XIII
E agora Tatiana conta um “causo” da “televisão a lenha”, como ela diz, da
televisão sem vídeo tape, para que tenhamos presente na linguagem dela o espírito
da época:
“Para os nossos espetáculos de teleteatro infantil, muitas vezes acontecia
termos de trazer ao estúdio, para transmissão ao vivo, toda sorte de bichos,
bichinhos e bicharocos, de formiga até vaca, passando por cabra, cobra,
tartaruga, rato, gato, galinha, cachorro, hamster e outros mais, inclusive
papagaio e passarinho. Esses “atores” não eram profissionais, todos eles
eram “amadores” e, por isso mesmo, imprevisíveis. O que causava a maior
taquicardia em toda a equipe, por medo de que, no meio da transmissão
direta, algum deles realizasse uma surpresa. Como esta:
Foi num domingo. A telepeça programada no Teatro da Juventude
era Rapunzel, aquela da longa trança dourada que servia de “tereza” (como
os presidiários chamam a corda improvisada com pedaços de lençóis
trançados) para o príncipe subir até a janela da torre onde ela vivia trancada
pela bruxa. No meu roteiro, para acrescentar uma nota romântica ao
espetáculo, eu incluí uma cena na qual a solitária Rapunzel conversava com
um passarinho, seu único amigo, que lhe fazia companhia nos intervalos
entre as visitas da bruxa. Rapunzel conversava com o passarinho, piu–piu,
piu–piu–piu, e dava beijinhos no amiguinho alado; e havia uma música linda
ao fundo e também canto de passarinho, tudo muito delicado e sentimental.
Pois bem, o nosso valoroso factótum Canales, encarregado da
produção e que era capaz de trazer para o estúdio literalmente qualquer
coisa, animada ou inanimada, trouxe o tal passarinho, a tempo e a hora. Era
um passarinho bem maior do que um canário, marronzinho, não sei de que
raça ou espécie. O que sei é que ele tinha de representar um rouxinol e,
como ninguém sabia como era a cara de um rouxinol, ficou valendo esse
mesmo.
No ensaio, com as câmeras desligadas, tudo funcionou a contento.
O tal “rouxinol”, colocado sobre o dedo indicador da Rapunzel - vivida pela
maravilhosa atriz Lúcia Lambertini, famosa pela criação inimitável da
boneca Emília, de Monteiro Lobato -, se comportou bem. Ficou lá, pousado
sobre o dedo da moça, mansinho e sossegado, de modo que todo mundo
estava, relativamente, calmo: tudo indicava que não seria um programa dos
mais difíceis, apesar de algumas trucagens meio complicadas.
Finalmente, soou o sinal e o espetáculo começou. E foi
transcorrendo, na medida do possível, tranqüilo. Isto é, até a cena em que,
no vídeo do telespectador, em casa, aparece a Rapunzel na janela da sua
prisão, conversando com o seu amigo rouxinol. Rapunzel, a Lúcia
Lambertini, com sua loura trança de ráfia, fazia biquinho para o passarinho,