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DIRCEU CLEBER CONDE
A ALTERNÂNCIA DA REFERÊNCIA DO SUJEITO-ENUNCIADOR
COMO EXPRESSÃO DA IDENTIDADE E SEUS EFEITOS DE
SENTIDO
Londrina, 2008.
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DIRCEU CLEBER CONDE
A ALTERNÂNCIA DA REFERÊNCIA DO SUJEITO-ENUNCIADOR
COMO EXPRESSÃO DA IDENTIDADE E SEUS EFEITOS DE
SENTIDO
Tese de doutoramento apresentada ao
Programa de s-Graduação em Estudos
da Linguagem da Universidade Estadual de
Londrina, como requisito parcial à obtenção
do título de Doutor.
Orientador: Prof.Dr. Luiz Carlos Fernandes
Londrina, 2008.
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca Central UEL, Londrina – PR., Brasil)
C745a CONDE, Dirceu Cleber
A alternância da referência do sujeito-enunciador como
Expressão da identidade e seus efeitos de sentido. / Dirceu
Cleber Conde. – Londrina, 2008.
354f.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Fernandes
Tese (Doutorado) - em Estudos da Linguagem - Programa
de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade
Estadual de Londrina, 2008.
1. Análise do Discurso 2. Interpretação de dados 2. Aná-
Lise do texto. I.Fernandes, Luiz Carlos II.Universidade Estadual
de Londrina. III.Título.
CDD 21.ed. 401.41
DIRCEU CLEBER CONDE
A ALTERNÂNCIA DA REFERÊNCIA DO SUJEITO-ENUNCIADOR
COMO EXPRESSÃO DA IDENTIDADE E SEUS EFEITOS DE
SENTIDO
Tese de doutoramento apresentada ao
Programa de s-Graduação em Estudos
da Linguagem da Universidade Estadual de
Londrina, como requisito parcial à obtenção
do título de Doutor.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos Fernandes -
Orientador
Universidade Estadual de Londrina
___________________________________
Prof. Dr. Pedro de Souza
Universidade Federal de Santa Catarina
___________________________________
Prof. Dr. Pedro Navarro Barbosa
Universidade Estadual de Maringá
___________________________________
Prof. Dra. Edina Regina Pugas Panicchi
Universidade Estadual de Londrina
___________________________________
Prof. Dra. Mariângela Peccioli Galli
Joanilho
Universidade Estadual de Londrina
Londrina, 25 de mao de 2008.
Para Márcia e Laura, pacientes
companheiras nesta jornada de estudos.
AGRADECIMENTOS
A Deus, de quem recebi sabedoria, força e coragem.
Ao Professor Luiz Carlos Fernandes, pela paciente orientação.
Ao Professor Bernard Bosredon da Université Paris III, que me acolheu no
período de estágio.
À minha família, de quem sempre recebi apoio e incentivo.
À Fundação Educacional Jandaia do Sul, mantenedora da FAFIJAN, pelo apoio
constante.
À Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
pela bolsa de estágio doutorando.
Ao amigo Ítalo Tasso, companheiro de trabalho e grande incentivador.
Aos Colegas de curso, pela constante troca de experiências e o apoio.
A todos os amigos que direta ou indiretamente colaboraram para que este
trabalho chegasse ao término.
CONDE, Dirceu Cleber. A alternância da referência do sujeito-enunciador como
expressão da identidade e seus efeitos de sentido. Tese (Doutorado em Estudos
da Linguagem) – Universidade Estadual de Londrina, 2008.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é compreender como se comporta o fenômeno da
alternância entre as refencias ao sujeito enunciador (pessoas do discurso,
conforme a tradição gramatical) em um mesmo texto e seus efeitos na constituição
das identidades dos sujeitos. Para tanto, desenvolvemos a análise de 446 textos
divididos em quatro grupos para observar as regularidades da alternância. A partir
das observações desenvolvidas, detectamos diferentes aspectos que se coadunam
para a existência do fenômeno, que vão desde os aspectos enunciativos, passando
por questões semânticas, chegando por fim às determinões discursivas. Na
relação entre a perspectiva da Enunciação e a da Análise Discurso está a principal
perspectiva teórica para a compreensão das alternâncias. Observamos que o
fenômeno da alternância não é uma falha de domínio da língua escrita, haja vista a
constante insistência dos professores de Língua e Redação para que haja esforço
dos aprendizes em manter a uniformidade. A alternância é constitutiva da
enunciação, cujas debreagens e embreagens enuncivas ou enunciativas fazem
parte das “estratégias da enunciação a serviço do discurso”. Não se trata aqui de um
sujeito estrategista, mas de formões ideológicas e formões discursivas, que se
estruturam em interdiscursos cujo objetivo principal é a hegemonia discursiva. Para
analisar as alternâncias, nos valemos de diferentes ferramentas, dentre elas a
estatística aplicada aos textos no nível do léxico e da frase. A relação entre léxico e
frase não representa um olhar meramente estruturalista, mas um meio a partir do
qual pudemos explorar a materialidade dos textos ao ponto de observarmos a
dinâmica dos discursos. Entre um enunciador dizer “eu”, “nós” ou não enunciar
nenhumas dessas marcas procedimentos de reconhecimento e instauração das
identidades que, por sua vez, também estão sujeitas às pressões do discurso.
Assim, compreender o fenômeno em seus diferentes matizes proporcionou também
compreender a formação das identidades em relação ao sujeito enunciador e ao
sujeito enunciado. Além de observarmos, no corpus, comportamentos discursivos,
tamm ousamos propor uma nova abordagem da enunciação graças à integração
da interpretação de dados enunciativos, estatísticos e discursivos.
Palavras-chave: enunciação; sentido; discurso; formação discursiva; sujeito
enunciativo; identidade.
CONDE, Cleber Dirceu. The alternation of the reference of the enunciative
subject as identity expression and its meaning effects. Thesis (PhD in Language
Studies) Universidade Estadual de Londrina, 2008.
ABSTRACT
The aim of this work is to understand how the alternation phenomenon among the
references of the enunciative subject behaves (discourse persons, according to
grammatical tradition) in a same text and its effects in the constitution of the subjects
identities. For this, we developed the analysis of 446 texts divided into four groups to
observe the alternation regularities. From the developed observations, we detected
different aspects, which join for the phenomenon existence, that start from
enunciation aspects, passing through semantic questions and finally getting to
discursive determinations. In the relation between the Enunciation and the discursive
Discourse Analysis perspectives lies the main theoretical perspective for the
alternations comprehension. We observe that the alternation phenomenon is not a
failure in the written language control, considering the frequent insistence of
Language and Writing teachers for the learners’ effort on keeping uniformity. The
alternation is part of the enunciation whose shifters and clutches are parts of the
“enunciation strategies on discourse service”. It is not the case here of a strategist
subject, but ideological formations and discursive formations which are structured in
inter discourses whose main objective is the discursive hegemony. In order to
analyze the alternations, we used different tools, among them statistics applied to
texts considering the lexical and sentence levels. The relation between the lexical
and the sentence does not represent a simply structural look, but a way from which
we could explore texts materiality to the point of observing the discourses dynamic.
Between the fact of an enunciator says “I” or “we” or when he doesn’t enunciate any
of these marks, there are recognizing procedures and identities instauration which,
on their turn, are also subjects exposed to discourse pressures. Thus, understanding
the phenomenon in its different shades also provided understanding the formation of
identities related to the enunciative subject and to the enunciated subject. Besides
observing, in the corpus, discursive behaviors, we also dare to propose a new
enunciation approach thanks to the integration of the enunciative, statistical and
discursive data interpretation.
Key-words: enunciation, meaning, discourse, discursive formation, enunciative
subject, identity.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 -
Exemplificação de análise semântica estrutural....................... 33
Quadro 2 -
Oposição “negro e “branco”..................................................... 41
Quadro 3 -
Exemplificação de debreagem e embreagem actanciais.......... 71
Quadro 4 -
O jogo de imagens e as perguntas subjacentes....................... 174
Quadro 5 -
O jogo de imagens e as perguntas subjacentes – continuação 174
Quadro 6 -
Exemplos de enunciados do grupo A....................................... 210
Quadro 7 -
Exemplo de enunciados do grupo B......................................... 210
Quadro 8 -
Exemplos de enunciados do Grupo C...................................... 210
Quadro 9 -
Distribuição das alternâncias do grupo A................................. 212
Quadro 10
-
Domínio físico-cultural da signalética identitária....................... 230
Quadro 11
-
Resumo de FD racista.............................................................. 243
Quadro 12
-
Correspondência entre papel temático e conteúdo.................. 251
Quadro 13
-
Paráfrase de discursos preconceituosos.................................. 284
Diagrama
1 -
Eixo da referencialidade............................................................ 66
Diagrama
2 -
Critérios de análise dos textos segmentados – 1º. Modelo...... 130
Diagrama
3 -
Primeiro modelo de análise....................................................... 137
Diagrama
4 -
Segundo modelo de análise...................................................... 138
Diagrama
5 -
Modelo final de segmentação................................................... 139
Diagrama
6 -
Produção dos efeitos de sentido............................................... 231
Diagrama
7 -
Produção dos efeitos de sentido a partir do diagrama 6........... 232
Diagrama
8 -
A relação entre elementos pré-discursivos e as noções........... 269
Ilustração
1 -
Tela de segmentação dos textos.............................................. 140
Ilustração
2 -
Tela de critérios........................................................................ 140
Ilustração
3 -
Tela de análise.......................................................................... 141
Ilustração
4 -
Tela de resultados estatísticos.................................................. 142
Ilustração
5 -
Tela de entrada do Lexico3....................................................... 145
Ilustração
6 -
Esquema de análise dos papéis temáticos............................... 158
Ilustração
7 -
Alimentação do banco de dados sobre alternância.................. 188
Gráfico 1 -
Relação de pessoas enunciativas e grupos.............................. 184
Gráfico 2 -
Erupções enunciativas por grupo.............................................. 185
Gráfico 3 -
Ilustração do mapa eruptivo...................................................... 187
Gráfico 4 -
Mapa enunciativo do texto 174A .............................................. 189
Gráfico 5 -
Mapa enunciativo 1................................................................... 190
Gráfico 6 -
Mapa enunciativo 2................................................................... 190
Gráfico 7 -
Média geral dos movimentos de alternância dos grupos.......... 191
Gráfico 8 -
Comparativo dos movimentos eruptivos nos grupos................ 192
Gráfico 9 -
PDs identirios conforme os grupos........................................ 201
Gráfico 10
-
Distribuição das co-ocorrências de “negro” e “branco”............ 203
Gráfico 11
-
Comparativo entre enunciação e paradigma identitário............ 209
Gráfico 12
-
Análise fatorial por enunciado do grupo A................................ 212
Gráfico 13
-
Distribuição dos PDs “negro” e “branco” - Grupo A.................. 214
Gráfico 14
-
Distribuição dos PDs “negro” e “branco” - Grupo B.................. 215
Gráfico 15
-
Distribuição dos PDs “negro” e “branco” - Grupo C.................. 215
Gráfico 16
-
Análise fatorial de todos os grupos do corpus.........................
216
Gráfico 17
-
Análise fatorial das alternâncias eruptivas do grupo A............. 217
Gráfico 18
-
Distribuição do PD “negro” entre as alternâncias do grupo A... 219
Gráfico 19
-
Distribuição do PD “branco”entre as alternâncias do grupo A.. 220
Gráfico 20
-
Distribuição dos papéis temáticos do grupo A.......................... 221
Gráfico 21
-
Distribuição do PD “sociedade” nos grupos do corpus............. 224
Gráfico 22
-
Co-ocorrência dos PDs “negros” e “sociedade........................ 225
Gráfico 23
-
Co-ocorrência dos PDs “braçose “sociedade........................ 225
Gráfico 24
-
Distribuição do PD “sociedade” no grupo A.............................. 226
Gráfico 25
-
Distribuição dos itens do PD “sociedade” no grupo A............... 227
Gráfico 26
-
Distribuição de parte do PD “negros” no grupo A..................... 234
Gráfico 27
-
Distribuição de “negro” e “negros” no grupo A.......................... 235
Gráfico 28
-
Distribuição do PD “brancos” no grupo A.................................. 245
Gráfico 29
-
Tipos de 1pp............................................................................. 253
Gráfico 30
-
Inclusões e exclusões em 1pp – grupo A................................. 255
Gráfico 31
-
Inclusões e exclusões em 1pp – grupo A, detalhando os tipos 256
Gráfico 32
-
Conteúdo preconceituoso por enunciação................................ 262
Gráfico 33
-
Co-ocorrência do PD “negros e da noção
“criminalidade”............................................................................
279
Gráfico 34
-
Análise das erupções em 004-A .............................................. 286
Gráfico 35
-
Co-ocorrências do PD “branco” e da noção “preconceito”........ 295
Gráfico 36
-
Surgimento do termo afrodescendente..................................... 302
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Quantidade de textos por grupo............................................... 125
Tabela 2 - Proporção dos modelos de mapas em relação à quantidade
de textos...................................................................................
189
Tabela 3 - Percentual de alternância por grupo........................................ 192
Tabela 4 - Paradigmas designacionais para as identidades no grupo A 200
Tabela 5 - Paradigmas designacionais para as identidades no grupo B 200
Tabela 6 - Paradigmas designacionais para as identidades no grupo C 200
Tabela 7 - Comparativo da análise fatorial dos grupos............................. 218
Tabela 8 - PD “sociedade”......................................................................... 223
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
1ps – primeira pessoa do singular
1pp – primeira pessoa do plural
AD – Análise do Discurso
AAD 69 – Análise Automática do Discurso de 1969
AIE – Aparelhos Ideológicos de Estado
ARE Aparelhos Repressores de Estado
FD Formação discursiva
FI – Formão ideológica
GGT Gramática Gerativo-Transformacional
LT – Lingüística Textual
np – não-pessoa
PD – Paradigma designacional
ST Estastica Textual (Statistique Textuelle)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........
....................
....................
..................
17
PARTE I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ..........................................
23
1 CAPÍTULO – INTRODUÇÃO ÀS DISCUSSÕES TEÓRICAS:
O HISTÓRICO E O ESTRUTURALISMO..............................................
23
1.1 Relembrando o estruturalismo............................................................
26
1.2 O aparelho da linguagem.....................................................................
37
1.3 O aparelho da linguagem – concepções............................................
44
1.3.1 A linguagem e a língua.........................................................................
45
1.3.2 Enunciação e enunciado......................................................................
48
1.3.3 Sentido e referência: uma primeira entrada para a dêixis................
52
1.3.3.1
Iniciando uma refleo sobre sentido e referência...........................
52
1.3.3.2
Denominação e relações denominativas...........................................
56
1.3.3.3
Uma perspectiva signalética da referência........................................
61
1.3.3.4
Dêixis e enunciação.............................................................................
64
1.3.3.5
A instauração da subjetividade: debreagem e embreagem.............
68
2 CAPÍTULO – O MATERIALISMO HISTÓRICO................................
73
2.1 O Materialismo Histórico na AD..........................................................
73
2.2 Althusser e suas marcas.....................................................................
76
2.3 A noção de ideologia............................................................................
78
2.4 O discurso.............................................................................................
96
2.4.1 O conceito de formação discursiva....................................................
99
3 CAPÍTULO – A PSICANÁLISE..........................................................
103
3.1 Inconsciente e Linguagem...................................................................
103
3.2 O sujeito.................................................................................................
111
3.3 A identidade..........................................................................................
116
PARTE II – OPERACIONALIZAÇÃO E ANÁLISES..............................
122
4 CAPÍTULO METODOLOGIA E OPERACIONALIZAÇÃO DE
CONCEITOS...........................................................................................
122
4.1 As motivações teóricas sobre a prática ............................................
122
4.2 Sobre a coleta de dados e grupos de controle..................................
124
4.3 Tratamento dos textos.........................................................................
126
4.3.1 Segmentação do corpus – o primeiro modelo...................................
127
4.3.2 O papel da Estatística Textual.............................................................
142
4.3.3 O componente semântico....................................................................
146
4.4 Conclusão do capítulo.......................................................................,,
160
5 CAPÍTULO DAS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E DO GÊNERO
DISSERTATIVO............................................................................................
161
5.1 O gênero do discurso...........................................................................
161
5.1.1 A finalidade............................................................................................
170
5.1.2 Os parceiros..........................................................................................
172
5.1.3 O lugar e o momento............................................................................
176
5.1.4 O suporte material................................................................................
177
5.1.5 A organização textual...........................................................................
179
5.1.6 O gênero dissertativo escolar.............................................................
180
5.2 Caracterização do corpus....................................................................
182
5.3 Sobre as características estruturais das alternâncias: erupções...
183
5.3.1 Sobre a alternâncias eruptivas............................................................
186
5.3.2 Os mapas mais recorrentes e as características dos grupos..........
188
5.4 Levantamento geral dos movimentos................................................
191
5.5 As referências às pessoas enunciativas no corpus analisado........
194
5.6 Paradigmas designacionais e seu cruzamento com as modalidades
enunciativas...................................................................
199
5.7 Exploração semântica e seu cruzamento enunciativo.....................
205
5.8 As alternâncias eruptivas no corpus principal..................................
211
5.9 O paradigma designacional “sociedade ..........................................
223
6 CAPÍTULO A SIGNALÉTICA DA ALTERIDADE: A CONSTRUÇÃO
DA REFERÊNCIA AO OUTRO....................................................................
229
6.1 Em busca da signalética identitária....................................................
230
6.2 As designações em não-pessoa...................................................,.....
240
6.3 O conceito de noção.............................................................................
242
6.4 Enunciação e designação em np........................................................
244
6.5 Enunciação e designação em 1ps......................................................
246
6.6 As designações em 1pp.......................................................................
248
6.6.1 Papéis temáticos enunciados em 1pp................................................
250
6.6.2 A referência complexa de 1pp.............................................................
252
6.7 A indicação do outro: uma signalética da alteridade........................
257
6.7.1 O papel tetico de “paciente” .........................................................
258
6.7.2 O papel tetico de “beneficiário” ....................................................
259
6.7.3 O papel tetico objeto” ...................................................................
260
6.8 A relação entre alternância e discursivo ...........................................
261
7 CAPITULO OS DISCURSOS E AS FORMAÇÕES DISCURSIVAS 264
7.1 Pré-discurso: a memória discursiva e a formação discursiva.........
264
7.2 Os discursos presentes nos textos ...................................................
269
7.3 As formações discursivas: racista e não-racista..............................
271
7.3.1 A superioridade branca........................................................................
273
7.3.2 O negro e a criminalidade ...................................................................
276
7.3.3 A igualdade essencialista....................................................................
279
7.3.4 Os discursos não-racistas...................................................................
282
7.4 A dêixis e as FDs..................................................................................
287
7.5
Movimentos eruptivos, FDs e inconsciente
..............................
........
289
7.6 A identidade dos sujeitos....................................................................
291
7.7 Alternância é constitutiva da enunciação ........................................
298
7.8 Identidade em construção: afrodescendente ...................................
302
CONCLUSÃO.............................................................................................
306
REFERÊNCIAS .........................................................................................
310
ANEXO I – Tema de redação dos grupos A, B e C............................
316
ANEXO II – Tema de redação do grupo D..........................................
320
ANEXO III – Questionário sócio-educacional do grupo C ...............
326
ANEXO IV – Testes sobre paradigmas designacionais....................
329
ANEXO V – Exemplário dos textos analisados .................................
33
4
17
INTRODUÇÃO
O fenômeno que abordamos nesta tese pode ser resumido em poucas
palavras, no entanto sua aparente simplicidade recobre o complexo mecanismo
enunciativo próprio dasnguas naturais. É interessante observarmos a maneira
como fenômenos tão corriqueiros podem, muitas vezes, surpreender; de modo que,
a cada vez que relatávamos nossa pesquisa em uma conversa informal, algum
interlocutor exclamava: “Que interessante... jamais havia pensado nisso!”. Mas essa
exclamação também vinha seguida de uma súbita reflexão, deixando entrever que,
apesar de não ter a “consciência” do fenômeno, o nosso interlocutor intuía algo
sobre o mesmo. O fato de em um mesmo texto o sujeito utilizar a primeira pessoa do
singular, a primeira pessoa do plural ou a não-pessoa, alternadamente, poderia
revelar diferentes efeitos de sentidos.
A primeira hipótese intuitiva para explicar a alternância era a de que a
maneira de alternar entre as pessoas da enunciação tinha a ver com o assunto a ser
tratado e para qual interlocutor se enunciava, tal intuição apontava para imagens e
conceitos que o senso comum alimenta nos falantes naturais sobre a sua própria
língua ou sobre a enunciação. Dissemos que se pode resumir o objetivo de nossa
pesquisa em poucas palavras, eis então: nosso objetivo é procurar compreender e
explicar a maneira como um sujeito-enunciador, em textos escritos, alterna as vozes
enunciativas, que passaremos a chamar de “modalidade enunciativa” entre a
primeira pessoa do singular, a primeira pessoa do plural e a não-pessoa. É comum,
em diferentes tipologias textuais não-narrativas vermos, dentro de um mesmo texto,
a “voz” do sujeito-enunciador alternar, entre esses registros (primeira pessoa do
singular, 1ps; primeira pessoa do plural, 1pp; terceira pessoa ouo-pessoa, np).
Apesar de todas as recomendações de mestres e manuais para que se
18
mantenha a uniformidade das pessoas do discurso”, as tais alternâncias,
invariavelmente, acontecem, demonstrando que, mesmo o autor mais consciencioso
e disciplinado
1
, às vezes, alterna involuntariamente. Ora, o que há nesse fenômeno
que provoca um sujeito a dizer “eu” em determinado momento e a dizer “nósem
outro, ou, ainda, a não dizer nada disso alhures? Quais seriam os processos que
levam o sujeito a enunciar referindo-se a diferentes vozes enunciativas? Indo um
pouco mais além: Qual seria o efeito resultante dessa alternância de vozes? Seria
uma maneira de o sujeito daquele dizer estabelecer alianças ou repulsas? Quais
seriam as relações de inclusão e exclusão decorrentes de tais variações na
combinação de vozes?
Para se chegar ao objetivo proposto, o de compreender a alternância e seus
efeitos de sentido decorrem outros objetivos específicos, tais como: i) compreender
a natureza e a materialidade dos enunciados; ii) compreender as regularidades dos
enunciados; iii) relacionar tais aspectos ao discurso; iv) compreender como tal
materialidade está intimamente ligada aos discursos e à questão identitária. Tais
objetivos irão redundar em uma compreensão de como se organizaram os discursos
identitários através das modalidades enunciativas.
A justificativa para um trabalho como nosso se deu pela complexa relação
entre a enunciação, o discurso e a identidade. muito tempo tínhamos como
curiosidade compreender os movimentos da alternância, o que não esperávamos
era que o um objeto, inicialmente enunciativo se transformasse em um objeto de
1
Cumpre esclarecer que toda vez em que tivermos expressões que levem à referência a um sujeito
da vontade, o significa que concordamos com tal possibilidade. O fato é que em condições de
produção, os sujeitos se posicionando sob a égide dos esquecimentos conforme descritos nas
páginas 84 e 85. sim, a nosso ver um sujeito da vontade, mas que fica sublimado pelo sujeito do
inconsciente, o sujeito da vontade é o que permite a um indivíduo assinar um contrato, escrever um
artigo, procurar emprego etc. Por isso, o sujeito que procura manter a uniformidade em um texto, que
procura argumentar não será objeto de nossa análise, contudo, por vezes, vemo-nos obrigados a nos
referirmos a ele, dada a condição de produtor de texto em situações como a da vida escolar, por
exemplo.
19
discurso dada a complexidade e as suas diferentes implicações. Quando então
decidimos pela análise, vimos que os dados apontavam para a enunciação, o
discurso e além deles para a a questão da identidade. Dada a quantidade de
trabalhos que se dedicam à questão identitária por diferentes perspectivas, vimos
ser de bom proveito para esse tema nos dedicarmos à uma perspectiva que
contemplasse a materialidade do sentido na constituição das identidades, que por
vezes, o tratadas bastante no campo teórico, ou então, quando são tratadas por
uma perspectiva mais analítica, são utilizados corpus bastante pequenos. O
tamanho do corpus não necessariamente implica na sua validade, mas quando se
trata de populações grandes é mister um determinado número de casos para que
alguma generalizão seja proveitosa.
Outro aspecto que justifica tal perspectiva é que as identidades são
construídas por diferentes práticas simbólicas, mas dentre elas a linguagem
articulada é a principal por fazer circular em uma cultura tanto o significante, quanto
o significado transbordante de sentido e de ideologia. Nenhuma identidade pode ser
criada e desenvolvida sem que exista linguagem, tanto verbal quanto não-verbal;
nesse caso a linguagem verbal e suas estratégias enunciativas são estudadas à luz
tamm do discurso.
Diante desse processo complexo de referência enunciativa, decidimos
empreender uma pesquisa na qual procuramos compreender como e quando as
alternâncias ocorrem e se regularidade em sua ocorrência. O ponto de partida
para a compreensão do fenômeno e a principal teoria em que se baseiam as
tentativas de explicações da alternância é a da Análise do Discurso de linha
francesa: com ressalvas, porém! O que queremos dizer com isso? Primeiramente
não estamos inventando uma nova Análise do Discurso, mas é preciso frisar que a
20
filiação a ela não é cega, nem é a única teoria que servirá de referência citada neste
trabalho. Prova disso é que o resultado final de nossa pesquisa apresentou uma
bipolaridade entre os rudimentos de nosso parco conhecimento em Análise do
Discurso e nosso escasso conhecimento em Teoria da Enunciação. Essa relação
entre Enunciação e Discurso não foi um simples acaso, um simples encontro de
teorias. Tal encontro foi o caminho mais verossímil capaz de explicar o fenômeno. O
resultado final chegou a uma análise do discurso e a uma interpretação dos gestos
enunciativos, isso só foi possível porque deixamos que o objeto a ser escandido, ora
falasse e ora fosse interpretado da mesma maneira que um médico ouve seu
paciente que possui intuições e até mesmo superstições sobre seu problema e o
médico, sem ignorar ou supervalorizar essa intuições toma os enunciados de seu
paciente para dar seu diagnóstico.
Essa nossa postura analítica se explica por dois fatores,, a saber: 1)
consideramos que nenhum objeto de alise pode ser compreendido sem que um
pré-discurso lhe feição, quer dizer, ao olhar um determinado fenômeno, o
analista, inevitavelmente, irá se posicionar de algum lugar: o que significa que
imparcialidade ou neutralidade não passam de efeitos. Tal fato não invalida a
tentativa de compreender um fenômeno; logo, o estamos à procura de uma lei,
mas à procura de reflexão; 2) apesar de o olhar lançado pelo analista ser sempre
influenciador em relação ao que procura demonstrar sobre o objeto, é preciso que
este não seja impedido de “falar”. Ainda que se trate, é claro, de um processo
antagônico, deve-se evitar impor ao objeto a maneira como ele deve se comportar,
embora determinadas abordagens possam tentar silenciá-lo; mesmo que o se
deseje esse silenciamento, um pouco de sua voz e de outras vozes serão
silenciadas. Temos, nesse aspecto, uma contradição dialética de força e vozes em
21
saudável conflito. É por isso que tentaremos ouvir o maior número possível de
vozes. E essa liberdade de conciliar ou de repudiar é-nos dada pela própria Análise
do Discurso (como um teoria que tem raízes dialéticas), a qual, felizmente, não se
prende a métodos totalmente pré-construídos, mas constrói um método próprio para
questões específicas. Por conta de tal postura teórica, é que serão encontradas,
neste trabalho, diferentes referências a outros pensamentos que não somente os da
Análise do Discurso.
Ao nos dedicarmos à análise do fenômeno, percebemos que ele demandava
um tratamento complexo no sentido de envolver mais que uma variante, ou mais que
um olhar era preciso tentar compreendê-lo em diferentes dimensões: a enunciativa,
a semântica, a sintática, a discursiva. Implica em dizer que o fenômeno da
alternância precisava de uma visão abrangente, ou seja, a materialidade do texto, as
questões semânticas (mais propriamente sobre o problema da referência) as
questões discursivas e ideológicas seriam elementos imprescindíveis para definir,
com alguma clareza, aquilo que identificamos no fenômeno.
Foi assim que, com o intuito de dar conta do assunto, organizamos este
trabalho em duas partes, sendo uma teórico-metodológica e outra com as análises e
resultados. Os princípios teórico-metodológicos permearam todo o relato da
pesquisa, desde a contextualizão do objeto e do corpus em que o objeto foi
identificado, até as conclusões finais. Achamos por bem deixar a descrição da
metodologia para o momento seguinte à apresentação dos pressupostos teóricos,
com o fito de facilitar a exposição da maneira como operacionalizamos a aplicação
dos conceitos neste trabalho. Ademais, a maneira como este trabalho se organiza,
reflete um pouco da nossa perspectiva enquanto pesquisador: a de que teoria e
prática são elementos distintos em sua natureza, porém indissociáveis em sua
22
existência, pois ao teorizar sobre um assunto o pesquisador passou por diferentes
reflexões sobre as prática e o próprio teorizar é um fazer que exige técnica,
encadeamento das idéias, verossimilhança entre outros aspectos. Da mesma forma,
o fazer ptico exige um caminho traçado previamente por princípios, diretrizes que
fazem parte do conhecimento teórico.
Assim, no tratamento das idéias e propostas da Análise do Discurso,
encaminhamo-nos em direção às três disciplinas ou campos do conhecimento (a
Lingüística, o Marxismo e a Psicanálise) para encontrar, em cada uma delas, as
balizas necessárias para o tratamento do fenômeno, mas, a nosso ver, o ponto de
partida matiz importante e esclarecedor do mesmo, talvez seja a compreensão da
materialidade discursiva.
Serviram de corpus à nossa pesquisa textos dissertativos produzidos por
candidatos em um exame vestibular, por alunos de primeiro ano de curso superior e
por estudantes que se preparavam para o vestibular. Essa diversidade textual, tanto
no que se refere à variedade de grupos de informantes como à diferença temporal
existente entre as coletas de dados, nos permitiu observar o fenômeno em diferentes
circunstâncias e, por isso, perceber, com maior clareza, as regularidades que se
fazem presente no processo de enunciação escrita. O corpus tem seus aspectos
heterogêneos e isso assegura um grau de abrangência do fenômeno e segurança
para discutirmos algumas idéias.
23
PARTE I
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO ÀS DISCUSSÕES TEÓRICAS: O HISTÓRICO E O
ESTRUTURALISMO
Uma perspectiva teórica ou uma vertente dentro de um sistema teórico que
embase qualquer pesquisa não deve ser um acidente, menos ainda, uma imposição
da vontade de quem desenvolve a pesquisa. No momento da escolha do caminho a
ser traçado, o pesquisador se diante das pressões que o próprio fenômeno lhe
impõe. Se o pesquisador permitir que o fenômeno analisado tenha sua própria “voz”,
não haverá a tensão para a moldagem das explicações segundo a visão do
analista, embora ele sempre imprima a sua perspectiva sobre o objeto de estudo,
a partir da sua escolha do mesmo e do recorte do corpus a ser trabalhado. Nessa
perspectiva de deixar o objeto falar e fazer também com que ele nos ouça,
pretendemos, nesta parte de nosso trabalho, traçar um caminho para a discussão
dos conceitos e fundamentos que serviram de apoio para nossa análise.
O roteiro a ser seguido compreende uma discussão baseada nas três
disciplinas que deram origem em três eixos da à Análise de Discurso francesa e que
se apresentam cristalizadas na fundamentação dessa disciplina, a saber: o
Materialismo Histórico, a Psicanálise e a Lingüística. Pretendemos tratar da
contribuição de cada eixo, articulando os temas que lhes são caros e traçando uma
linha que permita cuidar dos conceitos de modo a se operacionalizarem no resultado
de nossa reflexão. Assim, esta parte inicial contará com capítulos destinados à
24
contextualizão da disciplina, e com o tratamento de conceitos agrupados em torno
das noções de língua, discurso e sujeito. No entanto, os mesmoso tomados como
pivôs em redor dos quais se congregam outros pensamentos complementares.
Para iniciar a discussão, uma questão chave: por que a AD colocada no
centro desta pesquisa? Estamos caminhando para quase quarenta anos de reflexão
em AD: são quatro décadas de muitas discussões que suscitaram diferentes
dinâmicas ao ao seu desenvolvimento: foram descréditos, modismos, hegemonias e
polêmicas que marcaram profundamente algumas discussões. Em especial a
polêmica foi o componente essencial, pois a AD o se contenta em dar respostas
prontas, uma vez que as respostas são tão provisórias quanto seu objeto de análise,
o discurso. Por isso, ela não pode ser ciência num mundo em que o modelo de
ciência é o da Física, a qual tamm, aliás,se abalou há muito tempo, a partir das
descobertas da Física Quântica. Uma disciplina que respostas provisórias está
mais longe de se tornar uma ortodoxia, está mais preparada para ser abalada, como
os edicios construídos em regiões de maior atividades sísmicas: tem sido assim o
comportamento da AD, mais preocupada na construção de respostas que
simplesmente em ser fiel ao formalismo ou às supostas “leis ou “princípios”, sem,
contudo, deixar de ser metódica. Ela está mais próxima de ser um princípio
metodológico do que exatamente um método: não pára de reinventar-se, vivendo
uma dialética que lhe permite acompanhar seu objeto de análise altamente volátil.
Assim, a AD serviu de base para este trabalho porque tenta explicar o fenômeno por
bases transdisciplinares, pois, afinal, se fôssemos adotar um método único, não
teríamos como abranger o assunto de modo satisfatório, porque, em si, o objeto
comporta a sua complexidade.
Ao tratar da alternância enunciativa em um texto, vemos um fenômeno que
25
não pode ser explicado por um fator apenas, ou seja, o poderíamos tomar o
aspecto enunciativo, ou o semântico-sintático, ou o sócio-histórico, ou o psicanalítico
isoladamente. Percebemos que esses fatores estão, de algum modo, articulados, o
que está bem descrito na evolução do pensamento da AD. Para melhor
compreender a nossa escolha, e porque, a nosso ver, a AD é a melhor escolha para
dar conta do fenômeno, é mister apresentarmos, mesmo que superficialmente, um
pouco do seu histórico.
Trazer a esta tese todo o histórico da AD seria um erro, pois bibliografia
suficiente e mais competente para o tratamento do assunto com maior propriedade
2
.
Por outro lado, uma retomada em detalhes da sua história seria desnecessária e
inoperante ao nosso trabalho, mas o equilíbrio se faz necessário para maior
entendimento. Assim, as partes que se seguem não trarão a cronologia dos estudos
em AD, mas apenas um esboço de contextualização necessária à conceituação e
operacionalizão discutidas para o embasamento da pesquisa.
Se seguíssemos o fio da história dos estudos da linguagem, desde a
inauguração da Moderna Lingüística, com a edição, em 1917, do Cours de
Linguistique nérale, de Saussure, passaríamos pelo século XX como um grande
período de produção, mais do que em outros períodos da humanidade em que se
discutiram linguagem, código, comunicação, etc. Não porque se comunicou ou se
interagiu mais nesse culo, mas porque as transformões científicas, culturais e
políticas nesse período permitiram que a língua e a linguagem estivessem no centro
da atenção, diferentemente do que se deu com outras áreas de conhecimento, que
tiveram sua existência determinada pela Revolução Industrial. A inserção dos
conteúdos da comunicação na ordem do século XX se deu com a hegemonia dos
2
Para uma melhor compreensão, recomendamos a leitura de Maldidier (2003), obra que se citada
constantemente nesta tese.
26
meios de comunicação em massa, desde o surgimento do jornal escrito até a difusão
de redes via computador.
Nesta parte da tese, teremos a oportunidade de observar as origens da AD,
bem como alguns dos mais importantes conceitos teóricos básicos referentes ao
“aparelho da linguagem” e, no seu bojo, o que significarão língua, referência, dêixis e
enunciação. Para iniciar, preferimos comar pelo estruturalismo para, em seguida,
discutirmos o marxismo e a psicanálise, relembrando as três disciplinas fundadoras.
1.1 Relembrando o estruturalismo
Entre os anos 20 e 50 do século XX, a hegemonia do Estruturalismo no
universo de pesquisas da Lingüística irá determinar a maneira como se comportarão
os estudos da linguagem e da língua, inclusive, entre outros, os estudos das
ciências sociais. A Lingüística será a ciência piloto de outras ciências humanas,
valendo citar os trabalhos de LevyStrauss na antropologia como um dos exemplos
mais marcantes da influência que a maneira de pensar as estruturas teve nas
ciências ditas humanas.
O estruturalismo inaugurado por Saussure transforma os estudos da
linguagem em uma ciência, deslocando-os para longe da especulação das
gramáticas históricas com sua ânsia pela língua primitiva e pela genealogia das
línguas. Isso porque, mais do que dividir em dois o objeto linguagem, as dicotomias
saussurianas cindiram os limites de outros objetos a serem tratados pelos estudos
da linguagem, com a formulação de uma metodologia que, de certa maneira, projeta
sua influência sobre tudo que ainda se produz no âmbito dos estudos lingüísticos,
semânticos e pragmáticos. Um exemplo do pensamento estruturalista, a título de
ilustração, pode ser o que a própria AD admite quando diz que um sujeito, ao se
27
inscrever em uma formação discursiva, passa a se opor às demais. Ora, tal
perspectiva nada mais é do que uma referência ao prinpio estruturalista da
organização paradigmática: quando o falante seleciona um fonema ou um morfema
deixa os demais em estado de latência ou virtualidade que poderiam passar a
realizados. É claro que explicar as relações entre os discursos apenas através da
relação de pertença ou de negação pode ser um expediente muito redutor da sua
complexidade, maso podemos negar que esses princípios estão aí presentes.
A aplicação do estruturalismo não poderá responder ao momento histórico de
grandes transformações provocadas pela influência marxista e pelas releituras de
Freud e realizadas por Lacan nos anos de 1950 e 1960. Tais releituras fizeram com
que rupturas surgissem dentro do estruturalismo, em especial na França, o que não
significará o seu fim, mas sim uma revisão de rumos, uma revisão de perspectivas.
Em um mundo dividido entre direita e esquerda não podemos deixar de pensar no
Mundo pós–1945 –, a lingüística estruturalista o era capaz de dar respostas às
questões semânticas que voltavam às mesas de trabalho mais de um culo depois
que Frege (cujos trabalhos são da década de 1870 texto da referência 1978) e
Bréal (1890, texto da referência de 1992) lançassem as bases de diferentes linhas
de pesquisa em estudos semânticos. Assim, a cada de 1960, marcada pelos
questionamentos ao Estruturalismo e à Gramática–Gerativo–Transformacional
(GGT), período de grande efervescência cultural e intelectual, em que,
particularmente na França, se acirravam as disputas políticas, foi o tempo propício
ao desenvolvimento de um novo pensamento sobre o sentido do texto. Seus estudos
afastam-se para longe do conteudismo tradicional das cncias sociais, pautando-se,
agora, por três correntes: o Materialismo Histórico, a Psicanálise e a Lingüística.
Nos agitados anos de 1960, surge, no cenário intelectual francês, Michel
28
Pêcheux, figura inaugural da análise de discurso de orientação francesa. Filósofo de
formação, engajado na perspectiva althusseriana de releitura de Marx, e envolvido
no projeto da história das ciências e da epistemologia, Pêcheux se tornaria uma
emblemática figura para a AD. No Brasil, suas idéias e, diríamos, a vulgarização das
mesmas, chegou pelas mãos de Eni Orlandi na década de 1980. Não nos deteremos
muito na figura do pesquisador Pêcheux e seu engajamento político e científico, mas
o tomaremos como inaugurador da AD francesa para compreendermos um pouco do
desenvolvimento de alguns conceitos que defendeu ao longo da história. Como a AD
tem uma profunda ligação com os conceitos de história e historicismo, nada mais
justo que observemos a sua gênese levando tamm em consideração sua história.
O marco que inaugura a AD francesa foi a surgimento de um “estranho”, mas
instigante livro de Pêcheux intitulado Análise Automática do Discurso. Maldidier
resume o momento em que surge a obra, ao se dedicar a “reler Michel Pêcheux
hoje”:
o posso imaginar uma obra sobre Michel Pêcheux que não permitisse
revisitar o estranho livro que aparece na Dunod em 1969 com o título
provocador de Análise Automática do Discurso. É o momento inaugural do
caminho que quero dar a percorrer. Nele se ligam pela primeira vez
todos os fios constitutivos de um objeto radicalmente novo: o discurso.
(MALDIDIER, 2003, p. 19)
Até então, tanto no estruturalismo como na GGT, o objeto era a língua, sob
uma perspectiva predominante pautada no corte saussuriano entre langue/parole.
Nessa dicotomia, o elemento parole, por questões diversas (uma delas é a
necessidade de restringir o campo de pesquisa) foi deixado de lado por Saussure e
por aqueles que seguiram na mesma perspectiva teórica. O que Pêcheux fez foi dar
um outro significado à parole do “corte saussuriano”, revisitando-a sob uma
perspectiva que ultrapassou um enfoque restrito à simples elocução de fonemas,
morfemas ou frases, longe de um sujeito empírico e da subjetividade romântica, para
29
ir além da simples relação semântica do binômio sentido e referência, embora
pressuponha, a todo tempo, esses conhecimentos. De modo algum Pêcheux nega
Saussure ao propor o discurso como objeto de estudo:
O discurso construído por Michel Pêcheux o invoca, de forma alguma, a
“superação” da dicotomia língua/fala. Saussure é, para ele, o ponto de
origem da ciência lingüística. A seus olhos, o deslocamento operado por
Saussure, da função para funcionamento da ngua é um adquirido
científico irreversível. O essencial daquilo que, nos termos da
epistemologia da época, ele chamará de “o corte saussuriano”, reside na
idéia de que a língua é um sistema. (MALDIDIER, 2003, p. 20)
É interessante notar, como ficará claro mais adiante, que não se trata de
apagar o estruturalismo ou o texto inaugural de Saussure, mas atribuir à parole
aquilo que a maioria das linhas pós-saussurianas do estruturalismo não o fizeram:
Michel Pêcheux constitui o discurso como uma reformulação da fala
saussuriana, desembaraçada de suas implicações subjetivas. Desde este
momento, o essencial, que não vai variar, é colocado: tratar-se-á sempre
de manter-se no ponto de encontro da língua, tomada na pura acepção
saussuriana de sistema, e de coerções irredutíveis à ordem lingüística e ao
sujeito psicológico. (idem, p.22)
O Análise Automática do Discurso (daqui por diante AAD 69) será um esboço
do que se seguiria nos próximos anos. A revolucionária “máquina discursiva” – o que
Paul Henry, conforme Maldidier (idem), chamara de “cavalo de tróia” era uma
espécie de decodificação dos discursos para provocar uma reviravolta nas ciências
sociais. Não se trata de um cânone da AD, mas de umtexto fundador” que embasa
o roteiro de estudos e servirá de ponto a ser refutado: daí sua importância, pois
refutar esse ponto de partida garantirá à AD o seu amadurecimento. No entanto,
devemos muito a esse marco fundador, por constituir uma proposta de mudança de
conceitos sobre texto, leitura e sentido, e, especialmente, uma releitura do modelo
comunicacional oriundo de Jakobson ([1957]1988). Pêcheux introduz a figura, não
de interlocutores empíricos, mas de sujeitos colocados em posições sociais, que
enunciam a partir dessas posições; assim, o extralingüístico fora do território da
30
pragmática passa a figurar como elemento essencial na construção de sentido
entre sujeitos representantes de grupos sociais, classes, a voz dos discursos e as
formações discursivas. Abrimos um parêntese aqui para relembrar que, em outro
tempo e em outra episteme, o conceito de comunicação de Jakobson que tem
reflexos nas noções de sujeito foi questionado por Bakhtin. Segundo este
estudioso,
nos cursos de lingüística geral (até nos cursos rios como os de
Saussure), os estudiosos comprazem-se em representar os dois parceiros
da comunicação verbal, o locutor e o ouvinte (quem recebe a fala), por
meio de um esquema dos processos ativos da fala do locutor e dos
processos passivos de percepção e de compreensão da fala do ouvinte.
o se pode dizer que esses esquemas são errados e não correspondem
a certos aspectos reais, mas quando estes esquemas pretendem
representar o todo real da comunicação verbal se transformam em ficção
científica. (BAKHTIN, 1997, p. 290)
Isso demonstra que o modelo da comunicação estava predestinado a sofrer
revio, e a ser visto de uma nova perspectiva. Kerbrat-Orecchioni (1999, p. 15),
através de Halle, lembra que este autor vai além: “Ele afirma que, em certos
momentos, essa concepção de troca verbal se vê próxima de ser ideologicamente
suspeita, e influenciada por uma certa visão da circulação de bens tal qual acontece
na economia de mercado.” (tradução nossa)
3
. A discórdia com o modelo de
Jakobson, tanto em Bakhtin como em Kerbrat-Orecchioni, colocam o problema do
modelo monovetorial da comunicação, e por enxergar os sujeitos como seres em
uma troca constante de material verbal é que Bakhtin irá atacar os modelos
mecanicistas com a noção de atitude responsiva ativa (1997). Outro aspecto a ser
levado em conta é que, na troca de símbolos, como se se tratasse de uma economia
de mercado, a figura da mensagem simplesmente perde sua importância em si e
passa a ser considerada moeda de troca. o obstante, o modelo de Jakobson não
3
Il arrive enfin parfois que cette conception de l’echenge verbal se voie reprocher dêtre
idéologiquement suspect, et influencée par une certaine vision de la cirulation des biens telle qu’elle
fonctionne en économie de marché.
31
é de todo obsoleto ou inoperante, pois serve como uma boa base para a teoria da
comunicação cibernética e para a compreensão das fuões da linguagem, embora
o tratamento que lhe é dispensado seja ainda muito superficial quando se trata das
funções
4
. Essencialmente, os conceitos de AAD 69 serão revisitados, remodelados
e, finalmente, alguns abandonados ao longo das mudanças que a AD sofrerá, mas
eles sempre serão fundamentos de muito do que se dirá após.
Até aqui, a discussão ficou centrada na obra de cheux, no entanto,
retrocedendo um pouco no tempo, não podemos deixar de destacar a contribuição
do pensamento de Zellig Harris, que, a partir de seu artigo Discourse analysis,
publicado na revista francesa Langage, em 1969, propunha uma nova forma de
análise dos enunciados e de seus processos de encaixe dentro de um texto.
Pêcheux a tomacomo um procedimento para redução dos enunciados do texto a
enunciados mínimos e não só de um texto, mas de um conjunto de textos, vistos
como a expressão material do discurso. Interessantemente, esse tipo de
procedimento tamm foi empregado na presente pesquisa, o que contribuiu na
identificação, no material analisado, das formações discursivas, conceito que será
detalhado mais adiante.
Como dissemos anteriormente, a AD não irá negar o Estruturalismo e suas
vertentes, embora uma metodologia que busca enunciados mínimos possa ser
identificada às pticas estruturalistas, o que poderia suscitar a crítica de anti-
formalistas, que viriam na AD um privilégio à forma. Por outro lado, o conteudismo
sem compreensão da materialidade dos signos levaria a afirmões cujos
fundamentos poderiam se tornar vagos, ou seja, discutir o sentido somente pelo
sentido e pela cultura não seria suficiente para dar conta do texto e sua
4
Principalmente quando se trata de manuais de comunicação ou administração geral.
32
historicidade.
Juntando-se a essa entrada de Pêcheux pelo método lingüístico, vem a sua
filiação ao trabalho de Louis Althusser, filósofo marxista, empenhado na releitura de
Marx e na compreensão e interpretão da ideologia e seus processos formativos.
Para compreender melhor isso, é mister relembrarmos o conceito de ideologia em
Althusser (1970). Segundo este, diferentemente do que pensavam os filósofos
idealistas, a existência da ideologia é assegurada numa materialidade, ou seja, na
metáfora da infra–estrutura e da superestrutura, conforme Althusser. Segundo esse
pensamento, a infra–estrutura de um prédio, é o que sustentação à sua
superestrutura na superfície, determinando suas formas. Assim, a infra–estrutura da
organização social no capitalismo se dá pela relação material existente entre o
capital e a mão–de–obra, enquanto a superestrutura é o visível, o perceptível
representado pelas instituições: família, igreja, justiça etc. que têm sua existência e
material determinados pela infra–estrutura da relação capital–trabalho. Assim, a
ideologia não é mais simplesmente uma questão de idéias, mas das práticas que se
estabelecem nas relações entre os Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE) como são
a família, a igreja, a justiça. No momento primordial do trabalho de Pêcheux, tal
perspectiva o influenciará e será a porta para a entrada do marxismo na AD, pois os
projetos se interseccionaram:
Lingüística, então, aparece como um horizonte para o projeto althusseriano
da seguinte maneira: como a ideologia deve ser estudada em sua
materialidade, a linguagem se apresenta como o lugar privilegiado em que
a ideologia se materializa. A linguagem se coloca, para Althusser, como
uma via por meio da qual se pode depreender o funcionamento da
ideologia. (MUSSALIN, 2001, p. 104)
Essa tomada de posição produz efeitos: o primeiro é o de que a AD não se
coloca como uma evolução da Lingüística ou a superação de Saussure, pois, como
a língua (langue) se comporta como elemento sistemático, continua sendo
33
interpretada como tal, mas não é a lingüística o carro chefe; o segundo, o de que a
significão – e daí a retomada de uma Semântica voltada para o sentido e não para
a referência não é sistemática nos moldes do estruturalismo, que se filia à relação
entre traços. Tomemos um exemplo da semântica de Pottier, citado por Lopes
(1995, p 265) na análise ilustrativa do conceitocadeira”:
Cad. 1 Cad. 2 Cad. 3... ... Cadeira
N
q
1
=encosto...........
q
2
=veludo...........
q
3
= 4 pés...........
q
4
=de madeira...........
q
5
=para sentar–
se
...........
+
+
+
+
+
+
+
+
+
(+) –
+ (–)
– (+)
+
Quadro 1 - Exemplificação de análise semântica estrutural
Um modelo semântico como exemplificado acima, que se restringe ao vel
lexical ou frasal, não conta de descrever o discurso como objeto de análise.
Como a AD trata de uma abordagem também semântica, e de uma visão mais
ampla e ligada às condições de produção, seu escopo toma a forma de elemento
indicativo dos percursos do sentido.
É importante ressaltar-se que a AD o era feita apenas por Pêcheux e seu
grupo de pesquisa, mas envolvendo tamm a participação de Henry, Plon, Culioli,
Fuchs e os demais que faziam parte do laboratório de Psicologia Social do CNRS
(Centre National de la Recherche Scientifique)
5
. Jean Dubois tamm desenvolvia
seus trabalhos sob uma perspectiva marxista, mas utilizando a lingüística como a
principal corrente, de modo que os mesmos se desenvolviam como extensão da
lingüística, postura que levou a uma outra corrente de AD, normalmente identificada
como AD anglo-saxônica, voltada para a análise da conversação. Outra corrente que
5
Centro Nacional de Pesquisa Científica, órgão de fomento e organização da pesquisa científica na
França.
34
igualmente vem se popularizando no Brasil é a Análise Crítica do Discurso, cujo
representante mais conhecido é Fairclough (2003).
A partir da proposta e da releitura do marxismo de Althusser, cheux na
lingüística um nó capaz de unir discurso e ideologia, voltando-se para a busca de um
sujeito que responda, nas análises, às necessidades epistemológicas de sua
pesquisa. Torna-se assim mais fácil identificarmos quem não pode ser visto como
sujeito em sua teoria do que quem o é. Trata-se, então, de vermos um sujeito que
não é o dono do dizer, nem o único responsável pelo sentido, pois se trata de quem
responde não só a outro sujeito empírico, mas a um Outro mais amplo, que constitui
os outros sujeitos. Na AD, o é o sujeito da vontade de dizer, nem a intenção do
indivíduo o objeto de análise, haja vista que o dizer revela mais daquilo que o sujeito
não quer ser, ou não quer dizer, por causa do inconsciente e é essa a entrada para
a noção de inconsciente freudiano como um dos lugares onde a ideologia opera.
Logo, o sujeito, para a AD, não será mais considerado aquele que fala usando a
língua, mas sim aquele pela qual a ideologia fala. É claro que essa perspectiva
comporta um componente altamente determinista, mas não isentamos o mérito que
essa reflexão tem: o de inaugurar uma nova visão sobre o sujeito e sua
complexidade. Tal determinismo será a marca da máquina discursiva da AAD69,
mas passará por revisões e rediscussões até chegar a um modelo baseado no
sujeito fragmentado e, diríamos, complexo, cuja “vontade” não é ignorada e sim
compreendida em outra dimensão, a do efeito ideológico.
Para construir um panorama geral do assunto, resumiremos as “três épocas”.
Conforme o próprio Pêcheux, em um de seus últimos textos de 1983, a história da
AD pode ser resumida em três fases intituladas AD-1, AD-2 e AD-3, consideradas as
respectivas semelhanças e diferenças que justificam as distinções. A AD1 é
35
marcada pela recusa do sujeito intencional e pelo investimento na maquinaria do
discurso, de modo que o “sujeito-estrutura determina os sujeitos como produtores de
seu discurso” ( PÊCHEUX, [1983] 1993, p. 311). Nesse momento da AD, tem-se “um
procedimento por etapa, com ordem fixa, restrita teórica e metodologicamente a um
como e um fim predeterminados, trabalhando num espaço em que as ‘máquinas’
discursivas constituem unidades justapostas” (idem, p. 313), ou seja, através de um
conjunto de análises algébricas se almejava chegar à constituição do discurso e sua
desconstrução. Assim, o componente lingüístico do discurso era visto como
determinado pela discursivizão, cujo controle se dava pela ideologia, a qual por
sua vez, operaria no inconsciente. Trata-se de um sujeito sem escolhas, porta-voz
de um discurso que ele não domina.
A noção de maquinaria, na AD-1, demonstrava, por exemplo, que o discurso
político da direita era homogêneo e independente. na AD-2, uma modificão
no olhar dos pesquisadores, que irão se voltar para as relações que uma máquina
desenvolve em relação à outra. “Na perspectiva da AD2, estas relações são relações
de forças desiguais entre processos discursivos” (idem, p. 314). Nesse momento da
AD, coma a destruição das máquinas, para dar lugar à noção de
interdiscursividade, com a qual se procurava demonstrar o exterior dos discursos. O
sujeito, na AD2, ainda é determinado, mas a vantagem da inclusão de um olhar
sobre a interpenetração dos discursos irá assegurar à teoria mais coerência, haja
vista que um discurso só existe pela negação e/ou união a outros, o que vai
demonstrar a interdependência entre eles.
Finalmente, na AD-3, passa-se a priorizar a alteridade, enquanto que o
processamento dos discursos por ordem fixa deixa de ser a prática corrente. Entram
em cena também o conceito de heterogeneidade mostrada como uma forma de
36
assunção da flexibilidade do sujeito entre a determinação que sofre, e,
simultaneamente, sua atuação sobre o sistema. Essa será uma entrada que
permitirá uma maior liberdade tanto para o pesquisador, quanto para a sua
compreensão da identidade do sujeito do discurso. Possenti sintetiza bem a idéia do
sujeito ativo, divido:
o acredito em sujeitos livres nem em sujeitos assujeitados. Sujeitos
livres decidiriam a seu bel-prazer o que dizer numa situação de interação.
Sujeitos assujeitados seriam apenas um ponto pelo qual passariam
discursos prévios. Acredito em sujeitos ativos, e que sua ação se dá no
interior de semi-sistemas em processo. (POSSENTI, 1996, p.37)
Ou seja, a construção do sujeito dar-se-ia no jogo entre a determinação e a
vontade do ser e do saber, ou ainda, entre o consciente e o inconsciente. A nosso
ver, há muito mais a predominância do inconsciente e das formações discursivas
falando pelos enunciadores nos textos analisados, através das alternâncias. Por isso
observamos, na opinião de Possenti, que a presumível “liberdadeque os sujeitos
teriam seria uma liberdade condicionada pelas possibilidades de discursos
existentes.
Como dito anteriormente, optamos por não fazer uma retomada histórica
muito profunda sobre a AD, haja vista que o principal objetivo era apresentar uma
contextualizão que permitisse ao leitor situar o embasamento teórico da tese.
Outras noções históricas da disciplina serão retomadas em diferentes momentos ao
discutirmos conceitos chaves para esta pesquisa e sua operacionalizão. A
discussão do conceito sebreve para que sua retomada, no capítulo das análises,
seja mais produtiva diante de exemplos claramente definidos.
Assim, com vistas a auxiliar na compreensão do fenômeno a ser aqui
estudado e de atender nossa demanda teórica, procuraremos tratar aos conceitos
segundo as três correntes da AD: a Lingüística, o Marxismo e a Psicanálise. A
37
discussão sobre o Estruturalismo, a materialidade lingüística, a enunciação, a
semântica e o texto será desenvolvida nessa primeira parte; os conceitos sobre
ideologia e história seo tratados na corrente marxista no próximo capítulo e
finalmente, o sujeito, a identidade e o inconsciente serão tratados dentro da
psicanálise que constitui o último capítulo de nossa fundamentação teórica. A junção
desses pensamentos e a demonstração do mecanismo de análise ficam por conta
do elemento prático de nossa pesquisa, a partir do capítulo que versa sobre a
operacionalizão dos conceitos.
1.2 O aparelho da linguagem
Pode parecer preciosismo de nossa parte, mas o conseguimos introduzir
um pensamento sobre a linguagem sem nos remetermos à lingüística moderna, sem
tomarmos Saussure como ponto de referência. cheux reconhece a força das três
disciplinas formadoras da AD, invocando, ironicamente, a “Tríplice Entente”: Marx,
Freud e Saussure (cf. MALDIDIER, 2003, p. 21), mas, de nossa parte, preferimos
inverter essa ordem, tomando como base a lingüística e partindo do marco que foi o
estruturalismo, sem o qual acreditamos que seria impossível desenvolver-se. Sem o
estruturalismo pensamos que a AD não teria muitas condições de desenvolver um
mínimo de rigor metodológico.
Até Saussure, o pensamento sobre a linguagem baseava-se na gramática
clássica e nas gramáticas da tradição lógico-normativa como a gratica de Port-
Royal (ARNAULD, 1992) –, assim como nos estudos filológicos e na gramática
histórica ou comparativa. o se pode negar a importância e o relevante papel
histórico representado por esses trabalhos, a seu modo, na evolução do
pensamento lingüístico, nem tampouco podemos nos esquecer de que o próprio
38
pensamento saussuriano foi o resultado de uma longa tradição da gramática
histórica. Talvez isso tenha sido um fator preponderante para que hoje pudéssemos
usufruir de toda a herança que o pensamento estruturalista nos legou.
Com a elaboração do objeto língua por Saussure, não foi apenas o
tratamento exaustivo das dicotomias: langue X parole, paradigma X sintagma,
sincronia X diacronia, social X individual, signo X significante que se tornou
importante para a definão do objeto, mas deu-se um outro, embora menos
lembrado e até mais significativo para esta reflexão: o tratamento da dicotomia
“exterior X interior” da língua (SAUSSURE, 1975, p. 29). Ao propor-se também esse
recorte, não se estabelece a visão do mais importante sobre o menos importante,
mas sobrepõe-se a idéia de uma ciência realmente com limites capazes de permitir
com que ela prosseguisse, sem que se perdessem de vista princípios essenciais. O
pensamento do estudo imanente da língua engendrou um modelo próximo das
ciências naturais possível de ser aplicado no âmbito das ciências humanas. Além da
metodologia e da orientação cientificista, o estruturalismo conferiu aos estudos
lingüísticos uma “autonomia(BORBA, 1991, p. 304) antes inexistente.
Foi a partir de então que os estudos fonéticos e fonológicos e tamm as
oposições entre os feixes de traços, passaram a servir de trampolim metodológico
para muitos trabalhos estruturalistas que vieram a seguir, com Bloomfield, o Círculo
Lingüístico de Praga, Martinet, Hjelmslev, Harris. Em especial este último sede
grande importância no início dos estudos em AD, como citado anteriormente.
É necessário notar que o século XX produziu um grande movimento de
contestação, e Saussure será um dos precursores até da sociolingüística ao abordar
as questões da língua escrita X língua falada. A propriedade com que ele discute
essa e outras questões deve ser pesada de acordo com a situação dos estudos
39
sobre linguagem em sua época, para percebermos que se tratava de um grande
avanço para esse período (final do século XIX e início do século XX). Não obstante,
devemos observar, conforme Borba (1991, p. 306), que o rmen do pensamento
das oposições não é uma inusitada intuição do lingüista genebrino:
Como meio de comunicação e expressão, a língua é uma espécie de
instituição social: é coletiva e supra-individual; é algo criado pela sociedade
e, de certa forma, imposta aos indivíduos. Sob este aspecto Saussure
assimila as idéias do sociólogo francês Durkheim que depreende os fatos
sociais através de um feixe coeso de relações que constitui a realidade
social, independente dos indivíduos.
A reação à preocupão excessiva com a estilística, ao trato dos aspectos
individualizados e às particularidades das línguas muda de perspectiva. Com o
advento saussuriano, busca-se o que é comum e social, o supra-individual. O
sucesso da empreitada estruturalista teve como uma forte razão, a abertura dos
novos horizontes metodológicos:
As razões desse êxito espetacular dependeram essencialmente do fato de
que o estruturalismo apresentou-se com um método rigoroso que poderia
ocasionar esperanças a respeito de certos progressos decisivos no rumo
da ciência; mas também, simultaneamente, e de um modo mais
fundamental, do fato de que o estruturalismo constituiu um momento
particular da história do pensamento suscetível de ser qualificado como o
tempo forte da consciência. (DOSSE, 1994, p. 13)
O estruturalismo passou a ser uma alternativa aonone clássico (acentuado
nos estudos da Estilística, da Retórica), e também uma resistência ao pensamento
metafísico sobre a noção de língua/linguagem e também as concepções
normativistas, de longa data, dominantes nos bancos escolares. Embora Saussure
(leia-se Bally e Sechehaye) tenha empregado o termo “estrutura” apenas três vezes
no Cours de Linguistic Géneral, se a Escola de Praga a responsável pela sua
difusão e doutrina (cf. DOSSE, 1994, p. 15).
O apogeu de um pensamento, normalmente lhe confere uma hegemonia
perigosa até o levar à ruptura; no entanto, ruptura não significa fim ou esquecimento
definitivos, mas apenas o fim da hegemonia alcançada. Os traços que restam nas
40
sucessões de outros pensamentos que conquistarão hegemonia, estarão, e
inclusive nos pensamentos de resistência, tratando-se, é claro, de uma
interdiscursividade. É o que tentaremos delinear agora. Por volta de 1967, tem início
o “refluxo das críticas” (idem, p. 17), em que os estudiosos começam a tomar
posição de distanciamento e dissidência. É como se uma diáspora acontecesse no
núcleo duro: a Lingüística do Texto, a Pragmática, a cio-Lingüística, a Semântica
Argumentativa, a Psicolingüística nascem da tradição estruturalista, muito embora
tenham tomado rumos distintos e se firmado como disciplinas muito “independentes
– independência de militância, mais do que de conceitos.
A entrada da Lingüística e de sua episteme estruturalista nos estudos do
discurso dar-se-á através de duas figuras, segundo Maldidier (apud MUSSALIN,
2001, p. 101): Dubois e Pêcheux. Embora Dubois e Pêcheux apresentassem
preocupões distintas, a luta política os unia, haja vista seu envolvimento com o
Partido Comunista Francês.
Dubois, um lingüista, lexicólogo envolvido com os empreendimentos da
lingüística de sua época; Pêcheux, um filósofo envolvido com os debates
em torno do marxismo, da psicanálise, da epistemologia. O que de
comum no trabalho desse dois pesquisadores com preocupões distintas
é que ambos são tomados pelo espaço do marxismo e da política,
partilhando convicções sobre a luta de classes, a história e o movimento
social. (MUSSALIM, 2001, p. 101-102)
A vertente liderada por Dubois tomará a AD como uma extensão da
Lingüística, ou, pelo menos, como uma evolão dela. De modo que, para ele, o
contraste das regularidades no corpus será o método, e na concepção de
enunciação, com sua visão de um sujeito autônomo e idealizado pelo dizer. Já para
Pêcheux, não há sujeito autônomo, e isso leva a uma divio entre os pensamentos
muito particulares, entrando-se nos campos da discussão sobre a Ideologia e o
Sujeito.
Se o estruturalismo deixa de ter hegemonia, qual será sua importância na
41
AD? A lingüística estrutural será o que unirá a compreensão da inserção do
sujeito determinado/determinante histórico e ideológico com o sujeito do
inconsciente e dos processos da formação e identificação da identidade, pois toda a
linguagem e língua serão as entradas para a tentativa de compreensão do sujeito e
de sua existência histórica, sua formão ideológica e sua interação com os outros
sujeitos. Quando se diz “a língua será o nó”, entenda-se que ela seo lugar de
encontro entre os fios do sujeito, da história revelada e atuante não na estrutura da
língua por si, mas dessa estrutura com um processo explicado pelos traços
enunciativos deixados na enunciação. Ou seja, por que um sujeito que não admite
ser racista enunciaria uma frase como esta abaixo?
1) Mais o fato mais intrigante é que independente de ser rico ou pobre, branco ou
negro, inteligente ou ignorante, [atos de violência] vem sendo praticados sem
nenhuma neglincia. (Fragmento de um texto de estudante).
Note-se que, se tomarmos esse enunciado como um esquema paralelístico,
ele produziria o seguinte quadro:
VALORES
“POSITIVOS”
VALORES
“NEGATIVOS”
branco Negro
rico Pobre
inteligente Ignorante
Quadro 2 - Oposição “negro” e “branco”
Outro exemplo é o nosso corpus, trazendo para o problema de nossa tese:
Por que um sujeito alterna a referência do enunciador em seu texto? Não
responderemos a essa questão neste momento, no entanto ela reforça a idéia de
que, realmente, a estrutura lingüística, a enunciação e a semântica são os s
responsáveis por boa parte da costura do tecido da vida social, incluindo-se, é claro,
42
muitos outros meios, códigos e linguagens, de modo que o fenômeno da alternância
irá se traduzir em efeitos de sentidos diferentes. E é sobre ele que pretendemos
produzir nossas alises neste trabalho.
Outro raciocínio que não pode ficar no esquecimento é o de que a língua e
demais meios de expressão não representam simplesmente cada cultura em uma
dada época, mas, mais do que isso, o os veículos de formação da ideologia, pois
não é possível que um ser humano, vivendo em sociedade, seja afetado apenas por
uma ideologia, mesmo que seja afetado apenas por um língua enquanto sistema.
Inevitavelmente, ele também é afetado pelos sistemas psicolingüísticos e sociais
vigentes no contexto em que vive. Apesar das diferenças epistemológicas, vale a
pena lembrarmo-nos da hipótese Sapir-Whorf como ilustração:
A hipótese de Sapir-Whorf foi muito divulgada em meio a lingüistas e
antropólogos sobretudo nas décadas de cinqüenta e sessenta. Para essa
teoria, a conceitualização da realidade se revela claramente nas estruturas
gramaticais e semânticas das línguas. Em outras palavras: todo sistema
lingüístico manifesta tanto no seu léxico como na sua gramática, uma
classificação e uma ordenão dos dados da realidade que são típicos
dessa ngua e da cultura com que ela se conjuga. Ou ainda: cada língua
traduz o mundo e a realidade social segundo o seu próprio modelo,
refletindo uma cosmovio que lhe é própria, expressa nas suas categorias
gramaticais e lexicais. (BIDERMAN, 2001, p. 109)
Jamais poderíamos dizer que tal afirmação seja ponto pacífico, contudo vale
ressaltar que, se essa hipótese for verossímil, se forem comparadas línguas
distintas, também podemos afirmar que não só as estruturas gramaticais indicam
uma maneira de ver de uma dada sociedade, como tamm formam uma maneira
de ser. Assim, não estamos diante de um modelo de sujeito contemplativo, mas de
um sujeito ativo e interativo sobre e na “realidade” de seu grupo social, por isso
consideramos que a estrutura (língua) é veículo do discurso, e tamm um ente
formativo do discurso, de tal modo que um indivíduo seafetado pelas diferentes
formações discursivas, e isso em uma mesma língua, com os sentidos que se
digladiam na arena da linguagem, para além da sua dimensão estrutural.
43
A contribuição da AD para os estudos da linguagem coloca-se por um gesto
inaugural e ousado:
Se a lingüística deixa para fora a exterioridade (que é objeto das ciências
sociais) e as ciências sociais deixam para fora a linguagem (que é objeto
da lingüística), a AD coloca em questionamento justamente essa relação
excludente, transformando, por isso mesmo, a própria noção de linguagem
(em sua autonomia absoluta) e a de exterioridade (histórico-empírica).
(ORLANDI, 1996, p. 26)
Não se trata de um rompimento nem se trata de interdisciplinaridade, mas de
um conhecimento. Analisar o discurso é tentar dar conta do sentido, é uma
semântica que toca nas questões até então excluídas, tanto do campo da lingüística
quanto do campo dos estudos sociais, embora ambos, na década de 1960,
estivessem pautados na episteme estruturalista. A AD se coloca como uma nova
abordagem semântica, cujo estruturalismo servirá como objeto de questionamento e
tamm para uma de suas bases, de modo que tal contribuição (aqui contribuição
não deve ter um sentido minimizado) foi premente para o surgimento da AD e sua
configuração tal qual se encontra hoje.
Sempre que se pensa na língua e em seu funcionamento social, deve-se
tamm lembrar que o sistema é neutro. Retomando o corte saussuriano entre
langue X parole, Pêcheux admite a neutralidade do sistema e conceitua o que será a
língua para a AD:
Ao opor base lingüística e processo discursivo, inicialmente estamos
pretendendo destacar que, como foi apontado recentemente por P. Henry,
todo o sistema lingüístico, enquanto conjunto de estruturas fonológicas,
morfológicas e sintáticas, é dotado de uma autonomia relativa que o
submete a leis internas, as quais constituem, precisamente, o objeto da
Lingüística. É, pois, sobre a base dessas leis internas que se desenvolvem
os processos discursivos, e não enquanto expressões de um puro
pensamento, de uma pura atividade cognitiva, etc., que utilizaria
‘acidentalmente’ os sistemas lingüísticos. (PÊCHEUX, 1996, p. 91).
Com base nessa citação, entendemos que a episteme lingüística da AD é um
ponto de apoio, e essa conceituação será de extrema utilidade em nosso trabalho,
como demonstraremos na apresentação metodológica, pois através dos elementos
44
morfossintáticos, próprios do português falado e escrito no Brasil, entenderemos
algumas peculiaridades enunciativas escritas dos textos analisados. É mister
esclarecer que nosso objeto não é o interior do sistema, mas a sua relação com o
seu exterior, com o seu entorno.
1.3 O aparelho da linguagem: concepções
Para introduzir este assunto, tomemos como exemplo, um estudante de física
que tem por objetivo descrever em laboratório o comportamento de partículas
subatômicas. Ele se vale de aparelhos de precisão, de supercomputadores para
efetuarem os cálculos etc. Quando ele termina seus trabalhos daquele dia, ele se
envolverá com outras atividades que não propriamente seja o seu objeto de análise.
De modo diferente se comportam aqueles que analisam a língua, discurso,
enunciados, pois o seu objeto de análise é tamm o que serve para descrever o
objeto. É por isso que a compreensão e apreensão da metalinguagem é difícil,
porque o contato como usuário do objeto analisado lhe imprime mais senso comum
e pré-discursos do que um estudante de física teria sobre partículas subatômicas.
Pois um lingüista, um analista do discurso, um sociolingüista, um psicolingüista têm
por objetos de pesquisa a língua, o discurso, o processamento da linguagem, os
grupos lingüísticos e por ferramenta também a língua: ferramenta imperfeita
(lembrando HENRY, 1992 e também FREGE 1978). Tudo isso serve para dizer que
alguém que se debruça sobre a linguagem como objeto de estudo não consegue o
mesmo grau de distanciamento do objeto, como um físico o conseguiria.
Neste item, seguiremos, então, um traçado um pouco longo que envolverá a
conceituação de noções básicas, como as de língua, linguagem, sentido e
referência, enunciação, marcas enunciativas. Tais conceitos comportarão outros,
45
como por exemplo: a enunciação englobando os conceitos de enunciado,
debreagem e embreagem entre outras idéias inerentes à compreensão do fenômeno
analisado.
1.3.1 A linguagem e a língua
As discussões sobre a língua/linguagem remontam à Antigüidade Clássica
(ver ABBAGNANO, 1998, verbete linguagem; CÂMARA, 1980; entre outros), mas foi
Saussure quem estabeleceu importantes princípios sobre o tema e com
propriedade:
Mas o que é língua? Para nós, ela o se confunde com a linguagem; é
somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao
mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto
de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o
exercício dessa faculdade nos indivíduos. Tomada em seu todo, a
linguagem é multiforme e heteróclita; a cavaleiro de diferentes domínios, ao
mesmo tempo física, fisiológica e psíquica, ela pertence além disso ao
domínio individual e ao domínio social; não se deixa classificar em
nenhuma categoria de fatos humanos, pois o se sabe como inferir sua
unidade. (SAUSSURE, 1975, p. 17)
Em Saussure, a linguagem quase aparece como um ente geral e caótico,
como uma propriedade da existência, sem muita explicação, ou ainda com
explicações desnecessárias. Não devemos nos admirar dessa incerteza, pois, aos
olhos do pensamento positivista que embasa a época em que o Cours foi escrito,
seria muito difícil que asserções sobre a linguagem, algo que era visto como
desestabilizado, descontínuo, fragmentado, pudesse fazer sentido. No entanto,
mais adiante, o Cours afirmará: “A língua, assim, como delimitada no conjunto dos
fatos de linguagem, é classificável entre os fatos humanos, enquanto a linguagem
não o é.” (p. 23). E, ainda na página 24, vem a cartada final, na qual se propõe a
Semiologia como estudo geral dos signos, enquanto a língua é tomada como o
principal dos seus objetos. Saussure foi um pioneiro ao propor a diferença entre
46
língua e linguagem, isso porque lhe foi necessário definir o objeto da Lingüística, que
é a língua e não todos os sistemas simbólicos, daí sim, objeto da semiologia.
Poderíamos dizer que ele estava errado em fazer esse “corte”? De modo algum, se
considerarmos o que ele pretendia alcançar, e levarmos em conta o momento
histórico: o lingüista estava afetado pela formação discursiva do Positivismo.
Trazendo para o contexto desta pesquisa, como compreenderemos língua e
linguagem? Adotar um conceito meramente para que essa lacuna não fique em
branco, seria desonesto, tendo em vista o nosso objeto de análise, e também não
seria original de nossa parte simplesmente adotar um conceito apenas por tratar de
algo consagrado.
Como vimos, segundo Saussure, a língua é a principal linguagem para o
ser humano, sendo de maior importância que gestos, expressões, elementos
pictóricos: é a linguagem verbal que predomina nas conversas face a face, na leitura
de jornais, nos diálogos por telefone ou por meios eletrônicos. Então, o que vem a
ser linguagem? Partiremos do símbolo. Para nós, o símbolo é todo e qualquer
elemento dentro de um conjunto de normas e regras que vale por um outro. Por
exemplo, um “abanar de cabeça” pode significar “sim”, ou seja, estar no lugar de
“uma afirmativa”, ou estar na resposta de uma situação comunicativa. Alguns outros
exemplos: uma coluna de fumaça está apontando para um lugar onde fogo, ou
ainda, o léxico a palavra “xícara” referenciar um objeto na realidade. Daí a linguagem
passa a comportar as normas e regras organizadoras dos símbolos, no entanto,
devemos observar que a linguagem e o símbolo estão em sincronia: nem o mbolo
nem a linguagem existiram primeiro um em relação ao outro, mas
concomitantemente. O símbolo e a linguagem nascem juntos, como um mesmo
evento.
47
Se o símbolo aponta, denomina, significa e leva a efeitos de sentido, como
compreendê-lo no meio social e, principalmente, em um processo discursivo de
referenciação como, por exemplo, nosso objeto de análise? Trata-se de uma relação
bastante complexa a que nos leva a pensarmos no modo de referenciação dos
sujeitos enunciadores em seus textos e, mais ainda, nas representações lingüísticas
da alternância. O valor de algo por outro não encerra em si a referência, mas o
próprio sentido de valor” se amplifica: “estar no lugar de” é significativo, o que
aponta para escopos muito variados. Um exemplo dessa complexidade é o caso das
relações de sinonímia e hiperonímia que pressupõem a substituição lexical.
Substituir um termo próximo de sentido por outro ou uma estrutura sintática pois
outra pode manter uma mesma referência, mas não o mesmo sentido e efeito de
sentido, como substituir “negro” por “pessoa de cor”, ou usar a voz ativa no lugar da
voz passiva. As diferenças de uma forma a outra não estão somente na forma, mas
na relação que a forma estabelece com outros elementos constitutivos do efeito de
sentido, tais como sujeitos envolvidos, momento histórico, contexto enunciativo etc.
Isso acontece por existem valores agregados a “negroe “pessoa de cor” que levam
a efeitos de sentido dependendo de sua posição sintática, por exemplo.
Adotaremos a noção de cheux segundo a qual a língua é o nó, como foi
dito anteriormente, e a tomaremos, nesse sentido de tessitura dos textos, ou melhor,
como o que amarra os enunciados de que constituem os discursos. Contudo, essa
tecedora é dinâmica: tanto o quanto os fios se completam e existem porque
estão juntos, já que não existe língua sem discurso e não existe discurso sem língua.
O caminho que nos resta, para tentarmos a compreeno e reagrupação dos
discursos considerados “dispersos”, no sentido foucaultiano (FOUCAULT, 2002 e
2003) a partir dos fatores da língua e da enunciação, é buscar as marcas das
48
referências nas pistas deixadas nos enunciados. Isso, no entanto, não constitui uma
simples investigação em que, através das impressões digitais ou de algum tecido
orgânico, procura-se encontrar um culpado que seja denunciado pelo seu DNA. Esta
investigação não chega a pontos exatos, mas a outros indícios, ou a caminhos
possíveis de serem percorridos para se tentar compreender o modo de
funcionamento de procedimentos enunciativos.
1.3.2. Enunciação e enunciado
Os conceitos a respeito da enunciação são muitos e sobre eles foram
produzidas diferentes obras e muitos artigos. Para esta parte da tese, iniciaremos
com a clássica definição de Benveniste e depois faremos algumas observações sob
o prisma de Kerbrat-Orecchioni.
Segundo a clássica definição de Benveniste (1995), a enunciação é “a
colocação em funcionamento da língua por um ato individual de utilização”, o que se
opõe a “enunciado”, definido como produto do ato da enunciação. “A reflexão sobre
a enunciação pôs em evidência a dimeno reflexiva da atividade lingüística: o
enunciado faz referência ao mundo na medida em que reflete o ato de
enunciação que o sustenta. Assim, as pessoas e o tempo do enunciado são
selecionados em relação a sua situação de enunciação [...] (CHARAUDEAU E
MAINGENEAU, 2004, p. 193).
O ato individual ao qual Benveniste se refere não é um procedimento de
subjetividade no sentido idealista. Apesar de as críticas da AD serem muito
constantes sob a perspectiva enunciativa adotada por Benveniste, parecem-nos
muito importantes suas observações quanto à questão da subjetividade, aliás, um
ponto de equívoco, por parte daqueles que o criticam. A leitura mais apropriada de
49
Benveniste permite compreender que a abordagem empreendida não é mais que
uma questão estrutural das posições enunciativas. É o que deixa claro Possenti
quando questiona: “O que significa ‘o sentido depende da enunciação’?”: “[...] para
Benveniste, o sentido releva da língua. O que releva da enunciação é a referência,
e o problema quanto a ele é mais o suposto consenso do que qualquer outro.”
(POSSENTI, 2001, p. 194). Por isso, a leitura que faremos sobre Benveniste não
qualifica sua obra como “inocente”.
Eu designa aquele que fala e implica, ao mesmo tempo, um enunciado
sobre o “eu”: dizendo eu, não posso deixar de falar de mim. Na segunda
pessoa, “tu” é necessariamente designado por eu e não pode ser pensado
fora de uma situação proposta a partir do “eu”; e, ao mesmo tempo, eu
enuncia algo como um predicado do “tu”. Da terceira pessoa, porém, um
predicado é bem enunciado somente fora do “eu-tu”; essa forma é assim
excetuada da relação pela qual “eu” e “tu” se especificam. Daí, ser
questionável a legitimidade dessa forma como “pessoa. (BENVENISTE,
1995, p. 250)
Não acreditamos que Benveniste estivesse interessado em um “sujeito dono
do sentido”, mas sim preocupado com o circuito comunicativo sob uma perspectiva
de alteridade estrutural, empírica é claro. Sua preocupação também residia em
compreender o processo enunciativo e as marcas dos sujeitos enunciadores nos
enunciados, por se tratar de um procedimento altamente complexo; assim, a
instauração de pessoa subjetiva, pessoa o-subjetiva e não-pessoa compreende
um jogo de sentidos muito peculiar em diferentes línguas, como o próprio Benveniste
(1995) demonstra. Dessa situação, não como escapar de um sujeito-enunciador
que, ao assumir “eu”, fale de si mesmo, mesmo que esse “eu” seja um indivíduo com
a ilusão de integridade e uniformidade: afinal, sempre havealguém a empunhar a
caneta que é um ser empírico constituído de várias outras vozes, e não se trata de
subjetividade romântica ou romantizada e que o ser empírico não é senhor dos
sentidos.
Kerbrat-Orecchioni (1999) lembra os significados da enunciação, partindo de
50
Benveniste, mas também o que dizem Ascombre e Ducrot (apud KERBRAT-
ORECCHIONI, 1999, p. 32): “a enunciação é por essência histórica, eventualmente,
e, como tal não se reproduz jamais duas vezes idênticas a si mesma.” (tradução
nossa)
6
, daí se reconhece a dificuldade em se constituir a enunciação como objeto
em si mesmo de análise por parte dos lingüistas. No decorrer de suas observações,
Kerbrat-Orecchioni adotará os fatos enunciativos” como princípio de sua discussão
sobre enunciação:
s chamaremos de “fatos enunciativos as unidades lingüísticas, de
quaisquer natureza, posição e dimensão, que funcionem como indícios da
inscrição no seio do enunciado de um e/ou de outros parâmetros que
venham a ser enumerados, e que sejam por isso portadores de um arque-
trato semântico específico a que chamaremos de ´enunciatema´. (idem, p.
34).
7
Adotaremos o mesmo princípio, haja vista que nosso objeto de análise se
pauta em semelhante processo, pois os indícios do processo enunciativo são
percepveis por enunciatemas que se pautam em três eixos, relembrando
Benveniste e a lingüística da enunciação:
a) enunciado reportando ao locutor;
b) enunciado reportando ao alocutário;
c) enunciado reportando à situação enunciativa.
Em nossa análise, interessar-nos-á apenas a relação com o “locutor”, sendo
os outros considerados elementos secundários, embora não menos importantes,
isso porque a base da enunciação seja o “eu” (ego), ou seja, parte de um sujeito que
empunha a palavra a partir de um “aqui” (hic) e de um “agora” (nunc). Contudo,
como veremos nas análises, esse eu” pouco se referencia, sendo as enunciações
em np e 1ps muito mais numerosas e para explicar isso iremos propor uma outra
6
[L´énonciation] est donc par essence historique, événementielle, et, comme telle, ne se reproduit
jamais deux fois identique à elle-mème.
7
Nous appellerons faits énonciatifs” les unités linguistiques, quels que soient leur nature, leur rang,
leur dimention, qui fonctionnent comme indices de inscription au sein de l´énoncé de l´un et-ou
l´autre des paramètres qui viennent d´être énuméré, et qui sont à ce titres porteuses d´un archi-trait
mantique especifique que nous appelleronsenunciatème ».
51
perspectiva. Assim, não como se falar de uma enunciação sem uma centralidade
subjetiva. Vale lembrar que o conceito clássico de sujeito” evoca a noção do “ser”
sobre o qual se predica. Aristóteles, epicuristas e a tradição filosófica medieval
voltam seu olhar para a noção filosófica e gramatical. Já Locke irá chamar o sujeito
de “substrato ou suporte(ABBAGNANO, 1998, p. 913). Sem entrar no mérito da
discussão filosófica que contrapõe as correntes idealista e empirista e mesmo
considerando que o nosso trabalho esteja dentro da perspectiva da AD, devemos
ser prudentes em compreender o sujeito “ser” ou “indivíduo” como suporte na
enunciação, pois, como foi dito acima, trata-se de uma contingência estrutural da
própria natureza da interação entre os indivíduos. Sempre há um “eu” que se
instaura em e oposição a um “tu”, sempre um “aqui” que se instaura em oposição
ao “lá”, e um “agora” que se instaura em oposição a um “antes/depois”. A “tal
subjetividade é onipresente: todas essas escolhas implicam no locutor mas em
graus diversos” (KERBRAT-ORECCHIONI, 1999, p. 36) (tradução nossa)
8
, a nosso
ver, isso implica em pressupor que existam nuanças, diferenças, efeitos de sentido
quanto à instauração das referências enunciativas, sejam elas em 1ps, 1pp ou np.
Por conta da diferença entre enunciado e enunciação, é preciso remarcar que
o enunciado, mais que simplesmente o dito/escrito, é a materialização da
enunciação, e só se depreende a enunciação por intermédio dele. No mesmo
caminho de Kerbrat-Orecchioni, teremos como objeto para busca das pessoas
enunciativas o seguinte direcionamento:
[...] a problemática da enunciação (a nossa) pode ser assim definida: é a
busca dos processos lingüísticos (shifter, modalizadores, termos
avaliativos, etc.) através dos quais o locutor imprime sua marca no
enunciado, se inscreve na mensagem (implicitamente ou explicitamente) e
se situa por relão a si mesmo (problema da “distância enunciativa). É
uma tentativa de localização e descrição das unidades, de qualquer
natureza e de qualquer nível que sejam, que funcionam como indícios de
8
Cette subjetictivité est omniprésente: tous ses choix impliquent le locuteur mais à des degrés
divers.
52
inscrição no enunciado do sujeito da enunciação.
9
(idem)
O trabalho de Kerbrat-Orecchioni é bastante amplo, pois ela procura dar conta
do maior mero possível de marcas, enquanto s pretendemos apenas descrever
a marca dos sujeitos enunciativos, sem pensar em tempo e espaço como itens para
descrição. Isso torna a nossa pesquisa bastante específica, além, é claro, dessa
descrição ser parcial para os fins de discutir o sujeito fragmentado. O assunto
referente à enunciação se retomado mais adiante, após tratarmos da dêixis,
quando retomamos os aspectos teóricos da debreagem.
1.3.3. Sentido e referência: uma primeira entrada para a dêixis
Dada a natureza do objeto de nossa pesquisa, temos, obrigatoriamente, que
tratar de aspectos semânticos, principalmente no que dizem respeito à referência e,
assim, por conta deste aspecto, as queses dêiticas serão aprofundadas. Para
melhor fazê-lo, iniciaremos o capítulo partindo do pensamento de Frege (1978) a
respeito das questões da nomeação e da designação, perseguindo os conceitos de
dêixis resultantes de um importante colóquio realizado em 1990 na Sorbonne e
organizado por Morel e Danon-Boileau (1992).
1.3.3.1 Iniciando uma reflexão sobre sentido e referência
Não acreditamos ser interessante, para os objetivos aqui propostos,
explorarmos o que o pensamento grego produziu a respeito da discussão sobre o
sentido, o significado e a gramática, mas não podemos deixar de citar os diálogos de
9
[...] la problématique de l´énonciation (la nôtre) peut être ainsifini: c´est la recherche des procés
linguistiques (shifters, modalisateurs, termes évaluatifs, etc.) par lesquels le locuteur imprime sa
marque à l´énoncé, s´inscrit dans le message (implicitement ou explicitement) et se situe par rapport à
lui (problème de la « distance énonciative ») . est une tentative de repérage et de description des
unités, de quelque nature et de quelque niveau qu´elles soient, que fonccionnent comme indices de
l´inscription dans l´énoncé du sujet d´enoncitaion.
53
Platão, em especial, Teeteto e Parmênides (PLATÃO, 1988 e PLATON, 1975), como
boas referências sobre o tema, nem tão pouco nos vimos obrigados a tratar do que
os escolásticos da Idade Média pensavam sobre o assunto. Assim, desejamos iniciar
esta primeira reflexão em um momento hisrico mais recente, comando por Frege
cuja obra data do final do século XIX , que discute, em seu célebre artigo “Sobre
sentido e referência” (Frege, 1978)
10
, alguns conceitos sobre a relação “linguageme
“mundo” e desencadeia uma série de outras reflexões que se seguiram à sua com o
objetivo de sistematizar essa relação; inaugurou assim, aquilo que seria reconhecido
como Semântica Referencial.
A episteme que marca o momento de produção do pensamento de Frege foi a
do idealismo alemão, ao mesmo tempo em que os estudos gramaticais e sobre a
linguagem se voltavam para a história e a etimologia nas línguas por causa dos
estudos dos neogramáticos. Frege procurava construir uma Begriffsschrift
(aproximadamente, escrita conceitual) que desse conta de transcrever o
pensamento sem as falhas”, as imperfeições, as ambigüidades presentes nas
línguas naturais, uma vez que o pensamento de uma linguagem referencial tinha
por objetivo alcançar uma língua adâmica, capaz de aceder à Verdade sem os
percalços da língua natural que, segundo ele, estava, normalmente, impregnada de
equívocos, ou melhor dizendo, de derivas de sentido. Além disso, em sua
concepção, a linguagem deve ser capaz de levar conhecimento e, por isso, chegou
a considerar que o texto literário não seria capaz de alcançar esse objetivo, por não
se ater à Verdade, ou seja, o texto literário serviria para o deleite, mas não para
apreensão da Verdade objetiva. Apesar de um modo de pensar como esse parecer
estranho ao presente momento dos estudos sobre linguagem, no qual vemos
10
Para uma melhor compreensão desse pensamento, Henry (1992, p. 37-43).
54
avanços importantes para aproximar áreas outrora tidas como distantes, a
contribuição de Frege para a semântica resultou extremamente produtiva,
principalmente pela distinção que faz entre sentido e referência.
Ao se referir aos sinais e nomes próprios, Frege propõe: “Neste contexto fica
claro que, por ‘sinal’ e por ‘nome’, entendi qualquer designação que represente um
nome próprio, cuja referência seja um objeto determinado (esta palavra tomada na
aceão mais ampla)” (1978, p. 62). Assim, o que ele entende por referência é o
objeto real e o que entende por sentido são as formas, mais ou menos arbitrárias
socialmente, de referência ao objeto da realidade. Nessa circunstância, o que se
encontra nas línguas naturais é o fato de as referências terem mais de uma
designação e mais de um sentido. O que permite também que existam mais sentidos
que referência; é o que se observa, por exemplo, na expressão “o corpo mais
distante da Terra(idem, p. 63), cuja referência não é tangível, ou ainda quando se
trata de elementos mitológicos como “unicórnio”. Acrescenta, como conclusão, que
“portanto, entender-se um sentido nunca assegura sua referência.” (idem).
Essa relação, se levada às questões enunciativas, faria com que
passássemos a ter um aspecto que se estende às situações mais complexas, como,
por exemplo, a possibilidade de compreender a relação sentido e referência no
âmbito dos enunciadores. Por exemplo: se tomarmos um dêitico como “eu”, teremos
sentido que seria “a pessoa que enuncia num dado momento” e a referência seria a
própria pessoa enunciando emtal momento”. Mas essa não é uma questão simples,
pois, em um ambiente com mais de uma pessoa enunciando “eu” (como no caso de
um coro), teríamos um enunciado morfo-fonético-sintático idêntico, cuja referência
seria distinta da de um indivíduo, pois participariam vários indivíduos. Ao passo que
três pessoas em um recinto pronunciando a palavra “janela” teriam como referente
55
um mesmo objeto da realidade humana.
A questão da referência pode se complicar mais ainda. Observemos o que
ocorre em se tratando de “nós”, cuja fórmula é complexa: a) nós = ps + pns ou b)
nós = ps + np(x) – np(y)
11
, COMO, por exemplo, em:
2) Vamos tomar um café!
3) A nossa sociedade precisa dar uma chance para eles.
Embora, para Frege, expressões que podem ser um sinal, como Estrela da
manhã” e “Vênus”, tenham o mesmo referente, “Planeta Vênus, cada uma comporta
não só sinais diferentes, mas sentidos diferentes, ou seja, formas de aceder ao real
de maneira diferente e, por isso, têm a capacidade de produzir conhecimento. Ou
seja, um indivíduo que conhecesse apenas designação para Vênus, passa a
conhecer outras, porém, não podemos dizer o mesmo das formas pronominais e
verbais que demarcam a pessoa da enunciação. A complexidade do mecanismo
enunciativo irá compor um jogo diferente dos mecanismos de referenciar e dos
mecanismos dêiticos. Afinal, apontar objetos da existência não significa apenas
nominá-los e, por conseguinte, referenciá-los; a nosso ver, significa, em todo
instante, estabelecer avaliões, inscrever-se em formações discursivas e disparar
efeitos de sentidos. É por conta dessa reflexão que desejamos tocar em assuntos
pertinentes aos mecanismos de enunciação e também semântico para que
percebamos algumas distinções entre as modalidades enunciativas importantes.
1.3.3.2 Denominação e relações denominativas
Kleiber (1984, p. 77) afirma que a “linguagem tem por vocação primeira falar
11
1ps: primeira pessoa do singular ; pns: pessoa o-subjetiva (tu, você, vocês, referindo-se ao
interlocutor); np:o-pessoa (ele, outro elemento não participante do circuito interativo).
56
sobre o real” (tradução nossa)
12
. Assim, as relações de função de designação e
representação constituem a principal característica do signo lingüístico: o basta
estar no lugar de algo. O signo deve representar algo, funcionar como referencial de
algo.
[...] a função de designação, de representação constitui a característica
principal do signo lingüístico. A relação de denominação é uma parte
constitutiva dessa dimensão referencial. Ela se inscreve no processo que
coloca em relação os signos com as coisas e se posiciona ao lado das
relações referenciais: referir a, remeter a, designar, representar, denotar
etc. respondem ao esquema X (signo) x (coisa) (tradução nossa)
13
.
O esquema X (signo) x (coisa) pode, ainda, ser desdobrado em pelo
menos duas principais distinções que se fazem necessário considerar: a referência e
a denominação. Partiremos dos enunciados que servem de exemplo em Kleiber
(1984, p. 78):
4) a ) Uma pequena mosca se chama/ se nomeia / é chamada
MOSQUITO.
b) MOSQUITO é o nome da mosca pequena
5) a) O diretor da escola se chama / BERNARD.
b) BERNARD é o nome do diretor da escola
6)a) MOSQUITO designa / representa / denota uma pequena mosca
b) MOSQUITO refere-se / remete a uma pequena mosca
7)a) BERNARD designa / representa o diretor da escola
b) BERNARD refere-se / remete ao diretor da escola
8)a) ? BERNARD significa ‘o diretor da escola’.
b) ? BERNARD tem o sentido de diretor da escola.
c) ? O sentido de BERNARD éo diretor da escola’.
9)a) MOSQUITO significa mosca pequena’.
b) MOSQUITO tem o sentido de mosca pequena.
c) O sentido de MOSQUITO é ‘mosca pequena’;
Observamos uma determinada identidade entre os exemplos de 4 a 7. No
entanto, em língua portuguesa, 4a e 4b possuem um grau baixo de aceitabilidade, já
em 8a, 8b e 8c são impossíveis em português e em francês. O exemplo serve para
12
La langage a pour vocation première de parler du réel.
13
[...] la fonction de désignation, de représentation, constitue le caractère principal du signe
linguistique. La relation de dénomination est une partie consitutive de cette dimension référentielles:
référer à, renvoyer à, désigner, represénter, dénoter, etc., qui répondent toutes au schéma X (signe)
x (chose).
57
demonstrar que existem limitações entre os signos cujas naturezas referenciais
sejam distintas, como é o caso dos nomes comuns e dos nomes próprios e essa
diferença está no fato de BERNARD ser uma nomeação, enquanto que MOSQUITO,
uma designação. O artigo de Kleiber aprofunda-se em outros aspectos, mas nos
deteremos aqui, demonstrando que o nome próprio possui uma determinada
estabilidade enquanto outros nomes terão, ordinariamente, sua significação
eventual. Ora, em nossa pesquisa, iremos lidar com nomes, não apenas com
pronomes e verbos ao nos referirmos às estruturas lingüísticas que representam o
sujeito na enunciação, bem como o seu outro no que diz respeito às identidades
tocadas nos textos que servem de corpus. Essas relações designacionais serão
muito valiosas quando tratarmos de termos como “negro”, “branco”, “pessoa de cor
negra”sociedade”, “brasileiro(s)”, que são sentidos cuja referência merece um
tratamento, além de semântico, discursivo. Assim sendo, aqui abordada a diferença,
podemos compreender que tais nomes funcionam como designadores e, por isso, o
deslizamento de sentido constitui-se em uma natural mutação, cuja referência não é
clara e cujo sentido se fundamenta na base de uma dada discursividade, o que não
significa que tais termos fiquem em uma deriva incondicional, permanecendo à
mercê de sentidos exageradamente profícuos, como veremos a seguir.
Ao discutirmos sentido e referência, necessariamente entramos em um campo
bastante complexo de análise que se estende à distinção entre nomeação e
designação, como visto acima. Mais tarde, Kleiber (1994, p. 21) irá tratar desse
assunto ao retomar conceitos relativos às categorias filosóficas para tratar da
realidade, achegar a uma conceituação sobre o assunto da referência, como se
observa em termos como “sociedade”, “brasileiro”, “cultura”. Uma pergunta clássica
inicia o debate: Para a fundamental questão como se categorizam as coisas?, a
58
resposta clássica, ´aristotélica´, em que se pensa imediatamente é que a
categorização se faz à base de propriedades comuns.”
14
De acordo com esse
modelo, para se chegar a uma identidade, é necessário que se atendam às
condições necessárias e suficientes (esse é o modelo CNS). Por exemplo, para se
dizer que um “cão” pertence a sua categoria, são condições que ele seja um animal,
mamífero, quadrúpede etc., ou seja, impõem-se os atributos e propriedades comuns
de um o. O problema do modelo CNS está em que “sofre algumas dificuldades
para dar conta de ‘sentidos múltiplos’, ou seja, de palavras que se remetem a vários
tipos de referentes possíveis e que apresentam, então, um problema quanto à
fixação das CNS.” (idem, p. 26).
15
Se as distinções são claras, o modelo
corresponde a casos em que se tem mais de uma referência a um mesmo termo e
se resolveria o problema com a homonímia, muito embora a polissemia possa ser
evocada. Daí, eno, temos uma situação ambígua se tomarmos o léxico a palavra
“manga”. Trata-se de um termo polissêmico ou de um mesmo termo que nomes
a coisas distintas? Em uma situação como esta, achamos por bem dizer que não se
trata de um termo polissêmico, pois os conceitos de polissemia eso associados ao
tratamento do léxico isoladamente; por outro lado, se pensarmos que o signo pode
se referir a coisas distintas, encontramos apenas a forma (palavra) indicando objetos
distintos, mas seu sentido acaba sendo inequívoco. Voltando ao exemplo de
“manga”, entendemos que a parte da roupa e o fruto são objetos distintos, muito
embora a prosódia e a grafia do termo sejam idênticos, mas um refere a objetos
distintos. Se tivéssemos de formalizar frases como: “João colheu a manga”, e “João
14
“À la question fondamentale Comment catégorise-t-on?, la réponse classique “aristotélicienne, à
laquelle on pense immédiatement, est que la categorisation se fait sur la base de propriétés
communes.
15
“[...] Lê modele des CNS éprouve des difficultés à randre compte du ‘sens multiple, c´est-à-dire des
mots qui renvoient à plusieurs types de référents possibles et qui posent donc um problème quant à la
fixation des CNS.
59
rasgou sua manga” tomaríamos o argumento manga” como referências distintas
umas das outras. Nesse contexto, as CNS respondem às necessidades para
categorizar os entes manga1” e “manga2”, mas teríamos como dizer o mesmo de
termos como “sociedade” cuja extensão não se dá de maneira clara?
Em oposição ao modelo CNS, Kleiber lembra a versão Standard da
“semântica do protótipo”. “O que se chama de protótipo? Os testes e experncias
descritas nos primeiros trabalhos de E. Rosch introduziram a noção de protótipo
como sendo o melhor exemplar ou ainda a melhor instância, o melhor representante
ou instância central de uma categoria. (idem 47-48)
16
. A partir dessa citação,
podemos dizer que a semântica do protótipo se tornou uma teoria semântica lexical,
ainda em uma perspectiva bastante referencial, mas dando um salto em direção à
categorias mais abertas, ou seja, se aplicarmos o modelo de protótipo a um pássaro
(tem plumagem e é ovíparo) poderíamos, então, concluir que o pingüim é um
pássaro e uma proposição que o contivesse como pássaro seria verdadeira, pois ele
se aproxima de um modelo de pássaro (tem plumagem, é ovíparo). No entanto isso
não exclui um outro problema a se pensar: se, para João e Pedro, o protótipo de um
pássaro não é o mesmo, como eles identificam um pássaro como tal? Isso é
possível porque, em uma cultura, existem zonas de saber compartilhadas: “O
objetivo da semântica do protótipo é, evidentemente, o de descrever essas zonas de
saber prototípico compartilhadas.” (Langacker, apud, Kleiber, 1994, p. 49) (tradução
nossa)
17
.
O modelo prototípico sofreu revisões de seus elaboradores, principalmente no
que diz respeito ao próprio conceito de protótipo. Primeiramente, negar a idéia de
16
“Qu´appelle-t-on protoype? Les tests et expériences décrits dans les premiers travaux d´E. Rosch
introduisent la notion de prototype comme étant les meilleur exemplaire ou encore la meilleure
instance, les meilleurs représentant ou l´instance centrale d´une catégorie.”
17
Le but de la sémantique du prototype, c’est évidemment de décrire ces zones de savoir
prototypique partagé.
60
protótipo seria colocar abaixo toda a teoria; em segundo lugar, as experiências e
testes feitos por Rosch, nos anos 1960 e 1970 demonstravam que um conceito que
englobasse um princípio prototípico e procedente o dava conta da complexidade
presente na matéria. Logo, o conceito de protótipo teve que ser revisado e a primeira
revio foi excluir a noção de “ente” prototípico, ou seja, de rejeitar um exemplar que
resumisse ou congregasse as categorias de definição do objeto. “Falar de protótipo
é simplesmente uma ficção gramatical cômoda; o que é realmente visado são os
julgamentos de grau de prototipicalidade.” (Rosch, apud, Kleiber, 1994, p. 150)
(tradução nossa)
18
. Assim, diante de uma grande variação de categorias, as
significões devem ser compreendidas pela ligação que as categorias mantêm
entre si, como se se tratasse de graus de parentesco. O protótipo é um efeito de
organização e não o ente organizador da significação.
A importância dos princípios de prototipicalidade explorados acima têm
grande valia para nossa pesquisa, pois, a voz que enuncia mobiliza categorias que
lhe são inconscientes e ideológicas, de modo que enunciar não é simplesmente
dizer de onde vem a voz, mas em que posição social se enuncia e, logo, quais são
as relações prototípicas sobre conceitos como “negro”, “sociedade”, entre outros,
reveladores da formação discursiva que afeta os sujeitos. Os protótipos estão
intimamente ligados à noção de imagens, pois, as noções de prototipicalidade não
o meramente cognitivas, o também sociais, culturais, ideológicas;, por isso,
nossa busca também se deu no tocante a compreender o comportamento de
determinados termos, principalmente aqueles referentes às identidades.
Nessa relação prototípica, não entram as noções dêiticas, como veremos
adiante, mas ela irá se associar, em um enunciado como “nossos irmãos negros”,
18
Parler de prototype est simplement une fiction grammaticale commode; ce qui est réelement visé ce
sont lês jugements de degré de prototypicalité.
61
em que o pronome adjetivo “nossosé um elemento marcador da dêixis sobre dois
protótipos “irmãos” e “negros, cuja análise demonstrará as peculiaridades
desse tipo de construção nos textos dissertativos do corpus.
1.3.3.3 Uma perspectiva signalética da referência
Ao estudar como se dá o processo de nomeão de quadros, Bosredon
(1997) relata estar diante de um objeto estranho por se tratar de um universo
dividido entre o lingüístico e o não-lingüístico, mas com relações entre si muito
complexas.
Proponho considerar essa atividade [nomeação de quadros] como uma
atividade fortemente controlada, em um campo ao mesmo tempo individual
e coletivo; individual porque os sujeitos são compelidos a certas escolhas,
coletivo porque essas escolhas são fortemente condicionadas pelo uso e o
controle trazido por este é, em grande parte, inconsciente. (p. 7) (tradução
nossa)
19
A pergunta de quem este texto deve ser: o que tem a ver o procedimento
de nomeação dos quadros com os processos de alternância? A primeira coisa em
comum é que se trata de procedimentos lingüísticos e discursivos. Em seus
acontecimentos respectivos, não existem maiores detalhes em comum, mas uma
coisa chama a atenção: ambos processos trabalham com uma forma de
referenciação, com uma semântica que, juntamente com os aspectos enunciativos,
revela os controles dos signos. Assim, enquanto o título do quadro nomeia o objeto
único, as marcas enunciativas ou sua ausência referenciam e apontam para outros
elementos que não necessariamente o enunciador:
Denominei signalética esses campos específicos de identificação conforme
os domínios dos objetos identificados que permitem pensar que não se
19
Je propose de considérer cette activité comme une activifortement contrainte, dans un champ à
la fois individuel et collectif; individuel puisque les sujets sont confrontés à certains choix, collectif
parce que ces choix restent fortement conditionnés par l’usage et que les régulations apportées par
celui-ci sont en grande partie inconscientes.” Por não achar conveniente traduzir “contrainte” por
“constrangimento”, optamos por “controle”.
62
nomeia uma tela como se intitula um livro, um filme ou uma fotografia
artística, que se não nomeia o que por si já é nominável, ou o que é do já
intitulável, segundo, precisamente, uma signalética de domínio sempre
lingüisticamente marcado. A existência de signaléticas obriga, por
conseqüência, que se considere que toda operação de identificação,
procedendo por chamamento ou denominação,o pode ser analisada
sem que se leve em conta a especificidade dos domínios físico-culturais
aos quais ela se aplica.
20
Não nos interessa aqui o processo de nomeação dos quadros em si, mas
pensar em que tipo de domínio físico-cultural” baseia-se o controle dos sentidos.
Seja a referência por denominação ou uma designação (seja por dêixis ou não),
um conjunto de fatores que não são culturais, mas sociais e ideológicos que
determinam a modalidade de enunciador e as relações que este mantém com o seu
referente; mais adiante, teremos uma melhor visão de como se pode definir uma
signalética para o tipo de compreensão que podemos desenvolver.
As relações de referenciação presentes em textos, como os pertencentes ao
nosso corpus, são resultados de diferentes “pressões” (contraintes) controles e
identificações, balizadas pelas relações pragmáticas (informações dadas) e
discursivas (meria). Uma exemplificação disso pode ser obtida pela seguinte
análise preliminar, desenvolvida a partir do texto a seguir:
(Texto 006, grupo A)[Desde o descobrimento do Brasil, o negro e seus
descendentes, sofrem com o preconceito e a desvalorização.
muito tempo o negro vive na sociedade, como que não fosse membro desta
família. Muitas empresas, instituições e pessoas ainda faz distinção e desvaloriza o
homem de cor negra.]
1
[É tempo de parar e refletir o que somos e temos.]
2
preciso compreender que como ser humano a igualdade é direito de todos e por
isso a oportunidade de crescer e mostrar o valor como pessoa seja negra ou parda,
é este.
Pessoas de padrão rico em resistência, são considerados os negros, e nisso
consiste a força de sempre lutar, para que governantes de muitas universidades,
20
J’ai appelé signalétique ces champs spécifiques d’identification selon les domaines d’objets
identifiés qui permettent de penser qu’on ne nomme pas une toile comme on intitule un livre, un film
ou une photographie dart, qu’on ne nomme que du déjà nommable, du intitulable dans,
precisément, une signalétique de domaine toujours linguistiquement marquée. Lexistence des
signalétiques oblige par conséquent à considérer que toute opération d’identification procédant par
appellation ou dénomination ne peut être analysée sans que soit prise en compte la spécificité des
domaines physicoculturels auxquels elle s’applique.
63
possa favorecer o direito de cotas, para estudantes dessa cor.
O sucesso de um desses jovens, está nas mãos, na espera de quem possa-o
defender e acreditar nele.Confiar, é dar oportunidade, dar oportunidade é ceder algo,
ceder algo é contribuir;]
3
[ e contribuindo você será responsável pelo sucesso de
muitas pessoas e pelo desenvolvimento do nosso país.]
4
nesta corrente que inicia-se a esperança de muitas pessoas que por serem
negras, em-se, dessa propriedade de seus direitos.]
5
Nesses cinco segmentos do texto, é possível percebermos modos diferentes
de enunciação: 1: np; 2: 1pp; 3: np; 4: 1pp; 5: np. O texto referencia diferentes
objetos, ou, melhor ainda, conceitos, como por exemplo: “descobrimento do Brasil”,
“negros e seus descendentes”, “preconceito”, desvalorização”, “sociedade” etc.
Partindo de um ponto de vista estruturalista do sentido, poderíamos dizer que se
trata de conceitos convencionados na sociedade e que são vistos como translúcidos
por qualquer falante de língua portuguesa. No entanto, isso não ocorre dessa
maneira, pois um conceito como “sociedadepode variar deveras de um interlocutor
para outro, como se contivesse uma referência estica naquilo que seriam suas
“bordas semânticas”. Como, por exemplo, o termo “sociedade”, que pode adquirir o
conceito de população brasileira ou mundial, sistema cultural, ou sistema
ecomico-financeiro. Lembramos que estamos tratando de textos produzidos por
falantes nativos, estudantes recém-saídos do ensino médio que, muitas vezes,
utilizam certos termos inadequadamente. É possível compreender-se o protótipo de
cada um dos conceitos: negro, branco, sociedade, mas seriam necessários muitos
testes para chegarmos a alguma conclusão sobre os níveis de prototipicalidade,
embora seja possível inferirem-se alguns protótipos sem necessariamente fazermos
testes com os sujeitos: basta, para tanto, tentarmos compreender as regularidades
de uso desses temos pensando também em seu contexto enunciativo. Observemos
o exemplo a seguir, retirado do corpus:
64
10) Na nossa sociedade deveria ter pessoas que ajudassem mais essas pessoas,
pois até na hora de conseguir um emprego é difícil,[...]
O vocábulo sociedadeterá aí, em virtude do emprego do pronome adjetivo
em 1pp, uma determinação de seu sentido e também a sua referência.
Diferentemente do exemplo anterior, muito tempo o negro vive na sociedade,
como que não fosse membro desta família.”, no qual “sociedade” faz referência a um
espo social, sem conflito, mas também sem negros. No exemplo 10, a “sociedade”
é um espaço de onde o negro esexcluído, mas não se trata de espaço sico, e
sim de um espaço conceitual, o do usufruto de direitos proporcionados pela própria
sociedade.
Grosseiramente comparando as duas referências à sociedade”, percebemos
que elas são balizadas por outros conceitos ou operações enunciativas dentro de
um mesmo texto: uma deu-se pela enunciação em np e outra, em 1pp. Assim, a
signalética proposta neste trabalho não tem a ver com uma etiquetagem de objetos
como quadros, mas com uma “etiquetagem muito peculiar de conceitos moldados
pela enunciação e, principalmente, pela formão ideológica.
1.3.3.4ixis e enunciação
Discutidas as questões concernentes ao sentido, à referência e à questão
enunciativa, convém adentrarmos na questão da dêixis enquanto uma categoria
indicial das enunciação, conforme vimos em Kerbrat-Orecchioni (1999).
O termo “dêixis” vem do grego (δειξις) e tem o significado de “apontar”,
“referenciar”, “demonstrar”. Morel e Danon-Boileau (1992, p. 10) afirmam que a
dêixis constitui uma “categoria lingüística fundamental, situada no cruzamento das
operações de refencia e das operações de construção discursiva [...] constitui,
para muitas formas de ver, um ‘primeiro estado’ dos arranjos linguageiros” (tradução
65
nossa)
21
. De um modo geral, a referência dêitica se completa no contexto
enunciativo, de modo que um pronome como “eu” tem sentido, mas não tem
referência definida, e sua referência sempre esta por ser preenchida, como
acontece com dêiticos de tempo e de espaço.
O fato de a dêixis compreender um grande número de termos e frases, que só
têm significado dentro da enunciação, torna-a uma noçãolida, mas redutora. Se a
função da dêixis é apontar as coisas no mundo, mas dentro de um conjunto
enunciativo que carece da existência de um contexto de enunciação, isso constitui
um problema: quando o enunciador de um texto escrito, no caso do corpus
estudado, enuncia eu ou nós não temos, portanto, dêiticos? Trata-se, então, de que
tipo de referência? Não seria a mesma referência representada por um termo como
“Congresso Nacional”, ou como política”? Embora esses outros dois termos
necessitem, como todos os termos de uma língua, de interlocutores que construam
sentidos a partir deles, ou seja, que indiquem que o interlocutor vai enveredar por
efeitos de sentidos que são parte de suas crenças, “eu”, “nós”, “você” necessitarão
de um trabalho semântico maior para o preenchimento da referência, além do que tal
referência não ser dará de maneira tão simples como “política”. Se tratarmos de
textos escritos em que os interlocutores o estão face a face, enunciar eu” ou
“nós” é algo desprovido de sentido segundo um conceito muito estreito de dêixis?
Que tipo de referência é essa então?
A nosso ver, a dêixis não depende simplesmente de uma situação enunciativa
oral, mas falar de dêiticos textuais também não é conveniente para nosso objeto de
análise, uma vez que os dêiticos textuais têm outra característica: a de fazer
referência a elementos textuais em circunstâncias semelhantes às das anáforas e
21
Catégorie linguistique fondamentale, située à la croisée des opérations de référence et dês
opérations de construction discursive, la déixis constitue à maints égards une sorte de “premier état”
de l´agencement langagier.
66
catáforas. No entanto, em nossa perspectivas, um “eu” dentro de um texto ainda
será um elemento dêitico, mesmo que sua referência não se apresente claramente
definida; no entanto, fica patente a idéia de que, dependendo da cena enunciativa
em que figura, suas características podem ser diversas, como poderemos ver na
análise de dados nesta tese.
Para representar graficamente o processo de preenchimento de referência
pelo signo segundo uma espécie de curva, poderíamos representar a ixis através
da seguinte escala:
Diagrama 1 - Eixo da referencialidade
Ora, é como se, no eixo “Y”, quanto mais se sobe, menos preenchimento da
referência é exigido pela cena enunciativa, enquanto que, no eixo “X”, os termos são
ajustados ordenadamente pelo primeiro dêitico. Se “eu” significa apenas aquele que
enuncia, “lar” significa o ambiente moral, afetivo em que vive um grupo organizado
em família ou não, enquanto que o objeto “valise” referencia um modelo de bolsa,
temos uma espécie de gradação da referência. No caso, o vocábulo “valise” é mais
facilmente reconhecível do que a palavra “lar”, e também muito mais definível do que
“eu”.
Outro aspecto a se considerar é que a dêixis está intimamente ligada ao
eixo dos
termos
eixo do grau de
referenciação
E
U
L
A
R
S
O
F
Á
referência
determinável
X
Y
67
fenômeno de localização de objetos no espaço, no tempo e, a nosso ver, no
processo enunciativo, pois na medida em que se localiza os sujeitos enunciadores,
haja vista a centralidade do “ego” na enunciação, tem-se a imagem daqueles que
enunciam a partir dos tipos de referências que se constrói sobre um dizer. É claro
que esse modo de conceituar é extremamente redutor, mas pode ser o começo de
um aprofundamento, principalmente porque as relações entre o homem e sua
enunciação no mundo passam, necessariamente, pela dêixis.
Hagège (1992) propõe a compreensão da dêixis a partir de um système de
l´anthropophore (sistema antropofórico)” (p.115) da mesma maneira que Kerbrat-
Orecchioni aponta para a centralidade do elemento humano na enunciação –, o que
faz muito sentido, se analisarmos a proposta de Benveniste (1995) como uma
introdução ao assunto da subjetividade estrutural a partir de sua proposta de
compreender os entes envolvidos na comunicação não só pelo vs empírico, mas
com toda a conseqüência que esse pensamento traz. Segundo “Minha perspectiva
apresentada aqui é morfogenética, é a atividade de construção das línguas que es
no centro da presente contribuição. Os locutores-ouvintes não são somente vistos
como usuários, mas primeiramente como construtores de línguas.” (HAGÈGE, 1992,
p. 117-118) (tradução nossa)
22
. Hagège demonstra que existe um marco zero para
a dêixis e isso só pode por meio de um sujeito que não usa a linguagem, mas
que também opera sobre a mesma. Em suma, o pensamento desse autor reforça
aquilo que outrora afirmamos: uma interação estrutural necessária para que os
sujeitos se comuniquem.
A definição mais comum de dêixis é que se trata de termos ou de expressões
que não podem ter referência senão no momento de enunciação. Mas essa
22
Ma perspective étant ici morphogénétique, c´est l´activide construction des langues qui est au
centre de la présente contribuition. Les locuteur-auditeurs ne son donc pas seulement vus comme
usagers, mais d´abord comme constructeurs de langues
68
definição não é suficiente, considerando-se o corpus que temos para analisar, no
qual a dêixis actancial ou sua ausência tem significados diferentes. É o que se
observa, por exemplo, quando o indivíduo enuncia “eu”, mas não se trata
necessariamente de umeu” presente. Aí temos de concordar com Rousseau (1992,
p. 367) para quem a dêixis permite, globalmente, designar os objetos presente ou
ausentes. (tradução nossa)
23
A 1ps enunciada, pelo pronome e pelas formas
verbais referencia um objeto in absentia que é o enunciador daquele texto e, às
vezes, não é possível apontar, em uma realidade dada, quem o seja. É por isso que
a referência ao enunciador presente no texto pode ser compreendida como dêixis:
porque o elemento pode estar na presença ou na ausência, sem prejuízo do
princípio dêitico de referência preenchível”. Para todos os efeitos, as referências
actanciais, nos textos analisados, são indicadores e, por isso, são dêiticos apesar de
a cena enunciativa não ser oral. Esse preenchimento, no caso da enunciação de 1ps
e 1pp abrem o campo para discussão de outro aspecto: os movimentos de
debreagem e embreagem.
1.3.3.5 A instauração da subjetividade: debreagem e embreagem
Foi dito anteriormente que a subjetividade sobre a qual fala Benveniste é da
ordem da alteridade estrutural, ou seja, considera que semprealguém na posição
“A” de enunciador, enquanto alguém é colocado na posição “B” de enunciatário,
mesmo que não se trate, necessariamente, de seres humanos empíricos, mas seres
humanos sujeitos que enunciam de posições sociais. Como o processo de
instauração do sujeito depende de elementos dêiticos, é mister compreendermos
determinadas exigências que a própria estrutura enunciativa provoca.
23
La deixis permet globalement de désigner des objets, présent ou absens.
69
Primeiramente é importante lembrarmos que as línguas naturais m como
objetivo estabelecer as relações entre o homem e o mundo e os homens entre si,
logo a referencialidade é um fator preponderante;, no entanto a relação linguagem e
mundo não pode ser tida fora de um quadro discursivo. A referencialidade da qual
falamos está baseada no mito adâmico e pode ser relida da seguinte forma: o
“arquétipo” de Adão, o primeiro homem que nomeia as coisas e os seres viventes,
não se distingue de cada um que enuncia sentindo-se dono do dizer, de tal modo
que cada um de nós se constitui como um Adão, cuja ânsia de originalidade
sustenta nossa ilusão necessária de objetividade e de transparência na linguagem,
mas que, ao mesmo tempo, como tais “aes”, não conseguimos nomear sob uma
luz divina, mas sob uma luz ideológica. Não se trata apenas de uma questão
onomasiológica, como faz pressupor o mito adâmico; esse nomear acontece sob as
condições de produção do discurso, enraizadas na história. Em tempo: ainda vale
lembrar que, ao ato de nomear, precede o ato de apontar; logo, aixis é o primeiro
procedimento antes de se nominar um objeto na realidade, pois tal objeto es
localizado em relação ao sujeito. Por isso um objeto nomeado foi apontado no
mundo, e no momento em que um objeto apontado cria identidade, passa a fazer
parte das potencialidades do discurso, das virtualidades do efeito de sentido,
conseqüentemente, traz consigo valores historicamente constituídos. Um exemplo
disso é a expressão “afrodescentente”, ou “afro-brasileiro”: a dimensão do uso
desses termos localiza objetos no espaço, mas tamm constrói sobre os sentidos
diferentes perspectivas identitárias, o que faz de afrodescendente um designativo
diferente de “negro”, “preto”, “moreno” etc.
Como fora visto anteriormente, o sujeito é o instaurador do lugar e do tempo,
no entanto nem sempre o espaço e o tempo são próprios do enunciador, embora ele
70
sempre esteja no ponto de partida. É por causa das coincidências e não
coincidências que um jogo muito produtivo na enunciação leva a determinados
efeitos de sentido. Uma coisa é certa: a enunciação não está naquele que enuncia,
uma vez que, ao enunciar “eu”, aqui” e agora”, os movimentos de instauração do
sujeito são dois: a debreagem e a embreagem
24
. A debreagem consiste “num
primeiro momento, em disjungir do sujeito, do espaço e do tempo da enunciação e
em projetar no enunciado um não-eu, um não-aqui e um não-agora(Fiorin, 2002, p.
43), apresentando-se como dois tipos distintos: a enunciativa e a enunciva. A
debreagem enunciativa é a que se instala no enunciado, enquanto a enunciva
“instala os actantes do enunciado” (idem, p. 44), ou seja, o “ele”, o “algures” e o
“então”, que são as relações simétricas do outro em relação ao eu, aqui, agora.
Segundo Fiorin:
A debreagem enunciativa e a enunciva criam, em princípio dois grandes
efeitos de sentido: o de subjetividade e o de objetividade. Com efeito, a
instalação dos simulacros do ego-hic-nunc enunciativos com suas
apreciações dos fatos, constrói um efeito de subjetividade. Já a eliminação
das marcas de nunciação do texto, ou seja, da enunciação enunciada,
fazendo com que o discurso se construa apenas com enunciado, produz
efeitos de sentido de objetividade. (FIORIN, 2002, p. 45)
A nosso ver, isso é realmente um fato perceptível em diferentes textos, mas
não significa que tal procedimento seja fruto de um processo exclusivamente
estratégico
25
no processo de discursivização. O que fica patente é que, tanto em
uma como em outra debreagem, o sujeito simplesmente existe, independentemente
de sua vontade de aparecer ou não. Como não se trata de efeito de sentido
conscientemente provocado por um sujeito da vontade, os efeitos de
24
“Os termos advêm da tradução francesa do termo shifters, utilizado por Jakobson em seu artigo
“Les embrayeurs, les catégories verbales et le verbe russe”. [...] O lingüista russo mostrava nesse
artigo que a significação geral de um embreante não pode ser definida fora de uma referência à
mensagem.” (FIORIN, 2002: 27).
25
O sentido de estratégico” aqui é referente ao sujeito que procura conscientemente manipular os
efeitos de sentido. No entanto, tal procura não significa sua eficácia em todas as circunstâncias.
71
subjetividade/objetividade, nesta tese, estarão atrelados principalmente ao discurso,
ao inconsciente que é formado por uma linguagem na qual operam as formações
ideológicas. Logo, a debreagem e a embreagem actanciais não acontecem senão
por uma questão discursiva no sentido da AD e não na discursivização como propõe
Fiorin.
A embreagem, por sua vez, se comporta no caminho inverso da debreagem.
Na debreagem, trata-se do efeito da “neutralização das categorias de pessoa e/ou
espo e/ou tempo assim como pela denegação da instância do enunciado.[...] Por
conseguinte, obtém-se, na embreagem, um efeito de identificação entre sujeito do
enunciado e sujeito da enunciação, tempo do enunciado e tempo da enunciação,
espo do enunciado e espaço da enunciação. ” (idem, p. 48). A tulo de ilustração,
vejamos alguns exemplos de debreagem e embreagem actanciais retirados do
corpus :
Debreagem Embreagem
Enunciativa Enunciva Enunciativa Enunciva
11) imaginou se
eu resolvesse exigir o
meu espaço como
descendente de
russa dentro de uma
universidade
12) Esperamos que
continue sempre
assim, que acabe o
preconceito e eles
atinjam suas metas
como todo nós .
13) A criação de cotas para a entrada de
negros na universidade é uma possibilidade
que acarretará na proliferação do preconceito.
Quadro 3 - Exemplificação de debreagem e embreagem actanciais
No exemplo 11, ficam claras as demarcações do eu/tu, que leva uma
debreagem enunciativa, ou seja, a instauração dos interlocutores. Já em 12, se
instala, em oposição a um enunciador “nós”, uma debreagem enunciva para
distinguir o “eu/ele”. Em 13 tanto a debreagem enunciativa e enunciva estão
neutralizadas, pois não demarcação dos actantes da enunciação nem dos
actantes do enunciado, ambas as categorias estão neutralizadas.
A nossa análise, no entanto, tentou observar que esse procedimento
72
enunciativo pode ser simplificado e que, essencialmente, é preciso compreender-se
que, estatisticamente, a embreagem é mais presente que a debreagem, o que nos
fez inferir que a embreagem é base a enunciativa, como veremos na análise dos
dados.
73
CAPÍTULO II
O MATERIALISMO HISTÓRICO
O Materialismo Hisrico tem na AD uma história ppria, que se construiu
numa dada conjuntura política e acadêmica, e entender a relação da AD com essa
viés da história e da sociedade se faz necessário para que se possa compreender
determinados conceitos bastante importantes para o método e a análise nesta
pesquisa. Do intenso trabalho empreendido por Pêcheux e seu grupo de pesquisa,
conceitos foram desenvolvidos e aprimorados, dentre os quais, destacamos as
noções de Ideologia, Discurso e "Formação Discursiva".
Neste capítulo, tratamos do papel do materialismo histórico na formação
epistemológica da AD, ao mesmo tempo em que procuraremos compreender os
conceitos citados entre outros que serão operacionalizados na análise.
2.1 O Materialismo Histórico na AD
O marxismo não é um visitante na AD, mas sim o anfitrião e, para contar sua
história, nada melhor que resgatarmos novamente a figura de cheux: “O encontro
[de cheux] com Althusser será decisivo: ele traz o choque de um pensamento
político e decide sua ‘entrada na política’” (Maldidier, 2003, p. 17). Em que consistia
tal choque? Ora, cheux já havia iniciado seus estudos sobre a episteme das
ciências sociais e, ao ingressar no pensamento marxista sustentado pela releitura
que Althusser faz da obra de Marx, um horizonte diferente se abre: é a perspectiva
de compreender as ciências e a produção do conhecimento em uma dinâmica
materialista, no sentido de que as condições de vida material do homem é que lhe
proporcionam a concepção da vida em sociedade, vista como processo que se
74
pela linguagem. Entre as diferentes vulgatas do marxismo correntes em toda a
Europa e em todo mundo, é mister tentarmos compreender de qual leitura Pêcheux
se valeu e como tal pensamento passou a construir uma das partes da Tríplice
Aliança (Tríplice Entente): Marx, Saussure e Freud.
A incorporação de idéias do marxismo na AD dar-se através de Luis
Althusser e sua releitura de Marx. Em um de seus livros, “Aparelhos Ideológicos de
Estado” (1970), propõe uma nova visão sobre a noção de ideologia, e que servirá à
compreensão do discurso. Althusser será uma figura preponderante para os
conceitos que serão elaborados no decorrer da história da AD em sua primeira fase,
mesmo depois de seu afastamento da vida pública
26
. A releitura feita por ele do
marxismo será preponderante, visto que o movimento da AD nasce de uma condição
de produção específica, considerando-se dois fatores: a) hegemonia da Gramática
Gerativo-Transformacional; b) as releituras de Freud e Marx (Gregolin, 2004, p. 32).
A chave para a participação do marxismo althussereano será o anti-
humanismo que faz parte, inclusive, do pensamento freudiano. O anti-humanismo
consiste em ver, nas relações que os homens estabelecem entre si e suas
condições de produção, não como uma forma subjetiva de pensar a existência.
Nesse movimento anti-humanista o foco o é mais o homem como o centro da
produção e controle dos significados, mas um participante da história, dos fatos. Não
se trata mais da história individual de heis, reis, políticos, mas sim do coletivo de
homens como parte do processo histórico-social. Foi um deslocamento necessário
do homem do centro da vontade para a situação de quem vive e interage com as
suas condições de existência. O anti-humanismo permitirá uma revisão muito
importante quanto ao completo domínio pelo homem do “dizer”, ou seja, os efeitos
26
Em 1980 assassina a esposa em um acesso de loucura e viverá seus últimos dez anos de vida
internado em um asilo nos arredores de Paris.
75
de sentido vistos como sendo controlados socialmente e ideologicamente, não mais
pela vontade individual. O pensamento de que o indivíduo tem controle sobre o seu
dizer e que é sua fonte também é um dos efeitos próprios da ideologia, logo, nessa
revio anti-humanista, nega-se o poder e controle sobre o dizer e seus significados.
Quando o anti-humanismo é desenvolvido, o objetivo fora de descentralizar a
constituição do sujeito de seu egocentrismo, de tal maneira que fosse possível ao
pesquisador observar um ser fragmentado e constituído de outros. Da
descentralizão do homem nasce um sujeito atravessado por outras identidades
constituídas ao longo do tempo e da convicção de que o sujeito é fragmentado.
Logo, advém o fato de as formulações e reformulações sobre a realidade serem
olhadas como contendo pré-construídos não de uma subjetividade, mas da
intersubjetividade historicamente construída. A idéia de fonte do dizer será
contestada, a subjetividade inatista será abalada. Isso não significa que se passe a
dar menor importância ao homem, trata-se de redimensionar como o homem se
constitui como tal, ou seja, como as subjetividades são construídas a partir de outras
subjetividades pré-existentes. Esse deslocamento traz profundas mudanças, pois,
um ponto nevrálgico será o de que a noção de fonte do dizer é uma ilusão
necessária (Pêcheux, 1975).
A nosso ver, também o anti-humanismo facom que o sujeito como causa
do sujeito seja colocado em "causa" (Pêcheux, 1996). E a melhor metáfora
metafísica, nas palavras de Pêcheux, seria mesmo o "efeito Münchhausen",
referência à conhecida lenda a respeito do heróico barão da literatura infanto-juvenil
do século XIX, que se suspendeu no ar pelos próprios cabelos. É como se
estivéssemos diante de um paradoxo que leva à seguinte questão: Como o sujeito
que é formado por outros sujeitos pode ser a causa do sujeito? A resposta fica por
76
conta de se considerar que, uma vez em sociedade e uma vez o homem exposto a
outros homens e suas intersubjetividades, ninguém escapará ao recrutamento, salvo
as pessoas que sofrem algum tipo de mal, como os casos em que o autismo atinge
um grau muito elevado, para os quais não saberíamos dizer se a subjetividade
chega a ser constituída como efeito nos contornos da teoria que adotamos.
Voltaremos a discutir esse assunto quando retomarmos as questões
referentes à identidade; por hora, seguiremos no intuito de compreender o papel do
marxismo na AD e as influências de Althusser.
2.2 Althusser e suas marcas
Althusser, entre os anos de 1960 e 1970, fundou um grupo de trabalho
informal, reunindo jovens franceses brilhantes, entre eles cheux, no que se
convencionou chamar de escola althussereana” (Gregolin, 2004, p. 34). Embora a
orientação fosse marxista, havia um constante questionamento das diretrizes de
base do Partido Comunista Francês, num momento em que fazer ciência era
tamm fazer política. No entanto, a releitura operada por Althusser não se resumia
à luta política, mas, pelo contrário, tratava-se de um processo reflexivo mais amplo,
para além da vida política, porém, ao mesmo tempo, encantado pelo horizonte
aberto pelo estruturalismo, o que o leva ao pensamento anti-humanista, e isso não
agradava ao PCF (idem, p. 36). É preciso lembrarmos, no entanto, que o anti-
humanismo, como foi dito acima, tinha suas razões teórico-metodológicas,
objetivando retirar o homem de sua condição de sujeito-objeto das ciências
humanas, enquadrado na ótica da autonomia consciente e proposital de sua ão,
ou seja, livrá-lo de uma espécie de antropocentrismo narcísico na qual viviam
correntes das ciências humanas, e mesmo das ciências sociais. Ademais, não é
77
mistério identificarmos tanto na esquerda quanto na direita da época uma grande
paixão pelos ídolos, pelas personalidades, pois ambas correntes não poderiam viver
sem os narcisismo e o mito dos heróis individuais. Um bom exemplo disso é o culto
que se prestou aos nomes da Revolução Socialista na União Soviética e nos pses
do Leste Europeu. Inclusive, Pêcheux (1975a, p. 79) cita o artigo de Vingradov
“Triompher du culte de la personnalité dans la linguistique sovtique” (in Language,
1969, 15) para demonstrar como esse tipo de prática é também uma forma de
contradição quanto à ilusão de sujeito.
Althusser, Pêcheux e Foucault foram mais esclarecedores sobre a natureza
social do homem que necessariamente aqueles que se diziam humanistas, pois, em
suas releituras e pontos de vista, viram que, no jogo simbólico da linguagem e sua
complexidade, o homem se constitui em um animal ideológico (cheux, 1996),
logo, um ser na linguagem. O anti-humanismo de Marx já mostrava os indícios da
dificuldade que o homem tinha de se perceber fora de suas relações simbólicas: é o
que se observa no caso do exemplo que Marx dava utilizando a metáfora do
"espelho invertido" ao tratar de sua noção de ideologia, ou seja, segundo ele, o
espelho impunha ao ser humano uma visão distorcida da “realidade”. No entanto,
esse tipo de reflexão não o afastava dos resquícios de "humanismo hegeleriano" que
ficaram inscritos no que diz respeito à prática política segundo a qual os proletários,
pela vontade de poder e hegemonia, seguiriam seu curso natural para o fim da
historia, ou seja, o proletariado, actante consciente de sua missão, seguiria o curso
da meramente pelo desejo de o fazer. Tal teleologia será negada em prol da leitura
mecanicista e vulgar que se fizera, a título político, do Capital. Resta que tal
comportamento, criticado por muitos marxistas e não-marxistas, será posteriormente
registrado em debates e críticas.
78
Polêmico, critico, o pensamento de Althusser está fincado no projeto de
construção da análise do discurso, dando à obra de Michel Pêcheux sua
sustentação filosófica e política. Em Pêcheux podemos ler, explicitamente,
as teses mais radicais do althusserianismo, mobilizadas para reflexão
sobre o discurso, a ideologia, o sujeito, o sentido. (GREGOLIN, 2004, p.
52)
Acreditamos que a noção mais contundente e que necessita de uma reflexão
mais demorada é a de ideologia, que será centralizadora da compreensão do
fenômeno analisado, pois não como compreender o fenômeno do sentido sem
pensarmos a língua, sujeito e história afetados pela ideologia.
Apesar das muitas críticas à obra de Althusser em especial, Eagleton (1997)
é mister esclarecer porque tomamos o pensamento althussereano como base para
discutirmos alguns fenômenos abordados pelo marxismo, não pelo fato de
defendermos uma bandeira, mas por vermos que o anti-humanismo permitiu uma
visão um pouco mais afastada do objeto, numa tentativa de isenção, muito embora
tamm saibamos que essa tentativa constitua uma ilusão de nossa parte. Isso
porque, para nós, a visão de Althusser é menos equivocada, e nos permitirá ver o
objeto de análise de uma forma mais próxima da história em seu sentido amplo.
Ademais, essa descentralidade do sujeito é perceptível na materialidade do discurso
quando tratamos de assuntos como a enunciação e a alternância detectadas nos
textos, uma genuína mostra de que o sujeito é realmente fragmentado.
2.3 A noção de ideologia
Tratar da ideologia não é tarefa fácil, não só pela complexidade do conceito,
mas pelas noções vulgarizadas e enganosas que circulam, muito comumente, em
redor do assunto. Historicamente, a ideologia fora entendida como pensamento
dominante, conjunto de idéias, como consciência de classe, ou tomada,
genericamente, como prática simbólica. Segundo um ponto de vista histórico, é
79
possível compreendermos que há, pelo menos, dois grandes períodos que marcam
as discussões em torno do conceito de ideologia: o primeiro, que a contempla como
consciência e o segundo, na qual é compreendida por prática. Para a presente
discussão, é interessante tomar Eagleton (1997) como base, pois o autor é
abertamente anti-althussereano, o que coloca o contraponto e permite uma visão até
mais fortalecida da contribuição intelectual de Louis Althusser.
Para se entender melhor esses dois grandes peodos, pode-se dizer que a
primeira fase apresenta um conceito de ideologia baseada numa consciência em
forma de visão-de-mundo, sendo que o principal expoente desse período além do
próprio Karl Marx é o marxista húngaro George Lukács ([1923] 1989). Já a
segunda fase propõe a ideologia como uma prática social, ganhando projeção nos
trabalhos teóricos de Antonio Gramsci e Louis Althusser. Cada fase teve suas
peculiaridades e é mister compreendê-las, haja vista a necessidade de se explicitar
um conceito de ideologia suficientemente operacionalizável para o tratamento de
dados nesta tese.
O aparecimento do termo “ideologia” remonta ao século XIX:
Sabe-se que essa expressão (ideologia) foi forjada por Destutt de Tracy,
Cabanis e seus amigos. Eles compreendiam por esse termo, conforme a
tradição clássica na Filosofia Iluminista, na qual a noção de gênese tornou-
se uma noção central, a teoria (-logia) e da nese das idéias (ideo-),
donde Ideologia. Eles se deram a conhecer como os Ideólogos. Desde que
Napolo disse, em uma célebre fórmula: “Não se pode fazer nada com os
Ideólogos.”, ele pensava tão somente neles – não em si mesmo, apesar de,
evidentemente, ser o ideólogo n° 1 (ideologia no sentido marxista do termo)
[...] Marx tomou o termo 50 anos após seu uso público, as expressões
ideologia e ideólogos, mas lhes atribuindo um outro sentido totalmente
diferente.(ALTHUSSER, 1995, p. 205-206) (tradução nossa)
27
27
On sait que cette expression (l'idéologie) a été forgée par Destutt de Tracy, Cabanis, et leurs amis.
Ils entendaient par ce terme, selon une tradition classique dans la Philosophie des Lumières, la
notion de genèse tient une place centrale, la théorie (-logie) de la genèse des idées (idéo-) d'où
l'Idéologie. Ils avait donà leur groupe le nom connu: les Idéologues. Lorsque que Napoléon disait,
dans une formule célèbre: « on ne peut rien faire avec les Idéologues », il pensait à eux , et à eux
seuls – pas à lui évidemment qui, étant l'idéologue n° 1 (idéologie au sens marxiste du terme)
[...] Marx a pris 50 ans après leur premier usage public, les expressions: idéologie, les idéologues,
mais en leur donnant un tout autre sans.
80
Quando Marx e Engels falam de ideologia, em A ideologia alemã
([1847]1993), sustentam a concepção de que o conceito de ideologia explica o
fenômeno segundo o qual o homem experimenta uma visão distorcida da realidade,
ou seja, essa realidade como a câmara escura de uma máquina fotográfica que
inverte a sua visão da mesma
28
, de modo que a acha justa, como, por exemplo, a
existência da mais-valia e de outras práticas da sociedade capitalista, que formam
um todo "coerente": daí, tais fenômenos oriundos da atividade econômica e do
sistema de organização dos meios de produção passam a ter um estatuto natural
que, no caso, se refere ao fato de o dono dos meios de produção comprar a mão-de-
obra que está sendo ofertada por um preço abaixo de seu valor real. “Em A ideologia
alemã, essa fórmula (inversão da realidade) figura em um contexto francamente
positivista. A ideologia é pura ilusão, puro sonho, ou seja, nula. Toda realidade está
fora dela mesma.” (ALTHUSSER, 1995, p. 209) (tradução nossa).
29
Podemos identificar, nessa forma de distorção da realidade, o velho chavão "o
trabalho dignifica o homem" como um operador do mascaramento da realidade, em
que o homem se vê obrigado a vender sua força de trabalho a preços muito
inferiores e acredita estar sendo justo e honesto para consigo e para com a
sociedade. Na teoria de Marx (cf. EAGLETON, 1997), a ideologia é um operador que
atua na consciência e transforma a realidade objetiva em uma imagem, segundo os
interesses da classe dominante; assim, só existe uma ideologia para ele, que é a da
burguesia.
para Lukács (1989), tem-se uma visão reificada e distorcida que é a da
classe dominante enquanto que o proletariado a classe universal possui uma
28
As câmaras escuras fotográficas do século XIX invertiam a imagem em virtude dos tipos de lentes
que era possível se fabricar nessa época.
29
Dans L'idéologie allemande, cette formule figure dans un contexte franchement positiviste.
L'idéologie est pure illusion, pur rêve, c'est-à-dire néant. Toute sa réalité est hors d'elle-même.
81
visão ampla de sua existência. Se, para Marx, ela é monopolar, para Lukács ela é
bipolar, por estar tanto na burguesia quanto no proletariado. A ideologia, para ele, é
uma força que opera no âmbito da falsa ou verdadeira consciência. De maneira que
a verdadeira consciência é a constituída pelo proletariado, que, devido ao seu lugar
desprivilegiado na malha social, consegue contemplar a si mesmo e seu papel de
explorado. Essa noção lukácsiana do proletariado envolve uma noção bastante
idealizada de movimento social, pois a visão dos operários nem sempre é a de
explorado. a burguesia seria detentora de uma falsa consciência da realidade,
conformando-se com a visão deturpada da realidade que mascara as relações de
exploração; a essa visão que a burguesia tem, Lucáks o nome de consciência
reificada:
o proletariado, afirma ele [Lukács], é uma classe potencialmente
“universal”, já que carrega consigo a emancipação potencial de toda a
humanidade. Sua consciência, assim, é universal em princípio; mas uma
subjetividade universal é, na verdade, idêntica à objetividade. Portanto, o
que a classe operária conhece a partir de sua ppria perspectiva histórica
deve ser objetivamente verdadeiro. (EAGLETON, 1997, p. 91)
É importante ressaltar-se que, em se tratando de falsa ou verdadeira
consciência, não estamos operando com valores estereotipados do senso comum,
mas sobre a verdade no sentido do que pode valer universalmente, ou seja, sobre
generalizações. "Assim, a ideologia é, para Lukács, não exatamente um discurso
infiel à maneira como as coisas são, mas fiel apenas de uma maneira limitada"
(idem), superficial, ignorando suas tendências e ligações mais profundas no seio da
sociedade. E este é outro sentido que aflora das reflexões de Lukács: ao contrio
da opinião mais aceita, para ele, "a ideologia não é falsa consciência no sentido de
simples erro ou ilusão" (idem, p. 94), mas uma maneira reificada de olhar as
questões das lutas de classe.
Um dos principais problemas que Eagleton levanta na crítica que faz ao
82
modelo lukácsiano é a recorrência da crença em um essencialismo da consciência
(modelo visão-de-mundo), através da reificação da economia, da cultura, educação
etc. Isto reduz a burguesia a "um conjunto de 'expressões' de reificação
cuidadosamente superpostas" (idem). A visão de Lukács homogeneíza os elementos
de determinada classe, colocando-os em um mesmo nível de consciência. Esta
resistência ao fator homogeneidade é marcante em Eagleton, que prefere ver a
questão como uma colcha de retalhos – mais ao modo complexo pregado por
Foucault. De nossa parte, acreditamos existir uma tensão entre a homogeneização e
a individualizão e que há, realmente, algo em comum no discurso de determinada
classe, o que não quer dizer que o conjunto de burgueses, ou de operários, pense
da mesma forma. Esse tipo de divisão ou de categorizão determinista das classes
é um tanto perigosa, pois passa a vê-las como estanques e plenamente separadas
por uma visão empirista de sujeitos. Isso pode levar-se a crer que um sujeito
operário só terá acesso a uma formão discursiva porque a sua visão de mundo
assim o determina e pela experiência, vemos que o interdiscurso está presente nos
discursos dos sujeito, como é o caso de um operário que defende um discurso que
seria anti-operio.
Para Lukács a ideologia é quase que uma força "espiritual", como observa
Eagleton, e que essa força se revela para a revolução e depende da formação da
consciência de classe proletária para imprimir as transformações na sociedade. A
ideologia é vista como uma força abstrata, mais do que simplesmente como uma
prática. O que se observa em Lukács é uma concepção prescritiva de ideologia
como elemento transformador. Mais adiante veremos que uma ideologia não pode
ser prescritiva, mas analisável através das práticas que a evidenciem. Por isso, o
modelo da consciência não pode dar conta de todos os fenômenos sociais, haja
83
vista que o cidadão, seja ele um rico industrial ou um operário, age de forma
independente, sem consultar aquilo que vulgarmente se apelidou de "consciência
ideológica". Mas, essa visão tem uma origem e uma explicação que estão baseadas
no próprio fazer político de Lukács e seu envolvimento com as causas marxistas da
Europa Oriental (para uma melhor compreensão do texto de Lukács, sugerimos o
comentário de ZIZEK, 2003).
Ainda segundo Eagleton (1997), a ruptura com a forma essencialista da
consciência dá-se com o italiano Antonio Gramsci. Este vai utilizar o termo
hegemonia significando o fim último de uma ideologia, pois esta não se reduz à
ideologia. O que vem a ser a hegemonia? Quem responde é Eagleton: "Gramsci
normalmente usa a palavra hegemonia para designar a maneira como um poder
governante conquista o consentimento dos subjugados a seu domínio - apesar de, é
verdade, empregar o termo ocasionalmente para designar conjuntamente o
consentimento e a coerção." (idem, p. 105). Construindo uma vio que privilegia a
prática enquanto luta hegemônica ao invés de um conglomerado de idéias que
reificam a realidade, Gramsci o primeiro passo em direção a uma descrição do
que vem a ser o mecanismo ideológico na sociedade pelo viés da prática simbólica e
não mais no sentido das idéias, mas como uma espécie de concretude das práticas
ideológicas. Isso ainda não o isenta de certa tendência prescritiva ao falar do
intelectual orgânico e seu trabalho de conscientização das massas e ainda
homogeneíza as classes sociais como fez Lukács.
Podemos resumir: "A hegemonia, então, o é apenas um tipo bem-sucedido
de ideologia, mas pode ser decomposta em seusrios aspectos ideológicos,
culturais, políticos e econômicos. A ideologia refere-se especificamente à maneira
como as lutas pelo poder são levadas a cabo no nível da significação [...]." (idem, p.
84
106) Reconhecidamente, Gramsci vê que o fim hegemônico não existe apenas na
classe dominante, mas que está também dentro de toda a classe que quer ascender
ao poder, como seria o caso do proletariado através da luta pelo socialismo. O que
quer dizer que o temos mais uma questão de reificação, mas verdadeiramente a
luta de classes pelo poder e, conseqüentemente, um conjunto de fatores culturais e
políticos que o formular a nova ordem. Mais uma vez, podemos observar que não
é uma consciência que transforma a sociedade, mas a prática que é gerenciada pelo
papel do intelectual orgânico na transição de um sistema de produção para outro.
Enquanto Lukács é "vago" em descrever como a consciência empírica (aquela que
dava a visão universal ao proletariado) tem de se transformar em consciência do
possível (aquela que revoluciona), Gramsci dá a resposta através do intelectual
orgânico. Assim, Eagleton resume o papel dessa personagem:
o intelectual orgânico, assim, provê o vínculo ou pivô entre a filosofia e o
povo, versado na primeira, mas ativamente identificado com o segundo.
Seu objetivo é construir, baseado na consciência comum, uma unidade
'cultural-social' na qual as vontades individuais normalmente heterogêneas
são fundidas na base de uma concepção comum do mundo. (idem, p.110)
Em suma, o marxista italiano conseguiu dar um importante passo na direção
da perceão de ideologia, tomando-a enquanto prática.
É nesse cenário pós-Gramsci que a noção de práxis ideológica começa ser
desenvolvida, e Althusser procura formular uma teoria da ideologia a partir do
posicionamento da psicanálise lacaniana que concilia a prática ideológica ao
processo de formão do sujeito. Daí, a prática em Althusser não ser vista da
maneira prescritiva como propõe Gramsci ao falar dos intelectuais orgânicos, mas
como uma prática que ocorre na sociedade de forma inconsciente.
Para Althusser, toda ação, inclusive a insurreição socialista, é levada a
cabo na esfera da ideologia [...], é apenas a ideologia que empresta ao
sujeito humano a coerência ilusória, provisória, suficiente para que se torne
um agente social prático. Do ponto de vista sombrio da teoria, o sujeito não
85
tem absolutamente nenhuma autonomia ou consistência: é meramente o
produto “excessivamente determinado” desta ou daquela estrutura social.
(idem, p. 128)
O adjetivo "sombrio" talvez tenha sido exagerado, pois, na verdade, Althusser
propõe que o sujeito, enquanto indivíduo totalmente subjetivo (tudo que faz ou fala
pertence somente a ele), é uma ilusão necessária da qual Pêcheux irá tratar quando
fala do Efeito Münchhausen. o quer dizer que toda a “vontade” do ser humano
está apagada, ou seu livre arbítrio, mas que há produção de uma ferida em Narciso,
coincidentemente com o projeto de Foucault em “As palavras e as coisas”: “O projeto
de As palavras e as coisas é historicizar o advento dessa ilusão que seria o homem,
que nasceu nesse mundo no século XIX (GREGOLIN, 2004, p. 83). Ademais, a
própria noção de vontade passa a ser relativizada, a tal ponto, a nosso ver, que o
sujeito tem escolha, mas todas elas restritas à "verdade de sua época" (FOUCAULT,
2002). Não queremos dizer que a criatividade não exista, mas que as formações
discursivas limitam as escolhas conscientes e inconscientes.
Althusser (1995), na cada de 1970, i então propor a noção de
interpelão: que significa dizer que o “sempre-já sujeito” (o indivíduo antes de ser
constituído como sujeito) é chamado a ocupar seu espaço de sujeito, ou seja, ao
entrarmos no mundo social, nos é dado um nome, com que se inicia o processo de
subjetivação conforme a cultura e a história e isso é levado a cabo através do
processo ideológico. Por isso, Pêcheux chama o homem de "animal ideológico"
(PÊCHEUX, 1996), pois é possível diferenciar o ser humano dos demais seres pela
sua propriedade de poder criar um campo simbólico que lhe dá a ilusão de essência
em si.
Eagleton (1997) critica o fato de a teoria de Althusser ter um caráter pré-
determinado no sentido de considerar que o homem nasce em um determinado
86
discurso que o reproduzicomo uma máquina, mas esse argumento de Eagleton
não se sustenta plenamente. Observemos a citação abaixo:
Essa tese simplesmente retoma nossa última proposição: não existe
ideologia senão pelo sujeito e para os sujeitos. Observemos: não existe
ideologia senão para sujeitos concretos (como eu e você), e essa
destinação de ideologia não é possível se não pelos sujeitos enquanto
categoria e seu funcionamento. (ALTHUSSER, 1995, p. 223) (tradução
nossa)
30
Nas palavras do filósofo marxista, não vemos o sujeito enquanto uma mera
determinação, mas vemos tanto o sujeito influenciado pela ideologia, quanto a
ideologia existindo pelo sujeito, ou seja, a ideologia existe pelos sujeitos reais, e os
sujeitos reais só se compreendem porque existe ideologia. Isso implica em colocar o
sujeito como categoria indispensável para a existência da ideologia:
A categoria de sujeito é constitutiva de toda ideologia, mas ao mesmo
tempo, diríamos que a categoria de sujeito é constitutiva de toda ideologia,
e que também toda ideologia tem por função (que a define) “constituir” os
sujeitos concretos (como você e eu). É nesse jogo de dupla constituição
que existe o funcionamento de toda ideologia, que não é mais que seu
próprio funcionamento nas formas materiais. (idem) (tradução nossa)
31
Dessas observações, advém o pensamento de que Althusser estava
preocupado em perceber como o sujeito e a ideologia subsistem simulnea e
reciprocamente, e se a relação é de reciprocidade, significa que tanto uma como
outra categoria se afetam, de modo que o jogo se duplica também em determinar e
ser determinado, ou seja, os sujeitos modificam os processos ideológicos da mesma
maneira com que a ideologia determina como os homens o chamados a serem
30
Cette thèse revient tout simplement à expliciter notre dernière proposition: il n'y a d'idéologie que
par le sujet et que pour des sujets. Entendons: il n'y a d'idéologie que pour des sujets concrets
(comme vous et moi), et cette destination de l'idéologie n'est possible que par le sujet: entendons par
la catégorie de sujet e son fonctionnement.
31
Nous disons: la catégorie de sujet est constituve de toute idéologie, mais en me temps et
aussitôt nous ajoutons que la catégorie de sujet n'est constitutive de toute idéologie, qu'en tant que
toute idéologie a pour fonction (qui la définit) de « constituer » les sujets concrets (comme vous et
moi.). C'est dans ce jeux de double constitution qu'existe le fonctionnement de toute idéologie,
l'idéologie n'étant rien que son fonctionnement dans les formes matérielles de l'existence de ce
fonctionnement.
87
sujeitos. Neste último sentido, a determinação não pode ser esquecida, mas ela
deve ser compreendida, necessariamente, como um processo bivalente, daí
concluirmos que o determinismo e o assujeitamento, foram mal interpretados ao
longo da “fase heróica da AD tratada por Maldidier (2003), no entanto isso foi
corrigido posteriormente.
Como então compreender o paradoxo entre liberdade dos sujeitos e a sua
determinação? O sujeito não teria mesmo escapatória? Sob a nossa ótica, talvez
nem se trate de um paradoxo, ou mesmo que o fosse não necessitaria de ser
resolvido, pois tratar-se-ia de um paradoxo ou simples contradição necessariamente
constitutiva, ou seja, a dialética entre o determinismo e a “liberdade” seriam forças
atuantes na própria constituição dos sujeitos. Assim, dentro de uma comunidade ou
uma sociedade, existem diferentes discursos, de tal sorte que o sujeito interpelado
por eles assume alguns e nega outros, como se dá na articulação entre paradigma e
sintagma do estruturalismo, mas a diferea consiste em que um discurso A faz
fronteira, se opõe ou faz aliança com um discurso B em determinados aspectos. A
hipótese de Maingueneau (2005, p. 33) é bastante significativa para aquilo que
pretendemos compreender: “Nossa própria hipótese do primado do interdiscurso
inscreve-se nessa perspectiva de uma heterogeneidade constitutiva, que amarra, em
uma relação inextricável, o Mesmo do discurso e seu Outro.” Desse modo, sempre
um discurso existirá em função do outro e como a produção de discursos essujeita
às vicissitudes da história e sua dialética, o sujeito acaba sendo tocado por muitos e
diferentes discursos já dados ou em construção.
A configuração de como um discurso entrecorta o outro é que produzirá
concepções ou "visão de mundo" no sujeito, tamm a maneira como o sujeito vai
acomodar esses discursos em sua “identidadepassa a ser algo elementar para sua
88
sobrevivência em sociedade. Tais acomodações o contraditoriamente
constitutivas, e se aplicam a situações como a que se observa na passagem a
seguir:
14) Os negros tem capacidade de estudar e cursar uma faculdade ou até mesmo ter
uma pós, mas antes de tudo isso e necessário ele ter um lar, alimentação, roupas
entre outros itens indispensáveis.
Para analisarmos a frase 14, tomemos o conceito de pressuposição de Ducrot
(1977), para quem se trata de um tipo particular de conteúdo inscrito no enunciado
que permite ao posto (enunciado) ter coerência; ademais, o pressuposto é da ordem
do conhecimento coletivo, de uma voz anônima que não precisa ser explicitada. No
caso de 14, a locução até mesmoindica uma gradação hierárquica sobre o termo
“pós” que indica o nível da pós-graduação no Sistema Educacional Brasileiro, sendo,
para o sujeito-enunciador, o último e mais valioso vel, inclusive em que o negro
pode aceder. A informão pressuposta e que toca em um discurso também
pressuposto é o de que o negro está detido nos níveis inferiores à s-graduação,
ou seja, no máximo ele atinge a graduação. Logo, o “a mesmointroduz a exceção
ou o absurdo como uma escie de hipérbole; no caso, a informação pressuposta
seria
14’) Os negros (só) têm capacidade de estudar e cursar uma faculdade ou até
mesmo ter uma pós (porque eles normalmente não chegam a cursar uma s,
porque a sua capacidade normalmente não alcança esse objetivo), mas antes de
tudo isso e necessário ele ter um lar, alimentação, roupas entre outros itens
indispensáveis.
Esse conhecimento pressuposto, relativo aos limites que o negro teria, es
baseado em uma formão discursiva: a da inferioridade do negro. O sujeito até se
esforça para ser simpático à causa da igualdade, mas o efeito é contrário, pois ele
simplesmente ressalta o preconceito. Isso se deve ao fato de, ao enunciar assim,
tocar em dois discursos distintos: A) o da igualdade entre as raças; B) o da
89
desigualdade das raças. Se esse sujeito que enunciou a frase fosse inquirido sobre
o efeito de sentido preconceituoso, possivelmente não o perceberia de imediato. A
percepção aconteceria com um bom êxito desde que esse sujeito fosse exposto ao
outro discurso, ou seja, ao não-racista, ou quando as paráfrases e as explicações
revelassem os pressupostos que o "até mesmo" comporta nessa situação. A
dificuldade de uma percepção imediata e a impossibilidade de uma percepção do
próprio discurso estão inscritas no processo de formão do sujeito, pois a ideologia,
enquanto operação que se no inconsciente, se incumbe de alienar o sujeito
desses sentidos através do “duplo esquecimento”.
Segundo Pêcheux (1995), quando a ideologia opera no indivíduo para lhe
constituir como sujeito, duas formas de esquecimento baseadas na interpretação
que faz do sistema do inconsciente freudiano (ver capítulo III) em relação ao
discurso. Vejamos como se organiza o sistema do esquecimento:
Concordamos em chamar de esquecimento número 2 ao "esquecimento"
pelo qual todo sujeito-falante "seleciona" no interior da formação discursiva
que o domina, isto é no sistema de enunciados, formas e seqüências que
nela se encontram em relação de paráfrase.[...] Por outro lado, apela para
a noção de "sistema inconsciente" para caracterizar um outro
"esquecimento", o esquecimento número 1, que conta do fato de que o
sujeito-falante não pode, por definição, se encontrar no exterior da
formação discursiva que o domina. (PÊCHEUX, 1995, p. 173)
Diríamos que muitas interpretações surgiram dessa clássica definição, e não
faremos diferente. O esquecimento número 2 não pode ser apenas uma forma de
relação que o sujeito tem com o enunciar, ou seja, com a evidência de sentido, mas
de tentativa e controle pré-consciente e inscrevemos essa "vontade de verdade"
no âmbito da "intenção", muitas vezes banida das discussões da AD. A nosso ver,
não se trata da intenção no âmbito cognitivista ou inatista, considerada como uma
vontade interior imotivada, mas a intenção também pode ser um aspecto resultante
do efeito ideológico, como vemos no esquecimento número 2, cujo exemplo pode
90
ser: "O que você quer dizer com isso?" Nesse caso, trata-se de uma frase que
pressupõe que um dos enunciadores não entendeu aquilo que foi dito, e que o outro
interlocutor tem a capacidade de especificar os sentidos como se fossem domináveis
e daí a paráfrase sobre um termo ou sobre uma sentença vai atestar o que é o
desejo de verdade, de modo que o sujeito glosa o seu dizer para o tornar mais
evidente. No entanto, tal evidência nem sempre acontece. Assim, a ilusão de
transparência do sentido e controle do dizer serão fatores importantes na
compreensão dos processos enunciativos dos sujeitos. O esquecimento mero 1
evidencia-se pelo inconsciente, dado que a ideologia, como vimos, opera sobre o
inconsciente, de modo que a articulação entre os dois esquecimentos são formantes
do sujeito:
O efeito de forma-sujeito do discurso é, pois, sobretudo, o de mascarar o
objeto daquilo que chamamos o esquecimento número 1, pelo viés do
funcionamento do esquecimento número 2. Assim, o espaço de
reformulação-paráfrase que caracteriza a formação discursiva dada
aparece como lugar de constituição do que chamamos o imaginário
lingüístico (corpo verbal). (idem, p. 177)
A dimensão do imaginário lingüístico tamm diz respeito às imagens que os
sujeitos fazem dos componentes lexicais de sua língua, como atesta cheux: “A
esse imaginário lingüístico deveriam, sem dúvida, ser relacionadas também as
‘evidênciaslexicais inscritas na estrutura da língua[...]” (idem), ou seja, um sujeito
comum acredita que paráfrases possam ser feitas sem que sua significação seja
alterada, sem que isso possa inscrever o seu dizer em uma dada formação
discursiva.
Se considerarmos que os esquecimentos revelam um jogo tipicamente
humano de produções simbólicas que são construídas e reconstruídas ao longo da
história e dos discursos historicamente marcados, logo o "real" o pode ser
considerado como dado, se tomado no sentido da simples e pura objetividade. Ele é
91
construído historicamente de acordo com as epistemes de cada época, no entanto a
extrema relativização do sentido também não é muito produtiva. Diríamos que há
duas instâncias sobre o sentido e uma delas tem a ver com as relações lingüísticas
imaginárias: a primeira, que o sentido é socialmente compartilhado em um sistema,
de modo que qualquer falante de língua portuguesa sabe o que é “janela” e sabe
tamm interpretar metáforas como "os olhos são as janelas da alma", o que
chamaríamos de "sentido" numa perspectiva bastante fregeana. Já o "efeito de
sentido", pressuposto pelo sentido, parte deste para as zonas de instabilidade, pelo
menos de estabilidade aparente, pois, nesse caso, o exterior e o ideológico fazem o
sentido deslizar para efeitos.
No exemplo de "janela", a referência não é um objeto real, mas a sua função;
no caso
,
tem-se uma metonímia, em que a qualidade do objeto “entrada de ar, luz,
visão, relação com o exterior etc.) são evocados para o conceito “alma” (psique). No
contexto do discurso religioso, pode estar presente em um sermão sobre a cobiça;
no contexto artístico, pode ser o título de uma exposição de fotografias. Em ambos
os casos teremos efeitos de sentido distintos para “olhos”, “janela” e “alma”.
O processo de interpelação é a base para a criação da ilusão de sujeito, de tal
forma que é através dele que a sociedade "reconhece" o sujeito (o maior dos
esquecimentos), como o fato de ser chamado pelo nome, ou um conativo na rua. É o
que se dá, por exemplo, em “Hei, você!”, pois nos reconhecemos como sujeitos
capazes de responder a um apelo como esse. Os dois esquecimentos tratados
anteriormente farão o trabalho de esconder uma dura verdade e Eagleton (1997)
reconhece o mérito dessa idéia em Althusser –, a de que a sociedade não necessita
de um ser específico portador do que chamamos “identidade individual. Ela tem
necessidade de um sujeito que possa cumprir determinada função com eficiência, a
92
ideologia, enquanto recrutadora de indivíduos, esconde a desimporcia do sujeito,
para que ele seja motivado a ocupar seu espaço na sociedade. Indícios disso estão,
por exemplo, nos anúncios publicitários que provocam o sujeito a se ver como
indivíduo: “Um banco para você!” (anúncio de banco), que esconde o fato de que
o estabelecimento atende milhares de clientes simultaneamente.
Por outro lado, há um problema que depõe contra a teoria de Althusser: como
o sujeito reconhece aquele que o interpela como sujeito? É difícil responder a esta
questão sem cair numa cilada gica. A resposta seria que o sujeito é “sempre-já
sujeito, o que faz pressupor que ele existe antes mesmo de seu nascimento, como
se se tratasse de um “inatismo”! E há ainda outra questão a colocar: como o sujeito
se reconhece como tal e reconhece o outro? Seria necessário existir um terceiro
sujeito maior, pré-existente e, então, seria o caso de se perguntar quem interpelou
esse sujeito maior para que fosse como tal? Grosso modo, representamos aqui as
vidas que rondam a teoria.
Cremos que as respostas para essas dúvidas não sejam fáceis, mas
gostaríamos de apontar para alguma sda: admitamos, então, que, realmente,
exista um sujeito sempre-já-lá, só à espera de um preenchimento e que é criado por
um sujeito maior que é o próprio processo ideológico. O que acontece é que o Outro
faz parte da estrutura de qualquer sociedade, ou seja, onde quer que haja um grupo
humano estarão estruturas de poder e ideologia, que se sobrepõem à
individualidade. Bakhtin (1997) corrobora essa idéia dizendo que não basta colocar
dois seres humanos um diante do outro para que se comuniquem, mas que é
preciso considerar-se a existência da história como um processo evolutivo
32
. À
medida que as relações humanas na vida social e econômica foram adquirindo seus
32
Não no sentido positivista, mas do desenrolar das relações sociais entre os seres humanos.
93
contornos próprios, o Outro social foi tamm se constituindo com nuanças próprias,
daí a interação e a sinergia entre sujeito e ideologia da qual falamos acima. É claro
que há contradições na teoria, mas seria muito radicalismo reduzir o pensamento
althussereano como fez Eagleton, haja vista a ruptura que provocou no marxismo
filosófico. Todavia, apesar dos problemas, há sdas dentro do sistema apresentado.
É claro que toda essa controvérsia da existência de um terceiro sujeito poderia ser
dirimida se considerada a forma de existência das instituições (estado, escola,
igreja), ou seja, a presença dos Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE)
(ALTHUSSER, 1995) na formão do sujeito, os quais são esquecidos por Eagleton
no momento em que discute o problema da teoria. Ora, fica fácil descobrir de onde
vem a interpelação e como o indivíduo se reconhece como sujeito ao olhos desse
primeiro interpelador: A origem do mesmo esnos AIE, que são justamente lugares
onde se a reprodução/transformação das relações de produção (cf. PÊCHEUX,
1996). Isso fica patente, como no caso da esquerda que acreditava que tomar o
Poder e sua máquina estatal – uma parte dos AIE – era necessário para revolucionar
os meios de produção. Por isso grupos, sob a sigla de organizações como partidos e
grupos revolucionários procuram atingir a hegemonia se colocando à frente do
Estado.
Outro fator a ser considerado é que, de acordo com o conceito de ideologia
de Pêcheux herdado de Althusser ela não tem história, é eterna, o que lhe
confere o caráter de estrutura presente e perene, como elemento essencial para o
funcionamento de qualquer sociedade, porque acomoda os sujeitos em seus papéis.
A ideologia é "indispensável, em qualquer sociedade, para que os homens sejam
formados, transformados e equipados para reagir a exigências de suas condições de
existência." (ALTHUSSER, apud EAGLETON, 1997, p. 136). Portanto, em sua
94
aparência, o pensamento de Althusser parece pré-determinador: a vida em
sociedade convoca os seres humanos para desempenhar um determinado papel e
isso independe do meio, o que acontece é que cada meio social irá interpelar o
indivíduos à sua maneira. No caso das sociedades ocidentais, a individualidade é
supervalorizada para que esse indivíduo acredite que lhe é destinado algum tipo de
função no grupo e possa, assim, ter o mínimo de vontade para se sentir reconhecido
como sujeito. O que, na verdade, é uma forma de relação entre os meios de
produção e o campo simlico, talvez explicado por um pensamento bastante
simples ou simplista: para se entender o capitalismo contemporâneo não basta
compreender que existe uma elite que domina os meios de prodão (que não são
mais os mesmos da Revolução Industrial, momento histórico que marcou O Capital),
mas compreender que, se existem os meios de produção, existe uma finalidade para
eles. A sua finalidade é produzir bens e serviços, mas lembramos que nem todos os
bens e serviços são naturalmente (biologicamente falando) essenciais à manutenção
da vida. Assim, algumas necessidades devem ser criadas no âmbito do simbólico
que se encarrega de criar uma necessidade, que até então não existia.
A partir disso, podemos compreender a produção de um efeito de sujeito
narcísico a partir da ascensão da burguesia e que se reflete até hoje nos campos
simlicos relacionados ao consumo. Isso é o que leva a um conjunto de valores
relacionados ao tipo de produção adotado por uma determinada sociedade. No caso
de nossa história capitalista, desenvolvemos uma imagem de sociedade democrática
e igualitária, dentro da utopia da burguesia na qual todos os indivíduos têm a mesma
condição de competir para conquistar bens de consumo e bens simbólicos. Trata-se
da verdade desta nossa época, que não aceita, por exemplo, a verdade da época
escravista, cujos sujeitos tinham como natural o fato de um homem ter o direito de
95
decidir se seu escravo poderia ou não viver. No caso da sociedade contemporânea,
a satisfação do consumo não é meramente um desejo consciente, mas a criação
desse desejo de “ter” é essencialmente discursiva.
Em um caso como esse, a ideologia desenvolve um papel preponderante
como prática. Adotaremos aqui a formulação de Althusser (1995), segundo a qual
existe a ideologia geral e as ideologias específicas, sendo que a diferença entre elas
está no papel da história:
Então, de uma parte, eu creio poder sustentar que as ideologias têm uma
história própria (claro que ela é determinada em última instância pela luta
de classes nos aparelhos de reprodução das relações de produção); e, de
outra parte, eu creio poder sustentar, ao mesmo tempo, que a ideologia em
geral não tem história, não em um sentido negativo (sua historia está fora
de si), mas em um sentido absolutamente positivo. Esse sentido é positivo,
se for verdadeiro que o próprio da ideologia é ser dotado de uma estrutura
e de um funcionamento tal que eles constroem uma realidade não-
histórica, ou seja, oni-histórica, no sentido em que essa estrutura e esse
funcionamento, estão sob uma mesma forma, imutável, presentes no que
chamamos de história inteira [...] (p. 210) (tradução nossa)
33
Assim, a ideologia geral é aquela que chama o indivíduo a ser sujeito,
enquanto a ideologia específica é aquela pertencente a grupos sociais e a
momentos históricos diferentes. E é claro que a interpelação e a constituição dos
sujeitos só ocorrem graças à linguagem e através da língua. E, como o circuito
atravessa os sujeitos, as categorias bakhtinianas de dialogia e polifonia explicam
como é possível, por exemplo, que os sujeitos de nossa análise mantenham-se na
mesma memória compartilhada (ou formação discursiva, como veremos à frente) em
sua maior parte e não haja textos cuja construção do sentido ultrapasse o velho
clichê utilizado na AD sobre as formações discursivas: aquilo que pode ou não pode
33
Car, d'une part, je crois pouvoir soutenir que les iologies ont une histoire à elles (bien qu'elle soit
déterminée en dernière instance par la lute des classes dans les appareil de la reproduction des
rapports de lutte des classes dans les appareils de la reproduction des rapports de production); et,
d'autre part, je crois pouvoir soutenir en même temps que l'idéologie en général n'a pas d'histoire, non
en un sens négatif (son histoire est en dehors d'elle), mais en un sens absolument positif. Ce sens est
positif, s'il est vrai que le propre de l'idéologie est d'être dotée d'une structure et d'un fonctionnement
tels qu'ils en font une réalité non-historique, c'est-à-dire omni-historique, au sens cette structure et
ce fonctionnement sont, sous une même forme, immutable, présents dans ce qu'on appelle l'histoire
entière [...].
96
ser dito em uma determinada época.
O contra-argumento a essa idéia de formão discursiva seria dizer que os
textos que analisamos ou que agrupamos em um corpus seriam dados "viciados",
pois respondem a uma mesma motivação de tema e, por isso, têm discursos
semelhantes. A nosso ver, uma coisa é discorrer sobre um mesmo tema e outra é ter
a mesma posição sobre um tema; assim, o fato de três grupos da análise
responderem a um dado enunciado, não invalida a idéia de que tais sujeitos
compartilham discursos por terem sido igualmente afetados por eles. Além disso, é
preciso lembrar que, segundo Bakhtin, “um enunciado é repleto de ecos e de
referências a outros enunciados” (BAKHTINE, 1984, p. 296)
34
. Logo, a dialogia é
uma categoria inerente, constitutiva, e a polifonia é uma exibição dessa categoria
materialmente, ou seja, a idéia é de que as várias “vozes(sons) se mostram no
dizer alheio. Jaqueline Authier-Revuz (1990), através das noções de
heterogeneidade constitutiva e mostrada, ampliou o conceito bakhtiniano e permitiu
sua operacionalizão em diferentes aspectos. É graças à noção de heterogêneo,
que voltaremos a discutir no momento oportuno, que poderemos compreender como
as identidades dos sujeitos de nossa pesquisa se comportam.
Bem, falamos muito de discurso e formação discursiva, sem, contudo,
conceituá-los. Acreditamos, pois, que chegou o momento de fazê-lo.
2.4 O discurso
Definir “discurso” talvez seja a tarefa mais difícil em um trabalho como este,
não pelo caráter do corpus a ser trabalhado, mas pela própria história do termo e
seus diversos empregos em cada momento. Como já dissemos anteriormente, não
34
« Un énoncé est rempli des échos et des rappels d’autres énonces (....) »
97
há necessidade de recontarmos toda história da AD, mas é preciso retomar a origem
de alguns conceitos para melhor conceituá-los e apli-los na análise.
O termo "discurso" conhece seus primeiros usos a partir da filosofia grega e
seu sentido é colocado, inicialmente, como um sentido próximo do logos. Tanto que
foi e é sinônimo de fala, enunciado etc. Maingueneau (1991, p. 15) enumera pelo
menos sete sentidos para o termo “discurso, que o os seguintes:
Discurso 1: equivalente de “fala” saussuriana, ou seja, toda ocorrência
enunciada, ou seja, falada ;
Discurso 2: unidade de dimensão superior à frase (conforme a gramática de
texto)
Discurso 3: no quadro enunciativo e pragmático discurso é a dimensão
interativa, considerado seu poder de ação sobre o outro, sua inscrição em
uma situação enunciativa dada;
Discurso 4: é a conversação, entre os sujeitos, tomados do conceito 3;
Discurso 5: opõe-se, por vezes, à língua e a discurso como sistema virtual de
valor pouco específico, e opõe-se também à diversidade de superficial ligada
às variedades de uso (como por exemplo, discurso dos adolescentes, ou os
regionalismos);
Discurso 6: conceito utilizado correntemente para designar um sistema de
constrangimentos que rege a produção de um conjunto ilimitado de
enunciados a partir de uma certa posição social e ideológica;
Discurso 7: tradicionalmente a AD define seu objeto de análise distinguindo
enunciado e discurso.
Interessam-nos as duas últimas definições para este trabalho. A noção de
discurso, tal qual concebemos nesta pesquisa, começa com o surgimento da obra
inaugural de Pêcheux, AAD, em 1969. Como se trata de uma disciplina que vive
suas revisões sem maiores traumas, é importante observarmos que o conceito de
discurso modificou-se, mas, a título de contextualização, iremos fazer um aporte a
suas diferentes concepções, até chegarmos à não de formação discursiva (FD).
Antes de prosseguirmos, é preciso prevenir que a noção de FD se revisitada e
revisada por nossa parte, ou seja, não pretendemos enter-la simplesmente por
achá-la antiquada.
Charaudeau e Maingueneau (2004, p. 169) citam Foucault para definir
98
discurso: "Chamaremos de discurso um conjunto de enunciados na medida em que
eles provêm da mesma formão discursiva", ou ainda:
Chamaremos de discurso um conjunto de enunciados, na medida em que
se apóiem na mesma formação discursiva; ele não forma uma unidade
retórica ou formal, indefinidamente repetível e cujo aparecimento ou
utilização poderíamos assinar (e explicar, se for o caso) na história; é
constituindo de um número limitado de enunciados para os quais podemos
definir um conjunto de condições de existência. (FOUCAULT, [1969] 2002,
p. 135).
Definir discurso segundo um conceito, tal como definir ideologia não é tarefa
fácil, pois mais uma vez estamos diante de um termo que, além de antigo
lembrando que o termo é uma herança clássica , tem seu uso amplamente
difundido e vulgarizado. Por isso, partindo de Foucault, achamos por bem construir
uma compreensão diferenciada.
Quando o filósofo francês diz que se trata de um conjunto de enunciados que
se "apóiam/provêm", preferimos interpretar que se refere à sua inscrição em um
dado campo, mas é importante que fique bem claro que o "discurso" é a inscrição, e
a formação discursiva ou como querem outros pesquisadores chamar de
“memória”, “campo discursivo”, “campo semântico do discurso” etc. é a inscrição
de um discurso específico (discurso machista, neoliberal, de esquerda etc.). Assim,
os textos que aqui analisamos são discursos, as telenovelas são discursos, as aulas
tamm são discursos; logo, todo dizer se discurso, mas o discurso X será um
determinado discurso segundo formas de constrangimento que lhe são próprias.
Queremos, com essa distinção, retirar equívocos e aplicar a mesma relação
hierarquizada entre ideologia geral e ideologia específica. Logo, o podemos
dissociar discurso e formação discursiva.
Pêcheux toma de Foucault sua definição de FD e que se tornou amplamente
difundido nas pesquisas em AD, bem como amplamente "vulgarizado" no sentido da
banalização que o termo sofreu. Então, vejamos:
99
Chamaremos, então de formação discursiva aquilo que, numa formação
ideológica dada, isto é, a partir de uma posição dada numa conjuntura
dada, determinada pelo estado da luta de classes, determina o que pode e
deve ser dito (articulado sob a forma de uma arenga, de um sermão de um
panfleto, de uma exposição, de um programa etc.)." (PÊCHEUX, [1975]
1995, p. 160)
Esse conceito merece uma revisão que lhe possa imprimir mais coerência e
clareza, pois, como veremos mais adiante, alguns conceitos acabam sofrendo as
vicissitudes dos modismos e podem ser banalizados ou então, simplesmente
banidos, o que, ao nosso ver, é pior.
2.4.1 O conceito de formação discursiva: tentativa de resgate
A AD não foge também dos discursos da moda e daí também incorporar
termos que podem e não podem ser usados, como no caso de FD. Guilhaumou
(2004) faz uma interessante reflexão sobre o conceito de FD, lembrando que o
conceito teve sua origem em Arqueologia do Saber, de Foucault, e que, depois de
uma década de reinado, desaparece no início dos anos oitenta. E Guilhaumou
explica a ascensão, queda e possível retorno do conceito com as seguintes
palavras:
É o momento [início da cada de 1970] bastante inicial no qual eu mesmo
e Régine Robin situamos as formações discursivas ao lado das formações
ideológicas, seguros em relação à sua autonomia, ou seja, em quanto à
relação que mantém com os sistemas de representação, mais
precisamente às suas condições de produção no seio de uma realidade
social marcada pela ideologia dominante. A primeira abordagem crítica
(GUILHAUMOU, MALDIDIER, 1979) dessa busca teórica inaugural mostra
que a espécie discursiva era então classificada dentro do gênero
"ideologia", e que a questão do sentido era relacionada tão somente ao
exterior ideológico. (tradução nossa)
35
Mais adiante, o termo sofrerá os reveses com sucessivas transposições entre
35
C’est bien le moment initial où Régine et moi-même, nous situons les formations discursives du côté
des formations idéologiques, certes avec leur autonomie propre, c’est-à-dire dans leur rapport à des
systèmes de représentation, plus précisément à leurs conditions de production au sein d’une réalité
sociale marquée par l’idéologie dominante. La première approche critique (Guilhaumou, Maldidier,
1979) de cette démarche théorique inaugurale montre que l’espèce discursive était ainsi classée dans
le genre « idéologie », et que la question du sens était renvoyée au seul exrieur idéologique.
100
teoria e prática, as quais não o afastaram, necessariamente, das raízes marxistas,
mas a retomada do termo se faz necessária, haja vista o desgaste que sofreu.
No primeiro momento de seu repúdio, a FD foi abandonada, por causa da
materialidade do sentido, pois as análises empíricas contradiziam a primeira noção
posicionada segundo uma perspectiva altamente castradora da criatividade,
conforme atesta Guilhaumou:
[...] a descrição da materialidade dos textos focaliza nossa atenção sobre
práticas discursivas de sujeitos da enunciação tomados em relações de
reciprocidade no horizonte de uma atividade livre, logo emancipatória.
Ressalta-se a dimensão inventiva, logo, interpretativa do enunciado. No
seio de tal espaço de cooperação, a noção de formação discursiva pode
ainda conservar seu lugar. Num primeiro momento, nós tivemos a
tendência de considerar seu desaparecimento da cena discursiva como
definitivo [...](tradução nossa)
36
Essa reviravolta, por conta da prática, a nosso ver, desfará um equívoco
promovido na primeira fase da AD que era o de ler apenas enunciados dos grandes
discursos e não textos do cotidiano, perdendo-se um pouco da originalidade da
busca de regularidades na dispersão dos discursos de que fala Foucault em
Arqueologia, não o apenas os grandes discursos que podem ser agrupados a
partir da compreensão das regularidades, mas também os discursos cotidianos.
Ainda segundo Guilhaumou (2004):
Falar sobre formação discursiva para dar conta da regularidade de
enunciados dispersos e heterogêneos, no sentido de Michel Foucault,
retorna com a sua preocupação original e não separada da existência do
pensamento e do discurso. A formação discursiva é então o gênero ao qual
pertence todo o assunto, todo objeto e todo o conceito apto a simbolizar a
existência conjunta da realidade, do pensamento e do discurso, em virtude
da existência empírica dos fenômenos linguageiros. Estamos mais
próximos do universo dos dizíveis, ou seja, a articulação do uso das
palavras, logo de sua utilização, e de sua ligação ao pensamento, portanto
de sua verdade. A noção de formação discursiva pode, então, designar o
conjunto de regras dos nomes específicos ligados à generalidade de um
36
[...]la description de la matérialité des textes focalise notre attention sur les pratiques discursives de
sujets d’énonciation pris dans des relations de réciprocité à l’horizon d’une activité libre, donc
émancipatoire. L’accent est mis sur la dimension inventive, donc interprétative, de l’énoncé. Au sein
d’un tel espace de co-partage, la notion de formation discursive peut-elle encore conserver une place
? Dans un premier temps, nous avons eu tendance à considérer sa disparition sur le devant de la
scène discursive comme définitive [...]
101
discurso; ela nos lembra sem cessar que o discurso procede
simultaneamente da particularidade dos indivíduos falantes e da
generalidade de sua produção linguageira comum. (tradução nossa)
37
Para nós, o conceito de FD é altamente empírico, demonstrável, balizável: é
foucaultiano sem perder sua origem, e pêcheutiano em sua aplicação. As discussões
sobre a origem ("paternidade") do conceito pouco nos ajudariam a entender o
fenômeno que analisamos e, sem uma noção que nos permita o agrupamento dos
textos pouco nos valeria tratar de 464 sujeitos empíricos distintos, mas que se
posicionam em poucos sujeitos de discurso. Isso é um indício de que os sujeitos
empíricos são atravessados pelos sujeitos discursivos, porta-vozes das diferentes
FDs. Tal fenômeno será perceptível nos textos dos alunos conforme demonstram
diferentes métodos de análise, como, por exemplo, a estatística textual demonstrará
nas análise que realizamos.
Daí acreditamos que o golpe de misericórdia sobre a polêmica da noção de
FD esteja em Charaudeau e Maingueneau (2004, p. 242):
O recuo em relação a essa noção explica-se igualmente pelo interesse
crescente que incide sobre corpora o doutrinais. Deve-se, entretanto,
evitar cair no excesso contrário: para numerosos corpora, essa noção pode
mostrar-se produtiva, se for claramente definida.
38
A noção de formação discursiva, em nosso corpus, não é vista diretamente
como um poder ou não poder dizer, mas de um dizer que se inscreve, por suas
características materiais, em uma dada formação discursiva identificável pelos seus
37
Parler de formation discursive pour rendre compte de la régularité dénoncés dispersés et
hétérogènes, au sens de Michel Foucault, reviendrait alors à mettre l’accent sur le mode originel et
non séparé d’existence de la pensée et du discours. La formation discursive serait alors le genre
auquel appartient tout sujet, tout objet et tout concept apte à signifier l’existence conjointe de la réali
de la pensée et du discours, par le fait de l’existence empirique des phénomènes langagiers. Nous
sommes au plus près de l’univers des dicibles, c’est-à-dire à la charnière de l’usage des mots, donc
de leur utilité, et de leur lien à la pensée, donc de leur vérité. [...] La notion de formation discursive
pourrait alors désigner l’ensemble réglé des noms particuliers attachés à la généralité dun discours ;
elle nous rappellerait sans cesse que le discours procède à la fois de la particularité des individus
parlants et de lanéralité de leur production langagière commune.
38
Ainda sobre o assunto, sugerimos a leitura de Baronas (2005).
102
aspectos recorrentes como uso de um determinado léxico ou de segmentos
repetidos perceptíveis aos métodos lexicométricos e às características semânticas e
sintáticas do texto, bem como aos processos enunciativos. A busca das
regularidades nos permitirá aceder às formações discursivas.
103
CAPITULO III
A PSICANÁLISE
Chegamos então ao terceiro membro da Tríplice Entente, e pretendemos
compreender em quais aspectos a psicanálise se articula com a AD. Qual é o elo
entre esses três pensamentos com histórias muito distintas? Neste capítulo do nosso
trabalho, mais que tentar responder, pretendemos desenvolver uma reflexão sobre
conceitos operacionalizáveis que dêem conta da compreensão do fenômeno que
analisamos. O percurso deveras curto deste capítulo tem sua explicação, nossa
pouca experiência em tratar de assunto tão rico e complexo, mas faremos o possível
para compreender pelo menos três eixos nesta reflexão: o inconsciente, a identidade
e o sujeito.
No inconsciente tomaremos alguns conceitos de Freud, Lacan e a leitura que
Pêcheux fez deles, na qual se baseiam as articulações com a formação da
identidade, via ideologia, e como esta constitui o sujeito. Não se trata de uma
articulação comandada pelo inconsciente, mas comandada pela ideologia, que
opera no inconsciente e reproduzsujeitos”.
3.1 Inconsciente e linguagem
Forrester (1980, p. 39) afirma que "A psicanálise é a teoria de uma terapia. A
terapia, sob a forma mais pura e mais 'original'", que consiste em uma "cura pela
palavra"(tradução nossa)
39
, nada mais justo pensar na cura pela palavra, uma vez
que alguns males pquicos se originam na "palavra", ou melhor ainda, surgem na
da linguagem, cuja língua é um dos meios mais completos e complexos de sua
39
La psychanlyse est la théorie d'une thérapie. La thérapie, sous sa forme la plus pure et la plus
"originale", consiste en une "cure de parole" ["talking-cure"].
104
existência. Não trataremos de início da questão da língua e da linguagem, mas vale
a pena revermos alguns fatos que levaram o trabalho de Freud a tocar nas questões
da linguagem até chegarmos ao inconsciente lacaniano. Segundo Forrester (1980),
os trabalhos de Freud sobre a afasia serão muito importantes para o icio da
relação entre linguagem e psicanálise, pois as pesquisas do médico alemão
chegaram à formulação das noções de consciente, pré-consciente e inconsciente. A
descoberta de Freud sobre o inconsciente se deu pela sua originalidade, ou seja, de
tratar um problema pelo viés até então reservado aos gramáticos: a linguagem, que
muitas vezes o entrava no rol de objetos dos estudos cognitivistas. Freud se
debruça sobre as questões da linguagem, inicialmente pelo viés cognitivista, mas o
desenrolar de suas pesquisas o levaram a uma interpretação psicossocial dos
fenômenos da linguagem.
A nosso ver, a dicotomia que Freud propõe sobre a diferença entre
pensamento e linguagem se importante, e trará subsídios para a construção da
noção de inconsciente. Tal qual fez Althusser com a teoria marxista, ao realizar uma
releitura pelo viés do estruturalismo saussuriano, Lacan o fatambém a partir de
uma releitura de Freud.
O próprio Freud distinguia o pensamento de sua representação verbal e
examinava as diferenças que apareciam quando o processo exerce sua
influência tanto sobre as representações da palavra quanto da coisa. No
entanto, essa forma de evocar os "encadeamentos de pensamento" dava
cada vez mais o sentimento de que tais encadeamentos eram sempre
suscetíveis de tradução pelos encadeamentos verbais; certamente, a
impressão que ele tinha era de que existia um equivalente na cadeia verbal
sem solução de continuidade, porque ele chegava freqüentemente a
descrever tal cadeia como possuidora de uma gramática, possuidora
também de propriedades da linguagem, por exemplo, o duplo sentido. Os
processos que ele considera específicos, como o trabalho do sonho
condensação, projeção, etc. apresentam, com os procedimentos
estritamente lingüísticos (tais como a metáfora, metonímia, tropos, etc.)
estreitas semelhanças. (FORRESTER, 1980, p. 46-47) (tradução nossa)
40
40
Lui-même [Freud] distinguait la pensée de sa représentation verbale et examinait les différences qui
apparissent lorsque le preocessus exerce son influence aussi bien sur les représentations de mot que
sur les représentations de chose. Mais sa façon d'évoquer les "enchaînements de pensée" donnait à
105
Apesar de não dizer, Freud dava os indícios de que o inconsciente se
estrutura na forma de uma linguagem, e Lacan perceberá essa possibilidade de
interpretação através do pensamento estruturalista. As relações entre a AD e essas
releituras, como fora dito alhures, explicam os componentes psicanalíticos de seus
conceitos.
o nos esqueçamos de que a intuição que teve Freud no curso dos anos
1890, segundo a qual a psicose seria uma transposição do inconsciente
sobre o pré-consciente, demonstrava que a via da linguagem se
encontraria invadida pelo inconsciente. (idem, p. 114)
41
Assim, a condição para existência do inconsciente é a de que exista
linguagem capaz de estruturar não só o pensamento, mas tamm a sua negação,
tamm o impensado. É por isso que o pensamento de Freud irá transbordar na
encruzilhada da AD de forma a permitir uma compreeno mais pxima da
realidade psicossocial em que se encontram a faculdade da linguagem e as
competências lingüísticas no sentido amplo.
O inconsciente deixa de ser uma zona abissal povoada de monstros,
impossível de ser compreendida; o "débordement" do inconsciente no pré-
consciente permitirá não ao analista do discurso, mas ao psicólogo, psicanalista,
psiquiatra compreender alguns males psíquicos e processos sócio-psíquicos ligados
à constituição das psiques individuais e coletivas. Não se trata mais de um sujeito
uno, único, indivisível, portador de uma identidade nata ou construída por si mesma,
estamos diante de uma virada no estudo das ciências humanas que considerará o
sujeito como resultado da intersubjetividade, ou seja, quando um indivíduo vem ao
chaque fois le sentiment que ces enchaînements étaint toujours susceptibles d'être traduit par des
enchaìnements verbaux; on a pour tout dire l'impression qu'il les concervait comme ayant pour
équivalent une chaîne verbale sans solution de continuité, car il lui arriva fquemment de les décrire
comme possédent une grammaire ainsi que certains caracteristiques propres au langage, par
exemple le double sens. Les processus qu'il voyait comme spécifiques du travail du rêve
condensation, déplacement, etc. Psentent avec les procédés strictement linguistiques (tels que
métaphores, métonymies, tropes, etc.), d´étroites ressemblances."
41
Nous n'oublions pas l'intuition qui fut celle de Freud au cours des années 1880, et selon laquelle la
psychose aurait été un débordement de l'inconscient dans le préconscient, la voie du langage elle-
même se trouvant envahie par l'inconscient.
106
mundo, as relações estão postas entre outros indivíduos, e a teia de tais relações,
através do discurso, constituirá esse indivíduo em sujeito.
Como conceber o inconsciente freudiano? Humildemente tentaremos
sintetizar uma possível resposta, embora sabendo que correremos o risco do
reducionismo: mas não podemos deixar de tratar de tão importante tema, apesar de
nossas limitações. Em seu artigo de 1915, intitulado O inconsciente”, Freud (1969)
inicia pressupondo o inconsciente como um elemento subjacente:
Como devemos chegar a um conhecimento do inconsciente? Certamente,
só conhecemos como algo consciente, depois que ele sofreu
transformação ou tradução para algo consciente. A cada dia o trabalho
psicanalítico nos mostra que esse tipo de tradução é possível. (FREUD,
1969, p. 191)
Esse é praticamente o trabalho que o analista do discurso desempenha ao
tentar mostrar como a materialidade do sentido, envolvida em sua cadeia, em sua
trama, desempenha tal papel, praticamente o de trazer à tona o subjacente do
ideológico, ou seja, daquilo que ainda ignoramos por trás da “letra” conforme o
esquecimento número 1 ao qual se refere cheux (1995). No percurso de Freud, o
importante não foi definir o inconsciente, mas identificar sua existência, haja vista
que a definição, por si só, o responde a uma dada realidade empírica. O que se
aproxima de uma resposta seriam somente suas manifestações, ou seja, sabemos
que o inconsciente existe e sua existência é necessária e legítima”, e ainda
segundo Freud,
Ela é necesria porque os dados da consciência apresentam um número
muito grande de lacunas tanto nas pessoas sadias como nas doentes
ocorrem com freqüência atos psíquicos que só podem ser explicados pela
pressuposição de outros atos para os quais, não obstante, a consciência
não oferece qualquer prova. [...] nossa experiência diária mais pessoal nos
tem familiarizado com idéias que assomam à nossa mente vindas não
sabemos de onde, e com conclusões intelectuais que alcançamos não
sabemos como. (FREUD, 1969, p. 192)
A noção de inconsciente, que se aproxima do seu aniversário de um século,
adquiriu estatuto de doxa”, ou seja, popularmente podemos ouvir pessoas
107
falarem do inconsciente ou subconsciente na rua, confundindo seus conceitos e
atribuindo diferentes sentidos, como, por exemplo, ao se discutirem doenças
somáticas e se lhes atribuir ao “subconsciente”.
A prova do inconsciente de que fala Freud é indireta, sendo perceptível
através de indícios da análise da linguagem dos sujeitos. Da mesma forma, nós
tamm tivemos experiências muito produtivas nesse sentido: em diferentes
oportunidades, lidando com diferentes alunos (cursos de Letras, Ensino Médio,
Administração e em conferências) apresentamos a frase seguinte citada alhures
neste trabalho:
1) Mais o fato mais intrigante é que independente de ser rico ou pobre, branco ou
negro, inteligente ou ignorante, [atos de violência] vem sendo praticados sem
nenhuma neglincia.
Após apresentarmos tal frase, perguntamos ao auditório qual é a percepção
que tinha, e a grande maioria dos interpelados criticam a estrutura non sens da
frase, seus problemas de ortografia e sintaxe. Poderíamos dizer que a atenção do
auditório está focada nesses aspectos descritos, e é por isso que eles não percebem
o paralelismo branco, rico, inteligente com negro, pobre, ignorante. Em nossa
opinião, a atenção e o “esquecimento” do paralelismo o posturas cognitivas
influenciadas por um inconsciente, construído pela alteridade, ou seja, ao longo de
nossa formão escolar, em língua portuguesa, fomos instruídos a detectar o erro, a
enxergar a forma pela forma e não a relação entre “forma” e “conteúdo” grosso
modo. Nossa formão discursiva, com relação à questão do preconceito racial, se
mostra na operação de disjunção entre forma e conteúdo, aliás, cria uma espécie de
“esquizofrenia de letramento”, como no caso em que o estudante, ao dialogar com
seu professor a respeito de um texto corrigido, argumenta haver sentido em seu
trabalho.
108
O professor então contra-argumenta asseverando que o “texto o diz isso
que o aluno pretendia dizer e este retruca: “mas é isso que eu penso”. Daí o
esquecimento n. 2, ou ainda, preferimos chamar de fantasia, em que o sentido
parece óbvio, e no qual todos os sujeitos se baseiam, ou seja, todos os sujeitos
apresentam, de uma certa forma, um quadro de “esquizofrenia”, de não coincidência
do dizer com o querer dizer.
Ao expormos de maneira gráfica o paralelo entre negro” e “branco” da frase
citada, todos os alunos então reconhecem o paralelismo como uma expressão de
preconceito e tamm que esse sujeito não teve a “intenção” (consciente) de
parecer preconceituoso ou dizer algo preconceituoso, mas o disse
inconscientemente (sem intenção consciente). Daí advém outro fator que levamos
ao conhecimento desse auditório: a falta de percepção do paralelismo entre branco”
e “negro deu-se porque o auditório também esteve afetado por esse mesmo
discurso inconsciente do autor da frase que faz apagar o sentido.
Ao trazer essa discussão sobre a frase, realizamos, como pros Freud, ou
seja, uma operação na qual trazemos do inconsciente para o consciente um
conteúdo cognitivamente desconhecido ao conhecimento. Esse método não se
tratou de uma cura, mas de um momento de aprendizagem para esses sujeitos
com os quais lidamos.
Freud tratará ainda do inconsciente pelo viés dos impulsos, dos instintos e,
nesse momento, a linha da AD se distancia da psicanálise freudiana e tende para
mais próximo daquilo que Lacan abordou; mas antes de prosseguirmos nesta
discussão, retomamos de Freud (apud FORRESTER 1980, p. 107-108) (tradução
109
nossa)
42
o esquema mental no qual analisa as percepções, consciente, pré-
consciente e inconsciente:
O que de essencialmente novo em minha teoria é a idéia de que a
memória está presente não de uma forma, mas de várias e que ela se
compõe de diversos “signos”. O esquema a seguir ilustra essa maneira de
ver:
I II III
Percep. Percep. S. Incs. Pré-cons. Consc.
x x x x x x x x x x
x x x x x x
x
Percep. São os neurônios onde aparecem as percepções e aos quais se
ligam o consciente, mas que não se conservam em si mesmos qualquer
traço do que se lhe chega porque o consciente e a memória se excluem
mutuamente.
Percep. S. constitui o primeiro registro das percepções, de fato incapaz de
tornar-se consciente e organizado seguindo as associações simulneas.
Incs. (o inconsciente) é o um segundo registro ou uma segunda transcrição
[...]. Os traços do inconsciente corresponderiam talvez a algumas
lembranças conceituais e seriam também inacessíveis ao consciente.
Précs. (o pré-consciente) é a terceira transcrição, ligada às representações
verbais e correspondente ao nosso “eu” oficial. As investidas deslizantes do
Precs. tornam-se conscientes segundo certas leis. Tal consciência
cogitativa secundária, que aparece mais tardiamente, é ligada
provavelmente à reativação alucinaria de percepções verbais; [...].
43
É claro que a definição de inconsciente nesta citação é muito pobre em
relação ao que Freud diz em seu artigo de 1915, pois o esquema acima data de
42
Fomos obrigados a fazer uma citação de citação, pela dificuldade de encontrar o texto traduzido do
alemão para o português, como se trata de citação também integral no texto de Forrester acreditamos
na sua fidelidade.
43
Ce qu’il y a d’essentiellement neuf dans ma théorie, c’est l’ie que la mémoire est présente non
pas une seule mais plusierurs fois, et qu’elle se compose de diverses sortes de « signes ». [...]
Percp. Ce sont les neurenones apparaissent les perceptions et auxquels s’attache le conscient,
mais qui ne conservent en eux-mêmes aucune trace de ce qui est arrivé car le conscient e lamoire
s’ecluent mutuellement.
Percp. S. constitue le premier enregistrement des perceptions, tout à fait incaplable de devenir
conscient et aménagé suivant les associantions simultanées.
Inc. (l’inconscient) est un second enregistrement ou une seconde transcription [...]. Les traces de
l’inconscient orrespondraient peut-être à des souvenirs conceptuels et seraient aussi inaccessibles au
conscient.
Précs. (le préconscient) est la troisième transcrition, liée aux représentations verbales et
correspondant à notre moi officiel. Les investissements découlant de ce Pcs. deviennent selon
certaines lois. Cette conscience congitative secondaire, qui apparaît plus tradivement, est liée
probablement à la réactivation hallucinatoire de presprésentations verbales ;[...].
110
1896, mas o que nos chamou a atenção foi a noção de pré-consciente, que se
inscreve na instância da enunciação, ou seja, a enunciação não é consciente, nem
inconsciente, mas pré-consciente, e talvez seja esse o aspecto que permite com que
os sujeitos se enunciem em 1ps, 1pp, ou np. Ao longo de nossa análise,
percebemos que a referência sica ou subjacente (no sentido de ser o suporte das
demais) é a não-pessoa, porque ela existe antes da pessoa que opera no pré-
consciente, a não-pessoa é o Outro, o inconsciente imerso nos outros dizeres, como
os dados estatísticos apontarão mais adiante.
Após Freud lançar as bases do status da linguagem no campo da psicanálise,
tirando-a das reflexões meramente cognitivistas (no sentido lato do termo), Lacan
nos apresenta uma releitura de Freud que ireforçar as bases da AD no que diz
respeito à relações da entre sujeito, língua, linguagem e o próprio sentido. Dois
textos de Lacan serão fundamentais para esta reflexão: Função e campo da fala e
da linguagem em psicanálise e A insncia da letra no inconsciente ou a razão
desde Freud ”, sendo que se trata de um relatório e um artigo, respectivamente,
reunidos em Escritos (1988).
Afirmamos, quanto a nós, que a técnica não pode ser compreendida, nem
portanto corretamente aplicada, se se desconhece os conceitos que a
fundam. Nossa tarefa será de demonstrar que esses conceitos o tomam
seu sentido pleno senão ao se ordenarem num campo de linguagem,
senão ao se ordenarem à função da fala. (LACAN, 1988, p. 111)
Não vemos aqui senão uma retomada de Freud, que, segundo Forrester,
destaca os importantes progressos feitos sobre a questão da afasia. No entanto,
Lacan irá retomar e destacar a fantasia do real provocada pela linguagem, de modo
que a “alucinação verbal” que para cheux será a ilusão necessária acontece
em virtude de o ego ser o lugar da fantasia do real, daí a regressão terapêutica se
torna um momento de atualizar essa fantasia. Nela, não fala de um real, mas de uma
discursivizão sobre o passado, ou seja, ao recontar suas experncias, o paciente
111
não relata o real, mas constrói um discurso sobre ele.
É na versão do texto que o importante começa, o importante do qual Freud
nos diz que é dado na elaboração do sonho, isto é, em sua retórica. Elipse
e pleonasmo, hipérbato ou silepse, regressão, repetição, aposição, tais são
os deslocamentos sintáticos, metáfora, catacrese, antonomásia, alegoria,
metonímia e sinédoque, as condensações semânticas, onde Freud nos
ensina a ler as inteões ostentatórias ou demonstrativas, dissimuladoras
ou persuasivas, retorsivas ou sedutoras, com que o sujeito modula seu
discurso onírico. (idem, p. 132)
Tal perspectiva reforça mais a idéia de que a materialidade do discurso
constitui, revela, interage com o inconsciente, ou seja, este não se forma em zonas
etéreas, mas na realidade da letra, na sua materialidade lingüística.
Por fim, sem o inconsciente é impossível ter linguagem, e mesmo ter uma
máquina de discurso, o projeto primeiro de Pêcheux, o qual foi abandonado, o é
mera ficção, pois teoricamente é possível criar uma máquina que analise discurso e
produza discurso; o problema é que tal máquina deveria ter, em seus logaritmos,
todos os cálculos necessários à constituição do inconsciente, sem o qual não é
possível construírem-se o discurso interior (BAKHTIN, 1997) e o exterior. Uma
máquina do discurso deveria ser capaz de instaurar mais que o inconsciente: a
própria alteridade. Como veremos adiante, o inconsciente e o Outro se constituem
mutuamente, pois ambos são produtores/produto da linguagem.
3.2 O sujeito
O conceito de “sujeito”, conforme Abbagnano (1998) se funda sob dois
aspectos: o conceito herdado da cultura clássica, que o toma como objeto de que se
fala; o segundo, oriundo da filosofia moderna a partir de Kant , o toma como
“ego”, ou o indivíduo cognoscente. São ambas noções que subsistem em diferentes
pensamentos, ou conjunto de saberes como é o caso da gramática ao tratar das
112
estruturas sintáticas, ou ainda na doxa, ao se pensar um indivíduo da vontade (o
sujeito enquanto ser que vive, pensa, ocupa uma posição social etc.). No entanto, a
noção de sujeito a qual pertence a AD não é das mais fáceis de se compreender e
nem das mais ortodoxas em se pensando na ilusão de subjetividade. Além do mais
não se tem um sujeito apenas, em se tratando da AD, mas vários desdobramentos
de tal sujeito, como é o caso do próprio título de nossa tese ao tratar do sujeito do
enunciado.
A noção de sujeito irá nos permitir ainda a construção de outros significados
não menos importantes. O primeiro é o da subjetividade, que já foi debatido em outro
momento pelo viés enunciativo, mais uma vez rebatendo a doxa de que a
subjetividade diz respeito ao mundo interior. Assim, faremos a distinção entre sujeito
do discurso, sujeito do enunciado, sujeito-enunciador ou da enunciação, de modo a
nos situarmos em nossa pesquisa.
Segundo Charaudeau e Maingueneau (2004, p. 457), “o sujeito do discurso é
uma noção necessária para precisar o estatuto, o lugar e a posição do sujeito
falante (ou do locutor) com relação a sua atividade linguageira”, ou seja, não é
possível falar de linguagem sem que se tenha com clareza o papel de seus actantes,
como tamm a clareza de que instância esse ser portador da palavra fala e como o
faz. Entendemos que nesse fazer haja mais do que comunicar, mais do que
enunciar, mais do que interagir. O falar de um indivíduo que é convocado a ser
sujeito se inscreve no intervalo de ões/processos que vão desde de as funções
biológicas do aparelho fonador até as instâncias do efeito de sentido, passando por
aspectos bio-psico-sociais deveras complexos. Nesta situação da discussão é mais
fácil dizer o que o é sujeito para a AD até que se consiga chegar ao que é o
sujeito para ela. Assim, o sujeito o é um ser individual, dono do seu dizer,
113
juridicamente capaz, o é um ser empírico denominável e detectável da massa de
seres humanos.
[...] sob a evidência de que “eu sou realmente eu” ( com meu nome, minha
família, meus amigos, minhas lembranças, minhas idéias”, minhas
intenções e meus compromissos), o processo de interpelação-
identificação que produz o sujeito no lugar deixado vazio: “aquele que...”,
isto é, X, o qüidam que se achará aí [...] (PÊCHEUX, 1995, p. 159).
Essa definição dada por cheux, remete a sua feliz analogia com o “Barão
de Münchhausen” que se suspendeu puxando-se pelos próprios cabelos. A analogia
demonstra a ilusão do sujeito que se auto-constitui, tal pensamento da “máquina
discursiva” na qual os sujeitos eram totalmente assujeitados em sua primeira fase
(AD-1, cf. PÊCHEUX, 1983, in GADET E FUCHS, 1993). Tal posicionamento levou a
AD a um percurso que começara na sobredeterminação do sujeito: “Compreende-se
melhor, agora, de que modo o que chamamos domínio de pensamento’ se constitui
sócio-historicamente sob a forma de pontos de estabilização que produzem o sujeito,
com, simultaneamente, aquilo que lhe é dado ver, compreender, fazer, temer,
esperar, etc.” (PÊCHEUX, 1995, p. 161), e mais:
Somos, assim, levados a examinar as propriedades discursivas da forma-
sujeito, do “Ego-imaginário”, como “sujeito do discurso”. observamos
que o sujeito se constitui pelo “esquecimento” daquilo que o determina.
Podemos agora precisar que a interpelação do indivíduo em sujeito de seu
discurso se efetua pela identificação (do sujeito) com a formação discursiva
que o domina (isto é, na qual ele é constituído como sujeito): essa
identificação fundadora da unidade (imaginária) do sujeito apóia-se no fato
de que os elementos do interdiscurso [...] que constitui, no discurso do
sujeito, os traços daquilo que o determina, são reinscritos no discurso do
próprio sujeito. (idem, p. 163)
O sujeito, ainda na AD-1 e AD-2 é, para Pêcheux, altamente determinado sem
possibilidade de sair de dentro dos discursos, preso em suas determinações ou
pelas determinações interdiscursivas. Para outros teóricos, a sobredeterminação do
sujeito é deveras radical. Já há um consenso entre analistas do discurso que vêem o
sujeito nem totalmente determinado nem totalmente livre, o que faz muito sentido,
114
pois os focos de resistências aos discursos são comuns, do contrário, todos os
sujeitos seriam autômatos, sem resistência, semliberdade”, mesmo que vigiada.
Para Charaudeau, no quadro de uma problemática da alteridade, o sujeito
do discurso é, ao mesmo tempo, sobredeterminado mas somente em
partes pelos condicionamento de ordem diversas, e livre para operar
suas escolhas no momento de focalizar seu discurso. Ele é, ao mesmo
tempo, coagido pelos dados da situação de comunicação (contrato) que o
conduzem e se comportam discursivamente de uma certa maneira, e livre
de se individuar, o que o leva a usar estratégias. (CHARAUDEAU;
MAINGUENEAU, 2004, p. 458).
Lembramos mais uma vez Possenti (1996, p. 37) que, ao tratar dos sujeitos
divididos entre a prisão e a liberdade vigiada, considera-os ativos em meio às
produções linguageiras, como citado anteriormente.
Não se trata aqui de apenas um meio termo ou uma posição pacífica para
agradar a gregos e troianos, mas de uma posição verdadeiramente teórica e
fundamentada no sujeito ativo, porque “certamente domínios em que os sujeitos
sofrem efeitos, mas há outros em que sua atuação é demandada e verificável
(idem, p. 44). Nossa posição sobre o sujeito ativo é a noção próxima de autoria a
qual defende Baronas (2001) segundo a qual o autor é o sujeito capaz de transitar
por diferentes formões discursivas, como sujeito que consegue escapar de uma
FD mesmo que seja para ficar sob a custódia de outra. Por isso, acreditamos que
seja possível, na investigação, encontrar até onde vai o efeito de um discurso
interpelador, e onde está a vontade do sujeito em mobilizar determinado elemento
da língua para alcançar o efeito desejado, o que permitiria deixar existirem formas
diferentes e criativas de enunciação. No fundo, os sujeitos são polifônicos e
dialógicos, porque entram em contato com outros sujeitos produtores de outros
enunciados assumindo-os, repelindo-os ou reproduzindo-os, mas direcionado-se por
uma relativa liberdade, condicionada por constrangimentos dos diferentes discursos
subsumidos.
Assim, o termo “sujeito”, para nós, será o fruto do trabalho ideológico de
115
subjetivação, conforme Foucault (REVEL, 2005, p. 82):
O termo “subjetivação” designa, para Foucault, um processo pelo qual se
obtém a constituição de um sujeito, ou, mais exatamente de uma
subjetividade. Os “modos de subjetivação” ou “processo de subjetivação”
do ser humano correspondem, na realidade a dois tipos de análise: de um
lado, os modos de objetivação que transformam os seres humanos em
sujeitos o que significa que somente sujeitos objetivados e que os
modos de subjetivação são, nesse sentido, práticas de objetivação; de
outro lado, a maneira pela qual a relação consigo por meio de um certo
número de técnicas permite constituir-se como sujeito de sua própria
existência.
Nesse sentido podemos nos atrever a perceber proximidades entre Foucault e
Pêcheux ao verem os sujeitos como seres em construção; daí o fato de as técnicas
de subjetivação não serem interiores, mas exteriores e próprias de cada sociedade e
de cada época. Considerando-se essa compreensão de sujeito, adotamos, para
nossa pesquisa, o conceito de que o sujeito é o humano ou o indivíduo que assume
uma dada posição que lhe confere determinados saberes, como por exemplo, o de
individualidade, de identidade de grupo. Ou seja, trata-se de um ser que diz “eu”
porque a noção de individualidade está subjacente e foi construída socialmente,
tendo como princípio as relações que os homens sustentam entre si e com as suas
condições de produção.
Essa interpretação da realidade a partir das estruturas enunciativas sobrevive
pelo campo simbólico, e como a ngua com todos os seus aspectos estruturais
comporta a existência do simlica nos diferentes níveis (morfológicos, sintáticos,
semânticos), e além disso, nos níveis supra-frásticos e segmentais, tem-se o maior e
mais poderoso mecanismo de produção de sentido. No caso deste trabalho, os
processos de enunciação estão em relação com a constituição do outro, do
diferente, relacionado ao histórico dos negros no Brasil, ou seja, a maneira da
enunciação, da referenciação possíveis em língua portuguesa do Brasil serão os
116
indícios do discurso preconceituoso.
Mais adiante, veremos, através dos dados levantados, que o inconsciente
está não só pressuposto, mas legível através da superficialidade material e sempre
tomado em relação à alteridade:
Para poder trazer à tona seu material, Lacan assume que o inconsciente se
estrutura como uma linguagem, como uma cadeia de significantes latente
que se repete e interfere no discurso efetivo, como se houvesse sempre,
sob as palavras, outras palavras, como se o discurso fosse sempre
atravessado pelo discurso do Outro, do inconsciente. (MUSSALIN;
BENTES, 2004, p. 107)
Daí, no pensamento lacaniano, termos as relações de oposição e de
complementaridade na formão dos sujeitos que são clivados, cindidos,
preenchidos pelo Outro. A questão para Freud ainda era muito indicial, como atesta
Forrester (1980), mas suficiente para inaugurar as discussões.
Mais recentemente, Paveau (2006) uma importante abordagem à
“memória” ao falar sobre o conceito de “pré-discurso e revela que a
intersubjetividade, mais do que um conjunto de indivíduos construídos,
representa, na verdade, um conjunto de saberes pré-discursivos, aos quais os
discursos se remetem de maneira connua. A nosso ver, esse processo não se
de maneira direta, mas através de referências oblíquas e, muitas vezes apagadas,
pela formação ideológica, como quando exemplificamos anteriormente com a frase
“1”. Agora temos a deixa para entrarmos em outro aspecto da intersubjetividade: o
da identidade e da não-identidade.
3.3 A identidade
No campo da filosofia, a designação “identidade” relaciona-se a pelo menos,
três conceitos distintos. Segundo Abbagnanno (1998), a primeira definição vem de
Aristóteles, e se baseia na noção de unidade, ou seja, os elementos têm identidade
117
desde que entre si sejam unidos por uma mesma característica; a segunda forma é
herdada de Leibniz, baseada na igualdade de função, ou seja, se um elemento
substitui o outro sem lhe alterar o valor de verdade, tem-se uma identidade entre os
elementos; finalmente, a terceira visão é menos dogmática e é assumida por
diferentes lógicos da contemporaneidade. Nessa concepção, prevê-se que a
identidade pode ser estabelecida e reconhecida segundo os critérios de valores
convencionais.
Partindo da etimologia do termo, vindo do latim, em que idem, a priori significa
o mesmo, o homólogo, o igual, as três concepções acima m razão: o elemento
identitário faz parte do uno, ou então substitui outro elemento em uma mesma
função (e função pode ser exemplificada por uma fórmula matemática ou uma frase)
e tamm uma cultura pode identificar os iguais, como o caso de nossa cultura que
aboliu a escravatura identificando que todos os homens têm direito à liberdade e, por
isso, são “iguais”. Já, para a AD, a noção se aproxima dos conceitos sociológicos e
Charaudeau e Maingueneau (2004) alertam para a dificuldade que é definir o termo,
mas ressaltam que a noção de identidade deve estar relacionada com outras duas:
sujeito e alteridade, o que aproxima a AD de questões mais etnológicas, ou seja, da
terceira concepção. Então podemos conceber a identidade como igualdade entre
elementos (sujeitos) distintos (alteridades), unidos por traços de semelhança e
separados por diferenças, conforme o que convencionalmente tem sua raiz na
história e na ideologia, ou seja, conforme o discurso. Não é difícil de se perceber tal
fenômeno em nossa cultura, basta vermos como as práticas de si mesmo (no
sentido foucaultiano), com relação ao poderes instituídos, se dão, por exemplo, na
articulação existente nos dois sentidos do documento de “identificão” de um
cidadão (seja ele de qualquer nação). No caso brasileiro, a Carteira de Identidade
118
Nacional, entre outros documentos, identifica o indivíduo a um grupo, ou seja, o dos
brasileiros natos e essa identificação já lhe confere uma imagem de sujeito; por outro
lado, tamm o individualiza como um cidadão com um nome, sobrenome, filiação,
naturalidade etc; assim, o sujeito se identifica com os seus iguais e se distancia dos
seus diferentes. Não nos convém entrar no mérito da identidade pessoal, nem
tampouco da coletiva em sentido estrito, mas é possível, sim, relacionarmos os
sujeitos às múltiplas identidades que os constituem pelas relações do igual e do
diferente, que são sempre pautadas no Outro:
Qual é, pois esse outro a quem sou mais ligado que a mim, visto que no
seio mais consentido de minha identidade a mim mesmo, é ele quem me
agita? Sua presença o pode ser compreendida senão a um segundo
grau de alteridade, que desde então situa a ele próprio em posição de
mediação em relação a meu próprio desdobramento de mim mesmo como
de um semelhante. Se eu digo que o inconsciente é o discurso do Outro
com O maiúsculo, é para indicar para além onde se prende o
reconhecimento do desejo ao desejo de reconhecimento. (LACAN, 1988, p.
255)
As identidades são construções da linguagem em todos os sistemas
simlicos, sejam eles verbais ou não-verbais. Sobre o eixo da identidade,
pretendemos compreender como os sujeitos das redações expressam sua
identidade, tomando para si os lugares de autores para o vestibular as respectivas
relações. Assim, o branco, o negro, o brasileiro, o estrangeiro são identificações de
grupos que podem ser também identidades de grupos. “Essas identidades adquirem
sentido por meio da linguagem e dos sistemas simbólicos pelos quais elas são
representadas (WOODWARD, 2000, p. 8). Pelo fato de as identidades serem
construídas pelo simbólico, a AD, pode, através de seus métodos e dos diferentes
instrumentos de análise das estruturas lingüísticas (inclui-se aqui a compreensão
das alternâncias) perscrutar os jogos simbólicos constituintes e representantes das
identidades do sujeito, do grupo ou mesmo as outras identidades que o sujeito
“descreve” como o “outro”, uma vez que, basicamente, a identidade é formada por
119
oposições binômicas: negro X branco, católico X evangélico, esquerda X direita;
nesse binômio sempre encontraremos o eu/nós” se opondo a todos os outros. É
claro que, nesse processo, não estamos utilizando o par opositivo como
antagonismo, embora, em determinadas situações, os sujeitos possam ser
antagônicos ou antagonizados socialmente, o que se deve ao fato de que os
binômios são estruturas relacionais e marcadas pela diferença. Daí, nosso esforço,
através do exame das marcas lingüísticas, de perceber o discurso dos informantes
de nosso corpus. “As identidades são fabricadas por meio da marcação da
diferenças. Essa marcação da diferença ocorre tanto por meio de sistemas
simbólicos de representação quanto por meio de formas de exclusão social”.
Woodward (2000, p. 39). Mais adiante a autora define os papéis do social e do
simlico:
O social e o simbólico referem-se a dois processos diferentes, mas cada
um deles é necessário para a construção e a manutenção das identidades.
A marcação simbólica é o meio pelo qual damos sentido a práticas e a
relações sociais, definindo, por exemplo, quem é excluído e quem é
incluído. É por meio da diferenciação social que essas classificações da
diferença são “vividas nas relações sociais. (idem, p. 14)
É preciso ressaltar-se que tais diferenças, como construtos simbólicos, eso
submetidas também à história de como determinadas sociedades se organizam, por
isso a linguagem (como simbólico) é imprescindível para a constituição das
identidades e lembramos também que a linguagem, como aparelho psicossocial, é
transmissora dos discursos que estabelecem as identidades, da mesma forma como
as identidades retransmitem as posições discursivas dos sujeitos. Respostas às
questões como “quem eu sou?” são produzidas no, pelo e para os discursos.
Outro aspecto a ser considerado é que as identidades sobrevivem de suas
representações, ou seja, a identidade é apreendida e está em dinâmica construção a
partir das suas representações ou imagens motivadas principalmente pelas
120
formações ideológicas e pelos interdiscursos. É preciso, ainda, acrescentar-se que,
pensando de modo estruturalista, e isso dá um resultado aparentemente satisfatório,
podemos imprimir as relações opositivas para compreender os processos
identitários. Silva (2000, p. 74) ao introduzir seu artigo, diz que, à primeira vista, a
identidade parece ser concebida por uma “positividade”, enquanto que a diferença
pressupõe uma oposição negativa em si e para com o ser identificado: “eu sou
brasileiro, negro, jovem, heterossexual», em oposição a ela que é italiana, branca,
velha, homossexual”, a cada uma das positividades existe uma seqüência de
negações, por exemplo, a “brasileiro” em oposição a “argentino, peruano, norte-
americano, alemão...”, o que pode ser lido como “brasileiro = não-argentino, não-
peruano, não-norte-americano, não-alemão, não-X”. É por isso que a identidade
carrega em si os traços da alteridade. Como as sociedades se organizam em torno
de seus meios de produção, e em torno de como elas concebem suas realidades, o
jogo entre identidade e diferença serve, muitas vezes, para embasar as relações de
desigualdade entre os sujeitos. Barros (2005) faz uma interessante abordagem entre
os conceitos de “igualdade”, “desigualdade” e “diferença”.
Quando se considera o par 'Igualdade X Diferença' (ou 'igual' x 'diferente'),
tem-se vista algo da ordem das essências: uma coisa ou é igual à outra
(pelo menos em um determinado aspecto) ou então dela difere. [...] o
contraste entre Igualdade e Desigualdade refere-se quase sempre o a
um aspecto “essencial”, mas a uma “circunstânciaassociada a uma forma
de tratamento (mesmo que esta circunstância aparentemente se eternize
no interior de determinados sistemas políticos ou situações sociais
específicas).
Resumindo essa reflexão, podemos exemplificar da seguinte maneira:
homens e mulheres são biologicamente diferentes, mas não necessariamente
desiguais, daí, o fato de o campo das desigualdades ser construído sobre o
simlico, ou melhor, sobre o discursivo, tomando algum assunto, como por
exemplo, afirmar-se que homem dirige melhor que a mulher; ou, no campo do
121
preconceito racial: o branco é mais inteligente que o negro etc. Assim, diferenças, do
ponto de vista biológicas, existem entre os seres humanos em termos de fenotipia
(cor da pele, olhos, cabelos e sua textura; estatura, massa, faixa etária, sexo,
dificuldades físicas etc.), mas dizer que uma ra, uma faixa etária etc. são melhores
ou piores que outras é uma construção simbólica, logo, discursiva.
No entanto, é preciso lembrar que tanto a desigualdade quanto a igualdade
tamm são elementos que podem construir negativa ou positivamente relações
sociais. Um exemplo que Barros (2005) cita era o fato de os europeus tratarem as
tribos africanas com igualdade, ou seja, o respeitar as diferenças étnicas
existentes entre elas, ou ainda se valer dessas mesmas diferenças para que uma
tribo perseguisse a outra para escravizá-la.
Chegamos, assim, ao termo do que pressupomos como fundamentação
dessas relações. O primeiro aspecto é que o componente psíquico, a nosso ver,
revela mais do outro do que de si, pois somos sujeitos constituídos pelas
intersubjetividades, visão compartilhada por Freud, Lacan, Bakhtin, Authier-Revuz
etc. O segundo é que nem sempre esses processos estão sob a luz de uma
consciência que enxerga a tudo e que tem clareza do que “pensa” e do que diz;
assim, entramos no inconsciente que fala e nos processos de esquecimento aos
quais se refere Pêcheux. Em terceiro lugar, a posição do outro não é só uma posição
socialmente estabelecida, muito pelo contrário, o que o “eu” e “outro” ocupam são
imagens ou representações de relações de identidades e de diferenças construídas
pela linguagem em relação ao que a formação ideológica e à memória, ou o pré-
discurso já disseram alhures.
122
PARTE II
OPERACIONALIZAÇÃO E ANÁLISES
CAPITULO IV
METODOLOGIA E OPERACIONALIZAÇÃO DE CONCEITOS
Findas as discussões sobre a questão teórica, desejamos apresentar as
ferramentas de análise para podermos discutir os textos. Assim, este capítulo tratará
da operacionalização de conceitos, bem como de apresentar a metodologia e criar
um instrumental analítico minimamente coerente com as discussões. Para tanto,
iremos aproximar as teorias adotadas da metodologia aplicada, depois
apresentaremos a constituição do corpus e seus diferentes grupos e, logo em
seguida, as ferramentas computacionais que serão utilizados para a análise dos
elementos.
4.1 As motivões teóricas sobre a prática da análise
Para sistematizar as relações entre os conceitos estudados nos capítulos
anteriores e a nossa prática de análise é preciso um movimento interpretativo, até
certo ponto, incomum em AD. No capítulo 1, expusemos as razões pelas quais
adotamos a AD como fundamento, ponto de partida para nossas reflexões e quando
iniciamos as discussões teóricas falamos sobre as três epistemes como meio de
justificar essa prática analítica. Dessas três epistemes e isso se explica também
pelo que pensava cheux sobre a Lingüística como ponto de convergência para o
seu projeto , tomamos os aspectos da materialidade do sentido inscrito nas
estruturas semânticas, sintáticas e enunciativas, melhor dizendo a Lingüística e o
123
Estruturalismo como a porta de entrada para a Enunciação em nosso trabalho. E a
própria Enunciação acaba por ter tamm um papel condensador do fenômeno, o
que possibilitou que enxergássemos nessa possibilidade uma AD voltada para o
texto mais do que as ADs que se concentram na história e na psicanálise. Talvez
essa nossa excessiva preocupação com a materialidade se explique pela nossa
formação e convicções, uma delas é a de que devemos fazer mais análise que
discurso.
Como se ve mais adiante, os conceitos chaves estudados nos capítulos
anteriores se refletem na análise de maneira, muitas vezes, implícita, necessitando
de uma explicação mais esclarecedora. O primeiro desses esclarecimentos diz
respeito a dois pontos bastante relevantes: o papel da estatística textual na Análise
do Discurso e na enunciação. Primeiramente, a estatística, como es sendo
aplicada neste trabalho, é mais um método que uma teoria, pois os dados apontam
para tendências que devem ser lidas e interpretadas. Logo, não nos cabe decidir
sobre a validade ou não da interpretação, mas sobre sua verossimilhança com a
realidade do fenômeno. Assim, ao dizermos que a população de textos analisados
apresenta uma determinada propensão à utilizão de uma modalidade enunciativa,
relacionada com uma certa formão discursiva, estamos diante de uma
generalização pautada em dados.
Da mesma forma, o comportamento enunciativo, as recorrências de
determinado enunciado ou termos, a maneira de se referenciar os objetos “negro” e
“branco” em sua distribuição estatística apontam para a idéia de que um grupo de
sujeitos está inscrito em uma determinada formão discursiva; logo, isso implica em
que temos a demonstração efetiva e material da inscrição desses sujeitos, não
apenas uma vaga idéia por um gesto interpretativo, muitas vezes intuitivo. As
124
indicações estatísticas e as interpretações sobre as estruturas sintáticas e
semânticas elaboradas nesta pesquisa refletem também os movimentos do
inconsciente sobre a enunciação e a referenciação instituídas pelos sujeitos unidos
ou separados por diferentes formões ideológicas. Ademais, os gráficos nos
capítulos que se seguem procuram ser suficientemente ilustrativos dos dados, na
medida do possível tentamos compreendê-los e interpretá-los como indicadores de
determinados comportamentos materiais e discursivos.
Será a articulação entre a AD e a Enunciação que acabaapontando para
fatos novos sobre a própria enunciação e como os sujeitos, diante de determinadas
condições, acabam mobilizando o pré-discurso em função de suas formações
discursivas. O que torna a nossa tese diferente e até pretensiosa é o fato de
focalizarmos de maneira insistente a materialidade do discurso e para ela fazermos
convergir diferentes perspectivas e também a metodologia da estatística textual.
4.2 Sobre a coleta de dados e grupos de controle
Inicialmente, a coleta de dados foi realizada a partir de um processo seletivo
para os cursos superiores da Faculdade de Jandaia do Sul, no Estado do Paraná
(anexo I). Ressalte-se que a autorização do uso das redações para a pesquisa foi
previamente aceita pelos candidatos, haja vista que o edital do processo seletivo
prevê essa possibilidade e, assim, preservamos em sigilo as identidades dos
informantes. Além disso, todos os textos anexos foram digitados, de modo a excluir
qualquer vestígio de caligrafia, ou outro tipo qualquer de identificação.
Coletamos, primeiramente, 190 textos que tratavam do tema das cotas
raciais. Conforme fora explicado em outro momento, no entanto, no decorrer de
nossas análises, percebemos a necessidade de desenvolvermos pelo menos a
125
análise de outros grupos de controle para assegurar o rigor necessário da pesquisa
e poder ter um parâmetro seguro para as comparações. Esse esforço tamm se
deu para tentarmos controlar as possíveis variantes, como, por exemplo: contexto
imediato de produção e tema. No primeiro aspecto, consideramos que a situação de
avaliação (vestibular) pudesse provocar o enunciador a enunciar em outras pessoas,
o que tornaria os dados muito parciais, d então nos decidirmos por coletá-los
tamm em outras situações enunciativas; sendo assim, um segundo grupo de
textos foi produzido por estudantes do primeiro ano de um curso superior da
FAFIJAN. Não satisfeitos ainda, em virtude da área geográfica e das condições
socioeconômicas dos sujeitos que prestam vestibular ou estudam na FAFIJAN,
decidimos coletar textos tamm em um grupo do cursinho preparatório da UEL.
Finalmente, o quarto e último grupo de controle foi coletado para observarmos se o
tema proposto tinha influência ou não sobre o fenômeno analisado, pois o quarto
grupo foi constituído de textos de redação de vestibular, cujo tema era as
semelhanças e diferenças entre o crime organizado e o terrorismo” (anexo II).
Assim, temos a seguinte tabela que resume o número de textos por grupo:
Tabela 1 - Quantidade de textos por grupo
Grupo A Grupo B Grupo C Grupo D Total
190 71 110 93 464
Os grupos foram organizados de maneira a dar conta das seguintes
condições comparativas:
a) Entre A e B podemos ter ou não as diferenças de circunstâncias de
produção, em A houve o fator “prova”, em B o fato de a produção de
texto ter sido realizada fora das circunstâncias do vestibular;
b) Entre A e B um hiato de tempo de aproximadamente 4 anos. Além
do fator tempo, existe o detalhe de termos sujeitos distintos, embora de
perfil semelhante, d o fato de podermos explorar supostas diferenças
ou semelhanças entre os grupos que nos indiquem a participação na
mesma FD ou algum distanciamento dela;
126
c) Entre o grupo A e C, teremos a diferença geográfica, mas o perfil social
é muito semelhante, sendo que C pertence à grande Londrina, em sua
maioria, enquanto A pertence às cidades de Jandaia do Sul e
Apucarana, e às pequenas cidades circunvizinhas.
d) Entre o grupo A e D, existe a semelhança no que diz respeito à
realização da prova, o que pode excluir a suspeita de que a
alternância é provocada pela pressão da avaliação que faz o aluno
"errar". Além disso, coloca à prova se o tema é suficiente para provocar
ou não o fenômeno.
Vale ressaltar que a princípio, os comandos próspostos poderiam influenciar
nos resultados, como por exemplo, pensarmos que o termos como “política”,
“problema” “exclusão contribuíssem para que os textos falassem apenas de tais
temas. Isso não necessariamente se comprova, não podemos dizer categoricamente
que a presea de um termo seja suficiente ou não para ativar todas as memórias.
Exemplo disso foi que o próprio tema relacionado às “cotasnão apareceu, muito
embora o termo “cota” tamm esteja presente no comando. Outros testes poderiam
ser feitos com as paráfrases dos comandos das propostas, mas ao nosso ver,
pouca probabilidade desse tipo de relação imediata. Nesse caso a memória
discursiva fala mais alto.
4.3 O tratamento dos textos
O tratamento dos textos seguiu passos simultâneos e, algumas vezes,
complexos. Foram procedimentos que julgamos serem bastante materiais, ou
melhor, voltados para a materialidade do discurso. A seguir passamos a descrever
os passos tomados em tais procedimentos.
Primeiramente, os textos foram digitados para que pudessem ser analisados
pelos softwares que descreveremos a seguir. A princípio nhamos por objetivo ser
fiéis à grafia dos informantes sem lhes fazer quaisquer correções, mas não foi
possível por que um dos sistemas, o Lexico3, identificaria como diferentes as
palavras “situação” e “cituassão”, as quais, para os nossos informantes, teriam o
mesmo sentido. Também foram excluídos dos textos os seus títulos, em virtude de
127
alguns pontos: a) o tratamento pelos softwares envolveriam os títulos na massa do
texto; b) os títulos representam um fragmento que, muitas vezes, não tem relação
com o conteúdo pelo menos nos exemplares coletados; c) finalmente, os títulos
não representam qualquer aspecto de relevância à nossa pesquisa no que diz
respeito à erupção das pessoas enunciativas.
Para a análise dessa massa de textos, foram utilizadas duas ferramentas
distintas, sendo que cada uma tinha por objetivo desenvolver diferentes abordagens,
mas que no final seriam coadunadas. A primeira ferramenta foi o software Systemic
Coder, que é fornecido gratuitamente pela Wagsoft (www.wagsoft.com) e o segundo
o Lexico3, desenvolvido por pesquisadores da Sorbonne Nouvelle (www.cavi.univ-
paris3.fr/ilpga/syled/cla2t.htm). Cada qual foi tomado como um todo específico,
mas ambos com o mesmo pressuposto de se utilizar os dados estatísticos como
indicadores para nosso trabalho.
O Systemic Coder é um software destinado à categorização e ao
levantamento estatístico de partes de um corpus. O princípio é de que o pesquisador
faça a segmentação do corpus e crie seus critérios de análise. Já o sistema Lexico3
faz uma série de operações estatísticas e distribucionais sobre oxico e expressões
em um corpus. Ambos sistemas serão melhor bem explorados no decorrer da
análise.
4.3.1 Segmentação do corpus – o primeiro modelo
Pensamos ser interessante relatar como o nosso método de análise se
modificou ao longo da pesquisa para se ter a origem de nossa metodologia.
A primeira questão de ordem analítica que se impôs foi pressuposta pela
noção de alternância adotada inicialmente, pois, considerávamos que, se existia a
128
alternância entre as pessoas enunciativas em um único texto, presumíamos que era
necessário que houvessem parâmetros para identificarmos as fronteiras dessa
alternância. Somada a essa idéia, supervalorizamos a noção de escopo da pessoa
enunciativa, como se seguiu abaixo:
15) Nós sabemos que uma parte desses negros não tem uma chance na faculdade.
A princípio, imaginávamos que a oração principal “nós sabemos”
estabeleceria não só a sua regência sobre o restante da frase como também lhe
imprimiria o escopo do sujeito enunciado “nós”, assim, todo o restante do conteúdo
da frase estaria subordinado à 1pp, não só gramaticalmente, mas, semanticamente,
incluindo ainda o que se enunciaria sobre o sujeito da segunda oração, que é uma
parte desses negros”. A frase 15 é deveras simples em relação a outras construções
nas quais muitas orações inclusas, ou mesmo, situações em que o escopo do
enunciador ultrapassava aos limites dos pontos e dos parágrafos; além do mais, a
língua escrita, nesses casos, não é um bom delimitador, pois não imprime condições
ao fenômeno, apenas o reflete.
Diante dessa dificuldade de demarcar, tomamos como base a identificação
dos pronomes e verbos que fazem referência às formas da enunciação actancial, ou
seja, a refencia a 1ps, 1pp e a ausência total de referência, que é o caso da np.
Assim, elaboramos um modelo complexo de delimitação do escopo, mas que, ao
longo das análises, foi se mostrando um pouco inadequado, e isso tinha uma razão
no fenômeno enunciativo, a qual explicaremos ao apresentar as análises dos dados.
O primeiro modelo então de segmentação, que se preocupava com o escopo,
funcionava da seguinte maneira:
a) identificação de verbos e pronomes possessivos indicando a pessoa
enunciativa;
129
b) delimitação à direita e à esquerda da marca (verbo ou pronome) levando
em consideração fatores sintáticos como:
relação de orações principais e subordinadas;
e a troca de pessoa com outra marcação através de verbo ou de
pronome
Esses critérios não atingiam satisfatoriamente a totalidade do fenômeno, pois,
muitas vezes, nos amos na necessidade de arbitrar em que parte deveríamos
marcar o escopo por meios diversos que os critérios acima. A nosso ver, tal atitude
punha em risco os dados, pois seus resultados não refletiam a realidade que
encontramos no procedimento enunciativo próprio. Ao decorrer das exaustivas
análises, fomos nos apercebendo que esse modelo não seria capaz de dar conta, de
todo, da análise, mas era o gérmen de uma idéia que amadureceu e nos pareceu
mais coerente.
Nesse primeiro modelo, elegemos alguns critérios semântico-sintáticos que
consistiam primeiramente em um simples procedimento de observação intuitiva,
tomando-se o item que marca a referência (pronome e verbo) e, depois, observando-
se tanto à sua direita quanto à sua esquerda aquilo que julgássemos estar dentro do
escopo do verbo ou pronome, ou seja, dentro de um “escopo enunciativo”, na
maioria das vezes, colocávamos a extensão das orações como limite. Muitas vezes
era difícil enxergar os limites, o que dependia de escolhas com certo grau de
arbitrariedade por parte do analista. Observemos o exemplo:
16) [Ao questionarmos sobre a questão das cotas no Brasil surge uma grande
dúvida]
1
[será que dá certo previlegiarmos os negros se o racismo não acabou]
2
,
[imagine quantas criticas e mais forma de questionar o negro terá.]
3
Ao questionarmos sobre a questão das cotas no Brasil surge uma grande dúvida
será que dá certo previlegiarmos os negros se o racismo não acabou,
imagine quantas criticas e mais forma de questionar o negro terá.
O critério consistia em analisar, por exemplo, as orações independentes nas
130
quais surgem as referências e até onde eram verdadeiramente independentes.
Normalmente a alternância era marcada entre orações, principalmente pelo verbo.
Muitas vezes nos enganávamos verificando até onde ia um determinado escopo
como observado no exemplo acima, e os parágrafos e frases não significavam
limites ou segmentações confiáveis. A partir da segmentação das partes do texto,
fizemos então a sua qualificação conforme o esquema abaixo, através do Systemic
Coder:
Diagrama 2 - Critérios de análise dos textos segmentados – 1º. Modelo
O esquema também se mostrou falho, em virtude de uma série de fatores que
veremos a seguir, no entanto ele serviu de base para os procedimentos mais
simplificados a posteriori. O esquema foi construído para caracterizar as pessoas
enunciativas e tamm sua alternância, além de esboçar os níveis de análise.
131
Assim, temos as três formas: pessoa subjetiva (primeira pessoa do singular), pessoa
subjetiva com efeito de plural (primeira pessoa do plural), o enunciado em não-
pessoa (terceira pessoa para a gramática normativa). Em um segundo nível, há pelo
menos algumas modalidades de efeitos da 1ps, a primeira pessoa propriamente dita,
ou seja, quando o sujeito demarca sua enunciação através dos pronomes e das
marcas verbais da primeira pessoa do singular; no caso, o demarcado pelo pronome
eu”. ainda outras duas formas que consistem em estratégias distintas, como é o
caso de debrear a pessoa não-subjetiva que consistem na segunda pessoa
gramatical, ou ainda a terceira pessoa gramatical como efeito de segunda pessoa
como o “você(s)”, ou seja, ao enunciar “você” pressupõe-se o “eu” enunciador. Outra
modalidade enunciativa da primeira pessoa do singular é encontrada em três tipos
de situação, conforme Fiorin (2002, p. 96) que estariam associados ao “tipo de
texto”: a) plural majestático, b) plural de humildade, c) plural de autor. O primeiro se
aplicaria a pronunciamentos solenes de autoridades (Papa, presidente etc.); no
entanto, é importante lembrar que tanto os tipos “a” e “b” de enunciação de plural
representam uma diluição do efeito subjetivo da debreagem de um “eu”. No caso do
segundo, o plural de humildade ou modéstia tem por finalidade amenizar a
subjetividade que em determinada situação poderia ser pedante, ou colocaria o
enunciador em pé de igualdade com o enunciatário. Por fim, a última modalidade é a
que tenta diluir o discurso da subjetividade: Nesse caso, o enunciador usa ‘nós’
porque o é um indivíduo que fala em seu próprio nome, ele tem atrás de si a
comunidade científica e, para além dela, da própria ciência” (idem, p. 97).
Diante dessas noções, teríamos, nos textos analisados, um desses perfis de
1ps travestida em 1pp? Consideramos que, nos textos, dada a condição e situação
dos informantes, as enunciações não se construíam sobre as possibilidades de “a”,
132
“b” ou “c”, pois em “a” a situação já descarta o uso majestático desses enunciadores,
haja vista o anonimato das informantes. Já no caso de “b”, não haveria razão para
omitir a primeira pessoa, por uma questão de humildade, haja vista que o texto
produzido na situação de redação de vestibular exige opinião; a priori, poderia ser
“pessoal”, ou seja, subjetiva no sentido comumente usado. Assim, os enunciados
que julgávamos “majestático” (sendo um 1ps travestido em 1pp) passou a ser
percebido como 1pp mesmo, pela idéia contida no conceito “c” (plural de autor),
muito embora não tenhamos cientistas falando do lugar da cncia, mas sim um
sujeito enunciando a partir do senso comum, que pode, através desse artifício, levar
a alguns efeitos de sentido:
i) o eu enuncia da posição de uma coletividade que tem uma crença
comum, ou melhor, que compartilha as mesmas formões discursivas;
ii) o eu enuncia se dissipando nessa mesma coletividade incluindo
tamm o enunciatário, no caso pode ser um nós mais complexo ainda
incluindo referencialmente três instâncias: pessoa subjetiva + pessoa
não-subjetiva + não-pessoa.
A partir dessas reflexões, percebemo-nos diante de um novo modelo que
deveria considerar o surgimento da 1ps em forma de 1pp, como efeito de “autoria”,
conforme pros Fiorin, mas no sentido de ser esse autor alguém que enuncia a
partir do senso comum. Na análise dos dados, isso será melhor observado e então
veremos que o senso comum e a formão discursiva, podem ser, funcionalmente,
as mesmas coisas, mas que estão sob etiquetas distintas.
Ainda para a construção do primeiro modelo, partimos da idéia de que a
primeira pessoa do plural (1pp) apresenta diferentes desdobramentos e possui um
estatuto muito diferente das outras modalidades enunciativas. Concordamos com
Benveniste ao considerar a complexidade da 1pp, primeiramente porque os
pronomes não podem ser agrupados em um conjunto de léxicos que sofram o
133
mesmo processo banal de pluralização. Prova disso, em primeiro lugar, é o fato de,
na relação singular e plural, como em “Eu X nós”, “tu X vós”, não haver o simples
acréscimo do morfema do plural, como acontece no caso de “ele X eles” Em
segundo lugar:
Es claro, de fato, que a unicidade e a subjetividade inerentes a “eu”
contradizem a possibilidade de uma pluralização. Se não pode haver vários
“eu” concebidos pelo próprio “eu” que fala, é porque “nós” não é uma
multiplicação de objetos idênticos, mas uma junção entre o “eu” e o “não-
eu”, seja qual for o conteúdo desse “não-eu”. (BENVENISTE, 1995, p. 256)
Portanto, esse “não-eu” pode ser umtu/você”, um “vós/vocês” ou um “ele(s)”,
de modo que o “nós” se desdobra nas seguintes possibilidades de ocorrência:
a) nós = pessoa subjetiva (majestático, modéstia, autoria) que tem o status de
1ps;
b) nós = pessoa subjetiva + pessoa não-subjetiva (eu+vo/vocês);
c) nós = pessoa subjetiva + não-pessoa
d) nós = pessoa subjetiva + pessoa não-subjetiva (eu+você/vocês) + não-
pessoa;
Exemplos:
17.a') Acreditamos na inocência de nosso cliente. (Advogado em uma entrevista).
17.b') Vamos dar uma pausa para tomarmos um café? (Colegas de trabalho).
17.c') Estamos reivindicando um reajuste salarial e também a compensação para
repor as perdas. (Representante sindical).
17.d’) Pensemos que a nossa sociedade precisa ajudar os negros.
A enunciação em 1pp é um fenômeno de neutralização inerente estruturado
para compreender o eu + X”, constituindo-se em uma importante relação opositiva.
No que diz respeito ao desdobramento do “X” da fórmula “eu + X”, havíamos
proposto inicialmente que existiria o alcance ou escopo da enunciação sobre um
determinado segmento do texto, de tal sorte que seria possível segmentá-lo como
demonstramos anteriormente. E essa perspectiva nos levou a imaginar que
existiriam operações fixas de referenciação de modo que a extensão do “X” poderia
134
ser brasileiros, sociedade, povo, governo” apenas, e vimos que esse tipo de
extensão semântica é muito difusa. Inicialmente, o modelo previa até 6 tipos de “nós”
cuja constituição poderia ser interpretada pelas seguintes fórmulas:
ps: pessoa subjetiva (enunciador, aquele que fala/escreve);
pns: pessoa não-subjetiva (enunciatário, aquele que ouve/lê)
np: não pessoa que pode ser referenciado de diferentes maneiras
1pp1 = ps+np(todos)
1pp2 = ps+np(sociedade) + np(negros)
1pp2 = ps+np(sociedade)np(negros)
1pp3 = ps+np(não-negras)
1pp4 = ps+np(brasileiros) + np(negros)
1pp4 = ps+np(brasileiros) – np(negros)
1pp5 = ps+np(todos) – np(negros)
1pp6 = ps+pns
Isso não significa que alguns enunciados tenham se dado apenas da maneira
descrita nas 6 fórmulas, mas, ao serem aplicadas, elas demonstraram que não eram
suficientes para delimitar todos os efeitos da 1pp, daí passamos a rever as
subdivisões propostas para 1pp tal qual fizemos para 1ps. A primeira reformulação
foi sobre 1pp6, que previa uma enunciação semelhante a “17.c' ”, tornou-se algo
muito raro e difícil de ocorrer nos textos. Ficamos, então, diante de um impasse:
como poderíamos dizer se uma enunciação em 1pp seria realmente a enunciação
em 1ps de “autoria”? Até que ponto não seria o 1pp1 (todos)? Vejamos algumas
enunciações diceis de serem categorizadas:
18) É tempo de parar e refletir o que somos e temos.
19) Acreditamos que para eliminarmos essas desigualdade é possível dar estruturas
a essas pessoas e oportunidades.
A prinpio, havíamos caracterizado o enunciado 18” como 1pp6 por parecer
conclamar o enunciatário a uma atitude, mas o efeito é de atingir uma extensão
maior de referência. E os argumentos para o ser uma modalidade de ps+pns é
135
que nessa modalidade de texto escrito, não temos circunstâncias situacionais
explicitadas, como seriam os casos dos exemplos “17.a', b', c' , ou ainda de um
bilhete pessoal, como “Mamãe, me espere que possamos estar juntos em casa. Ass.
Seu filho.”. Há, nos textos do corpus, a distância entre os interlocutores por espaço e
tempo; ademais, não qualquer delimitador que indique a extensão em
“sociedade, paíscomo seria o caso de uma enunciação como “O nosso país... ou
“A nossa sociedade...”, o que nos leva a inferir que se a marcação do
quantificador universal “todos” ou a sua ausência: temos o efeito da extensão sobre
toda a humanidade. Daí a categoria 1pp6 deixou de existir em nossa análise,
passando as suas enunciações a figurarem na 1pp1. Diante dessa mudança, como
categorizar o que seria 1ps autoria ou 1pp1 todos? Para podermos fazer esse
tipo de análise, optamos pela natureza sintático-semântica de determinados verbos
em selecionar os argumentos como “experienciador” ou “agente”. Os argumentos
experienciadores são desencadeados por verbos psicológicos”, segundo a Teoria
Generalizada dos Papéis Temáticos de Franchi (1975), e suas conseqüentes
modificações. Vejamos o que Caçado fala sobre verbos como “temer”, acreditar”
(CANÇADO, 2002, p. 2):
Segundo a literatura na área, os verbos psicológicos apresentam diferentes
fenômenos relacionados à organização da estrutura argumental e à ligação
de anáforas. Nesses verbos, o argumento que recebe o papel temático de
Experienciador pode aparecer tanto na posição de sujeito como na posição
de objeto na estrutura superficial, parecendo ser essa escolha aleatória:
(1) Mário teme fantasmas.
Exp Tema
(2) Fantasmas assustam Mário.
Tema Exp
Os argumentos experienciadores são muito comuns nos textos de opinião e
um dos nossos objetivos em categorizar esses argumentos será compreender quais
136
serão as suas regularidades de acordo com as pessoas enunciativas. Para tanto,
seguiu-se um procedimento analítico que foi inventariar as pessoas enunciativas,
depois relacioná-las a determinados paradigmas designacionais e observar quais os
argumentos figuravam nas pessoas enunciativas, estatisticamente.
Dentre os três modos de enunciar encontrados nos textos, a não-pessoa se
comportou como a sua natureza lhe determina: apenas um efeito de sentido, pois
ela consiste na embreagem actancial porque, essencialmente, há sempre um sujeito
pressuposto enunciando. A queso é que ele não faz referência a si mesmo, ele
não se auto-enuncia como nos outros casos. Os efeitos de sentido de cada uma
dessas pessoas serão tratados nas análises e conclusões sobre os textos e as
oposições entre os grupos de controle. Os dados levantados nos mostrarão algumas
regularidades enunciativas e discursivas sobre essas condições.
Para demonstrar como o método progrediu nessa primeira fase, elaboramos
um exemplo, que pode ser visto no texto a seguir:
(Grupo A, texto 188) [Sem vida a iia de crião de cotas para o ingresso de
negros em universidades é um tanto polêmica.] [De um lado, vemos talvez, a única
solão para uma menor desigualdade nas universidades e maior oportunidade para
os negros, mas por outro, contribuímos para que o racismo não acabe e quem sabe
com essa atitude, não estaríamos aumentando a desigualdade.]
[Será que sua aprovação dependeria da cor?] [Devemos também levar em
consideração o fato de que uma percentagem destinada a negros pode talvez
acabar gerando mais restrições à sua entrada sabendo que nossa populão não
tem 20% de negros, como ficaria se mais candidatos negros fossem aprovados
com melhores resultados que candidatos brancos, será que eles poderiam ocupar os
seu lugares ou teriam que disputar somente os seus 20% de cotas? ]
[Acredito que a criação de cotas para universidades não seja a solução, mas sim
uma possibilidade de preparação no Ensino Médio igual para todos. Acho que em
termos de educação, o investimento deveria ser no "antes" de uma universidade
para que não haja restrições de quantos podem estudar, para que então todos
possam disputar, igualmente as vagas oferecidas, sem ter que responder "preto ou
branco".]
O diagrama a seguir foi concebido para tentarmos visualizar o movimento da
alternância, ainda consideras fronteiras bem delimitadas entre as partes do texto
137
segundo o escopo da enunciação.
1ps 1pp Np Segmento
1 Sem dúvida [...] polêmica.
2 De um lado [...] desigualdade.
3 Será que [...]da cor?
4 Devemos [...] cotas?
5 Acredito [...] branco”.
Diagrama 3 - Primeiro modelo de análise
Esse diagrama tenta dar conta dos movimentos enunciativos nos textos,
tendo servido para nos ajudar a perceber que uma boa quantidade de alternâncias
eram bastante recorrentes e dão alguns indícios do comportamento enunciativo dos
sujeitos dos grupos. No entanto, as análises mostraram algumas coisas importantes
que exploraremos mais especificamente nos capítulos que versarão sobre os
resultados. Mas, de antemão, precisamos deixar claro que mudamos o nosso
modelo conceitual, não nos preocupando com as balizas que demarcassem, no
texto, a fronteira entre um modo de enunciar e outro. Essa mudança de perspectiva
se deu pelo levantamento estastico que demonstrou uma grande massa de texto,
por exemplo, em np. Assim, ao invés de pensarmos na divisão entre as partes de um
texto, procuramos identificar as zonas de erupção”. Isso significa que, via de regra,
a np é a modalidade enunciativa básica, ou melhor, a principal. Usando uma
analogia geológica, diríamos que a crosta terrestre é a não-pessoa, que acaba, em
determinadas situações, sofrendo fissuras, nas quais eclodem o magma e o gás
formando montanhas e elevações, que poderiam ser, respectivamente 1pp e 1ps.
138
Assim, o modelo passou a ser, horizontal, ao invés de vertical.
Diagrama 4 – Segundo modelo de análise
Um segundo momento de nossa análise implementou algumas metodologias
da estatística textual. Após a construção do mapa topográfico de cada um dos
textos, tanto o grupo analisado quanto dos grupos de controle, usamos algumas
ferramentas de análise lexicométricas. Não bastava tentarmos compreender a
topografia da erupção das pessoas, era necessário compreender tamm como e
onde se distribuíam as pessoas enunciativas e, daí, poderíamos compreender um
pouco da dinâmica da referência às identidades.
Muito embora tenhamos abandonado a noção de escopo, ainda seria possível
compreendermos quais seriam as zonas de influência da pessoa enunciativa e
perceber quais as zonas de influência ou predominância seriam de 1ps, 1pp ou np.
Após essas reflexões, decidimos alterar o modelo de análise empregado, como se
segue.
1
2
3
4
5
6
1
ps
1
pp
np
139
Diagrama 5 - Modelo final de segmentação
Todo esse esforço analítico é uma tentativa de se compreender a dispersão
dos discursos em sua materialidade e, daí, reconstruir as regularidades contidas
neles até o ponto de identificar as formações discursivas presentes em enunciados
de sujeitos tão diferentes. Tamm percebemos a necessidade de um modelo
semântico que desse conta de alguns aspectos na construção da imagem do outro
pela enunciação, como veremos mais adiante. A título de demonstrarmos os
procedimentos de análise, apresentamos o funcionamento do Systemic Coder,
passo a passo :
140
Ilustração 1 - Tela de segmentação dos textos
Esta primeira tela do dispositivo demonstra o modo de segmentação, o qual
observamos nas marcas “II” verdes; nesse item, as segmentações podem ser
implementadas conforme queira o pesquisador. Em um segundo momento, o
pesquisador cria seus critérios de análises como se vê na tela seguinte.
Ilustração 2 - Tela de critérios
141
Ilustração 3 - Tela de análise
A ilustração 3 demonstra os procedimentos de análise. A partir do botão
“Coding” o sistema seleciona os trechos segmentados, como vemos na janela text
e o analista categoriza aquele trecho conforme o esquema de análise criado. Assim,
vemos duas colunas, “Pessoa” e “Alternância”, com seus respectivos critérios,
cabendo ao analista marcar o item correspondente. Se uma subdivisão do item,
como em, por exemplo, 1ps ou 1pp, as categorias respectivas io surgir para serem
definidas, e assim sucessivamente até a última categorizão. Cumpre-nos alertar
que nenhum dos sistemas utilizados faz análise automática dos textos: eles,
simplesmente, organizam as estatísticas conforme os critérios elaborados pelo
analista. A máquina, neste caso, só foi um instrumental para a extração de dados,
142
como se vê na ilustração seguinte.
Ilustração 4 - Tela de resultados estatísticos
Por fim, a tela de resultados estatísticos demonstra a quantidade de
ocorrências em um corpus que pode ser um texto ou diversos. Na ilustração,
utilizamos apenas um texto ilustrativo, mas, na análise completa, temos os textos
organizados por grupo, como veremos mais adiante na análise dos dados.
4.3.2 O papel da Estatística Textual
Dentre as ferramentas de análise que utilizamos nesta pesquisa, a Estatística
Textual (Statistique Textuelle ST) será de extrema importância, pois, como
dissemos anteriormente, a noção de materialidade do sentido, para nós, passa pelos
fatos linguareiros, de tal modo que a freqüência, as posições das recorrências de
determinados léxicos ou sintagmas representam discursos. Situaremos um pouco
mais a ST antes de abordarmos alguns procedimentos propriamente analíticos.
143
Segundo Lebart e Salem (1994), o sucesso alcançado pelas aplicações do
método estatístico em numerosos domínios das ciências naturais (Física, Biologia,
etc.), mas tamm nas ciências humanas (Psicologia, Economia, etc.) e
compreendido nas disciplinas que tocam a utilização da linguagem, acaba por
chamar a atenção dos especialistas nos estudos do vocabulário
44
. Inicialmente,
descobertas como as leis empíricas permitiam, inicialmente, melhorias no domínio
da descrição e as distribuições lexicais passam a ser estudadas sob o signo da
psico-biologia da linguagem por G.K. Zipf (1935). os primeiros trabalhos e
estudos que aplicam o método estatístico à análise de textos reagrupavam
costumeiramente uma série de abordagens quantitativas, mas isso ocorria sobre um
conjunto de unidades lingüísticas que se repertoriavam em um mesmo texto
(fonemas, lexemas).
Em um segundo momento, a ST (G.U. Yule, P. Guiraud e depois Gh. Muller,
conforme Lebart e Salem, 1994) procura resolver uma série de problemas propostos
por diferentes pesquisadores em estilística, que estavam preocupados com estudos
comparativos sobre o vocabulário de "grandes autores" e em particular de autores
do teatro clássico francês do século XVII. Essa corrente havia fixado alguns
objetivos que levavam ainda a marca das preocupações formuladas bem antes do
surgimento dos métodos quantitativos, que era a medida da evolução do vocabulário
de um mesmo autor ao longo de um período durante o qual ele produziu sua obra; É
nesse contexto que nasce a idéia de “riqueza vocabular”. Os trabalhos dessa
modalidade de estatística lexical estão também nos manuais de estatística "do uso
literário"; eles permitirão objetivar pela contagem as apreciações trazidas pelos
pesquisadores de estilística bem antes dos métodos quantitativos. Tais trabalhos
44
Segundo Pierre Guiraud: "A Lingüística é a ciência estatística tipo; os estatísticos sabem muito bem
disso, a maioria dos lingüistas ainda ignoram tal fato. ("La linguistique est la science statistique type ;
les statisticiens le savent bien, la plupart des linguistes l'ignorent encore"), (Guiraud, 1960).
144
trarão à tona numerosas dificuldades ligadas à definição das unidades de contagem.
A parte lingüística dessas pesquisas reside essencialmente na escolha racional das
unidades de análise que servirão de base às analises posteriores, ou seja, contam-
se palavras, xicos, sintagmas lexicais, ou sintagmas? Esta é uma pergunta em
aberto que caberá ao pesquisador e sua pretensões.
Paralelamente, os métodos desenvolvidos nesse mesmo quadro foram
apresentados por G. Herdan, sob o nome de Lingüística Estatística, como "a
quantificação da teoria Saussuriana da linguagem". Segundo Herdan (apud
LEBART; SALEM, 1994), essa disciplina se apresenta como um ramo na lingüística
estrutural, tendo por principal função a descrição estatística do funcionamento (em
um corpus de texto) das unidades definidas pela lingüística em diferentes níveis de
análise lingüística (fonética, lexical, frástica).
A evolução do método chegará com a Inteligência Artificial e a Informática,
pois a partir daí teremos uma aceleração das ferramentas de análise, mais do que
contar palavras e verificar a sua distribuição, os sistemas de informática e o método
estatístico permitirão com que o analista se debruce sobre uma quantidade de dados
grande e pode tratá-la com extrema agilidade. Conceitos como "crescimento
vocabular", "segmentos repetidos", "concordância", "análise fatorial" vão permitir
encontrar pistas sobre o comportamento discursivo, como é o nosso caso, pois,
através da constituição de paradigmas designacionais e a sua relação com a pessoa
enunciativa, podemos perceber aspectos significativos dos discursos analisados.
Não faremos definições de conceitos neste momento, mas na medida em que
fizermos a análise quantitativa dos textos, observaremos os aspectos mais
relevantes para as finalidades específicas.
Para compreendermos melhor o fenômeno, desenvolvemos uma metodologia
145
quantitativa que nos serviu de base para interpretarmos alguns fenômenos. É
necessário deixar claro que, diferentemente da sociolingüística, a qual, basicamente,
se vale de grandes corpora, utilizaremos a quantificação, mas do modo que sugere
Indursky:
É possível, igualmente, submeter um discurso a uma análise quantitativa.
No entanto, a quantificação não visa a selecionar a variável freqüente, em
detrimento à variável pouco expressiva. Ao contrário. O analista de
discursos procura localizar as variáveis indicadoras de um processo
discursivo para iniciar sua investigação sobre a base lingüística. Somente
após determinar seu foco de analista é que o analista, se assim o desejar,
poderá quantificar seus dados. (INDURSKY, 1990, p. 27)
Os levantamentos em ST desenvolveram-se tanto em um sentido horizontal
quanto vertical, o que quer dizer que observamos a contagem das recorrências
lexicais de determinados grupos designacionais e tamm o levantamento das
posições com as vozes enunciativas, ou seja, o componente horizontal.
O sistema Léxico 3 apresenta uma série de ferramentas que iremos
demonstrar em algumas telas ilustrativas.
Ilustração 5 - Tela de entrada do Lexico3
Nessa tela de entrada, encontramos as primeiras ferramentas, como
“concordância, segmento repetido, grupo de formas”, à esquerda da tela vemos o
“dicionário” que faz o levantamento quantitativo das palavras. Já de icio
146
observamos que, no grupo A, a palavra negros” surge 420 vezes, entre as palavras
mais recorrentes das línguas neolatinas, como as preposições, como é o caso de
“de”. Ao longo das análises ilustramos os comentários com outras ferramentas
utilizadas no Lexico3.
4.3.3 O componente semântico
Ao analisarmos os diferentes textos, não só expressões eram recorrentes,
como tamm estruturas sintáticas e papéis semânticos também. Poderíamos dizer
que se trata de um fenômeno da língua, mas nossa perspectiva não desliga a
relação entre língua e discurso, o que nos leva ao mesmo princípio que Pêcheux: ver
que as estruturas gramaticais não têm valor em si mesmas, mas sim no discurso, e
que elas representam a possibilidade de significação, daí o nosso trabalho ter uma
dedicação considerável à materialidade do discurso. Foi a partir dessa experiência
que nos vimos obrigados a ampliar o enfoque para além das estruturas enunciativas
referentes à demarcação do enunciador, sendo que essa sondagem procurava
demonstrar quais os casos papéis sintáticos em que se atribui a alteridade dos
elementos enuncivos. Isso quer dizer que o sujeito que enuncia da posição do
branco atribui ao seu outro, o negro”, um determinado papel nas orações. Esse
papel seria de agente, paciente, beneficiário? E como tais papéis se comportam nos
enunciados? Existiria alguma relação em atribuir esses papéis com a formação
discursiva dos sujeitos?
Examinaremos, neste item, a possibilidade de desenvolver categorias
semânticas como instrumentais de análise; no entanto, esse tipo de incursão tem
somente como objetivo tentar, com efeito, descrever aspectos do corpus, isso
porque não desejamos, de modo algum, desenvolver algum tipo de gramática
147
descritiva. Não temos por finalidade criar uma descrição do comportamento da
língua portuguesa do Brasil, muito embora os enunciados sejam analisados a partir
de situações reais e de sujeitos reais historicamente situados. Apesar de não
almejarmos esse objetivo, compreendemos que é possível que tenhamos acertado
em muitos aspectos descritivos.
Para a descrição, utilizaremos a nomenclatura prevista na Gramática de
Casos (FILLMORE, 1968a, 1968b) reconhecendo de antemão que o modelo foi
ultrapassado por outras reflexões, embora algumas bases dessa descrição
permaneçam deveras interessantes. Também reconhecemos que tais correntes de
análise semântico-sintáticas m origens e pressupostos muito diferentes da AD,
mas isso o invalida, a nosso ver, as possibilidades de analisar e compreender
algumas estruturas lingüísticas. Ademais, a AD não criou um modelo e mesmo uma
gramática que descreva a materialidade do sentido, ela costuma se valer de
procedimentos descritivos de outras teorias, exemplo disso é Indursky (1997).
Para ilustrarmos essa perspectiva, partiremos dos exemplos a seguir:
20) Tem sido grande o preconceito contra os negros tanto na sociedade Educacional
quanto em outros aspectos.
21) Esse fato também diminuiria a criminalidade e o envolvimento na drogas, pois
assim os negros sentiriam orgulho de sua cor.
22) E que devem ser dadas a criação de cotas para o ingresso de negros na
universidade?
23) Os negros têm capacidade de estudar e cursar uma faculdade ou até mesmo ter
uma pós, mas antes de tudo isso.
24) Os negros enfrentam uma série de obstáculos para sobreviverem em meio a
uma grande e cruel população.
Na análise sintática da gramática tradicional, teríamos os seguintes papéis
para “negros” em:
148
20, complemento nominal, do nome “preconceito”
21, sujeito do verbo “sentir” na oração subordinada
22, adjunto adnominal de “ingresso” que é o complemento nominal de
criação
23, sujeito do verbo “ter”
24, sujeito do verbo “enfrentar”
Evidentemente, uma análise gramatical é muito chã, pois o toma os
diferentes aspectos ou papéis que o termo poderia ter como nos verbos “sentir”,
“ter”, “enfrentar”. O fato é que os papéis semânticos desempenhados pelos
elementos que identificam as identidades podem ser indícios das formações
discursivas. Observamos que, am dos aspectos semânticos dos paradigmas
designacionais, é preciso pensar que os papéis semânticos no nível frasal têm uma
considerável contribuição. Foi pensando assim que iniciamos também uma frente de
análise dessas propriedades semânticas. A idéia é tentar compreender se há alguma
regularidade nas preferências enunciativas e os papéis semânticos designados para
as identidades, em termos práticos; é perceber, se por exemplo, as referências a
“negro e “branco” estão mais em posições agentivas, ou em outras posições.
Pensando nos papéis semânticos, devemos observar que a centralidade das
operações fica por conta dos verbos como pivôs dos papéis semânticos,
diferentemente das gramáticas tradicionais que prevêem os papéis semânticos a
partir dos termos em si e não considera as relações entre os nomes e verbos para a
interpretação. Para Chafe (1979, p. 96) os verbos têm outro papel:
Minha suposição será a de que o universo conceptual humano total é
dicotomizado inicialmente em duas grandes áreas. Uma, a área do verbo,
engloba estado (condições, qualidades) e eventos; a outra, a área do
nome, engloba “coisas (tanto objetos físicos como abstrações
coisificadas).
A natureza distinta dos nomes e dos verbos é uma unanimidade entre os
149
lingüistas; a diferença fica por conta da abordagem que cada um lhes dá. Na citação
de Chafe, não podemos deixar de notar o elemento cognitivista, o que não implica
que aspectos do discurso também não tenham algum aspecto cognitivo. Devemos
pensar no próprio conceito de cognitivo, ou seja, que a apreeno do mundo e o
próprio funcionamento psíquico estão intimamente ligados à visão de mundo de uma
cultura, de uma língua, o que aproxima a visão da AD das estruturas da língua como
um sistema independente, mas atualizável capaz de materializar as ideologias, como
ficará mais claro na análise.
Se o verbo seleciona os nomes que o circundam, que tipo de relação pode
ser essa? Se os verbos selecionam argumentos, há alguma predileção por alguns
argumentos e verbos a serem enunciados em 1ps, 1pp ou np? Primeiramente, a
relevância, a nosso ver, é o arranjo que se dá a vozes enunciativas ao atribuírem às
“coisas” papéis semânticos. Ora, se um considerável número de ocorrências na voz
passiva pode, dentro de um corpus, ter um determinado significado, podemos inferir
que as posições de argumentos ocupadas por determinados termos, como “negro” é
recorrente em uma dada posição sintático-semântica, o que pode ser indício de algo
sobre o qual se pode refletir.
Voltando aos exemplos de 20 a 24, vemos diferentes funções para o léxico
“negro que basicamente designa algo no mundo, mas designar não é o suficiente, é
preciso lhe atribuir papéis nesse mundo, em função de ões ou estados ligados a
esse ente. Por isso, cumpre-nos, primeiramente, examinar os verbos ou expressões
verbais componentes das frases para entendermos suas naturezas e os
comportamentos nas estruturas. Ao separar estados, processos e ações, Chafe
(1979) caracteriza os verbos através de testes, muito semelhantes aos de Kleiber
(1984, 1994, 1997)vistos em capítulo 1 de nossa pesquisa.
150
Observemos então como ele caracteriza as diferenças entre estado, processo
e ão, para o que utilizaremos os seus exemplos traduzidos em português, muito
embora reconheçamos que de uma língua para outra as traduções deixam a
desejar, no entanto o que nos interessa, basicamente, é a reflexão. Vejamos:
25.a. The wood is dry. (A madeira está seca.)
b. The rope is tight. (A corda esesticada.)
c. The dish is broken. (A travessa está quebrada.)
d. The elephant is dead. (O elefante está morto.)
26.a. The wood dried. (A madeira secou.)
b. The rope tightened. (A corda esticou.)
c. The dish boke. (A travessa quebrou.)
d. The elephant died. (O elefante morreu).
27 a. Michael ran. (Michael correu.)
b. The men laughed. (Os homens riram.)
c. Harriet sang. (Harriet cantou.)
d. The tiger pounced. (O tigre pulou.)
28.a. Michael dried the wood (Michael secou a madeira.)
b. The men tightened the rope. (Os homens esticaram a corda.)
c. Harriet broke the dish. (Harriet quebrou a travessa.)
d. The tiger killed the elephant. (O tigre matou o elefante.)
(CHAFE, 1979, p. 98)
No grupo 25, temos um nome que apresenta um determinado estado. Nesses
casos o autor denomina de paciente, ou seja, o elemento que pertence a um estado;
no grupo 26, 27 e 28, os elementos não pertencem à noção de estado; assim,
Chafe caracteriza a diferença entre estado e o-estado, sendo que o não-estado
pressupõe a existência entre ação e processo que se caracterizam por serem
“eventos”, em oposição entre as questões “o que é?” versus “o que acontece?”.
Geralmente a oposição funciona, mas isso é falível não servindo de regra, mas de
princípio.
No grupo 26 percebemos que o nome mudou de estado ou de condição, por
isso se tem um “processo”. Nesse caso, ainda é possível dizer-se que o nome é
paciente, como no estado; já em 27 não se trata de estado, nem mudança de
151
estado, mas de algo que “alguém faz ou provoca. Já no grupo 28, parece que
temos as duas coisas, ão e processo, pois o agente faz algo a um paciente, que
no caso tem seu status modificado.
O princípio é o de que a compreensão dos verbos nos permite tamm
compreender um pouco do papel dos nomes; logo, podemos perceber três posições
básicas: agente, paciente e circunstância, mas que podem melhor ser especificadas
se utilizarmos alguns pressupostos de Fillmore. Essa incursão pelas categorias
semânticas já teve um precedente. Moirand (1988) utilizou-se da metodologia da
Gramática de Casos que a ajudou a perceber como os professores de francês,
enquanto enunciadores viam as relações de ensino-apredizagem, e daí a
possibilidade de se compreender em que tipo de formação discursiva eles se
inscreviam e que tipo de posição-sujeito eles ocupavam. Ao realizamos uma análise,
pretendemos fazer semelhantemente ao que Moirand fez, ou seja: averiguar se
nossos sujeitos enunciadores costumam colocar alguns termos em determinadas
posições (agente, paciente, circunstância), e quais os sentidos que isso pode
desencadear. Se os verbos são pivôs dos nomes que os circundam, mas se o status
semântico dos verbos varia de acordo com sua natureza, função e valor nas línguas,
os nomes, por conseqüência, m seus papéis afetados. Assim, um nome como
“negro pode ter funções de agente, ou de paciente e essas fuões distintas podem
nos dizer algo sobre a referência enunciativa.
A literatura lingüística sobre a semântica que trata desses casos tem sua
origem arraigada nos trabalhos de diferentes pesquisadores dos anos de 1960 e,
principalmente, sobre a Gramática Gerativo-Transformacional (GGT), que sofreu
diferentes revisões e deu à luz diferentes modelos de análise, como foi com a
Gramática de Casos de Fillmore (FILLMORE 1968a, 1968b, 1975); a Teoria da
152
Dependência Conceitual (Conceptual Dependence Theory – CDT) (SCHANK, 1975);
a teoria da Semântica Conceitual (Conceptual Semantic Theory CST)
(JACKENDOFF, 1990) e, no Brasil, Franchi (1975). Em todas essas perspectivas, o
problema que se põe é o mesmo: tratar a língua natural por perspectivas que
pressupõem o sujeito da vontade. No entanto, sob o nosso ponto de vista, isso não
será um problema porque para nós as categorias semânticas levantadas aqui são
elementos da língua e do discurso, e o de um sujeito em especial e dono do dizer;
o fato da recorrência das categorias demonstra que esses sujeitos que
compartilham uma mesma língua estão afetados por seus sistemas de valores e,
conseqüentemente, pelas formões discursivas. Sem querer parecer que estamos
fazendo um Frankeinstein teórico, iremos unir as categorias de Chafe (1979) e
Fillmore (1968a, 1975) para aplicarmos a análise sobre o corpus.
Assim, se um verbo é o pivô e ele pode ter a natureza de estado, processo,
ão ou processo-ação, seus “pivotados podem assumir diferentes status. Mas
antes de tratarmos dos elementos, é premente falarmos sobre as posições de
argumento. A princípio, as categorizações gramaticais sobre o “caso” foram
herdades da tradição dos estudos clássicos, lembrando que o grego e o latim e
muitas outras línguas antigas e modernas têm as marcas morfológicas dos casos
sintáticos, ou seja, das funções sintáticas. Por outro lado, a Gramática Casual ou
Gramática de Casos se origina, como vimos, da GGT.
O primeiro aspecto a ser observado está na oposição entre predicados e
argumentos, o que não representa alguma novidade, se pensarmos na lógica
fregeana, que podemos formalizar, por exemplo, em:
x(y, w) = ferir (policial, estudante)
153
Na superfície da frase podemos ter: “ O policial feriu o estudante” ou “O
estudante feriu o policial”. O caso é uma questão de superfície sobre o curso das
transformações léxico-morfogicas da estrutura profunda em relação à estrutura de
superfície. Sabemos que as duas frases têm sentidos diferentes e o verbo “ferir
suporta dois argumentos, que são colocados em posições diferentes, assim, se
impõem à pesquisa duas questões: a) qual é o tipo de verbo que seleciona os
argumentos? b) e que tipos de argumentos se impõem ao verbo?
Já vimos que os verbos podem ser de quatro categorias, e Fillmore propõe
seis modalidades de argumentos:
agentivo, que se aplica ao instigador animado da ação exprimida pelo
verbo, no entanto, aplicaremos este princípio não a um ser potente para tal
(humano, vivo, animal etc.), mas também aos agentes que podem ser
metaforizados.
Instrumental, ligado a uma força animada ou a um objeto casualmente
implicado na ação ou processo expresso pelo verbo;
Dativo, que visa o ser animado afetado pelo processo;
Factivo, concernente ao objeto ou ser que resulta do processo;
Locativo, expressa a localização ou orientação espacial do verbo;
Objetivo, definido de maneira vaga, porque está ligado aos casos
« semanticamente neutros », perceptíveis como um nome cujos papéis no
processo variam de acordo como o verbo. (BAYLON; MAGNOT, 2002, p.
142) (tradução nossa)
Segundo Frawley (1992, p. 203) o agentivo é deliberado, potente, ativo,
instigador de um predicado e, normalmente, o agentivo é um humano, o que nos põe
um problema sobre sentenças como:
29) A sociedade precisa ajudar essas pessoas.
E se deve a dois aspectos: a) “sociedade” não é humano, logo “sociedade”
não pode ser um instigador; b) tem-se um verbo deôntico que pressupõe uma
embreagem enunciva. Para nós, a agentividade o depende da referência à
“realidade” objetiva, mas à realidade da língua e suas potencialidades, ou seja, se
154
um falante de uma língua natural pode usar o xico “sociedade” na posição de
sujeito e a frase é perfeitamente enunciável em condições normais e compreensível
em língua natural, nada mais justo que considerar, então, “sociedade” como um
elemento agentivo. Muito embora sua “potência” de ajudar não seja inerente a si
mesma, como seria em um ser humano capaz de ajudar, a verdade é que
“sociedade faz parte de um enunciado metafórico, o que nas línguas naturais é
perfeitamente posvel. A geração de frases, segundo Fillmore segue algumas
regras (R) de operação:
(R1) Sentença = Modalidade + Proposição ou (R2) S = M + P
Assim, a modalidade indica se a frase é afirmativa, interrogativa, negativa,
imperativa
45
, e a preposição indica as relações casuais existentes entre os verbos e
seus argumentos. O “P” é expansível a uma terceira regra:
(R3) P = V + C1 + … + Cn
De tal sorte, o verbo (V) é associado a um ou vários casos (Cx), por exemplo:
30)João feriu seu dedo com um martelo.
O verbo “ferir” permite ao menos dois casos ou dois argumentos. Cumpre
ressaltar que outros trabalhos e até mesmo uma nomenclatura mais simples e
categorizações diversas existem nessa mesma perspectiva com diferentes nuanças,
dentre eles Perini (2002) e Cançado (2005).
É preciso observarmos também que os argumentos têm diferentes relações;
45
Não trataremos do componente modal por uma questão de limite e prioridade, embora ele seja
muito importante. Assim, consideraremos apenas a modalidade afirmativa, por dois motivos: a) as
modalizações podem ser supra-segmentais e se perdem na escrita; b) a pontuação, que não é muito
explorada pelos sujeitos e por isso muitos indícios de modalização se perdem, com excão de
verbos dicendi, advérbios e locuções adverbiais.
155
assim, é que, se pensarmos o verbo como um dos nós, é possível identificarmos
hierarquias entre os argumentos.
Agente (A): o instigador da ação, como vimos acima ;
o O policial bateu no estudante.
Beneficrio (B): o recebedor de um resultado de uma ação
o O policial bateu no estudante.
Contra-Agente (CA): é um elemento provocado pelo agente a uma ação;
o O policial fez seu cachorro morder o estudante.
Instrumento (I): a entidade utilizada para uma ação
o João feriu seu dedo com um martelo.
Objeto (O): aquilo sobre o qual a ação tem um resultado
o João escreveu um texto.
Paciente (P): é o caso das orações cujo verbo é de estado ou de processo.
o A madeira secou.
Para os verbos estativos, ainda encontramos duas formas de estados: a)
propriedade e b) circunstância, baseados principalmente nas diferenças entre “ser” e
“estar”, de forma que é possível relembrar, da filosofia, a diferença entre essência e
acidente, em frases do tipo:
30) As crianças de rua são em sua maioria negras.
31) Os negros estão em uma situão de desvantagem.
Há ainda os argumentos que estão ligados ao verbo indiretamente:
Finalidade (F
): finalidade da ação.
o João estuda para a avaliação.
Momento (M): o M é o argumento possível na identificação do tempo
o João parte amanhã.
Lugar (L): é o aspecto da localização;
o Eu moro em Londrina.
156
Até aqui enumeramos os verbos como elemento principal do e da
categorização; isso é verdade, mas tamm há outras formas de se atribuírem casos
que não sejam necessariamente os verbos.
Diferentemente, Franchi (1994a; 1997) assume que as relações temáticas
não se estabelecem entre todos os itens lexicais (incluindo aí as
preposões), mas também entre expressões complexas. Para definir papel
temático, Franchi vale-se da proposta de Dowty (1989), que, embora em
outro quadro teórico, tenta estabelecer uma definição mais rigorosa para o
conteúdo semântico dos papéis temáticos. Dowty (1989), informalmente,
entende que o conteúdo semântico dos papéis temáticos se define a partir
da família de acarretamentos lexicais partilhados por argumentos da
mesma posição sintática aberta por um verbo. Partindo dessa idéia,
Franchi propõe que os papéis temáticos se definem a partir da família de
acarretamentos partilhados por argumentos de “expressões predicadoras
e não de verbos. Primeiro, para incluir nesse termo os itens lexicais que
entram em relações predicativas, independentemente da categoria sintática
em que se manifestem (nome, verbo, adjetivo/advérbio, preposição).
Segundo, para dar conta do processo composicional que reconstrói o
sentido das expressões complexas. (CANÇADO, 2002, p. 7)
Diante disso, aumentamos o leque de categorias para além do verbo e
decidimos por construir uma análise que pudesse identificar os papéis temáticos dos
termos do paradigma designacional.
Por várias vezes, citamos paradigma designacional, sem ainda defini-lo, por
isso é necessário conceituá-lo. Segundo Mortureaux (1993 e 2004, p. 100), o
paradigma designacional é a lista de co-referentes, ou seja, de palavras ou de
expressões diferentes que fazem referência a um mesmo objeto. Essa tal lista forma
um paradigma designacional que reagrupa os sintagmas co-referentes a um
mesmo referente na realidade. Já o conceito de designação é oriundo de Kleiber
(1984). A designão é compreendida como uma forma de apontar um objeto,
diferentemente de nomeá-lo, como por exemplo, referir-se a Napoleão Bonaparte
por seu nome é diferente de designá-lo por o vencedor de Austerlitz ou o vencido de
Watterloo. (CHARAUDEAU E MAINGUENEAU, 2004, p. 365). Designar não é
meramente “apontar” para um objeto na sua existência, mas apontar de uma
determinada maneira esse objeto, como seria o caso para Napoleão Bonaparte,
157
vencido ou vencedor. No corpus, encontramos palavras como “negro”, “pessoa de
pele escura, afrodescentente” para designar um indivíduo negro, da mesma forma
que temos, para “branco”, também um conjunto de outros termos.
Percebemos que poderíamos fazer uma análise integradora, identificando os
paradigmas designacionais, e como seu papel temático se comportava em diferentes
modalidades enunciativas. E ainda como a alternância de uma para outra
modalidade implicaria tamm na alternância de elemento do paradigma.
Finalmente, outra opção metodológica foi o uso do termo sujeito-enunciador.
Primeiramente, isso se deu porque não tratamos do sujeito empírico, que o deve
ser confundido com o sujeito dos textos. Este, por sua vez, se desdobra em
diferentes enunciadores, sendo ainda que um mesmo indivíduo, composto por
diferentes sujeitos e a análise do comportamento desses sujeitos nas formas
enunciativas podem revelar algo sobre o discurso. Na verdade, o termo sujeito-
enunciador recobre apenas a referência criada pelo efeito de debreagem ou
embreagem, porque sabemos que somente um enunciador é quem sustenta a
palavra.
Por fim, o último modelo de análise passou por dois processamentos: o
levantamento das concordâncias no Lexico3 das expressões dos paradigmas
designacionais e a caracterização deles pelo Systemic Coder, a partir dos tipos de
verbos que Chafe propõe, aliando-se aos verbos psicológicos, conforme Cançado, e
daí a busca de papéis. Embora Cançado (2002) faça uma importante distinção entre
papel temático e propriedades semânticas, e explique que um agente pode ser um
experienciador na superfície lingüística, vamos, para efeito de nossa análise,
distinguir entre “agente” e “experienciador” porque o uso de um ou de outro leva a
efeitos de sentido distintos. A além disso, também o caso dos verbos deônticos
158
(dever, ter que, ou seja, todos aqueles que indicam um dever, uma obrigação) que
precisam ser tratados. Assim, seguimos o modelo abaixo para a caracterização dos
papéis temáticos de algumas amostragens.
Ilustração 6 - Esquema de análise dos papéis temáticos
As categorias adicionais que acrescentamos ao esquema, além daquelas que
Fillmore havia elencado, foram a de experienciador e a de paciente”, conforme
os exemplos abaixo:
32) O negro tem vergonha da sua cor.
33) O negro não deve ser excluído de nada ele deve ser tratado igual a todos nós.
Em 32, temos o verbo psicológico “envergonhar-sena sua forma perifrástica
popularter vergonha”, já em 33 o deôntico “dever”. Na frase 32, o enunciado remete
a um discurso bastante difundido entre os sujeitos brasileiros que mobiliza a idéia de
que o negro se envergonha de suas origens. Historicamente falando, nos lembramos
159
de que foram quase 350 anos de escravidão brutal e é óbvio que, para escravizar o
outro, além da chibata havia o objetivo de se criar a identidade de um sujeito sem
direito algum simplesmente pela sua origem, pelo fato de ser negro. Se tomarmos
Foucault (2002), veremos que o método analítico consiste em partir do enunciado
chegando até o arquivo. No caso, o sujeito,colocado na posição de branco, ao dizer
que o negro se envergonha da sua condição faz remontar à formão discursiva que
tenta apagar o passado cruel da escravidão, mantendo-se, pois, à distância do
arquivo. Esse tipo de estragia remete ao que encontramos no capítulo 7 desta tese
quando nos referimos à “igualdade essencialista”. Os dados que extraímos dessa
análise servem para compreender o discurso e conseqüentemente o arquivo, este,
movido pelas dinâmicas da retomada ou eno do desejo de esquecimento.
O que queremos dizer com isso? Que o método quantitativo e as descrições
semânticas e sintáticas dos enunciados têm sua base empírica nos postulados da
AD, ou melhor, que a metodologia empregada não é nada mais que a materialização
em experimentos bastante “objetivos” no sentido próprio das cncias naturais.
uma grande resistência no meio acadêmico brasileiro a procedimentos científicos
nas ciências ditas humanas, mas é preciso, novamente nos importarmos com o
objeto de análise e depois com as nossas crenças” científicas. É preciso realizar,
como recomenda Kuhn (2000) uma epoké (esvaziamento) de nossas crenças para
observar um novo conhecimento ou perspectiva, compreendendo-o para, em
seguida, criticá-lo. Diríamos que Foucault e Pêcheux estavam certos, mas lhes
faltavam os recursos dos quais hoje dispomos para realizar os seus projetos.
Na frase 33, temos um verbo que o expressa processo nem ão, mas
está muito próximo de predicar uma noção estativa. Assim, os verbos psicológicos
selecionam predicados experienciadores enquanto verbos “dnticos”, verbos de
160
“estado” e o verbo “ter” selecionam “pacientes”. Mais uma vez, estamos diante de
uma questão semântica que serve de base para a análise do enunciado até que
cheguemos à compreensão do discurso: o papel de verbos estativos nos
enunciados. Tal aspecto será melhor explorado nos capítulos seguintes, mas que
adiantamos serem os indícios materiais do arquivo, principalmente no que diz
respeito à comparação entre os sujeitos, ou à atribuição de determinadas
características.
4.4 Conclusão do capítulo
Em termos de operacionalização dos conceitos, chegamos ao um método de
análise complexo que visa dar conta de alguns fatores pertinentes ao nosso corpus,
tomando a quantidade de dados e a sua qualidade. O objetivo final é tentar cruzar o
máximo possível essas informões quantitativas e qualitativas para percebermos
como os procedimentos de alternância da referência aos sujeitos enunciadores
revelam as formões discursivas e os efeitos de sentido das erupções. Assim,
seguimos para as análises dos dados e a sua discussão.
161
CAPÍTULO V
DAS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E DO GÊNERO DISSERTATIVO
Após a operacionalização dos conceitos, damos inicio às análises dos dados
levantados segundo a metodologia apresentada. Assim, nesta parte da tese,
iniciaremos com uma discussão a respeito das condições de produção dos textos,
para, em seguida, observarmos as análises descritivas já introduzidas na
metodologia. Nos capítulos a seguir, os dados observados são de ordem quantitativa
e indicam aspectos qualitativos dos grupos do corpus, para, logo em seguida, na
terceira e última parte, apresentarmos nossas considerações sobre as revelações
que obtivemos dos dados.
Não poderíamos proceder a uma análise dos textos sem expandir a noção de
“condição de produção” que foi citada na fundamentação teórica, pois, em relação
aos entornos da produção, sejam eles do contexto imediato ou histórico, não
podemos ignorar as influências que a enunciação exerceu sobre os textos. Nas
noções de condição de produção, evocaremos alguns conceitos muito importantes,
entre eles os de gênero discursivo e gênero textual, para tentar dar conta da
complexidade contida nos textos analisados. Esses conceitos serão explorados com
o fito de traçarmos um quadro mais verossímil dos enunciados produzidos.
5.1 O gênero do discurso
Discutir conceitos tais como condições de produção”, gênero”, “tipologia do
discurso” é tarefa bastante espinhosa do ponto de vista teórico, pois os conceitos
emanados das diferentes posições teóricas parecem ter sempre aspectos comuns,
na maioria das vezes, mas com abordagens e posicionamentos epistemológicos
162
distintos, o que pode levar a equívocos e contradições nos postulados, quando o
pesquisador se propõe a unir diferentes teorias, sejam elas da Lingüística Textual,
da Semântica Argumentativa, do Interacionismo, da Análise do Discurso entre
outras. A visão particular de cada posicionamento trará suas contribuições sobre o
tema, como, por exemplo, para a Lingüística Textual (LT), poderemos ver a
expressão “gênero discursivo”, conforme van Dijk, (1992) valer pelo conceito de
“gênero textual” da Análise do Discurso, um aspecto interessante é que, para alguns
autores, principalmente da LT, discurso e enunciado são sinônimos de texto.
Desde a tradição oriunda de Aristóteles, temos os posicionamentos teóricos
de variadas áreas de conhecimentos, como a dos estudos da linguagem, que se
valem de conceitos filosóficos básicos. O filósofo, ao tratar da noção dos “gêneros”,
falava de logosque fora um termo traduzido por “discurso”, e não por texto. Na
Antiguidade não se distinguia, grosso modo, texto (materialidade) e discurso
(sentido), muito embora a tradição medieval abrisse vistas às idéias de denotação
e conotação como modernamente empregadas. Considerando-se que os conceitos
estão profundamente ligados (condições de produção, texto, gênero, tipo...), vimo-
nos diante de um dilema: iniciaremos a discussão a partir das condições de
produção dos textos ou do tipo/gênero do texto/discurso? Isso constitui um dilema,
porque sabemos que tanto as condições como o gênero estão imbricadas a tal ponto
que não sabemos a partir de onde uma determina a outra. Decidimos, então,
comar pela questão do gênero discursivo. Essa necessidade também tem a ver
com o corpus, pois não é possível tratarmos de um fenômeno analisado em um
conjunto de textos sem antes termos uma noção muito clara de com o quê estamos
lidando.
A discussão do que se vem chamando de gênero é tão antiga quanto a
163
discussão sobre o discurso (texto) iniciada com Aristóteles em sua Arte Retórica e
na Arte Poética, ao tratar dos gêneros literários (tragédia, comédia, poesia épica e
lírica etc..). Acrescentemos um fato interessante: o filósofo grego já propunha a idéia
de que os gêneros não são puros, mas derivados uns dos outros. Infelizmente, muito
se discutiu sobre o gênero enquanto obra literária, mas não como discurso situado
em práticas sociais, fato que Bakhtin traz com muita propriedade, embora
Benveniste (1995), Jakobson (1988) e muitos outros oriundos das escolas
estruturalistas tenham feito importantes incursões nas questões do gênero. É claro
que a incorporação de uma noção dependerá tamm das concepções subjacentes
adotadas pelos estudiosos. Desse modo, para que nossa discussão sobre os textos
do corpus sejam coerentes, decidimos adotar a noção de gênero proposta por
Bakhtin, e é por isso que retomamos aqui alguns de seus princípios.
Ao criticar a escola estruturalista, Bakhtin concorda que o modelo de
comunicação proposto por Jakobson é válido, mas que não comporta toda a
realidade do processo comunicativo, porque parte de um “objetivismo abstrato”.
Nessa perspectiva, a língua é abordada como um sistema que parece “mecânico”,
estendendo esse vs mecanicista aos integrantes da comunicação como o
“emissor” – aquele que envia uma mensagem e o receptor” aquele que a
recebe. Nessa visão, os dois sujeitos principais não são mais que peças no
mecanismo e esse tipo de noção coloca o sistema em primazia. Bakhtin não
concorda com tal primazia, uma vez que tanto o sistema da comunicação quanto a
língua são neutros, ou seja, não carregam, em si, uma ideologia. Nesse aspecto,
Bakhtin reforça a neutralidade do sistema, em conformidade com a tradição pós-
saussureana, mas o sistema em funcionamento deixa sua neutralidade e passa a
servir aos homens em sociedade. É essa concepção que marca o interacionismo,
164
fazendo com que o emissor e o receptor sejam vistos como passíveis da
historicidade e da ideologia e esta carrega uma memória que, apesar da
neutralidade do sistema, sobrevive naquilo que é compartilhado pelo grupo, ou seja,
o homem é marcado historicamente pelo sentido. E o sentido, se constitui sobre
digos que são neutros imanentemente, conforme Bakhtin.
Bakhtin afirma que o “objetivismo abstrato”, que é uma das marcas dos
principais estudiosos estruturalistas (visão mais próxima da imanência do sistema),
reduz o processo comunicativo, o qual, para ele, deve estar identificado com as
relações sócio-históricas do homem, ou melhor, fazendo parte da interação que se
constitui entre os homens. Essas noções são deveras importantes, pois será a partir
das relações entre os homens que surgirão os gêneros e os tipos.
Para iniciarmos a compreensão da noção de gênero, comecemos por revisar
o artigo intitulado Os gêneros do discurso, contido em A Estética da Criação Verbal
(BAKHTIN, 1997). Esse artigo comporta princípios muito facilmente perceptíveis nos
textos analisados no corpus. Inicialmente, Bakhtin considera como ponto de partida
a noção das esferas da atividade humana, afirmando ser imprescindível que se
utilize a língua enquanto sistema para se comunicar; e a utilizão do sistema
lingüístico, seja pelo modo oral ou escrito, se atualiza em enunciados “concretos” e
“únicos” uns aos outros. Para ele, o sistema é neutro,uma vez que uma frase não
constitui sentido se não tiver contexto e historicidade, sempre em conformidade com
o tipo de vivência em sociedade que os seus falantes tiverem. Os enunciados criam
e recriam condições espeficas das relações humanas: [...] cada esfera de
utilização da língua elabora seus tipos relativamente esveis de enunciados, sendo
isso o que denominamos neros do discurso.(idem, p. 279). Equivale a dizer que,
assim como existe um grande número de esferas da atividade humana, para cada
165
uma delas existem os gêneros específicos do discurso, que podem ser
homogeneizados através de alguns tipos relativamente estáveis”. Como a relação
entre as esferas da atividade humana e o nero discursivo é de um para um, a
quantidade de neros se torna infinita e, conseqüentemente, inoperante para se
classificarem detalhadamente todos os gêneros. Esse problema Bakhtin resolve da
seguinte forma: agrupa os gêneros em dois grandes blocos: o gênero primário
(simples), relacionado a todo enunciado em circunstância de espontaneidade; e o
gênero secundário (complexo), relacionado ao gênero primário, mas em um contexto
mormente elaborado. Enquadram-se, no primeiro, os diálogos do cotidiano, a fala
familiar, a ordem militar etc; enquanto que, no gênero secundário, estão o discurso
político-ideológico, o romance, o conto, a redação escolar etc. Dada a sua
simplicidade, abrangência e mobilidade, essa distinção entre os gêneros nos rende
uma boa perspectiva de análise lingüística, haja vista que o autor considera as
relações entre os gêneros, sem contudo hierarquizá-los. É essa mesma mobilidade
que rende aos gêneros muita produtividade, que confirma o continuum entre oral e
escrito, defendido por Olson (apud CORRÊA, 1997). Essas observações nos fazem
acreditar que um texto dissertativo escolar, por exemplo, tem marcas de um gênero
primário, embora esteja arraigado às suas específicas condições de produção que
prevêem um gênero próprio e distinto do primário. Os gêneros discursivos, enfim,
constituem as condições de produção do texto. Observemos o que diz Furlanetto
[s.d. p. 5]:
Encaro o discurso como um objeto de investigação vinculado às condições
de produção dos enunciados (cf.MAINGUENEAU, 1991); os textos,
conjunto de enunciados obedecendo a certas condições de organização,
são formulados dentro de uma moldura institucional que estabelece balizas
para a sua enunciação; eles refletem, de algum modo, as características
históricas da sociedade onde circulam, e de que são marcos e documentos
– refletem, pois, valores, convicções, creas, conflitos.
166
As molduras que balizam o discurso são cruciais para a produção do texto.
Assim é que, para se compreender por que as alternâncias acontecem, é importante
observarem-se as condições de produção, envolvendo rios fatores de diferentes
ordens, tais como: 1) posição dos sujeitos enunciatários; 2) materialidade do texto;
3) espaço de produção e 4) objetivo do texto.
É mister fazer a distinção entre gêneros do discurso e tipologia textual. A
tipologia se desdobra num espaço limitado dentro do quadro maior das
práticas discursivas [...] No caso, a narração, a descrição, a argumentação
comporiam tipos textuais que podem atravessar todos os discursos
institucionalmente caracterizáveis (jornalístico, literário,...) e todos os
gêneros de discurso (o sermão, a reportagem, o conto, o romance,...)
[idem, p. 7]
É a partir dessas definições, que podemos pensar em uma tipologia do
discurso e uma tipologia textual baseadas em práticas sociais, em espaços
definidos, como no caso dos diferentes grupos, conforme Meürer (1997, p. 17)
explica:
[...] sempre que alguém escreve, há uma expectativa de que o texto
produzido seja o reflexo de determinados discursos e que, portanto,
espelhe as maneiras de falar ou escrever das diferentes instituições que
regulam a comunidade onde o indivíduo está inserido. Por isso, há também
uma expectativa de que todos os textos tenham formas, funções e
conteúdos específicos. E é esta expectativa que impõe ao escritor um
conjunto de exigências de caráter psicossociolingüístico que precisam ser
contempladas durante o processo de composição.
Essa citação vem confirmar que os mecanismos de produção de texto estão,
impreterivelmente, submetidos às condições sociais de produção bem como às
condições psicológicas e lingüísticas –, o que nos motiva a tecer algumas
considerações quanto ao funcionamento dos mecanismos de enunciação
especificamente no contexto da coleta do corpus.
Para compreender-se o mecanismo de textualização, ou seja, do
procedimento específico dos autores dos textos escreverem/enunciarem,
precisamos estabelecer algo que seja tido como unidade mínima de análise, ou
167
melhor, antes de termos uma unidade mínima, qual é a nossa unidade referencial
mínima? Vejamos: na lingüística estrutural, a unidade mínima de análise constituía-
se do signo lingüístico, tido como a palavra (no modelo de Saussure, o signo de
dupla face contém o significante e o significado); para o Gerativismo, a unidade
mínima de análise é a frase; para a visão interacionista proposta, o objeto é o
enunciado. Para Foucault, o enunciado tem uma existência ao mesmo tempo
singular e dispersa, mas, a exemplo do que faz Bakhtin, não pretende que o
enunciado tenha uma dimensão fixa:
[...] o enunciado o é uma unidade do mesmo gênero da frase, proposão
ou ato de linguagem; não se apóia nos mesmos critérios; mas não é
tampouco uma unidade como um objeto material poderia ser, tendo seus
limites e sua independência em seu modo de ser singular (nem
inteiramente lingüístico, nem exclusivamente material; ele é indispensável
para que se possa dizer se ou não frase, proposição, ato de linguagem;
[...] (FOUCAULT, 2002, p. 98)
Foucault fala do que não é enunciado; mas, então, o que é o enunciado?
Trata-se “de uma fuão que se exerce verticalmente, em relação às diversas
unidades, e que permite dizer a propósito de uma rie de signos se elas estão
presentes ou não”. (idem) Acreditamos que, ao associarmos essa noção, à de
Bakhtin, que compreende o enunciado como “unidade da comunicação verbal”, não
erraremos, mesmo que ambos os filósofos estejam muito distantes em seus
caminhos. A noção de enunciado, tanto em Foucault com em Bakhtin, se
assemelham no que diz respeito à busca da noção de unidade: “As fronteiras do
enunciado concreto, compreendido como uma unidade da comunicação verbal, são
determinadas pela alternância dos sujeitos falantes, ou seja, pela alternância dos
locutores. (BAKHTIN, 1997, p. 293-4). Se havíamos tomado nos capítulos iniciais
desta tese a noção de enunciado como materialização da enunciação, agora é o
momento de dizer qual é a extensão dessa materialização, o que implica em
delimitar suas fronteiras.
168
Alternar locutores pode a ser mais amplo, vai além da situação primária,
fazendo com que se possa alargar o conceito. Chegamos, então, a uma noção: a
fronteira entre um enunciado e outro, para o nosso objeto de análise, é a troca de
turno conversacional, expressão que deve ser compreendida latu senso, para além
da conversação oral, de modo que um enunciado pode ser uma frase, um romance,
uma tese acadêmica, um memorando administrativo, um sermão na igreja etc.
Assim, observando os princípios de Foucault e de Bakhtin, é possível
entreverem-se alguns aspectos em comum, como as idéias de unidade e de função.
A de unidade é que permite dizer-se isto é um romance”, “isto é uma notícias de
jornal” e a função é a que permite dizer-se, grosso modo, isto serve para o deleite”,
“isto serve para informar”. O conjunto de enunciados serve de objeto de análise e,
logo, para permitir que se compreendam as práticas sociais através da linguagem,
em suas condições de produção, uma vez que o enunciado é histórico, e é por essa
perspectiva que Bakhtin afirma que, antes de qualquer enunciado, outros
enunciados, bem como depois deles há “enunciados-respostas”:
[...] o locutor postula esta compreensão responsiva ativa: o que ele espera,
não é uma compreensão passiva que, por assim, dizer, apenas duplicaria
seu pensamento no espírito do outro, o que espera é um resposta, uma
concordância, uma adesão, uma objeção, uma execução [...]. (BAKHTIN,
1997, p. 291)
Fica patente a questão da alteridade para o autor, fato que se confirma em
Benveniste (1995) e em Pêcheux (1993).
Com relação ao caráter da “resposta à que se refere Bakhtin, devemos
observar que os enunciados da oralidade eso em interação direta; no caso dos
gêneros secundários, ou seja, dos textos escritos, a resposta ativa é retardada no
tempo e acontece em outro espaço, mas não deixa de existir. Desse modo, quando
um romancista escreve, ele não está criando uma obra sem um motivo ou como uma
provocação, mas espera uma resposta de seus interlocutores, mesmo que seja
169
distante, que pode vir sob um posicionamento social, uma inquietação, uma
atividade política, ou o engajamento em uma linha de pensamento ou o mero deleite.
para Maingueneau (2001, p. 61), “alguns autores empregam
indiferentemente ‘gênero’ e ‘tipo de discurso’, mas a tendência dominante é a de
distingui-los, como o fazemos desde o icio deste livro: os neros de discurso
pertencem a diversos tipos de discursos associados a vastos setores de atividade
social.” Assim, o tipo é mais geral, enquanto o gênero é mais específico. Por
exemplo: [...] o ‘talk show constitui um gênero de discurso no interior do tipo de
discurso ‘televisivo’ que, por sua vez, faz parte de um conjunto mais vasto, o tipo de
discurso midiático, em que figurariam também o tipo de discurso radiofônico e o da
imprensa escrita.” (idem). Assim, os gêneros dependem dos tipos e ambos os níveis
estão estreitamente relacionados às situações sociais, de modo que podemos
compreender uma sociedade a partir de seus gêneros e tipos.
Diante do que fora visto sobre a questão do gênero e do tipo, como podemos
compreender os textos que analisamos? Para compreender essas duas categorias
precisamos observar como socialmente elas eso constituídas. Para melhor
entender esse contexto, retomemos alguns critérios sugeridos por Maingueneau
para a caracterização dos gêneros e tipos, que são eles:
a) Uma finalidade
b) O estatuto de parceiros
c) O lugar e o momento
d) O suporte material
e) A organização textual
A partir desses critérios, será possível compreender de que tipo de interação
social tratam os textos analisados; por isso analisaremos as condições de acordo
com os cririos acima. O que Maingueneau propõe é caracterizar os gêneros
170
secundários em tipos; a nosso ver, isso não invalida o princípio de unidade e
tamm o invalida o de enunciado, muito embora utilizemos enunciado para nos
referirmos, por vezes, a um texto inteiro ou a um trecho de texto.
5.1.1 A finalidade
Para a admissão em um curso de nível superior o estudante brasileiro precisa
comprovar que está apto a cursar disciplinas que compõem as matrizes curriculares
dos diferentes programas de graduação, sendo que o processo seletivo para a
entrada em um curso superior é regulamentado pelo Ministério da Educação através
de diferentes normas emanadas da Lei 9394/96 (Lei Darci Ribeiro – Lei de Diretrizes
e Bases da Educação). Dentre as várias regulamentações dessa lei, estão atos
normativos, dentre os quais a Portaria Ministerial do Ministério da Educação (MEC)
de nº 391, de 7 de fevereiro de 2002, estabelece que todos os processos seletivos
para o ingresso no ensino superior tenham como uma das provas, obrigatoriamente,
a de redação e que nenhum candidato com nota zero possa ser admitido em curso
superior. Estamos diante de um gênero ou de um tipo de discurso? A “redação”
escolar, diante do que fala Bakhtin e do que Maingueneau propõe, constitui um tipo
de discurso dentro da instituição escolar que compreende todos os níveis do ensino,
inclusive suas avaliações eliminatórias e classificatórias para os diferentes níveis de
ensino, como é o caso da redação no processo seletivo. Por outro lado, qualquer
texto proposto no ambiente escolar pode constituir o tipo discursivo “redação
escolarque é diferente da redação em sentido amplo.
A redação escolar es intimamente ligada às condições escolares de
produção dos sentidos. Muitas vezes a experiência tem demonstrado que o escrever
171
na escola acaba se tornando algo burocrático
46
como a avaliação pela avaliação.
Por outro lado, é o único ambiente, no qual, muitos estudantes são levados a ler e a
escrever, haja vista que o ambiente familiar de muitos deles não incentiva a leitura e
as práticas da escrita. Há de se considerar a artificialidade das produções escritas
na escola, mas artificialidade não significa incompetência no ensino-aprendizagem
de língua materna e da produção de texto.
Costumamos utilizar uma analogia para explicar a artificialidade constitutiva
da escola: o treinamento de um piloto de avião. Normalmente, o piloto, em situação
de aprendizagem, vale-se de um simulador de vôo e isso não desmerece seu
processo de aprendizagem, pois se trata simplesmente de um exercício para que
possa aprimorar as técnicas de pilotagem de maneira que, como aprendiz, aprenda
e execute com segurança um vôo real. Assim, é preciso compreender que a
artificialidade da escola não é um mal necessário, mas que ela é simplesmente
constitutiva. Imaginemos um aluno de pilotagem em seu primeiro dia de vôo sendo
obrigado a conduzir um avião lotado de passageiros sem as noções mínimas de
velocidade, altitude, leitura de equipamentos etc. Sem dúvida, a vida de todos
estaria em risco. Infelizmente, os “simuladores de vôo da escrita” nas escolas ou
estão desligados ou funcionam mal, o prevêem turbulências, nem rotas
alternativas e muito menos acrobacias!
A tipologia redação escolar prevê diferentes neros em seu bojo, mas
sempre serão textos escolares. Podemos ter o texto dissertativo, narrativo, a
resenha, o resumo, a paráfrase etc. como neros que servem a diferentes
objetivos. No caso específico dos textos que analisamos, seja em situação de prova
de vestibular, prova simulada ou simplesmente um dever de casa, temos um fator
46
Sobre o tema, ver Geraldi (1991), Suassuna (1995).
172
importante: a avaliação. Ela pode servir, a princípio, apenas para atribuir-se uma
nota, ou para se dizer se um sujeito é competente ou o para cursar o nível
superior, ou, na situão ideal escolar, ela pode ter o objetivo de ajudar o estudante
a melhorar seu desempenho na escrita, considerando-se diferentes habilidades
nessa prática. Embora os textos dos grupos analisados tenham enunciatários
distintos, a avaliação está presente em diferentes nuanças e respostas. No caso das
provas de vestibular, a avaliação é convertida em uma nota que pode ser
eliminatória (conforme a portaria 391/2002 do MEC) ou classificatória, colocando os
indivíduos em ordem de melhor nota. Já nas condições de prova simulada ou
exercício de escrita, a idéia é que o professor responsável ajude o estudante a
identificar problemas nos textos e possa auxiliá-los a resolverem seus problemas.
Em todo o caso e, infelizmente, tanto o estudante quanto um candidato a uma vaga
no ensino superior, por força das circunstâncias, colocam em primeiro lugar o efeito
da aprovação e, em segundo lugar, demonstrar seu ponto de vista sobre um tema.
Também por força das circunstâncias, nem sempre os avaliadores ou professores
responsáveis conseguem devolver ao estudante diagnósticos avaliativos completos
sobre suas habilidades e competências na escrita, o que pode constituir um gênero
bastante superficial em seus propósitos, pois o atinge seus objetivos didáticos-
pedagógicos de ensino-aprendizagem de produção textual.
5.1.2 Os parceiros
Os sujeitos envolvidos na enunciação escrita dos textos analisados ocupam
posições discursivas socialmente pré-determinadas que, em função da finalidade (cf.
o item anterior), chamaremos de “avaliador” e de “avaliado”. Muito embora, o gênero
dissertação escolar pressuponha um sujeito opinando para outro, apesar das
173
dificuldades que os sujeitos (estudantes e candidatos) experimentam em produzir
textos, ainda assim, o espaço da dissertação escolar é um lugar de expressão das
opiniões, pois é onde o estudante pode ser ouvido, embora a reciprocidade nem
sempre seja satisfatória.
Para dar conta das imagens que os parceiros desse diálogo constroem,
tentaremos compreender, à luz do que Pêcheux (AAD [1969] 1996) expõe sobre os
lugares sociais que os interlocutores ocupam. Inicialmente, cheux promove uma
revio do esquema jakobsoniano da comunicação, pois coloca “emissor” e
“receptor” não mais como seres ontológicos e peças no processo, essas entidades,
na verdade, ocupam lugares sociais imaginários, ou seja, o sujeito empírico, ao
enunciar, pressupõe imagens sobre os lugares, constrói uma circunscrição simbólica
sobre sua posição e sobre a posição do outro e que, conseqüentemente,
constrangerá seu texto de alguma maneira. Retomemos o esquema conforme
Pêcheux:
(L)
D
A B
R
A: o “destinador”
B: o “destinatário”
R: o “referente”
(L): o digo lingüístico comum a “A” e a “B”
D: a seqüência verbal emitida por “A” a “B” (idem, p. 81-2)
Aqui, “D” não é uma simples mensagem, mas o efeito de sentido que “A”
provoca em “B”, e o sentido dessa seqüência vai depender da formação imaginária
entre os enunciatários posicionados em “A” e “B”. Considerando que as formações
imaginárias dependem das posições sociais que os interlocutores compartilham,
174
podemos ver no seguinte quadro como se o funcionamento desse esquema:
Expressão que designa as
formações imaginárias
Significação da expressão
Questão implícita cuja
resposta subentende a
formação imaginária
correspondente.
*
I
A
(A) Imagem do lugar de A para
o sujeito colocado em A
“Quem sou para lhe falar
assim?
I
A
(B) Imagem do lugar de B para
o sujeito colocado em A
“Quem é ele para que eu
lhe fale assim?”
I
B
(B) Imagem do lugar de B para
o sujeito colocado em B
“Quem sou para que ele
me fale assim?”
I
B
(A) Imagem do lugar de A para
o sujeito colocado em B
“Quem é ele para que me
fale assim?
Quadro 4 - O jogo de imagens e as perguntas subjacentes
Esse esquema é expansível ainda com relação a R, L e D. No caso das
avaliações das redações, acreditamos que seria interessante refletirmos sobre as
imagens que os enunciatários fazem de R e L, se realmente são mais significativas
que a de D; para isso, propomos um segundo quadro como tentativa de dar conta
dos outros elementos das condições imaginárias:
Expressão que designa as
formações imaginárias
Significação da expressão
Questão implícita cuja
resposta subentende a
formação imaginária
correspondente.
I
A
(R) Imagem do lugar de A para
o R.
“Quem sou para falar
sobre isso?”
I
A
[R(B)] Imagem do lugar de A para
falar de R para B.
“Quem sou eu para lhe
falar sobre isso?”
I
B
(R) Imagem do lugar de B para
o R.
“Quem é ele para ouvir
sobres sobre isso?”
I
B
[R(A)] Imagem do lugar de B para
ouvir de A sobre R.
“Quem sou para que ele
me ouça falar sobre isso?”
Quadro 5 - O jogo de imagens e as perguntas subjacentes - continuação
No último quadro, o imaginário é estabelecido sobre a proposta da produção
de texto e, conseqüentemente, amemória” ou o “pré-discurso” são acionados sobre
*
“I” significa imagem.
175
o tema, e logicamente, as FDs irão surgir de acordo com as condições ideológicas
dos grupos motivados a falar sobre R, mas esse falar é condicionado pelas posições
tamm e pelas imagens, o que não quer dizer que o avaliado irá dizer o que o
avaliador quer, mas aquilo que aquele julga que este considerará adequado,
pertinente, plausível. O avaliador é para o avaliado um especialista em língua que
julgará suas idéias e seu texto e, para o avaliador, o avaliado é alguém que
necessita comprovar que tem domínio mínimo sobre a escrita, em especial sobre o
gênero no qual o avaliado deve escrever. Como o corpus é constituído de textos
produzidos de maneira heterogênea, podemos pressupor que também tenhamos
dados muito heterogêneos. A pressuposição ficaria por conta das condições
distintas de produção de texto (processo seletivo para a universidade, dever de casa
e prova simulada), no entanto, o que temos ainda são sujeitos enunciantes: um
avaliador e um avaliado. A julgar pelas grandes semelhanças entre os grupos do
corpus, a relação avaliador e avaliado são muito determinantes.
Percebemos que o fato de termos sujeitos distintos para cada uma das
situações dos grupos de texto não alterou em muito as imagens que eles tinham do
que diziam e para quem diziam. Prova disso é que as alternâncias ocorreram
independentemente da situação de produção, além disso, os textos mantiveram
entre si uma grande proximidade lexical, isso é claro, graças ao tema comum e às
FDs em que estavam inscritos.
O avaliado em uma prova de vestibular somente tem acesso à sua nota final,
desconhecendo qualquer outro tipo de diálogo ou procedimento avaliativo que lhe
conferiria uma revisão de seu texto. Logo, não se trata de uma produção de texto
para a aprendizagem, na qual se considera o seu ir e vir do estudante para o
professor que orienta e auxilia nas dificuldades e refacções do trabalho. Além disso,
176
o avaliador não é conhecido do avaliado em condões de concurso, como os grupos
A e D (cf observamos no capítulo IV). Já os informantes dos grupos B e C (idem)
gozavam de outra relação com os seus avaliadores. Em B, nhamos uma avaliação
proposta como texto para ser produzido em casa, e em C, uma simulação de prova
de vestibular. Em ambas as situações os sujeitos avaliados conheciam seu sujeito
avaliador. A nosso ver, esse tipo de diferença não influencia na produção de texto,
pois, nesse gênero, os sujeitos já estão condicionados a seus papéis e objetivos, ou
seja, devem argumentar sobre um ponto de vista de maneira formal, organizando
seus argumentos e se colocando como sujeito do dizer. Prevalece, então,
infelizmente, como objetivo final desse tipo de tarefa a avaliação, a qual é, na
maioria das vezes, meramente punitiva. Nesse aspecto, estamos nos referindo à
condição escolar de produção de textos que, salvo as exceções, proporciona um
ensino massivo, no qual a preocupação não é a competência do educando na
elaboração do texto escrito.
5.1.3 O lugar e o momento
Diferentes modalidades se valem de estatutos diferentes de lugar, como, por
exemplo, o outdoor que está exposto na rua cujo leitor é um sujeito ocasional.
Diferentemente, um texto publicitário em uma revista masculina que pode ser
transportada de um lugar para outro e ser lida por um blico a quem apetece.
Entre o outdoor e a revista temos uma diferença de suporte. Além do suporte, o
espo pode ser significativo ou determinante do dizer, como é o caso de um
outdoor ter determinados limites para exposição de imagens que não seria o mesmo
de uma revista masculina, mesmo que se tratasse do anúncio de um mesmo
produto.
No caso das provas de vestibular e simulado de prova, o ambiente escolar é o
177
espo sico que representa tamm um espaço social. Mesmo quando se trata de
um texto escrito fora do ambiente escolar, no caso de um trabalho de casa, o
ambiente que domina o dizer ainda é escolar; no caso dos textos analisados,
somente os do grupo C não foram produzidos diretamente no espaço escolar, mas
escritos para a escola: em suma, fisicamente o era a escola, mas socialmente a
sua voz estava criando os seus constrangimentos para produção dos textos que os
estudantes fizeram fora de campo.
Com relação ao tempo, Maingueneau destaca alguns aspectos a serem
observados para a determinação de um gênero: periodicidade, encadeamento,
continuidade e validade. O texto dissertativo escolar não tem uma periodicidade,
como uma coluna em um jornal, também não há um encadeamento, pois ele é
produzido em um momento apenas e para uma finalidade apenas. Além disso, o
texto produzido na escola tem como efetivo leitor o professor ou então, no caso
dos interlocutores que analisamos, tem os avaliadores. O texto, enquanto unidade,
tem um ritmo de leitura contínuo, diferentemente de um romance e sua validade
expira na avaliação, pois, não se trata de textos aos quais se atribuem valores
temporais distintos, como é o caso de um jornal ou de um romance da literatura
universal.
Nesse caso, a temporalidade de um texto dissertativo escolar é semelhante à
dos que são produzidos nas condições da publicidade ou da notícia jornalística. A
diferença é que se soma a sua efemeridade, o caráter de texto privado, ao qual
têm acesso os seus autores e seus avaliadores.
5.1.4 O suporte material
O suporte material de um enunciado é tamm seu meio, como vimos no item
178
anterior. Como o texto verbal é constituído de ruídos que se propagam nas ondas
sonoras, o texto escrito se pelo contraste entre pigmento e um fundo, formando
desenhos convencionados, ou seja, os grafemas que tamm podem surgir pelas
imagens projetadas através dos íons dos monitores dos computadores. No caso dos
textos analisados, são todos eles manuscritos sobre uma folha de papel pautada. As
dimensões dos textos têm mínimo e máximo recomendados: mínimo de 18 linhas e
máximo de 35 e, no mínimo, 180 palavras.
Outro fator que deve ser levado em consideração é a quantidade de tempo
que os estudantes tinham para produzir os textos: no caso de A e D, os sujeitos
tinham a 4 horas para o fazerem, levando em consideração que eles deveriam
tamm responder a mais 40 questões objetivas de outros conteúdos. Já o grupo B
teve uma semana para escrever o texto, enquanto o grupo C teve apenas 2 horas,
que era o período de aula de Redação.
A mídia pela qual se escreve o texto, uma folha de resposta, condiciona-o a
um ou dois leitores no máximo, como é o caso das provas de vestibular, que
envolvem, pelo menos, dois leitores-avaliadores. os grupos os grupos B e C
tiveram apenas um interlocutor vislumbrado pelo estudante, que era o professor.
Antes de se chegar a uma versão final do texto, o candidato tem a oportunidade de
fazer um esboço ou rascunho do que pretende escrever e então pode passar
sobre a folha oficial a versão final: há, então, um espaço de tempo para a retomada
de idéias e uma revisão do texto, o que o implica que todos os enunciadores o
façam e, se o fazem, as alternâncias, que poderiam ser tidas como “erros” ou
enganos, não terão sido revisadas. O que pode ter duas explicões: a) a maioria
dos sujeitos são desatenciosos, b) os enunciadores estão condicionados a não
perceber a alternância como erro por força do fazer enunciativo, ou melhor, do
179
modus operandi, o que comprova que o próprio enunciador não percebe a
alternância como erro. Mesmo que os professores de produção textual advirtam
seus alunos sobre tal fenômeno, ele acontece, pois a alternância é algo internalizado
como um procedimento legítimo de enunciação, como veremos nos próximos
capítulos.
Outro aspecto a ser levado em considerão é a questão da identificação nos
textos do grupo A e D. Os avaliadores não têm acesso ao nome dos candidatos,
apenas a um número de identificação; aliás, é proibido ao candidato, sob pena de
desclassificação, se identificar, porque o objetivo desse tipo de restrição é manter
uma dada imparcialidade dos avaliadores, por se tratar de um concurso. No caso
dos textos produzidos em aula (grupos B e C), a identificação precisa ser feita em
função dos objetivos didáticos de correção e orientação da produção escrita.
Materialmente, os textos têm basicamente a mesma formação, o mesmo
meio-suporte, e essencialmente não acreditamos que isso seja um fator
preponderante para o fenômeno analisado, mas se trata de um item que permite a
categorização do gênero e representa uma dada condição de produção, em
especial, com relação ao tipo de discurso que é o escolar.
5.1.5 A organização textual
A organização textual, por sua vez é um elemento extremamente importante
no caso do gênero dissertativo escolar:
Todo gênero de discurso está associado a uma certa organizão textual
que cabe à lingüística textual estudar. Dominar um gênero de discursos é
ter uma consciência mais ou menos clara dos modos de encadeamento de
seus constituintes em diferentes níveis: de frase a frase, mas também em
suas partes maiores. (MAINGUENEAU, 2001, p. 68).
O texto dissertativo escolar é um gênero altamente associado a uma
organização textual: o espaço, aqui, seria muito curto para citar todos os livros,
180
apostilas didáticas e manuais de redação que prevêem o texto dissertativo escolar
como um texto composto de 4 parágrafos, sendo um de introdução, dois de
desenvolvimento e o último de conclusão, escrito de maneira preferencialmente
impessoal e no presente do indicativo.
É claro que esse tipo de orientação estereotipada do texto dissertativo escolar
é uma orientação que os estudantes, o necessariamente, seguem; então, o que
permite dizer que os textos produzidos pertencem a esse gênero? Podemos dizer
que alguns textos não preenchem completamente os requisitos para serem
categorizados como textos dissertativos escolares, mas isso não impede que o
enunciador rompa com algumas estruturas, e que esse romper também signifique a
exclusão do texto da pertença ou não ao gênero. Isso porque outros elementos
ainda são tão marcantes para determinar a sua pertença a um gênero que ele
compensa a ausência de outros, como é o caso do critério “conteúdo”. A cultura
criada em torno da redação do vestibular tamm explica o formato do texto em
relação ao conteúdo, que é o fato de se construir uma opinião sobre um tema
normalmente polêmico, o que acabou por estabilizar esse critério. Mesmo que o
texto seja julgado “ruim”, o preencha algumas condições mínimas de coesão e
coerência, ou que a opinião do sujeito seja absurda, tem-se apenas “um texto ruim
daquele gênero, jamais será um enunciado de outro gênero.
5.1.6 O gênero dissertativo escolar
Após observar os critérios discutidos nos itens anteriores, chegamos a uma
caracterizão do texto dissertativo escolar
47
, muito embora reconheçamos as
diferentes vertentes que estudam o nero de modo profundo, preferimos ficar com
uma visão um pouco mais esquemática e que pudesse ser mais operante.
47
Para outras abordagem recomendamos Pilar (2002), Meurer (1997, 2002).
181
Chamamo-lo também de “texto dissertativo escolar” e não simplesmente de redação
escolar em virtude de sua composição de conteúdo. A diferença entre um e outro
reside no fato de a “redação escolar” comportar todos os gêneros que passam a ser
ensinados na escola e são passíveis da esquematização e didatização próprios do
ambiente escolar. Tal esquematização provoca nos textos que circulam fora dos
muros da escola, uma transformação de função. Ou seja, se uma receita culinária é
tomada como objeto de estudo na escola, ela não deixa de ser uma receita, mas
passa a figurar na tipologia escolar e ter uma função didática e não a de instruir
um cozinheiro. Os sujeitos envolvidos nesse processo comportam, assim,
procedimentos didatizados dentro do discurso escolar, logo constroem uma imagem
esquematizada de produção de texto, que é bastante determinada pelas instituições
de ensino ou pelas instituições avaliadoras, uma vez que existe um “diálogo”
48
entre
elas.
Corrêa (1997, p. 124) afirma, em sua análise voltada para textos de
vestibular:
No caso do vestibular, portanto, o caráter de réplica, típico das situações
em que alguém se submete a um avaliador, permite levantar a hipótese de
que a (re)produção do esquema está ligada tanto ao imaginário sobre a
instituição à qual o vestibulando se dirige, como ao contato prévio com
tipos de textos que apresentam uma estrutura formal [...]
Além disso, há outro fator a ser considerado: o turno de troca, do qual falamos
ao retomar algumas idéias de Bakhtin, é provocado pela circunstância avaliativa e
desencadeia uma resposta a uma “provocação” que é o tema de redação composto
por, pelo menos, duas partes: a) textos de apoio; b) comando, como é caso dos
anexos I e II. Os textos de apoio servem para ativar a memória discursiva e cognitiva
dos estudantes ou candidatos, enquanto o comando é o trecho que explicita o
48
Trata-se do diálogo existente entre a instituição avaliadora e as instituições de ensino, em especial
os cursos pré-vestibular e as escolas de ensino médio, principalmente em relação ao vestibular. Esse
diálogo nem sempre é aberto, claro, público. Ele, na maioria das vezes, é um diálogo de mudos e de
achismos.
182
gênero de discurso e o foco temático a ser tratado. O tema não deixa de ser um
enunciado tamm com as suas peculiaridades: a primeira é a de constituir-se em
uma espécie de mote e, dessa circunstância, advêm alguns fatores, tais como
determinar o referente, determinar o gênero da resposta, pois um dos contratos
estabelecidos entre os interlocutores desse gênero (avaliado e avaliador) é de o
avaliado escrever sobre o assunto proposto no tema e de acordo com a orientação
(narração, dissertação etc.). Assim, o que se tem é um gênero específico, com
relações com outros gêneros, como os opinativos veiculados em jornais e revistas,
mas que serão lidos por, no máximo, dois leitores, como já explicado acima. A
questão que resta é tentar compreender como tais condições de produção desse
gênero podem influenciar no femeno analisado, o que pode ser observado
através das comparações feitas entre os textos para se averiguar se as condições
realmente tiveram sua colaboração.
5.2 Caracterização do corpus
Como foi antecipado na metodologia, o corpus está constituído de um total
de 464 textos distribuídos pelos grupos conforme a tabela número 1
49
. As
características de cada grupo e as condições de suas coletas foram descritas no
capítulo destinado à metodologia. Antes de darmos início à apresentação dos dados
quantitativos e qualitativos, gostaríamos de observar as características sócio-
educacionais dos grupos analisados. No entanto, os únicos dados sócio-
educacionais completos são os dos grupos A e B, pois, nos grupos C e D, tivemos
dificuldades para cole-los: no grupo C, um total de 27 informantes não preencheu
o questionário (anexo III). O grupo D, como foi constituído de textos do vestibular
49
Por uma questão de espaço, apresentaremos nos anexos V apenas 50 textos do grupo A, e 10
textos de cada um dos outros grupos B, C e D.
183
2006, e não se tinha mais, na Instituição, a prática de os candidatos preencherem o
questionário sócio-educacional, ficamos sem as informações desse perfil. No
entanto, é preciso lembrar que o perfil dos ingressantes nos cursos, conforme
levantamentos posteriores na avaliação institucional da FAFIJAN, não sofreu
grandes alterações nos últimos 5 anos, o que nos leva a crer que o mesmo perfil do
grupo A pode ser aplicado ao grupo D.
De um modo geral, os produtores dos textos analisados são, em sua maioria,
jovens na faixa etária entra 17 e 26 anos, oriundos de escola blica e que revelam
ter tido pouco contato anterior com o texto escrito. Esse tipo de perfil talvez não
explique propriamente as ocorrências de alternância, mas sim diferentes problemas
de escrita apresentados nos textos, conforme se possível observar-se nos
exemplos a serem destacados e nos anexos. As dificuldades que um estudante
possa encontrar na escrita não justificam a alternância, pois, mesmo pessoas com
habilidade desenvolvida na língua escrita estão propensas a alternar. Isso implica
em afirmar que a alternância o é um defeito, mas muito pelo contrário: ela nos
ensina algumas coisas sobre a astúcia da ideologia e da memória em que os
sujeitos estão inseridos, como veremos mais adiante.
5.3 Sobre as características estruturais das alternâncias: as erupções
Como prevenimos no capítulo que tratava da metodologia, iremos propor
que o modo enunciativo básico é a np, isso quer dizer que a 1ps e a 1pp são formas
acidentais (no sentido geológico), como erupções na crosta terrestre, o que quer
dizer que as debreagens fazem parte muito mais de algumas condições especiais da
enunciação que propriamente de sua base. Inicialmente observaremos as
características das “erupções dos modos enunciativos, com o conjunto de gráficos a
184
seguir ilustrando a quantidade de erupções conforme os grupos analisados.
Gráfico 1- Relação de pessoas enunciativas e grupos
Esses gráficos demonstram como todos os textos agrupados se comportam
em relação à predominância da pessoa enunciativa; nesse caso, contam-se aqui os
textos que não possuem erupções da 1ps e da 1pp, sendo como se toda massa
textual dos 464 sujeitos estivesse agrupada. De um modo geral, a voz
predominante é a np, enquanto alguns grupos demonstram uma variação pequena
em relação à 1ps, que é a menos ocorrente. No entanto, a discrepância entre B e D
é grande para 1ps, pois em B, temos 18% e em D, 6%. As semelhanças e diferenças
entre os grupos nos ajudaram a propor diferentes interpretações como as que se
seguem.
Ao observarmos A, B e C, percebemos que têm a média de 1ps variando
entre 10% e 18% (média simples 13,6%). No entanto, qualquer suposição sobre as
características dos enunciadores de B seria validada com outros procedimentos
de análise. Assim, julgamos que será melhor não emitirmos juízo sobre os motivos
que levaram a essa diferença, pelo riscos de recairmos na mera especulação. O
Enunciações do Grupo A
13%
39%
48%
1ps
1pp
np
Enunciação do Grupo B
18%
33%
49%
1ps
1pp
np
Enunciação do Grupo C
10%
40%
50%
1ps
1pp
np
Enunciação do Grupo D
6%
42%
52%
1ps
1pp
np
185
que vale ressaltar aqui é que todos os grupos apresentaram alternâncias.
É importante observar-se que os grupos A, B e C, que tratam das cotas
raciais, têm média de alternância muito próxima, enquanto em D, cujo tema é a
violência, há um sensível diferença.
Gráfico 2 - Erupções enunciativas por grupo
Os gráficos demonstram que todos os grupos apresentaram textos em que
não uniformidade da np, ou seja, em sua grande maioria, há a embreagem
enunciativa para a 1ps ou 1pp, em algum momento. Temos que ressaltar que, no
caso do grupo D, há uma maior incidência de textos que se mantiveram na np. Isso
pode levar a uma hipótese: a de que o tema influenciou na quantidade de
debreagens nos textos, ou seja, as erupções fazem parte da natureza enunciativa,
mas o tema pode motivar um número maior ou não de enunciados embreados. Em
nossa opinião, quando se trata de respostas em que os sujeitos o instados a
falarem de temas relacionados à identidade, a possibilidade de que as embreagens
Erupções em A
74%
26%
sem erupção
com erupção
Erupções em B
24%
76%
sem erupção
com erupção
Erupções em C
72%
28%
sem er upção
com er upção
Erupções em D
63%
37%
sem erupção
com erupção
186
enunciativas aconteçam é de pelo menos de 15% a mais.
Um outro argumento para que ocorram as alternâncias seria o de que os
sujeitos, por terem pouco contato com os temas propostos, ficariam buscando
argumentos como quem “tateia no escuro”, ou como quem procede a uma escie
de “ruminação enunciativa”, como alguns exemplos deixam entrever. Não
concordamos com essa explicação, embora mais testes precisem ser feitos para
comprová-la. A própria diferença entre o grupo de controle D e os demais demonstra
que o procedimento não se pela falta de conhecimento, pois, pela qualidade de
informações no grupo D, não é possível afirmar-se que os seus sujeitos tivessem
mais conhecimento sobre as semelhanças e diferenças entre o crime organizado e o
terrorismo do que sobre cotas raciais. Por isso, continuamos com a convicção de
que alternar é inerente aos procedimentos enunciativos e os temas, em virtude das
suas implicações em relação às imagens e às identidades, podem provocar maior ou
menor intensidade nas alterncias.
5.3.1 Sobre as alternâncias eruptivas
Observamos as possibilidades de segmentação nos textos e percebemos que
ela não era eficiente, como ficou demonstrado no capítulo IV. Observamos tamm
que a 1ps e a 1pp eram como erupções em um terreno formado pela np, assim,
teríamos, em termos de ilustração o seguinte gráfico:
187
Gráfico 3 - Ilustração do mapa eruptivo
O gráfico acima representa um texto que teve a seqüência np - 1pp - 1ps – np
- 1pp. Em tal caso, temos a linha lilás que representa e base enunciativa np,
enquanto que os índices 10 e 15 representam o eixo da debreagem”,
respectivamente de 1ps e 1pp, de modo que em uma escala de 0 a 15, o 1
representa embreagem np, o 10 a 1ps e o 15, 1pp. Essa escala numérica é apenas
a tentativa de representação da diferença entre a 1ps e 1pp, sem, contudo,
estabelecer uma hierarquia, servindo apenas para a demonstração que existem
diferenças entre uma e outra debreagem. No entanto, tal diferença está baseada em
uma distância referencial, da indeterminação para maior determinação. A partir do
mapa ilustrativo acima, surgem pelo menos três questões para serem discutidas:
a) Quantos modelos de mapas dariam conta dos 464 textos e haveria
variação de um grupo a outro?
b) Quais seriam as regularidades formais ou semânticas implicadas nesses
movimentos de alternância/erupção?
c) Haveria efeitos de sentido diferentes entre uma erupção e outra? Se
afirmativo, quais?
Passamos para a tentativa de responder as questões levantadas acima.
Mapa enunciativo
0
2
4
6
8
10
12
14
16
0 10 20 30 40 50 60 70
Formas
Debreagem
Linha enunciativa
np-base
188
5.3.2 Os mapas mais recorrentes e as características dos grupos
Observamos que os grupos tinham entre si semelhanças e diferenças que
passaremos a explorar. Inicialmente, é preciso deixar claro que foi montado o mapa
enunciativo de cada texto, e obtivemos um resultado bastante inesperado.
Primeiramente, uma análise combinatória das possibilidades no conjunto dos 464
textos levaria a um valor astronômico sem aplicabilidade prática. a título de
curiosidade, se realizássemos uma projeção combinatória sobre as 36 possibilidades
encontradas, ou seja, 12 itens de 1ps, 1pp e np com no máximo 3 marcações de
cada um, teríamos um total de 7.140 diferentes mapas. Quando falamos em 12
itens, é porque tivemos textos que foram demarcados em a12 fragmentos entre
1ps, 1pp e np. Para essa contagem de formas e construção dos mapas, utilizamos o
sistema “Access” da Microsoft, alimentando um banco de dados que nos apontou as
diferentes combinações, ainda no esquema vertical de levantamento como nas
ilustrações a seguir:
Ilustração 7: Alimentação do banco de dados sobre alternância
189
Na ilustração acima, temos a representação do texto 174 do Grupo A, que se
traduz em um mapa como o que se segue:
Gráfico 4 - Mapa enunciativo do texto 174A
A partir da comparação entre os grupos, vimos as suas peculiaridades, como
demonstra a tabela abaixo representativa dos tipos de combinações das
alternâncias que foram encontradas:
Tabela 2 - Proporção dos modelos de mapas em relação à quantidade de textos
Grupo A Grupo B Grupo C Grupo D
Total de textos 190 71 110 93
Quantidade de mapas 71 43 40 26
Percentual 37,36 60,56 36,36 24,73
A tabela 2 interpreta a quantidade de textos e as possibilidades
combinatórias, dado que não nos interessa diretamente, mas demonstrou que o
grupo B apresenta mais modelos e maior possibilidade de alternância em termos de
proporção. Em todo o caso, o grupo D ainda se mantém com um menor mero de
mapas, comprovando a hipótese de que a diferença dos temas tem a ver com o
fenômeno analisado.
Mapa enunciativo
0
2
4
6
8
10
12
14
16
0 10 20 30 40 50 60 70
Formas e np
Pessoas enunciativas
Linha enunciativa
190
No conjunto de todos os grupos, tivemos um total de 127 composições
distintas. E, desses modelos, tomaremos apenas 2 mais significativos para todo o
conjunto:
Gráfico 5 - Mapa enunciativo 1, total de 132 ocorncias
Gráfico 6 - mapa enunciativo 2, total de 47 ocorrências
Como vimos, a tabela 2 demonstra que, em alguns grupos, obtivemos mais
desenhos de alternância que em outros, sendo que o que nos chamou a atenção foi
a abundância de possibilidades no Grupo B, e também vimos que o grupo D
apresentou um conjunto menor de possibilidades de alternância. A princípio, isso
não significa muita coisa, pois podemos ter uma variação de mapas muito grande;
Mapa enunciativo
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
0 10 20 30 40 50 60 70
Formas
Debreagem
Linha enunciativa
np-base
Mapa enunciativo
0
2
4
6
8
10
12
0 5 10 15 20 25 30
Formas
Debreagem
Linha enunciativa
np-base
191
além disso, é importante ressaltar-se que, dos 127 modelos, apenas 133 textos
ficaram sem alguma alternância, lembrando que tivemos um texto apenas que teve
sua predominância enunciativa em 1pp. Todos esses dados comprovam que a
alternância é efetivamente presente, pelo menos, no gênero analisado.
Diante da multiplicidade de modelos, da quantidade de textos e da quantidade
de possibilidades, vimos que os diferentes mapas nos grupos nos informam que o
fato mais interessante não é a quantidade de mapas, nem seu formato, mas os
movimentos eruptivos encontrados na cadeia enunciativa, ou seja, em que
condições 1ps surge após um np ou vice-versa. Assim, a nossa busca pela
regularidade passa pelos principais movimentos e tenta compreender em quais
condições essas erupções estão implicadas e se há uma regularidade entre elas.
5.4 Levantamento geral dos movimentos
Para o levantamento das alternâncias eruptivas, utilizamos o software
Systemic Coder, de modo que pudemos perceber quais seriam os movimento mais
recorrentes em todo o corpus até chegarmos a algumas possíveis explicações para
as dispersões dos discursos desses sujeitos. Vejamos então no quadro geral dos
movimentos.
Gráfico 7 - Média geral de alternância dos 4 grupos
Movimentos
4%
9%
1%
5%
30%
8%
10%
33%
1ps-1pp
1ps-np
1ps-1ps
1pp-1ps
1pp-np
1pp-1pp
np-1ps
np-1pp
192
Gráfico 8 - Comparativo dos movimentos eruptivos nos grupos
Tabela 3 - Percentual de alternância por grupo
A B C D
Alternância % % % %
1ps-1pp 6 4 3 2
1ps-np 9 14 8 6
1ps-1ps 0 3 0 1
1pp-1ps 6 3 5 1
1pp-np 28 26 31 37
1pp-1pp 9 5 7 7
np-1ps 11 13 8 7
É perceptível que os movimentos estão basicamente proporcionais:
comparados à média do gráfico 7, percebemos uma determinada constância nos
tipos de movimento. E, como era de se esperar, uma vez que maior quantidade
Movimentos do grupo A
6%
9%
0%
6%
28%
9%
11%
31%
1ps-1pp
1ps-np
1ps-1ps
1pp-1ps
1pp-np
1pp-1pp
np-1ps
np-1pp
Movimentos do grupo B
4%
14%
3%
3%
26%
5%
13%
32%
1ps-1pp
1ps-np
1ps-1ps
1pp-1ps
1pp-np
1pp-1pp
np-1ps
np-1pp
Movimentos do grupo C
3%
8%
0%
5%
31%
7%
8%
38%
1ps-1pp
1ps-np
1ps-1ps
1pp-1ps
1pp-np
1pp-1pp
np-1ps
np-1pp
Movimentos do grupo D
2%
6%
1%
1%
37%
7%
7%
39%
1ps-1pp
1ps-np
1ps-1ps
1pp-1ps
1pp-np
1pp-1pp
np-1ps
np-1pp
193
de 1pp e np, maior serão as trocas entre essas duas modalidades enunciativas. No
entanto, observando-se com um pouco mais de atenção, podemos perceber as
peculiaridades dos grupos. Antes, no entanto, de explorarmos as particularidades,
vamos observar as semelhanças: a) todos os grupos apresentaram movimentos; b)
as proporções são variadas, mas ocupam posições muito semelhantes.
As diferenças devem ser ressaltadas, pois, em um total de 1007 movimentos
detectados em todo o corpus, é preciso observar-se, por exemplo, que uma
diferença entre um movimento e outro na casa de 8% representa 80,56 ocorrências;
embora o se trate de um número muito expressivo, ele é significativo para a
proporção do corpus. Assim, se fizermos a escolha da análise de um movimento em
específico, isso se deve às escolhas metodológicas e aos limites que devemos nos
impor para concluir um trabalho científico.
Qual seria a explicação plausível para a discrepância encontrada entre o
grupo A e C ou ainda entre A e D? Por que A e B se comportam semelhantemente,
da mesma forma que encontramos semelhanças entre C e D? A primeira tentação
para responder a essa pergunta é pensar que esses indivíduos são muito diferentes
em termos de contexto social e instrucional. Mas, na verdade, não são tão distintos,
e estão afetados por memórias semelhantes. A explicão mais plausível para D ser
diferente é a de que a proposta de tema é outra. A proposta diferenciada pode fazer
com que o sujeito ative outras memórias, o que se demonstrou desde as primeiras
análises. O fato de termos condições distintas de coleta dos dados, no caso de A e
B, na qual A foi realizada em circunstância de prova de vestibular e B foi coletada
como atividade extraclasse, demonstra que o fenômeno das erupções enunciativas
não está vinculado ao contexto imediato de produção, ou ao nervosismo do
candidato em situação de avaliação que o faria “errar”. A nossa hipótese é a de que
194
as alternâncias revelam preferências (não de um sujeito da vontade, mas de um
sujeito submetido, logo as preferências são do discurso e o dele individulamente)
enunciativas por um determinado discurso ou pelo menos por um determinado
paradigma designacional (PD).
Feito o levantamento de dados, ainda uma grande quantidade de
cruzamentos que devemos elaborar, com vistas a perceber se regularidades nas
alternâncias. Vimos que elas se comportam de uma maneira até certo ponto
previsível. Em primeiro lugar, por termos mais enunciados em np e 1pp, temos mais
alternância entre essas duas modalidades. Vimos também que o tema e a memória
que ele atrai também influencia na quantidade de alternâncias no corpus. Diante
dessa constatação, a alternância o é um mero acidente de sujeitos que não
dominam a norma, ou que são inabilidosos no que se refere ao domínio da língua
escrita não podemos negar o fato de que regularidade nos movimentos, mas
ainda não somos capazes de dizer se 1pp e np se inscrevem preferencialmente em
uma determinada FD. Atingiremos esses objetivos quando conseguirmos observar, a
partir dos levantamentos lexicais e da análise de determinados conteúdos, a
tendência das regularidades.
5.5 As referências às pessoas enunciativas no corpus analisado
Neste item, iremos discutir de uma maneira mais demorada cada uma das
referências às pessoas enunciativas, de tal modo que possamos compreender que
os movimentos observados no capítulo anterior não representam apenas meros,
mas as regularidades encontradas no fazer dos sujeitos para, finalmente, compor o
traçado do jogo das identidades.
É mister prevenirmos que os nossos informantes, por mais que apresentem
195
uma acentuada desestruturação do texto e tiveram pouquíssimo contato com
técnicas de retórica escrita, essencialmente, eles estão buscando exercitar o “dom
da argumentação e convencerem seus interlocutores para aceitar o seu modo de
pensar, o que demonstra que mesmo tendo dificuldades no domínio da modalidade
escrita, o sujeito procura argumentar, o que é próprio da interação e das funções dos
enunciados.
Não entraremos no mérito de dizer que a enunciação em determinada pessoa
constrói um determinado tipo de ethos, muito embora essa relação seja altamente
produtiva e sirva como mote para uma outra pesquisa. A questão que nos
colocamos aqui tem a ver com o ethos, mas não só no sentido da retórica: procura-
se perceber como o sujeito se mostra ou se esconde para tratar de identidades e,
principalmente, de identidades em conflito, como é o caso da identidade racial.
Diferentemente de Indursky (1997), que se apóia na noção de quarta pessoa
da psicanálise (cf. IRIGARAY, 1973), nossa perspectiva é inversa e se apóia mais
nos estudos de Dannon-Boileau (1987). Ao invés da quarta pessoa que é, na
verdade, o preenchimento da o-pessoa (Ele0) pelo “eu” que passa a ser um “eu”
disfarçado sob um “-se”, a nossa perspectiva é de que o sujeito emrico é um ser
único, um “eu”, mas a sua enunciação acontece sobre a base da np. É por isso que,
mais adiante, poderemos afirmar que, no processo enunciativo, temos três entes: o
ser empírico, o sujeito da enunciação e o sujeito enunciado. Observemos os
exemplos abaixo:
34) Esta sala está abafada.
Esse enunciador não diz:
34a) Eu afirmo que esta sala está abafada.
34b) Eu penso que esta sala está abafada.
196
34c) Em minha avaliação esta sala está abafada.
Para chegarmos a essa conclusão, retomemos a distinção que Ducrot (1980 e
1984) faz quando fala em polifonia.
A idéia central é que devemos, na descrição da enunciação que constitui o
sentido do enunciado, distinguir o autor da fala (locutor) dos agentes dos
atos ilocucionários (enunciadores) e ao mesmo tempo de uma maneira
correlativa o ser ao qual as palavras são ditas (alocutário) dos seres que
são os pacientes do ato (destinarios). (Ducrot, 1980, p. 43-44)
50
Mais adiante, em 1984, Ducrot utilizará um esquema bastante difundido e
Amoussy faz uma síntese bastante objetiva desse pensamento:
Ele (Ducrot) diferencia o locutor (L) do enunciador (E) que é a origem das
posões expressas pelo discurso e é responsável por ele; ela divide o
locutor em “L”, ficção discursiva, em “”, ser no mundo, aquele de quem se
fala (“eu” como sujeito da enunciação e “eu” como sujeito do enunciado).
Analisar o locutor L no discurso consiste não em ver o que ele diz de si
mesmo, mas em conhecer a aparência que lhe confere as modalidades de
sua fala. (Amoussy, 2005, p. 14-15)
Em nossa perspectiva, e E enunciam em np, enquanto que o L está
sujeito às erupções da 1ps e da 1pp e todos os matizes que acompanham esta
última modalidade. Assim, o enunciador está sempre em não-pessoa; quando um
elemento motivador para a erupção ela acontecerá. , no entanto, enunciados que
não admitem paráfrases como as de 35a e 35b, pelo menos em língua portuguesa:
35) Eu amo você, Maria.
36a) ? O João ama você, Maria. (João enunciando do próprio João)
36b) ? O João diz que ama vo, Maria. (João enunciando do próprio João)
Talvez seja uma questão com os verbos psicológicos ou experienciadores,
mas ainda é possível um outro tipo de paráfrase:
36) Eu amo você, meu bebê.
36a) A mamãe ama você, meu bebê.
50
L´idée centrale est que l’on doit, dans cette description de l’énonciation qui constitue le sens de
l’énoncé, distinguer l’aucteur des paroles (locuteur) et les agents des actes illocutionnaires
(énonciateurs) et en même temps d’une façon corrélative, l’ètre à qui les paroles sont dites
(allocutaire) et ceux qui sont les patients des actes (destinataires).
197
36b) A mamãe ama você, bebê.
Nesse caso, o argumento de ser um verbo experienciador não se sustenta,
logo o que explicaria a possibilidade de 36a e 36b e a estranheza de 35a e 35b é o
contexto em que se considera os interlocutores ou enunciatários. No caso de 36,
temos o sujeito “mãe que enuncia para o enunciatário “bebê”; no caso, os
enunciados mais aceitáveis e prováveis para essa circunstância são 36a e 36b, pois
um bebê ainda não tem a noção de subjetividade expressa pelo “eu”, pois ela ainda
está em formação. Por isso, na língua do adultos para a criança, há o uso da não
pessoa intuitivamente. Danon-Boileau (1987) propõe a noção de localização”
(repérage) da qual fala Culioli, para uma comparação entre a relação mãe e lactente
através dos pronomes:
Em suas primeiras experiências de mundo, o bebê demonstra três
comportamentos evidentemente diferentes :
1 – Desde que observa um objeto que se locomove em seu campo visual, o
bebê está atento, mas permanece em estado passivo e inativo.
2 – Quando o rosto de uma personagem maternal se aproxima face a face
com o ele, o bebê entra em interação com o rosto e se instaura um sistema
de troca (troca de sorrisos, sons modulados etc.).
3 Do contrário, se a personagem maternal apresenta uma “expressão
impassível”, o bebê se confunde, e procura restabelecer a troca, a fim de
suscitar um retorno de expressividade e de resposta. Na falta do retorno, o
bebê se retira do sistema interativo. (p. 22)
51
O autor explica que, quando a mãe apresenta a expressão impassível”, o
bebê a interpreta como um paradoxo: a mãe apresenta ao mesmo tempo um olá” e
umaté logo” e o bebê se retira do sistema (idem, p. 23).
O paralelo que proponho com a operação de localização conduz, então, às
especificidades seguintes:
1 – A atenção dada aos objetos corresponde ao valor dito fora do sistema
(interativo)” (o que define o “ele” no sistema pronominal).
2 A troca interativa corresponde ao valor « igual » (aquela que define o
51
Dans ses premières expériences du monde, le bébé fait montre de trois comportements nettement
différenciés: 1- Lorsqu’il observe un objet qui se déplace dans son champ visuel, le bébé est attentif
mais reste dans un état « passible et inactif » ; 2 - Lorsque le visage d’un personnage maternelle
s’approche de face, le bébé entre en interaction avec lui et un système d’échanges s’instaure
(échanges de sourires, de sons modulés, etc...) ; 3 - Toutefois, si le personnage maternelle présente
un « visage impassible » le bébé se trouble, cherche à rétablir l’échange, à susciter un retour
d’expressivité et de ponse. Faute d’y parvenir, le bé se retire du système interactif.
198
« eu ») dentro do sistema pronominal).
3 A troca interativa paradoxal corresponde ao valor “diferente mas não
sem relação” (aquela que define o “tu” no sistema dos pronomes). Nota-se
que o paralelo traçado não instaura uma analogia entre os componentes
cognitivos do bebê e os pronomes, mas entre uma modalização de certas
operações de localização inerentes à linguagem. (idem)
52
O interesse nessa relação, está, sobretudo, na circunstância atentiva que o
sujeito tem em relação ao que es dentro do sistema ou “fora do sistema” (no
sistema X fora do sistema). Fica claro que o efeito de sentido da enunciação das
marcas de pessoa (1ps, 1pp) é de oposição entre a neutralidade e a não
neutralidade. No entanto, o argumento mais interessante e mais forte é que a
subjetividade (no sentido benvenistiniano) não nasce da noção de « ego », mas da
noção primária do “ele”, em razão do reflexo no espelho”. Aqui lembramos Lacan e
a noção do “estágio do espelho”. Essa noção consiste em que, em determinada fase
de sua vida, o bebê diante de si o seu reflexo quando observa um adulto; o que
se tem, nessa circunstância, é a constituição de si sobre a alteridade, ou seja, aos
poucos o bebê percebe que o outro é o não-mesmo e, assim, a relação de alteridade
será muito importante, para se constituir o mesmo.
Passada essa fase, bem mais adiante, é que o bebê começa a dizer eu”, o
que não anula a idéia de subjetividade no sentido de que o euque fala instaura a
enunciação (ego-hic-nunc), mas fica patente o fato de que o “eu” é nascido do ele
e não o contrário. Por fim, a modalidade enunciativa mais complexa que é o “nós”
é atingida com um grau maior de maturidade, na qual a intersubjetividade está
bastante sedimentada e o indivíduo consegue se identificar com os grupos. Como
os sujeitos em sua enunciação estão mais aptos a falar do que está fora do circuito,
52
Le parallèle que je propose avec l’opération de repérage conduit alors aux spécifications suivantes:
1 L’attention portée aux objets correspond à la valeur dite « hors système » (laquelle finit « il »
dans le système de pronoms).2 L'échange interactif correspond à la valeur « égal » (lequel finit
« je » dans le système des pronoms. 3 – L'échange interactif paradoxal correspond à la valeur
« différent mais non sans rapport » (laquelle définit « tu » dans le système de pronoms).On notera que
le parallèle tracé n’instaure pas une analogie entre les comportements cognitifs du bébé et les
pronoms mais entre une modélisation de certaines opérations de repérage inhérentes au langage [...]
199
a np e a 1pp acabam sendo mais recorrentes que a 1ps. Foi por isso que optamos
por dizer que a np é a base da enunciação, enquanto que a localização do “eu” e do
“nós” acontece pela erupção, ou seja, pelo acidente.
Posto que a enunciação, a nosso ver, se baseia na não-pessoa, como
interpretar, então, as erupções de 1ps e 1pp, ou ainda essencialmente, como
interpretar np enquanto efeito de sentido de neutralidade”? Nos itens que se
seguem, observaremos o comportamento das enunciações, agora sob o prisma
lexical e semântico dos paradigmas designacionais mais relevantes.
5.6 Paradigmas designacionais e seu cruzamento com as modalidades
enunciativas
A maior quantidade de enunciados surgiu em np, em que o enunciador faz
uma debreagem enunciva como é o caso do efeito de sentido de objetividade
almejado no discurso científico (FIORIN, 2002, p. 45). Enunciar em np leva a um
efeito de distanciamento entre o sujeito-enunciador, o sujeito do enunciado e o
sujeito emrico, tratando-se de um efeito muito explorado pela intuição dos falantes
para manter o tal. A princípio, poderíamos hipotetizar que a enunciação em np será
um campo bastante amplo para que discursos preconceituosos se instaurem, pois é
o lugar onde o “eu” não aparece para “assumir” seu discurso, ou ainda seria um
espo para se manter distante. Diante da hipótese de que certos termos poderiam
surgir mais em uma determinada forma enunciativa que em outra, procedemos a um
cruzamento de dados no qual fizemos o levantamento total das designações para
“negro e “branco” e, então, obtivemos um quadro geral das maneiras de designar o
outro.
O primeiro dado que nos chama a atenção foi o que se apresenta nas tabelas
a seguir:
200
Tabela 4: Paradigmas designacionais para as identidades no grupo A
Negro Branco
Formas Quantidades Formas Quantidade
Negro(s) 600
Brancos 75
Sociedade negra 2
Brancas 26
Povo negro 2
Homem branco 6
Comunidade negra 2
Clara 4
Raça negra 16
Cor branca 12
De cor negra 15
Morenas 2
Pessoas de cor 13
Preto(s) 6
Afro 3
Pessoa(s) negra(s) 32
Pessoas de cor negra 4
Homem negro 6
Tabela 5 - Paradigmas designacionais para as identidades no grupo B
Negro Branco
Formas Quantidades Formas Quantidade
Negro(s) 255
Brancos 67
Raça negra 7
Clara 1
De cor negra 3
Pessoas brancas 3
Preto(s) 1
Crianças brancas 2
Afro 14
Pessoa(s) negra(s) 5
Pessoas de cor negra 2
Tabela 6 - Paradigmas designacionais para as identidades no grupo C
Negro Branco
Formas Quantidades Formas Quantidade
Negro(s) 354
Brancos 70
De cor negra 4
Brancas 10
Preto(s) 3
Homem branco 1
Afro 32
Clara
Pessoa(s) negra(s) 15
Cor branca
Pessoas de cor negra 8
Pessoa branca 3
Vejamos a proporção de referências identitárias dos textos em suas
proporções conforme os gráficos a seguir :
201
Gráfico 9 - PDs identitários conforme os grupos
Percebemos que o grupo A tem mais riqueza de formas, muito embora
existam formas que surjam apenas uma vez; logo, em termos de quantidade de
aparição, algumas não são relevantes para identificar formações discursivas. O dado
mais importante a ser observado é a quantidade de referências a “negro” em
oposição a “branco” e isso merece algumas considerações.
A primeira consideração é a de que sendo as cotas raciais o tema dos três
primeiros grupos, obrigatoriamente haveria um grande apelo à memória dos sujeitos
referente ao racismo, que procede, no entanto não é o suficiente para explicar as
proporções dos gráficos contidos em 8. O que precisamos observar é que o mesmo
não costuma falar de si, mas sempre do outro, marcando assim a diferença, como
vimos no capítulo 3. Logo, a esmagadora maioria dos enunciadores desses textos
está na posição identitária de “brancos”. Mas isso não tem qualquer relação entre o
Paradigma designacional identitário - Grupo A
85%
15%
Negro
branco
Paradigma designacional identitário - Grupo B
78%
22%
Negro
Branco
Paradigma designacional identitário - Grupo C
86%
14%
Negro
Branco
202
sujeito empírico e o sujeito da enunciação, haja vista que eles podem ou não
coincidir, o que permite que haja um sujeito empírico branco a enunciar como negro,
ou vice-versa; ou ainda, uma terceira posição: nem branco, nem negro. A
neutralidade absoluta com relação à identidade constitui um caso muito comum,
como no exemplo a seguir:
37) Uma afirmação é válida, o que difere um negro de um branco ou de um pardo?
Aos olhos de cada cidadão é uma questão simples de ser respondida mas a
realidade é totalmente diferente das desculpas anunciadas a cada dia
Outro aspecto a ser levado em consideração é que, nas enunciações em 1pp
ou np, o anafórico “ele(s)” estava sempre presente, indicando a debreagem para um
outro no discurso que não necessariamente o do enunciador. Soma-se a esse fato
que poucas são as co-ocorrências anafóricas entre elementos do paradigma branco
comele(s)”, o que comprova, mais uma vez, que a maioria dos enunciadores
assume a posição de sujeito branco. E isso implica em diferentes formações
discursivas e efeitos de sentido. Mas é preciso reconhecer que, sob 1ps, 1pp e np,
está subjacente o enunciador branco, daí o fato de que enunciar em uma dessas
modalidades leva a efeitos de sentido distintos.
Mesmo havendo uma diferença média de 8% de referência nos paradigmas
“negro e “branco” entre os grupos A, B e C, sendo que o B apresenta a maior
variação, não se identifica alguma peculiaridade no grupo B, pois a dia ainda está
próxima à dos outros grupos: o que verificamos é que há mais identidade que
diferença entre os grupos. Assim, os três grupos, apesar das condições distintas de
coleta, sustentam semelhanças bastante significativas.
Há variações lexicais de um grupo para outro, o que é bastante normal, como
por exemplo, no caso do grupo C, em que mais referências a “afro-
203
descendentesque no grupo A, o que é facilmente interpretável. A designação de
“negro por “afro-descendente” constitui uma nova identidade do grupo étnico, e é
visivelmente perceptível que essa nova identidade vem politizada. O lapso de 4
anos entre a produção de A e C demonstra que houve um crescimento do uso do
termo, mais um fator que demonstra que se trata de uma nova identidade em
construção, e que é bastante diferente de “pessoa de pele escura”, “negro” ou
“preto.
observamos que a ocorrência de “branco” é bem menor que “negro”, mas é
interessante observar a distribuição dessas ocorrências no mapa de seção, como se
segue no gráfico a seguir:
Gráfico 10 - Distribuição das co-ocorrências de “negro” e “branco”
Cada pequeno quadrado corresponde a um parágrafo; ao todo são 2030
computando todos os textos do corpus. Os pontos vermelhos indicam a ocorrência
de algum elemento do paradigma designacional “negro”, enquanto os quadrados
204
azuis indicam “branco”, já os quadrados mesclados em azul e vermelho indicam a
co-ocorrência de ambos paradigmas. Observa-se que, a partir da seção de número
1693, não indicação de nenhum dos paradigmas, pois se trata do grupo D no
qual não surge nenhuma referência a brancoou “negro”, o que implica, mais uma
vez, em reafirmar que a proposta temática influenciou não só na quantidade de
alternâncias eruptivas, como tamm influenciou nos paradigmas designacionais. A
nosso ver, essa questão indica que o sujeito, instado a falar de sua identidade,
promove a diferença a partir da referência ao outro: d a grande quantidade de
formas e ocorrências para “negro”, o que já afirmamos anteriormente.
A novidade da observação é que a quantidade de co-ocorrências de branco
e “negro” são muito maiores que somente a aparição de “branco”, lembrando-se, é
claro, que “negro” aparece muito mais vezes. A princípio, poderíamos dizer que o
fato de “negro” surgir mais implica em não sobrar espaço para que “branco” seja
incluso. Isso é uma hipótese falaciosa, pois, na maioria dos contextos em que surge
“branco”, ele esacompanhado de “negro” para ser o comparativo, como em frases
do tipo:
38) Realmente, ( para ) era tempo de parar, pensar e se dedicar a esse assunto
tão polemico, pois quantas vezes, era colocado em discuso a idéia de que o
negro deveria ter chances igual, a de um branco mas na realidade sabemos que
nunca foi assim. Por isso achamos ótima a idéia de que negros terão a mesma
igualdade de um branco para entrar nas universidades e até mesmo nos programas
de televisão.
No fragmento 38, é visível que as identidades constrdas se revelam
bastante balizadas entre negro e branco, sendo o branco o padrão de
comportamento ao qual o negro deve chegar. Há uma grande quantidade de
enunciados nos quais se espera que o negro seja “brancarizado”. O efeito de
sentido, nesses casos, remonta à idéia de que o branco alcançou benefícios e
privilégios sociais que devem ser dados ou oferecidos aos negros, e esse tipo de
205
discurso mostrar-se-á bastante presente na questão dos casos semânticos que
veremos na seção seguinte.
5.7 Exploração sentica e seu cruzamento enunciativo
Neste item, aprofundaremos a análise tentando observar se o comportamento
dos paradigmas designacionais identitários observados no item anterior seguem
algum tipo de padrão. Para tanto, dois dados serão de suma importância: o papel
temático ocupado pelas ocorrências e a classificação das vozes enunciativas em
que essas ocorrências surgiram.
Conforme o descrito no catulo IV, fizemos a categorizão das ocorrências
de negro” e “branco” no corpus. No entanto, como as ocorrências de alguns
paradigmas eram muito grandes, decidimos fazer a análise por amostragem,
tomando apenas 20% das ocorrências para cada grupo e paradigma identitário e em
cada uma das vozes. Por exemplo, no grupo A, no qual observamos 703 ocorrências
do paradigma “negro”, fizemos apenas a categorização de 140 referências,
distinguindo-as em np e 1pp. Dado o número inexpressivo de 1ps, decidimos por
não analisar as ocorrências de seu paradigma; no entanto, a 1ps não deixará de ser
observada nos capítulos consecutivos a seu tempo. Por hora, queremos apenas
traçar um panorama geral dos dados levantados. Por sua vez, o grupo D não
apresentou referências às identidades, fato muito importante para esta pesquisa que
tamm, a seu tempo, será retomado.
Como fora apresentado na metodologia, fizemos as classificações dos papéis
temáticos considerando os verbos e os argumentos. No entanto, tal trabalho se deu
de maneira bastante difícil, pois, como os textos são construções espontâneas da
linguagem natural, nem sempre obedeciam aquilo que poderíamos chamar de língua
padrão, ou de uma semântica mais estabilizada, ou mesmo, emprego coerente de
206
determinados verbos e termos. Alguns impasses também surgiram ao longo das
análises pelo menos com duas situações: a) alguns verbos de difícil categorização
bem como algumas perífrases verbais, ou b) orações encaixadas. Vejamos alguns
exemplos:
39) Muitos brasileiros acreditam que o nosso país tem uma dívida com o povo afro-
descendente, por toda a questão da escravidão e do racismo que permaneceram de
certa forma no passado [...]
40) Os negros no Brasil sofrem, muito com o racismo.
No caso 39, transformamos toda a perífrase tem uma dívida em dever”,
mas surgiu a dúvida: trata-se de que tipo de verbo, de estado, processo ou ação?
Como não se trata de uma ação que provoca um encadeamento, tamm não se
trata de processo porque não se tem a transformão de estado para outro, como no
caso de “endividar-se”; logo, por eliminão, chegamos à conclusão de que o verbo
“dever” seleciona argumentos de estado, assim, o argumento de que o “povo afro-
descendentenão é beneficrio, mas paciente, lembra que tanto um quanto outro
argumento são pacientes. Em 40, é evidente que “sofrer” pode ser um verbo
psicológico, caso em que temos um experienciador, embora em 41 essa conotação
possa ter outro sentido.
41) É do conhecimento de todos que os negros sofrem preconceitos desde que
nascem e a decisão tomada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do
Senado em estabelecer um número x para as vagas de universidadesblicas [...]
Em sofrer preconceito temos uma situação em que “negros” recebe o caso
como se fosse “preconceituar”:
41’) É de conhecimento de todos Ø preconconceituam os negros desde que
nascem[...]
Daí o fato de considerarmos, em 41, que “negros” ocupa o papel de
207
representar os beneficiários da ação. Estamos considerando que, mesmo no nível
superficial, outras transformações como o caso de um sintagma ou estrutura fixa
“sofrer preconceito”.
Outro problema de ordem semântica foi como categorizar o verbo “ter”, haja
vista que houve um mero razoável de ocorrências. Para resolver tal problema,
fizemos uma análise a partir da eliminação, considerando as denotações dos verbos
entre estado, processo e ação. Primeiramente, o verbo ter seleciona, no mínimo,
dois argumentos, um que se refere ao possuidor e outro ao possuído:
42) Estudar, ter uma profiso ser aceito por todos é nosso mérito depende de cada
um e não da cor de pele que temos se só existissem médicos, advogados,
deputados, professores brancos poderia se dizer que os negros não tem capacidade
de aprendizado, mas como sabemos pessoas de todos os tipos em todas as
profissões.
Não se trata de ação ou processo, pois não leva a mudanças de estados,
como em “A madeira secou”, nem se tem a descrição de uma ação praticada por um
agente, como em “Michael correu”; logo, o resultado é que o verbo “ter” é tamm
um estativo e, por isso, os argumentos são pacientes.
O terceiro problema que tivemos de equacionar nesse tipo de análise foi a
cumulão de papéis. Vejamos o exemplo abaixo:
43) Esperamos que os negros se capacitem cada vez mais independente se
conseguirem cotas exclusivas nas universidades.
Qual seria então o papel temático ocupado por “negros” em uma frase como a
de número 43? Consideraremos “objeto” de “esperamos” ou “agente” de capacitem?
Nessa situação, a cumulatividade de papéis por serem orações encaixadas e,
para não termos que estabelecer mais uma lista de categorizão, optamos por
classificar apenas um dos papéis adotados em uma das orações. Preferimos, então,
optar pela oração subordinada. Em 43, “negros” passou a ser agente, muito embora,
208
tenhamos que considerar, ainda, que, nesse exemplo, como se trata de um verbo
pronominalizado, o agente também é beneficiário, como, em “ferir-se”. Daí, para
dirimir mais esse problema, consideramos somente o primeiro caso: agente. A opção
pela oração subordinada se deve ao fato de compreendermos que, na oração
principal, existe uma proximidade maior da referência ao enunciador, como em
“esperamos”. Esse tipo de afirmação parece incoerente, pois se um dos objetivos
dessa análise é pensar na referência ao enunciador, por que não se analisar tal
aspecto, tomando no caso, a oração principal? Essa aparente incoerência se resolve
da seguinte maneira: a) primeiramente, a modalidade enunciativa foi detectada,
ou seja, se 1ps, 1pp, np; b) essa modalidade enunciativa, ou seja, essa maneira de
se posicionar do sujeito tributará sobre a identidade do outro o papel temático, no
caso de “negro” ou “branco”, sendo esta última informação bastante preciosa para se
chegar à compreensão dos efeitos de sentido na alternância. Isso confere que a
posição do enunciador sobre R (do diagrama de Pêcheux).
Observemos, então, os gráficos a seguir, que demonstram a relação entre
papel temático dos elementos designativos de identidade e a modalidade
enunciativa em que surgem:
Papel temático de "negro" em A, np
13%
22%
0%
0%
11%
45%
9%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
P apel te mát ico de "negro" em A, 1pp
0%
28%
0%
0%
18%
54%
0%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
209
Gráfico 11 - Comparativo entre enunciação e paradigma identitário
Os três grupos analisados e seus subgrupos (1pp e np) apresentam algumas
semelhanças e diferenças que precisam ser destacadas. Para tanto, vamos fazer as
análises comparando os gráficos através de duas orientações: leitura horizontal e
leitura vertical. Na leitura horizontal, temos os mesmos grupos e, na leitura vertical,
temos as mesmas enunciações, ou seja, na coluna esquerda, temos as enunciações
em np e, na coluna direita, a enunciação em 1pp. A observação inicial dos gráficos
deve ser na direção horizontal e, por isso, vemos que os três grupos mantém entre si
certa semelhança em que negro” surge majoritariamente na posição de paciente e
beneficiário. no grupo C, a posição de beneficiário é maior que nos dois grupos
anteriores Os grupos A e B mantêm entre si relação de identidade, enquanto C tem
uma identidade menor em relação aos outros. Para ilustrar as frases em que negro
apresenta papel temático, observem-se esses demonstrativos:
Papel t emát ico de "negro" em np-B
12%
40%
42%
4%
2%
0%
0%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
Pape l t emát ico 1pp- negros B
5%
19%
0%0%
11%
62%
3%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
Papel temático de negro em np-C
12%
50%3%
0%
4%
25%
6%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
Papel t emá t ico de "negro" em 1pp- C
11%
39%
2%
0%
13%
27%
4%
4%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
Lugar
210
Papel temático Np 1pp
Beneficiário O governo precisa dar cotas
especiais as pessoas
miseráveis que não tem o que
comer. Aos negros apenas o
direito de viver com dignidade
pois a igualdade e potencial
eles possuem igual a qualquer
outra cor .
O negro o deve ser excluído
de nada ele deve ser tratado
igual a todos nós .
Paciente Hoje negros, es com uma
grande parte integrada no meio
de comunicação, novela,
futebol.
é uma exclusão da
sociedade ele é igual a qualquer
um de nós, O negro merece ser
como s .
Quadro 6 - Exemplos de enunciados do grupo A
Papel temático Np 1pp
Beneficiário A cidadania não é expressa por
cotas. Elas não dão aos negros
o direito à cidadania .
Não é certo que só porque o
Brasil tem uma dívida” com
os negros desde a época da
escravidão, paguemos com
certas facilidades para eles no
dia-a-dia
Paciente Existem negros pobres, sem
condição, com problemas
educacionais, sim, porém
tamm existem brancos com
os mesmos problemas.
Não é certo que só porque o
Brasil tem uma dívida” com
os negros desde a época da
escravidão, paguemos com
certas facilidades para eles no
dia-a-dia .
Quadro 7: Exemplos de enunciados do grupo B
Papel temático Np 1pp
Beneficiário No ano de 2002, a implantação
da política de cotas
para negros em universidades
públicas desencadeou uma
série de polêmicas e
controvérsias, tanto nas
universidades como na
sociedade
não temos ensino de qualidade,
para os jovens negros que
querem ingressar numa
universidade .
Paciente mas é de extrema importância
ressaltar que o país sofre
desses problemas desde a
colonização onde
os negros eram submissos aos
brancos .
O sistema de cotas nos mostra
bem isso que devemos dar
oportunidades a todas as raças
e etnias. Onde os negros têm
direito de desfrutar do mesmo
“paraíso que um branco,
amarelo, pardo desfruta .
Quadro 8 - Exemplos de enunciados do grupo C
Vimos que a diversidade de enunciações e de papéis temáticos é grande,
mas demonstra tendências, se consideradas as especificidades dos grupos. No
211
entanto, podemos perceber que, majoritariamente, o negro ou é posto na situação
de beneficiário ou de paciente. Essa categorização é uma das estratégias que temos
para dizer se um discurso é preconceituoso ou não. O preconceito é um dos
elementos que irá compor as relações de inclusão e exclusão, como veremos no
capítulo 7. Daí, a composição entre modalidade enunciativa, referência ao outro e
discurso preconceituoso constitui o conjunto de elementos que intervêm na formão
das identidades. A compreeno de todos esses componentes permite chegar à
compreensão que os sujeitos enunciadores m do outro. Considerando esses
aspectos, decidimos verificar as alternâncias de vozes, procurando perceber as
maiores tendências no que diz respeito à imagem do outro. Para tanto,
observaremos inicialmente o comportamento enunciativo apenas do grupo A, haja
vista que se trata do grupo principal e demonstra razoavelmente as tendências dos
demais.
5.8 As alternâncias eruptivas no corpus principal
O grupo A é o principal do nosso corpus, por isso nos concentraremos nele
neste primeiro momento, enquanto os demais servirão de parâmetros comparativos.
ficou claro, nos itens anteriores, que as condições de produção imediatas não têm
relação direta com o fenômeno da alternância, mas com aspectos discursivos e
identitários. O que se extrai das relações entre condição de produção dos textos e
alternância é que o fenômeno acontece independentemente das condições dos
textos, o que implica em dizer que o fato de um sujeito alternar pode estar ligado,
além de às imagens, à própria estrutura enunciativa. Assim, traçados os mapas das
alternâncias eruptivas, precisamos compreender as passagens de uma modalidade
a outra. Inicialmente, apresentaremos os números absolutos das alternâncias:
212
Alternância Quantidade
1ps-1pp 26
1ps-np 37
1ps-1ps 1
1pp-1ps 26
1pp-np 115
1pp-1pp 39
np-1ps 44
np-1pp 125
Total 313
Quadro 9: Distribuição das alternâncias no grupo A
Estamos considerando aqui as enunciações dos textos, pensando nas
possibilidades de surgimento dos paradigmas designacionais identitários em um
segmento que passa de uma modalidade à outra. Observemos, a seguir, os gráficos
extraídos do Lexico3, fazendo as análises combinatórias para demonstrar quais são
as possibilidades de surgimento dos paradigmas conforme a modalidade
enunciativa.
Gráfico 12 - Análise Fatorial por enunciador do grupo A
Temos no gráfico anterior, a descrição fatorial da distribuição dos grupos por
213
modalidade enunciativa. Antes de darmos prosseguimento à análise, é preciso
explicar o princípio que fundamenta esse tipo de dado. Primeiramente estamos
utilizando a “estatística multidimensional” e
O princípio comum a todos os métodos de estatística descritiva
multidimensional é esquematicamente o seguinte: cada uma das
dimensões de uma tabela retangular de dados numéricos permite definir
distâncias (ou proximidades) entre os elementos de outra dimensão. Assim,
o conjunto de colunas (que podem ser compostas de variáveis, de
atributos) permite definir, através de fórmulas apropriadas as distâncias
entre linhas (que podem ser de indivíduos, de observações). Do mesmo
modo, o conjunto de linhas permite calcular as distâncias entre uma coluna
e outra. (LEBART & SALEM, 1992, p. 105)
53
.
A construção do gráfico 12 foi o resultado de uma série de cálculos
probabisticos que se traduziram visualmente, trata-se de plano cartesiano,
demonstrando as distâncias lexicais existentes entre os grupos. Isso implica que
especificidades vocabulares presentes em 1ps, 1pp e np consideradas as
proporções de termos enunciados; assim, vimos que os enunciados guardam sobre
si diferentes composições lexicais, o que já é um indício de que existem FDs
distintas para cada modalidade enunciativa. Isso permitirá observar que, em uma
determinada modalidade enunciativa, mais possibilidade de que um termo ou um
segmento repetido surja que em outra. Um exemplo disso é o gráfico seguinte:
53
Le principe commun à toutes les méthodes de statistique descriptive multidimensionnelle est
schématiquement le suivant: Chacune des dimensions d'un tableau rectangulaire de données
numériques permet de finir des distances (ou des proximités) entre les éléments de l'autre
dimension. Ainsi, l'ensemble des colonnes (qui peuvent être des variables, des attributs) permet de
définir à l'aide de formules appropriées des distances entre lignes (qui peuvent être des individus, des
observations). De la même façon, l'ensemble des lignes permet de calculer des distances entre
colonnes.
214
Gráfico 13 - Distribuição dos PDs “negro” e “branco - Grupo A
Como havíamos constatado anteriormente, a quantidade e a freqüência do
paradigma “negro” é muito maior; no entanto,as curvaturas que ambas linhas
apresentam são, no mínimo, curiosas: enquanto a incidência de negro” é muito
maior em 1pp, em um 1ps ela é maior, o que é inversamente constatado com
“branco”, que em 1ps é maior que em 1pp. Vale lembrar que esse tipo de gráfico faz
a contagem multidimensional, considerando a relação entre a freqüência dos termos
e a quantidade de vocábulos do corpus, e essa contagem acontece de maneira
proporcional. Então, temos um cálculo ponderado sobre os enunciados, ou melhor
dizendo, sobre as probabilidades estatísticas dos enunciados. É isso que
visualizarmos a distribuição vocabular, mesmo em uma pequena quantidade de
enunciados, como o caso de 1ps. Enfim, as probabilidades estão distribuídas
proporcionalmente.
215
Gráfico 14 - Distribuição dos PDs “negro” e “branco - Grupo B
Gráfico 15 - Distribuição dos PDs “negro” e “branco - Grupo C
Temos uma discrepância bastante visível com relação ao surgimento das
referências aos paradigmas, o que poderia parecer um problema se fôssemos tentar
compreender como um grupo se comporta diferentemente do outro em relação aos
seus paradigmas designacionais, pois o nosso foco é perceber como as alternâncias
provocam efeitos de sentido: logo, não iremos tratar das diferenças entre um e outro
grupo, muito embora seja um instigante tema. Essas diferenças, contudo, não
216
comprovam que esses indivíduos participam de formões discursivas muito
distintas, mas que têm outro posicionamento com relação ao surgimento das
designações dos paradigmas identitários de uma outra maneira, ou seja, um grupo
prefere referir-se mais a “negros” em np que em 1pp. Tanto é verdade que, em uma
análise fatorial dos grupos, podemos identificar que B e C estão mais próximos entre
si, em termos vocabulares, que A e B, como podemos constatar no gráfico abaixo:
Gráfico 16 - Análise Fatorial de todos os grupos do corpus
Isso significa dizer que B e C têm mais identidade lexical entre si, mas não é a
prova de que tenha mais identidade discursiva: para tanto, as análises deveriam ser
mais aprofundadas. É claro que não podemos ignorar que tal diferença pode
reproduzir posições de sujeitos enunciadores distintas, mas esse é um assunto para
outra oportunidade.
Retomando o grupo A, fizemos o cruzamento de duas informões: a) da
enunciação e b) dos paradigmas designacionais identitários. E, desse cruzamento,
retiramos algumas informações preciosas, as quais descreveremos a seguir.
217
Gráfico 17 - Análise fatorial das alternâncias eruptivas do grupo A
No gráfico 17, temos a análise fatorial dos segmentos de texto que alternam
de uma modalidade enunciativa para outra, ou seja, tomando cada uma das
possibilidades de alternância que encontramos no grupo A, podemos perceber como
se dão as referências à identidade a partir das comparações da especificidade
vocabular de cada um dos segmentos. Ao levantarmos a especificidade vocabular,
observamos a possibilidade de freqüência dos termos de acordo com os grupos nas
segmentações feitas. A especificidade vocabular é uma alternativa para se observar
as possibilidades de freqüência de determinados termos que podem indicar a
pertença ou não a um determinado discurso. O lculo é promovido em termos de
comparação, tal qual a análise fatorial.
A princípio, os grupos de alternância d, e, f têm características próximas, haja
vista que eles partem de 1pp, da mesma forma que “ge “h” que partem de np. Os
enunciados que partem de 1ps se distanciam em termos de especificidade. Para
218
percebermos, então, as diferenças entre os grupos fizemos um novo processamento
utilizando a Análise Fatorial e, depois, extraímos as possibilidades numéricas em
comparação dos grupos, para o que tomamos as 10 primeiras expressões e as 10
últimas em oposição, segundo observamos na tabela a seguir:
Tabela 7 - Comparativo da análise fatorial dos grupos
Grupos d, e, f Grupos g e h
Forma
Frq.
Tot. freqüência
coeficiente
Forma
Frq.
Tot. freqüência
coeficiente
nosso 56
41
16
Brasil 86
51
5
nós 48
32
11
A 66
43
5
nosso país 22
19
11
no Brasil 41
27
4
nossa 25
19
9
são 118
64
4
temos 32
21
8
49
30
4
nossa
sociedade 14
12
7
polêmica 12
9
3
em nosso 16
13
7
contra 14
10
3
vivemos 18
14
7
de cotas para
negros 16
12
3
país 61
31
7
de cotas para 29
18
3
em nosso
país 10
9
6
escola 25
17
3
que vivemos 16
12
6
Hoje 15
11
3
Brasil 86
12
-2
nossos 20
1
-4
no Brasil 41
4
-2
o nosso 12
0
-4
fazer 20
1
-2
nossa
sociedade 14
0
-4
o negro 62
8
-2
todos nós 12
0
-4
que tem 12
0
-2
vivemos 18
1
-4
cotas para 42
4
-3
país 61
11
-5
educacional 30
2
-3
todos 140
35
-5
na
universidade 14
0
-3
nos 48
7
-5
problemas 22
1
-3
em nosso 16
0
-5
universidade 52
4
-3
nosso país 22
0
-6
No comparativo da tabela 7, percebemos que alguns termos têm mais
probabilidade de aparecerem enquanto que outros não, como é o caso do
coeficiente negativo. Isso implica em que a quantidade de surgimento é muito menor
dentro da quantidade de texto analisado. Assim, nada mais natural que, em um
grupo predominantemente np, como é o caso do termo “nosso país com freqüência
-6 enquanto que em 1pp é de 11, nesse exemplo, a relação é óbvia, mas no que diz
219
respeito aos paradigmas identitários, temos o surgimento mais provável de “negro”
em 1pp, e, em np, essa probabilidade é menor. Isso implica no fato de que os
elementos mais prováveis de aparecimento são os marcadores das pessoas
enunciativas, como no grupo que tem 1pp. A especificidade vocabular ratificou
apenas a questão da enunciação, mas não a maneira como os sujeitos designam o
outro e como tal modo de designar está associado a uma modalidade enunciativa, o
que, porém, não a isenta de uma relação que foi percebida no comparativo de
ocorrências entre os grupos de alternância e os paradigmas identitários. Assim,
vejamos dois gráficos:
Gráfico 18 - Distribuição do PD “negro”entre as alternâncias do grupo A
220
Gráfico 19 - Distribuição do PDbranco”entre as alternâncias do grupo A
Se comparados os dois gráficos, temos alguns dados muito peculiares sobre
o surgimento das expressões identitárias. A alternância do grupo “a” (1ps-1pp)
guarda uma proporção entre os paradigmas branco e negro” que estão próximos,
lembrando aqui que 1ps envolve os casos de primeira pessoa no plural de autoria.
Na alternância “b (1ps-1ps), temos ocorrência zero. No caso “c (1ps-np), a
proporção de negro” para branco é muito superior, no grupo “d” (1pp-1ps)
uma proximidade entre os dois paradigmas, enquanto o grupo e” (1pp-1pp)
apresenta uma queda de “negro” para “branco” e que se acentua tamm em “f”
(1pp-np). E, finalmente,em “g” (np-1ps) e h (np-1pp), têm-se a discrepância, mas
com uma considerável ascensão de “g” para o paradigma “branco”. Mais uma vez,
esses dados reforçam a idéia de que os enunciadores se posicionam a partir da
posição-sujeito “branco”, o que nos leva a fazer outras comparações nos gráficos,
desta vez, entre seus próprios grupos.
Podemos observar que o gráfico 18 (negro) apresenta enunciação que
221
praticamente mantém o mesmo nível das ocorrências em quase todas as formas de
alternância. Já no gráfico 19 (branco), há uma considerável oscilação, sendo que em
1pp-1ps temos um pico de surgimento, que cai em “e(1pp-1pp) e também em “f”
(1pp-np). Já, em g” (np-1ps), uma elevação que volta ao mesmo nível de f” em
“h” (np-1pp). Tal distribuição, aparentemente caótica, pode ser amplamente
compreendida à luz dos papéis temáticos predominantes dos termos dos
paradigmas designacionais. Enquanto “negro” tem uma distribuição mais uniforme e
presente, branco” tem uma distribuição menos uniforme e também em menor
número. Vale a pena, então, retomar, entre os dois paradigmas, as posições
temáticas e percebermos as suas nuanças. No entanto, prevenimos que a
quantidade das ocorrências de “branco” no grupo é pequena; assim, não podemos
tomar como parâmetro muito seguro no que diz respeito a dados estatísticos
generalizáveis, pois, nesse contexto, a quantidade faz a diferença.
Gráfico 20 - Distribuição dos papéis temáticos do grupo A
Apesar de a quantidade ser pequena, a predileção para tematizar “branco
em paciente se deve à maioria das ocorrências de verbos “ser”, “estar” e ter” que
surgem no corpus do grupo A e, mormente, nas situações comparativas entre
“branco” e “negro”, como por exemplo em:
Papel tetico de "branco" em A np
23%
10%
0%
0%
3%
61%
3%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
Papel tetico de "branco" em A 1pp
10%
3%
0%
3%
10%
74%
0%
agente
benefi
contr.ag
instrum
objeto
paciente
experienc
222
44) Vamos lutar por uma causa justa, no que for correto ser injusto sim, com essas
pessoas que estragam o nosso ps com suas críticas sobre a cor negra, porque
seja negro ou branco, acreditamos em uma só justiça a de Deus .
45) Estudar, ter uma profiso ser aceito por todos é nosso mérito depende de cada
um e não da cor de pele que temos se só existissem médicos, advogados,
deputados, professores brancos poderia se dizer que os negros não tem capacidade
de aprendizado, mas como sabemos pessoas de todos os tipos em todas as
profissões.
A diferença que chama a atenção nos gráficos acima é a quantidade de
expressões do paradigma designacional branco que ocupa a posição de agente em
np, ou seja, 13% a mais que em 1pp. Observemos alguns exemplos então.
46) Na sociedade, o homem branco discrimina o homem negro devido à sua cor e
isso não deveria acontecer [...]
47) No Brasil se negros e brancos se unissem, a educação melhoraria muito pois
tiraria as crianças e adolescentes e das ruas e das drogas dando um futuro [...]
Por fim, ainda um PD a ser explorado, o qual é de suma importância para
a construção dos efeitos de sentido nos textos. Trata-se da referência ao espaço
social construído pelos sujeitos enunciadores através de diferentes enunciados
como “a nossa sociedade” ou simplesmente a sociedade”, ou ainda “o Brasil”, ou “o
nosso país”. Esse estudo se torna necessário, pois as co-ocorncias do paradigma
“sociedade tem se dado com grande freqüência junto a “negroe “branco”. Com o
tratamento dos dados referentes a esse paradigma, encerramos aquilo que
chamamos de triângulo identitário: “branco”, “negro” e “sociedade” no que diz
respeito a sua descrição e, assim, nos sentimos habilitados a tecer as considerações
sobre cada uma das vozes enunciativas e a alternância relacionada às questões
identitárias.
A idéia de triângulo identitário surge da necessidade de se localizar os
sujeitos em oposição em um dado espaço, como, por exemplo, sérvios e croatas nos
Bálcãs, corintianos e palmeirenses na partida de futebol, etc. Isso porque as
223
identidades não se constituem senão dentro de um espaço socialmente organizado.
5.9 O paradigma designacional “sociedade”
Devido a exemplos como o de mero “46” e o “3” (3. A nossa sociedade
precisa dar uma chance para eles.), que são bastante recorrentes, percebemos a
importância de se compreender como se dava a constituição do efeito de sentido
que se construía a partir da designação do “espaço” socialmente organizado. Diante
das condições de surgimento desses elementos designacionais, construímos a
seguinte tabela:
Tabela 8: PD “sociedade
Termo Quantidade
Sociedade 179
Sociedade Brasileira 15
País 83
Brasil 120
Nação 5
Total 402
A princípio, qualquer pessoa poderia questionar o fato de estarmos tratando
os termos “sociedade” e país” como se fossem equivalentes em termos de
referência, mas, na verdade, quando se trata de paradigma designacional, não
lidamos com equivalência absoluta, mas com equivalência relativa, ou seja, vale
para uma dada circunstância excluindo-se a noção de sinomia. O que nos levou a
verificar a validade de “Brasil” por “Nação”, ou por “sociedade brasileira”, foram
testes de comutação em algumas frases, como se observa no exemplo a seguir:
48) Mas só com o sistema de cotas a questão racial no Brasil não está resolvida.
48a) Mas com o sistema de cotas a questão racial na sociedade não está
224
resolvida.
48b) Mas só com o sistema de cotas a questão racial na sociedade brasileira não
está resolvida.
48c) Mas só com o sistema de cotas a questão racial no País não está resolvida.
Na frase 45”, temos um fragmento de texto e, nas decorrentes “a”, be c”,
temos as comutações, sendo que em todas as frases aceitabilidade gramatical e
semântica, pois as frases decorrentes da substituição continuaram com a mesma
referência, muito embora o sentido (conforme Frege) seja distinto de 48”; desse
modo, podemos perceber que se tem aqui uma noção suficiente do paradigma
“sociedade.
Em termos de distribuição entre os grupos do corpus, “sociedade” se
comporta da seguinte maneira:
Gráfico 21 - Distribuição do PD “sociedade” nos grupos do corpus
No gráfico por grupo de textos do corpus, o grupo A e C são os que mais
possuem a ocorrência do paradigma designacional “sociedade”. no que diz
respeito à co-ocorrência, pelo menos no grupo A, temos as seguintes situações:
225
Gráfico 22 - Co-ocorrência dos PDs “negrose “sociedade
Gráfico 23 - Co-ocorrência dos PDs “braços e “sociedade
Em termos quantitativos, o paradigma de “sociedade” chega muito próximo de
“negro, enquanto que, no gráfico 23, vemos como mais distribuição de
“sociedade que de “branco”, sendo mister, no entanto, observar-se que, na maioria
das vezes, sociedade aparece com função temática de agente ou de lugar. Na
segunda forma, enquanto lugar, ainda algo extremamente importante para ser
lembrado: um certo número de casos das ocorrências de sociedade que provocam
um efeito de exclusão do negro, como nos exemplos a seguir:
226
49) Nas escolas, sociedade, trabalho, muitas vezes são humilhados, sem direito de
defesa. Quando paramos num sinal de trânsito e avisamos meninos de rua negros,
pedindo esmolas, s trancamos em nosso carro e não queremos conversa,
porque o negro é taxado de bandido
50) Do outro es o negro que geralmente é descendente de família pobre, tem que
trabalhar para ajudar nas despezas da casa e pode freqüentar só uma escola
pública e devido às dificuldades não tem Internet em casa. Dificilmente irá alcançar o
mesmo grau de estudo do banco e com isso não conseguindo igualar-se no
mercado de trabalho. Ficando às margens de uma sociedade preconceituosa
A idéia de sociedade acaba tendo uma referência bastante “elásticapara os
sujeitos enunciadores, pois não se trata simplesmente da organização humana em
grupo, mas de uma organizão que se coloca em níveis e fronteiras, que
demonstra quem está dentro e quem es fora. E, nesse aspecto, vale tentar
perceber quais seriam as possibilidades de co-ocorrência de “negro”, “branco” e
“sociedade de acordo com a modalidade enunciativa.
Gráfico 24 - Distribuição do PD “sociedade” no grupo A
A princípio, percebemos que, na média, uma predileção para se enunciar
os termos do PD “sociedade” em 1pp, mais que em 1ps e np; no entanto, ao
observarmos o gráfico a seguir, percebemos que cada membro do paradigma possui
227
um surgimento próprio, como podemos constatar em:
Gráfico 25 - Distribuição dos itens do PD “sociedade” no grupo A
Na média, “país” e “sociedade” continuam sendo elementos com maior
probabilidade de surgirem em 1pp, mas, curiosamente, “Brasil” figura menos em 1pp
e mais em 1ps e np. A primeira explicação para isso talvez esteja no fato de que não
é de nossa cultura dizermos “nosso Brasil”, mas “nosso País” que equivale em
termos de referência. No entanto, esse tipo de predileção enunciativa também pode
esconder uma forma de como enxergamos a nossa identidade, pois a diferença
entre o possessivo “nosso” cujo escopo seja “Brasil” ou “Paíspode revelar algo que
pretendemos explorar nos próximos capítulos, quando falarmos da signalética
dessas referências e seus efeitos de sentido. Já o termo “sociedade”, cabe
perfeitamente em “nossa sociedade, sendo que o que é surpreendente nesses
casos são as co-ocorrências com negros” e seus efeitos de sentido, normalmente
excludentes:
51) Inicialmente podemos afirmar que a discriminação vem sendo um caso muito
grave diante da população negra como na falta de emprego nos estudos e diante da
sociedade.
228
52) A política de cotas para negros na universidades, Já é uma exclusão da
sociedade ele é igual a qualquer um de nós, O negro merece ser como nós .
53) As portas irão se abrir para o negro no campo de trabalho e estudos desde que
ele se esforce para ser digno e respeitado pela sociedade .
Todas as frases deixam entrever que uma visão bastante excludente do
negro, na qual se desenvolve um discurso de que a sociedade precisa “ajudar” ou
“deixar entrar”, por exemplo, na frase 49 em que é emblemático o sentido de que “o
negro precisa ser igual ao branco”, que é o padrão, ou seja, para “entrar” na
sociedade o negro deve se tornar com um branco. Tais conteúdos serão explorados
no capítulo VII.
Finalmente, todos os dados levantados neste capítulo apontam para uma
série de elementos que comem a alternância e os efeitos de sentido da inclusão
que serão abordados logo após compreendermos os mecanismos de referenciação
presentes no corpus através do desenvolvimento de uma signalética da identidade
(capítulo VI) e os discursos presentes no corpus (capítulo VII).
229
CAPITULO VI
A SIGNALÉTICA DA ALTERIDADE: A CONSTITUIÇÃO DA REFERÊNCIA AO
OUTRO
Neste breve capítulo, desenvolveremos um estudo que tenta explicar a
constituição lingüística e semântica da referência à alteridade. Como uma boa parte
dos dados trabalhados no capítulo anterior demonstraram, a maneira como o negro
é referenciado nos textos não é um mero acaso; no entanto, reconhecemos que as
regularidades perceptíveis no conjunto de sujeitos é de difícil apreensão. Neste
momento de nosso trabalho, tentaremos sistematizar as dispersões” a partir da
materialidade dos textos, e pretendemos apresentar cada uma das modalidades
enunciativas e suas respectivas regularidades. Defenderemos que cada uma das
maneiras enunciativas tem sua peculiaridade de lidar com o outro e que, na
enunciação, o que se tem realmente é a base enunciativa em np, enquanto as
outras formas são erupções que surgem a partir do seu rompimento, sendo que as
mesmas estão marcadas lingüística e discursivamente.
A signalética da alteridade, neste sentido, não é uma teoria, mas uma
maneira de tentar compreender como o sujeito assinala, denomina, designa o outro:
com esse processo, partiremos das maneiras de enunciar (as modalidades
enunciativas a np e as erupções) e a maneira de se referir ao outro: a maneira como
os PDs se comportam no corpus. No entanto, é mister advertirmos que o conceito de
signalética foi desenvolvido por Bosredon (1997) sobre um corpus relativamente
“estável”, que eram os títulos de pinturas; no nosso contexto, não muita
estabilidade porque os textos representam uma dinâmica muito grande de discursos
e de estruturas lingüísticas marcadas por equívocos constitutivos desse próprio
dizer: é o que podemos verificar nos exemplos e nos anexos desta tese. O objetivo,
230
neste capítulo, é encontrar tendências e possibilidades e não as leis que determinam
como a designação do outro acontece.
6.1 Em busca da signalética identitária
Bosredon (1997, p. 7) fala de “domínio físico-cultural para a referenciação
das obras de arte. Pensando em nosso contexto, quais seriam as condições físico-
culturais para denominar o outro? A princípio, o outro é uma noção até certo ponto
vaga que precisa ser preenchida por algo. Pensando na relação identitária, nota-se
que o outro não é o mesmo, mas, o que faz com que ambos sejam distintos entre si?
Conforme vimos anteriormente, a diferença existe e ela pode ser biológica ou
simlica (no sentido cultural e religioso), assim é que, respectivamente, podemos
ter homem e mulher, cristão e muçulmano. O domínio físico-cultural das identidades
pode ser desmembrado em duas colunas extremamente reducionistas, mas que
servem de ponto de partida:
Físico Cultural
Organismos biológicos humanos e seus
fenótipos.
Sociedade em que mais de um fenótipo
convive com outros.
Quadro 10 - Domínio físico-cultural da signalética identitária
Esse quadro só é aplicável às questões raciais que levam em conta o
fenótipo. Diferentemente seria a rivalidade entre duas regiões, que levariam em
conta o lugar onde as pessoas habitam, ou as igrejas que elas freqüentam, etc. O
que, na verdade, temos de elemento físico para assinalar o outro pode ser de
qualquer ordem material que possa indicar uma simbologia complexa e
historicamente construída. No entanto, o fator cultural é preponderante no modo de
dizer do outro, como podemos ver historicamente quando, na Expansão Ultramarina
Européia, as idéias de que nativos não tinham alma, que falavam línguas incultas
231
etc. eram exemplos das diferenças estabelecidas a partir dos componentes culturais.
Obviamente tais diferenças sempre foram motivadas por questões ideológicas.
Diante das possibilidades de designar as identidades do “negro” e “branco e
da designação de sociedade”, desenvolvemos um esquema ilustrativo que servirá
de ponto de partida para refletirmos sobre as preferências dos enunciados:
1ps
negro efeito
1
branco efeito
2
sociedade efeito
3
1pp
negro efeito
4
branco efeito
5
sociedade efeito
6
np
negro efeito
7
branco efeito
8
sociedade efeito
9
Diagrama 6 - Produção dos efeitos de sentido
O diagrama 6 procura descrever o que seria um dos componentes da
determinação da referência ao outro, com a questão da modalidade enunciativa. As
operações acima descritas tentam ilustrar que o ato de enunciar “negro” em 1ps, 1pp
ou em np leva a efeitos de sentido diferentes: lembramos, porém, que o sentido
pode aser o mesmo, mas o efeito de sentido não será. Isso se explica pelo fato de
que o PD “negro” referencia um grupo étnico e racial, o que o se altera tanto em
1ps, 1pp e np. O efeito de sentido fica por conta da presença do PD em determinada
232
modalidade enunciativa: é como se “negro”, na modalidade 1pp, levasse a efeitos de
sentido diferentes de “negro” na modalidade np.
Tão importante quanto à modalidade enunciativa e o PD que nela se inscreve
o os itens específicos da cada paradigma. o podemos descartar a hipótese de
que alguns de seus itens também revelam posições com relação ao outro a ser
designado; no caso, quando um enunciador diz “pessoa de pele escura” ao invés de
“negro, têm-se um enunciado inscrito em um dado efeito de sentido que a paráfrase
pode explicar. Usar “pessoa de pele escura” ao invés de “negroleva tamm a
efeitos de sentido pela negação, ou seja, toda vez que se seleciona um item do PD,
os demais ficam ainda no estado virtual. Dessa hipótese, desdobra-se o diagrama a
seguir em sub-operações de efeito de sentido:
1ps
negro efeito
1
negro efeito
1+a
de cor efeito
1+b
pessoa de cor efeito
1+c
pessoa de pele negra efeito
1+d
pessoa de cor negra efeito
1+e
Diagrama 7- Produção dos efeitos de sentido a partir do diagrama 6
O segundo esquema exemplifica as operações posveis através das palavras
componentes do paradigma, cujo efeito “1” faz a correspondência com a “noção”
negro e “+a” revela um efeito próprio da palavra do paradigma, como podemos
perceber nos exemplos parafrásticos;
54a) Por outro lado, a proposta de melhoria e inclusão do negro na sociedade,
está sendo visto com bons olhos [...]
54b) Por outro lado, a proposta de melhoria e inclusão das pessoas de cor negra na
sociedade, já está sendo visto com bons olhos [...]
233
É claro que os membros de um PD não têm a mesma situação de co-
referencialidade como em um romance no qual se pode designar uma personagem
X por seu nome ou outros epítetos (Maria, nossa heroína, a pobre, a sonhadora, a
irmã de João, a filha perdida etc.), porque o nosso corpus analisado é formado por
vários textos. Logo, temos as diferenças de sujeitos, o que nos leva a crer que a co-
referência dos paradigmas não precisa ser textual, mas pode ser discursiva. Assim,
ampliamos a noção de co-referencialidade, restrito a um mesmo texto, para o
discurso, como nos clássicos exemplos do discurso policial em jornais que designam
“réu” por “meliante, bandido, assaltante, facínora” etc.
Podemos dizer que o enunciado “54a” leva a efeitos de sentido diferentes de
“54b”. No primeiro caso, a identificação do “negro é, sem dúvida, atribuída à
questão fenotípica, mas toca na memória e evoca o aspecto cultural, enquanto em
“54b” (pessoas de cor negra) o item fenotípico do aspecto cultural é evocado em
primeiro lugar, e o fato de apresentar “pessoas nessa expressão cunhada para
designar “negro” evoca um interdiscurso: o de que negro também é pessoa”; ou
seja, pela afirmação do que seria um o-preconceito, o discurso preconceituoso
acaba acontecendo. É claro que não podemos generalizar a respeito desse
mecanismo de produção do sentido, acreditando que toda a vez que a palavra
“negro ou um dos membros do PD negro” surja, teremos sentidos de caráter
preconceituoso. O que percebemos é que há probabilidade de que isso aconteça e
que, proporcionalmente, haja predileção para um ou outro elemento designador,
dependendo da modalidade enunciativa. Para tanto, reagrupamos alguns elementos
dos PDs e os lançamos no gráfico para percebermos a tendência:
234
Legenda
Grupo Linha
Pessoa(s) negra(s)
Pessoas de cor negra, de cor negra, pessoa de cor
Sociedade negra, o povo negro, raça negra
Gráfico 26 - Distribuição de parte do PD “negros no grupo A
Esses exemplos designativos demonstram algumas preferências. O grupo
vermelho (pessoas negras) apresenta nenhuma ocorrência em 1ps, mas onde há a
palavra “cor” temos um alto índice de possibilidade de aparecimento em 1ps, que é o
grupo verde (pessoas de cor negra, de cor negra, pessoa de cor). No caso do grupo
amarelo, cujo sentido aponta para uma maior politizão do tema, vemos a maior
incidência em np, enquanto, por sua vez, “pessoa negra” tem seu maior índice em
1pp. A interpretação que fazemos para esse gráfico é que o enunciador em 1ps
prefere ressaltar que a “cor” é negra, enquanto que a enunciação em np parte para
um âmbito mais politizado da enunciação. A preferência, no caso do enunciador, é
que, em 1ps, não utilize a palavra “negro”, mas as expressões fixas pessoa de cor
235
negra” ou “pessoa de pele negra”: é como se a referência a negro tivesse que surgir
em 1ps de maneira “eufemizada”, ou seja, não se aponta o outro em 1ps de maneira
“objetivizada”, o que não acontece com as outras vozes que preferem tratar de
modos distintos esses grupos menores do PD.
Por outro lado, distinguindo o plural do singular (“negro” e “negros”), a
enunciação é bastante expressiva, como aponta o gráfico 27:
Gráfico 27: distribuição de “negro” e “negrosno grupo A
Proporcionalmente, o singular tende a aparecer mais em 1ps e o plural tende
a aumentar em np como nas frases abaixo:
55) O negro é igual ao branco e acredito que esta igualdade deveria começar por
ele mesmo, que é o maior racista o consegue se aceitar [...]
56) Estando no seculo vinte e um os negros continuam sendo o grande alvo da
sociedade pois sua imagem sempre foi denegrida, seus direitos nunca foram
respeitados [...]
236
Inicialmente, não identificamos uma causa exata para a preferência de 1ps
pelo singular e np pelo plural, mas, em ambos os casos, a referência é o coletivo,
sendo que, no caso do singular, temos uma referência ao grupo “negro” e não a um
membro dela:
57) José veio aqui?
– Sim, o negro, ele veio.
No caso de 57, o artigo o” está em função anafórica, daí sim há uma
definição partitiva do grupo, mas, em todos os casos, “o negro” e “os negros” são
expressões sinonímicas e indicam o coletivo, o o partitivo.
Ainda com o objetivo de compreendermos a constituição das designações do
ponto de vista lingüístico, observamos se algum efeito de sentido no âmbito dos
artigos e seus efeitos semânticos de definição e indefinição que precedem “negro”,
“branco” de “sociedade”. Constatamos que a maioria absoluta das ocorrências
acontece com o artigo definido, sendo raras as ocorrências com artigo indefinido
“um/uma”, as quais se dão em situações que um enunciador usa para exemplificar
58) É muito difícil você ver nos dias atuais um negro com um grau de escolaridade
superior [...]
Esse tipo de estrutura tem a ver com a definitude que os artigos e operadores
universais exercem sobre o escopo, no caso da língua portuguesa. Assim, ao se
referirem a “negro”, enquanto etnia, os sujeitos utilizarão o negro/os negros”, da
mesma forma para “branco”, quando se trata de exemplificar, utilizarão “um negro”,
enquanto que com a designação “sociedade” vamos encontrar apenas artigos
definidos, e não indefinidos. O que haveria de discursivo nesse contexto, como
interpretar a quantidade grande definição quando os sujeitos falam de R? A maior
237
propensão é a de que os discursos sirvam para assinalar “os negros” e “não-negros”,
demarcando, além do efeitos de sentido preconceituoso, os efeitos de que esse
objeto está definido, quer dizer, ocupa um lugar, uma existência: não se trata de algo
cuja referência seja elástica, ou cuja referência não seja encontrável, é algo bastante
definido. Além do componente semântico da definição/indefinição, a língua
portuguesa tende a utilizar muito mais enunciados com artigos definidos que sem
esses artigos; assim, a falta dos determinantes (artigos) seria uma exceção à
tendência da língua.
Somando-se a questão da definição dos nomes identitários do paradigma
designacional e o papel temático que eles adquirem nos enunciados e suas
respectivas modalidades, podemos chegar a algumas conclusões preliminares que
irão compor essa signalética das identidades associada às alternâncias eruptivas.
Necessitamos de, neste momento, elaborar alguns testes para avaliar se,
realmente, temos efeitos de sentido diferentes para cada elemento do PD. Para
tanto, realizamos alguns testes de comutação voltados para os efeitos de sentido
possíveis. O interessante desse tipo de teste é que a paráfrase desenvolvida pode
apreciar outros sentidos que não só o enunciado original. Decidimos fazer o teste em
pelo menos 10 exemplos dos 5 elementos mais importantes dos paradigmas
identitários surgidos no grupo A, sendo que os testes comutativos estão descritos no
anexo IV.
Desse modo, pudemos chegar à conclusão de que as diferenças entre as
modalidades enunciativas refletem, sim, sobre o efeito de sentido, não sobre o
sentido que será sempre uma maneira de apontar a referência, mas no conjunto
“modalidade enunciativa (1ps, 1pp, np)+ PD”. Os exemplos a seguir demonstram
como os efeitos podem ser desenvolvidos em diferentes contextos frasais:
238
59a) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que
notamos muitas vezes se tratarem de negros, tornando assim um círculo vicioso.
59b) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que
notamos muitas vezes se tratarem de pessoas negras, tornando assim um círculo
vicioso.
59c) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que
notamos muitas vezes se tratarem de raça negra, tornando assim um círculo
vicioso.
59d) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que
notamos muitas vezes se tratarem das pessoas de cor negra, tornando assim um
círculo vicioso.
59e) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que
notamos muitas vezes se tratarem de pessoas de cor, tornando assim um círculo
vicioso.
Cada uma desses enunciados inscreve o discurso em um efeito distinto e até
mesmo em FDs distintas, como é o caso das expressões “pessoa de cor negra”, da
qual tratamos anteriormente. Esse será um tema para o nosso último capítulo.
Até aqui conseguimos acumular um conjunto de dados e suposições sobre
o fenômeno analisado. Um dos primeiros aspectos que nos chamou a atenção foi
que o mesmo vai designar o “outro” quando é chamado a fazê-lo. Essa
constatação parece óbvia, no entanto é necessária, havendo dois fatores que nos
levam à mesma: a) as comparações entre os grupos A, B, C e o grupo D o fato de
termos 15% a mais de probabilidade de alternâncias nos três primeiros grupos que
em D; b) o haver qualquer referência, no grupo D, dos paradigmas identitários
“negro e branco”. Dessa reflexão, extraímos uma primeira regra geral que permite
assinalar as identidades:
I) o sujeito deve ser instado direta ou indiretamente para tocar em conteúdos
identitários.
239
Um segundo aspecto é que a designação de cada uma das identidades revela
um modo de se ver e se posicionar. Tanto a 1ps, 1pp e np se comportam
semelhantemente porque sabemos que é sempre um sujeito a enunciar e que as
modalidades enunciativas se prestam a constituir efeitos de sentido. Tomando o
exemplo “59a”, que é um enunciado original, fizemos comutações como elementos
do paradigma designacional, e agora faremos um novo grupo, modificando o
enunciado de 1ps para um 1pp e np, para percebemos as diferenças enunciativas
entre cada um dos enunciados:
60a) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que eu
noto muitas vezes se tratarem de negros, tornando assim um círculo vicioso.
60b) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que eu
noto muitas vezes se tratarem de pessoas negras, tornando assim um círculo
vicioso.
60c) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que eu
noto notamos muitas vezes se tratarem de raça negra, tornando assim um círculo
vicioso.
60d) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que eu
noto muitas vezes se tratarem das pessoas de cor negra, tornando assim um
círculo vicioso.
60e) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que eu
noto muitas vezes se tratarem de pessoas de cor, tornando assim um círculo
vicioso.
Agora vejamos a comutação com a np
61a) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que se
nota muitas vezes se tratarem de negros, tornando assim um círculo vicioso.
61b) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que se
nota muitas vezes se tratarem de pessoas negras, tornando assim um círculo
vicioso.
61c) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que se nota
notamos muitas vezes se tratarem de raça negra, tornando assim um círculo
vicioso.
240
61d) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que se
nota muitas vezes se tratarem das pessoas de cor negra, tornando assim um
círculo vicioso.
61e) tudo isso acaba gerando ou melhor criando adultos marginalizados, que se
nota muitas vezes se tratarem de pessoas de cor, tornando assim um círculo
vicioso.
A maneira de referenciar o outro tem dois aspectos distintos então: a) o
primeiro é a do item do paradigma a ser utilizado; b) e o segundo é o modo
enunciativo que o sujeito “escolhe”. Esses dois aspectos têm motivações distintas,
pois o paradigma pode revelar em qual FD participa o enunciado em questão e a
enunciação revela os movimentos de debreagem e embreagem enunciativa. A união
entre esses dois fatores pode ser um indício de como o sujeito se vê e vê o outro,
sendo que essas relações imagéticas ficam mais claras quando tratamos da 1pp.
Essas observações nos levam à segunda e terceira regras signaléticas para as
identidades:
II) O enunciador demarca quem é e quem é o outro através da enuncião actancial.
III) O uso dos paradigmas designacionais o procedimentos semânticos
referenciais inscritos em uma FI.
Ainda outro fator deve ser unido a esta análise e que já foi abordado
anteriormente: é o paradigma “sociedade”. Assim, existe uma triangulação da
referência à identidade “negro-branco-sociedade”. Observando o gráfico 22, página
226, podemos perceber as relações de co-ocorrências entre “negro-sociedade”.
6.2 As designações em não-pessoa
Os quadrados metade vermelho e metade preto indicam a co-ocorrência de
elementos do paradigma “negro” e do paradigma “sociedade”. Lembramos que a
divisão desse mapa de seções foi feita através do ponto final, ou seja, com cada
241
quadrado indicando uma frase, como nos exemplos a seguir :
62) (segmento 6) Os crimes que acontecem em todo o Brasil ainda resgata a
imagem do negro, porém é um país que não há racismo .
63) (segmento 419) Depois o importante esta no nosso coração sou negro fui criado
assim tendo a todos como amigo e tenho a consiencia que se parar de estudar serei
mais um analfabeto no Brasil excluído diante de todos .
64) (segmento 44) Desde o descobrimento do Brasil, o negro e seus descendentes,
sofrem com o preconceito e a desvalorizão. muito tempo o negro vive na
sociedade, como que não fosse membro desta família Muitas empresas, instituições
e pessoas ainda faz distião e desvaloriza o homem de cor negra [...]
Podemos observar que, diferentemente do gráfico 9, o 22 apresenta menos
co-ocorrências dentre “sociedade” e “negro”. Em 9, comparamos as co-ocorrências
de negro” e “branco” e constatamos que, na maioria das vezes em que aparece
“branco”, haverá algum item do paradigma “negro”. No entanto, a semelhança entre
9 e 22 fica por conta da co-ocorrência: toda vez em que um elemento do PD
“sociedade, na maioria das vezes, ele está acompanhando um elemento do PD
“negro. Esse fato é um forte indício de que o paradigma pivô, ao redor do qual
outros paradigmas se posicionam, é o PD “negros”.
Para nós, esse fato vem reforçar a regra signalética I e acrescentar mais
algumas reflexões sobre a interdiscursividade. Se a identidade de quem enuncia é
dada pela oposição ao outro, é natural que se enuncie primeiro o outro para que o
mesmo seja pressuposto, daí a explicação para que “negro” seja pivô. Daí também
os temas que podem ser agrupados sob FDs vão também circundar o outro, como é
o caso da constante associação do negro ao crime. Isso não é aplicável apenas a
temas que pareçam negativos. Podemos ter temas relacionados ao outro quando
encontramos discursos sobre educação brasileira enunciada por sujeitos brasileiros
que crêem que toda educação da Europa é eficaz, enquanto a brasileira não. Nesse
caso, o outro é visto como constituído predominantemente de aspectos positivos.
242
6.3 O conceito de “noção”
Lembramos que os sujeitos desta pesquisa são indivíduos que fazem um uso
natural da linguagem e, segundo Culioli (2000, p. 55), [...] se se quer tratar da
linguagem, não se é obrigado a se encastelar em uma concepção restrita do
lingüístico, mas, caso se queira tratar das línguas, é preciso saber que não se pode
falar de linguagem sem se ocupar das línguas.”(tradução nossa)
54
. Isso reforça que
estamos lidando com o real da enunciação (aspecto geral da linguagem), mas que,
ao mesmo tempo, essa enunciação se em língua portuguesa do Brasil, a qual
pertence a um grupo de sujeitos historicamente constituídos. Assim, a relação
“mundo X linguagem, além dos aspectos lingüísticos e semânticos abordados, inclui
aspectos ideológicos que não estão distantes do semântico. Daí tomarmos o
conceito de “noção” de Culioli (2000, p. 53-54):
A. Culioli: Falar de noção é falar de um conjunto que se pode exprimir, por
exemplo, por “ler; leitura, livro, leitor, biblioteca; etc.”, ou seja, é como se
dizer que não podemos reduzir as coisas a uma unidade lexical; esta
servirá de guarda-chuva, de entrada, mas é tudo. F. Bresson: O problema
é que a noção é qualquer coisa virtual e produtiva. Ela não é dada em
todas as concepções e é por isso que ela o pode corresponder a uma
unidade lexical. (tradução nossa)
55
Poderíamos dizer, então, que a “noção” é contraditória ao conceito de
“paradigma designacional? Absolutamente não, o que temos é que um paradigma
pode conter elementos de uma noção, mas, uma vez que a noção é altamente
virtual e está relacionada, por associações diversas e por agrupamentos mais
baseados na doxa
56
que necessariamente por fatores ditos objetivos e lógicos, como
54
[...] si l’on veut traiter du langage on est obli de ne pas se cantonner dans une conception
restreinte du linguistique; mais si l’on veut traiter des langues, il ne faut pas s’imaginer qu’on pourra
parler du langage sans soccuper des langues.
55
A. Culioli: Parler de notion c’est parler d’un ensemble que l’on peut exprimer, par exemple, par
« lire; lecture;livre, lecteur; bibliothèque; etc; » et c’est dire qu’on ne peut pas ramener les chose à une
unité lexicale; celle-ci va servir de porte-manteau, d’entrée, mais c’est tout. F. Bresson: Le problème
est que la notion est quelque chose de virtuel et de productif. Elle n’est pas donnée dans toutes
acception et c’est pur cella qu’elle ne peut pas correspondre à une unité lexicale.
56
Trataremos de doxa e memória no próximo capítulo.
243
é o caso de um sujeito associar “criminoso – negro”.
No caso dos discursos, o das crenças, o sujeito mediano é quase incapaz de
perceber que seu discurso carrega conteúdos preconceituosos, o que se explica
pelo fato de as FDs operarem no inconsciente e se constituírem como verdade.
Podemos dizer que os paradigmas identitários estão associados às noções que
servem a diferentes FDs, como, por exemplo, no quadro a seguir:
Formão discursiva racista
Paradigma designacional “branco” Paradigma designacional “negro”
noção noção
Sociedade dos brancos, não-
criminalidade, acesso à escola, rico, bem
sucedido.
Excluído da sociedade, criminoso, sem
acesso à educação, pobre, pedinte nos
semáforos, morador da favela
Quadro 11 - Resumo de FD racista
Isso demonstra que as entradas dos paradigmas designacionais da
identidade carregam tamm a entrada para as noções, como é o caso da relação
negro e criminalidade nos discursos analisados. Assim, a identidade não vem
simplesmente de se tratar do diferente, mas vem de dizer algo sobre o outro, e esse
algo, quando baseado na perspectiva de inferiorizá-lo, evoca noções que
sustentarão FDs. No caso da FD racista, as noções associadas sempre são sobre
um objeto, que não é necessariamente o tema. Como no grupo de textos analisados,
vimos que o que menos se falou foi de quotas raciais” nas universidades: o objeto,
nesse caso, é o negro”, cuja identidade se forma em oposição ao branco”. As
noções que irão compor os temas e que acompanham as identidades são
reveladoras de como os sujeitos enunciadores enxergam o outro e enxergam a si
mesmos. O que leva a uma quarta regra:
244
IV) Os atributos de uma identidade se fundamentam em temas, que por sua vez são
constituídos por noções que se posicionam em adjacência ao PD pivô.
Para prosseguirmos na tentativa de compreendermos como a signalética
identitária se comporta, faremos algumas observações referentes a cada uma das
modalidades enunciativas que encontramos no corpus bem como a maneira de se
designar que cada uma dessas modalidades desenvolve.
6.4 Enunciação e designação em np
Como afirmamos em outras passagens, a np constitui a forma enunciativa
básica, o que implica em dizer que, necessariamente, na maioria dos enunciados,
sejam eles em qualquer gênero, sejam eles em quaisquer circunstâncias, a
predominância será de não haver marcação de 1ps e 1pp. Como vimos no capítulo
V, a massa textual de todos os grupos do corpus está predominantemente
enunciada em np. No entanto, tal predominância não está numa perspectiva linear
da sucessão dos enunciados, mas sobre uma estrutura de terreno acidentado, como
se a np fosse uma planície enquanto os acidente fossem erupções que formassem
elevações sobre esse terreno, como nos gráficos e na metáfora-conceito de
“erupção enunciativa” referente às debreagens actanciais.
Intuitivamente, o falante imagina que enunciar em np assegura ao enunciador
isenção ou distância daquilo que enuncia, ou ainda que se desenvolva a
objetividade. Realmente esse é um efeito de sentido, pois, como dissemos alhures e
outros pesquisadores (INDURSKI, 1997, FIORIN, 2002, KERBRAT-ORECCHIONI,
1999), a enunciação em np é um efeito e não uma causa em si mesma. Tal
perspectiva se deve ao fato de que, embora, os sujeitos sejam entes empíricos e
existenciais, baseados na ilusão de unicidade, não necessitam de, a todo instante,
245
enunciar a partir da 1ps, com exceção dos momentos em que narra experiências
próprias ou que enuncia, diríamos, com verbos experienciadores (“eu creio”, “eu
penso”, eu sinto” etc.).
Essencialmente, em termos de enunciação em np, o efeito de neutralidade
é bastante conhecido e percebemos que, quando se trata da referência ao
paradigma “negro”, o texto mantém a mesma uniformidade com as outras pessoas
enunciativas, como pudemos observar no gráfico 12, no capítulo V. Como os textos
apontaram, há, no paradigma branco”, uma maior incidência de referências em 1ps
proporcionalmente. Isso nos leva a supor que as modalidades enunciativas
preferidas para “negro” são as 1pp e np, o que aponta tamm para a preferência de
determinar o outro nessas modalidades enunciativas. O efeito de neutralidade da np
nada mais é que a afirmão do próprio lugar no qual esse enunciador se coloca; é
como se o enunciador, através de uma imagem holográfica projetasse um outro que
fala por si, ou então, a cssica imagem do ventríloquo que fala pelo boneco, ou
ainda, o boneco que fala pelo ventríloquo, o que faz da np uma espécie de efeito de
“ventriloquia enunciativa”.
Gráfico 28 - Distribuição do PDbrancos” no grupo A
246
Se o “negro” está presente em todas as modalidades enunciativas de maneira
quase uniforme, e “branco” demonstra uma oscilão relevante nas outras vozes,
temos um indício a ser observado: em np, temos possibilidade menor de “branco”
que em 1ps. No entanto, é preciso ressaltar que a alta probabilidade esatrelada
ao plural de autoria como explicitamos no capítulo IV. Chegamos, assim, à
conclusão, não muito nova, de que enunciar e designar em np é como não se
envolver com o que se diz, logo os conteúdos mais preconceituosos irão surgir na
voz da np, como nos exemplos a seguir:
65) Por um lado, a estrutura da educação deve partir do primário da escola, pois não
terão uma mudança rápida de vida, que a maioria das pessoas que praticam a
violência são de origem negra .
66) O governo cria um sistema de cotas para ingressar os negros no ensino
superior, no entanto não percebe que estará alimentando o problema, ao invés de
diminuir, pois eles próprios vão se sentir discriminados, incapazes de caminharem
por suas capacidades .
Enunciar em np é dissimular não o indivíduo, mas o sujeito que é porta-voz de
uma FD, o que leva concluir que os enunciados preconceituosos tendem a surgir
mais em np e tamm em 1pp, como veremos a seguir.
6.5 Enunciação e designação em 1ps
A quantidade de enunciados em 1ps é deveras pequena, merecendo apenas
alguns esclarecimentos. O primeiro de todos é que a enunciação em 1ps não é bem-
vinda no gênero dissertação escolar que constitui o corpus.
Ao longo de nossa pesquisa, descobrimos, também, que havia um engano de
nossa parte ao conceber o enunciado em forma de 1pp como se fosse de 1ps,
desde que tivesse um verbo experienciador. Após alguns testes, chegamos à
conclusão de que deveríamos caracterizar os enunciados dessa categoria como
247
plural de autoria e deveria figurar na enunciação em 1pp, pois, sabemos que, em se
tratando de enunciação, só temos um sujeito emrico a enunciar e vários sujeitos do
discurso a “discursar”. Foi então que enunciados do tipo “nós acreditamos” foram
caracterizados então como 1pp no sentido de “autoriao 1ps majestático, como
propunha o primeiro modelo.
Ao desfazermos esse equívoco inicial (e que es descrito no capítulo IV)
chegamos à conclusão de que o sujeito-enunciador que se vale de verbos
experienciadores não fala de sua experiência particular (do eu”). O “nós
achamos/pensamos/acreditamos/vemos” existe socialmente, pois se tratam de
crenças desenvolvidas dentro de uma memória socialmente assumida, por isso o
fato de termos percebido que o “nós” de autoria, ficaria melhor classificado, no
conjunto das enunciações em 1pp; da mesma forma, o “eu
acho/penso/acredito/vejo” só existe socialmente; no entanto, a debreagem para
1ps o que leva ao efeito de centralidade no sujeito-enunciador, diferentemente da
condição de 1pp que descentraliza a referência que fica diluída.
Então, o quê, necessariamente, motiva alguém a enunciar em 1ps e não em
1pp? Infelizmente esta pergunta não conseguimos responder, pois nos vimos diante
de uma situação bastante embaraçosa, pois afirmar categoricamente que a
motivação de se enunciar em um 1ps tinha alguma origem especial era praticamente
impossível, porque a quantidade de dados era muito pequena para todos os grupos
do corpus. A hipótese mais plausível para se enunciar em 1ps talvez fosse a
necessidade de o sujeito se assumir como fonte do dizer. outro aspecto
interessante, apesar da quantidade pequena de dados: a neutralidade em relação ao
tema proposto, ou melhor, em 1ps, os enunciados tendiam a assumir menos a
posição de contrário ou a favor à implementação das cotas raciais. A modalidade
248
1ps era o momento de enunciar como dono do dizer, como quem assumisse o papel
de autor realmente engajado, mas não necessariamente com o tema proposto, e sim
com a sua própria iluo.
Por outro lado, a reflexão sobre 1ps reforçou nossa idéia de que estamos
lidando com erupções e não com linearidade enunciativa de signos que se sucedem
em uma linha horizontal discreta em seus intervalos, nos quais se percebe
claramente o que é 1ps, 1pp e np. Estamos lidando, sim, com modalidades
sobrepostas que não necessariamente apareçam em condição simultânea, mas que
se deixam ver de quando em quando, próximas talvez de um comportamento de
heterogeneidade mostrada.
É por esse motivo que vamos nos concentrar em 1pp e np, sendo que,
nesses casos, temos mais material textual e mais elementos de alternância eruptiva
que corroboram com as nossas hipóteses sobre a enunciação e sobre o discurso.
6.6 As designações em 1pp
Podemos dizer, com toda a segurança, que 1pp é a modalidade enunciativa
mais trabalhosa de se analisar. Se em np o enunciador é pressuposto ao enunciar,
por exemplo, em um “eu (branco) X eles(negros)”, em 1pp a distinção entre o “eu X
outro” ganha contornos identitários mais complexos, muito embora sejam bastante
claros e perceptíveis. Isso se deve ao fato de que o “nós comporta um escopo muito
grande, conforme Geffroy (1985, p. 6) afirma: “Do locutor apenas até todo o gênero
humano, o nós opera nesse conjunto e em toda sorte de seus subconjuntos”
(tradução nossa)
57
.
Diferentemente de 1ps, que tem uma quantidade de dados pequena e não
57
Du locteur seul au genre humain tout entier, le nous peut opérer dans cet ensemble toutes sortes
de partage.
249
deixa entrever situações de regularidade, 1pp é completamente diferente. Em 1ps
temos a instância enunciativa do actante coincidindo com a do enunciador; já em
1pp o enunciador escercado por outros, pois, nesse caso, o enunciador é um dos
actantes ao mesmo tempo em que se inscreve em um conjunto de entes
enunciados, como ,por exemplo, em nós, os professores”. Nesse caso, a fórmula
“nós=ps+np(professores)” inclui no conjunto de “professores” o próprio enunciador
em posição de não-pessoa, o que é diferente de 1ps em que o enunciador enuncia a
si mesmo na posição enunciado e actante. Essa dupla articulação de 1pp permite ao
enunciador se colocar na posição de porta-voz de uma coletividade. E, como Geffroy
demonstrou, a referência é altamente elástica”, sendo que pode assumir diferentes
sentidos: toda humanidade, todos brasileiros, todos brasileiros exceto os negros etc.,
como demonstramos no capítulo IV.
Uma observação de Landowski (1985, p. 13) acaba sendo bastante
elucidativa para compreendermos porque os sujeitos alternam:
Admitindo-se que a comunicação, vista sob o ângulo do público e do
privado, desencadeia mais especialmente uma problemática da visibilidade
dos sujeitos, a mensagem toma então a forma de uma imagem: imagem de
si-mesmo emitida por um sujeito observável, e apreendida (ou não) por um
observador. (tradução nossa)
58
Alternar, então, tem a ver com as imagens criadas e essas imagens estão
relacionadas às identidades. O primeiro indício de que a identidade racial está
atrelada à imagem que um grupo cria do outro é a relação de igualdade e diferença
(conforme abordamos no capítulo III), sendo grande a quantidade de exemplos no
corpus, como quando há pouco tratamos do conceito de Culioli de “noção”. Mais
uma vez, as imagens estão relacionadas às crenças que os sujeitos constroem, e o
material para essa construção tem origens diversas, ou melhor, discursos diversos
58
En admettant que la communication, envisagée sous l’angle du public et du privé, engage plus
spécialement une problématique de la visitiblité des sujets, le message prendalors la forme d’une
image: image de soi-même émise par un sujet observable, e captée (ou non) par un observateur.
250
que deixam suas marcas materiais nos enunciados dos sujeitos. Isso pode ser
percepvel nos dados levantados, como, por exemplo, em relação aos argumentos
ocupados pelos paradigmas designacionais apontados no capítulo IV, em que temos
uma grande maioria de enunciados em que “negro” é “paciente, “objeto”, o
“beneficiário”, em poucas situações ocupa o papel temático de “agente” e quando o
é, está associado a noções de caráter negativo como a de “criminalidade”.
Assim, para melhor ilustrar as relações “nós X eles”, na construção da
imagem do outro em 1pp, faremos uma análise mais minuciosa em pelo menos três
aspectos: a) o papel temático dos paradigmas designacionais identitários “branco” e
“negro; b) a referência própria da 1pp; c) as alternâncias que envolvem 1pp.
6.6.1 Papéis temáticos enunciados em 1pp
Lembrando o gráfico 12 do capítulo V, vemos que, nas ocorrências de 1pp, no
grupo A, há apenas a incidência de três papéis: paciente, beneficiário e objeto para
o PD “negros” e tal predominância, com algumas alterações, se repete também no
grupo B para 1pp. Pois bem, se tomarmos os três principais papéis lembrados aqui,
veremos que um discurso sobre o outro bastante descritivo, o que revela uma
determinada imagem atribuída de inatividade ou passividade com relação ao
“negro, vejamos os exemplos.
67) Nós sabemos que uma parte desses negros não tem uma chance na Faculdade
.
68) Não é raro vermos negros na rua sendo preso, fumando muitos entraram nisso
até por falta de uma oportunidade de vida melhor
69) Com isso devemos ter uma civilização negra melhor e bem aceita na educação,
trabalho no lazer e no bem estar com todos
70) Novamente vem a tona o preconceito racial, negros são pessoas como nós,
todos sabem disso até eles mas o dilema continua muitas vezes isso acontece por
racismo [...]
251
71) A solão está aos olhos de todos, reservando vagas nas faculdade, para os
negros, estamos dando-lhes estrutura para ingressar no mercado de trabalho e
educação para que eles não caiam no mundo das drogas.
Essas cinco frases ilustram alguns conceitos que irão compor algumas
formações discursivas presentes nos textos, como, por exemplo, a de associação do
negro ao mundo da criminalidade e das drogas e a missão profética e salvadora dos
brancos responsáveis pela dignificação do negro, ou melhor, de sua “brancarização”.
O processo de dignificação que é entrevisto nos enunciados citados acontece pela
transformação do negro em um branco, ou pela educação que o branco possa lhe
proporcionar ou pela inclusão social que também é papel de o branco desempenhar.
Os casos onde encontramos as posições de beneficiário, objeto ou paciente
servem para indicar as seguintes idéias que estão na base de alguns temas
constituídos pela FD racista:
Paradigma
Papel temático Conteúdo
Paciente Descrição ou comparação do “negro” (exemplo 42)
Beneficrio
Os brancos lhes dão ou proporcionam algo
(exemplo: 39)
Negro
Objeto
Como os brancos vêem os negros, ou seja,
discriminados, ou como criminosos, (exemplos: 41,
88).
Quadro 12 - Correspondência entre papel temático e conteúdo
A nossa interpretação desse tipo de construção de imagem é a de que a
memória discursiva desses sujeitos enunciadores, que percebemos um bom
tempo, enunciam da posição do branco. Presumimos, sem nenhum tipo de dado e,
por isso, o que vamos dizer é mera especulação, que os conteúdos descritos no
quadro 10 possam ter suas origens em dois momentos históricos distintos: a) o de
que o negro merece ser como o branco, surgido a partir do Abolicionismo; b) de que
o negro tem propensão à criminalidade, como um efeito da Abolão e do êxodo rural
que levou ao inchaço das grandes cidades (surgimento das favelas e da segregação
252
dos pobres na periferia). Assim, o discurso preconceituoso sustentado pelos
enunciadores esbaseado em condições hisricas que não tivemos oportunidade
ainda de averiguar. Isso explica o sentido da criminalidade atribuída ao negro e à
idéia da existência de uma missão salvadora do branco.
6.6.2 A referência complexa de 1pp
Como fora visto no capítulo IV, ao tratarmos da metodologia da análise,
percebemos que a 1pp é complexa no que diz respeito a vários aspectos
semânticos, mas, para nós, tal complexidade referencial esatrelada às também
complexas relações sociais desenvolvidas pelos sujeitos. Guespin (1985, p. 45)
afirma:
Um dos melhores pontos de estudo do exercício linguageiro do sujeito em
sua dimensão psicossocial será paradoxalmente o nós. Com efeito, nós
fornece uma grade de leitura: quando o locutor renuncia ao eu para se
associar a outros, através do recurso ao nós, ele marca implicitamente
quais traços de sua personalidade social, ou do processo de interação são
colocados em funcionamento. É claro que essa grade de leitura não é
evidente, mas é determinada, por sua vez, pela convenção social e pelas
interações sociais, pelas intenções, ilusões, manobras e pretensões do
sujeito. (tradução nossa)
59
Acreditamos que Guespin acerta em sua colocação, no entanto, além da
“intenção” ilusória que o sujeito possui, diríamos que o trabalho do inconsciente
tamm coloca em funcionamento os mecanismos de prodão do sentido com
relação ao nós. Para tentarmos compreender de quais discursos os sujeitos
enunciadores são porta-vozes e quais as identidades psicossociais eles carregam,
vamos observar, em termos quantitativos, as referências aos tipos de 1pp que
surgiram no grupo A. Para tanto, relembremos os tipos de 1pp que levantamos no
59
Un des meilleurs points d’étude de la mise en forme langagière du sujet dans sa dimention psycho-
sociale, ce separadoxalement le nous En effet, nous fournit une grille de lecture: lorsqu’il renonce
au je pour s’associer à d’autre, dans le recours au nous, le locuteur marque inplicitement quels traits
de sa personnalisociale, ou du procès d’interaction, sont mis en œvre. Bien sûr, cette grille de
lecture nest pas évidente, détrminée quelle est à la fois par la convention sociale et par les intentions,
illusions, manœvres et prétentions du sujet.
253
capítulo IV, agora acrescido do tipo “autoria”.
a) nós = pessoa subjetiva (majestático, modéstia, autoria) que tem o status
de 1ps;
b) nós = pessoa subjetiva + pessoa não-subjetiva (eu+você/vocês);
c) nós = pessoa subjetiva + não-pessoa
d) nós = pessoa subjetiva + pessoa não-subjetiva (eu+você/vocês) + não-
pessoa;
ps: pessoa subjetiva (enunciador, aquele que fala/escreve);
pns: pessoa não-subjetiva (enunciatário, aquele que ouve/lê)
np: não pessoa que pode ser referenciado de diferentes maneiras
1pp1 = ps+np(todos)
1pp2 = ps+np(sociedade) + np(negros)
1pp2 = ps+np(sociedade)np(negros)
1pp3 = ps+np(não-negras)
1pp4 = ps+np(brasileiros) + np(negros)
1pp5 = ps+np(brasileiros) – np(negros)
1pp6 = ps+np(todos) – np(negros)
1pp7 = ps+pns
1pp8 = ps+pns(autoria)
Gráfico 29 Tipos de 1pp
Aqui, não estamos considerando que “sociedade” e “Brasil” façam parte do
mesmo paradigma. Se somarmos ambos, chegaremos a gráficos em que os itens
1pp2 e 1pp4 compõem 44% das ocorncias dessa modalidade, o que implica em
Tipos de 1pp
7%
27%
9%
0%
15%
25%
17%
1pp1
1pp2
1pp3
1pp4
1pp5
1pp6
1pp7
254
perceber que mais referência a 1pp no PD “sociedade” do que a toda
humanidade, o que revela traços de segregação no discurso dos sujeitos, mas, para
se chegar ao nível de se afirmar que um discurso segregacional, é preciso
computar todas as formas de enunciados excludentes de “negro” que se conduzem,
a exemplo da frase a seguir:
72) Vivemos em uma sociedade
1
racista uma sociedade
2
que não com bons
olhos o seu irmão negro, só por que ele tem a pele um pouco mais escura que a
sua, de às vezeso tem roupas melhores para vestir e até mesmo por ser de outra
religião.
Nesse caso, temos um exemplo de 1pp5, ou seja, o verbo “vivemos” está
acompanhado pelo argumento “sociedade1” (lugar), enquanto que “sociedade2” é
argumento “agente” do verbo “ver”. Por exclusão, podemos inferir que esse
“vivemos” o é 1pp2 includente de “negro”, porque temos duas posições temáticas
ocupadas: nós(no caso pressuposto pela desinência número pessoal do verbo) e
“sociedade como argumento indireto de “lugar”. Mas isso não é o mais importante
desta reflexão, o que vale, sim, é ressaltar que somente o verbo vivemos” criou o
efeito de sentido de exclusão do negro do espaço social, pois o sujeito de “vivemos”
é nós=ps+np(brancos)”. São muito comuns enunciados com esse tipo de efeito de
sentido no corpus. Outro exemplo ainda é o que é utilizado alhures:
3) A nossa sociedade precisa dar uma chance para eles.
Nesse caso, o efeito de sentido da “sociedade” exclusiva dos brancos remete
ao tipo de discurso desenvolvido na fórmula “1pp2 = ps+np(sociedade)
np(negros)”.
Há casos, no entanto, de enunciados em 1pp que são inclusivos e outros que
não são nem inclusivos nem exclusivos, que deixavam dúvidas no momento de
categorizar:
255
73) Dentre todos os problemas vividos pela sociedade, a cada dia temos um a mais
para nos preocuparmos.
Observando a frase 73, percebemos que o é possível aplicar a
classificação incluo/exclusão, mesmo que a referência seja a fórmula 1pp2 =
ps+np(sociedade); o “nos preocuparmos”, em termos de referência mais próxima,
por contigüidade, pode atingir “sociedade”, o que se torna também possível pelo
elemento anafórico um que retoma problema”. Logo se a sociedade” vive “os
problemas”, e s” temos que resolver um “a mais”, entendemos que
contigüidade de sentido, mas, nesse caso, sociedade é simplesmente uma
referência ao grupo humano e brasileiro, sem contudo referir-se a inclusão ou
exclusão.
A observação da não aplicabilidade de oposição inclusão/exclusão nos levou
a modificar mais uma vez o modelo de análise para 1pp, acrescentando a
modalidade “não-aplicável”, o que resultou no gráfico a seguir:
Gráfico 30: inclusões e exclusões em 1pp – grupo A
O gráfico somente demonstra, de maneira bastante geral, os efeitos de
inclusão/exclusão. Para compô-lo consideramos que 1pp-Todos era tamm uma
Inclusão/Exclusão em 1pp
42%
41%
17%
inclui
exclui
não-aplic
256
modalidade inclusiva de “nós”, por outro lado as modalidades 1pp2-sociedade-
exclusiva, 1pp4-brasil-exclusivo, 1pp3-não-negros e 1pp5-todos-exceto-os-negros
compunham o grupo de 1pp excludente. Curiosamente, entre as referências a “país”,
“Brasil”, “sociedade” percebemos diferenças bastante importantes como o gráfico a
seguir demonstra:
Gráfico 31: inclusões e exclusões em 1pp – grupo A, detalhando os tipos
Quando se trata de compararmos a distribuição pela referência a Brasil”,
“país”, “nosso governantespercebemos uma tendência à inclusão, quando se trata
de “sociedade”, “mundo em que vivemos”, “época em que vivemos” (que não deixam
de ser expressões do paradigma de sociedade, se aplicarmos o conceito de “noção”
conforme Culioli) o índice de enunciados que revelam o negro como excluído é bem
maior. Esses dados nos levam a crer que, no contexto dos efeitos de sentido
analisados, o Brasil e sua administração representam um ente social includente, mas
a “sociedade”, ou seja, o local das práticas cotidianas, um “lugar” excludente do qual
os negros não se beneficiam. Chegamos, então, a mais uma regra:
V) O enunciador atribui ao sujeito do enunciado papéis temáticos condizentes com
as noções que lhes são pertinentes em um sistema de valores.
Relações inclusivas/exclusivas em 1pp
10%
13%
25%
11%
12%
9%
20%
sociedade inclusiva
sociedade exclusiva
Brasil inclusivo
Brasil exclusivo
todos exceto negros
não-negros
autoria
257
Isso quer dizer que, além da regra III, que prevê como o enunciador se
enxerga e enxerga o sujeito do enunciado nas relações entre 1ps, 1pp e np, os
papéis que o enunciador relega ao sujeito do enunciado esatrelado às noções.
Isso será melhor explorado nos itens que se seguem.
6.7 A indicação do outro: uma signalética da alteridade
O “negro” é o outro, como também poderia ser o “pobre”, o “argentino”, o
“rico”, o “muçulmano”. A questão a ser tratada reflete sobre um aspecto bastante
peculiar: ao tratar do outro e, no caso, o negro, estamos lidando com marcas
discursivas que a história e a historicidade deixaram na memória. Assim, não
podemos falar de uma signalética da identidade em geral, mas de identidades na
oposição negro-branco”, “ocidental-oriental”, “católico-evangélico dentro da
historicidade em que cada uma dessas formas de identidade se inserem, como, por
exemplo, “xiita-sunita”, que se inscreve apenas no contexto dos países muçulmanos
que comportam a historicidade pertinente a essas identidades.
Com a regra V de sinalização do outro, acreditamos que demos conta dos
aspectos semânticos e discursivos da maneira que se tem de indicar o outro. No
entanto, vemos que é muito importante aprofundar a questão da interpretação dos
papéis temáticos nos quais os enunciadores colocam os elementos dos PD e vale a
pena fazer uma reflexão sobre os três principais papéis que surgem no corpus. O
objetivo desta reflexão é proporcionar o material de análise para refletirmos sobre as
FDs que foram encontradas no corpus .
258
6.7.1 O papel temático paciente”
Como vimos no capítulo IV, consideramos o papel temático paciente aquele
selecionado por verbos de estado, ou seja, aquele que não denotava ação ou
processo. Lembramos que essa categorização é muito questionável, mas não
podemos negar que existam elementos que nos levam a crer que tal categorizão
no discurso proporciona uma compreensão bastante interessante sobre os efeitos
de sentido relacionados aos discursos sustentados, como fez Moirand (1988). Além
disso, não podemos nos esquecer de que os enunciadores falam do outro e é ao
outro que atribuem valores e os papéis temáticos: mais do que uma categorização
semântica, representam tamm elementos discursivos, se forem bem interpretados.
A maioria dos enunciados, tanto em 1ps como em np, que comportam os
elementos do paradigma “negro ocupam o papel temático de paciente. No caso, o
conceito de paciente significa que o argumento não é o agente, nem o afetado por
um processo ou por uma ação; logo, quaisquer um dos elementos semânticos que
fuja de um desses critérios acaba sendo um estado, como o caso do verbo “ter”,
segundo o que está no exemplo a seguir:
74) Os negros no Brasil tem poucas saídas porque nem todos o iguais tem um
que são ladrões e outros são bandidos por isso a raça negra fica difícil de arrumar
um serviço e outras coisas mais nem todos negros são bandidos e lades por causa
desses que não presta que estraga para os outros .
O papel temático de paciente demonstra procedimentos descritivos sob a
idéia do “ser”, “estar e “ter”, que apresentam o objeto designado pelas suas
características; assim, o outro não “faz”, “transforma”, “ajuda”, o que lhe confere
passividade. Quando o enunciador lhe delega uma agentividade, muitas vezes ela
não é nada positiva. Mesmo quando se tem paciente, como na frase acima,
observamos que a caracterização do outro esrelacionada à criminalidade. Então,
259
a primeira forma de se referir ao outro, e talvez isso seja geral para todas as formas
de assinalar o diferente, acontece pela tematização de paciente, ou seja, pela
descrição e atribuição de determinadas características e valores a ele. No caso do
corpus que estamos analisando, essa relação ficará melhor explicada no capítulo 7.
6.7.2 O papel temático beneficiário”
o papel temático de beneficiário coloca o argumento na posição de quem
recebe a ação, como descrito no capítulo IV, não sendo necessariamente um
argumento provocado por um verbo de ação, podendo ser um argumento
relacionado a uma expressão nominal, como em cotas para negros”. Isso porque,
mesmo em uma frase nominal (no sentido de não existir nenhuma forma verbal)
podemos transformá-la em uma paráfrase com verbo, como em: As universidades
destinam cotas de vagas específicas para negros.”, o que, referencialmente, tem o
mesmo valor que simplesmente “cotas para negros”, considerado o fator
situacionalidade.
É importante ressaltar-se que alguns papéis temáticos ocupam seus lugares
desde que necessariamente existam outros, enquanto alguns não precisam deles:
no caso do beneficiário, é mister que exista um agente. uma quantidade grande,
mas não tão considerável de elementos do paradigma “negro” na posição de
beneficiário e, em um razoável número de ocorrências, temos o branco”, a
“sociedade, as pessoas” como agentes de ações em prol do negro.
75) As pessoas de cor são discriminadas na sociedade dos negros.
76) O governo precisa dar cotas especiais as pessoas miseráveis que não tem o que
comer. Aos negros apenas o direito de viver com dignidade pois a igualdade e
potencial eles possuem igual a qualquer outra cor .
77) A questão de cotas nas universidades não vai resolver a situação da
comunidade negra, pois o negro possui capacidade suficiente tanto quanto o branco,
não precisando diferenciá-lo diante de sua sociedade
260
Seja o fato de que “Ø discriminam as pessoas de cor na sociedade dos
negrosou que o governo” precisa ajudar, ou ainda que as cotas não resolvem o
problema”, o fato é que “negro”, na maioria das ocorrências está na posição de
beneficiário, “recebe ajuda”, “são discriminados”, ou “recebem quotas”. Se, nas
ocorrências de paciente, o que temos são atribuões de valores pela descrição, não
é diferente quando se tem o beneficiário. No caso de receber um processo ou ação,
se tem uma valoração pela não escolha do argumento em posição de agente. Em
suma, é como se o discurso dissesse que o “negro” não pode fazer, mas que ele tem
que esperar que os outros façam por si. Isso é mais um indício do discurso racista
ou preconceituoso que estamos tentando compreender.
6.7.3 O papel temático objeto”
Finalmente, conforme o gráfico 20, observamos que o terceiro papel temático
é o de objeto. O caso do papel do objetoo é muito diferente do beneficiário, em se
tratando de sua ocorrência no corpus. Mais uma vez, temos o paradigma “negro”
valendo por um efeito de sentido inerte, contrário à agentividade, como nos
exemplos a seguir:
78) Muito se tem feito para defender a raça negra no Brasil .
79) tempos que as autoridades políticas vêm falando em melhoramento aos
atendimentos, relação aos negros, mas nas grandes cidades, os negros o vistos
como marginais, ladrões e são muito discriminados, até por próprios negros .
80) Os negros merecem ser vistos como pessoas que deram sua contribuição na
construção do nosso país sem ser excluídos da sociedade .
São as situações em que “alguém defende o negro”, ou que “alguém vê o
negro” de alguma forma, o que implica em, mais uma vez, atribuir-se características
à etnia, quando se escom o caso do modo “como marginais”, referido no exemplo
261
acima. Mais uma vez temos a perspectiva de inércia do outro. Em termos gerais, os
três principais papéis temáticos apontam para uma posição bastante estereotipada e
para um discurso do racismo que referencia o negro como um sujeito não-autônomo
(alguém sempre deve fazer por ele) ou, quando autônomo, como se tratasse de
alguém que está envolvido com o crime.
Observadas as questões referentes à maneira de referenciar o outro através
dos papéis temáticos dos casos, passaremos, agora, a tentar compreender os
efeitos de sentido da alternância entre uma modalidade enunciativa e outra; no caso,
a alternância entre 1pp e np.
6.8 A relação entre alternância e discurso
Para realmente concebermos se as alterncias refletem posições discursivas
ou o, é preciso tentarmos categorizar esses saltos. Já vimos que determinada
modalidade enunciativa desenvolve uma preferência por determinada maneira de
referenciar o outro, mas é necessário, ainda, percebermos se essa preferência se
reflete para a construção de uma FD, o que será nosso assunto para outro capítulo.
O desafio, então, é saber se a 1pp e np são veiculadoras de FDs distintas e, se no
movimento de alternância, cada uma delas desenvolve um discurso distinto. Esta
última afirmação, na verdade, assume uma hipótese que, para se tentar validar, mais
uma vez, teremos que apelar para a estatística aplicada à AD. Desta vez, não
podemos nos ater à questão lexical, mas sim ao contdo, do que advêm algumas
dificuldades: a) como dizer se um texto tem caráter preconceituoso ou não? b) o que
entenderemos por “caráter preconceituoso? Vejamos alguns exemplos:
81) Sim, mas os negros estão tomando cada vez mais esse grandioso lugar, e nossa
sociedade.
262
82) È tempo de parar e refletir o que somos e temos.
83) A partir do momento que nossos governantes começarem a mudar sua maneira
de pensar e agir, dar mais condições de vida aos negros, mais atenção, o índice de
criminalidade mudará, gera empregos sem preconceitos
84) Os políticos responsáveis pelo nosso pais, pensando em tentar acabar com o
racismo e a descriminação contra os negros criaram um projeto.
Quais desses enunciados trariam conteúdos preconceituosos? A princípio,
algumas frases não pareceriam ter conteúdo preconceituoso, pois o posto não o
apresenta: nesse caso, o conteúdo es pressuposto, como por exemplo os
enunciados 81, 83. Observando de perto essas frases e utilizando o conceito de
papel temático em 83, vemos que “negros” ocupa o papel de beneficiário. No caso
de 81, temos relação de pressuposição da exclusão do negro. Isso não significa que
o sujeito seja preconceituoso, mas que o discurso que ele enuncia contém
conteúdos preconceituosos. Nesses casos, o preconceito não reside
necessariamente no posto (enunciado), mas no pressuposto (na enunciação), cuja
exemplificação temos nas duas frases citadas. No caso de 82, a frase é neutra do
ponto de vista do preconceito racial, pois não faz referência alguma a diferenças
raciais. O enunciado 84 cita “negros”, mas não lhes confere qualquer sentido que
pudesse corresponder a uma posição preconceituosa no discurso. A partir dessas
considerações, passamos a categorizar, então, as passagens de 1pp-np e np-1pp
nos enunciados do grupo A apenas, o que nos revelou o seguinte gráfico:
Gráfico 32: conteúdo preconceituoso por enunciação
As duas modalidades de alternância m incidência de discurso
FDs e movimentos 1pp-np
35%
36%
29%
FD.prec
FD.n-prec
não
aplicável
FDs e movimento np-1pp
32%
44%
24%
FD.prec
FD.n-prec
não
aplicável
263
preconceituoso nos termos dos exemplos acima elencados, sendo que a variação é
relativamente pequena. No entanto, vimos que há uma quantidade razoável de
enunciados que não comportam discurso preconceituoso, o que implica em supor
que, em um mesmo texto, existem discursos preconceituosos e não preconceituosos
se alternando entre si. Outra informão relevante é que não importa se o enunciado
está em np ou em 1pp, pois os conteúdos preconceituosos estarão presentes em
maior ou menor escala, dependendo das condições de produção (cf. visto no
capítulo V). O que importa é que, em cada uma dessas situações, temos elementos
da ordem do discurso e da ordem da enunciação constituindo os efeitos de sentido.
De certo modo, os dados frustraram nossas expectativas, pois julgávamos
que encontraríamos regularidades que comprovassem que uma modalidade
enunciativa fosse o lugar de maior incidência de discurso preconceituoso.
Entretanto, elas se mostraram capazes igualmente de servirem tanto ao preconceito
quanto ao não-preconceito, mas cada uma à sua maneira. Outros tabus, mesmo
assim, foram quebrados: um deles era o de que o enunciado em 1pp constituía uma
modalidade enunciativa democrática, sendo que o que vimos foi a sua negação. Na
verdade, tanto uma forma enunciativa quanto a outra podem ser democráticas ou
não conforme a distribuição de valores. O próximo desafio a ser enfrentado é quanto
à maneira como os discursos preconceituosos e não preconceituosos se comportam
no corpus analisado, com o que fecharemos o ciclo de nossa análise.
264
CAPÍTULO VII
OS DISCURSOS E AS FORMAÇÕES DISCURSIVAS
Neste último capítulo, apresentamos as considerações sobre vários aspectos
dos discursos presentes no corpus. O percurso até aqui indicou umarie de
reflexões sobre a materialidade do discurso, pois todos os diferentes elementos
extraídos da estatística apontaram para várias questões do discurso. Vimos que os
elementos perscrutados das alternâncias, relacionados a questões semânticas
resultaram no levantamento de uma rie de dados das alternâncias eruptivas e
seus efeitos de sentido. Vimos também que existem regularidades a que
denominamos signalética das identidades.
Cumpre agora tratarmos do ápice de todas essas considerações, que são os
discursos. Muitas das considerações que aqui serão elencadas foram previstas,
em outros momentos desta tese, pois os dados, por vezes, falavam por si mesmos.
Nesta última parte da pesquisa, trataremos dos sentidos criados pelos discursos e,
finalmente, conseguiremos abrigar, sob o conceito de FD que compartilhamos, os
enunciados fragmentados. A partir da massa de textos, pudemos identificar
diferentes questões discursivas e identirias dos sujeitos, sua memória, as
condições pré-discursivas, interdiscursivas entre outros aspectos. Assim, trataremos
dos conteúdos que vão da memória discursiva até a criação de novas identidades.
7.1 Pré-discurso: a memória discursiva e a formação discursiva
Paveau (2006, p. 14) utiliza o termo pré-discurso (prédiscours) para propor
uma compreensão das relações entre o dito e a dizer: “Eu desejo, com efeito, me
dedicar ao problema da ‘caixa preta’ das informações precedentes que informam os
discursos, sobretudo do ponto de vista da articulação entre os dados anteriores e as
265
produções verbais.” (tradução nossa)
60
A misteriosa “caixa preta” de que fala
Paveau é o entre o anterior e o porvir. Um exemplo disso é quando, nos textos
analisados, os sujeitos relembram o passado escravista do Brasil e falam de
preconceito racial, como modo de atualizar a história no momento em que
enunciam. O precedente, ou o pré-discursivo, irá fazer referência a tudo que existiu
antes de uma enunciação.
Esses dados são produto da própria intersubjetividade precedente e, como
lembra Saint-Exupéry (1942, p. 174): “Um homem é somente um de relações, as
relações contam-se pelo homem” (tradução nossa)
61
. Pensamento que não dista dos
conceitos bakhtinianos de dialogismo. Como Paveau expõe, o objetivo é chegar à
“caixa preta”, ou seja, ao objeto que faz os “nós” entre “o dito” e o “a dizer”. Podemos
estabelecer algumas relões, primeiramente pensando que o pré-discurso contém
uma grande complexidade, no que diz respeito aos diferentes fatores que o
comem, ou melhor, o pré-discurso é um conceito amplo para abrigar, sob suas
abas, a complexidade de elementos discursivos ou não discursivos que, de alguma
maneira, influenciam o “a dizer”. É Paveau quem utiliza o termo pela primeira vez em
ciências da linguagem, muito embora tenha aparecido em outros autores como
Foucault, Lacan, Amoussy, mas estes sempre o utilizaram com outros termos
acompanhando-o, não como um conceito autônomo. Foucault fala de “experiência
pré-discursiva”, Lacan e Amoussy retomam o “ethos pré-discursivo”. Consideramos
que todos os autores m razão em utilizar o termo, como dito anteriormente, pois o
seu conceito é vasto e, por isso, bastante útil:
O termo pré-discursivo é utilizado aqui em seu uso essencial, definível
simplesmente como ‘o que identifica de tudo que se passa antes do
60
Je souhaite en effet me pencher sur le problème de la « boîte noire » des informations préalables
qui informent les discours, et surtout du point d’articulation entre ces données antérieures et les
producitons verbales.
61
“L’homme n’est qu’un ud de relations, les relations comptent sules pour l’homme.”
266
discurso’: alterna, freqüentemente, em outros momentos, nos estudos
argumentativos com os termos conhecimento prévio ou extradiscursivo.
(PAVEAU, 2006, p. 18-19) (tradução nossa)
62
Uma perspectiva como essa admite pensar não em elementos próprios
dos aspectos históricos e sociológicos, mas admite aspectos cognitivos que, muitas
vezes, não são tratados nos estudos do discurso. A autora também discute
conceitos como doxa, senso comum, memória coletiva entre outros. Não iremos nos
ater a essas questões, haja vista o vasto estudo e referência tratados por ela;
tomaremos, então, alguns conceitos aplicados ao contexto de nosso corpus.
Se o ato linguageiro é como se fosse um , o pré-discurso é uma das
pontas, por isso é necessário compreender-se as duas naturezas dos atos
linguageiros, ou melhor, as duas condições de cada uma das pontas da linha que
servem para tecer a rede: o pré-discurso e o discurso. E, se o pré-discurso é tudo
que existiu antes do discurso e que com este têm relação, há, portanto, um
arcabouço bem grande de informações pré-construídas em um mesmo sujeito.
Imaginemos que esse sujeito, ao longo de sua vida, foi afetado por muitos discursos
e que, em trinta linhas, tem que produzir um texto que fale de um tema polêmico. Em
todo caso, essas poucas e “mal traçadas linhas” são resultado do um percurso pré-
discursivo bastante volumoso. Fica em suspenso, uma pergunta: por que, dentro de
um conjunto tão grande de elementos pré-discursivos (memória social, memória
cognitiva, condições de produção etc.), apenas alguns conteúdos serão mobilizados
enquanto outros o, permanecendo na latência? Vamos refletir um pouco sobre
essa questão.
O primeiro aspecto a ser observado é que o pré-discurso foi discurso, ou
62
Le terme prédiscoursif est ici employé dans son usage minimal, définissable simplement comme
« ce qui relève de ce qui se passe avant le discours » ; il alterne d’ailleurs souvant dans les études
argumentives avec les termes préalable ou extradiscoursif. Decidimos traduzir préalable por
conhecimento prévio uma vez que não existe um termo em português satisfatório para o original em
francês, além disso, é um conceito mais conhecido por lingüistas e analistas do discurso brasileiros.
267
seja, que ambos os estados (o presente e o passado) compartilham da mesma
natureza, distinguindo-se em momentos de existência distintos, ou melhor dizendo, o
pré-discurso é virtual e o discurso é realizado, mas o realizado, passa depois a ser
pré-discurso. A distinção entre o dito e o a dizer é muito tênue, é difícil dizer com
precisão quando um dito migra para um dizer: na verdade, temos uma nuvem de
dizeres que constituem o já dito. Há uma grande tentão para que pensemos que o
pré-discursivo seja coletivo, e que sua atualização seja um ato individual. Do ponto
de vista enunciativo, trata-se sim de um trabalho individual, mas, do ponto de vista
discursivo, não. Os sujeitos enunciadores, na medida em que enunciam, trazem para
seus enunciados o dito ou o a dizer, “o por vir” (parvenir)
Outro fator importante é que o pré-discurso constitui, enquanto conjunto de
saberes, crenças, imagens etc., ou seja, a orientação para a interpretação daquilo
que será dito. O nó, ao nosso, ver é a enunciação e a discursivização (o ato
linguageiro), é o pôr em prática a língua e o discurso, estágio de uma total
confluência de diferentes saberes e práticas. Pré-discurso e discurso são partes de
um contínuo, mas segundo condições distintas, ambas imprescindíveis para os
homens organizados em sociedade. As FDs são a face não-diacrônica do pré-
discurso, o que implica em dizer que o pré-discurso contém a face diacrônica das
FDs, ou melhor, as histórias que elas carregam e sem as quais não é possível existir
interdiscurso.
Os sujeitos analisados, ao trazerem à sua memória um tema como o
preconceito racial, fazem a associação entre raça e etnias a partir das características
fenotípicas. Nesse caso, temos o exemplo de que as diferenças físicas e culturais
foram tomadas pelo europeu branco para tornar o africano negro desigual. Toda a
história da diferença entre o branco e o negro foi vivida e revivida pelos sujeitos e
268
levadas em forma de meria. O pré-discurso atualizado em discurso reconstrói o
conceito da diferença e da desigualdade, mas, dessa vez, com outras memórias,
como por exemplo, a de luta pelos direitos humanos, as políticas de inclusão etc.
Essas outras memórias também atingem as relações de o-identidade/identidade.
São as FDs constituídas diacronicamente juntamente com seu processamento de
dados, fatos, interpretações, imagens (verbais ou não), que farão com que os
sujeitos digam o que dizem. Um discurso preconceituoso sobre o negro faz parte do
pré-discurso, de uma história construída ao longo da sucessão de vários enunciados
anteriores. Podemos nos perguntar se o conceito de dialogismo (BAKHTIN, 1997)
não poderia dar conta do pré-discurso. Absolutamente não, pois o pré-discurso
contém o dialogismo no seu rol de elementos constitutivos, assim como o conceito
de memória, que ainda esbastante próxima do senso comum e é subsumido pelo
conceito de pré-discurso.
Aproveitamos a deixa dada pelo conceito de “memória” para introduzir outros
dois, bastante úteis para se explicarem os fenômenos identificados nos textos.
Moirand (2004) apresenta a idéia de que existe a memória das palavras e a memória
dos fatos. Segundo esta autora, a “memória das palavras” o é tomada no sentido
lexicológico que, muitas vezes, lhe é atribuído, mas no sentido do dialogismo
bakhtiniano em que os membros de uma comunidade falante compartilham de
sentidos comuns. a “memória dos fatos” esatrelada à memória interdiscursiva
na qual estão marcadas as mobilidades de sentido entre os sujeitos. Um exemplo
disso seria a resistência ou predileção que algum sujeito pudesse apresentar quanto
ao uso de determinados termos do PD “negro”, como, por exemplo, “pessoa de pele
negra”. Nesse caso, a memória das palavras, se um determinado grupo social
utilizasse esse termo designativo, estaria atrelada a uma maneira de referenciar o
269
negro, de modo que os outros elementos do PD fariam parte da referência à
memória dos fatos que, para um outro grupo, poderia soar como preconceito,
enquanto para outro, como falta de respeito etc.
Aliando o pré-discursivo como condição geral de existência de sentidos, seja
no âmbito de seu escopo referencial, seja no âmbito da memória, podemos
compreender que o conceito de noção”, conforme vimos em Culioli, constitui uma
relação horizontal com outros termos, enquanto que a relação vertical é a memória
associada tamm aos fatos. Isso nos permitiu construir o diagrama 8 que explica a
constituição da relação “negro-criminalidade” constatada no corpus.
Diagrama 8: a relação entre os elementos pré-discursivos e as noções
7.2 Os discursos presentes nos textos
Uma das coisas que mais nos chamou a atenção no corpus analisado, além
das alternâncias eruptivas, foi a maneira como o discurso que simula a inclusão do
negro, na verdade, prega a exclusão ou pelo menos valida a exclusão já existente. O
que percebemos, em termos enunciativos foi que a modalidade mais utilizada para
excluir foi a 1pp, enquanto que a np serve de uma possibilidade enunciativa do não-
compromisso, do não-dizer, do ser apenas um expectador dos fatos, criando a ilusão
de distância (ventriloquismo enunciativo), o que não deixava também de ser uma
Eixo pré-discursivo
Eixo das noções
270
maneira de exclusão bastante velada.
A materialidade mais perceptível entre as alternâncias eruptivas e o discurso
foram os elementos lexicais encontrados nos mapas de alternância. Mais do que
simplesmente relacionar uma voz a um discurso preconceituoso, pudemos identificar
as preferências desses discursos e perceber que as formas de designar o outro
estão altamente comprometidas com as respectivas formações discursivas. Assim,
passaremos a enumerar e tentar demonstrar quais as FDs presentes nos textos e
quais os interdiscursos presentes na memória dos sujeitos.
Do ponto de vista prático, os textos analisados são espécimes representativos
das FDs como resultados de seu componente pré-discursivo, o que nos faz inferir e
afirmar que todas as enunciações efetivas categorizadas conforme a FD foram
constituídas intersubjetivamente e os sujeitos apelaram à memória construída
coletivamente como a verdade de sua época em termos foucaultianos. Isso quer
dizer que, por mais que soe preconceituoso um determinado enunciado, tais sujeitos
estão dizendo o que é possível dizer segundo as limitações de seu tempo. Nesse
caso, época e tempo o dizem respeito à cronologia, mas à historicidade de suas
vivências. Pré-julgar um discurso como retrógrado ou futurista é estabelecer valores
que não auxiliam o analista em sua busca das dispersões. Falamos de memória,
mas também sabemos que os “esquecimentos 1 e 2” são condições para que a
memória exista. Essa aparente contradição se mostra produtiva se compreendermos
que os sujeitos necessitam de “esquecer” para enunciar. Se não esquecesse, não
seria possível enunciar, pois a auto-vigilância sobre o dizer tornaria o enunciador
“mudo”, incapaz de crer que ele é fonte do dizer e que o dizer é transparente, por
isso que cheux, sabiamente, denomina essa relação de “ilusão necessária”
conforme vimos no capítulo 3.
271
No âmbito das relações discursivas e interdiscursivas, Maingueneau (2005, p.
88) afirma: É por sua formação discursiva e não por seus temas que se define a
especificidade de um discurso”; dessa idéia, podemos entender porque os sujeitos
não trataram de cotas raciais”, mas de “racismo”, na maior parte dos enunciados.
Temas como “racismo” “feminismo”, “aborto” etc., não constituem em si FDs, mas
temas tratados nas FDs. Os temas a serem tratados são desencadeados pelas
propostas de redão, sendo alguns sentidos constituídos pelos sujeitos e esses
sentidos se inscrevem em determinadas FDs, as quais estão marcadas pelo pré-
discurso. Passamos então a analisar essas FDs e a sua constituição pelos sentidos
dos discursos.
7.3. As formações discursivas: racista e não-racista
Chegarmos à ntese das FDs presentes nos textos analisados não foi difícil
e atribuímos essa facilidade a dois fatores: a) o primeiro, refere-se à facilidade do
tema abordado pelos estudantes; b) o fato de que o exaustivo tratamento dos dados
nos deu uma grande convicção dos conteúdos e dos efeitos de sentido sustentados
pelos textos.
A primeira prova de que os sujeitos alternavam entre discursos de cunho
preconceituoso e/ou racista foi a maneira como abordaram o tema proposto de
redação. Ora, a questão era a criação de cotas raciais como uma forma de inclusão
do negro no ensino superior e não necessariamente o racismo. Nesse sentido, por
que, então, os sujeitos ativaram a memória sobre o preconceito racial? Está evidente
que as cotas raciais são parte dos objetivos da discriminação positiva, mas o simples
fato de se associar ao negro os discursos referentes à exclusão racial e social, tal
qual os sujeitos demonstraram em seus discursos, evidenciou que a “memória das
272
palavras” e a “memória dos fatos, assim como as noções, estão atreladas ao
histórico de escravismo vivido no Brasil cujas seqüelas ainda permanecem. Além
disso, como afirmamos há pouco, a especificidade do discurso está em como tratar o
tema. Diante das análises, identificamos, pelo menos, duas FDs enunciadas e uma
FD pressuposta pelo que permearam as produções de sentido e se apresentam nos
textos: uma racista, mas camuflada, outra não-racista e a racista pressuposta.
Aparentemente essas três FDs parecem bastante reducionistas do discurso, mas
vamos perceber que recobrem certa complexidade que se constitui sobre o
interdiscurso entre elas. Observaremos, então, como elas se revelaram pela
materialidade nos textos.
Para facilitarmos nossa maneira de identificar os textos é preciso deixar claro,
primeiramente, que o que chamaremos de FD1 (formação discursiva
preconceituosa) é a constituída de enunciados sobre o outro, ou seja, sobre o negro.
Tais enunciados comportam sentidos que caracterizam as pessoas negras como
elementos inferiores, ou criminosos na sociedade, embora isso aconteça de
maneira indireta e revestida de “boa intenção” no senso comum, ou melhor dizendo,
de ilusão objetiva. Assim, estamos diante de uma cristalizão do sentido em que o
discurso opera os modos de assujeitamento dos indivíduos de modo inconsciente.
a FD2 são os enunciados não preconceituosos e a FD3 é o discurso não
enunciado e pressuposto do qual falaremos adiante com mais propriedade.
Os sujeitos enunciadores dos textos não são preconceituosos objetivamente,
ou melhor dizendo, de maneira assumida; aliás, podemos afirmar que eles m uma
imagem construída de si mesmos como pessoas tolerantes e sem preconceitos. É
nesse aspecto que o discurso nos trai, por mais que objetivamente, ou que as
operações do esquecimento número 1 atuariam sobre s, os nossos enunciados e
273
seus efeitos de sentido, revelando algumas verdades inconvenientes escondidas no
inconsciente. Isso fica bastante claro nos momentos de alternância eruptiva, quando
o discurso transmutava da np para a 1pp, sendo que os enunciados preconceituosos
estavam mais instalados na 1pp. A rede de sentido preconceituoso revelado pela
FD1 constituía-se de alguns significados que chamaremos de subsistemas.
Cunhamos a expressão “subsistema” para evitar a proliferação de FDs, pois, para
cada efeito de sentido, poderíamos lhe atribuir o status de FD e, então, teríamos um
número tão grande de categorias que, além de inverossímeis, tornaria qualquer tema
uma FD. Isso levaria a um resultado catastrófico de inoperância do conceito.
Vejamos, então, alguns subsistemas de FD1.
7.3.1 A superioridade branca
A superioridade branca é um tema bastante presente nos textos analisados,
que, infelizmente, es presente nos discursos sustentados pelos sujeitos e sua
predominância aparece em 1pp, muito embora tamm em np haja vários vestígios
seus. Nos enunciados analisados, a superioridade se revela através de um jogo de
sentidos em que o enunciador não assume o racismo, mas, pelo contrário, ao
enunciar, crê, objetivamente na igualdade entre as raças, povos, sexo etc. Contudo,
na maneira de referenciar o outro, de lhe atribuir características, prevalece o efeito
de sentido da superioridade branca, e isso é materialmente visível em exemplos
como esses a seguir:
85) São pessoas, seres humanos iguais a nós, rico, pobres, ladrões, trabalhadores
e crianças, que muitas e muitas vezes, São esquecidas pela sociedade .
86) Os negros em nosso Brasil deveria ser igual aos brancos as mesmas atividade
como nos empregos, se há emprego não à crime e daí caía o número de lotação nas
grandes cadeias .
O comparativo entre o branco e o negro é bastante denunciador de FD1, pois
274
neles o negro tem que passar a ser igual ao branco, logo há uma série de
informações extraídas da pressuposição que levam ao efeito de sentido da
superioridade branca. Eis as pressuposições: a) existe quem considere o negro um
não-humano; b) logo, o humano é o branco; c) o branco está em posição
privilegiada; d) o branco é parâmetro de sucesso. O efeito que se sustenta é o de
que o negro está em uma situação desigual e que a almejada igualdade dependeria
de sua condição de existência ser igual à do branco. Resta, então, a idéia de que um
branco pobre acaba tendo mais oportunidades que um negro pobre.
Nesses discursos, há referência à igualdade; no entanto, como vimos no
capítulo III, a “igualdade” depende de alguns parâmetros; em 85, a igualdade refere-
se à espécie humana, ou seja, o pressuposto de que o negro o pertence ao
gênero humano; em 86, o efeito é o de que o trabalhador negro deve ser como o
trabalhador branco.
87) O negro não deve ser excluído de nada ele deve ser tratado igual a todos nos .
Ainda a referência à igualdade pode ser bastante estica, como no enunciado
87, ficando pressuposta pelo interlocutor, na mesma perspectiva da qual fala
Guespin em que o escopo do nós é muito grande. A qual igualdade o enunciador
dessa frase se refere? Seria a de ser humano (negros são seres humanos iguais aos
brancos), ou os negros devem ter o mesmo acesso ao trabalho que os brancos têm,
ou ainda: os negros devem ter o mesmo acesso que o branco tem à saúde?
Objetivamente o saberemos o que é “ser igual a s”, mas sabemos que ser
branco, no discurso desses enunciadores, é bem melhor do que ser negro.
Provavelmente o sentido de igualdade, no exemplo anterior, contempla um vasto
universo dos benefícios de quem vive na sociedade dos brancos. Ressalte-se ainda
que o acesso à sociedade está baseado na perspectiva de que o branco é padrão e
275
os demais devem se enquadrar no mesmo.
Ainda o discurso da superioridade branca é sustentado pelas relações de
inclusão e exclusão como vimos no capítulo anterior. As referências à “sociedade
branca”, “aos nossos governantes”, ao “nosso paísem oposição a “eles (negros)”
tamm tocam na posição privilegiada dos brancos que demonstra que os sujeitos
enunciadores dos textos, além de se colocarem na posição de brancos, também
assumem um discurso excludente do negro e isso, na maioria dos casos, acontece
na 1pp.
O discurso da superioridade branca fica por conta também do efeito de
sentido da missão profética e salvadora dos brancos, ou seja, de que estes agem
em prol dos negos, possibilitando a estes condições similares às do branco. A
predominância dos casos em que o PD negro” estava no papel temático de
beneficiário e os itens do PD “branco estavam como agentes é mais um fator
relevante para a constituição do sentido da superioridade branca. Isso significa que
somente quem está em condição de ajudar pode o fazer e, logo, o branco é que es
encarregado dessa tarefa. ainda a predominância de “negro” ocupando o
argumento de paciente, para ser comparado ou igualado ao branco como padrão de
ser e de conduta. Os dados apontaram para algo bastante claro: os sujeitos
enunciadores alimentam algum tipo de preconceito racial, cujo discurso
ideologicamente (no sentido em que abordamos neste trabalho) camuflou,
escondeu, sublimou.
Infelizmente, tais sentidos que agora surgem através dos discursos de
sujeitos medianos, ainda refletem como o preconceito racial é bastante intenso no
Brasil, mas que se esgueira nas reentrâncias do discurso, o que é uma prática mais
perniciosa que o preconceito assumido e declarado, pois este se mostra para ser
276
combatido, enquanto o outro se camufla e, por não se mostrar, consegue sobreviver.
7.3.2 O negro e a criminalidade
Um outro subsistema do preconceito é a constante associação do negro à
criminalidade. Surpreendentemente, vimos que ao fazer referência ao negro, os
enunciadores, também referenciavam a criminalidade, como lembramos no capítulo
V. Ao evocar a referência “negro os sujeitos tamm evocaram a noção “crime”
(prisão, bandido, traficante, crime, roubo etc.), mas, curiosamente, o grupo D que
tinha por tema a relação “crime organizado e terrorismo” não citou qualquer
elemento do paradigma “negro”.
Poderíamos dizer que a referenciação a negro” simplesmente não existiu no
Grupo D porque havia diferença entre os sujeitos dos corpora, e se o bastasse
isso, cada grupo enunciou em momentos e contextos distintos. No entanto, essa não
é a explicação para essa diferença entre os grupos de textos, pois a coleta de outros
textos e com sujeito em situações distintas de enunciação apresentaram discurso
muito semelhante ao do grupo A, como foi o caso dos grupos B e C. Além disso, em
todos os grupos uma grande semelhança entre os sujeitos informantes. A
explicação para o fato de os textos do grupo D falarem de “crime”, mas o de
“negro pode ser devida a outros fatores: a) as condições de produção do discurso,
no item tema, aciona a memória dos sujeitos para alguns sentidos que lhes são
imputados; b) e, por conseguinte, os discursos afloram de acordo com a mobilização
de um tipo específico de memória.
Diante dessa situação, vimos que a imagem do negro está associada, na
memória dos sujeitos, à criminalidade, constituindo um perfil bastante
preconceituoso no sentido mais original do termo, ou seja, que o negro é visto como
tendo propensão à criminalidade, como ilustram os exemplos abaixo:
277
88) Os crimes que acontecem em todo o Brasil ainda resgata a imagem do negro,
porém é um país que não racismo .
89) Geralmente são sujeitos a passar o resto de suas vida como empregados, ou até
mesmo entram no mundo do crime, se envolvendo com drogas, passando de um
mundo de cultura, para um mundo de marginalidade, sendo que muitos deles m a
capacidade de atuar numa Universidade, até mesmo em uma Universidade
Estadual, pois por serem negros, na maioria das vezes, m de famílias humildes,
que mal ganham para o seu sustento .
90) O povo brasileiro tem a visão que o negro é bandido que não é gente
Se a imagem do negro está associada ao crime e o crime não está associado
ao negro, chegamos a uma condição de implicatura unilateral, o que indica que, na
formação ideológica e identitária sobre o negro, além de inferior, ele é reputado
como criminoso. A visão de propensão ao crime esassociada à de marginalização
pela exclusão social, em uma nítida concepção de que o sujeito, privado de suas
necessidades básicas, tentará cometer crimes para sobreviver. É claro que esse tipo
de visão é altamente estereotipada, superficial, constituída sobre meias verdades.
Não podemos nos omitir e pensarmos que somente uma vida difícil, na qual as
pessoas com histórico de pobreza e privação, pode influenciar um sujeito a aderir ao
crime, pois adeo ao mundo da criminalidade é um movimento de adesão a um
discurso, a uma FD. Pois o crime também é uma prática social, uma FD que contém
os seus sistemas de restrições, como qualquer outra. Além disso, todos os
discursos são proselitistas, tanto o tráfico de drogas que recruta seus soldados e
colaboradores, ou uma organização religiosa, que recruta seus fiéis têm
semelhanças nesse aspecto. Cada uma dessas instituições possue seus valores e
verdades.
No caso do sujeito que adere ao discurso da justiça, da cidadania, do bem
comum, ele não está imune ao discurso preconceituoso que inscreve o branco como
padrão de justiça, de igualdade, de sociedade perfeita, como vimos anteriormente
278
nos exemplos. Poucos foram os textos que confessaram que a criminalidade não
tem raça, mas a grande maioria dos textos deixa entrever que, necessariamente, o
homem negro, em condições de subemprego é um marginal em potencial.
Infelizmente e historicamente, muitos negros foram empurrados para marginalidade,
mas o discurso acaba perpetuando essa perspectiva. A interpretação que os sujeitos
fazem da realidade, quando assistem aos documentários sobre criminalidade nos
grandes centros urbanos e vêem criminosos negros, é de prejulgar a estes. É claro
que a proporção de negros e brancos em determinadas regiões do País é diferente.
Imaginemos as periferias das grandes cidades ao sul do País, onde a população de
afrodescendentes é menor, conseqüentemente, teremos menos negros envolvidos
em crimes. Trata-se, não de uma questão de raça, mas de proporcionalidade
populacional, ou seja, da quantidade de pessoas que habitam determinado espaço.
Ora, o discurso preconceituoso fará com que o sujeito mediano assuma as
posições excludentes e da diferença entre si e o outro que foram construídas ao
longo da história e fazem parte desse discurso. Temas tratados indiretamente como
a inferioridade do negro e sua condição de criminoso em potencial, a necessidade
de que os brancos civilizadores tragam conhecimento e cultura aos excluídos, entre
outros temas preconceituosos constituem os valores de uma sociedade que ainda
vive relações bastante desiguais e preconceituosas.
Como vimos no tópico que trata da construção da diferença (capítulo 3),
sabemos que ela acontece através dos jogos simbólicos, e dentre os vculos mais
potencializadores do simbólico, es a língua articulada. Por conta da relação
estabelecida entre o protótipo “negro” (relembrando KLEIBER, 1984), a maioria dos
enunciados que contemplam a noção “criminalidade”, houve co-ocorrência com
negro, mais um argumento para comprovar que FD1 constitui uma voz
279
preconceituosa, como podemos constatar no gráfico a seguir:
Gráfico 33 - Co-ocorrência do PD “negros” e da noção “criminalidade”
7.3.3 A igualdade essencialista
Outro subsistema de sentido bastante utilizado nos discursos dos informantes
é crer e fazer crer que, essencialmente, os homens estão em de igualdade, no
acaso estudado, que brancos e negros sempre foram e são iguais essencialmente.
Esse discurso tem uma face bastante perversa: ele apaga os vestígios de que,
historicamente, essas identidades foram construídas nas práticas cotidianas e, por
conseguinte, negros e brancos tiveram rumos opostos dentro do capitalismo que se
desenvolveu no Brasil a partir da Abolição da Escravatura. Afirmativas como as
seguintes refletem as idéias de igualdade essencialista:
91) Por isso, o acesso as universidades deve ser livre e de competência de cada um
sem benefício a negros, brancos, ricos ou pobres .
92) Esse projeto faz que o racismo no país aumente pois dessa forma estaríamos
diferenciando o negro do branco quando na verdade todos devem ter direitos iguais
independente da sua cor .
93) Os brancos e os negros perante à Deus são todos iguais não sei porque existir
isto, diferença de cor é normas do ser humano desde da época da escravidão .
280
O que existe de apagamento ideológico na visão essencialista é crer que
todos os homens são realmente iguais perante a lei. No conteúdo ideal deveria
haver igualdade, não de oportunidades, em todos os aspectos da formação de
um ser humano. Isso porque a igualdade de oportunidade (concursos públicos,
vestibulares) mascara a competitividade típica de nosso sistema de produção de
bens materiais. Há uma escie de darwinismo social, pois os melhores preparados
para carreiras profissionais (que não são os negros estudantes da escola pública)
competem nas mesmas circunstâncias que a esmagadora população brasileira por
vagas nas universidades, nas entrevistas de emprego etc. A idéia de igualdade
perante a lei é uma espécie de contradição de sentidos muito interessante, pois a lei
veio para equilibrar as diferenças, ou seja, essencialmente ela já pressupõe que dois
indivíduos estão em condições distintas e que a superação do conflito entre classes
ou grupos deve chegar a termo através da pacificação das lutas de classe, seja essa
paz através da negociação, dos AIE, ou dos ARE. Nesse esforço de pacificação, não
a preocupação com os pesos e as medidas, pois basta vermos que cada período
histórico e cada povo teve e tem seus princípios jurídicos pautados nas suas
próprias estruturas sociais e culturais, como no caso em que alguns países islâmicos
usam a pena de lapidação contra mulheres acusadas de adultério, prática
inconcebível no direito ocidental, mesmo em países em que a pena de morte.
Primeiramente a lapidação não constitui uma pena que respeite os direitos humanos
no conceito ocidental, além do que o adultério não é tido como crime na maioria dos
países ocidentais. A cotas raciais, como parte da política de inclusão, pressupõem a
diferença existente entre os negros e brancos, além do que, no sistema jurídico de
países que reconhecem a discriminação racial como constituinte de sua história,
como por exemplo os EUA, tal assunto não é um tabu, como seria em outros países.
281
No final, o efeito de sentido do tema da igualdade refoa o preconceito à
medida que apregoa que todos os homens são iguais, mas que, nas práticas sócio-
ecomicas, jurídicas e culturais as diferenças se tornam desigualdades a todo
instante. Isso porque a idéia é de que o negro tenha a mesma oportunidade que o
branco, o que confere ao negro a competência para fazer algo que nem sempre es
ao seu alcance. É como colocar em competição um atleta que foi preparado para
correr cem metros rasos junto com um atleta de final de semana. É o que acontece
quando estudantes de diferentes origens e formações são colocados para disputar,
em de “igualdade a mesma vaga na universidade.
A situação de igualdade entre negros e brancos não existe, logo reputar ao
negro a responsabilidade total de seu destino individualmente é lhe atribuir uma
responsabilidade solitária e não solidária. Afirmar que negros e brancos são iguais é
uma forma de mascaramento das diferenças através de discurso pretensamente
“democrático”, para pré-construir a imagem de que todos são iguais e gozam das
mesmas oportunidades, como se o indivíduo não progredisse na escala social
porque não aproveitou as oportunidades. Os enunciados niveladores da igualdade
remetem ao discurso que só acentua as diferenças entre as classes, pois o
darwinismo social, tema que sustenta a FD da superioridade, se efetiva no momento
em que coloca em competição dois indiduos muito desiguais para o tipo de prova
que devem realizar. Dizer que ambos sujeitos gozam de benefícios somente pelo
fato de serem humanos não assegura igualdade em todas as práticas sociais.
Efetivamente, esse pensamento privilegia o mais “forte” e penaliza o mais “fraco”
que, no caso, são aqueles que, historicamente, foram colocados à margem em
várias situações, como na educação, no trabalho, na cultura e na religião. A suposta
igualdade entre os sujeitos brancos e negros recobre a desigualdade e promove um
282
simulacro de democracia e inclusão, escamoteando a competição desigual. Sempre
é o branco quem, na prática, está com a vantagem em virtude do que se construiu
historicamente nas sociedades herdeiras do passado escravista.
7.3.4 Os discursos não-racistas
Nas relações interdiscursivas presentes, alguns discursos se inscrevem na
FD2, que é de conteúdo não-preconceituoso, ou melhor, não-racista. Os
subsistemas dessa formão discursiva se inscrevem em sentidos contrários aos
estudados no item anterior, ou simplesmente, não fazem referência direta ou indireta
à superioridade do branco, à criminalidade do negro ou à igualdade essencialista.
Assim, encontramos subsistemas de sentido como: enaltecimento das qualidades
dos negros e denúncia do racismo.
A distinção entre o discurso racista e não-racista abre margem para uma
interpretação sobre o enunciado e os enunciadores. Vimos que alguns enunciados
inscritos em FD1 o fazem através dos esquecimentos que recobrem a FI racista. As
relações inclusivas e exclusivas, nas quais os enunciadores assumem os discurso
na np ou na 1pp, são marcas dessas relações. No caso dos efeitos de sentido de
FD2, temos os sujeitos que denunciam a existência do racismo, assumindo
explicitamente não compartilhar dela. Esse afastamento do enunciado é explicitado
sob a condição de que um enunciado não compartilha de FD1 em uma referência
interdiscursiva a práticas racistas, ou seja, pelo dizer está pressuposto o racismo em
um outro lugar, através de um outro sujeito:
94) Muitas empresas, instituições e pessoas ainda faz distião e desvaloriza o
homem de cor negra.
95) Quantos negros são punidos pela lei, sem ter culpa de nada, talvez até pagando
por um erro de outra pessoa. O que pode observar é que com o passar do tempo a
lei diz reduzir a desigualdade, promovendo o bem sem olhar a quem.
283
96) Outro exemplo é a nossa polícia de hoje, não pode ver uma pessoa de cor e
pede para ir encostando na parede, achando que é um bandido ou coisa assim.
97) No mundo atual em que vivemos, os negros passam por desigualdades sociais,
culturais, havendo preconceitos dentro da raça e discriminação.
Estamos falando de preconceito e racismo identificados nos enunciados e não
nos sujeitos, o que se explica pelo fato de um mesmo sujeito empírico ser
constituído de vários outros sujeitos; com efeito, são os sujeitos fragmentados, que
se inscrevem alternadamente em uma ou outra FD. Para identificarmos as FDs
presentes, tamm é necessário identificarem-se as relações interdiscursivas, como
observamos no capítulo II. Maingueneau (2005, p. 189) é bastante radical ao se
referir às relações interdiscursivas:
É forçoso, pois definir unidades semânticas, separar um interior de um
exterior, mas também admitir que esse dentro é de fato um fora. Em dois
sentidos: porque, no espaço enunciativo, o Mesmo se constitui no Outro, o
fora investindo o dentro, pelo próprio gesto de expulsá-lo; e porque, através
de seu sistema de restrições, o discurso se encontra engajado em uma
reversibilidade essencial com grupos, instituições, e, igualmente, com
outros campos. Não há imagem simples que torne isso visível. (grifo nosso)
A falta de uma imagem clara sobre o fenômeno não implica que ele seja
incompreensível e que não enxerguemos, pelo menos em discursos cotidianos,
como os analisados neste trabalho. Em sujeitos medianos, saídos de nossas escolas
públicas, afetados, em sua maior parte, pela mídia de massa e que lêem pouco,
vemos indivíduos afetados por uma meria discursiva bastante comprometida com
práticas preconceituosas revestidas do apagamento de seus conteúdos, como nas
frases do subsistema “criminalidade”. Da mesma forma que os enunciados de FD2
existem porque houve uma reação à FD1, eles estão intimamente ligados, sem
serem iguais, o que fica patente é que nenhuma FD sobrevive sem que outra lhe
sirva de mote. Esse mote é a base para os “sistemas de restrições” dos quais fala
Maingueneau (2005, p. 49):
284
O sistema de restrições semânticas que teremos que definir não visa, de
forma alguma, a engendrar fases gramaticais, mas a definir operadores de
individuação, um filtro que fixa os critérios em virtude dos quais certos
textos se distinguem do conjunto dos textos possíveis como pertencendo a
uma formação discursiva determinada.
De modo prático, poderíamos dizer que as FDs presentes nos textos dos
sujeitos comportam restrições semânticas que o da ordem do discurso, o que
significa dizer que a oposição, nesse contexto, é bastante específica: não se tratam
de restrições muito claras como no caso da obra de Maingueneau, em que ele trata
das oposições entre discurso “humanista devoto” e o discurso “jansenista”. pelo
menos três FDs em trabalho mútuo de restrições nos dados analisados, com o que
passamos a integrar o conjunto com mais uma FD bastante distinta em conteúdo e
natureza do que estivemos tratando.
Essa terceira FD é pressuposta pelas duas mais evidentes. Isso acontece
pelo seguinte fato: em FD1, uma luta para se incluir o negro pelo viés do branco,
mas sempre em um processo de inclusão pela repulsa do que vem anteriormente.
Com isso, essa FD torna-se uma contradição em si; em todo caso, ela procura se
opor a uma FD preconceituosa e explícita, que chamaremos de FD3, conforme
anunciado. No caso de FD2, que denuncia o racismo e enaltece o negro, temos uma
nítida oposição à FD3, como nos enunciados acima; mas FD1 e FD2 não estão em
oposição mútua entre si, mas estão em oposição à FD3. Como seriam, então, as
relações de sentido nessas três FDs? Vamos tentar ilustrar através de um quadro
em que parafraseamos um enunciado e colocamos suas oposições:
FD1 FD2 FD3
Preconceito velado Não-preconceito Preconceito assumido
Os negros em nosso
Brasil deveriam ser iguais
aos brancos, terem as
mesmas condições de
emprego.
Todos em nosso Brasil
deveriam ser iguais,
terem as mesmas
condições de emprego.
Os negros em nosso
Brasil não deveriam ser
iguais aos brancos, nem
terem as mesmas
condições de emprego.
Quadro 13: paráfrases de discursos preconceituosos
285
Nenhum enunciado surgiu em FD3, mas ela estava pressuposta pelos
demais, assim, toda vez que um enunciador designava o negro e sua condição de
discriminado, havia a pressuposição das ações deliberadamente discriminadoras, da
mesma forma que, em toda a vez que um sujeito enunciava dizendo que “o negro
deve ser incluído na nossa sociedade” ,havia duas informações importantes: i) o
negro estava fora da sociedade; ii) a sociedade é dos brancos e estes determinam
quem deve entrar. No caso de FD3, existem vários subsistemas, mas que operam as
restrições entre si de maneira bastante diversa, embora a coerência do sistema seja
mais clara, ou seja: todos os enunciados emanados de uma FD como essa são
assumidamente racistas, muito embora nenhum sujeito da pesquisa os tenha
enunciado; assim é que a sua pura pressuposição faz-nos perceber que eles
existem mesmo que não evidenciemos textualmente. A sua evidência é a própria
denegação, como se o sujeito dissesse: “Não concordamos com as pessoas que
afirmam que os negros são inferiores”; nesse caso, o sujeito afirma a exisncia de
um dizer ao negar que concorda com ele. A restrição contida em FD1 em relação à
FD3 é de negar a discriminação, reforçando-a através da valorizão do branco que
serve de parâmetro como vimos anteriormente.
Vale observar ainda que vários enunciados ou, melhor, unidades enunciativas
(textos), continham FD1 e FD2 alternadamente, como demonstra o exemplo abaixo:
(Grupo A, texto4) Presente tais opiniões, o negro tem uma grande desvantagem no
Brasil; pois ainda existem muitas pessoas racista.
tempos que as autoridades políticas vêm falando em melhoramento aos
atendimentos, relação aos negros, mas nas grandes cidades, os negros são vistos
como marginais, ladrões e são muito discriminados, até por próprios negros.
O Brasil tem que melhorar, e colocar os negros em igualdade com o branco, a
sociedade negra vive com sua maioria em favelas, periferias e com baixa renda. Por
ocorrência dessa baixa renda as crianças, já crescem com a marginalidade, isso não
pode acontecer, somos todos filhos de Deus, obedecemos à mesma regra, por que
os brancos são melhores que os negros.
No Brasil, uma percentagem enorme de negros, e tende a aumentar cada vez
mais.
286
Estudando estas normas, os órgãos de ensino estão dando grande prioridade ao
negro, para ingressar no trabalho e na educação.
O texto 4 do grupo A revela, além da alternância eruptiva, a composição com
mais de uma FD, como é o caso de encontrarmos refencia a FD1 e FD2; assim,
temos, seguramente, mais de 70% dos textos com a presença material das duas
FDs, o que confirma o sujeito fragmentado tanto na enunciação (alternância) quanto
nas filiações discursivas, demonstrando que se trata de um comportamento muito
comum dos sujeitos afetados por diferentes FDs e FIs.
Gráfico 34 - Análise das erupções em 004-A)
O gráfico acima representa a alternância e indica a erupção 1pp, na qual o
discurso se mostra preconceituoso. Vemos a convivência dissimulada do discurso
racista em meio ao discurso não-racista, sendo que a alternância não é regra para
isso, mas proporciona efeitos de sentidos que constituem algumas maneiras
excludentes, como no uso da 1pp. Finalmente, esse comportamento do discurso não
Mapa enunciativo 004-A
0
5
10
15
20
25
30
0 10 20 30 40 50 60 70
Formas
Debreagem
erupção 1pp
np
Igualdade
essencialista
287
pertence ao grupo A apenas, mas os demais grupos também sustêm as três FDs de
maneira proporcional entre si. O mais importante, nesse caso, é perceber que a
alternância eruptiva leva a efeitos de sentidos de inclusão e exclusão e que os
sujeitos, ao se comportarem dessa maneira, estão sendo inconscientemente
preconceituosos e demonstrando que a ideologia provoca os efeitos de sentido
utilizando-se de elementos enunciativos (alternâncias), semânticos (referência e
PDs) e semânticos-sintáticos (papel temático).
7.4 A dêixis e as FDs
Considerando o nosso conceito amplo de ixis, como observado no capítulo
I, percebemos que a localização dos enunciados comporta uma tal complexidade
discursiva no que diz respeito ao preenchimento de referência que abre brechas
para incompletude do sentido. Consideramos esse processo complexo, porque seu
preenchimento não é simplesmente uma operação semântica referencial, e existe
como base dos sentidos sem dúvida, mas o que preencherá o sentido de um eles”
em np é uma referência que pode ser “branco”, “negro”, “governantes”, “brasileiros”.
O “preenchimento” dessas referências não é a simples operação do “complete a
frase”, ou o simples procedimento de preenchimento da referenciação dêitica, mas
de um procedimento discursivo. Exemplo disso são os possessivos e os
demonstrativos como localizadores do enunciador, do enunciado e do enunciatário
em posições sociais.
Essas localizações dêiticas, por si só, não seriam capazes de produzir os
efeitos de sentido; assim, a dêixis, nos casos analisados, é um mecanismo
enunciativo bastante flexível e que se mostra altamente produtivo em termos de
efeitos de sentido. Não pretendemos esgotar o assunto nestas poucas linhas, mas
seguramente os textos apresentam a materialidade que confere aos elementos
288
dêiticos a entrada para a referenciação das identidades: “eu X eles”, “nós X eles” ou
“Ø X eles”. No caso de “zero”, o preenchimento é pressuposto, como no exemplo:
98) Hoje em dia muita descriminação com os negros, eles são iguais a todos, o
que muda é a sua cor que muitas pessoas desvalorizam
Em um caso corriqueiro de enunciação em np, como no exemplo 98, não há a
oposição explícita do enunciador em termos de elementos dêiticos. Isso implica em
dizer que a localização do “ele” é uma debreagem enunciva, pois atribui a um ser do
enunciado uma ação, estado ou processo e o ao ente enunciador que fica
distante; além disso, a debreagem enunciva, assim como a embreagem enunciva
o procedimentos constitutivos do ventriloquismo enunciativo (“quarta pessoa” para
INDURSKY, 1997). O que demonstra que a ausência de elementos que fazem a
localizão de 1ps e 1pp são também identificadores, ou dêiticos, de um ente que
fica na penumbra da enunciação, mas que é real: a np é a marca Ø (zero) do
enunciador, ou melhor, é a referência “zero” do sujeito-enunciador.
Em nossa perspectiva, o sujeito empírico cria, no momento da enunciação, a
referência ao sujeito do enunciado que pode coincidir ou não com o sujeito empírico.
Imaginemos que um ator, enquanto está representando, enuncia, mas não é o
sujeito em si, mas o suporte para a personagem. O quadro 4 demonstra o palco da
enunciação, no qual o sujeito empírico, se torna “sempre-já-sujeito” das diferentes
posições sociais. O fato de alternar está tamm intimamente ligado a esse
fenômeno, mas tal conteúdo fica para outro estudo que se aprofunde nesse tema.
No caso, só identificamos que os sujeitos empíricos e os sujeitos enunciativos
desses textos são entes distintos, pois o sujeito enunciativo é que se coloca na
situação de avaliado, ou melhor, de candidato a uma vaga no ensino superior.
Enfim, a dêixis, nesses casos, localiza pela presença ou pela ausência e
localiza, pela oposição entre o sujeito-enunciador (Ø, “eu”, s) X (eles
1
, eles
2
,
289
eles
3
), com os quais esse mesmo sujeito-enunciador pode estabelecer alianças ou
repulsas, dependendo do enunciado e dos efeitos de sentido que eles
desencadeiam, como já abordado anteriormente. Enquanto mecanismo de
localizão (repérage), os dêiticos se prestaram ao papel discursivo e identitário,
haja vista que a relação entre enunciador e ente enunciado pode ser preenchida de
vários efeitos de sentido, o que não foi diferente nos textos analisados que
provocaram efeitos como de inclusão/exclusão.
7.5 Movimentos eruptivos, FDs e inconsciente
De modo algum os movimentos eruptivos devem ser reputados a uma mente
estrategista, nem ao mero acaso. O organizador desse fenômeno é, com grande
margem de certeza, o inconsciente. E apresentaremos os motivos pelos quais
afirmamos que seja ele o “mentor” desse processo. O primeiro motivo é que a
ideologia, constituinte dos sujeitos, opera no inconsciente e as modalidades
enunciativas, enquanto elemento da linguagem, servem à propositura desses
efeitos. A prova de que a alternância eruptiva está presente como resultado de um
processo enunciativo inconsciente é o fato de o racismo, no Brasil, ser um tabu, pois
a nossa sociedade, tem uma auto-imagem bastante positiva em termos de tolerância
às diferenças, mas isso não implica em que a tolerância se concretize em outras
práticas sociais, que não as linguageiras.
Um segundo motivo é que os sujeitos, ao longo da vida escolar, receberam a
instrução de não alternarem, de manterem a uniformidade nos textos. Diríamos que,
conscientemente, os sujeitos estão instruídos a produzirem textos conforme uma
determinada cnica própria do gênero analisado; no entanto, as alternâncias
acontecem, elas escampam à revisão, e não se trata de desatenção. Não ignoramos
a possibilidade de que alguns sujeitos tenham conscientemente revisado seus
290
textos, mas o mero de textos com uniformidade é pequeno em relação àqueles
que efetivamente produziram algum tipo de erupção. Alternar não é, na maioria dos
casos, uma forma estratégica consciente do sujeito empírico, mas uma maneira de o
sujeito-enunciador constituir os efeitos de inclusão e exclusão próprios da FD à qual
pertence o enunciado. Mais uma vez, nos deparamos com o sujeito
constitutivamente fragmentado, contraditório e essencialmente dialético, cuja
alternância eruptiva é uma prova bastante contundente.
Da mesma forma que os sujeitos não alternaram motivados pela consciência
ou por uma movimentação estratégica, os discursos preconceituosos tamm não
fazem parte da “consciência” desses sujeitos, o que se comprova pelo fato da FD1
se opor em um nível de sentido mais explícito à FD3. Muito embora a oposição seja
explícita, os temas “igualdade essencialista”, “criminalidade”, “supremacia branca”
levaram os sujeitos a revelarem o que, realmente e inconscientemente, está em
seus enunciados: a desigualdade entre raças. Para todos os efeitos, ao dizer que o
negro deve chegar à igualdade de um branco revela um sentido semelhante ao
enunciado: “José é um negro de alma branca.”
Os sentidos sustentados nos textos revelaram, através das alternâncias, as
diferentes posições assumidas pelos sujeitos. E o mais importante: as erupções
aconteceram dentro de um mesmo texto, como revela o gráfico 2. Nas relações
interdiscursivas, devemos perceber que não temos dois grupos lutando pela sua
hegemonia e, mais uma vez, evocamos Maingueneau (2005), porque os sujeitos,
não defendem teses sobre a criação ou não de quotas raciais para a discriminação
positiva. Todos esses sujeitos assumem posições objetivamente anti-racistas, mas
com deslizes em que deixam entrever seus discursos preconceituosos. É
interessante notar-se que, objetivamente, o anti-racismo, ou melhor, a FD2 seria o
291
politicamente correto e por isso está no vel do consciente, enquanto que o
politicamente incorreto ocupa a inconsciência como a materialidade do sentido
demonstrou quando fizemos as análises da enunciação (inclusão, exclusão, silêncio,
apagamento, posições dos PDs nos papéis temáticos). Em suma, FD1 existe no
inconsciente e é enunciada, FD2 existe no consciente e é enunciada e FD3 existe
tanto na zona do inconsciente quanto do consciente e é pressuposta pelas outras
FDs.
7.6 A identidade dos sujeitos
O capítulo 7 comporta uma espécie de pré-conclusão de nossas pesquisas e
o que vi depois dele serão outras observações colhidas do tratamento do texto que
revelaram sentidos importantes, mas o tão relevantes. É mister observarmos que
a construção das identidades é simbólica, histórica e que a sua principal ferramenta
é a linguagem. Perguntamo-nos se haveria identificação entre os 464 sujeitos
enunciadores dos textos, se eles se inscreviam em FDs semelhantes e, para tal,
deveriam apresentar a materialidade do discurso que permitisse ao pesquisador
dizer que compartilham de uma mesma memória. Por isso, a análise da massa de
textos demonstrou que todos os sujeitos apresentaram semelhanças, que
estatisticamente puderam ser observadas nos gráficos.
Vimos que 464 textos, também 464 sujeitos empíricos, mas que
correspondem a um perfil médio de enunciadores historicamente constituídos. E tais
sujeitos somente existiram porque um outro diferente deles existe tamm. É
possível encontrar então um fio que une esses indivíduos com uma identidade? O
que nos permite dizer que esses sujeitos têm identidade? Como podemos afirmar
que existe uma identidade além da de brasileiros, falantes de português do Brasil?
Diríamos que as identidades construídas são múltiplas e representam uma grande
292
variação tais quais as previstas nas possibilidades de posições sociais que os
sujeitos possam ocupar.
O primeiro fator é o da enunciação. Todos os grupos de texto tiveram um
percentual acentuado de alternância eruptiva, com exceção do grupo D, que
apresentou uma quantidade menor de alternância e a explicão para esse fato é
que o tema abordado para essa produção não contemplava um conteúdo que
tocasse no senso identitário dos enunciadores (observar a regra I da signalética das
identidades, capítulo VI). Exemplo de que a regra I vale é o fato de que os
enunciadores do grupo D não se identificassem em uma relão de oposição como
“cidadão de bem X criminoso (traficante ou terrorista)”. Para os sujeitos desse grupo,
não há dúvida quanto às oposições, e as relações conflituosas entre essas duas
classes.
Contudo, nos outros textos, obtivemos a possibilidade de 15% a mais de
alternâncias eruptivas, ou seja, os sujeitos enunciadores, em todos os grupos,
tinham uma grande tendência para a alternância. Isso nos leva a inferir que os
sujeitos da pesquisa e talvez a grande maioria dos enunciadores, ao se depararem
com temas relacionados às identidades raciais e culturais são levados a alternarem
mais. A resposta para essa tendência é bastante óbvia: os sujeitos têm necessidade
de demarcar o que é o mesmo e o que não o é, quando identidades estão em
conflito. Na relação “negro X branco”, temos uma relação conflituosa; no grupo D,
não temos essa relação, pois os enunciadores se distanciaram o possível de
questões culturais da identidade, porque o tema não era propício a esse tipo de
retomada. Mais uma vez, estamos diante da comprovação de que as regras
signaléticas I e II do capítulo VI existem enquanto jogo pragmático e enunciativo.
Ademais, fica patente a concepção de que, para se chegar à identidade, é preciso
293
dizer primeiro do outro e não do mesmo.
Simplesmente para referenciar o outro não basta dizer quem é o mesmo. Ao
identificar o outro, estamos tamm colocando-o em algum papel, dizendo qual é o
seu lugar e o que deve ou não deve fazer: trata-se da atribuição de papéis sociais
que o elemento enunciado ganhará. Como vimos em vários outros momentos:
referenciar o outro não é um simples apontar na realidade, mas um apontar repleto
de discurso, efeitos de sentido, enfim, de inscrições em FDs. Nesse caso,
retomamos o quadro 5, em que expandimos o quadro dos jogos imagéticos de
Pêcheux (capítulo IV). Trata-se de uma nítida relação entre o que o enunciador
pensa e sobre o que ele faz, ou melhor, sobre o seu referente, no caso o negro e
sua condição, pois vimos que as quotas raciais foi o objeto de discussão menos
acessado pelos enunciadores.
Como vimos anteriormente, as construções identitárias, normalmente se
fundamentam nas oposições entre o mesmo e o outro, sendo por isso que
encontramos enunciados que excluem o negro da sociedade (branco pertence,
negro não pertence), que vêem o branco como alguém que pode ajudar o negro
(branco tem competência para ajudar o negro, o negro não tem competência para se
ajudar), isso ficou demonstrado nas análises, o que não ficou explícito, em termos da
identidade, é a construída sobre o branco, que o material mais rico é sobre o
outro. No entanto, o que poderia parecer silêncio sobre a identidade do branco é na
verdade a sua mais eloqüente afirmão, isso porque o falar sobre o mesmo, ou
então não dizer o óbvio pode significar que um determinado conteúdo é aceito
tacitamente. Logo, a missão salvífica do branco para com o negro, demonstrada até
aqui, só reafirma a identidade do branco como aquele que está além das capacidade
que o negro poderia ter.
294
Se o jogo identitário se fundamenta na relação de oposição (estrutural),
pudemos perceber alguns contrários que colocam o branco em uma situação de
vantagem sobre o negro através dos temas “igualdade essencialista”, “superioridade
branca e a “criminalidade”. Em se tratando de considerar que os sujeitos
enunciadores se encontram na posição de branco, cumpre-nos analisar o que esses
enunciadores falam de si mesmos. As primeiras análises, a partir da reflexão sobre o
dados, indicam que eles se vêem como sujeitos democráticos o preconceituosos,
superiores aos negros e cidadãos honestos. Nesse caso, trata-se da imagem
construída do sujeito branco sobre si mesmo, pelo menos nos enunciados
emanados da FD1. na FD2, há pouca tributação do preconceito racial aos
“brancos” no enunciado, sendo que as únicas ocorrências que apresentam o branco
como preconceituoso são os três seguintes:
99) Podemos ressaltar que, as vezes o ato de preconceito racial, não vem somente
de pessoas brancas, mais sim dos próprios negros que preferem não divulgar a sua
raça apesar de evidente, pessoas de cores e raças distintas se relacionam a todo o
momento, a única diferença é que os negros querem mais espaço em nossa
sociedade, e querem ser mais reconhecidos.
100) Mesmo com os preconceitos onde brancos não admitiam negros estudarem
juntos com eles .
101) Estão cada dia mais sendo discriminados pelo branco sem nenhuma posição
na vida cotidiana .
No entanto, tudo isso não é suficiente para se afirmar que a np seja uma
modalidade enunciativa que comporta menos preconceito que outras. A quantidade
de co-ocorrência do PD “branco” com noções de “preconceito” é bastante pequena
tamm, o que constitui mais um argumento sobre a condição de impessoalidade
dos predicados que poderiam atribuir ao sujeito branco” os papéis de agente ou
experienciador das noções relacionadas apreconceito”. O mapa de seções a seguir
295
demonstra como são raras as co-ocorrências:
Gráfico 35 - Co-ocorrências do PD “branco” e da noção “preconceito”
A maioria dos enunciados que tratam do surgimento do preconceito, é
impessoal:
102) Apesar de tantos esforços feitos em favor da causa negra, ainda existe muito
preconceito .
Se a identidade do branco se revela em FD1 (preconceituosa), em FD2 o
preconceito denunciado é impessoal, ou seja, pelo fato de não se atribuir as atitudes
preconceituosas ao branco, há, nesse aspecto, algo muito revelador. A
impessoalização da dencia do preconceito que está presente na maneira como os
enunciadores de FD2 tratam FD3 é reveladora da distância que os mesmos mantêm
de assumir uma voz que os comprometa com o preconceito. Há uma manobra
realizada pelo discurso que impede a atribuição de sentidos preconceituosos nesses
tipos de enunciado, que revela a “astúcia” da enunciação e do discurso tamm. É
como se os textos dissessem que “alguém” é preconceituoso, mas não se trata dos
296
sujeitos brancos, necessariamente, nem dos sujeitos enunciadores que, na verdade,
o brancos, é como se houvesse um terceiro Outro preconceituoso, que sustenta a
FD3. Trata-se de mais um argumento comprobatório de que os enunciadores eso
na posição do “branco” e tentam escapar, de uma maneira bastante sutil, dos efeitos
de sentido que poderiam denunciá-los como preconceituosos.
No que tange ao papel temático que os PDs assumem nos enunciados,
devemos lembrar que, numericamente, o PD “negro” é muito mais rico em formas e
em quantidade, enquanto PD “branco” é pobre e pequeno em ocorrências, se
comparado a “negro”; logo, a quantidade de ocorrências e possibilidades de papéis
temáticos é maior com o PD “negro”. Além dessa questão quantitativa, vimos que
uma regularidade de papéis temáticos como observamos no capítulo VI. Somando
esses dois fatores e continuando na linha da oposição entre “branco” e “negro”,
percebemos que, se verbos que promovem a tematização de beneficiário,
paciente e objeto, necessariamente, deve haver termos ou expressões que ocupem
as posições de agente e de paciente também, ou seja, para cada beneficiário, um
agente, para cada paciente em situação de comparação também um outro paciente
e para cada objeto, também um outro agente.
Como vimos nos exemplos do capítulo VI, os pacientes são “negro” e “branco”
em situações de comparação e, quando se tem negro” ocupando os temas como
beneficiário e objeto o “branco” é agente, ou simplesmente, a posição de agente não
é tomada e fica na impessoalidade novamente. Mais uma vez, a tendência é que a
impessoalidade omita o branco, ou seja, além da quantidade pequena de referência,
natural nas oposições identitárias quando o mesmo fala de si, temos mais omissão
da condição de branco como preconceituoso, ou como responsável pela situação.
Insistimos em que isso não é a regra, mas a tendência do discurso.
297
Ao observarmos a identidade dos enunciadores, vimos que, mesmo a FD2
mantém uma restrição que se traduz em o enunciar o agente do preconceito, ou
seja, o jogo de dissimulação e apagamento leva ao efeito indeterminação e a
discriminação demonstra uma interdição com o entrecruzamento de FD3, ou melhor,
os resquícios que esta FD deixou no discurso que se assumiria contra o preconceito.
Não imputamos à FD2 a condição de preconceituosa, porque o simples apagamento
dos agentes das ações não é suficiente para isso, mas demonstra que as FDs vivem
de repulsas e pactos; neste caso, têm-se um pacto silencioso.
Outra conclusão à qual chegamos, ao analisar os textos e refletir sobre a
construção da diferença é que, essencialmente, na construção das identidades as
diferenças e/ou desigualdades serão inerentes à formão dos sentidos e, em
nenhuma situação, dois grupos em condição de comparação serão imunes a algum
tipo de valoração. O preconceito assumira aspectos, ou melhor, matizes diferentes
para cada tipo de situação. É como discutir as nacionalidades, as torcidas
organizadas, as turmas escolares, os grupos religiosos. Quando as imagens mútuas
desses grupos sociais são construídas em termos de identidade, necessariamente
estarão se constituindo também sentidos diferentes de valoração de um sobre o
outro. A linguagem será o meio-existência mais eficiente para a simbolização de
identidades e diferenças entre os grupos; logo, compreender as FDs
preconceituosas ou não-preconceituosas, ou as FDs formantes desses enunciados
permite ao analista traçar um mapa de como uma identidade enxerga a outra. Vale
ressaltar que, para cada tipo de relação identitária, teremos tamm relações de
sentido distintas, pois a memória atua como elemento regulador: se se tratam de
torcidas organizadas, o ódio gratuito será um dos elementos; se se tratam de
nacionalidades, as injustiças que cada uma acha ter sofrido no passado serão os
298
elementos reguladores, entre outros exemplos.
Nem sempre, no entanto, o enunciador reputará ao outro a condição de
inferior, ou seja, nem sempre o discurso do mesmo se refere ao outro com temas
depreciativos. Muitas vezes, o próprio enunciador constrói sentidos preconceituosos
sobre a sua ppria identidade; quando, por exemplo, enunciados reputam ao
brasileiro a condição de subdesenvolvido, de malandro, preguiçoso etc., ou ainda,
quando se reputa ao Brasil uma imagem apenas negativa, trazendo à memória o
antigo tema herdado das identidades “Colônia X Metrópole”, de que tudo que é
estrangeiro é melhor. Esse tema auto-depreciativo sobre a identidade brasileira é
muito comum nos textos analisados, mas não nos deteremos nela. O importante é
percebermos que a formação das identidades contém sempre um nível de
preconceito muito variável, como também o exime o enunciador de se colocar em
posição diferente do outro, tanto como “melhor” ou “pior”.
7.7 Alternância é constitutiva da enunciação
Ao observar os fenômenos linguageiros presentes nos textos e após os
diferentes tratamentos e testes destinados ao corpus, percebemos que a distinção
entre enunciado e enunciação ainda é algo bastante produtivo para o tratamento dos
fenômenos da linguagem.
Afirma-se, com freqüência, que o enunciado é o dito, ou melhor, o produto da
enunciação, enquanto a enunciação é a língua em funcionamento. De nossa parte,
cremos ser isso verdadeiro, mas bastante simplista. Nós acreditamos que o
enunciado tem uma existência dimensional linear por causa da natureza lingüística
dos signos (cf. SAUSSURE, 1975), ou seja, o signo lingüístico acontece em
sucessão, o que é inquestionável. Implica em dizer que uma palavra, uma frase, ou
299
quaisquer sintagmas acontecem de maneira linear e discreta através de oposições.
Esse nosso posicionamento teórico reflete aquilo que dissemos no primeiro capítulo
deste trabalho sobre as contribuições do estruturalismo para os estudos da
linguagem.
A enunciação, por sua vez, tem uma existência multidimensional. Isso implica
em dizer que ela o depende necessariamente da sucessão de signos e de sua
hierarquização nas estruturas sintagmáticas. O que se tem com a enunciação são
vários aspectos da instauração dos actantes, do tempo e do espaço, bem como o
apelo à memória, ao interdiscurso, às expectativas de um sujeito embriagado de si
mesmo e toda a gama de elementos que não sejam simplesmente do âmbito da
estrutura lingüística. A multidimensão da enunciação é o “fora” complexo que
permite ao dentro” discreto fazer sentido. Nessa perspectiva, todos os elementos
enunciativos (enunciatemas, cf. KERBRAT-ORECCHIONI, 1999), além dos
cognitivos-discursivos (pré-discurso, cf. PAVEAU, 2006) cooperam para a condição
de produção de efeitos de sentido.
Além disso, devemos ressaltar que a cena enunciativa também é um
elemento de produção do sentido. Poderíamos dizer, então, que o linear e o
sucessório são típicos do signo lingüístico e do que é lingüístico e concernente à
língua exclusivamente? Sim, isso é inerente à língua, mas não à linguagem, não à
enunciação, que dependem de vários fatores emanados de diferentes origens que
se coadunam para que, enfim, os sentidos atinjam seus efeitos.
Foi por isso que nosso primeiro modelo de análise não conseguiu dar conta
de compreender as alternâncias enunciativas, pois a primeira compreensão do
fenômeno estava restrita a decidir exatamente onde estava a referência à pessoa
enunciativa. Tal definição se mostrou muito improdutiva, porque, como a alternância
300
era um processo visível, mas o definível na dimensão enunciada (linear), mas na
enunciativa (multidimensional), não era possível identificar onde começava e onde
terminava cada uma das pessoas enunciativas. Foi assim, que chegamos à
conclusão de que a base é a np enquanto as outras referências são “acidentes
geológicos”, ou melhor dizendo, as erupções.
Em virtude da observação desses fatos, chegamos a uma prévia conclusão
de que alternar é um fenômeno inerente à enunciação, e não um simples erro de
trajeto, ou inabilidade do sujeito-enunciador. Esse fato é demonstrável a partir do
momento em que se analisam outros textos que contêm também elementos de
alternância e não são necessariamente produzidos por um falante de língua
portuguesa ou um autor despreparado. A alternância existe por razões enunciativas
e, como o discurso se sustenta na materialidade proporcionada pelos atos
linguareiros, as FDs se valerão de todas as ferramentas enunciativas, semânticas,
sintáticas que estiverem ao seu alcance para manter sua hegemonia e sua
sobrevivência nos dizeres.
Tais considerações suscitam controvérsias: se alternar é inerente à
enunciação, por que então manter a uniformidade não é tamm inerente a ela?
Podemos dizer que a uniformidade e a não-uniformidade são possibilidades, mas a
alternância é a que conta com maior chance de acontecer em certas circunstâncias
do que a uniformidade, como os dados estatísticos demonstraram. A tese de que a
alternância é inerente à enunciação tem implicações diretas nas questões referentes
ao ensino-aprendizagem de língua materna; assim, em nossa opinião, o professor
de ngua, do mesmo modo que o revisor textos, não deve ter a preocupação da
uniformidade, pois os sujeitos se deixarão entender, ela existindo ou não, contudo os
efeitos de sentido, quando da alternância, esses sim devem ser observados com
301
maior atenção. A preocupação de ambos deve ser respeitada quando a alternância
venha a prejudicar a compreensão do texto. Pelo menos nos textos analisados,
muitos fatores fizeram deles textos de má qualidade, mas nenhum dos textos foram
reputados de ruins simplesmente pela alternância. Aliás, um dos bons textos
apresentou alternância nas três modalidades enunciativas.
Por outro lado não podemos pensar apenas na produção de textos com ou
sem alternância, mas na sua circulação e recepção. No caso da escola, na qual os
textos passam a ser didatizados e os próprios temas das aulas de Língua
Portuguesa, o ensino poderia se voltar para lidar com queses mais amplas. Uma
delas seria auxiliar o aprendiz de língua portuguesa a lidar com questões que vão
desde a semântica referencial às questões do discurso, de modo a preparar os
leitores a lidar com efeitos de sentido provindos da alternância eruptiva e fornecer-
lhes estratégias para melhor compreender as formões discursivas com as quais
têm contato. O estudo “das pessoas do discurso” e sua concordância, embora
sejam necessárias, não são os únicos conteúdos e os mais importantes para
leitores e produtores de texto em língua escrita, pois, se a alternância é inerente à
enunciação, isso significa que os aprendizes tamm devem ser capazes de lidar
com os efeitos de sentido provocados pelo fenômeno. Mesmo que a opção de
ensino seja a mais conservadora (ensino da uniformidade na produção de textos),
não se pode descartar a alternância eruptiva na leitura de textos políticos,
publicitários etc. A escola também não deve reputar a alternância como um erro de
quem não domina a língua escrita, ou os mecanismos de coesão textual, pois vimos
não se tratar de equívoco no conceito entre “certo e errado”.
302
7.8 Identidade em construção: afrodescendente
Ao longo de uma breve pesquisa sobre o termo “afrodescendente” em artigos
científicos e em edições do Governo Federal (material publicado pela Secretaria
Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial www.presidencia.gov.br),
encontramos as variantes afro-descendente e afrobrasileiro (afro-brasileiro) como
termos designativos de negros, mas infelizmente, não encontramos explicões
sobre o seu emprego, pelo menos por volta de que época ele surgiu, mas
presumimos que tenha ganhado força a partir de meados da década de 1990, pelo
menos, no Brasil. Ribeiro (2005, p. 185) apresenta um breve relato de pesquisas no
âmbito educacional sobre políticas inclusivas e enumera vários trabalhos em que o
termo “afrodescendente” surge ao longo dos anos de pesquisa, num exemplo de que
tal designação é recente. Para o contexto de nossa pesquisa, foi bastante exemplar
o salto qualitativo que o emprego do termo teve de um grupo para outro, como
observamos no gráfico a seguir:
Gráfico 36: surgimento do termo afrodescendente
303
Sabemos que os textos do grupo A tiveram sua redação executada em 2003,
enquanto os textos B e C, em 2007. Além disso, cumpre observar que A é o grupo
maior dos textos, e apresenta uma quantidade muito baixa de referência a
afrodescendente, enquanto B e C apresentam um número significativo de
ocorrências do termo, mesmo que somados atinjam a quantidade de A. O que isso
pode representar para nós? O gráfico indica que uma nova identidade étnico-racial
está em construção na cultura brasileira e, com isso, novos discursos também
surgem. Chegamos a essa conclusão observando que o lapso temporal entre um e
outro grupo é bastante significativo, havendo um intervalo de 4 anos entre um e
outro, período em que vimos se desenvolverem uma série de políticas promovidas
pelo Governo Federal de discriminação positiva.
O surgimento dessa nova identidade não teve efeitos muito diretos sobre os
textos analisados, mas constitui um assunto interessante para esta tese, haja vista
que os discursos podem mudar rapidamente, mas as condições reais de
sobrevivência dos grupos sociais, não. Isso implica em dizer que, embora,
afrodescendente seja um termo politicamente correto, ainda se está longe da
igualdade racial, ou seja, temos a modificação dos sentidos, mas o referente é o
mesmo, ainda que o efeito de sentido seja outro. Afrodescente evoca o conteúdo
cultural, étnico e politizado dos negros no Brasil. Qual seria, então, a diferença entre
enunciar preto” e afrodescendente”? A nosso ver, a necessidade de pesquisas
sobre o tema, mas, intuitivamente, poderíamos dizer que uma distância muito
grande entre quaisquer um dos elementos do PD “negro”, pois cada um deles,
lembrando-nos sobre o conceito de “memória das palavras” evoca sua própria
história. A olho nu, percebemos que um termo evoca o passado preconceituoso
(preto), enquanto o outro identifica um grupo social que reivindica seus direitos e têm
304
identidade cultural (afrodescendente).
Como todos os sentidos estão em constante construção, os de “afro-
brasileiro” ou “afrodescendente” não são diferentes; o que chama a atenção é a sua
recente utilizão, que acaba sendo bastante reveladora em relação à sua história
recente. Outro fato interessante, também do ponto de vista dos contrários é
compreender que não se encontra em discurso algum termos como
eurodescendente para se referir à população branca. Logo, a ppria referência a
afrodescente lhe atribui um status de diferente, enquanto o branco é o comum e
não precisa de um designador que evoque a sua origem. Curiosamente,
“afrodescendente” evoca o passado estrangeiro, vamos assim dizer. Essa maneira
de denominar o negro, faz ficar latente outros sentidos que servem de base para a
compreensão dessa nova identidade: o branco não precisa de origem para ser
incluso e fortalecer sua identidade. Resta latente a diferença: enquanto branco e
indígena são brasileiros, “afrodescendente”, assim como “afro-brasileiro”, carregam a
marca histórica da origem estrangeira, da deportação, do cativeiro.
Se, ao cunhar os termos “afrodescente” e “afro-brasileiro”, seus enunciadores
queriam resgatar a história e a identificação racial do negro brasileiro, conseguiram,
mas a reboque, outros sentidos também se fazem presentes pelo estereótipo: o
prefixo “afro”, referente ao continente Africano, retoma os estereótipos promovidos
pelas outras noções de “Continente Pobre”, “Continente Selvagem”. Para nós, a
nova identidade só é possível pelo tom politizado, pois a meria ainda es
próxima da dura realidade dos navios negreiros, muito próxima dos séculos XV a
XVII. É claro que essa memória pode, ao longo do tempo, tomar outros contornos,
como aconteceu com o termo “negro”, que outrora tabu, hoje se inscreve no discurso
politicamente correto.
305
Muito embora o tratamento do discurso tenha se incluído com mais
especificidade neste capítulo, vemos que ao longo do trabalho o processo
interpretativo das estruturas formais e semânticas apontavam para a direção da
interpretação, pois foi a partir dessas estruturas que conseguimos identificar os
temas constantes nas FDs tratadas. A relevância dessa discussão nos levou a ver
que o óbvio não é tão percepvel como se crê comumente. O que já sabíamos sobre
os discursos preconceituosos não se alterara muito essencialmente; mais uma vez
comprovou-se que o discurso racista está presente. O que fizemos de relevante foi
compreender quais foram os mecanismos enunciativos e discursivos por meio dos
quais se manifestaram.
306
CONCLUSÃO
Poderíamos resumir nossa conclusão apenas em uma frase: as alternâncias
eruptivas são constitutivas da enunciação a serviço das formações discursivas e
conseqüentemente da construção das identidades. A simplicidade da afirmação
recobre a complexidade do fenômeno, cuja compreensão foi facilitada pela interação
das teorias e métodos orquestrada pela AD. Antes de discutirmos os resultados
desta pesquisa, gostaríamos de reafirmar alguns pontos controversos da teoria, para
em seguida abordarmos a interpretação do fenômeno.
A primeira questão é a relação teoria e prática, uma vez que se tratam de dois
aspectos intimamente ligados e complementares, entendemos que o próprio fazer
teórico se constitui em uma prática, pois se alimenta da observão e da reflexão,
que não deixam de ser fazeres que necessitam de técnica. Os novos olhares
lançados sobre essas questões foram possíveis porque procuramos esgotar ao
máximo as relações entre a materialidade e o discurso como parte de nossa
perspectiva científico-metodológica.
No caso de nossa pesquisa, desenvolvemos tanto a observação dos
conceitos teóricos quanto a aplicação prática. Essa integração proporcionou a
reflexão sobre a própria teoria a ponto de lançarmos um outro olhar sobre a
enunciação, exemplo disso foi a concepção de que a não pessoa (debreagem
enunciva) é modalidade básica enunciativa, enquanto a debreagem enunciativa da
primeira pessoa do singular e da primeira pessoa do plural constituem “acidentes” no
sentido filosófico e geográfico do termo. O que nos levou a concluir que a
“alternância eruptiva” é constitutiva da enuncião.
Essa primeira conclusão tamm nos levou a outras no fio da reflexão. Se a
alternância é constitutiva da enunciação e se a alternância leva a efeitos de sentido,
307
então um componente discursivo que aciona tal mecanismo em condições
provocativas, ou seja, condições discursivas que provocam uma maior ou menor
alternância. No nosso caso, a primeira condição discursiva para tal foi a constituição
das identidades, sendo a racial um dos exemplos que abordamos. Chegamos a uma
média de 15% a mais de alternância em textos que discutiam as identidades raciais,
e por analogia, talvez fosse possível identificar índice semelhante em textos que
tratassem de outras identidades, mas isso fica para outra oportunidade de pesquisa.
No tocante à questão da identidade, formada simbolicamente (nos meandros
da linguagem) e, conseqüentemente, fundada sobre determinados discursos,
arquitetados ainda nas oposições, observamos que não bastava enunciar o outro
para que o enunciador se constituísse como sujeito, era necessário que este
atribuísse papéis tanto a si mesmo quanto ao outro. Isso porque as identidades,
como vimos, são compostas pelas relações geralmente opositivas entre o “eu” e
“ele”, ou entre “nós” e “eles”. Observamos que era necessário ao enunciador atribuir
ao outro características e atitudes caracterizadoras, e esse tipo de atribuição foi
muito marcante para pensarmos no discurso que os sujeitos brancos sustentam em
relação ao negro. Isso ficou bastante perceptível no tocante às duas FDs, a racista e
a não-racista, tratadas no capítulo VI. Ademais, o processo de designação, com
relação aos PDs se mostrou bastante revelador em termos quantitativos e
qualitativos.
Os dados observados corroboraram com a idéia dos três temas que são
observáveis no discurso racista: a superioridade branca, a relação entre o negro e a
criminalidade e a igualdade essencialista. Enquanto o discurso não-racista se
sustentava apenas na igualdade de direitos e na não-agressão à identidade do
negro, ficou bastante claro que existe uma relação entre os temas da FD racista e as
308
alternâncias enunciativas, não no sentido de dizermos que um tema proporciona
mais ou menos ocorrências, mas que no cômputo geral, houve “preferências do
discurso pela voz da np conforme o observado nos capítulos V e VI. Os temas, como
foi dito nos referidos catulos, são caminhos pelos quais o discurso racista se
sustenta dissimuladamente.
As alternâncias demonstraram de modo bastante claro que temos o resultado
de um sujeito fragmentado, pois em um mesmo texto, houve várias alternâncias com
efeitos de sentido distintos, proporcionando o efeito de diferentes filiações
discursivas. Esse é mais um exemplo de que a alternância é constitutiva da
enunciação, pois esta remete à fragmentação do seu enunciador, afetados por mais
de uma FD.
Outro aspecto que não pode deixar de ser observado nesta tese é o resultado
deste trabalho em razão das aplicações teóricas e práticas. No âmbito teórico vimos
a revisão da enunciação bem como a comprovação da fragmentação do sujeito.
Essas novas perspectivas contribuem efetivamente para a compreensão da
enunciação e do discurso, por outro lado, como nosso corpus se baseou em textos
produzidos no ambiente escolar, sentimos a liberdade de tecer algumas
considerações sobre os resultados no ensino-aprendizagem de língua materna
escrita.
Possivelmente, muitos professores, diante de nossas afirmões, venham a
se questionar ou a nos questionar: “Devemos aceitar a alternância dentro do padrão
culto de escrita? Podemos dizer aos estudantes que é possível aceitá-la em provas
de vestibular, em textos formais etc?” Não podemos ser arrogantes crendo que a
simples compreensão e interpretação dos dados nesta tese venham a modificar
procedimentos discursivos e enunciativos que as instituições sustentam.
309
Acreditamos que os professores devem optar pelo esclarecimento de seus
educandos e não pelo seu doutrinamento cego. O professor deve desenvolver junto
com seus alunos a observação sobre as diferentes questões da referencialidade, e
uma delas é essa alternância da referência ao sujeito-enunciador. Outro aspecto é
demonstrar que em determinadas situações e contextos as instituições nas quais ou
para as quais eles escrevem nem sempre verão com olhos tolerantes a alternância,
da mesma forma com que se trata a questão da variação lingüística. Com certeza,
para o ensino de estratégias de leitura, compreender as alternâncias pode ser um
grande ganho do ponto de vista da competência para a interpretação e
compreensão dos textos em seu contexto histórico, a fim de reconhecer as
estratégias do discurso e da enunciação.
Para uma boa aplicação didática desse conhecimento, não podemos lidar
com uma metodologia que pretenda apenas transpor o conteúdo desta tese para a
sala de aula, mas sim, traduzir as reflexões sobre enunciação, discurso e identidade
de modo adequado à formão dos estudantes com os quais se pretende explorar o
conteúdo da alternância.
Há muito ainda ser explorado dentro da relação enunciação e discurso. Um
deles seria perceber se o comportamento que identificamos nos diferentes grupos de
texto analisados caberia em outro tema identitário como o religioso, sexual,
trabalhista, entre outros. Embora estejamos longe de concluirmos o assunto, ou
ainda diante da verdade de que nenhum assunto preenche a condição de finito,
devemos concluir o texto e o fazemos lançando um próximo desafio que será tentar
compreender a alternância em outros gêneros e tipos de discurso.
310
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316
Anexo I
Tema de redação dos grupos A, B e C
317
ANTES DE OPTAR PELO TEMA I, LEIA O TEXTO DA PÁGINA 5.
BOCA NO TROMBONE
Presentes no Fórum Internacional de Liberdade, Educação e
Direitos Civis, artistas e representantes da comunidade negra
falaram com Ensino Superior.
“A questão das cotas é um tanto delicada, complicada e complexa:
ora considero uma boa solução, ora tenho dúvidas. De qualquer
forma, me sinto otimista com a posição do negro no Brasil. A
taxa de pessoas que se consideram negras aumentou: o Ps está
aceitando mais sua cor”, afirma Paula Lima, a diva do soul
brasileiro. “Mas esse movimento é essencial até para os negros
perceberem que o precisam se prender à beleza, à música e
ao futebol”, diz. O rapper Rapinn Hood, também presente ao
Fórum, concorda com ela: “Daqui a alguns anos, a sociedade
brasileira terá 60% de negros. O mínimo de 20% de cotas deve
ultrapassar 50%. Nossos antepassados nada conseguiram, mas está
na hora de mudar. Apenas acho que deve se espalhar por todos os níveis, do
maternal ao mercado de trabalho”, diz Hood.
anos ouço essa conversa. O que vejo é uma
quantidade maior de negros indo para as cadeias,
praticando crimes, se envolvendo com drogas, sem
qualquer perspectiva na vida”, contrapôs o rapper Xis.
São tantas crianças negras de até 7 anos de idade nos
faróis, pedindo para limpar vidros. E elas nasceram no
governo Fernando Henrique”, diz. “Antes de pensar na
universidade, é preciso dar estrutura a essas famílias”,
acredita ele.
Revista Ensino Superior, junho/2002
Refletindo sobre as iias contidas no Texto I, pág. 5, e no quadro acima, redija uma
DISSERTAÇÃO, defendendo uma posição quanto ao seguinte tema:
“A POLÍTICA DE COTAS PARA NEGROS, NAS UNIVERSIDADES, AJUDARIA
RESOLVER O PROBLEMA DA EXCLUSÃO EDUCACIONAL NO BRASIL?”
O rapper Xis não acredita na
eficiência da medida.
318
TEXTO I (da página 5)
O CHOQUE DA COR
A criação de cotas para o ingresso de negros na
universidade gera polêmica, suscita pesquisas e
divide opiniões
Tem sido grande a resistência à aceitação
do projeto que cria cotas para afro-descendentes no
acesso a universidades, empregos blicos e
contratos do financiamento estudantil. A decisão tomada
pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do
Senado garantia inicialmente cota de 20% das vagas
das universidades blicas e dos contratos de
financiamento estudantil a negros ou pardos, mas
esse número já chegou a 40%. De acordo com a
lei, a identificação da parcela que terá direito ao
benefício se por autoclassificação do candidato ao curso ou cargo preferido. Assim, a
antiga pergunta sobre cor dos vestibulandos e funcionários - que havia sido excluída
dos questionários de admissão dos exames e testes profissionais anos, por ser
considerada de tom racista - volta à ativa.
Numa pesquisa realizada pelo Programa de Poticas da Cor, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em 2001, somente 24% de 2.328 alunos se reconheceram
como negros ou pardos. Com isso, as discussões se intensificam e geram duas vertentes: essa
política ajuda a reparar uma dívida ou acirra o preconceito na sociedade brasileira?
Numa rápida análise, a proposta do governo de adotar cotas, por meio de lei
ordiria, poderia contrariar o artigo 5º da Constituição, segundo o qual “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. consenso entre os juristas quanto à
inexistência de diferença na medida. O presidente do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (CADE) e ex-consultor jurídico do Ministério da Justiça, Roberto Pfeiffer,
explica que, ao estabelecer reserva de mercado para os negros, se desencadeia um processo
de igualdade material. “A igualdade está em tratar desigualmente os desiguais. Assim, a
legislação ordinária pode favorecer os que se encontram em situações desfavoráveis,
como é o caso dos negros”, afirma. A medida também obedece a outros artigos, como o
3º, da Carta de 1988: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil,
entre outros: [...] reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos,
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação”.
Nos encontros promovidos por associações, órgãos do governo federal e
prefeituras, nota-se intensa vontade de questionar o sistema de cotas, seja para aderir ou
para rechaçar. Sou completamente contrário a todo e qualquer tipo de cota: não importa
se para negros, carentes ou minorias”, diz Carlos Roberto Santos, reitor da Universidade
Federal do Paraná (UFPR). Não temos quaisquer projetos, propostas ou expectativas para
garantir essa cota”, dispara. Para o coordenador do grupo de estudos afro-brasileiros da
UFPR, Nizan Pereira Almeida, o ensino médio precisa ser reformulado. Do contrário, a
medida de cotas não valerá, porque os negros entrarão na universidade para repetir os
modelos já conhecidos e perpetuarão a iia do Brasil como um País de brancos”,
afirma.
319
A professora Yvonne Maggie, diretora da Editora da UFRJ e autora do
livro Raça como Rerica, também faz suas ressalvas. “Fala-se em pagar uma dívida
herdada anos, mas é difícil quitar essa conta de ônus incalculável. A verdade é que
o sabemos qual será o resultado disso tudo. Corre-se o risco de exaltar a desigualdade
no lugar da igualdade”, acredita. “Além do mais, pela primeira vez o Brasil estabelece
uma potica de segregação, na qual clara divisão entre negros, pardos e brancos. A
minha preocupação refere-se à marca que esse sistema oferecerá aos estudantes negros”,
diz.
O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, contesta: O sistema de cotas pode
até não fornecer a total solão, mas é a maneira que temos de atacar o problema no Brasil.
Creio que, sem a imposição de leis, torna-se impossível chegar a uma solução espontânea.
A população negra brasileira já esperou durante muito tempo por políticas públicas que a
levem em consideração”, disse à Ensino Superior.
(Revista Ensino Superior, nº 45, junho de 2002)
320
ANEXO II
Tema de redação do grupo D
REDAÇÃO
objetivo
e O geral da redação é testar a habilidade do candidato em expressar-se na modalidade
escrita, nos moldes da língua padrão.
e A redação vale 4,0 (quatro) pontos.
e S e d esclassificado do vestibular, o candidato que obtiver zero na redação por apresentar
inconsistência temática e inabilidade na modalidade escrita, ou por entregá-la em branco.
e Indique o tema escolhido na folha de redação, versão definitiva, no espaço adequado.
Os
e textos apresentados servem de apoio. Esteja atento(a) ao comando destinado a cada tema. O
texto deverá apresentar-se em prosa, de forma legível, sem rasuras, em letra cursiva.
e Somente serão substituídas as folhas que estiverem com problemas de impressão gráfica.
e não deve ter menos de 18 e mais de 30 linhas.
r
A edação
e Não se esqueça de que você deverá dar um título à sua redação.
Terão nota zero as redações que:
a- apresentarem inconsistência temática e inabilidade na modalidade escrita, ou forem entregues
em branco (critério desclassificatório).
-
b f ugirem ao tema escolhido, conforme indicação enumerada no espaço próprio da folha.
c-
não
desenvolverem o tipo de texto proposto no comando do tema escolhido.
d- acentuada desestruturação e/ou divagação (informações soltas e desarticuladas)
apresentarem
no desenvolvimento.
e- identificação ou qualquer outro registro além do texto.
apresentarem
f- ilegíveis ou desenvolvidas em forma de desenhos, números, versos,
forem consideradas
espaçamento excessivo entre letras, palavras e parágrafos, bem como desenvolvidas em códigos
alheios à língua portuguesa escrita.
g
-
desenvolvidas a lápis ou à tinta em cor diferente da azul ou preta.
forem
h- f orem cópias dos textos de apoio.
I-
apresentarem
menos de 180 palavras, ou menos de 18 linhas e mais de 30 linhas.
QUESTÕES DE MÚLTIPLA ESCOLHA
e Esta prova contém 30 (trinta) questões de múltipla escolha numeradas em ordem crescente, com
conteúdos de: Língua Portuguesa, Literatura Brasileira, História, Geografia e Língua Estrangeira
(Responda somente as questões relativas à sua opção de Língua Estrangeira).
e Cada questão admite apenas uma resposta, isto é, uma alternativa a ser assinalada.
e Utilize caneta esferográfica de tinta azul ou preta para preencher o GABARITO.
e T ransfira a resposta para o gabarito com cuidado para não danifi-lo, pois, rasuras invalidam questões.
e Se este caderno não contiver as 30 (trinta) questões de forma legível, peça ao fiscal que o substitua.
Use
e o caderno de prova para seu rascunho.
e Ao término da prova, entregue o gabarito, o caderno de questões, as duas folhas de redação
(rascunho e versão definitiva) ao fiscal de sala.
NÃO SERÃO ACEITAS RECLAMAÇÕES POSTERIORES
INTRODUÇÃO
321
Leia os excertos abaixo antes de optar por um dos temas de redação e responder as
questões de 1 a 7.
TEXTO I
EXPLOSÕES AMBÍGUAS
Rogério Wassermann
Foi-se o tempo dos heróis internacionais das lutas pela independência e pela libertação
nacional, da era na qual o uso da violência com objetivos políticos era legitimado de acordo
com seus argumentos. O aparecimento, nas últimas décadas, do terrorismo extremista
islâmico e principalmente das ações conduzidas por meio de ataques suicidas tornou a
legitimação de tais atos quase impossível e acabou com o pouco de apoio popular que
ainda poderia haver às organizações terroristas. A avaliação é de um dos maiores
conhecedores mundiais do assunto. Repórter especial do jornal londrino The Sunday Times
e especializado em questões de segurança internacional, o pesquisador britânico Nick
Fielding é co-autor de Masteminds of terror, lançado em 2003 no Reino Unido pela Editora
Mainstream. O livro contém as primeiras e únicas entrevistas concedidas até hoje por Khalid
Shaik Mohammed e Ramzi Binalshibh, dois altos membros da rede terrorista AI Qaeda
considerados mentores dos ataques de 11 de setembro de 2001 aos EUA.
CULT - No passado, muitas ações terroristas eram consideradas legítimas por parte da
população. Podemos citar, por exemplo, os grupos terroristas judaicos que lutavam contra o
mandato britânico na Palestina e pela independência do Estado de Israel. Essa visão ainda
é válida hoje?
Nick Relding - O terrorismo sempre teve diferentes significados, dependendo do contexto.
Os grupos mais antigos de terroristas eram os "hassassins", que existiam no que hoje é o
norte do Irã, entre os séculos 10 e 12. Eram indivíduos contratados especificamente para
matar cristãos durante as Cruzadas e estavam preparados para morrer em sua ação. Esse
é um tipo de terrorismo. Depois disso, não houve outros exemplos ao longo da História por
muito tempo. Isso volta no século 19 como movimento significativo. Você tem o exemplo
da Rússia, com pessoas tentando assassinar o czar, incluindo o irmão de Lenin. Outra vez,
tentavam desestabilizar a política matando ou ferindo pessoas de alto status. Eles foram
muito criticados pelos bolcheviques e pelo movimento socialista russo e houve um grande
debate sobre se o terrorismo deveria ser um método usado para mudança de regime. E foi
rejeitado de fato pela maioria, embora as ações terroristas tenham continuado a acontecer
mesmo após os bolcheviques tomarem o poder. Depois disso, houve muitas ações
consideradas terroristas ligadas a lutas por libertação nacional. Eu diria que um
argumento que diz que, se você está lutando pela liberação de seu país, qualquer tática
para se livrar de seu opressor é legítima. Essa é possivelmente a posição usada pelo Irgun
e por outros grupos judaicos na luta pela formação de Israel. Explodiram uma bomba no
Hotel King David, em Jerusalém, matando 40 ou 50 oficiais britânicos. Seqüestraram
soldados britânicos e os executaram.
2
322
CULT - E dois líderes desses grupos [Menachem Begin e Yitzhak Shamir] tornaram-se
primeiros-ministros depois...
N.F. - Claro. O mundo está cheio de presidentes e primeiros-ministros que antes foram
líderes terroristas. Robert Mugabe, Nelson Mandela, líderes de Moçambique e Angola, foram
todos líderes de movimentos de libertação nacional em algum momento. Mas a natureza
dos conflitos mudou muitas vezes no curso do século 20. O que é significativo sobre os
movimentos que temos agora é que eles usam as mesmas táticas que os movimentos de
libertação nacional, mas são transnacionais. Então, eles não estão defendendo a libertação
de um território existente. Ao menos não somente isso. Estão tentando também estabelecer
uma ideologia específica. Dentro disso ainda as noções de território. Por exemplo,
algumas das organizações islâmicas dizem lutar pelo estabelecimento de califados, Estados
islâmicos puros. Então estão buscando a libertação de territórios que foram tomados
originalmente dos muçulmanos, como as Filipinas, ou a Andaluzia, na Espanha. Temos a
motivação de Osama bin Laden em relação às terras dos antigos califados, que ele acredita
estarem ocupadas pelas forças americanas. Então, suas ações estão ligadas à idéia de
libertação nacional, mas são mais importantes por sua idéia de estabelecer algum tipo de
Estado islâmico.
(Revista Cult, nº 95, ano 8, p. 48-49)
TEXTO II
PÓ DE GUERRA
Leonardo Sakamoto
Cocaína mata muito mais quem a vende do que quem a consome. Ou seja, homens
jovens e pobres, que formam a parte visível e descartável desse problema
Drogas matam. Mas os óbitos por overdose ou em decorrência de crimes cometidos sob a
influência de entorpecentes ilegais o a minoria dos casos. Registros policiais mostram que
mais homicídios relacionados ao consumo excessivo de álcool que é uma droga permitida do
que a qualquer outra. A forma como o tráfico se organizou é a principal razão dessa guerra
urbana, cujas baixas normalmente o homens, jovens e pobres, moradores de comunidades
carentes, envolvidos direta ou indiretamente nesse contexto. Em outras palavras, na maioria das
vezes, matam-se mutuamente. o o os únicos envolvidos nesse sistema, mas compõem sua
parte vivel e descarvel. (...)
Infelizmente, falta consenso sobre o mero de mortos nesse conflito. diferentes
pesquisas que atribuem ao tráfico de 12% a mais de 50% do total de assassinatos de cidades
como Rio de Janeiro e o Paulo, dependendo da metodologia. Mas todos os estudos são
unimes em afirmar que o problema é grave e escrescendo entre os mais jovens.
Algumas estatísticas relativas a 2004 ajudam a ver as conseqüências disso. Os
homicídios de pessoas entre 15 e 24 anos representaram quase 35% do total no
município de o Paulo, ao mesmo tempo em que 93% dos assassinados foram do sexo
masculino, de acordo com dados da prefeitura. No Estado do Rio de Janeiro, menores de
idade eram 60% do total de pessoas presas por envolvimento em drogas e 18% por
envolvimento com armas.
3
05
10
15
323
Outro dado vem de Alba Zaluar, coordenadora do Núcleo de Pesquisa das Violências
da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), sobre a Cidade de Deus. O lugar
tornou-se conhecido mundialmente após o filme homônimo de Femando Meirelles, no qual a
própria favela é a protagonista da história. Lá, em torno de 380 pessoas - das quais 77
menores de idade - estavam envolvidas nesse tipo de crime no início dos anos 90 (o que
representava menos de 1% da população do bairro). Em um período de 13 anos, 722
jovens dessa comunidade morreram na guerra do tráfico, ou seja, a quase substituição
completa, e por duas vezes, de todos os traficantes.
"Não é uma guerra no sentido formal, mas tem níveis de guerra", explica Marianna
Olinger, pesquisadora do projeto Coav (Crianças e Jovens em Violência Armada
Organizada), ao analisar a situação carioca. Facções como o Comando Vermelho, o Terceiro
Comando e o Amigos dos Amigos são grupos criminosos e não têm objetivos políticos ou
anseios de tomar o governo, muito menos criar um "Estado paralelo". Pelo contrário, eles
se valem da falta de uma presença do Estado e criam um "poder paralelo" em um
determinado território para proteger o seu negócio.
Não é o consumo de drogas pelos envolvidos que levam a matar os rivais e sim uma
questão muito mais racional: o comércio. No capitalismo, toda a expansão de mercado é
conflituosa. Quando se abre uma loja em um bairro, os que estavam estabelecidos
podem se sentir prejudicados. Ainda mais quando os forasteiros trazem produtos melhores e
a preços mais baixos. Se a concorrência é agressiva e chega a tal ponto em que a
convivência pacífica torna-se insustentável, pode-se apelar à Justiça, que decidirá quem tem
razão na disputa. Mas o que fazer quando se vive em um sistema ilegal, condenado pela
própria Justiça? A solução é ter o maior poder bélico possível para fazer valer o seu ponto
de vista sobre os demais, sobre a polícia, sobre os moradores de determinada comunidade.
(Revista Terra, outubro de 2005, p. 38-39)
(Revista Terra, outubro de 2005, p. 42-43)
4
324
TEXTO 3
A charge abaixo satiriza a segurança nos presídios brasileiros a partir da notícia de que o
traficante Fernandinho Beira-Mar negociava armas com pessoas envolvidas com a Al Qaeda,
organização terrorista comandada por Osama bin Laden:
REDAÇÃO: TEMA I
Após ler os dois textos 1 e 2, elabore uma dissertação a partir do tema: “As
semelhanças e diferenças entre o terrorismo e o crime organizado”.
REDAÇÃO: TEMA II
Considerando a falta de segurança no Brasil, a globalização e a corrupção,
escreva uma narrativa contando a fuga de um detento de um presídio
brasileiro de uma forma satírica e bem humorada. Você poderá criar
personagens fictícios ou utilizar figuras nacionais do crime, inclusive
corruptos!
5
BIIIP... VOCÊ LIGOU PARA BANGU I!
PARA FALAR COM A DIREÇÃO, TECLE 2...
CRIME ORGANIZADO, TECLE 3...
EU QUERIA FALAR COM
FERNANDINHO BEIRA-MAR
Ô BIN... POIS É MANO... O LANCE DO MÍSSIL VAZOU...
SAIU NA TV... E EU VOU TER QUE CANCELAR.
FOI MAL, IO!
OI! É O BIN! SEU MÍSSIL JÁ TÁ PRONTO AQUI!
SÓ FALTA ME MANDAR A GRANA!
EU TENHO QUE PAGAR A ESCOLA DOS
MENINOS!
BIIIP... CRIME ORGANIZADO, BOM DIA!
ESCOLA DOS SEUS
FILHOS?
O IMBECIL! ESCOLA DE PILOTAGEM DOS MENINOS
DA AL QAEDA! A CASA BRANCA E O PENTÁGONO
AINDA ESTÃO DE PÉ!
MANO, ISSO É
PROBLEMA SEU!
EU TENHO OS
MEUS! FUI!
BRINCANDO?
ISSO É UM
PRESÍDIO
BRASILEIRO!
TEM FOGO?
N-NÃO... FICO COM
O MÍSSIL!
TEM FOGO?
(Adapatado do site: www.charges.com.br)
FIM
ALGUM TEMPO
DEPOIS...
M-MAS... COMO ENTROU AQUI!
325
326
ANEXO III
Questionário sócio-educacional do grupo C Protocolo de pesquisa
327
ANEXO III
Prezado(a) Estudante
Estou realizando uma pesquisa cujo material de análise são textos produzidos
por candidatos do vestibular e vestibulandos, e servirão de dados para minha tese
de
doutoramento cujo título é “A alternância da referência do sujeito-enunciador
como
expressão da identidade e seus efeitos de sentido”. Em atenção ao que
estabelece a
Resolução 196/1996 de 10/10/1996 do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério
da
Saúde, que estabelece diretrizes éticas para a pesquisa científica no Brasil, venho
solicitar sua colaboração respondendo as questões da folha anexa e autorizando
que eu
utilize sua redação com o tema “... (TRANSCRIÇÃO DO TEMA)...”, aplicado em
____/_____/_______ como parte dos dados da pesquisa.
Você também poderá ter acesso aos resultados quando quiser e sua identidade
será mantida em sigilo.
Se você concordar, por favor responda as questões da folha anexa e assine a
autorização para que eu possa utilizar sua redação.
Obrigado.
Londrina ____ de _______ de ___________.
Dirceu Cleber Conde
Doutorando em Estudos da Linguagem UEL
Matrícula: 2004 118 70050
Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Fernandes
e-mails: c[email protected]; cleber@fafijan.br; cleberconde1@hotmail.com
Protocolo de Pesquisa
Nome:
_______________________________________________________________
RG: _________________________ Órgão Expedidor
_________________________
Endereço:
_____________________________________________________________
___________________________________________________________________
___
Cidade _________________________. Estado:
_______________________________
Tel: ( ) _____- ________ - e-mail: ________________________________________
1. Perfil socioecomico e educacional – assinale com “X” a alternativa em que
você se enquadra
1.1 Sexo:
( ) feminino
328
( ) masculino
1.2 Faixa etária:
Faixa etária entre
A 16-21 anos
B 22-26 anos
C 27-31 anos
D 32-36 anos
E 37-41 anos
F A partir de 42 anos
1.3. Onde cursou o ensino médio:
Onde cursou o ensino médio
A Todo em escola pública
B Todo em escola particular
C Parcialmente entre pública e particular
1.4. Qual é o meio que você mais utiliza para se manter informado(a):
Meio que se utiliza para se manter informado
A Jornal escrito
B TV
C Rádio
D Revistas
E Internet
F Outros
Autorizo que Dirceu Cleber Conde, doutorando em Estudos da Linguagem na UEL
utilize a redação de minha autoria realizada no dia ____/____/_______.
______________________________________
Assinatura
329
Anexo IV
Testes sobre paradigmas designacionais
331
Anexo IV
1ps
Negro(s) Não acredito que segregar
vagas no ensino
aos negros resolveria estes
problemas.
tudo isso acaba gerando ou
melhor criando adultos
marginalizados, que
notamos muitas vezes se
tratarem de negros,
tornando assim um círculo
vicioso.
Isso nos mostra as
condições de vida
enfrentada pelos negros e
nos resta admitir que
não acaba prejudicando
os negros sim o próprio
país .
na minha opinião o nosso
mercado de trabalho está
tendo rejeição com os
negros, e essa é a hora de
mudar dando oportunidade
a todos
0
Pessoa(s)
Negra(s)
Não acredito que segregar
vagas no ensino às
pessoas negras resolveria
estes problemas .
tudo isso acaba gerando ou
melhor criando adultos
marginalizados, que
notamos muitas vezes se
tratarem de pessoas
negras, tornando assim um
círculo vicioso.
Isso nos mostra as
condições de vida
enfrentada pelas pessoas
negras e nos resta
admitir que não acaba
prejudicando a raça
negra e sim o próprio país .
na minha opinião o nosso
mercado de trabalho está
tendo rejeição com as
pessoas negras, e essa é
a hora de mudar dando
oportunidade a todos
0
Raça
negra
Não acredito que segregar
vagas no ensino à raça
negra resolveria estes
problemas .
tudo isso acaba gerando ou
melhor criando adultos
marginalizados, que
notamos muitas vezes se
tratarem de raça negra,
tornando assim um círculo
vicioso.
Isso nos mostra as
condições de vida
enfrentada pelos negros e
nos resta admitir que
não acaba prejudicando
a raça negra e sim o
próprio país .
na minha opinião o nosso
mercado de trabalho está
tendo rejeição com a raça
negra, e essa é a hora de
mudar dando oportunidade
a todos
0
As
pessoas
de cor
negra
Não acredito que segregar
vagas no ensino às
pessoas de cor negra
resolveria estes problemas .
tudo isso acaba gerando ou
melhor criando adultos
marginalizados, que
notamos muitas vezes se
tratarem das pessoas de
cor negra, tornando assim
um círculo vicioso.
Isso nos mostra as
condições de vida
enfrentada pelos negros e
nos resta admitir que
não acaba prejudicando
as pessoas de cor negra e
sim o próprio país .
na minha opinião o nosso
mercado de trabalho está
tendo rejeição com as
pessoas de cor negra, e
essa é a hora de mudar
dando oportunidade a todos
0
Pessoas
de cor
Não acredito que segregar
vagas no ensino às
pessoas de cor resolveria
estes problemas .
tudo isso acaba gerando ou
melhor criando adultos
marginalizados, que
notamos muitas vezes se
tratarem de pessoas de
cor, tornando assim um
círculo vicioso.
Isso nos mostra as
condições de vida
enfrentada pelos negros e
nos resta admitir que
não acaba prejudicando
pessoas de cor e sim o
próprio país .
na minha opinião o nosso
mercado de trabalho está
tendo rejeição com as
pessoas de cor, e essa é a
hora de mudar dando
oportunidade a todos
0
332
1pp
Negro(s) O negro não deve ser
excluído de nada ele deve
ser tratado igual a todos
nos .
Todos somos iguais,
brancos, negros, pardos,
mas as vezes os negros
o mais preconceituosos .
Mas não era bem isso que
a gente pela televio,
revistas e jornais o negro
era muito discriminado no
mundo inteiro .
No mundo em que vivemos
existe sim, muita
descriminação de negros
No país em que vivemos,
grande parte dos negros
tem um destino traçado
Pessoa(s)
Negra(s)
A pessoas negra não deve
ser excluída de nada ela
deve ser tratada igual a
todos nós .
Todos somos iguais,
brancos, negros, pardos,
mas as vezes
as pessoas negras são
mais preconceituosas .
Mas não era bem isso que
a gente pela televio,
revistas e jornais a pessoa
negra era muito
discriminada no mundo
inteiro .
No mundo em que vivemos
existe sim, muita
descriminação de pessoas
negras
No país em que vivemos,
grande parte
das pessoas negras tem
um destino traçado
Raça
negra
A raça negra não deve ser
excluída de nada ela deve
ser tratado igual a todos
nos .
Todos somos iguais,
brancos, negros, pardos,
mas as vezes a raça negra
é mais preconceituosa.
Mas não era bem isso que
a gente pela televio,
revistas e jornais a
raça negra era muito
discriminada no mundo
inteiro .
No mundo em que vivemos
existe sim, muita
descriminação de
raça negra
No país em que vivemos,
grande parte da raça negra
tem um destino traçado
As
pessoas
de cor
negra
As pessoas de cor negra
não devem ser excluídos de
nada elas devem ser
tratadas igual a todos nos .
Todos somos iguais,
brancos, negros, pardos,
mas as vezes
as pessoas de cor são
mais preconceituosas .
Mas não era bem isso que
a gente pela televio,
revistas e jornais as
pessoas de cor negra
raça negra era muito
discriminado no mundo
inteiro .
No mundo em que vivemos
existe sim, muita
descriminação de pessoas
de cor negra
No país em que vivemos,
grande parte
das pessoas de cor negra
tem um destino traçado
Pessoas
de cor
Pessoas de cor não
devem ser excluídas de
nada elas devem ser
tratadas igual a todos nos .
Todos somos iguais,
brancos, negros, pardos,
mas as vezes as pessoas
de cor são mais
preconceituosas .
Mas não era bem isso que
a gente pela televio,
revistas e jornais as
pessoas de cor eram muito
discriminadas no mundo
inteiro .
No mundo em que vivemos
existe sim, muita
descriminação de pessoas
de cor
No país em que vivemos,
grande parte
das pessoas de cor tem
um destino traçado
333
Np
Negro(s) O negro muitas vezes não é
visto como o branco nos
meios de trabalho .
Pessoas negras passam por
grandes desafios todos os
dias e, isso faz com que
elas saíam vitoriosas dessa
grande batalha
Muito se tem feito para
defender a raça negra no
Brasil .
0 . Se comesçar agora com
um pequeno grupo
de pessoas de cor nesse
projeto, essas mesmas
teram mais condições tanto
competitivas ,
Pessoa(s)
Negra(s)
O negro muitas vezes não é
visto como o branco nos
meios de trabalho .
Pessoas negras passam por
grandes desafios todos os
dias e, isso faz com que
elas saíam vitoriosas dessa
grande batalha
Muito se tem feito para
defender a raça negra no
Brasil .
0 . Se comesçar agora com
um pequeno grupo
de pessoas de cor nesse
projeto, essas mesmas
teram mais condições tanto
competitivas ,
Raça
negra
O negro muitas vezes não é
visto como o branco nos
meios de trabalho .
Pessoas negras passam por
grandes desafios todos os
dias e, isso faz com que
elas saíam vitoriosas dessa
grande batalha
Muito se tem feito para
defender a raça negra no
Brasil .
0 . Se comesçar agora com
um pequeno grupo
de pessoas de cor nesse
projeto, essas mesmas
teram mais condições tanto
competitivas ,
As
pessoas
de cor
negra
O negro muitas vezes não é
visto como o branco nos
meios de trabalho .
Pessoas negras passam por
grandes desafios todos os
dias e, isso faz com que
elas saíam vitoriosas dessa
grande batalha
Muito se tem feito para
defender a raça negra no
Brasil .
0 . Se comesçar agora com
um pequeno grupo
de pessoas de cor nesse
projeto, essas mesmas
teram mais condições tanto
competitivas ,
Pessoas
de cor
O negro muitas vezes não é
visto como o branco nos
meios de trabalho .
Pessoas negras passam por
grandes desafios todos os
dias e, isso faz com que
elas saíam vitoriosas dessa
grande batalha
Muito se tem feito para
defender a raça negra no
Brasil .
0 . Se comesçar agora com
um pequeno grupo
de pessoas de cor nesse
projeto, essas mesmas
teram mais condições tanto
competitivas ,
334
ANEXO V
Exemplário dos textos analisados
335
ANEXO V
TEXTOS DO GRUPO A
<texto=001>§ Os crimes que acontecem em todo o Brasil ainda resgata a imagem do negro, porém
é um país que não racismo. De início, a política de cotas para negros pre a oportunidade de
20% das vagas para os negros ingressarem numa universidade.
§ Por um lado, a estrutura da educação deve partir do primário da escola, pois não terão uma
mudança rápida de vida, já que a maioria das pessoas que praticam a violência são de origem negra.
Por outro, a idéia segue uma demonstração das ofertas para melhorar a igualdade social.
§ A questão das cotas, deve ser mais discutida para não causar algum impacto ou reação de
constrangimento da população e principalmente dos negros, antes de aprovarem e estabelecer esta
oportunidade.
§ Para ajudar a resolver o problema da educação no Brasil esse direito ao negro o apresenta algo
maléfico e não prejudicará tanto financeiramente quanto moralmente as outras raças.
<texto=002>§Um dos grandes problemas encontrados na sociedade é a falta de cota, pois se ela
existisse no Brasil, atualmente não teria tanto negros fora da escola, ou até mesmo de uma
Universidade.
§ s sabemos que uma parte desses negros não tem uma chance na Faculdade. Geralmente são
sujeitos a passar o resto de suas vida como empregados, ou até mesmo entram no mundo do crime,
se envolvendo com drogas, passando de um mundo de cultura, para um mundo de marginalidade,
sendo que muitos deles têm a capacidade de atuar numa Universidade, até mesmo em uma
Universidade Estadual, pois por serem negros, na maioria das vezes, m de famílias humildes, que
mal ganham para o seu sustento.
§ E é nessa Faculdade, onde terão a chance de um dia ser reconhecidos, e não discriminados pela
sociedade.
§ Com medidas tomadas pela Comissão de Constituição, e com a ajuda do atual governo, pode ser
que o meio educacional adotado por esta cota, passe a fazer parte da vida desses cidadãos.
<texto=003>§Pessoas negras passam por grandes desafios todos os dias e, isso faz com que elas
saíam vitoriosas dessa grande batalha.
§ A percentagem de negros esta aumentando a cada dia que passa, eles vencem seus preconceitos
e passam por cima de suas maiores barreiras.
§ Mais ainda existe casos que os negros se sentem discriminados ex.: ao procurar emprego, as vezes
não encontram saída para o preconceito, então vão nos faróis à procura de uma solução, não
encontram começa criminalidade que vem tomando conta de nossas vidas, cadeia lotada falta de
conscientização da população.
§ Uma pessoa “branca” tem maior chance de se sair vitoriosa em uma situação constrangedora,
como essa que vivemos? Sim, mas os negros estão tomando cada vez mais esse grandioso lugar, e
nossa sociedade.
§ Os negros tem uma grande inteligência, isso faz com que eles se destacam cada vez mais. O
número de pessoas negras em nosso país com um diploma de nível superior, escada vez mais
constante pela grande habilidade que eles pertencem.
<texto=004>§Presente tais opiniões, o negro tem uma grande desvantagem no Brasil; pois ainda
existem muitas pessoas racista.
§ tempos que as autoridades políticas vêm falando em melhoramento aos atendimentos, relação
aos negros, mas nas grandes cidades, os negros são vistos como marginais, ladrões e são muito
discriminados, até por próprios negros.
§ O Brasil tem que melhorar, e colocar os negros em igualdade com o branco, a sociedade negra vive
com sua maioria em favelas, periferias e com baixa renda. Por ocorrência dessa baixa renda as
crianças, já crescem com a marginalidade, isso não pode acontecer, somos todos filhos de Deus,
obedecemos à mesma regra, por que os brancos são melhores que os negros.
§ No Brasil, há uma percentagem enorme de negros, e tende a aumentar cada vez mais.
336
§ Estudando estas normas, os órgãos de ensino estão dando grande prioridade ao negro, para
ingressar no trabalho e na educação.
<texto=005>§Aos dias atuais existe uma questão que é preocupante a população negra no País;
ou seja a desigualdade social.
§ Os negros enfrentam uma rie de obstáculos para sobreviverem em meio a uma grande e Cruel
população que os descriminam e os impedem de realizar benecios para si mesmos.
§ Um exemplo disso é a pouca ou quase inesistência de negros principalmente em universidades, ou
seja freqüentando cursos superiores. Esses problemas existem devido a falta de oportunidades
cedidas pelo próprio meio administrativo do Brasil.
§ Esse tipo de desigualdade poderia ser resolvido de uma maneira simples e eficaz, visando obter
formas para fazer com que a grande porcentagem negra existente viva com dignidade como
devereiam viver a um considerável tempo.
<texto=006>§Desde o descobrimento do Brasil, o negro e seus descendentes, sofrem com o
preconceito e a desvalorização
§ Há muito tempo o negro vive na sociedade, como que não fosse membro desta família Muitas
empresas, instituições e pessoas ainda faz distinção e desvaloriza o homem de cor negra. È tempo
de parar e refletir o que somos e temos. È preciso compreender que como ser humano a igualdade é
direito de todos e por isso a oportunidade de crescer e mostrar o valor como pessoa seja negra ou
parda, é este.
§ Pessoas de padrão rico em resistência, são considerados os negros, e nisso consiste a força de
sempre lutar, para que governantes de muitas universidades, possa favorecer o direito de cotas, para
estudantes dessa cor.
§ O sucesso de um desses jovens, está nas mãos, na espera de quem possa-o defender e acreditar
nele.
§ Confiar, é dar oportunidade, dar oportunidade é ceder algo, ceder algo é contribuir; e contribuindo
vo será responsável pelo sucesso de muitas pessoas e pelo desenvovimento do nosso país. É
nesta corrente que inicia-se a esperança de muitas pessoas que por serem negras, vêem-se, dessa
propriedade de sus direitos.
<texto=007>§A discriminação sempre esteve presente na sociedade. Esse fato, faz com que alguns
negros optem por meios indignos de sobrevivência.
§ O mercado de trabalho, as universidades e até mesmo a própria sociedade, faz com que os negros
sejam rejeitados, sendo que eles possuem a mesma capacidade de qualquer indivíduo.
§ Um grande passo para eliminar a exclusão no Brasil, seria aumentar o número de cotas nas
universidades, porque a partir desse momento, os brancos iria conviver mais com os negros e então
perceberiam a riqueza da cultura negra.
§ Esse fato também diminuiria a criminalidade e o envolvimento na drogas, pois assim os negros
sentiriam orgulho de sua cor.
§ Cada vez mais o governo deve investir na educação, aumentando o número de vagas nas
universidades e no mercado de trabalho, para que as igualdades possam ser percebidas por em
qualquer lugar.
<texto=008>§Visando melhoria de oportunidades, o governo decidiu adotar uma lei contra a exclusão
de negros nas universidades, tentando promover o bem estar, igualdade social e material.
§ Polêmica são geradas diante à tanta injustiça, assim como os negros todos tem o direito de cursar
uma universidade, sendo ele pardo, branco, independente de sua raça ou cor, pois as dificuldades
o relativas diante de um ensino público defasado.
§ Acredita-se que a inclusão racial deva mudar o preconceito existente(s), mas a realidade o é
esta, ao dar "chances" à concorrentes negros, os demais estarão sentindo-se excluídos, pois todos
estão lutando por um espaço digno na sociedade.
§ Sendo assim, o governo não deve optar por chances de ingresso e sim por um ensino digno, onde
todos possam disputar as oportunidades como seres humanos iguais, esquecendo sua raça, cor,
origem, deixando de lado a discriminação imposta na sociedade.
<texto=009>§Você acha que os negros tem a mesma chance que os brancos na sociedade
Educacional Brasileira? E que devem ser dadas a crião de cotas para o ingresso de negros na
universidade?
§ Tem sido grande o preconceito contra os negros tanto na sociedade Educacional quanto em outros
337
aspectos. A questão das cotas são um tanto delicada e complexa é preciso que as leis possam ser
menos racistas e a política poderá ajudar em muitos os negros a resolverem o problema da excluo
educacional, tanto o negro, quanto o branco precisam ter uma chance para poderem cursar um curso
superior, mas nem sempre é isso o que acontece, muitos dizem que ao oferecerem essa cota
estaram estabelecendo desigualdade material e outros acreditam que isso seria perca de tempo, pois
não iria mudar a quantidade de negros que se envolvem com drogas e que estão indo para a prisão.
§ Desse modo, antes de pensar na universidade é preciso dar estrutura a todas as pessoas que
acreditam que assim estarão ajudando, pois estão só piorando a situação na sociedade Brasileira.
<texto=010>§A exclusão está presente desde a hora que estão no berçário, rosados e escuros já são
apontados como negros, mais tarde na base de sua educação já são julgados pela sua cor e são
motivos de brincadeiras de colegas.
§ Talvez a política de cotas não seja a melhor solução concreta no Brasil que ele, com tão grande
quantidades diferentes de raças.
§ Enquanto nossos governos não investir na base de apoio para depois construir uma estrutura firme,
vamos continuar vendo cada vez mais afro-brasileiros praticando crimes gerando violência e
acabando nas cadeias.
§ Os negros tem capacidade de estudar e cursar uma faculdade ou até mesmo ter uma pós, mas
antes de tudo isso e necessário ele ter um lar, alimentação, roupas entre outros itens indispensáveis
§ É preciso lutar pelos direitos dos negros, abraçando as idéias de grandes idealistas como Luterking
entre outros negros que conseguiram vencer o preconceito e se tornaram símbolo para todos o
negros.
§ Precizamos perder o pessimismo pois cada vez mais os negros estão se destacando e que sirvam
de exemplo para queles que já perderam as esperança de lutar por dias melhores, sem depender que
deixam entrar uma pessoa na faculdade só pela sua cor.
<texto=011>§No período em que estamos cada vez mais aumenta o número de pessoas negras
§ que a grande maioria não chegam e uma escola com isso aumenta em muito a desigualdade
social e econômica. Pois não podendo ter estudo o conseguira ter um trabalho descente. E isto
acarretará em vários problemas como os crimes e furtos.
§ Os politicos responsáveis pelo nosso pais, pensando em tentar acabar com o racismo e a
descriminação contra os negros criaram um projeto.
§ Neste projeto acegura uma cota de vagas para pessoas negras nas universidades publicas em
concursos publicos e financimentos estudantis.
§ Esta lei está gerando muita polêmica na sociedade.
§ Será que vale a pena este "previlegio" pois isto só almenta ainda mais o preconceito com os povos
negros.
§ Portanto antes de criar estes cotas a sociedade em geral deveria pensar primeiro na estruturação
da família para depois criar um projeto deste porte tão polêmico.
<texto=012>§Não queremos divisão ou qualquer tipo de discriminação racial ou social. As cotas
melhorariam a situão do negro na sociedade.
§ Põem, cada um pode ter seu lugar, desde que lute para conseguir.
§ O negro é uma pessoa comum e possui inteligência total para conquistar o seu espaço.
§ Com certeza essas cotas só fariam aumentar mais o preconceito e racismo entre eles, pois não são
pessoas diferentes das outras.
§ A verdade é que se buscou uma estratégia para separar não apenas cor, mais capacidades
diferentes. O negro tem plena capacidade e orgulho próprio para se rejeitar a 20% da vaga de uma
universidade: isso é o que chamamos preconceito.
§ Deveriam sim, proporcionar mais oportunidades de emprego e sem deixar de lado a igualdade de
direitos: comer, estudar, se divertir e principalmente viver.
<texto=013>§A política de cotas para os negros nas universidades. Vem sendo a proposta dos
governantes, para melhorar o probema de exclasão educacional no pais.
§ Mas so isso difissilmente, não vai resouver o probema, porque primeiro e preciso que o pais cresça
economicamente e que mais empregos. E para jerar mais empregos, o nosso presidente, tem que
reduzir os empostos e facilitar os impretimos para os pequena e micros impresarios.
§ Jerando mais empregos e melhorando, a maneira eas condições que essas pessoas negras vivem;
so assim pode funcionar, a política de cotas para os negros no pais.
338
<texto=014>§Ainda continua a discriminão contra os negros. Sera que as cotas propostas na
constituição iriam resolver os problemas existente na sociedade?
§ Até os dias atuais ainda continua o preconceito contra os nossos irmãos negros, que foram livres,
mais continuam sendo perceguidos e até mesmo excluídos da sociedade. O negro não tem espaço
para progredir pois sempre são esbarrados, não tem aceso a uma educação de qualidade, exerce
cargos inferiores. O negro só tem valor e fama se for um bom jogador ou cantor pois está no sangue.
§ Por outro lado proposta de melhoria e inclusão do negro na sociedade, está sendo visto com
bons olhos, pois a constituição está abrindo espaço para que, o negro possa ter aceso as
univercidades com direito acegurado, pois no vestibular consegue uma vaga pessoas da classe
média, pois podem pagar uma escola particular e ter aprendizagem a nível de vestibular oferecido
pelas faculdades estaduais.
§ No entanto com as propostas das cotas uma parte da pessoas negras, que não aceitam a si
próprio, vão se sentir um cidadão com direito e sem preconceito, igual a todos e sentir orgulho de ter
pele negra.
<texto=015>§No Nosso país existem mentes brilhantes, que muitas vezes não tem a oportunidade de
exerce-lás, pois o radicalmente afastadas da sociedade. Essas mentes são as dos negros, que
muitas vezes são descriminados por sua cor. São pessoas, seres humanos iguais a nós, rico, pobres,
ladrões, trabalhadores e crianças, que muitas e muitas vezes, São esquecidas pela sociedade. Na
nossa sociedade deveria ter pessoas que ajudassem mais essas pessoas, pois até na hora de
conseguir um emprego é difícil, imagine estão na Educação que não tem incentivo.
§ chegou a hora de mudar, chegou a hora de resolver todos esses problemas, que abalam a
todos, chegou a hora de investir na educação, de mudar o rumo da criminalidade, da fome, do
desemprego, da exploração, e da desigualdade racial, vamos nos unir para que esses problemas
sejam resolvidos e que o insentivo para negros nas universidades seja maior!
<texto=016>§No Brasil ainda a sociedade continua, com o preconceito contra os negros, não dando
condição de emprego, moradia, quanto mais eles, não tem nem, o primeiro grau, muitos tem que
escalher as suas profissão, na área, que os brancos considera, lixo. E quando eles consegue um bom
emprego e a família, em seu filhos na escola, tem que ser uma escola, que a família da sociedade
branca, aceita, pais muitas família tiram, seus filhas se a escola permanece, com este aluno, negro, e
muitas alunas negros param de estudar, pelo perceguição, que a eles são feitos, e quando eles
conseguem terminar os estudos fraco que a escola, transmitem eles não pode fazer uma faculdade,
pois o tem a condição de se igualar, aqueles que pode fazer um cursinho, ou que estuda numa
escola melhor, pois a maioria tem a condição de pagar um estudo melhor.
§ Enquanto o governo lança, campanha de incentivo a eles numa falsa propaganda, a minoria dos
negros podem estar numa faculdade, se a condição, de um emprego pois, como eles sem, cursinho,
um estudo fraco podem se comparado aos brancos.
<texto=017>§As pessoas são ou não são preconceituosas? Brancos e negros são tratados iguais na
sociedade?
§ Se olharmos ao redor veremos que a maioria da população brasileira, têm a cor da pele negra ou
parda. Mas, o que realmente vemos é que de cada dez (10>§ pessoas ingressadas em uma
faculdade somente uma (1>§ é negra. A aceitação do projeto que cria cotas para afro-descendentes
nas universidades, contratos do financiamento estudantil e empregos públicos, está gerando
polêmicas e opiniões diversas. Os próprios negros se discriminam, numa pesquisa da UERJ
(universidade do Estado do Rio de janeiro) em 2001, somente 24% de 2.328 alunos se reconheceram
como negros ou pardos. Presumo que todas as pessoas querem reduzir as desigualdades sociais, e
regionais sem preconceitos de origem, raça, sexo cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação promovendo o bem a todos.
§ Quando as pessoas tiverem mais fé e amor no coração iram perceber que estavam pensando
totalmente errado e aceitaram negras nas universidades ou em qualquer outro lugar, pois Deus nos
fez a sua imagem e semelhança, porém todos são iguais, independente de cor, sexo ou religião.
<texto=018>§Criando uma política de cota, não resolveria totalmente o problema, mas é o início de
uma mudança, ou que pelo menos há pensamentos de mudanças.
§ Boa parte da população negra no Brasil se sente inferior, porque a sociedade os condenam quando
acham que não são merecedores de um trabalho descente, uma vida digna, como se a cor mostrasse
o caráter.
§ A partir do momento que nossos governantes começarem a mudar sua maneira de pensar e agir,
339
dar mais condições de vida aos negros, mais atenção, o índice de criminalidade mudará, gera
empregos sem preconceitos.
§ Todos deveriam abraçar essa causa para que o problema da exclusão nas universidades mudem.
<texto=019>§ Pessoas de péle escura são tristemente discriminadas, porém não são as únicas
expostas à exclusão educacional. Excluídos do ensino são evidentemente aqueles que não obtém
boa condição financeira. O quea ilusão de que criar cotas à negros nas universidades resolverá o
problema está relacionada à idéia extremamente preconceituosa de que negros são pobres.
§ Herdou-se de raízes históricas o racismo, o que infelismente ainda é notado com grande evidência,
a péle escura não determina a condição social, por tanto os negros são erroneamente julgados,
Juntos somam um grande percentagem da população nacional e muitos obtém uma classificação
social elevada, igualmente aos brancos.
§ O problema da exclusão na educação está diretamente ligada ao aspecto financeiro. Quando
obtem-se condições de receber bons estudos em colégios particulares de qualidade portando de
custo elevado é fácil o ingresso para as universidades, porém quando não existem possibilidades de
estudar em bons colégios, uma inversão dos fatos.
§ Enfim, a resolução deste problema está diretamente ligada a um maior investimento por parte dos
governantes no ensino público, dando assim novas e facilitadas oportunidades a quem possivelmente
será excluído.
<texto=020>§ Ao questionarmos sobre a questão das cotas no Brasil surge uma grande dúvida será
que certo previlegiarmos os negros se o racismo o acabou, imagine quantas criticas e mais
forma de questionar o negro terá.
§ Tem se ouvido muito falar sobre a criação de cotas para o negro entrar na universidade, para assim
dar mais valores a eles, a continuar em frente nos estudos, para chegarem a ser um grande
profissional.
§ Com esse benefício pode acontecer que almente mais o racismo, não se deve fazer essa diferença
pois o branco tem que estudar lutar muito para entrar na universidade. para eles será bem mais
cil entrar, assim cirando uma grande adversidade. Não é raro vermos negros na rua sendo preso,
fumando muitos entraram nisso até por falta de uma oportunidade de vida melhor, de educação, mas
não é assim que soluciona o problema dando prioridades que o gerar mais conflitos entre o branco
e o negro.
§ Pensar em mudar, tem que começar da raiz e não é de uma hora para outra, tem que ser dar mais
chance mais valor e oportunidade ma sem prioridades, fazendo eles correr atrás e conseguir o que
quer com seus esforços dando méritos a si mesmo e mudando os pensamentos dos seus
descendentes chegando a mudar a sociedade racista de pouco a pouco.
<texto=021>§ Cada dia que passa, vejo uma quantidade maior de negros indo para as cadeias,
praticando crimes, se envolvendo com drogas, sem qualquer perspectiva de vida.
§ o devemos ser tão medilcres ao ponto de pensar que o branco é diferente do negro, pois
diferença de cor, mas é um ser humano igual a todos.
§ Devemos dar oportunidade a todos de igual para igual, no qual gostamos de acreditar em tudo
aquilo que seja bom para você e para o próximo. Lugar de criança não é nas ruas, mas sim na escola
é para isso que existe oportunidade para que todos sejam educados para resolver os problemas da
Exclusão Educacional no Brasil.
§ Acreditamos que para eliminar essa desigualdade é possível dar estruturas a essas pessoas e
oportunidades, porque a igualdade está em primeiro lugar.
<texto=022>§ A conquista das pessoas que tem a cor negra esta cada veis mais elevada, mais
ainda tem pessoas racista o próprio negro e racista, A sociedade ainda codena o negro. A maioria do
povo de favela e negro, hoje em dia os brancos o pior que os negros, a cor branca sempre se
escapa mais os negros, não sempre vão prezo sem direito de defeza, toda população, negra sofre,
pode ser um cantor, artista um rico, pulitico etc. quem sofre com isso são as criança que fica com
tralma da sua própria cor, 50% da população de cada cidade convive com a cor negra, tem pessoas
que tem pavor do negro e mem teixa seus filhos ter contado.
§ A vida foi feita para amarmos um au outros, mais o ser humano não tem consiencia do que faz
no dia do jugamento de Deus eles terão consiencia do que eles faz com os negros.
<texto=023>§Nos dias atuais nos deparamos com a situação de que a maioria das vagas nas
faculdades são preenchidas por brancos, o que nos leva a crer que uma grande desigualdade
340
social, educacional e até mesmo racial.
§ Para as pessoas negras que já tem idade e formação adequada para se integrar à um curso
superior a política de cotas ajudaria nos dias de hoje, pois é uma oportunidade para essas pessoas
adquirirem boas profissões. Assim futuramente seus filhos terão o previlégio de ter acesso à uma boa
educação, desenvolvendo-se com igualdade às pessoas de outras raça. Sendo assim não precisarão
fazer uso das cotas e sim concorre de maneira igualitária a uma vaga nas faculdade mostrando seus
valores e batendo de frente com a injustiça e a desigualdade social. Qual o motivo da existência
dessa cota? Certamente que com as dificuldades políticas-sociais que o Brasil vem enfrentando até
hoje os negros são os mais prejudicados, pois com a situação geral de desemprego, fome, violência
soma - se com o preconceito que sofrem os mesmos. E para que isso venha a ficar somente em suas
histórias de vem aproveitar ao máximo as oportunidades que lhes forem oferecidas por direito.
<texto=024>§ Preconceito, não são metas desiquilibradas de uma população ingenuamente
enganada.
§ O Racismo em nosso país é o fruto de um trabalho escravo, onde havia fome, dor e humilhação.
§ Quando o Brasil foi descoberto, havia muitas riquezas, e os descobridores para lesa-las
prescisavam de muita mão-de-obra. Sendo assim trousseram os negros para trabalharem, pois eles
teriam previlégio sobre os negros sem custos ou direitos.
§ Ainda em nossos dias há preconceito e racismo com desculpas de desequilíbrio mental ou
emocional basean-se, e descriminam negros e leis que lhes dão direito a sociedade, a cargos
políticos.
§ Felismente às leis tomarão providências, e estão, abolido de pouco a pouco esse mal e semeando
a vida sem acepções com direitos iguais, para que todo homem passa se expressar.
<texto=025>§As oportunidades, as leis, os pensamentos se misturam em cores destacadas nos seres
humanos preparados os despreparados em busca das conquistas para o crescimento social.
§ No espaço geográfico brasileiro estão distribuídas variedades de cores e raças, que até parece que
cada pessoas vivente neste pai pertence a uma nação diferente pois são dirigidos a cada uma delas
olhares coloridos criados na conciência, revelando assim automaticamente ao grupo racial a que
pertence.
§ O grau de instrução que determinado ser re encontra o inclui a um patamar de um acesso a uma
cor não revelada tornando - o assim responsável pela sua própria inclusão a uma cor não vizivel em
pensamentos intelectuais, pessoas formais ou informais.
§ A conciência é inodora e é ela que inclui e influi para o andamento educacional.
<texto=026>§Hoje, observamos que muitas pessoas ainda sofrem com o preconceito, principalmente
os negros de classe baixa - em sua maioria -, não é dando chance para esses negros ingressarem
em Universidades que resolverá totalmente o problema, mais o início de mais uma conquista que vem
sendo vencida ao longo dos anos.
§ Os negros, infelizmente não são vistos como um indivíduo de bem, justamente por o terem
chance, muitas vezes de provar o contrário, um exemplo bem visível; nas favelas, em delegacias
principalmente de grandes centros, o que mais se vê, não são japoneses, polacos e sim negros. Isso
vem de geração, crianças são criadas para ficarem longe de negros.
§ Nem toda sociedade vê o negro como um ser irracional, mas muitas pessoas impõem situações as
quais os negros o diretamente discriminados, o que essas pessoas não vêem é que o preconceito
tomou conta de seu raciocínio retardando seus conceitos sobre a humanidade.
§ Levando em conta que nem todos tem a mesma visão, acredito que o envolvimento dos negros com
os demais, fará com que futuramente todos sejam iguais perante a sociedade, seja na trânsito, no
trabalho, enfim, todos iguais.
<texto=027>§Acredito que esta política de cotas é a mais desonesta atitude, a ser dado para
pessoas, somente pela cor de sua pele, saberemos do direito de todo cidadão, como direito do
trabalho direito do lazer e de ir e vir. Porque não o direito do estudo livre.
§ A política brasileira esta precisando de bons governantes, pessoas com seriedade para administrar
este Pai de tantas riquezas, como Amazônia o Pantanal e outras.
§ Estão falando em dar cotas de universidade para negros, e uma indignação, sabendo-se que os
verdadeiros brasileiros são os índios, que nem brancos são!
§ No Brasil quando se visita um presídio é a grande a proporsão de negros em relação aos brancos,
devido a estas atitudes de diferenciar as pessoas.
341
§ Enfim sabemos que no Brasil o racismo e crianças fora da escola, é crime mas sabemos também
que o direito educacional no Brasil deveria ser para todos.
<texto=028>§No importa a cor, a raça ou a origem de cada ser humano, o que importa mesmo, é nós
como pessoa.
§ Não devemos pensar que o negro, por ser negro é um indivíduo sem cultura, tudo o contrário, eles
têm uma história, uma tradição.
§ Sempre pensamos, quando escutamos em falar de assaltos, que um negro metido no assunto.
Será que a cadeia só foi feita para a raça negra e para pobres.
§ Na televisão, esta raça tem pouco campo de trabalho e quando existe sempre conseguem um papel
como: empregada doméstica ou papéis secundários, jamais veremos um ator negro interpretando um
papel principal. No entanto esta mesma raça, é a que nos enche de orgulho no que se refere ao
futebol, Pelé foi e será o embaixador brasileiro no Mundo inteiro. E em respeito às escolas de samba
onde os sambistas e demais integrantes em sua maioria negros mostra ao mundo a cultura do nosso
País.
§ Por tudo isso devemos defender a igualdade entre as raças e acabar com o racismo no planeta.
<texto=029>§Apesar das grandes dificuldades enfrentadas na época da escravidão, o negro ainda
permanece marginalizado e excluído da sociedade pois, o índice populacional de pessas brancas é
elevado, além disso o passado dramático da raça negra é lembrado por toda sociedade que se omite
a valoriza-lo.
§ Na época colonial o índice de população negra era elevado com as explorações e as condições
desumanas fez com que muitos deles perdessem a vida. Hoje o que-se vê pode resumir em exclusão
social e descriminação já que sendo a maioria de população branca fez com que os mesmos
tivessem vantagem na corrida por emprego e vagas nas universidades que tem o numero baixíssimo.
§ Além disso, o negro foi marcado por grandes sofrimentos vivido em sua história que hoje é
lembrada por toda sociedade. Nas escolas e no próprio meio social muitas pessoas olhavam para o
negro como-se fosse um animal selvagem, muitos deles sofrem discriminão e violência e não tem a
coragem de denunciar as autoridade, que a mesma também faz parte desse ciclo horrível de
violência ao ser humano.
§ Em virtude do que foi mencionado entende-se que a população negra ainda não conseguiu seu
espaço em meio a sociedade. É preciso que as autoridades tomem a devida providência, criar um
código penal severo para combater a discriminão e dar oportunidade para o negro colocar-se no
mercado de trabalho.
<texto=030>§Os negros sentem-se descriminados não tendo oportunidades na carreira de trabalho,
conseqüentemente por falta de acesso às universidades.
§ Eles se auto descriminam da sociedade, enquanto uns o atrás estudam, batalham por um futuro
melhor, outros estão nas ruas roubando matando e usando drogas, esperando que as coisas venham
ceis.
§ Hoje em dia não existe mais aquela pergunta sobre a cor nos concurso universitários, mostrando
que eles tem direitos iguais ao dos brancos e que há lugar para todos.
§ A criação de cotas para as universidades, de nada vão adiantar o problema da exclusão
educacional, sem o esforço das pessoas negras para poderem chegar ata lá.
<texto=031>§Brasil, país do carnaval, do futebol, possuidor de paisagens maravilhosas, abençoadas
por Deus com certeza, mas é um país que infelismente não respeita seu povo, suas origens, disfaa
finge que não é bem assim, mas que no fundo não reconhece sua própria cor, inventa novos termos,
criatividade é o que não falta.
§ O que realmente falta é o direito de negros brancos, amarelos seja lá qual for a cor do brasileiro a
educação de boa qualidade. A idéia do governo em relão as cotas para o ingresso de negros as
universidades pouco resolveria, pois o problema vai além e as dificuldades também. Desde de o
primário, a exclusão racial já está presente.
§ As cotas deveriam existir desde a educação infantil, construindo assim um alicerce forte e
duradouro, pouco adiantaria as mente falta é trabalho, dinheiro para gastos básicos, o que se vê hoje
é, quem estudou a vida toda em escolas particulares consegue com facilidade vagas em faculdades
públicas, ao contrário o aluno que estudar em escolas públicas, não consegue o ingresso as
faculdades públicas por falta de estrutura.
§ O acesso a boa educação é fundamental, a educação transforma os olhos o coração e a mente
do ser humano.
342
<texto=032>§Hoje a humanidade em geral está ligada a tudo que acontece em sua volta, não
deixando nada escapar quando se trata de racismo.
§ Todos tem o mesmo direito de ir e vir e de frequentar todos os lugares públicos.
§ Na sociedade brasileira desde o descobrimento do Brasil os negros já eram discriminados, e ainda
continuam sendo maltratados, humilhados e até mortos por causas injustas.
§ Hoje ainda leis contra o racismo estão sempre melhorando para acabar com esse preconceito, leis
novas como cotas para negros nas universidades, es causando muita disculsão.
§ Para os negros freqüentarem uma universidade que já está quase ao termo de seus estudos,
primeiro deveriam ter um acompanhamento desde à juventude pois muitos são de classe baixa e
dando lugares para entrar em uma universidade não resolveria o poblema de exclusão educacional
do país.
§ Tudo para ser feito correto deve ter um acompanhamento assim poderíamos ter uma vida sem
preconceito e discriminão entre seres humanos
<texto=033>§A nossa sociedade sempre tem a suas desigualdades, vejo que não é com os
negros que a uma regeição mas também com os pobres e humildes.
§ temos que conseguir superar todos os preconceitos e termos orgulho do que somos e do que
fazemos não é porque que alguns são preconceituosos que devemos seguir o mesmo exemplo.
Vamos lutar por uma causa justa, no que for correto ser injusto sim, com essas pessoas que
estragam o nosso país com suas críticas sobre a cor negra, porque seja negro ou branco,
acreditamos em uma só justiça a de Deus.
§ na minha opinião o nosso mercado de trabalho está tendo regeição com as pessoas de cor negra, e
essa é a hora de mudar dando oportunidade a todos, e que a desigualdade não seje aceita entre nós.
§ Com isso devemos ter uma civilização negra melhor e bem aceita na educação, trabalho no lazer e
no bem estar com todos.
<texto=034>§No mundo em que vivemos existe sim, muita descriminação de pessoas de cor negra, e
isso já é um fato consumado, que se torna revoltante, começou desde cedo com os nossos
antepassados, onde o negro servia apenas com escravo, serviçal para os brancos, excluídos até
hoje, eles não consegue entrar nas universidades.
§ Essa lei de cotas que muito se discuti, não ajudaria muita coisa, pois os problemas que eles
enfrentam no dia-a-dia é bem mais complexo do que muitos possam imaginar, atualmente a mente
das pessoas está com rótulos formado em relação aos negros, mediante a tudo o que vê e assiste
através dos meios de comunicação, é muito difícil ser negros ricos, mais sim estupradores, ladrões,
assassinos e pobres, tornando os assim revoltados com sua própria cor, é justo distribuir tais cotas
para a população negra, mas o correto seria trabalhar a mente das pessoas em relação aos negros,
valorizar o seu trabalho, sua cor, fazendo deles cidadões felizes por ter sua própria raça.
§ Mudando o nosso jeito de pensar, o nossa consciência, que os negro se sentiram valorizados, e
terminaria a exclusão
<texto=035>§No Brasil hoje está acontecendo uma grande discriminação contra os negros, tudo isso
por causa da sua cor. Mas tudo isso é ignorância da parte do povo Brasileiro porque isso não tem
nada em haver, não é que eles o “Pretos que são Burros”, ao contrario. Existem muitos
morenos, pretos, negros inteligentes.
§ Por isso o que eles precisam é de uma oportunidade para mostrarem seus talentos e conseguirem
lugar na sociedade Brasileira.
§ Um fator importante é o de incentivar esses negros a cada vez mais participarem da escolas,
universidades etc. Nós não deveríamos dar as costas para essas pessoas. Assim eles iriam
esquecer essa entrigas, discriminações e que sabe o Brasil poderia até se tornar um país de Brancos
e negros muitos inteligentes, trazendo grandes melhoria e abrindo caminho para a nova frota de
criança que estão ai por vir
§ Portanto a discriminação deve acabar por causa que o mundo de hoje não é mesmo mundo de
1500 anos atrás.
<texto=036>§Realmente, (para) já era tempo de parar, pensar e se dedicar a esse assunto tão
polemico, pois quantas vezes, era colocado em discussão a idéia de que o negro deveria ter chances
igual, a de um branco mas na realidade sabemos que nunca foi assim. Por isso achamos ótima a
idéia de que negros terão a mesma igualdade de um branco para entrar nas universidades e até
mesmo nos programas de televisão.
343
§ Pois assim os negros terão oportunidade de mostrar que é tão bonito, inteligente o apto a fazer
qualquer tipo de trabalho que sempre era destinado a um branco. Sendo assim seria muito mais fácil
acabar totalmente com a exclusão de negros não em universidades mas em qualquer órgão que
ofereça oportunidade para um ser humano pensante.
§ Porque, chega ser redicula e maneira de algumas pessoas, pensar que os brancos sejam melhores
do que os negros. Sendo assim tenho certeza de que ( os negros) a idéia de igualdade, a classe
negra,o só pode, como vai dar certo
<texto=037>§Falar em humanidade é fácil, mas cumprir com ela é difícil.
§ Durante muito tempo no Brasil, uma grande polemica em relação as pessoas de cor, hoje o número
abrange.
§ As pessoas são mais aceita nas repartições públicas, por isso que acontecia de pessoas entrar
pelos caminhos das drogas daí começa a gerar atritos com seus próprios amigos, com essa
mudança vimos que tudo teve novas vies, quando começou aceitação deles, as pessoas que ali
participavam se comoviam. Nunca devemos criticar as pessoas para que entrem a saem de cabeça
erguida eles tem as mesmas direitos, já que não era aceito o que fariam as crianças de cor não
podiam estudar, ter sua própria vida, no trabalho seria um dos piores.
§ Mas só se via felicidade estampado em seus lindos rostinhos.
<texto=038>§O Brasil desde o inicio quando entrou o regime político deveria ter apostado na
educação tanto para negros ou brancos, isto é, eliminando o preconceito no qual mostra a cor negra
como inferior.
§ Por motivos passados relacionados com distinção de cores hoje o pais passa por sérios problemas
educacionais, mostrando que a maioria que completa o ensino superioro de cor clara.
§ O governo preocupado, esta apostando em um sistema de cotas para negros nas universidades,
conciente que adotando este método pode resolver o problema de exclusão educacional no Brasil.
§ Resolver o problema não vai, mas iaumentar o preconceito racial, pois o individuo se senti
marcado ao entrar na universidade e obter privilégios por ser de cor negra.
§ Tudo isso resolveria se este método fosse aplicado não em universidade mas no momento em
que individuo passa a freqüentar um escola, dando –lhes apoio assitencial, não permitindo assim
que a necessidade o tire do caminho da educação para os ricos.
§ Não há exclusão educacional, mas sim falta de oportunidade pois quantos jovens negros ou
brancos querem alcaar o ensino superior, seria um grave preconceito ajuda apenas um quando o
problema e de todos.
<texto=039>§A poucos lugares para o negro na sociedade, universidades em todos os lugares a
uma discriminação sem limites. Tudo que se refere ao negro as dificudade almenta as oportunidades
de emprego em muito meio de trabalho o negro não é aproveitada o seu pontencial a sua qualidade
quando não questionada pelo reseio e mal aproveitado, Por que ninguém da uma chance de cresce.
Tem que buscar uma nova maneira que qualifica valoriza o negro na política o pouco negros que tem
não é o suficiente para exigir um liberdade que foi concedida mas que ahoje o choque continua.
As vezes muda a maneira de falar politicamente tudo funciona.
§ Mas pratica tudo continua com a quarenta anos atraz. Quando o negro sai em busca de
conhecimento leva um joque que muito vezes não tem retorno. Buscar conhecimento em outros
línguas ainda não a chance para o negro que em todos os sentindo e vista como um raça que muito
desacretida. Até crescer na sociedade a um limite as ser respeitado. as leis não e concetida nos
diretos dos patrois normais o racismo cresce pertubando e deixando de lado uma cultura rica em
conheciemnto que poderia ser aproveitada. Mas enquanto a sociedade desrespeitar e tocar os negros
com salvagem vai ter um choque ainda maior quando se encontra a saída mais o a limite nem
acordo so lamento por aquilo que muito já perdeu.
<texto=040>§Atualmente, as pessoas de cores pardos sofrem grande preconceitos quanto a sua cor.
§ Pessoas morenas não tem direito de expor suas proposta elas vão em busca de seus objetivos mas
quando estão quase alcançando surge o grande problema sua cor, e assim muitas vezes são
tratados como animais.
§ pessoas que tratam crianças morenas como se fossem bichos quando se próxima dela viram
até a cara com medo delas pedirem muitas o tem oportunidade nem conquistar seus objetivos
surge algo para lhe atrapalhar sendo assim passam a roubar.
§ Muitos chegam até sofrer agressões sem merecer se acontece alguma coisa ao aseu redor logo
olham para as pessoas negras como se elas cometecem erros.
344
§ Em virtude do que foi mencionado todos deveriam se conscientizar e tomar alguma providencia,
para que isso mude e todos possam viver com igualdade, sem essa desigualdade que atinge o
mundo todo.
<texto=041>§Os negros no Brasil sofrem,muito com o racismo.
§ Quando vão procurar o seu primeiro emprego muitas vezes, batem a porta na cara deles,pela cor
da pele negra.
§ Pouco a pouco vem melhorando,mas o racismo ainda não acabou.
§ Não adianta inventar cotas para negros em universidades,mas sim começar,pela educação das
crianças,criando projetos para estudar.Para que quando fique adulto tenha profissões.
§ Porque se essas crianças crescerem vendendo objetos no faróis,roubando sem estudar o acabar
na cadeia sem ninguém para apoialos.
§ Nunca se integrarão na sociedade.Então não adianta criar instituições sem começar de baixo.
<texto=042>§Acredita-se que o racismo no Brasil,esse tornando cada vez menor,pois na maioria
das universidades há cada vez mais negros ou descendentes deles.
§ Crê-se que melhora a cada dia que se passa,e menos analfabetos negros no Brasil,e assim
menos passando necessidades nas ruas.Seria realmente um problema a menos para o
governo,investir em educação e assim tirar milhares de criaas das ruas,drogas e
prostituições,dando a elas uma chance para virar o jogo onde a tanto tempo a raça negra é uma das
menos privilegiadas e é sem dúvida uma das que mais sofre com o preconceito e a falta de confiança.
§ Assim sendo mudar isso significa,abrir novos caminhos deixar que haja possibilidade de
crescimento entre todos independente de sua raça ou condição financeira.
<texto=043>§No país em que vivemos, grande parte das pessoas de cor tem um destino traçado, não
é necessário jogar beijos para perceber que essa gente vem de famílias pobres e são excluídas da
sociedade, não tem escola de qualidade e acabam desistindo de estudar, por não terem estudo e
nem boa aparência acabam não encontrando emprego, ficam apenas com o sub-emprego.
§ É preciso repensar numa sociedade mais justa, as escolas presisam dar mais subsídios e
desenvolver nas crianças negras e pobres o censo crítico para que elas persebam que apesar de sua
cor e condição social podem lutar por um mundo mais justo.
§ É necessário também estruturar as famílias dando a elas direito a viver com dignidade e respeito
pois todas as pessoas tem direito a saúde,liberdade tem direito a vida.
<texto=044>§Antigamente os negros, trabalhavam nas lavouras para garantir seus sustentos, se não
trabalhase certo eram castigados até a princesa Isabel declarar a Lei Áurea para não serem
escravos.
§ Isso não mudou muito o que continuo é que não são vistos como seres humanos, que tem o direito
de estudar, trabalhar,ter uma vida descente.
§ Nosso Brasil está precisando dar oportunidade para os negros de mostrar que o capazes de
transformar nossa sociedade em algo melhor para viver.
§ O que está acontecendo é assaltos a todo momento, seqüestro, fome o que os levam a fazer isso a
falta de condição para viver.
§ Nosso presidente, senadores colocassem uma lei para cada lugar ter uma pessoa negra em cargos
isso mudaria a questão de que eles nunca tem vez na sociedade.
§ Se fossem tratados com dignidade melhoraria o problema do Brasil.
<texto=045>§Os negros no Brasil estão muitos taxado, pessoa humilha as pessoas de cor, pensão
que eles não são ninguém.
§ No país precisa mudar dar mais emprego para as pessoas negras.
§ Então os povos de cor tem que botar a boca no trombone para os governantes atende os seus
manifestos para uma vida digna de um salário mais compenssavel para às pessoas.
<texto=046>§A discussão em torno de cotas para negros nas universidades gera polêmica.
§ Esse beneficio causa uma incerteza se esta proposta seria uma solução ou agravaria mais o
problema do racismo no Brasil.
§ Devemos pensar que este direito estabelecido deveria também ser imposto para carentes que
sofrem por não ter acesso ao um ensino melhor.
§ Existem outros casos para serem resolvidos antes de ser pensar no ensino superior, a miséria e a
violência são problemas que se deve solucionar ainda quando criança, que não serão corrigidos
345
ofertando algumas vagas nas instituições.
§ De que maneira isto traria melhoras sendo que a exclusão educacional nas universidades se
também ao fato que o ensino médio deve ser modificado, preparando melhor seus alunos para o
vestibular, lembrando que os maiores obstáculos que negros sofrem para ingressar nas instituições
muitas outras pessoas também passam pelas mesmas dificuldades.
§ Esse projeto faz que o racismo no país aumente pois dessa forma estaríamos diferenciando o
negro do branco quando na verdade todos devem ter direitos iguais independente da sua cor.
<texto=047>§Mais uma vez o tema preconceito está em pauta, desde que nascemos e por toda
nossa vida vamos presenciar a luta dos negros por espaço e quase sempre sem resultado. O fato é
que muito se fala e pouco se faz.
§ Temos como exemplo a questão das cotas que seriam reservadas para negros em universidades,
muitos aprovam e muitos contestam. Tenho pra mim que está não seria uma boa solução, seria
como decretar: realmente os negros são inferiores e por isso os seus direitos tem que ser imposto a
qualquer custo. Então eles ficariam marcados e a divisão e o preconceito seriam ainda mais visíveis.
Não existe preconceito só contra negros, então porque os favorecidos com as cotas seriam só eles?A
conquista de vagas em universidades em cargos públicos no meio social em geral deve ser mérito de
cada um independentemente de raça, cor, sexo ,religião.
§ O problema é muito mais difícil de solucionar do que pensamos, vagas em universidades não farão
as pessoas deixarem de ter preconceito. O respeito, a ética e o amor devem ser prioridade em toda e
qualquer situação, através disso é que conquistamos o que desejamos e finalmente porque
merecemos.
<texto=048>§Todos sabem que anos atrás existe um grande mero de pessoas humanas da
raça negra em nosso país que saiam de um estado para outro em busca de melhores condições de
vida e respeito na sociedade política brasileira.
§ Ao examinarmos estas condições verificamos que os negros contam com uma capacidade alta em
administrar certos setores educacional no Brasil.
§ Mas para o racista os negros é o foco central de crimes ocorridos na sociedade.
§ Isso acaba prejudicando e fazendo com que os negros se deixam a si próprio e a comunidade.Por
isso falta de incentivos por parte dos políticos podendo mencionar a união a igualdade para que
possa banir as dificuldades enfrentadas pelos negros.
§ Isso nos mostra as condições de vida enfrentada pelos negros e só nos resta admitir que não acaba
prejudicando se a raça negrae sim o próprio país.
<texto=049>§A política de cotas, levaria o Brasil a valorizar mais o negro, dentro da sociedade e faria
com que o país fosse visto de uma maneira diferente, onde não houvesse tanta descriminação e
injustiças.
§ momento em que nossos governantes passam uma confiança de que tudo pode mudar que o
mundo depende de nós, mas sabemos, onde houver descriminação o país se torna pobre, pois
precisamos nos unir para que a escola e faculdade seja caminho onde todos possam caminhar, sem
medo e com certeza de que tudo depende de como fomos educados.
§ Não devemos ter dúvidas que todos temos direitos iguais, caberia a sociedade apostar na cota,
dando assim direito aos negros de mostrar que vivemos em um país sem desigualdade, mais justo e
feliz.
<texto=050>§A criação de cotas para a entrada de negros na universidade é uma possibilidade que
acarretará na proliferação do preconceito.
§ No mundo competitivo em que vivemos, desde que nascemos somos separados e classificados
durante nossa vida precisamos mudar esta situação é realizando nossos ideais com força e coragem
que decidimos o caminho de nossas vidas.Estudar, ter uma profissão ser aceito por todos é nosso
mérito depende de cada um e não da cor de pele que temos se existissem médicos, advogados,
deputados, professores brancos poderia se dizer que os negros não tem capacidade de aprendizado,
mas como sabemos há pessoas de todos os tipos em todas as profissões.
§ Os negros se auto-preconceituam por isso quando não conseguem exercer uma atividade com
sucesso usam sua cor como escudo.Todo ser humano é dotado de inteligência independente de cor,
que alguns usam suas abilidades para benefício em sua vida e outros pensando que vão se dar
bem praticando coisas erradas, perante a sociedade,prejudicam a todos.
§ Por isso, o acesso as universidades deve ser livre e de competência de cada um sem benefício a
346
negros,brancos,ricos ou pobres.
TEXTOS DO GRUPO B
<texto=001>
Pessoas sofrem de deficiência física e mental são privilegiados por serem pessoas
extremamente especiais e necessitadas de cuidados excessivos.
Podemos observar isto como um caso em é extremamente necessário, não gostaria que as
pessoas apenas vissem por esse lado, mas também para o mundo em que um país de primeiro
mundo como os Estados Unidos em que existe uma diferença racial, assim como o sistema de cotas
que deve funcionar aqui no Brasil, aonde negros estariam recebendo um espaço em universidades e
concursos públicos, para possivelmente pagar uma divida em que nós mesmo enxergamos o erro,
isso não mudará a fome, diminuindo a violência ou a lavagem de dinheiro da corrupção política do
país, vai apenas pagar a divida do passado, mas continuará cego no presente em dar estas cotas
para pessoas de classes baixas, mas a capacidade é de cada um pela vontade de ser alguém, não
basta apenas uma oportunidade mas devemos aproveita-la, porque todos nós somos iguais, mas
capacitamo-nos através de nossas escolhas e esforços e objetividades de querer realmente lutar por
aquilo ou a lugar algum chegaremos se nós mesmos não buscarmos a nossa oportunidade.
<texto002><F><16-21>
Uma das maiores questões discutidas e destacadas dentro de toda sociedade é a discriminação
em diversos campos, como a racial.
rias leis são analisadas e até mesmo aprovadas, dando mais direitos aos negros, como por
exemplo, nos estudos, oferecendo melhores condições para entrar em uma faculdade.
Este assunto por sua vez gera polêmica entre todos, pois existem muitos a favor e muitos
contra. É uma questão tanto interessante e delicada, pois ter uma cor diferente não significa ter mais
dificuldades do que os outros. Todos devem ter as mesmas oportunidades e todos devem lutar, se
esforçar para garantir seu lugar no mundo, o resultado depende de cada um. Uma pessoa com
problemas físicos ou mentais deve ter oportunidades diferentes, mas uma pessoa de cor negra não
deve ser favorecida, pois isto não muda em nada, a dedicação que faz a diferea.
Estas leis, propagandas a favor dos negros, de uma forma ou outra, aumenta a desigualdade no
mundo, pois assim os colocam em uma posição inferior aos brancos que na realidade não existe isso,
a cor não interfere no esforço, na vontade, nos sonhos, brancos e negros o iguais, podem chegar a
qualquer lugar que desejar.
<texto003><F><32-36>
Até hoje se procura reparar os erros cometidos contra os negros durante muitos séculos, muitas
vezes por caminhos tortos, para se chegar a fins nem sempre tão positivo, como se propõem,
colocando a diferea da cor, ainda mais em evidência.
Nossos governantes propõem encontrar soluções, mas parece que ainda não reconheceu o
problema, que parece ser muito mais social do que racial, não se pode negar que existe preconceito
racial, mas tem que se considerar, e muito, os nossos problemas sociais.
Será que a melhor forma para incluir o negro na sociedade ou em uma sociedade que lhe seja
mais justa, basta que lhe garantam algumas costas de vagas nas universidades? Será que é só isso
que falta para que ele seja tratado com a dignidade que lhe é de direito? Será que ele entrando na
faculdade por cota e não por mérito, o preconceito das pessoas não será ainda maior?
Essas e muitas outras indignações, nós nos fazemos quando lemos essas propostas nos
jornais.
Aparentemente é muito pouco e soa muito falso esses projetos de inclusão, essa inclusão teria
que ser feita desde os primeiros anos de vida escolar para que não só o negro, mas todas as
pessoas que sofrem exclusão social tenham condição de concorrer com qualquer outra pessoa, de
igual para igual à sua vaga, na universidade, e tê-la, não porque tiveram “piedade”, mas por mérito.
<texto004><F><22-26>
O problema da exclusão não se baseia somente na raça negra nas universidades, mas sim em
um contexto geral e com todos.
347
E assim ao ser criado essa cota para negros, os mesmos acabam automaticamente se
excluindo e o pior sendo racista com as demais cores, raças, etc. Pois assim a cor negra ganha um
benefício, porém o Brasil e o mundo não se estendem somente neste preconceito.
No entanto esta lei vem ajudar os mesmos a reconhecer sua própria cor e servir de incentivo
para muitos estudarem, buscando assim uma vida melhor.
Porém estas cotas se limitam somente nas universidades e o que fazer até chegar lá? Pois já
que a lei busca uma igualdade o que fazer com o sistema de saúde, empregos para negros, pois se
há racismo este está em tudo e em todos.
O que deve se ter é uma lavagem cerebral, pois o ser humano está preso à desigualdade em
todas as áreas, e não se deve deixar se privar de cotas, pois estas é uma maneira de disfarçar o
racismo.
<texto005><F><16-21>
Ao mesmo tempo em que penso que sim também acredito que não, pois no Brasil existem
muitas pessoas que são discriminadas não só pela sua cor, mas sim, por tudo que saem dos padrões
de vida que eles consideram bons, essenciais.
Essas cotas estão dando mais direito aos negros para que eles percebam que não precisam se
prender a beleza, isso não importa, quer dizer, o que importa realmente é a capacidade e o esforço
de cada pessoa, para que possa ser alguém na vida e se superar perante essa sociedade
preconceituosa.
Mas também acredite que não resolverá o problema da exclusão no Brasil, pois existem
pessoas nesse mundo muito preconceituosas e interesseiras ainda. Algumas pessoas se aproximam,
não só dos negros, mas de todos que estão fora dessa sociedade que se diz perfeita, só porque é
inteligente, rico e que possa ser útil aquela determinada pessoa.
Infelizmente no Brasil, não só os negros estão pedindo em faróis e sendo violentados, mas
também os brancos estão cada vez mais se envolvendo nesse mundo de violência.
Esse preconceito com relação a que somente negros estão se envolvendo em crimes, não é
mais real, e isso é uma grande tristeza, pois todos sofremos com esse grande problema.
<texto006><F><16-21>
Cotas de pessoas com raça negra é um tema muito polêmico, visto que até que ponto ajuda
mediar o pré-conceito? Será que não aumenta?
Sendo posvel às vagas para concorrência de pessoas negras somente com pessoas negras é
à maneira de separação, ou seja, estamos cedendo para uma divisão e não para misturar. A
competência, inteligência está em cada ser, independente da cor da pele. Esse fator não pode ser um
critério para maior possibilidade de uma vaga e menos concorrência.
Se aceitarmos essa imposição, estaremos aceitando a divisão das raças, dessa forma
indiretamente o pré-conceito. A cor da pele deve ser apenas um fator biogico.
Portanto, não devemos aceitar essa divisão, de forma alguma, estamos sendo condicionados a
um tipo de julgamento errôneo. O que se deve levar em consideração é a capacidade.
<texto007><F><16-21>
Primeiramente vamos pensar na dívida que o Brasil tem com os negros há muitos anos, sem
dúvida isso faz uma enorme diferença em nossa sociedade, até hoje sofrem com algum tipo de
preconceito, e as cotas para negros em vestibulares é uma forma de desrespeito. Com certeza as
cotas é dar atestado de que nosso país é preconceituoso, dar cotas a alunos de escolas públicas sim,
é claro, é mais do que justo, mas do mesmo jeito, deveriam reformular o ensino dessas instituições, e
não simplesmente deixar com que seja fácil, para esses alunos, entrar em uma faculdade, seja ela
particular ou pública.
As cotas deveriam ter algumas regras consideveis como, por exemplo, um aluno, seja ele,
branco, negro, amarelo ou pardo ter freqüência de pelo menos 70% da sua vida estudantil em escola
pública. Dar cotas só porque o cidadão é negro é errôneo, assim o Brasil carimba o seu atestado
preconceituoso. Perante as leis somo todos iguais, sem distinção de raça, cor, sexo, idade ou
qualquer tipo de discriminação.
348
o é certo que só porque o Brasil tem uma “dívidacom os negros desde a época da
escravidão, paguemos com certas facilidades para eles no dia-a-dia.
A política de cotas para negros nunca ajudará a resolver a problemática de exclusão social.
O problema de educação do Brasil não está em ter cotas em vestibulares, mas sim que o ensino
público está sucateado.
<texto008><F><16-21>
A desigualdade está focada em todas as sociedades e por todos os indivíduos, esta palavra “a
desigualdade” é causadora de muitos debates e gera muita polêmica em torno dela.
Mas atualmente a polêmica que está gerando muitas discussões é a criação de cotas para os
negros ingressar na universidade, uma proposta do governo para resolver o problema educacional.
Será que isso ajudará a resolver este problema social ou invés de revolucionar o Brasil, este
preconceito não vai gerar mais discriminação dentro do estabelecimento onde os negros vão
ingressar, pois vai haver um efeito negativo entre os colegas porque a cor negra entrou com mais
facilidade mais do que brancos e pardos.
O governo deveria investir mais na educação pública no ensino médio para que todos tivessem
uma oportunidade igual para irem mais preparados para o ensino superior, ser alguma regra, uma lei
para todas as crianças e as de baixa renda como de periferias possam se conscientizar de que a
educação é essencial para o futuro delas e do nosso mundo.
Se esta proposta for aprovada vamos supor que os negros se formem e saiam para exercer a
sua profissão lá fora e o preconceito estiver fora dessa universidade será que isso vai ajudar ou vai
piorar a situação?
Temos que mobilizar as pessoas para acabar de vez com este preconceito que está em todos
os lados e que muitos ainda não se preocupam, mas infelizmente se esta proposta for aprovada vai
provocar uma grande desigualdade.
<texto009><F><16-21>
O preconceito de forma geral é um assunto muito discutido dentro da sociedade, mas o
preconceito racial é o mais polêmico.
A política de cotas nas universidades do Brasil tem dividido muitas opiniões, penso que essa
política não ajuda a resolver o problema da exclusão educacional, pois a nossa sociedade busca hoje
a igualdade social, se buscamos igualdade como podemos dividir vagas nas nossas universidades
pela cor e raça dos indivíduos.
Isso de certa forma acaba incentivando as diferenças entre as raças e o preconceito racial. Os
próprios negros se excluem da sociedade.
Todos nós independente de raça, cor, religião, classe social temos capacidade de chegar onde
queremos, claro que alguns tem mais oportunidade, mas todos podemos nos esforçar para chegar
onde queremos e para realizar nossos sonhos.
Então, acredito que essa política de cotas não terá um bom resultado dentro da nossa
sociedade. O governo deveria se preocupar com a educação das nossas crianças, lutar contra o
preconceito e buscar a igualdade social.
<texto010><F><22-26>
tamanha discussão sobre cotas em faculdades públicas, para afros descendentes, que se
rotulam como cor desfavorecida, a maneira de seleção é completamente duvidosa e há também
muitos brancos miseráveis que sonham com uma formação profissional em nosso país.
A cor da peleo da provas concretas sobre sua descendência, sendo assim a maneira de
autorizão para se beneficiar da cota, deveria ser revista, pois muitos são injustiçados e muitos sem
precisão favorecidos.
Os negros desejam receber pela divida da escravidão que os brancos têm com eles, mas
também muitos de cor diversa que também sofre por nosso capitalismo consumista, pelo lado mais
favorável financeiramente.
349
Com esses argumentos podemos concluir que isso não resolveria o problema da educação no
Brasil, ao invés de criarem cotas por que não criarem universidades? Sendo assim, teriam
oportunidade para negros, brancos, amarelos, índios... Que se tenha um plebiscito para esta questão,
que os brasileiros reflitam sobre esta questão, livres de preconceitos e opiniões formadas.
TEXTOS DO GRUPO C
<texto001><F><16-21>
O preconceito é uma questão que nunca deixou de existir, principalmente o fato do racismo, que
agora vem sendo debatido nas universidades públicas para a questão de cotas para negros, um fato
que mostra claramente a divisão das raças.
Na história do Brasil sempre houve o preconceito racial, desde á escravidão até os dias de hoje,
no qual o debate agora é a implantação de cotas para negros nas universidades, esse fato ta gerando
grandes polêmicas. Mas se olharmos á fundo percebemos que esta forma de “igualdade” só es
trazendo mais a tona á desigualdade. Além de contrariar o artigo 5º da constituição brasileira onde diz
que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, não é isso q vai acontecer
com a implantação dessas cotas.
Foi feita uma pesquisa na universidade do Rio de Janeiro em 2001, para o reconhecimento da
cor, julgadas pelos próprios alunos, o resultado mostrou que somente 24% se reconhecerem como
negros ou pardos o que comprova que os estudantes não estão preocupados em se declarar negro,
pois isso pode dar um tom racista. A diretora da editora Yvonne Maggue salienta que essa tais cotas
correm o risco de exaltar a desigualdade no lugar da igualdade.
Contudo fica claro que não é criando vagas reservadas para negros, que vai resolver o
problema da exclusão educacional no Brasil. Mas ouvir seriamente a opinião do rapper Xis, que diz
“antes de pensar na universidade, é preciso dar estrutura a essas famílias”. Seria uma forma de
igualdade.
<texto002><F><16-21>
Uma nova questão que vem sendo muito discutida e é a causa de muita polêmica, coloca nossa
sociedade no meio de duas situações: a adoção ou não do sistema de cotas para afro-descendentes.
Esta medida que pareci primar pela inclusão destas pessoas é apenas imediata, pois quando
não se melhora o ensino público o que acontece são estas novas soluções que não corrigem o
verdadeiro problema que é a falta de recursos para a melhora do ensino.
O que deveria ser levado em consideração é a revisão do ensino público, proporcionando e
capacitando as referidas pessoas em questão, para que os mesmos se mantenham em igual
patamar, sem necessitarem de cotas para entrarem em faculdades ou cargos públicos.
Sendo assim a política de cotas apesar de resolver os problemas presentes, a longo prazo não
é favorável, prevalecendo assim a melhoria do ensino público que é na verdade o nosso real
problema na sociedade de hoje em dia e que merece ser revisado para se evitar este tipo de medida,
como a de cotas para afro-descendentes.
<texto003><F><16-21>
A criação de cotas no Brasil tem gerado uma grande polêmica, a mesmo entre os afro-
descendentes, no acesso a universidades e a empregos públicos.
Algumas pessoas acreditam que a criação de cotas é um meio de mostrar que os direitos não
o iguais para todas as pessoas, que isso é uma forma de desenvolver ainda mais o preconceito.
Outras acreditam que as cotas é uma forma dos negros começarem a retomar o seu espaço que foi
invadido por “brancos” na época da escravidão, e que as pessoas estão reconhecendo que o
desenvolvimento da população negra sempre esteve preso aos brancos, e que isso seja um modo de
fornecer um pouco de estrutura para que os negros possam ter direitos iguais.
muito tempo já era para alguém ter feito algo pelos que sofrem preconceito, e esperamos
que isso aconteça agora, pois já esperamos muito para termos direitos iguais.
350
<texto004><F><16-21>
anos o Brasil enfrenta um sério problema, o preconceito racial. Principalmente no que se
refere à educação. A maioria da população vê os negros como se fosse um mendigo, catador de
lixo... Não consegue ver a capacidade que existe dentro deles, são seres humanos como quaisquer
outros.
Segundo a diva soul brasileiro, “Paula Lima”: “a questão das cotas é um tanto delicada,
complicada e complexa: ora considero uma boa solução, ora tenho dúvidas”, este assunto é bem
polêmico, pois muitos de nós conseguimos ver a aparência, não a essência das pessoas. O sistema
de cotas nos mostra bem isso que devemos dar oportunidades a todas as raças e etnias. Onde os
negros têm direito de desfrutar do mesmo “paraíso” que um branco, amarelo, pardo desfruta.
Chegou à hora de deixarmos este preconceito de lado e sermos mais compreensivos. Chega de
viver neste “mundinhodo “eu”. É hora de abrirmos nossos olhos e enxergar o mundo onde os afro-
brasileiros são cidadãos como cada um de nós.
<texto005><F><16-21>
É fundamental ter uma posição sobre o preconceito racial no Brasil, porque são valores éticos e
morais que estão sendo discutidos diariamente por alunos, professores e diretores de varias
instituições de ensino, sobre cotas para negros.
O preconceito racial é manifestado pelo indivíduo, principalmente, a partir de sua educação
familiar, mas esse não é o único fator. A sociedade em geral, a mídia e até crenças o fazem agir
assim. É o senso comum, o pré-conceito que temos de tudo e de todos.
E esse preconceito não é só visto de um homem branco por um homem negro, mas também de
um negro para um branco. O seu pensamento é sem esperança, porque tem a certeza de que as
coisas são assim e nunca irão mudar. Mas a história nos dá esperança, quando vemos que aqui no
Brasil, temos exemplos de negros que lutaram por uma vida melhor e venceram. São exemplos vivos
dessa luta Edson Arantes do Nascimento, o nosso rei do futebol Pelé, e também Gilberto Gil o
ministro da cultura, entre todos.
Mas o que vemos nessas vidas com tantas guerras e batalhas? As esperanças, as lutas e a
dedicação ao que todos querem: viver com dignidade. A esperança, a confiança e a determinação
o requisitos indispensáveis nessa guerra a favor das cotas para negros.
É preciso que as autoridades competentes reorganizem o sistema educacional do país, não só
sobre cotas, mas também em toda a sua estrutura, para que essa guerra seja vencida.
<texto006><F><27-31>
No Brasil, como em todo o mundo, existe preconceito racial e social. É difícil lutar com tais
situações, porém, na tentativa de sanar ou pelo menos amenizar o problema a comissão de
constituição decidiu pelo sistema de cotas para negros e pardos nas universidades e empregos
públicos.
O sistema favorece afro-descendentes e estudantes de escolas públicas que, por tem uma
educação básica deficiente, estariam em desvantagem em relação aos concorrentes melhores
preparados em colégios particulares.
quem diga que programas de política da cor privilegiam apenas negros e excluem a
preocupação com idade ou opção sexual acirrando assim o preconceito.
Ninguém se assume preconceituoso, no entanto, a igualdade sem distinção perante a lei fica
apenas nas páginas da constituição brasileira.
Governantes deveriam ampliar o projeto incluindo todos os tipos de menos favorecidos pela
sociedade como pessoas de idade avançada, trabalhadores, es solteiras e moradores de áreas
rurais e cidade pequenas.
<texto007><F><22-26>
351
O sistema de cotas é um assunto muito polêmico e delicado e que gera muitas discussões, uns
o á favor, outro contra, a verdade é que a sociedade está dividida.
A criação de cotas foi um meio superficial que se achou para resolver este problema tão serio
que é o preconceito racial. Se o governo implantasse um sistema de educação digno e decente que
tivesse uma estrutura forte e uma base firme, com profissionais para ensinarem nas escolas a
igualdade racial, e se banissem da mídia o preconceito, pois o negro não aparece com tanta
freqüência nas propagandas quanto os brancos, aí sim a sociedade começaria a esquecer e a tirar da
cabeça a idéia absurda de que o branco só por ser branco, é superior, ou melhor, em alguma coisa
que o negro.
A cor, raça ou a religião não vai contar pontos na hora do vestibular, a capacidade o esforço, a
determinação e dedicação da pessoa e que faz a diferea na hora de ingressarmos na faculdade, e
isso todos nós temos igualmente seja branco, ou seja, negro.
<texto008><F><22-26>
No primeiro momento houve um grito de alegria, o ar de vitória tomou conta dos que a tempos
sofriam maior preconceito.
Foi concebido o direito de cotas para negros em universidades.
Nunca deixamos de lembrar da escravidão, da dificuldade e luta pela abolição e após esse fato
histórico, batalhas contra a discriminação foram sendo conquistadas.
É um direito de todos os cidadãos brasileiros escrito na constituição de educação, saúde,
moradia, alimentação... O nimo para sobrevincia. Mas, hoje a realidade é bem diferente, o poder
está descentralizado e o país não faz a sua obrigação omite esses direitos.
E vem através de programas sociais, tentar regularizar a situação, as cotas foi gerada para
esconder um defeito na escolarização fundamental que não consegue atingir 6,0 de média na ultima
avaliação realizada em maio no Paraná.
Portanto seria justo que todos tivéssemos um aprendizado de níveis elevado, de boa qualidade
assim ninguém achava que está sendo prejudicado, mas enquanto isso não acontece cada um luta
pelos seus direitos e tenta sobreviver perante as desigualdades sociais que assolam nossa terra.
<texto009><M><16-21>
É de conhecimento de todos, o grande problema das cotas no Brasil.
Nessas últimas décadas, têm se discutido muito a questão das cotas em universidades públicas
do país, onde 80% das vagas se dirigia para negros vindos de escolas públicas, pois isso vêm-se
tornando polêmica no Brasil, sobre a questão da igualdade, mas é de extrema importância ressaltar
que o país sofre desses problemas desde a colonização onde os negros eram submissos aos
brancos.
Por outro lado, os negros estão sendo banalizados pelos políticos brasileiros, porque há uma
grande deficiência na política pública, pois a educação foi “abandonada”, não temos ensino de
qualidade, para os jovens negros que querem ingressar numa universidade.
Ainda convém lembrar que a constituição brasileira garante á igualdade de cotas perante a lei,
mas em contra partido isso não ocorre na prática, são só teorias, que não sai do papel, pois isto é um
problema histórico do Brasil, onde a desigualdade é constante.
Em vista disso, os negros vêm sendo tratados como minoria nesta sociedade capitalista, nessas
alturas as cotas resolvem o problema, mas o que deveria ser feito na realidade é uma reciclagem na
educação brasileira, pois se nós não raciocinarmos e refletirmos sobre essa questão dos negros na
sociedade,o chegaremos a consenso nenhum.
<texto010><M><16-21>
muitos anos os negros são discriminados e excluídos de algumas ocupações na sociedade,
mas de alguns anos pra cá o governa está, então para ajudar na inclusão dos negros a sociedade
criaram as cotas.
As cotas são vagas especiais para negros, em faculdades e cargos públicos. Mas será que isso
352
vai resolver os problemas de excluo educacional e social.
Mas o que realmente importa é, será que todas as pessoas negras pensam assim. E talvez eles
queiram ser reconhecidos pelo que são, ou por ser negro que entrou para a faculdade por cotas e
depois conseguiu um emprego por cotas.
As cotas não é a solução, e sim, o esforço para conseguirem o que querem.
TEXTOS DO GRUPO D
<texto=001>
Atualmente várias pessoas sofrem com a falta de segurança tanto por causa de crimes ilegais
ou por mortes; facções e o terrorismo são as principais causas desses crimes ilegais.
O terrorismo age impulsionado pelo patriotismo, segue-se o dever, a obediência a causa em
que se acredita, sendo que para os terroristas de extrema não ligam de morrer pelo ideal que
acredita.
As organizações Criminosas querem lucro e poder, se interessam pelo tráfico de drogas, de
armas e o contrabando. Muitas pessoas são vitimas deste comércio ilegal, quando não são usuários
de drogas, trabalham para o crime organizado.
Tanto terroristas quanto ao crime organizado matam inocentes, desses sendo vitimas da
miséria, pessoas morrendo feridas e mortas por seus semelhantes.
As organizações criminosas se destroem umas as outras por causa de poder, referências, e por
causa do comércio ilegal.
Existem diferenças e semelhanças entre o terrorismo e o crime organizado, mas os mais fracos
semelhantes e que sofrem as conseqüências.
É por falta de uma fiscalização mais rigorosa é que se agem essas facções e que famílias são
dizimadas sem que se faça algo para evitar
<texto=002>
Está cada vez mais difícil viver em um mundo onde o terrorismo e o crime organizado andam
lado a lado, acabando com famílias e vidas inocentes.
O terrorismo vem crescendo a cada dia, pessoas da alta sociedade, como líderes políticos,
morrem por causa do egoísmo e sede de vingança de outros que não conseguiram alcançar tal
status. Matam até mesmo pelo prazer de ver pessoas sofrendo.
O crime organizado também vem se espalhando e crescendo a cada dia. Homens, mulheres e
até crianças colocam suas vidas em risco, se envolvendo e trabalhando a favor do crime;
comercializando armas ilegais e vendendo drogas, para conseguir dinheiro. Muitas vezes colocam a
própria vida em risco se envolvendo em brigas de gangues e conflitos entre policiais e criminosos.
A grande semelhaa entre o crime organizado e o terrorismo é que ambos matam, destroem
vidas e famílias por ambição, dinheiro e poder.
Isso é uma vergonha uma total falta de educação e respeito para com os seres humanos, que
não merecem tal humilhação.
<texto=003>
Em busca de poder, muitas vezes em benefício do próprio país, terroristas matam, ferem
pessoas, planejam crimes organizados.
No entanto, o terrorismo hoje resulta em violência, mortes, pessoas sem moradias; os crimes
organizados, por sua vez, matam, atacam, seqüestram gerando grandes transtornos a população,
porém muitas vezes são formados de jovens, principalmente os de baixa renda, pois sem
conhecimento, sem escolas, jogados nas ruas e favelas acabam entrando para o mundo do crime,
entretanto, existem também terroristas que se organizam buscando a libertação nacional, e a
libertação de territórios.
Com isto, a violência aumenta cada vez mais; o estado de tomar os recursos necessários, para
que sejam usados na diminuição dos crimes organizados. Se nada for feito de concreto para acabar
com o terrorismo, sairão vitoriosos e desperdício de recursos e a violência.
<texto=004>
Podemos citar uma semelhança entre o terrorismo e o crime organizado, que a cada dia que
passa pessoas inocentes são mortas por terroristas e também pelo crime organizado
A diferença que podemos citar do contexto é que há muitos jovens menores de dezoito anos
envolvidos nessa parte do crime organizado, mas a maioria dos jovens menores de dezoito anos são
353
presos pelo envolvimento com drogas, do que com envolvimento com armas ao contrário do
terrorismo, que muitos dos envolvidos são pessoas maiores; indivíduos que um dia foram líderes
terrorista hoje o presidentes e primeiros-ministros.
Devemos lutar contra o terrorismo e contra o crime organizado.
Nosso mundo merece um pouco de paz, e (não) segurança e menos violência
<texto=005>
As semelhanças e diferenças entre o terrorismo e o crime organizado são várias, o crime
organizado não causou tanta destruição e morte igual o terrorismo, as organizações terroristas como,
por exemplo, a Al Qaeda comandada por Osama Bin Laden, causou uma enorme destruição nos
Estados Unidos nos ataques de 11 de setembro de 2001, destruindo as duas torres gêmeas, com o
ataque aéreo de pilotos suicidas, dois dos três aviões seqüestrados bateram nas torres gêmeas, e um
de menor porte caiu sobre o pentágono. Esse é só um dos vários exemplos que se pode citar sobre o
terrorismo;
Já o crime organizado já não tem todo esse poder de destruição, mas também causa muita
morte, o crime organizado (já não) acontecem principalmente nas favelas grupos de jovens e
adolescentes se envolvem com o tráfico, mas não é o consumo de drogas que levam a matar os
rivais e sim o comércio, as favelas são um campo de guerra pondo em risco a vida de várias pessoas
inocentes.
<texto=006>
O aparecimento do terrorismo surgiu através de ataques suicidas, que acabou com pouco apoio
da população, por não ser o jeito certo de conseguir o poder.
Como vemos diariamente em televisão, jornais. Ataque suicida deixa 20 pessoas mortas. É aí
que surgi, o crime organizado, a sociedade se junta para obter o crime.
Iraque arma um crime organizado, e explode a torre Gêmeas nos Estados Unidos no dia 11 de
setembro de 2001, aí que surgi terrorismo.
Apesar do terrorismoo ser o meio de preocupação para nós. Por não existir em nosso País.
Temos que fazer alguma coisa uma manifestação. Se isso não acabar pode até acabar atingindo nós.
<texto=007>
Ouvimos muito falar em terrorismo e crime organizado, estas palavras já se tornaram muito
comuns em nosso dia-a-dia. São poucas as diferenças e muitas as semelhanças entre uma e outra.
O terrorismo é uma palavra que há vários significados, são pessoas contratadas para matar,
movimentos para mudar o regime de um país, pessoas que acabam tornando-se importantes em seu
país por tais envolvimentos, agora, o crime organizado não, o cometidos geralmente por pessoas
de baixa renda, moradores de comunidades pobres, que entram nesse conflito como única e última
opção de vida.
Essas guerras sangrentas o se tornando maiores a cada ano, a morte é a maior semelhança
entre o terrorismo e o crime organizado, os dois estão ligados ao capitalismo e a liderança, cada um
de sua maneira, mas com propósitos e expectativas semelhantes.
Enfim, os temas citados acima são gerados muitas vezes por ganância e falta de justiça,
pessoas que entram e não conseguem mais sair.
Esperamos que as pesquisas mudem suas estatísticas e que o percentual de mortes sejam
menor.
<texto=008>
O poder está sendo causa de guerra, conflitos em nosso mundo, não só hoje, mas no decorrer
da hisria da humanidade.
o se importam com conseqüências, com o próximo e nem consigo mesmos. Como é o caso
de terroristas que se suicidam junto as suas ações de destruição, onde o mandante está com o poder
e vivo.
Acontece também nas favelas aonde inocentes morrem por balas perdidas, outros são
induzidos ou obrigados a matar.
Entram em um caminho sem volta, onde se encontram confusos, como se fosse feita uma
lavagem cerebral, defendem seus mandantes com “unhas e dentes”.
Todos lutando para alcançar o poder, intenções diferentes, mas infelizmente “poder”, que será
entregue ao mais forte.
Uns querendo incutir seu lema, dominar países, estabelecer sua ideologia.
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Outros impondo seu território, seu governo, derrubando a concorrência no tráfico, dominando
seu espaço.
Lutam pela ambão de riqueza, soberba, sem se importar com o mais belo dos poderes que
fomos presenteados: a vida.
<texto=009>
Tanto no passado quanto no presente, o terrorismo e o crime organizado são dois temas muito
discutidos por todos. Não se sabe qual é o pior. È matar e estar morrendo ao mesmo tempo.
As pessoas já se cansaram de assistir, ler e ouvir sobre o terrorismo e o crime organizado, pois
é um tema muito discutido não só entre a alta sociedade, mas entre toda a população mundial que se
sente muitas vezes ameaçada.
o se sabe qual é o menos prejudicial, pois tanto um como o outro trazem grandes prejuízos, o
terrorismo destrói, feri e mata, muitas vezes em grande quantidade, enquanto que o crime organizado
também matando, destruindo e ferindo, acontece em menor quantidade referente à vidas.
Além disso, quem mata está ao mesmo tempo morrendo no terrorismo homens e adolescentes
se matam para matar os outros, e quem comete o crime organizado, pode também morrer naquele
momento ou então passar o resto de sua vida e morrer na prisão.
Em virtude dos fatos citados, o terrorismo e o crime organizado prejudica muito a todos, não por
destruir lares, acabar com trabalhos e outros fatores relativos à bens, mas sim por acabar com vidas.
<texto=010>
Vivemos em um mundo sem paz, amor, compreensão, honestidade, onde o terrorismo e o crime
organizado prevalecem, fala mais alto o poder, e por amor a própria pátria.
o pensam dois segundos para saírem atirando e explodindo, carros prédios, aviões e
cidades.
Enquanto isso num piscar de olhos faz com seus amigos, companheiros, o que Deus nos deu
com muito amor.
Por isso o crime organizado vive em conflitos para ter o poder.
Matam, seqüestram, roubam, dominam a polícia, as favelas, os morros, tomam posse de seu
habitat.
Mesmo quando vão presos continuam organizando seus grupos de apoio para suas demandas.
Os grupos terroristas e o crime organizado são grupos bem estruturados, bem planejados, que
as leis não conseguem dominar, e com isso seus grupos vão fortalecendo, com armas mais potentes
como míssil e assim por diante.
Saem preparados para morrer ou matar, onde possam defender seu território de negócio.
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