como realidade sociológica. (p.104).
2.1.6. O gênero e suas influências no concubinato, casamento e união estável
De acordo com Maluf e Mott (1998), no início do século XX a família era uma instituição
legitimada e definida pelo Estado à sua semelhança. Nessa forma considerada ideal de família o
Estado legitimava também um papel social feminino ligado à imagem de “mãe, esposa, dona de
casa”, compreendida como a principal e mais importante função da mulher que, como afirmam os
historiadores, “correspondia àquilo que era pregado pela Igreja, ensinado por médicos e juristas,
legitimado pelo Estado e divulgado pela imprensa” (p.375). Malluf e Mott entendem essa
imagem da mulher autenticada pelo Estado a partir da definição de família, também legalizada
pelo mesmo, como uma representação que teve por conseência uma desconsideração da
constituição psicológica própria da mulher, fazendo com que suas obrigões passassem a ser
medidas e avaliadas pelas prescrições do dever ser.
102
Maluf e Mott (1998) citam o manual de economia doméstica denominado O Lar Feliz
publicado no mesmo ano do antigo Código Civil da República – 1916 – como um marco na
propagação dos papéis que, legitimados, deveriam ser exercidos pela mulher e, em se tratando
das relações de gênero, pelo homem dentro da família. Os autores ressaltam a importância dessa
obra na medida em que ela divulgava para um público amplo o papel a ser desempenhado por
homens e mulheres na sociedade, e, utilizando a idéia do lar feliz, sintetizava a estilização do
que denominam “espo ideologicamente estabelecido como privado. É importante lembrar o
conceito de família individualista e relacional (SINGLY, 2000), tratado no capítulo anterior,
considerada como aquela modalidade existente do início do século XX até os anos 60. Essa
organização familiar tinha como principal característica uma divisão tradicional dos papéis de
gênero.
Essa descrição precisa dos papéis de gênero é explicita na seguinte citação extraída por
Malluf e Mott (1998) do manual O Lar Feliz, destinado às jovens mães e, assinalam os autores,
“a todos quantos amam seu lar:
Nem a todos é dado o escolher sua morada, pois em muitos casais a instalação depende
da profissão do chefe. Entretanto à mulher incumbe sempre fazer do lar modesssimo
que seja ele – um templo em que se cultue a Felicidade; à mulher compete encaminhar
para casa o raio de luz que dissipa o tédio, assim como os raios de sol dão cabo dos maus
micróbios [...] Quando há o que prenda a atenção em casa ninguém vai procurar fora
divertimentos dispendiosos ou prejudiciais; o pai, ao deixar o trabalho de cada dia, só
tem uma idéia: voltar para casa, a fim de introduzir ali algum melhoramento ou cultivar
o jardim. Mas se o lar tem por administrador uma mulher, uma mulher delicada e com
amor à ordem, isso então é a saúde para todos, é a união dos corações, a felicidade
perfeita no pequeno Estado, cujo ministro da Fazenda é o pai, cabendo à companheira de
sua vida a pasta política, os negócios do Interior. (O lar feliz apud MALLUF e MOTT,
1998, p.374)
Os historiadores prosseguem fazendo a ressalva de que a descrição da família como
pequeno Estado” continha uma discriminação das funções de marido e mulher, atribuindo a cada
um papéis complementares, mas não pressupondo em momento nenhum, igualdade de direitos.
Como afirmam, “acentuava-se o respeito mútuo, que pode ser traduzido como a expressa
obediência de cada sexo aos limites do donio do outro. Nas palavras de Afrânio Peixoto
iguais, mas diferentes. Cada um como a natureza o fez( MALLUF E MOTT, 1998, p.375).
103
Maluf e Mott (1998) associam a descrição da família como um pequeno Estadono qual
homem e mulher tinham papéis de gênero complementares, mas não simétricos, com vários
preceitos do Código civil de 1916 que estabeleciam a inferioridade da mulher casada ao marido.
Sendo o homem o chefe da sociedade conjugal, cabia-lhe representar legalmente a família,
administrar os bens comuns do casal e os bens particulares da esposa segundo o regime
matrimonial adotado. Era ainda concedido ao marido o direito de fixar e mudar o local de
domicílio familiar. Como afirmam os autores, houve uma incorporação e legalização pela nova
ordem jurídica do modelo que concebia a mulher como dependente e subordinada do marido, e
este como senhor da ação. A esposa foi ainda declarada relativamente incapacitada para o
exercício de determinados atos civis, limitões que, ressaltam Maluf e Mott, eram comparáveis
somente aos pródigos, menores de idade e índios.
Os historiadores apontam uma distância entre o Código Civil de 1916 e a legislação de
1840, afirmando que neste último era atribuída ao marido, de maneira expcita, a chefia da
sociedade conjugal, assim como a responsabilidade pública da família. Cabia-lhe também a
completa manutenção dos seus, e a administração e o usufruto de todos os bens, inclusive
daqueles trazidos pela esposa no contrato de casamento. No Código Civil de 1916, a manutenção
da família passou a ser responsabilidade de ambos os cônjuges, e não somente do marido. Maluf
e Mott (1998) salientam um fato, denominado por eles de “perversão jurídica, que perpetuou a
submissão da esposa ao marido. Refere-se à necessidade da autorização do marido ou, em alguns
casos, do arbítrio do juiz para que a mulher exerça o direito de trabalhar.
Da época do antigo Código Civil, de 1916, até o período de promulgação do novo Código
Civil – 2002 – que trouxe, a partir do reconhecimento jurídico da união estável, implicações
substanciais não somente ao campo de Direito de Família, mas ao âmbito da conjugalidade e, por
extensão, da vida privada como um todo – aconteceram diversas mudanças tocantes aos papéis
femininos e masculinos e, em conseência, da expectativa social ligada ao desempenho desses
papéis dentro do casamento, cuja representação também se alterou. É importante ressaltar que
essas mudanças aconteceram no plano jurídico e social, uma vez que o contexto social, ao se
transformar a respeito de algum tema ou objeto, pressiona a criação de leis, como aconteceu com
a união estável. O atendimento ao princípio jurídico básico de que todos os seres humanos
104
inclusive homem e mulher, independente do gênero – são iguais perante a lei implicou uma
modificação tocante ao papel da mulher casada – que no primeiro código era hierarquicamente
inferior ao marido na administração da vida conjugal e familiar – passando essa a ser considerada
tanto quanto seu cônjuge responsável pelo casamento e família com ele construídos. Da mesma
forma, os direitos concedidos, ainda que por decisão jurisprudencial, à mulher convivente
constitui um exemplo das mudanças sociais tocantes ao gênero e de sua influência no campo
conjugalidade bem como, quando se trata de determinados fatos e/ou momentos históricos, da
trajetória conjunta construída por essas duas variáveis.
A legalização da união estável é um fato jurídico novo que representa um avanço
substantivo no âmbito da vida privada, visto que esse arranjo se tornou uma opção de vida
conjugal freqüente, mas que em razão de sua ilegalidade não gerava até a oficialização efeitos
jurídicos exceto através de jurisprudência – por ser considerada concubinato. A ancoragem no
concubinato é a razão da estigmatização que especialmente até a metade do século XX, quando
o casamento era considerado como o único modelo de vida conjugal e essa forma de relação,
apesar de existir, não era muito comum, exceto como concubinato impuro – incidiu sobre esse
arranjo e aqueles que a ele aderiam, especialmente às mulheres que quando viviam em união
estável eram chamadas de amantes, amásias, barregãs. Viver em união estável era para as
mulheres algo muito mais complexo do que para os homens. Sobre elas recaía uma discriminação
social acentuada como demonstram as adjetivações pejorativas citadas anteriormente, as quais,
embora tratassem de uma relação de concubinato formada por um casal, eram direcionadas ao seu
membro feminino. Tal associação com uma relação ilegal pode ser a origem de uma maneira
hegemônica de representar a união estável, que permaneceu durante muito tempo presente em
nossa sociedade, de maneira circular. Esse arranjo era mal-visto porque era ilegal e se mantinha
de tal forma porque, sendo mal-visto e ilegal, não constituía uma modalidade de vida conjugal
com presença demográfica significativa, de tal modo que a partir dessa representatividade aqueles
que a ela aderissem buscassem legitimidade social e jurídica, reivindicando direitos decorrentes
de sua opção.
Enquanto concubinato a relação conjugal e as demandas daqueles casais ou membros que
a constituíam, ao invés de se tornarem públicas, eram muitas vezes mantidas em sigilo, no âmbito
105
privado, pelo risco de discriminação social. A construção de uma identidade feminina em torno
da imagem da mulher mãe, esposa, dona de casa” eficiente endossada pelos referenciais
externos Estado, igreja, escola –, somados a um ideal higienista que pregava o casamento e a
família como um meio eficaz para evitação de doenças, presentes em um contexto tradicional,
dificultava a manifestação da alteridade e de outras formas de vida conjugal que não fossem o
casamento tradicional.
À medida que a identidade feminina se alterou, a mulher, do ponto de vista legal,
alcançou diversos direitos como o voto, a possibilidade de trabalhar fora sem a antes necessária
permissão do marido, etc. Evidentemente, imeras vezes apesar de determinadas leis serem
publicadas trazendo benefícios para a vida pública e privada, por serem fatos novos não são
assimiladas de imediato pelo todo social. A mediação do Estado é, especialmente no campo da
intimidade, algo que muitas vezes afeta a subjetividade provocando mal-estar, estranhamento. Tal
processo foi observado com a promulgação da Lei do Dircio (1977) que, apesar de trazer
indiscuvel avanço no campo da vida privada, não foi aceita de imediato nos setores sociais mais
conservadores. É importante lembrar que logo as a promulgação da Lei do Dircio as que
mulheres que se divorciavam eram alvo de severa reprovação, e até mesmo, discriminação, em
função de sua nova condição civil. A situação conjugal de divorciada atentava contra valores
tradicionais jurídicos, religiosos, morais, etc. – que determinavam a indissolubilidade do
casamento e um lugar único lugar destinado à mulher: o de mãe, esposa, dona-de-casa. Nessa
representação do feminino estão contidos elementos que remetem à conjugalidade, na medida em
que nela é atribuído à mulher um papel de esposa, e na representação da conjugalidade há sempre
uma referência ao gênero, através de uma expectativa ligada ao desempenho dos papéis
femininos na relação conjugal, o que manteve por muito tempo de forma hegemônica e
indissociada.
A alteração da identidade feminina possibilitou que as demandas das mulheres pudessem
ter visibilidade social, ou seja, se tornarem públicas, possibilitando uma mudança nas
representões sociais chamadas hegemônicas. Essa mudança aconteceu em muitos aspectos,
centrando-se particularmento no âmbito da conjugalidade. Podemos afirmar que os direitos
concedidos à mulher concubina por decisão jurisprudencial representaram um avanço no sentido
106
da legalização da união estável, além dos índices demográficos que atestam o aumento
substancial dessa modalidade de vida conjugal. A adoção de uma nova identidade em um
contexto cujos referenciais externos já estavam enfraquecidos parece ter feito com que esse grupo
minoritário tivesse possibilidade de buscar a legitimidade desse arranjo, cujo reconhecimento
social foi adquirido progressivamente. Nesse sentido, a própria “crise do casamento
contemporâneo, na qual a emancipação feminina é em conjunto com outros fatores apontada por
Jablonski (1998), autor que cunhou o termo, como uma das principais causadoras, fez com que o
modelo tradicional do casamento fosse questionado e outras formas alternativas de conjugalidade
fossem buscadas, já que, apesar da crise evidenciada pelo alto número de separações e dircios,
decréscimo do número de casamentos, etc., o desejo de viver algum tipo de experiência conjugal
ainda permanece no social. A união estável pôde ser vista então como uma alternativa de
construção da conjugalidade na qual, caso não dê certo, o processo de separação é mais fácil do
que no casamento. Há inclusive uma coincidência temporal entre o período de crise do casamento
e o incremento da união estável, como atesta Singly (2000), apontando o final dos anos sessenta
como uma época cujo crescimento desses dois femenos ocorreu de forma acentuada, como
demonstram também os dados estasticos oficiais divulgados pelo IBGE.
As representões sociais construídas em torno da união estável têm uma historicidade.
Havia uma maneira que podemos chamar hegemônica de representar esse arranjo quando
concubinato. Essa forma foi alterada através do processo histórico, culminando com o
reconhecimento jurídico desse arranjo, no qual a interferência do gênero teve um papel
fundamental. Como assinala Arruda (1998):
As lutas de demarcação de territórios identitários tais como se vêem nos problemas de
minorias, ou nas questões regionais que serviam de ilustração para Bourdieu (1982),
podem ser uma pista para a compreensão da dinâmica inevitável das representões
sociais que se desenharão representões hegemônicas. O que é fundamental, segundo
ela, é não perder de vista que uma representação pode encobrir outra. Cada
representação constitui uma vitória sobre a ambigüidade dos estímulos e dos sujeitos,
mas toda vitória é provisória. Ela é apenas um recorte da figura sobre o fundo, que pode
se inverter no momento seguinte, a depender de múltiplos fatores. Entre eles a interação
permanece provavelmente bastante influente, pois através dela se expressam as disputas
de interesses, os valores vigentes a cada momento, toda a miríade de possibilidades de
pressão que podem conduzia à closura e infletir sua forma. (p.43)
107
Arruda (1998) destaca o problema identitário das minorias como um caminho para
compreensão das representões hegemônicas deixa claro que o processo de construção dessas
entidades é dinâmico, mas não linear. No tocante à união estável é interessante investigarmos se
no conhecimento compartilhado a seu respeito permanece ou se constrói algo hegemônico. É
importante lembrar que esse arranjo é um acontecimento social antigo e, ao mesmo tempo, um
femeno jurídico novo que cria uma nova realidade social e representa uma “modernizaçãono
campo da conjugalidade. Nesse sentido, ao tratar da modernidade, Giddens (2002) discute as
divisões de classe e outras linhas fundamentais de desigualdade, dentre elas aquelas referentes ao
gênero ou à etnicidade, definidas em parte em termos do acesso diferencial ao poder, ressaltando
que “a modernidade, não se deve esquecer, produz diferença, exclusão, marginalização(p.13). O
gênero é um aspecto intimamente ligado às transformões ocorridas no campo da conjugalidade,
influenciando as representões sociais e práticas construídas a respeito das várias modalidades
de vida conjugal. No tocante à união estável podemos dizer que as mudanças nas representões
a seu respeito, revelada pelo incremento dessa forma de relação nas práticas, aconteceu
simultaneamente a uma mudança nos papéis sociais da mulher incentivada pelo movimento
feminista. Entretanto, o ideal de emancipação feminina preconizado pelo mesmo esbarrou em
dificuldades, visto que, como afirma Giddens (2002):
[...] ao se libertarem do lar, e da vida doméstica, as mulheres enfrentavam um ambiente
social fechado. As identidades das mulheres eram definidas tão estritamente em termos
do lar e da família que davam o passo” e entravam em ambientes sociais em que as
únicas identidades disponíveis eram aquelas oferecidas pelos estereótipos masculinos.
(p.199)
Assim como Arruda (1998) e Giddens (2002), Costa (1998) também aborda a liberação
das minorias sexuais, enxergando nesse processo uma influência na construção do amor-
romântico, ideal social, como afirma Giddens (2002), tipicamente feminino.
Podemos também supor que a liberação e a emancipação das chamadas minorias sexuais
trouxe, para muitos, a esperança de realização amorosa, aumentando assim o
investimento afetivo no ideal do amor. Podemos enfim, imaginar que, sem a força dos
meios dos meios tradicionais de doação da identidade família, religião, pertencimento
político, pertencimento nacional, segurança de trabalho, apro pela intimidade, regras
mais estritas de pudor moral, preconceitos sexuais, códigos mais rígidos de satisfação
sensual, etc. - restou aos indivíduos a identidade amorosa derradeiro abrigo num mundo
pobre em ideais de EU. (p.19-20)
108
Segundo Gay (1988) o laço conjugal era o mais importante do século XIX e o amor
indispensável para as mulheres nesse mesmo período em que predominava a discussão em torno
da sexualidade feminina. Quando o século XIX terminou esse debate cedeu lugar à discussão em
torno dos direitos da mulher incentivada pelo Movimento Feminista. Como afirma Gay (1988):
“a mulher moderna começava a levantar questões concretas e prementes, pressionando políticos,
educadores e médicos através de sua luta por uma educação liberação e profissional, por direitos
iguais no tocante à propriedade e ao dircio, e pelo direito de votar(p.124).
Entretanto o historiador salienta que, embora o movimento feminista mantivesse a
importante questão da sexualidade subjacente e quase totalmente impcita, dificilmente poderia
ignorar de todo a esfera erótica, visto que, segundo ele, as batalhas que se travaram a respeito do
aborto e da prevenção da concepção estavam tão explicitamente ligadas à sexualidade da mulher
quanto à sua emancipação legal e econômica. Ele afirma que a interminável sucessão de crianças
que os maridos queriam impor às esposas, bem como a persistência de antigos padrões de
hierarquia doméstica, mantinham muitas mulheres de classe média desgastadas em razão dos
trabalhos domésticos e dos cuidados com os filhos, impedindo-as de aprimorar suas apties
intelectuais e condenando-as a um envelhecimento precoce. O autor conclui assim que “nessa
atmosfera, carregada de problemas de conseências incalculáveis, a argumentação repetitiva e
maçante acerca de inclinões sexuais naturais da mulher acabou por se mostrar ofensiva e
desnecessária(p.124).
Embora o debate sobre os papéis sexuais seja algo que podemos chamar de moderno –
inaugurado pelo Movimento Feminista – o gênero é um aspecto central na estruturação da vida
social e, por conseguinte, dos sujeitos sociais –, cuja influência nas relões conjugais e
amorosas se observa desde a antiguidade. Veyne (1989) aponta a existência de uma idéia errônea,
falseada pelas lendas de que no período da antiguidade vigorava exclusivamente a não repressão.
O autor diz ter havido em Roma antiga um escravismo machista e uma recusa à paixão por parte
dos homens, uma vez que esse sentimento era visto como algo negativo porque fazia com que o
casal se apartasse do social. Essa representação fortemente influenciada por um padrão de papéis
de gênero, que originava expectativas ligadas ao cumprimento de tais papéis, teve como
109
conseência o que Veyne denomina como fronteira do amor romanodescrita na seguinte
afirmação:
A paixão amorosa é ainda mais temível, pois torna um homem livre escravo de sua
mulher, ele a chamará de senhora” e, como uma serva lhe estenderá o espelho ou a
sombrinha. A paixão amorosa não era, como para os modernos, um refúgio da
imaginação individual, no qual os amantes têm a impressão de estar logrando alguém
porque se afastam da sociedade. (p.198)
Essa retrospectiva histórica em torno da união estável nos permite uma análise acerca
daquilo que permanece, passando de geração em geração, e do que é mutável nas representões
e práticas a respeito da conjugalidade em suas várias formas, inclusive da união estável. Nesse
sentido Giddens (2002) reconhece que na atualidade ainda existam vínculos conjugais baseados
nos deveres e obrigações tradicionais, mas afirma que com o surgimento da relação pura
inclusive de parentesco, exceto entre pais e filhos devido ao desequilíbrio de poder envolvido –
as relações de modo geral estão cada vez mais desprovidas de tais critérios. O autor manifesta
descrédito em relação ao estabelecimento de tradições desaparecidas e a construção de novas
tradições, justificando:
[...] é duvidoso que a tradição possa ser efetivamente recriada nas condições da alta
modernidade. Ela perde sua razão de ser à medida que a reflexividade, associada aos
sistemas especializados, penetra por todos os desvãos até o centro da vida cotidiana. O
estabelecimento de “novas tradições” é claramente uma contradição em termos. E, no
entanto, dito isso, um retorno às fontes da fixidez moral na vida diária, em contraste com
a posição sempre revisáveldo progressismo moderno, é um fenômeno de certa
importância. Em vez de constituir uma regressão para uma recusa romântica” da
modernidade, pode marcar um movimento incipiente para além de um mundo dominado
por sistemas internamente referidos. (p.191)
Em virtude de sua historicidade, a união estável é uma forma de relação conjugal cuja
representação está, em nosso entender, ancorada no concubinato – como era considerada até o
seu reconhecimento jurídico ou no casamento. Dentro da perspectiva de Giddens (2002) a
ancoragem no concubinato pode ser compreendida como um certo retorno às fontes de fixidez
moral presentes em outras épocas, nas quais o casamento era a única forma de relação conjugal
aceita socialmente. A ancoragem no casamento, por outro lado, poderia estar ligada à construção
de uma “nova tradição, já que, apesar do casamento ser o meio tradicional de estabelecimento da
110
conjugalidade, uma vez sendo a união estável concebida pelo senso comum como um casamento,
esse arranjo passou a substituir as uniões formais em muitos setores sociais, alcançando
acentuada incidência demográfica. Esse incremento foi facilitado pelo enfraquecimento dos
critérios tradicionais e pelo fortalecimento dos sistemas internamente referidos. Entretanto,
quando representada como casamento a união estável é compreendida, em sentido bastante
diferente do tradicional, como algo sempre revisável, femeno esse tipicamente moderno. A
opção pela união estável representa, nesse sentido, uma modernização dos costumes ligados à
conjugalidade.
2.1.7. O concubinato na modernidade
De acordo com Pereira (1996) a referência sobre o concubinato na modernidade é dada
pelo jurista Moura Bittencourt (1969 apud PEREIRA, 1996) quando este anuncia:
A união não-matrimonial só desponta como elemento de negociação jurídica a partir da
instituição do casamento civil, no século XVI e nos séculos posteriores acentuou-se a
tendência de legislar-se sobre essa matéria. Anteriormente a essa conquista de
institucionalização do matrimônio, as ligões estranhas a este não se apresentavam
como problema: existia uma disciplina legal a respeito, tal como o Direito romano, em
que o concubinato era considerado casamento inferior, de segundo grau, e como no
regime das ordenões Filipinas, em que a ligação extramatrimonial prolongada gerava
direitos em favor da mulher. (BITTENCOURT, 1969 apud PEREIRA, 1996, p.28-29)
Gama (2001) esclarece que as Ordenões Filipinas, bastante influenciadas pelo Direito
Canônico, anularam várias regras integrantes de resoluções conciliares, cuidando pouco das
uniões passageiras – pelo autor denominadas concubinagem –, estabelecendo efeitos de união
estável, chamada na época de concubinato, como a união de duas pessoas de sexo diferente
vivendo como marido e mulher segundo a avaliação dos grupos aos quais pertencem. A esse
respeito Gama cita Pereira que afirma:
As ordenões, cuidando do concubinato em muitos dispositivos travam uma
diferença entre o comércio carnal e concubinato. Mancebia, barreguice ou concubinato
era a ligação de uma mulher, vivendo em fama de marido e mulher, com mesa e leito
comuns, por sendo havidos, por toda a vizinhança e vila (...) e entre ajuntamento,
simples cópula e mancebia. (PEREIRA, 1996 apud GAMA, 2001, p.103-104).
111
Na contemporaneidade, de acordo com Gama (2001), os tribunais franceses, convocados a
se pronunciar sobre causas propostas por concubinas, consideram as ditas relões como
sociedades com caráter econômico e como obrigação natural quando havia promessas de
determinadas vantagens para a ex-companheira. Em novembro de 1912 surgiu a primeira lei
francesa sobre o tema, estabelecendo como fato gerador de reconhecimento de filiação ilegítima
o concubinato notório, gerando uma série de leis sobre o instituto posteriormente.
Às hoje denominadas companheiras ou conviventesjuntam-se ainda os antigos termos
amante, amásia e barregã que, assim como os primeiros, refletem as representações sociais e as
práticas tocantes à união estável em determinada época, nas quais encontra-se um recorte de
gênero importante. Na literatura referente ao concubinato não encontram-se referências ao
homem concubino. Ou seja, apesar do concubinato em ambas as suas formas – puro e impuro, do
ponto de vista legal ter sido uma modalidade de relação comum aos homens e as mulheres em
todas as épocas e culturas, seu estigma social recai sobre a mulher. A concubina, a amante ou a
outra termos aplicados em casos de infidelidade são alvo de discriminação social na medida
em que podem destruir a família. Essa presença é tão ameaçadora que a prostituição – prática
ilegal chegou a ser apontada por Hungria como uma solução para os homens insatisfeitos com
seus casamentos, visto que, com a prostituta, ao contrário do que acontecia com a “amante, em
geral não se criam laços afetivos. Paradoxalmente, o concubinato é uma alternativa que pode
salvar o casamento, mas com a ressalva de que, se envolvesse afeto em uma época em que era
proibido aos cônjuges se separarem, poderia trazer uma série de prejuízos pessoais e sociais a
quem assim o fizesse. Nesse contexto não eram tão raras as situações de homens que se
apaixonavam por prostitutas. Entretanto, o contrato era de outro tipo e funcionava como uma
tentativa de assegurar o não envolvimento.
Com o passar do tempo a união estável tornou-se algo não exclusivo de pessoas casadas,
mas uma forma de relação comum inclusive entre jovens, que muitas vezes a adotam como uma
alternativa para o estabelecimento da vida conjugal sem se casar, uma vez que entende-se que
este arranjo não traz as obrigões vistas como necessárias no casamento. Essa modalidade de
relação é uma opção também bastante comum entre pessoas separadas que pretendem reconstruir
a vida conjugal sem ter que submeter-se novamente às formalidades picas do casamento. São
112
muitos os motivos que levam pessoas em diferentes situações sociais a optar pela união estável
dentre eles a não imposição a regras, e associado a esse fator, o rompimento com a tradição, etc.
–, devendo-se ressaltar, contudo, que o que prevalece como motivo para seu estabelecimento é o
amor. Em grupos distintos quanto à situação conjugal esse arranjo é visto como uma tentativa de
construção da conjugalidade que, caso não dê certo, é mais fácil separar.
É interessante notarmos que essa facilidade de rompimento do vínculo conjugal estava
ligado ao fato de que na união estável, em razão de sua informalidade – pois não estava sujeita à
mediação pelo Estado – não era necessário recorrer à justiça para repartir bens nos casos de
separação. Esse arranjo que inicialmente representava um querer estar junto simplesmente”
torna-se complexo, pois reacende essa discussão referente às questões patrimoniais relação por
interesse, manutenção da relação por medo de perder o patrimônio comum, que algumas vezes
não é comum, ou seja, não foi constituído conjuntamente pelo casal, ou o esforço em comum
empreendido para sua construção é compreendido de maneira distinta por esse, etc. – visto que
sua legalização foi feita tendo como modelo o casamento.
Em um contexto de crise do casamento contemporâneo, associada a um conjunto de
fatores como a emancipação feminina, o amor-romântico, a família nuclear, etc. (JABLONSKI,
1998), o concubinato continuou a existir, mas de maneira diferenciada. Nesse sentido algumas
considerações precisam ser feitas no intuito de demarcar a coexistência temporal do concubinato
e da união estável, já que atualmente são formas de relação distintas. Nota-se através das práticas
sociais que há muito tempo a união estável deixou de ser considerada socialmente como
concubinato, embora permanecesse até seu reconhecimento jurídico – iniciado na Constituição de
1988 e efetivado em 2002, com a promulgação do novo Código Civil em alguns setores mais
tradicionais com a marca do concubinato, uma vez que legalmente era entendida de tal maneira.
A legalização a retira então dessa categoria. Ou seja, a união estável não é mais, segundo a lei,
considerada concubinato, termo hoje aplicado legalmente somente àquele tipo de relação na qual
um ou ambos os membros sendo casados mantém uma relação amorosa com outra pessoa.
É importante ressaltar que, quando aqueles que “vivem juntossão legalmente casados,
ou seja, ainda não se separaram oficialmente, mesmo que de fato já o tenham feito, a lei não
113
entende essa relação como união estável, mas como um “concubinato puro, uma vez que,
estando seus integrantes separados de fato, embora não se encontrem separados de direitode
seus antigos cônjuges, não há infidelidade. O concubinato impuro, ao contrário, implica
infidelidade, uma vez que diz respeito à relação entre aqueles que estando casados de fato e de
direito firmam um vínculo conjugal com outras pessoas, não havendo garantias previstas em lei a
esse tipo de relação. Incluem-se nessa categoria as relões chamadas desleais formadas por
pessoas que, vivendo uma relação qualificada como concubinato, constituem uma nova relação
do mesmo tipo, e também os relacionamentos incestuosos (GAMA, 2001).
Consideramos tal distinção importante visto que a união estável, considerada até seu
reconhecimento jurídico como concubinato, foi uma relação durante um longo período mal-vista
socialmente, independente de ocorrer entre pessoas solteiras, separadas ou casadas, não tendo
nenhum amparo legal. Quando envolvia pessoas casadas ou separadas a discriminação social era
ainda maior, visto que, no primeiro caso, implicava infidelidade e, no segundo, reforçava o
estereótipo negativo do qual eram alvo as pessoas que dissolviam o vínculo conjugal. Vale
lembrar que a Lei do Dircio, um marco no campo do Direito de Família, data somente de 1977.
A relação de união estável apesar de ter permanecido incapaz de gerar efeitos legais até seu
reconhecimento jurídico, consolidado com a promulgação do novo Código Civil em 2002, se
tornou uma opção de vida conjugal cada vez mais comum, femeno que em nosso entender está
ligado a um processo de mudanças sociais acentuadas e, por assim dizer, da subjetividade social
–, no qual o significado do casamento e da família se alterou para um sentido diferente do
tradicional, sendo possível o estabelecimento da vida em comum e a constituição da família
embora hoje estes dois processos não estejam necessariamente referidos um ao outro – sem a
oficialização antes imposta pelos referenciais tradicionais. A união estável passou assim a ser
representada como uma relação conjugal – ou família, em geral quando o casal que a constituí
tem filhos em comum, apesar de, do ponto de vista jurídico, a família poder ser composta de
diferentes maneiras, inclusive por um casal sem filhos com sentido próximo ao do casamento e
não mais necessariamente como uma relação de caráter inferior.
Esse paralelismo em relação ao casamento e à família constituído pelo concubinato é
importante no estudo das representões sociais da união estável, uma vez que, apesar das
114
mudanças ocorridas no campo da conjugalidade, a consideração desse arranjo como uma “família
inferior, um semi-casamento, se mantém em alguns grupos sociais, sendo ainda hoje
aconselhado, por alguns sujeitos sociais e até mesmo por alguns operadores do Direito, ao casal
que decide pela vida em comum a opção do casamento em detrimento da união estável. O
argumento jurídico é, nesse sentido, usado em favor ao casamento tanto na época em que a união
estável era considerada concubinato quanto atualmente, as o reconhecimento jurídico dessa
forma de relação. Se antes da regulamentação justificava-se que o casamento era a melhor opção
porque a relação conjugal não legalizada concubinato – não oferecia ao casal nenhum tipo de
amparo legal em caso de separação, as a regulamentação a justificativa se baseia no fato de que
o reconhecimento jurídico da união estável estabeleceu alguns pontos complexos e sujeitos a
discordância no que se refere à divisão patrimonial.
Esses aspectos estão associados a imeros problemas suscitados pela legalização da
união estável evidenciados nas varas de família, dentre os quais destacam-se especialmente
aqueles referentes à repartição do patrimônio em comum. As questões patrimoniais são, desde o
início da relação de união estável, quando muitas vezes o casal opta por fazer um contrato
constitutivo de união estável, até o momento da separação, quando é preciso provar que a relação
existiu, um aspecto a respeito do qual é difícil haver consensualidade por parte do casal. Isso se
agrava na medida em que muitas vezes é difícil para o mesmo estabelecer um momento exato em
que a relação teve início, tornando também complexa a divisão do patrimônio constituído durante
a vida em comum, como prevê a lei.
Para evitar os conflitos e batalhas jurídicas decorrentes desse femeno jurídico novo o
casamento se reafirma algumas vezes como a melhor opção. Com o advento da união estável o
que era “simples” em razão da informalidade – viver junto – se tornou complexo, uma vez que
está sujeita à mediação do Estado e, como relação juridicamente reconhecida, aos direitos e
deveres estabelecidos por lei. O reconhecimento legal da união estável fez com que essa forma de
relação conjugal passasse a constituir uma nova realidade social na qual o simples, o já
conhecido, é o casamento, sendo, para alguns, melhor casar do que viver em união estável. Em
razão da complexidade inerente a esse arranjo na atualidade teve origem uma simplificação na
maneira de lidar com o mesmo da qual a opção pelo casamento faz parte. Tal estratégia é
115
compreensível, pois, além dos diversos problemas ligados à união estável, como todo objeto novo
esse arranjo provoca mal-estar, estranhamento.
Ao contrário do que acontecia em outras épocas em que o argumento jurídico a respeito
das uniões conjugais não legalizadas consideradas concubinato – era utilizado em favor da
discriminação, e até mesmo da exclusão, daqueles que optavam por esse tipo de relação, as o
reconhecimento da união estável como entidade familiar o vínculo conjugal não legalizado entre
homem e mulher que, através dos tempos, alcançou um significativo reconhecimento social,
passou a ser juridicamente oficial. Esse fato representa um avanço substancial no âmbito das
relões interpessoais e, especificamente, conjugais, e da alteridade. Mas como todo objeto novo,
e portanto não compreendido, gera um sentimento de ansiedade por parte dos atores sociais que
lidam com essa nova realidade social em suas práticas cotidianas. Esse sentimento é
potencializado, uma vez que a legalização da união estável traz conseqüências importantes à vida
privada, campo este que, depositário das expectativas acerca da conjugalidade construídas
socialmente, se afirma através dos tempos como um dos pilares fundamentais da existência
humana.
A contextualização da união estável como objeto representacional deve se dar nos
aspectos históricos, demográficos e jurídicos, os quais estão indissociados. Observamos que, na
análise da literatura referente a esse arranjo, o aspecto histórico é considerado por juristas como
Gama e Pereira, por exemplo – e também por Veloso em suas abordagens específicas a respeito
do tema. Por outro lado, os dados demográficos que atestam o crescimento dessa forma de
relação são expostos por historiadores ao tratarem das transformões ocorridas no campo da
vida privada. Dentre estas, o incremento das uniões conjugais não oficiais, aspecto demográfico,
é um fator considerado na maioria das abordagens acerca da conjugalidade, da família e de temas
correlatos na atualidade. É importante ressaltar ainda que a união estável tem uma trajetória
construída em conjunto com as transformações ocorridas na família e no casamento, cujo exame
é preciso para o seu entendimento. Esse arranjo é, do ponto de vista jurídico e do senso comum,
comparável ao casamento, inclusive no que se refere ao affectio maritalis (GAMA, 2001). Além
disso, a união estável é nesses dois campos reconhecida como família. Tal representação como
uma modalidade de vida conjugal próxima ao casamento marca a evolução histórica desse
116
arranjo, passando o mesmo a ser visto progressivamente como algo distante do concubinato. Essa
ancoragem no casamento permitiu o crescimento demográfico acentuado dessa forma de relação,
fator que impulsionou seu reconhecimento jurídico como entidade familiar.
117
2.2. CONTEXTUALIZAÇÃO DEMOGFICA
2.2.1. Os arranjos familiares no Brasil
Nesse capítulo será feita uma contextualização demográfica da união estável,
demonstrando seu crescimento nas duas últimas décadas em comparação às formas de relação
conjugal mais tradicionais especificamente o casamento civil e/ou religioso. Procurar-se-á
ainda demonstrar alguns fatores relacionados à incidência desse arranjo, como gênero, idade e
etnia. Para esse objetivo de traçar um perfil demográfico da união estável serão considerados os
dados relativos à nupcialidade no Brasil oriundos do estudo desenvolvido por Berquó (1998),
como também os resultados dos Censos Demográficos de 1991 e de 2000. A união estável é
abordada tanto por esta autora como pelos Censos com o título de união consensual, termo que
utilizaremos ao nos referirmos aos dados estasticos no intuito de manter uma fidelidade com o
instrumento oficial, passando, em outros momentos, a utilizar a atual denominação legal a ela
conferida.
Em sua análise acerca dos arranjos familiares no Brasil Berquó (1998) afirma que em
nossa sociedade as uniões conjugais foram regidas por sistemas legais que sofreram modificões
ao longo do tempo, fator que segundo ela dificulta as comparões de aspectos relativos às
mesmas por períodos muito longos. Observamos que a autora aponta assim a influência do
componente jurídico na incidência demográfica que os arranjos familiares e conjugais
apresentaram no decorrer do percurso histórico. Além dos fatores jurídicos, a presença das
diversas modalidades de relacionamento conjugal no campo social é determinada também por
fatores históricos, que fazem com que os índices demográficos que atestam o aumento ou o
decréscimo de determinado tipo de arranjo adquiram variação temporal. Como afirma Berquó
(1998), durante o Império o estado conjugal das pessoas era determinado pelo vínculo religioso,
nessa época católico e indissolúvel. Esse cenário se alterou a partir de 1870, quando, seguindo as
determinões da lei Nº 1829, ocorreu a organização do registro civil pelo Estado, ficando a
igreja obrigada a enviar à autoridade civil a série de informações registradas nesse órgão. Na
República, a lei de 24 de janeiro de 1890 criou o casamento civil, que passou a ser independente
do religioso e se tornou o único a ter validade jurídica e civil.
118
Berquó (1998) declara que, assim como as modalidades de relação conjugal, o tipo de
informação acerca do estado conjugal da população obtida através dos censos também variou
bastante nos vários períodos históricos. Para exemplificar essa mudança na forma de coletar os
dados relativos à situação conjugal da população brasileira a autora cita Jardim que esclarece:
O recenseamento geral da população do império, realizado em 1872, só considerou,
quanto ao estado civil, na lista de famíliaadotada para recolher as informões, os
solteiros, casados e viúvos; o de 1890, no mapadestinado à coleta de informões,
acrescentou àqueles quesitos o que se referia à condição de divorciado; o de 1900
também, no seu boletim individual, inquiriu sobre os divorciados; o de 1920 voltou ao
critério do de 1872; o de 1940 inclui no boletim de famíliao quesito relativo à
condição de desquitado, estabelecendo nas instruções para preenchimento daquele
boletim que as pessoas casadas segundo a lei estrangeira e que tivessem obtido divórcio,
em vez de desquitado deveriam responder divorciado, ao prestarem as suas informões.
O recenseamento de 1950 adotou diretriz semelhante. (JARDIM, apud BERQUÓ, 1998,
p.412)
Berquó (1998) prossegue revelando que em 1942 foi introduzido no Código Civil o artigo
315, que estabeleceu a separação sem dissolução do vínculo matrimonial, inaugurando uma
situação conjugal denominada desquite. Nesse mesmo ano a lei Nº 4529, de 30 de julho,
regulamentou a anulação do casamento. A autora salienta que atualmente continua em vigor a lei
Nº 6015, de 31 de dezembro de 1973, que regulamentou o registro dos fatos vitais, e a de Nº
6515, de dezembro de 1977, que instituiu o dircio, possibilitando que aqueles que se
encontrassem nessa nova condição de divorciados contraíssem novo casamento.
Tomando como base principal os dados censitários, a autora tem como proposta realizar
um levantamento dos arranjos familiares existentes no Brasil com enfoque em suas mudanças nas
últimas décadas. Ela afirma que cortes temporais no calendário da história atingem estruturas
populacionais específicas, cuja conformação é decorrente de processos demográficos que são, ao
mesmo tempo, resultado de mudanças nas formas e concepções de viver e sobreviver de uma
sociedade e condicionantes de novas possibilidades e estilos de vida de diferentes camadas
sociais. Berquó (1998) considera as oportunidades e fatalidades que ocorrem ao longo do ciclo
vital como fatores que modelam as biografias desses segmentos, e as situões em que esses
eventos aleatórios ocorrem como variáveis que se refletem nas configurões familiares, quando
119
examinadas em um dado momento. A influência dessas variáveis situacionais nas organizões
familiares contemporâneas é ilustrada na seguinte afirmação:
A situação de uma mulher morando sozinha com um filho, por exemplo, pode ser o
efeito de vários acontecimentos. Casou-se, teve um filho só ou apenas um sobreviveu,
depois separou-se ou ficou viúva e ainda não voltou a casar-se ou nunca o fará. Ou ela se
casou, teve mais de um filho e, ao separar-se, o marido ficou com a guarda dos demais
filhos, ou estes moram com os avós por causa da separação ou viuvez da mãe. Ou então
ela é mãe solteira, seja biológica, seja adotiva. Ou, ainda, se for mais velha, os demais
filhos já podem ter morrido ou saído de casa para formar novas famílias ou partir em
trajetórias migratórias à procura de outros destinos. (BERQUÓ, 1998, p.413)
De acordo com Berquó (1998), do ponto de vista demográfico, interagem, nesse caso,
processos resultantes da “evolução dos níveis e padrões da fecundidade”, do quantum e do
tempo da nupcialidade, das separações e divórcios e dos recasamentos, das alterões das curvas
de mortalidade e seus diferenciais por sexo e idade, e da intensidade dos deslocamentos espaciais
da população. A intensidade desses processos é determinada, por sua vez, pelas transformações
econômicas, sociais e culturais que ocorrem no decorrer do tempo.
Berquó (op .cit) entende a passagem do tempo como uma variável que exerce uma
influência fundamental na organização dos arranjos conjugais e familiares. Concedendo assim
um lugar de destaque ao aspecto temporal, a autora se reporta a Ryder, dizendo que, para esse
teórico, o significado da passagem do tempo constitui-se num problema que é, em parte, o
problema da sobrevivência, ou seja, da maneira como atravessar as etapas distintas do ciclo vital
até a chegada do envelhecimento. Ainda com base em Ryder, Berquó afirma que para uma
população esse significado equivale ao problema da reposição. Para que a necessidade de
manutenção de uma população seja atendida apesar da mortalidade de seus membros é preciso
que haja um processo de reposição, através do qual novos seres humanos são gerados para
substituir aqueles que morrem.
Como afirma Berquó (1998), essa tarefa de reposição demográfica e, por conseguinte, os
problemas advindos da passagem do tempo tanto para o indivíduo como para a população, é
atribuída à família. A partir de uma visão demográfica, a autora demonstra entender essas duas
atribuições como as principais funções da família. Ela afirma que, do ponto de vista demográfico
120
e estastico, a estrutura familiar brasileira existente nas últimas décadas tem sido marcada por
mudanças e permanências. E, assinala que o caráter nuclear da família, isto é, a organização
formada pelo casal com ou sem filhos, continua predominando, mas que a quantidade da família
diminuiu, e cresceu o número de arranjos monoparentais caracterizados pela presença do pai ou
da mãe com filhos, com a participação ou não de outros parentes habitando conjuntamente e de
uniões conjugais sem vínculos legais, arranjo conjugal que a partir da Constituição de 1988 foi
denominada de união estável e, com a promulgação do Novo Código Civil em 2002, reconhecida
como entidade familiar.
Berquó (1998) salienta, entretanto, que as mudanças tocantes aos arranjos conjugais e
familiares mais significativas vem ocorrendo no interior do núcleo familiar, principalmente no
que diz respeito à alteração do posicionamento da mulher dentro do mesmo e aos novos padrões
de relacionamento entre os componentes da família. Segundo a autora há atualmente uma
tendência pela qual a família hierárquica estaria cedendo lugar a uma família mais igualitária,
tendência esta mais visível na classe média urbana, mas que com o tempo teria passado a
transpassar também as camadas populares.
Berquó (op .cit) sustenta que a análise dessas transformações nos arranjos familiares,
observadas a partir do censo de 1950, requer um exame prévio do cenário matrimonial do país a
partir dessa data. Como afirmam diversos autores entre eles Singly (2000), cujas idéias a
respeito do final dos anos sessenta e suas implicações na vida conjugal e familiar já foram
tratadas no primeiro capítulo –, a segunda metade do século vinte é um período marcado por
profundas transformações sociais – nas quais se incluem alterões de concepções políticas e
religiosas – que atingiram a maneira como os membros de uma sociedade estabeleceram a vida
conjugal. A mudança de mentalidade inaugurada especialmente nos anos sessenta permitiu uma
quebra dos modelos tradicionais de vida conjugal e familiar e a adoção, nos termos de Giddens
(2002), de um estilo de vida com o qual a união estável era mais compavel do que o casamento,
forma de relação tradicional.
Esse processo de mudanças se estendeu até a atualidade, onde, por derivação, as
representões sociais existentes no campo da conjugalidade sustentam também uma nova
121
concepção de família. Assim como as representões e as práticas sociais ligadas a conjugalidade
mudaram, a família passou a ser atualmente representada e composta de forma distinta da
existente no início do século vinte – período em questão – época em que sua origem estava
irremediavelmente condicionada ao casamento. O ápice desse processo de mudanças ocorreu
com a promulgação do Novo Código Civil (2002) através do qual a união estável entre homem e
mulher passou a ser definida como família. Além disso, devemos lembrar das novas
configurações familiares como as famílias monoparentais e as famílias afetivas reconhecidas
juridicamente e pelo IBGE legitimadas a partir de uma nova maneira de representar o núcleo
primeiro formador dessa instância, a conjugalidade. A mudança das representões sociais e as
práticas tocantes a conjugalidade possibilitaram que esta passasse a ter como fundamento o afeto
e não a tradição, o que permitiu, como demonstram os índices estasticos, a incidência
demográfica de vários tipos de relação conjugal e de família e, nesse aspecto, do crescimento da
união estável em relação ao casamento.
De acordo com Berquó (1998) o comportamento matrimonial dos brasileiros alterou-se
nas últimas décadas em alguns aspectos e permaneceu constante em outros. Nesse período houve
um aumento do número de separações e dircios, uma manutenção da média das idades ao
casar, e um crescimento do papel das uniões não legalizadas na preferência das pessoas. Com
base nos últimos censos brasileiros, a autora afirma que a maior parte da população de quinze
anos ou mais enuncia-se casada, legalmente ou através de vínculos informais, apresentando-se
em seguida os solteiros. Enquanto a proporção de casados revelou tendência média ascendente
entre 1940 e 1991, decresceu a de solteiros, que passou de 40% a 31,8% nesse mesmo período.
As categorias viúvos” e “divorciados ou separadosdemonstraram tendências contrárias,
decaindo a primeira e ascendendo a segunda.
O aumento da expectativa de vida ao nascer, ao longo desses anos, é um fator considerado
pela autora como responsável pela diminuição do número de pessoas viúvas no cenário conjugal.
Um mero mais elevado de viúvas do que de viúvos é, segundo ela, justificado pelos
diferenciais por sexo no acréscimo de anos por viver, com sobremortalidade masculina. Entre as
mulheres, a proporção de viúvas caiu de 8,8% em 1960 para 8,2% em 1991, enquanto no
segmento masculino a viuvez representou 2,5% nesses mesmos anos.
122
Observamos a partir de Berquó (op .cit) que, apesar das variações relativas à
conjugalidade descritas anteriormente, a idade média do casamento legal não teve alterões
significativas. De 1974 até 1994 os homens casavam-se, em média, aos 27,6 anos. O mesmo
aconteceu com as mulheres, cuja idade na ocasião do casamento civil variou de 23,7 a 24,1 anos
entre 1974 e 1994. A autora aponta a permanência ao longo desse período de um traço cultural
responsável pelo fato do homem ser mais velho do que a mulher no ato do casamento legal. A
diferença de idade entre o homem e a mulher nesse momento, 3,6 anos, permaneceu praticamente
constante no período considerado.
Através de uma retrospectiva no tempo Berquó (1998) verifica que, para os homens, em
1940 a média de idade no ato do casamento legal era de 27,1 anos, a qual se manteve quase
inalterada até o final da década de noventa. Como afirma, esse processo, entretanto, aconteceu
somente com os homens, não atingindo as mulheres. Em 1940, elas se casavam no civil mais
cedo, em média aos 21,7 anos, idade que veio aumentando sistematicamente e passou a 23,3 anos
em 1950, 23,8 em 1960 e 24 em 1970. Esse aumento de idade ao casar é, segundo Berquó,
determinado pela alta progressiva nos índices de escolaridade entre as mulheres e pelo seu
ingresso no mercado de trabalho. Por outro lado, a autora entende que, entre aquelas que
iniciaram a vida conjugal através de uniões não formais, esses fatores podem ter prolongado o
tempo para legalizá-las.
Berquó (1998) ressalta que, apesar da presença dos que denomina “casados lato sensuser
majoritária no cenário matrimonial, houve um decnio da taxa bruta de nupcialidade legal
(mero de casamentos legalizados por mil pessoas) entre 1979, ano em que atingiu 7,83, e 1994,
quando passou a 4,96, como demonstra o gráfico 1. A autora assinala ainda uma queda
substancial do número de casamentos não legalizados em 1983 – ano em o que denomina crise da
década perdida” se mostrou mais acentuada –, quando houve também uma diminuição
significativa da renda das famílias. A partir desse período ocorreu uma pequena recuperação até
1986, ano em que a curva de nupcialidade é marcada por uma queda sistemática dos índices de
casamentos oficiais, femeno que se estende até a atualidade.
123
Gráfico 1 – dia da idades ao casar no civil. Brasil, 1974-94.
Em contrapartida à diminuição do número de casamentos legais as taxas brutas de
separações judiciais, isto é, desquites e divórcios (por mil pessoas) aumentaram no decorrer do
período, atingindo, em 1994, valor quatro vezes maior do que o correspondente em 1979 (gráfico
2), como demonstra Berquó (op .cit). A autora acredita que o intenso crescimento na primeira
metade da década de oitenta reflita, em grande medida, a oficialização de separões anteriores à
lei n.6515, de dezembro de 1977, que instituiu o dircio no país, concedendo aos divorciados o
direito de casarem-se novamente. Até então, como afirma, os casados no civil dispunham
unicamente do desquite, introduzido no Código Civil em 1942, que estabelecera a separação sem
dissolução do vínculo conjugal. Berquó (1998) interpreta o aumento do número de dircios
dizendo que a medida em que uma demanda reprimida de destituir legalmente o casamento – o
que, em nosso entender traz como conseqüência importante a possibilidade de refazer a
conjugalidade também por meios legais foi saciada pela promulgação da Lei do Divórcio, a
curva passou a refletir, nos anos posteriores, a própria dinâmica do comportamento matrimonial,
com taxas ascendentes de dircios.
124
Gráfico 2 – Taxas brutas de nupcialidade. Brasil, 1979-94.
De grande importância para o nosso estudo acerca representação social da união estável é
a análise feita por Berquó (1998) do total de pessoas casadas segundo o tipo de vínculo
matrimonial, a qual indica que os casamentos não legalizados – ou seja, a união estável
denominada pela autora de coabitação sem vínculos legais ou união consensual (tabela 1) – vem
assumindo importância crescente no país como revelam os índices estasticos por ela utilizados
que atestam seu crescimento acentuado especialmente a partir da segunda metade do século vinte,
mais especificamente dos anos sessenta. Como demonstra a autora, essa forma de relação que
representava, em 1960, 6,5% das uniões registradas atingiu, em 1995, a taxa de 23,5%, isto é,
quase um quarto de todos os casamentos existentes no país se inseriam nessa categoria informal.
Tabela 1 – Pessoas de 15 anos ou mais de idade, casadas, segundo o tipo de união.
Brasil, 1960-95.
Tipo de União 1960 1970 1980 1991 1995
Civil e Religioso 60,5 64,6 63,8 58,0 55,0
Só Civil 12,8 14,1 16,3 18,4 17,1
Só Religioso 20,2 14,4 8,1 5,2 4,5
Consensual 6,5 6,9 11,8 18,4 23,5
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: Fundação IBGE, censos de 1960, 1970, 1980 e 1991, e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD)
de 1995.
125
Berquó (1998) afirma, entretanto, que, embora desde a República, de acordo com a
Constituição de 1891, a única união reconhecida legalmente é a civil, a valorização do casamento
somente religioso continuou a existir entre as pessoas, fato que segundo ela acentua-se
especialmente em contextos marcados pela inexistência de cartórios do registro civil. A autora
diz que, apesar de haver muitas restrições aos conceitos de rural e urbano, ainda hoje, de cada
cem casamentos acontecidos em ambientes rurais, dez se realizam somente na igreja. Esses
índices a fizeram constatar que, apesar dos casamentos civis e religiosos continuarem
predominante no cenário matrimonial, a diminuição desses últimos e o crescimento do número de
uniões realizadas apenas no registro civil reforçam mais uma vez a queda do presgio do
casamento religioso, mais evidente nos centros urbanos.
Segundo Berquó (op .cit), no mesmo período em que os estudos demográficos passaram a
ser realizados de forma mais sistemática entre as décadas de 50 e 60 – as uniões consensuais
tiveram uma incidência maior nos estratos mais pobres da população. Como ressalta a autora,
essa forma de relação constituía, antes do dircio, que foi instituído somente em 1977, a única
alternativa para uma nova união as a dissolução de um casamento civil. Ela acrescenta,
entretanto, que estudos demonstram que entre os vínculos conjugais estabelecidos mais
recentemente a união consensual, além de assumir importância, tem se tornado uma primeira
opção para o estabelecimento da conjugalidade também nas camadas médias. Esse dado é
fundamental para o nosso estudo, visto que os maiores problemas relacionados à separação na
união estável são aqueles referentes à partilha do patrimônio construído pelo casal na vigência da
relação. Sendo a classe média o estrato que, de acordo com os dados censitários, tem maior poder
de aquisição de bens móveis e imóveis, pode-se supor que o casal a ela pertencente encontre
maiores dificuldades nesse aspecto da separação do que aqueles integrantes das camadas
populares.
Dentro desse raciocínio para esses últimos a disputa judicial seria inexistente, pois, não
havendo bens a repartir, não se justifica a mediação jurídica na separação – já que o vínculo é
informal e, ao contrário do casamento, comprovado a posteriori, ou seja, as existência da
relação – exceto para desfazer-se o contrato constitutivo de união estável, caso os conviventes o
tenham feito. Alguns representantes do senso comum e mesmo dos setores especializados do
126
conhecimento atribuem, inclusive, motivos econômicos à opção pela união estável, escolha que
eliminaria gastos com cartório, festa de casamento, etc. Deve-se lembrar, porém, que atualmente
as cerimônias de casamentos coletivos reduziram bastante as despesas jurídicas com o casamento.
Sempre foi possível casar somente no civil e, mesmo aqueles que optam pelo religioso, algumas
vezes preferem casar sem festejos, através da conhecida forma dos “cumprimentos na igreja.
Entretanto, muitas vezes, mesmo aqueles que estão iniciando a vida conjugal através da união
estável celebram esse momento com algum rito, em geral informal como o próprio arranjo, como
um jantar íntimo, etc. Ou seja, embora a classe social seja um fator importante no tratamento da
união estável, seu estudo a partir da perspectiva da psicologia social e como objeto privilegiado
da teoria das representações sociais exige a consideração de outros fatores como as próprias
representões sociais, as práticas, os costumes, etc. – que de maneira integrada se fazem
presentes e perpassam a adoção dessa modalidade de relação cada vez mais freqüente no
cotidiano. Berquó (1998) explica essa opção definindo a união estável – ou consensual, nos seus
termos – da seguinte forma:
Seria uma espécie de casamento experimental” com grandes perspectivas de adoção por
parte dos coortes mais jovens, principalmente aquelas que vivem nos grandes centros
urbanos. De experimental pode se tornar definitivo, significando uma ruptura com
valores e normas tradicionais. (BERQUÓ, 1998, p.421)
A autora acrescenta a esse respeito que dados do censo de 1991 revelaram que entre os
rapazes de quinze e dezenove anos que se encontravam “casados, 64% uniram-se
consensualmente, taxa que correspondia a 46% das jovens na mesma faixa etária. Segundo ela,
esses resultados confirmaram outras análises cujos dados atestam ter quadruplicado a proporção
de uniões consensuais entre quinze e dezenove anos no período de 1970 a 1980 na Grande São
Paulo.
Segundo Berquó (1998), embora exista a restrição civil ao casamento legal de mulheres
com menos de dezesseis anos e de homens com menos de dezoito anos, a elevada taxa de uniões
não legalizadas não pode ser explicada exclusivamente por esse aspecto legal. A autora considera
a associação entre a transitoriedade que caracteriza esse período do desenvolvimento e a
percepção da instabilidade do vínculo conjugal dos familiares e amigos desses jovens um fator
127
determinante na sua busca por formas de união mais coerentes com seu estilo de vida. Vale
lembrar que Giddens (2002) considera o estilo de vida como uma característica própria da
modernidade e que assume, em tal contexto, um significado particular, uma vez que sua escolha é
cada vez mais importante na constituição da auto-identidade e da vida cotidiana.
Berquó (1998) cita Greene, que afirma que em um contexto matrimonial ocasionado por
um déficit de homens nas faixas etárias em que as pessoas costumam casar-se, como é o caso do
Brasil, as uniões consensuais funcionariam como meio através do qual os homens poderiam
deslocar-se por várias uniões instáveis, dividindo-se entre diversas mulheres ao longo dos anos.
Greene afirma ainda que, quando a diferença de idade não é utilizada para atenuar a compreensão
do mercado matrimonial, o casamento informal pode cumprir esse papel. Utilizando dados da
PNAD de 1984, essa autora revelou a existência de uma correlação negativa entre o que
denomina “razão dos sexos” e a probabilidade das mulheres assumirem uniões consensuais, ou
seja, a maior disponibilidade de maridos potenciais possibilitaria às mulheres escolher a forma de
relação conjugal que querem assumir, se união formal ou consensual.
Berquó (1998) afirma, entretanto, que, apesar dessa possibilidade de escolha, as mulheres
continuarão em desvantagem no estabelecimento da conjugalidade, visto que, como aponta, o
censo de 1991 acentuou ainda mais, quando comparado ao de 1980, razões de sexo desfavoráveis
às mulheres a partir dos 25 anos. O déficit de homens em termos absolutos chega a 800 mil na
faixa dos 25 aos 39 anos. Berquó (op .cit) entende o cenário conjugal onde acontecem as escolhas
amorosas como um mercado que, como tal, está sujeito às leis da procura e da oferta. As escolhas
tornam-se assim difíceis em função da grande proporção de mulheres em idade de casar em
relação ao pequeno número de homens disponíveis.
As análises feitas por Berquó revelaram que, seja qual for o prisma utilizado para o exame
dos arranjos familiares, as mulheres enfrentam maior diversidade de situões, decorrentes da
assimetria a que estão sujeitas no cenário matrimonial em relação aos homens. A autora ilustra
essa afirmação dizendo que, na faixa etária de cinqüenta a cinqüenta e quatro anos, por exemplo,
um homem não casado teria uma chance trinta vezes maior de encontrar uma parceira do que
uma mulher na mesma faixa etária. Entretanto, ela reconhece que atualmente estar sozinha, ou
128
seja, não casar, pode ser também uma opção. O gráfico 3, além de documentar, para 1995, a real
forma assimétrica da “pirâmide dos não casados, revela o quanto o celibato e a viuvez
concorrem, no caso da mulher, para esse perfil demográfico desigual, no seu entender fruto de
escolhas e restrições.
Gráfico 3 – Estrutura Etária dos Não-Casados. Brasil, 1995.
2.2.2. A nupcialidade no Brasil: panorama geral
Os dados estasticos oficiais fornecidos pelo IBGE confirmam esse panorama descrito
anteriormente por Berquó (1998). O Censo 2000 informa o estado civil legal da população,
revelando que 54,2% das pessoas de 10 anos ou mais são solteiras, 37,2% são casadas, 3,7% são
desquitadas, separadas ou divorciadas e 4,6% são viúvas. Assim, em 2000, o país tinha 57,9
miles de solteiros, 33,8 miles de pessoas vivendo em união conjugal, 5,6 miles de viúvos,
2,4 miles de pessoas separadas, 1,4 miles de divorciados e 1,8 miles de desquitados. Entre
os solteiros, 45,9% situa-se na faixa etária de 10 a 19 anos.
129
Dados dos Censos Demográficos de 1991 e 2001 revelam ainda que, de 1991 até 2000,
49% do total da população de 10 anos ou mais, viviam em união conjugal, incluindo os
casamentos legais e as uniões consensuais. E ainda, que de maneira geral as mulheres se casam
mais cedo do que os homens, mas são estes que conseguem manter altas taxas de nupcialidade ao
longo da vida. As mulheres, a partir dos 35 anos, apresentam taxas menores. Entre os jovens de
15 a 19 anos, a proporção dos homens que vivem em união conjugal é superior à das mulheres
que se encontram nessa condição: 70,9% contra 27,9%. Este resultado revela que a partir de uma
certa idade as mulheres têm mais dificuldade de casar novamente. De acordo com resultados da
amostra do Censo Demográfico 2000, na composição por sexo, a grande predominância em todo
Brasil era de homens, com um excedente de 3,8 miles em relação às mulheres. Entretanto, nos
grupos de idade mais avançada existe tendência ao predonio feminino entre os solteiros, o que
explica as dificuldades para as mulheres nessa faixa-etária encontrarem cônjuges ou
companheiro(a)s.
A comparação dos resultados dos Censos Demográficos de 1991 e 2000, demonstra um
decnio da proporção de solteiros, um crescimento da proporção de desquitados, separados
judicialmente e divorciados e uma manutenção da proporção de casados e viúvos. Em 2000, das
33,8 miles de pessoas que viviam em união conjugal, conforme visto anteriormente, 49,4% era
casada no civil e no religioso, percentual inferior ao encontrado no Censo Demográfico de 1980:
63,9%. Contudo ainda fazendo-se a comparação dos resultados dos dois censos verifica-se que,
em 2000, o número de pessoas vivendo em união consensual cresceu em relação a 1980,
passando de 11,7% para 28,6%. O crescimento dessa modalidade de relação pode ser atestado no
gráfico abaixo:
130
Gráfico 4 – Proporção de uniões de pessoas de 10 anos ou mais de idade, por
natureza da união – Brasil 1980/2000.
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.
Os dados do IBGE revelam que de 1991 para 2002 – ano em que foi promulgado o novo
Código Civil que, entre outras determinões, reconheceu a união estável entre homem e mulher
como entidade familiar – diminuiu o número de casamentos no Brasil e cresceu o número de
separações e divórcios; Nesse mesmo período os homens se casaram, em média, com 30,3 anos e
as mulheres, com 26,7 anos. Os resultados do Censo Demográfico 2000 revelaram que a cor ou
raça e a religião são fatores importantes para a análise das uniões conjugais e geralmente
influenciam a idade média ao casar e a proporção daqueles que permanecem solteiros. A idade
média ao casar das pessoas que se declaram de cor amarela (orientais) foi a mais elevada (27
anos), o que é explicado pela estrutura etária desta população. A idade mais baixa foi encontrada
entre os indígenas (22,1% anos). Entre as religiões, a espírita, que também tem uma estrutura
mais envelhecida, apresentou a mais alta idade média ao casar (26,7 anos). Por unidades da
Federação, a maior idade média foi encontrada em Minas Gerais (25,2 anos) e a menor no Acre
(22,1 anos). Observa-se que a elevação da idade ao casar é uma tendência crescente, chegando a
aumentar 0,6% em dois anos – de 2000 a 2002.
131
Em relação à escolaridade, os dados do Censo 2000 revelam que o grupo sem instrução e
com menos de 1 ano de estudo apresentou idade média ao casar de 24 anos; para os que tinham
11 anos ou mais de estudo, essa idade era de 26,6 anos. Contudo, o grupo que apresentou menor
idade média ao casar (22,7 anos) foi o das pessoas que tinham de 4 a 7 anos de estudos. Portanto,
a idade não apresentou tendência crescente na estrutura da escolaridade. Entretanto, no que se
refere ao aspecto econômico, observou-se o aumento da idade média ao casar a medida que
aumentava o rendimento familiar, ou seja, os mais pobres casam-se mais cedo. Enquanto a idade
média para as pessoas com rendimento familiar de até um salário nimo era de 20,6 anos, para
os que apresentaram rendimento familiar superior a 20 salários era de 29 anos.
Em 2002 a idade média dos homens na separação foi de 37,7 anos e das mulheres, 35; No
Brasil os casamentos duram em média, 10,5 anos; no Acre 9 anos; Em cada 10.000 pessoas, 7 se
divorciam, sendo que os homens se divorciam mais tarde do que as mulheres. Em 2000, os
solteiros, considerados aquelas pessoas que não viviam em nenhum tipo de união conjugal,
totalizavam 57,9 miles de pessoas (42,3%), sendo que 52,7% nunca tiveram nenhuma união e
5,2 miles eram solteiros que já viveram em união consensual. A taxa de dircios aumentou
ligeiramente em relação a 1991, quando era de 1,0 dircio por mil habitantes, mas tem se
mantido estável em 1,2 por mil desde 1999. A taxa de separões judiciais tem se mantido estável
em 0,9 por mil habitantes desde 1991 – a única exceção foi o ano de 1993, quando aumentou
ligeiramente para 1,0 por mil. Assim como a taxa de nupcialidade, as taxas de dircios e
separações são calculadas sobre a população de 15 anos ou mais.
No período de 1991 a 2002 diminuiu a proporção de casamentos legais e aumentaram os
índices de uniões consensuais. No que se refere ao estado conjugal das pessoas o Censo revelou
que, entre 1991 e 2000, houve uma queda no total de casamentos legais, que de 57,8% passou
para 50,1%, enquanto a proporção de pessoas vivendo em união consensual aumentou
significativamente, passando de 18,3% para 28,3%. Entre os mais jovens, as proporções de
pessoas que adotam esse tipo de vínculo conjugal são maiores. Entre as pessoas unidas
consensualmente o estado do Amapá tem a maior proporção de pessoas que não são legalmente
casadas, 57,2%, mas que vivem em união consensual, vindo a seguir Roraima com 51,2% e
Amazonas, 48,4%. Por sua vez os estados do Piauí, Minas Gerais e Santa Catarina têm
132
respectivamente proporções menores, 17,4%, 18,1% e 19,9%. O Censo de 2000 revela que nos
municípios maiores, a proporção de união consensual chegava a 31, 3%. O Rio de Janeiro, local
onde será realizada nossa pesquisa, é, segundo a tabela abaixo, o segundo estado em mero de
uniões consensuais. A tabela 2 demonstra as proporções relativas aos tipos de vínculo conjugal
casamento civil e religioso, casamento civil, casamento religioso e união estável – nas grandes
regiões e unidades da Federação Brasileira.
Tabela 2 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal, por
tipo de união, segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação.
Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal
Tipo de união
Grandes Regiões e
Unidades da Federação
Total
Casamento civil
e religioso
Só casamento
civil
Só casamento
religioso
União
consensual
Brasil
67 440 422
a
33 763 324
b
11 640 821
c
2 928 522
d
19 107 754
c
Norte
4 590 520
b
1 312 362
d
794 322
d
482 161
e
2 001 675
c
Rondônia
563 129
c
224 033
e
114 260
f
20 198
h
204 637
e
Acre
188 770
c
42 503
f
34 363
f
23 663
g
88 241
e
Amazonas
965 972
c
209 550
e
171 263
e
117 694
g
467 465
d
Roraima
115 807
c
23 020
f
25 011
e
8 537
h
59 240
d
Pará
2 160 581
c
627 051
e
340 728
e
240 921
g
951 881
d
Amapá
159 640
c
32 403
g
19 880
g
16 117
g
91 240
d
Tocantins
436 622
c
153 802
e
88 816
e
55 032
f
138 972
e
Nordeste
17 332 359
a
6 247 174
c
3 728 923
c
1 585 672
d
5 770 590
c
Maranhão
1 929 028
c
401 788
e
548 743
e
273 189
f
705 309
e
Piauí
1 057 928
c
412 875
d
255 480
e
205 200
f
184 374
e
Ceará
2 752 759
b
1 279 980
d
514 571
d
253 663
f
704 546
d
Rio Grande do Norte
1 057 741
c
364 951
e
276 938
d
53 020
g
362 832
e
Paraíba
1 288 946
c
578 677
d
260 339
e
96 081
g
353 849
e
Pernambuco
2 918 056
b
1 071 927
d
644 093
d
124 706
f
1 077 330
d
Alagoas
1 015 991
c
394 117
e
179 040
e
96 065
f
346 768
e
Sergipe
652 667
c
221 661
e
116 533
e
43 604
g
270 869
d
Bahia
4 659 242
b
1 521 197
d
933 185
d
440 144
f
1 764 715
d
Sudeste
29 714 757
b
17 221 648
c
4 817 342
c
428 242
e
7 247 524
c
Minas Gerais
7 008 049
b
4 780 890
c
785 686
d
169 627
g
1 271 847
d
Espírito Santo
1 298 708
c
692 576
d
231 252
e
19 592
h
355 287
e
Rio de Janeiro
5 888 747
b
2 534 292
d
1 233 837
d
62 196
h
2 058 422
d
São Paulo
15 519 253
b
9 213 890
c
2 566 567
d
176 827
g
3 561 970
d
Sul
11 068 589
b
6 817 764
c
1 390 289
d
271 169
e
2 589 367
d
Paraná
4 020 028
c
2 500 073
d
551 118
e
116 283
g
852 553
d
Santa Catarina
2 478 470
b
1 722 000
c
189 742
e
72 953
g
493 775
e
Rio Grande do Sul
4 570 092
b
2 595 690
d
649 430
d
81 933
g
1 243 039
d
133
Centro-Oeste
4 734 197
b
2 164 377
c
909 945
c
161 279
e
1 498 597
c
Mato Grosso do Sul
868 761
c
361 130
e
158 294
e
26 504
g
322 833
d
Mato Grosso
1 007 951
c
442 949
d
169 154
e
42 482
g
353 366
d
Goiás
2 091 972
b
1 007 318
d
434 396
d
71 034
f
579 223
d
Distrito Federal
765 514
c
352 980
d
148 101
d
21 258
g
243 175
d
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000
A presença demográfica maior da união estável nos municípios maiores demonstra que a
urbanização, variável cuja influência já fora estudada em relação ao casamento (JABLONSKI,
1998), tem influência também na união estável. O fato de pessoas viverem em grandes centros
urbanos ou mesmo em municípios maiores entendidos aqui em oposição às zonas rurais as
torna mais sujeitas ao processo de modernização dos costumes, no que se inclui as representões
e práticas sociais ligadas à conjugalidade, dentro do qual a união estável se tornou um
acontecimento comum e, recentemente (2002), um femeno jurídico. A tabela 3 revela os
índices relativos ao estado conjugal de pessoas, com destaque para a união estável, em situões
de domicílio rural e urbana.
Tabela 3: Percentual de pessoas de 10 anos ou mais de idade por estado conjugal e
situação do domicílio, Brasil 2000.
Pessoas de 10 anos e mais de idade
Estado conjugal
Casadas / Unidas
Situação do
domicílio e classes
de tamanho da
população dos
municípios
Total
Solteiras (1)
Total
No civil
e/ou
religioso
União
consensual
Desquitadas ou
Separadas e
Divorciadas (2)
Total
136 910 358
38,6 49,5 71,4 28,6 7,8
Urbana
112 387 959
38,3 49,0 70,8 29,2 8,5
Rural 24 522 399 40,3 51,7 74,0 26,0 5,0
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000 - Amostra.
(1) Não vivem e nunca viveram em companhia de cônjuge
(2) Não vivem em companhia de cônjuge, mas já viveram.
134
Esse aumento significativo do número de uniões estáveis ocorrido especialmente nas
últimas décadas e a concomitante diminuição do número de casamentos, femeno descrito por
Berquó (1998) e evidenciado pelos dados estasticos oficiais fornecidos pelo IBGE – nos quais a
referida autora também se baseou como fundamento de sua análise demográfica aponta para
uma mudança nas representações e práticas tocantes à conjugalidade. A adoção de uma
modalidade de vida conjugal informal se enquadra na adoção de um estilo de vida – possibilidade
pica da modernidade ao mesmo tempo individual e coletivo, na medida em que a união estável
é um arranjo baseado em uma escolha individual que se tornou presente em diversos segmentos
sociais, o que teve como conseência uma queda da nupcialidade uma vez que em se tratando
do estabelecimento da conjugalidade tem se tornado, freqüentemente, a primeira opção.
2.2.3. A união estável no contexto nupcial brasileiro
As informões a respeito da nupcialidade são encontradas no Registro civil, sendo
importante esclarecer de início que as informações dessa fonte são publicadas desde 1974 e
fornecem nocias relacionadas aos fatos vitais, ou seja, nascimentos e óbitos, casamentos,
separações judiciais e dircios ocorridos no Brasil. Esses dados são considerados um
instrumento importante no acompanhamento da evolução populacional do país, viabilizando
estudos demográficos e subsidiando a implementação de políticas públicas e o monitoramento do
exercício da cidadania. Com base em informões obtidas nos cartórios do Registro Civil e nas
Varas de Famílias, em 2002, o capítulo que trata dos casamentos e dircios aborda os arranjos
conjugais, com dados sobre o número de uniões legais, e as dissoluções desses casamentos, que
englobam as separões judiciais e os dircios. A união estável é, nesse mesmo capítulo, tratada
com a denominação de união consensual.
De acordo com dados do IBGE, os brasileiros casam-se cada vez menos e mais tarde,
como demonstra a taxa geral de nupcialidade legal, índice que caiu gradualmente durante a
década de noventa, passando de 8,0 por mil habitantes em 1990 para 5,7 por mil em 2001. Essa
tendência de queda foi observada principalmente nas regiões Sul e Sudeste. O ano de 1999 foi,
135
contudo, uma exceção, visto que apresentou o maior mero de casamentos da década (788 mil)
e teve aumento nas taxas de nupcialidade em todas as regiões. Tal fato é explicado pela
realização de várias cerimônias coletivas para a efetivação de uniões legais, sobretudo no
Nordeste e no Centro Oeste do país, onde também são maiores as taxas de dircios.
A comparação da última década com os dados de 2002 demonstrou queda de 4% no
mero de casamentos realizados. Em meros absolutos foram 715.416 casamentos realizados
em 2002, contra 743.416 realizados em 1991. Na comparação com 2001, o aumento de uniões
legais foi de 1%. Entretanto, essa queda no número de casamentos não ocorreu de forma
ordenada, visto que o menor mero de uniões legais (697 mil) foi registrado em 1998, e o maior
(786 mil), em 1999. O aumento de quase 90 mil casamentos observado de um ano para outro foi
influenciado pela realização dos vários casamentos coletivos ocorridos em diversos estados
brasileiros, numa parceria entre as prefeituras locais e a Igreja Católica. Em 2002, essa iniciativa
repetiu-se, mas de maneira menos intensa do que a observada em 1999. Ainda assim, de 2001
para 2002, a taxa de nupcialidade legal, que expressa o número de casamentos realizados em
determinado ano por mil habitantes, manteve-se constante (4,1) no Brasil. Entre os estados, o
Espírito Santo apresentou a taxa mais alta, 5,6, e o Maranhão a mais baixa, 2,2.
É importante destacarmos que essas cerimônias coletivas de casamento aconteceram com
o objetivo de legalizar as uniões consensuais já existentes no país. Esse incentivo à conversão da
união estável em casamento é também encontrado na lei que regulamenta essa forma de relação e
facilita sua conversão em casamento, diminuindo os trâmites burocráticos necessários para a
realização do mesmo. Em um contexto de crise do casamento contemporâneo (JABLONSKI,
1998) evidenciada pelos dados estasticos oficiais, que revelam a diminuição do número de
casamentos em paralelo ao aumento do número de separações e dircios, a união estável cresce
como primeira opção de vida conjugal na preferência das pessoas, opção esta que se enquadra em
um estilo de vida próprio da modernidade, onde há um rompimento com os referenciais
tradicionais. Entretanto, apesar dessa forma de relação se afirmar como um acontecimento cada
vez mais presente nas práticas cotidianas até se tornar um femeno jurídico novo, em 2002 –
sua trajetória não é totalmente linear. A tentativa de transformá-lo em casamento demonstra não
um retorno da tradição, considerando a improbabilidade do mesmo afirmada por Giddens (2002),
136
mas a nuance de uma forma hegemônica de representar esse arranjo que em outras épocas já fora
considerado concubinato.
Apesar de durante toda a década de noventa a taxa de nupcialidade ter decrescido no
Brasil, houve uma estabilização da mesma no período de 2001 para 2002. Em 1991 foram
registradas 7,5 uniões legais por mil habitantes, número que caiu para 5,7 por mil em 2001 e
2002. A taxa leva em consideração apenas a população em idade de casar, segundo o IBGE, ou
seja, 15 anos ou mais. Essa queda da nupcialidade indica que o casamento formal vem perdendo
força no país, cedendo lugar às uniões informais.
O mero de casamentos registrados no ano de 2002 aumentou 1% em relação a 2001.
Ainda assim permaneceu num patamar 4% inferior ao de 1991. Essa oscilação da taxa de
nupcialidade é demonstrada no gráfico abaixo.
Gráfico 5 – Resumo Geral (casamentos, separações, dircios, etc).
Os dados do IBGE demonstram que, indubitavelmente, a união estável se tornou uma
alternativa cada vez mais comum para o estabelecimento da conjugalidade. Nesse sentido, é
137
importante considerarmos quais fatores – ou variáveis estão associados ao crescimento dessa
forma de relação e, por conseguinte, influenciando as representações sociais construídas a seu
respeito. Por sua vez essas representões podem orientar outras práticas específicas, inclusive
aquelas ligadas ao convívio cotidiano do casal que vive em união estável, como, por exemplo,
acordos referentes ao patrimônio em comum, feitura de um contrato constitutivo de união estável,
etc. A interação conjugal é assim alterada em função da inclusão de novos dados na relação
afetiva, uma vez que, apesar de aparentemente objetivos, eles suscitam questões subjetivas
fundamentais no que se refere à construção e manutenção do vínculo conjugal. Dentre essas
questões a confiança, um dos eixos do que Giddens (2002) denomina relação pura, é um aspecto
central mobilizado na discussão relativa aos bens.
O gênero e a idade são, segundo o IBGE, fatores correlacionados à opção por esse arranjo.
Em um contexto social marcado pela multiplicidade de arranjos familiares e conjugais e, de
acordo com Berquó (1998), pela desvantagem feminina no que se refere ao estabelecimento da
conjugalidade, tem aumentado o número de mulheres unidas conjugalmente com homens mais
novos. A proporção de uniões em que a idade do homem é inferior à idade da mulher é uma
tendência em ascensão nos últimos censos. Em 1980 representava 15% do total das uniões;
passou a 17,3 % em 1991 e atingiu 19,1% em 2000.
A maior proporção de vínculos com essa característica se encontrava entre as uniões
consensuais e, em 55% delas, a diferença de idade entre mulheres e homens era de até 3 anos. Em
9,2% das uniões de mulheres com homens mais novos a diferença de idade existente era de 10
anos. A união consensual é o tipo de relação em que se encontram as maiores proporções
relativas à diferença entre as idades do homem e da mulher, com predonio da idade da mulher
maior que a idade do homem. Em comparação ao casamento, seja ele civil ou religioso, esses
índices aumentam, como demonstra a tabela 4. No casamento, ao contrário, há um predonio da
idade do homem.
138
Tabela 4 – Propoão de uniões de pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam
em companhia de cônjuge ou companheiro(a) por categorias de diferença entre as idades do
homem e da mulher.
O fato da união estável ser caracterizada como tipo de relação conjugal onde mais se
encontram diferenças tocantes à idade da mulher e do homem faz com que se confirme o
entendimento de que o gênero é uma variável fundamental no estudo das representões sociais
construídas e compartilhadas a seu respeito. Os dados do Censo revelaram a influência de uma
associação entre gênero e idade na opção por essa modalidade de relação conjugal. A análise dos
tipos de união por sexo e idade revelou que as mulheres mais jovens, entre 15 e 19 anos,
experimentam todos os tipos de união, especialmente a união estável, onde têm participação 3,5%
maior que a masculina. Em 2000, havia 954.044 mulheres nessa faixa-etária vivendo em união
estável, em oposição a 259.071 homens. A partir dos 25 anos de idade, as uniões legais das
139
mulheres ultrapassam as uniões consensuais. E seguindo essa tendência aparente a legalizar a
união com o tempo – e, conseqüentemente, com o aumento da idade a partir dos 40 anos a
participação masculina nas uniões legais passa a ser superior à feminina. A tabela abaixo revela a
incidência etária dos tipos de vínculo conjugal abordados pelo Censo (tabela 5).
Tabela 5 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal, por
tipo de união, segundo o sexo e os grupos de idade Brasil.
Pessoas de 10 anos ou mais de idade que viviam em união conjugal
Tipo de união
Sexo e grupos de
idade
Total
Casamento civil
e religioso
Só casamento
civil
Só casamento
religioso
União
consensual
Total (1)
67 440 422
a
33 763 324
b
11 640 821
c
2 928 522
d
19 107 754
c
10 a 14 anos
86 762
f
10 181
h
5 257
i
1 911
j
69 413
f
15 a 19 anos
1 623 146
c
203 127
e
203 236
e
64 079
f
1 152 705
d
15 a 17 anos
550 865
d
50 935
g
51 567
f
21 838
g
426 525
d
18 e 19 anos
1 072 281
d
152 191
e
151 669
e
42 241
f
726 180
d
20 a 24 anos
5 724 799
c
1 342 218
d
951 120
d
263 299
d
3 168 162
c
25 a 29 anos
8 442 597
c
2 943 414
c
1 615 825
c
372 557
d
3 510 800
c
30 a 34 anos
9 542 482
b
4 128 209
c
1 806 957
c
397 422
d
3 209 894
c
35 a 39 anos
9 433 486
b
4 739 767
c
1 809 959
c
316 846
d
2 566 914
c
40 a 44 anos
8 240 472
b
4 604 242
c
1 497 620
c
260 331
e
1 878 279
c
45 a 49 anos
6 704 641
c
4 071 307
c
1 181 841
d
206 813
e
1 244 680
d
50 a 54 anos
5 361 514
c
3 443 391
c
846 753
d
208 298
e
863 073
d
55 a 59 anos
3 913 831
c
2 557 153
c
588 300
d
210 815
e
557 563
d
60 a 69 anos
5 333 997
c
3 651 902
c
752 314
d
339 603
d
590 178
d
70 anos ou mais
2 993 019
c
2 046 931
d
375 731
d
284 414
e
285 942
e
Homens (1)
33 719 646
a
16 881 694
b
5 819 604
c
1 464 609
d
9 553 740
c
10 a 14 anos
14 455
h
2 857
j
1 741
k
-
9 856
h
15 a 19 anos
298 563
d
20 126
h
20 382
h
9 751
h
248 305
d
15 a 17 anos
61 670
f
4 600
j
1 967
j
2 850
j
52 253
f
18 e 19 anos
236 893
d
15 526
h
18 414
h
6 901
h
196 052
e
20 a 24 anos
2 196 101
c
419 048
d
326 008
d
84 533
e
1 366 512
c
25 a 29 anos
3 882 798
c
1 203 573
c
743 995
d
177 627
e
1 757 603
c
30 a 34 anos
4 679 739
c
1 958 604
c
862 288
d
206 014
d
1 652 834
c
35 a 39 anos
4 691 325
c
2 287 275
c
915 233
d
165 611
e
1 323 206
c
40 a 44 anos
4 281 108
c
2 353 831
c
781 810
d
141 235
e
1 004 232
c
45 a 49 anos
3 574 234
c
2 104 914
c
647 556
d
105 547
e
716 217
d
50 a 54 anos
2 864 391
c
1 790 550
c
455 157
d
106 644
e
512 040
d
55 a 59 anos
2 193 976
c
1 374 132
c
353 324
d
102 284
e
364 235
d
60 a 69 anos
3 050 727
c
2 046 362
c
440 243
d
174 462
e
389 661
d
70 anos ou mais
1 973 097
c
1 308 429
d
269 602
d
190 071
e
204 995
e
Mulheres (1)
33 720 776
a
16 881 631
b
5 821 218
c
1 463 914
d
9 554 014
c
10 a 14 anos
72 307
f
7 324
i
3 516
i
1 911
j
59 557
f
15 a 19 anos
1 324 583
c
183 001
e
182 854
e
54 328
f
904 400
d
140
15 a 17 anos
489 196
d
46 336
g
49 600
f
18 988
g
374 272
d
18 e 19 anos
835 388
d
136 665
e
133 254
e
35 341
g
530 128
d
20 a 24 anos
3 528 698
c
923 170
d
625 112
d
178 766
e
1 801 650
c
25 a 29 anos
4 559 799
c
1 739 841
c
871 831
d
194 930
d
1 753 197
c
30 a 34 anos
4 862 743
c
2 169 605
c
944 670
d
191 408
e
1 557 060
c
35 a 39 anos
4 742 161
c
2 452 492
c
894 725
d
151 235
e
1 243 709
c
40 a 44 anos
3 959 364
c
2 250 411
c
715 810
d
119 095
e
874 048
d
45 a 49 anos
3 130 407
c
1 966 393
c
534 285
d
101 266
e
528 463
d
50 a 54 anos
2 497 123
c
1 652 841
c
391 597
d
101 653
e
351 033
d
55 a 59 anos
1 719 855
c
1 183 020
c
234 976
d
108 531
e
193 328
e
60 a 69 anos
2 283 270
c
1 605 540
c
312 072
d
165 141
e
200 517
e
70 anos ou mais
1 019 921
d
738 502
d
106 129
f
94 343
e
80 947
f
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.
(1) Inclusive as pessoas com idade ignorada
Os resultados do Censo Demográfico 2000 demonstraram ainda que por categorias de cor
ou raça, na população indígena encontra-se o maior índice de pessoas vivendo em união
consensual. Entre aqueles que viviam em companhia de um cônjuge, 46,9% viviam nessa
situação conjugal. No outro extremo, se encontrava a população de cor amarela, com apenas
12,5% de pessoas vivendo em união consensual. Essa era, portanto, a categoria de cor em que
mais se encontravam casamentos formais: 87,5% se casaram no civil ou religioso. A população
de cor preta e a indígena foi a que apresentou os maiores percentuais de pessoas desquitadas,
separadas ou divorciadas, 10,2% e 9,75%, respectivamente. O estado conjugal da população
brasileira por cor ou raça é demonstrado na tabela abaixo:
141
Tabela 6: Percentual de pessoas de 10 anos e mais de idade por estado conjugal e cor
ou raça – Brasil 2000.
Pessoas de 10 anos e mais de idade
Estado conjugal
Casadas / Unidas
Cor ou raça e
classes de
tamanho da
população
dos
municípios
Total
Solteiras
(1)
Total
No civil
e/ou
religioso
União
consensual
Desquitadas
ou Separadas
e Divorciadas
(2)
Viúvas
Total
136 910 358
38,6 49,5 71,4 28,6 7,8 4,1
Branca 74 149 482 36,9 51,3 77,2 22,8 7,1 4,6
Preta 8 965 594 37,9 47,3 59,8 40,2 10,2 4,6
Amarela 675 292 35,7 52,9 87,5 12,5 5,8 5,7
Parda 51 658 035 41,2 47,2 64,4 35,6 8,4 3,2
Indígena 572 945 33,6 52,4 53,1 46,9 9,7 4,3
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000 - Amostra.
Não vivem e nunca viveram em companhia de cônjuge.
Não vivem em companhia de cônjuge, mas já viveram.
Os dados do IBGE, além de demonstrarem o aumento domero de uniões estáveis na
última década, apresentam fatores que auxiliam no entendimento das razões pelas quais essa
modalidade de relação conjugal tem se tornado uma opção cada vez mais freente. Dentre essas
variáveis a idade e o gênero são elementos importantes na análise nas representões sociais da
união estável no Rio de Janeiro, não somente pela sua influência na opção por esse arranjo, como
também no conhecimento construído e compartilhado a respeito dele em grupos sociais distintos.
Quanto à variável cor ou raça não teremos em nosso estudo dados sobre a maioria
indígena, negra ou parda que vive em união estável, visto que definimos como integrantes de
nossa amostra homens e mulheres (casados, solteiros, separados e em união estável) pertencentes
à classe média urbana, com nível de escolaridade médio, no nimo, a qual é predominantemente
de cor branca, posto que acreditamos que eles podem ter representações sociais da união estável
em sua nova formulação jurídica.
142
2.3. CONTEXTUALIZAÇÃO JURÍDICA
2.3.1. Considerações iniciais
Nesse capítulo será feita a contextualização jurídica da união estável
, buscando-se
explicitar, do ponto de vista legal, os aspectos fundamentais à sua compreensão enquanto
femeno jurídico. Para esse propósito serão enfocadas as características e os requisitos
integrantes de tal instituto. A construção do eixo teórico se baseou nos textos jurídicos que
versam sobre a união estável. No campo jurídico, diversos autores se ocupam em descrever esse
arranjo – suas características, requisitos, etc. Optamos por utilizar como referência
principalmente Gama (2001), Pereira(1996) e Veloso (1997). A utilização de tais autores se
justifica, no que se refere ao primeiro, pela sua exaustiva e completa abordagem do tema; ao
segundo, pelo destaque em sua análise do componente afetivo e das representões sociais,
aspecto importante em se tratando de um assunto cuja abordagem é necessariamente
multidisciplinar; e ao terceiro, pela forma breve e clara, mas não menos consistente, que facilita a
apreensão de informões fundamentais ao entendimento do assunto.
A união estável é uma modalidade de relação que encontra uma divergência terminológica
no próprio campo jurídico, como demonstra Gama (2001). O autor afirma que esse arranjo já fora
chamado de “concubinato puro, “concubinato impuro, união informal, “casamento de fato,
união livre”, sociedade de fato, família natural, “companheiratoou simplesmente
“concubinato. E, as a Constituição de 1988, união estável. Gama ressalta que esta expressão
já havia sido utilizada antes da promulgação da Carta Magna por Orlando Gomes e Edgard de
Moura Bittencourt. Gama (2001) se insere numa corrente que tem preferência pela utilização do
termo companheirismo ao invés de união estável no tratamento desse arranjo. Ele justifica essa
opção afirmando:
a) se casamento e “união estávelnão possuem a mesma significação, e são espécies de
família, certamente o adjetivo estávelnão serve como diferenciador entre tais
institutos, caso contrário ter-se-ia que considerar o casamento como união instável, o
que certamente não corresponde à realidade; b) não se deve nomear um instituto, como
regra, apontando uma ou várias características próprias do mesmo. (p.133)
143
A respeito da terminologia utilizada para nomear a união estável Gama (2001) defende a
adoção do termo companheirismo, que, nos moldes já descritos não sofre qualquer restrição,
diante da busca de se atribuir prevalência do elemento anímico indispensável para a constituição
e manutenção de tal espécie de família mormente no direito nacional(p.134). Nesse trabalho
está sendo adotada a terminologia proposta na Constituição Federal e no novo Código Civil.
Apesar do reconhecimento jurídico da união estável suscitar, algumas vezes, dúvidas no
senso comum e até nos operadores do Direito, quando lidam com situões afetivas de difícil
categorização – quanto a que tipos de relações conjugais podem ser consideradas como união
estável e quais não se encaixam nessa categoria, qual o limite entre o namoro na sua forma atual e
a união estável, etc, a lei é bastante clara ao definir esse arranjo como um tipo de vínculo
conjugal notadamente próximo do casamento e, portanto, diferente de outras formas de relação
amorosa, inclusive do namoro. De acordo com o artigo 1.723 do novo Código Civil, “é
reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na
convivência pública, connua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de
família” (BRASIL, 2002, p. 1834).
Como afirma Veloso, (1997), o reconhecimento jurídico da união estável é um fato que
tem ocorrido em países como Cuba (Lei, N
o
1.285, de 14 de fevereiro de 1975) e Paraguai, que
regulou essa modalidade de relação em capítulo especial do Código Civil de 1985. A
regulamentação tem sido, segundo o autor, uma tendência nas legislações da América Latina. No
Brasil diversos teóricos do Direito de Família afirmam que o grande marco nesse sentido
aconteceu na Constituição de 1988. Veloso cita a esse respeito a interpretação do § 3
o
. do art. 226
feita por Manuel Gomes Ferreira Filho, que ressalta: “a Constituição de 1988 é a primeira no
Brasil a reconhecer a união estável entre o homem e a mulhercomo sendo entidade familiar’.
Isso significa que tal união passa a ser reconhecida como família e assim goza da proteção do
Estado(FILHO, apud VELOSO, 1997, p.16).
Segundo Veloso (1997), no intuito de regulamentar o assunto foi criada a Lei Nº 8.971, de
29 de dezembro de 1994, cuja ementa declara: Regula o direito dos companheiros a alimentos e
à sucessão. Em seguida, surgiu a Lei n º 9. 278, de 10 de maio de 1996, cuja ementa enuncia:
Regula o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. No entanto, o jurista Rodrigo Da Cunha
144
Pereira (2002) afirma que essas leis interpretaram de forma contraditória entre si elementos para
a compreensão da união estável. Segundo ele, o novo Código Civil brasileiro incorporou os
elementos da última lei, no seu entender mais aberta e que melhor traduz o que se define como
união estável. O autor levanta a possibilidade da inclusão do título União Estávelno Livro de
Família do novo Código Civil Brasileiro ter sido a grande mudança realizada neste novo diploma
legal.
Pereira (1996) afirma que o novo Código Civil manteve a mesma organização estrutural
existente no Código Civil de 1916, apresentando, contudo, variões dentro dessa mesma
estrutura. Segundo ele, uma dessas variões e modificões na sistematização foi a inserção da
união estável na estrutura organizacional do mesmo. Entretanto, faz a ressalva de que essa
inclusão ocorreu em função das discussões e influências emergentes a partir de 1994, visto que,
originalmente, e mesmo em mudanças s-constitucionais, o texto do Projeto afirmava que
somente o casamento estabelecia a família legítima, desconsiderando outras formas de família.
Entretanto, como esclarece o jurista, ultrapassada essa discussão, venceu o texto que incorporou,
sobretudo, os elementos das Leis N
o
8.971/94 e N
o
9.278/96. Ele aponta uma evolução ocorrida
no artigo 1.723 do novo Código Civil, citado anteriormente, primeiramente pela eliminação da
demarcação de um tempo rígido para a caracterização da união estável, como ocorria na Lei N
o
8.971/94. E, em segundo lugar, pelo entendimento de que as pessoas que mantiveram seu estado
civil de casadas, mas estando separadas de fato, poderão estar constituindo união estável. Isso
está disposto no § 1
o
do referido artigo 1723, que afirma: A união estável não se constituirá se
ocorrerem os impedimentos do art.1531; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a
pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”. (BRASIL, 2002, p.1.834)
A união estável é um arranjo conjugal que tem características e requisitos estabelecidos
por lei. Embora tais atributos possam parecer sinônimos, Gama (2001) afirma ser necessária a
distinção entre as características e os requisitos constituintes desse arranjo, ressaltando,
entretanto, que esses aspectos mantém entre si uma íntima relação que deve ser considerada na
análise do instituto. O autor considera as características como aquelas qualidades que permitem
que uma relação possa ser qualificada como união estável e os requisitos como as exigências de
145
ordem objetiva e subjetiva da mesma maneira necessários à configuração desse femeno
jurídico.
Gama (2001) enumera assim as seguintes características da união estável: finalidade de
constituição de família, estabilidade, unicidade de vínculo, notoriedade, continuidade e
informalismo ou ausência de formalidades. A seguir, o autor apresenta os requisitos desse arranjo
subdividindo-os em requisitos objetivos e subjetivos. Os primeiros incluem a diversidade de
sexos, a ausência de impedimentos matrimoniais, a comunhão de vida e o lapso temporal de
convivência. Os segundos dizem respeito à convivência more uxorio e ao affectio maritalis,
aspecto que o autor traduz como o ânimo de constituir família.
Algumas dessas terminologias são bastante claras e até mesmo auto-explicativas, de
forma que uma primeira leitura das mesmas deixa claro que a união estável é um tipo de vínculo
conjugal que, por definição, ultrapassa a situação de namoro e, em muitos aspectos, se aproxima
ao casamento. Entretanto, antes mesmo de caracterizar esse arranjo, Gama (2001) faz algumas
considerações relevantes sobre as quais é importante nos atermos para a obtenção de elementos
de análise úteis na investigação das representações sociais construídas a seu respeito em grupos
distintos.
Gama (2001) cita Milton Fernandes (1988), que entende que o texto constitucional não
transformou a união estável em um casamento de segunda classe, mas continuou a tratá-la
como uma realidade fática. Esse jurista afirma que, tendo em vista a constituição ter apontado
somente a estabilidade e a heterossexualidade da união para efeito de sua consideração como
união estável, isso permitiria pensar na inclusão das relões adulterinas e mesmo incestuosas
nessa categoria. Gama discorda do posicionamento defendido por Fernandes, argumentando em
resposta que tal postulão contraria a própria regra constitucional que prevê a conversão da
união estável em casamento. Ele prossegue afirmando que as relões incestuosas e adulterinas
não poderiam ser transformadas em uniões matrimoniais a não ser que fossem considerados não
recepcionados pelo texto constitucional diversos dispositivos do Código Civil, dentre eles os que
tratam dos impedimentos matrimoniais.
Além das razões expostas acima, no intuito de refutar a proposição de Fernandes, Gama
(2001) esclarece que não é da tradição das Constituições conceituar institutos jurídicos, sendo,
146
em seu entender, correto que a doutrina majoritária e prevalente considera que a norma
constitucional não forneceu conceito ou definição a respeito da união estável, no que agiu de
acordo com os princípios jurídicos e a técnica necessária na formulação da regra constitucional.
Gama cita, nesse sentido, diversos posicionamentos contrários à definição da união estável.
Como afirma:
Ao fazer breves comentários acerca do companheirismo, Caio Mário da Silva Pereira
entende não ser conveniente o legislador formular definição sobre o instituto, apontando
que trata-se de conceito novo, sem a devida sedimentação” e, assim, uma norma
legislativa definidora poderia pecar pelo excesso, lançando a noção muito além do objeto
a definir-se ou revelar-se demasiado restrita, deixando de abraçar nos seus termos os
pressupostos necessários. O mesmo posicionamento havia sido adotado por Marilene
Silveira Guimarães, para quem a edição de lei ordinária, neste momento, poderia
ensejar o aparecimento de norma por demais vigorosa devido à reação conservadora que
se observa. Da mesma forma, Antonio Carlos Coltro: ...melhor seria não haver solução
legislativa a respeito do conceito a ser atribuído à união estável, sendo de ver-se que o §
3.
o
do art. 226 cometeu à lei, apenas, facilitar sua conversão em casamento. (p.150-
151)
Gama (2001) afirma que no que se refere ao casamento a diferença entre os caracteres
ou características e os requisitos e/ou pressupostos é feita de forma bastante clara pela
doutrina existente a seu respeito. O autor cita o jurista Orlando Gomes (1984), que exemplifica
tal distinção dizendo que o casamento apresenta como característica a pessoalidade, a
secularidade e a solenidade. Segundo ele, esses aspectos distinguem o casamento de outros atos,
entretanto, para que sua existência, validade e regularidade sejam reconhecidos, é necessário que
atenda também aos seguintes requisitos: a) condições necessárias à sua existência jurídica
(diversidade de sexo, consentimento dos nubentes e celebração por autoridade competente); b)
condições necessárias à sua validade (capacidade dos nubentes, seu status familiar, sua situação
do ponto de vista da moralidade pública); c) condições necessárias à sua regularidade (sua
celebração e a posição eventual dos nubentes). Ainda tratando da diferenciação feita por Gomes,
Gama (2001) cita Caio Mário da Silva Pereira (1984), que apresenta a solenidade, a diversidade
de sexos e a dissolubilidade como características do casamento, e a diversidade de sexos, a
celebração propriamente dita, a competência ratione materiae do celebrante, a idade dos
nubentes, a ausência de vínculo matrimonial entre os nubentes e a habilitação como os requisitos
ou pressupostos matrimoniais.
147
Gama (2001) ressalta que, na sua abordagem da união estável, é traçado um paralelo com
o casamento para fins de melhor compreensão da sistematização apresentada, porque o
casamento é uma realidade conhecida e próxima da união estável. Tomando o casamento como
exemplo na sua proposta de fazer uma diferenciação entre as características e os atributos da
união estável, Gama (2001) acaba por construir também uma distinção entre essas duas formas de
relacionamento conjugal próximas a ponto de, atualmente, a união estável ser muitas vezes
representada pelos sujeitos sociais como casamento, fato que, em nosso entender, contribuiu
sobremaneira para o reconhecimento jurídico. Vale ressaltar que essa maneira atual de
representar a união estável se diferencia bastante daquela à época em que esse tipo de relação era
considerado no âmbito dos universos reificados e, por influência desses, também nos universos
consensuais como concubinato, o que dificultava seu reconhecimento jurídico.
A proposta de diferenciação entre as características e os requisitos da união estável é
importante primeiramente, como sustenta Gama (2001), para a fixação dos contornos desse
instituto visto que como o próprio autor afirma na maioria das vezes a doutrina que o trata
considera as suas características como sendo requisitos e vice-versa. O autor alerta que alguns
juristas ao se referirem ao tratamento constitucional dado à união estável incluem na
caracterização desse arranjo de determinados elementos que do ponto de vista jurídico, não se
apresentam como tais. Em relação a esse ponto Gama (2001) afirma ser importante ter a cautela
necessária para distinguir sistematicamente o que deve ser considerado característica, requisito ou
mesmo efeito da união estável. O jurista ressalta ainda que os efeitos jurídicos decorrentes desse
arranjo, no que se incluem os direitos e deveres entre companheiros, não podem servir como
características ou requisitos, até mesmo em virtude de existirem somente se estiverem presentes
os requisitos do instituto, que, como reafirma, deve ser dotado dos atributos e características
reconhecidas juridicamente que são descritas a seguir.
148
Segundo Gama (2001) apesar do casamento e da união estável terem algumas
características e alguns requisitos comuns, como a unicidade de vínculo (requisito) e a
diversidade de sexos (característica), no geral esses aspectos diferem substancialmente nessas
duas modalidades de relação conjugal. A respeito dessa diferenciação entre as duas modalidades
de relacionamento conjugal o jurista então afirma:
As dissonâncias entre companheirismo e casamento se revelam , inclusive, quanto ao
momento da incidência dos efeitos jurídicos sobre cada um dos institutos, sabido que o
companherismo é um fato social, antes der ser jurídico...ou seja enquanto os noivos ou
namorados têm plena consciência de que ao contraírem matrimônio civil, estarão
submissos às regras que regem o casamento, em todos os seus aspectos, inclusive com
reflexos anteriores à celebração (observância de todo o procedimento necessário para a
habilitação, feitura do pacto antenupcial), os companheiros só passam a se submeter às
regras inerentes ao companheirismo as a devida caracterização de que foram
preenchidos os requisitos indispensáveis à existência e validade do vínculo, com as
características que também são próprias, o que pressue a configuração do vínculo em
momento posterior ao início da relação mantida entre eles (GAMA, 2001, p.152-153)
Baseando-se na afirmação de Francisco José Cahali de que “enquanto no casamento a
constituição é celebrada a priori, na união estável sua caracterização é a posteriori, verificados os
seus elementos essenciais(CAHALI, 1996 apud GAMA 2001, p.153), Gama (2001) conclui
que, apesar de possuírem pontos em comum, há marcantes distinções entre o casamento e a união
estável, o que exige a construção sistemática de regras e princípios específicos desse arranjo.
Dentro da proposta do presente estudo é interessante observarmos se nas representões sociais
construídas acerca desse objeto essa distinção se confirma, aproximando tal arranjo do
concubinato, ou se a mesma inexiste, permitindo que os sujeitos sociais a ancorem no casamento.
2.3.2. Características:
Finalidade de constituição de Família: A primeira característica da união estável apontada
por Gama (2001) é a finalidade de constituição de família. De acordo com o autor, a união
extramatrimonial entre um homem e uma mulher necessita ter esse objetivo de formação de um
cleo familiar para que possa ser caracterizada como união estável e, assim, estar sujeita às
regras do Direito de Família e ser abrangida pelas normas integrantes da Constituição Federal.
149
Gama se reporta ao também jurista Caio Mário da Silva Pereira, que afirma ainda ser importante
na constituição da união estável, assim como no casamento, a comunhão de vida e de interesses, a
satisfação do amor recíproco, aquela affectio maritalis, que, segundo ele, os casamentos romanos
apontavam como fator psíquico da vida em comum e base da essência do casamento.
Gama (2001) entende que nas relões conjugais não oficiais dotadas desse objetivo de
constituição de família está presente também uma outra finalidade: a de gerar filhos. Entretanto, o
autor ressalta que, embora a descendência seja uma conseqüência natural desses arranjos estáveis
que, assim como o casamento, têm como objetivo a constituição de família, esse aspecto não é
um componente essencial, e sim, facultativo. Ele reconhece que não existe na união estável uma
obrigatoriedade à procriação, considerando-se a condição pessoal dos companheiros que, da
mesma forma que os casados, em razão de fatores como idade, saúde, ou mesmo o que denomina
“conviões filosóficas, podem optar por não terem filhos. Entretanto, apesar de apontar uma
mudança no tratamento da união estável, uma vez que a presença de filhos passou a ser
considerado um indicador e não um elemento essencial na caracterização desse arranjo, o jurista
reafirma a importância da presença da finalidade da constituição da família, atribuindo o
reconhecimento social do mesmo a tal característica. Assinalando essa importância, Gama (2001)
afirma:
[...] Basta lembrar que a Constituição Federal considera o companheirismo (ou, na
expressão constitucional, a “união estável) como espécie de família. Ainda que assim
não o fosse, a realidade social já havia consolidado tal característica, não reconhecendo
outras espécies de união que não visassem a constituição de família. (p.158)
Estabilidade: É a característica que diferencia a união estável do namoro, do chamado
“casoou de uma aventura” amorosa, visto serem tais relões consideradas, do ponto de vista
jurídico, como algo revestido de caráter ocasional e desprovidos, portanto, de uma duração que
permita qualificá-las como estáveis. Entretanto, o tempo de existência da relação, apesar de
importante, não é considerado como critério único pra a aferição da estabilidade. A quantidade de
vida em comum ou, em termos jurídicos, o lapso temporal de convivência é considerado um
indicador essencial para a união estável, mas que isoladamente não atesta o caráter estável da
relação.
150
É importante lembrar que Giddens (2001) se refere à existência na modernidade de
relões baseadas exclusivamente em deveres e obrigações tradicionais que, ao contrário da
relação pura”, onde a intimidade é a condição principal de qualquer estabilidade, se ancoram em
exteriores ao próprio relacionamento, como questões econômicas, etc. Essas relões descritas
pelo autor podem ser longas e, no sentido do tempo de duração, estáveis, embora desprovidas de
elementos essenciais para sua caracterização como um vínculo marital na acepção plena de tal
expressão. Nelas falta justamente a affectio maritalis tão citada pelos juristas, aspecto subjetivo
que faz com que os membros de uma relação conjugal seja ela casamento ou união estável
sintam-se e vivam em suas práticas cotidianas como casal “casado, ou seja, unido pela
conjugalidade. Vale lembrar que no primeiro capítulo essa dimensão foi definida como aquilo
que efetivamente forma e une o casal.
Gama (2001) também menciona a existência comum de pessoas casadas que não mantém
mais uma união sólida e sim vidas isoladas, sem qualquer participação do cônjuge em suas
trajetórias pessoais a não ser aparentemente, como forma de justificar a continuidade do
casamento perante a sociedade De tal forma, embora haja um reconhecimento por parte da
maioria dos juristas da necessidade de estipulação de um prazo legalmente definido para que uma
relação possa ser considerada união estável, a estabilidade é compreendida consensualmente do
ponto de vista jurídico como um aspecto que inclui outros fatores que ultrapassam o aspecto
temporal.
A respeito da presença dessa característica na união estável e no casamento, Gama (2001)
cita Fardin (1993) e Rodrigues (1996). A primeira autora afirma que no casamento a estabilidade
é considerada um aspecto a priori, ao contrário do que acontece na união estável, relação na qual
essa característica é verificada a posteriori, pelo prolongamento da relação. A segunda autora
define a relação de união estável como aquela que tende a se prolongar através do tempo e exigirá
fidelidade recíproca e respeito mútuo, envolvendo-se os parceiros numa estreita e íntima
comunhão de afetos e interesses. Para Rodrigues a notoriedade da relação, a existência de filhos,
o tempo prolongado são elementos consideráveis, mas que por si sós, isoladamente, não
caracterizam a solidez da união. Todavia ela afirma que, quando aliados ao animus de vida
matrimonial, esses elementos constituirão prova imbavel da relação estável.
151
Gama (2001) considera o período de dois anos como um critério que deve ser levado em
conta no tocante à constituição da família através da união estável, visto que considera esse prazo
razoável para a solidez e a estabilidade da união. Antes de fazer tal afirmação o autor lembra que
atualmente, por critério de política legislativa e atendendo a princípios jurídicos como o de
promover a segurança social, o período de dois anos é visto como adequado para se aferir à perda
da affectio maritalis na união matrimonial no caso dircio baseado em separação de fato.
No tocante à união estável a falta de prazo fixado legalmente para a caracterização da
relação é vista pelos envolvidos com o tema em diversas áreas de atuação profissional, inclusive
alguns juristas, como um problema. Eduardo Estrada Alonso (1995 apud GAMA, 2001), por
exemplo, defende o estabelecimento de um prazo como índice de estabilidade das uniões livres.
Entretanto, no campo do Direito de Família não há uma concordância geral tocante à
imprescindibilidade de um prazo legal para a identificação da estabilidade da união estável
defendida por alguns representantes do judiciário. De acordo com a posição de outros juristas
esse prazo é questionável. Rodrigo da Cunha Pereira (1996) defende, inclusive, que não há um
tempo determinado com rigor absoluto que permita caracterizar uma relação como união estável.
Ao tratar dos elementos caracterizadores do concubinato ele reconhece a interferência de fatores
jurídicos e sociais nesse entendimento, manifestando a seguinte posição, aplivel também à
união estável:
[...] é necessária uma certa continuidade, durabilidade da relão. Não há um prazo, com
rigor absoluto, para determinar a partir de quando a relação se caracterizaria como
concubinato. Em alguns países (...), é calculado em dez anos, outros em dois anos,
dependendo da cultura e vários outros fatores. No Brasil convencionou-se que o prazo é
de cinco anos. Provavelmente este entendimento está ligado à regra da Lei 6.515/77,
antes das alterões da nova Constituição, onde havia necessidade de separação prévia
de cinco anos para a concessão de separação judicial. (...) É preciso pontuar, entretanto,
que hoje o prazo para o divórcio foi abreviado para dois anos. (p.46)
Em suma, Gama (2001) afirma que, de acordo com a previsão constitucional, para que
possa ser caracterizada como união estável a relação conjugal deve ser estável, não podendo estar
revestida caráter instável. Os juristas entendem como estável algo duradouro, não efêmero ou
passageiro, como as relações formadas pela mera atração sexual. Essa característica voltará a ser
abrangida no requisito lapso temporal de convivência.
152
Unicidade de vínculo: Para que uma relação conjugal seja considerada juridicamente
como união estável é preciso que seus parcipes não tenham outros vínculos conjugais
concomitantes, ou seja, que a mesma se trate de uma relação monogâmica. Caso contrário, se
houvesse outro vínculo conjugal anterior, matrimonial ou não, de um dos membros da nova
relação, esta seria necessariamente considerada concubinária, não fundada no companheirismo e,
de tal modo, não contemplada pela norma constitucional, não alcançando dos efeitos jurídicos
inerentes ao instituto criador de família.
Como afirma Gama (2001), à semelhança de outros sistemas jurídicos ocidentais, o
Direito brasileiro adota o princípio da monogamia, segundo o qual uma mesma pessoa é por lei
impedida de contrair e manter ao mesmo tempo dois ou mais vínculos matrimoniais e, no que se
refere à união estável, extramatrimoniais. Ele esclarece que bigamia é tipificada como crime,
além do segundo vínculo ser considerado nulo, no âmbito do Direito Civil, diante do
impedimento dirimente público (art. 183, inc. VI, do Código Civil). Gama (2001) aponta a
existência na sociedade de valores morais reconhecidos juridicamente, nesse caso, sob a forma de
impedimentos matrimoniais apliveis diretamente à união estável. De tal modo, as uniões
adulterinas e também as incestuosas não são tratadas como espécies de família exatamente
por contrariar esses valores.
A fidelidade é vista no âmbito judiciário como indicador fundamental da estabilidade da
união estável. Gama faz menção à afirmação de Azevedo, segundo a qual, na ausência dessa
característica as relões conjugais não podem ser abrangidas pela doutrina que trata desse
arranjo, sendo possível que elas eventualmente caracterizem sociedade de fato. O jurista se
reporta também a Coltro (1996), que entende essa falta como prejudicial no amparo das
concubinas, tendo-se em vista a dificuldade de determinar qual delas se encontra lesada em
situões de separação nas quais haja duplicidade de vínculo conjugal. Ademais, como esclarece
esse autor, sua defesa é feita por diversos juristas na tentativa de reiterar a idéia de “casamento
normal. Gama (2001) cita ainda Edgard de Moura Bittencourt que, quanto à necessidade de
obediência ao princípio da monogamia, afirma:
153
Sendo a fidelidade, como visto, necessária à verificação sobre estabilidade da união de
fato, por lógico que a pluralidade de companheiros afastará tal atributo, prestando-se,
dessa forma, a servir como elemento contrário à afirmação sobre estar presente a
convicção ensejadora dos direitos do companheiro. (BITTENCOURT 1996, apud
GAMA, 2001, p.164)
Na parte relativa ao requisito ausência de impedimentos matrimoniais essa característica
voltará a ser abordada.
Notoriedade: Segundo Gama (2002), a união extramatrimonial fonte originadora de
família, além de ser dotada de estabilidade e representar o único vínculo dos seus membros, deve
ser revestida de notoriedade, o que implica que a mesma deve ser reconhecida socialmente, ainda
que em pequenos círculos sociais nos quais o casal interaja mais freentemente, como acontece
no casamento. Por assim dizer, a relação de união estável deve ser pública. O autor esclarece que
essa característica sempre foi apontada, não como tal, mas como requisito pelos legisladores.
Entretanto, independente dessa consideração como característica ou requisito, Gama afirma que o
importante em relação à notoriedade é a sua identificação no sentido oposto ao do clandestino, do
oculto. Tal aspecto é interessante se pensarmos a consideração do concubinato como algo impuro
adjetivo usado inclusive na área jurídica para nomear o concubinato adulterino –, moralmente
condenável e, portanto, escondido. Acerca desse aspecto Gama cita a designação dada por
Leoni Lopes de Oliveira à palavra publicidade:
No concubinato qualificado, os concubinos, tais como os esposos, não escondem seu
relacionamento da sociedade em que vivem; pelo contrário, frequentam-na, ostentando
sua situação fática, como marido e mulher. Convivência pública é aquela conhecida de
todos; é a convivência daqueles que vivem em união estável e manifesta, notória. Essa
convivência se dá em público, não é uma convivência secreta. (OLIVEIRA, 1997 apud
GAMA, 2001, p.165)
Conforme Gama (2001), o emprego da expressão notoriedade pelo jurista citado teve
como significado a indicação da notoriedade, através da utilização do adjetivo pública”, contido
no art 1.
o
, da Lei 9.278/96.
Ele aponta ainda a discordância em relação a essa característica feita
por Francisco José Cahali. Este jurista considera que, embora a notoriedade constate o reflexo do
relacionamento expressado pelos concubinos, não cabe à sociedade ou à comunidade ver ou saber
154
das intenções subjetivas dos companheiros, importando que eles se tratem na intimidade com as
peculiaridades, atitudes e responsabilidades tais como se casados fossem.
Prosseguindo na discussão existente a respeito dessa característica presente no campo
jurídico, Gama (2001) destaca a distinção entre notoriedade e publicidade feita por Maria Helena
Diniz, que afirma:
Notoriedade de afeições recíprocas, que não significa de modo algum publicidade. A
esse respeito bastante expressiva é a lição de Cunha Gonçalves, segundo a qual a ligação
concubinária há de ser notória, porém pode ser discreta, caso em que a divulgação do
fato se dá dentro de um círculo mais restrito, o dos amigos, o das pessoas de íntima
relação de ambos, o dos vizinhos da concubina, que poderão atestar as visitas freqüentes
do amante, suas entradas e saídas. (DINIZ, 1993 apud GAMA, 2001, p.166)
Não obstante, apesar da discordância quanto à necessidade da publicidade da relação de
união estável, há concordância no que se refere à comprovação e aos direitos e deveres gerados
por esse tipo de vínculo conjugal. Sobre esse aspecto Gama (2001) cita novamente Cahali, que
afirma que “não se pode negar que a notoriedade assume relevanssimo papel no campo da prova
do relacionamento, ou seja, constitui um fato cuja demonstração por si só indica a efetiva
existência da relação concubinária apta a produzir seus efeitos enquanto entidade familiar
(CAHALI, 1996 apud GAMA, 2001, p.165).
Gama (2001) concorda com a posição do jurista, acrescentando que a importância da
notoriedade excede ao campo da prova:
No que pertine ao companheirismo, não existe o registro, tal como a lei prevê em relação
ao casamento, motivo pelo qual a notoriedade da união é considerada característica de
modo a tornar evidenciada, aos olhos dos outros, a comunhão de vida e de sentimentos
que os parcipes da relação vêm mantendo, como se casados fossem. Na eventualidade
de ambos os companheiros declararem união em juízo ou perante tabelião, ou ainda, um
deles reconhecer o companheirismo em testamento cerrado, mais uma vez afigura-se
reforçada a característica da notoriedade, agora sim sob a denominação de publicidade,
pois gerará efeitos
erga ommes
. Desse modo, a notoriedade não perde sua razão de ser
como característica, não servindo apenas no campo da prova. (p.166)
155
Continuidade: Dando continuidade à caracterização da união estável, Gama (2001)
entende que tal união extramanimonial formada entre o homem e a mulher com o objetivo de
constituição da família, dotada de estabilidade, consistindo no único vínculo mantido por cada
parcipe, deve também ser connua, ou seja, initerrupta. Ou seja, de acordo com o jurista, o
convívio do casal deve ser connuo, sem interrupções na convivência. Deve ser permanente não
no sentido da perpetuidade, mas de maneira que permita a verificação da solidez do vínculo, não
ficando sujeito a abalos ou mesmo rompimentos em decorrência de problemas comuns na vida
conjugal.
Gama (2001) cita Leoni Lopes de Oliveira (1995), que confirma e a necessidade da
durabilidade da relação dizendo que na união estável, em caso de separação, e não de suspensão,
o prazo para a caracterização da estabilidade recomeça a correr, não sendo possível somar-se o
período anterior à separação. Antônio Mathias Coltro, também citado por Gama (2001), discorda
da essencialidade atribuída a essa característica, argumentando que, embora não haja dúvida de
que o casal que vive em união estável deva permanecer junto, a separação temporária é um fato,
que, assim como no casamento, pode ocorrer entre o casal que vive essa modalidade de vida
conjugal, que quando restabelecem o vínculo retornam ao convívio como marido e mulher.
Segundo esse autor o rompimento acontecido anteriormente contribui muitas vezes para reforçar
no casal o interesse de ser mantida a união estável, ou a comunhão de vida e interesses. Em sua
concepção a continuidade da vida em comum deve ser analisada conforme o caso que se
apresenta para julgamento, não se podendo afirmar, com base unicamente no fato do casal, em
determinado momento, ter se separado, embora depois retornado à vida em comum, em não
caracterização da convivência connua, sendo atendido desta forma outro pressuposto contido na
Lei 9.278/96.
No entender de Gama (2001) não há como tal argumentação ser aceita, uma vez que,
como afirma:
[...] A continuidade da união à evidência, se reveste de importância para a caracterização
do instituto jurídico na medida em que o relacionamento sólido, estável, não está sujeito
a rupturas constantes; caso contrário, haveria relões imaturas, instáveis, não
construídas em terreno sedimentado(...) .Diversamente do casamento, o companheirismo
somente pode ser caracterizado
a posteriori
, ou seja, as a constatação da coexistência
de uma série de fatores, devidamente combinados. E uma das características ínsitas da
união formada com o objetivo de formação da família é justamente a continuidade. Caso
156
assim não o fosse, haveria uma completa insegurança jurídica na sociedade no
concernente `as relões jurídicas mantidas entre os companheiros, e entre estes e
terceiros. (p.168)
Ademais, Gama (2001) acrescenta que, tendo a união estável como característica
exclusiva a informalidade, ou seja, a inexistência de qualquer solenidade para sua formação como
para sua extinção, a separação de fato ocorrida entre os integrantes da relação é indicadora da
dissolução do vínculo anteriormente existente. O autor reconhece, entretanto, que não é qualquer
tipo de separação que implicará a considerão jurídica da falta de continuidade, cabendo àquele
que julga, na análise do caso concreto, verificar se a mesma provocou ou não a ruptura do vínculo
conjugal, ainda que posteriormente o casal se reconcilie novamente. Ele afirma que nesse aspecto
particular não é possível a adoção do mesmo critério utilizado para o casamento, forma de
relação que tem outros requisitos e características próprias, entre elas a solenidade para o seu
início e término, apesar, como afirma, da separação de fato, mesmo no casamento, já provocar
certos efeitos jurídicos. E, traçando uma comparação com o casamento, ilustra de forma bastante
clara a maneira pela qual a ruptura ou descontinuidade do vínculo é compreendida na ótica
jurídica ao fazer a seguinte afirmação:
Assim, adotando a continuidade como característica do companheirismo, deve-se
entender que eventual caracterização de ruptura da união, a implicar o expurgo da
permanência da relação mantida, provoca a dissolução da sociedade entre os
companheiros e, na eventualidade de reconciliação, deve ser novamente conquistada a
continuidade, ao lado de outras características, para o fim de novamente reconhecer o
companheirismo. Em termos comparativos ao casamento, tomadas as devidas cautelas,
seria a hitese dos cônjuges terem se divorciado, rompendo o vínculo mantido entre
eles, e somente um novo casamento, com pressupostos e requisitos indispensáveis,
possibilitaria a reconstituição do vínculo conjugal mantido entre eles. Na hitese do
companheirismo, toda a formalidade necessária ao casamento é substituída pelo convívio
entre os companheiros, com atributos e qualidades já mencionadas, dentre eles a
continuidade. (GAMA, 2001, p.169)
Informalismo: Dando continuidade a sua maneira própria de abordar as características da
união estável, aglutinando-as sucessivamente de maneira a formar um conceito dessa forma de
relação, Gama (2001) afirma que na união extramatrimonial estabelecida para o fim de
constituição de família, dotada de estabilidade, notoriedade, continuidade e consistindo no único
vínculo familiar dos companheiros é dispensável aos futuros conviventes qualquer regra relativa
157
ao casamento formal ou a qualquer outro ato solene para a formação da união estável. A
afirmação do jurista torna nítido o entendimento que para que a união estável se inicie é preciso
apenas que as pessoas envolvidas queiram viver a relação de tal maneira. Ao contrário do
casamento formal não são necessários formalismos e solenidades para que se dê início a esse
arranjo conjugal. Essa última característica é importante na comparação da união estável com o
casamento, por definição, um ato solene. Nesse sentido, vale lembrar que toda a formulação legal
referente à união estável é feita tendo como modelo o casamento.
Gama (2001) afirma que a ausência de formalismo como característica foi citada por
diversos juristas nesta diferenciação entre casamento e união estável. Dentre elas destacamos a
afirmação de Rodrigo da Cunha Pereira (1996), a qual consideramos de importância fundamental
não somente para ilustrar essa característica como também para caracterizar a união estável:
Como podemos perceber das posições de todos os doutrinadores e jurisprudência,
nacionais, a conceituação e caracterização do concubinato estão sempre à procura da
idéia de casamento oficial, o matrimônio. Todos os elementos aqui apresentados são
como uma espécie de comparação, uma tentativa de se desenhar um casamento, com a
diferença de não haver ato civil. (PEREIRA, 1996, p.47)
Se as características anteriores aproximam a união estável do casamento de maneira que,
muitas vezes, estes parecem se tratar de uma mesma realidade jurídica, o informalismo, por sua
vez, exerce o papel de prover uma distinção – ou mesmo oposição, somente possível, do ponto de
vista jurídico, e, atualmente, até mesmo social, através desse aspecto – entre ambos. Como afirma
Gama (2002), a principal diferença entre essas duas modalidades de vida conjugal é a ausência de
formalidades, aspecto próprio e exclusivo das relações extramatrimoniais, quando confrontadas
com aqueles integrantes do matrimônio. Tal afirmação é reiterada pelo próprio autor quando este
sustenta que a consideração da característica se presta à diferenciação desses dois vínculos. Diz
ainda, em acréscimo, que o matrimônio é um ato solene, formal, destinado a unir em casamento o
homem e a mulher, dando origem a uma nova família. A união estável, ao contrário, é um
instituto envolto pela informalidade, ausência de solenidade e, mesmo que os integrantes da
relação pretendam formalizar a união através, por exemplo, de declaração da união perante o
Oficial do Cartório de Notas, ou de documento particular nesse sentido, como ressalta, tais
158
providências não são exigidas por lei, e, mesmo no campo das provas, devem ser confrontadas
com outros elementos que demonstrem a existência da união estável.
2.3.3. Requisitos:
Ao tratar dos requisitos da união estável Gama (2001) volta a afirmar que muitas vezes
aspectos apontados por alguns juristas como características desse arranjo consistem, na verdade,
em requisitos e vice-versa, como já fora demonstrado anteriormente. Não obstante, o jurista
entende que essa divergência terminológica oportuniza o debate mais aprofundado do tema.
Seguindo a proposta de Francisco José Cahali, o autor adota como critério diferenciador dos
requisitos aqueles tocantes a situões ou eventos concretos e aos elementos anímicos,
enumerando como condição indispensável à configuração da união estável os seguintes
requisitos: requisitos objetivos (referentes às situões ou eventos concretos), que incluem: a)
diversidade de sexos; b) ausência de impedimentos matrimonias; c) comunhão de vida; d) lapso
temporal de convivência; e requisitos subjetivos, (tocantes aos elementos anímicos), que
englobam: a) convivência more uxorio; b) affetio maritalis: o animus de constituir família.
2.3.3.1. Requisitos objetivos:
De acordo com Gama (2001), devem ser consideradas como requisitos objetivos as
condições pessoais e os eventos cuja existência ocorrem independentemente do elemento anímico
dos membros das uniões extramatrimoniais, de modo a incluir, a título de requisitos subjetivos,
tudo aquilo que se refira ao elemento volitivo dos companheiros. O autor ressalta que o proposto
não se trata de inovação, visto toda doutrina relativa aos requisitos jurídicos está, em geral,
baseada na divisão proposta.
Diversidade de sexosComo afirma Gama (2001), a união estável, apesar de algumas
considerações contrárias oriundas das decisões dos tribunais, ou seja, da jurisprudência, somente
é reconhecida como instituto jurídico se acontecer entre um homem e uma mulher. O vínculo
constituído por duas pessoas de sexos diferentes é o único capaz de gerar efeitos jurídicos,
excluindo-se dos mesmos as relões homossexuais. Questões relacionadas às uniões entre
159
pessoas do mesmo sexo – como, por exemplo, a formação de um patrimônio em comum
registrado no nome de apenas uma delas são tratadas no âmbito do Direito das Obrigões, e
não do Direito de Família. De tal forma, a diversidade dos sexos é apontada hierarquicamente
como o primeiro requisito fundamental para a união estável, como expressa o posicionamento de
Leoni Lopes de Oliveira, citado por Gama.
Gama (2001) elucida que essa obrigatoriedade da diferenciação entre os sexos do casal
formador da união estável se justifica pelo fato de que, em se tratando de famílias conjugais,
somente poderá ser reconhecida juridicamente como família a união informal que possa ser
convertida em casamento. Sendo assim, essas relões devem estar de acordo com os valores e
princípios que fundamentam o ordenamento jurídico brasileiro, implicando a adoção de regras de
conduta apliveis às relações familiares – que não foram modificadas pela Constituição Federal
–, tais como a proibição do incesto e a diversidade dos sexos. Sobre esse aspecto o jurista
reafirma que “deve-se sublinhar a importância da noção de casamento mesmo quanto às uniões
informais: os contornos do casamento se mostram fundamentais no mundo jurídico para o
reconhecimento das famílias jurídicas fundadas na conjugalidade, por força do sistema existente,
tal como previsto na Constituição Federal(GAMA, 2001, p.177).
Gama (2001) afirma, entretanto, que a Constituição Federal de 1988 considerou alguns
modelos de família, deixando fora dessa abrangência outras formas de organização familiar. E
cita o voto do relator Breno Mussi que, em julgamento recente destacou que a união estável deve
ser encarada como a relação em que as pessoas não estão preocupadas com o casamento. Pode
ocorrer, inclusive, que o que justamente não querem é o matrimônio, sem que a relação deixe de
ser uma união estável(MUSSI, apud GAMA, 2001, p. 177-178). Não obstante, o jurista reitera a
necessidade de que a união estável, para ser reconhecida do ponto de vista jurídico como tal,
possa ser convertida em casamento, o que exige, entre outros requisitos, que ela seja constituída
por um casal livre de impedimentos matrimoniais. A afirmação seguinte é esclarecedora a
respeito desse aspecto:
[...] não há união estável, e nunca haverá, naquelas uniões que, por força do tratamento
no Direito matrimonial, nunca poderão ser convertidas em casamento. Dois,
basicamente, são os fundamentos de tal afirmação: a) a Constituição Federal estimula a
constituição,
ab initio
ou por conversão, de famílias matrimoniais; quanto às outras
famílias (informais ou monoparentais), as reconhece, sem pretender sua proliferação. A
regra constante da parte final do § 3.º do art. 226, da Constituição Federal, ao prever que
160
a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento, é elucidativa a esse
respeito; b) não houve equiparação entre família matrimonial e as outras famílias
sociológicas (ora reconhecidas constitucionalmente), daí por que há a prevalência
constitucional do casamento sobre outras formas de constituição (e manutenção) de
família. Logo, não pode ser reconhecida como família qualquer união não parental que,
abstratamente, não possa se transformar em casamento, pois do contrário estar-se-ia
descumprindo a Constituição Federal com o estímulo à constituição de outras famílias
que não a família matrimonial. (GAMA, 2001, p.178)
Ausência de impedimentos matrimoniaisEm relação a esse atributo Gama (2001)
esclarece que a doutrina de maneira geral vem se orientando no sentido de somente reconhecer a
união estável entre pessoas desimpedidas, isto é, em situação conjugal que não caracterize o
concubinato impuro, termo aplicado às relões adulterinas ou incestuosas. Entretanto, o jurista
expressa alguns temas tocantes a esse atributo que, segundo ele, ainda não foram abordados de
maneira suficiente. Tal consideração e os questionamentos a ela atinentes são expressos na
afirmação abaixo feita pelo autor ao comar a tratar do aspecto em questão:
De início, alguns questionamentos se imem: a) o art. 226 § 3.
o
, da Constituição
Federal somente permite união estávelentre pessoas solteiras, divorciadas e/ou
viúvas? ; b) diante da regra constitucional é possível que um ou ambos os companheiros
sofram algum impedimento matrimonial previsto no art.183, do Código Civil, e mesmo
assim a união mantida pode ser considerada familiar, na modalidade de
companheirismo? c) a situação das pessoas casadas e se paradas de fato de suas
cônjuges, vindo a se unir informalmente com outras, poderá constituir união estável?;
haverá alguma outra hitese não juridicamente definida como impedimento
matrimonial a ensejar a impossibilidade de constituição do companheirismo? (p.180)
O jurista acrescenta ainda que, adicionando complexidade a tais dúvidas, a Lei 8.971/94
foi promulgada, fazendo referência em seu artigo 1
o
à “companheira comprovada de um homem
solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, para o propósito de atribuir direitos a
alimentos, utilizando-se, em seu entender, de redação totalmente inadequada para a hitese.
Apesar de não tratar especificamente da referida lei, Gama afirma que não há dúvidas quanto ao
complicador criado pela mesma, salientando que os questionamentos explicitados na afirmação
anterior merecem reflexão.
No âmbito jurídico não existe uma concordância geral em relação às indagões
levantadas por Gama (2001), como demonstra o próprio autor. Apesar disso, nota-se uma
161
preocupação geral com a situação de pessoas que, as estarem casadas e separadas de fato de
seus cônjuges, constroem um novo vínculo conjugal informal com outras, no sentido da
caracterização dessa atual relação. Há uma discordância, entre os juristas, quanto à possibilidade
dela poder se encaixar no conceito de união estável, dado o dispositivo legal que estabelece as
características e os atributos necessários à configuração de tal arranjo. Como demonstra Gama,
alguns representantes do judiciário, como Basílio de Oliveira (1995), entendem que a união
estável, nos termos da Lei 8.971/94, abrange também o “concubinato adulterino unilateral,
contanto que o beneficiário da relação seja o casado, devendo o outro membro ser livre. Para esse
autor a Constituição não fez distinção entre o concubinato puro e impuro e, uma vez
caracterizada a união estável entre homem e mulher entidade familiar –, deve ser aplicado o que
dise a Lei 8.971/94. De maneira divergente, Eduardo Leite (1997), baseado na noção de
conversão em casamento, entende que a união estável referida no texto constitucional abrange
somente as uniões livres de impedimentos matrimoniais e não os concubinatos – onde acontecem
impedimento, adultério –, caso contrário, não se cogitaria a conversão. Analisando as muitas
divergências tocantes a esse aspecto, Gama (2001) sintetiza:
[...] a norma constitucional não limitou a abrangência do companheirismo aos solteiros,
divorciados ou viúvos, e sim enunciou regra segundo a qual os parcipes da relação
extramatrimonial devem preencher os requisitos objetivos e subjetivos necessários para a
conversão, ou seja, que sejam companheiros. A primeira resposta, portanto é negativa:
a
Constituição Federal não limita o companheirismo aos solteiros, divorciados e viúvos.
Além destes são também destinatários da norma constitucional todos os separados
judicialmente ou de fato, desde que mantenham convivência com os requisitos e as
características do companheirismo pelo prazo de dois anos. (p.184)
Nota-se, através da afirmação acima, que o que se apresenta como fundamental para a
caracterização da união estável é um conjunto de fatores que permita enquadrar esse arranjo na
definição proposta por Lei. Quando Gama fala dos requisitos e características desse deixa claro
que um elemento isoladamente não pode caracterizar a união estável e, seguindo esse
entendimento, até mesmo o prazo de dois anos é questionado por alguns juristas como Rodrigo
da Cunha Pereira. Concordando com Teresa Arruda Alvim, que afirma que “o Direito, cada vez
mais, protege situões reais e, cada vez menos, situões meramente formais(ALVIM, 1995
apud GAMA, 2001, p.185), esse jurista aponta uma adequação do Direito às situações sociais, as
quais envolvem as mudanças ocorridas no campo da conjugalidade, no qual é bastante comum
162
ocorrer a separação conjugal não formalizada e a posterior retomada do vínculo conjugal com
outros pares afetivos. Além dos índices de separões e dircios oficiais aferidos pelo IBGE,
certamente há um mero grande de pessoas que se separam informalmente e muitas delas
refazem sua vida conjugal através da união estável.
Esse fato pode ser explicado, entre outros fatores
, por razões econômicas que impedem
gastos com a separação oficial, apesar de ser assegurado o direito de gratuidade da justiça quando
comprovado o desprovimento financeiro daqueles que buscam seu suporte. Um outro motivo para
essa informalidade pode ser o estilo de vida moderno que, assim como faz com que a
oficialização não seja, como ocorria em outras épocas, uma condição necessária para a existência
do vínculo conjugal – uma das razões pela qual, em nosso entender, a união estável se tornou
uma opção de vida conjugal cada vez mais freente –, permite que as pessoas desfaçam esse
vínculo sem intermédio da justiça, o que, do ponto de vista subjetivo, não se constitui
necessariamente num problema e tampouco num impedimento para que o lo conjugal seja
refeito posteriormente com novos companheiros. Não é possível ao Direito ficar isento diante
dessa mudança na maneira de representar os objetos presentes no campo da conjugalidade. A
criação de leis, e nisso se inclui o reconhecimento jurídico da união estável, é feita a partir das
mudanças ocorridas no social e, dialeticamente, interfere nesse campo. A respeito dessa simetria
entre as leis e as práticas sociais Rodrigo da Cunha Pereira (1996) manifesta:
A segunda situação é aquela em que uma das partes concubinária mantém o casamento,
mas apenas em sua formalidade, ou seja, há uma separação de fato, há muito tempo (...)
Aqui, na realidade, não existe mais o casamento, apenas uma aparência e um vínculo
formal que não se sustentam em sua essência. (...) O Direito deve proteger a essência
muito mais que a forma. (...) Como podemos verificar, os tribunais brasileiros, sob o
princípio de que o Direito deve proteger a essência mais que a forma, têm acatado a tese
de que o concubinato (...) pode sobrepor-se a um casamento desfeito apenas de fato. E
assim, os seus efeitos patrimoniais terão prevalência sobre a relação que está presa a uma
mera formalidade cartorial, para responder a interesses mais verdadeiros, para fazer a
melhor tradução da essência do Direito. (p. 74-76)
Finalmente, em relação à questão dos impedimentos matrimoniais, Gama (2001) conclui:
[...] para o companheirismo, aplicam-se os impedimentos previstos no art. 183, do
Código Civil, apenas com a mitigação quanto à regra do inciso VI, ou seja, não há
impedimento se um dos companheiros ou ambos forem casados com terceiras pessoas,
mas que estejam separados de fato há mais de dois anos, hitese em que não há
adultério, pois a comunhão de vida entre os cônjuges não vigora mais. Tal conclusão
163
advém da correta interpretação do texto constitucional. E. além dos impedimentos
mencionados, deve-se considerar a impossibilidade da constituição do companheirismo
entre o casal quando houver prévia relação fundada no companheirismo com outras
pessoas, originando o concubinato entre eles, sob a modalidade desleal. (p.190)
Comunhão de vidaCom base na doutrina legal, Gama (2001) considera a convivência
sob o mesmo teto um requisito necessário para a configuração da união estável. A vida dentro de
um lar conjugal implica, inclusive, o débito conjugal, ou seja, a prática efetiva de relações sexuais
entre o casal convivente, de forma semelhante ao que ocorre no casamento. Deve-se ressaltar,
entretanto, que assim como há uma concordância por parte de alguns juristas de que a comunhão
de vida deve ocorrer sob o aspecto espacial embora esses não desconsiderem em nenhuma
hitese o aspecto subjetivo, ou seja, a convivência more uxorio (que será abordada mais adiante,
quando tratarmos dos requisitos subjetivos) como requisito essencial à união estável –, existem
diversas posições contrárias a esse entendimento. Entre elas, a de Rodrigo da Cunha Pereira
(1996), que afirma:
É preciso considerar, ao contrário, entretanto, que o conceito de comunidade ou
comunhão de vida tem sofrido profundas mudanças na contemporaneidade. A tendência
parece ser mesmo a de dispensar a convivência sob o mesmo teto para a integração do
concubinato (...). No Direito brasileiro, atualmente, já não se toma o elemento da
coabitação como requisito essencial para caracterizar ou descaracterizar o instituto do
concubinato, mesmo porque, hoje em dia, já é comum haver casamentos onde os
cônjuges vivem em casas separadas (...). (p.44)
A afirmação do jurista transcrita acima aponta a necessidade da adoção de uma certa
relativizaçãona caracterização da união estável, que se faz necessária pelo próprio caráter
dinâmico das sociedades contemporâneas, nas quais emergem diversos tipos de relacionamentos
que podem ser classificados como conjugais, mas que, entretanto, possuem características muito
diferentes dos modelos tradicionais referentes a eles. Esse fato não torna dispensável a exigência
de alguns elementos para a caracterização jurídica de um determinado tipo de relação como, no
caso, a união estável. A coabitação se mostra como um indicador importante na sua
caracterização como instituto jurídico que, contudo, não deve sobrepor-se ao chamado aspecto
anímico da relação, uma vez que esse se refere ao compartilhamento da vida conjugal, que pode
ou não ocorrer sob o mesmo teto. Embora para muitos casais a organização da casa seja um
164
aspecto fundamental na construção da conjugalidade, permeando diversas etapas da tessitura do
vínculo formado pelos mesmos, para outros a relão conjugal independe do aspecto habitacional
– habitação comum.
Quanto à necessidade de diferenciação requisito objetivo – residência comum e
subjetivo – convivência more uxorioGama (2001) assim profere:
Deve, no entanto, ser separado o requisito objetivo, residência comum para os
companheiros, do requisito subjetivo, convivência more uxorio, apesar de sua íntima
relação, porquanto o tratamento dispensado por um ao outro companheiro,
reciprocamente, é que possibilitará a aferição quanto á espécie de relação mantida entre
eles. É possível que um homem e uma mulher habitem a mesma residência e até
mantenham relões sexuais, com certa freqüência, mas conservem suas vidas de forma
completamente independente, mantendo o que modernamente se convencionou se tratar
de relação aberta”. Falta, portanto, o elemento anímico indispensável à caracterização
do companheirismo. (p.191)
Veloso (1997), fazendo referência expcita ao dispositivo legal, esclarece que “em regra,
a vida em comum, sob o mesmo teto, é uma das mais marcantes características da união estável.
Esta aparência de casamento é fator de demonstrão inequívoca da constituição de uma família”
(p.71). Porém, esclarece que a Súmula N
o
. 382 do STF enuncia que a vida em comum sob o
mesmo teto, more uxorio, não é um elemento indispensável à caracterização do concubinato.
Lapso temporal de convivência Gama (2001) afirma que o decurso de período de tempo
razoável de convivência entre o casal que vive em união estável deve ser considerado como
requisito para a configuração desse arranjo. O jurista ressalta, nesse sentido, que no sistema
jurídico brasileiro esse período equivale a, no nimo, dois anos. Essa determinação está
expressa no § 3
o
. do artigo 226 da Constituição federal de 1988 – citado no início do capítulo –,
segundo o qual, para efeito da proteção do Estado é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Em
consonância com tal norma constitucional, Gama (2001) sustenta:
Diante da correta interpretação da norma constitucional, portanto, qualquer efeito
jurídico relativo ao companheirismo, tanto no aspecto dos efeitos exteriores (perante o
Estado e a sociedade) quanto nos aspectos dos efeitos internos (entre companheiros),
deve levar em consideração a imprescindibilidade da presença do lapso temporal de dois
165
anos ou mais para a configuração do companheirismo. Qualquer texto legislativo editado
as 1988 deverá ser considerado inconstitucional naquilo que disser respeito a prazo
inferior a dois anos, conforme interpretação alcançada, e toda legislação anterior a 1988
deve ser adequada a norma constitucional para o fim de somente reconhecer efeitos
jurídicos positivos ao companheirismo no caso de união extramatrimonial pelo prazo
mínimo de dois anos. (p.202)
Todavia Gama (2001) considera que, apesar do tempo de convivência ser um requisito
fundamental no que se refere ao reconhecimento jurídico da união estável, ele deve ser conjugado
com os demais requisitos dessa modalidade de relação para que tal finalidade seja alcançada.
Como sublinha o autor: [...] a simples caracterização de convívio entre um homem e uma
mulher, pelo prazo de dois anos, não implica a existência de companheirismo(p.195), razão pela
qual reafirma a necessidade da presença, ao lado do aspecto temporal, dos demais requisitos
objetivos e subjetivos para a caracterização da união estável. De acordo com o jurista:
A característica da estabilidade, expressa no próprio texto constitucional, pressue o
preenchimento do requisito temporal, como índice de estabilidade das uniões livres, na
precisa expressão utilizada por Eduardo Estrada Alonso. A solidez a estabilidade da
união extramatrimonial – deve ser aferida com base em vários requisitos, dentre os quais
o lapso temporal de convivência. (p.195)
Como demonstra Gama (2001), a estipulação de um prazo legal para a caracterização da
união estável suscitou posicionamentos distintos no âmbito jurídico. Alguns concordam com essa
norma, outros adotam em relação a ela uma postura intermediária, como Francisco José Cahali
e o próprio Gama, como se observa na sua afirmão citada no início desse tópico – e outros
ainda se mostram totalmente contrários ao disposto na Constituição.
2.3.3.2. Requisitos subjetivos:
Segundo Gama (2001), o elemento anímico é fundamental na caracterização da união
estável. A ausência dos requisitos subjetivos, mesmo com a presença dos requisitos objetivos,
implica a não existência desse arranjo, podendo eventualmente existir concubinato, forma de
166
relação não abrangida pelos efeitos jurídicos positivos reconhecidos por lei quando se trata da
união estável. A esse respeito o jurista assinala:
Em toda família, a presença da intenção dos parcipes de viverem em comunhão de vida
e de sentimentos, no sentido de auxílio mútuo, de repartição de responsabilidades,
vantagens e prejuízos, de colaboração recíproca, é requisito indispensável para a
preservação da estrutura familiar, bem como todos os efeitos e conseqüências jurídicas
daí decorrentes. (p.203-204)
A partir desse entendimento, Gama (2001) assevera que devem ser considerados dois
requisitos subjetivos que, como afirma, na prática chegam quase a se confundir: a convivência
more uxorio e a affectio maritalis. O autor destaca ainda como ponto importante o fato de que a
questão patrimonial não é interessante para a configuração da união estável, apesar de alguns
juristas incluírem a contribuição patrimonial como requisito desse instituto.
Convivência more uxorioGama (2001) aponta como primeiro requisito subjetivo da
união estável esse tipo específico de convivência que a diferencia de outros tipos de relação
amorosa não fundadas no companheirismo – compreendido no sentido legal insólitas, e
consideradas, portanto, abertas. Segundo o jurista a convivência more uxorio significa:
[...] a intenção de vida em comum dos companheiros sob o mesmo teto, mantendo vida
como se casados fossem, ou seja, o tratamento respeitoso, afetuoso, carinhoso,
compreensivo, de maneira recíproca, e a exteriorização desse tratamento, possibilitando
o conhecimento da relação a todos aqueles que mantiverem contato com seus parcipes.
(p.204)
O jurista acrescenta ainda a influência desse atributo no tocante aos deveres legais
presentes na união estável, salientando com base no art. 231 do antigo Código Civil que “os
deveres pessoais de coabitação, de auxílio moral e material, de fidelidade se exteriorizam em
similitude com os deveres matrimoniais. (p.205)
A convivência more uxorio confere às relões conjugais informais estabilidade, de
maneira que juridicamente estas possam ser reconhecidas como uniões estáveis. A ausência desse
atributo tem como implicação a descaracterização desse arranjo, em razão da impossibilidade de
167
aferir-se a estabilidade fornecida pelo mesmo. Conforme explicitado no acórdão transcrito no
livro Direito de Família aspectos constitucionais, civis e processuais, citado por Gama
(2001), as relões marcadas por essa ausência são denominadas abertas, ou seja:
Relação aberta é aquela que se caracteriza, por envolvimento amoroso e
companheirismo, básica e fundamentalmente, por interesse e conveniências sociais, a
partir de uma pseudo-identificação, de ordem espiritual, A relação aberta, como o
próprio nome está a indicar, define-se, na essência e estruturalmente, pela inexistência de
compromisso. O que marca, em realidade, esse tipo de relação, é o descompromisso dos
parceiros, que convivem na participação e realização de eventos sociais, em função,
contudo, do sentido e da repercussão destes, sem prejuízo, evidente, de vantagens e
prejuízos próprios. (acórdão transcrito in Direito de Família aspectos constitucionais,
civis e processuais, v.2,. p.459-460, apud GAMA, 2001, p.205)
Affectio maritalis: Aspecto definido por Gama (2001) como o animus de constituir
família, o qual, segundo o autor, deve estar ao lado da convivência more uxorio. Nas palavras do
jurista:
Como requisito subjetivo, a affectio maritalis representa o elemento volitivo, a intenção
dos companheiros de se unirem cercados de sentimentos nobres, desinteressados, com
pureza dalma, congregando amor, afeição, solidariedade, carinho respeito,
compreensão, enfim, o germe e o alimento indispensáveis, respectivamente, à
constituição e mantença da família. (p.206)
A respeito desse atributo existem diversas considerações no campo jurídico. Todas, não
obstante, se encaminham no sentido de traduzi-lo, acrescentando ou salientando aspectos que, de
acordo com o entender de cada jurista, melhor o definam. Assim, a intenção de constituir a
família é reafirmada por Gama (2001) como essencial na caracterização da união estável. O autor
justifica:
[...] Além da existência do elemento anímico do campo emocional, mantendo a união
extramatrimonial tendente à permanência, deve se caracterizar o objetivo inequívoco dos
parcipes de formarem e manterem uma família. A Constituição Federal expressamente
inclui o companheirismo dentre as espécies de família,e desse modo não pode ser
olvidado requisito subjetivo tão importante quanto a finalidade de constituição e
mantença da família, fundada nos sentimentos de afeição, respeito, carinho,
compreensão e colaboração mútua. (p.207)
168
Gama (2001) reitera a existência de um vínculo estreito entre a convivência more uxorio e
a affectio maritalis, dizendo, de forma a deixar clara a abrangência neles de outros elementos
caracterizadores da união estável, inclusive o suporte material, o seguinte:
É evidente o vínculo estreito entre convivência more uxório e a affectio maritalis,
porquanto, de regra, o convívio entre os companheiros comportando-se como se casados
fossem, pressue uma integração espiritual, dalmas, formada com base nos
sentimentos nobres que são revelados de um para o outro, no cotidiano do casal, e
exteriorizados por condutas de auxílio material, espiritual, moral, além de solidariedade,
amor e afeto, com efeitos daí decorrentes. (p.207)
Esses dois aspectos a convivência more uxorio e o affectio maritalisconferem à união
estável um aspecto de família e, de forma geral, demonstram estarem presentes nas
representões sociais e nas práticas conjugais daqueles que optam por esse arranjo. O
sentimento de “estar casado” e a comunhão de vida são expressão da existência da conjugalidade
que, uma vez comprovada, gera efeitos jurídicos.
2.3.3.3. Requisitos: outras questões
Gama (2001) aborda ainda outras questões importantes referentes aos requisitos
necessários ao reconhecimento jurídico da união estável. No tocante a esse aspecto adverte que,
primeiramente, não se pode confundir os requisitos com os efeitos ou conseqüências jurídicas da
união estável. Os deveres inerentes ao companheirismo, entre os quais se inclui o sustento, a
guarda e a educação dos filhos, não podem, de acordo com o seu entendimento, ser considerados
pressupostos necessários à existência ou à validade dessa modalidade de relação. Como afirma o
autor, eles surgem, ao contrário, como reflexo dos efeitos do instituto, englobando as relações
pessoais que passam a existir entre os conviventes. No que se refere aos filhos, Gama demonstra
que, apesar de haverem juristas que consideram a existência de prole como um fator capaz de
atestar a estabilidade da relação entre companheiros – podendo inclusive substituir o prazo legal
exigido para a caracterização da mesma –, há no âmbito jurídico concordância significativa de
que o elemento filhos é apenas um indicador e não um elemento definidor da união estável. Gama
então conclui a esse respeito:
169
[...] deve ficar assentado que a eventualidade da existência de prole não pode ser
considerada como requisito para a configuração do companheirismo, nem pode servir de
parâmetro substitutivo do requisito temporal para a aplicação de efeitos relativos ao
companheirismo. (p.213)
No tratamento da união estável os textos jurídicos utilizam como base o casamento.
Acreditamos ser importante observar se existe nesse sentido uma coincidência entre a lei e as
representões sociais construídas acerca desse arranjo, identificando se as mesmas também
estão ancoradas no casamento. Ou, se esse arranjo é representado como concubinato. No campo
do Direito há um esforço de diferenciação entre a união estável o concubinato, como é
demonstrado no item notoriedade, através do qual muitos juristas entendem a união estável, ao
contrário do concubinato, como uma relação pública e notória.
Uma vez que a união estável é uma situação fática que cria efeitos jurídicos, antes de
adentrarmos no tópico relativo aos direitos e deveres decorrentes dessa relação jurídico-familiar,
na expressão de Gama (2001), é importante mencionarmos em que momento da vigência do
vínculo conjugal tais efeitos passam a incidir sobre os membros do casal convivente. Embora a
temática referente a esse arranjo seja algo cada vez mais comum nas cenas cotidianas, inclusive
pela discussão freente na dia, por se tratar de um femeno jurídico novo alguns aspectos
legais podem ser compreendidos de maneira incompleta, e até mesmo incompreendidos. Essa
obscuridade atinge, principalmente, os direitos e deveres gerados pelo tipo de vínculo, ou seja,
quais são eles e quando efetivamente se aplicam às suas situões conjugais em particular.
No que se refere à incidência aos direitos e deveres sobre o casal que vive em união
estável, a situação de separação é aquela em que mais se observa uma preocupação relativa aos
direitos acompanhada de uma busca dos mesmos na justiça. Embora esses efeitos sejam gerados
desde o início da relação – comprovada a posteriori, no seu rompimento – a consciência efetiva
dos mesmos tem demonstrado ocorrer somente quando esta se finda. De maneira geral, a relação
de união estável é vivenciada nas práticas como um casamento informal; pelo caráter seu
informal não há uma preocupação com direitos, e, por ser representada como um casamento, os
deveres são compreendidos como inerentes, embora deve-se ressaltar que, dentro de um contexto
170
atual ou moderno, essa compreensão é muitas vezes tênue e, assim sendo, distante de uma
aplicabilidade na esfera conjugal.
Os requisitos e características da união estável abordados por Gama (2001) podem ser
conceituados como os aspectos que, conjuntamente, definem esse arranjo conjugal, e sua extinção
a desqualifica como tal, ou seja, o vínculo em questão passa a ser visto como desprovido da
característica essencial que lhe confere a denominação jurídica, a estabilidade. A inexistência da
estabilidade, constituída pelo conjunto de características e requisitos próprios da união estável,
faz com que determinado arranjo, de acordo com a ótica jurídica, seja considerado concubinato.
Quanto à separação, situação na qual ocorrem os principais problemas ligados aos direitos
e deveres da união estável, especialmente pela questão patrimonial levantada pelo rompimento do
vínculo conjugal entre o casal convivente, Gama (2001) afirma que a mesma pode ocorrer de
duas maneiras descritas a seguir:
Na primeira, ambos os companheiros, consensualmente, resolvem extinguir a relação até
então mantida entre eles, e assim procedem da mesma forma que iniciaram o vínculo, ou
seja, informalmente. Apesar da semelhança com a separação consensual, em matéria de
casamento, a separação dos companheiros independe de qualquer providência
jurisdicional. Assim, apenas para romper o vínculo basta que ambos deixem de coabitar,
manifestando seus desejos de não mais se manterem unidos e, portanto, destituírem a
relação familiar entre companheiros. É certo que vários efeitos decorrentes da dissolução
podem ser regulados através do acordo celebrado entre os companheiros e, caso envolva
matéria relativa a direito indisponível, deve ser submetida à homologação judicial. Na
segunda, apenas um dos companheiros pretende extinguir a união, não obtendo a
anuência do outro, bastando apenas deixar o convívio, com as devidas cautelas,
propondo, por exemplo, medida judicial autorizando seu afastamento do lar. Os reflexos
desta dissolução, normalmente, serão discutidos em sede judicial, através das ões
possíveis diante dos efeitos patrimoniais decorrentes do companheirismo (p.215)
Apesar da união estável ser um tipo de vínculo conjugal que tem como uma de suas
principais características a informalidade sendo inclusive essa a sua diferença em relação ao
casamento, vínculo formal –, sua constituição pode, em certo sentido, conter uma nuance de
formalidade no momento em que o casal convivente opta pelo reconhecimento da relação em
cartório. Esse direito é assegurado por lei, como também a conversão da união estável em
casamento. O contrato constitutivo de união estável é, no entender de Paulo Lins e Silva
171
(informação verbal)
2
, um procedimento que, embora tenha por finalidade assegurar direitos
patrimoniais, se mostra permeado pela afetividade, uma vez que muitas vezes representa a
preocupação de proteção ao companheiro(a), a possibilidade de reconstrução da conjugalidade,
quando um ou ambos os membros do casal é separado, viúvo ou divorciado, etc. Veloso (1997)
também é favorável ao contrato, assim expressando em relação as suas finalidades:
O relacionamento afetivo de um casal nasce de um fato. A permanência, a notoriedade, a
intenção de ficar juntos, qualificam esse fato, que se transforma em união estável. O
contrato escrito, não para inaugurar um relacionamento, mas, sobretudo, para regular as
questões patrimoniais que podem decorrer da convivência , dá mais segurança e certeza
aos componentes da relação. Nem se argumente que este contrato teria objeto ilícito, por
estabelecer uma situação matrimonial, regida por normas congentes, de ordem pública,
porque não seria este o fim do contrato. Aliás, o art. 3
o
, vetado, mencionava que o
contrato teria de observar os preceitos da lei, as normas de ordem pública atinentes ao
casamento, etc. (p.81-82)
No que tange a conversão da união estável em casamento, há uma facilitação prevista em
lei para esse fim, como deixa claro Gama (2001). O autor cita o art. 8
o
, da Lei 9.278/96, que
afirma a possibilidade “de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união
estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil de seu domicílio.
2.3.4. Direitos e deveres na união estável
2.3.4.1. Deveres:
Ao enfocar os deveres atinentes à união estável, Gama (2001) cita a postura comparativa
de Ricardo César Galbiatti (1991) quanto aos fins e efeitos dessa modalidade de relação e do
casamento. O primeiro jurista considera indispensável o estabelecimento de regras normativas a
respeito dos direitos e deveres dos conviventes, uma vez que, sendo eles inerentes ao aspecto
interno da relação fundada no companheirismo, na ordem moral e fática, já eram considerados há
2
Seminário A Sociedade Brasileira em Discussão IX. Família: Mudanças nas Leis e nos Costumes. A sociedade vos
declara marido e mulher. Dezembro, 2000.
172
muito tempo, razão pela, qual, como afirma, os tribunais se anteciparam à legislação no sentido
do reconhecimento de tais efeitos.
FidelidadeSegundo Gama (2001), é o dever decorrente da característica unicidade de
vínculo. Na união estável a fidelidade, como afirma o autor:
Envolve o dever de lealdade entre os parcipes, sob os aspectos físico e moral, no
sentido de abster-se de manter relões sexuais com terceira pessoa, e mesmo praticar
condutas que apontem esse propósito ainda que não consume a traição. Envolve,
portanto, tanto a fidelidade material quanto a moral. (p.231-232)
Gama (2001) demonstra haver, todavia, divergências entre os juristas em relação a quais
comportamentos poderiam ser definidos como infiéis e até mesmo se a fidelidade se constituiria
num dever entre pessoas que vivem em união estável. Embora alguns juristas como Cahali
entendam a fidelidade como dispensável entre aqueles que vivem em união estável, a maioria a
considera um elemento essencial na caracterização desse arranjo conjugal, que deve, assim como
o casamento, estar fundado sobre o princípio da monogamia. Rodrigo da Cunha Pereira lembra,
inclusive, que alguns autores defendem uma fidelidade ostensiva. Ademais, Gama esclarece que a
conduta que denomina “quase-adultério, ou seja, aquela que, conforme Santos não chega à
cópula carnal, mas mostra a intenção do cônjuge de satisfazer-se sexualmente fora da sociedade
conjugal(SANTOS, 1995 apud GAMA, 2001, p.235), também se insere na noção de
descumprimento do dever de fidelidade no sentido moral.
CoabitaçãoApontado por Gama (2001) como o segundo dever imposto àqueles que
vivem em união estável, no transcorrer da relação familiar existente entre os conviventes. O autor
afirma que a coabitação é um reflexo das características de estabilidade, continuidade e objetivo
de constituição da família e do requisito de comunhão de vida more uxorio. Há também nesse
aspecto muitas controvérsias, como se pode constatar através da posição de Rodrigo da Cunha
Pereira, citada anteriormente, que defende inclusive que a vida em comum sob o mesmo teto não
deve ser considerada como um elemento necessário para a caracterização da união estável.
173
Dever de assistência moral Conforme Gama (2001), é conseência lógica da
convivência more uxorio e da affectio maritalis e reflete a característica do objetivo de
constituição da família. O autor ressalta que o dever de assistência moral implica também dever
de assistência material, mas, sem qualquer exigibilidade jurídica nos termos da legislação
anterior á lei 8.971/94(p.243). E, ao defini-lo, cita Orlando Gomes, que afirma que o mesmo
“consiste em ajuda e cuidados; ajudam-se os cônjuges mutuamente em todas as circunstâncias da
vida, compartilhando dores e alegrias, um confortando o outro na adversidade, um cuidando do
outro na enfermidade(GOMES, 1984 apud Gama, p.243).
Guarda, sustento e educação dos filhos Gama (2001) adverte que apesar desses deveres
não envolverem reciprocidade entre os cônjuges que vivem em união estável, mas deveres com a
prole comum que resulte da união extramatrimonial, constituem um aspecto importante, uma vez
que seu descumprimento pode, no seu entender, gerar desagregação da estrutura familiar e do
próprio relacionamento conjugal. Assim, o jurista define esse dever da seguinte maneira:
O dever de sustento envolve a obrigação de prover a subsistência material dos filhos,
fornecendo alimentação, vestuário, habitação, medicamentos, enfim o necessário à
sobrevivência e manutenção do menor. A guarda se refere ao dever dos pais de ter os
filhos em sua companhia, exercendo vigilância sobre os mesmos. E, a educação se
vincula ao dever dos pais de proporcionar a instrução dos filhos, pelo menos a básica,
buscando também inseri-los nos níveis subseqüentes. (p.247).
Em sentido similar, Rodrigo da Cunha Pereira (2002) cita o artigo 1.724 do novo Código
Civil brasileiro, que afirma: as relações pessoais entre companheiros obedecerão aos deveres de
lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos(BRASIL, 2002, p.
1834).
2.3.4.2. Efeitos jurídicos em relação a terceiros
Além dos efeitos jurídicos tocantes a cada membro do casal que vive em união estável,
esta pode gerar também efeitos em relação aos filhos em comum, entre outros.
174
Reconhecimento dos filhos comunsComo afirma Gama (2001), não há atualmente
dúvidas a respeito da possibilidade de reconhecimento dos filhos em comum por parte daqueles
que vivem em união estável, independente do seu estado civil. Conforme o jurista, independente
de qualquer evento – termo ou condição –, o que importa para que tal reconhecimento se efetue é
a realidade biológica. Ele lembra que, anteriormente, os filhos frutos de relação extraconjugal
eram considerados ilegítimos ou adulterinos e, em virtude desse não reconhecimento jurídico,
não tinham os direitos legais hoje adquiridos.
Previdência social e indenizõesAspecto que, segundo Gama (2001), melhor traduz o
amparo legal para aqueles que vivem em união estável. Como afirma, a infortunística e o Direito
Previdenciário são campos pioneiros na garantia de assistência material aos que, vivendo esse
tipo de vínculo, sofrem perda do companheiro por morte. Esse fato, prossegue o autor, tem por
mérito a retirada do ... tom preconceituoso e estigmatizante do tratamento (ou, da omissão)
legislativo a respeito das uniões livres(p.255), na medida em que, reconhecendo realidades
fáticas, atribuíram-lhe efeitos jurídicos. Rodrigo da Cunha Pereira é enfático acerca desse
aspecto, afirmando:
Um dos ramos do direito que mais contribuiu, e evoluiu, para o estabelecimento de
normas acerca do concubinato foi o previdenciário. Talvez porque no plano da
Previdência Social o conceito de assistência ou de previdência seja mais um conceito
econômico que propriamente jurídico, porque representa
quaestio factio, e não quaestio
juris
. (PEREIRA, 1996, p.95)
Quanto a indenizões por acidente, diz Gama (2001) que “tem direito a pedir reparação
toda pessoa que demonstre um prejuízo e a sua injustiça(p.257). O autor acrescenta que “a
concubina não pode, com efeito, apresentar como título a união irregular mantida com a vítima,
uma vez que o título legítimo para esse fim é o casamento. Mas seu interesse, conforme o caso
concreto, é legítimo(p.257). E, salienta ainda, a respeito da concessão desse benefício: tais
ensinamentos são perfeitamente atuais e se adequam à noção moderna do companheirismo,
levando em conta ainda o próprio reconhecimento constitucional de tal realidade fática” (p.258).
175
Gama (2001) afirma que atualmente, em casos de acidentes, o amparo legal à esposa de
fato, ou seja, a mulher que vive em união estável, é algo consagrado pela consciência coletiva.
Destaca de tal forma o peso do social, do coletivo em femenos como a união estável. Gama
(2001) demonstra ter havido uma evolução legal no tratamento da união estável, especialmente
no que se refere ao reconhecimento e à concessão relativos à previdência social e a indenizões
dos direitos à companheira, ato que, como ressalta, representa um tratamento isonômico às
famílias, sejam elas tradicionais, formadas pelo casamento, ou, como expressa a lei, entidades
familiares originadas pela união estável.
Uso do patronímico do companheiroSegundo Gama (2001), a situação da mulher usar
os apelidos de família do marido, circunstância esta denominada nomen, é um requisito
considerado pela doutrina para a posse do estado de casados, sendo isto comum na realidade
fática. De acordo com o jurista: A doutrina mais recente aponta, à unanimidade o direito da
companheira ao uso do patronímico do companheiro como sendo uma das grandes conquistas no
campo das uniões extramatrimoniais(p.271).
Repercussões no campo fiscal Gama (2001) faz referência a Rodrigo da Cunha Pereira,
dizendo que esse jurista “aponta o artigo 44, de 17 de julho de 1963, que passou a permitir ao
contribuinte, separado judicialmente e sem obrigões alimentares com sua ex-esposa, o
abatimento do imposto sobre a renda, das despesas que tivesse com sua companheira, como
encargo de família, desde que o convívio fosse superior a cinco anos, que ela fosse indicada
beneficiária” (p.275).
Direito à locaçãoSegundo Gama (2001), deve-se considerar a situação da união estável
e de suas conseências jurídicas no caso de falecimento do locatário ou da dissolução do arranjo
conjugal. Ele faz a seguinte afirmação a esse respeito: “a locação de imóveis urbanos sofre
profundas influências da união extramatrimonial nos seus efeitos(p.277). Também na união
estável, a questão imobiliária surge como um problema quando essa relação se finda, por
separação, situação na qual o imóvel, muitas vezes disputado pelo casal ou, por falecimento de
um dos companheiros, ficando o viúvo com receio de perder seu local de residência.
176
Contudo, Gama (2001) entende que existe uma equiparação dos companheiros aos
cônjuges termo usado para aqueles que são casados oficialmente –, em ambos os lados da
relação locacia, para reconhecimento dos mesmos direitos. O jurista aponta um inequívoco
avanço na legislação predial urbana, afirmando que isso está “em perfeita harmonia com os novos
rumos do Direito de Família, e de forma coerente com a preocupação constitucional com o tema”
(p.279). E salienta que “a noção conceitual, requisitos e características do companheirismo são
aqueles indicados pela doutrina, e construídos pela jurisprudência(p.279).
Impenhorabilidade do bem de família De acordo com Gama (2001), esse é outro efeito
jurídico importante para os próprios cônjuges que vivem em união estável, como também para
aqueles que mantém relação jurídica de natureza patrimonialcom os mesmos. Ele cita a Lei
8.009/90, afirmando que a mesma decreta que o imóvel residencial próprio do casal, ou da
entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida contraída pelos
cônjuges, ou pelos pais ou filhos que sejam proprietários desse imóvel e nele residam, salvo nas
hiteses previstas na mesma lei.
A respeito da impenhorabilidade do bem de família, este é extensivo à união estável, uma
vez que esse arranjo é reconhecido pela Constituição Federal e pelo novo Código Civil como
entidade familiar. Gama cita a posição de Luiz Rodrigues Wambier, que afirma a esse respeito:
o texto legal refere-se “a todo tipo de união cita, capaz de servir de acolhedouro das emoções e
das afeições dos seres humanos, e que muitas vezes acabam por substituir social, psicológica e
afetivamente a figura formal do casamento(WAMBIER, 1995 apud GAMA, 2001, p.283).
Gama (2001) cita o exemplo do julgamento do Recurso Especial 182.223, que garantiu a
impenhorabilidade do lugar de moradia da família, entendida segundo a ementa desse
julgamento, como instituição social de pessoas que se agrupam, normalmente por los de
casamento, união estável, ou de descendência(ementa do julgamento do Recurso Especial
182.233-SP apud GAMA, 2001). Gama considera que essa decisão judicial seguiu a melhor
orientação, ao não estabelecer parâmetro, nem fixar requisitos ou conceito da união estável.
Segundo o jurista, cabe aos tribunais, com o devido amparo doutrinário, fixar os contornos do
instituto, de acordo com a análise de cada caso a ser julgado, em particular. Ou seja, a definição
177
acerca do que está se constituindo como esta nova forma de relação conjugal, no sentido jurídico,
é algo que, apesar do suporte legal necessário, é dada na dimensão das práticas ocorridas nesse
campo.
AdoçãoÉ, segundo Gama (2001), um efeito jurídico importante e relativamente recente
que diz respeito à possibilidade do casal que vive em união estável adotar uma criança. O jurista
considera correta e coerente a não estipulação pelo Estatuto da Criança e do adolescente dos
requisitos necessários para a configuração do companheirismo, exigindo somente que seja
comprovada a estabilidade da família (art. 42, § 2
o
, da lei 8.069/90). Estabilidade, ele acrescenta,
é caracterizada por uma série de fatores como prazo de dois anos e natureza anímica evidenciados
por circunstâncias exteriores. E, salienta: Portanto, não é relevante a espécie de família, mas sim
sua qualidade” (GAMA, 2001).
2.3.5. Relações patrimoniais entre os companheiros
Como entende Rodrigo da Cunha Pereira (2002), as relões de afeto têm conseqüências
patrimoniais. A união estável, pela sua complexidade como acontecimento antigo e femeno
jurídico novo, é o tipo de arranjo conjugal cuja legalização instaura uma série de problemas, em
sua maioria associados ao aspecto patrimonial especificamente à divisão de bens emergente
no momento da separação. A união estável é um tipo de relação baseado em uma escolha
individual cuja base é o afeto, na qual o Estado interfere. Dessa mediação decorrem
conseências patrimoniais que serão abrangidas nesse tópico.
Quanto ao critério legal utilizado para divisão de bens na união estável, Rodrigo da Cunha
Pereira (2002) afirma que é considerado para a partilha de bens o esforço comum, termo
empregado no novo Código Civil e na legislação anterior a este. Nesse sentido o Artigo 1.725 do
novo Código Civil determina: Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros,
aplica-se às relões patrimoniais, no que couber, o regime de comunhão parcial de bens
(BRASIL, 2002, p.1834). Pereira ressalta que o conteúdo desse artigo é semelhante ao que foi
estabelecido em leis anteriores.
178
Gama (2001) afirma que no período anterior à Constituição de 1988 faltava a adequação
do direito à realidade fática. A constituição, apesar de não equiparar a união estável ao
casamento, inaugura uma nova fase no tratamento do instituto, atribuindo ênfase ao aspecto
afetivo da relação de vínculo entre homem e mulher. Ele demonstra concordar com o tratamento
constitucional, proferindo:
Enquanto houver afeição, carinho, compreensão, respeito, auxílio, deve ser reconhecida
a presença de uniões dignas e merecedoras de proteção do Estado. O apego ao
patrimônio deve ser desestimulado, para o fim de tornar mais límpidas as relões
humanas, fundadas naquilo que o homem tem de melhor: seu sentimento.(p.295)
O jurista também reconhece que a união estável implica repercussões importantes no
campo patrimonial entre os seus integrantes, entendendo a questão patrimonial como
“conseência direta da comunhão de vida e de almas. Ele aponta um redirecionamento das
relões homem mulher com influências na questão alimentar, ressaltando que, para que haja
proteção jurídica aos integrantes desse arranjo, há necessidade de previsão legal, visto que a
mesma não existe somente pela convivência more uxorio.
Como afirma Gama (2001), durante muito tempo os tribunais não aceitavam qualquer
demanda fundada no que a lei denominava concubinato, e menos ainda reivindicações
patrimoniais por aqueles não casados oficialmente, devido à idéia predominante de proteger a
família legítima. A legalização da união estável representou uma grande mudança nesse sentido,
visto que, como afirma, com o reconhecimento dessa modalidade de relação como entidade
familiar ou, como expressam os textos jurídicos, sua elevação à categoria de família, essa
modalidade de vida conjugal passou, assim como o casamento, a resultar obrigação alimentar.
A união estável vista como concubinato, como relação imprópria, inadequada ou mesmo
“esria, fazendo-se uso da terminologia de Gama (2001), por ser contrária à concepção de
família formada pelo casamento, dita legítima, não era considerada apta para gerar nenhum efeito
jurídico positivo. A partir de situões injustas envolvendo casais não casados no civil, os
tribunais comaram a aplicar a doutrina da sociedade de fato, segundo a qual os companheiros,
uma vez tendo a posse do estado de casados, são tratados como sócios, que ao fim da relação
179
societária terão o patrimônio comum dividido entre eles já que não há critério de partilha, em
50% no caso de dúvida – , excetuando-se todo e qualquer bem por eles adquirido futuramente.
Gama (2001) entende a sociedade de fato como um tipo societário aplivel ao companheirismo,
sendo a mesma definida como uma sociedade universal, constituída informalmente pela vontade
de seus membros.
Gama (2001) faz referência à Teresa Alvim, que afirma que situações que estavam à
margem do direito e, portanto, de proteção do Estado foram ao longo do tempo crescendo
acentuadamente, desempenhando os papéis sociais, econômico e psicológico de um verdadeiro
casamento. Dessa forma, quando a relação terminava, a jurisprudência foi substituindo a prática
de indenização da mulher pela tese da sociedade de fato, vista como a melhor forma de, em suas
palavras, resolver a situação do concubinato não paralelo ao casamento, mas que substituíao
próprio casamento(ALVIM, 1992 apud GAMA, 2001, p.298).
Ao tratar dos efeitos patrimoniais da união estável, Gama (2001) cita ainda Rodrigo da
Cunha Pereira, que também destaca o papel da jurisprudência, afirmando: Os efeitos
patrimoniais dessas relações são marcados, em nosso direito, principalmente pela jurisprudência”.
O jurista afirma, contudo, que a evolução da jurisprudência não se deu de forma tranqüila e, na
verdade, ainda não havia cessado diante da atual noção de esforço comum a orientação mais
recente do STJ de considerar a contribuição indireta para o reconhecimento da sociedade de fato
(PEREIRA, 1996, apud GAMA, 2001, p.298-299). Segundo ele, a discussão foi reaberta com a
Lei 9.276/96, inclusive quanto à existência ou não de regime de bens na união estável.
Gama (2001) afirma que a jurisprudência sempre diferenciou a união estável, muitas
vezes entendida e denominado concubinato, da sociedade de fato, visto que nem sempre havia o
aumento de patrimônio durante a constância da relação, ou devido ao fato de não haver a
contribuição efetiva daquele que deixara a união sem nenhum registro de bem em seu nome.
Conforme Gama (2001), a existência de posições divergentes em relação ao regime de
bens na união estável resulta na interpretação distinta da expressão “esforço comumpelos
tribunais. Nesse âmbito por vezes há, de um lado, exigência de provas de que ambos os
180
companheiros contribuíram para a construção de patrimônio comum e, de outro, reconhecimento
da economia gerada pelo desempenho das atividades domésticas da ex-companheira. Não
obstante, a separação é o momento no qual mais se fala da união estável e onde mais ficam claros
os atravessamentos de gênero nesse tipo de vínculo.
2.3.5.1. Regime de bens na união estável
Como afirma Gama (2001), o tratamento da União estável fora do Direito das Obrigações
e sua inclusão no Direito de Família, assim como os problemas envolvendo os companheiros,
propiciou novo enfoque da questão. O autor esclarece que a união estável, por ser uma relação
afetiva, pessoal, difere da sociedade de fato, relação esta comercial, não fundada em aspectos
pessoais, os quais incluem o objetivo de constituição de família. Na segunda, sustenta, os deveres
de fidelidade, coabitação, assistência, sustento, guarda e educação dos filhos não são impostos.
Uma vez reconhecendo que a união estável, por toda sua constituição examinada até aqui
características, requisitos, etc. –, tem como base a vontade de seus parcipes, situando-se, por
assim dizer, fora do âmbito das obrigações, ele afirma: “a ratio dessas uniões é o afeto, a
comunhão de vida e não meros interesses obrigacionais(GAMA, 2001, p.323).
Gama (2001) esclarece que na Constituição Federal houve reformulação da expressão
esforço comum. Segundo o jurista, a doutrina vem debatendo preferencialmente a questão
envolvendo alimentos e a sucessão entre companheiros. De acordo com o jurista, não há apenas
um único regime de bens no companheirismo, podendo ocorrer a separação absoluta de bens
adquiridos onerosamente por cada um dos companheiros durante a união estável, ou pode-se
ainda estipular previamente uma fração ideal diferente do estipulado pela lei mediante pacto
prévio, como se dá em casos de separação. Uma vez pactuado, o regime de bens não pode ser
alterado. Como acrescenta, a divisão dos bens se aplica somente aos bens adquiridos durante a
relação. Sobre esse aspecto Rodrigo da Cunha Pereira (2002) afirma:
Em síntese, uma vez caracterizada a união estável, os bens adquiridos na constância da
relação, a título oneroso, pertencem a ambos os conviventes. Em caso de dissolução do
vínculo, deverão ser partilhados como determinam as regras do regime de comunhão
parcial de bens, dispostas no artigo 1.658 e seguintes do novo Código Civil brasileiro.
(p.240)
181
Segundo o jurista há atualmente uma valorização da contribuição direta na aquisição dos
bens assim como da contribuição indireta, o que reflete, por sua vez, uma valorização do trabalho
doméstico feminino. Ele ressalta que, antes da constituição de 1988, a união estável era tratada no
campo do Direito Obrigacional e que somente a elevação dessa modalidade de relação à categoria
de família, com o advento da Lei 8.971/94, ela passou a ser, assim como o casamento, fonte de
obrigação alimentar. Entretanto, esse jurista demonstra ser contrário à indenização por serviços
prestados e alimentos na união estável, por tratar-se ela de uma relação de amor. Ele diz a esse
respeito:
O amor é uma via de mão dupla, na qual os dois sujeitos da relação são responsáveis por
seus atos e escolhas. Se justificarmos pela relação de trabalho na união estável, a
indenizaçãoou reparação decorreria de um vínculo amoroso de emprego e deveria ser
buscada na Justiça do Trabalho. Caso contrário, é inadmissível na ordem jurídica
brasileira o pagamento por serviço amoroso prestado. (p. 241)
Adotando o raciocínio aplivel ao casamento, Gama (2001) considera indispensável a
caracterização do bimio necessidade/possibilidade para a concessão de alimentos pelo ex-
companheiro culpado ao inocente, afirmando que “tanto o regime de bens quanto o direito a
alimentos tiveram seus antecedentes jurídicos no Direito brasileiro através da doutrina da
sociedade de fato e a indenização por serviços prestados(p.420). Como esclarece o próprio
autor, o bimio citado tem sido o fundamento jurídico para a concessão de alimentos.
Entretanto, como afirma Gama (2001), diante de algumas hiteses, desaparecerá o direito a
alimentos e conseentemente a obrigação alimentar será extinta. Por exemplo: quando a pessoa
se separa e constitui uma nova união.
2.3.6. Direito sucessório
Segundo Gama (2001), a introdução desse ramo do Direito no sistema jurídico nacional é
importante para a tentativa expcita de dar efetivo cumprimento à norma constitucional, na
precisa consideração da união estável como espécie de família.
182
Direito de propriedade: Gama (2001) esclarece que na Constituição de 1988 há direito
sucessório na união estável, mas as Leis 8.971/92/94 e 9.278/96 regulamentam o preceito do § 3
o
.
do art. 126, que elevou a patamar constitucional essa forma de relação conjugal. Segundo o
jurista:
O fundamento da sucessão é diverso daquele referente ao partilhamento de bens mantido
durante a união matrimonial ou não. Enquanto o regime de bens, em regra, leva em
conta o esforço comum para fins de comunhão de bens adquiridos e, portanto, conduz à
partilha dos mesmos com a dissolução da sociedade, a sucessão hereditária se dá
independemente de qualquer contribuição e esforço do sobrevivente, tendo como
pressuposto, no caso do consorte, apenas a falta de testamento descendente e ascendente.
(p. 431- 432)
Direito de usufruto: Gama (2001) afirma a esse respeito: A Lei 8.971/94 intituiu o direito
de usufruto ao companheiro supérstite, na eventualidade da existência de herdeiros das classes
anteriores quando do falecimento do de cujus. (p.439).
Direito de habitação: Gama (2001) cita Álvaro Villaça de Azevedo, que afirma: “esse
direito é concedido ao concubino sobrevivente, condicionalmente, sob termo ou condição
resolutiva. O direito existirá enquanto viver o titular e enquanto não concubinar-se ou não se
casar(AZEVEDO, 1996 apud GAMA 2001, p.455). O jurista salienta que, apesar da
importância da Lei 9.278/96 no contexto familiar da relação do companheirismo, esta falha pela
imprecisão, laconismo e omissão. E, lembra a proposta de Sílvio Rodrigues da edição de um
único diploma para a consolidação do assunto.
Da instituição como herdeiro testamentário: Segundo Gama (2001), diz respeito à
previsão de impedimento para ser nomeada herdeira ou legatária “a concubina do testador
casado, expressa no art. 1719, inc. III do antigo Código Civil. O autor afirma que a mesma
proibição se aplicava à doação e ao seguro. Ele destaca nesse aspecto a discriminação em relação
ao concubinato, especificamente no que se refere ao tratamento dado à concubina, mas ressalta
que essa conduta não prevalecia em relação à união estável, retirada da categoria de concubinato
as o reconhecimento jurídico. Nessa não prevalência, como diz o autor, os tribunais também
tiveram um papel importante.
183
2.3.7. Outras questões de relencia
A conversão da união estável em casamento
Gama (2001) destaca como uma questão importante a possibilidade legal de conversão da
união estável em casamento. Nota-se que esse aspecto está plenamente de acordo com a
legislação que regula esse arranjo, uma vez que a mesma toma como base desse tratamento o
casamento. Antes mesmo do novo Código Civil que, em seu art. 1.726, citado anteriormente,
prevê essa conversão, como afirma o jurista, o art.8 da Lei 9.278/96 já determinava que “os
conviventes poderão de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união estável
em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio.
Tal conversão é diferente de contrato constitutivo de união estável, que, como o próprio nome
diz, trata-se de um documento feito em cartório que indica direitos, deveres e acordos
patrimoniais feitos pelo casal que vive nesse tipo de relação, e que sobre eles incidirá. Não é,
como no exposto acima, uma conversão da relação em casamento.
O reconhecimento da união estável como entidade familiar pelo novo Código Civil
promulgado em 2002, e que passou a vigorar em 2003 – representa uma mudança substancial no
campo da vida privada. Ao definir esse arranjo através do estabelecimento das características e
dos requisitos necessários à sua constituição, a legislação encontra-se diante de uma realidade
fática, e, por assim dizer, circunstancial, de caráter eminentemente psicossocial. A afirmação de
Rodrigo da Cunha Pereira (2002) sintetiza a complexidade desse arranjo, que se estende à sua
própria definição ou, em sentido inverso, nela se inicia:
Definir união estável não é muito simples então até porque também não é nada simples,
na atualidade, o conceito de família. Aliás este é o grande desafio do Direito de Família
contemporâneo. Definir união estável começa e termina por entender o que é família. A
partir do momento em que a família deixou de ser o núcleo econômico e de reprodução
para ser o espaço do afeto e do amor surgiram novas e várias representões sociais para
ela. (p.227)
184
3. A TEORIA DAS REPRESENTÕES SOCIAIS
3.1. O conceito de representações sociais
Esse capítulo abordará a teoria das representações sociais, base teórica do presente
trabalho. Uma vez que nosso objetivo é analisar as representações sociais da união estável em
quatro grupos distintos de sujeitos (solteiros, casados, em união estável e separados) pertencentes
à classe média do Rio de Janeiro, identificando onde elas se ancoram, se no concubinato ou no
casamento, serão enfocados aqueles aspectos teóricos considerados importantes para o
embasamento teórico do tema e discussão dos dados empíricos. Dessa forma, pretendemos
também responder às indagações levantadas nesse estudo. Foram incorporadas também algumas
contribuições de autores do campo da psicologia jurídica, da modernidade e de outros que
discutem sobre o espaço público. Tais reflexões oriundas de outros campos do conhecimento
podem auxiliar a compreensão das representões sociais construídas e compartilhadas a respeito
dessa união estável, arranjo que, as a promulgão do novo Código Civil tornou-se não
somente um femeno jurídico novo, mas passou a constituir uma nova realidade social cujo
debate no âmbito das interões sociais cotidianas, inclusive daquelas ocorridas no âmbito
público.
A palavra representação advém etimologicamente do latim representare e, entre seus os
diversos significados, quatro em particular dizem respeito ao sentido assumido pela mesma na
teoria das representões sociais: 1) ser imagem ou a representação de; 2) tornar presente,
patentear, significar; 3) estar em lugar de, substituir; 4) figurar como símbolo (FERREIRA,
1986). O uso de tal termo remete à filosofia pré-socrática que o empregava na tentativa de
compreender como acontecia o processo de conhecimento da verdade dos fatos e dos objetos que
estavam presentes em um mundo em movimento. Dada a impossibilidade de conhecer a essência
de uma realidade que se movimenta, e, portanto, se modifica, seria então preciso re-apresentar a
mesma, o que implica acabar com a sua singularidade e, ao mesmo tempo, construir algo
verdadeiro, tornar outra vez presente o real verdadeiro. Na sua origem o conceito de
representação estava, por assim dizer, intimamente ligado à idéia de expressar a verdade, uma vez
que se relacionava diretamente com a verdade dos objetos e eventos.
185
A análise dos antecedentes filosóficos do termo demonstra que o mesmo era tratado
individualmente, ou seja, a representação era uma expressão do sujeito a respeito dos fatos e
eventos existentes em um mundo em movimento. Falava-se, então, apenas em representação, não
sendo acrescido a essa palavra nenhum adjetivo que pudesse qualificá-la como social ou, mesmo
antes disso, coletiva. O primeiro uso do termo representação nesse sentido foi feito por Durkheim
(1970) ao propor o conceito de representões coletivas, designando uma classe de objetos reais
por si próprios através dos quais a sociedade, considerada “antes de mais nada um conjunto de
idéias, uma realidade sui generis, se expressa. A construção teórica erigida por esse autor
forneceu fundamentos para o que se pode denominar pensamento social moderno. De acordo com
sua concepção a representação não é resultante de um trabalho psíquico individual, mas é
construída e estabelecida pelas interões sociais. Durkheim buscava entender porque os grupos
sociais representavam o mundo de uma determinada maneira. E, essa representação do mundo
não era compreendida através da sua redução ao indivíduo, mas tão somente pelo social.
Contudo, embora afirmasse que “a vida coletiva como a vida mental do indivíduo é feita de
representões(p.16), o sociólogo desconsiderava o fato de que é na dinâmica social enquanto
universo consensual e reificado, porém permanentemente aberto a mudanças, que o coletivo
encontra mobilidade.
O universo consensual é definido por Moscovici (1978) como o lugar de pensamento do
senso comum. Nele são estabelecidos, através das livres conversões que geram consensos
espontâneos sobre os vários temas da vida social. O universo corresponde, segundo o autor, ao
donio da ciência. É representado pelo pensamento erudito e pelas especializões. Em sua obra
“a construção do objeto de pesquisa em representões sociaisSá (1998) exemplifica esses dois
universos afirmando:
Os fenômenos de representação social são caracteristicamente construídos no que
Moscovici chamou de universos consensuais de pensamento. Os objetos de pesquisa que
deles se derivam são tipicamente uma elaboração do universo reificado da ciência. Se o
estudo em si da representação estivesse contido no mesmo universo consensual em que
esta é mobilizada para fins práticos da vida cotidiana, o produto desse estudo seria ele
próprio uma representação social. (p.22)
186
Em um momento de crise na psicologia social, caracterizada pela insuficiência de
conceitos e pela limitação dos seus objetos e paradigmas, Moscovici (1978), tentando dar nitidez
à terminologia proposta por Durkheim, em sua obra a respeito da socialização da psicanálise na
França, no final dos anos cinqüenta, propõe o conceito de representões sociais com o objetivo
manifesto de “redefinir os problemas e os conceitos da psicologia social, a partir desse femeno,
insistindo sobre sua função simlica e seu poder de construção do real(p.14). Essa formulação
surge também como um desdobramento do conceito de representões coletivas de Durkheim.
Moscovici (1978) afirma não ter uma posição contrária ao duplo determinismo entre a vida social
e todo e qualquer pensamento organizado postulado por Durkheim, mas ao fato do autor
desconsiderar a pluralidade dos modos de organização do pensamento ainda que eles fossem
todos sociais, o que, no seu entender compromete a especificidade do conceito de representação.
Ele considera a existência das representões hegemônicas, definidas como um tipo uniforme de
representação que se faz presente de nas práticas simlicas e afetivas, mas reconhece a
mobilidade da dinâmica social, sendo esse o principal aspecto diferenciador de sua teoria. Assim,
segundo Moscovici (1981):
Por representões sociais entendemos um conjunto de conceitos, afirmões e
explicações originado na vida cotidiana no curso de comunicações interpessoais. Elas
são o equivalente, em nossa sociedade, dos mitos e sistemas de crenças das sociedades
tradicionais; podem também ser vistas como a versão contemporânea do senso comum.
(p.181)
Vala (2000) faz uma análise desse conceito, dizendo que o mesmo envolve elementos de
particularização, uma vez que assume que as representões são na atualidade os
“equivalentesdos mitos ou sistemas de crenças característicos de outras sociedades ou tempos
históricos. O próprio Moscovici (1984) elucida essa afirmação, especificando, posteriormente à
sua primeira formulação do conceito de representações sociais, quais delas constituem seu objeto
particular de estudo:
As representões sociais de que me ocupo não são as das sociedades primitivas, nem o
que delas resta no subsolo da nossa cultura. São as da nossa sociedade atual, do nosso
solo político, cienfico e humano, e que nem sempre tiveram o tempo suficiente para
permitir a sedimentação que as tornaria tradições imutáveis. (p.181)
187
Entretanto, Moscovici (1978), na sua obra inaugural intitulada la psychanalyse, son
image et son public, reconhece a dificuldade conceitual tocante às representações sociais, razão
pela qual evita estabelecer, logo de início, um conceito sobre as mesmas, preferindo fazer uma
discussão argumentativa de modo a torná-lo mais nítido e próximo. Como afirma o autor, apesar
das representações serem entidades quase palpáveis que, em suas palavras, “circulam, cruzam-se
e se cristalizam incessantemente” através dos discursos, gestos e encontros ocorridos no universo
cotidiano, fazendo sua realidade algo de fácil apreensão, o mesmo não acontece com o seu
conceito, uma vez que este situa-se numa posição fronteiriça entre uma série de conceitos
sociológicos e uma série de conceitos psicológicos.
Jodelet (1989a) numa tentativa de sistematização do campo exprime o que tem
demonstrado ser consensual entre os estudiosos de representões sociais, definindo-as como:
uma forma de conhecimento socialmente elaborado e partilhado, orientado de forma pragmática
para a construção de uma realidade comum a um conjunto social(p.36). A autora considera
como suporte de veiculão das representões as interpretões que os discursos, práticas e
comportamentos recebem dos meios de comunicação de massa, que de tal maneira
retroalimentam as representões, contribuindo para sua manutenção enquanto se transformam ou
para sua transformação enquanto se mantém, tendo sido essa dupla face de estruturas estruturadas
e estruturas estruturantes amplamente reconhecida por Moscovici (1978, p.62) ao enfatizar o
poder de criação das representões sociais. Segundo ele, “aí reside o poder criador da atividade
representativa: partindo de um repertório de saberes e experiências, ela é suscevel de deslocá-
los e combiná-los, para integrá-los aqui ou fazer com que se desintegre acolá”.
Como demonstra Sá (1996), ao tratar do conceito de representões sociais, em uma
perspectiva complementar à formulação original feita por Moscovici estão os conceitos de Doise
e Abric. O primeiro autor concede destaque aos níveis de análise posicional e ideológico,
definindo as representações sociais como princípios geradores de tomadas de posição ligadas a
inserções específicas em um conjunto de relões sociais e que organizam os processos
simlicos que intervém nessas relões(DOISE, 1990, p.125).
188
Segundo Sá (1996), um exemplo da inserção de representações na organizão de relões
simlicas entre atores sociais é encontrado no estudo de Moscovici sobre as representões
sociais da psicanálise, no qual são estabelecidas distinções entre os diferentes sistemas de
comunicação que caracterizavam as relações que três distintas instâncias da imprensa francesa
mantinham com seus leitores. A difusão, característica da imprensa de grande circulação, é
identificada pela não existência de diferenciação entre a fonte e os receptores da comunicação e
teria como objetivo principal criar um interesse comum a respeito de determinado assunto, como
também adaptar-se aos interesses de seus leitores. A propagação, localizada na imprensa
vinculada à igreja católica, que teria como finalidade expandir sua organizada visão de mundo,
adequando seletivamente os conteúdos de outras doutrinas ao seu próprio sistema; E a
propaganda, identificada na imprensa comunista, cujo intuito seria a diferenciação antagônica
entre supostos conhecimentos verdadeiro e falso, sendo o primeiro representado pelas suas
próprias perspectivas e o falso, por exemplo, pela psicanálise.
Moscovici (1978) propôs uma correspondência entre tais relações de comunicação e as
diferentes instâncias de organização cognitiva: a difusão com a opinião; a propagação com a
atitude; a propaganda com o estereótipo. Conforme diz Sá (1996), essa articulação entre alguns
componentes das representões sociais – opiniões, atitudes, estereótipos e certas práticas
comunicacionais socialmente bem definidos permite identificar o caráter distintivo das
representões sociais de serem intimamente vinculadas a inserções sociais específicas.
Abric, por sua vez, em 1976, ao propor a teoria do núcleo central define representões
sociais como o produto e o processo de uma atividade mental pela qual um indivíduo ou um
grupo reconstitui o real com o que se confronta e lhe atribui uma significação específica
(ABRIC, 1994 a, p.13). Ocupando-se especificamente do conteúdo cognitivo das representões,
concebido como um conjunto organizado ou estruturado e não como uma simples coleção de
idéias e valores, sua principal contribuição se refere à proposição de que o conteúdo da
representação se organiza em um sistema central e um sistema periférico, com características e
funções distintas (SÁ, 1996; 1998).
189
Moscovici (1978) salienta o caráter prático, funcional, das representões na medida em
que afirma que ela corresponde ao mesmo tempo à substância simlica que entra na elaboração
e à prática que produz a dita substância, sendo um conhecimento que, como afirma, os sujeitos
usam “em seu próprio proveito, para lidar com as situões cotidianas que a eles se apresentam.
O autor ressalta ainda essa praticidade ao apontar a necessidade de resolver problemas, de
fornecer um molde à conduta ou transvazar o conteúdo de uma ciência ou ideologia como
motivos fortes para a construção de uma representação social. Sá (1996) cita nesse sentido a
seguinte afirmação de Jodelet, a respeito da eficácia e das funções das representões sociais:
qualificar esse saber como práticose refere à experiência a partir da qual ele é produzido, aos
quadros e condições nos quais o é, e sobretudo, ao fato de que a representão serve para agir
sobre o mundo e sobre os outros. (JODELET, 1989 a, apud SÁ, 1996, p.33).
Portanto, a teoria traz à tona uma proposta de estudo da construção de consensualidade e
da partilha social de conhecimentos, sobretudo quando novos elementos sociais estão surgindo,
como é o caso da legalização da união estável. Propõe-se a estudar exatamente este processo de
absorção e acomodação de novos objetos e conceitos ao universo representacional dos grupos
sociais. Ou seja, analisa o processo de familiarização do estranho, resultando num tipo de pensar
pragmático orientado para a “apreensão do real e organização do ambiente social, material e
ideal, como explica Jodelet. O conceito inovador de representões sociais, uma vez aplicado às
diversas problemáticas dentro das ciências humanas, inaugurou um vasto campo de estudos
psicossociais, configurando um espo de investigão multidiciplinar.
3.2. O campo de estudos das representações sociais
Jodelet (1989a), através de um esquema composto por dois eixos para explicar as
múltiplas dimensões do campo de estudos das representões sociais, entende, num primeiro
eixo, as representações como formas de conhecimento prático, orientadas para a compreensão do
mundo e para a comunicação e, num segundo eixo, como elaborações (construções de caráter
expressivo) de sujeitos a respeito de objetos socialmente valorizados.
190
Neste segundo eixo de estudo das representões sociais, o homem é situado dentro do
processo histórico, o que, através da noção de subjetividade, permite entender as representações
sociais não como meras expressões cognitivas, mas também permeadas pelo afeto, questão esta
que é retomada por Grize (1989) quando diz que num tipo de saber como as representões
sociais é impossível separar o cognitivo e o afetivo. No tocante à união estável, sua
regulamentação legal e em discussão o afeto e a intimidade, passando-se da objetividade do
fato jurídico para a esfera da subjetividade. As representações são ainda construções, na medida
em que são sempre representões de um sujeito sobre um objeto, tendo este um papel
fundamental nesta relação. São assim interpretões da realidade, e nunca reprodução desse
objeto, posto que a relação com o real nunca é direta, mas mediada por categorias histórica e
subjetivamente construídas. Viver em união estável é, de tal forma, uma representação que
recorta características sublinhadas segundo a conjuntura histórica (SÁ, 1996; ARRUDA, 1998;
SPINK, 1993). O esquema de Jodelet deixa claro, em primeiro plano, que as representões
sociais são um tipo de saber prático que liga um sujeito a um objeto.
Sá (1996) afirma que outra forma, mais ampla, de mapear o campo fenomenal pode ser
feita pela distinção entre diferentes tipos de representação em função de suas origens e
respectivos âmbitos de inserção social. O autor ressalta que a memória e as práticas sociais dos
grupos e as convenções são fundamentais na gênese da representação de um determinado objeto
ou assunto. Constituem, segundo ele, a base comum, compartilhada e consensual da
representação social e suas funções são fornecer a ela uma certa continuidade e permanência. Sá
ainda ressalta que as representões hegemônicas, emancipadas e polêmicas são vistas por
Moscovici como legitimamente sociais, tendo o autor ao justificar sua preferência pelo adjetivo
social em lugar de coletivo, feito a distinção entre elas.
Moscovici (1988) distingue as representões sociais entre hegemônicas, emancipadas e
polêmicas, afirmando que as primeiras demonstram prevalecer implicitamente em todas as
práticas simlicas e afetivas, e, em nosso entender, especialmente na união estável,
principalmente no que se refere à sua ancoragem no concubinato. Tais representões podem ser
partilhadas por todos os membros de um grupo sem terem sido produzidas por ele. Elas
demonstram ainda serem uniformes e coercivas e refletem a homogeneidade e a estabilidade,
191
eixo do entendimento que originou sua denominação como coletivas por Durkheim. Existem
também representões emancipadas, surgidas em conseqüência da circulão e do crescimento
de idéias compartilhadas entre subgrupos que conservam uma proximidade entre si. E, ainda,
representões polêmicas, geradas no decorrer de conflitos sociais e não sendo compartilhadas
pela sociedade como um todo. Vala (2000) afirma que estudar as representações a partir da sua
ancoragem poderá, além de ajudar-nos a associar a construção das representões a processos de
comunicação diferenciados, a diferentes sistemas de regulação social e a diferentes tipos de
relões intra e intergrupais, permitir ainda identificar seu caráter hegemônico, emancipado ou
polêmico.
Jodelet (1998) confirma a fluidez entre representões hegemônicas, emancipadas e
polêmicas tanto quanto entre sujeito e objeto, entre o que é considerado positivo ou negativo,
visto que, em se tratando da construção do outro e do mesmo, aquilo que ameaça é também o que
assegura, o que serve de garantia. Esta construção é resultante de um espo de ambigüidade que
permanece atuante, e permite reacomodação, segundo as circunstâncias.
Arruda (1998) afirma que a construção da alteridade e do mesmo se move ao compasso
das conjunturas históricas. De tal maneira, as mudanças de representações hegemônicas
correspondem, segundo ela, a novas necessidades coletivas de estabelecer um novo senso comum
com relação a si mesmo e ao outro, oriundas da renovação de projetos políticos, econômicos,
sociais, de situões culturais e outras. Com base nessa autora, podemos afirmar que a teoria das
representões sociais traz assim uma contribuição fundamental ao estudo da união estável, visto
que analisa a alteridade pela via da cognição, mas também dos afetos, apontando-os como fontes
do direcionamento dos novos e antigos contornos sociais, assim como ajuda a esclarecer como se
constrói a instituição imaginária da sociedade e, dentro desta, uma plasticidade. Vale destacar
que, como já fora dito anteriormente, no que se refere aos estudos sobre casamento e outras
formas de relação conjugal os contextualistas defendem a importância das relões subjetivas,
conferindo destaque ao papel da linguagem na constituição das práticas afetivas concebidas como
algo que se refere ao mesmo tempo à vida privada, mas, não obstante, é mediada pelo social.
192
3.3. A explicação teórica das representações sociais e suas articulações
Nos diversos textos que lidam com as representões sociais enquanto formas de
conhecimentos prático são destacadas várias funções, entre elas: orientação das condutas e
comunicações (função social); proteção e legitimação de identidades sociais (função afetiva); e
familiarização com a novidade (função cognitiva). A função cognitiva de familiarização com a
novidade através da qual o estranho – potencialmente ameaçador é transformado em familiar
possibilita-nos evidenciar os dois processos principais envolvidos na construção das
representões: a objetivação e a ancoragem. (SÁ, 1996, 1998; SPINK, 1993; MOSCOVICI,
1978; JODELET, 1989 a)
Considerando-se o caráter funcional das representões, Moscovici afirma que todas as
representões têm como objetivo transformar algo não familiar, ou a própria não familiaridade
em algo familiar. Numa consideração importante para o nosso objeto de estudo, diz que a
dinâmica dos relacionamentos é uma dinâmica de familiarização. Nela, objetos, indivíduos e
eventos são percebidos e compreendidos em relação a encontros ou paradigmas prévios. Como
resultado, a memória prevalece sobre a dedução, o passado sobre o presente, a resposta sobre o
estímulo e as imagens sobre a ‘realidade(MOSCOVICI, 1984, p.23-24).
Moscovici (1984) afirma que coisas que não são classificadas nem denominadas são
estranhas, inexistentes e ao mesmo tempo ameaçadoras. Ancorar é, portanto, classificar,
denominar. Consiste num trabalho de integração cognitiva do objeto representado num sistema de
pensamento social pré-existente. Ou seja, na incorporação de novos elementos de saber em uma
rede de categorias mais familiares. A ancoragem do novo se faz por semelhança, mas também por
contraste, sempre com referência a um padrão pré-existente. Apesar da união estável ser um tipo
de arranjo conjugal comum nas práticas cotidianas, considerando-se as atuais mudanças jurídicas,
ela é hoje também um fato novo no universo representacional das pessoas, cabendo a indagação
acerca de como esse tipo de arranjo conjugal se tornou opção e onde se ancora, se mais para o
concubinato ou mais para o casamento formal. De acordo com Vala (2000), o processo de
ancoragem refere-se à assimilação de um objeto novo por objetos já presentes no sistema
cognitivo. Esses objetos são âncoras que vão permitir construir a representação do novo objeto.
193
Então, responder a tal indagação através do estudo da representação social da união estável
significa inventariar as âncoras que sustentam essa representação e, por isso, modelam seus
conteúdos semânticos.
Segundo Vala (2000), a ancoragem pode ser compreendida em duas acepções.
Primeiramente, como um processo que precede a objetivação, referindo-se ao fato de que
qualquer tratamento da informação recebida por um sujeito exige pontos de referência, visto que,
como ressalta, quando um sujeito pensa um objeto, o seu universo mental não é, por definição,
uma tabula rasa. Pelo contrário, é por referência a experiências e esquemas de pensamentos já
estabelecidos que o objeto em questão vai ser pensado(p.362). A partir da compreensão da
ancoragem como um processo que segue a objetivação, o autor cita a seguinte afirmação de
Moscovici: Se a objectivação explica como os elementos representados de uma teoria se
integram enquanto termos da realidade, a ancoragem permite compreender a forma como eles
contribuem para exprimir e constituir relões sociais. (MOSCOVICI, 1961 apud VALA, 2000).
A análise acerca desse processo leva o autor a definir as próprias representões sociais,
afirmando:
[...] as representões sociais oferecem uma rede de significados que permitem a
ancoragem da accção e a atribuição de sentido a acontecimentos, comportamentos,
pessoas, grupos, factos sociais. Uma representação social é um código de interpretação
no qual ancora o não familiar, o desconhecido, o imprevisto. (VALA, 2000, p.362)
A objetivação refere-se a uma “operação imaginante e estruturante” através da qual se
confere uma forma ou figura específica ao conhecimento sobre o objeto, tornando concreto,
quase palpável o conceito abstrato, como que “materializando a palavra” (JODELET, 1984).
Segundo Moscovici (1984, p.38), objetivar é descobrir a qualidade icônica de uma idéia ou ser
imprecisos, reproduzir um conceito em uma imagem. Sá (1996, p.47) cita uma importante
proposição do autor na qual ele afirma que “desde que s pressupomos que as palavras não
falam de nada, somos compelidos a ligá-las a alguma coisa, a encontrar equivalentes não
verbais. Introduz assim a importante noção de cleo figurativo, referente a um complexo de
imagens que reproduz visivelmente um conjunto de idéias ao qual são integradas aquelas palavras
194
que, devido a sua capacidade para serem representadas, tiverem sido selecionadas. A respeito da
função dos processos de objetivação e ancoragem, Vala (2000) afirma:
A objectivação permite compreender como, no senso comum, as palavras e os conceitos
são transformados em coisas, em realidades exteriores aos indivíduos. A ancoragem
refere a transformação do não familiar em familiar, um processo que remete para a
sociogénese das representões sociais e para a sua funcionalidade. Esta dimensão
funcional e prática das representões sociais manifesta-se na organização dos
comportamentos, das actividades comunicativas, na argumentação e na explicação
quotidianas, e na diferenciação dos grupos sociais. (p. 49)
Arruda (1998) oferece uma importante reflexão acerca destes dois processos dizendo que
as representações sociais servem não apenas à integração do estranho, mas também para a
transformação do familiar, sua transposição para novos quadros, em readequação ao presente,
quando é preciso tornar inéditos estranhar elementos até então familiares. Esse dinamismo é
encontrado em relação aos elementos constituintes das práticas em relação à união estável dentro
de épocas específicas. Atualmente, apesar desse arranjo conjugal ter se tornado familiar, dentro
das práticas cotidianas, frente às mudanças jurídicas que originaram seu reconhecimento como
entidade familiar e suas implicações, ele também poderá suscitar estranhamentos. Esse
estranhamento pode ser forçado pelo próprio contexto social em que situa a união estável no
sentido dessa modalidade de relação deixar de ser vista como concubinato – representação
tradicional e também dela passar a ser vista como um ato que tem efeitos jurídicos. Apesar de,
como prática, a união estável ser um fato antigo comum na vida social, enquanto femeno
jurídico novo, essa modalidade de relação requer tradução, familiarização, de maneira que possa
ser absorvida no cotidiano dos grupos. Essa familiarização é possível através da ancoragem, visto
que, como afirma Vala (2000), [...] o processo de ancoragem é, a um tempo, um processo de
redução do novo ao velho e reelaboração do velho tornando-o novo(p.363). A respeito dessa
mobilidade tocante às representões sociais, femeno que atinge o conhecimento construído e
compartilhado a respeito da união estável, é pertinente a seguinte afirmação de Vala (2000):
Na nossa época, de par com as pressões para a hegemonia e a homogeinização de
algumas representões, verifica-se que muitas delas assumem, cada vez mais, um
caráter de trasitoriedade, discutibilidade e polémica. As teorias psicossociológicas sobre
a construção e o funcionamento dos
grupos sociais
e sobre os fenômenos da
identidade
social
constituem um importante fator na compreensão um importante factor na
195
compreensão da
diferenciação social
e da dinâmica das representões sociais, conceito
nuclear na Psicologia Social do conhecimento quotidiano. (p.49)
De acordo com Giddens (2001), em contraste com os laços pessoais existentes em
contextos tradicionais, as relões na atualidade não estão ancoradas em condições exteriores da
vida social, sendo essencialmente o compromisso, definido como adesão às recompensas da
própria relação, o que substitui as âncoras externas que as relações pessoais próximas
costumavam ter nas situações pré-modernas. Gay (1988) relata que nos séculos XVIII e XIX o
casamento era o laço mais importante na esfera social, caracterizando-se em geral por uma prole
extensa e tendo o amor como aspecto tão indispensável para as mulheres quanto o cumprimento
dos seus deveres matrimoniais. Não obstante, observamos atualmente a permanência de valores
tradicionais naquelas relações que, baseadas em deveres e obrigações, contrastam com o conceito
de qualidade de vida conjugal. Calligaris (1994) indaga a esse respeito se casar teria se tornado
algum tipo de dever. Hoje, tros aparentemente fundamentais como filhos não aparecem
associados à satisfação conjugal, não sendo inclusive um elemento definidor da união estável,
cujo reconhecimento legal instala um novo valor jurídico e mudanças na vida privada.
Como afirma Spink (1993) o estudo empírico das representações tem revelado
freentemente a concomitância de conteúdos mais dinâmicos, sujeitos à mudança, e de
conteúdos mais estáveis, menos sujeitos a mudanças. Estes permitem definir as representões
sociais como campos socialmente estruturados na interface de contexto social de curto e longo
alcance histórico, sendo este último denominado imaginário social, cujas produções são filtradas
pelas representações hegemônicas constituintes da visão de mundo de uma determinada época
histórica e reinterpretadas em função do pertencimento a grupos sociais específicos. Costa (1999)
observa nesse sentido a existência do mito do amor-romântico, enfatizando que, nascido com o
surgimento de uma classe média na Europa no século quatorze, ele firma-se como um molde
imaginário de todo o modo de amar do Ocidente moderno, sendo através dele que o sentimento
de insegurança constitutivo da subjetividade moderna se ancora.
O entendimento das crenças coletivas é importante dentro de um enfoque psicossocial dos
estudos sobre a união estável, visto que crenças, valores e modelos sociais carregam de conteúdos
196
diferentes a palavra casamento, concubinato, união estável e seus adeptos. Spink (1993) ressalta
que as crenças tal como os desejos constituem um conteúdo mental próprio dos agentes sociais
que questionam as expectativas de papel definidas publicamente. Vale lembrar que Durkheim
(1970) afirmava que “as crenças coletivas são o nó vital de qualquer sociedade”. Duveen (1998)
cita uma importante diferenciação feita por Moscovici entre representações baseadas no
conhecimento e representações baseadas em crenças, refletindo a sua separação entre os
universos consensual e reificado. As últimas, tendo como cerne crenças, geralmente são mais
homogêneas, afetivas, impermeáveis à experiência ou à contradição, e deixam pouco espo para
diferenças individuais, ao contrário das representões baseadas no conhecimento, que são mais
fluidas, pragmáticas, passíveis de ser submetidas a prova de sucesso ou fracasso. O autor salienta
que as diferentes formas de relões sociais são também associadas a diferentes tipos de estrutura
representacional. Em situões onde existiria um julgamento valorativo do outro pode-se
compreender a utilização de certos mitos que, como diz Moscovici (1978), invalidam ou até
mesmo rebaixam o saber produzido por determinado grupo, como acontecia no discurso acerca
do concubinato que, principalmente ao se referir as mulheres, utilizava a referência jurídica na
exclusão da alteridade. Guareschi (1998), ao afirmar que “somos como que um ancoradouro para
onde chegam miles de naus(p.153), propõe a análise do outro a partir das relões através da
dimensão da alteridade, a qual, segundo ele, traz elementos para a construção de um novo
paradigma para a compreensão do mundo e do ser humano e para constituição de práticas sociais
que impliquem uma dimensão ética.
De acordo com Vala (2000), podemos afirmar que a análise psicossociológica da
ancoragem da união estável inscreve os conteúdos das representões sociais desse arranjo
conjugal na maneira como os indivíduos se situam simbolicamente frente às relões sociais e as
divisões posicionais e categoriais do campo social da conjugalidade. Além das mudanças sociais
aceleradas, o reconhecimento da união estável entre homem e mulher pelo novo Código Civil é
um fato novo que, na tentativa de organizar juridicamente essa nova concepção de relação, altera
substancialmente o significado da vida em comum. O estudo das representações sociais da união
estável, ao buscar identificar como esse tipo de arranjo conjugal se tornou opção e onde se
ancora, permite instaurar uma possibilidade de pensar além da objetividade do fato jurídico,
investigando de que maneira o que está escrito no código se inscreve em cada sujeito social, nos
197
fornecendo de tal forma elementos significativos para a compreensão do sentido da vivência
conjugal na atualidade.
3.4. A abordagem estrutural das representações sociais
Moscovici (1978), ao formular a teoria das representações sociais em sua obra inaugural a
respeito da psicanálise, deixou claro que as mesmas possuem uma organização interna. Em uma
das primeiras proposições quanto à estrutura das representações ele afirma que essa organização
se constitui através de três dimensões: informação, atitude, campo de representação ou imagem.
A informação, também chamada pelo autor de dimensão ou conceito relaciona-se com a
organização dos conhecimentos que um grupo possui a respeito de um objeto social
(MOSCOVICI, 1978, p. 67). Por sua vez, a dimensão designada por ele pela expressão campo de
representação remete-nos à idéia de imagem, de modelo social, ao conteúdo concreto e limitado
das proposições atinentes a um aspecto preciso do objeto da representação(MOSCOVICI, 1978,
p. 69). Quanto à atitude Moscovici (1978) afirma ser aquela que, por sua vez, logra destacar a
orientação global em relação ao objeto da representação(p. 70), e como afirma, ela é a mais
freente das três dimensões e “geneticamente primordial.
Moscovici (1978) afirma que a noção de dimensão faz com que seja necessário o
reconhecimento da existência de um campo de representação onde houver uma unidade de
elementos organizados de maneira hierarquizada. Em uma aproximação que consideramos
possível com as proposições do autor a respeito da psicanálise, podemos afirmar que, no que se
refere à união estável, a amplitude desse campo e os pontos que lhe conferem orientação variam e
englobam tanto os juízos formulados sobre a união estável quanto as asserções sobre a mesma ou
a tipologia das pessoas que recorrem a essa forma de relação conjugal. Sá (1996) acrescenta que a
dimensão “campo de representação” é um aspecto privilegiado na teoria do núcleo central, na
qual será também conferida uma importância fundamental às práticas sociais.
Embora Moscovici (1978) tenha se referido à existência de uma estrutura interna nas
representões sociais, a postulação teórica formal a esse respeito foi feita por Abric, em 1976,
198
quando formulou a teoria do núcleo central. Como afirma Sá (1996), para esse autor a idéia
essencial da teoria do núcleo central é a de que “toda representação está organizada em torno de
um cleo central (...), que determina, ao mesmo tempo, sua significação e sua organização
interna”. E que, ainda segundo Abric, o núcleo central é “um subconjunto da representação,
composto de um ou alguns elementos, cuja ausência desestruturaria a representação ou lhe daria
uma significação completamente diferente” (ABRIC, 1994 a).
Sá (1996) relata que a proposição de Abric permitiu solucionar teoricamente o problema
empírico incômodo de que as representações exibiam características contraditórias, ou seja,
mostravam-se ao mesmo tempo estáveis e mutáveis, rígidas e flexíveis, consensuais e
individualizadas. Ou seja, conforme o autor, a teoria foi capaz de conciliar as aparentes
contradições de todo que se mostrava ao mesmo tempo estruturado e dinâmico.
Abric (1994 b apud SÁ, 1996) propõe uma diferenciação entre um sistema central e um
sistema periférico, definindo-os da forma que se segue. O primeiro está ligado à memória
coletiva e à história do grupo, é consensual, define a homogeneidade do grupo, é estável, coerente
e rígido, é resistente à mudança e pouco sensível ao contexto imediato; Suas funções são gerar a
significação da representação e determinar sua organização. O segundo permite a integração das
experiências e histórias individuais, suporta a heterogeneidade do grupo, é flexível, suporta
contradições, é evolutivo e sensível ao contexto imediato. Tem por funções permitir adaptação à
realidade concreta, permitir a diferenciação do conteúdo e proteger o sistema central. Segundo o
autor, o núcleo central proporciona o significado global da representação e organiza o sistema
periférico, o qual por sua vez assegura a interface com as situões cotidianas.
Sá (1998) afirma que as demais contribuições da teoria do núcleo central decorrem dessa
sua proposição estrutural básica. Tendo em vista as transformões das representões sociais
inclusive naquelas referentes à união estável elas começariam então, de acordo com Flament
(citado em SÁ, 1996), pelo sistema periférico frente às modificões introduzidas nas práticas
sociais, podendo apresentar diferentes desenvolvimentos e estados finais a partir de
circunstâncias variadas. No tocante à comparação entre as representões mantidas por dois
grupos distintos ou por um mesmo grupo em diferentes momentos, a teoria adota um critério a
199
partir do qual elas serão diferentes se e apenas se – os seus cleos centrais forem compostos
de elementos significativamente diferentes; caso contrário, tratar-se a de estados diferencialmente
ativados da mesma representação, em função das situões específicas em que se encontrarem os
dois grupos, ou em se tratando de um mesmo grupo, do estágio em que se encontre o processo de
transformação da sua representação.
Segundo Abric (1994 a), o núcleo central é determinado, por um lado, pela natureza do
objeto representado e, por outro lado, pelo tipo de relões que o grupo mantém como mesmo,e
ainda pelo sistema de valores e normas sociais que constituem o meio ambiente ideológico do
momento e do grupo. Conforme o autor o núcleo central de uma representação assume duas
funções essenciais: uma função geradora, que constitui o elemento através do qual o significado
dos outros elementos constitutivos da representação são criados ou transformados, e uma função
organizadora, uma vez que sendo o núcleo central que determina a natureza dos los, unindo
entre si os elementos da representação, ele é assim o seu elemento unificador e estabilizador.
O cleo central é, segundo Abric (1994 a), constituído em parte pela natureza do objeto
representado e em parte pela relação que o sujeito – ou o grupo – mantém com esse objeto,
podendo, de tal maneira, assumir duas dimensões distintas: uma dimensão funcional,
exemplificada em situões cuja finalidade é operatória, e uma dimensão normativa,
exemplificada em todas as situões onde se observa a intervenção direta de dimensões sócio-
afetivas, sociais ou ideológicas. Com base no autor podemos afirmar que, tendo as relações
conjugais – nas quais se incluiu a união estável – uma dimensão sócio-afetiva, uma norma, um
estereótipo, uma atitude fortemente marcada” poderão estar no centro da sua representação.
No campo das representões sociais é reconhecida a relação entre as práticas sociais e as
representões, embora o sentido dessa influência tenha se apresentado como um ponto de
discordância entre os autores. Abric (1994 c apud SÁ, 1996) discute se são as práticas sociais que
determinam as representões ou o contrário. E ainda se ambas são indissociavelmente ligadas e
interdependentes. De acordo com Flament (1994 b apud SÁ, 1996) as representações sociais são
transformadas a partir da influência que recebem das práticas sociais. Essa transformão é
descrita pelo autor através de um esquema segundo o qual o processo de modificação da
200
representação a partir das práticas implica, seqüencialmente, modificões das circunstâncias
externas, modificação das práticas sociais, modificação dos prescritores condicionais e
modificação dos prescritores absolutos (cleo central). O autor define as circunstâncias externas
como qualquer estado do mundo fora da representação social, ou seja, dependente de uma
causalidade estranha à representação social(p.49). As práticas sociais são concebidas como de
algum modo a interface entre circunstâncias externas e prescritores internos da representação
social. São comportamentos globais que evoluem para adaptar-se às mudanças das circunstâncias
externas(p.49). A respeito dos prescritores absolutos e condicionais Sá (1996) esclarece:
Considerando que, no funcionamento cotidiano da representação, são as prescrições
absolutas e condicionais – que determinam o engajamento dos indivíduos ou grupos em
determinadas práticas sociais, configuradas de tal ou qual maneira, deve-se esperar,
segundo Flament, que esses prescritorestendam a absorver” as eventuais
modificações das práticas ocorridas em função de algum fator circunstancial externo.
(p.92)
Como afirma Sá (1996), a partir da suposição descrita acima Flament aborda os processos
de modificação ao nível especificamente representacional dos dois últimos elementos do
esquema. Flament (1994 b), então, sustenta:
Um princípio elementar de economia cognitiva quer que as modificações cognitivas
sejam mínimas. Deve-se portanto esperar que as mudanças sejam inicialmente o menos
possível sobre os prescritores absolutos, que não se modificarão senão se os prescritores
condicionais forem antes modificados, de uma maneira ou de outra. (FLAMENT, 1994 b
apud SÁ, 1996)
A união estável pode ser pensada como um femeno jurídico novo que, como tal, suscita
representões sociais a seu respeito. Estas, por sua vez, quando criadas e compartilhadas podem
modificar as práticas sociais tocantes a esse arranjo. Por outro lado, as mudanças nas práticas
sociais referentes à união estável forma de relação conjugal existente desde a antiguidade – que
culminaram no seu reconhecimento jurídico como entidade familiar pelo novo Código Civil
promulgado em 2002, podem suscitar uma mudança na maneira como a mesma é representada
pelos diversos grupos sociais, uma vez que a retirou da categoria de concubinato e a introduziu
dentro de um conceito moderno de família. Enquanto a união estável era juridicamente
considerada como concubinato e, portanto, ilegal, uma vez que atentava contra o princípio da
201
monogamia, base do Direito, era vista também pelo senso comum como um vínculo ilegítimo em
razão de sua ancoragem no concubinato. De tal forma, nas representações sociais construídas
sobre ela estavam presentes elementos de discriminação, em sintonia com as práticas sociais que
envolviam esse tipo de relacionamento. Assim acreditamos estar presente no que se refere à união
estável uma bidirecionalidade. Ou seja, as representões sociais sobre esse objeto influenciam as
práticas sociais cotidianas que o envolvem, assim como a mudanças das mesmas influenciam a
maneira como ele é representado pelo vários segmentos sociais.
Os próprios dados estasticos do IBGE em conjunto, especialmente com a
contextualização histórica desse objeto, apresentados anteriormente, atestam essa correlação em
dois sentidos, uma vez que, como demonstram, ao longo do percurso histórico a presença
demográfica da união estável cresceu acentuadamente. E aumento, em nosso entender, foi
favorecido pela mudança na forma de ver essa forma de relação, ao mesmo tempo em que a
mudança nas práticas tocantes a ela, isto é, a possibilidade de conviver, compartilhar e se
identificar com um mero significativo de pessoas que estabeleceram a vida conjugal através da
união estável, permitiu representá-la de uma nova maneira, distante do concubinato e próxima do
casamento. Entretanto, tratar a união estável a partir da teoria das representões sociais significa
reconhecer as implicações que esse arranjo suscita como femeno novo que, como tal, exige
tradução, familiarização. O seu reconhecimento jurídico, embora represente um avanço
substantivo no campo da intimidade, altera substancialmente a vida em comum, na medida em
que, com a legalização, surgem novos problemas e introduzem-se novos dados na relação afetiva.
Em torno desse fato jurídico novo e da discussão a seu respeito se posicionam estudiosos de
diversos campos do conhecimento. A adoção da teoria das representações sociais, pela sua
interface multidisciplinar, nos permite incorporar algumas delas na tentativa de, como sugere
Abric (1994 a ) conhecer da melhor forma possível nosso objeto.
3.5. A legalização da união estável e suas implicações: uma casuística moderna
Como afirmamos anteriormente, diversos autores entendem que o reconhecimento da
união estável como entidade familiar aponta uma modernização do conceito de família. Alexos
202
(1969) define a modernidade a partir de uma historicização dos diversos significados do termo
moderno. O sentido desse termo tal como o concebemos hoje, isto é o “culto do novo pelo novo,
surge, segundo o autor, próximo ao final do século dezenove com o “estilo moderno. Podemos
afirmar que a opção pela união estável está associada a esse estilo de vida moderno ou aos gostos
modernos, descritos por Alexos, nos quais, ao nosso entender, se inclui um gosto moderno de
viver a conjugalidade. Fica claro que o sentido e o valor atribuído ao novo varia de acordo com o
contexto sócio-histórico, tendo essa extrema valorização daquilo que é novo atingido seu ápice
nos tempos atuais.
Alexos (1969) faz uma referência a Baudelaire, autor que, segundo ele, traz uma grande
novidade à consciência do novo. E prossegue afirmando que, para Baudelaire, o moderno” é
expressamente o efêmero, o fugaz. Este é um ponto de reflexão importante para o nosso objeto de
estudo na medida em que a união estável é um fato jurídico novo, apesar de já existente, e,
portanto, antigo, nas práticas afetivas cotidianas. Nesse âmbito observa-se muitas vezes que a
opção de viver junto aparece como um escape às amarras da tradição representada pelo
casamento formal na medida em que a união estável enquanto uma opção de vida conjugal não
formal era representada como algo mais fluído, menos responsável e, portanto, mais fácil de
dissolver nas práticas. Hoje muitos casais optam por se conhecerem melhor antes do casamento
através de uma experiência conjugal prévia chamada muitas vezes de um namoromais sério,
constituindo-se com isso uma fase intermediária ao casamento formal ou à união estável
tipicamente moderna. Até recentemente esse tipo de situação afetiva não estava presente na vida
social, sendo uma marca dos nossos tempos inaugurada a partir das três últimas décadas,
aproximadamente. Se essa experiência não der certo, a relação se dilui antes do casamento formal
ou de uma organização mais efetiva para uma vida em comum como compra de imóvel, vida
conjugal assumida, etc. – o que implicaria em uma maior estruturação a nível interno,
intrapsíquico, e externo, referente ao cotidiano dos futuros cônjuges ou companheiros no sentido
de um compromisso formal ou não-formal, como no caso da união estável.
A separação conjugal parece ser, para aqueles que optam ou optaram, principalmente no
passado, pela união estável algo muito mais possível nesse tipo de arranjo conjugal do que no
casamento formal, uma vez o mesmo está ligado a um sentimento de amor - como demonstra os
203
dados do estudo piloto realizado para nossa tese – que, por sua vez, está ligado a uma idéia de
escolha individual. A opção pela união estável representa a adoção de um estilo de vida moderno,
por pessoas em cujas concepções não necessitam de critérios externos, - no caso a igreja e o
Estado, que perderam sua força como referenciais externos, como demonstra Giddens (2002),
para dizer-lhes que estão casados. A conjugalidade hoje não precisa de uma referência externa
para se ancorar visto que o estilo de vida moderno, no que se incluem representões e práticas,
permite a escolha da forma e do momento ideal para que cada sujeito social possa vivenciá-la. Na
atualidade, com a profusão dos novos arranjos conjugais e familiares torna-se evidente que não
há mais uma forma e um tempo determinados para viver a conjugalidade. Esta pode ser
vivenciada previamente no namoro ou mais tardiamente, como atestam os dados demográficos do
IBGE referentes aos casamentos tardios e as maternidades precoces, na adolesncia, ou
ocorridas já na maturidade, ambos os femenos variáveis segundo a classe social.
A classe social é uma variável importante no tratamento de nosso objeto de estudo na
medida em que, de acordo com os operadores do direito, é na classe média onde ocorrem os
principais problemas referentes à separação na união estável, visto que, nessa camada, em geral,
há algum patrimônio constituído pelo casal durante a vigência da relação conjugal. A questão
patrimonial demonstra ser, na classe média, um dos pontos mais difíceis no que se refere à união
estável visto que, paradoxalmente, esse arranjo, ao contrário do casamento, exige uma prova de
sua existência no momento de sua dissolução. Esse fato acontece devido à questão da divisão
patrimonial estabelecida pela lei na união estável e indica uma maior facilidade, revelada nas
práticas jurídicas, desse arranjo se dissolver quando não há bens, o que ocorre nas classes sociais
menos favorecidas.
Na união estável há um questionamento jurídico de base quanto à adequação de sua
regulamentação. É inegável que o reconhecimento jurídico dessa situação já existente cuja
história social aponta para uma trajetória até os anos 50/60 marcada pela absoluta rejeição até,
mais recentemente, a sua consideração como uma família inferior à família legítima iniciada pelo
casamento representa um grande avanço no campo da cidadania. Nota-se, entretanto, que,
especialmente as a Lei de Dircio (1977), as pessoas que optam pela união estável não
querem ter regras estabelecidas para viverem a conjugalidade nesse tipo de arranjo. Criou-se no
204
plano da vida conjugal e amorosa, de forma geral, uma espécie de ética sem deveres, sendo
importante ressaltar nesse sentido que, antes do reconhecimento legal, a união estável não estava
mediada por nenhum referente externo. Não obstante, a união estável introduz deveres no
momento em que com, a informalidade característica legal desse arranjo e do próprio estilo de
vida contemporâneo não se queria deveres. Na união estável a escolha do companheiro é feita, na
maioria das vezes, exclusivamente por amor e não por imposições externas. O que prevalece é a
vontade de uma vida em comum. Há assim uma contradição interna na união estável. As sua
regulamentação ela passa a ser é um ato de amor no qual alguém – no caso o Estado – interfere.
Nesse sentido, Leis e Costa (2000) indagam se a democratização, disciplinarização ou
legalização da vida íntima não representariam, precisamente, a negação da condição de
desenvolvimento do self moderno. Em uma crítica a Giddens e Melluci fazem um
questionamento acerca do por quê tornar transparente aquilo que foi criado exatamente com a
finalidade oposta, de permanecer oculto. Trazem assim uma importante reflexão ao estudo das
representões sociais da união estável, cujo reconhecimento legal atinge a vida íntima de todos
aqueles implicados com a questão, na medida em que falam de uma impossibilidade de
tratamento teórico e/ou empírico do íntimo posto que haveria uma impossibilidade de
transposição do privado para o público.
Leis e Costa (2000) afirmam que a discussão acerca da intimidade se aia na
argumentação não aceita consensualmente de que a transformação de problemas íntimos em
exposição pública representaria a perda da qualidade do espo público enquanto esfera política e
a violação da intimidade enquanto refúgio impenetrável de auto-construção do self. Sua
argumentação se aia na idéia de que o público e o privado dizem respeito a campos sociais
distintos e de que conceitualmente a intimidade refere-se a um campo de experiências singulares,
marcado por ões cujo sentido não é decodifivel socialmente, nem universalizável
politicamente. Dizem ainda os autores que:
Os sentidos das ões íntimas são construídos fora daquelas condições de partilhamento
amplo que, sabemos desde Weber, marcam as relões sociais. Na intimidade,
constroem-se códigos, formas, gestos, linguagens que só podem ser perfeitamente
compreendidas por aquela ou aquelas pessoas envolvidas diretamente na relação íntima.
Mais importante que os fatos objetivos que marcam os movimentos dessa relação
objetiva são os significados partilhados pelas pessoas nela envolvidas: a certeza de que
205
os códigos nela criados são singulares e exclusivos representa o imperativo de
constituição da própria relação íntima. Quando se transportam para o espo público os
fatos que marcam uma relação íntima só se pode fazê-lo destituindo tais fatos daquilo
que os constituiu como íntimos. (p.107)
Ao afirmarem que a intimidade é um campo cujo sentido não é decodifivel socialmente
por ser um campo constituído de experiências singulares os autores parecem adotar uma visão de
sujeito individual, idiossincrático, não priorizando em sua análise acerca da intimidade a
mediação da vida privada e, por conseguinte, daquele que a vivencia, por categorias sociais. É
interessante pensarmos que embora a ciência tenha como objetivo a generalização encontramos
em alguns vetores cienficos - inclusive na própria psicologia a idéia de que “caso é um caso
as quais, por sua vez, são encontradas também no senso comum, especialmente quando se trata
de temas complexos da vida social. Na união estável, por ser ela uma realidade fática, tudo que a
envolve é muito circunstancial havendo, por exemplo, casos de relacionamentos que se situam
entre o namoro e o casamento e/ou que um dos conviventes – geralmente a mulher considera
união estável e o outro apenas namoro, nos quais é difícil de determinar se aquela relação se
constitui ou não como uma união estável. Há ainda outras situões que, apesar de não se
enquadrarem nas exigências legais configuram-se como tal, como no caso de duas uniões estáveis
simultâneas, o que, do ponto de vista legal não é permitido e, portanto, não reconhecido, mas
ainda assim é um caso sujeito à análise e a decisão jurisprudencial.
Embora o Direito reconheça e considere a singularidade em suas práticas não pode
legislar para cada um individualmente na medida em que, se assim o fizesse, se oporia ao seu
princípio fundamental de organização da vida social. Antes do reconhecimento legal os assuntos
referentes à união estável eram julgados pelo Direito Comercial, uma vez que essa relação era
vista como uma sociedade e não como uma família. Até esse momento, por vezes, vinha ao
conhecimento público casos isolados de pessoas que obtiveram algum amparo legal, geralmente
mulheres as a morte do companheiro, estando numa situação de vida em comum não
regulamentada, denominada ainda nessa época de concubinato. Entretanto, como fora dito
anteriormente, justamente por ter como princípio básico à organização da cultura, o Direito não
pode legislar para cada um individualmente. De tal forma, o reconhecimento da união estável
como entidade familiar confere um caráter de cidadania a esse arranjo e aos que o vivem,
206
principalmente as mulheres, retirando-o da categoria de concubinato e incluindo-o no conceito de
família.
As o reconhecimento legal as questões referentes à união estável passaram então a
serem tratadas pelo Direito de Família e aqueles que a vivenciam a ter direitos e deveres legais.
Diante das mudanças de costumes aceleradas ocorridas no campo do casamento e da família, e
especialmente dos problemas oriundos da união estável, o direito tem um papel fundamental de
resolver os impasses decorrentes dessa modalidade de relação visto não ser possível que os
mesmos fiquem a critério de cada um envolvido na questão. Legendre (1999) traz uma
contribuição importante para o estudo das representações sociais da união estável ao discutir o
poder genealógico do Estado na determinação da paternidade e da filiação. Partindo desse
entendimento do Direito como princípio organizador da cultura, esse autor propõe a existência de
uma genealogia determinante dos lugares sociais e subjetivos a serem ocupados por pais e filhos,
a partir dos quais esses poderão reivindicar seus direitos.
O argumento proposto por Legendre (1999) é, em nosso entender, aplivel também à
união estável possibilitando aos operadores do Direito e aos estudiosos do tema uma reflexão que
considere os fatos jurídicos e a subjetividade como indissociáveis. As à promulgação da Lei
(especificamente o artigo 1.723 do novo Código Civil) que reconhece efetivamente a união
estável como entidade familiar o Estado dise os sujeitos sociais num lugar específico a partir
do qual, como no caso da paternidade e da filiação, os mesmos podem fazer reivindicações acerca
seus direitos subjetivos. Direitos, deveres e obrigações conjugais vão ser então atribuídos nessa
genealogia.
A união estável e, mais especificamente, a maneira como essa modalidade de vida
conjugal se coloca hoje para os sujeitos sociais é, ao mesmo tempo, uma questão privada no
sentido de como atinge cada um em nossa época, mas é também pública, visto que seus impasses
são no momento da separão explicitados num espo público, local onde do ponto de vista
legal serão resolvidas. Observamos, inclusive, que o tema da união estável tem, através da
divulgação pela dia de casos problemáticos envolvendo pessoas famosas, se tornado tem
atualmente cada vez mais público e passando cada vez mais a fazer parte das conversas
cotidianas. Nas conversas cotidianas ou nos discursos dos sujeitos que falam sobre esse objeto
207
encontramos representões sociais construídas com o objetivo prático de lidar com o mesmo na
vida social. No processo de construção dessas representões sociais através do
compartilhamento dos significados atribuídos a esse objeto é criada também uma identidade
grupal. Cabe ressaltar que, segundo Legendre (1999), a identidade é construída a partir dos
lugares estabelecidos através da genealogia.
Legendre (1999) se refere à função paterna concebida, em termos psicanalíticos, como a
entrada de um terceiro e, de tal forma, como uma interdição. Embora essa afirmação seja oriunda
de um enfoque teórico distinto daquele que estamos utilizando sua consideração na reflexão
acerca da união estável evidencia um caráter terapêutico da justiça na medida em que esta
fornecerá interditos em situões como aquelas em que, por exemplo, estando a relação
configurada como tal, um dos cônjuges se negue a fazer a repartição dos bens comuns ou, ao
contrário, quando essa divisão é solicitada não estando o casal vivendo em união estável.
Legendre (1999) afirma que “a chave de um pensamento moderno sobre a função do terceiro e o
poder de fundar é a de promover a reflexão sobre a casuística jurídica e a função do juiz(p.93).
A união estável dada a sua complexidade como femeno psicossocial fundante na vida dos
sujeitos é um exemplo de fato jurídico no qual ao mesmo tempo em que a conduta da justiça não
pode ser rígida, pois não pode ficar presa à literalidade da lei, é necessária a regulamentação.
Uma aplicação da genealogia proposta por Legendre (1999) à união estável iria ao nosso
ver ao encontro de propostas, como a de Guareschi (1998), que buscam considerar o outro em
suas reflexões e ações no campo da alteridade contribuindo para a criação de práticas sociais que
impliquem uma dimensão ética. A justiça em sua acepção plena somente seria cumprida
efetivamente se esse princípio de uma humanização, facilitada pelos apoios simlicos sociais e,
ao mesmo tempo, de civilização do ser humano fosse atingido. É preciso lembrar, nesse sentido,
que a justiça está indissociada da ética na medida em que para algo ser justo precisa contemplar o
bem comum. A justiça precisa legislar para um bem coletivo, como observamos através da lei
que reconhecendo uma realidade sócio-afetiva já existente, – a união estável garante aos que
optam por esse arranjo direitos e deveres inscrevendo-os na ordem da cidadania.
Quando os direitos e deveres conjugais eram atribuídos juridicamente somente aos
homens e mulheres casados formalmente observava-se um distanciamento da própria realidade
208
social, dado o crescimento acelerado das uniões conjugais não formais nos últimos anos, e um
forte sentimento de desamparo que não se restringia à dimensão subjetiva, mas era fruto de um
desamparo legal. O lugar que os sujeitos que “viviam juntosocupavam na legislação anterior ao
reconhecimento da união estável entendida nessa época como concubinato e tratada pelo
Direito Comercial e na lei que regulamentou esse arranjo conjugal tem significados jurídicos e
psicológicos que devem ser considerados por todos aqueles que se ocupem do tema em suas
práticas profissionais. A improvisação jurídica em qualquer situação pode causar danos
subjetivos atentando contra sua própria acepção de para que algo seja justo precisa atender ao
bem comum sem, entretanto, permanecer atado à literalidade da lei.
Uma vez, inclusive, que a legalização da união estável – que está ancorada na idéia de
amor – não garante a inexistência de outros motivos, não ligados necessariamente aos
sentimentos, que ainda hoje façam com que as pessoas ao optarem por esse arranjo o façam por
amor, ou ainda que, mesmo que esse sentimento exista, que ele garanta a permanência da relação,
é preciso que os operadores do Direito, através de uma análise profunda se possível com apoio
de outros campos disciplinares, especialmente da psicologia – busquem o entendimento de como
se estabelece cada relação que se apresenta diante do judiciário como união estável. A partir
dessa forma de compreensão será possível que se evite uma casuística ao reverso no momento da
separação, cometendo-se através de tal feito uma injustiça.
O reconhecimento da união estável atende a esse princípio organizador do direito que
através de uma genealogia vai determinar o lugar de cada um, sendo esta importante no sentido
de pensar a conjugalidade na união estável uma vez que, na conjugalidade, a função conjugal é
um princípio organizador que vai inscrever o sujeito na ordem humana e na genealogia. Para que
alguém que viva em união estável faça reivindicações judiciais é preciso que parta desses lugares
de companheiro(a) ou convivente dados pelo direito. Essa montagem de direitos e deveres é, por
sua vez, construídas pelas disposições jurídicas existentes em cada cultura. Entretanto, por ser um
femeno jurídico novo, os sujeitos sociais parecem não saber que a união estável é mediada pelo
Estado. Esse desconhecimento ou conhecimento pouco detalhado acerca dos aspectos jurídicos
reguladores desse arranjo conjugal traz muitas implicações na medida em que afeta direta e
profundamente a vida daqueles que vivem essa forma de relação.
209
Embora o tema da união estável diga respeito à vida privada acreditamos que, tendo em
vista a série de problemas vivenciados atualmente pelos que optam por essa modalidade de
relação e as dificuldades de operacionalização do tema no campo do direito, sua discussão no
âmbito público contribui, primeiramente, para o esclarecimento para os que vivem ou pretender
viver essa forma da relação, de uma realidade próxima, visto que se refere às suas vidas íntimas,
mas distante, porque está submetida a algo muito afastado de suas práticas cotidianas, a esfera
jurídica. Além disso, como fora dito anteriormente, esse arranjo constitui-se em uma realidade
social cada vez mais presente que pelo seu crescimento significativo, como atestado por vários
autores e pelos os próprios dados do IBGE, envolve todos os sujeitos sociais, sendo atualmente
quase impossível não ser do conhecimento de algum deles situões de casais que vivam em
união estável.
O conhecimento propiciado pelo debate em torno da união estável pode contribuir
também para as operacionalizões jurídicas, nem sempre fáceis diante de um tema tão
complexo, e para a alteração de possíveis representões hegemônicas ainda existentes a seu
respeito que, ancoradas na idéia de concubinato, possam estar no cerne de práticas
discriminatórias. Vale lembrar que, como afirmam Moscovici e Jodelet em várias de suas obras, a
informação é um elemento fundamental na construção das representões de tal maneira que a
identificação de sua fonte é procurada no trabalho empírico de investigação de temas diversos.
Embora, apesar de estarmos em nosso estudo acerca da união estável utilizando
pressupostos teóricos distintos daqueles usados por Leis e Costa (2000), concordamos com os
autores na sua afirmação de que historicamente a intimidade representa um dos eixos centrais da
constituição da modernidade e do indivíduo moderno e que perguntar pela intimidade parece ser
um tema central para entender o presente fundamental em nosso objeto, que tem como pano de
fundo a modernidade. Acreditamos que o debate acerca da união estável no espaço público gera
uma ampliação dos conhecimentos a seu respeito e dos direitos e deveres de cada indivíduo, dos
quais podemos falar a partir de Legendre, fundamental no exercício de sua cidadania.
A consideração da dimensão da cidadania no reconhecimento legal da união estável na
conquista de um lugar mais justo, assegurado pela legislação, especialmente para as mulheres que
optam por viverem essa modalidade de vida conjugal nos reporta ao gênero, tema cujos
210
atravessamentos perpassam nosso objeto de estudo. É importante destacar sentido, que embora
deixem claro sua posição discordante de Giddens, Leis e Costa (2000), apontam no autor a
consideração da emergência da mulher como sujeito no plano da intimidade e a possibilidade
disponível aos sujeitos sociais, sejam homens ou mulheres, de transformação do campo privado
em uma esfera democratizada e reflexiva fazendo da intimidade uma extensão necessária e
crucial das possibilidades emancipatórias que emergem no bojo da modernidade radicalizada.
O reconhecimento jurídico da união estável estabeleceu um diálogo a respeito dessa forma
de relação conjugal que se constitui pela conversação e pelo compartilhamento no âmbito
público. Ou seja, a união estável é um femeno jurídico novo que gera conversação e, em razão
disso, tem publicidade, sendo esse um aspecto central no processo de construção das
representões sociais a seu respeito. Entretanto na publicidade originada pelo debate que se
constrói a seu respeito a qual é, ao mesmo tempo, uma exigência legal para configuração desse
arranjo está presente um estranhamento suscitado pela própria mediação do Estado no âmbito da
vida privada e suas conseqüências para aqueles que lidam com a união estável em suas práticas
cotidianas. Defrontados com uma nova realidade psicossocial que necessita ser traduzida e
tornada familiar os sujeitos sociais constroem representões que são elaborações a respeito dessa
realidade a partir do compartilhamento e da busca de consensos através da ancoragem do novo
em categorias familiares pré-existentes. Cabe, então, o entendimento de quais seriam essas
representões sociais da união estável construídas a partir da discussão em torno da sua
legalização. Para atender a esse propósito será a seguir apresentado o método de investigação
adotado no presente trabalho.
211
4. ESTUDO EMPÍRICO
4.1.OBJETIVOS
O presente estudo tem como objetivo descrever, analisar e comparar os conteúdos e as
estruturas das representões sociais da união estável como manifestadas por quatro grupos
distintos de sujeitos solteiros, casados, em união estável e separados –, pertencentes à classe
média e habitantes do Município do Rio de Janeiro. Procurar-se-á também identificar se tais
representões ancoram-se no concubinato ou no casamento.
4.2.MÉTODO
Sujeitos:
Para a obtenção dos dados referentes às representões sociais da união estável no
presente trabalho serão investigados 304 sujeitos, sendo 152 homens e 152 mulheres, que se
encontram em diferentes situões conjugais solteiros, casados, em união estável e separados –,
ou seja, 76 sujeitos para cada um desses subgrupos, sendo todos pertencentes à classe média e
habitantes do Rio de Janeiro. Os níveis de escolaridade considerados foram: nível médio
completo, superior completo e superior incompleto.
Coleta de dados:
O instrumento de coleta de dados utilizado na pesquisa empírica é um questionário
(Anexo 1) constituído de 41 questões. Dentre elas, 40 são questões substantivas relativas à união
estável, com vistas à obtenção de dados que configurem circunstancialmente as representões
sociais, sendo 21 delas fechadas e 19 abertas. O questionário é encabeçado por uma questão
específica de evocação livre à descrição de uma relação conjugal do tipo união estável, para a
identificação dos conteúdos temáticos básicos e da estrutura das representações sociais, de modo
a permitir a sua comparação. Finalmente, uma questão, desmembrada em 6 itens, visa à
caracterização sócio-demográfica do conjunto de sujeitos.
212
Análise dos dados:
Os dados das evocações livres foram analisados através do software EVOC 2000, que
procede à combinação dos critérios de freência e ordem de evocação das palavras e expressões.
As respostas às questões abertas, foram submetidas a uma categorização prévia, e às questões
fechadas tiveram um tratamento estastico descritivo e comparativo para os quatro grupos
investigados (solteiros, casados, em união estável e separados).
213
4.3. RESULTADOS E SUA DISCUSSÃO
4.3.1. Resultados da evocação livre: a estrutura temática das representações sociais
Nesse capítulo serão apresentados inicialmente os quadros de resultados obtidos através
da técnica de evocação livre referentes às representações sociais manifestas pelos sujeitos nas
diferentes situações investigadas. Tais evocões emergiram em resposta à seguinte frase
utilizada na pesquisa como questão indutora: ... relação entre um homem e uma mulher ambos
solteiros, separados ou divorciados – que estão juntos há algum tempo – morando ou não na
mesma casa com pleno conhecimento de seus respectivos familiares e amigos. Essa definição
foi utilizada por supormos que a nomenclatura “união estávelseria pouco conhecida pelos
sujeitos da pesquisa embora utilizada na Constituição de 1988, no tratamento a esse arranjo –
em função do seu uso cotidiano ter sido mais freente as a entrada em vigor do novo Código
Civil, em 2002, quando incrementou-se o debate social em torno da legalização das uniões
conjugais informais e suas implicações, processo no qual a dia teve papel fundamental.
Os resultados encontrados entre os casados, solteiros, em união estável e separados,
apresentados conjuntamente, nos permitem comparar os conteúdos e estruturas das
representões sociais construídas sobre essa forma de relação nos quatro grupos estudados.
Além desses dados, as evocões encontradas nas amostras totais masculinas e femininas
possibilitam que essa mesma análise seja feita em relação ao gênero. No que se refere à primeira
variável situação conjugal – observa-se que os prováveis cleos centrais de todas as amostras
consideradas, ou seja, casados, solteiros, conviventes e separados, apresentados nas figuras 1, 2, 3
e 4, respectivamente,
apresentam praticamente os mesmos componentes, sendo assim quase
idênticos.
A acentuada presença do elemento “amornas evocões dos quatro grupos demonstra, a
semelhança do que ocorre em outros tipos de vínculos conjugais, o lugar central ocupado por esse
sentimento nas representões sociais a respeito da união estável. O segundo elemento citado por
todos os grupos ao se defrontarem com a definição de união estável dada pelo instrumento foi o
respeito. Dessa maneira é possível afirmar que, excetuando-se algumas variações encontradas,
o bimio “amor/respeito” estrutura as representões constituídas em torno desse novo arranjo
214
conjugal. Deve-se considerar que as referidas variões dizem respeito aos acréscimos de alguns
integrantes a esses cleos feitas pelos sujeitos casados (“companheirismo), solteiros
(“amizade) e em união estável (“cumplicidade).
Sujeitos: CASADOS
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
amor 41 1,488 amizade 21 3,429
16
respeito 32 2,344 cumplicidade 17 3,529
companheirismo 28 2,679
família 11 2,636 fidelidade 13 3,231
<< 16
compreensão 9 2,778 compromisso 9 3,222
sexo 8 2,875 carinho 8 3,375
confiança 7 2,857 parceria 7 3,429
Figura 1Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos casados de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 7. Rio de Janeiro, 2008.
Sujeitos: SOLTEIROS
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
amor 40 1,450 companheirismo 24 3,292
19
respeito 29 2,138
amizade 20 2,900
sexo 15 2,467 cumplicidade 14 3,000
<< 19
fidelidade 12 3,000
união 11 3,182
namoro 10 3,100
Figura 2Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos solteiros de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 9. Rio de Janeiro, 2008.
215
Sujeitos: UNIÃO ESTÁVEL
O.M.I.
< 2,9 >= 2,9
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
amor 48 1,479 companheirismo 34 3,000
14
respeito 27 2,148 amizade 26 3,269
cumplicidade 14 2,857
fidelidade 11 2,727 compreensão 10 3,700
sexo 7 2,429 carinho 9 3,667
<< 14
confiança 6 2,667 casamento 7 3,571
família 6 2,500 compromisso 7 3,286
união 7 3,571
compartilhamento 6 4,667
sinceridade 6 3,000
Figura 3Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos conviventes de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 6. Rio de Janeiro, 2008.
Sujeitos: SEPARADOS
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq. O.M.I.
Tema evocado
Freq. O.M.I.
17
amor 46 1,674 companheirismo 26 3,269
respeito 30 2,633
confiança 10 2,800 filhos 16 3,250
amigos 9 2,667 amizade 15 3,067
<< 17
sexo 15 3,600
família 12 3,000
carinho 11 3,273
união 10 3,700
cumplicidade 9 3,333
Figura 4Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos separados de temas
associados à união estável. N = 76. Freência nima: 9. Rio de Janeiro, 2008.
216
No que se refere à comparação em termos do gênero, as representões sociais existentes
entre homens e mulheres, apresentadas nas figuras 5 e 6, respectivamente, demonstram-se
similares na medida em que seus cleos centrais também são constituídos pelo “amor” e
respeito. Os homens acrescentam a essa estruturação básica o “companheirismo. Ressalta-se
que, apesar das mulheres não terem evocado esse item com a mesma incidência dos homens, ele
integra o quadrante superior direito considerado uma primeira periferia, que por assim se situar,
estaria próxima da centralidade da representação. Este fato nos permite, ainda que com alguma
reserva necessária, considerar o companheirismo” como possível elemento central da
representação evocada por esse grupo.
É importante salientar nesse sentido, quanto à formação do quadrante superior direito, que
se no grupo dos casados o “companheirismointegra o primeiro quadrante, dentre os solteiros e
dentre aqueles que vivem em união estável ele constitui a referida “periferia próxima”, ou seja, o
quadrante superior direito. Desse modo, podemos entender que o núcleo central da representação
social destes três grupos acerca da união estável engloba esse componente em sua composição.
Tal posição por ele ocupada é observada na análise dos quadrantes do grupo em sua totalidade.
Contudo, apesar da “amizade” integrar o núcleo central das representões sociais sobre o
arranjo estudado, na medida em que se situa no primeiro quadrante, entre os solteiros, no
quadrante superior direito, entre os casados e em união estável, essa expressão, quando evocada
pelos separados, se mostrou estruturalmente mais afastada da possível centralidade da
representação social construída a respeito da união estável. No quadrante inferior direito ou
segunda periferia” estão situados os elementos mais nitidamente periféricos das representões
sociais, os quais, conforme Abric (1998), têm por função a ancoragem da representação na
realidade, a adaptação desta aos contextos sociais e a proteção do núcleo central.
217
Conjunto: FEMININO
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq. Med.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
amor 93 1,484 companheirismo 60 3,200
24
respeito 64 2,109 amizade 44 3,341
cumplicidade 35 3,429
família 15 2,800 fidelidade 21 3,476
confiança 14 2,857 sexo 19 3,000
namoro 11 2,636 carinho 17 3,529
<< 24
lealdade 10 2,900 união 17 3,471
afeto 8 2,375 compreensão 16 3,375
compromisso 16 3,563
parceria 14 3,286
casamento 12 3,167
filhos 9 3,333
liberdade 9 3,333
responsabilidade 8 4,000
Figura 5Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos femininos de temas
associados à união estável. N = 152. Freência nima: 8. Rio de Janeiro, 2008.
218
Conjunto: MASCULINO
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
Tema evocado
Freq.
O.M.I.
amor 82 1,573 amizade 38 3,000
27
respeito 54 2,574
companheirismo 52 2,865
sexo 26 2,846 família 20 3,150
fidelidade 21 2,667 carinho 19 3,526
cumplicidade 19 2,737 casamento 17 3,235
<< 27
confiança 17 2,941 união 17 3,235
liberdade 9 2,556 compreensão 16 3,063
sinceridade 9 2,556 filhos 16 3,250
afeto 7 2,857 namoro 13 3,538
compromisso 12 3,000
estabilidade 12 3,583
parceria 12 3,500
felicidade 10 3,500
Figura 6Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos masculinos de temas
associados à união estável. N = 152. Freência nima: 7. Rio de Janeiro, 2008.
A figura 7 sintetiza os resultados anteriormente apresentados quanto ao gênero e a
situação conjugal, demonstrando que o núcleo central do grupo geral é constituído pelo “amor” e
pelo respeito. Essa estruturação básica é complementada pelos termos “amizade”,
“companheirismo” e cumplicidade”. Na “segunda periferia” e, portanto, mais distantes do
cleo central da representação, situam-se a “confiança, a “liberdade” e o sexo. O quadrante
inferior direito ou última periferia” é composto pelo “carinho, “casamento, “compreensão,
“compromisso, família”, fidelidade”, filhos, namoro, parceria” e união, sendo esses os
elementos mais afastados da centralidade da representação social da união estável.
219
Sujeitos: GRUPO GERAL
O.M.I.
< 3 >= 3
Freq.
Med.
Tema evocado
Freq. O.M.I.
Tema evocado
Freq. O.M.I.
amor 175 1,526 companheirismo 112 3,045
52
respeito 118 2,322 amizade 82 3,183
cumplicidade 54 3,185
sexo 45 2,911 fidelidade 42 3,071
confiança 31 2,903 carinho 36 3,528
<< 52
liberdade 18 2,944 família 35 3,000
união 34 3,353
compreensão 32 3,219
casamento 29 3,207
compromisso 28 3,321
parceria 26 3,385
filhos 25 3,280
namoro 24 3,125
Figura 7Quadro de quatro casas a partir das evocações pelos sujeitos em todas as situões
conjugais de temas associados à união estável. N = 304. Freência nima: 18. Rio de Janeiro,
2008.
Embora já tenhamos apresentado as proposições referentes às proposições do núcleo
central anteriormente no capítulo referente à teoria das representões sociais convém lembrar
que, conforme Abric (1998), esse cleo é o que irá permitir o estudo comparação das
representões construídas pelos diferentes grupos acerca de um dado objeto social. O autor
acrescenta que a identificão do conteúdo de uma representação não é suficiente essa possa ser
reconhecida e especificada. Em seus termos: “a organização desse conteúdo é essencial: duas
representões definidas por um mesmo conteúdo podem ser radicalmente diferentes, caso a
organização destes elementos, portanto sua centralidade, seja diferente” (p.31).
Abric (op. cit) deixa claro no seu entendimento um critério de condicionalidade segundo o
qual e somente nessas condições – duas representações podem ser consideradas diferentes na
medida em que sejam organizadas em torno de dois núcleos centrais diferentes. Portanto, a
identificação da semelhança dos núcleos centrais das representões sociais construídas por
homens e mulheres casados, solteiros, em união estável e separados a respeito da união estável é
220
o que nos permite afirmar que esse arranjo é consensualmente representado por esses grupos
como uma relação associada, em primeiro plano, ao amor e ao respeito. É importante ressaltar
ainda que, desde sua formulação da hitese inicial, referente ao núcleo central, Abric entende
esse eixo representacional como responsável também pelo significado da representação. A esse
respeito ele acrescenta:
Para nós, a homogeneidade de uma população não é definida pelo consenso entre seus
membros, mas sim pelo fato de que sua representação se organiza em torno do mesmo
cleo central, do mesmo princípio gerador do significado que eles dão à situação ou ao
objeto com o qual são confrontados. (ABRIC, 1998, p.34)
Os resultados referentes às respostas às perguntas fechadas
e abertas do questionário,
apresentados a seguir, analisados em associação com aqueles obtidos através
das evocões
livres,
nos permitirão descrever o conteúdo mais detalhado das representações sociais da união
estável pelos grupos nas diferentes situões conjugais investigadas. As posturas menos
consensuais em relação aos temas tratados permitirão ainda uma interpretação em termos do
sistema periférico no que se refere, principalmente, à ancoragem da representação social da união
estável na realidade social de nossa época na qual emergiu como novo arranjo conjugal. Tais
reflexões serão apresentadas nos capítulos seguintes.
221
4.3.2. Resultados das perguntas fechadas e abertas do questionário: os conteúdos
conhecimentos, afetos e juízos das representações sociais
4.3.2.1. A informação a respeito do reconhecimento jurídico da união estável e suas fontes
Os resultados do presente estudo demonstram de início que o reconhecimento da união
estável pelo novo Código Civil Brasileiro é um fato que a maioria dos sujeitos investigados
conhecem, como revelam as tabelas 1 e 2. Entretanto, no tocante a esse aspecto foram
encontradas diferenças relacionadas ao gênero e à situação conjugal, na medida em que dentre os
grupos pesquisados as mulheres que vivem em união estável são as que mais sabem a respeito
dessa nova realidade social (89,47%), seguidas pelos homens casados (84,21%). Uma outra
diferença relativa a essa questão se mostrou acentuada entre os solteiros, visto que 81,58% dos
homens nessa condição declararam ter conhecimento a respeito do reconhecimento jurídico da
união estável, enquanto apenas um pouco mais da metade das mulheres no mesmo estado civil
(55,26%) disseram possuir tal informação. As mulheres solteiras são as que menos sabem a
respeito desse fato jurídico novo, sucedidas pelos homens separados, visto que, embora 76,32%
dos homens nessa situação conjugal o conheça, esse foi o segundo grupo com menos informação
a esse respeito. De maneira geral a tabela 1 nos mostra que, no que se refere ao reconhecimento
jurídico da união estável, dentre os casados, ainda que com muito pequena diferença percentual,
os homens sabem mais do que as mulheres. Essa diferença percentual se mostra maior entre
aqueles que vivem em união estável, grupo no qual, ao contrário do anterior, as mulheres
conhecem mais esse fato do que os homens. Essa alternância se mantém também nos outros
grupos, posto que esse conhecimento acerca da legalização da união estável é maior entre os
homens solteiros do que entre as mulheres solteiras, e, entre as mulheres separadas do que entre
os homens separados.
Tabela 1: Distribuição da amostra feminina a respeito do conhecimento relativo ao
reconhecimento jurídico da união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 31 81,58% 34 89,47% 21 55,26% 31 81,58% 117 76,97%
Não 7 18,42% 4 10,53% 17 44,74% 7 18,42% 35 23,03%
222
Tabela 2: Distribuição da amostra masculina a respeito do conhecimento relativo ao
reconhecimento jurídico da união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 32 84,21% 30 78,95% 31 81,58% 29 76,32% 122 80,26%
Não 6 15,79% 8 21,05% 7 18,42% 9 23,68% 30 19,74%
A dia em suas variadas formas (impressa, televisiva, digital) foi a principal fonte de
informação daqueles sujeitos que declararam ter conhecimento a respeito do reconhecimento da
união estável como entidade familiar pelo novo Código Civil (2002), confirmando a importância
do seu papel na formação e propagação das representações sociais, tal como fora descrito por
Moscovici e reafirmado por Jodelet em seus comentários feitos nas múltiplas publicações a
respeito desse conceito e das múltiplas dimensões do campo de estudos que o mesmo passou a
constituir.
No que se refere ao papel da dia na construção e veiculação das representões sociais
acerca da união estável, esta influência é confirmada, principalmente pelos homens casados,
tendo 92,68% dos membros desse grupo declarado ter obtido conhecimento sobre esse arranjo
através desse vetor. Da mesma forma, em sentido decrescente, as mulheres solteiras (84,38%), os
homens separados (71,43%) e em união estável (68,75%), as mulheres separadas (65%) e em
união estável (56,10%), os homens solteiros (51,35%) e as mulheres casadas (42,55%) deixam
claro essa função, como mostra a tabela 3.
As conversas entre amigos ocupam a segunda fonte de informação declarada pelos
sujeitos a respeito do reconhecimento jurídico da união estável. A influência desse vetor é maior
entre as mulheres casadas (27,66%), os homens solteiros (24,32%) e as mulheres em união
estável (21,95%), tendo os homens casados sido o grupo que menos citou a referida fonte
(2,44%). Esses dados confirmam que a união estável é um fato novo – do ponto de vista jurídico
– que, como tal, gera debates a seu respeito, os quais, por sua vez, respondem pela produção de
um conhecimento compartilhado pelos diversos grupos sociais, cuja função é a familiarização dos
seus membros com a novidade com a qual se defrontam. Nesse processo a dia tem um papel
223
fundamental, na medida em que, muitas vezes, a tematização em torno da união estável é gerada
a partir do conhecimento de “casos de união estável(principalmente de separação, envolvendo
pessoas públicas) que, despertando interesse, produzem conversas cotidianas em busca de um
consenso relativo a esse arranjo, a partir do qual são construídas as representações sociais a ele
referentes.
Tabela 3: Distribuição das respostas das amostras sobre as fontes de informação
relativas ao reconhecimento jurídico da união estável.
Solteiro F Solteiro M Casado F Casado M
União estável
F
União
estável M
Separado F
Separado M
Respostas
f % f % f % f % f % f % f % f %
Através da mídia
impressa,
televisiva e
digital
27
84,38%
19
51,35%
20
42,55%
38
92,68%
23
56,10%
22
68,75%
26
65,00%
30
71,43%
Através de
conversas entre
amigos,
comentários
4
12,50%
9
24,32%
13
27,66% 1 2,44% 9
21,95%
4
12,50%
4
10,00%
5
11,90%
Através de livros
1 3,13% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Através de
parentes e
amigos
advogados ou
operadores do
Direito
0 0,00% 3 8,11% 4 8,51% 0 0,00% 2 4,88% 1 3,13% 4
10,00%
4 9,52%
Através da
faculdade
0 0,00% 3 8,11% 0 0,00% 0 0,00% 2 4,88% 1 3,13% 2 5,00% 1 2,38%
Através do
Código Civil
0 0,00% 0 0,00% 4 8,51% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,13% 0 0,00% 1 2,38%
Através de
leituras a
respeito
0 0,00% 1 2,70% 4 8,51% 1 2,44% 2 4,88% 0 0,00% 1 2,50% 0 0,00%
Através do
trabalho
0 0,00% 0 0,00% 1 2,13% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 5,00% 0 0,00%
Através de
repetidos casos
judiciais
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,44% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Mantém uma
união estável
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 4,88% 1 3,13% 0 0,00% 0 0,00%
Por acaso
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,13% 0 0,00% 0 0,00%
Por ocasião do
divórcio
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,13% 0 0,00% 0 0,00%
Não lembra
0 0,00% 1 2,70% 1 2,13% 0 0,00% 1 2,44% 0 0,00% 1 2,50% 1 2,38%
Não respondeu
0 0,00% 1 2,70% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
32
100,00%
37
100,00%
47
100,00%
41
100,00%
41
100,00%
32
100,00%
40
100,00%
42
100,00%
224
4.3.2.2. As denominações dadas à união estável e aos seus adeptos
As tabelas 4 e 5 demonstram que para a maior parte dos sujeitos considerados a união
estável se caracteriza como um casamento sem formalismos, com predominância dos homens
separados (68,42%) e das mulheres em união estável (65,79%) nessa acepção. É interessante
notarmos, contudo, que no tocante ao grupo dos solteiros, apesar das mulheres nessa situação
ocuparem o terceiro lugar na concepção da união estável como um “casamento sem formalismos
(60,53%), em contraposição, os homens solteiros são os que mais consideram a união estável
como um concubinato (ou amigação) mais aceitável socialmente (31,58%).
As outrasdenominões dadas pelos sujeitos investigados à união estável,
discriminadas nas tabelas 6 e 7, demonstram que há nessas maneiras de caracterizar tal vínculo,
ao invés do distinto, uma mesma referência ao formalismo e aos sentimentos, que serão
encontradas nas questões subseentes. Vale dizer que, embora nessa questão, de maneira geral,
esses dois componentes se misturem, as mulheres separadas e em união estável destacaram
preponderantemente o aspecto emocional em suas respostas alternativas à indagação feita, tendo
a tradição se manifestado nesses dois grupos nas referências à coabitação e à lei concernente à
união estável, e não em relação às instituições tradicionais que legitimavam a união conjugal.
Assim também, os homens em união estável reportam-se unicamente ao consenso como uma
outra maneira possível de se nomear a união estável. Contrariamente, os homens separados
citaram exclusivamente os aspectos tradicionais, expressos na menção ao casamento formal. É
interessante notarmos ainda que, segundo as mulheres solteiras (20%) e as mulheres em união
estável (33,33%) que assumiram essa posição alternativa no que concerne à adoção de uma
concepção caracterizadora da união estável, esta se caracteriza pelo morar junto. Da mesma
forma, os homens solteiros (20%) se referiram ao tempo de convivência nessa qualificação.
225
Tabela 4: Distribuição da amostra masculina a respeito das concepções
caracterizadoras da união estável.
Casados
União estável
Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Um casamento sem formalismos 20
52,63%
22
57,89%
20
52,63%
26
68,42%
88
57,89%
Um namoro (ou noivado) com mais
compromissos
5
13,16%
4
10,53%
1
2,63%
2
5,26%
12 7,89%
Um concubinato (ou amigação)
mais aceitável socialmente
8
21,05%
10
26,32%
12
31,58%
8
21,05%
38
25,00%
Casamento sem formalismos/
Concubinato mais aceitável
socialmente
1
2,63%
1
2,63%
0
0,00%
0
0,00%
2 1,32%
Outra 3
7,89%
1
2,63%
5
13,16%
2
5,26%
11 7,24%
Não respondeu 1
2,63%
0
0,00%
0
0,00%
0
0,00%
1 0,66%
Tabela 5: Distribuição da amostra feminina a respeito das concepções
caracterizadoras da união estável.
Casadas
União estável
Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Um casamento sem formalismos 22
57,89%
25
65,79%
23
60,53%
22
57,89%
92
60,53%
Um namoro (ou noivado) com mais
compromissos
2
5,26%
2
5,26%
5
13,16%
2
5,26%
11 7,24%
Um concubinato (ou amigação)
mais aceitável socialmente
9
23,68%
6
15,79%
5
13,16%
8
21,05%
28
18,42%
Casamento sem formalismos/
Concubinato mais aceitável
socialmente
0
0,00%
2
5,26%
0
0,00%
0
0,00%
2 1,32%
Namoro com mais compromisso/
Concubinato mais aceitável
socialmente
0
0,00%
0
0,00%
0
0,00%
1
2,63%
1 0,66%
Outra 5
13,16%
3
7,89%
5
13,16%
3
7,89%
16
10,53%
Todas as opções anteriores 0
0,00%
0
0,00%
0
0,00%
1
2,63%
1 0,66%
Não respondeu 0
0,00%
0
0,00%
0
0,00%
1
2,63%
1 0,66%
226
Tabela 6: Distribuição das respostas da amostra masculina a respeito das “outras
concepções caracterizadoras da união estável.
Casados União estável Solteiros Separados
Respostas
f % f % f % f %
A que dure um certo tempo 0 0,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
Um casamento com formalismos
2 66,67% 0 0,00% 2 40,00% 2
100,00%
Um relacionamento pautado no
respeito, nas diferenças, na
diversidade e no direito e dever
de cada um
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
Uma relação sem a formalidade
de casamento ou namoro
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
Namoro de longo prazo com
conhecimento de todos os amigos
e parentes
1 33,33% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Um casamento por consenso 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Total 3 100,00% 1
100,00%
5
100,00%
2
100,00%
227
Tabela 7: Distribuição das respostas da amostra feminina a respeito das “outras
concepções caracterizadoras da união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas
Respostas
f % f % f % f %
Um casamento com formalismos 1 20,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
Um casamento sem formalismos,
mas que não necessariamente o
casal precise morar junto
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
União de duas pessoas com
interesses comuns
0 0,00% 0 0,00% 2 40,00% 1 33,33%
A que o casal em comum acordo
estabelecer para sua "união"
1 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Companheirismo total, irrestrito 1 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Formação da célula familiar 1 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Relação (união), registrada em
cartório
1 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Duas pessoas vivendo sob o mesmo
teto
0 0,00% 1 33,33% 1 20,00% 0 0,00%
Uma relação que compartilha as
alegrias, as dificuldades,
compromissos e outros
0 0,00% 1 33,33% 0 0,00% 0 0,00%
A que está vigorando hoje no
Código Civil
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33%
Uma relação onde ambos se
respeitam
0 0,00% 1 33,33% 0 0,00% 1 33,33%
Total 5
100,00%
3
100,00%
5
100,00%
3
100,00%
De acordo com a tabela 8, a grande maioria dos sujeitos em todas as situões conjugais
conhecem, nas suas relões de família ou amizade, casais que estariam incluídos na categoria
legal de união estável, tendo-se encontrado o mesmo índice entre os homens e as mulheres em
união estável, as mulheres casadas e as que se encontram separadas (97,37%). Ou seja, nesses
grupos quase todos os sujeitos disseram conhecer em suas relões sociais casais que, segundo
eles, podem ser incluídos na definição legal de união estável. Essa declaração foi dada também
por 94,74% dos homens casados, 92,11% das mulheres solteiras, e ainda, em outra coincidência
percentual, por 89,47% dos homens solteiros e separados. Tais resultados confirmam dados do
228
IBGE, utilizados inclusive por Berquó (1998) em sua análise demográfica dos arranjos familiares
no Brasil, os quais atestam o aumento crescente do número de uniões estáveis em nossa
sociedade, ocorrido a partir de 1950 nas camadas mais empobrecidas, passando, mais
recentemente, a constituir em larga escala primeira opção de vida conjugal também nas camadas
médias.
Tabela 8: Distribuição da amostra feminina referente ao conhecimento de casais
incluídos na categoria legal de união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 37 97,37% 37 97,37% 35 92,11% 37 97,37% 146 96,05%
Não 1 2,63% 1 2,63% 3 7,89% 1 2,63% 6 3,95%
Tabela 9: Distribuição da amostra masculina referente ao conhecimento de casais
incluídos na categoria legal de união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 36 94,74% 37 97,37% 34 89,47% 34 89,47% 141 92,76%
Não 2 5,26% 1 2,63% 4 10,53% 4 10,53% 11 7,24%
Contudo, ainda a esse respeito, a maior parte dos homens acredita que a maioria dos
homens que comem esses casais se consideram mais próximos da condição de casados, com
predominância significativa dos homens separados (82,35%) e dos homens em união estável
(72,97%) nessa afirmação. Vale destacar que quase três quintos dos homens casados (58,33%) e
solteiros (58,82%) atribuem a esses outros homens a sua consideração como casados. Quando
perguntadas sobre essa mesma questão, mais de três quintos das mulheres nas várias situações
conjugais investigadas também entendem que aqueles homens em união estável, aos quais se
reportaram, consideram-se como casados. Entre as mulheres observa-se um equilíbrio nos índices
229
estasticos, não ressaltando-se nenhuma diferença expressiva tocante aos mesmos, como ocorreu
nos grupos dos homens em relação a essa questão, como revelam as tabelas 10 e 11.
No tocante a essa questão, como mostra a tabela 12, as mulheres solteiras (100%) e em
união estável (100%) utilizaram o termo “companheiro, denominação legal conferida aos que
vivem em união estável, como opção à denominão dos homens que vivem essa modalidade de
relação. Nota-se nas alternativas dadas pelos homens casados e, principalmente, pelas mulheres
separadas a essa indagação, a presença de valores tradicionais revelados através da atribuição
feita pelos mesmos de adjetivação pejorativa aos conviventes do sexo masculino. Os demais
grupos não ofereceram respostas alternativas a tal questionamento.
Tabela 10: Distribuição da amostra masculina em relação ao entendimento acerca
do sentimento dos homens em união estável sobre sua própria condição.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casado 21 58,33% 27 72,97% 20 58,82% 28 82,35% 96 68,09%
Amigado 10 27,78% 8 21,62% 8 23,53% 4 11,76% 30 21,28%
Namorado 4 11,11% 2 5,41% 6 17,65% 2 5,88% 14 9,93%
Outra (Junto) 1 2,78% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,71%
Tabela 11: Distribuição da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do
sentimento dos homens em união estável sobre sua própria condição.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casado 24 64,86% 25 67,57% 22 62,86% 23 62,16% 94 64,38%
Amigado 11 29,73% 6 16,22% 5 14,29% 6 16,22% 28 19,18%
Namorado 2 5,41% 4 10,81% 7 20,00% 3 8,11% 16 10,96%
Outra 0 0,00% 1 2,70% 1 2,86% 5 13,51% 7 4,79%
Casado/Amigado 0 0,00% 1 2,70% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,68%
230
Tabela 12: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação ao
entendimento acerca do sentimento dos homens em união estável sobre sua própria
condição (outra).
Casadas União estável Solteiras Separadas
Respostas
f % f % f % f %
Companheiro 0
0,00%
1
100,00%
1
100,00%
0 0,00%
Acomodado 0
0,00%
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Amante 0
0,00%
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Parceiro 0
0,00%
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Só para dar à mulher os benefícios que tem 0
0,00%
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Solteiros 0
0,00%
0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Total 0
0,00%
1
100,00%
1
100,00%
5
100,00%
Quando perguntados como acreditam que a maioria das mulheres membros dos casais aos
quais se reportaram se sentem, a grande maioria dos homens de todos os grupos entendem que as
mesmas se sentem próximas da condição de casadas, com predonio dos homens em união
estável (91,89%) nesse entendimento. É interessante notarmos que, ao se tratar da avaliação do
sentimento das mulheres que vivem em união estável a respeito de sua própria situação conjugal,
os homens casados e solteiros se posicionam de uma forma bastante diferente daquela feita
anteriormente em relação aos homens nessa mesma condição, visto que 83,33% dos casados e
85,29% dos solteiros acreditam que as mulheres que vivem em união estável se sentem próximas
da condição de casadas, como demonstram as tabelas 10 exposta anteriormente e 15. Essa
percepção é consensual também entre as mulheres quando questionadas a respeito de tal questão,
não tendo-se observado grandes variões entre os grupos em função da situação conjugal.
Todavia, pode-se afirmar através dos dados estasticos encontrados que, de maneira geral, as
mulheres nas distintas situões conjugais acreditam que as mulheres que vivem em união estável
se consideram ou se sentem mais próximas da condição de casadas do que os homens que vivem
essa mesma modalidade de relação conjugal. Essas diferenças estão expostas nas tabelas 11
apresentada anteriormente 13 e 14, a qual revela também que o termo “companheira” é
utilizado pelas mulheres em união estável (2,70%) como uma denominação alternativa aos
231
termos fornecidos pelo instrumento utilizado na pesquisa àquelas mulheres que se encontram em
sua própria situação conjugal.
Tabela 13: Distribuição da amostra feminina em relação ao entendimento acerca do
sentimento das mulheres em união estável sobre sua própria condição.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casada 30 81,08% 29
78,38%
30 85,71% 33 89,19% 122 83,56%
Amigada 6 16,22% 3 8,11% 2 5,71% 2 5,41% 13 8,90%
Namorada 1 2,70% 3 8,11% 3 8,57% 0 0,00% 7 4,79%
Outra 0 0,00% 1 2,70% 0 0,00% 2 5,41% 3 2,05%
Casada/Amigada 0 0,00% 1 2,70% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,68%
Tabela 14: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação ao
entendimento acerca do sentimento das mulheres em união estável sobre sua própria
condição. (outra)
Casadas União estável Solteiras Separadas
Respostas
f % f % f % f %
Companheira 0 0,00% 1 100,00% 0 0,00% 0 0,00%
Comprometida 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 50,00%
Indefinida 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 50,00%
Total 0 0,00% 1 100,00% 0 0,00% 2 100,00%
232
Tabela 15 - Distribuição da amostra masculina em relação ao entendimento acerca
do sentimento das mulheres em união estável sobre sua própria condição.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casada 30 83,33% 34
91,89%
29 85,29% 30
88,24%
123 87,23%
Amigada 5 13,89% 1 2,70% 2 5,88% 1 2,94% 9 6,38%
Namorada 1 2,78% 2 5,41% 3 8,82% 2 5,88% 8 5,67%
Outra (amizade) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,94% 1 0,71%
Nesse sentido, entre os que vivem ou já viveram em união estável, as mulheres nessa
condição são as que se dizem mais próximas da condição de casadas, seguidas pelos homens na
mesma situação conjugal. Em contrapartida, as mulheres solteiras foram as que menos se
consideram próximas da condição de casadas quando em união estável (7,89%). A maioria se
identifica com a condição outra” (36,84%) e de “namorada” (23,68%), não tendo, apesar disso,
nenhuma integrante desse grupo se declarado próxima da condição de concubinato. Essa mesma
concepção é observada entre os homens solteiros, embora 18,42% tenham dito sentirem-se
próximos da condição de casados – número consideravelmente maior do que as mulheres na
mesma condição – e, assim como as mulheres solteiras, 28,95% aproximaram-se da condição de
namorados. Vale destacar ainda, que o termo “companheirofoi empregado alternativamente
pelas mulheres em união estável (100%) e separadas (11%) nessa auto-nomeação e,
conseentemente, aproximação de uma modalidade de relação conjugal específica, seja uma
dentre aquelas fornecidas pelo próprio instrumento de avaliação, ou, citadas ineditamente pelos
sujeitos. (tabelas 16, 17, 18 e 19)
233
Tabela 16: Distribuição da amostra feminina que vive ou viveu em união estável
acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casado(a) 14 36,84% 26 68,42% 3 7,89% 23 60,53% 66 43,42%
Amigado(a) 0 0,00% 3 7,89% 1 2,63% 1 2,63% 5 3,29%
Namorado(a) 4 10,53% 5 13,16% 9 23,68% 1 2,63% 19 12,50%
Outra 10 26,32% 1 2,63% 14 36,84% 9 23,68% 34 22,37%
Não respondeu 10 26,32% 1 2,63% 11 28,95% 4 10,53% 26 17,11%
Casado(a)/Amigado(a) 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Namorado(a)/Outra 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Tabela 17: Distribuição da amostra masculina que vive ou viveu em união estável
acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casado(a) 21 55,26% 25 65,79% 7 18,42% 17 44,74% 70 46,05%
Amigado(a) 1 2,63% 5 13,16% 3 7,89% 3 7,89% 12 7,89%
Namorado(a) 4 10,53% 6 15,79% 11 28,95% 4 10,53% 25 16,45%
Outra 7 18,42% 1 2,63% 7 18,42% 9 23,68% 24 15,79%
Não respondeu 5 13,16% 1 2,63% 10 26,32% 5 13,16% 21 13,82%
234
Tabela 18: Distribuição das respostas da amostra feminina que vive ou viveu em
união estável acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.(outra)
Casadas União estável Solteiras Separadas
Respostas
f % f % f % f %
Não vivi esta situação 6 60,00% 0 0,00% 13 92,86% 7 77,78%
Solteira 0 0,00% 0 0,00% 1 7,14% 0 0,00%
Companheira 0 0,00% 2
100,00%
0 0,00% 1 11,11%
Incógnita 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 11,11%
Estou casada há 38 anos com o mesmo homem 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não posso falar pois sou casada oficialmente 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Parceiro 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total 10
100,00%
2
100,00%
14
100,00%
9
100,00%
Tabela 19: Distribuição das respostas da amostra masculina que vive ou viveu em
união estável acerca do seu sentimento atual ou passado referente a essa condição.(outra)
Casados União estável Solteiros Separados
Respostas
f % f % f % f %
Não aplivel
0 0,00% 0 0,00% 1 14,29% 0 0,00%
Não vivi esta situação
4 57,14% 0 0,00% 6 85,71% 8 88,89%
Isento desta condição
1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não é o meu caso, não tenho como responder de
forma mais completa
1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não se aplica
1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não sabe declarar
0 0,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Outros
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 11,11%
Total
7
100,00%
1
100,00%
7
100,00%
9
100,00%
235
4.3.2.3. A união estável e o namoro
De acordo com as informões dadas pela maioria dos sujeitos pesquisados, o namoro
atual, no qual as pessoas vivenciam algumas vezes situões em outras épocas somente
permitidas no casamento, não pode ser considerado união estável. É importante destacar que,
como evidenciam as tabelas 20 e 21, no tocante a essa questão, houve uma diferença entre os
grupos
, na medida em que os homens casados e em união estável acreditam menos nessa
equiparação do namoro moderno” à união estável do que as mulheres nas mesmas situões
conjugais. Ao contrário, as mulheres solteiras e separadas compartilham mais dessa aproximação
do que os homens solteiros e separados. Desses últimos, quase 90% discordam de tal afirmação.
Tabela 20: Distribuição da amostra feminina a respeito da possibilidade do
namoro” atual ser considerado uma união estável.
Casadas
União estável
Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 8
21,05%
10
26,32%
14
36,84%
12
31,58%
44 28,95%
Não 29
76,32%
28
73,68%
24
63,16%
26
68,42%
107 70,39%
Nem sempre 1 2,63% 0 0,00% 0
0,00%
0 0,00% 1 0,66%
Tabela 21: Distribuição da amostra masculina a respeito da possibilidade do
namoro” atual ser considerado uma união estável.
Casados
União estável
Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 13
34,21%
13
34,21%
8 21,05% 4
10,53%
38 25,00%
Não 25
65,79%
25
65,79%
30 78,95% 33
86,84%
113 74,34%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,63% 1 0,66%
236
Conforme revelam os dados da tabela 23, a justificativa dada a essa questão por 35% dos
homens solteiros, aproximadamente, é de que no namoro faltam elementos caracterizadores da
união estável. A segunda explicação fornecida por esse grupo à referida distinção entre o namoro
e a união estável é a afirmação de que no namoro não há compromisso e que o casal de
namorados não vive sob o mesmo teto. A maioria das mulheres solteiras, como mostra a tabela
22, assim como os homens na mesma condição, concebe a união estável como uma relação
distinta do namoro atual, sustentando essa diferença também na ausência, neste último, de
elementos caracterizadores da união estável, de compromisso e da coabitação, tendo esses três
aspectos sido citados com os mesmos índices (16,67%).
Os homens casados sustentam a desigualdade entre o namoro atual e a união estável a
partir da idéia de que o namoro é apenas namoro, ou seja, é uma etapa precursora de uma
possível relação mais séria, constituindo-se, em alguns casos, como momento de experimentação,
por vezes baseado no ficar, na aventura, na diversão. Eles entendem, igualmente, que nesse tipo
de relacionamento não há compromisso necessário à sua elevação ao status de união estável. Já
para as mulheres casadas a disparidade entre ambas as formas de relação reside no fato de,
segundo elas, a união estável ser igual ao casamento e o namoro ser desprovido de compromisso.
Nota-se uma equiparação bastante maior da união estável ao casamento pelas mulheres casadas
do que pelos homens casados. Vale dizer que esse foi o grupo no qual a referida concepção da
igualdade entre os dois tipos de relação conjugal casamento e união estável foi explicitado de
forma mais expressiva.
Segundo os homens em união estável a referida diferença baseia-se no fato de que “o
namoro é apenas namoro” e, por conseguinte, não há nesse tipo de relação compromisso
necessário à sua conceituação como união estável. Todavia, as mulheres na mesma situação
conjugal entendem tal desigualdade em razão dos namorados não morarem sob o mesmo teto” e
da ausência, no namoro, de elementos caracterizadores da união estável. Esses foram os mesmos
aspectos salientados pelas mulheres separadas no entendimento da dessemelhança entre a união
estável e o namoro. Porém, a idéia da igualdade entre a união estável e o casamento e o
entendimento do namoro como apenas namorosustenta a diferenciação entre ambas as formas
de relação feita pelos homens separados.
237
Tabela 22: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina a respeito da
possibilidade do “namoro” atual ser considerado uma união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
O
São diferentes 2 8,33% 0 0,00% 1 3,23% 2 7,69%
A união estável é igual ao casamento 3 12,50% 7 22,58% 2 6,45% 1 3,85%
O namoro é apenas namoro, é um precursor, baseado no
ficar, aventura, diversão
1 4,17% 4 12,90% 1 3,23% 2 7,69%
Faltam elementos caracterizadores da união estável 4 16,67% 2 6,45% 5 16,13% 5 19,23%
Não há compromisso 4 16,67% 7 22,58% 3 9,68% 2 7,69%
Depende 1 4,17% 1 3,23% 3 9,68% 1 3,85%
Não moram "sob o mesmo teto" 4 16,67% 4 12,90% 7 22,58% 6 23,08%
Não há "projeto de vida" 2 8,33% 1 3,23% 0 0,00% 3 11,54%
Mudanças sociais 1 4,17% 0 0,00% 1 3,23% 2 7,69%
Moral e religião 0 0,00% 4 12,90% 1 3,23% 1 3,85%
Pela Lei 0 0,00% 0 0,00% 1 3,23% 1 3,85%
Há comunhão de vida 0 0,00% 0 0,00% 2 6,45% 0 0,00%
Convívio, conhecimento do outro, intimidade 0 0,00% 0 0,00% 1 3,23% 0 0,00%
Não respondeu 2 8,33% 1 3,23% 3 9,68% 0 0,00%
Total
24
100,00%
31
100,00%
31
100,00%
26
100,00%
SIM
A união estável é igual ao casamento 5 35,71% 1 12,50% 1 9,09% 1 9,09%
Não moram "sob o mesmo teto" 0 0,00% 1 12,50% 1 9,09% 2 18,18%
Não há compromisso 0 0,00% 1 12,50% 2 18,18% 0 0,00%
Depende 1 7,14% 0 0,00% 1 9,09% 1 9,09%
O namoro é apenas namoro, é um precursor, baseado no
ficar, aventura, diversão
0 0,00% 0 0,00% 1 9,09% 0 0,00%
Mudanças sociais 5 35,71% 1 12,50% 0 0,00% 2 18,18%
Pela Lei 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 9,09%
Há comunhão de vida 0 0,00% 1 12,50% 3 27,27% 2 18,18%
A relação é igual 1 7,14% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Convívio, conhecimento do outro, intimidade 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 18,18%
Relação séria, completa, duradoura (tempo de convivência) 1 7,14% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Há amor e respeito 0 0,00% 0 0,00% 2 18,18% 0 0,00%
Não respondeu 1 7,14% 3 37,50% 0 0,00% 0 0,00%
Total
14
100,00%
8
100,00%
11
100,00%
11
100,00%
238
Tabela 23: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina a respeito
da possibilidade do “namoro” atual ser considerado uma união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
O
São diferentes 2 6,90% 0 0,00% 1 4,00% 0 0,00%
A união estável é igual ao casamento 2 6,90% 1 3,85% 2 8,00% 7 20,00%
O namoro é apenas namoro, é um precursor, baseado no
ficar, aventura, diversão
1 3,45% 6 23,08% 6 24,00% 7 20,00%
Faltam elementos caracterizadores da união estável
10
34,48% 4 15,38% 4 16,00% 4 11,43%
Não há compromisso 4 13,79% 6 23,08% 5 20,00% 5 14,29%
Depende 1 3,45% 1 3,85% 1 4,00% 1 2,86%
Não moram "sob o mesmo teto" 4 13,79% 3 11,54% 1 4,00% 5 14,29%
Não há "projeto de vida" 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 5,71%
Mudanças sociais 2 6,90% 2 7,69% 1 4,00% 2 5,71%
Moral e religião 2 6,90% 3 11,54% 0 0,00% 2 5,71%
Pela Lei 1 3,45% 0 0,00% 1 4,00% 0 0,00%
Há comunhão de vida 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Convívio, conhecimento do outro, intimidade 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 3 12,00% 0 0,00%
Total
29
100,00%
26
100,00%
25
100,00%
35
100,00%
SIM
A união estável é igual ao casamento 1 12,50% 1 7,69% 3 21,43% 2 50,00%
Não moram "sob o mesmo teto" 0 0,00% 2 15,38% 0 0,00% 0 0,00%
Não há compromisso 1 12,50% 2 15,38% 2 14,29% 0 0,00%
Depende 1 12,50% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O namoro é apenas namoro, é um precursor, baseado no
ficar, aventura, diversão
0 0,00% 0 0,00% 1 7,14% 0 0,00%
Mudanças sociais 0 0,00% 2 15,38% 1 7,14% 0 0,00%
Pela Lei 1 12,50% 2 15,38% 1 7,14% 0 0,00%
Há comunhão de vida 0 0,00% 0 0,00% 1 7,14% 1 25,00%
A relação é igual 1 12,50% 1 7,69% 0 0,00% 0 0,00%
Convívio, conhecimento do outro, intimidade 1 12,50% 0 0,00% 2 14,29% 1 25,00%
Relação séria, completa, duradoura (tempo de convivência)
1 12,50% 1 7,69% 2 14,29% 0 0,00%
Há amor e respeito 1 12,50% 1 7,69% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu 0 0,00% 1 7,69% 1 7,14% 0 0,00%
Total 8
100,00%
13
100,00%
14
100,00% 4
100,00%
239
Conforme as respostas dadas pela maior parte dos sujeitos de quase todos os grupos,
consubstanciadas nas tabelas 24 e 25, é possível que, num casal, um dos parceiros considere que
esteja vivendo em união estável, enquanto o outro entenda que está apenas namorando.
Entretanto, observa-se, que entre as mulheres que vivem em união estável essa diferença sofre
um decréscimo significativo em comparação aos outros grupos, visto que somente um pouco
mais da metade (55,26%) daquelas que vivem esse tipo de relação acreditam em tal possibilidade.
Inversamente, no tocante aos homens em união estável, esse mesmo índice foi encontrado
naqueles que não concordam com essa possível visão diferenciada quanto à natureza da relação
pelos membros de um casal.
Tabela 24: Distribuição da amostra feminina relativa à possibilidade de que, num
casal, um dos membros considere que esteja vivendo em união estável, enquanto o outro
entenda que está apenas namorando.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 27 71,05% 21 55,26% 23 60,53% 30 78,95% 101 66,45%
Não 11 28,95% 17 44,74% 15 39,47% 8 21,05% 51 33,55%
Tabela 25: Distribuição da amostra masculina relativa à possibilidade de que, num
casal, um dos membros considere que esteja vivendo em união estável, enquanto o outro
entenda que está apenas namorando.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 25 65,79% 17 44,74% 26 68,42% 23 60,53% 91 59,87%
Não 12 31,58% 21 55,26% 12 31,58% 15 39,47% 60 39,47%
Não respondeu 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
No tocante à questão anterior, a explicação dada pelos homens solteiros à diferença de
perspectivas de cada membro do casal a respeito da natureza da relação reside nos sentimentos
individuais, nas concepções distintas e na ausência de diálogo. Para as mulheres solteiras tal
240
distinção centra-se, primeiramente, no próprio gênero e no compromisso. Em segundo lugar são
citados os sentimentos para com os parceiros e, em terceiro, as concepções distintas de cada um.
(tabelas 26 e 27)
A posição dos homens casados a respeito dessas óticas diferenciadas é atribuída aos
sentimentos, as concepções distintas e, em terceiro lugar, ao gênero, aos sentimentos individuais
e à falta de diálogo. As mulheres no mesmo estado civil citam como motivo dessa disparidade o
gênero, os sentimentos e, em terceiro lugar, às concepções distintas, ao fato de um membro do
casal levar a relação mais a sério do que o outro e à ausência de diálogo.
As concepções distintas e o compromisso são os primeiros fatores que, segundo os
homens em união estável, possibilitaria que num casal um dos membros considere estar vivendo
em união estável, enquanto o outro pense que está apenas namorando. Seguem-se a eles os
sentimentos e os sentimentos individuais e a falta de diálogo. As mulheres na mesma condição
consideram possível essa assimetria, primeiramente, em função dos sentimentos individuais, em
segundo lugar das concepções distintas e dos sentimentos, e, em terceiro, do gênero, do fato de
um membro da díade conjugal levar a relação mais a sério do que o outro, das expectativas, da
falta de diálogo e do morar junto.
Os homens separados citam como motivos dessa divergência nos modos de encarar a
relação o gênero, a falta de diálogo e os sentimentos. As mulheres separadas a atribuem em
primeiro lugar ao compromisso e aos sentimentos individuais. Em segundo lugar são apontadas
as concepções distintas e, em terceiro, o gênero.
241
Tabela 26: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra masculina em
relação à possibilidade de que, num casal, um dos membros considere que esteja vivendo
em união estável, enquanto o outro entenda que está apenas namorando.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Concepções distintas 6 20,69% 5 19,23% 5 22,73% 1 3,85%
Gênero* 3 10,34% 3 11,54% 0 0,00% 6 23,08%
Compromisso 0 0,00% 0 0,00% 5 22,73% 2 7,69%
Um leva a relação mais a sério que o outro 2 6,90% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,85%
Sentimentos 3 10,34% 9 34,62% 3 13,64% 4 15,38%
Expectativas 1 3,45% 2 7,69% 0 0,00% 2 7,69%
Sentimentos individuais** 7 24,14% 3 11,54% 3 13,64% 2 7,69%
Lei e seu entendimento / Falta de clareza dos
aspectos legais
2 6,90% 1 3,85% 2 9,09% 2 7,69%
Ausência de diálogo 4 13,79% 3 11,54% 4 18,18% 5 19,23%
Morar junto 1 3,45% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,85%
Total 29
100,00%
26
100,00%
22
100,00%
26
100,00%
* A categoria gênero se refere aos diferentes modos de pensar e agir em relação ao aspecto abordado em função da condição
masculina ou feminina.
** A categoria “sentimentos individuaisrefere-se a um modo de funcionamento afetivo na relação conjugal ligado às questões de
personalidade e/ou à história de vida.
242
Tabela 27: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra feminina em
relação à possibilidade de que, num casal, um dos membros considere que esteja vivendo
em união estável, enquanto o outro entenda que está apenas namorando.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Concepções distintas 3 13,04% 3 11,11% 3 13,64% 5 16,13%
Gênero* 5 21,74% 9 33,33% 2 9,09% 4 12,90%
Compromisso 5 21,74% 1 3,70% 1 4,55% 6 19,35%
Um leva a relação mais a sério que o outro 1 4,35% 3 11,11% 2 9,09% 0 0,00%
Sentimentos 4 17,39% 4 14,81% 3 13,64% 3 9,68%
Expectativas 0 0,00% 0 0,00% 2 9,09% 1 3,23%
Sentimentos individuais** 1 4,35% 2 7,41% 4 18,18% 6 19,35%
Lei e seu entendimento / Falta de clareza dos
aspectos legais
2 8,70% 1 3,70% 1 4,55% 2 6,45%
Falta de / Ausência de diálogo 2 8,70% 3 11,11% 2 9,09% 3 9,68%
Morar junto 0 0,00% 1 3,70% 2 9,09% 1 3,23%
Total 23
100,00%
27
100,00%
22
100,00%
31 100,00%
* A categoria gênero se refere aos diferentes modos de pensar e agir em relação ao aspecto abordado em função da condição
masculina ou feminina.
** A categoria “sentimentos individuaisrefere-se a um modo de funcionamento afetivo na relação conjugal ligado às questões de
personalidade e/ou à história de vida.
De acordo com as respostas da maioria dos homens e mulheres em todas as situações
conjugais investigadas os sentimentos constituem o principal fator responsável pela
transformação do namoro em união estável. Convém destacar que houve uma incidência maior
dos homens separados e em união estável nessa atribuição, tendo quase quatro quintos dos
sujeitos de cada grupo se posicionado dessa maneira. Os homens solteiros foram, dentre todos os
grupos investigados, os que menos consideraram os sentimentos como principal variável
relacionada à dita transformação. Segundo aproximadamente 27% deles esta passagem de uma
situação conjugal à outra ocorre por questões financeiras e pela própria convivência. As mulheres
em união estável, segundo grupo com menor índice na atribuição da passagem do namoro à união
estável aos sentimentos, também citam esse último elemento como fator dessa transformação,
seguido pelos fatores externos e legais. (tabelas 28 e 29)
243
Tabela 28: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação aos elementos
necessários à transformação do namoro em união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Os sentimentos 32 66,67% 30 65,22% 27 57,45% 27 61,36%
Dinheiro, questões financeiras, bens 6 12,50% 5 10,87% 3 6,38% 1 2,27%
Filhos 1 2,08% 2 4,35% 1 2,13% 2 4,55%
Morar junto 1 2,08% 1 2,17% 1 2,13% 4 9,09%
Convivência, tempo de convivência /
Conhecimento mútuo
5 10,42% 3 6,52% 7 14,89% 3 6,82%
Fatores sociais (mudança social) 0 0,00% 0 0,00% 1 2,13% 1 2,27%
Fatores externos (pressões familiares,
gravidez, etc) e legais
0 0,00% 1 2,17% 6 12,77% 2 4,55%
Moral, tradição 0 0,00% 1 2,17% 0 0,00% 1 2,27%
Não respondeu / Não sabe 3 6,25% 3 6,52% 1 2,13% 3 6,82%
Total 48
100,00%
46
100,00%
47
100,00%
44
100,00%
Tabela 29: Distribuição das respostas da amostra masculina em relação aos
elementos necessários à transformação do namoro em união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Os sentimentos 27 51,92% 28 63,64% 30 76,92% 32 78,05%
Dinheiro, questões financeiras, bens 7 13,46% 2 4,55% 1 2,56% 2 4,88%
Filhos 0 0,00% 1 2,27% 1 2,56% 0 0,00%
Morar junto 5 9,62% 1 2,27% 1 2,56% 1 2,44%
Convivência, tempo de convivência /
Conhecimento mútuo
7 13,46% 6 13,64% 3 7,69% 3 7,32%
Fatores sociais (mudança social) 2 3,85% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Fatores externos (pressões familiares,
gravidez, etc) e legais
4 7,69% 1 2,27% 1 2,56% 3 7,32%
Moral, tradição 0 0,00% 0 0,00% 1 2,56% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 5 11,36% 1 2,56% 0 0,00%
Total 52
100,00%
44
100,00%
39
100,00%
41
100,00%
244
As tabelas 30 e 31 revelam que os sentimentos são também considerados pelos homens e
mulheres em todas as situões conjugais investigadas como fator essencial para que a relação
entre homem e mulher seja considerada união estável. Essa eleição do aspecto sentimental como
primeira condição para classificação de uma relação amorosa como união estável foi maior entre
os homens casados, dos quais aproximadamente 55% compartilham dessa idéia, assim como
quase 51% dos homens que vivem em união estável. As mulheres separadas são as que menos
declaram essa primazia dos sentimentos, apesar da diferença percentual ser pequena em
comparação aos homens e mulheres solteiras, às mulheres casadas e em união estável e aos
homens separados.
O segundo elemento importante no tocante à classificação citado pelos homens solteiros é
fato de morar junto e o tempo de convivência e a escolha, ou seja, a vontade de “viver junto. O
terceiro elemento, citado por esse grupo, foram os aspectos materiais que incluem bens, contas e
pensões. Os casados citam o fato de morar junto e o tempo de convivência e a escolha como os
fatores que, respectivamente, sucedem os sentimentos nesse entendimento. As mulheres casadas
listaram a coabitação e o tempo de convivência como os elementos prioritários subseqüentes aos
sentimentos. De acordo com os homens em união estável os elementos que sucedem os
sentimentos são o tempo de convivência e o viver sob o mesmo teto. As mulheres em união
estável, assim como os homens nessa mesma situação, entendem a coabitação como o segundo
requisito necessário à qualificação da união estável, seguido pela escolha. Vale dizer que o
morar juntoocupa a segunda posição também entre os homens separados, seguido pela escolha
em conjunto com convivência propriamente dita. As mulheres separadas listaram a escolha como
o segundo elemento necessário à classificação de uma relação como união estável e a coabitação
como o terceiro. (tabelas 30 e 31)
Consideramos importante ressaltar que, além das mulheres solteiras, os filhos foram
citados por aqueles sujeitos que vivenciam uma relação conjugal excetuando-se os homens
casados –, ou seja, pelas mulheres casadas e pelos homens e mulheres em união estável, ainda
que com percentuais bastante baixos. O conhecimento social da relação, requisito legal
necessário à configuração da união estável, foi citado com índices pequenos por todos os grupos,
exceto pelos homens separados. (tabelas 30 e 31)
245
A pouca importância dada aos filhos na classificação de uma relação como união estável,
fato incomum há algumas décadas, é um dado que acompanha as mudanças na maneira de
representar essa forma de relação, a qual por sua vez está relacionada à maneira como tal arranjo
é hoje tratado pela lei e as próprias práticas sociais a ele concernentes. Como já fora apontado
anteriormente, na atualidade encontramos uma multiplicidade de arranjos conjugais e familiares
dentro dos quais podemos incluir, respaldados no novo Código Civil (2002), a união estável –,
sendo comum nesse contexto a presença de famílias constituídas por casais sem filhos. Ou seja, a
representação da família como uma instituição gerada a partir da legitimação civil e religiosa cuja
formação se consolidaria pela prole extensa, vivendo todos os membros sob o mesmo teto, como
assinala Szymanski (2000), cedeu lugar a uma outra concepção na qual a diversidade é muito
mais aceita do que outrora. Em acréscimo, consideramos importante relatar como indício dessa
mudança de concepção tocante ao casamento e à família, um dos resultados encontrados em uma
pesquisa anterior a respeito da satisfação conjugal, feita com 93 homens e 107 mulheres casados,
o qual revelou que, nesse grupo, a satisfação com o casamento maior entre os que não tinham
filhos do que entre aqueles que os tinham. (ENNES, P. P.).
A suprema valorização dos sentimentos pelos sujeitos de todas as situões conjugais
investigadas ao tratarem da união estável revelam que na mesma, assim como em todas as demais
formas de relação conjugal, a conjugalidade tem como condição de existência o componente
afetivo, o qual pode ser traduzido como amor, sentimento associado primeiramente nessa
pesquisa por homens em mulheres a esse tipo de vínculo. Com base em Calligaris (1994), autor
que considerara tal exigência um femeno específico da modernidade ocidental, podemos
afirmar que esta característica reafirma seu caráter contemporâneo.
246
Tabela 30: Distribuição das respostas da amostra feminina relativa aos componentes
necessários para que a relação entre um homem e uma mulher seja considerada união
estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Sentimentos 24 40,68% 23 37,70% 26 37,14% 19 32,76%
Escolha, vontade 7 11,86% 5 8,20% 9 12,86% 12 20,69%
Conhecer o outro, estarem juntos, conviver,
viver junto
2 3,39% 4 6,56% 3 4,29% 4 6,90%
Dividir responsabilidades 1 1,69% 2 3,28% 3 4,29% 0 0,00%
Morar junto 8 13,56% 12 19,67% 12 17,14% 8 13,79%
Tempo 8 13,56% 6 9,84% 4 5,71% 7 12,07%
Filhos 3 5,08% 2 3,28% 1 1,43% 0 0,00%
Aspectos materiais (bens, contas, pensão) 3 5,08% 4 6,56% 5 7,14% 2 3,45%
A união estável é diferente do casamento 1 1,69% 0 0,00% 0 0,00% 1 1,72%
Conhecimento social da relação 2 3,39% 1 1,64% 4 5,71% 4 6,90%
Moral, tradição 0 0,00% 1 1,64% 0 0,00% 0 0,00%
Aspectos legais (sem comprovação legal) 0 0,00% 1 1,64% 2 2,86% 1 1,72%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 0 0,00% 1 1,43% 0 0,00%
Total 59
100,00%
61
100,00%
70
100,00%
58
100,00%
247
Tabela 31: Distribuição das respostas da amostra masculina relativa aos
componentes necessários para que a relação entre um homem e uma mulher seja
considerada união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Sentimentos 22 40,00% 27 55,10% 27 50,94% 20 35,09%
Escolha, vontade 6 10,91% 4 8,16% 5 9,43% 7 12,28%
Conhecer o outro, estarem juntos, conviver,
viver junto
3 5,45% 2 4,08% 2 3,77% 7 12,28%
Dividir responsabilidades 1 1,82% 1 2,04% 1 1,89% 3 5,26%
Morar junto 6 10,91% 5 10,20% 6 11,32% 9 15,79%
Tempo 6 10,91% 5 10,20% 7 13,21% 3 5,26%
Filhos 0 0,00% 0 0,00% 1 1,89% 0 0,00%
Aspectos materiais (bens, contas, pensão) 4 7,27% 2 4,08% 0 0,00% 4 7,02%
A união estável é diferente do casamento 1 1,82% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Conhecimento social da relação 3 5,45% 2 4,08% 1 1,89% 0 0,00%
Moral, tradição 2 3,64% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Aspectos legais (sem comprovação legal) 0 0,00% 1 2,04% 1 1,89% 3 5,26%
Não respondeu / Não sabe 1 1,82% 0 0,00% 2 3,77% 1 1,75%
Total 55
100,00%
49
100,00%
53
100,00%
57
100,00%
248
4.3.2.4. As características legais atribuídas à união estável
Para a maioria dos homens avaliados as características legais necessárias para que uma
relação a dois possa ser considerada como união estável foram apresentadas na seguinte
seência: estabilidade, finalidade de constituição de família, continuidade, unicidade de vínculo,
informalismo, notoriedade e diversidade de sexos. Já a ordenação feminina relativa aos aspectos
legais foi a seguinte: estabilidade, finalidade de constituição de família, unicidade de vínculo,
continuidade, notoriedade e informalismo – estes últimos praticamente com a mesma freência
e diversidade de sexos. (tabelas 32 e 33)
É interessante notarmos a concordância dos dois gêneros nesse aspecto e a representação
da união estável, primeiramente, como um tipo de relação dotada de estabilidade. Embora essa
atribuição se traduza aparentemente numa redundância semântica, sua importância reside na
coincidência entre as características que a lei e o senso comum, que dela se apropria, estabelecem
como primordiais para a considerão de uma relação como união estável. No plano jurídico é
preciso ao se pensar na proteção a uma relação conjugal não tradicional que se estabeleça um
critério definidor para esse tipo específico vínculo, a partir da determinação de uma série de
requisitos e características necessários à sua configuração. Somente através do atendimento a tais
critérios essa relação pode gerar efeitos jurídicos, passando então seus membros a terem direitos e
deveres dela oriundos. No que se refere à união estável, o critério de estabilidade obedece a uma
lógica lingüística segundo a qual, para ser definida como estável através de um julgamento
jurídico, a relação constituída entre um homem e uma mulher precisa ser dotada de estabilidade.
Essa condição é determinada em referência ao casamento, considerado uma espécie de âncora
para o estabelecimento de padrões aos novos arranjos conjugais, como a união estável.
249
Tabela 32: Distribuição das respostas da amostra feminina referentes às
características legais consideradas importantes para que uma relação a dois possa ser
classificada como união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Finalidade de constituição de família
30
18,87%
25 15,92% 25 17,12% 25 18,12% 105 17,50%
Estabilidade 31
19,50%
31 19,75% 35 23,97% 33 23,91% 130 21,67%
Unicidade de vínculo 28
17,61%
24 15,29% 24 16,44% 20 14,49% 96 16,00%
Notoriedade 19
11,95%
24 15,29% 17 11,64% 18 13,04% 78 13,00%
Continuidade 23
14,47%
25 15,92% 24 16,44% 18 13,04% 90 15,00%
Diversidade de sexos 9 5,66% 4 2,55% 4 2,74% 7 5,07% 24 4,00%
Informalismo 19
11,95%
24 15,29% 17 11,64% 17 12,32% 77 12,83%
Total 159
100,00%
157
100,00%
146
100,00%
138
100,00%
600
100,00%
Tabela 33: Distribuição das respostas da amostra masculina referentes às
características legais consideradas importantes para que uma relação a dois possa ser
classificada como união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Finalidade de constituição de família 34
23,45%
28 21,05% 17 12,78% 29 22,48% 108 20,00%
Estabilidade 33
22,76%
25 18,80% 33 24,81% 32 24,81% 123 22,78%
Unicidade de vínculo 13 8,97% 16 12,03% 20 15,04% 23 17,83% 72 13,33%
Notoriedade 20
13,79%
20 15,04% 17 12,78% 6 4,65% 63 11,67%
Continuidade 22
15,17%
20 15,04% 19 14,29% 15 11,63% 76 14,07%
Diversidade de sexos 11 7,59% 4 3,01% 7 5,26% 10 7,75% 32 5,93%
Informalismo 12 8,28% 20 15,04% 19 14,29% 14 10,85% 65 12,04%
Nenhuma dessas respostas 0 0,00% 0 0,00% 1 0,75% 0 0,00% 1 0,19%
Total 145
100,00%
133
100,00%
133
100,00%
129
100,00%
540
100,00%
250
A não determinação legal de que, para que uma relação seja considerada união estável, o
casal viva sob o mesmo teto, é um aspecto em relação ao qual quase a metade dos homens e
mulheres casados discordam. Porém, metade dos homens em união estável discorda desse
aspecto legal, e, metade das mulheres no mesmo estado civil concorda com o mesmo. Da mesma
forma, um pouco mais da metade dos homens solteiros se posicionam de maneira favorável a não
exigência da coabitação e, aproximadamente dois quintos das mulheres solteiras, concordam e
discordam equiparadamente a esse respeito. Assim como os casados, aproximadamente metade
dos homens e mulheres separados discorda da flexibilização legal posta em questão. (tabelas 34 e
35)
Tabela 34: Distribuição da amostra feminina em relação à não determinação legal
que, para que uma relação seja considerada união estável, o casal viva sob o mesmo teto.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Concordo 16 42,11% 19 50,00% 15 39,47% 15 39,47% 65 42,76%
Discordo 18 47,37% 17 44,74% 15 39,47% 20 52,63% 70 46,05%
Não sei 4 10,53% 2 5,26% 8 21,05% 3 7,89% 17 11,18%
Tabela 35: Distribuição da amostra masculina em relação à não determinação legal
que, para que uma relação seja considerada união estável, o casal viva sob o mesmo teto.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Concordo 16 42,11% 17 44,74% 20 52,63% 15 39,47% 68 44,74%
Discordo 18 47,37% 19 50,00% 13 34,21% 18 47,37% 68 44,74%
Não sei 4 10,53% 2 5,26% 5 13,16% 5 13,16% 16 10,53%
251
A maioria das mulheres solteiras que concordam com a não exigência legal da coabitação
para configuração da união estável assim se posicionam, em função, primeiramente, de uma
relativização tocante a essa questão, na qual está presente a idéia de que o elemento fundamental
para essa consideração no plano jurídico são os sentimentos e não a vivência sob o mesmo teto.
Esta é apresentada, seencialmente, como um aspecto relativo às escolhas e circunstâncias
(22,22%), sendo ainda reforçado nesse sentido, pelo mesmo número de sujeitos, que o que
importa na relação de união estável são os sentimentos. Os homens solteiros consideram que
morar sob o mesmo tetodiz respeito às escolhas e circunstâncias (30,77%), tendo
aproximadamente um quinto deles relativizado a necessidade desse aspecto, visto que, em
acréscimo, para esse grupo o que de fato importa para que uma relação de união estável seja
considerada como tal são os sentimentos (11,54%) e o compromisso e estabilidade (11,54%) nela
presentes.
O entendimento de que “morar juntodiz respeito às escolhas e circunstâncias é
compartilhado também por metade das mulheres casadas, as quais relativizam esse aspecto
(18,75%) reiterando que o que importa nesse tipo de vínculo são os sentimentos (18,75%). Os
homens casados ao serem questionados a respeito dessa flexibilização legal apresentam os
argumentos de que o mesmo diz respeito às escolhas e circunstâncias (23,81%), da mesma forma
que sua existência é relativa no que concerne à caracterização da união estável. De acordo com
sua ótica a comunhão de vida e o convívio existente entre o casal (9,52%) é o que permite o
enquadramento da relação por eles vivida na definição de união estável (9,52%), a qual, segundo
os mesmos, pela priorização desses aspectos deixam em segundo plano a questão da coabitação.
A relativização tocante a esse aspecto é apontada por 30% das mulheres que vivem em união
estável, ratificando a idéia de que a coabitação diz respeito às escolhas e circunstâncias (20%) e
de que, o que importa nesse tipo de vínculo são os sentimentos (15%).
As mulheres conviventes acrescentaram ainda a necessidade de comunhão de vida, a
importância da convivência, e a própria definição de união estável, todos com índices de 10%,
como justificativas de sua acepção. Os homens na mesma situação conjugal apontam a
relativização construída por eles em torno da coabitação (31,58%), a importância dos sentimentos
(26,32%) e a noção de que viver sob o mesmo teto diz respeito às escolhas e circunstâncias
252
(21,05%) como as razões de sua concordância com a flexibilidade concedida pela lei. Essa
adesão é justificada pelas mulheres separadas com base na relativização (31,25%), na
importância dos sentimentos (18,75%) e na própria definição de união estável (12,50%), assim
como pela convivência (12,50%). Os homens separados são, dentre todos os grupos investigados,
os que mais relativizam a coabitação como aspecto definidor da união estável, visto que 60%
questionaram esse determinismo, tendo sido a prevalência dos sentimentos como elemento
estruturante desse tipo de relação afirmado por 20% dos sujeitos nessa situação conjugal.
Dentre a minoria que discorda da flexibilidade concedida pela lei à coabitação os homens
solteiros justificam essa oposição nos aspectos legais, na definição de união estável, na
necessidade comunhão de vida e na noção de casamento. As mulheres também sustentam sua
discordância, primeiramente, na associação entre a coabitação e o casamento e no convívio,
prejudicado, nesta visão, pela vida em casas separadas. Elas acrescentam ainda a necessidade de
comunhão de vida para a consideração de uma relação como união estável, o que também seria
desfavorecido com a ausência da convivência marital sob o mesmo teto.
É interessante notarmos que, no tocante a essa questão, muitos daqueles que discordam da
não exigência legal da convivência sob o mesmo teto para que uma relação seja considerada
união estável o fazem a partir de uma associação da coabitação com elementos necessários do
ponto de vista legal para a configuração da união estável, como aqueles citados Gama e Pereira
(2001), dentre os quais destaca-se a comunhão de vida, fazendo-se assim, pela idéia da ausência,
uma associação desse arranjo com o casamento. Observa-se, desse modo, uma coincidência entre
a fala dos sujeitos e a lei no que tange a coabitação.
De tal modo, as mulheres casadas justificam sua oposição à não obrigatoriedade legal
posta em questão pela necessidade de comunhão de vida (16,67%) e pela importância do
convívio (16,67%). Elas acrescentam ainda os conceitos de casamento, de compromisso e
estabilidade e a definição de união estável, todos com mesmo índice (11,11%), como fatores
associados e favorecidos pela coabitação, a qual por sua vez, dotada de todas essas
potencialidades, associa-se, nessa representação, à união estável. Os homens casados apontam
como motivos de sua oposição à convivência (26,32%), a definição de união estável (21,05%), e,
253
em acréscimo, a necessidade de comunhão de vida (10,53%), a consideração de que sem a
coabitação a relação é namoro (10,53%), além de uma visão crítica e/ou moral (10,53%)
construída a esse respeito. As mulheres em união estável manifestam sua discordância tocante ao
tratamento legal dado à coabitação com base, na noção de casamento (22,22%), no entendimento
de que sem convivência “sob o mesmo teto” a união estável é namoro (16,67%) e, com os
mesmos índices (11,11%), na necessidade de comunhão de vida e em questões legais. Os homens
na mesma situação conjugal utilizam como argumentos nessa oposição a definição de união
estável (36,84%), a equiparação da união estável, sem coabitação, com o namoro (15,79%).
Foram citados ainda, a concepção de que, para a relação de união estável possa ser considerada
como família, é necessário que o casal convivente viva “sob o mesmo teto” e o posicionamento
crítico e/ou moral, com adesão de 10,53% dos sujeitos em cada uma dessas posições assumidas.
As mulheres separadas utilizaram a definição de união estável como principal fundamento
de sua oposição a respeito da abordagem jurídica referente à coabitação nessa forma de relação,
tendo aproximadamente 33% delas assim se manifestado sobre o aspecto em questão. As outras
justificativas dadas por esse grupo à discordância assumida em relação ao tratamento legal foram
à necessidade de convivência (23,81%), subtraída, nesse entendimento, pela vida conjugal em
casas separadas e pela visão crítica e/ou moral (14,29%) sobre tal possibilidade facultada pela lei
no que concerne à consideração da união estável como tal, ou seja, como uma relação conjugal,
que possa ser definida em semelhança ao casamento sendo capaz, em razão dessa constituição,
como família, de gerar efeitos jurídicos.
É importante lembrar a afirmação de Pereira (2002) segundo a qual a definição de união
estável guarda uma íntima relação com a definição da família. Este autor destaca o surgimento de
novas e múltiplas representões sociais a respeito dessa instituição a partir do momento que a
mesma deixou de ser o núcleo econômico e de produção e passou a se constituir como o espo
do afeto e do amor. Observamos, nesse sentido, que quando homens e mulheres constroem suas
representões sociais a acerca da união estável o fazem em relação a um tipo de relação conjugal
ao qual foi atribuído pela lei um estatuto de família, sendo essa uma das razões além da própria
vinculação existente entre a conjugalidade e o sentimento amoroso, descrita por Calligaris (1994)
– pela qual, em nosso entender, nesse conhecimento produzido e compartilhado a seu respeito os
254
aspectos sentimentais assumem importância central, enquanto outros são considerados
secundários.
Os homens separados reafirmam a necessidade de convivência (31,58%) para que uma
relação seja considerada união estável, entendendo-se nessa ótica uma idéia de convivência nos
moldes convencionais, isto é, dentro da mesma casa. Conforme as declarões dadas por 21,05%
dos membros desse grupo se a relação existir sem coabitação, ela se enquadra em uma concepção
de namoro, visto que para que uma relação seja considerada como união estável é necessário que
haja comunhão de vida, fator dentro de uma visão mais tradicional viabilizado, assim como a
convivência, unicamente pela coabitação.
É relevante considerarmos que, apesar da coabitação ser um fator que tenda fortemente a
favorecer o convívio do casal, a posição contrária assumida pela maioria dos sujeitos à
flexibilidade legal em relação a esse aspecto pode ser entendida como um estranhamento
precipitado por esta possibilidade nova que, se opondo a uma idéia estruturante da concepção
tradicional de casamento, torna-se ameaçadora. Na avaliação desse dado novo, com o qual se
defrontaram, os sujeitos sociais tomam como base o casamento utilizando-se assim de
argumentos tradicionais para justificar a necessidade da vida em comum sob o mesmo tetona
união estável. A ancoragem do novo no antigo é útil para lidar com as inquietações suscitadas
pela união estável e seus múltiplos aspectos em relação aos quais a tradição, como afirma
Giddens (2002), assume uma função de, diante das incertezas provocadas pelo inédito, dizer
“como o mundo é”, facilitando assim a absorção da diferença pelos universos grupais.
Embora alguns dos sujeitos investigados não tenham assumido nenhum posicionamento
em relação à questão da coabitação, determinados pronunciamentos destacaram-se em função da
situação conjugal. Os homens solteiros reiteram a idéia de que sem vida conjugal sob o mesmo
teto” a união estável é namoro (20%). As mulheres solteiras entendem (12,50%) que a coabitação
está associada a um maior compromisso com a relação, embora um mesmo número tenha feito
uma relativização desse aspecto. Os homens casados que manifestaram dúvidas a esse respeito
não acrescentaram a mesma nenhuma argumentação, isentando-se nesse sentido. Contudo, as
mulheres no mesmo estado civil citam a noção de casamento (25%) e a definição de união estável
255
(25%) como justificativas de suas respostas. As mulheres em união estável que declararam
dúvida a respeito da flexibilidade legal posta em questão reafirmaram ser tal aspecto algo que diz
respeito às escolhas e circunstâncias (50%), em contraposição a 25% que se reportou à noção de
casamento. Os homens em união estável, da mesma maneira que as mulheres, reiteraram que
viver ou não sob o mesmo tetodiz respeito às escolhas e circunstâncias do casal convivente
(33,33%), tecendo, de igual maneira, considerações a esse respeito (33,33%). As mulheres
separadas destacam o prejuízo à convivência, como prolongamento de suas respostas (33,33%). E
os homens separados, assim como os casados, não fizeram nenhum acréscimo ao posicionamento
adotado em relação ao aspecto legal questionado, limitando-se em isentarem-se nas respostas.
Convém ressaltar que, tendo essa parcela dos grupos investigados na pesquisa declarado um não
saberrelativo ao aspecto abordado, em coerência, a maioria de seus membros que assim se
posicionaram não acrescentaram nenhuma declaração a essa posição, não respondendo, de tal
modo, a questão. (tabelas 36 e 37)
256
Tabela 36: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao
posicionamento frente a não determinação legal referente à coabitação.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
CONCORDO
É necessário comunhão de vida 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 1 6,25%
Família (idéia geral) 0 0,00% 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00%
Casamento (idéia geral) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 6,25%
Convivência (convívio, conhecimento do outro) 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 1 6,25%
Compromisso / Estabilidade 1 5,56% 0 0,00% 0 0,00% 2 12,50%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 4 22,22% 8 50,00% 4 20,00% 1 6,25%
Relativização 8 44,44% 3 18,75% 6 30,00% 5 31,25%
O que importa são os sentimentos 4 22,22% 3 18,75% 3 15,00% 3 18,75%
Por questões legais 1 5,56% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Porque sim 0 0,00% 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00%
Definição de união estável 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 2 12,50%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 0 0,00% 1 5,00% 0 0,00%
Total 18
100,00%
16
100,00%
20
100,00%
16
100,00%
DISCORDO
É necessário comunhão de vida 3 16,67% 3 16,67% 2 11,11% 1 4,76%
Família (idéia geral) 1 5,56% 1 5,56% 1 5,56% 1 4,76%
Casamento (idéia geral) 4 22,22% 2 11,11% 4 22,22% 0 0,00%
Convivência (convívio, conhecimento do outro) 4 22,22% 3 16,67% 0 0,00% 5 23,81%
Compromisso / Estabilidade 2 11,11% 2 11,11% 0 0,00% 0 0,00%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 0 0,00% 1 5,56% 1 5,56% 1 4,76%
Relativização 0 0,00% 2 11,11% 1 5,56% 1 4,76%
É namoro 1 5,56% 1 5,56% 3 16,67% 2 9,52%
O que importa são os sentimentos 1 5,56% 0 0,00% 1 5,56% 0 0,00%
Por questões legais 0 0,00% 1 5,56% 2 11,11% 0 0,00%
Crítica, moral 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 3 14,29%
Definição de união estável 2 11,11% 2 11,11% 3 16,67% 7 33,33%
Total 18
100,00%
18
100,00%
18
100,00%
21
100,00%
O SEI
Casamento (idéia geral) 0 0,00% 1 25,00% 1 25,00% 0 0,00%
Convivência (convívio, conhecimento do outro) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33%
Compromisso 1 12,50% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 0 0,00% 0 0,00% 2 50,00% 0 0,00%
Relativização 1 12,50% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Definição de união estável 0 0,00% 1 25,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 6 75,00% 2 50,00% 1 25,00% 2 66,67%
Total 8
100,00%
4
100,00%
4
100,00%
3
100,00%
257
Tabela 37: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao
posicionamento frente a não determinação legal referente à coabitação.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
CONCORDO
É necessário comunhão de vida
1 3,85% 2 9,52% 1 5,26% 0 0,00%
Família (idéia geral)
1 3,85% 1 4,76% 0 0,00% 0 0,00%
Casamento (idéia geral)
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Convivência (convívio, conhecimento do outro)
1 3,85% 2 9,52% 0 0,00% 0 0,00%
Compromisso / Estabilidade 3
11,54%
0
0,00%
1
5,26%
1
6,67%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 8
30,77%
5
23,81%
4
21,05%
0
0,00%
Relativização 5
19,23%
5
23,81%
6
31,58%
9
60,00%
É namoro 2
7,69%
1
4,76%
0
0,00%
0
0,00%
O que importa são os sentimentos 3
11,54%
1
4,76%
5
26,32%
3
20,00%
Por questões legais 2
7,69%
1
4,76%
0
0,00%
0
0,00%
Está errado 0
0,00%
0
0,00%
1
5,26%
0
0,00%
Porque sim 0
0,00%
1
4,76%
0
0,00%
0
0,00%
Crítica, moral 0
0,00%
0
0,00%
0
0,00%
2
13,33%
Definição de união estável 0
0,00%
2
9,52%
0
0,00%
0
0,00%
Não respondeu / Não sabe 0
0,00%
0
0,00%
1
5,26%
0
0,00%
Total 26
100,00%
21
100,00%
19
100,00%
15
100,00%
DISCORDO
É necessário comunhão de vida 2 13,33% 2 10,53% 1 5,26% 3 15,79%
Família (idéia geral) 0 0,00% 3 15,79% 2 10,53% 1 5,26%
Casamento (idéia geral) 2 13,33% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Convivência (convívio, conhecimento do outro)
1 6,67% 5 26,32% 1 5,26% 6 31,58%
Compromisso / Estabilidade 1 6,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 5,26%
Relativização 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É namoro 1 6,67% 2 10,53% 3 15,79% 4 21,05%
O que importa são os sentimentos 1 6,67% 1 5,26% 1 5,26% 0 0,00%
Por questões legais 3 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 5,26%
Crítica, moral 1 6,67% 2 10,53% 2 10,53% 1 5,26%
Definição de união estável 3 20,00% 4 21,05% 7 36,84% 2 10,53%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 0 0,00% 2 10,53% 0 0,00%
Total 15
100,00%
19
100,00%
19
100,00%
19
100,00%
O SEI
Casamento (idéia geral) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Convivência (convívio, conhecimento do outro)
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Compromisso 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Diz respeito às escolhas e circunstâncias 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33% 0 0,00%
Relativização 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33% 0 0,00%
É namoro 1 20,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Definição de união estável 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 4 80,00% 4
100,00%
1 33,33% 5
100,00%
Total 5
100,00%
4
100,00%
3
100,00%
5
100,00%
258
A maioria dos sujeitos investigados entendem que os direitos daqueles que vivem em
união estável são os afetivos e sentimentais, o que, para alguns, inclui o respeito e a liberdade.
Essa concepção demonstrou-se forte entre os homens e as mulheres casados e separados e
também entre os homens em união estável. As mulheres solteiras e em união estável
compartilham dessa mesma idéia da preponderância dos direitos afetivos em relação aos demais
(especialmente materiais), embora, as primeiras, com percentual muito próximo dos aspectos
materiais, percentuais estes que se igualaram na seleção feita pelas mulheres conviventes. É
interessante notarmos que, embora considerada comumente uma característica feminina, essa
adesão ao plano sentimental foi maior entre os homens casados, em união estável e separados,
com índices de 34,69%, 33,33% e 30,91%, confirmando, respectivamente, tal inclinação.
Ressalta-se que, em sentido inverso, os homens solteiros foram o único grupo no qual os direitos
materiais relacionados especificamente aos bens, seu usufruto e sua divisãosuplantaram os
direitos afetivos ou sentimentais. (tabelas 38 e 39)
Tabela 38: Distribuição das respostas da amostra feminina a respeito dos direitos
dos conviventes.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Os mesmos do casamento 2 3,77% 3 6,67% 3 5,56% 4 8,33%
Bens, seu usufruto e sua divisão 10
18,87%
7 15,56% 2 3,70% 6 12,50%
Bens, seu usufruto e sua divisão quando adquirido pelo
casal
4 7,55% 5 11,11% 11 20,37% 3 6,25%
Direitos previdenciários 6
11,32%
7 15,56% 5 9,26% 6 12,50%
Herança 2 3,77% 2 4,44% 4 7,41% 0 0,00%
Afetivos, sentimentais (inclui respeito e liberdade) 11
20,75%
13 28,89% 11 20,37% 14 29,17%
Comunhão em sentido global (afetiva e material), bens,
vantagens, benefícios
0 0,00% 3 6,67% 3 5,56% 2 4,17%
Direitos civis, cidadania (inclui reconhecimento social) 1 1,89% 0 0,00% 4 7,41% 4 8,33%
Direitos iguais para homem e mulher 1 1,89% 1 2,22% 0 0,00% 0 0,00%
Reconhecimento legal 3 5,66% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Benefícios em geral 4 7,55% 1 2,22% 2 3,70% 0 0,00%
Direitos parentais / Constituir família 2 3,77% 0 0,00% 3 5,56% 1 2,08%
Não respondeu / Não sabe 7
13,21%
3 6,67% 6 11,11% 8 16,67%
Total 53
100,00%
45
100,00%
54
100,00%
48
100,00%
259
Tabela 39: Distribuição das respostas da amostra masculina a respeito dos direitos
dos conviventes.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Os mesmos do casamento 4 7,69% 6 12,24% 6 13,33% 10 18,18%
Bens, seu usufruto e sua divisão 24
46,15%
6 12,24% 8 17,78% 4 7,27%
Bens, seu usufruto e sua divisão quando adquirido pelo
casal
4 7,69% 2 4,08% 2 4,44% 4 7,27%
Direitos previdenciários 7
13,46%
2 4,08% 3 6,67% 6 10,91%
Herança 0 0,00% 1 2,04% 0 0,00% 2 3,64%
Afetivos, sentimentais (inclui respeito e liberdade) 1 1,92% 17 34,69% 15 33,33% 17 30,91%
Comunhão em sentido global (afetiva e material), bens,
vantagens, benefícios
1 1,92% 2 4,08% 0 0,00% 3 5,45%
Direitos civis, cidadania (inclui reconhecimento social) 1 1,92% 2 4,08% 1 2,22% 0 0,00%
Direitos iguais para homem e mulher 0 0,00% 4 8,16% 1 2,22% 0 0,00%
Reconhecimento legal 1 1,92% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Benefícios em geral 2 3,85% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Direitos parentais / Constituir família 4 7,69% 2 4,08% 2 4,44% 5 9,09%
Não respondeu / Não sabe 3 5,77% 5 10,20% 7 15,56% 4 7,27%
Total 52
100,00%
49
100,00%
45
100,00%
55
100,00%
Em consonância com a questão anterior, conforme os sujeitos de todos grupos
investigados, os deveres daqueles que vivem em união estável são os afetivos (tabelas 40 e 41).
Essa declaração foi dada por três quintos das mulheres casadas, e por aproximadamente três
quintos das mulheres em união estável, separadas e solteiras e dos homens casados. Entre os
homens solteiros, em união estável, e separados esse índice sofre um leve decnio embora, ainda
assim, mais da metade dos homens nessas três situões conjugais tenham priorizado o plano
emocional no que tange aos deveres dos companheiros. É interessante notarmos que os homens
separados, seguidos pelos homens casados e em união estável, foram os que mais afirmaram
serem os direitos desses últimos àqueles referentes ao casamento. Observa-se quanto a essa
questão uma diferença em comparação às mulheres nos mesmos estados civis, especialmente
entre os separados. Os homens separados, ainda que com percentual pequeno (15,69%), foram
ainda os que mais apontaram o amparo econômico ao (à) convivente e à prole como um dever
260
daqueles que vivem em união estável, revelando a permanência de expectativas sociais
circulantes no cotidiano ligadas aos papéis masculinos e femininos no relacionamento conjugal.
Uma dessas expectativas está ligada a representação do homem como provedor que, ocupando o
lugar de pai ou chefe” de família precisa assegurar a esse cleo o sustento econômico
necessário. Essa funçãotorna-se por vezes mais nítida para os homens no momento da
separação, em que recaem mais fortemente (até mesmo pela via judicial) sobre eles as obrigões
legais decorrentes de do vínculo conjugal que foi ou está sendo desfeito, sendo essa a razão pela
qual, ao nosso ver, o fator “amparo econômico ao (à) convivente e a prolefoi mais citado pelos
homens separados e não foi citado por nenhum homem solteiro, visto ser da mesma forma
comum que, menos ainda que pelas mulheres solteiras, esse aspecto não chegue sequer a ser
considerado pelos homens em tal situação.
De maneira geral, observa-se por parte dos sujeitos entrevistados uma valorização dos
aspectos sentimentais em detrimento dos materiais no tocante aos direitos e deveres daqueles que
vivem em união estável, embora os homens separados tenham uma consciência maior dos
deveres materiais do que os demais grupos, acreditamos, que em razão de sua própria condição
na qual a clareza tocante às obrigões seja mais freentemente observada. Essa prevalência dos
aspectos sentimentais no que tange aos direitos e deveres dos que vivem em união estável, assim
como a maior consciência dos deveres materiais por parte dos homens separados, ocorre, da
mesma forma como no casamento, conduzindo-nos a supor uma aproximação entre as duas
formas de relação nesse aspecto.
261
Tabela 40: Distribuição das respostas da amostra feminina referente aos deveres
daqueles que vivem em união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Afetivos (emocionais, sentimentais) 25 60,98% 27 60,00% 29 64,44% 28 62,22%
Aqueles referentes ao casamento 3 7,32% 3 6,67% 3 6,67% 1 2,22%
Divisão e manutenção dos bens 0 0,00% 2 4,44% 3 6,67% 2 4,44%
Divisão de despesas / Pagamento de contas 3 7,32% 3 6,67% 3 6,67% 6 13,33%
Amparo econômico ao (à) convivente e à prole 0 0,00% 4 8,89% 1 2,22% 3 6,67%
Legais 0 0,00% 1 2,22% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 10 24,39% 5 11,11% 6 13,33% 5 11,11%
Total 41
100,00%
45
100,00%
45
100,00%
45
100,00%
Tabela 41: Distribuição das respostas da amostra masculina referente aos deveres
daqueles que vivem em união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Afetivos (emocionais, sentimentais) 24 54,55% 26 57,78% 24 55,81% 27 52,94%
Aqueles referentes ao casamento 3 6,82% 5 11,11% 5 11,63% 7 13,73%
Divisão e manutenção dos bens 3 6,82% 2 4,44% 1 2,33% 2 3,92%
Divisão de despesas / Pagamento de contas 4 9,09% 5 11,11% 1 2,33% 4 7,84%
Amparo econômico ao (à) convivente e à prole
3 6,82% 1 2,22% 4 9,30% 8 15,69%
Legais 1 2,27% 1 2,22% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 6 13,64% 5 11,11% 8 18,60% 3 5,88%
Total 44
100,00%
45
100,00%
43
100,00%
51
100,00%
4.3.2.5. O regime de bens na união estável
Quanto ao regime de bens de comunhão parcial de bens que vigora na união estável – o
qual estabelece que, em caso de separação, o patrimônio comum adquirido pelo casal convivente
é dividido em 50%, ficando disponível metade para cada membro do casal a grande maioria dos
262
sujeitos concorda com a divisão do patrimônio prevista em lei, com ênfase das mulheres casadas,
dos homens separados, dos homens casados e das mulheres separadas nessa anuência relativa aos
bens. (tabelas 42 e 43)
Tabela 42: Distribuição da amostra feminina a respeito do regime de bens vigente na
união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 36 94,74% 27 71,05% 30 78,95% 32 84,21% 125 82,24%
Não 2 5,26% 9 23,68% 7 18,42% 5 13,16% 23 15,13%
Não respondeu 0 0,00% 1 2,63% 1 2,63% 1 2,63% 3 1,97%
Depende 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Tabela 43: Distribuição da amostra masculina a respeito do regime de bens vigente
na união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 33 86,84% 30 78,95% 25 65,79% 35 92,11% 123 80,92%
Não 5 13,16% 8 21,05% 13 34,21% 3 7,89% 29 19,08%
A maioria dos sujeitos que concorda com o regime de bens vigente na união estável e sua
divisão, em caso de separação, aia sua conformidade ao que está previsto em lei na premissa da
construção conjunta e na noção de justiça. Tais argumentos foram utilizados conjuntamente por
todos os grupos, com, respectivamente, os seguintes índices: mulheres solteiras, 36,84% e
23,68%; homens solteiros, 38,71% e 29,03%; mulheres casadas, 46,51% e 20,93%; homens
casados, 51,61% e 9,68%; mulheres em união estável, 52,94% e 23,53%; homens em união
estável, 45,71% e 22,86%; mulheres separadas, 50% e 23,53% e homens separados, 41,03%,
30,77%. Vale ressaltar que, da mesma forma, as mulheres solteiras (15,79%) e separadas
(14,71%), os homens solteiros (12,90%) e separados (12,82%), as mulheres (8,82%) e os homens
em união estável (8,57%) e os homens casados (6,45%) afirmaram estarem de acordo com a regra
263
jurídica estabelecida para a divisão de bens na união estável em função da associação dessa forma
de relação com o casamento. Ou seja, uma parcela de todos os grupos estudados justifica suas
tomadas de posição referente ao regime de bens e sua repartição através da ancoragem da união
estável no casamento. (tabelas 44 e 45)
Todavia, a não concordância com a regra jurídica tocante à divisão patrimonial vigente na
união estável é justificada por quase 30% das mulheres e dos homens solteiros e por mais da
metade das mulheres em união estável em razão de que, no entendimento dos membros desses
grupos, cada pessoa deve ficar com o que tinha antes da união e com o que conquista
individualmente. Esse entendimento expressa um atravessamento da noção de individualismo
nessa questão, lógica esta que segundo diversos autores marca as sociedades contemporâneas em
vários aspectos da vida cotidiana, inclusive as relões afetivas estando, segundo Jablonski
(1998), fortemente associada à “crise do casamento contemporâneo. (tabelas 44 e 45).
264
Tabela 44: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao
posicionamento adotado frente ao regime de bens na união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
O
Somente em determinadas condições 1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pelos problemas que essa regra pode gerar em
caso de separação
1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Cada um deve ficar com o que tinha antes da
união / com o que conquista
2 28,57% 0 0,00% 5 55,56% 1 25,00%
O patrimônio pode não ser conjunto 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 25,00%
Somente se fossem casados 0 0,00% 0 0,00% 1 11,11% 1 25,00%
Porque a união estável não é um casamento 1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É arbitrário, imposto 0 0,00% 0 0,00% 2 22,22% 0 0,00%
Referente ao que o casal adquiriu as a
relação
0 0,00% 1 50,00% 0 0,00% 1 25,00%
Cada caso deve ser avaliado individualmente 1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Equívocos em casos de namoro, poucos meses
0 0,00% 1 50,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 1 14,29% 0 0,00% 1 11,11% 0 0,00%
Total 7
100,00%
2
100,00%
9
100,00%
4
100,00%
SIM
Ambos podem ter independência financeira 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Justo / Ninguém é prejudicado / É o certo 9 23,68% 9 20,93% 8 23,53% 8 23,53%
Os direitos são iguais 3 7,89% 4 9,30% 0 0,00% 4 11,76%
Se ambos contribuíram (premissa da
construção conjunta)
14 36,84% 20 46,51% 18 52,94% 17 50,00%
União estável é igual (próxima, assemelhada)
ao casamento
6 15,79% 4 9,30% 3 8,82% 5 14,71%
Se ambos concordarem 2 5,26% 1 2,33% 1 2,94% 0 0,00%
Cada caso deve ser avaliado individualmente 0 0,00% 0 0,00% 1 2,94% 0 0,00%
É a Lei 0 0,00% 2 4,65% 0 0,00% 0 0,00%
Coerente, se ambos estiverem juntos por
determinado tempo
2 5,26% 3 6,98% 0 0,00% 0 0,00%
Tanto faz, o dinheiro é o de menos 0 0,00% 0 0,00% 1 2,94% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 1 2,63% 0 0,00% 2 5,88% 0 0,00%
Total
38
100,00%
43
100,00%
34
100,00%
34
100,00%
NÃO RESPONDEU
1
100,00%
0 0,00% 2
100,00%
1
100,00%
Total
1
100,00%
0 0,00% 2
100,00%
1
100,00%
265
Tabela 45: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao
posicionamento adotado frente ao regime de bens na união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
O
Somente em determinadas condições
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ambos podem ter independência financeira
0 0,00% 0 0,00% 1 14,29% 0 0,00%
Pelo valor dado nos bens
1 6,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pelos problemas que essa regra pode gerar em caso
de separação
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Casal pode não estar pronto para isso
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33%
Pela burocracia
1 6,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Cada um deve ficar com o que tinha antes da união
/ com o que conquista
4 26,67% 0 0,00% 1 14,29% 0 0,00%
O patrimônio pode não ser conjunto
0 0,00% 0 0,00% 2 28,57% 1 33,33%
Somente se fossem casados
0 0,00% 1 20,00% 0 0,00% 1 33,33%
Porque a união estável não é um casamento
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É arbitrário, imposto
1 6,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Deve ser consensual
0 0,00% 0 0,00% 1 14,29% 0 0,00%
Promove uniões por interesse
1 6,67% 1 20,00% 0 0,00% 0 0,00%
Se ambos contribuíram (premissa da construção
conjunta)
1 6,67% 0 0,00% 2 28,57% 0 0,00%
Referente ao que o casal adquiriu as a relação
2 13,33% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Se ambos concordarem
1 6,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Cada caso deve ser avaliado individualmente
3 20,00% 2 40,00% 0 0,00% 0 0,00%
Equívocos em casos de namoro, poucos meses
0 0,00% 1 20,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
15
100,00%
5
100,00%
7
100,00%
3
100,00%
SIM
Ambos podem ter independência financeira
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Cada um deve ficar com o que conquista
1 3,23% 0 0,00% 1 2,86% 0 0,00%
Justo / Ninguém é prejudicado / É o certo
9 29,03% 3 9,68% 8 22,86% 12 30,77%
Os direitos são iguais
1 3,23% 2 6,45% 1 2,86% 0 0,00%
Se ambos contribuíram (premissa da construção
conjunta)
12 38,71% 16 51,61% 16 45,71% 16 41,03%
Referente ao que o casal adquiriu as a relação
0 0,00% 2 6,45% 0 0,00% 2 5,13%
União estável é igual (próxima, assemelhada) ao
casamento
4 12,90% 2 6,45% 3 8,57% 5 12,82%
Se ambos concordarem
2 6,45% 0 0,00% 1 2,86% 0 0,00%
Cada caso deve ser avaliado individualmente
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É a Lei
0 0,00% 1 3,23% 2 5,71% 2 5,13%
Coerente, se ambos estiverem juntos por
determinado tempo
2 6,45% 4 12,90% 0 0,00% 2 5,13%
Tanto faz, o dinheiro é o de menos
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe
0 0,00% 1 3,23% 3 8,57% 0 0,00%
Total
31
100,00%
31
100,00%
35
100,00%
39
100,00%
266
4.3.2.6. O contrato constitutivo de união estável
A possibilidade de feitura em cartório de um contrato constitutivo de união estável é um
fato conhecido por 65,79% dos homens casados e 60,53% das mulheres no mesmo estado civil.
Esse último índice foi encontrado também entre aquelas que vivem em união estável que, assim
como mais da metade dos homens que vivem essa modalidade de relação, afirmaram ter
informação sobre essa possibilidade de formalização da relação em cartório. O grupo dos
solteiros é aquele em que se observa um menor grau de conhecimento a esse respeito, embora
essa falta de informação tenha sido declarada por quase 60% das mulheres e um pouco mais da
metade dos homens em tal condição. Os homens casados e as mulheres separadas são os que mais
sabem a respeito do contrato constitutivo de união estável, tendo mais de três quintos dos sujeitos
em ambas as condições declarado conhecer a existência desse instrumento oficial facultativo ao
casal convivente. (tabelas 46 e 47)
Tabela 46: Distribuição da amostra feminina referente ao conhecimento a respeito
da existência do contrato constitutivo de união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 23 60,53% 23 60,53% 16 42,11% 26 68,42% 88 57,89%
Não 15 39,47% 15 39,47% 22 57,89% 12 31,58% 64 42,11%
Tabela 47: Distribuição da amostra masculina referente ao conhecimento a respeito
da existência do contrato constitutivo de união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 25 65,79% 21 55,26% 18 47,37% 23 60,53% 87 57,24%
Não 13 34,21% 16 42,11% 20 52,63% 15 39,47% 64 42,11%
Não respondeu 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Dentre aqueles que não têm informação a respeito da possibilidade de feitura do contrato
constitutivo de união estável
, os solteiros de ambos os sexos são os que mais consideram positivo
267
tal dispositivo, tendo os índices relativos a essa valoração sido 65, 22%, entre as mulheres, e
60%, entre os homens nesse estado civil. Inversamente, os homens separados são os que mais se
posicionaram de maneira contrária a esse aspecto legal facultativo aos conviventes, tendo mais de
dois quintos deles compartilhado desse entendimento. Consideramos importante ressaltar que,
entre as mulheres em união estável não houve nenhuma discordância relativa ao contrato, tendo
sido esse o único grupo em que se observa total ausência total nos índices referentes a essa
categoria. (tabelas 48 e 49)
É interessante notarmos ainda que a defesa da consensualidade entre os membros do casal
convivente no que tange a feitura do contrato de união estável prevalece nos casados de ambos os
sexos e nos homens separados, entre os que conhecem a possibilidade legal de feitura do contrato
e, nas mulheres separadas, entre os que a desconhecem. (tabelas 48 e 49)
A maioria dos sujeitos que sabem da existência do contrato constitutivo de união estável
qualifica essa possibilidade positivamente. Essa adjetivação positiva obteve maior índice entre os
homens solteiros (72,22%) e sofreu um decréscimo expressivo entre os homens casados, dos
quais 33,33% consideram tal contrato como algo justificável somente se for feito de comum
acordo entre os membros do casal. E, 22,22% não concordam com esse dispositivo por considerá-
lo negativo na medida em que é visto como desnecessário, podendo esta formalização específica
ser ainda incômoda e inconveniente a um dos integrantes da díade conjugal e, por conseguinte, à
relação marital. Esse entendimento da necessidade do contrato ser facultativo aos conviventes e
assim é, conforme a Lei que regula a união estável e não uma imposição legal é uma idéia
compartilhada também por 30,43% das mulheres em união estável e por 22, 73% dos homens
separados. (tabelas 48 e 49)
A reflexão acima descrita é coerente com um pensamento existente no senso comum de
que a união estável é uma opção de vida conjugal que, pelo seu caráter informal, deve estar isenta
de interferências externas. De tal forma, o contrato constitutivo de união estável, instrumento
legal que confere a esse arranjo, antes informal, formalidade, é visto como algo positivo cuja
existência, no entanto, deve estar submetida exclusivamente à vontade do casal convivente.
268
Tabela 48: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina a respeito do
contrato constitutivo de união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Bom, ótimo, interessante, positivo, certo,
justo, válido, saudável, útil, legítimo
11 68,75% 16 66,67% 13 56,52% 18 69,23%
Se for de comum acordo entre os
membros do casal (consensual) / escolha
1 6,25% 3 12,50% 7 30,43% 4 15,38%
Concordo em situões específicas /
Aceitável, normal
1 6,25% 1 4,17% 0 0,00% 2 7,69%
Não concordo (desnecessário, incômodo,
inconveniente)
3 18,75% 4 16,67% 1 4,35% 2 7,69%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 0 0,00% 1 4,35% 0 0,00%
Indiferente. 0 0,00% 0 0,00% 1 4,35% 0 0,00%
Total 16
100,00%
24
100,00%
23
100,00%
26
100,00%
O
Bom, ótimo, interessante, positivo, certo,
justo, válido, saudável, útil, legítimo
15 65,22% 4 26,67% 7 46,67% 4 28,57%
Se for de comum acordo entre os
membros do casal (consensual) / escolha
1 4,35% 2 13,33% 3 20,00% 4 28,57%
Concordo em situões específicas /
Aceitável, normal
2 8,70% 2 13,33% 1 6,67% 2 14,29%
Não concordo (desnecessário, incômodo,
inconveniente)
1 4,35% 0 0,00% 0 0,00% 3 21,43%
Não respondeu / Não sabe 4 17,39% 7 46,67% 4 26,67% 1 7,14%
Total 23
100,00%
15
100,00%
15
100,00%
14
100,00%
269
Tabela 49: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina a respeito
do contrato constitutivo de união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Bom, ótimo, interessante, positivo, certo,
justo, válido, saudável, útil, legítimo
13 72,22% 10 37,04% 13 65,00% 13 59,09%
Se for de comum acordo entre os
membros do casal (consensual) / escolha
1 5,56% 9 33,33% 2 10,00% 5 22,73%
Concordo em situões específicas /
Aceitável, normal
1 5,56% 2 7,41% 2 10,00% 2 9,09%
Não concordo (desnecessário, incômodo,
inconveniente)
2 11,11% 6 22,22% 3 15,00% 2 9,09%
Não respondeu / Não sabe
1 5,56% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Indiferente.
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total 18
100,00%
27
100,00%
20
100,00%
22
100,00%
O
Bom, ótimo, interessante, positivo, certo,
justo, válido, saudável, útil, legítimo
12 60,00% 6 50,00% 7 41,18% 3 25,00%
Se for de comum acordo entre os
membros do casal (consensual) / escolha
1 5,00% 2 16,67% 3 17,65% 1 8,33%
Concordo em situões específicas /
Aceitável, normal
0 0,00% 0 0,00% 1 5,88% 1 8,33%
Não concordo (desnecessário, incômodo,
inconveniente)
3 15,00% 2 16,67% 2 11,76% 5 41,67%
Não respondeu / Não sabe
4 20,00% 1 8,33% 3 17,65% 2 16,67%
Indiferente.
0 0,00% 1 8,33% 1 5,88% 0 0,00%
Total 20
100,00%
12
100,00%
17
100,00%
12
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00%
Total
0 0,00% 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00%
4.3.2.7. A conversão da união estável em casamento
A facilitação legal para a conversão da união estável em casamento é um aspecto
conhecido por metade das mulheres que vivem em união estável e mais da metade dos homens e
mulheres em todas as situões conjugais investigadas, exceto entre os solteiros de ambos os
sexos, entre os quais, inversamente, mais de 50% o desconhece, como demonstra as tabelas 50 e
51.
270
Tabela 50: Distribuição da amostra feminina frente a possibilidade de conversão da
união estável em casamento.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 20 52,63% 19 50,00% 17 44,74% 20 52,63% 76 50,00%
Não 18 47,37% 19 50,00% 21 55,26% 18 47,37% 76 50,00%
Tabela 51: Distribuição da amostra masculina frente a possibilidade de conversão da
união estável em casamento.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 21 55,26% 20 52,63% 18 47,37% 21 55,26% 80 52,63%
Não 17 44,74% 18 47,37% 20 52,63% 17 44,74% 72 47,37%
A facilitação prevista em lei para a conversão da união estável em casamento é
considerado algo positivo por todos os sujeitos investigados. A maioria dos homens casados, das
mulheres solteiras e dos homens e mulheres separados, que tem informação a respeito dessa
previsão, acrescentam à qualificação positiva desse aspecto que a mesma “depende do casal, ou
seja, tais sujeitos compartilham a idéia de que determinados aspectos legais tocantes à união
estável, mesmo aqueles facilitadores que, com caráter inovador, visam, de acordo com o
entendimento legal, favorecer esse tipo de relação inclusive, como é caso do dispositivo legal em
questão, equiparando-a, de certo modo, ao casamento, são facultativos ao casal de conviventes.
(tabelas 52 e 53)
As tabelas 52 e 53 demonstram ainda que essa concepção do livre arbítrio é encontrada
também entre aqueles sujeitos que declararam não saberem da existência de tal facilitação legal
para a conversão da união estável em casamento, tendo, com índices próximos, as mulheres
solteiras, separadas e casadas e os homens separados citado esse aspecto posteriormente à
atribuição de características positivas à facilidade prevista pela lei que regula a união estável.
271
É interessante notarmos, contudo, que aproximadamente uma parcela pequena dos
homens em união estável (15%) e das mulheres casadas (13,64%) que declararam possuírem
conhecimento sobre o aspecto legal em questão acrescentam à qualificação positiva a ele tecida
sua consideração como seqüência normalda relação de união estável, em uma possível
aproximação desse tipo de relação com o casamento na medida em que, de acordo com essa
concepção, é “normalque uma relação de união estável se torne, com o transcorrer do tempo,
uma relação convencional, de casamento. (tabelas 52 e 53)
Apesar da maioria dos sujeitos considerarem positiva a facilitação legal para conversão da
união estável em casamento alguns grupos não concordam com esse aspecto legal, inclusive por
motivos morais e religiosos. Essa oposição específica aparece entre aqueles que desconhecem tal
previsão jurídica, em dois grupos, na seguinte seência: homens solteiros (23,81%), mulheres
casadas (15%) e separadas (14,29%). Entre os que não possuem informação sobre o aspecto legal
em discussão, surgiram também ausência de respostas relativas ao mesmo por 38,10% dos
homens em união estável, 15,79% das mulheres em união estável e 15% das mulheres casadas.
272
Tabela 52: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra feminina em
relação à possibilidade de conversão da união estável em casamento.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Bom, legal, ótimo, adequado, importante, justo 12 50,00% 13 59,09% 7 35,00% 8 36,36%
Melhor casar 0 0,00% 1 4,55% 0 0,00% 0 0,00%
Ênfase no casamento 2 8,33% 1 4,55% 2 10,00% 3 13,64%
Seqüência normal 0 0,00% 3 13,64% 0 0,00% 1 4,55%
Depende do casal / Escolha 6 25,00% 1 4,55% 3 15,00% 6 27,27%
Facilidades 3 12,50% 2 9,09% 1 5,00% 1 4,55%
Moral, religião / Desnecessário, não vê vantagens,
não concorda
1 4,17% 1 4,55% 5 25,00% 3 13,64%
Não respondeu. 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 0 0,00%
Total 24
100,00%
22
100,00%
20
100,00%
22
100,00%
O
Melhor casar 0 0,00% 0 0,00% 1 5,26% 1 4,76%
Precisa de divulgação 1 3,23% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Bom, legal, ótimo, adequado, importante, justo 9 29,03% 5 25,00% 10 52,63% 10 47,62%
Ênfase no casamento 4 12,90% 2 10,00% 1 5,26% 0 0,00%
Seqüência normal / Possível, faz sentido 3 9,68% 1 5,00% 0 0,00% 0 0,00%
Depende do casal / Escolha 5 16,13% 2 10,00% 1 5,26% 5 23,81%
Facilidades 4 12,90% 4 20,00% 2 10,53% 2 9,52%
Moral, religião / Desnecessário, não vê vantagens,
não concorda
1 3,23% 3 15,00% 1 5,26% 3 14,29%
Não respondeu / Não sabe 4 12,90% 3 15,00% 3 15,79% 0 0,00%
Total 31
100,00%
20
100,00%
19
100,00%
21
100,00%
273
Tabela 53: Distribuição das justificativas fornecidas pela amostra masculina em
relação à possibilidade de conversão da união estável em casamento.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Estranho, melhor casar (União estável é igual a
Concubinato)
1 4,35% 0 0,00% 0 0,00% 2 8,00%
Bom, legal, ótimo, adequado, importante, justo 10 43,48% 12 54,55% 11 55,00% 9 36,00%
Melhor casar 1 4,35% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ênfase no casamento 4 17,39% 1 4,55% 1 5,00% 1 4,00%
Seqüência normal 0 0,00% 1 4,55% 3 15,00% 1 4,00%
Depende do casal / Escolha 2 8,70% 4 18,18% 1 5,00% 5 20,00%
Facilidades 4 17,39% 3 13,64% 0 0,00% 5 20,00%
Moral, religião / Desnecessário, não vê
vantagens, não concorda
1 4,35% 1 4,55% 2 10,00% 2 8,00%
Não respondeu. 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 0 0,00%
Total 23
100,00%
22
100,00%
20
100,00%
25
100,00%
O
Melhor casar 0 0,00% 2 12,50% 0 0,00% 1 5,00%
Precisa de divulgação 0 0,00% 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00%
Bom, legal, ótimo, adequado, importante, justo 10 47,62% 6 37,50% 7 33,33% 8 40,00%
Ênfase no casamento 3 14,29% 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00%
Sequência normal / Possível, faz sentido 0 0,00% 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00%
Depende do casal / Escolha 1 4,76% 1 6,25% 3 14,29% 4 20,00%
Facilidades 1 4,76% 0 0,00% 1 4,76% 3 15,00%
Moral, religião / Desnecessário, não vê
vantagens, não concorda
5 23,81% 1 6,25% 2 9,52% 2 10,00%
Não respondeu / Não sabe 1 4,76% 3 18,75% 8 38,10% 2 10,00%
Total 21
100,00%
16
100,00%
21
100,00%
20
100,00%
274
4.3.2.8. A aproximação da união estável com o casamento ou com o concubinato
Para a grande maioria das mulheres em todas as situões conjugais a união estável está
mais próxima do casamento e, por assim dizerem, distante do concubinato. Esse mesmo
entendimento ocorre entre os homens em união estável, grupo no qual 92,11% dos sujeitos
compartilham dessa aproximação. Embora ainda considerem a união estável mais próxima do
casamento do que do concubinato, essa proximidade entre as duas formas de relação é
progressivamente menor entre os homens separados, casados e solteiros, tendo-se observado
nesses grupos maiores índices de associação entre a união estável e o concubinato. (tabelas 54 e
55)
Tabela 54: Distribuição da amostra feminina referente à aproximação da união
estável ao casamento ou ao concubinato.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casamento
34 89,47% 33 86,84% 36 94,74% 33 86,84% 136 89,47%
Concubinato
3 7,89% 3 7,89% 2 5,26% 5 13,16% 13 8,55%
Os dois
1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Não respondeu
0 0,00% 2 5,26% 0 0,00% 0 0,00% 2 1,32%
Tabela 55: Distribuição da amostra masculina referente à aproximação da união
estável ao casamento ou ao concubinato.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Casamento 27 71,05% 35 92,11% 26 68,42% 31 81,58% 119 78,29%
Concubinato 9 23,68% 1 2,63% 12 31,58% 7 18,42% 29 19,08%
Os dois 1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
Não respondeu 1 2,63% 2 5,26% 0 0,00% 0 0,00% 3 1,97%
275
A justificativa dada pela maioria dos sujeitos investigados à associação da união estável
ao casamento baseia-se nos aspectos legais. Essa explicação foi dada por mais de dois quintos das
mulheres em união estável, dos homens solteiros, das mulheres solteiras, dos homens separados,
e por aproximadamente 30% dos homens em união estável, das mulheres separadas e casadas e
dos homens casados, nessa seência. Da mesma forma, metade das mulheres solteiras que
consideram a união estável próxima do concubinato utilizam o referencial jurídico como base de
suas concepções. Entretanto, nessa associação sobressaem-se os aspectos morais explicitados nas
explicações dadas à mesma pelos sujeitos. Essa referência foi maior entre as mulheres casadas e
em união estável, tendo todas feito menção a esse aspecto, entre os homens casados, dos quais
quase 90% a utilizaram, e também entre os homens separados (57,14%) e solteiros (30,77%).
É interessante notarmos que, aproximadamente, 31% dos homens solteiros argumentam a
aproximação da união estável com o concubinato, primeiramente, em virtude de razões morais e
religiosas, tendo pouco mais de um quinto acrescentado posteriormente a tais motivos a idéias
que “é preciso formalidades, em uma clara menção ao casamento tradicional. Ou seja, nessa
lógica motivos religiosos e morais impedem que uma relação informal como a união estável
possa ser considerada como casamento. Para que assim o seja “é preciso formalidadespicas do
casamento capazes de atender a valores presentes nas representões sociais construídas por
determinados grupos em torno da vida em comum. Nessa mesma lógica o casamento é
representado como único meio possível de conjugalidade, uma vez que atende por via destas
formalidades a simbologias presentes em um imaginário construído a respeito das relões
conjugais. Parece haver, nesse entendimento, duas representões em torno da vida em comum
que, de certo modo, se confrontam: casamento e união estável.
276
Tabela 56: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina em relação à
aproximação da união estável ao casamento ou ao concubinato.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
CASAMENTO
Aspectos legais / Deficiência da Lei 16 42,11% 11 28,95% 15 45,45% 11 33,33%
É igual, próxima, assemelhada ao casamento 5 13,16% 11 28,95% 5 15,15% 8 24,24%
Sentimento do casal de estar casado, seriedade,
compromisso, amor, respeito, estabilidade /
Comunhão de vida
3 7,89% 5 13,16% 1 3,03% 3 9,09%
Morar junto, conviver 3 7,89% 3 7,89% 1 3,03% 0 0,00%
Família 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 1 3,03%
Moral, religião 2 5,26% 0 0,00% 1 3,03% 1 3,03%
É preciso formalidades / Tradição, simbologia
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Mudanças sociais 1 2,63% 0 0,00% 2 6,06% 2 6,06%
Noção correta do termo concubinato
1 2,63% 1 2,63% 1 3,03% 3 9,09%
Noção errônea do termo concubinato
2 5,26% 1 2,63% 1 3,03% 0 0,00%
Não sabe qual a diferença entre casamento e
concubinato
1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É aceitável como um passo para se chegar ao
casamento
1 2,63% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação 0 0,00% 4 10,53% 2 6,06% 2 6,06%
Não respondeu / Não sabe 3 7,89% 1 2,63% 4 12,12% 2 6,06%
Total
38
100,00%
38
100,00%
33
100,00%
33
100,00%
CONCUBINATO
Aspectos legais / Deficiência da Lei 1 50,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É igual, próxima, assemelhada ao casamento 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Morar junto, conviver 1 50,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Moral, religião 0 0,00% 3
100,00%
3
100,00%
1 20,00%
É preciso formalidades / Tradição, simbologia
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 20,00%
Noção errônea do termo concubinato
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 40,00%
Não sabe. 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
2
100,00%
3
100,00%
3
100,00%
5
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 1
100,00%
2
100,00%
0 0,00%
Total
0 0,00% 1
100,00%
2
100,00%
0 0,00%
277
Tabela 57: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina em relação à
aproximação da união estável ao casamento ou ao concubinato.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
CASAMENTO
Aspectos legais / Deficiência da Lei 13 44,83% 8 27,59% 7 17,07% 15 40,54%
É igual, próxima, assemelhada ao casamento
5 17,24% 6 20,69% 13 31,71% 9 24,32%
Sentimento do casal de estar casado,
seriedade, compromisso, amor, respeito,
estabilidade / Comunhão de vida
4 13,79% 5 17,24% 8 19,51% 6 16,22%
Morar junto, conviver 0 0,00% 1 3,45% 3 7,32% 2 5,41%
Família 0 0,00% 0 0,00% 1 2,44% 0 0,00%
Moral, religião 1 3,45% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,70%
É preciso formalidades / Tradição,
simbologia
1 3,45% 2 6,90% 0 0,00% 0 0,00%
Mudanças sociais 0 0,00% 0 0,00% 3 7,32% 0 0,00%
Noção correta do termo concubinato 0 0,00% 0 0,00% 1 2,44% 1 2,70%
Noção errônea do termo concubinato 2 6,90% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,70%
Não sabe qual a diferença entre casamento e
concubinato
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É aceitável como um passo para se chegar ao
casamento
1 3,45% 2 6,90% 0 0,00% 2 5,41%
Ponderação 0 0,00% 2 6,90% 1 2,44% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 2 6,90% 3 10,34% 4 9,76% 0 0,00%
Total
29
100,00%
29
100,00%
41
100,00%
37
100,00%
CONCUBINATO
Aspectos legais / Deficiência da Lei 2 15,38% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
É igual, próxima, assemelhada ao casamento
2 15,38% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Morar junto, conviver 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Moral, religião 4 30,77% 8 88,89% 0 0,00% 4 57,14%
É preciso formalidades / Tradição,
simbologia
3 23,08% 0 0,00% 0 0,00% 2 28,57%
Noção errônea do termo concubinato 1 7,69% 0 0,00% 0 0,00% 1 14,29%
Ponderação 0 0,00% 1 11,11% 1
100,00%
0 0,00%
Não sabe. 1 7,69% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
13
100,00%
9
100,00%
1
100,00%
7
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 2
100,00%
2
100,00%
0 0,00%
Total
0 0,00% 2
100,00%
2
100,00%
0 0,00%
278
4.3.2.9. As diferenças entre viver junto e ser casado oficialmente
Quando questionados a respeito da existência de alguma diferença entre viver junto e ser
casado oficialmente a maioria dos sujeitos afirmaram não haver distinção entre as duas formas de
relação. Essa equivalência foi apontada principalmente pelos homens separados e em união
estável, tendo aproximadamente quatro quintos deles assim declarado, e pelas mulheres em
ambas situões conjugais, das quais mais de 70% se posicionaram da mesma forma. Essa
tendência é menor entre os casados de ambos os sexos, principalmente entre os homens, visto que
apenas um pouco mais da metade deles entende a equiparação entre a união estável e a forma de
relação em que vivem, ou seja, o casamento. Da mesma forma, essa similitude é apontada por
três quintos das mulheres casadas. (tabelas 58 e 59 )
Tabela 58: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra feminina em
relação ao questionamento quanto às possíveis diferenças existentes entre viver junto e ser
casado oficialmente.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 13 34,21% 10 26,32% 11 28,95% 10 26,32% 44 28,95%
Não 23 60,53% 28 73,68% 26 68,42% 28 73,68% 105 69,08%
Não respondeu 2 5,26% 0 0,00% 1 2,63% 0 0,00% 3 1,97%
Tabela 59: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra masculina em
relação ao questionamento quanto às possíveis diferenças existentes entre viver junto e ser
casado oficialmente.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 18 47,37% 8 21,05% 14 36,84% 7 18,42% 47 30,92%
Não 20 52,63% 30 78,95% 24 63,16% 31 81,58% 105 69,08%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
279
Dentre os que consideram haver diferenças na vivência de ambas as formas de relação à
formalização foi o principal aspecto citado por aproximadamente dois quintos das mulheres
solteiras e por dois quintos dos homens em união estável, tendo sido este o índice de mulheres
separadas que consideraram os aspectos legais como a diferença central entre estar casado e
viver junto. Os referidos aspectos ocupam o primeiro lugar também entre os homens solteiros,
juntamente com a oficialização, com 25% de respostas para cada categoria. Os homens e
mulheres casados consideram que a dita diferença diz respeito às garantias legais por eles
atribuídas exclusiva ou prioritariamente à sua condição, de casados. As mulheres em união
estável e os homens separados (33,33%) alocam essa desigualdade no reconhecimento social
subtraído dos conviventes e obtido, em maior proporção, pelos casados. (tabelas 60 e 61)
Tabela 60: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina às diferenças
afirmadas entre viver junto e ser casado oficialmente.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
Garantias / Indica a falta de garantia na união
estável - durabilidade, compromisso, etc
1 8,33% 5 38,46% 1 11,11% 0 0,00%
Aspectos jurídicos, legais 1 8,33% 1 7,69% 1 11,11% 1 6,67%
Formalização (oficialização): papéis, burocracia,
nome, sobrenome, aliança
5 41,67% 4 30,77% 1 11,11% 6 40,00%
Religião / Ritual, cerimônia / Simbologia 2 16,67% 1 7,69% 0 0,00% 4 26,67%
Reconhecimento social / Reconhecimento familiar 2 16,67% 1 7,69% 3 33,33% 3 20,00%
Reconhecimento social ou questões pessoais 0 0,00% 0 0,00% 1 11,11% 0 0,00%
Questões pessoais, sentimentos, crenças, opiniões 1 8,33% 1 7,69% 2 22,22% 1 6,67%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total 12
100,00%
13
100,00%
9
100,00%
15
100,00%
280
Tabela 61: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina às
diferenças afirmadas entre viver junto e ser casado oficialmente.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
Garantias / Indica a falta de garantia na união
estável - durabilidade, compromisso, etc
3 18,75% 6 28,57% 1 10,00% 2 22,22%
Aspectos jurídicos, legais 4 25,00% 5 23,81% 2 20,00% 0 0,00%
Formalização (oficialização): papéis,
burocracia, nome, sobrenome, aliança
4 25,00% 3 14,29% 4 40,00% 2 22,22%
Religião / Ritual, cerimônia / Simbologia 2 12,50% 1 4,76% 1 10,00% 1 11,11%
Reconhecimento social / Reconhecimento
familiar
2 12,50% 3 14,29% 1 10,00% 3 33,33%
Reconhecimento social ou questões pessoais 0 0,00% 0 0,00% 1 10,00% 0 0,00%
Questões pessoais, sentimentos, crenças, opiniões
0 0,00% 3 14,29% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu 1 6,25% 0 0,00% 0 0,00% 1 11,11%
Total 16
100,00%
21
100,00%
10
100,00%
9
100,00%
4.3.2.10. Os termos aplicáveis àqueles que vivem em união estável
Segundo as mulheres em todas as situões conjugais os principais termos que se aplicam
a alguém que vive em união estável são: companheiro (a), marido ou mulher, parceiro e
esposo(a). É interessante notarmos que o grupo das solteiras foi o que menos assinalou a
expressão consorte, possivelmente em razão deste o grupo etário mais jovem. Esta foi a
expressão com menor índice de ocorrência em todos os grupos investigados. Os dados obtidos
revelam que, apesar de algumas variações, não houve entre as mulheres grandes diferenças
quanto à situação conjugal no tocante a nomeação daqueles que vivem em união estável. (tabelas
62 e 63)
Os homens nos diversos estados civis investigados, assim como as mulheres, apontaram a
expressão companheiro (a) como o primeiro termo designativo daqueles que vivem em união
estável, devendo-se ressaltar, contudo, que entre os separados os termos marido ou mulher
tiveram o mesmo número de assinalões, também ocupando, dessa forma, o primeiro lugar.
Observa-se ainda algumas variões no que se refere aos outros termos em função da situação
281
conjugal. Conforme os homens casados, e em união estável, a segunda palavra associada aos que
vivem em união estável é marido ou mulher. Já para os solteiros, o termo indicativo é parceiro(a)
e para os separados é esposo(a). No que se refere à terceira expressão atribuída aos conviventes,
encontramos grande variabilidade. De acordo com os casados, cônjuge é a palavra atribuída aos
mesmos. Segundo os que vivem em união estável a expressão indicada, em terceiro lugar, é
esposo(a). Entretanto os solteiros
, apontaram o termo marido ou mulher como designativo dos
companheiros e, os separados, os nomearam como parceiro (a). A quarta posição foi ocupada
pelo termo parceiro, entre os que vivem em união estável e entre os casados, e pelos termos
esposo e cônjuge, entre os solteiros, tendo este último termo sido citado também pelos separados.
(tabelas 62 e 63)
É importante ressaltarmos que, em relação à comparação entre homens e mulheres, nota-
se uma predominância bastante maior dos homens no que se refere ao uso das expressões
concubino, antiga denominação legal dada aos que estabeleciam a vida conjugal sem
oficialização. Essa diferença percentual entre os dois sexos permanece expressiva em relação ao
uso da palavra namorado (a) na associação com aqueles que vivem em união estável, na medida
em que esse termo foi indicado por 8% dos homens e somente 4% das mulheres,
aproximadamente. Ainda mantendo essa distinção de gênero, os companheiros são designados
pelos homens como consortes em uma proporção bastante maior do que pelas mulheres. Da
mesma forma, mais do que as mulheres, estes apontam os conviventes como esposo(a).
282
Tabela 62: Distribuição das respostas da amostra feminina em relação aos termos
considerados aplicáveis a alguém que vive em união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Convivente 12 7,95% 9 5,73% 9 6,47% 10 6,02% 40 6,53%
Marido ou Mulher 22 14,57% 30 19,11% 26 18,71% 31 18,67% 109 17,78%
Amigo(a) 9 5,96% 12 7,64% 4 2,88% 6 3,61% 31 5,06%
Amante 14 9,27% 8 5,10% 9 6,47% 7 4,22% 38 6,20%
Esposo(a) 16 10,60% 16 10,19% 14 10,07% 19 11,45% 65 10,60%
Companheiro(a) 29 19,21% 35 22,29% 32 23,02% 32 19,28% 128 20,88%
Cônjuge 15 9,93% 18 11,46% 13 9,35% 22 13,25% 68 11,09%
Concubino(a) 5 3,31% 1 0,64% 3 2,16% 7 4,22% 16 2,61%
Parceiro(a) 18 11,92% 18 11,46% 18 12,95% 22 13,25% 76 12,40%
Namorado(a) 7 4,64% 6 3,82% 10 7,19% 3 1,81% 26 4,24%
Consorte 3 1,99% 2 1,27% 0 0,00% 7 4,22% 12 1,96%
Outro 0 0,00% 2 1,27% 0 0,00% 0 0,00% 2 0,33%
Não respondeu 1 0,66% 0 0,00% 1 0,72% 0 0,00% 2 0,33%
Total 151
100,00%
157 100,00% 139 100,00% 166
100,00%
613
100,00%
283
Tabela 63: Distribuição das respostas da amostra masculina em relação aos termos
considerados aplicáveis a alguém que vive em união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Convivente 8 5,00% 8 4,82% 14 7,25% 8 5,63% 38 5,75%
Marido ou Mulher 26 16,25% 29 17,47% 23 11,92% 27 19,01% 105 15,89%
Amigo(a) 10 6,25% 10 6,02% 10 5,18% 5 3,52% 35 5,30%
Amante 8 5,00% 10 6,02% 10 5,18% 4 2,82% 32 4,84%
Esposo(a) 18 11,25% 21 12,65% 20 10,36% 21 14,79% 80 12,10%
Companheiro(a) 32 20,00% 30 18,07% 33 17,10% 27 19,01% 122 18,46%
Cônjuge 20 12,50% 18 10,84% 20 10,36% 14 9,86% 72 10,89%
Concubino(a) 8 5,00% 2 1,20% 11 5,70% 8 5,63% 29 4,39%
Parceiro(a) 19 11,88% 18 10,84% 26 13,47% 16 11,27% 79 11,95%
Namorado(a) 8 5,00% 13 7,83% 17 8,81% 6 4,23% 44 6,66%
Consorte 3 1,88% 6 3,61% 5 2,59% 4 2,82% 18 2,72%
Outro 0 0,00% 1 0,60% 4 2,07% 2 1,41% 7 1,06%
Total 160
100,00%
166 100,00% 193 100,00% 142
100,00%
661
100,00%
4.3.2.11. O posicionamento frente à união estável
A maioria dos sujeitos de todos os grupos investigados se posicionam de maneira
favorável ao reconhecimento jurídico da união estável e, conseentemente aos seus efeitos
jurídicos (direitos e deveres). Essa favorabilidade é encontrada principalmente entre aqueles que
optaram por esse arranjo, ou seja, os que vivem em união estável. Desses, aproximadamente
quatro quintos dos homens e mulheres são a favor da legalização e suas conseqüências. O
segundo índice mais alto é observado entre as mulheres separadas, das quais 71% são propícias à
regulamentação jurídica da união estável. Os homens separados (15,79%) e as mulheres solteiras
(13,16%) são os que menos concordam com esse fato jurídico novo e, os homens solteiros
(26,32%) e separados (23,68%), os que são mais indiferentes ao mesmo.
284
Tabela 64: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra feminina frente ao
reconhecimento jurídico da união estável e suas implicações (direitos e deveres).
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % F % f % f %
A favor 26
68,42%
31 81,58% 23 60,53% 27 71,05% 107 70,39%
Contra 3
7,89%
2 5,26% 5 13,16% 3 7,89% 13 8,55%
Indiferente 8
21,05%
5 13,16% 8 21,05% 8 21,05% 29 19,08%
Não respondeu 1
2,63%
0 0,00% 2 5,26% 0 0,00% 3 1,97%
Tabela 65: Distribuição do posicionamento adotado pela amostra masculina frente
ao reconhecimento jurídico da união estável e suas implicações (direitos e deveres).
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % F % f % f %
A favor 25
65,79%
30 78,95% 24 63,16% 23 60,53% 102 67,11%
Contra 4
10,53%
2 5,26% 4 10,53% 6 15,79% 16 10,53%
Indiferente 8
21,05%
6 15,79% 10 26,32% 9 23,68% 33 21,71%
Não respondeu 1
2,63%
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 0,66%
De acordo com as declarações de 36,36% das mulheres solteiras que se posicionaram
favoravelmente em relão ao reconhecimento jurídico da união estável sua avaliação positiva se
deve ao fato desse fato jurídico novo estar de acordo com as mudanças sociais. Além desse
aspecto, 13,64% das mulheres nessa condição afirmam que o importante, nesse tipo de questão,
são os sentimentos e não a formalidade e, o mesmo percentual, 13,64%, se reporta aos benefícios
legais que essa nova realidade passou a gerar. Assim como as mulheres, os homens solteiros
citam como primeira justificativa de suas tomadas de posição em relação ao reconhecimento
jurídico da união estável o fato desse feito acompanhar as mudanças sociais (22,22%), em
conjunto com benefícios legais (18,52%) gerados pelo mesmo. A equiparação da união estável ao
casamento (14,81%) é citada em terceiro lugar nessa argumentação favorável à legalização desse
arranjo conjugal. (tabelas 66 e 67)
285
As mulheres casadas declaram que os benefícios legais são o primeiro motivo de sua
concordância (32,14%) com o reconhecimento jurídico da união estável seguidos pelo fato deste
ser condizente com as mudanças sociais (14,29%) e, da reafirmação que, em se tratando desse
tipo de relação, o que importa são os sentimentos e não a formalidade (10,71%). Esse grupo faz
ainda, com o mesmo índice anterior, referência ao tempo de convivência como um elemento
importante a ser consideração nessa avaliação tocante à relação de união estável. Os homens
casados apontam os benefícios legais como a razão primeira de seus julgamentos (33,33%)
considerando subseqüentemente nessa avalião, com os mesmos índices (8,33%), o tempo de
convivência, o fato do casal que vive em união estável ter um projeto de vida”, a coerência da
oficialização com as mudanças sociais e a equiparação da união estável ao casamento.
As mulheres em união estável explicam a favorabilidade assumida frente ao
reconhecimento jurídico da união estável apontando os benefícios legais como base de sua
avaliação (40%). Segundo quase 27% delas esse fato jurídico novo está de acordo com as
mudanças sociais e, nessa reflexão, 10% o equiparam ao casamento. Os homens nessa situação
conjugal ancoram seu posicionamento em relação à oficialização nos benefícios legais (34,48%)
e no entendimento de que a mesma é coerente com as transformões sociais (10,34%).
As mulheres separadas elegem os benefícios legais como justificativa primeira de sua
adesão ao reconhecimento jurídico da união estável (26,67%). Em seguida esse grupo cita a
coerência entre a legalização e as transformões sociais (20%) e a diminuição da burocracia
(10%) como base de seu posicionamento. A importância dada aos benefícios legais, decorrentes
da legalização, aspecto citado por todos os grupos na avaliação favorável referente ao
reconhecimento jurídico da união estável, foi reiterado por aproximadamente 30% dos homens
separados. Em suas respostas eles equiparam a união estável ao casamento (17,39%) e
consideram justo o tratamento dado à mesma pelo novo Código Civil promulgado em 2002
(13%).
Dentre os que manifestaram posição contrária ao reconhecimento jurídico da união
estável os homens solteiros justificam sua oposição com base em motivos morais e naqueles
286
oriundos da tradição. As mulheres solteiras sustentam nesse entendimento que, quando se trata
desse tipo de vínculo, o importante são os sentimentos, e não a formalidade (33,33%).
Os homens casados que se declararam contra o reconhecimento jurídico da união estável,
assim o fizeram por razões morais e de tradição (66,67%) e também por considerarem a
oficialização uma imposição legal com riscos e conseências para os que vivem esse tipo de
relação (33,33%). As mulheres no mesmo estado civil que assumiram posicionamento contrário à
legalização, fizeram, apesar disso, em suas explicações, a ressalva de que esse fato jurídico
acompanha as mudanças sociais (100%).
As mulheres em união estável que se disseram contrárias à legalização da união estável
não justificaram esse posicionamento, isentando-se em fornecer argumentos que justificassem sua
oposição. Contudo, os homens na mesma situação conjugal que adotaram a mesma posição
contrária ao reconhecimento jurídico, assim como os casados, se reportaram à imposição legal da
oficialização e seus riscos (50%), ressaltando igualmente que no tipo de vínculo em questão o
importante são os sentimentos e não a formalidade (50%).
Os homens separados que adotaram um posicionamento contrário ao reconhecimento
jurídico da união estável aiam seu entendimento nos argumentos morais e oriundos da tradição
(50%), na imposição legal e suas conseências negativas (33,33%) e no fato de, segundo esse
entendimento, a legalização transformar qualquer namoro em união estável (16,67%). As
mulheres separadas aiam seu julgamento contrário em motivos morais/tradicionais (66,67%),
fazendo algumas ponderões a respeito do fato jurídico novo sobre o qual foram questionadas
(33,33%).
As mulheres solteiras que se declaram indiferentes ao reconhecimento jurídico da união
estável sustentam que o importante nessa modalidade de relação são os sentimentos e não a
formalidade (14,29%), acrescentando, uma condicionalidade nessa posição contrária em relação à
legalização expressa na resposta do tipo depende(14,29%). A indiferença manifesta pelos
homens na mesma situação conjugal tem como base o argumento de que, nesse tipo de vínculo o
287
importante são os sentimentos (30%), além da percepção acerca da legalizão da união estável
como algo imposto, que, como tal, traz conseências maléficas aos parcipes da relação (10%).
As mulheres casadas compartilham dos mesmos argumentos fornecidos pelas solteiras na
justificativa de sua indiferença ao fato da união estável ter passado a constituir uma realidade
jurídica com direitos e deveres legais, ou seja, a crença de que nesse tipo de vínculo o importante
são os sentimentos e não a formalidade (25%), nesse grupo com maior ênfase do que entre as
solteiras, e a condicionalidade manifesta na resposta do tipo de “depende” (12,50%).
A prevalência dos sentimentos em relação à formalidade (40%) e o uso da
condicionalidade na reflexão a respeito do próprio posicionamento frente ao reconhecimento
jurídico da união estável (20%) foram os aspectos privilegiados na análise das mulheres em união
estável, tal como fizeram as solteiras e casadas, ao serem solicitadas a adotar uma posição frente
ao arranjo em questão. Nesse grupo foi acrescentada ainda uma ponderação a esse respeito
(20%). Essa ressalva foi feita também por 50% dos homens em união estável na explicação das
razões de sua indiferença ao reconhecimento jurídico da união estável.
As mulheres separadas baseiam sua indiferença em relação ao reconhecimento jurídico da
união estável nos próprios aspectos legais, incluindo nessa visão, uma observação tocante ao
patrimônio (16,67%). Os homens separados limitam-se, nessa reflexão acerca de seu
posicionamento em referência a união estável, a fazerem algumas ponderões nesse sentido.
Deve-se ressaltar que a maioria das mulheres separadas, solteiras e casadas e dos homens casados
que se declararam indiferentes em relação ao reconhecimento jurídico da união estável não
forneceram respostas a esse questionamento. Da mesma forma, metade dos homens casados e em
união estável, e quase metade dos separados se mantiveram nessa isenção. As mulheres em união
estável foram o único grupo que, ao adotarem um posicionamento indiferente em relação à
legalização desse arranjo, mais justificaram suas respostas nesse sentido.
288
Tabela 66: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao
posicionamento adotado em relação ao reconhecimento jurídico da união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % F % f %
A FAVOR
Benefícios legais/Direitos legais 2 9,09% 9 32,14% 8 26,67% 6 20,00%
Justo 1 4,55% 1 3,57% 0 0,00% 2 6,67%
Cidadania (visibilidade social) 0 0,00% 0 0,00% 2 6,67% 1 3,33%
Acompanha as mudanças sociais (está de acordo) 8 36,36% 4 14,29% 8 26,67% 6 20,00%
O importante são os sentimentos e não a formalidade
3 13,64% 3 10,71% 0 0,00% 2 6,67%
Igual ao casamento (próximo) 0 0,00% 2 7,14% 3 10,00% 2 6,67%
Tem um "projeto de vida" 0 0,00% 1 3,57% 1 3,33% 0 0,00%
Possibilidade dos que não tinham dinheiro 2 9,09% 0 0,00% 0 0,00% 2 6,67%
Facilita a relação, união familiar 1 4,55% 1 3,57% 0 0,00% 1 3,33%
Responsabilidades 1 4,55% 1 3,57% 0 0,00% 0 0,00%
Conscientização 0 0,00% 1 3,57% 0 0,00% 0 0,00%
Aspectos legais (benefícios, direitos) 1 4,55% 0 0,00% 4 13,33% 2 6,67%
Menos burocrático 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 3 10,00%
Tempo de convivência 1 4,55% 3 10,71% 1 3,33% 1 3,33%
Elimina o preconceito 0 0,00% 2 7,14% 1 3,33% 0 0,00%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 3,33%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta 2 9,09% 0 0,00% 2 6,67% 1 3,33%
Total
22
100,00%
28
100,00%
30
100,00%
30
100,00%
CONTRA
Imposição legal e suas conseqüências, riscos 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Moral, tradição 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00% 2 66,67%
Acompanha as mudanças sociais (está de acordo) 0 0,00% 2
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
O importante são os sentimentos e não a formalidade
2 33,33% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Transforma qualquer namoro em união estável 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 33,33%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta 1 16,67% 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00%
Total
6
100,00%
2
100,00%
1
100,00%
3
100,00%
INDIFERENTE
O importante são os sentimentos e não a formalidade
1 14,29% 2 25,00% 2 40,00% 0 0,00%
Aspecto legal, legalidade (Patrimônio) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
Depende 1 14,29% 1 12,50% 1 20,00% 0 0,00%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 1 20,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta 5 71,43% 5 62,50% 1 20,00% 5 83,33%
Total
7
100,00%
8
100,00%
5
100,00%
6
100,00%
O RESPONDEU
2
100,00%
1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Total
2
100,00%
1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
289
Tabela 67: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao
posicionamento adotado em relação ao reconhecimento jurídico da união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % F % f %
A FAVOR
Benefícios legais/Direitos legais
5 18,52% 6 25,00% 10 34,48% 7 30,43%
Justo
2 7,41% 1 4,17% 2 6,90% 3 13,04%
Cidadania (visibilidade social)
1 3,70% 1 4,17% 1 3,45% 0 0,00%
Acompanha as mudanças sociais (está de acordo) 6 22,22% 2 8,33% 3 10,34% 1 4,35%
Moral, tradição
2 7,41% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O importante são os sentimentos e não a formalidade
0 0,00% 0 0,00% 2 6,90% 1 4,35%
Igual ao casamento (próximo)
4 14,81% 2 8,33% 3 10,34% 4 17,39%
Tem um "projeto de vida"
0 0,00% 2 8,33% 0 0,00% 0 0,00%
Possibilidade dos que não tinham dinheiro
1 3,70% 1 4,17% 0 0,00% 0 0,00%
Facilita a relação, união familiar
0 0,00% 1 4,17% 0 0,00% 2 8,70%
Responsabilidades
0 0,00% 1 4,17% 0 0,00% 0 0,00%
Conscientização
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Aspectos legais (Benefícios, direitos)
1 3,70% 2 8,33% 0 0,00% 0 0,00%
Menos burocrático
2 7,41% 0 0,00% 0 0,00% 1 4,35%
Tempo de convivência
1 3,70% 2 8,33% 2 6,90% 1 4,35%
Elimina o preconceito
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O mais importante são os sentimentos
0 0,00% 0 0,00% 1 3,45% 0 0,00%
Ponderação
1 3,70% 0 0,00% 0 0,00% 2 8,70%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta
1 3,70% 3 12,50% 5 17,24% 1 4,35%
Total
27
100,00%
24
100,00%
29
100,00%
23
100,00%
CONTRA
Imposição legal e suas conseqüências, riscos
1 25,00% 1 33,33% 1 50,00% 2 33,33%
Moral, tradição
2 50,00% 2 66,67% 0 0,00% 3 50,00%
Acompanha as mudanças sociais (está de acordo) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O importante são os sentimentos e não a formalidade
0 0,00% 0 0,00% 1 50,00% 0 0,00%
Transforma qualquer namoro em união estável
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
Ponderação
1 25,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
4
100,00%
3
100,00%
2
100,00%
6
100,00%
INDIFERENTE
Moral, tradição
0 0,00% 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00%
O importante são os sentimentos e não a formalidade
3 30,00% 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00%
Aspecto legal, legalidade (Patrimônio)
1 10,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Depende
0 0,00% 1 16,67% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação
0 0,00% 0 0,00% 3 50,00% 5 55,56%
Não respondeu / Não sabe / Não afeta
6 60,00% 3 50,00% 3 50,00% 4 44,44%
Total
10
100,00%
6
100,00%
6
100,00%
9
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Total
0 0,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
290
4.3.2.12. A união estável e a extinção do casamento
Segundo a grande maioria dos sujeitos investigados o casamento não acabará com o
advento da união estável. Essa afirmação foi consensual entre homens e mulheres em todas as
situões conjugais consideradas, tendo sido declarada principalmente pelas mulheres solteiras,
visto que nesse grupo todas acreditam na permanência do casamento no cenário social, apesar do
surgimento da união estável como fato jurídico novo. Vale ressaltar que o índice da crença na
perpetuação da existência do casamento é um pouco menor em comparação aos demais grupos,
embora ainda bastante forte entre os homens em união estável e mulheres separadas (89,47%).
Tabela 68: Distribuição da amostra feminina em relação à crença de que, com o
advento da união estável, o casamento irá acabar.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 1 2,63% 2 5,26% 0 0,00% 4 10,53% 7 4,61%
Não 37 97,37% 36 94,74% 38 100,00% 34 89,47% 145 95,39%
Tabela 69: Distribuição da amostra masculina em relação à crença de que, com o
advento da união estável, o casamento irá acabar.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 3 7,89% 4 10,53% 1 2,63% 1 2,63% 9 5,92%
Não 35 92,11% 34 89,47% 37 97,37% 37 97,37% 143 94,08%
Uma vez que a continuidade do casamento, apesar do advento da união estável,
considerada como fato jurídico novo, é consensual entre os sujeitos investigados, mais de dois
quintos dos homens e das mulheres solteiras apontam como razões para a perpetuação do vínculo
formal a tradição e os fatores pessoais, que incluem a escolha, as preferências, os objetivos e os
motivos. As mulheres casadas (17,07%) consideram os últimos como causas dessa permanência,
291
seguidas pela necessidade de oficialização (14,63%) e pelo sonho (12,20%). Os homens casados
acreditam nessa contigüidade por motivos religiosos (16,22%), fatores sociais (13,51%) e, por
último, questões pessoais (10,51%) e mudanças sociais tocantes ao próprio casamento (10,51%).
O casamento é imortalizado pelas mulheres em união estável devido às questões pessoais
(34,29%), aos fatores sociais (11,43%) e, com o mesmo índice, a necessidade de oficialização
(11,43%). Os homens em união estável elegem a tradição (18,92%), os fatores sociais (16,22%) e
a religião (13,51%) como os fatores responsáveis pela não extinção das uniões tradicionais.
Conforme os homens separados esses motivos são o sonho (21,43%), os fatores sociais (19%), as
questões pessoais (11,90%) e a tradição (11,90%). E, de acordo com as mulheres separadas, o
sonho (21,43%), a tradição (19%) e as questões pessoais (16,67%) são as variáveis responsáveis
pela perenização do casamento. Convém ressaltar ainda que a similaridade e a diferença entre a
união estável e o casamento foram fatores pouco citados nessa avaliação feita pelos sujeitos
investigados. Os índices relativos ao primeiro ficaram em torno de 3%, não tendo tal aspecto sido
citado pelas mulheres solteiras e casadas e pelos homens casados. A dessemelhança entre as duas
formas de relação foi apontada por 5,41% dos homens casados e aproximadamente 3% das
mulheres e dos homens em união estável, não tendo sido citados pelos demais grupos.
Os fatores apontados pelos sujeitos como responsáveis pela permanência do casamento
formal nos conduz ao entendimento de que, conforme a argumentação construída pelos membros
dos grupos investigados a esse respeito, fatores pessoais e sociais se misturam na perenização dos
vínculos conjugais formais. O sonho de casar oficialmente pode ser assim compreendido como
resultante de uma construção social em torno do casamento, transmitido através da tradição, de
geração em geração. Nesse processo o romantismo tem um importante papel na medida em que a
forma romantizada de amor exige sua concretização – principalmente por parte das mulheres –,
através do casamento civil e/ou religioso. O mito do amor românticoancora-se no casamento
realizando, através dele, o sonho de felicidade amorosa reiterado através das crenças presentes
nas representações sociais construídas em torno da vida conjugal.
292
Tabela 70: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina ao
entendimento referente à extinção do casamento, a partir do surgimento da união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
O
Tradição 11 25,00% 3 7,32% 3 8,57% 8 19,05%
Fatores sociais 4 9,09% 4 9,76% 4 11,43% 5 11,90%
Questões pessoais (escolha, preferência, objetivos,
motivos)
11 25,00% 7 17,07% 12 34,29% 7 16,67%
Sonho 3 6,82% 5 12,20% 2 5,71% 9 21,43%
Necessidade de oficialização, do registro, do papel,
formalismo
2 4,55% 6 14,63% 4 11,43% 2 4,76%
Necessidade do casal 0 0,00% 1 2,44% 0 0,00% 0 0,00%
Religião 1 2,27% 4 9,76% 1 2,86% 4 9,52%
Família 2 4,55% 2 4,88% 0 0,00% 0 0,00%
Crítica a união estável (desvantagens) 0 0,00% 3 7,32% 1 2,86% 0 0,00%
Ritual 3 6,82% 0 0,00% 2 5,71% 3 7,14%
Simbologia 1 2,27% 1 2,44% 0 0,00% 2 4,76%
Mudanças sociais tocantes ao próprio casamento 4 9,09% 1 2,44% 2 5,71% 1 2,38%
Garantia legal e afetiva 1 2,27% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
União estável como passo para o casamento 1 2,27% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,38%
Pela existência de sentimentos 0 0,00% 1 2,44% 0 0,00% 0 0,00%
São ou serão iguais 0 0,00% 1 2,44% 1 2,86% 0 0,00%
São diferentes 0 0,00% 0 0,00% 1 2,86% 0 0,00%
Não respondeu 0 0,00% 2 4,88% 2 5,71% 0 0,00%
Total
44
100,00%
41
100,00%
35
100,00%
42
100,00%
SIM
Conseqüências maléficas 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Pelas facilidades, vantagens 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 33,33%
Pela mudança de mentalidade dada em relação ao
casamento
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela existência de sentimentos 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
Crítica ao casamento 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
São iguais 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 33,33%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 1
100,00%
0 0,00%
Total
0 0,00% 1
100,00%
1
100,00%
6
100,00%
293
Tabela 71: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina ao
entendimento referente à extinção do casamento, a partir do surgimento da união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
O
Tradição 9 21,43% 3 8,11% 7 18,92% 5 11,90%
Fatores sociais 4 9,52% 5 13,51% 6 16,22% 8 19,05%
Questões pessoais (escolha, preferência, objetivos,
motivos)
9 21,43% 4 10,81% 3 8,11% 5 11,90%
Sonho 2 4,76% 2 5,41% 1 2,70% 9 21,43%
Necessidade de oficialização, do registro, do papel,
formalismo
2 4,76% 1 2,70% 3 8,11% 3 7,14%
Necessidade do casal 1 2,38% 1 2,70% 2 5,41% 3 7,14%
Religião 1 2,38% 6 16,22% 5 13,51% 1 2,38%
Família 1 2,38% 2 5,41% 1 2,70% 2 4,76%
Crítica a união estável (desvantagens) 0 0,00% 0 0,00% 1 2,70% 0 0,00%
Ritual 3 7,14% 0 0,00% 3 8,11% 2 4,76%
Simbologia 0 0,00% 0 0,00% 2 5,41% 2 4,76%
Mudanças sociais tocantes ao próprio casamento 2 4,76% 4 10,81% 0 0,00% 0 0,00%
Garantia legal e afetiva 0 0,00% 1 2,70% 0 0,00% 0 0,00%
União estável como passo para o casamento 2 4,76% 1 2,70% 0 0,00% 0 0,00%
Pela existência de sentimentos 2 4,76% 5 13,51% 0 0,00% 0 0,00%
São ou serão iguais 1 2,38% 0 0,00% 1 2,70% 1 2,38%
São diferentes 0 0,00% 2 5,41% 1 2,70% 0 0,00%
Não respondeu 3 7,14% 0 0,00% 1 2,70% 1 2,38%
Total
42
100,00%
37
100,00%
37
100,00%
42
100,00%
SIM
Conseqüências maléficas 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pelas facilidades, vantagens 1
100,00%
1 33,33% 0 0,00% 0 0,00%
Pela mudança de mentalidade dada em relação ao
casamento
0 0,00% 1 33,33% 1 25,00% 0 0,00%
Pela existência de sentimentos 0 0,00% 1 33,33% 0 0,00% 0 0,00%
Crítica ao casamento 0 0,00% 0 0,00% 3 75,00% 1
100,00%
São iguais 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
1
100,00%
3
100,00%
4
100,00%
1
100,00%
294
4.3.2.13. O privilégio das mulheres conviventes
De acordo com a maioria dos sujeitos avaliados a união estável não beneficia mais a
mulher do que o homem que vive essa modalidade de relação. É importante salientar que foram
as próprias mulheres, nos diferentes estados civis, e os homens solteiros aqueles que mais
negaram essa unilateralidade legal, afirmada algumas vezes pelo senso comum, ficando os
índices relativos a essa posição superiores a 70%. Os homens casados são os que mais aderem à
idéia do maior proveito feminino na união estável, embora um pouco mais da metade não
acredite nessa suplantação das mulheres em relação aos homens no que tange aos benefícios
recebidos pela mulher convivente.
Tabela 72: Distribuição da amostra feminina em relação à avaliação a respeito do
maior benefício das mulheres na relação de união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 11 28,95% 7 18,42% 9 23,68% 9 23,68% 36 23,68%
Não 27 71,05% 29 76,32% 29 76,32% 28 73,68% 113 74,34%
Não soube responder 0 0,00% 2 5,26% 0 0,00% 1 2,63% 3 1,97%
Tabela 73: Distribuição da amostra masculina em relação à avaliação a respeito do
maior benefício das mulheres na relação de união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 14 36,84% 12 31,58% 9 23,68% 12 31,58% 47 30,92%
Não 21 55,26% 26 68,42% 29 76,32% 25 65,79% 101 66,45%
Não soube responder 3 7,89% 0 0,00% 0 0,00% 1 2,63% 4 2,63%
295
A maioria dos sujeitos que concordam com a idéia de que a união estável beneficia mais
as mulheres do que os homens que vivem esse tipo de relação afirmam que essa tendenciosidade
ocorreria em função dos aspectos materiais, especificamente da dependência financeira, que as
levaria à busca de estabilidade através de garantias legais como divisão de bens, pensões, etc. É
interessante notarmos que essa ótica está presente de forma mais pregnante nas afirmões de
57,14% das mulheres solteiras, por 42,86% das mulheres em união estável e por 30% das
mulheres casadas, sendo ela a principal explicação dada a essa suposta “proteção às mulheres
companheiras. Os homens em união estável simplesmente reiteram essa concepção afirmando
que “a mulher é mais beneficiada”, uma vez que aproximadamente 45% deles não justificaram
suas asseverões nesse sentido. Da mesma forma, 22,22% dos homens solteiros corroboram essa
concepção tomando como base a dependência financeira, embora o mesmo número de sujeitos
tenha se mantido isento, não respondendo tal questão. Por sua vez os homens casados (28,57%) e
as mulheres separadas (33,33%) consideram que as mulheres conviventes são beneficiadas em
razão do reconhecimento social de sua relação marital e da conseqüente proteção jurídica
conferida a mesma. Convém destacarmos que os homens separados citam a “visão da sociedade”
(25%), o reconhecimento social, a dependência financeira e a Lei, com os mesmos índices
(16,67%), como as razões que, respectivamente, justificam a parcialidade em questão.
Entretanto, a maioria dos que não concordam com a referida afirmação fundamentam sua
oposição através do argumento de que a união estável beneficia ambos os membros da relação de
união estável, sem distinção de sexo, ou seja, que os direitos são iguaispara o homem e a
mulher convivente. Essa máxima bastante empregada cotidianamente pelos sujeitos no
tratamento das questões de gênero foi utilizada na avaliação por 90% dos homens casados, por
73% das mulheres separadas, por quase 70% dos homens solteiros e das mulheres casadas, por
mais de dois quintos das mulheres separadas e solteiras e por praticamente dois quintos das
mulheres em união estável. Vale ressaltar que a emancipação feminina foi o segundo motivo
através do qual as mulheres solteiras negaram o maior benefício feminino das mulheres que
vivem nesse arranjo, tendo sido este o grupo no qual o mesmo foi mais citado.
296
Tabela 74: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina em relação ao
privilégio concedido às mulheres conviventes.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Pelos casos ouvidos 1 14,29% 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela questão financeira (bens, pensão) 2 28,57% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela dependência financeira passada e futura
(procura por estabilidade, etc)
2 28,57% 3 30,00% 3 42,86% 1 16,67%
Pela visão da sociedade (questões sociais),
inclusive machismo
1 14,29% 1 10,00% 2 28,57% 1 16,67%
Pelas desigualdades de gênero 1 14,29% 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00%
Reconhecimento social, proteção jurídica, amparo /
Faz julgamento favorável, justo
0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 2 33,33%
Pela "má fé" (relação por interesse, tirar vantagens,
etc)
0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00%
Filhos 0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00%
A mulher é mais prejudicada 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 1 10,00% 2 28,57% 0 0,00%
Total 7
100,00%
10
100,00%
7
100,00%
6
100,00%
O
Pela dependência financeira passada e futura
(procura por estabilidade, etc)
0 0,00% 0 0,00% 1 3,70% 1 4,55%
A mulher é mais prejudicada 0 0,00% 0 0,00% 1 3,70% 0 0,00%
Beneficia os dois 12 44,44% 13 52,00% 14 51,85% 8 36,36%
Beneficia e prejudica os dois 0 0,00% 0 0,00% 1 3,70% 1 4,55%
Não beneficia nem prejudica ninguém 0 0,00% 0 0,00% 2 7,41% 0 0,00%
Os direitos são iguais 5 18,52% 4 16,00% 2 7,41% 8 36,36%
Emancipação feminina, atualmente a mulher
trabalha (autonomia feminina)
3 11,11% 2 8,00% 4 14,81% 1 4,55%
Pela questão legal 1 3,70% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Beneficia mais o homem / Pelo machismo
(desigualdade de gênero)
1 3,70% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não beneficia ninguém 0 0,00% 2 8,00% 0 0,00% 1 4,55%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 9,09%
Não respondeu / Não sabe 5 18,52% 4 16,00% 2 7,41% 0 0,00%
Total 27
100,00%
25
100,00%
27
100,00%
22
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 0 0,00% 2
100,00%
1
100,00%
Total 0 0,00% 0 0,00% 2
100,00%
1
100,00%
297
Tabela 75: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina em relação
ao privilégio concedido às mulheres conviventes.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Pelos casos ouvidos
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela questão financeira (bens, pensão)
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 8,33%
Pela dependência financeira passada e futura
(procura por estabilidade, etc)
2 22,22% 1 7,14% 0 0,00% 2 16,67%
Pela visão da sociedade (questões sociais),
inclusive machismo
1 11,11% 3 21,43% 0 0,00% 3 25,00%
Pelas desigualdades de gênero
1 11,11% 1 7,14% 1 9,09% 0 0,00%
Reconhecimento social, proteção jurídica, amparo /
Faz julgamento favorável, justo
1 11,11% 4 28,57% 1 9,09% 2 16,67%
Pela "má fé" (relação por interesse, tirar vantagens,
etc)
0 0,00% 2 14,29% 0 0,00% 1 8,33%
Filhos
1 11,11% 0 0,00% 1 9,09% 0 0,00%
A mulher é mais prejudicada
0 0,00% 2 14,29% 0 0,00% 0 0,00%
A mulher é mais beneficiada
0 0,00% 0 0,00% 5 45,45% 0 0,00%
Pela Lei
0 0,00% 1 7,14% 1 9,09% 2 16,67%
Os direitos são iguais
0 0,00% 0 0,00% 1 9,09% 0 0,00%
Beneficia mais o homem / Pelo machismo
(desigualdade de gênero)
1 11,11% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe
2 22,22% 0 0,00% 1 9,09% 1 8,33%
Total 9
100,00%
14
100,00%
11
100,00%
12
100,00%
O
Pela dependência financeira passada e futura
(procura por estabilidade, etc)
1 3,45% 1 5,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela visão da sociedade (questões sociais),
inclusive machismo
0 0,00% 1 5,00% 0 0,00% 0 0,00%
Reconhecimento social, proteção jurídica, amparo /
Faz julgamento favorável, justo
0 0,00% 0 0,00% 1 3,85% 0 0,00%
Pela "má fé" (relação por interesse, tirar vantagens,
etc)
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 1 4,76%
A mulher é mais prejudicada
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Beneficia os dois
19 65,52% 14 70,00% 14 53,85% 13 61,90%
Beneficia e prejudica os dois
0 0,00% 0 0,00% 1 3,85% 1 4,76%
Não beneficia nem prejudica ninguém
0 0,00% 0 0,00% 1 3,85% 0 0,00%
Os direitos são iguais
1 3,45% 4 20,00% 5 19,23% 2 9,52%
Emancipação feminina, atualmente a mulher
trabalha (autonomia feminina)
2 6,90% 0 0,00% 1 3,85% 1 4,76%
Pela questão legal
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Beneficia mais o homem / Pelo machismo
(desigualdade de gênero)
2 6,90% 0 0,00% 1 3,85% 0 0,00%
Não beneficia ninguém
1 3,45% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Pela Lei
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 2 9,52%
Ponderação
3 10,34% 0 0,00% 0 0,00% 1 4,76%
298
Não respondeu / Não sabe
0 0,00% 0 0,00% 2 7,69% 0 0,00%
Total 29
100,00%
20
100,00%
26
100,00%
21
100,00%
O RESPONDEU
0 0,00% 3
100,00%
0 0,00% 1
100,00%
Total 0 0,00% 3
100,00%
0 0,00% 1
100,00%
4.3.2.14.
A facilidade de separação na união estável
Ao contrário do que ocorreu na questão anterior, as declarões da maioria dos sujeitos
entrevistados confirmam a crença corrente no senso comum de que é mais fácil para um casal se
separar estando ele vivendo em união estável do que estando casado, tendo mais da metade dos
homens e mulheres nas diferentes situões conjugais avaliadas se posicionado dessa maneira.
Esse índice foi um pouco menor entre as mulheres separadas, visto que somente metade delas
compartilham dessa mesma concepção. O grupo que mais adere à idéia de uma suposta
viabilização maior da separação na união estável, comparativamente ao casamento, é o grupo dos
solteiros, dos quais mais de três quintos dos homens e mulheres endossam a tese da maior
estabilidade presente no casamento em comparação a outras formas de vínculo conjugal.
A união estável é, de acordo com essa visão, representada como um tipo de relação mais
frágil do que o casamento, o que tem como principal conseência a maior facilidade para seus
membros destituírem esse tipo de vínculo conjugal. Essa idéia de fragilidade está, por sua vez,
associada à ausência de formalidades, capazes nesse entendimento, de assegurar a permanência
da conjugalidade. Tais certezas relativas à durabilidade da relação conjugal e seus correlatos são
fornecidas pela tradição, cujo papel, como esclarece Giddens (2002), é fundamental diante de um
mundo em transformação, transformações estas que se estendem à vida privada revelando-se,
inclusive, através do surgimento de novas organizões familiares e conjugais, como é o caso da
união estável.
299
Tabela 76: Distribuição da amostra feminina quanto à maior facilidade de separação
na união estável do que no casamento.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 22 57,89% 22 57,89% 24 63,16% 19 50,00% 87 57,24%
Não 15 39,47% 15 39,47% 12 31,58% 18 47,37% 60 39,47%
Não soube responder 1 2,63% 1 2,63% 2 5,26% 1 2,63% 5 3,29%
Tabela 77: Distribuição da amostra masculina quanto à maior facilidade de
separação na união estável do que no casamento.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Sim 22 57,89% 21 55,26% 24 63,16% 21 55,26% 88 57,89%
Não 16 42,11% 17 44,74% 14 36,84% 17 44,74% 64 42,11%
A principal atribuição feita pela maioria dos sujeitos investigados que acreditam em uma
suposta facilidade maior para a separação na união estável do que no casamento, especialmente
mulheres separadas (72,22%) e solteiras (65,22%), é de que a primeira situação envolve menos
burocracia e formalidade ao ser dissolvida. A mesma constância pode ser observada nas
justificativas daqueles que não compartilham dessa crença, visto que o aspecto sentimental
constitui a base de suas negativas a ela direcionadas. As afirmações de que, em se tratando da
separação, seja no casamento, seja no casamento os sentimentos são os mesmos” e de que “o
que importa são os sentimentos” expressam essa valorização dos aspectos emocionais na
destituição do vínculo conjugal pelos homens e mulheres participantes da pesquisa. Essas duas
categorias constituídas a partir das respostas dos sujeitos à referida questão são complementares
embora a primeira, além da importância concedida aos sentimentos, equipara através da
afirmação de sua mesma natureza, isto é, de sua presença indiferenciada na dissolução dos dois
tipos de vínculo, a união estável ou casamento. Contudo, alguns grupos utilização a primeira
afirmação e outros a segunda como base de suas posições. Assim sendo, para a maioria, na
separação, independente da modalidade de relação conjugal o que se apresenta como fator
300
central, mais importante, são os sentimentos. Por sua vez, os homens solteiros (30,77%) e os
homens em união estável (40%) consideram que, na separação, esses sentimentos são os mesmos,
esteja o casal vivendo em união estável ou casado. É interessante notarmos que a equiparação da
união estável ao casamento através da paridade dos sentimentos presentes na separação em
ambos os tipos de relação é feita prioritariamente pelos homens. Ressalta-se que, apesar disso,
mais de 30% dos homens solteiros, mesmo número dos que disseram a que na separação os
sentimentos são os mesmos, não responderam à questão. As mulheres casadas, ao contrário dos
outros, grupos, apontam razões jurídicas (23,53%), acrescidas de ponderões (23,53%), como as
primeiras explicações dadas à dita indiferenciação quanto às facilidades no processo de separação
e, como segundos fatores, o fato de que “o que importa são os sentimentos” e de que “os
sentimentos envolvidos são os mesmos(11,76%).
A indiferenciação tocante à suposta maior facilidade de separação na união estável do que
no casamento aponta para a existência de elementos afetivos na ancoragem desse arranjo no
casamento. Com o enfraquecimento das instituições tradicionais o amor-romântico passou a ser o
principal critério para o estabelecimento das relões conjugais cuja forma, antes única e
determinada pela tradição, tornou-se dependente da vontade dos membros do casal.
301
Tabela 78: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina à maior
facilidade de separação na união estável do que no casamento.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Menos burocracia / Menos formalidade 15 65,22% 14 58,33% 12 60,00% 13 72,22%
Do ponto de vista jurídico / Implicações legais 4 17,39% 3 12,50% 4 20,00% 1 5,56%
Pela questão financeira 0 0,00% 1 4,17% 0 0,00% 0 0,00%
Os sentimentos envolvidos são os mesmos 1 4,35% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O que importa são os sentimentos 0 0,00% 0 0,00% 2 10,00% 0 0,00%
A união estável é informal (menos
responsabilidades, menos pressão social)
1 4,35% 3 12,50% 1 5,00% 2 11,11%
Ponderação 2 8,70% 1 4,17% 0 0,00% 2 11,11%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 2 8,33% 1 5,00% 0 0,00%
Total 23
100,00%
24
100,00%
20
100,00%
18
100,00%
O
Menos burocracia / Menos formalidade 1 7,69% 2 11,76% 0 0,00% 1 7,14%
Do ponto de vista jurídico 0 0,00% 4 23,53% 2 13,33% 2 14,29%
Os sentimentos envolvidos são os mesmos 3 23,08% 2 11,76% 5 33,33% 5 35,71%
O que importa são os sentimentos 4 30,77% 2 11,76% 6 40,00% 6 42,86%
A união estável é informal (menos
responsabilidades)
0 0,00% 3 17,65% 1 6,67% 0 0,00%
Ponderação 4 30,77% 4 23,53% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 1 7,69% 0 0,00% 1 6,67% 0 0,00%
Total 13
100,00%
17
100,00%
15
100,00%
14
100,00%
O SOUBE RESPONDER
2
100,00%
1
100,00%
1
100,00%
1
100,00%
Total 2
100,00%
1
100,00%
1
100,00%
1
100,00%
302
Tabela 79: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina à maior
facilidade de separação na união estável do que no casamento.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
SIM
Menos burocracia / Menos formalidade 12 48,00% 7 31,82% 12 50,00% 13 52,00%
Do ponto de vista jurídico / Implicações legais 4 16,00% 5 22,73% 4 16,67% 4 16,00%
Pela questão financeira 0 0,00% 1 4,55% 1 4,17% 0 0,00%
Os sentimentos envolvidos são os mesmos 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O que importa são os sentimentos 0 0,00% 0 0,00% 1 4,17% 2 8,00%
A união estável é informal (menos
responsabilidades, menos pressão social)
4 16,00% 5 22,73% 2 8,33% 3 12,00%
Ponderação 4 16,00% 4 18,18% 1 4,17% 3 12,00%
Não respondeu / Não sabe 1 4,00% 0 0,00% 3 12,50% 0 0,00%
Total 25
100,00%
22
100,00%
24
100,00%
25
100,00%
O
Menos burocracia / Menos formalidade 0 0,00% 1 7,14% 1 6,67% 2 13,33%
Do ponto de vista jurídico 1 7,69% 1 7,14% 1 6,67% 1 6,67%
Os sentimentos envolvidos são os mesmos 4 30,77% 4 28,57% 6 40,00% 4 26,67%
O que importa são os sentimentos 3 23,08% 5 35,71% 4 26,67% 7 46,67%
A união estável é informal (menos
responsabilidades)
0 0,00% 2 14,29% 0 0,00% 0 0,00%
Ponderação 1 7,69% 1 7,14% 2 13,33% 1 6,67%
Não respondeu / Não sabe 4 30,77% 0 0,00% 1 6,67% 0 0,00%
Total 13
100,00%
14
100,00%
15
100,00%
15
100,00%
4.3.2.15. A satisfação conjugal
Todavia, conforme a maioria dos sujeitos pesquisados uma vida conjugal satisfatória é
favorecida tanto pelo casamento quanto pela união estável. Ou seja, a forma de vínculo é
indiferente no que se refere à satisfação conjugal. Ao tratarem dessa questão as mulheres são
mais enfáticas do que os homens, exceto no grupo de separados, no qual os homens (81,58%)
303
associam menos a satisfação conjugal com a forma de relação do que as mulheres (78,95%).
Dentre todos os sujeitos entrevistados as mulheres em união estável (89,47%) são as que menos
correlacionam a modalidade de relacionamento conjugal e a satisfação com a mesma, e, os
homens casados e solteiros, os que mais fazem tal vinculação (68,42%).
Tabela 80: Distribuição da amostra feminina referente ao questionamento a respeito
da maior satisfação conjugal no casamento ou na união estável.
Casadas União estável Solteiras Separadas Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Pelo casamento 9 23,68% 0 0,00% 6 15,79% 8 21,05% 23 15,13%
Pela união estável 2 5,26% 4 10,53% 1 2,63% 0 0,00% 7 4,61%
É indiferente 27 71,05% 34 89,47% 31 81,58% 30 78,95% 122 80,26%
Tabela 81: Distribuição da amostra masculina referente ao questionamento a
respeito da maior satisfação conjugal no casamento ou na união estável.
Casados União estável Solteiros Separados Total
Respostas
f % f % f % f % f %
Pelo casamento 11 28,95% 3 7,89% 8 21,05% 7 18,42% 29 19,08%
Pela união estável 1 2,63% 4 10,53% 4 10,53% 0 0,00% 9 5,92%
É indiferente 26 68,42% 31 81,58% 26 68,42% 31 81,58% 114 75,00%
A primazia dos sentimentos é um fato observado também nas respostas dos sujeitos a
respeito ao questionamento sobre a possibilidade da vida conjugal ser mais satisfatória na
situação de casamento ou de união estável. A idéia de que o importante para a satisfação conjugal
é a realidade do casal, os sentimentos e o laço afetivo existente entre ambos foi a principal razão
pela qual a maioria dos sujeitos de todos os grupos sustenta que o tipo de vínculo é indiferente
para a satisfação conjugal na medida em que, como já dito, segundo eles a condição para que a
mesma exista são os sentimentos. Essa noção aparece com maior ênfase entre os homens casados,
dos quais quase 70% a reiteram. Além da não correlação entre satisfação conjugal e tipo de
304
vínculo, um segundo aspecto apresentado consensualmente entre os que em relação a essa
questão se posicionam como indiferentes é o entendimento de que a felicidade conjugal depende
do casal, de seus princípios, crenças e valores, tendo sido este compartilhado por
aproximadamente um quinto das mulheres separadas e solteiras e dos homens solteiros e
separados. Esse índice sofre um decnio progressivo nas mulheres em união estável (14,71%),
nos homens em união estável (13,33%), nos homens casados (3,85%) e nas mulheres casadas, em
cujas declarações não fizeram nenhuma menção a essa variável.
A idéia de que a união estável e o casamento são iguais perante a lei ou em termos
afetivos sustentam, por último, o posicionamento adotado pelos grupos no tocante a satisfação
conjugal. As mulheres solteiras privilegiam o segundo ao primeiro, ao passo que os homens
solteiros apontam a igualdade em termos legais, não fazendo nenhuma referência ao aspecto
afetivo. Ao contrário dos solteiros os homens casados citam em primeiro lugar o plano
sentimental, embora façam alusão ao fator legal. As mulheres casadas priorizam ambos,
indistintamente. Os homens e as mulheres em união estável adotam a mesma posição ratificando
a uniformidade entre a união estável e o casamento em termos afetivos. Nota-se de tal modo que,
ao contrário dos outros grupos, os homens e mulheres conviventes concordam a respeito dessa
questão, sendo a mesma apontada por ambos como uma das razões pelas quais, no seu entender, a
satisfação conjugal independe da forma de vínculo. Inversamente, as mulheres separadas
apontam o aspecto legal como eixo de seu entendimento a respeito da felicidade conjugal na
união estável ou no casamento e, os homens separados, priorizam a identidade afetiva presente
em ambos como elemento fundamental na reiteração da que a forma de relação é indiferente para
a satisfação conjugal.
Nessa acepção, é interessante notarmos que o posicionamento adotado pelos solteiros e
casados confirmam idéias presentes no senso comum, e ratificadas pela ciência, de que os
homens são mais racionais” e as mulheres mais “emocionais. Essas noções têm sua origem no
universo reificado, da ciência e, através da difusão e divulgação através dos meios de
comunicação de massa, passam a circular no cotidiano sendo apropriadas pelos grupos sociais,
passando a constituir um conhecimento comum e compartilhado por esses universos específicos,
o qual Moscovici (1961) denominou representões sociais. Essa dinâmica do processo
305
representacional explicado por Moscovici, faz com que, uma vez constituídas pelo senso comum,
esse saber qualificado pelo autor como prático, concorra para a construção de uma realidade
comum a esses conjuntos sociais, como afirma Jodelet (1989 a). No caso dos homens e das
mulheres casadas e solteiras os dados encontrados na pesquisa confirmam a existência de um
forte elemento de gênero nas representões desse grupo a respeito da união estável. A idéia de
que “a mulher é mais afetiva e o homem mais racionalé confirmada cotidianamente pela ciência
perpetuando essa distinção de gênero nos modos de sentir e agir, diferença esta cujo papel é
essencial no que tange às relações amorosas e conjugais, visto que com base no que afirmara
Moscovici, sendo essa representação da relação um conhecimento prático ela interferirá, por
assim dizer, nas práticas afetivas presentes nas múltiplas formas de relacionamento e, por
conseguinte, na satisfação conjugal.
As noções ditas do senso comum também demonstram-se no fato dos conviventes terem
apresentado os mesmos percentuais nas respostas ligadas a esse aspecto, confirmando uma
mentalidade menos convencional que permite viver em união estável, em razão, inclusive, do
enfraquecimento dos referenciais externos (GIDDENS, 2002). Entre os separados a inversão
demonstra prevalecer para o homem, muitas vezes considerados prejudicados no processo de
separação, a idéia de que o importante é o afeto. Já as mulheres aderem ao aspecto legal por uma
tradição história de injustiça mantida em relação a elas pela raiz histórica da união estável no
concubinato, a qual se extingue em definitivo no novo Código Civil que, em consonância com a
Constituição de 1998, confere a essa forma de relação o título de “entidade familiar.
Dentre os que consideram que a vida conjugal satisfatória é mais favorecida pela união
estável do que pelo casamento, as mulheres solteiras e casadas e as mulheres e homens em união
estável reiteram a importância da realidade do casal, seus sentimentos, os los afetivos
existentes entre seus membros para a satisfação conjugal, tendo sido essa ótica preponderante
entre as mulheres em união estável. Vale lembrar que os separados de ambos os sexos não
consideram satisfação conjugal possa ser mais favorecida pela situação de união estável. Dentre a
minoria dos componentes desse grupo que facultam maior felicidade conjugal ao casamento
44,44 % das mulheres o fazem por atribuírem um maior status social à união tradicional e, em
segundo lugar, por questões morais e religiosas. Da mesma forma, 33,33% dos homens separados
306
imputam maior satisfação conjugal ao casamento do que à união estável devido ao maior status
social atribuído ao vínculo formal, e, o mesmo índice, baseia essa prerrogativa na concepção de
que neste há mais comunhão de vida, sentimentos e vivência de família.
Dentre as parcelas dos grupos que concedem ao casamento maior grau de satisfação do
que na união estável, 25% dos homens solteiros referem-se à união formal como dotada de regras
mais bem definida em comparação à informal e, 25%, consideram nesse entendimento seu status
social. Esses fatores foram, dentre outros com o mesmo índice (14,29%), citados pelas mulheres
solteiras nessa referência. Nela, os homens casados acrescentam como base principal de suas
justificativas o maior comprometimento, responsabilidade e compromisso social por eles
depositado no casamento, além da melhor definição de regras, direitos e deveres e do maior peso
social por eles relacionado a união tradicional. Essa característica foi utilizada por 27,27% das
mulheres casadas em seu julgamento favorável ao vínculo tradicional quando se trata da
satisfação do casal com a própria relação. Apesar de um mero pequeno de homens que vivem
em união estável terem atribuído maior felicidade conjugal ao casamento, os mesmos não
justificaram as razões dessa concessão. Já as mulheres em união estável se mantiveram
totalmente isentas no destaque dado às uniões formais explicitada na sua correlação com a
satisfação conjugal.
307
Tabela 82: Distribuição das justificativas dadas pela amostra feminina à atribuição
de maior satisfação conjugal ao casamento ou a união estável.
Solteiro F Casado F
União estável F
Separado F
Respostas
f % f % f % f %
PELO CASAMENTO
São "iguais" perante a Lei em mais de uma condição
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Maior comprometimento, responsabilidade,
compromisso pessoal
1 14,29% 3 27,27% 0 0,00% 0 0,00%
Religião, moral 1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 2 22,22%
Regras mais bem definidas (definidas de forma
melhor), direitos e deveres
1 14,29% 2 18,18% 0 0,00% 1 11,11%
Status maior, peso maior (termo casamento), questão
social
1 14,29% 1 9,09% 0 0,00% 4 44,44%
Comunhão de vida, mais sentimentos, mais união,
família
1 14,29% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Tradição 0 0,00% 2 18,18% 0 0,00% 1 11,11%
Dá mais segurança, mais confiança 0 0,00% 1 9,09% 0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 2 28,57% 2 18,18% 0 0,00% 1 11,11%
Total
7
100,00%
11
100,00%
0 0,00% 9
100,00%
PELA UNIÃO ESTÁVEL
São "iguais" perante a Lei em mais de uma condição
0 0,00% 0 0,00% 1 16,67% 0 0,00%
O importante para satisfação é a realidade do casal,
os sentimentos, a relação (los afetivos)
1
100,00%
2
100,00%
3 50,00% 0 0,00%
Maior comprometimento, responsabilidade 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Status maior, peso maior (termo casamento) 0 0,00% 0 0,00% 1 16,67% 0 0,00%
Não há compromisso formal / Não é uma obrigação
tradicional
0 0,00% 0 0,00% 1 16,67% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Total
1
100,00%
2
100,00%
6
100,00%
0 0,00%
É INDIFERENTE
O importante para satisfação é a realidade do casal,
os sentimentos, a relação (los afetivos)
15 50,00% 16 61,54% 16 47,06% 15 50,00%
Depende do casal, seus princípios, suas óticas,
concepções do casal, seus valores, não a relação
5 16,67% 0 0,00% 5 14,71% 7 23,33%
São "iguais" perante a Lei 2 6,67% 3 11,54% 1 2,94% 2 6,67%
Igual em termos afetivos, não fala de Lei 3 10,00% 3 11,54% 4 11,76% 1 3,33%
Ponderação 0 0,00% 0 0,00% 2 5,88% 1 3,33%
Não respondeu / Não sabe 5 16,67% 4 15,38% 6 17,65% 4 13,33%
Total
30
100,00%
26
100,00%
34
100,00%
30
100,00%
308
Tabela 83: Distribuição das justificativas dadas pela amostra masculina à atribuição
de maior satisfação conjugal ao casamento ou a união estável.
Solteiro M Casado M
União estável M
Separado M
Respostas
f % f % f % f %
PELO CASAMENTO
São "iguais" perante a Lei em mais de uma condição
0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 0 0,00%
Maior comprometimento, responsabilidade,
compromisso pessoal
1 12,50% 2 20,00% 0 0,00% 0 0,00%
Religião, moral 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Regras mais bem definidas (definidas de forma
melhor), direitos e deveres
2 25,00% 2 20,00% 0 0,00% 0 0,00%
Status maior, peso maior (termo casamento), questão
social
2 25,00% 2 20,00% 0 0,00% 2 33,33%
Tradição 0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 1 16,67%
Comunhão de vida, mais sentimentos, mais união,
família
1 12,50% 1 10,00% 0 0,00% 2 33,33%
Dá mais segurança, mais confiança 0 0,00% 1 10,00% 0 0,00% 1 16,67%
Não respondeu / Não sabe 2 25,00% 0 0,00% 3
100,00%
0 0,00%
Total
8
100,00%
10
100,00%
3
100,00%
6
100,00%
PELA UNIÃO ESTÁVEL
São "iguais" perante a Lei em mais de uma condição
0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
O importante para satisfação é a realidade do casal,
os sentimentos, a relação (los afetivos)
0 0,00% 0 0,00% 1 25,00% 0 0,00%
Maior comprometimento, responsabilidade 2 50,00% 0 0,00% 1 25,00% 0 0,00%
Status maior, peso maior (termo casamento) 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00%
Não há compromisso formal / Não é uma obrigação
tradicional
1 25,00% 1
100,00%
0 0,00% 0 0,00%
Não respondeu / Não sabe 1 25,00% 0 0,00% 2 50,00% 0 0,00%
Total
4
100,00%
1
100,00%
4
100,00%
0 0,00%
É INDIFERENTE
O importante para satisfação é a realidade do casal,
os sentimentos, a relação (los afetivos)
15 57,69% 18 69,23% 11 36,67% 12 42,86%
Depende do casal, seus princípios, suas óticas,
concepções do casal, seus valores, não a relação
5 19,23% 1 3,85% 4 13,33% 5 17,86%
São "iguais" perante a Lei 2 7,69% 1 3,85% 1 3,33% 3 10,71%
Igual em termos afetivos, não fala de Lei 0 0,00% 3 11,54% 5 16,67% 5 17,86%
Ponderação 1 3,85% 1 3,85% 1 3,33% 2 7,14%
Não respondeu / Não sabe 3 11,54% 2 7,69% 8 26,67% 1 3,57%
Total
26
100,00%
26
100,00%
30
100,00%
28
100,00%
309
A não associação entre o tipo de vínculo e a satisfação conjugal proposta pela maioria dos
sujeitos investigados e a idéia, associada a essa desvinculação, de que o sentimento de felicidade
com a relação como um todo ou com aspectos específicos da mesma (GRAY-LITTLE e
BURKYS, 1983) depende prioritariamente dos sentimentos, ou seja, do lo afetivo que constitui
o elemento estruturante da vida conjugal confirma a posição adotada por vários autores a respeito
da importância do sentimento amoroso na contemporaneidade. Com base na afirmação de Costa
(1998) segundo a qual o amor produz hierarquias de desejos e objetos internalizadas no processo
de formação de subjetividades(p.18), entendemos que nas representões sociais construídas
por homens e mulheres em torno da união estável o componente afetivo ocupa lugar de destaque
na medida em que, apesar de ser uma prática conjugal antiga, tendo esse arranjo passado a
constituir as o seu reconhecimento jurídico pelo novo Código Civil, em 2002 – uma nova
realidade social, a construção de conhecimento originada nos debates cotidianos a seu respeito
pode ser entendida como uma tentativa de compreender esse fato novo e também de torná-lo
familiar, amenizando, dessa forma, as inquietões trazidas pelo seu ineditismo.
A familiarização com a novidade é o principal objetivo das representões sociais
construídas em torno de um objeto social. Em se tratando da união estável é importante a
consideração de que a processo de construção de conhecimento a ela concernente ocorre em um
contexto social no qual a importância do amor e o estilo de vida estão intimamente associados à
maneira como as pessoas estabelecem a vida conjugal. Uma vez que, contemporaneamente, o que
importa para o relacionamento a dois são os sentimentos, a conjugalidade pode ser vivenciada de
diversas maneiras, sendo o estilo de vida, noção empregada por Giddens (2002) em sua análise
acerca da modernidade, um determinante fundamental da opção de vínculo conjugal adotada
pelos casais. Podemos afirmar, dessa forma, que estas duas noções afeto e estilo de vida estão
presentes nas representações sociais da união estável e, conseentemente, nas práticas
associadas a essa modalidade de relacionamento conjugal a qual, por assim dizer, podemos
qualificar como contemporânea.
310
5. CONCLUSÕES
Apresentaremos, a seguir, as conclusões a que chegamos a partir dos resultados
encontrados na pesquisa empírica e de sua articulação com o referencial teórico utilizado no
presente estudo, no qual destacamos a teoria das representões sociais, nosso eixo fundamental
de análise. Nessa etapa de construção final do trabalho de pesquisa, foram priorizados tanto
aqueles resultados que confirmam posicionamentos esperados da parte dos sujeitos investigados a
respeito da união estável quanto outros que surpreendem, por contrariarem probabilidades
baseadas no conhecimento do senso comum” a ela referente.
Como já fora tratado anteriormente no transcorrer de todo esse trabalho, a união estável é
uma forma de relacionamento conjugal simultaneamente antigo, na medida em que é uma prática
existente como concubinato – em diversas culturas desde a Antiguidade, e novo, do ponto de
vista jurídico, a partir do tratamento a ela conferido pela Constituição de 1988 e, especialmente,
pelo novo Código Civil, que lhe outorga o título de “entidade familiar, passando essa forma de
relação a compor o Livro de Família deste diploma legal. Consideramos importante relembrar
aqui que Pereira (2002) entende ser tal inclusão a grande mudança ocorrida nessa carta jurídica
promulgada em 2002.
O propósito de citar novamente a afirmação do jurista justifica-se, ao nosso ver, em razão
do caráter inovador por ele apontado não se restringir aos aspectos legais referentes ao tipo de
vínculo em questão, mas, essencialmente, às repercussões desse fato jurídico novo na
subjetividade daqueles que com ele de algum modo se relacionam em suas práticas cotidianas,
tendo esse assunto – da subjetividade – um grande destaque em suas reflexões acerca dos temas
tratados pelo Direito de Família contemporâneo. Consideramos essencial a relevância conferida a
esse fator, na medida em que, a partir da teoria das representões sociais, entendemos que, como
novo arranjo conjugal, a união estável gera nos membros da sociedade um estranhamento
acompanhado da necessidade eminente de construção de um sentido comum, compartilhado
pelos grupos sociais a seu respeito. Esse conhecimento produzido a respeito da união estável, por
dizer respeito à esfera da vida privada, remete diretamente à subjetividade e, por assim dizer, ao
afeto.
311
O debate gerado pela união estável tem papel fundamental na tarefa de tradução da nova
realidade social constituída por essa forma de relação em seus múltiplos aspectos evidenciando
a construção de representões sociais à mesma concernentes –, uma vez que tal realidade, por
vezes, torna-se ameaçadora, sentimento freqüentemente observado nas conversações ocorridas no
espo público a respeito desse arranjo, em especial quando da divulgação através da dia de
nocias a ele referentes. Os “casos de união estável” envolvendo pessoas famosas e as opiniões
dos especialistas – operadores do Direito, preponderantemente – difundidos através dos meios de
comunicação de massa têm, nesse sentido, contribuído para a publicidade do tipo de vínculo
conjugal em questão. Nesse processo de “familiarização com a novidade”, princípio básico de
todo processo de construção das representões sociais, é preciso ancorar esse fato novo,
estranho, ameaçador, em um conhecimento antigo, já existente.
Ao pretendermos analisar e comparar as representões sociais da união estável
construídas por homens e mulheres casados, solteiros, em união estável e separados,
pertencentes à classe média do Rio de Janeiro, utilizamos a noção de ancoragem como ponto de
partida para a estruturação de todo o trabalho, em suas dimensões teórica e empírica. Ou seja,
apropriando-nos de um conceito explicativo fundamental da teoria das representões sociais,
construímos a problemática central em torno da união estável, indagando em que tipo de vínculo
conjugal essa nova forma de relação se ancora, se no concubinato ou no casamento.
É importante ressaltarmos a esse respeito que o instrumento de pesquisa assumiu um
caráter também informativo, além de buscar identificar as associões, ou seja, a ancoragem do
novo – a união estável, do ponto de vista jurídico – no antigo – as formas de relões que a
precedem em sua nova formulação legal – o casamento e o concubinato –, para buscar
esclarecer
os sujeitos acerca de aspectos peculiares dessa nova realidade, ao mesmo tempo em que sobre ela
os interrogava. Esse caráter informativo teve como propósito auxiliar as tomadas de posição
frente aos aspectos pouco difundidos e, assim sendo, supostamente pouco conhecidos, em relação
a essa nova realidade, as quais são consideradas importantes na construção de conhecimento
compartilhado a seu respeito pelos grupos investigados.
312
Nesse sentido, os resultados referentes às evocões livres demonstraram que o núcleo
central das representações sociais construídas sobre a união estável é constituído pelo “amor,
pelo respeito” e, segundo o critério de aproximação periférica, pelo “companheirismo. Esses
achados remetem logo de início a uma provável associão feita pelos sujeitos investigados entre
a união estável e o casamento, na medida em que outros estudos realizadas na área da
conjugalidade revelam uma associação do casamento aos afetos, tendo sido os dois primeiros
amor e respeito – apontados em pesquisa anterior como os principais elementos necessários à
satisfação com o casamento. (ENNES, P.P., 1996)
A partir de Abric (1998), podemos dizer que a representação social da união estável
estrutura-se em torno de um cleo central formado basicamente pelo bimio “amor-respeito,
sendo ele o responsável pela organização e pelo significado dessa representação. Vale destacar a
importância atribuída pelo autor a esse sistema ao afirmar:
A organização de uma representação apresenta uma característica particular: não apenas
os elementos da representação são hierarquizados, mas além disso toda representação é
organizada em torno de um núcleo central, constituído de um ou de alguns elementos
que dão a representação o seu significado. (ABRIC, 1994 a, p.19)
A construção do significado da qual fala Abric foi observada nessa pesquisa através dos
posicionamentos assumidos paulatinamente em relação aos vários aspectos da união estável nela
abordados, os quais reiteraram a estruturação inicialmente demonstrada através dos dados
oriundos das evocões livres. Convém lembrar, contudo, que, como é próprio de toda e qualquer
representação social, as representações sociais da união estável são compostas também pelo
sistema periférico, que tem por função, além defesa do núcleo central, sua ancoragem na
realidade e adaptação aos contextos evolutivos, permitindo dessa forma a integração das
experiências cotidianas nessa produção.
Nesse sentido, os resultados do presente estudo revelam um notável conhecimento acerca
do reconhecimento jurídico da união estável pela maioria dos sujeitos em todas as situões
conjugais pesquisadas, especialmente entre as mulheres em união estável. Esses dados
demonstram ainda uma surpreendente familiaridade dos mesmos com os detalhes da legislação.
313
Esse nível de informação é coerente com o tratamento dado atualmente a essa forma de relação
pela dia, principal instância responsável pela formação e veiculação das representões sociais,
na qual, como mencionado anteriormente, o tema das uniões informais e, até mesmo, de maneira
genérica, de suas conseências jurídicas, têm conquistado destaque crescente. No âmbito
televisivo, as novelas têm, inclusive, abordado aspectos legais específicos desse arranjo, como o
contrato constitutivo de união estável. O debate “midiático” em torno da união estável migra para
o senso comum, gerando uma conversação cotidiana a ele concernente, a qual confirma sua
relevância culturalou espessura social, princípios propostos por Sá (1998) para definir a
especificidade dos objetos pertencentes ao campo de estudos das representões sociais no qual
se insere o arranjo investigado. A partir das suas implicações na vida privada e de sua
repercussão social entendemos a união estável como um problema psicossocial fundamental de
nossa época
, que está presente nas práticas cotidianas gerando uma discussão social que se
encaminha no sentido de traduzi-la, enquanto nova forma de relacionamento conjugal, através da
construção de representações sociais, sobre cujas estrutura e conteúdo discorreremos a seguir.
De acordo com o esperado, a união estável foi nitidamente associada ao casamento por
todos os grupos considerados nessa investigação. Os resultados diretamente relacionados a essa
simetria foram dados de forma expcita àquelas perguntas do questionário estruturadas em torno
da comparação direta entre as duas formas de vínculo, casamento e concubinato. Assim, o
primeiro indício dessa paridade foi encontrado no entendimento da união conjugal informal como
um “casamento sem formalismospela maioria dos sujeitos investigados. Essa simetria se
mantém nas questões subseqüentes através da interpretação – feita pelos homens quanto ao
sentimento das mulheres em união estável e, destas em relação aos homens, assim como as
respostas daqueles que vivem ou viveram nessa condição – do sentimento dos conviventes como
um sentimento de “casado(a)s.
É importante salientar que, em consonância com a questão anterior, de acordo com a
maior parte dos homens e das mulheres em todas as situões conjugais avaliadas, os homens em
união estável se consideram próximos da condição de casados. Esse mesmo entendimento foi
encontrado nas respostas fornecidas por ambos os gêneros em relação ao sentimento das
mulheres conviventes. Ou seja, a elas foi atribuído consensualmente de maneira geral, mais do
314
que aos homens na mesma situação conjugal, inclusive – o sentimento de casadas. Essa
prevalência era prevista na medida em que é coerente com um julgamento do senso comum
segundo o qual, por uma série de motivos associados – históricos, educacionais –, a mulher é
mais inclinada ao casamento do que o homem. O fato das mulheres conviventes, seguidas pelos
homens na mesma condição, se dizerem mais próximas da condição de casadas ratifica tal
concepção.
Uma vez que estamos tratando das representões sociais
, é importante salientarmos,
atentando para o papel do universo reificado na formação desse tipo de saber do senso comum
– dada a apropriação feita pelo mesmo dos conceitos cienficos, tal como demonstrou Moscovici
(1978) em seu estudo a respeito da psicanálise –, que a ciência tem um importante papel na
constituição e sustentação dessa concepção que associa mais a mulher ao casamento e às relões
conjugais, de forma geral, do que o homem. Essa concepção tocante às relões de gênero, uma
vez ratificada nesse âmbito, assume valor legítimo de verdade – uma vez que é vista e
incorporada pelos universos consensuais como cienfica sendo usada por homens e mulheres
nas suas argumentões favoráveis ou contrárias ao estabelecimento da vida conjugal, inclusive
da união estável, apesar desta forma de relação ter sido representada nessa pesquisa como menos
rígidado que o casamento no que tange à separão, o que supostamente faria com que ambos
os gêneros, e, principalmente, os homens, a ela aderissem com mais facilidade.
De fato, além das explicações psicossociais dadas às diferenças de gênero em relação aos
mais variados temas da vida social, as explicações oriundas da psicobiologia constituem outra
fonte bastante popularizada acerca dessas distinções contribuindo para a continuidade da visão
diferenciada a respeito das óticas e posturas femininas e masculinas relativas à vida conjugal. A
importância dada ao gênero em razão do seu atravessamento nos múltiplos temas da vida social,
na medida em que o fato de ser homem ou mulher está intimamente relacionado à forma como os
indivíduos concebem os temas presentes nas sociedades e, coerente com essa compreensão,
adotam maneiras de agir frente a eles, tem sido consensual em diversas áreas do conhecimento,
resultando numa elaboração teórica consistente a respeito dessa variável, a qual tem sido
apropriada por diversas disciplinas, seja tratando-a como objeto de pesquisa, seja tratando-a
como uma variável na investigão. Monteiro (2000), definindo o gênero como uma categoria
315
básica sobre o qual o mundo está organizado, entende, por essa razão, tratar-se esse aspecto de
uma variável central nos estudos sobre as relões conjugais. Em acréscimo, sustenta o autor, que
os papéis de gênero oferecem possibilidades de conferir visibilidade às relações afetivas em que
há semelhanças e diferenças.
Esta assertiva é particularmente aplicável à união estável tendo em vista os consensos e os
dissensos manifestos por homens mulheres em relação a essa forma de relão tanto a nível
representacional quanto das práticas sociais a ela associadas, as quais dada a associação passada
do vínculo em questão com o concubinato, constituíram-se, sobretudo nas gerões anteriores,
como discriminatórias, principalmente em relação à mulher companheira. Contudo, apesar do
enfraquecimento da tradição, apontada por Giddens (2002), ter facilitado a possibilidade de
escolha de uma modalidade de relação dentre os vários tipos disponíveis dentro das sociedades e
sua aceitação pelos membros desses contextos, a modernidade femeno analisado pelo autor
não excluiu totalmente a oposição aos novos comportamentos, principalmente quando estes se
referem à vida privada, o que se exemplifica no prolongamento das atitudes tradicionais em
relação às uniões informais, e aos seus adeptos e sua persistência, ainda que isolada, mesmo as
sua descaracterização como concubinato e posterior elevação ao lugar de família. Nessa
investigação os perfis convencionais referentes à união estável manifestaram-se na associação
desse arranjo ao concubinato por uma minoria masculina.
Além da influência do gênero no reconhecimento social conferido à união estável
favorecido pela discussão e atos legais referentes aos direitos das mulheres concubinas –,
julgamos fundamental a consideração do gênero na análise das representações sociais construídas
por homens e mulheres a respeito dessa forma de relação, por entendermos que esse
conhecimento sobre ela compartilhado pode variar em função do mesmo. Tal variação está
explicitada no posicionamento distinto manifesto nessa pesquisa por homens e mulheres em
relação a alguns aspectos específicos atinentes à união estável nela investigados e sua
comparação com o casamento, como os que discorremos a seguir sendo essa a razão pela qual
optamos por fazemos nessas considerações conclusivas esse recorte o qual, analogamente, foi
feito na pesquisa em relação a essa mesma variável.
316
A disparidade entre o namoro e a união estável apontada pelos homens e mulheres
participantes do estudo reforça a idéia de seriedade concedida a esse arranjo, o que indiretamente
também o aproxima do casamento. É interessante notarmos que, mesmo tendo sido interrogados a
respeito dessa possibilidade de nivelamento em se tratando do namoro atual, fazendo-se a
ressalva de que, em sua forma contemporânea, esse tipo de vínculo comporta algumas situões
em outras épocas permitidas somente no casamento a negativa referente a essa equiparação foi
compartilhada por todos os grupos investigados, os quais afirmam de maneira geral que “o
namoro é apenas namoro, e, em associação, que nele “faltam elementos caracterizadores da
união estável, dentre os quais destacam-se o compromisso e a coabitação. Vale lembrar que
Giddens (2002) afirma ser o compromisso uma espécie específica de confiança, pressuposto
fundamental do que denomina relação pura, ou seja, uma relação em que os critérios externos se
dissolveram e cuja existência está condicionada às satisfões ou recompensas que ela própria
pode dar. De acordo com essa lógica, o autor assinala que o compromisso presente nesse tipo de
vínculo deve ser entendido como um femeno do sistema internamente referido, constituindo-se
assim em um compromisso com a relação em si mesma e com a outra ou outras pessoas nela
envolvidas.
Uma interessante diferença de gênero tocante a esse aspecto se mostrou entre os casados,
visto que as mulheres nessa condição equiparam muito mais a união estável ao casamento do que
os homens, tendo sido este o grupo, dentre todos os demais, no qual o argumento de igualdade
entre o vínculo formal e o informal foi empregado de forma mais expressiva para justificar a
crença na impossibilidade do namoro atual ser considerado uma união estável. O fato de “serem
casadasparece fazer com que as mulheres afastem, mais do que os sujeitos que se encontram em
outras situões conjugais, a paridade entre essas duas formas de relação, postura esta que
encontra uma espécie de reforço em razão do seu vínculo conjugal ser oficial. Ou seja, a tradição
confere um peso maior à associação da união estável ao casamento através da desvinculação,
feita pelas mulheres casadas, entre o namoro a união conjugal dita informal.
O gênero confere um cunho a essa nuance da tradição em relação ao aspecto em discussão
na medida em que, aliado ao estado civil, o fato de ser mulher e as implicações psicossociais que
essa circunstância biológica acarreta interferem profundamente nas representões e práticas
317
tocantes às múltiplas formas de relacionamento conjugal e seus múltiplos aspectos, como a
similaridade entre o namoro atual e a união estável e sua associação com o casamento. Essa
influência se exemplifica em relação ao tópico em discussão visto que o fato de “ser mulher
casadatraz em si duas vertentes de determinações referentes a uma questão complexa em
relação à união estável que é justamente sua semelhança com o namoro atual, dada inclusive pela
ampliação das possibilidades de vivenciar nessa relação experiências antes somente permitidas no
casamento, ao ponto de torná-la próxima de uma relação conjugal, razão pela qual a reflexão em
torno dela se faz importante no estudo acerca das representões sociais da união estável, posto
que a compreensão diferenciada quanto à natureza da relação resulta em imeros processos nas
Varas de Família pelos membros do casal.
Na medida em que nosso foco de análise são as representões sociais construídas a
respeito da união estável é, importante sua compreensão como um conhecimento contextualizado,
e, por assim se constituir, resultante das condições em que surgem e circulam(ARRUDA,
1993, p.303), condições estas que podemos denominar modernasno sentido empregado por
Giddens (2002) ao se referir às instituições e modos de comportamento que se estabeleceram
inicialmente as o feudalismo, os quais adquiriram impacto a nível mundial no século XX. Em
estreita ligação com o tipo de saber que estamos investigando, esse autor afirma que “a
modernidade altera radicalmente a natureza da vida social cotidiana e afeta os aspectos mais
pessoais de nossa existência” (p.9), incidência esta que atinge particularmente a vida privada no
que tange às representações e práticas atinentes às várias modalidades de relações amorosas,
conjugais e familiares presentes nos contextos chamados modernos, nas quais se inclui a união
estável.
A modernização dos costumes ligados à vida privada se expressa no posicionamento
favorável em relação a alguns aspectos da união estável considerados polêmicos, como o
regime de bens, o qual, inclusive, gera grande discussão em vários âmbitos. Vale lembrar que a
regra jurídica considerada para a divisão patrimonial nesse arranjo é a mesma estabelecida para o
casamento. Uma vez que a união estável é a ele associada, nos parece coerente que a maioria dos
sujeitos investigados tenham qualificado positivamente tal determinação a partir desse detalhe
sobre o qual foram informados através do instrumento utilizado na pesquisa. A idéia da
318
“construção conjunta” fornecida como justificativa a esse posicionamento reitera as mudanças
sociais tocantes aos papéis de gênero na relação conjugal e a noção de justiça consubstancia as
inovões com referência ao passado, tempo em que viver em união estável era uma “opção
envolta em grandes dificuldades.
Não obstante, a crença acerca da possibilidade de um dos membros de um casal
considerar que está namorando enquanto o outro entenda que está vivendo em união estável é
uma das marcas mais fortes da incidência da modernidade nesse tipo de vínculo – e, por extensão
na vida privada –, percepção esta que, uma vez atuando nas práticas cotidianas, faz da definição
dos limites entre o namoro e a união estável um dos principais problemas ligados a essa
modalidade de relacionamento na atualidade. Essas diferentes perspectivas nos modos de
entender a relação criam impasses de natureza afetiva cujo desmembramento atinge a esfera
jurídica, os quais têm sido enunciados através de matérias veiculadas pela dia impressa,
televisiva e digital, tais como a intitulada “detalhes que fazem namoro virar união estável,
publicada durante a realização dessa pesquisa em um jornal de grande circulação
3
. Na internet
outras nocias revelam a preparação de documentos formais pelos namorados visando evitar que
o seu patrimônio seja dividido caso a relação termine. Esse tipo de comportamento e,
principalmente, a questão do qual deriva a indiferenciação entre o namoro e a união estável é
algo absolutamente contemporâneo, na medida em que não se encontram registros de
comportamentos similares em outra época histórica. Antes da legalização da união estável,
quando a mesma era considerada como concubinato, excetuando-se as dificuldades próprias da
dinâmica conjugal e do seu rompimento, os demais problemas suscitados por essa forma de
relação estavam ligados à sua ilegitimidade. Não havia dúvidas entre os membros do casal que
optavam pelo vínculo informal quanto à natureza de sua relação; ao contrário, a certeza de sua
condição servia de motivo para suas reivindicações em busca do reconhecimento social que lhes
era negado.
O advento da união estável, fazendo de uma forma de relação conjugal antiga um novo
arranjo conjugal, estabelece novos problemas e inclui novos dados no relacionamento afetivo. Ao
mesmo tempo em que a legislação que regula esse arranjo representa um avanço, na medida em
3
Jornal O Globo, 20 de junho de 2004.
319
que assegura aos que por ele optam garantias legais antes usufruídas somente por aqueles que
eram legalmente casados, alguns aspectos jurídicos dessa nova realidade não são imediatamente
absorvidos pelos integrantes dos diversos grupos sociais. O contrato constitutivo de união estável
é um dispositivo que exemplifica as contradições trazidas pelo reconhecimento jurídico da união
estável. Ao mesmo tempo em que esse instrumento legal ampara os conviventes em caso de
ruptura do vínculo conjugal, sendo por essa razão muitas vezes considerado por parte de alguns
juristas, e dos próprios sujeitos da união estável, como um ato afetivo na medida em que se
propõe a proteger o outro, em algumas situões, inversamente, o que coloca discussão não é a
dimensão do cuidado, mas o afeto e a confiança existente entre o casal. Esse questionamento
decorre do entendimento de que fazer um contrato formal para estabelecer a divisão patrimonial é
visto como um ato baseado sentimento de desconfiança relativa aos bens. Essa desconfiança é
pessoalizada, na medida em que é relacional, ou seja, direcionada de um componente da díade
conjugal em relação ao outro. Tal como os demais aspectos das representações sociais as dúvidas
suscitadas pelo aspecto abordado remetem ao contexto social no qual emerge esse novo arranjo,
incidindo, de outras maneiras, sobre as relações afetivas como um todo. Giddens (2002) define a
modernidade como “a cultura do risco, afirmando, nesse sentido, que “em circunstâncias de
incerteza e múltipla escolha, as noções de confiança e risco têm aplicação particular (...) a
modernidade reduz o risco geral em certas áreas e introduz novos parâmetros de risco, pouco
conhecidos ou inteiramente desconhecidos em épocas anteriores(p.11).
Nessa concepção uma relação, uma vez que constituída essencialmente pelo amor, garante
por si mesma a utilização pelos membros do casal que a come de um critério de justiça
necessário na repartição do patrimônio comum ou, de outro modo, a existência de sentimentos
torna as questões patrimoniais irrelevantes e, portanto, a existência de um contrato formal
desnecessário, visto que o que vale é um contrato de outra natureza, o afetivo. Todavia, o
contrato constitutivo de união estável foi avaliado positivamente pela maioria dos sujeitos
investigados, dos quais uma parcela considerável fez a ressalva de que a concordância com a sua
consecução – na qual deixaram impcita sua qualificação positiva está condicionada à
existência de uma consensualidade entre os membros do casal convivente a esse respeito. A idéia
de consensualidade expressa o entendimento de que, em se tratando de uma opção de vida
conjugal informal como a união estável, não deve haver interferências externas, sendo essa uma
320
das queixas comumente ouvidas nas conversas cotidianas a respeito da legalização. Ou seja, na
medida em que é possível escolher a maneira pela qual a conjugalidade será vivenciada é preciso
assegurar o direito concedido pela modernidade de manter os assuntos ligados a essa esfera a
critério do casal, ainda que, com abertura que permita, dependendo de sua vontade, utilizar dessa
possibilidade legal vista, em primeira instância, como positiva. Dias e Pereira (2002) questionam
o limite de intervenção do Estado na intimidade e na privacidade interrogando:
Não constituirá excessiva e indevida intervenção na vida privada do cidadão estabelecer,
por exemplo, a necessidade de identificar um culpado pelo fim do amor? De outro lado,
teria o Estado legitimidade para se imiscuir nas relões amorosas daqueles que optaram
viver sem o selo da oficialidade do casamento e, de modo exaustivo, impor regras,
direitos e deveres a quem não deseja tal ou tanta intervenção? (p.5-6)
É importante ressaltar que o caráter facultativo pleiteado pelos participantes dessa
investigação em relação ao contrato constitutivo de união estável manifestou-se também em suas
respostas à possibilidade de conversão da união estável casamento, devendo-se ressaltar ser tal
demanda coincidente com o disposto no texto legal em relação a ambos os aspectos, tratados no
âmbito jurídico como possibilidades cuja concretização está submetida à escolha do casal
convivente. A intenção de privacidade acompanha a avaliação positiva conferida pela amostra a
esses aspectos, necessidade tipicamente contemporânea. Segundo Giddens (2002), a escolha é o
componente fundamental do cotidiano na modernidade, na medida em que nesse contexto os
indivíduos são confrontados com uma complexa multiplicidade de escolhas, não lhes sendo
oferecido, contudo, o auxílio suficiente para sua seleção. O autor afirma que desse fato resulta a
noção de estilo de vida por ele definido como um conjunto mais ou menos integrado de práticas
que um indivíduo abraça não só porque essas práticas preenchem as necessidades utilitárias, mas
porque dão forma material a uma narrativa particular da auto-identidade” (p.79).
A opção pela união estável encaixa-se dentro de um estilo de vida moderno, no qual os
adeptos dessa maneira de vivenciar a conjugalidade precisam fazer escolhas dentre as várias
possibilidades que sua opção conjugal encerra. Nesse sentido, o posicionamento e as atitudes
observadas nessa pesquisa falam de uma identidade compartilhada a partir de permanências
culturais ligadas a essa forma de relação, reveladas no entendimento de que nesse tipo de vínculo
321
não deve haver interferências externas. Diante de uma inovação legal trazida pelo
reconhecimento jurídico de sua forma de relação conjugal os sujeitos recolocam a união estável
no campo da vida privada, reafirmando sua opção por uma relação cuja natureza informal é
sustentada pelo amor e pelo respeito, o núcleo central de sua representação. Nesse processo de
atribuição de significados as novidades trazidas pela legalização são absorvidas, desde que as
mesmas não atinjam essa natureza que, exacerbando a noção de escolha, situa a união estável no
terreno da intimidade referindo-a exclusivamente ao casal. Ou seja, observa-se, de tal modo, um
movimento de adaptação no qual cognição e afeto se engendram para a assimilação dos detalhes
da lei que regulam esse tipo de vínculo.
A qualificação positiva dada ao contrato constitutivo de união estável é a mesma
direcionada pelos respondentes à facilidade dada pela lei para a conversão da união estável em
casamento, tendo sido em relação a ela acrescentada a idéia de justiça, tal como na avaliação
referente ao regime de bens. O posicionamento que, a princípio, demonstra ser uma atitude
condizente com a lei que equipara a união estável ao casamento parece indicar que o vínculo
formal ainda constitui o paradigma para as relões conjugais e familiares. Cabe aqui a
interrogação: se a união estável é igual ao casamento, por que se transformar nele? A adesão a
essa facilidade legal foi preponderante entre as mulheres casadas e em união estável, homens
casados e homens e mulheres solteiros, respectivamente. Quanto aos primeiros era previsto que,
tendo eles optado pela união formal, julguem seu modo de vida como o mais adequado e assim
considerem positiva a facilitação legal concedida para aqueles que vivem em união estável, visto
que ela permite que estes também se tornem casados, encaixando-se numa categoria
representacional no plano da conjugalidade.
Em coerência com as transformões sociais a maioria dos sujeitos investigados negam
um pensamento corrente de que a união estável beneficia mais a mulher do que o homem que
vive esse tipo de relação, utilizando como justificativas as afirmativas de que a mesma “beneficia
os dois” e que “os direitos são iguais. Referida uma à outra, a primeira explicação reafirma o
caráter positivo atribuído ao reconhecimento jurídico da união estável e a segunda reflete a
apropriação de uma expressão de uso comum no conhecimento produzido a respeito desse
arranjo, devendo-se ressaltar que a idéia de “direitos iguaisacompanha a história social da qual
322
a união estável faz parte, refletindo-se em vários aspectos do cotidiano dos diversos grupos
existentes nas sociedades modernas. O discurso social em torno da “igualdadese desloca do
nível macrossocial para o nível microssocial, penetrando, primeiramente, na esfera das relações
de gênero através do debate em torno dos direitos das mulheres. Uma vez relacional essa
discussão perpassa posteriormente o campo dos relacionamentos. Madeira (1998) enfatiza essa
presença da dimensão histórica nas representões ao afirmar:
A representação social traz em si a história na história particular de cada um. Nas
variâncias de sua estruturação estão as particularidades de cada sujeito, e, em suas
invariâncias, as marcas do sentido atribuído, por determinados segmentos ou grupos, ou
até, por sua totalidade a um dado objeto. (p.16)
Ainda nesse sentido de adequação ao presente época em que a união estável tem
aumentado progressivamente, como atestam os dados demográficos expostos anteriormente –, de
acordo com as posições tomadas em relação aos vários aspectos da união estável, a amostra
pesquisada considera esse arranjo mais próximo do casamento do que ao concubinato, não
identificando diferenças entre viver junto e ser casado oficialmente. Tais atitudes evidenciam que
o sentido – ao qual se referiu Madeira atribuído à união estável é um sentido de casamento.
Esse significado é construído a partir de seu núcleo estruturante básico – amor, respeito – e
aprofundado na aproximação dessa forma de relão com o casamento e pelo entendimento de
que não existem diferenças entre “viver junto” e ser casado oficialmente. A ancoragem condensa
essa aproximação através da nomeação daqueles que vivem em união estável como
“companheiros, mesma denominação legal a eles atribuída, cujo uso tornou-se bastante comum
na atualidade, assim como os termos marido ou mulher, as quais são empregados
indistintamente na denominação de pessoas casadas ou em união estável. Apropriando-nos das
explicações de Vala (2000) acerca do processo de ancoragem, podemos afirmar que o fluxo de
informões referentes à união estável que atravessam o cotidiano social exige organização, a
qual é feita através de uma estrutura semântica organizada em categorias. Podemos afirmar, de
acordo com o autor, que conhecer a união estável é classificar esse tipo de vínculo, dar-lhe um
nome. Classificar a união estável como uma relão de amor, respeito e companheirismo” é
atribuir-lhe uma posição num sistema de categorias originário de representões sobre a natureza
das relações amorosas. O amor, o respeito e o companheirismo são as âncoras que sustentam a
representação social desse arranjo e modelam seus conteúdos semânticos. Nessa investigação
323
estes afetos delineiam o conteúdo representacional da união estável nos vários aspectos nela
abordados.
O posicionamento favorável ao reconhecimento jurídico da união estável foi
consensualmente compartilhado por homens e mulheres participantes dessa investigação,
principalmente aqueles que vivem nessa modalidade de relação. Dentro desse entendimento, a
estabilidade foi por eles considerada como a principal característica legal para que uma relação a
dois possa ser considerada união estável. Entendemos que a estabilidade da qual falam os sujeitos
pesquisados se refere, preponderantemente, aos sentimentos presentes no núcleo central de sua
representação. Assim como este organiza e estrutura essa representação dando-lhe estabilidade,
na visão dos sujeitos, o amor e o respeito – seus principais componentes assumem a mesma
função na relação a dois. A presença desses elementos é o que permitirá sua definição como
estável. A ênfase nos sentimentos decorre do enfraquecimento da tradição, aspecto nessa
pesquisa mencionado nos argumentos fornecidos à crença de perenização do casamento.
Contudo, apesar da união estável ter sido associada ao casamento, ao ponto de não terem sido
mencionadas diferenças no aspecto vivencial dessas duas formas de relação, a construção de
significado a seu respeito não é totalmente linear, visto que alguns temas ligados a esse arranjo
parecem situados entre a permanências e as inovações culturais.
Como afirma Arruda (1998) “as representões sociais são tanto a expressão de
permanências culturais como são o locus da multiplicidade, da diversidade e da contradição
(p.305), características que se misturam nas representões sociais do nosso objeto. Se por um
lado a união estável, como fato novo, traz em si características próprias da modernidade, como a
adesão consensual ao reconhecimento jurídico da união estável declarada como positivo e justo
– observa-se no conhecimento construído e compartilhado a seu respeito atravessamentos da
tradição, como o entendimento de que, à semelhança do casamento, para que uma relação possa
ser considerada como tal é necessário que seus membros vivam sob o mesmo teto. Essa
concepção favorável à coabitação foi confirmada pela discordância manifesta por uma parcela
bastante expressiva dos sujeitos averiguados em relação à não determinação legal de que, para
que uma relação seja considerada união estável, o casal convivente compartilhe a mesma
residência. A vida “sob o mesmo tetofoi, inclusive, um dos motivos apontados por uma parcela
324
pequena dos homens solteiros e separados, das mulheres casadas, em união estável e separadas
em relação à possibilidade de que, num casal, um dos membros considere que esteja vivendo em
união estável enquanto o outro entenda que está apenas namorando.
A estreita convivência entre os namorados facilitada por uma coabitação em tempo
integral ou parcial – nos fins de semana, feriados, férias etc é uma característica de muitos
namoros na atualidade, contribuindo em conjunto com outros indicadores inclusive do ponto de
vista jurídico – de vínculo conjugal, como conta bancária conjunta, compra de bens móveis e
imóveis, pagamento de aluguel, entre outros, para essa diferença de perspectiva dos membros do
casal, da qual resultam imeros processos judiciais visando direitos oriundos de uma relação
cuja existência é concebida unilateralmente. Não obstante, essa óticas distintas são relacionadas
pelos sujeitos investigados primeiramente aos sentimentos de um membro da díade conjugal para
com outro, aos sentimentos individuais, aos sentimentos, as concepções distintas, ao
compromisso e ao gênero. Apesar da divulgação feita pela dia de situões de litígio entre os
namorados precipitadas pela coabitação, a convivência “sob o mesmo tetonessa etapa da vida
afetiva foi apontada, principalmente pelas mulheres em união estável, como um dos motivos da
diferença de percepção entre os membros do casal de namorados a respeito da natureza de sua
relação. Nos parece possível que, em razão da própria união estável ser comumente denominada
viver junto, e isso signifique no plano social viver sob o mesmo teto, coabitar, as mulheres
conviventes tenham apontado a coabitação como um dos fatores responsáveis por tal distinção.
Além disso, o gênero e a situação conjugal, associadamente, demonstram tornar esse sentido mais
pregnante para as companheiras cuja prática conjugal é, comumente, constituída e nomeada em
função desse componente. Viver em união estável representa, segundo esse grupo, entre outros
fatores, coabitar.
De acordo com as respostas da maioria dos homens e mulheres em todas as situações
conjugais investigadas, os sentimentos constituem ainda o principal fator responsável pela
transformação do namoro em união estável, tendo sido também apontados como fator essencial
para que uma relação seja considerada união estável. As mulheres em união estável, embora
citem os sentimentos como os primeiros responsáveis pela transformação do namoro em união
estável, foram menos incisivas nessa atribuição. Em seguida aos motivos emocionais, elas
325
relacionam a passagem de uma situação afetiva à outra aos fatores externos e legais. Ao
contrário, os homens em união estável constituem o segundo grupo com maiores índices
relacionados a essa atribuição. Coincidentemente, a eleição dos sentimentos como primeiro fator
essencial e definidor da relação de união estável foi feita, prioritariamente, pelos homens casados
e em união estável. As mulheres nessa situação, embora em menor proporção, também
consideram os sentimentos como o elemento fundamental para que uma relação seja como tal
considerada, seguidos pela coabitação. Esse foi o segundo elemento citado por todos os grupos
nessa classificação, exceto pelos homens conviventes que, anteriormente a eles, apontam o tempo
de convivência. Vale dizer que as mulheres separadas foram o grupo que menos aderiu a essa
primazia do plano emocional declarada pelos demais.
O afeto foi privilegiado também nas respostas dos participantes da pesquisa quando
interrogados acerca dos direitos e deveres daqueles que vivem em união estável, nos quais
incluíram o respeito e a liberdade. Esse resultado reforça nosso entendimento de que, ao
tratarmos de temas que remetem diretamente à afetividade como aqueles ligados à vida amorosa,
conjugal e familiar – nos quais, pela inserção nas três categorias, se inclui a união estável –, é
importante que essa dimensão ressaltada em nossa pesquisa nas tomadas de posição frente aos
imeros aspectos levantados em relação à união estável, seja considerada como um aspecto
fundamental de análise. É importante dizer, nesse sentido, que a própria teoria das representões
sociais a qual utilizamos como eixo teórico nos auxilia nesse intento, na medida em que a esse
entendimento acerca da relevância do afeto nos estudos acerca dos diversos objetos sociais por
ela contemplados é compartilhado por diversos autores nesse campo de estudos.
Grize (1989) alerta para a impossibilidade de dissociação entre a cognição e o afeto nesse
tipo saber. A esse respeito Jodelet (1989 a) assinala: “as representações sociais devem ser
estudadas articulando elementos afetivos, mentais, sociais, integrando a cognição, a linguagem e
a comunicação às relões sociais que afetam as representões sociais e à realidade material,
social e ideativa sobre o qual elas intervêm. (p.31).
Arruda (1993) reitera tais posições referentes à importância do afeto reportando-se ao
esquema elucidativo das múltiplas dimensões do campo de estudos da representação social,
326
proposto por Jodelet (1989a). A primeira autora esclarece que, no primeiro eixo desta figura as
representões sociais constituem formas de conhecimento prático direcionadas para a
compreensão do mundo e para a comunicação e, no segundo eixo, as mesmas são sempre
produções contextualizadas, resultantes das circunstâncias em que emergem e se propagam. Em
seguida a essa interpretação Arruda faz a consideração de que “as representações sociais são
ainda “uma expressão da realidade intra-individual, uma exteriorização do afeto(p.303). Ela
acrescenta ainda que, embora neste segundo eixo o homem seja situado no processo histórico,
nele é concedido espo para “as forças criativas da subjetividade”, trazendo para o centro do
debate a questão do afeto. Tal reflexão a faz reiterar, em seguida, a importância da consideração
do componente afetivo ao se tratar das representações sociais ao afirmar que “as representões
sociais não são, assim, meras expressões cognitivas; são permeadas também pelo afeto.
No que se refere às representações sociais compartilhadas em relação à união estável as
entendemos como construções afetivizadasde homens e mulheres em diferentes situões
conjugais a respeito desse tipo de vínculo. Ou seja, nas conversações cotidianas travadas sobre
essa forma de relação ou nos posicionamentos manifestados por escrito em nossa pesquisa, os
sujeitos falam também a respeito dos sentimentos a ela vinculados. Refletem, discutem e
analisam a união estável tomados pelo o afeto a ela inerente, construindo um discurso que se
dirige ao outro e o convida a simplificar essa nova e complexa realidade, lembrando, conforme
Sá (1998), que esse processo de simplificação está embutido na própria formação de uma
representação social.
Essa simplificação é necessária e útil em se tratando da união estável e confirma a função
das representações sociais enunciada primeiramente por Moscovici, ao qualificar esse saber
como prático – na medida em que permite aos sujeitos lidarem com as incertezas e problemas
provocados por esse novo arranjo, cuja complexidade própria das relões de afeto, como
afirmam Dias e Pereira (2002) ao discorrerem sobre o tratamento dado a essas relões no campo
do Direito de Família, ultrapassa a objetividade dos fatos e atos jurídicos e remete à esfera da
subjetividade, pelos quais os mesmos são permeados.
327
Dias e Pereira (2002) reiteram que esta subjetividade presente na objetividade dos atos e
fatos jurídicos tem repercussões no mundo jurídico. Uma vez que a união estável é considerada
nesse campo como família, consideramos relevante citar o convite feito pelos autores a pensar as
novas representações sociais da família no intuito de compreender essa instituição no novo
século. Segundo eles, essas várias possibilidades de representações sociais da família
evidenciam-se através dos novos arranjos conjugais citados no artigo 226 do novo Código Civil,
que afirma ser a entidade familiar plural e não mais singular como ocorria no passado. Há uma
coincidência entre a lei e o conhecimento do senso comum expresso nessa pesquisa, na medida
em que a união estável, tendo sido ancorada no casamento, inclui nessa representação vários
aspectos em conformidade a uma moderna definição de família. Essa mudança nas
representões da família, entendida pelos autores como uma conquista, muito se aproxima da
maneira como os homens e mulheres investigados concebem a união estável. A união estável,
enquanto novo arranjo conjugal, é representada, em consonância com a legislação, também como
família contemporânea, estando a proximidade entre os dois conceitos – de união estável e de
família este último em sua acepção contemporânea, ressalta-se explicitada na seguinte
consideração feita por Dias e Pereira (2002) a respeito dessa última instituição:
[...] a família não é mais essencialmente um núcleo econômico e de reprodução, onde
sempre esteve instalada a suposta superioridade masculina. Passou a ser muito mais um
espo para o desenvolvimento do companheirismo, do amor e, acima de tudo, o cleo
formador da pessoa e elemento fundante do próprio sujeito. (p.4)
Pereira (2002) esclarece que o esforço empenhado no sentido de entender o que, na
atualidade, se define como família procede, na medida em que o Estado tem como interesse
fundamentar a proteção a essa entidade, em suas múltiplas formas, desde que estas, como tal, se
constituam. A partir de um enfoque moderno dado à família essa avaliação utiliza como critério
básico a identificação dos vínculos afetivos que estruturam e consolidam a formação do núcleo
familiar, em detrimento da forma que o mesmo possa assumir, como acontecia no passado. Esse
moderno enfoque jurídico dado à família tem sua expressão no universo consensual através da
“afetivizaçãoda vida privada, característica própria da modernidade, tal como manifesto
exaustivamente nessa pesquisa em relação aos vários aspectos concernentes à união estável.
328
Contudo, apesar da união estável nos remeter ao tema da mudança social, uma vez que ela
mesma fora tornada nova, do ponto de vista legal, pelas transformões ocorridas especialmente
no século passado e suas implicações na esfera da intimidade, as representões sociais
construídas a respeito dessa relação comportam elementos tradutores da mudança social e outros
oriundos da tradição. Essa emergência simultânea, explicada pela teoria do núcleo central,
permite-nos situar a união estável entre a tradição e a transformação, subtítulo do livro
organizado por Féres-Carneiro (1998) a respeito do casamento – no qual se ancora e da família
como é considerada no âmbito jurídico –, do qual fazemos uso pela adequação ao
posicionamento ocupado por esse arranjo na atualidade e pela sua aproximação a ambas
instituições feita nesse estudo.
Apesar de poder ser conceituada como uma forma de relação moderna” a partir da
legalização, em razão de sua nova formulação, e, antes dela, por contrariar costumes
conservadores –, em se tratando do saber representacional erigido a respeito da união estável a
tradição e a transformação não são excludentes, mas, ao contrário, se alternam nessa construção.
Os resultados do presente estudo demonstram um notável conhecimento declarado por homens e
mulheres a respeito do reconhecimento jurídico da união estável e de alguns aspectos específicos
da lei que regula esse tipo de vínculo conjugal, bem como o posicionamento favorável a ele
direcionado, indicadores de uma mudança de mentalidade tocante às uniões informais e seus
adeptos, em outrora alvos de discriminação e exclusão social. Contudo, a tradição se manifesta
consideravelmente na discordância de uma parcela expressiva de sujeitos com a não exigência
legal da coabitação para que uma relação seja considerada do ponto de vista jurídico como união
estável, na crença na perenização do casamento e na idéia de que é mais fácil se separar na união
estável do que no casamento. Esta última concepção parece inclusive contrariar, em certo sentido,
a prevalência dos sentimentos expressa no decorrer de toda a pesquisa. Eis o paradoxo inerente
ao tipo de vínculo em questão: ele é forte, na medida em que tem como base o afeto, e frágil,
porque, apesar disso, não sendo vista como oficial – no sentido do casamento –, é mais fácil se
dissolver.
A representação da união estável como uma “relão de amor e respeito” culminou nas
declarões da maioria dos sujeitos pesquisados de que uma vida conjugal satisfatória é
329
favorecida tanto por esse tipo de vínculo quanto pelo casamento, justificadas pelo argumento de
que, em se tratando da satisfação conjugal, o importante não é a forma de relação, mas os
sentimentos. O tema da felicidade amorosa – uma das principais demandas contemporâneas,
como atesta Calligaris (1994) encerra a investigação acerca da união estável, consubstanciando
sua ancoragem no casamento, a partir de uma estruturação afetiva que confere significado a todo
o conteúdo representacional. Estruturadas em torno do amor, do respeito e, por aproximação, do
companheirismo, tais construções revelaram uma amostra bastante homogênea quanto à
priorização do afeto nessa forma de relação. A valorização dos componentes afetivos, a forte
adesão às inovões jurídicas trazidas pelo reconhecimento jurídico e a ancoragem no casamento
revelam um tipo de saber que reformula o dito popular “amigado com fé, casado é”,
transformando-o no enunciado unido com amor, respeito, e companheirismo, casado é, este
mais condizente com a realidade social contemporânea no qual a união estável se insere. A
estabilidade desse arranjo, característica legal que o nomeia, se origina dessa organização.
A união estável é um tema de nossa época que altera o significado da vida em comum,
potencializando o que Féres-Carneiro (1998) entende como a “dificuldade de ser casal. O estudo
das representações sociais da união estável ao responder à problematização tecida nessa pesquisa,
revelando onde essa relação se ancora, ao invés de encerrar as reflexões sobre nosso objeto,
suscita novas questões a respeito desse tema. Consideramos importante que outros estudos
investiguem a possível existência de uma “zona muda” (ABRIC, 2003) em alguns aspectos
polêmicos da legislação ou ainda que investigações futuras aprofundem o “estranhamento do
familiar(ARRUDA, 1998), ou seja, a “reelaborão do velho, tornando-o novo(VALA, 2000)
no processo de ancoragem das representações sociais da união estável. Ocorre-nos ainda que o
estudo das representações sociais de díades conjugais a respeito da união estável considerando o
conceito identidade conjugal(FÉRES-CARNEIRO, 1998) poderia auxiliar a compreensão das
maneiras pelas quais essas construções organizam e estruturam as práticas cotidianas de casais,
permitindo um detalhamento na análise da associação entre práticas e representações sociais e sua
articulação com o conceito de alteridade.
Denominadas saber do senso comum, códigos de interpretação, “estruturas
estruturadas e estruturantes, entre outras adjetivões, as representões sociais têm como
330
principal objetivo lidar com os fatos e situações novas que se apresentam nos vários contextos
sociais. Diante da complexidade da união estável e dos novos problemas que essa forma de
relação introduz no cotidiano, encerramos com o princípio de simplificação proposto por Sá
(1998), por entendermos sua utilização nas representações sociais da união estável visto que as
mesmas ao se estruturarem em torno do amor, do respeito e do companheirismo utilizam-se da
simplicidade dos afetos na tentativa de simplificação da vida cotidiana da qual é, na atualidade,
parte substancialmente importante.
331
6. REFERÊNCIAS
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337
ANEXOS
338
Condição: ________________
Número: ________
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL
QUESTIONÁRIO
Este questionário se destina à obtenção de dados para a tese de doutorado de Patrícia Ennes sobre
as representações sociais de uma determinada forma de “relação a doisque tem se tornado cada
vez mais comum na sociedade contemporânea.
As experiências e as informações que votem acerca dessa relação, bem como os seus
julgamentos, são muito importantes para este trabalho.
Agradecemos desde já a sua colaboração.
Nosso primeiro pedido é que você escreva, nas linhas abaixo, as 5 (cinco) palavras ou
expressões que lhe vêm à cabeça, quando você pensa numa ...
... relação entre um homem e uma mulher ambos solteiros, separados ou divorciados
que estão juntos há algum tempo – morando ou não na mesma casa – com pleno
conhecimento de seus respectivos familiares e amigos.
( ) _____________________________________________________________________
( ) _____________________________________________________________________
( ) _____________________________________________________________________
( ) _____________________________________________________________________
( ) _____________________________________________________________________
Agora, retorne às palavras que você escreveu e lhes atribua uma ordem de importância.
Para isso, registre, nos espos entre parênteses que as antecedem, o número 1para aquela que,
no seu entender, é a mais importante, o número 2para a que você considera que é a seguinte
em importância, e assim por diante.
339
Nossas outras perguntas são as seguintes:
A. Vosabia que o novo Código Civil brasileiro, promulgado em 2002, passou a reconhecer o
tipo de relação descrito na pergunta anterior como uma entidade familiar legal, dando-lhe a
designação de “união estável?
1.( ) Sim 2.( ) Não
B. Se vorespondeu sim, como soube disso? _______________________________________
______________________________________________________________________________
C. Qual das seguintes concepções melhor caracterizaria, no seu entender, a união estável
legalmente reconhecida?
1.( ) Um casamento sem formalismos
2.( ) Um namoro (ou noivado) com mais compromissos
3.( ) Um concubinato (ou amigação) mais aceitável socialmente
4.( ) Outra. Qual? _____________________________________________________________
D. Você conhece, nas suas relações de família ou amizade, casais que estariam incluídos na
categoria legal de união estável?
1.( ) Sim 2.( ) Não
E. Se respondeu sim, você acha que a maioria dos homens que comem esses casais se
considera ou se sente mais próximo da condição de ...
1.( ) casado 2.( ) amigado 3.( ) namorado 4.( )_______________
F. Ainda se respondeu sim, você acha que a maioria das mulheres que comem esses casais
se considera ou se sente mais próxima da condição de ...
1.( ) casada 2.( ) amigada 3.( ) namorada 4.( )_______________
340
G. Se você mesmo(a) vive ou já viveu em união estável, você se considera ou se sente – ou, se
no passado, se considerava ou se sentia mais próximo(a) da condição de ...
1.( ) casado(a) 2.( ) amigado(a) 3.( ) namorado(a) 4.( )_______________
H. O namoro” atual, no qual as pessoas vivenciam algumas vezes situões em outras épocas
somente permitidas no casamento, pode ser considerado uma união estável?
1.( ) Sim 2.( ) Não
I. Por quê?_____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
J. Voacha possível que, num casal, um dos parceiros considere que esteja vivendo em união
estável, enquanto o outro ache que está apenas namorando?
1.( ) Sim 2.( ) Não
K. Se “sim, como você explicaria isso? _____________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
L. Considerando que um namoro pode evoluir para uma união estável, o que, no seu entender,
tende a favorecer essa transformação?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
M. O que é preciso, no seu entender, para que a relação entre um homem e uma mulher seja
considerada uma união estável?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
341
N. Marque nas características legais apresentadas abaixo aquelas que voconsidera
importantes para que uma relação a dois possa ser considerada como união estável.
1.( ) Finalidade de constituição de família (haver intenção, objetivo por parte do casal de
constituir família)
2.( ) Estabilidade (a relação ter uma certa durabilidade, não ser efêmera, ser diferente de uma
aventura)
3.( ) Unicidade de vínculo (ambos os companheiros não terem vínculos conjugais casamento
ou de outro tipo – com outros parceiros)
4.( ) Notoriedade ( o casal ter convivência pública comum, aparecerem, apresentarem-se
publicamente, socialmente como estando juntos)
5.( ) Continuidade ( a relação não ter longas ou freentes interrupções)
6.( ) Diversidade de sexos (os conviventes serem de sexos diferentes)
7.( ) Informalismo (não ser preciso formalidades para viver esse tipo de relação)
O. A lei não determina que, para que uma relação seja considerada união estável, o casal viva
sob o mesmo teto. O que vopensa sobre isso?
1.( ) Concordo
2.( ) Discordo
3.( ) Não sei
P. Por quê? ____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Q. A união estável, como todo instituto jurídico, implica direitos e deveres. Cite alguns direitos e
deveres que você supõe terem as pessoas que vivem em união estável.
Direitos:_______________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Deveres:_______________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
342
R. O regime de bens que vigora na união estável, assim como no casamento, é o de comunhão
parcial de bens. Portanto, quando o casal que vive em união estável se separa, o patrimônio
comum, é dividido em 50%, ficando disponível metade para cada membro do casal. Você está de
acordo com essa regra jurídica?
1.( ) Sim 2.( ) Não
S. Por quê?_____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
T. Vosabia que o casal pode formalizar em cartório um contrato constitutivo de união estável,
pelo qual diversos aspectos como o da comunhão ou separação de bens (podendo ser
estabelecida uma divisão diferente da descrita na questão anterior) são explicitados?
1.( ) Sim 2.( ) Não
U. O que você acha disso? ________________________________________________________
______________________________________________________________________________
V. Vosabia que a relação de união estável pode ser convertida, sem grande burocracia, em
casamento?
1.( ) Sim 2.( ) Não
W. O que vopensa disso? _______________________________________________________
______________________________________________________________________________
X. Considerando os aspectos da relão de união estável vistos até aqui, você acha que ela está
mais próxima do casamento ou do concubinato?
1.( ) Casamento 2.( ) Concubinato
Y. Por quê?____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
343
Z. Considerando os aspectos da união estável vistos até aqui, você acha que existe alguma
diferença entre viver junto e ser casado oficialmente?
1.( ) Sim 2.( ) Não
A. Se sim, qual ou quais?_________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
B. Assinale, por favor, qual ou quais dos termos abaixo você acha que se aplicam a alguém que
vive em união estável.
1.( ) Convivente
2.( ) Marido ou Mulher
3.( ) Amigo (a)
4.( ) Amante
5.( ) Esposo (a)
8.( ) Concubino (a)
9.( ) Parceiro (a)
10.( ) Namorado (a)
11.( ) Consorte
12.( )____________________
6.( ) Companheiro (a)
7.( ) Cônjuge
C. Como vose posiciona em relação ao fato de um tipo de arranjo conjugal comum nas
práticas cotidianas há muito tempo ter passado a constituir uma realidade jurídica, com direitos
e deveres legais?
1.( ) A favor
2.( ) Contra
3.( ) Indiferente
D. Por quê? ___________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
344
E. Voacredita que, com o surgimento desse fato jurídico novo, o casamento irá acabar?
1.( ) Sim 2.( ) Não
F. Por quê?____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
G. Voacha que a união estável beneficia mais a mulher que vive esta modalidade de relação
do que o homem?
1.( )Sim 2.( )Não
H. Por quê? ___________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
I. Você acha que é mais fácil para um casal se separar estando ele vivendo em união estável do
que estando casado?
1.( )Sim 2.( )Não
J. Por quê? ____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
K. Voacha que uma vida conjugal satisfatória é mais favorecida pela situação de casamento
ou pela situação de união estável?
1.( ) Pelo casamento
2.( ) Pela união estável
3.( ) É indiferente
345
L. Por quê?____________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Dados Pessoais
M. Idade ______ anos
N. Sexo 1.( ) Feminino 2.( ) Masculino
O. Escolaridade 1.( ) Nível médio completo
2.( ) Superior incompleto
3.( ) Superior completo
P. Religião: ___________________________________________________________
Q. Orientação política: 1.( ) Direita ou Centro-direita
2.( ) Esquerda ou Centro-esquerda
3.( ) Outra. Qual? ________________________________
4.( ) Não tem orientão política
R. Estado civil ou situação conjugal atual (registrar apenas uma opção):
1.( ) Solteiro
2.( ) Casado. Há quanto tempo?_______________
3.( ) União Estável. Há quanto tempo? _______________
4.( ) Separado/Divorciado. Há quanto tempo?________________
346
ESCLARECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO NA PESQUISA
Estou desenvolvendo uma pesquisa para minha tese de doutorado que se propõe a analisar
as representações sociais construídas a respeito de uma forma de “relação a doisbastante
comum em nossa sociedade. Para tanto, estou realizando a aplicação deste questionário. Sua
participação é de fundamental importância para a realização deste estudo.
Não haverá riscos, nem desconfortos, nem gastos de qualquer natureza. Você poderá
solicitar qualquer esclarecimento quando sentir necessidade e poderá interromper sua
participação a qualquer momento, sem nenhum ônus, de qualquer natureza. Asseguro que o que
for dito, registrado e escrito será respeitosamente utilizado, e que serão mantidos o sigilo e o
anonimato das informões aqui contidas. Desde já agrado a sua colaboração.
_________________________________________
Pesquisadora: Patrícia Piedade Ennes
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social / UERJ
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, ________________________________________________________, autorizo o
registro das informações fornecidas por mim, em forma escrita, para ser utilizada integralmente
ou em partes, sem restrições de prazos ou citões, desde a presente data. Da mesma forma,
autorizo a leitura de tais por terceiros, ficando vinculado o controle e guarda dos mesmos a
Patrícia Piedade Ennes, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, com o objetivo de realizar a pesquisa a respeito de um
tipo de “relação a dois” cuja freência tem aumentado significativamente em nossa sociedade.
Rio de Janeiro, ____/____/________
Assinatura: ___________________________________________
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