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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO – EAESP
MARCELO BRUTO DA COSTA CORREIA
ABORDAGENS INSTITUCIONALISTAS DAS
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: AS EXPERIÊNCIAS DA INGLATERRA E
DE MINAS GERAIS
SÃO PAULO
2008
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MARCELO BRUTO DA COSTA CORREIA
ABORDAGENS INSTITUCIONALISTAS DAS
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: AS EXPERIÊNCIAS DA INGLATERRA E
DE MINAS GERAIS
Dissertação apresentada à Escola de Administração
de Empresas de São Paulo, em cumprimento aos
requisitos para a obtenção do título de Mestre em
Administração Pública e Governo
Campo de conhecimento: Transformações do
Estado e Políticas Públicas
Orientadora: Profa. Dra. Regina Silvia Viotto
Monteiro Pacheco
SÃO PAULO
2008
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Marcelo Bruto da Costa Correia
ABORDAGENS INSTITUCIONALISTAS DAS
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: AS EXPERIÊNCIAS DA INGLATERRA E
DE MINAS GERAIS
Dissertação apresentada à Escola de Administração
de Empresas de São Paulo, em cumprimento aos
requisitos para a obtenção do título de Mestre em
Administração Pública e Governo
Campo de conhecimento: Transformações do
Estado e Políticas Públicas
Orientadora: Profa. Dra. Regina Silvia Viotto
Monteiro Pacheco
Data de aprovação: ___/___/___
Banca Examinadora:
__________________________________________
Profa. Dra. Regina Silvia Viotto Monteiro Pacheco
EAESP – FGV (Orientadora)
__________________________________________
Prof. Dr. Peter Kevin Spink
EAESP – FGV
__________________________________________
Prof. Dr. Carlos Ari Vieira Sundfeld
EAESP - FGV
Dedicatória
A Patrícia, companheira de todas as horas, fonte inesgotável de amor e compreensão no
período em que me dediquei a este trabalho; e a meus pais, Júlio e Maria das Graças,
responsáveis por minha formação e apoiadores incondicionais desta minha incursão pela
vida acadêmica.
Agradecimentos
Dificilmente este trabalho teria sido possível sem o apoio de minha orientadora, Regina
Pacheco, que em todo o momento me estimulou a enfrentar o desafio de fazê-lo num
escasso tempo.
Sou grato também aos professores Carlos Ari Sundfeld e Fernando Luiz Abrúcio, pela
colaboração e pelas sugestões oferecidas por ocasião da qualificação da proposta de
dissertação, assim como aos professores e colegas da Escola de Administração de
Empresas da Fundação Getúlio Vargas, que muito contribuíram para meu
aprofundamento nas teorias e temas objeto deste trabalho.
Agradeço à CAPES e à Fundação Getúlio Vargas pelo suporte que me foi conferido no
período.
Não poderia tampouco esquecer o largo aprendizado profissional que me incentivou a
pesquisar os temas aqui tratados adquirido no Lima & Falcão Advogados, ao qual
agradeço no nome dos sócios e amigos Amílcar Falcão e Tiago Lima e dos colegas do
Departamento de Direito Administrativo, Rodrigo Miranda, Luciana Fujino, Rodrigo
Araújo, Aldem Jonhston, Daniel Mayer e Natália Gomes.
Reconheço a paciência e compreensão com minha ausência das gravações dos amigos do
“Café Colombo – seu programa de livros e idéias”, Eduardo Maia, Ketinaldo José,
Marcelo Sandes e Renato Lima.
A Patrícia Souto Maior, Priscila Souto Maior e Júlio César da Costa Júnior dou todos os
créditos pela formatação dos gráficos utilizados neste trabalho. Os sobrinhos Letícia, Luiz
Felipe e Matheus também muito me ajudaram, ainda que involuntariamente, a superar
com divertimento os momentos de maiores preocupações enfrentados.
Finalmente, agradeço a companhia e conversas inteligentes de almoços de meus irmãos
Fernanda e Romero.
RESUMO
Parcerias Público-Privadas representaram um dos pilares das Reformas do Estado
internacionalmente. No Brasil, modalidades de parcerias foram introduzidas durante o
curso dos anos 90, culminando com a aprovação da Lei das Parcerias blico-Privadas,
instituídas com o objetivo de estimular investimentos em infra-estrutura após a primeira
etapa de privatizações e concessões, sob a inspiração da experiência britânica de Private
Finance Initiative.
O aparente isomorfismo sugerido pelas melhores práticas internacionais, contudo, não
raramente obscurece variedades histórico-institucionais que influenciam o desenho das
PPPs entre os países, em especial a estrutura de incentivos e a credibilidade de longo
prazo dos contratos.
O objeto deste trabalho é discutir como a literatura institucionalista de diferentes tradições
teóricas sociologia, economia e ciência política explica a interação entre o ambiente
institucional e as estruturas de governança das parcerias, modulando suas características e
influindo nos resultados. Ao fim, descreve, à luz da experiência britânica de parcerias, a
implantação do programa de PPP no Estado de Minas Gerais, ilustrando variáveis e
hipóteses extraídas da literatura.
Palavras-chave: Parcerias Público-Privadas; Instituições; Reforma do Estado; Infra-
Estrutura; Concessões; Contratos; Minas Gerais (estado).
ABSTRACT
Public-Private Partnerships have been one of the pillars of the reforms of the state
internationally. In Brazil, types of partnerships have been created during the course of the
90s, culminating with the approval of the law on Public-Private Partnerships, established
with the objective of encouraging investment in infrastructure after the first stage of
privatizations and concessions, under the inspiration of the British experience of Private
Finance Initiative.
The apparent similarity suggested by the best international practice, however, not rarely
obscures historical and institutional varieties that influence the design of PPPs between
countries, in particular the structure of incentives and credibility for long-term contracts.
The object of this discussion is to inquiring how the institutionalist literature of different
theoretical traditions - sociology, economics and political science - explains the
interaction between the institutional environment and the structures of governance of
these partnerships, modulating its features and influencing the results. After, describes, in
the light of the British experience of partnerships, the deployment of PPP programme in
the state of Minas Gerais, illustrating variables and assumptions drawn from the literature.
Keywords: Public-Private Partnerships; Institutions; Reform of the State; Infrastructure;
Concessions; Contracts; Minas Gerais (estado).
LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Estrutura do Project Finance
Figura 2: Relações público-privado em infra-estrutura
Figura 3: Curva de maturidade das PPPs
Tabela 1: Características das PFIs
Figura 4: Formas de Propriedade e Modelos de Gestão na Reforma Gerencial de 1995
Tabela 2: Taxas de Crescimento de Indicadores de Infra-Estrutura (em %)
Tabela 3: Investimentos públicos em Infra-Estrutura no Brasil por Setor 1981-1990 (% do
PIB)
Tabela 4: Objetos das modalidades de contratação
Tabela 5: Carteiras de Projetos no Brasil
Tabela 6: Níveis de Análise Institucional
Figura 5: Instituições Políticas, processo de formulação de políticas e outcomes
Tabela 7: Fundamentos teóricos dos institucionalismos
Tabela 8: Estado Positivo e Estado Regulador
Tabela 9: Difusão horizontal das reformas regulatórias
Tabela 10: Variáveis institucionais na ECT
Tabela 11: Problemas de coordenação nas variedades de capitalismo
Figura: 6: O Modelo de Gestão Mineiro
Tabela 12: Tipologia de contratos e estruturas de gestão
Tabela 13: Incentivos Ex Ante nas Teorias Econômicas
Tabela 14: Coordenação Ex Post na ECT e na Teoria dos Contratos Relacionais
Tabela 15: Precedentes jurisprudenciais sobre concessões
Tabela 16: Projetos PPP/MG
Tabela 17: Estrutura dos Processos Licitatórios
Tabela 18: Estrutura de incentivos
Tabela 19: Alteração contratual
Tabela 20: Credible commitments
Tabela 21: Resolução de conflitos
SUMÁRIO
1.Introdução........................................................................................................................9
2. Parcerias Público-Privadas.
2.1. Origens Históricas e Teóricas......................................................................................12
2.2. As PPPs como estruturas de governança: o caso das PFIs..........................................23
3. Reformas e infra-estrutura no Brasil
3.1. A reforma gerencial.....................................................................................................38
3.2. A participação privada em infra-estrutura: PPPs em sentido
amplo..................................................................................................................................41
3.3. As PPPs em sentido estrito..........................................................................................46
4. Fundamentos teóricos dos institucionalismos.
4.1.Institucionalismos e trajetórias de reforma..................................................................56
4.2. O isomorfismo institucional: explicações econômicas e sociológicas........................58
4.3. A adaptação institucional: a explicação da economia dos custos de transação...........61
4.4. A resiliência institucional: os limites das reformas no institucionalismo histórico....65
4.5. As tradições teóricas em diálogo.................................................................................68
5. Regulação estatal e gestão privada na infra-estrutura desenvolvimento teórico e
aplicação das abordagens institucionalistas.
5.1. As origens teóricas das PPPs: a construção do Estado Regulatório............................70
5.2. O ambiente institucional: as regras do jogo................................................................77
5.3. A estrutura de governança das PPPs: o jogo em disputa.............................................88
5.4. A complementaridade entre ambiente institucional e estruturas de governança.......102
6. O contexto histórico-institucional e a implantação das PPPs em Minas Gerais.
6.1. O ambiente institucional............................................................................................107
6.2. O caso Minas: reforma do Estado e a implantação das PPPs....................................119
6.3. As PPPs em Minas Gerais.........................................................................................130
7. Conclusão: complementaridade institucional e considerações sobre o caso
Minas...............................................................................................................................143
8. Referências Bibliográficas.........................................................................................149
9. Apêndice......................................................................................................................163
9
1. INTRODUÇÃO.
A análise institucional, objeto de literaturas da sociologia (DI MAGGIO e POWELL,
1984), da economia (NORTH, 1990; WILLIAMSON, 1991; LEVY e SPILLER,
1996) e da ciência política (COX e MCCUBINS, 2001; PIERSON, 2004), tem
influência marcante nos estudos sobre as reformas do Estado, oferecendo explicações
para os padrões de convergência e diversidade de trajetórias percorridas e estratégias
adotadas pelos reformistas.
Os arranjos criados para a provisão de infra-estrutura pública por intermédio
da participação privada das mais marcantes vertentes entre as transformações das
últimas décadas - podem ser examinados por meio de hipóteses extraídas dessas
literaturas: primeiro, por sua abrangente difusão, a sugerir padrões de isomorfismos
que desafiam barreiras histórico-institucionais; segundo, pelos variados resultados
encontrados, que aguçam explicações para a existência de diferenças no seio do
reformismo.
O presente trabalho objetiva apresentar a discussão institucionalista sobre as
Parcerias Público-Privadas em infra-estrutura, com ênfase no modelo brasileiro de
PPPs corporificado na Lei Federal n. 11.079/2004, que, em fato, complementa o
marco jurídico das concessões de serviços públicos, disciplinadas na Lei Federal n.
8.987/1995.
As vertentes de institucionalismo que amparam o trabalho são as do
institucionalismo sociológico (POWELL e DIMAGGIO, 1983), do institucionalismo
histórico (HALL e SOSKICE, 2001; PIERSON, 2004), das teorias econômicas do
agente-principal (JENSEN e MECKLING, 1976), dos contratos incompletos
(GROSSMAN e HART, 1986) e da nova economia institucional (NORTH, 1990;
WILLIAMSON, 1991; SPILLER e TOMMASI, 2005). Finalmente, as literaturas
sobre a reforma da gestão pública nos campos da Administração e do Direito
(POLLITT e BOUCKAERT, 2000; BRESSER PEREIRA, 2004; GRIMSEY e
LEWIS, 2004; SUNDFELD, 2005; PORTUGAL e PRADO, 2007) orientam a
discussão sobre as estratégias para implementação das PPPs e os dilemas a elas
subjacentes.
10
A escolha das PPPs brasileiras em sentido estrito como recorte para a
discussão teórica se justifica porque as parcerias tipificadas no marco legal mais
recente expandem os objetos e os atores envolvidos em contratos dessa natureza. As
concessões celebradas na década de 90 se concentraram majoritariamente em alguns
setores (energia, telecomunicações e rodovias) governados pela União e por poucos
Estados
1
; as PPPs, a seu turno, foram objeto da adesão de inúmeros entes federados,
abrangendo a prestação de serviços públicos econômicos deficitários e a prestação de
serviços não econômicos que envolvam o soerguimento de infra-estrutura pública. Em
suma, as PPPs em sentido estrito representam o recurso mais generalizado a uma
forma de parceria cuja estrutura econômica é nova para a maior parte dos agentes
envolvidos.
Ao cabo da exposição teórica, será descrita, em caráter exploratório e sem
pretensões de exaustão, a implantação das primeiras parcerias público-privadas no
Estado de Minas Gerais, a fim de ilustrar a forma de incorporação das PPPs neste ente
e de que maneira as instituições pátrias a medeiam, mitigam ou exacerbam os
dilemas subjacentes
2
.
Um olhar sobre a implantação do programa – com foco na escolha dos
primeiros projetos e seu desenho procura trazer pistas sobre os microfundamentos
das primeiras PPPs nacionais, vez que a Lei Federal foi objeto de vários estudos
nos campos da Administração Pública e da Economia, dentre os quais destacamos os
trabalhos de Souza e Savi (2006) e Gregg (2006), e do Direito, como Sundfeld (2005)
e Portugal e Prado (2007).
O Estado de Minas Gerais foi selecionado para ilustrar a revisão da literatura,
primeiro, porque o programa de PPP está inserto num projeto amplo de reforma
administrativa que abre oportunidade para a identificação de complementaridades
entre estratégias mais amplas de mudança e as estruturas de governança das PPPs. Em
segundo, pode-se estar diante de “caso desviante” (LIJPHART, 1971), eis que as
condições histórico-institucionais de Minas Gerais ofereceriam obstáculos para a
implantação de parcerias dessa natureza. O programa foi lançado, em 2003, num
1
Andrade (2005) menciona entre os Estados que geriram concessões rodoviárias Rio Grande do Sul,
Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia.
2
Trata-se, portanto, de descrição de caso com o intento de apurar variáveis apontadas pela literatura
(LIJPHART, 1971).
11
Estado que acumulava déficits fiscais, anunciara uma moratória de sua vida perante
a União e carecia de crédito, revelando, sob o aspecto da credibilidade, elevado
passivo histórico.
Para dar cabo deste trabalho, foram empregadas como técnicas de pesquisa
entrevistas semi-estruturadas realizadas com a Secretária de Planejamento e Gestão do
Estado de Minas Gerais, Renata Vilhena, e o Coordenador Geral da Unidade PPP
deste ente federativo, Luiz Antônio Athayde, e análise documental de diplomas legais,
editais e contratos.
Além desta introdução, o trabalho conta com mais seis capítulos. O
subseqüente apresenta o histórico, os conceitos e os desafios postos pela literatura a
respeito das PPPs, com ênfase no modelo britânico. O capítulo 3 discute as PPPs no
Brasil; no capítulo 4, são alinhados os fundamentos e tradições teóricas dos
institucionalismos. O capítulo 5 debate a literatura institucionalista aplicada à
regulação e à participação privada em infra-estrutura, enfocando a complementaridade
entre o ambiente institucional e as estruturas de governança contratuais. O capítulo 6
descreve trabalhos de corte institucionalista sobre o ambiente institucional nacional e
ilustra os problemas encetados com a descrição da implantação das PPPs em Minas
Gerais. Finalmente, o capítulo 7 formula as conclusões advindas da exposição
presentemente realizada.
12
2. PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS.
2.1. Origens Históricas e Teóricas.
A participação privada na operação de infra-estrutura pública tem inúmeros
antecedentes. Grimsey e Lewis (2004) enumeram entre eles os pedágios em estradas e
pontes no Império Romano e em cidades européias da Idade Média; as turnpikes
3
britânicas e americanas dos fins do século XVIII; o underground londrino do século
XIX; e as concessões francesas, como a do canal mediterrâneo-atlântico do século
XVII. No curso do culo XX, sobretudo após a década de 40, a participação privada
cedeu espaço para a intervenção direta estatal, em especial na Europa e na América
Latina. Novas formas de parcerias recrudesceram a partir da década de 70,
culminando com a difusão, particularmente nos anos 90, de diversos formatos de
parcerias entre Estado e iniciativa privada.
Além da diversidade de experiências históricas, contemporaneamente o
conceito de PPP é utilizado em sentidos abrangentes, compreendendo não apenas
arranjos voltados para o investimento em infra-estrutura, mas parcerias utilizadas para
outras finalidades. A expressão Public-Private Partnerships é normalmente utilizada
em sentido amplo, abarcando praticamente todo tipo de parceria entre Estado e
particulares. Segundo Portugal e Prado (2007) e Enei (2007), a esta flexibilidade do
termo em inglês corresponde uma maleabilidade dos instrumentos contratuais dos
sistemas de Common Law em que a variabilidade de tipos contratuais segue mais a
prática comercial do que tipologias legais
4
.
Hodge e Greve (2007), procurando relacionar as acepções da expressão,
enumeram cinco tipos de parcerias para as quais se emprega a expressão PPP: (i) joint
ventures para produção conjunta de bens e serviços, com compartilhamento de riscos
entre as partes; (ii) contratos de longo prazo no setor de infra-estrutura, com precisa
especificação de outputs; (iii) redes de políticas com relações informais entre
3
Assim eram conhecidas as rodovias pedagiadas.
4
A amplitude, no entanto, tampouco é superada em outras línguas: por exemplo, em Portugal, o
Decreto-Lei n. 86/2003, que instituiu o programa luso de PPPs, trata de concessão de obras públicas,
concessão de serviço público, fornecimento contínuo, prestação de serviços, gestão e, enfim,
colaboração (ZYMLER e ALMEIDA, 2005).
13
stakeholders; (iv) desenvolvimento de projetos em conjunto com sociedade civil e
comunidades locais; e (v) projetos de renovação urbana e desenvolvimento
econômico.
Há, porém, um contexto histórico que confere ao logotipo um sentido que
reúne um conjunto de programas assim nominados num sentido mais estrito trata-se
de PPPs destinadas a investimentos em infra-estrutura, isto é, construção, ampliação
ou reforma de ativos e prestação de serviços a eles associados, numa estrutura de
incentivos que lhe confere uma natureza particular. Esse contexto histórico concerne,
primeiro, ao desenvolvimento de novas estruturas de financiamento de projetos pela
iniciativa privada; segundo, ao processo de reforma do Estado que, no Reino Unido,
propiciou a criação de programa de PPP para infra-estrutura que, aproveitando a
experiência adquirida no financiamento privado de projetos, angariava suporte em
inovações reformistas e teorias microeconômicas que lhe reveste de significante
coerência. O presente trabalho, ao empregar o termo PPP de forma genérica, refere-se
a estes arranjos.
Referidos modelos de financiamento de projetos passaram a ser utilizadas na
década de 70
5
, primordialmente na Inglaterra, para a exploração de petróleo e gás
natural na plataforma continental britânica e no Mar do Norte, no que se nomina
project finance.
Através dessa modalidade de financiamento de projetos, o setor privado
desenvolvia modelos de negócios que viabilizavam a construção de infra-estrutura
predominantemente por intermédio da alavancagem de recursos financeiros e ao
abrigo de instrumentos de mitigação de riscos para empreendimentos vultosos.
Conforme resume Enei (2007;37), as características centrais das Project Finances
são:
a) Segregação do empreendimento: isolamento de um
empreendimento das demais atividades desenvolvidas pelo
patrocinador normalmente avançado via constituição de
sociedade de propósito específico que proveja a limitação de
responsabilidade de seus acionistas.
b) Alavancagem financeira: financiamento desse
empreendimento via capital próprio dos patrocinadores e
5
Yescombe (2007) menciona outra origem, mais remota, das project finances: nos campos de petróleo
do Texas, na década de 30. O próprio autor, no entanto, assinala que a difusão do modelo ocorre a
partir de seu uso na Europa, na década de 70. Enei (2007) também relata antecedentes históricos das
Project Finances.
14
dívida proveniente de mútuos ou outras figuras afins por parte
do financiador externo, normalmente com maior participação
do componente dívida.
c) Financiamento garantido pelo empreendimento: créditos
do financiador externo tendo como garantia principal as
receitas (recebíveis) e ativos do empreendimento e,
eventualmente, alguma garantia limitada dos patrocinadores
(mas nunca uma garantia integral ou direito de ação do credor
que possa alcançar ilimitadamente o patrimônio geral do
patrocinador).
d) Rede de contratos: conjunto de contratos coligados
celebrados com o objetivo de alocar responsabilidades e riscos
de forma clara, preferencialmente às partes que estejam aptas
a absorvê-los.”
Assim, a construção de empreendimentos de infra-estrutura poderia ser
executada através de uma sociedade de propósito específico SPE, entidade com
personalidade jurídica distinta dos patrocinadores do projeto, que obteriam
financiamento com garantia exclusivamente oriunda dos retornos do empreendimento
(no recourse) ou apenas parcialmente garantida pelo patrimônio dos patrocinadores
(limited recourse).
A SPE seria responsável por um conjunto de serviços integrados (bundling) -
projeto, construção, operação e manutenção cujos riscos seriam mitigados por meio
de uma rede de contratos firmados com consultores, subempreiteiros, seguradoras e
financiadores, aptos para assumir cada modalidade de risco de uma forma menos
custosa para o empreendimento. A estruturação clássica de uma PPP numa project
finance é ilustrada por Borges e (2002), apontando o nexo de contratos dessa
modalidade de financiamento de empreendimentos com SPE, patrocinadores,
financiadores, seguradores, operadores, construtores.
Figura 1: Estrutura do Project Finance
Adaptado de Borges e Sá e Faria (2002)
15
Embora nem todas as PPPs viessem a pressupor a estruturação de project
finance, esta modelagem de negócio abriu, para a iniciativa privada, a oportunidade
de executar grandes empreendimentos através de instrumentos mitigadores de riscos
e, ademais, combinando recursos próprios (equity) e de terceiros (debt) sem onerar
demasiadamente seu patrimônio, diversificando seu portfólio de investimentos. No
mesmo passo, criavam-se as condições para o interesse do mercado financeiro em
incluir em suas carteiras projetos voltados para a infra-estrutura
6
.A exploração de
infra-estrutura pública apresentava características propícias para project finances,
dados o porte elevado dos empreendimentos e a previsibilidade do fluxo de caixa e da
taxa de retorno, próprios de monopólios naturais (BORGES e SÁ E FARIA, 2002)
assim que a década de 70 assistiria a experiências em nível regional na Europa e nos
Estados Unidos de parcerias entre o Estado e a iniciativa privada para a reestruturação
de áreas urbanas, com inovações nas modelagens financeira e organizacional
também as privatizações da década seguinte, sobretudo no setor elétrico, fariam uso
dessas modelagens.
Na década de 80, viriam a ser impulsionados os processos de transformação
nos Estados que tinham, entre suas forças propulsoras, a crise fiscal que reduzia a
capacidade de despender elevados recursos em infra-estrutura. As práticas reformistas
se espalhariam particularmente a partir das inovações encampadas por Inglaterra,
Nova Zelândia e Austrália de paradigmas de gestão pós-burocráticos, abrigados pela
alcunha de Nova Gestão Pública (HOOD, 1991), que tinha entre seus nortes o
controle fiscal, a gestão por resultados, a introdução de parcerias com entidades
privadas (com ou sem finalidades lucrativas), a segregação entre formuladores e
provedores vinculados por intermédio de contratos e a flexibilização das relações de
trabalho no setor público
7
.
Entre essas transformações, estava presente nos anos 80 a instituição de
mecanismos de mercado (privatizações e terceirizações) com vistas a economizar
recursos do tesouro e obter ganhos de eficiência no setor público, assim como se
6
Yescombe (2007) oferece interessante relato sobre o amadurecimento do mercado de project finance
na Europa, o que permitiu a evolução da classificação dos empréstimos nesta seara pelo Bank for
International Settlements (BIS): enquadrados nos anos 80 como de risco relativamente alto, a partir de
2005 são considerados formalmente como de baixo risco.
7
Como se verá no capítulo 4, a agenda de reformas incorporou novos temas durante o tempo, assim
como apresentou variações entre os países.
16
procurava aproveitar a expertise e a capacidade inovadora da iniciativa privada
(POLLITT e BOUCKAERT, 2000). Apesar de, então, existirem experiências de PPPs
em plena vigência, sobretudo no setor rodoviário
8
(BULT-SPIERING e DWULF,
2006), seria na Inglaterra que as Parcerias Público-Privadas ganhariam status de
programa estruturado de forma abrangente, espraiando-se o formato econômico de
contratos regidos por incentivos e resultados por setores os mais diversos, como
saúde, educação, aeroportos, presídios, instalações administrativas em geral. Assim, o
programa britânico assimilava prescrições teóricas que influenciaram, nas décadas
pregressas, as privatizações e as terceirizações, como a regulação por incentivos e a
contratualização de resultados, originárias das Teorias do Agente-Principal, dos
Direitos de Propriedade e da Nova Economia Institucional discutidas no capítulo
cinco deste trabalho.
A extensão da estrutura econômica que caracteriza as PPPs para diversos
contratos celebrados pela Administração se com a criação das Project Finance
Initiatives - PFI, em 1992, introduzidas pelo governo conservador de John Major, e
em seguida absorvidas por seu sucessor trabalhista, o primeiro-ministro Tony Blair,
que as expandiu consideravelmente como marca da new left inglesa – até 2007
haviam sido contratadas mais de 700 PFIs (FLINDERS, 2005; HM TREASURY,
2006).
Como bem expõe Harris (2006), as PFIs como modalidade de contratação
correspondem, na Inglaterra, ao estágio culminante do processo que se iniciara nos
anos 1980 com as privatizações e a competição administrada, pontos polares que
representavam, respectivamente, a transferência da propriedade de ativos instalados
para a iniciativa privada e o envolvimento privado na operação de serviços
previamente prestados pelo setor público, impulsionado pela obrigatória licitação
de serviços internos (Compulsory Competitive Tendering CCT). As PFIs
completariam o marco institucional, conferindo “caráter sistemático do recurso à
contratualização” (COSSALTER, 2005; 444) ao processo reformista em prol da
cooperação público-privado na prestação de serviços públicos, sobretudo ao dilatar a
possibilidade de construção de novos empreendimentos isto é, de novos estoques de
8
Um dos exemplos são as concessões rodoviárias espanholas, que remontam às décadas de 60 e 70. A
França também manteve durante o século XX concessões no setor de saneamento.
17
infra-estrutura, conhecidos como greenfield. O gráfico a seguir ilustra como as PPPs
destinadas para novas instalações completavam o marco institucional das relações
entre público e privado:
Figura 2: Relações público-privado em infra-estrutura
Adaptado de Delloite (2006)
Dentro deste arcabouço geral de PFIs, enquadra-se uma série de formas de
contratação de projetos com diferentes modelagens, como BOT
9
, BOO
10
, DBFO
11
,
DBFT
12
.
Releve-se que, no programa britânico, o título Public-Private Partneships,
empregado especialmente a partir da posse de Blair, em 1997, compreende outras
modalidades de parcerias além das PFIs. Entre esses outros modelos, destacam-se as
strategic partnerships - joint ventures organizadas por programas ou projetos em que
os objetivos não podem ser facilmente especificados ou a escala de um único projeto
não justifica a modelagem de PFI – e project delivery organizations – entidades
privadas contratadas para gerenciar projetos muito complexos, desde a licitação até a
efetiva operação dos serviços (HM TREASURY, 2008). As PFIs PPPs mais
numerosas e relevantes, das quais se originariam os formatos ulteriormente
desenvolvidos - são definidas pelo Tesouro Britânico como um arranjo em que o
Setor Público adquire serviços usualmente derivados de investimentos da iniciativa
privada em ativos, através de contratos com duração entre 15 e 30 anos (HM
TREASURY, 2008).
Entre as características das PFIs, assinala-se que (i) a iniciativa privada
constrói e mantém infra-estrutura com o objetivo de entregar os serviços contratados,
existindo, portanto, uma etapa de construção seguida da operação; (ii) a contratação é
geralmente celebrada com uma Sociedade de Propósito Específico, companhia com o
9
Build Operate and Transfer: Construir, Operar e Transferir
10
Build Operate and Own: Construir, Operar e Ser Proprietário
11
Design, Built, Operate and Own: Desenhar, Construir, Operar e Ser Proprietário
12
Design, Built, Operate and Transfer: Desenhar, Construir, Operar e Transferir
18
propósito pré-determinado de empreender o projeto, podendo ter um ou mais
acionistas; (iii) considerável parte do risco é assumido pela SPE, que os mitiga
transferindo-o a terceiros muitas vezes até mesmo acionistas da SPE através de
subcontratos, sob o princípio norteador de que os riscos devem ser transferidos para a
parte mais apta a manejá-lo – geralmente, os riscos de desenho, construção e operação
são absorvidos pelo parceiro privado; (iv) a SPE se utiliza de financiamento privado,
normalmente um mix de equity (patrimônio líquido da SPE) e debt (alavancagem no
mercado financeiro), para viabilizar os trabalhos de construção up-front
13
; (v) a SPE é
remunerada pelo serviço provido ao setor público na forma de preços fixos, cujo
pagamento realizado diretamente pelo Estado ou pelos usuários - é condicionado
pela performance da SPE durante a vigência contratual e submetido a redução na
hipótese de cumprimento insuficiente dos standards contratados referidos
pagamentos se iniciam somente após a conclusão da etapa construtiva, quando os
serviços passam a ser providos; e (vi) a SPE administra e entrega os serviços
requeridos de acordo com standards específicos de serviço, o que a obriga a conservar
a qualidade dos ativos a eles associados durante toda a vigência do contrato (HM
TREASURY, 2008).
Originalmente, a criação das PFIs foi fortemente motivada pelos
constrangimentos fiscais que impediam a expansão da infra-estrutura existente por
intermédio de endividamento público (FLINDERS, 2005). Até o final da década de
80, vigiam no Reino Unido as conhecidas Ryrie rules, expedida pelo Tesouro
Britânico, segundo a qual o financiamento privado de projetos de interesse público
apenas poderia ser levado a cabo sob dois princípios que deveriam ser observados em
conjunto: (i) o financiamento privado apenas poderia ser promovido se oferecesse
vantagem em termos de custo-benefício em face de contratação ordinária pelo Poder
Público, ainda que, esta última, em face das restrições orçamentárias, não pudesse ser
efetivamente realizada; (ii) os projetos financiados privadamente tinham de ser
incluídos pelo Governo em seu plano de investimento público – on balance sheet, por
conseguinte.
13
Assim porque a SPE apenas recebe recursos após efetuados os investimentos iniciais que põem o
empreendimento em operação.
19
A extinção das Ryrie-Rules, ainda sob o governo de Margaret Thatcher, em
1989, abriu espaço para a criação das PFIs em 1992, que, então, resultava na
flexibilização desses regramentos pretéritos, representando, segundo Butt-Spiering e
Dewulf (2006), um rompimento com a tradição britânica de 300 anos em que o
Tesouro se opusera a formas alternativas ao financiamento estatal da infra-estrutura
pública. Na ocasião, dois princípios eram anunciados como motivadores das PFIs: a
genuína transferência de riscos para os parceiros privados e a geração de value for
money
14
no uso de recursos públicos. No entanto, as PFIs na Inglaterra, como
institutos análogos pelo mundo, continham um apelo que, a bem da verdade,
superavam esses princípios oficiais.
Sua adoção era fortemente subsidiada por preocupações macroeconômicas
com o déficit público, surgindo como uma opção para que o Governo reduzisse a
pressão sobre seu orçamento através do financiamento privado da infra-estrutura
(HODGE E GREVE, 2007) – que a princípio estaria fora do balanço dos entes
públicos contratantes. Esta característica das PFIs importava relevante vantagem
desses institutos comparativamente às tradicionais formas de contratação financiadas
por recursos orçamentários, sobretudo num contexto em que a integração européia
pressupunha o alcance de metas de déficit público para os países membros dentre
outros, o Pacto de Estabilidade e Crescimento, firmado com amparo no art. 104 do
Tratado da Comunidade Européia e na Resolução do Conselho Europeu de
17/07/1997, estabeleceria na década de 90 limites para o déficit público, o que
corroborava a tendência verificada na década de 80 de redução da capacidade de
investimento dos Estados.
Os riscos de que esta vantagem a desoneração do orçamento público - se
sobrepusesse sobre os demais princípios motivadores das PPPs estão presentes na
literatura acadêmica (GRIMSEY e LEWIS, 2004; YESCOMBE, 2007) e nas
diretrizes das entidades governamentais (HM TREASURY, 2006, 2008) e
multilaterais (OCDE, 2000; EUROPEAN COMMISION, 2003), além de consultores
internacionais (DELLOITE, 2006; PRICEWATERHOUSE, 2005).
14
O conceito de value for money inclui, mas não se limita a, análise de custo do projeto, abrangendo a
combinação de riscos transferidos, custo por toda a vida do projeto e qualidade do serviço oferecido
pela instalação construída (HM TREASURY, 2006).
20
Não por outro motivo, a partir de 1997 se apercebe uma ênfase do novo
Governo britânico em garantir que a escolha dos projetos para serem implantados
como PFIs fosse governada pelo princípio do value for money e não na diluição do
gasto governamental para períodos subseqüentes. Neste ano, era estabelecida uma
força-tarefa do Tesouro (Treasury Taskforce
15
) cujo objetivo era ajudar os
departamentos a negociar com os parceiros privados, definir especificações de outputs
que assegurassem a obtenção de value for money e publicar diretrizes e princípios
sobre arranjos com financiamento privado. Em 2000, em função das recomendações
do Relatório Bates, foi instituída The Partnerships UK, uma joint venture – ela
própria uma PPP – com participação pública e privada, que fornece expertise e
conselhos para os departamentos incumbidos de tocar cada projeto de PFI, assim
como dar suporte financeiro para estes.
As diretrizes emitidas pelos órgãos britânicos expressam a preocupação de
que os projetos implementados através de PFIs sejam motivados pela transferência de
riscos e obtenção de value for money, sendo esta apenas uma dentre as modalidades
de contratação
16
.
Dessa maneira, a abordagem britânica vigente – e seguida pelas diretrizes de
entidades supranacionais procura superar a perspectiva de que as PPPs serviriam
como instrumentos para elevar o investimento em infra-estrutura driblando os
constrangimentos orçamentários. Seu objetivo central seria o value for money por toda
a vida do projeto.
O alcance desses objetivos é proporcionado pelos elevados (high-powered)
incentivos subjacentes ao contrato de PPP, mediante o foco em indicadores de
desempenho, a integração do projeto por todo o ciclo de custeio (desenho, construção,
operação e manutenção), as inovações do particular que controla os meios de entrega
dos outputs e a alocação do risco de cada atividade contratada ao parceiro mais apto
para mitigá-lo. Esse desenho traria como vantagens, assim, a redução do prazo para a
implantação dos empreendimentos, que os investimentos deixam de depender
15
O Treasury Taskforce substituía o Private Finance Panel, concebido pelo Governo Major.
16
“PFI is only one of a number of procurement options that the Government can use to invest in public
services. The Government only uses PFI where it can be shown to deliver value for money and does
not come at the expense of employees’ terms and conditions.” (HM TREASURY, 2006; 4)
21
exclusivamente dos aportes do Poder Público; o estímulo a introdução de inovações; a
possibilidade de realização de um maior número de projetos, sem crowding out
17
; a
liberação de recursos para o custeio de projetos prioritários que não seriam atrativos
para a iniciativa privada; os ganhos de escala; e os incentivos promovidos pela due
diligence da instituição financiadora (GRIMSEY e LEWIS, 2004; HM TREASURY,
2008).
Evidentemente, para tanto, anota o Tesouro Britânico, esses resultados
dependem da compatibilidade entre a estrutura de incentivos inerente às PFIs e as
características propícias para sua aplicação, a saber: (i) necessidade de um elevado
investimento de capital, requerendo efetiva gestão de riscos associada com a
construção e a entrega de serviços; (ii) a natureza do serviço permita ao Setor Público
definir suas necessidades em termos de outputs de serviços que possam ser
adequadamente contratados de forma a garantir a efetividade e a accountability na
prestação de serviços públicos em longo prazo, propiciando a alocação clara e o
enforcement dos riscos e obrigações das partes; (iii) a possibilidade de que o ativo e
os serviços a ele associados, assim como os riscos existentes, sejam custeados por
toda a sua vida, com base numa relação de longo prazo; (iv) o valor de capital do
projeto seja superior a 20 milhões de libras, a fim de assegurar a proporcionalidade
com os altos custos do processo licitatório; (v) a tecnologia e outros aspectos do setor
sejam estáveis e não marcados por ritmo célere de transformações; (vi) o horizonte
de planejamento possa ser realizado em longo prazo, com a confiança de que os ativos
e os serviços ofertados serão utilizados por longo período futuro (HM TREASURY,
2008).
Sob inspiração das PFIs, a participação privada na infra-estrutura em geral e
as modelagens de Parcerias Público-Privadas em particular foram objeto de estímulo
de inúmeras entidades multilaterais que elaboraram relatórios, guias e diretrizes para
sua implantação, formando, dessa maneira, uma influente comunidade internacional
em prol das PPPs.
17
Crowding out ocorre quando o investimento privado simplesmente substitui o investimento público,
não havendo investimento adicional. Pinto (2005) registra que isso não ocorre em PPPs porque a
iniciativa é destinada a objetos que não seriam realizados nem pelos particulares, nem pelo Estado.
22
A exemplificar, (i) a Comissão Econômica para a Europa das Nações Unidas
(Guidelines on Private Partnerships for Infrastructure development, 2000); (ii) o
Departamento de Assuntos Fiscais do Fundo Monetário Internacional (Public-Private
Partnerships, 2004); (iii) o Banco Europeu de Investimentos (Innovative financing of
infrastructure – the role of public-private partnerships: Infrastructure, economic
growth and the economics of PPPs, 2005; Innovative financing of infrastructure – the
role of public-private partnerships: Lessons from the early movers, 2005); (iv) a
União Européia (Guidelines for Successful Public-Private Partnerships, 2003) e o
Banco Mundial (How to revitalize infrastructure investments in Brazil: public policies
for better private participation, 2007) estão entre as entidades que publicaram sobre o
tema. A difusão das PPPs é representada pela ampla gama de países e de setores nos
quais o financiamento privado em infra-estrutura é, hoje, utilizado, por óbvio, em
diferentes estágios de refinamento institucional e quantidade de projetos contratados,
conforme gráfico abaixo.
Figura 3: Curva de maturidade das PPPs
Adaptado de Delloite (2006)
Entre os setores nos quais são empregados modelagens de PPPs, citam-se
transporte (rodovias, ferrovias, portos), saneamento, presídios, saúde, assistência
social, energia, telecomunicações, habitação, esportes e lazer, aeroportos, defesa,
instalações administrativas e regeneração urbana (GRIMSEY e LEWIS, 2004; BULT-
SPIERING e DEWULF, 2006).
23
2.2. As PPPs como estruturas de governança: o caso das PFIs.
2.2.1. Os resultados existentes.
A adoção das PPPs por tantos países e entre vários setores, incentivadas por influentes
atores internacionais, não tem impedido que os próprios estimuladores dessas
modelagens e os acadêmicos que se debruçam sobre o tema expressem os desafios
subjacentes a esta forma de governança. Autores como Hodge e Greve (2007) alertam
que as evidências sobre as vantagens das PPPs comparativamente aos mecanismos
tradicionais de contratação são limitadas, embora haja, especialmente na Inglaterra,
resultados apurados pelo Tesouro (HM TREASURY, 2003, 2006) e pelo National
Audit Office (NAO, 2001) que relatem substanciais ganhos na observância do
orçamento previsto (on-budget) e no cumprimento do prazo de disponibilização (on-
time). A Arthur Andersen e a enterprise LSE (2000) encontraram evidências de
redução de custos em 29 projetos de PFI, comparativamente com contratações
comuns.
As controvérsias surgem, em especial, quando os estudos são desagregados
por setores. O Institute for Public Policy Research (2001) assinala que as PFIs são
definitivamente casos de sucesso para prisões e rodovias, mas cujas vantagens em
hospitais e escolas, à frente dos dados então existentes, são ainda limitadas. Outros
estudos de caso críticos das PFIs lançaram dúvidas sobre ditos arranjos numa série de
serviços, de que são exemplos os trabalhos de Pollock, Shaoul e Vickers (2002) e
Shaoul (2004). O próprio Tesouro Britânico, após experiências mal-sucedidas em
projetos de Tecnologia da Informação, descartou o recurso a PFIs nesses casos (HM
TREASURY, 2006). Além disso, é reconhecido o fato de que, neste momento, os
primeiros contratos de PFIs chegam a seus 15 anos de vigência - sendo a maioria
deles firmados a partir de 1997 o que explica a inexistência de avaliações
conclusivas sobre suas vantagens.
Neste passo, os relatórios dos entes governamentais britânicos expressam
uma abordagem cautelosa sobre as PFIs, evitando-se o recurso às parcerias como
resposta generalizada para as dificuldades enfrentadas pelos serviços públicos.
Apenas a exemplificar, no biênio 2005/2006, as PPPs/PFIs representavam apenas
24
10% do total do investimento público no Reino Unido, destacando-se, expressamente,
que estas somente são empregadas quando assegurada a obtenção de value for money
sem deterioração dos termos e condições de trabalho dos empregados (HM
TREASURY, 2006).
Dessa forma, as inovações postas pelas PPPs em comparação com formas
tradicionais de prestações de serviços públicos impõem desafios para o Poder Público,
desafios estes que estão no cerne da exploração das potencialidades e mitigação dos
riscos. Grimsey e Lewis (2004) registram que estas estruturas de governança
demandam uma atuação plural do Estado, como cliente, planejador de redes, gestor de
projeto, financiador e supervisor do contrato - e não somente na função tradicional de
“representante do interesse público/Poder Concedente” detentor de prerrogativas
unilaterais.
2.2.2. As Private Finance Initiatives
.
Antes de se especificar as principais características dos contratos de PFIs, é preciso
destacar alguns aspectos do contexto institucional em que está inserto o referido
programa.
Primeiro, são as diretrizes do Tesouro as principais fontes normativas das
PFIs, com exceção de “algumas disposições esparsas e de cunho contingente,
adotadas nos textos atinentes a alguns aspectos particulares dos contratos de PFI, e
quase sempre a propósito de contratos adotados por autoridades locais”
(COSSALTER, 2005; 427). Assim, o predomínio do Executivo britânico marcante
exemplo de sistema político majoritário com poucos pontos de veto (LIJPHART,
1999) faz-se sentir no desenho do programa de PFIs, em relação ao qual o Poder
Legislativo teve parca influência.
Segundo, o contrato de PFI no direito britânico, assim como os demais
contratos administrativos, não se distingue dos contratos civis, disciplinados pelas
regras da liberdade de contratar (freedom of contract) e da inviolabilidade do contrato
(sanctity of contract). Desse modo, os contratos não são desenhados sob um quadro
25
de princípios e regras pré-estabelecidos, mas adaptados funcionalmente a suas
necessidades. O resultado é que as prerrogativas do Setor Público, inclusive a
mutabilidade das avenças, são contratualizadas (COSSALTER, 2005), existindo, pois,
maior liberdade contratual do que nos regimes de direito público herdeiros do sistema
francês.
Apesar deste fato a maleabilidade do contrato no Direito Britânico é certo
que, no curso do século XX, fragilizou-se a idéia pré-existente de que não haveria um
Direito Administrativo com prerrogativas exorbitantes da Administração, revelando-
se, nos contratos públicos, poderes de ação unilateral e graus de discricionariedade
assemelhados ao Direito Administrativo de tradição francesa (RIVERO, 2004; DI
PIETRO, 2005).
2.2.2.1 Seleção e modelagem de projetos.
A etapa preliminar ao processo licitatório é considerada essencial para o sucesso dos
projetos, vez que é nesse instante que se materializa a abordagem governamental
sobre as parcerias. O risco central nesse momento destacado pelas melhores práticas
internacionais (OCDE, 2000; HM TREASURY, 2006) - consiste na seleção dos
projetos a serem executados via PPP não por considerações de value for money, mas
pela possibilidade de execução de obras públicas sem imediata onerosidade do
orçamento.
As PPPs pressupõem que o custo de capital da infra-estrutura seja diluído ao
longo do prazo contratual, não afetando de pronto o orçamento público. A
contabilidade de futuros desembolsos com PPPs off balance sheet permite que as
autoridades públicas contraiam obrigações e provejam serviços públicos superando
constrangimentos orçamentários legais, como, no caso europeu, as limitações
impostas pelo Tratado de Maastricht.
Tanto mais grave pode se afigurar esta possibilidade de que as PPPs sirvam
como escape para um regime de soft budget constraint se o sistema político estabelece
incentivos para que os governantes ajam com horizonte temporal de curto prazo, na
medida em que o contraente das obrigações poderia onerar os futuros governantes
26
auferindo os benefícios imediatos de disponibilização do serviço público. Em outras
palavras, as PPPs funcionariam como um mega-credit card, nas palavras de Hodge e
Greve (2007).
Exemplo comumente citado dos riscos de descontrole das finanças é o
português. Seu programa de concessão de rodovias sem a cobrança de pedágios
(pedágio sombra), nominado SCUT, em que o Estado arca com os custos pelo uso da
infra-estrutura disponibilizada, proporcionou a contração de obrigações que
superavam as disponibilidades orçamentárias (ZYMLER e ALMEIDA, 2005),
comprometendo as finanças do erário e a própria continuidade do programa de
expansão da malha rodoviária.
Sob o ponto de vista contábil, a questão central é se o ativo construído pelo
parceiro privado deve ser incluído no balanço do Poder Público (on balance sheet) ou
não (off balance sheet). O Financial Report Standard 5, do Accounting Standard
Board, adota o princípio de que o ativo construído deve ser incluído no balanço da
parte que aufere os benefícios e se expõe aos riscos associados à propriedade. O ativo
é off balance sheet quando demonstrado o value for money para qualquer despesa do
setor público efetuada no projeto e transferido nível significativo de risco para o
privado. Desse modo, a abordagem inglesa, hoje, é a de que a inclusão do ativo on ou
off balance sheet não interfere na seleção dos projetos executados através de PFIs,
como expõe o Tesouro (HM TREASURY, 2006), sendo 50% dos projetos existentes
reportados on balance sheet
18
19
.
Integra, ainda, a etapa de seleção de projetos a averiguação da viabilidade
econômico-financeira comparativamente ao financiamento público e do value for
18
“The accounting treatment of a PFI project on a departmental balance sheet, and its reflection as an
asset in the national accounts, plays no part in the Government’s decision about when to use PFI. That
decision is based on value for money. Around 50 per cent of PFI projects by capital value are reported
on departmental balance sheets. The accounting treatment follows rules set and audited by a series of
independent national and international organisations.” (HM TREASURY, 2006; 23)
19
A despeito desse princípio, a potencialidade de as PPPs servirem como meio para superação de
constrangimentos orçamentários é inevitavelmente um apelo para os Governos sem capacidade de
investimento em curto prazo, em que inexiste a alternativa ressaltada pelos britânicos de construção
da infra-estrutura através de recursos orçamentários - por meio do Value for Money Guidance. A
conseqüência da inviabilidade de PPPs é a não realização do investimento público (YEASCOMBE,
2007).
27
money proporcionados pelas PFIs, o que é considerado condição sine quo non para o
recurso a PPPs - isto porque o custo do capital para o Estado é inferior ao custo do
capital para os parceiros privados incumbidos de obter o financiamento nas PPPs
vez que o Poder Público tem a possibilidade de externalizar riscos por meio da
tributação, o que, em regra, permite a contração de dívidas com juros menores
(PINTO, 2005).
Assim, se não obtidos ganhos de eficiência com o arranjo via PPP, a
princípio a execução direta pelo Poder Público seria menos custosa – claro, desde que
seja assumido que a utilização de PPPs não resulte da inexistente capacidade de
investimento estatal.
Na Inglaterra, esta aferição se dá através do Value for Money Guidance (HM
TREASURY, 2007a), que englobou o pretérito Public Sector Comparator
20
O VfM
Guidance intenta garantir que o value for money seja o critério decisivo para a escolha
da PFI comparativamente a execução direta, assim como institui uma ferramenta de
benchmarking e apuração de riscos. O suposto é de que as PFIs devem representar
uma combinação ótima entre custeio por toda a vida do projeto e qualidade do serviço
para atingir os requerimentos dos usuários, apurados por intermédio de levantamentos
qualitativos e quantitativos. VfM, enfim, corresponde a um conceito relativo, ao
requerer comparação com resultados potenciais de formas alternativas de provisão do
serviço considerando-se, por óbvio, a alocação de riscos inerentes a cada tipo de
provisão.
Estas metodologias não estão infensas a críticas de que, ao contrário do
princípio oficial (value for money) haveria no pretérito PSC vieses em favor das PFIs.,
como as de Bult-Spiering e Dewulf (2006), para os quais não raramente eram
comparados valores nominais de projetos sob contratação tradicional com valores
presentes de contratos de PPP. Essas críticas são reproduzidas por Grimsey e Lewis
(2004), que a elas acrescentam que a definição e a aplicação da taxa de desconto sobre
os fluxos de caixa das PPPs afetavam sensivelmente as conclusões do PSC, sujeitas a
20
O VfM Guidance não apenas englobou o PSC, como incorporou três estágios sucessivos (i) o
cabimento das PFIs para um programa de investimentos, (ii) a análise do projeto e (iii) contínua análise
de mercado para garantir que as premissas de VfM não sejam comprometidas. O VfM adota métodos
quantitativos mais simples do que o PSC e aprimora os métodos qualitativos, considerando a existência
de evidências nos projetos realizados que dispensam procedimentos mais custosos (HM
TREASURY, 2006).
28
vieses otimistas que superestimavam receitas e subestimavam despesas. Finalmente,
ao partir da premissa de que a execução do objeto a ser realizado poderia ser feita
através do direto investimento estatal, a metodologia VfM/PSC pode não ser
apropriada para países em desenvolvimento em que a inexistência de recursos
públicos é também um motivo para o uso de PPPs (PORTUGAL e PRADO, 2007; e
LEIGLAND e SHUGART, 2006).
2.2.2.2 O processo licitatório.
A complexidade dos contratos de PPPs põe realce sobre a capacidade de estruturação
e gerenciamento de processos licitatórios, entre outros motivos, porque as autoridades
públicas apreciam propostas que admitem maior variedade de soluções cnicas
que o Estado não exaure o projeto, enfocando seus outputs e devem considerar uma
série de atividades integradas (desenho, construção, operação e manutenção)
prestadas em longo prazo.
Desses fatos decorre que os altos custos do processo licitatório nas PPPs
terminam sendo um motivo desencorajador da sua adoção, bem como redutor da
competitividade ante os altos custos de elaboração de propostas (BULT-SPIERING e
DEWULF, 2006). Numa tentativa de mensurar os custos de transação exclusivamente
dos processos licitatórios, Dudkin e Väli(2005) chegaram à estimativa de que se
supera o montante de 10% do valor do investimento do projeto contratado
21
. O
Tesouro britânico tem ensejado esforços para reduzir o custo e o tempo dos processos
(que em países como Irlanda, Portugal e a própria Inglaterra chega a demandar dois
anos), seguindo, assim, o exemplo espanhol, em que a simplicidade do procedimento
proporciona custos e tempo menores
22
(BULT-SPIERING e DEWULF, 2006).
A envergadura dos projetos de PPP, assim como o fato de que estes
perduram por décadas, perpassando por vários mandatos de membros do executivo e
do legislativo, demanda preocupações com a transparência do processo licitatório
21
É por isso que as PPPs/PFIs não são passíveis de utilização em projetos pequenos, nos quais a
proporção dos custos de transação sobre o valor de investimento do projeto é ainda maior (HM
TREASURY, 2006; 2008).
22
Uma dificuldade de seguir o exemplo espanhol é que as licitações inglesas de PFIs incluem etapas de
negociação que as tornam mais lentas.
29
(YEASCOMBE, 2007), sendo condição sine quo non para sua legitimidade em longo
prazo a publicidade e a isonomia, refletidos na Diretiva n. 18/2004 da União
Européia. A abertura desses processos, ademais, afigura-se como elemento central
para garantir a maior competitividade dos certames licitatórios. A estrutura de
incentivos das PPPs é fundada na competição ex ante pelo mercado, na
impossibilidade de competição no mercado
23
por força das características de bem
público do objeto contratado, disso resultando que a inexistência de competitividade
de facto fragiliza a premissa central das PPPs: a entrega de value for money
(PORTUGAL e PRADO, 2007).
A competição recebe significante ênfase nas PFIs. O tesouro britânico
estabelece, inclusive, que nos mercados com um único fornecedor, devem ser
adotados mecanismos como (i) o teste de mercado dos segmentos da cadeia de
suprimentos do parceiro privado que podem ser submetidos a competição; (ii) o
benchmarking quando não possível o teste de mercado com contratações
comparáveis; (iii) e o incremento da flexibilidade por meio da redução do prazo
contratual ou break points em que o contrato pode ser objeto de nova licitação se
houver ingresso de novos players no mercado (HM TREASURY, 2006). A Inglaterra
adota, ainda quando haja competição prévia ao certame licitatório, especialmente para
os chamados serviços soft referentes a serviços cotidianos, que não são intensivos
em capital, para a operação de um ativo, como limpeza, segurança, alimentação,
transporte (HM TREASURY, 2006) os instrumentos de benchmarking e market
testing: no primeiro caso, há comparação com periodicidade (de três a sete anos) entre
os preços do parceiro privado e os preços de terceiros; no segundo, ocorre, quando
possível, a também periódica submissão do subcontrato firmado pela SPE a
procedimento licitatório aberto a novos competidores
24
.
Dois outros mecanismos são comuns em licitações de PPPs: primeiro, aos
parceiros privados interessados em se engajar em parcerias pode ser permitida a oferta
de propostas não solicitadas, com o objetivo de ser criar, nesses termos, uma
23
A impossibilidade de competição extensiva ex post, porém, pode ser minimizada por instrumentos de
contestabilidade, como o faz a Inglaterra.
24
A partir da versão de standirzação dos contratos de PFI (HM TREASURY, 2007b), o market
testing tem primazia sobre o benchmarking, que é utilizado somente quando o primeiro não for
aplicável.
30
competição por projetos (PORTUGAL e PRADO, 2007); segundo, a presença de
etapa de negociação com licitantes pré-qualificados numa short-list (BULT-
SPIERING e DEWULF, 2006).
O primeiro instituto, embora bastante comum aos estados americanos
pioneiros em PPPs e em países europeus, revelou problemas na Inglaterra, onde as
notícias de que a aceitação de propostas não solicitadas na prática representava
restrição da competitividade resultaram na sua vedação (BULT-SPIERING e
DEWULF, 2006).
Em contrapartida, o processo licitatório britânico nas PFIs sempre foi
caracterizado por uma flexibilidade negocial marcante. O chamado negotiated
procedure prevalecia até 2006: o licitante preferido (prefered bidder) era eleito após
estágios com três ofertantes, em seqüência reduzido para dois após entabuladas as
negociações iniciais, sendo os competidores finais convocados para oferecerem sua
best and final offer (BAFO) e, eventualmente, outra proposta final last and final
offer (LAFO).
A Diretiva n. 18/2004 da União Européia, contudo, estabeleceu regramento
para as contratações realizadas por autoridades públicas dos Estados-membros,
através da qual se procurava acomodar a flexibilidade do negotiaded procedure e os
princípios da isonomia e da publicidade (YESCOMBE, 2007). O procedimento
resultante dessas acomodações para contratos complexos foi denominado competitive
dialogue
25
, no qual, após etapa pré-qualificatória aberta a todos os interessados, a
autoridade pública inicia o processo de negociação que pode ocorrer em etapas
sucessivas que restrinjam paulatinamente o número de competidores -, podendo ser
promovidas alterações e revisões no projeto até a apresentação das propostas e, após
ofertadas estas, eventuais clarificações. O competitive dialogue entrou em vigor no
ano de 2006 na Inglaterra, onde sua introdução, embora preservando características
centrais do negotiaded procedure, representa a explicitação de regras sobre a
publicidade do certame e de restrição das negociações, que passam a ter definidas
25
Segundo o referido regramento, o Competitive Dialogue se aplica a projetos “particularmente
complexos”, em que a autoridade não consegue definir tecnicamente suas necessidades e objetivos e/ou
não pode especificar objetivamente a modelagem legal e financeira do projeto.
31
formalmente seu início e fim, bem como são vedadas após as ofertas finais (HM
TREASURY, 2006).
Por último, o fechamento das condições financeiras do projeto (Financial
Close) integra o processo licitatório, sendo considerado seu último estágio. O Tesouro
Britânico pode inclusive, nesta etapa, submeter a competição o financiamento do
projeto, com vistas a assegurar que os termos do empréstimo estejam de acordo com
as condições de mercado (HM TREASURY, 2006). O financiamento de PFI provém
não apenas de bancos, mas também por meio de bonds negociados no mercado de
capitais e do que se nomina monoline
26
.
2.2.2.3. A estrutura de incentivos.
De acordo com o Tesouro britânico, o principal instrumento para a obtenção de value
for money é a transferência de riscos para o parceiro privado, válido o princípio de
que devem ser transferidos apenas aqueles riscos que possam ser melhor gerenciados
pelo particular. Este suposto outorga ao Poder Público a tarefa de identificação dos
riscos e seus mitigadores, quantificação e alocação numa matriz de risco por cada
projeto, não usual nas contratações ordinárias.
Em regra, as PFIs atribuem os riscos do projeto, da construção e da
operação ao parceiro privado, através de contratos com preço fixo e data pré-
determinada de entrega, cabendo a este arcar com extrapolações de data e custos;
maior variabilidade ocorre em relação ao risco de demanda, que se reflete no
mecanismo de pagamento contratualmente estipulado, que pode ser amparado na
demanda dos usuários (usage-based), na disponibilidade (availability-based) e na
performance (performance-based) ou mesmo combinações entre essas estruturas de
pagamento. A escolha de mecanismos fundados na demanda dos usuários como
concessões remuneradas por tarifas representa a transferência do risco da demanda
ao particular, o que depende da sua previsibilidade e da capacidade de o particular
influenciá-la
27
. A seu lado, o Governo britânico normalmente retém os riscos de
26
Neste caso, o capital é levantado no mercado de capitais, com a garantia de um segurador que
assume os riscos do projeto.
27
Yescombe (2007) expõe o insucesso de modelagens de PFIs que transferiam o risco da demanda em
prisões para o parceiro privado. Mustafá (1999) narra caso que ilustra os dilemas suportados em
32
especificação dos serviços contratados, da possibilidade de sua mudança e de
inflação.
Há, na gestão dos riscos dos contratos de PFIs, dois perigos polares: (i) o de
transferir ao parceiro privado riscos em excesso, que poderiam ser melhor mitigados
pelo Estado; e (ii) a possibilidade de o Poder Público resgatar o contratado de
dificuldades (bail-out), uma vez materializado risco que ameace a continuidade do
serviço. A transferência de risco em excesso se traduz em prêmios elevados e
incapacidade de sua mitigação a um custo baixo. Não por outro motivo, relata
Yescombe (2007) que tal ocorrência produziu prematuras renegociações de contratos
de PFIs, inclusive antes da sua celebração, por exigência dos financiadores dos
projetos.
De outro turno, ainda que o risco seja apropriadamente transferido, a
peculiaridade nos contratos públicos é que a autoridade remanesce politicamente
accountable pelo serviço provido vez que a contratação por meio de PPPs não
implica a exclusão de responsabilidade política pelos serviços (FLINDERS, 2005).
Disso decorre que a falha do parceiro privado em cumprir com suas obrigações pode
resultar na intervenção estatal para salvaguardar a continuidade do serviço público
delegado, motivo pelo qual o enforcement do contrato de PPP poderia ser fragilizado
se o particular crer que, ao fim e ao cabo, o Estado será sempre o segurador universal
dos riscos (bail-out) Moore (2007) explica que essa posição dúbia do Estado
contratante e responsável pela continuidade dos serviços põe em xeque sua
capacidade negocial. Apesar deste temor, existem incentivos para que os parceiros
privados patrocinadores e financiadores evitem tais falhas. O primeiro, porque
continuará a arcar com os custos do financiamento, pois que a autoridade pública
detém o direito de rescisão antecipada; o segundo, porque suportará os danos do
default da SPE, motivo pelo qual mantém poderes de due diligence sobre o
andamento do projeto e de step in rights
28
(BORGES e SÁ, 2002; ENEI, 2007;
DELLOITE, 2006; YESCOMBE, 2007).
rodovias ao se adotar pedágios-sombras baseados em bandas (limites de uso da rodovia acima e abaixo
dos quais a remuneração não varia).
28
Através do step in rigths, o financiador do projeto pode assumir a operação da PFI para reestruturar
financeiramente a SPE.
33
As PPPs modificam a estrutura de incentivos através do objeto da
contratação, que passam a ser os outputs assim caracterizados os níveis de serviços
contratados e não os meios para seu fornecimento. Segundo o Tesouro britânico, os
contratos não devem prever qualquer parcela fixa de pagamento que não esteja
atrelada a metas de desempenho.
A eleição de indicadores, no entanto, não é tarefa comezinha, dados os
múltiplos objetivos estatais, motivo pelo qual o Standardization of PFI Contracts
(HM TREASURY, 2007b) enfatiza a relevância de sua proporcionalidade e
atualidade: a primeira requer que não sejam fixadas metas que redundem em
transferência elevada de riscos para o particular; a segunda demanda a revisão
periódica dos indicadores. O tesouro estimula, ainda, a inserção de indicadores
qualitativos, como pesquisas com os usuários dos serviços, apesar de reconhecer sua
sujeição a manipulações
29
.
Os indicadores de desempenho associados ao mecanismo de pagamento são,
portanto, cruciais nos contratos de PFIs, que trazem regras para a dedução do preço-
fixo estipulado quando do atendimento insatisfatório aos standards pré-estabelecidos,
deduções estas que são crescentes na hipótese de reiteração de subdesempenho ou
irresolução de deficiências detectadas nos serviços (HM TREASURY, 2007b).
Pesquisas realizadas com os gestores dos contratos, no entanto, revelam dificuldades
no entendimento de complexos mecanismos de dedução de pagamento, assim como
temores de que o seu enforcement prejudique a relação com o parceiro privado (NAO,
2001).
Finalmente, ao delegar a responsabilidade pelos inputs através dos quais são
entregues os serviços ao particular, o Estado não interfere – senão excepcionalmente –
no desenho dos projetos formulados pelo parceiro privado, sob pena de diluir a
alocação de risco correspondente. Em conformidade com o Standardization of PFI
Contracts (HM TREASURY, 2007b), a autoridade pública não deve, antes do início
da etapa de operação, sequer reter qualquer direito de aprovar ou aceitar o desenho da
operação. Embora os projetos sejam submetidos ao apreço do Estado para fins de
29
Para mitigar esse risco, prevê-se que a pesquisa será feita pelo contratado ou por uma terceira parte;
no primeiro caso, a autoridade pública retém o direito de rever a pesquisa, com precedência sobre a do
contratado (HM TREASURY, 2007).
34
fiscalização, os comentários que podem ser realizados são acatados ou não a
critério e risco exclusivos do parceiro privado incumbido contratualmente de formatá-
los.
Há, no entanto, pré-condições para que o bundling de atividades não se
converta na perda de controle sobre os serviços contratados mediante PFIs. O HM
Treasury (2008) alinhava (i) a capacidade de fixação de outputs, (ii) o
estabelecimento de prazo não excessivo, compatível com a escala e os investimentos
realizados no empreendimento e (iii) a eleição de ativos cujas tecnologias não sejam
demasiado instáveis.
Autores como Trujillo et al. (1998) defendem que o bundling próprio das
PFIs pode não representar as soluções inovadoras esperadas que, a rigor, a SPE
obtém a expertise requerida através de subcontratos que poderiam ser celebrados pelo
próprio Poder Público servindo, apenas, para reduzir a competitividade. Este
segundo efeito decorreria do fato de que uma série de serviços que poderia ser
contratada mediante processo licitatório competitivo é sujeito a decisão interna à SPE
– o que as PFIs tentam mitigar mediante os pré-citados mecanismos de benchmarking
e market testing.
Esse argumento, entretanto, assume que o Poder Público poderia articular o
mesmo grupo de contratos coligados com eficiência igual à dos parceiros privados
detendo expertise para articular os contratos necessários para o projeto, supervisioná-
los, assim como gerenciar e mitigar riscos que, sob PFIs, seriam transferidos para o
parceiro privado. Trata-se, segundo Grimsey e Lewis (2004) de uma premissa pouco
realista, embora se possa desenvolver a estratégia de contratação de uma companhia
privada exclusivamente para essa função de gerenciar, supervisionar e mitigar riscos
do projeto.
2.2.5. Flexibilidade, credible commitments e resolução de conflitos.
Assim como as etapas ex ante do contrato de PPP têm altos custos transacionais, os
custos de transação ex post são deveras elevados, sobretudo quando considerado o
longo prazo do contrato e a complexidade dos empreendimentos, que o sujeita a
contínuos processos monitoramento, adaptação, revisão, negociação e execução de
salvaguardas. Mencionada dificuldade pode decorrer por força de transformações
35
tecnológicas, demográficas e políticas, resultando na necessidade de adaptar o
contrato aos novos requerimentos sem fragilizar a estrutura de incentivos inerente ao
contrato.
Ocorre, no entanto, que ao transferir riscos, o Estado, por excelência, abdica
do direito de interferir a seu bel prazer na forma de provisão de serviços eis porque
os gestores públicos incumbidos das PFIs julgam-nas mais rígidas do que as
contratações comuns. Por esses motivos que o Tesouro britânico endereça o assunto
diretamente em seu Relatório sobre PFIs (HM TREASURY, 2006), expressando a
necessária introdução de cláusulas contratuais de “variação” de outputs durante o
prazo contratual classificadas como variações pequenas, que podem ser periódicas,
e variações maiores que, demandando maiores dispêndios de capital, recebem
regramento detalhado e cuja efetivação pode depender de aprovação do financiador
do projeto.
Além de mecanismos de revisão de indicadores de desempenho, o
Standardization of PFI Contracts (HM TREASURY, 2007b) destaca a importância de
se estabelecer (i) menores prazos contratuais, (ii) estruturas financeiras com menor
grau de alavancagem, (iii) etapas de desenvolvimento de projetos amparadas por
parcerias de longo prazo e (iv) possibilidade de rescisão antecipada do contrato,
inclusive de partes dele, e de break points datas específicas em que o Poder Público
tem a opção de rescindir o contrato, através de uma compensação específica que
acoberte a remuneração do acionista da SPE (equity) e do financiador da project
finance (debt). Destaca-se, contudo, que maior flexibilidade é obtida a um preço
maior, o que demanda um balanço entre preço, flexibilidade em longo prazo e certeza
sobre os padrões de desempenho.
O preço da flexibilidade é função, ainda, da demanda por credible
commitment inerente a contratos de longo prazo que envolvem investimentos vultosos
em ativos específicos e, portanto, impõem maiores custos para alteração dos
contratos. Embora o déficit de credibilidade seja maior em países política e/ou
economicamente instáveis, Cossalter (2005) lembra que, na Inglaterra, as PFI foram
antecedidas de diplomas legais cujo objetivo era oferecer maior segurança aos
financiadores, particularmente em face de precedentes jurisprudenciais que
36
declaravam a nulidade de contratos de parcerias diante da extrapolação de
competência de autoridades locais.
A saída foi instituir procedimento de “certificação” o que resulta na
blindagem dos contratos. Esta certificação é feita pelas próprias autoridades locais,
implicando, uma vez cumpridos seus requisitos de validade fixados no Local
Government Contracts Act, o respeito às cláusulas contratuais como se a autoridade
de fato tivesse competência para tanto.
A eventual mutabilidade dos requerimentos de serviço em termos de
quantidade e qualidade - tem grande influência sobre os mecanismos e pagamento,
motivo pelo qual os contratos de PFI adotam também revisões anuais dessas
cláusulas. Quando o pagamento é baseado no uso, a flexibilidade do sistema de
pagamento é maior, que fundada em unidades discretas
30
, ao contrário do
pagamento por disponibilidade, como instalações de saúde e educação, em que a
mudança requer uma “recalibragem” do mecanismo de pagamento segundo processo
disciplinado contratualmente.
A ocorrência de conflitos é endereçada nas PFIs através de procedimentos de
resolução amigável, em que se estatui um prazo para que as partes cheguem a acordo,
ao fim do qual, não alcançado este, um expert eleito de acordo com o contrato entre
um grupo de experts em construção e/ou operação decide a contenda (no caso de
disputa financeira, o expert nessa área pode ser escolhido em comum acordo). A
irresignação de uma das partes, ao fim e ao cabo, pode redundar na instauração de
processo judicial ou, se assim disciplinado contratualmente, de arbitragem (HM
TREASURY, 2007b).
2.2.6. O Modelo de Governança.
Todas essas ponderações convergem para a conclusão de que as PPPs demandam
inúmeros desafios institucionais para o Poder Público, cujo alcance tem o condão de
influenciar no próprio objetivo do programa de entregar mais e melhores serviços
30
É comum nesses casos a inclusão de cláusulas take-or-pay, em que o Estado paga por uma demanda
mínima independentemente da efetivamente observada. Assim, acima do mínimo contratado a
autoridade tem flexibilidade para determinar a quantidade requerida.
37
públicos. Alguns países têm desenvolvido estruturas de governança para disseminar
informações e conhecimentos sobre PPPs, assim como assessorar os departamentos
diretamente incumbidos de gerenciá-las, a começar pela própria Inglaterra, que, a
partir do Relatório Bates, instituiu as forças-tarefas do Tesouro (Treasure Taskforces)
as Partnerhips UK e a 4P’s (esta promovendo e aconselhando autoridades locais), e
periodicamente publica diretrizes para aferição de value for money e elaboração de
contratos (MUSTAFA, 1999).
O Governo britânico, nesse caminho, publica padronizações para a elaboração
de contratos – Standardisation of PFI contractsVersion 4 (HM TREASURY,
2007b) e guia para aferição do value for money de cada projeto Value for money
assessment guidance (HM TREASURY, 2007a)
31
.
Tabela 1: Características das PFIs
Aspectos críticos Desenho Institucional
Contexto Institucional Majoritarianismo, predominância do Executivo e
flexibilidade do contract law
Seleção de Projetos Value for Money
Licitação Flexibilidade, processo de negociação e financial close
Estrutura de Incentivos Contratação de Resultados, competição ex ante,
bundling de atividades (ex. projeto, construção,
operação, manutenção), dedução de pagamentos,
marketing test/benchmarking,
Flexibilidade Revisão de indicadores de desempenho, prazos não
excessivos, menores graus de alavancagem, parcerias
para o desenvolvimento de projetos, rescisão
antecipada
Credibilidade Step-in-rights, processo de certificação de contratos de
autoridades locais, contract law
Resolução de Disputas Mecanismos de resolução amigável e arbitragem e/ou
judiciário
Modelo de Governança Unidade central com participação mista (Partnerships
UK), standards para contratos e processos, apoio para
autoridades locais (4Ps), Forças-tarefas
Elaboração do autor
31
Outros países que se destacam em estruturas de governança para a gestão de PPPs são Portugal, que
instituiu uma unidade central em 2003, e a Holanda, que criou a PPP Knowledge Centre com o
objetivo de iniciar e estimular parcerias, além de aconselhar agências governamentais e prover
organizações privadas com informações gerais.
38
3. REFORMAS E INFRA-ESTRUTURA NO BRASIL.
3.1. A Reforma Gerencial de 1995.
As Parcerias Público-Privadas no Brasil, num sentido amplo, foram difundidas, na
década de 90, num contexto de Reforma do Aparelho do Estado. Assim como
ocorreria com outros países latino-americanos, o Brasil sofrera especialmente a partir
da década de 80 as pressões que impulsionariam a adoção de reformas estruturais,
refletidas nos sinais de esgotamento do modelo de desenvolvimento pautado pela
substituição de importações, como a crise da dívida e a explosão do processo
inflacionário.
No plano da gestão pública, a escassez de recursos públicos acentuava as
deficiências históricas da burocracia brasileira, construída sob o predomínio de
indicações políticas para os cargos públicos como forma de obtenção de suporte
político pelos chefes do Poder Executivo nacional, acompanhada da estratégia de
criação de anéis de excelência nas áreas consideradas essenciais para o modelo
pretérito de desenvolvimento estratégia esta que Geddes (1994) intitula de
“compartimentalização”. Esta característica dicotômica da burocracia brasileira, que
superara o período de expansão industrial das décadas de 60 e 70, tinha seus defeitos
explicitados num contexto de crise fiscal e redemocratização que marcava a década de
80: corrupção, patrimonialismo, ineficiência e descontrole sobre os entes da
administração indireta eram os resultados palpáveis do modus operandi do serviço
público brasileiro.
Justamente o estágio incompleto da reforma do civil service brasileiro a
despeito das pretensões abrangentes que anunciava a reforma daspiana nos anos 30 -
que impulsionaria, por ocasião da Assembléia Constituinte de 1987/1988, a
elaboração de um capítulo sobre a Administração Pública na Constituição de 1988
que impunha princípios e regras próprias do modelo burocrático weberiano como
resposta ao diagnóstico de descontrole sobre a gestão pública perpetrada sob o modelo
do Decreto-Lei n. 200/1967
32
.
32
Este diploma normativo representara, segundo Bresser-Pereira (1998), uma tentativa de superação
dos limites do modelo burocrático por uma administração voltada para o desenvolvimento,
distinguindo administração direta e indireta e conferindo a autarquias, fundações e empresas estatais
39
Neste passo que a Constituição Federal de 1988 materializaria uma contra-
reforma burocrática como reação ao clientelismo e a ineficiência que grassavam na
década de 80 - instituindo novas formas de controle, a obrigatoriedade de concursos
para a contratação de pessoal para entes da Administração direta e indireta e a criação
do regime jurídico único para os servidores públicos mas também reafirmava
privilégios corporativistas, de que é exemplo o sistema de aposentadoria de
remuneração integral.
Ainda que a Constituição Federal ilustrasse um recrudescimento burocrático,
outras mudanças ocorriam na década de 80 convergentes com as transformações que
então aconteciam no mundo, embora este primeiro estágio reformista se restringisse,
como anota Haggard (1995), ao ajuste fiscal e às privatizações. É nesse rastro que,
entre 1985 e 1989, primeiros passos foram dados na reforma das finanças públicas
nacionais, em que se destacam (i) a incorporação gradual das contas do orçamento
monetário no orçamento geral da União, (ii) a extinção da conta-movimento do Banco
do Brasil e das funções de fomento do Banco Central, (iii) a criação da Secretaria do
Tesouro Nacional; (v) a exigência de que todas as despesas blicas federais
contassem com prévia autorização legislativa; e (vi) a transferência da administração
da dívida pública para o Ministério da Fazenda e a incorporação ao OGU das despesas
com o pagamento da dívida pública, passando a ser submetido ao Congresso
Nacional, ademais, a aprovação dos limites de endividamento público (GIAMBIAGI
e ALÉM, 2000). Iniciara também o processo de desestatização, a princípio adstrito a
empresas pequenas, que desempenhavam atividades estritamente econômicas, cujo
controle fora assumido pelo Estado nas décadas antecedentes. O assunto ganharia
tratamento sistemático com a Lei Federal n. 8.031/1990, que criava o programa
nacional de desestatização.
A partir de 1995, com o Governo Fernando Henrique Cardoso à frente de um
bem sucedido plano de estabilização monetária, o Plano Real, que demandava o
controle das contas públicas, a Reforma da Gestão Pública ganhou novos impulsos,
que terminaram por ser explicitados pela criação do Ministério da Administração e
uma autonomia de gestão superior ao que então existira em certo sentido, pois, antecipando
princípios das reformas das décadas seguintes. Seus pecados, no entanto, foram a fragilização do
núcleo estratégico do Estado e a perda do controle sobre a administração indireta.
40
Reforma do Estado MARE, cujo comando ficou por conta do Ministro Luiz Carlos
Bresser Pereira.
Ainda em 1995, o MARE delimitou no Plano Diretor de Reforma do Aparelho
do Estado (BRASIL, 1995) as diretrizes da Reforma Gerencial brasileira, em que
estavam presentes os princípios da gestão por resultados, plasmados na criação de
qualificações a serem conferidas a entidades estatais (agências executivas) e não
estatais (organizações sociais e de da sociedade civil de interesse público) para
assumirem, respectivamente, a prestação de serviços exclusivos de Estado e de
serviços não-exclusivos com externalidades positivas, controladas por intermédio de
contratos de gestão com definição de resultados a serem perseguidos e a garantia de
autonomia para tanto.
Figura 4: Formas de Propriedade e Modelos de Gestão na Reforma Gerencial de 1995
Fonte: Brasil, 1995
As diretrizes do Plano Diretor receberiam amparo constitucional e legal a
partir da aprovação da Emenda Constitucional n. 19 e das leis que criaram novas
formas institucionais, como OS’s (Lei Federal n.9.637/1998) e OSCIP’s (Lei Federal
n. 9.790/1999), que deram um norte para o debate sobre a Administração Pública no
país, a despeito dos revezes sofridos, não raro, em face do dilema entre os objetivos
de ajuste fiscal que preconizava novas formas de controle - e mudança institucional
41
(REZENDE, 2004) - que pressupunha a outorga de maior autonomia para as entidades
controladas.
Dessa maneira, a Reforma Gerencial de 1995, apesar de sofrer com a perda de
uma perspectiva integrada no Governo Federal - no segundo mandato do próprio
Governo FHC e no Governo Lula ao mesmo tempo tem influenciado uma série de
gestões em nível estadual amparadas em idéias contidas no Plano Diretor (ABRÚCIO
e GAETANI, 2006).
3.2. A participação privada em infra-estrutura: PPPs em sentido amplo.
O processo de desestatização deslanchado na década de 90 antecede as PPPs em infra-
estrutura no país. O Brasil experimentara, principalmente a partir da década de 30, o
predomínio estatal na prestação dos serviços de utilidade pública, após décadas de
protagonismo privado que remontava às “Cartas de Privilégio” instituídas por meio do
Decreto 101, de 1835. Os investimentos em infra-estrutura estatal se expandiriam nas
décadas de 60 e 70 movidos pelo forte ritmo de crescimento da economia e pela
liquidez do mercado financeiro internacional, que provia recursos suficientes para este
modelo de desenvolvimento.
Nessas cadas se aceleraram os processos de crescimento da capacidade do
Estado brasileiro se financiar por meio de poupança forçada, através do incremento de
recursos orçamentários de origem tributária e de recursos extra-orçamentários,
mediante a criação de grandes fundos (PIS-PASEP, FGTS), emissão de títulos da
dívida pública no mercado financeiro (ORTN e LTN), entre outras fontes. Esta
tendência centrípeta se combinou com a expansão da ação empresarial impulsionada,
entre outros motivos, pela ausência de mercados no nascente capitalismo nacional
(MARTINS, 1985).
Os indicadores de expansão das indústrias de utilidades públicas ilustram os
resultados obtidos até a década de 80, quando, no entanto, os investimentos passariam
a escassear. Revela-o a trajetória das taxas de crescimento de indicadores de infra-
estrutura.
42
Tabela 3: Taxas de Crescimento de Indicadores de Infra-Estrutura (em %)
Períodos Extensão da Malha Rodoviária
(KM)*
Capacidade
de Geração
de Energia
Elétrica
(MW)
Telefones
fixos (linhas)
PIB per capita (R$
de 2005)
1950-1985 4,80 9,40 9,30 3,70
1985-2004 0,60 3,90 6,30 0,70
1950-2004 3,30 7,40 8,30 2,60
Adaptado de Afonso e Biasotto Jr (2007)
* Inclui estradas pavimentadas e não-pavimentadas
Na década de 80, ao secarem as fontes que financiaram a expansão dos
investimentos estatais, expressou-se o esgotamento desta forma de intervenção na
deterioração dos investimentos públicos, represados em face da crise econômico-
financeira do Estado brasileiro e da necessidade de contenção de tarifas cobradas por
estatais prestadoras de serviços públicos (como as distribuidoras de energia) diante da
escalada inflacionária.
Tabela 4: Investimentos públicos em Infra-Estrutura no Brasil por Setor 1981-1990 (% do PIB)
Setor 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990
Eletricidade
3,13 3,30 3,63 3,29 3,56 2,88 3,82 2,94 1,89 1,55
Transporte
0,94 0,62 0,88 0,86 0,68 0,46 0,40 0,73 0,14 0,13
Telecomunicações
0,61 0,66 0,82 0,80 0,74 0,72 0,80 0,90 0,70 0,52
Água
0,45 0,37 0,30 0,18 0,27 0,24 0,30 0,35 0,17 0,19
Fonte: World Bank (2007)
A Constituição Federal de 1988 agravou esse quadro mediante o aumento das
transferências para estados e municípios estes últimos com menores atribuições no
campo da infra-estrutura – a que se adicionou o crescimento das obrigações para com
a seguridade social (AFONSO e BIASOTTO JR., 2007). Nos anos subseqüentes, o
ajuste fiscal concentrado na elevação das receitas não impediu a escalada das despesas
correntes salários, transferências, subsídios, consumo e juros da dívida - em
detrimento das despesas de capital (VELLOSO, 2006; AFONSO e BIASOTTO JR.,
2007).
Dentro desse contexto, as reformas da década de 90 endereçariam o problema
da ausência de recursos para investimentos em infra-estrutura através da abertura dos
setores anteriormente sob exclusiva intervenção de empresas e órgãos estatais para a
iniciativa privada, o que ocorreria no âmbito do programa nacional de desestatização.
Se na década de 80, as privatizações se destinaram a enxugar o portfólio de
investimentos do BNDES e no início da década de 90 foram alienadas empresas de
grande porte historicamente controladas pelo Estado, a partir de 1995 os setores de
43
utilidades públicas – energia, rodovias, ferrovias, telecomunicações – estariam na
ordem do dia.
O Plano Diretor (BRASIL, 1995), referindo-se ao setor de produção de bens e
serviços para o mercado, preconizava que a propriedade estatal só se justificaria
quando não existissem capitais privados disponíveis não sendo mais o caso
brasileiro - ou em casos de monopólio natural, sendo que, neste caso, a gestão privada
tenderia a ser a mais adequada, desde que acompanhada por um seguro sistema de
regulação. Assim se fixavam como objetivos na seara da produção para o mercado:
“dar continuidade ao processo de privatização através do Conselho de
Desestatização”, “reorganizar e fortalecer os órgãos de regulação dos monopólios
naturais que forem privatizados” e “implantar contratos de gestão nas empresas que
não puderem ser privatizadas.”
A regulação, porém, não seria o foco do Plano Diretor; e de fato não viria o
MARE a ser incumbido de coordenar a reforma dos setores de utilidades públicas
abertos para o mercado. A despeito de recomendação exarada pelo Conselho da
Reforma do Estado para a criação de Agências Reguladoras – Recomendação de
31/05/1996 -, os processos de privatização, de criação de marcos regulatórios e de
Agências Reguladoras observaram a dinâmica própria de cada setor – com seus atores
e peculiaridades próprios
33
.
Apesar dessa trajetória fragmentada, as transformações foram relativamente
muitas, a exemplificar: (i) criação do marco legal das concessões e permissões de
serviços públicos, através das Leis Federais n. 8.987/1995 e n. 9.074/1995; (ii)
aprovação das Emendas Constitucionais n. 7 (permitindo o transporte de mercadorias
na cabotagem e a navegação interior por embarcações estrangeiras), n. 8 (permitindo a
exploração, mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de
telecomunicações, e a criação de um órgão regulador); (iii) aprovação de marcos
regulatórios de setores como portos, (Lei Federal n. 8.630/1993), telecomunicações
33
Como exemplo dessa trajetória da reforma regulatória, Mello (2002) registra que a criação da
primeira Agência Reguladora – a Agência Nacional de Energia Elétrica ANEEL estava associada à
modelagem do setor feita em 1997 pela empresa de consultoria Coopers & Lybrand, (...) e não
remetem à reforma administrativa do Governo.
44
(Lei Federal n. 9.472/1997), energia elétrica (Leis Federais ns. 9.074/1995,
9.427/1996, 9.468/1998, 10.438/2002, 10.848/2003) e autorização legal para
delegação de portos e rodovias para administrações estaduais, responsáveis por tocar
programas de arrendamento e concessões; (iv) instituição de agências reguladoras de
setores de utilidades públicas, como transporte (ANTT e ANTAQ), energia (ANEEL),
telecomunicações (ANATEL) e água (ANA); (v) alienação do controle de empresas
estaduais de distribuição de energia, de subsidiárias da então holding Telebrás,
outorga de concessões nos setores de transporte (rodoviário e ferroviário) e de
arrendamentos no portuário; (vi) desenvolvimento de empreendimentos estruturados
como project finance e de expertise no financiamento do processo de desestatização
(BNDES) e na regulação (Agências Reguladoras).
Referidas transformações institucionais criaram marcos que oportunizaram a
realização de investimentos privados no transcorrer dos anos 90, de maneira que o
Brasil veio a ser o maior beneficiário de investimentos em infra-estrutura na
mencionada década (WORLD BANK, 2007). Entretanto, a maior parte dos referidos
investimentos foi dirigida para a aquisição de ativos nos processos de privatização, e
não a investimentos greenfield, que proporcionam novos estoques de infra-estrutura
(WORLD BANK, 2007).
Figura 5: Destino do investimento privado nos anos 90 no Brasil
Investimento Privado em Infra-
Estrutura no Brasil, de acordo com o
setor (1994-2002)
Transporte;
14,51%
Água e
Esgoto;
2,20%
Energia;
34,16%
Telecomuni
cação;
49,12%
Investimento Privado em Infra-
Estrutura no Brasil, de acordo com a
modalidade (1994-2002)
Contrato de
Gestão e
Leasing,
0.01%
Greenfield,
24.16%
Concessão,
14.75%
Aquisições,
61.07%
Fonte: Banco Mundial (2007)
Dessa maneira, os institutos até então criados, mormente as concessões de
serviços públicos, que pressupunham que a remuneração do investidor privado se
daria exclusivamente através da exploração dos serviços concedidos (mediante tarifas
ou receitas de fontes alternativas) não se mostravam suficientes para compensar a
45
redução dos investimentos públicos como ocorrera, por exemplo, no Chile
(WORLD BANK, 2007).
Assim era, especialmente, em face do diagnóstico presente ao fim desse
processo inicial de concessão de serviços públicos, de que os retornos proporcionados
pelos serviços explorados não recompensariam os elevados riscos incorridos pelos
investidores na América Latina em geral, em contraste com o investimento em infra-
estrutura nos países da OCDE, considerado de longo prazo e baixos risco e retorno
(WORLD BANK, 2007)
34
.
Neste contexto, as Parcerias Público-Privadas passaram a ser citadas por
autoridades do Governo Federal, por ocasião da implantação de projetos do Plano
Plurianual 2000-2003, que tinha entre seus nortes a perspectiva, ainda difusa, de atrair
recursos privados para o investimento em infra-estrutura. Realizados os primeiros
estudos ao fim do Governo Fernando Henrique Cardoso
35
- o que incluiu a elaboração
de uma primeira minuta de projeto de lei o Governo Lula acolheria a idéia em 2003
com entusiasmo. O primeiro projeto apresentado ao Congresso pelo Governo (Projeto
de Lei n. 2.546/2003), objeto de críticas na iniciativa privada
36
e no Senado Federal
37
,
foi reformulado por iniciativa do próprio Governo, desta feita com participação
intensa da Secretaria do Tesouro Nacional, sendo propiciada aprovação, em
31/12/2004, de substitutivo no Senado através de acordo entre lideranças do Governo
e da Oposição na Comissão de Assuntos Econômicos CAE (SUNDFELD, 2005;
PORTUGAL e PRADO, 2007).
34
Sirtaine et al. (2005) revelam que, no período entre 1997-2003, o retorno sobre o capital empregado
(RoCE) se mostrou inferior ao custo ponderado médio do capital (WACC) para os setores de energia,
telecomunicações e água, corroborando estudos similares Estache e Pinglo (2004), que ilustrariam a
insuficiência dos retornos obtidos nas concessões comparativamente com os riscos assumidos, ainda
altos devido à volatilidade dos retornos.
35
Sundfeld (2005) e Portugal e Prado (2007) trazem relatos sobre a trajetória de aprovação do projeto.
36
“Setor privado cobra garantias para investir”. Folha de São Paulo. Dinheiro, 01/02/2004.
37
“PPP é convite à corrupção, reafirma Tasso (Jereissati)”. Folha de São Paulo, Dinheiro, 18/09/2004.
46
3.3. As PPPs em sentido estrito no Brasil.
As PPPs instituídas no Brasil em 2004 têm conceito mais estrito do que a amplitude
que lhes emprestam os programas da maior parte dos países que as empregam, como
Inglaterra, Canadá e Portugal.
Este fato relaciona-se com o contexto em que foi lançado o programa
brasileiro de PPPs, quando a participação privada na prestação de serviços públicos
em geral, e na infra-estrutura em particular, já era objeto de outras formas de parcerias
entre agentes públicos e privados. Parcerias blico-Privadas num sentido amplo,
abrangente não apenas de infra-estrutura, como também de outras áreas, não são
propriamente uma novidade no Brasil. Na área social, é histórica a participação
privada, remontando a tempos coloniais, das ordens e irmandades que cuidam de
assistência social, cemitérios, orfanatos e educação, tendo por contrapartida não
apenas contribuições privadas como dotações do setor público (QUEIROZ e
ALVARENGA, 2006). Recentemente, a própria Reforma da Gestão Pública de 1995
criou as Organizações Sociais - OS e Organizações da Sociedade Civil de Interesse
Público – OSCIPs.
Na infra-estrutura, data do período imperial a criação das Cartas de Privilégio,
por intermédio do Decreto 101, de 1835, o qual autorizou a instituição de companhias
de estrada de ferro que estivessem interessadas em promover a ligação da Capital do
Império, Rio de Janeiro, às capitais de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia
(FROÉS, 2006). Ainda no Império são conhecidos os casos das ferrovias brasileiras,
no século XIX implantadas sob o amparo da cláusula ouro, através da qual o Tesouro
assumia o compromisso com o concessionário de cada ferrovia de lhe garantir uma
rentabilidade mínima (ZYMLER e ALMEIDA, 2005). As concessões em setores de
infra-estrutura foram se esvaindo a partir da década de 30, com o nascedouro e
apogeu do Estado desenvolvimentista, para só então na década de 90 tornarem à
ordem do dia.
A aprovação da Lei Federal n. 8.987/1995 é o marco central da nova era de
PPPs em sentido amplo, ao disciplinar a delegação da execução de serviços públicos
47
ao particular que, em seu próprio nome e por sua conta e risco, explore-o mediante
tarifa paga pelo usuário ou outra forma de remuneração decorrente da prestação do
serviço (DI PIETRO, 2002)
38
. Assim, as concessões instituídas nos anos 90,
inspiradas nos princípios internacionais da reforma do Estado, inovavam em relação
ao modelo pretérito, em que os riscos assumidos pelo particular eram bastante
reduzidos; desta feita, os riscos seriam contratualmente compartilhados
39
, embora,
como anotam Câmara (2005) e Portugal e Prado (2007), nem todas as concessões
outorgadas tenham materializado os princípios da gestão por resultados e da
transferência de riscos.
A Lei Geral de Concessões proporcionou, ao lado dos marcos regulatórios
setoriais, o retorno da iniciativa privada nos setores de telecomunicações, energia,
rodovias, saneamento e ferrovias, recorrendo-se também a autorizações para o
desenvolvimento de atividades outorgadas para particulares em regime competitivo e,
ainda, permissões, estas últimas adstritas a outorgas temporárias e precárias.
Amparados nesses marcos legais gerais e setoriais foram estruturadas project finances
no transcorrer da década de 90, cuja modelagem se aproxima do que vêm a ser as
PFIs britânicas
40
. Entre outras parcerias também utilizadas, citam-se as franquias,
realizadas pelo Correios para expandir sua rede de agências, os contratos de
arrendamento, celebrados para operações portuárias, contratos de operação e
manutenção (O & M) de infra-estruturas, bastante utilizados por Companhias
Estaduais de Saneamento, contratos turn key, de que recorrentemente faz uso a
Petrobrás; operações urbanas consorciadas, disciplinadas pelo Estatuto das Cidades
(Lei Federal n. 10.257/2001); além de outras modalidades sistematizadas no trabalho
de Di Pietro (2002).
38
A Lei n. 8.987/1995 rege também as concessões precedidas de obras públicas e as permissões.
39
Assim seria com base no art. 10: “Sempre que forem atendidas as condições do contrato, considera-
se mantido seu equilíbrio econômico-financeiro”.
40
Como exemplos, os projetos de geração de energia que vieram a constar do Programa Prioritário de
Termelétricas PPT, em que, mediante autorização, os parceiros privados construíam e operavam o
empreendimento, tendo a compra da energia produzida assegurada; e o Programa de Incentivo a Fontes
Alternativas de Energia PROINFRA, que garantiam a compra de energia, por prazo determinado, de
novos empreendimentos baseados em energia eólica, biomassa e pequenas centrais hidroelétricas,
criados pela Lei Federal n. 10.438/2002.
48
Apesar de as parcerias em sentido amplo terem se incorporado na realidade da
Administração Pública na década de 90, a introdução do novo marco legal a Lei de
PPPs resultou do entendimento de que o ordenamento jurídico carecia,
particularmente, de normas que tratassem expressamente da possibilidade de
contraprestações adicionais às tarifas
41
e respectivos sistemas de garantias para os
projetos que não fossem viabilizados exclusivamente por meio da cobrança de tarifas
e de fontes alternativas de receita; assim como de um marco que possibilitasse o
recurso à estrutura de incentivos das concessões para serviços administrativos em
geral que demandassem a implantação prévia de infra-estrutura.
O marco legal então existente de contratos com o Poder Público a Lei de
Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal n. 8.666/93) e a Lei Geral de
Concessões (Lei Federal n. 8.987/1995) não dava conta desse duplo desafio,
limitando, assim, a aplicabilidade da estrutura de incentivos própria das PPPs
internacionais. Em efeito, de um lado, nas contratações administrativas comuns,
regidas pela Lei de Licitações e Contratos Administrativos, não estão presentes os
novos horizontes que haviam sido abertos pelas Reformas da Gestão Pública, como a
transferência para parceiros privados de riscos e responsabilidade de um conjunto de
atividades, como projetos, construção e operação de serviços e o foco nos resultados
em detrimento de regras (PORTUGAL e PRADO, 2007). De outro, a Lei Geral de
Concessões embora pressupusesse a transferência de riscos e o foco nos
resultados - não se voltavam explicitamente a projetos não sustentáveis
economicamente, que demandassem subsídio estatal, além de garantias adicionais ao
parceiro privado.
Dessa maneira, a criação da Lei de PPPs brasileira tinha dois objetivos
principais, nas palavras de Portugal e Prado (2007): “permitir e viabilizar e realização
de pagamento de subsídio pela Administração aos concessionários de serviços
públicos que não se sustentam financeiramente com a mera cobrança de tarifas” e
“autorizar a utilização da estrutura econômica das concessões de serviço público para
41
Como explicam Sundfeld (2005) e Andrade (2005), a contraprestação era possível na Lei de
Concessões, embora limitada a sua eficácia à míngua de uma disciplina de garantias.
49
a contratação de serviços antes submetidos ao regime contratual previsto na Lei
8.666/93”.
Em relação ao primeiro, Freitas (2006) assinala que as PPPs, no contexto
brasileiro, nada mais são do que versões “blindadas” de contratos administrativos bem
conhecidos, as concessões; teria sido juridicamente viável, inclusive, sua criação
ainda que menos impactante na esfera política – por intermédio de retoques às Leis de
Concessões e de Licitações. O conceito das PPPs brasileiras, mais restrito que a
dominante no Direito Comparado, introduziria “a tentativa de oferecer garantias
adicionais (a blindagem) para alguns contratos públicos, com o propósito de atrair
investidores a aceitar o longo prazo de amortização para empreendimentos de monta
(FREITAS, 2005).
No que se refere ao uso da estrutura econômica das concessões, poder-se-ia,
expandir o modelo de incentivos das concessões com o bundling das atividades de
projeto, construção, operação e manutenção para contratos de prestação de serviços
que envolvessem elevados investimentos, preteritamente regidos pelas regras da Lei
de Licitações.
Nesse particular, materializou-se essa preocupação no veto ao inciso II do art.
11, que previa a possibilidade de o parceiro privado elaborar os projetos executivos
das obras, mas não o projeto básico (como nas concessões comuns); as razões do veto,
explicitando a convergência com as experiências internacionais, assinalavam que uma
das diversas fontes de eficiências das PPPs era “a elaboração dos projetos básico e
executivo pelo parceiro privado”. Eis, pois, que as PPPs permitiriam ao Estado
celebrar contratos em que o particular assume os riscos pela entrega dos serviços
(outputs), devendo a contratação ser feita não mediante a prévia elaboração de projeto
pelo Estado, mas simplesmente de elementos deste quando precedida de execução de
obra pública, conforme já previsto na Lei Geral de Concessões (art. 18, XV), sem que
seja vedada a participação na licitação do autor do projeto (art. 31, Lei Federal n.
9.074/1995).
Neste passo, as PPPs brasileiras são espécies da qual a concessão é gênero.
Paradoxalmente, como exposto no capítulo 2, as PPPs na literatura internacional são
50
gênero – do qual as concessões são apenas uma – ainda que das mais relevantes, como
as PFIs - espécie
42
. Assim, com a edição da lei das PPPs (Lei Federal n. 11.079/2004),
em 30 de dezembro de 2004, o governo brasileiro ampliou a potencialidade de
contratações com agentes privados sob a estrutura de incentivos própria das
concessões. É por isso que, embora não tenha inaugurado um marco geral de
parcerias, a Lei possibilitou o estabelecimento de uma abordagem abrangente, através
da expansão do modelo contratual para mais setores não apenas serviços públicos
econômicos, mas serviços administrativos em geral – e mais unidades federadas.
Pode-se afirmar, pois, que a criação das PPPs reflete a adoção de uma sistemática
ampla de parcerias, nos moldes das PFIs britânicas. O conjunto de leis que
disciplinam a contratação de obras públicas passou a ser composto por um leque
abrangente de possibilidades, a que estão subjacentes riscos e incentivos distintos.
Tabela 3: Objetos das modalidades de contratação
Contrato Comum Concessão Comum PPP (Concessão
Administrativa)
PPP (Concessão
Patrocinada)
Objeto
Obra e/ou serviço Serviço Público
Econômico com
sustentabilidade
econômico-
financeira
Serviço
administrativo geral
ou Serviço Público
Econômico sem
sustentabilidade
econômico-
financeira
Serviço Público
Econômico sem
sustentabilidade
econômico-
financeira
Prazo
Conclusão da obra
(se incluída no
PPA) e 5 anos para
serviços de natureza
contínua
Setorial Mínimo de 5 anos e
máximo de 35
Mínimo de 5 anos e
máximo de 35
Elaborado pelo autor
As PPPs brasileiras se subdividem em dois tipos de concessões: (i) a
concessão patrocinada é a “concessão de serviços públicos ou de obras públicas de
que trata a Lei n
o
8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente
à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao
parceiro privado” e (ii) a concessão administrativa corresponde ao contrato de
42
O enquadramento das PPPs como concessões é assim justificado por Portugal e Prado (2007): “...a
Lei de PPP buscou, por um lado, tanto quanto possível, preservar e aproveitar o arcabouço legal e
institucional montado ao longo dos anos 90 para realização dos processos de desestatização. Doutro
lado, tratou de incorporar esse arcabouço inovações ou aperfeiçoamentos que provieram de duas
origens: da experiência acumulada no âmbito das Agências Reguladoras na lida com contratos de
concessão e do Direito Comparado”.
51
prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta,
ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”.
Nota-se, assim, que a concessão patrocinada segue o mesmo rastro das
concessões comuns da Lei Federal n. 8.987/1995, com a novidade da contraprestação
adicional resguardada por garantias; a concessão administrativa é o contrato de
prestação de serviços que, preteritamente regido apenas pelas normas da Lei de
Licitações e Contratos (Lei Federal n. 8.666/93), passa a poder ser realizado na
estrutura econômica da concessão quando envolver investimentos de monta, com
prazos superiores a cinco anos para amortizar elevados investimentos. Os serviços
objeto dessas concessões podem ser não apenas os serviços públicos econômicos,
passíveis de ser explorados através da cobrança de tarifas dos usuários, mas também
serviços administrativos prestados ao Estado o que expande consideravelmente o
objeto potencial das PPPs.
As principais inovações das PPPs, além da participação do Poder Público na
remuneração do particular (total, no caso das concessões administrativas, e parcial, no
caso das patrocinadas), as que abaixo se discrimina: (i) o pagamento condicionado ao
início da disponibilização do serviço (art. 7º) e ao cumprimento de indicadores de
desempenho fixados no contrato (art. 6º, Parágrafo Único); (ii) a criação de garantias
para a eventual inadimplência do Poder Público, inclusive mediante a instituição de
Fundo Garantidor cuja execução não fica submetida à ordem de inscrição dos
precatórios, conforme art. 100 da Constituição Federal (art. 8º)
43
; (iii) o step-in-rights,
isto é, a possibilidade de o financiador do projeto assumi-lo no caso de inadimplência
do concessionário, instituto típico das project finance (art. 5º, §2º, I), além da
possibilidade de emissão de empenho em favor do financiador (art. 5º, §2º, II) e a
legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por extinção
antecipada do contrato, bem como pagamentos efetuados pelos fundos e empresas
estatais garantidores de parcerias público-privadas (art. 5º, §2º, III); (iv)
obrigatoriedade de criação de Sociedade de Propósito Específico – SPE para executar
o projeto (art. 9º); (v) licitações com possibilidade de inversão das fases de habilitação
43
O Fundo Garantidor da União Federal foi disciplinado pelo Decreto Federal n. 5.411/2005,
administrado pelo Banco do Brasil, de acordo com a Resolução n. 2 do Comitê Gestor de PPP Federal.
52
e julgamento das propostas, de etapa de saneamento de falhas formais e leilões em
viva voz (art. 10); (vi) aplicação de reajuste sem necessidade de homologação da
Administração (art. 5º, §1º)
44
.
Explicitando, ainda, a reprodução do modelo da Lei de Concessões que
atribuía ao contrato a distribuição dos riscos, a Lei das PPPs previu como cláusula
obrigatória sua alocação objetiva sendo o contrato, maleável às características do
projeto em implementação, o instrumento por excelência da relação entre as partes
(PORTUGAL e PRADO, 2007).
A Lei prevê a criação de órgão gestor, na esfera da União, a fim de definir os
serviços prioritários para execução no regime de PPPs, disciplinar os procedimentos
de celebração dos contratos, autorizar a abertura da licitação e aprovar seu edital e
apreciar os relatórios de execução dos contratos. Assim, o Decreto Federal n.
5.835/2005 criou o Comitê Gestor de Parceria Público-Privada Federal, formado por
representantes do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que o coordena,
do Ministério da Fazenda e da Casa Civil da Presidência da República. Foram criados,
ainda, a Comissão Técnica das Parcerias Público Privadas e o Grupo Executivo,
cabendo a este segundo, sob a supervisão da primeira, assessorar o CGP em suas
atividades.
Dessa maneira, e seguindo lições absorvidas da literatura internacional sobre
PPPs e de países como Inglaterra, Holanda e Portugal, a União criava um órgão gestor
central das parcerias, fazendo uso, ainda, o CTP, de Forças-Tarefas para a
implantação de projetos, conforme autorizado pela Resolução n. 2 do CGP. Exemplos
de Forças-Tarefas autorizadas são aquelas criadas pela Portaria n. 977/2005 expedida
pelo Coordenador do CTP, para levar adiante os projetos da BR-116 e da Ferrovia
Norte-Sul.
44
A Lei das PPPs repercutiu na Lei das Concessões: a Lei Federal n. 11.196/2005 viria ulteriormente
para alterar a Lei Geral de Concessões, a fim de nela incorporar parte das inovações presentes na Lei
das PPPs, no que tange ao processo licitatório e às garantias adicionais para os financiadores. Seria
disciplinada com maior rigor, ainda, a regra que possibilita ao concessionário ceder parcela de seus
créditos operacionais futuros para garantir os contratos de financiamento firmados para o cumprimento
do contrato de concessão (art. 28-A), indispensável para a viabilização de Concessões e PPPs sob a
estrutura de project finance.
53
O risco de servirem como fontes de endividamento público foi objeto de
acirrado debate no curso da tramitação do projeto de Lei, reverberando a discussão
internacional sobre a matéria
45
. Em resposta a esse tipo de críticas, a Lei das PPPs
criou critérios que condicionam a escolha das PPPs, seja para impedir seu uso
indiscriminado em detrimento de concessões comuns em que não desembolso
estatal -, seja para constranger a possibilidade de aumento do endividamento em
longo prazo que comprometa a responsabilidade fiscal.
Como forma de evitar o uso ilimitado de PPPs, a lei brasileira requer que os
projetos tenham investimento mínimo de R$ 20 milhões, com prazos mínimos e
máximos de prestação de serviços de, respectivamente, 5 e 35 anos; veda que o
contrato tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e
instalação de equipamentos ou a execução de obra pública; submete a contratação de
concessão patrocinada com mais de 70% da remuneração do parceiro privado feita
pela Administração a prévia aprovação legislativa; e limita o comprometimento da
União com PPPs ao teto de 1% da receita corrente quida anual, ficando os demais
entes federativos que superarem esse limite proibidos de receber garantias e
transferências voluntárias. Este limite um dos objetos de alegações de
inconstitucionalidade por juristas é, hoje, contestado particularmente por
Governadores do Nordeste
46
.
A própria abertura de procedimento licitatório para contratação de PPP fica
submetida aos critérios inscritos no art. 10 da Lei das PPPs, em que se destacam a
demonstração, pela autoridade competente, da conveniência e da oportunidade da
contratação, mediante identificação das razões que justifiquem a opção pela forma de
parceria público-privada, da compatibilidade com as regras da Lei de
Responsabilidade Fiscal, inclusive os limites de endividamento, quando for o caso, a
submissão do Edital a consulta pública e a licença ambiental prévia ou expedição das
45
Pinheiro (2003), por exemplo: “Vista dessa forma, a PPP nada mais é do que uma forma do governo
tomar recursos emprestados para financiar uma obra hoje, deixando a conta para ser paga por futuras
administrações”.
46
Segundo o jornal Valor Econômico (15/04/2008), o Governador de Pernambuco formalizou pleito
para a Casa Civil, a fim de que dito limite seja ampliado para 5%.
54
diretrizes para o licenciamento ambiental do empreendimento, sempre que o objeto
contratado o exigir.
Embora a Lei não imponha o critério do value for money por meio de
metodologia similar às PFIs, é demandada a demonstração da conveniência e
oportunidade da contratação através da modalidade PPP em detrimento, por exemplo,
de concessão comum. Foi neste sentido, por exemplo, que após conclusão dos estudos
sobre os projetos da Ferrovia Norte-Sul e da BR 116-324, na Bahia, optou-se por
excluí-los da carteira de PPPs federais, que poderiam ser viabilizados por
concessão comum
47
.
No que se refere ao enquadramento das despesas contraídas com as PPPs, o
art. 25 outorgou para a Secretaria do Tesouro Nacional a incumbência de editar
normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de
parceria público-privada. A STN o fez por meio da Portaria n. 614/2006, a qual
estabeleceu como regra geral (art. 4º) que a assunção pelo parceiro público de parte
relevante de pelo menos um entre os riscos de demanda, disponibilidade ou
construção será considerada condição suficiente para caracterizar que a essência de
sua relação econômica implica registro dos ativos contabilizados na SPE no balanço
do ente público em contrapartida à assunção de dívida de igual valor decorrente dos
riscos assumidos. Isto é, segue-se o princípio geral de que a assunção de riscos
relevantes implicariam a contabilização do ativo construído por meio das PPPs no
balanço do ente público.
Por fim, necessário registrar que, antes mesmo da aprovação das PPP,
inúmeros Estados – cuja situação fiscal posterior ao Plano Real impedia a contratação
de grandes investimentos haviam se adiantado na aprovação de suas Leis de PPPs.
Foi o caso de Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo, Goiás, Bahia e Ceará.
Posteriormente à aprovação da Lei Federal n. 11.079/2004, outros Estados, além do
Distrito Federal, seguiriam esse rastro, como Pernambuco, Alagoas, Paraíba Piauí,
47
A exclusão desses primeiros projetos-piloto de PPP pela União Federal refletiu a melhoria do
cenário econômico nacional e internacional, como a queda nas taxas de juros, a maior disponibilidade
de capital no mercado financeiro, a baixa probabilidade de uma crise cambial e o crescimento da
atividade produtiva doméstica diverso, portanto, da crise por que passou o país quando do impulso
aos primeiros projetos.
55
Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, e Municípios como São Paulo, Vitória e
Porto Alegre. Todos eles se submetem às normas gerais das Leis das PPPs, as quais
não podem ser contrariadas por Leis Estaduais e Municipais, que resguardam a
competência concorrente para disciplinar normas especiais, nos termos do art. 24, §§
3º e 4º da Constituição Federal.
As primeiras PPPs foram contratadas nos Estados
48
. Os principais Estados que
têm desenvolvido projetos e aberto licitações são Minas Gerais e São Paulo, seguidos
por Pernambuco, Bahia, Distrito Federal, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Outros
tantos Estados, embora tenham aprovado suas Leis, ainda não deslancharam seus
primeiros projetos. Vários setores têm sido examinados para implantação através de
PPPs, conforme ilustra o gráfico abaixo com projetos em diferentes estágios, dos
primeiros estudos à efetiva contratação.
Tabela 5: Carteiras de Projetos no Brasil
Estado/Município Setor
União Federal Instalações Administrativas (Datacenter), Transporte
(Rodovias), Projetos de Irrigação
São Paulo (Estado) Transporte (Metrô, Corredores, Trens), Saneamento (Sistema
Alto Tietê), Segurança (Identificação On Line de Identidade),
Esporte (Complexo Desportivo), Saúde (Planta de Produção de
Medicamentos)
São Paulo (Município) Transporte (Metrô), Educação (Creches)
Minas Gerais Transporte (Rodovias), Segurança (Presídio), Instalações
Administrativas (Centro Administrativo, Unidades de
Atendimento Integrado), Educação (Campus de Universidade)
Pernambuco Transporte (Ponte/Sistema Viário, Rodovia), Saneamento
(Sistemas de Saneamento), Segurança (Presídio), Saúde
(Hospitais), Instalações Administrativas (Sistema de
Atendimento Integrado)
Bahia Saneamento (Emissário Submarino), Transporte (Rodovia),
Segurança (Presídio)
Rio Grande do Sul Transporte (Rodovias)
Distrito Federal Instalações Administrativas (Centro Administrativo)
Santa Catarina Transporte (Portos, Rodovias), Saneamento (Redes de Água e
Esgoto), Segurança (Presídio), Instalações Administrativas
(Centro Administrativo)
Elaboração do autor
48
As primeiras PPPs foram a concessão administrativa para a operação de um emissário submarino na
Empresa Baiana de Saneamento EMBASA, a concessão patrocinada para a exploração da rodovia
MG-50 pelo Estado de Minas Gerais, a concessão patrocinada para exploração da linha 4 do Metrô de
São Paulo e a concessão patrocinada de Pernambuco para exploração de rodovia em Jaboatão dos
Guararapes.
56
4. FUNDAMENTOS TEÓRICOS DOS INSTITUCIONALISMOS.
4.1.Institucionalismos e trajetórias de reforma.
As descrições entabuladas nos capítulos 2 e 3 permitem inferir que as PPPs como
forma de governança estão imersas num ambiente institucional que interfere na sua
adoção e implantação. As teorias institucionalistas trazem hipóteses relevantes sobre o
assunto, sugerindo explicações de variações e convergências e as conseqüências em
termos de estratégias e resultados.
É difícil renegar o fato de que as reformas difundidas nas últimas décadas têm
origens que atingem diferentes países manifestas em fatores propulsores
econômicos, sociais e demográficos comuns, mas também em respostas
assemelhadas, como as próprias PPPs. Contudo, não é certo resumi-las aos passos
iniciais da Nova Gestão Pública na Inglaterra, Nova Zelândia e Austrália; mesmo
nesses países pioneiros, que originalmente deram primazia aos nortes do controle
fiscal e da eficiência, a trajetória não foi uniforme no tempo (ABRÚCIO, 2005), vez
que a agenda reformista incorporou novos temas para além das preocupações de
minimize e marketize (POLLITT e BOUCKAERT, 2000), ganhando espaço a
efetividade dos serviços públicos e a accountability.
Outros países desenvolvidos, em cujas jurisdições é rica a agenda reformista,
apresentam estratégias mais suaves, mediadas por sistemas políticos consensualistas,
como os nórdicos, muitos dos quais introduziram inovações com trajetória
incremental, seguindo a trilha da modernização (POLLITT e BOUCKAERT, 2000), a
enfatizar processos de desregulação, descentralização política e administrativa,
participação e accountability (BRESSER-PEREIRA, 2004), embora também
incluindo instrumentos de mercado. Na América Latina, é comum a identificação de
uma primeira onda centrada no ajuste fiscal e nas privatizações e de uma segunda
etapa reformista, em que se reconhecia a relevância da mudança institucional a
orientar transformações nos sistemas administrativo, político e judicial (HAGGARD,
1995; LORA, 2007).
Pierson (1994) e Pollitt e Bouckaert (2000) são exemplos de análises
institucionalistas que recorrem ao institucionalismo: o primeiro, enfocando as
57
dificuldades dos Governos Reagan e Thatcher, na década 80, de reformarem os
Estados de bem-estar social, respectivamente, dos Estados Unidos e da Inglaterra; os
segundos, examinando as variadas trajetórias e estratégias de reformas em países
desenvolvidos.
O conceito de instituições nem sempre é unânime nas diferentes tradições
teóricas. North (1990; 3), por exemplo, denomina-as como os constrangimentos,
criados pelo homem, que torneiam a interação humana, reduzindo a incerteza ao
prover uma estrutura que orienta o intercâmbio. Hall e Thelen (2005; 3), cuja
background teórico é da ciência política e da sociologia, definem-nas como um
arranjo de práticas regularizadas com a qualidade de regras, de forma que os atores
esperam sua observância, estejam ou não amparadas por sanções enfatizando mais
do que North as instituições como recursos que podem ser o próprio objeto da ação,
para além dos constrangimentos que modelam a interação humana. De formas
variadas, pode-se assinalar como pontos comuns nos conceitos de instituição a
abrangência de um sistema de regras formais e informais que estruturam as relações
sociais (HODGSON, 2006).
É relevante, ainda, ressaltar que esse sistema de regras é composto de
diferentes planos, cujos padrões de transformações são diferentes, conforme
taxonomia de Williamson (2000), segundo quem quatro níveis complementares, a
saber, o enraizamento social, o ambiente institucional (ou “regras do jogo”), as
estruturas de governança das transações (o “jogo em disputa”) e, finalmente, a
alocação de recursos.
Tabela 6: Níveis de Análise Institucional
Nível de Análise Freqüência (em anos) Propósito da ação social
Enraizamento: instituições
informais, costumes, tradições,
normas religiosas
10
2
a 10
3
Espontânea, não calculada
Ambiente institucional: regras
formais do jogo (direitos de
propriedade, judiciário, executivo,
legislativo, sistema administrativo)
10 a 10
2
Adoção da instituição: Economia de
“primeira ordem”
Governança: disputa do jogo
(alinhamento de estruturas de
governança e transações)
1 a 10 Adoção da estrutura de governança:
Economia de “segunda ordem”
Alocação de recursos (preços e
quantidades; alinhamento de
incentivos)
Contínua Adoção das condições marginais
“corretas”: Economia de “terceira
ordem”
Adaptado de Williamson (2000)
Desse modo, as instituições informais e o ambiente institucional definem as
regras do jogo em que são processadas as políticas públicas na esfera das estruturas de
58
governança, onde o jogo é propriamente disputado, havendo complementaridades
entre os planos: as eficiências obtidas nas estruturas de governança dependem do
ambiente institucional. As PPPs, por exemplo, são estruturas de governança cujo
desenho seria condicionado pelas regras formais e informais que delimitam os
potenciais da cooperação.
As explicações institucionalistas de diferentes vertentes política, econômica,
sociológica – formulam hipóteses que procuram explicar cursos de processos de
reformas, na medida em que os novos formatos organizacionais podem enfrentar
resistências no ambiente institucional (resiliência), podem ser mimetizados
(isomorfismo) ou adaptados, podendo resultar em funcionamento diferente das formas
de governança.
4.2. O isomorfismo institucional: explicações econômicas e sociológicas.
A literatura econômica de diferentes matizes explica como o objetivo da eficiência
pode proporcionar o isomorfismo no plano das estruturas de governança, sendo
relevantes nas discussões sobre a reforma da gestão pública as teorias do agente-
principal (JENSEN e MECKLING, 1976), dos contratos incompletos (GROSSMAN e
HART, 1986) e da economia dos custos de transação (WILLIAMSON, 1991). O traço
comum dessas correntes teóricas reside no relaxamento dos estritos pressupostos da
economia neoclássica, o que lhes permite examinar instituições e organizações,
enquanto a economia walrasiana, não se propondo a tanto, atribui a firmas caracteres
de função de produção maximizadora de lucros uma caixa preta, enfim
(EISENHARDT, 1989)
A economia dos custos de transação (ECT), variante da agenda de pesquisa da
nova economia institucional, explica através do conceito de custos de transação o
porquê de as atividades serem realizadas em diferentes estruturas de governança.
Referido conceito foi formulado por Ronald Coase (1937;1960), segundo quem as
organizações hierárquicas, como firmas, são criadas diante da existência de custos
para celebração de contratos no mercado (“custos de transação”), consistentes na
procura por fornecedores, na especificação de serviços, na negociação dos termos
59
contratuais, no monitoramento da partes contraentes e no enforcement das obrigações
contratadas.
A hipótese da ECT, portanto, como assinala Oliver Williamson (1991)
principal expoente da escola modernamente é a de que as transações são alocadas
em estruturas de governança que melhor representem a minimização dos custos de
produção e de transação.
Adotando pressupostos que a distinguem da teoria econômica neoclássica,
como a racionalidade limitada, e carecendo do grau de formalização próprio dos
modelos econométricos, a ECT tem sido bastante relevante como teoria sobre
contratos inclusive para contratos firmados pelo Estado (BAJARI e TARDELIS,
2001; ATHIAS e SAUSSIER, 2006; CHONG, HUET e SAUSSIER, 2006; BILLON,
2006). A despeito de seguir o método hipotético-dedutivo (BRESSER-PEREIRA,
2000), a rigor não é certo afirmar que a ECT ampare soluções do tipo one size fits all,
porque os atributos das transações que definem as estruturas de governança mais
eficientes são variáveis que podem ser consideradas contingentes a setores e países,
como a incerteza da negociação, a especificidade dos ativos envolvidos e a freqüência
do acordo.
As teorias do agente-principal e dos contratos incompletos (TCI) contêm um
grau maior de formalização matemática, aproximando-se mais da teoria econômica
neoclássica, de que se afastam, essencialmente, na assunção de que existem
informações assimétricas entre contratantes (agente-principal) e entre contratantes e
terceiros (TCI) e no enfoque das organizações como objeto de observação
(SAUSSIER, 2005).
Das teorias econômicas sobre contratos mais detalhadas no capítulo
subseqüente emanam hipóteses sobre a maior eficiência que pode ser obtida através
de estruturas de governança apropriadas para determinadas transações, que,
outorgando riscos e direitos para o prestador do serviço, proveriam maiores incentivos
para o investimento e a inovação ao menor custo possível arcabouço relativamente
mais vantajoso do que as hierarquias de comando e controle próprias do modelo
burocrático.
Contudo, a agenda da reforma do estado incorporou outros temas como
efetividade e accountability cujo norte valorativo não está adstrito à eficiência, de
60
forma que as pressões para o isomorfismo podem ser identificadas, também, com
amparo em fatores não-econômicos, nos moldes sugeridos por Powell e DiMaggio
(1983), cuja base teórica é sociológica, partindo do pressupostos, portanto, de que a
ação reformista, socialmente orientada, não se ampara exclusivamente no cálculo
maximizador, mas em diferentes tipos de ação social categorizados por Weber (1999).
As organizações não competem somente para serem mais eficientes, mas por poderes
políticos e por legitimidade, existindo processos que as induzem a serem mais
parecidas sem, necessariamente, tornarem-se mais eficientes. São identificados três
mecanismos de mudança isomórfica.
Primeiro, o isomorfismo coercitivo, cuja pressão formal ou informal - se
origina de organizações das quais seja o ente reformista dependente, o que pode
explicar, por exemplo, transformações induzidas por entidades multilaterais
estimuladoras de novos formatos institucionais e ao mesmo tempo financiadoras de
projetos.
Segundo, o isomorfismo mimético, resultante das incertezas enfrentadas pelo
ente reformista que, em face de problemas com soluções ambíguas e causas não muito
claras, amparam-se em experiências bem sucedidas de outras entidades. A
exemplificar, a experiência britânica de PFIs pode servir como um guia para inúmeros
entes estatais que enfrentaram o desafio de expandir sua infra-estrutura sem recursos
orçamentários para tanto, ainda que não haja conclusões cabais sobre a solução
perseguida.
Terceiro, o isomorfismo normativo, fundado no consenso de profissionais de
uma determinada área profissional que, através de uma visão compartilhada da
realidade e de redes de disseminação de informações, legitimam certos formatos
institucionais no caso das PPPs, a importância de cnicos e consultores na
disseminação de informações sobre PPPs pode oferecer amparo também para esta
hipótese.
61
4.3. A adaptação institucional: a explicação da Economia dos Custos de
Transação.
Como antes assinalado, seria simplória a conclusão de que as hipóteses oriundas da
ECT convergiriam para o isomorfismo institucional, visto que o próprio Williamson
(1991) admite que as características inerentes a cada transação são determinadas por
fatores exógenos, como a estabilidade do ambiente institucional em que se insira a
transação.
Reconhecendo que as atribuições das transações são contingentes a
características do ambiente histórico-institucional em que estão insertas, a ECT
permite o desenvolvimento de análises de caso históricas (NORTH e WEINGAST,
1989). Não por outro motivo, esta corrente teórica que se origina na economia foi
acolhida na ciência política, de que são exemplos os trabalhos pioneiros de Mccubins,
Noll e Weingast (1987; 1989). Custos de transação, nesta seara, costumam ser
definidos como aqueles imprescindíveis para se obter a cooperação de atores políticos
sendo função dos sistemas políticos que estruturam os incentivos destes. A
exemplificar, em sistemas políticos cujas regras eleitorais estimulem o personalismo
dos parlamentares como o voto proporcional aberto a cooperação é obtida através
do dispêndio de recursos para obras particularistas (porks) e empreguismo
(patronage). Duas abordagens recentes e complementares enfrentaram diretamente o
tema da complementaridade institucional: Cox e Mccubins (2001) e Spiller e
Tommasi (2003).
Cox e Mccubins (2001) fazem uso do conceito de Tsebelis (2000) de Veto
Players
49
, para examinar dois trade-offs subjacentes aos efeitos do sistema político-
constitucional sobre as políticas públicas encampadas na esfera das estruturas de
governança.
O primeiro se refere aos atributos de decisiveness (capacidade de decisão) e
resoluteness (estabilidade da decisão) para pôr em realce a escolha que os países
enfrentam no desenho de seus sistemas políticos entre ter (i) a habilidade para decidir
49
Veto Players são tomadores de decisões (individuais ou coletivos) cuja concordância é necessária
para uma mudança no status quo (TSEBELIS, 2000).
62
com celeridade e (ii) a habilidade para se comprometerem com a continuidade das
políticas.
Ambos os extremos do continuum são problemáticos. A incapacidade de
tomar decisões pode exacerbar o unilateralismo, levar a diferentes formas de
paralisação do sistema e a maiores custos fiscais em face dos elevados custos de
transação (traduzidos em dispêndio de recursos orçamentários e empregos para
obtenção de apoio político) demandados para a tomada de decisão. Já o Estado
incapaz de se comprometer impossibilita a sustentabilidade de uma política que
demande cooperação de longo prazo.
O outro trade-off se reporta à oposição entre universalismo e particularismo
das políticas. Sistemas políticos com elevado número de pontos de veto isto é,
combinando divisões constitucionais de autoridade no processo de produção de
políticas e divisões de propósitos entre os poderes constitucionais proporcionariam
incapacidade de decisão ou balcanização, neste segundo caso a capacidade decisória
sendo obtida mediante soluções do tipo second ou third best, como custosas trocas
particularistas em detrimento de políticas concebidas para o interesse público.
Isto, por outro lado, não quer dizer que seja desejável um Estado sem pontos
de veto, cujo preço seria sua irresolução, a ser paga pela incapacidade de se
comprometer com políticas de longo prazo, assim como pelo baixo nível de
representatividade dos interesses sociais.
Nota-se, assim, que o mérito do modelo de Cox e Mccubins (2001) está em
assinalar os trade-offs envolvidos na interação entre o ambiente institucional e as
políticas nele produzidas, útil para explicar as implicações, em termos dos formatos
das políticas públicas, das características mais marcantes do sistema constitucional
analisado.
Aplicando a contratos de longo prazo, que envolvem recursos vultosos,
referido modelo implica que um sistema político-constitucional em que o Poder
Executivo não se submete a checks and balances pode ter dificuldades em garantir
sua credibilidade com a iniciativa privada. No outro extremo, sistemas político-
constitucionais com excesso de pontos de veto podem produzir o lock-in do Estado
em arranjos com a iniciativa privada desvantajosos e que ainda assim compreendam
décadas de prazo contratual.
63
O modelo de Spiller e Tommasi (2003), que se inspira em Levy e Spiller
(1996) e orientou o subseqüente trabalho Politics of policies (2007), produzido pelo
Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID, exemplifica a inflexão das
reformas de estado para temas de natureza institucional, compreendendo uma
abordagem que expande os insights de Cox e Mccubins (2001) e oferece hipóteses
explicativas da variedade de resultados encontrados nas reformas das últimas décadas.
Segundo estes autores, as políticas públicas resultam de uma série de transações
políticas intertemporais entre atores racionais, que são modeladas pela natureza das
instituições nacionais.
Estas instituições, assumidas como exógenas, fornecem os incentivos para os
atores chave Executivo, Legislativo, Burocratas investirem em ações individuais
ou coletivas na produção de políticas.
Assume-se que características ótimas de equilíbrio que são alcançadas
sob condições ideais: são as políticas produzidas por atores com horizontes temporais
longos, que descontam o futuro a uma taxa de desconto baixa
50
, realizando contratos
completos e plenamente enforceables. A definição clara e coercível dos direitos de
propriedade políticos gera, então, políticas ótimas, dotadas das características
desejáveis, como qualidade, previsibilidade e adaptabilidade a circunstâncias
supervenientes.
Por oposição, haveria ambientes institucionais que dariam incentivos para que
os atores descontassem o futuro a taxas de descontos demasiado altas, tendendo a
adotar políticas com horizonte temporal curto, com o objetivo de obter ganhos
imediatos.
Na hipótese, poderiam ser produzidas políticas públicas sub-ótimas, mas
somente através de salvaguardas adicionais que oferecessem credible commitments.
Os atores teriam de amarrar suas mãos para alcançar resultados melhores, mas ao
fazê-lo não poderiam reagir celeremente a eventos supervenientes que exigissem
mudanças nas políticas públicas.
As possíveis resultantes de ambientes institucionais desse tipo seriam: (i)
perseguição de benefícios de curto prazo para formação de coalizões políticas; (ii)
regras inflexíveis, processos e estruturas para políticas de longo prazos que
50
Isto é, o horizonte temporal do autor é longo, pois ele valoriza os resultados futuros de sua ação.
64
mitigassem o oportunismo dos agentes com horizontes temporais curtos; (iii) políticas
desejáveis não implementadas (indecisiveness); ou (iv) sub-investimento em
capacidades dos agentes envolvidos (como os servidores públicos), levando a
políticas de baixa qualidade.
A implantação desse tipo de estrutura second ou third best seria condicionada
pelo ambiente institucional, através (i) do número de pontos de veto, (ii) de quem
possui o poder de veto a cada momento do tempo, (iii) da extensão do horizonte
temporal dos atores, (iv) das características institucionais que admitam a prática de
atos unilaterais sem contraditas (medidas provisórias e processo orçamentário, por
exemplo), (v) das capacidades administrativas do Estado e (vi) da estabilidade
política.
No seguinte gráfico fica estruturado o modelo dos Custos de Transação de
Spiller e Tommasi (2003):
Figura 5: Instituições Políticas, processo de formulação de políticas e outcomes
Fonte: Spiller e Tommasi (2003)
Assim, no modelo da ECT, a incorporação das PPPs na agenda reformista
poderia ser realizada mesmo em regimes políticos e burocráticos de natureza
instáveis, com melhoria da qualidade das políticas públicas, embora nem sempre
produzindo os mesmos resultados que seriam alcançados num ambiente institucional
superior.
65
4.4. A resiliência institucional: os limites das reformas no institucionalismo
histórico.
Reformas administrativas implicam transformações deliberadas no curso dos
processos e estruturas das organizações governamentais (POLLITT e BOUCKAERT,
2000), o que pressupõe ações humanas propositais, envolvendo motivos e escolhas
entre alternativas.
Este fato implica que, ao examinarmos trajetórias e estratégias de reformas
institucionais, empreitada em que se lança o trabalho em pauta, não podemos olvidar
dos limites da ação humana para a identificação de desafios, análise de alternativas
para enfrentá-los, instauração de um curso de ação planejado e avaliação e controle
dos resultados alcançados. O reformista, afinal, não tem controle sobre todos os
resultados de sua ação.
Na célebre abordagem de Robert Merton (1936), a ação proposital encontra
limites motivadores de conseqüências não antecipadas, impostos por certos
constrangimentos (estado da arte do conhecimento, erro, conflitos intertemporais de
interesses, decisões formadas sob o domínio de valores e as próprias previsões dos
agentes sociais). As diferentes fontes mertonianas de conseqüências não antecipadas
expõem os obstáculos das ações humanas propositais, não raro examinadas como se
adotadas em ambientes de informação completa, racionalidade plena e cálculo
funcionalista. O reconhecimento da imperfeição da ação deliberada realça o caráter de
muddling through da ciência administrativa (LINDBLOM, 1959), em que o método
decisório não consiste na racionalidade abrangente suposta em alguns modelos
econômicos, mas pelo método das comparações sucessivas e limitadas, em que fins e
cursos de ações escolhidos são entrelaçados e a avaliação da política se mede pelo
consenso dos analistas.
A abordagem do institucionalismo histórico desconfia de transformações
institucionais abrangentes, do tipo one-size-fits-all, identificadas por esses próprios
autores como próprias dos políticos e consultores defensores das reformas de cunho
gerencial (POLLITT e BOUCKAERT, 2000). O óbice central para essa modalidade
de transformação abrangente e de caráter uniforme seria a path dependence, a saber,
processos dinâmicos envolvendo retornos crescentes, o que proporciona a
66
coexistência de múltiplos equilíbrios no mundo social a partir de trajetórias prévias
(PIERSON, 2004). A presença de múltiplos equilíbrios, assim, marca relevante
diferença comparativamente com a ECT.
O conceito de retorno crescente refere-se ao fato de que, eleita uma trajetória
entre outras tantas num determinado ponto do tempo possivelmente tempos remotos
o benefício de conservar o processo instaurado supera de maneira crescente os
custos de reversão para um caminho alternativo, ainda que esta rota distinta
proporcionasse, numa realidade social que existisse no vácuo, resultados melhores
para os agentes envolvidos no processo decisório. Diante do retorno crescente, a
probabilidade de reversão de um curso de ação se reduz ao passo em que este se
estenda no tempo.
Pierson enumera quatro fontes de retornos crescentes: (i) altos custos de
implantação ou custos fixos, que oferecem maiores benefícios marginais no recurso
ao processo previamente escolhido em comparação com as alternativas existentes; (ii)
efeitos de aprendizagem; (iii) efeitos de coordenação, através de externalidades de
redes entre os inúmeros agentes e tecnologias que se entrelaçam no processo
existente; e (iv) expectativas adaptativas entre agentes que realizam suas projeções do
futuro com base nos padrões existentes. Portanto, a manutenção de estruturas
institucionais minimiza os custos de transações dos agentes envolvidos no processo
decisório, ao reduzir as fricções decorrentes de novos aprendizados, compatibilização
de tecnologias na rede, obtenção de informações.
Os processos com retornos crescentes se agravam na política. Primeiro, porque
a prevalência da ão coletiva incrementa os custos de transação dos agentes para
promover mudanças, perante massivos custos de implementação, de coordenação e de
adaptação de expectativas. Segundo, a densidade institucional, derivada da primazia
da coercitividade sobre a troca, impõe constrangimentos formais sobre todos os atores
sociais, independentemente de suas preferências pessoais, reduzindo a potencialidade
da opção de saída, na expressão de Hirschmann (1971). Terceiro, a alocação da
autoridade política e de poderes assimétricos reforça as estruturas institucionais
existentes. E, quarto, a complexidade da política, em cujo contexto as preferências dos
cidadãos dificilmente podem ser adstritas a um único e claro objetivo, fortalece o uso
de mapas mentais que solidificam práticas sociais.
67
Em conjunto com essas características inerentes ao processo político, aumenta
o poder explicativo da path dependence o fato de que os mecanismos para reverter o
curso de ação comumente mencionados na literatura econômica competição e
aprendizado são enfraquecidos pelo horizonte temporal próprio da política e o viés
em favor do status quo.
O horizonte temporal dos agentes políticos, na Administração Pública não é
pautado exclusivamente por considerações de eficiência e efetividade, mas por lógicas
políticas e eleitorais, de maneira que custos e benefícios de longo prazo têm limitado
efeito sobre os agentes que descontam a altas taxas de desconto os retornos de um
futuro distante. Deste modo, potenciais benefícios futuros de um novo curso de ação
podem ser abandonados em prol de ganhos políticos de curto prazo preservados pelo
conservantismo.
Exatamente porque o futuro é descontado fortemente na política, os
compromissos de longo prazo que são realizados o são através de constrangimentos
institucionais criados para limitar a própria ação do agente político, assim como a
discricionariedade de seus sucessores, a fim de criar credible commitment. Esse
padrão de construção de compromissos resulta em instituições resistentes, e, assim,
um viés em favor do status quo.
Essas características presentes na Administração Pública dão a tônica do que
Pierson denomina resiliência institucional, cuja força é função, portanto, não apenas
dos custos de coordenação, do número, estrutura e escopo dos pontos de vetos, como
também da especificidade dos ativos empregados pelos atores na existente estrutura
institucional (investimentos realizados em termos de aprendizado, expectativas, redes
de complementaridade institucional), sendo esta última a fonte por excelência de
retornos crescentes.
A resiliência institucional explicaria, desse modo, as variedades que persistem
nos modelos de Estado, ainda que sob pressões similares que se fazem sentir sobre os
países reformistas nas últimas décadas. Ou seja, a despeito de pressões comuns, as
práticas adotadas seguem trajetórias contaminadas pelo quadro político e
administrativo de cada país.
Das mais disseminadas explicações, nesse tocante, é a de variedades de
capitalismo (HALL e SOSKICE, 2001), segundo a qual as firmas enfrentam
68
problemas de coordenação por intermédio de um conjunto de regras do jogo que se
complementam – o que daria forma a modelos de capitalismo com retornos crescentes
entre as instituições. Esta perspectiva traz hipóteses para a coordenação entre Estado e
particulares aplicáveis ao investimento privado em infra-estrutura, sendo tratada, pois,
no capítulo 5.
O fato é que não haveria, em face do legado do passado enfocado pelo
institucionalismo histórico, uma tendência em favor do isomorfismo institucional: os
países tenderiam a preservar as vantagens comparativas de cada modelo de
capitalismo, submetidas a seriíssimos riscos de falhas as importações de modelos de
alhures. Nota-se, aqui, como a presença de múltiplos equilíbrios se opõe à noção de
equilíbrio ótimo da ECT.
Esta compreensão não redunda, como explicam Hall e Thelen (2005), num
total congelamento das instituições, mas num padrão de reforma raramente
abrangente, na medida em que as formas de coordenação de uma economia
dependentes de múltiplas instituições e atores (uma “ecologia de instituições”) –
poderiam ser afetadas negativamente por reformas que alterasse em profundidade as
instituições que dão suporte a elas. Embora as economias de mercado tenham sido
objeto de liberalização nas últimas décadas, assinalam os autores que os resultados
obtidos são variáveis.
O institucionalismo histórico e as variedades de capitalismo são, pois,
abordagens que se amparam em diferentes fontes embora também na Nova
Economia Institucional. Ao enfatizar a relevância do papel exercido pela cultura,
pelas regras informais e pela história, os autores utilizam a sociologia como amparo
para suas hipóteses, mencionando-se trabalhos como o de Powell e Di Maggio (1983).
4.5. As tradições teóricas em diálogo.
O capítulo ora descerrado procura explorar a relação entre instituições e reformas,
com vistas a identificar tradições teóricas que são aplicadas a PPPs, como se
demonstra no capítulo a seguir.
As abordagens institucionalistas, repousando em metodologias da economia,
da sociologia e da ciência política, enfatizam hipóteses explicativas de padrões
isomórficos, adaptados e variados de mudança; permitem, pois, identificar as pressões
69
em favor da convergência, as oportunidades para alcançar resultados positivos e seus
obstáculos.
Tabela 7: Fundamentos teóricos dos institucionalismos
Corrente teórica Autores Origem Pressupostos
Contratos
Incompletos e
Agente-Principal
Grossman e Hart
(1986), Jensen e
Meckling (1976)
Economia Racionalidade
completa,
informação
assimétrica,
indivíduos
maximizadores
Institucionalismo
sociológico
Powell e Di Maggio
(1983)
Sociologia Ação social
compreensiva
51
Economia dos
Custos de
Transação
Coase (1936;1960),
Williamson (1991),
Cox e Mccubins
(2000), Spiller e
Tommasi (2003)
Economia e Ciência
Política
Racionalidade
limitada,
oportunismo e
indivíduo
minimizador dos
custos
Institucionalismo
Histórico
Pierson (2004) e
Hall et al. (2001)
Economia, Ciência
Política e
Sociologia
Racionalidade
Instrumental e Ação
social compreensiva
Elaborado pelo Autor
Primeiro, há pressões isomórficas fundadas na eficiência e na legitimidade que
podem explicar a adoção de estruturas de governança, mesmo não apropriadas ao
ambiente institucional. Segundo, a ECT, partindo também do suposto da
complementaridade institucional, oportuniza a análise das potencialidades para a
implantação de políticas em ambientes institucionais imprevisíveis, apontado as
implicações das escolhas feitas na esfera das estruturas de governança. Terceiro, as
inovações institucionais propugnadas pelos reformadores, como o são as Parcerias
Público-Privadas, enfrentam obstáculos que moldam as estratégias, que haveria
retornos crescentes na estrutura institucional pré-existente que impedem (ou
reconfiguram) tais inovações ou simplesmente modificam os outcomes dos
resultados prometidos.
51
Remetemos aos tipos weberianos de ação social weberianos próprios do método sociológico: (i)
racional referente a fins, (ii) racional referente a valores, (iii) afetivo e (iv) tradicional (WEBER, 1999)
70
5. REGULAÇÃO ESTATAL E GESTÃO PRIVADA DA INFRA-ESTRUTURA
:
DESENVOLVIMENTO TEÓRICO E APLICAÇÃO DAS ABORDAGENS
INSTITUCIONALISTAS.
5.1. As origens teóricas das PPPs: a construção do Estado Regulatório.
Até o efetivo predomínio intelectual de parcerias com o setor privado disciplinadas
por competição e incentivos (capítulo 2), a intervenção estatal na gestão de infra-
estrutura ocorria através da propriedade pública ou da regulação por instrumentos
como o controle de inputs, de preços e de entrada (VISCUSI, VERNON E
HARRINGTON, 1997). Estes modelos vigentes por considerável parte do século XX,
respectivamente, na Europa e nos Estados Unidos, tinham por fundamentos teóricos a
existência de falhas de mercado. Seus pressupostos amadureceriam nos trabalhos de
economistas como Pigou (1918), Robinson (1934), e Hotelling (1938), culminando
com o que viria a ser denominada Teoria Normativa da Regulação, que define os
postulados motivadores da intervenção estatal na provisão de bens públicos diante da
existência de falhas de mercado.
As falhas de mercado clássicas são as externalidades, os bens públicos e o
monopólio natural.
As externalidades ocorrem quando o comportamento de uma firma afeta a
função utilidade de terceiros, de forma positiva ou negativa, sem que os custos (ou
benefícios) desses efeitos sobre terceiros sejam internalizados pelo agente que os
causa, autorizando a intervenção governamental para fixar limites ao comportamento
danoso ou promover o virtuoso.
Ao conceito de externalidades se assomam os de bens públicos e comuns. Em
efeito, sem os incentivos postos pela atividade reguladora, ou a direta promoção
governamental, as falhas de mercado podem produzir os clássicos problemas do sub-
investimento em bens públicos e a super-exploração dos recursos comuns sendo a
classificação dos bens como tais realizada de acordo com os atributos da exclusão e
da rivalidade
52
.
52
A rivalidade ocorre quando o uso de um bem por um agente reduz a quantidade do referido bem para
o uso de terceiros; são não-rivais aqueles bens cujo uso por um agente não reduz a sua disponibilidade
para terceiros – o custo marginal de se incluir mais um usuário é zero.
71
Recursos comuns produzem um caso clássico de externalidades: a tragédia dos
comuns. Assim são chamados aqueles bens rivais de cujo gozo nenhum usuário pode
ser excluído. Os usuários internalizam individualmente os ganhos privados de seu
uso, mas não os custos sociais da utilização, consistentes na escassez dos bens para o
uso de terceiros. Como exemplo clássico, recursos naturais não-renováveis como a
água são disciplinados por normações estatais com vistas a minimizar os custos da sua
super-exploração
53
.
São classificados como bens públicos aqueles de cujo gozo nenhum usuário
pode ser excluído ou é difícil fazê-lo e em que é zero o custo marginal para um
indivíduo adicional usá-lo não-rival). Tais bens não são providos porque os
benefícios privados hauridos por potenciais provedores não internalizam os ganhos
sociais de sua oferta, ao passo em que os usuários beneficiam-se coletivamente com a
referida infra-estrutura pagando ou não, sendo-lhe mais atraente agir como free riders:
aproveitar o bem público sem colaborar com seu financiamento o conhecido “efeito
carona”. O exemplo de bem público puro
54
mais citado é a defesa nacional: não é
possível excluir um morador da proteção provida e é zero o custo de beneficiar um
indivíduo a mais.
Finalmente, o monopólio natural é caracterizado por um conflito entre
eficiências produtiva e alocativa. A atividade assim se qualifica quando os custos de
produção em especial por haver um grande custo fixo envolvido - são menores com
um único prestador que obtém ganhos de escala (eficiência produtiva), em detrimento
da eficiência alocativa, que o monopolista fixará seu preço de venda acima do seu
custo marginal e o consumo dos bens e serviços produzidos pelo monopolista fica
aquém do nível que maximiza o bem-estar social, produzindo o peso morto
(deadweight losses) correspondente à quantidade não consumida (PINHEIRO e
JADDI, 2005)
55
.
53
Uma das formas de disciplinar essa super-exploração é a outorga de direitos de propriedade para
indivíduo que internalize os custos da utilização (STIGLITZ, 2000).
54
O bem público puro atende na integra os requisitos de não-exclusão e não-rivalidade. Há, porém,
bens que atendem apenas parcialmente a alguns dos requisitos, mas são providos pelo Estado
(STIGLITZ, 2000). São bens públicos impuros.
55
A ineficiência alocativa, nos setores de infra-estrutura, é especialmente danosa porque a maioria dos
usuários mantém seu vel de consumo independentemente do preço praticado pelo monopolista, cuja
elasticidade é baixa. Assim, os consumidores têm pouca influência sobre a fixação da tarifa pelo
monopolista (ARMSTRONG, COWAN e VICKERS, 1994).
72
A essas falhas de mercado clássicas externalidades, bens públicos e
monopólio natural - a literatura econômica adicionou conceitos que questionariam a
solução puramente de mercado para provisão de bens e serviços, como as informações
assimétricas (AKERLOF, 1970) e os mercados incompletos (STIGLITZ, 2000). A
rigor, informação é uma espécie de bem público (STIGLITZ, 2000), cuja não
provisão gera imperfeições de mercado
56
; mercados incompletos correspondem a
falhas do mercado em prover certos tipos de bens, como seguros, mercado de capitais
e mercados complementares
57
.
Em face das falhas de mercado, a solução postulada pela Teoria Normativa da
Regulação era de que as atividades a elas afetas deveriam ser submetidas a
intervenção estatal, através da provisão direta dos bens públicos e comuns, ou por
intermédio da regulação, mediante instrumentos de controle como o estabelecimento
de preços, a fixação de quantidades e a criação de regras de entrada (VISCUSI,
VERNON e HARRINGTON ,1997).
Em ambos os casos (regulação ou provisão direta), o pressuposto da
intervenção era de que o governante seria um ditador benevolente, cujo objetivo é
maximizar o bem-estar social, sendo-lhe outorgada ampla discricionariedade para
perseguir esta finalidade. Como, nos modelos da economia neoclássica (STIGLITZ,
2000), o Estado é uma variável exógena, autores como Sappington e Stiglitz (1987)
advogam que as privatizações apenas poderiam atender a demandas sociais no caso de
mercados perfeitos, porque comparados com formas de intervenção “ótimas”,
maximizadoras do bem-estar geral. Sob a preponderância destas premissas teóricas,
na Europa e na América Latina prevaleceu como solução a supressão da atividade
privada na provisão de infra-estrutura pública, enquanto os Estados Unidos
inauguravam o formato institucional das agências reguladoras independentes, que se
desenvolvera especialmente a partir de 1887, com o Interstate Commerce Act - que
56
Seguros e mercados de capitais são citados como dois mercados que podem não ser providas sem
uma regulação da informação.
57
Stiglitz (2000) explica que mercados complementares o aqueles que dependem entre si para que
haja a provisão. Um exemplo frugal é o café e o açúcar. A inexistência de mercado para um dos bens
pode proporcionar a não provisão do outro.
73
criou o ICC Interstate Commerce Commission, primeira agência reguladora
americana (VISCUSI, VERNON e HARRINGTON, 1997)
58
.
A profusão de agências no sistema político-jurídico americano dar-se-ia mais
exatamente a partir do New Deal, quando o approach teórico do governo como
solução viria a preponderar. O modus operandi das agências reguladoras americanas,
amparadas pela sua propagada expertise em detrimento do amadorismo dos políticos,
era de elevada discricionariedade na maneira de intervir, superando as estritas
preocupações madisonianas com freios e contrapesos da Constituição americana,
suposto entrave para a ação governamental em favor do interesse público
(SUNSTEIN, 1987). O modelo regulatório predominante era o da taxa de retorno, no
qual cabia ao agente regulador fixar a tarifa dos prestadores de atividades reguladas,
acrescendo-se ao custo do regulado um plus que lhe garantiria a atratividade do
negócio
59
.
A Teoria Normativa da Regulação receberia na década de 70 as críticas que
nortearam as reformas regulatórias nas décadas seguintes. Referiam-se elas tanto ao
pressuposto político da Teoria Normativa – a noção de ditador benevolente como às
estruturas de governança regulatória - nos Estados Unidos, agências com elevado
poder discricionário e, na Europa, empresas estatais.
Em 1971, o economista George Stigler publicava “A Teoria da Regulação
Econômica”, cuja conclusão era a de que “em regra, a regulação é adquirida pela
indústria, além de concebida e operada em seu benefício”. Stigler argüia que a oferta
de regulação atendia a uma demanda da indústria, no que viria a ser conhecida como
Teoria da Captura. Mencionada proposição, à falta de comprovações empíricas
ulteriores (PELTZMAN, 1989), recebeu aprimoramentos de Peltzman (1976) no
que veio a ser chamada Teoria Econômica da Regulação cuja premissa era de que o
processo regulatório era integrado por agentes auto-interessados reguladores,
empresas reguladas e consumidores de forma que os primeiros procuravam
58
Froés (2006) esclarece que a Inglaterra teve experiência com órgão regulador antes dos Estados
Unidos, pois em 1873 a Railway and Canal Comission atuava na fiscalização das operações de
ferrovias privadas. A estatização dessas atividades na Inglaterra, contudo, provocou a solução de
continuidade dessas experiências no século XX, até a década de 80.
59
Do ponto de vista dos incentivos, esse modelo se aproxima do cost plus, ambos sendo enquadráveis
como regimes do custo do serviço, em que ao particular regulado não são transferidos os riscos de seu
gerenciamento.
74
equilibrar o suporte político dos empresários que visam a lucros maiores com o apoio
dos usuários dos serviços regulados, que se eleva com a redução dos preços.
Em verdade, como reconhece Posner (1974), antes de Stigler formular sua
Teoria da Captura e Peltzman (1976) conceber a Teoria Econômica da Regulação,
outros economistas haviam interpretado o processo político incorporando o Governo,
como apregoa Downs (1957), “não como uma variável exógena, mas endógena ao
modelo econômico”. Desta feita, os governantes não seriam “perfeitos altruístas em
busca do bem comum”, mas “maximizadores de rendas, poder e prestígio” (DOWNS,
1957).
O mesmo individualismo metodológico que orienta Downs, sob o pressuposto
do auto-interesse, fundamentou os trabalhos de Buchanan e Tulock (1962) e de Olson
(1965), culminando com a aplicação de suas premissas à regulação por Stigler e
Peltzman, que então teria grande influência no debate americano a respeito da
regulação
60
. Contraditava-se, assim, a noção, então prevalecente, de que a
discricionariedade e a expertise dos reguladores proporcionariam a correção das
falhas de mercado.
Havia, como enfatiza a literatura da public choice, “falhas de governo” as
decisões políticas também provocam externalidades àqueles por elas prejudicados -
que pesariam contra a intervenção governamental, sendo a escolha pública ponderada
pelo trade-off entre os custos para se tomar uma decisão que compreenda todos, não
causando externalidades (regra da unanimidade) e os custos das externalidades da
ação governamental - que aumenta proporcionalmente à redução do número de
decisores (BUCHANAN e TULOCK, 1962).
Sob o prisma econômico, o modelo então prevalecente de regulação por
agência ou prestação de serviço público diretamente, através de empresas estatais,
tampouco restaria incólume.
Primeiramente, Demsetz (1968) e Posner (1970) contestariam o suposto de
que as únicas alternativas para as falhas de mercado seriam a regulação discricionária
da agência reguladora ou a prestação direta dos serviços. Impossibilitada a
60
No período, é questionado o isolamento tecnocrático das agências, discutida a criação de novos
mecanismos de controle pela Presidência, pelo Legislativo e pelo Judiciário e proporcionado um
ambiente em favor da desregulação (SUNSTEIN, 1987)
75
competição no mercado diante dos elevados custos fixos (sunk costs) que tornariam
contraproducente em termos de eficiência produtiva a duplicação de ativos, o second
best seria a “competição pelo mercado”. A autoridade pública poderia, mediante
licitações, oferecer para os interessados o monopólio no exercício das atividades
disputadas por um prazo certo, de forma que os concorrentes fixariam preços que não
seriam próprios de monopólio natural. Esta proposição, embora contestada por
Goldberg (1976) e Williamson (1975)
61
, ofereceu as bases teóricas para a regulação
amparada no contrato e no regime de preço do serviço como estrutura de governança.
Segundo, os efeitos do monopólio natural seriam contrapostos em face de
teorias oriundas da corrente econômica da Organização Industrial (BAIN, 1954), que
enfoca como objeto de análise a estrutura da indústria - fornecedores, clientes,
substitutos, entrantes potenciais como determinante do retorno das empresas, e não
estas isoladamente. Desta tradição nasce a teoria dos mercados contestáveis, de
Baumol, Panzar e Willig (1982), segundo os quais, ainda que de um mercado fizesse
parte número pequeno de competidores, bem como estivessem presentes altos custos
fixos e economias de escala, as empresas não teriam a liberalidade de fixar o preço
que bem entender se deparadas com a entrada efetiva ou potencial de novos
competidores. A contestabilidade, desta forma, apenas não seria possível quando
presente custos fixos irrecuperáveis (sunk costs), de forma que a reação do
incumbente ao ingresso de novos concorrentes se daria por meio da redução de preços
o que eleva em demasia o risco de que os novos entrantes não recuperem o capital
investido.
A contestação dos mercados seria um substituto preferível para a regulação
fundada na fixação de tarifas e nas barreiras de entrada e saída. O regulador poderia
assegurar a redução das barreiras em mercados potencialmente competitivos, de
maneira que o preço do incumbente pudesse ser desafiado pela ameaça de entrada de
novas empresas no mercado. Tal proposição teórica embasou, no âmbito das reformas
regulatórias, a desverticalização das atividades prestadas pelo monopolista
(unbundling), abrindo-se os mercados contestáveis para novos entrantes e assegurado
61
A crítica centra desses autores é de que, mesmo após a competição ex ante, o monopólio ex post não
asseguraria a eficiência alocativa. Williamson (1975) nota que a barganha ex post do monopolista sem
efetiva concorrência poderia dissipar os ganhos ex ante.
76
o acesso não-discriminatório da infra-estrutura necessária (instalações essenciais
62
)
para a prestação dos serviços, modelagem seguida, por exemplo, nos setores elétrico e
de telecomunicações.
Terceiro, as próprias deficiências dos modelos pré-existentes mostravam-se
mais claramente. A ineficiência das empresas estatais era explicada pelas teorias dos
direitos de propriedade e dos contratos incompletos (ALCHIAN e DEMSETZ, 1972;
GROSSMAN e HART, 1986), da economia dos custos de transação (WILLIAMSON,
1991) e do agente-principal (JENSEN e MECKLING, 1976), que sublinhavam os
baixos incentivos existentes para a inovação e a produtividade, em vista da não-
transferência de riscos e direitos residuais de controle para os executores dos serviços.
As falhas do tipo regulatório da taxa de retorno/cost plus manifestavam-se na custosa
apuração da estrutura de custos internos dos regulados, bem como do monitoramento
de suas ações inobserváveis, em face das informações assimétricas existentes em
desfavor do ente regulador (LITLECHILD, 1983; ARMSTRONG, VICKERS e
COHAN, 1994) – o que proporcionou a concepção do price cap por Litlechild (1983),
originalmente para o setor elétrico britânico.
A criação do price cap, em que o preço da empresa regulada passa a ser
disciplinado pela fórmula “RPI – X”
63
, associa-se ao conceito de regulação por
resultados (ou incentivos). A empresa regulada assume os riscos correspondentes a
sua estrutura de custos e da definição dos meios para a entrega dos serviços
outorgados; o objeto da regulação não mais é a apuração destes, mas da produtividade
e qualidade dos serviços ofertados. Transferência de riscos e regulação por resultados
seriam dois princípios norteadores do gerencialismo presentes tanto na regulação das
utilidades públicas quando nas Private Finance Initiative PFI (HM TREASURY,
2008).
Esse novo sistema de regulação por incentivos em que a regulação direta é
subsidiária quando impossível a competição e a contestabilidade (LITLECHILD,
62
A doutrina das essential facilities operacionalizou a abertura dos mercados contestáveis. Seu
precedente jurisprudencial nos Estados Unidos (MCI Communications Corp. x AT&T, 7th Circuit)
postulou sua aplicação quando (i) o ativo é controlado por monopolista; (ii) o competidor não pode
duplicá-lo; (iii) o monopolista recusa o compartilhamento; e (iv) possibilidade cnica de
compartilhamento (OECD, 1996).
63
RPI é a sigla de Retail Price Índex, indexador dos preços dos serviços regulados. X é o fator
produtividade que, fixado pelo regulador, deveria ser deduzido do reajuste periodicamente aplicado à
tarifa.
77
2003) requisitaria, ainda, a adoção de mecanismos que proporcionassem a
credibilidade intertemporal de agentes públicos, cujo suposto comportamental não
mais era o do ditador benevolente, mas de atores políticos constrangidos pelas regras
do jogo político-eleitoral (MAJONE, 1999). Assim, o modelo de agências foi
difundido para inúmeros países, tendo por fundamento, além das vantagens
decantadas de autonomia e conhecimento técnico, o da credibilidade.
Esse conjunto de teorias deu respaldo para as reformas regulatórias da década
de 1980, particularmente a britânica que - abrangendo os setores elétrico, de gás,
telefonia e saneamento - impulsionou a adoção de parcerias com o setor privado sob
novos princípios, influenciando os marcos regulatórios dos demais países reformistas.
Entre as principais diretrizes do chamado Regulatory State se destacam: (i)
abertura do mercado de utilidades públicas para o setor privado, através de
privatizações, concessões e parcerias público-privadas; (ii) introdução da competição
ex ante através de processo licitatórios e abertura de mercados contestáveis; (iii)
criação das agências reguladoras com autonomia decisória e financeira e mandatos
para seus diretores, com o objetivo de garantir a credibilidade de longo prazo das
políticas regulatórias e a expertise técnica; (iii) recurso preferencial à regulação por
incentivos, através de instrumentos como price cap, yardistick competition
64
e
segregação dos mercados contestáveis (unbundling), além da outorga de direitos de
exploração mediante licenças e/ou contratos competitivamente licitados.
5.2. O Ambiente Institucional: as regras do jogo.
5.2.1. O Estado Regulatório: a hipótese da convergência.
As principais proposições teóricas inerentes às reformas no campo regulatório
envolviam as estruturas de governança (agências e contratos) e a alocação dos ativos
(participação privada) que ofereceriam maiores estímulos para o investimento
produtivo e a inovação.
64
Forma de competição administrada em que o regulador fiscaliza os parâmetros de eficiência de um
operador em comparação com outros operadores, reproduzindo, assim, uma ambiente competitivo num
monopólio natural.
78
Essas proposições culminaram em estratégias reformistas que, segundo
Majone (1999), “concorrem para limitar o papel do Estado intervencionista ou
positivo, especialmente ao restringir seu poder de tributar e de despender, ao mesmo
tempo em que aumenta o poder normativo e, assim, o papel do Estado regulador”.
Neste passo, o Estado Regulador refletiria uma convergência internacional na forma
de intervenção estatal na economia, desta feita de forma indutiva, através da disciplina
de incentivos.
Referindo-se particularmente à Europa, o autor relata como a propriedade
pública como instrumento de intervenção estatal, a partir da década de 70, passou a
ser substituída pela propriedade privada, disciplinada por um modo alternativo de
controle. A privatização, assim, era seguida por uma combinação entre desregulação e
nova regulação, que buscaria atingir “alguns objetivos reguladores através de métodos
menos pesados”. O Estado Regulador traduz em termos institucionais a convergência
dos Estados Nacionais para um novo modelo de governança que se opõe ao Estado
Positivista marcado pelo controle direto, através da propriedade. O quadro abaixo
resume as principais características do Estado Regulador via-à-vis o Estado Positivo
(MAJONE, 1999):
Tabela 8: Estado Positivo e Estado Regulador
Modelos Estado Positivo Estado Regulador
Funções principais Redistribuição, estabilização
macroeconômica
Corrigir falhas de mercado
Instrumentos Tributação (ou tomar fundos
emprestados) e dispêndio
Formulação de regras
Arena Política principal de conflito
político
Alocações orçamentárias Revisão e controle de formulação
de regras
Instituições características Parlamento, departamentos
ministeriais, empresas
nacionalizadas, serviços de bem-
estar social
Comissões parlamentares, agências
e comissões independentes,
tribunais
Atores-chave Partidos políticos, funcionários
públicos, grupos corporativos
Movimentação em prol de questões
singulares, reguladoras, peritos,
juízes
Estilos de políticas Discricionário Limitado por regras, legalista
Cultura de políticas Corporativista Pluralista
Responsabilização política Direta Indireta
Fonte: Majone (1999)
Nas áreas que demandam conhecimentos e experiência específicos e a
necessidade de comprometimentos - demandas reforçadas pela dinâmica da economia
nas últimas décadas, cujas rápidas transformações seriam de difícil acompanhamento
em termos de produção legislativa ou por burocracias generalistas - o Estado
Regulador trazia como novidade institucional a outorga de autonomia a agentes
79
independentes, cuja “verdadeira vantagem comparativa (...) é a combinação de
conhecimentos e experiência específicos com a continuidade de preocupações. Isto
é, a concessão de autonomia para as agências reguladoras no contexto das reformas
das últimas décadas tinha por principal desafio resolver o problema de inconsistência
temporal comum nas democracias, em que o processo político determina o rumo e a
aceleração das políticas públicas, o que pode ser incompatível com políticas de longo
prazo que envolvem ativos específicos, para cujo sucesso a credibilidade regulatória é
condição sine quo non.
A difusão isomórfica do Estado Regulatório ou do Capitalismo Regulatório
(LEVI-FAUR, 2005) – marca os trabalhos da literatura sobre o Regulatory State
(MAJONE, 1999; THATCHER, 2005; GILARDI, 2005). Entre suas forças
propulsoras se destacam fatores top-down: respostas dos policy makers locais a
pressões exógenas, comuns a vários Estados, como a integração da economia
internacional e a maior mobilidade do investimento privado, o surgimento de novas
tecnologias, a transição do modelo fordista para o pós-fordista de produção e a
relevância de instituições internacionais, como a União Européia
65
.
ainda fontes de pressão do tipo bottom-up. Os países enfrentam desafios
similares concomitantemente, para cuja solução os instrumentos do Estado
Regulatório são entendidos como boas soluções. Entre esses fatores são citados a
necessidade de credibilidade, nos termos acima expostos, e a incerteza política,
caracterizada pelo risco de reversão das medidas adotadas, o que sublinha as
vantagens de soluções de credible commitment como a celebração de contratos e a
criação de agências reguladoras independentes (GILARDI, 2005); mas também
podem ser citados a crise fiscal e as ineficiências identificadas no modelo anterior de
provisão estatal direta (MAJONE, 1999).
Finalmente, Gilardi (2005) menciona como fator de homogeneidade a difusão
horizontal entre países, o que pode tomar a forma de duas categorias amplas:
aprendizado e emulação no primeiro caso, a adoção de novos formatos
institucionais é realizada após observação dos resultados alhures; no segundo, a
65
Na Europa, a edição de normativas pela União Européia com aplicabilidade na jurisdição de seus
membros, a demandar entes incumbidos de zelar pelas mesmas, como as agências, que se
disseminaram pelos países da UE (MAJONE, 1999; THATCHER, 2005).
80
importação não depende dos resultados de outros, mas pela mimetização,
independentemente do efetivo sucesso em termos de resultado. Interessante notar que
os padrões de difusão horizontal tampouco são necessariamente nacionais, mas
podem ser setoriais, conforme o modelo de Jordana e Levi-Faur (2003):
Tabela 9: Difusão horizontal das reformas regulatórias
Difusão setorial Difusão Nacional
Aprendizado reformista
Versão “forte”: a performance do
mesmo setor em outros países é a
medida relevante para o
aprendizado.
Versão “fraca”: Setores específicos
com alguma demonstração de
melhor performance são os mais
significantes para a reforma
Versão “forte”: A performance de
outros setores de um país é a
medida relevante para a difusão
através do aprendizado
Versão “fraca”: Países específicos
com um histórico de melhores
performances são considerados os
significantes para a reforma
Emulação reformista
Versão “forte”: O número de países
que reformaram o mesmo setor é a
medida relevante para predizer a
difusão
Versão “fraca”: A existência de
significantes reformas em alguns
setores servem como indicador para
a emulação
Versão “forte”: O número de
setores objeto de reformas num país
é o indicador relevante para a
emulação da política
Versão “fraca”: Os efeitos de ações
significativas de outros países (sem
claro histórico de sucesso) são as
medidas relevantes para a reforma
Fonte: Jordana e Levi-Faur. (2003)
Trabalhos empíricos assinalam, a propósito, a importância da emulação de
reformas tomadas como corretas (taking for granted) e/ou fundadas no simbolismo
tanto na Europa (GILARDI, 2005) quanto na América Latina (JORDANA e LEVI-
FAUR, 2003) o que pode ser parcialmente explicável pela relevância de medidas
urgentes; os Estados nem sempre podem esperar conclusões definitivas de
experiências alheias para tentarem resolver seus problemas de que é exemplo o
apelo das PFIs.
A hipótese da convergência institucional representa o diagnóstico mais
imediato e impressionista das transformações nas formas de provisão de infra-
estrutura nas últimas décadas, sendo composto por explicações isomórficas que
acompanham as tradições sociológica e econômica eficiência, normatividade,
coerção e incerteza parecem haver influenciado padrões similares; o ambiente
institucional não teria impedido nem condicionado a convergência do Estado
Regulatório.
81
5.2.2. A abordagem da ECT: a hipótese da adaptação second best.
A variedade de resultados proporcionados pelas inovações nas formas de provisão de
infra-estrutura sugere que o isomorfismo encontrava seus limites nas condições
histórico-institucionais dos países reformistas – a mera adoção da regulação por
incentivos, sem respaldo do ambiente político-institucional, não esgotava os dilemas
regulatórios.
Na década de 90, surgiram evidências de que o modelo regulatório emanado
da Inglaterra não lograva completo êxito em todos os ambientes sem que houvesse a
construção de instituições que lhes dessem suporte. Levy e Spiller (1996), em trabalho
pioneiro nessa agenda de pesquisa, relatam as diversidades de modelos regulatórios,
em muito pautadas pelo sistema político-institucional dos países. Guasch (2004)
aponta como a adoção da regulação por incentivos (como o price cap) na América
Latina culminara com inúmeros processos de renegociação em que os ganhos das
concessões se dissipavam.
Exemplos de descumprimento das regras contratuais, litígios judiciais e
mudanças dos marcos regulatórios chamavam atenção para o fato de que não
bastariam estruturas de governança teoricamente aptas para atrair e estimular os
investimentos produtivos (WORLD BANK, 2007). Este subsistema regulatório
requeria garantias adicionais das regras do jogo político-institucional que
assegurassem a credibilidade da política regulatória no âmbito das regras do jogo - se
o objetivo, afinal, era propiciar um ambiente propício para o investimento privado de
longo prazo.
Em fato, o tema da credibilidade regulatória é especialmente relevante no
campo da infra-estrutura pública, que demanda investimentos em ativos específicos
por parte de investidores, cuja amortização apenas ocorre no transcorrer de longos
prazos contratuais – com média de duas a três décadas – que ultrapassam vários ciclos
eleitorais numa democracia. Como as utilidades públicas são serviços de alto
consumo pelo usuário-eleitor
66
, os potenciais ganhos eleitorais obtidos com a
expropriação do investidor são um risco a que estão submetidos os concessionários
(SPILLER E TOMMASI, 2005).
66
Evidentemente, aqui consideramos os ativos remunerados diretamente pelo usuário. Mas a
remuneração do Estado, nas PPPs, não eliminam o risco de inadimplemento estatal.
82
A origem do problema da credibilidade no ambiente institucional é resumida
por Weingast (1995): um governo imprescindível e forte para proteger os direitos de
propriedade e fazer cumprir contratos é também forte o suficiente para confiscar a
riqueza de seus cidadãos. Instituições que ofereçam credibilidade para políticas de
longo prazo permitiriam previsibilidade dos padrões de interação. Mas nem todos os
países têm instituições políticas assecuratórias de que as regras do jogo não serão
alteradas, não impedindo, assim, que o Governo que contrata seja o mesmo que
adiante espolie o investidor.
Para North e Weingast (1989), quanto maior for a possibilidade de alteração
das regras contratuais ex post pelo Poder Público, menor é o retorno esperado do
investimento - e maiores são as garantias exigidas pelo particular para ingressar na
cooperação. Assim, duas formas de o Estado se comprometer: primeiro, por
intermédio de sua reputação construída pelo comportamento responsável precedente,
histórico, estando fora do âmbito de mudanças possíveis num horizonte de curto
prazo; segundo, comprometimentos violentos que limitam sua capacidade de mudar
as regras, mas que podem ser as melhores soluções disponíveis em face da natureza
do processo político.
Na literatura da Economia dos Custos de Transação, o output possível nos
casos em que o ambiente institucional e a história do ente público não asseguram
interações de longo prazo ocorre na forma de comprometimentos violentos: agências
reguladoras insuladas, processos administrativos e contratos abrangentes, regidos por
normas que limitem a discricionariedade do Estado, ao preço de diminuir sua
capacidade de oferecer respostas ágeis a choques sócio-econômicos, a novas
demandas eleitorais e/ou prioridades políticas, a mudanças tecnológicas, entre outros
eventos posteriores aos compromissos assumidos com as provedoras dos serviços
públicos (SPILLER e TOMMASI, 2005).
Esses compromissos traduzidos na redução da discricionariedade poderiam
limitar a eficiência da regulação por incentivos, na medida em que esta demandaria
flexibilidade para a atualização dos outputs de serviços, assim como dos níveis de
produtividade requeridos do regulado (SPILLER e TOMMASI, 2005). O resultado
seria um modelo regulatório do tipo second best: ou maiores riscos seriam retidos
pelo Poder Público, ou contratos rígidos provocariam maior custo de transação ex post
83
(refletido no maior custo da mudança contratual) ou se pagariam maiores prêmios de
risco ao investidor.
Em ambientes adversos em termos de cumprimento de compromissos de
longo prazo, surge, então, um trade-off entre credibilidade e flexibilidade, em que a
primeira é conquistada à custa da segunda: o Governo abre mão de seu poder de
decisão para que seus compromissos sejam críveis, paga um preço maior ou retém
maiores riscos. Em todo o caso, a rationale da regulação por incentivos cederia
espaço para um modelo second best.
Entre as características do ambiente institucional que interferem na
credibilidade das estruturas de governança regulatória e, assim, condicionam seu
desenho, é ponto comum na literatura que a existência de pontos de veto é variável
central.
Se a necessidade de credible commitment decorre, sobretudo, da
potencialidade da alteração arbitrária na política pública, tal arbitrariedade pode ser
contida, exatamente, pelos pontos de veto institucionais que limitem a
discricionariedade dos agentes políticos. Se o Legislativo e o Judiciário impedissem o
Executivo de modificar a política regulatória no curso das relações contratuais
celebradas, dispensáveis seriam salvaguardas extraordinárias. Nesse sentido, inúmeros
cientistas políticos, como Henisz (2000), Levy e Spiller (1994), Mauro (1995)
sugerem como medida de credible commitment a existência de pontos de veto no
sistema político, seguindo os citados trabalhos de Cox e Mccubins (2001) e
Tsebelis (2000).
Apesar dessa proposição, como ressaltam Cox e Mccubins (2001), muitos
pontos de vetos podem implicar altos custos transacionais no processo político, que
transbordam para o unilateralismo do Executivo - ou para a construção de coalizões
através de distribuição de recursos e cargos públicos. Se o reduzido número de pontos
de veto pode produzir arbitrariedade, sua elevação pode gerar fisiologismo e
unilateralismo. Assim, em conjunto com o número de pontos de veto, menciona a
literatura o efeito do particularismo do processo eleitoral (HENISZ e ZELNER,
2004). Partidos institucionalizados que resolvem o problema de ação coletiva dos
políticos facilitariam a cooperação de longo prazo; sistemas personalistas elevam os
custos transacionais.
84
Spiller e Tommasi (2005) enumeram também os seguintes determinantes da
cooperação política que influenciam a credibilidade regulatória de um país:
Tabela 10: Variáveis institucionais na ECT
Variáveis Exemplo
Conexões intertemporais entre atores políticos-chave A continuidade dos atores políticos em interação
favorece a cooperação. Partidos políticos consistentes
aumentam o horizonte temporal do jogo político.
Tempo e observabilidade dos movimentos
A cooperação será mais difícil de se sustentar se os
atos unilaterais do Poder Executivo são difíceis de ser
observados pelos investidores privados e verificados
pelo Judiciário.
Tecnologias de enforcement A delegação para uma burocracia capacitada, para um
Judiciário independente ou instrumentos de arbitragem
com firme amparo legal permitem o cumprimento de
transações de longo prazo.
Arena onde as transações políticas são realizadas Formas de celebração de acordos institucionalizados,
por exemplo, no legislativo, engendram cooperação,
enquanto a inexistência de fóruns transparentes a
obstaculiza.
Estrutura de pay-offs entre períodos Se a estratégia de descumprir transações traz benefícios
de curto prazo para os atores políticos, a cooperação
torna-se difícil
Elaboração do autor
São essas variáveis, assim, que em conjunto com a reputação histórica do ente
contratante (WEINGAST e NORTH, 1989) determinariam se as estruturas de
governança regulatória demandariam salvaguardas adicionais ou se, resguardadas
pelas características cooperativas das regras do jogo, a política regulatória dispensaria
regras muito gidas, caracterizando-se como um ambiente ótimo para a regulação por
incentivos.
5.2.3. As variantes de capitalismo regulatório: a hipótese da variedade.
A abordagem das variedades de capitalismo (VC) atribui um peso maior ao legado
histórico subsumido na noção de retornos crescentes - do que a ECT, além de
reservar relevância ao papel da cultura, das regras informais e das expectativas
compartilhadas na explicação institucional. A firma e as formas pelas quais ela se
coordena com suporte nas instituições nacionais são a referência analítica dessa
agenda de pesquisa.
A história tem uma função primordial porque as instituições existentes, as
organizações e a cultura oferecem os sustentáculos para que as empresas resolvam
seus principais problemas de coordenação, que se referem primordialmente aos
seguintes aspectos:
85
Tabela 11: Problemas de coordenação nas variedades de capitalismo
Problemas de coordenação nas variedades de
capitalismo
Conceito
Relações industriais Normatização da barganha acerca de salários e
condições de emprego com a força de trabalho e
organizações dela representativas
Treinamento vocacional e educação Provisão dos recursos para que a força de trabalho
tenha habilidades necessárias para garantir a
competitividade econômica
Governança corporativa Disciplina do acesso ao financiamento e disposição das
regras para investimentos oriundos do patrimônio dos
acionistas (equity)
Relações entre firmas Regência das relações das companhias com outras
empresas, notavelmente fornecedores e clientes
corporativos para garantir o acesso aos inputs e à
tecnologia
Relações com os próprios empregados Regramento das relações com funcionários, a fim de
assegurar sua aptidão técnica e o cumprimento dos
objetivos empresariais
Fonte: Hall e Soskice (2001)
A superação desses desafios é realizada historicamente por meio de
mecanismos de coordenação como mercados, hierarquias e formas híbridas (relações
horizontais entre empresas, Estado, associações). As instituições reduzem a incerteza
que os atores têm em relação aos outros, permitindo que sejam feitos credible
commitments, ao prover capacidades para (i) a troca de informações, (ii) o
monitoramento do comportamento das partes e a (iii) sanção da conduta não-
cooperativa. A presença de complementaridades institucionais com retornos
crescentes é ilustrada pela categorização de dois tipos ideais de capitalismo: a
economia de mercado liberal (EML) e a economia de mercado coordenada (ECL).
Na primeira, o principal mecanismo de coordenação utilizado pelos agentes é
o mercado, existindo menor respaldo institucional para realização de transações fora
dele.
Nesse passo, os sistemas financeiros e de governança corporativa são flexíveis
relativamente a fusões e aquisições, inclusive hostis, criando incentivos para que os
níveis correntes de lucros e preços das ações no mercado de capitais sejam decisivos
para a obtenção de financiamento. Os financiadores fundamentam sua decisão de
investimento, sobretudo, em informações publicamente disponíveis nos balanços
sobre a lucratividade corrente.
Nas relações industriais, a liberdade da firma para contratar e demitir é maior,
sendo menos relevantes instâncias de negociação coletiva. Os sistemas educacionais e
vocacionais são complementares a este mercado de trabalho fluido: o treinamento
86
oferecido centra em habilidades genéricas, pois nem as empresas detêm instrumentos
para garantir a continuidade no emprego de funcionários altamente especializados,
nem estes têm incentivos para investir na formação específica onde a rotatividade no
emprego é elevada. Esse mercado de trabalho flexível permite, ainda, que a
transferência de tecnologia ocorra através da rotatividade de profissionais entre
empresas.
As relações entre firmas ocorrem majoritariamente através do mercado e de
contratos formais. A fragilidade das relações baseadas em reputação e redes de atores
e os sistemas de governança e financiamento sensíveis a flutuações de curto prazo
reduzem os incentivos para credible commitments de longo prazo. O resultado é um
menor amparo para contratos relacionais, cujo instrumento de coordenação cardeal é a
relação de longo prazo.
As complementaridades institucionais existentes são bem destacadas por Hall
e Soskice (2001). Por exemplo, contratos de trabalho flexíveis que permitem às
empresas demitir de acordo com a flutuação econômica são complementares a
mercados financeiros cujas garantias principais de acesso são conferidas pela situação
financeira corrente da companhia. Estruturas corporativas mais flexíveis, pois,
tornam mais fácil para as firmas demitir e contratar quando pressionadas pelo
mercado financeiro, possibilitando-lhes mudar rapidamente para uma nova estratégia
compatível com oportunidades que correntemente surgem num sistema marcado por
ativos mais voláteis.
No outro pólo do espectro, nas EMCs, a governança corporativa e o mercado
financeiro não se amparam preponderantemente em informações públicas; o acesso ao
financiamento é suportado por outras formas de monitoramento, como redes
reputacionais entre atores que compartilham informações, apoiados por associações
empresariais. Ademais, o financiamento seria provido em maior proporção por lucros
retidos, sendo incomuns aquisições hostis. O resultado é uma maior estabilidade dos
fluxos de financiamento.
A estrutura interna das empresas termina por ser complementar ao ambiente
externo menos competitivo. Ao contrário das empresas nas economias de mercado
liberais, aqui é reduzida a capacidade de ação unilateral de contratação e demissão,
atitudes que são comumente mediadas por instâncias de deliberação coletiva, como
87
sindicatos. Assim, com relações mais estáveis entre funcionários e empresas e salários
negociados coletivamente, o treinamento vocacional seria dirigido para capacidades
específicas.
Com mercados de trabalho inflexíveis, a transferência de tecnologia é
realizada majoritariamente por relações de longo prazo entre empresas, sendo comuns
contratos relacionais, flexíveis, com cláusulas abertas, suportados por associações
industriais que provêem standards e meios de resolução de disputas entre empresas
isto é, credible commitments não formais com suporte nas relações empresariais de
longo prazo, no que se nominam contratos relacionais (CASPER, 2001).
Esses grupos polares de EML exemplificados por Estados Unidos e
Inglaterra e EMC como Japão e Alemanha têm vantagens comparativas: as
EMLs estatuem incentivos para inovação radical e adaptação a mudanças abruptas, ao
passo que as EMCs favorecem inovações incrementais que demandem longo prazo de
maturação, assim como standards de qualidade proporcionados por contratos
relacionais com fornecedores e funcionários.
Conforme Hall e Thelen (2005), as complementaridades institucionais e os
retornos crescentes, embora não impedindo reformas, como a liberalização de
mercados ocorridas nas últimas décadas, produzem “distintos caminhos de ajuste”,
mantendo as diversidades nacionais.
No plano das reformas regulatórias, a hipótese das variedades de capitalismo
prediz caminhos interpretativos diferentes do isomorfismo do Estado Regulatório e da
adaptação da ECT: a reforma concorreria para a reconfiguração das instituições de
coordenação, e não por sua integral substituição por novas formas de credible
commitments (THATCHER, 2007). Exemplificativamente, a existência de formas de
coordenação e monitoramento relacionais e não baseadas em balanços patrimoniais
publicamente disponíveis e contratos formais, como nas EMLs podem produzir
Estados Regulatórios em que os compromissos entre os atores sejam fundados não
somente em contratos formais e em que, comparativamente com as EMLs, a
competitividade da indústria seja menor, privilegiando-se a reputação e/ou a
nacionalidade do regulado.
Esta foi a hipótese examinada exploratoriamente por Thatcher (2007),
comparando transformações nos setores de energia e telecomunicações na Inglaterra e
88
na França país este que normalmente é classificado como centrado no Estado ou
semi-articulado (SCHNEIDER, 2004). Os resultados sugerem que, apesar de adotar
instrumentos formais similares aos britânicos, o Governo Francês conservou maiores
poderes sobre os entes regulados, adotou modelos menos competitivos e conservou
controle patrimonial sobre empresas, o que fortalece a hipótese de que os
instrumentos de coordenação pré-existentes entre Estado e iniciativa privada
interferiram no modelo regulatório ulterior.
5.3. A Estrutura de Governança das PPPs: o jogo em disputa.
Observamos, nos tópicos pretéritos, três hipóteses de corte institucional sobre a
introdução da provisão de infra-estrutura através de empresas privadas regidas por
incentivos. Mas de que forma essas hipóteses influenciam a estrutura de governança
típica das PPPs? Se o isomorfismo, a adaptação e a variedade influenciam o desenho
das estruturas de governança, quais são os resultados em termos de incentivos,
flexibilidade, riscos?
O contrato é, por excelência, a estrutura de governança das PPPs
67
. Não é
incomum que o instrumento contratual encontre suporte em instituições
complementares, como standards, processos administrativos disciplinados em Lei e
atos de Agências Reguladoras. Nas PPPs, é no contrato, porém, que se plasmam os
direitos e obrigações das partes, inclusos aqueles abrigados por institutos
complementares regulados em Lei ou atos normativos, refletindo-se nele, pois, as
principais escolhas realizadas pelos agentes sob as regras pré-definidas no ambiente
institucional.
O contrato como estrutura de governança é objeto da literatura econômica
décadas, encontrando em Coase (1937) a origem de contribuições relevantes que
permitem inferir os dilemas a ele subjacentes, com destaque para as teorias do agente-
principal, dos contratos incompletos e da economia dos custos de transação, cuja
unidade, como afirmado, reside nas colaborações prestadas a análises institucionais
indo além, portanto, dos modelos neoclássicos em que organizações são uma black
box.
67
Ver capítulos 2 e 3.
89
Adicionalmente, com suporte em pressupostos de outras ciências além da
economia, notadamente a sociologia, a teoria dos contratos relacionais sugere um
approach que pode ser examinado como substituto ou complementar às teorias
econômicas dos contratos; fato é que, sob a perspectiva dos contratos relacionais se
extraem possibilidades teóricas recorrentemente mencionadas na análise de contratos
de longo prazo.
5.3.1. As Teorias Econômicas dos Contratos.
5.3.1.1. A Teoria do Agente-Principal.
A teoria da agência, a que têm recorrido teóricos de inúmeras áreas no campo das
ciências sociais, enfoca os desafios inerentes à divisão de trabalho cooperativo entre
partes que têm metas diferentes (JENSEN e MECKLING, 1976; FAMA, 1980;
EISENHARDT, 1989).
Os dilemas surgem, fundamentalmente, por decorrência das informações
assimétricas entre as partes, de que resultam os fenômenos da seleção adversa e do
moral hazard.
A seleção adversa é o efeito pré-contratual da assimetria de informações
(AKERLOFF, 1970). Como a parte interessada em celebrar o negócio não detém
todas as informações imprescindíveis para tanto, aceita despender um montante
proporcional à qualidade esperada isto é, com um deságio correspondente ao risco
provocado pela ausência de informação. A conseqüência é que o vendedor que de fato
possua um produto de qualidade superior não realiza o negócio, mas somente aquele
cujo produto tenha efetivamente falhas ocultas.
A seleção adversa, assim, afasta o ofertante de bens de maior qualidade, salvo
se houver mecanismos de sinalização dos atributos do bem negociado processos
licitatórios, por exemplo, enfrentam dito desafio através de mecanismos de
sinalização, como a exigência de requisitos de habilitação jurídica, fiscal, técnica e
econômico-financeira dos interessados.
Moral hazard é um problema pós-contratual que surge em face da existência
de informações privadas exclusivas a uma das partes presentes a priori ou
adquiridas no curso da relação negocial que as pode usar em detrimento do outro
contratante. E o faz porque as informações privadas relevantes podem permanecer
90
ocultas (hidden information) ou porque suas ações não são observáveis ou
verificáveis. A ação é observável quando o outro contraente pode aferir sua
quantidade e/ou qualidade e verificável se houver instrumentos para que a parte
prejudicada possa comprovar sua ocorrência a uma terceira parte incumbida do
enforcement – o Judiciário, em regra.
Neste passo, a Teoria do Agente-Principal se dirige à relação entre uma parte
(principal) que outorga a outra (agente) obrigações que serão desempenhadas em
favor da primeira. As dificuldades advêm, portanto, das finalidades diferentes dos
contratantes e dos óbices em termos materiais e/ou financeiros – para verificação da
conduta do agente.
O desafio enfrentado por esta literatura é alinhar contratualmente as
preferências dos contraentes, o que pode ser perseguido por intermédio de duas
estratégias genéricas: a uma, pode ser instituído um sistema de monitoramento e
colheita de informações (inevitavelmente custoso) para eliminar ou mitigar o risco
moral do agente, solução típica, no espectro regulatório, do regime de custo do
serviço (cost plus/taxa de retorno); a duas, pode o principal transferir riscos ao agente,
cujos ganhos passam a ser proporcionais a seu desempenho, como decorre da
instituição do regime de preço do serviço (price cap).
Ambas as modalidades contratuais genéricas, no entanto, são contingentes
relativamente às (i) características da transação realizada e (ii) ao comportamento das
partes contraente perante o risco.
Primeiramente, se a conduta do agente é facilmente observável o que
minimiza os custos do sistema de monitoramento e este, o agente, é avesso ao
risco
68
, ao passo que o principal é neutro quanto ao risco, a transferência de risco será
custosa e desnecessária. O prêmio de risco cobrado por um agente a ele avesso será
alto proporcionalmente ao sistema de monitoramento que pode ser instaurado a custo
relativamente baixo.
Se o comportamento do agente não é facilmente observável, sendo salientes os
problemas de informação assimétrica, a eficiência da decisão contratual dependerá
68
Nos modelos da Teoria do Agente-Principal, a atitude perante o risco é explicada pela capacidade de
a parte diversificar riscos. Por exemplo, numa relação laboral, considera-se o empregado risco avesso
porque ele não pode distribuir seu ativo, o trabalho, por muitas empresas (EISENHARDT, 1989).
91
dos custos relativos de criar (a) um sistema de monitoramento mais complexo e (b)
transferir o risco para o contratado. Tanto melhor será a decisão de transferir o risco
para o contratado quanto menos seja ele avesso ao risco e quanto menor for a
incerteza de definir os resultados desejados com a contratação; do contrário, a
transferência de risco poderá não ser eficiente se o custo para fazê-la for alta e a
certeza na definição dos resultados, baixa.
Note-se que as hipóteses parecem consistentes com a literatura sobre PPPs ao
sublinhar a importância das características do objeto contratado e do risco envolvido
no negócio. A redução da incerteza, através da observabilidade e verificabilidade de
indicadores de desempenho e mitigação dos riscos contratuais, torna contratos com
fortes incentivos, como as PPPs, vantajosos; sob incerteza e riscos altos, os tais
contratos redundariam no pagamento de prêmios de risco elevados (YESCOMBE,
2007).
5.3.1.2. A Teoria dos Contratos Incompletos.
De acordo com Hart (2003), se os infortúnios existentes numa relação contratual
referissem-se exclusivamente a informações assimétricas, os incentivos seriam
definidos – e resolvidos através da especificação exaustiva dos direitos e obrigações
das partes no contrato.
Entretanto, há custos para fazê-lo, proporcionados não apenas pela negociação
e redação, mas também pela introdução de regras que exaurissem todos os eventos
supervenientes (e as estruturas necessárias em termos de coleta de informações e
mecanismos de monitoramento). Assim, o problema não é apenas de informação
assimétrica, mas de incompletude contratual.
Isto posto, anotam Grossman e Hart (1986), quando é por demais custoso para
uma das partes especificar exaustivamente todos os direitos e obrigações de que
necessite num contrato, pode esta optar por adquirir todos os direitos residuais sobre o
objeto transacionado, ressalvando contratualmente os direitos específicos que prefira
alienar a outrem. O controle dos direitos residuais sobre um ativo é obtido através da
propriedade, que garante a seu detentor os poderes para completar as lacunas de um
contrato incompleto.
92
Haveria, assim, dois tipos de direitos contratuais: direitos específicos,
contratualmente estabelecidos; e direitos residuais, decorrentes da propriedade de um
ativo e exercidos pelo proprietário.
Se o Estado contrata um particular para realizar serviços de manutenção em
um hospital de sua propriedade, outorga direitos específicos para o contratado, mas
preservando os demais direitos residuais de controle sobre o seu ativo isto é, a salvo
os direitos do particular, pode decidir o que fazer com a referida instalação. Já se o
Estado contrata serviços a serem prestados por um hospital particular, adquire os
direitos específicos contraídos na avença, mas é a empresa privada que detém o
controle dos direitos residuais não especificados contratualmente para gerir o hospital
como bem entender.
O cerne do problema é que a alocação dos direitos de controle residual tem
efeitos em termos de eficiência na operação de serviços públicos (HART, SHLEIFER
e VISHNY, 1997; HART, 2003).
Com efeito, ao optar por realizar determinadas atividades associadas a um
ativo internamente ou contratá-las junto a terceiros, o Estado se envolve num trade-off
que afeta o nível e a qualidade do investimento realizado. Preservando-se como
detentor dos direitos residuais de controle, o Estado conserva a possibilidade de
completar os vazios contratuais como bem entender, mas seu funcionário (ou
terceirizado) não possui incentivos para investir em inovações ou na redução de
custos não especificados no contrato porque não garantias de que o Estado-
proprietário o remunerará adequadamente.
Trata-se do risco de hold-up: o proprietário dos direitos residuais de controle
tem poderes de barganha frente a sua contraparte. O executor da atividade, portanto,
não internaliza os efeitos dos ganhos possibilitados pela inovação e pela redução do
custo dos serviços.
Se o particular, contudo, detém os direitos residuais de controle sobre o objeto
contratado, possui incentivos para realizar ambos os tipos de investimentos: na
inovação e na redução de custos. O problema é que esta, a redução de custo, pode ser
realizada ao preço da redução da qualidade não-contratada dos serviços contratados
que o particular detém o direito de preencher as lacunas, inclusive sobre os
parâmetros de qualidade não-contratados.
93
Hart (2003) aplica o modelo da TCI diretamente à escolha da modalidade PPP
vis-à-vis contratações tradicionais em que não há o bundling de serviços isto é, o
Estado contrata o projeto, a obra, a manutenção e a operação, por exemplo,
separadamente.
O trabalho chega a uma simples conclusão: a provisão tradicional de serviços
produzirá resultados superiores se a qualidade da construção do ativo puder ser bem
especificada, enquanto a qualidade do serviço associado ao ativo não possa sê-lo.
Trata-se de uma questão de informação assimétrica relativa às características do ativo
e da qualidade do serviço entre as partes contratantes e a terceira parte incumbida do
enforcement.
Exemplificativamente, para o autor, a construção de presídios e escolas pode
ser qualificada nessa categoria, em que a qualidade construtiva da instalação pode ser
bem especificada, mas a especificação dos serviços por longo prazo pode ser tarefa
árdua. Por óbvio, a eficiência desta contratação com foco em inputs depende desta
capacidade de o projeto definir com precisão as qualidades construtivas do ativo, pois
que, nos regimes de pagamento que se fundamentam no custo do serviço,
incentivos para que o particular contratado eleve os custos do empreendimento,
alargando a base de remuneração o que pode ser agravado se elevadas
informações assimétricas
69
.
Havendo capacidade de precisar os inputs mitigando o risco de explosão de
custos e informações assimétricas - o sub-investimento em inovação e redução de
custo pode não provocar maus resultados, mas o super-investimento na diminuição de
custos poderia redundar em danos sobre os serviços (vez que estes, não estando bem
especificados, poderiam ter sua qualidade reduzida já que o particular detém os
direitos de controle residual)
Em contrapartida, PPPs seriam vantajosas quando os indicadores de
desempenho pudessem ser bem definidos, ocasião em que o super-investimento em
redução de custos não teria o condão de provocar a perda da qualidade especificada
em direitos contratuais específicos.
69
Esta é uma das críticas centrais ao modelo de price cap nos Estados Unidos.
94
5.3.1.3. A Economia dos Custos de Transação.
A Teoria do Agente-Principal e a TCI se aproximam ao enfocar a estrutura de
incentivos contratuais ex ante, isto é, como o desenho da estrutura de governança
estimula (ou não) o parceiro privado a cumprir com suas obrigações, realizar
inovações, reduzir custos. Nelas, portanto, o contrato é, sobretudo, uma ferramenta de
incentivos (SAUSSIER, 2005).
A ECT delas difere por mirar os efeitos ex post dos contratos, ou melhor, por
examinar o contrato como mecanismo adaptativo, como o são as organizações
(BARNARD, 1938) e o mercado (HAYEK, 1945). Os custos de transação, segundo
Williamson (1991), decorrem dos pressupostos comportamentais da racionalidade
limitada e do oportunismo. Em virtude dos constrangimentos cognitivos, as partes
numa transação não antevêem todas as contingências ulteriores a sua celebração e,
mesmo se pudessem fazê-lo, seria altamente custoso redigir reservas contratuais para
cada potencial contingência; os contratos o, então, incompletos, implicando
renegociações contratuais futuras.
O oportunismo eleva o risco de contratar, porque a contraparte pode submeter
o contraente a perdas por ocasião de eventos antes imprevistos, motivo pelo qual,
antecipando esse risco, os agentes procuram desenhar instituições que o minimizem
no futuro.
duas formas polares de instituições hierarquias e mercados. A produção
de atividade em hierarquias, como uma organização ou o Estado, reduz os riscos das
renegociações futuras isto é, dos custos de transação ex post através do uso da
autoridade como instrumento de coordenação: necessárias mudanças na forma de
organização das transações hierarquicamente concebidas, os funcionários submetidos
a ela se acomodam de acordo com a ordem emanada da autoridade superior sem
alterar seus ganhos.
O limite da hierarquia é que seus incentivos internos são frágeis, ou low-
powered, porque mudanças no nível de esforço e desempenho dos funcionários não
provocam efeito sobre sua compensação pecuniária pessoal - ou o fazem apenas de
maneira tênue . Segundo Williamson (1991), ainda perdas adicionais na forma de
95
disputas internas por apropriação dos ganhos e custos necessários para o
monitoramento das atividades.
No mercado, o contrário acontece. Os incentivos são altos (high-powered), vez
que o desempenho está diretamente associado ao ganho; a competitividade também o
é, se o custo de escolher novos parceiros é baixo; por outro lado, acaso não se estiver
num mercado perfeitamente competitivo e existirem ativos específicos empregados
pelas partes, a adaptação, dependendo do mútuo consentimento de entes autônomos,
está sujeita a barganhas custosas que não serão eficazmente disciplinadas em
contratos clássicos.
Entre mercados e hierarquias, Williamson (1991) concebe modalidades
híbridas, em cujo bojo estão enquadrados os “contratos neoclássicos”: instrumentos
de longo prazo, com salvaguardas e mecanismos de resolução de conflitos.
Comparadas ao mercado, as estruturas híbridas sacrificam os incentivos em favor de
modos de coordenação superiores (como contratos neoclássicos); em face de
hierarquias, os modelos híbridos aumentam o risco da não-cooperação em prol de
uma maior intensidade de incentivos.
A vantagem relativa dessas estruturas de governança relaciona-se com três
atributos das transações - incerteza, freqüência e especificidade do ativo envolvido
que definem o risco de o comportamento oportunista produzir custos de transação ex
post.
A especificidade do ativo é a variável mais relevante. É definida pelo valor do
uso alternativo de um investimento feito por uma das partes numa transação. uma
“quase-renda” medida pela diferença entre o uso ideal e o uso alternativo de um ativo;
na hipótese de a transação ser interrompida após o investimento no ativo ser realizado,
a “quase-renda” é dissipada, em razão do que o risco de uma parte que investe num
ativo específico é alto, que o comportamento oportunista poderá se materializar na
dissipação da “quase-renda”.
Exemplificando, típico ativo específico é uma utilidade pública, como uma
rodovia que, uma vez construída, não tem uso alternativo significante seu uso está
atrelado aos direitos e obrigações contratados. O investidor que construí-la, pois, está
submetido ao risco de comportamento oportunista de sua contraparte: feito o
investimento, afinal, a “quase-renda” pode ser objeto de barganha, acaso não haja
96
salvaguardas confiáveis. Em casos que tais, a solução institucional disponível, pois,
pode ser a internalização da atividade – o Estado constrói a rodovia em seu interesse –
ou contrata terceiro para fazê-lo sob uma estrutura híbrida, com credible
commitments.
A alta incerteza aumenta o risco de que barganhas ex post dissipem as “quase-
rendas”. Maior número de distúrbios ou da sua variabilidade eleva a probabilidade de
que as partes tenham de renegociar as cláusulas contratuais. Em relação à freqüência,
transações recorrentes possibilitam maiores retornos de estruturas híbridas criadas
para administrar a presença de ativos específicos. A ação oportunista, neste caso, é
mitigada pelos ganhos das partes com a existência de futuras transações. Transações
ocasionais com baixo grau de especificidade de ativos podem ser realizadas no
mercado, podendo os ativos ser realocados a um custo baixo no caso de ação
oportunista.
De maneira geral, quando esses atributos concorrem para tornar as partes mais
dependentes uma da outra porque o ativo é específico incrementam-se os riscos
contratuais e as alternativas disponíveis passam a ser hierarquias ou arranjos híbridos,
cercados de salvaguardas para as partes que transacionam, conforme a tipologia
abaixo apresentada.
Tabela 12: Tipologia de contratos e estruturas de gestão
Tipo de Contrato Características da transação
Estrutura de gestão
(governança)
Clássico Incentivos de mercado: preços
Baixa especificidade dos ativos
Curta duração/alta freqüência
Ausência de riscos
Baixo custo de controle
Mercado
Neoclássico Incentivos de mercado: preços
Alta especificidade dos ativos
Longa duração/baixa freqüência
Incerteza e risco
Alto custo de controle
Híbrido
Subordinado Sem incentivos de mercado
Alta especificidade dos ativos
Duração indefinida
Alta incerteza e risco
Alto custo de controle
Hierarquia
Elaboração de Correia e Gomide (2007)
No modelo de Williamson, pois, a escolha entre as estruturas de governança
tem por propósito a melhor combinação entre incentivos e mitigação dos custos de
97
transação ex post (ou do risco do oportunismo) o que caracteriza o trade-off clássico
dessa literatura.
Por esse motivo, Williamson (1975) questionou a formulação de Demsetz
(1968), que defendera como alternativa à regulação estatal de utilidades públicas a
licitação por contrato, o que asseguraria a oferta de preços competitivos na
concorrência ex ante; de fato, se os custos de transação ex post fossem altos, o
contrato poderia ser renegociado inúmeras vezes, desta feita sem que qualquer
concorrência houvesse. Assim o é porque, como o demonstra o desenvolvimento da
ECT, a eficiência do contrato como estrutura de governança depende dos atributos de
cada transação.
Interessante notar que, entre as estruturas polares hierarquia e mercado os
arranjos que podem ser acobertados pelo modelo neoclássico são bastante variados e
envolvem, em diferentes graus, o dilema entre altos incentivos e mitigação dos riscos
contratuais. Explique-se: dentre os modelos híbridos de contratação, por exemplo,
podem ser contratadas empreitadas sob o regime de preço, em que os riscos de
variação dos preços são transferidos para o empreiteiro; trata-se de arranjo com altos
incentivos, mas também mais arriscado. Neste caso, estamos diante de contrato mais
próximo do mercado do que da hierarquia. Em oposição, as contratações do tipo cost
plus minimizam os riscos, na medida em que as variações supervenientes são
incorporadas ao preço despendido pelo contratante, conservando o contrato mais
adaptável para enfrentar contingências futuras. No entanto, os incentivos são menores
para a inovação e a eficiência, já que a remuneração do particular contratado não está
atrelada a esses atributos.
É de se perceber que a ECT adiciona um problema ao framework das teorias
do agente-principal e dos contratos incompletos; com efeito, os contratos com altos
incentivos são por natureza cercados de maiores custos de transação ex post novas
contingências têm de ser renegociadas, e não saneadas automaticamente por uma
mudança, por exemplo, na estrutura de custos do contratado. Assim, a literatura
aponta, a ilustrar, que processos licitatórios cuja competição se dá por leilões
embora em tese confiram maiores incentivos à competição são menos adaptáveis do
que processos licitatórios em que a adjudicação ocorre após negociação entre as
partes.
98
Quando o Poder Público, no Brasil, contrata nos termos clássicos da Lei de
Licitações, conserva prerrogativas unilaterais para adaptar os inputs contratuais a seu
bel prazer, desde que preservando o equilíbrio econômico-financeiro do particular
contratado. Os contratos são, pois, bastante adaptáveis, mas há poucos incentivos para
que o contratado reduza custos e inove; nas concessões, se os incentivos são maiores,
também o são os custos de transação ex post. O risco de uma contratação mal
especificada é mais elevado não por acaso Justen Filho (2005) revela que a
concepção equivocada de concessões na década de 90, à míngua de projetos executivo
e básico, gerou custosas renegociações entre Estado e concessionárias. Em semelhante
caminho aponta o trabalho de Guasch (2004) na América Latina, onde contratos de
concessão mal concebidos redundaram em renegociações que eliminaram os
potenciais ganhos de eficiência.
5.3.2. A Teoria dos Contratos Relacionais.
É relevante referirmo-nos à teoria dos contratos relacionais porque nela se admitem
formas de coordenação sob a presença de incentivos não econômicos aos contratantes,
servindo, pois, como um arcabouço teórico complementar – ou alternativo - às teorias
econômicas.
Contratos relacionais são instrumentos cujo fundamento último de sua
autoridade reside nos ganhos mútuos proporcionados pela manutenção de uma relação
de longo prazo (MACNEIL, 1978). O instrumento, per se, formaliza o processo
através do qual as partes interagem, mas sua credibilidade e eficiência são fundadas
em variáveis relacionais, e não em prêmios, punições e salvaguardas contratualmente
firmados.
A reputação pode ser o fundamento relacional de cooperação, como admitido
pelas teorias econômicas dos contratos, em que aquela serve como um mecanismo de
salvaguarda: a reputação é um ativo que atrai fluxos de recursos para o agente que a
detém, e que, conseqüentemente, possui incentivos para cumprir com acordos ainda
que sem salvaguardas formais.
Os modelos da teoria dos jogos explicam bem esse efeito econômico da
reputação (BAKER, GIBBONS e MURPHY, 1997). Nos jogos de apenas uma
99
rodada, se inexistem mecanismos de enforcement, o equilíbrio de Nash
70
pode ser o
dilema do prisioneiro, em que a decisão de não cooperar é a melhor estratégia
racional, considerando-se a conduta não-cooperativa esperada da outra parte.
nos jogos repetitivos, quando duas partes possuem uma relação de longo
prazo que resulta num fluxo de ganhos para ambas, a melhor estratégia racional
disponível é a cooperação, ainda que, se houvesse apenas uma rodada, o
descumprimento do contrato pudesse gerar ganhos imediatos superiores para o
descumpridor. Afinal, o comportamento não-cooperativo pode ser punido e o
cooperativo, premiado, nas rodadas seguintes. Nesses casos, os contratantes cooperam
de forma dinâmica, seguindo a estratégia chamada tit-for-tat: uma parte coopera
enquanto a outra também o faça.
Portanto, mesmo modelos econômicos que supõem indivíduos racionais
maximizadores incorporam a possibilidade de que a reputação funcione como
mecanismo de enforcement.
A Teoria dos Contratos Relacionais (MACNEIL, 1978), também relevando o
poder da reputação, acresce a esta dimensão outros mecanismos não-econômicos de
cooperação.
Esta tradição teórica remonta à sociologia de Durkheim (1993) que,
contraposta ao contratualismo de Hobbes, assinala a precedência das relações sociais
ao contrato que, embora elemento essencial na divisão de trabalho, não basta a si
mesmo; sua função é exercida de acordo com regras gerais pré-estabelecidas
socialmente – daí porque cruciais seriam os elementos não contratuais do contrato. As
relações contratuais não poderiam ser resumidas ao exercício da autonomia da
vontade individual como o são nas teorias econômicas - mas representariam
relações de solidariedade. O pressuposto da maximização de utilidade e/ou redução
dos custos de transação cede espaço para motivações não-econômicas nas relações de
cooperação.
Modernamente, esta perspectiva se encontra na Nova Sociologia Economia
representada por Granovetter (2007) que, criticando as concepções atomísticas das
relações econômicas, defende que a interação está imersa em sistemas concretos e
70
Considera-se equilíbrio de Nash a situação em que a escolha de cada parte é ótima considerando-se a
escolha da outra parte (VARIAN, 2000).
100
contínuos de relações sociais. A presença destas proporciona a instauração de relações
baseadas na confiança, que desencorajam a má-fé em oposição à ECT, em que o
oportunismo não é mitigado pela confiança, mas por hierarquias ou contratos com
salvaguardas.
Há, assim, uma oposição teórica entre Contratos Relacionais e ECT, como
bem notou Macedo Júnior (2007). Enquanto na ECT as relações bilaterais autônomas,
por assim dizer, é fonte de custos transacionais, na teoria dos contratos relacionais são
estas relações a liga sob cuja existência o compromisso existe e se torna sustentável.
Para Macneil (1978), a diferença crucial dos contratos relacionais
relativamente aos contratos clássicos e neoclássicos é o desaparecimento da aplicação
da contract law baseada na assunção de que toda a relação contratual está abrigada
pelas regras do instrumento original.
Segundo o autor, a doutrina clássica do contract law parte de dois supostos:
primeiro, a relação entabulada é discreta, sem continuidade no tempo, e portanto
impessoal pouco interessa a parte com quem se contrata tratando-se do típico
arranjo num mercado competitivo; segundo, o instrumento realiza o que se chama de
presentation, uma forma de incorporar os efeitos do futuro no presente, de maneira
que os eventos supervenientes sejam disciplinados pelo regramento das expectativas
futuras sobre a transação.
A doutrina neoclássica típica da passagem de uma sociedade manufatureira
para a produção fordista - flexibiliza esses princípios porque o método produtivo
demanda relações continuadas, mas ainda assim o instrumento contratual e suas
cláusulas são o fundamento último de solução de pendengas, expressa em cláusulas de
ajustamento de condutas (MACEDO JÚNIOR, 2007).
A doutrina relacional, por sua vez, desenvolvida durante o pós-fordismo dos
anos 70, superaria o instrumento contratual como norte primário do acordo entre as
partes, insuficiente para dar conta da agilidade das transformações, da incerteza e da
flexibilidade por elas requeridas; o princípio unificador é a própria relação
(MACNEIL, 1978). Assim, ao passo que os contratos neoclássicos marcados pelos
supostos das Teorias Econômicas pressupõem incentivos e sanções, salvaguardas e
mecanismos de enforcement, o contrato relacional é regido por princípios que se
amparam no propósito de que a relação seja continuada, movida pelos nortes da
101
solidariedade e da boa fé, considerados mais aptos para conferir flexibilidade num
ambiente instável.
Não apenas o mecanismo de saída isto é, a rescisão ou a sanção - seria
utilizado nas relações cooperativas, mas também instrumentos de voz e lealdade que
produzem transformações contratuais sem solução de continuidade na relação entre as
partes (HIRSCHMANN, 1971). O contrato é um processo entre as partes que reforça
esses mecanismos que representam, per se, instrumentos de compromisso entre os
contratantes.
Macedo Júnior (2007; 106 e 107) assim resume essas características do
contrato relacional “sociológico”:
“A sua indeterminação ultrapassa, pois, o âmbito do contrato
aberto que estipulava regras definidas (ainda que mais abertas em
relação à teoria clássica) para os reajustes. Desde já, a própria
possibilidade do estabelecimento de um “standard” objetivo e
prefixado para o reajuste, tal como formalizado pela teoria
neoclássica, começa a se demonstrar insuficiente face o aumento
expressivo do grau de contingencialidade e variação dos termos das
relações contratuais. O contrato assume, numa dimensão maior do
que a teoria neoclássica é capaz de admitir e incorporar, um caráter
processual, que adquire a forma de um jogo reflexionante que
produz “in fieri” a medida de sua razoabilidade e justiça contratual.
... em substituição aos termos de ajustamento, os contratos de
relacionais incluem termos estabelecendo processos institucionais
pelos quais os termos de troca e ajuste serão especificados no curso
da performance ou cumprimento contratual. Deste modo, os
contratos de longa duração fazem mais do que regular a troca de
mercadorias e seu ajuste. Eles estabelecem o processo para
cooperação inter organizacional no produto, na produção e na
estruturação da forma de gerenciamento (“management design”).
(...) O lucro será agora menos o produto da barganha entre as partes
e mais o produto de mútua cooperação, dentro de novos princípios
de solidariedade.”
Na prática, os aspectos relacionais se traduzem em cláusulas mais abertas,
eminentemente processuais, cuja flexibilidade é regrada pelos princípios da confiança
e da boa-fé interpretados jurisprudencialmente não como preenchedores de vazios,
mas matrizes da relação contratual.
É preciso anotar um senão: a concepção relacional fundada na confiança como
mecanismo ordenador das relações econômicas não resulta necessariamente numa
perspectiva otimista. Granovetter (2007) reconhece, com efeito, que as redes de
relações sociais se estruturam irregularmente, não afastando, assim, a presença de
desconfiança e do oportunismo. Além disso, a confiança não implica necessariamente
102
a mitigação da má-fé, podendo gerar conflitos maiores do que na hipótese de relações
atomizadas. A confiança, afinal, proporciona também ganhos elevados por meio da
má-fé uma parte se aproveita da excessiva confiança depositada por outra e o uso
da força e de fraudes por grupos que podem ser entrelaçados por relações de
confiança, como cartéis.
Dessa forma, os contratos relacionais enfatizam a importância de elementos
informais para a eficiência e flexibilidade de arranjos cooperativos, existindo, por
assim dizer, correntes relacionais atreladas a supostos econômicos (BAKER,
GIBBONS e MURPHY, 1997), como a maximização de payoffs, e mais associadas a
motivos sociológicos para a ação humana, como confiança, boa e solidariedade
(MACNEIL, 1978; MACEDO JÚNIOR, 2007).
5.4. A complementaridade entre ambiente institucional e estruturas de
governança.
No plano das regras do jogo, pudemos identificar três vertentes teóricas que, fundadas
em premissas diferentes (ver capítulo 4), sugerem estratégias, ou combinações de
estratégias, que respondem a pressões para a convergência, mas também para
adaptações e variedades. Suas combinações sugerem que, a despeito dos fatores top-
down, bottom-up e horizontais, subsidiados em fontes econômicas e não-econômicas,
existem características do ambiente institucional e das modalidades de capitalismo
que podem moldar os novos desenhos institucionais e, inclusive, modificar seus
resultados.
Da ECT se infere que a capacidade do sistema político-institucional engendrar
cooperação de longo prazo influencia o funcionamento das estruturas de governança.
Os high-powered incentivos supostos nas PPPs, por exemplo, podem ser fragilizados
ou vir acompanhados de prêmio de risco elevado – se não estabilidade das
políticas públicas.
De outro norte, a VC traz a hipótese de que modalidades de coordenação
capitalistas distintas num pólo que vai das economias liberais até as coordenadas
podem influenciar o desenho regulatório, através de tipos contratuais, relações entre
103
Estado e empresas e acesso ao financiamento que criam diferentes formas de
competição e cooperação.
Assim, tanto as regras do jogo quanto os tipos de capitalismo interagem com
as estruturas de governança. Em relação a estas, embora tenham supostos nem sempre
coincidentes, as teorias econômicas dos contratos Agente-Principal, TCI e ECT
são complementares e estão largamente presentes em análises sobre contratos
firmados pelo Poder Público (ATHIAS e SAUSSIER, 2006; CABRAL, 2006;
BILLON, 2006).
Agente-Principal e TCI permitem que se compreenda a estrutura de incentivos
ex ante das relações contratuais e como esta estrutura é afetada pelo risco e pelo
grau de certeza na especificação dos resultados contratados, sua observabilidade e
verificabilidade.
Estas literaturas sugerem que ganhos efetivos que podem ser obtidos com a
transferência de riscos inovação e custos mais baixos mas que demandam
cautelas. O gráfico abaixo resume os dilemas e principais variáveis relacionadas aos
incentivos ex ante.
Tabela 13: Incentivos Ex Ante nas Teorias Econômicas
Desafios Variáveis
Agente Principal
Informações assimétricas (moral
hazard e seleção adversa),
transferência de risco
Grau de risco; comportamentos
relativos a risco; custos de
monitoramento; observabilidade e
verificabilidade das ações; precisão
dos resultados contratados
Contratos Incompletos
Nível de investimento em
custo/inovação, redução da
qualidade e alienação de direitos
residuais de controle
Especificação precisa de resultados
e verificabilidade por terceira parte
Elaboração do autor
Do ponto de vista dos incentivos ex ante, o dilema atinente à alienação de
direitos residuais de controle, cujo corolário é a redução da discricionariedade do
Poder Público, pode incluir redução da capacidade de responder com rapidez a
mudanças econômicas, tecnológicas e à demanda do eleitorado (ABRÚCIO, 2000;
POLLITT e BOUCKAERT, 2000); enfim, os custos associados à alienação do
controle dos direitos residuais pelo Estado estão envoltos em polêmicas que não
podem ser olvidadas, mas as variáveis apontadas pela literatura oferecem um
importante guia para a minimização dos riscos atrelados a esse tipo de estrutura de
governança.
104
A ECT amplia o escopo da análise para a eficiência ex post dos contratos: não
se podem desenhar estruturas de incentivos ex ante desconsiderando os riscos de
renegociação ex post, cuja ocorrência é função dos atributos das transações, como a
especificidade dos ativos, a incerteza e a freqüência dos negócios realizados. Existe
um trade-off: estruturas de incentivos fortes são menos adaptáveis do que estruturas
mais hierárquicas.
A ênfase sobre contratos formais das referidas teorias econômicas não pode
deixar em branco a relevância de elementos extracontratuais que influenciam os
contratos.
É o que as teorias dos contratos relacionais acrescentam, sob o aspecto
puramente econômico (BAKER, GIBBONS e MURPHY, 1997), mas,
principalmente, sob o aspecto sociológico (MACNEIL, 1978). A vantagem dos
contratos relacionais sobre os neoclássicos seria o desenvolvimento de relações mais
flexíveis e nem por isso ineficientes, eis que self-enforcing modalidades de
contratos bastante citadas na literatura da VC, segundo a qual as relações de longo
prazo entre os agentes econômicos nas economias coordenadas permitem formatos
cooperativos não-formais.
A literatura sobre PPP (vide capítulo 2) destina atenção principalmente aos
incentivos econômicos formais dos contratos high-powered comparativamente aos
contratos tradicionalmente celebrados pelo Estado. Mas não se descarta a presença de
elementos relacionais, que não precisam ser substitutos dos contratos formais, mas
complementares; Poppo e Zenger (2002), afinal, sugerem que o relacionamento
extracontratual pode colaborar com o funcionamento dos contratos formais,
facilitando a manutenção da estrutura de incentivos sem perda da flexibilidade
negocial.
Desireux (2006), por exemplo, examinou contratos de PPP na França
comparativamente com os Estados Unidos, para chegar à conclusão de que elementos
informais, como um detalhado entendimento comum sobre o conteúdo das parcerias
entre público e privado, facilitam o enforcement do contrato na França; isto porque,
neste país, não é raro que ditos contratantes tenham backgrounds educacionais e
profissionais que conformam práticas e valores comuns, como a noção de cultura do
serviço público.
105
Na própria experiência inglesa de PFIs, o papel das expectativas
compartilhadas e da confiança não é relegado ao esquecimento. Assinala-se que uma
perspectiva comum entre parceiros público e privado é fator relevante no andamento
das parcerias, conquanto se ressalte, ao fim e ao cabo, que em última instância a
relação é contratual
71
. Para as parcerias em que o objeto contratado envolve maior
incerteza e requer flexibilidade superior, o Governo britânico recorre a “parcerias
estratégicas” joint ventures entre público e privado cuja relação é eminentemente
processual e movida por objetivos genéricos – utilizadas em projetos de saúde e
educação com essas características.
Na literatura da Reforma da Gestão Pública, a despeito da influência marcante
dos contratos das teorias econômicas nas primeiras etapas da Reforma, na Inglaterra e
na Nova Zelândia, contratos baseados na coordenação, no ajuste e no aprendizado
organizacional, próprios dos países escandinavos (economias de mercado
coordenadas mais próximas de arranjos relacionais), são correntemente mencionados
como bons exemplos de arranjos flexíveis e eficientes (PACHECO, 2004; JANN e
REICHARD, 2002; BOVARD, 2004), o que parece compatível com as dificuldades
enfrentadas em precisar resultados de longo prazo em organizações de múltiplos
objetivos, como o Estado.
Como assinalado por Granovetter (2007), porém, não se pode entender a
predominância de elementos relacionais de forma excessivamente otimista, que a
precedência de relações sociais ao contrato pode também resultar no conluio e na
fraude. Assim, não sendo regular e universal a influência dos elementos relacionais
sobre os contratos, é preciso observar concretamente as interações para se identificar
como operam os elementos relacionais – e como fortalecem ou mitigam a estrutura de
incentivos contratual.
71
The Government believes that the relationship between the public and private sector in a PFI project
must always ultimately be contractual but should be overlaid with partnership working to ensure that
operations are effective. There is a genuine benefit in ensuring that the public and private sector have a
clear understanding of how they should work together and communicate to manage the project
effectively in a genuine partnership arrangement (HM TREASURY, 2006; 82).
106
Tabela 14: Coordenação na ECT e na Teoria dos Contratos Relacionais
Desafios Variáveis
Economia dos Custos de
Transação
Trade-off entre incentivos e má
adaptação ex post, oportunismo
Especificidade dos Ativos,
Incerteza e Freqüência da
Transação
Contratos Relacionais
Imersão do contrato na realidade
social: confiança mitiga má fé ou
possibilita conluios?
Confiança, redes, padrões de
relacionamento
Elaboração do autor
É possível entender, assim, porque as regras do jogo influenciam não apenas o
desenho dos contratos, mas os próprios resultados proporcionados pelos mesmos: elas
interferem com a eficiência ex ante vez que impactam os riscos, a capacidade de
monitoramento e de especificação de resultados, o enforcement dos contratos mas
também com a eficiência ex post, ao interagir com a incerteza das transações e a
confiança entre os atores.
Desses insights se infere que, por um lado, os desenhos institucionais podem
repercutir a interação entre ambiente institucional e as variáveis apontadas. Assim,
podem ser encontrados contratos mais rígidos ou menos riscos transferidos em face
desta repercussão, como afinal defendem Guasch (2004) e Justen Filho (2005). De
outro lado, ilustram-se os perigos que existem no mimetismo: estruturas de
governança idênticas podem produzir resultados contraditórios em ambientes
institucionais diferentes.
107
6. O CONTEXTO HISTÓRICO-INSTITUCIONAL E A IMPLANTAÇÃO DAS
PPPS EM MINAS GERAIS.
6.1. O Ambiente Institucional.
À época da outorga de concessões na década de 90 no Brasil, a credibilidade
institucional do Estado brasileiro era tema central no desenho das agências
reguladoras e dos contratos; estava-se diante de um histórico de moratória, confisco
de poupanças, uso de tarifas de utilidades públicas para controle de inflação,
congelamentos de preços, manipulação de variáveis econômicas, desrespeito por
direitos de propriedade intelectual e mudanças arbitrárias de regras (ALSTON et al.,
2006).
Como relatado no capítulo 3, porém, o país passou por importantes
transformações a partir da década de 90, entre as quais se destaca o crescimento da
participação privada na operação de infra-estrutura, proporcionada por marcos
constitucionais e legais favoráveis a parcerias, que proporcionaram um elevado fluxo
de investimentos privados, embora insuficiente para recompor a redução de
investimentos públicos desde a década de 80.
No entanto, os problemas enfrentados em alguns setores, de que são exemplos
a crise elétrica de 2001, as disputas judiciais instauradas por tentativas de alteração de
regras contratuais nos setores rodoviário e de telefonia e as interferências nas
Agências Reguladoras, não raro dão respaldo para temores sobre os riscos políticos e
regulatórios riscos estes que, segundo o Banco Mundial (2007), são ainda cruciais
no arcabouço regulatório brasileiro.
A despeito disso, os setores de infra-estrutura permanecem como objetos
atrativos para o setor privado, servindo as PPPs como um marco institucional para sua
difusão por diversas áreas. Como, afinal, o ambiente institucional do país influencia o
desenho dessas parcerias? E de que forma são contornados os obstáculos postos pelas
regras do jogo?
Não sendo, a resposta exaustiva a estas indagações, o objeto do presente
trabalho, o capítulo em pauta procura apresentar algumas leituras teóricas aplicadas ao
Brasil e, em seguida, descrever a implantação do programa de Parcerias Público-
108
Privadas em Minas Gerais, a fim de que se possam extrair variáveis relevantes dessa
intricada relação entre instituições.
6.1.1. As Regras do Jogo Nacional.
Seria por demais pretensioso ensaiar, neste trabalho, uma explicação sobre a natureza
do jogo institucional no Brasil; mas possível é, para os objetivos em pauta, discorrer
sobre relevantes trabalhos que, desafiando essa tarefa, ofertam-nos pistas de pesquisa.
Num trabalho exploratório na tradição da ECT, Levy e Spiller (1996) sugerem que se
examinem três dimensões institucionais: a natureza do jogo político, o Poder
Judiciário e o Sistema Administrativo.
6.1.1.1. O jogo político.
Desde o início do processo de redemocratização do Brasil e, em especial, a partir do
marco que é a promulgação da Constituição Federal de 1988, cientistas políticos têm
expressado, entre os principais desafios a serem enfrentados na consolidação
democrática, o da governabilidade, para cujo alcance o desenho institucional de 1988
impunha altos custos.
Em síntese, num regime presidencialista com eleição proporcional de lista
aberta para a Câmara, nível de institucionalização do sistema partidário incipiente e
governadores com elevado poder político, as instituições políticas sofreriam de uma
armadilha provocada pelo “excessivo número de pontos de veto” (AMES, 2002)
recursos e empregos públicos eram os instrumentos disponíveis para um Executivo
encalacrado tomar decisões e aprovar legislações. Inúmeros autores apontam nas
regras eleitorais as origens da indisciplina e da fragmentação partidária (AMES, 2002;
MAINWARING e SCULLY, 1995), convergindo para a conclusão de que as
instituições políticas brasileiras traziam incentivos negativos para a governabilidade
democrática. Esta era a leitura preponderante no período imediatamente posterior à
constituinte: ou o Executivo não governa ou o faz autoritariamente, como único
guardião do interesse nacional como se houvera uma democracia delegativa
(O’DONNELL, 1993).
109
Trabalhos mais contemporâneos contestaram a visão de que o regime
constitucional produzia um desequilíbrio em desfavor da governabilidade, sendo
apontada razoável estabilidade do sistema partidário no Parlamento por Limongi e
Figueiredo (2002). Pereira e Muller (2002;2004) sustentam que a governabilidade é
alcançada facilmente pelo Presidente da República (por meio do controle das emendas
parlamentares), ao custo de uma predominância do Poder Executivo sobre o Poder
Legislativo
72
.
Contudo, não é unânime a crença de que, ao contrário da falta de
governabilidade com poder disperso, teríamos governabilidade com poder
concentrado; Palermo (2004) tem uma perspectiva mais equilibrada do sistema
político brasileiro, em que o Executivo tem, sim, capacidade de implementação de sua
agenda e, os partidos, razoável disciplina na votação dos projetos de lei no Congresso,
mas contesta a hipótese de que essa governabilidade estaria sendo obtido ao custo da
concentração de poderes.
As análises existentes sobre as relações entre Executivo e Legislativo no
Brasil, embora variem da percepção do alto custo de decidir a uma concepção de
preponderância do Executivo, parecem convergir para um outcome: a definição de
políticas públicas é essencialmente concentrada no Poder Executivo.
Em recente trabalho sobre os efeitos das instituições políticas sobre as
políticas públicas, Alston et. al (2006) concluem que o equilíbrio alcançado, sob a
predominância do Poder Executivo, é dinâmico e variável em relação ao assunto. As
características de uma política específica dependem da capacidade de o Executivo e
seus líderes partidários oferecer incentivos apropriados que garantam retornos
eleitorais aos parlamentares.
O Executivo concentraria esforços em ganhar autonomia para conferir à
política macroeconômica em face da qual responde diretamente ao eleitorado a
adaptabilidade e a estabilidade desejáveis, concedendo aos parlamentares, nas
políticas que se referem a suas bases eleitorais, os recursos necessários para
conquistar apoio legislativo. Haveria ainda políticas insuscetíveis a choques externos
72
Esta é a mesma conclusão expressa no estudo de caso brasileiro de Anastasia, Melo e Santos (2004),
em que se relata a estabilidade alcançada pelo regime político brasileiro no transcorrer da década de 90,
mas marcado pela predominância do Poder Executivo sobre o Poder Legislativo.
110
ou alternâncias políticas, como é o caso de saúde e educação, dado a
institucionalização obtida a partir da vinculação de verbas orçamentárias; e políticas
residuais, que não se inserindo nos grupos anteriores, ficam sujeitas aos choques
externos e à alternância política. Dessas dinâmicas resultam grupos de políticas
públicas com características dessemelhantes: políticas “estáveis e adaptáveis” (ex.
macroeconômica), fisiológicas (ex. transferências regionais), “rígidas” (ex. saúde) e
“residuais” (ex. infra-estrutura).
O problema dos investimentos em infra-estrutura custeados por recursos
públicos, então, é seu caráter residual no jogo político, agravado pela rigidez do
processo orçamentário: é nessa unidade orçamentária que o Poder Executivo tem mais
flexibilidade para manejar recursos para cumprir as metas fiscais, sendo também
nessa rubrica que os parlamentares têm a prerrogativa de emendar, individual ou
coletivamente, a lei orçamentária. Desse quadro resulta que o comportamento das
verbas destinadas a investimentos é elástico em relação aos ciclos econômicos
(LIMONGI e FIGUEIREDO, 2002;2005), ficando submetido às preferências do
Poder Executivo, o que influenciaria as PPPs, cujo custeio é total ou parcialmente
pago pelo Estado.
inúmeros indícios que sustentam a tese de que os investimentos em infra-
estrutura são instáveis em relação a outros itens do orçamento. Estudo do Banco
Mundial (2007) sobre a infra-estrutura no Brasil relata a correlação negativa existente
entre os programas de ajuste fiscal das décadas de 80 e 90 e os investimentos estatais
em inúmeros setores de infra-estrutura no Brasil, incluindo telecomunicações, energia,
rodovias e saneamento.
A respeito das concessões, os períodos de maior instabilidade econômica na
última década assistiram a ameaças de modificação das regras do jogo regulatório
pelo Poder Executivo. É o que historiam Alston et al. (2006), reportando-se a ameaças
de revisão de índices de reajuste e de antecipação de revisão tarifária no setor elétrico,
por ocasião da crise cambial de 1999, além do questionamento dos índices de reajuste
dos contratos de concessão de telefonia fixa e rodoviário, este último pelo Governador
do Paraná.
Nos Estados, a propósito, as concessões rodoviárias foram alvo de turbulência.
Andrade (2005) relata as disputas envolvendo concessionárias no Rio de Janeiro, no
111
Paraná e no Rio Grande do Sul, onde os governantes adotaram medidas como a
revisão unilateral de tarifas e a omissão na autorização de reajustes, atos repelidos no
Judiciário.
6.1.1.2. O Judiciário.
Os trabalhos realizados por teóricos da ECT abrangendo as instituições nacionais e
seus efeitos sobre as políticas públicas são bastante favoráveis ao Judiciário brasileiro
como tecnologia de enforcement para fazer cumprir decisões políticas manifestas em
leis e contratos.
Em conformidade com Stein et al. (2006), baseados em dados do Fórum
Econômico Mundial (2004) e de Henisz (2000), o Poder Judiciário nacional fica, com
exceção do Chile, à frente dos demais países latino-americanos em termos de
independência frente ao Poder Executivo. Alston et al. (2006), ao examinar embates
entre o Governo Federal e o Supremo Tribunal Federal, assim como as regras
constitucionais sobre o Poder Judiciário, chega à semelhante conclusão de que
independência do Judiciário vis-à-vis o Executivo, de que se poderia esperar decisões
judiciais técnicas e não-políticas relativamente à política regulatória e a contratos de
concessão (MUELLER, 2001). A experiência das concessões na década de 90
colaborou com esta percepção do Poder Judiciário brasileiro como eficiente
mecanismo de enforcement quando da prolação de importantes decisões judiciais das
Cortes Superiores sobre concessões, conforme exemplificado.
Tabela 15: Precedentes jurisprudenciais sobre concessões
Processo Tribunal Data de
Julgamento
Objeto Decisão
Agravo na
Suspensão de
Liminar 57/2004
Superior Tribunal
de Justiça (Corte
Especial)
01/07/2004 Mudança do índice
de reajuste do
contrato de
concessão das
telefônicas
Manutenção do
índice de reajuste
contratual
Agravo na
Suspensão da
Liminar n. 76/2004
Superior Tribunal
de Justiça (Corte
Especial)
01/07/2004 Reajuste do contrato
de concessão
rodoviária no
Paraná
Concessão de tutela
antecipada para
efetivação do
reajuste contratual
Agravo na
Suspensão de
Liminar n. 34/2004
Superior Tribunal
de Justiça (Corte
Especial)
19/05/2004 Exigência de rota
alternativa a
rodovias como
condição para
cobrança de tarifas
Legalidade da
cobrança
independentemente
da alternativa
Agravo Regimental
na Suspensão de
Superior Tribunal
de Justiça (Corte
01/08/2005 Suspensão do
fornecimento de
Legalidade da
suspensão
112
Segurança n.
1497/RJ
Especial) energia por
inadimplência
Recurso Especial
911.802/RS
Superior Tribunal
de Justiça (1ª
Seção)
24/10/2007 Cobrança de tarifa
de assinatura mensal
sobre os serviços de
telefonia
Legalidade da
cobrança
Elaboração do autor
Apesar da percepção de que o Judiciário brasileiro é predominantemente
técnico no enforcement de contratos, há, no entanto, deficiências que surgem como
obstáculos no exercício desse ofício.
Pinheiro (2005) destaca como principal gargalo a morosidade, agravada pelos
litigantes, inclusive o Poder Público em relação ao qual o exemplo mais notório são
os recursos na área tributária - que procuram fazer uso de todos os instrumentos
recursais como meio de financiamento, ao angariar a protelação do cumprimento de
obrigações – oferecendo o sistema processual vários instrumentos para tanto. Referido
expediente é ainda mais interessante para os Governos, que além de terem privilégios
processuais
73
- que conferem ao Poder Executivo relevante poder de barganha em
suas relações com contratados, pois estes têm de enfrentar longo e custoso processo
para litigar com o Estado -, podem postergar para futuras administrações o pagamento
de obrigações (ALSTON et al, 2006).
Finalmente, as entrevistas de Pinheiro (2005) com uma amostra de
magistrados de vários Estados e do Distrito Federal revelam uma relação ambígua a
respeito das reformas dos anos 90: a maioria aprova boa parte das transformações
ocorridas, mas não anui com a “privatização da infra-estrutura”, sendo elevada a
proporção de Juízes favoráveis à proposição de que “a busca da justiça social justifica
decisões que violem os contratos”, em especial nos “litígios que envolvem o meio
73
A
Fazenda tem prazos maiores para responder ações e para recorrer, podendo ainda interpor
recursos e ingressar com medidas sem arcar com despesas processuais de imediato, poderes que lhe
conferem instrumentos para dilatar o andamento dos processos. A concessão de medidas de urgência
(liminares e antecipações de tutela) contra o Estado é regida por normas restritivas, além de que pode a
Fazenda postular sua suspensão através de medida excepcional dirigida aos Presidentes dos Tribunais,
amparada em razões de “interesse público”, como a lesão grave “à ordem, à saúde, à segurança e à
economia públicas”. Os bens do Poder Público não se sujeitam em regra a penhora e, mesmo quando
condenado, o pagamento se submete ao regime de precatórios (art. 100 da Constituição); especialmente
no caso dos estados federados, o credor pode levar anos até receber o valor da condenação, mesmo
após a conclusão do processo.
113
ambiente, os direitos do consumidor, a regulação dos serviços públicos e questões
trabalhistas e previdenciárias”.
Percepções como estas podem proporcionar uma dinâmica curiosa: ainda que
os Tribunais Superiores façam cumprir, ao fim e ao cabo, os contratos de concessão, a
autonomia dos juízes de primeira instância, o elevado número de recursos, a baixa
especialização e a morosidade da Justiça podem provocar a persistência de decisões
contrárias ao estabelecido contratualmente
74
. de se destacar que essas aparentes
deficiências têm sido endereçadas através de mudanças constitucionais
75
e legais a
Reforma do Judiciário - que têm procurado instituir formas de uniformização da
jurisprudência e restringir o cabimento de recursos, sendo, contudo, ainda cedo para
aferir o resultado dessas reformas.
Por último, o instituto da arbitragem, disciplinado pela Lei Federal n.
9.307/1996, vem sendo sugerido como alternativa viável para resolução de conflitos
em contratos administrativos, o que permitiria maior agilidade e expertise nessas
matérias (TÁCITO, 1997; MOREIRA NETO, 1997; TALAMINI, 2005; PORTUGAL
e PRADO, 2007), recebendo, ainda, o respaldo explícito da Lei das PPPs e da Lei de
Concessões
76
, além de recente precedente do Superior Tribunal de Justiça
77
. Por
outro lado, outros juristas defendem a inaplicabilidade da cláusula compromissória de
arbitragem em contratos administrativos em face da alegada indisponibilidade do
interesse público (BANDEIRA DE MELLO, 2005) -, assim como órgão do Tribunal
de Contas da União já decidiu por seu descabimento
78
.
Ante a persistência de incerteza sobre o que pode ou não ser objeto de
arbitragem em contratos de PPP, Oliveira (2005b) defende a complementação da Lei
Federal n. 9.307/1996, que disciplina este instituto, a fim de sanear as dúvidas
existentes.
74
Não custa lembrar que, em relação à disputa do reajuste das telefonias, aproximadamente 1 ano
separou a concessão da liminar que alterou o índice de reajuste aplicável e a decisão do STJ que a
reformou.
75
A Emenda Constitucional n. 45/2004 instituiu, entre outras novidades, a súmula vinculante. As três
primeiras súmulas vinculantes foram aprovadas no dia 30/05/2007.
76
Esta passou a admitir explicitamente a arbitragem após a aprovação da Lei n. 11.196/2005
77
RESP n. 612.439-RS, Segunda Turma, Ministro Relator João Otávio Noronha, Julgamento em
25/10/2005. DJ 14/09/2006. Outra decisão recorrentemente citada é a do Supremo Tribunal Federal no
AI n. 52.181, de 14/11/1973, relatado pelo ministro Bilac Pinto.
78
Acórdão n. 584/2003, Segunda Câmara, Ministro Relator Ubiratam Aguiar.
114
6.1.1.3. O sistema administrativo.
Como relatado no capítulo 3, a reforma daspiana do civil service não se completou
nas décadas seguintes, de forma que o Brasil chegou à constituinte de 1987/1988 com
um sistema administrativo que combinava as gramáticas do mérito e do
clientelismo(GEDDES, 1994; NUNES, 1997), com um intenso padrão de circulação
de elites insuladas na alta burocracia convivendo com áreas clientelistas e de baixa
capacidade profissional (SCHNEIDER, 1991), sem a existência de controles sobre as
mesmas.
O capítulo sobre Administração Pública da Constituição Federal reflete a
preocupação de, removendo os abusos proporcionados pelos descontroles das décadas
pretéritas, instaurar-se o “universalismo de procedimentos” como regra através da
consolidação de um padrão burocrático de Administração, refletido em maiores
controles sobre licitações e contratos governamentais e contratação de pessoal,
aplicáveis inclusive sobre entes da administração indireta estatais, autarquias,
fundações.
Ilustração interessante da onda em favor de maiores controles no processo de
redemocratização se percebe em relação aos processos de contratação, com a edição
do Decreto-Lei n. 2.300/1986 que disciplinava licitações e contratos administrativos
e da Lei Federal n. 8.666/93, novo Estatuto regente da matéria, além da própria
Constituição Federal de 1988, que valorizava o dever de licitar no art. 37, XXI.
Segundo Sundfeld (2005), “o resultado foi uma disciplina normativa exigindo rigidez
no procedimento, objetividade absoluta no julgamento (em regra, feita pelo menor
preço) e a definição prévia, pela Administração, de todos os detalhes das prestações
do contratado; ademais, proibiu-se a inclusão de financiamentos entre os encargos do
contratado”.
A disciplina e aplicação da Lei de Licitações e Contratos têm lógicas distintas
das contratações de resultados própria das PPPs: apesar de, segundo Portugal e Prado
(2007), a Lei n. 8.666/93 não impedir, com as exceções expressamente previstas
79
, a
repartição de riscos por meio do contrato, na prática, sob o respaldo da doutrina
79
Para esses autores, a Lei só disciplina expressamente a atribuição dos riscos de modificação
unilateral, de modificação da legislação, de danos provocados por supressão de obras e, de forma
menos evidente, de flutuações inflacionárias.
115
jurídica tradicional, os contratos ordinariamente celebrados sob a vigência desse
diploma têm implicado a retenção da maior parte dos riscos do negócio com o Poder
Público que conserva, em contrapartida, poderes unilaterais exorbitantes (arts. 58 e
65) sem mencionar a proibição de participação na licitação do autor do projeto
básico.
Nesse sentido, é comum a interpretação inflexível da Lei de Licitações em
face, até mesmo, da severidade das normas punitivas (COELHO MOTTA, 2005) -,
que não conferiria maiores liberdades de disposição contratual, além do entendimento
de que é impossível “suprimir as prerrogativas essenciais do Poder Público,
especialmente quando se configurar um serviço público” (JUSTEN FILHO, 2005b).
Portugal e Prado (2007) relatam que, mesmo nas concessões, alguns doutrinadores
supuseram que a Lei n. 8.987/1995 não poderia submeter o regime de distribuição de
riscos à disposição contratual. Ademais, a gestão dos riscos retidos costumeiramente é
temerosa, de que são exemplos atrasos recorrentes de procedimentos a cargo da
Administração, como desapropriações e licenças, inadimplência no pagamento dos
recursos devidos aos contratados e as falhas e alterações em projetos básicos e
executivos.
Exemplar são as deficiências relativas a projetos, fragilidade que também afeta
as PPPs no que atine a modelagens, definição de outputs e análise de projetos
ofertados pela iniciativa privada (PORTUGAL e PRADO, 2007). Justen Filho (2005;
239) narra que a outorga de concessões sem prévios projetos básicos e executivos
durante a década de 90 foi sucedida de “permanentes ajustes e reformulações dos
contratos” ante as falhas de concepção.
Finalmente, outras regras existentes no sistema jurídico como a
discricionariedade para limitação de empenhos e o contingenciamento de recursos
afiguram-se como fatores de elevação do risco de inadimplência, cuja mitigação é
limitada diante da impenhorabilidade dos bens públicos mesmo quando vinculados
a uma despesa específica
80
(PORTUGAL e PRADO).
80
O Plenário do TCU determinou por meio do acórdão n. 1.574/2005 que não sejam objeto de limites
de movimentação e empenho as despesas obrigatórias. Entretanto, estas são, na União Federal,
definidas na LDO.
116
Os princípios norteadores das reformas introduzidas a partir de 1995
traduziram-se na criação de institutos mais flexíveis de parcerias entre o Estado e a
iniciativa privada – com ou sem fins lucrativos – como é o caso das OSs, OSCIPs e da
disciplina de autorizações, permissões e concessões de serviços públicos, culminando
com a edição da Lei das PPPs, motivo pelo qual autores que se refiram a uma
nova perspectiva de “Estado contratual” em que a horizontalidade ganha corpo
perante as cláusulas exorbitantes (OLIVEIRA, 2005). As experiências com essas
modalidades de parcerias proporcionaram apreciações judiciais favoráveis dos
institutos por tribunais superiores, como os citados julgados do STJ, e o julgamento
da Medida Cautelar na Adin n. 1.923-5 do STF
81
, em que a Corte Suprema optou por
não suspender os efeitos da Lei das OS, considerando os resultados por elas já
produzidos, cujo exame de mérito poderia melhor disciplinar – sem prejuízo de
celeumas que ainda são tratadas pela doutrina jurídica (BANDEIRA DE MELLO,
2005; DI PIETRO, 2002).
A Lei das PPPs não tem passado ao largo de questionamentos jurídicos, que se
dirigem, por exemplo, à suposta invasão de competências legislativas estadual e
municipal
82
(BINEMBOJM, 2005; BANDEIRA DE MELLO, 2005; FERREIRA,
2006), à vinculação de receitas e à criação do Fundo Garantidor (HARADA, 2005;
BANDEIRA DE MELLO, 2005; FERREIRA, 2006), ao step-in-rights (BANDEIRA
DE MELLO, 2005; FERREIRA, 2006), além da citada previsão de arbitragem. A
mera existência de questionamentos não implica obstáculos graves ao instituto no
sistema administrativo, especialmente por existirem reputados trabalhos que têm
manifestado perspectivas favoráveis ao instituto das PPPs – como Binembojm (2005),
Sundfeld (2005) e Portugal e Prado (2007) - mas sinaliza que suas inovações isto é,
naquilo que não se herde a experiência das concessões - haverão de passar pelo crivo
da jurisprudência.
No que se refere aos servidores, os últimos trabalhos sobre a burocracia
federal brasileira, relativamente a outros países latino-americanos, revelam padrões de
qualidade e independência comparativamente elevados embora convivendo com
81
Julgamento em 01/08/2007.
82
Essas “invasões” se dariam, por exemplo, pelas regras que criam o piso do valor do contrato de PPP
e pela vedação de prestação de garantias e transferências voluntárias pela União para outros entes
federados cujas despesas com PPPs superem 1% da receita corrente líquida.
117
grande número de cargos comissionados. É a conclusão a que chegam Etchebarría e
Cortázar (2007), Evans e Rauch (1999) e Alston et al. (2006). No que tange aos
Estados, porém, é comumente assinalada a persistência de padrões clientelistas e de
uma burocracia defasada, mesmo após a redemocratização (ABRÚCIO e GAETANI,
2006).
Sob o aspecto da reforma, Abrúcio e Gaetani (2006) expõem que as reformas
iniciadas no plano federal se desdobraram nos Estados simultaneamente ou em
“ciclos modernizantes” posteriores, nos mandatos que se iniciaram em 1999 e 2003.
Assim, o retrato nos Estados é de importantes inovações, o que tem incluído, em
alguns Estados, a criação de carreiras de gestores públicos, de Escolas de Governo e
processos de treinamento, sem mencionar a incorporação de institutos marcadamente
relacionados ao modelo gerencial, como a qualificação de OSs e OSCIPs e a
contratualização de resultados.
6.1.2. A variedade de capitalismo nacional.
Schneider (2004) atribui à América Latina uma posição intermediária entre os
tipos de economias de mercado liberal e coordenada, no que classifica como
economia de mercado “semi-articulada”, assemelhando-se ao tipo “mediterrâneo” ou
“centrado no Estado”, mencionado por Hall e Soskice (2001) ao se referirem a
França, Itália, Espanha, Portugal, Grécia e Turquia. Esse tipo híbrido possui maior
organização institucional não-competitiva para as relações entre empresas e governos
e ao acesso a financiamento e tecnologia do que as economias liberais, mas se baseia
mais no mercado para as relações laborais do que as economias coordenadas.
No plano produtivo, conglomerados domésticos e multinacionais tiveram
marcante atuação histórica, por vezes complementar, estimulados pelo Estado. Este
seria a peça cardeal da modalidade de coordenação capitalista latino-americana,
reforçando as complementaridades através da regulação do capital, do trabalho, da
tecnologia e de uma variedade de bens e serviços – e assim influenciando diretamente
o investimento privado. Dessa forma, o padrão de coordenação capitalista é
historicamente não-competitivo.
O traço característico dessa modalidade brasileira de capitalismo periférico
liderada pelo Estado, como bem anota Nunes (1997), é que a universalidade de
118
procedimentos impessoal, característica das relações de mercado, foi integrada a
outras gramáticas, como o clientelismo, o corporativismo e o insulamento burocrático,
que “permeiam a sociedade de alto a baixo, e estão simultaneamente presentes nas
instituições formais”. Da interação entre essas gramáticas decorrem padrões de
relacionamento entre Estado e sociedade que reúnem “trocas generalizadas e
pessoais”, em que as relações entre os agentes econômicos supõem a “expectativa de
relações pessoais futuras” e dependem das relações pretéritas; e “trocas específicas e
impessoais”, que “ocorrem sem preocupação com as características pessoais dos
indivíduos envolvidos”.
Dessa forma, Evans (1993), Geddes (1994) e Schneider (1991) expõem como
a estratégia de desenvolvimento pautada em “bolsões de eficiência” no interior da
burocracia conviveu com normas clientelistas tradicionais, resultando no predomínio
de relações público-privado não-institucionalizadas, de caráter ad hoc e
personalizadas, em que as empresas apostavam na influência sobre políticas setoriais
discricionárias e voláteis de que eram dependentes (SCHNEIDER, 1991), formando
“anéis burocráticos” com agentes públicos, conforme Cardoso (1975), em detrimento
de uma estrutura burocrática estável que proporcionasse interações institucionalizadas
entre público e privado. A parca institucionalização e a combinação de diferentes
gramáticas produziram casos exitosos de industrialização (EVANS, 1993),
convivendo com instabilidade e fragilidade no cumprimento de funções mínimas de
Governo (SCHNEIDER, 1995).
A coordenação própria das economias semi-articuladas na obtenção de
recursos para investimento e celebração de parcerias, então, assemelha-se mais a
economias de mercado coordenadas, prevalecendo redes reputacionais e relações de
longo prazo e não competitivas - entre os agentes produtores, financiadores e o
Estado (HALL e SOSKICE, 2001). Neste caso, a possibilidade do desenvolvimento
de contratos relacionais (ver Capítulo 5) é maior do que nas economias liberais, mas
também menor é a competição.
No Brasil, o problema chave é que não apenas o corporativismo (clássico nas
economias de mercado coordenadas) ou o insulamento burocrático governam essas
redes relacionais, mas também relações clientelistas e personalistas que poderiam pôr
em xeque a disciplina de incentivos das PPPs. Assim, o dilema é que as redes
119
relacionais podem ser um mecanismo mitigador das vantagens decantadas nas PPPs,
mas podem também fortalecer mecanismos de enforcement para além das regras
contratuais.
Por exemplo, o predomínio de agentes financiadores estatais ou multilaterais
(BNDES, IFC, BID) como de parceiros privados com vasta atuação no Brasil ou
consorciados com parceiros brasileiros fortalece mecanismos de enforcement para
além das regras contratuais, já que as relações duradouras entre os agentes minimizam
o risco de oportunismo. Enei (2007) cita como exemplo o financiamento por meio de
agentes multilaterais de crédito, cujo inadimplemento produz pesado ônus para o
Estado que o acomete, por intermédio da restrição do financiamento para novos
projetos, isto é, a dependência de relações de longo prazo com o financiador é meio
de credible commitment. Por outro lado, os laços existentes entre Estado e
particulares, nem sempre institucionalizados, podem fragilizar a competição e a
estrutura de incentivos.
É interessante rememorar que referidas formas de coordenação não são
imutáveis e transformações importantes têm sido realizadas nos últimos anos.
Entretanto, mercados de capitais ainda incipientes são, ao menos na etapa inicial, uma
limitação para project finances mais sofisticadas no Brasil, como nota Borges e Neves
(2005), o que revela a presença de mecanismos de financiamento menos sofisticados
do que em economias liberais .
6.2. O Caso Minas: Reforma do Estado e a Implantação das PPPs.
A implantação do programa de Parceria Público-Privada no Estado de Minas Gerais é
objeto da presente descrição por dois motivos: primeiro, por se tratar de um Estado
que, em 2003, quando da aprovação de sua Lei Estadual de PPP, sofria grave crise
fiscal e um déficit de credibilidade institucional; segundo, porque as PPPs mineiras
estão inseridas num programa amplo de Reforma do Estado, sendo um dos projetos
estruturadores dos Planos Plurianuais de Ação do Estado de Minas Gerais dos
períodos 2004/2007 e 2008/2011.
A Constituição Federal de 1988 promoveu uma descentralização de recursos
entre os entes da Federação, favorecendo Estados e Municípios e aprofundando o
120
processo descentralizador que se iniciara ainda ao fim da década de 70. Referida
tendência se refletiu na outorga de maior autonomia para tributar aos entes
subnacionais, mas, sobretudo, no aumento de sua participação na receita de tributos a
cargo da União Federal.
A despeito da existência das normas sobre finanças públicas na Constituição
Federal, porém, o período posterior à constituinte não foi acompanhado por um
regime de restrição orçamentária forte (hard budget constraint) para os entes
subnacionais, que aceleravam seus gastos para além da expansão das receitas. Nos
Estados, este artifício se refletia na expansão de gastos por meio do uso de recursos de
bancos e empresas estatais estaduais, pelo imposto inflacionário e pelo regime de
endividamento de restrições orçamentárias fracas (soft budget constraint), na medida
em que a União contribuía financeiramente com os Estados endividados, o que
culminou com a crescente participação dos Estados na dívida total do setor público
(FERREIRA JR., 2006). A partir da estabilidade conquistada por meio do Plano Real,
o regime de soft budget constraint foi seriamente afetado com a eliminação do
imposto inflacionário para as três esferas de Governo e, particularmente em relação
aos Estados, a União passou a criar condições rígidas para a rolagem das dívidas
estaduais.
A renegociação das dívidas dos Estados, entabuladas sob a vigência da Lei
Federal n. 9.496/1997, culminou com a promulgação da Lei de Responsabilidade
Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000), que sistematizava o regime de hard budget
constraint. Alguns estados sofreram para se adequar a este regime, como Minas. Em
2003, quando da posse do Governador Aécio Neves, a crise das finanças estaduais se
refletia em indicadores como o déficit orçamentário acumulado desde 1995, numa
média de 6,2% entre 1997-2002; no descumprimento do limite do Poder Executivo
para despesa com pessoal relativamente à receita corrente líquida fixado na LRF
(49%), chegando ao percentual de 61,7%; no descumprimento do patamar de 200%
estabelecido pelo Senado Federal para a relação entre Dívida Consolidada Líquida e
Receita Corrente Líquida, cuja relação era de 274,4% (NOMAN et al., 2006; REIS,
2006).
Esse quadro fiscal resultara na inadimplência do Estado para com seus
funcionários e credores e na inexistência de crédito perante instituições financeiras
121
internacionais, que o Estado era classificado na categoria “C” relativamente a sua
situação financeira pela Secretaria do Tesouro Nacional
83
, o que impedia a obtenção
de aval da União para obtenção de empréstimos no mercado financeiro internacional
(DIAS, 2007).
O Governo Itamar Franco (1998-2002) acrescera a essa situação fiscal a
declaração de moratória no pagamento da dívida renegociada junta à União
84
(REIS,
2006). Também no Governo Itamar Franco ocorreu a celeuma entre o Estado de
Minas Gerais e empresas privadas que, tendo adquirido ações da distribuidora
estadual de energia elétrica, a CEMIG, durante o Governo Eduardo Azeredo (1995-
1998), haviam celebrado acordo de acionistas que submetia ao crivo dos novos
acionistas privados (minoritários) decisões da estatal. O Estado ingressou com ação de
nulidade contra o referido acordo e logrou êxito na Justiça Estadual – decisão mantida
pelo STJ
85
. Interessante notar que a disputa resultou na promulgação, pela Assembléia
Legislativa do Estado, da Emenda Constitucional n. 49/2001 que, entre outras
novidades, submeteu a desestatização de empresas públicas de distribuição de gás
canalizado, geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ou saneamento
básico a referendo popular.
Relevante registrar que, sob o ponto de vista institucional, os Estados são
considerados casos de ultrapresidencialismo (ABRÚCIO, 1998), dada a prevalência
do Poder Executivo no sistema político estadual; Minas Gerais é um Estado com
pouca competição política (ALSTON et. al, 2007), tornando ainda mais forte o Poder
Executivo vis-à-vis o Legislativo. Segundo Alston et al. (2007), esta configuração
institucional tem efeitos majoritariamente ambíguos sobre as políticas públicas:
permitiria a oferta de mais bens públicos através do alongamento do horizonte
temporal de um Poder Executivo não sujeito a pressões competitivas, mas, por outro
lado, pode implicar menores pontos de veto para a adoção de medidas pelo Governo
sem qualquer oposição.
83
A portaria n. 89/1997, do Ministério da Fazenda, disciplina sobre a classificação dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, relativamente a sua situação financeira/capacidade de pagamento, o
que condiciona a prestação de garantia da União em seu favor.
84
Sob o aspecto puramente fiscal, a moratória teve efeitos quase nulos, dado o acionamento de
garantias pela União, através do bloqueio do repasse do FPE (REIS, 2006).
85
Agravo de Instrumento n. 481023, STJ, Quarta Turma, DOU de 16/02/2004.
122
Não é de estranhar, assim, que Clemente (2007; 125) tenha chegado à
conclusão, após analisar os Governos Eduardo Azeredo (1995-1998), Itamar Franco
(1999-2002) e Aécio Neves (2003-2006) de que a Assembléia mineira, incluindo a
oposição, adota postura bastante cooperativa em relação ao Poder Executivo, sendo “a
liderança do governador em torno de uma agenda ...um fator fundamental para
entender o processo decisório”, o que reflete a histórica tradição conciliatória
imputada ao político mineiro.
Dessa forma, assim como o Governo Itamar Franco encontrou apoio
legislativo para obstruir o processo de desestatização, o Governo Aécio Neves, que o
sucedeu, pôde implementar sem maior oposição um forte ajuste fiscal, além de
programas favoráveis ao investimento privado, inclusive através de inúmeras leis
delegadas
86
(CLEMENTE, 2007). Assim, o Governo que tomou posse em 2003
implementou programa de reforma que endereçava, de imediato, a grave conjuntura
fiscal então encontrada e, paralelamente, procurava criar um direcionamento
estratégico para o Estado de Minas Gerais, no que Guimarães e Almeida (2006)
intitulam de “planejamento dual”, com dois pilares: o primeiro, a “estratégia do
presente”, seria um rigoroso equilíbrio fiscal; o segundo, a “estratégia do futuro”,
seria uma “agenda do desenvolvimento”.
O lema “Choque de Gestão” sintetiza os nortes da reforma mineira, cuja
implantação se deu a partir da edição de 63 Leis Delegadas em janeiro de 2003,
enfocando o alcance de três dimensões: o ajuste à realidade, o planejamento e a
inovação (VILHENA e ATHAYDE, 2005). O ajuste fiscal envolveu a redução de
despesas, através da melhoria da gestão de processos e contingenciamento de gastos, e
a elevação da receita, culminando com o anunciado “Déficit Zero”, em novembro de
2004.
A reforma procurou, ainda, revigorar instrumentos de planejamento, com a
edição, em 2004, do Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI), por meio
de Lei Estadual aprovada na Assembléia Legislativa (Lei n. 15.032/2004), que fixava
três diretrizes estratégicas – (i) reorganizar e modernizar a administração pública
estadual, (ii) promover o desenvolvimento econômico e social em bases sustentáveis e
86
Em 2003, foram editadas 63 Leis Delegadas. Em 2007, novamente, foram editadas mais 67 Leis
Delegadas.
123
(iii) recuperar o vigor político de Minas Gerais. Essas diretrizes se plasmaram em
“projetos estruturadores” inicialmente, 30 projetos considerados prioritários,
submetidos a uma gestão intensiva, que materializavam a dimensão inovação
(VILHENA e ATHAYDE, 2005).
Entre os 30 projetos estruturadores, destaca-se o próprio “Choque de Gestão
Pessoas, Qualidade e Inovação na Administração Pública”
87
, que procurava
configurar no Executivo mineiro um modelo gerencial de Gestão, “com foco em
resultados” (VILHENA e ATHAYDE, 2005).
O programa de PPPs, instituído através da Lei Estadual n. 16.083, de
16/12/2003, portanto, foi criado num contexto de reforma que interage com a
implantação da estrutura de governança das PPPs, um dos projetos estruturadores
eleitos nos PPAs 2004-2007 e 2008-2011.
Antes de examinarmos o programa de PPP, importa registrar como as três
dimensões da reforma mineira ajuste à realidade, planejamento e inovação podem
influenciar o desenvolvimento do programa e dos primeiros projetos de PPP,
importando num fator de complementaridade institucional entre as PPPs e o sistema
administrativo.
6.2.1. O Ajuste à realidade.
A situação fiscal de Minas Gerais, em 2003, era ilustrada pela baixa disponibilidade
de recursos para investimento e pela ausência de crédito perante instituições
tradicionalmente financiadoras de projetos de infra-estrutura. Desta forma, se o
programa de PPP poderia ser um alento para a retomada de investimentos em infra-
estrutura, o ajuste fiscal era uma pré-condição para assegurar a contrapartida estatal
em arranjos colaborativos e a atração de entidades financiadores aos primeiros
projetos de PPP.
Assim, é possível afirmar que o equilíbrio fiscal perseguido pelo Estado
mineiro era um passo sine quo non para a reconquista da credibilidade necessária aos
programas de PPPs e, particularmente, para atrair o apoio de instituições aptas a dar
suporte a essas parcerias. Essas perspectiva é corroborada por Noman et al. (2006),
87
A expressão “Choque de Gestão, portanto, é utilizada tanto para a reforma como um todo, quando
para um específico projeto estruturador.
124
para quem, adequando-se aos limites legais de equilíbrio fiscal, o Estado pôde
“receber recursos externos de organismos como o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BIRD)”.
Especificamente em relação a este último aspecto, Dias (2007) assinala que,
ao final do ano de 2004, o Estado teve sua situação financeira classificada pela
Secretaria do Tesouro Nacional na categoria “B”, o que lhe permitiu “recuperar o
crédito internacional e pleitear novos investimentos nas áreas social, de infra-estrutura
e gestão”, possibilitando a celebração de contratos de financiamento com o BID e o
BIRD, neste último caso, “após mais de dez anos da última contratação que o Estado
logrou realizar” (NOMAN et al, 2006).
Segundo Reis (2006), o norte fiscal do Choque de Gestão efetivamente logrou
êxito tanto sob o aspecto da receita, quando pelo aspecto da despesa. Indicadores
como despesa de pessoal/receita corrente líquida e dívida consolidada/receita foram
adequados aos limites fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pelo Senado
Federal.
6.2.2. O Planejamento.
O planejamento em Minas Gerais é materializado numa série de instrumentos, a
começar pelo Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado PMDI que, previsto na
Constituição Estadual, equivale ao Planejamento Estratégico do Governo Estadual,
sem, necessariamente, prazo pré-definido.
O Choque de Gestão tornou o PMDI peça central de planejamento de longo
prazo, aprovando-o em 2004 através da Lei Estadual n. 15.032/2004, com definição
de visão e objetivos estratégicos, orientando a escolha dos 30 projetos estruturadores
considerados prioritários, que compuseram um portfólio submetido à Gestão
Estratégica de Recursos e Ações - GERAES. O PMDI foi proposto pelo Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social CDES, presidido pelo Governador do Estado
e com a participação de integrantes do Governo, da sociedade civil entidades de
classe, instituições de ensino e pesquisa e personalidade notáveis, o que conferiria
legitimidade ao referido instrumento. Em 2007, foi aprovado o PMDI 2007-2023,
através da Lei Estadual n. 17.007/2007, que, fundado nas mesmas bases do PMDI
2004, visa ao “refinamento da estratégia”, e sob amparo dos resultados obtidos no
125
quadriênio 2003-2006, formula a “segunda geração do Choque de Gestão”, cujo
objetivo é a construção de um “Estado para Resultados” o que significa, segundo o
PMDI 2007-2023, “garantir à população serviços públicos com alta qualidade,
máximo índice de cobertura e aos menores custos” (MINAS GERAIS, 2007). A
estratégia do “Estado para Resultados” é desdobrada em onze áreas de resultados, que
agrupam 57 projetos estruturadores, definidos no Plano Plurianual aprovado através
da Lei Estadual n. 17.347/2008.
Os objetivos do PMDI orientam a elaboração do PPA que, a seu feito, instrui a
LDO e a LOA. O Choque de Gestão instituiu a prática de revisão anual do PPA, com
vistas a minimizar o clássico problema de segregação entre Planejamento e
Orçamento – dificuldade esta mitigada pela concentração das áreas de planejamento e
orçamento na SEPLAG
88
. Acrescente-se que outra peculiaridade de Minas no
processo orçamentário refere-se à existência de um órgão a Junta de Programação
Orçamentária e Financeira (JPOF) que, colegiada com membros das Secretarias da
Fazenda e de Planejamento e Gestão, responde pelas metas fiscais, promovendo,
quando necessário, o contingenciamento. Segundo Oliveira, Almeida e Guimarães
(2006), a existência da JPOF assim formada assegura uma maior integração entre as
decisões de planejamento e as medidas controladoras tomadas, minimizando o “fluxo
errático de recursos”.
Os projetos estruturadores foram definidos nos PPAs, respectivamente, dos
períodos 2004/2007 e 2008/2011, estando, em ambos, eleito como projeto
estruturador o programa de PPPs. Os projetos estruturadores são submetidos a
regramento orçamentário próprio. Identificados na LOA com código específico,
recebem execução orçamentária e financeira com fluxo de recursos privilegiado,
excluídas de eventuais contingenciamentos pela LDO
89
. Segundo Oliveira, Almeida e
Guimarães (2006), este privilégio se refletiu, nos anos de 2004 e 2005, num
crescimento dos recursos dos projetos estruturadores superior aos não estruturadores,
88
Segundo entrevista concedida pela Secretária Renata Vilhena ao autor.
89
A exemplificar, o Decreto de programação orçamentária e financeira do ano de 2008 (Decreto
Estadual n. 44.716/2008) especifica a programação dos projetos estruturadores para os diferentes tipos
de despesas (art. 1º, §4º) e atribui aos responsáveis pela área de planejamento, gestão e finanças das
unidades que executam os projetos estruturadores a obrigação de assegurar sua precedência. Na LDO, a
exemplo do exercício de 2008 (Lei Estadual n. 16.919/2007), as despesas com projetos estruturadores
são expressamente excluídas da base contingenciável (art. Art. 35, §2º, VII).
126
assim como uma execução orçamentária relativamente maior comparativamente aos
últimos.
O GERAES representa o gerenciamento intensivo dos projetos estruturadores.
São eleitos Gerentes Executivos, responsáveis pelo alcance das metas, criando-se uma
estrutura matricial em que os Gerentes e as unidades administrativas que participam
de sua execução atuam em posição de igualdade. Ao Gerente Executivo, cujas
funções foram definidas pelo Decreto Estadual n. 43.378/2003, cabe executar as
decisões da Coordenação do Projeto, atuar, em nome do Estado, junto aos órgãos e
entidades envolvidos em sua execução, coordenar as ações a serem executadas,
responsabilizar-se pelas metas contratadas, prestar contas, periodicamente ou sempre
que for solicitado, do estágio em que se encontra o Projeto, à Subsecretaria de
Planejamento e Orçamento da SEPLAG e fazer correções de estratégia, quando
necessário
90
.
O planejamento se desdobra em ações, responsáveis, prazos e avaliação
periódica, realizada esta última pela Unidade de Apoio Gerencial aos Projetos
Estruturadores - UAGP, da Subsecretaria de Planejamento e Orçamento (SPLOR) da
SEPLAG, que em sessões mensais obtém dados do andamento, verifica o
desempenho, identifica dificuldades e riscos, consolida solicitações orçamentárias e,
se necessário, revisa o planejamento, compondo um Status Report; este permite
verificar, por ação, os créditos orçamentários autorizados e pagos, o andamento das
ações vis- à-vis a previsão planejada, as principais realizações do mês, a quantificação
das metas, a solicitação orçamentária do mês ou de decretos de remanejamento
orçamentário.
É nesta etapa de acompanhamento, ainda, que se estabelece, através do
Relatório Executivo, um plano de ação que aponta dificuldades e riscos, a ação a ser
realizada para superá-los, o responsável pela ação, o prazo para tanto, o “farol” de
realização da ação (resolvido = verde; ação realizada, problema pendente = amarelo;
ação não realizada = vermelho) e a posição do andamento da resolução do problema.
Além do acompanhamento da UAGP, o próprio Governador do Estado recebe “Painel
90
A gestão desses projetos se fundamenta na Metodologia Estruturada de Planejamento e Controle de
Projetos (MEPCP), do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG).
127
de Controle”, que permite a avaliação e cobrança de metas por parte da alta direção do
Estado.
Segundo Almeida e Guimarães (2006), o GERAES representaria a superação
de entraves para o andamento de projetos na Administração, como a inadequação
orçamentária, a insuficiência das dotações orçamentárias, o encaminhamento de
pleitos pelos gerentes que não poderiam ser executados pelas unidades responsáveis, a
falta de informações precisas para a aprovação do pagamento, a falta de associação
entre os pleitos financeiros/orçamentários e o andamento das atividades e o
conhecimento dos resultados e identificação dos gargalos pela alta gerência do
Governo.
A inclusão das PPPs como projetos estruturadores é, portanto, medida
direcionada aos riscos de falhas comuns em contratações administrativas, como os
atrasos nas medidas atribuídas ao Poder Público e o fluxo dos pagamentos, que
culminam com atrasos nos cronogramas de obras comuns e elevação do custo dos
empreendimentos. De forma mais ampla, a condução conjunta dos processos de
planejamento e orçamento também se manifesta numa estratégia que pode mitigar o
risco do atraso de pagamento.
6.2.3. O Modelo Gerencial.
O projeto estruturador “Choque de Gestão Pessoas, Qualidade e Inovação na
Administração Pública”, enfocando a introdução de mecanismos gerenciais na área
meio da gestão, relaciona-se com os demais projetos estruturadores do Governo
Mineiro.
De acordo com Vilhena e Athayde (2005), o novo modelo de gestão tem por
premissa a gestão por resultados, que se materializa na celebração de acordos de
resultado verticais (com órgãos e entidades da Administração Pública) e horizontais
(com os gerentes executivos dos projetos estruturadores), na avaliação de desempenho
individual (com servidores públicos) e na realização de parcerias com a iniciativa
privada, seja com pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos (OSCIPs), seja
com pessoa jurídica de direito privado com fins lucrativos (PPPs). Assim se desenha o
modelo de gestão:
128
Figura 6: O Modelo de Gestão Mineiro
Fonte: Vilhena e Athayde, 2005
A contratualização de resultados, no Governo mineiro, alcançou grau de
abrangência que confere ao projeto estruturador em referência status de melhor
prática nacional e internacional (WORLD BANK, 2007). Na primeira etapa, os
processos de adesão e indução foram a força motriz por trás da celebração dos
acordos de resultados (MINAS GERAIS, 2004), a “segunda etapa do Choque de
Gestão” pressupõe a generalização, para toda a administração pública estadual, dos
avanços já obtidos em determinados segmentos”, não sendo por outro motivo a
síntese do novo PMDI o “Estado para Resultados”.
Referida generalização do método de gestão por resultados se faz sentir, por
exemplo, na criação do Manual de Indicadores de Desempenho (MINAS GERAIS,
2004), na celebração de convênios com o Banco Mundial para, entre outros objetivos,
o desenvolvimento de indicadores de desempenho (WORLD BANK 2007) e na
criação de uma Área de Indicadores, dentro da estrutura da Secretaria de
Planejamento e Gestão.
Dessa forma, a disseminação da lógica de resultados por todas as áreas de
atuação do Governo mineiro possibilita o desenvolvimento de expertise na criação e
avaliação de indicadores de desempenho para diferentes áreas passíveis de serem
objeto de PPPs. Trata-se de potencial impacto de longo prazo que, em certo sentido,
pode reproduzir a experiência britânica, em que as PFIs foram pontos culminantes do
129
processo de contratualização de resultados iniciado na década de 80 (HM
TREASURY, 2008).
6.2.4. Atores da Reforma.
Os integrantes do Governo entrevistados atribuem ao Governador e ao Vice-
Governador do Estado – embora ocupantes de cargos por natureza submetidos a
mudanças periódicas – papéis de alicerces para a abrangência e consolidação do
modelo.
Neste arranjo, enquanto o Governador assume protagonismo no cenário
político para a obtenção de apoios ao programa, o Secretário da SEPLAG na primeira
gestão Aécio Neves e Vice-Governador do mandato que compreende o período 2007-
2011, Antônio Anastasia, tem participação marcante na concepção e operacionalidade
do programa – inclusive tendo participado do processo reformista do MARE na
primeira gestão FHC
91
. Ademais, a equipe que em Minas concebeu e implantou o
“Choque de Gestão” também esteve no Governo FHC, a começar pela Secretária da
SEPLAG, Renata Vilhena.
De acordo com a Secretária de Planejamento e Gestão, Renata Vilhena, o
suporte do Governador do Estado e do Vice-Governador da segunda gestão tem
propiciado a difusão da gestão por resultados em inúmeros órgãos, superando
resistências e a tradicional dicotomia entre ajuste fiscal e mudança institucional nas
reformas do aparelho do estado (REZENDE, 2004):
“A gente recebeu 60% dos Estados brasileiros querendo conhecer o
Choque de Gestão. Hoje, eu afirmo com certeza: a receita é o mais fácil,
não tem mistério; mas tem de ter vontade política e liderança para poder
fazer isso tudo. E esse é o diferencial de Minas Gerais. A gente tem um
Governador que a exercita.”
O respaldo do Governador e de seu Vice é destacado pelo Banco Mundial
(2007) como a força motora da reforma do aparelho do Estado em Minas Gerais.
Também segundo a Secretaria de Planejamento e Gestão, a aproximação do
Governador junto a entidades supranacionais, como Banco Mundial e BID, foi
91
Embora fosse formalmente vinculado ao Ministério do Trabalho.
130
fundamental para o papel que têm desempenhado essas instituições no processo
reformista mineiro.
É, ainda, relevante no programa mineiro o Instituto de Desenvolvimento
Gerencial INDG, consultoria em gestão empresarial no Brasil que, contando com o
suporte de importantes empresários, forneceu ao Governo mineiro tecnologias
centrais no “Choque de Gestão”, como a própria metodologia de gerenciamento
intensivo de projetos.
Finalmente, o apoio das instituições multilaterais Banco Mundial e BID à
reforma mineira é outro ponto de suporte do Choque de Gestão. Este alicerce se
manifesta não apenas no retorno do financiamento a projetos específicos, mas, em
especial, na cooperação para o desenvolvimento de políticas intitulado Minas Gerais
Partnership for Development, que oferece amparo para três pilares da reforma
implantada o equilíbrio fiscal, a reforma da gestão pública e o desenvolvimento do
setor privado – e inclui o repasse de recursos cuja contrapartida é formada por
indicadores relacionados à continuidade da reforma do aparelho do Estado (WORLD
BANK, 2008)
6.3.As PPPs em Minas Gerais.
Minas Gerais foi o primeiro Estado brasileiro a aprovar sua Lei de PPPs – Lei
Estadual n. 14.868, de 16/12/2003 quando inexistia, ainda, clara compreensão sobre
como, de fato, o novo marco legal se integraria ao arcabouço legislativo existente,
sobremaneira a Lei de Licitações (Lei Federal n. 8.666/93) e a Lei de Concessões (Lei
Federal n. 8.987/1995).
Ainda assim, o Estado aproveitava, em boa medida, os primeiros estudos
realizados no âmbito federal ao fim do Governo Fernando Henrique Cardoso, até
mesmo porque o então responsável pela Unidade PPP no Governo Federal, Luiz
Antônio Athayde, assumira a função de levar adiante a implantação do
correspondente programa em Minas Gerais.
A Lei das PPPs foi editada sem que houvesse projetos cuja modelagem
indicasse sua adequação à modalidade de contratação que se pretendia instaurar com
131
as PPPs. Conforme o responsável pelo programa mineiro
92
, num primeiro momento a
edição das PPPs exerceu uma função “mobilizadora” do debate sobre a participação
privada em infra-estrutura:
“... em que pese dependesse de várias alterações, ou vários fundamentos
legais que vieram a acontecer com a Lei Federal, até porque era de
aplicação geral não cabia a Minas Gerais legislar sobre o regime de
concessões – quando tivemos a discussão da Lei de Minas Gerais foi
exatamente para haver uma grande mobilização do papel que o setor
privado poderia ter para acelerar a oferta de serviços de infra-estrutura. E
foi muito útil. Com um ano de discussão na Assembléia, esse foi um
assunto que, de certa forma, já se dominava um pouco”.
É certo, contudo, que a Lei das PPPs mineira antecipava regras que seriam
incorporadas pela Lei Federal das PPPs, a se destacar: (i) a outorga da exploração e
gestão das atividades decorrentes da implantação e do desenvolvimento de obra,
serviço ou empreendimento (art. 1º, Parágrafo Único); (ii) o pagamento variável
condicionado a observância de indicadores de desempenho (art. 1º, Parágrafo Único,
art. 12, incisos I e II; art. 15, §1º); (iii) a concessão da faculdade para escolha dos
meios para a execução do contrato (art. 14, inciso II); (iv) a expressa previsão de
possibilidade de contraprestação oriunda do Tesouro (art. 15); (v) a explícita
autorização para inclusão de cláusula arbitral no contrato (art. 13); (vi) a possibilidade
de emissão de empenho em favor do financiador do projeto (art. 15, §2º); (vii) a
possibilidade de proteção do crédito dos parceiros privados através de diversas
modalidades de garantia, inclusive vinculação de recursos por meio de fundos
específicos (art. 16); (viii) e a criação do Conselho Gestor de Parcerias – CGP,
vinculado à Governadoria, e da Unidade PPP, no âmbito da Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Econômico (arts. 19 e 20).
Na ocasião, foram selecionados, por ato do Governador, cinco projetos-
piloto
93
para realização dos estudos de modelagem. Entretanto, a prioridade, antes de
serem postos a prova os primeiros projetos, era pôr em funcionamento as estruturas
institucionais previstas para as PPPs, conforme Athayde, Gusmão e Silva (2006):
92
Entrevista concedida ao autor.
93
(i) Recuperação da infra-estrutura da Rodovia MG-050; (ii) Construção de três mil vagas
penitenciárias; projeto de saneamento básico nas regiões com menores IDH do Estado; (iii) Centro
Administrativo mineiro; e (iv) construção do campus da Universidade Estadual de Minas Gerais
UEMG
132
“É correto afirmar que a legislação de PPPs de Minas buscou, sobretudo,
delinear um modelo de governança e um novo marco institucional para as
políticas atinentes à estruturação, licitação, contratação e execução das
parcerias com o setor privado. Além de identificar a metodologia e os
conceitos das PPPs – inovadores no cenário jurídico nacional -, a lei
mineira atribui especial ênfase no processo decisório através do qual seria
autorizada a realização de projetos sob essa roupagem, prescrevendo a
necessidade de um criterioso planejamento, resguardada, sempre, a
participação da sociedade em todo o processo (...) A fim de ilustrar
algumas dessas estruturas, cite-se a figura do “Plano Estadual de Parcerias
Público-Privadas”, a do “Conselho Gestor de Parcerias Público-Privadas”,
a da “Unidade PPP”, a do “Arranjo de Garantias” e a da Consulta
Pública”. Além dessas figuras – que estão, na verdade, expressamente
previstas na Lei -,o programa de Minas Gerais conta ainda com traços
diferenciais, que se revelam na criação do “Manual de Operações, na
política de capacitação adotada para os servidores, na constituição de uma
“Rede PPP no Estado, bem como no apoio dado pelo Banco
Interamericano de Desenvolvimento BID, através da celebração de
convênio de cooperação técnica não reembolsável, por meio do Fundo
Multilateral de Investimentos - FUMIN”.
Além das previsões legais, os PPAs de 2004/2007 e de 2008/2011 permitem
entrever as metas atribuídas ao Gerente Executivo do programa de PPPs que, como
antes assinalado, é um dos projetos estruturadores submetidos a gerenciamento
intensivo. No PPA 2004/2007 o projeto é denominado “Unidade Parceria Público-
Privada MG”, tendo por ações a elaboração dos projetos-piloto de PPP”, a
“implantação da agência reguladora de PPP em Minas Gerais”, a “implementação de
unidade coordenadora PPP/MG”, a “viabilização da aprovação de projetos de leis
específicas” e o “apoio aos campi integrado da UEMG” (MINAS GERAIS, 2004). No
PPA 2008/2011, o projeto passa a ser nominado “Parcerias para a provisão de
serviços de interesse público” e segue dois nortes: de um lado, o “fomento à
realização de modelagens de PPPs” e a “implementação de projetos de PPPs” e, de
outro, “as estruturas institucionais do programa” e a “gestão do conhecimento e
desenvolvimento do ambiente de parceria” (MINAS GERAIS, 2008)
Dessa forma, para que se retrate, efetivamente, o desenvolvimento do
programa mineiro de PPPs, é preciso relatar duas dimensões: (i) o modelo de
governança instituído; (ii) e a efetiva implantação dos primeiros projetos de parcerias
público-privadas.
6.3.1. O Modelo de Governança.
A Lei mineira criou dois órgãos centrais para o programa de PPPs: o Conselho Gestor
de Parcerias – CGP, vinculado à Governadoria, e a Unidade PPP, integrando a
133
estrutura da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico. Foram ambos
instituídos pelo Decreto Estadual n. 43.702, de 16/12/2003 (mesmo dia de aprovação
da Lei). O CGP
94
é presidido pelo Governador do Estado e outros ocupantes de cargos
no Poder Executivo e tem função deliberativa: elabora o Plano Estadual de PPPs,
autorizando a integração dos projetos a ele, e aprova editais, contratos, aditamentos e
prorrogações.
A Unidade PPP é o braço cnico do programa. Desenvolve, analisa e
recomenda à CGP os projetos sob modelagem PPP, provê suporte técnico ao CGP e
presta assessoramento técnico às unidades setoriais de PPP e ao agente financeiro do
Fundo PPP, dissemina a metodologia dos contratos de PPP, gerencia a rede, além de
outras atividades correlatas.
Embora, originariamente, o PPA 2004-2007 previsse a criação de uma
Agência Reguladora de PPPs, esta ação foi excluída do PPA 2008-2011 que prevê,
desta feita genericamente, “consolidar o modelo institucional” do programa - e o
primeiro projeto licitado MG-050 define como fiscalizador do contrato o próprio
ente licitante, o DER-MG.
A Lei Estadual n. 14.869, de 16/12/2003, criou o Fundo de Parcerias Público-
Privadas, entidade contábil sem personalidade jurídica, que daria suporte ao programa
de PPPs e teria como agente financeiro o Banco de Desenvolvimento de Minas
Gerais, não sendo, contudo, regulamentado o referido Fundo até o momento de
elaboração deste trabalho. O Acordo de Resultados firmado entre o Governador e a
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico prevê a criação de uma nova
Lei que compatibilize o diploma legal existente à superveniente Lei Complementar
Estadual n. 91/2006 que dispõe sobre a gestão de Fundos Estaduais e da
regulamentação do FGP
95
. No primeiro contrato de PPP do Estado, a garantia
assegurada ao Parceiro Privado foi acobertada por royaltes de propriedade da
CODEMIG. No Edital do Complexo Penal BH, submetido a consulta pública, o
arranjo de garantias resta indefinido.
94
Ou CGPPP, como denomina o Decreto.
95
O Unibanco – União de Bancos Brasileiros S.A. foi contratado para o auxílio técnico na estruturação
do arranjo de garantias (UNIDADE PPP/MG, 2005)
134
Seguindo o modelo inglês de criação de standards para orientar a escolha de
projetos de PPP, está prevista, ainda, a criação de “Manual de Operações” que,
conforme definido pelo Acordo de Resultados retro referido, definirá “o fluxograma
de encaminhamento e tramitação dos projetos de PPP no Estado e os critérios de
seleção e hierarquização a serem adotados”. De se notar que, em 2005, foi
divulgada a “Cartilha PPP/MG” que, sem caráter normatizador, procura definir os
principais conceitos envolvidos nas PPPs e anuncia as principais ações em curso
(UNIDADE PPP/MG, 2005).
Foi instituído pelo Decreto Estadual n. 44.565/2007, ainda, em vista da
possibilidade de participação na licitação dos autores ou responsáveis
economicamente pelos projetos, a disciplina do procedimento de manifestação de
interesse, que oportuniza, para a iniciativa privada, discutir os projetos prioritários do
Poder Público e apresentar estudos antes da abertura do processo licitatório
(UNIDADE PPP/MG, 2005).
Finalmente, a Unidade PPP/MG tem recorrido, na construção do modelo de
governança das PPPs, à participação de entidades multilaterais como o BID e o Banco
Mundial (ATHAYDE, GUSMÃO e SILVA, 2006; WORLD BANK, 2007; 2008), à
Partnerships UK, além do BNDES e consultorias renomadas na área de PPPs, como
KPMG e PricewaterhouseCoopers, na modelagem econômico-financeira dos projetos
(UNIDADE PPP/MG, 2005).
6.3.2. Os primeiros projetos.
Dos cinco projetos-piloto inicialmente eleitos, a concessão patrocinada da MG-050
foi a primeira a ter sua modelagem econômico-financeira a cargo da KPMG -
concluída. Entre esta conclusão e a efetiva celebração do contrato com a empresa
vencedora do processo licitatório, no entanto, passaram-se mais de mil dias. De
acordo com o Coordenador Geral da Unidade PPP (e gerente do projeto estruturador),
Luiz Antonio Athayde, a cautela relativamente aos demais projetos não foi
acidental
96
:
“Nós seguramos todas as outras iniciativas, como, por exemplo, foi o caso
dos Presídios, para ver a primeira PPP dar certo. Nós não fomos levando.
Fizemos questão de ter a primeira PPP, instigando competidores, num
96
Entrevista concedida ao autor.
135
processo que a Justiça respondeu muito bem nas interpelações feitas na
fase licitatória (...) Isso deu um revestimento institucional muito grande
para que nós levássemos adiante as outras iniciativas que, de certa forma,
sob o ponto de vista técnico, de sua modelagem, estavam prontas. É o caso
dos presídios. (...) Por ser uma coisa ainda muita incerta, muito recente,
nós contratamos as primeiras modelagens e passamos dois anos
modelando, discutindo; dez meses depois, o Estado lançava sete mil
quilômetros lotes (rodoviários) em procedimento de manifestação de
interesse. (...) Quer dizer, nota-se o ponto de governança e que foi muito
bem recebido pelo setor privado”.
O início do programa através de uma concessão rodoviária tampouco foi por
acaso. Sobre a escolha do setor rodoviário como projeto-piloto inaugural para o
processo, explica Athayde:
“Se a gente computar toda a experiência do mecanismo de PPP no mundo,
em valor de contratos, 70% é na área de transporte, dos quais algo em
torno de 60% é transporte rodoviário. Então era natural que a primeira
experiência fosse no setor de transportes, (inclusive) porque existia, no
país, em bom funcionamento um modelo de concessões de rodovias.”
Registre-se, nesta altura, que o critério de value for money é um, mas não o
único, aplicável à seleção dos primeiros projetos de PPP no Estado. A Lei Federal n.
11.079/2004 não submete o início do processo licitatório à comparação nos moldes de
um Value for Money Guidance (ver Capítulo 3), mas à demonstração de
“conveniência e a oportunidade da contratação, mediante identificação das razões que
justifiquem a opção pela forma de parceria público-privada” (art. 10, I, “c”). Na
legislação mineira, o Conselho Gestor de Parcerias Público-Privadas é incumbido de
examinar os projetos encaminhados pelos órgãos interessados em realizar PPPs e,
aprovando-os, submetê-los ao crivo do Governador (art. 7º). Ao encaminhar os
projetos para apreciação do CGP, o órgão interessado deve apresentar “a vantagem
econômica e operacional da proposta para o Estado e a melhoria da eficiência no
emprego dos recursos públicos, relativamente a outras possibilidades de execução
direta ou indireta” (art. 10, I).
Ainda assim, a legislação mineira emprega critério para aprovação do projeto
como PPP aproximado da metodologia britânica, vez que se de apontar a melhoria
de eficiência relativamente a modalidades alternativas de execução. Há, no entanto,
duas diferenças fundamentais: primeiro, a inexistência de um procedimento formal – à
moda do VfM – para efetivação da comparação; segundo, nem sempre a alternativa de
contratação direta estará disponível, em face das restrições fiscais. Tais peculiaridades
136
são assim expostas pelo Coordenador Geral da Unidade PPP/MG, Luiz Antônio
Athayde
97
:
“Não nos iludamos. s vamos continuar, sempre, sob o estigma da
restrição fiscal. Hoje, por exemplo, nós temos uma condição muito mais
afiada de investimentos, mas, para a celeridade e quantidade de
investimentos que se precisa ter, restrição fiscal para diversas áreas. Por
outro lado, a questão da eficiência é de enorme significância, por que isso
representa termos o provimento do serviço de forma mais célere e que a
contribuição pública vai premiar o serviço mais barato, mais em conta,
para a população. (...) Aqui no Brasil, precisa-se ter uma decisão muito
rápida quanto a isso e, ao se comparar a realização da operação pública
com a possibilidade de operação privada, como você tem a possibilidade
de recuperar alguma receita por conta do usuário, só esse cálculo do
encurtamento do prazo para a oferta do serviço se comparada com a
alocação direta do recurso lhe uma orientação para isso. O
investimento privado, pelo encurtamento do prazo e pela celeridade que se
tem para a oferta se tudo correr bem vis à vis a implementação ser por
recurso público, (permite) ganho na economia aumento de geração de
imposto, melhora a eficiência - ....É uma decisão que tem de ser muito
rápida. Diferentemente da Inglaterra, em que a plataforma de infra-
estrutura está pronta, você está refinando o serviço...É um pouco
diferente da realidade do Brasil”.
Contratada a concessão patrocinada da MG-050, foi aberta para consulta
pública a construção e gestão, na modalidade de concessão administrativa, do
Complexo Penal BH e aberto para Procedimentos de Manifestação de Interesse novos
lotes rodoviários e unidades de atendimento integrado, estando, por sua vez, em fase
de modelagem, as PPPs para a exploração do centro administrativo do Governo do
Estado e do campus da UEMG.
Tabela 16: Projetos PPP/MG
Projetos em Andamento Modalidade de PPP Estágio
Rodovia MG 050 Concessão Patrocinada Execução contratual
Complexo Penal BH Concessão Administrativa Consulta Pública
Lotes Rodoviários Concessão Patrocinada PMI
Unidades de Atendimento
Integrado – UAI
Concessão Administrativa PMI
Centro Administrativo Concessão Administrativa Modelagem
Implantação do Campus
da UEMG
Concessão Administrativa Modelagem
Fonte: Unidade PPP/MG
Com vistas a identificar variáveis relevantes sobre a interação entre o desenho
das estruturas de governança contratuais e o ambiente institucional, apontam-se a
seguir as regras basilares das minutas disponibilizadas a público pelo Estado de Minas
Gerais MG-050 e Complexo Penal BH -, incluindo normas básicas do processo
97
Entrevista concedida ao autor em 10/03/2008.
137
licitatório, a disciplina de incentivos, as normas atinentes a mudanças contratuais,
solução de conflitos e credible commitments.
O primeiro se trata de uma concessão patrocinada com prazo de 27 anos,
abrangendo a recuperação, manutenção e operação da Rodovia, cuja licitação,
precedida de audiência e consulta pública, foi instruída com manifestação de interesse
de financiamento de quatro instituições financeiras: o BNDES, o BMDG, o IFC
(Banco Mundial) e o BID.
O processo licitatório teve a participação de uma empresa e três consórcios:
Equipav S/A Pavimentação, Engenharia e Comércio; BRVias MG050 (constituído
pelas empresas Splice do Brasil Telecomunicações e Eletrônica S/A, Aeropar
Participações S/A e Bolognesei Engenharia Ltda); Cowan-OHL Brasil-Barbosa Mello
(constituído pelas empresas Construtora Cowan S/A, OHL-Obrascon Huarte Lain
Brasil S.A, Construtora Barbosa Mello S/A) e Construcap-Ferreira Guedes,
constituído pelas empresas Construcap-CCPS Engenharia e Comércio S.A e
Construtora Ferreira Guedes S/A. A Equipav sagrou-se vencedora do certame
licitatório, celebrando-se o contrato no dia 21/05/2007 com a SPE (Concessionária
Nascente das Gerais) formada por esta empresa em consórcio com o grupo Bertin .
O Complexo Penal BH é uma concessão administrativa para a gestão de
unidades penitenciárias, com prazo previsto de 27 anos, cuja modelagem foi realizada
pela empresa de consultoria PricewaterhouseCoopers; os termos das minutas de Edital
e Contrato disponibilizadas em consulta pública, embora ainda não consistindo
versões definitivas, contribuem para o entendimento de como vem sendo feito o
desenho institucional das estruturas de governança em Minas Gerais.
Por fim, ao contrário do setor de transporte rodoviário, as concessões
penitenciárias não têm o mesmo grau de disseminação, embora tenham
crescentemente sido submetidas a operação privada, em especial a partir da década de
90, seja através de privatizações, nos Estados Unidos, seja através de terceirizações,
na França. No Brasil, Cabral (2006) relata experiências de terceirização da gestão de
presídios nos Estados do Paraná, da Bahia, do Amazonas, do Ceará, de Santa Catarina
e do Espírito Santo.
138
6.3.2.1. A estrutura de governança contratual: incentivos, credibilidade e
flexibilidade.
6.3.2.1.1. O processo licitatório.
As estruturas dos referidos processos licitatórios apresentam similaridades, à parte
poucas diferenças:
Tabela 17: Estrutura dos Processos Licitatórios
EDITAIS
Critério de
Seleção
Pré-
Qualificação
Inversão de
Fases
Metodologia
de Execução
Lances em
Viva-Voz
Saneamento
de Falhas
MG-050
Menor
Contraprestação
Pecuniária
Não Não Sim Não Sim
COMPLEXO
PENAL BH
Menor
Contraprestação
Pecuniária
Sim Sim Sim Não Sim
Elaboração do autor
Os processos diferem pela inexistência de inversão de fases no caso da MG-
050; em contrapartida, na Minuta do Edital elaborada para o Complexo Penal BH, a
inversão de fases foi acompanhada de processo de pré-qualificação, que, no entanto,
não se confunde com a etapa de pré-qualificação nas licitações regidas pela Lei n.
8.666/93. As exigências atinentes ao processo de pré-qualificação nesta minuta
referem-se a (i) proposta dos padrões de desempenho e do parâmetro referente à
pontuação pela ocorrência de eventos graves; (ii) plano de Operação do Complexo
Penal e (iii) Plano de Segurança do Complexo Penal, sendo desclassificado o licitante
que não atender ao critério de pontuação mínima. Em fato, trata-se de etapa para
avaliação e recebimento de projetos para a operação da instalação durante a execução
do contrato.
A distinção marcante dos processos licitatórios em pauta do modelo de
“diálogo competitivo” majoritário nas PFIs inglesas (HM TREASURY, 2006)
consiste na ausência de procedimento negocial entre licitantes pré-qualificados,
solução delicada no Brasil, segundo Portugal e Prado (2007), ante a “existência de
desconfiança generalizada na gestão das relações entre Administração e parceiros
privados e das dificuldades que o procedimento de negociação competitiva representa
para o controle dos atos da Administração”. Os Editais optaram por não admitir os
lances em viva-voz criados pela Lei Federal n. 11.079/2004, sob inspiração da
experiência com privatizações (Lei Federal n.9.491/1997).
139
6.3.2.1.2. A Estrutura de Incentivos Contratual.
Com exceção do market testing e do benchmarking, os demais mecanismos de
incentivos presentes nas PFIs são utilizados nas primeiras minutas.
Tabela 18: Estrutura de Incentivos
Edital Projetos Indicadores de
Desempenho
Estrutura de
pagamento
Dedução
de
pagament
os
Principais
Riscos
transferidos
Riscos
compartilha
dos
MG
050
Elaboração do
Parceiro
Privado após
contratação
(Cláusula 21)
Nota QID
98
-
indicadores de
desempenho
Operacional,
Ambiental,
Financeiro
e Social
(Cláusula 33)
Tarifa de
Pedágio
(Cláusula 39) +
Contraprestação
pecuniária
mensal (Cláusula
35)
+ Fontes
acessórias
(rendimentos
financeiros e
indenizações/pen
alidades
previstas em
contratos com
terceiros)
(Cláusula 43)
Regime de preço
do serviço, com
ganhos de
produtividade
revertidos
integralmente
em favor do
operador
(Cláusula 29.9)
Apuração
Mensal, de
acordo
com Nota
QID
(Cláusula
35)
Projeto (Cláusula
21)
Disponibilidade
(Cláusula 35 e
Anexo VI)
Demanda dentro
do limite
abaixo/acima de
10% do previsto
(Cláusula 30)
Caso fortuito e
força maior
seguráveis
(65.2.1)
Demanda
abaixo/acima
do limite de
10% do
previsto
(Cláusula 30)
CP-BH
Definidos
pelo Parceiro
Privado na
Metodologia
de Execução e
na Pré-
Qualificação
(Cláusula 5ª)
Sistema de
Mensuração de
Desempenho e
Disponibilidade
(vagas
disponibilizadas
/desempenho
bimestral/
qualidade da
disponibilidade
bimestral
+
desempenho
anual
+
parâmetro de
excelência
associado à
capacidade de
empregar o
Contraprestação
pecuniária
mensal + Parcela
anual de
desempenho
+ Parcela
referente ao
parâmetro de
excelência
Regime de preço
do serviço, com
ganhos de
produtividade
revertidos
integralmente
em favor do
operador
(Cláusula 24.2)
Apuração
bimestral,
descontada
da fatura
dois meses
depois do
mês
correspond
ente
(Cláusula
14.13)
Projeto
Disponibilidade
de Vagas
Caso fortuito e
força maior
seguráveis
98
Quadro de Indicadores de Desempenho.
140
trabalho dos
sentenciados)
6.3.2.3. Flexibilidade, Credibilidade e Solução de Conflitos.
Ambos os Contratos estabelecem procedimentos de revisão dos indicadores de
desempenho, preservando a possibilidade de sua alteração unilateral por força de
eventos especificados contratualmente; indo além desta previsão presente também
nas PFIs – as minutas reservam ao Poder Público a possibilidade de determinar,
unilateralmente, modificações no próprio Projeto de incumbência da operadora no
que vai além da disciplina das PFIs, em que a intervenção do Estado relativamente ao
projeto é excepcional.
Tabela 19: Alteração Contratual
Edital Revisão Periódica
de Indicadores de
Desempenho
Hipóteses de
Revisão Unilateral
de Indicadores de
Desempenho
Alteração
Unilateral do
Projeto
Equilíbrio
Econômico-
Financeiro do
Contrato
MG 050 3º e 6º ano de
vigência, bem
como, a partir do
10º ano, a cada 60
meses ou quando da
revisão do Plano de
Negócios da
Rodovia (cláusula
33.4)
Indicadores de
desempenho
inaplicáveis e/ou
ineficazes;
Surgimento de
inovações
tecnológicas ou
adequação a padrões
internacionais;
“outras hipóteses
previstas no Anexo
V” (Cláusula 33.4.1
e Anexo V)
99
Objeções ao projeto
apresentado
inicialmente
(Cláusula 21.3.2) e
imposição de
modificações a bem
do interesse público
(Cláusula 21.4)
Assegurado no caso
de modificação
unilateral pelo
DER/MG
(Cláusulas 21.4.1 e
29.3, I)
100
Complexo Penal
BH
Segundo semestre
do 4º ano de
operação, Segundo
semestre do 6º ano
de operação,
Segundo semestre
do 10º ano de
operação e, após
este, a cada 5 anos
(Cláusula 16.2)
Indicadores de
desempenho
inaplicáveis e/ou
ineficazes;
Surgimento de
inovações
tecnológicas ou
adequação a padrões
internacionais; e
revisão de pesos de
indicadores
Prevista (Cláusula
25.4, “i”)
Assegurado no caso
de modificação
unilateral do projeto
(Cláusula 25.4, “i”)
e, no caso de
revisões de
indicadores de
desempenho que
representem 50% ou
mais dos medidores
(Cláusula 25.4, “e”
99
Em resposta a indagação feita por interessado na Consulta Pública, o DER/MG respondeu que “as
alterações dos indicadores de desempenho será (SIC) de comum acordo entre as partes”. No entanto, a
cláusula 33.4 prevê a modificação “a seu critério exclusivo”, alinhavando na Cláusula 33.4.1 as
hipóteses para tanto.
100
Em resposta a indagação feita por interessado na Consulta Pública, o DER/MG optou por não
considerar a sugestão de previsão de que alteração nos indicadores poderiam gerar direito ao equilíbrio
econômico-financeiro. No entanto, a cláusula 29.3, I, prevê o direito à revisão no caso de “alteração
unilateral sobre as condições do contrato”.
141
É proibida a
modificação de
indicadores de
desempenho
relativamente ao
parâmetro anual de
desempenho
(Cláusula 16.4)
previstas no Anexo
X. (Cláusula 16.1 e
Anexo X)
Elaboração do autor
As minutas fazem uso das previsões legais em favor da instituição financiadora das
concessões step-in-rights, possibilidade de empenho em seu nome, recebimento de
indenização em face de extinção antecipada, além da oferta dos recebíveis das
concessões como garantia.
No que se refere a garantias ao adimplemento da contraprestação tarifária, o
Contrato da MG-050 prevê como tal os royalties da Companhia de Desenvolvimento
Econômico de Minas Gerais - CODEMIG referente aos lucros líquidos decorrentes da
venda de produtos derivados do beneficiamento e industrialização de minérios pela
Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração CBMM. a minuta do
Complexo Penal BH prevê a inclusão de garantia embora ainda não a defina por
ocasião da Consulta Pública.
Tabela 20: Credible commitments
Edital Step in Empenho em
nome do
financiador
Indenização por
extinção
antecipada do
contrato
Oferta dos
recebíveis
como
garantia
Garantia ao
parceiro
privado
MG – 050
Sim (Cláusula
11.2)
Sim (Cláusula
18.2.1.2)
Sim (Cláusula
18.2.2)
Sim (Cláusula
18.2.1)
Sim. Royalties
da CODEMIG
(Cláusula 38)
Complexo Penal
BH
Sim (Cláusula
10.6)
Sim (Cláusula
14.10)
Sim (Cláusula
29.4)
Sim (Cláusula
29.1)
Sim.
Indefinido na
etapa de
Consulta
Pública
Elaboração do autor
A disciplina da garantia conferida relativa à Contraprestação Pecuniária na
MG-050 prevê o seguinte procedimento: 1) CODEMIG abre conta vinculada em
agência bancária; 2) a CBMM é instruída pela CODEMIG por escrito e de forma
irrevogável e irretratável a creditar na conta vinculada, até o útil de cada mês as
importâncias pagáveis em virtude da garantia prestada; 3) o Banco é autorizado pela
CODEMIG de forma irrevogável e irretratável a reter o valor correspondente a
contraprestação até a comprovação de pagamento do DER/MG; 4) no caso de não
pagamento, concessionária apresenta fatura com certificado de Nota QID (Quadro de
142
Indicadores de Desempenho) emitido pelo Verificador Independente ao Banco, que
notifica Garantidor para autorizar pagamento em 5 dias úteis, transferindo o valor
devido à concessionária no prazo de 48 horas da data da autorização emitida pelo
Garantidor. As primeiras minutas elaboradas em Minas Gerais prevêem, ainda, regras
de monitoramento e resolução de conflitos. Disciplina-se a presença de Verificador
Independente e de Comissão Técnica e incluem cláusula compromissória arbitral; em
nenhum dos casos se atribui a Agência Reguladora o gerenciamento e/ou fiscalização
do contrato, que ficam a cargo, respectivamente, do DER/MG e da Secretaria de
Defesa Social.
Tabela 21: Resolução de Conflitos
Edital Entidade
Gestora/Fiscalizadora
Atribuições do
Verificador
Independente
Resolução
Amigável de
Conflitos
Cláusula Arbitral
MG-050
DER/MG Monitoramento
permanente do
desempenho da
concessionária,
inclusive emitindo
Termo de
Certificação de
Execução e Nota
QID (Cláusula 34)
Comitê Técnico
formado por 1
presidente indicado
pelo DER/MG, 1
membro indicado
pela concessionária
e 1 membro
indicado em
comum acordo
pelas partes, para
solucionar
eventuais
divergências de
natureza técnica
(Cláusula 68)
Cláusula 71 (não
definidas as regras
do procedimento
arbitral)
Complexo Penal
BH
SDS/MG Avaliar Relatório
de Disponibilidade
e da ocupação das
unidades prisionais
(Cláusula 14.11.12)
e verificar índice de
desempenho
elaborado
bimestralmente pela
concessionária
(Cláusula 14.13)
Comitê Técnico
formado por 1
presidente indicado
pelo DER/MG, 1
membro indicado
pela concessionária
e 1 membro
indicado em
comum acordo
pelas partes, para
solucionar
eventuais
divergências de
natureza técnica
(Cláusula 35)
Previsto
procedimento de
solução de
controvérsias não
definidos pela
Comissão Técnica
(Cláusula 36)
Cláusula 37 (regras
do procedimento
arbitral previstas
para serem
definidas quando
da licitação)
Elaborada pelo autor
143
7. CONCLUSÃO: COMPLEMENTARIDADE INSTITUCIONAL E
CONSIDERAÇÕES SOBRE O “CASO MINAS”.
O trabalho em apreço reuniu literaturas institucionalistas que permitem identificar
variáveis e formular hipóteses afetas à implantação das PPPs no Brasil. Para tanto,
procuramos caracterizar o histórico e as particularidades dessas estruturas de
governança em especial na Inglaterra e os precedentes da criação do programa
nacional.
As literaturas institucionalistas, fundadas em teorias nem sempre coincidentes,
tentam explicar convergências, diferenças, adaptações e resultados obtidos nas
estruturas de governança complementares ao quadro institucional; a combinação de
tradições teóricas distintas aparentemente não mostra incompatibilidade absoluta,
sendo possível, ao revés, a identificação de complementaridades que fortaleçam a
compreensão dos fatos.
Assim, podem ser enriquecidas as perspectivas isomórficas que marcam os
diagnósticos dos processos reformistas, redundando em explicações mais atentas aos
microfundamentos das PPPs, com potenciais implicações em termos de estratégias de
reforma: afinal, se os caracteres das estruturas de governança - incentivos,
credibilidade e flexibilidade - estão envoltos no ambiente institucional, que os mitiga,
modula ou complementa, a reforma pode combinar estratégias em diferentes níveis
institucionais, cuja complementaridade permite ao reformista conhecer dos desafios
existentes.
A ilustração exploratória do caso Minas, enfim, autoriza extrair variáveis que
refletem estratégias de implantação que passam pelo sistema administrativo, pelo
contrato e por relações extracontratuais, cujos efeitos sobre o desenho contratual
poderão ser sentidos nos incentivos, na credibilidade e na flexibilidade do referido
instrumento no curso do tempo.
fatores diversos de pressão isomórfica nas PPPs mineiras, de origens top-
down (relevância de entidades multilaterais no processo) bottom-up (crise fiscal que
assolou Minas em 2003 e a persistência dos constrangimentos orçamentários para
investimentos) e horizontais (resultados positivos colhidos na experiência britânica,
suporte de consultores e profissionais especializados e a incerteza relativamente a
144
alternativas que não a atração de investidores privados). E, como era de se esperar, o
programa mineiro apresenta convergências com princípios norteadores das
experiências internacionais das PPPs, a começar pela presença de consultorias
internacionalmente relevantes no mercado de PPPs na modelagem dos primeiros
projetos.
As convergências se revelam também no propósito de instaurar modelo de
governança centralizado, de que é elo central a Unidade de PPP. Mas aqui se releva
que houve aprendizado. A originalidade reside em havê-la posto em engrenagem
antes do deslanchar dos projetos. Apesar de persistirem pendentes metas previstas
para este modelo, o primeiro contrato, celebrado em 2007, foi assinado sob o
funcionamento da Unidade PPP. A construção do modelo de governança é, para o
Governo Mineiro, o traço marcante de sua estratégia, o suporte para a instauração de
um ambiente de confiança
101
. O desenho contratual reproduz a disciplina de
incentivos das PPPs, através do bundling e do pagamento subordinado a parâmetros
de desempenho.
Mas a ECT e a VC sugerem que deve haver peculiaridades. Primeiro, porque o
Brasil possui características próprias em seu ambiente institucional que põem desafios
originais: (i) a predominância de um Executivo com uma história pregressa de ruptura
de contratos (particularmente presente nos Estados); (ii) a morosidade do Judiciário,
acompanhada da variabilidade e pouca expertise das decisões nas primeiras
instâncias; e (iii) um sistema administrativo em que forte tradição da lógica de
controle e prerrogativas unilaterais do Estado, associada a fragilidades no desenho e
gestão de projetos e contratos.
Segundo, porque a variedade de capitalismo nacional se distingue pela
presença de forte coordenação liderada pelo Estado, prevalecendo, portanto, formas
de cooperação não competitivas empregadas com gramáticas por vezes
contraditórias que podem desembocar na forte presença de contratos relacionais
(capítulo 5).
No que atine ao ambiente institucional, o Estado recorre a instrumentos
previstos pela Lei das PPPs para oferecer credible commitments: cláusulas de
arbitragem, garantias instituídas em favor do financiador step-in-rights, emissão de
101
Segundo palavras do Coordenador da Unidade PPP, Luiz Antônio Athayde.
145
empenho em seu nome, possibilidade de garantia de recebíveis atrelados às
concessões e, no caso da MG-050, arranjo garantidor associado a um fluxo de
recebíveis não submetidos à impenhorabilidade e ao regime de precatórios, a ser
administrado por um trustee.
Embora, na tradição teórica da ECT, assinale-se que inseguranças no ambiente
institucional pudessem repercutir em contratos demasiado rígidos, as regras para
alteração contratual não podem ser classificadas como tal: as minutas instituem
processos de revisão periódica de indicadores de desempenho e reservam ao Estado o
poder de alteração unilateral não apenas dos outputs, mas dos próprios projetos
elaborados pelo parceiro privado.
O recurso a essa prerrogativa, restrito excepcionalmente para alguns projetos
nas PFIs (HM TREASURY, 2007b), implicaria a reassunção do risco de projeto pelo
Poder Público e menores incentivos para a inovação embora possa reduzir a
incerteza no curso da contratação, como nota Justen Filho (2005). É válido, pois,
observar como o Estado a manejará no curso da contratação, influindo na estrutura de
incentivos original.
Tampouco o desenho de contratos fragiliza a estrutura de incentivos própria
das PPPs. Apesar de inexistirem mecanismos para a contestabilidade ex post do
parceiro privado, como market testing e benchmarking, a estrutura de incentivos
segue o postulado das PPPs, com a transferência de riscos e o pagamento
condicionado por desempenho, como visto.
Mas ainda diferenças: (i) a seleção de projetos não tem o grau de
refinamento do Value for Money Guidance; (ii) o processo licitatório é marcado pela
rigidez, sem procedimento negocial durante seu curso; (iii) além de a contestabilidade
do parceiro privado no transcorrer da licitação não ser realizada através de market
testing e benchmarking.
Essas diferenças permitem vislumbrar processos licitatórios mais rígidos e
contratos menos submetidos a pressões competitivas; os primeiros, não-negociados;
os segundos, menos contestáveis.
A seleção de projetos não observa a parâmetros de VfM nos moldes ingleses,
assim como pressupõe constrangimentos fiscais que eliminam a alternativa de
execução dos serviços diretamente pelo Estado. A demanda por investimentos em
146
curto prazo e as restrições fiscais são postas como justificativas condutoras dessas
diferenças centrais ao modelo mineiro.
A rigidez do processo licitatório, que segundo a ECT pode provocar maiores
custos de transação ex post, parece ser endereçada por um novo instituto criado pelo
Estado, em face das patentes dificuldades de superação dos controles da Lei n.
8.666/93: o Procedimento de Manifestação de Interesse – PMI, que, em conjunto com
audiências e consultas públicas, possibilita antecipar o diálogo entre Estado e
interessados para a etapa que antecede o processo competitivo. Embora a eficácia do
PMI para estimular um “mercado de projetos possa ser testada nos primeiros
procedimentos instaurados, não é possível atribuir-lhe a mesma flexibilidade que
marca o “diálogo competitivo” no PMI, mesmo podendo haver sessões públicas, o
procedimento prevê apenas o encaminhamento de estudos de viabilidade,
levantamentos, investigações, dados, informações técnicas, projetos ou pareceres de
interessados, que precedentemente podem obter informações da Administração
(Decreto n. 44.565/2007, arts. 2º e 6º)
Outra peculiaridade do caso mineiro um dos motivos de escolha do caso é
o fato de que seu programa de PPP se notabiliza por acompanhar amplo processo de
reforma administrativa (“Choque de Gestão”), isto é, as regras do jogo do sistema
administrativo são objeto de transformações que podem produzir interessantes
feedbacks institucionais nas dimensões fiscal, de planejamento e de gestão de
resultados: (i) o equilíbrio fiscal conquistado pelo Estado é uma fonte de credibilidade
para um Estado que pretende atrair investidores; (ii) o planejamento, em especial a
gestão intensiva das PPPs através do GERAES, pode proporcionar uma maior certeza
quanto ao fluxo de recursos públicos aportados nas parcerias, assim como um sistema
de gerenciamento dos riscos mantidos sob a responsabilidade do Poder Público; (iii) a
consolidação de uma gestão por resultados contribui com a sedimentação de
indicadores de produtos e performances, bem como promovem formas de controle
estatal não adstritas ao sistema de comandos e prerrogativas tradicionais aos contratos
comuns.
Observe-se, assim, que a reforma mineira pode produzir efeitos sobre as
variáveis anotadas pela literatura sobre contratos (ver capítulo 5), representando
importante exemplo de complementaridade institucional. Em fato, referidas
147
dimensões atuam sobre as variáveis risco/incerteza, capacidades de monitoramento e
especificação de outputs, podendo ampliar o arco de potencialidades das PPPs no
Estado.
Finalmente, no que diz respeito aos efeitos da variedade de capitalismo
nacional sobre o programa mineiro, é limitada a capacidade de se realizar inferências
à luz dos documentos analisados e entrevistas realizadas. Mas podemos mencionar
aspectos que insinuam a presença de elementos extracontratuais que podem ser
identificados como importantes para o programa mineiro: primeiro, o suporte político
do Governador e do Vice-Governador do Estado, líderes de uma equipe com
experiência prévia na reforma gerencial do Governo FHC; segundo, o suporte de
instituições multilaterais.
O primeiro, se não garante per se aos concessionários e financiadores o self
enforcement dos compromissos de longo prazo, representa o aval do principal ator de
um cenário político-econômico marcado por cooperação e predominância do Poder
Executivo, o que tem correspondido a aprovação de leis, edição de decretos, adesão
de várias Secretarias ao Choque de Gestão e obtenção de apoio técnico-financeiro de
entidades multilaterais. O desafio é como esse suporte político pode concorrer para a
institucionalização dessas reformas, impedindo futuras mudanças abruptas: a
participação da sociedade e a solidificação do modelo de governança das PPPs são as
estratégias postas para tanto
102
.
A identificação, por importantes integrantes do Governo mineiro, do
Governador e do Vice como alicerces do programa, é uma surpresa relativamente ao
arcabouço teórico da ECT em que a ausência de pontos de veto fragiliza a
credibilidade estatal. Aqui, segundo os entrevistados, governantes fortes seriam os
avalistas das reformas.
O segundo aspecto relacional se traduz no apoio expresso por entidades
tradicionalmente financiadoras de projetos em infra-estrutura, com destaque para BID
e Banco Mundial, ao programa de PPP. Neste caso, pode haver uma dinâmica de self
enforcement não-contratual: sendo essas entidades financiadoras de inúmeros projetos
102
Essa é a opinião da Secretária de Planejamento e Gestão, Renata Vilhena, e do Coordenador da
Unidade PPP, Luiz Antonio Athayde.
148
sociais e de infra-estrutura no Estado de Minas Gerais, a preservação da relação é um
objetivo per se do Governo mineiro, podendo servir como um mecanismo de credible
commitment ao cumprimento de contratos que contem com seu suporte. Ressalte-se
que o recurso a esse mecanismo relacional foi materializado no próprio processo
licitatório da MG-050, precedido de declarações de apoio de BID, Banco Mundial,
BNDES e BDMG.
Este elemento permite inferir que, ao menos nos momentos iniciais das PPPs
no Brasil, a existência de poucos financiadores pode terminar sendo um importante
mecanismo de enforcement.
De outro lado, no que se refere à relação entre Estado e competidores, os
dados levantados não permitem maiores conclusões. Mas futuros estudos podem
trazer luz à hipótese da literatura sobre Variedades de Capitalismo, segundo a qual a
competição cede espaço à coordenação relacional sendo intrigante, no caso,
indagar-se se esta coordenação não-competitiva implica em conluio ou em formas
virtuosas de relacionamento de longo prazo.
Evidentemente, a constatação de elementos não-contratuais da cooperação de
longo prazo requer mais do que o proposto pelo presente trabalho, mas essas pistas
permitem inferir que, para além das garantias formais, podem existir mecanismos de
self enforcement que dosam as estruturas de incentivos e influenciam a credibilidade
do programa. Sua vantajosidade ou não, como exposto, depende da gramática
predominante: se o compromisso pode ser obtido por vias não contratuais, a mitigação
da competição pode fazer esvair as virtudes das PPPs.
149
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151
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………….Lei Federal. 9.074, de 7 de julio de 1995. Estabelece normas para outorga e
prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências.
…………Lei Federal n. 9.427, de 26 de dezembro de 1996. Institui a Agência Nacional de
Energia Elétrica - ANEEL, disciplina o regime das concessões de serviços públicos de
energia elétrica e dá outras providências.
…………Lei Federal n. 9.472, de 16 de julio de 1997. Dispõe sobre a organização dos
serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros
aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constitucional nº 8, de 1995.
................Lei Federal n. 9.637, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a qualificação de
entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a
extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por
organizações sociais, e dá outras providências.
…………Lei Federal n. 9.648, de 27 de maio de 1998. Altera dispositivos das Leis no
3.890-A, de 25 de abril de 1961, no 8.666, de 21 de junho de 1993, no 8.987, de 13 de
fevereiro de 1995, no 9.074, de 7 de julho de 1995, no 9.427, de 26 de dezembro de 1996,
e autoriza o Poder Executivo a promover a reestruturação da Centrais Elétricas
Brasileiras - ELETROBRÁS e de suas subsidiárias e dá outras providências.
...............Lei Federal n. 9.790, de 23 de março de 1999. Dispõe sobre a qualificação de
pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e
outras providências.
………..
Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças
públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências.
………...Lei Federal n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da
Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e outras
providências.
...............Lei Federal n. 10.438, de 26 de abril de 2002. Dispõe sobre a expansão da oferta
de energia elétrica emergencial, recomposição tarifária extraordinária, cria o Programa
de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), a Conta de
Desenvolvimento Energético (CDE), dispõe sobre a universalização do serviço público
de energia elétrica, nova redação às Leis no 9.427, de 26 de dezembro de 1996, no
9.648, de 27 de maio de 1998, no 3.890-A, de 25 de abril de 1961, no 5.655, de 20 de maio
de 1971, no 5.899, de 5 de julho de 1973, no 9.991, de 24 de julho de 2000, e outras
providências.
………..Lei Federal n. 10.848, de 15 de março de 2004. Dispõe sobre a comercialização de
energia elétrica, altera as Leis nos 5.655, de 20 de maio de 1971, 8.631, de 4 de março de
1993, 9.074, de 7 de julho de 1995, 9.427, de 26 de dezembro de 1996, 9.478, de 6 de
agosto de 1997, 9.648, de 27 de maio de 1998, 9.991, de 24 de julho de 2000, 10.438, de 26
de abril de 2002, e dá outras providências.
152
………..Lei Federal n. 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Institui normas gerais para
licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública.
………..Decreto n. 5.411, de 6 de abril de 2005. Autoriza a integralização de cotas no
Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas - FGP, mediante ações representativas
de participações acionárias da União em sociedades de economia mista disponíveis para
venda e dá outras providências.
…………Resolução n. 2, de 19 de setembro de 2005.Comitê Gestor de PPP Federal. Dispõe
sobre a criação de forças-tarefa para a implementação de projetos de parcerias público-
privadas.
………….Portaria n. 614, de 21 de agosto de 2006. Secretaria do Tesouro Nacional.
Estabelece normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos
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programa estadual de Parcerias Público-Privadas.
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Parcerias Público-Privadas do Estado de Minas Gerais.
..............................Decreto Estadual n. 43.702, de 16 de dezembro de 2003. Instala o
Conselho Gestor de Parcerias Público-Privadas e dá outras providências.
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.............................Lei Estadual n. 15.033, de 20 de janeiro de 2004. Estabelece o Plano
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.............................Decreto Estado n. 44.565, de 03 de julho de 2007. Institui o procedimento
de manifestação de interesse em projetos de parcerias público-privadas, nas
modalidades patrocinada e administrativa, e em projetos de concessão comum e
permissão.
............................Lei Estadual n. 16.910, de 06 de agosto de 2007. Dispõe sobre as diretrizes
para a elaboração da Lei Orçamentária para o exercício financeiro de 2008 e outras
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.............................Lei Estadual n. 17.007, de 28 de setembro de 2007. Atualiza o Plano
Mineiro de Desenvolvimento Integrado – PMDI e dá outras providências.
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Plurianual de ação governamental – PPAG – para o período 2008-2011.
............................Plano Plurianual de Ação Governamental 2008-2011. 2 Volumes. Belo
Horizonte: Minas Gerais, 2008.
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Externo das Concessões de Serviços Públicos e das Parcerias Público-Privadas. Belo
Horizonte: Fórum, 2005.
163
9. APÊNDICE: ENTREVISTAS SEMI-ESTRUTURADAS
Entrevistado Função Data da entrevista
Renata Vilhena Secretária de Estado da
SEPLAG
09/03/2008
Luiz Antônio Athayde Coordenador Geral da
Unidade PPP/MG e
Gerente do projeto
estruturador
09/03/2008
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