As regularidades de associação entre papéis semânticos e funções gramaticais ocorrem
também quando se comparam línguas diferentes. Classes de verbos que apresentam
uniformidade na realização dos argumentos em uma dada língua tendem também a apresentar
uniformidade análoga em outras línguas. Paralelamente, classes de verbos que apresentam
irregularidades na associação de papéis semânticos a relações gramaticais em uma dada
língua, tendem também a manifestar variações desse tipo de associação em outras línguas
(LEVIN; RAPPAPORT-HOVAV, 1995).
Por exemplo, do ponto de vista da uniformidade de realização dos argumentos, os
verbos que projetam argumentos Agente e Paciente (por exemplo, os verbos matar,
destruir, cortar) tendem a ser transitivos em todas as línguas. Além disso, excetuando-se as
línguas Ergativas
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, que, em tese, apresentam uma inversão regular na associação entre papéis
semânticos e funções gramaticais, esses papéis são realizados da seguinte forma: o Agente
como Sujeito e o Paciente como Objeto. Assim, os papéis semânticos Agente e Paciente
são, de algum modo, privilegiados na associação entre os papéis semânticos e as funções
gramaticais Sujeito e Objeto. Outro exemplo de uniformidade ocorre com os verbos
psicológicos. Por exemplo, o verbo assustar não apresenta variação de realização dos
argumentos entre as diversas línguas (LEVIN; RAPPAPORT-HOVAV, 2005), realizando o
Estímulo como Sujeito e o Experienciador como Objeto.
Do ponto de vista da variação na realização dos argumentos, os verbos psicológicos
que realizam o Experienciador como Sujeito, por exemplo, temer, tendem a apresentar
variação na realização dos argumentos. Se em línguas como português e inglês esses verbos
realizam o Experienciador como Sujeito, em línguas como o islandês, o russo e o marata,
uma das línguas oficiais da Índia, o Experienciador pode ser realizado como Oblíquo no
caso dativo, e não no nominativo, que é o caso regular do Sujeito (MOORE; PERLMUTTER,
2000; CROFT, 1991). O verbo piacere do italiano é realizado em configuração sintática desse
tipo, como atesta o exemplo transcrito como (44), em que a preposição dativa a introduz o
Experienciador realizado na função sintática de “Complemento Oblíquo”.
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Postula-se que o papel semântico do Objeto sintático é exclusivamente determinado pelo significado do verbo
que o projeta; já o papel semântico do Sujeito sintático é composicionalmente determinado pelo verbo e pelo
argumento realizado como o Objeto. Em função disso, a existência de regularidades na associação entre papéis
semânticos e relações gramaticais em uma dada língua é uma evidência de que o significado do verbo é um fator
relevante para a realização sintática das frases.
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Nas línguas Ergativas, o Tema projetado pelos verbos transitivos é sintaticamente realizado no mesmo caso
morfológico (o Absolutivo) do argumento projetado pelos verbos intransitivos. O Agente é realizado no caso
Ergativo. Como o argumento dos verbos intransitivos é realizado como Sujeito e o caso Absolutivo é
normalmente não marcado e realizado em posição mais distante do verbo, é possível argumentar que as línguas
Ergativas realizam o Tema como Sujeito e o Agente como Objeto (BAKER, 1997).