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partir de uma lógica da linguagem da fé, na qual argumento e desejo em
encontrar razões necessárias procedem de uma atitude crente, o ato de crer
restitui pela Graça as competências existentes antes da queda. Essa lógica da
fé é também uma lógica da razão enfraquecida, mas não aniquilada, que em
seu dinamismo leva à procura da fé e, num segundo momento, a busca e ao
encontro dessa fé em si mesma. Para Pedro Abelardo (1079 – 1142)
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, nutrido
favor da existência de Deus. Representante eminente da teologia monástica, Anselmo
procurou, sobretudo, as razões que permitissem elucidar os mistérios da fé. É considerado o
“pai da escolástica” devido justamente ao seu método racional, isto é, o uso das “razões
necessárias” destinadas a provar que a fé diz de Deus, e mesmo do mistério da Trindade. Para
ele, a crença e a fé correspondem a verdade, e existe verdadeiramente um ser do qual não se
pode pensar nada maior. Anselmo começa por provar que existe algo de soberanamente
grande que é o sumo (summum) de tudo que existe. Todas as coisas têm uma causa, menos o
ser incriado, que é a causa de si mesmo e fundamenta todos os outros seres. Esse ser é Deus.
Num dos seus primeiros livros Monologion, que aparece em 1076, ele medita sobre a essência
divina; fala que a essência suprema existe em todas as coisas e tudo depende dela. Nessa
essência reconhece a onipotência, onipresença, máxima sabedoria e bondade suprema; Ela
cria tudo a partir do nada. Sustentando filosoficamente seus argumentos, Anselmo alcança
uma ontologia radical que vai até as raízes do ser: Somente o ser soberano é, e todo o resto é
quase nada. Seus argumentos não foram totalmente aceitos, embora ele tenha buscado na
autoridade dos Padres a sua defesa, particularmente no De Trinitate de Agostinho. Ele mesmo
acaba por superar a si próprio, substituindo seus complexos argumentos do Monologion por um
argumento ontológico único que é apresentado no Proslogion. Nele, encontramos, ao mesmo
tempo, a expressão de adoração de Deus que se revelou pela fé e um processo dialético da
razão que busca compreender o objeto de sua contemplação. Partindo de dois pressupostos, a
saber: “Deus é aquilo em relação ao qual nada de maior pode ser pensado” e “tudo o que
existe, também, na realidade é maior que aquilo que só existe no pensamento”, Anselmo
chegará não só a afirmação “Deus existe verdadeiramente”, mas à impossibilidade lógica da
negação da existência de Deus. Foi canonizado pela Igreja Católica e declarado Doutor da
Igreja em 1720, pelo Papa Clemente XI. Para maiores informações sobre a teologia e filosofia
de Santo Anselmo, Cf. E. GILSON, A Filosofia na Idade Média; Santo Anselmo e Pedro
Abelardo, v.7 (Col. Os Pensadores).
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Pedro Abelardo foi discípulo de Roscelino de Compiègne (1045-1120), um dos principais
defensores do nominalismo, com o qual estudou lógica dialética. Depois, foi discípulo de
Guilherme de Champeaux (1070-1121), que defendia o realismo dos universais. A “querela dos
universais” foi, dessa forma, um dos principais interesses de Abelardo. Nesse embate, ele se
colocou em posição contrária aos dois mestres. Para ele, os universais são conceitos,
realidades mentais que dão significado aos termos gerais que designam propriedades de
classes de objeto. A contribuição principal de Abelardo foi a análise sistemática das doutrinas
tradicionais de um ponto de vista filosófico. Para ele, Pai, Filho e Espírito Santo são nomes que
significam os atributos divinos de potência, sabedoria e bondade, reconhecidos por todos.
Abelardo submete os dogmas da fé católica à análise dialética da razão, aproximando-se
perigosamente do que era considerado heresia. Como resultado dessa desavença, as obras de
Abelardo são condenadas ao fogo, pelo Concílio de Sens (1140). Essa é sua segunda
condenação. A primeira foi quando redigiu um livro sobre o problema da unidade e Trindade
divinas, o qual suscita violentas polêmicas e o concílio de Soissons (1121) condena como
herética sua posição. Escreve outras importantes obras: a Dialética; Ética ou Conhece-te a Ti
Mesmo; as Glosas, onde discute Aristóteles, Porfírio e Boécio; na Teologia Cristã retoma o
tema de sua obra condenada em Soissons; Sic et non ou Sim e Não, compilação sistemática
de textos dos primeiros padres da Igreja, que manifestam perspectivas divergentes; História
das Minhas Calamidades, composição de sua autobiografia; e Diálogo entre um Filósofo, um
Judeu e um Cristão, obra inacabada. Manteve correspondência com Heloísa, escrevendo
cartas que imortalizaram os dois amantes. É importante também a sua contribuição para as
áreas da lógica e da teoria da linguagem, sobretudo quanto à discussão da noção de