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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
Éber Nunes
Da Burocracia para a Profecia: mudanças no neopentecostalismo brasileiro
São Paulo
2007
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Éber Nunes
Da Burocracia para a Profecia: mudanças no neopentecostalismo brasileiro
Dissertação apresenta à Universidade
Presbiteriana Mackenzie, como requi-
sito parcial para a obtenção do título
de Mestre em Ciência da Religião.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Ribeiro
Caldas Filho
São Paulo
2007
2
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Éber Nunes
Da Burocracia para a Profecia: mudanças no neopentecostalismo brasileiro
Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana
Mackenzie como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Ciência da Religião.
Aprovado em 26 de fevereiro de 2008.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Ribeiro Caldas Filho
Universidade Presbiteriana Mackenzie
______________________________________________________________________
Prof. Dr. Breno Martins de Campos
Universidade Presbiteriana Mackenzie
______________________________________________________________________________________________
Prof. Dr. Edin Sued Abumanssur
Pontifície Universidade Católica de São Paulo
3
RESUMO
O neopentecostalismo chama a atenção devido ao seu crescimento aqui no Brasil.
Dentre as igrejas neopentecostais destaca-se a Igreja Mundial do Poder de Deus.
Fundada pelo apóstolo Valdemiro Santiago em 1998, tem conquistado lugar nadia e
em número de adeptos. A Igreja Mundial do Poder de Deus é uma dissidência da Igreja
Universal do Reino de Deus. Nossa pesquisa verifica o que de convergente e
divergente entre a Mundial e a Universal. Para compreender o processo
fenomenológico, optamos pelo método werberiano da sociologia da compreensão.
Construímos através da revivência um conceito de tipo puro ideal no movimento
dialético entre a Mundial e Universal. No campo da idealidade, a Universal passa a
representar a Burocracia, que é o processo de institucionalização, resultado histórico de
todo movimento religioso. A Mundial representa a Profecia, cuja característica é a
contestação. Em decorrência, um exame da dominação racional e dominação
carismática nos ajudará compreender o fenômeno. A diferença fundamental entre as
duas igrejas se concentra no carisma. A Universal se institucionaliza através da
burocracia, dominação racional, e a Mundial é a profecia que se reafirma através da
dominação carismática.
Palavras-chave: Igreja Mundial do Poder de Deus Igreja Universal do Reino de Deus
– Burocracia – Profecia – Carisma
4
ABSTRACT
The new Pentecostalism calls attention because of its growing here in Brazil. Between the new
Pentecostal churches can be mentioned the “World’s Church of God’s Power”. Founded by apostle
Valdemiro Santiago in the year 1998, have conquered place in media and in number of adepts. The
“World’s Church of God’s Power” is a dissident of “Universal Church of God’s Kingdom”. Our
research verify the differences and similarities between the “World’s Church of God’s Power” and
“Universal Church of God’s Kingdom”
. To understand the phenomenological process, we choose
the Weberian method of the sociology of comprehension. We built through the relive, one concept
of pure and ideal type in the dialectic movement between
“World’s Church of God’s Power” and
Universal Church of God’s Kingdom”. In the ideality field, the “Universal” represents the
bureaucracy, which is the process of institutionalization, historic results of all the religious movement.
The
“World’s Church of God’s Power” represents the prophecy, that the characteristic is the
contestation.
An exam of the rational domination and charismatic domination will help us to
comprehend the phenomenon. The fundamental difference between the two churches is focused in
charisma. The “Universal” institutionalize itself trough the bureaucracy, rational domination, and the
“World’s” is the prophecy that is reaffirmed by the charismatic domination.
Key-words: World’s Church of God’s Power - Universal Church of God’s Kingdom - Bureaucracy -
Prophecy – Charisma
5
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS...........................................................................................................8
INTRODUÇÃO....................................................................................................................9
CAPÍTULO 1 IGREJA MUNDIAL DO PODER DE DEUS: “A MÃO DE DEUS ESTÁ
AQUI”..........................................................................................................................................16
Sua história......................................................................................................................17
O rompimento com a Igreja Universal do Reino de Deus...............................................18
O culto.............................................................................................................................21
O trabalho dos pastores e obreiros.................................................................................27
A mídia como instrumento de divulgação........................................................................29
A cura divina e sua representação..................................................................................33
CAPÍTULO 2 CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS ENTRE UNIVERSAL E
MUNDIAL.....................................................................................................................................48
Convergências.................................................................................................................49
Divergências....................................................................................................................63
CAPÍTULO 3 A IURD COMO REPRESENTAÇÃO DA BUROCRACIA: DOMINAÇÃO
RACIONAL..................................................................................................................................68
O tipo ideal......................................................................................................................69
Tipos de dominação........................................................................................................72
A IURD e sua dominação burocrática.............................................................................73
CAPÍTULO 4 A IMPD COMO REPRESENTAÇÃO DA PROFECIA: DOMINAÇÃO
CARISMÁTICA............................................................................................................................83
Tipo Profético..................................................................................................................84
A IMPD e sua dominação carismática.............................................................................86
6
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................91
Referências Bibliográficas...............................................................................................96
7
AGRADECIMENTOS
A Deus, que pela sua Graça abriu as portas na Universidade Mackenzie e
pelo apoio recebido do MACKPESQUISA.
A minha família, a meus pais, Arnaldo Nunes e Rachel Nunes, e a minha
irmã, Dorcas Rosicler Nunes, que em tudo me apoiaram e me incentivaram a continuar,
mesmo em duras lutas.
A minha filha querida, Ester Dantas Reis Nunes, que ficou muitas vezes
privada do meu convívio mas que de maneira compreensiva e terna teve paciência.
Ao meu querido prof. Dr. Carlos Caldas, meu orientador, que com extrema
paciência, mas sem perder o alvo acadêmico, me ajudou e incentivou a terminar minha
pesquisa.
Aos professores e colegas do curso de mestrado no Mackenzie, os quais
me ensinaram muito na disciplina acadêmica.
Ao meu pastor Luiz Cherry e meus irmãos de minha igreja que oraram
para que eu chegasse até o fim.
A minha querida companheira, Priscila, a “Pri”, que em hipótese alguma
permitiu que nosso namoro atrapalhasse a conclusão de minha dissertação.
8
INTRODUÇÃO
O neopentecostalismo no Brasil é um fenômeno religioso que tem chamado à
atenção dos pesquisadores. Dentre as várias igrejas neopentecostais, podemos
destacar a Igreja Mundial do Poder de Deus, que foi fundada em 1998 pelo “apóstolo”
Valdemiro Santiago.
A Igreja Mundial do Poder de Deus é uma dissidência da Igreja Universal do
Reino de Deus, está em franca expansão com presença na mídia, provocando uma
disputa intensa na conquista de audiência e fiéis.
Nossa pesquisa consiste em saber em que a Mundial difere da Universal e como
foi o processo fenomenológico do surgimento dessa igreja. Para entendermos esse
processo, optamos em usar a metodologia weberiana da sociologia compreensiva. Em
outras palavras, é “compreender a ação social, para explicá-la no seu desenvolvimento
e efeitos.”
1
Essa metodologia consiste em captar o sentido subjetivamente do fato
presente, fazendo uma construção tipológica. Partindo da premissa de que é impossível
fundamentar qualquer valor último ou supremo, evitando qualquer reducionismo,
procuramos discorrer o tema dentro da intersubjetividade
2
weberiana, que não nega o
olhar para o outro e nem o olhar do pesquisador, nem totalmente fora do sujeito
(objetivismo) e nem totalmente dentro do sujeito (subjetivismo, psicologismo). Richard
1
WEBER, Max. Economía y sociedad. México: Fondo de Cultura Económica, 1944.p.6.
2
LAZARTE, Rolando. Max Weber: Ciência e Valores. São Paulo: Cortez ed., 1996.p.64.
9
Bernstein comenta sobre isso: “Weber [...] insistiu sobre a brecha última e
intransponível entre o Ser e o Dever, entre o que a ciência pode nos ensinar sobre o
mundo e as nossas normas morais últimas.”
3
Destacamos que “o poder reviver’
plenamente algo alheio é importante para a evidência da compreensão, mas não é uma
condição absoluta para a compreensão do sentido.”
4
A construção conceitual será
estabelecida por meio da racionalidade com determinadas características, eliminando
os elementos irracionais. O que nos chamou à atenção em Weber foi sua poli-
historicidade, pois a realidade é inapreensível em sua totalidade.
A sua poli-historicidade, em suma, reside no fato de ser a realidade
inapreensível em sua totalidade, mas apreensível, parcialmente, em
alguns de seus elementos, pela representação intelectualmente
elaborada, escorada por regras formais, as quais garantem um
conhecimento condicional, que, em outras palavras, na concepção
weberiana, é a interpretação dos fatos sociais que se faz a partir de
uma formalização de pressupostos, ordenações apriorísticas e
valorativas de conceitos sociológicos.
5
O conhecimento será construído de forma conceitual buscando o tipo ideal, que
é realidade no pensamento sem a pretensão de conter a realidade. Essa construção
pretende unir um cosmos de relações que não são contraditórias em si, cuja finalidade
será demonstrar uma apresentação significativa. Esses significados serão criados e não
descobertos. A razão desse procedimento se reforça por causa de não haver leis
universais ou teleologia ou determinismo. A realidade é um fluxo ininterrrupto, seja
interno ou externo, é simultânea, sucessiva e carece de significado. A realidade é “um
caos eternamente fluente.” Cohn assim afirma: “A solução imediata de Weber consiste
em o falar diretamente de causalidade, mas de atribuição causal a menos
3
BERNSTEIN, Richard. Beyond objectivism and relativism: Science, Hermeneutics and Praxis. Philadelphia,
University of Pennsylvania Press, 1983.p.11.
4
WEBER, op. cit., p.4.
5
HIRANO, Sedi. Castas, estamentos e classes sociais em Marx e Weber. São Paulo: Alfa-Ômega, 1974.p.18.
10
particulares entre fenômenos.”
6
Procuramos evitar perspectivas valorativas pessoais e
idiossincráticas, por entendermos que o conceito é “um recipiente provisório, [...] um útil
auxiliar para descrever provisoriamente uma pluralidade de fenômenos particulares e
concretos.”
7
Consideramos que as leis da causalidade não é um fim da investigação
em si mesma, contudo, é um meio que facilita uma “imputação causal”.
Quando se trata de saber a causa de um fenômeno singular, a pergunta
do cientista não está endereçada ao conhecimento de leis, mas de
conexões causais concretas, cuja relevância explicativa pode ser
determinada com o auxílio do saber nomológico.
8
Estabelecido o todo, explicitaremos o tema escolhido. Como dissemos no
início, nossa pesquisa consiste em saber em que a Igreja Mundial do Poder de Deus é
convergente ou divergente à Universal, e como ocorreu seu processo fenomenológico.
Para uma melhor compreensão desse processo será necessário entender a
representação de cada igreja. Se o neopentecostalismo brasileiro tem um movimento
dialético, então, cada uma delas possui um papel significativo e simbólico dentro desse
processo. E se cada uma delas possuem um papel significativo, será preciso identificá-
los para compreendermos sua função. Qual seria o papel significativo da Igreja
Universal do Reino de Deus e sua distinção em relação à Igreja Mundial do Poder de
Deus e vice-versa?
Partindo do método weberiano na construção do tipo puro no campo da
idealidade, o papel significativo que coube a Igreja Universal do Reino de Deus é o da
Burocracia. Em relação à Igreja Mundial do Poder de Deus, o seu papel significativo
será o da Profecia. Nossa pesquisa pretende compreender esse fenômeno, a
6
COHN, Gabriel. Crítica e resignação.Fundamentos da sociologia de Max Weber. São Paulo: T.A. Queiroz,
1979.p.89.
7
WEBER, Max. “Roscher y Knies y los problemas lógicos de la escuela histórica de economía, in: El problema de
la irracionalidad en las ciencias sociales. Org. por José M. García Blanco. Madrid: Tecnos, 1985, p.13.
8
LAZARTE, op. cit., p. 74.
11
passagem do caráter burocrático para o profético, e em que consiste a diferença entre
eles. O entendimento desses conceitos se de importância na compreensão do
processo fenomenológico para entendermos a diferença ou as diferenças fundamentais
entre as igrejas Mundial e Universal, como também suas semelhanças.
A escolha do tema tem como objetivo discorrer o processo ocorrido nessas
igrejas, a partir do momento da institucionalização através da burocracia estabelecida
pela racionalização. A racionalização da religião é pontuada pelas teologias, instituições
e hierarquias, sinais típicos da burocratização religiosa. A racionalização religiosa tem
influência, de certo modo, aquele pensamento secular em que “podemos controlar
todas as coisas mediante o cálculo.” Assim Weber diz:
O progresso científico é uma fração, a mais importante, do processo de
intelectualização que experimentamos durante milênios, e que na
atualidade costuma ser julgado de um modo sumamente negativo.
Aclaremos primeiro o significado prático dessa racionalização
intelectualista, criada pela ciência e pela tecnologia cientificamente
orientada. [...] [A] intelectualização e racionalização crescentes não
implicam maior conhecimento geral das condições em que vivemos.
Significam algo distinto; a saber, o conhecimento ou a convicção de que
, se o desejarmos, “poderíamos” descobri-lo a qualquer momento.
Portanto, significam que, no essencial, não intervêm forças misteriosas
incalculáveis, mas que, em princípio, podemos controlar todas as coisas
mediante o cálculo. Isto supõe um desencantamento do mundo. não
é necessário recorrer a meios mágicos a fim de dominar ou implorar os
espíritos, como fazia o selvagem, para quem existiam tais poderes
misteriosos. Os meios técnicos e os cálculos cumprem essa função. É
neste o significado primordial da intelectualização.
9
O desencantamento do mundo que é a racionalização intelectualizada do mundo,
de alguma forma atinge o processo fenomenológico religioso através da burocratização.
A institucionalização da Igreja Universal do Reino de Deus representa uma certa forma
de desencantamento do mundo por causa da burocratização. Ela é estabelecida
9
WEBER, Max. La ciência como vocación, in: GERTH, Hans e MILLS, Car Wright (eds.), Ensayos de sociología
contemporánea. Barcelona: Martínez Roca, 1975.p.172.
12
através de hierarquias, transferência do carisma pessoal do líder para a instituição,
divisão de espaços, etc. A profecia surge dentro da instituição como uma contestação,
denúncia de que o carisma original se dissipou. Esse é o papel da Mundial, pois como
dissidência da Universal, representará o papel profético. Assim, o tema escolhido
propõe compreender o processo de mutação do burocrático para o profético. Como a
Igreja Universal do Reino de Deus se tornou burocrática? Quais as razões que levaram-
na a passar por esse processo? Do mesmo modo, olhando para a Igreja Mundial do
Poder de Deus, por que ela é a profecia? Por que o carisma, como dominação, está
ligado a profecia? Essas questões são importantes para esclarecer o papel significativo
de cada igreja no processo fenomenológico religioso que propusemos estudar.
Tentaremos respondê-las procurando construir um tipo puro ideal, que muitas vezes na
prática teremos dificuldades em compor.
[...] Obtém-se um tipo ideal mediante a acentuação unilateral de um ou
de vários pontos de vista e mediante o encadeamento de grande
quantidade de fenômenos isoladamente dados, difusos e discretos, que
se podem dar em maior ou menor número ou mesmo faltar por
completo, e que se ordenam segundo os pontos de vista unilateralmente
acentuados, a fim de se formar um quadro homogêneo de pensamento.
É impossível encontrar empiricamente na realidade este quadro, na sua
pureza conceitual, pois trata-se de uma utopia.
10
Reafirmamos que nossa pesquisa tratará o tema apenas no campo conceitual,
procurando entender em como o processo fenomenológico passou da Burocracia para
a Profecia, ressaltando sua etapas, conseqüências, motivações. Procuraremos partir
do empírico-histórico para uma plano mais ideal, no intuito de fazermos uma tentativa
de compreender o processo na sua pureza, e isso nos aproximará da realidade.
[...] Também existe apenas um critério, o da eficácia, para o
conhecimento causal e na sua significação. Portanto, a construção de
10
WEBER, Max. Metologia das Ciências Sociais. Parte 1, p. 137-138.
13
tipos ideais abstratos não interessa como fim, mas única e
exclusivamente como meio de conhecimento.
11
Ao tentarmos verificar a passagem da Burocracia para a Profecia,
examinaremos se realmente houve mudanças no neopentecostalismo brasileiro. Se
houve, quais seriam essas mudanças? Será preciso levantar as convergências e
divergências entre a Igreja Mundial do Poder de Deus e a Igreja Universal do Reino de
Deus. Feito esse levantamento, precisaremos descrever quais diferenças realmente
existentes entre as duas igrejas. Pois, estabelecido essa questão, teremos condições
de concluir se realmente houve mudanças no neopentecostalismo brasileiro.
Justificado o tema, agora passemos para a composição do conteúdo. Nossa
pesquisa está dividida em quatro capítulos e no final as considerações. O primeiro
capítulo intitulado “A Mão de Deus está aqui, tem como objetivo discorrer sobre a
história, origem e características específicas da Igreja Mundial do Poder de Deus.
Nesse capítulo pretendemos examinar as origens da Mundial, destacando sua história e
procurando identificar as razões do rompimento com a Igreja Universal do Reino de
Deus. Ainda nesse capítulo, trataremos de descrever a liturgia, a maneira como seus
pastores e obreiros são preparados e escolhidos, como usam a mídia e o valor que lhe
dão, e descrever principalmente o uso da cura divina como marketing da Mundial e seu
significado como profecia. Ainda nesse capítulo, ressaltaremos a vida e origem do
“apóstolo” Valdemiro Santiago e sua experiência de naufrágio que irá mudar sua vida
ministerial.
No capítulo 2 Convergências e divergências entre Universal e Mundial,
argumentaremos sobre as características da Mundial que se aproximam da Universal,
11
WEBER, op. cit., p. 139.
14
dando uma certa impressão de reminiscência. Nessa parte observaremos em que
sentido a Universal influenciou a Mundial mantendo assim uma certa identificação,
embora o “apóstolo” Valdemiro Santiago tente de todas as formas “eliminar” essa
identificação ao descrever a Mundial em seus discursos. Por outro lado, verificaremos
em que a Mundial se afasta da Universal, ou melhor, em que realmente consiste a
diferença entre essas igrejas.
No capítulo 3 A IURD como representação da Burocracia: dominação racional,
trataremos da questão em como a IURD está se institucionalizando, e isso significa
burocracia, ou seja, o carisma do bispo Macedo está se transferindo para a instituição.
Esse capítulo nos ajudará a entender as razões do surgimento da Mundial.
No capítulo 4 – A IMPD como representação da Profecia: dominação
carismática, demonstra que a Mundial é fruto da contestação Burocrática da Universal,
baseada numa “nova” revelação divina que se manifesta pela Profecia consolidando-se
através da dominação carismática. Aqui, iremos entender as razões da Mundial
enfatizar os milagres, a cura divina, e principalmente contestar a revelação construída
na forma de instituição na Universal.
Nas considerações finais faremos um balanço se realmente uma diferença
significativa entre a Igreja Mundial do Poder de Deus e a Igreja Universal do Reino de
Deus. A diferença significativa justificará se houve realmente uma mudança no
neopentecostalismo brasileiro e se podemos falar em uma aproximação entre elas ou
um afastamento.
15
CAPÍTULO 1
“A mão de Deus está aqui”
Toda organização para subsistir tende a
despertar e cultivar entre o público a crença em
sua própria legitimidade
Max Weber
12
A Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) foi fundada pelo “apóstolo”
13
Valdemiro Santiago de Oliveira
14
em 1998, após romper com a Igreja Universal do
Reino de Deus (IURD). Na IURD, chegou a a posição de bispo, ocupando vários
cargos como de obreiro, pastor, líder regional, e abrindo várias igrejas. Foi missionário
na África, fazendo parte, enfim, do seleto conselho de Bispos, os quais desfrutam da
confiança do Bispo Edir Macedo, fundador e líder máximo da IURD. Ricardo Bitun
15
assim comenta:
[...] nestes últimos oito anos, ele tem alcançado uma significativa
expressão no campo religioso pentecostal brasileiro que, a não ser por
algum deslize grave de percurso, será a primeira igreja saída da Igreja
Universal do Reino de Deus que conseguirá fazer frente ao seu
poderoso império religioso.
12
WEBER, Max. Economia e Sociedade. Vol. 1, Brasília: UnB, 1991, p. 138.
13
Em dezembro de 2006, Valdemiro Santiago se auto-intitulou “apóstolo”, obedecendo uma “ordem divina”. No
mesmo período sua esposa, pastora Franciléia, passou a ser chamada de “bispa”. O título “apóstolo” é usado somente
por ele.
14
Na coleta dos materiais mais recentes de nossa pesquisa, como os periódicos JORNAL MUNDIAL -edição
2007, o nome do líder da IMPD vem escrito como “Valdemiro” e não “Waldemiro”, característica apresentada nas
edições anteriores. Para uma melhor sistematização do nome, optamos pela primeira opção.
15
BITUN, Ricardo. Igreja Mundial do Poder de Deus: Rupturas e Continuidades no Campo Religioso
Neopentecostal, tese de doutorado, pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Sociais, PUC, São Paulo, 2007. p.
48-49.
16
Os motivos que levaram ao rompimento ainda não estão claros, mas
possivelmente houve desacordos depois que o “apóstolo” sofreu um naufrágio na
África. Valdemiro Santiago de Oliveira
16
relata o seguinte:
poucos anos eu resolvi recomeçar tudo, mas eu e a minha esposa,
sofremos, pagamos o preço. Quando aconteceu o naufrágio na África
[...] e cheguei aqui no Brasil, começei a ser humilhado, pisado pelos
próprios irmãos que se intitulavam da mesma fé, e descobri que os
tubarões que tinham do lado de fora eram mais perigosos do que os que
enfrentei em alto mar.
Um certo dia quando eu ia passando por uma rua no nordeste, encontrei
e cumprimentei uma pessoa que ajudei sair da sarjeta. Esta pessoa
simplesmente olhou para mim, cuspiu, e virou às costas. Quanta
ingratidão meus irmãos!
Tudo isso, apenas porque eu resolvi começar uma nova vida, num novo
ministério, o da fundação da Igreja Mundial do Poder de Deus ou
Templo dos Milagres [...].
Em outro momento ele declara sua decepção dizendo:
Pensava que depois de tanto sofrimento, dores e desesperos tudo fosse
passar, mas me enganei; tive grandes decepções até com os meus
próprios companheiros de trabalho, irmãos na fé, homens que
pregavam, partilhavam da mesma fé, pregavam a palavra como eu,
esperava deles um apoio, uma palavra de conforto. Pelo contrário, fui
extremamente humilhado.
17
Sua História
Começando em Sorocaba, a primeira reunião contava com apenas dezesseis
pessoas incluindo o “apóstolo” Valdemiro sua esposa e filhas. Depois de muita
evangelização, durante quinze dias, conseguiu juntar dezesseis pessoas, em fevereiro
de 1998. Após dois anos, Valdemiro decidiu mudar-se para Pernambuco
18
.
16
OLIVEIRA, Waldemiro Santiago de. Os pensamentos de Deus. São Paulo: Ed. E-la Print, 2005. p. 46-47.
17
Ibid., O Grande Livramento. São Paulo: Ed. E-la Print, 2006. p. 25.
18
Em várias conversas com seus auxiliares não obtivemos com clareza as razões dessa decisão.
17
Aos dezesseis anos, Valdemiro alcançou a restauração dentro da Igreja
Universal do Reino de Deus em Juiz de Fora, Minas Gerais. Ali em Minas, teve a
primeira experiência de cura divina e assim ele relata em uma entrevista:
Eu observava as pessoas sofrendo e aquilo mexia comigo, então, pela
primeira vez eu fui num hospital fazer uma visita e me pediram
oração, eu era novo ainda tinha menos de 17 anos de idade, me
pediram oração, tinha uma jovem paralítica, eu não sabia que Deus
tinha me ungido com esse Dom também, eu fiz a oração, na verdade ela
estava na cadeira de rodas, mas naquela época pensei: “essa jovem
deve estar nessa cadeira de rodas por causa das complicações, e de
repente pra não forçar por recomendações médicas” na verdade ela não
andava a (sic) muitos anos, eu fiz a oração, eu falei: “você pode
levantar um pouquinho?”, ela levantou, a família começou a chorar,
as enfermeiras, em Juiz de Fora, eu não sabia que ela tinha sido
curada, eu não sabia de nada, eu falei: “num é que Deus me deu
mesmo o dom”. Então eu percebi o chamado de Deus e ali nasceu um
desejo de pregar, na época ainda na outra igreja (Igreja Universal do
Reino de Deus).
19
O rompimento com a Igreja Universal do Reino de Deus
Ao regressar da África, depois de um naufrágio que sofreu, desliga-se da Igreja
Universal do Reino de Deus, geralmente mencionado pelo “apóstolo” como o “outro
ministério”, resolve iniciar sua nova igreja. Ricardo Mariano
20
chama “tal processo de
cissiparidade”, fenômeno comum no pentecostalismo. Brandão
21
disse que “Se alguma
coisa é realmente estável no mundo da religião, essa coisa é a dialética de sua
constituição, onde a Igreja conquista o sistema e gera a seita que vira a Igreja que
produz a dissidência.” Para Bourdieu
22
um princípio que dinamiza o campo religioso
cuja causa é a concorrência entre os especialistas, assim ele explica:
19
BITUN, op. cit., p.51.
20
MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Ed. Loyola,
1999. p. 55.
21
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os deuses do povo. São Paulo: Brasiliense, 1980. p. 113.
22
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2001. p.50.
18
As relações de transação que se estabelecem, com base em interesses
diferentes, entre os especialistas e os leigos, e as relações de
concorrência que opõem os diferentes especialistas no interior do campo
religioso, constituem o princípio da dinâmica do campo religioso e
também das transformações da ideologia religiosa.
A saída do “apóstolo” Valdemiro Santiago da Universal, foi o resultado da
concorrência com o Bispo Edir Macedo, pois ambos se tornaram especialistas no
sagrado, na gestão dos bens de salvação. Berger
23
assim definiu o sagrado:
O historiador da religião Rudolf Otto, em A idéia do Sagrado
(originalmente publicado em alemão em 1917), tentou o que pode ser
considerado como uma descrição definitiva deste algo completamente
outro” da experiência religiosa. Otto enfatizou que os sagrado (isto é, a
realidade que o homem crê encontrar na experiência religiosa) é
“totalmente diferente” dos fenômenos humanos ordinários, e neste “algo
completamente outro” o sagrado impressiona o homem como um poder
esmagador, terrível e estranhamente fascinante.
A idéia do sagrado está ligada ao profano, para Durkheim
24
estão presentes em
todas as crenças religiosas, e em termos weberianos
25
serão chamados de excepcional
e banal respectivamente.
O naufrágio vivido pelo “apóstolo” em 1996
26
é destaque na história da Igreja
Mundial do Poder de Deus. No seu livro O Grande Livramento
27
o “apóstolo” relata que
em 21/05/96 sofreu um naufrágio onde duas pessoas faleceram. Sendo salvo por um
milagre, pois pesava mais de 153 quilos e nadou durante sete horas num mar infestado
de tubarões. Esse fato ocorreu na Baía de Maputo (capital de Moçambique). O
“apóstolo” declara que esse milagre de seu salvamento foi efetuado por dois “anjos”
que o levaram até a praia onde fora socorrido por pescadores. Assim ele relata: “Não vi
23
BERGER, Peter L. Rumor de anjos: a sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural. 2
a
Ed., Petrópolis:
Vozes, 1997. p.21.
24
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 19-20.
25
ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. 5
a
ed., São Paulo: Martins Fontes, 2000. p.487.
26
Matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, 23/05/96, p.4 ; e no jornal O Estado de São Paulo, 23/05/96, p.
A18.
27
OLIVERIA, O Grande Livramento, pp. 7-27.
19
rastro algum, a praia estava toda certinha; então tive certeza absoluta, que os anjos do
Senhor haviam me visitado e me dado o livramento.”
28
Sobre essa experiência o
“apóstolo” assim se expressa:
Hoje entendo que Deus permitiu todas essas coisas para que eu
pudesse crescer na fé, ainda que, com pesar, tenha perdido dois dos
meus companheiros que para mim eram como filho, um deles, inclusive,
já trabalhava comigo há quase quinze anos, quando isso ocorreu.
Deus que me livrou de todas essas coisas, me livrou do vale da sombra
da morte; me livrou da morte mesmo, das grandes ciladas satânica [sic].
Ele livra todo aquele que crê, que confia. Não tem outro caminho. O
caminho é confiar, é depositar em Deus a e deixar Deus agir sempre.
Enquanto houver vida, a esperança e a fé têm que trabalhar juntas.
29
No ano de 2006, a Igreja Mundial do Poder de Deus se transferiu para uma nova
sede nacional no bairro do Brás, em São Paulo. Chamado de Grande Templo dos
Milagres, com 50 mil metros quadrados e um estacionamento para 10 mil automóveis,
tem atraído multidões. A conseqüência desse fenômeno religioso é a disputa acirrada
na produção de bens religiosos como cura, salvação, libertação do mal e etc, no mundo
neopentecostal. Na disputa pela produção dos bens dentro do campo religioso
neopentecostal, a atenção da Igreja Universal do Reino de Deus tem sido despertada, o
que tem apressado o interesse em retardar seu crescimento e por conseguinte sua
concorrência.
Nos programas de televisão, o “apóstolo” Valdemiro Santiago tem divulgado que
muitas pessoas querem “fechar as portas” de sua igreja, e que pessoas que se dizem
“de Deus” tem perseguido seu ministério, entretanto ele reafirma que veio para brigar
por “um lugar ao sol”. Se porventura fecharem sua igreja, “irá para as praças, se o
prenderem, ele pregará nas prisões, ninguém o fará parar”. Segundo Novaes
30
esse
28
Ibid., p. 19.
29
Ibid., p. 25.
30
NOVAES, Regina Reyes. Funções organizacionais do culto numa igreja anarquista. Religião e sociedade, n. 12/1,
ago. 1998, pp. 112-126.
20
sentimento de perseguição é exacerbado entre os pentecostais tornando-se um
elemento constitutivo da identidade religiosa.
O Culto
O “apóstolo” abre o culto
31
dizendo: “quem precisa de um milagre venha para
frente”. O apelo é atendido, e milhares de fiéis se levantam e vão em direção ao palco.
se forma uma imensa fila para dar testemunhos. Em seguida, o “apóstolo” dá
oportunidade para as pessoas falarem dos milagres que receberam na Igreja Mundial
do Poder de Deus. Conforme as pessoas vão relatando o milagre, o “apóstolo” vai
repetindo o slogan “a mão de Deus está aqui”. Esta frase está logo abaixo do logotipo
da Igreja que é formado por duas mãos em forma de concha que seguram o mundo.
Um sentimento de euforia começa a tomar conta do público, e a cada testemunho as
expressões “glória Deus”, “aleluia Jesus” etc., e os aplausos vão se intensificando em
suas manifestações; e aquelas experiências individuais, passam a ser o comum no
coletivo, ou seja, as experiências compartilhadas uni aquela multidão. Joachim Wach
32
diz que “Os atos cultuais tendem a conectar e unir aqueles que se acham animados
pela mesma experiência central.” A espontaneidade dos gritos, dos gestos, nos
lembram aquilo que Leite Filho
33
escreveu:
Ainda que inteiramente envolvidos pelo sagrado, no culto pentecostal,
no louvor a Deus, se escondem os desejos de libertação. Quanto mais
pobres, mais espontâneos e liberados são os gritos e os gestos nos
cultos; quanto mais aburguesados, mais comedidos são as
exclamações, vozes e gestos. O religioso significa, simbolicamente, uma
31
Anotações pessoais realizadas em 01/04/2007 às 8h01 na Sede Nacional da IMPD, no bairro do Brás em São
Paulo.
32
WACH, Joachim. Sociologia da religião. São Paulo: Paulinas, 1990. p. 57.
33
LEITE FILHO, Tácito da Gama. Seitas Neopentecostais: seitas do nosso tempo. 3ed., Rio de Janeiro: Juerp, 1994.
p. 63-64.
21
válvula de escape para os sentimentos de opressão e angústia das
classes pobres.
No centro do palco, entre cada testemunho, o “apóstolo” se torna um
“hierofante”
34
, pois em cada palavra, em cada atitude, emana dele a promessa de um
milagre. Para Mircea Eliade
35
as hierofanias ocorrem quando uma pessoa se torna
canal de expressão do sagrado.
Ouvido os testemunhos, e isso durou quase duas horas, o “apóstolo” então
prepara-se para trazer uma mensagem. Mas, antes desta, faz um apelo aos seus fiéis,
que vai durar não mais que quinze minutos. Ele precisava renovar um contrato com um
canal de televisão. E, para renovar esse contrato, “Deus lhe deu uma estratégia”. Atrás
do púlpito, no palco, haviam mil Bíblias, cujos marcadores estavam no livro de Números
capítulo 11 versículo 23, onde o “apóstolo” ressaltou uma frase proferida por Deus a
Moisés: “[...] Agora mesmo, verás se cumprirá ou não a minha palavra!”; e
acompanhando os marcadores estava o número da conta bancária da Igreja, que após
adquirir as Bíblias, o fiel deveria depositar a quantia de R$ 500,00 (quinhentos reais),
com a promessa de uma boa colheita da “semente” plantada. Até o final do culto restou
apenas uma centena delas. Segundo Paul Freston
36
, essa doação não seria um ato de
gratidão, mas de investimento, assim ele comenta:
De acordo com a doutrina clássica cristã, as pessoas apenas devolvem
a Deus o que é Dele, pois tudo que temos pertence a Deus e nossa
oferta é um ato de gratidão pela salvação e pelas bênçãos recebidas. Na
teologia da prosperidade a doação não significa isso, não é ato de
gratidão, mas é investimento. A relação é oposta, nós devemos dar a
Deus para que ele nos devolva com lucro. Como é que se a Deus?
Onde está a conta bancária de Deus, para você fazer o depósito? É a
34
Que na antiga Grécia era o sacerdote que presidia aos mistérios de Elêusis.
35
ELIADE, Mircea.O sagrado e o profano: a essência das religiões. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p.15. O termo
“hierofanias” cunhado por Mircea Eliade, se refere as manifestações do sagrado que se diferenciam do profano
fazendo com que o homem tenha consciência do mesmo.
36
FRESTON, Paul.Pentecostalismo. Belém: Unipop, 1996. pp. 45-46
22
igreja que é a procuradora de Deus na terra, então a ênfase na teologia
da prosperidade não está na doação caritativa, não diz que você deve
sair por dando por caridade, mas para a igreja. Portanto, a doação
deverá ser eclesiástica. Obviamente essa teologia é uma teologia
funcional para financiar ministérios caros.
Para Campos
37
incompreensões e equívocos em relação à idéia de
mercantilização da religião. Assim ele se expressa:
A “mercantilização” da religião é uma palavra que, ao ser usada, exige
cuidados, pois presta-se a incompreensões e equívocos, incompatíveis
com o discurso científico, d o fato de a colocarmos entre aspas. Isso
porque “mercantilização”, em nosso meio, se refere a algo
extremamente negativo quando aplicado à religião. Dizer que esta ou
aquela religião é “mercantilista” tornou-se um estigma que atribuído
insistentemente a uma instituição, é de difícil remoção.
Porém, diga-se de passagem, a “mercantilização do sagrado” como
estigma lançado a diversas práticas religiosas é uma incoerência do
sistema capitalista porque, se tudo nele é negócio e mercadoria, por
qual motivo a religião deveria estar fora desse mercado?
A maneira como os dízimos, ofertas, campanhas, etc, são coletados pela Igreja
Mundial do Poder de Deus, nos mostra aquela continuidade que Reginaldo Prandi
38
comentou sobre a questão do acesso à religião não mais ser gratuito, mas paga:
A expansão das religiões cuja filiação depende de gastos elevados em
ritos de iniciação ou contribuição financeira sistemática, obrigatória e em
montantes expressivos em face dos escassos rendimentos dos adeptos,
tem alterado substancialmente a concepção que se faz entre religião e
compromisso financeiro; a religião vai deixando de ser entendida como
pública, isto é, gratuita, um direito de todos no entender de nossa
cultura, para tornar privada. É preciso pagar para fazer parte dela.
Após a distribuição das Bíblias, o “apóstolo se dirige ao púlpito que fica bem no
centro do palco e passa a discursar aos seus fiéis. Palco e púlpito ficam no meio do
templo e as cadeiras são espalhadas à sua volta. Nas beiras do palco vimos os fiéis
37
CAMPOS, Leonildo Silveira. Templo, teatro e mercado. Petrópolis, São Paulo, São Bernardo do Campo: Vozes,
Simpósio e Unesp, 1997. p. 177.
38
PRANDI, Reginaldo. Religião paga, conversão e serviço, in Novos Estudos CEBRAP, n.45, jun, Cebrap, São
Paulo, 1996, p. 268.
23
depositando fotos, roupas, garrafas d’água, carteiras de trabalho, contratos e etc. E do
púlpito, Valdemiro Santiago fala, e seus fiéis ouvem em silêncio sobre o resultado da
e de que “Deus quer mudar tua sorte, mas tem que viver pela fé.” Essa atitude
demonstra a importância que a Igreja Mundial do Poder de Deus a centralidade da
palavra. Essa prática é comum tanto entre os protestante, pentecostais e
neopentecostais, configurando-se como uma herança dos movimentos de reforma.
Abumanssur
39
diz o seguinte:
a palavra que] determina desde a disposição relativa dos móveis
dentro do templo até a forma de conceber a ordenação espacial e sua
distribuição volumétrica [...] a palavra tem ainda o poder de manipular
esse mundo: conjurar o auxílio divino, esconjurar o demônio, pôr as
forças invisíveis que comandam as vidas e todo o universo a serviço das
necessidades e mazelas pessoais.
Em todos os cultos em que participamos na Sede Nacional da Igreja Mundial do
Poder de Deus, e principalmente naqueles em que o “apóstolo” estava dirigindo, ele
andava sempre de uma lado para o outro, visando chamar a atenção dos fiéis, e
envolvê-los “no clima do teatro que se desenvolve”
40
. Toda a direção do culto está sob a
autoridade do “apóstolo”, inclusive os músicos (dois que se revezam num teclado) e a
a filmagem dos cultos. Toda liturgia é acompanhada por música.
Num outro dia
41
, estivemos visitando a Sede Nacional. O Bispo Josevaldo Batista
estava dirigindo o culto. Logo na entrada do templo, os obreiros estavam distribuindo
uma “rosa ungida”. Os fiéis estão na frente do palco esperando a oração “de
declaração”. O Bispo começa dizendo: “espírito do mal que trouxe doenças, problemas
financeiros, desempregos, causa na justiça, miséria [...]. um grito de derrota
39
ABUMANSSUR, Edin Sued. As moradas de Deus – Arquitetura de Igrejas Protestantes e Pentecostais. São Paulo:
Novo Século, 2004. p. 132.
40
CAMPOS, op. cit., p. 72.
41
Anotações pessoais realizadas no dia 15/04/2007, a partir das 8h33 na Sede Mundial da Igreja Mundial do Poder
de Deus, no bairro do Brás em São Paulo.
24
demônio! Manifeste amarrado [...].” Assim ele continuou, “diga, eu não aceito esse mal
meu Deus...”. Em seguida, pediu que os fiéis pusessem a “rosa ungida” na cabeça, e
todos de uma vez disseram: “sai...sai...sai... e não volte nunca mais!” . Depois de
ouvirmos os testemunhos, veio a mensagem. No final, o Bispo, pede para pegar os
envelopes dos dízimos e ofertas e pediu para colocar nos alforjes que estavam nas
mãos dos obreiros em frente ao palco. Em seguida, ofereceu outro envelope, onde o fiel
poderia doar R$ 200,00, R$ 100,00 , R$ 50,00 ou R$ 10,00. O fiel teria que passar com
o envelope em uma das três portas gigantescas que estavam ao lado do palco, e
entregar o envelope para os obreiros. Estava começando a campanha dos “Três Dias
da Porta Aberta”, que significaria um pedido de uma porta grande aberta. O Bispo
repetia por várias vezes, “pedi coisa grande...”. Podemos observar que no culto da
Igreja Mundial do Poder de Deus, o uso de objetos como pontos de contato nas
campanhas fazem parte de sua liturgia entre eles podemos constatar: “pães
abençoados”, “água orada”, “fronha da felicidade”, “toalhinha e lençinho tu uma
benção”, “rosa ungida”, etc. José Bittencourt Filho
42
diz que “Onde mais se destaca a
convergência do PA [Pentecostalismo Autônomo] com a matriz religiosa é no uso fora
do comum de objetos como mediação do sagrado.” Edir Macedo
43
, líder da Igreja
Universal do Reino de Deus, justifica a utilização dos pontos de contato da seguinte
maneira:
Pontos de contato são elementos usados para despertar a das
pessoas, de modo que elas tenham acesso a uma resposta de Deus
para seus anseios. Muitas pessoas têm dificuldade para colocar sua
em prática, por isso precisam de pontos de contato, que podem ser óleo
de unção, a água, a rosa e outros elementos. Esses objetos não têm
poderes em si mesmos, mas despertam o coração e as mentes das
42
José Bittencourt Filho, Remédio Amargo, p. 32, in ANTONIAZZI, Antonio et al. Nem anjos nem demônios:
Interpretações sociológicas do pentecostalismo. Petrópolis: Vozes, 1996.
43
MACEDO, Edir.Doutrinas da Igreja Universal do Reino de Deus. Vol. 2. Rio de Janeiro: Universal,2001. pp. 101-
102.
25
pessoas para a realidade de que o Senhor está presente para abençoá-
las. Quando as pessoas amadurecem espiritualmente, tendem a não
depender tanto dos pontos de contato como no início de sua caminhada
cristã. Entendem que o poder está no Senhor Jesus Cristo e na ação do
seu Espírito.
Como vimos, nos cultos da Igreja Mundial do Poder Deus faz parte de sua liturgia
usar objetos como ponto de contato, um costume oriundo da Igreja Universal do Reino
de Deus. Nesse quesito, manteve uma semelhança quanto à liturgia. No capítulo 2
discorremos mais sobre esse assunto.
Outra questão que observamos nos cultos da Igreja Mundial do Poder de Deus,
notados nos discursos das coletas dos dízimos e ofertas e na interpretação em relação
às doenças e todos os males que atormentam seus fiéis, foi a influência da Confissão
Positiva ou Teologia da Prosperidade. Campos
44
define a teologia da prosperidade do
seguinte modo:
Tem se dado o nome de “teologia da prosperidade” a um conjunto de
crenças e afirmações, surgidas nos Estados Unidos, que afirma ser
legítimo ao crente buscar resultados, ter fortuna favorável, enriquecer,
obter o favorecimento divino para a sua vida material ou simplesmente
progredir. No Brasil, essa teologia está na base da pregação de várias
denominações e seita [...].
De acordo com o Dictionary of Pentecostal and Charismatic Movements
45
assim
se define a Confissão Positiva ou Teologia da Prosperidade:
Confissão positiva é um título alternativo para teologia da fórmula da
ou doutrina da prosperidade promulgada por vários televangelistas
contemporâneos, sob a liderança e a inspiração de Essek William
Kenyon. A expressão confissão positiva” pode ser legitimamente
interpretada de rias maneiras. O mais significativo é que a expressão
“confissão positiva” refere-se literalmente a trazer à existência o que
declaramos verbalmente, uma vez que a fé é uma confissão.
44
CAMPOS, op. cit., p. 363.
45
BURGESS, Stanley M. e McGEE, Gary B. Dictionary of Pentecostal and Charismatic Movements. Grand Rapids,
Michigan, EUA: Zondervan, 1988, p.718.
26
A Igreja Mundial do Poder de Deus não faz menção às chamadas “correntes”
46
,
que consiste num período de tempo em que o fiel se compromete a participar de todas
as reuniões realizadas num dia da semana, para alcançar um milagre, cura, emprego,
casa própria, causas na justiça, etc. Para demonstrar um certo distanciamento da Igreja
Universal do Reino de Deus, convoca seus fiéis por um tempo que pode variar entre
sete semanas ou doze dias, como “12 domingos da transformação com o Apóstolo
Valdemiro Santiago”, “12 domingos da Força de Deus com o Apóstolo Valdomiro
Santiago”, “21 semanas de Daniel”, “Sete Sextas-Feiras do MILAGRE URGENTE”, etc.,
mas em nenhum momento usa a terminologia da Igreja Universal do Reino de Deus.
Campos
47
cita várias correntes da Igreja Universal como “Corrente da Prosperidade”,
“Corrente da vida regalada”, “Corrente dos empresários”, “Corrente dos 70 pastores ou
apóstolos”, etc.
O trabalho dos pastores e obreiros
Ao entrarmos na sede nacional, não encontramos os obreiros, credenciados e
uniformizados, na recepção dos fiéis ou visitantes dando-lhes as boas vindas. Mas
estão uniformizados com calças e saias azuis e camisas brancas espalhados pelo
salão, e em suas mãos envelopes e produtos produzidos pela Igreja. Segundo Paul
Freston
48
a uniformização dos obreiros é uma das características das igrejas
pentecostais e neopentecostais no Brasil. Os obreiros na Igreja Mundial do Poder de
46
Alguns pesquisadores fazem diferenciação entre correntes e campanhas, para uma maior discussão ver Campos
(1997); Freston (1993) e Ricardo Mariano (1999).
47
CAMPOS, op. cit., p.161.
48
FRESTON, Paul. Protestantes e política no Brasil: da constituinte ao impeachment. Campinas, Tese de Doutorado
pela IFCH-Unicamp, 1993. p. 105.
27
Deus executam outras funções como ajudar na distribuição de envelopes de ofertas,
jornais da igreja, panfletos, ajudando a manter a ordem do templo durante toda a
reunião. Eles chegam com antecedência às reuniões, orando, lendo a Bíblia, e estão
em alerta para qualquer eventualidade, e estão autorizados a darem conselhos e
expulsar demônios conforme o momento. Não são remunerados; seu trabalho é
voluntário. No caso daqueles que querem ser pastor, os jovens, deixam suas famílias,
amigos, casa e vão morar na igreja, onde hospedagem para os solteiros e vão
trabalhar em tempo integral. Nessa mudança de vida, eles aspiram uma igreja para
pastorear e administrar. Esses jovens ganham uma ajuda de custo que pode chegar a
R$ 300,00 reais mês. Ali, estarão sujeitos aos pastores e não poderão escolher os
serviços, estarão 24h por dia à disposição dos pastores e dos obreiros mais antigos. Os
obreiros são escolhidos do meio dos fiéis, e são convidados a participarem na
organização e administração da igreja e tendo um bom desempenho poderá galgar
posições mais elevadas na hierarquia da igreja. No depoimento do ex-pastor da igreja,
Rafael
49
explica que um pastor mediano ganha R$ 500,00 reais, e um pastor
conceituado ganha R$ 900,00 reais e um pastor que está mais na mídia ganha R$
1.500,00 reais, um bispo ganha R$ 2.500,00 reais. Contudo, os pastores não têm
carteira assinada e não pagam o INSS.
Os pastores almejam suas próprias igrejas e para isso não medem esforços para
alcançar o tão sonhado projeto, foi o que ouvimos de alguns deles em conversa
informal depois das reuniões. Eles trabalham dia e noite, podem ser convocados pelo
“apóstolo” a qualquer momento, seja para vigílias ou reuniões. Ao término das reuniões,
49
BITUM, op. cit., p. 75.
28
alguns pastores ajudam na administração da igreja, outros atendem aos fiéis dando
conselhos, ministrando orações, etc.
Para o cargo de pastor na Igreja Mundial do Poder de Deus, o candidato deve
passar primeiro por uma “prova” que consiste no exercício da fé, disposição de
abandonar tudo inclusive desejos materiais. O candidato deverá ter dedicação exclusiva
ao ministério e submissão incontestável ao seus líderes e ao “apóstolo”. Mas segundo o
relato de Rafael
50
, ex-bispo da igreja, pastores o escolhidos por “pura amizade e
coleguismo”. A Igreja Mundial do Poder de Deus,o estimula os pastores e obreiros a
estudarem teologia, por fazer mal àqueles que querem “servir a Deus”.
Para que não seja criado um vínculo ou mesmo “vícios” entre pastores e fiéis, a
igreja promove um rodízio de pastores pelos cultos e templos. Os pastores ficam um
tempo determinado. Vencendo este tempo ele é automaticamente removido e
transferido para outra região ou em novas igrejas que estão sendo abertas. Os laços, o
vínculo com os fiéis abre o precedente de futuros rachas ou a independência da igreja
local ou da igreja mãe. No critério de escolha de pastores vale complementar que, se
for um ex-pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, será admitido o mais rápido.
A mídia como instrumento de divulgação
Através da mídia, a Igreja Mundial do Poder de Deus tem divulgado seu projeto
fazendo uso de seu slogan “A mão de Deus está aqui!” , como forma de sua
estratégia. Na televisão e no jornal, esse slogan reforça a legitimação da igreja, por ser
um lugar onde o poder de Deus se aflora. A mídia eletrônica e escrita tem sido objeto
50
Ibid., pp. 77-78.
29
de maciço investimento para divulgação de seus projetos e na expansão de suas
igrejas. O jornal Mundial, cuja circulação começou em maio de 2005 com tiragem
superior a 50.000 exemplares, promove os milagres realizados pelo “apóstolo”, as
campanhas, eventos, datas festivas da igreja. Os milagres, a cura divina, são destaque
em todo o jornal. Também consta a informação da abertura de novos templos,
endereços e horários dos grandes acontecimentos, demonstrando o sucesso do
empreendimento. Fonseca
51
menciona que não são poucos as pesquisas que mostram
a mídia como um dos principais meios usados para a fabricação e sustentação da
liderança carismática no Brasil. No jornal também encontramos propagandas diversas,
desde prestação de serviços até informações políticas, como também a promoção dos
cultos e dos endereços das igrejas alistadas.
O sucesso vem em grande parte da utilização da mídia, que se torna objeto
central e meio de sustentação das iniciativas religiosas. Na realidade é uma adequação
ao secularismo e pluralismo religioso. Falar da mídia nos obriga a mencionar o
marketing. A mídia é um instrumento de propaganda dos produtos da igreja, que visa
alcançar um mercado e sua necessidade, neste caso, o mercado religioso. Campos
52
menciona que as estratégias de marketing valorizam os famosos quatro “Ps”: “produto””
“ponto de vendas”, “promoção” e “preço”. Sua aplicação nas organizações não-
lucrativas, no caso, as igrejas, “exige uma inevitável adaptação dessas ferramentas de
trabalho, oriundas do marketing empresarial, cujo objetivo é o lucro monetário.” Nas
organizações religiosas esses “produtos” são : “ministérios”, “programas”, “serviços”,
“trabalhos”, “cultos” que se expressam em hinos, sermões, liturgias, jingles, spots,
51
FONSECA, Alexandre Brasil. Lideranças Evangélicas na Mídia: Trajetórias na Política e na Sociedade Civil.
Religião & Sociedade, v. 1, Rio de Janeiro, ISER, 1977. p. 85.
52
CAMPOS, op. cit., p. 223.
30
relatos de milagres, orações, etc. Os produtos numa organização religiosa é “tudo
aquilo que pode ser distribuído num templo, ou por intermédio de um veículo de
comunicação de massa, quando usado pela igreja.” A estratégia de marketing está
ligada às carências humanas e a um esforço na adequação entre bens e “produtos”, é o
que afirma Campos
53
:
Não estratégia de marketing sem o reconhecimetno da sazonalidade
e mutabilidade histórica das carências humanas, assim como de um
esforço para uma melhor adequação dos bens e “produtos” às
necessidades do público-alvo, e a aceitação de que é possível interferir
nos processos de busca de soluções para determinadas demandas.
Toda instituição
54
surge da necessidade, esta imperiosa de atender as
necessidades humanas, pois, “necessidades insatisfeitas impulsionam as pessoas em
direção a novos ‘gurus’ e outras promessas de soluções.” A propaganda, a publicidade
religiosa é uma conseqüência do pluralismo, pois onde monopólio religioso não
necessidade de propaganda.
A televisão é outro meio pela qual a Igreja Mundial do Poder de Deus divulga
seus projetos. Várias tentativas foram feitas para começar um programa de rádio, mas
segundo o comentário que percorre entre os fiéis, é que a Igreja Universal sempre
pagava mais e monopolizava as programações em rádio. Na televisão houve uma
tentativa, mas o proprietário manteve o contrato e assim, a igreja passou a ter um
programa de televisão.
Pode-se observar que a Igreja Mundial do Poder de Deus segue o mesmo
caminho de sua antecessora na busca de programas de TV e rádio. Carlos Magno
55
,
que foi líder da Universal, disse em reportagem que ao implantar a igreja em João
53
CAMPOS, op. cit., p. 225.
54
Ibid., p.227.
55
Jornal da Tarde, 02.04.1991.
31
Pessoa, conseguiu um horário na rádio e começou a pregar. Arrumou um clube e
marcou as reuniões aos domingos. Muitas pessoas que ouviam a rádio foram às
reuniões. Sua estratégia consistia em começar com um núcleo a partir de um programa
de rádio ou televisão e dali nascia a igreja. Nos poucos anos de existência a Igreja
Mundial do Poder de Deus tem um espaço significativo na televisão. Tem um programa
no Canal 21 UHF, de segunda à sexta-feira, das 3h às 10h e, sábado e Domingo, das
3h às 8h e na Rede TV, de segunda à Sexta, das 5h às 8h30 exibem o programa “O
Poder Sobrenatural da Fé”, cujo apresentador é o próprio “apóstolo” Valdemiro
Santiago, que é apresentador, diretor, protagonista responsável pelo programa. O
programa divulga os milagres que acontecem na igreja, cujos testemunhos relatam o
livramento de doenças, problemas financeiros, etc , que após freqüentarem a igreja
foram sarados. A finalidade do programa é atrair pessoas, com chamadas incisivas, que
conclamam as pessoas a virem conhecer a igreja. Promovem as reuniões com a
participação do “apóstolo” Valdemiro Santiago, para experimentar o poder de Deus.
Esse apelo é marcado exclusivamente pelos fiéis que freqüentam a Igreja Mundial do
Poder de Deus. A entrada dos pentecostais e neopentecostais nos meios de
comunicação, principalmente na televisão, segundo Hugo Assman
56
, possuem vários
conceitos como “igreja eletrônica”, “igreja comercial”, “marketing da fé”, “messianismo
eletrônico”, “assembléia eletrônica” e vários outros. Um dos pregadores eletrônicos que
mais tempo passa em exposição na TV é o missionário R.R. Soares, líder da Igreja
Internacional da Graça, que segundo a revista Veja, edição de 29.01.2003, menciona
que para manter seu programa em horário nobre para todo Brasil na Rede
Bandeirantes, investe cerca de 2,5 milhões por mês de aluguel. O programa de
56
ASSMAN, Hugo. A igreja eletrônica e seu impacto na América Latina. Petrópolis. Vozes, 1986.
32
televisão promove a formação de uma comunidade que, apesar de não terem
convivência física ou relações de proximidade, estão ligadas pelas informações da
igreja e até mesmo pela cura divina. Para Gouveia, a midiatização dos lugares
relacionais, formam estas comunidades, pois os espaços urbanos não favorecem os
relacionamentos fora de casa. Assim ela diz:
um território do sagrado pentecostal, que o é mais sedentário, se
move pela ondas da TV, percorre ruas da cidade, através das mentes de
seus adeptos e simpatizantes. É difícil, agora, a delimitação de suas
fronteiras físicas para a realização de uma cartografia da comunidade da
fé com sua redes de sociabilidade.
57
O uso dos meios de comunicação de massa pela Igreja Mundial do Poder de
Deus, dá ao fiel a oportunidade de sua experiência religiosa que será mediada pela TV,
que segundo Abumanssur
58
, haverá uma apropriação do sagrado individualmente na
solidão das casas, cuja experiência transcende o espaço físico da igreja, organizando
um novo espaço de sociabilidade e solidariedade religiosa.
A cura divina e sua representação
A Igreja Mundial do Poder de Deus tem na cura divina sua mensagem principal.
O “apóstolo" Valdemiro Santiago faz ressurgir a tônica do pentecostalismo da segunda
onda. “A primeira onda do movimento pentecostal enfatizou a glossolalia (falar em
línguas); a segunda onda enfatizou a cura divina; a terceira onda passou a enfatizar o
dinheiro.”
59
A divisão da história do pentecostalismo no Brasil em “ondas” foi sugerido
57
GOUVEIA, Eliane Hojaij. Imagens Femininas: a reengenharia do feminino pentecostal na televisão. Tese de
Doutorado, PUC/ SP, 1998. p. 15.
58
ABUMANSSUR, op. cit., p. 184.
59
ROMEIRO, Paulo. Decepcionados com a graça: esperanças e frustrações no Brasil. São Paulo: Mundo Cristão,
2005. p. 107.
33
por Paul Freston
60
e adotado também por Ricardo Mariano
61
, dividindo o
pentecostalismo em três ondas. Na primeira onda, estão a Congregação Cristã no
Brasil (1910), e a Assembléia de Deus (1911). A Segunda onda, que começa a partir
dos anos 1950, estão incluídas a Igreja do Evangelho Quadrangular (1953), O Brasil
para Cristo (1955), Deus é Amor (1962), Casa da Bênção e outras de menor expressão.
A terceira onda, começa a partir da metade da década de 1970 que inclui a Igreja
Universal do Reino de Deus (1977), a Igreja Internacional da Graça de Deus (1980), a
Cristo Vive (1986), a Comunidade Sara Nossa Terra (1976), a Comunidade da Graça
(1979), a Renascer em Cristo (1986), a Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo (1994),
a Comunidade Cristã Paz e Vida (1996) e a Igreja do Avivamento Contínuo (2002). A
terceira onda foi marcada com início do neopentecostalismo no Brasil. O
neopentecostalismo começou com a fundação da Igreja Universal do Reino de Deus,
cujos fundadores foram Edir Macedo e R.R. Soares, fundador da Igreja Internacional da
Graça de Deus. Ambos saíram da Igreja Nova Vida no Rio de Janeiro. Ricardo Mariano
explica as razões do uso do termo “neopentecostal” para a terceira onda e para a Igreja
Universal do Reino de Deus:
O prefixo neo mostra-se apropriado para designá-lo tanto por remeter à
sua formação recente quanto ao caráter inovador do
neopentecostalismo. Embora recente entre nós, o termo
“neopentecostal” foi cunhado vários anos nos EUA. Lá, na década de
70, ele designou as dissidências pentecostais das igrejas protestantes,
movimento que posteriormente foi designado de carismático.
62
No contexto norte-americano, existe uma diferença de sentido quanto ao
emprego do termo “neopentecostal”:
60
FRESTON, op. cit.,1996, p.7.
61
MARIANO, op. cit., pp. 28-33.
62
MARIANO,op. cit., p. 33.
34
Naquele país, atribui-se o termo “neopentecostalismo” a pessoas
com mentalidade pentecostal, mas que se consideram adeptas de
uma “renovação espiritual” dentro dos próprios quadros
denominacionais a que pertencem. De uma maneira geral, esse
“neopentecostalismo” enfatiza exorcismo, cura divina, dons
espirituais, continuidade da revelação divina através de líderes
carismáticos, e uma parte deles aceita a “teologia da
prosperidade”. Esse “neopentecostalismo” ganhou força no mundo
religioso norte-americano nos anos 70, período em que também
começou a penetrar na América Latina, provocando o surgimento
de novas igrejas, seitas e denominações, assim como cisões nas
principais denominações protestantes brasileiras, entre elas a
metodista, a batista, a presbiteriana, a congregacional e outras.
63
outras designações para o neopentecostalismo como: pentecostalismo
autônomo, isopentecostalismo, pentecostalismo neoclássico, pós-protestantismo, pós-
pentecostalismo, pentecostalismo crioulo, pentecostalismo mestiço, protestantismo
sincrético e ultrapentecostalismo.
64
Mendonça
65
classifica o pentecostalismo de outra maneira. Ele classifica em
duas fases: os primeiros anos do século XX, ao que chamamos de “pentecostalismo
clássico”, e a década de 1960, momento em que surgiu o neopentecostalismo (ou
movimento carismático protestante), da renovação carismática católica e das agências
de cura divina. Segundo Paulo Romeiro
66
, a linha é muito tênue na separação nas
igrejas da segunda onda. A Casa da Bênção que é incluída por Ricardo Mariano na
segunda onda, tem quase todos os elementos que caracterizam o neopentecostalismo
como teologia da prosperidade, o diabo e seus demônios etc.
A Igreja Mundial do Poder de Deus usa a cura divina como um chamariz para
ganhar adeptos. Em um programa de Televisão
67
, uma mulher estava estendida no
63
CAMPOS, op. cit., p.50.
64
ROMEIRO, p. 49.
65
MENDONÇA, Antônio G. e VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil. São Paulo:
Loyola, 1990. p.256.
66
ROMEIRO, op. cit., p. 51.
67
Anotações pessoais do programa exibido na Rede TV no dia 10/10/2007.
35
palco, parecia semi-morta, totalmente desacordada. O “apóstolo” ia de uma lado para o
outro, gesticulando, e perguntando, “alguém conhece essa mulher?”. Então, o
“apóstolo” vira para a multidão que lotava a reunião e diz, “se essa mulher não levantar
agora, a Mão de Deus não está aqui, não está comigo e este ministério não é sério...”.
Ele então ora pela mulher, os auxiliares se aproximam, e ela levanta e começa a andar.
O povo começa a aplaudir e a gritar, aliaviados de que “a Mão de Deus realmente está
ali”. Esse é um exemplo de vários em relação à ênfase na cura divina que ocorrem
diariamente nos cultos.
A cura divina, o milagre é uma das marcas indelével da Igreja Mundial do Poder
de Deus. O pensamento de que indo à igreja, os problemas serão resolvidos, carrega
no seu bojo a idéia de que todo desejo do fiel será atendido, seja qual for. Freqüentar a
igreja resultaria em manipulação do sobrenatural em relação aos interesses dos fiéis.
Se esse pensamento representa a verdade sobre o fenômeno que está em questão,
estamos diante da magia. A religião tem como característica a submissão e serviços
prestados à divindade
68
, enquanto que a magia, nada mais é do que uma “coerção de
Deus”, pois constrange os poderes da divindade para prestar serviço às necessidades
de sua clientela. A coexistência entre a magia e a religião, para José Bittencourt
69
é
uma forma de protestantismo sincrético. dificuldades em separar magia e religião
nos grupos pentecostais que praticam a cura divina
70
, por isso são chamadas de
“igrejas mágicas”. A magia sempre tem chamado à atenção dos homens, pois nela se
acha a possibilidade do domínio sobre problemas ou circunstâncias que vão além da
capacidade humana, e porque ela traz consigo um toque de poder, um toque do
68
WEBER, Max., op. cit., 1991, p. 294.
69
José Bittencourt in BEOZZO, José O. (org.), Curso de Verão, Ano VII, São Paulo: Cesep-Paulus, 1993. pp. 107-
119.
70
MENDONÇA, Antônio G. O Celeste Povir. 1
a
ed., São Paulo: Paulinas,1984. p. 158.
36
sobrenatural. Weber
71
viu isso na religiosidade dos camponeses, que sempre estavam
propensos à magia, e isso antes do utilitarismo dos mercadores, uma conexão entre a
religião cristã e a prosperidade material estava estabelecida. Nos ritos se buscavam
soluções para os problemas práticos da vida. No final da Idade Média, com a
monetarização crescente, relíquias, sacramentos, indulgências, passaram a ser
trocadas por moedas. De qualquer forma, toda religião tem um envolvimento com os
poderes sobrenaturais que vão expressar em prece, sacrifício, veneração, que segundo
Weber, pode-se chamar de “culto” e religião. Contudo, a magia (zauberei) tem a
característica de “um forçar por meios mágicos”
72
. Conseqüentemente, a oração e
veneração são dirigidas aos deuses, e em oposição a magia força e seduz os
demônios. Entretanto, Weber diz que fazer esta distinção na prática é quase
impossível, pois nos cultos religiosos há sempre uma boa dose de elementos mágicos.
A questão entre o mágico e a religião está na visão de mundo. A visão religiosa
não transita no terreno do imediato, pois seu terreno é o da finalização, do significado
da vida, e seu espaço tem como caracterítica os “símbolos finalizadores da existência e
do destino da vida humana”
73
. A visão mágica enxerga as realidades sensíveis,
imediatas, palpáveis, que estão na dependência de forças supra-sociais. Ela representa
um mundo habitado por forças ou entidades, com mais ou menos poderes, as quais são
compelidas a resolverem os problemas imediatos. Os rituais mágicos, nesta
perspectiva, produzem bens que serão desfrutados no imediato. Diante do que foi
exposto, podemos afirmar que na Igreja Mundial do Poder de Deus os seus ritos de
cura divina estão no terreno do gico porque respondem ao imediato. Esse
71
WEBER, Max. História Geral da economia. São Paulo: Mestre Jou, 1968. p. 13.
72
Ibid., Èconomie et Société. T. I, Plon, 1971, p. 449.
73
ROLIM, Francisco Cartaxo. Pentecostalismo: Brasil e América Latina. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 97.
37
imediatismo está tão presente no discurso do “apóstolo” Valdemiro Santiago que certa
vez em uma das reuniões disse para um aleijado, “se vo tivesse vindo a Igreja
Mundial do Poder de Deus, você não perderia essa perna”.
Em Joachim Wach
74
a diferença entre a religião e a magia está na autoridade
que ambas exercem. Na primeira o homem reconhece e se sujeita ao sobrenatural, o
qual ele cultua; na segunda, o homem impõe sua vontade aos deuses através da
conjuração. “A autoridade do mago é bastante aumentada por símbolos, emblemas e
utensílios que constituem seus pertences especiais, como por exemplo, linguagem
peculiar, trajes, manto, instrumentos, armas, jóias, perfumes.”
75
No caso da Igreja
Mundal do Poder de Deus a “autoridade do mago” está estampada na própria pessoa
do “apóstolo”. Certo dia chegando à Sede Nacional da igreja
76
, próximo ao palco, o
“apóstolo” estava gravando algumas entrevistas. À sua volta estava uma multidão que
se comprimia no esforço de chegar perto dele. Na realidade, eles queriam tocar no
“apóstolo”. Em suas mãos podiam-se ver fotos, receitas médicas, exames médicos,
carteira profissional, chapas de pulmão, lenços, toalhinhas, etc., que com grande
esforço procuravam encostar no “apóstolo” e depois saíam aliviados fazendo preces de
que algum “milagre” fora liberado. Dessa maneira, ficou demonstrado que o “apóstolo”
exerce uma grande autoridade espiritual sobre seus adeptos. Em sua pessoa, pelo
toque, os fiéis esperam o resultado imediato de seus problemas.
Na Igreja Mundial do Poder de Deus, não preocupação na sistematização de
doutrina. A doutrina é definida exclusivamente pelo “apóstolo”. Toda religião com o
passar do tempo sistematiza sua posições doutrinarias. Por que isso ainda não
74
WACH, op. cit., p. 419-420.
75
Ibid., p. 425.
76
Anotações pessoais do dia 01/04/2007, às 7h27, na Sede Nacional da Igreja Mundial do Poder de Deus, no bairro
do Brás, na cidade de São Paulo.
38
aconteceu na Mundial? Julien Freund
77
diz que “[...] quanto mais uma religião abandona
seus aspectos gicos e místicos para se tornar uma ‘doutrina’, mais se desenvolve
sob forma de um conhecimento teológico ou apologético.” Talvez seja por isso que o
“apóstolo” não incentive seus pastores a estudar, ou fazer teologia, porque essa atitude
irá fazer com que o mágico desapareça. A Igreja Mundial do Poder de Deus não
sobreviveria, pois o mágico é sua existência. As práticas mágicas têm como objetivo o
concreto, o específico e o imediato, está em oposição aos objetos mais abstratos,
aqueles mais genéricos, e que estariam mais distantes da religião. Essas práticas têm
como inspiração a coerção e manipulação dos poderes sobrenaturais, evitando, por
exemplo, atitudes contemplativas da “oração”. As práticas mágicas possuem aquele
ritual do toma da . O “apóstolo” em seu programa de TV
78
disse que ia ao monte
constantemente para orar, e que naquela semana estaria indo quase todos os dias para
orar. Essa atitude demonstra uma “certa contemplação”, embora não estímulos para
que seus fiéis tenham a mesma atitude, pois ir ao monte é uma obrigação e
exclusividade para ele e seus auxiliares. A ida ao monte parece revelar que a intenção
do “apóstolo” é “recarregar as baterias do mágico”. Seu ministério precisa do mágico
para que sua autoridade jamais diminua. Isso está relacionado também com o carisma,
no sentido weberiano, pois magia e carisma precisam andar juntos para reafirmar a
legitimidade do líder. Pois uma autoridade carismática perde sua autoridade não
havendo mais sinais sobrenaturais. Essa questão estaremos comentando com mais
detalhes no capítulo 4 .
77
FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber. 4a.ed., Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1987. p. 136.
78
Programa realizado no dia 10/10/2007 pela Rede TV.
39
Sobre a questão magia e religião e suas diferenças, ficou claro que a magia é
imediata, enquanto que a religião permanece num terreno fixo e previsível. Mendonça
79
fala que esse caráter de permanecer num terreno fixo é característico das “religiões
tradicionais”. Assim ele diz:
A sociedade brasileira hoje é um mundo caótico, que marginaliza cada
vez mais as classes pobres e desorganiza a classe média. Ora, as
religiões tradicionais, como religião, m a função de cultuar e manter
um universo fixo e previsível. Quando esse universo se desorganiza, as
religiões tradicionais têm dificuldades para ajustar as pessoas. Entra,
então, a magia, com sua visão mais compartimentada do universo, que
permite ajustes imediatos e parciais. Seria, então, lícito sob o ponto de
vista das ciências sociais, concluir que o neopentecostalismo é um
ajuste entre a religião e magia.
O milagre, a cura divina, é o mote da Igreja Mundial do Poder de Deus. Seu
discurso imediatista revela a presença da magia ou do mágico, que de certa maneira é
difícil separá-la da religião que não é imediata. Mas por outro lado, se a magia não
estiver próxima da religião, ela será pura magia, portanto, não será religião. O mundo
em que se insere a Igreja Mundial do Poder, é um mundo cristão, portanto, um mundo
de religiosidade. Esse mundo, no caso o Brasil, é uma sociedade sincretista, portanto,
sujeita ou influenciada pelo gico. De qualquer forma, o mágico sempre está presente
no religioso. A matriz religiosa do imaginário brasileiro é sincretista, Campos
80
afirma o
seguinte:
Entendemos como imaginário brasileiro o conjunto de representações
coletivas sedimentadas que, transmitidas de uma geração para outra,
formaram um substrato comum a todos, uma espécie de matriz religiosa,
que permanece subjacente ao catolocismo, a certas formas de
kardecismo e religiões afro-brasileiras. Esse terreno contém o húmus no
qual o neopentecostalismo se alimenta tanto ritual como teologicamente,
ao se apropriar de símbolos, linguagens e visões de mundo
preexistentes ao seu surgimento na história.
79
MENDONÇA, Antônio Gouvêa. Protestantes, Pentecostais e Ecumênicos O campo religioso e seus
personagens. São Bernardo do Campo: Umesp, 1997. p. 161.
80
CAMPOS, op. cit., pp. 19-20.
40
O povo brasileiro na sua cultura tem três vertentes principais – a cultura ibérica, a
latina e a católica. O resultado dessa mistura dessas culturas fez surgir o imaginário de
um mundo formado por espíritos bons e maus, por demônios, poderes que tem uma
função intermediária entre o homem e o sobrenatural, e por possessões.
81
Quando nos referimos ao termo sincretismo, estamos querendo dizer que é “a
fusão de elementos de civilizações diversas e aantagônicas, compondo um elemento
único no qual percebe, todavia, a permanência de traços das origens
82
. Sendo, então, o
imaginário religioso brasileiro sincretista, a magia tem que estar presente no ato
religioso, pois sem isso não identicação. Os milagres, a cura divina, que ocorrem na
Igreja Mundial do Poder de Deus, são sinais que chamam à atenção por identidade
religiosa. Como afirmamos, neste contexto, magia e religião tem que andar juntas,
porque a magia representa a identidade sincretista, e a religião a identidade tradicional.
Portanto, podemos afirmar que a Igreja Mundial do Poder de Deus acomoda de modo
compatível magia e religião. Ela é uma “igreja mágica” e em contrapartida é uma
religião.
Outra questão que precisa ser elucidada quanto à representação da cura divina
na Igreja Mundial do Poder de Deus é a influência da “teologia da saúde e da
prosperidade”. Utilizada por outras igrejas neopentecostais como Igreja Universal do
Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça, Igreja Renascer em Cristo, Comunidade
Evangélica Sara Nossa Terra e outras. A doença, para esses grupos, é considera como
falta de fé, ou a incapacidade do fiel crer que Deus pode curá-lo.
81
MENDONÇA, op. cit., p. 160.
82
Ibid., p. 66.
41
Romeiro
83
afirma que “Uma das propostas principais da maioria de seus
pregadores é banir da vida humana a doença, a pobreza e todo tipo de sofrimento. Com
isso, pretendem produzir uma nova geração de fiéis rica e fisicamente saudável.” A
confissão positiva ou teologia da prosperidade e saúde surgiu com o norte-americano
Essek William Kenyon, que se envolveu em diversos ministérios. Foi convidado por
Aimee Semple McPherson para pregar no templo sede do Evangelho Quadrangular;
assumiu o pastorado em 1926 na igreja batista independente em Pasadena. Fundou a
Igreja Batista Nova Aliança em 1931 na cidade de Seatle. Romeiro
84
diz que muitos
críticos da confissão positiva falam que ele sofreu influência da ciência cristã, que
explica que toda causa e efeito são mentais e não físicos. Para ciência cristã a matéria
parece existir, mas na realidade não existe. Todas as coisas são substituídas por idéias
espirituais. Deus não é autor do pecado, nem da doença, nem da morte, como ser
divino e supremo, mente que está isenta de todo mal. A matéria não tem vida nem
sensações, por isso deve-se abandonar a farmacologia e adotar a ontologia – “a ciência
do verdadeiro ser.”
85
Na ciência cristã, que aborda a religião intelectual e
filosoficamente, aqueles que buscam cura são atraídos pelo pressuposto de que nunca
estiveram doentes
86
. Segundo Robert Bowmann
87
, muitas idéias de Kenneth Hagin, o
profeta maior da teologia da prosperidade, estão diretamente ligadas a Kenyon.
Vejamos algumas idéias que vieram de Kenyon ou sofreram uma grande influência:
A natureza humana é espírito, alma e corpo, porém é mais
fundamentalmente espírito.
83
ROMEIRO, op. cit, p. 88.
84
Ibid., p.90.
85
EDDY, Mary Baker. Ciência e saúde com a chave das Escrituras.Boston: The First Church, Scientist.
p.113,114,123,129.
86
MATHER, George e NICHOLS, Larry A. Dicionário de religiões, crenças e ocultismo. São Paulo: Vida, 2000.
87
BOWMANN JR., Robert M. The word: Faith controversy: Understanding the health and wealth gospel. Grand
Rapids: Baker Book, 2001.p.37.
42
Deus criou o mundo pronunciando palavras de fé, e faz tudo o mais
pela fé, e espera-se que exerçamos o mesmo tipo de fé.
Na queda, os seres humanos receberam a natureza de Satanás e
perderam para ele o seu domínio divino, fazendo-o o Deus legal
deste mundo.
Jesus morreu espiritualmente, como também fisicamente, recebendo
a natureza de Satanás, sofrendo no inferno para nos redimir, e assim
nasceu de novo.
Através de nossa confissão positiva com o tipo de de Deus,
podemos vencer a doença e a pobreza.
Após a morte de Kenyon, em 1948, sua filha Ruth continuou a publicar os
escritos do pai. Alguns anos depois Kenneth Erwin Hagin vai usar as idéias e os
escritos de Kenyon e desenvolver um movimento controvertido dentro do mundo
evangélico atual que é a teologia da saúde e da prosperidade. Romeiro
88
menciona
sobre a influência direta de Kenyon em Hagin:
É fato conhecido entre os pesquisadores da confissão positiva que
Hagin plagiou boa parte dos escritos de Kenyon. Embora ele tente, sem
sucesso, negar os plágios, admite a influência de Kenyon em sua vida e
em seu ministério. No livro O nome de Jesus, Hagin conta como entrou
em contato com os escritos de Kenyon, declara sua admiração por ele e
menciona a “licença” de Ruth para que ele citasse a obra de Kenyon.
Para desenvolver sua idéia, Hagin usou o texto bíblico de Isaías 53.4-5 que diz:
“Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou
sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi
traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüidades; o castigo
88
ROMEIRO, op. cit., p.92.
43
que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados”. Hagin fala
de suas conclusões sobre esse texto:
Eu ainda não sabia que a cura estava na expiação (Is 53.4-5). Não sabia
que Jesus carregou nossas enfermidades (Mt 8.17). Não sabia que,
pelas chagas de Jesus, fomos curados (1 Pe 2.24). Não sabia que
Satanás era o autor da doença e da enfermidade. Portanto o medo de
ficar doente de novo continuava a me atormentar [...]. Deus não é o
autor da doença. Os homens ficaram doentes depois que deram
ouvidos ao Diabo [...] . A doença e a enfermidade são do Diabo. Deixe
que a verdade dessa afirmação entre profundamente em seu espírito.
Então siga os passos de Jesus e trate com a doença da forma que
Jesus tratou. Trate a doença e a enfermidade como um inimigo, e nunca
as tolere em sua vida.
89
Na pregação da teologia da prosperidade não lugar para doenças. Os
pregadores neopentecostais, em sua maioria, pregam que tanto a salvação da alma
como a saúde física estão garantidas na expiação de Cristo na cruz. T.L. Osborn afirma
isso:
Por estas escrituras vemos a cura para o corpo na mesma expiação que
vemos a salvação para a alma. A cura está na expiação. Temos a cura
na redenção. Se somos salvos, devemos ser curados. Se somos
curados, devemos ser salvos. Nosso Senhor não fica satisfeito com
meia salvação [...]. A enfermidade não provém do amor, e Deus é amor.
A doença rouba a saúde, rouba a felicidade, rouba o dinheiro de que
necessitamos para outras coisas. A doença é nossa inimiga. É ladra. Ela
rouba aquele doente tuberculoso! Sobreveio-lhe na mocidade e tornou-o
pesado para a família; encheu-o de cuidado e dúvida, medo e dores, e
lhe roubou a fé. Não digais a ninguém que doença assim é a vontade de
Deus. É a vontade do ódio; é a vontade de Satanás. Se a doença se tem
tornado a vontade do amor, então o amor se tem tornado em ódio. Se a
doença é a vontade de Deus, então o céu está cheio de doença.
90
As posições de Kenneth Hagin encontram eco aqui no Brasil,
principalmente no neopentecostalismo brasileiro. Vejamos algumas declarações de
Hagin sobre a doença:
89
HAGIN, Kenneth E. Sermões Clássicos. Rio de Janeiro: Graça, s.d. p. 222-225.
90
OSBORN, T.L. Curai enfermos e expulsai demônios. Rio de Janeiro: Coleção Graça de Deus, 1980.p.45-47.
44
Quando a Bíblia fala no sofrimento, não se refere à enfermidade. Não
temos nenhum motivo para sofrer com enfermidades e doenças, porque
Jesus nos redimiu dela [...] . Faz anos que estou pregando que Deus
quer que todos os seus filhos não apenas alguns de nós, mas todos
nós tenhamos saúde e fiquemos curados. Deus quer que vivamos o
período integral da nossa vida, aqui embaixo, sem enfermidades e sem
doenças. É o plano melhor que ele tem para nós. Nem todas as pessoas
ficam à altura desse plano, mas ele não deixa de existir. A gente é
criticado por pregar essa verdade.
91
Não é da vontade de Deus que fiquemos doentes. Nos dias do Antigo
Testamento, não era da vontade de Deus que os filhos de Israel
ficassem doentes, e eles eram servos de Deus. Hoje, somos filhos de
Deus. Se sua vontade era que nem sequer seus servos ficassem
doentes, não pode ser sua vontade que seus filhos fiquem doentes! As
doenças e as enfermidades não provêm do amor. Deus é amor.
92
Não tive um dia de doença em 45 anos. Não disse que o Diabo não
me atacou. Mas antes de findar o dia, estou curado. Quando o Diabo
me ataca, digo-lhe:”Satanás, estas enfermidades foram carregadas no
corpo de Jesus.Você não tem o direito de trazer a imagem delas para cá
a fim de me assustar. Agora, pegue as suas coisas, ponha-as na mala e
saia daqui. Eu não aceitarei tais coisas”.
93
Para muitos pregadores da teologia da prosperidade, as causas das doenças
não tem relação com problemas hereditários, nem com o meio ambiente, e nem com o
contexto geográfico social. Para eles, todas as enfermidades são provocadas por
agentes espirituais e não físicos. William Branhan explica como Satanás exerce seu
papel na doença:
Toda doença tem vida um germe. Este germe é de Satanás, porque
destrói. É o que Jesus chamou de espírito de enfermidade. Esse germe
faz a doença desenvolver-se exatamente como o germe da vida, quando
somos gerados, nos faz crescer e tornamo-nos corpo humano. Quando
esse germe, ou vida deixa o nosso corpo, ele morre. Ele se depaupera e
volta ao pó. Do mesmo modo, quando o espírito de uma doença sai, a
doença morre, depaupera e desaparece. Nós temos poder sobre o
espírito do Diabo que nos traz doença porque Jesus disse: “Em meu
nome expulsarão demônios”. Em seu nome temos absoluta autoridade
para ordenar que a vida de moléstia saia, e ela tem que obedecer-nos.
Quando ela sai, então a doença morre e os seus feitos desaparecem.
Por exemplo, um câncer tem vida em si. Essa vida é do Diabo, porque
destrói e mata. Enquanto essa vida estiver ali, o câncer continuará a sua
obra de destruição, mas quando ordenamos que essa vida do câncer
91
HAGIN, Kenneth E. É necessário que os cristõas sofram? Rio de Janeiro: Graça, 1990.p.8,27.
92
Ibid., Redimidos da miséria, da enfermidade e da morte. Rio de Janeiro: Graça, 1990.p.19.
93
Ibid., O nome de Jesus. Rio de Janeiro: Graça, s.d.,p.124.
45
saia, em nome de Jesus, ela tem que ir; então o câncer morre. Ele
definha e desaparece, e o doente se restabelece.
94
Influenciada pela teologia da prosperidade, a Igreja Mundial do Poder de Deus
professa que as enfermidades provêm de agentes espirituais, e não de ordem física e
portanto, devem ser combatidas com armas espirituais. Bispo Josilvaldo Batista assim
se expressa:
Aqui nós determinamos a cura, a restauração do lar e da vida financeira
das pessoas. Não aceitamos, em hipótese algumas palavras negativas,
de morte, porque o Senhor é Todo Poderoso, Onipotente, Onisciente e
Onipresente, dono do ouro e da prata, e autor de nossas vidas,
dependemos exclusivamente Dele, e se nós colocarmos tudo em suas
mãos, devemos confiar e aguardar a sua boa obra.
95
Um dos pregadores neopentecostais que mais recebeu influência da teologia da
prosperidade foi o missionário R.R. Soares, fundador da Igreja Internacional da Graça
de Deus. Sua editora, Graça Editorial, publica quase todos os livros sobre esse
assunto, e ele afirma que:
[...] nervosismo, dores de cabeça, insônia, medo, desmaios, desejo de
suicídio, ódio, inquietude e tantos outros males aparentemente comuns
podem muito bem significar que a pessoa está sendo ‘circuncidada
pelos espíritos [...] para problemas espirituais, as respostas têm de ser
espirituais.
96
Neste capítulo um breve relato da história e do surgimento, e a composição
orgânica da Igreja Mundial do Poder de Deus. Em sua liturgia, organização ministerial,
cura divina, e no uso dadia, não muita diferença com a igreja antecessora, Igreja
Universal do Reino de Deus. Esse é o problema que será discutido no próximo capítulo:
94
Citado em OSBORN, T.L. A cura de Cristo: Como recebê-la. Rio de Janeiro: Graça, 1990.p.21-22.
95
Jornal FÉ MUNDIAL, ano II, ed. no.24, p. 2.
96
SOARES, R.R. Espiritismo, a magia do engano. Rio de Janeiro: Graça Editorial, 2001.p.102-104.
46
Quais as convergências e divergências entre a Igreja Mundial do Poder de Deus e a
Igreja Universal do Reino de Deus?
47
CAPÍTULO 2
CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS ENTRE UNIVERSAL E MUNDIAL
[...] não rupturas totais nas sociedades
humanas, mas sim, continuidades retrabalhadas,
sínteses recompiladas sucessivamente, sempre a
partir de materiais antigos, mas em reposta a
desafios históricos e concretos operantes sobre
um grupo social em momentos específicos
Leonildo Silveira Campos
97
No capítulo anterior, procuramos relatar a história da origem da Igreja Mundial do
Poder Deus. Para entendermos o processo de transformação da tipologia weberiana
burocrática para a profética, no nosso caso, as razões que tornaram a Igreja Universal
do Reino de Deus numa burocracia e a Igreja Mundial do Poder de Deus em profecia,
precisamos saber as convergências e divergências entre elas. Se partirmos do
pressuposto de que não “rupturas totais[...] mas sim, continuidades”, então nesse
processo temos possibilidades de identificar semelhanças e dissemelhanças, as quais
irão nos ajudar a compreender o tipo burocrático e o tipo profético, os quais
analisaremos com mais detalhes nos capítulos subseqüentes. Nosso intuito não é
somente elucidar as semelhanças ou as dissemelhanças, mas identificar qual é o ponto
chave que diferencia uma igreja da outra, o que torna especificamente um ministério
diferente do outro.
97
CAMPOS, Teatro, templo e mercado, p. 19.
48
Convergências
certa semelhança na origem das duas igrejas. Tanto o bispo Edir Macedo
como o “apóstolo” Valdemiro Santiago se sentiram rejeitados por suas lideranças, e por
causa disso resolveram fundar suas próprias igrejas. Mario Justino
98
escreve o seguinte
sobre Edir Macedo: “Sem o apoio dos líderes de suas igrejas aos seus métodos
revolucionário de atrair fiéis, como distribuição de sal milagroso, o então evangelista
Macedo se juntou a um grupo de amigos evangélicos e fundou a sua própria igreja [...].”
Mariano diz que Edir Macedo estava “farto do eletismo e sem apoio saiu da igreja”
99
,
pois suas atividades evangelísticas eram consideradas agressivas. Esse conflito que
gera uma contestação da hierarquia foi comentado por Bourdieu:
[...] O conflito pela autoridade propriamente religiosa entre os
especialistas (conflito teológico) e/ou o conflito pelo poder no
interior da Igreja conduz a uma contestação da hierarquia
eclesiástica que toma a forma de uma heresia do momento em
que, em meio a uma situação de crise, a constestação da
monopolização do monopólio eclesiástico por parte de uma fração
do clero depara-se com os interesses anticlericais de uma fração
dos leigos e conduz a uma constestação do monopólio
eclesiástico enquanto tal.
100
Outra característica das duas igrejas é a prática eclesiástica dinâmica e
inovadora, com uma criatividade que impressiona. Romeiro comentando sobre as
igrejas neopentecostais, diz que “Muitas vezes, quem deixa de freqüentar por uma
98
JUSTINO, Mário. Nos bastidores do Reino: a vida secreta na Igreja Universal do Reino de Deus. São Paulo:
Geração Editorial, 1995.p.57.
99
MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil, p.54.
100
BOURDIEU, op.cit., p.62.
49
semana alguma de suas igrejas corre o risco de ficar desatualizado.”
101
Foi o caso da
mudança de “bispo” para “apóstolo” Valdemiro Santiago na Igreja Mundial do Poder de
Deus. As liturgias mudam, os líderes de escalões inferiores são transferidos, como as
campanhas, os símbolos, cálice de libertação, rosa ungida, águas que saram, etc. Na
Igreja Universal do Reino de Deus, por exemplo, os cultos de libertação passaram a ser
chamados de “sessões de descarrego”
102
.
O fator carisma também está presente em ambas as lideranças, tanto no
“apóstolo” Valdemiro Santiago como no bispo Edir Macedo, embora neste último o
processo carismático esteja em transformação, ou seja, o carisma de Edir Macedo,
paulatinamente está se diluindo na instituição, como afirma Campos:
[...] está em curso na Igreja Universal, aparentemente com o
consentimento do próprio Macedo, um processo de fortalecimento
institucional e a adoção de estratégias de transferência do seu carisma,
e, dos demais pastores e bispos, para a instituição eclesiástica. Isso
pode ser percebido até mesmo nas entrevistas, levadas ao ar pela
televisão, com obreiros e membros; sendo que, quaisquer
supervalorizações de qualidades pessoais de pastores e bispos, são
eliminadas de imediato. Admite-se, tão somente, o engrandecimento da
Igreja e destaca-se sempre a ligação dela à pessoa de Jesus Cristo.
103
Mesmo ocorrendo esse fato, a palavra de Edir Macedo dentro da instituição tem
grande validade, ou seja, ainda muita influência de sua liderança na Igreja Universal
do Reino de Deus. As evidências fenomenológicas de origem das duas igrejas, nos
mostram que o carisma é uma marca em ambas, pelo menos no seu início. Ambas
igrejas possuem uma liderança carismática. O líder carismático possui um magnetismo
irresistível, e demonstra uma aparência de vencedor defendendo sua causa ou idéia
101
ROMEIRO, Paulo. Decepcionados com a graça, p. 71.
102
Ibid., p.72.
103
CAMPOS, Teatro, templo e mercado, p. 396.
50
com um entusiaismo constante. Seu carisma lhe permite convencer, agregar, dominar e
manipular seus adeptos, o que resulta num culto à personalidade.
A palavra “carisma” deve ser compreendida como referindo-se a uma
qualidade extraordinária de uma pessoa, quer seja tal qualidade real,
pretensa ou presumida. “Autoridade carismática”, portanto, refere-se a
um domínio sobre os homens, seja predominantemente externo ou
interno, a que os governados se submetem devido à sua crença na
qualidade extraordinária da pessoa específica. O feiticeiro mágico, o
profeta [...], o chefe guerreiro [...] o chefe pessoal de um partido são
desses tipos de governantes para os seus discípulos, seguidores,
soldados, partidários etc. A legitimidade de seu domínio se baseia na
crença e na devoção ao extraordinário, desejado porque ultrapassa as
qualidades humanas normais e originalmente considerado como
sobrenatural. A legitimidade do domínio carismático baseia-se, assim, na
crença nos poderes mágicos, revelações e culto do herói.
104
A história tem demonstrado em relação ao carisma que o culto à personalidade
tem se repetido na relação entre senhores feudais e vassalos, políticos e eleitores,
ditadores e compatriotas. Michael Green comenta o seguinte:
Os fiéis, na verdade, endeusam o líder: ele é supremo, e a sua vontade
tem de ser obedecida. De fato, sua posição corresponde quase
exatamente àquela do imperador romano que exercia completo poder
político sobre o mundo conhecido, e era adorado por seus subjugados.
Da mesma forma, Hitler declarou ser o emissário do Todo-poderoso e o
fundador do reino de mil anos. Os nazistas morriam invocando seu
nome, e sua personalidade era considerada transcendente. O mesmo
aconteceu com Mao. Ele não era apenas um líder; ele era uma
divindade. Ele foi adorado. As pessoas se ajoelhavam diante dele.
Recitavam seus pensamentos. Acreditavam que ele as curava pelas
mãos de um cirurgião. Ele tomou o lugar de Deus.
105
A liderança carismática exercida por Valdemiro Santiago e por Edir Macedo é
centralizadora que marca profundamente seus liderados. Os pastores da Universal
como da Mundial pregam na igreja e nos programas da TV imitando seus líderes
carismáticos tornando-se clones, nos gestos, na entonação de voz, usando os mesmos
104
WEBER, Max. Ensaios de sociologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1982.p.340.
105
GREEN, Michael. I believe in Satan’s downfall. Grand Rapids: Baker Book, 1981.p.158.
51
jargões. Mario Justino comentando sobre a liderança de Edir Macedo descreve o
seguinte:
O centro das atenções na Igreja Universal sempre foi o bispo Macedo.
Era o nosso líder espiritual. O nosso poderoso chefão. Hoje, diria que
ele personificava à perfeição uma mistura de Dalai Lama com Antonio
Conselheiro e Don Corleone sendo esta última a faceta predominante.
Edir Macedo era obsecadamente imitado por todos os pastores, que
pregavam como ele, cantavam como ele, agiam como ele. Como o
bispo, os pastores choravam durante as orações públicas. Porém,
nenhum chegou a ir tão longe quanto o pastor Randal Filho, o juninho,
que , fazendo jus ao apelido de “Macedinho”, entortava as mãos para
ficar mais parecido com o amado mestre, que nasceu com as mãos
deformadas.
106
A liderança carismática reafirma sua posição mediante a exibição de poderes
espirituais, como o dom de curar enfermos, o constante testemunho de experiências
subjetivas, como, visões sobrenaturais, anjos, sonhos, e revelações e diálogo com o
divino. Os fiéis criam uma dependência de seus líderes e precisam de suas orientações
e passam a viver segundo sua aprovação. Os líderes carismáticos passam a ser o elo
entre as bênçãos de Deus e os fiéis. Ari Oro assim comenta:
Esses homens se mostram dedicados na multiplicação dos templos, no
país e até no exterior [...]. Por isso se desdobram em viagens pastorais e
exercem um acentuado controle doutrinário e administrativo-financeiro
sobre as igrejas e pastores que se encontram sob seu poder. Desfrutam,
junto aos fiéis, de um prestígio elevado enquanto líderes carismáticos.
Dons extraordinários e poderes fora do comum lhes são reconhecidos
pelos seus seguidores quando se lhes indaga sobre os fundadores. As
famílias deles são também objeto de deferência e de admiração
especial. Elas figuram em santinhos, fotografias, cartazes, capas de
discos e de livros.
107
O carisma para Weber é “uma qualidade pessoal e extracotidiana [...] em virtude
da qual se atribuem a uma pessoa poderes ou qualidades sobrenaturais, sobre-
humanos [...] ou então se a toma como enviada por Deus, um exemplar [...].”
108
Em seu
106
JUSTINO, Mário. Nos bastidores do Reino, pp. 28-29.
107
ORO, Ari Pedro. Avanço pentecostal e reação católica. Petrópolis: Vozes, 1996.p.54.
108
WEBER, Max. Economia e sociedade, pp.158-159.
52
livro O Grande Livramento, o “apóstolo” Valdemiro Santiago procura passar exatamente
essa idéia aos seus fiéis, pois além do naufrágio, ele conta outros livramentos que
experimentou, como a queda de um edifício de oito andares:
Esta foi uma queda para quebrar todos os ossos do meu corpo. Durante
a queda ainda consegui abrandá-la ao me segurar um cabo de telefone
esticado entre os postes, cortando minhas mãos. Nesta queda, nenhum
osso do meu corpo se quebrou, apenas pequenos cortes. Estava
cantando, naquele momento, um hino muito conhecido, aquele: Segura
nas mãos de Deus..., e quando me levantei, vi muita gente que veio ver
meu corpo estendido no chão, morto; ainda assim continuei a cantar
pois graças a Deus nada me aconteceu, a não ser os cortes nas mãos
pelo fato de ter segurado nos cabos telefônicos. Neste tempo eu era
noivo. Até deram a notícia para a minha noiva, esta que hoje é minha
esposa, que eu havia caído de um prédio, da altura de oito andares.
Quando ela me viu naquele dia, mal pôde acreditar, pois a não ser por
um milagre, ninguém sobrevive a uma queda daquela altura.
109
Em outra ocasião, escapou milagrosamente de uma emboscada:
era pastor. Tinha uns dez anos de ministério. Na Paraíba, eu e mais
dois pastores andávamos por uma cidade, quando três homens surgiram
num carro, um corcel e pararam na nossa frente. [...] E apontando a
arma, uma arma de alta precisão, um rifle, disparou contra a minha
cabeça [...]. Dispararam um tiro, não acertaram. Dispararam outro tiro,
foi quando os dois pastores que estavam comigo correram. [...] Ouvi
mais três tiros na minha direção. Tinha uma árvore pequena atrás, vi os
galhos daquela árvore serem cortados pelas balas. Depois de atirarem
três vezes a poucos metros de distância com uma arma daquelas de alta
precisão, aqueles homens viram que não tinham me baleado e talvez
tenham ficado assustados. Jogando a arma para dentro do carro,
entraram no mesmo e aceleraram. Fugiram sem nos causar dano algum,
a não ser o susto é claro.
110
Ele também comenta que na África escapou de uma mina terrestre sem sofrer
qualquer dano no seu carro:
[...] estava com alguns pastores e um oficial do exército da África e
passamos por um campo minado. Na África, mais especificamente em
Moçambique e Angola, devido as guerras que aqueles países sofreram,
tem muitos campos minados e nós passamos por um desses lugares.
Não sabíamos nada a respeito das minas, nem mesmo o soldado que
estava conosco sabia. Passamos por cima delas, uma bomba explodiu
109
OLIVEIRA, Waldomiro Santiago de. O grande livramento.pp.20-21.
110
Ibid., p.21.
53
arremessando nosso carro e jogando-nos a alguns metros de altura,
talvez uns três metros e, naquele momento eu clamei a Deus. Quando
eu vi o carro subindo, considerei mais um livrameto que Deus nos deu e
aquele homem, oficial do exército, que não era convertido, aceitou a
Jesus.
111
Nessas palavras podemos perceber uma ênfase no sobrenatural sobre a vida do
”apóstolo” Valdemiro Santiago, como uma tentativa de legitimar sua autoridade e seu
papel de líder da Igreja Mundial do Poder de Deus. São os testemunhos desses
milagres e outros, que fazem seus fiéis acreditarem que ele é um homem especial.
Essa atitude é comum numa liderança carismática, segundo Weber, “[...] O
pressuposto indispensável para isso é ‘fazer-se acreditar’: o senhor carismático tem de
se fazer acreditar como senhor ‘pela graça de Deus’, por meio de milagres, êxitos e
prosperidade do séquito e dos súditos.”
112
A manifestação do milagre anda junto com o
líder carismático, porque é um sinal de uma “qualidade extraordinária”
113
. A liderança
carismática “tem prevalecido sempre que a crença na magia é dominante.”
114
Em relação a forma de governo e organização, a Mundial se assemelha com a
Universal. Segundo Reed Eliott Nelson, o protestantismo brasileiro apresenta três
modelos organizacionais, que são eles:
1. O modelo burocrático: importado com as primeiras missões
protestantes, continua sendo adotado pelas igrejas históricas
em maior ou menor escala. Este modelo caracteriza-se por
uma estrutura administrativa complexa, incluindo vários
departamentos, conselhos oficiais, posições hierárquicas e
111
OLIVEIRA, Waldomiro Santiago de. O grande livramento.pp.21-22.
112
WEBER, Max. Metodologia das Ciências Sociais. Parte 2. São Paulo: Cortez; Campinas, SP: Ed. Universidade
Estadual de Campinas, 2001.p.356.
113
BENDIX, Reinhard. Max Weber, um perfil intelectual. Brasília: Ed. Universidade de Brasília; c 1996.p.237.
114
Ibid., op. cit., p.240.
54
regras escritas. São comuns os relatórios, reuniões de
planejamento e coordenação e treinamento formal.
2. O modelo personalista: é geralmente encontrado nas igrejas
pentecostais, às vezes misturado com traços burocráticos nas
denominações maiores. No modelo personalista (ou de
compadrio) pode existir alguma coordenação entre
congregações e conselhos. Outras estruturas formais às vezes
existem oficialmente, mas suas funções são mais simbólicas
do que reais [...]. A influência do pastor na vida pessoal do
seus membros pode ser considerável, e muitas vezes a
maioria da congregação conheceu a por seu intermédio.
Chamo este modelo “de compadrio” ou “personalista” por
causa do relacionamento entre pastor e fiel, que se assemelha
aos laços de dominação pessoal que ligam o agregado ao
patrão no meio rural tradicional.
3. O modelo de parentesco: é o familiar, usado somente na
Congregação Cristã no Brasil [...]. Como outros grupos
pentecostais, a Congregação Cristã não apresenta estrutura
organizacional diferenciada, não dispõe de fortes pastores
carismáticos, nem do controle formal das regras e normas
escritas. Ainda assim, desfruta de unidade ideológica maior
que as igrejas personalistas e de crescimento quase igual [...].
Os membros são regidos por normas informais e um
sentimento de lealdade generalizada na entidade como um
55
todo, em vez de focalizada num departamento ou líder
específico. A liderança é determinada por idade ou tempo de
casa, mas decisões são geralmente tomadas consensualmente
por um grupo dos mais antigos na organização.
115
Dentre os modelos apresentado por Nelson, tanto a Igreja Mundial do Poder de
Deus como a Universal do Reino de Deus, se encaixam no personalista. Isso ocorre
porque nessas igrejas possuem a figura de um líder forte e carismático. Valdemiro
Santiago e Edir Macedo estão no topo da pirâmide da organização, e por isso, são
isento de qualquer questionamento. Eles não são obrigados a dar satisfação de seus
atos morais ou éticos, e nem sobre as finanças que administram, pois ambos são
considerados como “ungidos do Senhor”. A idéia de que não se pode tocar no “ungido
do Senhor” já foi estabelecida como regra extraída da Bíblia
116
, e por isso ninguém pode
questionar sua liderança.
Nas convergências entre as igreja Mundial e Universal, em relação aos usos e
costumes, elas são também idênticas. Não fazem restrições quanto ao cabelo,
vestimentas, lazer, etc, uma liberdade no viver social. Não preocução em vigiar
os fiéis para ver se estão infringindo alguma regra. A Congregação Cristã no Brasil e
Assembléia de Deus, até os anos 1970, tinham como marca o comportamento rígido, o
ostracismo social e uma espiritualidade mística. Essas igrejas não estavam
preocupadas com os bens terrenos, aliás, os tesouros deste mundo eram desprezados,
115
NELSON, Reed Eliott. Modelos organizacionais, crescimento e conflito no protestantismo brasileiro: Uma
perspectiva semiótica, in Estudos da religião. São Bernardo do Campo: Umesp, no. 17, dezembro de 1999.p. 41,43.
116
A idéia “ungido do Senhor” pode ser encontrada em Gênesis 20.1-13 , onde Abraão é considerado por Deus; e em
1 Samuel 24.6, onde Davi poupou a vida do rei Saul por considerá-lo “ungido do Senhor”. Esses textos não se
referem a questionamento ético ou doutrinário do “ungido do Senhor”, mas em relação à integridade física da pessoa.
Para maiores detalhes sobre esta questão ver Paulo Romeiro, Evangélicos em crise, São Paulo, ed. Mundo Cristão,
1996, p. 40, 42.
56
porque atrapalhavam a jornada do fiel para o céu. O pentecostalismo ao longo de sua
história foi radical quanto aos usos e costumes. A radicalidade se estendia sobre a vida
do fiel em relação à aparência, vestuário, lazer e até bater palmas nos cultos e atingia
os instrumentos musicais que poderia ou não serem usados durante o culto. Essa
radicalidade dificultava alcançar pessoas de classe social mais elevada. Com o passar
dos anos, fiéis do pentecostalismo brasileiro passaram a ingressar nas universidades e
com isso o questionamento do radicalismo dessas igrejas começou a aumentar. Foi
nesse momento que surge o neopentecostalismo, e vai encontrar um campo fértil para
sua expansão. Uma nova geração de crentes vai romper com o radicalismo
pentecostal, alterando os usos e costumes, a liturgia, a cosmovisão, a eclesiologia e a
espiritualidade. Paulo Romeiro resume muito bem esse rompimento com o radicalismo
pentecostal:
[...] Os bens materiais não são inimigos da a ser combatidos, mas
grandes aliados na busca da felicidade e do sucesso. A preocupação
com o céu, com a vida após a morte e com o retorno de Cristo arrefeceu
sensivelmente, dando lugar à busca das bênçãos financeiras e da
solução de problemas e conflitos. Renunciar ao mundo tornou-se tarefa
mais amena, o que levou a classe média a aderir, em grande escala, ao
movimento neopentecostal.
117
A ética vivenciada na Igreja Mundial do Poder de Deus como na Universal, é
uma ética conformada ao mundo, que é demonstrada nas suas conquistas como carro,
roupas, viagens, dinheiro, conforto, sinais que os adeptos possuem um ótimo
relacionamento com Deus. Com isso, outras pessoas são induzidas a buscarem na
igreja as mesmas bênçãos. As conquistas dessas bênçãos têm como alvo gozar a vida
que Deus deu. A ética protestante, ao contrário da ética da Mundial e da Universal,
117
ROMEIRO, Decepcionado com a graça, p.76.
57
desconfia dos bens deste mundo; busca o lucro, o para gozar a vida , mas para
produzir cada vez mais. Raymond Aron assim explica:
A ética protestante convida o crente a desconfiar dos bens deste mundo,
e a adotar um comportamento ascético. Ora , trabalhar racionalmente
tendo em vista o lucro, e não gastá-lo, é por excelência uma conduta
necessária ao desenvolvimento do capitalismo, sinônimo do
reinvestimento contínuo do lucro não-consumido. É que aparece, com
o máximo de clareza, a afinidade espiritual entre uma atitude protestante
e a atitude capitalista. O capitalismo pressupõe a organização racional
do trabalho; implica que a maior parte do lucro não seja consumida, mas
sim poupada, a fim de permitir o desenvolvimento dos meios de
produção. Como afirmava Marx , em O Capital: “Acumulai, acumulai;
esta é a lei e o profetas.” De acordo com Max Weber, a ética protestante
proporciona uma explicação e uma justificativa deste comportamento
estranho, de que não exemplo nas sociedades não-ocidentais, a
busca do lucro máximo, não para gozar a vida, mas para a satisfação de
produzir cada vez mais.
118
O fiel da Mundial e da Universal são conduzidos pelo imediatismo. Mais importa
o “aqui”, o “agora”. A solução dos problemas é o que mais importa, pois o “céu” pode
esperar. A ética protestante, um dos fatores que influenciou o capitalismo
119
, pelo
contrário, estava preocupada com a certitudo salutis
120
. Por onde a disciplina da
predestinação fosse veiculada, havia uma exigência de um critério infalível para se
saber a filiação dos electi. Desde Beza como na grande massa de homens comuns a
pergunta que se fazia era : “serei eu um dos eleitos?”. A necessidade lógica calvinista
em relação à doutrina da predestinação, transformou aquele “Pai do Novo Testamento,
tão humano e compreensivo”
121
num “Deus transcendente, que está além do alcance da
compreensão humana, deixando o indivíduo num sentimento de solidão interior. O
homem está sozinho porque ninguém podia fazer nada por ele. Essa circunstância é o
118
ARON, Raymond. A Etapas do Pensamento sociológico.p. 482.
119
WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Martin Claret, 2006.p.75. Aqui Weber
revela sua intenção em sua obra dizendo : “[...] queremos apenas nos certificar se, e em que medida, as forças
religiosas tomaram parte na formação qualitativa e na expansão quantitativa desse espírito pelo mundo.”
120
Ibid., p. 86-87.
121
Ibid., p. 82.
58
resultado da eliminação da magia do mundo
122
. Está presente no processo histórico das
religiões, que começou com os antigos profetas hebreus, e paralelamente ao
pensamento científico helenístico. A influência desse processo chegou de tal forma no
puritanismo, que rejeitava no enterro de um ente querido qualquer sinal de cerimônia
religiosa no intuito de não haver nenhum incentivo a superstição ou confiança em forças
mágicas. Assim Weber explica:
[...] com as gidas doutrinas da absoluta transcendência de Deus e da
corrupção de qualquer coisa que pertencesse à carne, esse isolamento
interior do indivíduo contém, por um lado, o motivo da atitude
completamente negativa do puritanismo quanto a todos os elementos
sensoriais e emocionais na cultura e na religião, pois não tinham
utilidade para a salvação e promoviam ilusões sentimentais e
superstições idólatras.
123
Voltando para questão do sinal dos electi, a necessidade de formular um
sinal que os identicasse, precisava em primeiro lugar saber o significado do mundo
por que o mundo existe? Para o calvinismo, o mundo existe para glorificar a Deus.
[...] O mundo existe para servir à glorificação de Deus, e para esse
propósito. Os cristãos eleitos estão no mundo apenas para aumentar a
glória de Deus, obedecendo a Seus mandamentos com o melhor de
suas forças. Deus, porém, requer realizações sociais dos cristãos,
porque Ele quer que a vida social seja organizada conforme Seus
mandamentos, de acordo com tais propósitos. A atividade social dos
cristãos no mundo é apenas uma atividade in majorem gloria Dei.
124
Se o mundo existe para a glorificação de Deus, o sinal que identificaria os electi ,
estaria na conduta que prestasse glória a Deus. Somente o eleito é capaz de na
conduta ou nas obras reais aumentar a glória de Deus. O calvinista criou, então, sua
própria convicção de salvação: salvação pelo trabalho
125
. “O Deus do calvinismo exigia
de seus crentes não boas ações isoladas, mas uma vida de boas ações combinadas
122
WEBER, op. cit., p. 83.
123
Ibid., p. 83.
124
Ibid., p.85.
125
WEBER, op. cit., p. 90.
59
em um sistema unificado”
126
. O fim transcendental direcionado na vida do santo foi
racionalizada neste mundo, que foi dominado pela idéia de que a glória de Deus deve
ser aumentada sobre a terra. Esse pensamento leva à tendência ao ascetismo. A
diferença entre os ascetismo calvinista e o ascetismo medieval, é que este se
ausentava das atividades seculares, e o primeiro incentiva as ocupações seculares. O
fator positivo acrescentado pelo calvinismo foi comprovar a pelas atividades
seculares. Assim, o calvinismo fez uma racionalização metódica da conduta ética, fato
não realizado no luteranismo. O ascetismo calvinista
127
é ativo e agressivo no
transformar o mundo para glória de Deus, e convencer os condenados do
reconhecimento de Sua lei. Quer manter , com todo rigor, uma comunidade cristã. Para
atingir esse objetivo, racionaliza e disciplina toda ação numa teoria ética e uma
ordenação eclesiástica. O ascetismo calvinista persegue a estimação das coisas desse
mundo para ajudar no progresso e prosperidade da comunidade cristã. Troeltsch faz
uma comparação interessante entre o ascetismo luterano e o ascetismo calvinista:
[...] O luteranismo tolera o mundo em cruz, dor e martírio; o calvinismo o
sobrepuja para glória de Deus em um trabalho sem trégua, em razão da
autodisciplina que inculca o trabalho e em razão também da
prosperidade da comunidade cristã que se alcança com ele. Pois ambas
formas de ascetismo colaboram no fundo, que de diferente maneira,
o ascetismo da rigorosa de salvação; o luterano evita o naturalismo e
a confiança nas forças e incitações naturais, o calvinista evita o
endeusamento da criatura implícito em toda forma de amar o mundo por
ele mesmo. Ambos se entregam à finalidade divina e ultramundana do
mundo, um padecendo, e o outro atuando.
128
Ao introduzirmos o pensamento da ética protestante, no caso o ascetismo
calvinista e luterano, podemos identificar que, tanto na Igreja Mundial do Poder de Deus
como na Universal do Reino de Deus, o caminho ético é divergente. No primeiro, se
126
Ibid., p. 91.
127
TROELTSCH, E. El protestantismo y el mundo moderno. México: Fondo de Cultura Económica, 1983.p.49
128
TROELTSCH,op. cit.,p. 50.
60
associa ao capitalismo na obtenção do máximo lucro, mas não goza a vida. No
segundo, busca o lucro e goza a vida. Podemos deduzir daí, que a Mundial e a
Universal de alguma forma colaboram com o espírito capitalista. Como sua ética é
dominada pelo imediatismo, a única forma de colaboração que podemos identificar é o
consumo. Pois, se os adeptos de ambas igrejas buscam uma conquista transfigurada
em carros, roupas, viagens, dinheiro, conforto, saúde, casa, etc., podemos afirmar que
a Mundial e a Universal colaboram com o espírito do capitalismo na forma de consumo.
Weber continua certo quando “quis demonstrar [...] que a atitude econômica pode ser
orientada pelo sistema de crenças, tanto quanto o sistema de crenças pode ser
comandado, num dado momento, pelo sistema econômico.”
129
A Igreja Mundial do Poder de Deus em sua liturgia se converge à Universal, pois
seus cultos são alegres, as palmas marcam o ritmo das músicas, há uma
espontaneidade nos gestos e na voz dos adeptos. Os gestos tem uma marca indelével
nas cerimônias como colocar a rosa na cabeça, ou mesmo pegar uma receita médica e
encostar no corpo do “apóstolo”, são gestos que se transformam numa “linguagem não-
verbalizada [...]. As afirmações doutrinárias são demonstradas através dos símbolos
que o povo vai construindo.”
130
Rolim
131
explica que a linguagem não verbalizada é um
disfarce inconsciente. São palavras truncadas, gestos soltos, na tonalidade das vozes,
que mobilizam as energias sufocadas das camadas pobres.
A linguagem não verbalizada aparece com uma dupla função: a de
busca de proteção, no sagrado, pela súplica, em que os movimentos e
os gestos atuam na forma de terapia; e a de protesto, no caso dos
assistentes mais pobres, à situação de pobreza, como se os gestos mais
soltos e os gritos quisessem exprimir o desejo de libertação.
132
129
RAYMOND, Aron. As etapas do pensamento sociológico.p. 484.
130
LEITE FILHO, Tácito da Gama. Seitas Neopentecostais: seitas do nosso tempo.p.65.
131
ROLIM, Francisco Cartaxo.O que é Pentecostalismo. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense,
1987.p.45-46.
132
ROLIM, op. cit., p. 46.
61
A energia que está sufocada, também se expressa em palavra que responde
imediatamente às aflições do cotidiano:
O burburinho cresce, os alto-falantes chegam aos últimos assentos
como eco de uma trovoada. Talvez o visitante ao convertido [sic] não
tivesse nenhuma voz, mas agora tem muitas, canta, geme, grita,
gesticula, fala em línguas num êxtase que apenas pode estar
começando. No ritmo alucinante, a palavra é multiplicada por centenas,
milhares de bocas. O vocabulário é pobre, com freqüência, a gramática
é incorreta, mas a força da palavra está na resposta imediata às aflições
do cotidiano: saúde, prosperidade, trabalho, solução de problemas
familiares; enfim, libertação do vício, do pecado; [...] uma vida exemplar,
o domínio sobre o demônio, a certeza da salvação total.
133
A Igreja Mundial do Poder de Deus se converge à Universal em relação ao uso
da mídia. Na primeira onda do pentecostalismo, usou-se o evangelismo pessoal, a
literatura ou distribuição de folhetos, como também a utilização de reuniões ao ar livre
usando o proselitismo. Entretanto, na segunda onda, além de usar esses métodos,
passou a usar o rádio. Na terceira onda, além de usar todos esses métodos, investiu
agressivamente no televangelismo. Arlindo Pereira Dias assim comenta:
A década de 1990, no Brasil, está marcada por uma disputa acirrada e
proselitismo entre denominações cristãs pela mídia televisiva. Acelera-
se a luta entre igrejas pela concessão de canais de televisão e
emissoras de rádio. Dezenas delas alugam espaços nos canais
convencionais abertos com o intuito de mostrarem sua cara. Em termos
de opção religiosa, os canais pagos exibem programas para todos os
gostos. Vivemos a era da “igreja eletrônica” [...]. A TV comercial foi-se
transformando num campo fértil para a expansão da mídia religiosa [...].
As iniciativas religiosas o conseguem fugir de seu aspecto
institucional, que, automaticamente, as situam no âmbito empresarial,
transformando a fé em mercadoria.
134
133
CESAR, Waldo e SHAULL, Richard. Pentecostalismo e futuro das igrejas cristãs. Petrópolis: Vozes; São
Leopoldo: Sinodal, 1999.p.74-75.
134
DIAS, Arlindo Pereira. Domingão do cristão: Estratégias de comunicação da Igreja Católica. São Paulo:
Salesiana, 2001.p.22.
62
Paulo Romeiro comenta sobre o espaço na mídia ocupada pelo
neopentecostalismo:
A disputa pelo espaço na mídia entre as igrejas que compõem o
movimento neopentecostal está longe de terminar. Ao contrário, a
tendência é crescer cada vez mais, alimentada pela tirania do mercado e
pela pressões financeiras dessas instituições, algo que exige um
marketing cada vez mais arrojado na busca por novos adeptos. Deles
e de um número muito grande deles depende o sucesso de qualquer
empreendimento religioso.
135
Divergências
Mediante o que foi exposto, a Igreja Mundial do Poder de Deus em muito se
converge à Universal. Por mais que o “apóstolo” tente demonstrar que a Mundial é
diferente da Universal, elas mais se aproximam do que se afastam.
Como foi dito no início, em dezembro de 2006, Valdemiro Santiago se auto
titulou “apóstolo”. Esse título inexiste na Universal. O título mais alto na hierarquia é o
de “bispo”. duas novidades que diferenciam a Mundial da Universal, o primeiro é o
título de “apóstolo” usado somente por Valdemiro Santiago e também o título de “bispa”
usado por sua esposa Franciléa. Esse título também inexiste na Universal. Não existem
mulheres nomeadas como “bispas”. Os “bispos” são todos do sexo masculino. Nessa
questão, podemos afirmar que a Igreja Mundial do Poder de Deus se afasta da
Universal quando usa o título de “apóstolo” e “bispa”. O interessante é que na Igreja
Mundial do Poder de Deus apenas um “apóstolo” e uma “bispa”, títulos que somente
Valdemiro e sua esposa usam. Esse fato demonstra que o título é usado para fazer
uma distinção hierarquica, ou seja, Valdemiro é o chefe supremo da igreja, e está acima
135
ROMEIRO, Paulo.Decepcionado com a graça: esperanças e frustrações no Brasil neopentecostal.p.83.
63
de todos os outros bispos. Como dissidência, Valdemiro inovou, demonstrando assim o
poder de seu carisma na Igreja Mundial do Poder de Deus.
Sobre a origem da palavra “apóstolo”, E. von Eicken e H. Lindner
136
, mencionam
que no grego clássico a palavra αποστλλω (apostello), usada desde Sófocles em
diante, é um composto de stello “colocar”, “aprontar”, e a preposição apo, “de”, “para
longe”, “para trás” significa “enviar” (tanto para pessoas como coisas), “mandar
embora”, “escorraçar”, “enviar para longe”. Quando se trata de uma delegação para um
propósito especial, e em muitas vezes significa a causa de um envio. Foi na filosofia
estóica popular que a idéia de autoridade que representava seu mestre passou a ter um
significado religioso. Com isso, apostello passou a significar uma autorização divina. A
palavra apostolos, derivada de apostello, foi encontrada também na linguagem
marítima, a qual significava um navio de carga ou a frota enviada (Demócrito).
Posteriormente passou a significar o comandante de uma expedição naval, ou um
grupo de colonizadores enviados para além-mar. Em duas passagens de Heródoto, a
palavra apostolos significa um enviado ou emissário como pessoa individual. As idéias
mais comuns são: uma comissão expressa; ser enviado para além-mar. Provavelmente,
mais tarde nos círculos gnósticos que αποστολοζ (apostolos, “enviado, embaixador,
apóstolo) veio a transmitir o conceito oriental de emissários como mediadores da
revelação divina. Esse conceito podia ser empregado no singular para um salvador
celestial, ou no plural para representar certo número de pessoas salvadoras ou
“homens espirituais”. No Novo Testamento a palavra apostello é empregada 131 vezes,
e dos 119 casos se acham distribuídos de modo mais ou menos igual entre os
Evangelhos e Atos. No evangelho de Lucas a forma εξαποστελλω ( exapostello,
136
BROWN, Colin (editor geral). Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. Trad. Gordon
Chown. V.1. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1984.p.234-236.
64
“enviar para fora” ), é usada 11 vezes das 13 ocorrências de seus escritos. Em Atos
dos Apóstolos, os 7 exemplos usados tem o mesmo significado que apostello. Outra
palavra grega usada é πεµπω (pempo, “enviar”), que ocorre como sinônimo,
principalmente no evangelho de João, 32 vezes, mas ocorre em Lucas e Atos (10 ou 11
vezes).
Toda essa explanação sobre a origem do oficio de apóstolo foi exposto até
aqui para compreendermos o sentido desse título no ministério de Valdemiro Santiago
na Igreja Mundial do Poder de Deus. Na origem o título de apóstolo era direcionado
para aqueles que acompanharam o Mestre (Cristo) e que naturalmente eram “os
depositários da verdade da nova revelação”
137
. A palavra “apóstolo” é “uma
transliteração do vocábulo grego apóstolos, i.e., um ‘embaixador’; ‘mensageiro’;
‘enviado extraordinário’; ‘pessoa que representa aquele que o enviou’[...].”
138
Os
apóstolos, na igreja primitiva, eram um veículo de revelação de Deus e por isso serão
alicerce da Igreja
139
.
O título de “apóstolo” usado por Valdemiro Santiago na Igreja Mundial do Poder
de Deus não está em sintonia com aquilo que foi exposto em relação à origem
neotestamentária. Ele não foi uma testemunha do Jesus histórico e nem participou da
revelação neotestamentária. Por outro lado, nos ofícios, seja nos carismáticos ou
adminitrativos, haviam outras pessoas que exerciam o mesmo ofício, ou seja, não havia
exclusividade no título. Se apóstolos, os Doze; se bispo, serão vários
espalhados pelas igrejas. O título de apóstolo foi usado como ofício somente àqueles
que participaram da vida do Jesus histórico, principalmente na ressurreição. Portanto,
137
CRABTREE, A.R. Introdução ao Novo Testamento, Rio: Casa Publicadora Batista, 1963.p.43.
138
BOYER, Orlando. Pequena enciclopédia bíblica. São Paulo: Ed. Vida, 2006.p.73.
139
LADD, George Eldon.Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: Juerp, 1985.p.497.
65
no sentido neotestamentário, o ofício de apóstolo se extinguiu. Então fica a pergunta:
Por que Valdemiro Santiago resolveu adotar esse título? Sabemos que outros líderes
de ministérios neopentecostais adotaram, i.e., é comum acontecer no movimento
neopentecostal. O que nos chama à atenção, é que, sendo a Igreja Mundial do Poder
de Deus uma dissidência da Universal do Reino de Deus, igreja que adotou o modelo
neotestamentário do episcopado, por que razão Valdomiro Santiago não imitou Edir
Macedo? Até aqui, vimos que na Igreja Mundial do Poder de Deus mais
convergências do que divergências em relação à Igreja Universal do Reino de Deus.
Uma hipótese que lançamos, seria que Valdemiro Santiago optou por assumir o título
de apóstolo por duas razões: A primeira, por querer ser diferente da Universal; a
segunda razão, e talvez a principal, é que Valdomiro Santiago se auto-intitulou por
querer manter sobre sua pessoa o carisma, e uma autoridade espiritual que sobrepuja
os outros líderes de sua igreja, dando-lhe o direito de ser líder inquestionável, tanto na
área do sagrado como na administrativa. A centralidade sobre sua pessoa, talvez torne
o governo de sua igreja mais fácil, com ausência de oposição, praticando assim um
certo caudilhismo. O problema que fica é, na ausência de Valdemiro Santiago, quem
herdará seu império? Quem terá o carisma suficiente para continuar a jornada da Igreja
Mundial do Poder de Deus? Essa questão discutiremos no capítulo IV, onde
discorreremos sobre a questão da dominação carismática, representada pela Igreja
Mundial do Poder de Deus.
O carisma sobre Valdemiro Santiago e sua igreja é o fator diferencial entre as
igrejas Mundial e Universal. Olhando o carisma , pela perspectiva weberiana, como
influência no processo fenomenológico religioso, e sua maneira de desdobrar-se, será
preciso ver agora como a Universal deixou de ser carisma. A compreensão desse
66
processo nos dará maior visão lógica em revivenciar o processo dialético
fenomenológico que representa a Igreja Mundial do Poder de Deus em relação à Igreja
Universal do Reino de Deus. O carisma , como processo dialético religioso, surge no
meio do tipo religioso burocrático, como profecia, como nova revelação, que vai
contestar o que está dado. No próximo capítulo trataremos em como a Universal do
Reino de Deus passou a representar burocracia, no sentido weberiano, dando assim
razões para o surgimento da Igreja Mundial do Poder de Deus, que vai representar a
profecia.
67
CAPÍTULO 3
A IURD COMO REPRESENTAÇÃO DA BUROCRACIA: DOMINAÇÃO RACIONAL
A burocracia se caracteriza por um profundo
desprezo por toda religiosidade irracional, o que
se alia à consciência de que ela pode ser
utilizada como meio de domesticação
Max Weber
140
O neopentecostalismo brasileiro como um fenômeno religioso é caracterizado
por um movimento dialético. O “espírito” que o move é a contestação. Esse “espírito”
surge no meio da religião devido a insatisfação quanto à manipulação do sagrado. É
quando o carisma do líder não tem mais validade ou surgem outras “revelações
ministeriais” que dão mais conta das necessidades dos fiéis. Esse processo gera
conflito de liderança causando assim os “rachas” no mundo neopentecostal. A igreja
neopentencostal surge assim da constestação profética.
[...] o profeta contesta, denuncia: faz parte de seu papel perseguir e
excluir depois de ele próprio ter-se excluído do grupo que agora
combate. Por outro lado, quer reunir seus discípulos e fazer deles, a
despeito de rivalidades ou conflitos, uma falange mais unida que os
cinco dedos da mão.
141
Da constestação profética, devido ao movimento dialético, passa para o segundo
estágio que é o burocrático. Pierre Bourdieu comenta sobre essa questão:
140
WEBER, Max. Wirtschaft und Gesellschaft. Colonia-Berlim: Kiepenheuer und Witsch, 1964, v. II, p.374.
141
BOUDON, Raymond e BOURRICAUD, François. Dicionário crítico de sociologia. São Paulo: Ática, 1993. Os
movimentos de inspiração religiosa são movimentos sociais, e a história de todo movimento social inicia-se com a
fase da mobilização. O primeiro recurso do movimento é o carisma do líder, e cita como exemplo Ghandi, na Índia,
que parece com os movimentos proféticos ao longo da história.p.372-380.
68
Produto da institucionalização e da burocratização da seita profética
(com todos os efeitos correlatos de banalização”), a Igreja apresenta
inúmeras características de uma burocracia (delimitação explícita das
áreas de competência e hierarquização regulamentada das funções,
com a racionalização correlata das remunerações, das “nomeações”,
das “promoções” e das “carreiras”, codificação das regras que regem a
atividade profissional e a vida extraprofissional, racionalização dos
instrumentos de trabalho, como o dogma e a liturgia, e da formação
profissional etc,) e opõe-se objetivamente à seita assim como a
organização ordinária (banal e banalizante) opõe-se à ação
extraordinária de constestação da ordem ordinária.
Toda seita que alcança êxito tende a tornar-se Igreja, depositária e
guardiã de uma ortodoxia, identificada com as suas hierarquias e seus
dogmas, e por essa razão, fadada a suscitar uma nova reforma.
[...] A força de que dispõe o profeta (empresário independente de
salvação) cuja pretensão consiste em produzir e distribuir bens de
salvação de um tipo novo e propensos a desvalorizar os antigos tarefa
para qual conta exclusivamente com sua “pessoa” como única caução
ou garantia na falta de qualquer capital inicial -, depende da aptidão de
seu discurso e de sua prática para mobilizar os interesses religiosos
virtualmente heréticos de grupos ou classes determinados de leigos,
graças ao efeito de consagração que o mero fato da simbolização e da
explicitação exerce. De outro lado, tal força depende também do grau
em que contribui para a subversão da ordem simbólica vigente (isto é,
sacerdotal) e para a reordenação simbólica da subversão desta ordem,
ou seja, para a dessacralização do sagrado (isto é, do arbitrário
“naturalizado”) e para a sacralização do sacrilégio ( isto é, da
transgressão revolucionária).
142
O tipo ideal
O tipo ideal, no conceito weberiano, significa um método de compreensão do
fenômeno religioso, “[...] o tipo ideal é, acima de tudo, uma tentativa de apreender os
indivíduos históricos ou os seus diversos elementos em conceitos genéticos.”
143
O tipo
ideal não se manifesta em sua pureza conceitual. Ele é construído numa forma
esporádica. Weber explica a razão do uso desse método:
[...] Ora, os conceitos se tornam, então, tipos ideais, isto é, não se
manifestam na sua plena pureza conceitual, ou apenas de forma
142
BOURDIEU, Pierre.A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2001.p.59-60.
143
WEBER, Max. Metodologia das Ciências Sociais. Parte I. São Paulo: Cortez; Campinas: Ed. da Universidade
Estadual de Campinas, 2001.p.140.
69
esporádica o fazem. Aqui, como em qualquer outro campo, qualquer
conceito que não seja puramente classificatório nos afasta da realidade.
Mas a natureza discursiva do nosso conhecimento, a circunstância de
apenas captarmos a realidade através de uma cadeia de transformações
na ordem da representação, postula esse tipo de taquigrafia
conceitual.
144
O tipo ideal não é uma avaliação apreciadora que procura construir
perfeitamente o significado do fenômeno, mas possui “um caráter puramente lógico”
145
.
É uma construção intelectual que tem como propósito a medição e a caracterização
sistemática das relações individuais, que possuem um significado da sua
especificidade
146
. O tipo ideal usará a realidade empírico-histórica como material. Weber
alerta para o seguinte perigo:
[...] No interesse da demonstração clara do tipo ideal ou do
desenvolvimento de tipo ideal, ela deverá ser ilustrada mediante um
material da realidade empírico-histórica. O perigo deste procedimento,
legítimo em si, reside em que o saber histórico aparece como servidor
da teoria, em vez de suceder o contrário.
147
Os conceitos construídos no tipo ideal o são o fim em si mesmo, mas meios
para uma compreensão significativa em relação a pontos de vista individuais. A
validade objetiva do saber empírico está na ordenação da realidade em categorias
subjetivas.
[...] A validade objetiva de todo saber empírico baseia-se única e
exclusivamente na ordenação da realidade dada segundo categorias
que são subjetivas, no sentido específico de representarem o
pressuposto de que é valiosa, aquela verdade que o conhecimento
empírico nos pode proporcionar.
148
144
WEBER, op. cit., p. 140.
145
Ibid., p. 144.
146
Ibid., p. 144.
147
Ibid., p. 146.
148
WEBER, op. cit., p. 152.
70
Após compreendermos que o tipo ideal é uma construção conceitual lógica do
empírico-histórico de um fenômeno dado, é preciso saber os tipos religiosos propostos
por Weber que nos ajudarão entender o tipo burocrático representado na Igreja
Universal do Reino de Deus.
Os tipos religiosos
149
são identificados como: o feiticeiro, o sacerdote e o profeta.
O feiticeiro age sobre os demônios por meios mágicos, e sua atividade é descontínua,
sua profissão é livre e possui carisma. O sacerdote é um funcionário do culto para
louvar a divindade, cuja liderança está sobre um agrupamento socializado. Sua
atividade é contínua e possui uma qualificação intelectual. O profeta possui uma
vocação pessoal e é guiado por uma revelação pessoal, possui carisma e sua atividade
é gratuita.
O exercício prático dos tipos religiosos trazem no seu bojo a necessidade de
dominação. Essa idéia envolve a vontade de obediência. Sobre o conceito de
dominação Weber assim explica:
Deve-se entender por ‘dominação’, [...] a probabilidade de encontrar
obediência dentro de um grupo determinado para mandatos específicos
(ou para toda sorte de mandatos). [...] Um determinado grau mínimo de
vontade de obediência, ou seja, de interesse (externo ou interno) em
obedecer, é essencial a toda relação autêntica de autoridade.
Não consiste, portanto, em toda espécie de probabilidade de exercer
‘poder’ ou ‘influência” sobre os outros homens. No caso concreto, esta
dominação (“autoridade”), no sentido indicado, pode descansar nos mais
diversos motivos de submissão: desde o hábito inconsciente até o que
são considerados puramente racionais segundo fins determinados.
150
Toda dominação requer um quadro administrativo, isso ocorre nem sempre de
modo absoluto. Esse quadro tem obediência pelo costume, pelo lado afetivo, como
também pelo interesse material ou pelos ideais. É a natureza dos motivos que
149
FREUD, Julien. Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1987.p142-146.
150
CASTRO, Anna Maria de; DIAS, Edmundo F. Introdução ao pensamento sociológico. Rio de Janeiro: Eldorado
Tijuca, 1976.p.137.
71
determinará o tipo de dominação. Se o motivo for “puramente” material ou racional, a
relação entre o dominador e dominado se relativamente frágil. O fundamento da
dominação o qual levará alguém a obediência está na “crença na legimidade
151
. Os
motivos puramente materiais, afetivos ou racionais, não satisfazem a dominação. Toda
dominação desperta e fomenta a crença em sua legitimidade. A classe de ligitimidade
que se pretende que definará o tipo de obediência, o quadro administrativo e o tipo de
dominação.
Tipos de dominação
Segundo Weber
152
três tipos puros de dominação: o de caráter racional ou
legal, o de caráter tradicional e o de caráter carismático. O fundamento de sua
legitimidade consiste no seguinte: na primeira, a crença de sua legitimidade está na
legalidade de ordenações que são instituídas com base no direito de mando dos que
são chamados a exercer a autoridade autoridade legal. A autoridade legal se
caracteriza pela obediência às ordenações impessoais e objetivas, às pessoas por elas
designadas. Na Segunda, a crença repousa sobre a crença quotidiana na santidade
das tradições que vigoram desde os tempos antigos e na legitimidade dos que são
designados por essa tradição para exercer autoridade autoridade tradicional. A
obediência à pessoa foi designada pela tradição por motivos de piedade (pietas), na
esfera do que é costumeiro. E na terceira repousa na atititude extraquotidiana em
relação à santidade, ou ao heroísmo ou ao exemplo de alguma pessoa, e às ordens
criadas com base na revelação autoridade carismática. A autoridade carismática é
151
Ibid., p. 138.
152
Ibid., p. 139.
72
marcada pela obediência a um caudilho por confiança pessoal na revelação, heroísmo
ou exemplaridade no âmbito da em seu carisma. Sobre essa última, iremos discorrer
com mais detalhes no quarto capítulo, pois é o papel representado pela Igreja Mundial
do Poder de Deus.
A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e sua dominação burocrática
A Igreja Universal do Reino de Deus em seu início não foi burocrática quanto a
sua dominação eclesiástica e administrativa. Ela surge num papel profético de
contestação as suas lideranças, no caso, a Igreja de Nova Vida. Edir Macedo que se
utilizava de “métodos revolucionários de atrair fiéis, como distribuição de sal
milagroso”
153
vai abrir sua própria igreja. Ricardo Mariano assim comenta sobre a
Universal:
Embora nascida de uma “costela” de Nova Vida, a Igreja Universal é seu
oposto em matéria de expansão denominacional e freqüência nas
manifestações de poder divino e demoníaco na vida cotidiana dos fiéis.
Inaugurando um templo por dia em média, a Universal constitui o grande
fenômeno atual do pentecostalismo nacional. Seu crescimento,
sobretudo a partir de meados dos anos 80, quando começa a adquirir as
primeiras rádios, tem sido impressionante.
154
O carisma, que tem como caráter a profecia contestadora, precisava ser definida.
O grupo que começou a Universal juntamente com Edir Macedo formado por Carlos
Alberto Rodrigues, R.R. Soares (cunhado de Macedo, que mais tarde rompeu com ele,
fundando a Igreja da Graça), o reverendo De Paula ( se desentendeu com Macedo e
saiu), o pastor Joacir ( também saiu), o pastor Benedito ( saiu), e o contador Naylton
Nery – foi desfeito. Com a dissolução do grupo, Macedo vai ter a liderança absoluta.
153
JUSTINO, Mário.Nos bastidores do Reino: a vida secreta na Igreja Universal do Reino de Deus.p.57.
154
MARIANO, op. cit.,p.53.
73
Com o crescimento imprevisível do bolo, e com cada um querendo o
melhor fatia, começou uma luta interna pelo poder que terminou com a
dissolução do grupo, o que deu a Macedo a liderança total, daquilo que
viria a ser um milionário aglomerado de empresas que, além da fé,
atuaria em ramos tão diversos entre si quanto redes de comunicação e
madeireiras, construtora e banco.
155
Segundo Weber, o “declínio do carisma” é uma tendência histórica:
É o destino do carisma, sempre que este penetra nas instituições
permanentes de uma comunidade, dar lugar aos poderes da tradição e
da socialização racional. Esse declínio do carisma indica, geralmente, a
diminuição na importância da ação individual [...].
156
Uma manchete da Folha Universal
157
dizia o seguinte: “A Igreja (IURD) está
acima do Bispo Macedo.” Essa manchete demonstra claramente que o carisma está
sendo lançado sobre a instituição. Podemos então observar que, “o declínio do
carisma” está evidente na Igreja Universal do Reino de Deus. Com a institucionalzação
do movimento surge a burocracia. Por mais que se lute contra esse estágio, mais cedo
ou mais tarde, a burocracia se estabelecerá por causa da racionalização do sagrado e
do rito.
Ainda sobre a Igreja, o mesmo pastor afirmou que a ‘Igreja Universal é
um grande movimento, que não quer se tornar uma instituição. Ela vai
lutar sempre para isso, pelo menos enquanto o bispo Macedo viver’.
Para aquele pastor, o sonho de Macedo é manter a Igreja na categoria
de movimento, desestimulando dessa forma, o aparecimento de uma
burocracia que venha gerar problemas. Por outro lado, ainda segundo
essa fonte, o grande temor do bispo Macedo seria a burocratização,
vista como uma das principais causas da derrocada das demais
organizações religiosas.
Porém, gostem ou não seus fundadores, todo movimento religioso,
historicamente se defronta com o dilema: institucionalizar ou
desaparecer. A passagem de movimento para organização é marcada
por um processo de divisão do trabalho religioso, e aparecimento de
aparatos de intermediação entre o empreendedor e os demais
seguidores. O surgimento dessa situação é apenas uma questão de
155
JUSTINO, op. cit., p. 57-58.
156
From Max Weber. Essays in Sociology. Nova Iorque, Oxford University Press, 1947.p.253.
157
FOLHA UNIVERSAL de 31.12.95.
74
tempo. Assim, pequenos e dinâmicos movimentos precedem o posterior
advento de complexas organizações religiosas.
158
Esse processo pode ser evidenciado nas palavras de rio Justino quando era
pastor da Universal e participava das reuniões de pastores. Ele relata o seguinte:
As reuniões de pastores, que nos anos anteriores continham leituras de
salmos, cânticos espirituais e longas horas de oração, assumiam agora
as características de reunião do conselho administrativo de mega-
empresa. Os assuntos do dia eram compra e venda de imóveis ao redor
do mundo, as cotações do ouro e do dólar ou os movimentos da bolsa
de São Paulo e Londres. O único Evangelho pregado nesses encontros
era aquele segundo Lilian Wite Fibe.
159
A “rotinização do carisma” leva o carisma do líder a ser transferido para a
organização.
A ‘rotinização do carisma’ implica na transferência do carisma do
empreendedor inicial para a organização. Na Igreja Universal tal
precesso se iniciou prematuramente e se desenvolve com muita rapidez,
como tudo na história dessa Igreja. Por isso, após uma fase de
crescimento acelerado, em 1993 houve uma ordenação de novos bispos
e a divisão do País em regiões episcopais. A retória da Igreja enfatizava
o crescimento explosivo como causa primordial para as providências
administrativas então tomadas (Folha Universal, 26.9.93).
Na Igreja Univesal, a passagem de movimento para organização
religiosa de sucesso, provocou uma luta pela centralização do poder nas
mãos de um líder. O primeiro round terminou com a saída, três anos
após a fundação da Igreja, de Romildo R. Soares, que dizia discordar da
forma autoritária, que seu cunhado Macedo queria imprimir à
instituição.
160
A organização do movimento é burocracia. A divisão de responsabilidade, a
cooperação de diversos indivíduos para que a organização ou instituição funcione, é
burocracia.
[...] No sentido weberiano, a burocracia é definida por alguns traços
estruturais: é a organização permanente da cooperação entre
numerosos indivíduos, na qual cada um exerce uma função
158
CAMPOS, Leonildo Silveira. Teatro, templo e mercado: organização e marketing de um empreendimento
neopentecostal. 1997,p.380.
159
JUSTINO, op. cit., p.75.
160
CAMPOS, op. cit., p. 391.
75
especializada. O burocrata exerce uma profissão separada da sua vida
familiar, afastada, por assim dizer, da sua individualidade. Quando
lidamos com um funcionário do correio, escondido atrás do balcão, não
nos relacionamos com uma pessoa, mas com um executante
anônimo.
161
A natureza da burocracia está configurada na impessoalidade
162
, pois todos
envolvidos conhecem as leis, e respondem em relação às ordens abstratas de uma
regulamentação estrita. Também faz parte de sua característica uma remuneração
conforme as normas. Esse aspecto torna necessário uma burocracia com recursos
próprios.
A dominação racional ou legal está ligada a dominação burocrática. Assim
Weber explica:
A dominação “legal” em virtude de ser estatuto. O seu tipo mais puro é
indiscutivelmente a denominação burocrática. A sua idéia básica é a
seguinte: qualquer direito pode ser criado e modificado mediante um
estatuto sancionado corretamente no que diz respeito à sua forma. A
associação que domina é eleita ou nomeada, sendo ela própria e todas
as suas partes algo como “empresas”. Denomina-se “pessoal de
serviço” uma empresa ou parte dela, heteronôma e heterocéfala ( isto é,
cujos regulamentos e órgãos executivos pela sua participação em uma
associação mais ampla, portanto, não autônoma e nem autocéfala). O
quadro administrativo consiste em funcionários nomeados pelo dono, e
os subordinados são membros da associação ( “cidadãos”,
“camaradas”).
Obedece-se à pessoa não em virtude do seu direito próprio, mas à regra
estatuída, que estabelece ao mesmo tempo quem e em que medida se
deve obedecer. Aquele que manda também obedece a uma regra no
momento em que existe uma ordem: obedece à “lei” ou a um
“regulamento” de uma norma formalmente abstrata. O tipo daquele que
manda é o “superior”, cujo direito de mando esta legitimado pelas regras
estatuídas no âmbito de uma competência concreta cuja legitimação e
especialização se baseiam na utilidade objetiva e nas exigências
profissionais estipuladas para a atividade do funcionário.
163
161
ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 2000.p.477.
162
Ibid., p.477.
163
WEBER, Max. Metodologia das Ciências Sociais.Parte 2, p. 349-350.
76
O ideal da dominação burocrática é sine ira et studio
164
, em outras palavras, sem
uma influência de motivos pessoais ou sentimentos de qualquer espécie, com total
ausência do livre arbítrio ou capricho, e “sem consideração à pessoa”. Sua maneira de
agir será formal, segundo regras racionais, ou “segundo pontos de vista de
conveniência ‘objetiva’. A obediência é estabelecida numa hierarquia de cargos, onde
os subordinados inferiores estão sujeitos aos superiores. O funcionamento de toda
organização está embasado na disciplina. Entretanto, Weber
165
nos alerta que a
burocracia é o tipo tecnicamente mais puro da dominação legal, contudo, nenhuma
dominação é exclusivamente burocrática, e é difícil encontrar um quadro administrativo
que seja puramente burocrático, pois a burocracia não é o único tipo de dominação
legal. O processo de burocratização no fenômeno religioso, que é a prática sacerdotal e
a sistematização que os sacerdotes impõem à mensagem original, é resultado de
forças externas que assumem pesos desiguais segundo a conjuntura histórica, e com
as quais o corpo sacerdotal deve contar. São elas”:
a) as demandas dos leigos ( e em particular, o tradicionalismo laico e o
intelectualismo laico); b) a concorrência do profeta e do feiticeiro; c)
tendências internas ligadas à posição do corpo sacerdotal na divisão do
trabalho religioso e à estrutura particular da Igreja como instituição
permanente capaz de reivindicar com maior ou menor sucesso, o
monopólio da administração dos bens de salvação (extra ecclesiam
nulla salus), e como burocracia de funcionários aspirando ao “monopólio
da coerção hierocrática legítima” e encarregados de organizar, em
lugares e momentos determinados, o culto público do deus, isto é, a
prece e o sacrifício (em oposição à coerção mágica) e , ao mesmo
tempo, a prédica e a cura das almas.
166
A sistematização e a banalização são fundamentais para o funcionamento de
uma burocracia.
164
Ibid., p. 350.
165
Ibid., p. 351.
166
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas, p. 94-95.
77
A “sistematização casuístico-racional” e a “banalização” constituem as
condições fundamentais do funcionamento de uma burocracia da
manipulação dos bens de salvação, no sentido de que permitem a
quaisquer agentes (isto é, permutáveis) o exercício de maneira contínua
da atividade secerdotal, fornecendo-lhes os instrumentos práticos
escritos canônicos, breviários, sermonários, catecismos etc. que lhes
são indispensáveis para o cumprimento de sua função a um menor
custo em carisma ( para eles mesmos) e a um risco menor (para a
instituição), sobretudo quando lhes é necessário “tomar posição em
relação a problemas que não foram resolvidos pela revelação”.
167
Para Campos, os tipos ideais de dominação na Igreja Universal tem uma
característica pendular, assim ele explana:
Se estabelecermos uma hierarquia de tipos ideais de dominação
diríamos que, na Igreja Universal, prevalece uma autoridade pendular
entre os três polos. Às vezes, prevalece em primeiro lugar a autoridade
carismática, depois, a tradicional e finalmente, um pouco de autoridade
burocrática. A autoridade está centralizada na pessoa de Edir Macedo,
cuja legitimidade repousa numa escolha atribuída diretamente a Deus.
168
A institucionalização decorrente do crescimento do empreendimento, resulta no
surgimento de um corpo administrativo, a necessidade de delegação de poderes e a
“transformação do carisma”
169
. Mais cedo ou mais tarde, surgirá um corpo administrativo
de tendência aristocrática, que sempre usufruiu do carisma do fundador, e estabelecerá
uma tradição de uso posterior, que reivindicará maiores poderes. O modelo
administrativo de mando, como se fosse um pêndulo, sai do tipo carismático para uma
aproximação aos modelos de dominação tradicional ou racional-legal.
A Igreja Universal do Reino de Deus, seguindo a metodologia weberiana, se
tornou “uma associação hierocrática compulsória”, resultado de sua “organização
contínua”, cuja autoridade está nas mãos de Edir Macedo, autoridade “vinda de Deus”,
167
Ibid., p. 98.
168
CAMPOS, op. cit., p.393.
169
CAMPOS, op. cit., p.393.
78
como também nas mãos de alguns, aqueles que usufruem do carisma do líder,
matendo autoritariamente o monopólio dessa coerção
170
.
Naqueles dias, quando Edir Macedo fazia suas primeiras reuniões num coreto do
Jardim do Méier, no Rio de Janeiro, e não tinha nem condições para pagar o aluguel,
ainda era movido pelo profético. Ao sair da igreja Vida Nova, em 1975, Macedo estava
contestando e decide fundar sua igreja. Com uma pregação caracterizada contra o culto
afro e ênfase na prática do exorcismo e com um discurso apelativo com grande
criatividade, principalmente em relação ao dinheiro, a IURD cresceu rapidamente em
todo o território nacional. Esse crescimento fez surgir a necessidade de uma
organização, e para isso, a IURD se burocratizou. Ao burocratizar-se, a IURD deixou ou
melhor , começou a se afastar do profético e da dominação carismática. Toda
burocratização exige uma organização, por isso, a IURD quando passou a burocratizar-
se, tornou-se uma empresa.
Quando eu era um simples fiel, não imaginava o que se passava nos
bastidores, depois que a cortina cai. O atos de alguns pastores logo me
levaram a descobrir que a Igreja Universal nada mais era do que uma
empresa com fins lucrativos como qualquer outra na ciranda financeira.
A única diferença era o produto vendido: sal que tira vício, lençinhos
molhados no “vinho curativo” o conhecido K-Suco - , água da Embasa,
que dizíamos ter vinda do Rio Jordão, azeite Galo, que dávamos ao
povo como legítimo óleo ungido proveniente de Jerusalém, e uma longa
lista de outros produtos tão falsos quanto as gotas de leite extraídos dos
seios da Virgem Maria, que eram vendidas na Europa, nos primeiros
séculos, aos otários em busca de milagres.
171
Ricardo Mariano também tem a mesma opinião em relação à IURD.
[...] Funcionar como empresa lucrativa, este é o lema do bispo primaz
para competir e ser bem-sucedido num mercado altamente
concorrecional como é o atual mercado religioso brasileiro. Por isso,
dedicação, profissionalismo e aumento de produtividade (isto é, aumento
de arrecadação, do número de congregação, de fiéis e dizimistas, em
170
WEBER, Max. Conceitos básicos de sociologia. São Paulo: Ed. Moraes, 1989.p.109-110.
171
JUSTINO, op. cit., p.49.
79
parte decorrente da longa jornada de trabalho dos pastores) estão entre
as principais exigências feitas aos pastores e bispos da igreja.
172
Com seu crescimento, passou a ter uma cultura peculiar, fruto de uma interação
do próprio processo vivenciado pelos fiéis. Nesse processo surge o subproduto,
caracterizado por valores que lhe o comuns, onde objetivos são compartilhados e
suas biografias estão intimamente entrelaçadas, em histórias comuns, cujas normas,
valores e metas deverão ser passadas para a nova geração através de treinamento e
sistema educacional. A cultura organizacional possui como se fosse um “cheiro”
173
que
está distribuído em todo processo funcionando como um “lubrificante” que agiliza sua
continuidade. Para Campos
174
a transformação do movimento para organização afeta
diretamente a cultura de determinado grupo. Toda cultura sofre alterações no processo
de institucionalização, inclusive na sucessão da primeira liderança. Na rotinização do
carisma do empreendedor inicial uma transferência para a organização ou
instituição gerando então uma burocracia que é representada pela nomeação de novos
bispos e a divisão do país em regiões episcopais. Em qualquer tipo de organização ou
instituição são necessários mecanismos de dominação. Reed Nelson (1982,1993)
175
estudou os mecanismos utilizados pelos protestantes tradicionais, pentecostais e até
mesmo pelos mórmons norte-americanos. Nos protestante históricos, presbiterianos,
metodistas, luteranos, congregacionais e outros, o quadro administrativo é
caracterizado pela administração burocrática, na qual qualquer manifestação de
carisma é extirpada ou, no mínimo, abafadas. Nessas denominações, prevalece a
“autoridade institucional”, estabelecida por regras racionalmente elaboradas. Desta
172
MARIANO, op. cit., p.64.
173
OLIVEIRA, Marco A. Cultura Organizacional. São Paulo: Nobel, 1988.p.33.
174
CAMPOS, op. cit., p. 386.
175
Ibid., p.392.
80
forma, toda inconstância e risco vindo do carisma ou de um sagrado “não-
domesticado”, serão contidos e circunscritos dentro de parâmetros controláveis pela
autoridade religiosa.
Junto com o processo de burocratização da organização vem o aburguesamento.
Esse fato ocorre porque a burocracia está históricamente ligada à classe média
emergindo “como mediação entre os interesses particulares e os gerais.”
176
Um
movimento religioso que se torna uma organização pelo processo de burocratização,
atrai a sociedade burguesa, pois “[...] No capitalismo, a burocracia é assimilada pela
sociedade burguesa.”
177
Esse fato possivelmente é a razão do surgimento e criação de
novas igrejas.
[...] O que vem ocorrendo nos últimos anos é que, à medida que as
igrejas pentecostais se aburguesam, abrem-se espaços sociais livres
nas camadas populares mais pobres. Surgem então oportunidades de
criação de igrejas pentecostais mais ligadas às camadas pobres, menos
burocratizadas e menos aburguesadas.
178
O aburguesamento da IURD se pelo fato de toda camada social
positivamente privilegiada num plano econômico-social, ter na religião a “função de
legitimar sua própria situação social e seu próprio estilo de vida.”
179
Por isso, ao
acompanharmos os programas na TV da IURD, sempre veremos testemunhos de
empresários que estavam falídos e que “milagrosamente” passaram a ser prósperos.
Assim, vimos, no campo da idealidade, em como a IURD passou do tipo
profético com dominação carismática para o tipo sacerdotal com dominação
burocrática. Observamos também que além da IURD se tornar burocrática, como
organização, ela também teve um processo de aburguesamento. Agora precisamos
176
TRAGTENBERG, Maurício. Burocracia e Ideologia. São Paulo: Ática, 1985.p.187.
177
TRAGTENBERG, op. cit., p.188.
178
ROLIM, Francisco Cartaxo. Pentecostalismo: Brasil e América Latina. Petrópolis: Vozes, 1994.p.92-93.
179
Ver Max Weber, Economie et Societé. T. I, Plon, Paris, 1967, p.513.
81
entender como surgiu a Igreja Mundial do Poder Deus, saindo de uma organização
burocrática, a IURD, para ser um movimento profético de dominação carismática. É o
que veremos no próximo capítulo.
82
CAPÍTULO 4
A IMPD COMO REPRESENTAÇÃO DA PROFECIA: DOMINAÇÃO CARISMÁTICA
[...] Seria, então, lícito, sob o ponto de vista das
ciências sociais, concluir que o
neopentecostalismo é um ajuste entre a religião e
magia.
Antonio Gouvêa Mendonça
180
A Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD), no processo dialético do
neopentecostalismo brasileiro representa a sintese entre a Igreja de Nova Vida e a
Igreja Universal do Reino de Deus. Seguindo o método dialético hegeliano
181
, onde os
termos de dois predicados contraditórios do mesmo sujeito existem negando um ao
outro, como por exemplo, quente e não-quente, o movimento dialético no
neopentecostalismo é caracterizado pela negação interna que é a contradição. O
processo de movimento se manifesta da seguinte maneira: a Igreja de Nova Vida como
posição, a Igreja Universal do Reino de Deus como supressão ou negação, e por fim, a
Igreja Mundial do Poder de Deus como superação ou ntese. Esse processo,
contraditório, faz parte do movimento de sua relação verdadeira, movimentando o
próprio tempo, a própria história, num processo contínuo.
No método werberiano, que segue o dialético, o tipo profético é a negação ou a
contestação do tipo sacerdotal. A característica de dominação do primeiro é carismática
180
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Protestantes, Pentecostais e Ecumênicos: o campo religioso e seus personagens.
São Bernardo do Campo: Umesp, 1997.p.161.
181
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2005.p.247-249.
83
e do segundo, burocrática. Discorreremos agora, para entendermos a representação da
Mundial como negação da Universal, o tipo profético.
TIPO PROFÉTICO
Como foi mencionado, os tipos religiosos idealizados por Weber são: o
feiticeiro, o sacerdote e o profeta. “A terceira figura é a do profeta. Weber o considera
portador absolutamente pessoal de um carisma, que anuncia em virtude de sua missão
uma doutrina religiosa de uma ordem divina.”
182
O profeta possui um carisma que vai
exercer força na palavra profética.
[...] A ação carismática do profeta exercer-se fundamentalmente por
força da palavra profética, extraordinária e descontínua, ao passo que a
ação do sacerdócio exerce-se por força de um método religioso de tipo
racional” que deve as suas características mais importantes ao fato de
que se exerce contínua e cotidianamente. De modo correlato, “o
aparelho” do profeta opõe-se a um aparelho administrativo de tipo
burocrático tal como a Igreja, ou seja, um corpo de funcionários do culto
dotados de uma formação especializada: recrutados segundo critérios
carismáticos, os “discípulos” ignoram a “carreira” e as “promoções”, as
“nomeações” e as “distinções”, as hierarquias e os limites de
competência.
183
O discurso profético tem um discurso de ruptura e de crítica instigado na
inspiração carismática, cujo objetivo é contestar as autoridades que manipulam o poder
simbólico.
[...] Enquanto discurso de ruptura e de crítica que encontra na
invocação de sua inspiração carismática a justificativa ideológica de sua
pretensão em contestar a autoridade das instâncias detentoras do
182
FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber. RJ: Forense-Universitária, 1987.p.143.
183
BOURDIEU, A economia das trocas simbólicas, p.89.
84
monopólio do exercício legítimo do poder simbólico, o discurso profético
tem maiores chances de aparecer em períodos de crise manifesta ou
latente, afetando sociedades inteiras ou determinadas classe, isto é, em
períodos nos quais as transformações econômicas ou morfológicas
determinam, nesta ou naquela parte da sociedade, a destruição, o
enfraquecimento ou a obsolescência das tradições ou dos sistemas de
valores que forneciam os princípios da visão do mundo e da conduta na
vida.
184
uma luta interna entre o corpo sacerdotal e o profeta concorrente, em que o
resultado vai depender das forças envolvidas no processo.
[...] O resultado da luta entre o corpo sacerdotal e o profeta concorrente
(com seus discípulos leigos) depende não apenas da força propriamente
simbólica da mensagem profética ( efeito mobilizador e crítico
“desbanalizante” da nova revelação, etc), mas também da força dos
grupos mobilizados pelas duas instâncias concorrentes nas relações de
força extra-religiosas.
Como aponta Max Weber, a maneira pela qual se resolve a tensão entre
o profeta e seus discípulos de um lado, e o corpo sacerdotal do outro, é
uma “questão de força”[...] e todas as soluções são possíveis, desde a
supressão física do profeta até a anexação da profecia, passando por
todas as formas de concessões parciais.
185
Isso é evidente quando o “apóstolo” Valdemiro reclamou que estava sendo
perseguido:
Estão nos perseguindo: lacraram uma igreja por causa do barulho; uma
igreja reclamou na justiça em relação ao nome da Mundial. Estão
querendo até tomar o nosso nome. uma igreja, que não quero falar o
nome, tem feito uma proposta ao dono da emissora para comprar o
nosso horário. Eles não vão conseguir...
186
Pode-se observar que a luta está aguerrida, pois a expansão da Mundial tem
incomodado opositores. Em seu programa de televisão, o “apóstolo” Valdemiro
Santiago informou que tem inaugurado 12 (doze) igrejas em média.
187
O resultado
184
BOURDIEU, op. cit., p.93.
185
Ibid., p.94.
186
Anotações pessoais do programa exibido em 24/10/2007 na Rede TV às 7h20.
187
Programa exibido em 26/10/2007.
85
dessa “guerra santa” não sabemos. Uma coisa o “apóstolo” tem demonstrado, que veio
para ficar, portanto, a luta vai continuar.
A Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) e sua dominação carismática
A fonte da devoção pessoal é caracterizada por dotes sobrenaturais (carisma),
aptidões gicas, revelações do divino, habilidade intelectual ou de oratória, o sempre
novo, o extra-cotidiano e o arrebatamento emocional, cujos tipos mais puros são: a
dominação do profeta, do herói guerreiro e do grande demagogo. A obediência ao líder
carismático é estabelecida não por posição estatuída ou por uma dignidade tradicional,
mas por suas qualidades excepcionais, as quais serão o sustentáculo de sua liderança,
ou seja, sua liderança subsistirá enquanto esse carisma se manifestar. Por isso, nos
programas televisivos da Igreja Mundial do Poder de Deus, os milagres realizados pelo
“apóstolo” Valdemiro Santiago estão sempre em evidência. Pois, desta forma, o
carisma do “apóstolo” se reafirmará continuamente.
São características da administração carismática a revelação ou a criação
momentânea, a ação e o exemplo, as decisões particulares, ou seja, sua marca está
no irracional. Não está presa à tradição, pois o profeta tem o “direito natural”, sua
proclamação é revolucionária, portanto, está sujeita à contínuas mudanças. A base da
autoridade carismática está embasada na “crença” no profeta ou no “reconhecimento”
pessoal de sua autoridade, que também com eles pode cair. Para Weber
188
a
188
WEBER, Max. Metodologia das Ciências Sociais. Parte 2, p.355-356.
86
autoridade carismática é uma das forças revolucionárias na história, mas na sua forma
pura é autoritária e dominadora.
O fato do “apóstolo” Valdemiro Santiago dar ênfase aos milagres, em seus
programas de TV e nos cultos, demonstra a intencionalidade do “fazer-se acreditar”, e
quase em todos os testemunhos de milagres, o “apóstolo” insiste em dizer que esses
sinais que acontecem em sua vida ministerial é “pela graça de Deus”, discurso
necessário para a manutenção do carisma
189
.
Na dominação carismática a relação social está caracterizada no extracotidiano e
no puramente pessoal. E, se ela subsistir após o desaparecimento do portador do
carisma, a relação de domínio, a autoridade, será repassada aos sucessores. No caso
da Igreja Mundial do Poder de Deus, o carisma está sob a pessoa do “apóstolo”. No
caso de sua falta, a igreja terá sérias dificuldades em escolher um novo líder. Isso deve-
se ao fato de todo o ministério estar focado em sua pessoa. O grande problema neste
tipo puro de administração é a questão da sucessão. Edir Macedo , devido ao processo
de transferência de carisma para a instituição, a Igreja Universal, talvez terá menos
problema em sua administração, pois seu carisma pessoal está em processo de
transferência institucional. Esse processo pode ocorrer da seguinte forma:
1 Por conversão das ordenações carismáticas para o tipo
tradicional;
2 Pela passagem do quadro administrativo a um quadro legal
ou estamental;
3 – Por transformação do sentido do próprio carisma.
189
Ibid., p. 356.
87
A dominação carismática possui um caráter de emergência, a resposta a uma
crise se sempre pessoal na experiência humana, e prevalecerá a palavra do profeta.
O sucessor do profeta tem que preservar um carisma pessoal. Os métodos para
encontrar um sucessor deverão ser baseados em critérios que assegurem as
qualidades carismáticas indispensáveis do eleito, ou o próprio líder designará seu
sucessor ou os próprios discípulos serão considerados aptos para designar um
sucessor qualificado.
Fica evidente que a administração na Igreja Mundial do Poder de Deus é
carismática, devido a centralização das decisões na pessoa do “apóstolo” Valdemiro
Santiago. O improviso é uma marca neste tipo de administração devido a dinâmica de
todo o processo carismático. Templos improvisados, que antes eram fábricas e são
transformados em local de culto público, campanhas inovadoras, estratégias recicláveis
semanalmente, enfim, o extracotidiano prevalece. Essa é a dinâmica da Igreja Mundial
do Poder de Deus que com o passar do tempo tende a despersonalizar o carisma por
causa da institucionalização.
É o destino do carisma, sempre que este penetra nas instituições
permanentes de uma comunidade, dar lugar aos poderes da
tradição e da socialização racional. Esse declínio do carisma
indica, geralmente, a diminuição na importância da ação
individual[...]
190
A Igreja Mundial do Poder de Deus por ter um “espírito profético”, respaldado
numa “nova visão” eclesiástica, na pessoa do “apóstolo” Valdemiro Santiago, rompe
com o conservadorismo ritualístico da Universal. A união entre o carisma e as coisas
está no profetismo. Esse profetismo vivenciado pela Igreja Mundial do Poder de Deus é
revolucionário, pois se lança em direção a todos os homens, e não está restrito às
190
From Max Weber.Essays in Sociology. Nova Iorque, Oxford University Press, 1947; p. 253.
88
pessoas de um grupo ou uma etnia. Isso ocorre porque tem uma oposição
estabelecida entre este mundo e o outro, entre as coisas e o carisma.
O carisma traz consigo uma reorientação completa de todas as atividades
religiosas em relação aos ritos e formas anteriores. Por isso, o “apóstolo” Valdemiro
Santiago tem feito esforços no sentido de mostrar que sua igreja é diferente da
Universal.
Na administração carismática, ou seja, no tipo ideal, não burocracia, as
qualidades estabelecidas são carismáticas. As pessoas são “chamadas pelo Senhor”, o
que difere de uma carreira funcional. A hierarquia inexiste, o que é a intervenção do
chefe. E conseqüentemente, o preceitos jurídicos. O “espírito” dominante na
administração carismática é o de corroboração.
O tipo profético com administração carismática, na forma pura, se manifesta
através do entusiasmo. Nos cultos que presenciamos na sede nacional da Igreja
Mundial do Poder de Deus, a cada prodígio relatado, havia um entusiasmo do povo,
principalmente naqueles momentos em que os fiéis viam as cadeiras de rodas sendo
levantadas pelos obreiros para serem trazidas até o palco. A cena é de apoteose,
ninguém escapa ao sentimento de entusiasmo. O processo é reforçado pela indigência
e esperança dos fiéis.
A Igreja Mundial do Poder de Deus representa o tipo profético, que constesta a
Igreja Universal do Reino de Deus, por ter uma “nova visão” profética em relação ao
sagrado. Sua dominação é carismática, a qual se baseia na qualidade extraordinária e
sobrenatural de seu líder o “apóstolo” Valdemiro Santiago, cuja qualidade fora “enviada
de Deus”. Por meio dos prodígios o “dever” de reconhecê-lo como autoridade do
sagrado é mantido. O problema mais evidente da administração carismática está na
89
questão da escolha do sucessor. Pois o prodígio, o sobrenatural terá que acompanhar
as ações do sucessor.
90
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Igreja Mundial do Poder de Deus assume o papel do tipo profético quando de
sua fundação pelo “apóstolo” Valdemiro Santiago. Como resultado de um movimento
dialético que o antecede, tem como característica uma revelação pessoal e carismática.
Por ser uma revelação pessoal, a confrontação a revelação estabelecida é inevitável. A
nova revelação se faz necessária, devido a novas necessidades que precisam ser
satisfeitas, e por ineficiência do carisma estabelecido, que não consegue responder às
necessidades dos fiéis em relação aos pedidos efetuados ao sagrado. Quando as
necessidades não são respondidas, o carisma estabelecido perde seu valor, ou seja, o
profeta não tem mais autoridade sobre o sagrado. Conseqüentemente, todos os
auxiliares envolvidos com o profeta, também perdem a autoridade e a exclusividade
sobre o sagrado. O rompimento surge, com base na “nova profecia”, que através dos
prodígios e na manipulação do sagrado vai-se constituindo como resposta às
indigências e esperanças dos fiéis, que buscam no novo profeta a resposta de seus
problemas. O profeta para se manter precisa da divulgação de seus prodígios. Marca
de sua especificidade está no sobrenatural. Por ser uma igreja do tipo profético, a Igreja
Mundial do Poder de Deus precisa ter como retórica o milagre, o sobrenatural, o
prodígio, a manifestação do sagrado, para uma auto-afirmação de seu propósito. Tem
91
como pêndulo dois sinais proféticos o prodígio e a contestação. O prodígio é
reafirmado em seus cultos, o qual é divulgado constamente na mídia, o que leva
dezenas de pessoas a freqüentarem seus cultos, e que promove sua expansão. Essa
expansão tem incomodado as igrejas diretamente concorrentes, transformando assim o
campo religioso numa “guerra santa” por audiência e número de igrejas e fiéis. A
contestação é evidenciada na postura da Igreja Mundial do Poder de Deus em querer
ser diferente da Universal do Reino de Deus. Por ser constestadora, ela precisa dizer-
se diferente da Universal.
Como vimos, em muito a Mundial se assemelha com a Universal. São
semelhantes em símbolos e objetos utilizados nos cultos, no investimento e estratégia
na mídia, no preparo e ordenação de seus pastores e bispos, na forma administrativa,
ou seja na centralização do poder, e até nas ambições expansionistas, etc.
Nossa pesquisa mostra que a diferença exata entre as duas igreja, partindo do
tipo puro weberiano, consiste na questão da burocracia e profecia. A Universal está
vivendo um processo de burocratização, onde o carisma do bispo Edir Macedo está
sendo transferido para a instituição. O poder pessoal vai se dissipando e o carisma é
transferido para a instituição. Esse processo é caracterizado pela burocratização,
tendência histórica de toda religião. Quando a instituição começa a se burocratizar,
novas necessidades surgem e o carisma instituicional é questionado.
O “apóstolo” Valdemiro Santiago surge com sua igreja nesse momento histórico
da Universal, como uma contestação à burocracia. Como em toda contestação
resistência, pois está em jogo a profecia e o carisma histórico e com eles posições e
regalias dos que auxiliam o profeta instituído. Com o tipo profético vem a dominação
carismática. Então, temos no fenômeno religioso duas forças antagônicas: de um lado
92
o dominação carismática e do outro o dominação burocrática. Na dominação
carismática, representada na Igreja Mundial do Poder de Deus, cujo seu líder , o
“apóstolo” Valdemiro Santiago, tem uma “nova revelação”, marcada por prodígios, pelo
sobrenatural, mostrando ter uma intimidade com o sagrado, torna-se o “profeta”. Esses
prodígios reforçam um carisma que todo profeta precisa ter. O carisma pessoal se
infiltrará em todas as ações da igreja, tornando-se o ícone na dominação e nas
escolhas dos auxiliares. A dominação carismática é tão influente na Mundial que
Valdemiro Santiago se auto intitulou “apóstolo”,tulo que demonstra ser o líder máximo
na Mundial. Na Universal esse título inexiste, por isso a transferência do carisma para a
instituição será facilitada. Na dominação carismática o irracional estabelecerá as regras,
pois seu norte estará baseado na “revelação” pessoal do líder carismático. Por ser
profética e carismática, será revolucionária, pois jamais estará ligada ao passado ou à
tradição.
A Igreja Universal do Reino de Deus representa a dominação burocrática,
processo histórico natural em toda religião, pois se assim o o fizer, estará em franca
extinção. Depois de surgir sob a dominação carismática, sob a liderança do bispo Edir
Macedo, devido a sua grande expansão e a necessidade da diversidade de cargos e
divisão do espaço territorial ocupado pela igreja, a burocracia passa a fazer parte de
sua administração. Tendo a burocracia sido estabelecida ou em processo de
estabelecimento, pois o bispo Edir Macedo ainda tem muita influência nas decisões da
igreja, o fato é que é uma igreja que está na dominação burocrática. A burocracia faz
parte do processo de racionalização da instituição, que vai ser direcionada, não por
uma “nova revelação”, pois se isso acontecer, deixará de ser a Universal, mas o que
prevalece é o que foi revelado e transformado numa tradição. Portanto, a
93
racionalidade nas regras será evidente. Não cabe aqui regras vinda do “extracotidiano”,
pois elas são instituídas e não podem ser quebradas. Burocratização e racionalidade
estão juntas em sua manifestação. O problema desta dominação consiste em não dar
abertura para novas necessidades aos fiéis. Em conversas no corredor com alguns fiéis
na sede nacional da Igreja Mundial do Poder de Deus, nos disseram terem vindo da
Universal, pois não conseguiram receber nenhum “milagre”. A necessidade de
resposta às questões novas, surge então o “espírito profético” que trará uma nova
revelação a qual desqualificará todo quadro sacerdotal da religião instituída.
Assim a diferença fundamental entre a Igreja Mundial do Poder de Deus e a
Igreja Universal do Reino de Deus está na dominação. A primeira , por ser profética
possui a dominação carismática, que é revolucionária, baseada em novas revelações
do seu líder, que não é burocrática e possui um caráter irracional em relação as suas
regras. A segunda, possui uma dominação burocrática, marcada pela racionalidade em
suas regras, influenciado pelo passado e pela tradição, o carisma pessoal é transferido
para a instituição. A burocracia estabelece a tradição, a racionalidade o poder legal. O
carisma, ao contrário, rompe com as continuidades, quebra a instituição, colocando em
dúvida a ordem estabelecida, recorrendo a uma nova maneira de compreender as
relações entre as pessoas. Ela ao mesmo tempo destrói e constrói. A diferença de
dominação é tão evidente que numa temos a figura de um “apóstolo”, e no outro a
figura de um “bispo”. Na Mundial um “apóstolo”, enquanto que na Universal
vários “bispos”.
A Igreja mundial do Poder de Deus ainda está no processo profético e sua
dominação carismática em pleno auge. Como toda religião, em breve ela também
estará se burocratizando. A questão é: quem será o próximo “apóstolo”? Na falta de
94
Valdemiro Santiago, visto não ter filhos do sexo masculino, quem será o “apóstolo” a
sua altura em termos de carisma pessoal? Esse é um problema da dominação
carismática. Decerto Edir Macedo não tem esse problema devido a burocratização de
sua igreja. Por enquanto, Valdemiro Santiago está ganhando terreno por causa dos
prodígios e milagres que tem ocorrido através de seu carisma pessoal. Por outro lado,
despertou uma “guerra santa” entre a Mundial e Universal na disputa na dia e na
conquista de fiéis. Aonde vai terminar isso, não podemos prever. A Universal é uma
igreja instituída com amplo recursos, e que talvez possa trazer alguns transtornos para
a Mundial. O fato é que mesmo em menor poder de fogo, a Mundial continua a crescer
e a expandir-se.
95
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