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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Maria do Rosario Corrêa de Salles Gomes
Nacionalização da Política de Assistência Social e Governos Estaduais no Brasil: o
caso do estado de São Paulo
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL
SÃO PAULO
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Maria do Rosario Corrêa de Salles Gomes
Nacionalização da Política de Assistência Social e Governos Estaduais no Brasil: o
caso do estado de São Paulo
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Serviço Social pela
Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, sob a orientação da Profa. Doutora
Aldaiza Sposati.
SÃO PAULO
2008
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Banca Examinadora
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
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DEDICATÓRIA
Para minhas crias
Mariana, Juliana e Lua
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RESUMO
TÍTULO: Nacionalização da Política de Assistência Social e Governos Estaduais
no Brasil: o caso do estado de São Paulo
NOME DO AUTOR: Maria do Rosario Corrêa de Salles Gomes
Está em curso a elaboração de um novo pacto federativo de gestão da Política de
Assistência Social, dado pelo processo de implantação do Sistema Único de Assistência
Social (SUAS). Trata-se de um sistema público não-contributivo, descentralizado e
participativo que dá efetividade à Política Nacional de Assistência Social, vinculado à
divisão de responsabilidades entre os entes federados, a um modo de gestão
compartilhada, ao co-financiamento e a cooperação técnica. Sob o peso de um processo
de descentralização político-administrativa que enfatizou, ao longo dos últimos 20 anos
a municipalização, faz-se mister a redefinição do exercício prático das competências e
responsabilidades de cada esfera governamental. Uma primeira hipótese sugere que a
implementação da descentralização da assistência social pública (portanto, após 1988)
vem ocorrendo, primordialmente sob o protagonismo mais forte das esferas municipal e
federal, ao lado de um protagonismo mais incerto e secundário da esfera estadual.
Considera-se, para tanto, a influência do legado de políticas prévias para a atual
propositura de uma política nacional de proteção social não-contributiva, que não tem
tradição republicana na gestão compartilhada da assistência social. Assim, o surgimento
da institucionalidade da assistência social como responsabilidade estatal aparece, ao
longo da história, em ritmos e tempos diferentes para os entes federados. Interessa
conhecer, então, o modo como se configurou nos estados brasileiros a responsabilidade
pela assistência social, cujo protagonismo histórico na configuração da federação
brasileira tem força política que antecede a presença dos municípios no pacto
federativo. Aprimorar a definição da particularidade da responsabilização estadual na
gestão de um sistema unificado passa por conhecer os condicionantes históricos que
determinam a atual conformação dos órgãos gestores, bem como as resistências e
facilidades para aderir ao novo pacto federativo requerido pelo SUAS. Nesse sentido, o
exame particular de oito estados permite detectar semelhanças e diferenças entre si, as
aproximações da influência da esfera federal sobre a estadual e particularidades de
ordem regional.
PALAVRAS-CHAVE: SUAS; ente federado; descentralização político-administrativa;
gestão estadual; gestão da assistência social; governo do estado de São Paulo.
6
ABSTRACT
TITLE : Nationalization of Social Assistance Politic and State Governments in
Brazil: São Paulo State case.
AUTHOR NAME: Maria do Rosario Corrêa de Salles Gomes
It is in course the elaboration of a new federative pact of Social Assistance Politic
management, given by the implantation process of Social Assistance Unique System
(SUAS). It means a no-contributive public system, decentralized and participative that
give effectiveness to Social Assistance National Politic a closely bound division of
responsibility between the federate beings, in a shared way of management, of co-
financing and technical cooperation. Under the load of a process of political-
administrative decentralization emphasized during the last 20 years of city council is
made a need of a practical exercise re-definition of competences and responsibilities of
each governmental scope.
A first hypothesis suggest that the implementation of public social assistance
decentralizing (therefore after 1988) is happening , primordially under a higher
municipal and federal scope protagonist, beside a more dubious and secondary state
scope protagonist.
In such case, is needed a consideration of the influence of previous politics legacy for
the actual proposition of a national politic of no-contributive social protection, that has
not a republican tradition of social assistance partaken management. In such case, the
institutional appearance of social assistance as state responsibility is presented,
alongside the history, under different rhythms and times to the federate people.
It’s interesting to recognize the way how was shaped in the Brazilian states the
responsibility about social assistance, which historic presence in Brazilian federation
possess a political force that antecede the municipal presence in the federative pact.
To refine the definition of the particular state responsibility management of an unified
scheme undergo the knowledge of historic conditionings that determinate the
management organs actual conformation, as well as the resistance and facilities to join
a new federative pact required by SUAS.
In such sense, the particular examination of eight states permit to detect similarities and
differences among themselves, approximation of federal scope influence over the state
and regional order particularities.
KEY WORDS: SUAS, federate people; political-administrative decentralization ; state
management; social assistance management; São Paulo state government.
7
Lista de siglas
ABEPPS-Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social
ANASSELBA-Associação Nacional dos Empregados da LBA-Legião Brasileira de
Assistência
ARC-Atuação Regional Comunitária
ASSELBA-Associação Brasileira de Assistência aos Servidores da Superintendência
Estadual da Fundação LBA de São Paulo.
BNDE-Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico.
BNH-Banco Nacional de Habitação.
BPC-Benefício de Prestação Continuada
CAR-Coordenadoria de Ação Regional
CARN-Centro de Acolhimento e Reabilitação dos necessitados
CAS-Coordenadoria de Apoio Social
CASA-Centro de Atendimento Sócio Educativo
CAST-Coordenadoria de Ação Social e Trabalho
CBCISS-Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais.
CDC-Coordenadoria do Desenvolvimento Comunitário
CEAS-Conselho Estadual de Auxílios e Subvenções
CEBRAP-Centro Brasileiro de Análise e Planejamento
CEDIT-Centro de Estudos, Diagnóstico e Indicação de Tratamento
CEME-Central de Medicamentos
CERET-Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador.
CESE-Coordenadoria dos Estabelecimentos Sociais do Estado
CETAS-Centro de Triagem e Atendimento Social
CETREMIS-Centro de Triagem e Encaminhamento de Migrantes
CETREM-Central de Triagem e Encaminhamento
CF-Constituição Federal
CIAS/RS-Comitê Interinstitucional de Articulação da Assistência Social do Rio Grande
do Sul
CIB-Comissão Intergestores Bipartite
CIT-Comissão Intergestores Tripartite
CNAS-Conselho Nacional de Assistência Social
CNSS-Conselho Nacional de Serviço Social
CONGEMAS-Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social
CONSEA-Conselho Nacional de Segurança Alimentar
CONSEAS-Conselho Estadual de Assistência Social
CRAS-Centro de Referência da Assistência Social
CREAS-Centro de Referência Especializado da Assistência Social
CRT-Coordenadoria de Relações do Trabalho
CSU-Centro Social Urbano
CTA-Conselho Técnico Administrativo
DAG-Divisão de Atendimento Geral
DAIS-Departamento de Amparo de Integração Social
DATAPREV-Empresa do Processamento de Dados da Previdência Social
DEESP-Departamento de Estatísticas do Estado de SP
DOT-Departamento de Orientação Técnica
DRADS-Divisão Regional de Assistência e Desenvolvimento Social
DSS-Divisão de Serviço Social
8
ETEC-Escola de Tecnologia
FAO-Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
FAS-Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social
FASE-Fundação de Atendimento Sócio-Educativo
FASPAR-Fundação de Ação Social doParaná
FASPG-Fundo de Assistência Social do Palácio do Governo
FASUL-Fundo de Assistência Social Sul Matogrossense
FATEC-Faculdade de Tecnologia
FCBIA-Fundação Centro Brasileiro de Assistência à Infância e Juventude
FEAS-Fundo Estadual de Assistência Social
FEBEM-Fundação Estadual do Bem Estar do Menor
FEBEMMA-Fundação Estadual do Bem Estar do Menor Alice de Almeida
FGTAS-Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social
FGTS-Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FIBGE-Fundação Instituto Brasileira de Geografia e Estatística
FIDES-Fundação de Integração e Desenvolvimento das entidades sociais
FIS-Fundo de Investimento Social
FLBA-Fundação Legião Brasileira de Assistência
FNDE-Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FONGEMAS-Fórum Nacional de Gestores Municipais da Assistência Social
FONSEAS-Fórum Nacional de Secretários Estaduais de Assistência Social
FPE-Fundação de Proteção Especial
FSS-Fundação de Serviço Social
FUNABEM-Fundação Nacional do Bem Estar do Menor
FUNDAC-Fundação Desenvolvimento da Criança e do Adolescente
FUNDAP-Fundação para o Desenvolvimento Administrativo
FUNDASUL-Fundação Sul-Rio Grandense
FUNDEB-Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da
Valorização dos Profissionais da Educação.
FUNDEF-Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e da
Valorização do Magistério.
FUNDESCO-Fundação para o Desenvolvimento de Comunidades do Estado da Bahia
FUNRURAL-Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural
FUSSESP-Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo
GPS-Grupo de Planejamento Setorial
IAM-Instituto de Atendimento ao Menor
IAFAM-Instituto de Assuntos da Família
IAP-Instituto de Aposentadoria e Pensão
IAPAS - Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social
IASP-Instituto de Ação Social do Paraná
ICM-Imposto sobre Circulação de Mercadorias
IDH-Índice de Desenvolvimento Humano
IDH-M-Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
INAMPS - Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
INAN-Insituto Nacional de Alimentação e Nutrição
INPS - Instituto Nacional de Previdência Social
IPEA-Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas
IPRS-Índice Paulista de Responsabilidade Social
ISSB-Instituto de Serviços Sociais do Brasil
IPVS-Indice Paulista de Vulnerabilidade Social
9
LBA-Legião Brasileira de Assistência
LDB-Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MARE-Ministério da Administração e Reforma do Estado
MAS-Ministério da Assistência Social
MEC-Ministério da Educação
MESA-Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome.
MBES-Ministério da Habitação e Bem Estar Social
MOBRAL - Movimento Brasileiro de Alfabetização
MPAS-Ministério da Previdência e Assistência Social
MTPS-Ministério do Trabalho e Previdência Social
MUNIC 2005- Pesquisa de Informações Básicas Municipais –Perfil dos Municípios
Brasileiros .Munic 2005 Assistência Social
NAI-Núcleo de Atendimento Inicial
NEPPOS/UNB - Núcleo de Estudos e Pesquisas em Políticas Sociais da Universidade
de Brasília
NOB-Norma Operacional Básica
NOB-RH-Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de
Assistência. Social
ONU - Organização das Nações Unidas
PAIF-Programa de Atenção Integral à Família
PDT - Partido Democrático Trabalhista
PEMI-Programa Estadual de Migrações Internas
PETI-Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PGRM-Programa de Garantia de Renda Mínima
PLIMEC-Plano de Integração do Menor e Família na Comunidade
PNAS-Política Nacional de Assistência Social
PP-Partido Popular
PROAFE-Programa de Apoio à Família do Egresso
PRÓ-MENOR-Fundação Paulista de Promoção Social do Menor
PROMOSUL-Fundação de Promoção Social de Mato Grosso do Sul
PRÓ-NUTRI-Programa de Nutrição ao Pré-Escolar
PROVOPAR-Programa de Voluntariado do Paraná
PSB-Proteção Social Básica
PSE-Proteção Social Especial
PT-Partido dos Trabalhadores
PTB-Partido Trabalhista Brasileiro
SAC-Serviço de ação continuada
SAM-Serviço de Assistência ao Menor
SAS-Secretaria de Assistência Social
SASCT-Secretaria de Assistência Social, Cidadania e Trabalho
SEAC-Secretaria Especial de Ação Comunitária
SEAS-Secretaria de Estado da Assistência Social
SEBRAE-Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequena Empresa
SECR-Secretaria de Estado da Criança e Assuntos da Família
SEDH-Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano de PB
SEDEST-Secretaria do Desenvolvimento Social e Trabalho
SEHAB-Secretaria da Habitação e Ação Comunitária
SEJA-Secretaria da Justiça, Trabalho e Ação Social
SEMO-Sistema Estadual de Mão de Obra
SETA-Secretaria do Trabalho e Ação Social
10
SETASS-Secretaria do Trabalho, Assistência Social e Economia Solidária
SETPS-Secretaria do Trabalho e Promoção Social
SETRABES-Secretaria do Trabalho e Bem Estar Social
SIMI-Sistema de Informações sobre Migrações Internas
SINE-Sistema Nacional do Emprego
SINPAS-Sistema Nacional da Previdência e Assistência Social
SRCOS-Seção de Registros e Cadastro de Obras Sociais
STAS-Secretaria do Trabalho e Ação Social
SUAS-Sistema Único de Assistência Social
SUBSAS-Subsecretaria de Assistência Social
SUS-Sistema Único de Saúde
SUTACO-Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades
UAI-Unidade de Atendimento Inicial
UIP-Unidade de Internação Provisória
UNICAMP-Universidade Estadual de Campinas
11
11
SUMÁRIO
Introdução .............................................................................................................................. 12
Capítulo I Iniciativas republicanas da União e do Estado na institucionalização da
Assistência Social (1889-1946)....................................................................... 38
1.1 Panorama nacional..................................................................................... 38
1.2 Panorama do Estado de São Paulo............................................................ 53
Capítulo II Percursos paralelos da União e dos Estados na gestão da Assistência Social
(1946-1964).....................................................................................................
105
2.1 Final da era getulista (1954)...................................................................... 107
2.2 Final do interstício democrático (1964).................................................... 121
Capitulo III
133
134
183
Capitulo IV
Enquadramento da gestão estadual da assistência social pelo federalismo
centralizado (1964-1988)................................................................................
3.1 Da ditadura à abertura democrática (1982)...............................................
3.2 Da redemocratização à Constituição (1988)..............................................
Trânsitos para a construção da nacionalização da Política de Assistência
Social (1988-2005).........................................................................................
195
4.1 Movimentos da nacionalização da Política de Assistência Social............ 200
Considerações finais: A busca da nacionalização da gestão da assistência social............. 259
Bibliografia ............................................................................................................................ 295
Anexos.................................................................................................................................... 302
Nº 1 – Competência dos Estados no SUAS
Nº 2 – Formulário das cartas da Pesquisa Perfil da Gestão Estadual na área da Assistência Social
(2a,2b,2c)
Nº 3 - Pesquisa sobre as obras sociais matriculadas
Departamento de Assistência Social – SP1937 – Condições de Funcionamento
Nº 4 - Pesquisa sobre as obras sociais matriculadas
Departamento de Assistência Social – SP1937 – Instalações destinadas aos assistidos
Nº 5 - Formulário de inquérito – Serviço Social de Casos Individuais (1937)
Nº 6 – Pesquisa sobre as obras sociais matriculadas
Departamento de Assistência Social – SP1937 – Classificação
Nº 7 – Classificação das obras sociais de beneficência ou de serviço social matriculadas no
Departamento de Serviço Social – SP1942
Nº 8 – Ementa 1
Marcos regulatórios da institucionalidade estadual da assistência social – São Paulo
Nº 9 – Ementa 2
Marcos regulatórios da institucionalidade estadual da primeira dama – São Paulo
Nº 10– Fotografias
Dependências do Instituto Disciplinar (Chácara do Belém/Tatuapé) (10 a1, 10 a2, 10
a3, 10 a4)
LBA – distribuição de cigarros aos combatentes (10b)
Instituto Modelo Feminino (SP) – 1952 (10c)
LBA Posto nº 7 Realengo (10d)
Nº 11 – Conselho Estadual de Auxílios e Subvenções (CEAS) de São Paulo
Nº 12 – O Cruzeiro – Primeira dama vai ganhar novo nome
12
12
Introdução
A gestão governamental no Brasil e, principalmente, no âmbito das políticas
sociais, vem, nos últimos 25 anos, enfrentando uma questão fundamental: como
construir, em uma federação, a unidade territorial na gestão de uma política nacional.
O avanço das políticas sociais sob o conceito de welfare state, na metade do
século 20 constituiu-se ao mesmo tempo – e como parte inclusiva – no modelo de
Estado-Nação do nacional-desenvolvimentismo. Analisar ou propor uma Política
Nacional de Saúde, de Educação ou em qualquer outro campo social significava tratar,
nesse modelo, não só uma questão orçamentária ou de financiamento, mas instalar um
modo de gestão centralizado na instância nacional. A construção do Estado-Nação nos
países europeus era o modelo ascendente que polarizava a concepção de estado para
esfera nacional ou federal no caso brasileiro. Fortaleceu essa gestão nacional tanto o
regime parlamentar dos estados europeus quanto o processo de unificação de etnias e
culturas para (re)composição dos países após as guerras mundiais e a re-territorialização
dos Estados europeus.
Por contraponto, o modelo federativo americano e a regência liberal de suas
políticas sociais têm como marca a alta fragmentação territorial, já que seus estados
arbitram diversamente o alcance e o formato de suas políticas. Exemplo cabal é o da
aplicação da pena de morte em alguns dos estados americanos. O federalismo
americano não supõe uma resposta nacional para todas as questões. Em grande parte,
cada Estado constrói os rumos e o alcance da política social como responsabilidade
público-estatal.
No terceiro milênio, a Europa vive mutações em seu processo de gestão
centralizada. O Estado Nacional passou a incorporar experiências de descentralização
territorial, mobilizado pelo novo modelo neoliberal de regulação propugnando o Estado
mínimo, mas também pela revalorização da dimensão cultural da população incluída nas
atenções das políticas antes só nacionais.
13
13
Movimentos pautados em recentralidades culturais – em contraponto à
globalização – também vieram a fortalecer essa estratégia de descentralização,
introduzindo a categoria cultura. O caso francês é um dos recentes para exame do
equilíbrio de responsabilidades entre os governos: nacional, regionais/departamentais e
locais.
A efetividade do regime federativo brasileiro tem sido posta à prova quanto
à garantia de direitos sociais para todos dos brasileiros. Esses foram fortemente
incluídos na agenda pública a partir das demandas dos movimentos sociais que se
expandiram – e permanecem, mesmo que com menor vigor no país – desde a metade
dos anos 70.
É presente na história política contemporânea do Brasil o avanço das
experiências de governos locais no campo social como resposta à pressão dos
movimentos sociais e à busca da democratização. Desde a década de 70, o processo de
abertura política – os famosos casos de Lajes, Boa Esperança, Vila Velha – trouxe à
cena o município, no seu novo papel de gestor de políticas sociais. Nesse contexto
avançou a área de saúde, aliando a expansão do conhecimento dos sanitaristas em saúde
coletiva com a pressão dos movimentos sociais, não só em prol da oferta de hospitais,
mas sobretudo de saúde básica. O primeiro momento desse processo de descentralização
no Brasil foi cunhado sob a expressão municipalização, indicando uma estratégia de
gestão para o avanço da responsabilidade local no campo social.
A Constituição Federal de 1988 – CF 88 – consignou os municípios como
entes federativos, ampliando sua autonomia por tantos momentos seqüestrada em toda a
história brasileira, do Império à República, e marcadamente exercida pelo
intervencionismo dos governos estaduais na gestão de municípios, primordialmente as
capitais tomadas como áreas de segurança nacional.
A fragilidade de compromissos ou responsabilidades dos governos federal e
estaduais no âmbito do financiamento
1
e execução das políticas sociais no período pós-
1
A Constituição Federal introduziu mudanças tributárias significativas, rompendo com a centralização
federativa dos recursos. Ampliou-se a competência tributária dos governos subnacionais, mas também
aumentou a participação das esferas de governo inferiores na arrecadação dos governos superiores. À
14
14
constitucional levou à constatação de que o processo de municipalização transformava-
se facilmente na equivocada “prefeiturização”, isto é, na sobrecarga de
responsabilidades dos municípios, com a ausência de partilha de compromissos e
financiamento com os demais entes federativos.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 4 de maio
de 2000) impôs-se nesse cenário, já que operou como mecanismo de controle do gasto e
do endividamento da gestão municipal, provocando, indiretamente, a clara demanda por
novos pactos federativos cujas responsabilidades pela gestão social pudessem ser
compartidas em compromissos e financiamentos.
Outra força a somar nessa direção foi o movimento de desmembramento (ou
de autonomização) de municípios, via de regra ampliando o já considerável número de
pequenos municípios – até 20 mil habitantes – no território nacional: hoje representam
73% do total e reúnem 20% da população brasileira, sendo que 45% de seus habitantes
vivem em áreas rurais. Para esses, principalmente pela baixa arrecadação local, não
existe fôlego próprio – salvo raras exceções – para implantação, ou até mesmo
manutenção de suas responsabilidades, o que requer o compartilhamento com o ente
estadual. Nova questão também se colocou pós CF88 quanto ao alcance dos direitos
sociais para a população rural, e não só a urbana. É legalmente instituído no Brasil o
forte limite dos municípios para ação na questão rural, igualmente de atribuição estadual
e federal.
Novas saídas foram sendo construídas na gestão das políticas sociais. A
resolução construída no campo da educação, que atribuiu responsabilidades aos níveis
federativos por níveis de complexidade, não se mostrou de plena resolutividade. Nela,
cabe ao ente federal o ensino universitário, ao estadual o ensino médio, e o nível
fundamental, em caráter complementar, aos municípios. Ao ente local cabe a educação
infantil e fundamental. Essa divisão não gera até hoje uma solução que dê conta da
diversidade dos 5.564 municípios brasileiros em sua capacidade de resposta com
qualidade para o ensino infantil e fundamental.
descentralização fiscal acompanha um crescimento progressivo dos gastos sociais públicos pelos
governos subnacionais (Draibe, 2002).
15
15
A aprovação do FUNDEB
2
– Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – em substituição ao
FUNDEF
3
– Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério – foi palco de forte pressão dos municípios, quer pelo
porcentual necessário ao financiamento do ensino fundamental, quer pela inclusão nesse
porcentual de capacidade para desenvolvimento do ensino infantil.
Nesse movimento foi sendo identificada a viabilidade – ou não – de cada
ente local municipalizar o ensino fundamental e nele incluir o ensino infantil, conforme
preconiza a LDB-9394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira.
Outra estratégia de gestão foi adotada na área da saúde que, para além da
constituição de Fundos de Gestão para transferência mútua de recursos entre os entes
federativos, introduziu o modelo de sistema único denominado SUS – Sistema Único de
Saúde. O artigo 198 da Constituição estabelece os pilares de um sistema único
composto por rede regionalizada e hierarquizada, regulamentado posteriormente pela
Lei 8080/90. Esse sistema, embora também hierarquize níveis de competência pela
complexidade entre os entes federativos, inclui a concepção de territórios de gestão, que
estabelecem a abrangência da ação e a distinção entre a atenção básica de caráter
preventivo e territorialmente coletivo para além da assistência médica mais curativa. No
caso, estende o conceito de um serviço de atenção à saúde do campo individual para
alcançar as condições de saúde da população de um território – os territórios de saúde –
introduzindo a vigilância sanitária e a vigilância epidemiológica na expansão de
responsabilidades do Estado. Resultam de um expressivo movimento social pela
reforma sanitária brasileira, que desde 1983 lutava pela unificação das redes
governamentais e pelo alargamento do escopo da saúde pública e do direito à saúde.
2
Fundo de natureza contábil, instituído pela Emenda Constitucional nº 53 de 19/12/2006, entrou em vigor
em 1/1/07 por meio da Medida Provisória nº 339 de 29/12/06 e regulamentado pela Lei nº11494/07. O
FUNDEB terá vigência até 2020 e a meta é atender, a partir de 2009, 47 milhões de alunos da educação
básica, o que envolve creche, educação infantil, ensino fundamental e médio, educação especial e
educação de jovens e adultos.
3
Instituído pela Emenda Constitucional nº 14 de 12/9/96, foi implantado em janeiro de 1998. Sua
inovação foi mudar a estrutura de financiamento do ensino fundamental público no país, por meio da
subvinculação de uma parcela dos recursos da educação a esse nível de ensino, com a distribuição de
recursos realizada automaticamente, de acordo com o número de alunos matriculados em cada rede de
ensino fundamental.
16
16
É um sistema complexo de gestão que introduz novos locus aglutinadores de
gestores das três instâncias como esferas decisórias para a pactuação do sistema
unificado (as comissões intergestores tripartite e bipartite). Ao mesmo tempo, se apóia
em locus paritários – governo e sociedade – como espaços de decisões e gestão
democrática (os conselhos de saúde).
Esse modelo da gestão da saúde no Brasil já está em sua terceira década de
desenvolvimento e tem se transformado em paradigma para construção da unidade
democrática de um sistema federativo de gestão de uma política social.
Seguramente é uma experiência com muitas questões – em parte já
superadas e outras tantas ou mais por resolver – que procura fazer com que a saúde
alcance resultados quanti-qualitativos para a população em todo o território nacional. O
SUS pode ser considerado como um dos maiores sistemas de saúde do mundo (Campos,
2006): 70% dos brasileiros dependem absolutamente do SUS, e 30% têm seguro
privado ou recursos para custear seu atendimento. Enfrenta dificuldades, pois “...
permanece uma definição imprecisa da responsabilidade sanitária deste ou daquele
ente federado...” (idem: 142), tida então como uma reforma incompleta.
Pode-se afirmar que, hoje, a constituição de sistemas nacionais de caráter
unificado vem sendo (conservadas as particularidades de cada campo social) uma
resposta aplicada pelas políticas sociais para efetivar direitos sociais expandidos a todos
os brasileiros.
Nesse cenário foi proposta, também, a perspectiva de um sistema nacional
na gestão da assistência social, desde o artigo 204
4
da CF-88, posteriormente detalhado,
não de forma cabal, pela Lei Orgânica de Assistência Social em 1993 (Lei nº 8742/93).
4
Estabelece fontes de financiamento e diretrizes das ações governamentais na área da assistência social,
propondo:
·a descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal: a
coordenação e execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a
entidades beneficentes e de assistência social;
·participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no
controle das ações em todos os níveis.
17
17
Ocorre que, nesse caso, o Sistema Único de Assistência Social – SUAS – só
foi regulamentado através da Norma Operacional Básica em 2005 (NOB/SUAS),
aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social pela Resolução nº 130, de 15 de
julho de 2005.
o sistema único de assistência social
O Sistema Único de Assistência Social – SUAS – corresponde ao novo
modo de gestão da Política de Assistência Social brasileira, mas representa, antes disso,
a materialização da construção e efetivação da agenda democrática com raízes históricas
nas lutas e contradições que compõem o alcance desse direito social (Lopes, 2006).
A história recente da luta pela efetivação do SUAS, empreendida por
trabalhadores sociais, intelectuais, cidadãos em geral comprometidos pelo
restabelecimento da cidadania brasileira, demarca uma conquista que parte da afirmação
da assistência social como política de seguridade social, atribuída pela Constituição
Federal de 1988 e confirmada em marcos regulatórios posteriores.
5
Todavia, a efetivação de um novo patamar de assistência social pública, de
confirmação do direito de qualquer cidadão aos benefícios e serviços socioassistenciais
vem se consolidando em um contexto sócio-político arredio ao alargamento do
compromisso estatal com a cidadania. Operado pela compreensão neoliberal acerca da
redução da agenda pública e a favor da hipervalorização da secular iniciativa
benemerente da sociedade civil, os governos que sucedem à ruptura constitucional
negligenciam ou minimizam esse novo patamar conferido à assistência social pública,
pelo menos até 2003, quando ocorre uma segunda ruptura igualmente oriunda de
intensas lutas políticas. Nesse ano, a principal deliberação da IV Conferência Nacional
de Assistência Social é pela implantação do Sistema Único de Assistência Social.
5
Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº 8742/93); NOB 01/97 (Portaria nº 35 de 26/12/1997);
Política Nacional de Assistência Social e NOB 2 (Resolução nº 207 de 16/12/1998); Política Nacional de
Assistência Social – PNAS 2004 (Resolução nº 145 de 15/10/2004); Norma Operacional Básica
NOB/SUAS (Resolução nº 130 de 15/7/2005), NOB-RH/SUAS (Resolução nº 269 de 26/12/2006).
18
18
O SUAS resulta de quase 20 anos de luta na assistência social e do
aprendizado com a gestão de saúde, em particular o Sistema Único de Saúde – SUS
(Sposati, 2006: 102).
Mais ainda, em 1990 já se propunha um sistema único gestor da assistência
social, pela ANASSELBA – Associação Nacional dos Empregados da LBA (Legião
Brasileira de Assistência) –, como resultado da experiência dos trabalhadores da LBA e
da vivência conjunta com a perspectiva de efetivar o Sistema Único de Saúde no país,
ou seja, o modo de gestão da Política de Saúde proposto constitucionalmente e
regulamentado pela Lei nº 8080/90.
Em 1989, a Comissão de Saúde, Previdência e Assistência Social da Câmara
de Deputados realizou o I Simpósio Nacional sobre Assistência Social, caracterizado
como um espaço democrático de livre debate com setores envolvidos com a assistência
social no Brasil, com o objetivo de reafirmar os pontos de consenso, explicitar as
divergências, registrar as opiniões e colher sugestões para a formulação do dispositivo
legal regulador da Política de Assistência Social, a LOAS. Foi um evento que reuniu
533 pessoas de diversas regiões do país, durante 3 dias, entre técnicos, professores,
estudiosos, parlamentares, autoridades, representantes de entidades sociais, sindicais,
trabalhadores e lideranças comunitárias.
A deliberação por um sistema unificado da assistência social é resultado de
um conjunto de fatores históricos propulsores de uma nova ordenação da gestão da
assistência social como política pública: o acúmulo de experiências e resultados das
gestões municipais; estudos e pesquisas acadêmicos; a organização e a potência de
Fóruns de Assistência Social como espaços de organização e de luta militante pela
assistência social pública que, ao lado dos Conselhos de Assistência Social,
protagonizam o campo do controle social ampliado da Política de Assistência Social.
Pode-se afirmar que não se trata, somente, de redefinições no campo
conceitual da política pública da assistência social e/ou de reordenamentos institucionais
requeridos das instâncias gestoras da política – esferas federal, estadual e municipal.
19
19
O SUAS não corresponde a uma reificação do tecnicismo burocrático na
operação de uma política pública de recorte social. Corresponde a um estágio de
amadurecimento político da estratégia de gestão descentralizada e participativa da
assistência social, iniciada a partir de 1988. É expresso tanto na elevada presença
6
de
órgãos gestores municipais e estaduais quanto na expansão dos mecanismos de controle
social da política de assistência social – conselhos, conferências, fóruns. O
aprimoramento de procedimentos homogêneos e complementares de gestão e a revisão
do co-financiamento público caracterizam-se como demandas de um sistema público
unificado, que caminhe para a universalização do direito à proteção social não-
contributiva, própria da Política de Assistência Social. Contudo, a efetivação do SUAS
requer que se continue a enfrentar a perspectiva conservadora, que desclassifica o gasto
social no direito não contributivo como favor, como sinônimo de tutela questionada e,
dessa forma, indesejável (Paiva, 2006).
No elenco de desafios vinculados à efetividade do SUAS, ganha destaque a
revisão das relações federativas entre as instâncias gestoras, isto é, o caráter federalista
que supõe a ação integrada de três níveis de gestão: federal, estadual e municipal
(Sposati, 2007).
Pode-se dizer que o sentido do compartilhamento e complementaridade das
atribuições e competências a serem assumidas, em escala crescente pelas esferas
gestoras, é a espinha dorsal do novo modo de gestão da assistência social pública,
considerando a centralidade do dever de Estado em sua condução. Essa revisão das
relações federativas é um forte componente condicionador do desafio de construir a
unidade proposta pelo SUAS. Construí-la é passível de um possível paradoxo – chegar a
um sistema único que dê conta da unificação de diretrizes, princípios, procedimentos,
coberturas e resultados norteadores da Política, mas que respeite a diversidade sócio-
territorial, o que requer considerar as múltiplas particularidades encontradas na
6
Dos municípios brasileiros, 99,7% tinham, em 2005, estrutura organizacional para tratar da política de
assistência social, além de 98% dos municípios apresentarem Conselhos Municipais de Assistência Social
Fonte: FIBGE MUNIC – 2005 Assistência Social. Mais de três quartos dos Conselhos Municipais
(76,6%) foram implementados entre 1995 e 1998, mesmo período de maior implementação dos
Conselhos Estaduais de Assistência Social. Fontes: Brasil, Fotografia da Assistência Social no Brasil,
2005. Brasil, Indicadores da Gestão Municipal da Política de Assistência Social no Brasil 2005/2006,
2007.
20
20
dinâmica constitutiva do cotidiano das famílias e dos territórios, nas escalas local,
regional e nacional.
A centralidade da investigação adotada neste trabalho diz respeito ao
percurso histórico e transições necessárias, por parte do ente federado estadual, para a
efetividade do modelo de gestão unificada da política de proteção social não
contributiva.
A análise crítica dessa investigação exige, de saída, as seguintes
considerações:
1. a absoluta ausência de tradição republicana na gestão compartilhada da
assistência social. Mesmo o governo central exercendo sempre um forte papel, ele
sempre foi mais emblemático do que pragmático na demarcação de ações e do tamanho
da presença da assistência social no conjunto das políticas sociais brasileiras. A
assimetria no tempo e na condução integrada estatal dá lugar ao surgimento de órgãos
gestores estaduais e municipais ao sabor de histórias e ritmos determinados por fatores
diversos – de caráter regional e/ou local – que não sob a perspectiva de um pacto
republicano;
2. dessa forma, o aparecer do campo da gestão estatal da assistência social
não seguiu, historicamente, uma relação de precedência entre a esfera federal à estadual
ou entre esta e a municipal. É possível que a institucionalização dessa área revele que
estados precederam a União
7
e até a probabilidade de que cidades precederam estados;
3. um considerável afluente do caudaloso leito de imprecisões da
responsabilidade social pública é o fato de que a assistência social aparece primeiro
como uma prática social de iniciativa da sociedade, construída em um amálgama secular
de mecanismos de ajuda aos grupos sociais desfavorecidos, que mescla a benemerência,
a caridade (por meio de esmolas e auxílio material e moral) à benemerência
7
O Estado de São Paulo é pioneiro e precede o âmbito federal, ao implantar o Departamento de
Assistência Social em 1935, já que a Legião Brasileira de Assistência - LBA, órgão inaugural federal, foi
criada em 1942 e o Conselho Nacional de Serviço Social -CNSS-, embora um conselho e não um órgão
gestor propriamente dito, tenha sido instalado em 1938.
21
21
institucionalizada em espaços de apoio gradualmente destinados à atenção desses
segmentos sociais (Sposati, 1994).
A tríade da ajuda-favor-benesse caracteriza-se como o fator dominante da
carga genética da assistência social brasileira, tendo como fator recessivo a presença
secundária e coadjuvante do Estado, desde os primórdios do período colonial.
Mesmo quando a assistência social ingressa na agenda do Estado, sempre o
fez de forma dúbia (Mestriner, 2001), reconhecendo mais as iniciativas da sociedade
civil, institucionalizadas em organizações sem fins lucrativos, e menos a
responsabilização estatal pelas necessidades da população atendida por essas
organizações.
Dessa forma, o Estado brasileiro tem sido o último a responder diretamente
pelas atenções sociais (idem: 21), sob a prevalência do princípio da subsidiariedade
8
na
relação público-privado. Delega à sociedade responsabilidades maiores, por meio de
subvenções, subsídios e isenções tributárias às organizações sociais, reservando para o
âmbito estatal as ações emergenciais;
4. ao estágio contemporâneo de exercício de múltiplos esforços para a
consolidação gradual de um sistema único, precede a ruptura provocada pela CF-88 na
assistência social. O texto constitucional assegura, no âmbito da seguridade social, a
proteção social como afiançadora de seguranças sociais.
É no campo da seguridade social que estão assegurados os direitos relativos
à saúde – de caráter universal –, à previdência social – de caráter contributivo – e à
assistência social – de caráter não contributivo –, por meio de um conjunto articulado de
ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade. A primazia do Estado na
8
A subsidiariedade é um dos princípios básicos da Doutrina Social da Igreja, que regula as relações do
Estado com as pessoas e comunidades. Incumbe ao Estado a obrigação da ajuda, do apoio, da orientação e
provisão nas deficiências e este princípio esteve presente na encíclica social Quadragésimo Anno de Pio
XI (1931), encíclica que confirmou os princípios da Rerum Novarum (1891). A encíclica evoca a
subsidiariedade com a idéia de que o enfrentamento do desemprego e da pobreza requeria o esforço
partilhado de todos, cabendo ao Estado uma ação indireta por meio de ajudas pontuais tal como a
subvenção às obras sociais (Mestriner 2001; Sposati, 1994).
22
22
condução e organização da proteção social fica clara no conjunto dos objetivos a serem
alcançados.
9
Essa inscrição da assistência social como política da seguridade social
inaugura seu reconhecimento como área de responsabilidade pública pela vigilância e
garantia do direito às seguranças sociais, à proteção da dignidade humana (bem como
combate às suas violações), às populações vulnerabilizadas pela contingência etária e
por fragilidades da convivência familiar e societária.
Implica, também, ampliar a responsabilidade social estatal, quer seja por
meio da atenção direta às necessidades de proteção social, quer seja por meio de
regulações próprias de um novo patamar da relação público-privado, baseado na
construção de parcerias sob o ângulo maior do interesse público. Isso significa romper
com a anterior primazia das práticas privadas subvencionadas pelo Estado “... que
terminam por diluir as obrigações do Estado e os possíveis direitos do cidadão em ações
de solidariedade da sociedade em prol dos mais “pobres” e “fracos”... (Sposati, et alii,
1985:33).
No bojo desse complexo conjunto de rupturas constitucionais se instala a
questão medular do presente estudo. Refere-se ao modo como a assistência social
transitou no aparato de Estado dos governos estaduais até 1988. Um leque de questões
se abre:
y quais são as condições objetivas para a ruptura acontecer de fato?
y qual é o estatuto que a assistência social tinha nas gestões estaduais na
época, no sentido de ser mais próxima ou mais distante dessa ruptura?
y qual é a trajetória que teve e até onde essa trajetória tem inculcado um
conjunto de valores e compreensões que pode levá-la a ter menor porosidade para um
processo de mudanças?
y partindo de uma matriz de responsabilidades erguida historicamente na
esfera estadual, de que forma essas responsabilidades se mantêm e se alternam na
conformação do compromisso estatal regional?
9
Artigo 194 § único da CF/88.
23
23
São perguntas que nascem de uma primeira hipótese: a implementação da
descentralização político-administrativa da assistência social pública (portanto, pós 88)
vem ocorrendo primordialmente sob o protagonismo mais forte das esferas municipal e
federal, ao lado de um protagonismo mais incerto e secundário da esfera estadual.
Na verdade, o processo de descentralização político-administrativa vem se
efetivando pela prevalência da municipalização, traduzida na equivocada transferência
acumulada de responsabilidades e encargos à prefeitura, o que corresponde à
prefeiturização. Ademais, a compreensão a respeito do comando único
10
das ações em
cada esfera de governo se efetiva de modo fragmentado por Municípios, Estados e
União, desconectado da idéia de unidade entre essas instâncias.
O baixo protagonismo dos Estados vem se expressando na presença menor
do co-financiamento
11
, no exercício pouco expressivo da gestão territorializada
12
, mais
centrado na execução de programas governamentais próprios.
10
Lei nº 8742/93, Artigo 5º, Iº.
11
O co-financiamento pelos três entes federados está previsto na própria Constituição Federal (Artº 204).
Chama a atenção o destaque dado aos Estados e DF, somente, com a introdução de um incentivo pela
Emenda Constitucional nº 42, de 2003: permite que vinculem a programa de apoio a inclusão e promoção
social até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação no pagamento de :
despesas com pessoal e encargos sociais, serviço da dívida e outras despesas correntes de fora da área.
O exame da participação dos entes federados no financiamento da política de assistência social , no
período de 2002 a 2006, revela que a União participa com a maior parcela dos recursos anuais (70,.6%
em média), seguido dos municípios (17,2%) e, por último, pelos estados com a menor parcela de
participação na alocação de recursos (12,2%). Ressalta-se que nos valores municipais alocados estão
incluídos os valores transferidos pelos estados aos municípios, pois não é possível desagregá-los por meio
do Sistema de Coleta de Dados Contábeis dos Estados, Distrito Federal e Municípios- SISTN, da
Secretaria do Tesouro Nacional-STN (Brasil, MDS. Caderno SUAS, 2, 2007). Há, pelo menos, outros
dois pontos complexos que merecem consideração, na questão do financiamento da assistência social
pública: a ausência do comando único em estados e municípios pode levar à aplicação dos recursos
orçamentários em programas filiados à assistência social, ou seja, a dispersão do recurso próprio da
política em outra área administrativa governamental; a dificuldade quanto ao acesso e o domínio da
informação de recursos financeiros ainda se faz presente nos órgãos gestores da política: em nenhuma das
regiões brasileiras os municípios detêm um domínio superior a 50% da informação sobre custeio dos
programas estaduais. Fonte: Brasil, Indicadores da gestão municipal da Política de Assistência Social no
Brasil, 2005/2006. 2007.
12
O artigo 25 § 3º da CF/88 aponta para a responsabilidade dos entes federados estaduais instituírem
regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de
municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de
interesse comum. Fica estabelecida, então, a competência estadual na gestão sinérgica e
intergovernamental para a resolução racional dos microterritórios compostos por municípios, com
especificidades semelhantes. Os sucessivos marcos regulatórios da Política de Assistência Social
reforçam a possibilidade de organização de consórcios intermunicipais e outros arranjos similares, pelo
órgão gestor estadual.
24
24
Por sua vez, é voz corrente e recorrente de que está claro o papel da gestão
estadual no SUAS (veja anexo 1), mas isso supõe uma referência de unidade e não se
constrói essa referência sem passar pelos elementos que marcaram, historicamente, a
diversidade, tanto no âmbito das gestões estaduais quanto no âmbito das relações
federativas. Uma das formas de reconhecer essa diversidade é tentar analisar o percurso
das gestões estaduais.
A base do exame dessas questões será aqui realizada pelo desvelamento
histórico da arquitetura institucional, para consolidar a responsabilidade social do
governo do Estado de São Paulo e, com esta referência como pano de fundo, cotejar a
processualidade peculiar da assistência social de outros seis estados brasileiros e o DF –
RS, SC, PR, MS, PB, RR
13
. A proposta é fazê-lo de forma inserida no contexto social,
econômico e político nacional, considerando a influência do duplo movimento da
permanência/evolução do pensamento predominante da sociedade a respeito do modo
de atenção às populações fragilizadas. Considera-se que
o âmbito de uma política social é, em grande parte, resultante do
processo histórico político e, por conseqüência, das orientações que
uma sociedade estabelece quanto às necessidades de reprodução social
da sociedade que terão provisão pública, isto é, aquelas que transitam
da responsabilidade individual e privada para responsabilidade social
e pública (Sposati, 2004:1).
A ferramenta que aqui se construiu para auxiliar o exame é uma régua a que
se denominou de “régua do tempo”. Trabalhar com a régua do tempo na análise das
trajetórias institucionais estaduais requer a apreensão do pensamento dominante sobre a
assistência social em cada momento histórico, que pauta a agenda de provisões e o lugar
do Estado (subsidiário, executor, coordenador e responsável).
Destacam-se, portanto, as tensões que demarcam os caminhos da gestão
estadual em direção à possível unidade na construção do SUAS.
13
São as unidades estaduais que dispunham de informações e dados históricos, o que leva a supor que o
registro sistematizado da memória institucional regional praticamente inexiste. A memória institucional
nacional padece do mesmo vazio. Certamente, a dimensão do registro histórico da gestão publica da
assistência social é pouco valorizada e urge se configurar como um campo de pesquisa acadêmica e de
trabalho da mais elevada importância política e científica. As informações históricas do Paraná foram
obtidas em fonte secundária (Alves, 2002).
25
25
1. O federalismo, como um tipo específico de organização do Estado,
instalado no Brasil a partir de 1889, marco da passagem do Império para um Estado
Nacional.
A forma anterior dos estados subnacionais se dava pelas províncias,
revestidas de poder unitário e concorrente, cuja particularidade de interesses era
empecilho à construção unitária do Império. Por outro lado, o poder central era forte,
inspirado pela manutenção da unidade territorial e de constituição de um sentimento de
nacionalidade, também ponto de interesse das elites.
A Constituição Imperial de março de 1824 mudou o sistema de governo
regional: o presidente da província passou a ser a autoridade regional (Sposati,
1988:77).
Contudo, o descontentamento das províncias com a centralização
monárquica, em termos políticos e financeiros, foi uma causa forte para o ocaso do
Império (Abrucio, 2002) – a centralização fiscal predominava, mas os interesses
provinciais por sua extinção eram heterogêneos, desiguais e particularizados
territorialmente.
A alta fragmentação do território nacional se assentava nas desigualdades
econômicas regionais – as acusações mútuas sobre quem se beneficiava com a estrutura
tributária imperial conviviam com o interesse comum em eliminar a centralização fiscal,
dada sua redistribuição pautada por critérios de favorecimentos pontuais de interesse do
Império.
Dessa forma, as desigualdades econômicas regionais, já no nascedouro da
República, constituíram obstáculo à união de todas as províncias ao redor de um projeto
reformista tributário. “... O federalismo nasceu, em grande medida, do
descontentamento ante o centralismo imperial, em prol da descentralização, o que deu
26
26
um sentido especial à palavra federalismo para o vocabulário político brasileiro, que
persiste até hoje...” (idem:32)
14
Trata-se da falta de unidade no Império que adentra o formato republicano
brasileiro. O caráter originalmente hierárquico da federação brasileira é impresso no
mote da autonomia financeira das antigas províncias, que perpetua no arranjo
republicano a discriminação das rendas – servirá basicamente aos estados exportadores
e mais ricos e particularmente a São Paulo, portanto, desigualmente às unidades da
federação.
O elo comum da reivindicação federativa das províncias era a autonomia
política, que garantia a eletividade dos antigos presidentes de províncias, transformados
depois em governadores de estado, e assim superar a nomeação de outrora. O controle
seguro da eleição do “presidente da província” interessava à elite política da região,
longe então do assombramento das derrubadas impostas pelo anterior governo imperial.
Abrucio (2002:34-35) resume a gênese da federação brasileira assentada em
dois parâmetros básicos: o primeiro refere-se à diversidade de importância dos estados
dentro da Federação; e o segundo refere-se à garantia de que a elite local exerceria o
comando do processo político de cada estado. Assim, “... as máquinas políticas
estaduais serão peças fundamentais no tabuleiro político do país...”.
A partir da promulgação da Constituição de 1891 ocorre a adoção da
estrutura federativa no país, com a característica de um formato binário, moldado pela
presença dos entes federal e estadual, que vigorou por quase um século (1891 a 1988).
A Constituição Federal de 1988 reconhece e agrega o município como ente federado
autônomo, fato que dá início a um formato de federalismo trino, o que exige a
redefinição do sentido de autonomia e independência de cada ente, principalmente
porque os municípios passam a ter suas próprias leis de organização, não mais
dependentes das leis estaduais. Requer novas composições de força e poderio político,
fiscal, orçamentário e administração sobre seu território. Pode-se dizer que essa nova
14
José Bonifácio de Andrada e Silva defendia, a exemplo, a monarquia federativa como forma de
manutenção do poder central com a composição regional que se constituiu desde as capitanias
hereditárias do Brasil colônia.
27
27
configuração desintegra as relações de mediação da esfera estadual sobre a municipal,
na medida em que se estabelece uma relação direta do Município com a União.
A dificuldade da construção da unidade federativa é congênita ao modelo
republicano brasileiro, sob o peso da forte fragmentação regional e da particularidade
dos estados, o que pode tensionar o alcance da unidade da Política de Assistência
Social.
2. Relações interfederativas e intrafederativas na gestão da política de
assistência social
No interior da história da assistência social, é possível perceber a ausência
de um conjunto nacionalmente articulado de prestação de serviços e benefícios durante
quase meio século (1942-1988), até os marcos de seu reconhecimento constitucional
como política de proteção social não-contributiva
15
.
Conviveram historicamente apartadas políticas federais, estaduais e
municipais, o que não permite afirmar que tenha sido instituída no Brasil uma política
nacional de assistência social (Arretche, 2000: 170), mesmo que a instância federal
tenha sempre exercido forte influência no setor - pelo fato de definir sua estruturação
institucional, por sua capacidade técnica e financeira, e por sua capacidade de inovação
institucional. Dessa forma, estados e municípios operavam seus programas,
independentemente da União.
Um recorte no tempo desses quase cinqüenta anos de história institucional
permite destacar que a desarticulação mencionada ocorria tanto na esfera federativa
quanto no próprio âmbito intrafederativo federal. A LBA transformou-se em Fundação
Nacional em 1969, e conviveu com a criação da Fundação Nacional do Bem-Estar do
Menor – FUNABEM
16
. Certamente, pode-se considerar que a FUNABEM imprimiu de
15
O limite de 1942 é atribuído pela constituição da LBA que, embora na forma de um movimento
legionário, articulado pela esposa do presidente Vargas, vai articular as esposas dos governadores e estas
as dos prefeitos. Essa construção atravessa o marco constitucional até a extinção da LBA, que ocorreu em
1995, como um ato inaugural da primeira gestão de Fernando Henrique Cardoso.
16
A FUNABEM foi criada em 1964, substituta do Serviço de Assistência ao Menor - SAM - implantado
em 1941. Vinculada ao Ministério da Justiça, propunha transformar o modelo de atendimento carcerário
em um novo modelo terapêutico-pedagógico (Aguiar, 1997), disseminado no modo institucional usual de
atenção ao menor abandonado e delinqüente. Definiu e implantou a Política Nacional do Bem-Estar do
Menor, implementada através da instalação da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor-FEBEM - dos
28
28
forma mais incisiva e perene sua influência no espaço estatal estadual, mantida ainda na
permanência de fundações estaduais dedicadas à atenção da criança e do adolescente
vítimas de abandono e em conflito com a lei. Conviveram dois órgãos centrais
responsáveis pela formulação e execução da política federal da assistência social até sua
extinção em 1995, porém gestados de forma centralizada e superposta, isolados entre si.
Essa convivência paralela foi intercalada por momentos de aproximação e
distanciamento entre os dois órgãos federais. Ao passo que a LBA se manteve vinculada
durante 25 anos a um mesmo órgão superior (o Departamento Nacional da Criança, do
Ministério da Saúde, entre 1942 e 1967), transitou por 4 diferentes ministérios no
período de 1967 a 1989
17
. Por sua vez, a FUNABEM, oriunda do Ministério da Justiça,
coabita com a FLBA no MPAS, MBES e Ministério do Interior. Depois desse período
histórico, mantêm-se vinculados ao Ministério da Ação Social, renomeado
posteriormente como Ministério do Bem-Estar Social, até a extinção de ambos em
1995. Ambos foram submetidos, então, a uma instabilidade organizacional que, mesmo
coabitantes, primavam pela sobrevida paralela.
Dessa forma, há de se considerar o legado da política prévia
18
na
configuração da Política de Assistência Social em seu alcance republicano. Aguiar
(1997:14) chama a atenção a respeito da intensidade e influência da história anterior no
processo de implementação da descentralização participativa corroborada pela LOAS:
“...cabe observar que a presença e o peso da história anterior ou o apego ao modelo
anterior poderá dificultar muito a implantação do novo modelo- relações entre as
esferas de governo e destas com as organizações não governamentais...”
3. Tensão da subsidiariedade. Trata-se de um pólo aliciador de interesses
particulares, resistentes às mudanças exigidas pela efetivação da assistência social como
um dever do Estado e direito do cidadão, construídos na arena pública do interesse
coletivo. Ainda persistem práticas esparsas e individualizadas de manejo do campo da
governos estaduais, bem como por meio de convênios celebrados com as prefeituras e entidades
particulares.
17
Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS); Ministério da Previdência e Assistência Social
(MPAS); Ministério da Habitação e Bem-Estar Social (MBES); Ministério do Interior; volta ao MPAS.
18
Arretche (2000) considera que um determinante do processo de descentralização das políticas sociais
no Brasil é o fato de que processos de reforma de programas sociais são influenciados pela herança
institucional dos programas anteriores.
29
29
assistência social pública, similares à pregressa apropriação do bem público sob a ótica
do interesse privado, materializada na distribuição de emendas parlamentares
individuais a entidades socioassistenciais. Somada a isso, a persistência do “primeiro-
damismo”
19
se configura como uma via paralela que faz escorrer a verba pública para
além da possibilidade de se constituir como ação estatal dotada de efetividade de
proteção social.
São usos e costumes operados fora do interesse coletivo e do controle social,
porém dentro da política de assistência social, muitas vezes ao reboque do orçamento
público dessa área: fraturam a perspectiva do trato público e do sentido unitário e
unificador.
Em síntese, este trabalho se ocupa da particularidade da implementação do
SUAS e de suas dificuldades/facilidades para construir um sistema articulado de gestão
da assistência social como política pública no campo dos direitos à seguridade social.
Nesse movimento, particulariza-se um dos entes federativos, os governos
estaduais, cujo protagonismo histórico na constituição do sistema federativo brasileiro
tem força política que antecede a presença dos municípios no pacto federativo.
A singularidade das responsabilidades desse ente federativo na gestão
integrada tem sido palco de discussões, teses, contendas, no campo das diferentes
políticas sociais.
Pretende-se aqui, para o campo da política de assistência social, identificar a
singularidade desse ente federativo e seu campo de responsabilidades, que envolve a
mutação do seu desempenho histórico. Esse processo de mutação não pode ser
caracterizado sem partir da clara e crítica leitura dos condicionantes históricos que
determinam não só a atual conformação da gestão estadual, mas também as
resistências/facilidades para aderir a um novo pacto federativo de gestão.
19
Entendido como a recorrência histórica de delegar à esposa do governante cuidados à parcela
empobrecida e vulnerável da população, prática nepotista aceita pelo pensamento dominante nos mais
diferentes momentos históricos.
30
30
a pesquisa
A pesquisa de dados deste trabalho envolveu os procedimentos
metodológicos relacionados abaixo.
a) Participação direta como pesquisadora em três pesquisas (duas
acadêmicas e uma institucional).
aa) Pesquisa “Perfil da gestão estadual na área da assistência social”
20
.
Trata-se de uma pesquisa desenvolvida pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em
Seguridade e Assistência Social (NEPSAS) do Programa de Estudos Pós-graduados em
Serviço Social da PUCSP, no período 2006-2007 (2º semestre e 1º semestre,
respectivamente), com o objetivo de colaborar com a melhor definição de competências
e responsabilidades da gestão estadual no SUAS. A proposta foi apreender o modo pelo
qual foram sendo construídas as responsabilidades estaduais no campo da assistência
social, a partir de três fontes investigativas.
- Órgãos gestores estaduais: a perspectiva foi identificar o processo de
instalação das Secretarias Estaduais - ou órgão congênere -, bem como suas relações
com o órgão regional da LBA e a convivência institucional de ambos com os trabalhos
exercidos pelas esposas dos governadores. Outra dimensão do estudo foi desenhar a
forma como se inscreveu a institucionalidade da atenção à criança e ao adolescente em
situação de abandono e/ou em conflito com a lei, ou seja, detectar se a inscrição dessa
demanda de proteção social ocorreu e se mantém em lócus interno ou externo ao órgão
gestor estadual.
Nesse sentido, foram enviadas cartas de apresentação da Pesquisa a todos os
órgãos gestores estaduais e do Distrito Federal, bem como se estabeleceram
entendimentos com os responsáveis – ou profissional designado – pela Pasta, durante o
período de realização da pesquisa. As respostas obtidas foram parciais no conjunto das
questões e no conjunto dos entes estaduais, sendo que os estados examinados neste
trabalho propiciaram respostas mais completas. Há de se destacar que houve esforços
nesse sentido por uma parcela de órgãos gestores estaduais
21
, porém a ausência de
20
Os formulários usados correspondem aos Anexos 2 a, 2 b e 2 c.
21
É preciso levar em conta que a fase de aplicação da pesquisa se deu em uma conjuntura em
transformação, ou seja, em uma época de eleições e mudança / permanência de governos estaduais.
31
31
sistematização histórica do percurso do órgão gestor é um fator predominante, o que
determinou a orientação deste trabalho para a captura da memória formadora do lugar
da gestão estadual na política de assistência social.
Parte-se do princípio de que o domínio sobre a memória da assistência
social - no caso, das gestões estaduais – configura-se como um contraponto significativo
à condução de fato emergente que ainda se presencia na gestão da política regional (e
local), o que pode gerar a descontinuidade e não-efetividade de uma política estatal,
substituída pela alternância de políticas governamentais fragilizadas pelas variações e
mudanças político-eleitorais. A cultura política que deve dar sustentação às exigências
de mudanças históricas, tal qual as demandas de um novo pacto republicano para a
consolidação do SUAS, tende a se enfraquecer caso a amarração histórica dos
condicionantes regionais (e locais) permaneça afrouxada e até desconhecida. Intercalar
o conhecimento pretérito com a inovação presente são duas dimensões siamesas que
compõem os novos desafios da Política de Assistência Social. Corresponde a examinar
a expressão da configuração histórica da assistência social pública nas esferas
federativas
22
, e nela os fatores próprios dos estados, encontrando pontos de aproximação
e distância entre si.
y Faculdades de Serviço Social: a proposta de conhecer a possível produção
acadêmica sobre a temática da gestão estadual ensejou o envio de correspondência a
oitenta e três cursos de Serviço Social, desenvolvidos por instituições de ensino superior
filiadas à ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social).
Houve resposta por parte de seis cursos, e a Faculdade de Serviço Social da PUC do Rio
Grande do Sul colocou à disposição material para o empreendimento investigativo.
Depreende-se que o tema em tela requer maior atenção por parte das instituições
acadêmicas de formação do assistente social, considerando que é o profissional de
22
No curso das investigações, foi detectado que há um acervo histórico da Legião Brasileira de
Assistência depositado nas dependências da antiga sede desse órgão em Brasília, encaixotado e
desprovido de tratamento documental adequado. Em 1999, a Secretaria de Estado da Assistência Social
(SEAS, órgão gestor federal) deu início ao resgate e recuperação de acervo documental da LBA
encontrado no Rio de Janeiro (RJ), constituindo para tanto uma Comissão de Referência e Estudos da
Assistência Social (CREAS), integrada por membros da SEAS, do Conselho Nacional de Assistência
Social, do Ministério da Ciência e Tecnologia, do Ministério da Cultura e da sociedade civil. É
interessante destacar que, anteriormente, um Grupo de Trabalho foi constituído para traçar uma política
de resgate e preservação da história das ações da assistência social e, dentre seus membros, constava a
presidente da Fundação Darci Vargas (Edite Vargas) bem como Celina Vargas do Amaral Peixoto,
socióloga, prováveis parentes da ex-primeira primeira dama brasileira (Darci Vargas).
32
32
maior presença histórica no campo da administração pública da assistência social,
inclusive da esfera estadual
23
.
y Órgãos de classe: foi enviada correspondência ao Conselho Federal de
Serviço Social (CFESS) e a todos os Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS)
do país, com o intuito de conhecer se a origem regional da atuação do serviço social na
gestão estadual se dera na área da assistência social ou em outro setor de política
pública como saúde e educação. Entender o lugar e o percurso da profissão na gestão
estadual não encontrou resposta, limitada à do Conselho Regional da 10ª região (RS),
órgão que atuou ativamente na transição da política estadual no período pós-
constitucional
24
.
ab) Pesquisa “Trajetória da Pesquisa Acadêmica no campo da Assistência
Social: teses e dissertações”: foi desenvolvida pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em
Seguridade e Assistência Social (NEPSAS) do Programa de Estudos Pós-graduados em
Serviço Social da PUCSP, no período de 2003 a 2007. O objetivo era analisar as
tendências históricas sobre a produção das dissertações e teses na área da assistência
social, configurando-se como o terceiro trabalho investigativo
25
do NEPSAS sobre a
produção de conhecimento acadêmico acerca do tema, com o diferencial de realizar o
levantamento no conjunto das produções cadastradas no Banco de Teses da CAPES,
portanto um estudo de caráter transdisciplinar e de alcance, entre 1984 a 2004. Do
conjunto de 321 trabalhos de pós-graduação encontrados, detectou-se que não há uma
produção específica sobre o tema deste trabalho, sendo encontrados 21 produtos
assemelhados que abordam parcelas do tema da gestão estadual da política de
assistência social, quer seja por realizarem estudos regionais (de recorte específico de
um determinado estado brasileiro ou da trajetória de programas públicos), estudos do
23
Cerca de dez mil trabalhadores operam a política de assistência social nos governos estaduais e, desses,
23% possuem ensino superior completo. Dentre os profissionais universitários, os assistentes sociais
comparecem em maior número (38%), seguidos pelos pedagogos (17%), psicólogos (11%), advogados
(6%) e economistas (5%). Fonte: Álbum de Fotografia da gestão da assistência social. CNAS, 2005/2006.
24
Em 1992, a LBA regional organiza o Comitê Interinstitucional de Articulação da Assistência Social,
composto por uma gama de instituições-chave para a redefinição da assistência social no patamar de uma
política pública, dentre elas o CRESS regional.
25
1ª produção: Livro Carta-tema: a Assistência Social no Brasil 1983-1990; 2ª produção: Seminário:
Produção da PUC/SP na Política de Assistência Social.
33
33
histórico regional em um determinado período, e estudos do percurso histórico de
alcance nacional (em um dado momento e/ou segmentado por um subtema)
26
.
ac) Sistematização Diagnóstica da Gestão Estadual da Assistência Social.
Trata-se de um trabalho de coleta, organização e análise de dados e informações
relativas à gestão da política de assistência social dos estados federados no período
2005/2006, de autoria coletiva e desenvolvido no âmbito da Secretaria Nacional de
Assistência Social (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome-MDS). A
perspectiva do estudo foi construir uma visão de conjunto do estágio de organização dos
26 entes estaduais e do Distrito Federal – em suas dimensões de uniformidade e
diversidade –, a fim de subsidiar o processo de construção de pactos de aprimoramento
de gestão do SUAS nos estados.
Dessa forma, o acervo de dados coletado no conjunto das pesquisas
mencionadas é heterogêneo, de natureza diversa e, no limite, descontinuado nas
datações históricas. Assim, a opção foi complementá-los, a partir da adoção do caso do
estado de São Paulo, pela proximidade geográfica de busca e acesso às informações, de
tal forma que permitissem desenhar a arquitetura da institucionalidade da gestão
estadual da política de assistência social desde seu nascedouro, o que envolveu a
pesquisa documental e iconográfica de fontes específicas, a saber.
y Biblioteca da Secretaria Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social
do Estado de São Paulo
y Centro de Pesquisa e Documentação do Fundo de Solidariedade e
Desenvolvimento Social e Cultura do Estado de São Paulo
y Divisão de Acervo Histórico da Assembléia Legislativa do Estado de São
Paulo
y Centro de Pesquisa e Documentação da Escola para formação e
capacitação profissional da Fundação CASA (ex-FEBEM)
y Arquivo Público do Estado de São Paulo
26
Desse conjunto, os trabalhos consultados estão referenciados na Bibliografia.
34
34
Além de recorrer à bibliografia diversa (livros, revistas especializadas,
periódicos institucionais, relatórios técnicos, dissertações, teses, publicações eletrônicas,
documentos oficiais, matérias jornalísticas), foram realizadas cinco entrevistas, a saber.
y Vicente y Plá Trevas, ex-subchefe de assuntos federativos da Secretaria de
Relações Institucionais da Presidência da República
y Professora Maria Lúcia Carvalho, do Programa de Estudos Pós-graduados
em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
y Ana Lígia Gomes, Secretária Nacional de Assistência Social do Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
y Margarete Cutrim Vieira, presidente do Fórum Nacional de Secretários
Estaduais de Assistência Social – FONSEAS – e Secretária da Secretaria Estadual de
Desenvolvimento Social do Maranhão
y Marcelo Garcia, presidente do Colegiado Nacional de Gestores
Municipais de Assistência Social – CONGEMAS – e Secretário da Secretaria Municipal
de Assistência Social do Rio de Janeiro (RJ).
Valdete de Barros Martins, assistente social, ex-Secretária interina do
FONSEAS (Fórum Nacional de Secretários Estaduais de Assistência Social), ex-
Superintendente da Assistência Social do Governo de Mato Grosso do Sul
capítulos da tese
Os capítulos da tese encontram-se organizados sob o critério de datação
histórica, com intervalos delimitados pelo significado do conjunto de fatos e
acontecimentos políticos, econômicos e sociais expressivos e incidentes na moldagem
da esfera intermediária federativa, singularizada na escultura da responsabilidade estatal
estadual pela assistência social. Ademais, a intenção é detectar as expressões mutantes
das possibilidades de construção da nacionalização da assistência social pública, ou
seja, em que medida as institucionalidades federal, estadual e municipal caminharam na
direção de uma área de responsabilização estatal organicamente articulada.
35
35
O primeiro capítulo diz respeito à gênese dessa responsabilização, na
transição do século 19 para o século 20, quando as primeiras iniciativas oficiais, tanto
na esfera federal quanto na estadual paulista, ocupam-se em regular euforicamente e
inaugurar os primeiros serviços sociais segmentados para a infância e a adolescência
enjeitada, exposta e delinqüente, tal qual eram identificados na época. Representavam a
foz do caudaloso leito da imperiosidade de dotar maior segurança à Nação, em plena
metamorfose do sistema produtivo, que requeria uma força de trabalho forjada para a
disciplina, para o trabalho e para o engrandecimento da economia agro-exportadora e
industrial nascente. Era preciso adestrar, desde cedo, as crianças – e suas pobres
famílias pobres – para a supressão da ameaça contida na suposta desordem familiar e
social de que eram portadores. Trata-se de um momento peculiar da história do país, que
agrega a passagem da Velha República para o Período Varguista, que concentra em
quinze anos transformações perenizadas até a atualidade na conformação do sistema de
proteção social brasileiro, e no qual se inaugura a institucionalidade da assistência social
estatal nos âmbitos federal e estadual paulista.
O segundo capítulo versa sobre um interstício político que alterna a ditadura
civil imposta pelo Estado Novo (1937-1945) e a ditadura militar (1964-1984), no
intervalo entre 1946 a 1964, orientado pela ideologia desenvolvimentista pautada na
diversificação industrial e promoção de exportações. O cenário social sofre mudanças
pela elevada mobilidade populacional (de rural para urbana) à procura de trabalho e
renda, cujas demandas sociais são supridas, por excelência, pela assistência social sob o
véu populista.
O terceiro capítulo forja a exuberância da ação governamental na moldagem
autocrática do modelo de proteção social da Nação
27
, com destaque ao aprimoramento
dos mecanismos institucionais dirigidos à infância e à adolescência em situação
irregular, materializado na inauguração da agência especializada de alcance nacional, a
FUNABEM – Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor. Afinal, ordem é progresso.
A nova Fundação se espraia e cimenta a adesão do nível estadual na construção de
27
Deve-se levar em conta que o sistema brasileiro de proteção social nasceu e conformou sua identidade
durante os dois ciclos autoritários - o de Vargas (1930-1945) e o da ditadura militar (1964-1984), nos
quais prevalece um estado unitário, sob o predomínio de concepções autoritárias e gestão centralizada das
políticas sociais. (Almeida, 1996) Nesse sentido, a marca do campo da assistência social estatal é a da
nacionalização descendente, de regulação impositiva e modelagem programática tolhedora da autonomia
do ente estadual.
36
36
FEBEMs pelo Brasil afora. É o momento no qual a gestão federal se esmera na
instabilidade da alocação administrativa dos principais órgãos executivos da assistência
social (LBA e FUNABEM), e a gestão estadual paulista eleva o status do órgão gestor
da assistência social ao grau de Secretaria de Estado (1967), sem instâncias
institucionais intermediárias na relação com o governador de Estado, a não ser a
convivência com outra esfera governamental recém-inaugurada: o lócus oficial da
primeira-dama estadual, denominado Fundo de Assistência Social do Palácio de
Governo (1968).
A reabertura democrática, acelerada pelas eleições regionais (1982), traz de
volta à cena o protagonismo dos governadores, que tornam a exercer influência capital
no cenário político da época, marcado pela revisão constitucional no fim da década de
1980.
O capítulo quarto concentra os movimentos decisivos para a identidade da
assistência social como política de seguridade social, de Estado e de direito de qualquer
cidadão. Apesar de se configurar como o momento histórico que reúne medidas para
uma nacionalização ascendente, distributiva na questão das competências entre os entes
federados, o contexto nacional e mundial é avesso ao alargamento da responsabilização
estatal, quiçá à expansão de mecanismos reconhecedores dos direitos sociais,
tensionadamente erguidos na concomitância com o sobrepujamento do (re)nascente
terceiro setor
28
. Todavia, é o contemporâneo da luta que vai redesenhando a
possibilidade de credenciar a passagem da política de assistência social para um sistema
uniformizado, dotado de maior efetividade na proteção, defesa e vigilância sociais de
28
O terceiro setor tem sido definido de diferentes formas, mas a tendência nacional e internacional é
conceituá-lo como “... o conjunto de organizações privadas, sem fins lucrativos, que atendem a
finalidades públicas ou coletivas...” (Falconer &Vilela, 2001). Uma pesquisa comparativa entre 42 países,
denominada “John Hopkins comparative nonprofit sector research project” e coordenada por Lester
Salamon e Helmut Anheir vem desenhando o perfil mundial desse setor. Adotam uma matriz conceitual
comum, definindo-as como aquelas que são privadas, formais, sem fins lucrativos, autônomas e
voluntárias.
No Brasil, esse setor reunia, em 1995, 220 mil organizações, empregava 1 milhão de pessoas em tempo
integral - corresponde a 2,2.% da população economicamente ativa não-agrícola. Movimentava um
volume de recursos da ordem de 10.6 bilhões de dólares, o que equivale a 1,5% do PIB da época, ao
passo que a média internacional de participação era de 4,7% do PIB de outros países.
A tensão evocada se traduz na perspectiva de minimizar a responsabilização estatal em contrapartida ao
protagonismo hegemônico do terceiro setor. Seria, em outras palavras, o retorno às práticas seculares no
campo da atenção aos grupos sociais fragilizados pelas contingências etárias e econômicas.
37
37
populações vulneráveis em virtude de contingências etárias, de vida e de ocorrências
circunstanciais.
O conjunto de resultados dessa progressão histórica permite estabelecer o
cotejo entre a matriz identitária federal e a paulista, com a conformação da gestão
estadual de outros estados brasileiros, a partir de categorias dominantes e comparativas.
Assim, a última parte do trabalho analisa a história da institucionalidade da assistência
social pública em 6 estados federados e no DF, tendo como base comparativa uma
matriz de responsabilidades desenhada a partir dos dados encontrados na pesquisa
empreendida.
Este é um trabalho precursor, de elaboração complexa, tardio – talvez – mas
dotado de uma perspectiva central: a memória institucional da presença estatal estadual
no campo da assistência social não se resume a uma conjugação pretérita, de construção
de um mosaico disperso de acontecimentos e fatos passados. Deve propiciar a apreensão
dos múltiplos movimentos ocorridos na roda da história, de tal forma que fortaleçam a
compreensão sobre o presente, pois caso contrário e no futuro podem levar ao
desconhecimento de seu potencial de transformação.
38
38
Capítulo I - Iniciativas republicanas da União e do Estado na institucionalização
da assistência social (1889-1946)
1.1 Panorama nacional
As primeiras iniciativas governamentais com foco nos problemas sociais,
em âmbito federal, e estadual paulista, ocorreram no começo do século 20 e se deram
concentradamente, no campo da atenção à criança e ao adolescente empobrecidos – de
um lado, vítimas do abandono, orfandade ou negligência familiar e, de outro lado,
autores ou cúmplices de crime ou contravenção social. Trata-se, por enquanto, da
instalação de serviços sociais próprios a esse segmento social.
Há uma lógica nessa gênese governamental: a forte demanda por respostas
governamentais, orquestrada por setores expressivos da sociedade da época, germinada
desde o século 19, e que exigia maior controle oficial sobre a situação dos menores
enjeitados, expostos e delinqüentes
29
. Esse controle não se propunha a zelar por
melhores condições sócio-familiares, mas sim zelar pela suposta ameaça à ordem social
que representavam. A lógica prevalente se guiava pelo asilamento desse grupo social –
o exílio seguro – e pela reeducação familiar.
Trata-se de duas questões que se revelam como o desembocadouro de uma
tendência progressiva e anteriormente construída.
Os cuidados com os menores enjeitados – órfãos, desprotegidos, bastardos –
tinham residência nas iniciativas seculares da sociedade civil, capitaneadas
inauguralmente pelo mecanismo secular das Rodas dos Expostos desde o século 18.
A primazia colonial exercida pelas Casas de Misericórdia, modelo trazido
pela Coroa Portuguesa, replicava a tradição européia de instalação de rodas de expostos.
A Metrópole portuguesa, a 10 de maio de 1783, ordenara que em todas as cidades e
vilas se instalasse uma “roda”, e um empregado recebia as crianças e dava parte ao
magistrado, que as dava a criar por amas de leite e à custa do rendimento das Câmaras.
29
São termos próprios ao período examinado, que continuarão a ser adotados neste trabalho quando
referidos ao pensamento de determinado autor consultado, a fim de não descaracterizar o modo como a
infância e adolescência em situação de risco pessoal e social eram tratados.
39
39
Marcilio (1996) refere a instalação da primeira Roda de Salvador, em 1708,
funcionando em 1726; no Rio de Janeiro, em 1738, em Recife, em 1790, e somente em
1825 é instalada em São Paulo, por iniciativa do presidente da província de São Paulo e
também provedor da Santa Casa local, Visconde de Congonhas do Campo.
30
A
preocupação maior era não deixar morrerem os inocentes sem o batismo
31
, pois o
destino dessas crianças era uma questão secundária. Até 1850, foram criadas mais doze
Rodas, como a de Porto Alegre, em 1826, e a Belém do Pará, nessa época.
No geral, as crianças recolhidas pelas Rodas eram criadas até 3 anos de
idade, quando iam para a casa das amas-de-leite para serem educadas até os 7 anos , em
média. A partir dessa idade, a preocupação era iniciar a formação dos meninos em um
ofício; as meninas eram encaminhadas para iniciação nas prendas e artesanato
doméstico, preparando-as para, eventualmente, serem futuras mães de família.
(Marcilio, 1996:171) Os setores de aprendizagem do Arsenal de Guerra ou da Marinha
criaram uma Escola de aprendizes para os meninos, que também eram encaminhados
para seminários religiosos, para trabalhar no comércio ou, no limite, ao recolhimento de
menores. Às meninas restava prestar serviço doméstico em casa de família, em fábricas
ou, senão, iam para serviços de recolhimento de meninas. Para ambos, a exploração
como mão-de-obra gratuita ou com remuneração aviltante era, muitas vezes, a única
opção.
No entanto, o modelo da Roda dos Expostos foi se tornando incompatível
com a mentalidade predominante no Século XIX, capitaneada por higienistas, políticos
30
Mais curioso, ainda, é apontar as recomendações dos alvarás oriundos da Coroa Portuguesa quanto aos
enjeitados, em época mais remota ainda. O alvará de 6/12/1603 regulava que os enjeitados deveriam ter
sua criação a cargo dos hospitais, das albergarias ou do conselho onde aqueles não existissem. Em
seguida, outro alvará de 29 de agosto de 1654 trazia a recomendação de que, àqueles que cuidassem dos
enjeitados, eram concedidas isenções dos encargos de guerra.
Segundo Silva (1954), a possibilidade de essa medida ser exitosa é grande, pelas vantagens concedidas.
Em 1806, outro alvará eximia do serviço de tropa de linha a tantos filhos de lavradores quantos fossem os
enjeitados por eles criados e educados gratuitamente.
Portanto, esse conjunto de estímulos precedentes ao mecanismo oficial das Rodas de expostos se dirigia à
disposição do voluntarismo familiar na atenção aos enjeitados e à designação institucional das Casas de
Misericórdia para fazê-lo posteriormente.
31
A primeira Roda (em Salvador) foi instalada “... a fim de evitar-se o horror e deshumanidade que então
praticavão com alguns recém-nascidos, as ingratas e desamorozas mães desassistindo-os de si, e
condenando-os a vários lugares imundos com a sombra da morte, onde quando amanhecera o dia se
acharão mortas, e algumas devoradas pelos caens e outros animais, com lastimozo sentimento de piedade
catholica por se perderem aquellas almas, por falta do Sacramento do Baptismo...” Livro 5º dos Expostos
1834-1846 do Arquivo da Santa Casa de Misericórdia de Salvador, Livro 17. In Marcilio (1996: 169).
40
40
e advogados, que camuflavam argumentos respaldados na moral sob a forma de
conhecimentos adquiridos pela Ciência Médica.
O alto índice de mortalidade infantil encontrado nos asilos privados estava
associado às precárias condições de higiene desses espaços assistenciais, e se somavam
às críticas de que a Roda dos expostos estaria incentivando uniões ilícitas e até o
abandono de filhos de famílias com escassez de recursos para sua sobrevivência.
Nesse sentido, na segunda metade do século XIX, a Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro (Capital do Império e depois da República) foi um grande cenário de
debates e discussões sobre a mortalidade infantil nas Rodas de Expostos, bem como
foram produzidas orientações sobre cuidados para o bom atendimento e higiene das
crianças (Alves, 2002). O alvo não era tão somente as rodas, mas também as famílias
pobres – um forte exemplo pode ser evidenciado na trajetória do médico higienista do
Rio de Janeiro, Dr. Arthur Moncorvo Filho, que se inicia em 1880. Wadsworth (1999)
mostra que ele foi um defensor aguerrido da organização de serviços públicos
destinados à infância, e crítico severo do descaso do governo da época em relação à
pobreza no setor urbano, chegando até a calcular o impacto negativo que essa falta de
atenção teria acarretado para as crianças do país.
Os modelos de atenção à infância por ele criados e propostos refletem bem a
forma como os médicos, políticos, advogados e eugenistas percebiam a necessidade de
assistência pública à infância, no caso, pobre. A questão estava em ensinar as mães a
serem mães melhores, segundo os padrões de higiene e cuidados, porém o foco estava
no futuro da Nação.
Em março de 1880, Moncorvo Filho fundou o Instituto de Proteção e
Assistência à Infância no Rio de Janeiro, como o centro administrativo de todas as
organizações criadas por ele e de onde emanavam suas campanhas de assistência e
educação
32
.
32
Em 1921 existiam 17 agremiações semelhantes ao Instituto, espalhadas pelo Brasil.
41
41
Era uma organização caritativa privada, cuja oferta de serviços às famílias
pobres pretendia atingir todos os aspectos da infância
33
. A expectativa de Moncorvo
Filho era fazer do Instituto o alicerce de um programa nacional de assistência à infância.
Em 1919, implantou o Departamento da Criança (vinculado ao Instituto)
com a intenção de atuar como uma agência de pesquisa e como um banco de dados
cujas informações coletadas seriam postas à disposição pelo governo federal. Esses
dados seriam relativos às instituições privadas e oficiais de assistência à infância, dados
estatísticos e demográficos, e realização de congressos. Moncorvo sugeriu que esse
Departamento fosse uma espécie de agência nacional centralizada, ao qual ele
denominava Administração Pública Federal.
É interessante apontar que o Instituto por ele criado funcionou até 1938 e ,
em 1940, o governo federal implantou o Departamento Nacional da Criança
34
,
vinculado ao Ministério da Educação e Saúde Pública, com finalidades semelhantes na
prestação de serviços proposta por Moncorvo Filho.
Uma das iniciativas tomadas na implementação do Instituto foi a
Organização das Damas da Assistência à Infância, segmento composto por mulheres das
classes média e alta, com o propósito de promover novas estratégias de proteção à
infância, tais como a confecção de roupas para os “menores carentes”, organização de
festas e arrecadação de donativos, preparação de material médico, distribuição de
brinquedos em datas festivas.
À propósito, a presença de organizações femininas como essa revela
distinções de gênero (Wadsworth, 1999:6) que reforçavam o papel sagrado da mulher
como esposa, mãe e provedora. Consolidava uma hierarquia de classe e de gênero,
reforçando a dominação masculina e a vocação biológica de maternidade.
33
Propunha inspecionar e regular as amas-de-leite, estudar as condições de vida das crianças pobres,
providenciar proteção contra o abuso e a negligência para com os menores de idade, inspecionar escolas,
fiscalizar o trabalho feminino e de crianças nas indústrias. Disseminação de conhecimento sobre doenças
infantis, campanha de vacinação. Estabelecimento de cooperação com os governos federal, estadual e
municipal com vistas à proteção do jovem, e apoio a todo tipo de iniciativa que pudesse maximizar a
proteção à infância.
34
O DNCr foi o primeiro órgão federal criado e responsável pela coordenação de todas atividades ligadas
à proteção da infância, maternidade e adolescência. No ano de 1942, a LBA foi criada, vinculada a esse
Departamento.
42
42
A questão de ordem era prevenir o abandono das crianças, fato entendido
como uma ameaça ou presságio à proliferação da violência. A profilaxia residia na
capacidade de oferecer o padrão de moralidade, felicidade, saúde e bem-estar das
classes abastadas às crianças e famílias pobres das cidades (Wadsworth, 1999).
Esse é o contexto social e político de passagem do século 19 para o século
20, de mudanças de uma economia mercantil escravista para a economia exportadora
capitalista, que é marca do Brasil no final do Império e nos primeiros anos da Velha
República (Sposati, 1988:87).
Trata-se de um período de transição de profundas mudanças estruturais
econômicas, políticas e sociais, marcadas pela necessidade de preparo da força de
trabalho pós-abolicionismo, semente da crença propagada de que a criança seria o
futuro da Nação, desde que devidamente preparada e adestrada.
De forma implícita, a motivação econômica parecia se sobrepor à
preocupação pela proteção à infância. Moncorvo Filho desenvolveu cálculos, como
tantos outros, sobre o impacto econômico da falta de atenção às crianças – o custo
econômico da mortalidade infantil
35
, véu simbólico e oculto da preocupação em
preservar e forjar adequadamente a força de trabalho para a agricultura e para a indústria
que começava a se instalar no país.
De costas para as causas estruturais da condição de desigualdade social em
que viviam, a preocupação das elites envolvidas nesses trabalhos era menos com o
benefício às crianças pobres e mais com a preservação da ordem social.
É interessante apontar que o desembargador Ataulpho Nápoles de Paiva (RJ)
exerceu uma ação incisiva e decisiva na direção de uma “nova Justiça”, visando
especialmente aos “menores de idade”, engrossando o forte movimento de
representantes da infância e da justiça que exigiam um sistema de proteção desse grupo
social, ao lado de uma legislação própria
36
.
35
Cálculos sobre 20 mil vidas infantis ceifadas entre 1902 e 1921, pela transmissão de doenças por
moscas e pela tuberculose representaram uma perda de cerca de US$ 3 milhões e 580 mil.
36
É exatamente no período da República Velha -1889 a 1930- que se produz uma vasta legislação sobre
as formas de assistência à infância e adolescência abandonada e delinqüente.
43
43
Desde os primeiros anos republicanos, pela primeira vez, entraram na agenda
pública os debates sobre as funções assumidas pelo Estado (Sposati, 1988:107).
Ataulpho de Paiva protagonizou ativamente esse debate, trazendo para o Brasil uma
discussão que ocorria em países europeus a respeito da assistência pública e privada.
Acreditava que era preciso criar um órgão estatal de controle das ações de assistência
que introduziria uma nova racionalidade na organização e no conhecimento sobre os
processos de ajuda. Essa ação estatal seria de fiscalização da filantropia, para que as
obras de caridade operassem na direção oposta à manutenção da vadiagem e da
mendicidade. Paiva propôs a criação do Ofício Geral de Assistência no Brasil – que não
foi concretizado – e seria responsável pelo seguro social aos pobres: assistência à
orfandade, à velhice, assistência jurídica e médica.
Entretanto, essa proposição desembocava no reconhecimento público da
miséria, rejeitada pela concessão oligárquica da Velha República e, desde os primórdios
da Colônia e já no Império, a mendicidade era sinônimo de vadiagem, merecendo
tratamento policialesco e destituidor de direitos humanos e políticos.
É na Primeira República que predomina a filantropia higiênica, marcada pela
conjugação entre a prevenção e a segregação na atenção assistencial, sob forte regulação
médico-religiosa. Sposati (et alii, 1985) avalia que, até 1930, a compreensão
predominante sobre a pobreza era tratá-la como disfunção pessoal, deslocada da
perspectiva de ser expressão da desigualdade social. Perpetuada no circuito da
solidariedade social expressa nas organizações filantrópicas, ao Estado cabia enquadrar
esses indivíduos como “caso de polícia”, plasmando a identidade do desempregado
como vagabundo, aquele que ameaça a segurança pública.
A pressão relativa à ordenação pública de um sistema de proteção à infância
sugere êxito quando, em 1903, é criada a Escola Correcional Quinze de Novembro, no
Rio de Janeiro, pelo Governo Federal, para educar e corrigir profissional e moralmente
as crianças entre 9 e 14 anos de idade em situação de abandono, orfandade e/ou miséria.
Em 1918 é regulamentada a criação de Escolas de Aprendizes Artífices
(Decreto 13064), implantadas por meio de um convênio entre os estados federados e o
Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Eram escolas que ministravam
44
44
gratuitamente o ensino profissional primário a crianças e adolescentes entre 10 e 16
anos, em regime de externato e com formação de operários e contramestres em oficinas
de trabalho manual ou mecânico, “... (oficinas) que forem mais convenientes aos
Estados em que funcionarem as escolas, consultadas, quanto possível, as especialidades
das indústrias locais...” (artigo 2º).
Essas escolas sediavam, então, as primeiras lições para a formação da mão-
de-obra requerida pelas indústrias, notadamente instaladas no meio urbano. Cabe
destacar que o alcance da propositura era, pela primeira vez, dirigida ao território
nacional e mediada pelos governos estaduais.
Para o meio rural, havia os Patronatos Agrícolas, reorganizados em 1919
(pelo Decreto nº 13706), e gerenciados pelo mesmo Ministério. Em regime de internato,
abrigavam a mesma faixa etária das Escolas de Aprendizes, com a exceção dos menores
delinqüentes, dos portadores de moléstias contagiosas e deficiência física limitadora do
trabalho rural. Notadamente, atendia ao grupo social mais empobrecido e vulnerável,
encaminhado pelas autoridades judiciais.
O Decreto nº 16272 de 20/12/1923 estabeleceu a essencialidade da
assistência e proteção aos menores abandonados e delinqüentes, organizando um
regulamento próprio para tal. Aí se esboça a primeira tipologia de serviços assistenciais,
próprios para cada condição:
y esgotadas as possibilidades de permanência no seio familiar e social (como
o tutor e pessoa encarregada pela sua guarda), cabia a internação em hospital, asilo,
instituto de educação, oficina, escola de preservação ou de reforma;
y àquele abandonado, pervertido ou na sua iminência, cabia o
encaminhamento a asilo, casa de educação, escola de preservação ou a pessoa idônea;
y institutos disciplinares eram as escolas de preservação para meninas de 7 a
18 anos, sendo destinado um pavilhão específico para meninas julgadas por infração
penal.
Assim, a precursora Escola Quinze de Novembro foi reorganizada em duas
seções: uma de preservação (para abandonados) e outra de reforma (para meninos entre
45
45
14 e 18 anos, criminosos ou contraventores). A diretriz pedagógica se assentava na
educação física, moral, profissional e literária.
Esse Decreto trouxe, ainda, duas inovações relevantes.
y Cria no Distrito Federal o Juízo Privativo de Menores abandonados e
delinqüentes. Como serviço de retaguarda, havia um abrigo destinado à recepção
provisória das crianças até a definição do local a que seriam encaminhadas;
y Cria também o Conselho de Assistência e Proteção dos Menores,
protoforma parcial do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente trazido pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente
37
. A competência dos conselheiros, já
designados
38
no Decreto, era ampla: deviam fiscalizar os estabelecimentos de educação,
as fábricas e oficinas e, nas situações irregulares, o Ministro da Justiça deveria ser
comunicado; auxiliar na ação do juiz e seus comissários de vigilância; vigiar, proteger e
intervir na situação dos menores egressos dos estabelecimentos e daqueles que se
encontravam nas ruas. Percebe-se aí que há sinais de abrandamento parcial no trato
punitivo até então prevalente, insinuando-se como uma primeira medida de viés
democrático e socializador das decisões necessárias para a proteção infanto-juvenil.
Aliás, é a primeira vez que se faz menção oficial à assistência e proteção como
demandas próprias das pessoas nesse ciclo de vida, porém restritas às camadas
pauperizadas da sociedade de então e ainda que sob a linha repressora.
Em 1927 é implantado o Código de Menores, sendo reveladora a concepção
de que a criança representava um bem econômico e social à Nação – Estado e sociedade
civil – através das declarações do Juiz de Menores Mello Mattos, em 1929, segundo
Wadsworth (1999):
(...) o menor contribui para o desenvolvimento do povoamento, do
solo e para a manutenção da integridade e da independência da Pátria;
por isso, além de outras razões, a vida dos menores é preciosa à Nação
(...) A criação e a educação do menor interessam no mais alto grau à
ordem pública, da qual o Estado é o guarda. Por isso, ele deve intervir
com a sua proteção aos menores nas ruas e nas oficinas, na exploração
37
Lei nº 8.069, artigo 88, II.
38
Composição do Conselho: diretores do Colégio Pedro II, Instituto Benjamin Constant, Instituto de
Surdos-Mudos, Hospital Nacional dos Alienados, diretores de instituições de beneficência
subvencionadas pelo Estado ou consideradas de utilidade pública; um representante da Prefeitura, do
Instituto da Ordem dos Advogados, da Academia Nacional de Medicina e do Departamento Nacional de
Saúde Pública.
46
46
pelos pais e pelos patrões, na fiscalização dos divertimentos
comercializados, no uso de tóxicos, na disseminação dos vícios, etc.
Sob a ótica da disfunção social da família empobrecida, esse marco
regulatório legal destinado à infância centrava sua visão sobre o “menor em situação
irregular”. O menor abandonado ou delinqüente requeria proteção, porém sob cuidados
policialescos e punitivos (Aguiar, 1997).
A década de 30 caracterizou-se como um período peculiar da história
nacional, eivado de mudanças multidimensionais – econômicas, políticas e sociais. O
perfil populacional do país se transformava, passando de 30.838.301 habitantes - na
década de 20 - para 43.246.931 em 1937. A concentração se mantinha no litoral e nas
zonas já povoadas do interior, persistindo cada vez mais o desequilíbrio entre o sul e o
resto do país. Uma alteração importante no perfil da força de trabalho se fazia pelo
aumento da migração interna, concomitante à diminuição da mão-de-obra estrangeira
39
.
As correntes migratórias provinham principalmente do Nordeste, em busca do eixo Rio-
São Paulo, em um período no qual a subvenção à imigração foi suspensa pelo Estado
central (1927 a 1935, ano em que foi retomada). O estado de São Paulo respondia por
42,84% do total de trabalhadores nas indústrias do país (Carone, 1974).
A Revolução de 30 inaugurou a etapa decisiva do processo de constituição
do Estado brasileiro, quando
a quebra das “autonomias” estaduais que amparavam os “polos
oligárquicos” resultou numa crescente centralização do poder:
concentravam-se progressivamente no Executivo Federal os comandos
sobre as políticas econômica e social, bem como a disposição sobre os
meios repressivos e executivos. O Estado seguirá federativo na sua
forma, mas os núcleos de poder local e regional serão subordinados
cada vez mais ao centro onde se gestam as decisões cruciais (Draibe,
2004:54).
O legado de um Estado fraco e dominado pelas oligarquias regionais,
próprio da Primeira República, era incompatível com as mudanças no eixo econômico,
nacional e internacional da época. De um lado, a crise da hegemônica economia cafeeira
atingiu seu clímax com a depressão dos anos de 1930, e convivia com a expansão
industrial. Por outro lado, a dominância do capital industrial não se deu como um
39
Entre 1891 e 1900, chegaram ao Brasil 1.129.315 imigrantes, ao passo que entre 1931 a 1940 vieram
somente 218.607 estrangeiros.
47
47
desenlace (idem: 25), pois o contexto sócio-político da época exigia uma nova política
no interior da esfera estatal, ou seja, a metamorfose do próprio Estado.
O estágio de industrialização brasileira exigia, então, um Estado forte que
regulasse, planejasse, interviesse nos mercados, desafios que foram assumidos pelo
novo governo que iniciava a era Vargas (1930-1945). Consumada a Revolução, Vargas
assumiu o comando do Governo Provisório da República. Logo se investiu de poderes
excepcionais, o que lhe permitiu desmanchar as estruturas da República Velha. Foram
dissolvidos o Congresso Nacional e todos os órgãos legislativos estaduais e municipais,
além dos governadores estaduais serem afastados e substituídos por interventores
federais nomeados.
É forjado nesse período um Estado revestido de autonomia oriunda da
incapacidade hegemônica, tanto dos vários setores oligárquicos quanto dos setores
urbano-industriais. Um Estado que incorporou e materializou em seu organismo as
relações contraditórias que configuravam o campo social heterogêneo, que se viu diante
da necessidade de “admitir sua responsabilidade social para com os mais pobres, o que
não estava na agenda liberal que dominava o pensamento de então” (Mestriner,
2001:68).
Contudo, a contingência de ter que estabelecer mecanismos de proteção
social se materializou principalmente na regulação das relações trabalhistas, na
delimitação do seguro social ao trabalhador do mercado formal, no aparelhamento
estatal de controle das demandas trabalhistas.
40
40
A Constituição Federal de 1934 se destaca pela primazia do trabalho como categoria redentora e
definidora dos direitos e garantias individuais, afirmando que todos devem prover sua subsistência com o
próprio trabalho (Artigo 113 item 34), com a ressalva, no Artigo 121, de que a lei promoverá o amparo
da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção
social do trabalhador (Sposati, 1988:113).
No âmbito da Previdência Social, as caixas de aposentadoria e pensão (CAPs), criadas na década de 20,
foram transformadas nos IAPS – Institutos de Aposentadoria e Pensão -, a partir de 1933, como
autarquias federais e responsáveis por serviços previdenciários e assistenciais aos segurados da respectiva
categoria profissional. Até a década de 60 ocorreram várias tentativas de unificação do sistema
previdenciário: Em 1945, o Decreto-lei nº 7526 estabelece a Lei Orgânica dos Serviços Sociais do Brasil
e cria um Instituto de Serviços Sociais do Brasil (ISSB), com o intento de unificar todos os serviços de
previdência e assistência social. Esse Decreto-lei coloca como agentes primordiais dos serviços de
previdência e assistência social a União e, como cooperadores, estados, municípios e instituições públicas
e particulares (idem:114). O ISSB foi concebido como um órgão publico composto por setores da
burocracia estatal e os próprios segurados. Revogado em 1946, a Lei Orgânica da Previdência demorou
13 anos para ser aprovada no Congresso Nacional em 1960 (Draibe, 2004). Portanto, as tentativas de
48
48
A proteção social correspondente aos mais pobres, ao não-segurado, ao
desvalido e enjeitado
41
ficava restrita ao circuito do amparo social privado, subsidiado
pelo Estado. A regulação estatal da assistência social começou com Getúlio Vargas, que
atribuiu a si, inicialmente, o poder de distribuir auxílio às organizações sociais, por
meio da “contribuição de caridade” – tributo alfandegário sobre a importação de bebidas
alcoólicas (Sposati, 1994). O fato é que lhe permitia discricionar quais organizações
sociais contribuiriam para a manutenção da ordem social, medida direta e personalizada
da então ação estatal subsidiária e, portanto, indireta.
Em 1931 foi criada a Caixa de Subvenções no Ministério da Justiça,
substituída em 1938 pelo Conselho Nacional de Serviço Social – CNSS, que se
caracteriza como a primeira modalidade de presença da assistência social na burocracia
do Estado Republicano, “(...) ainda que na função subsidiária de subvenção às
organizações sociais que prestam amparo social” (Mestriner, 2001:66-67). O CNSS
primou sua atuação pelo controle da filantropia privada, avaliando os pedidos de
subvenções ordinárias e extraordinárias, corroborada depois pelo Ministério de
Educação e Saúde, cabendo a Presidente da República estipular a quantia subsidiada.
Em 1932, mais um serviço social federal foi implantado na capital da
República, e novamente especializado na atenção à infância abandonada. O Decreto nº
21 518 regulamentou o funcionamento desse novo serviço – Instituto Sete de Setembro
–, um abrigo provisório de crianças que aguardavam a decisão judicial por um
“conveniente destino”. Excepcional e provisoriamente, podia abrigar menores
delinqüentes, somente para cumprir alguns ritos como a observação médico-psicológica,
a realização de exames pedagógicos, identificação pessoal (fotos, cadastramento).
Impressiona o nível de detalhamento contido nesse Decreto quanto aos ritos e fluxos de
trabalho, procedimentos de recepção das crianças, sanções, funções do quadro de
pessoal, enfim, um conjunto de cento e dezesseis artigos, assinados pelo Chefe do
Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil – Getúlio Vargas –
para um único serviço social. O detalhe é que era mais uma iniciativa governamental na
provisão direta de um serviço, principalmente porque se destinava à infância desvalida.
unificação do sistema previdenciário vincularam a assistência social em seu escopo, porém restrita ao
círculo dos segurados.
41
Termos de uso recorrente na época.
49
49
A Constituição de 1934 estabeleceu, no Artigo 138, a incumbência da União,
estados e municípios de assegurarem o amparo aos desvalidos, à infância e à
maternidade, de socorrerem as famílias de prole numerosa, de adotarem medidas para
restringir a mortalidade e morbidade infantil, de protegerem a juventude e cuidarem da
higiene mental. Essa é a primeira menção de atenção à pobreza na condição de
desvalido, “(...) de não-válido, claro que aos olhos da submissão à lógica do trabalho,
precedente à da ética da dignidade humana ou da cidadania” (Sposati, 1994:13).
Apesar de definir a atribuição estatal, não ficaram esclarecidas as
competências na relação entre os serviços públicos e privados (Sposati, 1988:114),
tampouco entre as três esferas governamentais, o que ficou para definição posterior em
leis próprias, portanto, uma definição eclipsada do ponto de vista republicano.
Em 1937 e às vésperas das eleições presidenciais disputadas por José
Américo de Almeida e Armando de Salles Oliveira (governador de São Paulo que se
afastara para entrar na disputa eleitoral), o presidente Getúlio Vargas deu um golpe de
Estado, devidamente apoiado pelos chefes militares. Suspendeu as eleições, fechou o
Congresso Nacional e os partidos políticos, impôs ao país uma nova Constituição, de
caráter nitidamente ditatorial e parcialmente inspirada nos modelos nazi-fascistas
42
de
governos europeus de então. Foi o começo da ditadura civil do Estado Novo, que
perdurará até 1945.
Em 1941, ocorreu uma inovação na esfera federal que rompe a tradição de
instalar/incentivar serviços sociais esparsos: ocorre a institucionalidade da assistência à
criança e adolescente no corpo do Estado Nacional. O Decreto-lei nº 3799 transformou
o Instituto Sete de Setembro em um Serviço de Assistência ao Menor – SAM –,
vinculado ao Ministério da Justiça e Negócios do Interior com a finalidade de:
y sistematizar e orientar os serviços de assistência a menores desvalidos e
delinqüentes, internados em estabelecimentos oficiais e particulares;
y estudar as causas do abandono e da delinqüência, para orientação dos
poderes públicos;
42
A Constituição de 1937 foi apelidada de “Polaca”.
50
50
y promover a publicação periódica dos resultados das pesquisas.
Ainda não estava claro se havia a intenção desse serviço
43
gestor de uma
área estatal alcançar outros territórios da Nação. Contudo, representava o início da
organização técnica e administrativa de uma parcela da área da assistência social, ainda
que sob o âmbito da Justiça.
É forte, na época, a presença de instituições para crianças e adolescentes.
Sposati (1988:115) menciona dois campos na filantropia, na primeira metade do século
XX no país: a assistência médico-hospitalar e o atendimento à criança que, em asilos e
hospitais filantrópicos, atendem (...) às vicissitudes de suas vidas, distante do plano de
configurá-los como parte de uma deliberada política pública. Além do mais, a idéia
predominante não era pela proteção integral e universal à infância e adolescência, por
parte do Estado: a pressão maior era pela responsabilização pública pelo segmento
social pauperizado, sob a alcunha do enjeitado, órfão, abandonado, delinqüente. A idéia
subjacente era pela formação disciplinadora e forjadora do futuro trabalhador, antítese
do pária e sinônimo do combate ao suposto binômio pobreza-desordem social. Por outro
lado, a responsabilização pública não significava que a estruturação de serviços se daria
somente pelo ente estatal – como a instalação de reformatórios, orfanatos – mas,
principalmente significava institucionalizar, no corpo do Estado, a prática do auxílio e
subvenção às obras sociais para que, essas sim, prosseguissem na sua missão
benemerente.
Era 1942. O Brasil apresentou sua declaração de guerra às potências do Eixo
que combatiam na Segunda Guerra Mundial, e o governo federal determinou a
mobilização geral das Forças Armadas brasileiras. Foi preciso acionar uma infra-
estrutura capaz de oferecer suporte interno ao esforço nacional para a mobilização de
grandes contingentes militares e sua manutenção operacional. Esse esforço desencadeou
campanhas de arrecadação de fundos e movimentos populares de apoio: aí nasceu a
Legião Brasileira de Assistência-a LBA
44
.
43
O SAM incorporou outros serviços sociais como a Escola Quinze de Novembro, Escola João Luiz
Alves, Patronato Agrícola Artur Bernardes, Patronato Agrícola Venceslau Braz.
44
Decreto-lei nº 4830 de 15/10/1942.
51
51
Sob o comando da primeira-dama do país, Darcy Sarmanho Vargas, e apoio
da Federação das Associações Comerciais e da Confederação Nacional das Indústrias,
estendeu uma de suas principais finalidades – proteção e assistência à maternidade e à
infância – para o amparo total às famílias dos convocados de guerra, dado o estado de
emergência da época.
Assim, coordenou e levou adiante várias iniciativas de caráter campanhista.
A LBA criou o Corpo de Defesa Passiva (curso de formação de voluntários) para
treinamento da população civil; desenvolveu a Campanha de Apoio às Forças Armadas,
como estratégia de ligação entre a população e as tropas que lutavam na Itália,
coordenando os Centros de Diversões e Cantinas do Combatente (campanha de diversão
nas cantinas, hospitais e centros militares), os Clubes de Madrinha do Expedicionário,
os serviços de correspondência postal para o front, as campanhas de cigarros
45
,
campanha do agasalho para o pracinha, campanhas de presentes durante o Natal e a
edição do Boletim da LBA, com notícias do Brasil para os soldados combatentes.
Patrocinou a Campanha da Vitória, a fim de arrecadar a doação popular de matérias-
primas necessárias à indústria de guerra, como borracha, ferro-velho, vidro e papel.
Criou, também, a Campanha de Hortas e Clubes Agrícolas, com o apoio do Ministério
da Agricultura, como estratégia facilitadora da produção e consumo local de alimentos,
uma vez que o transporte ferroviário concentrava o deslocamento de tropas e material
bélico e as vias marítimas sofriam o bloqueio naval
46
.
Finda a Segunda Guerra Mundial, a LBA retomou suas finalidades
inaugurais em 1946, sob o lastro da ação voluntária e do espraiamento da ação primeiro-
damista nas esferas estaduais e municipais. Cabe destacar a diversidade de propósitos
contida em seus objetivos inaugurais: prestar assistência social diretamente ou em
colaboração com o poder público e as instituições privadas, tendo em vista:
y prestar assistência médica em todas as modalidades às pessoas
necessitadas;
45
A fotografia do anexo 10b ilustra o momento de distribuição de cigarros e presentes aos combatentes.
46
Fonte: Boletim Fundação LBA nº 2 Ano XXVII 1971:2.
52
52
y favorecer o reajustamento das pessoas, moral ou economicamente
desajustadas;
y contribuir para a melhoria da saúde do povo brasileiro, atendendo
particularmente ao problema alimentar e de habitação;
y incentivar a educação popular, inclusive cooperando na criação e
desenvolvimento de escolas, bibliotecas e outras instituições educativas;
y desenvolver esforços em favor do levantamento do nível de vida dos
trabalhadores e promover o aproveitamento racional do lazer, principalmente
estimulando a organização de centros de recreação e cultura, além de realizar inquéritos,
pesquisas e estudos sobre matérias destinadas ao progresso do serviço social no Brasil.
Portanto, a LBA surge plena de representações: protagoniza a primeira
campanha assistencialista de âmbito nacional, materializa a maternagem desejável na
proteção da família brasileira que, em um momento emergencial, busca a coalizão da
solidariedade aos filhos da Nação que servem à Pátria, conduzida no seio da família do
governante do país. O suposto despojamento da vida privada rompe barreiras da esfera
doméstica para se colocar a serviço do interesse maior na esfera pública que, mesmo
após o fim da guerra, avança no cultivo do suposto solidarismo despojado: crava no
fulcro do pensamento dominante a aliança entre a assistência social e o primeiro-
damismo, que necessita do combustível da ação voluntária, do compartilhamento da
bondade alheia para a missão de atender aos mais pobres. Juntos, cristalizam o
arquétipo da mulher dócil que entra na esfera pública para interagir com a cumplicidade
alheia, sensibilizados com a condição pauperizada da massa popular. Esse é o lugar
reservado e cativo da mulher na política, que se enternece na compaixão pelos
segmentos sociais desfavorecidos. Arquétipo que rasga a evolução da história, ignora as
mudanças sócioculturais por décadas, comparece em outras realidades estrangeiras e
perdura até a atualidade: o lugar privilegiado do protagonismo político dessa mulher é
no campo da assistência social, localizado nos limites da fronteira entre as esferas
privada e pública. Presa do imaginário, arquétipo de gênero do inconsciente coletivo,
impulsiona governos estaduais
47
a manter espaços para o bem fazer feminino,
47
A gestão inaugural de uma mulher no Rio Grande do Sul, em 2007 (Governo Yeda Crusius) mantém
esse lócus, com a criação do Comitê de Ação Solidária, de cunho campanhista (Campanha do Agasalho,
53
53
atualmente, mantida a condução voluntária. Note-se que essa modalidade de parentes no
poder é naturalizada pela sociedade, assentada na noção - quase monárquica - do poder
como propriedade dos pares genéticos; portanto, as críticas ao nepotismo não a
alcançam.
A despojada ação feminina garante seu lugar, quase sacralizada em um altar
atípico do lugar comum da administração pública, varrido por sucessivas denúncias de
corrupção sobre os imbricamentos do interesse privado com o público. Pode-se dizer, a
essa altura e salvo exceções
48
, que a pureza da esfera pública supostamente tem sexo.
Essa construção guardava, ainda, o ausente compromisso do dever
institucional do Estado, acobertado como ação de primeira-dama, figura dúbia enquanto
Estado e não-Estado, já que suas relações e presença se dão pelo campo privado das
relações familiares e não pelo campo público.
Além disso, esse marco histórico ainda não foi alusivo às relações
federalistas necessárias para uma iniciativa que envolvesse a União, os Estados e os
Municípios, mesmo que tenha estimulado que primeiras-damas de Estados e Municípios
organizassem sua ação social.
Portanto, nas quatro décadas iniciais do século 20, a exigência pelo controle
governamental sobre as manifestações da desigualdade social recaía na assistência
infantil pública e privada subsidiada. Esse parece ser o determinante comum a estados
federados brasileiros como São Paulo - criou em 1902 o Instituto Disciplinar e Colônia
Correcional-, ao Rio Grande do Sul (1945) e ao Paraná (1947).
1.2 Panorama do Estado de São Paulo
Abordar especificamente o caso de São Paulo significa analisar o primeiro
momento em que uma parte do Estado Republicano desenvolve uma responsabilidade
indireta pela assistência social. A exemplo do governo federal, as primeiras iniciativas
por exemplo), comandado pela filha da governadora. O mesmo ocorrera na primeira gestão da atual
governadora do Rio Grande do Norte (Governos Wilma de Faria).
48
O governo Collor de Mello (1989-1992) teve à frente da LBA sua esposa, Rosane Collor, que
despontou como um dos baluartes na malversação do dinheiro público e favorecimento ilícito de parentes
para seu alcance, próprio dessa gestão federal, interrompida pelo impeachment exigido pela Nação.
54
54
acontecem sob a perspectiva da atenção à infância e adolescência em situação de
abandono e de conflito com a lei, em 1902, distante, portanto, da inscrição no aparelho
do estado regional de um órgão central
49
regulador, organizador e provedor de outros
serviços sociais.
A participação relevante da economia regional no cenário do país
experimentava forte crescimento, principalmente a partir do final do século 19, com a
expansão da cafeicultura e depois, no século 20, como pólo dinamizador do processo de
industrialização brasileiro. É na transição dos séculos que ocorreram transformações
profundas no perfil demográfico regional, motivadas por dois fatores básicos: a extinção
da escravidão e a necessidade de atender o acelerado crescimento da cafeicultura, a
partir da segunda metade do século 19, o que resultou em um significativo contingente
de imigrantes vindos para o Estado (Baeninger & Bassanezi, 2006). Entre 1887 e 1900,
entraram cerca de 910 mil estrangeiros, principalmente italianos, espanhóis e
portugueses, que correspondiam a 21% da população total paulista em 1900. Muito
embora esse movimento migratório tenha ocorrido para fornecer a mão-de-obra
necessária à lavoura, gradativamente foram se concentrando na capital do estado
50
.
A tendência de participação estrangeira no perfil populacional experimentou
declínio a partir de 1920, quando os movimentos migratórios internos com destino a
São Paulo começaram a ganhar presença e exponência a partir da década de 30
51
.
A composição da classe operária no Estado era integrada, inicialmente,
pelos trabalhadores imigrantes e seus descendentes, portadores de conhecimento técnico
que não existia, ainda, no país. Ademais, os processos de industrialização e urbanização
provocaram também mudanças na forma de organização do trabalho, nas relações rural-
49
Em 1934 é implantado o Serviço de Reeducação do Menor, com o objetivo de fiscalizar e promover a
orientação pedagógica e administrativa dos Institutos Disciplinares no Estado. Em seguida, é criado em
1935 o primeiro órgão gestor da área da assistência social, o Departamento de Assistência Social.
50
Em 1920 correspondiam a 24.7% da população paulistana, chegando a 37,5% em 1940.
51
A suspensão da subvenção federal à imigração, entre 1927 e 1935, encontrou sua contrapartida na
estratégia adotada no estado de São Paulo, com o objetivo de aumentar o número de trabalhadores na
lavoura. Com o apoio de subvenção do governo estadual, quatro sociedades privadas assumiram o
recrutamento, transporte, alimentação e instalação dos trabalhadores de outros estados da federação que,
inicialmente, ficavam nos denominados campos de concentração, antes de sua partida para as fazendas.
Em 1935, já haviam introduzido 50mil trabalhadores no estado (Carone, 1974).
55
55
urbanas, logo no início do século 20, e o agravamento das demandas sociais que
exigiam presença estatal efetiva.
Nos anos 90 do século 19, já era discutida e debatida a necessidade de criar
uma instituição que fizesse valer o Código Penal da República, cuja função seria atender
crianças e adolescentes nomeadas como vadios, ociosos e abandonados, na capital do
estado. Em 1893, o Presidente do Estado, Dr. Bernardino de Campos
52
, encaminhou ao
Congresso Constituinte
53
uma mensagem aos senadores e deputados estaduais
chamando sua atenção quanto a essa questão. Como resposta, o Senador Paulo Egídio
Oliveira Carvalho apresentou um Projeto de Lei propondo a criação do “Asylo
Industrial de São Paulo”, que atenderia aqueles até 14 anos de idade - mendicantes,
abandonados, criminosos e filhas de pais viciados. Sem êxito, esse Projeto de Lei é
retirado e, na seqüência, o Deputado Dr. Cândido Nanzianzeno Nogueira da Motta tece
críticas à deplorável situação dos jovens infratores que eram recolhidos na Penitenciária
do Estado e em cadeias públicas, propondo a criação de instituições especializadas. Em
1900, esse deputado apresenta um Projeto de Lei propositor da criação do Instituto
Educativo Paulista, para reeducação dos desvalidos (entre 9 e 21 anos), por meio da
instrução literária, industrial e agrícola.
Em 10 de outubro de 1902, foi promulgada a Lei nº 844 pelo Presidente do
Estado, Dr. Bernardino de Campos, criando o Instituto Disciplinar e a Colônia
Correcional na Chácara do Belém, mesmo local que futuramente sediou o Complexo do
Tatuapé da FEBEM. Esse processo de criação do primeiro serviço social governamental
paulista já reunia diferenças entre a proposta original do Deputado Cândido Motta e
52
BERNARDINO JOSÉ DE CAMPOS JÚNIOR (1841-1915). SEGUNDO E SEXTO PRESIDENTE
Período de governo: 8/1892 –4/1896; 7/1902 –5/1904. Mineiro, nasceu na cidade de Pouso Alegre no ano
de 1841. Formou-se em Direito em 1863, pela Faculdade do Largo de São Francisco. Foi jornalista e
lutou pelo abolicionismo. Fundador do Partido Republicano Paulista – PRP, foi deputado provincial
(1888/1889), chefe de polícia (1889/1890), deputado constituinte e deputado federal (1891/1892),
presidindo a Câmara dos Deputados. Em 1892 iniciou seu primeiro mandato enfrentando a revolução dos
federalistas, enviando socorros para a cidade paranaense da Lapa, que se encontrava sitiada, e destacando
forças para vários pontos do litoral. Entre o primeiro e o segundo governo de São Paulo foi Ministro da
Fazenda (1896/1898) e Senador da República. No segundo mandato, iniciado em 1902, desenvolveu um
novo plano de saneamento do porto de Santos, pois novamente ocorria um surto de febre amarela.
Inaugurou o Museu do Ipiranga e melhorou o abastecimento de água na Capital. Prosseguiu sua carreira
política como senador estadual entre 1903 e 1915. Apoiou a campanha civilista pró Rui Barbosa para as
eleições à Presidência da República. Recebeu o título de General Honorário do Exército Brasileiro.
Faleceu em São Paulo no ano de 1915. Alguns anos depois seu filho, Carlos de Campos, também chefiou
o executivo paulista.
53
No período de 1891 a 1930, todos os Parlamentos regionais do país foram bicamerais (Congresso
Legislativo), constituídos por Senado e Câmara de Deputados.
56
56
aquela contida no ato de criação do Instituto Disciplinar: de caráter educativo, técnico e
humanista assumia uma feição correcional, punitiva e repressiva como linha
recuperadora da infância e juventude desvalida, respectivamente.
O Instituto Disciplinar
54
foi, então, estruturado sob a tríade da disciplina,
hierarquia e trabalho, constituída como a diretriz organizativa de seu funcionamento e
instrumento regenerador dos meninos que lá eram internados. Fazia parte da disciplina o
domínio do corpo dos internos, imposto por meio de uma postura física uniforme, quer
seja nas aulas de educação física, que recebiam de componentes da Força Pública, na
marcha interna para qualquer deslocamento dos meninos, quer seja na postura de
descanso cabisbaixa e de mãos cruzadas atrás, quando se encontravam na presença de
adultos. O ócio não era visto com bons olhos, tampouco nos finais de semana e férias, o
que fez do trabalho um componente de qualquer atividade diária, desde os afazeres de
manutenção do Instituto, passando pelo trabalho agrícola – foi a atividade predominante
até 1911, quando a implantação de oficinas industriais nesse ano orientou-os a
fabricarem artigos para a Força Pública. A partir de 1913, outras oficinas foram
introduzidas, como as de mecânica, sapataria, marcenaria, encanador. Em contrapartida,
havia a geração de receitas com o excedente da produção agrícola e industrial: a venda
dos produtos gerava uma receita que era incorporada no orçamento do Instituto e, por
sua vez, os recursos oriundos do trabalho executado pelos meninos constituíam um
pecúlio utilizado quando saíam do estabelecimento correcional.
Os trabalhos lá desenvolvidos foram objeto de vários pronunciamentos dos
presidentes de Estado, de matéria jornalística, e valorizados pela sociedade da época.
Em 1909, o Governador do Estado
55
promulgou a Lei nº 1192, que
estabeleceu convênios do governo estadual com as instituições particulares para ampliar
54
Subordinado, inauguralmente, à Secretaria do Interior e da Justiça, depois transformada em Secretaria
de Justiça e Segurança Pública. As fotos anexas (23 a1, a2, a3 e a4) ilustram suas dependências,
conservadas parcialmente ainda hoje, com destaque à estátua erguida logo na entrada, que representava
um menino devidamente uniformizado e pronto para enfrentar a vida, a partir das virtudes da disciplina-
hierarquia-trabalho inculcadas e aprendidas em sua passagem pelo Instituto.
55
MANOEL JOAQUIM DE ALBUQUERQUE LINS (1852-1926) OITAVO PRESIDENTE Período de
governo: 05/1908 - 05/1912 Alagoano, de São Miguel dos Campos, formou-se em Direito pela Faculdade
do Recife, na turma de 1877. Nos últimos anos do Império foi deputado provincial (1888/1889) e, em
1889, Presidente da Província do Rio Grande do Norte. Já em São Paulo, foi vereador da Câmara
Municipal (1899-1901), presidindo-a nesse período. Torna-se senador do Estado em 1901, permanecendo
no cargo até 1904. Depois de ocupar a Secretaria da Fazenda e do Tesouro do Estado (1904/1907)
exerceu mandato como presidente do Estado durante o período de 1908 a 1912. Graças aos preços
57
57
a assistência às crianças e adolescentes de todo o estado, extensiva às meninas. Pela
primeira vez, o Instituto Disciplinar abriu-se para um público externo em 1915, quando
lá foi implantada a Escola Preliminar Operária Noturna, admitindo adolescentes de
ambos os sexos e filhos de famílias operárias e/ou necessitadas desse tipo de apoio
oficial.
Em 1924, sob o comando de Washington Luiz
56
, foi criado o Juízo Privativo
de Menores da Comarca da capital, especificamente concebido para assistência e
proteção dos desvalidos e delinqüentes, portanto, um ano depois da iniciativa do
Distrito Federal. Da mesma forma, foi instituído o Conselho de Assistência e Proteção
ao Menor, em 1925, semelhante àquele instalado no Distrito Federal em 1923.
A Roda dos expostos permaneceu funcionando até o Código de Menores
extingui-la em 1927, no caso da cidade de São Paulo. Mais ainda, o controle das amas-
de-leite foi assumido pela Prefeitura de 1892 até 1904, quando passou para o nível
estadual, e mais tarde, é possível que tenha sido absorvido pela ação dos Centros de
Saúde, criados em 1925 no Serviço Sanitário do Estado (Sposati, 1988:76-77).
Foi cimentada, assim, a apartação e estratificação social desse subgrupo de
menores de idade, dotando-os de um aparelhamento estatal primoroso para sua
vigilância, controle e reforma de possíveis desvios de conduta.
favoráveis do café no mercado internacional conseguiu despontar como um dos maiores presidentes do
Estado, construindo edifícios, expandindo o sistema de armazenamento da rede escolar, criando o ensino
técnico agrícola e a Diretoria Geral de Instrução Pública, em substituição à Inspetoria do Ensino. Deu
continuidade à construção do Instituto Butantã, iniciou a do Hospital de Isolamento de Santos e deixou o
estado com grande superávit financeiro. Depois disso, ainda foi senador estadual por três mandatos:
1913/1916, 1916/1922 e 1922/1926. Faleceu na cidade de São Paulo em 1926.
56
WASHINGTON LUÍS PEREIRA DE SOUSA (1869-1957) DÉCIMO-PRIMEIRO PRESIDENTE
Período de governo: 5/20 - 5/24 Fluminense, da cidade de Macaé, formou-se em Direito, em 1891, pela
Faculdade do Largo de São Francisco. Iniciou sua vida pública na cidade de Batatais, interior de São
Paulo, como vereador e presidente da Câmara (1897/1898). Acabou se tornando intendente (prefeito) de
Batatais, nos anos de 1898 e 1899. Sua carreira dirigiu-se, em seguida, para a assembléia estadual, sendo
deputado entre 1904 e 1914. Durante o governo de Rodrigues Alves foi líder da Maioria, na Câmara
estadual. De 1914 a 1919, durante a Primeira Guerra Mundial, foi prefeito do município de São Paulo. Só
então se tornou presidente de São Paulo, no ano de 1920. Foi senador da República (1925/1926) e, em
seguida, Presidente da República, destituído pela Revolução de 30, quase ao final do mandato
(1926/1930). Foi o consolidador da Estrada de Ferro Sorocabana, tendo também eletrificado a Estrada de
Ferro de Campos do Jordão. Construiu 1.326 quilômetros de estradas de rodagem. Seu lema era
“Governar é abrir estradas”. Cuidou ainda da navegação fluvial e enfrentou a pressão dos produtores
quando sobreveio nova queda nos preços internacionais do café. Faleceu na cidade de São Paulo no ano
de 1957.
58
58
Outra intervenção posterior encerra o ciclo de mais de trinta anos de
unidirecionalidade da infância e adolescência empobrecida/infratora na
responsabilização governamental paulista: a criação do Serviço de Reeducação do
Menor, por meio do decreto 6476/1934, com o objetivo de reorganizar e normatizar os
serviços governamentais e não-governamentais do segmento infanto-juvenil, além de
enfatizar a necessidade de reformulação dos Institutos Disciplinares estaduais. A
reorganização do Instituto Disciplinar de São Paulo visou a suprimir seu caráter
punitivo e repressor, substituindo-o por uma matriz pedagógica–protetiva, mudança essa
inspirada no recém-implantado Código de Menores, e já sob a interventoria federal no
estado, decorrente do novo Governo Provisório de Vargas, sob o comando de Armando
de Salles Oliveira
57
. Essa medida alcançou outros Institutos Disciplinares existentes –
de Mogi Mirim e Taubaté.
Cabe destacar que o Dr. Cândido Motta Filho assumiu o comando desse
Serviço de Reeducação: filho do deputado Cândido Motta - propositor do embrião do
Instituto Disciplinar – e deputado estadual constituinte, assumiu também a relatoria do
Projeto de Lei que criou o primeiro órgão gestor da assistência social pública do Estado
de São Paulo – Departamento de Assistência Social –, criado em 1935. Antes disso,
ainda em 1935, Cândido Motta Filho assumiu a direção do Reformatório Modelo, nova
designação dada à época ao Instituto Disciplinar.
57
ARMANDO DE SALLES OLIVEIRA (1887-1945). SÉTIMO INTERVENTOR E PRIMEIRO
GOVERNADOR CIVIL DO 1º PERÍODO CONSTITUCIONAL Período de governo: 8/33 - 12/36.
Natural de São Paulo, cursou engenharia civil na Escola Politécnica de São Paulo e se tornou empresário,
atuando no ramo das usinas hidrelétricas, no interior do Estado. Foi diretor da Companhia Mogiana de
Estrada de Ferro. Em decorrência dessas atividades e de seu envolvimento com a modernização do país,
foi fundador e presidente do Instituto de Organização Racional do Trabalho – IDORT, em 1931. Atuou
como revolucionário do movimento de 1932 em São Paulo. No mesmo ano foi diretor do jornal O Estado
de São Paulo. Entre 1933 e 1935 foi Interventor Federal. Seu nome está associado à criação de uma das
maiores universidades do país, a Universidade de São Paulo - USP, criada por ele em 1934. Foi nomeado
7º Interventor de São Paulo no dia 17.08.1933, tornando-se, no dia 11/4/35, o 1º Governador do período
Constitucional, cargo do qual se afastou dia 29/12/ 36 para concorrer à Presidência da República,
acreditando que Getúlio Vargas não impediria a realização das eleições. Com o golpe de Estado de 1937
foi preso e acabou exilado do País, só retornando em 1945, pobre e doente. Nesse mesmo ano foi
fundador e membro da União Democrática Nacional – UDN, falecendo em São Paulo meses depois.
Disponível em http://www.galeriadosgovernadores.sp.gov.br/03galeria/galeria.htm#16
59
59
O deputado estadual Motta Filho interveio no Parlamento para abordar a
necessidade de constituir um campo próprio da assistência social, mesclada à noção
sinônima de solidariedade, na 16ª sessão da Assembléia Constituinte de 1935, em 3 de
maio (São Paulo, Assembléia Legislativa, Annaes da Assembléia Constituinte de 1935:
139-141). Referenciou sua exposição partindo da Constituição Federal de 1934,
afirmando que ela
deu-nos regras jurídicas de solidariedade social em alguns de seus
títulos e principalmente quando estabelece, no seu Artigo 138, que
incumbe à União, aos Estados e aos Municípios assegurar amparo aos
desvalidos, criando serviços especializados e animando os serviços
sociais cuja orientação procurarão coordenar. Trata-se, Sr.Presidente,
de uma inovação em nosso direito público e que proveio da invasão do
elemento social nos velhos quadros jurídicos (...)
Em todos os tempos houve, Sr. Presidente, em maior ou menor
intensidade, esse desejo de amparar-se pelos Estados os elementos
desmerecidos e infelicitados na luta social (...)
(...) Nomeado pelo benemérito Governo do Estado para dirigir o
Serviço de Reeducação, vi de perto como se impunha a ação social do
Estado. Percorrendo as grandes cidades, conversando com os juízes de
menores, visitando abrigos e escolas, observando as oficinas,
verifiquei a existência de focos anti-sociais. O esforço da
administração paulista neste sentido não desmente até hoje as
tradições da terra e da raça. Prestigiado pelo patriotismo do Sr.
interventor federal, conseguimos efetuar nesse terreno uma grande
sondagem e vimos da necessidade de uma política social, amparada
definitivamente pelo estado. A assistência social tem tido agora seu
trabalho redobrado, porque o futuro é incerto. O governo age por
todos os meios a seu alcance. Falta-lhe, porém, uma regra geral para
ampará-lo e animá-lo (...)
Os grandes centros alimentam a existência de inúmeras formas de
vícios e de perdições sociais e morais, fazem crescer todos os dias o
número dos miseráveis, dos criminosos, dos pervertidos,
depauperados, revoltados. Não exagero. No Reformatório que
procurei dirigir, numa pequena comunidade de trabalho, procurei usar
de todos estímulos para a revelação do caráter dos alunos internados e
encontrei a denúncia da possibilidade da ferida social, quando
constatei que 80% dos menores eram abandonados e retardados
pedagógicos.
É a mutilação da família pobre, é a ameaça de morte da família do
operário, é a possibilidade da anarquia moral e da revolta contra a
imprevidência dos homens. Lares desfeitos por moléstias contagiosas,
pela sífilis, pela tuberculose, pelo álcool: lares separados pelo excesso
de luta pela vida, separando os casais (...)
(...) A Constituição traduz um estado de consciência, retrata um
momento histórico de uma civilização. Ela abre caminhos para os
bons governos e os fecha para os maus (...)
Haverá matéria mais constitucional que essa que afirma a
solidariedade entre os homens? Que seja, portanto, a nossa
Constituição, além de uma grande obra paulista, além de uma obra de
colaboração nacional, uma obra profundamente humana, trazendo, na
60
60
lógica impassível dos textos, a palpitação de sentimentos e emoções
superiores.
Outra importante atuação para a configuração da assistência social no
âmbito da responsabilização pública foi a participação do deputado estadual Dr.
Pacheco e Silva
58
na Assembléia Constituinte de 1935 e também como membro da
Comissão nomeada pelo Secretário da Justiça e Negócios do Interior, Sylvio Portugal,
encarregada de esboçar a primeira proposta de criação do Departamento de Assistência
Social do Estado de São Paulo, encaminhada à apreciação da Assembléia Legislativa
em 7 de dezembro de 1935, pelo Governador Armando de Salles Oliveira.
O deputado Dr. Pacheco e Silva pronunciou-se na 48ª sessão ordinária da
Assembléia Constituinte, versando sobre os problemas sociais. Com prudência,
menciona também o Artigo 138 da Constituição Federal de 1934, dando destaque aos
princípios gerais e à obrigatoriedade não só da União como dos Estados e até dos
Municípios de acudir aos que necessitam de amparo e instrução. Aponta que
resta-nos não só desenvolver as diretrizes já delineadas como ainda
delimitar as atribuições do Estado e as dos Municípios e sobretudo a
forma pela qual, em ação concorrente, poderão outros poderes se
harmonizar entre si e ainda com a iniciativa particular, cujo concurso
inestimável jamais poderá ser menosprezado quando se quer atuar no
campo social.
O problema é vastíssimo e complexo. Estudando esta questão à luz do
que se tem feito nos países da Europa, sobretudo depois da grande
guerra, em que os problemas tomaram vulto excepcional,
verificaremos que as conclusões em toda parte foram mais ou menos
idênticas.
Antes de tudo é preciso proceder à investigação cuidadosa com o
objetivo de se apurar as origens dos males sociais (São Paulo,
Assembléia Legislativa. Annaes da Assembléia Constituinte de
1935. Volume 1: 645).
Por sua vez, a Constituição do Estado de São Paulo de 1935 mencionou,
pela primeira vez, a assistência social. Nas Constituições anteriores
59
, havia a referência
58
Médico psiquiatra, Pacheco e Silva ministrou a cadeira de Serviços Sociais na Escola de Sociologia e
Política, em 1936, apontando a necessidade de dotar o trabalho social de racionalidade, para superar a
atuação leiga prevalente na época.
59
As Constituições estaduais republicanas somam 12, no período compreendido entre 1890 e 1989. Logo
na primeira (1890), há um veto expresso de relação do Governo do Estado com qualquer culto ou Igreja
para receber subvenção oficial ou para manter relação de dependência ou aliança. Pode-se dizer que essa
é uma manifestação inaugural de uma tendência da Primeira República, na qual o Estado central não se
relacionava com a Igreja Católica. O que existia de iniciativa na área da assistência era executada pela
Igreja, e o Estado considerava que o social não era função pública (Mestriner, 2001).
Há dois destaques na Constituição Estadual de 1891:
61
61
à assistência pública, conceito mais próximo da responsabilização estatal pelas
demandas sociais oriundas da desigualdade social. Essa Constituição reorganizou o
Poder Executivo, exercido a partir de então pelo Governador do Estado, além de
reconhecer que o Poder Legislativo era a Assembléia Legislativa, constituída por
deputados do povo e deputados das organizações profissionais. Dentre as atribuições do
Poder Legislativo, previu a capacidade de legislar, complementar ou supletivamente
sobre “... direito rural, regime penitenciário, assistência social, assistência judiciária e
estatística...” (Seção II, 21, b).
Além disso, uma seção específica regulou o campo de abrangência da
Assistência Social, disposto da seguinte forma:
TITULO V - DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
Art. 79 - Cabe ao Estado e aos Municípios coordenar e assegurar os
serviços sociais, criando os necessários departamentos
especializados,com o fim de:
a) promover o amparo aos desvalidos;
b) estimular a educação eugênica;
c) amparar a maternidade e a infância;
d) socorrer as famílias de prole numerosa;
e) proteger a juventude contra toda exploração, ou o abandono físico,
moral e intelectual;
f) restringir a mortalidade e a morbidade infantis;
g) impedir a propagação de doenças transmissíveis;
h) cuidar da higiene mental e incentivar a luta contra os venenos
sociais;
i) prestar socorros públicos de urgência;
j) animar a iniciativa particular, nas matérias acima referidas.
Art. 80 - O Estado e os Municípios destinarão um por cento, das
respectivas rendas tributárias, para o amparo à maternidade e à
infância.
· veda o direito político ao voto para os mendigos e analfabetos (artigo 59), a mesma medida adotada pela
primeira Constituição Federal de 1891 (artigo 70 § 1) o que, por sua vez, é um legado da Constituição
Imperial de 1824 (Sposati, 1985);
·pela primeira vez, indica um lócus social autorizado a receber subvenção do ente público regional.
Dentre as competências do Congresso paulista, previa legislar sobre ensino primário, secundário, superior
e profissional, sendo que, à exceção do ensino primário, os outros podiam ser ministrados por indivíduos
ou associações, subvencionados ou não pelo Estado (artigo 20, 11º).
As Cartas Magnas de 1905, 1908, 1911, 1921 e 1929 reiteram que a Constituição reconhece e assegura a
nacionais e estrangeiros os direitos de igualdade, liberdade, segurança e propriedades, com exceção ao
alistamento como eleitores aos mendigos, analfabetos e religiosos.
Trata-se de uma medida que explicita o entendimento do Estado de que a sociedade era composta por
cidadãos e não-cidadãos, proporcional à capacidade de aquisição de conhecimento (educação) que
credenciasse o indivíduo ao discernimento do voto. De forma particular, o mendigo era tido como
portador de múltiplas incapacidades, desde o trabalho, a renda e a instrução. Enfim, reitera a ótica do
despossuído, necessitado, o não-portador de direitos.
62
62
É significativa a associação da assistência social à saúde, apesar de não estar
explicitada essa relação na denominação do capítulo constitucional. A diminuição da
mortalidade e morbidade infantis, a prevenção de propagação de doenças transmissíveis
e os cuidados com a higiene mental certamente correspondem ao campo da saúde. Por
outro lado, essa associação reflete o modelo médico-social na condução das respostas
possíveis aos problemas sociais da época, sob a prevalência dos higienismo e assepsia
social, o que alcança até a eugenia. Não à toa, uma das funções conferidas à assistência
social dizia respeito ao estímulo à educação eugênica, claramente de orientação nazi-
fascista, o que, em outras palavras, se reporta à “... [eugenia é...] o estudo das condições
mais propícias à reprodução e melhora da raça humana...” (Aurélio, 2004).
Por outro lado, essa constituição determinou a competência compartilhada
entre Estado e Municípios de coordenar e garantir os serviços sociais, conferindo a
necessária institucionalidade para tanto. Pela primeira vez, oficializou o pacto
republicano dos governos sub-nacionais como requisito à efetividade da assistência
social pública, ao mesmo tempo em que dividiu as incumbências trazidas por esse novo
marco constitucional com as iniciativas particulares – senha para aprovação do auxílio e
subvenção à iniciativa benemerente.
Trouxe, ainda, a noção do amparo e socorro aos grupos sociais fragilizados,
sobretudo ao segmento materno-infantil, reforçado pela vinculação orçamentária (artigo
80): confirma a tendência aprovadora de investir neste subgrupo social, o que vinha se
calcificando por décadas e de larga aceitação nacional.
Em 1935, foi criado o Departamento de Assistência Social subordinado à
Secretaria de Justiça e Negócios do Interior, antecedendo, então, a iniciativa federal de
criar o primeiro órgão oficial em 1942, a Legião Brasileira de Assistência, sob os signos
da condução cativa da primeira-dama da República e da ação voluntária civil.
Em São Paulo, já haviam ocorrido tentativas anteriores de instalação de um
espaço público para a área. Durante a Revolução de 1932
60
, o governador Pedro de
60
As oligarquias regionais exerceram forte influência e domínio sobre o Estado na Primeira República.
Todavia, o governo Vargas centralizava, cada vez mais, decisões políticas, econômicas e regionais, o que
não agradava, e tampouco atendia aos interesses das oligarquias. À burguesia interessava romper também
63
63
Toledo
61
criara o Departamento de Assistência à População Civil, na Secretaria de
Educação e Saúde Pública, porém extinto pelo interventor federal, general Waldomiro
Lima
62
, nesse mesmo ano (Sposati, 1988).
Em 1935, foi promulgado o Decreto nº 7078, que criou o Departamento de
Assistência Social estadual. Esse Decreto regulou a incorporação de serviços que
estavam afetos à extinta Secretaria do Interior, de outros serviços espalhados em áreas
da administração pública, mudando a denominação da Secretaria de Estado dos
Negócios da Justiça para Secretaria de Estado da Justiça e Negócios do Interior.
Nas considerações preliminares, considerava-se que a obra de assistência
social e as medidas referentes à defesa do trabalho e respectiva legislação eram aspectos
fundamentais da atividade, que deviam ser executadas pela Secretaria da Justiça. Deve-
se levar em conta que o Departamento Estadual do Trabalho estava, até então,
subordinado à Secretaria da Agricultura, Indústria e Comércio. De toda forma, já se
com o governo federal, forma pela qual exerceriam influência na esfera regional. Constrói-se o dualismo
entre o Bem e o Mal, o primeiro representado aqui por São Paulo e o segundo pelo resto do Brasil: “..São
Paulo bate-se pela causa constitucionalista para repor o Brasil no regime da lei...manda para as fronteiras
a flor de sua mocidade, as expressões mais nobres de sua inteligência e riqueza...e a ditadura? bate-se para
perpetuar o domínio de um punhado de militares e reduzido grupo de civis. De que maneira? despejando
contra médicos, advogados e outros uma jagunçada colhida nos sertões... ” (in Carone, 1974:87). Apesar
da burguesia lançar argumentos a respeito de sua superioridade, sua história, seus direitos e sua vitória
inconteste, é selado um acordo em 4 de outubro, com o Governo Provisório federal, que põe fim à
Revolução de 1932.
61
PEDRO MANUEL DE TOLEDO (1860-1935) QUARTO INTERVENTOR Período de governo: 3/32 -
10/32. Paulistano de nascimento, formou-se em Direito pela Faculdade de Recife – PE, no ano de
1884.Voltando para São Paulo, foi procurador fiscal da Tesouraria Provincial de São Paulo em 1885 e,
em seguida, delegado e chefe de polícia interino de São Paulo (1889). Foi também comandante interino
da Guarda Nacional, no ano de 1893. Passa então a atuar no poder legislativo, como Deputado Estadual
entre 1895 e 1910. Nesse período foi fundador e membro da Academia Paulista de Letras, sendo titular da
cadeira nº 39. Sua vida pública passa para a área federal, quando ocupa os ministérios da Agricultura
(1910/1913) e da Viação e Obras Públicas (1912). Passa então a ocupar a função de embaixador do
Brasil, na Itália (1914/1917) e na Argentina (1919/1926). Volta para o Brasil e, em 1932, é nomeado
Interventor Federal.Tomou parte ativa no movimento constitucionalista de 1932, sendo Comandante Civil
da Revolução Constitucionalista. Organizou um secretariado desvinculado do Governo Federal. Após o
episódio de 23/05/1932, quando foram mortos os estudantes Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo, cujas
iniciais deram origem ao movimento MMDC, foi aclamado Governador Civil da Revolução de 1932. É
então aclamado governador pelo povo.Após três meses de luta, São Paulo foi derrotado e Pedro de Toledo
deposto, preso e exilado, só retornando ao Brasil em 1934.
62
Encerrado o Movimento Constitucionalista, o então governador General Waldomiro Lima liberou o
jogo nas estâncias balneárias e resolveu aplicar os recursos tributários decorrentes nas obras sociais. Para
tanto, foi criada a Comissão de Assistência Social que deliberava “(...) o que convinha ou não em
assuntos de assistência social “ (idem:111); composta por representantes da aristocracia paulista, era
ligada ao Serviço Sanitário do Estado. Essa comissão foi extinta pelo governador Armando de Salles
Oliveira, concomitante à criação do Departamento de Assistência Social.
64
64
estabelecia, desde então, um vínculo – ainda invisível – entre a assistência social e o
trabalho.
O Artigo 4º do Decreto criou o Departamento de Assistência Social - como
substituto da Comissão de Assistência Social
63
que existia – deixando-o diretamente
subordinado à Secretaria da Justiça e Negócios do Interior. O § 1º menciona que o
Governo fixaria as finalidades, atribuições e organização do Departamento de
Assistência Social por meio de outro decreto, mas esse intento foi alcançado a partir de
um projeto de lei encaminhado à Assembléia Legislativa em dezembro desse mesmo
ano.
Enquanto atribuições de serviços da Secretaria da Justiça e Negócios do
Interior constaram, separadamente, os serviços relativos à assistência social daqueles
destinados aos meninos pervertidos, delinqüentes e abandonados. Assim, desde a gênese
da institucionalidade da assistência social em São Paulo, é mantida a tendência
separatista no trato dessas duas áreas.
Em sete de dezembro de 1935, o Governador Armando de Salles Oliveira
encaminhou mensagem ao Presidente da Assembléia Legislativa, Dr. Laerte Teixeira de
Assumpção, contendo a exposição de motivos a propósito da organização do
Departamento de Assistência Social, criado pelo Decreto nº 7078. No Parlamento
paulista, recebeu o número PL 132/1935.
Consta dos autos deste PL o ofício do Secretário da Justiça, Dr. Sylvio
Portugal, mencionando a Comissão nomeada e seus componentes para “... lançarem as
bases do grande edifício da assistência pública que, estou certo, constituirá, dentro de
pouco tempo, mais um legítimo motivo de orgulho para o Estado...” (PL 132/35:2). Sob
a presidência do Dr. Eduardo de Oliveira Cruz, compuseram-na Plínio Barreto, Antonio
Carlos Pacheco e Silva (já mencionado anteriormente), Cândido Motta Filho (idem),
Vicente Baptista, Joaquim Penino e Pedro Xisto Pereira de Carvalho, “... pessoas todas
elas esclarecidas e perfeitas conhecedoras do assunto”.
63
A hipótese é que essa Comissão fora constituída para preparar as primeiras propostas normativas e
organizativas da área da assistência social estatal, na medida em que não remonta a outro dispositivo legal
anterior.
65
65
As Comissões de Constituição e Justiça e Finanças e Orçamento apreciaram
a proposta, elaborando o primeiro parecer, numerado como 93. Apresentado na Sessão
Ordinária de 9/12/1935 e publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo (E. U. do
Brasil de 10/12/1935:37), reconhecia o cumprimento do Artigo nº 79 da Constituição
Estadual, e atendia, dentro das possibilidades, aos necessários e urgentes reclamos de
São Paulo, expondo que
(...) na verdade, todo o Serviço Social tem sido feito até hoje com
grande sacrifício e com enorme dispersão de esforços. A discordância
das atividades, muitas vezes, concorreram para resultados negativos.
O Departamento, dentro dos limites constitucionais do Estado,
centraliza, coordena e edifica a assistência social. Com ele, haverá
uma consciência social vigilante e atenta e um trabalho de socorro
efetivo.
O projeto traça um grande plano para ser executado, aos poucos, à
medida que aumentem as possibilidades financeiras e, ao mesmo
tempo, facilita a organização pedagógica e científica da assistência
social.
Formando o plano de assistência, atende à formação dos técnicos,
eleva a compreensão coletiva dos deveres e direitos sociais, anima as
atividades particulares pelo bem público. Desde já ele organiza e faz
trabalhar o Serviço de Assistência Jurídica, indispensável para o início
de uma organização social, dada a função específica do direito que
tem, preliminarmente, à função de pacificar antagonismos sociais.
Organiza, por sua vez, o “Serviço de Assistência e Proteção aos
Menores”, obra indispensável no momento, não só porque há no
Estado em proporção impressionante, menores abandonados, como
também, porque, na sociedade atual, a reeducação da infância é o
suporte possível à eficácia da educação geral.
Cumpre salientar que o projeto não traz encargos pesados ao Estado e,
a sua execução, de modo algum, traz qualquer desequilíbrio no plano
orçamentário, conforme se verifica da tabela anexa.
Pelo que as Comissões Reunidas de Constituição e Justiça e Finanças
e Orçamento são de parecer que o mesmo projeto deve ser aprovado,
tal qual foi redigido, e é que se segue: [a redação do Projeto de Lei na
íntegra]
O PL foi lido e passou à apreciação, de onde surgiram 43 emendas
64
da mais
variada ordem, apresentadas pelos deputados estaduais, na sessão de 11/12 daquele ano.
Nessa sessão, a Deputada Maria Thereza Nogueira de Azevedo interveio na
defesa da propositura:
(...) Sr. Presidente, desde tempos imemoriais, a maior inimiga da paz e
da tranqüilidade, da beleza e da alegria do gênero humano é a miséria.
64
São: 18 emendas aceitas, 1 aceita parcialmente, 13 rejeitadas, 2 prejudicadas e 9 aceitas com
substitutivo.
66
66
Conjugada com a ignorância e a enfermidade, a miséria forma o
capítulo mais triste, direi mesmo mais dantesco, da história do mundo.
É ela que tem desagregado lares, destruído esperanças, ressecado
corações, ... emurchecido almas..., e aniquilado um sem número de
vidas, tal como se trouxesse em seu rastro um cotejo de mortandade,
de tormentos e de agonias, igual ao de uma guerra permanente e sem
fim ( São Paulo, Annaes da Assembléia Legislativa, 1935, vol. III).
Continua, trazendo como sinônimo de tragédias maiores que as catástrofes e
guerras, as misérias física e moral. Perguntando se não haveria salvação, responde que “(...)
quando Deus criou o homem, deu-lhe a arma decisiva na luta pela vida: a inteligência (...) E
chego à grandeza da propositura, a necessidade nela contida, (...) as proporções dessa empresa
legislativa (...)” (idem).
A partir do conjunto das emendas, as Comissões reunidas apresentaram
outro parecer (de nº 113), submetendo-o ao julgamento de seu mérito na sessão de
12/12/35. Finalmente, na sessão de 20/12 de então, a Comissão de Redação propôs a
redação final do PL 132. Finalmente, na sessão de 21 de dezembro, o Projeto de Lei foi
aprovado.
Criado pela Lei nº 2497 de 24 de dezembro de 1935, o Departamento de
Assistência Social confirmou a centralidade da infância e adolescência desvalidas na
sua configuração organizacional. Chama a atenção o fato de que cerca de dois terços
dos dispositivos legais são dirigidos ao Serviço Social de Assistência e Proteção a
Menores. Somado a isso, o Serviço de Reeducação do Menor, criado em 1934, foi
absorvido pelo novo Departamento.
Continuava em destaque, então, o espaço destinado à questão da criança e do
adolescente como campo de responsabilidade publica prioritária, sem que isso fosse
sinônimo de responsabilização direta por parte do Estado. Na verdade, a matriz da
gênese institucional paulista foi a do estabelecimento de marcos regulatórios (normas de
funcionamento, cadastramento de obras sociais), de tal forma que primeiramente
propiciaram o diagnóstico do modo como operam, para depois estabelecer adequações a
um padrão desejado, sob a ótica de um direcionamento adequado da subvenção estatal.
As competências inaugurais delegadas ao Departamento de Assistência
Social paulista eram:
superintender todo o serviço de assistência e proteção social;
67
67
celebrar, para a realização de seu programa, acordo com as instituições
particulares de caridade, assistência e de ensino profissional;
harmonizar a ação social do Estado, articulando-a com a dos particulares;
orientar os poderes públicos nos assuntos de assistência social;
receber e aplicar doações que lhe fossem feitas;
distribuir os auxílios e subvenções fornecidas pelo poder público a
instituições particulares de assistência ou serviço social;
orientar e desenvolver a investigação e o tratamento das causas e efeitos
dos problemas individuais e sociais que necessitem de assistência,
organizando, para tal, quando oportuno, a Escola de Serviços Sociais;
praticar os atos que, por lei, couberem ao Conselho de Assistência e
Proteção aos Menores.
Há, pelo menos, quatro pontos inaugurais nessa conformação de identidade
do órgão gestor constituído que sugerem a circunscrição de sua competência no campo
de serviços, na regulação das relações entre o ente estadual e as instituições particulares
e na vigilância, investigando os fatores que geram a demanda pela assistência social.
1. Apesar de estabelecer a inter-relação entre assistência social e proteção
social, tratou-as de forma separada, como se pertencessem a áreas distintas. Assim,
assistência social não é entendida como um campo de proteção social. O modelo de
proteção social forjado a partir desse período histórico separa a abrangência do seguro
social da assistência social, identificada como mais próxima à noção de amparo social.
Amparo também significa proteção – supõe abrigo, refugio, resguardo -, indica um
estancamento da condição de deterioração, ao passo que proteção indica, por sua vez, o
impedimento de que ocorra a destruição (Sposati, 2007). Dessa forma, proteção é mais
vigilante, encerra a compreensão da necessidade da prevenção de risco, ao passo que o
amparo ocorre a partir de um risco. Proteção é preventiva, ao passo que amparo se
aproxima da compreensão curativa do desamparo presente nas precárias condições de
vida de parcelas imensas da população.
Atualmente, um desafio da Política de Assistência Social, ainda a ser
superado, é consolidar a compreensão de que a assistência social pública tem a função
68
68
de proteção preventiva e reparadora na violação de direitos, de vigilância social e de
defesa de direitos.
Nota-se que uma das competências inaugurais do órgão paulista é
embrionária da função de vigilância social
65
.
2. Compartilhou a ação do ente estadual com instituições da sociedade civil,
por meio de “acordos”, germe da tendência histórica posterior e duradoura do
instrumento de convênios, como a estratégia reguladora privilegiada da relação público-
privado. Uma tendência que era estabelecida na relação ad hoc, particularizadora das
demandas das instituições da sociedade civil, impeditiva, portanto, de alcançar o
conjunto das demandas de proteção da assistência social, sem contar que estabelecia
vias paralelas de apoio federativo: uma mesma instituição social poderia ser
contemplada, de forma sobreposta, pelo subsídio estatal.
3. Delegou ao órgão paulista a concessão de auxílios e subvenções a
instituições de assistência ou serviço social, o que legitima e legaliza a concessão de
subsídios estatais às iniciativas da sociedade civil. Ao mesmo tempo, mimetizou a
natureza dessas instituições em uma mesma matriz identificadora: serviço social e
assistência social.
66
Supõe-se que essa vinculação iguale a natureza da instituição com a
oferta de atenções que deve garantir. No entanto, a questão de fundo é precisar o que era
considerada uma instituição de assistência social, sinônimo de instituição de serviço
social, o que é possível detectar no resultado da primeira pesquisa realizada pelo
Departamento estadual em 1937, tratado na página 80 deste trabalho.
Chama a atenção o fato de que, nos seis primeiros artigos da Lei de criação
do Departamento estadual, adotem-se três termos diferentes e identificadores das
instituições da sociedade civil abrangidas pelo campo da assistência social: instituições
particulares de caridade, assistência e de ensino profissional; instituições particulares
de assistência ou serviço social, como sinônimos; associações particulares de
65
A vigilância socioassistencial consiste no desenvolvimento da capacidade e de meios de gestão
assumidos pelo órgão público gestor da Assistência Social para conhecer a presença das formas de
vulnerabilidade social da população e do território pelo qual é responsável (NOB/SUAS, 2005:93).
66
A própria denominação do Conselho Nacional de Serviço Social em 1938 demonstra a dupla
associação serviço social/assistência social, que se prolonga até 1994, quando passa a se chamar Conselho
Nacional de Assistência Social.
69
69
assistência. Essa profusão semântica se revela como parte integrante de uma tendência
histórica de conferir múltiplas denominações às organizações públicas e privadas de
assistência social, tendência essa que permanece arraigada até hoje, no que se refere à
compreensão sobre a natureza delas. Não se trata de uma questão de nomenclatura,
somente, mas sim o reflexo de uma identificação alargada e nebulosa de que pertencem
ao mesmo campo a instituição própria de assistência social, a instituição originada da
prática da caridade ou benemerência e a instituição de ensino – uma imprecisão
prenunciada no caso São Paulo.
É o véu que encobre uma compreensão suficientemente ampla, de alcance
nacional, que permite a simbiose entre a filantropia, a benemerência e a assistência
social, que têm sido tratadas no Brasil como irmãs siamesas, substitutas uma da outra
(Mestriner, 2000: 14). Uma simbiose que tem expressão duradoura na prática do Estado,
tanto na esfera federal como na recém inaugurada esfera estadual: reconheciam mais o
conjunto das organizações sem fins lucrativos do que propriamente como de
responsabilidade sua as necessidades da população atendida pelas organizações
assistenciais. Assim, a ênfase estatal era pela produção de mecanismos de apoio a essas
organizações e a outras, classificadas, em momentos históricos diferentes, como
benemerentes, filantrópicas, beneficentes, de assistência social, pertencentes inclusive a
outras áreas como educação e saúde
67
. Mesclam a natureza originária de prestação de
67
A história da regulação de reconhecimento do Estado sobre as organizações da sociedade civil sem fins
econômicos é plena de legislações e normas conflitantes, que se estende para além do âmbito da
assistência social. Por opção metodológica, destacam-se algumas dessas medidas que podem ilustrar o
alargamento de estímulos e vantagens fiscais ofertadas pelo Estado às organizações da sociedade civil,
que desembocam no século XXI na identidade difusa e plasmada de entidade beneficente de assistência
social.
É na década de 30 que se iniciou uma profusão de medidas regulatórias, quando o Decreto Lei
20351/31 cria a Caixa de Subvenções destinada a auxiliar estabelecimentos de caridade, de ensino técnico
e serviços de ensino. A Lei nº 091/35 determina as regras pelas quais são declaradas de utilidade pública
(aprimoradas posteriormente pelo Decreto Lei 50517/61)...por servir desinteressadamente à coletividade
na área da educação, pesquisas científicas, culturais ou filantrópicas, estas de caráter geral ou
indiscriminado. Em 1943 (Decreto Lei 5844/43), a possibilidade de isenção de imposto de renda abrange
uma gama ampla de instituições, que vão desde aquelas de caráter beneficente, filantrópico, religioso,
cultural, instrutivo, científico, artístico, literário até recreativo, esportivo, associações e sindicatos. Em
1958, a Lei 3470 autoriza a dedução no imposto de renda de doações às instituições filantrópicas e é em
1959 que é promulgada a Lei 3577, que permite a isenção da contribuição da cota patronal à previdência
social, por parte das organizações sociais, por meio da concessão do certificado de fins filantrópicos.
Normas e leis posteriores desembocam na confirmação constitucional (Artigo 195 da CF 1988) da
isenção de contribuição à seguridade social das entidades beneficentes de assistência social, como o
conjunto daquelas que atuam no campo da saúde, educação e assistência social, com o detalhe de que nas
duas primeiras é facultada a participação de organização privada de caráter não-beneficente desde que
reservem 60% e 20%, respectivamente, de gratuidade na atenção a seus usuários. Fontes: Brasil, MDS.
Chiachio et alii, (2007); Mestriner (2000); Sposati (1994).
70
70
serviços pela qual foram constituídas, com o interesse exclusivo e particular na
concessão de títulos e incentivos fiscais, o que foi sedimentado em um campo público
diverso, porém ilusoriamente único.
A própria Constituição Estadual de 1935 mencionava a incumbência dos
municípios
68
e do Estado de coordenar e garantir os serviços sociais, sem explicitar as
atribuições específicas de cada um. Percebe-se que a compreensão subliminar sobre
serviços sociais foi alargada na sua delimitação, como sinônimo de múltiplas ofertas a
grupos desvalidos, como será possível detectar mais adiante.
4. Apontou a perspectiva de criar Escolas de Serviços Sociais como
requisito para o aprofundamento do conhecimento sobre a dinâmica dos fatores que
caracterizavam os problemas sociais, em uma conjuntura contemporânea à implantação
da pioneira Escola de Serviço Social. A primeira Escola de Serviço Social brasileira foi
implantada em São Paulo em 1936, gestada a partir de duas situações distintas entre si.
De um lado, São Paulo já abrigara a instalação da primeira escola de
ciências sociais da América Latina, em 1933, a Escola Livre de Sociologia,
posteriormente denominada Escola de Sociologia e Política. Foi lá que o deputado
estadual constituinte dr.Pacheco e Silva ministrou a cadeira de Serviços Sociais em
1936, apontando para a necessidade de racionalização e profissionalização dos serviços
sociais, apresentando as escolas de Serviço Social inglesas e alemãs como formas
modernas de assistência social (Sposati, 1988:114).
O Decreto Presidencial nº 6308, de 14 de dezembro de 2007, regulamenta o entendimento sobre entidades
e organizações de assistência social de que trata o artº 3º da Lei Orgânica da Assistência Social, prevendo
a possibilidade das mesmas prestarem, isolada ou cumulativamente: atendimento continuado por meio de
serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica ou especial, dirigidos às famílias em
situação de vulnerabilidade ou risco pessoal e social; assessoramento voltado ao fortalecimento dos
movimentos sociais e organizações de usuários, formação e capacitação de lideranças, dirigidos ao
público da política de assistência social; de defesa e garantia de direitos socioassistenciais, construção de
novos direitos, promoção da cidadania, enfrentamento das desigualdades sociais, articulação com órgãos
públicos de defesa de direitos, dirigidos ao público da política de assistência social.
Seguramente, esse é um marco histórico e resultado de intensos debates coordenados pela SNAS e
CNAS, catalizados desde 1995, e fundamental para a distinção entre organizações beneficentes e de
assistência social.
68
Francisco Burkinski, membro da Comissão Nacional organizadora da Associação Brasileira de
Municípios, propôs a criação de um imposto sobre a riqueza do cidadão que vivesse exclusivamente de
rendimentos, afim de que aumentasse a arrecadação municipal e, com isso, os municípios poderiam arcar
com serviços de assistência social. Expôs essa idéia em artigo publicado na Revista do Serviço Público,
julho de 1946:52-7, intitulado “O município e a assistência social” (Sposati, 1988:112).
71
71
De outro lado, o Centro de Estudos e Ação Social (CEAS), criado em 1932
em São Paulo, e ligado à Igreja Católica, mantinha a formação especializada de pessoal
para atuar na assistência social, sob a ótica da doutrina social da Igreja.
A proposta original do Departamento de Assistência Social paulista se dava
conta da imperiosidade de dotar a anunciada responsabilidade estatal estadual de pólos
multiplicadores de conhecimento e formação de pessoal que dela participariam, direta
e/ou indiretamente.
O desenho inaugural da gestão do órgão paulista já contava com um
Conselho Consultivo composto, em maior escala, por representantes governamentais:
diretores dos diferentes serviços da Secretaria da Justiça e Negócios do Interior, que
dividiam espaço com três delegados das associações particulares de assistência e mais
três representantes do Secretário estadual. Mesmo consultivo o Conselho, há uma
assimetria nessa composição, da ordem de mais de dois membros governamentais para
um membro não-governamental. A função atribuída a esse Conselho era ampla, a saber:
tida como órgão auxiliar da administração, cabia-lhe dar pareceres nas dúvidas, sugerir
medidas a um funcionamento coordenado das obras de assistência social (artº 3º),
conhecer os Relatórios produzidos pelos diretores, sugerir regulamentações das
atribuições da lei, além de promover a organização de uma biblioteca especializada e de
divulgação dos serviços sociais. De toda forma, essa proposta inaugural abriu espaço
para o acompanhamento participativo de organizações da sociedade civil, porém sem
cogitar da presença de usuários dos serviços sociais. Reservou, ainda, um importante
espaço próprio para o registro de documentos e informações da área.
Outro dispositivo da Lei de criação do Departamento disciplinou a criação
de um “livro de matrícula das associações particulares de assistência existentes no
Estado” (artº 6º), fato que legitima a matrícula como pré-requisito para a concessão de
subvenções tanto estaduais quanto municipais
69
. Revelou-se como o primeiro e
duradouro modo de regulação estatal estadual, próximo da perspectiva de “controle da
filantropia mediante seu enquadramento nas normas técnicas que caracteriza o novo
69
A coluna do jornalista Mário Graciotti - Ponto de Vista- publicada no jornal Diário Popular, em
19/5/83, reconstruiu a trajetória da subsidiariedade nesse período, sob o título Subsídios para a história
das obras assistenciais de São Paulo (Sposati, 1988:110).
72
72
Departamento de Assistência Social” (idem:115). Tal regulação transborda a fronteira
da competência estadual, ao condicionar eventuais subvenções municipais à matrícula
no âmbito estadual. Não é possível tipificá-la como medida compartilhada ou
complementar federativa, tal como um banco de dados comum, mas sim subalterna,
em uma suposta relação hierárquica do trabalho social promovido pelos órgãos gestores
municipais. Além do mais, a incumbência do Departamento Estadual de cadastro das
associações particulares de assistência e a arbitragem da atribuição de subvenções a elas
se assemelha às funções que serão exercidas, sobejamente, pelo Conselho Nacional de
Serviço Social
70
, criado dois anos depois, contando no âmbito estadual com a
interferência prevista do mencionado Conselho Consultivo.
Por sua vez, a matrícula caracteriza-se como um primeiro passo da
identificação das associações particulares de assistência na relação com o ente estadual.
Implica a seletividade daquelas que serão contempladas com o subsídio estatal, “a
critério da política adotada pelo estado (...)” Sposati (1994:27), que guiará sua
vinculação ao Departamento estadual de Assistência Social.
A composição original do Departamento de Assistência Social previa os
seguintes serviços:
y Serviço Social de Assistência e Proteção a menores;
y Serviço Social de Assistência e Proteção aos desvalidos;
y Serviço Social de Assistência e Proteção aos trabalhadores;
y Serviço Social de Assistência e Proteção aos egressos de reformatórios,
estabelecimentos penais correcionais e hospitalares;
y Serviço Social de Assistência e Proteção à família;
y Consultório Jurídico de Serviço Social.
70
Mestriner (2000:65) indica que o CNSS ensaia uma função normatizadora e fiscalizadora para a área,
que com o tempo será abandonada. Em sua criação, foram fixadas as bases da organização do Serviço
Social em todo o país, função que exerceria para sua disseminação, porém seqüestrada pela prevalência
do trabalho cartorial de cadastro das organizações privadas e a concessão de subvenções.
73
73
Tal classificação inaugurou, no âmbito governamental paulista, outra
tendência histórica de definir o campo de ação pelo qual se responsabiliza a assistência
social pela via da tipificação dos segmentos sociais pauperizados e não pelas
necessidades sociais propriamente ditas, manifestas pela condição de desigualdade
social na qual se encontram segmentos sociais
71
. Perpetuada desde essa época, a
assistência social é entendida como parte do ambivalente campo de ajuda à pobreza,
desconectada do direito ao trabalho: é sinônimo do campo de atenção ao não-
trabalhador, ao não-cidadão, pária do sistema. A proteção social cunhada na era Vargas
centraliza os mecanismos oficiais no seguro social previdenciário, ao trabalhador
formal, em uma época de expansão do capitalismo industrial e da decorrente
necessidade de expansão da força de trabalho operária, todavia solapada pelos baixos
salários. Portanto, é de interesse o alargamento de mecanismos de proteção
socioassistencial que inscrevam na esfera governamental a atenção aos desamparados (e
dentre eles o próprio trabalhador espoliado), pela via do amparo social benemerente
alimentada pelo subsídio estatal. Faz sentido, então, um Serviço de Assistência e
Proteção aos trabalhadores
72
.
A relação assistência social-trabalho é outro ponto polêmico, predominante
e duradouro na circunscrição identitária da assistência social, tratada como pólos
antagônicos: a proteção do trabalho distante da proteção socioassistencial. A vinculação
da assistência social ao trabalho traduz-se como garantia de que a assistência social não
manteria a tutela, a dependência do usuário por suas atenções. Examinando a Matriz de
identidades da institucionalidade estadual da assistência social construídas
historicamente (v página ), essa vinculação comparece em sete estados examinados, à
71
Trata-se de uma tendência que se mantém, inclusive, quando o órgão gestor paulista alcança o status de
Secretaria de Estado, em 1967. O Decreto nº 49165, de 29/12/1967, em seu Artigo 1º, delimita o campo
funcional da Secretaria de Promoção Social em duas áreas de atuação: a) a ação comunitária visando à
melhoria de condições sociais e econômicas da população, em todos os aspectos, através da atuação
orientadora educativa, o desenvolvimento do associativismo e a coordenação e mobilização dos recursos
particulares e públicos voltados para o desenvolvimento social; b) o atendimento aos menores
abandonados e necessitados, à velhice desamparada, desempregados, imigrantes, vítimas de calamidade
pública e outros grupos específicos em situação de inadaptação social.
Por sua vez, o inciso IV do Artº 2º da estrutura funcional da Secretaria especifica como atendimento a
grupos em situação de inadaptação social os menores abandonados e delinqüentes, imigrantes,
desempregados, mães solteiras, prostitutas, mendigos, velhice desamparada, vítimas de calamidade
pública. Dessa forma, mantém a clássica definição de atribuições a partir dos grupos mais fragilizados,
sob a alcunha de grupos em situação de inadaptação social.
72
Ao mesmo tempo que a Lei estadual inaugural incluiu no Departamento esse Serviço, dubiamente o
exclui e o manteve no Departamento Estadual do Trabalho, outro departamento pertencente à Secretaria
da Justiça e Negócios do Interior.
74
74
exceção somente do Distrito Federal. O agravante é perceber que ela está presente em
cinco estados no momento histórico da ruptura constitucional, que eleva a assistência
social à singularidade de política pública de seguridade social brasileira.
O Serviço Social de Assistência e Proteção ao menor compreendia:
y o Juízo de Menores
73
, mantido na Comarca da Capital do estado de São
Paulo;
y os Abrigos Provisórios de Menores na capital e no interior;
y o Instituto de Pesquisas Juvenis: funcionava junto do Abrigo Provisório de
Menores, destinado a fornecer as bases científicas para o tratamento médico-pedagógico
da infância abandonada e delinqüente;
y o Comissariado de Menores: órgão de vigilância e sindicância, sob a
orientação direta do Juiz de Menores, composto por um Comissário Geral (advogado);
assistentes sociais gratuitos
74
(Art. 22 inciso b), escolhidos dentre estudantes de
Medicina e Direito; doze comissários de vigilância, sendo cinco mulheres; um escrivão;
um escrevente e um servente. Previa a possibilidade de ingressarem nesse grupo pessoas
idôneas e de confiança do Juiz, para atuarem voluntariamente;
y os estabelecimentos oficiais e auxiliares de reeducação, preservação e
reforma. Mantinha-se a tipologia classificatória de “menores”, encontrada nesse
instrumento legal: menor em abandono, menor delinqüente, menor insubmisso e menor
pervertido. A eles, eram destinados serviços próprios “em estabelecimentos oficiais de
proteção e reforma da infância abandonada e delinqüente” (artº82) como reformatórios,
escola de reforma, escola de conduta social. Certamente, à luz do Código de Menores, a
tônica era corrigir desvios imputados ao caráter individual e à (des)organização familiar,
de costas para a condição vulnerável de grupos sociais pela condição de desigualdade
social: a ênfase residia no disciplinamento e na exigência de formação de mão-de-obra
para o mercado de trabalho.
73
Criado em 1924 para assistência, proteção, defesa, processo e julgamento de menores abandonados e
delinqüentes.
74
Designação dada a voluntários acadêmicos, conhecidos como auxiliares sociais, equivalem ao moderno
“estagiário”.
75
75
Outro Serviço criado na estrutura inaugural paulista foi o Serviço de
Proteção aos Desvalidos. Atendia todos os desprovidos de recursos, recolhidos em
estabelecimentos públicos ou particulares, e previa atenção específica a inválidos – em
asilos ou abrigos – à velhice, pela ausência de recursos ou parentes, e aos mendigos
75
.
O Serviço de Proteção aos Egressos previa três caracterizações de
estabelecimentos de egressos, retrato da prevalência da orientação contemporânea de
cunho médico-social, de tendência higienista e de assepsia social. Estava subdividido
em:
y egressos dos reformatórios: adolescentes e jovens que ficavam a cargo do
Serviço de Assistência e Proteção aos Menores;
y egressos dos estabelecimentos correcionais e penais: para tanto, estava
previsto o funcionamento do Conselho Oficial dos Patronatos dos condenados, liberados
condicionais e egressos das prisões, com a incumbência de coordenar a assistência aos
sentenciados, durante e após o cumprimento da pena;
y egressos dos estabelecimentos hospitalares: instituiu o Patronato dos
egressos dos Hospitais de São Paulo que, pela condição de saúde ou falta de recursos,
necessitassem de amparo.
Cabia ao Serviço de Amparo Social à Família realizar pesquisas sociais
sobre as necessidades e possibilidades do amparo social à família; coordenar as
atividades públicas ou particulares; organizar e desenvolver centros sociais de educação
familiar; socorrer as famílias numerosas; fazer a profilaxia da prostituição; prover a
revalorização moral da mulher vítima de crime ou abuso sexual, na perspectiva de
“reformação ou normalização da sua vida familiar e econômica” (Artº 150, F). Essas
atribuições revelam outra faceta da tendência higienista/moralista hegemônica da época,
que incide sobre a predominância da matriz do amparo maternal que, dez anos depois,
75
O Artigo 126 da Lei Estadual reafirma a mendicidade como contravenção prevista no Código Penal.
Para tanto, previa a construção de asilos especiais na capital do estado e em cinco localidades do interior.
Cabe ressaltar que os mendigos eram classificados como inválidos, decrépitos ou enfermos, inseridos nos
serviços governamentais bem como nas casas de caridade, devidamente subvencionadas e sob a
fiscalização do governo estadual. Conforme Mestriner (2001), a distinção de espaços institucionais
especializados de atendimento é típico do período da filantropia higiência (1889-1930), tendo como
diretrizes programáticas a assistência, a prevenção e a segregação. O período subseqüente (1930-1945)
caracterizou-se pela filantropia disciplinadora, cujo eixo central era o disciplinamento das pessoas de
acordo com as exigências de maior preparo e especialização da mão-de-obra.
76
76
transformaria a finalidade do primeiro órgão executivo federal na área da assistência
social brasileira, a Legião Brasileira de Assistência. De certa forma, também mantém
congruência com as orientações germinadas desde o século anterior, relativas à
reeducação familiar das famílias pobres e o disciplinamento preventivo da suposta
desordem social.
Por último, ao Consultório Jurídico de Serviço Social cabia dar consultoria
ao Departamento e prestar assistência jurídica a todos que necessitassem de proteção
social (Artº 151).
Três anos depois, sob o comando de Adhemar Pereira de Barros
76
, foi
promulgado o Decreto 9486 (de 13/09/1938), que alterou os dispositivos da Lei
inaugural, redenominando o Departamento de Assistência Social como Departamento
de Serviço Social, sendo designados os seguintes serviços:
y Serviço Social dos Menores,
y Serviço Social dos Desvalidos,
y Serviço Social dos Trabalhadores,
y Serviço Social dos Detentos e Egressos,
76
ADHEMAR PEREIRA DE BARROS (1901-1969). DÉCIMO INTERVENTOR, QUARTO E
OITAVO GOVERNADOR. Períodos de governo: 4/38 - 6/41; 3/47 - 1/51; 1/63 - 6/66
. Nasceu na cidade
de Piracicaba, interior de São Paulo. Formou-se em medicina, em 1923, pela Faculdade Nacional do Rio
de Janeiro. Entre 1923 e 1926 fez cursos de especialização e de aperfeiçoamento na Alemanha
(Universidade de Berlim), em hospitais na França, Inglaterra, Áustria e Estados Unidos.Voltando ao
Brasil, trabalhou no Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, sendo em seguida voluntário, como
tenente-médico, na Revolução Constitucionalista de 1932, já em São Paulo.Também foi voluntário, como
médico, na Guerra do Chaco, entre Paraguai e Bolívia (1932/1933). Novamente no Brasil foi constituinte
em 1935 e deputado estadual, entre 1935 e 1937. Depois de seu mandato como interventor federal
(1938/1941), fundou o Partido Social Progressista – PSP, sendo seu presidente de 1945 a 1965. Quando
foi interventor federal iniciou a eletrificação da Sorocabana, as Rodovias Anchieta e Anhanguera, o
Hospital das Clínicas, o Estádio do Pacaembu (junto com o Prefeito nomeado Prestes Maia) e a
retificação do rio Tietê. Eleito Governador em 1947, concluiu o Hospital das Clínicas e realizou uma série
de outras obras. Foi Prefeito da Capital de 1957 a 1961. Em 1962 foi novamente eleito governador, sendo,
em 1966, deposto pelos militares da Revolução de 1964. Na última gestão iniciou a Rodovia do Oeste,
atual Castelo Branco. Faleceu em Paris no ano de 1969. Disponível em:
http://www.galeriadosgovernadores.sp.gov.br/03galeria/galeria.htm#16
77
77
y Serviço Social da Família
y Procuradoria de Serviço Social.
Percebe-se que a denominação do Departamento foi substituída por Serviço
Social, e a exclusão da proteção e assistência na designação dos serviços pertencentes
ao Departamento seguem a nova identidade conferida. Cristaliza a identificação dos
serviços pelo segmento social ao qual se destina, desvestida da marca de proteção e
assistência de que foram dotados inauguralmente.
O Artº 13 desse Decreto previu a criação de cinqüenta Casas de Serviço
Social, como postos de cooperação e educação sociais, com a indicação de serem
instaladas a partir da orientação do próprio Departamento, de acordo com suas diretrizes
e das peculiaridades locais. Previa-se a possibilidade de convertê-las em postos
itinerantes de serviço social. Por hipótese, essa pode ser uma primeira estratégia de
implementação descentralizada de natureza dupla: de prestação de serviços do
Departamento e de aproximação da realidade dos territórios paulistas, quiçá
embrionário do acompanhamento das ações desenvolvidas nos municípios. Contudo, ao
denominar os postos de cooperação e educação sociais como Casas, recorria-se a um
termo próprio da esfera privado-doméstica, sob o risco de mascarar a relação público/
privada.
Ainda nesse ano de 1938, outro Decreto (nº 9744 de 19/11/38) foi
implementado, provocando a reorganização do Serviço Social dos Menores (SSM) do
Departamento de Serviço Social. Ampliou, sobremaneira, as atribuições desse Serviço.
Além das funções originalmente trazidas na Lei 2497/35, cabia-lhe instituir bolsas
escolares em todos os cursos de todos os graus para os superdotados assistidos do
Serviço; amparar os menores de vinte e um anos, egressos de estabelecimentos do
Serviço ou por ele fiscalizados, auxiliando-os em seu reajustamento; proporcionar à
Justiça de Menores a cooperação necessária à boa execução da liberdade vigiada;
exercer vigilância sobre meninos e meninas, nos termos da respectiva legislação;
colaborar com as demais autoridades públicas e delas solicitar colaboração, para a fiel
observância da legislação; propor à autoridade competente o desligamento antecipado
do adolescente e as medidas referentes à liberdade vigiada, bem como solicitar a
78
78
autorização que fosse devida para sua entrega a pessoas idôneas, mediante soldada
77
ou
outras condições, nos termos da respectiva legislação; assinar os contratos de soldada,
na forma da letra anterior, e exercer a respectiva fiscalização e vigilância; receber as
importâncias das soldadas, depositando-as na Caixa Econômica Estadual, em nome dos
respectivos beneficiados; proceder aos exames referentes ao estado físico, mental ou
moral e, quando necessário, em colaboração com outros serviços especializados do
Departamento, realizar a pesquisa sobre a situação moral, social e econômica dos pais,
tutor ou pessoa sob cuja guarda vivessem tais meninos e meninas.
Modificou a composição do Serviço Social de Menores: Diretoria, Institutos
de Menores, Pensionatos de Menores, Abrigos Provisórios, Comissões Municipais de
Cooperação. O Juízo de Menores saiu do âmbito do Serviço Social em tela. A Diretoria
se ramificou em três subdiretorias:
y a Subdiretoria Técnico-Científica à qual estavam subordinados o Instituto
de Pesquisas (centro dos estudos técnico-científicos do SSM), o Serviço de Saúde e o
Serviço de Abrigo e Triagem;
y a Subdiretoria Administrativa : cabia-lhe todo o serviço administrativo;
y a Subdiretoria de Vigilância: exercer vigilância sobre os menores de idade,
tendo para isso a garantia do ingresso de seus agentes onde quer que se encontrassem.
Sediou, então, o Comissariado da Capital, os Comissários do interior e o Serviço de
egressos e externos.
Os Institutos de Menores apontados nesse Decreto eram: o Instituto Modelo
de Menores da Capital – nova designação dada ao Reformatório Modelo e exemplo
referenciado para os outros –, o Instituto de Menores de Mogi-Mirim, o Instituto de
Menores de Taubaté, o Instituto de Menores de Campinas, o Instituto de Menores de
Monção. Previa a instalação de outros, conforme a conveniência. Esses Institutos
deveriam proporcionar ensino primário e técnico-profissional, de acordo com os
princípios de orientação profissional e pedagogia emendativa.
77
Quantia com que se paga o trabalho de criados, operários, etc; salários... (Aurélio: 746).
79
79
Os Pensionatos de Menores foram concebidos como local de moradia dos
usuários de oficinas, escolas, resultado de parcerias com os poderes municipais e que
ficariam sob a guarda de um casal residente, de reconhecida idoneidade.
As Comissões Municipais de Cooperação foram concebidas para existir em
todos os municípios “(...) integrada por elementos de eficiência social e reconhecida
idoneidade (...)” para proporcionar, nos municípios sede de comarca, o recolhimento
dos meninos e meninas sujeitos a investigação e processo por parte dos juízes
competentes, e promover o amparo aos egressos dos estabelecimentos, mantidos ou
fiscalizados pelo Serviço.
Apesar de o Departamento de Serviço Social estadual contar com outras
seções destinadas ao atendimento de segmentos sociais variados, mantinha-se
calcificada a centralidade da infância e adolescência desvalidas como eixo prioritário no
reconhecimento oficial desse campo de política pública estatal.
No Relatório da S.S. Social correspondente ao ano de 1937
78
, está registrado
que nesse ano fora criada a Secção de Assistência Social, cuja finalidade era “orientar e
desenvolver a investigação e o tratamento de causas e efeitos dos problemas individuais
e sociais”, disposto na alínea g da Lei 2497/35. Os dados do Relatório permitem
verificar que a função da nova Secção era coordenar o funcionamento dos serviços
sociais do Departamento bem como (...) realizar o conjuncto de trabalhos necessários ao
reajustamento de certos indivíduos ou grupos às condições normaes de vida (...) (p.15).
Fica claro, pelos registros nele apontados, que duas prioridades orientaram o
trabalho inicial desta Secção:
y a articulação com as obras sociais, matriculadas em 1936 e no período
subseqüente;
y atendimento aos necessitados que recorressem ao Departamento.
78
Apresentado ao Diretor Geral do Departamento em janeiro de 1938. As pesquisas documentais do
acervo histórico paulista encontrado indicam que é o primeiro documento técnico produzido no
Departamento de Assistência Social, ainda sob essa denominação, e de autoria desconhecida.
80
80
A demanda relativa às obras sociais em 1937 gerou uma pesquisa
79
, a
primeira realizada no estado de São Paulo
80
, com o fito de classificá-las e verificar se
atendiam a requisitos como:
y enquadrar-se na Lei 2497/35;
y ser dirigida por pessoas competentes e de reconhecida idoneidade moral;
y estar aparelhada de forma a atingir os fins determinados em seus estatutos;
y ter finalidades que correspondessem às necessidades do meio social a que
se destinam.
Examinando o questionário da pesquisa, no quesito de caracterização e
enquadramento de tipologias
81
orientadoras para os pesquisadores, os dados
caracterizadores das obras particulares e sua classificação em categorias de serviço
social eram da seguinte ordem:.
a) Beneficência: entendida como assistência paliativa, era caracterizada pela
esmola exercida de indivíduo a indivíduo ou por meio de associações
82
. A
beneficência não atinge as causas do problema, procura aliviá-lo, somente.
Uma nota complementar sugere que “... atualmente, há propensão para
excluir a beneficência do serviço social (...)”.
79
A metodologia adotada compôs-se de capacitação prévia dos pesquisadores, orientados sobre as
possíveis denominações e tipologias adotadas para o fito de caracterização das obras sociais. Houve a
distribuição de processos de matrícula das obras sociais, para estudo minucioso dos pesquisadores,
seguido de visita e preenchimento de um questionário previamente estruturado. Os pesquisadores faziam
a visita às obras sociais filiadas, não-restritas à possível organização social mantenedora, bem como eram
orientados a visitar as obras ainda não-cadastradas no Livro estadual de Matrículas. Por último, o relato
das observações sobre as condições sociais das cidades visitadas era registrado em um relatório à parte. O
registro dos dados indica que esses pesquisadores eram indicados pela Escola de Serviço Social de São
Paulo.
80
Em 1935, uma pesquisa congênere foi realizada no município de São Paulo. Samuel Lowrie, sociólogo
que atuava na Subdivisão de Documentação Social e Estatísticas Municipais do Departamento de Cultura
da Prefeitura e também na Escola de Sociologia e Política, apresentou um estudo de duzentas instituições
paulistanas de assistência filantrópica, classificando-as em médicas, não-médicas, públicas e particulares.
Concluiu que de 3 a 3.5% da população local recorria aos serviços de assistência social, o que aumentaria
para 10% da população, se considerados os serviços oficiais e particulares de assistência médica. (Sposati,
1988:125).
81
Os anexos 3, 4 e 6 demonstram as condições de funcionamento, as instalações destinadas ao
atendimento e a classificação das obras sociais matriculadas, respectivamente.
82
Esse documento já mencionava a distinção entre fundações e associações: nas primeiras, previstas no
Código Civil artº24, um instituidor destina uma dotação especial de bens livres, por escritura pública ou
testamento, especificando o fim a que se destina e aclarando, se quiser, a maneira de administrá-la. A
associação é definida como uma reunião de pessoas para um fim comum.
81
81
b) Assistência preventiva
83
: prevenir, evita o aparecimento do mal.
c) Assistência curativa: remediar ou remover as causas do mal.
d) Auxílio-mútuo
84
:associação cuja finalidade é proporcionar a seus
membros vantagens de ordem econômica, organizado pelos próprios
beneficiários. Cita como exemplos: cooperativas, sociedades de
habitações populares.
e) Seguro social: consiste em prevenir ou reparar as conseqüências de certos
acontecimentos ou fases da existência humana e as repercussões das
deficiências de ordem econômica e social sobre a vida individual. Uma
nota de esclarecimento adverte que nem sempre é organizado pelos
próprios beneficiários.
f) Auto-assistência: self-help, consiste em formar grupos de pessoas
sofrendo de algumas deficiências e educá-las de maneira a torná-las aptas a
fazer seu próprio serviço social (segundo Melle, Adéle de Loneux
85
).
Apresenta duas características: ser organizada pelos próprios membros e
educar o indivíduo em função de seu meio.
83
Precede a classificação de assistência preventiva e assistência curativa a definição de que pertencem à
categoria de assistência social, como sendo o auxílio que a sociedade empresta aos necessitados para
prevenir ou remediar algum mal, citando, entre parênteses, a fonte consultada: Jean Dabin “La
philosophie de l’ordre juridique positif”. Dabin (1889-1971) foi proeminente jurista belga, professor da
Universidade de Lovaina e membro da Academia Real da Bélgica, além de doutor honoris causa em
diversas universidades européias. De extensa produção bibliográfica, sua obra “Doutrina Geral do
Estado” é considerada como um amplo e profundo tratado sobre o Estado. Para ele, a concepção de
Estado é inseparável da concepção do homem e o conhecimento do Estado deve estar sustentado no
conhecimento do homem, caso contrário não poderia ser um conhecimento verdadeiro. Classifica os
elementos que contribuem para a formação da essência do Estado em prévios (população e território) e
em constitutivos: o fim do Estado (que denomina como bem público temporal) e a autoridade (poder
público). O Estado tem que ser sujeito de direitos e obrigações e, pela superioridade de seus fins e meios
perante qualquer outra entidade social, o Estado é soberano. Todavia, como agrupamento humano que
está a serviço de um fim superior, o Estado está submetido ao direito. Prefere a adoção do termo “bem
público” a “bem comum” porque indica com precisão que o bem comum em jogo é o bem comum
público. Dessa forma, o autor entende que o estado é o agrupamento humano orientado pelo bem comum-
o bem público temporal. Fonte: Raúl González Schmal, Prefácio da Doutrina Geral do Estado, publicada
pelo Instituto de Investigações Jurídicas da Universidade Nacional Autônoma do México.
84
Precede a classificação de auxílio mutuo e seguro social seu enquadramento em uma categoria maior,
a previdência, sem definição complementar.
85
Assistente social belga e professora da École Catholique de Service Social, de Bruxelas, veio a São
Paulo em 1932, realizando duas conferências “(...) que despertaram entusiasmo e culminaram com a
fundação, em 1936, da Escola de Serviço Social de São Paulo, a primeira do país” (in Revista Secretaria
de Promoção Social Nº 3, p. 60. Ano I Maio/Junho de 1969).
82
82
A princípio, pode-se dizer que essa classificação distingue mais claramente
o tipo de prestação de serviço das obras sociais beneficentes, pelo assistencialismo
praticado, além das obras sociais de auxílio-mútuo, pela natureza da prestação de
serviços de interesse exclusivo de determinados grupos.
No ano de 1937, foram realizadas 251 pesquisas, sendo 222 em obras
sociais já matriculadas e 29 outras para efeito de concessão de matrícula. Os resultados
obtidos indicavam que a grande maioria das organizações “philantropicas” visitadas
“(...) faz simples beneficência. Poucas são as que desenvolvem seus trabalhos segundo
os métodos do serviço social e tendo em vista a cura ou a prevenção do mal (...)” ( fls.
5). Essa passagem do relatório indica claramente a afirmação da necessidade do
profissional assistente social, um campo novo que se abria com a criação simultânea da
Escola de Serviço Social.
As falhas encontradas nas organizações philantropicas foram atribuídas aos
seguintes fatores, predominantemente de ordem técnica:
inexistência de critério estabelecido para seleção dos (...)
necessitados (idem);
reduzida eficiência da assistência prestada, na medida que a
subdivisão dos recursos obedecia ao número de necessitados inscritos,
âmbito de ação ilimitado;
falta de coordenação entre as obras.
Quanto às obras de atendimento à infância, os principais problemas
encontrados eram de natureza técnica, a saber: educação deficiente, não formando para
a vida prática; desligamento dos meninos aos 12 anos; inexistência de investigação
sobre a procedência das crianças, bem como do acompanhamento de egressos dessas
instituições.
Nos asilos de velhos e inválidos, constataram a presença de crianças junto
com os adultos, sem receber uma atenção especial, além de inexistir a identificação dos
asilados.
83
83
A situação mais deficiente constatada foi nas obras que prestavam
assistência à família, uma vez que a atenção individualizada não contemplava o
conjunto familiar, o que permanece como questão em muitas análises atuais de atenção,
que dizem se destinar à família e terminam por trabalhar somente com as mães.
Há de se fazer um destaque para a conclusão desse estudo. Constatou-se a
boa vontade das associações em colaborar com o Departamento, mas o empecilho mais
forte para o desenvolvimento da ação desse órgão estatal era a exigüidade de verbas
para subvencionar as obras particulares, reconhecendo que lutavam com grandes
dificuldades financeiras. Nesse sentido, relativizava o aconselhamento sobre melhorias
nos serviços, subordinando-o ao valor reduzido das subvenções.
Percebe-se, então, que o espaço da ação pública estatal paulista, nesse
momento inaugural, era circunscrito à sua capacidade subsidiária da iniciativa privada,
ou seja, à capacidade normativa e técnica do ente estadual bem como o volume de
recursos para os auxílios e subvenções. Essa compreensão será determinante na
trajetória do órgão paulista, estendendo-se, inclusive, na ação da primeira-dama
estadual, a partir de 1968.
Mais curioso, ainda, é constatar que, para além da classificação do tipo de
serviço social prestado, essa pesquisa levou à classificação das obras sociais segundo o
gênero de assistência que prestavam, entendido como “(...) a categoria de pessoas a que
se destina a obra”, a saber.
a) Assistência à infância abandonada e delinqüente
aa) Abandonados: menores cujas famílias são incapazes ou indignas de
cumprir a sua missão educativa. Eram subdivididos em materialmente abandonados
(enjeitados, expostos; aqueles que perderam todo o contato com a família; órfãos) e
moralmente abandonados (filhos de pais incapazes; filhos de pais negligentes, ou
seja, não cumprem seus deveres por desleixo); filhos de pais indignos (imorais,
cruéis, especuladores, condenados).
84
84
ab) Delinqüentes: menores de 18 anos, autores ou cúmplices de atos
qualificados como crimes ou contravenções.
Consequentemente, o Departamento de Assistência Social reconhecia dois
tipos de obras de assistência à infância: os asilos, que mantinham creches, escolas
maternais, jardins de infância, cursos primários e profissionais; os orfanatos, que
mantinham creches, escolas maternais, cursos primários e profissionais. Para os
delinqüentes, os reformatórios, com cursos primário e profissionais.
b) Assistência aos desvalidos : abrangendo todas as pessoas desprovidas de meios
de subsistência, como os inválidos, velhos, mendigos e egressos de
estabelecimentos hospitalares. As obras sociais correspondentes eram: asilos,
escolas, dispensários, albergues noturnos.
c) Assistência aos trabalhadores: identificados como todas as pessoas que obtêm
sua subsistência pelo trabalho. As obras de assistência e proteção a esse
segmento eram: mútuas; cooperativas, sociedades de habitações populares;
sociedades recreativas e culturais; restaurantes e pensões; escolas noturnas.
d) Assistência aos egressos: identificados como todas as pessoas que, tendo
sofrido uma condenação, deixam os estabelecimentos correcionais por terem
cumprido pena ou estarem sob regime de liberdade vigiada. Eram os egressos de
prisões e reformatórios e os liberados condicionais. Não foram encontradas
obras particulares para esses segmentos sociais.
e) Assistência à família: família era entendida como grupo de pessoas unidas por
laços de parentesco e vivendo sob a dependência econômica de um chefe. As
obras de assistência e proteção à família deveriam prover os seguintes serviços:
higiene pré-natal; serviços de puericultura; creches; escolas maternais; jardins
de infância; parques infantis; cooperativas escolares; bibliotecas infantis; cursos
primário e profissionais; escolas especiais para (...) anormais; preventórios;
dispensários; obras de proteção às mulheres vítimas de abuso sexual; obras de
profilaxia da prostituição.
Essa classificação confirma o pensamento dominante prevalente no período,
de organizar, com maior ênfase e em espaços especializados, o atendimento a grupos
85
85
sociais indesejáveis, na perspectiva asilar e tuteladora, sob a profusão maior e semi-
especializada de serviços diversos organizados para proteção materno-infantil.
O tratamento dos dados coletados na pesquisa foi realizado pelo
organizador de estatística do Departamento, responsável por analisá-los e determinar os
critérios de partilha dos recursos estaduais de forma eqüitativa, tratados como “(...)
quota de subvenção”, levando em conta: número de assistidos, custo médio per capita,
condições financeiras da associação; eficiência dos serviços prestados. Portanto, o
subsídio estadual era determinando pelo mérito institucional do desempenho
administrativo-contábil como categoria balizadora da arbitragem governamental,
distante da ótica de reunir em um plano público o conjunto das demandas expressas pela
manifestação do próprio usuário. O Relatório não esclareceu a compreensão adotada
sobre a eficiência dos serviços prestados, supondo que está mais próxima de um
desempenho coerente com as finalidades da organização philantropica do que os efeitos
de sua ação no conjunto expresso acima.
O segundo grupo de dados trazido nesse Relatório refere-se ao Serviço
Social de Casos individuais, considerado como “(...) a parte mais delicada e que maiores
esforços exigiu desta Secção” (p.7). Trata-se do atendimento direto aos necessitados
(idem) apoiado por uma metodologia própria
86
e orientada pelos seguintes princípios:
y estimular o necessitado fazendo-o participar ativamente de todos os
projetos que se relacionem com o tratamento;
y utilizar todos os elementos do meio social que possam influenciá-lo no
sentido desejado de sua readaptação;
86
O atendimento direto era precedido por um inquérito-questionário aplicado pelos pesquisadores-
versando sobre o próprio interessado e seu meio social. O extenso formulário (Anexo 5) dava elementos
para a formulação do diagnóstico e o tratamento indicado. Correspondem a três etapas próprias da técnica
do Serviço Social de Caso, adotada na intervenção do assistente social. O relatório dá destaque à
dedicação e abnegação dos pesquisadores, que “(...) diversas vezes expuseram-se a perigos, como seja o
contato direto com as pessoas atacadas de moléstias ou de alienação mental...” (p.7).
Realizado o inquérito, os casos referentes aos menores de idade eram encaminhados aos serviços
competentes, e aqueles relativos aos desvalidos e família eram tratados na Seção de Assistência Social
com o apoio dos serviços sociais do Departamento e das instituições públicas ou particulares. Detecta-se
aí o prenúncio da separação do Serviço Social de Menores do restante, que migrará em 1947 para a
vinculação direta ao Secretário da Justiça e Negócios do Interior.
86
86
y auxílio material, reduzido ao mínimo indispensável para não prejudicar o
tratamento indicado nos dois itens anteriores.
Durante o ano de 1937, foram realizados 500 inquéritos e atendidos 466
casos, assim distribuídos pela ordem de maior incidência: 214 famílias (incluindo as
vítimas da revolução), 205 desvalidos (inválidos, velhos, mendigos e egressos de
estabelecimentos hospitalares), 26 menores de idade (para os quais concorreu o Lar do
Menor Trabalhador e Instituto de Pesquisas Juvenis), 17 egressos de estabelecimentos
prisionais e 4 casos remanescentes de egressos hospitalares.
O Serviço Social de Família foi considerado como “(...) o ponto mais
importante do nosso trabalho e, por assim dizer, a razão de ser de todos os outros
serviços do Departamento...” (p.8). Os registros apontam que o centro das atenções foi
desenvolver o sentimento de solidariedade familiar, com o intuito de evitar o
desmembramento da família, pois a demanda pela internação dos filhos foi expressiva,
tanto por parte de famílias com prole numerosa quanto por parte de mães solteiras. Duas
soluções imediatas foram apontadas: implantação do regime de abonos familiares -
prenúncio de um benefício de transferência de renda estatal - e orientação técnica às
organizações particulares de assistência social existentes para o atendimento familiar,
salientando que o número dessas organizações era insuficiente.
Cabe destacar outra sugestão formulada no Relatório como uma medida
mediata de solução para os problemas sociais típicos das famílias de (...) classe
popular: a criação de Centros Sociais de Formação Familiar. Essas famílias eram
aquelas cujas “condições de vida apresentam deficiências de ordem material, intelectual
e moral e que não podem prescindir da intervenção do serviço social” (Relatório, anexo
nº 9 p.1). Seus problemas eram de ordem diversa, a exemplo da falta de senso de
responsabilidade social, manifestada pelo recurso usual a empréstimos financeiros, a
adiantamento salarial, à inadimplência e atraso no pagamento de dívidas, o que
significava imprudência e ausência de esforço de economia. As outras dificuldades
referiam-se à alimentação deficiente, às más condições de moradia (“pequenez da casa,
a desordem, o ambiente desfavorável para as meninas desenvolverem o gosto pela vida
doméstica e a promiscuidade que torna difícil a conservação da dignidade e do pudor”),
87
87
ao prejuízo do aproveitamento escolar pelas crianças, ao trabalho externo da mãe e ao
trabalho precoce dos filhos
87
.
As causas das deficiências se dividiam em “diretas”, como o salário baixo,
os encargos familiares, o desemprego, ocorrência de moléstias, morte do chefe de
família, e “indiretas”, ou seja, as moléstias sociais, a falta de educação doméstica das
mães e o mau comportamento.
Conseqüentemente, os membros da classe popular eram tidos como
“criaturas diminuídas”, vítimas do mau funcionamento dos quadros sociais e a única
solução plausível estava em reorganizar os quadros sociais, criar serviços de assistência
e benemerência a todos aqueles “(...) que são incapazes de qualquer esforço e
progresso” (p.3); fazer a formação social da classe popular, empregando o método do
self-help
88
.
Os Centros Sociais propostos resolveriam as necessidades de sobrevivência
daqueles que se encontravam em estado de indigência, por meio da distribuição de
gêneros de primeira necessidade (roupas, remédios); serviço de empréstimo financeiro
àquelas famílias circunstancialmente em situação embaraçosa, com o atenuante de não
cobrar juros; os portadores de deficiência física teriam disponível clínica pré-natal e
infantil, clínica geral e gabinete dentário e, finalmente, a educação familiar descuidada
contaria com o apoio de pessoas competentes a ensinar pequenas lições demonstrativas
de economia doméstica
89
. É interessante a menção de que o trabalho dos Centros
Sociais contariam com o apoio dos Patronatos
90
na tarefa de despertar o gosto pelo
trabalho das crianças, findo o curso primário e sem idade para freqüentar escolas
profissionais, com o fito de desenvolverem hábitos de disciplina, de pontualidade, de
capricho na execução dos trabalhos. Para as meninas, o Patronato ensinaria noções de
87
Não se questionava a situação do trabalho infantil, mas sim as condições de sua realização: interrupção
dos estudos, trabalhos sem perspectiva de futuro e a ocupação de meninas em “(...) profissões
inadequadas ao desenvolvimento de suas aptidões femininas, que impedem o seu preparo para a vida de
mãe de família” (idem:3).
88
Consistia na proposta de agrupar famílias com necessidades econômicas e morais similares, educando-
as para criar serviços de economia, educação e recreação devidamente custeados pelos participantes, na
crença de que os valores prevalentes - auxílio mútuo e solidariedade - garantiriam o desenvolvimento do
senso de responsabilidade social.
89
Baseada em serviços desenvolvidos na França, nesse período, destinados a famílias numerosas e
denominados como aide aux mères de familles nombreuses.
90
Instituições de assistência especializadas para menores (Aurélio: 615, 6ª Edição).
88
88
puericultura, com participação nos serviços de creche, jardim-de-infância e clínica
infantil, experiência útil para aquela que desejasse “(...) empregar-se em casas de
família e concorrerá para elevar o nível das domésticas...” (p.5), por meio das agências
de colocação. Portanto, preservava-se a mesma visão adotada no começo do século
quanto à moldagem dos serviços sociais próprios a esse segmento social.
Os Centros Sociais de Formação Familiar guardavam semelhança com a
proposta contida no Artº 13 do Decreto nº 9486, de criação de Casas de Serviço Social,
na perspectiva de se configurarem como espaços de educação social. Há de se destacar
que o Relatório em análise data de janeiro de 1938, e o Decreto foi promulgado em
setembro desse ano.
É nítida a ótica conservadora de ajuizamento moral sobre a destituição de
valores afirmativos, que a classe apresentava, que pudessem inspirar o desenho de uma
família sadia, nucleada e movida por valores construtivos. O necessitado era
despossuído de bens econômicos e de valores capazes de manter a segurança familiar e
social, habitantes da fronteira da desordem social, na qual a imperiosidade era dotar a
mulher, desde menina, de atitudes condizentes com sua possível e aceitável expressão
no ambiente doméstico sadio, assegurador de crianças e adolescentes não-portadores de
riscos à sociedade como um todo. A educação pelo trabalho tem raízes na convicção de
ensinar, de modo subalternizador, o lugar que cabe à cria da classe popular no mundo
do trabalho: aprender, obedecer, produzir; desviar dessa rota, jamais.
Na análise conclusiva do Relatório, foram apontadas dificuldades quanto à
organização e aos procedimentos assincrônicos no funcionamento dos serviços do
Departamento. A título de exemplo, a classificação dos necessitados era realizada pelo
Protocolo e baseada nas declarações do próprio interessado, o que nem sempre
correspondia ao enquadramento esperado. Isso pode ser um indício para o número
reduzido de casos de “menores de idade” encontrado, uma vez que a prevalência no
atendimento de casos foi de famílias. Percebe-se que a orientação maior, impressa pelo
responsável da Seção de Assistência Social, era dar centralidade à atenção do grupo
familiar, o que pode ser considerado como certeira, porém, com a devida reserva sobre a
compreensão adotada a respeito da dinâmica familiar. Como medida solucionadora,
propôs-se um novo fluxograma de procedimentos centralizados na coordenação da
89
89
Seção em tela, desde o primeiro atendimento dispensado às pessoas que procuravam
auxílio no Departamento, até um controle maior da autonomia de funcionamento do
Consultório Jurídico – que usualmente não prestava conta das providências adotadas
para os casos que para lá eram encaminhados.
A maior dificuldade apontada era o reduzido quadro de trabalhadores,
principalmente dos pesquisadores, que eram requisitados tanto para o trabalho de
monitoramento das organizações de assistência social, quanto para a realização do
inquérito preliminar no atendimento de casos.
O plano de trabalho traçado para 1938 propunha a continuidade do serviço
social dos casos individuais, orientação dos trabalhos de investigação estatística, o
aprimoramento da orientação técnica das obras sociais, a organização de um fichário
central das obras sociais e dos “(...) necessitados existentes no estado de São Paulo”
(p.13), com a intenção declarada de “(...) combater a exploração da caridade e prevenir
a duplicidade de distribuição de socorros” (idem). A proposição era agregar
informações que permitissem fiscalizar o possível funcionamento inadequado das obras
sociais e racionar o acesso à ajuda por parte dos necessitados.
A questão central nesse trabalho desenvolvido pelo Departamento de
Assistência Social refere-se às inter-relações entre o Serviço Social e Assistência Social
entendidos, de um lado, como a profissão que se anunciava nesse momento histórico e
começava a ocupar espaço na divisão social e técnica do trabalho do país, inclusive no
próprio órgão gestor paulista
91
. De outro lado, a trajetória da profissão acompanha a
assistência social brasileira desde essa época, quando o Estado assume “... uma
intervenção reguladora frente à emergente questão social
92
no país...” (Yazbek,
2006:124). Ambos se estruturam estreitamente vinculados, não só no avanço da
profissionalização do tratamento da questão social e da centralidade do Estado na
91
Os primeiros assistentes sociais contratados do Departamento foram os “pioneiros” Nadir Gouvêa
Kfouri, Helena Iracy Junqueira e Luis Carlos Mancini, recém-formados pela Escola de Serviço Social,
conforme depoimento em entrevista realizada (em 21 e 27 de novembro próximo passado) com a
Professora Dra. Maria Lúcia Carvalho, do Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social da
PUCSP. A entrevistada foi funcionária concursada do órgão gestor paulista durante 32 anos.
92
Conforme a autora, entendida como a disputa pela riqueza social na sociedade capitalista pelas classes
sociais. Refere-se às manifestações da desigualdade social oriundas das relações assimétricas entre capital
e trabalho.
90
90
prestação de serviços sociais, baseado em um saber técnico, mas também na inserção do
assistente social no conjunto das iniciativas filantrópicas da sociedade civil. Assim, a
concessão da atenção assistencial, pela via da ajuda material (auxílio financeiro, doação
de alimentos, o passe, o auxílio para o medicamento e outros) encontra no assistente
social o “... profissional instituído para conferir um mérito social a essa doação, de tal
forma que não se configure como um favorecimento ilícito...” Sposati et alii (1985:60).
Não restrita ao campo de trabalho do assistente social e tampouco por sua
responsabilização, mas sob sua presença hegemônica, é que se constrói a tradição
clientelista e assistencialista que permeia a área da assistência social, compreendida e
tratada, pelo menos até a ruptura constitucional, como prática secundária, em geral “(...)
adstrita às atividades do plantão social, de atenções em emergências e distribuição de
auxílios financeiros” (Yazbek, 2006:128).
Dessa forma, o assistencialismo não é sinônimo da prática profissional do
assistente social: é, antes de tudo, a face humanitária da lógica capitalista a justificar as
desigualdades sociais, o modo pelo qual estende os bens e serviços às classes tornadas
subalternas, legitimado pelo aval técnico do assistente social, sendo essa a matriz
prevalente que se forja nessa era varguista e resiste às mudanças trazidas pela ruptura
constitucional.
Vem daí a preocupação técnica da Seção de Assistência Social paulista em
imprimir uma metodologia – nascedoura – de inquirir o necessitado, vasculhar sua
inserção no meio social, prognosticar a conduta técnica possível e encaminhá-lo ao
serviço social competente para sua possível readaptação social, passível de ajuda
material e/ou atenção diversa nas instituições públicas e privadas da área. Essa é a
protoforma desenhada para um serviço duradouro, executado concomitante e
primordialmente pelos órgãos governamentais do campo da assistência social: o Plantão
Social. Marcado pela atenção emergencial, pontual e descontínua, persiste como prática
compensatória das mazelas sociais e executadas, no limite, por órgão gestor estadual até
recentemente
93
, quando seu destino é a inserção de seu atendimento em um plano
municipal de assistência social.
93
A título de exemplo, a Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social de Tocantins executou, até
2007, a concessão direta e centralizada, na capital do estado (Palmas), de benefícios categorizados como
91
91
Não há como não estabelecer comparações com o enunciado do Relatório
do Dr. Cícero Fajardo
94
(1937), no qual estabelece relação entre o comportamento
glandular, o comportamento social e o anti-social.
A Introdução desse documento tinha a subdenominação O comportamento
glandular e sua importância. Faz menção às modernas conquistas da Endocrinologia
que veio lançar “(...) uma luz límpida e clara sobre a gênese do caráter e sobre a
formação da personalidade, com a descoberta da importante função que exercem sobre
o comportamento as glândulas endocrínicas (...)” (p.3).
Nesse Relatório, o Comissário Geral de Menores afirmava que “é na
puberdade que se realizam as mutações psíquicas, da meninice para a idade adulta, a
evolução da emotividade, da inteligência, e do caráter, o que não deixa dúvida alguma
sobre a extraordinária influência que exercem os hormônios sexuais sobre a evolução e
sobre o equilíbrio psíquico” (idem). Complementa afirmando que, segundo o Professor
Nicolau Pende, o homem deve aos hormônios masculinos sobretudo as suas qualidades
de valor, reconhecidas como de escassa emotividade, de domínio sobre si mesmo, de
estabilidade psíquica, de maior firmeza da inteligência, mais adaptável ao pensamento
abstrato e mais independência. Por conseguinte, “a mulher deve principalmente ao
hormônio feminino suas virtudes de ternura, de piedade, de abnegação e de doçura”.
Recorrendo à Moebius, concluiu que as mais elevadas faculdades psíquicas,
as mais aperfeiçoadas atividades de inteligência, o pensamento criador e o gênio
artístico são inteiramente ligados aos hormônios sexuais masculinos.
eventuais - auxílios natalidade e funeral - além de outros benefícios como vale-transporte, concessão de
órtese-prótese, remédios. O início da municipalização dessa concessão começou em 2008. (Fonte:
acompanhamento da gestão estadual por meio de consultoria desenvolvida no MDS). O Artº 13 da LOAS
especifica que a competência estadual é destinar recursos financeiros aos municípios para o custeio dos
benefícios eventuais, mediante critérios estabelecidos pelos Conselhos Estaduais de Assistência Social. A
desejável, porém tardia, regulação federal a esse respeito foi promulgada em 14/12 próximo passado, por
meio do Decreto nº 6307 que estabelece, em seu Artº 6º, que cabe aos estados destinar recursos
financeiros aos municípios, a título de participação no custeio do pagamento dos auxílio natalidade e
funeral, ratificando os dispositivos complementares apontados na LOAS.
94
Comissário Geral do Comissariado de Menores do Estado de São Paulo; Relatório correspondente ao
ano de 1937. Imprensa Oficial do Estado. São Paulo, 1938.
92
92
Obviamente, essa discriminação sexista retrata a crença da época, de
inferioridade feminina e prevalência da inteligência masculina. Acrescentou que,
quando as alterações que geram o defeito da secreção tireóide (cf. Pende: 4) ocorrem na
infância ou na adolescência, o desenvolvimento psíquico do indivíduo paralisa e
permanece no grau que alcançou, na época da enfermidade. Nesse sentido, deu razão à
moderna psicologia que distingue a idade mental da idade adulta das pessoas,
concluindo que o comportamento emocional era a regra da conduta e o comportamento
racional ou ideológico a exceção que influenciava o comportamento social. Ao analisar
o comportamento anti-social, entendia que
o que é preciso conhecer antes de tudo não é se a criança culpada
sabia que fazia um mal, nem se entreviu as penalidades que a
esperavam, mas melhor, se conhecendo este mal e estas penalidades,
teve a força de resistir, se sua vontade não foi desarmada pelo seu
ambiente imediato, a levando ao mal pelo exemplo, talvez mesmo
pelo constrangimento. O que é preciso considerar não é o mal isolado
cometido pelo menor, é o bem conquistado pela sociedade, com a sua
readaptação, tornando-se um homem honesto (p.7).
Faz sentido, então, a classificação dos serviços sociais adotada na pesquisa
realizada pelo Departamento de Assistência Social paulista. A assistência preventiva ou
curativa identificava a capacidade da obra social de prevenir ou curar algum mal, a
exemplo das obras de profilaxia da prostituição, cujo resultado positivo para a sociedade
era a possibilidade de readaptação social de pessoas com desvio de conduta. Mesmo a
infância material ou moralmente abandonada carregava a culpa pela sua condição no
seio de sua família: pais incapazes, negligentes, indignos.
Predominava, pois, a imperiosidade corretiva e protetora do Estado: entre a
culpa e a proteção supostamente delegada às obras sociais, em nenhum momento se
consideravam fragilidades do tecido familiar pela condição precária de sobrevivência
desses grupos sociais.
À título de conclusão, o Relatório do Comissariado de Menores mostrou a
influência do meio social sobre o comportamento do menor, pontuando que a educação
não se restringia à escola como fonte de socialização da criança. Citou a família, as
companhias, o meio social em que viviam, o bairro em que residiam, o gênero de
habitação, a rádio difusão, a imprensa (jornal, revista, folhetim, todo o gênero de
93
93
literatura), a escola, a oficina, as leis em vigor. O Comissário Geral acreditava que o
ideal de uma educação dirigida pelo Estado seria adaptar todas essas coisas às
necessidades educativas da criança e não amoldar a mente infantil de acordo com as
mesmas e concluiu: (...) disto tudo ressalta que para bem educar, é preciso sanear o
ambiente mediante um verdadeiro serviço de higiene social” (p.22).
Em janeiro de 1943, é apresentado ao Diretor Geral do Departamento de
Serviço Social o Relatório Técnico
95
das atividades do ano de 1942
96
. A Diretoria Geral
contava, na época, com a Divisão Técnica e a Diretoria de Expediente, como áreas de
apoio à coordenação dos trabalhos. Cada Servo Social (da Família, dos Desvalidos e
detentos, e Egressos) contava com um assistente técnico de serviço social na sua direção
e é interessante apontar que o Serviço Social de Menores
97
e a Procuradoria de Serviço
Social foram abordados à parte, no transcurso do Relatório em tela. A Divisão Técnica –
substituta da Secção de Assistência Social (1937) – respondia por: Serviço Social de
Casos Individuais (denominado como Plantão do Serviço Social), Estatística do Serviço
Social, Fichário Central (das obras sociais e casos atendidos) e Orientação Técnica das
Obras Sociais (obras particulares, Casa Maternal
98
D. Leonor Mendes de Barros e aos
Conselhos Municipais de Serviço Social).
95
Título: A Divisão Técnica do Departamento de Serviço Social durante o ano de 1942. Apresentado por
Maria Kiehl, assistente técnica de serviço social encarregada da coordenação dos trabalhos da Divisão.
Arquivado pela Biblioteca do Serviço Social do Estado, Secretaria da Justiça e Negócios do Interior. São
Paulo, 1943. Mimeo.
96
Em junho de 1941, Fernando Costa assume o Governo de São Paulo até outubro de 1945, quando é
substituído provisoriamente por Sebastião Nogueira de Lima. Em novembro desse ano, Macedo Soares é
o novo governador paulista.
97
Esse Serviço, reorganizado pelo Decreto nº 9744 de 19/11/1938, adquiriu outro status de importância e
autonomia relativa dentro do Departamento de Serviço Social, na medida que tinha uma Diretoria
Especial, bem como a Procuradoria de Serviço Social. Os outros Serviços Sociais ficavam, então, sob a
administração direta da Diretoria Geral do Departamento estadual. O Serviço Social do Trabalhadores
manteve-se afeto ao Departamento Estadual do Trabalho, repartição subordinada à Secretaria da Justiça e
Negócios do Interior e órgão representante, no estado de São Paulo, do Ministério do Trabalho, Indústria
e Comércio.
98
Dona Leonor Mendes de Barros, esposa de Adhemar de Barros (que exerceu 3 vezes o mandato de
governador: 1938 a 1941; 1947 a 1951 e 1963 a 1966) fundou a Casa Maternal em SP (SP) para atender
as mães solteiras. Exerceu papel precursor, em âmbito estadual e nacional, como primeira-dama, e na
atuação sobre uma gama diversa de problemas sociais e de saúde.
Dados biográficos indicam suas realizações:
“(...) Fato novo na política brasileira foi o trabalho da esposa de Adhemar, D. Leonor Mendes de Barros,
na área social. Ela revolucionou o papel da mulher junto ao Estado: jamais aceitou ser somente uma dona
de casa. Católica praticante, considerava que tinha uma missão por cumprir e pôs-se a trabalhar. D.
Leonor dirigia pessoalmente o trabalho social e desenvolvia campanhas periódicas - como a do agasalho
e o Natal da Criança, distribuindo alimentos e brinquedos; apoio às creches, amparo às crianças
abandonadas e enfermas. Criou e presidiu a Bandeira Paulista contra a Tuberculose. Fundou a
Assistência Social Leonor Mendes de Barros e a Casa Maternal, na capital. Colaborava com a
Associação Evangélica Beneficente de Santos e com a Liga de Assistência Social e Combate à
Tuberculose de São José dos Campos. Fundou e manteve os Pavilhões Leonor Mendes de Barros e Nossa
94
94
A Divisão Técnica acumulava tarefas administrativas, como a determinação
de rotinas de trabalho, controle de processos, controle de pessoal, mas a ênfase de sua
atuação estava no campo técnico, a exemplo do trabalho exercido de aperfeiçoamento
profissional dos funcionários do Departamento estadual. No ano em curso, a Divisão
Técnica se encontrava na fase de implementação de um Plano de Bolsas de Estudos
Municipais que custearam a formação de assistentes sociais de dezenas de municípios
paulistas, na Escola de Serviço Social ou no Instituto de Serviço Social
99
, ambos na
capital. As prefeituras selecionavam os candidatos por meio de editais públicos e a
Divisão Técnica elaborava as bases dos editais, bem como as normas para a seleção dos
pretendentes, de onde se depreende que não ocorreu o incentivo financeiro por parte do
governo estadual.
Além desse apoio técnico às municipalidades, o Relatório aponta que já
ocorria uma primeira aproximação com o órgão federal recém-criado:a LBA. Foi
comissionada uma pesquisadora social (assistente social) da Divisão Técnica na
Comissão Estadual da LBA, para prestar serviços nesse órgão que se instalava, então,
no estado de São Paulo. A responsável pela Divisão Técnica estadual ministrou,
também, aulas de serviço social no Curso de Visitadoras de Emergência, organizado
pela Comissão Estadual da LBA e oferecido às “(...) moças do interior durante as férias
do último verão” (p. 54). Foram enviados, também, à Comissão Central da LBA, planos
para a instalação de lactário, educandário, e de Centro de Formação Familiar padrão.
São esboços de uma ação intergovernamental integrada que se desenham:
resta saber a sua suficiência bem como sua manutenção nos períodos subseqüentes.
Senhora das Graças, ambos no complexo do Hospital do Mandaqui; o abrigo de Emergência na Moóca e
em Sorocaba. Colaborava na manutenção do Sanatório de Bussocaba, em Osasco; dos Pavilhões Sóter de
Araújo e Guilherme Álvaro, em Santos. Na área de Proteção à infância, inúmeras creches foram
patrocinadas ou construídas com o seu apoio. Foi também uma grande promotora política nas campanhas
eleitorais. Liderou a criação do Movimento Político Feminino, fundado em setembro de 1947. Criou o
Departamento Feminino no Comitê da Vitória na campanha de 1954. Participava dos comícios,
organizava festas e reuniões”. Disponível em www.adhemar.debarros.nom.br/social.htm
99
Criado em 2 de março de 1940 por iniciativa da Juventude Universitária Católica – JUC-, cuja
finalidade era a formação de assistentes sociais masculinos para o serviço social público ou particular,
especialmente para o setor relativo aos problemas do trabalho (p.117).
95
95
A composição técnica dessa Divisão estadual atendia a uma resolução
interna do Departamento de Serviço Social
100
: 11 estagiários em fase de término do
Curso de Serviço Social e 5 pesquisadores sociais, já graduados, o que era avaliado
como positivo para o avanço dos trabalhos, pois, praticamente, respondiam pelas ações
prioritárias do Departamento, como o Plantão Social, pelas orientações técnicas
relativas às obras sociais (inclusive a mediação com as principais parceiras, como a Liga
das Senhoras Católicas, Liceu Coração de Jesus, Instituto Santa Terezinha para Surdas-
Mudas e Instituto Paulista para Surdos-Mudos), pela elaboração das estatísticas e pelo
Fichário Central. O apelo subjacente contido no relatório era pela equiparação dos
estagiários aos pesquisadores, dada a graduação no Curso de Serviço Social e a
qualidade de seu trabalho.
O Serviço Social de Casos Individuais sofreu um aprimoramento técnico, se
comparado aos trabalhos iniciais desenvolvidos no período de 1937, e tratados no
Relatório da Secção de Assistência Social, analisado anteriormente neste trabalho. Os
pesquisadores sociais se encontravam subdivididos em zonas da comarca da capital ou
regiões do interior do estado de São Paulo - pelas quais respondiam também na
orientação técnica das obras sociais – e, em 1942, sua ação englobava a atenção aos
casos do Serviço Social dos Desvalidos, dos Egressos e o Serviço Social da Família. A
metodologia
101
empregada era semelhante à anterior, percorrendo as etapas de pesquisa,
diagnóstico e tratamento, devidamente analisadas pela coordenação da Divisão Técnica
e empreendida totalmente pelos pesquisadores sociais, com maior sofisticação técnica.
A atenção aos desvalidos era realizada no Abrigo de Vila Mascote (situado
na margem da auto-estrada de Santo Amaro, em São Paulo) e pertencente à Associação
100
Ato nº 57, 10 §2º,b) (...)satisfazem a exigência do diploma expedido por escola ou curso de serviço
social, inspecionados nos termos do decreto 9970, de 2 de fevereiro de 1939 (p.23)
101
A coleta de dados inicial visava a atender ao registro de informações necessárias à avaliação da
Divisão Técnica e à realização da pesquisa realizada pelo assistente social. O relato das informações
iniciais seguia de modo livre, porém atendendo a um certo número de indicações gerais ordenadas de
modo sistemático. Essa questão fez parte de um trabalho publicado por um Assistente Técnico de Serviço
Social do Departamento: FERREIRA, Francisco de Paula. Métodos de Pesquisa Social. Separata da
Revista do Arquivo Municipal. Volume LXIX, São Paulo: 1940. A pesquisa individual focava a situação
física, econômica, mental e moral da pessoa, além da situação familiar, a reputação da família e o
histórico desta (semelhante ao processo americano de construção da biografia conhecido na época como
life-story). Outros elementos do meio social ao qual pertencia o indivíduo também integravam essa fase
metodológica: relações de trabalho, outras relações sociais. Assim, era adotado o social case work,
próprio da influência da escola norte-americana de Serviço Social, substituta da influência inaugural da
escola belga na gênese da Escola de Serviço Social.
96
96
Vicentina aos Mendigos
102
. Quanto aos egressos penais, a principal providência era a
regularização da documentação civil e profissional, para a qual eram requisitados os
préstimos da Procuradoria de Serviço Social. Para a colocação profissional, recorria-se à
Agência de Colocações do Departamento Estadual do Trabalho ou às empresas do
mercado. De toda forma, a avaliação contida no Relatório era de que as providências
ainda eram insuficientes, considerando a ausência de obras destinadas ao amparo dessas
pessoas, as “(...) quais, entretanto, raramente podem contar com o apoio e simpatia das
instituições particulares e mesmo oficiais” (p.32).
Fica claro, nesse Relatório, que o Serviço Social da Família englobava,
também, a assistência aos menores de idade, desenvolvida por instituições
subvencionadas pelo governo regional. As principais instituições conveniadas para o
atendimento de casos especiais eram:
y Liga das Senhoras Católicas
103
: dispunha de um Departamento de
Menores que os encaminhava a um de seus internatos ou a outros educandários, tanto na
capital quanto no interior do estado, com os quais mantinha acordo;
y Associação Feminina Beneficente e Instrutiva: acordo celebrado dispunha
sobre o atendimento anual de 80 menores de idade de 4 a 10 anos;
y Liceu Coração de Jesus: atendia os filhos da denominada categoria de (...)
“pobres envergonhados” (p.33), ou seja, filhos de famílias de classe média que
temporariamente encontravam-se em dificuldades econômicas, em um total de até 110
menores de idade por ano em sistema de externato;
y Centro de Estudos e Ação Social: implantou 3 Centros de Formação
Familiar e Social nos bairros paulistanos de Santana, Ponte Pequena e Quarta Parada,
sob a subvenção de CR$110.000,00;
y Instituto Santa Teresinha, em Campinas, para educação de meninas
surdas-mudas, em regime de internato (sob o custeio do governo estadual àqueles que
não tinham recursos financeiros para pagar tal procedimento);
102
O acordo era recolher e internar 100 indigentes anualmente, a um custo para o Departamento estadual
de CR$ 80 mil (oitenta mil cruzeiros).
103
O Decreto-lei nº 12.864 de 4/5/42 reajustou o custo per capita de CR$70 para CR$150.
97
97
y Instituto Paulista de Surdos-Mudos, para meninos portadores de anomalia
de audição e de fala.
Em suma, a Divisão Técnica atendeu, por meio do Serviço Social de Casos
Individuais, 4077 casos, 725 iniciados e 3352 casos prosseguidos, sendo que, durante o
ano, foram encerrados 2593 casos. Com relação aos casos novos, a exemplo dos dados
apontados no Relatório de 1937, prevaleceu o maior número de casos relativo às
famílias (545 casos), seguido dos desvalidos (68 casos). A seguir, comparecem os casos
de menores de idade (27) e diversos (28), com acentuada diminuição dos casos de
desvalidos, o que gera a suposição de que os egressos hospitalares já estivessem sob os
cuidados da área de saúde. Chama a atenção o fato de que a assistência prevalente
prestada foi a assistência monetária (58% dos casos), pois incluía o auxílio às vítimas da
Revolução de 32 – pensão às viúvas e pagamento a sanatórios – seguido de
encaminhamento a outros serviços públicos, a ambulatórios, a dispensários, a escolas e
internação em colégios.
O desempenho do serviço de Orientação Técnica das Obras Sociais
demonstrava, também, um refinamento nos procedimentos burocráticos e técnicos para
a concessão da matrícula, de tal forma que alcançaram uma precisão maior quanto ao
tipo de obra social que estaria vinculada ao campo da assistência social estatal.
Examinando os Anexos 6 e 7, pode-se comparar as categorias de classificação das obras
sociais adotadas em 1937 e em 1942. Percebe-se um enquadramento mais preciso,
partindo de uma delimitação restrita a obras sociais de beneficência ou de serviço
social
104
, situação bem diferente daquela apontada nos seis primeiros artigos da Lei
2497/35, conforme análise realizada anteriormente. As condicionalidades oficiais
105
e a
metodologia de trabalho dos pesquisadores anteriormente adotada se mantiveram e os
benefícios decorrentes da matrícula se ampliaram: além da possibilidade de serem
subvencionadas pelo Estado, podiam usufruir da isenção de impostos – o que já era
considerado uma forma de auxílio – e receber outras formas de auxílio (como angariar
104
Foi adotada a restrição trazida no Artº 12 do Decreto nº 9486/1938: (...) Haverá, no Departamento de
Serviço Social, um registro de matrícula das instituições particulares de beneficência e de serviço social
existentes no Estado.
105
A obra social deveria atender os requisitos de: enquadrar-se na Lei nº 2497/35 e no Decreto nº
9486/37; ser dirigida por pessoas capazes e de reconhecida idoneidade moral; estar aparelhada para
atingir os fins determinados nos estatutos; ter finalidades que correspondessem às necessidades do meio
social em que atuava.
98
98
donativos publicamente e orientação para reorganização de um serviço). Assim,
encontravam-se matriculadas no Departamento de Serviço Social, em 1942, 392 obras
sociais, das quais 139 eram sediadas na capital e 253 no interior do estado. Desde 1935,
foram negados 44 pedidos de matrícula (por não se enquadrarem nos requisitos) e
canceladas 28 matrículas anteriormente concedidas.
Havia uma nova exigência para a concessão de subvenções pelo poder
público: a instituição contemplada com auxílio superior a CR$ 20.000,00 tinha que
provar que mantinha tantos empregados brasileiros maiores de 45 anos de idade quantas
fossem as parcelas iguais àquela quantia
106
. Trata-se de uma medida de iniciativa do
governo federal de valorização do trabalhador brasileiro e de recorte etário, supondo-se
que a mão-de-obra estrangeira estabelecia concorrência e, no caso, nem sempre se
adequava às exigências do trabalho social
107
. Ademais, todas as obras sociais fundadas
ou mantidas por estrangeiros, matriculadas no Departamento estadual, foram objeto de
estudo para verificar sua situação de funcionamento, “(...) em face dos dispositivos
legais em vigor, ditados, em sua maioria, pelo estado de guerra em que nos
encontramos” (p.53).
Outro serviço da Divisão Técnica que aprimorou técnicas e resultados foi a
Estatística do Serviço Social, a ponto de a coordenadora dessa Divisão sugerir a
extensão de seus trabalhos para o controle estatístico do Serviço Social de Menores e da
Procuradoria de Serviço Social e, assim, dotar o Departamento de Serviço Social de um
sistema central de controle de dados. A perspectiva de um aparelhamento maior do
tratamento de dados era apontado como a possibilidade de integrá-lo ao plano de
uniformização da estatística social do país, empreendido, na época, pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, sendo seu representante estadual a Junta Regional
de Estatística. Portanto, já existia a preocupação de integrar bases de dados em uma
106
Segundo o Decreto-lei federal nº 4362/1942, 3º (...) as entidades que recebem subvenção do poder
público são obrigadas a manter em seus quadros de pessoal tantos empregados brasileiros, maiores de
quarenta e cinco anos e admitidos na vigência deste decreto-lei, quantas sejam as parcelas de vinte contos
de réis compreendidas no valor da subvenção.
107
Examinando o Trabalho de Conclusão de Curso da Escola de Serviço Social “O Serviço Social no
Instituto Modelo Feminino”, de autoria de Carmelita Malheiros (1952), era mencionada a predominância
de enfermeiras e auxiliares de ensino de origem alemã na prestação de serviços às meninas internas. A
autora detectava não só a barreira de comunicação daí gerada, mas também o rigor excessivo na disciplina
interna, imprimida por essas funcionárias, o que resultava em agressões verbais incompreensíveis,
xingamentos e um ambiente anti-educativo para o sucesso dos trabalhos. O Anexo 7 mostra parte das
dependências do Instituto, ilustrada por jovens que lá eram atendidas.
99
99
mesma plataforma, o que só veio a ocorrer mais de meio século depois, para a
assistência social pública. Desde 2005 está em curso a construção da REDE SUAS, o
Sistema Nacional de Informação do SUAS que utiliza a internet na obtenção de dados,
transferência de recursos orçamentários e acompanhamento das ações do Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e dos órgãos gestores federados correlatos.
Além do registro e tratamento dos dados relativos ao Plantão de Serviço
Social e Orientação Técnica das Obras Sociais, a distribuição das subvenções era
calculada pela estatística por meio de critérios de partilha
108
considerados impessoais, o
que era visto como positivo e “(...) veiu pôr termo aos velhos processos de concessão de
auxílio às instituições particulares” (p.65). Apesar da perspectiva de primar pela
objetividade e transparência no processo de partilha das subvenções
109
, a coordenadora
da Divisão Técnica lamentou o fato de o Conselho Administrativo do Estado de São
Paulo – sancionador desse processo – incluir instituições que haviam sido excluídas do
mesmo e contemplar outras instituições de natureza diversa da do campo da assistência
social. Pode-se concluir que critérios políticos foram sobrepostos ao critério técnico,
configurando-se como um exemplo da prática dominante de manipulação do subsídio
estatal, identificada historicamente no solo fértil do terreno da assistência social pública.
O Fichário Central do Departamento estadual publicou, em 1941, o
Indicador das Obras Sociais do Estado de São Paulo, que consistia em um catálogo
dotado de informações sobre os serviços públicos e privados de beneficência e de
serviço social do estado paulista. Foi a primeira publicação no gênero
110
, e sua edição se
esgotou rapidamente, enviada para os mais diversos colaboradores locais, regionais e
internacionais
111
. É interessante destacar que, para a organização da segunda edição do
108
Dentre os critérios adotados, a prioridade continuava a recair para as instituições de proteção a famílias
em situação de miséria, seguindo o disposto no Decreto-lei nº 3200 - conhecido como Estatuto da Família
- e para os serviços sociais destinados a crianças, à difusão do ensino e preparo dos trabalhadores sociais,
apoiado nas recomendações do VII Congresso Panamericano da Criança, realizado em Washington
(EUA), em 1942.
109
Em 1942, os recursos orçamentários para subvenção tinham natureza dupla: saldo da verba
“subvenções”, com o equivalente a Cr$282 mil, somado ao reforço proveniente da verba “despesa
especial”, participando com Cr$618 mil, totalizando Cr$ 900 mil (p.66).
110
Matéria jornalística de O Correio Paulistano, de 29 de novembro de 1941, mencionava “(...) Pela
primeira vez se publica em nossa língua um catálogo dessa natureza, cumprindo notar-se serem poucos os
países que dispõem de organizações que hajam editado guias semelhantes” (p.108).
111
M. Teixeira de Freitas, secretário geral do Conselho Nacional de Estatística; Tales de Azevedo, diretor
da Secretaria do Conselho de Assistência Social do estado da Bahia; Celia Lourdes Franco, da Escuela de
Asistencia Social de Buenos Aires, Argentina; Carmen Bellavita, diretora do Secretariado Central de
100
100
Indicador, a Divisão Técnica encaminhou uma carta aos assistentes sociais de São
Paulo, solicitando sugestões de aperfeiçoamento do referido documento. Além disso, a
consulta aos arquivos, bem como a solicitação de documentação sobre as obras sociais,
também era alvo de expressiva procura, incluindo o Ministro Ataulpho N. de Paiva,
presidente do Conselho Nacional de Serviço Social, e representantes da Comissão
estadual da LBA.
Os serviços complementares de Biblioteca e Publicidade do Departamento
Estadual, transferidos para a Divisão Técnica em 1940, cresceram nos quesitos de
acervo e de exercício de publicização das medidas adotadas pelo órgão gestor,
respectivamente. Trata-se de serviços de consulta e esclarecimento públicos, de variada
composição, e a preocupação atendida foi dotar o acervo da Biblioteca de publicações
técnicas, de tal monta que as principais demandas fossem atendidas: temas do serviço
social (como o serviço social hospitalar, serviço social na indústria), sociologia (o
problema do cortiço, do custo de vida), legislação social brasileira (previdência social,
trabalho da mulher), educação e estatística. Além dos atos oficiais do Diretor Geral do
Departamento de Serviço Social, eram publicados também os Relatórios Anuais, o que
ampliava a visibilidade do trabalho realizado, alcançando positivamente a imprensa
112
,
fundamental para a formação da opinião pública.
Cabe destacar a participação do Departamento de Serviço Social na
Exposição do Estado Nacional, realizada em novembro de 1942, na capital federal, no
Museu Nacional de Belas Artes e organizada pelo governo federal. Em um estande, os
trabalhos desenvolvidos foram divulgados por meio de cartazes, desenhos do
organograma adotado, cartogramas
113
, relatórios e materiais técnicos de apoio.
Certamente, o caráter nacionalista e fomentador do ideário de construção do Estado-
nação estava impregnado nesta Exposição Nacional, produto da tendência que vinha
Asistencia Social de Buenos Aires; Emilio Fournie, chefe do Instituto Internacional Americano de
Protección a la Infancia, de Montevidéu,Uruguai.
112
Há menção do extenso editorial publicado na Revista Economia (Ano IV, nº 35, de abril de 1942),
intitulado A Medida de Todas as Cousas.
113
Contemplavam a comparação entre a superfície do estado e o número de obras sociais em cada região,
entre a população e o número de obras sociais matriculadas distribuídas por regiões, entre os internatos
matriculados e o recolhimento efetuado para desvalidos. Pode-se dizer que se caracterizam como a
protoforma parcial do georeferenciamento social, estratégia moderna de referenciamento das demandas
de proteção social e a cobertura disponível para sua atenção, considerando a centralidade sócio-familiar
em seu território, o que veio a ser adotado em âmbito nacional a partir da implementação da Política
Nacional de Assistência Social, 2004.
101
101
desde o término do Século 19, cuja matriz eram as exposições internacionais temáticas
realizadas em vários países. O êxito das apresentações foi manifestado no ofício do
Presidente do Conselho Nacional de Serviço Social e dirigido ao diretor do
Departamento estadual de Serviço Social (Dr. Cory Gomes de Amorim), no qual
comunicava ter sido lavrado, em ata do Conselho, “(...) um voto de unânime aplauso ao
departamento tão superiormente dirigido por V. Excia. pela primorosa exposição
instalada no Museu Nacional de Belas Artes” (p.78).
Por fim, diante dos resultados obtidos e do acúmulo de trabalho gerado pelo
aprimoramento apontado nos diversos serviços, a coordenadora geral propõe, em nome
de um conjunto de instituições sociais da área
114
, a criação oficial da carreira de
assistente social no serviço público estadual, apoiada em estudo
115
próprio para tal.
Somada a isso, propõe a extensão das orientações técnicas às obras sociais que tiveram
sua matrícula cancelada e/ou pedido de registro negado, como medida profilática e
reparadora das fragilidades que motivaram tais medidas. Encerra reiterando a
objetividade e imparcialidade alcançada nos cálculos estatísticos de distribuição,
fundamentando a manutenção da prática de emissão de pareceres desfavoráveis aos
pedidos de auxílio-extraordinário. Depreende-se daí uma expectativa, mais para desejo
do que materializadora, de os critérios técnicos estarem acima de obscuros interesses
políticos.
Percebe-se, então, um aprimoramento técnico significativo nesse período
fundante do órgão gestor paulista, em seus sete anos iniciais. O aperfeiçoamento da base
de tratamento de dados atestava sua capacidade de se constituir como um banco de
dados útil para as demandas internas do Departamento de Serviço Social, para outros
órgãos públicos e para se credenciar como referência para um público externo
diversificado: estudantes, pesquisadores, organizações privadas beneficentes, de ensino
nacional e internacional e até a imprensa contemporânea. A elaboração do catálogo das
obras sociais paulistas, a publicização dos atos oficiais e relatórios anuais caminharam
114
Centro de Estudos e Ação Social, Escola de Serviço Social, Instituto de Serviço Social e Comissão
Permanente de Ação Social.
115
As proposições eram: integração definitiva e imediata no Quadro Único do funcionalismo, composto
por cinco classes ou degraus; a inclusão na relação de cargos de carreira de provimento efetivo,
correspondente ao Quadro Único; pelas características do trabalho do assistente social, o cargo inicial
teria seus provimentos fixados pelo padrão “G”; o provimento do cargo inicial seria feito por concurso de
títulos, entre assistentes sociais regularmente diplomados por escolas de Serviço Social, reconhecidas
pelo governo paulista, nos termos do estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo.
102
102
nessa mesma direção, de imprimir o caráter público próprio da natureza do serviço
estatal. O mesmo não se pode dizer quanto à interferência externa ao órgão gestor na
decisão sobre a partilha das subvenções, que seqüestra o saber técnico e a adoção de
critérios eqüitativos no acesso ao recurso público.
Por sua vez, o amadurecimento da organização permitiu a distribuição dos
pesquisadores sociais em sub-regiões geográficas, aproximando o órgão gestor da
realidade local dos municípios, o que se configura como uma estratégia esperada por
parte do ente estadual. Todavia, o rigor técnico encontrado no afinamento metodológico
para o atendimento de casos e das demandas das obras sociais, mesmo que em um
estágio inicial de descentralização, ainda seguiam uma matriz conservadora, apartadora
e fragmentadora do não-cidadão – no reconhecimento da pessoa do necessitado. O
mesmo se pode dizer quanto à tentativa de restringir o círculo de instituições
particulares abrangidas pela assistência social: a categoria beneficente e de serviço
social ainda eram insuficientes para uma delimitação, por mais que seu propósito tenha
sido positivo. Na verdade, não se pode creditar ou mesmo restringir a imprecisão a essa
passagem histórica do Departamento de Serviço Social: conforme já mencionado neste
trabalho, trata-se de uma indefinição que se arrastou por mais seis décadas, no país,
quando foi promulgado, em 14 de dezembro próximo passado, o Decreto federal nº
6308, que dispõe sobre as entidades e organizações de assistência social.
Além do mais, depreende-se que o saber técnico tinha sua importância
relativizada na época, restrita ao nascido círculo dos profissionais da área. Pensar os
serviços em seu conjunto é infringir o caráter supletivo da assistência social,
(...) que, então, passa a ser reconhecida, quando dentro de padrões
técnicos, como serviço social. Vista como encargo da comunidade,
onde o Estado exerceria um caráter suplementar, certamente não
caberia pensar a assistência social como um todo (Sposati, 1988:127).
O que importava era o exame caso a caso, obra social por obra social,
confirmando a idéia de que o aparato estatal era o instrumento para processar a
normatização das ações da filantropia privada.
Os dados consubstanciados na lei inaugural, somados àqueles apresentados
nos Relatórios técnicos do órgão gestor estadual permitem inferir que uma matriz de
responsabilidades da esfera paulista pode ser desenhada – e cravada – na figura de dois
103
103
triângulos eqüiláteros correspondentes entre si, cujas pontas traduzem a competência
inaugural atribuída ao órgão gestor estadual da assistência social e que, em sistema de
rodízio quanto ao grau de prevalência, impregnarão sua trajetória. Um triângulo (azul)
refere-se ao objeto da responsabilidade de gestão: o amparo social a casos, o apoio às
entidades sociais e o asilamento de grupos sociais especiais. O outro triângulo (verde)
demonstra o tipo de resposta ao objeto, respectivamente: o plantão social; o cadastro,
subvenção, convênio e isenção tributária à entidade social; o atendimento em internato,
semi-internato, instituto. Outro componente dessa Matriz é a presença do Serviço Social
como profissão emergente que começava a ocupar espaço na divisão social e técnica do
trabalho na época, reforçado pelo fato da 1ª Escola de Serviço Social do país ter sede
em São Paulo. Assim, o órgão executivo paulista abriu campo de trabalho ao assistente
social, e de forma precedente ao órgão federal LBA que requisita, em maior escala, a
ação voluntária desempenhada pelas primeiras damas. Esse é o desenho sugestivo de
uma matriz determinante da conformação do órgão gestor estadual paulista, o que
requer o exame do movimento de alternância das responsabilidades inaugurais na sua
trajetória histórica.
Matriz I – Responsabilidades da esfera estadual de gestão da assistência social
Serviço Social
cadastro
subvenção
convênio
isenção
Apoio a
entidades
sociais
Internato
semi-internato
institutos
Asilamento de mendicidade,
crianças e adolescentes,
grupos especiais.
Serviço Social
Amparo
social a
casos
Plantão Social / Auxílios
104
104
Há de se apontar uma inflexão: a convivência da prestação de serviços
próprios estaduais com os serviços privados e municipais do campo da assistência
social. O modo pelo qual estabeleceram essa relação de convivência pode ser
determinante para um desenho de relações paralelas ou complementares, mais distantes
ou mais próximas de um desenho republicano.
Outra matriz determinante que já se desenhava nessa primeira metade do
século 20 aponta para a construção departamentalizada e separadora da responsabilidade
estatal pela assistência social em quatro desenhos paralelos de organização técnico-
administrativa: um próprio para a questão da criança e do adolescente tidos como
desvalidos, outro multitemático para a assistência social (com aparato próprio e indireto
de serviços), um terceiro para acolher as ações das primeiras-damas, que ensaia os
passos inaugurais com a exuberância de iniciativas da primeira-dama Leonor Mendes de
Barros, e um quarto desenho paralelo que demonstra o nomadismo no pertencimento
organizacional da gestão da assistência social na esfera estatal: ora está vinculada ao
setor da justiça, ora à saúde, ora ao trabalho, de forma predominante. Por sua vez, a
assistência social trava com o campo da criança e do adolescente uma relação setorial
alternada entre convivência e separação, o que determina um movimento de migração
de campo entre ambos.
Matriz II – interferências no modo de gestão estadual da assistência social
criança e adolescente
migração de campo relação com entidades
assistência social/ atendimento a casos
aparato próprio internação/semi-
internato
paralelismo primeira-dama: presença/influência
associação heterogênea na gestão trabalho, saúde, justiça...
Portanto, as duas matrizes podem ser apontadas como fundamentais na
determinação dos caminhos históricos do órgão gestor estadual paulista para a
construção unificada do SUAS.
105
105
Capítulo II - Percursos paralelos da União e dos Estados na gestão da assistência
social (1946-1964)
O Estado getulista materializou a idéia de que, em um país desarticulado
como o Brasil, cabia ao Estado organizar a nação para promover, dentro da ordem, o
desenvolvimento econômico e o bem-estar geral e, para tal modernização conservadora,
Getúlio lapidou, com sabedoria, a sua imagem de pai dos trabalhadores, e a de sua
esposa, de mãe dos pobres. De forma oculta, o discurso maternalista adquiriu
institucionalidade no aparelho do Estado, orgânica e emblemática, na era getulista,
calcificada na história pregressa e presente.
O “discurso maternalista” é entendido como a postura ideológica adotada
por mulheres das camadas médias e alta, que defendia a prevalência do sexo feminino
na defesa e desempenho de atividades relacionadas ao bem-estar das mulheres e das
crianças, devido à natureza específica para a maternidade, a sua vocação própria (Mott,
2001).
Ao longo do século 19, os poucos lugares de encontro e discussões de
mulheres brasileiras, em torno de temas relativos ao bem comum e de interesse do
próprio sexo, eram as agremiações literárias, as reuniões internas dos jornais e revistas
femininas, as sociedades abolicionistas e associações de caridade. Supõe-se que fatores
conjunturais da época tenham influenciado no baixo número de grupos associativos
femininos, tais como a força da autoridade masculina, receio de ir contra os costumes e
ser alvo de censura pública, dentre outros. Assim, a denúncia e luta das mulheres
brasileiras contra a opressão social ficava restrita à publicação de livros e a jornais
editados por mulheres, que começaram a circular a partir de 1850, sendo que os
principais temas abordados eram a educação feminina e a importância da maternidade.
Ganhava destaque a defesa da educação das mulheres para um melhor desempenho da
função de mãe de família, com as quais os filhos aprenderiam as primeiras lições e os
princípios morais.
Dessa forma, Moncorvo Filho contou com o inegável apoio das Damas da
Assistência à Infância para sua obra, conferindo legitimidade à transmissão dos valores
necessários para os padrões desejáveis da educação materno-infantil da época. A
106
106
presença de grupos e associações fundadas, organizadas e administradas por mulheres
aumentou no período republicano e, na virada do século 20, o reconhecimento da
importância da mulher, devido à maternidade, já estava solidificada na sociedade
brasileira e era aceito por homens e mulheres. Assim, a natureza feminina (dantes
restrita à esfera doméstica) foi usada para abrir as portas e levar aptidões maternas para
fora de casa, para o exercício de determinadas atividades consideradas próprias das
mulheres, como a assistência social, coerentes com a missão altruística das mães – e até
mesmo para o exercício de direitos políticos, devido a uma moralidade específica do
sexo feminino (idem:210).
Nas primeiras décadas do século 20, a participação feminina em
movimentos de reforma social e de reivindicações políticas foi intensificada, com uma
pauta de lutas pela defesa de direitos políticos tais como o direito ao voto da mulher, a
emancipação jurídica, econômica, social e intelectual, e pelo estabelecimento de leis de
proteção à infância e à maternidade. Foram lutas decisivas, que influíram na acolhida de
várias reivindicações na Constituição de 1934: o direito de a mulher votar e ser votada
em situação de igualdade com os homens, de preservar a nacionalidade se casada com
estrangeiro, salário mínimo, limite de oito horas diárias de trabalho, férias remuneradas,
licença maternidade, acesso a funções públicas, participação na direção e administração
de programas de assistência e bem-estar social relativos à maternidade e à infância.
Na seqüência histórica, a assistência materno-infantil norteou a ação tanto
da benemerência quanto das ações inaugurais de órgãos governamentais. Entidades
filantrópicas se constituíram, lastreadas pela proeminência de mulheres combativas
como Pérola Byington
116
e Leonor Mendes de Barros, que mesclava iniciativas
filantrópicas na condição de empreendedora social e esposa do político paulista
Adhemar de Barros.
Órgãos federais como o Departamento Nacional da Criança e a LBA são
criados sob essa diretriz, influente também na estruturação do Departamento de
Assistência Social de São Paulo. Eclipsada pelas relações desiguais entre as próprias
116
Fundadora da Cruzada Pró-Infância, liderava um grupo de mulheres de São Paulo, junto com Maria
Antonieta de Castro, com o objetivo de combater a mortalidade infantil através de um programa de
assistência para as crianças e para suas mães.
107
107
mulheres, porém, a tônica do trabalho social pendia para a valorização da formação e
inserção de meninas pobres em ofícios necessários à reprodução da “maternidade
transferida”
117
, visível em algumas propostas feitas, principalmente, pelo órgão gestor
paulista em sua fase inaugural.
Inspirada nessa lógica, Darcy Vargas protagonizou, com excelência, a
vocação feminina de cuidados à prole, numerosa no âmbito nacional, à família dos
combatentes e, lato sensu, à família brasileira desguarnecida de apoio à sobrevivência
digna, recuperável a partir da proteção materno-infantil. Matriz do arquétipo cuidador e
provedor, abriu alas para a sedimentação do exercício profícuo e duradouro de
primeiras-damas públicas.
2.1 Final da era getulista (1954)
A inclinação centralizadora se revelou desde os primeiros meses da
Revolução de 30, e alcançou sua plenitude no Estado Novo. Os Estados foram
governados por interventores sob forte controle de um departamento administrativo do
Governo Central: os orçamentos e todos os decretos-leis dos interventores dependiam
da aprovação desse departamento – a partir do decreto-lei de abril de 1939 (Fausto,
2007:366).
O Estado Novo representou uma aliança de interesses de diferentes setores
da sociedade em torno do objetivo comum de promover a industrialização sem grandes
abalos sociais: a burocracia civil considerava-a como o caminho para a verdadeira
independência do país; aos militares, interessava a instalação de uma indústria de base
como elemento possível para o fortalecimento da economia, o que era importante para a
segurança nacional; os industriais estavam convencidos de que uma intervenção ativa
do Estado seria o incentivo necessário à industrialização.
Fausto (2007) entende que os problemas do Estado Novo decorreram mais
da inserção do país no quadro das relações internacionais do que propriamente das
117
É uma prática protecionista, fundada sob a mais diversa natureza, na qual as mulheres atribuem-se
mútuas responsabilidades. Para o exercício de atividades fora do lar, da esfera doméstica, é trivial que as
mulheres precisem delegar tarefas da administração de sua casa a outras mulheres (Costa, 2002).
108
108
condições políticas internas. Um conjunto de fatores provocou divergências no interior
do Estado e impulsionou as oposições a lutarem pelo fim da ditadura civil.
A entrada do país na Segunda Guerra Mundial foi entendida como uma
contradição entre o apoio do Brasil às democracias e a convivência com a ditadura
interna. A primeira manifestação nesse sentido deu-se com o Manifesto dos Mineiros
(em 24/10/1943), mesma data comemorativa da vitória da Revolução de 30, na
perspectiva de mostrar que a Revolução se desviava de seus objetivos democráticos.
Esse movimento, composto por representantes da elite mineira, propunha a instalação
no país de um verdadeiro regime democrático, capaz de dar segurança econômica e bem
estar ao povo brasileiro.
y O Ministro Osvaldo Aranha, da pasta das Relações Exteriores, demonstrou
apoio à abertura democrática quando não conseguiu assumir a vice-presidência da
Sociedade dos Amigos da América - que congregava civis e militares da oposição - ao
ser fechada pela polícia antes de sua posse. Pediu demissão do Ministério.
y Outro fato de peso para o fim do Estado Novo foi o regresso do general
Góis Monteiro ao Brasil – era embaixador em Montevidéu – para assumir o Ministério
da Guerra em agosto de 1945, mais para encaminhar a saída de Getúlio, embora tenha
sido um dos idealizadores e mantenedores do Estado Novo.
y Por parte da sociedade civil, um grupo novo e de prestígio surgiu da luta
pela democratização – os estudantes universitários se mobilizaram contra a ditadura,
organizando a União Nacional dos Estudantes (UNE) e suas seções estaduais. Apesar de
serem fortemente reprimidos, angariavam simpatia e adesão crescentes. O governo
usava o argumento da continuidade da ditadura enquanto durasse a guerra e que, tão
logo terminasse, as eleições seriam realizadas.
y Em 1944, a oposição liberal lançou a candidatura do major-brigadeiro da
Aeronáutica Eduardo Gomes à presidência da República. Um novo Código Eleitoral foi
decretado em 1945, fixando a eleição presidencial e uma Assembléia Constituinte em 2
de dezembro, além da realização dos pleitos estaduais em 6 de maio de 1946. O
candidato governista foi o general Dutra, apoiado pelo Partido Social Democrático-
PSD.
y Surpreendentemente, o apoio do Partido Comunista Brasileiro (PCB) ao
Governo Vargas tendia a mudar o processo eleitoral. Dantes perseguido e (quase)
varrido do cenário político, o PCB propunha agora o apoio aos círculos trabalhistas –
109
109
cooptados por Vargas – e à campanha “queremista”
118
de inversão do pleito eleitoral: a
defesa era pela realização de uma Assembléia Nacional Constituinte, com Getúlio no
poder, seguida das eleições presidenciais mantendo-o como candidato.
y As sucessivas aproximações do getulismo com o peronismo da Argentina
influenciaram na deposição de Vargas. Em condições diferentes, ambos defendiam a
consolidação de um capitalismo nacional erguido sob a colaboração coesa das massas
populares e da burguesia nacional, sustentado pela ação de um Estado que fosse capaz
de incorporar as aspirações de todos. Getulismo e peronismo são duas expressões do
populismo latino-americano que não eram vistos positivamente pelo governo norte-
americano, todavia isto não chegou a se caracterizar como estopim da queda de Vargas.
Ao conjunto dos fatores sucessivos expostos somou-se a deposição do
prestigiado chefe da polícia do Distrito Federal – João Alberto –, imediatamente
substituído pelo irmão do Presidente da República, Benjamin Vargas. A partir desse
fato, o Ministro da Guerra mobilizou as tropas militares e Getúlio renunciou, voltando a
sua terra natal (São Borja-RS).
A transição pré-eleitoral para a democracia pós-getulista foi conduzida pelo
presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares. O General Eurico Gaspar Dutra
venceu as eleições presidenciais de 1945 – e iniciou seu mandato em janeiro de 1946 –
principalmente porque recebeu o apoio de Vargas na véspera do pleito eleitoral, o que
mostra seu prestígio mantido entre os trabalhadores. Além do mais, o comparecimento
às urnas dos eleitores foi maior do que ocorrera em 1930 – os eleitores, de 1,9 milhão,
passaram a 6,2 milhões (Fausto, 2007:398). Concomitantemente, Vargas volta à cena
política, elegendo-se senador pelo PSD do Rio Grande do Sul.
Em setembro de 1946, a nova Constituição Federal foi promulgada,
reafirmando o caráter federativo da República e estabelecendo as atribuições da União,
Estados e Municípios. As atribuições dos três Poderes – Executivo, Legislativo e
Judiciário – também foram fixadas e, apesar de prever a participação dos trabalhadores
no lucro das empresas, isso não chegou a se efetivar pela inexistência de lei
regulamentadora posterior. A Constituição abre uma nova perspectiva para as
118
Resumia a palavra de ordem “queremos Getúlio”.
110
110
instituições sociais: isenta de impostos as instituições de assistência social, desde que
suas rendas sejam aplicadas integralmente no país e para os respectivos fins (Art. 31, V,
letra b)
119
. Essa medida estende e amplia o acesso ao benefício fiscal, que antes era
atribuído de forma particularizada e a poucas instituições, mantendo ainda o crivo
sancionador do CNSS, criado em 1938.
A queda de Vargas, a retomada do Estado de direito e a Constituição de
1946 configuram-se como fatores que impulsionaram a entrada do país no período
democrático-populista, 1946 a 1964 (Mestriner, 2001).
O padrão paternalista e protetor, próprio da ação política getulista, foi
substituído por um padrão nacionalista e democrático que, todavia, preserva o
populismo como traço dominante do governante. De um lado, a dependência dos países
industrializados para obter equipamentos, tecnologia e financiamento se colocava como
questão a ser superada com a industrialização plena do Brasil, um atraso a ser superado.
De outro lado, o estilo de liderança política, do modo de governar, o carisma pessoal, a
não vinculação orgânica partidária encontraram sua expressão em governantes da época
como Jânio da Silva Quadros, João Goulart, além do retorno do próprio Getúlio Vargas
à Presidência da República, e em Adhemar Pereira de Barros nas gestões estadual e
municipal paulistas.
Na década de 40, o Estado de São Paulo foi governado pelos interventores
federais Fernando de Souza Costa (1941 a 1945) e José Carlos de Macedo Soares (1945
a 1947), sucedidos pelo governador eleito Adhemar de Barros (1947 a 1951). A
Assembléia Legislativa é reaberta (permanecera fechada desde 1937) em 1947 e, após a
Constituinte, é promulgada uma nova Constituição Estadual, nesse ano.
Diferentemente da Constituição anterior, essa nova Carta Magna estadual
abre, em seu Título VII, um espaço próprio para a Assistência Social e, agora, inclui na
sua denominação a Saúde Pública. É a primeira vez que a área da saúde designa um
capítulo na órbita constitucional estadual.
119
Sua regulamentação ocorre somente em 1957 (Lei 3193), ao dispor que veda à União, Estados e
Municípios lançar imposto sobre templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos,
instituições de educação e assistência social, desde que suas rendas sejam aplicadas integralmente no país
e para os respectivos fins.
111
111
Logo no primeiro item do Título – artigo 130 – ficou estabelecida a
incumbência do Estado em assegurar a assistência, a previdência, a higiene e a saúde
pública, mediante um plano geral. Duas inovações podem ser daí apreendidas.
y A área de abrangência do capítulo constitucional estadual prenuncia a
seguridade social garantida na Constituição Federal de 1988
120
, ao conjugar a saúde,
previdência e assistência social em um mesmo campo de política pública.
y Imprime racionalidade técnica à articulação intersetorial necessária, por
meio do planejamento governamental. A Lei estadual nº 568/49 criou uma Comissão de
Planejamento de Saúde, Higiene e Assistência para cumprir esse dispositivo
constitucional, sendo aprimorada três anos depois (Lei nº 1714/52), quando dispôs que
sua composição seria constituída por técnicos e especialistas pertencentes ou não à
Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde Pública e Assistência Social.
As finalidades conferidas ao campo da assistência social e saúde pública
envolviam a educação sanitária da população, o que difere substancialmente da
disposição constitucional anterior
121
, além de indicar a necessidade de pesquisas
continuadas multitemáticas na área da saúde pública.
Delimitou a priorização da assistência médico-social à maternidade, à
infância e à velhice, o que obedeceu a tendência pretérita e contemporânea de focar a
centralidade na proteção materno-infantil. A estratégia de implementação dessas
finalidades, no âmbito estadual, estava na articulação com os municípios e as obras
sociais. Dessa forma, foi aperfeiçoada na carta constitucional a competência do ente
estadual de buscar a articulação intergovernamental e interinstitucional para executar as
finalidades expressas.
A vinculação orçamentária foi alargada tanto em seu escopo de alcance
quanto no porcentual financeiro: abarcou o combate às endemias e flagelos sociais –
sendo esse último considerado ora como veneno ora como mal social –, o que elevou
para 2% das receitas ordinárias a dita vinculação das receitas estaduais.
120
Artigo 194: a Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa do Poder
Público e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência
social.
121
Artigo 79, b: estimular a educação eugênica.
112
112
Os artigos nº 132 e 133 explicitaram a subsidiariedade estatal às instituições
privadas idôneas, pela via da subvenção e isenção fiscal, reservando maior
detalhamento às instituições privadas de assistência social. Garantiam a perspectiva de
tratamento homogêneo e mais centrado nas relações com as instituições de assistência
social que dependiam, então, de um comando único, centralizado em um órgão estadual,
supostamente exercido pelo Departamento de Serviço Social, em um primeiro momento
devidamente planejado, regulado e fiscalizado
122
. O aparelho do Estado se organizou
organicamente para tal tarefa ao criar, em 1960, o Conselho Estadual de Auxílios e
Subvenções – o CEAS – (Lei nº 5580 de 21/1/60).
Por outro lado, no cenário nacional, o percurso adotado foi alargar o âmbito
da provisão dos serviços sociais para além da benemerência e da ação voluntária do
primeiro-damismo. Era preciso um novo aparato social, articulado com a elite industrial
emergente e com aquela relativa ao setor terciário, por meio de macro-organismos
sociais (Mestriner, 2001:117).
Assim, foram criados, logo no início do Governo Dutra (1946), o Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), o Serviço Social do Comércio (SESC)
e o Serviço Social da Indústria (SESI) que, conjugados ao Serviço Nacional da Indústria
(SENAI) – criado em 1942 –, compuseram o reconhecido Sistema S, o que avalizou o
ingresso de setores do mercado na gama de ofertas de serviços sociais, de recorte ora
corporativo ora ampliado para a população.
Esse conjunto institucional representa, sobejamente, a característica datada
do período da filantropia partilhada sob o âmbito educacional (idem, 2001). A
perspectiva formadora da força de trabalho, exigida pelos setores da indústria e do
comércio em plena expansão, era parte integrante do horizonte desenvolvimentista da
época.
Em São Paulo, por força do novo patamar conferido à conjugação entre
assistência social e saúde pública, ocorreram mudanças na organização administrativa
122
Conforme apontado no Anexo nº 21, há um conjunto de Leis estaduais, no período ora analisado, que
disciplinam a concessão de auxílios e subvenções às obras de assistência social: Lei nº 45/1947; Lei nº
922/1950; Lei nº 3314/1955; Lei nº 5466/1959; Lei nº 6023/1960.
113
113
estadual. O Departamento de Serviço Social passou a ser denominado como Serviço
Social do Estado (decreto-lei nº 17274, 3º de 6/6/47). Por sua vez, o Serviço Social de
Menores (SSM) saiu da esfera desse órgão gestor estadual e passou a ser subordinado
diretamente à Secretaria da Justiça e Negócios do Interior, atribuindo-lhe todos os
serviços relativos à infância e adolescência necessitada, aos abandonados e
delinqüentes. Sem dúvida, essa mudança de status administrativo do SSM é o começo
da trajetória paralela que incide na responsabilidade estadual sobre a assistência social e
o campo desse segmento social desvalido. Somente cerca de 45 anos depois (1993)
ocorrerá a fusão administrativa de ambas
123
, voltando à separação parcial
posteriormente
124
. Esse movimento de distanciamento/aproximação entre as duas áreas
(criança/adolescente e assistência social) persistem e se alternam na roda da história
conformação mutante da roda dos expostos dos tempos coloniais – do órgão gestor
paulista e de outros estados brasileiros.
O decreto-lei nº 17339 de 28/6/47 criou a Secretaria de Estado dos Negócios
da Saúde Pública e da Assistência Social. Nesse momento, a estrutura anterior –
Secretaria de Educação e Saúde Pública – preservou somente a Pasta da Educação
isolada. O Serviço Social do Estado passou a fazer parte da Secretaria da Saúde Pública
e Assistência Social, à exceção de determinados órgãos internos
125
. Portanto, a
assistência social migrou da área da justiça e integra o campo da saúde por mais 20
anos, quando em 1967 foi organizada em um setor próprio e específico, com a criação
da Secretaria da Promoção Social.
Essa vinculação da assistência social à saúde ocorre com freqüência
histórica na divisão do trabalho governamental, como expressão da ótica secular
higienista e da perspectiva médico-social de enfrentamento dos “males sociais”,
um binômio próprio do conceito que associa saneamento moral e
higiênico. Limpar a sociedade dos “venenos sociais”, reiterando o
conceito miasmático das doenças, já defasado no campo da medicina,
123
O decreto-lei nº 36454 de 19/1/93 dispõe que a Secretaria do Menor passa a denominar-se Secretaria
da Criança, Família e Bem-Estar Social, incorporando outras unidades da Secretaria da Promoção Social.
A Lei nº 8312 de 12/5/93 extingue a Secretaria da Promoção Social e transfere suas atribuições à
Secretaria da Criança, Família e Bem-Estar Social.
124
Em 2001, a FEBEM-SP sai da esfera da assistência social para alojar-se na recém criada Secretaria da
Juventude e, em 2004, migra para a Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania.
125
Permanecem na Secretaria de Estado da Justiça e dos Negócios Interiores a Procuradoria do Serviço
Social e o serviço de proteção a egressos de reformatórios e estabelecimentos correcionais e penais.
114
114
fazia, ao que parece, parte das concepções sobre os problemas
sociais nas primeiras décadas do século XX. Os fluídos dos
“venenos sociais” precisavam ser contidos e a medicina
higiênica, como forma de controle político das populações, se
prestava a tanto (Sposati, 1988:122).
Portanto, a reorganização técnico-administrativa realizada em 1947 mantém
na assistência social estadual a responsabilidade pelo serviço social dos desvalidos
(adultos), dos trabalhadores e da família.
Em 1948 é realizada a I Semana de Estudos dos Problemas dos Menores, por
iniciativa do Tribunal de Justiça de São Paulo, por inspiração de idealistas como o
Desembargador Theodomiro Dias e o então Procurador de Justiça, João Baptista de
Arruda Sampaio. A proposta era debater e realizar reformas de ordem jurídica,
pedagógica e social no estudo e recuperação dos menores de idade, o que congregou o
apoio e participação do Juizado de Menores, do Serviço Social de Menores, Serviço
Social do Estado, outros órgãos afins, e renomados juristas e técnicos da área social.
Foram realizadas outras Semanas anualmente, no intervalo entre 1948 a 1973, quando
os debates sobre a estruturação de um órgão específico para a atenção ao menor
abandonado e infrator impulsionou a criação da Fundação Paulista de Promoção Social
do Menor – PRÓ-MENOR – em 1973.
O Governo Dutra acomodou tensões sociais, sob o preço de um crescimento
industrial em evolução, graças a um regime cambial que não favorecia as exportações, e
com restrições para importações. Em nome da luta contra o comunismo e da defesa da
democracia no Ocidente, suspendeu as relações diplomáticas do Brasil com a União
Soviética, fechou o Partido Comunista Brasileiro em 1947, e cassou os mandatos de
seus parlamentares no Congresso Nacional, nas Assembléias Estaduais e nas Câmaras
Municipais.
Cabe retomar aqui a configuração da Legião Brasileira de Assistência.
Araújo (2002) indica que a concepção de um órgão central criado para expandir e
integrar, ao mesmo tempo, as ações voluntárias benemerentes vinham se dando no
interior do Estado, antes da entrada do país na Segunda Guerra Mundial. Interessava ao
Governo Central fomentar as iniciativas civis, pois já atendiam as demandas sociais que
se avolumavam nos centros urbanos, principalmente nas regiões onde a industrialização
115
115
avançara, e antecipar-se a pressões sociais exercidas pelas precárias condições de vida
dos segmentos sociais excluídos econômica e socialmente; controlá-las era fundamental.
Há indícios de que a própria sigla – Legião – pode ser originária de outro movimento
semelhante empreendido pela esposa do então presidente do estado gaúcho, Getúlio
Vargas, em 1930, quando Darcy Vargas organizou no Rio Grande do Sul a Legião da
Caridade, movimento assistencial de atendimento aos combatentes e aos seus familiares
na Revolução de 30 (idem :179).
A concepção desse órgão central de assistência social, em 1942, levou à
aproximação com as Confederações da Indústria e do Comércio, a fim de estabelecer o
apoio, também, para a estruturação de um organismo captador de recursos e estimulador
da ação voluntária, que era a Fundação Darcy Vargas
126
. Todavia, a guerra precipitou o
formato campanhista e de apoio prioritário às famílias dos combatentes, o que exigia
que tivesse alcance nacional e, para isso, era preciso que se reproduzisse a iniciativa nos
estados e municípios. Darcy Vargas telegrafou para as primeiras-damas estaduais, com
a seguinte mensagem:
Visto grandes dificuldades atravessa nosso País, mulher brasileira será
chamada cumprir missão na proteção famílias bravos soldados e
execução todos os deveres civis necessários [...] Sugerimos assuma
neste estado a direção dos movimentos em conjunto Associação
Comercial que a procurará imediatamente (Araújo, 1981: 15 in
Araújo, 2001: 180).
A partir dessa iniciativa, a primeira-dama federal estimulou o espírito
patriótico das esposas dos governantes estaduais e municipais, desencadeando
oficialmente o processo de mobilização do voluntariado, sob a expressão de uma
“nacionalização descendente” das ações assistenciais, ou seja, o alistamento
compulsório das mulheres/esposas/voluntárias para o front social, convocadas de cima
para baixo.
126
A Fundação Darcy Vargas foi criada em 25 de novembro de 1938, na região central da capital federal,
como instituição filantrópica e exerce atividades até a atualidade. Em 8/9/40, a Casa do Pequeno
Jornaleiro foi fundada, com a proposta original de atender os meninos de rua (que vendiam jornais) em
sistema de internato. Foi reestruturada gradativamente, abolindo o internato e se ampliando para atender a
estudantes de escolas municipais dos arredores da instituição social de ambos os sexos, de 11 a 18 anos de
idade, com ênfase no atendimento à educação geral e à capacitação para o trabalho. Recebem uma bolsa-
auxílio de R$70 mensais, doada por um padrinho ou madrinha voluntário(a). Fonte: www.fdv.org.br
116
116
É curioso apontar que, em documento interno da LBA
127
, há o registro de
que o Programa de Voluntariado implantado em 1942 tinha como princípio a “justeza
social”, traduzido por um rigor seletivo na prestação da assistência social, por parte do
voluntário, com o fito de avaliar se os pobres eram realmente pobres ou aproveitadores.
A prestação de forma justa propiciaria o atendimento da necessidade real, haja vista não
existir recursos para todos, orientando o registro do atendimento em um fichário dos
assistidos, e com possibilidade de recorrer a serviços públicos e privados, como asilos,
hospitais, sanatórios e escolas, que receberiam subsídios de baixo valor. Nota-se, então,
que o critério orientador da intervenção voluntária era pela restrição de acessos,
próximo da justeza e, portanto, longe da baliza da justiça social. Outra orientação era
dar maior atenção aos mutilados de guerra e aos desempregados do perímetro urbano, o
que os deixava ao sabor do mérito social atribuído pela atenção leiga.
Portanto, o modelo implantado – e perenizado – da LBA era despolitizador
da questão social e apolítico pois, a própria primeira-dama federal reafirmava que o
movimento do voluntariado não era político, era de solidariedade. A teia tecida e
mantida pela arregimentação das primeiras-damas estaduais e municipais tinha, na sua
pessoa, o fio condutor de uma rede assistencialista sustentada pelo exercício solidário
pessoal e institucional.
Dessa forma,
o Programa de Voluntariado situava-se entre o poder constituído e as
classes sociais menos privilegiadas. As relações eram de incentivo à
participação social da sociedade brasileira no Programa, orientado
pelos princípios da moral e do civismo. Nessa direção, as necessidades
sociais do povo eram consideradas naturais, cabendo ao Estado
estimular os mais providos (voluntários) para fazerem o bem ao
próximo. Esses valores e princípios humanitários também compunham
o elenco do cenário populista, como a corrente econômica
nacionalista, que se expandia, na intenção de tornar o País mais
independente da influência de outros, ao mesmo tempo em que
idealizava o seu desenvolvimento. Tais elementos inseriram-se no
imaginário do povo, enquanto o projeto capitalista brasileiro evoluía.
A partir dessa forma de governo, foi consolidado um estilo que se
reproduziu em diversas dimensões na história do desenvolvimento
político brasileiro (Araújo, 2002:183).
127
Legião Brasileira de Assistência. Relatório apresentado pela Comissão Estadual do Rio Grande do Sul.
Porto Alegre, 1994. In Araújo, 2002:181.
117
117
Ao término da guerra, ocorreu a primeira reestruturação da LBA, em 1946,
conduzida pelo Dr. Otávio da Rocha Miranda, já no Governo Dutra, com a modificação
do estatuto original do órgão, porém centrado na prestação da assistência à maternidade
e à infância em todo o país, por meio da centralidade da atenção à família.
Foi implantado um planejamento racional de suas atividades, sob forte
influência do Serviço Social enquanto profissão emergente na sociedade brasileira, com
o objetivo de reformular a política assistencial adotada até então. A perspectiva era
adotar uma metodologia de estudo da realidade, para a criação de serviços dotados de
programação adequada, baseados em padrões mínimos necessários à superação do
assistencialismo, válidos tanto para as obras próprias quanto para aquelas objeto de
convênio com a LBA. As iniciativas implantadas pela LBA serviam de modelo para a
criação de outras similares, tal qual os centros de proteção à mãe e à criança, na forma
dos Postos de Puericultura, Creches, Comissões Municipais, Hospitais Infantis e
Maternidades. Sob o exemplo modelar da LBA, foram criadas, por iniciativa da
sociedade civil, as Associações de Proteção à Maternidade e à Infância – APMI. Além
disso, a LBA tomava a iniciativa de atender e estimular o atendimento às necessidades
socioeconômicas de populações atingidas por catástrofes como secas, incêndios,
desabamentos e enchentes.
A recondução de Darcy Vargas à presidência da LBA ocorreu em 1951,
quando Getúlio Vargas retornou à Presidência da República, sem o apoio do general
Dutra, em contrapartida àquele dado pelo Governador paulista Adhemar de Barros. O
Programa de Voluntariado se revigorou em 1952, sob o comando da assistente social
Léa Leal
128
, que colaborou muito com a primeira-dama, no envolvimento das mulheres
dos ministros de Estado e de outras de grande representação sociopolítica no país.
Certamente, estava em curso o fato de que
assim como o trabalho assistencial, através do voluntariado
filantrópico mesclando as esferas do público e do privado, constitui-se
em uma estratégia de despolitização da questão social, da mesma
maneira o predomínio do trabalho feminino na prestação dos serviços
sociais participa desta estratégia despolitizadora, ao encobrir a relação
profissional com a aura humanitária do cuidado feminino, do olhar
sensível e da atenção maternal (Fleury, 1994: 56).
128
Foi presidente da LBA em 1979.
118
118
A estrutura administrativa da LBA, em 1951, era composta por uma
Comissão Central, por quatro órgãos administrativos (chefia de gabinete, Departamento
de Maternidade e Infância, Departamento de Administração e Procuradoria Geral) e um
Conselho Deliberativo
129
, cujos membros pertenciam à Comissão Central e outros que
eram representantes de órgãos privados e públicos, na proporção de 2 para 1,
respectivamente. Dessa forma, a sociedade civil comparece com maior peso na esfera
decisória do principal órgão estatal da assistência social, no começo da segunda metade
do século 20, o que confirma o trânsito titubeante da responsabilidade estatal pela
assistência social, entre as fronteiras da esfera pública e privada, até o começo do
terceiro milênio. Salta aos olhos a presença hegemônica dos segmentos da indústria e do
comércio nacional, exacerbada pela participação de 6 representantes dentre 15
conselheiros, em contrapartida à única representação do segmento benemerente,
exercido pela Igreja Católica.
Ainda em 1951, foi organizada uma Comissão Nacional de Bem-Estar Social
(CBES) pelo Presidente Vargas, com o objetivo de orientar os diversos serviços ligados
ao bem-estar das populações (Boletim LBA c, 1951). Sob a presidência do Ministro do
Trabalho, Segadas Viana, seus membros reuniram-se em novembro daquele ano, tendo
como representante da LBA Alzira Vargas do Amaral Peixoto, filha de Getúlio e Darcy
Vargas. O primeiro pronunciamento foi do Professor Josué de Castro, técnico, versando
sobre os trabalhos da Comissão Brasileira do Trabalho e Emprego – CBTE – na
perspectiva da unificação dos planos de benefícios da Previdência Social, enquanto
matéria em análise e sob posterior consideração do Presidente da República. Outro tema
129
Membros da Comissão Central:
·Presidente: Darcy Sarmanho Vargas
-Vice-Presidente (s): Dr. João Daudt d’Oliveira (Presidente da Confederação Nacional do Comércio); Dr. Euvaldo
Lodi (Presidente da Confederação Nacional da Indústria); Professor Joaquim Martagão Gesteira (Diretor do
Departamento Nacional da Criança); Dr. Aluízio Alves (Representante da Ação Social Arquidiocesana).
Membros do Conselho Deliberativo:
Comissão Central
·Presidente do Conselho Nacional do Serviço Social (Ministro Ataulfo Nápoles de Paiva)
·Presidente da Associação Brasileira de Imprensa (Dr. Herbert Moses)
·Presidente do Banco do Brasil (Ricardo Jaffet)
·Presidente da Academia Nacional de Medicina (representante: Dr. Álvaro Cumplido Sant’Ana)
·Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (Prof. Henrique Valadão)
·Juiz de Menores do Distrito Federal (Dr. Orlando de Mendonça Moreira)
·Representante dos Órgãos Arrecadadores (Dr. Henrique de La Roque Almeida)
·Representantes da Confederação Nacional da Indústria (Dr. Eduardo Vasconcelos Pederneiras e Dr. Arthur Tavares
de Moura)
·Representantes da Confederação Nacional do Comércio (Dr. José Manoel Fernandes e Sr. Pedro Magalhães Corrêa)
·Representante do Governo Federal (Desembargador Augusto Sabóia Lima)
Fonte: Boletim LBA a, 1951.
119
119
tratado dizia respeito à questão das habitações populares, planejadas a longo prazo e de
largo alcance sócio-econômico.
Alzira Vargas pronunciou-se, afirmando que esperava que
os membros da Comissão levem os temas, que venham a defender,
dentro de um terreno objetivo e que é sabido que o fenômeno que
envolve a economia brasileira não é mais nem menos que o reflexo do
que ocorre no mundo do após guerra, condições impostas por uma
sociedade que domina populações inteiras em detrimento de direitos
das grandes massas populares. Diz a senhora Alzira Vargas do Amaral
Peixoto, ao finalizar as suas palavras, que o mais necessário ainda é
criar-se no povo uma confiança incondicional nas coisas públicas e
que, tão logo se consiga buscar a confiança desse povo, os problemas
serão resolvidos suficientemente (Boletim LBA c, 1951:13).
Certamente, a referida Comissão Nacional transcendia a esfera da LBA,
organizada como uma arena de debates e discussões sobre as políticas sociais que
requeriam o aval da opinião pública – o deputado Euvaldo Lódi estava presente, na
condição de Presidente do SESI Nacional e da Confederação Nacional da Indústria,
além de vice-presidente da Comissão Central da LBA.
Nesse início da década de 50, várias medidas foram tomadas para incentivar
o desenvolvimento econômico, mantendo a ênfase na industrialização. Foram realizados
investimentos públicos no sistema de transportes e de energia, com ampliação da oferta
para o Nordeste. Em 1952 foi fundado o Banco Nacional do Desenvolvimento
Econômico (BNDE), orientado a acelerar a diversificação industrial, ao mesmo tempo
em que a inflação avançava no país: de 2,7% em 1947, passou para uma média anual de
13,8%, entre 1948 e 1953, chegando a 20,8% nesse último ano.
Getúlio se via ilhado entre duas tendências antagônicas: não podia deixar de
se preocupar com as reivindicações trabalhistas, pela alta do custo de vida e, de outro
lado, tinha que adotar medidas impopulares de controle da inflação. Em 1953, nomeia
para o Ministério do Trabalho João Goulart, mais conhecido como Jango, identificado
como a personificação do peronismo no Brasil nos círculos antigetulistas, defensor de
uma “República sindicalista” (Fausto, 2007:410).
A liberalização do movimento sindical e os problemas decorrentes da alta do
custo de vida deflagraram uma série de greves em 1953, como a greve dos marítimos,
120
120
que mobilizou cerca de 100 mil trabalhadores em pontos diferentes do país. A greve dos
300 mil trabalhadores em São Paulo acontece simultaneamente à eleição de Jânio
Quadros para a prefeitura de São Paulo, sob forte cunho populista de combate à
corrupção – adotou o lema do tostão contra o milhão e a vassoura como símbolos de sua
missão política.
Entre os adversários civis do Governo Vargas, destacava-se a UDN e grande
parte da imprensa, especialmente Carlos Lacerda. Por meio de seu jornal Tribuna da
Imprensa, iniciou violenta campanha antigetulista, propondo a renúncia do Presidente
da República.
Getúlio nacionalizou a produção de energia elétrica, por meio da criação de
uma empresa estatal para o setor, a Eletrobrás. Criou também a Petrobrás, garantindo o
monopólio estatal da prospecção e produção do petróleo. Mesmo que tenha substituído
o ministro do Trabalho, anunciou no dia 1º de maio aumento de 100% do salário
mínimo, o que gerou uma onda de protestos pelo temor do agravamento do quadro
inflacionário.
Por fim, o guarda presidencial e fiel amigo de Getúlio se envolveu com a
tentativa de assassinato de Carlos Lacerda, sem êxito, matando o major da Aeronáutica
Rubens Vaz. Esse foi o estopim para o movimento pela renúncia de Getúlio assumir
proporções enormes, culminando com um manifesto da elite do Exército à nação.
Em 24 de agosto de 1954, Getúlio suicidou-se no Palácio do Catete,
deixando para o país uma “carta-testamento” na qual se coloca como vítima e pereniza
sua imagem como herói protetor dos trabalhadores.
121
121
2.2 Final do interstício democrático (1964)
São Paulo era governado por Lucas Nogueira Garcez
130
, sendo que a década
de 50 foi a de maior crescimento populacional no estado, com média de 3,6% ao ano,
em comparação a 3,2% do país, certamente impulsionado pelo movimento migratório
interno que buscava o eixo Rio-São Paulo em busca de trabalho. A ocupação territorial
acompanhou a dinâmica e a localização das atividades industriais, pois desde a década
anterior, ocorria uma significativa concentração industrial no Estado, favorecendo, no
início, a região metropolitana da capital e municípios circunvizinhos. Gradativamente,
ocorreu a desconcentração rumo ao interior, beneficiando as regiões situadas no centro e
leste do Estado. Em 1940, a população era de 7.180.316 pessoas, chegando, em 1950, a
9.134.423 habitantes no território paulista (SEADE, 2007; Aeninger & Bassanezi,
2006).
Maria Carmelita Leme de Oliveira Garcez, esposa do governador, era
presidente da Comissão Estadual da LBA, exercendo, pois, a representação regional do
órgão federal e a vocação esperada de implementar as diretrizes nacionais pelo território
paulista. Uma delas dizia respeito à formação de Comissões Municipais da LBA nas
principais cidades. Em novembro de 1951, a primeira-dama estadual recebe a visita de
Darcy Vargas, que veio a São Paulo “... agradecer a generosidade da ajuda recebida no
combate à seca do nordeste, apertar a mão da Sra. Maria Carmelita Leme de Oliveira
Garcez, traçando projetos em prol da obra nacional...” (Boletim LBA b, 1951:5).
Observa-se, então, que a atuação da primeira-dama estadual independia de um lócus
administrativo próprio, e os registros históricos encontrados neste trabalho indicam que
a precursora regional foi Leonor Mendes de Barros. De outro modo, Leonor foi
precursora na cidade de São Paulo, ainda que não sob a condição de primeira-dama,
130
LUCAS NOGUEIRA GARCEZ (1913-1982).QUINTO GOVERNADOR Período de governo: 1/51 -
1/55.Paulistano, formou-se em engenharia civil pela Escola Politécnica de São Paulo na turma de 1936,
onde foi também professor. Sua vida profissional ganha destaque quando assume a superintendência da
construção da hidrelétrica de Avanhandava (1940) e da Fábrica Nacional de Motores (1943). Em 1946
obtém o título de doutor em Ciências Físicas e Matemáticas pela Escola Politécnica. Prossegue a carreira
atuando na área de saúde pública. Em 1949 ocupa o cargo de Secretário de Estado de Viação e Obras
Públicas, base para a sua eleição como governador do Estado. Em seu mandato criou o Departamento de
Águas e Esgotos, a USELPA (Usinas Hidrelétricas do Paranapanema), o Conselho Estadual de Higiene e
Segurança do Trabalho, o Departamento de Assistência Médico-Hospitalar ao Servidor Público Estadual
e o Fundo de Amparo ao Menor. Prosseguiram as obras das hidrelétricas de Salto Grande, Limoeiro,
Euclides da Cunha e Barra Bonita, os aeroportos de Congonhas e Viracopos e a realização das últimas
obras da Via Anchieta. Depois de seu governo deu continuidade ao seu trabalho na universidade e em
institutos de pesquisa. Em 1970 foi presidente da Aliança Renovadora Nacional – ARENA. Foi também
diretor das Centrais Elétricas de São Paulo – CESP (1966/1975) e presidente da Eletropaulo (1979/1982).
Faleceu em São Paulo no ano de 1982.
122
122
quando assumiu a presidência da Comissão Municipal de Assistência Social do
Município, criada na década de 50 e na gestão do prefeito Armando Arruda Pereira
(Sposati, 1988:169).
O exame do Relatório de 1952 do Serviço Social do Estado
131
indica a
propensão a expressiva mudança em seu rol de competências: iniciava-se nesse
momento uma restrição progressiva no atendimento direto de casos pelos técnicos e
pesquisadores desse órgão público. Detecta-se que, durante esses 15 anos de atuação, o
órgão gestor da assistência social pública precisava conhecer objetivamente não só os
problemas e dificuldades encontrados pelas obras sociais na realização de suas
finalidades, como também requeria conhecer as causas e efeitos das dificuldades
apresentadas pelos “necessitados”, incluindo os problemas sociais de seu meio de
origem. Somadas a isso, as obras sociais não apresentavam condições sócioeconômicas
nem dominavam o saber técnico exigido para esse trabalho. Foi possível construir o
Fichário Central sistematizador das informações tanto das obras sociais quanto da “...
complexidade dos casos de desajustamento...” (São Paulo, 1952:9). Por isso, era
considerado de
caráter transitório e supletivo a atividade do Serviço Social do Estado
no tratamento direto dos casos. Aliás, nunca o Serviço Social do
Estado perdeu de vista, nas diretrizes da sua política assistencial, que a
sua missão não é prestar auxílio direto aos necessitados, mas auxiliar
as obras sociais para que estas efetivem os seus objetivos assistenciais
(idem).
Dessa forma, delineou-se, mais claramente, a tendência a delegar o
atendimento de casos às obras sociais, tratado dentro de um plano de ação social com
vistas à organização social da comunidade, entendida como objeto de maior
entrosamento entre o Serviço Social do Estado e as obras sociais. A partir dos registros
encontrados, observa-se que a questão do atendimento de casos se colocava mais em um
plano de intenções do que propriamente de realizações, naquele momento, o que pode
se inferir a partir da divisão interna dos trabalhos executados naquele exercício.
Naquele momento, o Serviço Social do Estado mantinha a Divisão
Administrativa e a Divisão Técnica, essa última composta por 36 técnicos em Serviço
131
Diretor: Luiz Rodrigues Alves. A Diretora da Divisão Técnica era Srta. Graziella de Paula Ferreira e a
direção da Divisão Administrativa era do Sr. Fausto de Lima Faro, tendo como bibliotecária a Srta. Nelly
Dabague.
123
123
Social, sendo a maioria já graduada em serviço social, além de 21 funcionários
administrativos, ainda considerados de baixa presença perante o vulto dos trabalhos
desenvolvidos pelo órgão gestor paulista.
Em 1942, o Serviço Social de Casos individuais e o Plantão do Serviço
Social compunham uma unidade de prestação de serviço, diferentemente dessa
conjuntura de 1952, pois cada qual tinha função específica. O Plantão funcionava para a
recepção, seleção e providências de tratamento emergencial de casos, desenvolvidos por
4 assistentes sociais que procediam à entrevista, orientação, encaminhamento e/ou
provisão de auxílios imediatos, cabendo aos casos mais complexos a indicação de
estudo para processo de reajustamento. Por sua vez, a Seção de Serviço Social de Casos
se ocupava dos casos
132
que requeriam estudo e plano de tratamento, oriundos quer seja
do Plantão quer seja encaminhados por outros órgãos públicos e particulares. Os
problemas sociais de caráter geral oriundos desse trabalho forneciam subsídios à Seção
de Estudos e Estatística do Serviço Social.
Em 1952, foram conjugados os serviços de Orientação Técnica das Obras
Sociais e o Fichário Central em uma única Seção de Obras Sociais e Fichário Central.
Foi mantido o alcance a obras sociais de beneficência ou de serviço social
133
, com a
finalidade de orientá-las tecnicamente, mediante a solicitação da obra interessada,
matriculada ou não, o que foi um diferencial atendido em virtude da postulação
pretendida em 1942. Os atributos do Fichário Central foram mantidos, bem como os
ritos adotados para o processo de matrícula, sendo que a orientação técnica era avaliada
como um dos trabalhos mais importantes do Serviço Social do Estado, com o fito de
ampliar a eficiência e enquadramento dos seus métodos e processos assistenciais na
direção do saber técnico do serviço social. Para tanto, havia uma diversidade de técnicas
adotadas, tais como pesquisas, mesas-redondas, pareceres, sugestões escritas, planos de
132
Para esses casos, era aberto um prontuário condensador dos dados para diagnóstico, do plano de
tratamento, das medidas adotadas e a justificativa do encerramento do caso, ao passo que o Plantão
operava com uma ficha social.
133
Por outro lado, a Lei nº 1943, de 04 de dezembro de 1952, estabeleceu novas regras para as
instituições de assistência social destinadas a recolher a infância desamparada. Não podiam denominar-se
como asilo, abrigo, orfanato, reformatório ou casa correcional, dando preferência aos termos lar, escola,
educandário, creche ou outros que se ajustassem às finalidades do estabelecimento. A desatenção ao
dispositivo legal impediria que essas instituições fossem declaradas de utilidade pública, bem como não
receberiam auxílio e subvenção. O prazo de adequação à nova ordem era de 180 dias após sua publicação.
124
124
reforma, presença do assistente social in loco, comparecimento do dirigente da obra
social na sede do Serviço Social do Estado.
Percebe-se que a centralidade agora é pela orientação técnica das obras
sociais, de tal forma que
é consolador verificar não só a progressiva confiança de um número
cada vez maior de obras na procura espontânea dessa orientação,
como um crescente e efetivo resultado no sentido de aquelas de
beneficência se aproximarem da prática do serviço social, e aquelas de
serviço social se adequarem melhor a seus fins (São Paulo, 1952: 11).
Então denominado como Seção de Estudos e Estatística do Serviço Social,
era-lhe conferido o status de “centro de entrozagem entre as diversas secções da Divisão
Técnica” (idem:12) e cabia-lhe proceder ao estudo dos problemas sociais, à estatística
do serviço social, ao cálculo das subvenções anuais, elaborar planos de criação e
reorganização de serviços sociais, desenvolver estudos de legislação de serviço social
(oriundos da legislação federal, estadual e municipal), minutar acordos e convênios
celebrados com as obras sociais para a prestação de serviços, analisar solicitações de
bolsas de estudos de estudantes de serviço social, produzir documentação técnica para o
órgão gestor paulista. Sem dúvida, essa seção cresceu, tanto no volume de tarefas
quanto no grau de importância enquanto atividade-meio, configurando-se como
expoente de apoio técnico daquele momento histórico.
Foram criadas duas novas seções.
y Recuperação Moral e Social da Mulher: criada em 1950 e originada da
peculiaridade complexa que envolvia o caso de mulheres vítimas de crime ou abuso
sexual, bem como prostitutas, atendidas pelo Serviço Social de Casos. Era
predominante o viés moralista, diante da difícil tarefa de recuperar moral e socialmente
a mulher prostituída, tida como “pessoa desajustada”, o que requeria não só uma
profunda base de estudos como também a existência de casas especializadas, revisão de
legislação existente na época e alternativas ainda difusas para seu alcance.
y Serviço Social Rural: criado em 1951, seu objetivo era fixar o homem no
campo a partir de duas estratégias. A primeira e imediata era implementar um plano de
colonização de uma gleba de terras de propriedade do governo estadual, situada em Sete
Barras (Vale do Ribeira), denominada Fazenda Mamparra. Para lá eram encaminhados
migrantes, com a observação de que eram objeto de “seleção racional dos elementos
125
125
nacionais que, necessitados de assistência de reajustamento devessem e desejassem ser
fixados no campo”.( p.14) A organização de uma nova comunidade rural contava com
um assistente social residente na Fazenda, que prestava assistência inicial integral para,
aos poucos, preparar os moradores para a auto-suficiência.
Era considerada como uma experiência preliminar e necessária à
implementação da segunda estratégia, de criação de Centros Sociais Rurais, que seriam
disseminados nas diferentes regiões agrícolas do interior do estado, destinados à
assistência, educação e recuperação das populações campesinas mais carentes.
Existiam mais três serviços diretamente subordinados à Diretoria da Divisão
Técnica .
y Biblioteca Maria Kiehl, assim denominada como homenagem à memória
da “primeira assistente social brasileira (e ex-responsável pela Divisão Técnica em
1942), integrada por 1.541 volumes.
y Abrigo de Emergência para Tuberculosos: destinado à internação e
tratamento gratuito de tuberculosos à espera de vagas em sanatórios, localizava-se na
Moóca e tinha capacidade para atender 50 adultos de ambos os sexos. Trata-se de um
abrigo doado ao Estado, por volta de 1951, pela Bandeira Paulista, contra a
Tuberculose, obra social fundada e presidida pela ex-primeira-dama estadual Leonor
Mendes de Barros, provavelmente cedido ainda na gestão estadual de Adhemar de
Barros (1947 a 1951).
y Abrigo-asilo para itinerantes: há a menção de que seria inaugurado logo,
no bairro da Água Funda, para atender 100 adultos indigentes ou doentes não-
portadores de moléstia infecto-contagiosa, à espera de internação hospitalar, que
recorriam ao Plantão do Serviço Social do Estado. A criação desse serviço social se
dava pela insuficiência de vagas nas obras sociais assemelhadas (como o Albergue
Noturno da capital, mantido pela Associação Cívica Feminina), mas também pelo
propósito de aprimorar o atendimento realizado pelo serviço social estadual dos
desvalidos.
Era desenvolvida, também, a assistência em casos de calamidade,
caracterizada como ação social de emergência para assistir grupos de indivíduos e
famílias atingidos por calamidades ou flagelos sociais tais como incêndios, desastres,
126
126
desmoronamentos e enchentes, prontamente atendidos pela Seção de Serviço Social de
Casos.
É interessante apontar a alteração nas prioridades adotadas pelo órgão gestor
paulista em seus quinze anos iniciais de existência, ocorridas de 1937 a 1952. O ponto
alto em 1937 era a importância do Serviço Social de Família, com o propósito de serem
criados os Centros Sociais de Formação Familiar. Em 1942, a ênfase estava no
aperfeiçoamento técnico-burocrático do funcionamento do Departamento estadual,
expresso no aprimoramento da base de tratamento de dados, na elaboração do primeiro
catálogo de obras sociais existentes no estado de São Paulo e nos esforços de
publicização dos trabalhos desenvolvidos. Já em 1952, a centralidade se deslocou para o
entrosamento com as obras sociais, principalmente para aumentar sua capacidade de
atendimento direto dos casos dos “necessitados”. Por outro lado, cresceu o corpo
funcional do Serviço Social do Estado, se comparado com a força de trabalho existente
em 1942: 36 técnicos em Serviço Social e 21 funcionários administrativos, em 1952,
contra a presença de 11 estagiários de Serviço Social, em fase de graduação, e 5
pesquisadores sociais, dez anos antes. Ganha destaque a criação de tres serviços sociais
para adultos
134
, em 1952, mesmo que mantida a perspectiva médico-social: é a primeira
vez que foram anunciados serviços próprios da esfera estadual para além daqueles
criados, hegemonicamente, para crianças e adolescentes fragilizados.
Em 1957, na gestão de Jânio da Silva Quadros
135
, foi criado o Fundo de
Assistência ao Menor – FAM (Lei nº 3738, de 18/1/57), na Diretoria do Serviço Social
de Menores da Secretaria da Justiça e Negócios do Interior. A finalidade principal desse
Fundo era cooperar financeiramente com as entidades públicas e privadas que tratavam
134
Comunidade rural da Fazenda Mamparra, Abrigo de emergência para tuberculosos e Abrigo-asilo para
itinerantes.
135
JÂNIO DA SILVA QUADROS (1917-1992).SEXTO GOVERNADOR Período de governo: 1/55 -
1/59. Mato-grossense, nascido em Campo Grande, formou-se em Direito no ano de 1939, pela Faculdade
do Largo de São Francisco. Durante vários anos foi professor dos colégios Dante Alighieri e Vera Cruz,
em SP (SP). Elegeu-se então vereador para a Câmara Municipal de São Paulo (1948/1951) e deputado
estadual em 1951. Fez-se líder do Partido Democrata Cristão – PDC. Em 1953 elegeu-se prefeito de São
Paulo e governador em 1954. Como Governador, preocupou-se com o abastecimento de água e com o
setor energético. Construiu a Estação de Tratamento de Vila Leopoldina. Pavimentou 1.775 quilômetros
de estradas. Elegeu-se deputado federal, pelo Paraná, em 1958. Em 1961 alcançou a Presidência da
República, mas renunciou no dia 25.08.1961, após sete meses de mandato. Foi substituído pelo vice-
presidente João Belchior Marques Goulart. Disputou, ainda, por duas vezes, o Governo do Estado, sendo
derrotado. Em 1985 foi eleito, novamente, Prefeito de São Paulo. Faleceu em São Paulo em 1992.
127
127
do problema do “menor” abandonado ou infrator, colaborando nos estudos e na
orientação da política social do Estado. A receita desse Fundo era constituída de
contribuições do Estado, do Governo Federal e do Município, bem como de pessoas
físicas e jurídicas e outras oriundas de multas e impostos. Sua gestão era realizada por
meio de um Conselho Diretor, composto pelo Secretário estadual da Justiça, o diretor do
Serviço Social de Menores, o Juiz da Vara Privativa de Menores, o diretor do Serviço
Social do Estado e o 1º Curador de Menores (representando o Ministério Público).
Dentre suas atribuições, cabia ao Conselho Diretor decidir sobre a aplicação dos
recursos do Fundo, estabelecer convênios com as obras particulares, fiscalizá-las quanto
ao cumprimento das orientações traçadas pelo Estado. Estava prevista a criação de um
Conselho de Cooperação, integrado por 6 representantes de entidades particulares de
educação e assistência ao menor abandonado, um representante da Liga Paulista de
Higiene Mental e um representante da Associação Profissional dos Assistentes Sociais
de São Paulo.
É possível perceber a persistência do lugar de importância da questão da
criança e do adolescente no âmbito estatal paulista, dotando-a de um fundo financeiro
público próprio, gestado por um conselho diretor deliberativo e outro de caráter
consultivo. Caracteriza-se como uma forma preliminar e precedente ao desenho
disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente 33 anos depois.
Por sua vez, em 1960, foi instituído o Conselho Estadual de Auxílios e
Subvenções – CEAS (Lei nº 5580 de 21/1/60) – vide Anexo 11 –, vinculado à Secretaria
de Estado dos Negócios do Governo, na gestão de Carlos Alberto Alves de Carvalho
Pinto
136
. Esse novo dispositivo legal demonstra que era preciso estabelecer um lócus
136
CARLOS ALBERTO ALVES DE CARVALHO PINTO (1910-1987).SÉTIMO GOVERNADOR
Período de governo: 1/1959 - 1/63. Paulistano, em 1931 formou-se em Direito pela Faculdade do Largo
de São Francisco, tornando-se professor de Ciências das Finanças na Faculdade Paulista de Direito e
advogado da Prefeitura de São Paulo. Entre 1938 e 1945 foi assessor jurídico dos prefeitos Prestes Maia e
Abraão Ribeiro. Nesse mesmo período foi professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
lecionando também Ciência das Finanças. Em 1953 ocupou o cargo de Secretário das Finanças do
município de São Paulo. Entre 1955 e 1958 foi Secretário de Estado da Fazenda. Sua carreira pública em
São Paulo culminou com sua eleição para o governo do Estado. Seu governo, que decorreu de 1959 a
1963, orientou-se pelas diretrizes delineadas no seu PAGE (Plano de Ação do Governo do Estado). Foi o
primeiro governador a estabelecer um planejamento orçamentário dos vários setores da administração
pública. Iniciou a construção da Usina Hidrelétrica de Urubupungá, projetou as Usinas de Promissão,
Paraitinga-Paraibuna e Capivari, além de realizar obras nas usinas de Limoeiro, Euclides da Cunha, Barra
Bonita, Jurumirim, Bariri, Graminha e Xavantes. Criou a Universidade de Campinas. No governo federal
128
128
central na esfera pública estadual para o disciplinamento da concessão de auxílios,
subvenções e isenções fiscais às instituições privadas que exerciam atividades
específicas de assistência social, notadamente as de proteção à saúde, à educação, à
cultura, à infância, à maternidade, à velhice, ao desemprego, ou de combate ao
alcoolismo e ao uso de tóxicos. Cabia ao Conselho organizar o cadastro dessas
instituições, fiscalizá-las e elaborar o planejamento das atividades assistenciais do
Estado, por meio de estudo dos vários setores da vida social e a indicação das suas
necessidades de proteção. Para tanto, era necessário harmonizar as atividades das
instituições contempladas e promover acordos com os municípios, para maior amplitude
de sua ação orientadora.
De saída, pode-se depreender que volta ao cenário da subsidiariedade
estadual o amálgama processador da mistura de naturezas distintas das instituições
sociais, classificadas dentro do escopo de “atividades de assistência social”. Supõe-se
que o cadastro das obras sociais do Serviço Social do Estado passou a ter uma função
subsidiária e secundária, haja vista que o alcance do CEAS transcendia as obras sociais
de beneficência e de serviço social, adstritos ao campo do SSE. Esse Conselho estadual
exercerá importância capital no interior do aparelho do Estado paulista até sua extinção,
em 1999.
Em 1962 ocorreram novas mudanças na estrutura do Serviço Social do
Estado. A Divisão Técnica contava com o Plantão, e o Serviço Social de Casos passou a
ser nominado como Seção de Casos. A Seção de Obras Sociais e Fichário Central
alterou para Seção de Obras Sociais, tendo como parte integrante o cadastro de obras. A
Seção de recuperação moral e social da mulher foi redesignada como Seção de Amparo
à Mulher e não existia mais o Serviço Social Rural, da mesma forma que não havia
registro sobre a permanência do Abrigo para tuberculosos e o Abrigo para itinerantes na
esfera do Serviço Social do Estado. Ficou mantida como era a Seção de Estudos e
Estatística do Serviço Social.
Em janeiro de 1964, a estrutura técnico-administrativa era mais pujante. Um
novo setor foi criado: Seção de Desenvolvimento de Comunidade. Foram mantidas as
ocupou o cargo de Ministro da Fazenda, em 1963. Foi senador da República, cumprindo mandato de 1967
a 1975. Faleceu em São Paulo em 1987.
129
129
Seções de Casos, de Obras Sociais, de Estudos e Estatística do Serviço Social, sendo
que a Seção de Plantão contava com duas extensões na prestação do atendimento de
casos rápidos : o Serviço de Proteção e Previdência Social da 8ª Delegacia Auxiliar e o
Albergue Noturno da Sociedade dos Albergues Noturnos. A Seção de Amparo à Mulher
contava com um atendimento de plantão para seleção, encaminhamento e matrícula dos
casos, bem como atendia demandas relativas à adoção de crianças e à colocação
profissional de trabalhadoras domésticas. Operava ainda duas unidades prestadoras de
serviços (Amparo Maternal), classificadas como “Casas de Serviço Social”. Além delas,
existiam mais cinco “Casas”: o Abrigo do Serviço Social do Estado, o Educandário
Jacareí (composto por creche, jardim-de-infância, lar escola, lar dos rapazes, lar das
moças, setor de assistência médico-dentária, setor de assistência social, setor de
administração), as Agências Regionais do órgão gestor paulista em Santos, Campinas e
Bauru. Há a menção de que foram criadas 50 Casas de Serviço Social, faltando 43 a
serem instaladas, além da reinstalação do Serviço de Triagem.
O acervo de iniciativas do Serviço Social do Estado se encontrava, então,
diversificado, mesclando unidades prestadoras de serviços sociais com unidades de
representação local do órgão público, apontando a perspectiva de outras oito
representações estarem em fase de instalação. Dessa forma, a descentralização técnico-
administrativa já caminhava para efetivar a desconcentração do órgão estadual, quer
seja da capital do estado, quer seja da presença eventual de seus técnicos em viagens
pelo interior.
No âmbito federal, três presidentes interinos cumpriram mandatos-
relâmpago nos 16 meses após o suicídio de Getúlio Vargas, tido como um período de
forte turbulência político-eleitoral. Em outubro de 1955 Juscelino Kubitschek foi eleito
Presidente da República, sendo seu vice João Goulart, e tomam posse em 31 de janeiro
de 1956.
A política econômica de Juscelino foi definida no Programa de Metas,
modulador de um plano nacional de desenvolvimento inspirado no lema adotado:
cinqüenta anos (de progresso) em cinco (de governo). O Programa se concentrava em
seis setores: energia, transporte, alimentação, indústria de base, educação e a construção
de Brasília, chamada de meta-síntese (Fausto, 2007:425).
130
130
Trata-se de uma política econômica de cunho nacional-desenvolvimentista,
que combinava o Estado, a empresa privada nacional e o capital estrangeiro para
promover o desenvolvimento, mantida a ênfase na industrialização. Os resultados dessa
combinação foram exitosos, do ponto de vista de crescimento da produção industrial
(em 80%), com destaque para a indústria automobilística, e do crescimento do PIB (a
uma taxa anual de 7%, entre 1957 e 1961).
Todavia, o custo da pujança econômica implicou deficits crescentes do
orçamento federal, comprometido pelos gastos governamentais efetuados para sustentar
o programa da industrialização e a construção de Brasília, somado a um sério declínio
dos termos de intercâmbio com o exterior. A inflação galopara, atingindo seu nível mais
alto em 1959 – 39,5% – e, mesmo anunciando um plano de estabilização da economia,
Juscelino não recebeu apoio para sua concretização. Recorreu ao FMI, na medida em
que o plano mencionado previa um empréstimo de 300 milhões de dólares, mas a reação
contrária interna foi expressiva, o que levou à ruptura do governo com o órgão
internacional e à indefinição sobre a correção dos rumos inflacionários.
A eleição presidencial se deu em 3 de outubro de 1960, com as candidaturas
de Adhemar de Barros (que concorrera em 1955 e teve votação significativa), do
general Lott e de Jânio Quadros, mímico de um programa político personalizado e quase
apartidário, que prometia castigo implacável aos beneficiários de negociatas e de
qualquer tipo de corrupção. Jânio Quadros venceu e o vice-presidente, eleito também,
foi Jango.
É curioso observar como a imprensa da época valorizou a disputa pela via da
futura primeira-dama. O anexo nº 12 traz uma matéria da extinta Revista O Cruzeiro, de
circulação nacional, sob o título Primeira Dama Vai Ganhar Novo Nome, sobre a
provável substituta de Sarah Kubitschek que, por hipótese, poderia ser considerada a
sucessora de Darcy Vargas na condição de primeira-dama de forte atuação
137
. A matéria
lapidou três perfis diferentes de prováveis futuras primeiras- damas: dona Leonor que,
137
Sarah Kubitschek criou a Fundação das Pioneiras Sociais em 1957, uma fundação pública que
implantou a Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação. Em 1991, foi transformada em uma entidade de
direito privado, sem fins lucrativos, renomeada como Associação das Pioneiras Sociais - Serviço Social
Autônomo.
131
131
ao contrário de sua trajetória benemerente em São Paulo, revelava uma face irretocável
de prendas domésticas; dona Eloá perfilou um programa de ação que passa pela
moralização da LBA e pelo aprimoramento do Serviço de Assistência ao Menor (SAM);
dona Antonieta não escondia sua sinceridade ao confessar o desgosto com um provável
mandato primeiro-damista. Não há registro documental que confirme os planos de Eloá
Quadros, conduzida à condição de primeira- dama nacional no pleito de outubro de
1960, com mandato de curta duração.
Jânio assumiu um governo eivado de controvérsias, de forte estilo
personalista, durante sete meses somente. Mesclava assuntos desproporcionais ao cargo
que ocupava, tais como a proibição das brigas de galos, do uso de lança-perfume e do
biquíni, com medidas mais sérias, como o pacote ortodoxo de estabilização econômica
de contenção de gastos públicos e de expansão monetária, o que agradou inclusive os
credores externos e o FMI. Chegou a condecorar o Ministro da Economia de Cuba,
Ernesto Che Guevara, com a Ordem do Cruzeiro do Sul, fato que atiçou a fúria dos
conservadores e temerosos do fantasma do possível comunismo cimentado em solo
brasileiro.
Em 25 de agosto de 1961, Jânio renunciou à presidência da República
movido por motivos que até hoje não estão claros para o conjunto da sociedade. É voz
corrente que ficou uma dúvida: renunciara por motivos de ordem pessoal, dada sua
personalidade instável, ou o fizera como um suposto golpe para retornar fortalecido? Na
seqüência, a resistência no meio político ao comando do vice-presidente João Goulart
foi negociada com a concordância a um regime parlamentarista, o que o levou ao posto
de presidente da República em 7 de setembro de 1961.
Em um primeiro momento, a linha adotada foi de moderação, com o fito de
mostrar a adesão de Jango aos princípios democráticos e repulsa ao comunismo. Em
1963, um plebiscito antecipado devolve o país à condição do presidencialismo e, na
tentativa de combater a escalada da inflação
138
, o Ministro do Planejamento, Celso
Furtado, lançou o Plano Trienal, com a intenção de combinar o enfrentamento da
inflação com crescimento econômico e reformas sociais (de base). Previa a reforma
138
Em 1960, o índice anual era 23,6%, ao passo que em 1962 avançou para 54,8% (Fausto, 2007:455).
132
132
agrária e a redução dos gastos públicos, controversamente não atendido pelo aumento
de 70% do salário do funcionalismo. Cresciam no país o movimento das Ligas
Camponesas (adepto da reforma agrária e do fim da subserviência do trabalhador do
campo), a sindicalização do trabalhador rural e a invasão de terras, cuja conjunção era
execrada pelos latifundiários. A UNE adquiria maior proeminência, a Igreja se dividia, e
as Forças Armadas se fortaleciam na construção de uma ideologia expressa na doutrina
da segurança nacional, contrária à ameaça anarcocomunista.
Por fim, as senhoras católicas ligadas à Igreja conservadora põem
literalmente na rua a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em São Paulo, com
500 mil pessoas desfilando em 19 de março de 1964.
A questão fundamental, civil e militar, era extirpar o perigo da subversão da
ordem. Começava, pois, a partir de 31 de março daquele ano, o longo período da
ditadura militar, sob o manto de uma revolução redentora do restabelecimento da paz.
133
133
Capítulo III - Enquadramento da gestão estadual da assistência social pelo
federalismo centralizado (1964-1988)
O regime militar instaurado a partir de 1964 manteve o Congresso Nacional
funcionando, mas governava por meio de decretos chamados de Atos Institucionais
(AI), atos complementares, a Lei de Segurança Nacional e decretos específicos.
O Estado unitário, centralizador, restringiu ao máximo a autonomia política
dos governos estaduais – suporta a eleição estadual de 1965, mas não tolera os
resultados de descontentamento expresso nas urnas. Ceifa, a partir disso, o processo
democrático de escolhas e mutila o repasse de recursos orçamentários, eivado de
condicionalidades, conforme análise empreendida neste capítulo.
À parte, os aparelhos estatais estaduais já apresentavam, nesse período, uma
organização inicial para a área da assistência social, nem sempre coincidente com o
campo da criança e do adolescente, estigma histórico e separatista. Essa fratura foi
acelerada pela criação da Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM),
que instigou os governos estaduais a replicarem estruturas assemelhadas na forma de
Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (FEBEM).
Em São Paulo, ocorreram os primeiros ensaios de uma sincronia
programática entre as instâncias estadual e municipal da capital paulista. Em janeiro de
1960, a Professora e vereadora Helena Iracy Junqueira assumiu a condução da Divisão
de Serviço Social (DSS), órgão municipal responsável pela assistência social
governamental criado em 1955. Jovem e desprestigiado, o órgão municipal padecia da
quase ausência de recursos orçamentários, fato que instigou um redirecionamento nas
atenções pelas quais respondia. A nova diretora da DSS contava com o consenso de
outras lideranças profissionais de áreas estratégicas do campo da assistência social
139
no
que se refere à função e área de competência da DSS. Entendia que não deveria ser uma
ação concorrencial aos serviços estaduais: a questão era evitar o paralelismo de ação, a
dupla iniciativa. Nesse sentido, foi feito um acordo, pactuado entre as lideranças, de
repassar gradativamente para o Serviço Social do Estado a incumbência da atenção para
139
Conhecido como grupo de assistentes sociais chefes, a vanguarda do Serviço Social era composta por:
Nadir Gouvêa Kfouri (da Superintendência Estadual da LBA), José Pinheiro Cortez (do Serviço de
Colocação Familiar do Juizado de Menores) e Graziela de Paula Ferreira (do Serviço Social do Estado).
134
134
os denominados “grupos especiais” – menores de idade, migrantes, prostitutas,
mendigos, alcoólatras – na medida em que vinha atuando na provisão de respostas a eles
(Sposati, 1988:262-266).
Pode-se dizer que esse pacto configura-se como um divisor de
responsabilidades estatais, emblemático, porém preciso, pois, mesmo restrito aos pares
paulistas, seu significado pode ter sido decisivo para inaugurar a especialização técnica
da competência estadual na responsabilização por grupos em situação pronunciada de
riscos pessoais e sociais.
O reconhecimento da importância do saber técnico, da ação profissional
baseada no conhecimento, o “poder do saber” (idem) marcou a trajetória da DSS no
período – por hipótese, coincidia com o desejo e a expectativa profissional de outros
órgãos gestores municipais e estaduais, principalmente, visível nos fatos que se
sucederão nesse período histórico, adverso e diverso.
3.1 Da ditadura à abertura democrática (1982)
O AI-1 visava a reforçar o Poder Executivo, dotando-o de poderes
excepcionais, e reduzir o campo de ação do Congresso, através de prazos restritos de
apreciação dos Projetos de Lei, o que culminava na aprovação dos PLs “por decurso de
prazo”. De saída, o AI-1 suspendia as imunidades parlamentares e autorizava o
comando do governo central a cassar mandatos – nos âmbitos federal, estadual e
municipal – e a suspender direitos políticos pelo prazo de dez anos. As garantias de
vitaliciedade (dos magistrados) e de estabilidade (dos servidores públicos) foram
suspensas.
A repressão às pessoas e grupos supostamente contrários à nova ordem
política disseminou-se rapidamente, instalando a perseguição e a tortura como recursos
velados e corriqueiros. Estudantes, professores, parlamentares, líderes rurais,
sindicalistas, funcionários públicos, juízes, cidadãos em geral, foram duramente
castigados ou mortos, sob o poder conferido a um órgão central de controle dos
cidadãos: o Serviço Nacional de Informações (SNI).
135
135
Por meio da votação indireta do Congresso Nacional, o general Humberto
de Alencar Castelo Branco foi eleito presidente da República, em 15 de abril de 1964,
com mandato até 15 de março de 1967.
Um importante direito, valorizado pelo trabalhador assalariado e garantido
na CLT – a a estabilidade no emprego após dez anos de serviço – foi praticamente
substituído pelo Fundo de Garantida por Tempo de Serviço (FGTS), em 1966.
Caracterizado pela adesão voluntária, era quase impossível obter emprego sem ele, além
de ser desvantajoso em relação à estabilidade de outrora, pois a correção monetária se
dava abaixo da inflação e o não-recolhimento de parcelas devidas ao FGTS era comum.
Para enfrentar a complexa situação econômico-financeira que vinha do final
do governo Jango, foi lançado o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG),
com vistas a reduzir o deficit público, a obter crédito privado e, por efeito, comprimiu
os salários. Subsídios estatais foram cortados, em contrapartida à elevação de tarifas e
preços que atingiram o custo de vida da população brasileira.
De um lado, o PAEG atingiu seus objetivos. A variação anual da inflação
que, em 1964, era de 91,.9%, caiu para 25,4% em 1968, e o PIB voltou a crescer a partir
de 1966 (era 3,8%) para 11,2% em 1968 (in Fausto, 2007:473).
De outro lado, o decréscimo da capacidade aquisitiva do salário mínimo é
progressivamente acentuado: o salário mínimo, se considerado em 1960 igual a 100,
equivalia a 69 em 1970, a 62 em 1980 e a 45 em 1984. Entre 1960 a 1980, os 10% mais
ricos apropriam 46,2% da renda total do país, e os 50% mais pobres, 13,6% (Fleury,
1989:49).
Esse conjunto parcial de dados mostra os resultados de uma época
impregnada de medidas e planos para desenvolvimento do país, com elevado custo
social e civilizatório. As ações assistenciais continuaram a ser usadas para amenizar o
estado de empobrecimento da população, inclusive dos trabalhadores.
Mestriner (2001) sugere a idéia de que, durante o regime militar,
consolidou-se o Estado assistencial, traduzido em medidas compensatórias pontuais do
136
136
achatamento salarial, da ausência de renda, da repressão exacerbada sobre as
manifestações e reivindicações dos trabalhadores. Um Estado secundário e marginal às
manifestações da pobreza e da miséria, que alimentou oficialmente a rede de
solidariedade reconhecida como a viga mestra da proteção social brasileira, em que o
patamar compensatório de atenção provocado por essa aliança seria suficiente para a
dispersão das tensões sociais. (Falcão, 1989:119) Por outro lado, a bandeira levantada
era a da integração social como solução para a situação de marginalização social – são
as teses do nacional – desenvolvimentismo que prevalecem no período.
Não obstante, o padrão da atenção assistencial adquiriu maior rigor técnico,
no qual o planejamento social sofisticava os diagnósticos sociais, sob a égide de um
racionalismo técnico, próprio do estado tecnocrático pós-64.
O padrão predominante da ação estatal para lidar com a questão social se
dava pela articulação repressão–assistência, sendo que a “... repressão se faz sentir
especialmente na desmobilização social e na desarticulação dos instrumentos de pressão
e de defesa das classes populares...” (Sposati et alii, 1985:50).
O aparato estatal aumentou e se burocratizou, progressivamente, nesse
período político brasileiro, em uma profusão de programas e serviços desconectados da
lógica integradora entre os entes federados e conformados sob a ótica fragmentadora
dos segmentos necessitados, faixas etárias e problemas sociais específicos.
Crescia desde a década de 50 a pressão social pela reformulação do projeto
estatal adotado no modelo repressor do Serviço de Assistência ao Menor (SAM),
pressão essa que exigia a criação de um órgão responsável por uma política dita
assistencial para a criança e o adolescente abandonados e/ou infratores. A imprensa da
época se encarregava de estampar notícias sobre o tratamento questionável que
recebiam no SAM, alardeado também por comissões de sindicância de parlamentares
(Fleury, 1989:67).
A Declaração dos Direitos da Criança, aprovada em Assembléia Geral da
ONU em 1959, impulsionou a alternativa brasileira de FUNABEM e FEBEMs por
entender que, com isso, responderia ao disposto quanto à responsabilidade do Estado
137
137
pelo bem-estar da criança, reconhecida pela ONU como portadora de direito à vida
digna.
O governo central criou a FUNABEM pela Lei nº 4513, de 01 de dezembro
de 1964, e extinguiu o SAM, vinculando-a ao Ministério da Justiça com a competência
de definir uma Política Nacional do Bem-Estar do Menor – a PNBEM. Dessa forma, o
Estado central dava mostras de que passou a deter toda a responsabilidade com relação à
infância e à adolescência abandonada e/ou infratora.
Sob o estofo dessa lógica, esse poderoso e influente organismo federal,
incorporando as iniciativas estaduais como FEBEMs (Fundação Estadual do Bem-Estar
do Menor), atuou e se capilarizou nos territórios estaduais até sua extinção (em 1995),
sob a forma reorganizada da Fundação Centro Brasileiro da Infância e Adolescência
(FCBIA).
A estratégia de funcionamento adotada foi a de repasse de recursos federais
pela via do convênio
140
com projetos de assistência apresentados por municípios,
entidades privadas, ambos mediados pelas Fundações Estaduais em seu território. À
FUNABEM cabia a normatização, o financiamento e a execução direta reservada a
projetos experimentais.
Cabe destacar dois aspectos centrais na criação desse poderoso órgão
federal.
a) Sua apresentação gráfica trazia, na capa e contracapa do documento
oficial, os dizeres: “a redenção da infância e da juventude”; “a base do futuro sem
fronteiras”; “uma revolução de métodos e homens”. O objetivo apresentado era o de
formular e implantar uma política nacional do bem-estar do menor, mediante o estudo
do problema e o planejamento das soluções, além de orientar, coordenar, auxiliar
financeiramente e fiscalizar as entidades incumbidas de executá-las, complementando
que
não se trata de mais uma entidade para internar. A Fundação é uma
entidade autônoma tanto na administração delegada como
na gestão
140
O instrumento jurídico do convênio preserva a responsabilidade do Estado, estabelecido entre
organismos para execução de projetos de interesse comum, no sistema de parceria e cooperação mútua
(técnica ou financeira) (Mestriner, 2001).
138
138
de seus bens e interesses, com personalidade jurídica adquirida nos
termos da lei e jurisdição em todo território nacional... livre, portanto,
de injunções políticas, representa uma esperança para superar a
desassistência em que está imersa parte de nossa juventude. É o início
de uma outra era. É o tempo da reeducação. É a abolição do castigo
violento, da repressão brutal, do uso de capatazes, de capitães-do-
mato, da colocação de ineptos em cargos ligados aos Serviços de
Menores. Enfim, é a fase do tratamento à base da compreensão, da
disciplina consentida, da ação de professores à altura, de psicólogos
capazes, de gente que realmente gosta de menores, de pessoal
escolhido e treinado para uma missão tão elevada.
A lei nº 4513 é uma Revolução. E como toda Revolução ela vai agitar,
modificar, mudar mentalidades, quebrar rotinas. A nova política de
atendimento ao problema de menores é uma troca de rumos, uma
mudança de estrutura. Faltava ao Brasil uma diretriz realmente capaz
de equacionar o problema e planejar programas para atenuá-lo. Mas
ela acaba de surgir com a Fundação (Brasil, FUNABEM, 1964:2).
O símbolo revolucionário era, então, fomentado e adotado na criação do
novo órgão assistencial, tal qual um filho primogênito da Revolução de 64, guiado pela
imperiosidade secular de ajeitar a cria enjeitada.
b) O presidente da FUNABEM, durante dez anos (1964-1974), Dr. Mário
Altenfelder Silva, rememorou, na sua participação na Semana de Estudos dos
Problemas do Menor de 1969 (organizada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo), que a
lei de criação da FUNABEM era fruto do trabalho de uma grande comissão que estudou
o problema, composta por personalidades que vinham desde a década de 50 tentando
transformar o SAM, e reconhecidas como figuras de expressão da época, como Dom
Cândido Padim, Helena Iracy Junqueira
141
, Eduardo Bartlett James (diretor do SAM na
gestão João Goulart), Lúcia Silva Araújo, Luis Carlos Mancini, Maria Celeste Flores da
Cunha, Odylo Costa Filho e Pedro José Meirelles Vieira (fora nomeado pelo ex-
presidente Jânio Quadros para propor soluções ao SAM).
A legitimidade do regime instaurado passava pela composição com grupos
representativos da classe média, presentes tanto na comissão de trabalho acima
141
Junto com Luis Carlos Mancini, foram assistentes sociais precursores no Departamento de Assistência
Social do estado de São Paulo. Helena Iracy Junqueira foi expoente também na profissão, na cátedra, na
formulação do conhecimento do serviço social, tendo exercido mandato como vereadora na Câmara
Municipal de São Paulo na legislatura de 1956.
139
139
mencionada quanto na composição do Conselho Nacional
142
de gestão da PNBEM,
revestido de caráter deliberativo.
Além do Conselho Nacional, compunham a gestão da FUNABEM uma
diretoria, o conselho fiscal
143
e as comissões regionais. Nos registros históricos
encontrados para este trabalho, foram obtidas informações
144
a respeito de convênios do
órgão federal com entes federados que podem indicar não só a capilaridade da
FUNABEM, em 1969, em 9 estados brasileiros, mas também o grau de
institucionalidade dessas unidades federativas nesse momento:
y Piauí: Serviço Social do Estado;
y Maranhão: Secretaria da Justiça (Superintendência do Desenvolvimento) e
Fundação do Bem-Estar Social (através de um Plano de atenção à
menores e famílias);
y Pará: Prefeitura Municipal de Belém, com um Plano de atenção aos
menores e famílias, organizado pela administração estadual, além de
outro convênio com a Fundação do Bem Estar Social (estadual);
y Sergipe: há menção de um programa estadual de assistência a menores,
sem indicação do órgão estadual conveniado;
y Pernambuco: Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor;
y Bahia: Serviço Estadual de Assistência a Menores (SEAM);
y Goiás: Secretaria de Serviços Sociais de Goiás;
y Rio de Janeiro: Fundação Fluminense do Bem-Estar do Menor (FLUBEM-
Estado do Rio);
y Paraná: Instituto de Assistência a Menores.
142
·Um representante de cada uma das seguintes instituições: Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais (APAE), Conselho Federal dos Assistentes Sociais (CFAS), Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (SENAC), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), União
Nacional das Associações Familiares (UNAF), Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural
(ABCAR), Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Conferência dos Religiosos do Brasil
(CRB), Confederação Evangélica do Brasil (CEB), Confederação Israelita do Brasil (CIB), Legião
Brasileira de Assistência (LBA) - que foi, portanto, colocada na composição da sociedade civil;
· seis representantes do Poder Executivo: Ministérios da Justiça, da Educação e Cultura, do Trabalho,
Previdência Social, da Agricultura, da Saúde (diretor do Departamento Nacional da Criança);
· três pessoas de notório saber no campo da proteção à família;
· presidente da FUNABEM e do Conselho Nacional, Dr. Mário Altenfelder Silva.
143
Composto por um representante do presidente da República, um representante do Ministério da
Fazenda e um contador designado pelo Conselho Nacional.
144
In São Paulo, Tribunal da Justiça, 1983: 206-212.
140
140
Em dezembro de 1969, a FUNABEM estava presente em quase todo o
território nacional, com escritórios regionais em 21 unidades federadas, à exceção do
Rio de Janeiro e dos cinco territórios federais
145
(FUNABEM, 1969: 30-31).
Por sua vez, o marco regulatório das relações do Estado com as entidades
sociais teve produção intensificada nesse período inicial da ditadura militar. Logo em
1964, foram estabelecidas condicionalidades para a isenção do imposto de renda - a
não-remuneração da diretoria e a aplicação de recursos afinados com os objetivos
institucionais -, ao mesmo tempo em que regulamentou a dedução do imposto de renda
de pessoa jurídica sobre doações efetuadas a entidades filantrópicas (lei nº 4506). A lei
federal nº 4917 aprimorou a isenção fiscal dos impostos de importação e de consumo,
de emolumentos consulares e outras taxas e impostos relacionados à doação de
alimentos e utilidades adquiridos no exterior. Em 1966, as entidades sociais foram
dispensadas da contribuição de 1% ao BNH – Banco Nacional da Habitação (lei nº
5127) e a Constituição Federal de 1967 previa a isenção de impostos sobre o
patrimônio, a renda ou serviços de instituições de educação e assistência social,
observados os requisitos fixados em lei (artº 20, III, alínea c), benefício esse ampliado
por outro dispositivo constitucional de 1969, que estendeu as isenções de impostos
estaduais e municipais, mediante lei complementar (artº 19, III, §2). Foi dispensado o
recolhimento do FGTS dos funcionários das entidades filantrópicas (decreto-lei nº
194/67), bem como a arrecadação da taxa rodoviária única dos veículos das instituições
de caridade (decreto-lei nº 999/69) (Sposati, 1994:69; Mestriner, 2001:170-171).
Ainda no âmbito federal, a LBA passou por modificações significativas. Em
1966, os diversos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP) foram unificados em um
único órgão previdenciário, o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). De 1946
a 1966, a LBA foi sustentada basicamente por recursos provenientes dos IAPs,
complementada por donativos vindos da iniciativa privada e de contribuições
complementares das esferas estadual e municipal. Assim, a unificação provocou o
cancelamento da contribuição previdenciária, substituída por recursos consignados no
145
A divisão geográfica do país compreendia 22 estados, o Distrito Federal e 4 territórios federais:
Roraima, Rondônia, Amapá e Fernando de Noronha.
141
141
Orçamento da União
146
, o que levou a LBA a “... entrar em um período de crise
financeira crônica, de vez que as verbas oficiais não chegavam a cobrir todas as
obrigações assumidas com a execução de seus programas...” (LBA, Boletim LBA
especial, 1971:4).
Conseqüentemente, em 1967 ocorreram mudanças nos estatutos da LBA,
então sob a presidência da assistente social Maria Luiza Muniz de Aragão, ocasião em
que migrou do Departamento Nacional da Criança para o Ministério do Trabalho e
Previdência Social (MTPS). À assistência à maternidade, infância e adolescência foi
incorporada à finalidade de formação para o trabalho da mulher e do “menor” (in LBA,
1999), “... ensinando-lhe técnicas que garantirão sua subsistência futura...”. Para tanto,
foram criados os Departamentos de Educação para o Trabalho, Medicina e Serviço
Social, e mantido o Departamento de Administração e a Procuradoria Geral.
Em 1968, sob a presidência de Yolanda Barbosa da Costa e Silva (primeira-
dama), esse órgão federal contava com uma estrutura descentrada em 26 unidades
estaduais e territoriais, que passaram a ter regimento próprio. Em 1969, o decreto de
criação da Loteria Esportiva Federal, assinado em maio pelo presidente da República,
Marechal Arthur da Costa e Silva, outorgou 40% da renda líquida obtida à LBA, o que
veio a ser implementado somente no final de 1970, e traduziu-se na única fonte
permanente de recursos da LBA (afora as eventuais dotações orçamentárias da União e
contribuições particulares). Yolanda Costa e Silva manteve-se no cargo de presidente da
LBA, mesmo quando seu marido adoeceu e, afastado do cargo, uma Junta Militar
impediu que o vice-presidente civil, Pedro Aleixo, assumisse. Já na gestão de Emílio
Garrastazu Médici (30/10/69 a 15/3/74), ocorreram alterações no sistema de distribuição
de cotas da Loteria Esportiva, sem alterar o percentual devido à LBA, o que motivou o
envio de um telegrama ao presidente Médici:
nome Legião Brasileira Assistência venho respeitosamente apresentar
Vossa Excelência mais sinceros efusivos agradecimentos pela
confirmação do benefício de quarenta por cento da renda líquida favor
esta Fundação vg conforme decreto assinado referente Loteria
Esportiva federal pt Renovo toda admiração apreço Governo Vossa
Excelência vg reafirmando irrestrito apoio solidariedade todos
146
O “... recolhimento do fundo de garantia substitutivo da estabilidade no trabalho é que será apoio aos
serviços da LBA...” (Sposati & Falcão, 1989: 21).
142
142
sacrifícios benefício assistência maternidade infância no país vg
elevando cada vez mais bom nome nosso Brasil pt Yolanda Barbosa
Costa e Silva Presidente LBA (LBA, 1999).
Em dezembro de 1969 e pelo transcurso do Dia Nacional da Família, a
primeira-dama do país, Scila Nogueira Médici, dirigiu mensagem à mulher brasileira,
pedindo apoio e confiança na ação do marido e presidente da República, que iniciara
mandato a partir de outubro daquele ano. Trata-se de uma carta, publicada na Revista
Brasil Jovem – da FUNABEM, com o seguinte teor:
Desde que o nome de meu marido foi escolhido para o exercício da
Presidência da República, em substituição ao grande Costa e Silva,
formou-se ao meu redor intenso e compreensível movimento de
curiosidade...
Aqui estou... mas para trazer uma palavra, fazer um aceno a todas as
mulheres como eu.
Sou e serei o que sempre fui: a esposa de meu marido, duas vezes
mãe. Ao longo de minha vida, não me tem feito maior diferença a
função que ele exerce desde que permitido me seja estar a seu lado.
...Minha valia é tão pouca, minha missão é tão fácil e tão suave. A
mim toca fazer-lhe a casa amiga e serena, faze-lo sentir-se o homem
simples e confiante que sempre foi, fazer o presente encontrar-se com
as raízes de si mesma no amor de nosso lar...
...Desejaria dizer a todas esposas, neste Dia Nacional da Família, às
outras avós, mães, filhas...com elas me identifico, me associo e me
integro na silenciosa tarefa de fazer o Brasil crescer dentro de casa. E,
voltando meu coração para o coração da mulher brasileira,... peço a
todas e a cada uma que lhe dêem a sua fé. Peço que ajudem outras
pessoas a acreditarem e a confiarem nele também. Mas peço que
vejam no novo presidente... um homem que não traz milagres na
palma da mão, mas um homem de quem sempre podemos esperar
lealdade e trabalho, austeridade e justiça (FUNABEM, 1969:29).
Pode-se dizer que esse pronunciamento expressa uma outra dimensão do
“discurso maternalista” – partindo da condição de mãe e esposa abnegada, conclama
mulheres à cumplicidade, a fiarem sua confiança no novo presidente, de honra
devidamente avalizada por sua esposa. Só a natureza feminina poderia entender, a essa
altura, o apelo (explícito e subjacente) contido no texto.
Um balanço sobre os resultados alcançados no triênio 1968-1970
147
mostrava que a severa contenção de despesas não prejudicou o desempenho desse órgão
147
Foram aplicados CR$ 73.442.023,79 para os seguintes resultados: atendimentos médicos (8.011.854),
clientes de Serviço Social (2.625.233), vacinas aplicadas (1.768.800), concluintes dos cursos de iniciação
ocupacional (195.805), partos realizados (182.660), registros de nascimento (151.514), ações de família
(40.799), casamentos efetuados (19.623), convênios firmados com instituições congêneres (3.578)
(Boletim LBA, 1971).
143
143
federal. Nota-se que o binômio saúde-assistência manteve-se na prestação dos serviços,
agora acrescidos de ações no campo do trabalho, novo componente do trinômio
sustentador da LBA.
Em 1969, o decreto-lei nº 593 transforma-a em uma Fundação, dotando-a de
personalidade jurídica de direito privado e de maior autonomia administrativa
148
, apesar
de permanecer subordinada ao MTPS e preservar a natureza fundante de assistência à
maternidade, infância e adolescência. Os programas de assistência em geral
continuaram disciplinados pelo convênio ou contrato com outros órgãos e organizações
da sociedade prestadores de serviços assemelhados. Dessa forma, a instituição-mor,
responsável pela assistência social pública, desenvolvia programas e projetos direta e
indiretamente país afora.
Percebe-se que, em 1970, o patrimônio institucional da FLBA era
considerável, tendo em vista que possuía:
y 5 maternidades e 3 hospitais infantis;
y 2 laboratórios industriais farmacêuticos;
y 95 postos de puericultura e 1 posto volante;
y 52 unidades de assistência ao parto;
y 12 unidades de medicina preventiva;
y 75 unidades de medicina em Centros Sociais, acrescido de
y 12 unidades em Centros Comunitários, em Centros Regionais,
em Casa da Criança e em antigas Comissões Municipais;
y 44 unidades de proteção ao pré-escolar; 6 educandários (LBA, 1999).
Consideradas como obras próprias, gerenciadas pela própria Fundação, a
vocação da assistência direta à população do principal órgão federal do campo da
assistência social se embrenhava e se especializava na atenção médico-social. Dividia-a
com a manutenção de programas dispersos em outras áreas de proteção à criança e sua
família, possíveis por meio de: ajuda econômica e financeira; colocação em lar
substituto; assistência educacional em regime de internato, semi-internato e externato;
alimentação pré-escolar para a faixa etária de 2 a 6 anos; proteção à criança
148
Possibilitou a organização de Superintendências Estaduais e a criação de Centros Regionais (Falcão &
Sposati, 1989:22).
144
144
excepcional. Deduz-se que tais programas eram implementados através das parcerias
com as municipalidades e entidades sociais particulares.
Em síntese, pode-se dizer, nesse início do período militar, que a gestão
federal da assistência social pública encontrava-se bipartida entre a FUNABEM e a
FLBA, essa última assumindo iniciativas em prol criança abandonada e/ou fragilizada
por contingências familiares e sociais que, em tese, seriam da alçada da FUNABEM.
Dessa forma, estabeleciam-se vias paralelas e superpostas de condução das iniciativas
governamentais, somado ao fato de robustecerem a execução direta da FLBA com
iniciativas típicas do campo da saúde, até porque o predomínio privatista da saúde na
época expurgava a atenção ao cidadão empobrecido. Ao lado da capilarização profusa
de serviços próprios das duas fundações federais, o governo militar investiu
acentuadamente no incentivo fiscal à iniciativa civil das entidades sociais
149
, o que
sugere um movimento duplo de ampliação da oferta de serviços sociais diretos e
indiretos, distante, porém, da possibilidade de configurá-los como um conjunto
uniforme e integrante de uma política social articulada e equilibrada, sobre
competências partilhadas entre os entes federados.
Ainda no Governo Castelo Branco, foram realizadas eleições diretas para o
governo de onze estados brasileiros, em 1965, e as urnas já mostravam certo
descontentamento com os rumos do novo regime político brasileiro. A oposição venceu
na Guanabara e em Minas Gerais, elegendo dois colaboradores de Juscelino Kubitschek,
e ainda em Santa Catarina.
Sob pressão dos setores militares que reivindicavam um controle estrito de
decisões do poder central, Castelo Branco baixou o AI-2, ainda em outubro de 1965,
mês das eleições estaduais. Esse novo ato institucional manteve as eleições indiretas
para presidente e vice-presidente da República, por meio do voto aberto do Congresso
Nacional, ou seja, era uma manobra que eliminaria surpresas advindas do voto secreto.
Extinguiu os partidos políticos existentes, prevalecendo o bipartidarismo entre a Arena
e o MDB (partido de oposição). Na seqüência, em fevereiro de 1966, o AI-3 estabeleceu
149
A ampliação dos benefícios fiscais provocou um acúmulo do trabalho do CNSS, o que levou a uma
reformulação organizacional de sua estrutura e a sua institucionalização mais formal, adquirida com o
reconhecimento como “órgão (estatal) de deliberação coletiva de terceiro grau” (Mestriner, 2001:174-
175).
145
145
também o princípio da eleição indireta dos governadores estaduais, por meio de votação
interna de colegiados das Assembléias Legislativas, fator de restrição máxima do voto
popular.
Abrucio (2002) afirma que, nos dois regimes autoritários do século 20
(Estado Novo e ditadura militar), a intenção foi acabar com o poder político dos
governos estaduais, pela expressiva importância que exerciam - e ainda exercem - sobre
a República. Foram regimes políticos pautados pelo exercício do federalismo
centralizado, que implica a transformação dos governos estaduais e locais em agentes
administrativos do governo federal, que exerce forte influência nos assuntos das
unidades subnacionais, associada à sua primazia decisória e de distribuição de recursos
(Almeida, 1996).
São Paulo era governado por Adhemar de Barros, eleito em 1962 mas
deposto pelos militares em junho de 1966, sendo sucedido por Laudo Natel, seu vice-
governador, que exerceu o resto do mandato (até março de 1967). A tendência de
concentração da população nas áreas urbanas crescia, o que elevou essa participação de
44,1%, em 1940, para 80,3%, em 1970. Da mesma forma, São Paulo se consolidava
como o estado mais populoso do país, saindo de uma população de 9.134.423, em 1950,
para 17.741.928 habitantes, em 1970. Proporcionalmente, em três décadas, ambas as
participações quase duplicaram, o que indica aceleradas transformações sociais que
aconteciam no território paulista (São Paulo, SEADE, 2007; Aeninger & Bassanezi,
2006).
Em 1965, o Serviço Social do Estado promoveu o I Seminário Nacional de
Órgãos Estaduais de Serviços Sociais, o que pode ser considerado como um primeiro
movimento de aproximação e articulação entre os órgãos gestores estaduais no campo
da assistência social pública. A partir desse Seminário, ficou estabelecido que sua
realização seria bienal, precedida de jornadas regionais aglutinadoras dos estados pelo
critério da proximidade geográfica, na seguinte ordem:
y Sul: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo;
y Centro-oeste: Rio de Janeiro, Guanabara, Goiás, Distrito Federal, Minas
Gerais e Espírito Santo;
146
146
y Norte e Nordeste: Bahia, Pernambuco, Pará, Maranhão, Rio Grande do
Norte, Sergipe, Alagoas e Amazonas.
Por hipótese, esse arranjo dos estados sugere que a institucionalidade da
assistência social existia, em 1965, em 17 unidades federadas e no Distrito Federal,
observada a ausência da participação de 5 estados – Acre, Piauí, Ceará, Paraíba e Mato
Grosso –, acrescida dos territórios federais Amapá, Rondônia, Roraima e Fernando de
Noronha.
Entre 1967 e 1968 aconteceu a II Jornada Regional Sul de Serviços Sociais,
em Florianópolis, excepcionalmente organizada após a realização do II Seminário
Nacional das Secretarias e órgãos estaduais de Serviços Sociais, ocorrido em Brasília
em 1967. O temário único da Jornada Regional foi guiado pelo diagnóstico e
prognóstico social das esferas estaduais e municipais no denominado setor específico
dos serviços sociais.
A principal deliberação do evento de alcance nacional foi apontar a
necessidade de estudos sobre a conjuntura dos serviços sociais no país, e sobre as
condições para a criação de um organismo nacional de coordenação da política de bem-
estar social. Para tanto foi constituído um Grupo Nacional de Trabalho, dirigido pela
Secretaria de Serviços Sociais do Distrito Federal, que coletou subsídios enviados pelos
estados e elaborou o documento Diretrizes para uma Política Nacional de Modernização
e Desenvolvimento dos Serviços Sociais
150
(SÃO PAULO, Revista Promoção Social,
1968:44-45).
Esse documento propunha duas grandes medidas.
y A reforma da estrutura institucional dos Serviços Sociais existentes, nos
âmbitos administrativo e regulatório (de legislação e normas). A orientação era pela
criação ou reforma dos órgãos estaduais em nível de secretaria de Estado, uma vez que a
intenção era alcançar a unidade das políticas de ação dos organismos federais a partir da
150
Modernização dos serviços sociais era entendida como “... mudanças institucionais e técnicas que
possibilitem melhor estrutura organizacional e aperfeiçoamento dos métodos de trabalho...” e, por
desenvolvimento dos serviços sociais “..., a expansão de suas atividades de crescimento e diversificação
de prestação de serviços, reorganização estrutural, de modo a atender em níveis mais satisfatórios as
diversas necessidades sociais apresentadas pela população...” (idem).
147
147
criação de um organismo com status ministerial, o que poderia levar a um diálogo maior
entre ambos.
y A implantação do planejamento setorial de Serviços Sociais como
condição básica para o desenvolvimento ordenado de suas atividades, e a elaboração de
planos estaduais de Serviços Sociais associado a um plano nacional.
A Jornada Regional Sul constatou que São Paulo era o único ente estadual
dotado de órgão próprio e com status de Secretaria de Estado
151
, ratificando a
recomendação desse alcance pelas outras unidades federadas, além de apontar a
necessidade de revisão da legislação estadual no âmbito dos Serviços Sociais e do
registro obrigatório de todas as entidades contempladas com auxílios e subvenções
estaduais no órgão oficial de Serviço Social.
Portanto, o ponto de partida dos órgãos gestores estaduais foi,
primeiramente, construir uma coalizão entre si, a fim de propagar a necessidade do
reordenamento institucional da assistência social estatal nas três esferas federativas,
ainda que mantivessem a denominação de “órgãos de serviços sociais”.
O desordenamento federal carecia da construção da unidade, tendo em vista
que LBA e FUNABEM seguiam rotas paralelas na condução programática e financeira.
Em especial, chama a atenção o fato de que o município pretendia uma nova
institucionalidade para essa área de responsabilidade estatal. Pode-se dizer que a
presença do estado municipal nas respostas à questão social, advindas do acelerado
processo de urbanização, ocorreu a partir da década de 50 e, com mais vigor, na década
de 60. Dessa forma, a gestão da assistência social pública deixou de ser bipartite –
intercalada entre os entes federal e estadual –, e começou a se esboçar uma gestão
tripartite a partir dos anos 60, com os primeiros ensaios de medidas racionais comuns,
tal qual a indicação da elaboração dos planos local, regional e nacional. O que estava
em jogo era a embrionária reivindicação pela construção de uma unidade de
encaminhamentos que colocasse, na mesma arena, os três entes federados, curiosamente
despertada por debates suscitados pelos entes estaduais e não o ente federal.
151
Criada em 1967, a Secretaria de Promoção Social será analisada nas próximas páginas.
148
148
O estado de São Paulo tinha novo governador a partir de março de 1967,
eleito indiretamente pela Assembléia Legislativa: Roberto Costa de Abreu Sodré
152
.
Ainda em 1967, uma nova Carta Constitucional regional foi adotada,
preservando o escopo da saúde pública e da assistência social agrupadas em um mesmo
campo de responsabilidade pública, porém delimitado com um diferencial inovador: o
primeiro artigo desse capítulo constitucional (artigo 134) estabeleceu que o Estado
desenvolveria as atividades necessárias para promover, preservar e recuperar a saúde da
população por todos os meios ao seu alcance e em cooperação com os órgãos da União,
de outros Estados, dos municípios, (órgãos) internacionais e com as entidades
particulares. Comparado à Constituição estadual de 1947, introduziu a estratégia
ampliada de parcerias para a implementação desse objetivo, vinculando-a a uma
articulação republicana ou de relacionamento interfederativo entre as esferas
governamentais – com destaque para outros estados e municípios – somado às alianças
com organismos internacionais e privados.
Por sua vez, a responsabilidade da cobertura estatal ampliou a atenção aos
necessitados de forma geral, direta e/ou indiretamente por meio de auxílios e
subvenções concedidos às entidades de caráter assistencial, submetidas ao controle do
Tribunal de Contas. Ratificou, ainda, a necessidade do comando único na concessão e
fiscalização da ação subsidiária estatal por um órgão técnica e cientificamente
aparelhado para pesquisas e planejamento harmônico dos serviços sociais.
Pode-se afirmar que a inovação mais expressiva dessa Constituição estadual
foi o arco de alianças interinstitucionais que o Estado regional deveria construir para
152
ROBERTO COSTA DE ABREU SODRÉ (1918-1999). DÉCIMO GOVERNADOR Período de
governo: 3/67-3/71.Paulistano, formou-se em direito pela Faculdade do Largo de São Francisco na turma
de 1942. Em 1945 foi um dos fundadores da União Democrática Nacional – UDN, tornando-se membro
da sua Comissão Executiva Nacional e secretário geral da Executiva Estadual. No âmbito do poder
legislativo iniciou sua atuação como deputado estadual, exercendo mandatos sucessivos entre 1951 e
1963. Em 1966 foi um dos fundadores da Aliança Renovadora Nacional – ARENA, quando se instalou o
bipartidarismo no Brasil, logo no início da ditadura militar. Foi o primeiro governador a ser eleito
indiretamente, para o período de 1967 a 1970. Deu continuidade ao plano energético do Estado,
implantando o “linhão” de Urubupungá em direção a São Paulo. A Rodovia do Oeste, cujo nome foi
mudado para Castelo Branco, teve o primeiro trecho inaugurado em seu governo. Nesse período foram
também unificadas a Força Pública com a Guarda Civil, criando a Polícia Militar. E, no setor rodoviário,
iniciou a abertura da Rodovia dos Imigrantes, como alternativa à Via Anchieta. Em 1979 fundou o
Partido Democrático Social – PDS. Foi presidente da Eletropaulo (1982) e Ministro das Relações
Exteriores (1986/1990), durante o governo do Presidente José Sarney. Faleceu em 1999, em São Paulo.
149
149
implementar sua responsabilidade pela saúde, seguro social supletivo e assistência
social, o que se confirmou na Constituição estadual de 1969.
A gestão Abreu Sodré iniciou uma grande transformação no desenho
organizacional do aparelho administrativo estadual, robustecido nas gestões anteriores
de Adhemar de Barros e Laudo Natel, que criaram órgãos diversos e reformularam as
atividades internas existentes, porém desprovidos de um plano global para essas
transformações (Felicissimo, 1983: 74).
Trata-se de uma transformação orientada por um Plano de Reforma
Administrativa iniciado em 1967, apoiado basicamente em critérios de normalização da
estrutura do governo e de caráter essencialmente setorial. Assim, o tratamento da
questão social pelo Estado ganhou maior relevo no quadro das prioridades da gestão
estadual no governo Sodré, uma vez que, anteriormente, esteve circunscrita às
Secretarias da Justiça e Saúde, respectivamente, e nessa gestão, a área da assistência
social constituiu-se em uma secretaria exclusiva “... que vai dar atenção especificamente
ao problema das populações marginais...” (idem: 75).
Em dezembro de 1967, o decreto nº 49165 (de 29 de dezembro) criou a
Secretaria da Promoção Social. Todavia, há de se atentar ao fato de que o que estava em
jogo era o governo estadual se ajustar aos ditames de uma ampla reforma político-
administrativa do governo central, ditada pelo decreto-lei federal nº 200, de 25 de
fevereiro daquele exercício. Esse dispôs sobre a organização da administração federal e
estabeleceu diretrizes para a reforma administrativa dessa esfera. Para além da
delimitação dos órgãos que compunham a administração federal, dos princípios
fundamentais que guiavam suas atividades, o capítulo III do DL nº 200 tratava
especificamente da descentralização das atividades da administração federal, uma vez
que dispunha que deveriam ser amplamente descentralizadas em três planos principais
(artigo 10º):
y dentro dos quadros da Administração Federal, distinguindo-se claramente
o nível de direção do de execução;
y da Administração Federal para as unidades federadas, quando estivessem
devidamente aparelhadas e mediante convênio;
150
150
y da Administração Federal para a órbita privada, mediante contratos ou
concessões.
O §5º dispunha que “... ressalvados os casos de manifesta impraticabilidade
ou inconveniência, a execução de programas federais de caráter nitidamente local
deverá ser delegada, no todo ou em parte, mediante convênio, aos órgãos estaduais ou
municipais incumbidos de serviços correspondentes”.
Na seqüência, o § 6º atestava que “... os órgãos federais responsáveis pelos
programas conservarão a autoridade normativa e exercerão controle e fiscalização
indispensáveis sobre a execução local, condicionando-se a liberação dos recursos ao fiel
cumprimento dos programas e convênios...”.
A delegação de competência, utilizada pelo governo central como
instrumento de descentralização administrativa, ficava condicionada à precisão da
indicação da autoridade delegante, à autoridade delegada e às atribuições objeto de
delegação.
Certamente, a materialização de um nacionalismo descendente assumia um
formato velado e inconfundível, simultaneamente. Não se tratava de um processo de
descentralização das políticas públicas federais revestido de delegação de poder e
autonomia aos entes federados. O aparelho estatal estadual – e municipal – urgia por
reformulações compatíveis com as adequações exigidas pela reforma administrativa
federal, sob o risco de tornar inviável a transferência de recursos da esfera central.
Assim, o decreto estadual nº 47830, de 16 de março de 1967, estabelecia a
existência de grupos de planejamento setorial (GPSs) para tratarem das atividades
relacionadas ao planejamento e à reforma administrativa de cada área setorial paulista,
devidamente regulados e controlados pela Secretaria de Estado dos Negócios de
Economia e Planejamento
153
.
153
Os GPS’s foram criados pela Lei nº 9362 de 31/5/1966, cujo artigo 1º, V, trazia a competência a essa
Secretaria de orientar os Grupos de Planejamento Setorial das Secretarias de Estado e das Autarquias
Estaduais, colaborando com os mesmos na preparação dos respectivos planos setoriais. O artigo 6º
estabelecia que ficava criado, junto a cada um dos gabinetes dos Secretários de Estado, dos dirigentes de
autarquias e do Conselhos Estadual de Educação, um Grupo de Planejamento Setorial (GPS).
151
151
Na época, o Secretário de Planejamento, Arrobas Martins, entendia que a
área da assistência social não resolveria, por si só, a questão social, mas sim por meio de
uma ação integrada, intersetorial, o que poderia mantê-la subjugada a outras áreas
setoriais de políticas públicas, no desenho da reforma administrativa estadual. Nesse
sentido, foi decisiva a participação de dois profissionais expoentes da profissão do
serviço social, na época – e sempre – na configuração do GPS para a delimitação de
uma área específica da assistência social estadual: os assistentes sociais Maria Lúcia
Carvalho e Carlos Alfredo de Souza Queiroz. Membros do GPS das áreas do trabalho,
educação, saúde e assistência social, sugeriam primeiramente que essa última área fosse
reconhecida como “promoção popular”, na perspectiva de reunir os diferentes órgãos
estaduais dispersos no aparelho estatal, que convergiam para uma mesma população
154
,
sendo que o anteprojeto de lei que elaboraram sofreu mudanças expressivas na
Assembléia Legislativa.
A mensagem do Governador encaminhada à Assembléia Legislativa
indicava que
urge criar estruturas administrativas adequadas para a formulação e
execução de uma política coerente de desenvolvimento social e que
tais estruturas deveriam : I-reunir e gerir racionalmente os recursos até
agora dispersos, por diferentes órgãos do Estado, ou distribuídos de
forma assistemática ou criteriosa, às instituições privadas; II-
estimular a organização de comunidades locais, com o fim de
desenvolver os hábitos e padrões de sua participação consciente nos
diferentes esforços pela promoção social, bem como implementar as
instituições capazes de desenvolver os programas deste estímulo (in
Nogueira, 1990:92).
Finalmente, em dezembro de 1967, a Assembléia Legislativa reconheceu, e o
governador Sodré ratificou, a criação da Secretaria da Promoção Social, delimitando
como áreas de atuação:
y a ação comunitária visando à melhoria das condições sociais e econômicas
da população, em todos os aspectos, através da atuação orientadora e educativa, o
desenvolvimento do associativismo e a coordenação e mobilização dos recursos
particulares e públicos para o desenvolvimento social; e
154
As últimas informações mencionadas foram coletadas a partir de entrevistas realizadas com Maria
Lúcia Carvalho nos dias 21 e 27/11/2007 na cidade de São Paulo.
152
152
y o atendimento aos menores abandonados e necessitados, à velhice
desamparada, desempregados, imigrantes, vítimas de calamidade pública e outros
grupos específicos em situação de inadaptação social.
A estrutura funcional do novo órgão dispunha de uma administração
superior
155
, a administração-meio, seguida de duas áreas-fins:
y a ação comunitária;
y o atendimento a grupos em situação de inadaptação social.
A reforma administrativa propugnada no decreto estadual 49165/67
abrangia, também, as áreas de cultura, educação física, esportes e turismo que,
conjugadas com a área da promoção social, deveriam atender aos objetivos específicos:
y dinamização dos setores de atividades, através da ampliação do
atendimento dos serviços prestados na época pelo Estado, e incorporação de novas
funções que não vinham sendo executadas;
y estabelecimento de adequada estruturação das unidades e racionalização
dos serviços, visando à melhoria qualitativa e elevação da eficiência;
y aparelhamento administrativo, material, e de pessoal dos setores;
y melhor coordenação das atividades do Estado com os particulares.
O Título III do referido decreto estadual dispôs sobre a transferência de
órgãos, de tal forma que a Secretaria do Governo passava a denominar-se Secretaria da
Promoção Social (I); a Secretaria da Saúde Pública e da Assistência Social denominava-
se, a partir de então, como Secretaria da Saúde Pública (III), e foram transferidos para a
Secretaria da Promoção Social os seguintes serviços (IV, a):
y Serviço Social do Estado;
y Serviço Social de Menores e o respectivo Conselho Social, além do Fundo
de Assistência Social ao Menor, da Secretaria da Justiça;
y Departamento de Imigração e Colonização, da Secretaria de Agricultura;
y Conselho Estadual de Auxílios e Subvenções, da Casa Civil do
Governador.
155
Os primeiros secretários estaduais foram José Felício Castellano (gestão janeiro de 1968 a julho de
1970) e Carlos René Egg (julho de 1970 a março de 1971).
153
153
Observa-se que
a competência estadual no tratamento da questão social vai,
gradativamente, a partir de 1967, se concentrando na função
executiva e, menos, nas funções de formulação de diretrizes e de
provimento de recursos. No plano das diretrizes aumenta o
comprometimento com programas federais, como por exemplo:
os Centros Comunitários com o Centro Nacional de
Desenvolvimento de Comunidade,... o MOBRAL estadual ao
Mobral federal... (Felicissimo, 1983: 77).
A dependência de transferência de recursos federais se estabelecia, em
outros setores de políticas públicas, mesmo para os programas de iniciativa estadual,
como era o caso do Sistema Estadual de Mão de Obra (SEMO) e do Programa de
Nutrição (PRONUTRI), dependentes, respectivamente, de recursos do Ministério do
Trabalho e do Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (PRONAN).
O Plano de Reforma Administrativa de 1967 demonstra que o governo
estadual passou a encarar a questão social de maneira mais abrangente, relacionando-a
com o desenvolvimento industrial e o processo de urbanização. A intervenção estatal foi
ampliada para outras áreas, como habitação e trabalho, tornando-se mais estruturada e
centralizada, realinhando serviços dispersos em uma mesma área, como ocorreu com a
criação da Secretaria da Promoção Social. Por sua vez, destacava-se uma tendência do
Estado regional paulista no tratamento da questão social:
a posição do Estado de São Paulo como instância de governo
subordinado a um governo federal que assume cada vez mais um
caráter autoritário e centralizador...que reduziu a margem de
autonomia do governo estadual, notadamente a partir de 1967 (idem).
Diga-se de passagem que a dependência político-administrativa do governo
central não atingiu, somente, o estado paulista. O modelo centralizador da ambígua
federação brasileira definiu, nesse período histórico, o padrão organizacional das
administrações públicas estaduais e municipais, inspirados no modelo organizativo
federal. Constrangidos pelas normas centrais e pelos critérios de repasses de recursos
fiscais, os sistemas regional e local de planejamento tinham sua capacidade reduzida na
atenção às demandas peculiares, subjugadas à tutela federal (idem, 1992: 10-11). Em
outras palavras, a nacionalização das ações públicas no campo social se dava por razões
de adesão involuntária, de necessidade compulsória, somadas à característica de replicar
154
154
nos territórios regionais e locais programas pré-estabelecidos. Trata-se, portanto, do
predomínio de um nacionalismo descendente, autocrático e anticooperativo.
A meta básica do Governo Abreu Sodré era promover a integração e o
desenvolvimento, matriz inspiradora da criação da Secretaria da Promoção Social:
integração de órgãos e serviços governamentais, a nova integração governo estadual e
municipais (através da implantação de consórcios intermunicipais) e a
institucionalização da integração povo-governo, potencializada pelo desenvolvimento
das comunidades.
Havia o Documento Básico sobre Diretrizes de Política de Ação no Setor da
Promoção Social, que orientava a necessidade de sintonizar a política de promoção
social com as metas e prioridades do desenvolvimento geral, ou seja, o acentuado
progresso material do estado de São Paulo exigia uma intervenção sistemática,
planejada e preventiva na complexa problemática social gerada pelo próprio processo de
desenvolvimento, sob risco de o desajustamento social comprometê-lo. Como medida
preventiva, era necessário estimular a comunidade, conscientizando-a e organizando-a
para participar desse processo.
Nesse sentido, a Secretaria estruturou seu campo funcional em duas faixas
interdependentes:
a) prevenção, amparo e readaptação sociais de grupos especiais;
b) ação comunitária.
Manteve-se o atendimento direto aos casos considerados necessitados, além
de promover interlocução e convênios com os serviços públicos e obras sociais
estratégicas para a resolução dos casos. Inicialmente, foi preservada a estrutura do
antigo Serviço Social do Estado, que tinha o CARN (Centro de Acolhimento e
Reabilitação dos Necessitados), o Abrigo Pré-hospitalar, o Centro Maternal e de
Reabilitação Feminino, além do Educandário Margarida Galvão, em Jacareí (SP). O
atendimento preliminar era realizado pelo Plantão, que provia a atenção imediata aos
casos em situação de emergência, preservando para aqueles mais complexos a matrícula
e o atendimento progressivo. O CARN, localizado na capital, desenvolvia o
atendimento dispensarial ao indigente, ao “desvalido”, ao pobre, através de apoio
155
155
econômico e social, cuidados médicos, com o objetivo de alcançar a reintegração social
dos mesmos (São Paulo, Promoção Humana, 1968).
Transferido da Secretaria da Agricultura, o Departamento de Imigração e
Colonização fora criado logo no início do século, como espaço de referência para o
acolhimento e moradia temporária dos trabalhadores imigrantes e suas famílias que
chegavam ao país, à capital
156
,para depois se fixarem em postos de trabalho, em São
Paulo ou no interior do estado. Em 1971, esse serviço se transformou em Departamento
do Migrante, tendo em vista o aumento gradativo da migração interna de trabalhadores
que buscavam oportunidades de trabalho na capital e imediações, preservando o
atendimento a imigrantes que chegavam à capital, em número reduzido.
Foram implantados, interior afora, Postos de Triagem do Migrante em
cidades estratégicas de pólos regionais, para atendimento e encaminhamento racional
dos migrantes para sua fixação, certamente com a intenção de prevenir a demanda
concentrada na capital do estado. Em 1970, estavam em funcionamento Postos em
Presidente Epitácio, Presidente Prudente, Assis, Ourinhos, Cruzeiro e Santa Fé do Sul
(São Paulo, Promoção Humana, 1970).
Por sua vez, o Serviço Social de Menores, agora novamente sob gestão do
órgão gestor da assistência social pública, teve seu atendimento ampliado. Enquanto
esteve sob a gestão da Secretaria da Justiça e Negócios do Interior, atendeu a 10.524
crianças e adolescentes fragilizadas pelo abandono familiar, passando para 46.523 em
meados de 1970. A orientação adotada pela Secretaria da Promoção Social foi fomentar
a abertura do atendimento em regime de semi-internato, através de convênios com as
obras sociais (para 11501 crianças e jovens, e 1840 portadores de deficiência),
prevenindo e reduzindo a tendência anterior do asilamento integral (havia nessa época
10602 internos e 2500 com algum tipo de necessidade especial). A essa cobertura
somavam-se 3 mil atendidos pelos serviços próprios estaduais e 17 mil mantidos sob
convênio através dos consórcios de promoção social. Quanto aos adolescentes
156
Na cidade de Santos havia a Hospedaria do Imigrante, como espaço de acolhida inicial dos
trabalhadores que chegavam de navio. Serviu também como abrigo de quarentena a essa população,
principalmente quando ocorreu a epidemia de febre tifóide local, o que exigia tratamento médico
profilático.
156
156
infratores, foram construídas 4 Casas de Estar em cidades do interior, que seriam
conveniadas para a ampliação do atendimento (idem).
Da nova secretaria paulista fazia parte a Coordenadoria do Desenvolvimento
Social, erguida sobre a crítica à tendência pretérita e hegemônica de atenção estatal
individual às obras sociais e a casos sociais, de cunho assistencialista e tutelador, com a
proposta de promover uma mudança social planejada e participativa concernente ao
desenvolvimento das comunidades (Nogueira, 1990). O trato individual e de baixa
eficiência tendia a ser suplantado pelo trato coletivo de superação de problemas, de
promoção ao desenvolvimento das potencialidades latentes na própria comunidade. A
nova proposta era fundada na racionalidade técnica e no planejamento, orientada pela
crença de que a eficiência organizacional, conduzida pelo órgão gestor estadual,
suplantaria interesses paternalistas e corporativistas e ofereceria soluções para as
mazelas circunstanciais oriundas do capitalismo, o que ignorava - de certa forma - as
relações estruturais próprias das relações de produção capitalista e o decorrente embate
de classes sociais (idem: 1990).
A ação comunitária inaugural foi implementada pela estratégia da assistência
técnica desenvolvida pelos assistentes sociais do órgão gestor estadual, que realizavam
o estudo e o diagnóstico das comunidades demandatárias da ação institucional, bem
como a organização de grupos sociais para sua integração no [suposto]
157
processo de
desenvolvimento social local, regional e nacional. Pode-se inferir que essa nova
orientação institucional encobria a orientação esperada do governo central, de exigir do
governo estadual uma presença mais efetiva no cotidiano das comunidades, no sentido
de reverter as embrionárias insatisfações populares de contestação ao regime político
em vigor.
A Coordenadoria de Desenvolvimento Social foi se estruturando para
organizar as Divisões Regionais de Promoção Social, instâncias fundamentais para a
interiorização e aproximação do órgão gestor estadual das demandas locais (individuais,
municipais e/ou das obras sociais). Em 1970, estavam organizadas 11 divisões
157
Observação da autora deste trabalho.
157
157
regionais
158
, sendo que a assistência técnica prestada pelos assistentes sociais era
respaldada por uma autonomia institucional que lhes permitiam assessorar a
implantação de órgãos gestores municipais, impulsionados, nesse período, para
organizar atividades comunitárias para além dos desenhos programáticos, o que foi
avaliado positivamente se comparado às gestões subseqüentes (Nogueira, 1990).
Um poderoso instrumento adotado para a implementação das duas faixas
interdependentes do campo funcional da secretaria foi a implantação de consórcios de
promoção social. Conhecidos também pela alcunha de “consórcios intermunicipais de
promoção social”, correspondiam à articulação das prefeituras de uma sub-região
circunvizinha para soluções conjugadas de problemas comuns. Em síntese, o órgão
estadual estimulava a integração interinstitucional local, potencializadora de respostas
às demandas locais, preservando, para a Secretaria da Promoção Social, a ação indireta,
as funções normativa, capacitadora, controladora e co-financiadora.
Precedeu à instalação dos consórcios de promoção social, os consórcios
intermunicipais de assistência ao menor que, em 1968, totalizavam 23, e agrupavam
mais de 150 municípios. A idéia era ampliar o escopo de cobertura desses consórcios
para outros segmentos populacionais, e sob um novo arranjo organizativo (São Paulo,
Promoção Humana, 1968).
A instância decisória dos consórcios de promoção social era composta pelas
Assembléias de Prefeitos, assessoradas pelos respectivos conselhos consultivos e, no
nível local, o Conselho Municipal de Promoção Social. A estratégia básica era as
intersetorialidade e interinstitucionalidade locais e sub-regionais, cabendo ao órgão
estadual a estimulação do potencial resolutivo local. No mínimo, cinco municípios
deveriam estabelecer os acordos para, sancionados pelos respectivos parlamentos locais,
estabelecerem o contrato bilateral com o governo estadual. O co-financiamento era
estabelecido em cotas municipal e estadual.
Em setembro de 1968, havia 2 consórcios estabelecidos entre 9 municípios,
crescendo para 24 em dezembro daquele exercício, o que envolvia 155 municípios e, em
158
Grande São Paulo; Santos; São José dos Campos; Sorocaba; Campinas; Ribeirão Preto; Bauru; São
José do Rio Preto; Araçatuba; Presidente Prudente; Marília.
158
158
dezembro de 1969, o alcance já atingia a casa dos 337 municípios paulistas, articulados
em 57 consórcios instalados com essa nova modalidade de mobilização comunitária. A
ação comunitária desenvolvida implantou 57 Centros Comunitários e as comunidades
rurais contavam com 19 Centros Rurais – centros esportivo-recreativos – herdados da
Secretaria da Agricultura (SÃO PAULO, Revista Promoção Humana, 1970).
Pode-se afirmar que a experiência paulista dos consórcios intermunicipais de
promoção social, nessa época, antevia e se antecipava à orientação emanada duas
décadas depois na Constituição Federal de 1988 (artigo 25, 3º). Aponta para a
responsabilidade dos estados federados instituírem mecanismos gerenciais de
agrupamento de municípios limítrofes para a execução de funções públicas de interesse
comum. Dessa forma, a estratégia favorável, que foi se aperfeiçoando nos marcos
regulatórios posteriores, para a política de assistência social, é a regionalização, trazida
claramente na NOB/SUAS como de responsabilidade da esfera estadual em dois níveis:
y promover, coordenar, regular e co-financiar a estruturação de ações
regionalizadas pactuadas (a exemplo dos consórcios públicos) para a oferta de serviços,
benefícios, programas e projetos sociais destinados à proteção social de grupos sociais
em situação de extrema vulnerabilidade social;
y analisar e definir, em conjunto com os municípios, o território para
construção de “unidades de referência regional”, a oferta de serviços, o fluxo de
atendimento dos usuários no Estado e as demandas prioritárias para serviços regionais e
serviços de consórcios públicos.
Dessa forma, a orientação contemporânea é a de que o ente estadual não seja
animador somente de arranjos intermunicipais e interinstitucionais, mas sim dotado de
funções de coordenação, de co-financiamento e, no limite, de executor responsável pela
proteção social especial de determinados segmentos populacionais, quando não se
justificar que municípios assumam essa responsabilidade – quer seja pelo seu porte
populacional, quer seja pela incidência atenuada do risco social.
Em meados de 1970, a estrutura administrativa reorganizada da Secretaria de
Promoção Social contava com:
y Departamento de Orientação Técnica (DOT): seção de obras sociais, setor
de planejamento e padronização, setor de treinamento do pessoal técnico, setor de
estudos sociais, biblioteca e protocolo;
159
159
y Coordenadoria do Desenvolvimento Social (CDS);
y Coordenadoria dos Estabelecimentos Sociais do Estado (CESE): englobava
o Serviço Social de Menores e as respectivas unidades prestadoras de atendimento
159
e o
Departamento de Migrantes, com a unidade central (Rua Visconde de Parnaíba, na
capital), o CARN, e outros serviços sociais, como o Serviço Médico Para-Hospitalar, o
Centro de Reabilitação de Gestantes e Mães Solteiras e o Centro de Reabilitação de
Jovens Egressas da Prostituição.
A reforma administrativa empreendida no governo Abreu Sodré criou outro
importante, e não menos polêmico espaço institucional de intervenção na questão social:
a Lei nº 10064 de 27/03/1968 instalou o Fundo de Assistência Social do Palácio do
Governo (FASPG), novo lócus oficial de ação da primeira-dama do Estado paulista. A
partir desse ato, fica institucionalizada, no aparelho do Estado, a intervenção paralela e
superposta da esposa do governante, administrativa e diretamente ligada ao Gabinete do
Governador. Paradoxalmente, a reforma propugnava a modernização e a racionalização
de estruturas e órgãos dispersos e respectivos gastos administrativos. O que se
depreende é que a criação de mais esse órgão não colidia com essa lógica
racionalizadora, estando mais próxima de dois fatores motivantes:
y atender aos preceitos do Decreto federal nº 200, mimetizando o FASPG
como estrutura equivalente à LBA. Conseqüentemente, o desdobramento desse
mimetismo se daria nas esferas municipais;
y atender a interesses políticos de maior autonomia no manejo clientelista do
trato da questão social.
As finalidades desse novo órgão estadual se pautam pelo modelo médico-
social, espelhado pelo órgão correspondente federal (LBA), e criam uma segunda via da
subsidiariedade estatal, uma vez que era exercida também pela Secretaria da Promoção
Social. Era imcumbida de:
159
Eram subdivididas em Casas de Triagem (10) e Casas de Permanência (11). As Casas de Triagem
eram: Berçário, Casa das Mães, Casa Nair Coelho, Educandário N. Sra. Maria Auxiliadora, Educandário
Sampaio Viana, Instituto de Aprendizado Doméstico (IAD), SAT-Lares e Jupuruchita, Casa de Plantão,
Pavilhão Central, Pavilhão II. Casas de Permanência: Inst. Sta. Emília (Guarujá), Inst. Agrícola de
Menores de Batatais, Inst. Agríc. de Menores de Itapetininga; Inst. Masculino de Menores de Mogi
Mirim, Instituto Agrícola de Menores de Iaras, Patronato Anita Costa (Lins), Colônia de Férias de São
Vicente, Educandário Dª Margarida Galvão (Jacareí), Pensionato N. Sra. do Carmo; Instituto Modelo de
Menores, Instituto Dª Paulina de Souza Queiroz.
160
160
y prestar assistência econômica, educacional e médico-hospitalar aos
necessitados – portanto, outra via paralela de atenção aos segmentos sociais
pauperizados;
y manter a assistência social e o Posto de Hidratação do Palácio do Governo
- propunha-se a replicar, nesse espaço institucional, ofertas próprias da área da
assistência social e de atenção à saúde da população infantil;
y prestar assistência econômica às entidades assistenciais devidamente
registradas nos órgãos da Secretaria da Promoção Social – a instala, sutilmente, a
subordinação intrafederativa estadual do órgão gestor da política de assistência social
regional ao desígnio da esposa do governador;
y prestar assistência econômica às entidades privadas que se dediquem a
atividades educacionais e médico-hospitalares – alarga o alcance da subsidiariedade
para além das denominadas obras sociais, entrando na seara das entidades sem fins
lucrativos das áreas de educação e saúde, vasto campo fecundado pela natureza secular
e mista da iniciativa filantrópica.
A direção desse novo órgão contava com um Conselho Deliberativo, sob a
presidência da primeira-dama “ou outra pessoa de livre escolha desta” (o que nunca
ocorreu), composto por sete membros. Estruturado com receitas financeiras, essas
provinham de contribuições, donativos e legados de pessoa física ou jurídica de direito
privado; de auxílios e subvenções concedidas pela União, Estados ou Municípios, bem
como por autarquias; de materiais inservíveis ao governo estadual que podiam ser
comercializados pela primeira dama, acrescidos de quaisquer outras receitas que
legalmente pudessem ser incorporadas. Logo, a informalidade de outrora da ação social
da esposa do governante estadual estava suficientemente estofada de um aparato
administrativo e financeiro que dava sustentação a suas iniciativas.
Maria do Carmo Mellão de Abreu Sodré foi a primeira dirigente do FASPG,
atuando anteriormente na embrionária versão denominada Fundação Plano de Amparo
Social (PAS), sediada na futura sede do FASPG. Em 1968, criou um Plano de ação
assistencial visando ao desenvolvimento de ações conjugadas da esfera estadual, para
implementar ambulatórios médicos, dentários e enfermarias no interior do estado
paulista (São Paulo, Fundo Social de Solidariedade, 2007).
161
161
Assim, foram realizadas as primeiras doações de ambulâncias, cadeiras de
rodas, óculos e aparelhos auditivos. Teve forte atuação nas calamidades públicas
oriundas das enchentes de 1968 e 1969 que atingiram a capital e regiões litorâneas.
Realizou doações significativas às entidades filantrópicas, por intermédio do CEAS, o
que não deixa de ser um fato curioso: a transferência desse Conselho Estadual para a
alçada da Secretaria da Promoção Social ocorreu no ato de sua criação, saindo do
Gabinete do Governador. Paradoxalmente, a primeira-dama interferia na concessão de
auxílios e subvenções, de dentro do gabinete do Governador.
Por sua vez, a FLBA exercia atividades em quatorze unidades na capital do
Estado e dezessete no interior paulista, constituídas como Centros Regionais que se
desdobravam em 237 unidades menores, ou seja, em Centros Municipais. Através da
Divisão de Serviço Social da Diretoria estadual, a linha mestra era o serviço social de
comunidade, “... processo do qual os esforços do povo se unem aos esforços do
Governo, com o fim de melhorar as condições globais do povo, a fim de integrar as
comunidades na vida nacional, (assim) participa a LBA no progresso do país...” (Brasil,
LBA, 1966).
Percebe-se que a tendência prevalente desse período histórico era privilegiar
a abordagem do desenvolvimento comunitário, tanto por parte da representação regional
do órgão supremo federal da área da assistência social estatal, quanto por parte da
recém-criada Secretaria da Promoção Social, reflexos da abordagem metodológica
prevalentemente adotada pela área profissional do serviço social. O refino metodológico
da LBA seguia indicações estatísticas apropriadas pelo DEESP – Departamento de
Estatísticas do Estado de São Paulo – na caracterização do perfil predominante de cada
região paulista, sob a égide da planificação social, entendida como uma técnica para o
desenvolvimento.
No plano federal, o presidente Médici conduzia com maestria o binômio
repressão-euforia, seja pela extirpação de focos da luta armada contra o regime militar,
seja pelos resultados do período chamado de “milagre econômico”, entre 1969 a 1973.
Embalada pela marchinha “Pra frente Brasil”, a vitória do futebol brasileiro fertilizou a
crença de que “ninguém segura este país”: o pico de crescimento do PIB ocorreu em
1973, com a taxa de 13%, e a inflação não passava dos 18%, resultados encobertos pelo
162
162
inconfessável e indescritível aumento da dívida externa brasileira. Por outro lado,
acentuou-se a concentração de renda, à custa de uma pujança do potencial industrial
brasileiro e de indicadores muito baixos de saúde, educação e habitação (Fausto,
2007:485-487).
O sucessor de Médici foi o general Ernesto Geisel, primeiro presidente
escolhido pelo Colégio Eleitoral, governando de março de 1974 a março de 1979.
Geisel protagonizou o início da abertura política, definindo-a como lenta, gradual e
segura. A morte de Vlado Herzog nos porões do DOI-CODI paulistano em 1975,
seguida da do operário Manoel Fiel Filho em 1976, provocou a mudança do comando
militar regional, substituído por tentativas de aproximação ao diálogo com a sociedade
civil, a despeito da fúria do coronel Erasmo Dias, comandante da Polícia Militar
paulista, que não suportava essa tendência, protagonizando a incendiária invasão da
PUCSP em 1977, e o ataque aos estudantes supostamente subversivos que lá imaginava
existir.
O cenário social se modificava pela intensa mobilização e manifestação de
repulsa às mortes e à tortura, protagonizada pela Igreja Católica, OAB e resultados das
urnas eleitorais em 1974, que aumentavam a presença da oposição na cena política.
O governo central fazia um movimento duplo. De um lado, tentava estreitar
a chance de o partido de oposição (MDB) continuar a crescer, baixando a Lei Falcão –
restritiva à propaganda eleitoral falada –, criando a figura do senador biônico – eleito
indiretamente – e modificando a proporcionalidade da representação dos estados na
composição da Câmara de Deputados. De outro lado, em 1978, começou encontros com
líderes do MDB, da Associação Brasileira de Imprensa e da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil para a restauração das liberdades políticas, o que possibilitou a
revogação de medidas arbitrárias impostas ao Congresso Nacional, aos funcionários
públicos, ao cidadão em geral. Concomitantemente, os movimentos sociais ganhavam
forma e protagonismo, principalmente aqueles organizados na órbita das comunidades
eclesiais de base (CEBs) da Igreja Católica (nas periferias das cidades
160
), ligados aos
160
A título de exemplo, na cidade de São Paulo, era expressivo o Movimento contra a carestia e o custo
de vida (zona sul), Movimento de luta por creches (organizado por mulheres e militantes das CEBs da
zona sul), o Movimento de Saúde (zona leste).
163
163
trabalhadores urbanos e rurais (a Comissão Pastoral da Terra). A mobilização por
melhores salários, imposta pelo sindicalismo operário da região do ABC paulista,
influenciou outros movimentos de trabalhadores (professorado, profissionais
assalariados), propulsores de grandes greves em 1978 e 1979.
Novas mudanças ocorreram na estrutura administrativa dos Ministérios,
atingindo a FLBA. A Lei nº 6036, de 01/05/1974, dispôs sobre o desdobramento do
Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS) em dois ministérios: Trabalho;
Previdência e Assistência Social (MPAS). O artigo 2º delimita os assuntos do MPAS:
previdência e assistência social. Dois meses depois, o decreto 74254, de 04/07/1974,
dispôs sobre a estrutura básica do MPAS, quando foi criada a Secretaria de Assistência
Social (SAS) – artigo 2º, IV, 3. O artigo 8º define a transferência da FLBA para esse
novo Ministério, e seus recursos agora são procedentes do FAS – Fundo de Apoio ao
Desenvolvimento Social –: “...assim, vai se rompendo sua natureza de órgão legionário,
complementar ao Estado, para se apresentar explicitamente como parte componente da
ação governamental...” (Sposati & Falcão, 1989:23). À FLBA são incorporados o
FUNRURAL (previdência própria dos trabalhadores rurais), o atendimento ao idoso e
ao excepcional, todos oriundos do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).
Portanto, a organicidade ao campo da assistência social pública adquiria forma,
constatando-se que o órgão principal e perene (SAS) teve sua gênese, então, pelas mãos
do governo militar.
É importante registrar que foi realizado, em novembro de 1974, o Seminário
Bom Clima, em Petrópolis (RJ) com o objetivo de subsidiar a recém formada Secretaria
de Assistência Social, cujos resultados estão condensados em documentos do Centro
Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS)
161
(in Sposati et
alii, 1985:56-57). Em síntese, a preocupação era apontar a necessidade de mudança de
paradigmas quanto à compreensão sobre a finalidade da assistência social, substituindo
a acepção tradicional de concessão de auxílios (materiais e financeiros) e serviços
concebidos para aliviar a pobreza, sem alterar a estratificação social, fundada mais em
um dever ético-religioso do que no reconhecimento de direitos do assistido. A idéia era
indicar que a pobreza não resultava de características individuais, mas estruturais, pela
161
Documento nº 90: Alternativas da política assistencial brasileira e Documento nº 91: Desenvolvimento
e marginalização social.
164
164
somatória de fatores sociais, o que reconhecia a responsabilidade coletiva na satisfação
das necessidades primárias do homem, portanto, um direito a ser garantido pelo Estado,
com o apoio das instituições privadas. Assim, a idéia era sair de um patamar de ajuda,
de tutela, para uma intervenção técnica e planejada de participação da clientela e
propiciadora da mobilidade social. Nessa perspectiva, a assistência social faria a
travessia entre a marginalização e a integração social, se somada à ação de outros
órgãos, porém ainda insuficiente quanto à efetividade dessa intervenção.
Seguindo essa lógica, um vigoroso programa social foi criado em 1975, para
concretizar a ação comunitária esperada como força motriz do desenvolvimento de
potencialidades locais para o desenvolvimento social. Por meio do Decreto nº 75922,
foram criados os Centros Sociais Urbanos (CSUs), sob gestão da FLBA, para “...
promover a integração social nas cidades, através do desenvolvimento de atividades
comunitárias nos campos da educação, cultura e desporto, da saúde e nutrição, do
trabalho, previdência e assistência social e da recreação e lazer...” (artº 1º). Eram
equipamentos sociais de uso múltiplo, operados por meio da cooperação
técnicofinanceira com entes federados e organizações da sociedade civil, desde que
assegurada a sustentabilidade dos mesmos e as principais fontes de custeio federal
provinham do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Fundos de
Participação dos Estados e Municípios, de financiamentos oriundos da Caixa
Econômica Federal e Banco Nacional da Habitação (BNH), e recursos do Orçamento da
União, além de outros recursos públicos e privados.
Na verdade, o programa dos CSUs integrava a Política Federal de
Desenvolvimento Social e de Desenvolvimento Urbano expressa no II Plano Nacional
de Desenvolvimento, implantado no Governo Geisel, cuja dimensão econômica
mantinha a meta do desenvolvimento acelerado, à custa de elevada dívida externa
brasileira e, em contrapartida, o acirramento da desigualdade social. Fora instalado o
Conselho de Desenvolvimento Social, ao qual estava vinculado o Grupo Executivo do
Programa CSU.
A título de exemplo sobre o impacto desse Programa, o governo do Estado
da Bahia delegou à Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (SETRABES) a função
de agente gestor e, para constituí-la, foi criada a Fundação para o Desenvolvimento de
165
165
Comunidades do Estado da Bahia – FUNDESCO –, com o objetivo de “... melhor
executar a política estadual de desenvolvimento de comunidades de população de baixa
renda e de integração social nos centros urbanos...” (BAHIA, Programa Nacional de
Centros Sociais Urbanos, 1979). Foram implantados 33 CSUs na Bahia, cuja avaliação
positiva era creditada ao fato de que
o Programa CSU reúne características especiais, pois além de resultar
do esforço da comunidade, somado a recursos institucionais, encerra o
confronto e o contraste das culturas urbana e rural, mesclando o saber
técnico com a sabedoria popular. Estimula a dinâmica da vida
comunitária e descobre novos valores, revitaliza antigas manifestações
culturais, e assim cada CSU vai construindo sua própria história
(idem).
Em 1975, o decreto nº 76719, de 03 de dezembro, provocou nova alteração
na estrutura do MPAS, agregando à SAS e à FLBA a FUNABEM, sendo que, pela
primeira vez, esses dois importantes órgãos da política social ficaram juntos, apesar de
continuarem em trajetos separados. Além disso, explicita as competências da SAS:
à Secretaria de Assistência Social compete supervisionar a execução
da política relativa à prestação de auxílios à pessoas carente de
recursos materiais, educacionais e outras medidas de proteção social
para cuja concessão não seja exigido contraprestação direta dos
assistidos, bem como aos assuntos de subvenções, auxílio e isenções a
entidades que atendam essa clientela (artigo 12)
162
.
Note-se que aqui se cria o que se pode chamar de enlaçamento da assistência
social/proteção social, através de benefícios e medidas que não exigem a
contraprestação direta dos “assistidos”, ou seja, a atenção socioassistencial não é
contributiva, ao contrário do seguro social.
Torna-se explícita a tendência que vinha sendo adotada há décadas, sobre o
alcance da assistência social pública: destinada a pessoas “carentes”, como um
contraponto ao padrão “normal” do trabalhador; atender as pessoas inadaptadas, de
forma semelhante à conceituação empregada na criação da Secretaria da Promoção
Social de São Paulo (grupos em situação de inadaptação social), para a qual o
receituário dominante indicava o placebo da integração e promoção social, como
contrapontos à assistência e a possível dependência que poderia gerar.
162
A respeito dessa criação, o CBCISS – Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços
Sociais – realizou, em novembro de 1974, o Seminário de Bom Clima/ Petrópolis.
166
166
Dois anos depois, foi criado o Sistema Nacional de Previdência e Assistência
Social (SINPAS) – lei nº 6439 de 1/9/77 –, vinculado ao MPAS. Integravam o SINPAS:
o INPS, o INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social,
novo órgão para o qual foram transferidos os serviços médicos e hospitalares da LBA),
a FLBA, a FUNABEM, a DATAPREV (Empresa de Processamento de Dados da
Previdência Social), a CEME (Central de Medicamentos, como órgão autônomo) e o
IAPAS (Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social,
outro órgão criado).
O capítulo III, artigo 9º
163
, dispôs que à LBA competia prestar assistência
social à população carente, mediante programas de desenvolvimento social e de
atendimento às pessoas, independentemente da vinculação destas a outra entidade do
SINPAS. O caráter não-contributivo da proteção social atribuída à LBA ficava, então,
oficializado, apesar de isso estar implícito desde sua gênese, na era Vargas, além de
preservar a possibilidade de o trabalhador segurado/pauperizado ser contemplado pelas
ações desse órgão assistencial.
À FUNABEM cabia promover a execução da política nacional do bem-estar
do menor, com a ressalva de que os programas a cargo das entidades estaduais ou
municipais de assistência social poderiam ser subvencionados, em caráter suplementar,
com recursos da FUNABEM. (artigos 10º e 11º). É interessante apontar que a reserva
subvencionária aparecia somente para a Funabem, ratificando que a gestão dos auxílios
e subvenções de ordem assistencial diversa ficava a cargo da SAS (e não mais da LBA).
Por último, o SINPAS constituiu a receita de suas entidades integrantes em
um Fundo de Previdência e Assistência Social – FPAS –, de natureza contábil e
financeira, administrado por um colegiado integrado pelos dirigentes desses órgãos, sob
a presidência do Ministro da pasta.
163
O parágrafo único estabelecia que “... os serviços de assistência complementar não prestados
diretamente pelo INPS e pelo INAMPS aos seus beneficiários poderão ser executados pela LBA
conforme se dispuser em regulamento...”.
167
167
O Presidente da LBA, na época, Luiz Fernando da Silva Pinto, entendia que
era preciso desenvolver uma “economia da pobreza” ou “economia do quarto
estrato
164
”, na qual a LBA assumiria um papel semelhante ao do BNDE na área
econômica, de tal forma que, por meio de múltiplas atividades, promoveria a
reestratificação dos pobres, passando-os do quarto para o terceiro estrato (in Sposati &
Falcão, 1989:25). Dessa forma, a profusão de programas era bem vista e foi efetivada, o
que impulsionou a fragmentação ainda maior das ações do órgão, sob a diretriz da ação
comunitária de cunho educativo, executada por técnicos e voluntários.
O que se questiona é o fato de que programas sociais se perfilam tal qual um
rosário de atenções, tão frágil na sua durabilidade quanto a orientação diversa que cada
governo pode imprimir e modificá-los, o que distancia cada vez mais a LBA e a
FUNABEM da configuração de uma política nacional organicamente orquestrada.
A LBA se atribuía a missão de atender 40 milhões de pessoas, “...
socialmente vulneráveis e completamente marginalizadas do desenvolvimento e
progresso brasileiro...” (LBA, Núcleo da Memória da Assistência Social, 1999). Em
1979, contava com uma rede de cooperação técnica e/ou financeira com entidades
públicas e particulares, somada a 981 equipamentos sociais próprios: 198 Centros
Sociais e unidades de atendimento, 464 Núcleos de Voluntariado, 319 Postos do
Programa de Complementação Alimentar, coordenados por meio de 22 Diretorias
Estaduais, 3 Diretorias Territoriais e a Diretoria de Brasília. Os programas sociais que
desenvolvia eram:
y Programa de Complementação Alimentar atendendo 310 mil gestantes,
nutrizes e crianças até 3 anos no combate à desnutrição;
y Programa de creches-casulo: aproveitava espaços ociosos de escolas,
igrejas e outras instituições sociais, bem como equipamentos e recursos humanos dos
mesmos para atender cerca de 230 mil crianças até 6 anos de idade;
y Programa de Distribuição do Leite em pó para grupos sociais mais
pauperizados (130 mil pessoas), era desenvolvido nos Centros Sociais;
164
A pobreza era entendida como um segmento marginal ao processo produtivo, caracterizando-se como
o quarto estrato social.
168
168
y Programa de Legalização do Homem Brasileiro: atuava para regularizar a
documentação civil e profissional como forma de acesso à escola, cursos
profissionalizantes e ao mundo do trabalho;
y Programa de Educação para o Trabalho: eram 700 mil alunos de cursos de
iniciação profissional, em área urbana e rural, com ênfase na recuperação de artesanatos
locais;
y Programa de Assistência ao Excepcional: eram atendidas 90.046 pessoas
com deficiências, na linha da prevenção e reabilitação;
y Programa de Assistência ao Idoso: 35 mil atendidos pela via do asilamento
ou de atividades grupais com vistas à integração social;
y Programa Nacional do Voluntariado (PRONAV); fomentado pela
mobilização preliminar das primeiras-damas estaduais e municipais, a meta era alcançar
4 mil Núcleos de Voluntariado.
Na esteira das reformas programáticas, a FUNABEM implantou, em 1978, o
PLIMEC (Plano de Integração do Menor e da Família na Comunidade), gerado a partir
de um convênio com o UNICEF. A proposta era implantar um modelo preventivo na
mesma lógica de ação comunitária potencializadora da integração social de grupos
sociais pauperizados.
O estado de São Paulo teve, na década de 70, dois governadores, eleitos
indiretamente: Laudo Natel (março de 1971 a março de 1975) e Paulo Egydio Martins
(março de 1975 a março de 1979). Na gestão da Secretaria da Promoção Social,
estiveram, respectivamente, Mário Romeu de Lucca e Mário de Moraes Altenfelder
Silva.
Laudo Natel
165
demonstrou, logo em seu discurso de posse, seu alinhamento
ao governo militar, colocando-se como colaborador para acelerar a obra
165
LAUDO NATEL (1920) NONO E DÉCIMO-PRIMEIRO GOVERNADOR Períodos de governo: 6/66
- 03/1967; 3/71 - 3/1975. Nascido em São Manuel, interior de São Paulo, formou-se em Economia e
Administração de empresas. Durante 25 anos foi diretor do Banco BRADESCO. Nessa mesma área de
atuação foi diretor da Associação Comercial de São Paulo, diretor do Sindicato dos Bancos de São Paulo
e presidente da Comissão Bancária do Conselho Monetário Nacional. Foi eleito vice-governador em
1962. Com a destituição de Adhemar de Barros, em 1966, exerceu o resto do mandato, unificando as 11
usinas hidrelétricas de São Paulo, que deram origem à CESP (Companhia Energética de São Paulo).
Eleito indiretamente como governador, exerceu mandato de 1971 a 1975. Nesse período de governo deu
ênfase ao desenvolvimento do interior com o PROINDE (Plano Rodoviário de Interiorização do
169
169
desenvolvimentista nacional, baseado na afirmativa de que cabia aos políticos
brasileiros “... um dever que se subleva aos demais: auxiliar o chefe da Nação no seu
declarado empenho em normalizar a vida institucional...” (Nogueira, 1990:120).
O novo Secretário da Promoção Social apresentou o plano gerencial da
pasta, apontando como linhas mestras:
y a criação da carteira de desenvolvimento comunitário destinada à obtenção
de crédito para as organizações de base das comunidades;
y a criação de canais de participação do povo nos processos de planejamento
local e regional;
y a criação de centros de interesse para a juventude e a instalação de centros
rurais e urbanos de atividades promocionais; os centros comunitários foram ampliados
quantitativamente e na prestação de serviços: assistência técnica agropecuária, médico-
dentária, educacional e recreativa, com o objetivo de fixação do homem em sua
comunidade, de caráter profilático contra o êxodo rural;
y a revisão da política de atendimento à família e ao menor de idade;
y a reformulação do sistema de cooperação técnica e financeira nos
consórcios intermunicipais de promoção social e obras sociais.
Desse conjunto de metas, efetivamente privilegiou a última, dado o potencial
que os consórcios e as obras sociais reuniam para o atendimento direto das demandas
socioassistenciais, conduzidas sob a primazia da racionalidade técnica do planejamento
social
166
. Assim, a ação comunitária manteve-se na retórica, perdendo exeqüibilidade,
uma vez que projetos experimentados na gestão anterior foram interrompidos, tais como
Integração Escola-Comunidade, Integração Recreação-Comunidade e as atividades de
pesquisa participada sobre a realidade social.
A autonomia profissional dos assistentes sociais da Coordenadoria de
Desenvolvimento Social, agora renomeada como Coordenadoria de Desenvolvimento
Comunitário, foi gradativamente substituída por um controle burocrático de suas
atividades, pela adoção de novos instrumentais de registro dos trabalhos técnicos, em
Desenvolvimento). Prosseguiu a pista ascendente da Rodovia Imigrantes, criou a SABESP e a CETESB e
elaborou plano para desenvolvimento do Vale do Ribeira.
166
A gestão Lucca teve a assessoria de uma empresa especializada em planejamento social: EDAP-
Educação Assessoria e Planejamento.
170
170
nome da eficiência e da racionalidade. A ordenação de procedimentos comuns passou a
guiar a intervenção técnico-profissional e inspirou a adoção de “padrões mínimos” para
os consórcios intermunicipais e para as obras sociais: estabeleciam critérios de registro e
matrícula na Coordenadoria de Desenvolvimento Comunitário, sob a forma de uma
pontuação posteriormente atribuída, sancionadora do acesso ao subsídio estadual.
A sofisticação burocrática se sobrepunha ao parecer técnico. Para as
entidades sociais, essa mensuração detalhava, minuciosamente, características físicas,
técnicas e aspectos gerais que, somados, deveriam atingir 40% dos 2160 pontos
atribuídos, a fim de que pudessem ser registradas.
Independentemente dos pontos alcançados, os Consórcios Intermunicipais
deveriam estar formalizados (estatuto e regimento interno registrados em Cartório de
Títulos e Documentos), ter seu programa de trabalho aprovado em assembléia de
prefeitos, e contar com um assistente social devidamente contratado.
Assim, o controle ficou estabelecido duplamente pelo órgão gestor estadual:
condicionou a assistência técnica aos critérios normativos e pautou o funcionamento dos
consórcios e entidades sociais pelos requisitos pré-estabelecidos. Em hipótese, é
possível supor que tais medidas se distanciavam da intenção de uniformidade dos
serviços que deveriam prestar. A diferença está no fato de que o alcance de uma
possível uniformidade deveria contemplar a diversidade (em múltiplas dimensões)
trazida pelo território, pelas manifestações culturais de seus habitantes, pelo perfil de
demandas sociais peculiares à determinada realidade social. A padronização técnica não
resulta do tolhimento da peculiaridade; pelo contrário, o modelo adotado nesse período
indicava maior proximidade de uma modelagem autocrática e pré-estabelecida pelo
aparelho estatal, à qual as instituições parceiras deveriam se adequar.
Sem dúvida, a ênfase imprimida nessa gestão era no fortalecimento dos
consórcios de promoção social, dado o fato de que abrigavam maior potencial
resolutivo, tecido por um funcionamento eficiente e eficaz das articulações
interinstitucionais de natureza pública e privada. Conseqüentemente, foram
implementados diversos projetos sociais nos municípios responsáveis pela formação de
grupos de produção, formação de mão-de-obra para o trabalho, formação de
171
171
cooperativas para drenagem dos produtos confeccionados e atividades de educação de
base (Nogueira, 1990:134). Assim, o primado do binômio assistência-trabalho
prevalecia, cimentado pelas alianças estabelecidas com Senac, Senai e com o PIPMO –
Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra do MEC.
Cabe salientar que o governo estadual contava com um órgão específico para
potencialização de experiências regionais, sub-regionais e comunitárias, de absorção da
mão-de-obra marginalizada, com ênfase nas produções locais de artesanato: era a
Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades (SUTACO)
167
. Nessa gestão
governamental, aumentou a participação da Secretaria de Promoção Social no Conselho
Consultivo do órgão, com três representantes (CESE, CDC e DOT), o que indica uma
aproximação maior das duas áreas de políticas sociais estaduais. Todavia, essa relação
assistência/trabalho estará sujeita ao movimento aproximação/distanciamento até o
início da década de 90, de forma similar às flutuações históricas da convivência do
campo da assistência social com aquele responsável pela criança e adolescente
fragilizados.
Nesse período, a exacerbação do trabalho administrativo imprimiu,
gradativamente, o afastamento do domínio da conjuntura local, por parte do técnico
estadual, agora mediado pelos consórcios e entidades sociais. O rito burocrático do
trabalho do assistente social seqüestrava-o de sua função supervisora: ganhou espaço
sua ocupação com tarefas como a conferência de documentos na montagem de
processos administrativos, conferência de atas de eleição e posse de diretoria, orientação
quanto à realização de balancetes financeiros e balanços patrimoniais.
A gestão de Lucca imprimiu outras mudanças na estrutura organizacional da
Secretaria estadual:
y o Departamento de Migrantes passou a denominar-se Departamento de
Amparo e Integração Social (DAIS);
167
A SUTACO foi criada pelo Decreto lei nº 256 de 29/5/1970, então denominada como
Superintendência de Comunidade de Trabalho, vinculada à Secretaria de Economia e Planejamento, com
a missão de organizar sistemas alternativos de absorção da mão-de-obra marginalizada tais como:
consórcios de empresas comunitárias, de trabalhadores individuais e artesãos, de pequenas empresas e
bolsas de sub-contratação. Em 1975, o decreto 6347 vinculou-a à Secretaria de Relações do Trabalho.
172
172
y o Centro de Acolhimento e Reabilitação dos Necessitados (CARN) foi
transformado em Divisão de Atendimento Geral (DAG);
y após essas mudanças, em 1971, o Centro de Reabilitação de Jovens
Egressas da Prostituição e o Centro de Reabilitação de Gestantes e Mães Solteiras
compuseram o Serviço de Acolhimento Suplementar, extinto em 1973;
y o Serviço Médico Para-Hospitalar foi incorporado ao DAG e a Seção de
Plantão integrou a Central de Triagem e Encaminhamento (CETREN).
Em suma, ocorreu uma readaptação de serviços históricos em um novo
formato de subespecialização hierarquizada de prestação de atenções sociais,
configurando-se como um subsistema de atendimento estadual de casos, centralizados
na capital. A “porta de entrada” era desenvolvida pela CETREN, que atendia os casos
emergenciais e dirigia os casos mais complexos para os outros dois serviços estaduais,
conforme a natureza da demanda individual: o DAIS configurava-se como um abrigo
provisório para a população migrante, pauperizada, moradores de rua, e o DAG, por sua
vez, provia a retaguarda médico-social para os casos que envolviam a atenção à saúde,
como egressos hospitalares e aqueles que aguardavam vaga na rede hospitalar.
Percebe-se, então, que o órgão gestor paulista aprimorava sua vocação pelo
atendimento direto de casos, presente desde o momento inaugural da criação do
Departamento de Assistência Social. Pode-se afirmar que a matriz de
responsabilidade estadual paulista sugerida na forma de dois triângulos
eqüiláteros (Matriz I) permanecia desenhada no órgão gestor, 40 anos depois: a
ampliação de estratégias de atendimento de casos (amparo social), somada ao apoio às
entidades sociais, que continuava fortalecido e até amplificado pelo alcance dos
consórcios de promoção social, e ao trabalho de supervisão técnica empreendido pela
Coordenadoria de Desenvolvimento Comunitário nas instituições privadas. Por sua vez,
a regulação sobre as formas de atenção direta e indireta ao asilamento de grupos sociais
fragilizados estava presente, principalmente a partir do pacto estabelecido com a
municipalidade paulistana, que praticamente inaugurou a especialização técnica da
competência estadual na responsabilização por grupos em situação pronunciada de
riscos pessoais e sociais, tais como prostitutas, mendigos, migrantes, crianças e
adolescentes fragilizados e migrantes. Considera-se que a atenção dispensada pelo ente
estadual não se restringia à internação em unidades conveniadas e próprias (tal qual o
173
173
DAG, DAIS, Casas de Permanência de crianças e jovens) mas também contava com
serviços especializados para o atendimento em regime de semi-internato, conforme
terminologia da época (Casas de Triagem para crianças e adolescentes, CETREN).
Matriz I – Responsabilidade da esfera estadual de gestão da assistência social
A outra matriz determinante na configuração estatal estadual (Matriz II) se
delineou mais claramente nesse período. A área da criança e do adolescente, que se
separara no final da década de 40, retornou para o seio da assistência social, quando
instalada a Secretaria da Promoção Social em 1967. Contudo, ganhou relativa
autonomia com a criação da Fundação Paulista de Promoção Social do Menor (PRÓ-
MENOR), em 1973, passando a gerenciar todos os serviços específicos dessa área, a
definir os convênios, parcerias e respectivos auxílios e subvenções necessárias para a
execução dessa política específica. Cabia-lhe aplicar em todo o território do Estado as
diretrizes e normas da Política Nacional do Bem-Estar do Menor em harmonia com a
legislação federal e articulada à FUNABEM. A PRÓ-MENOR contava com um
Conselho de Promoção Social do Menor, de composição não-paritária e a favor de uma
maioria representada por segmentos institucionais da sociedade civil. Logo depois, em
1974, migrou para a Secretaria da Justiça, retornando à esfera da assistência social em
1975, sendo renomeada em 1976 como Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor
(FEBEM), ato reflexo de orientação emanada pela FUNABEM - os órgãos estaduais
correlatos, em sua maioria, adquiriram esse nome . A FEBEM-SP introduziu uma
Amparo social
a casos
Cadastro
subvenção
convênio
isenção
Apoio a
entidade
s sociais
Internato
semi-internato
institutos
Asilamento de mendicidade,
crianças e adolescentes,
grupos especiais
Serviço Social
plantão social/auxílios
174
174
condição para a celebração de convênios com as entidades sociais: somente poderiam
mantê-los, para recebimento de per capita destinado à assistência a menores de idade,
as entidades que estivessem organizadas de acordo com a orientação da Fundação, à
qual submeteriam, anualmente, seus planos de trabalho e relatório circunstanciado dos
serviços realizados no exercício anterior, para a apreciação dos órgãos técnicos da
FEBEM–SP, e posterior aprovação do Conselho Estadual do Bem-Estar do Menor.
Ainda como componente da segunda matriz prevalente na gestão paulista
(Matriz II), o campo da assistência social se bifurcou com a criação do FASPG, em
1968, e assim se mantém até a atualidade. A segunda primeira-dama a exercer o cargo
de presidente desse órgão foi Maria Zilda Gamba Natel, criando, em sua gestão, o
Programa de Recuperação de Recursos Humanos destinado à população de rua.
Funcionava na Fazenda São Roque, no município de Franco da Rocha (na região
metropolitana de São Paulo), através do Centro de Reabilitação do Indigente (CRI),
onde os pedintes retirados das ruas eram assistidos física e
psicologicamente para serem recuperados e reintegrados à sociedade,
através da profissionalização, pois, além de aprenderem a lidar com a
terra e com os animais para o sustento da própria fazenda, tinham
cursos nas áreas mais diversificadas, promovidos pelo Senai e Sesc...
(São Paulo, Fundo Social de Solidariedade, 2007:16).
Sua ação era movida por campanhas
168
de mobilização da sociedade civil,
diversificada pela criação do Centro de Convalescença, destinado à recuperação dos
egressos hospitalares e à população de rua que necessitava de tratamento médico,
configurando-se como uma atenção paralela e desconectada daquela provida pelo DAG.
É possível afirmar que a transformação do suposto “vadio” em trabalhador
era tratado como desígnio da esposa do governante estadual, imiscuindo o binômio
assistência-trabalho no veio assistencialista promovido pela primeira-dama do Estado
paulista, sob o véu acrítico da retórica insistente da reintegração social. Conclui-se que,
segundo a lógica adotada, sair do estrato social subterrâneo dependia de educação para o
trabalho, do gesto bondoso da mulher do governador e independia da estratificação
desigual da sociedade capitalista brasileira. Essa era a missão cristã da primeira-dama
Maria Zilda, como atestou a matéria da Revista Promoção Humana: “... valorização da
168
Os lemas adotados eram “Um mendigo a menos, um trabalhador a mais” e “Se me deres esmola
comerei hoje, se me deres trabalho comerei sempre”.
175
175
pessoa humana, além de ser obrigação social de todos, constitui dever cristão...
integrada nesse sentimento cristão, Dona Maria Zilda Gamba Natel executa um plano de
recuperação do homem para o trabalho e a sociedade...” (nº 14, 1972: 45).
A contabilidade de seu trabalho aumentava e transpunha fronteiras
interestaduais. Através do Serviço de Assistência Social do Palácio do Governo,
distribuiu gêneros alimentícios, medicamentos, roupas, agasalhos, material escolar,
cadeiras de rodas, máquinas de costura, aparelhos ortopédicos e auditivos a 514
municípios, 703 obras assistenciais do interior do Estado, 437 da capital e 5 de outros
Estados.
Matriz II – interferências no modo de gestão estadual da assistência social
criança e adolescente
migração de campo relação com entidades
assistência social/ atendimento a casos
aparato próprio internação/semi-
internato
paralelismo primeira-dama: presença/influência
associação heterogênea na gestão trabalho, saúde, justiça...
De março de 1975 a 1979, Paulo Egydio Martins
169
governou São Paulo.
Assumiu o Poder Executivo do Estado quando a situação econômica do país já estava
numa fase bastante evidenciada de recessão. A racionalidade da eficiência foi
intensificada, na medida em que a crença em vigor era atribuir possíveis problemas da
administração pública à não adoção do modelo da empresa privada, principalmente
porque o novo governador provinha do meio empresarial do setor bancário. De toda
169
PAULO EGYDIO MARTINS (1928) DÉCIMO-SEGUNDO GOVERNADOR Período de governo:
3/75 - 3/79. Nascido na Capital do Estado, formou-se pela Escola Nacional de Engenharia da
Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, em 1951. Foi superintendente do Departamento de Engenharia
e, depois, gerente geral da Byington & Companhia, empresa ligada à família de sua esposa Lila Byington,
filha de Pérola Byington. Iniciou sua carreira pública na esfera federal, quando ocupou o Ministério da
Indústria e do Comércio em 1966-1967. Eleito indiretamente governador do Estado de São Paulo,
enfrentou, logo no início de sua gestão, as epidemias de meningite meningocócica e de encefalite, a
primeira, na região metropolitana da Grande São Paulo e a segunda, no Litoral Sul, vencendo-as com
sucesso. Concluiu a pista ascendente da Rodovia dos Imigrantes, realizou o maior plano de saneamento
básico do País ao elevar de 40% para 92% as áreas metropolitanas dotadas de água e esgotos, criou a
UNESP e construiu a Rodovia dos Bandeirantes. Construiu, no conjunto do Hospital das Clínicas da USP,
o prédio dos Ambulatórios, o Instituto do Coração e o Instituto da Criança, bem como 67 laboratórios de
pesquisa. Construiu o Hospital Universitário do Butantã e o Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto.
176
176
forma, a crise do milagre brasileiro expunha a problemática social, o que levou a eleger
a área de saúde e saneamento como absolutamente prioritária, dada a queda dos níveis
de saúde da população, com destaque à elevação dos índices de morbidade e
mortalidade
170
(Felicissimo, 1993:82).
Reunidas as informações sobre o funcionamento organizacional do setor da
promoção social
171
do governo paulista, constatou-se a inexistência de uma política
global do Estado, atribuída ao incipiente inter-relacionamento entre os principais órgãos
que o compunham. Verificou-se que as ligações existentes entre o setor de promoção
social e os demais setores da área de desenvolvimento social (secretarias de saúde,
educação, habitação, cultura, esporte, trabalho) eram esporádicas e superficiais.
O Secretário da Promoção Social designado para o cargo foi Mário de
Moraes Altenfelder Silva. Presidente da FUNABEM por 10 anos, desde sua criação,
voltou a São Paulo para cumprir a “missão da Promoção Social” – título de seu discurso
de posse no dia 19/3/75. Nitidamente, o novo secretário vestia a farda do regime
dirigente da Nação brasileira, a despeito de ser cidadão sem patente militar.
Em seu discurso de posse, comparava a missão que assumia a uma tarefa
revolucionária:
cuidar do social é preocupação revolucionária. A Revolução de 31 de
março, em um dos aspectos mais importantes de sua ação
restauradora, providencia a união de esforços entre o Poder central,
Estados e Municípios, visando solucionar problemas que
fundamentalmente interessam à Nação como um todo - a proteção e
amparo aos marginalizados, procurando preservá-los do perigo que
representa, para si e para a sociedade, a manutenção de seu estado de
carência afetiva e material.
A lei federal confia o encargo de definir e implantar uma política de
atenção aos marginalizados a vários de seus organismos, atribuindo-
lhes funções normativas, de coordenação, assessoria e cooperação
170
O coeficiente de mortalidade infantil, por exemplo, estava próximo de 85 óbitos por mil, em 1975,
passando para 51 em 1980, 31 em 1990 e 17 em 2000. A acentuada queda está relacionada à expansão
dos serviços de saneamento básico, o que fez com que as doenças diarréicas quase desaparecessem como
causa de morte, somado à vacinação que eliminou doenças como poliomielite e sarampo. Contudo, as
doenças infecciosas e parasitárias contribuíam com 37% da mortalidade infantil do Estado, junto com
doenças do aparelho respiratório (SEADE, 2005).
171
O governo Egydio Martins identificou 5 tipos de entidades públicas envolvidas em diferentes atuações
no setor: a Secretaria da Promoção Social, Conselho da Promoção Social e Fundo de Assistência Social
do Palácio do Governo, ambos vinculados ao Gabinete do Governador; a Fundação de Promoção Social
do Menor, vinculada, então, à Secretaria da Justiça e o Juizado de Menores, com o Serviço de Colocação
Familiar, portanto fora da alçada do Poder Executivo.
177
177
financeira. Aos estados compete, com observância dos critérios de
ordem geral, planejar e executar os próprios serviços e aos municípios
cabe a ação supletiva ou complementar, na elaboração e no
cumprimento de programas que atendam aos seus problemas
peculiares ou às matérias de seu particular interesse (Silva, 1977:14).
Percebe-se que, apesar de mencionar a união de esforços que deveria imperar
na relação entre os entes federados, ficou estabelecida a competência de cada um, sem
ligas amarradoras da complementaridade que norteiam sua razão de ser. Segundo essa
concepção, aos estados estava delegada uma tarefa auto-executiva, desprovida de apoio
e partilhamento de responsabilidades com os municípios, o que poderia tornar o ente
paulista mais afastado dos preceitos definidos na Constituição estadual de 1967 e 1969.
O conceito de desenvolvimento anteriormente adotado foi substituído por
aquele que propugnava o desenvolvimento do homem, da terra (aumento de
produtividade) e o desenvolvimento das instituições políticas, econômicas, psicossociais
e militares, formulado pela Escola Superior de Guerra, e veiculado em documentos
oficiais da Secretaria da Promoção Social (Nogueira, 1990).
Foi constatada a falta de uma política social que definisse e orientasse o
funcionamento da Secretaria, apesar de existir o DOT, o GPS e a Junta Técnica
Administrativa dotados da incumbência do planejamento setorial. Somava-se a
insuficiência dos recursos humanos (técnicos e administrativos) para o atendimento da
demanda própria à Secretaria: em 1973, havia 79 assistentes sociais para a
implementação de todos programas de desenvolvimento comunitário. Comparando-se o
orçamento dotado à Secretaria estadual àqueles dirigidos ao FASPG e ao CEAS, há um
desequilíbrio proporcional: à SEPS foram destinados, em 1975, CR$ 142.410,00, o que
equivalia a 0,5% do orçamento geral do Estado, ao passo que para o CEAS a dotação
era de CR$ 112.958,00 e para o FASPG, CR$ 4.265,00. A expectativa do Secretário
Altenfelder era incorporá-los no orçamento da Secretaria estadual, o que veio a ocorrer
e perpetuar o desvio de recursos orçamentários para atividades estranhas à assistência
social pública.
Foram realizadas mudanças radicais no corpo estrutural do órgão gestor
estadual: as Divisões Regionais ficaram diretamente subordinadas ao Gabinete do
Secretário, os consórcios intermunicipais sucumbiram ante a crítica de ineficácia na
178
178
gestão dos recursos financeiros e resultados duvidosos, sendo que a viga mestra da
gestão foi a amplificação do PLIMEC no território estadual somada ao elevado
desempenho subsidiário, protagonizado pelo CEAS.
Houve uma inversão metodológica na condução dos programas e projetos
sociais. A prospecção das demandas próprias de cada realidade, estimulada e exercida
até então na ação comunitária empreendida, deu lugar à determinação prévia quanto ao
programa a ser implantado, ao número de atendimentos e à sua execução . Vinculada ao
gabinete do Secretário, a tarefa de elaborar e organizar a execução da estratégia de
desenvolvimento e organização da comunidade saiu da esfera (anteriormente autônoma)
de competência das Divisões Regionais e ficou centralizada. Felicissimo (1983:156)
define como característica desse período a “centralização com formalização”, na qual as
metas a serem alcançadas pelas regionais requeriam a compatibilização entre as
necessidades de ação regional e estadual da Secretaria.
As Divisões Regionais passaram a ter um protagonismo executor maior,
para o qual foram reformuladas e dotadas da seguinte estrutura funcional:
y SRCOS: registro e cadastro de obras sociais;
y Coordenação regional e local do PLIMEC;
y DR CDC: orientação e acompanhamento técnico dos Programas PRÓ-
NUTRI, PRÓ-SOCIAL, CENTROS COMUNITÁRIOS, Sistema Estadual de Mão-de-
Obra (SEMO), além de programas de aprimoramento de pessoal;
yDR CESE: orientações sobre os contratos com asilos de idosos, migrantes;
yDR FEBEM: apoio e orientação nos pedidos de internação de crianças e
adolescentes;
yDR MOBRAL: colaboração na implementação do programa social;
yDR Gabinete: além da representação oficial da Secretaria na região, provia
o apoio técnico administrativo na organização dos Encontros de Promoção Social,
elaboração da proposta orçamentária anual relativa à auxílios e subvenções.
No cômputo geral, a participação da Secretaria da Promoção Social no
Orçamento do Estado evoluiu nesse período, aplicando o orçamento progressiva e
concentradamente em auxílios e subvenções às entidades sociais, por meio do CEAS, e
também nas despesas vinculadas à administração superior e da sede. É importante frisar
179
179
que as despesas relativas à CESE referem-se aos estabelecimentos sociais próprios do
governo estadual, paulatinamente minimizadas. Portanto, a marca dessa gestão foi a
priorização do investimento social indireto, mediado pelas entidades sociais, com
elevado desempenho centralizador.
Quadro 1. Participação proporcional orçamentária dos setores da SEPS no orçamento
anual e participação proporcional da SEPS no orçamento geral do Estado Período 1975-
1980 Moeda: CR$
Participação
(%)
1975 1976 1977 1978 1979 1980
Administração
superior
3.5 51.5 52.0 50.0 59 53.5
CEAS
35.0 29.0 35.0 37.0 24.5 35.0
CESE
46.5 16.0 11.0 11.5 14.5 10.0
CDC
15.0 3.5 2.0 1.5 2.0 2.0
Total
100 100 100 100 100 100
SEPS no
orçamento
geral do
Estado
1.5 1.6 2.1 2.1 1.4 1.4
Fonte: Felicissimo, 1993, p. 220-221
Cabe destacar a realização de um importante evento político-social em
outubro de 1977, organizado pela Secretaria da Promoção Social: o I Encontro Nacional
de Secretários da Área Social, no qual participaram representantes de órgãos gestores da
área da assistência social de 13 estados brasileiros e do Distrito Federal
172
. Teve o apoio
e participação do Ministério da Previdência e Assistência Social, através da Secretaria
de Assistência Social e contou com representantes da FUNABEM, PLIMEC e
Ministério do Interior. É interessante salientar que a matriz identitária dos órgãos
estaduais participantes é destacadamente heterogênea, quanto à sua designação: de
todas, a raiz prevalente é a da área do trabalho, incidente em 6 casos, que se compõe
com termos derivativos da assistência social (assistência, ação, serviço, bem-estar
social). Deduz-se o quanto prevalecia a idéia desse campo de política pública adquirir
sustentabilidade e credibilidade quando atrelado ao setor do trabalho, seguido da
172
Órgãos participantes: Secretaria do Trabalho e Serviços Sociais do Amazonas; Secretaria do Trabalho
e Bem-Estar Social da Bahia; Secretaria do Interior e Justiça do Ceará; Secretaria do Interior e Justiça do
Maranhão; Secretaria do Trabalho e Serviços Sociais da Paraíba; Secretaria do Trabalho e Ação Social de
Pernambuco; Secretaria do Trabalho e Previdência Social do Piauí; Secretaria da Justiça e Ação Social de
Sergipe; Secretaria de Serviços Sociais de Goiás; Secretaria do Interior e Justiça do Mato Grosso;
Secretaria do Trabalho e Assistência Social de Minas Gerais; Secretaria de Saúde e Bem-Estar Social do
Paraná; Secretaria da Promoção Social de São Paulo; Secretaria dos Serviços Sociais do DF.
180
180
presença de órgãos pertencentes à área da justiça: somente São Paulo e o Distrito
Federal apresentavam um setor específico para a política regional de assistência
social.Pode ser considerada como uma expressão da “associação heterogênea na
gestão”, apontada na Matriz II: a múltipla associação da assistência social a outro setor
de política social. Além disso, é também um indício da resistência e dificuldade
históricas de reconhecê-la, pura e diretamente, com esse nome, sob o peso pejorativo e
polissêmico que lhe pode ser atribuído, com o agravante de que esse estigma resiste ao
tempo e se mantém na contemporaneidade.
A conferência ministrada pelo representante da SAS, intitulada A Política
Federal no Campo Social expressou a expectativa dessa Secretaria adquirir o status
ministerial, como possível solução para o enfrentamento da problemática social. Por sua
vez, o presidente da FUNABEM demonstrou pessimismo quanto à sua exeqüibilidade
no curto prazo, o que deveria ser precedido de maior integração de trabalho entre os três
entes federados. Nesse sentido, ficou patente nas intervenções dos participantes a
constatação da desarticulação prevalente, quer seja pela duplicidade de iniciativas
tomadas pela instância federal, quer seja pela ausência de diálogo institucional entre os
entes federados em um mesmo território.
Outro aspecto interessante abordado nesse evento referiu-se ao fato de que a
descentralização das iniciativas não terminava na instância municipal, pois ela deveria
ocorrer por dentro das cidades, a exemplo de São Paulo: a Coordenadoria do Bem-Estar
Social tinha Supervisões Regionais de Serviço Social (SURS) em cada administração
regional do município, instância máxima da descentralização interna. O PLIMEC foi
abordado como o único programa eficaz dirigido à criança e adolescente fragilizados,
com forte capilaridade nacional, e outro ponto abordado, de reconhecido deficit no
quesito do enfrentamento, referia-se à questão do migrante, cuja magnitude foi
demonstrada pelo representante do Ministério do Interior. Segundo o censo de 1970,
representava quase um terço da população brasileira (30 milhões de pessoas),
prevalentemente concentrados nas regiões metropolitanas, com destaque nas áreas de
São Paulo e Rio de Janeiro. Para tanto, o Ministério executava, em parceria com
gestores estaduais e municipais, a instalação de Centros de Triagem e Encaminhamento
de Migrantes (CETREMIS), em cidades estratégicas como Foz do Iguaçu (PR),
Salvador (BA), Vilhena (RO), Tucuruí-Carajás (PA), e também nos estados de Minas
181
181
Gerais e Espírito Santo. A apropriação sistemática sobre a mobilidade dos fluxos
migratórios ensejava a criação do SIMI (Sistema de Informações sobre Migrações
Internas) que estaria articulado ao Sistema Nacional de Emprego (SINE).
Os participantes desse evento elaboraram um Documento Final com os
seguintes pontos de destaque:
y os programas de desenvolvimento social deveriam ser guiados pelo
fortalecimento de uma política redistributiva que permitisse o acesso à renda e
conseqüente melhoria da qualidade de vida dos brasileiros;
y a União deveria atuar integrada aos planos regionais e locais existentes,
delegando a essas instâncias a execução direta, preferencialmente, a fim de evitar
duplicidade de serviços e desperdício de recursos;
y a melhoria do atendimento social dependia do apoio a políticas nacionais
articuladoras dos recursos públicos e privados, e da consideração do desenvolvimento
social no planejamento econômico, com a alocação progressiva financeira pelas três
instâncias federadas;
y os programas preventivos deveriam ser priorizados em relação aos
programas terapêuticos e assistenciais. A perspectiva de mudança de mentalidade fazia-
se mister como tarefa das Secretarias Sociais, considerando-se a necessidade de
envolvimento e participação do conjunto da comunidade;
y a competência pela migração dirigida era do Governo federal, cabendo às
Pastas Sociais estaduais a execução de programas de fixação do homem no campo e nas
pequenas e médias cidades, preventivo do êxodo maciço para os grandes centros
urbanos;
y as Pastas Sociais deveriam manter o melhor relacionamento
interinstitucional, incentivando a implantação de experiências pioneiras (a exemplo de
plantões sociais nas delegacias de polícia) para a superação de tratamento equivocado à
questão social;
y os programas institucionais a favor do velho, da criança e da família não
poderiam depender exclusivamente do governo, como ponto de sustentabilidade da ação
social;
y rejeição ao emprego clientelista e de fins eleitoreiros na condução da ação
social;
182
182
y incentivo à criação de Conselhos Comunitários como espaços de
elaboração e reivindicação de prioridades de atendimento social;
y ênfase nos programas sociais de promoção do homem pelo trabalho,
através do acesso à documentação, profissionalização e informação sobre oportunidades
de emprego; ênfase na aproximação intergeracional nos programas sociais, substituta da
abordagem isolada “mãe-filho”;
y o desfavelamento era considerado como o principal programa que exigia a
ação integrada de todos os setores envolvidos no problema social, cabendo às Pastas
Sociais influenciarem no planejamento e na priorização das faixas de população de
baixa renda nos programas de casa própria;
y dar prosseguimento à tarefa de aproximação e cooperação com os meios de
comunicação, com vistas à diminuição dos espaços conferidos à violência em sua
programação e ampliação da veiculação de informes sobre a situação social do país.
Conclui-se que o enfoque sobre a questão social, abordado nesse I Encontro
Nacional de Secretários da Área Social, é de maior dimensão daquele contemplado
durante a realização dos primeiros encontros (I e II Seminário Nacional de órgãos
Gestores Estaduais de Serviços Sociais). Naquele momento, a reivindicação maior era
pelo reordenamento desses órgãos no formato de secretarias estaduais, o que, em tese e
parcialmente, foi alcançado em 1977: não é possível dimensionar o status interno do
setor de assistência social nas secretarias estaduais participantes. Entretanto, a
reivindicação pela distribuição equilibrada e racional de competências entre as
instâncias governamentais ganhou destaque, assim como espaço de maior presença do
Estado na responsabilidade pela questão social, sem prescindir da parceria com a
sociedade civil.
A atuação mais expressiva da primeira-dama Brasília (Lila) Byington
Egydio Martins foi na organização do trabalho voluntário, o que ensejou a oficialização
do Dia do Voluntário Social (decreto nº 8137 de 02/06/1976) e a participação
comunitária: instituiu as quinzenas de participação comunitária, dias comunitários de
recreação, os Núcleos e Campanhas de Participação Comunitária. Realizou cursos de
treinamento para agentes sociais públicos e de entidades sociais, incentivando a
alimentação natural e a reciclagem de material; para lideranças comunitárias, a proposta
era fomentar alternativas geradoras de renda, como a instalação de hortas comunitárias,
183
183
a doação de máquinas de costura, além da implementação de minibibliotecas e cursos de
educação para a saúde.
3.2 Da redemocratização à Constituição (1988)
O fim do ciclo da ditadura militar se deu na gestão central de João Batista
Figueiredo, que governou de março de 1979 a 1985. Foi um período no qual dois traços
prevaleceram: a ampliação da abertura política e o acirramento da crise econômica. A
inflação acelerou de 40,8% em 1978 para 223,8% em 1984, acrescida do aumento da
dívida externa, de 43,5 bilhões de dólares para 91 bilhões, respectivamente (Fausto,
2007:504).
O Congresso Nacional aprovou a lei de anistia, em agosto de 1979,
importante passo na ampliação das liberdades públicas, apesar de Figueiredo dilatar a
abrangência da anistia aos “crimes de qualquer natureza relacionados com crimes
políticos ou praticados por motivação política” para aqueles envolvidos na prática da
tortura. Todavia, a resistência à abertura política continuou na forma de atentados à
bomba em diversas instituições sociais e espaços públicos.
Em dezembro de 1979, foi aprovada a Nova Lei Orgânica dos Partidos, que
punha fim à era do bipartidarismo e abria caminho para o surgimento de novas
aglomerações partidárias, como o Partido dos Trabalhadores (PT), o PDT (de Brizola),
o PTB (liderado por Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio), o Partido Popular (PP).
O calendário eleitoral de 1982 foi mantido e, pela primeira vez, os
governadores dos Estados seriam eleitos desde 1965. Os governadores exerceram um
papel estratégico na passagem do regime autoritário para a redemocratização do país
(Abrucio:2002), no trânsito de um “federalismo centralizado para um federalismo
cooperativo”
173
. Nesse período, o poder concentrado no governo central, em
contraposição à redução do poder dos estados, esteve aliado à redução de recursos
repassados a essas esferas governamentais.
173
O federalismo cooperativo caracteriza-se por formas de ação conjunta entre instâncias de governo e
graus diversos de intervenção do poder federal, sendo que as unidades subnacionais preservam expressiva
autonomia decisória e capacidade própria de financiamento (Almeida, 1996).
184
184
Com a retomada das eleições para governador, em 1982, os governadores
recuperaram força, exercendo o poder de forma desequilibrada nas relações travadas
entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sendo esses dois últimos
efetivamente controlados pelos governadores.
Abrucio (2002) identifica-os como barões da federação, pelo forte
protagonismo exercido por eles nesse período, e na conformação do atual sistema
político brasileiro. Compará-los figurativamente ao baronato corresponde a um poder
sem contrapeso, anti-republicano, avesso à subordinação a uma autoridade maior.
O fortalecimento dos governadores ao longo do processo de
redemocratização, na transição do autoritarismo para a democracia, se deve a 3 fatores
principais.
y Ao modo de transição política do país: a crise do regime militar
possibilitou a expressão de novos atores, com destaque para governadores e líderes
políticos regionais. O fato de a redemocratização brasileira ter se iniciado com uma
eleição estadual (1982), marcada pela vitória das oposições, apontou para o cenário de
reconstrução do sistema político. Além disso, o regime militar não conseguiu acabar
com o apoio das carreiras políticas ofertado pelos governadores, refletido nas lealdades
estaduais demonstrada, em grande parte, pelo comportamento dos parlamentares.
y A crise do modelo do estado nacional-desenvolvimentista: sustentado pelos
militares, o modelo agoniza pela própria crise financeira do Governo Federal. Um jogo
de competição não-cooperativa se sobrepôs a um pacto de dominação, no plano
nacional.
y Enfraquecimento do pacto federativo centralizador: a União foi perdendo
recursos e legitimidade durante a década de 80, em contraposição ao aumento de poder
dos governos estaduais nas áreas política e econômica.
A esse poderio dos governadores, no plano nacional, no período de
redemocratização, Abrucio denomina de federalismo estadualista. No plano interno dos
estados, o poder dos governadores decorre de um sistema político ultrapresidencialista
- o ultrapresidencialismo estadua l-, no qual a política nos estados girou em torno dos
chefes do executivo estadual, verdadeiro centro das decisões do governo e controlador
185
185
do processo decisório em sua extensão. Sobretudo, os outros Poderes (Legislativo,
Judiciário) não interferiam no Poder Executivo.
Ao lado do forte protagonismo ressurgido na esfera estadual executiva, a
pressão pela realização de eleições diretas para escolha do presidente da República
galopou mais rápido do que as forças resistentes militares à abertura e distensão política.
O PT assumiu como uma de suas prioridades promover uma campanha pelas eleições
diretas, para a qual se coligou a outros partidos, o que ganhou força quando o PMDB
entrou nessa campanha, pelo peso de seu presidente, Ulysses Guimarães.
Em janeiro de 1984, um comício realizado na Praça da Sé, na cidade de São
Paulo, ultrapassou as expectativas de seus organizadores e assombrou pela magnitude
da presença e clamor populares, fato que catalizou ampla mobilização pela retomada da
democracia no país. A euforia cívica foi sepultada, temporariamente, pela derrota no
Congresso Nacional da possibilidade das eleições diretas, substituída, novamente, pelo
hermético método do Colégio Eleitoral.
Apesar da eleição ser indireta, o candidato da oposição, Tancredo Neves,
angariava a simpatia e apoio populares na realização de comícios, confrontando-se com
o engendramento político dissimulado e protagonizado pelo candidato do governo,
Paulo Maluf. Surpreendentemente, Tancredo venceu as eleições em janeiro de 1985, e
sucumbiu à manifestação de uma possível saúde fragilizada, postergando os cuidados
necessários para debelá-la. Faleceu em 21 de abril de 1985, legando ao país a condução
do vice-presidente, José Sarney, que iniciou uma nova era denominada Nova República
que, na verdade, cimentou o velho sistema de dominação de personagens e lideranças
do regime anterior. Sarney legalizou partidos políticos clandestinos, convocou a
Assembléia Nacional Constituinte, sustentou o discurso da recuperação democrática,
oferecendo-se como fiador da transição política (Paixão, 1992:45). Entretanto,
preservou laços com as Forças Armadas, para sustentação e respaldo político, e assumiu
compromisso com o enfrentamento da questão social, acionando medidas institucionais
tangidas pela retórica do “tudo pelo social”.
Esse discurso toma forma com a criação da Secretaria Especial de Ação
Comunitária (SEAC), vinculada ao Gabinete Pessoal do Presidente da República. As
186
186
considerações preliminares do texto legal (decreto nº 91500 de 30/07/1985) apontavam
para a necessidade de estimular a participação comunitária no processo de
desenvolvimento econômico-social, e à Presidência da República cabia a indispensável
articulação das iniciativas relacionadas com a ação comunitária, por parte dos diferentes
órgãos e programas governamentais, de empresas e de entidades da sociedade civil.
Segundo o Secretário nomeado para a Pasta, Nelson Proença, a intenção do Governo
Sarney era criar um órgão que imprimisse agilidade e desburocratização na gestão dos
programas sociais federais, dotando-os de eficiência e competência (Brasil, Câmara dos
Deputados, 1989:98).
Contudo, a execução dessa perspectiva caminhou no sentido inverso. Uma
profusão de iniciativas compunham o Programa Nacional de Ação Comunitária, de
elevada atuação pulverizadora de projetos sociais da mais variada natureza, tais como:
apoio à reforma ou construção de creches, postos médicos e odontológicos, criação e
construção de centros comunitários, pequenas obras de saneamento por meio de
mutirões comunitários, organização de bibliotecas comunitárias, patrulhas mecanizadas
para pequenos produtores rurais. Era explícito o objetivo de distribuição pulverizada de
recursos orçamentários para atingir o maior número possível de pequenos projetos
sociais
174
, da mesma forma que a qualidade requerida por somas maiores de recursos
para um mesmo projeto era descartada diante da possibilidade de gotejamento desse
valor financeiro em vários projetos. (idem, 100-101) Além disso, esse órgão federal
prioritário dispunha de total autonomia administrativa e financeira, garantida pela
existência do Fundo Nacional de Ação Comunitária (decreto 91970/85).
Por vezes, a SEAC operava de forma intersetorial, tal como o Programa
Nacional do Leite, remodelado de forma articulada com o Ministério da Saúde. Mas, via
de regra, se os resultados dessa Secretaria Especial se assemelham a retalhos de uma
política social, mesmo em sua unidade, o que dizer a respeito da ação interministerial?
Certamente, a ocorrência de mais uma via do recorrente paralelismo intrafederativo-
federal – foi aberta, duplicando ações dos Ministérios do Interior, Previdência e
Assistência Social, Agricultura, dentre outros, com destaque para a FLBA. Por outro
lado, recorrer às instâncias estaduais e municipais operava a complementariedade para
174
Em 4 anos, alcançou cerca de 50 mil projetos em mais de 4 mil municípios brasileiros.
187
187
o alcance da construção habitacional, a exemplo de 1431 casas populares em 1502
municípios. Mesmo assim, essa cobertura era ínfima, se comparada ao deficit
habitacional da época, estimado em 10 milhões de unidades.
A vocação habitacional da SEAC ensejou a criação do Ministério da
Habitação e Bem-Estar Social, em 1988 (decreto nº 96634 de 02/09/1988), ao qual
foram agregadas a SEAC, a FLBA e a FUNABEM. Logo em seguida, esse Ministério é
extinto (lei nº 7739, de 16/03/1989), transferindo para o Ministério do Interior esses
órgãos federais, que novamente passaram por mudanças cinco meses depois: a FLBA
volta para o MPAS e a SEAC é transformada em Secretaria da Habitação e Ação
Comunitária (SEHAC).
Conclui-se que a ação prioritária do Governo Sarney na área social pautou-se
pela variante definição/indefinição de foco quanto à estratégia de enfrentamento das
manifestações parciais da desigualdade social. Recorrendo ao (já) desgastado discurso
da ação comunitária, picotou a intenção original de criação da SEAC que, de
articulador, passou a executor de frações orçamentárias.
Mais grave ainda é constatar a turbulência exagerada a que foram
submetidas a FLBA e FUNABEM, nesse período de 1967 a 1988, avançando no início
de 1989. A mudança de residência administrativa ocorreu cinco vezes
175
, transitando em
ministérios da mais variada natureza, o que gera a dúvida de se a justificativa era pela
indefinição de atribuições desses órgãos, pelo pensamento dominante em dado
momento histórico ou se, no limite, não sabiam o que fazer com esses dois órgãos
históricos federais de proteção social.
Nesse interstício de tempo, São Paulo teve a gestão Paulo Maluf
176
como
sucessora da de Paulo Egydio Martins, de março de 1979 a maio de 1982, quando deixa
175
MTPS, MPAS, Ministério da Habitação e Bem Estar Social, M. Interior e MPAS.
176
PAULO SALIM MALUF (1931) DÉCIMO-TERCEIRO GOVERNADOR Período de governo: 3/79 -
5/1982. Nasceu na capital do Estado e formou-se em engenharia civil pela Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo, no ano de 1954. Até 1969 atuou na área privada, ocupando funções como:
vice-presidente da Serraria Americana Salim Maluf S.A., diretor-superintendente da Loma S.A.
Agricultura, Administração e Comércio, diretor-superintendente da Eucatex S.A. Entre 1967 e 1969 foi
presidente da Caixa Econômica Federal de São Paulo. Foi Prefeito nomeado da cidade de São Paulo de
1969 a 1971. Nesse ano passou a ocupar o cargo de Secretário de Estado dos Transportes, exercendo-o até
1975. Eleito indiretamente Governador do Estado, exerceu o mandato de 15/3/79 a 15/5/82. Nesse
188
188
o cargo de governador para se eleger como deputado federal e lançar-se na disputa pelo
posto máximo de presidente da República. Foi sucedido por José Maria Marin
177
(maio
de 1982 a março de 1983).
A Secretaria da Promoção Social foi assumida, nesse período de março de
1979 a maio de 1982, por Antonio Salim Curiati e, na seqüência, por Dured Fauaz
(maio de 1982 a março de 1983), gestões unívocas do ponto de vista de linha
orientadora e realizações de continuidade.
A principal marca dessa gestão foi o uso e a manipulação intensivos da
Secretaria, a favor de interesses político partidários. Era preciso ampliar as bases de
sustentação do partido situacionista, principalmente porque o governador da época tinha
planos políticos de médio e longo prazo, que dependiam, em parte, de um colégio
eleitoral plenamente atendido em suas reivindicações pessoais. Assim, os contratos de
novos programas e desenvolvimento de serviços sociais gerais tinham esse crivo
norteador, empenhando-se no atendimento do maior número possível de solicitações
feitas pelas entidades sociais e, para tanto, os valores financeiros foram rebaixados.
Discordantes dessa estratégia, os profissionais tentavam contemplar o maior número
possível de projetos em uma mesma entidade social (Nogueira, 1990).
A estrutura administrativa da Secretaria foi reformulada, dinamizando o
CEAS como um verdadeiro “Banco Social”: desburocratizou os trâmites anteriores, de
maneira a facilitar o acesso e a desobstruir a concessão de auxílios e subvenções às
entidades sociais. A Coordenadoria de Desenvolvimento Social (CDS) foi renomeada
como Coordenadoria de Ação regional (CAR), e preservou a função de cadastro e
governo, levou o Metrô da Praça da Sé ao Tatuapé e à Estação República, construiu 55 quilômetros da
Rodovia dos Trabalhadores, deu continuidade às obras do SANEGRAN, para tratamento dos esgotos. Em
1982, desincompatibilizou-se do cargo para candidatar-se a Deputado Federal, sendo eleito com mais de
600 mil votos. Seu mandato estendeu-se de 1983 a 1987. Foi eleito prefeito da Capital, exercendo o
mandato de 1993 a 1996.
177
JOSÉ MARIA MARIN (1932) DÉCIMO-QUARTO GOVERNADOR Período de governo: 5/82 -
03/83 Nascido na capital formou-se em direito na Universidade de São Paulo em 1955, onde também
obteve o título de doutor. Iniciou sua vida pública já no ano de 1964, como vereador à Câmara Municipal
de São Paulo, da qual foi presidente, em 1969, e líder do Prefeito, no ano seguinte. Deputado Estadual de
1971 a 1975 e de 1975 a 1979, tendo presidido várias comissões da Assembléia Legislativa do Estado.
Em 1979 elegeu-se indiretamente como vice-governador, na chapa de Paulo Salim Maluf. Com a
desincompatibilização de Maluf, governou durante 10 meses. Não teve tempo para planejar nenhuma obra
de vulto, mas coube-lhe inaugurar a primeira etapa de operações da Usina Hidrelétrica de Nova
Avanhandava, projetada no governo de Paulo Egydio Martins e iniciada no Governo Paulo Maluf.
Presidiu o diretório do Partido Social Cristão – PSC, de São Paulo.
189
189
assistência técnica às entidades sociais. Devolveu à CAR a administração das Divisões
Regionais, com o desdobramento da regional da grande São Paulo para um
Departamento Regional de Promoção Social, subdividido em 8 Divisões de Promoção
Social da Área Metropolitana. Operavam sob pressão político-partidária de adesão ao
PDS.
Outra proposta implementada foi a de criação de Conselhos Municipais de
Ação Social. Como órgãos colegiados, eram compostos por representantes do Poder
Executivo e Legislativo local, do Fundo de Assistência Social do Palácio do Governo e
entidades diversas do município: clubes de serviço, sociedade amigos de bairro,
entidades sociais e outras personalidades ligadas à área de promoção humana e social.
Sua principal função era indicar os contratos que seriam firmados entre a SEPS e as
entidades sociais. No entanto, vários fatores colaboraram para sua curta duração:
manipulação política a que eram submetidos, esvaziamento da participação popular,
excessiva burocratização e regulamentação.
Foi implantado o Programa Estadual de Migrações Internas – PEMI –, a
partir de um convênio da SEPS com o Ministério do Interior, para implementar o
Sistema de Informações de Migrações Internas (SIMI), conforme propugnado no I
Encontro Nacional de Secretários da Área Social, em 1977. Outros programas sociais,
oriundos das gestões anteriores, tiveram prosseguimento, contando com a instalação de
Plantões de Serviço Social em delegacias de polícia da capital.
A atuação da primeira dama Silvia Lutfalla Maluf foi pontilhada por projetos
sociais orientados sob a mesma lógica de suas antecessoras: ações voláteis ou mutantes,
que adquirem nova denominação conforme o governo. Implantou as Oficinas de
Trabalho Comunitário, incentivador do trabalho voluntário como placebo de resolução
de problemas sociais. Na mesma linha, o Programa de Profissionalização e Pré-
profissionalização se dirigia ao adolescente e o Programa Pró-Família incentivava o
desenvolvimento da gravidez e paternidade responsáveis. Foi responsável pelo
Programa de Saúde da Mulher, em parceria com o Instituto Brasileiro de Controle do
Câncer. Sucedida por Neusa Augusta Marin, enfatizou campanhas e doações a entidades
sociais de gêneros alimentícios, gabinetes dentários, cadeiras de rodas, aparelhos
ortopédicos, agasalhos, por meio de festas e chás beneficentes.
190
190
Portanto, as gestões Altenfelder e Curiati se destacaram pela priorização do
apoio às entidades sociais, sob a diferença de uma condução autocrático-tecnocrática e
fisiologista, respectivamente, favoráveis ao ocultamento da responsabilidade estatal na
construção de respostas coerentes com sua competência em face da questão social.
O governo paulista eleito democraticamente em 1982 teve à frente André
Franco Montoro
178
, de março de 1983 a março de 1987, pertencente ao partido de
oposição – PMDB.
O Programa de Governo construído contou com a participação de mais de 3
mil colaboradores, de composição heterogênea, como militantes de movimentos sociais,
profissionais liberais, funcionários públicos, intelectuais diversos, tendo como
perspectiva “...a ampliação das liberdades democráticas, a valorização do trabalho, a
elevação do nível de vida dos trabalhadores e a subordinação do poder econômico ao
controle social da democracia...” (Paixão, 1992:10).
Coordenado por Helena Iracy Junqueira, um grupo de assistentes sociais
elaborou uma proposta de reformulação do setor de promoção social do Estado,
aprimorado posteriormente, já no exercício do novo Secretário da Pasta, o assistente
social Carlos Alfredo de Souza Queiroz. Pela primeira vez, os funcionários da secretaria
estadual participaram de encontros formuladores das diretrizes norteadoras de sua ação,
sob a orientação maior do propósito de “garantir o processo de melhoria de qualidade de
vida para criar e fortalecer condições voltadas ao auto-desenvolvimento integral da
população e para criar e aperfeiçoar condições de atendimento social às classes
populares e aos segmentos mais vulneráveis a crises econômicas” (idem:12).
178
ANDRÉ FRANCO MONTORO (1916–1999) DÉCIMO-QUINTO GOVERNADOR Período de
governo: 03/1983 - 03/1987 Paulistano, formou-se em Direito, pela USP, e em Filosofia e Pedagogia,
pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras São Bento, no mesmo ano de 1938. Quando eleito
governador, já havia percorrido longa carreira política como vereador, deputado estadual e, entre 1959-
1971, três vezes deputado federal. No governo parlamentarista de Tancredo Neves ocupou o Ministério
do Trabalho e da Previdência Social (1961/1962). Foi também senador da República, entre 1971 e 1983.
Governou São Paulo de 15/ 3/ 83 a 15/ 3/ 87. Descentralizou a Administração do Estado em 42 Regiões
de Governo. Na área da educação, municipalizou a merenda e as construções escolares, além de implantar
o Ciclo Básico no 1º Grau. Construiu 4 mil quilômetros de estradas vicinais, redes de água e esgoto,
expandiu a linha Leste-Oeste do Metrô e reequipou as Polícias Civil e Militar. Foi uma das principais
lideranças da luta pela redemocratização do país e da campanha pelas eleições diretas para Presidente da
República. Fundador e presidente do PSDB, em 1988, voltou a atuar como deputado federal, entre 1995 e
1999, ano em que faleceu.
191
191
As duas principais áreas internas funcionais foram preservadas, sob nova
orientação programática: a Coordenadoria de Ação Regional (CAR) e a Coordenadoria
de Apoio Social (CAS), anteriormente designada como Amparo e Readaptação Social,
sendo que, nessa gestão, foram criados o Instituto de Assuntos da Família – IAFAM –
(extinto em 1998) e o Fundo de Investimento Social – FIS – (extinto em 1999).
O esforço em imprimir uma gestão democrática encontrou maior
possibilidade na aproximação da administração estadual dos poderes locais, quando se
substituiu o paternalismo governamental pela participação ativa da comunidade,
valorizando o papel proativo das divisões regionais, o que leva a supor que a
descentralização de poder e recursos teve papel determinante. Com isso, a atuação
esteve mais referenciada na realidade social de cada território estadual, levando em
conta as estratégias sistemáticas de consulta que os técnicos faziam nas entidades
sociais e organizações comunitárias. Por sua vez, havia limites conjunturais para um
governo estadual de transição democrática exercer a pleno suas intenções: o país estava
ainda sob tutela militar durante metade dessa gestão estadual, as políticas sociais e
econômicas federais permaneciam fortemente centralizadas e a severa recessão
econômica que atingia expressivo contingente populacional atingia cerca de 1/3 dos
habitantes do estado paulista, segundo estimativas em 1982 (Paixão, 1992:117).
O estranhamento de uma estratégia de aproximação, consulta, deliberação
coletiva, participação ativa, provocava as mais diferentes interpretações e reações por
parte de alguns técnicos e funcionários da própria secretaria estadual e dirigentes de
entidades sociais, acostumados a outra ordem de acontecimentos impregnados na
cultura institucional da administração pública. A título de exemplo, debates a respeito
da desinternação de crianças e adolescentes da FEBEM ocorriam mescladas a propostas
de municipalização do atendimento, o que provocava, em alguma medida, focos de
resistência.
Por outro lado, era tarefa quase impossível para um governo romper o
legado de práticas históricas fragmentárias, de caráter pontualmente compensatório das
desigualdades sociais, composta por programas e atividades desconexas em que, na
maioria das vezes, ganhavam mais sentido em si mesmas do que nas alterações que
192
192
poderiam causar nas condições de reprodução social. (Sposati, 1989: 17) Uma tentativa
de sua superação se deu pela implantação da atuação regional comunitária (ARC), cuja
intenção era evitar a fragmentação programática e financeira, empalidecida por
dificuldades no diálogo intersetorial da administração pública estadual e pela opacidade
da própria imagem institucional da Secretaria estadual no ambiente social e político de
sua atuação.
A despeito de todos os esforços modernizadores, a gestão Franco Montoro
criou reserva orçamentária do CEAS para distribuição, pelos deputados estaduais, de
auxílios e subvenções a entidades sociais (lei nº 4187/ 84 e decreto nº 23044/84), além
de autorizar o Poder Executivo a contrair empréstimo de CR$ 2,5 bilhões destinados a
entidades hospitalares de caráter filantrópico, para construções e desenvolvimento de
suas atividades, por intermédio da Secretaria da Promoção Social (lei nº 4629/1985).
Assim, inaugurou a prática da emenda parlamentar escapista à integração no conjunto
da política da assistência social, delegando também ao órgão gestor dessa política a
incumbência de gerenciamento do empréstimo bancário – de natureza diversa daquela
que funda a razão de sua existência.
Sob a gestão de Lucy Pestana Silva Franco Montoro, o FASPG mudou sua
designação para Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo (FUSSESP),
mantida até 2007. Sob sua condução, foram implantados Fundos Municipais de
Solidariedade em 524 municípios paulistas, através do decreto nº 20925/83, o que pode
ser avaliado como um forte incentivo à descentralização paralela, isto é, à organização
da institucionalidade das primeiras-damas municipais em moldes diversos da
configuração dos órgãos gestores municipais responsáveis pelo campo da assistência
social pública. Modifica as finalidades do Fundo Social, dirigidas a um estreitamento
das relações com órgãos de assistência social públicos e particulares, pautando essas
últimas por critérios e normas fixadas previamente. A tendência campanhista
permaneceu, além do apoio a grupos produtivos e programas de atenção à criança e
adolescente, sob orientação de sua duplicação na instância municipal.
193
193
Em 1987, é eleito o Governador Orestes Quércia
179
, do PMDB, que adota,
entre as medidas iniciais do novo governo paulista, a criação da Secretaria do Menor, o
que delega a essa nova área parte das unidades e atribuições da Secretaria da Promoção
Social (decreto nº 26906 de 15/03/1987). Novamente, a diáspora criança-adolescente
vulneráveis/assistência social toma forma, apartando a possibilidade de fortalecer a
configuração de uma política estadual unívoca para o campo da assistência social
pública.
No plano nacional, a Assembléia Nacional Constituinte iniciou seus
trabalhos em fevereiro de 1987, de percurso longo, e encerrado somente em outubro de
1988. Sem dúvida, a Constituição promulgada refletiu o anseio e o avanço na extensão
de direitos sociais e políticos aos cidadãos em geral, e abriu a descentralização fiscal a
fim de dotar de maior autonomia os entes federados, sem a devida correspondência em
sua sustentação. Marco do fim dos vestígios formais do regime autoritário, a resistência
quanto a um consenso sobre preceitos trazidos pela nova Carta Magna se intercalam, a
exemplo da área de seguridade social, nela contemplada e assegurada como de
responsabilidade do Estado e composta pela saúde, previdência e assistência social.
Cabe trazer o depoimento da deputada federal Sandra Cavalcanti, por
ocasião da realização do I Simpósio Nacional sobre Assistência Social, realizado pela
Comissão de Saúde, Previdência e Assistência Social da Câmara de Deputados, entre
30/05 e 01/06/1989, portanto, logo após a promulgação da nova Constituição Federal
(Brasil, Câmara dos Deputados, 1989:31-33). Inicialmente, ela refuta a idéia
disseminada de que a Constituição estaria atrapalhando a vida do país, por uma série de
favores que os deputados estabeleceram para determinados setores, esquecendo de
localizar os recursos tanto e, se postos em prática, quebrariam o país, afirmando que
179
ORESTES QUÉRCIA (1938) DÉCIMO-SEXTO GOVERNADOR Período de governo: 3/87 - 3/91
Natural de Pedregulho-SP, mudou-se, ainda na juventude, para Campinas. Jornalista, é também advogado
formado pela Pontifícia Universidade Católica dessa cidade (1962), onde iniciou a carreira política como
vereador (1963). Já filiado ao MDB, foi deputado estadual (1967) e prefeito (1969). Em 1974, elegeu-se
senador da República. Foi um dos fundadores do PMDB, presidindo-o entre 1991 e 1993. Em seu
mandato como governador, criou a Secretaria do Menor, como iniciativa de cumprimento do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Realizou investimentos na duplicação de importantes rodovias e na reforma de
estradas vicinais. Construiu o Memorial da América Latina. Como defensor do municipalismo,
desenvolveu ações de fortalecimento do interior, como a regionalização da produção. Foi presidente
regional do PMDB de São Paulo (2001-2003) e empresário, atuando no ramo imobiliário e das
comunicações.
194
194
se há dificuldades, são bem anteriores à Constituição ...nasceram
muito mais da irresponsabilidade e impunidade do Poder Executivo do
que de atos do Poder Legislativo...e o argumento de que o que está
posto como diretriz constitucional da área da assistência social não vai
poder ser implementado, pelo fato de, na prática, não poder ser
conseguido, tem que ser desmanchado...
Não é verdade que os defeitos dessa Constituição residam no fato de
termos, pela primeira vez na história dos textos constitucionais
brasileiros, nos debruçado sobre uma expressiva parcela da população
brasileira que não era mencionada nas Constituições anteriores.
Poderia ter sido alvo de atenção e providências porque, se as
Constituições anteriores não tinham um capítulo expresso sobre saúde,
previdência e assistência social, sobre a criança e adolescente, o idoso,
a família, sobre as pessoas portadoras de deficiência, nem por isso elas
deixaram de existir... e se havia um artigo declarando que eram todos
iguais perante a lei, de uma forma muito mais ampla, em todas as
Constituições anteriores, nada tem impedido que houvesse, por parte
das autoridades, um cuidado muito grande com esse setor de nossa
população....(trata-se de) acordar o Poder Executivo para essas suas
responsabilidades, até porque estas não são áreas que conseguem fazer
lobby nos corredores...
No texto constitucional, no artigo 195, quando definimos de forma
muito clara quais seriam os recursos que financiariam a seguridade
social, está dito que a seguridade social será financiada por toda a
sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei-que vai nascer
certamente até o final deste simpósio-mediante recursos provenientes
dos Orçamentos da União, dos Estados, do DF, dos municípios e das
contribuições sociais.
Transcrito, esse pronunciamento espelha o início da era conturbada de
consolidação dos direitos socioassistenciais, um embate inconcluso.
195
195
Capítulo IV – Trânsitos para a construção da nacionalização da política de
assistência social (1988-2005)
As mudanças no padrão do Estado brasileiro requeridas pela nova ordem
constitucional do pós-88 aconteceram em um momento histórico mundial eivado de
transformações. O processo de globalização das economias, a transformação do sistema
produtivo cada vez mais automatizado e consolidador do desemprego estrutural, a
comunicação planetária acelerada pelo avanço da informática se alinhavam ao
pensamento dominante de que o Estado deveria ter um protagonismo diminuído no
plano das políticas sociais, restrito ao apoio do mutante setor sem fins lucrativos da
sociedade civil, então renomeado de terceiro setor.
O paradoxo de tendências contrárias conviviam. De um lado, a demanda
pela reforma do aparelho do Estado, dilapidado pelo peso burocrático e pela crise social
e econômica de um quadro de forte recessão, que acentuou a desigualdade social. O
quadro recessivo resultou, entre outros fatores, da conjuntura internacional, da crise do
Estado e das políticas governamentais fracassadas com vistas a combater a inflação
(Fausto, 2007:543). Os índices de desemprego aumentaram, expandindo o mercado
informal, os trabalhadores assalariados se tornaram mais pobres: tiveram uma queda de
rendimento médio de 19,7% e, em setembro de 1990, o salário mínimo era 35,7%
menor do que no mesmo mês de 1989 (idem:546). Segundo dados de 1983, do Banco
Mundial, os 50% mais pobres da população se apropriavam de apenas 13,6% da renda
total do país, enquanto os 10% mais ricos se apropriavam de 46,2% dessa renda.
Por outro lado, a CF-88 refletiu os anseios do país na extensão de direitos
sociais e políticos aos cidadãos em geral, reconhecendo a cidadania como um dos
princípios fundamentais da República, apontando os direitos e deveres individuais e
coletivos (artº 5º). Reconhece os direitos sociais à educação, à saúde, ao trabalho, à
moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à
infância, à assistência aos desamparados, e exigem que o estado se responsabilize por
sua garantia e efetivação.
Inscreveu o campo da seguridade social como um conjunto integrado de
ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade visando a assegurar os direitos
196
196
relativos à saúde, à previdência e à assistência social, sendo de competência do Poder
Público organizá-la. Ampliou o alcance da proteção social para além da vinculação com
o emprego formal, introduzindo a noção da proteção social não-contributiva, o que
significa que o acesso a serviços e benefícios independem de qualquer pagamento,
antecipado ou no ato da atenção (Sposati, 2007).
A proteção social não-contributiva está enraizada no princípio fundamental
da dignidade humana (artº 1º), no direito à segurança, proteção à maternidade e à
infância e assistência aos desamparados (artº 6º), estendendo-a à proteção à família, ao
ciclo de vida (infância, adolescência e velhice) e à proteção a pessoas com deficiência
(artº 203). Para a garantia de direitos à criança, ao adolescente e ao idoso, a Constituição
adota o princípio da subsidiariedade, vinculando-os como dever da família, depois da
sociedade e do Estado (artº 227 e 230). Nesse sentido, a própria Carta Magna abriu uma
fissura para a fragilização da concepção de dever primeiro do Estado para com esses
segmentos.
Não obstante, definiu um novo arranjo federativo pautado pela
democratização, autonomia fiscal e descentralização, com expressiva transferência de
capacidade decisória, de funções e de recursos da esfera federal para estados e,
principalmente, para municípios. Logo no Artº 1º está desenhada a anatomia da
República Federativa, anunciando que é formada pela união indissolúvel dos Estados,
Distrito Federal e Municípios que, ao lado da União, configura-a como Estado
democrático de direitos, garantindo a autonomia de cada ente federado (artº 18) e
operando com competências comuns (art º 23), concorrentes à União, aos Estados e ao
DF (artº 24, no que se refere a legislações) e exclusivas (artº 21, capítulos III, IV e V).
Ainda é interessante notar que a Constituição faz menções diferenciadas
quanto às relações intergovernamentais propostas para políticas sociais, tendo como
exemplo a educação, a saúde e a assistência social. Para a Educação, a organização dos
sistemas públicos de ensino tem como base a colaboração entre a União, os Estados, o
Distrito Federal e os municípios
180
. Já para a Saúde
181
, o artigo 198 deixa claro a
engenharia operacional necessária, ao anunciar que:
180
Artigo 211, modificado pela Emenda Constitucional nº 14, de 12/9/1996. Tal mudança especifica,
melhor, a competência de cada esfera governamental quanto aos níveis de ensino (educação infantil,
197
197
as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada
e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo
com as seguintes diretrizes:
I- descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II- atendimento integral, com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III- participação da comunidade
Parágrafo 1º- O sistema único de saúde será financiado, nos termos do
artigo 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de
outras fontes.
A Emenda Constitucional nº 29
182
, de 13/9/00 acrescenta a esses
dispositivos a aplicação mínima de porcentuais orçamentários que cada ente federado
deve realizar, alcançando sua regulamentação em outubro de 2007.
Das três áreas mencionadas, a área da saúde é a única em que a reforma pós-
constitucional decorre de uma política deliberada e radical de descentralização proposta
no âmbito federal, síntese convergente dos Poderes Executivo e Legislativo. Além
disso, o movimento pela unificação das redes governamentais era desenhado desde
1983, e havia um núcleo animador de peso que operava o movimento pela reforma
sanitária, composta por profissionais experientes em gestão pública. O Movimento
Sanitário brasileiro, composto por militantes oriundos de várias profissões, e com
distintas orientações políticas, gerou uma intelligentsia (Campos, 2006) capaz de
produzir uma interpretação dos problemas sanitários e um conseqüente projeto político
de saúde que ultrapassava seus interesses corporativos. Contribuiu para a formação de
um bloco histórico – heterogêneo –, indutor da transformação do sistema único e
descentralizado de saúde em política oficial do Estado brasileiro.
Assim, o Movimento Sanitário brasileiro configurou-se como uma
mobilização para a reforma dos serviços públicos de saúde que, por sua vez, coligou
ensino fundamental, médio), uma vez que desde 1988 se sobrepunham iniciativas e competências entre o
estado e o município.
181
O Artigo 198 menciona o Artigo 195, que diz: ...a seguridade social será financiada por toda a
sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos Orçamentos
da União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais...
182
EC 29: alterou os artº 34, 35, 156, 160, 167 e 189 da CF. No caso de estados, municípios e do Distrito
Federal os recursos destinados às ações e serviços de Saúde estão vinculados à receita de impostos e
transferências constitucionais. No caso da União, o percentual mínimo de aplicação é definido com base
na variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Os estados devem disponibilizar obrigatoriamente
para a Saúde 12% de suas receitas, enquanto municípios devem aplicar uma soma de 15%. O desrespeito
à lei autoriza a União a intervir nos estados e estes nos seus respectivos municípios. A fiscalização da EC
deve ser feita pelos Conselhos de Saúde e pelas Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais.
198
198
governadores, prefeitos, parlamentares, gestores estaduais e municipais, fator favorável
que se somou à estrutura prévia facilitadora da descentralização: a centralização anterior
de decisões, de controle, de recursos e de parte da rede prestadora de serviços
conviviam com as redes próprias estaduais e municipais, postas em segundo plano.
Campos (2006) afirma que a reforma sanitária brasileira pode ser
considerada como tardia, pois ocorreu no período histórico no qual as concepções de
perspectiva socialista ou de estado do bem-estar social, em todo o mundo, já estavam
em declínio. Um período marcado pela idéia do neo-reformismo liberal, de defesa da
reforma do Estado na direção da redução de seu papel provedor, atendo-se a regular o
mercado e à prestação de serviços estratégicos, propondo que o atendimento à saúde da
população seria de competência do setor privado e/ou de organizações sem fins
lucrativos.
Na contramão dessas tendências, o sistema público de saúde brasileiro veio
se estabelecendo na intenção de ser universal, aumentou o número de serviços públicos
em todo o país e abarcou a integralidade da atenção, quer seja no âmbito preventivo,
quer seja no âmbito curativo.
Contudo, Almeida (1996) avalia que o desejo de descentralização
impulsionadora da reforma da saúde não deu a devida atenção à dimensão federativa da
organização do estado brasileiro:
ynão conferiu clareza ao papel dos estados;
ynão considerou o poder e a autonomia dos entes subnacionais;
ynão previu a possibilidade de perda da capacidade coordenadora,
orientadora e implementadora da esfera federal, decorrente em grande parte dos
desequilíbrios fiscais.
Conseqüentemente, a década de 90 foi marcada pela diversidade de ritmos e
formas, entre os estados brasileiros, na implantação do Sistema Único de Saúde (SUS).
Mesmo que a reforma tributária constitucional tenha multiplicado os recursos sob
gestão estadual ou municipal, sua aplicação na área da saúde foi determinada pela
disposição política e condição político-administrativa próprias de cada governo. Além
disso, a autonomia política típica dos entes federados ainda desconcerta o
199
199
funcionamento racional do sistema descentralizado, especialmente no que se refere à
coordenação regional.
Na área da educação, a falta de delimitação clara de competências
exclusivas dos níveis de governo possibilitou que atuassem em todos os níveis de
ensino, com a prevalência das competências concorrentes, o que foi corrigido pela
Emenda Constitucional de 1996. Por sua vez, os estados sempre foram os principais
responsáveis pela oferta pública de ensino fundamental e médio, preservando nessa
instância grande poder decisório.
A necessária revisão das responsabilidades exclusivas de cada esfera
governamental foi relegada pela pressão descentralizadora, isto é, a prioridade era
desconcentrar mecanismos centralizados pelo Ministério da Educação - como a merenda
escolar e responsabilidades pelas escolas técnicas –, além da municipalização do ensino
e autonomia das unidades escolares.
A diminuição do poder central do governo federal foi pequena, pois
continuou sob a gestão do MEC a cota federal do salário-educação, que seria aplicado
nos municípios. A resistência à descentralização, manipulada por grupos burocráticos
interessados em manter o poder do MEC, foi amplamente abastecida pela instabilidade
política na gestão do órgão, provocada pelas sucessivas trocas de ministros e equipes.
A mobilização social pela descentralização da educação careceu de força e
organicidade, tendo destacado protagonismo o Fórum de Secretários Estaduais de
Educação. A agenda reformista privilegiou a defesa do ensino público e o
estabelecimento de porcentuais fixos orçamentários para cada ente federado.
O alcance da descentralização na educação variou muito em ritmo, natureza,
intensidade e continuidade, dependendo muito das decisões e empenho dos governos
estaduais, uma vez que as redes de ensino fundamental e médio eram majoritariamente
estaduais. Mesmo a municipalização enfrenta obstáculos, pois implica, em grande parte,
a vontade de governos em implementá-la, o que deixa amplo espaço para resistências,
tanto das instâncias que não querem repassar atribuições, quanto daquelas que não
querem assumi-las.
200
200
É preciso considerar que saúde e educação diferem entre si não só enquanto
a natureza de cada política mas também dotadas de atributos adminitrativos próprios,
que se materializam em estágios e ritmos variados de descentralização político-
administrativa intrasetoriais.
Os pontos de partida para a distribuição de competências e atribuições
foram diferentes e em ritmos próprios nas áreas de educação, saúde e também para a
assistência social, dependentes de fatores como a presença ou ausência da deliberação
de descentralização na política setorial federal, natureza e poder das coalizões
reformadoras, e características prévias setoriais de suas estruturas e relações
intergovernamentais (Almeida, 1996).
4.1 Movimentos da nacionalização da política de assistência social
O marco constitucional da assistência social é o nascedouro de outro modelo
de nacionalização, tripartite – considerando as três instâncias governamentais
conduzindo as relações de parceria com entidades sociais –, e ascendente, consideradas
a singularidade territorial e a construção gradativa de mecanismos de controle social
ampliado (conselhos, fóruns e conferências de assistência social).
O ritmo e forma de construção pós-constitucional da política de assistência
social, tardio e lento, foi imprimido, inicialmente, pela condição – e tensão – de aliar
conteúdo e método, ou seja, sua redefinição de competências e definição do modelo de
descentralização político-administrativa.
Inicialmente, cabe resgatar as orientações emanadas do Seminário Nacional
As Políticas Sociais na Nova República: transformação da assistência social no país,
realizado entre 8 e 11 de julho de 1986
183
. O objetivo era ampliar as informações e os
183
Realizado pela Associação dos Servidores da Superintendência Estadual da Fundação Legião
Brasileira de Assistência de São Paulo, em conjunto com o Programa de estudos Pós – graduados em
Serviço Social da PUCSP. Teve a participação das ASSELBAs de Alagoas, Ceará, Paraná, Roraima,
Pernambuco, Rondônia, representantes de Universidades estaduais e federais (UNICAMP, UNESP
Franca, UFUberlândia), representantes do Sindicato de Assistentes Sociais, de secretarias municipais, da
Secretaria de Promoção Social do Estado de São Paulo e outras instituições governamentais.
201
201
canais de comunicação entre diferentes agentes sociais da área da assistência social,
uma vez que a prática recorrente era a “inapetência ao debate” das questões ligadas à
atuação do próprio órgão (FLBA) por parte das autoridades e direções técnicas, o que
deixava à margem das definições (anunciadas em portarias oficiais e matérias
jornalísticas) seus servidores e o conjunto dos operadores da área. Era patente a
reivindicação pela ruptura da gestão autocrática, considerando que naquele momento
histórico diversos segmentos políticos da sociedade do país se mobilizavam para iniciar
os debates quanto à elaboração da nova Constituição federal (Serviço Social e
Sociedade 22, 1986: 147-149).
O documento final do Seminário serviu de parâmetro para a multiplicação
de eventos similares país afora, com a expectativa do resultado desse processo constituir
a base para os debates da Assembléia nacional constituinte. As principais deliberações
foram:
1. uma política de assistência social deve se pautar em ampliar os direitos
sociais à população não como forma de garantir o consumo individual de
serviços, mas efetivando mecanismos que inscrevam e expressem interesses
populares no espaço institucional;
2. uma política de assistência social, como parte das políticas sociais, deve
ser um espaço estratégico de organização popular e de prestação de serviços
concretos à população;
3. uma nova perspectiva na política de assistência social deve ter claro que
seu horizonte é garantir que o brasileiro possa, cada dia mais, superar a
necessidade de existência dessa política;
4. uma política de assistência social deve romper com o assistencialismo,
com a pulverização, a fragmentação e superposição de programas e das
verbas disponíveis, e se para isso necessário for, reuni-los sob um só órgão
de forma a garantir a unidade e a globalidade de uma proposta;
5. uma política de assistência social deve contar com uma forma de
organização administrativa que, ao invés de estratégia institucional voltada
para interesses pessoais, seja sim espaço concreto de fortalecimento dos
interesses da população; concorda-se que uma nova política de assistência
social exige mudanças administrativas, mas que estas mudanças devem estar
voltadas para:
y incluir a população e os servidores no processo decisório da
organização,
y respeitar as características e as necessidades de cada região mantendo a
unidade e não a uniformidade de propostas,
y garantir a transparência do processo administrativo, inclusive de
elaboração de orçamentos e aplicação de recursos;
6. mudanças imediatas são necessárias na forma de administração da LBA
para que se inicie o exercício dessas novas perspectivas como:
202
202
y estabelecer eleições diretas para as chefias com a participação dos
servidores e da população,
y descentralizar as ações dando poder gerencial aos centros sociais.
Percebe-se que a concepção sobre a política de assistência social era mais
pelas reformas necessárias no âmbito federal e menos para um desenho republicano
intergovernamental. Não obstante, pontua como referencial para um novo patamar a
ampliação dos direitos sociais, a democratização dos processos decisórios e
orçamentários, ainda que restrito à participação dos servidores e da população - porém
impreciso quanto a seu alcance. Prescindir da assistência social pública (item 3) é, ao
mesmo tempo, polêmico e ingênuo, porque o momento requeria sua afirmação e não sua
negação, somado ao fato de que os participantes do Seminário entendiam que esse
campo de política pública diz “... respeito direto à problemática dos contingentes
populacionais de baixa renda, que beira os dois terços da população brasileira...”. Essa
visão, da época e ainda corriqueira nos dias de hoje, entende que a cota setorial da
assistência social é a da pobreza, natureza fundante de ser e existir como política
compensatória para pobres, distante da noção de que as situações de ameaça ao bem-
estar (riscos) e a respectiva capacidade de responder a elas (vulnerabilidades) decorrem
de contingências humanas do próprio ciclo de vida, outras geradas pela situação de
deficiência, além daquelas oriundas de fragilidades e ruptura de vínculos familiares e
societais, que podem ser agravadas pela condição de pobreza.
É preciso salientar que, há 22 anos, já havia o reconhecimento da
importância da singularidade de cada território para manter a unidade e não a
uniformidade de propostas (item 5): a unidade no diverso e no diferencial é uma diretriz
de comando ainda inconclusa, alçada mais claramente a partir da Política Nacional de
Assistência Social de 2004. Pode-se afirmar que as conclusões desse Seminário de 1986
anunciam o caminho da ruptura da nacionalização descendente, até então hegemônica,
centralizadora e de costas às peculiaridades que devem engendrar a unificação da
assistência social pública.
Propostas de reforma para a área de assistência social integravam a agenda
de reformas da Nova República, ao que tudo indica, elaborada sem o recurso da
consulta participativa. Uma Comissão de Apoio à Reestruturação da Assistência Social
foi instituída pelo governo federal, em 1986, que apontou os problemas responsáveis
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pela ineficácia e inefetividade de suas ações (Arretche, 2000): concepção
assistencialista e utilização clientelista, insuficiência de recursos, fragmentação
institucional, superposição de ações realizadas pelas três instâncias de governo,
excessiva centralização financeira e político-administrativa das políticas e programas
federais e de baixa qualidade no atendimento. Conseqüentemente, as recomendações da
Comissão indicavam o caminho da descentralização e, particularmente, da
municipalização, o que veio se materializando instavelmente.
Os Governos Sarney, Collor e Itamar
184
primaram pela instabilidade
administrativa e ministerial, período marcado por reformas administrativas causadoras
da turbulência de localização da FLBA e FUNABEM, conforme mencionado
anteriormente neste trabalho. Associado a esse fato, descentralizar não era de interesse
político: correspondia a abrir mão de poderosa moeda fisiologista de troca política entre
a Presidência da República, o Congresso Nacional e as bases estaduais e municipais,
uma vez que representava aproximadamante 1% do PIB da época (idem).
A imprecisão interna de rumos, na época, para a assistência social, pode ser
aferida por meio da conferência realizada pela representante da SAS, Ivanisa Maria T.
Martins, no I Simpósio Nacional sobre Assistência Social da Câmara dos Deputados,
em 1989. Entendia que a assistência social não era residual, “... mas pretende ser
compensatória e recuperadora de direitos...” (Anais do I Simpósio Nacional, 1989:143).
Não se tratava de criar um sistema público de atendimento à sociedade informal,
concorrente com o sistema público de atendimento à sociedade formal, o que equivalia a
reproduzir um sistema não-oficial de prestação de serviços. A tradução da
descentralização político-administrativa significava dar autonomia aos estados para
coordenar, ao passo que a execução de uma política integrada de ações era de
competência dos municípios e entidades beneficentes de assistência social. O papel
desse campo de política pública era entendido, por vezes, como via de acesso a outras
políticas sociais: garantir que a sociedade informal fosse atendida em igualdade de
direitos pela área da saúde, subvencionar e legalizar as escolas comunitárias para o
acesso à educação. Finaliza sua intervenção afirmando que o papel da assistência social,
naquele momento do país, era o de caminhar para se tornar efetivamente residual, na
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Fernando Collor (15/3/90 a 29/12/92) e Itamar Franco (29/12/92 a 1/1/95)
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defesa de uma política de desenvolvimento social que atendesse a todos seus cidadãos
contribuintes, direta e indiretamente, dentro de uma perspectiva redistributiva que
reduzisse ao máximo as desigualdades sociais. De saída, nega e afirma o caráter residual
da assistência social, localiza a intersetorialidade através da vocação mediadora da
assistência social e delega ao ente estadual a coordenação da municipalização: são três
fatores que, conjugados, serviam para recuar nos avanços constitucionais.
Em 1990, há dois fatos de destaque: Fernando Collor sucede a José Sarney
na Presidência da República, sendo o primeiro presidente eleito pelo voto direto após o
regime militar, ventríloquo dos órgãos de imprensa que investiram pesadamente na
construção de sua imagem:de bom moço e atleta, figurante de uma suposta república
nova, disposto a caçar marajás e sanear a administração pública. Seu governo foi
marcado por propostas relativas à reforma do Estado, expressas nos projetos de
Reforma Administrativa e nos Programas de Desregulamentação e Desestatização. O
Plano Brasil: um projeto de reconstrução nacional, de março de 1991, preconizou um
Estado menor, mais ágil, que delega a modernização da economia à iniciativa privada,
cabendo ao Estado o papel de articulador dos agentes privados. O desenvolvimento
social era concebido como decorrência do crescimento econômico e ao Estado cabia
executar políticas complementares ao mercado (Raichelis, 1998:94).
A política de assistência social era marcada pela concepção residual e
emergencial, limitada às camadas mais empobrecidas da população e com tratamento
prioritário à criança. Essa gestão ignorou o direito constitucional de acesso ao benefício
mensal de prestação continuada para o idoso e pessoa com deficiência desprovidos de
meios de subsistência, o que justificou com a proposta de um auxílio a famílias o veto
integral ao Projeto da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), aprovado pelo
Congresso Nacional em setembro de 1990.
Segundo a concepção vigente, não era responsabilidade do Estado a garantia
dos direitos sociais, exercendo a pleno a redução drástica nos gastos sociais diretos –
corte de programas e redução de cobertura das iniciativas da FLBA – em contrapartida
ao crescimento exponencial da via subsidiária de transferência de recursos financeiros
às entidades assistenciais, filantrópicas e comunitárias. Predominaram convênios para o
atendimento de crianças de 0 a 6 anos nas creches privadas (66,7%), ao passo que a
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redução na cobertura das creches públicas da própria LBA foi da ordem de 70,5% (in
Raichelis, 1998:95-96) A isso se soma o fato de que a primeira-dama, Rosane Collor,
dirigiu a LBA na rota do favorecimento da filantropia familiar, nomeando parentes em
cargos de superintendência estaduais e transferindo recursos públicos para as entidades
sociais pertencentes e administradas por sua família em sua terra natal, inaugurando
uma modalidade – desconhecida até então – de “nepotismo filantrópico”.
Sob sua arrogância política, o plano econômico que Collor imprimiu (de
seqüestro da conta corrente e poupança de milhares de cidadãos) pretendia combater a
inflação: a propalada inflação zero não se realizou, e veio acompanhada da elevação do
desemprego, da recessão e desvalorização salarial, da abertura do mercado às
importações e esmorecimento do mercado financeiro.
O segundo fato de destaque desse momento histórico refere-se ao advento do
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069 de 13/07/1990) – ECA -, substituto
do Código de Menores e do paradigma da criança e adolescente em situação irregular
para a proteção integral que lhes é reconhecida como sujeitos de direitos. O ECA é
resultado das recomendações oriundas de tratados internacionais, com forte mobilização
da sociedade civil a respeito da proteção social devida a esse segmento social. Instalou o
controle social ampliado na fiscalização das políticas sociais específicas a esse
segmento social – Conselhos e Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente –,
além do Conselho Tutelar como órgão executivo na atenção e fiscalização das medidas
socioprotetivas correspondentes. A FUNABEM é transformada em Fundação Centro
Brasileiro de Assistência à Infância e Juventude (FCBIA).
Em abril de 1991, a assistência social voltou a ser discutida no Congresso
Nacional, para retomar a regulamentação desse capítulo constitucional. Foi recuperado
o projeto original, formulado pelo IPEA (Instituto de Planejamento Econômico e
Social) e Neppos/UnB (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Políticas Sociais da
Universidade de Brasília), sendo aperfeiçoado pelos órgãos de classe e da categoria
profissional dos assistentes sociais : Conselho Federal dos Assistentes Sociais,
Associação Brasileira de Ensino do Serviço Social, Centro de Estudos de Ensino de
Serviço Social, Associação Nacional das Associações de Servidores da LBA e o Núcleo
de Estudos e Pesquisas em Seguridade e Assistência Social. Foi realizado em Brasília,
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em junho de 1991, um seminário nacional sobre assistência social denominado
Impasses e perspectivas da assistência social no Brasil. (Mestriner, 2001:202) O
desdobramento principal desse evento foi a multiplicação dos debates em todos os
estados, envolvendo universidades e toda a categoria profissional, além de avançar na
discussão sobre a criação do Ministério da Ação Social (1991), conduzido então por
Margarida Procópio, que abarcara a FLBA e o CNSS.
O mesmo bom moço, caçador de marajás, envolveu-se em um esquema
milionário de propinas e escândalos financeiros em torno de aproximadamente meio
bilhão de dólares, estopim de um possível impeachment e mobilizador da opinião
pública que exigia sua retirada, o que fez por renúncia ao cargo em dezembro de 1992.
Itamar Franco, na qualidade de vice-presidente, assumiu interinamente e
tomou posse em 29/12/02, cumprindo mandato de presidente da República até 1/1/95. O
país estava no meio de mais uma crise econômica séria, elevando a inflação a 1.100%
em 1992, alcançando quase 6.000% em 1993, o que o levou a trocar de ministros da
área econômica várias vezes, até que Fernando Henrique Cardoso assumiu a pasta,
lançando o Plano Real no início de 1994.
Em abril de 1993, cumprindo o previsto na Constituição federal de 1988, o
governo realizou um plebiscito para a escolha da forma e do sistema de governo no
Brasil, mantendo-se o regime republicano e presidencialista.
Em dezembro de 1993, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) foi
aprovada, estabelecendo uma nova matriz para a assistência social brasileira, “...
iniciando um processo que tem como perspectiva torná-la visível como política pública
e direito dos que dela necessitarem...” (Yazbek, 2004:13). A LOAS delimita as
provisões assistenciais no âmbito das garantias de cidadania sob vigilância do Estado,
ao qual compete a universalização da cobertura e garantia de acesso aos serviços,
benefícios, programas e projetos socioassistenciais. Dessa forma, ficou estabelecida
claramente a primazia da responsabilidade estatal, o que fecha fissuras constitucionais.
O novo marco legal estabelece as competências específicas de cada ente
federado, prevendo o comando único em cada esfera governamental, e reconhece, como
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instância deliberativa do sistema descentralizado e participativo, os Conselhos de
Assistência Social organizados em nível municipal, estadual e nacional. O CNSS é
substituído pelo CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social), órgão superior de
deliberação colegiada implantado em 1994 com a complexa tarefa de administrar o
legado de um órgão pautado pela manipulação política, pelo rito cartorial, por
escândalos ligados à corrupção e subvenção às entidades-fantasma. Um desafio em
marcha, desde então, tem sido substituir o paradigma do assistencialismo filantrópico,
reiterador de interesses individuais pela precedência da cidadania dirigida ao interesse
coletivo. Todavia, dificuldades para essa transposição se colocavam no nascedouro do
novo órgão: a alteração provocada pela LOAS preservou no CNAS a função de registro
e atribuição do mérito filantrópico às entidades sociais, às quais foram acrescidas das
entidades de educação e saúde (por meio de legislação anterior ao advento da
LOAS).Em outras palavras, a obtenção do certificado de fins filantrópicos exigido para
o acesso à isenção da contribuição à seguridade social ampliou o alcance da
classificação das entidades beneficentes de assistência social, o que vem provocando,ao
longo desse interstício de 14 anos constrangimentos na convivência do novo paradigma
com o velho (Mestriner, 2001:210), que permaneceram como demonstra a Polícia
Federal em 2008 na nomeada Operação Fariseu.
O Ministério do Bem Estar Social foi renomeado, nesse governo, para
Ministério da Ação Social, desprovido de mudanças substanciais para o avanço da
assistência social pública, porém pleno de desgastes institucionais: os escândalos
oriundos da malversação financeira envolvendo a LBA (Rosane Collor) e o CNSS
(articulado com o Congresso Nacional) adubaram o caminho para a desmoralização da
área, a redução de recursos orçamentários e o álibi para a extinção da LBA em 1995.
Nos períodos pré e pós-constitucional (1987-1991), São Paulo foi governado
por Orestes Quércia. A Secretaria de Planejamento diagnosticou, em outubro de 1988,
um complexo quadro de barreiras à governabilidade estadual. Resultado de uma série de
fatores, as dificuldades de coordenação global nas ações do governo tiveram origem nos
governos anteriores, somado às fragilidades dos governos em exercício –além do
estadual -, traduzidos na complexa gestão de uma máquina pública agigantada
(Felicissimo, 1992)
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Assim, a relação entre recursos e demandas era dramática: da receita
tributária arrecadada, somente 33% ficava no estado, ao passo que São Paulo recebia à
época cerca de 240mil migrantes, o que demandava múltiplos investimentos. O parecer
da secretaria estadual era de que, se havia concentração econômica regional, havia um
adensamento de problemas sociais, confrontado à conclusão de que o Estado não tinha
capacidade para atender a essas necessidades. A despeito do gigantismo administrativo,
predominava a lógica cartorial no funcionamento do aparelho estatal, somado a
ocupação indevida de espaços pelo estado, fatores que emperravam um funcionamento
adequado.
A Fundação para o Desenvolvimento Administrativo - FUNDAP -, autarquia
do governo paulista, realizou estudos e pesquisas voltadas à melhoria do desempenho da
máquina pública, considerando a nova ordem constitucional federal de 1988. A Carta
Magna (artº 23) determinou o aumento de competências comuns entre as esferas
federal, estadual e municipal em setores relevantes tais como saúde, habitação, meio
ambiente, agropecuária, abastecimento e recursos hídricos, que orientaram a formulação
da Constituição paulista de 1989. Foi constatado que pairava uma indefinição dos
limites de atuação das diferentes esferas, o que apontava para a importância da criação
de um espaço regional (intraestadual) para a negociação e cooperação mútua, com
vistas a definição e execução de políticas e de papéis entre os entes envolvidos. (idem:
68). A FUNDAP concordava com a proposta constitucional (CF 88) de estados
organizarem unidades regionais compostas por agrupamentos de municípios limítrofes –
em regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões – visando integrar a
organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum,
contando com a participação da população no planejamento e tomada de decisões, o que
foi acolhido na Constituição Paulista de 1989 (Cap. II, artº 152 a 158).
O diagnóstico espacial-territorial empreendido pela FUNDAP confirmava
que os problemas mais prementes do estado de São Paulo eram de cunho urbano-
industrial, o que gerava questões de natureza nitidamente regional. A interiorização do
desenvolvimento paulista fortaleceu determinados núcleos urbanos que, por sua vez,
tendiam a reproduzir problemas típicos da região metropolitana de São Paulo. Um dado
agravante detectou que a ausência de intervenção efetiva do governo estadual no
planejamento da organização espacial esboçava uma situação de descontrole face aos
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problemas sociais existentes. Por conseguinte, o espaço regional era tido como a
solução para integrar ações municipais e estaduais em torno dos problemas concretos
que se configuram nesse âmbito, apesar de se constatar que já existia uma estrutura
estadual descentralizada equivalente a um modelo de regionalização, porém, pouco
explorada.
Em síntese, os estudos já apontavam para a potência da organização regional
como um importante mecanismo de descentralização de políticas públicas e de fomento
às capacidades intra-regionais e locais. É interessante destacar que a regionalização
ocupa, atualmente, a pauta da modelagem do SUS e do SUAS, considerada como a
estratégia capacitada ao gerenciamento de micro-relações federativas cooperativas para
a resolução de questões complexas que transbordam as fronteiras municipais.
A criação da Secretaria do Menor em 1987 foi um dos primeiros atos do
governo Quércia. Em maio desse ano, Alberto Goldman foi nomeado Secretário
Especial de Coordenação de Programas, com a incumbência de formular proposta de
reforma administrativa, compreendida como um programa de investimentos na melhoria
da qualidade da máquina administrativa. O resultado desse trabalho gerou a alteração da
organização dos serviços da administração direta e indireta, disposta no Decreto nº
29355 de 14/12/1988. As atribuições de duas secretarias foram absorvidas pela
Secretaria da Promoção Social :
-Secretaria da Ação Comunitária, criada em 1981, subordinando o Conselho
Estadual do Idoso e da Juventude à pasta da promoção social;
-Secretaria das Relações do Trabalho, transferindo os bens móveis,
equipamentos, direitos e obrigações das unidades: Departamento de Lazer do
Trabalhador; Departamento de Assistência Sindical e de Relações Empresariais;
Departamento de Recursos Humanos (exceto a Divisão de Higiene e Segurança do
Trabalho); a Fundação Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador
(CERET) e a SUTACO.
Competia, então, à Secretaria da Promoção Social incentivar a ação e
participação comunitária para promover o desenvolvimento do artesanato no Estado,
coordenar e desenvolver atividades afeta às relações do trabalho, mantendo a FEBEM
vinculada à pasta. É curioso constatar que, inusitadamente, a área do trabalho é
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incorporada à área da assistência social, quando a tendência usual é o contrário disto:
supõe-se que, mesmo assim, a medida era profilática à possível e imaginária tutela e
dependência da qual a assistência social seria portadora, pois, segundo essa concepção,
ela geraria dependência, acomodação e ócio em seus usuários, imunizados pelo primado
do trabalho.
A Constituição de São Paulo de 1989 abriu um espaço específico para a
Ordem Social, a exemplo da Constituição Federal, prevendo que cabe ao Estado
assegurar o bem estar social, garantindo o pleno acesso aos bens e serviços essenciais ao
desenvolvimento individual e coletivo. Ratifica a incumbência do Estado de garantir,
em seu território, o planejamento e desenvolvimento de ações que viabilizem, no âmbito
de sua competência, os princípios de seguridade social previstos nos artigos 194 e 195
da Constituição Federal. A assistência social é denominada como promoção social,
agora separada da saúde, e embasada nos princípios da participação da comunidade, da
descentralização administrativa – prevê a coordenação e execução de programas às
esferas estadual e municipal, considerando os municípios e as comunidades como
instâncias básicas para o atendimento e realização dos programas. Um terceiro princípio
diz respeito a integração das ações dos órgãos e entidades da administração em geral,
preventiva à duplicidade entre as esferas estadual e municipal.
Em 2006, uma Emenda Constitucional faculta ao Poder Público a vinculação
de até cinco décimos por cento de sua receita tributária à área da promoção social, à
semelhança da Constituição Federal (assegurada por Emenda Constitucional de 2003).
Está prevista a subvenção às entidades assistenciais filantrópicas e sem fins lucrativos,
prioritamente àquelas dedicadas às pessoas com deficiência, além da criação do
Conselho Estadual da Promoção Social.
Todavia, a Constituição Paulista de 1989 expressa o reconhecimento de que
a área da assistência social tem natureza compensatória e emergencial (a exemplo da
SAS federal, na época), o que não permite que prevaleça sobre políticas sociais básicas
como saúde, educação, abastecimento, transporte e alimentação. Pode-se afirmar que
essa compreensão representa a antítese da ruptura propugnada na CF 88: calcifica um
suposto caráter residual à assistência social, sujeita ao descrédito e descontinuidade
expressos em programas de governo. Assim sendo, o mais importante marco legal
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regional empalidece a perspectiva da política estadual de assistência social de fato se
constituir como política, tampouco básica, o que dizer republicana.
De forma inédita, há um capítulo sobre proteção especial, dirigido à família,
criança, adolescente, idoso, deficiente e índios. O enunciado do artº 227 desse capítulo
incumbe o Estado e à família assegurar aos segmentos mencionados, à exceção do
índio, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e agressão. Os dispositivos complementares preveem, inclusive,
serviços de prevenção e acolhimento provisório de vítimas de violência, o que aproxima
esse dispositivo constitucional ao conceito contemporâneo de proteção social especial
devida pela assistência social, voltada à prevenção e atenção aos segmentos sociais
expostos à violação de direitos.
A primeira dama Alaíde Cristina Barbosa Ulson Quércia, médica
oftalmologista, priorizou a questão da pessoa com deficiência nas atividades do
FUSSESP. Implantou a Estação Especial da Lapa (São Paulo, capital) para promover a
integração social desse segmento social em um amplo espaço dotado de cursos
profissionalizantes, lazer, cultura, esportes, acompanhamento multidisciplinar e
colocação no mercado de trabalho. Além disso, foi realizado o cadastramento de
crianças com deficiência em todo o território paulista e institucionalizado o Programa de
Ação Preventiva de Saúde Visual na rede estadual de ensino. O Fundo de Solidariedade
lançou o manual: Elementos Básicos para Eliminação de Barreiras Arquitetônicas e
Ambientais. Desenvolveu um programa de combate às drogas, estimulando a criação de
120 Conselhos Municipais de Entorpecentes, além de projetos voltados para a terceira
idade.
Em 1990, ocorreu outra mudança na Secretaria da Promoção Social. O
decreto nº 31768 modifica sua denominação para Secretaria do Trabalho e da Promoção
Social, transferindo à Secretaria do Menor a FEBEM e o IAFAM. A estrutura
organizacional da SETPS estava composta por duas instâncias:
-administração centralizada: gabinete do secretário, assessoria técnica de
planejamento e controle, assessoria especial, Conselho Estadual de Auxílios e
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Subvenções (CEAS), Coordenadoria de Relações do Trabalho (CRT), Coordenadoria de
Ação Social e do Trabalho (CAST), Coordenadoria do Apoio Social (CAS), Divisão de
Divulgação e Relações Públicas;
-administração descentralizada: CERET e SUTACO
À CAST estavam vinculados 14 Plantões Sociais em delegacias de Polícia,
as 21 Divisões Regionais de Promoção Social e Trabalho (8 na região metropolitana de
São Paulo), desdobrados em Postos de Atendimento à população, associações
comunitárias, movimentos sociais e outras formas de organização popular para prover a
orientação trabalhista, a realização de cursos profissionalizantes e emissão de carteira
profissional.
À CAS pertenciam a CETREN, DAIS, o DAMS- Departamento de
Assistência Médico-Social- ,o Núcleo Pioneiro Sócio-Terápico “Arquiteto Januário José
Ezemplari (antiga Fazenda São Roque), Chácara Paraíso (também voltado ao abrigo de
homens) e o Albergue Noturno
À CRT pertenciam o Departamento de Recursos Humanos, que prestava
orientações às instituições de classe dos trabalhadores, o Departamento do Lazer do
Trabalhador, a Divisão de Engenharia (responsável pelo projeto de Centros de Lazer do
Trabalhador) e a Divisão de Segurança e Saúde do Trabalho, o FIS (Fundo de
Financiamento e Investimento Social) e o Amparo Social (localizado na capital São
Paulo).
Essa reorganização administrativa primou pela dispersão programática e pela
divisão discriminatória das Coordenadorias. Desde a criação da SEPS, foram mantidos
dois eixos definidores da organização administrativa institucional: a ação comunitária e
a atenção a grupos “inadaptados” e/ou “marginalizados”, conforme denominação da
época. As sucessivas gestões mantiveram, também, o apoio às entidades sociais. Na
configuração quercista, os eixos substitutos se restringiram a apartar a atenção ao
trabalhador (CAST) e ao não-trabalhador (CAS), fraturando assim a matriz triangular
de responsabilidades da esfera estadual que vinha desenhando a identidade desse campo
de política pública. Ademais, retomou o caminho de desagregar a atenção à criança e
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adolescente, outra ocorrência da migração de campo da área da assistência social,
conferindo-lhe status administrativo de secretaria de Estado: Secretaria do Menor.
No final de 1988, a Secretaria do Menor desempenhava a função de “...
preparar as novas gerações, reconhecendo-lhes direitos e garantindo-lhes justiça...”
(folheto comemorativo “Secretaria do Menor hoje, Dia da Criança”, 12/10/1988).
Desenvolvia 15 programas diversificados em 419 unidades implantadas no território
paulista para mais de 100 mil crianças e jovens. A FEBEM-SP foi transferida para essa
Secretaria em 1990. Metáforas à parte, o cenário de um circo acolhia o conjunto profuso
de programas e codinomes-fantasia, transformando o Circo-Escola como o eixo
condutor da Secretaria, no qual a vivência lúdica das artes circenses potencializava a
formação profissional dos segmentos sociais atendidos. Todavia, as lonas foram
recolhidas com a extinção da Secretaria em 1993 durante a gestão do governador Luiz
Antonio Fleury Filho.
Fleury Filho
185
governou de março de 1991 a janeiro de 1995. Iniciou o
mandato com uma disponibilidade do financiamento público praticamente esgotada,
uma vez que os últimos investimentos em infra-estrutura , realizados pela administração
anterior, foram feitos às custas de cortes orçamentários de difícil execução e elevação
do endividamento do Estado. Outro complicador foi o impacto causado pelos sucessivos
planos econômicos federais, provocadores de forte recessão acompanhada de queda
abrupta da arrecadação estadual, do aumento do desemprego e a elevação da demanda
por serviços públicos. Dessa forma, “... nunca antes o quadro fora tão adverso, nem
mesmo durante a apocalíptica crise de 1929, quando a economia do país era
essencialmente rural e a então escassa concentração urbana não acirrava os elementos
da crise como o faz hoje...”. (in Felicíssimo, 1992:133-134)
185
LUIZ ANTÔNIO FLEURY FILHO (1949) DÉCIMO-SÉTIMO GOVERNADOR Período de governo:
03/1991 - 01/1995 Natural de São José do Rio Preto-SP, foi aluno da Academia de Polícia Militar de São
Paulo. Formou-se em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas, em 1972, passando a atuar como
professor e promotor público, já em 1973. Exerceu atividades no Ministério Público até 1987, chegando a
ser presidente da sua Confederação Nacional, por três mandatos sucessivos. Nesse ano, passou a ocupar o
cargo de Secretário de Segurança Pública do governo Orestes Quércia, criando grupos especiais de ação
na Polícia Militar. Em 1990, ainda sob a legenda do PMDB, foi eleito governador. Em sua gestão, deu
continuidade a obras públicas do governo anterior, destacando-se a Hidrovia Tietê-Paraná, que viabilizou
a navegação até o sul de Goiás, a partir do sistema de eclusas da Hidrelétrica Nova Avanhandava e do
canal de Pereira Barreto. Construiu o complexo de aproveitamento múltiplo Mogi Guaçu e deu
prosseguimento ao complexo de Canoas. Em 1999, iniciou mandato como deputado federal e tornou-se
secretário-geral do Diretório Nacional do PTB.
214
214
Diante das limitações orçamentárias e da restrição do financiamento de
organismos internacionais de então, o governo paulista adotou a fórmula de alcançar
complementariedade com as empresas privadas, que permitisse ao Estado incorporar
novas fontes de financiamento, desenhando uma parceria associada entre Estado e
capital privado. A estratégia encontrada foi a instalação do “Fórum Paulista de
Desenvolvimento”, que reunia representantes da administração estadual, sindicalistas,
membros da comunidade acadêmica e científica, parlamentares e empresários.
Desprovido de estrutura burocrática formal, foi lançado em maio de 1991 sob a
influência desestimuladora do recém lançado Plano Collor. Quatro meses depois, o
Fórum operava o diagnóstico do quadro econômico nacional e a situação do estado de
São Paulo, apoiado em 13 grupos temáticos de setores estratégicos da economia, além
dos grupos setoriais sobre saúde/ segurança do trabalhador e treinamento de mão de
obra. Foram tomadas medidas fiscais para setores prioritários da agricultura, comércio e
indústria e linhas de financiamento foram viabilizadas, principalmente com a criação da
Companhia Paulista de Desenvolvimento (responsável pela área de infra-estrutura e
formada principalmente com capital privado) e a Agência de Desenvolvimento Tietê-
Paraná.
A Secretaria do Trabalho e Promoção Social teve 3 secretários
186
no
comando da pasta e 2 mudanças técnico-administrativas substanciais. A primeira delas
ocorreu em julho de 1992, quando as atribuições relativas à área do trabalho retornam
para a pasta original, voltando a denominar-se como Secretaria da Promoção Social, por
meio do decreto nº35341:
Constitui o campo funcional da Secretaria da Promoção Social:
I - a formulação e execução da política estadual de Promoção Social, visando
conjugar esforços dos setores governamental e privado, no processo de
desenvolvimento social;
II - o assessoramento ao Governo do Estado nos assuntos de Promoção
Social;
III - o desenvolvimento de planos e programas destinados a: executar
atividades de promoção humana; incentivar a ação e participação
comunitária; a assistência social e a educação de base;
IV - a manutenção e a difusão de atividades de pesquisa da realidade social,
bem como o desenvolvimento e treinamento de recursos humanos para a
186
Antonio Adolpho Lobbe Neto (16/03/1991 a 17/07/1992), Rosmary Correa (17/07/1002 a 01/01/1994)
e Therezinha Fram (01/01/1994 a 01/01/1995)
215
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prestação de serviços técnicos na área social, tanto para o setor
governamental como para o setor privado;
V - a prestação de assistência financeira a: entidades assistenciais do setor
privado;
Prefeituras Municipais, no desenvolvimento inicial de centros comunitários
rurais e urbanos;
VI - a prestação de assistência técnica a entidades sociais do setor público e
privado, visando racionalizar e desenvolver seus recursos destinados aos
serviços de amparo e readaptação social de: migrantes, desempregados,
egressos (em conjugação de esforços com a Secretaria da Segurança
Pública), trabalhadores rurais volantes; mães
solteiras;prostitutas;mendigos;velhice desamparada;vítimas de calamidade
pública, em conjugação de esforços com a Coord. Estadual de Defesa Civil;
VII - a fiscalização de entidades sociais, beneficiadas ou não por recursos
estaduais;
VIII - a promoção, de modo efetivo e atuante, do intercâmbio de
informações e ajudas mútuas entre: os setores públicos; os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário; as associações representativas de classes
econômicas; as entidades de natureza assistencial ou promocional, religiosa
ou leiga.
Chama a atenção a primeira atribuição conferida à Secretaria (I) pelo fato de
ensejar alianças com o setor privado, lato sensu, o que sugere estar coerente às diretrizes
adotadas pelo governo, de complementariedade com o capital privado. A assistência
social integrou o rol de atividades esperadas (III), o que reflete uma compreensão sobre
assistência social mais próxima de uma prática do que campo de política social.
A unidade administrativa da Secretaria CAST foi renomeada com sua
denominação anterior de CAR e foi mantida a Coordenadoria de Apoio Social (CAS).
Tanto as Divisões Regionais de Promoção Social (22) quanto a Divisão de Registro e
Cadastro de Entidades Sociais foram vinculadas à CAR, permanecendo o CEAS
187
na
SEPS. É possível afirmar que a matriz triangular de responsabilidades do ente estadual
foi retomada nesse redesenho técnico-administrativo, acrescido do detalhe de que o
Amparo Social
188
operava a concessão de benefícios eventuais no atendimento de casos,
duplicando a iniciativa que também era executada no FUSSESP. Assim, a ausência de
187
As subvenções de manutenção do custeio das entidades sociais atingiram a área médico-hospitalar,
além da promoção social, totalizando 1859 entidades privadas de caráter assistencial. Fonte: Diário
Oficial do Estado, Seção I, p.30, 09/02/1993
188
Doações de aparelhos auditivos, órteses e próteses, cadeiras de rodas, colchões d’água, óculos,
próteses oculares, muletas, triciclos, dentre outros
216
216
comando único na esfera estadual, contrária à orientação da LOAS se ramificava na
duplicidade de concessões ofertadas pelo mesmo ente federado.
A Secretaria do Menor manteve os 14 programas da pasta, em 1992. Nesse
momento, alcançara a definição de quatro grandes linhas de atuação: atendimento a
meninos(as) de rua, a prevenção e o combate à violência, programas de
desenvolvimento integral de crianças e jovens (composto pelo atendimento em creche,
atendimento complementar à escola e preparação para o ingresso no mercado de
trabalho) e a formação de recursos humanos. Implantou o Projeto Sócio-Educativo e
Terapêutico a Adolescentes em regime de internação, com o objetivo de viabilizar a
aplicação das normas estabelecidas pelo ECA. Esse projeto encontrava-se em fase
inicial de implementação, voltado para a desconcentração do modelo de grande
internato exercido no quadrilátero do Tatuapé
189
e descentralização aproximadora do
restabelecimento do convívio familiar e social dos jovens infratores. (Diário Oficial do
Estado, Seção I, p.84, 09/02/1993)
A segunda mudança dessa gestão ocorreu em 1993, por meio do decreto
nº36454 de 19 de janeiro, que conferiu maior relevância à Secretaria do Menor: passou
a denominar-se como Secretaria da Criança, Família e Bem Estar Social (SCFBS) e,
praticamente, absorveu a estrutura da Secretaria da Promoção Social, que veio a ser
extinta somente 4 meses depois (lei nº 8312 de 12/05/1993).
Comparado ao campo funcional disposto no decreto nº 35341, foram
alterados o caráter da política, agora relativa à criança, adolescente, família e bem estar
social; o assessoramento nos assuntos relativos à assistência social e, principalmente, a
promoção da integração dos planos e programas de atendimento aos segmentos
mencionados em nível federal, estadual e municipal, bem como com empresas públicas,
de economia mista e privadas, além de organismos internacionais. Inconfundivelmente,
essa foi a primeira menção à perspectiva de uma definição republicana por parte do ente
estadual paulista, em tempos pós-constitucionais. Expressou parcialmente a intenção de
ruptura a paradigmas anteriores, não fosse a menção da atribuição da FEBEM-SP de
189
Localizado nas instalações do pioneiro Instituto Disciplinar (1902-1903), em São Paulo, capital
217
217
promover a execução da política de ação para o atendimento à criança e adolescente
“em situação irregular” (decreto 36454, artº 5, XI).
É possível afirmar que o FUSSESP ganhou maior visibilidade nesse período,
revestido de funções integradoras intersetoriais entre diferentes secretarias e órgãos da
administração estadual. Comandado por Nair Passos (Ika) Fleury, coordenou o Plano
Estadual de Ações Sociais, responsável pela articulação das ações dos diferentes órgãos
públicos estaduais e as ações de atendimento direto à população. Os programas
desenvolvidos eram variados, voltados à pessoa com deficiência, à população idosa e de
prevenção ao uso indevido de drogas. Havia 18 escritórios regionais distribuídos pelo
interior do estado, de apoio à atuação da atuação das primeiras damas dos 624
municípios paulistas.
No dia 01/01/1995, assumiu a presidência da República Fernando Henrique
Cardoso (FHC), 1º presidente brasileiro reeleito por dois mandatos. Senador da
República eleito duas vezes, um dos principais fundadores do Partido da Social
Democracia Brasileira (PSDB), foi Ministro das Relações Exteriores e da Fazenda no
Governo Itamar Franco. Embuído de um agressivo programa de reforma do Estado
iniciou-a com a extinção da FLBA, a FCBIA e o Ministério do Bem Estar Social,
realocando a SAS no MPAS, agora identificada como Secretaria Nacional de
Assistência Social. A mesma Medida Provisória (nº 813) que extinguiu esses órgãos
criou o Programa Comunidade Solidária, dirigido pela esposa do presidente da
República, Ruth Cardoso. As antigas superintendências estaduais da LBA foram
transformadas em escritórios regionais da SAS, para realizarem a transferência
patrimonial-equipamentos sociais, programas federais do ex-órgão federal-aos órgãos
estaduais responsáveis pela política de assistência social.
Paradoxalmente, a LBA inicia com uma primeira dama em 1942, e cabe a
outra primeira dama desfechar-lhe o golpe, em 1995. O caráter legionário passa a ser
comunitário, com ênfase solidária. Inicia um novo ciclo de modernidade de primeira
dama, que permanece usando recursos financeiros e infraestrutura do Estado para negar
a presença do Estado.
218
218
A proposta de reforma do Estado brasileiro ensejou a criação do Ministério
da Administração e Reforma do Estado (MARE), responsável pela implementação do
Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, voltado para a administração pública
federal. A justificativa da reforma reconhecia-a como indispensável para consolidar a
estabilização e assegurar o crescimento sustentado da economia e, consequentemente,
promover a correção das desigualdades sociais e regionais. Para tanto, a redefinição do
papel do Estado era considerada como vital, o que significava que ele deixaria de ser
responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de
bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse
desenvolvimento. (Gomes, 2002)
Os principais pontos da reforma referiam-se: ao programa de privatização de
empresas estatais, pois se reconhecia que a tarefa de produção era realizada de modo
mais eficiente pelo setor privado, pela transferência ao “setor público não-estatal”
190
da
produção de serviços não-exclusivos do Estado, entendidos como aqueles que não
envolviam o exercício de poder do Estado porém subsidiados por ele. Esse último ponto
compunha o Programa de Publicização e dizia respeito aos serviços de saúde, educação,
cultura e pesquisa científica, viabilizado por um sistema de parceria entre o Estado e a
sociedade civil. A Lei nº 9637/98 cria a “organização social” (OS) que possibilita a
transferência/ privatização e geração de novas iniciativas nas quais executam serviços,
em tese, de natureza estatal, a exemplo da saúde e educação. Esse modelo institucional
vem sendo regulado e adotado por estados e municípios brasileiros, principalmente na
área da saúde pública.
Iniciava-se aí a materialização da redução da responsabilidade estatal perante
o bem estar da coletividade, o que provocou um amplo processo de revisão do marco
regulatório da relação público-privado, coordenado pelo Programa Comunidade
Solidária. (PCS). Este ficava sediado na Casa Civil da Presidência da República e sua
missão era coordenar e integrar as diferentes iniciativas ministeriais voltadas ao
atendimento dos segmentos sociais pauperizados, com destaque aos programas de
combate à fome e à pobreza. Operava por meio de um Conselho composto por ministros
190
Refere-se à esfera não-estatal correspondente às iniciativas da sociedade civil voltadas para o bem
estar geral, portanto,de caráter público
219
219
e personalidades da sociedade civil, dentre artistas, pesquisadores, dirigentes e
militantes de organizações não-governamentais. Sob o mote do fortalecimento e
valorização da responsabilidade social e civil, a retórica era pelo enfrentamento
solidário no combate à desigualdade social, o que se traduziu na multiplicação de
núcleos de voluntariado pelo país e no engrandecimento do trabalho executado pelas
organizações não-governamentais. Refletia o pensamento dominante sobre a ineficácia
do Estado na produção de benefícios e serviços sociais, tendo como contrapartida
“positiva” a iniciativa da sociedade civil protagonizada pelo então aclamado terceiro
setor.
De costas para o processo que se iniciava, país afora, de adequação aos
preceitos da LOAS por parte dos órgãos gestores, conselhos em organização e entidades
socioassistenciais, ficou praticamente reduzido e vinculado ao PCS - sob a lógica
solidarista- o comando do enfrentamento (seletivo e focalista) às manifestações da
desigualdade social, traço indelével do governo FHC.
O trabalho voluntário ganhou legitimidade e legalidade por meio da Lei
9608/98 que oficializa seu caráter de atividade não-remunerada. Outra iniciativa nessa
direção foi o reconhecimento do protagonismo nascente do empresariado na resolução
de problemas sociais, conhecido como “cidadania empresarial”. O Programa
Comunidade Solidária (PCS) criou em 1997 a Associação de Apoio ao PCS, instituindo
a seleção e financiamento de programas sociais com a participação de segmentos do
empresariado.
É preciso lembrar que ambas as medidas estavam sintonizadas à tendência
mundial, na época, de dotar o terceiro setor de uma importância superlativa,
potencializada pelo ingresso do financiamento e iniciativas diretas de setores do
mercado que, por sua vez, identificavam-nas como possibilidades concretas de
aprovação pública ao associar a imagem de empresa socialmente responsável como
senha para a elevação do consumo de seus produtos.
O PCS priorizou a reformulação das regulamentações existentes sobre as
atividades das chamadas organizações não-governamentais, especialmente para
220
220
estabelecer novos padrões para o acesso à renúncia fiscal. Dessa forma, duas leis foram
instituídas, bastante favoráveis ao funcionamento das organizações não-governamentais:
a)Lei nº 9732/98: revê os mecanismos da isenção do recolhimento da cota
patronal ao INSS, incorporando na categoria difusa de “entidade beneficente de
assistência social”instituições de saúde e educação, condicionadas à cotas de gratuidade;
b)Lei 9790/99:dá uma nova qualificação às entidades sem fins lucrativos que
optarem pelo título “organização da sociedade civil de interesse público” (OSCIP). Sob
a justificativa de agilizar as parcerias com o Estado, amplia o alcance da natureza das
organizações não-governamentais para outras áreas, viabiliza a realização de parcerias
com o Poder Público de forma direta-por fora da deliberação dos conselhos setoriais de
políticas públicas-, possibilitando, ainda, a remuneração do corpo dirigente que
desenvolver projetos institucionais.
Apesar do cenário adverso de ausência de direção política e normativa para a
área, orientadora do sistema descentralizado e participativo, a realização da I
Conferência Nacional em novembro de 1995 foi emblemática na demonstração da
mobilização dos agentes sociais envolvidos e comprometidos com a perspectiva de
construir uma política nacional. Precedida pela realização de conferências municipais e
estaduais, acompanhadas da organização de fóruns estaduais e municipais que
iniciavam a aglutinação informal dos gestores governamentais, conselheiros, técnicos, a
academia e representantes de entidades sociais, a Conferência Nacional contou com
mais de mil participantes credenciados de todos estados brasileiros para o debate e
avaliação do estágio da política de assistência social, orientado pelo tema “Assistência
Social-direito do cidadão e dever do Estado”. O consenso foi em torno da eliminação do
paralelismo entre as instâncias governamentais no lugar do comando único, da extinção
do programa Comunidade Solidária e fundos de solidariedade, aprovando a necessidade
da vinculação orçamentária de 5% ao menos do orçamento da seguridade social para o
financiamento da assistência social. (Mestriner, 2001)
Em 1997, a Portaria nº 35 de 26 de dezembro regulou a 1ª Norma
Operacional Básica (NOB 01/97) e a Sistemática de financiamento da assistência social
para disciplinar o processo de descentralização político-administrativo nas três esferas
de governo, porém dotado de viés profundamente municipalista. Logo na apresentação
221
221
do documento, assinado pela então Secretária Nacional de Assistência Social, Lúcia
Vânia Abrão Costa, afirmou que
esses dois documentos tem como prioridade implementar o processo
político-administrativo da assistência social, no âmbito da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, com enfoque
municipalista...visando, sem dúvida alguma, o fortalecimento do
processo de descentralização e do poder local ou municipal, essencial
para a construção da democracia e da cidadania em nosso país.
(BRASIL, Norma Operacional Básica:5)
A NOB 01/97 previu dois níveis de gestão da assistência social: gestão
municipal e a gestão estadual (e do Distrito Federal). Na gestão estadual, a transferência
do recurso federal ficava condicionada a três situações:
-parceria de programas e projetos de maior complexidade, de caráter
nacional e de execução do ente estadual, municipal ou de ambos;
-programas e projetos estaduais prioritários, cuja complexidade e
especificidade garantissem impacto e alcance social;
-transferência de recursos do Fundo Nacional de Assistência Social para o
Fundo Estadual e deste diretamente às entidades e organizações de assistência social,
até que os municípios daquele estado federado cumprissem o disposto no Artº 30
191
da
LOAS. Aparentemente sem importância maior, esta situação revelou-se ímpar na
configuração do lugar de importância da gestão estadual na política de assistência social
da época, caracterizando esse estágio inicial da descentralização como a
“estadualização” da política.
Para compreendê-la, é interessante apontar que o período de implantação de
mais de ¾ dos Conselhos Municipais de Assistência Social (76.6%) foi entre 1995 e
1998
192
. Deve-se considerar aí a gradatividade do processo, bem como a inexistência,
até então, de Conselhos Municipais em cerca de 1301 municípios brasileiros. Nesse
191
É condição para os repasses aos Municípios, aos Estados e ao Distrito Federal, dos recursos de que
trata esta Lei, a efetiva instituição e funcionamento de:
I- Conselho de Assistência Social, de composição paritária entre governo e sociedade civil;
II- Fundo de Assistência Social, com orientação e controle dos respectivos Conselhos de Assistência
Social;
III- Plano de Assistência Social
Parágrafo único:É ainda condição para transferência de recursos do FNAS aos Estados, ao DF e aos
Municípios a comprovação orçamentária dos recursos próprios destinados à Assistência Social, alocados
em seus respectivos Fundos de Assistência Social, a partir do exercício de 1999 (acrescido pela Lei 9720,
de 30/11/98)
192
Pesquisa Fotografia da Assistência Social no Brasil na perspectiva do SUAS. MDS, NEPSAS/PUCSP,
2005
222
222
sentido, a transição para o cumprimento pleno do Artº 30 da LOAS permitiu que os
gestores estaduais mediassem a transferência de recursos federais às organizações de
assistência social, o que pode ser entendido como uma espécie de gestão direta e por
fora das gestões municipais. Mais ainda, até que o ente municipal cumprisse os
requisitos mencionados no artigo 30, a gestão completa do repasse dos recursos
orçamentários esteve a cargo do ente estadual. Por hipótese, essa competência
cumulativa pode ter gerado certa concentração temporária de poder no comando
estadual, retirado na medida em que os órgãos gestores municipais se reestruturaram
para assumir plenamente a municipalização da assistência social. De alguma forma, a
retirada dessa mediação estadual pode ter provocado o “esvaziamento” do papel
exercido pelo ente estadual, tanto pela diminuição do raio de gerenciamento político
quanto pela manipulação que esses recursos permitiam. Consequentemente, a relação
direta entre o nível federal e municipal da gestão política remove a importância primária
do ente estadual, abrindo espaço para sua acomodação e baixo protagonismo.
A II Conferência Nacional de Assistência Social (1997) contou com um
trabalho técnico de balanço dos resultados das conferências estaduais
193
que indicou o
estágio de inexistência do reordenamento institucional articulado que envolvesse o
redesenho das três esferas de poder, mais próximo da persistente prática descontínua,
fragmentada em ações focalizadas em alguns segmentos. Segundo esse estudo, apenas
46.9% dos municípios brasileiros atendiam as exigências do artº 30 da LOAS, mesmo
que 65.4% já tivessem o conselho municipal instalado, o que revela que não foi
sincrônica a implantação dos instrumentos de gestão. Somente 27% dos municípios
estavam habilitados para a gestão municipal, sob o peso da descentralização se traduzir
em repasse para as prefeituras de responsabilidades que antes eram dos Estados e da
União, assimetricamente financiados.
A SAS operava, sob forte restrição orçamentária, a gestão de serviços de
ação continuada prioritariamente dirigidos à criança, adolescente, idoso e pessoa com
deficiência, por meio de convênio com os órgãos gestores estaduais e municipais,
somado ao Programa “Brasil Criança Cidadã”. Este incluía o Programa de Erradicação
193
Realizado pelas Profas. Beatriz Paiva, Maria Carmelita Yazbek e Raquel Raichelis, por solicitação do
CNAS
223
223
do Trabalho Infantil (PETI) que atingia 3 estados brasileiros; o Programa de combate à
exploração, à violência e ao abuso sexual infanto-juvenil e Projetos de Enfrentamento
da Pobreza, voltado a subsidiar financeira e tecnicamente iniciativas produtivas, tais
como as lavouras comunitárias, projetos de geração de renda e ações sociais e
comunitárias. O benefício de prestação continuada (BPC), implantado somente em 1996
(oito anos depois de sua previsão constitucional) atingia 15.64% da demanda potencial
de idosos e 22.38% de pessoas com deficiência. (Stein, 1999)
Pela primeira vez foi regulada a Política Nacional de Assistência Social
(PNAS) em 1998, mesmo ano em que foi determinada a ampliação do intervalo de
realização de conferências de assistência social
194
.A proposição normativa tentou
avançar, em seu enunciado (estritamente), ao reconhecer que a assistência social evoluiu
de uma ótica de favor para direito social, considerando que o sistema descentralizado
estabelecia novos conceitos de participação e formação de uma rede de inclusão e de
proteção social que, no conjunto de ações intersetoriais, visava a inserção dos excluídos
do mercado e dos que estavam à margem da sociedade, dantes considerados “assistidos”
e agora cidadãos de direitos. Apesar de considerar que os contingentes populacionais
mais vulnerabilizados referiam-se às condições próprias do ciclo de vida, às situações
circunstanciais e conjunturais e às condições de desvantagem pessoal (pessoa com
deficiência), subordina-os à condição seletiva de acesso à política, pelo corte de renda
familiar (per capita de até meio salário mínimo).
Essa Política Nacional inaugural implantou as instâncias de pactuação
intergestores tripartite e bipartite, de caráter permanente, constituídas pela CIT
(Comissão Intergestores Tripartite), organizada no nível federal, e CIB’s (Comissões
Intergestores Bipartite) organizada nos níveis estaduais. A Norma Operacional Básica 2,
complementar à Política Nacional, detalhou a composição proporcional da CIT, com
três representantes, respectivamente, da SAS, dos estados e municípios, legitimando os
espaços mobilizadores de representação informal do FONSEAS (Forum Nacional de
Secretários Estaduais da Assistência Social) e FONGEMAS
195
(Fórum Nacional de
194
Lei 9720/98, transferindo a III Conferência Nacional para 2001. Para as conferências seqüentes, foi
retomado oficiosamente o intervalo bienal
195
Posteriormente foi renomeado como CONGEMAS: Colegiado Nacional de Gestores Municipais da
Assistência Social
224
224
Gestores Municipais de Assistência Social). Para a composição das CIB’s, participam
três representantes do órgão gestor estadual e seis representantes dos municípios,
indicados pela representação regional do FONGEMAS.
O FONGEMAS e FONSEAS constituem-se como espaços de mobilização
política e de aglutinação de interesses específicos de cada nível federativo de gestão,
fundamentais para a geração gradativa do acúmulo técnico necessário ao desenho do
conteúdo e estratégia do sistema descentralizado e participativo da assistência social
pública.
O FONSEAS
196
foi criado em setembro de 1994 a partir de um
desmembramento do FONSET (Fórum Nacional de Secretários Estaduais do Trabalho),
na medida em que a maioria dos órgãos gestores do campo da assistência social pública
encontravam-se vinculados a essa Pasta. É estruturado como uma organização da
sociedade civil sem fins lucrativos , com sede no Distrito Federal e está disposto em seu
Estatuto que suas finalidades são:
definir e firmar posições em torno de problemas fundamentais,
formulando diretrizes básicas para subsidiar o estabelecimento de
política básica para o setor;
fortalecer a participação dos estados federados na definição da
política de assistência social brasileira;
intensificar o intercâmbio de experiências e ações que facilitem
a solução de problemas na área da assistência social;
congregar esforços, organizar meios e captar recursos para
intensificar as ações de interesse comum;
colaborar com Ministérios da área social, apresentando
sugestões que propiciem o aperfeiçoamento e harmonização para o
bem estar social
As reuniões ordinárias eram trimestrais, alternadas em cada estado e
concomitante à realização de encontros do FONSET. Denominadas como Fóruns
Nacionais do FONSEAS, o resultado dessas reuniões era condensado em uma Carta de
expressão de pontos de luta e reivindicação junto ao governo federal e orientação ao
conjunto dos órgãos gestores estaduais e aos municipais de assistência social, no limite.
196
Dados obtidos com a assistente social Valdete de Barros Martins, ex-Superintendente da Assistência
Social do Governo de Mato Grosso do Sul, ex-Secretária interina do FONSEAS no período de 1999-2000
e volta a participar em 2006, na qualidade de gestora estadual de Mato Grosso do Sul. Portanto, as
informações colhidas referem-se a esses intervalos de participação no órgão. .
225
225
É interessante observar que a criação do FONSEAS se deu pouco tempo
após o advento da LOAS, isto é, em setembro de 1994, o que leva a supor que a
demanda pela descentralização político-administrativo da assistência social pública
impulsionou a organização dos gestores estaduais em um espaço comum de
encaminhamentos técnicos e políticos. Logo no 2º fórum nacional, realizado em março
de 1995, a carta dos dirigentes estaduais manifestava a preocupação com indefinições
advindas da extinção do Ministério do Bem Estar Social e a não-nomeação do dirigente
da Secretaria da Assistência Social (vinculada ao MPAS). Consequentemente
propunham a imediata nomeação do titular da SAS, a regulamentação do FNAS (Fundo
Nacional da Assistência Social), a indicação dos órgãos federais herdeiros dos recursos
orçamentários dos órgãos então extintos (FLBA e FCBIA) e a instituição de um
programa social emergencial, no âmbito federal, substituto à indefinição que vigorava.
Em julho de 1995 e sob a presidência do deputado federal Eliseu Padilha
(então no exercício do cargo de secretário estadual), o 3º fórum nacional realizado
externou a posição resistente dos gestores estaduais quanto ao processo de
municipalização da política nacional de assistência social que se iniciava e a anunciada
retirada do lugar de importância da esfera estadual na mediação das relações
intergestores. Na Carta de Campo Grande (sede da realização desse fórum nacional), os
“... Secretários de Estado dos Negócios da Assistência Social...” (SIC) propõem que
nenhum programa social fosse implantado nos municípios sem a participação das
secretarias estaduais, quanto a sua deliberação. Da mesma forma, a Carta do 6º fórum
nacional (1996) trouxe a reivindicação à SAS de exigência do parecer das secretarias e
conselhos estaduais da assistência social quanto aos projetos municipais, sendo essa
reivindicação aprimorada na reunião posterior realizada em Goiânia, nesse mesmo
exercício: o repasse de recurso orçamentário federal às prefeituras, pela via convenial,
se daria pela intermediação preliminar do Fundo Estadual da Assistência Social
(FEAS). As pautas subseqüentes ratificaram essa proposição, que alcançavam a
sugestão de que o repasse orçamentário da esfera federal à municipal (via
FNAS/FMAS) se desse em caráter de excepcionalidade, após a discussão com os órgãos
gestores e conselhos estaduais de assistência social (11º fórum nacional, 1997, sob a
presidência do secretário estadual de Minas Gerais, Eduardo Barbosa).
226
226
Por ocasião da primeira reunião do FONSEAS em 1998, há sinais de uma
provável mudança quanto às resistências apontadas, uma vez que os gestores estaduais
propõem manter a participação do FONGEMAS (Fórum Nacional de Gestores
Municipais de Assistência Social) nas reuniões do FONSEAS, ao considerar o novo
modelo de gestão preconizado na NOB-1. Nas reuniões seguintes (até 1999), essa
proposiçãose mesclava à esperada participação do ente estadual na definição dos
critérios de partilha de recursos orçamentários, o que, em tese, era exercido no espaço
da CIT (Comissão Integestores Tripartite).
O tema do financiamento da política nacional de assistência social
predominou em oito fóruns nacionais, dentre dez realizados, com ênfase na mediação
estadual reivindicada, ao lado de um temário variado como o estabelecimento e
melhoria de fluxos de comunicação com a SAS, a unificação dos cadastros de serviços
socioassistenciais das três instâncias intergovernamentais, a preocupação quanto à
implementação de programas federais (tal como o Programa Comunidade Solidária)
que, usualmente, prescindiam do parecer das secretarias estaduais e a constatação da
superposição de ações dentre as esferas federadas e o vazio de definições
interinstitucionais que só contribuíam para o desprestígio da área.
A ilustração desse período inicial de funcionamento do FONSEAS espelha a
fase da estadualização da política nacional, de forma mais acentuada no interstício de
1995 a 1996, além do parecer da assistente social entrevistada de que, à época, o Fórum
Nacional de Secretários Estaduais de Assistência Social se caracterizava como um
espaço contraditório onde, de um lado, se defendia a profissionalização dos órgãos
gestores (incluindo os escritórios regionais da SAS) face às exigências trazidas pela
nova regulação contida na LOAS mas, de outra parte, apoiava o projeto de lei em
tramitação no Congresso Nacional de legalização do trabalho voluntário. O Fórum
defendia a descentralização político-administrativa, porém adstrita à esfera estadual.
Nesse primeiro qüinqüênio, prevalecia a participação de deputados estaduais, federais e
primeiras damas na composição do FONSEAS, que imprimiam uma baixa mobilização
do coletivo de gestores estaduais.
O governo federal implantou, nesse momento, o Programa de Garantia de
Renda Mínima (PGRM) caracterizado pela transferência de renda às famílias com
227
227
dependentes até 14 anos de idade, residentes em municípios com receita tributária
inferior à média estadual, sendo o benefício no valor de R$ 15. No cálculo de ingresso
familiar, eram considerados valores concedidos por outros programas federais, tais
como previdência rural, seguro-desemprego, renda mínima a idosos e deficientes (como
a renda mensal vitalícia e o BPC), bem como outros oriundos de programas estaduais ou
municipais de complementação pecuniária. A meta final era atender a mais de três
milhões de famílias, o que representava um gasto social da ordem de R$1,5 bilhão.
Contudo, a gestão complexa adotada pela União envolvia a alocação de recursos
orçamentários no FNAS e sua transferência para o MEC (Ministério da Educação), uma
vez que a condicionalidade da manutenção do benefício era a freqüência escolar das
crianças e adolescentes contemplados. Mediado pelas prefeituras municipais, estava
prevista a autonomia sobre o modo de gestão do repasse e acompanhamento familiar, o
que se traduziu, na maior parte das cidades, na delegação ao órgão gestor da assistência
social local considerando que outro requisito disposto era complementar a concessão do
benefício com a assistência socioeducativa ao conjunto familiar. O apoio financeiro da
União alcançava até 50% do valor dos respectivos programas municipais, sendo o
restante de responsabilidade do município ou em conjunto com o estado. Assim, a
gestão orçamentária era indireta para o campo da assistência social federal, do ponto de
vista da coordenação nacional, e direta na execução do trabalho social, sem dúvida, sob
forte ressalva à capacidade setorial da assistência social para a eficiência do programa e
com ressalvas quanto à tutela potencial que poderia gerar nos beneficiários. A marca
mais forte desse programa foi a restrição: de acessos, de gestão e de competências
complementares entre as instâncias governamentais.
No segundo mandato de FHC, a SAS foi transformada em Secretaria de
Estado da Assistência Social (SEAS) em 1999, coordenada por Wanda Engel Aduan. A
Secretaria era responsável por implementar políticas de atenção à população mais
vulnerabilizada do país, “...aqueles segmentos que aumentam os índices de mortalidade
infantil, evasão escolar e analfabetismo...”. (Brasil, MPAS/SEAS, 2001:10). Nesse
sentido, a assistência social era considerada uma área nevrálgica para a mudança desses
números, levando a SEAS a se colocar frente a três desafios: focalizar as ações nas
regiões mais pobres, montar uma “engenharia” que atendesse à complexidade do
fenômeno da pobreza e combater a pulverização de recursos. Para isso, era fundamental
alcançar a integração entre as instâncias governamentais e destas com a sociedade civil,
228
228
além da integração setorial com a educação, saúde, cultura, esporte, meio ambiente,
habitação, trabalho e justiça.
Em 2000, a SEAS fez mudanças programáticas com o fito de se ajustar à
complexidade das diferentes realidades regionais e das diferentes situações de exclusão,
agravadas por discriminação sexual, racial e étnica. Os serviços de ação continuada para
o atendimento de crianças de zero a seis anos, pessoas com deficiência e idosos eram
executados diretamente pelo gestor estadual e municipal ou por meio de uma rede
prestadora de serviços, composta pelas entidades sociais, estritamente. Essa definição
impedia a amplitude de se evoluir para uma rede socioassistencial pública, referenciada
na complementariedade de iniciativas governamentais e não-governamentais, nas
diferenças regionais, colocando-se como reiteradora da tendência de compra de vagas
da iniciativa privada, segundo essa concepção.
O repasse de recursos federais ficava condicionado à existência dessa rede.
Dada a fragilidade de grande parte dos municípios, a proposta da SEAS foi implantar
novas modalidades de atendimento, a exemplo de: creches volantes e o atendimento
domiciliar (para criança, portador de deficiência e idoso); família acolhedora ; casa-lar ,
república, centro de convivência. Pode-se dizer que essa ampliação é positiva para o
alcance de alternativas fortalecedoras da sociabilidade e preventiva às tradicionais
práticas de asilamento.
A SEAS construiu junto aos governantes estaduais e do Distrito Federal a
criação da Agenda Social, com o objetivo de se estabelecer metas factíveis e sujeitas a
alianças ampliadas com a sociedade civil, empresariado, universidades e os diferentes
níveis de governo, para a melhoria dos serviços prestados, de alcance intersetorial. Para
a formulação dos diagnósticos regionais, os estados levaram em conta o índice de
desenvolvimento humano (IDH), considerando a conjugação dos indicadores de
longevidade, educação e renda. No final de 2000, os resultados indicaram que 25
estados e o DF elegeram o combate ao trabalho infantil como prioridade, além do
trabalho com crianças e jovens de rua. Pela ordem, outras áreas de preocupação
estabelecidas por parte dos governantes estaduais, foram o combate ao abuso e violência
sexual infanto-juvenil (21 estados), mortalidade infantil, analfabetismo, geração de
229
229
emprego e renda, pessoas idosas e deficientes, sendo a infração praticada por jovens
avaliada como prioridade por 2 estados, somente. (idem:15-16)
Mário Covas Junior
197
governou São Paulo de janeiro de 1995 a março de
2001, quando veio a óbito e foi sucedido por Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho
(março de 2001 a dezembro de 2006). O estado paulista continuava a apresentar taxas
de crescimento populacional maiores que a média nacional: enquanto aumentou 1.8%
ao ano, entre 1991 e 2000, o país cresceu 1.6% nesse quesito, decaindo, entre 2000 a
2005 para 1.6% contra 1.4% no resto da nação. Esses resultados reiteram a forte atração
exercida pelo estado no cenário nacional, o que pode ser atribuído à alta concentração
de atividades produtivas e ao elevado desempenho econômico regional. O decréscimo
populacional reflete importantes mudanças na estrutura etária da população: é visível o
predomínio de uma população adulta, em processo de envelhecimento, pois a proporção
de habitantes com mais de 60 anos passou de 6.3% em 1980 para 9.6% em 2005,
acompanhado do aumento da participação da população adulta e potencialmente ativa
(15 a 59 anos) de 60% para 66% em 2005. (SÃO PAULO, SEADE, Atlas Seade da
Economia Paulista, 2007)
Iniciou um processo de reforma e modernização administrativa, tendo em
vista as dívidas herdadas da gestão anterior. Demitiu 4 mil empregados do Baneser,
dada a constatação de que havia funcionários-fantasma por indicação de políticos e
apadrinhados. Alinhado política e ideologicamente com o governo federal, Covas
compartilhava com a postura de redução do aparelho estatal, ao implementar o
197
MARIO COVAS JÚNIOR (1930-2001) DÉCIMO-OITAVO E DÉCIMO-NONO GOVERNADOR
Períodos de governo: 01/1995 - 01/1999; 01/1999 - 03/2001 Natural de Santos, químico industrial,
engenheiro civil, pela Escola Politécnica da USP, iniciou a vida pública em 1961, como candidato a
prefeito de sua cidade. Deputado Federal em 1962 e em 1966, foi cassado pelo regime militar (1969).
Recuperando os direitos políticos em 1979, foi eleito Deputado Federal em 1982, pelo PMDB. Prefeito da
capital (1983-1985) elegeu-se senador da República (1986-1994) com a maior votação até então
registrada. Fundador do PSDB foi eleito governador, em 1994, e reeleito em 1998. Saneou as finanças
públicas, dando importante contribuição à estabilidade monetária do país. Realizou um bem sucedido
programa de desestatização. Iniciou o Rodoanel. Retomou e concluiu obras de hospitais, estradas, usinas
hidrelétricas que estavam paralisadas há muitos anos. Informatizou a administração. Implantou os
Poupatempos e o acesso a serviços públicos, via internet. Fortaleceu políticas sociais com a construção de
mais de 130 mil casas populares, a distribuição gratuita de medicamentos, o assentamento de mais de 4
mil famílias de trabalhadores rurais.Ampliou o sistema de transportes, inclusive o de metrô. Reformou a
Pinacoteca, construiu a Sala São Paulo, reestruturou a Orquestra Sinfônica do Estado. Fez do saneamento
básico e da educação marcas do seu governo. Faleceu em março de 2001, antes de completar seu segundo
mandato, sendo sucedido por Geraldo Alckmin.
230
230
Programa do Estado de Desestatização (PED), privatizando empresas e estradas
estaduais entre 1995 e 2000.
A Secretaria da Criança, Família e Bem Estar Social foi dirigida por dois
secretários: Marta Terezinha Godinho (janeiro de 1995 a novembro de 1999) e Edson
Ortega (novembro de 1999 a abril de 2001). Em 1995, a Secretaria contava com 6637
funcionários, diminuindo para 992 em 1999. (SÃO PAULO, SCFBS, Relatório de
Governo, 1999)
Em outubro de 1995, a Lei nº 9177 de 18/10/1995 instituiu o Conselho
Estadual de Assistência Social (CONSEAS) e o Fundo Estadual respectivo, reconhecido
como o órgão deliberativo, coordenador e controlador das ações da Política Estadual de
Assistência Social, portanto, dois anos após a promulgação da LOAS. Composto
paritariamente por 24 membros, 10 representantes do Poder Público provêm de
secretarias estaduais e do FUSSESP, além de representantes da Assembléia Legislativa
e universidades públicas estadual. De início, percebe-se uma desproporcionalidade na
condição de um único representante da área específica da assistência social (SCFBS),
traço comum de outros conselhos estaduais e municipais, sendo um fator de risco para o
desequilíbrio no encaminhamento das especificidades requeridas na construção,
deliberação e avaliação de um Plano de Assistência Social. Quanto a sociedade civil,
repete-se a situação do provável desequilíbrio na proporcionalidade representativa,
indicada na LOAS (artº17,§ I, II)
198
, uma vez que há 5 representantes de entidades
variadas (3 de assistência social, 1 do campo jurídico e 1 de criança e adolescente) em
contrapartida a uma representação de entidade de categorias profissionais da assistência
social, que não se assemelha a 1 representação da área patronal com referência no setor
social ou educacional. Assim, o espaço deliberativo da política estadual nasce e se
constitui com forças, pesos e medidas desiguais.
A primeira pauta de trabalho da nova gestão estadual foi promover a revisão
e qualificação das ações, programas e projetos, conferindo às ações básicas caráter
emancipador (SIC), visando atender necessidades de geração de renda, complementação
198
A Lei Orgânica orienta quanto a presença de representantes de usuários ou organizações de usuários,
entidades e organizações de assistência social e dos trabalhadores do setor
231
231
da renda familiar, capacitação e formação dos jovens para o trabalho e combate às
drogas, à prostituição e ao trabalho infantil, o que significou um aumento da ordem de
64% nos recursos orçamentários da Secretaria no período 1995-1998 e a elevação na
participação do orçamento da Pasta de 0.88% para 1.03%, respectivamente. (São Paulo,
SCFBS, Relatório de Governo, 1999) Os programas estaduais atingiram 622 municípios
(96.4% do estado), dos quais 464 encontravam-se em gestão municipal (cf. PNAS e
NOB-2)
O processo de descentralização político-administrativa se iniciou neste
período, com a municipalização de parte dos serviços próprios estaduais e orientação
técnica às municipalidades para o reordenamento necessário. Em 1996, tomou forma a
estadualização, com o repasse de recursos orçamentários da esfera federal para a
estadual e deste para os municípios, acompanhado de dificuldades burocráticas,
inconstância nos repasses financeiros, além da indefinição e resistência a novas
competências trazidas por esse processo, por parte das três instâncias governamentais
(SIC). Foram realizadas as I e II Conferências Estaduais de Assistência Social em 1995
e 1997, cujas principais conclusões apontaram para o desafio de assegurar, nos
municípios, a estrutura básica e a participação da sociedade, cabendo ao governo
estadual a garantia de recursos, agilidade e apoio técnico para desencadear os programas
e sua gestão.
O decreto nº 42826 de 21/01/1998 reorganizou a Secretaria, denominado-a
como Secretaria da Assistência e Desenvolvimento Social (SADS). Foi redefinida como
a Pasta responsável pela formulação, implantação, coordenação e avaliação da Política
Estadual de Assistência Social e também pela normatização e articulação das ações
governamentais e não-governamentais na área, além de apoiar financeiramente os
municípios. A Secretaria ficou com a seguinte estrutura básica:
-gabinete do secretário (com a Ouvidoria); CONSEAS; CEAS;
-Coordenadoria de formulação e avaliação de políticas e programas,
composta por grupos de políticas e programas relativos aos segmentos sociais atendidos
pela Pasta estadual, além de manter canais de articulação com os governos federal,
municipais e entidades sociais;
232
232
-Coordenadoria de fomento da rede de assistência social, ao qual pertenciam
grupos macro-regionais (gestores das divisões regionais), de gestão do cadastro e
registro das entidades e o Centro Pioneiro Sócio-Terápico;
-Coordenadoria de gestão de fundos e convênios;
-Instituto de Assuntos da Família;
-FEBEM
Os fundos vinculados à Secretaria eram: FIS; Fundo Especial de Despesa
(decreto nº 28081/1988); Fundo especial de Despesa do Centro Pioneiro Sócio-Terápico
Arquiteto Januário José Ezemplari; FEAS.
Está previsto no decreto a criação de um Conselho de Gestão Estratégica
como órgão colegiado de natureza consultiva, com a atribuição de discutir e avaliar
planos e programas de trabalho para a Secretaria, propor diretrizes gerais e promover a
integração de trabalho entre as diversas unidades internas. Supõe-se que tenha
substituído o Conselho Técnico Administrativo (CTA) existente, voltado ao
planejamento participativo interno e composto pelos dirigentes, consultores, convidados
especiais e demais funcionários.
Foi implantado o Plano Diretor de Informática para dotar a Secretaria com
recursos em rede informatizada interligada com os demais órgãos estaduais. A atuação
da Secretaria ficou estruturada por Programas:
-Programa da Criança e Adolescente: os serviços desenvolvidos atingiram
18.14% da demanda prioritária estadual, no intervalo 95-98, o que incluía as ações do
PETI e de atendimento aos usuários de drogas;
-Programa Família: implementado pelos projetos Fortalecendo a Família,
Complementando a Renda e Direito à Convivência Familiar. Caracterizados como ações
de transferência de renda e o atendimento socioeducativo a grupos familiares, alcançou
5.3% da demanda prioritária estadual, com recursos estaduais (98%) complementados
por verba federal;
-Programa Idoso: com ações preventivas ao asilamento, valorizando núcleos
de atendimento em meio aberto e formação de redes locais e regionais de serviços, as
ações foram desenvolvidas através de convênios com as prefeituras, o que resultou no
alcance de 17.3% da demanda estadual;
233
233
-Programa Migrante e População de Rua: por meio de parcerias com
entidades sociais, os serviços oferecidos pelo CETREM, DAIS e DAMS passaram a ser
prestados por entidades sociais conveniadas, preservando-se na gestão direta o Núcleo
Pioneiro Sócio-Terápico, atendendo a 58% da demanda estimada.
-Programa Pessoa Portadora de Deficiência: desenvolvido pelas
municipalidades, atingiu 14% da população demandatária;
-Programa Enfrentamento à Pobreza: refere-se à abertura de linhas de crédito
popular financiadores de atividades produtivas e geradoras de renda, gerenciados pelo
FIS e Banespa, atingindo 2.3% dos grupos potenciais. Em 1999, foi criada a Agência de
Desenvolvimento Social de São Paulo - Fundo de Investimento (Lei nº 10200) com o
objetivo de promover a auto-sustentação das entidades sociais e conceder crédito e
apoio técnico a projetos de produção de bens e serviços. Revogou outras modalidades
de auxílios e subvenções, o que levou a transferência das dotações orçamentárias do
CEAS à Agência.
A FEBEM iniciou a municipalização parcial dos abrigos estaduais e dos
trabalhos relativos aos jovens em cumprimento das medidas socioeducativas,
imprimindo a descentralização necessária por meio de parcerias com prefeituras e
entidades sociais. O SOS Criança deixou de prover o atendimento de recebimento e
encaminhamento, multiplicando em outras modalidades o acompanhamento dos casos
de denúncia de violência, desaparecimento de crianças e respectivas famílias. Foram
mantidas sob gestão direta da FEBEM a casa de recepção e encaminhamento (CARE), 5
casas abrigo e foram implantados projetos sociais específicos para meninos e meninas
de rua tais como:
- Banca Legal - postos avançados apoiados por um sistema móvel de
atendimento de educadores de rua inspiraram a instalação de outro projeto (Farol não é
Casa), sendo que a proposta era a reintegração familiar ou abrigamento
- Banco Legal - semelhante a um banco comercial, créditos eram gerados aos
meninos atendidos conforme o cumprimento das medidas tidas como ressocializadoras:
o não-regresso à situação de rua, retorno e permanência no núcleo familiar, ingresso e
freqüência escolar, dentre outras. No limite, o órgão gestor estadual parecia manter em
sua cultura institucional resquícios do ideário orientador das primeiras iniciativas do
governo paulista adotadas no começo do século 20, pois a complexidade dos fatores
234
234
determinantes da permanência de crianças e jovens na rua quase sempre escapam de seu
arbítrio, dadas as condições sócio-familiares contrárias a um convívio social saudável.
Apesar das mudanças estruturais e programáticas empreendidas no período
em tela, foi preservada a unidade Amparo Social que atendia solicitações dos
municípios paulistas quanto a doação de aparelhos como cadeiras de rodas, aparelhos
auditivos, próteses e órteses. Ao que parece, desenvolvia iniciativas típicas do
FUSSESP, porém na rota contrária das orientações da LOAS quanto à gestão de
benefícios eventuais, que é de competência da municipalidade assumí-la, devidamente
apoiada com recursos financeiros do órgão estadual.
O FUSSESP foi dirigido por Florinda Gomes (Lila) Covas que procurou
adotar uma nova estratégia na implementação das ações sociais do órgão, por meio de
parcerias com a sociedade civil, sem abandonar práticas tradicionais como campanhas
emergenciais. Priorizou ações voltadas à pessoa com deficiência (Estação Especial da
Lapa); para os idosos implantou o Espaço Convivência no Parque da Água Branca
(SP/SP) e, para a infância e juventude, reforçou atividades na Casa da Solidariedade dos
Campos Elíseos (SP/SP), construindo uma segunda unidade no Parque Dom Pedro, na
capital.
Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho
199
terminou a gestão Covas na
condição de governador e foi reeleito em 2002. No exercício do primeiro mandato como
deputado federal, integrou a Comissão de Saúde, Previdência e Assistência Social
responsável pelos debates relativos à primeira versão da LOAS, posteriormente vetada
pelo presidente Collor. No mandato Covas, coordenou o PED, sendo que o estado de
São Paulo foi o único a cumprir as metas de privatização determinadas pelo governo
199
GERALDO JOSÉ RODRIGUES ALCKMIN FILHO (1952) VIGÉSIMO GOVERNADOR
Período de governo: 03/2001 – 12/2002; 01/2003 - 12/2006 Natural de Pindamonhangaba, interior de São
Paulo, formou-se em medicina em 1977 pela Faculdade de Taubaté, especializando-se em anestesiologia
pelo Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo. Foi professor de fisiologia e de enfermagem
neuropsiquiátrica em Lorena. Iniciou sua vida política elegendo-se vereador (1973-1977) e prefeito
municipal (1977-1982) em sua cidade natal. Foi deputado estadual (1983-1987) e deputado federal por
dois mandatos, de 1987 a 1994. Em 1988, foi um dos fundadores do PSDB. Como vice-governador do
Estado de São Paulo, fez parte dos dois governos de Mário Covas (1994 a 2001), presidindo o Programa
Estadual de Desestatização-PED, em 1996. Com a morte do Governador Mario Covas em março de 2001,
assumiu o governo de São Paulo por vinte e dois meses, dando prosseguimento ao programa do governo
Covas, voltado para os grandes projetos de investimento no Estado. Foi eleito governador, sob a legenda
do PSDB, em outubro de 2002.
235
235
federal, dando continuidade a esse programa em seu mandato como governador eleito
(2003-2006). Preservou o programa Bom Prato, que oferece refeições balanceadas de
baixo custo, além do Banco do Povo, de concessão de crédito a pequenos
empreendedores formais e informais Instalou o Programa Acessa São Paulo com 211
infocentros com acesso gratuito à internet.
A Secretaria Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social (SEADS),
renomeada dessa forma, esteve sob a direção de três secretários estaduais: Nelson
Guimarães Proença (abril de 2001 a janeiro de 2003), Maria Helena Guimarães de
Castro (janeiro de 2003 a março de 2006) e Rogério Pinto Coelho Amato (abril a
dezembro de 2006). O Plano Estadual de Assistência Social aprovado pelo CONSEAS
para o período 2002-2006 ratifica a responsabilidade do órgão gestor estadual de
coordenar as ações de assistência social no âmbito regional, o que inclui o
acompanhamento e orientação técnica quanto aos programas federais da época
desenvolvidos nos municípios: os Núcleos de Apoio à Família, o Programa Agente
Jovem de Desenvolvimento Social e Humano, Programa Sentinela – destinado a
crianças e adolescentes vítimas do abuso e exploração sexual – além do monitoramento
e revisão da concessão do benefício de prestação continuada. Essa é uma competência
própria do ente estadual, pois, dessa forma, administra o conjunto das iniciativas das
três instâncias governamentais em seu território.
No Plano Estadual ficou estabelecido que os destinatários da política são as
famílias e pessoas em situação de risco pessoal e social com renda familiar mensal de
até dois salários mínimos, excluídas do acesso a bens e serviços, residentes em regiões
concentradoras de violência e com altos índices de pobreza. A Fundação SEADE
estimou, na época, a existência de 3.6 milhões de pessoas nessa condição, das quais
cerca de 1.7 milhões de pessoas encontravam-se em situação de indigência, pertencentes
a uma população de 36.9 milhões de habitantes. (SÃO PAULO, SADS, 2002)
Um avanço na formulação do Plano Estadual foi considerar não só os
indicadores de pobreza e miséria pelo fator de renda, mas também agregar a
classificação dos municípios paulistas pela conjugação dos indicadores de escolaridade,
longevidade e riqueza local, compostos no Índice Paulista de Responsabilidade Social
(IPRS/ SEADE) porque demonstra a incidência territorial de sub-regiões com
236
236
maior/menor vulnerabilidade. Assim, os dados aferidos apontaram que as micro-regiões
de Campinas, Baixada Santista, São José dos Campos e Ribeirão Preto deveriam ser
objeto de intervenção intersetorial e integrada por parte das três esferas de governo com
a efetiva participação da sociedade civil.
Lançado em 2001, o Programa Renda Cidadã substituiu o Programa
Complementando a Renda, o que significou transferir recursos financeiros para famílias
empobrecidas (renda familiar até 1 salário mínimo, excepcionalmente até 2 salários) por
um período de 12 meses, sujeito a prorrogação de acordo com a avaliação técnica. Em
parceria com as prefeituras e entidades sociais, os grupos familiares eram
acompanhados por meio de trabalho socioeducativo estabelecido pelo Programa
Fortalecendo a Família de forma integrada ao Renda Cidadã (a partir de 2001).
O Programa Criança Cidadã foi implantado em 2002, substituto do Serviço
SOS Criança, para atender a crianças e adolescentes que viviam nas ruas da região
metropolitana paulistana. Os vários projetos sociais da gestão anterior deram lugar à
instalação de centros de referência de atendimento ininterrupto e a casas de passagem,
(abrigos de curta permanência), além de subsidiar projetos desenvolvidos pelas
prefeituras paulistas.
A Secretaria instalou o Sistema de Informações Estratégicas com duas ações:
-o Cadastro Pró-Social com o objetivo de traçar o perfil dos beneficiários
dos programas e projetos estaduais, favorecendo com isso o diagnóstico das demandas
sociais. Essas informações obtidas complementavam o Cadastro Único federal, que era
um banco de dados dos beneficiários dos programas federais, especialmente do
Programa Bolsa Escola, alimentado com o ingresso de dados executado pelas
municipalidades. Em 2004, esse Cadastro estadual estava sendo preparado para ampliar
sua base de dados, com a inclusão de registros sobre as ações desenvolvidas pelas
entidades sociais e órgãos públicos da assistência social.
-o Sistema de monitoramento e avaliação estruturado por um conjunto de
indicadores de desempenho e de avaliação dos programas sociais, quantitativos e
qualitativos.
237
237
A FEBEM foi transferida em 2001 para a Secretaria da Juventude, mantendo
o Conselho Estadual do Bem Estar do Menor como órgão deliberativo e fiscalizador da
instituição. As diretrizes orientadoras da Fundação indicavam a continuidade da
municipalização dos abrigos, a desconcentração do cumprimento da medida de privação
de liberdade para unidades regionais e também a municipalização das medidas em meio
aberto. Percebe-se, pelos registros encontrados, que a questão do atendimento de
crianças e adolescentes em abrigos temporários tinha gestão dupla na esfera estadual,
tanto pela SEADS quanto pela FEBEM, que preservava abrigos próprios e dava apoio
técnico e financeiro para a implantação dessas unidades no interior. Gradativamente, a
instituição vai se responsabilizar somente pela questão do adolescente em conflito com
a lei.
A FEBEM estava implantando novas modalidades de atendimento como o
Núcleo de Atendimento Integrado (NAI) que se caracteriza como um espaço de
integração operacional que deve realizar o primeiro atendimento ao adolescente autor de
ato infracional. Nele, ficam sediados os órgãos vinculados a esse tipo de atendimento,
ou seja, a Delegacia especializada, Ministério Público, a Vara da Infância, a Defensoria
Pública e a possibilidade de sediar o Conselho Tutelar e o Conselho de Direitos. Outra
proposta é a Unidade de Atendimento Inicial (UAI) para os adolescentes que aguardam
a liberação após os primeiros atendimentos realizados pela delegacia especializada. A
Unidade de Internação Provisória (UIP) atende ao jovem que aguarda a sentença
judicial, pelo prazo máximo de 45 dias. De toda forma, a coexistência com grandes
unidades superlotadas, a exemplo do Complexo Tatuapé e Imigrantes (SP, capital),
conduzidas sob o binômio assistência-repressão, explodiam em rebeliões internas até
serem desativadas e o atendimento descentralizado, passando por reformulações
institucionais que deslocaram esse órgão para a Secretaria da Justiça e Defesa da
Cidadania em 2004.
Em 2003 assumiu a Presidência da República Luis Inácio Lula da Silva. O
novo governo se vê frente a um enorme desafio: inverter a agenda política nacional, até
então plenamente dominada e pautada pela preocupação com os humores do mercado,
pelo comprometimento massivo do orçamento público com o superávit primário em
detrimento da redução dos gastos sociais governamentais, uma agenda que não marca
238
238
hora para políticas como a da assistência social. O presidente Lula conclama a
sociedade para saldar um passivo histórico acumulado: o combate à fome.
A segurança alimentar adentrou, pela primeira vez, a esfera pública na
década de 40, com programas voltados ao grupo materno-infantil, sobejamente
presentes na LBA, e para estudantes com a merenda escolar. Em 1972, foi criado o
Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição - INAN – no âmbito do Ministério da
Saúde, porém foi na primeira metade da década de 90 que o tema do direito à
alimentação mudou o enfoque dos debates. (BRASIL, IPEA, 2007) Em 1993 foi
instalado o Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), no governo Itamar
Franco, por efeito indireto de ampla mobilização nacional, com a atribuição de propor
medidas de combate à fome e de promoção da segurança alimentar no país, mas foi
extinto no governo FHC, ocupando em seu lugar o Conselho da Comunidade Solidária.
O governo Lula teve início com a criação do Ministério da Assistência
Social (MAS) e do Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e Combate à
Fome (MESA), por meio da Medida Provisória nº 103 de 01/01/2003, além da recriação
do CONSEA pela Lei nº 10683 de 28/05/2003. O MAS propunha o Plano Nacional de
Atendimento Integral à Família -PAIF- trazendo a família como a base dos serviços de
ação continuada e benefícios socioassistenciais que operava, sob um orçamento de R$
5.7 bilhões.
O Programa Fome Zero instalou uma nova modalidade de transferência de
renda- o cartão alimentação – integrante das ações específicas que garantam o acesso
direto à alimentação, ao lado de ações estruturantes (dirigidas a combater as causas da
fome) e ações locais (para garantir o abastecimento alimentar em nível municipal).
Outra expressiva medida tomada nesse início de Governo foi a unificação dos diferentes
benefícios de transferência de renda existentes, com a intenção de universalizar o
alcance: em outubro desse ano, foi implantado o Programa de Transferência Direta de
Renda com Condicionalidades, o Programa Bolsa Família, inserido no desenho geral da
política de combate à fome e vinculado à Presidência da República, através de uma
Secretaria Executiva. Em dezembro, tornava-se clara a necessidade de coordenação
entre as ações do Fome Zero, o Bolsa Família e os programas e benefícios da assistência
social, do âmbito do MAS.(idem:86-87)
239
239
Um forte movimento catalizador da unificação do sistema descentralizado e
participativo da política de assistência social foi gerado pelo processo de realização da
IV Conferência Nacional de Assistência Social. Com o tema “Assistência Social como
política de inclusão: uma nova agenda para a cidadania-LOAS 10 anos”, foi deliberado
o compromisso de construção efetiva de um sistema único de assistência social baseado
na universalização do direito à proteção social fundado na cidadania, ruptura das “...
idéias tutelares e subalternas que (sub) identificam brasileiros como carentes,
necessitados, miseráveis, discriminando-os do reconhecimento de ser de direitos...”.
(Lopes, 2006:80) Era necessário provocar a integração das esferas governamentais e
não-governamentais em torno de um mesmo projeto de política pública pautado pelo
direito socioassistencial, padronizando atenções e organizando uma nova sistemática de
financiamento.
Em janeiro de 2004 a Medida provisória nº 163 criou o Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) aglutinador e articulador das
políticas nacionais de assistência social, segurança alimentar e de transferência de
renda, desenvolvidas por cinco secretarias: Assistência Social, Segurança Alimentar e
Nutricional, Renda da Cidadania, Articulação Institucional e Parcerias, Avaliação e
Gestão da Informação. Ficaram sob sua responsabilidade o Fundo Nacional de
Assistência Social e Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (e respectivo
Conselho), além dos órgãos colegiados: CNAS, Conselho de Articulação de Programas
Sociais e Conselho Gestor do Programa Bolsa Família.
O CNAS realizou reuniões ampliadas e descentralizadas para o debate da
Política Nacional de Assistência Social- PNAS/2004-, aprovada em outubro de 2004 e,
para sua regulamentação, debates complementares resultaram na proposição de uma
Norma Operacional Básica de sua regulação – NOB-SUAS, aprovada em julho de 2005.
A PNAS/2004 avança ao ressaltar a necessidade da política considerar e
respeitar as diferenças sociais na expressão das três vertentes da proteção social (as
pessoas, as circunstâncias e seu núcleo fundante, a família) no cotidiano de vida das
pessoas, pois é nele que riscos e vulnerabilidades se expressam. A correlação entre
pessoa/família e território é vital para a nova construção: as peculiaridades passam por
240
240
várias escalas, desde considerar as diversidades regionais, a diversidade de porte de
municípios, a diversidade nos arranjos familiares que se pode encontrar, considerando
as potências que possuem.
A atual Política Nacional e a respectiva NOB-SUAS geram forte ruptura
com a tendência, até então prevalente, de proposição de marcos regulatórios mais
disciplinadores do que reguladores, início de um novo paradigma técnico e político que
sustente o direito à seguridade social, à proteção social não-contributiva de todos que
dela necessitem, portanto, articulada a outras políticas do campo social, voltadas à
garantia de direitos e de condições dignas de vida. Não se trata de suprir necessidades,
somente, mas de desenvolver capacidades de acesso, de (re) distribuição dos acessos a
bens e recursos.
Assumir a centralidade sociofamiliar nas ações da Política Nacional
significa reconhecer a dinâmica demográfica e socioeconômica vinculadas aos
processos de exclusão/inclusão social, próprios da manifestação da desigualdade social
nas cidades - e seus espaços intra-municipais, intermunicipais, micro-regionais e
regionais. Mais ainda, é preciso considerar as diferenças contidas no meio urbano e
rural, as dinâmicas próprias que influenciam sobre a valorização/ precarização das
condições de vida e o fortalecimento/fragilização dos vínculos familiares, cujas
respostas de proteção social são peculiares.
Segundo dados do Atlas do Desenvolvimento Humano (2002), as cidades
brasileiras apresentam a seguinte diversidade:
-Municípios pequenos: subdivididos em porte 1 (com população até 20 mil
habitantes) e porte 2 (com população entre 20.001 a 50 mil habitantes);
-Municípios médios: com população entre 50.001 a 100 mil habitantes;
-Municípios grandes: com população entre 100.001 a 900 mil habitantes;
-Metrópoles: com população superior a 900 mil habitantes.
Os municípios de pequeno porte 1 (4018 cidades, ou seja, 73% do total de
municípios brasileiros) reúnem 20% da população brasileira, sendo que 45% de seus
habitantes vivem em áreas rurais; por sua vez, as metrópoles concentram 20% da
população, apesar de habitarem em apenas 15 cidades e a grande maioria (97%) habitar
241
241
em área urbana. Tratam-se de dois pólos diversos, que concentram quase metade da
população (40%), expostas às situações adversas porém igualmente complexas quanto à
situações de vulnerabilidades e riscos sociais. Aliado à inversão do crescimento etário
(maior aumento da população idosa), a presença da concentração da renda requer a
consideração de outros indicadores que mensurem as condições de vida de cada
território, em seu sentido amplo: redes de proteção social, precedência e presença ativa
do Estado estimuladora do acesso a bens e serviços, obstáculos geográficos e
discriminatórios ao acesso, presença de parcerias públicas afiançadoras deste acesso.
Inclui-se, neste rol de condicionantes, o papel ativo do gestor estadual que deve superar
obstáculos advindos da ausência de iniciativas locais de proteção social -básica e
especial- o que gera a necessidade de coberturas de alcance intermunicipal.
Associada à consideração diferenciada dos portes dos municípios, outra
importante inovação introduzida pela PNAS e a NOB-SUAS é a possibilidade de
adesão ao SUAS por níveis de gestão- inicial, básica e plena- o que reconhece o estágio
de organização administrativa de cada município e as diferentes capacidades de
implementação da política de assistência social, pautada então pelo gradualismo na
adesão ao sistema único. Contudo, o preenchimento dos requisitos dispostos na
regulação pode ser insuficiente para uma apropriação qualitativa do estágio municipal, o
que pode gerar a habilitação de municípios com requisitos igualmente atendidos, porém
desiguais no modo como imprimem a gestão desse requisito no cotidiano da política.
Sposati (2006:110) sugere uma escala mensuradora em cada nível, que permita um
crescimento horizontal de qualidade da gestão, antes do escalonamento vertical de
classificação do nível de gestão.
Para os estados e DF não há níveis de gestão. Há requisitos que definem a
aplicação de incentivos por parte da União e a condição do órgão estadual como
coordenador da Política Nacional em seu território. A NOB-SUAS prevê a construção e
celebração do Pacto de Aprimoramento da Gestão Estadual e do DF com o gestor
federal, com vistas a adequação dos órgãos executivos estaduais e do DF ao pleno
exercício da gestão da assistência social no seu âmbito de competência. Nos dois anos
do SUAS foram debatidos aspectos que esse processo envolve, sendo regulamentados
pela CIT em setembro de 2006 (Resolução nº 5); e celebrados ao longo de 2007.A cada
242
242
dois anos os Pactos serão avaliados e renovados, obedecendo o primeiro e terceiro ano
de mandato do governo estadual e do DF (BRASIL, MDS, 2006).
O atual marco regulatório leva em conta as diferenças dos entes federativos
em cada nível e entre si, o que estabelece de forma hierarquizada e complementar as
competências e responsabilidades próprias para instalar, regular, manter e expandir as
ações de assistência social como dever de Estado e direito do cidadão à proteção social
pública de seguridade social e à defesa da cidadania do usuário.
A NOB-SUAS dá destaque ao fato de que o pacto federativo necessário à
sustentação do SUAS requer a objetivação de vários elementos:
-o conhecimento quanto à presença e prevenção de riscos e vulnerabilidades
sociais da população: delimitar quais situações de riscos e inseguranças constituem-se
campo da proteção social não-contributiva;
-caracterizada essa demanda, qual é o grau de cobertura da rede
socioassistencial existente;
-construção sincrônica de metas;
-trato eqüitativo dos municípios, das micro-regiões dos estados, dos estados
e regiões nacionais;
-defesa dos direitos socioassistenciais;
-o padrão de financiamento e o controle social.
É possível afirmar que o processo de realização da V Conferência Nacional
de Assistência Social (2005) foi decisivo para a delimitação de metas e do campo dos
direitos socioassistenciais, em uma perspectiva temporal de alcance. A VI Conferência
Nacional (2007) foi pautada pela avaliação do estágio de alcance, em escala nacional,
das metas acordadas e da materialização dos direitos, construindo para tal os principais
desafios a serem enfrentados para o avanço do SUAS. Por sua vez, está em curso a
elaboração do SUAS Plano 10, que será o primeiro Plano Nacional do campo da
assistência social pública, em uma perspectiva igualmente temporal de alcance até 2015.
Um grande avanço da PNAS e NOB-SUAS foi delimitar as funções da
Assistência Social entre a proteção social, a vigilância social e a defesa de direitos. Mais
ainda, clareia o tipo de proteção social a ser afiançada pela assistência social pública,
243
243
hierarquizada entre proteção social básica e proteção social especial (de média e alta
complexidade). A proteção socioassistencial refere-se ao conjunto de ações, atenções,
cuidados, benefícios e auxílios ofertados pelo SUAS para redução e prevenção do
impacto das circunstâncias sociais e naturais ao ciclo de vida, à dignidade humana e à
família. A proteção social básica (PSB) é de caráter preventivo às situações de risco a
que estão expostas pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social, decorrente
da pobreza, da privação (de renda e/ou acesso aos serviços públicos) e também pela
fragilização de vínculos afetivos- relacionais e de pertencimento social. A proteção
social especial (PSE) é voltada a prover ações socioassistenciais aos grupos
populacionais que já se encontram em situação de risco pessoal e social, decorrente do
abandono, de maus-tratos físicos e psíquicos, outras situações de violência (doméstica,
sexual), de conflito com a lei, de situação de rua, de exploração pelo trabalho infantil. O
desenho da arquitetura do SUAS ganha contornos nítidos ao se estabelecer a
importância de uma sólida rede de proteção socioassistencial que articule os benefícios
e serviços que a compõe, a partir de unidades blicas estatais de ingresso à PSB e PSE,
exercidas pelos Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), respectivamente.
É nessa medida de graduações de complexidades das situações de risco que
se delimita a possibilidade de que municípios de pequeno porte, por exemplo, e/ou pelo
nível de gestão, não reúnam condições e/ou demanda que justifique a oferta de serviços
especiais de média e alta complexidade. Pode existir também a situação de municípios
que ofertem serviços de referência de alcance regional, voltados à atenção de sua
população e a de municípios vizinhos. A iniciativa de acordos de cooperação federativa,
como consórcios públicos ou acordos intermunicipais, pode partir dos próprios
municípios como também, e principalmente, ser objeto de iniciativa do governo
estadual em estimular, coordenar e co-financiá-los, ou até mesmo prestar os serviços de
alcance regional, exercendo sua vocação na promoção do desenvolvimento regional. Na
escala territorial das metrópoles, a gestão regional das demandas de proteção
socioassistencial que leve em conta os municípios de seu entorno também requer a
presença ativa e coordenadora do ente estadual. Outro importante papel do ente estadual
é fazer a gestão dos recursos federais destinados ao co-financiamento das ações
continuadas da política de assistência social dirigidos aos municípios não-habilitados
244
244
em gestão inicial, básica e plena, bem como dar suporte técnico à elevação da condição
de gestão dos municípios para sua habilitação.
Dois avanços significativos para a gestão do sistema único foram
introduzidos:
- o co-financiamento da PNAS é pautado agora por pisos de proteção social
básica e especial, hierarquizados de acordo com a complexidade de ofertas do serviço
socioassistencial, o que supera o arcaico padrão de financiamento por valores per capita.
Os repasses financeiros ganharam agilidade e transparência em sua gestão a partir de
sistemas informatizados e interligados;
- os instrumentos de gestão estão apoiados pelo sistema de informação
REDE SUAS como suporte para a administração, monitoramento e avaliação da
política.
As principais ações que compõem a Secretaria Nacional de Assistência
Social, responsável pela coordenação da PNAS, são:
-Benefícios: subdivididos em eventuais (de execução dos entes federados) e
de prestação continuada. Além do idoso, foi implantado em março do presente exercício
o Programa de acompanhamento e monitoramento do acesso à escola das pessoas com
deficiência beneficiárias do BPC/LOAS (BPC na Escola). Estende a concessão do
benefício a crianças e adolescentes, prioritariamente;
-Proteção Social Básica: CRAS-PAIF: trata-se do Programa de Atenção
Integral a Família, serviço continuado de proteção social básica desenvolvido nos
CRAS que confere a centralidade familiar como eixo das atenções socioassistenciais
preventivas à incidência de riscos; Agente Jovem: dirigido a jovens de 15 a 17 anos para
o desenvolvimento de experiências práticas de protagonismo juvenil, envolve
transferência de renda (bolsa agente jovem) e a realização de ações socioeducativas;
serviços específicos e continuados para crianças, idosos e suas famílias; PROJOVEM:
Projovem adolescente é um dos 4 eixos do Programa Nacional de Inclusão de Jovens,
lançado em setembro de 2007, visa criar oportunidades para jovens entre 15 a 29 anos
promover o aumento da escolaridade, formação profissional e o desenvolvimento
humano, por meio de serviços socioeducativos e transferência de renda;
-Proteção Social Especial: a) serviços de média complexidade - oferecem o
atendimento a indivíduos com seus direitos violados cujos vínculos não foram
245
245
rompidos. Compreende o PETI, o CREAS, o Serviço de enfrentamento à violência,
abuso e exploração sexual (Sentinela) e serviços específicos para pessoas idosas e com
deficiência, atendidos em meio aberto; b) serviços de alta complexidade – para o
atendimento às famílias e indivíduos com grave violação de direitos, sem vínculos
familiares e comunitários, compreende o albergue, o atendimento integral institucional
(abrigo), casa lar, família acolhedora, república, moradia, casa de passagem.
Em 2006, cerca de 57 milhões de brasileiros integravam os programas e
serviços das áreas da assistência social, transferência de renda e segurança alimentar do
MDS. Os recursos financeiros investidos foram da ordem de R$ 23 bilhões, o que
corresponde a um aumento de 23% em relação a 2005 (R$17,8 bilhões). As ações da
Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), desenvolvidas por meio dos
programas, projetos e serviços socioassistenciais atingiram mais de 15 milhões de
pessoas, com o aporte de recursos da ordem de mais de R$12,5 bilhões, somado ao
alcance do benefício de prestação continuada que atingiu 2.7 milhões de idosos e
pessoas com deficiência. Cálculos da Fundação Getúlio Vargas demonstram que, pela
primeira vez, a taxa de pobreza em 2006 ficou abaixo de 20% da população, o que
equivale a uma redução de cerca de 15% em relação a 2005, sendo que essa queda, para
o período de um ano, é recorde na série histórica do levantamento, iniciado em 1992.
Pelos dados do IPEA, quase 10 milhões de brasileiros ultrapassaram a linha da pobreza
e mais sete milhões saíram da condição de indigência no período de 2003 a 2005.
A evolução recente da queda do número de indigentes e pobres no país, entre
2001 e 2005 é significativa: em 2001, eram 16.5% e 36.5%, respectivamente ao passo
que, em 2005, correspondiam a 11.3% e 30.1% (BRASIL, IPEA, 2007:81-82).
Pode-se afirmar que a inversão de pauta da agenda política nacional precisa
continuar e apoiada por um conjunto de medidas governamentais que crescerão em
resultados à proporção do vulto do federalismo cooperativo.
Sob a gestão de Maria Helena Guimarães de Castro, a SEADS implantou
uma nova modalidade contratual com os municípios, implementada em 2004 e
substituta de inúmeros instrumentos conveniais que regulavam as relações de parceria:
trata-se do convênio único, dotado de um repasse financeiro de cobertura global às
246
246
diferentes iniciativas desenvolvidas, gerando maior autonomia ao ente municipal na
gestão das despesas, por meio de planos municipais informatizados. O critério de
alocação do recurso é balizado pelo Programa Estadual de Proteção Social Básica
(assistência em meio aberto) e Especial (contempla as ações de acolhimento e
abrigamento). Esse formato é semelhante ao utilizado no SUS e mais adequado à
aplicação em demandas locais específicas, sobretudo porque supera a tradicional
pulverização financeira e programática.
Foi criada a Rede Social São Paulo no ano de 2004, com o objetivo de
integrar e articular programas intersetoriais, convergindo as atuações de diferentes áreas
do governo estadual, dos governos municipais, de organizações da sociedade civil, do
empresariado paulista e suas fundações, conselhos de assistência social, de direitos da
criança e do adolescente, conselhos tutelares e demais conselhos sociais. Cabe à SEADS
coordenar, estimular e apoiar a cooperação. As primeiras ações desenvolvidas foram de
capacitação de profissionais de entidades sociais da capital sobre alimentação saudável,
em parceria com a Nestlé do Brasil e o Projeto Cidadão do Presente, com o apoio do
SEBRAE, Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho, prefeituras do Vale do
Ribeira (SP), Ministério da Assistência Social e FAO/ONU. Em 2004, esse projeto
atendeu 1233 famílias de 12 municípios de menor índice de desenvolvimento humano
municipal (IDH-M) para a capacitação e apoio de empreendimentos sociais que
revertam em trabalho e renda. A capacitação dos conselhos municipais de direito da
criança e do adolescente e conselhos tutelares também ocorreu (SÃO PAULO, SADS,
2004).
É fato que a Secretaria estadual adotou instrumentos de gestão que conferem
agilidade e racionalidade nos trabalhos da esfera estadual e municipal, especialmente
pela adoção do convênio único e o cadastro pró-social. Em 2002, a quase totalidade dos
municípios (642) encontravam-se qualificados para o processo de municipalização.
Todavia, projetos sociais não foram municipalizados para não sofrerem solução de
continuidade ou mesmo mudanças que alterassem seus objetivos e público-alvo, pois
eram projetos que envolviam outras secretarias estaduais (IDEM:16). A
intersetorialidade não se define pela restrição, pelo contrário, é possível alcançá-la pela
via da ação federativa cooperativa,ou seja, secretarias municipais e estaduais
articuladas.
247
247
Em 2005, a SEADS foi reorganizada, cuja estrutura administrativa se
mantém atualmente. O decreto nº 49688 prevê: Gabinete do Secretário, CONSEAS,
Conselho de Administração e Orientação da Agência de Desenvolvimento Social de São
Paulo - Fundo de Investimento. As Coordenadorias são: Gestão Estratégica, Ação
Social, Desenvolvimento Social e de Administração de Fundos e Convênios.
A Coordenadoria de Gestão Estratégica opera o Cadastro Pró-Social
200
,
desenvolve estudos e pesquisas que subsidiem a Pasta, monitora e avalia os programas e
projetos. A Coordenadoria de Ação Social responde pela interiorização do órgão gestor,
gerenciando as 26 Diretorias Regionais de Assistência e Desenvolvimento Social
(DRADS). A Coordenadoria de Desenvolvimento Social responde pelas articulações
interinstitucionais junto aos Conselhos e órgãos públicos.
Essa nova organização modifica, pela primeira vez, a matriz dominante
incidente nas gestões estaduais anteriores pois as atividades-fim das estruturas antigas
se concentravam em dois eixos: atendimento social e ação comunitária/regional. Já em
1998, mudanças parciais ocorreram, quando as unidades estaduais da CETREM, DAIS
e DAMS foram conveniadas, mas continuaram sob gestão direta o Centro Sócio
Terápico e o Amparo Social, promotoras do atendimento social direto de casos. Agora,
essa responsabilidade encontra-se municipalizada, exigindo a adaptação do órgão para
funções de coordenação, monitoramento e avaliação das alianças e parcerias públicas
que compõem a Política Estadual de Assistência Social, preferencialmente dirigidas à
regionalização.
A gestão de Maria Lúcia Guimarães Ribeiro (Lu) Alckmin no FUSSESP
priorizou projetos de geração de renda, implantando 10 mil padarias artesanais em
fundos municipais, escolas, penitenciárias, hospitais, unidades da FEBEM, dentre
outros. Criou 11 mil casas de brinquedo (brinquedotecas) e deu continuidade aos
programas iniciados por Lila Covas: as Casas de Solidariedade, a Estação Especial da
Lapa e o Jori - Jogos Regionais do Idoso.
200
Paradoxalmente , concede a inscrição às entidades e organizações de assistência social, bem como a
sua suspensão, cancelamento, restabelecimento e indeferimento. Trata-se da preservação do antigo
cadastro e registro das organizações de assistência social que, a rigor, deveria se dar somente no conselho
de assistência social
248
248
Em 2006, José Serra
201
assume o governo paulista. As principais iniciativas
de seu programa de governo são: Programa Acessa SP (meta de implantar 57 novos
infocentros); 10 metas para o ano 2010 (programa da área de educação com metas de
melhoria de resultados); moradias (regularização fundiária, urbanização de favelas e
ações para públicos específicos (idoso, pessoa com deficiência e servidor público);
ensino técnico e tecnológico (aumentar o número de faculdades de tecnologia-FATEC-
e escolas técnicas estaduais – ETEC); Fundação CASA (continuidade à construção
descentralizada de novas unidades, com pequena capacidade de internação);
Poupatempo (ampliação do número de postos de atendimento); Rodoanel (continuidade
às obras em andamento); rodovias (construção do Rodoanel Mário Covas e Ferroanel);
saúde (criação de 40 ambulatórios médicos de especialidades, ampliação do Dose Certa,
auxílio mensal para custeio a hospitais filantrópicos, fábrica de vacinas e Programa
Paulista de Saúde da Mulher).
A lei nº 12469 de 22/12/2006 altera a denominação da FEBEM-SP, que
passa a denominar-se Fundação Centro de Atendimento Sócio-Educativo ao
Adolescente-Fundação CASA-SP. Consequentemente, o Conselho Estadual do Bem
Estar do Menor é renomeado como Conselho Estadual de Atendimento Sócio-Educativo
ao Adolescente.
Foi mantido na condução da SEADS Rogério Pinto Coelho Amato. As
inovações introduzidas, na nova gestão, referem-se ao Programa Ação Jovem 2007, que
é a revisão e acréscimo de condicionalidades ao anterior Projeto Ação Jovem de
transferência de renda a jovens entre 15 e 24 anos. Outra meta se propôs a transformar o
Pró-Social em um portal público de informações, em tempo real, da ação social do
governo paulista. A Secretaria integra um programa desenvolvido entre órgãos
201
Graduado em Economia no Chile, onde na condição de exilado político durante a ditadura militar
brasileira, foi professor e funcionário das Nações Unidas. Exilou-se também nos EUA, onde fez mestrado
e doutorado. Em 1978 voltou ao Brasil, tornando-se professor da Unicamp (SP), pesquisador do
CEBRAP e editorialista do jornal Folha de São Paulo. Elegeu-se deputado federal constituinte em 1986 e
reelegeu-se em 1990, sendo relator dos capítulos de Orçamento, Tributação e Finanças. Em 1994 foi
eleito senador e, no governo FHC, foi Ministro do Planejamento e Orçamento para depois assumir a Pasta
da saúde. Em 2004, foi eleito prefeito de São Paulo (SP), realizando um programa de reforma tributária
local, além de investimentos na saúde, proteção social e educação
249
249
estaduais, municipais e organizações sociais parceiras denominado Virada Social,
voltado à segurança e melhoria da qualidade de vida em bairros e comunidades, a partir
de indicadores do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS).
Encontra-se, em fase de planejamento, a construção do Índice de
Vulnerabilidade Familiar, em parceria com a Fundação SEADE (São Paulo, D.O.E.S.P.,
2008:6-7). O órgão gestor paulista confirma o compromisso com o Sistema Único de
Assistência Social ao celebrar o Pacto de Aprimoramento da Gestão Estadual para o
período 2007/2008, expressando como pauta prioritária um conjunto de iniciativas
voltadas progressivamente para o desenvolvimento social por meio da inclusão
produtiva e geração de trabalho e renda que, ao lado de ações assistenciais, propiciem
ao cidadão (...) construir seu caminho de sucesso e autonomia. (SÃO PAULO, SEADS,
Pacto de Aprimoramento da gestão estadual 2007/2008 : 8).
Para o alcance da meta pactuada, as diretrizes estratégicas adotadas pela
Pasta paulista são:
- a inclusão social:é desenhada na perspectiva da universalização, propondo
tornar o indivíduo alcançável pelas demais políticas setoriais na construção da
cidadania, removendo os obstáculos que impedem o acesso a bens e serviços;
- a regionalização: o papel conferido à Secretaria estadual fica restrito à
proposição, ao incentivo e articulação de parcerias com vistas à geração de renda,
principalmente, além de coordenar e avaliar os resultados e divulgar experiências
exitosas. A iniciativa direcionada ao bem estar dos indivíduos deve partir dos
municípios, mobilizando recursos por meio de parcerias.
Dentre os objetivos expostos no instrumento do Pacto de aprimoramento,
consta a intenção do órgão estadual de efetivar ações regionalizadas e estadualizadas de
proteção social especial de média e alta complexidades, traçando a meta de 10 CREAS
regionalizados.
-integração: significa reconhecer que a base territorial dessa estratégia se dá
no município, voltada ao tratamento integrado das ações e programas da rede de
proteção social;
-parcerias e ações integradas com os setores governamental, empresarial e
não lucrativo: a parceria entre o setor público e privado é considerada como via única
para aumentar a eficiência das iniciativas.
250
250
O co-financiamento é pautado pelas demandas oriundas dos Planos
Municipais, processadas pelo Sistema de Informações Estratégicas Pró-Social, com a
previsão de se manter os mesmos valores orçamentários de 2007 para 2008, com
recursos oriundos do FNAS e FEAS. Para o quadrênio 2008-2011, a proposta é de
expansão de 10% dos recursos estaduais, sendo que a previsão orçamentária da fonte
estadual, contida no Pacto, totaliza R$ 128.502.873,00.
Quanto às estratégias programáticas previstas no Pacto, o Programa de
Proteção Social Básica será garantido por meio de benefícios eventuais e os Programas
Renda Cidadã, Enturmando/Clube da Turma, Ação Jovem, Geração de Renda,
associados às iniciativas federais: PAIF, Agente Jovem, Bolsa Família
.
O FUSSESP está sob a direção de Mônica Serra, que imprimiu a mudança
do nome, adotado oficiosamente: Fundo de Solidariedade e Desenvolvimento Social e
Cultural do Estado de São Paulo. Segundo a primeira dama, o motivo é de deliberada
opção política, entendendo que a ação do Fundo não se reduz a medidas de caráter
assistencial, trazendo a cultura como meio de inserção das pessoas dela marginalizadas.
(Folha de São Paulo, 2007). Dá continuidade às ações desenvolvidas por sua
antecessora, iniciando a capacitação de agentes multiplicadores, desenvolvida para
lideranças comunitárias e entidades sociais da capital paulista e cadastradas no
FUSSESP, com o fito de ampliar as oportunidades de trabalho e de aumento da renda.
É possível apresentar a configuração do modelo estadual de gestão da
assistência social estatal paulista. Desde sua gênese, a prevalência da atenção à infância
e adolescência pauperizada ocorre de forma alternada quanto ao grau de priorização que
recebe, o que não significa a responsabilização direta por parte do estado de garantir
proteção a esse grupo social: o subsídio estatal às entidade sociais sempre esteve
presente para tal incumbência. Uma matriz de responsabilidades da esfera paulista
mostra que as competências predominantes exercidas são: o apoio técnico e a subvenção
às entidades sociais, o atendimento direto a segmentos sociais de maior vulnerabilidade
e a regulação sobre formas diretas e indiretas na atenção a grupos especiais. Essa matriz
prevaleceu praticamente por 6 décadas (até1998), quando o processo de
municipalização da Política de Assistência Social no território paulista encontrava-se
251
251
consolidado e, com isso, permanece no âmbito de competência da esfera estadual a
atenção ao adolescente infrator para o cumprimento de medidas socioeducativas de
privação e restrição da liberdade, ainda que exercida em outro setor de política pública–
justiça e defesa da cidadania.
Por sua vez, a partir da gênese da institucionalidade da assistência social em
São Paulo, é mantida uma tendência separatista no trato da criança e do adolescente,
caracterizada por um movimento de separação e aproximação contínuo entre ambas,
alcunhada como “migração de campo” de forma assistemática. Ambas as áreas
convivem com a ação da primeira dama estadual, sediada em lócus imutável pela sua
natureza fundante, que não passa pela mesma rotatividade de sede administrativa: a
assistência social transitou pelas áreas da Justiça, Saúde e Trabalho, ao passo que
infância e adolescência foi alocada pelas Pastas da Justiça, Assistência Social, Menor e
Juventude.
Os eixos prioritários na condução das provisões da assistência social pública
são datadas e coincidentes, na maioria das vezes, à duração de governos. A título de
exemplo, em 1937 a ênfase foi a valorização do Serviço Social de Família, em 1952 era
o entrosamento com as obras sociais, em 1967 foi a ação comunitária e atendimento de
casos, chegando ao período de 1967-1975 com a priorização dos consórcios
intermunicipais de promoção social. A interiorização do órgão gestor iniciada na década
de 50 aproxima atualmente as relações federativas estado-município, fortalecidas por
meio de dois instrumentos de gestão: o convênio único e o cadastro pró-social.
réguas do tempo
O percurso histórico delineador da memória institucional empreendido
nesse trabalho permite ser visualizado por meio das réguas do tempo, tratadas como
ferramentas de apoio e que expressam, pela ordem de apresentação, a evolução da
institucionalidade da assistência social brasileira no plano federal, considerando a
mutação histórica constitutiva da institucionalidade no âmbito federal.
A segunda régua diz respeito à trajetória própria de conformação da Legião
Brasileira de Assistência, configurada pelas datações que imprimiram mudanças
institucionais. A terceira régua desenha a construção paralela do percurso de outro
órgão federal, a FUNABEM, que trilhou o processo de migração de campo semelhante
252
252
à esfera paulista, porém de menor intensidade, no movimento de convivência/separação
com a LBA.
A quarta régua refere-se à conformação da institucionalidade do campo da
assistência social no estado de São Paulo, disposta em dois períodos (1902-1995; 1996 a
2005), que permite visualizar os movimentos de aproximação e distanciamento
institucional do campo da criança e do adolescente com a área da assistência social
pública paulista, ou seja, a caracterização paulista da migração de campo entre ambas.
A quinta régua especifica a evolução da institucionalidade da ação da
primeira dama no aparelho do estado de São Paulo, sintetizando as principais
ocorrências de acordo com os mandatos.
253
253
(1) Poderio dos governadores no âmbito nacional
(2)Poderio dos governadores no âmbito interno dos estados federados
Federalismo Estadualista (1)
1902 1931 1936 1938 1942 1959 1967 1975 1977 1994 1995 1997 2004 e 2005 2006
Escola
Correcional
Quinze de
Novembro
(RJ)
LBA
integra o
SINPAS
NOB - RH
FUNABEM no MPAS
1932 - Criação Instituto Sete de Setembro
LBA vai para Min. Trab. Prev. Social
(1) Poderio dos governadores no âmbito nacional
(2)Poderio dos governadores no âmbito interno dos estados federados
2000
2003 Ministério
da Assistência e
Promoçáo Social
1980
FUNABEM:
vinculada à
SAS (MPAS)
Min. Habit. E
Bem Estar
Social :
SEAC,
FLBA,
FUNABEM
CNAS
substitui
o CNSS
LOAS
Min. Bem
Estar
Social
(FLBA e
FCBIA)
Extinção
da LBA,
FCBIA/Min.
SAS no
MPAS
RÉGUA DO TEMPO
MUTAÇÃO INSTITUCIONAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA: INSTITUCIONALIDADE FEDERAL
VARIÁVEIS INFLUENTES NA GESTÁO ESTADUAL
1998
Início
Redemocratização
brasileira
1985 1988
Ultra presidencialismo
estadual (2)
DITADURA MILITAR
1989
paralelism
o da
SEAC /
FUNAC
Entinção
MHAB e Bem
Estar Social:
órgãos vão
para Min.
Interior.
FLBA passa
para MPAS.
A SEAC
transformada
em SEHAC
(Habit. E
Ação
Comunitária)
Criaçáo
do
MPAS
(e SAS)
1ª PNAS /
NOB 2.
CIT e
CIB´s
Ministério do
Desenvolvimento
Social e Combate à
Fome/SNAS
PNAS (2004)+
NOB/SUAS (2005)
1º NOB +
MPAS -
SAS
(
Secr.
Assistênci
a Social)
1974
LBA vinculada à
SAS (MPAS)
1982
CONSTITUIÇÃO
1990
Primeiro PL da LOAS é
vertado.
FUNABEM é extinta e
substituída pela FCBIA
+ LBA: Integradas ao
Ministério da Ação
Social
1993
Declaraçao
dos Direitos
da Criança
(ONU)
1941
Criação do
Serviço de
Assisncia ao
Menor (SAM)
(substitui
Insittuto 7 de
setembro) e XV
de Novembro
1964
Extinção do SAM e
Criação da
FUNABEM
(Ministério da
Justiça)
1ª revisão
Estatutos
LBA
1946
1999
-
C
r
i
ã
o
d
a
Secretaria de
Estado da Assist.
Social
MPAS -
Secr.
Estado
Assistência
Social
1927
Código de
Menores
1ª Escola de Serviço Social
CRIAÇÃO DA
LBA
(Departamento
Nacional da
Criança)
CNSSCaixa de
Subvençóes
LBA
transformada
em Fundação
1969
254
254
Recursos da Uniáo
Recursos dos IAP´s
Recursos da Loteria Esportiva
LBA: Fundaçáo
Governo Collor Governo Itamar
1946 1966 1969 1977 1985 (*) 1988
reestruturao
das finalidades
LBA: assistência
à maternidade e
infância
Criação
INPS
1967:
MTPS
nova
reestruturaçao:
assistência
promocional =
proporcionar
condóes para o
trabalho e
subsistência da
populaçáo
carente
Criada a Secretaria
Especial de Ação
Comunitária (SEAC)
e FUNAC
Min Hab
e Bem
Estar
Social
(MBES)
Ministério
da Açao
Social
(FLBA)
Ministério
do Bem
Estar
Social
(FLBA)
Dá origem à
Secretaria
Especial de
Habitaçao e
Açao
Comunitária =>
1988: Ministério
da Habitaçao e
Bem Estar
Social (FLBA
vinculada)
FLB
A
(*) 1985: a) Estrutura de execuçao direta de programas.
8006 servidores
26 supertintendências regionais nas capitais
288 Centros Sociais
616 Unidades de Açao Comunitária
1067 Núcleos de Voluntariado
b) Execuçao indireta de programas: Convênios com entidades públicas e privadas -> 1986= 9692 convênios
Estrutura
: - 21 diretorias estaduais; - coordenaçáo regiáo metropolitana RJ; - 3 Diretorias Territoriais; - Diretoria BSB;
Obras
próprias
: - 2 Educandários; - 2 Escolas Artes Gráficas;- 137 Centros Sociais (que comportam Unidades Operacionais de Medicina,
Servo Social, Educaçáo para o Trabalho e Jurídico - legal); -3 Casas da Criança; - 2 Casas Maternais; - 71 Postos de
Puericultura; - 18 Maternidades; - 9 Hospitais; - 1 Centro de Hidrataçáo e Recuperaçáo;
RH:
4500 servidores diretos; 4500
(
servi
ç
os de terceiros
)
TOTAL
: 2400 obras
p
p
rias e alheias
RÉGUA DO TEMPO: TRAJETÓRIA DA LBA: ASCENSÃO E QUEDA
1970: Receitas FLBA:
- subvençóes Uniáo,
Estados ou
Municípios;
- contribuiçóes de
pessoa física ou
jurídica de direito
público ou privado;
- rendas patrimoniais
e eventuais;
- outras receitas
estabelecidas em Lei
LBA
1989 - Entinção MBES - FLBA vai para Min. Interior
e depois para MPAS.
Extinçáo da
FLBA.
Criaçáo dos
ERSAS -
Escritórios
Regionais
de
Assistência
Social
Integra o
SINPAS -
Sistema
Nacional de
Previdência e
Assistência
Social. LBA
financiada pelo
FPAS.
Servos
médios e
hospitalares
passaram para
INAMPS
19951974
MPAS -
Subordinada à
SAS - Secretaria
da Assistência
Social. Criação
Fundo Apoio
Desenv. Social
(FAS)
1990
Recursos do Fundo de
Previdência e Assistência
Social - FPAS (dp= Fundo
Nacional da Açao
Comunitária FUNAC)
1938
CNSS
19931942
LBA
(Departa
mento
Nacional
da
Criança)
255
255
1890 1902 1927 1932 1941 1959 1964 1970 1979 1980 1982 1985 1988 1995
Primeiras
leis para
organiz
ão
Justiça e
Assist. á
Infância e
Adolescê
ncia
Escola
Correcion
al Quinze
de
Novembr
o (RJ)
Código de
Menores:
menor
abandona
do ou
delinquent
e, menor
de 18
anos =
proteçáo
= caráter
policial e
punitivo
Criaçáo do
Serviço de
Assistência
ao Menor
(SAM)
Assembléia
Geral da ONU
aprova a
Declaraçáo
dos Direitos da
Criança e
Cidadania à
criança =
Estado é
responsável
pelo seu bem
estar
Extinçáo SAM
e criaçáo da
FUNABEM
(Ministério da
Justiça)
1ª FASE:
atençáo na
organizaçá
o da nova
estrutura
institucional
2ª FASE:
hegemoni
zaçáo
(corpo
técnico +
PNBEM)
- vinculada à
Secretaria de
Ass. Social
(MPAS);
- compos o
SINPAS;
- início da
desorganizaçá
o e fase de
politizaçáo;
- alteraçáo
Código de
Menores
aumenta a
competência
do Judiciário
(agrava
tendência
internamento)
Distribuiçáo
recursos de
forma
eleitoral
- 21 entidades
educacionais
(internato, semi
-
int, etc),
menores de 6-
18 anos
abandonadose
autores de ato-
infracional;
- 26 escritórios
regionais;
- 2695
funcionários;
- 2786
convênios
(1986)
extinçao
j
unto com
FLBA
1975 - Migra para MPAS
Criação do Inst. 7
de Setembro
substitui o
Inst. 7 de
Serembro e
incorpora o
Inst. Xv de
Novembro e
outros 3
serviços
sociais
RÉGUA DO TEMPO: FUNABEM
1990
Passa a se
denominar
FCBIA
(Fundaçáo
Centro
Brasileira
para
Infância e
Adolescên
cia)
- transformaçáo do modelo
CARCERÁRIO em novo modelo
TERAPÊUTICO -
PEDAGÓGICO
(A QUESTAO DO "MENOR")
1. Repasse convenial a projetos
de assistência dos Estados
(pelas FEBEMs), municípios e
entidades
2. Funçáo normativa + projetos
exper. Particulares
Constituiçáo
Federal
.
Vai para Min.
Habit. e Bem
Estar Social
- FUNABEM = definiçáo e
implantaçáo da Política Nacional
do Bem Estar do Menor
(PNBEM)
256
256
1902 1934 1935 1950 1967 1968 1971 1973 1984 1987 1989 1992 1993 1995
Instituto
Disciplinar e
Colônia
Correcional
(Chácara do
Belém/
Tatuapé)
Serviço de
Reeducação
dos Menores
Criaçáo
da
Secretaria
de
Promoçáo
Social -
SPS.
Recebe o
Fundo de
Imigraçáo e
Colonizaçáo
Secretaria
+ Conselho
de
Promoçáo
Social
Criaçáo da
Secretaria
do Menor
Fusáo: SPS
+ Secretaria
do Trabalho
Separaçáo
Vinculada
à Secr.
Justiça
(1974)
1990 -
Secr. do
Menor.
1993 -
Fusão
Secretarias
2001 -
Secr.
da
Juventu
de.
2004 -
Secr.
Justiça
Defesa
Cidadania
1976 - F. PRÓ-
MENOR passa a
denonimar-se FEBEM.
2006 - FEBEM
passa a
denominar-se
Fundação
CASA-SP
- inicia
descentralizaçáo
programas da S. Menor
na Capital -
qualificaçáo às
Prefeituras para
cumprimento do ECA
Criaçáo do
- IAFAM
(Instituto de
Assuntos da
Família) -
extinto em 98
- FIS (Fundo
de
Investimento
Social) -
extinto em 99
Fusáo:
SPS +
Secretaria
Menor =
Secretaria
da
Criança,
Família e
Bem Estar
criaçáo do CTA
(Conselho
Técnico
Administrativo da
SCFBES) para
planejamento
participativo
interno
- inicio da
municipalizaçáo
- criaçáo do
CONSEAS
(Cons. Estadual
A. Social) e
FEAS (Fundo
Estadual)
- realiza
ç
áo I
1975 -
Vinculada
à SEPS.
- Conselho Estadual Auxílios e
Subvençóes (Casa Civil). Extinto
1999
Programa de
Recuperaçáo
de RH -
transferido
para SPS.
SPS absorve
a FEBEM
- Departamento Imigraçáo e
Colonizaçáo (Secretaria de
Agricultura)
A
bsorve:
- Departamento
Imigraçáo e
Colonizaçáo se
transforma no
Departamento de
Migrantes -
DAIS +DAG
- Serviço e Conselho Social de
Menores (Secretaria de Justiça)
1938: Muda a
denominação:
Departamento de
Serviço Social
Secretaria
da Saúde
e
Assistênci
a Social:
Passa a
denominar
-
se Serviço
Social do
Estado.
SSMenore
s fica
vinculado
à Secr.
Justiça
1960 - Criação do
Conselho Estadual de
Auxílios e Subvenções
(CEAS)
Departamento de
Assistência Social
(Secretaria de
Justiça e Negócios
do Interior) -
absorve o Serviço
de Reeducaçáo do
Menor, criado em
1934
- Serviço Social do Estado
(Secretaria de Saúde Pública)
- inicio da
municipalizaçáo
- criaçáo do
CONSEAS
(Cons. Estadual
A. Social) e
FEAS (Fundo
Estadual)
- realizaçáo I
Conferência
Estadual A.
Social
Criaçáo da
Fundaçáo
Paulista de
Promoçáo
Social do
Menor
(PRÓ-
MENOR)
19941947 1975
Década de 50:
acordo governo
estadual X
municipal/SP =
atendimento
direto =
competência
órgáo gestor
estadual
RÉGUA DO TEMPO
Institucionalidade Estadual de São Paulo (1902-1995)
257
257
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Capacitaçáo
técnico-
gerencial a
494
municipios
+ extinçáo do IAFAM + extinçáo FIS
- processo
municipalizaçáo
612 Municipios
- realizaçáo III
Conferência
Estadual de A.
Social
-Programa Renda
Cidadã substitui
Complementando a
Renda
- Criaçáo do PEFI
(Parque Estadual
Fontes do Ipiranga)
= ex-Febem
Imigrantes
- Denominação:
Secretaria Estadual
de Assistência e
Desenv. Social
- processo
Municipalizaçáo
atinge 603
Municipios.
- implantaçáo
Programa SOS
Bombeiros no
Resgate de
Cidadania
(crianças de 10 a
15 anos)
- Nova estrutura
organizacional
- Contrato BID para
execuçáo do
Projeto de
Avaliaçáo e
Aprimoramento da
Política Social de
SP
- implantaçáo de
sistema
informatizado para
Plano Municipal de
Assistência Social
descentralizaçáo
das açóes
federais para
instância estadual
- aceleraçáo processo
municipalizaçáo (172
municipios)
- realizaçáo da II
Conferência Estadual A.
Social
- implantaçáo do Programa
de Atençáo à Família -
incorpora IAFAM e
desenvolve:
1) complementando a
renda;
2) fortalecendo a família
- processo
municipalizaçáo
atinge 642
municipios.
- Programa Criança
Cidadá substitui o
SOS Criança
(criança rua,
RMSP)
- Programa Espaço
Amigo (atividades
sócio-educativas)
- Programa
Criando Asas
(PPD 0 a 6 anos)
Reordenamento Institucional:
- divulgaçáo P.B.S.P.
assistenciais e critérios de
concessáo;
- Sistema de Informaçóes
Estratégicas;
- Cadastro Pró-social
(registro instituiçóes,
programas, famílias e
benefícios)
- Indicadores desempenho
base unificada
-Capacitaçáo PSB-PSE
- Instituiçáo do Convênio
Único (instrumento único
parceria com Municipios)
- Instalaçáo da REDE
SOCIAL SÁO PAULO
(aliança governo estadual,
iniciativa privada e entidades
do 3º setor)
- implantaçáo do
Convênio único de
Proteçáo Social
- Capacitaçáo em
gestáo social
(técnicos, gestores,
conselheios em
545 Municipios)
reestruturaçáo para
Secretaria de
Assistência e
Desenvolvimento
Social
cria a Agência
de Desenv.
Social - FI,
recebe
dotações do
CEAS
RÉGUA DO TEMPO
Institucionalidade Estadual de São Paulo (1996-2005)
258
258
(*1)
Finalidades:
- Prestar assistência econômica, educacional, médico-hospitalar e sanitária aos necessitados
- Manter vinculos estreitos com órgáos de assistência social, particulares ou governamentais, nos assuntos pertinentes
- Conhecer e cooperar com os programas de órgáos governamentais de assistência social
- Distribuir, de acordo com critérios e normas previamente ficadas, recursos financeiros e materiais a entidades assistenciais que se dediquem a atividades educacionais, médico-hospitalares e outras de natureza social
-
M
an
t
er a ass
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s
nc
i
a soc
i
a
l
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t
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(*2)
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l
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t
e
d
o
E
s
t
a
d
o;
Finalidades
(*)
Modifica finalidades (*1) Decreto 35374 (*2)
1968
(Abreu Sodré)
1973
(Laudo Natel)
1983
(Montoro)
1984 1992
(Fleury Filho)
1993 1998
(Covas)
2000 2002
(Alckmin)
2007
(Serra)
Criaçáo do
Fundo de
Assistência
Social do
Palácio do
Governo
muda: Fundo
Social da
Solidariedade do
Estado de SP
Gerenciamento do material excedent
e
- competência:
Receitas:
- controbuiçóes, donativos e legados de PF ou PJ de direito privado;
- auxílios ou subvençóes concedidas pela Uniáo ou pelos Estados e Municipios, bem como por autarquias
- os juros de seus depósitos
- materiais inservíveis doados pelo Estado;
- quaisquer outras receitas que legalmente lhe possam ser incorporados
(*)
- Prestar assistência econômica educacional e médica-hospitalar aos necessitados
- Manter a assistência social e o Posto de Hidrataçáo do Palácio do Governo
- Prestar assistência econômica às entidades assistenciais devidamente registradas nos órgáos da Secretaria de Promoçáo Social
- Prestar assistência econômica às entidades privadas que se dediquem a atividades educacionais e médico-hospitalares
Antes: Fundação Plano de Amparo Social (PAS)
" … conceber, implementar e desenvolver, isoladamente ou em
cooperaçáo com outros órgáos e entidades de promoçáo social,
programas e serviços de atendimento e assistência à populaçáo carente
do Estado, em consonância com a política estadual de assistência
social, nos termos do art. 8º da Lei Federal 8742, de 07/12/93 - LOAS"
- 1 dos 7 membros do Conselho Deliberativo é indicado pela Secretaria
Estadual de AssistÊncia e Desenvolvimento Social
- prestar apoio técnico, econômico-financeiro e operacional a entidades regularmente cadastradas junto à Secretaria da Criança, Família e Bem Estar-Social e a Fundos Sociais de Solidariedade legalmente instituídos
em municìpios do Estado
Direçáo: Conselho
Deliberativo, com 7
membros sob a
presidência da
esposa do
Governador do
Estado "ou outra
pessoa de livre
escolha deste".
amplia finalidade:
… manter a
Assistência Social,
o Posto de
Hidataçáo do
Palácio do
Governo e a
Fazenda Sáo
Roque (Franco da
Rocha
)
(mantém) vinculaçáo à Secretaria de
Estado de Governo, que responde por
3 unidades orçamentárias:
- Secretaria do Ewstado de Governo
- Fundo Social de Solidariedade
- Instituto Paulista de Adoçáo
- Condicionalidades
para cessáo de bens
móveis às entidades:
- documentaçáo ou
- registro na
Secretaria Promoçáp
Social (CAR ou
Conselho Estadual
Auxlios e
Subvençóes)
- dispensa de
apresentaçáo de
documentaçáo pelas
Prefeituras
RÉGUA DO TEMPO: O LUGAR DA 1º DAMA
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL - SÃO PAULO
Ratifica as
condicionalidade
s para cessáo
dos bens móveis
Fundo de Solidariedade e
Desenvolvimento Social e Cultura
do Estado de Sáo Paulo
(www.fundosocial.sp.gov.br)
(inservível) = FUSSESP
Necessidade de
integraçáo do FUSSESP
às diretrizes fixadas pela
LOAS:
259
259
V. Considerações finais
A busca da nacionalização da gestão da Assistência Social
A análise realizada neste estudo permite apreender que a evolução histórica
das institucionalidades paulista e federal do campo estatal da assistência social
obedecem a fatores de múltipla ordem, por vezes sincrônicas. A gênese da iniciativa
estatal dessas esferas coincidem no tempo (começo do século 20) e no fator
determinante (pressão direta das elites e indireta da sociedade por responsabilizar o
Estado pela tutela assistencial à criança e adolescente enjeitada e/ou delinqüente), ainda
que sob a forma de unidades públicas de serviços. A ocorrência dessa similaridade,
alcunhada como coincidência, se deve a fatores externos do âmbito federativo de
relações intergovernamentais, determinada pelo pensamento dominante da época.
A exposição da pesquisa desenvolvida ao longo dos capítulos construiu
elementos para o desenho da matriz fundante da presença da gestão estadual da
assistência social. O conhecimento dessa matriz contem elementos explicativos não só
do presente como dos elementos de continuidades e/ou rupturas para que ocorra a
identidade de gestão estadual com o Sistema Único de Assistência Social
coincidência da data base com diversidade de alcance de gestão
São Paulo instala em 1935 o primeiro órgão gestor da assistência social
pública, responsável por segmentos sociais diversos e pauperizados, definindo-se
gradativamente pela importância do atendimento individual de casos de diferentes
grupos sociais ocorrer na abordagem do indivíduo em família. No âmbito federal, a
LBA é criada 7 anos depois, inicialmente para uma ação emergencial e de cunho
campanhista, reformulando após o fim da guerra mundial sua estratégia de trabalho. A
primeira aproximação entre os dois órgãos ocorre na instalação da Comissão Estadual
da LBA, em 1942, com a cessão de técnico do órgão estadual para o apoio dos
trabalhos, pautado por relações de vizinhança no lugar de uma ação programática
conjunta.
260
260
Além do binômio materno-infantil, os dois órgãos caminham pela via
prioritária da subvenção às obras sociais e pela via secundária de organização de
serviços próprios, com o diferencial do comando administrativo: enquanto o órgão
gestor paulista não teve à frente a primeira dama estadual, a LBA se definiu pela
prevalência dessa coordenação - é congênita a sua natureza.
A esfera estadual teve como desenho permanente do campo da assistência
social a organização técnico-administrativa definida pela variação, na forma, na
intensidade e no tempo, de interferências no modo de gestão desse campo institucional.
Caracteriza-se pela dispersão funcional, programática e orçamentária, dada a
convivência intermitente com o campo próprio da criança e do adolescente, com o
paralelismo de iniciativas que marca a co-relação com a institucionalidade da ação da
primeira dama e a associação heterogênea na gestão que provoca a definição do lócus da
assistência social pública estadual pelo nomadismo administrativo: caminhou vinculada
à Justiça, à Saúde, à área do Trabalho, passou pela identificação com uma área definida
pela família e criança e hoje é definida pelo paradigma do desenvolvimento social..É
possível afirmar que o nomadismo administrativo se deve a uma indefinição quanto ao
possível lócus próprio da assistência social, marcada em sua conformação histórica pela
tendência de atribuição multitemática, na medida em que a vinculação imediata de sua
natureza é a atribuição do atendimento à pobreza, à múltiplas manifestações da
desigualdade social, caracterizada por uma linha indelével que separa, de forma
precária, a inicativa privada sem fins lucrativos da iniciativa pública governamental
Predomina na esfera paulista a matriz triangular de responsabilidade que
cobre sua história até o início do processo de municipalização em 1995, que indica a
definição do objeto de sua competência e as formas prevalentes de respostas. Assim ,ao
amparo social a casos (atendimento de caso), o serviço assistencial de permanência mais
duradoura na estrutura técnico-administrativa do órgão gestor paulista é o Plantão
Social. À atribuição de apoio às entidades sociais corresponde os mecanismos de
incentivo à iniciativa privada sem fins lucrativos como a isenção tributária e a
transferência direta financeira pela prestação de serviço de atendimento regulado pelo
convênio, a subvenção que independe da contrapartida do atendimento de casos e o
cadastro institucional para ambas as situações. A responsabilidade pela atenção a grupos
sociais especiais em situação de extrema vulnerabilidade social, que requerem a atenção
261
261
em instituições totais nos sistemas de internato e semi-internato, o órgão gestor divide a
prestação direta com a indireta ofertada pelas entidades sociais.
. Já na esfera federal, ocorre a bifurcação da assistência social pública a
partir de 1964 com a criação da FUNABEM. Os dois entes federados se estruturam
sobre o pilar da subsidiariedade mesclada à iniciativa direta, trilhando uma rota comum
de trabalhos somente para a questão da criança e adolescente com a criação das
FEBEMs, sob a coordenação técnica da FUNABEM.
Debater o modo de gestão estadual da Política Nacional de Assistência
Social implica conhecer a evolução dos marcos regulatórios que delimitam a
competência comum dos estados.
A Constituição Federal de 88 confirma o caráter federativo da política de
assistência social, então reconhecida como política de seguridade social e a LOAS
estabelece as competências específicas de cada ente federado, prevendo o comando
único em cada esfera governamental, e reconhece, como instância deliberativa do
sistema descentralizado e participativo, os Conselhos de Assistência Social organizados
em nível municipal, estadual e nacional. Representa o trânsito para o modelo de
nacionalização tripartite, ascendente e participativo.
A LOAS (Artº 13) inicia a inscrição das responsabilidades da esfera
estadual, gradativamente detalhadas nos instrumentos regulatórios sequentes:
...I-destinar recursos financeiros aos municípios, a título de participação no custeio do
pagamento dos auxílios natalidade e funeral, mediante critérios estabelecidos pelos
Conselhos Estaduais de Assistência Social;
II- apoiar técnica e financeiramente os serviços, programas e os projetos de
enfrentamento da pobreza em âmbito regional ou local;
III- atender, em conjunto com os municípios, às ações assistenciais de caráter de
emergência;
IV- apoiar técnica e financeiramente as associações e consórcios municipais na
prestação de serviços de assistência social;
V- prestar os serviços assistenciais cujos custos ou ausências de demanda municipal
justifiquem uma rede regional de serviços, desconcentrada, no âmbito do respectivo
Estado...
O co-financiamento de benefícios eventuais e participação direta em ações
intermunicipais em rede já circunscrevem, então, duas das maiores responsabilidades da
esfera estadual já em 1993, ratificadas posteriormente na NOB-SUAS.
262
262
A NOB 01/97 clareia os requisitos norteadores da gestão estadual,
assegurando a descentralização da execução direta com a reserva da prestação de
serviços de âmbito sub-regional, a partir de uma rede regional de serviços, o que evolui
do apoio apontado na LOAS para a execução direta por parte do ente estadual. Assegura
o compromisso de dotação orçamentária específica e da definição da Política estadual
alinhada à Política Nacional de Assistência Social. A PNAS de 1998 e a NOB-2
acrescentam a competência de coordenar a Política e o Sistema Estadual de Assistência
Social e articular-se com outras políticas públicas visando a inclusão dos destinatários
da assistência social. A NOB-SUAS adiciona às competências definidas o
gerenciamento dos recursos federais e estaduais destinados ao co-financiamento dos
municípios não-habilitados aos níveis de gestão e dá ênfase às ações regionalizadas de
proteção social especial de média e alta complexidade.
Dessa forma, não existe uma imprecisão na definição de competências que
cabe à esfera estadual na gestão da assistência social pública. Entretanto, as normas
configuram-se como uma abstração jurídica de uma realidade que, por sua vez, é muito
mais complexa do que a norma, dada a dinâmica de múltiplos fatores sócio-culturais,
políticos, econômicos que incidem sobre ela. Consequentemente, a processualidade de
sua aplicação nem sempre retrata a intenção dos marcos regulatórios e, desta feita, os
espaços de controle social da política e a renovação periódica da pactuação intergestores
estadual com o federal são fundamentais para a unidade do sistema único.
É de interesse analisar o perfil histórico dos estados, a partir de categorias
comparativas que indiquem a possibilidade de semelhança entre matrizes de
responsabilidades, a alocação administrativa no aparelho dos estados e a incidência da
organização administrativa trifurcada.
Rio Grande do Sul
A primeira iniciativa na área da assistência social do governo gaúcho foi a
criação do Serviço Social de Menores (SESME), em 1945, vinculado ao Departamento
Estadual da Saúde. Da mesma forma que São Paulo (Instituto Disciplinar) e o governo
federal (Escola Correcional Quinze de Novembro), a situação da criança e adolescente
263
263
desvalida fundou a iniciativa do RS, sob o código da punição regulada como
instrumento corretivo e moralizador. Atendia a infância e adolescência abandonada e
autora de ato infracional. Nas unidades do SESME a punição tinha a função de
domesticação e de moralização da conduta do "menor" interno, sendo que as regras para
manutenção da disciplina compunham um Regulamento. O trabalho compulsório era
uma forma de castigo, ao passo que o trabalho remunerado era considerado um prêmio
(Ertzogue, Maria Haizenreder, 1999).
É possível detectar, pela régua do tempo do RS (anexo a seguir), a alta
mobilidade administrativa e a vinculação permanente a outra área de política pública,
com a predominância do trabalho. O percurso histórico indica que a assistência social
coabita o mesmo lócus administrativo da criança e adolescente, porém em sub-
estruturas diferentes e separadas. A primeira dama estadual atua oficiosamente por meio
de campanhas esporádicas. Portanto, as três áreas existem e, de certa forma,
desarticuladas entre si.
Em 1959, o SESME foi absorvido pela Secretaria do Trabalho e Habitação
e, em 1964 foi substituido pela Fundação Sul-Riograndense de Assistência
(FUNDASUL), que continuou a atender o mesmo grupo social, o que, por hipótese,
resulta da implantação da FUNABEM. A Secretaria foi renomeada como Secretaria do
Trabalho e Ação Social (STAS) em 1969: o binômio trabalho-assistência dividia a
proteção ao trabalhador com assistência ao menor de idade, o desvalido (adulto) e ação
comunitária, o que a deixa na mesma condição do estado paulista em 1989.
Dois anos depois, essa Secretaria deu lugar à Pasta da Justiça, do Trabalho e
da Cidadania, responsável pelo desenvolvimento comunitário, ação social, assistência e
profissionalização do “menor abandonado”, dentre outras. Em 1995, passou por outra
mudança compondo a Secretaria do Trabalho Cidadania e Assistência Social, alocada
em um Departamento próprio (Departamento de Assistência Social-DAS), quando foi
iniciado o processo de preparação dos municípios para a implantação do sistema
descentralizado e participativo, com a criação de conselhos, fundos e planos municipais
de assistência social.
264
264
Em 1992, a LBA regional impulsionou uma ampla mobilização para a
instalação do Comitê Interinstitucional de Articulação da Assistência Social-CIAS/RS,
envolvendo universidades, órgãos de classe, órgãos governamentais para o apoio ao
processo de municipalização e articulação interinstitucional de implementação da
política de assistência social.
Vinculados à Secretaria, estavam a FEBEM e FGTAS (Fundação Gaúcha do
Trabalho e Ação Social). A FEBEM foi renomeada como FASE em 2002 (Fundação de
Atendimento Sócio-Educativo) e a FPE (Fundação de Proteção Especial) foi criada para
o atendimento de criança e adolescente em situação de extremo risco.
No biênio 2005-2006, a principal atribuição do DAS era implementar a
política de assistência social nos municípios, por meio de assessoria técnica, processos
de capacitação , co-financiamento- em 2005, o orçamento da Pasta correspondia a 14%
do orçamento geral da secretaria, contra 50% destinados à área do trabalho e geração de
renda. (RS, STCAS, 2006). Foram implantados 3 CREAS regionais, sob a coordenação
indireta do órgão estadual (a coordenação executiva ficou para a prefeitura-sede do
serviço de referência regional) e a implementação do Programa estadual de
enfrentamento à violência e exploração sexual infanto-juvenil, de caráter intersetorial,
foi desenvolvido, por meio de seminários, encontros de capacitação e planejamento
local integrado. Trata-se de atribuições próprias do ente estadual, dependente de um
aporte maior de recursos orçamentários para o co-financiamento da Política Estadual.
Essa questão foi indicada como uma dificuldade e ação prioritária não-realizada na
garantia dos direitos socioassistenciais aos usuários da Política de Assistência Social,
apontada nas conferências municipais de assistência social de 2007 (CEAS/RS,
Relatório final da VII Conferência Estadual de Assistência Social, 2007)
A partir de 2007, o DAS fica vinculado à Secretaria da Justiça e do
Desenvolvimento Social. No Pacto de Aprimoramento de Gestão da Política de
Assistência Social no Rio Grande do Sul (2007:13), há menção sobre o
contingenciamento de recursos do estado gaúcho, o que o leva a integrar e articular
políticas públicas. Uma estratégia de ampliação dos recursos apontada é a
disponibilização de uma Carteira de Projetos Sociais para financiamento direto do
terceiro setor, por meio de incentivo fiscal às empresas. A Lei de Solidariedade
265
265
(estadual) possibilita o repasse de recursos diretamente às entidades do terceiro setor
que integram a rede de proteção social. Trata-se de uma medida indireta do
financiamento público que deveria reservar a alocação financeira e deliberação do
financiamento à esfera competente – no caso, o Conselho e Fundo Estadual de
Assistência Social. Caso contrário, representa uma via terceirizada da subsidiariedade
estatal.
266
266
1959 1964 1969 1975 1991 1992 1995 2001 2007
É absorvido pela
(Secretaria dos
Negócios do Trabalho
e Habitaçao)
Delimita a área
de
competência:
LBA: Comitê
Interinstittucional de
Articulaçao da
Assistência
Social(CIAS)
Criaçao da
Secretaria do
Trabalho,
Cidadania e
Assistência
Social
(STCAS)
1º Plano
Estadual de
Assistência
Social
FEBEM=
exclusividade
na execuçao
de medidas
sócio-
educativa
Secretaria do
Trabalho e Açao
Social (em 1969)
Vinculam-se
Febem e
FGTAS
Criaçáo do
DAS -
Departamento
Assistência
Social
órgáos vinculados: 1991 - Extintas e fundidas na FGTAS (Trabalho e Açao Social)
- Fundaçao Gaúcha do Travalho (criado em 66)
- Fundaçao sul-riograndense de assistência (menor abandonado) - (criado em 64)
FEBEM -RS
(Executora da
PNBEM da
FUNABEM)
Extinçao antiga
Secretaria e criaçao da
Secretaria da Justiça e
do Trabalho e da
Cidadania +
pulverizaçao açoes nas
Secretarias de
Educaçao e Saúde
Mudança para
a Secretaria
de Justiça e
Desenvolvime
nto Social
Mudança da
Estrutura do
DAS - atender
aos programas
estaduais em
andamento e
estruturar o
Programa de
Garantia de
Renda Mínima
Familiar
1999
DEPAS
(Depto. de
Assistência
Social da
Secretaria
do
Trabalho e
Habitaçáo
1945
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL / RIO GRANDE DO SUL
2002
Criadas:
-Fundaçao
Proteçao
Especial do
RS (medidas
de proteçao)
- FASE -
Fundaçao
Atendimento
Sócio-
educativo do
RS, substituto
da FEBEM
1996
Serviço Social
de Menores
-
Departamento
Estadual de
Saúde
Muda nome
para
Secretaria do
Trabalho e
Ação Social -
STAS
- órgáos centrais
promoçao social
- assistência ao
trabalhador
- assistência ao menor
- habitaçao
267
267
Santa Catarina
A institucionalidade da assistência social nesse estado inicia na década de
60 do século passado e, em um período de quase 50 anos, sofreu várias mutações,
praticamente a cada novo governo, o que pode ser considerada como uma expressão da
associação heterogênea na gestão, ou sejam múltiplas associações a diferentes campos
de políticas públicas.Outra peculiaridade regional se dá pela associação de sua
identidade com o desenvolvimento comunitário, seguido da convivência administrativa
com os mais diferentes setores de políticas públicas – saúde, trabalho, habitação,
desenvolvimento urbano, meio ambiente. Pode-se dizer que a tendência prevalente, na
maioria dos estados, é a matriz assistência social e trabalho: estava presente em 14
estados no período 2005-2006, sendo que em 8 estados o órgão gestor era constituído
somente pela área de assistência social (BRASIL, MDS 2006)
A origem do órgão gestor se deu com o Departamento de Assistência Social
vinculado ao setor de saúde no começo dos anos 60. Na primeira metade da década de
70, compõe a Secretaria dos Serviços Sociais, dando ênfase ao Plano Preventivo da
Marginalização do Menor e cooperou, técnica e financeiramente, com o trabalho da
primeira dama desenvolvido no órgão PROMENOR, voltado à orientação profissional
de jovens. No governo seguinte, ocorreu a compactação de vários órgãos da
administração pública na Supervisão da Ação Comunitária e foi criada a Fundação
Catarinense do Bem Estar Social, executora regional da Política Nacional do Bem Estar
do Menor (FUNABEM). Na seqüência, foi criada a Secretaria do Bem Estar Social
responsável pela política de promoção social catarinense, que implantou o programa de
desenvolvimento de comunidade através da Fundação Catarinense de Desenvolvimento
de Comunidade, dos centros sociais urbanos (CSU) e centros comunitários. Aqui se
detecta a presença de duas fortes iniciativas federais da época, orientadas pela
FUNABEM e LBA (CSU). Mais um governo e a Secretaria do Bem Estar Social mudou
para Secretaria do Desenvolvimento Social. No período 1987-1991, nova reforma
administrativa renomeia-a como Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento
Comunitário para, em seguida, se chamar Secretaria da Habitação e Desenvolvimento
Comunitário.
268
268
Note-se que, em todo esse “mover-se”, a competência da assistência social
era atrelada à organização e desenvolvimento comunitário, matriz hegemônica da
identidade institucional catarinense, de forte influência na conformação da
responsabilidade estatal da época. Designada como Secretaria de Desenvolvimento
Social e Família, a assistência social foi vinculada à pasta do desenvolvimento social,
urbano e meio ambiente (em 2003): aqui, a competência de formular e executar a
política estadual da promoção social ficou separada da política de garantia de direitos da
criança e adolescente. Concomitantemente, a descentralização da administração pública
catarinense ganhou vulto, com a criação de 36 Secretarias de Desenvolvimento
Regional: distribuídas nas regiões administrativas do estado, compostas por todos os
setores de políticas públicas e mantidas as secretarias temáticas na direção técnica. Esse
desenho de administração pode aproximar, de fato, a presença do governo estadual dos
territórios locais, ser um facilitador para a relação inter-federativa estado-município,
efetivador da intersetorialidade, o que deve levar em conta o possível tensionamento
entre a estrutura regionalizada e a setorial centralizada no estado.
Dentre as competências da Secretaria do Desenvolvimento Social, Trabalho
e Renda, em 2005, ficou estabelecido: aplicar a normatização e regulação das ações de
proteção social do Sistema Único de Assistência Social- SUAS- e do Sistema Estadual
do Trabalho, Emprego e Renda; elaborar subsídios para a gestão, monitoramento e
avaliação das ações de proteção social do Sistema Único de Assistência Social e do
Sistema Estadual de Trabalho, Emprego e Renda.
Por fim, em 2007, a atual Secretaria de Assistência Social, Trabalho e
Habitação, a qual está vinculada a Diretoria de Assistência Social, anunciou a
competência de cumprir o disposto no artigo 13 da LOAS. A Secretaria Executiva de
Políticas Sociais de Combate à Fome, pertencente a primeira, descentralizou nas
Secretarias Regionais gerências da Pasta, para garantir a presença, inclusive, da área da
assistência social.
269
269
1971 1974 1975 1978 1979 1983 1986 1987 1990 1991 1994 1995 1999 2002 2003 2006 2007 2010
Criaçáo Secretaria dos
Serviços Sociais
Supervisão da
Ação Comunitária
vinculam-se:
-COHAB
-FUCABEM
-FUDASESC
+ criaçáo de Coordenadorias
Regionais
a) in Assistencia Social:
- extinçáo Coordenandorias Regionais
Plano Preventivo da Marginalizaçáo do Menor: - criaçáo 29 Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR)
- ampliaçáo Educandário
XXV de Novembro
- implantaçáo Cenbtro Educacional para menores com problemas de conduta
- construçáo Centro de Recepçáo e Triagem para Menores
- cooperaçáo técnica PROMENOR, entidade presidida pela 1ª Dama - orientaçáo profissional de menores
b) COHAB/SC
Programa de Desenvolvimento e Organizaçáo Comunitária em Cobjuntos habitacionais
Criaçáo da Secretaria de Estado de Assistência Social, Trabalho
e Habitaçáo:
- políticas estaduais de assistência social; trabalho e renda;
habitaçáo
- intersetorialidade
+ Secretaria Executiva de Políticas Sociais de Combate a Fome
- DIRETORIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL:
- gerência de Política de Assistência Social
- gerência de Proteçáo Social Básica
-gerência da Proteçáo Social Especial
- gerência Centro Educacional Dom Jaime
de Barros Câmara
- gerência Centro Educacional Sáo Gabriel
Secretaria Estado de Habitaçáo e
Desenvolvimento Comunitário - SHD
- política habitacional -
saneamento básico -
organizaçáo e desenvolvimento comunitário
- assistência social
- organizaçáo e proteçáo do trabalho
- apoio do cooperativismo e ao associativismo
Secretaria de Estado do
Desenvolvimento Social e da
Família: -
política estadual de promoçáo
social - política
defesa e garantia dos direitos da
criança e do adolescente
- planejar e coordenar a aplicaçáo
de recursos para AUXÍLIOS E
SUBVENÇÓES A ENTIDADES
PARTICULARES DE
CARÁTER ASSISTENCIAL
-
p
olítica de habitaçáo
- organizaçáo e proteçáo ao
trabalho
2005
Criada a Secretaria de Estado do
Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda:
- políticas estaduais de assistência social,
trabalho, emprego e renda, habitaçáo
+ 1SDR = 30 SDR`s
Secretaria de Estado do
Desenvolvimento Social, Urbano e
Meio Ambiente - SDS
Secretaria
Desenvolvim
ento Social e
da Família
Secretaria
Desenvolvimento Urbano
e Meio Ambiente
Criaçáo Secretaria do Trabalho e
Desenvolvimento Comunitário para:
- mercado de trabalho
- relacionamento com as entidades
sindicais e de classe
- formaçáo e aprimoramento de
recursos humanos -
assistência e promoçáo humana
- organizaçáo e desenvolvimento
comunitário - atendimento
ao menor em situaçáo irregular
- artesanato
+ extinçáo das 3 Fundaçóes:
FUCABEM, FUDASESC, FUCAT
Departamento
Assistência Social
(Secretaria da Saúde
Secretaria do
Desenvolvimento
Social: criaçáo da
FUNABEM -
Fundaçáo Catarinense
do Bem Estar Social
Secretaria do Bem
Estar Social
Criaçáo da FUDASESC - Fundaçáo
Catarinense de Desenvolvimento de
Comunidade (política de
desenvolvimento da comunidade)
muda para Secretaria do Desenvolvimento
Social
Secretaria
Extraordinária do
Trabalho
1960 1982 1998
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL / SANTA CATARINA
270
270
Paraná
Em 1929, o governo estadual criou 2 escolas para o atendimento à criança
órfã ou “carente”; porém, a institucionalidade acontece em 1947, com a criação do
Departamento Estadual da Criança, que tinha o objetivo de estimular e orientar na
organização de estabelecimentos particulares, destinados à proteção da maternidade,
infância e adolescência. Outro objetivo era promover a cooperação do estado com os
municípios e instituições de caráter particular, mediante subvenção e auxílio destinados
à maternidade, criança e adolescente. Percebe-se, nessa configuração original, a
presença da subsidiariedade e do binômio materno-infantil, semelhante ao modelo
preconizado e executado pela LBA: a atenção em postos de puericultura, lactário,
maternidade, creche, banco de leite humano, postos volantes, hospital infantil. O
Departamento tinha a Divisão de Proteção Social, que prestava os serviços sociais de
colaboração familiar, registros e documentos, colocação familiar e serviços
odontológicos. Outra estratégia adotada era estimular a criação de Associações de
Proteção à Maternidade e à Infância nas cidades do interior.
O IAM (Instituto de Atendimento ao Menor) foi implantado em 1962, com a
incumbência de formular e executar a política governamental de assistência ao “menor”,
estabelecendo, para tanto, articulações com as prefeituras e FUNABEM, quando criada.
A política estadual do bem estar do menor preconizava, para o atendimento da criança e
adolescente, a fixação em sua região de origem em programas terapêuticos e
preventivos de reeducação, de ação comunitária e internação. O Instituto estava
descentralizado em 21 escritórios regionais, que supervisionavam os programas
comunitários de atendimento ao menor bem como fiscalizavam a aplicação dos auxílios,
subvenções e contribuições às entidades sociais.
Em 1974, o IAM ficou vinculado à Secretaria da Saúde e Bem Estar Social.
Entre 1975-1978, foi inaugurado o Centro de Estudos, Diagnóstico e Indicação de
Tratamento (CEDIT) que era uma unidade de internação provisória de crianças e
adolescentes de zero a 18 anos, tido como modelo para outras cidades. Foi estruturada a
Fundação de Integração e Desenvolvimento de Entidades Sociais (FIDES), responsável
pelo repasse de verbas e recursos às entidades assistenciais.
271
271
Em 1979, a FIDES é renomeada como Fundação Promoção Social do
Paraná (PROMOPAR), com o objetivo de executar direta ou indiretamente programas
sociais de acordo com a política e normas técnicas de bem estar social, fixadas pela
Secretaria da Saúde e Bem Estar Social. O atendimento era dirigido a pessoas carentes,
ao amparo social à velhice, a ação assistencial comunitária, o desenvolvimento
comunitário através dos CSU’s, a central de Voluntários e reabilitação social.
Observa-se que, no final da década de 70, a institucionalidade da assistência
social paranaense tem o formato da matriz triangular de responsabilidade estadual
encontrada em São Paulo: responde pelo atendimento de casos, subvenciona entidades
assistenciais e tinha unidades de acolhimento e abrigamento, prioritariamente para
crianças e adolescentes. Sua área de competência é definida, então, pelo amparo social,
apoio à entidades sociais e atenção a grupos sociais especiais.
A PROMOPAR tinha o Centro de Triagem e Atendimento Social (CETAS)
para atendimento médico, educacional e social às pessoas sem cobertura do seguro
social. Em 1987, ocorreu a fusão do IAM com PROMOPAR, resultando na Fundação
de Ação Social do Paraná (FASPAR), agora vinculada à Secretaria do Trabalho e Ação
Social (SETA). Tinha a função de dar o apoio operacional à Secretaria e o
gerenciamento das unidades estaduais de atendimento a menores, órfãos, carentes,
abandonados, infratores, adulto e pessoa com deficiência. Em 1989, essa Fundação
ficou vinculada à Secretaria da Justiça, Trabalho e Ação Social (SEJA), até que em
1995 foi modificada para Instituto de Ação Social do Paraná (IASP), subordinada à
nova Secretaria de Estado da Criança e Assuntos da Família (SECR), órgão gestor
estadual responsável por estabelecer uma política de assistência social mais humana e
facilitadora do acesso aos benefícios sociais básicos. A Secretaria contava com as áreas
internas: Coordenadoria do Desenvolvimento Comunitário, Coordenadoria da
Assistência Social, Coordenadoria de Apoio às Atividades Produtivas, Coordenadoria
da Política do Idoso e do Portador de deficiência. Somava-se ao programa de
voluntariado (PROVOPAR) e as ações estavam descentralizadas em 15 escritórios
regionais no interior do estado.
272
272
Assim, de forma semelhante ao quadro encontrado em Santa Catarina,
analisando as diferentes estruturas administrativas da história da assistência social
no Estado do Paraná, pode-se observar que, da mesma forma que mudaram os
governos, mudaram a denominação dos órgãos estaduais de amparo à maternidade,
à infância, à adolescência e à família, aos portadores de deficiência e aos idosos
pobres. Percebe-se igualmente a falta de continuidade dos programas
desenvolvidos pelo Estado que, a cada gestão desmontava uma estrutura existente,
extinguindo órgãos ou serviços para colocar outra estrutura administrativa e criar
novos programas de atendimento à população necessitada.
(Alves, 2002:258)
Há um diferencial com o estado catarinense. O trânsito intenso e a mutação
de formas e identidade que designa o campo da assistência social paranaense obedeceu
a lógica mais restrita na localização administrativa: ficou sediada entre duas áreas,
somente, a saúde e trabalho, diferente de Santa Catarina que teve performance mais
eclética e ficou vinculada as mais diferentes áreas setoriais. O Paraná definiu a
institucionalidade da assistência social pública no formato de fundações e institutos,
trajetória interrompida na SECR.
Em 2003, foi implantada a Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e
Promoção Social (SETP), mantida até hoje e é responsável pela gestão das políticas do
trabalho, assistência social, segurança alimentar e garantia de direitos para crianças e
adolescentes no estado do Paraná. Vinculado à Secretaria, o Núcleo de Coordenação
Estadual da Política de Assistência Social (NUCLEAS) preserva a função estratégica de
efetivar a coordenação do Sistema Estadual da Política de Assistência Social, em
conjunto com as Políticas de Segurança Alimentar e do Trabalho, e ainda o Instituto de
Ação Social do Paraná (IASP), responsável pela garantia de direitos da criança e do
adolescente, na prestação direta de serviços ou em parceria com a rede e no subsídio
técnico aos municípios, tendo como objetivo a implantação dessas políticas públicas no
âmbito do estado (PARANÁ, 2006) e como finalidade a ampliação do Estado.
democrático e dos direitos (PARANÁ, 2007). Esse Núcleo é composto pelas
Coordenadorias de Desenvolvimento Integrado, de Apoio à Gestão Municipal e
Programas Especiais de Enfrentamento à Pobreza, descentralizados em 18 Escritórios
Regionais prestadores de assessoria e supervisão direta aos municípios paranaenses.
O NUCLEAS afirma a necessidade do planejamento e intervenção
regionalizados, considerando que o estado é composto por áreas economicamente
relevantes e socialmente crítica, é concentrado e desigual. No que se refere à assistência
273
273
social, cabe a implementação dos CREAS para o atendimento de pessoas em situação de
risco pessoal e social, além do apoio técnico que favoreça a articulação entre as políticas
para o enfrentamento de processos que geram vulnerabilidades, como a pobreza,
promovendo desenvolvimento local e regional. Levando em conta o fluxo migratório , o
grau de urbanização e aglomeração urbana, demandam outros serviços de média e alta
complexidade com ordenamento regionalizado para o atendimento especializado de
pessoas sem vínculos, vítimas de violência, em situação de exploração no trabalho, em
conflito com a lei, para pessoas com deficiência acoplado com transtorno de
comportamento e de outros segmentos com direitos violados (idem: 7-16).
Para o biênio 2007-2008, os objetivos e prioridades apontados no
instrumento do Pacto de aprimoramento da gestão estadual são:
-reordenamento institucional e programático da Secretaria: revisão do
quadro de recurso humano institucional; da organização do órgão gestor com a
reformulação do Departamento de Assistência Social; a organização político-
administrativa nas regionais;
-objetivos e prioridades nacionais e regionais: propostas dirigidas à proteção
social básica (tal como o co-financiamento dos benefícios eventuais), à proteção social
especial (tais como o co-financiamento de CREAS; implantação, manutenção e
monitoramento de serviços de referência regional de alta complexidade para
atendimento de adolescentes em conflito com a lei e serviço de referência regional para
atendimento de pessoas itinerantes); aprimoramento da gestão (por exemplo, realização
de pesquisas e estudos socioterritoriais); aprimoramento do apoio técnico aos
municípios (além da supervisão técnica promovida pelos escritórios regionais, são
indicadas propostas como a organização de base de dados dos serviços
socioassistenciais de proteção social básica distribuídos por micro-região, mapeamento
de recursos orçamentários, elaboração do guia de orientação para habilitação municipal
à gestão do SUAS e a realização do monitoramento e avaliação dos níveis de gestão);
coordenação, gerenciamento e co-gestão de programas de capacitação de gestores,
profissionais, conselheiros e prestadores de serviço.
274
274
1947 1957 1962 1974 75 a 78 1979 1987 1989 1991
Criaçáo do Departamento
Estadual da Criança (DECr)
IAM passa para
Secretaria de Sde e
Bem Estar Social
FASPAR - Fundaçáo de
Açáo Social do paraná.
(fusáo do IAM e do
PROMOPAR)
FASPAR = administraçáo
indireta, vinculada à
Secretaria Estado da
Justiça, Trabalho e Açáo
Social - SEJA
FASPAR
deixa de ser
Fundaçáo e
oassa a
autarquia
vínculo = criáo
da SECR .
Secretaria de
Estado da
Criança e
Assuntos da
Familia
Divisáo de
Protáo Social do
(DECr). Criaçáo de
31 novas APMI
(Associaçáo de
Protáo à
Maternidade e à
Infância) no interior
do estado
RÉGUA DO TEMPO
1929
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL /PARANÁ
1995
FIDES é
transformado em
PROMOPAR -
Fundaçáo de
Promáo Social
do Paraná
Entidade de
administraçáo
direta, vinculada à
Secretaria de
Estado do Trabalho
e Açáo Social -
SETA
FASPAR =
trnaformada para
IASP - Instituto
de Açáo Social
do paraná.
Criaçáo de 2
Escolas Oficiais
para atendimento
à criança órfã ou
carente
vínculo -
Secretaria
da
Educaçáo
Finalidades: ….
Estimular e orientar a
organizaçáo de
estabelecimentos
municipais e
particulares
destinados à proteçáo
de maternidade,
infância e
adolescência …
promover cooperaçáo
do Estado com os
municípios e
instituiçóes de carater
particular, mediante
subvençáo e auxílio
destinados à
maternidade, infância
e adolescência.
Criáo do IAM
(Instituto de
Assistência ao
Menor). Ligado à
Secretaria do
Trabalho e
Assistência
Social. Funçáo:
formular a
execuçáo da
política
governamental de
assistência ao
menor
Criaçáo:
- CEDIT (Centro de
Estudos,
Diagnóstico e
Tratamento) do
IAM e
- FIDES
(Fundaçáo
de Integraçáo e
Desenvolvimento
de Entidades
(Sociais) -
vinculada
diretamente à Secr.
Saúde e Bem Estar
SOcial
275
275
Mato Grosso do Sul
O estado do Mato Grosso do Sul foi criado em decorrência da divisão do
estado de Mato Grosso, em 1977. Consequentemente, foi organizada a representação
regional de órgãos públicos como a LBA, a Secretaria do Desenvolvimento Social e o
Mobral.
Em 1979, foi implantado o Fundo de Assistência Social Sul Matogrossense
(FASUL) como órgão responsável pela área da assistência social estadual, presidido
pela primeira dama, e era dirigido por um Conselho Deliberativo composto de sete
membros sob a presidência da esposa do governador ou outra pessoa de sua livre
escolha. Os trabalhos desenvolvidos eram: prestar assistência aos “necessitados”,
manter vínculos com órgãos governamentais e não-governamentais da área e cooperar
com os programas de órgãos governamentais. Basicamente, o Fundo executava as metas
traçadas no Plano de Ação Social, seguindo modelo proposto à época, pela LBA, de
incentivo a execução nos municípios dos programas: assistência à comunidade,
educação para o trabalho, assistência ao excepcional, assistência à família, ao idoso e
assistência jurídico-legal.
Em 1980, foi executado o programa Panelão, que consistia na venda de
produtos da cesta básica, com preços subsidiados, para famílias de baixa renda. O
desenvolvimento comunitário nos bairros e favelas também era desenvolvido, sendo
que, para ambas iniciativas, as demandas eram mediadas por organizações fundadas
pela FASUL, tais como centros comunitários, clube de mães e associações.
Em 1982, a nova primeira dama extinguiu o Panelão, legalizou as
organizações de apoio ao seu trabalho e priorizou a construção de creches. Uma
reestruturação administrativa do FASUL demonstra os eixos da intervenção da
assistência social estadual: atendimento de casos, contando com setor de farmácia e de
colocação para o trabalho, e ação comunitária, contando o órgão com 25 assistentes
sociais. Em 1987, foi implantada a Secretaria de Ação Social e Comunitária,
responsável pelo planejamento setorial e a ação executiva integrada da Política Estadual
de Assistência, Promoção Social e Ação Comunitária. Essa Secretaria era o órgão
central do Sistema de Ação Social e Comunitária, voltado a prestar atendimento às
276
276
comunidades, diretamente ou por meio de entidades sociais e/ou órgãos
governamentais.
Observa-se o predomínio dos eixos da ação comunitária e atendimento de
casos como norteador da identidade institucional, eixo comum aos outros estados
analisados, porém diferente no quesito do comando (exercido no MS pela primeira
dama estadual).
No ano de 1991, a Secretaria foi substituída pela Fundação de Promoção
Social de Mato Grosso do Sul (PROMOSUL), com a incumbência de coordenar a
política estadual para crianças e adolescentes, adultos, pessoas com deficiência e idosos.
Por causa da extinção da LBA em 1995 ocorreu a transferência de parte do patrimônio
regional para o órgão gestor estadual, bem como as atividades que vinha
desenvolvendo. Entre 1996 e 1998, a ênfase do trabalho desenvolvido foi pela
efetivação do artigo nº 30 da LOAS, preparando os municípios para a gestão local,
sendo que em 1998 todos estavam habilitados à gestão municipal. O acompanhamento
desse processo de passagem da estadualização para a municipalização foi desenvolvido
pelo escritório regional da SAS (do nível federal), o que envolvia a transferência de
recursos Fundo a Fundo e a orientação normativa necessária, inclusive pela implantação
da CIB /MS que ocorreu em 1999.
Tendo em vista a extinção do escritório regional da SAS, o vulto dos
trabalhos do órgão gestor e a complexidade das demandas da área, a estrutura básica foi
reformulada com a criação da Secretaria de Estado de Assistência Social, Cidadania e
Trabalho (SASCT) e a extinção da PROMOSUL, em 2000. Nova alteração ocorreu em
2002, quando passou a ser denominada como Secretaria de Estado de Trabalho,
Assistência Social e Economia Solidária (SETASS), responsável por coordenar ações
voltadas à geração de emprego e renda, à inclusão social e à promoção da cidadania.
Observa-se que, em MS, a autonomia do lócus institucional da assistência
social estadual esteve garantida na medida em que foi conduzida pela primeira dama,
ainda que sob cunho assistencialista. Ao alcançar o status de secretaria condicionada à
extinção do órgão da primeira dama, o fez na condição de partilhar o mesmo espaço
institucional ocupado por uma dimensão do mundo do trabalho que estimula o
277
277
associativismo e a produção associada como forma de enfrentamento ao desemprego
estrutural - o direito ao trabalho e à renda resulta, na perspectiva da economia solidária,
de uma iniciativa grupal e não individual. Dessa forma, a convivência com a área do
trabalho sugere, nessa situação, uma hipotética ruptura de convivência subalterna do
clássico binômio trabalho-assistência social.
Atualmente, a Secretaria responde pelas políticas públicas do trabalho,
assistência social, antidrogas, direitos humanos e defesa do consumidor. Encontra-se
subdividida em 4 Superintendências: da Política de Assistência Social, de Programas de
Inclusão Social, das Políticas de Defesa da Cidadania e de Proteção e Defesa do
Consumidor.
O modelo estadual do co-financiamento adotado se assemelha ao convênio
único implantado por São Paulo, uma vez que o recurso repassado, na forma de pisos de
proteção básica e especial, permite ao Conselho Municipal de Assistência Social
deliberar sobre sua aplicação. Dentre as propostas contidas no instrumento do Pacto de
Aprimoramento da gestão estadual, destaca-se a de implantar o sistema estadual de
informação, monitoramento e avaliação das ações de assistência social, de âmbito
estadual e regional, por nível de proteção social articulado com os sistemas municipais e
consoante ao sistema federal. Trata-se de uma ferramenta importante para a vigilância
social, com capacidade de ampliar as medidas preventivas à situação de risco a que
populações fragilizadas possam estar sujeitas.
A questão do adolescente em conflito com a lei teve trajetória à parte do
lócus da assistência social. Em 1989, existia o Estabelecimento de Guarda do Menor
Infrator (EGAMI), vinculado à Secretaria da Justiça. Em 1990, foi criada a Casa de
Guarda e Assistência ao Adolescente (CGAA) para meninos em conflito com a lei,
implantados em municípios do interior. Em 1992 foi instalado o Centro de Triagem do
Menor (CETREMI), hoje denominado como Unela Camalotes (unidade de liberdade
assistida). Somente em 2000 ocorreu a incorporação da questão do adolescente infrator
na SASCT, o que levou à criação do Grupo de reordenamento das medidas
socioeducativas, com o objetivo de elaborar uma proposta pedagógica, hoje orientada
pela Coordenadoria de Medidas Socioeducativas.
278
278
Nota-se que a trajetória da assistência social pública matogrossense foi
singular, nascida sob a perspectiva da ação “primeiro-damista” e é mais jovem no tempo
de sua existência do que outros estados analisados. A possibilidade de ocorrência de
eixos paralelos da institucionalidade estadual ficou reduzida, uma vez que coincidia a
ação da primeira dama estar sediada no órgão gestor, mantendo, dessa forma e até 2000
o paralelismo somente para a questão do adolescente infrator.
279
279
criança/adolescente
1979 1980 1982 1987 1991 1992 1996/1997 1998 1999 2000 2002 2004 2007
1ª dama continua a presidir
FINALIDADES DO FUNDO são fixadas: -
prestar assistência aos necessitados - manter
vínculos com órgãos (gov. e não-gov.) de assis. social
- conhecer os programas de órgãos governamentais de assist.
social podendo cooperar com eles - manter a
assistência social
Criação do
Estado do MS
1ª dama:
- extinção do
Panelão;
- legalização
das
Associações
- conclusão
construção
creches
2003
1989-1990: EGAMI
- Estabelecimento
de Guarda do
Menor Infrator
(Secret. Estado da
Justiça)
RÉGUA DO TEMPO
1977
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL / MATO GROSSO DO SUL
Criação da FASUL.
Fundo Social de
Assis. Social
- dirigido pela 1ª
dama (ou outra
pessoa de livre
escolha do
governador)
- Conselho
deliberativo:
composto por 7
membros. Parceria
FLBA
PROJETO PANELÃO
(venda subsidiada de produtos
cesta básica)
+
1. trabalho comunitário nas favelas e
bairros: demandas mediadas por organizações
fundadas pela FASUL (clube mães, Associações Centro
Comunitário);
2. execução de metas traçadas no Plano de Ação
Social, baseado no PROVAC, que estabeleceu nos
municípios: - Assist. à Comunidade, Educação para o
trabalho, Assistência ao Excepcional, Assit. à Familia,
Assist. Juridico legal, Assist. ao Idoso.
2007: Coordenadoria da
MSE: UNELA
CAMALOTES (L.A.) + 9
Unidades Educacionais de
Internação e 1 Unidade de
Semiliberdade
2003-2006: Reordenamento
técnico e pedagógico das
Unidades Educacionais de
Internação e Semiliberdade
1991: Criaçáo da CGAA
-
Casa da Guarda e
Assistência ao
Adolescente (privação
de liberdade) na capital
e mais 3 casas no
interior
1992: Criaçáo do
CETREMI - Centro de
Triagem ao Menor
2000: Posteriormente PROAM
(Programa de Atendimento ao
Adolescente em Medidas Sócio-
Educativas)
em estudo o
reordenamento da
SETASS para
adequação à
PNAS/ 2004 e
NOB/SUAS
Criáo da
FUNDAÇÃO DE
PROMOÇÃO SOCIAL -
PROMOSUL
:
- estabelecer e coordenar a
Política Nacional de Promoção
e Assistência Social, em seu
âmbito.
-
definir diretrizes, estabelecer,
coordenar e executar políticas
estaduais para crianças /
adolescentes, adultos, PPD e
idosos.
- parceria com FLBA
Crião do
Sistema
Estadual de Ação
Social e Comunitária
e
Secretaria de Ação
Social e Comunitária
rgáo central): -
planejamento setorial e a
ação executiva integrada
da Política Estadual de
A
ssist., Promoçáo Social
e Ação Comunitária.
- instalação da
CIB/MS: 6
gestores
municipais e 3
estaduais. -
extinção do
Escritório
Regional SAS/MS:
início estudos
para que a
PROMOSUL
passasse à
Secretaria de
Estado.
Objetivo do SISTEMA
ESTADUAL DEÃO SOCIAL E
COMUNITÁRIA: - prestar
atendimento às comunidades
diretamente ou através de
entidades sociais e / ou órgãos
governamentais; - desenvolver
estudo de problemas e
planejamento das soluções-ações
sociais voltadas ao crescimento e
desenvolvimento urbano
organizado
- aprovação
da estrutura
básica da
SETASS.
Finalidade
:
orientação e
execução de
ações que
visem à
geração de
emprego e
renda, à
inclusão social
e à promoção
da cidadania.
SETASS:
Superintendência
da Política de
Assistência Social:
- Coordenadoria
da PSB;
- Coordenadoria
da PSE;
- Coordenadoria
de Apoio à Gestão
- extinção da
PROMOSUL e
criação da
SECRETARIA DE
ESTADO DE
ASSISTÊNCIA
SOCIAL, CIDADANIA
E TRABALHO -
SASCT
SASCT muda
para
SECRETARIA
DO ESTADO DO
TRABALHO,
ASSISTÊNCIA
SOCIAL E
ECONOMIA
SOLIDÁRIA -
SETASS
(
agrega trabalho e
defesa do
consumidor)
- concentração de
esforços para instalação
de fóruns, seminários e
encontros para orientar
gestores de ass. social,
entidades sociais na
criação de Conselhos,
Fundos de A.S. e
elaboração de Planos
Municipais (art. 30
LOAS)
- com a extinção da
FLBA, repasse de metas
e patrimônio parcial ao
Gov.de MS
todos os municipios
habilitados à gestão
municipal (NOB/97)
+ Escritório Regional da
SAS: - acompanhar,
supervisionar e controlar a
aplicação dos recursos do
FNAS para o FEAS e
FMAS's; - divulgão de
normatização referentes à
Política Nacional de A.
Social
280
280
Distrito Federal
A primeira iniciativa operada no campo da assistência social governamental
se deu pela Fundação das Pioneiras Sociais, organização presidida por Sarah
Kubitschek, primeira dama federal, durante o biênio 1960-1961. Em 1961 foi criada a
Fundação do Serviço Social do DF (FSS/DF) e, em 1964, a Secretaria de Serviços
Sociais incorporou a Fundação, mantendo a coordenação e execução do campo da
assistência social na FSS.
Posteriormente, a Secretaria da Criança e Assistência Social desempenhou
uma função normativa, até a extinção da FSS/DF em 2000 provocar a alteração para
Secretaria de Estado de Ação Social do DF. A partir de 1995, a Fundação assumiu os
convênios de atendimento a crianças e adolescentes, idosos e pessoas com deficiência,
dantes executados pela LBA. A partir de 1989, a Fundação baseava sua atuação em dois
eixos:
- o programa de assentamento de favelados e inquilinos de baixa renda;
-o programa de ação comunitária: de atendimento à migrantes e outros
grupos de baixa renda, associado à assistência a grupos de produção e o apoio
financeiro às entidades sociais;
As ações das primeiras damas do DF foram desenvolvidas através de uma
organização não-governamental denominada Proteção e Ação Social, mais tarde
renomeada como Instituto Solidariedade. O atendimento ao adolescente infrator foi
interinstitucional, envolvendo a ação direta da Superintendência da Regional centro
oeste da FUNABEM na execução e direção de unidades de privação de liberdade junto
ao Juizado de Menores da capital federal, de 1978 a 1984. Com o advento do ECA em
1990, a FSS promoveu o reordenamento institucional, assumindo a coordenação e
execução global das unidades de internação, bem como as medidas em meio aberto, à
exceção da prestação de serviço à comunidade, a cargo da Vara da Infância e Juventude
do DF.
A reforma administrativa do governo do DF cria a Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Social e Trabalho (SEDEST) no lugar das Secretarias de Estado do
Trabalho, Secretaria de Ação Social e de Solidariedade e da Agência de
281
281
Desenvolvimento Social, instalando, dessa forma, o comando único da política de
assistência social do DF. A Pasta responde pelas políticas do trabalho, de segurança
alimentar e de assistência social, cabendo à Subsecretaria de Assistência Social
(SUBSAS) a coordenação da política regional. A política voltada ao adolescente em
conflito com a lei está sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Justiça,
Direitos Humanos e Cidadania (DISTRITO FEDERAL, 2007)
A gestão da política de assistência social do DF é atípica. O DF corresponde
a uma unidade federativa estadual, é sede da capital da república e responsável por uma
área territorial de perfil metropolitano composto por 29 regiões. Marcado por profunda
desigualdade social, reúne o melhor índice de desenvolvimento humano do país (0.849)
que convive com o rebaixamento do índice nos territórios do entorno da capital federal,
o que engloba as cidades-satélite e cidades mineiras e goianas próximas, desprovidas de
oferta de trabalho e acesso às condições básicas para uma condição de vida digna.O
Grande DF ocupa a 11ª posição no ranking do IDH das 33 regiões metropolitanas
brasileiras (0.75) (idem:8).
Portanto, o órgão gestor da política de assistência social do DF tem uma
função executiva e direta de atendimento às demandas socioassistenciais,
desenvolvendo-a por meio da implementação de serviços e benefícios socioassistenciais
como o CRAS, CREAS, programa de transferência de renda (Programa Renda
Solidariedade e Renda Minha) e outros serviços da rede de proteção social. Nesse
sentido, uma alternativa indicada para a proteção social especial dirigida à população do
entorno do DF, demandante dos serviços da capital federal, é articular o co-
financiamento de serviços de referência regional com o estado de Goiás e municípios da
sub-região.
Assim sendo, trata-se de ente estadual com características especiais e com
perfil de cidade – pólo de região metropolitana, sendo singular o requisito da gestão da
política de assistência social regional, normatizado na NOB-SUAS.
282
282
FSS
. Projeto de Atendimento ao Menor Ingfrator - PROAMI -:3 unidades especializadas = herança FUN
A
1964 1978 1979 1984 1989 1990 1994
Fundaçao
das
Pioneiras
Sociais
Criação da
Secretaria
de
Serviços
Sociais
(vinculada
à
Fundação
do Serviço
Social)
FUNABEM
-
Superintendê
ncia da
Regional
Centro Oeste
Funabem
opera o
CIAMF
-
Centro
Integrado de
Atendimento
ao Menor e
Família
CIAMF passa
coordenaçao
para Juizado de
Menores DF
FSS: processo
de
reordenamento
institucional =
assume
execuçao da
LA,
semiliberdade,
internaçao
CAJE: Centro
de
Atendimento
Juvenil
Especializado
março
: - extinçao FSS-
DF
- Secretaria Criança e
Assistência Social: órgao
executor (era só
normativo antes)
- maio
: a Secretaria
passa para "Secretaria
de Estado de Açao
Social do DF"
- Assentamento de favelados e inquilinos de baixa renda.
Obs.: As 1º damas executam açao paralela em uma ONG denominada PAS - Proteçao e Açao Social - depois renomeada como Instituto Solidariedade
- Programa de Ação Comunitária (migrantes, pop. de baixa renda;
assistência á grupos de produção; apoio financeiro à inst. Assistência social;
hortas e artesanato)
INSTITUCIONALIDADE DO DISTRITO FEDERAL
Anexo 16: RÉGUA DO TEMPO
Criaçao da
Fundaçao
do Serviço
Social do
DF (FSS-
DF
1961 1988
Projeto Triagem
em liberdade
(FSS) -
adolescentes
em conflito com
a lei (LA)
2000
283
283
Paraíba
A institucionalidade estadual da assistência social no estado da Paraíba
começou em 1951, com a criação do Departamento Social do Estado. Reestruturado em
1965, passou a contar com as Divisões de Combate à Mendicância Profissional, de
Ensino Profissional e Economia Doméstica. Essa reforma administrativa retratou a
prevalência da orientação higienista que colocava o primado do trabalho, com
capacidade resolutiva e saneadora, no centro das medidas profiláticas de
responsabilização estadual. Esse Departamento foi transformado na Secretaria
Extraordinária do Trabalho e Serviços Sociais em 1966, na qual o Departamento do
Menor respondia pelo atendimento à infância e juventude abandonada e infratora. Em
1975, o Departamento deu lugar à Fundação Estadual do Bem Estar do Menor “Alice de
Almeida” (FEBEMAA) como fundação de direito privado vinculada à Secretaria
estadual.
Em 1977, passou à denominação de Secretaria do Trabalho e Serviços
Sociais, mudando para Secretaria do Trabalho e Ação Social em 1991. Por ocasião da
extinção da LBA, o escritório regional da SAS assessorou a Secretaria paraibana no
processo de orientação aos municípios para a constituição dos conselhos, fundos e
planos municipais, além do órgão estadual herdar a gestão das parcerias relativas ao
atendimento integral à criança de zero a seis anos, à pessoa idosa, à pessoa com
deficiência e de geração de renda. Por sua vez, a sede das primeiras damas foi a
FUNSAT e CENDAC, órgãos estaduais extintos e estabelecedores do duplo comando.
Em 1993, a FEBEMAA foi alterada para Fundação Desenvolvimento da
Criança e do Adolescente “Almeida” (FUNDAC), responsável pela Política Estadual de
Proteção e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente atualmente e vinculada à
SEDH. Atende adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de privação
de liberdade e semiliberdade, além de egressos e suas famílias, desenvolvendo, para tal,
o Programa de Apoio à Família e ao Egresso (PROAFE).
Somente em 2005 o órgão gestor estadual passou à denominação de
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano, composta pela Gerência Executiva
de Assistência Social (com duas Gerências Operacionais, de Proteção Social Básica e
284
284
Especial, coordena a rede de serviços socioassistenciais do estado além de assessorar os
municípios); Gerências Regionais (processadora da descentralização institucional);
Gerência Executiva de Apoio a Programas Governamentais (organiza o sistema de
monitoramento e avaliação do sistema estadual de assistência social); Gerência
Executiva de Trabalho, Emprego e Renda. A gestão orçamentária da Secretaria é
realizada pelo Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza no Estado da Paraíba, fonte
de despesas institucionais, apesar da existência do Fundo Estadual de Assistência
Social.
Uma meta expressa no instrumento do Pacto de Aprimoramento de Gestão
estadual estabelece que a rede de proteção social básica sob gestão estadual será objeto
de transição e transferência dos serviços socioassistenciais para a gestão municipal, após
pactuação na CIB e Conselho Estadual de Assistência Estadual. Por outro lado,a rede de
proteção social especial estadual será aperfeiçoada no quesito de gestão de
trabalhadores e de infra-estrutura de funcionamento (PARAÍBA, 2007).
As mudanças na organização administrativa do órgão gestor paraibano
foram de menor intensidade, se comparado a estados como Santa Catarina e Rio Grande
do Sul. Resumiram-se à redefinições na identidade e na finalidade, sem transitar pela
via compulsória de múltiplas vinculações da assistência social estadual a outros setores
de políticas públicas. Sua trajetória foi atrelada ao setor da política do trabalho,
adquirindo autonomia institucional a partir de 2005 e mantem, sob sua gestão, a
competência da política estadual da criança e do adolescente. Portanto, o perfil desse
estado é singular considerando a autonomia e a gestão de uma Fundação designada a
normatizar, executar e dirigir a política estadual mencionada.
285
285
1965 1966 1975 1977 1991 - 1993 1995 2005
Reestruturão do
Departamento:
muda para
Secretaria
Extraordinária do
Trabalho e
Servos Sociais
(SETRASS)
Secretaria do Trabalho e
Servos Sociais
SETRASS
Secretaria Trabalho
e Ação Social
(SETRAS)
Secretaria Estado do
Desenvolvimento Humano
(SEDH)
Divies
:
- Combate a
mendicância
profissional;
- Ensino Profissional;
- Economia Doméstica
Departamento do
Menor (SETRASS)
Obs.
: Existiram dois órgáos 1ª dama: FUNSAT e CENDAC
FUNDAC (junho 2007)
- Abrigo para 44 crianças de 0 a 7 anos e 1 familia
- Programa de preparação para o trabalho: Padaria Escola Nosso Pão (na capital): 6 jovens de 18 anos e familias
- Programa de reinserção social (do adolecente em conflito com a lei): 3/6 adolescentes e 225 familias em 7 unidades de atendimento
- Programa de Apoio a Familia e ao Egresso (PROAFE):
171 adolescentes e jovens egressos e 153 familias.
TOTAL
: 537 C/A e 232 familias
a) Extião da
FLBA: ações
incorporadas
gradativamente
pelo órgão
estadual
b) Escr. Regional
SAS (federal):
apoio à SETRAS,
ênfase na
orientáo
municipios para
CPF
c) atendimento à
PPD.
Atendimento
integral crianças
de 0 a 6 anos
(creche).
Atendimento à
pessoa idosa.
Geraçáo de renda
Competências:
- coordenar a
PNAS do Estado
- desenvolver
capacitaçáo junto
às equipes
municipais
- Monitoramento e
avaliaçáo da
politica
- execuçáo de
açóes
regionalizadas
FUNDAC:
atende adolescentes em cumprimento de MSE de privação de liberdade e semiliberdade e egresso/familias (PROAFE). Atende ainda crianças em situaçáo de
risco no Abrigo Lar da Criança Jesus de Nazaré (capital). Tem 15 unidades de atendimento e abrange 8 municipios. É vinculada à SEDH
Criação do órgão
gestor:
Departamento
Social de Estado
Crião da
FEBEMAA
(Fundação
Estadual do Bem
Estar Menor Alice
de Almeida) -
Fundação de
Direito Privado
FEBEMAA muda
para FUNDAC
(Fundação Desenv.
Da Criança e do
Adolescente Alice
de Almeida)e
transformão para
Fundão de
Direito Público
RÉGUA DO TEMPO
1951
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL /PARAÍBA
286
286
Roraima
Em 1974, o então Território federal de Roraima passou a contar com
Secretarias criadas pelo governo federal, sendo a Secretaria de Promoção Social
designada a desenvolver a Política de Integração do Território e executar programas de
ação comunitária, de atenção à migração e assentamento populacional, de formação
profissional e desenvolvimento do artesanato, de habitação de interesse social e
assistência social. Era composta por 3 coordenações:
-Coordenação do Bem Estar do Menor: com a competência de programar,
coordenar, controlar, executar e avaliar as atividades atinentes à ação preventiva e
sócio-terapêutica de acordo com as normas técnicas da Política Nacional do Bem Estar
do Menor, orientada pela FUNABEM;
-Coordenação dos Centros Sociais: competência de programar, coordenar,
controlar e avaliar as atividades relacionadas com a implantação e funcionamento de
centros sociais urbanos, de acordo com as normas técnicas do Programa Nacional dos
Centros Urbanos da LBA;
-Coordenação de Assistência Social: responsável por programar, coordenar,
executar e avaliar programas de assistência ao idoso, detentos e familiares, sugerindo
aos órgãos competentes a implantação e execução dos programas governamentais
dirigidos a ampliar a infra-estrutura social.
A gênese da institucionalidade de Roraima espelha mais sua condição de
pertencimento ao governo central, pela condição de território subordinado à execução
de planejamento prévio, designando a Pasta da assistência social pública por um
conjunto de ações não-integrantes de uma política e de natureza tão diversa que não
guardam coerência e unidade entre si para tanto. Assemelha-se à delegação de tarefas a
serem executadas, estabelecendo como sinônimo da assistência social a prática social,
com temas variados. que se somam à difusa categoria de “programas de assistência
social”.
Transformada em 1987 como Secretaria do Trabalho e Bem Estar Social,
cabia-lhe coordenar e executar a política de valorização do trabalho e do trabalhador,
além de coordenar e executar a política governamental de promoção do bem estar da
população. A coordenação da Pasta era usualmente desenvolvida pela primeira dama
287
287
estadual, apoiada pelo voluntariado composto por mulheres de classe média, o que pode
ser considerado como uma expressão do discurso maternalista (Mott, 2001),
consolidado pelo Programa Nacional do Voluntariado da LBA.regional.
Em 1988, Roraima foi transformado em estado federativo, o que provocou a
alteração da denominação do órgão para Secretaria de Estado do Trabalho e Bem Estar
Social, em 1991, atribuindo-lhe a função de desenvolver políticas relativas às áreas
assistenciais, trabalho e promoção social (SIC). Nota-se a imprecisão genérica quanto à
natureza específica que seria de responsabilidade dessa área de política pública.
Em 1996, a Secretaria inicia o trabalho de atendimento ao adolescente
infrator, instalando uma unidade de privação de liberdade e da medida socioeducativa
de semiliberdade, e passou a atender os adolescentes egressos através do programa
Cidadania Ativa. Atualmente, está em curso o processo de municipalização das medidas
em meio aberto.
A Secretaria estadual possui atualmente 3 departamentos: Política de
Trabalho, Emprego e Renda; Proteção Social Especial; Proteção Social Básica.,
Coordenação de Regulação do SUAS e Coordenação de Monitoramento, Avaliação e
Gestão da Informação.
A implementação da Política Estadual de Assistência Social ocorre por meio
da execução direta de programas sociais de proteção social básica dirigidos à infância,
adolescência e famílias sediados na capital do estado. Quanto à proteção social especial,
há abrigos governamentais para crianças, uma casa abrigo para mulher vítima de
violência, uma casa de passagem para migrantes e famílias além de um Centro
Socioeducativo para o cumprimento de medida de privação de liberdade. O órgão gestor
estadual desenvolve também o apoio técnico às secretarias municipais através de
assessoria técnica, capacitação das equipes municipais, apoio para a execução de
programas e projetos sociais.
São várias as particularidades do estado de Roraima, tais como a
peculiaridade geográfica do território e suas vias de acesso aos 15 municípios do estado,
de composição diversificada quanto a sua população, somada a elevada densidade
288
288
populacional concentrada na capital do estado e nas sedes municipais, dentre outras.
Singularizam o modo de gestão da política de assistência social estadual, levando a
desenvolver iniciativas diretas que, em tese, são de competência municipal,
concomitante às provisões voltadas à proteção social especial que, em tese, são
pertinentes à responsabilidade da esfera estadual.
A análise do conjunto de 8 sistemas estaduais públicos de assistência social
mostra que, em sua maioria, espelham uma compreensão similar sobre o sentido da
unidade na diversidade que compõe um sistema único. O conjunto dos Pactos de
Aprimoramento de Gestão, com pequenas variações, indica proposições quanto ao
reordenamento institucional e um novo modo de gestão de pessoas da área, de
municipalização do atendimento direto; a quase totalidade dos sistemas estaduais indica
a intenção de exercer a atribuição conferida à esfera estadual, de repensar a gestão sobre
o território por micro-regiões.
Contudo, são sistemas estaduais da Política Nacional de Assistência Social
que ainda fazem o trânsito da instabilidade de outrora, sob a predominância do dialeto
próprio de cada governo: novas denominações do órgão gestor, novas primeiras damas e
a tentativa de (novos) programas sociais. A memória institucional dos 8 estados
abordados mostra, em sua gênese, semelhança para três estados (atendimento à criança e
adolescente) e, na sua trajetória, a condicionalidade da convivência com a política do
trabalho, em menor escala a de saúde, hoje justiça e desenvolvimento social; com a
presença, até meados da década de 1990, de uma matriz triangular comum de
responsabilidades atribuída ao ente estadual: atendimento de caso, subvenção estatal à
rede privada sem fins lucrativos e o asilamento de grupos sociais de extrema
vulnerabilidade.
Considerando as características que compõem os sistemas estaduais de
assistência social analisados, os alinhamentos necessários para a efetividade de um
sistema único devem levar em conta a dinâmica complexa do cotidiano e as mutações
acordadas que demandarão, sempre, o aprimoramento dos pactos federativos. Portanto,
o SUAS não é um modo de gestão da política calcificado, de tal forma que não
apresente porosidade às peculiaridades históricas.
289
289
Dessa forma, é possível delinear caracteres que podem definir um perfil
comum da responsabilidade da esfera estadual no campo da assistência social estatal.
1. A matriz genética assentada na atenção à criança e adolescente pobres,
sob abandono e/ou em conflito com a lei, tratados como ameaça, mas também como (...)
expressão da ferida social, o que requer a ação social do Estado que age por todos os
meios a seu alcance, mas falta-lhe, porém, uma regra geral geral para ampará-lo e
animá-lo (...) (SÃO PAULO, Assembléia Legislativa, Annaes da Assembléia
Constituinte de 1935:139-141. Pronunciamento do deputado estadual Motta Filho na 16ª
sessão da Assembléia Constituinte de 1935). Está presente nos estados do Paraná, Rio
Grande do Sul e São Paulo
2. A persistência do vínculo com a filantropia, embora com graus diferentes
de racionalidade, regulação e controle. Constitutiva da relação do Estado brasileiro e
paulista com a iniciativa benemerente, as expressões são variadas e algumas delas
resistem à inscrição desse vínculo na esfera pública ampliada do controle que deve ser
estabelecido pelos conselhos de assistência social, na forma das emendas parlamentares
executadas no Parlamento, na forma do exercício do primeiro-damismo ou na forma do
incentivo fiscal indireto e dirigido ao mercado, como o caso Rio Grande do Sul.
3. Matriz associada à constituição do campo de trabalho para o Serviço
Social e, com isso, a superposição de concepção entre Serviço Social e Assistência
Social
Outro elemento genético diz respeito à presença do Serviço Social como
área de formação profissional no país a partir de 1936. Na esfera federal, o lugar do
Serviço Social foi reduzido ao CNSS - Conselho Nacional de Serviço Social – ou ainda
ao Sistema S do Serviço Social do Comércio, da Indústria enquanto expressões
nominais do Serviço Social sem vincular propriamente a presença ou campo de trabalho
da categoria profissional a ele correlata. Outra realidade foi a da gestão estadual e, no
caso de São Paulo, o Departamento de Assistência Social (depois nominado como
Serviço Social do Estado) nucleava no interior do aparelho estatal o profissional da
nova divisão sócio-técnica do trabalho, desde seu nascedouro. O Serviço Social do
290
290
Estado foi espaço para trabalho profissional de assistentes sociais que foram seus
gestores.
4. Em contraponto ao lugar de maior presença do assistente social no campo
da assistência social, o estímulo à presença das primeiras-damas na esfera da iniciativa
estatal se deu pelo governo federal, que fez emergir esse trabalho pela LBA e sua
disseminação pelos Estados. Dessa forma, a dualidade da gestão técnica e filantrópica
pode se manter pela convivência entre o saber técnico e o poder nepótico, de incidência
acentuada no campo da assistência social estatal. Essa questão comparece com
intensidade no estado do Mato Grosso do Sul.
5. O nomadismo no pertencimento organizacional da gestão da assistência
social, ora lócus próprio, ora transitável no seu todo ou em partes para múltiplos setores
de políticas públicas. O maior trânsito se dá no campo do trabalho, da justiça, da saúde
e/ou com crianças e adolescentes intervinculados à assistência social
6. A ausência de rede de serviços próprios do ente estadual tinha seu
contraponto preponderantemente na capital, com serviços voltados a grupos sociais
especiais e, em menor escala, serviços interiorizados. para a criança e adolescente
abandonados e/ou em conflito com a lei. O vazio de rede impulsiona a prática
compulsória da subsidiariedade
7. O início e permanência de grandes serviços de caráter de instituição total,
com forte resistência ao tempo na gestão estadual. O modelo do Instituto Disciplinar do
começo do século 20 foi longevo, resistiu ao tempo e ficou impregnado nas estruturas
da FEBEM, e certamente deve encontrar focos de resistência à mudanças. O legado
apartador da atenção à criança e adolescente vulnerabilizados pelo abandono,
negligência e conflito com a lei enseja à indagação de quais são as mudanças
institucionais, culturais, sociais que tem separado o modelo consolidado daquele
executado por meio de medidas protetivas e sócio-educativas? Associado a isso, o
trânsito da delegação de responsabilidade institucional, na esfera estadual, percorre a
definição incerta entre a assistência social e área da Justiça.
291
291
8. O federalismo descentralizado no campo da gestão da assistência social se
dá acompanhado da ausência de história comum e de identidade inter-estados e, desses,
com a União. A ausência de tradição republicana na gestão da assistência social convive
com um modo de gestão que convoca compulsoriamente a complementariedade, o
compromisso de responsabilidade com a política de assistência social –no caso estadual,
por meio dos Pactos de Aprimoramento da Gestão Estadual. No entanto, o cumprimento
dos pontos acordados, de per si, não reservam suficiência quanto à avaliação do alcance
das mudanças provocadas. A nacionalização da política de assistência social requer o
aprimoramento gradativo e contínuo de mecanismos de concertação federativa, de
caráter democrático e participativo.
9. Persiste a baixa clareza, em grande parte, na relação com o município. Há
expressões, ainda, que reconhecem o município como se fosse uma entidade a mais e
não como instância de gestão. Se o FONSEAS, em sua gênese, protagonizou a
resistência à autonomia municipal, qual tem sido o modo de relação do órgão gestor
estadual com o município?
10. O co-financiamento correspondente à esfera estadual ganha visibilidade
a partir do Pacto de Aprimoramento da Gestão Estadual. A norma subjetiva adquire o
formato do compromisso de reserva orçamentária para o co-financiamento das políticas
municipais de assistência social. O apoio financeiro aos processos de formação
continuada nos municípios, aos sistemas de informação, monitoramento e avaliação
municipais, as ações regionalizadas, iniciativas de produção associada, são
possibilidades indicadas já na NOB-SUAS, mas, para além disso, está por se avançar na
proporcionalidade da alocação de recursos orçamentários dos entes federados. O
financiamento estadual diz respeito também à revisão da gestão de pessoas do órgão
estadual, que também foi objeto da pactuação intergestores estadual/federal
11. É preciso lembrar que os primeiros movimentos em busca da
mobilização e articulação de órgãos gestores da área da assistência social ocorreram por
iniciativa das gestões estaduais. Em 1965 e 1977 foram realizados o I Seminário
Nacional de Órgãos Estaduais de Serviços Sociais e o I Encontro Nacional de
Secretários da Área Social, respectivamente, quando já apontaram a necessidade da
reforma da estrutura institucional dos denominados serviços sociais estaduais e no
292
292
âmbito federal, para alcançar a unidade da ação. Apontaram para a necessidade da
União atuar integrada aos planos regionais e locais existentes, delegando a essas
instâncias a execução direta, a fim de evitar duplicidade de serviços e desperdício de
recursos. Manifestaram o consenso pelo incentivo à criação de Conselhos Comunitários
como espaços de elaboração e reivindicação de prioridades de atendimento social.
Assim, a expectativa sobre a concertação entre as instâncias federativas responsáveis
pela assistência social pública é datada, prévia ao estatuto constitucional adquirido em
1988 como política pública de seguridade social participativa, prévia à construção das
esferas públicas que lhe garanta o caráter democrático – à época, os conselhos
comunitários teriam um protagonismo semelhante aos Conselhos de Assistência Social.
Prévia, também, a tentativa de aglutinação de gestores de uma mesma instância de
poder, o que leva a crer que os fóruns e conselhos de assistência social, colegiados
políticos estadual e municipais de representação do ente federativo –FONSEAS,
CONGEMAS e COEGEMAS- detem uma importância capital na manutenção da
nacionalização ascendente da Política de Assistência Social.
293
293
1943 1974 1980 1981 1987 1991 1996 1998 2006
Governo
Federal
cria as
Secretaria
s do
Território
MSE
em
meio
aberto
Início da
Municipaliz
açáo MSE
em meio
aberto.
Secretaria da Promoçáo Social:
Assistência Social (compatível ao SUAS)
- Trabalho, Emprego e renda
- Segurança alimentar
- algumas açóes habitaçáo
- medidas socio educativas
Coordenaçáo do B - E do Menor ( Funabem)
Coordenaçáo dos Centros Sociais (Programa Nacional dos Centros Sociais)
Coordenaçáo de Assistência Social ( assist. Idosos, detentos e familiares; ampliaçáo infra-estrutura social)
Anexo 19: RÉGUA DO TEMPO
Passa a ser
chamado de
Roraima
(território
federal)
1962
INSTITUCIONALIDADE ESTADUAL / RORAIMA
1988
Transformado
em Estado
Criaçáo do
Território Federal
do Rio Branco
Primeiras damas +
voluntariado
+ nomeadas como
gestoras da STBES
Ministério do Interior
aprova regimentos
internos das
secretarias
SETRABES
:
incíio de
trabalho de
atendimento
sócio-educativo:
CSE Homero de
Souza Cruz
Filho
- nao teve
FEBEM
- adolescentes:
delegacias e
abrigos
Nova estrutura
organizacional da
Secretaria de
Estado Trabalho e
Bem Estar Social -
SETRABES
- executar atividades de açóes
comunitárias, migraçáo, assentamento
populacional, mercado de trabalho,
formaçáo profissional, artesanato,
programas de habitaçáo de interesse
social, programas de assistência social.
- desenvolver a política de integraçáo do
território
Estado é instalado.
Muda para
Secretaria de
Estado do
Trabalho e Bem
Estar Social
(desenvolvimento
políticas relativas às
áreas assistenciais,
trabalho e promoçáo
social)
Transformada em
Secretaria do
Trabalho e Bem
Estar Social
(políticas de bem
estar da populaçáo
+ política
valorizaçáo do
trabalho e
trabalhador
294
294
RS SC PR SP MS DF PB RR
Gênese data
ç
áo
1945 início decada de 1960 1947 1935 1979 1961 1951 1974
Locus Institucional
Serviço Social de
Menor
Departamento de
Assistência Social
Departamento Estadual da
Criança
Departamento de
Assistência Social
Fundo da Assistência
Social Matogrossense
(FASUL) (*1)
Fundaçáo do Serviço
Social do DF - FSS/DF
Departamento Social de
Estado
Secretaria da
Promoçao Social
V
ínculo Institucional
ori
g
inal
Departamento
Estadual de Saúde
Secretaria de Saúde Secretaria de Educaçáo
Secretaria da Justiça e
Negócios do Interior
órgáo de 1ª dama _____ _____ locus próprio
Secretaria da Saúde Secretaria da Saúde Secretaria da Educaçáo
Secretaria da Justiça e
Negócios do Interior
FASUL (*1)
Secretaria de Serviços
Sociais (vincula a
FSS/DF)
Secretaria Extraordinária do
Trabalho e Servos Sociais
Secretaria do
Trabalho e Bem
Estar Social
Secretaria do Trabalho
e Habitaçáo
Secretaria dos Servos
Sociais
Secretaria do Trabalho e
Assistência Social
Secretaria da Saúde e
Assistência Social
(órgão gestor = Servo
Social do Estado)
Secretaria Açáo
Social e Comunitária
Secretaria da Criança e
Assistência Social
Secretaria deTrabalho e
Serviços Sociais
Secretaria de Estado
do Trabalho e Bem
Estar Social
Secretaria do Trabalho
e Açáo Social
Supervisão da Ação
Comunitária
Secretaria da Saúde e Bem
Estar Social
Locus própio
: Secretaria
da Promoçáo Social
Fundaçáo de
Promoçáo Social -
PROMOSUL
Secretaria de Açáo
Social
Secretaria do Trabalho e
Ação Social
Criação da Secretaria
da Justiça , do
Trabalho e da
Cidadania +
pulverizaçáo de açóes
na Educaçáo e Saude
Secretaria de
Desenvolvimento Social
Secretaria do Trabalho e
Açáo Social (órgão gestor
da Assistência Social =
FASPAR - Fundação de
Ação Social do Paraná)
Fusáo Secr. Promoçáo
Social e Secr.Trabalho
Secretaria Estado de
Assistência Social,
Cidadania e Trabalho
Secretaria do
Desenvolvimento Humano
Secretaria do
Trabalho, Cidadania e
Assistência Social
Secretaria do Bem Estar
Social (depois muda a
denominação para
Secretaria do
Desenvolvimento Social)
Secretaria da Justiça,
Trabalho e Açáo Social
separa
Secretaria do
Trabalho, Ass. Social
e Economia Solidária
Secretaria da Justiça e
Desenvolvimento
Social
Secretaria do Trabalho e
Desenvolvimento
Comunitário
Secretaria da Criança e
Assuntos da Familia
(FASPAR transformada em
IASP - Instituto de Ação
Social do Paraná)
Fusáo Secr. Promoçáo
Social e Secr. Menor
(SCFBES)
Secretaria da Habitação e
Desenvolvimento
Comunitário
Secretaria da
Assistência e
Desenvolvimento Social
Secretaria do
Desenvolvimento Social e
da Familia
Secretaria do
Desenvolvimento Social,
Urbano e Meio Ambiente
Secretaria do
Desenvolvimento Social,
Trabalho e Renda
Secretaria da Assistência
Social, Trabalho e Habitaçáo
* PR= até 2002
localização institucional do órgão gestor no período da CF/88.
Anexo 20: Matriz de identidades da institucionalidade estadual da assistência social - (gênese a 2006) *
Gestões Estaduais
Mutaçóes de vínculo
institucional (por ordem
cronológica,
descendente)
295
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302
302
Anexo nº 1
As responsabilidades do órgão gestor estadual são:
a) cumprir as competências definidas no art. 13 da LOAS;
b) organizar, coordenar e monitorar o Sistema Estadual de Assistência Social;
c) prestar apoio técnico aos municípios na estruturação e implantação de seus Sistemas
Municipais de Assistência Social;
d) coordenar o processo de revisão do BPC no âmbito do Estado, acompanhando e orientando
os municípios no cumprimento de seu papel, de acordo com seu nível de habilitação;
e) estruturar a Secretaria Executiva da Comissão Intergestores Bipartite (CIB), com profissional
de nível superior;
f) estruturar a Secretaria Executiva do Conselho Estadual de Assistência Social com, no
mínimo, um profissional de nível superior;
g) co-financiar a proteção social básica, mediante aporte de recursos para o sistema de
informação, monitoramento, avaliação, capacitação, apoio técnico e outras ações pactuadas
progressivamente;
h) prestar apoio técnico aos municípios para a implantação dos CRAS;
i) gerir os recursos federais e estaduais, destinados ao co-financiamento das ações continuadas
de Assistência Social dos municípios não-habilitados aos níveis de gestão propostos por esta
Norma;
j) definir e implementar uma política de acompanhamento, monitoramento e avaliação da rede
conveniada prestadora de serviços socioassistenciais no âmbito estadual ou regional;
k) instalar e coordenar o sistema estadual de monitoramento e avaliação das ações da
Assistência Social, de âmbito estadual e regional, por nível de proteção básica e especial em
articulação com os sistemas municipais, validado pelo sistema federal;
l) coordenar, regular e co-financiar a estruturação de ações regionalizadas pactuadas na proteção
social especial de média e alta complexidade, considerando a oferta de serviços e o fluxo de
usuários;
m) alimentar e manter atualizadas as bases de dados dos subsistemas e aplicativos da REDE
SUAS, componentes do sistema nacional de informação;
n) promover a implantação e co-financiar consórcios públicos e/ou ações regionalizadas de
proteção social especial de média e alta complexidade, pactuadas nas CIB e deliberadas nos
CEAS;
o) analisar e definir, em conjunto com os municípios, o território para construção de Unidades
de Referência Regional, a oferta de serviços, o fluxo do atendimento dos usuários no Estado e as
demandas prioritárias para serviços regionais e serviços de consórcios públicos;
p) realizar diagnósticos e estabelecer pactos para efeito da elaboração do Plano Estadual de
Assistência Social, a partir de estudos realizados por instituições públicas e privadas de notória
especialização (conforme Lei nº 8.666, de 21/06/1993);
q) elaborar e executar, de forma gradual, política de recursos humanos, com a implantação de
carreira específica para os servidores públicos que atuem na área de Assistência Social;
r) propor e co-financiar projetos de inclusão produtiva, em conformidade com as necessidades e
prioridades regionais;
s) coordenar, gerenciar, executar e co-financiar programas de capacitação de gestores,
profissionais, conselheiros e prestadores de serviços;
t) identificar e reconhecer, dentre todas as entidades inscritas no Conselho Estadual de
Assistência Social, aquelas que atendem aos requisitos definidos por esta Norma para o
estabelecimento do vínculo SUAS;
u) definir parâmetros de custeio para as ações de proteção social básica e especial;
v) preencher o Plano de Ação no sistema SUAS-WEB e apresentar Relatório de Gestão como
prestação de contas dos municípios não-habilitados;
y) co-financiar no âmbito estadual o pagamento dos benefícios eventuais.
303
303
Programa de Estudos Pós-Graduados
em Serviço social
São Paulo, 24 de agosto de 2006.
Carta à direção do CRESS
O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Seguridade e Assistência Social (NEPSAS)
do Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social da PUCSP está
desenvolvendo uma Pesquisa sobre o perfil da gestão estadual na área da
assistência social para entendermos melhor o papel da gestão estadual no SUAS.
O período sucessor à inscrição da assistência social como política pública de
seguridade social, portanto após 1988, acelerou a descentralização político-
administrativa da assistência social, redefinindo o papel e competência de cada uma
das instâncias federativas (federal, estadual e municipal) e a instalação de órgãos
gestores em cada esfera governamental.
Estamos buscando entender o período de instalação das Secretarias Estaduais
ou órgão congênere no campo da Assistência Social e sua gênese institucional: órgão
inaugural da área da assistência social no estado, período de instalação, formas
administrativas que recebeu, principais ações, etc.
Interessa à pesquisa saber sobre o início da atuação do Serviço Social na
gestão estadual: ocorre na área da assistência social? Quando? Ocorre
primeiramente em outro setor de política pública (saúde, educação, etc)?
Quando? Enfim, é de interesse comum entendermos o lugar da profissão
na gestão estadual da assistência social.
Portanto, vimos pelo presente solicitar a informação sobre a existência de
trabalhos, estudos e pesquisas que relatem essa trajetória. Há acesso a esse
documento?
Nesse sentido, a pesquisadora deste
Núcleo...................................................................................(nome) e e-
mail........................................... é o contato para estabelecermos este intercâmbio de
informações e dados, de interesse acadêmico e técnico para o fortalecimento da política
pública de assistência social.
Contando com a colaboração desta valiosa instituição de ensino,
Atenciosamente,
Profa. Dra. Aldaíza Sposati
oordenadora do NEPSAS PUCSP
Anexo 2a
Rua Monte Alegre, 984
4º andar - Perdizes
tel/fax: (011) 3670-8512
304
304
Programa de Estudos Pós-Graduados
em Serviço social
São Paulo, 24 de agosto de 2006.
Carta à direção do Curso de Serviço Social
O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Seguridade e Assistência Social
(NEPSAS) do Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social da
PUCSP está desenvolvendo uma Pesquisa sobre o perfil da gestão estadual
na área da assistência social para entendermos melhor o papel da gestão
estadual no SUAS.
O período sucessor à inscrição da assistência social como política pública
de seguridade social, portanto após 1988, acelerou a descentralização político-
administrativa da assistência social, redefinindo o papel e competência de cada
uma das instâncias federativas (federal, estadual e municipal) e a instalação de
órgãos gestores em cada esfera governamental.
Estamos buscando entender o período de instalação das Secretarias
Estaduais ou órgão congênere no campo da Assistência Social e sua gênese
institucional: órgão inaugural da área da assistência social no estado, período de
instalação, formas administrativas que recebeu, principais ações, etc.
Portanto, vimos pelo presente solicitar a informação sobre a existência de
estudos e pesquisas que relatem essa trajetória. Há TCC´s de aluno, outras
pesquisas realizadas ou em andamento? Há acesso a esse documento?
Nesse sentido, a pesquisadora deste
Núcleo...................................................................................(nome) e e-
mail........................................... é o contato para estabelecermos este
intercâmbio de informações e dados, de interesse acadêmico e técnico para o
fortalecimento da política pública de assistência social.
Contando com a colaboração desta valiosa instituição de ensino,
Atenciosamente,
Profa. Dra. Aldaíza Sposati
Coordenadora do NEPSAS/ PUCSP
Rua Monte Alegre, 984
4º andar - Perdizes
tel/fax: (011) 3670-8512
Anexo 2b
305
305
Programa de Estudos Pós-Graduados
em Serviço social
São Paulo, 04 de SETEMBRO de 2006.
Carta ao (à) gestor(a) do órgão estadual de assistência social
O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Seguridade e Assistência Social (NEPSAS)
do Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social da PUCSP está
desenvolvendo uma Pesquisa sobre o perfil da gestão estadual na área da
assistência social para entendermos melhor o papel da gestão estadual no SUAS.
O período sucessor à inscrição da assistência social como política pública de
seguridade social, portanto após 1988, acelerou a descentralização político-
administrativa da assistência social, redefinindo o papel e competência de cada uma
das instâncias federativas (federal, estadual e municipal) e a instalação de órgãos
gestores em cada esfera governamental.
Estamos buscando entender o processo de instalação das Secretarias Estaduais
ou órgão congênere no campo da Assistência Social e sua gênese institucional e, para
tanto, solicitamos vossa colaboração, respondendo os 6 itens abaixo relacionados:
órgão inaugural da área da assistência social no estado,
período de instalação e principal função,
formas administrativas que recebeu até o desenho atual e suas principais ações,
o lugar ocupado pela primeira dama na gestão estadual: origem, coincidência ou
não como órgão inaugural da área da assistência social; convívio deste órgão na
atualidade;
relação histórica com a ex-LBA (Legião Brasileira de Assistência): influência da
Superintendência estadual da LBA na conformação do órgão estadual; período;
relação da antiga/ atual Febem com a gestão estadual
Nesse sentido, a pesquisadora deste
Núcleo....................................................(nome), no e-mail
é o contato para estabelecermos este intercâmbio de
informações e dados, de interesse acadêmico e técnico para o fortalecimento da política
pública de assistência social.
Contando com a colaboração desta valiosa instituição de ensino, atenciosamente,
Profa. Dra. Aldaíza Sposati
Coordenadora do NEPSAS/ PUCSP
Anexo 2c
Rua Monte Alegre, 984
4º andar - Perdizes
tel/fax: (011) 3670-8512
306
306
Anexo 3
PESQUISA SOBRE AS OBRAS SOCIAIS MATRICULADAS
DEPARTAMENTO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – SP 1937
- CONDIÇÕES DE FUNCIONAMENTO -
1. Dados de identificação
– nome, endereço; diretoria; oficial (governamental, particular,
utilidade pública); de caráter religioso; credo (religioso
ou político); fundação ou associação; nome da
mantenedora (“nome do centro da qual depende a obra);
data de fundação; finalidade; âmbito de ação (“indicar a
parochia, bairro, districto, comarca, município”).
2. Condições de atenção –
Condições de admissão: idade, sexo, estado civil, nacionalidade, cor, pagamento (sim ou não) e
gratuidade (sim ou não)
Condições de eliminação: previstas em regulamento
Outras condições:...
3. Instalações da obra
– adequação (sim ou não, de acordo com anexo 4); capacidade;
lotação na data da realização da pesquisa; número de (...)
assistidos; internos e externos (nº).
4. Organização interna
– detalhar para serviços administrativos os cargos e serviços
técnicos (tipo de serviços); pessoal, remuneração (se há
voluntário), horário.
- disciplina da casa: “regulamento a que devem se submeter os
assistidos”.
- mecanismo do serviço de assistência: métodos e técnicas de
atendimento.
5. Recursos da obra (
valores financeiros) – patrimônio; contribuição de sócios; subvenções
(federal, estadual, municipal, particular); escrituração organizada.
6. Problemas e soluções da obra:
Higiênico = dormitório mal instalado, alimentação deficiente;
instalação sanitária em mau estado; facilidade de transmissão
de moléstias contagiosas.
Educativas = Nas obras que se ocupam de crianças: corpo
docente deficiente; falta de cursos especializados. Nas obras
que se ocupam de adultos: dificuldades para combater a
exploração, a imoralidade.
Econômicas = falta de recursos para atingir finalidade.
Sociais = A repercussão que os serviços da obra tem no meio
social.
7. Resultados da obra:
adoção dos critérios: nulo, regular, bom quanto aos aspectos:
-econômico;
-higiênico;
-morais;
-sociais.
307
307
Anexo 4
308
308
Anexo 5
309
309
CLASSIFICAÇÁO SEGUNDO
CATEGORIAS DE SERVIÇO SOCIAL
EXPRESSÁO
CLASSIFICAÇÁO SEGUNDO
O GÊNERO DE
ASSISTÊNCIA
GÊNERO
TIPOS DE OBRAS DE ASSISTÊNCIA E SERVIÇOS
QUE MANTEM
benemerência
- Abandonados
-
- benemerência ad hoc materialmente abandonado
- Asilos (creches, escolas maternais, jardins de
infância, cursos primários e profissionais)
- benemerência institucional enjeitado, exposto, perda de contato com família, órfão.
moralmente abandonado
- Orfanatos (creches, escolas maternais, cursos
primários e profissionais)
- filhos de pais indignos (imorais, cruéis, condenados);
- filho de pais incapazes, filho de pais negligentes
- Reformatórios (curso primário, curso profissional)
----------------------------------- -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------------------
-
- Asilos
- Desvalidos : pessoas desprovidas de meios de subsistência: inválidos, velhos,
mendigos, egresso de estabelecimento hospitalar.
- Escolas
. Dispensário
- Albergue Noturno
- mútuas
- cooperativas
- sociedades de habitaçóes populares
- restaurantes, pensóes
- escolas noturnas
SEGURO SOCIAL
previne / repara
consequências e deficiências
sócio-econômicas
assistência aos egressos - Egresso de prisáo e liberado condicional náo foram encontradas obras particulares
serviços de higiene e pré-natal
serviços de puericultura
creches
escolas maternais
jardins de infância
parques infantis, cooperativas escolares, bibliotecas
infantis, curso primário e profissional, escola especial
para anormais, obra de profilaxia de prostituição,
preventório, dispensário, obra de proteço à mulher
vítima de abuso sexual.
Fonte: Relatório da Seção de Assistência Social - 1938
AUTO-ASSISTÊNCIA (self help)
educação voltada à
realizaçáo do auto
rendimento
assistência à família - Grupo de pessoas unidas por laços de parentesco
remove as causas do mal
vantagens restritas aos
beneficiários
assistência aos trabalhadores
DEPARTAMENTO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - SP 1937 - CLASSIFICAÇÁO
PESQUISA SOBRE AS OBRAS SOCIAIS MATRICULADAS
assistência aos desvalidos
Pessoas que obtem sua subsistência pelo trabalho
Departamento de Assistência Social. Secretaria da Justiça e Negócios do Interior de SP. 1937
BENEFICÊNCIA (assistência paliativa)
Assistência à Infância
abandonada e delinquente
ASSISTÊNCIA PREVENTIVA evita aparecimento do mal
ASSISTÊNCIA CURATIVA (remediar)
AUXÍLIO MÚTUO
- Delinquentes
- menores de 18 anos autores ou cúmplices de atos como crime ou
contravenções
Anexo 6
310
310
SERVIÇO GOVERNAMENTAL OBRA SOCIAL SERVIÇOS QUE MANTINHAM
- creches
- escolas maternais
- jardins da infância
Serviço Social dos Menores - curso primário
Abandonados. - curso profissional
- escolas especiais para anormais
… e Delinquentes Reformatórios - curso primário
- curso profissional
Asilos e Vilas
Albergues Noturnos
Escolas de readaptaçáo (colônias de trabalho)
Dispensários
Mútuas
Instituiçóes de seguro social
Cooperativas
Sociedades de habitaçóes populares
Sociedades recreativas
Colônias de férias
Restaurantes populares
Pensionatos
Escolas Noturnas (alfabetização, formação e
aperfeiçoamento profissional)
Serviço de higiene pré-natal
Serviço de puericultura
Escolas maternais
Jardins da infância
Cooperativas escolares
Bibliotecas infantis
Oratórios festivos e parques infantis
Cursos primários e profissionais
Escolas especiais para anormais
Preventórios infantis
Dispensários
Centros sociais
Obras de proteção a mulheres vítimas de abusos sexuais
Obras de profilaxia da prostituiçáo
Serviço Social dos Trabalhadores
Serviço Social da Família
Fonte: Relatório "A Divisáo Técnica do Departamento de Serviço Social durante o ano de 1942." Coord.: Mª Kiehl. Secretaria da Justiça e Negócios do Interior de São Paulo
ANEXO 7
CLASSIFICAÇÁO DAS OBRAS SOCIAIS DE BENEFICÊNCIA OU DE SERVIÇO SOCIAL MATRICULADAS
NO DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL SP - 1942
Internatos (asilos e orfanatos)
Serviço Social dos Desvalidos
Serviço Social dos Egressos não havia obra particular de assistência
311
311
Anexo 8
Ementa 1
Marcos regulatórios da institucionalidade estadual da assistência social São Paulo
TIPO DESTAQUE DE CONTEÚDO OBSERVAÇÓES
Lei nº 2497 –
24/12/1935
Organiza o Departamento de Assistência
Social do Estado, subordinado à Secretaria da
Justiça e Negócios do Interior.
Organiza os Serviços de Assistência e
Proteção: a menores; aos desvalidos; aos
trabalhadores; aos egressos de reformatórios e
estabelecimentos penais, correcionais e
hospitalares; à família. Organiza o consultório
jurídico de serviço social
Substitui o Decreto nº 7078 –
06/04/1935
Decreto nº
9486 –
13/09/1938
Altera denominações dispostas pela Lei nº
2497/35:
- muda para Departamento de Serviço Social;
- muda para Serviço Social: dos menores; dos
desvalidos; dos trabalhadores; dos detentos e
egressos; da família.
- muda para Procuradoria de Serviço Social
Cria, como postos de
cooperação e educação
sociais, cinqüenta CASAS
DE SERVIÇO SOCIAL, que
podem ser convertidas em
postos itinerantes de serviço
social
Decreto-Lei nº
17274 –
06/06/1947
Transforma o Departamento de Serviço
Social:
- passa a denominar-se Serviço Social do
Estado;
- subordina o Serviço Social dos Menores
diretamente à Secretaria da Justiça e Negócios
do Interior
Ficam atribuídos ao Serviço
Social de Menores todos os
serviços relativos aos
menores necessitados,
abandonados e delinqüentes
do Estado.
Decreto-Lei nº
17339 –
28/06/1947
Cria a Secretaria de Estado dos Negócios de
Saúde Pública e da Assistência Social
O Serviço Social do Estado é
transferido para esta
Secretaria.
Lei nº 1943 –
04/12/1952
Dispõe sobre a denominação das instituições
oficiais de assistência social, destinadas a
recolher a infância desamparada.
- não poderão denominar-se como asilo,
abrigo, orfanato, reformatório ou casa
correcional.
- preferência aos termos lar, escola,
educandários, creche e outros que se ajustem
à finalidade do estabelecimento
A desatenção ao disposto na
lei impede que o Estado
declare de utilidade pública
e/ou conceda
auxílio/subvenção às
instituições particulares.
Decreto nº
42148 –
04/07/1963
Institui e regulamenta Curso para monitor de
menores excepcionais no Serviço Social de
Menores (SMM):
destinado à formação de monitores
educacionais para débeis mentais, (dirigido a
pessoal estranho ao SSM) e formação de
Criado no Instituto Dona
Paulina de Souza Queiroz
(órgão do SSM). Requisito
escolar:
Bacharéis ou licenciados
em Pedagogia, Filosofia
312
312
monitores de grupo(dirigido a pessoal do
SMM) – Art. 1º § 1º
ou Psicologia
Professores normalistas
Pessoal do Serviço Social
de Menores diplomado em
curso secundário ou
profissional, com 2 anos
de serviço.
Lei nº 9362 –
31/05/1966
Cria Grupos de Planejamento Setorial (GPS)
junto aos Gabinetes dos Secretários de
Estado, incumbidos do planejamento e
reforma administrativa da Pasta.
Decreto nº
47830 –
16/03/1967
Dispõe sobre os Grupos de Planejamento
Setorial (GPS)
Prevê a organização de:
- Colegiado deliberativo acerca das diretrizes
setoriais, da reforma administrativa e da
regionalização do serviço público estadual;
- equipe técnica: realiza estudos e
diagnósticos; orienta e coordena elaboração
dos programas e orçamento-programa; analisa
propostas de reforma administrativa; controla
andamento físico e financeiro dos programas
e orçamento-programa.
O GPS tem função de
assessoria, devendo as
decisões do Colegiado serem
sancionadas pelo Secretário
de Estado.
Decreto nº
49165 –
29/12/1967
Dispõe sobre a reforma administrativa das
atividades de promoção social, cultura,
educação física, esportes e turismo.
Cria Secretaria da Promoção Social
- Secretaria do Governo
passa a denominar-se
Secretaria da Promoção
Social.
- Secretaria de Saúde Pública
e da Assistência Social passa
a denominar-se Secretaria da
Saúde Publica
Lei nº 9994 –
20/12/1967
Dispõe sobre a denominação de instituições
de amparo à infância
Decreto nº
26906 –
15/03/1987
Cria a Secretaria do Menor (a reforma
administrativa de 1988 transfere parte das
unidades e atribuições da Secretaria
Promoção Social para a nova Secretaria)
Decreto nº
29355 –
14/12/1988
Transfere unidades e atribuições da Secretaria
do Trabalho para a Secretaria da Promoção
Social
Decreto nº
31768 –
28/06/1990
Modifica a denominação da Secretaria da
Promoção Social para Secretaria do Trabalho
e Promoção Social.
Decreto nº
35341 –
16/07/1992
Modifica a denominação para Secretaria da
Promoção Social, transferindo as questões
relativas ao tema do trabalho para pasta
específica.
Decreto nº
36454 –
19/01/1993
Secretaria do Menor passa a denominar-se
Secretaria da Criança, Família e Bem Estar
Social, incorporando outras unidades da
313
313
Secretaria da Promoção Social.
Lei nº 8312 –
12/05/1993
Extingue a Secretaria da Promoção Social e
transfere suas atribuições à Secretaria da
Criança, Família e Bem Estar Social.
Decreto nº
42826 –
21/01/1998
Reorganiza a Secretaria da Criança, Família e
Bem Estar Social e altera sua denominação
para Secretaria de Assistência e
Desenvolvimento Social
Decreto nº
45632 –
16/01/2001
Altera denominação para Secretaria Estadual
de Assistência e Desenvolvimento Social
Decreto nº
49688 –
17/06/2005
Reorganiza a Secretaria Estadual de
Assistência e Desenvolvimento Social
Revoga o Decreto nº 42826 -
21/01/1998
Lei nº 12246 –
27/01/2006
Revoga Lei nº 2497 –
24/12/1935 e Decreto
Estadual nº 9486 –
13/09/1938.
314
314
Anexo 9
Ementa 2
Marcos regulatórios da institucionalidade estadual da primeira dama – São Paulo
TIPO DESTAQUE DE
CONTEÚDO
OBSERVAÇÓES
Lei nº 10064 – 27/03/1968 Cria o Fundo de
Assistência Social do
Palácio de Governo
(FASPG) – dirigido por um
Conselho Deliberativo, sob
a presidência da esposa do
governador de Estado ou
de outra pessoa de sua livre
escolha
Gestão Maria do Carmo
Mellão de Abreu Sodré
(1967/1971) anteriormente,
havia a Fundação Plano de
Amparo Social (PAS)
Decreto nº 49758 –
04/06/1968
Aprova o regulamento do
FASPG:
finalidades: assistência
econômica, educacional e
médico-hospitalar aos
necessitados; prestar
assistência econômica às
entidades assistenciais
devidamente registradas
nos órgãos da Secretaria da
Promoção Social; prestar
assistência econômica às
entidades privadas que se
dediquem a atividades
educacionais e médico
hospitalares; manter a
Assistência Social e o
Posto de Hidratação do
Palácio do Governo
Revogado pelo Decreto nº
36692 – 23/04/1993
Decreto nº 50588 –
24/10/1968
Altera o regulamento do
FASPG
Decreto-lei complementar
nº 16 – 02/04/1970
Dispõe sobre a instituição e
o funcionamento de fundos
especiais na Administração
Extensivo à toda
Administração Pública
estadual, inclui FASPG.
Decreto nº 1232 –
07/03/1973
Autoriza a implantação do
Programa de Recuperação
de Recursos Humanos do
SASPG – Serviço de
Assistência Social do
Palácio do Governo
Gestão Maria Zilda Gamba
Natel (1971-75)
Funciona na Fazenda São
Roque (Franco da Rocha)
da Secretaria da Saúde.
Decreto nº 1303 –
20/03/1973
Altera regulamento do
FASPG e amplia suas
Manter a Assistência
Social, o Posto de
315
315
finalidades (ao lado, em
grifo)
Hidratação do Palácio do
Governo e a Fazenda São
Roque
Decreto nº 6281 –
09/06/1975
Transfere para a Secretaria
da Promoção Social a
responsabilidade da
execução do Programa de
Recuperação de Recursos
Humanos
Gestão Brasília
(Lila) Byington
Egydio Martins (1975-79)
Lei nº 1106 – 07/10/1976 As importâncias relativas
às vendas dos materiais ou
bens referidos (*),
efetuadas pelo FASPG,
poderão ser despositados
em conta especial do
Banespa ou CEESP
(*) muda artigo 6º da Lei
nº10064/98
Lei nº 3031 – 15/10/1981 Amplia receitas do FASPG
(abaixo,em grifo) auxílios
ou subvenções concedidas
pela União, Estados ou
Municípios, bem como por
autarquias ou outros órgãos
ou entidades públicas ou
privadas, nacionais,
estrangeiras ou
internacionais
Gestão Silvia Lutfala
Maluf (1979-1982)
altera redação do inciso II,
art, 4º, Lei 1064
Gestão Neusa Augusto
Marin (1982-1983)
Decreto nº 20869 –
15/03/1983
Modifica finalidades do
FASPG (em grifo): prestar
assistência econômica,
educacional, médico-
hospitalar e sanitária
aos
necessitados, manter
vínculos estreitos com
órgãos de assistência
social, particulares ou
governamentais nos
assuntos pertinentes;
conhecer e cooperar com
os programas de órgãos
governamentais de
assistência social; distribuir
de acordo com critérios e
normas previamente
fixadas, recursos
financeiros e materiais a
entidades assistenciais que
se dediquem a atividades
educacionais, médico-
Gestão Lucy Pestana
Silvia Franco Montoro
(1983-1987)
316
316
hospitalares e outras de
natureza social; manter a
assistência social e postos
de atendimento.
Decreto nº 20925 –
16/05/1983
Muda a identificação de
FASPG para FUSSESP –
Fundo Social de
Solidariedade do Estado de
SP
Incentivo à
“descentralização paralela”
estimulando a
institucionalidade da 1ª
dama municipal
Decreto nº 21984 –
02/03/1984
Organiza a Secretaria
de Estado de Governo e
traz como campo
funcional, dentre
outros, a assistência
social a pessoas físicas
e o auxílio financeiro a
entidades filantrópicas
e às de natureza
pública.
São órgãos vinculados
a esta Pasta:
FUSSESP e Instituto
Paulista de Adoção
FUSSESP conta com
uma unidade de
despesa própria
Decreto nº 26492 –
19/12/1986
Autoriza e permite uso em
favor do CNPq de
dependências de imóvel em
SP/SP (Centro de Ciências
para Juventude)
Lei nº 6544 – 22/11/1989 Doação de bens móveis às
entidades sociais
Gestão Alaíde Cristina
Barbosa Ulson Quércia
(1987-1991)
Decreto nº 35374 –
23/07/1992
Estabelece as
condicionalidades para a
doação de bens móveis:
“(...) documentação
estatutária ou registro na
Secretaria de Promoção
Social: documentação ou
registro na CAR
(Coordenação de Ação
Regional) ou no CEAS
(Conselho Estadual de
Auxílios e Subvenções)” –
(órgão da SEPS)
Gestão Nair Passos (IKA)
Fleury (1991-1994)
Decreto nº 36692 –
23/04/1993
Altera o regulamento do
FUSSESP – Competências:
317
317
- conceber, implementar e
desenvolver, isoladamente
ou em cooperação com
outros órgãos e entidades
de promoção social,
programas e serviços de
atendimento à população
carente do Estado;
- prestar apoio técnico
econômico-financeiro e
operacional a entidades
regularmente cadastradas
junto à Secretaria da
Criança, Família e Bem
Estar Social e a Fundos
Sociais de Solidariedade
legalmente instituídos em
municípios do Estado
Decreto nº 42875 –
20/02/1998
Revisão de competências
(abaixo, em grifo):
- prestar apoio técnico,
econômico-financeiro e
operacional a entidades
sociais, observado, em
relação à doação de bens
móveis o disposto no
Decreto 35374/92, e aos
Fundos Sociais de
Solidariedade em
Municípios do Estado
Gestão Florinda Gomes
(Lila) Covas (1995-2001)
Altera Decreto 36692/93
Decreto nº 42876 –
20/02/1998
Organiza os serviços
administrativos e
assistenciais do FUSSESP:
prevê a instalação de
células de apoio à Grande
São Paulo e ao interior,
com 17 regionais
É a regionalização do
FUSSESP, por meio das
células de apoio
(outra via paralela de duplo
comando: a Secretaria
Estadual já tinha sua
estrutura regionalizada em
27 DRADS – Divisão
Regional de Assistência e
Desenvolvimento Social)
Decreto nº 44960 –
14/06/2000
Transfere para o FUSSESP
as atribuições relativas a
material excedente * do
Governo estadual, por
meio do Centro de Material
Excedente (gerenciava a
solicitação de doações às
prefeituras e entidades
sociais)
* regido pelo Decreto nº
44723/00 (sobre material
excedente ou inservível)
Decreto nº 44993 – Cria no FUSSESP as
318
318
23/06/2000 unidades:
Estação Especial Leste
Estação Especial Sul
Estação Especial Norte
Casa da Solidariedade –
Parque Dom Pedro II
Decreto nº 46827 –
12/06/2002
Acrescenta, nas
competências, a
necessidade de atuar “em
consonância com a política
estadual de assistência
social, nos termos do art. 8º
da Lei Federal 8742/93 –
LOAS”
Integra, no Conselho
Deliberativo do Fundo, um
representante da Secretaria
de Estado da Assistência e
Desenvolvimento Social –
SEADS
Gestão Maria Lucia
Guimarães Ribeiro (Lu)
Alckmin (2001-2002/2003-
2006)
Primeira vez que ocorre a
dupla menção: operar de
acordo com a POLÍTICA
Estadual e de acordo com a
LOAS.
Decreto nº 49529 -
11/04/2005
Reorganiza a Casa Civil e
são entidades vinculadas a
ela: FUNDAP, IMESP,
PRODESP, FUSSESP.
O FUSSESP sempre foi
ligado à Secretaria de
Governo do Estado de SP,
sendo que a Casa Civil é
um órgão dela.
Decreto nº 50688 –
31/03/2006
Ratifica o FUSSESP como
Unidade Orçamentária
Decreto nº 51737 –
05/04/2007
Altera a denominação do
FUSSESP para Fundo de
Solidariedade e
Desenvolvimento Social e
Cultural do Estado de São
Paulo
Gestão Mônica Serra
(2007-2010)
Decreto nº 51741 –
09/04/2007
Transfere do Fundo Social
para a Secretaria de Saúde
a Estação Especial da Lapa
319
319
Anexo 10.a.1
320
320
Anexo 10.a.2
321
321
Anexo 10.a.3
322
322
Anexo 10.a.4
323
323
Anexo 10.b
324
324
Anexo 10.c
325
325
Anexo 10.d
326
326
Anexo 11
327
327
Anexo 12
O Cruzeiro - 1 de outubro de 1960.
Primeira
Dama vai
ganhar
novo
nome
Reportage
m de
EURILO
DUARTE
UM
homem se
despede
do povo. É Juscelino Kubitschek de
Oliveira. A 3 de outubro, quando quase 15
milhões de brasileiros escolhem o novo
Presidente, êle começa a arrumar as
malas para deixar o Govêrno. Ao seu lado
está uma mulher. É Dona Sarah
Kubitschek. Sua figura feminina - que se tornou popular com a instituição das
Pioneiras Sociais - vai ser substituída por outra Primeira Dama. Quem será?
Dona Leonor. Dona Eloá. Dona Antonieta. Três nomes. Três hipóteses. Cada
uma delas representa uma possibilidade. Mas sòmente uma delas irá ao pôsto
até agora ocupado por Dona Sarah. Seus maridos, candidatos, apresentaram
programas de Govêrno. E elas, como Primeiras Damas em potencial, também
têm suas idéias, seus planos, suas decisões. “O Cruzeiro” conversou com
Dona Leonor, Dona Eloá e Dona Antonieta. Ouviu parentes. Ouviu amigos.
Sabe o que cada uma pensa da assistência social. Como entendem a atuação
da mulher na vida do País. E, sobretudo, como agem elas na vida do lar. O
leitor, que soube escolher seu Presidente, pode saber agora qual a Primeira
Dama que vai ter. Quem é o que faz, dentro e fora do lar.
Dona Leonor não gosta de gatos
DONA Leonor é dinâmica. Fundou e preside a Bandeira Paulista Contra a
Tuberculose. Promoveu inúmeras campanhas para construção de hospitais e
maternidades. É contra o “feminismo exaltado”, admitindo que a mulher
trabalhe fora do lar sòmente para manutenção da família. Acha que a
burocracia é o grande inimigo na assistência social. “Às vêzes uma mãe
precisa de leite para matar a fome de um filho, mas quando o leite chega a
fome já matou a criança.” Conservadora nas instalações da casa (construção
antiga onde reside há 25 anos), todos os seus móveis são de linhas clássicas,
grande parte em jacarandá entalhado. As paredes são ornamentadas com
pinturas acadêmicas, contra um fundo em tonalidade pérola. Não pretende
deixar a velha casa, coisa que só fará obrigada pela “invasão” dos
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apartamentos que começam a subir a Rua
Albuquerque Lins, cidade de São Paulo. Gosta
de bichos, menos de gatos - “que parecem
certos políticos: são infiéis, falsos, aduladores
só quando lhes convém”. Em casa há dois
cachorros, Pingo e Roy. Quatro papagaios,
duas araras, nove canários. Dona Leonor tem
quatro filhos, dois homens e duas mulheres, e
doze netos que a visitam diàriamente. Dispõe
de um pequeno contingente de empregadas
domésticas, ativas e inativas. A mais velha,
chamada Maria, foi cozinheira durante 25 anos.
Agora ganhou "aposentadoria", mas ainda
círcula na casa com os seus 70 anos. É Tuta para todos da família. A
governanta, portuguêsa Patrocínia, trabalha com os Barros há 23 anos. Dona
Leonor gosta de acompanhar pessoalmente o preparo da comida e suas visitas
à cozinha não são surprêsa. Não suporta coquetéis e raramente faz refeições
na sala de jantar: prefere uma pequena sala de almôço. Dona Paulina, sua
secretária, recebe muitos convites para Dona Leonor comparecer a recepções.
Quase sempre são recusados. Tôdas as manhãs ela visita alguns hospitais e, à
tarde, invariàvelmente, vai ver a mãe, Dona Elisa de Moraes Mendes, que
conta 93 anos de idade. O problema da favela a preocupa e está empolgada
com o livro escrito pela favelada Carolina de Jesus. Às vêzes acompanha
Adhemar em suas excursões políticas, que encara como missão em prol dos
humildes.
Dona Eloá quer o fim das favelas
DONA Eloá acompanha Jânio Quadros em quase tôdas as viagens. Mas só faz
vida social quando imposta pelos compromissos do marido. Orienta em pessoa
os estudos da filha, Dirce Maria, no quarto ano ginasial do Colégio Sion
paulista, onde também estudou. Foi Jânio quem pôs na filha o apelido de Tutu,
prato preferido por êle. Dona Eloá se declara interessada pela assistência
social e pelas entidades públicas ou particulares que a promovem. Acredita que
a Legião Brasileira de Assistência, depois de moralizada, pode prestar grandes
serviços à mãe e à criança desamparadas. O SAM, do Ministério da Justiça, é
outra instituição que, no seu entender, deve ser recuperada. Vê com bons
olhos a ação das Pioneiras Sociais, de Dona Sarah Kubitschek, pretendendo
manter e ampliar seu raio de ação, se chegar a Primeira Dama. As favelas e os
mocambos, pragas semelhantes, devem ser exterminadas. Construção de vilas
para o operariado é providência que tem prioridade, em seus planos, bem
como no programa do marido, com o aproveitamento dos recursos da
Previdência Social e da Fundação da Casa Popular. É contra arranha-céus e
edifícios de apartamentos. Em Brasília, Fortaleza, Belém, João Pessoa, Recife,
Rio, São Paulo, Pôrto Alegre e Belo Horizonte, planeja intensificar o combate à
mortalidade infantil, atualmente com índices desanimadores. Está apavorada
com o abandono da criança no Norte e Nordeste, quadro não muito diferente
do que viu em Minas, Goiás e Mato Grosso. É apontada como possuidora de
hábitos simples e modestos. Não gosta de luxar. Muitos dos seus vestidos e da
filha são feitos em casa, por suas mãos. Faz tricô muito bem. Vai a teatro e
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cinema, tendo predileção pelo teatro nacional.
Fala com todos, indistintamente.
É
considerada
uma das audiências mais fáceis de São Paulo.
E reconhecem-na como uma das maiores
fôrças políticas da Capital paulista,
notadamente nos bairros operários, embora
não se interesse por qualquer partido nem por
qualquer cargo eletivo. E nos comícios de
Jânio, ela se tornou figura freqüente.
Dona Antonieta perde a matinê
Sítio é uma tranqüila localidade mineira. Lá
nasceu o Marechal Lott. Lá nasceu também Dona Antonieta, a espôsa. São
primos, ela sobrinha e afilhada da mãe dele, Dona Batistina. Brincaram juntos,
cresceram juntos, mas Dona Antonieta, muito jovem, casou com Antônio José
Zeferino do Amarante Neto, outro primo. E ainda jovem também ficou viúva,
com um filho. Veio para o Rio e começou a ensinar crianças, como professôra
da Prefeitura do antigo Distrito Federal. Com êsse dinheiro, parco, educou o
filho e sustentou o pai doente, Senhor Eudoro Lasthenes de Andrade. Deu
aulas na Escola Equador, Vila Isabel, até 1946, quando se aposentou. Lott
casara e também ficara viúvo. No dia 31 de julho de 1952, as portas da matriz
de Teresópolis abriam-se para receber um casal maduro, mas sorridente: o
então General Lott e sua prima, que, em solteira, tinha pràticamente o mesmo
nome de hoje - Antonieta Duffles Teixeira de Andrade. Ela e êle gostava muito
de dinema. Tôdas as quintas e sábados, de 2 às 4, estavam na matinê do
“miramar”, no Leblon. Metòdicamente. Essa alegria acabou quando Lott asumiu
o Ministério da Guerra, em 1954. Nunca mais houve matinê no “Miramar”.
Agora, o ponto de contato eraa música clássica. Em seu gabinete, o Marechal
mantinha o rádio ligado para a “Roquete Pinto”. À noite, em casa, a família se
reunia (êle tem 6 filhos do primeiro casamento) para ouvir uma dupla ao piano:
Lott e Dona Antonieta. Até hoje tocam a quatro mãos, tendo sido aumentada a
assistência com três netos. E rezam juntos depois de cada jantar. Em alguns
serões, Lott lê e Dona Antonieta costuraa o seu lado. É ela quem conserta as
meias dos netos. Quem fêz a renda de Irlanda para o casamento do filho, Major
Duffles. A nora, Dona Nally, é sobrinha dela. Os Duffles casam na família. E
muitas blusas distribuídas pelas Pioneiras Sociais saíram das mãos habilidosas
de Dona Antonieta, que também é admirável cozinheira, mestre em quibebe de
abóbora, couve à mineira e quitutes tradicionais. Prefere as cores sóbrias e não
transige em questões de moral. Odeia a política. Não compareceu a um só
comício do marido. “Se tiver de exercer atividades de Primeira Dama, será à
minha revelia, porque prefiro a vida de casa”, confessa com sinceridade.
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