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serem beneficiadas pela escolarização. Conclui-se, então, que a escola
deve “compensar” o que falta à família, e a crianças são consideradas
como sistemas deficientes. Se, pelo menos, os pais fossem interessados
nas coisas boas que oferecemos, se, pelo menos, fossem como os pais da
classe burguesa, então poderíamos cumprir com nossa tarefa... uma vez
compreendido o problema mesmo implicitamente, dessa maneira, torna-
se,então, oportuno forjar expressões como “deficiência cultural”, “deficiência
lingüística”, etc... E se pode ficar à espera que esses rótulos cumpram cada
um com seu triste dever.
Ao atribuir a culpa pelo fracasso escolar às crianças provindas das camadas
populares e buscando justificar seu insucesso escolar, as teorias educacionais
correntes mencionavam que estas são deficientes culturais, sofrem carência e
privação cultural, terminologias que contribuíram com uma imagem negativa das
crianças de classe baixa, além de reforçar preconceitos que vieram a aumentar
ainda mais as desigualdades dentro da escola.
Mais uma vez as práticas de avaliação tiveram papel decisivo na rotulação
destas crianças, já que, estritamente padronizadas a certo nível cultural, partiram da
homogeneidade e da comparação. Em outras palavras, as práticas de avaliação
partiam de um padrão que era considerado normal, e com isso abriu-se espaço para
que existisse o diferente, o anormal.
Essa diferenciação entre o que é normal e o que é anormal na escola, que
tinha como instrumento de medida a avaliação, favoreceu ainda mais a criação de
preconceitos e rótulos, identificando e justificando o insucesso daquelas crianças que
não conseguiam adaptar-se à cultura privilegiada nos currículos escolares.
Com esse tipo de prática avaliativa, ao invés da escola proporcionar o
crescimento cultural e a inserção do indivíduo às diferentes realidades objetivando a
construção do conhecimento a partir da diversidade, num processo de construção
coletiva com respeito às diferenças, ela passa a negar a sua principal finalidade,
destruindo na criança o prazer de freqüentar a escola e participar deste ambiente.
Nesse sentido, Charlot (1985, p.87) afirma que a escola apresenta-se ao
mesmo tempo isolada e adaptada ao meio social em que está inserida, pois
[...] a escola é acusada de servir aos interesses econômicos e sociais da
classe dominante, de cuja ideologia assegura a transmissão e expansão;
sob este ponto de vista, a escola não está inadaptada, mas demasiado
adaptada à sociedade atual. Encontram-se, portanto, denunciados, ao
mesmo tempo, o isolamento da escola face ao meio e sua subordinação
ideológica a este último.