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Dissertão apresentada no Curso de Mestrado
Acadêmico Multidisciplinar em Organizões e
Desenvolvimento com área de concentrão em
Sustentabilidade Socioecomica da UNIFAE -
Centro Universitário, como requisito parcial à
obtenção do grau de Mestre.
Orientador: Prof. Fernando Muniz Santos, Dr.
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Esta dissertação foi aprovada pelo Curso de Mestrado Acadêmico
Multidisciplinar em Organizações e Desenvolvimento com área de concentração
em Sustentabilidade Socioeconômica da UNIFAE - Centro Universirio.
Curitiba, 21 de março de 2007.
______________________________
Prof. José Edmilson de Souza Lima, Dr.
Coordenador do Curso
______________________________
Prof. Fernando Muniz Santos, Dr.
Orientador
UNIFAE - Centro Universitário
______________________________
Prof. Belmiro Valverde Jobim Castor, Ph.D.
Examinador Interno
UNIFAE - Centro Universitário
______________________________
Prof. Carlos Alberto Farracha de Castro, Dr.
Examinador Externo
Pontifícia Universidade Católica do Paraná
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GHWXDPXOKHU $EUDoDGDDWL3RLVHVVDp$
~QLFDSHUVSHFWLYDGRVKRPHQV´
(Trecho do afresco (SRSpLD GH *LOJDPHVK de autoria
desconhecida – Mesopotâmia 1750 a.C.).
5(6802
A partir de uma análise preliminar do conceito de democracia direcionada com o
objetivo de se chegar a uma definição de democracia econômica, esta
consubstanciada em um ambiente adequado para o exercício da liberdade de
consciência e de escolha econômicas que, com a devida participação popular,
permitirá a cooptação das preferências e escolhas sociais difusamente presentes
na sociedade, se concluirá que o desenvolvimento econômico e o incremento das
práticas democráticas caminham juntos. Na seência serão rapidamente
identificados os principais gargalos ao desenvolvimento ecomico brasileiro e se
apresentauma teoria democrático-desenvolvimentista que se entende como a
adequada à realidade brasileira, concluindo-se que tal teoria se identifica com a
iia de democracia econômica. Entende-se que só será possível atingir o
desenvolvimento ecomico em um ambiente economicamente democrático
regulado pelo Estado. Ou seja, a atividade reguladora do Estado deverá garantir e
orientar o exercício popular da liberdade de consciência e de escolha econômicas,
com a finalidade de, ao final, descobrir as preferências e escolhas sociais, o que é
essencial ao desenvolvimento econômico. Em específico seestudada a figura
do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicões (FUST), fundo
blico composto, principalmente, por recursos provenientes da arrecadação de
uma contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) com o objetivo de
promover, por meio da universalização dos serviços blicos, a redistribuição,
princípio que a um tempo é mecanismo e conseqüência do desenvolvimento
econômico. A redistribuão proporciona o crescimento da demanda e a
eliminação da concentração de renda, imperfeições que contribuem para o
subdesenvolvimento brasileiro. Portanto, objetiva o presente estudo verificar se no
caso do FUST o aparato regulatório do Estado brasileiro possui instrumentos
aptos a permitir o real exercício da democracia econômica, considerado meio
capaz de oportunizar a participação popular para o devido aliciamento das
escolhas e preferências sociais que esparsamente se encontram na sociedade,
uma vez que o papel do fundo é fazer chegar ao maior mero possível de
pessoas carentes com qualidade e a pros módicos um serviço essencial e
estratégico para o desenvolvimento econômico do país, pois o eventual ficit
democtico na constituição do conteúdo da regulão do FUST pode ser um
indicativo de concentração de renda.
3DODYUDVFKDYH: Democracia; desenvolvimento; participação; regulação;
universalização; FUST.
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From a preliminary analysis of the concept of democracy with the objective of
defining economic democracy, the latter understood in an environment proper to
the exercise of freedom of thinking and economic choices that, with the due
popular participation, will allow cooptation of social preferences and choices
diffusely present in society, the conclusion is that economic development and the
increase of the democratic practices walk hand in hand. Then, the main Brazilian
economic development bottlenecks will be identified and a democratic-
developmentalist theory understood as adequate to the Brazilian reality will be
introduced, with the conclusion that such theory is identified with the idea of
economic democracy. It is understood that it is only possible to achieve economic
development in an economically democratic environment ruled by the State. That
is, the regulating activity of the State should guarantee and guide the popular
exercise of freedom of thinking and economic choices, with the purpose of, at the
end, find out the social preferences and choices, which is essential to economic
development. Specifically, the idea of the Telecommunications Services
Universalization Fund ()XQGR GH 8QLYHUVDOL]DomR GRV 6HUYLoRV GH
7HOHFRPXQLFDo}HV - FUST), public fund formed, mainly, by resources from a tax of
intervention contribution in the economic dominium (FRQWULEXLomRGHLQWHUYHQomRQR
GRPtQLR HFRQ{PLFR - CIDE) with the objective of promoting through
universalization of public services, the redistribution a principle that is a
mechanism and a consequence of the economic development at the same time.
Redistribution allows demand to grow and income concentration to be eliminated,
imperfections that contribute to the Brazilian underdevelopment. Therefore, the
present study aims at verifying whether in the case of FUST the regulatory
apparatus of the Brazilian State has tools to allow the actual exercise of the
economic democracy, considered as a means capable of organizing the popular
participation to the due attraction of social choices and preferences that can be
sparsely found in society, once the role of this fund is to take to the largest number
of people in need an essential and strategic service to the economic development
of the country with good quality and prices, because the eventual democratic deficit
in the constitution of the regulatory content of FUST can point to income
concentration.
.H\ ZRUGV: Democracy; development; participation; regulation;
universalization; FUST.
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ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade
ANATEL - Agência Nacional de Telecomunicações
APA - Administrative Procedural Act (Lei de Processo Administrativo)
CEE - Comunidade Econômica Européia
CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico
COFINS - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
CTN - Código Tributário Nacional
EUA - Estados Unidos da América
FUST - Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações
ICMS - Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias
e sobre Prestação de Serviços de Transportes Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicações
LGT - Lei Geral das Telecomunicações
LRF - Lei de Responsabilidade Fiscal
OPPI - Observatório de Políticas Públicas de Infoinclusão
PIB - Produto Interno Bruto
PIS - Programa de Integração Social
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
TFF - Taxa de Fiscalização de Funcionamento
TFI - Taxa de Fiscalização de Instalação
680È5,2
,1752'8d2................................................................................................. 10
'(02&5$&,$('(6(192 / 9 , 0( 17 2 .................................................... 14
1.1 DEMOCRACIA.......................................................................................... 14
1.1.1 Considerações Preliminares .................................................................. 14
1.1.2 Formas de Governo ............................................................................... 14
1.1.3 Democracias Direta, Indireta e Semidireta............................................. 18
1.1.4 Liberalismo x Socialismo........................................................................ 19
1.1.5 Democracia e Elitismo............................................................................ 23
1.1.6 Democracias Formal, Substancial e Participativa .................................. 24
1.1.7 Democracia Econômica ......................................................................... 27
1.2 DEMOCRACIA E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO
......................................................................................................................... 28
1.2.1 Democracia Brasileira a partir de 1988 .................................................. 28
1.2.2 Democracia Econômica e Desenvolvimento Econômico ....................... 31
5(*8/$d2(81,9(56$/ , =$d2'26  6 ( 59 , d2 6  3 Ò%/ , &2 6........ 40
2.1 REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ............................................ 40
2.1.1 Definição de Regulação ......................................................................... 40
2.1.2 Regulação no Mundo ............................................................................. 41
2.1.3 Regulação dos Serviços Públicos Brasileiros ........................................ 43
2.1.4 Agências Reguladoras Brasileiras ......................................................... 44
2.2 SERVIÇOS PÚBLICOS DE TELECOMUNICAÇÕES ............................... 47
2.2.1 Delegação de Serviços Públicos............................................................ 47
2.2.2 Análise Constitucional da Lei Geral de Telecomunicações (LGT) ......... 49
2.2.3 Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) .............................. 51
2.2.4 Outros Aspectos Institucionais dos Serviços de Telecomunicações...... 52
2.3 UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ................................. 53
2.3.1 Regulação, Universalização e Desenvolvimento ................................... 53
2.3.2 Universalização dos Serviços de Telecomunicações............................. 54
 )81'2 '( 81,9(56$/,=$d2 '26 6(59,d26 '(
7(/(&2081,&$d®(6)86 7  ..................................................................... 59
3.1 FORMAS DE CUSTEAR A UNIVERSALIZAÇÃO..................................... 59
3.2 NATUREZA JURÍDICA DA ENTRADA DOS RECURSOS ....................... 60
3.3 UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS ............................................................... 61
3.4 FONTES DE RECEITAS........................................................................... 62
3.5 NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO........................................... 63
3.6 RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA DA CONTRIBUIÇÃO....................... 65
3.6.1 Fato Gerador.......................................................................................... 66
3.6.2 Sujeito Ativo ........................................................................................... 66
3.6.3 Sujeito Passivo....................................................................................... 67
3.6.4 Base de Cálculo ..................................................................................... 68
3.6.5 Alíquota.................................................................................................. 70
3.7 CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO DA CONTRIBUIÇÃO....... 71
3.8 CONSIDERAÇÕES GERAIS .................................................................... 71
3$57,&,3$d23238/$5('e),&,7'(02&5È7,&2 ......................... 74
4.1 PARTICIPAÇÃO POPULAR E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO...... 74
4.2 PARTICIPAÇÃO POPULAR E REGULAÇÃO........................................... 75
4.2.1 Legitimidade, Regras Procedimentais e Consenso................................ 75
4.2.2 Mecanismos de Participação Popular .................................................... 77
4.2.3 Consultas e Audiências Públicas ........................................................... 78
4.2.4 Participação Popular na ANATEL .......................................................... 79
4.3 DÉFICIT DEMOCRÁTICO NAS AGÊNCIAS REGULADORAS ................ 80
4.4 DÉFICIT DEMOCRÁTICO NA REGULAÇÃO DO FUST .......................... 83
&21&/862 .................................................................................................. 87
%,%/,2*5$),$ ............................................................................................... 90
10
,1752'8d2
O Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento constatou que nos países latino-americanos e,
conseqüentemente, no Brasil, existe uma forte tensão entre a escolha pelo
desenvolvimento econômico e a democracia, sendo relativamente baixa a
preferência da população por esta última (PNUD, 2002, p. 1-9).
Os altos níveis de exclusão socioeconômica têm levado as populações
latino-americanas a valorizar mais os avanços econômicos do que a ampliação
das práticas democráticas.
Por isso, o objetivo inicial do presente estudo é justamente demonstrar
que a democracia não é tão-somente um valor em si mesmo, mas também um
ambiente necessário para se alcançar o desenvolvimento econômico, não
sendo preciso escolher entre um e outro. A porque, o exercício da
democracia pela população é o meio mais eficiente de se cooptar as escolhas
e preferências sociais que determinarão as diretrizes de qualquer estratégia
desenvolvimentista eficiente.
Para tanto, sob o contexto do embate entre o liberalismo e o
socialismo, far-se-á, no primeiro capítulo, uma análise do conceito de
democracia em suas diversas facetas, com o objetivo de desembocar numa
definição de democracia econômica, esta consubstanciada em um ambiente
apto a permitir o exercício popular da liberdade de consciência e de escolha
econômicas, que, adianta-se, devidamente regulado pelo Estado, constitui-se
em um meio de extrema relevância para favorecer o desenvolvimento
econômico, pois, com a participação popular, será possível aliciar as escolhas
e preferências sociais que se encontram de forma difusa na sociedade.
Uma vez compreendida essa concepção econômica de democracia
como um ambiente propício ao desenvolvimento econômico, será
especificamente examinada a situação da democracia no Brasil, procurando-se
entendê-la e enquadrá-la numa das reflexões teóricas inicialmente expostas.
Todas essas análises serão, após, correlacionadas com uma teoria
democrático-desenvolvimentista que se apresentará como sendo a adequada
ao caso brasileiro, iniciando-se com um rápido levantamento das principais
11
causas do subdesenvolvimento do Brasil e com a devida identificação dos valores
e estratégias necesrios à sua superação.
Entre os principais gargalos ao desenvolvimento ecomico brasileiro,
pretende-se examinar, em espefico, o da alta concentração de renda, que
impede o crescimento da demanda. Para tanto, elegeu-se a redistribuição como o
valor referencial a ser perseguido pelo esforço democtico-desenvolvimentista, e
a universalização de servos públicos como a estratégia de ação a ser implantada
pelo Estado mediante sua atividade regulatória.
A crise financeira que a partir da década de 1980 abalou as estruturas
das administrações públicas dos diversos países que adotaram o modelo de
Estado social culminou na mitigação da interferência direta do Estado nas
relações econômicas.
Conseqüentemente, viu-se o surgimento da regulação como uma
modalidade de intervenção estatal indireta na economia, caracterizada por
utilizar-se da atribuição essencialmente normativa do Estado para disciplinar as
atividades econômicas das iniciativas privada e pública, com o objetivo de
garantir e realizar interesses públicos fundamentais, entre eles, o do
desenvolvimento econômico.
O grande desafio da intervenção indireta do Estado na economia na
sua modalidade regulatória se o de inserir países subdesenvolvidos na
economia de mercado com a garantia à população local do adequado exercício
da liberdade de consciência e de escolha econômicas consubstanciado em um
ambiente de democracia econômica apto a oportunizar a participação popular
aliciadora das escolhas e preferências sociais.
No Brasil, onde, tradicionalmente, a intervenção estatal na economia
acontece de forma direta por meio da prestação de serviços públicos e da
exploração de atividades econômicas, a Constituição Federal de 1988
estabeleceu o arcabouço de um Estado social quando este estava em
decadência em outros países, o que, por conseguinte, tem obrigado a revisão
constitucional do papel do Estado na qualidade de agente propulsor do
desenvolvimento econômico.
Com as reformas constitucionais iniciadas a partir da década de 1990
que culminaram na instituição das agências reguladoras, houve no Brasil uma
parcial redefinição das atribuições intervencionistas do Estado no campo
12
econômico, que de financiador do desenvolvimento econômico passou a
exercer as funções de fiscalizador e equilibrador. Portanto, o modelo de Estado
brasileiro vem sendo gradualmente alterado do interventor direto para o
indireto, na modalidade regulatória.
E se isso deu, também, porque, apesar de estar atualmente em fase de
consolidação política da sua democracia, o Brasil ainda não obteve êxito em
transferir os anseios da sociedade para o campo econômico, o que
compromete qualquer esforço desenvolvimentista, uma vez que eterniza a
insatisfação social.
Em virtude disso, objetiva-se também demonstrar que o Estado por meio
da modalidade regulatória de interveão indireta na economia pode garantir à
populão um ambiente de democracia ecomica, ou seja, de adequado
exercício da liberdade de consciência e de escolha ecomicas.
Diante disso, o segundo catulo analisará, inicialmente, a regulação dos
servos públicos e as agências reguladoras no Brasil e no mundo, para, num
segundo momento, ingressar em específico na regulão dos serviços públicos de
telecomunicações, examinando-se, obrigatoriamente, as formas de delegação da
atividade à iniciativa privada e a constituão do seu ente regulador.
No último tópico do segundo catulo, será examinado o instituto da
universalizão dos serviços públicos, que, como se demonstrará, constitui-se em
uma estratégia da atuação regulatória do Estado com o objetivo de diluir a alta
concentração de renda e de fazer crescer a demanda, efetivando-se o valor
referencial da redistribuição.
Como se verá, a universalizão geralmente não é lucrativa, uma vez que
tem por finalidade levar a prestão de serviços blicos fundamentais para o
desenvolvimento econômico do país, como o de telecomunicações, a reges e
populões onde a iniciativa privada por si não se interessaria ante a
inviabilidade econômica do empreendimento.
O terceiro catulo tratará da figura do Fundo de Universalização dos
Servos de Telecomunicões (FUST), fundo blico especial instituído com a
finalidade de promover diretamente, por meio da universalizão de serviços
blicos, a redistribuição, valor que, a um só tempo, é mecanismo e conseqüência
de um ambiente de democracia econômica, ou seja, do exercício pela população
da liberdade de consciência e de escolha econômicas.
13
O FUST, entre outras formas de captão de receitas, é, principalmente,
composto pela arrecadão da contribuição de um por cento (1%) sobre a receita
operacional bruta dos agentes econômicos delegados que atuam no setor de
telecomunicações, sendo a sua natureza jurídica de uma contribuição de
intervenção no domínio ecomico (CIDE).
Os recursos arrecadados para a composição do FUST m justamente o
objetivo de financiar a universalizão, ou seja, a prestação dos serviços públicos
de telecomunicações a populações e reges carentes, onde a iniciativa privada
o se interessaria, cabendo ao Estado, mediante a utilização de instrumentos
regulatórios, fiscalizar e equilibrar a aplicão oportuna desse numerário e o
cumprimento das metas de universalizão, garantindo que os anseios da
sociedade sejam satisfeitos.
O quarto e último capítulo tem a finalidade de examinar se o aparato
regulatório do Estado brasileiro referente ao FUST possui mecanismos que
permitem o exercício da democracia econômica, capaz de possibilitar a
participação popular para o devido aliciamento das escolhas e preferências
sociais que estão difusamente na sociedade.
A intenção será verificar se efetivamente a participação popular é
relevante no processo de tomada de decisões sobre o conteúdo da regulação do
FUST, ou seja, se ou o um adequado exercio da liberdade de consciência
e de escolha econômicas em um ambiente de democracia econômica, e,
conseqüentemente, favorecedor do desenvolvimento econômico.
A análise sob esse prisma assume importância porque um eventual déficit
democtico na formação do conteúdo da regulão relativa ao FUST pode ser
indicativo de insatisfação social e de concentração de renda, peculiaridades do
subdesenvolvimento brasileiro.
14
'(02&5$&,$('(6(192 / 9 , 0( 17 2
1.1 DEMOCRACIA
1.1.1 Considerações Preliminares
Segundo o Minidicionário Houaiss da língua portuguesa a palavra
democracia significa o governo cuja soberania é desempenhada pela
população (2004, p. 215).
Para grande parte da literatura jurídica e política, a democracia integra
um sistema de conceitos denominado teoria das formas de governo, que tem
como preocupação a análise, discussão, diferenciação e comparação das
diversas espécies de governo. É a partir desse prisma que o conceito de
democracia se presentemente desenvolvido. No entanto, preliminarmente,
são necessárias algumas distinções.
Tanto a teoria geral do Estado, cujo objetivo é a análise do Estado em
sua plenitude, quanto a ciência política, que pesquisa os fatos, as instituições e
as idéias políticas, estabelecem diferenças entre formas de Estado e formas de
governo.
O Estado tem por finalidade a promoção do bem comum, e seus
elementos formadores são: o povo, o território e a soberania. As formas de
Estado se preocupam justamente em estudar as tipologias de Estados que
surgem em decorrência da maneira como seus elementos formadores se
conectam, enquanto que as formas de governo se caracterizam pela maneira
como as instituições que integram o Estado se estruturam e inter-relacionam
para o exercício do poder político.
Feito esse esclarecimento e tendo em vista que a definição de
democracia está inserida no sistema conceitual das formas de governo, passa-
se a seguir a analisar sinteticamente as diversas tipologias de governo.
1.1.2 Formas de Governo
Como destacado anteriormente, as formas de governo se caracterizam
pela estruturação das instituições que compõem o Estado e pela maneira como
essas instituições relacionam-se para o efetivo exercício do poder político.
15
As classificações mais tradicionais adotaram, fundamentalmente, o
critério do número de detentores do poder político como definidor da natureza
das formas de governo, e seus principais preconizadores foram Aristóteles
(Grécia 384-322 a.C.), Marco Túlio Cícero (Roma 106-43 a.C.), Nicolau
Maquiavel (Florença 1469-1527) e Charles-Louis de Secondat, Barão de la
Brède e de Montesquieu (França 1689-1755).
Em 3ROtWLFD, Aristóteles, considerando o número de detentores do
poder político e, também, o condicionamento ou não do exercício desse poder
político ao interesse público, classificou as formas de governo em: a) três tipos
puros, quando o poder político é utilizado em respeito ao interesse público:
monarquia, o governo de apenas um; aristocracia, o governo de poucos; e
democracia, o governo da maioria; e b) seus respectivos tipos impuros, quando
o interesse pessoal do governante prevalece sobre o interesse público: tirania,
oligarquia e demagogia (Berloffa, 2004, p. 193).
É importante explicar que as palavras democracia e demagogia não
eram empregadas por Aristóteles com o mesmo sentido que aqui, porque, o
que ora se pretende, é interpretar a sua reflexão e não os seus vocábulos.
Democracia era chamada por Aristóteles de SROLWpLD, o governo da maioria com
respeito à minoria; enquanto que demagogia era denominada de democracia, o
governo das multidões brutas (Azambuja, 2005, p. 201).
Tendo como pressuposto a tipologia aristotélica, Cícero, no 'H
UHSXEOLFD, acrescentou uma quarta forma, a do governo misto, que
representava uma limitação ou mitigação dos poderes da monarquia, da
aristocracia e da democracia, por meio de instituições políticas como um
Senado aristocrático ou uma Câmara popular. Para Cícero a república romana
era o exemplo perfeito dessa forma de governo misto (Bonavides, 2001, p.
194).
Diferenciando-se de Aristóteles e de Cícero, em 23UtQFLSH, Maquiavel,
apresentou a primeira classificação moderna e, apesar de manter o critério do
número de detentores do poder político como definidor da natureza das formas
de governo, substituiu a clássica tripartição pela bipartição em monarquia e
república, sendo que esta última podia ser tanto aristocrática quanto
democrática. Para Maquiavel o poder político estava, na monarquia, nos
desejos de apenas um; na república aristocrática, no interesse comum
16
representado por meio de uma assembléia privativa; e na república
democrática, também no interesse comum, que manifestado por meio de
uma assembléia pública (Costa, 2006, p. 76-77).
O último entre os tradicionais, Montesquieu, em 2 HVStULWR GDV OHLV,
retomou a classificação tripartida e apresentou as seguintes formas de
governo: a república, compreendendo a democrática e a aristocrática; a
monarquia; e o despotismo. Em cada uma das formas de governo,
Montesquieu, também utilizando o critério do número de detentores do poder
político, destacou a sua natureza, ou seja, a razão que faz com que o governo
tenha o significado que tem; bem como o seu princípio, que é a causa do
estímulo da atuação do poder político. A natureza da república democrática
consistia no fato da soberania pertencer ao povo, e o seu princípio residia na
virtude; enquanto que a natureza da república aristocrática estava no fato da
soberania pertencer a poucos, e o seu princípio residia na moderação dos
governantes. Com relação à monarquia, a sua natureza advinha de ser o
governo de apenas um e o seu princípio estava pautado no sentimento de
honra. no despotismo a sua natureza se fundamentava no desrespeito às
leis e o seu princípio consistia no medo (Costa, 2006, p. 134-135).
A partir de Montesquieu a classificação aristotélica com base no
número de detentores do poder político começou a perder força. A separação
dos poderes passou a exercer forte influência como critério definidor da
natureza das formas de governo. Diante desse novo pressuposto surgiu a
seguinte tipologia: a) a parlamentar, que se fundamenta essencialmente na
isonomia e cooperação entre os poderes executivo e legislativo; b) a
presidencial, que é constitucionalmente estruturada em uma inflexível
separação entre os poderes executivo, legislativo e judiciário; e, por último, c) a
convencional ou de assembléia, que se caracteriza pelo predomínio da
assembléia representativa em questões de governo (Bonavides, 2001, p. 197-
198).
Na contemporaneidade, os princípios básicos que definem e norteiam o
desempenho do poder político também passaram a constituir influente critério
definidor da natureza das formas de governo. Por meio dele o regime político,
definido como o conjunto de princípios políticos e ideológicos que compõem
determinada concepção de Estado e sociedade e que inspiram seu
17
ordenamento jurídico, acabou por se confundir com a noção de governo. o
os princípios políticos e ideológicos que definem e direcionam o exercício da
atividade estatal, bem como explicam as formas de governo. A maneira e os
instrumentos de estruturação do governo têm importância caso auxiliem no
respeito a esses mesmos princípios políticos e ideológicos. Dessa forma,
segundo Bonavides, é possível identificar duas formas de governo, uma livre e
outra totalitária (2001, p. 200).
No entanto, na realidade, apesar de historicamente enfraquecida, ainda
hoje a diferença entre monarquia e república é a principal e mais famosa
tipologia das formas de governo, bem como a que mais se conservou no
tempo.
Com o surgimento do Estado Moderno nasceu a monarquia em sua
faceta absolutista ante a necessidade na época de governos fortes, porém,
com o passar do tempo, os poderes reais acabaram sendo limitados
juridicamente por meio de uma constituição, e, mais tarde, foi adotado o
parlamentarismo, no qual ao monarca coube tão somente a chefia do Estado,
ficando o exercício do governo a cargo de um primeiro ministro. Em linhas
gerais, as características essenciais da monarquia são: a) vitaliciedade, o
monarca exerce o governo por toda a sua vida ou enquanto estiver em
condições para tanto; b) hereditariedade, a transferência do poder político se
faz com respeito à linha de sucessão; e c) irresponsabilidade, o monarca não é
obrigado a prestar contas ou explicações de suas ações à população ou às
instituições representativas desta (Dallari, 2001, p. 226-227).
A república, por sua vez, se caracteriza principalmente como uma
forma de governo contraposta à monarquia, e, ressalta-se, guarda muita
semelhança com o sentido de democracia porque ambas sinalizam para o
compartilhamento do governo com o povo. A acepção moderna de república foi
desenvolvida a partir dos embates com a monarquia absoluta.
Atualmente existem poucos países que não sejam republicanos e a
defesa de causas monarquistas é com freqüência encarada como retrógrada.
Basicamente, as particularidades mais marcantes da república são: a)
temporariedade, o poder político é exercido por um prazo determinado; b)
eletividade, ou seja, é o povo quem escolhe o seu governante por meio de
eleições; e c) responsabilidade, o governante é obrigado a prestar contas e
18
explicações de seus atos à população ou às instituições representativas desta
(Dallari, 2001, p. 227-229).
1.1.3 Democracias Direta, Indireta e Semidireta
Na época em que os Estados nacionais surgiram por meio da atuação
autoritária dos monarcas dizia-se que a democracia só era realizável em países
pequenos. Tal pensamento era dominante porque até então a idéia de
democracia que prevalecia era a dos pensadores clássicos, ou seja, a da
democracia direta, considerada como toda e qualquer forma de participação no
poder político que não se resolve num ou noutro tipo de representação (Bobbio,
1992, p. 149-150).
Na democracia direta o povo por meio de assembléias exerce o poder
político diretamente sem quaisquer representantes ou delegados, decidindo
acerca de todas as matérias, como leis, justiça, política externa e gestão
pública; não governo, parlamento ou tribunal, os governantes são os
próprios governados (Vieira, 1986, p. 283).
Porém, com o advento da independência dos Estados Unidos da
América (1776) e da Revolução Francesa (1789) surgiu uma nova noção de
democracia: a indireta, exercida por meio de um governo representativo.
Essa nova modalidade de democracia geralmente se configurava e
ainda se configura pela atuação de um indivíduo em nome de uma coletividade
que o escolheu e lhe atribuiu, por meio do sufrágio, um mandato eletivo para
participar de assembléias e cargos políticos (Berloffa, 2004, p. 230).
Foi Alexis de Tocqueville (França 1805-1859) em 'D GHPRFUDFLD QD
$PpULFD quem principalmente identificou essa até então inédita forma de
governo, apta para territórios extensos e com grandes populações, em
contraposição à democracia direta dos pensadores clássicos (Bobbio, 1992, p.
151).
Com a consolidação do Estado representativo no ocidente, a tradicional
classificação das formas de governo foi pouco a pouco se restringindo ao
debate entre democracia e autocracia. Conforme constatou Tocqueville na
democracia americana, o Estado representativo, cujos elementos essenciais é
o princípio da soberania do povo e o associativismo, sofreu um processo de
democratização em direção à extensão do direito de voto até o sufrágio
19
universal do homem e da mulher, bem como ao desenvolvimento do
associativismo político até o surgimento das agremiações de massa e o
reconhecimento do seu papel público (Bobbio, 1992, p. 153).
No entanto, a solidificação da democracia indireta não impediu, ainda
que secundariamente, o retorno do debate sobre a democracia direta. No
conturbado experimento político da Comuna de Paris (1871), por exemplo, Karl
Marx (Alemanha 1818-1883) concluiu ter identificado alguns vestígios da
democracia direta, idéia esta que, aliás, foi reforçada por Vladimir Illitch
Ulianov, o Lênin (Rússia 1870-1924), em 2 (VWDGR H D UHYROXomR. Nessa
época, com freqüência, a democracia direta era considerada como a forma
própria da democracia socialista em oposição à democracia indireta, julgada
burguesa e imperfeita (Bobbio, 1992, p. 154).
Por último, cumpre destacar a figura da democracia semidireta, que
resulta da combinação de institutos da democracia direta e indireta. Nessa
modalidade, sem esvaziar as funções atribuídas aos seus representantes, o
povo exerce diretamente a soberania popular no que se refere aos assuntos
mais relevantes da vida pública. Para tanto, utiliza-se dos seguintes
instrumentos: a) o veto popular, que oportuniza aos eleitores, após a aprovação
de uma lei, um prazo para que seja requerida a concordância popular; b) o
referendo, que inclui os eleitores no processo de produção legislativa, pois
submete uma lei oriunda do Parlamento ao sufrágio dos cidadãos que podem
ou não aprová-la; c) o plebiscito, que nada mais é do que uma consulta prévia
aos cidadãos; d) a iniciativa, que concede a um determinado número de
eleitores o direito de apresentar uma proposta legislativa ou uma revisão
constitucional (Vieira, 1986, p. 284-286); e, por último, e) a revogação, que
pode ser utilizada para revogar a eleição de um representante legislativo ou
modificar uma decisão judicial que tratou sobre a constitucionalidade de
alguma lei (Dallari, 2001, p. 154-155).
1.1.4 Liberalismo x Socialismo
Durante o culo XIX o debate em torno da democracia se deu por
meio do conflito entre as duas principais linhas de reflexão político-econômica
da época: o liberalismo e o socialismo (Bobbio, 1986, p. 323).
20
Entre os liberais firmou-se a idéia de que o único tipo de democracia
capaz de coexistir com o Estado liberal, que reconhece e protege alguns
direitos essenciais, era a indireta, onde a obrigação de criar leis era de um
pequeno grupo de representantes eleitos por cidadãos com direitos políticos
reconhecidos (Bobbio, 1986, p. 323-324).
No ideal liberal de democracia a participação do poder político era
alcançada por meio do exercício das diversas liberdades individuais que o
cidadão conseguiu e obteve em oposição ao Estado absolutista, como a
liberdade de escolha, de consciência, de expressão, de reunião, de
associação, bem como o direito de eleger e ser eleito (Bobbio, 1986, p. 324).
Para os liberais não se pode falar em democracia caso não existam
alguns direitos essenciais de liberdade que possibilitem a participação política
direcionada pela manifestação da vontade autônoma de cada pessoa (Bobbio,
1986, p. 324).
Como ressaltado anteriormente, nos regimes representativos o
processo de democratização seguiu em duas direções: a do aumento gradativo
e geral do direito de voto a se atingir o sufrágio universal masculino e
feminino e, ainda, a do desenvolvimento do associativismo político a o
surgimento das agremiações de massa e o reconhecimento do seu papel
público (Bobbio, 1992, p. 153). Seja qual for a direção, esse processo de
democratização, traduzido como o exercício cada vez mais absoluto da
soberania popular, se incluía na estrutura do Estado liberal, compreendido
como um Estado de garantias, tratando-se, pois, de uma transformação mais
quantitativa do que qualitativa do regime representativo (Bobbio, 1986, p. 324).
Portanto, a democracia na sua concepção liberal se apresentava não
como uma alternativa, mas sim como um complemento ao regime
representativo (Bobbio, 1986, p. 324).
O socialismo, por sua vez, considerava a democracia um componente
participante e indispensável, mas não formador. Participante, porque um dos
objetivos do socialismo era um Estado com forte apoio popular; e
indispensável, porque sem um forte apoio popular a profunda transformação da
sociedade idealizada pelos socialistas não seria possível. No entanto, não é um
componente formador porque o fundamento do socialismo sempre foi a idéia
21
da revolução das relações econômicas e não somente políticas (Bobbio, 1986,
p. 324).
A maneira de encarar o processo de democratização do Estado é o
que difere o socialismo do liberalismo. Para este, o sufrágio universal é o fim da
linha, enquanto que para aquele é apenas o início. Na doutrina socialista, além
do sufrágio universal, o aperfeiçoamento do processo de democratização pode
se dar de duas maneiras: por meio do questionamento da democracia indireta,
meramente representativa, com a rediscussão de alguns tópicos da
democracia direta, bem como por meio da extensão da participação e controle
populares do processo de tomada de decisões políticas ao de decisões
socioeconômicas, conhecido como tipo real de funcionamento dos novos
órgãos de controle, chamados de FRQVHOKRVRSHUiULRV (Bobbio, 1986, p. 324-
325).
Partindo dos estudos de Marx sobre a Comuna de Paris, Lênin em 2
(VWDGRHDUHYROXomR expôs as linhas e os fundamentos da nova democracia
dos conselhos operários. Na sociedade liberal os centros de poder dos órgãos
do Estado se transferiram para a grande empresa, o que tornou insuficientes os
instrumentos tradicionais da democracia indireta colocados à disposição do
cidadão para exercer o controle dos abusos, cuja extirpação é o objetivo final
da modalidade democrática de governo. A nova forma de controle dar-se-ia no
próprio local de produção e seria diretamente exercida pelo trabalhador por
meio dos conselhos operários, que, unificados em reagrupamentos
ascendentes, formariam a essência do sistema estatal. Os conselhos
operários, portanto, constituíam-se no gérmen do Estado socialista em
oposição ao Estado liberal (Bobbio, 1986, p. 325).
Analisando o debate entre o liberalismo e o socialismo do ponto de
vista socioeconômico, Dahl destaca que a economia liberal, na qual os agentes
econômicos são em regra privados, gera um contexto muito mais conveniente
à democracia do que uma economia socialista. Porém, essa conexão entre a
economia liberal e a democracia exprime uma contradição, porque o
liberalismo econômico naturalmente acarreta em desigualdades políticas, uma
vez que indivíduos economicamente desiguais provavelmente também serão
politicamente desiguais (2001, p. 175).
22
Segundo Dahl, a democracia indireta sobreviveu apenas em países
que adotaram uma forma de economia liberal e não socialista. Pois, numa
economia liberal os agentes econômicos, na imensa maioria privados como
mencionado, têm como finalidade maior a obtenção de lucro e, historicamente,
um sistema onde as decisões econômicas são tomadas livremente por agentes
independentes que visam interesses próprios leva, a longo prazo e de maneira
mais eficiente do que qualquer outra alternativa conhecida, ao desenvolvimento
econômico, que, por sua vez, é conveniente à democracia porque diminui a
pobreza e melhora as condições de vida, auxiliando na redução dos conflitos
socioeconômicos. Sem falar que o desenvolvimento econômico possibilitado
pelo liberalismo propicia excedente de recursos suficiente para investimentos
em áreas sociais e para combater os conflitos socioeconômicos (2001, p. 184-
185).
Da mesma forma, algumas das conseqüências sociopolíticas do
liberalismo econômico também são favoráveis à democracia, uma vez que a
economia liberal proporciona o surgimento de uma classe dia de
proprietários que geralmente é aliada das práticas democráticas porque anseia
por liberdades pessoais, ascensão social e segurança jurídica; bem com
normalmente torna desnecessária a eventual adoção de um governo forte ou
totalitário porque as decisões econômicas são tomadas de forma
descentralizada e pulverizada entre os diversos agentes econômicos (Dahl,
2001, p. 185).
Numa economia socialista somente o Estado poderia se investir na
função de coordenador e controlador das decisões econômicas no lugar do
mercado. No entanto, segundo Dahl, salvo em algumas situações ocasionais e
provisórias, o Estado não se demonstrou à altura da missão. A economia
socialista deixa nas mãos dos governantes o destino alocativo dos recursos
econômicos, o que, além de ser muito arriscado, pois confere a poucos
decisões importantes que afetam a muitos, desperta a natural tentação humana
de se corromper, por isso o modo de produção socialista sempre esteve
historicamente correlacionado com governos autoritários (2001, p. 186).
No entanto, apesar do liberalismo econômico ser mais conveniente à
democracia do que uma economia socialista, alguns de seus resultados
também são prejudiciais às práticas democráticas.
23
Segundo Dahl o liberalismo econômico e a democracia vivem num
embate constante em que um altera e restringe o outro. É perceptível que em
países onde as insatisfações populares podem ser livremente expressadas, por
pelo menos dois motivos, uma economia absolutamente livre de regulação é
impossível de se realizar. Primeiro, porque os próprios princípios básicos da
economia liberal necessitam de regulação, como, por exemplo, a defesa da
concorrência. Segundo, porque sem regulação uma economia liberal pode
acarretar sérios prejuízos a algumas pessoas, uma vez que os agentes
econômicos o motivados por interesses próprios e não são inclinados a se
preocupar com o bem comum (2001, p. 192-193).
Naturalmente uma economia liberal gera desigualdades
socioeconômicas e mitiga a potencialidade da democracia indireta, pois alguns
cidadãos, porque têm mais prestígio que outros, conseguem participar e
influenciar o processo de tomada de decisões socioeconômicas, o que ofende
a igualdade política, princípio essencial da democracia. Portanto, o liberalismo
econômico, em virtude de seus efeitos contrários à igualdade política, não é
favorável ao desenvolvimento da democracia a patamares além de um regime
representativo (Dahl, 2001, p. 195-196).
1.1.5 Democracia e Elitismo
Segundo Bobbio, tanto a crítica do liberalismo à democracia direta
quanto a crítica do socialismo à democracia indireta foram despertadas por
algumas suposições ideológicas referentes às várias instruções relacionadas
aos valores essenciais (1986, p. 325).
No final do século XIX, os chamados teóricos das minorias
governamentais, em tese, com base na observação dos fatos, elaboraram uma
crítica científica e não ideológica à democracia em sua concepção tradicional
de teoria da soberania popular. Para esses estudiosos não existe um regime
político em que o poder real não esteja nas mãos de uma minoria, por isso a
soberania popular é um objetivo que jamais representou ou representará a
realidade. Esse posicionamento encerrou a trajetória da clássica teoria grega
dos três tipos de governo que, inclusive, estava na origem histórica do conceito
de democracia, porque se o poder sempre esteve nas mãos de uma minoria, a
oligarquia é a única forma de governo que existe e que é possível. O que não
24
significa que todos os sistemas políticos sejam iguais, mas tão-somente que se
uma peculiaridade pode ser distinguida, e esta não pode estar sujeita a um
critério extrínseco como a quantidade de governantes, mas sim às diversas
maneiras de como um grupo político se cria, prolifera, renova, organiza e
desempenha o poder (Bobbio, 1986, p. 325-326).
A teoria elitista considerava a democracia como uma forma de domínio,
só que com uma peculiaridade: a existência de uma disputa entre as elites para
o exercício do poder (Canotilho, 1993, p. 405).
Portanto, a teoria das elites resgatou o que de mais realístico a teoria
tradicional da democracia contém, demonstrando que podem existir regimes
legalmente democráticos em que o poder é exercido por uma minoria
dominante (Bobbio, 1986, p. 326).
1.1.6 Democracias Formal, Substancial e Participativa
Analisando o ideal democrático sob as óticas do liberalismo e do
socialismo, bem como a sua certa aproximação da teoria das elites, pode-se
concluir que a democracia está mais para um conjunto de regras
procedimentais para a formação de um governo e para tomada de decisões
políticas do que para uma ideologia. Ou seja, essa sua compatibilidade com
doutrinas e teorias de diferentes conteúdos, se deve justamente à prevalência
do seu caráter formal e não substancial (Bobbio, 1986, p. 326).
No pensamento político moderno, principalmente em países
democrático-liberais, as definições de democracia se limitam em maior ou
menor grau ao seguinte rol de regras procedimentais: a) a existência de um
órgão político ximo com função legislativa composto por membros eleitos
direta ou indiretamente pelo povo; b) a existência de outras instituições com
dirigentes eleitos adicionadas a este órgão legislativo máximo; c) a todos os
cidadãos maiores de idade deve ser garantido o direito de votar; d) o voto tem
o mesmo valor para qualquer eleitor; e) o eleitor deve ter absoluta liberdade
para a formação da sua opinião e para a escolha do destino do seu voto; f) o
eleitor deve estar em condições de livremente exercer o seu direito de escolha
entre alternativas reais; g) nos pleitos o princípio a ser seguido deve ser o da
maioria numérica; h) as decisões tomadas pela maioria não devem mitigar os
25
direitos da minoria; i) o órgão do governo deve ter a confiança do parlamento e
do chefe do executivo (Bobbio, 1986, p. 326-327).
Todas essas regras determinam a forma como se deve tomar a
decisão política e não sobre o que será decidido (Bobbio, 1986, p. 327), por
isso, muitos consideram a democracia formal como meramente aparente
(Berloffa, 2004, p. 237).
Ressalta-se ainda, segundo Friede, que numa democracia formal não é
preciso que a ordem jurídica e a lei produzam efeitos reais de forma absoluta, e
o Estado, por mera omissão dos governantes e/ou por insuficiência de
instrumentos, não consegue efetivamente realizar o direito positivo por ele
mesmo criado (2002, p. 95).
No entanto, atualmente, o processo de democratização, ou seja, a
criação e utilização de instrumentos capazes de possibilitar a participação dos
interessados na tomada de decisões, não se limita apenas no inter-
relacionamento das democracias indireta, direta e semidireta, mas,
principalmente, na transposição da democracia formal, na qual o indivíduo é
visto como cidadão, para a democracia substancial, na qual o indivíduo é
encarado em suas múltiplas condições, como, por exemplo, a de pai e de
profissional (Bobbio, 1992, p. 155-156).
A democracia contemporânea não é mais entendida como uma simples
forma de governo em que os elementos definidores da sua natureza são o
número de governantes e a maneira como se exerce o poder político. A
definição moderna identifica a democracia como uma forma de governo em que
objetivos e princípios traçam as diretrizes de atuação dos detentores do poder
político. E a essência desses objetivos e princípios é a igualdade
socioeconômica e não apenas a igualdade jurídica instituída pelas
Constituições liberais (Bobbio, 1992, p. 157).
A democracia formal consiste num rol de regras universais de conduta
sem levar em conta objetivos e princípios, enquanto que a democracia
substancial consiste num conjunto de objetivos e princípios, como as
igualdades jurídica e socioeconômica, sem considerar os meio utilizados para
realizá-los (Bobbio, 1986, p. 329). Ou seja, a democracia formal se preocupa
em específico com a forma de governo e a democracia substancial com o
26
conteúdo dessa forma. Para Bobbio a democracia perfeita deveria ser tanto
formal quanto substancial (1992, p. 157-158).
no que diz respeito à democracia participativa, insta destacar que o
que importa é a participação popular. A população representa não mais apenas
um eleitorado temporário, mas também um agente influenciador e decisório
(Höffe, 2005, p. 131).
É fundamental enfatizar que no presente estudo a idéia de participação
popular é identificada com o conceito de S~EOLFRSDUW LFLSDWLYR, entendido como
cidadãos organizados que objetivam a inclusão socioeconômica e política por
meio do debate público, do enaltecimento da transparência e da
responsabilização, bem como da colocação em prática de suas escolhas e
preferências (Wampler e Avritzer, 2004, p. 215).
A participação popular tem muitas atribuições em uma democracia
participativa. Nos meios de comunicação, por exemplo, além de possibilitar a
troca de idéias e discussões, permite também debates e confrontos com o
objetivo de obtenção de influência e poder, bem como também serve como
uma referência crítica que deve fundamentar e explicar as atuações políticas e
judiciárias (Höffe, 2005, p. 132).
Pois, como bem lembrou rgen Habermas (Alemanha 1929),
participar requer a discussão popular e o deslocamento do poder político para
além dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, assumindo a população
uma posição destacada na organização social (Mattos, 2004, p. 319).
De acordo com sua definição existencial, a democracia participativa
pode ser tida como um estilo de vida e uma prática social em que,
diferentemente da democracia formal, o que interessa é que todos os cidadãos
possam defender seus direitos políticos e exprimir suas preferências
socioeconômicas, participando efetivamente do processo de tomada de
decisões (Höffe, 2005, p. 133).
Concluindo, na democracia participativa o elemento central do ideário
democrático é a participação popular no processo de tomada de decisões, ou
seja, é a razão da legitimidade e a justificativa moral da democracia (Ugarte,
2004, p. 98-99).
27
1.1.7 Democracia Econômica
É muito comum se encarar as relações econômicas apenas sob a ótica
das formas de acumulação, sem qualquer preocupação com o destino da
alocação da riqueza produzida.
Deve-se lembrar que o crescimento econômico, como será visto nos
tópicos à frente, é um componente muito importante do desenvolvimento
econômico, que, para tanto, deve ser harmonizado com os anseios e
escolhas da sociedade.
Nesse sentido, percebe-se que a democracia não deve mais ser tida
apenas como um simples regime político, mas também como uma forma de
governo que deve oportunizar, com ampla liberdade, a participação da
população no processo de tomada das decisões econômicas que lhe afetam,
até mesmo para se ter conhecimento de suas escolhas e preferências.
Os socialistas, em substituição à idéia de democracia baseada no
princípio da soberania popular, considerada formal e burguesa, apresentavam
como solução a democracia social ou proletária, a qual, além de possibilitar a
participação formalmente igualitária na constituição da vontade geral, também
incluiria equitativamente a população no processo de distribuição de riqueza.
Porém, conforme destacou Kelsen, a concepção socialista não é sustentável,
uma vez que o princípio da liberdade deve prevalecer sobre o da igualdade na
formação do ideário democrático (2000, p. 99).
O sistema socialista para privilegiar o princípio da igualdade centralizou
e planificou a economia, o que acabou por fragilizar o ideário democrático, uma
vez que relegou a liberdade da sua concepção, afetando também, por
conseguinte, o clássico princípio da soberania popular, na medida em que
concentrou nas mãos de poucos a competência para a tomada de decisões
econômicas.
A contemporânea idéia de democracia econômica se fundamenta
justamente na liberdade, porque pretende transportar para as decisões
econômicas a mesma liberdade de consciência e de escolha que existe no
âmbito político.
É importante esclarecer também, que a democracia econômica se
fundamenta na ética dos resultados, pois de nada valem as boas intenções dos
detentores do poder político e/ou econômico se o resultado final for o
28
alargamento da exclusão socioeconômica. E para isso a idéia de democracia e
liberdade é essencial, porque quando o processo de tomada de decisões
econômicas se der de forma mais participativa e envolvendo interesses
distintos, os resultados se inclinam para uma maior satisfação social. Logo, a
democracia econômica consiste basicamente em incluir no processo de
tomada de decisões interesses sujeitos a eventuais perdas ou danos de
qualquer natureza (Dowbor, 2006, p. 86).
A democracia econômica propriamente dita se revela como
propiciadora: a) de inclusão no processo produtivo, que deve ser encarada não
apenas como uma avaliadora da disponibilidade ou não de bens e serviços,
mas também como uma forma de incentivar e preparar os indivíduos para se
tornarem agentes ativos de sua própria transformação econômica e não mais
serem meros espectadores; b) de distribuição de renda, pois o capitalismo
tende naturalmente à acumulação; e c) de acesso à informação que garanta o
exercício da liberdade de consciência e de escolha (Dowbor, 2006, p. 87-91).
Portanto, pode-se dizer que existe democracia econômica quando a
sociedade é incluída no processo de tomada de decisões econômicas, ou seja,
quando lhe é oportunizado o exercício da liberdade de consciência e de
escolha econômicas, o que deve acontecer por meio de instrumentos
regulatórios do Estado capazes de exprimir e transmitir essa liberdade, bem
como de garantir que as decisões sejam as melhores (Salomão Filho, 2002, p.
31-33).
Mais a frente se fará a correlação entre a democracia econômica e o
desenvolvimento econômico, procurando-se demonstrar de que forma a
liberdade de participação da população na tomada de decisões favorece o
desenvolvimento econômico.
1.2 DEMOCRACIA E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO
1.2.1 Democracia Brasileira a partir de 1988
A Constituição brasileira de 1988 baseando-se no exemplo de países
com práticas democráticas historicamente lidas adotou uma democracia
indireta complementada por alguns institutos da democracia participativa
utilizáveis pela população em processos decisórios (Vitale, 2004, p. 240).
29
O artigo 14 da Constituição Federal, ao prescrever que a soberania do
povo expressar-se-á pelo sufrágio universal e do voto direto, secreto e de igual
valor para todos, bem como, nos casos em que haja previsão legal, por meio
do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular, disponibilizou três
instrumentos da democracia semidireta passíveis de utilização na geração
legislativa pelo Estado, permitindo o exercício da democracia participativa da
população nessa esfera.
No Brasil, é possível ainda a participação da sociedade na formulação
e implementação de políticas públicas em áreas sociais (Constituição Federal,
artigos 194, VII; 198, III; 204, II; 206, VI; 216, parágrafo 1º; 227, parágrafo 1º);
na Administração Pública direta e indireta (Constituição Federal, artigo 37,
parágrafo 3º); na elaboração e debate de leis orçamentárias por meio de
audiência pública (Lei de Responsabilidade Fiscal, artigo 48, parágrafo único);
no acesso ao Poder Judiciário por meio da ação popular (Constituição Federal,
artigo 5º, LXXIII); e na competência que lhe é atribuída para o julgamento de
crimes no Tribunal do Júri (Constituição Federal, artigo 5º, XXXVIII).
Contemporaneamente existe uma grande variedade de instrumentos
de participação popular porque a democracia indireta, tendo em vista a
complexidade das sociedades atuais, possui limitações que muitas vezes
deformam os próprios princípios e práticas democráticas.
No Brasil, em especial, as limitações são extraordinárias, uma vez que
são maximizadas pelas imperfeições das regras político-eleitorais, como a
insuficiente representação perante a União dos entes federativos mais
povoados e desenvolvidos, bem como a falta de mecanismos aptos ao controle
e responsabilização dos políticos perante a população. Sem falar em algumas
práticas infelizmente arraigadas na cultura política brasileira como a falta de
vigor das agremiações políticas, o personalismo dos políticos, o abuso do
poder político e econômico nas eleições, o clientelismo e a captação ilícita de
sufrágio (Vitale, 2004, p. 242).
Vale lembrar aqui a crítica feita por Faoro acerca do domínio que o
HVWDPHQWREXURFUiWLFRexerce sobre o patrimonialista Estado brasileiro, o que
contribui para restringir as práticas democráticas no país (2006, p. 107 e 825).
Segundo Faoro, a estrutura burocrática do Estado brasileiro não está
preocupada com o regular desempenho do mercado em associação com o
30
exercício de práticas político-democráticas. Muito pelo contrário, a apreensão
estatal está em atender os interesses do HVWDPHQWR EXURFUiWLFR, ou seja, de
grupos particulares que comandam o Estado mediante a ocupação de posições
e postos na estrutura organizacional pública e/ou outras formas de se exercer
ingerência política (2006, p. 112 e 826).
A essas imperfeições causadoras de profundas deturpações na
democracia brasileira, Salomão Filho acrescenta também a falta de instituições
públicas dinâmicas e confiáveis, a forte ingerência política nas decisões
socioeconômicas, a alta concentração de poder econômico e a ausência de
liberdade de consciência e de escolha econômicas (2002, p. 34-35).
A modalidade indireta de democracia, embora seja uma maneira
indispensável de garantir a participação popular na vida pública, deve ser
complementada por institutos da democracia participativa, os quais podem
corrigir as distorções provenientes do sistema representativo. Por isso, as
democracias indireta e participativa não são sistemas incompatíveis entre si,
mas sim, complementares (Vitale, 2004, p. 242).
Porém, apesar de estatuído constitucionalmente no Brasil 18 anos,
o princípio da democracia participativa na prática pode ser apenas
parcialmente constatado. No plano da Administração Pública foram criados
alguns conselhos de participação referentes a áreas sociais, mas os
mecanismos previstos no artigo 14 da Constituição Federal para o exercício
direto da influência popular na produção legislativa estatal não foram colocados
em prática. O que se pode ver, portanto, é que a prescrição da democracia
participativa no Brasil vem associada a um espaço vazio de eficácia social, pois
seus mecanismos de efetivação foram apenas em parte colocados em prática.
Vale lembrar, conforme destacou Friede, que o princípio democrático
brasileiro, além de deficitário em suas práticas participativas, não consegue
assegurar aos cidadãos seus direitos fundamentais, os quais se encontram
apenas formalmente garantidos na Constituição (2003, p. 95).
Por isso a democracia brasileira é também meramente formal, ou seja,
se limita a um rol de regras universais de conduta e se preocupa
fundamentalmente com “quantos” governam e “como” se governa, e não com
“quem” governa e sobre “o quê” se governa.
31
São poucos os exemplos de práticas democráticas no Brasil que
conjugam forma e substância, bem como que permitem a participação popular.
Em nível administrativo, o orçamento participativo municipal, apesar de não
previsto constitucionalmente, e não obstante as fortes críticas que lhe são
feitas, é um exemplo exato de participação popular. Segundo Vitale, por meio
do orçamento participativo a população do município participa diretamente de
assembléias públicas para discutir o conteúdo da lei orçamentária e
estabelecer a alocação dos investimentos no exercício orçamentário
subseqüente (2004, p. 243).
No âmbito da atividade regulatória do Estado, como será demonstrado
no último capítulo, é também possível constatar alguns exemplos de
participação popular na atuação das agências reguladoras brasileiras por meio
de instrumentos como a consulta e a audiência públicas.
1.2.2 Democracia Econômica e Desenvolvimento Econômico
Ainda que o presente estudo tenha como foco somente a dimensão
econômica do desenvolvimento sustentável, cumpre, preliminarmente, dar uma
iia superficial de sua definição.
O desenvolvimento sustentável pode ser entendido como um processo
de transformação que busca beneficiar a coletividade a partir do
equacionamento de problemas específicos por meio do inter-relacionamento
não conflituoso e que deve ser regulado por instituições entre os campos
da economia, do espaço, da saúde, da educação, da cultura e do meio-
ambiente (Silva, C. L., 2005, p. 37).
É ainda importante distinguir preliminarmente, que o freqüentemente
confundidos, desenvolvimento ecomico e crescimento ecomico. O primeiro é
um processo sustentável de permanente elevação da acessibilidade de bens e
servos em dimensão superior ao crescimento populacional de uma sociedade,
processo este que deve ser capaz de provocar alterações qualitativas na esfera
socioeconômica; enquanto que o segundo se verifica tão-somente com o
incremento da renda e do Produto Interno Bruto (PIB) de um país, sem quaisquer
modificões estruturais e/ou sociais de envergadura, ou seja, leva em
consideração apenas aspectos quantitativos (Nusdeo, 2001, p. 349-350).
32
Não obstante estar atualmente em fase de consolidação da sua
democracia política, o Brasil não tem conseguido elaborar e praticar uma
estratégia de desenvolvimento econômico capaz de cooptar as escolhas e
preferências sociais, bem como de transferi-las à esfera econômica.
Embora alguns doutrinadores defendam a idéia de que a interferência
estatal direta na economia é uma imposição do próprio processo de criação de
riqueza, o que assumiria importância ainda maior ao se considerar como
indispensável ao desenvolvimento econômico a diminuição das desigualdades
sociais (Grau, 2001, p. 21), o fato é que as medidas econômicas
intervencionistas adotadas pelo Estado brasileiro não obtiveram êxito em
transferir os anseios e escolhas da sociedade para o campo econômico.
Contemporaneamente, segundo Salomão Filho, as teorias econômicas
no Brasil e na América Latina em geral têm sofrido forte influência das
doutrinas anglo-saxônicas, as quais o se preocupam muito em estudar
formas de desenvolvimento econômico, por acreditarem que este é uma
conseqüência necessária e natural do andamento do mercado dentro das
diretrizes neoclássicas, ou seja, o resultado mais satisfatório para sociedade é
conseguido por meio da acumulação de riqueza, ficando a redistribuição em
segundo plano, conforme preconiza a teoria da escolha social (2003, p. 18).
São três as linhas de pensamento econômico que de alguma forma
questionam o neoclassicismo: a) os teóricos das imperfeições dos mercados,
que procuram detectar as falhas nos âmbitos macro e microeconômico para
preveni-las ou corrigi-las; b) os teóricos da nova economia institucional, que
buscam estudar as instituições com o objetivo de minorar os custos de
transação para que o mercado possa caminhar mais naturalmente; e, por
último, c) alguns economistas que, individualmente, procuram estudar assuntos
relacionados à pobreza e ao desenvolvimento, e, com isso, acabam por
questionar a eficácia do mercado na solução desses problemas (Salomão
Filho, 2003, p. 18-19).
Graças em parte às conclusões dessas três linhas de pensamento,
hoje não pairam mais dúvidas de que as estratégias de desenvolvimento
econômico se correlacionam diretamente com a existência de instituições
eficientes e de valores a serem incorporados pela sociedade. No entanto, de
acordo com Salomão Filho, no caso do Brasil para se descobrir essas
33
instituições e esses valores é necessário que a sociedade passe por um
processo de autoconhecimento com a propagação forçada da liberdade de
consciência e de escolha econômicas para que, com a participação popular,
seja possível cooptar as escolhas e preferências sociais que se encontram de
maneira difusa na sociedade (2003, p. 19).
Os valores essenciais a serem incorporados por uma sociedade no seu
processo de desenvolvimento econômico devem ser a liberdade de consciência
e de escolha econômicas, bem como a consciência de qual é a melhor opção
econômica a ser tomada. Para que isso seja possível, é imprescindível que a
sociedade esteja apta a expressar essa liberdade e que existam mecanismos
para sua efetiva transmissão.
Portanto, a idéia de desenvolvimento econômico, segundo Salomão
Filho, acaba por se identificar com a de democracia econômica, que, como
visto, é verificável quando a sociedade é incluída no processo de tomada de
decisões econômicas, ou seja, quando lhe é oportunizado o exercício da
liberdade de consciência e de escolha econômicas, o que deve acontecer por
meio de instrumentos regulatórios capazes de exprimir e transmitir
efetivamente essa liberdade, bem como de garantir que as decisões tomadas,
além de representar os anseios da sociedade, sejam as melhores (2002, p. 32).
Salomão Filho destaca que as principais correntes que analisaram o
desenvolvimento econômico no Brasil e na América Latina foram: a) a
econômica, que entendeu que existem diferenças estruturais entre os países
desenvolvidos e subdesenvolvidos decorrentes de um processo histórico de
evolução da economia internacional, e que o subdesenvolvimento é uma
estrutura determinada pelo sistema capitalista e não um estágio do
desenvolvimento; b) a sociológica, que procurou buscar as causas políticas
internas do subdesenvolvimento, e concluiu que a ingerência política nas
discussões econômicas provoca o subdesenvolvimento; e, por último, c) a
institucionalista, que entende que a ausência de instituições efetivamente
dinâmicas e confiáveis é a causa do subdesenvolvimento (2002, p. 34-35).
Da corrente econômica pode-se extrair que a grande concentração de
renda no Brasil e na América Latina é um entrave ao desenvolvimento, porque
mantêm os fluxos de capital nas mãos de poucos e não multiplica o consumo;
da corrente sociológica conclui-se que a ingerência política flexibiliza moral e
34
eticamente o processo de tomada de decisões econômicas, causando efeitos
malignos sobre a economia e a sociedade, bem como favorece a alta
concentração de renda, o que possibilita o exercício de enorme influência nas
resoluções regulatórias; e, por fim, da corrente institucional verifica-se que
normas de convivência, formal ou informalmente impostas, têm grande efeito
na maneira de se operar o desenvolvimento econômico (Salomão Filho, 2003,
p. 25).
Para que os entraves ao desenvolvimento econômico sejam resolvidos
é preciso a elaboração de uma estratégia democrático-desenvolvimentista que
considere a realidade brasileira, caracterizada pela alta concentração de renda,
causadora de relevantes deficiências alocativas e da impossibilidade da
sociedade de exprimir suas opções. Para tanto, é necessário que, por meio da
regulação estatal, seja feita a imediata propagação forçada da liberdade de
consciência e de escolha econômicas direcionada para esses aspectos
problemáticos da realidade econômica brasileira (Salomão Filho, 2003, p. 26).
O grande dilema está em justamente criar um processo de formação de
liberdade de consciência e de escolha econômicas próprias, bem como de
meios para difundir essa liberdade e extirpar a sua eventual concentração.
Ao Estado caberá essa nova função regulatória, o que, inclusive,
acarretará em mudanças no seu papel, uma vez que deverá permitir a
capacidade de expressão e mecanismos de transmissão da liberdade de
consciência e de escolha econômicas. O que será possível com uma
mudança institucional que absorva e entenda os valores fundamentais
incorporados na sociedade e que passe a utilizar-se de regras procedimentais
para defini-los e aplicá-los.
No entanto, além dessa mudança institucional, é preciso ainda a
participação popular no processo de confecção dessas regras procedimentais.
Ressaltando que esse princípio procedimental não implica em prejuízos ao
estabelecimento dos objetivos gerais da regulação. Primeiro, porque todos
convergem no sentido da participação geral no processo de tomada de
decisões econômicas; segundo, porque os valores fundamentais da sociedade
são genéricos, e é no seu preenchimento e efetivação que a liberdade de
consciência e de escolha econômicas tem importância (Salomão Filho, 2003, p.
27-29). A mesmo porque, de acordo com Jürgen Habermas (Alemanha
35
1929), o as regras procedimentais que permitirão que as escolhas e
preferências sociais que se encontram de forma difusa na sociedade sejam
transportadas, debatidas e incorporadas pela estrutura burocrática estatal
(Mattos, 2004, p. 319).
Diante desse panorama conclui-se que os princípios que devem reger
o esforço desenvolvimentista são basicamente três, todos simultaneamente
instrumento e conseqüência da difusão da liberdade de consciência e de
escolha econômicas: a) o da redistribuição; b) o da diluição dos centros de
poder econômico, e a conseqüente propagação de informações e consciência
por toda a sociedade; e, por último, c) o do estímulo à cooperação, como forma
de eliminação do individualismo exacerbado (Salomão Filho, 2002, p. 38-39).
Com relação ao primeiro princípio, o da redistribuição, cumpre destacar
que o Estado como gestor parece não cumprir a contento suas obrigações, o
que não implica em destituir-lhe dessa função. A principal atribuição do Estado
contemporâneo deve ser não mais a gestão abstrata e macroeconômica da
sociedade, mas sim a redistribuição, algo que a iniciativa privada jamais fará.
Ou seja, o Estado deve passar a pautar sua gestão em valores fundamentais
incorporados pela sociedade, e não em resultados econômicos (Salomão Filho,
2002, p. 38).
Uma das formas de se efetivar a redistribuição acontece de maneira
direta com a universalização de serviços blicos, o que geralmente não é
lucrativo e se quando o Estado por meio de sua ação regulatória exige que
os agentes econômicos delegados permitam o acesso irrestrito de toda a
população a essas utilidades com qualidade e a preços dicos,
independentemente da condição socioeconômica e da localidade.
o princípio da diluição da concentração do poder econômico, por
sua vez, objetiva, por meio da regulação estatal, prevenir que a liberdade de
consciência e de escolha econômicas permaneça nas mãos de poucos, bem
como a conseqüente imposição de seus valores aos demais. Ou seja, a
regulação se justifica para criar uma igualdade jurídica substancial, e não
apenas formal, entre todos os agentes econômicos e garantir a correção da
sua conduta no mercado e na sociedade (Salomão Filho, 2003, p. 36).
Os princípios da redistribuição e da diluição da concentração do poder
econômico garantem aos agentes econômicos a liberdade de consciência e de
36
escolha. No entanto, para a democratização econômica falta ainda a
possibilidade de se comparar as escolhas individuais com as escolhas sociais,
o que será possibilitado pelo terceiro princípio desenvolvimentista, o da
cooperação (Salomão Filho, 2003, p. 36).
Não obstante uma escolha individual, a cooperação depende também
da existência de condições e instituições que permitam o seu desenvolvimento.
Um pequeno número de participantes, a existência de informação sobre o
comportamento dos mesmos, bem como a existência de relação continuada
entre os agentes, são condições mínimas para o surgimento da cooperação. E
o Estado deve atuar no sentido de criar um ambiente com condições para o
florescimento da cooperação, acabando com o receio do comportamento
estratégico da contraparte, bem como permitindo que ela se torne uma
alternativa viável de interação social (Salomão Filho, 2003, p. 37-39).
Nos setores regulados a cooperação também é essencial para o
desenvolvimento econômico, pois uma característica da teoria da regulação é a
sua tendência ao auto-cumprimento das decisões, que depende da existência
de precondições institucionais, sendo que essa mesma tendência ao auto-
cumprimento pode levar à auto-regulação. No entanto, o sucesso da tentativa
de auto-regulação está diretamente vinculado ao seu enquadramento em um
ambiente de forte regulação, desde que este seja capaz de criar condições
para cooperação (Salomão Filho, 2003, p. 40).
Outra característica regulatória é a sua capacidade de diferenciar as
formas socialmente positivas de cooperação, ou seja, aquelas que visam o
auto-cumprimento de regras e que permitem aos agentes procurar interesses
supra-individuais, bem como as formas negativas para o interesse público que
objetivam somente reforçar posições de poder econômico e abusar do
consumidor. A aquisição de conhecimento e a existência de informação são os
instrumentos de estímulo à cooperação socialmente positiva. O fato de versar
ou não sobre variáveis concorrenciais, bem como a existência ou não de uma
convivência continuada, são outras formas de se diferenciar a cooperação
socialmente positiva da negativa (Salomão Filho, 2003, p. 40-41).
A cooperação é conseqüência da difusão da liberdade de consciência e
de escolha econômicas, tendo em vista que caso não ocorra essa difusão, o
que se verá será a concentração de poder econômico, tornando o ambiente
37
desfavorável à sua existência. Por outro lado, a cooperação é também causa
da propagação dessa liberdade, uma vez que possibilita comparações de
ordem individual e social (Salomão Filho, 2003, p. 42).
Portanto, o desenvolvimento econômico está diretamente relacionado à
idéia de democracia econômica, ou seja, a um ambiente adequado para o
exercício da liberdade de consciência e de escolha econômicas, que, com a
devida ação regulatória do Estado, possibilite a participação popular que
permitirá o aliciamento das escolhas e preferências sociais difusamente
encontradas na sociedade.
Segundo Salomão Filho, essa correlação é positiva no sentido de que
permite a busca de resultados específicos para cada realidade social, porém,
pode ser negativa na medida em que possibilita o relativismo das conclusões, o
que pode levar à inexistência de valores sociais fundamentais a serem
protegidos. Ocorre, que toda solução participativa geralmente leva à definição
de objetivos valorizados. E, a redistribuição, a participação de todos no
processo de tomada de decisões, a eliminação da exclusão e da concentração
de poder, bem como a possibilidade de escolha de valores coletivos por meio
da cooperação, são os valores sociais fundamentais que, inclusive, definem a
democracia econômica (2003, p. 43).
Porém, apesar do quase consenso existente em torno dos gargalos ao
desenvolvimento econômico brasileiro apontados neste tópico, principalmente
no que se refere à necessidade de redistribuição, existem algumas
divergências quanto à teoria democrático-desenvolvimentista presentemente
adotada proposta por Salomão Filho, as quais serão a seguir examinadas.
A principal divergência, que, inclusive, antecede à formulação da
posição ora adotada, é a constante na teoria econômica e elitista de
democracia desenvolvida por Joseph Alois Schumpeter (Áustria 1883-1950) em
&DSLWDOLVPR VRFLDOLVPR H GHPRFUDFLD. Fundamentando-se essencialmente na
realidade, esta teoria preconiza que os seres humanos possuem motivações
egoísticas e na sua imensa maioria não são aptos a participar de qualquer
processo de tomada de decisões e que, por isso, o sistema democrático seria
apenas uma forma institucional de tomada de decisões políticas por um
pequeno grupo de indivíduos detentor do poder político em razão do sufrágio
universal obtido em um processo eleitoral. O que importa para a formação do
38
ideário democrático é a escolha do chefe e não a participação popular no
processo de obtenção de decisões (Ugarte, 2004, p. 97).
Sob o prisma da teoria econômica e elitista de Schumpeter seria
irrealizável a idéia de um adequado exercício pela população da liberdade de
consciência e de escolha econômicas consubstanciado em um ambiente de
democracia econômica no qual a participação popular no processo de tomada
de decisões é fundamental para o aliciamento, necessário ao desenvolvimento
econômico, das escolhas sociais existentes de forma esparsa na sociedade.
No entanto, como examinado anteriormente, a cooptação dessas
escolhas e preferências sociais pela participação popular no processo de
tomada de decisões econômicas é perfeitamente possível com o exercício da
atividade regulatória do Estado por meio de regras procedimentais, a qual, para
alcançar o desenvolvimento econômico, deve ser regida pelos princípios da
redistribuição, da diluição dos centros de poder econômico, e, por último, do
estímulo à cooperação.
O papel do Estado no esforço desenvolvimentista é outra divergência
que gera muita controvérsia, pois, como visto, alguns doutrinadores
defendem que a idéia de que a interferência estatal direta na economia é uma
imposição do próprio processo de criação de riqueza, o que assumiria
importância ainda maior quando se considera como indispensável ao
desenvolvimento econômico a diminuição das desigualdades sociais. Essa
intervenção direta se justificaria em virtude da força de trabalho ser o único
valor da maior parte da população, bem como diante da necessidade de
formação de poupança para alavancar o desenvolvimento econômico (Grau,
2001, p. 21).
Ocorre que a grave crise financeira que abalou o Estado brasileiro na
década de 1980 e uma forte tendência mundial levou a sociedade a questionar
a função estatal no processo de desenvolvimento econômico.
A intervenção estatal direta na economia, que, segundo Moreira Neto,
pode-se dar pela a prestação de serviços públicos e pela a exploração de
atividades econômicas (2003, p. 28), acarretou no agigantamento do Estado
brasileiro e, conseqüentemente, no seu posterior colapso financeiro. Logo, e
isso será examinado no próximo capítulo mais detalhadamente, a intervenção
do Estado na esfera econômica tem se tornado gradualmente indireta, na
39
modalidade regulatória, com a transferência da prestação ou exploração de
atividades à iniciativa privada.
Portanto, o que a experiência histórica tem demonstrado é que o
Estado não tem mais condições de atuar diretamente como agente propulsor
do desenvolvimento econômico em razão de suas deficiências financeira e
administrativa constatadas com as crises públicas vistas nos últimos tempos.
No próximo capítulo analisar-se-á o instituto da regulação e a sua
atuação na redistribuição de renda por meio da universalização dos serviços
públicos, bem como de que forma isso pode contribuir para a democracia e
desenvolvimento econômicos.
40
5(*8/$d2(81,9(56$/ , =$d2'26  6 ( 59 , d2 6  3 Ò%/ , &2 6
2.1 REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS
2.1.1 Definição de Regulação
Atualmente a lógica econômica tem exercido forte influência na
definição das políticas blicas, na maneira de se enfrentar crises, bem como
na forma com que o Estado elabora suas estratégias de desenvolvimento.
A análise econômica do direito, comum entre os norte-americanos, está
cada vez mais se expandindo e arrebanhando seguidores no Brasil, ao mesmo
tempo em que o Estado tem intensificado e aperfeiçoado sua atuação
regulatória, criando novos instrumentos e instituições (Sundfeld, 2002, p. 18).
A chamada primeira onda de regulação estatal, que aconteceu por
volta dos anos 1930 com o 1HZ 'HDO norte-americano, surgiu na esfera
econômica e tinha como objetivo corrigir as deficiências do mercado,
agravadas com a crise advinda da quebra da bolsa de valores de 1HZ<RUNem
1929. E, entre os anos 1945 e 1965, veio a segunda onda regulatória, desta
vez para amenizar os efeitos indesejados do mercado nas áreas social e
ambiental.
Ou seja, a intervenção indireta do Estado por meio da regulação pode
se dar com objetivos claramente econômicos ou também com finalidades
diversas. E essa forma de intervenção pode atingir tanto os setores
exclusivamente públicos ou privados, como os de reserva estatal explorados
por particulares.
Em sua essência a regulação é uma atividade com natureza de
monitoramento, pois o Estado, utilizando-se de mecanismos de intervenção
indireta, estabelece alguns limites à independência que os particulares têm de
tomar decisões sobre objetivos e procedimentos (Justen Filho, 2002, p. 30).
É, também, uma atividade de caráter finalístico, uma vez que visa por
em prática regras para assegurar o desempenho equilibrado das relações
socioeconômicas, bem como para que este desempenho esteja em
consonância com objetivos públicos (Mastrangelo, 2005, p. 24).
41
A ação regulatória do Estado só se legítima quando destinada à
primazia do interesse público. No Brasil, inclusive, a Constituição dispõe que a
dignidade da pessoa humana deve direcionar a atividade regulatória.
A razão de ser da regulação vem da necessidade do Estado de
indiretamente intervir de forma precisa e permanente na organização
socioeconômica por meio de instrumentos de autoridade, bem como da
vontade de delegar certa autonomia a essa autoridade em face da estrutura
tradicional do poder político (Sundfeld, 2002, p. 19).
Portanto, pode-se dizer que a regulação se traduz na freqüente e
ordenada intervenção indireta do Estado sobre a atividade socioeconômica dos
agentes públicos e privados, com o objetivo de por em prática políticas públicas
e de realizar direitos fundamentais (Justen Filho, 2005, p. 447).
A intervenção estatal indireta na modalidade de regulação pode se dar
pela transferência da administração ou execução de serviços públicos à
iniciativa privada, bem como pelo exercício do poder polícia, ou seja, pela
função do Estado de repreender práticas particulares objetivando garantir a
ordem pública.
Os principais ícones de um sistema regulatório são as chamadas
agências reguladoras que, no Brasil, podem ser definidas como autarquias
especiais criadas por lei para possibilitar a intervenção indireta do Estado na
economia, possuindo atribuição para regular um segmento específico, com
poderes de natureza normativa e para dirimir conflitos entre particulares, bem
como sujeitas a um regime jurídico capaz de lhes garantir independência ante a
Administração Pública central (Justen Filho, 2002, p. 344).
2.1.2 Regulação no Mundo
Nos Estados Unidos da América (EUA) as primeiras agências surgiram
na primeira metade do século XIX para controlar o transporte ferroviário. Mas
foi entre os anos 1930 e 1940, quando houve por meio do 1HZ 'HDO uma
expansiva intervenção do Estado na economia em virtude da crise provocada
pela quebra da bolsa de valores de 1HZ<RUN em 1929 e da Segunda Guerra
Mundial (1939-1945), que inúmeras agências foram criadas com o objetivo de
corrigir as deficiências do mercado, iniciando-se dessa forma a chamada
42
primeira onda regulatória, que tinha como foco principal as relações
econômicas.
A segunda onda regulatória se deu entre os anos 1945 e 1965 quando
foi aprovada nos Estados Unidos da América (EUA) a Lei de Processo
Administrativo (1946), o $GPLQLVWUDWLYH 3URFHGXUDO $FW $3$, o que conferiu
maior legitimidade ao processo de tomada de decisões. Essa fase objetivava
essencialmente amenizar os efeitos indesejados do mercado nas áreas social e
ambiental.
Entretanto, a partir de 1985 as preocupações se voltaram para o
crescente problema da captura das agências pelos agentes econômicos
regulados. Portanto, essa fase se caracterizou pela adoção de um novo modelo
regulatório independente e acompanhado de mecanismos externos de controle.
Na Inglaterra, por sua vez, entes reguladores já existiam desde o
século XIX, porém foi com o processo de desestatização dos anos 1980 que os
mesmos foram incrementadas e se multiplicaram.
na Europa continental, institutos semelhantes às agências norte-
americanas, chamados de autoridades independentes, se multiplicaram com a
consolidação da Comunidade Econômica Européia (CEE).
É importante diferenciar as agências norte-americanas e as
autoridades independentes que surgiram na Europa continental. Pois, entre os
norte-americanos a iniciativa privada sempre foi a responsável pelas atividades
econômicas, as quais aos poucos foram se tornando objeto de regulação
estatal, enquanto que na Europa continental os serviços públicos sempre foram
prestados pelo Estado e, em muitos casos, sob a forma de monopólio. Por isso,
as autoridades independentes surgiram de forma diferente das agências, uma
vez que nos países europeus, em certo momento, a intervenção estatal
começou a apresentar falhas, o que ocasionou a separação entre o ente
regulador e o agente econômico regulado (Mastrangelo, 2005, p. 26-27).
Cumpre ressaltar que, em alguns países da Europa continental como
na França e na Espanha, as funções regulatórias do Estado o se limitaram
às atividades econômicas e/ou à prestação de serviços públicos transferida à
iniciativa privada, tendo se estendido também à proteção de direitos
fundamentais.
43
Na América do Sul pode-se citar o exemplo da Argentina que nos anos
1980 introduziu entes reguladores por ocasião do significativo programa de
desestatização que empreendeu. No entanto, apesar da natureza autárquica e
do alto grau de tecnicidade dos seus servidores, o modelo argentino pecou
pela falta de garantias funcionais capazes de assegurar a independência dos
diretores dos entes reguladores.
2.1.3 Regulação dos Serviços Públicos Brasileiros
Desde 1990 o Brasil vem gradualmente se adaptando a uma nova
forma de Estado, baseada em um modelo mediador e regulador, se
desvinculando, dessa forma, das amarras do monopólio estatal, resíduo de
modelos intervencionistas do período getulista (1930-1945 e 1950-1954) e do
regime militar (1964-1985).
Uma forte tendência mundial também está ajudando a formatar essa
nova estrutura estatal, que, aos poucos, vem abandonando a antiga maneira
de intervenção direta para assumir um modelo regulatório de ingerência
indireta. Este novo modelo situa-se entre dois pólos político-econômicos: o
liberal e o socialista. Entretanto, o Estado regulatório pode se voltar mais para
o lado liberal ou mais para o lado socialista, dependendo das diretrizes que
norteiam o modelo regulador adotado por cada país.
Durante grande parte do século XX, o Brasil viveu sobre a égide da
forte intervenção direta do Estado na esfera econômica. Somando-se os anos
em que o país foi governado por ditaduras, chega-se ao longo lapso de tempo
de 35 anos. Foram 15 anos de getulismo e 20 anos de regime militar. Isto sem
falar nos períodos em que vigoraram leis que inibiam a livre iniciativa privada e
que fechavam o país para o ingresso de investimentos estrangeiros.
A presença estatal se dava em incontáveis segmentos econômicos. O
Estado brasileiro detinha, por exemplo, os monopólios do petróleo, da energia
elétrica e das telecomunicações.
Segundo Coimbra, esse excesso de intervenção estatal direta na
economia acarretou: a) no aumento da carga tributária, uma vez que o Estado
desejava manter e aumentar o elevando grau de investimentos nas
empresas públicas; b) na criação de um campo fértil para prática do
clientelismo e da troca de favores; e, também, c) no aumento da corrupção,
44
pois a fiscalização de empresas públicas era realizada pelo próprio Estado
(2001, p. 2-3).
A flexibilização das regras econômicas no Brasil começou a partir da
década de 1990. A desregulamentação de certos segmentos e o início do
processo de desestatização foi de extrema importância, uma vez que o Estado
brasileiro não conseguia mais suportar o elevado grau de investimentos
necessário para gerar o desenvolvimento econômico.
Logo, o Brasil superou uma etapa de extrema intervenção direta para
ingressar, ainda que não completamente, em um novo modelo, o do Estado
regulatório.
Conforme visto, este sistema tem como seus principais ícones as
agências reguladoras. E, é justamente com o advento da criação dessas
agências reguladoras, na qualidade de órgãos do Poder Executivo para a
regulação das relações econômicas, que foi redesenhado um novo papel do
Estado no desenvolvimento econômico.
De acordo com este sistema, delega-se para iniciativa privada a
administração e/ou execução de alguns serviços públicos que até pouco tempo
eram de atribuição exclusiva do Estado, o qual, neste novo momento, aparece
como fiscalizador e equilibrador, e não mais como executor.
Nesta nova fase de prestação de serviços públicos, o Estado brasileiro
vem progressivamente deixando de ser um executor, que atuava na ordem
econômica por meio de pessoas jurídicas a ele vinculadas, e passando a ser
um Estado regulatório, que, de acordo com o artigo 174 da Constituição
Federal, fixou as regras disciplinadoras da ordem econômica para ajustá-la aos
ditames da justiça social, exercendo o papel de fiscalização.
2.1.4 Agências Reguladoras Brasileiras
Não custa lembrar que a agência reguladora, no Brasil, pode ser
definida como uma autarquia especial criada por lei para possibilitar a
intervenção indireta do Estado na economia, possuindo atribuição para regular
um segmento específico, com poderes de natureza normativa e para dirimir
conflitos entre particulares, bem como sujeita a um regime jurídico capaz de lhe
garantir independência ante a Administração Pública central (Justen Filho,
2002, p. 344).
45
Mattos destaca ainda como peculiaridades importantes das agências
reguladoras brasileiras: a) o fato de suas decisões serem tomadas por órgãos
colegiados; b) a sua autonomia decisória; c) o seu poder normativo; e, por
último, d) a sua obrigação de criar e colocar em prática regras procedimentais
que possibilitem a participação popular no processo de tomada de decisões
sobre o conteúdo da regulação (2002, p. 183).
No Brasil as agências reguladoras têm a tarefa de organizar setores
fundamentais da infra-estrutura econômica, e, para tanto, editam normas,
fiscalizam, aplicam sanções, resolvem disputas entre empresas, bem como
decidem sobre reclamações de consumidores, além de gozarem de autonomia
estrutural em relação ao Poder Executivo e de suas decisões não serem
alteradas pela Administração Pública central (Fróes, 2006, p. 516-517).
É importante destacar, como bem lembrou Marques Neto, que agência
reguladora não é sinônimo de privatização, uma vez que a regulação pode ser
exercida em todos os setores, não só nos privatizados (2005, p. 03).
O termo agência reguladora, utilizado pelo legislador brasileiro, é
originário dos Estados Unidos da América (EUA), o que tem ocasionado
protestos de alguns doutrinadores que acreditam que tais entidades são
incompatíveis com o ordenamento jurídico brasileiro por serem próprias do
direito anglo-saxão. No entanto, as agências reguladoras nada têm de
específicas à FRPPRQODZ, até porque, foram, inclusive, adotadas em países
como a França, de tradição européia continental (Sundfeld, 2002, p. 23).
A regulação é uma característica de modelos econômicos em que o
Estado não exerce diretamente a atividade empresarial, mas nela intervém por
meio de mecanismos de autoridade. Ou seja, a regulação não é uma
peculiaridade de determinado sistema jurídico, mas sim uma opção de política
econômica (Sundfeld, 2002, p. 23).
Muito mais do que com o norte-americano, o processo brasileiro de
implementação das agências reguladoras se identifica com o sistema europeu
continental, que enfrenta desafios comuns aos do Brasil, como a
desestatização, bem como a desregulação e a implantação e defesa da
concorrência.
A independência das agências reguladoras, tanto financeira quanto
administrativa, garantida pelo legislador brasileiro, tem por objetivo,
46
retoricamente, destacar o desejo de que essa entidade seja autônoma em
relação ao Poder Executivo, que atue de forma imparcial, bem como não esteja
sujeita a pressões políticas e/ou econômicas (Santos, 2002, p. 229).
Ressalta-se que no Brasil a outorga de autonomia às agências
reguladoras pretendia, inicialmente, dar segurança aos investidores
estrangeiros, atraindo-os para a compra de ativos estatais. O que, é importante
lembrar, não implicou em imunidade absoluta, pois todos os atos
administrativos estão sujeitos à eventual apreciação do Poder Judiciário, da
mesma forma que as contas dos entes reguladores são submetidas à
fiscalização dos Tribunais de Contas.
A autonomia financeira das agências reguladoras é assegurada pelo
recebimento de numerário proveniente da cobrança de taxas e de preços
públicos em razão da natureza de suas atribuições (Santos, 2002, p. 229).
A estabilidade dos dirigentes é a garantia da autonomia administrativa
das agências reguladoras, e o modelo utilizado tem sido o de estabelecer
mandatos fixos, não coincidentes com o do Chefe do Poder Executivo, após
prévia aprovação pelo Poder Legislativo, ou seja, uma vez nomeado o dirigente
exerce seu mandato sem a possibilidade de ser exonerado a qualquer tempo.
A perda do cargo será possível em casos de grave falta funcional apurada
após o devido processo administrativo, no qual tenha sido assegurado o direito
à ampla defesa ao acusado (Santos, 2002, p. 229).
Sendo as agências reguladoras autarquias ligadas à Administração
Pública indireta, em tese, sua autonomia estaria comprometida. Contudo,
segundo Sundfeld, o problema deve ser encarado de maneira diversificada,
haja vista que existem agências com maior ou menor grau de ingerência do
Poder Executivo. Até porque a Constituição brasileira impõe uma certa ligação
entre os entes reguladores e o Poder Executivo, na medida em que obriga a
supervisão administrativa deste em relação àqueles (2002, p. 26).
Com relação à natureza autárquica das agências reguladoras, cumpre
ressaltar que o Supremo Tribunal Federal (STF) quando do julgamento da ação
direta de inconstitucionalidade (ADIN) de n 1717-6 ao entender que a
natureza da personalidade é fator fundamental para que um ente possa exercer
poderes de autoridade pública, motivou o legislador federal, com o objetivo de
evitar futuros questionamentos perante o Poder Judiciário, a enquadrar as
47
agências reguladoras no gênero autarquias, que é uma das organizações da
Administração Pública indireta e que, principalmente, possui personalidade de
direito público (Sundfeld, 2002, p. 26).
o poder normativo das agências reguladoras, ao contrário do que
pensam alguns doutrinadores, não significou uma usurpação da função
legislativa, uma vez que o Poder Legislativo tem editado leis com alto grau de
abstração e generalidade, e que não atendem aos novos padrões da sociedade
que exigem normas mais diretas e específicas. Tal panorama justificou a
competência normativa das agências reguladoras, acarretando no
aprofundamento da atuação normativa do Estado. Mas, é importante destacar,
que, apesar de constitucionalmente garantido, o poder normativo das agências
reguladoras não sugere a edição de regulamentos autônomos, porque esse
poder deve ser exercido com base legal (Mastrangelo, 2005, p. 68).
No último capítulo do presente estudo essa questão sobre o poder
normativo das agências reguladoras será melhor explorado, abordando-se
inclusive as formas de se conferir legitimidade às normas reguladoras editadas.
2.2 SERVIÇOS PÚBLICOS DE TELECOMUNICAÇÕES
2.2.1 Delegação de Serviços Públicos
Como destacado anteriormente, a regulação se traduz na freqüente e
ordenada intervenção indireta do Estado sobre a atividade socioeconômica dos
agentes públicos e privados, com o objetivo de pôr em prática políticas públicas
e de realizar direitos fundamentais. E essa intervenção estatal indireta pode se
dar pela delegação de serviços públicos aos particulares ou pelo exercício do
poder polícia pelo Estado.
Este tópico analisará justamente a intervenção indireta do Estado por
meio de sua ação regulatória, consubstanciada nas diversas modalidades de
transferência da administração e execução de serviços públicos à iniciativa
privada.
Preliminarmente, é importante ressaltar que o objetivo principal do
Estado é a efetivação do bem comum, e uma das maneiras de se cumprir com
essa finalidade é por meio da realização de atividades públicas, entre as quais
se encontra a prestação de serviços públicos.
48
É possível definir serviço público como uma atividade da Administração
Pública colocada em prática sob o regime de direito público com o objetivo de
atender de forma plena e real às exigências individuais, coletivas e difusas,
materiais ou imateriais, diretamente associadas a um direito fundamental,
reservadas a pessoas não definidas (Justen Filho, 2005, p. 478).
Os serviços blicos são administrativamente organizados de acordo
com os diversos segmentos que constituem o interesse público, o que é muito
importante diante da exigência de estruturação da atividade estatal segundo
um rol de prioridades públicas, uma vez que são essas prioridades que definem
quais o os serviços públicos essenciais, e que por isso devem ser prestados
diretamente pelo Estado, bem como quais são os serviços públicos não
essenciais, e que podem ser prestados de maneira descentralizada com a
ajuda da iniciativa privada (Botelho, 2001, p. 17-18).
Portanto, os serviços públicos podem ser prestados de duas formas:
diretamente pelo Estado por meio da ação de seus agentes, órgãos e
empresas; ou indiretamente por meio de delegação à iniciativa privada, ou seja,
pela ação regulatória estatal.
A prestação indireta de serviços públicos por meio de delegação à
iniciativa privada pode acontecer das seguintes maneiras: a) por concessão:
que é um contrato multilateral de caráter estrutural e aproximativo, por meio do
qual o Estado transfere, por um certo período de tempo, a execução de serviço
público à iniciativa privada, que, sob o acompanhamento estatal e da
sociedade civil, se responsabiliza diretamente pela prestação ante os usuários,
recebendo para tanto uma remuneração advinda do próprio empreendimento,
mesmo que essa remuneração seja parcialmente originária do erário público
(Justen Filho, 2005, p. 501); b) por permissão: que é um ato administrativo de
transferência da execução de serviço público à iniciativa privada, sem que esta
seja obrigada a empregar recursos financeiros amortizáveis em curto espaço
de tempo (Justen Filho, 2005, p. 545); c) por autorização: que é um ato
administrativo unilateral, discricionário e precário, emitido pelo Estado por
solicitação do agente privado para a prestação de serviços públicos
necessários diante de uma situação temporária de urgência (Bacellar Filho,
2006, p. 427); e, por último, d) por terceirização: que é um contrato por meio do
qual o Estado delega à iniciativa privada a obrigação de prestar um
49
determinado serviço público essencial à satisfação de um dever (Justen Filho,
2005, p. 552).
É importante destacar que na concessão, permissão, autorização ou
terceirização, é delegada à iniciativa privada tão-somente a administração e/ou
execução material do serviço público, mantendo o Estado a titularidade do
mesmo e a obrigação de efetivar o bem comum.
Com relação em específico à prestação dos serviços públicos de
telecomunicações, de acordo com o inciso XI do artigo 21 da Constituição
Federal, esta poderá ser delegada nas modalidades de concessão,
permissão e autorização. Sendo que a concessão e a permissão estão
submetidas ao regime jurídico público, e a autorização ao regime jurídico
privado (Lei n.º 9.472/97, artigo 63).
2.2.2 Análise Constitucional da Lei Geral de Telecomunicações (LGT)
Inicialmente é necessário definir os serviços de telecomunicações.
Legalmente, estes são considerados um grupo de atividades que possibilita a
transmissão, emissão ou recepção por fio, rádio, eletricidade, meios óticos ou
qualquer outro processo eletromagnético de símbolos, caracteres, sinais
escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza (Lei n.º 9.472/97,
artigo 60, FDSXW e parágrafo 1º).
De uma forma um pouco mais simples, Marques Neto define o serviço
de telecomunicações como a condução de coisas não tangíveis por meio de
alguns instrumentos que sustentam esta serventia (2002, p. 309).
Na redação originária do inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal,
os serviços de telecomunicações eram considerados, material e formalmente,
não essenciais, mas públicos por natureza, bem como que seriam prestados de
forma direta pela União ou, indiretamente, por meio de concessões a empresas
sob controle acionário do Estado. Ou seja, não era permitida a transferência da
execução material dos serviços de telecomunicações à iniciativa privada.
No entanto, com o advento da emenda constitucional de n.º 8 de 18 de
agosto de 1995 que deu nova redação ao inciso XI do artigo 21 da Constituição
Federal, a situação se alterou, passando a ser possível a transferência irrestrita
à iniciativa privada, por meio de concessões, permissões ou autorizações, da
execução material dos serviços públicos de telecomunicações.
50
A nova redação do inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal
trazida pela emenda constitucional de n.º 8 de 18 de agosto de 1995
determinou também que caberia à lei ordinária infraconstitucional a prerrogativa
de regulamentar a organização dos serviços, a criação de uma agência
reguladora e outros aspectos institucionais da prestação dos serviços de
telecomunicações, tendo sido, para tanto, editada em 16 de julho de 1997 a Lei
de n.º 9.472, conhecida como a Lei Geral de Telecomunicações (LGT).
Segundo Botelho, os principais princípios constitucionais que balizam a
atuação dos agentes públicos e privados na prestação dos serviços de
telecomunicações são os da isonomia (artigo 5º, FDSXW), da necessidade de
licitação prévia (artigos 37, XXI, e 175), da justiça social (artigo 170, FDSXW), e
da redução das desigualdades regionais e sociais (artigo 170, inciso VII). Além
desses destaca-se ainda o princípio geral do direito segundo o qual não é
permitido à lei infraconstitucional diferenciar ou igualar questão não
diferenciada ou igualada pela Constituição (2001, p. 24).
O inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal, que trata dos serviços
públicos de telecomunicações, o prevê nenhuma espécie de tratamento
normativo diferenciado a ser concedido a quaisquer agentes delegados.
Apenas com relação ao nível de vinculação de cada espécie de delegação são
admitidas algumas diferenças no tratamento normativo, como, por exemplo,
que na concessão e na permissão é obrigatória a licitação, e que na
autorização o tratamento poderá ser o mesmo dependendo das peculiaridades
do serviço público (Constituição Federal, artigos 175, FDSXW, e 223).
Nesse sentido, conforme bem constatou Botelho, não é válido o
parágrafo único do artigo 63 da Lei de n.º 9.472/97, porque instituiu tratamento
diferenciado entre os regimes jurídicos público e privado para as modalidades
de delegação de prestação dos serviços de telecomunicações. Apenas os
concessionários e os permissionários estão sujeitos ao regime público, sendo,
portanto, os únicos obrigados a cumprir com os encargos de universalização
como forma de exploração competente da atividade. Os autorizatários, por sua
vez, estão isentos dessa obrigação contratual, uma vez que estão sujeitos ao
regime privado, estando, porém, obrigados, da mesma forma que os
concessionários e permissionários, a cumprir com a universalização pública por
meio do pagamento das contribuições que integram as receitas do fundo de
51
universalização (2001, p. 31-32). Esta questão será melhor esclarecida quando
forem mais à frente analisadas as formas de universalização dos serviços de
telecomunicações que a lei prevê.
Portanto, o parágrafo único do artigo 63 da Lei de n.º 9.472/97 é
inconstitucional pois, ao instituir tratamento diferenciado entre os regimes
jurídicos público e privado para as modalidades de delegação, acabou por
diferenciar questão o diferenciada pela Constituição, bem como, ao isentar o
autorizatário do serviço de cumprir com os encargos de universalização como
forma de exploração competente da atividade, desrespeitou os princípios
constitucionais da justiça social (artigo 170, FDSXW) e da redução das
desigualdades regionais e sociais (artigo 170, inciso VII), os quais devem
balizar a atuação dos agentes econômicos delegados de quaisquer serviços
públicos (Botelho, 2001, p. 31-32).
2.2.3 Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL)
A Lei de n.º 9.472/97, em cumprimento às determinações da nova
redação do inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal trazida pela emenda
constitucional de n.º 8 de 18 de agosto de 1995, regulamentou a organização
dos serviços de telecomunicações, a criação e o funcionamento da agência
reguladora, bem como tratou de outros aspectos institucionais.
A ANATEL, cuja criação está prevista no artigo da Lei de n.º
9.472/97, é uma autarquia especial federal integrante da Administração Pública
indireta com o papel de regular a delegação e a execução dos serviços
públicos de telecomunicações. Apesar de vinculada ao Ministério das
Comunicações a ANATEL não possui subordinação hierárquica, sendo
independente financeira e administrativamente, possuindo extensivo poder
normativo e administrativo de decisão, peculiaridades estas, ressalte-se,
comuns a quaisquer agências reguladoras conforme mencionado
anteriormente.
Portanto, pode-se verificar que nos casos de serviços públicos não
essenciais, o Estado, além de transferir a prestação e/ou administração à
iniciativa privada, também descentralizou a sua fiscalização, a qual passou a
ser incumbência das agências reguladoras.
52
2.2.4 Outros Aspectos Institucionais dos Serviços de Telecomunicações
O inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal estatuiu que a lei
ordinária infraconstitucional, além de dispor sobre a organização dos serviços
de telecomunicações e a criação da agência reguladora, deveria cuidar
também de outros aspectos institucionais da atividade. Portanto, quis a
Constituição, desde que respeitadas as suas diretrizes, transferir ao legislador
ordinário o encargo de tratar sobre outros aspectos institucionais dos serviços
de telecomunicações.
A Lei de n.º 9.472/97 no que se refere aos outros aspectos
institucionais trouxe disciplina específica. Os primeiros artigos tratam de
princípios aplicáveis a todos os demais institutos jurídicos editados e regulados
pela própria lei.
Os incisos I e II do artigo da Lei n.º 9.472/97 impõem ao Estado a
obrigação de garantir o acesso irrestrito às telecomunicações e o estímulo à
expansão dos serviços a toda população, o que consagra os princípios
constitucionais da isonomia (artigo , FDSXW), da justiça social (artigo 170,
FDSXW) e da redução das desigualdades regionais e sociais (artigo 170, inciso
VII), uma vez que os serviços de telecomunicações por serem públicos têm a
sua prestação constitucionalmente dirigida para o interesse blico e para a
realização do bem comum.
Portanto, a primeira obrigação institucional a ser respeitada na
prestação dos serviços públicos de telecomunicações deverá ser a do acesso
irrestrito às telecomunicações e estímulo à expansão dos serviços a toda
população, não importando se em regime de concessão, permissão ou
autorização, ou seja, a chamada universalização dos serviços públicos.
O que leva à conclusão de que os princípios constitucionais gerais da
isonomia, da justiça social e da redução das desigualdades regionais e sociais,
bem como os princípios específicos do acesso às telecomunicações e estímulo
à expansão dos serviços a toda população, são os mesmos.
Vê-se aqui uma preocupação com a redistribuição, valor que,
simultaneamente, é instrumento e conseqüência da difusão da liberdade de
consciência e de escolha econômicas, essencial ao desenvolvimento
econômico no caso brasileiro.
53
2.3 UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS
2.3.1 Regulação, Universalização e Desenvolvimento
Como visto anteriormente a redistribuição é um dos princípios que deve
reger o esforço desenvolvimentista, tendo em vista que constitui,
simultaneamente, instrumento e conseqüência da difusão da liberdade de
consciência e de escolha econômicas, ou seja, da democracia econômica.
E uma das maneiras de efetivação da redistribuição é diretamente por
meio da universalização de serviços públicos, que geralmente não é lucrativa e
se quando o Estado por meio de instrumentos regulatórios exige que os
agentes econômicos delegados permitam o acesso irrestrito de toda a
população a esses serviços com qualidade e a preços módicos,
independentemente da condição socioeconômica e da localidade.
Em outras palavras, a universalização dos serviços públicos é
representada pela colocação em prática de políticas públicas destinadas a
permitir o acesso irrestrito de toda a população a determinadas utilidades
estrategicamente importantes para as relações socioeconômicas (Faraco,
2003, p. 368), o que, repita-se, gera redistribuição de forma direta.
Neste caso, a ação regulatória do Estado, consubstanciada na sua
intervenção indireta por meio da delegação da prestação de serviços públicos à
iniciativa privada, tem por finalidade a realização do direito fundamental de
acesso irrestrito e universal de toda a população a determinada utilidade
pública.
O que assume importância diante da necessidade de inclusão em
qualquer estratégia de desenvolvimento econômico, além da lógica da
acumulação, de valores essenciais incorporados pela sociedade, os quais, no
presente caso, consubstanciados na redistribuição, representam nada mais do
que a liberdade de consciência e de escolha econômicas, bem como a
consciência de qual é a melhor opção. E a universalização dos serviços
públicos, efetivada por meio da ação regulatória do Estado, é um instrumento
capaz de permitir à sociedade a expressão e efetiva transmissão dessa
liberdade.
As doutrinas econômicas em sua grande maioria têm demonstrado que
investimentos públicos e/ou privados em infra-estrutura, como, por exemplo,
54
em telecomunicações, são estratégicos para o crescimento econômico, pois
propiciam um maior regresso dos insumos da iniciativa privada, incentivam o
investimento, criam empregos e vitalizam a atividade econômica (Coutinho,
2002, p. 66).
No entanto, a simples aplicação de recursos em infra-estrutura o
garante a redistribuição mediante o acesso irrestrito de toda a população a
serviços públicos, devendo o Estado por meio de instrumentos regulatórios
captar investimentos com o objetivo de expandir a prestação dessas utilidades
a regiões onde a iniciativa privada por si não se interessaria (Coutinho,
2002, p. 67).
Essa necessidade surge, porque possibilitar o acesso irrestrito a toda a
população pode, em determinadas situações, ser economicamente inviável,
uma vez que a exploração econômica do serviço público pode não gerar
ganhos suficientes para cobrir os investimentos realizados com a sua
prestação (Faraco, 2003, p. 371).
Quando se fala em universalização dos serviços públicos, incumbe-se
ao Estado, por meio da regulação, a função de estabelecer nortes de longo
prazo que direcionem meios institucionais para aplicação de recursos em infra-
estrutura, sem que isso represente uma tentativa de tutelar o mercado
(Coutinho, 2002, p. 69).
No caso do Brasil o dilema da regulação da universalização de serviços
públicos com fins de redistribuição parece estar em alcançar o equilíbrio entre
os benefícios econômicos concedidos à iniciativa privada com a exploração
econômica da utilidade blica e a devida contraprestação dos particulares,
consubstanciada nas obrigações de universalização de serviços e de cobrança
de tarifas aceitáveis (Coutinho, 2002, p. 69).
2.3.2 Universalização dos Serviços de Telecomunicações
As telecomunicações, por serem um serviço de infra-estrutura
estratégico para a sociedade, uma vez que possibilita a ação comunicativa
entre a população e favorece o desenvolvimento econômico por meio da
redistribuição, representa um dever inadiável do Estado no seu eficiente
controle e manutenção.
55
Toda a população tem direito à comunicação, o que será passível
de ser alçando por meio da extensão do acesso aos serviços para além do
quanto possa ser explicado como exploração competente da atividade (Tôrres,
2005, p. 04).
Esse direito ao acesso é assegurado pelo princípio da universalização,
que visa possibilitar que os serviços públicos de telecomunicações possam
alcançar a todos com qualidade e eficiência sem distinção de local ou de
condição socioeconômica.
Como o Estado tem a finalidade de realizar o bem comum
(Constituição Federal, artigo , inciso IV), é sua obrigação disponibilizar a toda
população o acesso irrestrito a serviços públicos, até porque também lhe
incumbe o dever de diminuir as desigualdades sociais (Constituição Federal,
artigo 3º, inciso III).
A Lei de n.º 9.472/97, bem como as demais normas que tratam sobre
telecomunicações, devem se pautar pelos princípios constitucionais da
isonomia (artigo , FDSXW), da justiça social (artigo 170, FDSXW) e da redução
das desigualdades regionais e sociais (artigo 170, inciso VII), pois são esses
princípios que direcionam a atuação dos agentes públicos e privados na
prestação de serviços públicos.
Quando regulamentou os outros aspectos institucionais, previstos na
parte final do inciso XI do artigo 21 da Constituição Federal, a Lei de n.º
9.472/97 institucionalizou como dever público a universalização dos serviços de
telecomunicações. Os incisos I e II do seu artigo impõem ao Estado a
obrigação de garantir o acesso irrestrito e o estímulo à expansão dos serviços
a toda população, consagrando, dessa maneira, os princípios constitucionais
mencionados anteriormente, uma vez que os serviços de telecomunicações por
serem públicos têm a sua prestação constitucionalmente dirigida para o
interesse público e para a realização do bem comum. Cabendo ao Governo
Federal, após prévia elaboração e proposição pela ANATEL, aprovar um plano
geral de metas de universalização dos serviços (Lei n.º 9.472/97, artigos 18,
inciso III, e 19, inciso III). Plano este que, antes de proposto, deve ser
submetido pela ANATEL a uma consulta pública formal (Lei n.º 9.472/97, artigo
42).
56
A universalização dos serviços públicos de telecomunicações está
definida na Lei de n.º 9.472/97 como obrigações com a finalidade de
oportunizar o acesso irrestrito aos serviços de telecomunicações para toda a
população, não interessando o local ou o VWDWXV socioeconômico, e, também,
como deveres com o objetivo de possibilitar o uso das telecomunicações em
atividades fundamentais de interesse coletivo (artigo 79, parágrafo 1º).
De acordo com o mencionado dispositivo, pode-se perceber que são
três as dimensões básicas em que a universalização dos serviços públicos
deve se desdobrar: a) geográfica; b) qualitativa; e c) referente ao preço. Apesar
da dimensão qualitativa não estar expressamente disposta na lei, entende-se
que a mesma deve ser abrangida nas políticas de universalização, uma vez
que não seria coerente possibilitar o acesso irrestrito a serviço que não esteja
em perfeito estado de utilização (Faraco, 2003, p. 370).
A Lei de n.º 9.472/97 dividiu em duas modalidades a obrigação de
universalização dos serviços de telecomunicações: a) as denominadas
obrigações de universalização, de cunho essencialmente contratual, como
forma de exploração competente da atividade (artigos 79 e 80); e b) a
universalização pública, fixada em lei, a ser custeada pelo fundo de
universalização e recursos públicos (artigo 81) (Tôrres, 2005, p. 05).
O elemento fundamental dessa separação é a possibilidade de
recuperação dos recursos desembolsados com a universalização como forma
de exploração competente da atividade, o que não se verifica na
universalização pública, que é custeada pelo fundo e recursos orçamentários
(Tôrres, 2005, p. 06).
Sendo a prestação dos serviços de telecomunicações de interesse
coletivo, é importante destacar que a sua universalização é encargo
operacional e financeiro para o agente econômico delegado, uma vez que
importa na efetiva execução de atividades remuneráveis ou não. A Lei de n.º
9.472/97 em seus artigos 63, 79 a 82, 93, incisos V e IX, 120, inciso IV, impõe
ônus específicos, inerentes à própria assunção do serviço (Botelho, 2001, p.
58).
É nesse momento que o Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações (FUST), que será tratado mais adiante em capítulo
específico, assume relevância, pois sua finalidade é a de subsidiar a parcela
57
mensurável do custo da obrigação de universalização, delimitada no plano
geral de metas e não atendida pela simples exploração competente do serviço
delegado.
Portanto, a Lei de n.º 9.472/97 impõe aos agentes econômicos
delegados obrigações de fazer e de pagar. De fazer, porque estão obrigados a
cumprir com as metas estabelecidas no plano de universalização. De pagar,
porque são obrigados a contribuir financeiramente para a composição do
FUST, o qual lhes reembolsará dos investimentos não recuperáveis por meio
da simples exploração econômica da atividade delegada (Botelho, 2001, p. 62).
Cumpre relembrar aqui o inconstitucional tratamento normativo
diferenciado instituído entre agentes delegados analisado anteriormente no
item 2.2.2. O parágrafo único do artigo 63 da Lei de n.º 9.472/97, como visto,
instituiu tratamento diferenciado entre os regimes jurídicos público e privado
para as modalidades de delegação de prestação dos serviços de
telecomunicações. Apenas os concessionários e os permissionários estão
sujeitos ao regime público, sendo, portanto, os únicos obrigados a cumprir com
os encargos de universalização como forma de exploração competente da
atividade. Os autorizatários, por sua vez, estão isentos dessa obrigação, uma
vez que estão sujeitos ao regime privado, o que, porém, não os exclui do dever
de cumprir, da mesma forma que os concessionários e permissionários, com a
universalização pública por meio do pagamento das contribuições que integram
as receitas do fundo de universalização (Botelho, 2001, p. 31-32).
Foi o inciso II do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97 que estabeleceu que
tanto os agentes delegados sujeitos ao regime jurídico público (concessionários
e permissionários) quanto os sujeitos ao regime jurídico privado (autorizatários)
são obrigados a pagar as contribuições que integram as receitas do FUST,
bem como que somente aos concessionários e permissionários a obrigação de
universalização como forma de exploração competente da atividade é imposta,
estando os autorizatários isentos dessa última obrigação.
Essa desigualdade de tratamento torna insustentável a estrutura
normativa instituída pela Lei Geral das Telecomunicações (Lei n.º 9.472/97),
pois os autorizatários deverão contribuir financeiramente para parcialmente
reembolsar o cumprimento das obrigações de universalização de terceiros, da
mesma forma que os concessionários e permissionários contribuirão para o
58
FUST na mesma proporção que os autorizatários, os quais não têm o dever
contratual de atingir as metas de universalização (Botelho, 2001, p. 63).
A seguir analisar-se-á em específico e mais detalhadamente o FUST,
importante fonte de recursos para o financiamento da universalização dos
serviços blicos de telecomunicações, promotora da redistribuição direta de
uma atividade essencial ao desenvolvimento econômico.
59
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3.1 FORMAS DE CUSTEAR A UNIVERSALIZAÇÃO
Fazendo um apanhado do que foi até o presente momento exposto,
pode-se dizer que a universalização dos serviços públicos tem como finalidade
a realização de maneira direta da redistribuição, que, como visto, é um dos
valores que deve reger o esforço desenvolvimentista no caso brasileiro, tendo
em vista que constitui, simultaneamente, instrumento e conseqüência da
difusão da liberdade de consciência e de escolha econômicas, ou seja, da
democracia econômica, meio apto a permitir, pela ação regulatória do Estado,
a participação popular para cooptação das escolhas e preferências sociais que
difusamente se encontram na sociedade.
Os incisos I e II do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97 estabelecem,
respectivamente, duas fontes possíveis de recursos para o custeamento da
universalização dos serviços públicos de telecomunicações, cujo investimento
não possa ser recuperável com a simples exploração competente da atividade:
a) recursos oriundos dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios; e b) recursos captados por meio de fundo público
especial criado especificamente com essa finalidade, para o qual contribuirão
os agentes econômicos delegados sob o regime público ou privado. O FUST é
a fonte a que se refere o inciso II do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97.
Embora não seja o foco do presente estudo, é importante esclarecer,
conforme estatuiu o parágrafo do artigo 80 da Lei de n.º 9.472/97, que o
financiamento da universalização dos serviços públicos de telecomunicações
não deve interferir na estruturação concorrencial do segmento. É por isso que o
FUST deve sobrecarregar equitativamente a todos os agentes econômicos
delegados que atuam no setor (Faraco, 2003, p. 376).
Por último, cumpre lembrar ainda que o advento do FUST, criado pelo
inciso II do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97 e instituído pela Lei de n.º 9.998/00,
afastou a eventual adoção das outras maneiras de captação de recursos para o
financiamento da universalização previstas nos incisos I e II do parágrafo único
do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97, cuja utilização estava atrelada à não
instituição do fundo, quais sejam, ajuda financeira entre as formas de prestação
60
dos serviços ou entre os setores de consumidores, ou pagamento de
acréscimo extra ao valor de interconexão.
3.2 NATUREZA JURÍDICA DA ENTRADA DOS RECURSOS
Para se entender a natureza jurídica da entrada dos recursos no FUST,
cumpre, preliminarmente, fazer uma breve análise acerca da figura jurídica dos
fundos públicos.
Fundo público equivale ao aprovisionamento de receitas financeiras
públicas, que pode ser ocasional ou para atender a finalidade específica, com a
sua correspondente comprovação gráfico-contábil (Botelho, 2001, p. 64).
Pode também consistir no agrupamento de recursos financeiros ou de
títulos e papéis da dívida pública destinados à realização de um determinado
propósito, sob a administração do Poder Público (Botelho, 2001, p. 64).
Não custa lembrar que, justamente por serem públicos, a instituição,
administração e aprovisionamento dos fundos públicos devem estar pré-
estabelecidos na lei.
Para a Constituição brasileira os fundos públicos assinalam o
aprovisionamento de uma determinada parcela de recursos financeiros
públicos que integra a lei anual do orçamento (artigo 165, parágrafos , inciso
I, e 9º, inciso II).
A Lei de n.º 4.320/64, recepcionada pela Constituição em virtude da
não edição da lei complementar prevista no inciso II do parágrafo do seu
artigo 165, estabeleceu as normas gerais de direito financeiro para elaboração
e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e
do Distrito Federal, e prevê a existência de fundos públicos gerais e especiais,
sendo que estes últimos se caracterizam pela vinculação da utilização de seus
recursos à realização de certos objetivos e serviços (artigo 71); pela aplicação
dos seus recursos estar prevista na lei orçamentária (artigo 72); por serem
representados mediante conta gráfico-contábil (artigo 24); e por serem
especificados no orçamento público como despesas de capital (artigo 13).
Portanto, os fundos públicos representam um destaque do
aprovisionamento de recursos públicos, realizado por força de lei, destinados
ao custeamento de certas atividades de interesse público.
61
Diante do que foi até agora dito, pode-se concluir que a natureza
jurídica da entrada dos recursos no FUST é a de receita pública orçamentária.
Não obstante estarem submetidos à Lei de n.º 4.320/64 os fundos
públicos especiais também são regulados pela lei específica que os instituiu,
bem como pelas leis que fixam as metas orçamentárias plurianual e anual. Por
isso, quando o fundo público está submetido à gestão e controle de entidade
da Administração Pública indireta os recursos que lhes devem ser destinados o
serão por iniciativa do ente arrecadador. Pois, o ingresso de recursos para o
fundo público especial é resultado de receita pública orçamentária, sendo do
orçamento da União no caso do FUST (Botelho, 2001, p. 75).
Em se tratando de serviços públicos de telecomunicações, é da
ANATEL a atribuição de arrecadação e aplicação do fundo público especial, ou
seja, do FUST. Devendo o ente regulador, anualmente, encaminhar ao
Ministério das Comunicações a sua específica proposta orçamentária, a qual
será enviada ao Ministério do Planejamento e Orçamento para a sua respectiva
inclusão na lei orçamentária anual. Na proposta, o valor a ser transferido ao
FUST deverá ser individualizado (Botelho, 2001, p. 77).
3.3 UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS
Considerando que o ingresso de recursos no FUST representa o
resultado de uma receita pública orçamentária, a saída de seus recursos, da
mesma forma, constitui uma despesa pública orçamentária.
Tal contexto, inicialmente, apontaria para a necessidade de
exigibilidade de licitação para a utilização dos recursos do FUST.
Porém, dada a destinação excepcional dos recursos do FUST,
acredita-se que a sua disponibilização se enquadraria na hipótese de dispensa
de licitação prevista no inciso VI do artigo 24 da Lei de n.º 8.666/93, ou seja,
caso a União seja obrigada a interferir no âmbito econômico para equilibrar os
preços ou regularizar o fornecimento.
Ressalta-se ainda que como a finalidade do FUST é o custeamento da
universalização dos serviços públicos de telecomunicações, e sendo a
universalização uma obrigação dos agentes econômicos delegados, os quais,
inclusive, obrigatoriamente foram submetidos a um processo licitatório, faz-
se desnecessária a realização de licitação para a utilização de seus recursos,
62
uma vez que os mesmos poderão ser destinados aos delegatários do setor,
que, inclusive, são os que têm o dever de contribuir para a composição do
fundo (Botelho, 2001, p. 79-80).
Ou seja, o vencedor do certame licitatório para a prestação dos
serviços públicos de telecomunicações será possível e eventual beneficiário
dos recursos do FUST, porém também estará obrigado a cumprir com o dever
de universalização, finalidade para a qual o fundo foi criado.
No entanto, de acordo com Faraco, não basta a simples definição de
metas de universalização para que os agentes econômicos delegados tenham
direito à utilização dos recursos pertencentes ao FUST. É preciso verificar
inicialmente se o agente econômico delegado, na modalidade de concessão,
não está contratualmente obrigado a cumprir com essas metas, pois, caso
esteja, não terá direito de acesso aos recursos, como estatui o parágrafo do
artigo 80 da Lei de n.º 9.472/97 (2003, p. 377).
Ainda que não seja uma obrigação contratual, o agente econômico
delegado terá acesso aos recursos do FUST caso a exploração competente
da atividade não gere receitas suficientes à recuperação do investimento
empregado com a universalização dos serviços públicos de telecomunicações
(Faraco, 2003, p. 378).
Para se ter direito aos recursos do FUST, é necessário que o agente
econômico delegado demonstre que, apesar da exploração competente da
atividade, a prestação dos serviços públicos de telecomunicações não gera
receitas suficientes a cobrir a parcela direcionada para o alcance das metas de
universalização (Faraco, 2003, p. 379).
É bom esclarecer que, apesar do estabelecimento de metas estar
baseado na disponibilidade de recursos, as receitas do FUST devem ser
captadas e recolhidas independentemente da existência ou não de metas de
universalização a serem custeadas (Faraco, 2003, p. 379).
3.4 FONTES DE RECEITAS
A Lei de n.º 9.998/00, ao instituir o FUST em atendimento ao disposto
no inciso II do artigo 81 da Lei de n.º 9.472/97, fixou como seu objetivo a
captação de recursos para financiar os dispêndios realizados pelos agentes
econômicos delegados de regime público no cumprimento com as obrigações
63
de universalização dos serviços públicos de telecomunicações que não podem
ser reavidos com a simples exploração competente da atividade.
As receitas do FUST são representadas: a) por dotações
orçamentárias; b) pela metade do arrecadado com a cobrança da Taxa de
Fiscalização de Instalação (TFI) e da Taxa de Fiscalização de Funcionamento
(TFF); c) por preços públicos cobrados pela ANATEL em razão de
transferências de concessão, permissão, autorização ou uso de
radiofreqüência; d) pela contribuição de um por cento (1%) sobre a receita
operacional bruta, descontando-se o Imposto sobre Operações relativas à
Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transportes
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações (ICMS), o Programa de
Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social (COFINS), paga pelos agentes econômicos delegados sujeitos aos
regimes jurídicos blico e privado; e) por doações; e, finalmente, f) por outras
que eventualmente no futuro lhe forem conferidas (Lei de n.º 9.998/00, artigo
, incisos I, II, III, IV, V e VI).
A contribuição de um por cento (1%) sobre a receita operacional bruta
dos agentes econômicos delegados prevista no inciso IV do artigo da Lei de
n.º 9.998/00, sem dúvida, representa a principal e mais complexa fonte de
captação de recursos ao FUST, por isso será a única a merecer análise mais
detalhada no presente estudo, o que se fará a partir do próximo tópico.
3.5 NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO
Como visto, a contribuição de um por cento (1%) sobre a receita
operacional bruta a ser paga pelos agentes econômicos delegados ao FUST,
instituída pelo inciso IV do artigo da Lei de n.º 9.998/00, terá seus recursos
exclusivamente destinados ao financiamento da universalização dos serviços
públicos de telecomunicações, que, diga-se, é a razão de sua existência.
A única espécie tributária colocada em prática com o objetivo de
financiar a interferência do Estado no âmbito econômico é a contribuição de
intervenção no domínio econômico (CIDE), considerada um tributo da espécie
das contribuições especiais. Integram a sua conceituação três peculiaridades: a
de ser um tributo; a de fazer parte do gênero das contribuições especiais; e a
de estar vinculada ao atendimento de uma determinada finalidade, no caso, a
64
de financiar a ação intervencionista do Estado na esfera econômica (Gama,
2003, p. 125).
Diante desses elementos, pode-se afirmar que a contribuição ao FUST
é uma espécie de CIDE porque, além de ser obrigatória e com todas as notas
inerentes à definição de tributo, possui um objetivo que justifica a intervenção
estatal, que é a universalização dos serviços públicos de telecomunicações. Os
recursos arrecadados são destinados a estender o acesso dos serviços,
beneficiando inclusive os próprios agentes econômicos delegados, uma vez
que a utilização dos seus recursos aumentará o número de pessoas que
passarão a utilizar os serviços públicos de telecomunicações.
Como destacado anteriormente, as telecomunicações, por serem um
serviço de infra-estrutura estratégico para a sociedade, uma vez que possibilita
a ação comunicativa entre a população e favorece o desenvolvimento
econômico por meio da redistribuição, representam um dever inadiável do
Estado no seu eficiente controle e manutenção. Toda a população tem direito à
comunicação, o que será passível de realização por meio da extensão do
acesso aos serviços para além do quanto possa ser explicado como
exploração competente da atividade.
Esse direito ao acesso é assegurado pelo princípio da universalização,
que visa possibilitar que os serviços públicos de telecomunicações possam
alcançar a todos com qualidade e eficiência sem distinção de local ou de
condição socioeconômica.
Lembra-se que a Lei de n 9.472/97 dividiu em duas modalidades a
obrigação de universalização dos serviços públicos de telecomunicações: a) as
denominadas obrigações de universalização, de cunho essencialmente
contratual, como forma de exploração competente da atividade (artigos 79 e
80); e b) a universalização pública, fixada em lei, a ser custeada pelo fundo de
universalização e por recursos públicos (artigo 81) (Tôrres, 2005, p. 05).
Sendo o elemento fundamental dessa separação é a possibilidade de
recuperação dos recursos desembolsados com a universalização como forma
de exploração competente da atividade, o que não se verifica na
universalização pública, que é custeada pelo fundo e por recursos públicos
(Tôrres, 2005, p. 06).
65
Junto com os deveres fixados em lei aos agentes econômicos
delegados de regime jurídico público, deve o Estado cumprir com a sua parte,
colocando em prática políticas públicas a partir da instituição de um fundo
público especial para a universalização, composto por recursos públicos e
privados, com o objetivo de alcançar metas que não seriam realizáveis tão-
somente com a simples obrigação de universalização do serviço como espécie
de exploração competente do serviço. Ressalta-se, como visto, que o dever
de universalização como forma de exploração competente da atividade é
atribuível a apenas aos agentes econômicos delegados de regime jurídico
público (concessionários e permissionários), enquanto que a universalização
pública por meio do pagamento de contribuição ao FUST deve também ser
paga pelos de regime jurídico privado (autorizatários).
Concluindo, o princípio da universalização dos serviços públicos, como
medida de redistribuição, valor essencial ao desenvolvimento econômico,
justifica a instituição de uma espécie tributária denominada CIDE, cuja
finalidade é a de levantar recursos para oportunizar o acesso irrestrito da
população aos serviços blicos de telecomunicações. E se tratando de uma
espécie tributária, a ela devem ser aplicados os princípios constitucionais da
reserva legal (artigo 150, inciso I) e da anualidade fiscal (artigo 150, inciso III)
(Botelho, 2001, p. 107-112).
3.6 RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA DA CONTRIBUIÇÃO
A relação jurídica tributária acontece no específico momento da efetiva
realização do fato correspondente à descrição da hipótese de incidência
tributária, ou seja, do acontecimento fático anteriormente descrito em lei que
tem a atribuição de determinar o nascimento da obrigação de pagar o tributo
(Ataliba, 1998, p. 49-54).
A hipótese de incidência tributária no caso específico da contribuição
ao FUST, é constituída pelos seguintes aspectos: a) material: que é a
prestação de serviços públicos de telecomunicações de interesse coletivo em
regime jurídico público ou privado; b) temporal: que acontece no específico
momento da prestação desses serviços; c) espacial: que está representado nos
atos de prestação dos serviços realizados territorialmente; d) pessoal: formado
pelo sujeito passivo que será sempre o concessionário, permissionário ou
66
autorizatário dos serviços públicos de telecomunicações, bem como pelo
sujeito ativo que é a ANATEL; e, por último, e) quantitativo: constituído pela
base de cálculo que é o resultado da quantificação da receita operacional bruta
deduzindo-se o ICMS, o PIS e a COFINS, e pela a alíquota que é de um por
cento (1%) sobre a receita operacional bruta no período de trinta dias.
A seguir serão examinados mais detidamente alguns desses elementos
que integram a relação jurídica tributária.
3.6.1 Fato Gerador
O fato gerador é o acontecimento fático que, por corresponder à
descrição da hipótese de incidência tributária prevista em lei, faz nascer a
obrigação de pagar o tributo (Ataliba, 1998, p. 61).
A contribuição ao FUST tem como fato gerador a receita operacional
bruta auferida com a prestação de serviços públicos de telecomunicações de
regime jurídico público ou privado.
São dois, portanto, os elementos definidores do fato gerador da
obrigação de pagar a contribuição ao FUST: a) a execução dos serviços
públicos de telecomunicações; e b) o resultado econômico obtido com a
exploração dessa atividade (Botelho, 2001, p. 117).
Para o nascimento da obrigação de pagar a contribuição ao FUST é
necessária a constatação da ocorrência desses dois elementos.
3.6.2 Sujeito Ativo
O sujeito ativo é a pessoa jurídica de direito público detentora do direito
subjetivo, ou seja, da atribuição de reclamar o cumprimento da obrigação de
pagar o tributo (Melo, 1997, p. 169).
Os incisos I, II e III do artigo e o artigo da Lei de n 9.998/00
atribuem à ANATEL o poder para administrar, fiscalizar, controlar e reclamar o
pagamento da contribuição ao FUST.
Portanto, à ANATEL é atribuída a condição de sujeito ativo da relação
jurídica tributária, devendo o produto da arrecadação da contribuição colocar
em prática o crédito orçamentário destinado ao FUST, uma vez que o ingresso
desses recursos é resultado de receita pública orçamentária da União (Botelho,
2001, p. 115).
67
Não custa lembrar que a ANATEL tem a obrigação de, anualmente,
encaminhar ao Ministério das Comunicações a sua específica proposta
orçamentária, a qual será enviada ao Ministério do Planejamento e Orçamento
para a sua respectiva inclusão na lei orçamentária anual, devendo estar
individualizado na proposta o valor a ser transferido ao FUST.
3.6.3 Sujeito Passivo
O sujeito passivo na relação jurídica tributária é o contribuinte, ou seja,
é de quem se deve reclamar o cumprimento da obrigação de pagar o tributo,
uma vez que de alguma forma incitou ou motivou a ocorrência do fato que, por
corresponder à descrição da hipótese de incidência tributária prevista em lei,
fez nascer tal obrigação (Ataliba, 1998, p. 77-79).
Na contribuição ao FUST o sujeito passivo é a concessionária,
permissionária ou autorizatária dos serviços públicos de telecomunicações de
regime jurídico público ou privado.
Nos casos de interconexão, analisando o aspecto material da hipótese
de incidência tributária e constatando que se trata de uma atividade típica de
telecomunicações, bem como que a base de cálculo é a receita operacional
bruta, o que confirma esse aspecto material de incidência, é fácil concluir que o
sujeito passivo da contribuição ao FUST são todas das prestadoras de serviços
de telecomunicações não importando em que modalidade, inclusive as que
realizam a complementação por meio de contrato típico de interconexão de
redes, trabalhando com transferências (Tôrres, 2005, p. 08).
Logo, sempre que se tratar de interconexão de redes, por causa das
transferências que são realizadas, tem-se uma responsabilidade tributária
solidária, uma vez que todos os agentes econômicos delegados envolvidos são
sujeitos passivos da obrigação tributária, cujo fato gerador é a receita
operacional bruta auferida com a prestação de serviços de telecomunicações
em regime jurídico público ou privado (Tôrres, 2005, p. 09).
Não é possível analisar os serviços públicos de telecomunicações, em
qualquer uma de suas modalidades, descartando-os da definição de
universalização de serviços públicos, pois a partir do momento em que a
contribuição foi instituída com o objetivo custear o FUST, nasceu um dever
típico de universalização. O princípio da universalização torna obrigatórios
68
alguns deveres legais com o objetivo de ampliar certas atividades essenciais a
todos e a custos módicos (Tôrres, 2005, p. 09).
Portanto, o agente econômico delegado operador dos serviços públicos
de telecomunicações por interconexão é sujeito passivo da contribuição ao
FUST, notadamente no que se refere à tarifa de uso, ou seja, sobre a receita
operacional bruta auferida com a mesma, devendo o delegatário recolher a
exação na proporção do serviço que efetivamente prestar, excluindo o custo de
interconexão (Tôrres, 2005, p. 10).
Por último, é importante destacar que os diretores, gerentes ou
representantes dos agentes econômicos delegados são pessoalmente co-
responsáveis pelo eventual descumprimento da obrigação tributária, caso
tenha sido praticado com excesso de poderes e/ou ilegalmente, conforme
dispõe o artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN).
3.6.4 Base de Cálculo
Primeiro aspecto quantitativo da hipótese de incidência tributária, a
base de cálculo é a unidade de medida utilizada como referência para
determinar o valor nos fatos tributários (Barreto, 1998, p. 53).
Na contribuição ao FUST a base de cálculo é determinada exatamente
como a receita operacional bruta, deduzindo-se o ICMS, o PIS e a COFINS. A
apuração do valor é o resultado do levantamento de todos os atos de prestação
de serviços públicos de telecomunicações, no período de trinta dias, na
proporção da receita operacional bruta auferida, uma vez que se trata do único
momento passível de quantificação adequada, ou seja, pelo somatório dos
serviços prestados a um dado usuário (Tôrres, 2005, p. 06).
Como bem destacou Tôrres, a base de cálculo é um reflexo patrimonial
do fato jurídico descrito na hipótese de incidência tributária, servindo não
apenas para apurar o valor do tributo a ser pago, mas também para delimitar o
aspecto material tributável. Sendo que, no presente caso, essa atribuição
assume especial importância, pois é responsável por designar que apenas a
receita operacional bruta recebida com a prestação de serviços de
telecomunicações poderá ser utilizada para se exigir o tributo (2005, p. 06).
É oportuno explicar que o conceito de receita inclui as seguintes
espécies: a) as receitas operacionais, que são aquelas auferidas com a
69
comercialização de produtos ou prestação de serviços, e b) as receitas não-
operacionais, que são obtidas por meio de outras formas de ingressos, mas
sempre em razão da atividade da empresa (Botelho, 2001, p. 121-122).
Qualquer ingresso que não seja em função do funcionamento da
empresa não é receita operacional, uma vez que não se destina a maximizar o
capital estabelecido.
E a receita operacional bruta é aquela auferida pela empresa com a
comercialização de seus produtos ou a prestação de seus serviços sem a
dedução das despesas. Logicamente, se as despesas forem deduzidas, a
receita operacional passará a ser líquida.
Portanto, a contribuição ao FUST poderá atingir a receita obtida em
decorrência direta das atividades de prestação de serviços públicos de
telecomunicações concretamente realizadas, sem se deduzir as despesas.
Destaca-se aqui uma imperfeição na Lei de n.º 9.998/00. O inciso IV do
seu artigo estatui que a base de cálculo da contribuição ao FUST será a
receita operacional bruta, deduzindo-se o ICMS, o PIS e a COFINS.
No entanto, se a referência é a receita operacional bruta, nenhuma
despesa poderia ter sido excluída da base de lculo pela lei. Por outro lado,
se de fato não se verifica a receita operacional bruta, também não se pode
dizer que se trata de receita operacional líquida, uma vez que apenas o
dispêndio com três tributos foi excluído da base de lculo e não todas as
despesas. Logo, pode-se concluir que, na realidade, a base de cálculo da
contribuição ao FUST trata-se de receita operacional semilíquida (Botelho,
2001, p. 124).
Pode ainda compor a base de lculo da contribuição ao FUST
serviços prestados por outras operadoras, como acontece nos casos de
interconexões. De acordo com o parágrafo único do artigo 146 da Lei de n.º
9.472/97, interconexão é a ligação entre redes diferentes, porém compatíveis,
por meio da qual o usuário de uma delas poderá se comunicar com um usuário
da outra, além de utilizar seus serviços.
Nesses casos a composição da base de cálculo pode se dar com
complementações próprias dos contratos de interconexão, inclusive, como
receita bruta, pela sistemática de retenção na fonte, podendo,
conseqüentemente, o agente econômico delegado devedor reter o
70
correspondente à proporção dos serviços prestados pelo credor. É possível
também ser utilizada uma base de lculo específica para cada delegatário
contribuinte, de acordo com os serviços diretamente prestados, excluindo-se da
base de cálculo do devedor qualquer valor relativo à interconexão (Tôrres,
2005, p. 07).
Não pode ser considerada receita operacional a receita de partes
alheias que integram o contrato de interconexão. As receitas obtidas nos casos
de interconexão devem ser separadas em receitas operacionais e receitas de
parte alheia para a correta distribuição das obrigações tributárias assumidas
por cada agente econômico delegado no momento da prestação de serviços
públicos de telecomunicações. Logo, a idéia de receita operacional predomina
sobre a de receita bruta, pois esta última é o total obtido pela empresa; e a
primeira é a auferida exclusivamente com a comercialização de produtos ou
prestação de serviços (Tôrres, 2005, p. 07).
Em se tratando de interconexão, portanto, foram duas as formas
possíveis propostas pela Lei n.º 9.998/00: a) a adotada pela ANATEL, que
determina a composição da base de cálculo de operadora por operadora, com
receitas operacionais faturadas com serviços diretos e tarifas de uso
decorrentes dos contratos de interconexão, na proporção do quanto couber; e
b) a do regime de retenção na fonte, mas que, por precisar de lei específica,
não pode ser utilizada diretamente (Tôrres, 2005, p. 08).
3.6.5 Alíquota
A alíquota, segundo aspecto quantitativo da hipótese de incidência
tributária, é o indicador da dimensão a ser considerada pela base de cálculo na
determinação do valor nos fatos jurídicos tributários (Barreto, 1998, p. 58).
No caso específico da contribuição ao FUST, de acordo com o inciso IV
do artigo da Lei de n 9.998/00, a alíquota será de um por cento (1%) sobre
a receita operacional bruta dos agentes econômicos delegados, deduzindo-se
o ICMS, o PIS e a COFINS.
Esta fixação não acarreta em grandes complexidades, pelo que se faz
desnecessário exame mais aprofundado da questão.
71
3.7 CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO DA CONTRIBUIÇÃO
O crédito tributário é o direito que a Administração Pública tem de
cobrar e receber valores dos particulares, em virtude da ocorrência do
correspondente fato gerador, materializado pelo efetivo acontecimento de todos
os elementos que integram a hipótese de incidência tributária prevista em lei
(Melo, 1997, p. 195).
Esse crédito tributário é constituído pelo chamado lançamento,
definido, pelo artigo 142 do Código Tributário Nacional (CTN), como o
procedimento administrativo responsável pela constatação do acontecimento
do fato gerador da obrigação tributária, pela delimitação da matéria a ser objeto
da tributação, pela determinação do valor do tributo exigível, pela identificação
do contribuinte, e, caso seja necessário, pela indicação de penalização.
A constituição do crédito tributário da contribuição ao FUST ocorre com
o lançamento em sua modalidade por homologação, verificada no caso dos
tributos em que a lei confere ao contribuinte a obrigação de antecipar o
pagamento sem anterior conferência pela autoridade administrativa, a qual, ao
ter ciência desse pagamento, o homologa, efetivando dessa maneira o ato
administrativo (Código Tributário Nacional, artigo 142).
Portanto, cabe ao agente econômico delegado do serviço público de
telecomunicações providenciar o pagamento e o lançamento por homologação
da contribuição ao FUST, sem a prévia conferência da autoridade
administrativa. O que deve ser feito mensalmente conforme determina o
parágrafo 3º do artigo 10 da Lei de n.º 9.998/00.
3.8 CONSIDERAÇÕES GERAIS
Segundo informou Dantas em artigo publicado no VLWHdo Observatório
de Políticas Públicas de Infoinclusão (OPPI), atualmente cerca de quarenta por
cento (40%) das residências brasileiras não têm acesso a qualquer tipo de
serviço de telefonia e cinqüenta por cento (50%) das escolas públicas não
possuem linhas telefônicas, ou seja, no Brasil a universalização dos serviços
públicos de telecomunicações está longe de ser uma realidade (2007, p. 01).
Apesar da atual estrutura das telecomunicações permitir a oferta
suficiente dos serviços, a demanda é ainda muito deficitária, o que reflete a
histórica concentração de renda brasileira.
72
Em se tratando de telefonia fixa, no Brasil quase seis anos o seu
crescimento não ultrapassa a metade do número total de residências. Nos
últimos três anos o número de linhas instaladas diminuiu algo em torno de um
milhão. A ociosidade no sistema é elevada, chegando a quarenta por cento
(40%) em regiões como o Norte e Nordeste. E a densidade do serviço atinge
cinqüenta por cento (50%) em apenas quarenta municípios brasileiros, sendo
que em outras duas mil e quinhentas cidades raramente alcança dez por cento
(10%) (Dantas, 2007, p. 01).
Com referência à telefonia celular, apesar do forte crescimento
verificado nos últimos anos, o mesmo se deu, principalmente, em relação ao
sistema pré-pago, que hoje atende a cerca de oitenta por cento (80%) dos
usuários. Porém, esse sistema possui baixa lucratividade, uma vez que a
população mais pobre, que representa a imensa maioria dos usuários, utiliza-
se do serviço muito mais para receber chamadas do que para fazê-las.
Em virtude desse baixo retorno do sistema pré-pago, os agentes
econômicos delegados só conseguem manter o equilíbrio econômico-financeiro
do negócio com as receitas auferidas com o tráfego de interconexão (Dantas,
2007, p. 01).
Diante de todos esses dados, é possível verificar que o crescimento da
rede de telecomunicações chocou-se com a forte concentração de renda que
estruturalmente caracteriza o Brasil. Apesar de existir estrutura apta à oferta,
não há demanda, porque não há renda.
O país possui um potencial imensurável no seu mercado interno
representado pelos excluídos.
Um panorama como esse torna necessária a implementação de
políticas de redistribuição de renda, e a universalização de serviços públicos é
uma maneira direta de se fazer isso, sendo o FUST um importante mecanismo
de efetivação de políticas dessa natureza, pois, como visto, é um fundo público
especial instituído para o custeamento da universalização dos serviços públicos
de telecomunicações, cujo investimento não possa ser recuperável com a
simples exploração competente da atividade. Serve, portanto, como fonte de
ressarcimento dos agentes econômicos delegados.
Não obstante desde a instituição do FUST em 2001 até o final de 2006
aproximadamente quatro bilhões e quinhentos milhões de reais (R$
73
4.500.000.000,00) terem sido arrecadados, nenhum centavo foi utilizado na
universalização dos serviços públicos de telecomunicações, pois, suspeita-se,
o Ministério da Fazenda vem retendo esses recursos para atingir o superávit
primário (Dantas, 2007, p. 02).
A boa notícia é que recentemente, em 07 de fevereiro de 2007, por
meio do Decreto de n 6.039, foi aprovado pela Presidência da República o
plano de metas para a universalização do serviço telefônico fixo comutado em
instituições de assistência às pessoas com deficiência auditiva, plano este que
deverá contar com recursos do FUST. Portanto, ainda que timidamente, parece
que a partir de 2007 os recursos do fundo começarão a ser empregados no
financiamento de políticas redistributivas.
Desde que utilizado, o FUST pode ser um importante instrumento para
a universalização dos serviços públicos de telecomunicações, ou seja, uma
maneira de redistribuição direta, que, conforme visto, é um dos valores que
deve reger o esforço desenvolvimentista no caso brasileiro, tendo em vista que
constitui, simultaneamente, instrumento e conseqüência da difusão da
liberdade de consciência e de escolha econômicas, ou seja, da democracia
econômica.
Em outras palavras, o imenso potencial do mercado interno brasileiro
representado pelos excluídos, pelo menos em se tratando de
telecomunicações, poderia estar sendo realmente explorado.
O próximo capítulo sedestinado a examinar se, no caso do FUST, o
aparato regulatório do Estado brasileiro possui mecanismos que permitam o
exercício da democracia econômica, meio capaz de possibilitar a participação
popular para o devido aliciamento das escolhas e preferências sociais que
esparsamente se encontram na sociedade.
74
3$57,&,3$d23238/$5('e),&,7'(02&5È7,&2
4.1 PARTICIPAÇÃO POPULAR E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
Como visto até agora, a idéia de desenvolvimento econômico se
identifica com a de democracia econômica, a qual é constatável quando a
população é incluída no processo de tomada de decisões econômicas, ou seja,
quando lhe é oportunizado o exercício da liberdade de consciência e de
escolha econômicas, o que deve acontecer por meio de uma ação regulatória
do Estado que seja capaz de exprimir e transmitir efetivamente essa liberdade,
bem como de garantir que as decisões tomadas, além de representar os
anseios da sociedade, sejam as melhores.
A estratégia democrático-desenvolvimentista deve considerar a
realidade brasileira, cuja peculiaridade é a alta concentração de renda, que
mitiga a demanda e impossibilita a expressão das escolhas e preferências
sociais. Para tanto, conforme dito anteriormente, é preciso propagar
forçadamente o exercício popular da liberdade de consciência e de escolha
econômicas, inclusive, para que essas opções sociais sejam cooptadas.
O desafio é a criação de um processo para a formação da liberdade de
consciência e de escolha econômicas própria, bem como de meios para
difundir essa liberdade e eliminar a sua concentração.
E é ao Estado que cabeesse papel, o que, inclusive, acarretará em
mudanças nas suas atribuições tradicionais, uma vez que deverá, por meio da
regulação, assegurar à população a capacidade de expressão e mecanismos
de transmissão da liberdade de consciência e de escolha econômicas. O que
será possível com uma mudança institucional que absorva e entenda os
valores fundamentais incorporados na sociedade e que passe a se utilizar de
regras procedimentais para defini-los e aplicá-los. Sendo necessário também
que a população participe do processo de confecção dessas regras
procedimentais. Pois, conforme mencionado anteriormente, segundo Jürgen
Habermas (Alemanha 1929), são as regras procedimentais que permitirão que
as escolhas e preferências sociais que se encontram de forma esparsa na
sociedade sejam transportadas, debatidas e incorporadas pela Administração
Pública (Mattos, 2004, p. 319).
75
4.2 PARTICIPAÇÃO POPULAR E REGULAÇÃO
4.2.1 Legitimidade, Regras Procedimentais e Consenso
É crescente, contemporaneamente, a apreensão em assegurar
mecanismos de debate público que possibilitem à participação popular
identificar as decisões da Administração Pública, bem como as políticas
públicas, com os anseios da sociedade.
Destacou Canotilho que tornar a democracia mais democrática por
meio da participação implica em incrementar a ingerência popular no processo
de tomada de decisões (1993, p. 426). Sendo que a participação para ser
considerada democrática deve ser livre, e deve ser posta em prática mediante
regras procedimentais pré-estabelecidas e acessíveis a todos, valendo o
princípio da maioria nos casos de necessidade de tomada de decisão (Ugarte,
2004, p. 96).
A idéia de participação popular, não custa lembrar, é aqui identificada
com o conceito de S~EOLFRSDUWLFLSDWLYR, entendido como cidadãos organizados
que objetivam a inclusão socioeconômica e política por meio do debate público,
do enaltecimento da transparência e da responsabilização, bem como da
colocação em prática de suas escolhas e preferências (Wampler e Avritzer,
2004, p. 215).
A prática administrativa, tradicionalmente, representa a expressão da
vontade da Administração Pública e decorre do exercício da própria hegemonia
desta. Sendo que a constituição dessa vontade, para ter validade, sempre
esteve correlacionada com o objetivo final da Administração Pública, ou seja, à
realização do bem comum submetida ao cumprimento de certos métodos.
No entanto, a tendência contemporânea é a de incluir também a
participação popular como elemento legitimador da prática administrativa, o
que ressalta a importância da legislação que trata das agências reguladoras
brasileiras que explicitamente prevê a participação da população no processo
de produção de normas reguladoras por meio de regras procedimentais em
mecanismos como as audiências e consultas públicas.
Apesar das críticas realizadas à eventual ilegitimidade desse poder
normativo das agências reguladoras ante a ausência de investidura política
democrática de seus quadros, Moreira Neto acertadamente defende que as
76
mesmas são entes com atribuições administrativas e não políticas, mas que, da
mesma forma, buscam legitimidade na sociedade, que por meio de regras
procedimentais, as quais, pela publicidade, pela intervenção, pelo contraditório
e pela ampla defesa, asseguram a participação dos interessados no processo
de tomada de decisões (2003, p. 156).
A produção normativa pelas agências reguladoras não significa uma
usurpação da função legislativa, uma vez que o Poder Legislativo edita leis
com alto grau de abstração e generalidade, e que não atendem aos novos
padrões da sociedade, que exigem normas mais diretas e específicas. Tal
panorama também justifica a competência normativa das agências
reguladoras, acarretando, como dito anteriormente, no aprofundamento da
atuação normativa do Estado.
Destaca-se que o processo de produção normativa nas agências
reguladoras, o qual por meio de regras procedimentais deve garantir a
participação popular, pode ser examinado sob três aspectos fundamentais: a) a
regularidade formal, referente aos prazos, publicações, intimações, entre
outros; b) a regularidade substancial, relativa ao conteúdo das regras
procedimentais, notadamente à regra oficialmente publicada; e, por último, c)
os motivos definidores, ou seja, a relação motivadora apresentada pelo ente
regulador no momento da aceitação ou desaprovação das contribuições
populares (Moreira, 2004, p. 204).
A participação popular, sem dúvida, confere legitimidade às práticas da
Administração Pública. Porém, convém ressaltar, que para a realização do bem
comum, que representa o objetivo final da Administração Pública, não é apenas
suficiente a adequação das práticas administrativas à legalidade, porque a
própria participação popular intensifica a obrigatória observância dos princípios
da razoabilidade e da eficiência (Mastrangelo, 2005, p. 99). Da mesma forma,
que, apesar de constitucionalmente garantido, o poder normativo das agências
reguladoras não sugere a edição de regulamentos autônomos, porque esse
poder deve ser exercido com base legal.
Contudo, é possível verificar um progresso com relação ao princípio do
consenso na Administração Pública, o qual preconiza a participação popular
por meios de regras procedimentais nos debates de assuntos de interesse
público, procurando sempre se chegar a uma uniformidade de posições.
77
O consenso encorpa a transparência e a moralidade das práticas
administrativas porque torna conhecida a identidade das partes envolvidas na
conciliação e impede eventuais insinuações sobre a honestidade do
procedimento, da mesma forma que garante mais estabilidade às relações
administrativas ao maximizar a segurança jurídica quando soluciona
antecipadamente divergências.
É importante esclarecer que a participação popular mediante de regras
procedimentais não visa obrigatoriamente o consenso, mas sim incorporar e
controlar possíveis insatisfações sociais ao oportunizar a inclusão popular no
debate sobre assuntos que interessam a todos.
Um bom exemplo de regras procedimentais em matéria regulatória que
efetivamente oportunizam a participação popular em temas de interesse geral é
o das agências norte-americanas, cuja produção normativa, conforme dispõe a
Lei de Processo Administrativo dos EUA (1946), o $GPLQLVWUDWLYH 3URFHGXUDO
$FW $3$, exige um procedimento participativo, perceptivo e lógico.
Participativo, no sentido de se permitir aos interessados a apresentação por
escrito de suas posições e justificativas; perceptivo, pois a participação deve
incluir a todos cuja norma em debate, potencialmente, pode afetar; e lógico,
uma vez que as agências devem demonstrar a relevância da norma produzida
com os componentes captados na fase de participação popular e com o
propósito normativo (Mastrangelo, 2005, p. 100).
4.2.2 Mecanismos de Participação Popular
Tratar de mecanismos de participação popular na Administração
Pública obrigatoriamente demanda a procura por recursos que permitam à
população interferir de maneira efetiva na concretização das atribuições do
Estado (Santos e Caraçato, 2006, p. 811).
É possível classificar os mecanismos de participação popular na
Administração Pública em: a) legislativos: que permitem a ingerência da
população no processo de confecção de normas do Estado por meio, por
exemplo, do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular; b) judiciais: que
possibilitam a interferência popular na atividade judicial do Estado com a
finalidade de defender interesses coletivos, o que é possível com a utilização
de instrumentos como, por exemplo, a ação civil pública, a ação popular e a
78
ação direta de inconstitucionalidade; e, por último, c) administrativos: que são
regras procedimentais que captam e incluem de maneira ágil, efetiva e não
burocrática na estrutura da gestão pública as escolhas e preferências sociais
(Santos e Caraçato, 2006, p. 811).
Tendo em vista que um dos principais assuntos discorridos neste
trabalho é o da ação regulatória do Estado em prol do desenvolvimento
econômico, faz-se pertinente ao presente estudo tão-somente o exame dos
mecanismos administrativos de participação popular na Administração Pública,
e destes apenas os que se referem exclusivamente aos setores regulados,
especificamente as consultas e audiências públicas utilizadas pelas agências
reguladoras brasileiras, o que será feito no tópico a seguir.
4.2.3 Consultas e Audiências Públicas
No âmbito regulatório a consulta pública é uma espécie de mecanismo
administrativo de participação popular na Administração Pública no que se
refere à produção normativa das agências reguladoras brasileiras de prestação
de serviços públicos.
O precedente da consulta pública no direito estrangeiro são as
chamadas enquetes, que são uma modalidade de participação constituída em
um procedimento de obtenção de informações junto à população sobre temas
de interesse público (Pietro, 1993, p. 134).
Apesar de ser um mecanismo muito comum na França e nos países de
tradição anglo-saxônica, no Brasil pode-se verificar a enquete, embora de
forma isolada, em alguns debates públicos realizados pelo Estado e/ou pela
sociedade civil organizada (Pietro, 1993, p. 135).
As informações obtidas por meio de enquetes possibilitam à
Administração Pública a cooptação das preferências e escolhas sociais que se
encontram esparsas na sociedade, o que fornece elementos para que as
decisões estatais possam ter maior identidade com os anseios da população,
da mesma forma que incrementam a legitimidade das práticas administrativas
(Moreira Neto, 1992, p. 125).
Instituto com a mesma finalidade que as enquetes, porém mais amplo,
a consulta pública possibilita aos atingidos pela ação regulatória do Estado,
formalmente e por escrito, exprimir os seus interesses e apresentar suas
79
razões favoráveis ou contrárias ao cabimento da norma reguladora a ser
eventualmente publicada, influenciando, dessa maneira, nos rumos da
regulação. No entanto, essa ingerência popular deve seguir determinadas
regras procedimentais que são controláveis (Mattos, 2004, p. 320-321).
A legislação específica das agências reguladoras brasileiras determina
que a confecção normativa deve obrigatoriamente ser precedida por um prévio
procedimento de consulta popular sobre o rascunho da futura norma. Exemplo
disso, como se verá adiante, é o estabelecido no artigo 42 da Lei de n.º
9.472/97 (LGT) com relação à ANATEL.
Da mesma forma que a consulta pública, a audiência pública tem
precedentes estrangeiros, como o sistema de planejamento urbano da
Inglaterra e, nos EUA, o ULJKW WR D IDLUKHDULQJ, direito a uma audiência justa
(Mastrangelo, 2005, p. 118).
No Brasil, no que se refere à regulação, a audiência pública é um
relevante mecanismo administrativo de participação popular na Administração
Pública destinado à fiscalização do cumprimento de políticas públicas nos
setores regulados e à solução de divergências (Mattos, 2004, p. 321).
A audiência pública se constitui em um procedimento aberto aos
interessados, oportunizando mediante debates orais a expressão das escolhas
e preferências sociais aptas a auxiliar o Estado na tomada de decisões
majoritariamente consensuais (Moreira Neto, 1992, p. 129).
O que essencialmente distingue consulta pública e audiência pública é
que a realização desta última não é obrigatória, dependendo para tanto do
exame, pelo ente regulador, da sua pertinência e necessidade no caso
específico.
4.2.4 Participação Popular na ANATEL
O artigo 42 da Lei de n.º 9.472/97 estabelece que o rascunho de
eventuais futuras normas reguladoras deverão ser submetidos pela ANATEL à
consulta pública, sendo que as opiniões populares serão obrigatoriamente
analisadas.
A consulta pública recebeu ainda regulamentação específica no
Regimento Interno da ANATEL, o qual estatuiu que os temas importantes e os
rascunhos das normas a serem editadas deverão ser submetidos à opinião
80
pública em geral, cujas observações e propostas deverão ser apresentadas por
escrito (Resolução n.º 197/99, artigo 45, FDSXW e parágrafo 2º).
É oportuno destacar que, em se tratando especificamente de
universalização de serviços públicos, cabe à ANATEL elaborar e propor ao
Presidente da República o plano geral de metas de universalização dos
serviços públicos de telecomunicações prestados sob regime jurídico público,
sendo obrigatória a sujeição do plano à prévia consulta popular (Lei de n.º
9.472/97, artigos 18 e 19, inciso III).
com relação à audiência pública, o Regimento Interno da ANATEL
estabelece que a sua finalidade é a de instaurar debates orais sobre assuntos
do interesse de todos, com o objetivo de coletar as escolhas e preferências
populares para subsidiar as decisões da agência reguladora, sendo, no
entanto, opcional a apresentação formal e por escrito dessas contribuições
(Resolução n.º 197/99, artigos 42 e 43, parágrafo único).
Na realidade, conforme ressaltou Mastrangelo, a ANATEL prefere
harmonizar os dois institutos no mesmo procedimento administrativo, sendo a
audiência pública utilizada para contribuir na definição do tema que será objeto
da consulta pública (2005, p. 124).
4.3 DÉFICIT DEMOCRÁTICO NAS AGÊNCIAS REGULADORAS
Quando se tem como pressuposto a idéia de democracia econômica, a
qual a exige a inclusão da população no processo de tomada de decisões
econômicas ou seja, quando oportuniza o exercício popular da liberdade de
consciência e de escolha econômicas, o que deve acontecer por meio de
instrumentos regulatórios do Estado capazes de exprimir e transmitir essa
liberdade, bem como de garantir que as decisões sejam as melhores não é
suficiente apenas a verificação da existência ou não de regras procedimentais
decisórias, bem como se as mesmas são ou não efetivamente utilizadas. É
preciso também que seja examinado de que maneira a definição do conteúdo
da regulação foi realmente debatido e influenciado pela participação popular.
Conforme Mattos, o processo de tomada de decisões sobre o conteúdo
da regulação deve necessariamente contar com uma participação popular
substantiva, cujas escolhas e preferências devem efetivamente ser
consideradas pela agência reguladora. O que, diga-se, pode ser alcançado: a)
81
com regras procedimentais que possibilitem o exercício da argumentação e
contra-argumentação pela população, expandindo o debate acerca das razões
e resultados desejados no conteúdo da futura norma reguladora; b) com a
obrigatoriedade de justificação pela diretoria da agência reguladora do rumo
tomado na definição do conteúdo final da norma, inclusive apresentando os
motivos da adoção ou não de contribuições populares; e, por último, c) com a
realização de audiências e consultas públicas no mesmo procedimento
administrativo, possibilitando a instauração de debates no decurso do prazo de
discussão sobre o rascunho da futura norma reguladora (2004, p. 322-323).
Nesse contexto, pode-se dizer que em tese a consulta e a audiência
públicas são mecanismos administrativos que possibilitam a influência popular
acerca do conteúdo das normas reguladoras, pois permitem por meio de regras
procedimentais que os atingidos pela regulação do Estado exprimam e
consignem suas escolhas e preferências (Mattos, 2004, p. 320).
Segundo destacou Moreira, qualquer rompimento no contorno
democrático do processo de tomada de decisões públicas implica na procura
de novos meios de legitimação. Com relação às agências reguladoras
brasileiras, ante a ausência de investidura política democrática de seus
membros, a solução apresentada tem sido essencialmente a combinação do
conhecimento técnico com o cumprimento de certas regras procedimentais que
permitam a participação popular no processo de tomada de decisões
normativo-regulatórias (2004, p. 185-186).
No entanto, na prática, apesar de haver participação, esta geralmente é
restrita às camadas privilegiadas da sociedade e versa quase sempre sobre
assuntos discricionariamente estabelecidos pelas próprias agências
reguladoras.
No Brasil não existe uma solução uniforme sobre as consultas e
audiências públicas entre as agências reguladoras. Na ANATEL, não obstante
todos os rascunhos de atos normativos serem sujeitados à consulta pública
prévia, a competência decisória final é exclusiva de sua diretoria.
E a ausência de colaboração popular não frustra a edição da norma, ou
seja, a participação da população no procedimento não é requisito de validade,
uma vez que a real contribuição no processo de produção de normas nas
agências reguladoras é apenas circunstancial e não fundamental. Sendo que
82
em casos de ausência de colaboração o procedimento é legitimado
internamente, mediante decisão normativa unilateral dos órgãos colegiados
competentes (Moreira, 2004, p. 192).
Sem falar que no caso da audiência pública a sua realização não é
obrigatória, dependendo para tanto do exame, pelo ente regulador, da sua
pertinência e necessidade no caso específico (Mattos, 2004, p. 321).
Portanto, o que se prioriza na atual sistemática da regulação brasileira
é a potencialidade democrática do procedimento de produção normativa e não
a busca pela sua efetividade democrática.
O processo de elaboração das normas das agências reguladoras
brasileiras quase sempre é restrito e envolve estratos sociais flagrantemente
privilegiados, e que tendem a defender somente os seus próprios interesses.
E uma das causas disso é que as formas de divulgação das consultas
e audiências públicas, que se dão por meio do Diário Oficial, de jornais de
grande circulação e da LQWHUQHW, quase sempre não alcançam as outras
camadas da população.
O Diário Oficial é o instrumento de menor repercussão popular,
enquanto que os jornais de grande circulação, apesar do grande alcance que
proporcionam, geralmente publicam pequenos editais que na maioria das
vezes fazem referência aos endereços físicos e/ou eletrônicos dos entes
reguladores.
Na prática a LQWHUQHW é o meio de maior repercussão junto à população,
contudo, ela traz à tona o problema da exclusão digital na medida em que
somente pessoas com acesso aos aparelhos necessários, com dinheiro e
conhecimento cnico, conseguem ter ciência e participar das consultas e
audiências públicas (Moreira, 2004, p. 194).
As regras procedimentais a serem seguidas na produção normativa
garantem transparência às ações das agências reguladoras, no entanto, essa
produção, quase sempre, não é fruto da participação popular legitimadora, mas
sim da institucionalização da captura dos entes reguladores pelos agentes
econômicos regulados (Moreira, 2004, p. 197).
A própria rapidez na tomada de decisões, que inclusive é uma
particularidade importante que justifica a existência das agências reguladoras,
representa maior quantidade de normas, menos debates, menor participação e,
83
conseqüentemente, menos legitimidade democrática. Essa multiplicação
normativa acaba por restringir o número de pessoas cientes das normas e de
sua aplicação (Moreira, 2004, p. 198-199).
É importante também destacar que a produção normativa das agências
reguladoras, além de oriunda da democrática participação popular legitimadora
efetivada por regras procedimentais, baliza-se ainda por critérios
essencialmente técnicos, o que representa uma tentativa de neutralizar
eventuais pressões políticas e/ou econômicas.
Em tese, argumentos político-democráticos não são suficientes à
eventual não implantação de uma decisão puramente técnica, da mesma forma
que a participação dos interessados não possui efeitos vinculantes, pois pode
ser afastada pela chamada discricionariedade técnica.
Logo, os óbices à efetiva participação popular nas agências
reguladoras estariam: a) na definição das autoridades competentes e da
matéria regulada; b) nas regras procedimentais a serem desenvolvidas; e, por
último, c) na complicação técnica da decisão (Moreira, 2004, p. 202).
É fácil concluir que, na medida em que a lei confere a um determinado
agente uma rie de ponderações complexas, seria difícil, senão impossível, a
efetiva participação popular nas suas decisões.
No entanto, como lembra Moreira, não existe questão altamente
técnica que não possa ser imparcialmente avaliada em juízo, e muito menos
existe perícia exclusiva, sigilosa e/ou desconhecida dos demais cientistas e
peritos. Portanto, é possível sim um controle externo da discricionariedade
técnica, porém, judicial e não mediante democrática participação popular
(2004, p. 204).
4.4 DÉFICIT DEMOCRÁTICO NA REGULAÇÃO DO FUST
De acordo com pesquisa realizada por Mattos, entre os anos de 1998 e
2003 foram realizadas pela ANATEL apenas três consultas públicas sobre
universalização dos serviços públicos de telecomunicações que tivessem
alguma correlação com o FUST. São as seguintes: a) consulta pública de n.º
265/2000, que se refere à proposta de regulamento para arrecadação da
contribuição das prestadoras de serviços de telecomunicações ao FUST; b)
consulta pública de n.º 273/2000, que trata da proposta de regulamento de
84
operacionalização da aplicação de recursos do FUST; e, por último, c) consulta
pública de n.º 284/2000, relativa à proposta de plano de metas para a
universalização de serviços de telecomunicações em escolas públicas de
ensino médio e profissionalizante com a utilização dos recursos do FUST
(Mattos, 2004, p. 324-325).
Em nenhuma dessas três consultas populares foi realizada
conjuntamente audiência pública no mesmo procedimento administrativo, bem
como não foi apresentado pela ANATEL o relatório complementar com a
compilação das contribuições e opiniões populares encaminhadas por HPDLO,
carta ou fac-símile, e, muito menos, foi emitido qualquer parecer fundamentado
sobre o aproveitamento ou não das sugestões da população no conteúdo final
da norma editada (Mattos, 2004, p. 325).
Apenas com relação à consulta pública de n.º 284/2000 foi aberto um
espaço público para se debater sobre as contribuições e opiniões apresentadas
pela população, no entanto, isso se deu somente após o término do
procedimento consultivo, ou seja, na prática não possibilitou uma participação
popular decisória (Mattos, 2004, p. 326).
A consulta pública de n.º 284/2000 foi também a única que não resultou
na edição de uma norma reguladora, o que ressalta a gravidade da situação
considerando que era também a única das três que versava sobre a efetiva
utilização de recursos do FUST para alcançar metas de universalização. Sendo
que, no caso, a consulta tratava de uma política pública cujo objetivo era o de
levar a execução dos serviços públicos de telecomunicações às escolas
públicas de ensino médio e profissionalizante. Ou seja, de redistribuir renda
diretamente ao financiar a prestação de serviços públicos em situações em que
a iniciativa privada por si só não se interessaria.
Ao levantar o perfil dos participantes dessas três consultas, Mattos
verificou que o próprio Poder Público e as pessoas físicas tiveram forte
participação e que foram responsáveis pela grande maioria das contribuições,
enquanto que os agentes econômicos delegados e as empresas de outros
segmentos da economia tiveram uma participação quase inexistente. Porém, o
índice de real aproveitamento pela ANATEL das contribuições apresentadas
pela sociedade foi muito baixo (Mattos, 2004, p. 333-337).
85
entre os anos de 2004 e 2006, segundo informações obtidas no VLWH
da ANATEL, foram realizadas apenas duas consultas públicas que de alguma
forma envolveram o FUST. Tratam-se da consulta pública de n.º 494/2004, que
se refere à proposta de plano geral de metas de universalização do serviço de
comunicações digitais destinado ao uso do público em geral; e da consulta
pública de n.º 716/2006, relativa à proposta de plano de metas para a
universalização de serviço telefônico fixo comutado em instituições de
assistência às pessoas com deficiência auditiva.
Analisando a postura da ANATEL com relação à participação popular
nessas duas consultas, foi possível verificar quase as mesmas características
das constatadas nas consultas anteriores. Ou seja, em nenhuma delas foi
realizada audiência pública no mesmo procedimento administrativo, e também
não foi proferido parecer fundamentado sobre o aproveitamento ou não das
sugestões da população no conteúdo final da norma editada. No entanto, em
ambas foram emitidos relatórios complementares com a compilação das
contribuições e opiniões populares enviadas por HPDLO, carta ou fac-símile.
No que diz respeito ao perfil dos participantes, notou-se algumas
diferenças com relação às consultas realizadas entre 1998 e 2003. Na consulta
pública de n.º 494/2004 as organizações representativas e, na seqüência, os
agentes econômicos delegados foram os responsáveis pela grande maioria das
contribuições; enquanto que na consulta pública de n.º 716/2006 os principais
contribuintes foram os agentes econômicos delegados, seguidos pelas pessoas
físicas.
A única dessas consultas públicas que resultou na edição de uma
norma foi a de n.º 716/2006, fato que, apesar de tudo, pode ser encarado com
otimismo porque o conteúdo da consulta versava sobre metas de
universalização a serem financiadas com recursos do FUST. Tal consulta
resultou no Decreto de n.º 6.039/2007, que aprovou o plano de metas para a
universalização do serviço telefônico fixo comutado em instituições de
assistência às pessoas com deficiência auditiva, o que leva a crer que a partir
de 2007 os recursos do FUST começarão a ser utilizados para o financiamento
de políticas redistributivas.
A conclusão que se tira de todas essas informações, referindo-se
exclusivamente ao tema da universalização dos serviços públicos de
86
telecomunicações correlacionados com o FUST, é que na ANATEL os
mecanismos administrativos de participação popular possuem uma boa
potencialidade democrática, uma vez têm permitido razoável expressão pela
população de suas escolhas e preferências.
No entanto, quando a ANATEL não utiliza a audiência pública
conjuntamente com a consulta pública para a definição do tema a ser debatido,
não emite parecer fundamentado explicando o porquê da utilização ou não das
contribuições apresentadas pela população, o permite a contra-
argumentação da população depois que suas contribuições foram
formalizadas, bem como utiliza muito pouco as manifestações populares no
direcionamento do conteúdo final da norma reguladora, deixa evidente o déficit
democrático com relação aos rumos da regulação do FUST.
Se não bastasse, como visto no capítulo anterior, a não utilização
dos recursos do FUST para a redistribuição direta de renda, há ainda um
problema institucional, consubstanciado na pouca seriedade da ANATEL na
utilização dos mecanismos de participação popular, que tem gerado esse
déficit democrático na regulação do FUST.
Tendo como pressuposto a idéia de democracia econômica, conclui-se
pela razoável potencialidade democrática no que se refere à existência e
utilização de regras procedimentais que permitem a participação popular.
Porém, verifica-se um déficit democrático relativo à maneira como é definido o
conteúdo das normas reguladoras, sendo neste aspecto baixa e relativa a
influência da população.
Portanto, em se tratando de telecomunicações, a estratégia de ação do
Estado brasileiro para atenuar a alta concentração de renda mediante a
universalização dos serviços com recursos do FUST tem se demonstrado
democraticamente insuficiente em virtude de imperfeições na constituição do
conteúdo regulatório.
87
&21&/862
Como visto, a idéia de desenvolvimento econômico acaba por se
identificar com a de democracia econômica, a qual é verificável quando a
sociedade é incluída no processo de tomada de decisões econômicas, ou seja,
quando é oportunizado o exercício popular da liberdade de consciência e de
escolha econômicas, o que deve acontecer mediante a ação regulatória do
Estado para viabilizar a participação popular com a finalidade de aliciar as
escolhas e preferências sociais difusamente encontradas na sociedade, bem
como de garantir que as decisões tomadas, além de representar os anseios da
população, sejam as melhores.
Portanto, possibilitar a participação popular é a maneira mais eficiente
para o Estado cooptar as opções sociais que deverão determinar as diretrizes
de qualquer estratégia desenvolvimentista.
E para isso a idéia de democracia e liberdade é essencial, porque
quando o processo de tomada de decisões econômicas se der de forma mais
participativa e envolvendo interesses distintos, os resultados se inclinam para
uma maior satisfação social. Ou seja, a participação popular acaba por se
tornar um importante elemento legitimador da ação regulatória do Estado, uma
vez que incorpora e controla as possíveis insatisfações sociais ao oportunizar a
inclusão da população no debate sobre assuntos de interesse coletivo, além de
possibilitar à Administração Pública identificar suas políticas com os anseios da
sociedade.
No caso das telecomunicações foi possível verificar no decorrer do
presente estudo que a expansão dos serviços chocou-se com a forte
concentração de renda que estruturalmente caracteriza o panorama
socioeconômico brasileiro.
Em outras palavras, existe oferta, mas não demanda, porque não
renda. O que leva a crer que o país possui um potencial imensurável no seu
mercado interno representado pelos excluídos.
Um panorama como esse torna primordial a propagação forçada da
liberdade de consciência e de escolha econômicas com a adoção de políticas
públicas redistributivas. A redistribuição, portanto, é um dos princípios
88
fundamentais que deve reger o esforço democrático-desenvolvimentista
brasileiro.
E, uma das formas de se promover redistribuição acontece de maneira
direta com a universalização de serviços públicos, que se quando o Estado,
por meio de sua ação regulatória, exige que os agentes econômicos delegados
permitam o acesso irrestrito de toda a população a essas utilidades com
qualidade e preços módicos, independentemente da condição socioeconômica
e da localidade. Ou seja, trata-se de oportunizar à sociedade a expressão e
efetiva transmissão da liberdade de consciência e de escolha econômicas.
Nesse contexto, o FUST representa um importante instrumento para
financiar a universalização no caso dos serviços públicos de telecomunicações,
uma vez que é um fundo público especial instituído para o custeamento de
metas de universalização, cujo investimento não possa ser recuperável pelos
agentes econômicos delegados com a simples exploração competente da
atividade.
Nas agências reguladoras a democrática e legitimadora participação
popular na formação do conteúdo da regulação deve ser dar por meio de
regras procedimentais em mecanismos como as audiências e consultas
públicas.
Analisando os procedimentos participativos realizados pela ANATEL
entre 1998 e 2006 com relação ao FUST, a conclusão que se chega é que na
ANATEL os mecanismos administrativos de participação popular possuem uma
boa potencialidade democrática, uma vez têm permitido razoável expressão
pela população de suas escolhas e preferências.
Porém, quanto ao conteúdo da regulação do FUST é evidente o déficit
democrático, porque a ANATEL geralmente não utiliza a audiência pública
conjuntamente com a consulta pública para definir o assunto a ser discutido,
não emite parecer explicando o porquê da utilização ou não de contribuições
apresentadas pela população, não permite a contra-argumentação da
população depois que suas contribuições foram formalizadas, bem como utiliza
muito pouco as manifestações populares no direcionamento do conteúdo final
da norma reguladora.
Se o bastasse, como visto no decorrer deste estudo, a não
utilização dos recursos do fundo para a redistribuição direta de renda, ainda
89
um problema institucional representado pela pouca seriedade da ANATEL na
utilização dos mecanismos de participação popular, o que tem gerado um
déficit democrático na formação da regulação do FUST.
A partir da noção de democracia econômica, conclui-se pela razoável
potencialidade democrática no que se refere à existência e utilização de regras
procedimentais que permitem a participação popular. Porém, verifica-se um
déficit democrático relativo à maneira como é definido o conteúdo das normas
reguladoras, sendo neste aspecto baixa e relativa a influência da população.
Concluindo, os rumos da regulação do Estado brasileiro referente aos
serviços públicos de telecomunicações não conta com a concreta participação
popular para a diminuição da alta concentração de renda mediante a
universalização dos serviços com recursos do FUST.
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