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sobre o que é justo ou injusto. Hobbes diz que o soberano ordena o que é justo, portanto é
justo o que o soberano ordena.
As leis civis transformam em ordens as leis da natureza. As leis da natureza, como
vimos, são espécies de qualidades morais, deduzidas pela razão a partir do princípio de
buscar a paz e a segurança, que dispõem os homens para a paz e constituição do Estado
através do pacto. Quando o Estado é fundado, graças ao poder do soberano (que, como
veremos abaixo, inclui a espada, isto é, o comando do exército) transformam-se em leis ou,
na linguagem de Hobbes, em comandos que devem ser obedecidos pelos súditos. E, além,
disso, o soberano também tem por função estabelecer o que as leis da natureza prescrevem,
isto é, o seu conteúdo. Ou seja, as leis naturais apenas proíbem todo tipo de crimes ou
ofensas entre os cidadãos, como o roubo, o homicídio, o adultério etc., mas é a lei civil,
promulgada pelo soberano, que determina o que se deve entender por roubo, homicídio,
adultério etc., por exemplo, “nem toda a morte é homicídio; apenas aquela que é proibida
pela lei” (Do Cidadão, VI, 16). Portanto, o soberano hobbesiano está acima das leis, sejam
as naturais, sejam as civis, pois é sua função exclusiva justamente criar, promulgar ou
derrogar as leis do Estado: ele está livre de qualquer sujeição a elas.
Hobbes também defende que a transferência de direitos dos súditos ao soberano é
praticamente total. Como vimos, no pacto, cada indivíduo renuncia ao seu direito a todas as
coisas e o transfere ao soberano. Mas ele faz isso seguindo a regra prudencial da razão que
deduz a lei natural segundo a qual é proibido fazer o que coloca a sua vida em risco e omitir
o que pode garanti-la. Assim, a preservação da vida, como vimos, é o axioma sobre o qual
se baseia toda a teoria política de Hobbes e fundamenta a existência e função do Estado.
Que não se possa renunciar ao direito à vida faz parte intrínseca do sistema político de
Hobbes, que justifica a existência do Estado para evitar a permanente ameaça à vida que