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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE – UFCG
CENTRO DE HUMANIDADES UNIDADE ACADÊMICA DE
LETRAS
MESTRADO EM LINGUAGEM E ENSINO
ESTUDO DA COMPETÊNCIA ARGUMENTATIVA DE
ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Enilda Cabral Barreto
Campina Grande – março de 2008
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Enilda Cabral Barreto
ESTUDO DA COMPETÊNCIA ARGUMENTATIVA DE
ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Linguagem e Ensino da
Universidade Federal de Campina
Grande, como registro parcial às
exigências para obtenção do Grau
de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Williany
Miranda da Silva
Campina Grande – 2008
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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA UFCG
B273e
2008 Barreto, Enilda Cabral.
Estudo da com
petência argumentativa de alunos do ensino fundamental /
Enilda Cabral Barreto. Campina Grande: 2008.
122f. : il
Dissertação (Mestrado em Linguagem e Ensino) – Universidade Federal
de Campina Grande, Centro de Humanidades.
Referências.
Orientadora: Drª. Williany Miranda da Silva.
1. Argumentação. 2. Competência Argumentativa. 3. Ações
Metodológicas. I. Título.
CDU 371.332 (043)
Dedico este trabalho a Deus,
único digno de toda honra, glória
e louvor e à minha mãe Arlinda,
pelo incentivo que sempre me deu
na vida, e em especial, durante a
Pós-Graduação, como também
pelo exemplo de mãe que é.
AGRADECIMENTOS
· A Deus, por me conceder esta jornada marcante na minha carreira
profissional.
· À Escola Abílio de Souza Barbosa, nas pessoas de Lúcia Duarte (Gestora)
e Conceição Baracho (Vice-gestora), pela ajuda e incentivo que me deram
durante a coleta de dados.
· Aos alunos do 9º ano do turno da manhã, pelos momentos maravilhosos
desfrutados durante um ano, e pela compreensão que tiveram comigo
quando, durante algumas aulas, tivemos que, usando uma terminologia
deles, “esticar as aulas”.
· À minha orientadora, Williany Miranda, pelo dinamismo e profissionalismo,
além da sua amizade sempre presente durante as orientações.
· Aos meus pais, Severino e Arlinda, pelo amor e torcida ininterrupta.
· Ao meu esposo, Gilvan Júnior, pelo carinho e compreensão dedicados em
todos os momentos da nossa vida conjugal.
· Aos meus familiares, pelo apoio e incentivo.
· À minha sobrinha Flávia Barreto, pela ajuda nos momentos difíceis.
· A todos os amigos que torceram por mim, em especial a Shirley Stella, pela
força dada durante o Mestrado.
· Aos meus professores do Curso de Mestrado, juntamente com as colegas
de curso, em especial Rosa, Ana Cláudia, Verônica, Kátia, pelas alegrias e
conhecimentos compartilhados.
Resumo
Este trabalho objetivou analisar a manifestação da argumentação nas
produções orais e escritas dos alunos, por intermédio de uma ação metodológica,
através da interpretação do impacto do conjunto de atividades organizadas e
aplicadas pela professora na sala de aula (DOLZ, NOVERRAZ & SCHNEUWLY,
2004). Assim, de modo específico, pretendeu-se investigar o uso dos operadores
argumentativos na produção de argumentos em artigos de opinião escritos por
alunos do ano e analisar o impacto da ação metodológica da professora no
exercício da competência argumentativa nas produções orais (interação) e
escritas dos alunos. As questões postas foram: Como se manifesta a
competência argumentativa dos alunos nas suas produções escritas? E que
estratégias metodológicas desenvolvidas na seqüência didática contribuíram para
o desenvolvimento da competência argumentativa manifestada? Os resultados da
pesquisa mostram que os alunos têm consciência da necessidade de apresentar
argumentos para a defesa de um ponto de vista nas modalidades oral e escrita.
Todavia, tal consciência, por si só, não responde pelas produções ditas “bem
feitas,” que a escola exige desses alunos. O ensino sistematizado, organizado em
torno de uma seqüência didática, sobre o estudo da argumentação, voltado para
as necessidades específicas dos alunos, foi capaz de evidenciar melhorias
significativas nas produções argumentativas deles. Assim, constatamos que o
desenvolvimento da competência argumentativa dos alunos demonstrado na sala
de aula, durante a interação, bem como nas produções escritas, recebeu
influência direta das ações metodológicas da professora visto que o tratamento
dado a tal objeto de estudo promoveu contribuições teóricas acerca do objeto
contemplado, uma vez que se amadureceu em torno da aprendizagem dos
alunos.
Palavras chave: argumentação competência argumentativa ações
metodológicas.
Abstract
This work objectived to analyze the demonstration of argumentation in the
oral and written students’ productions, through methodological action, through
interpretation of the impact of the collection of the organized and applied activities
by teacher in the classroom (DOLZ, NOVERRAZ & SCHNEUWLY, 2004). So, in a
specific way, we intended to investigate the use of the argumentative operators in
the productions of the arguments in opinion articles written by students in 9
th
year
and to analyze the impact of the teacher’s methodological action in the exercise of
the argumentative competence in students’ oral and written productions. The
raised questions were: How demonstrate students´ argumentative competence in
their written productions? And what methodologies strategy developed in the
educational sequence contributed for the development of argumentative
competence demonstrated? The results of the research show that the students
have conscience of the necessity to present arguments for defense of a point of
view in oral and written modalities. However, such conscience, for itself, doesn’t
answer for productions said as “well done” that school demands from these
students. The systematized teaching, organized around an educational sequence
about the study of the argumentation, returned for the students specific
necessities, was able to evidence significant improvements in students´
argumentative productions. So, we noticed that development students´
argumentative competence demonstrated in the classroom, during the interaction,
as well as in written productions, received direct influence from teacher’s
methodological actions since the treatment given to such object of study,
promoted theoretical contributions about the contemplated object, since matured
around student’s learning.
Key-words: argumentation – argumentative competence – methodological actions.
LISTA DE QUADROS
Quadro 01- Quadro dos principais operadores argumentativos...................... 30
Quadro 02- Quadro de atividades realizadas na sondagem (pré-módulo) e
na seqüência didática.......................................................................................
61
Quadro 03- Visão geral dos operadores argumentativos nas produções dos
alunos................................................................................................................
67
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................... 11
Capítulo 1
Estudo Histórico das competências.........................................................
15
1.1- Competência lingüística e comunicativa...........................................
1.2- Competência Argumentativa............................................................
1.3- Estudos sobre Argumentação..........................................................
1.3.1- A Retórica Clássica........................................................................
1.3.2- A Nova Retórica.............................................................................
1.4- A Semântica Argumentativa e os operadores argumentativos.........
1.5- O artigo de opinião como gênero da ordem do argumentar.............
15
19
22
22
25
27
33
Capítulo 2
A formação do professor de língua portuguesa.......................................
37
2.1- Concepções de língua / escrita e ensino de língua..........................
2.2- Influencias das práticas letradas do professor na sala de aula........
2.3- O artigo de opinião como objeto de ensino
aprendizagem da
argumentação...................................................................................
40
44
49
Capítulo 3
Procedimentos metodológicos...................................................................
52
3.1- Natureza da pesquisa........................................................................
3.2- Caracterização do contexto de pesquisa...........................................
3.3- Os sujeitos da pesquisa.....................................................................
3.4- Procedimentos de coleta de dados...................................................
3.4.1- Tipo de intervenção: a seqüência didática.....................................
3.4.2- Instrumentos para a coleta de dados.............................................
3.5- Procedimentos de análise.................................................................
52
54
55
56
58
62
64
Capítulo 4
A manifestação da competência argumentativa dos alunos versus a
ação metodológica da professora..............................................................
65
4.1- Manifestações da competência argumentativa ................................ 66
4.1.1- Por operadores argumentativos.....................................................
4.1.2- Por classe argumentativa e escala argumentativa.........................
4.2- Estratégias metodológicas.................................................................
4.2.1-Tipo de proposta de intervenção.....................................................
4.2.2- Condução das atividades...............................................................
66
77
84
84
90
Considerações finais...................................................................................
102
Referências bibliográficas...........................................................................
105
Anexos 111
11
INTRODUÇÃO
O ensino da produção escrita do texto argumentativo na maioria das
escolas é pautado no modelo aristotélico dividido em três partes: introdução,
desenvolvimento e conclusão. Esse protótipo reflete-se, na prática de sala de
aula, através das regras passadas aos alunos do “como” produzir o texto
argumentativo, ou mesmo a antiga “redação ou dissertação”, tendo como ponto
de partida figuras ou títulos dados pelo professor ou mesmo pelo autor do livro
didático.
Nesse modelo de ensino da produção escrita, a preocupação do professor
restringe-se apenas ao aspecto normativo das partes que a compõem. Como
conseqüência, a redação escolar quase sempre é produzida apenas para atender
/ preencher o planejamento do professor, que por sua vez desconsidera a
diversidade de estratégias enunciativas de argumentação trazidas / apresentadas
no texto do aluno, além de atribuir pouco valor às argumentações orais ocorridas
na sala de aula.
A emergência na mudança da prática docente proposta pelos PCN (1998)
levou à ressignificação das práticas escolares, de tal modo que o texto foi tomado
como unidade de ensino para possibilitar ao aluno a ampliação de suas
competências objetivando que este se torne um produtor de texto capaz de
atender às diversas / múltiplas exigências sociais.
Aponta-se um novo paradigma de ensino, cujas características estão
voltadas para um ensino que seja capaz de, dentre outras especificidades, tratar a
língua como lugar de interação entre os membros de uma sociedade (KOCH,
2005), de forma que a leitura e a escrita sejam encaradas como processos
contínuos, reconstruídos no contexto da sala de aula e utilizados fora dela.
Muitas vezes, o aluno ao ser convidado a realizar uma produção textual,
tendo como base leituras realizadas, apresenta dificuldades. Isso porque nessa
atividade deverá demonstrar habilidades específicas no âmbito da leitura e da
escrita, como a habilidade de argumentar.
A atividade de organizar argumentos orais ou escritos para comprovar um
ponto de vista, quer essa atividade se realize no contexto escolar ou fora dele,
exige prática cotidiana e o direcionamento de alguém mais experiente. Em casa,
12
esse alguém geralmente é a mãe, o pai, os irmãos ou outro adulto, que, durante
as trocas orais (diálogos produzidos cotidianamente), auxiliam as crianças na
produção de discursos argumentativos eficazes, ou seja, capazes de convencer o
(s) outro(s).
Na escola, esse alguém é obrigatoriamente o professor, que, na qualidade
de mediador da aprendizagem, tem, além de outros deveres, o de sistematizar os
saberes do aluno, oportunizando-lhe momentos de uma defesa oralmente ou por
escrito de seu ponto de vista, de forma lógica, isto é, fazendo uso de argumentos
que não gerem dubiedade e que não comprometam a coerência textual, e
democrática, no sentido de que o aluno deve se sentir bastante à vontade nas
suas tomadas de posições, embora muitas delas não sejam compartilhadas pelo
professor.
Assim, temos a escola como o espaço específico para tratar do
desenvolvimento das práticas argumentativas. É nela que, através da metodologia
utilizada pelo professor, o aluno poderá ou não demonstrar desempenho
satisfatório diante dessas práticas e das exigências sociais.
A sociedade como um todo exige cada vez mais que os indivíduos
demonstrem competência lingüística, comunicativa e argumentativa, isto é, que
saibam articular o repertório lingüístico de sua comunidade na construção das
expressões que compõem os seus textos, sejam orais ou escritos, formais ou
informais independentemente de norma padrão, escolar ou culta (PCN, 1998).
Exige-se também que os alunos - produtores saibam adequar o uso da
língua às situações comunicativas, considerando os interlocutores envolvidos,
como também a organização dos discursos e das estratégias utilizadas, com o
objetivo de influenciar os interlocutores, garantindo adesões.
Desse modo, saber argumentar é um pré-requisito para uma ampla e
efetiva participação social, e essa competência tem na escola o locus do seu
desenvolvimento e melhoria, restando ao professor a conscientização de
mudança metodológica, isto é, de desapego a algumas práticas - leitura
decodificadora, texto escrito apenas como produto e como pretexto para o ensino
de gramática - cujas aulas são sempre baseadas em nomenclaturas e frases
soltas (POSSENTI, 2004), tendo em vista preparar o aluno para inserção social.
13
Essa conscientização implica organizar uma metodologia de ensino
sistematizado, comprometido com a realidade dos alunos e, conseqüentemente,
com o desenvolvimento da competência argumentativa. Embora argumentar seja
uma capacidade humana, exercida muito antes de aprendermos ou dominarmos
as convenções da escrita, é nesta que se evidenciam dificuldades para a
elaboração e defesa de um ponto de vista de forma consistente na escola.
Nesse sentido, o professor deve refletir sobre a sua prática e observar o
que não fez nas aulas, partindo da realização de sondagem para verificar o
desempenho dos alunos na leitura e na escrita. E, a partir de então, repensar o
ensino de produção textual, de modo que o texto utilizado em sala de aula seja
objeto de reflexão e, conseqüentemente, de aprendizagem dos conteúdos
selecionados por ele.
Diante do exposto, nossos questionamentos para o desenvolvimento deste
trabalho foram os seguintes: Como se manifesta a competência argumentativa
dos alunos nas suas produções escritas? E que estratégias metodológicas
desenvolvidas na seqüência didática contribuíram para o desenvolvimento da
competência argumentativa manifestada?
De modo geral, objetivamos analisar a manifestação da argumentação nas
produções orais e escritas dos alunos, mediante a ação metodológica da
professora, através da interpretação do impacto do conjunto de atividades
organizadas e aplicadas pela professora na sala de aula.
De modo específico, investigaremos o uso dos operadores argumentativos
na produção de argumentos em artigos de opinião escritos por alunos do 9º ano e
analisaremos o impacto da ação metodológica da professora no exercício da
competência argumentativa nas produções orais (interação) e escritas dos alunos.
A relevância do nosso trabalho associa-se à contribuição pedagógica que
poderá trazer, que, na parte prática, apresentamos para o ensino da
argumentação o que de fato contribui ou não, em termos de metodologia adotada,
para o desenvolvimento da competência argumentativa dos alunos; e na parte
teórica apresentamos algumas reflexões em torno do estudo / ensino da
argumentação.
A dissertação organiza-se em 05 (cinco) partes, a saber: a introdução, na
qual apresentamos as questões e os objetivos da pesquisa e quatro capítulos.
14
Desses, dois são destinados à teoria (capítulo 1 e 2), um à metodologia (capítulo
3) e um à análise (capítulo 4); a última parte diz respeito às considerações finais
e, por fim, disponibilizamos as referências bibliográficas utilizadas.
No capítulo 1, apresentamos as concepções teóricas que nos serviram de
embasamento referentes às noções de competência lingüística, competência
comunicativa e competência argumentativa; os estudos históricos sobre
argumentação, incluindo nesses a Retórica Clássica e a Nova Retórica.
Enfocamos, de modo específico, as contribuições advindas da Semântica
Argumentativa.
Nestas, tratamos dos estudos do lingüista francês Oswald Ducrot e das
contribuições teóricas dadas a esses estudos, no Brasil, por Ingedore Koch, no
que se refere aos operadores argumentativos, através da organização de um
quadro (p.30). Ainda nesse capítulo, apresentamos a descrição do artigo de
opinião, como gênero textual específico da ordem do argumentar.
No capítulo 2, abordamos a formação do professor de língua materna
vinculada às concepções de língua / escrita e ensino de língua materna, que por
sua vez, respondem pelas suas práticas letradas. Como resposta a elas,
retomamos o estudo do artigo de opinião enquanto objeto de ensino-
aprendizagem da argumentação.
No capítulo 3, apresentamos os aspectos metodológicos da pesquisa,
dentre eles estão a natureza e tipo de pesquisa; a caracterização do contexto de
pesquisa; os sujeitos envolvidos; os procedimentos da coleta de dados,
destacando-se a seqüência didática como o tipo de intervenção adotada; os
instrumentos para a coleta de dados, seguidos dos procedimentos de análise, os
quais aparecem subdivididos em duas categorias.
No capítulo 4, com base nas categorias organizadas, analisamos os dados
coletados através da apresentação de exemplos (registros) comentados, os quais,
por sua vez, anunciam as considerações finais. Nestas, tecemos comentários a
respeito dos resultados da pesquisa. Seguem-se as Referências bibliográficas e,
em anexo, encontra-se o corpus da pesquisa.
15
Capítulo 1
Estudo Histórico das competências
Desde a Antiguidade greco-latina de Aristóteles, a argumentação é alvo de
interesse de estudiosos das diferentes áreas do conhecimento Gramática,
Lógica, Poética e Filosofia. As diversas abordagens presentes em cada uma
dessas áreas apresentam como ponto em comum a noção de que argumentar é
ato de convencer / persuadir o outro, através do discurso oral e / ou escrito.
Entende-se, portanto, que o uso da linguagem com fins persuasivos está
marcado pela presença de competências de quem fala / escreve. Os estudiosos
da língua denominaram essas competências de lingüística e comunicativa, as
quais se agregam / consolidam na competência argumentativa, de modo que
quem argumenta com proficiência, necessariamente tem habilidades com a língua
nos seus aspectos lingüístico e comunicativo (BALTAR, 2004). Passemos então
ao estudo de cada uma dessas competências.
1.1- Competência lingüística e comunicativa
É sabido que todo falante
1
nativo de Português, independentemente da
origem, idade, sexo e da situação sócio-econômica, produz sentenças bem
formadas, sejam elas próprias da chamada língua padrão ou de outras
variedades, mas que, de qualquer forma, estão de acordo com as regras do
sistema da língua que esse falante internalizou.
A essa capacidade de formar seqüências gramaticais adequadas às regras
do sistema lingüístico dá-se o nome de competência lingüística, sendo esta
inerente a todo falante. Não cabe, portanto, confundir o conceito de seqüências
bem formadas, oriundas da noção de competência lingüística, com a noção de
erro defendida pelas gramáticas normativas, segundo as quais toda sentença que
não siga as regras da língua padrão é considerada “errada”.
1
Nesta dissertação, falante será representado pelo aluno. Em várias passagens haverá um
deslocamento de “cidadão”, “sujeito”, “criança” para “aluno”. Tal deslocamento ocorre em função
do nosso objeto de estudo.
16
Segundo os PCN (1998, p.23),
a competência lingüística refere-se aos saberes que o falante /
intérprete possui sobre a língua de sua comunidade e utiliza para
construção das expressões que compõem os seus textos, orais e
escritos, formais ou informais, independentemente da norma padrão,
escolar ou culta.
Considerando a linguagem da criança, podemos dizer que se trata de um
fenômeno natural, pois antes mesmo de freqüentar a escola, ela domina sua
língua, de forma que seus enunciados são compreendidos pelos adultos sem
dificuldades.
Nesse sentido, Scherre (2005) compara o ato de falar ao de andar, o qual
acontece naturalmente em qualquer parte do planeta, nas mesmas faixas etárias,
independente de raça, cultura, cor, sexo e instrução. Segundo essa autora, a
criança, em interação, se apropria da língua, sendo capaz de pedir algo, informar,
perguntar, argumentar, entre outras habilidades. Para isso faz uso do vocabulário
específico da sua língua e mesmo aos três anos de idade, qualquer criança se
comunica usando estruturas lingüísticas complexas.
Além da competência lingüística, também a competência comunicativa
caracterizada pelo uso competente da língua que todo falante faz, no sentido de
saber o que falar e como falar com quaisquer interlocutores em quaisquer
circunstâncias (BORTONI- RICARDO, 2004).
Podemos assim dizer que nenhum falante usa mal a sua língua materna
(op.cit. p.110), isto é, todo falante tem competência lingüística; podemos também
dizer que de acordo com a situação comunicativa, com os interlocutores, e com
os objetivos da comunicação, o falante é capaz de adequar sua fala a tais
circunstâncias, ou seja, demonstrar sua competência comunicativa (BORTONI-
RICARDO, 2005). Para essa autora, os falantes, à medida que vão ampliando
suas experiências na comunidade onde vivem, adquirem recursos comunicativos
dos quais fazem uso ao assumir diferentes papéis sociais.
Quando esses papéis estão além do domínio da família e da vizinhança
mais próxima, ficam cada vez mais complexos e diversificados os usos da língua.
A comunicação torna-se cada vez mais propensa a atender a normas vigentes
nos novos domínios de interação social que passam a freqüentar.
17
A noção de competência comunicativa proposta por Dell Hymes
2
é central
na área de ensino e aprendizagem de línguas, uma vez que do ponto de vista da
Sociolingüística Educacional, um membro de uma comunidade de fala, para ser
aceito, deve aprender o que dizer, como dizer a qualquer interlocutor, em
qualquer circunstância (BORTONI-RICARDO, 2005).
Isso quer dizer que, para nos inserirmos de fato numa sociedade,
precisamos adequar nossa fala ao local e às pessoas desse local onde estamos,
de modo que dominemos as diversas situações comunicativas.
Hymes define a competência comunicativa como “o conhecimento (prático
e não necessariamente explicitado) das regras psicológicas, culturais e sociais
que comandam a utilização da fala num quadro social” (COSTE, 1997, p.11). A
aquisição progressiva dessa competência completa necessariamente a
competência gramatical do sujeito falante. Assim, segundo Neves (1997, p.15),
quando se diz que a gramática funcional considera a competência
comunicativa, diz-se exatamente que o que ela considera é a
capacidade que os indivíduos têm não apenas de codificar e decodificar
expressões, mas também de usar e interpretar essas expressões de
uma maneira interacionalmente satisfatória.
A competência comunicativa supõe o domínio de códigos, de variantes
sociológicas, e de critérios de passagem de um código ou de uma variante para
outros códigos; implica também num saber pragmático quanto às convenções
enunciativas que estão sendo usadas na comunidade.
Desse modo, a grande contribuição de Hymes foi acrescentar ao processo
tradicional de descrição gramatical a descrição das regras para o uso social
apropriado da língua. Assim, ele propôs a habilidade de exercer interação social
por meio da linguagem.
Discutindo sobre os deslizes ocorridos no trato das noções de competência
comunicativa e lingüística, Coste (op. cit.) tece alguns comentários pertinentes: O
2
O sociolinguista norte-americano Dell Hymes, em 1966 amplia o sentido do termo competência
lingüística, empregado por Chomsky, para além do nível estritamente gramatical, por entender que
este não conta das questões da variação da língua. Na perspectiva chomskyana tem-se a idéia
apenas de um sujeito falante ideal, cuja comunidade lingüística caracteriza-se pela
homogeneidade. Para Hymes, “os membros de uma comunidade lingüística partilham, ao mesmo
tempo, de uma competência de dois tipos: um saber lingüístico e um saber sociolingüístico, ou
ainda, um conhecimento conjugado das normas gramaticais e das normas de emprego” (BALTAR,
2004, p, 33).
18
primeiro é direcionado à tendência a se falar de competência comunicativa
considerando apenas a capacidade de participar, eficientemente, das trocas orais
face a face. Segundo esse autor, tal tendência é limitada porque teria apenas o
diálogo como prática e para isso existe o trabalho dos etnógrafos da
comunicação, que, por excelência, direcionam seus trabalhos para a observação
que privilegia as relações verbais face a face e “isso não significa que não seja
pertinente tratar de maneira semelhante às práticas da escrita...” (COSTE, 1997,
p. 12).
O segundo comentário refere-se à tendência de se considerar a
competência comunicativa como totalidade única. O autor argumenta que a
verdade é que “cada sujeito possui sua própria competência comunicativa”
(op.cit) e que esta competência
permitirá trocas eficazes, enquanto competência social, se comportar
largas zonas comuns com as dos outros atores sociais, mas que
também, sendo construída progressivamente por uma experiência
individual permanece irredutível a qualquer outra (op.cit).
O terceiro comentário é que uma tendência a se separar
categoricamente competência comunicativa e competência lingüística como se
elas fossem duas entidades complementares sem que houvesse outra relação a
não ser a de adição.
Sobre essa questão, o autor explica haver uma coexistência das duas
competências que não é de vizinhança, e sim de imbricação por se tratar de uma
língua natural, na sua afirmação:
a competência comunicativa abrange a competência lingüística ou, pelo menos,
controla o seu uso, não deixando de reconhecer que a gramática tem suas
próprias leis e que a competência comunicativa pode realizá-las e assumi-las
com fins pragmáticos respeitando o seu alcance e as suas tolerâncias (op. cit, p,
13).
Furlanetto (2005, p. 266), em estudo sobre a teoria do discurso de
Maingueneau, observa que ele, em análise de textos de comunicação, usa o
termo competência comunicativa para incluir o domínio dos gêneros.
Conforme essa autora, tal domínio “não significa que todos tenham ou precisem
ter o domínio de todos os gêneros”, o que necessitaria, em muitos
19
casos, de formação específica. Por outro lado, acreditamos na impossibilidade do
domínio dos gêneros na sua totalidade devido ao grande número existente e às
semelhanças entre muitos deles.
A competência comunicativa tratada no referido estudo se explica pela
habilidade de membros de uma sociedade poderem produzir textos em muitos
gêneros, especificamente naqueles que circulam numa dada sociedade (pedir
uma informação, escrever uma carta, preencher um formulário...).
Em todas essas produções, o falante articula as competências
comunicativa e lingüística, uma vez que, segundo Coste (1997, p. 13), “a
competência lingüística e a competência comunicativa estão uma e outra
mobilizadas por toda atividade da linguagem, escrita ou oral, de compreensão ou
de expressão”.
Nesse sentido, concordamos com os PCN (1998) que é tarefa da escola
ampliar os conhecimentos e as competências que o aluno possui, de modo que
forme cidadãos críticos e reflexivos, aptos a lidarem com as exigências sociais.
Para que o aluno sinta-se de fato inserido na sociedade, é necessário que
suas habilidades de uso com a língua sejam efetivadas, isto é, que as
experiências vivenciadas na escola com a língua sejam de fato reais, de tal modo
que os textos lidos / debatidos / produzidos encontrem fora da escola sua
efetivação. Somente assim, ele terá como retorno a certeza de que é capaz de se
comunicar em diferentes situações sociais, com diferentes interlocutores, fazendo
uso consciente da (s) modalidade (s) da língua.
Além das competências lingüística e comunicativa, o falante precisa
demonstrar uma outra competência para que, de fato, ele consiga convencer o
outro através do discurso produzido. Estamos tratando da competência
argumentativa, cuja base reúne domínios das competências tratadas, estando,
por esse motivo, ligadas a elas.
1.2- Competência argumentativa
No plano das competências com o uso da ngua, a competência
argumentativa agrega uma gama de contribuições das competências lingüística e
comunicativa. Isso porque para se argumentar e conseqüentemente convencer o
20
outro, é necessária a junção / consolidação do conhecimento lingüístico e
comunicativo.
O imbricamento dessas competências atende à necessidade social que
temos de defender cotidianamente nossos pontos de vista. Essa necessidade é
posta à prova no momento em que o (s) nosso (s) interlocutor (es) demonstra (m)
resistência à adesão, isto é, demonstra (m) dificuldades em “passar para o nosso
lado”. Por isso, temos que lançar o de certos artifícios da linguagem na
tentativa de persuadi-los.
De modo geral, esses artifícios incluem o uso da linguagem com vista à
produção do texto argumentativo estruturado, ou seja, o texto produzido com a
finalidade de convencer o leitor / ouvinte. Para tanto, esse texto deve apresentar
argumentos coerentemente formulados com o ponto de vista que se deseja
defender.
De modo específico, o texto dessa natureza deve apresentar, além do
ponto de vista, os recursos lingüísticos que o definem como tal, que tornam
possível a existência da coesão, isto é, os operadores argumentativos (CITELLI,
1994).
Produzir um texto dentro desses parâmetros é um pré-requisito para que
seu produtor seja considerado competente no uso da argumentação, fato que lhe
garante uma ampla e efetiva participação social.
Para assegurar o domínio, ou mesmo a excelência, na produção dos textos
argumentativos é que entra o papel da escola, cuja incumbência é de formar
cidadãos para o exercício pleno da cidadania, cidadãos que atestem a
capacidade de argumentar, ou em outras palavras, que demonstrem competência
argumentativa.
A noção de competência argumentativa que propomos neste trabalho está
ligada à proficiência que o usuário da língua possui para usar argumentos. É a
ação verbal dotada de intencionalidade por parte do falante capaz de fazer o outro
se convencer dos juízos de valor defendidos e criticados por esse usuário. Essa
competência permite ao produtor do texto a defesa de diferentes pontos de vista,
permite também a elaboração de argumentos plausíveis a temas com os quais o
produtor esteja ou não emocionalmente envolvido, considerando, nessas
situações, o uso dos operadores argumentativos dentro das suas funções.
21
Por outro lado, sabemos que para atingir o outro através do discurso e
assim conseguir a sua adesão, não se faz necessário que o usuário da língua
seja obrigatoriamente adulto.
Estudos recentes, a exemplo de Faria (2004) e Leal e Morais (2006), têm
demonstrado a capacidade que as crianças possuem de argumentar até mesmo
nos primeiros anos de vida. Na modalidade oral, essas produções podem ser
observadas, quando através da (re) formulação de argumentos, as crianças
conseguem a adesão dos pais e de outros adultos a fazerem seus desejos.
A esse respeito, Faria (op. cit, p.8-9) afirma:
a criança desde cedo argumenta em favor de um presente, de um
passeio que deseja fazer, de uma roupa que quer usar, do que deseja
comer, enfim, de uma série de situações que lhe dizem respeito.
Ao chegar à escola, as crianças evidenciam essa mesma capacidade nas
duas modalidades de uso da ngua: na modalidade escrita, isso acontece,
quando na escola, desde as primeiras séries, demonstram habilidade em
construírem argumentos por escrito quando têm como tarefa defender seus
pontos de vista sobre um tema proposto. Embora se trate do discurso infantil, é
possível percebermos a presença da competência argumentativa evidenciada nos
discursos produzidos (em defesa do meio ambiente, por exemplo). Ainda na
escola é possível constatarmos a competência argumentativa na modalidade oral,
especificamente durante as aulas.
Tal constatação somente é possível quando o ambiente de ensino é
pautado na interação professor x aluno, com práticas marcadas por diversos
momentos em que o aluno precise explicar escolhas, criticar, assumir pontos de
vista, defendê-los; enfim, quando a todo o momento o aluno é convidado a
argumentar. Conforme reitera Koch (2000, p. 19), “a interação social por meio da
língua caracteriza-se, fundamentalmente, pela argumentatividade”.
Dessa forma, podemos dizer que é no ambiente da sala de aula que a
competência argumentativa, além de se evidenciar, se desenvolve ou se anula. É
nela, através dos textos que circulam e da metodologia utilizada pelo professor
que o gerenciadas informações capazes (ou não) de fazer o aluno um sujeito
conhecedor das técnicas de argumentação, um usuário competente dos
22
operadores argumentativos, que entram na organização de textos, marcados por
seqüências argumentativas.
Segundo Faria (2004), a escola pode e deve melhorar a prática
argumentativa de seus alunos, para que desenvolvam o pensamento crítico e
para que, na hora de produzir um discurso argumentativo, essa prática se torne
menos traumática.
Defendemos, portanto, para o desenvolvimento da competência
argumentativa dos alunos a realização de aulas mediadas por textos escritos,
para serem lidos e debatidos, conforme orientam os PCN (1998).
Com uma prática dessa natureza, a escola, aqui representada pelo
professor, tem condições de oferecer um ensino comprometido com a habilidade
de argumentar, a qual o aluno deverá demonstrar na sociedade, dado seu
prestígio que explica o fato de ser cultivada / apreciada desde os primórdios da
História pelos gregos, como veremos a seguir:
1.3- Estudos sobre argumentação
Para o desenvolvimento da presente dissertação, faremos um percurso
sobre o modo como a argumentação tem sido vista desde a antiguidade, através
das contribuições de Aristóteles, até a modernidade, representada pelas reflexões
de Perelman e Olbrechts-Tyteca [1958] (2005) e de seus seguidores. Por esse
motivo, os estudos sobre argumentação estão divididos em dois momentos
distintos, a saber:
1.3.1- A Retórica Clássica
Defender pontos de vista, convencer alguém de alguma coisa ou mesmo
discursar visando à adesão dos ouvintes, embora pareçam práticas de pessoas
consideradas modernas, são práticas que remontam o século V a.C. Segundo
Faria (op. cit), os povos mais antigos (hindus, egípcios, chineses e hebreus)
fizeram uso da linguagem persuasiva.
Nessas épocas remotas, com as constantes lutas em defesa de seus bens,
os antigos necessitavam defendê-los fazendo uso da linguagem. Para tal
23
situação, as escolas de retóricas foram as pioneiras a tratarem da argumentação,
sendo esta consolidada em teoria com Aristóteles, em seu livro Arte Retórica.
Nesse livro havia a preocupação com as técnicas de organização do
discurso e com a persuasão (CITELLI, 1998), tornando-se um testemunho das
discussões sobre a caracterização do discurso, na medida em que seu autor se
opunha aos instrutores de retórica, seja quanto à concepção da mesma, seja
quanto ao modo de representar o discurso (BONINI , 2002).
Para Aristóteles (s.d, p. 33),
a Retórica é a faculdade de ver teoricamente o que, em cada caso,
pode ser capaz de gerar a persuasão. Nem uma outra arte possui esta
função, porque as demais artes têm, sobre o objeto que lhes é próprio,
a possibilidade de instruir e de persuadir; por exemplo, a Medicina,
sobre o que interessa à saúde e à doença, a Geometria, sobre as
variações das grandezas, a Aritmética, sobre o mero, e o mesmo
acontece com as outras artes e ciências. Mas a Retórica parece ser
capaz de por assim dizer, no concernente a uma dada questão,
descobrir o que é próprio para persuadir.
Assim, podemos afirmar que a retórica tem algo de ciência; é através dela
que conhecemos os passos para se produzir a persuasão, ou seja, ela tem como
revelar como esta se faz. Com efeito, o domínio da retórica seria o domínio dos
meios para se atingir a persuasão. Sendo, portanto, seu objeto a arte de falar em
público de modo persuasivo.
Dessa forma, os antigos retóricos, preocupados com o desenvolvimento da
capacidade de argumentar, desenvolveram uma descrição das partes
convencionais do discurso que, somada a outros conteúdos, funcionava como um
conjunto de regras rígidas do bem falar.
De acordo com a natureza e o papel a ser desempenhado, o discurso
argumentativo podia ser dividido em 4 partes: o exórdio (introdução do discurso
com uma prévia do assunto a ser tratado); a narração (exposição do fato que
origem à discussão); as provas (argumentação propriamente em torno do fato) e a
peroração (resumo das provas e fecho do discurso).
Aristóteles se opunha a uma aplicação simplista deste tipo de descrição e à
visão de retórica, que ele encerrava em afirmações como esta:
24
[...] não resta a mínima dúvida que os autores de artes retóricas
permanecem fora do assunto, quando fornecem regras para tudo o
mais, quando fixam qual deva ser o conteúdo do exórdio, da narração e
de cada uma das outras partes do discurso. Procedendo assim,
contentam-se com indicar o meio de situar o juiz nesta ou naquela
disposição; mas no tocante à Arte, propriamente dita, das provas,
omitem toda e qualquer indicação, não obstante sua importância para
adestrar no manejo do entimema
3
(ARISTÓTELES, s.d, p. 30).
Para esse filósofo, o papel da retórica não era o de servir como técnica de
persuasão (ou para a prática da eloqüência), mas o de estudar os processos
persuasivos que possam existir em cada situação discursiva.
Nesse sentido, o filósofo passa a pensar a forma do texto não como uma
abstração, mas como algo que depende da situação em que está envolvido,
porém sempre em relação às possibilidades de convencimento.
Uma descrição como a apontada acima não se aplicaria, assim, a todas as
situações discursivas, variando em cada gênero do discurso que, para Aristóteles
eram três: o judiciário, no qual o auditório julga uma ação passada; o deliberativo,
em que o auditório julga uma ação futura e o epidítico, no qual o auditório não tem
que julgar ações passadas nem futuras. Portanto, esses gêneros se ligam
intimamente “ao tipo de auditório a que se dirige e às funções dos oradores:
julgar, aconselhar e fazer uso do jogo oratório” (FARIA, 2004, p. 18).
Além desses pontos, é preciso salientar dois aspectos da obra aristotélica:
a importância atribuída ao conhecimento do auditório; e o seu pioneirismo em
reconhecer claramente que a retórica em si mesma é moralmente neutra,
podendo ser usada para o bem ou para o mal (PERELMAN e OLBRECHTS-
TYTECA, [1958] 2005).
Nesse sentido, em termos de argumentação, Aristóteles deixa o seu legado
para a posteridade. Quando, por exemplo, na escola, o aluno é convocado a
produzir um texto com o objetivo de convencer alguém, e por assim dizer,
demonstrar sua competência argumentativa, ele coloca em prática um conjunto
de referências codificadas muito tempo (séculos) e dadas como estruturadoras
do tipo de texto solicitado.
3
Entimema, em Aristóteles, é uma classe de silogismos, o silogismo retórico, baseado em
semelhanças e sinais, e desobrigado da função de conduzir a uma conclusão verdadeira.
25
1.3.2 - A Nova Retórica
Com o surgimento da Nova Retórica, os principais elementos da retórica
aristotélica submeteram-se a uma visão atualizada do assunto, especialmente
com os trabalhos de Perelman (KOCH, 2000).
Assim, a partir de 1947, na Bélgica, Chaïm Perelman e sua colaboradora,
Lucie Olbrechts-Tyteca deram início a pesquisas que alteraram o quadro dos
estudos da argumentação, com a publicação da obra Tratado da Argumentação
[1958] (2005).
A retórica moderna retoma as concepções que haviam sido deixadas para
trás, ou seja, “reaparece aquele tópico que deseja estudar a organização
discursiva a fim de apreender os procedimentos que permitem ligar a adesão de
um ponto de vista àquelas idéias que lhe são apresentadas” (CITELLI, 1998, p,
17).
Perelman e Olbrechts-Tyteca (op.cit) propõem um novo paradigma
filosófico, analisando a argumentação numa perspectiva diferente da antiga
retórica de Aristóteles. A idéia básica do trabalho desses estudiosos é analisar os
aspectos particulares da argumentação, conferindo ênfase, principalmente, às
características próprias do orador, assim como do auditório, procurando,
paralelamente, estabelecer os laços que ligam um ao outro, ou seja, como o
auditório exerce influência sobre o orador, e como este, por sua vez, se adapta ao
auditório.
A crítica desses autores se pauta no fato de que a retórica aristotélica
centrava seus estudos na arte de falar em blico, como uma forma de obter a
adesão do auditório. Como retórica significa eloqüência, o dom da palavra ou
arte do bem falar pode parecer, à primeira vista, que a referida obra não passe
de um tratado sobre a forma de discursar. No entanto, ela é um estudo sobre a
dialética no velho e tradicional sentido aristotélico, em que se objetiva explorar os
caminhos que levam à constatação estrutural da argumentação, como elemento
de comunicação ou de convencimento de um ou de vários interlocutores, que
chamamos de auditório.
A nova retórica preocupa-se com a argumentação do ponto de vista da
linguagem falada e escrita, embora a ênfase seja dada aos textos escritos. Esta
26
abordagem teórica conserva da retórica clássica a idéia de auditório, de orador e
de discurso, elementos responsáveis pelo movimento argumentativo, mas seu
objeto de estudo é, sobretudo, a estrutura da argumentação, sem haver uma
preocupação com as leis da lógica
4
.
Essencialmente, Perelman redefiniu a retórica de modo que esta passa a
compreender toda a manifestação discursiva que visa à adesão do ouvinte, como
também salientou a natureza temporal da argumentação e, conseqüentemente,
seu caráter não restritivo (OSAKABE, 1979). Isso significa que a argumentação
produzida num dado momento pode não apresentar o mesmo efeito de outrora,
pois depende sobremaneira do seu contexto de produção.
Da Retórica Clássica, Perelman e Olbrechts-Tyteca [1958] (2005) conservam a
noção de auditório (conjunto de todos aqueles que o orador deseja influenciar
mediante a argumentação produzida), pois segundo esses estudiosos, toda
argumentação é pessoal e
Todo discurso se dirige a um auditório, sendo muito freqüente esquecer que se
o mesmo com todo escrito. Enquanto o discurso é concebido em função direta do
auditório, a ausência material de leitores pode levar o escritor a crer que es
sozinho no mundo, conquanto, na verdade, seu texto seja sempre condicionado,
consciente ou inconscientemente, por aqueles a quem pretende dirigir (op. cit, p,
7).
Desse modo, o auditório recebeu a seguinte classificação: auditório
particular - formado no diálogo, pelo interlocutor ou interlocutores a quem o
discurso é dirigido; e auditório universal - constituído por toda a humanidade, os
homens em geral, todo ser de razão.
Perelman e Olbrechts-Tyteca (op.cit) fazem duas distinções fundadas na
natureza do ouvinte presumida pelo locutor: a persuasiva e a convincente. A
primeira é válida para um auditório particular e a segunda está relacionada a um
auditório universal, ou seja, pretende obter a adesão de todo ser racional.
Koch (2000, p.20) diferencia esses dois tipos de auditórios da seguinte
forma: o ato de convencer
se dirige unicamente à razão, através do raciocínio
lógico e por meio de provas objetivas é capaz de atingir um auditório universal, ou
4
Lógica é o estudo dos métodos e princípios usados para distinguir o raciocínio correto do
incorreto. Lógica e raciocínio dedutivo não estão preocupados em examinar a verdade das
premissas em um argumento lógico (...), a preocupação é com o fato de se as premissas
envolvem logicamente a conclusão (COPI, 1982, p.19 apud DIAS, 1996, p.13).
27
seja, trata-se da busca pela razão, de caráter puramente demonstrativo e
atemporal; o ato de persuadir se dirige ao auditório particular, pois esse ato
procura atingir a vontade e o sentimento do (s) interlocutor (es), através de
argumentos plausíveis ou verossímeis e tem caráter ideológico, subjetivo e
temporal.
A grande contribuição de Perelman e Olbrechts-Tyteca [1958] (2005) foi
dar início a uma nova discussão sobre argumentação, cuja perspectiva (filosófica)
tem como objeto de estudo o discurso em ação. Ou seja, a linguagem é
concebida como lugar de ação e de interação. Nessa perspectiva a argumentação
está fora da lingua(gem).
Embora a revisão teórica inicial situe alguns estudiosos da argumentação,
nossa perspectiva teórica está pautada noutro eixo. Em particular, nas
contribuições teóricas advindas da Semântica Argumentativa (Ducrot), por
concordarmos com a concepção teórica de que a argumentação está na língua.
Portanto, para essa perspectiva quando se aprende uma língua está se
adquirindo a competência argumentativa, como veremos no tópico a seguir:
1.4- A Semântica argumentativa e os operadores argumentativos
Oswald Ducrot define a argumentação como um ato lingüístico
fundamental, um elemento estruturante do discurso. Para ele, não falamos sobre
o mundo, falamos com a finalidade de construir um mundo e a partir dele, tentar
convencer nosso interlocutor de nossa verdade. Verdade essa criada pelas e nas
nossas interlocuções, sendo, pois relativa à comunidade que se forma na
argumentação.
Nesse sentido, não falamos para trocar informações sobre o mundo, mas
para convencer o outro a entrar no nosso jogo discursivo, ou, em outras palavras,
para convencê-lo de nossa verdade. Assim, o ato de argumentar, objeto de
estudo dos filósofos, “passa a ser uma característica intrínseca a toda e qualquer
interação e, portanto, preocupação de todos aqueles que se preocupam com as
interações cotidianas” (ESPÌNDOLA, 2005, p.19).
A Semântica Argumentativa postula uma pragmática integrada à descrição
lingüística, em que o semântico, o sintático e o pragmático se interligam, de modo
28
que a argumentativide está inscrita na própria língua, ou seja, esta é
argumentativa na sua essência, no seu modo de existir enquanto tal (DUCROT,
1999). Ducrot (1989, p. 18) explicita esta idéia na seguinte afirmação:
A argumentação pode estar diretamente determinada pela frase, e não
simplesmente pelo fato de que o enunciado da frase veicula. Neste
caso, dir-se-á que a argumentação está na língua, nas frases, que as
próprias frases são argumentativas.
Desse modo, o homem, em interação com o seu meio social, necessita
constantemente defender pontos de vista, convencer alguém de alguma coisa,
isto é, argumentar a fim de estabelecer uma comunicação profícua.
Nessa perspectiva, o uso da língua consiste fundamentalmente no
“esforço” de tentar formar a opinião do “outro”, buscando convencê-lo a aderir ao
discurso proferido. Para Ducrot ( op. cit, p. 07),
argumentar é com efeito, segundo a concepção usual dessa atividade,
apresentar de início ao alocutário uma afirmação, que ele pode admitir
ou rejeitar, e pretender em seguida, no caso em que é admitida, que ela
obrigue a aceitar uma certa conclusão.
Para atingir esse fim, a noção de argumentação materializada na língua
durante a interação assume um papel significativo na sociedade. A esse respeito,
Leal e Morais (2006, p. 08) definem o ato de argumentar como sendo
(...) uma atividade social especialmente relevante, que permeia a vida
dos indivíduos em todas as esferas da sociedade, pois a defesa de
pontos de vista é fundamental para que se conquiste espaço social e
autonomia.
Atribuímos essa atividade à competência argumentativa, freqüentemente
requerida nas interações que ocorrem nos diversos meios sociais dos quais
fazemos parte. Em todas essas interações, a linguagem argumentativa manifesta-
se através do uso de elementos lingüísticos que asseguram a argumentação, os
denominados operadores argumentativos.
Tomados em sentido amplo, costumam ser denominados de marcas
linguísticas da enunciação ou da argumentação. Outras vezes, também em
29
sentido amplo, o denominados modalizadores, por terem a função de
determinar o modo como aquilo que se diz é dito (KOCH, 1992).
Koch (op.cit) relata que o termo operadores argumentativos foi utilizado por
Ducrot, criador da Semântica da argumentação, para referir-se a certos elementos
da gramática de uma língua que têm por função indicar (“mostrar”) a força
argumentativa dos enunciados e o sentido para o qual apontam.
Há que ressaltar, aqui, que o termo operadores argumentativos, em sentido
amplo, como vimos no parágrafo acima, abrange: operador argumentativo (em
sentido estrito) partícula da língua que, aplicada a um enunciado, indicará o
topos e a força com que este será atualizado; conector argumentativo partícula
da língua que articula duas porções textuais, indicando o topos e a respectiva
força com que será atualizado; e modificador (realizante e derrealizante)
palavras cuja função é modificar os predicados de uma língua (nomes e verbos),
indicando o topos e a força com que serão aplicados a uma determinada situação
/ pessoa / fato (ESPÍNDOLA, 2005).
O termo topos, oriundo da Retórica Clássica, foi incorporado por Ducrot na
sua Teoria da Argumentação da Língua. É parte constitutiva do sentido, é a
garantia da argumentação, uma vez que ele passa a ser ponto de articulação
entre a língua e o próprio discurso.
Para este trabalho, demos prioridade aos operadores argumentativos no
sentido estrito. Assim, com base em Koch (op. cit), vejamos no quadro 01 a
distribuição dos principais operadores argumentativos e suas respectivas funções:
30
Quadro 01: Quadro dos principais operadores argumentativos
Tipos
Funções
Exemplos
1- Reforço de argumento;
Assinalar o argumento mais forte de
uma escala orientada no sentido de
determinada conclusão.
Até, mesmo, até mesmo, inclusive, etc.
2- Acréscimo de argumentos; Somar argumentos a favor de uma
mesma conclusão
e, também, ainda, nem (=e não), não
só..., mas também, tanto... como, além
de... além disso..., a par de... etc.
3- Introdução de conclusão
relacionada a enunciados anteriores;
Introduzir uma conclusão a
argumentos anteriormente citados.
Portanto, logo, por conseguinte, pois,
em decorrência, conseqüentemente,
etc.
4- Introdução de alternância; Introduzir argumentos alternativos que
levam a conclusões diferentes ou
opostas.
Ou, ou então, quer... quer, seja... seja,
etc.
5- Relação de comparação; Estabelecer comparações entre
elementos para se chegar à
conclusão.
Mais que, menos que, tão... como, etc.
6-Introdução de justificativa /
explicação relacionada ao enunciado
anterior;
Apresentar uma asserção derivada
que visa esclarecer, retificar,
desenvolver uma enunciação anterior.
Porque, que, já que, pois, isto é, ou
seja, etc.
7- Marcadores de oposição 7- Marcadores de oposição Mas,(porém, contudo, no entanto),
embora (ainda que, posto que, apesar
de (que), etc.
8-Introdução de pressupostos; Indicar mudança de estado e / ou
introduzir mais de um argumento a
favor de determinada conclusão.
Já, ainda, agora, etc
9- Distribuição de escalas opostas. Selecionar os operadores em escalas
opostas ( afirmação total (tudo, todos
) e negação total (nada, nenhum) para
dar seqüência ao discurso.
Quase, apenas, um pouco e pouco.
Esses operadores não se esgotam na listagem acima, evidentemente
outros tipos que, como esses, fazem parte da gramática da língua. Muitos deles
aparecem nas gramáticas tradicionais sob a denominação de palavras
denotativas de inclusão, de exclusão, de retificação, etc, porém tais palavras
também são responsáveis pela força argumentativa dos nossos textos, sejam eles
orais ou escritos.
É o operador argumentativo que estabelece a diferença entre duas frases
aparentemente iguais. Após análises de expressões como ‘pouco e um pouco’,
Anscombre e Ducrot (1994) defendem que os enunciados com esses morfemas
31
são sinônimos do ponto de vista factual, porém apresentam orientações
argumentativas diferentes, como podemos observar nos exemplos:
(a) a menina estudou pouco.
(b) a menina estudou um pouco.
A diferença situa-se no nível argumentativo e não no informativo, pois do
ponto de vista factual, os dois exemplos permite uma mesma interpretação no
nível enunciativo estudar um pouco pode ser uma hora, estudar pouco pode ser
igualmente uma hora.
Para Faria (2004), a relevância de estudar a argumentação pelo viés da
Semântica desfaz a concepção da tradição retórica dominante, que considera
língua e argumentação de modo separado.
Com Ducrot, a argumentação passa a ter características eminentemente
lingüísticas, pertencentes à lógica da língua que, por sua vez, desempenha um
papel central na linguagem; ou seja, torna-se parte intrínseca dela e por isso o
se confunde com a lógica do pensamento ou lógica clássica, cuja visão concebe a
argumentação exterior à língua (FARIA, op. cit).
A partir do exame dos operadores organizados no quadro, percebe-se que
todos eles fazem parte da gramática da língua e supõem um valor argumentativo
da própria gramática. Admitir esse valor é que nos leva a postular a
argumentação como ato lingüístico fundamental.
Para explicar o funcionamento dos operadores argumentativos, Ducrot
(apud Koch 1992, p. 30), relaciona-os aos conceitos de classe argumentativa e
escala argumentativa. Uma classe argumentativa se constitui de um conjunto de
argumentos que têm a mesma força argumentativa para levar a uma conclusão.
Exemplos:
Classe argumentativa: (1) João é o melhor candidato (conclusão R)
arg. 1 tem boa formação em Economia; arg. 2 tem experiência no cargo; arg.
3 não se envolve em negociatas etc (todos os argumentos têm o mesmo peso
para levar o alocutário a concluir R)
De acordo com os argumentos apresentados no exemplo acima, ter boa
formação em Economia, além de ter experiência no cargo que ocupa, não se
envolvendo em passeatas, são pré-requisitos que levam o alocutário à conclusão
de que João seja o melhor candidato.
32
Uma escala argumentativa representa uma graduação na força
argumentativa dos enunciados para se chegar à conclusão (a que, por
convenção, se denomina R). Para estudarmos a escala argumentativa segue o
exemplo: Escala argumentativa: (2) A apresentação foi coroada de sucesso
(conclusão R)
arg. 1 estiveram presentes personalidades do mundo artístico; arg. 2
estiveram presentes pessoas influentes nos meios políticos; arg. 3 esteve
presente o Presidente da República (argumento mais forte).
Com base nos argumentos apresentados acima, afirmamos que para se
chegar à conclusão houve o aspecto gradativo dos argumentos, de modo que
cada um, analisados individualmente, não foi capaz de dar conta da conclusão. É
necessário, portanto, de um argumento mais forte em relação aos apresentados
anteriormente, para que a argumentação convença de fato.
Produzir uma argumentação levando em conta os conceitos de classe e
escala argumentativa, por um lado, pode representar uma tarefa árdua para o
aluno acostumado a práticas de escrita do texto argumentativo embasadas em
modelos prontos. Por outro lado, vai exigir dele o domínio no uso dos operadores
argumentativos dentro das suas funções, o que lhe confere competência
argumentativa.
No que concerne ao processo ensino-aprendizagem dos operadores
argumentativos, em grande parte das nossas escolas estes são estudados como
conjunções coordenativas e subordinativas. Os alunos, na maioria das vezes, os
decoram sem, contudo, relacionar seu uso ao contexto de produção (POSSENTI,
2004). Tal prática, por sua vez, compromete o desenvolvimento da competência
argumentativa desses alunos porque estes, no momento de usá-los, não saberão
adequá-los às suas funções e aos propósitos de atingir o (s) interlocutor (es).
Desse modo, o professor que elege a argumentação como objeto de ensino de
suas aulas deve estar consciente, em primeira instância, de que a argumentação
está na língua e ao aprendê-la (a língua), se adquire a competência
argumentativa, que poderá ser aprofundada / redimensionada na escola,
mediante as oportunidades de uso da língua dadas aos alunos.
Nesse sentido, os alunos, oralmente ou por escrito, tendem a produzir
enunciados argumentativos, obedecendo a uma estrutura lingüística interna, o
33
que, por sua vez resulta numa argumentação que contempla os diversos
operadores argumentativos existentes na língua. Na modalidade escrita, essa
argumentação aparece materializada em gêneros específicos para esse fim,
como é o caso do artigo de opinião, de que trataremos a seguir.
1.5- O artigo de opinião como gênero da ordem do argumentar
De acordo com o estudioso russo Bakhtin ([1953],2000), a cada tipo de
atividade humana que implica o uso da linguagem corresponde enunciados
particulares, os gêneros discursivos. Assim, sempre que falamos, utilizamos
gêneros do discurso, ou seja, todos os enunciados são construídos a partir de
uma forma padrão de estruturação.
São definidos, portanto, como “tipos relativamente estáveis de enunciados”,
(p. 279) ligados a alguma esfera da comunicação humana, com finalidade
discursiva definida, e, como acrescenta Marcuschi,
Fruto de trabalho coletivo, os gêneros contribuem para ordenar e
estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. São entidades
sócio-discursivas e formas de ação social, incontornáveis em qualquer
situação comunicativa (2002, p.19).
Esses enunciados relativamente estáveis o construídos sócio-
historicamente e se relacionam diretamente a diferentes situações sociais, sendo
que cada situação gera um determinado gênero com características temáticas,
composicionais e estilísticas próprias (BAKHTIN, op. cit)). Assim, pode-se afirmar
que o artigo de opinião possui características próprias que permitem aos leitores
não confundi-lo, por exemplo, com uma notícia.
Enquanto entidades sócio-discursivas e formas de ação, os gêneros
pertencem a certas esferas da comunicação humana, como a esfera do discurso
jornalístico, na qual temos diversos gêneros, inclusive nos jornais diários
impressos.
O artigo de opinião é um gênero específico no qual alguém, não
necessariamente os jornalistas, desenvolve uma idéia e apresenta uma opinião
que é publicada nos editoriais e nos suplementos especializados (MELO, 2003).
34
A imprensa mundial, especificamente a européia e americana, concebe o
artigo de opinião de maneira diversificada. No entanto, não é do nosso interesse
aprofundarmos nossa atenção a tais diversificações, de modo que nos deteremos
nas concepções que perpassam o jornalismo brasileiro. Nesse âmbito, tal gênero
pertence à categoria de jornalismo opinativo, representada por aqueles textos em
que consta a opinião expressa de um orador sob um determinado fato ou tema.
O artigo de opinião é um gênero cuja angulagem é determinada pelo
critério de competência de seus autores, que, por sua vez, têm a preocupação de
apresentar valores inerentes aos fatos que analisam, princípio capaz de
aproximar esse gênero da resenha (MELO, 2003).
Segundo esse autor, a palavra artigo, no âmbito social, possui duas
significações de natureza diferenciadas: o senso comum tem uma concepção
restrita, que considera o artigo de opinião apenas enquanto produto, ignorando o
processo, ou seja, ele não passa de uma matéria publicada em jornal e revista.
Por outro lado, as instituições jornalistas concebem a noção de artigo de
maneira ampliada: é um gênero escrito por um colaborador do jornal, que
geralmente é uma pessoa que exerce influência na sociedade.
Segundo Cunha (2002, p. 170),
O artigo de opinião expõe o ponto de vista de um jornalista ou de um
colaborador do jornal, fazendo uso de iticos e do presente do
indicativo como tempo de base num contexto claramente argumentativo.
O jornalista / colaborador faz uso da palavra, sustenta seu ponto de vista
sobre determinado assunto da atualidade. O que for por ele defendido e criticado
não significa esgotar o assunto.
Ao contrário, os leitores valendo-se do discurso existente, o ampliarão com
seus pontos de vista, o permitindo que a palavra final pertença a outrem. Tal
liberdade confere ao artigo de opinião seu caráter democrático.
Considerado um gênero caracteristicamente argumentativo, o artigo de
opinião busca convencer o outro de uma determinada idéia, a princípio,
controversa. O discurso que permeia esse gênero é formado no -dito social. Na
afirmação de Cunha (op. cit, p.179),
35
o artigo de opinião é constituído de outros discursos sobre os fatos comentados e
de antecipações das objeções do leitor, para fazer aderir ao seu ponto de vista e
para criticar os outros com os quais mantém uma relação de conflito.
Assim, o artigo de opinião é um gênero discursivo jornalístico, cuja
especificidade está exatamente em argumentar sobre um tema determinado,
presente na mídia. Envolve um diálogo com seus interlocutores (auditório
particular) e com os discursos proferidos, numa reação de crítica / apoio a
esses discursos ou mesmo como ponto de partida para novos argumentos e
novas teses.
Nesse sentido, Bräkling (2000, p. 226) o define como sendo
um gênero de discurso em que se busca convencer o outro de uma
determinada idéia, influenciá-lo, transformar os seus valores por meio
de um processo de argumentação a favor de uma determinada posição
assumida pelo produtor e de refutação de possíveis opiniões
divergentes.
É um processo que prevê uma operação constante de sustentação das
afirmações realizadas, por meio da apresentação de dados consistentes que
possam convencer o interlocutor (auditório). É, portanto, inevitável a refutação por
parte desse interlocutor, pois, conforme Rosenblat (2000, p.198),
(...) se podemos antecipar que nosso interlocutor não está minimamente
disponível para uma negação de opiniões ou posições sobre um dado
tema, não se estabelecerá uma comunicação de cunho argumentativo.
Nesse sentido, Santos (1996 apud FARIA, 2006, p.27) aponta duas
condições necessárias para que ocorra o discurso argumentativo:
primeiro, que haja uma diferença de opinião a respeito de um mesmo
tema entre falante e ouvinte; segundo, que o argumentador se imagine
com a capacidade de convencer seu interlocutor.
Por esse motivo, segundo Leal e Morais (2006), para que a argumentação
se efetive, é preciso que haja um tema passível de debate, uma idéia a ser
defendida, proposições que justifiquem e / ou refutem a declaração, como
36
também um antagonista, podendo ser uma pessoa ou grupo de pessoas (reais ou
virtuais). O discurso argumentativo é dialógico, uma vez que é inegável a
presença de um interlocutor que vai apresentar contra-argumentos em relação à
proposição defendida.
A posição do autor contribui para a formação de visões de mundo, pontos
de vista e concepções que pretendem, em última instância, influenciar nos
conceitos, idéias e opiniões das pessoas. Em função dessa finalidade, o artigo de
opinião apresenta-se sob duas feições: o artigo doutrinário e o científico.
O artigo doutrinário tem como objetivo levar o público leitor a ver e julgar,
de uma determinada maneira, uma questão atual, embasado pela condição de
intelectual compromissado com o presente do articulista.
O artigo científico tem o compromisso de tornar público o avanço das
ciências. Raramente aparece nas edições diárias dos jornais. É mais freqüente
nas edições dominicais dos diários ou nas seções especiais dos seminários e dos
periódicos de informação geral.
Esse tipo de artigo conta com duas subdivisões explícitas: o artigo de
divulgação, cuja característica é fazer chegar aos leitores o andamento das
pesquisas científicas; e o artigo educativo, caracterizado por apresentar ao leitor
uma série de argumentos, buscando fazê-lo aceitar a nova descoberta ou o uso
de uma nova tecnologia (MELO, 2003).
Quanto à estrutura, o artigo de opinião, é formado prioritariamente por
seqüências argumentativas, frases nominais para constituição do título, assinatura
do produtor acompanhada do nome da instituição à qual está vinculado.
No plano enunciativo, algumas características comuns, são os enunciados
irônicos ou sarcásticos, com o intuito de aguçar a crítica do leitor, além do uso de
enunciados produzidos por pessoas consideradas lebres (argumento de
autoridade).
37
Capítulo 2
A formação do professor de língua portuguesa
A formação do professor de língua materna é um dos principais parâmetros
quando se pretende pôr em discussão os resultados de sua atuação em sala de
aula (KLEIMAN, 2001; GUEDES, 2006; BUNZEN & MENDONÇA, 2006).
Problemas referentes à aprendizagem dos alunos quanto à leitura, à escrita
e outros aspectos, encontram no professor um dos responsáveis. Esse quadro do
ensino / aprendizagem geralmente associa-se à formação escolar desse
profissional, pois sua ação docente reflete as concepções que tem sobre língua,
texto, leitura e sobre o ensino e a aprendizagem.
Uma formação docente inadequada tende a repercutir no modo como o
professor trata os aspectos relacionados ao ensino da disciplina sob sua
responsabilidade. A formação do professor parece constituir o principal alvo de
acusações, pois lhe é delegada a tarefa de preparar os profissionais competentes,
cujas capacidades possam inverter tais problemas, melhorando assim o
desempenho dos alunos nesses aspectos.
Para a sociedade, é consenso que o professor de Português seja um
sujeito com amplo domínio da leitura e da escrita, ou em outras palavras, que seja
um sujeito letrado. Assim, é contraditório falar de um professor de língua materna,
considerado um representante por excelência da cultura letrada, que não domine
as habilidades de leitura e escrita. Entretanto, segundo Kleiman (op.cit , p, 41),
A representação social mais comum da professora alfabetizadora (e,
também em menor grau, de toda professora, inclusive a de Português) é
a de um sujeito com falhas sérias nas suas capacidades para ler e
escrever: alega-se que ela não é plenamente letrada.
Para essa autora, o retrato da professora divulgado pela imprensa e pelo
mundo acadêmico é de uma mulher não competente no exercício da sua
profissão. Problemas desde a escolha do material didático, a suas práticas
letradas (incapacidade de escrever um parágrafo em prosa coerente, erros
básicos de ortografia e concordância ao escrever, falta de interesse das alunas
38
nos cursos de Pedagogia e Letras, além de não cultivar o habito de leitura) o
recorrentes na sua vida profissional.
Atribui-se grande parte desses problemas à própria história do se fazer
docente. Muitos professores provêm de famílias de baixa ou nenhuma
escolaridade, fato que, em muitos casos, constitui-se como únicos letrados na
família, cujo diploma é resultado do esforço coletivo desses, visivelmente
representado como comprovação de ascensão social via escola (KLEIMAN,
2001).
Desse modo, um “letramento forçado”, frente às exigências de natureza
profissional. Sendo, pois, contraditória a missão do professor de português, que
tem nas mãos a tarefa de formar leitores e produtores de textos, uma vez que ele
mesmo não é considerado como tal.
Segundo Almeida (2001), as leituras que o professor faz fora da sala de
aula vão ajudá-lo na sua auto-estima, na maneira como o aluno o ver, pois o
professor-leitor tem garantida sua identidade profissional, identidade essa surgida
de maneira não muito satisfatória, tendo em vista o que inicialmente se
convencionou chamar “professor de Português”.
De acordo com Soares (2001), a disciplina Língua Portuguesa ou
Português passou a fazer parte dos currículos escolares tardiamente, e o
processo de formação de professores de Português teve início nos anos 30 do
século XX. Os chamados professores de Português eram médicos, advogados,
engenheiros e outros profissionais que, sem qualquer formação específica para a
disciplina, davam suas aulas seguindo um manual didático o qual somente a eles
cabia o direito de comentar e discutir, enquanto profundo conhecedor da área.
Para tais aulas esses profissionais precisavam apenas dominar a tradição da
gramática, da retórica e da poética.
O perfil do professor altera-se ao longo dos anos, uma vez que os manuais
didáticos, a partir dos anos 50, passaram a dar autonomia ao professor com
exercícios de leitura e interpretação textual, garantindo, de certa forma, o
exercício de professores formados. Embora haja o aumento do número de alunos
e conseqüentemente de professores, os salários, ao contrário, passaram a
diminuir e o professor teve de assumir outras turmas visando ao aumento salarial.
39
Como conseqüência disso, a prática docente delimitou-se pelo uso quase
absoluto do livro didático. Conforme Guedes (2006, p, 19),
Nunca houve no Brasil nenhum esforço pela qualificação de
professores; pelo contrário, a regra de toda política educacional desde a
submissão do professor aos minunciosos ditames do Ratio Studiorum
até hoje tem sido o achatamento intelectual, acadêmico, profissional e
salarial.
Destaque-se, ainda, que a perda de prestígio da profissão docente mudou
também a clientela dos cursos de Letras. A simples multiplicação de alunos na
escola levou à necessidade de um número maior de professores, pouco
importando a competência dos candidatos ao cargo, de modo que os referidos
cursos passaram a ser freqüentados por alunos oriundos de grupos sociais
menos letrados. Segundo Kleiman (2001), os professores de Português, após a
década de 60, eram oriundos de grupos de tradição oral, sendo ele, muitas vezes
o único membro da família a possuir curso superior.
Segundo Pinto (2001), historicamente o professor de Português foi vítima
de um processo de desvalorização do seu trabalho pela sociedade e pelo
governo. Além disso, para atingir o estado do letramento, e por assim dizer,
favorecer a formação de sujeitos, do mesmo modo, letrados, resta-lhe o convívio
amplo e diário com matérias de leitura. De tal modo que há uma sobrecarga de
obrigações delegadas ao professor para esse fim, e, na maioria das vezes, este
profissional não se encontra apto a realizá-las devido a questões sociais, políticas
e econômicas, como a sua formação precária e os baixos salários para a compra
de livros, por exemplo.
Nesse sentido, constata-se a diferença gritante entre aquilo que a
sociedade espera do professor e o que ele de fato é. Para ela, o professor de
Português é aquele que lê, escreve e por isso tem no exercício dessas duas
práticas subsídios para formar cidadãos competentes para lidarem com as
exigências sociais, que freqüentou o curso de Letras e, em seguida, se
especializou na área, que participa de capacitações periódicas e por esses
motivos é capacitado.
Atualmente, a formação do professor tem sido discutida nos meios
acadêmicos e cio-políticos na tentativa de encontrar soluções para os
40
problemas que o professor encontra na sala de aula, e, por outro lado, de resgatar
a imagem positiva do professor (SILVA, 2001).
Considerando as expectativas sociais direcionadas ao professor de
Português, parece-nos cabível tratarmos de modo específico das concepções de
língua / escrita do professor adotadas no ensino de língua materna.
2.1- Concepções de língua / escrita e ensino de língua
Parece ser consensual a idéia de que subjaz a toda prática de ensino uma
concepção de língua e de escrita de tal modo que as situações criadas pelo
professor em sala de aula no tocante à leitura e à escrita respondem pelo seu
grau de letramento e pelas concepções de língua e escrita que este adota.
Vale ressaltar que há, para a maioria dos professores do ensino
fundamental e médio a compreensão equivocada de que o aluno ao entrar na
escola ainda não conhece totalmente sua língua, por não ter tido contato com
textos escritos, restando à escola e ao professor de Português favorecer tal
conhecimento. Sob essa ótica, muitos professores acreditam que cabe à escola
realizar um treinamento de modo a fazer com que seu aluno domine as regras
prescritivas de sua língua e que as represente na modalidade escrita.
Autores como Rojo (2003) e Possenti (2004) desfazem essa concepção,
uma vez que para eles, a criança ao chegar à escola tem percorrido um longo
caminho e construído uma série de usos e concepções sobre objetos escritos,
embora não compatíveis com os da escola.
A barreira colocada pela escola frente aos conhecimentos e às práticas dos
alunos com os textos escritos, que, por sua vez, considera válido apenas o saber
repassado na instituição, tem suas bases fincadas na concepção tradicional de
ensino.
De acordo com Geraldi (2002, p, 71),
o ensino tradicional de ngua portuguesa investiu, erroneamente, no
conhecimento da descrição da língua supondo que a partir deste
conhecimento cada um de nós melhoraria seu desempenho no uso da
língua.
41
Esse investimento, entretanto, impediu que o aluno fosse além da
descrição e da memorização de regras. Conhecer a gramática, nessa concepção
de ensino, significa, pois, elevá-la à condição de quem domina a língua. O
professor, por outro lado, se manteve apegado aos ensinamentos do livro
didático, o qual passou a ser a fonte mais segura / legítima para esse profissional
ministrar suas aulas.
Assim, na perspectiva tradicional, a língua é vista como algo pronto,
imutável, sem evolução e sem influência do meio. Ela é vista como algo de que o
aprendiz se apropria para fazer uso de acordo com as suas necessidades de
expressão oral / escrita. Por outro lado, o ensino de língua é concebido como o
estudo dos conceitos e das regras da gramática normativa, sendo o professor um
mero transmissor de conhecimentos, em sua maioria, extraídos do livro didático e
dos manuais de gramática normativa, de forma inquestionável.
Nesse modelo de ensino, tanto para os discentes quanto para o docente a
produção escrita não passa da redação escolar do tipo argumentativa (BUIN,
2007), cujo conteúdo é discorrido a partir de um título dado pelo professor, que
também repassa as regras e rmulas para que a produção atinja os propósitos
dele e da instituição escolar.
Os alunos, por sua vez, ficam na condição de subordinados ao professor e
ao sistema de ensino. A esse respeito, Leal e Morais (2006, p, 167) afirmam:
“Estando numa situação subordinada, os alunos podem se sentir impedidos a
assumir a voz da instituição ou do que eles acham que a instituição diz sobre o
tema proposto”. O aluno estará sempre impedido de ser ele próprio, de se
assumir enquanto sujeito do que faz e pensa.
A produção de texto na sala de aula não é concebida como espaço onde
se possa desenvolver uma habilidade aperfeiçoável pelo exercício, da mesma
forma que não é vista como produção de conhecimento (GUEDES, 2006).
Segundo esse mesmo autor (p, 39), trata-se de um ensino privatizante, cujas
características seguem quase maciçamente uma rotina:
Igualmente privatizante tem sido o tratamento dado ao texto na aula de
Português, a começar pelo velho bito de ler para a turma o melhor
dos textos, consagrando-o como melhor apenas por esse ritual. Não
discussão de critérios, não comparações entre textos; dá-se
sumariamente a entronização do artista pelo reconhecimento de seu
42
dom. O trabalho dos alunos para produzir o seu texto perde toda a
importância diante dessa revelação, e nem a turma nem o processo
ensino-aprendizagem ganham alguma coisa com isso.
A afirmação acima nos faz crer na necessidade de mudança de perspectiva
pela qual passa a escola e o professor de Português. Basta refletir sobre os
baixos índices de aproveitamento dos alunos na leitura e na escrita, divulgados
pela mídia em testes como o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e o SAEB
(Sistema de Avaliação da Educação Básica), por exemplo, para verificar que os
alunos encontram-se aquém do esperado por esses sistemas de avaliação, não
dominando as etapas básicas exigidas para essa etapa de escolarização
(MARCUSCHI, B. 2006).
Tudo isso aponta para uma concepção de língua e de ensino que impedem
o aluno de se tornar um sujeito criativo, crítico e capaz de fazer uso competente
da língua nas diversas situações de interação social, tendo em vista a situação de
fala e os interlocutores que dela participam.
Marcuschi (2001), ao questionar a perspectiva tradicional de ensino, afirma
que a mesma vai cedendo lugar para uma outra que valoriza a língua como fato
social, dependente da origem de cada falante e da situação de uso. Trata-se da
visão sócio-interacional, da qual compartilhamos. Essa visão concebe a língua de
forma abrangente, relacionada intrinsecamente às atividades cotidianas de
interação verbal.
Sob essa ótica, o ensino da argumentação deve preocupar-se com a
construção de um conhecimento reflexivo a respeito das técnicas argumentativas
orais e escritas. Tratar a argumentação sob esse prisma é considerar que seu
ensino não deve priorizar regras e conceitos, mas é centrá-la na valorização e
prática da leitura e da produção textual como ponto de partida para o ensino da
análise lingüística que, por sua vez, vem a se constituir de modo interativo,
possibilitando ao aluno um conhecimento / domínio mais eficaz de como se
argumenta.
A esse respeito, a escola, através do ensino, deve formar alunos
produtores do conhecimento, alunos com proficiência na tarefa de argumentar,
ampliando seus horizontes mediante as informações que lhes são proporcionadas
nas atividades de leitura e escrita em sala de aula. Desse modo, essas atividades
43
devem ser realizadas de forma que os alunos possam refletir sobre o que lhes foi
proposto.
Na perspectiva sócio-interacional, o professor deixa de ser o centro do
conhecimento e passa a ser um mediador no processo de ensino-aprendizagem
da língua. Para isso, de acordo com os PCN (1998), o ensino de língua
portuguesa deve priorizar as atividades discursivas, a partir de situações
concretas de uso da língua, nas quais os alunos possam operar sobre a própria
linguagem e sobre os processos de produção de leitura e de texto.
Por isso, a leitura não deve ser confundida com extração de informações
ou com a simples atividade de “decodificar”, e o texto não deve ser entendido
como um produto, mas sim um processo que se dá na relação interativa e na sua
situacionalidade (MARCUSCHI, B. 2006).
Os efeitos de sentido por ele produzido o frutos do trabalho conjunto
entre produtores (alunos e professor) e receptores (professor, colegas e demais)
em situação de uso. O texto concebido como processo permite ao professor
realizar um trabalho reflexivo de modo que seus alunos realizem refacções
quantas forem necessárias, visando sua melhoria e domínio quanto aos
conteúdos estudados. Trata-se de uma relação dialógica sócio-historicamente
construída no sentido bakhtiniano do termo, a qual atribui relevância ao processo
de construção de sentidos do texto, passando necessariamente pela interação
professor / aluno.
É possível que o desenvolvimento da competência argumentativa dos
alunos se dê nessas etapas, pois estes atribuirão olhar específico para as “falhas”
ocorridas nas primeiras produções, tendo a melhorá-las, ou mesmo, saná-las
durante as refacções.
Para Guedes (2006, p, 53-54),
Significa levar o aluno a fazer entender-se, formular as perguntas que o
levem a preencher as lacunas que no seu texto representam as lacunas
de seu entendimento; cobrar-lhes as informações necessárias para
torná-lo inteligível, a clareza na expressão da opinião que quer
apresentar, os argumentos que vão dar-lhe respeitabilidade, o
encadeamento que vai capturar o leitor.
44
A afirmação acima se justifica por ser a competência argumentativa um
processo dinâmico, o qual se desenvolve cada vez que se entra em contato com
novas situações, em diferentes interações, envolvendo múltiplas capacidades:
rapidez de raciocínio, análise situacional, domínio lingüístico, por isso pode e
deve ser trabalhada, sistematicamente, desde o início, nas ries escolares, para
um melhor desempenho do discurso argumentativo do dia-a-dia (FARIA, 2004).
A produção escrita atrelada à concepção sócio-interacional de língua é que
vai permitir o desenvolvimento das capacidades acima citadas, que, por sua vez,
resultam no domínio / na familiaridade do aluno com as técnicas argumentativas,
uma vez que esse trabalho do professor na sala de aula leva o aluno a esforçar-
se na utilização dos recursos expressivos necessários para dizer o que tem a
dizer com competência argumentativa.
2.2- Influências das práticas letradas do professor na sala de aula
Como vimos anteriormente, a formação docente somada a outras práticas
sociais (participação em eventos, cursos de formação continuada, leitura e escrita
como práticas sociais) constituem-se como base que podem conferir ao professor
sua qualificação profissional, ou mesmo a garantia de tratar-se de um sujeito
plenamente letrado.
Sendo, pois, o letramento “o estado ou condição de quem se envolve nas
numerosas e variadas práticas sociais de leitura e de escrita” (SOARES, 1998, p,
44), consideramos eventos de letramento todos aqueles dos quais o professor
participa objetivando o aperfeiçoamento de sua prática docente.
Desse modo, o professor de Português que vive em estado de letramento é
alguém que desenvolveu capacidades dessa ordem e que é capaz de usá-las
socialmente, em especial na sala de aula com seus alunos, respondendo às
exigências sociais no ensino da leitura e da escrita na sua disciplina. Este
professor é capaz de dentre outras especificidades, ajudar na formação do
letramento dos seus alunos.
Podemos afirmar, portanto, que o ensino da escrita precisa apoiar-se, ao
mesmo tempo, em valores didáticos e pedagógicos. Pedagógicos na medida em
que é necessário que o professor pratique ele próprio os escritos que propõe aos
45
alunos, explicite as normas e exigências, o exemplo de leitor. Didáticos na
medida em que é necessário que o professor socialize os escritos produzidos na
sala de aula, de modo que fique clara a noção de produção textual enquanto
processo, e não enquanto produto.
Ora, é precisamente a ausência da capacidade de processamento da
informação escrita, presente em alguns materiais específicos destinados ao
professor (Os PCN, por exemplo) em várias situações sociais, somada a sua
concepção tradicional de ensino, alguns dos responsáveis pelas falhas do
professor no exercício da profissão. No entanto, alguns estudiosos (BUNZEN &
MENDONÇA, 2006; KLEIMAN, 2001) alertam para o fato de que julgar os pré-
requisitos que conferem o grau de letramento do professor requer que se leve em
conta algumas situações vivenciadas por ele.
A esse respeito, Kleiman (op.cit, p, 43) afirma:
(...) a questão do letramento da professora deveria ser analisada da
perspectiva de práticas contextualmente situadas, própria dos estudos
do letramento, ou seja, a partir da perspectiva das práticas de leitura e
de escrita para o trabalho e no contexto do trabalho, levando em
consideração, portanto, exigências e capacidades de comunicação
efetivamente requeridas para ensinar.
Segundo a autora, essa seria uma forma de atenuar os muitos
preconceitos criados em torno daquelas usuárias da língua que, de certa forma,
chegaram “atrasadas” ao mundo letrado.
Para refletir sobre a afirmação acima, o professor se insere em práticas de
letramento situado no momento em que participa de eventos mediados pela
leitura e pela escrita, com funções e características específicas, ligadas à
instância social em que ocorrem (BUNZEN & MENDONÇA, op. cit). Assim, a
tarefa de preparação de aulas, a consulta a livros didáticos e de referência, a
pesquisa no dicionário e na própria Internet, a produção escrita de atividades para
a turma e de textos didáticos para serem lidos o mediadas pelo uso da leitura e
da escrita desse professor. Constitui-se, portanto, como “uma prática de
letramento própria do trabalho docente, cujas especificidades decorrem das
necessidades que lhe são próprias” (op.cit, p, 19).
No entanto, de se admitir que todo esse seu trabalho tem repercussões
diversas nos resultados apresentados pelos alunos. aqueles que demonstram
46
maior apropriação dos conteúdos ensinados na aula, porém, outros que
atestam total inapropriação dos mesmos. O que pesa nessas situações não é “o
que” o professor diz, mas “como” ele o diz (KLEIMAN, 2001).
O letramento do professor parece oferecer pistas para uma possível
avaliação de sua prática em sala de aula. Isso porque a seu letramento
profissional se inclui todo o conhecimento adquirido durante a sua graduação /
formação, isto é, seus conhecimentos teóricos sobre a disciplina, atrelados à
forma como ele põe em prática os mesmos.
Esse processo é denominado de transposição didática, isto é, “processo
pelo qual passa um determinado saber em uma situação de exposição didática”
(CHEVALLARD, 1991, p, 20 apud GATINHO, 2006, p, 145). Esse saber /
conhecimento do professor na sua prática cotidiana sofre adaptações, ganha
contornos específicos, de modo que é transformado / reconstruído para atender à
situação de ensino. O professor durante sua aula “faz uso de diversas fontes de
saberes, ou em outros termos, mobiliza saberes advindos de diversas instâncias
de produção de conhecimento” (RAFAEL, 2001, p, 158).
Segundo pesquisa realizada por esse autor, alguns desses saberes são
aqueles a que o professor foi exposto durante o seu curso de graduação, outros
ao longo da sua formação profissional, mas há também os construídos localmente
na aula de língua portuguesa, no e pelo processo de didatização. Assim, os
saberes do professor além de serem plurais, heterogêneos e históricos, são
também personalizados e situados.
A mobilização de saberes / conhecimentos disponíveis na sala de aula
articula, através da interação, os três elementos constitutivos da instância de
produção, ou seja, o professor, o aluno e o conteúdo específico da disciplina alvo
da aprendizagem.
Essa articulação pode gerar dois resultados, o de “solidarização” e o de
“sobreposição”, também conhecidos como “efeitos da transposição didática”. O
primeiro ocorre quando o professor faz uso de termos e / ou noções teóricas
advindos de fontes diferentes de conhecimento de referência, sem, no entanto,
incorrer em “erros” ou contradição teórica. O segundo, por sua vez, ocorre quando
o professor, ao substituir um termo por outro, realiza uma contradição teórica ou
não equivalência de sentido entre os termos usados (RAFAEL, op. cit).
47
Os professores em formação e aqueles formados estão, portanto,
propensos aos efeitos da transposição didática. Entretanto, uma probabilidade
de maior incidência do primeiro efeito, ou seja, da “solidarização”com os
professores formados pelo fato deles estarem mais acostumados ao cotidiano da
sala de aula. Em contrapartida, os professores ainda em formação estarão mais
voltados para o uso de terminologias / nomenclaturas, o que os fará realizar mais
a “sobreposição”.
Considerando os cursos de formação continuada, vale ressaltar que estes
se aproximam da sala de aula, uma vez que da mesma forma são espaços de
construção e transformação do saber. Os saberes tratados / discutidos nesses
espaços passam por sucessivas mobilizações as quais vão desde como chegam
aos professores e como o interpretados, alinhados e realinhados também pelos
formadores objetivando que as práticas de ensino possam responder às
necessidades criadas pelos documentos oficiais e pelas demandas reais da sala
de aula (GATINHO, 2006).
Esse movimento / percurso realizado pelo professor na aplicação de seus
conhecimentos lhe confere vivência em práticas letradas, pois se trata de uma
forma de evidenciar que os conhecimentos teóricos adquiridos durante sua
passagem no curso de Letras foram ressignificados no momento de pô-los em
prática, assim como não serviram de “receitas prontas” as informações
repassadas nos cursos de formação continuada (capacitações).
Nesse sentido, Assis e Matêncio (2001,p, 286-287) argumentam que a
dimensão implicada pelo conceito de “competência do formando vincula-se à
compreensão do fenômeno do letramento e das relações entre práticas orais e
escritas de produção de texto”. Segundo essas autoras,
Essa dimensão está, também, relacionada à inserção do formando no
universo da escrita letrada”: a uma transformação desse sujeito em
alguém que não apenas sabe falar sobre a língua(gem) como objeto de
estudo mas também, e sobretudo, alguém que faz uso consciente da
linguagem, nas situações de interação nas quais atua e vier a atuar.
Essas considerações conferem aos cursos de formação, mais
especificamente aos cursos de Letras, singular responsabilidade na formação dos
seus alunos, futuros professores. Refletir sobre esses cursos, entretanto, a
48
princípio, não é relevante no momento. No entanto, torna-se significativo o
estabelecimento de certos pontos na tentativa de endereçar o letramento do
professor e o uso eficaz das suas práticas com a leitura e a escrita em sala de
aula ao curso que freqüentou / frequenta.
Partindo desse princípio pode-se assegurar que um dos caminhos para a
mudança na dinâmica da sala de aula é o de motivar professores e futuros
professores à convivência de múltiplas práticas discursivas na escola. A esse
respeito, Assis e Matêncio (2001, p. 283) afirmam:
(...) é possível pressupor que as ações que se vierem a se realizar na
formação de professores podem representar, a médio prazo, a
possibilidade de que, além da mera ampliação dos objetos de estudo
privilegiados na aula de Português, haja condições para a realização de
um trabalho reflexivo com os textos no espaço escolar, o que pode, por
sua vez, impulsionar o movimento social de conscientização da
variabilidade lingüística e textual.
Compreende-se que tenha vindo a surgir na escola um contexto de novas
necessidades de ensino e aprendizagem, decorrentes da nova realidade social
(industrialização e urbanização, ampliação da utilização da escrita, expansão dos
meios de comunicação eletrônicos e maior contingente de alunos na escola
regular).
Para tanto, tem-se nos PCN o suporte voltado para o professor em que se
procuram definir princípios e orientações para o ensino de língua. Neles se
evidencia “a necessidade de se avaliar e trabalhar todos os aspectos da
linguagem a partir do texto, e a escrita dos alunos não a partir da forma, mas
também focando a coerência, a construção de sentido” (BUIN, 2007, p, 47). Essa
idéia da necessidade de mudança no ensino proposta pelos PCN (1998) é
transparente logo na sua introdução ao considerar anacrônicos os métodos e os
conteúdos tradicionais.
Contemplando a essência da informação introdutória do documento,
podemos admitir que as propostas para o ensino de língua contrariam a prática
rotineira e demasiado escolarizada em que se inscreve, muitas vezes, o ensino da
leitura e da escrita na escola; considerando a formação do professor, o teor da
proposta do documento oficial (PCN) faz erigir um conjunto de valores didáticos e
49
pedagógicos capazes de induzir uma mudança nas formas de trabalhar os
docentes.
Dentre esses valores, de se realçar um que funciona quase como um
programa didático completo: a diversificação. Contemplando os textos a serem
trabalhados na sala de aula, mas também as atividades, no sentido de abranger,
por um lado uma grande variedade discursiva e, por outro, uma enorme variedade
de tarefas, com as quais o futuro professor deve estar apto a dirigi-las, conforme
propõem Assis e Matêncio (2001), para assim se poder ir ao encontro dos
diferentes estilos cognitivos presentes na sala de aula.
Desse modo, resta a esse futuro professor saber criar situações
propiciadoras de um desenvolvimento nos alunos das suas competências de
leitura e escrita. Para tanto, deve-se ressaltar o fato de que formar professores
que ensinem a língua implica, portanto, propiciar condições para o
desenvolvimento da sua própria proficiência lingüística e, ao mesmo tempo,
proporcionar-lhes os meios necessários à apropriação de saberes condizentes a
uma inovação didática e ao desenvolvimento profissional desses docentes.
Há, portanto, de se considerar que todo esse trabalho está
necessariamente associado a uma concepção de língua. Em se tratando do
ensino da argumentação, a escolha do gênero que contemple esse conteúdo e o
modo de ensiná-lo em sala de aula, também são reflexos das influências letradas
do professor. O artigo de opinião, como vimos no capítulo 01, é um gênero
tipicamente argumentativo, e por isso, elegê-lo como objeto de ensino-
aprendizagem é uma forma de propiciar o desenvolvimento da competência
argumentativa dos alunos.
2.3- O artigo de opinião como objeto de ensino-aprendizagem da
argumentação
No contexto escolar, o artigo de opinião define-se como um gênero em que
o aluno apresenta um posicionamento escrito em defesa de um determinado
assunto, utilizando-se de estratégias argumentativas.
Levar esse gênero para a sala de aula como objeto de estudo é uma
escolha de extrema relevância devido a vários motivos, entre os quais
50
destacamos seu apelo popular devido à forte influência exercida pela mídia na
vida dos alunos. Produzi-lo é uma forma que o aluno tem de apropriar-se do
letramento extra-escolar e assim desenvolver a competência argumentativa. O
outro motivo é a repercussão social que atualmente esse gênero adquire quando
apresenta argumentos bem formulados. O uso desse gênero é também uma
forma do aluno explicitar os seus pontos de vista frente a temas controversos,
garantindo a sua autonomia e liberdade de expressão; permitindo-lhe considerar
intuitivamente os prováveis leitores. Nesse sentido, é aconselhável que o
professor organize o seu trabalho em torno de uma seqüência didática, para que
possa desenvolver atividades voltadas para o estudo do gênero artigo de opinião.
Conforme Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), a seqüência didática
constitui-se de atividades planejadas para uma vivência sistemática a contemplar
um gênero textual oral ou escrito. Ela é um meio que o professor tem a seu favor
para contemplar o estudo de um gênero, pois o domínio deste poderá acontecer
em tempo semelhante e diferenciado. As atividades organizadas em módulos
permitem a aplicação de exercícios variados com os quais o professor mede os
progressos alcançados, podendo refletir sobre a eficácia dos mesmos. Se ele
julgar necessário, pode reformulá-los, objetivando sempre que na produção final o
aluno ponha em prática todos os conhecimentos adquiridos na seqüência didática
(DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY, op. cit).
Vale ressaltar que a produção final significa para nós apenas o momento
oficial da produção. Entretanto, durante todo o percurso anterior a esta, o aluno
tem oportunidades de escrever / falar sobre a temática estudada e o gênero. Em
outras palavras, o aluno tem a oportunidade de argumentar constantemente.
Desse modo, é importante que o professor, ao trabalhar com o artigo de
opinião, inclua, em sua seqüência didática, várias leituras e discussões sobre o
tema estudado, pois é através delas que o aluno constrói e amplia os seus
argumentos. É por esse motivo que durante as discussões o professor deve
deixar o aluno livre dando-lhe voz e vez, para que este exponha o seu ponto de
vista com autonomia.
Além das leituras / discussões em sala, na aplicação da seqüência didática,
é interessante que se realize um estudo inicial do gênero, para que o aluno se
aproprie de suas características básicas a ponto de não confundi-lo com outros
51
gêneros de natureza argumentativa (carta do leitor, carta de reclamação, discurso
de defesa, dentre outros). Posteriormente, o professor desenvolve uma proposta
de produção vinculada às discussões temáticas, a qual leva o aluno a argumentar
e contra-argumentar.
Dessa forma, toda e qualquer produção do aluno deve ser objeto de
reflexão nas aulas. Através da interação entre o professor e os alunos é possível
que o retorno das produções leve os alunos a identificarem falhas conjuntamente.
Isso ocasiona uma atividade de reflexão e reformulação das produções.
52
Capítulo 3
Procedimentos metodológicos
3.1- Natureza da pesquisa
A nossa pesquisa objetivou, de uma maneira geral, analisar a
manifestação da argumentação nas produções orais e escritas dos alunos, e sua
relação com a ação metodológica da professora, através da interpretação do
impacto do conjunto de atividades organizadas e aplicadas pela professora na
sala de aula.
Através da pesquisa-ação, analisamos uma intervenção didática acerca da
manifestação da argumentação dos alunos: 1) na produção escrita do artigo de
opinião e, 2) na interação em sala de aula. Há, portanto, o grau ximo de
implicação da professora, pois esta, além de constituir a ação, em outros
momentos, assume o papel de analista crítica do seu próprio fazer docente.
De acordo com André (2002), a pesquisa-ação caracteriza-se pela inegável
vivência do professor em sala de aula. Dentre outras vantagens, traz a de
conhecer mais de perto os problemas com a aprendizagem, e, na maioria das
vezes, conhecer a gênese desses problemas, sendo capaz de conseguir realizar
mudanças em atitudes e comportamentos dos indivíduos.
Esse tipo de pesquisa muitas vezes recebe o nome de intervenção, pois se
busca, num mesmo instante, conhecer, atuar e alterar um contexto concreto, isto
é, intervir na realidade social através de uma proposta com o objetivo definido. Tal
procedimento não passa de uma interação efetiva e ampla entre pesquisadores e
pesquisados.
Assim sendo, na fase inicial da nossa pesquisa realizamos uma sondagem
e diagnosticamos que os alunos apresentavam dificuldades significativas no
momento de expor um ponto de vista. Os argumentos orais e escritos que eles
apresentavam evidenciavam influência marcante, ou mesmo “repetidora”, dos
discursos de outrem (pais / professora).
Desse modo, o cotidiano da sala de aula foi o ponto central para essas
“descobertas” realizadas pela professora, no sentido de conscientizar-se da
53
necessidade de intervir no processo de ensino, visando ao progresso dos
aprendizes.
Dada a natureza do problema e os procedimentos adotados, a pesquisa é
qualitativa do tipo pesquisa-ação, de caráter interpretativista. A pesquisa
qualitativa, segundo Bogdan e Biklen (1999) e André (2002), apresenta algumas
das especificidades, dentre elas, permite que a recolha dos dados e o passar do
tempo com os sujeitos direcionem os resultados da pesquisa.
Ao adotarmos essa linha de estudo, consideramos como pontos basilares
para a análise do objeto: o contato direto com o ambiente em que se desenvolveu
a pesquisa, no caso, a escola; a descrição dos elementos constitutivos, isto é, os
sujeitos diretamente envolvidos (professora / pesquisadora e alunos); a não-
formulação de hipóteses previamente elaboradas e o estudo do fenômeno em
processo.
Dessa forma, ao iniciarmos a coleta, não tínhamos condições de sequer
inferir numa antecipação de qual seria a melhor estratégia metodológica no
sentido de contribuir para o desenvolvimento da competência argumentativa dos
alunos, visto que no tipo de pesquisa por nós adotado, o processo de uma dada
situação e seus significados têm primazia sobre os resultados (ANDRÉ, op. cit.).
A natureza interpretativista da pesquisa, segundo Moita Lopes (1994), é
mais adequada para tratar dos fatos com que o lingüista aplicado se depara, além
de, devido ao seu aspecto inovador, revelar conhecimentos de natureza diferente.
A esse respeito, Cavalcanti (1990) diferencia de modo pertinente a
pesquisa aplicada da pesquisa lingüística. Para essa autora, a primeira não
espera pelos avanços teóricos para realizar-se, pelo contrário, ela contribui para
teorizar a própria prática; a segunda limita-se à biblioteca e à escrivaninha de
modo que os dados são construídos pelo pesquisador.
No caso da presente pesquisa, as anotações de campo somadas às
produções orais e escritas dos sujeitos envolvidos constituíram o material
específico para a elucidação de nuances responsáveis pelo conhecimento teórico
por nós construído.
Nossa atuação em sala de aula ocorreu de forma direta, isto é, como
professora regente / titular e como pesquisadora, desde a detecção do problema
apresentado pelos alunos no tocante à formulação de argumentos, e a escolha e
54
preparação das atividades didáticas, até a aplicação dessas atividades, com o
propósito de modificar / variar o trabalho docente e o cotidiano da sala de aula,
tendo em vista alcançar objetivos específicos.
Em razão disso, nossa investigação constituiu-se num tipo de intervenção
em sala de aula, podendo, por esse motivo, ser definida como uma pesquisa-
ação. De modo mais sintético, a pesquisa é do tipo qualitativa e envolve dois
procedimentos metodológicos: o intervencionista e o descritivo-interpretativo.
O primeiro procedimento se refere à própria natureza de intervir no
processo de ensino através da aplicação de uma seqüência didática, com o
objetivo de oferecer outras oportunidades de desenvolvimento da competência
argumentativa dos alunos; o segundo constitui-se da descrição dos dados
coletados acompanhados das nossas interpretações para tal descrição.
3.2- Caracterização do contexto de pesquisa
A pesquisa ocorreu no segundo semestre de 2006, na escola pública
estadual Abílio de Souza Barbosa, localizada no município de Orobó-PE. Trata-se
de uma escola de grande porte, pois abriga cerca de 1260 (mil duzentos e
sessenta) alunos e oferece cursos diversos, tais como: Educação Especial,
Ensino Fundamental (3º e 4º ciclos), Educação de Jovens e Adultos (EJA), Ensino
Médio, Normal Médio e Avançar nos turnos da manhã, tarde e noite.
O ambiente institucional tem boas condições de funcionamento, pois
quanto aos aspectos físicos, a escola é composta de 17 salas de aula; uma
biblioteca; um laboratório de informática; um laboratório de ciências exatas; uma
sala para os professores; sala de grêmio; almoxarifado; cantina e banheiros. A
escola dispõe ainda da secretaria e diretoria, além de uma área recreativa e de
uma quadra de esportes, atendendo às necessidades de seus usuários: alunos,
professores e funcionários.
Quanto ao aspecto pedagógico, os professores têm acompanhamento no
planejamento didático sempre realizado no início do ano letivo, além de reuniões
ao rmino dos bimestres. Os professores e gestores também participam de
cursos de atualização promovidos pela Secretaria de Educação do Estado de
Pernambuco que, obedecendo à oferta por disciplinas, ao término do ano letivo
55
contempla os docentes em suas respectivas áreas de atuação. Essa realidade
aponta para o ensino cada vez mais voltado para a atualidade e a formação
crítica dos seus educadores e, conseqüentemente dos seus educandos.
A escolha dessa escola deveu-se ao fato de ser o local de trabalho da
professora / pesquisadora, que, por sua vez, tinha interesses pedagógicos em
sociabilizar os resultados com os demais professores da escola - os de língua
materna e os das outras disciplinas -, tendo em vista o clima de curiosidade
instaurado desde o início da coleta de dados.
Dada a situação descrita, a escola tornou-se espaço relevante por pelo
menos duas razões: ambiente da professora / pesquisadora e ambiente
acostumado a reflexões pedagógicas e experimentações de ensino / contribuição
– socialização dos conhecimentos da pesquisa / resultados em si.
3.3- Os sujeitos da pesquisa
Os sujeitos implicados para a realização do estudo foram: a professora /
pesquisadora e os 25 alunos do 9º ano do Ensino Fundamental II, turno da
manhã.
Com relação à professora, esta exerce suas atividades profissionais na
escola em referência, desde o ano de 2002, graduou-se em Letras pela
Faculdade de Ensino Superior de Pernambuco (FESP), com habilitação em
Português e Inglês e especializou-se em Ensino-Aprendizagem de Língua
Portuguesa na Educação Básica, na Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG), na época da pesquisa era aluna regular do curso de Mestrado. Suas
práticas acadêmico-profissionais estão voltadas para o alcance de maior titulação
acadêmica e para os cursos de atualização profissional realizadas na referida
escola. Com efeito, a prática da professora tende a ser marcada pelos
conhecimentos didáticos – pedagógicos advindos das instâncias educacionais
que vem freqüentando.
Com relação aos alunos, estes compõem uma turma mista, sendo 10 do
sexo masculino e 15 do sexo feminino, com faixa etária variando de 13 a 15 anos,
não havendo repetentes. Na sua maioria (15), residem na zona rural do município
de Orobó-PE e os demais (10), na zona urbana do mesmo município. Por se
56
tratar de alunos de uma escola pública, muitos deles possuem baixo poder
aquisitivo, sendo filhos de agricultores e funcionários públicos, com renda familiar
variando em torno de dois salários mínimos.
Possuem hábitos de leitura e de escrita bem diversificados, registrando-se
desde aqueles que se restringem às atividades escolares e, no máximo, à leitura
de alguns cadernos (esporte e lazer) dos jornais estaduais que circulam na escola
(Diário de Pernambuco e Jornal do Comércio), até outros que, além desses
hábitos, têm o hábito freqüente da leitura e da escrita.
Esses hábitos estão voltados principalmente aos textos bíblicos, visto que
desses 25 alunos, 06 são evangélicos, sendo comum vê-los, durante os intervalos
das aulas, lendo a bíblia sozinhos ou em pequenos grupos. Participam de eventos
sociais que exigem mais habilidade do domínio oral e escrito (participação na
escola dominical, direção de programa na rádio local e ouvintes desse programa),
Considerando o universo das práticas letradas de professora e alunos,
podemos afirmar que elas se assemelham nas suas origens, isto é, o grau de
letramento da professora / pesquisadora, embora seja mais abrangente, tem sua
gênese ancorada a práticas letradas similares às dos seus alunos (prática de
leitura / escrita, na sua maioria, voltada para as atividades escolares). Dessa
forma, acreditamos haver uma expectativa, por parte de ambos, de que as
práticas vivenciadas na escola poderão levar os alunos à Universidade.
A razão que levou a professora a assumir a função de pesquisadora na
turma em questão ocorreu pelo fato de conhecer muitas das necessidades
específicas dos alunos na sua disciplina (Português), uma vez que estes, no ano
letivo anterior (8º ano), tinham sido seus alunos. Assim, julgamos ter ocorrido
continuidade do trabalho docente, com a professora e com diversas estratégias
empreendidas em sala de aula. Esse contexto situacional facilitou na escolha do
tipo de pesquisa, bem como nas atividades que seriam propostas.
3.4- Procedimentos de coleta de dados
O processo da coleta de dados contemplou duas etapas: 1- sondagem e,
2- intervenção. A sondagem com os alunos (pré-módulo) ocorreu no início da
coleta, tinha como objetivo que eles escolhessem o tema a ser trabalhado nas
57
aulas subseqüentes através de uma votação (02 aulas). Esse procedimento, que
responde pela concepção de ensino que adotamos, levou os alunos, em interação
com a professora, a participarem de decisões conjuntamente.
A relevância de se escolher um tema durante a interação professor x
alunos está ligada à própria situação em si. É pela interação que se constrói o
tema e a motivação para desenvolver as atividades em sala de aula. Além disso,
co-responsáveis pelas decisões, sentem-se envolvidos durante as atividades
propostas. Assim foi escolhido como tema para abordagem das futuras leituras,
debates e da produção escrita, as eleições.
Essa escolha deveu-se ao fato de que na época dessa votação, estávamos
em plena campanha eleitoral na qual o então e atual Presidente da República
(Luís Inácio Lula da Silva) era um dos candidatos. Isso concorreu para que os
assuntos pautados pela mídia afetassem diretamente a escola.
Com base numa charge (anexo l), que envolvia os presidenciáveis com
maiores índices de votos, de acordo com as pesquisas de opinião pública
divulgadas pela mídia, realizamos atividades de leitura e discussão na sala.
A idéia inicial - o estudo da charge e o nosso diagnóstico, o tema - foi
modificado para o novo perfil social da mulher, oportunizado, à época, ao fato de
haver uma mulher entre os presidenciáveis, oportunizando as discussões para
esse foco. Nesse momento foi solicitada aos alunos a primeira produção escrita,
(realizada em duplas -02 aulas) orientada pelo seguinte comando:
Você concorda com o novo perfil social da mulher? Escreva um
parágrafo defendendo seu ponto de vista. Se julgar necessário,
enumere os argumentos que comprovem a posição defendida.
Através dessa atividade, compreendemos que os alunos apresentavam
dificuldades para defenderem um ponto de vista, isto é, eles não formulavam
argumentos sólidos / coerentes para justificar, por exemplo, a presença feminina
na disputa presidencial – tema suscitado pela charge.
Os argumentos apresentados eram construídos, em sua maioria, a partir da
reprodução do discurso dos pais, da professora, da mídia televisiva, etc, ausentes
estavam as marcas de reorganização que legitimassem os argumentos, como de
autoria do produtor em questão.
58
Num segundo momento, após a leitura de vários textos que enfocavam o
tema da produção, e de um exercício de reflexão coletiva sobre a versão,
realizou-se a reescritura (04 aulas) da primeira produção (2ª versão). Para a
realização dessa atividade, foi apresentado o seguinte enunciado:
Os textos que vocês vão ler foram retirados da produção escrita de
vocês. Leiam silenciosamente, para em seguida fazermos uma reflexão
coletiva e realizarmos a reescritura da mesma. A questão foi a seguinte:
Você concorda com o novo perfil social da mulher? Escreva um
parágrafo defendendo seu ponto de vista. Se julgar necessário,
enumere os argumentos que comprovem a posição defendida.
As reescrituras, comparadas às primeiras produções, apesar de terem
atestado melhorias na apresentação dos argumentos, estes continuavam presos
à ideologia de outrem, faltava aos alunos - produtores a liberdade que lhes
garantisse autonomia / autoria do ponto de vista defendido.
A partir desse diagnóstico, ocorreu a segunda etapa da coleta de dados,
uma vez que nos conscientizamos da necessidade de um ensino sistemático que
ajudasse os alunos a desenvolver e assumir uma dada competência
argumentativa.
Para a vivência do novo tema, foram levados para a sala de aula textos de
várias fontes, inclusive lidos no período da sondagem, além de outros que
enfocavam a mulher ocupando diferentes cargos sociais. Esses textos foram lidos
em equipes e debatidos na sala de aula. Nesse tipo de atividade tínhamos
objetivos didáticos de familiarizar os alunos com o tema e de oportunizar-lhes
momentos em que deveriam expor um ponto de vista oralmente.
Diante do que afirmamos até então, podemos dizer que a votação e a
sondagem realizadas nos apresentaram o eixo temático e composicional para o
prosseguimento da pesquisa, podendo, pois, fazer parte do que chamamos de
pré-módulo.
3.4.1-Tipo de intervenção: a seqüência didática
Para a proposta de ensino, elaboramos uma seqüência didática adaptada
aos moldes propostos por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), com vistas ao
59
estudo da argumentação, na qual enfatizamos o oral (falar durante as aulas) e o
escrito (produção do artigo de opinião).
A seqüência didática que contemplou algumas atividades voltadas para o
estudo da argumentação e, especificamente, para a melhoria da reescritura da
versão, produzida no período da sondagem, surgiu a partir do diagnóstico
brevemente descrito no tópico 3.4. As atividades organizadas para a seqüência
didática, realizadas após o pré-módulo, ocorreram em três módulos
5
, vivenciados
em 14 aulas, distribuídos da seguinte forma:
No primeiro módulo (03 aulas), as aulas foram expositivas, com leituras de
textos teóricos (anexo ll), enfocando:
· estudo inicial da argumentação: noções básicas sobre a argumentação, o
artigo de opinião como gênero textual eminentemente argumentativo e as
dificuldades comuns na prática argumentativa;
· estudo das marcas lingüísticas, através de uma listagem dos principais
operadores argumentativos, tendo como base o modelo de Vilela e Koch
(2001).
No segundo módulo, detivemo-nos especificamente no estudo do tema (o
perfil social da mulher) e da argumentação, através de aulas nas quais a
professora e os alunos, em interação, liam os textos trazidos (anexo III) e
discutiam as atividades de interpretação propostas. Para esse módulo foram
necessárias 08 aulas, distribuídas com as seguintes atividades:
· localização da presença da opinião pessoal do escritor, a identificação da
questão em debate, as formas de sustentação apresentadas e identificação
da opinião à qual o autor se opõe;
· leitura de um artigo de opinião e de uma entrevista para comprovação de
que a argumentação se faz presente em uma outra modalidade de gênero
textual além do artigo de opinião;
5
A noção de módulo que utilizamos nesta pesquisa difere da noção adotada por Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004). Apesar de os módulos terem enfocado os problemas surgidos na produção,
conforme orienta o grupo de Schneuwly, para a realização da presente pesquisa, eles funcionaram
como subunidades das unidades de ensino da argumentação. No momento da sondagem, que
incluiu a votação e a produção em duplas (1ª e versão), não tínhamos noção de trabalhar
especificamente com o artigo de opinião. Essa idéia veio a surgir somente após os resultados da
sondagem, esta, para esses autores, corresponde, portanto, à produção inicial.
60
· reconhecimento do gênero textual em estudo e identificação dos
operadores argumentativos utilizados pelo autor para a defesa do seu
ponto de vista;
· refacção coletiva (professora e alunos) de um artigo de opinião produzido
em duplas pelos alunos, buscando a ampliação dos argumentos
apresentados pelos autores.
O terceiro módulo foi representado pela produção escrita do artigo de
opinião. A realização dessa atividade deu-se em 03 aulas. No entanto,
inicialmente foram retomados os dois primeiros módulos para uma recapitulação
das características básicas do artigo de opinião, dando prioridade à importância
do uso dos operadores argumentativos; e para verificação da familiaridade dos
alunos com o tema. Feito isso, solicitamos aos alunos:
· produção escrita de um artigo de opinião a partir do tema discutido no
segundo módulo de atividades, a partir do seguinte comando:
Os textos que lemos e discutimos nas últimas aulas a respeito da
mulher trataram de um assunto ainda polêmico na sociedade: a
ascensão social da mulher ou até mesmo as novas e mais variadas
profissões que a mulher atualmente exerce.
Com base nas leituras e nas discussões que realizamos em sala de
aula, suponha que você foi convidado (a) pelo Jornal do Commércio
para produzir um texto que seria publicado no Caderno “Opiniões”,
respondendo a seguinte questão: Você concorda com o novo perfil
social da mulher? Lembrete: Você deverá defender seu ponto de vista
de tal maneira que convença seus leitores a adotarem a sua opinião.
Para isso utilize os operadores argumentativos e faça uso da linguagem
formal (culta). Não se esqueça de formular um titulo para seu artigo.
Vale ressaltar que não houve interrupções para atividades de outra
natureza durante as aulas em que a seqüência didática foi aplicada. Nessas
aulas, a professora / pesquisadora esteve sempre atenta à execução das
atividades no tempo previsto.
Como cada módulo foi organizado objetivando preparar os alunos para
alguns domínios durante a produção escrita (defesa do ponto de vista,
apresentação de argumentos no gênero artigo de opinião e domínio temático), as
atividades propostas nos módulos foram interdependentes, não tinham caráter
definitivo: o primeiro módulo foi retomado durante as atividades do segundo; e o
61
terceiro, por sua vez, retomou as discussões ocorridas nos primeiro e segundo
módulos.
Para uma visualização resumida de todas as atividades descritas no tópico
3.4 e no sub-tópico 3.4.1, as quais totalizam 22 aulas, apresentamos o quadro de
atividades a seguir:
Quadro 02- Quadro de atividades realizadas na sondagem (pré-
módulo) e na seqüência didática
Atividades
Data (s)
Objetivo (s)
Número de aulas
Escolha do tema para
elaboração da
seqüência didática.
28 / 07/2006
Definir o tema a ser trabalhado nas aulas
subseqüentes
02
Produção diagnóstica a
partir do tema
escolhido.
25/08/2006
Observar as estratégias de desenvolvimento textual,
em especial, a construção de argumentos
02
Leitura de textos
variados e reescritura
da 1ª versão.
01/09/06
Analisar a organização dos argumentos após
atividades de leitura e discussão dos textos.
04
Realização do
do módulo: sobre
argumentação e
operadores
argumentativos.
13/11/2006
Refletir sobre noções básicas da argumentação e do
artigo de opinião, necessárias ao uso oral e escrito
da língua.
03
14/11/2006
Reconhecer o gênero textual;
03
16/11/2006
Identificar argumentos em vários textos e refletir
sobre seu funcionamento para estabelecimento da
coerência.
03
Realização do
módulo:Retomada do
tema para abordagem
da argumentação.
17/11/2006
Refletir coletivamente sobre a pertinência dos
argumentos utilizados pelos autores do texto,
amplinado-os quando necessário.
02
Realização do
módulo:Produção
escrita do artigo de
opinião.
20/11/2006
Apresentar um ponto de vista sobre um tema,
atentando para o uso dos argumentos.
03
62
3.4.2 – Instrumentos para a coleta de dados
As peculiaridades de uma pesquisa interpretativista conduziram à utilização
de instrumentos de natureza variada, tais como: observações e anotações em
diários de campo das atividades desenvolvidas em sala de aula; aulas audio-
gravadas e transcritas (cinco); produção escrita e reescrita (atividade em duplas)
e produção escrita final (atividade individual). Vejamos uma breve descrição do
papel de cada um dos instrumentos:
As observações e anotações em diários de campo registravam o
direcionamento das atividades realizadas e da recepção dos alunos. Segue um
fragmento como exemplo:
Registro 01:
Iniciei a aula distribuindo o texto (artigo de opinião) de Nelly
Carvalho e, como no dia anterior, iniciei a leitura sozinha e em seguida
pedi que os alunos lessem em voz alta.
Houve algumas interrupções, pois os alunos começaram a se
identificar com as idéias defendidas pela autora do texto. Eles aderiram
à opinião da autora, quando a mesma deixou claro que o dialeto
nordestino tem “valor” em época de eleição. (anotações de diário de
campo do dia 14- 11- 06).
As aulas áudio-gravadas e transcritas, por sua vez corresponderam, a 03
aulas de cinqüenta minutos, cada uma delas dedicadas a uma atividade reflexiva
(refacção coletiva) a respeito de um texto argumentativo produzido anteriormente
em duplas. Somados a esses dados, tivemos 03 aulas destinadas à produção
escrita individual do artigo de opinião, sendo este um dos focos principais da
nossa análise por se tratar da etapa final de produção, seguido das falas da
professora / pesquisadora e dos alunos.
O conteúdo desses dados está representado pelas falas de ambos os
sujeitos (professora / pesquisadora e alunos) numa situação interativa, de forma
não planejada por ambos os sujeitos e por isso constituíram um retrato vivo da
competência argumentativa dos alunos e da própria metodologia da professora /
63
pesquisadora. Na análise dos dados alguns exemplos serão tratados conforme o
fragmento seguinte
6
:
Registro 02:
A6- acrescentar ( )
P- ahn?
A6- acrescentar:: mais alguma coisa
P- acrescentar... essa coisinha que a gente acha que falto::u sabe? a
gente vai acrescentar não com a minha opinião... eu apenas vou ser a::
escrivã... mais... com a opinião aqui de todos vocês falando e a gente
reconstruindo o texto... o texto existe... o texto é deles... é de autoria
deles... mas hoje a gente vai ampliá-lo a ser agora um texto
coletivo...ok? agora... como o texto... eu pedi... pra que eles falassem
sobre o perfil da mulher... eu gostaria primeiro... antes da gente / pra
gente éh:: retomar aquelas idÉIas... que a gente já havia... falado...
outros dias... éh... antes mesmo desse ( ) eu trouxe pra vocês aqueles
textos do:: é... eu queria que vocês me... vamos recapitular (( A
professora mostra alguns textos)) esse texto aqui por exemplo... vocês
vão lembrar... de forma rápida muito pida de que trata?... qual era o
foco principal... desse aqui::?
A6- a charge ( fragmento da aula do dia 17/ 11/ 2006)
O terceiro e último instrumento de coleta de dados corresponde às
produções escritas e reescritas realizadas em duplas e individualmente, as quais
evidenciam a intervenção realizada por parte da professora.
A focalização da reescritura como objeto de estudo / reflexão durante o
período de intervenção responde pelas informações diagnósticas que obtivemos
na fase preliminar da nossa pesquisa. A produção escrita final (individual) é a
mais abrangente em termos de dados para análise, pois os alunos para chegarem
a essa fase submeteram-se ao processo de estudo da argumentação envolvendo
leitura, discussão, escrita e reescrita.
6
Para as transcrições, seguimos o modelo do projeto NURC (Norma Urbana Culta). Trata-se de
um projeto de documentação e pesquisa iniciado no final da década de 1960 envolvendo as
cidades brasileiras de Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre ( BAGNO,
2001). Vejamos algumas descrições que serviram de base: ( ) Incompreensão de palavras ou
segmentos;
(hipótese) Hipótese do que ouviu; / - Truncamento (havendo homografia, usa-se acento
indicativo da tônica e / ou timbre; Maiúscula- Entonação enfática; :: podendo aumentar para :::
ou mais Prolongamento de vogal e consoante (como r, s); ? Interrogação; ... Qualquer
pausa; ((minúscula))- Comentários descritivos do transcritor, dentre outros. Além disso,
utilizamos os sinais abaixo para indicar as falas: P- Professora; AA- Alunos; A- Aluno / aluna
(numerada de acordo com a ordem de participação durante a aula).
64
O conjunto de dados organizados e triangulados constituem-se, pois, como
reveladores, no sentido de responderem às nossas questões de pesquisa postas
inicialmente.
3.5 - Procedimentos de análise
O procedimento de análise levou em consideração o processo de
triangulação dos dados, confrontando aqueles obtidos no momento da realização
da sondagem, com os dados obtidos nos 03 módulos da seqüência didática, com
o seu planejamento e com o diário de campo.
O confronto de várias ações e diferentes dados possibilitou estabelecer
duas categorias que agrupou um grande tópico cada uma, subdividido em outros,
os quais serão tratados detalhadamente no capítulo de análise.
A primeira categoria visa responder à primeira pergunta de pesquisa, e por
isso está organizada em função da análise das produções escritas dos alunos,
através do tópico: manifestação da competência argumentativa, o qual está
subtopicalizado por operadores argumentativos.
A segunda categoria, por sua vez, visa responder a outra pergunta de
pesquisa, está, pois, organizada em função da análise dos resultados da
seqüência didática planejada, com base no tópico estratégias metodológicas,
onde analisamos o tipo de proposta de intervenção e a condução das atividades.
65
Capítulo 4
A manifestação da competência argumentativa dos alunos versus a ação
metodológica da professora
Neste capítulo foram observados os dados coletados (anotações em
diários de campo, aulas áudio-gravadas e transcritas, produção escrita e reescrita
pelas duplas e produção escrita final atividade individual) mediante a
triangulação dos mesmos, tendo em vista as duas categorias organizadas para
análise: categoria em função da análise das produções escritas dos alunos; e
categoria em função da análise dos resultados da seqüência didática planejada.
Essas categorias agruparam dois tópicos: A primeira, topicalizada pela
manifestação da competência argumentativa dos alunos, diz respeito ao
desempenho dos alunos e, por esse motivo esteve diretamente voltada para suas
produções (escritas). Neste tópico registramos as manifestações da competência
argumentativa dos alunos, por operadores argumentativos, que, por sua vez,
abrange as noções de classe argumentativa e escala argumentativa.
A segunda categoria de análise contemplou a reflexão em torno do
desempenho da professora / pesquisadora. No tópico estratégias metodológicas,
suas ações na sala de aula, bem como as respostas dos alunos a essas ações
(interação) e o tipo de proposta de intervenção foram objeto de interesse para
análise. Assim, refletimos sobre o impacto da sua ação metodológica no sentido
de favorecer / ou não a competência argumentativa dos alunos. Para isso,
subdividimos o tópico acima em dois itens: tipo de proposta de intervenção e
condução das atividades.
Iniciemos, pois, nossa análise tendo como ponto de partida a primeira
categoria acima mencionada e os itens nela envolvidos:
66
4.1- Manifestação da competência argumentativa
4.1.1- Por operadores argumentativos
Ao compararmos as produções dos alunos com o quadro de operadores
argumentativos proposto por Koch (1992), percebemos algumas semelhanças e
diferenças em relação ao tipo de operador e a sua função discursivo-
argumentativa. As produções escritas tratadas nesse item ocorreram em duas
fases: produção inicial em duplas, considerada na versão e na versão; e
produção final, realizada individualmente.
Nessas produções, verificamos um aspecto significativo para a nossa
análise: a não diversidade dos operadores argumentativos, que, por sua vez,
gerou a recorrência de uns em comparação a outros. Este fato não comprometeu
a competência argumentativa dos alunos, uma vez que, apesar do uso restrito
desses operadores, em sua maioria, eles se apresentaram de modo coerente
para darem sustentação à argumentação apresentada (KOCH, op.cit).
Verificamos na primeira fase da produção que o alunado atrelou sua
competência argumentativa ao uso repetitivo de operadores no texto, gerando
assim um maior distanciamento das orientações de Koch (op.cit), de tal modo que
a presença desses recursos se deu de modo aleatório, sem reflexão sobre o seu
uso. A melhoria pôde ser observada a partir do momento em que houve reflexão,
fosse esta mediada pela professora ou pelo (s) aluno (s).
Assim, para uma melhor compreensão do uso dos operadores
argumentativos e suas respectivas funções adotadas nas produções analisadas,
bem como para uma visão geral da análise realizada a seguir, montamos o
quadro 03 adaptado em Koch (op.cit) e citado na fundamentação teórica (capítulo
01). Vejamos:
67
Quadro 03- Visão geral dos operadores argumentativos nas produções
dos alunos
Tipos
Funções
Exemplos
1- Introdução de justificativa /
explicação relacionada ao enunciado
anterior
Justificar adesão de um ponto de vista.
“Nós concordamos porque a mulher
pode ter os mesmos direitos que o
homem” (1ª versão de E e J.R);
“Nós concordamos porque a mulher
vem crescendo profissionalmente” (2ª
versão de E e J.R).
2-Introdução de nova idéia
Somar argumentos.
“(...) e também mulher para nós é
aquela que trabalha e vai em busca de
alguma coisa na vida” (1ª versão de E
e J.R)
3-Marcadores de oposição
Apresentar um sentido contrário ao
que vinha sendo afirmado.
“Hoje, porém se a mulher for vítima de
agressão no lar (...)” (2ª versão de E e
J.R);
“(...)mem todo tipo de trabalho é lícito,
mas essas diferenças vão
desaparecendo devagar” (T.M)
4-Relação de comparação
Estabelecer comparações.
“ Ela precisou se expandir no meio da
sociedade.Tanto no meio do trabalho
como familiar” (T.M);
“Os salários na maioria das vezes é
menor que o dos homens(...)” (T.M).
5-Introdução de finalização / conclusão Marcar finalização do enunciado
anterior.
Com tudo o seu perfil foi e vai
crescendo.” (T.M)
6- Apresentação de resumo / síntese
Resumir enunciados anteriores para
se chegar a uma conclusão.
“”(...) em si elas têm mais confiança
no seu trabalho, são mais presentes
no trabalho eTc”.(T.M)
7-Introdução de pressupostos.
Indicar mudança de estado em relação
a um tempo anterior, e para diferenciar
coisas da mesma natureza.
“Hoje em dia vemos que muitas
empresas tem cargos específicos
para elas”. (T.M)
O quadro acima mostra que os alunos usam os operadores argumentativos
na escrita, porém, em algumas passagens, não refletem sobre o uso,
equivocando-se e trocando um pelo outro.
A manifestação da competência argumentativa pelo uso dos operadores
argumentativos, dentre outras nuances, garante ao texto sua progressão. Assim é
que através da leitura é possível verificar seu começo, meio e fim.
68
Acrescente-se que, por meio das relações discursivo-argumentativas,
encadeiam-se não conteúdos (estado de coisas de que falam os enunciados
anteriormente apresentados), mas atos de fala, em que se enunciam argumentos
a favor de determinadas conclusões (KOCH e ELIAS, 2006).
Num primeiro plano, isso significa que o ato de fala, ou mesmo a tomada
de posição, pode ser realizada de forma independente pelo aluno em relação ao
que ele pretendia defender (o ponto de vista é livre). No entanto, para se efetivar
a progressão do que se defende, surge a necessidade de justificar, explicar,
atenuar, etc o que inicialmente se afirmou.
Os operadores argumentativos estabelecem inúmeras relações
(justificação, soma, oposição, dentre outras) as quais, nos textos, podem conferir
ao usuário da língua competência argumentativa. A esse respeito analisaremos a
seguir as produções escritas dos alunos.
Inicialmente apresentamos para análise uma primeira produção escrita em
que os produtores emitiam sua opinião sobre o perfil social da mulher. Esta foi
realizada em duplas como resultado de um exercício de sondagem realizado na
sala de aula.
Exemplo 01:
1ª versão
7
Nós concordamos porque a mulher pode ter os mesmos direitos
que o homem e também mulher para nós é aquela que trabalha e vai
em busca de alguma coisa na vida. (E.e J. R)
Neste texto, os alunos - produtores afirmam concordar com o novo perfil
social da mulher, através do fragmento “nós concordamos”; e para isso
apresentam a justificativa introduzida pelo operador argumentativo porque de
modo adequado. No entanto, percebemos a falta de continuidade para aquilo que
eles afirmaram ter os mesmos direitos dos homens”. uma lacuna de
informatividade para a defesa desse argumento, pois não informação sobre os
direitos a que se referem.
7
Os textos dos alunos estão iguais aos originais, com apenas as iniciais dos nomes dos
produtores para preservar-lhes a identidade.
69
A argumentação produzida se constrói em função da idéia de que a mulher
que trabalha tem os mesmos direitos que o homem. Assim, a definição da mulher
dentro desse novo perfil social é aquela que busca algo na vida. Do contrário,
perpassa a idéia da mulher com direitos inferiores em comparação aos dos
homens.
Como marca da ruptura do texto produzido, eles utilizam os operadores
argumentativos e também com valor de além disso, que, segundo Vilela e Koch
(2001), constituem argumentos para uma mesma conclusão. Neste caso, o uso
desses operadores funciona como uma idéia de argumento novo, porém falsa.
Nesta primeira versão, constatamos indícios da competência
argumentativa, pelo fato de os autores concordarem e apresentarem uma idéia
como justificativa, embora seja inadequada a escolha que fizeram do operador
argumentativo. Isso significa que o fato de apenas “concordar” com uma pergunta
do enunciado não conta da competência argumentativa dos alunos
produtores.
Para uma análise mais profícua do uso dos operadores argumentativos,
observemos como se apresentou a segunda versão desse mesmo texto, realizada
uma semana após a primeira produção mediante uma leitura reflexiva da dupla,
sob mediação da professora.
Exemplo 02:
2ª versão
Nós concordamos porque a mulher vem crescendo profissionalmente,
ocupando cargos elevados a cada ano. A mulher hoje não é aquela de
antigamente, menosprezada pela sociedade. Hoje, porém se a mulher for vítima
de agressão no lar, imediatamente vai a uma delegacia prestar queixas contra
quem lher agrediu, porque isso indica uma mulher guerreira que sabe lutar pelos
seus direitos. (E e J.R)
Observamos que, na segunda versão, os alunos - produtores foram
capazes de traçar um paralelo entre a mulher de antigamente e a de hoje. Isso fez
com que eles utilizassem um maior número de argumentos do que na primeira
versão, e, conseqüentemente, demonstrassem melhor desempenho
argumentativo, tendo em vista o uso dos operadores argumentativos dentro das
suas respectivas funções.
70
Comparando as duas versões, verificamos que no plano argumentativo a
segunda mantém a idéia de igualdade entre o homem e a mulher da primeira
versão. Essa idéia aparece ampliada na última linha da segunda versão através
da construção “guerreira que sabe lutar pelos seus direitos”.
A mudança da segunda versão esteve relacionada a dois fatos: acréscimo
de informações / idéias / argumentos atrelados ao tema. Na primeira versão eles
argumentaram que a mulher pode ter os mesmos direitos do homem; na segunda,
a argumentação se deu pelo reconhecimento por parte dos alunos produtores
de que a mulher vem crescendo profissionalmente; e pelo uso adequado de
operadores argumentativos.
Quanto a estes, os alunos - produtores repetiram o porque no início da
produção justificando, assim, o ponto de vista defendido; a reflexão em torno do
uso os levou a eliminar o e também ocorrido na primeira produção, responsável
pela quebra da argumentação, que orientados pela professora foram capazes de
perceber e oferecer uma alternativa.
No momento de argumentarem a favor da mulher de hoje, os operadores e
também estavam inseridos na série de argumentos apresentados (a mulher vem
crescendo profissionalmente; o é aquela de antigamente; se for agredida,
presta queixas, etc).
Essa melhoria, em termos de argumentação e do uso dos operadores
argumentativos, contou com a ajuda das estratégias da professora, nos
momentos que antecederam a reescritura, quando foram realizadas a leitura e
reflexão das primeiras versões e discussão do tema. A estratégia da reescritura
colabora, pois, para a melhoria das produções.
Esse foi um momento primordial vivenciado nas aulas, porque embora
cada dupla não tenha tido uma atenção especial e particularizada da professora,
a leitura realizada por ela, acompanhada dos seus comentários sobre as
produções forneceram pistas para melhorar o desempenho dos alunos na
refacção.
Nesse sentido, para apresentarem um sentido contrário durante a
comparação entre a mulher de antigamente e a de hoje, usaram o operador
argumentativo porém. Esse operador, juntamente com outros da mesma natureza
71
(mas, contudo, no entanto etc), tem a função de marcar uma oposição entre
elementos semânticos explícitos ou implícitos (KOCH, 1992).
O uso de um ou outro depende do tipo de estratégia empregado pelo
produtor. No caso da produção analisada, a estratégia foi mostrar, de modo
explícito, a oposição entre “ser vítima de agressão no lar”, e, como conseqüência,
tomar as providências contra quem a agrediu, procurando a delegacia.
Na conclusão, observamos que a dupla utilizou o operador argumentativo
porque, como uma forma de dar continuidade à justificativa da mudança da
mulher nos dias atuais, mantendo a idéia da primeira versão.
Ainda comparando as duas produções da mesma dupla, é possível verificar
que na segunda versão os operadores argumentativos, além de terem se
apresentado em maior número no texto, parecem ter sido usados de forma mais
reflexiva do que na primeira versão.
Talvez seja esse o momento dos alunos desenvolverem uma escrita com
uso mais recorrente de argumentos e dos operadores, pois para alcançá-la, os
alunos - produtores demonstraram maior conhecimento e domínio da língua na
situação comunicativa em estudo. Em outras palavras, na referida produção
uma presença das competências lingüística e comunicativa no uso dos
operadores, o que, por sua vez, propiciou a competência no uso dos operadores
argumentativos.
A argumentatividade inscrita no interior da própria língua (DUCROT, 1999)
permite que as frases, por curtas que sejam, tragam orientação argumentativa.
Por esse motivo, elas têm por característica obrigar o intérprete a determinar a
conclusão “X” para a qual apontam. Para uma melhor compreensão do que
afirmamos, seguem os exemplos 03 e 04, nos quais a dupla emitiam a opinião
sobre o novo perfil social da mulher através de um exercício de sondagem,
conforme analisamos nos exemplos anteriores (01 e 02). Vejamos:
Exemplo 03:
1ª versão
Nós concordamos, por que as mulheris estão lutando por seus
direitos e além disso elas estam conquistando seu lugar entudo (J.A e J.
I).
72
A orientação argumentativa da produção acima está marcada, de modo
explícito, pelos operadores argumentativos porque (grafado por que) e além
disso. A primeira ocorrência do operador argumentativo nos obriga a
compreender a explicação dada ao enunciado anterior que foi o fato dos alunos
produtores concordarem com o novo perfil social feminino. O simples início da
frase “Nós concordamosleva o leitor a prever uma conclusão que justifique tal
início (“por que as mulheris estão lutando por seus direitos”).
Assim, o valor semântico de uma frase argumentativa traz no seu interior o
conjunto de instruções capazes de demonstrar a orientação argumentativa da
mesma.
Se considerarmos a orientação argumentativa construída na primeira
ocorrência do operador argumentativo, podemos afirmar que a segunda
ocorrência (“... e além disso elas estam conquistando seu lugar entudo”)
compromete a eficácia da argumentação, devido a inadequação semântica dos
operadores usados. Comecemos pelo uso de “e além disso”, que segundo vimos
na fundamentação teórica no quadro dos operadores argumentativos (Quadro 01)
embasado em Koch (1992), que esses operadores têm a função de somar
argumentos a favor de uma mesma conclusão. No entanto, a soma desses
argumentos semanticamente foi sinônima. Podemos explicar o que afirmamos
através da comparação das construções “... as mulheris estão lutando por seus
direitos” e “... elas estam conquistando seu lugar entudo”. Ora, é evidente que se
as mulheres estão lutando pelos seus direitos, elas estão conquistando seu lugar.
Houve, portanto, um somatório duplo e sinônimo com o uso dos operadores o
qual acarretou a qualidade da argumentação.
Situações como essa vem apenas confirmar a importância do papel do
professor na sala de aula, cuja missão é mediar o ensino dos operadores
argumentativos e de suas respectivas funções, para que os alunos façam uso
desses elementos lingüísticos de forma mais reflexiva.
Nesse sentido, passemos para a análise da segunda versão da dupla
acima analisada. A partir da leitura é possível atestarmos melhorias no uso dos
operadores argumentativos, as quais endereçamos a eficácia do ensino oferecido.
73
Exemplo 04:
2ª versão:
Sim, nós concordamos por que a mulher está conquistando seu
espaço em todos os aspectos, ou seja, elas estão correndo atrais de
uma vida melhor e não aquela vida de lavar prato e varrer casa.
Elas estão atrais de melhorias para sua vida como trabalhar em
cargos que ela se sinta a vontade (J.A e J.I).
As melhorias verificadas estão no uso adequado dos operadores
argumentativos, tendo como ponto central a variação. Essa variação foi possível
porque os alunos juntamente com a professora questionaram a adequação de
muitos dos operadores argumentativos usados por eles na primeira versão.
De certa forma, há de se admitir que a atuação da professora ajudou os
alunos na melhoria das suas produções. Como forma de comprovação podemos
verificar que a dupla demonstrou competência argumentativa através do uso
variado dos operadores “por que” (linha 01), “ou seja (linha 02), e” (linhas 02 e
03) e “como” (linha 04).
Na primeira versão o uso do operador porque teve por base explicar um
enunciado anterior, de modo que o operador foi mantido na segunda versão com
o mesmo fim da primeira, que no caso foi explicar / justificar o porquê da dupla
concordar com o novo perfil social da mulher.
A novidade se deu pelo uso acertado do operador argumentativo “ou seja”,
que por sua vez, tem a função de esclarecer uma enunciação anterior, no caso
em análise foi para explicar como as mulheres estão conquistando seus espaços
em todos os aspectos, conforme fora anunciado nas linhas iniciais da produção
(“Sim, nós concordamos por que a mulher está conquistando seu espaço em
todos os aspectos ...”). Após o uso desse operador, a dupla apontou o que a
mulher andava fazendo (“...elas estão correndo atrais de uma vida melhor...”) e
usou o operador “e”, de forma repetida, dentro da sua função, ou seja, para somar
argumentos a favor da conclusão construída em torno da corrida dela em busca
de uma vida melhor (“e não aquela vida de lavar prato e varrer casa”).
O mesmo ocorreu com o uso do operador argumentativo “como, no
parágrafo final da produção: “Elas estão atrais de melhorias para sua vida como
trabalhar em cargos que ela se sinta a vontade”. Seu uso somou os argumentos
74
para a conclusão das melhorias que as mulheres estão em busca para as suas
vidas.
Atribuímos, portanto, ao desenvolvimento da competência argumentativa
dos alunos nos textos analisados à oportunidade de reverem o primeiro texto e o
reescreverem, de tal modo que foi possível realizar a repetição do operador que
não comprometia o sentido da argumentação, eliminar o que comprometia e
acrescentar um novo operador respeitando a sua função.
Para que esse resultado fosse efetivado, não foram necessárias aulas nas
quais a metalinguagem gramatical, no caso, os operadores argumentativos,
ocupasse o foco central da discussão. Através da análise e revisão da primeira
versão dos textos, o conteúdo foi trazido para a aula como ponto de reflexão em
função dos argumentos apresentados e da pertinência dos usos dos operadores
argumentativos.
Por esse motivo, é importante o professor estar sempre consciente de que
o texto argumentativo, embora se apresente “bom” na primeira versão, ou seja,
embora apresente o uso coerente de operadores argumentativos, não significa
que ele esteja acabado, que atingiu todos os pré-requisitos que o classificam
como tal. Essa afirmação retoma a idéia proposta nos PCN (1998) de que não há
texto pronto / acabado, pois mesmo que o houvesse, lhe caberia sucessivas
versões.
Uma reflexão sobre essa proposta dos PCN (op. cit) pode ser feita a partir
da leitura da próxima produção, na qual o aluno-produtor havia participado de
leituras, seguidas de debates sobre o tema (novo perfil social da mulher),
produção / refacção em duplas, produção coletiva mediada pela professora, para,
em seguida, realizar uma produção individual de um artigo de opinião, cujo tema
era o mesmo dessas aulas, ou seja, o novo perfil social da mulher. Segue o texto
produzido:
Exemplo 05:
EFEITO COLATERAL
A partir da exigência de que a mulher carecia ter suas próprias
liberdades de expreção; trabalhar sustentar a família, ter suas próprias
coisas como; casa roupas carro etc. Ela precisou se expandir no meio
da sociedade. Tanto no meio do trabalho como familiar.
75
Desse modo elas precisaram ter seu lugar garantido no meio da
sociedade. Com tudo o seu perfil foi e vai crescendo. Dessa forma
posso considerar que: a mulher se explorou ao máximo por ter seu lugar
garantido socialmente.
Os salários na maioria das vezes é menor que o dos homens, mem
todo tipo de trabalho é lícito para ela, mas essas diferenças vão
desaparecendo devagar.
Hoje em dia vemos que muitas empresas tem cargos
específicos para elas, em si elas têm mais confiança no seu trabalho,
são mais presentes nos trabalhos eTc.
Do meio que elas eram e são digamos assim, a mulher deu uma
reviravolta em torno de si mesma.
Sendo assim, posso dizer que esmais do que aprovado seu perfil
na sociedade. (Autor: T.M)
O aluno começou o texto explicitando os motivos que levaram a mulher
ascender socialmente (ter suas próprias liberdades de expreção; trabalhar
sustentar a família, ter suas próprias coisas...), através do uso dos operadores
argumentativos tanto... como, para estabelecer uma comparação de igualdade
nos setores do trabalho e da família.
O segundo parágrafo parece sinalizar para a finalização do primeiro (Desse
modo elas precisaram ter seu lugar garantido no meio da sociedade). No entanto,
esse início de parágrafo é logo seguido pelo uso do operador contudo (escrito
“com tudo”) fora da sua função semântica, a qual, segundo Koch (1992), constitui
um marcador de oposição.
Assim, ao escrever com tudo o seu perfil foi e vai crescendo”, o aluno
distancia-se das construções argumentativas anteriores (1º parágrafo) e das
posteriores no mesmo parágrafo (2º parágrafo). Isso porque ainda nesse
parágrafo o aluno inseriu um argumento conclusivo, embora não tenha concluído
sua afirmação anterior, iniciada pelo operador argumentativo contudo.
O emprego de uma adversativa, como a usada no 2º parágrafo, serve para
o locutor pôr em ação a “estratégia do suspense”, de modo que se protela o
momento de deixar claro / evidente a qual (is) dos argumentos ele adere (KOCH e
ELIAS, 2006).
Como vimos, não foi essa a intenção do aluno - produtor. O uso do contudo
foi apenas uma forma de usar um operador argumentativo a mais, talvez por ele
conceber que ao maior número de operadores usados corresponderia saber mais
do conteúdo estudado em sala de aula. Possivelmente, o aluno em questão, de
posse da lista dos operadores argumentativos, pois a professora permitira
76
consultá-los no momento da produção escrita, supôs que a qualidade da sua
produção vinculava-se à quantidade de uso desses operadores. Como efeito, o
operador “contudo” apareceu desvinculado da sua relação discursivo-
argumentativa.
No parágrafo, o aluno inseriu uma justificativa para a afirmação feita no
final do parágrafo anterior, ou seja, o fato de a mulher se “explorar” ao máximo
para ter seu lugar garantido na sociedade é justificado pela desigualdade entre os
salários da mulher e dos homens e pela ilicitude de muitos dos trabalhos delas. O
uso do mas garante a oposição do enunciado anterior, concluindo-o (... mem todo
tipo de trabalho é lícito para elas, mas essas diferenças vão desaparecendo
devagar).
O uso repetido do operador argumentativo já, no 4º parágrafo (Hoje em dia
vemos que muitas empresas já tem cargos específicos para elas...) indica
mudança em relação a um tempo anterior: antes e depois. Em se tratando da
primeira ocorrência (Hoje em dia vemos que...) significa que antes não amos
a situação citada. O hoje que inicia o enunciado é um marcador temporal e tem a
função de situar o leitor no momento atual da enunciação, em comparação com
um momento anterior. Ele também é um marcador (ativador) de pressuposição.
A segunda ocorrência do operador argumentativo já (... muitas empresas
tem cargos específicos para elas...) significa que outras empresas não propiciam
a mesma oferta de cargos específicos para mulheres. Ainda nesse mesmo
parágrafo, o aluno utiliza a expressão “em si elas têm mais confiança no seu
trabalho, são mais presente eTc” com valor de operador argumentativo, cuja
função é de resumir o que foi dito antes a fim de se chegar à conclusão.
Com relação aos dois últimos parágrafos, estes serviram para comparar /
comprovar a mudança social da mulher, bem como para ele demonstrar sua
adesão ao perfil feminino de mudança. O aluno usou de sutileza na construção do
texto, de modo que a sua adesão explícita somente veio a ocorrer no último
parágrafo da produção. Ele, por sua vez, vai apresentando os argumentos que
justificam o novo perfil social da mulher, descrito no decorrer dos parágrafos.
A progressão textual foi garantida ao longo da produção, salvo no segundo
parágrafo, fato que não comprometeu a essência da argumentação. Por esse
motivo, o texto analisado enquadra-se no rol dos textos argumentativos
77
relativamente “bem construídos”, cujo produtor demonstra estar desenvolvendo a
competência argumentativa, por dentre outras exigências, fazer uso adequado
dos operadores argumentativos.
4.1.2- Por classe argumentativa e escala argumentativa
Outra forma para investigar a efetivação da competência argumentativa por
meio do uso dos operadores argumentativos esteve relacionada às noções de
classe argumentativa e escala argumentativa, desenvolvidas nas produções dos
alunos.
Nesse sentido, focamos nossa atenção / reflexão nas “manobras”
argumentativas realizadas pelos alunos produtores para chegarem a uma
conclusão em defesa do ponto de vista defendido. Para isso consideramos a
organização / peso dos argumentos e a forma como eles se apresentaram nas
produções como uma das manifestações da competência argumentativa.
Tomemos, pois, como exemplo para análise a produção individual de um
artigo de opinião, cujas condições de produção foram as mesmas do texto
analisado no exemplo anterior. Vejamos o exemplo a seguir:
Exemplo 06:
A mulher ontem, hoje e amanhã
Eu como mulher, concordo e defendo com o novo perfil feminino.
A mulher vem atuando como uma mulher superada, não é mais
aquela que não saia de casa, não trabalhava, agora sim, ela trabalha,
têm um papel melhor do que tinha na sociedade antigamente, ocupa
vários cargos que não ocupava antes.
É fácil vermos a mulher ocupando cargos de destaque social como
ministra, advogada, juíza, promotora, prefeita, senadora e muitas outras
profissões.
Pela ascenção da mulher, o homem que demonstra um
comportamento machista, ele vai ser excluído da sociedade, pois ela
não aceita mais esse tipo de comportamento masculino. A sociedade
quer hoje um homem que entusiasmo à mulher para que ele cresça
sempre mais. E se o homem não fizer isso, ele vai ter o desprezo da
maioria das mulheres.
Não posso deixar de falar na capacidade que Xuxa demonstra
frente as câmeras, pois foi ela quem deu a maior audiência a rede
Globo no horário da manhã. Esse é apenas um exemplo de uma mulher
lutadora e vencedora, que não se deixou abater pelas críticas da mídia.
Na minha opinião até acho que quando a mídia critica a Xuxa, é
porque a apresentadora es se destacando, porque ninguém joga
pedras em árvores que não têm frutos.
78
Daqui a uns dez anos, acredito que o perfil social da mulher esteja
completamentedefinido: não haverá mais preconceito contra a mulher e
ela terá ocupado todos os cargos que o homem ocupa (menos o de
papa, mas ela também nem quer!). Autora: (A. S. O)
Os 06 (seis) parágrafos desenvolvidos na produção acima, podem
analisados à luz de Ducrot e Koch (1992), segundo a competência argumentativa
demonstrada.
Como ponto de partida para a análise da presença da classe
argumentativa, consideremos o seguinte enunciado, retirado dos dois primeiros
parágrafos do texto: “Eu como mulher, concordo e defendo com o novo perfil
feminino“ (L-1, 1º parágrafo).”A mulher vem atuando como uma mulher
superada... (L-2, parágrafo). Segue o conjunto de argumentos usados para a
comprovação da tese acima, cuja força argumentativa entre eles é a mesma,
estando, ao mesmo tempo, direcionados à conclusão:
arg 1- (...) não é mais aquela que não saia de casa (...)” (L-2 e 3,
parágrafo)
arg 2- “(...) não trabalhava (...)” (L-3, 2º parágrafo)
arg 3- “ (...) ela trabalha (...)”;(L- 3, 2º parágrafo)
arg 4- “(...) têm um papel melhor do que tinha na sociedade de antigamente
(...)”; (L- 4, 2º parágrafo)
arg 5- “É fácil vermos a mulher ocupando cargos de destaque social (...)”;
(L- 6, 3º parágrafo)
arg 6- “Não posso deixar de falar na capacidade que Xuxa demonstra
frente as câmeras, pois foi ela quem deu a maior audiência a rede Globo no
horário da manhã”. (L- 15,16 e 17, 5º parágrafo).
A série de argumentos apresentados pela aluna garantiu a progressão
textual, culminando na conclusão do seu texto: “Daqui a uns dez anos, acredito
que o perfil social da mulher esteja completamente definido: não haverá mais
preconceito contra a mulher e ela terá ocupado todos os cargos que o homem
ocupa (menos o de papa, mas ela também nem quer!).
Para tratarmos da noção de escala argumentativa, consideremos o
seguinte enunciado, extraído das linhas 09 e 10 do 4º parágrafo: “... o homem que
79
demonstra um comportamento machista, ele vai ser excluído da sociedade...”.
Para essa tese, a aluna apresenta os seguintes argumentos:
arg 1- “... ela não aceita mais esse tipo de comportamento masculino”; ( L-
11 e 12 do 4º parágrafo)
arg 2- “A sociedade quer hoje um homem que dê entusiasmo à mulher para
que ela cresça sempre mais”; (L- 11, 12 e 13 do 4º parágrafo)
arg 3- “E se o homem não fizer isso, ele vai ter o desprezo da maioria das
mulheres” (L- 13 e 14 do 4º parágrafo) – argumento mais forte.
No último parágrafo, a autora, de modo implícito, retomou os argumentos
acima tratados apostando no “desaparecimento” do preconceito contra a mulher
como resultado da mudança da visão machista (“não haverá mais preconceitos
contra a mulher...” L- 23 e 24). Para conseguir convencer o leitor, ela utilizou o
operador argumentativo , empregado com a função de encadear um argumento
relacionado à mudança de estado da mulher, comprovando assim a tese
defendida, ou seja, a certeza da ascensão da mulher.
É interessante observar o caráter de certeza da aluna quanto a essa
ascensão, de modo que ela finalizou seu texto citando a profissão do papa como
sendo a única que a mulher não ocuparia. O operador argumentativo mas usado
na última construção serviu para estabelecer uma oposição ao enunciado
anterior. Oposição essa, cujo efeito veio em forma de provocação / deboche
para seu interlocutor, conferindo à aluna-produtora um discurso de caráter
feminista que, por sua vez, encontrou respaldo semântico na linha do primeiro
parágrafo da sua produção, ou seja, na tese por ela defendida (“Eu como mulher,
concordo e defendo com o novo perfil feminino).
A partir dessa análise, vimos que a argumentação eficaz trabalha com os
mecanismos de classe e escala argumentativa presente na língua. Ter o domínio
deles em situação de uso (oral / escrita) é, antes de tudo, ter o domínio dos
operadores argumentativos considerando o seu funcionamento no texto. Em
outras palavras, é uma forma de comprovar a existência da competência
argumentativa por parte do produtor.
Isso significa que, para o domínio desses elementos lingüísticos, é
necessária uma vivência ampla com eles. Por isso, antes de tudo, é importante
que o usuário, no nosso caso, o aluno, argumente, oralmente ou por escrito, para
80
se familiarizar com os elementos que encadeiam sua argumentação. Para tanto,
ele deve ter a garantia de uma participação efetiva e ininterrupta nas aulas
(KLEIMAN, 2005). Essa participação, uma vez efetivada na escola, se estende
para outros setores da sociedade fazendo com que o aluno participe plenamente
dela, pois essa aquisição tem influência direta no desenvolvimento da
competência argumentativa dele, o que pode ser observado na forma de
organizar os argumentos num texto opinativo, como ficou demonstrado no
exemplo 06.
A manifestação lingüística dos alunos está além das informações da sala
de aula. Vejamos noutra produção individual, que a competência argumentativa
do aluno - produtor por meio das noções de classe e escala argumentativa pode
estar relacionada às leituras realizadas na sala de aula e fora dela.
Assim, as noções de classe e escala argumentativa, presentes na
produção seguinte comprovaram conhecimento de mundo amplo, além de um
maior grau de informatividade, que, por sua vez, revelou influência de diferentes
domínios do saber, não necessariamente passados / tratados nas aulas de
Língua Portuguesa. Vejamos o exemplo:
Exemplo 07:
A nova mulher e o mundo
Atualmente temos visto na mídia uma nova mulher que tem
conquistado espaços e direitos na sociedade, mulher esta determinada
forte e objetiva, mas isto não acontece com todas, pois ainda vemos
mulheres que apanham e sofrem pelas mãos de homens que mais
parecem homens das cavernas.
Tanto que ainda hoje em muitos paises o papel da mulher é
caracterizado pela submissão, pelo sofrimento e pela falta de direitos,
um exemplo disso é a Índia, um país do continente asiático onde a
mulher como um peso para sua família. Pois para que eles se casem é
costume oferecer um alto dote a família do noivo.
em outros países como o Canadá, o papel da mulher é muito
diferente pois ela tem um ensino superior maior que os dos homens,
ou o número de mulheres na Universidade é maior do que os dos
homens.
No Brasil as mulheres m conquistado seu espaço, um exemplo
disso é a ministra : Diuma Rousefer e a candidata e Senadora do
(PSOL) Heloísa Helena, apesar dela não ter chegado ao segundo turno
mas foi capaz de abocanhar mais de 6 % dos votos dos brasileiros.
Nesta semana a Revista Veja publicou uma notícia sobre o novo
perfil da mulher, e observei que as mulheres muitas vezes o
conseguem consiliar o seu novo papel e a vida, mulheres que não se
casam mais, que não querem ter mais filhos, tudo isto é acompanhado
pelo desejo de alcançar seus objetivos e direitos, objetivos esses que
81
por direito a elas pertencem. Deixo aqui a minha adesão ao novo perfil
social da mulher. Na Bíblia está escrito que homens e mulheres são
todos iguais perante Deus. Autor : J.S
A construção argumentativa da produção do exemplo 07 possibilitou ao
aluno produtor demonstrar sua competência na organização dos argumentos
distribuídos em classe e escala argumentativa.
As seqüências argumentativas do seu texto se apresentaram na ordem
progressiva, de tal modo que ele deixa clara a sua adesão ao novo perfil social da
mulher no final do último parágrafo do texto após elencar todas as premissas para
tal posição através do enunciado: “Deixo aqui minha adesão ao novo perfil social
da mulher” L- 26,27 e 28, 5º parágrafo.)
Desse modo, a produção foi realizada tendo em vista comprovar a
ascensão da mulher na sociedade atual, apesar dos vários contra-argumentos
apresentados pelo aluno produtor os quais se constituíram como entraves para
a totalidade dessa ascensão, como podemos observar no fragmento retirado a
partir da terceira linha do primeiro parágrafo e de todo o segundo parágrafo da
sua produção: (...) mas isto não acontece com todas, pois ainda vemos
mulheres que apanham e sofrem pelas mãos de homens que mais parecem
homens das cavernas.
Tanto que ainda hoje em muitos paises o papel da mulher é caracterizado
pela submissão, pelo sofrimento e pela falta de direitos, um exemplo disso é a
Índia, um país do continente asiático onde a mulher como um peso para sua
família. Pois para que eles se casem é costume oferecer um alto dote a família do
noivo”.
Para atingir seu objetivo o aluno produtor foi capaz de traçar um paralelo
da situação da mulher mundo afora. Os dados apresentados para a comprovação
do seu ponto de vista marcaram explicitamente, o uso combinado das noções de
classe e escala argumentativa. Por um lado, todas as referências feitas a países
como o Canadá e o Brasil, bem como à publicação da Revista Veja, se
direcionaram para a conclusão de que a mulher de fato tem um novo perfil na
sociedade, o qual tem a aprovação do aluno –produtor.
82
Tais referências podem ser distribuídas da seguinte forma: Classe
argumentativa: (1) A mulher conquistou espaços e direitos na sociedade
(conclusão R).
arg 1- (No Canadá) “(...) ela tem um ensino superior maior que os
homens”.(L- 13 e 14, 3º parágrafo)
arg 2- (No Canadá)” (...) o número de mulheres na Universidade é maior do
que os dos homens”. (L- 14 e 15, 3º parágrafo)
arg 3- (No Brasil) “(...) as mulheres têm conquistado seu espaço”. (L- 16,
parágrafo) - Nesta construção foram citados os exemplos de mulheres como a
ministra Dilma Roussef e a candidata a Presidência da República e Senadora
Heloísa Helena.
arg 4- (Revista Veja) “(...) publicou uma notícia sobre o perfil da mulher (...)
tudo isto é acompanhado pelo desejo de alcançar seus objetivos e direitos”. (21,
22,24 e 25, 5º parágrafo).
Como vemos, a relação de argumentos apresentados tem a mesma força
argumentativa direcionados à conclusão.
Quanto à escala argumentativa, verificamos uma maior incidência nos dois
primeiros parágrafos, especificamente na apresentação dos contra argumentos
com relação à não participação social da mulher, vejamos:
Escala argumentativa: (2) Todas as mulheres não conquistaram seu espaço
na sociedade.
arg 1- “(...) ainda vemos mulheres que apanham e sofrem pelas mãos de
homens (...)” (L-4 e 5, 1º parágrafo)
arg 2- “(...) para que elas se casem é costume oferecer um alto dote a
família do noivo”. (L- 9, 10 e 11, 2º parágrafo)
arg 3- “(...) em muitos países o papel da mulher é caracterizado pela
submissão, pelo sofrimento e pela falta de direitos”. (L- 6, 7 e 8, 2º parágrafo)
argumento mais forte distribuído de forma gradativa.
Por outro lado, podemos ainda tomar as mesmas referências utilizadas pelo
aluno produtor e afirmar que estas somente foram possíveis devido ao seu grau
83
de letramento
8
. Atribuímos tais referências a participação do aluno em eventos
variados de letramento. As discussões realizadas no período específico da
aplicação da seqüência didática quando foram lidos e debatidos textos enfocando
o novo perfil social da mulher, não deram conta de muitas das informações
apresentadas no exemplo 07.
Acreditamos no letramento adquirido além dessas aulas, isto é, em outras
instâncias sociais (BARTON, 2000), ou mesmo na própria escola nas aulas de
História e Geografia, como uma possível justificativa à referência do aluno a
países como o Canadá e a Índia, no tocante à situação da mulher.
Atribuímos ainda ao letramento ocasionado pela mídia, através da leitura /
assistência / escuta a jornais, telejornais e revistas, as informações fornecidas
pelo aluno quanto ao percentual de votos da candidata Heloísa Helena, por
exemplo.
Em outras palavras o autor do texto em questão evidenciou competência
argumentativa na elaboração de seqüências da mesma natureza, apresentando
um ponto de vista sobre o novo perfil social da mulher, com os argumentos
cabíveis / coerentes para esse ponto de vista em escala e classe argumentativa.
Portanto, vimos que a competência argumentativa do aluno - produtor foi
desenvolvida, não na escola, através das noções de classe e escala
argumentativa, mediadas por aulas reflexivas que primaram pela organização dos
argumentos, mas também esteve atrelada às experiências letradas extra-
escolares do aluno, de tal modo que estas favoreceram o desempenho no
contexto escolar.
Em termos gerais, as formas de manifestações da competência
argumentativa foram visíveis pelo uso dos operadores argumentativos de forma
crescente / contínua, isto é, houve melhoria substancial no uso desses,
considerando a estratégia docente da reescritura. Nas produções, evidenciamos
que os alunos demonstraram domínio desses operadores no decorrer das aulas
para a integração de outras informações pertinentes ao tema.
8
Autores como BARTON, D & HAMILTON, M (2000); KLEIMAN, (2001), (2005) ; ROJO (2001a),
(2001b), (2005), dentre outros, têm seus trabalhos voltados para esse tema. Nessa pesquisa, não
é nosso propósito analisar os dados à luz dessas teorias, razão pela qual apenas as citamos.
84
Em outro momento da análise, verificamos que a quebra da argumentação
impediu a progressão das idéias dos alunos - produtores nas situações em que a
função do operador foi distorcida, ou mesmo, empregada com outro valor
semântico, como foi o caso do exemplo 01.
Por outro lado, alguns alunos demonstraram domínio significativo na
elaboração dos argumentos (classe e escala argumentativa) para chegarem à
conclusão, evidenciando a importância dos conhecimentos adquiridos através da
leitura ou de outros tipos de informação. Com isso, reiteramos que a manifestação
da competência argumentativa requer o domínio de operadores argumentativos,
relacionado a outros fatores também, tais como: o letramento
escolar, o
letramento midiático, cujas práticas de leitura e de escrita se realizam em várias
instâncias sociais com atribuições outras, o especificamente ligadas à de
natureza escolar.
4.2- Estratégias metodológicas
4.2.1- Tipo de proposta de intervenção
Nosso enfoque dirigiu-se para os tipos de atividades propostas na
seqüência didática (reescritura coletiva / individual das produções, estudo dos
operadores argumentativos, leitura e reflexão de textos) e para as estratégias
utilizadas pela professora durante a execução dessas atividades (releitura de
textos, interação na sala de aula, recapitulação de discussões)a fim de verificar a
eficácia dessas atividades para o desenvolvimento da competência argumentativa
dos alunos.
A intervenção no ensino, através da aplicação de uma seqüência didática,
encontrou respaldo na teoria de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), pois para
esses estudiosos uma seqüência didática tem, precisamente, a finalidade de
ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe assim
escrever ou falar de maneira mais adequada numa dada situação de
comunicação. O sentido da proposta residiu, pois, nas oportunidades que o aluno
teve de expressar-se na fala e na escrita.
85
A partir das anotações de campo, a professora / pesquisadora
conscientizou-se da necessidade de realizar uma intervenção visando à melhoria
das produções textuais através da reflexão e usos dos argumentos. Vejamos,
portanto, como essa necessidade foi explicitada, tendo como base as anotações
de campo da professora:
Exemplo 08:
(...) Os alunos (homens) apesar de, na grande maioria, defenderem
direitos iguais para homens e mulheres detiveram mais seus
argumentos na questão da “subida” da candidata nas intenções de voto.
Ao atentarem para o discurso da charge, reconheceram o
“medo”reinante dos outros dois candidatos (Alckimin e Lula). Registrei
por escrito indícios do discurso machista, produto das crenças e valores
defendidos socialmente. Tal fato me fez perceber que eu deveria intervir
no ensino, pois os argumentos apresentados pelos alunos, além de
soltos, estavam repletos de preconceitos sociais, isto é, os alunos
pareciam apenas reproduzirem os discursos de outrem.
( anotações de campo ocorrida durante a sondagem realizada na sexta-
feira, 04 de agosto de 2006).
Com base nas anotações de campo (exemplo 08), verificamos que a
professora / pesquisadora mostrou-se sensível à falta de argumentos
provenientes dos próprios alunos. Ela reconheceu nas produções deles apenas
uma passagem / imitação / reprodução do discurso de outrem. De acordo com
Leal e Morais (2006), desde muito cedo, nossos alunos são capazes de
argumentar, quer oralmente, quer por meio de textos escritos. A preocupação da
professora / pesquisadora com a natureza dos argumentos dos alunos justifica-se
pela ausência de domínio próprio da competência argumentativa deles, em
especial, após, no mínimo seis anos de escolaridade.
Assim, considerando a reflexão docente acerca da argumentação
produzida pelos seus alunos, diríamos que se tratou de um momento significativo
ocorrido no período da sondagem, capaz de propiciar uma intervenção eficaz
voltada para o desenvolvimento da competência argumentativa dos alunos. Essa
postura da professora / pesquisadora confere uma concepção de língua como
interacionista.
A seqüência didática, com ênfase na reescritura, foi, pois, o meio
encontrado para atenuar, ou mesmo sanar, essas possíveis “falhas” dos alunos
86
na construção de argumentos para a defesa de um ponto de vista. É, pois de se
esperar que as atividades organizadas pela professora na seqüência didática
conduzissem os alunos à produção argumentativa oral / escrita com proficiência.
Considerando o ensino / estudo da argumentação efetivado pela
professora, a princípio apontamos como adequado o momento do estudo dos
operadores argumentativos, uma vez que em termos lingüísticos / gramaticais,
estes se prendem à argumentação. No entanto, vamos observar que o estudo
desse conteúdo gramatical, durante uma das aulas áudio-gravadas e transcritas,
fere as recomendações dos PCN (1998) no tocante à apropriação / domínio do
mesmo. No trecho da aula que segue, retirado da aula de produção coletiva do
artigo de opinião, a professora insiste na afirmação de que o domínio ou a
memorização de operadores argumentativos é necessária, sem, contudo, deixar
clara a forma de apropriação dos mesmos. Vejamos o exemplo:
Exemplo 09:
63- P- argumentando... você está argumentando... toda vez que você se
decide a convencer alguém de que você está certo... você pega um
ponto de vista e vai defender... então você está ... argumentando PAra
isso não é? para isso... você se vale daqueles termos gramaticais que a
gente viu que eu passei aquela listinha prá vocês porque eles vão
ajudar na hora de você argumentar... sem você perceber:: eles também
vão surgir nos seus textos... aqueles o quê?... quem lembra? a lista de
quê?
64- A1- de::
65- A2- dos operadores gramaticais
66- P- prá que serve?
67- A1- prá...
68- A3- pra... prá auxiliar no texto...
69- A2- auxiliar:: ...
70- P- se você retirasse de um texto todos os operadores
argumentativos... você ia... éh:: desmanchar
71- A1 e A3- desmanchar o texto
72- A2- ia ficar sem sentido
73- P- ia ficar sem sentido... ia ficar uma argumentação solta... solta...
ia nem ficar argumentação eu acredito né...? se você saísse usando
aquelas pecinhas todinha... tira um mas... tira um porque... tira um e...
um também
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006,
sexta-feira)
O discurso da professora (exemplo 09) apenas confirma que a sua
concepção de domínio da argumentação está presa à mera presença dos
operadores argumentativos no texto. Seu discurso se apóia excessivamente na
87
metalinguagem e não no uso e reflexão dos operadores, como podemos constatar
nas falas 70 e 73. Através delas, a professora repassa aos seus alunos a noção
de que o sentido da argumentação está vinculado à presença dos operadores
argumentativos, o que constitui um equívoco já discutido por autores como Koch e
Elias (2006), Charolles (1997) e Costa Val (2000), ao tratarem dos mecanismos
constitutivos da textualidade, coerência, situação comunicativa e outros,
responsáveis por conferir informatividade, progressão e outras características que
compõem a textualidade.
A professora / pesquisadora expõe idéias de forma contraditória, instantes
após as suas falas analisadas no exemplo 08, ao se referir à naturalidade do uso
de tais operadores. Segue um fragmento de sua fala:
Exemplo 10:
93- (...) Eles vão sustentar o quê? ((silêncio)) a sua argumentação... não
é? eles vão servir de suPORte pra você... com ele... com ele você
você argumenta... então eis o motivo que eu quero que eu pedi pra
vocês lerem em casa pra se familiarizar:: porque depois eles ficam tão
normais nas nossas vidas... que é igualmente a:: o quê? ((silêncio))
tomar uma... tomar uma água água tá com sede tomar água é tão
normal tão natural você falar operadores argumentativos oh eu vou
argumentar então eu tenho que ficar ligado nessas coisas... não
decorando mas de forma natural...
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
O fragmento em destaque (exemplo 10) marca uma tradição de ensino da
forma em detrimento do conteúdo. Pela apreciação da fala da professora, parece
que as idéias estão em função dos operadores e não o contrário. A postura da
professora revela uma certa dificuldade em mobilizar os saberes construídos ao
longo da sua vida profissional de forma didatizada (RAFAEL, 2001), de modo que
ela se valeu de artifícios repetidos ao longo dos anos, com pouca eficácia na
aprendizagem para garantir apropriação dos operadores argumentativos(“...então
eis o motivo que eu quero que eu pedi pra vocês lerem em casa pra se
familiarizar: porque depois eles ficam tão normais nas nossas vidas... que é
igualmente a: o quê? ((silêncio)) tomar uma... tomar uma água água com sede
tomar água é tão normal tão natural você falar operadores argumentativos...”).
Durante algumas passagens das aulas áudio-gravadas e transcritas,
observamos que a naturalidade para apropriação / uso dos operadores
88
argumentativos foi uma marca constante no discurso da professora. O trecho que
segue corresponde à fala dirigida aos seus alunos no dia em que estes produziam
individualmente o artigo de opinião.
Nesse trecho, a professora permitiu a consulta à lista dos operadores
argumentativos estudados no primeiro módulo (textos teóricos) da seqüência
didática. O enfoque que demos no referido trecho está voltado para o
comportamento contraditório da professora mais uma vez repetido, como vimos
no fragmento do exemplo 10. Tal fato, por sua vez, pode confirmar que a
concepção tradicional de ensino ainda encontra-se enraizada na escola,
especificamente no discurso da professora com relação ao conteúdo gramatical
(operadores argumentativos), selecionado para a seqüência didática. Vejamos o
exemplo:
Exemplo 11:
24- (...) éh... o que é que eu estou querendo falar? que os operadores
daquela lista vocês vão poder consultá-los... pra vocês poderem utilizá-
los... não é que você vai utilizar to::dos... mais de qualquer forma eles
vão aparecer... porque quando você vai se expor... defender uma
situação... você vai tomar partido... eles naturalmente vão surgir então
você pode está confirmando... deixa eu ver se esse operador::
certo... ah... eu acho que dá...(...)
(fragmento da aula de produção individual do dia 20-11-2006
segunda-feira)
De acordo com Ducrot (apud KOCH, 1992), o funcionamento dos
operadores argumentativos está relacionado aos conceitos de classe e escala
argumentativa, e como tais, para se produzir uma argumentação, faz-se
necessária a presença de argumentos e não necessariamente a daqueles
operadores.
É por esse motivo que Vigner (1997, p. 122), ao se referir aos conteúdos
lingüísticos como um dos componentes da argumentação, adverte que a
argumentação não poderia ser reduzida a um inventário de estruturas léxico-
sintáticas que marcam de modo explícito as tomadas de posição do locutor diante
de certas proposições.
Desse modo, a argumentação pode se manifestar na própria organização
do discurso e por isso vai depender do valor semântico de certos termos ou de
89
certas passagens. Esse é o ponto que a professora desconsidera na
sistematização do tema tratado, embora o faça intuitivamente quando expõe os
alunos a outros textos.
Considerar apenas a utilização do operador argumentativo no texto na
forma de um jogo de “troca-troca”, como sugeriu a professora no exemplo 11, a
fim de garantir uma boa argumentação, é uma forma de conceber a intervenção
realizada para o estudo da argumentação unicamente pelo viés da gramática
normativa. É conceber que através da leitura / consulta a uma lista dada, o aluno
possa argumentar eficazmente, de modo a convencer / persuadir o seu
interlocutor (auditório).
Durante as atividades realizadas no segundo módulo da aplicação da
seqüência didática, foi possível verificarmos que, ao contrário da postura acima
analisada (Exemplo 11), ela facilitou a participação dos alunos, de modo que
estes argumentaram oralmente com proficiência, isto é, convencendo-a. Tal fato
ocorreu no momento em que a professora / pesquisadora deixou valer uma
postura mais interativa, e, por outro lado, desconsiderou mais os textos teóricos
antes mencionados.
O trecho que segue faz parte de uma das aulas em que foram retomadas a
leitura e reflexão de uma charge anteriormente estudada, e a professora /
pesquisadora pedia aos alunos que apresentassem argumentos os quais
justificassem que a mulher representada na charge era Heloísa Helena e não Ana
Maria Rangel:
Exemplo 12:
320- P- certo... mas ana... mas ana maria rangel chegava nessa
situação? poderia dizer que era ela?
321- AA- nã::o
322- A1- é heloísa helena
323- P- qual o argumento...que a gente tem:: para dizer assim... NÃO...
aqui não trata-se... a a ... eles aqui não se referem a::
324- A1- ana maria
325- P- ana maria rangel?
326- A2- porque é assim ( )
(( muitos alunos falam ao mesmo tempo))
327- A9- porque ela não tinha se candidatado ainda
328- P- pera aí...vamos falar um de cada vez (...)
329- A3- essa aí ana maria rangel foi / se candidatou-se agora éh...
330- A9- agora?
331- A3- poucos dias antes da eleição...quando essa charge foi
publicada... quem tava canidata era... heloísa helena (...)
90
332- A2- era a única mulher a ser canidata e:: e:: ana maria rangel foi
(aproximando-se) da outra semana já:: do da eleição
333- A3- do dia da eleição
334- P- pronto
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
A interação professora / aluno se deu a partir do momento em que um dos
alunos afirmou categoricamente que se tratava de Heloísa Helena (L-322), e a
professora / pesquisadora pediu que justificassem porque não se tratava de Ana
Maria Rangel.
Verificamos, através da fala 328 (“pera aí...vamos falar um de cada vez”), a
preocupação da professora / pesquisadora em registrar as muitas contribuições
dos seus alunos, as quais podem ser observadas pelo número de participantes
(A2, A3, A9,) para uma mesma pergunta dirigida à turma, havendo, portanto, uma
indicativa de aceitação das contribuições deles na fala final da professora /
pesquisadora (L-334).
Essa dinâmica na sala de aula garantiu pelo menos dois aspectos,
pertinentes para facilitar o desenvolvimento da competência argumentativa dos
alunos seja, pela participação, seja pelo conhecimento de mundo dos alunos,
quer este tenha sido construído na escola, ou mesmo adquirido nas várias outras
instâncias sociais das quais os alunos participam.
Por outro lado, os alunos A2 e A3 evidenciam a influência da mídia em
suas vidas: nas falas representadas nas linhas 329 essa aí ana maria rangel foi /
se candidatou-se agora éh...”, 331 poucos dias antes da eleição...quando essa
charge foi publicada... quem tava canidata era... heloísa helena (...)”, 332 era a
única mulher a ser canidata e:: e:: ana maria rangel foi (aproximando-se) da outra
semana já:: do da eleiçãoe 333 do dia da eleição”. Constatamos o letramento
do tipo midiático, o que reforça a contribuição de outros segmentos para a
construção da argumentatividade.
4.2.2- Condução das atividades
Uma outra estratégia destacada como propiciadora do desenvolvimento da
competência argumentativa refere-se à releitura de textos ocorrida antes da
91
produção coletiva do artigo de opinião, permeada por momentos de trocas, de
argumentações, refutações, nas quais professor e alunos negociam sentidos com
vistas à produção de um texto persuasivo e / ou convincente.
Nesse sentido, o clima de interação oportuniza ao aluno a expressão oral,
a formulação e defesa de pontos de vista, de forma mais livre, sem a sanção da
professora. A esta cabe o direito de questionar e ouvir o aluno, para a partir de
então julgar a pertinência dos argumentos apresentados e, em caso de falhas,
ajudá-lo na formulação de novos argumentos.
No entanto, observamos que esse comportamento não foi demonstrado, ou
foi insatisfatório, revelando uma prática muito presa ao letramento escolar, focado
mais na estrutura, nas formas textuais. Em outras palavras, a professora
reconhece que pode e deve “fazer” diferente, mas não consegue pôr em prática
alternativas mais flexíveis de condução de atividades, tais como: não controlar o
turno, construir os argumentos, incentivar a interação entre os alunos, exercitar a
escuta dos alunos, socializando os conceitos entre eles, etc. Passemos então a
analisar um trecho do início da aula em que, antes de começar a produção
coletiva (refacção), retoma a leitura de uma charge, que tematizava os
presidenciáveis.
Com essa atitude, seu objetivo era de recapitular as discussões realizadas
anteriormente para inseri-las na “nova” produção. Vale salientar que o teor das
discussões em torno da referida charge foi o fato de uma mulher (Heloísa Helena)
se candidatar à Presidência da República. Vejamos, no exemplo 13, o trecho
retirado das anotações do diário de campo, como se realizou essa retomada,
“recapitulação,”conforme denominou a professora / pesquisadora para, em
seguida, confrontarmos com a transcrição dessa mesma aula no exemplo 14:
Exemplo 13:
(...) O primeiro texto que apresentei foi uma charge lida por todos os
alunos, por isso todos eles responderam acertadamente que era uma
charge (gênero textual) e dois ou três alunos falaram do conteúdo da
mesma, justificando o porquê dele e o momento vivido.
(anotações do diário de campo do dia 17-11- 2006, sexta-feira).
92
Exemplo 14:
300- P- charge muito bem... mas essa charge aqui em especial tratou
de quê?
301- AA- de política
302- A1- política
303- P- política... isso aqui:: poderia... de alguma forma ter como a
gente... éh... produzir nosso texto? alguma coisa daqui a gente poderia
pegar::? de que forma? se tiver...
304- A1- éh::
305- A2- tem
306- P- como?
307- A2- porque ali nesse texto fala sobre... uma mulher que foi
candidata a pré fei / a presidente
308- A1- da república
309- A2-república e os dois outros... maiores candidatos ficavam... éh...
falando dela porque ela estava crescendo nas... éh nas pesquisas né?
eles estavam preocupados por isso... porque ela está (tomando ) votos
de alguns deles
310- P- ah entendi... então quer dizer... na verdade aqui mostra... de
certa forma... o quê?
311- A1- que a mulher tem capacidade para... se...
312- A3- se destacar?
313- P- ocupar um cargo público... não é? quem é essa mulher em
questão? qual é a mulher que se trata aqui?
314- AA- Heloísa Helena
315- P- Heloísa Helena né? tinha outra... também (...)
316- A11- Mari::a...
317- AA- Ana Maria
318- A1- Ana Maria de Queiroz
319- A2- Ana Maria Rangel
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
Se considerarmos a intenção da professora de “recapitular” algumas
leituras antes vivenciadas para facilitar a ampliação dos argumentos na produção
escrita, verificamos que sua atitude pouco contribuiu para essa finalidade.
Apesar de ter registrado no seu diário de campo (exemplo 13) que “ (...) dois
ou três alunos falaram do conteúdo da mesma, justificando o porquê dele e o
momento vivido”, verificamos que a professora de fato questionou a turma de que
forma o conteúdo da charge poderia ajudá-los na nova produção, e um dos
alunos (exemplo 14) (A2) deu sinal positivo, isto é, argumentou que a charge tinha
subsídios inerentes à questão temática (o novo perfil social da mulher).
No entanto, ao invés de estimular a expansão dos argumentos
apresentados pelo aluno, deu-se por satisfeita e já formulou uma nova pergunta, e
sem esperar a resposta do aluno, antecipou-a, como podemos verificar, no
exemplo 14, a partir das falas das linhas 310 a 313: 310- P- ah entendi... então
93
quer dizer... na verdade aqui mostra... de certa forma... o quê? 311- A1- que a
mulher tem capacidade para... se... 312- A3- se destacar? 313- P- ocupar um
cargo público... não é? quem é essa mulher em questão? qual é a mulher que se
trata aqui?”
A professora / pesquisadora ignorou uma explicação relevante do aluno a
qual contribuiria para a questão temática, que era o fato de explicar o crescimento
da mulher (Heloísa Helena) nas intenções de voto, conforme a fala 309: A2-
república e os dois outros... maiores candidatos ficavam... éh... falando dela
porque ela estava crescendo nas... éh nas pesquisas né? eles estavam
preocupados por isso... porque ela está (tomando ) votos de alguns deles”
A tomada do turno pela professora revela uma necessidade de controlar a
situação de ensino / aprendizagem, mantendo a assimetria na relação de poder:
“Eu falo” você “escuta”. “Eu ensino” você “aprende”, a qual impediu o aluno de
concluir sua fala, voltando a participar durante essa questão de forma mínima, isto
é, apenas completando respostas iniciadas por outros colegas, conforme o
registro da fala 319: A2- Ana Maria Rangel
Com essa atitude, a professora tende a limitar o desenvolvimento da
competência argumentativa dos alunos. Sendo interrompidos, eles podem passar
a considerar que suas falas pouco (ou nada) contribuem para o andamento da
aula, gerando um clima de inibição e corroborando para o sentimento de
incapacidade ou de inadequação em sala de aula. Essa atitude promove muitas
vezes a desmotivação ou desestímulo do aluno em participar ativamente da aula.
Atitudes como a que vimos nos fazem crer que a professora / pesquisadora
fez perguntas aos alunos apenas para efetivar outras falas / participações, além
da dela. Contudo, o que realmente foi válido, fica por conta da fala dela (LEAL e
MORAIS, 2006). O aluno é convidado a participar e, no mesmo instante, sua fala
é substituída pela fala da professora.
Tal atitude contraria a perspectiva bakhtiniana do uso da palavra: as duas
faces existentes na palavra são resumidas à face da professora. Segundo esse
estudioso, a palavra “é determinada pelo fato de que procede de alguém, como
pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da
interação do locutor e do ouvinte (BAKHTIN, 1996, p. 113).
94
Por fim, na penúltima fala, a professora (L-313), além de antecipar a
conclusão do aluno, muda o roteiro da questão, formulando uma segunda
pergunta :“ quem é essa mulher em questão? qual é a mulher que se trata aqui?”
Os alunos demonstraram domínio da pergunta e a responderam
satisfatoriamente (Heloísa Helena). E, mais uma vez, a professora / pesquisadora
demonstrou “pressa” dando pistas de uma segunda mulher que também disputou
as eleições (L-315), no caso, Ana Maria Rangel, vejamos: P- Heloísa Helena né?
tinha outra... também (...)”.
O momento que poderia ser rico de explicações e argumentações dos
alunos, por duas vezes, num curto espaço de tempo, foi interrompido pela
professora / pesquisadora. Assim podemos afirmar que as atividades de
reescritura propostas na escola apresentam como característica típica uma
imposição do discurso escolar.
Conforme apontam Leal e Morais (2006), parece haver na escola um ponto
de tensão envolvendo, por um lado, as imposições de pontos de vista da
instituição escolar, e, por outro lado, as estratégias de manutenção da voz do
aluno-aluno. Isso significa que na maioria das vezes, quando o aluno cala,
deixando valer a voz do professor, é porque de fato não sabe, ou porque ele tem
consciência de que sua contribuição não será acatada pelo professor.
Assim, por meio da análise do exemplo 14, pudemos perceber que a
professora / pesquisadora, ao questionar os alunos, previamente tinha elaborado,
de acordo com a ideologia que defendia, a resposta esperada. Se, por um lado,
ela não surgisse na fala do aluno, a professora imediatamente daria, confirmando,
de alguma forma, que a palavra final lhe pertence naquele local (LEAL E
MORAIS, op.cit).
No entanto, comportamento contrário ao analisado no exemplo acima foi
verificado minutos após, no momento em que a professora permitiu a participação
ativa dos alunos, sem lhes fazer interrupções. Esse fato serviu para confirmar que
a eficácia no ensino da argumentação, bem como de qualquer outro conteúdo
selecionado pelo professor para suas aulas advém do espaço dado ao aluno. O
trecho da aula que analisamos foi marcado pelo questionamento de um aluno no
que se referia à coerência dos argumentos que estavam sendo construídos
coletivamente na refacção.
95
Na realidade, a produção coletiva estava prestes a ser concluída, porém
um dos alunos interrompeu a etapa conclusiva de forma crítica, e fez a sua
argumentação, interagindo com a professora e outros colegas. Vejamos:
Exemplo 15:
842- A3- sim mai o que é que tem a ver espancame::nto com isso aí?
843- P- onde?
844- A3- esse negócio de delegacia com isso aí?... colando isso
não professora...negócio [de::
845- P- ((lendo))”[quando fatos como agressão no lar ocorre...”
846- A1- ( ) na delegacia olha aí...
847- P- diga... tá certo até onde é capaz... você tá querendo dizer que tá
misturando?
848- A3- acabou de sair da delegacia... de um negócio e entrar em
emprego num sei o quê num sei o quê?
849- P- é o vendo? ((lendo)) “ISso demonstra que a mulher
atualmente é guerreira... se comparada com a escrava de ontem”... até
aí tudo bem...
850- A2- ahn rã... até aí tá bom
851- P- ((lendo)) “hoje a mulher... com atitudes de coragem e força é
capaz de::”
852- A3- a partir desse aí não tem nada a ver não::
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
A atuação desse aluno (A3) nos leva a crer na sua reflexão crítica diante
dos argumentos apresentados. Sem dúvida, ele demonstrou conhecimento da
falta de organização argumentativa, que, por sua vez, implicaria na progressão
temática. Suas contribuições nos permitiram admitir que se tratava de um aluno
em pleno desenvolvimento da competência argumentativa nas modalidades oral e
escrita.
Considerando a situação comunicativa da produção coletiva na sala de
aula, supomos que enquanto a produção transcorria, ele, ao mesmo tempo que
participava com os outros colegas, dando sugestões, relendo e construindo os
períodos, foi capaz de questionar uma construção anterior (L- 842), como sendo
incoerente, a qual comprometia a progressão temática (“...o que é que tem a ver
espancame::nto com isso aí?” ), como também foi capaz de argumentar com base
nos dados da produção construída (L- 848) a incoerência apontada por ele:
acabou de sair da delegacia... de um negócio e entrar em emprego num sei o
quê num sei o quê?”
96
A argumentação oral feita pelo aluno confere à produção coletiva como sendo
um momento oportuno da aula para esse tipo de argumentação. O aluno, embora
tivesse a professora à sua frente na tarefa de escrever no quadro de giz e julgar o
que escrevia, ele também se colocou como leitor crítico do texto e realizou essa
última atividade (julgar o que escrevia).
Esse tipo de questionamento do aluno nos permitiu fazer duas
considerações: primeira é que o aluno tinha noção de que o texto “não é uma
sucessão desconexa de frases ou palavras enunciadas aleatoriamente” (CITELLI,
1994, p. 23), como bem ele interferiu conforme sua fala na linha 848: acabou de
sair da delegacia... de um negócio e entrar já em emprego...?” Isso significa que o
aluno estava consciente de que o texto, para ser coerente, devia apresentar um
ajuste seqüencial das idéias, fato que não estava ocorrendo no texto produzido. A
segunda consideração é que o aluno demonstrou competência argumentativa, ao
contestar a produção que estava sendo realizada. Ele além de ter contestado
através de uma pergunta (L-842): sim mai o que é que tem a ver
espancame::nto com isso aí?”, apresentou argumentos para a sua contestação
(L- 844): esse negócio de delegacia com isso aí?... tá colando isso não
professora”.
O efeito da sua argumentação foi garantido na interação da sala de aula:
ele conseguiu convencer seus interlocutores imediatos a professora e os
colegas -, de que ele estava certo. Como evidência da eficácia da sua
argumentação, vimos que a professora releu a produção (L- 845) e fez uma
confirmação, em forma de pergunta, para o restante da sala (L-849) de que o
aluno (A3) estava certo (“é tão vendo?”).
Esse fato nos permite afirmar que, quando o aluno tem a oportunidade de
falar, de argumentar durante as aulas, articula sua competência comunicativa e,
como resultado, desenvolve sua competência argumentativa, uma vez que
garante participação social, e facilita a participação dos outros colegas.
Observemos que o aluno (A3), juntamente a outro colega (A2), passaram a dar os
comandos da produção com autonomia (L- 850 e 852), inclusive para a
professora (“A2- ahn rã... até bom”; A3- a partir desse não tem nada a
ver não::”).
97
De modo contrário ao que vimos no exemplo 14, situações como a
analisada no exemplo 15, ao serem vivenciadas na sala de aula, atestam que
aquilo que é dito pelos alunos é relevante para além da situação escolar, porque
de alguma forma, é transferido para outras situações extra-escolares. Os alunos,
de posse de oportunidades como a que analisamos, tornam-se argumentadores
autênticos, isto é, argumentadores com o compromisso de questionar e contra-
argumentar em interação com qualquer interlocutor, muitas vezes representado
por alguém detentor de poder e prestígio social, como é o caso do professor na
instituição escolar.
Por esse motivo e pelo fato de o uso da linguagem, em si, ser um ato
eminentemente argumentativo (KOCH, 1992), é que o professor precisa ter
consciência de dar voz e vez ao aluno durante as aulas, de modo que a
metodologia adotada por ele esteja pautada na concepção de produção escrita
como objeto de interação (GUEDES, 2006).
A esse respeito, flagramos um momento da mesma aula analisada nos
exemplos 14 e 15, em que se pôs em discussão o título para a produção realizada
coletivamente. No trecho que segue, a professora convoca os alunos a dar
sugestões, e estes, por sua vez, conferem participação, através de várias
sugestões. Vejamos:
Exemplo 16:
875- P- (...) vamos aqui gente... o título... que título a gente daria pra
esse texto dos meninos que nós ampliamos?
876- A10- a evolução da mulher
877- A3- mudança radical
878- P- segundo Midian... a evolução da mulher tá bem?...
879- A2- a metamorfose da mulher
880- A1- e como a mulher (...)
881- P- a metamorfose da mulher... olha quantas idéias... outra...
882- A1- como assim... como ela tá se evoluindo como?
883- P- como a mulher tá se evoluindo que a gente viu?
884- A1- ela tá o quê? tá crescendo os braços... aumentando perna?
885- A9- a boca?
886- P- hein?
887- A2- a metamorfose da mulher?
888- P- mas a evolução que:: Midian tá falando não é a evolução
física... é a evolução...
889- A4- na sociedade
890- P- na sociedade é a evolução social... é o perfil que ela vem
atingindo... não é isso midian que você querendo dizer? assim
certo...entendeu géssica?
891- A1- entendi
98
892- P- não é a evolução física... que a gente viu na entrevista que as
meninas têm mais éh...
893- A1- evolução
894- P- evoluem mais que os meninos o é? depois tudo se
normaliza... mas e aí? vocês ... as meninas aí? que título vocês...
895- A18- os direitos das mulheres
896- P- ahn?
897- A18- os direitos das mulheres?
898- P- os direitos das mulheres dá certo?
899- A1- já falamos nisso demais
900- P- os direitos das mulheres dá certo?
901- A1- uma nova mulher
902- P- uma nova mulher?... a nova mulher?
903- A8- é a nova mulher
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
Segundo o exemplo 16, de acordo com as falas representadas nas linhas
876,877,879,897 e 901, vimos que os alunos deram cinco sugestões para o título:
“a evolução da mulher”(L- 876- A10); “mudança radical” (L- 877- A3); a
metamorfose da mulher” (L- 879 – A2); “os direitos das mulheres” (L- 897 – A18) e
“uma nova mulher” (L- 901 – A1), além da sugestão da professora “a nova
mulher” (F- 902) confirmada por outro aluno (A-8) na fala 903.
Considerando o seguimento das falas, observamos que, num curto espaço
de tempo, seis diferentes alunos (A10; A3; A2; A18; A1 e A8), motivados pela
interação da sala de aula, participaram do convite feito pela professora: o de dar
um título ao texto ampliado”. Os títulos apresentados pelos alunos mantêm
relação de sentido com o tema abordado na produção (O novo perfil social da
mulher), o qual foi objeto de estudo de aulas anteriores à produção. Isso nos leva
a crer na construção conjunta da competência argumentativa, via interação em
sala de aula.
O efeito argumentativo de uma das sugestões apresentadas pôde ser
observado através do questionamento da aluna (A1) a respeito da sugestão dada
por outra colega (A10), da seguinte forma: No momento em que A10 sugeriu
como título a evolução da mulher”, imediatamente, A1 questionou o sentido do
termo “evolução” (“como assim... como ela está se evoluindo como?L- 882) e,
apesar da pergunta feita pela professora na tentativa de elucidar o título dado(L-
883 como a mulher se evoluindo que a gente viu?”), a aluna em questão
continuou questionando: ela tá o quê? crescendo os braços... aumentando
perna?” (L- 884).
99
A interferência da aluna obrigou a professora a explicar, de modo claro, à
qual “evolução” a colega se referia, como podemos constatar através da
explicação dada nas falas 888 e 890: mas a evolução que:: midian falando
não é a evolução física... é a evolução...”; “na sociedade é a evolução social... é o
perfil que ela vem atingindo... não é isso midian que você querendo dizer?
assim tá certo... entendeu géssica?.
Como se tratava de uma produção coletiva, a escolha do título permitiu que
outros (títulos), além dos apresentados no exemplo 16, fossem objeto de impasse
entre os alunos, permitindo assim que os alunos interagissem com outros colegas
através da refutação às sugestões apresentadas, como podemos observar no
exemplo seguinte, após ter sido realizada a leitura do texto produzido.
Exemplo 17:
911- P- e aí... qual é o título?
912- A1- a mulher guerreira?
913- A3- não tem nada a ver
914- P- ahn?
915- A3- sou mais o título que ( ) falou
916- A6- é
917- A2- a mulher atual
918- P- a mulher atual?
919- A3- tem nada a ver não
920- P- o novo papel (...)
921- A2- da mulher
922- A3- atual
923- A6- a evolução da mulher
924- P- a evolução da mulher dá?
925- A1- é tá melhor
926- P- tá certo? a evolução... nós vamos entender:: que não é a
evolução...
927- A1- matéria
928- A2- física
(fragmento da aula de produção coletiva do dia17-11-2006, sexta-feira)
Na exposição do exemplo 17, através das expressões “não tem nada a ver”
(L-913) e tem nada a ver o” (L-919), o aluno A3 rejeitou as sugestões dadas
por A1 (“a mulher guerreira” L- 912) e por A2 (“a mulher atual” L- 917). Ficando,
portanto, decidido como título a evolução da mulher”, sugestão dada por A10,
como vimos no registro anterior (13), a qual foi retomada por A6, inclusive
recebendo a adesão da aluna (A1), (“ é ta melhor” L- 925), cuja primeira aparição,
rejeitara.
100
A partir dos exemplos 14 até 17, vimos que conceber o ensino da
argumentação apenas como sendo uma forma dos alunos convencer o outro por
meio da apresentação de argumentos é uma forma vaga, não conta de sua
plenitude. Apesar dos obstáculos registrados (exemplo 14), de forma geral, a
atuação da professora foi significativa para o desenvolvimento da competência
argumentativa dos alunos. O sucesso na condução das atividades dependeu, em
grande parte, das oportunidades dadas aos alunos. Estes, somente puderam
evidenciar seus saberes no momento em que lhes foi garantido o turno
conversacional, no momento em que, de igual modo, foram respeitados e
refletidos os conteúdos das suas indagações / refutações na construção conjunta
do texto argumentativo. Tal estratégia teve a vantagem de confirmar a
participação deles, de modo que lhes facilitou a apropriação do gênero requerido
na produção escrita (artigo de opinião), conforme requer a aplicação da sequência
didática, fato que, por outro lado, evidenciou a ampliação do grau de letramento
desses alunos.
Todavia, é interessante destacar que, apesar da atitude significativa da
professora de intervir no ensino da argumentação visando à melhoria na
construção de argumentos, ela própria, durante as aulas, demonstrou acreditar
que, para se produzir um bom texto argumentativo, era necessário recorrer à lista
dos operadores argumentativos. Isso significa que, nesses momentos, a idéia que
lhe cercava era apenas a da forma, ignorando por vez a função discursiva que
todo texto estabelece e como agravante, repassando / multiplicando essa mesma
idéia para seus alunos.
Um outro aspecto que merece destaque foram as interrupções feitas às
falas dos alunos. Estas, além de torná-los “passivos” durante a aula, em muitos
casos, se acentuam como fator inibidor da capacidade que eles m de
contribuírem nas aulas, mediante a interação.
Podemos afirmar que a proposta da aplicação da seqüência didática trouxe
benefícios para a sala de aula, pois através dessa atitude da professora
percebemos indícios para a melhoria no ensino, apesar das limitações que
destacamos acima.
Algumas das ações docentes em sala de aula (releitura dos textos antes da
produção, aceitação de algumas contribuições dos alunos, ampliação do
101
letramento dos alunos através da leitura de textos distintos para a apropriação
temática e do gênero textual), deixam perceber que a professora em questão
encontra-se numa zona de transição para a adoção de uma perspectiva de ensino
dialógica, nos moldes bakhtinianos. Ela parece didatizar os saberes com
dificuldades, fato perceptível quando tem a oportunidade de se auto-avaliar,
assumindo a condição de professora / pesquisadora, como foi o caso.
102
Considerações finais
Nesta dissertação estudamos a competência argumentativa de alunos do
ensino fundamental a partir da oferta de um ensino sistematizado tendo como
base a aplicação de uma seqüência didática. Após essa aplicação observamos
como se manifestou a competência argumentativa dos alunos no momento em
que estes foram submetidos a defender um ponto de vista por escrito (artigo de
opinião) e oralmente (interação em sala de aula). A competência argumentativa
ligada à prática docente necessita de metodologia de escrita, de modo que foi do
nosso interesse, investigar que estratégias metodológicas utilizadas pela
professora durante a aplicação da seqüência didática contribuíram para o
desenvolvimento da competência argumentativa dos alunos.
De acordo com os dados analisados, pudemos verificar que os alunos
demonstraram consciência da necessidade de defender um ponto de vista
mediante a apresentação de argumentos em textos do tipo argumentativo. Isso
ficou comprovado nas produções (orais e escritas) analisadas, inclusive naquelas
coletadas no período anterior à aplicação da seqüência didática (período da
sondagem ou pré-módulo), quando os alunos, em duplas, produziram o texto
argumentativo, cujas produções se apresentaram marcadas pelo uso dos
operadores argumentativos, com melhorias substanciais na 2ª versão (refacção)
do mesmo, após a leitura reflexiva da versão. Nessas produções houve uma
forte influência das três competências: lingüística, comunicativa e argumentativa.
Quanto à produção individual (final), o desenvolvimento da competência
dos alunos - produtores evidenciou sua fase mais significativa em comparação à
e versão realizadas em duplas. Os alunos, em sua maioria, foram capazes
de apresentar argumentos voltados para o ponto de vista defendido, levando em
conta alguns aspectos como: a própria situação comunicativa e a questão da
progressão temática mediante o uso dos operadores argumentativos. Estes nos
possibilitaram analisar as produções escritas considerando as noções de classe e
escala argumentativa, que por sua vez, serviram de estratégias argumentativas
para convencer / persuadir o (s) interlocutor (es) na interação via texto. Foi
através dessas noções que evidenciamos a influência dos vários letramentos
(escolar, midiático, televisivo, etc) que os alunos possuem.
103
Na modalidade oral os alunos demonstraram mais autonomia para
argumentar e convencer seus interlocutores (professora e colegas). Tal
comportamento foi marcante porque além de estabelecer a interação entre os
participantes da aula, foi eficaz na comprovação de que as contribuições do aluno
são tão úteis na sala de aula quanto às da professora, de modo que esta, por não
ser a “dona” exclusiva dos saberes que perpassam na aula, não deve deter por
completo o turno das falas.
Quanto à aprendizagem, verificamos um aproveitamento gradativo, isto é,
no período da sondagem, os alunos produtores apresentaram indícios da
competência argumentativa desde a realização da versão, sendo mais notória
na 2ª versão, consolidando-se na produção individual.
Tal fato, em termos, confirma a eficácia da aplicação da seqüência didática
como sendo esta uma forma de sistematizar o ensino, em especial o da
argumentação. No entanto, a proposta mostrou-se limitada uma vez que, em
alguns aspectos, a professora priorizou a produção de argumentos apenas pelo
viés do uso de recursos lingüísticos (operadores argumentativos).
Vimos que no momento em que a professora deslocou o foco das suas
ações na sala de aula para atividades interativas ressaltadas pelo uso de uma
pedagogia culturalmente sensível, a qual permitiu ouvir os alunos, garantindo-lhes
o turno conversacional, além da sistematização dos operadores argumentativos,
os resultados evidenciados nas produções comprovaram melhor desempenho dos
alunos.
De forma geral, o desenvolvimento da competência argumentativa dos
alunos esteve associado à ação metodológica da professora, no sentido de
garantir momentos de interação na sala de aula, nos quais os alunos tiveram a
oportunidade de falar, sugerir, argumentar e contra-argumentar com seus
interlocutores mais próximos (professora e colegas), sempre na intenção de
convencê-los / persuadi-los de algo.
De acordo com a análise do impacto da seqüência didática, esta enquadra
a professora / pesquisadora numa zona de transição entre a concepção
tradicional de ensino e a concepção sociointeracionista. Devemos, pois,
considerar o caráter positivo da ação metodológica da professora / pesquisadora,
104
ao perceber as “falhas” dos alunos nos textos argumentativos e por esse motivo
ter “inovado” no ensino através da aplicação da seqüência didática.
Por isso acreditamos no caráter extensivo dessa pesquisa para outros
interesses, no sentido de levá-la adiante, investigando outros aspectos não
tratados de forma abrangente na mesma, tendo em vista não ser nosso objeto de
estudo. Como exemplo, podemos citar a assimetria nas relações de poder na sala
de aula, cujos estudos podem ser contemplados pelo viés da Sociolingüística
Interacionista (BORTONI-RICARDO, 2004, 2005). Também é possível que essa
extensão traga contribuições significativas através das teorias do letramento
(BARTON, D & HAMILTON, M, 2000; KLEIMAN, 2001, 2005; ROJO 2001a,
2001b, 2005), que, por sua vez, priorizam um estudo que leva em conta as
histórias dos sujeitos.
105
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POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado de Letras,
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ANEXOS
112
113
Anexos ll - TEXTOS TEÓRICOS
Escola Abílio de Souza Barbosa- Orobó-PE
Professora- Enilda Cabral Barreto
Os dois textos que vamos ler e refletir tratam de um assunto que embora não
dominemos por completo, é inevitável nas nossas falas com colegas e familiares, como
também é inevitável nos textos escritos que produzimos. Trata-se da argumentação e de
uma das suas realizações concretas, ou seja, o artigo de opinião.
Meu objetivo para a leitura/debate de artigo de opinião é de levá-los a entender o
que é a argumentação e como ela se apresenta nos textos que frequentemente lemos em
jornais e revistas, suporte aonde boa parte destes textos circulam. Embora não pretendam
funcionar como procedimento a ser seguido, visa a orientar futuras produções.
1- Argumentação: noções básicas
Comunicar não é apenas trocar informações no qual emissor e receptor pura e
simplesmente produzem, recebem e compreendem a mensagem. uma grande diferença
entre receber uma comunicação e assumir uma comunicação.
Segundo Platão e Fiorin (1997, p.287), “Comunicar é agir sobre o outro (...)”, de
modo que, quando nos comunicamos não queremos apenas que o nosso interlocutor receba
/ compreenda a nossa mensagem, mas sobretudo que a aceite como verdadeira. A
comunicação só será eficaz se atingirmos esse objetivo.
Quando produzimos um texto escrito, por exemplo, estamos sempre interessados
em convencer alguém de algo, seja de forma explícita ou implícita. Isso porque a
argumentação está presente em qualquer texto que produzimos. Para Platão e Fiorin
(1990), a argumentação é qualquer tipo de procedimento usado pelo produtor do texto com
a finalidade de levar o leitor a aderir às teses defendidas nele.
Nessas produções é necessário que o produtor recorra a vários recursos da língua
para persuadir, para fazer com que o receptor aceite o que lhe foi comunicado e fazer o que
lhe foi proposto. Para tanto usamos recursos da língua que são capazes de sustentar nosso
ponto de vista e assim convencer nosso interlocutor. Isso se explica da seguinte forma:
ü Quando se defende um determinado tema / assunto é preciso que sejam
organizados os argumentos de modo que o texto apresente unidade gica,
ou seja, comece, desenvolva-se e termine obedecendo o tema central;
ü O convencimento só é possível se houver comprovação das teses defendidas
.Aqui, muitas vezes, o produtor recorre a outras pessoas e cita seus textos e
suas falas para dar legitimidade aos argumentos, esse procedimento
constitui um argumento de autoridade;
ü Uma outra característica do texto argumentativo é a refutação dos
argumentos contrários, pois quando se trata de um tema, sobretudo
polêmico, o produtor precisa apresentar as opiniões divergentes sobre esse
mesmo tema e refuta-las com argumentos sólidos, ou seja, precisa
apresentar argumentos concretos.
2- O artigo de opinião e os componentes da argumentação
A noção do que seja argumentar e de como proceder na produção do texto
argumentativo encontra lugar em alguns gêneros textuais que circulam na
sociedade, a exemplo da propaganda, do artigo de opinião, da carta de reclamação
entre outros.
114
Nesse bimestre vamos deter nossa atenção e estudo para o artigo de opinião,
que, diga-se de passagem, é um poderoso formador de opinião.
De circulação da mídia (jornais, revistas, etc), o artigo de opinião como o
próprio nome indica, é um gênero no qual prevalece o texto argumentativo. O
produtor, de posse de um tema que divide opiniões na sociedade, produz seu texto
buscando expor o seu ponto de vista de modo a convencer o leitor a ter também a
sua opinião, ou seja, a aceitá-la. Esse produtor a todo momento defende o seu ponto
de vista e para isso se vale de algumas estratégias, sendo elas:
ü Presença constante da argumentação;
ü Apresentação de provas (dados) que comprovem sua tese,
acompanhadas da conclusão;
ü Envolvimento com o leitor ;
ü Opção, na maioria das vezes, pela terceira pessoa;
ü Emprego do presente do indicativo/subjuntivo na exposição da tese e
dos argumentos;
ü Emprego do passado (pretérito) para apresentar dados;
ü Citações de outros autores / textos e
ü Uso constante dos operadores argumentativos. (conjunções, em sua
maioria que têm a função de mostrar a força argumentativa dos
enunciados e o sentido para que apontam .
Ao mesmo tempo não se deve esquecer para quem se escreve, ou seja, quem são os
interlocutores previstos, o que eles fazem, quais suas possíveis refutações para aquilo que
você está defendendo. O que eu quero dizer é que a todo momento você (produtor do
artigo de opinião) não deve se esquecer de quem você quer persuadir.
O artigo de opinião, por circular na mídia, privilegia o uso culto da língua, que,
para passar confiabilidade no que está sendo defendido (ponto de vista), precisa atestar que
seu produtor possui além de um vocabulário adequado ao tema, também possui um bom
domínio do padrão culto da língua.
Segue um conjunto de procedimentos lingüísticos que, segundo Vigner (1997,
p.121-122), são capazes de, na produção textual do artigo de opinião, justificar de forma
coerente uma tomada de posição no trato de um tema, são eles:
Fórmulas introdutórias: Comecemos por, a primeira observação recai sobre,
inicialmente, é preciso lembrar que, a primeira observação a ser feita é que.
As transições: passemos então a, voltemos então a, mais tarde voltaremos a, antes
de passar a... é preciso observar que..., sublinhado isto.
As fórmulas conclusivas: logo, consequentemente, é por isso que, afinal, em suma,
pode-se concluir afirmando que.
A enumeração: em primeiro (segundo, etc) lugar, e por último, e em último lugar,
inicialmente, e em seguida, além do mais, além disso, além de que, aliás, a // se
acrescenta, por outro lado, enfim, se acrescentarmos por fim.
As fórmulas concessivas : é certo que, é verdade que, evidente, seguramente,
naturalmente, incontestavelmente, sem dúvida alguma, pode ser que.
A expressão de reserva: todavia, no entanto, entretanto, mas, porém, contudo.
As fórmulas de insistência: não apenas... mas, mesmo, com muito mais razão,
tanto mais que.
A inserção de um exemplo: consideremos o caso de, tal é o caso de, este caso
apenas ilustra, o exemplo de... confirma, etc.
3- Dificuldades comuns na prática argumentativa
115
Quando se quer argumentar a favor/contra algum tema, certos cuidados devem ser
mantidos pelo produtor para que o texto se apresente sem defeitos de argumentação. Para
nosso estudo sobre esse tema (argumentação), selecionei os problemas apontados no livro
dos autores já citados, os quais farei um resumo. Vejamos:
1- Emprego de noções confusas: muitas vezes usamos palavras que se
prestam a duas ou mais significações. Tal procedimento no texto
argumentativo compromete o sentido do mesmo, invalidando os
argumentos apresentados. Para evitar esses empregos, é aconselhável
que evitemos palavras ou expressões carregadas de ambigüidade, e que
ao usá-las, devemos definir claramente em que sentido as usamos.
2- Emprego de noções de totalidade indeterminada: o uso de noções
totalizadoras do tipo “todos os políticos são iguais: fazem roubar” ou
“todos (as) os (as) homens (mulheres) são iguais:são enganadores (as)”,
comprometem a força argumentativa do texto, pois dá margem a contra-
argumentações imediatas.
3- Emprego de noções semi-formalizadas: certos termos do campo
científico quando tomados em sentido geral podem comprometer a
argumentação, pois esses termos têm significado preciso, restrito a esse
tipo de linguagem. Um exemplo desse uso que gera defeito seria: “Não
se deve negar ao cidadão o direito de protestar: isso é comunismo”.
Ora, comunismo não significa necessariamente governo autoritário, que
não liberdade ao cidadão. Comunismo é um sistema econômico que
não admite que os meios de produção( fábricas, terras etc) estejam nas
mãos de particulares. Nesse caso, seria mais adequado o termo
autoritarismo, ao invés de comunismo.
4- Defeitos de argumentação pelo exemplo: o dado apresentado como
exemplo deve ser verdadeiro, isto é, deve corresponder a um dado da
realidade, observável para quem quiser conferir. Um exemplo seria:
No Brasil, a maioria da população ativa ganha acima de dez salários
mínimos”. Esse é um dado falso, não corresponde à realidade concreta
dos brasileiros, ou seja, não há conteúdo de verdade.
Uma outra atitude que deve ser tomada pelo produtor de texto é extrair a
conclusão dos dados. A apresentação dos dados deve encaminhar a conclusão, fazendo
com que o texto tenha unidade, implicando as partes entre si. Portanto fica assegurado que
a conclusão do texto argumentativo seja um desfecho cuidadosamente pensado desde a
primeira apresentação dos argumentos e que se consolidando de modo concatenado
(com os argumentos). O que seria um erro você defender um ponto de vista ao iniciar a
produção e concluir com outro, ou com nenhum.
Bibliografia
FIORIN, Luiz José e SAVIOLI, Francisco Platão.Lições de Texto: leitura e redação. São
Paulo: Editora Ática, 1997
_______________________________________Para entender o texto Leitura e
redação.São Paulo: Editora Ática, 1997
VIGNER, Gerard. Técnicas de aprendizagem da argumentação escrita. In: GALVES,
Charlotte, ORLANDI, Eni P e OTONI, Paulo. O Texto, Leitura & Escrita. São Paulo:
Pontes, 1997, p,117-136
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