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maioria não tem contato com ele. Entretanto, malgrado todas as
pessoas que correm para cá e para lá a fazer o bem, o paciente, que
é quem recebe o benefício de todos estes esforços, pode julgar que
o grande hospital moderno deve ser para ele um dos locais mais
solitários e infelizes do mundo! Em primeiro lugar porque se acha
separado do lar, da família e dos amigos. Em segundo lugar, porque
sofre dores ou virá a sofrê-las. Em terceiro lugar, todos os temores
básicos, que ele pode controlar quando sadio, despertam-se ao
internar-se no hospital. Estes são os temores da morte ou de tornar-
se mutilado fisicamente ou de perder o controle emocional. Num
hospital, estes temores têm muito mais probabilidade de sobrevir do
que fora dele. Há grande ligação entre doença emocional física e
espiritual. Consideremos, por exemplo, a depressão. É uma doença
emocional comum. A pessoa deprimida pode ter várias queixas
quanto a males físicos, que podem envolver qualquer órgão do
corpo. Estas pessoas não têm apetite, sofrem de prisão de ventre ou
de diarréia, podem sentir dor no peito ou palpitação, não têm sono,
perdem o interesse em tudo e retraem-se do mundo, muitas vezes
sentindo-se desprezadas por todos. Muitas vezes lhes sobrevém
uma mórbida sensação de ter agido mal ou cometido o pecado
imperdoável, e que Deus as abandonou, e que a doença seja castigo
por seus pecados passados. Penso que nós, os que trabalhamos em
hospitais de clínicas, temos nos desviado muito do alvo de Rahere,
que era prover hospitalidade aos doentes. O hospital de clínicas
moderno não é lugar muito hospitaleiro. Nossos empenhos dirigem-
se mais no sentido da doença da pessoa do que da pessoa do
doente. Interessando-nos mais pelos rins do que pelos donos dos
rins, mais no coração como uma bomba do que no coração como
sede das emoções, mais pelo cérebro como um computador do que
órgão que aloja a consciência. Temos levado longe demais a
especialização. Agora temos que restaurar o toque pessoal – a
hospitalidade – aos nossos hospitais. Temos de tratar a pessoa toda
– corpo, espírito e alma, e não apenas alguns órgãos que funcionam
mal. Ministros e psiquiatras, enfim, todos os que assistem os doentes
têm singular oportunidade de servir ao homem todo. E o homem
hospitalizado aí está porque chegou a uma encruzilhada na vida.
Pode ele estar enfrentando a morte ou uma mutilação cirúrgica, ou
pode ter perdido temporariamente o contato com a realidade, ou
perdido o controle de suas emoções. O doente está extremamente
necessitado de ajuda não somente de remédios, cirurgias, curativos
[...] mas, ele precisa de alguém que seja usado por Deus para curar
a sua alma: o capelão, o visitador evangélico. Oliver Wendell Holmes
disse: “é privilégio do médico curar às vezes, aliviar muitas vezes,
confortar sempre”. Nós, médicos, nos empolgamos tanto com a
primeira parte que muitas vezes passamos por alto a última. O
capelão eficiente pode ajudar-nos a tratar do indivíduo todo, corpo,
espírito e alma. Ele pode ajudar-nos a tornar o hospital mais uma
vez, um lugar onde se encontra a hospitalidade. (Souza Lima apud
VASSÃO, 1997, p.51).
Quando o autor citado por Vassão afirma que o paciente considera o hospital um
local infeliz e solitário, ele retrata o que é visto, em muitos casos, no trabalho da