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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
GILSON BISPO DE JESUS
CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS: UMA ALTERNATIVA
PARA DESENVOLVER CONHECIMENTOS ACERCA DA
DEMONSTRAÇÃO EM UMA FORMAÇÃO CONTINUADA
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
São Paulo
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
GILSON BISPO DE JESUS
CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS: UMA ALTERNATIVA
PARA DESENVOLVER CONHECIMENTOS ACERCA DA
DEMONSTRAÇÃO EM UMA FORMAÇÃO CONTINUADA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE EM
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação do(a) Prof.
Dr. Saddo Ag Almouloud.
São Paulo
2008
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Banca Examinadora
________________________________________
________________________________________
________________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________
“A Bahia já me deu
régua e compasso.
Quem sabe de mim sou eu
Aquele abraço!”
Gilberto Gil
Esse trabalho é dedicado a minha avó Rosa, uma
mulher sábia e especial, por ter confiado em mim e
nas minhas decisões sempre.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, por me oportunizar realizar este sonho.
Ao Professor Doutor Saddo Ag Almouloud, pela sua
orientação, por confiar em mim, por respeitar o meu
tempo e por ter me dado autonomia para a realização
desta pesquisa.
Aos membros da banca, Professoras Doutoras Elenice de
Souza Lodron Zuin e Maria José Ferreira da Silva, pelas
valiosas contribuições e sugestões para essa pesquisa.
A todos os professores, que voluntariamente se
disponibilizaram a ser sujeitos deste trabalho.
Aos colegas Messildo, Ana Maria, Milton, Ricardo,
Victoria, Sérgio e Eliana, pelas observações realizadas
durante a coleta dos dados, especialmente a Vânia pelo
companheirismo, presente como observadora em todos os
encontros.
A todos os colegas de grupo e as professoras Cileda,
Renata e Ana Maria pelas discussões e contribuições para
esse trabalho.
As professoras Maria José e Maria Inez, por terem
aceitado o desafio de serem formadoras nesse estudo.
Aos amigos Iran Abreu Mendes e Carlos Aldemir Farias,
pelo grande apoio na revisão e formato final do trabalho.
A todos os funcionários do Centro de Ciências Exatas, da
PUC-SP, pelo convívio durante esse tempo, especialmente
ao Francisco pela valiosa companhia em muitos momentos.
A todos os colegas com os quais tive a oportunidade de
conviver durante o curso, em especial aqueles que se
tornaram meus amigos: Patrícia, Eurivalda, Victoria,
Gabriela, Irene, Aida, Jacinta, Liu, Ana Maria, Milton,
Denise, André, Dani, Guilherme, Cássia, Alexis, Franciana
e Ivete.
Ao corpo docente do Programa de Estudo Pós-Graduados
em Educação Matemática da PUC-SP, com o qual tive o
privilégio de conviver, sobretudo aqueles com os quais tive
a oportunidade de ser aluno: Saddo Almouloud, Wagner
Valente, Lulu Healy, Sandra Magina, Ana Paula Jahn, Sílvia
Machado, Benedito Silva, Sonia Igliori, Cristina Maranhão
e Antonio Carlos Brolezzi.
Aos professores e colegas baianos, Adelaide, Elda,
Antônio e Auxiliadora, que em minha trajetória sempre
pontuaram a Educação Matemática.
Ao meu amigo Celso, pelo grande apoio dado nessa cidade
imensa.
A todos os amigos e colegas do grupo EMFOCO, pela
presença constante em minha vida desde o final da
especialização.
A Zezé, que além de ter sido parte da banca e formadora,
me presenteou com a sua amizade.
Aos meus pais, Laurinda e José Miguel, por terem sempre
me proporcionado condições para estudar. Amo vocês!
A minha Cláudia, que sempre compreendeu a minha
ausência-presente com o seu amor e companheirismo. Eu
te amo!
Aos meus irmãos: Carlinhos, Zete, Gersinho, Rosana e
Lene; meus cunhados: Mello, Cláudio, Helton, Luciana,
Terezinha e Fátima; minha sogra Vilma e meus sobrinhos:
Tati, Bia, Lai, Jajá, Jeferson, Nari, Ingrid, Ruan e Artur.
E a todos os meus familiares, por acreditarem em mim,
mesmo quando não sabiam onde eu desejava chegar e por
estarem ao meu lado sempre.
A Secretaria de Educação do Estado da Bahia, pelo
investimento em minha formação, concedendo-me o
afastamento.
Ao CNPq, pela concessão da bolsa, me permitindo
dedicação exclusiva aos estudos.
A todas as pessoas que, de alguma forma, contribuíram
para a realização deste trabalho.
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar uma sequência de atividades
desenvolvidas em uma formação continuada para professores. Esta seqüência
visava que os participantes construíssem a definição de mediatriz de um segmento
e, a partir desta, demonstrassem propriedades inerentes a esse objeto matemático.
Além disso, objetivava que os professores justificassem matematicamente, com
base na Geometria plana, algumas construções geométricas em que esse objeto era
a principal ferramenta para a resolução do problema. A questão pesquisada foi: uma
seqüência de ensino com enfoque em construções geométricas pode contribuir para
o desenvolvimento de conhecimentos acerca da demonstração em Geometria em
uma formação continuada de professores? Assim, aplicamos junto a um grupo de
professores de Matemática (Ensino Fundamental e Médio) em formação continuada,
a seqüência de atividades. Para tal, nos baseamos nos estudos de Duval (2003) e
Brousseau (1986), sobre os registros de representação semiótica e a Teoria das
Situações Didáticas respectivamente. Trabalhamos também com Duval e Egret
(1989) e De Villiers (2001; 2002), no que diz respeito às demonstrações e com
autores especializados em formação de professores, para a fundamentação teórica
dessa pesquisa. A escolha metodológica pela pesquisa-ação e pelos pressupostos
da Engenharia Didática contribuíram para o alcance dos objetivos desse estudo. A
análise das discussões e comportamentos dos professores durante a formação
revelou-nos que as atividades provocaram reflexões sobre definições, propriedades,
teoremas recíprocos, justificativas matemáticas, demonstrações, além de oportunizar
a descoberta e construção de alguns conceitos da Geometria plana ao realizarem
construções geométricas. Nesse sentido, pudemos destacar o registro material de
representação, identificado por nós, e inferir que essa formação contribuiu para a
autonomia dos professores.
Palavras-chave: Construções Geométricas. Demonstração em Geometria.
Formação de Professores.
ABSTRACT
The purpose of this study is to analyze a sequence of activities carried out with in
service teachers, aiming the construction of the definition of line bisector of a
segment and, from this definition, to allow them to demonstrate inherent properties of
this mathematical object. Moreover, the study also aimed that the teachers were able
to justify it mathematically, based on plane Geometry, some geometric constructions
in which this object was the main tool to solve the problem. Our research question
was: Can a teaching sequence, carried out with in service teachers, and focus on
geometric constructions, contribute for the development of knowledge about
demonstration in Geometry? In order to answer this question, we developed a
sequence with a group of in-service teachers of Mathematics for Elementary and
secondary school. To reach such aim, we base our study on the theoretical approach
of Duval (2003) and Brousseau (1986), about Semiotics Representation Registers,
and the Didactic Situation Theory respectively. We also used the Duval and Egret
(1989) and De Villiers (2001; 2002) ideas about demonstrations. Finally, we still used
some authors’ ideas about teacher’s formation. The methodological choice was
research-action and Didactic Engineering, which had contributed to achieve the
objective of this study. The analysis of the discussions and the behaviors of the
teachers during the formation reveled that the activities had caused reciprocal
reflections about definitions, properties, theorems, mathematical justifications,
demonstrations. Moreover, the sequence allowed these teachers to discover and to
construct some plane Geometry concepts, whilst they made geometric constructions.
In this sense, we do highlight to the importance of material representation register.
We conclude that this formation contributed for the autonomy of these teachers.
Keywords: Geometric Constructions. Demonstration in Geometry. Teachers
Training.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................14
CAPÍTULO 1: PROBLEMÁTICA..........................................................................................................16
1.1
O INTERESSE PELO TEMA........................................................................................................ 16
1.2
O PROBLEMA DE PESQUISA..................................................................................................... 19
1.3
ASPECTOS METODOLÓGICOS................................................................................................. 24
1.4
CONSTRUINDO A FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..................................................................... 28
1.4.1 REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA............................................................. 28
1.4.2 QUADRO, REGISTRO E PONTO DE VISTA.......................................................................34
1.4.3 TEORIA DAS SITUAÇÕES DIDÁTICAS ..............................................................................35
1.4.4 DEMONSTRAÇÕES .............................................................................................................40
1.4.5 FORMAÇÃO DE PROFESSORES....................................................................................... 44
CAPÍTULO 2: BREVE ESTUDO HISTÓRICO-EPISTEMOLÓGICO ...................................................50
2.1
A MEDIATRIZ NO CONTEXTO DA GEOMETRIA ....................................................................... 50
2.2
A DEMONSTRAÇÃO ................................................................................................................... 54
2.3
AS CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS........................................................................................ 59
CAPÍTULO 3: CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEM.....................................62
3.1
GEOMETRIA................................................................................................................................ 62
3.2
DEFINIÇÃO.................................................................................................................................. 67
3.3
DEMONSTRAÇÃO....................................................................................................................... 69
3.4
CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS.............................................................................................. 74
3.5
PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS.......................................................................... 78
CAPÍTULO 4: AS ATIVIDADES E SUAS ANÁLISES .........................................................................82
4.1
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................................................... 82
4.2
OS PROFESSORES.................................................................................................................... 84
4.3
DESCRIÇÃO DA APLICAÇÃO DA SEQÜÊNCIA......................................................................... 89
4.4
AS ATIVIDADES E SUAS ANÁLISES PRÉVIAS E A POSTERIORI............................................ 89
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................196
REFERÊNCIAS...................................................................................................................................202
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO PERFIL.........................................................................................207
APÊNDICE B - ATIVIDADES PROPOSTAS......................................................................................209
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: TRIÂNGULO OBTUSÂNGULO ...................................................................................................... 32
F
IGURA 2: TRIÂNGULO ACUTÂNGULO ........................................................................................................ 33
F
IGURA 3: MEDIATRIZ DO SEGMENTO AB .................................................................................................. 52
F
IGURA 4: MEDIATRIZ DE UM SEGMENTO ................................................................................................... 95
F
IGURA 5: SOLUÇÃO DA ATIVIDADE 02 ...................................................................................................... 98
F
IGURA 6: SOLUÇÃO DA PROFESSORA EVA ............................................................................................... 99
F
IGURA 7: REPRESENTAÇÃO DA CONJECTURA......................................................................................... 100
F
IGURA 8: REPRESENTAÇÃO DO PAR SIMÉTRICO ..................................................................................... 100
F
IGURA 9: LINGUAGEM FIGURAL - ATIVIDADE 3......................................................................................... 102
F
IGURA 10: REPRESENTAÇÃO DA PROFESSORA RUTE ............................................................................. 106
F
IGURA 11: LINGUAGEM FIGURAL - ATIVIDADE 4....................................................................................... 109
F
IGURA 12: MUDANDO DE PONTO DE VISTA ............................................................................................. 113
F
IGURA 13: PONTOS EQÜIDISTANTES PERTENCEM À MEDIATRIZ................................................................ 114
F
IGURA 14: DEMONSTRAÇÃO VIA TRIÂNGULO ISÓSCELES ......................................................................... 115
F
IGURA 15: DEMONSTRAÇÃO SEM USO DO TRIÂNGULO ISÓSCELES ........................................................... 115
F
IGURA 16: UMA OUTRA DEMONSTRAÇÃO ............................................................................................... 118
F
IGURA 17: ÂNGULOS CONGRUENTES QUE NÃO SÃO O.P.V....................................................................... 120
F
IGURA 18: CONSTRUÇÃO DA MEDIATRIZ ................................................................................................ 127
F
IGURA 19: CONSTRUÇÃO DA MEDIATRIZ - PROFESSORES MIRTES E JOSÉ................................................ 129
F
IGURA 20: CONSTRUÇÃO DA MEDIATRIZ - PROFESSORA JOANA .............................................................. 130
F
IGURA 21: CONSTRUÇÃO DA MEDIATRIZ MÉTODO DO LOSANGO............................................................ 131
F
IGURA 22: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA I................................................................................................. 133
F
IGURA 23: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA II................................................................................................ 137
F
IGURA 24: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA III............................................................................................... 141
F
IGURA 25: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - PROBLEMA III......................................................... 143
F
IGURA 26: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA EVA - PROBLEMA III.............................................................. 144
F
IGURA 27: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA IV .............................................................................................. 145
F
IGURA 28: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - PROBLEMA IV ........................................................ 146
F
IGURA 29: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA V ............................................................................................... 148
F
IGURA 30: CONSTRUÇÃO DO FORMADOR - PROBLEMA V......................................................................... 150
F
IGURA 31: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA VI .............................................................................................. 152
F
IGURA 32: CONSTRUÇÃO DO PROFESSOR RENATO - PROBLEMA VI......................................................... 154
F
IGURA 33: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA RUTE - PROBLEMA VI ........................................................... 154
F
IGURA 34: CONSTRUÇÃO - PROBLEMA VII ............................................................................................. 155
F
IGURA 35: CONSTRUÇÃO DO PROFESSOR JOSÉ - PROBLEMA VII ............................................................ 157
F
IGURA 36: CONSTRUÇÃO DOS PROFESSORES JOSÉ E MIRTES - PROBLEMA VII........................................ 157
F
IGURA 37: LEI DO PONTO MÉDIO ........................................................................................................... 160
F
IGURA 38: CONSTRUÇÃO 1 DA PROFESSORA EVA - ATIVIDADE 8............................................................. 161
F
IGURA 39: CONSTRUÇÃO 2 DA PROFESSORA EVA - ATIVIDADE 8............................................................. 162
F
IGURA 40: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA RUTE - ATIVIDADE 8.............................................................. 162
F
IGURA 41: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - ATIVIDADE 8 .......................................................... 162
F
IGURA 42: CONSTRUÇÃO DO PROFESSOR CARLOS - ATIVIDADE 8 ........................................................... 163
F
IGURA 43: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA JOANA - ATIVIDADE 8 ............................................................ 164
F
IGURA 44: UMA NOVA PROPRIEDADE..................................................................................................... 169
F
IGURA 45: ESPAÇO AÉREO ................................................................................................................... 169
F
IGURA 46: REGIÃO EM UMA FAZENDA .................................................................................................... 169
F
IGURA 47: ESPAÇO AÉREO - CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES...................................................... 172
F
IGURA 48: INSTITUCIONALIZAÇÃO DA NOVA PROPRIEDADE...................................................................... 174
F
IGURA 49: CONSTRUÇÃO - QUESTÃO 01................................................................................................ 176
F
IGURA 50: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - QUESTÃO 01.......................................................... 179
F
IGURA 51: REPRESENTAÇÃO DO RAIO. .................................................................................................. 179
F
IGURA 52: CONSTRUÇÃO - QUESTÃO 02................................................................................................ 181
F
IGURA 53: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - QUESTÃO 02.......................................................... 182
F
IGURA 54: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA JOANA - QUESTÃO 02. .......................................................... 183
F
IGURA 55: CONSTRUÇÃO - QUESTÃO 03................................................................................................ 184
F
IGURA 56: CONSTRUÇÕES DO PROFESSOR CARLOS - QUESTÃO 03 ........................................................ 186
F
IGURA 57: CONSTRUÇÃO A
1
- ATIVIDADE 12........................................................................................... 188
F
IGURA 58: CONSTRUÇÃO A
2
- ATIVIDADE 12........................................................................................... 188
F
IGURA 59: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA RUTE - ATIVIDADE 12............................................................ 191
F
IGURA 60: CONSTRUÇÃO DAS PROFESSORAS ANGÉLICA E PAULA - ATIVIDADE 12.................................... 192
F
IGURA 61: CONSTRUÇÃO DA PROFESSORA MIRTES - ATIVIDADE 12......................................................... 192
F
IGURA 62: CONSTRUÇÃO 01 DA PROFESSORA JOANA - ATIVIDADE 12. .................................................... 193
F
IGURA 63: CONSTRUÇÃO 02 DA PROFESSORA JOANA - ATIVIDADE 12 ..................................................... 193
F
IGURA 64: CONSTRUÇÃO 03 DA PROFESSORA JOANA - ATIVIDADE 12 ..................................................... 193
F
IGURA 65: CONSTRUÇÃO 04 DA PROFESSORA JOANA - ATIVIDADE 12 ..................................................... 194
F
IGURA 66: ÂNGULO DE 60º E TRIÂNGULO EQÜILÁTERO............................................................................ 194
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: DIFERENTES REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO......................................................................... 33
Q
UADRO 2: DIFERENÇAS ENTRE PEDAGOGIA E ANDRAGOGIA...................................................................... 47
Q
UADRO 3: CARACTERÍSTICAS DO CONTÍNUO PEDAGÓGICO-ANDRAGÓGICO ................................................ 48
Q
UADRO 4: PERFIL DOS PROFESSORES .................................................................................................... 88
14
INTRODUÇÃO
Esse trabalho se iniciou a partir de uma percepção, advinda da nossa
experiência em sala de aula, enquanto professor de Matemática e Desenho
Geométrico
1
. A oportunidade de lecionar essa segunda disciplina nos fez vislumbrar
que um trabalho focado nas construções geométricas
2
poderia minimizar algumas
dificuldades no desenvolvimento de conceitos geométricos.
O ingresso no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática
na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, mais especificamente no
grupo de pesquisa (CoFE – Conceitos: Formação e Evolução) ao qual pertencemos,
nos levou a ter contato com o tema demonstrações em um curso de formação
continuada de professores. Sendo assim, resolvemos elaborar a nossa dissertação
sobre a temática: demonstrações, construções geométricas e formação continuada de
professores. Faltava, então, escolher o objeto de estudo, optamos pela mediatriz de
um segmento.
Inicialmente, fizemos uma revisão dos trabalhos que focavam esse tema, com
o intuito de verificar a relevância do mesmo e quais alternativas eram apontadas, para
que pudéssemos efetuar as escolhas adequadas para a nossa pesquisa. Em primeiro
lugar fizemos leituras de trabalhos cujo tema era a Geometria e alguns deles já
apontavam para um trabalho com foco nas demonstrações geométricas, sobretudo
em formações continuadas de professores. No entanto, os trabalhos com construções
geométricas eram poucos, encontramos apenas duas indicações. Entendemos, então,
que a nossa temática tinha relevância e passamos a construir os passos desse
trabalho.
Resolvido que o trabalho seria com professores, partimos para o segundo
passo, ou seja, nos colocamos a fazer um estudo sobre o ensino e a aprendizagem
dos temas abordados e fizemos a opção metodológica que levava em consideração
________________
1
No Ensino Fundamental as disciplinas Matemática e Desenho Geométrico eram ministradas
separadas, no qual a segunda compunha a parte diversificada do currículo.
2
As construções geométricas abordadas neste trabalho são aquelas que fazem uso de papel e lápis.
15
os pressupostos da Engenharia Didática e da pesquisa-ação. Fizemos, também, um
estudo histórico-epistemológico da temática dessa pesquisa.
O nosso terceiro passo foi escolher a fundamentação teórica do trabalho.
Encontramos nos estudos de Duval (2003), sobre os registros de representação
semiótica, de Brousseau (1986), sobre a Teoria das Situações Didáticas, nos
trabalhos de Duval e Egret (1989) e De Villiers (2001; 2002), sobre demonstrações e
em alguns autores de formação de professores, o apoio necessário.
Com essa bagagem, partimos para a elaboração da seqüência de atividades
que seria desenvolvida com os professores em formação continuada. Durante essa
elaboração, mudanças e ajustes foram realizados a fim de que ela pudesse nos
fornecer dados que dessem subsídios a responder a questão de pesquisa. Partimos,
então, para a aplicação da seqüência, que propiciou a coleta e análise dos dados.
Fizemos, em seguida, algumas considerações a respeito do trabalho realizado.
Apresentamos agora a estrutura do trabalho. A dissertação está configurada
em quatro capítulos, além das considerações finais. No capítulo 1 apresentamos a
problemática, na qual destacamos o interesse pelo tema, o problema de pesquisa, os
aspectos metodológicos e a construção da fundamentação teórica. O capítulo 2 traz
um breve estudo histórico-epistemológico, no qual destacamos a mediatriz de um
segmento no contexto da Geometria, a demonstração e as construções geométricas.
O capítulo 3 tece considerações sobre o ensino e a aprendizagem da
Geometria, da definição em matemática, da demonstração e das construções
geométricas. Destacaremos, ainda, às recomendações dos Parâmetros Curriculares
Nacionais de Matemática para o 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental – PCN. No
capítulo 4, apresentamos os procedimentos metodológicos, os sujeitos da pesquisa,
uma descrição da aplicação da seqüência e as atividades em conjunto com as
análises prévias e posteriores.
Finalizando, apresentamos algumas considerações finais, apontando possíveis
conclusões oriundas da análise dos dados que coletamos para essa pesquisa.
Deixamos, ainda, algumas sugestões para trabalhos futuros a partir das questões que
não objetivamos responder, bem como pistas para estudos que possam resultar do
que pesquisamos.
16
CAPÍTULO 1
PROBLEMÁTICA
Neste capítulo inicial da nossa dissertação apresentamos a justificativa do
nosso trabalho, a qual reflete parte da trajetória profissional do autor, uma vez que,
essa trajetória contribuiu, em grande medida, para a temática do presente trabalho.
Apresentamos também o problema de pesquisa, seguido dos aspectos metodológicos
que delinearam esse estudo e, por fim, a fundamentação teórica.
1.1 O INTERESSE PELO TEMA
Sou professor de Matemática há 14 anos e, durante seis anos (1993 – 1998),
tive a oportunidade de lecionar não apenas a disciplina de Matemática, mas também
Desenho Geométrico para turmas de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental, o que me
propiciou um maior envolvimento com as construções geométricas, além de
desenvolver um novo olhar para questões de ensino e aprendizagem desse campo da
matemática.
No retorno às atividades de Matemática, comecei a perceber algumas
dificuldades dos alunos em relação ao desenvolvimento de conceitos geométricos,
dificuldades essas não identificadas no tempo em que lecionava concomitantemente
Matemática e Desenho Geométrico. Por esse motivo, comecei a buscar novas
abordagens que pudessem minimizar tais dificuldades.
Com essa inquietação, ingressei no Programa de Especialização em Educação
Matemática, proposto pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL), em 2002. Os
estudos teóricos nesse programa foram motivadores da busca de mais
conhecimentos acerca de tais reflexões e indicaram que os problemas de ensino e
aprendizagem da Geometria têm sido objeto de estudo de pesquisadores em
17
Educação Matemática. Com essa perspectiva, desenvolvi a monografia de final de
curso sobre essa temática
3
.
Os estudos desenvolvidos na especialização me instigaram a buscar novas
teorias relacionadas à Educação Matemática. Com o final do curso, mas não de
minha vontade em aperfeiçoar e ampliar os conhecimentos até então adquiridos,
fundei juntamente com alguns colegas da especialização o grupo de estudos EMFoco
– Educação Matemática em Foco – do qual faço parte até os dias de hoje. Os estudos
nesse grupo, a motivação intrínseca a ele e a busca por mais conhecimentos me
levaram a fazer a seleção no Programa de Estudos Pós-Graduado em Educação
Matemática para cursar o mestrado acadêmico em Educação Matemática oferecido
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC–SP).
Neste programa participei do projeto intitulado: O raciocínio dedutivo no
processo de ensino-aprendizagem da matemática nas séries finais do Ensino
Fundamental – financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa) –, o que me
levou a refletir sobre o tema demonstrações, tanto no decorrer da minha formação
inicial – Licenciatura em Matemática, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) –,
como no contexto da formação continuada de professores de Matemática.
Na graduação, o meu contato com as demonstrações foi muito grande, porém
com o viés formalista da matemática, ou seja, a demonstração tinha como único
intuito, verificar a validade de um teorema, e nós, os alunos, com a postura apenas de
aprendizes, isto é, “aprendíamos” a demonstrar pelo processo de imitação de nossos
professores. As aulas eram ministradas sob o esquema: definições, axiomas,
teoremas e demonstrações, como se esse fosse um processo linear, infalível e sem
interrupções. Poucas foram as discussões em que os professores se preocupavam
com a gênese do objeto matemático, ou seja, demonstrações construídas em um
processo de ir e vir, fazer e refazer, buscar refutações e contra-exemplos, que
evidenciassem a demonstração como um processo de construção humana e histórica.
Todavia, sempre me preocupei em compreender as entrelinhas do que se expunha
nas demonstrações, preocupando-me em entender e “destrinchar” os aspectos
implícitos presentes, em grande medida, nas demonstrações feitas pelos professores
e apresentadas nos livros didáticos.
________________
3
JESUS, G. B.. Ensino de Geometria: uma abordagem referendada na teoria das situações didáticas.
2007. 46f. Monografia (Especialização. em Educação Matemática) – UCSal, Salvador, 2007.
18
Nesse período, na UFBA, participei como aluno de iniciação científica do
Programa Especial de Treinamento (PET), no qual tive bolsa da CAPES por três anos
e aprofundei estudos na área de Álgebra e Geometria Diferencial, entrando em
contato, cada vez mais, com as demonstrações no campo da matemática pura. Nessa
época, conduzia os meus estudos ao bacharelado em matemática e assim o fiz até o
sétimo semestre. Por questões diversas, no oitavo semestre matriculei-me nas
disciplinas da licenciatura e dei seqüência a concluir primeiro esta modalidade,
percebendo que as disciplinas pedagógicas e as de fundamentos da matemática não
se relacionaram com as disciplinas de matemática pura e/ou apresentavam a
demonstração com a mesma estrutura, ou seja, não traziam nenhuma novidade para
o trabalho desse tópico em sala de aula.
Meu primeiro contato com a Educação Matemática ocorreu no primeiro ano de
graduação ao participar, por motivações próprias, do III ENEM (III Encontro Nacional
de Educação Matemática – 1990) e, em seguida, do IV EBEM (IV Encontro Baiano de
Educação Matemática – 1991). Sempre fui preocupado e inserido em questões
ligadas ao ensino e aprendizagem da matemática (fui monitor de Matemática durante
dois anos, ainda aluno do 2º grau, na Escola Técnica Federal da Bahia). Nas
disciplinas Didática da Matemática e Metodologia e Prática de Ensino da Matemática
tive a oportunidade de ter aulas com professores engajados no movimento da
Educação Matemática, porém, o contato com questões inerentes à demonstração
permanecia o mesmo, isto é, era sempre via verificação de uma verdade matemática.
Conforme relatei anteriormente, fui professor de Desenho Geométrico durante
alguns anos e as atividades desenvolvidas tinham como foco realizar construções
geométricas com as respectivas justificativas matemáticas. Recordo-me da fala de um
aluno, quando comuniquei que não iria demonstrar o teorema de Tales: “Tomara que
não seja difícil de acreditar”. Outro episódio instigante ocorreu quando propus aos
alunos o problema da construção da bissetriz de um ângulo, quando não se tem
acesso ao vértice. Para essa questão, só busquei uma justificativa matemática ao
ministrar este curso e os alunos trouxeram três formas diferentes e justificadas. Minha
surpresa foi grande, pois esperava uma única resposta: aquela sugerida, de maneira
sutil, por um problema de construção, que eles já haviam resolvido (foi o que tinha me
motivado, ao preparar a aula).
19
Ao retornar a ministrar apenas aulas da disciplina Matemática e perceber as
dificuldades em Geometria apresentadas pelos alunos, comecei a acreditar que as
atividades, nas aulas de Desenho Geométrico, poderiam contribuir para a superação
das dificuldades de aprendizagem em Geometria.
Essa inquietação me levou a elaborar o anteprojeto de pesquisa, durante o
curso de Metodologia da Pesquisa, oferecido pelo programa de Educação
Matemática, com a temática: “Geometria, construções geométricas e demonstração”.
Assim sendo, me debrucei a ler outros trabalhos cuja temática era próxima, para
perceber sua relevância e se ainda existiam questões por responder. Encontrei alguns
trabalhos e percebi que parte deles apontava para a formação de professores, no que
diz respeito aos conhecimentos geométricos, mais especificamente, às
demonstrações nesse campo, o que influenciou, em grande medida, a realização
desta pesquisa em um grupo de formação continuada com professores da disciplina
Matemática do Ensino Fundamental.
Deste modo, meu orientador e eu, decidimos realizar esse estudo, do qual
apresentamos a seguir, a questão de pesquisa.
1.2 O PROBLEMA DE PESQUISA
De acordo com Almouloud e Mello (2000), um dos problemas enfrentados pelo
sistema de ensino brasileiro refere-se ao baixo desempenho dos alunos do Ensino
Fundamental em Matemática. As recentes avaliações feitas pelo SAEB/MEC (Sistema
de Avaliação da Educação Básica – Ministério da Educação e Cultura), pela
Secretaria de Educação de São Paulo evidenciam que esse desempenho torna-se
ainda mais baixo quando o tema abordado é a Geometria. Embora os currículos mais
recentes destaquem a importância de se resgatar o trabalho com Geometria no
Ensino Fundamental, o professor não sabe claramente o que fazer. A Secretaria de
Ensino Fundamental do MEC colocou em discussão nacional os Parâmetros
Curriculares e apontou a necessidade de formar professores para a efetiva
implantação de novas alternativas.
Para Fainguelernt (1999):
O ensino da Geometria, que não pode ser reduzido a aplicação de
fórmulas e de resultados estabelecidos por alguns teoremas, se
justifica pela preocupação com a descoberta de caminhos para a sua
demonstração e também para a dedução de suas fórmulas, sem a
20
preocupação do compromisso de se apoiar no processo exaustivo de
formalização (FAINGUELERNT, 1999, p. 20).
Maioli (2002) ao propor a questão: “como trabalhar com formação de
professores de forma a contribuir com saberes referentes à Geometria e, ao mesmo
tempo, proporcionar aprimoramento em conhecimentos didáticos inerentes a este
conteúdo?”, alcançou seus objetivos. Porém, relata na conclusão:
Com relação à demonstração, constatamos que a oficina contribuiu no
sentido de chamar a atenção para sua necessidade, os professores
avançaram, visto que na primeira atividade com demonstrações, não
conseguiam utilizar a ferramenta sugerida (paralelas cortadas por uma
transversal) e nas últimas, já conseguiam explicitar o caminho da
demonstração. No entanto, a oficina não deu conta de desenvolver
conhecimentos a ponto do professor escrever sozinho uma
demonstração completa. Se faz necessário um estudo mais profundo
sobre demonstrações (MAIOLI, 2002, p. 144).
A formação sólida em Geometria, por parte dos professores de todos os níveis,
se faz necessária para que qualquer proposta de ensino seja implantada, afirmam
Almouloud e Manrique (2001) e, ainda relatam, que uma das dificuldades que
apareceu na resolução de um problema proposto a um grupo de professores foi a
falta de competência em relação à demonstração.
A necessidade de uma formação adequada do professor para trabalhar a
demonstração em Geometria, a fim de que os alunos possam se apropriar dos
conceitos e habilidades geométricas, no âmbito do Ensino Fundamental, é uma das
vertentes defendidas por Almouloud e Mello (2000).
A proposta de trabalhar a demonstração em Geometria via construções
geométricas, nos leva a corroborar com as hipóteses de José Carlos Putnoki, quando
diz:
Já faz um bom tempo que o Desenho Geométrico foi banido das
nossas escolas de 1º e 2º graus. “Coincidentemente”, de lá para cá, a
Geometria, cada vez mais, vem se tornando o grande terror da
Matemática, tanto para alunos quanto para professores. Com certeza,
não se trata apenas de uma coincidência, mas sim, em parte, de uma
conseqüência (PUTNOKI, 1988, p. 13).
Tendo em vista essa temática, Zuin (2001) aponta para a falta de trabalhos que
pudessem subsidiar o seu estudo, intitulado: “Da régua e do compasso: as
21
construções geométricas como um saber escolar no Brasil”, sugerindo questões para
pesquisas futuras, dentre as quais destacamos:
Qual o papel das construções geométricas na elaboração do
conhecimento da Geometria?
Qual a importância das construções geométricas na construção do
raciocínio lógico-dedutivo? (ZUIN, 2001, p. 192).
Entretanto, Maioli (2002) relata que os professores, com os quais trabalhou em
sua investigação, estavam abertos para conhecer e discutir pesquisas realizadas na
área de Educação Matemática, deixando a seguinte pergunta como sugestão: “que
outras formas de trabalho podem contribuir para estabelecer um elo entre a pesquisa
e o professor de Matemática do ensino fundamental e médio que estão trabalhando
em sala de aula?” (Ibid, p. 105).
Este relato nos levou a refletir sobre a formação continuada do professor de
Matemática e a pensarmos em contemplar aspectos didáticos – pesquisas na área de
Educação Matemática – que pudessem ser discutidos com os professores em
formação continuada no trabalho que pretendíamos desenvolver.
Já Gouvêa (1998), propunha, como um dos objetivos de sua pesquisa, uma
reflexão por parte dos professores sobre o ensino de Geometria com demonstrações,
detectando que esses professores subestimavam a capacidade de seus alunos,
constatando que eles não trabalhavam com a Geometria dedutiva, pois possuíam
pouca habilidade em lidar com o tema, além de não encontrarem subsídios para tal
trabalho em livros didáticos. Percebemos, no trabalho de Gouvêa, uma sugestão de
se trabalhar com as demonstrações geométricas na formação continuada de
professores.
No programa de Educação Matemática da PUC–SP, tivemos a oportunidade de
discutir sobre prova e demonstração, no contexto da Educação Matemática, ou seja,
relacionados ao ensino e aprendizagem. Tal contato nos levou a refletir sobre o nosso
interesse em Geometria, mais especificamente sobre as construções geométricas e
como o tema demonstração poderia estar inserido nesse processo. O contato com
outras pesquisas veio reforçar o tema escolhido e me permitiu vislumbrar um trabalho
centrado na formação continuada de professores de Matemática. A participação no
projeto de pesquisa, citado anteriormente, nos permitiu fazer reflexões sobre a nossa
prática, a nossa formação e a estruturar as atividades da oficina que pretendíamos
22
desenvolver no projeto. Sendo assim, resolvemos desenvolver esta pesquisa com o
tema: Geometria, construções geométricas e demonstrações em uma formação
continuada de professores de Matemática.
Escolhido os temas Geometria, demonstração, construções geométricas e
formação continuada de professores, passamos à busca do objeto matemático que
daria subsídios ao desenvolvimento dessa pesquisa.
Ao buscarmos o objeto geométrico que serviria de referência para conceber a
seqüência de atividades a serem desenvolvidas nas oficinas, com os professores em
formação continuada, fizemos escolha pelo objeto: mediatriz de um segmento.
Realizamos um estudo epistemológico acerca desse objeto, pesquisando em
livros didáticos franceses
4
e em livros didáticos de Desenho Geométrico
5
, podendo
assim constatar a riqueza desse objeto para resolução de problemas de construções
geométricas. Destacamos que a possibilidade de os professores participantes dessa
pesquisa construírem a definição de mediatriz, enunciarem e demonstrarem a
propriedade referente a esse objeto, sob “pontos de vista” diferentes, contribuiu de
forma singular para essa escolha.
Além disso, corroboraram com a nossa escolha, a diversidade de problemas e
situações-problema, ligados a esse objeto, em que se podem exigir justificativas
matemáticas da construção geométrica realizada, a possibilidade de formular
conjecturas e fazer demonstrações, trabalhar em vários registros de representação
semiótica, com teoremas recíprocos, propriedades diversas e ainda poder explorar as
várias funções da demonstração sugeridas por De Villiers (2001; 2002).
Na verdade, a riqueza matemática e a possibilidade de sua exploração didática
em atividades a serem desenvolvidas, tomando por base a Teoria das Situações
Didáticas, com os professores em formação continuada foram os pilares de motivação
que nos levou a escolher o objeto geométrico mediatriz de um segmento como
referência para desenvolver as oficinas de formação.
________________
4
Os livros didáticos consultados foram: MATHS 4
E
de Raymond Barra, Georges Borion, Marie Lampin e
Joel Malaval, 1988 e MATHÉMATIQUES PYTHAGORE 4
E
de Gerard Bonnefond, Daniel Daviaud e
Bernard Revranche, 1992.
5
Os livros consultados foram: Coleção Régua & compasso: Geometria e Desenho Geométrico (v. 1, v.
2, v. 3 e v. 4) de José Carlos Putnoki “JOTA”, Scipione, São Paulo, 1991 e Desenho Geométrico de
Benjamin de A. Carvalho, Ao Livro Técnico, Rio de Janeiro, 1993.
23
Diante do exposto, esperávamos contribuir para reflexões, estudos e para o
debate em Educação Matemática sobre o ensino de Geometria, em particular, a
demonstração, com o viés das construções geométricas, em uma formação
continuada de professores de Matemática, ao respondermos à questão:
Uma seqüência de ensino com enfoque em construções
geométricas pode contribuir para o desenvolvimento de
conhecimentos acerca da demonstração em Geometria e, ao
mesmo tempo, proporcionar o aprimoramento em
conhecimentos didáticos em uma formação continuada de
professores?
No entanto, devido às dificuldades encontradas durante a formação como, por
exemplo, a quantidade de encontros possíveis, visto que estávamos finalizando o ano
letivo, resolvemos redimensionar nossa questão de pesquisa e optarmos por
responder a seguinte questão:
Uma seqüência de ensino com enfoque em construções
geométricas pode contribuir para o desenvolvimento de
conhecimentos acerca da demonstração em Geometria
em uma formação continuada de professores?
Na tentativa de responder a essa questão de pesquisa objetivamos
desenvolver, com os professores em formação continuada, uma seqüência de
atividades que pudesse permitir aos participantes construir a definição de mediatriz de
um segmento, e, a partir desta, justificar de maneira formal, ou seja, fazer a
demonstração de propriedades inerentes a esse objeto matemático, bem como
justificar matematicamente, com base na Geometria plana, algumas construções
geométricas em que esse objeto é a principal ferramenta para a resolução do
problema.
Ao buscarmos subsídios para resolver essa questão, nos apoiamos nos
pressupostos da Engenharia Didática para conceber a seqüência de atividades da
oficina e também para validar as nossas hipóteses. A literatura sobre formação de
professores e aprendizagem de adultos foi mais um aporte a ser utilizado para
24
analisar os dados coletados. Os trabalhos sobre o ensino e a aprendizagem de
Geometria e demonstração, bem como aqueles que apontam a construção de
definições em matemática como contribuição para a ampliação de conceitos, foram
todos de grande valia para o desenho dessa pesquisa. Além disso, fizemos a escolha
da fundamentação teórica desse estudo.
A seguir, passaremos a destacar os aspectos metodológicos desse trabalho.
1.3 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Essa pesquisa se insere no projeto: O raciocínio dedutivo no processo de
ensino-aprendizagem da matemática nas séries finais do Ensino Fundamental, o qual
já estava em andamento, e tornou-se mais um trabalho a ser desenvolvido com um
grupo de professores em formação continuada e, por isso, deveria se adequar aos
aspectos metodológicos adotados nesse projeto.
A metodologia utilizada para a formação dos professores, nesse projeto, é a
pesquisa-ação, que destacamos enquanto linha de pesquisa associada a diversas
formas de ação coletiva orientada em função da resolução de problemas ou de
objetivos de transformação. Para Thiollent (2003, p. 14):
A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica, que
é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com
a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e
participantes representativos da situação e do problema estão
envolvidos de modo cooperativo ou participativo.
Segundo esse autor, uma pesquisa pode ser qualificada de pesquisa-ação
quando houver realmente uma ação por parte das pessoas ou grupos implicados no
problema sob observação. Além disso, é preciso que a ação seja uma ação não-
trivial, o que quer dizer uma ação problemática merecendo investigação para ser
elaborada e conduzida. Com relação ao pesquisador ele destaca: ‘‘com a pesquisa-
ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade
dos fatos observados” (THIOLLENT, 2003, p. 16).
Thiollent (2003) diz, ainda, que a pesquisa-ação não é constituída apenas pela
ação ou pela participação, mas pela necessidade de produzir conhecimento, adquirir
experiência, contribuir para a discussão ou fazer avançar no debate acerca das
25
questões abordadas. A seu ver, parte da informação gerada deve ser divulgada, sob
formas e meios apropriados, no seio da comunidade.
Para o nosso projeto, uma das qualidades fundamentais da pesquisa-ação,
consiste no fato de que as populações não são consideradas como ignorantes e
desinteressadas. Levando a sério o saber espontâneo e cotejando-o com as
explicações dos pesquisadores, um conhecimento descritivo e crítico é gerado acerca
da situação, com todas as sutilezas que escapam aos procedimentos padronizados.
Para a construção e análise da seqüência de atividades tratada nesse trabalho
nos baseamos nos pressupostos da Engenharia Didática, que garantiu aos
professores em formação continuada construir conhecimentos acerca da
demonstração em Geometria apoiada na mediatriz de um segmento e nas
construções geométricas. Essa escolha deu oportunidade ao pesquisador de avaliar
as atividades propostas fundamentado na teoria e utilizar a linha metodológica da
pesquisa-ação.
A Engenharia Didática visa entender “as relações entre a investigação e a ação
do sistema de ensino” (ARTIGUE, 1996, p. 193). De acordo com a autora, esse
método caracteriza-se por ser um processo empírico que objetiva conceber, realizar,
observar e analisar situações didáticas em sala de aula. Apesar de não tratarmos os
professores em formação continuada como alunos, acreditamos que as atividades
desenvolvidas nas oficinas de formação tiveram momentos similares à sala de aula.
Nesse sentido, Artigue (1996) distingue quatro fases para uma Engenharia
Didática:
Análises prévias ou preliminares;
Concepção e análise a priori das situações didáticas da engenharia;
Experimentação;
Análise a posteriori – validação.
Na primeira fase da pesquisa, das análises preliminares, conforme Artigue
(1996), foram feitas ponderações envolvendo o quadro teórico da Teoria das
Situações Didáticas, de Brousseau (1986), e dos Registros de Representação
Semiótica, de Duval (2003); além de aspectos de conhecimentos ligados a:
Geometria, demonstrações e construções geométricas, e destacamos o objeto
matemático mediatriz de um segmento. Nesse contexto, demos destaque aos
26
aspectos históricos e epistemológicos, ao processo de ensino e aprendizagem e a
presença de possíveis obstáculos, de modo que pudessem respaldar ou possibilitar
previsões ao elaborarmos as atividades. Além disso, fizemos um estudo teórico sobre
formação de professores.
Na segunda fase, intitulada concepção e análise a priori das atividades,
conforme Artigue (1996), delimitamos as variáveis didáticas a serem consideradas e
que foram abordadas nas sessões de formação desenvolvidas em forma de oficinas.
Para Brousseau (1986), é fundamental na investigação em didática fazer a análise a
priori da situação, pois a previsão dos efeitos da situação que o pesquisador elaborou
antes de colocá-la em experimentação é fundamental para, posteriormente, poder
comparar com os comportamentos observados nos dados coletados. Nas atividades
dessa seqüência foram considerados os seguintes aspectos e/ou objetivos:
Orientar os professores em formação na resolução das situações-
problema propostas;
Desenvolver situações controladas que promovam o desequilíbrio e a
adaptação dos sujeitos ao “milieu”
6
;
Propiciar o desenvolvimento de fases adidáticas, propostas na teoria das
situações didáticas de Brousseau (1986), como ação, formulação e
validação;
Propiciar os momentos de institucionalização – fase didática – que serão
coordenados pelo formador;
Criar condições para que os professores em formação continuada criem
conjecturas, realizem construções geométricas, justifiquem
matematicamente tais construções e possam em vários momentos
realizar demonstrações;
Que as atividades contemplem as funções da demonstração propostas
por De Villiers (2001; 2002): explicação, descoberta e sistematização,
bem como os professores em formação continuada utilizem vários
registros de representação semiótica efetuando conversões.
Na terceira fase, de experimentação, propusemos aos professores trabalharem
com a seqüência didática que concebemos. Durante os encontros de formação não
________________
6
Segundo Brousseau (1986).
27
deixamos de considerar os aspectos do contrato didático
7
, ou seja, cabia aos
professores em formação continuada, a responsabilidade de administrar sua relação
com o conhecimento na fase adidática (ação, formulação e validação) e ao formador,
a responsabilidade de coordenar as atividades fazendo devoluções na fase adidática
e institucionalizar o conhecimento na fase didática.
Na análise a posteriori e validação, quarta fase da Engenharia Didática,
analisamos a produção dos professores a partir dos dados coletados, ou seja,
comparamos os dados coletados com as análises a priori.
Os dados desta pesquisa foram coletados mediante observações dos
encontros durante a oficina. Essas observações foram realizadas por mestrandos e
mestres que participavam do projeto. Nesse sentido, nos apoiamos em Vianna (2003)
quando afirma que os estudos observacionais podem ser realizados em diferentes
lugares, destacando em particular o processo de formação de professores.
Esclarecemos que, neste trabalho, os participantes já estavam familiarizados
com o processo de observação. E, com relação aos aspectos positivos do trabalho
com observadores, concordamos com Vianna (2003, p. 32) quando diz: “a observação
demanda um período mais longo de contato entre o observador, gerando, um
relacionamento emocional (amizade, simpatia, etc. e mesmo emoções negativas) que
pode facilitar, ou dificultar, uma melhor compreensão do observado”.
Com relação aos observadores, os mesmos já estavam participando da coleta
de dados com os professores em formação continuada antes do início dessa
pesquisa, o que corrobora com as idéias de Vianna (2003, p. 10) quando diz:
Um artifício para minimizar a influência do efeito do observador seria a
presença do mesmo em sala várias vezes, mas sem coletar dados, a
fim de que o professor e alunos, a serem observados, se acostumem
com a sua presença e possam agir com maior naturalidade durante o
processo efetivo de realização da observação.
________________
7
Brousseau (1986) define o contrato didático como o conjunto de comportamentos específicos do
professor, esperado pelos alunos, e o conjunto de comportamentos dos alunos, esperado pelo
professor. Esse contrato é uma relação que determina – explicitamente em pequena parte, mas,
sobretudo implicitamente – aquilo que cada parceiro, professor e aluno, têm a responsabilidade de gerir
e pelo qual será, de uma maneira ou de outra, responsável perante o outro. (apud Almoulud, 2007, p.
89).
28
A fim de suprir possíveis dúvidas das observações efetuadas na coleta de
dados, recorremos às gravações em áudio, realizadas durante todas as oficinas de
formação.
Definido nosso problema de pesquisa e os aspectos metodológicos adotados,
apresentamos, em seguida, a fundamentação teórica que norteou este trabalho.
1.4 CONSTRUINDO A FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Nesta parte do trabalho, destacaremos as teorias de Raymond Duval sobre os
Registros de Representação Semiótica e de Guy Brousseau sobre a Teoria das
Situações Didáticas, destacando as idéias de Marc Rogalski sobre “ponto de vista” e
autores que darão suporte ao desenvolvimento do trabalho em relação a
demonstração e a formação de professores.
1.4.1 REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA
Os objetos de estudo em matemática: conceito, propriedades, relações e
estruturas não são diretamente perceptíveis aos sentidos humanos. Recorremos,
então, a notações simbólicas, códigos, tabelas, gráficos, esquemas, escritas, como
representantes para estes objetos. Partindo dessa premissa, Raymond Duval
desenvolveu a Teoria dos Registros de Representação Semiótica.
Sabendo que uma expressão, uma noção, um símbolo representam objetos
matemáticos como: um número, uma função, um ponto, um círculo, percebemos uma
distinção entre o objeto matemático e sua representação e, por isso, não devem ser
confundidos. Segundo Duval (2003), toda confusão implicará numa perda da
compreensão e, conseqüentemente, os conhecimentos adquiridos não estarão
disponíveis no contexto da aprendizagem. Para este pesquisador, a distinção entre
um objeto matemático e a sua representação é um ponto estratégico na compreensão
da matemática e, apesar de se buscar uma apreensão conceitual dos objetos
matemáticos, é só por meio de uma representação semiótica que uma atividade é
possível sobre eles. A confusão entre objeto e representação é quase inevitável, pois,
a apreensão dos objetos matemáticos é conceitual, mas, é somente por meio de
representações semióticas que uma atividade sobre estes objetos se torna possível.
29
Duval (1995) usa as terminologias sémiosis e noésis para esclarecer esse ponto ao
afirmar que:
O funcionamento cognitivo do pensamento humano se revela
inseparável de existência dos diversos registros de representação
semiótica. Chamarei de sémiosis a apreensão ou a produção de uma
representação semiótica e de noésis a apreensão conceitual do
objeto, é necessário afirmar que a noésis é inseparável da sémiosis
(ibid, p. 39-40).
Podemos, então, dizer que para ocorrer a apreensão do objeto matemático, é
necessário que a noésis ocorra por meio de várias e significativas sémiosis. Dessa
forma, temos que o paradoxo cognitivo do pensamento matemático e a dificuldade
que resulta na aprendizagem é que não se tem noésis sem sémiosis (DUVAL, 1993).
Mas o que é um registro de representação semiótica? Uma figura geométrica,
um enunciado em língua materna, uma fórmula algébrica ou uma representação
gráfica, por exemplo, são representações semióticas em registros semióticos
diferentes. Duval (1995, p. 20) explica a noção de registro de representação semiótica
da seguinte forma:
Em primeiro lugar, constituir um traço ou um conjunto de vestígios
perceptíveis, que sejam identificáveis como uma representação de
algo num sistema determinado. Em seguida transformar
as
representações pelas únicas regras próprias ao sistema, de maneira a
obter outras representações que podem constituir uma
correspondência de conhecimentos em relação às representações
iniciais. Por último, converter
as representações produzidas num
sistema de representações para outro sistema, de tal maneira que
este último permita esclarecer outros significados relativos ao que é
representado. Não são todos os sistemas semióticos que permitem
estas três atividades cognitivas fundamentais [...] Mas as línguas
naturais, as línguas simbólicas, as representações gráficas, as figuras
geométricas, etc., permitem-no. Falamos então de registro de
representação semiótica.
Para melhor entendermos como se dá a aprendizagem segundo essa teoria,
diferenciar tratamento de conversão é fundamental. Para Damm (2002):
O tratamento de uma representação é a transformação dessa
representação no próprio registro onde ela foi formada. O tratamento é
uma transformação interna a um registro. Por exemplo, às estruturas
simbólicas (cálculo numérico, cálculo algébrico,...)
A conversão de uma representação é a transformação desta em uma
representação em outro registro conservando a totalidade ou uma
parte do objeto matemático em questão. A conversão não pode ser
30
confundida com o tratamento. O tratamento se estabelece “dentro” do
registro, já a conversão se dá entre registros diferentes (DAMM, 2002,
p. 145-146).
A esse respeito Henriques, Attie e Farias (2007, p. 19) relatam:
A conversão tem uma importância particular. No entanto, é geralmente
negligenciada no ensino da matemática, enquanto que, como sublinha
Duval, uma das condições essenciais para a apreensão conceitual dos
objetos matemáticos é dispor, para um mesmo objeto, de várias
representações semióticas.
A escolha de um registro de representação adequado pode favorecer
o tratamento (transformações das representações ao interior de um
mesmo registro). No entanto, dispor de vários registros de
representação não é suficiente para garantir a compreensão. Uma
segunda condição é necessária: a coordenação dos registros de
representações. Ela se manifesta pela capacidade de reconhecer, em
duas representações diferentes, representações de um mesmo objeto.
Ela aparece como a condição fundamental para todo tipo de
aprendizagem.
Sendo assim, “é necessário que o professor tenha claro o objeto matemático a
ser ensinado, isto lhe possibilitará definir quais os registros de representação
semiótica que possibilitarão a construção do mesmo” (DAMM, 2002, p. 142), bem
como, a garantia de poder mudar de registro de representação semiótica. Isso
significa fazer conversões, pois ao fazermos conversões estamos mudando a forma
pela qual o conhecimento é representado.
Diante do que foi relatado, percebemos que a conversão é uma atividade
cognitiva diferente e independente do tratamento. Por exemplo, pode-se trabalhar
com números racionais na forma decimal ou na forma fracionária, sem, no entanto,
pensar em converter de uma forma a outra, ou seja, trabalhando-se no mesmo
registro de representação semiótica (efetuando-se tratamentos). Podemos destacar
que um elemento facilitador, ao se usar várias representações, é a possibilidade de
poder efetuar alguns tratamentos que não são possíveis em outros registros de
representação semiótica.
Na verdade, a originalidade da atividade matemática (com compreensão) está
na mobilização simultânea de, ao menos, dois registros ao mesmo tempo, ou na
possibilidade de trocar a todo momento de registro de representação (Duval, 2003).
Logo, o que garante a apreensão do objeto matemático é a coordenação entre vários
registros, ou seja, a conversão. Duval (2003) destaca que, em alguns domínios, pode-
31
se privilegiar explicitamente um determinado registro, porém deve existir a
possibilidade de passar de um registro a outro, pois, ao efetuarmos conversões entre
registros de representação semiótica, estamos possibilitando o acesso a propriedades
e/ou aspectos diferentes de um mesmo objeto matemático que não são perceptíveis
nem acessíveis em alguns registros. O autor destaca, ainda, que o ponto decisivo
está no fato de que o conteúdo de uma representação depende mais do registro da
representação do que do objeto representado e justifica essa afirmação com o
seguinte argumento: “porque passar de um registro de representação a outro não é
somente mudar o modo de tratamento, é também explicar as propriedades ou os
aspectos diferentes de um mesmo objeto” (DUVAL, 2003, p. 22).
Segundo Duval (2003, p. 21), “o sucesso, para grande parte dos alunos em
Matemática, ocorre no caso dos monoregistros. Existe como que um
‘enclausuramento’ de registros que impede o aluno de reconhecer o mesmo objeto
matemático em duas de suas representações bem diferentes”. Sendo assim, a
compreensão matemática está ligada ao fato de podermos efetuar conversões, pois
essa é a única possibilidade de que se dispõe para não fazer confusão entre o objeto
matemático e a sua representação.
Como vimos, ao mudar de registro podemos ter acesso a propriedades
diferentes do mesmo objeto (não observadas no outro registro), isto é, dois registros
de representação não trazem o mesmo conteúdo. De acordo com Duval (1993, p. 49):
Esta situação se faz em função das possibilidades e das dificuldades
semióticas de cada registro. Uma linguagem não oferece as mesmas
possibilidades de representação de uma figura ou diagrama. Isso quer
dizer que toda representação é cognitivamente parcial em relação ao
que ela representa.
O autor afirma que a evolução dos conhecimentos matemáticos conduziu ao
desenvolvimento e a criação de vários registros de representação para o mesmo
objeto. No entanto, o estudo dos isomorfismos em matemática teve uma contribuição
no que diz respeito a não se valorizar as mudanças de registros de representação, já
que, se existe isomorfismo, tanto faz trabalhar com as propriedades em um registro
ou em outro. Não queremos aqui negar a importância dos isomorfismos para o
desenvolvimento de muitos aspectos da matemática, mas que este não sirva de
justificativa para não se privilegiar os vários registros de representação de um mesmo
objeto e, sobretudo, a mudança de registro ou a manipulação de dois registros
32
simultaneamente. Na verdade, quando mudamos de registro de representação não
estamos mudando apenas de tratamento, estamos abrindo horizontes para explicar
propriedades e/ou perceber aspectos diferentes de um mesmo objeto.
Com relação à heterogeneidade dos dois sentidos de conversão, Duval (2003)
afirma que nem sempre a conversão se efetua quando se invertem os registros de
partida e chegada. Este autor relata que, em geral, no ensino se privilegia um sentido
de conversão, acreditando que a conversão no outro sentido estaria automaticamente
proposta. A identificação dos objetos por suas diferentes representações é uma
atividade fundamental defendida por esse pesquisador, pois garante que tarefas de
estrito reconhecimento são tão importantes para a aprendizagem, quanto à de
resolução de problemas, uma vez que os conhecimentos disponíveis e mobilizáveis
por um indivíduo são aqueles que permitem reconhecimentos relativamente rápidos.
No ensino de Geometria, geralmente, se privilegiam questões no registro
figural, que exigem apenas um reconhecimento dos dados em língua natural, seguido
de algum tratamento, em detrimento de se propor questões no registro da língua
natural, para posterior conversão para o registro figural e, por último, o tratamento.
Isto pode ser verificado em situações do tipo:
Calcule o valor do ângulo
C
na figura
(Figura 1), sabendo que 50º e que o
ângulo 60º.
ˆ
=CA
ˆ
B
=SA
ˆ
H
Figura 1: Triângulo obtusângulo
Nesta situação o aluno apenas reconheceria os segmentos
AS
e
H como
bissetriz interna do ângulo  e altura relativa ao lado
BC
respectivamente. A seguir
determinaria os dados numéricos e efetuaria alguns tratamentos, concluindo no final
que a medida do ângulo é 5º.
C
ˆ
Essa mesma situação poderia ser apresentada de forma a possibilitar a
construção da figura, isto é, a mudança do registro em língua natural para o figural:
Em um triângulo ABC o ângulo do vértice A mede 50º e o ângulo formado pela
bissetriz interna e pela altura relativas ao vértice A mede 60º. Quanto mede o ângulo
do vértice C?
33
25°
60°
Neste caso o aluno teria que conhecer as definições de altura e bissetriz
interna, e perceber que a altura pode ser externa ao triângulo – informação dada na
proposta anterior – pois, em geral, os problemas que envolvem ângulo formado pela
altura e pela bissetriz interna são dados com esses segmentos internos ao triângulo.
O aluno poderia fazer um registro figural da situação, como apresentado na figura 2 e
se perguntar: como será que 60º poderá caber em 50º? E depois avançaria
percebendo que a figura correta é a apresentada na situação anterior.
25°
60°
Figura 2: Triângulo acutângulo
Como salientamos, anteriormente, na maioria das salas de aula de Matemática,
o sucesso do aluno ocorre nos monoregistros, isto é, quando lhe é solicitado resolver
um problema que exija a mudança de registros ou mesmo a articulação simultânea de
dois registros diferentes, o sucesso nem sempre é alcançado.
Desta forma, em nosso trabalho caracterizaremos os objetos matemáticos no
quadro geométrico, mais especificamente no campo da Geometria plana, usando três
tipos de registro de representação semiótica: o registro em língua natural, o registro
simbólico e o registro figural, que podem ser exemplificados com o caso da
representação de retas perpendiculares mostrados no quadro 1.
Linguagem natural Linguagem simbólica Linguagem figural
A reta r é perpendicular
à reta s.
r s
Quadro 1: Diferentes registros de representação.
34
Por tudo que foi dito, as idéias de Duval corroboraram com a nossa pesquisa,
pois, acreditamos que o ponto de partida para se realizar uma demonstração com
êxito é compreender o que se deseja demonstrar. Neste sentido, ao se pedir para
enunciar as propriedades geométricas, sempre o fizemos exigindo, no mínimo, dois
registros de representação e, em alguns casos, três, buscando assim garantir que a
propriedade que se desejava demonstrar e/ou justificar fosse explicitada e entendida.
Acreditamos também que a conversão de registros ocorreu de maneira natural, pois
esperávamos que os professores participantes testassem uma representação,
tomando outra como base, e percebessem que um registro pode apresentar algumas
vantagens em relação ao outro. Assim, percebendo que a mudança de um registro
para outro, possibilita a percepção de diferentes facetas do mesmo objeto
matemático, além de permitir a realização de tratamentos mais simples.
No entanto, se faz necessário esclarecer diferenças entre registros de
representação semiótica, “ponto de vista” e quadro, pois é comum esses termos
serem confundidos. Uma vez que trataremos na nossa seqüência dos dois primeiros.
1.4.2 QUADRO, REGISTRO E PONTO DE VISTA
Para Almouloud (2007), ao trabalhar, ensinar e aprender matemática, é
necessário entender que uma noção matemática funciona em vários registros de
representação semiótica, além de ser necessário mudar de quadros, de “ponto de
vista” e/ou de registro de representação semiótica. Uma vez que, para compreender
um conceito, demonstrar teoremas, resolver problemas, é necessário saber em quais
domínios ele funciona e bem escolher os registros de representação semiótica e/ou
compreender os vários “pontos de vista” ligados a esse saber.
Douady (1993) caracteriza o quadro como sendo:
constituído de ferramentas de uma parte da matemática, de relações
entre os objetos, de formulações eventualmente diferentes e de
imagens mentais associadas a essas ferramentas e relações. Dois
quadros podem ter os mesmos objetos e serem diferentes por causa
das imagens mentais e da problemática desenvolvida (Ibid apud
ALMOULOUD, 2007, p. 64).
Podemos citar, como exemplo, o quadro algébrico, o quadro geométrico, o
quadro numérico, entre outros. Para essa pesquisadora, uma mudança de quadro é
uma passagem de um quadro para outro com o objetivo de se chegar a formulações
35
diferentes de um mesmo problema. Tal mudança, muitas vezes, é necessária para
resolver um problema de matemática ou para facilitar sua resolução.
Quanto a “ponto de vista”, Rogalski (1995 apud ALMOULOUD, 2007) usa esse
termo para designar uma maneira de entrar em um problema matemático, de olhar
(interpretar), de fazê-lo funcionar ou, eventualmente, definir um objeto matemático.
Para a resolução de um determinado problema, um “ponto de vista” pode apresentar
vantagens em relação a outro. Ao olharmos um objeto nos diferentes quadros e/ou
registros, temos vários “pontos de vista”, porém podemos ter vários “pontos de vista”
no mesmo quadro e/ou registro.
Neste sentido, muitas vezes, não é necessário mudar de quadro e/ou registro,
pois para facilitar a resolução de um problema, basta mudar de “ponto de vista”.
Pode-se olhar, por exemplo, a mediatriz de um segmento sob dois “pontos de vista”
diferentes no quadro da Geometria e no registro da língua natural:
A mediatriz de um segmento é a reta que passa pelo ponto médio desse
segmento e é perpendicular a ele;
A mediatriz de um segmento é o conjunto de todos os pontos que
eqüidistam das extremidades desse segmento.
Nesta pesquisa, solicitamos aos professores em formação continuada a
construção da definição de mediatriz de um segmento sob diferentes “pontos de
vista”, de maneira que, ao resolverem problemas de construções geométricas, tais
“pontos de vista” facilitem a abordagem do problema e a construção solicitada. Neste
sentido, esperamos que objetos geométricos, em geral, vistos sob um único “ponto de
vista”, possam ser olhados e/ou definidos sob diferentes “pontos de vista”.
Apesar de não focarmos nas atividades que desenvolvemos, a mudança de
quadro, foi oportuno o esclarecimento acerca dessa questão, pois, desta forma
evitamos possíveis confusões e/ou distorções quanto a essa terminologia.
1.4.3 TEORIA DAS SITUAÇÕES DIDÁTICAS
Encontramos na Teoria das Situações Didáticas (TSD), proposta por Guy
Brousseau, um embasamento teórico que deve ser considerado ao se preparar e
apresentar atividades de matemática, visando realizar uma Educação Matemática
mais significativa e participativa para o aluno.
36
Segundo Brousseau (1986), o objetivo da TSD é caracterizar o processo de
aprendizagem por uma série de situações reprodutíveis, que conduzem a uma
modificação de um conjunto de comportamentos dos alunos. Esta modificação é que
gera o conhecimento, isto é, a aprendizagem com significado. Na verdade, o objeto
central de estudo dessa teoria não é o sujeito e sim a situação didática que irá gerar
interações na tríade professor–aluno–saber e as modificações descritas
anteriormente.
Brousseau (1996a) descreve o trabalho do matemático (cientista) colocando o
“status” da obtenção deste conhecimento no mesmo pelo qual deveria passar o aluno,
com um detalhe: no caso do aluno, haveria uma simulação da situação. Destacando
também que o ensino axiomático é não verdadeiro em termos de conhecimento, ou
seja, sendo o aluno responsável pela construção do seu conhecimento a sua
compreensão deve ser garantida. A esse respeito, Freitas (2002, p. 67) afirma:
É evidente que não se trata de simplesmente tentar reproduzir o
ambiente científico em que o saber foi originalmente estabelecido e
nem tampouco teatralizar uma redução do trabalho do matemático. A
idéia pedagógica de trabalhar com as aparentes facilidades de uma
redescoberta do conhecimento não é tão fácil de ser colocada em
prática e somente faz sentido num quadro muito bem refletido.
E o que é uma situação didática? Brousseau (1986) define situação didática
como:
O conjunto de relações estabelecidas explicitamente e/ou
implicitamente entre um aluno ou um grupo de alunos, um certo
“milieu”
8
(contendo eventualmente instrumentos ou objetos) e um
sistema educativo (o professor) para que estes alunos adquiram um
saber constituído ou em constituição (BROUSSEAU, 1986 apud
ALMOULOUD, 2007, p. 33).
No entanto, a compreensão efetiva das possibilidades do milieu é necessária.
Segundo Almouloud (2007), a TSD se baseia em três vertentes:
O aluno aprende adaptando-se a um “milieu” que é fator de
dificuldades, de contradições, de desequilíbrio, um pouco como
acontece na sociedade humana. Esse saber, fruto da adaptação do
aluno, manifesta-se pelas respostas novas, que são a prova da
________________
8
“Milieu” é tudo com o que o sujeito interage para construir o conhecimento. Deve-se ainda diferenciar o
milieu potencial do milieu efetivo, o primeiro é organizado pelo professor e o segundo aquele com que
o aluno realmente interage.
37
aprendizagem. Esta hipótese é uma referência à epistemologia
construtivista de Piaget, segundo a qual, a aprendizagem decorre de
processos de adaptação, no sentido biológico do termo, desenvolvidos
pelo sujeito frente a situações problemáticas.
O “milieu” não munido de intenções didáticas é insuficiente para
permitir a aquisição de conhecimentos matemáticos pelo aprendiz.
Para que haja essa intencionalidade didática, o professor deve
organizar um “milieu” no qual serão desenvolvidas as situações
suscetíveis de provocar essas aprendizagens.
A terceira hipótese postula que esse “milieu” e essas situações
devem engajar fortemente os saberes matemáticos envolvidos no
processo de ensino e aprendizagem. (ALMOULOUD, 2007, p. 32)
Nesse contexto, o trabalho pedagógico inicia-se com a escolha das situações-
problema (atividades) a serem trabalhadas com os alunos. Esta é uma etapa
fundamental e deve ser realizada com bastante cuidado pelo professor, já que ele é
quem conhece a realidade da turma e deverá fazer as escolhas das variáveis
didáticas
9
adequadas e compatíveis para os alunos.
Porém, para analisar o processo de aprendizagem, a TSD observa e
decompõe esse processo em quatro fases diferentes: ação, formulação, validação e
institucionalização, sendo que as três primeiras caracterizam a fase adidática, ou seja,
situação na qual a intenção de ensinar não é revelada ao aprendiz, porém foi
planejada pelo professor para proporcionar condições do educando de se apropriar do
novo saber que o professor deseja ensinar. Essa situação é caracterizada por uma
ATIVIDADE ou conjunto de ATIVIDADES que faça o aluno agir, falar, refletir, ... de
forma a adquirir novos conhecimentos por meio dessa situação, isto é, sem apelo a
razões didáticas impostas pelo professor. Vale ressaltar que a situação adidática é
diferente de uma situação não didática, pois, na primeira, existe uma intenção do
professor de ensinar algo novo, o que não ocorre na segunda. A esse respeito,
Freitas (2002, p. 70) relata que:
As situações adidáticas representam os momentos mais importantes
da aprendizagem, pois o sucesso do aluno nas mesmas significa que
ele, por seu próprio mérito, conseguiu sintetizar um conhecimento.
Neste sentido não podem ser confundidas com as situações não
didáticas, que são aquelas que não foram planejadas visando uma
aprendizagem.
Vejamos os aspectos fundamentais das fases de ação, formulação, validação e
institucionalização.
________________
9
Variáveis didáticas são escolhas feitas pelo professor que levam a modificações no processo ensino-
aprendizagem.
38
Fases de ação
Segundo Maioli (2004), são fases estruturadas (pelo professor) de forma que o
aprendiz tenha condições de agir buscando a solução do problema. Nessa busca, ele
realiza ações mais imediatas, que produzem conhecimentos de natureza mais
operacional. Nestas situações, há o predomínio do aspecto experimental do
conhecimento. O aprendiz vai escolhendo, ou desenvolvendo, estratégias para
solução sem a preocupação com explicitação de argumentos de natureza teórica que
justifiquem a validade de sua resposta. Em geral, as estratégias são criadas e postas
em prova pela experimentação. Ela é aceita ou rejeitada depois da apreciação por
parte do aluno. Uma situação de ação deve, então, permitir ao aluno julgar o resultado
de sua ação. Não é o professor que apresenta a solução, ele pode fazer devolução
10
para os alunos, porém são estes que devem ter a responsabilidade da resolução do
problema.
Fases de formulação
Nestas fases, o aluno formula a solução encontrada buscando explicações
para as suas ações. De acordo com Almouloud (2007), o aluno troca informações
com uma ou várias pessoas. Os interlocutores são emissores e receptores, e trocam
séries de mensagens escritas ou orais que estão redigidas em linguagem ingênua ou
matemática segundo as possibilidades de cada emissor. Em geral, estas fases
permitem que o aluno explicite as ferramentas utilizadas para resolver a situação-
problema em questão. Neste momento, pode surgir uma linguagem própria do aluno
ou grupo, ou seja, termos, códigos ou símbolos que o grupo cria para comunicar-se
entre si. O objetivo das fases de formulação é a troca de informações.
Fases de validação
As fases de validação são aquelas em que o aluno utiliza alguns mecanismos
de prova, já que as situações anteriores (ação e formulação) podem levá-lo a
enveredar por um raciocínio equivocado. Assim sendo, far-se-á necessário, um outro
tipo de situação que venha expor este equívoco e que exija um raciocínio mais
voltado para os “porquês”, a certeza e a ausência de contradições. As fases de
________________
10
O ato de fazer DEVOLUÇÃO (ato pelo qual o professor leva o aluno a aceitar a responsabilidade da
situação de aprendizagem) é no qual se fundamenta o processo de ensino e aprendizagem idealizado
por Brousseau.
39
validação servem tanto para garantir que a solução está correta ou não, isto é, o
aluno elabora algum tipo de “prova” buscando a sua convicção.
Nas três fases descritas até agora, o aluno é o ator principal do processo de
ensino e aprendizagem, ou seja, é ele quem age, formula e valida. É importante
salientar que, apesar de essas fases proporcionarem momentos de extrema
importância na construção do conhecimento do aluno, elas podem deixar
conhecimentos falsos, validados de forma incorreta, já que o aluno trabalha de forma
mais livre e sem a interferência direta do professor. Logo, é necessário um outro tipo
de fase: a institucionalização.
Fases de institucionalização
Nas fases de institucionalização ocorre uma intervenção direta do professor,
visando estabelecer o caráter do objeto e a universalidade do conhecimento, bem
como a correção de possíveis equívocos (definições erradas, demonstrações
incorretas...) que possam ter ocorrido nas fases anteriores. Segundo Maioli (2002),
essas fases permitem ao aluno criar uma linguagem própria ou um conhecimento
mais individualizado. No entanto, este conhecimento precisa ser aceito, tanto pelo
meio social, quanto pelo científico, extrapolando o contexto local em que foi gerado.
Cabe, então, ao professor, selecionar os pontos essenciais que devem passar a
constituir um saber formal, oficial, a ser incorporado como patrimônio cultural pronto
para ser utilizado em novas ocasiões.
De acordo com Brousseau (1996b), as situações de ensino tradicionais são
situações de institucionalização, porém, sem que o professor se ocupe da criação de
fases adidáticas (ação, formulação e validação). Todavia, essas fases estão
extremamente interligadas de forma que não percebemos seus limites, ou seja, onde
termina uma e começa a outra.
Nesse trabalho, a TSD contribuiu para o desenvolvimento das oficinas, por
meio da proposição de atividades que permitiram aos professores participantes
vivenciarem as fases de ação, formulação e validação, com o formador, fazendo
devoluções e propondo momentos de institucionalização, o que serviu de base para
conceber e aplicar as atividades que foram elaboradas. Em alguns momentos,
deixamos explícito para os participantes essas fases e discutimos um pouco desse
40
referencial teórico, buscando sugerir um exercício de preparação das suas aulas,
mantendo-os, assim, em contato com conteúdos didáticos.
Destacamos, ainda, que a preparação do formador para conduzir as oficinas
com base na TSD foi fundamental, pois esperávamos por muitas surpresas, uma vez
que a formação poderia tomar rumos variados dependendo do tipo de raciocínio que
os participantes adotassem.
1.4.4 DEMONSTRAÇÕES
Ao trabalharmos com o tema demonstração não pretendemos desenvolver um
trabalho técnico-formal acerca do “como demonstrar”, ou seja, sobre quais aspectos
devem contemplar a escrita de uma demonstração. Interessamo-nos, sobretudo, no
“por quê” e no “para quê” demonstrar, considerando que as funções da demonstração
propostas por De Villiers (2001; 2002), podem nos levar a busca de alternativas para
o “como demonstrar”.
De Villiers (2001; 2002), convencido de que grande parte dos pesquisadores
usa como principal função da demonstração a verificação, apresenta um modelo que
vem usando em suas investigações, em relação às funções da demonstração:
Verificação (diz respeito à verdade da afirmação);
Explicação (fornece explicações quanto ao fato de ser
verdadeira);
Sistematização (organiza os vários resultados num sistema
dedutivo de axiomas, conceitos principais e teoremas);
Descoberta (descoberta ou invenção de novos resultados);
Comunicação (a transmissão do conhecimento matemático);
Desafio intelectual (a realização pessoal/gratificação resultantes
da construção de uma demonstração).
A seguir descrevemos aspectos acerca das funções da demonstração com
base em De Villiers (2001; 2002).
A demonstração como processo de verificação/convencimento
A esse respeito, os professores de Matemática parecem acreditar que somente
a demonstração fornece a certeza e é a única autoridade para o estabelecimento da
verdade de uma conjectura. Nesse sentido, ele afirma que a demonstração não é um
41
requisito necessário para a convicção, relatando que a convicção é, freqüentemente,
usada como pré-requisito para a procura de uma demonstração. Destaca, ainda, que
um alto grau de convicção pode ser atingido mesmo na ausência da demonstração,
em especial, pelos matemáticos.
Este pesquisador acredita que existem duas dimensões a respeito da obtenção
da certeza: uma lógica, que exige, de alguma forma, a demonstração dedutiva e,
outra, psicológica, que se apóia no fato das pessoas precisarem, ao mesmo tempo,
de alguma experimentação exploratória ou compreensão intuitiva.
A demonstração como processo de explicação
Apesar de ser possível atingir um alto nível de confiança e validade de uma
conjectura, por meio de verificações empíricas, tais processos não fornecem uma
explicação satisfatória dessa validade. O autor afirma que mais importante do que a
validade é a busca por saber o porquê é válido, indicando também que a explicação é
um bom critério para definir o que é uma boa demonstração. Muitas vezes, a busca
não é para aumentar a certeza, mas sim para explicar porque tal conjectura é
verdadeira.
A demonstração como processo de descoberta
Acreditando que alguns teoremas foram descobertos por meio da intuição e de
métodos empíricos, o autor destaca que grande parte da descoberta e criação
matemática ocorreu por meio de processos puramente dedutivos. E destaca que, para
o matemático profissional, a demonstração não é apenas um meio de verificação de
um resultado já descoberto, mas, muitas vezes, um processo de explorar, analisar,
descobrir e inventar novos resultados.
A demonstração como processo de sistematização
A demonstração revela as subjacentes relações lógicas entre as afirmações,
em contraposição à intuição e testes empíricos, considerando que a demonstração é
uma ferramenta indispensável para transformar um sistema dedutivo de axiomas,
definições e teoremas, em um conjunto de resultados conhecidos. Esse autor
evidencia algumas funções importantes de uma sistematização dedutiva de
resultados: ajuda a identificar inconsistências, unifica e simplifica teorias matemáticas,
constitui uma ajuda para aplicações na matemática ou em outros campos, conduz a
sistemas dedutivos alternativos, entre outros.
42
A demonstração como meio de comunicação
Afirmando que a demonstração é uma forma de discurso, um meio de
comunicação entre pessoas que fazem matemática, este pesquisador reconhece que
o argumento matemático é dirigido a uma audiência humana, ou seja, a
demonstração é um modo único de comunicar resultados matemáticos entre
matemáticos profissionais, entre professores e alunos e entre os próprios alunos. A
escrita subentende um leitor, e, portanto, uma das funções da demonstração é
comunicar resultados.
A demonstração como desafio intelectual
Garantindo que, para os matemáticos, a demonstração é um desafio
intelectual, ou seja, cumpre uma função gratificante de realização própria, muitas
vezes, o que está em dúvida não é a verdade do resultado, mas se seremos capazes
de demonstrá-lo.
O autor destaca, ainda, que embora as funções da demonstração tenham
características próprias, elas aparecem misturadas em alguns casos específicos ou,
em outros casos, certas funções se sobressaem sobre outras, ou, às vezes, nem
estão presentes.
Entendendo que a demonstração é um discurso diferente daquele praticado,
em geral, nas aulas de Matemática, buscamos em Duval os fundamentos necessários
para tal premissa. Almouloud (2003) observa que, acerca do ensino da demonstração
em Geometria, Duval (1998) afirma que os problemas nesse campo apresentam uma
grande originalidade em relação a muitas tarefas matemáticas que podem ser
propostas aos alunos. A resolução de tais tarefas exige uma forma de raciocínio
referendado em uma axiomática local, a que se desenvolve no registro da língua
natural; e também que Duval (1996) defende que a aprendizagem da demonstração
consiste primeiramente na conscientização de que se trata de um discurso diferente
do que é praticado pelo pensamento natural (em geral, praticado nas aulas de
Matemática).
Duval e Egret (1989), ao analisarem as causas do fracasso do ensino e
aprendizagem da demonstração em matemática, dizem que ela envolve uma
atividade cognitiva específica, e que sua aprendizagem está desvinculada de
situações de interação social, ou seja, a sua aprendizagem não está ligada a nenhum
43
processo de imitação ou por convivência com pessoas que fazem demonstrações.
Estes pesquisadores ainda explicitam que as demonstrações não estão subordinadas
a pressões internas de nenhum objeto matemático específico. Fundamentados
nesses pesquisadores, podemos afirmar que a demonstração requer um modo de
processamento cognitivo autônomo com características específicas.
De acordo com esses autores a demonstração tem uma espécie própria de
estrutura, que denominam “estrutura profunda”. Tal estrutura é caracterizada por
articular os enunciados em função do estatuto
11
que lhe é reconhecido e não em
função do seu significado, e também por se apresentar em progressões por
substituições de enunciados e não pelo encadeamento de enunciados. No entanto,
esses pesquisadores relatam que a “estrutura superficial” – assemelha-se à estrutura
de uma argumentação na qual os enunciados são encadeados uns aos outros –
também é parte da demonstração.
Com as peculiaridades exigidas no ensino e aprendizagem da demonstração
em matemática, Duval e Egret (1989) sugerem um tipo de tarefa específica, a
organização dedutiva, isto é, uma tarefa em que, dado um corpo de enunciados, o
aprendiz deverá ordená-los em função de seu estatuto por meio de um jogo de
substituições. As atividades que desenvolvemos nas oficinas de formação com os
professores, contemplaram esse tipo de tarefa.
Para esses autores, as tarefas de organização dedutiva devem preceder as
tarefas heurísticas em que os aprendizes, por meio de um problema, desenvolvem
estratégias de resolução, fazem conjecturas e as demonstram.
Concordamos com Duval e Egret (1989), ao afirmarem que a tomada de
consciência do que é uma demonstração somente ocorre em uma articulação de, ao
menos, dois registros de representação semiótica, sendo um deles a utilização da
língua natural. Particularmente, no quadro da Geometria, Duval (1995) salienta que:
[...] a atividade matemática exigida em geometria faz uso de ao menos
dois registros de representação semiótica: o figural e o da língua
natural. No entanto, não se trata de simplesmente executar uma troca
de registro como em outras situações da matemática, em que os
tratamentos são efetuados somente em um dos registros. A atividade
cognitiva pedida em geometria exige mais. Os tratamentos efetuados
separada e alternadamente em cada um dos registros não são mais
suficientes, é necessário que os tratamentos discursivos sejam
________________
11
Estatuto nesse contexto é entendido como o “status” que possui uma definição, propriedade,
afirmação matemática de modo a se tornar inquestionável.
44
efetuados simultaneamente e de forma interativa (apud MAIOLI, 2002,
p. 29).
Neste trabalho consideraremos as funções da demonstração propostas por De
Villiers (2001; 2002) e os trabalhos de Duval e Egret (1989), tanto para conceber as
atividades da seqüência didática, como também para analisar os dados coletados.
1.4.5 FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Muitos pesquisadores têm se preocupado com o ensino e a aprendizagem de
demonstrações, em particular, no campo geométrico e na formação de professores.
Dreyfus e Hadas (1994), ao analisarem dificuldades de alunos em matemática,
formularam seis princípios para identificar a compreensão de teoremas e
demonstração. Esses princípios são:
Princípio 1. Um teorema não tem exceções. Diz-se que uma
afirmação matemática é correta somente quando é correta em
qualquer circunstância concebível.
Princípio 2. Mesmo afirmações “óbvias” têm de ser provadas. Em
particular, uma demonstração não pode ser construída com base nos
aspectos aparentes da figura.
Princípio 3. Uma demonstração deve ser geral. Um ou mais casos
particulares não provam uma afirmação geral. Porém, um contra-
exemplo é suficiente para refutá-la.
Princípio 4. As suposições de um teorema devem ser claramente
identificadas e distinguidas das conclusões.
Princípio 5. A recíproca de uma afirmação correta não é
necessariamente correta.
Princípio 6. Figuras complexas são constituídas por componentes
básicos cuja identificação pode ser indispensável numa demonstração
(DREYFUS e HADAS, 1994, p. 61).
Os autores afirmam que, geralmente, esses princípios não são bem
compreendidos pela maioria dos alunos de capacidade média e que podem ser
implementados em qualquer curso de Geometria euclidiana. Com base em nossa
experiência docente, acreditamos que muitos professores, que lecionam na Educação
Básica, não possuem esses princípios muito claros, e alguns nem os conhecem. Por
isso os implementamos, sempre que possível, na formação continuada que
desenvolvemos.
A problemática da formação do professor em conceitos geométricos não é um
fato que ocorre apenas no Brasil. Hershkowitz et al. (1994, p. 273), por exemplo, ao
realizarem uma pesquisa com professores em Israel, relatam que “se os alunos
45
devem aprender esses fundamentos, é importante que os professores da escola
elementar conheçam bem essas idéias e as maneiras de ajudar as crianças a
aprender”. Esses pesquisadores ainda destacam que os professores apresentam
padrões e concepções incorretas, semelhantes aos seus alunos de quinta a oitava
séries.
A respeito do conhecimento matemático do professor de Matemática, Ponte
(2001) mostra que este vem merecendo muita atenção nas pesquisas em formação
de professores, destacando como axioma: “sem um bom conhecimento de
Matemática não é possível ensinar bem a Matemática” (Ibid, p. 11) e indica, ainda,
que essa situação é problemática em todos os níveis de ensino.
Ainda a respeito do conhecimento do conteúdo específico que o professor tem
que ministrar em suas aulas, Shulman (2001) discorre sobre o conhecimento de
base
12
do professor, o qual é indispensável para a docência. Ao elencar sete
categorias de conhecimento que subjazem à compreensão que o professor necessita
para promover a aprendizagem dos seus alunos, o autor destaca o sólido
conhecimento do conteúdo que vai ensinar.
Quanto à definição na formação inicial em matemática, Farrel (1994, p. 292),
relata que:
Muitos alunos de faculdade completam sua formação em matemática
sem uma apreciação da natureza inventiva das definições
matemáticas. No plano intelectual, esses alunos concordarão que as
definições podem ser construídas; no plano emocional, comportam-se
como se a substância e a forma das definições em geometria fossem
fixas e inevitáveis.
Percebemos nesse relato, que a construção de definições não é abordada na
formação inicial de professores, e indicamos que tal prática ocorre também na sala de
aula da Educação Básica, particularmente em Geometria, onde as definições
aparecem estanques, completas e inquestionáveis.
Por outro lado, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (BRASIL,
1998) revelam que um dos obstáculos enfrentados pelo Brasil, em relação ao ensino
de Matemática, é a falta de uma formação profissional qualificada e que muitos
________________
12
Conhecimento de base aqui é empregado como sendo o conjunto da compreensão, conhecimento,
habilidades e motivação que um professor precisa para atuar eficazmente em uma dada situação de
ensino.
46
esforços pontuais, governamentais ou não, vêm sendo implementados para amenizar
esse problema. Segundo esse documento:
essas iniciativas ainda não atingiram o conjunto dos professores e por
isto não chegam a alterar o quadro desfavorável que caracteriza o
ensino de Matemática no Brasil. A formação dos professores, por
exemplo, tanto a inicial quanto a continuada, pouco tem contribuído
para qualificá-los para o exercício da docência (BRASIL, 1998, p. 22).
A esse respeito, Pietropaolo (2005) destaca que uma das possíveis mudanças
em cursos de formação de professores é que a abordagem de conteúdos da
Educação Básica seja feita de modo mais profundo e com a utilização de
demonstração. Este pesquisador discorre, ainda, que os alunos dos cursos de
Licenciatura em Matemática devem vivenciar situações de demonstração análogas
àquelas que irão trabalhar com seus alunos.
Porém, tanto na formação inicial, quanto na continuada, tratamos com adultos,
e por isso buscamos em DeAquino (2007) algumas orientações a esse respeito.
Dentre as várias dificuldades, geralmente, enfrentadas por adultos em situação
de aprendizagem, apontadas pelo autor, destacamos duas:
Eles foram acostumados a aprender de forma pedagógica, com alguém
simplesmente ensinando, transmitindo conteúdo e direcionando a
aprendizagem;
Já estão, há algum tempo, distantes dos bancos escolares e não estão mais
acostumados a aprender.
Para o autor, o que caracteriza o processo de aprendizagem é a possibilidade
ou não de reflexão do aprendiz, pois:
A aprendizagem não reflexiva exige pouca atividade intelectual de
nossa parte, como nas situações em que decoramos alguma coisa ou
desempenhamos uma tarefa simples, sem acrescentarmos um
significado pessoal. A aprendizagem reflexiva, por outro lado, requer
muito mais competência cognitiva, por exemplo, se procurarmos
entender o porquê de estarmos desempenhando determinada tarefa,
se procurarmos questionar a aplicabilidade de um conhecimento que
nos é ensinado etc. (DEAQUINO, 2007, p. 6).
Esse autor relata, ainda, que durante muito tempo o ensino e a aprendizagem
eram ligados, ou seja, para se ter aprendizagem era necessário que houvesse ensino,
47
daí a crença de que a aprendizagem era centrada no professor. Tal processo
caracteriza a pedagogia, isto é, educação centrada no professor, onde este assume
toda a responsabilidade sobre o que será aprendido, como e quando vai acontecer. O
autor critica esse modelo, principalmente quando o aprendiz é adulto, pois este, em
geral, é independente e possui responsabilidade pelos próprios atos, destacando a
andragogia como uma alternativa à pedagogia.
A andragogia entendida inicialmente como a ciência que ajuda os adultos a
aprender é atualmente, vista enquanto educação cujo centro é o aprendiz,
independente da idade. O quadro 2 mostra as principais diferenças entre andragogia
e pedagogia, levantadas pelo autor.
Pedagogia
(aprendizagem centrada no professor)
Andragogia
(aprendizagem centrada no aprendiz)
Os aprendizes são dependentes.
Os aprendizes são independentes e
autodirecionados.
Os aprendizes são motivados de forma
extrínseca (recompensas, competição etc.).
Os aprendizes são motivados de forma
intrínseca (satisfação gerada pelo
aprendizado).
A aprendizagem é caracterizada por técnicas
de transmissão de conhecimento (aulas,
leituras designadas).
A aprendizagem é caracterizada por projetos
inquisitivos, experimentação, estudos
independentes.
O ambiente de aprendizagem é formal e
caracterizado pela competitividade e por
julgamentos de valor.
O ambiente de aprendizagem é mais informal
e caracterizado pela eqüidade, respeito
mútuo e cooperação.
O planejamento e avaliação são conduzidos
pelo professor.
A aprendizagem deve ser baseada em
experiências.
A avaliação é realizada basicamente por
meio de métodos externos (notas, testes e
provas).
As pessoas são centradas no desempenho
em seus processos de aprendizagem.
Quadro 2: Diferenças entre pedagogia e andragogia
(Fonte: DEAQUINO, 2007, p. 12)
DeAquino (2007), em detrimento à oposição entre pedagogia e andragogia,
propõe o contínuo pedagógico-andragógico de aprendizagem, isto é, pode-se
mesclar o ensino ora por uma abordagem pedagógica, ora por uma abordagem
andragógica, dependendo da postura do aprendiz, questionando a aplicação da
andragogia somente com os adultos, quando afirma que:
não é correto presumir que todos os adultos terão um melhor
desempenho em termos de aprendizagem em um ambiente centrado
no aprendiz, porque muitos deles não estarão dispostos nem serão
capazes de assumir pelo menos parte da responsabilidade pelo
aprendizado. [...] a desmistificação de que os adultos acumulam uma
48
miríade de ricas experiências ao longo de sua vida e acabam
utilizando-a como recursos para a aprendizagem. [...] Um terceiro mito
derrubado é que todos os adultos têm uma motivação interna,
intrínseca, para aprender (DEAQUINO, 2007, p. 14).
DeAquino (2007), ao defender o contínuo pedagógico-andragógico afirma
que ele pode ser aplicado em qualquer situação de aprendizagem,
independentemente da idade e maturidade do aprendiz, pois “encontraremos adultos
que aprendem melhor por meio de um modelo mais direcionado, enquanto algumas
crianças já apresentam a maturidade necessária para aprenderem por meio de um
modelo facilitado de aprendizagem” (Ibid, p. 14). Ainda com base nesse autor,
destacamos no quadro 3 algumas características do contínuo de aprendizagem
pedagógico-andragógico.
Pedagogia Andragogia
Aprendizagem direcionada Aprendizagem facilitada
Aprendizagem não reflexiva Aprendizagem reflexiva
Centrada no professor Centrada no aprendiz
Aluno passivo Aluno ativo
Quadro 3: Características do contínuo pedagógico-andragógico
Por outro lado, Hershkowitz et al. (1994), acreditam que em um trabalho de
formação de professores, é improdutivo, maçante e constrangedor, ensiná-los da
mesma maneira como eles aprenderam, propondo que se os professores tomarem
conhecimento explicitamente de suas imagens conceitos
13
incorretas e incompletas,
eles terão mais condições de entender o que se passa com seus alunos.
Silva (2005, p. 222), com base em Linard (2000) diz que “a autonomia não é
uma simples qualidade, mas um modo superior de conduta integrada que, para a
maior parte dos indivíduos, não faz parte do seu repertório e, por isso, deve ser
aprendida”.
________________
13
A noção de imagem conceito é entendida como um conjunto de imagens mentais que uma pessoa
tem de um dado conceito. A imagem conceito de uma pessoa pode ser completa, parcial ou incorreta.
Uma imagem conceito parcial não contém todos os aspectos abrangidos na definição do conceito. Uma
imagem conceito incorreta contém pontos que não procedem (Hershkowitz et al., 1994).
49
Esperamos que a formação de professores abordada nesse trabalho possa
contribuir para resgatar e/ou desenvolver a autonomia dos professores em formação
continuada. Neste sentido, tomamos de hipótese que os professores avançarão no
desenvolvimento da sua autonomia quando detectarmos que eles situaram-se na
extremidade da andragogia do contínuo pedagógico-andragógico e ao
demonstrarem avanços nos critérios sugeridos por Gardner (1993 apud
GRZEGORCZYK e STYLIANOU, 2006), que são: habilidade de usar idéias em
contextos apropriados, aplicar idéias às situações novas e explicar e estender idéias
encontrando novos exemplos.
Na elaboração das atividades da oficina baseada na TSD pretendemos
possibilitar aos professores em formação continuada, a construção e ampliação de
seus conhecimentos a respeito de definição, teoremas e demonstrações, em especial,
a mediatriz de um segmento, estudada sob o viés de construções geométricas.
De acordo com DeAquino (2007), pretendemos que essa formação privilegie
uma aprendizagem reflexiva, bem como que seus conceitos imagens sejam
explicitados, a fim de desenvolver sua autonomia. Nesse sentido, pautamos as
atividades na extremidade do contínuo pedagógico-andragógico, na andragogia.
Não esquecendo que, segundo Shulman (2005) e Ponte (2001), uma formação de
professores deve contemplar aspectos que destaquem a aprendizagem de conteúdos
matemáticos por parte dos professores participantes.
Acreditamos também que o conhecimento desse contínuo pedagógico-
andragógico contribuiu na postura do formador, que pôde propor uma transição
adequada de uma aprendizagem direcionada para uma aprendizagem facilitada, isto
é, uma aprendizagem reflexiva, propiciando ao professor participante desenvolver sua
autonomia, em muitos momentos.
Desta forma, o formador considerará a diversidade dos professores
participantes, buscando conhecer cada um, acreditando na capacidade de
aprendizagem deles e procurará contextualizar a aprendizagem quer seja do ponto de
vista pessoal quanto do profissional (sala de aula).
No próximo capítulo, faremos um breve estudo histórico-epistemológico dos
temas abordados nesse trabalho: a mediatriz no contexto da Geometria, a
demonstração e as construções geométricas.
50
CAPÍTULO 2
BREVE ESTUDO HISTÓRICO-EPISTEMOLÓGICO
No presente capítulo, destacaremos aspectos históricos e/ou epistemológicos
no que concerne aos temas: a mediatriz no contexto da Geometria, demonstração e
construções geométricas. Dessa forma, embasamos melhor nossas escolhas, bem
como a fundamentação das atividades e a clareza no que diz respeito aos objetos que
estudamos.
2.1 A MEDIATRIZ NO CONTEXTO DA GEOMETRIA
Apesar de nenhum dado nos permitir estimar quantos séculos se passaram
para se elevar a Geometria ao “status” de ciência, muitos escritores concordam que
foi no Egito antigo, no vale do rio Nilo, que a Geometria passou a ser tratada como
ciência. Assim, temos na agrimensura, prática do antigo Egito, os primórdios da
Geometria, que significa medida da terra, como ciência. Acreditamos que a Geometria
científica nasceu de necessidades práticas. Vejamos o que disse o historiador
Heródoto, do século V a. C.:
Eles diziam que este rei [Sesóstris] dividia a terra entre os egípcios de
modo a dar a cada um deles um lote quadrado de igual tamanho e
impondo-lhes o pagamento de um tributo anual. Mas qualquer homem
despojado pelo rio de uma parte de sua terra teria de ir a Sesóstris e
notificar-lhe o ocorrido. Ele então mandava homens seus observarem
e medirem quanto a terra se tornara menor, para que o proprietário
pudesse pagar sobre o que restara, proporcionalmente ao tributo total.
Dessa maneira, parece-me que a geometria teve origem, sendo mais
tarde levada até a Hélade (apud Eves, 2001, p. 3).
Porém, tudo indica que foram os gregos que transformaram a Geometria em
uma matéria diferente de um conjunto de conclusões empíricas, pois insistiam que os
fatos geométricos deveriam ser estabelecidos não por procedimentos empíricos, mas
por raciocínios dedutivos.
51
Segundo o Sumário Eudemiano
14
, a Geometria grega parece ter começado
essencialmente com o trabalho de Tales de Mileto, um digno fundador da Geometria
demonstrativa. É a ele que estão associadas as primeiras idéias da utilização de
métodos dedutivos em Geometria. Pitágoras é o segundo geômetra grego importante
mencionado nesse Sumário, considerado como sistematizador da Geometria iniciada
por Tales. Entretanto, foi Euclides (300 a. C.) quem organizou e produziu uma obra
memorável – Os Elementos – uma cadeia dedutiva única de 465 proposições.
Já para Boyer (1996), Tales foi o primeiro a que se deve descobertas
matemáticas específicas, apesar de que, um milênio antes, muitas teorias já eram
conhecidas pelos babilônios. Tales teria dado as primeiras contribuições significativas
para o desenvolvimento da Geometria. Com ele, nascia a abstração geométrica e a
busca por comprovar fatos que só eram tidos, como verdadeiros, empiricamente.
Mediante a importância dessa parte da Geometria, já evidenciada nos
contextos históricos, consideramos necessário apontar como alguns autores de livros
de matemática tratam esse assunto. Destacaremos como Barbosa (1985), Dolce e
Pompeo (2001), Wagner (1993), e Rezende e Queiroz (2000), definem e apresentam
o objeto geométrico mediatriz de um segmento.
Barbosa (1985) apresenta a definição de mediatriz após demonstrar a
proposição: Todo triângulo está inscrito em um círculo e enuncia que: Três pontos não
colineares determinam um círculo
15
. Destacamos que o argumento fundamental
nessa demonstração consiste no leitor observar que todos os pontos da reta que
passa pelo ponto médio de um segmento e é perpendicular a ele, eqüidista das
extremidades do segmento. E apresenta a seguinte definição: “Chamamos mediatriz
de um dado segmento à reta perpendicular ao segmento passando pelo seu ponto
médio” (BARBOSA, 1985, p. 134), e em seguida enuncia o seguinte corolário: As
mediatrizes dos lados de um triângulo encontram-se em um mesmo ponto.
________________
14
Esse sumário consiste nas páginas de abertura do Comentário sobre Euclides, Livro I, de Proclo e é
um breve resumo do desenvolvimento da geometria grega desde seus primeiros tempos até Euclides.
Embora Proclo tenha vivido no século V d.C., mais de um milênio depois do início da matemática
grega, ele ainda teve acesso a muitos trabalhos históricos e críticos que de então para cá se perderam,
salvo alguns fragmentos e alusões preservados por ele próprio e outros. Dentre esses trabalhos
perdidos está um resumo de uma história aparentemente completa da geometria grega, já
desaparecida à época de Proclo, cobrindo o período anterior a 335 a.C. e escrita por Eudemo, um
discípulo de Aristóteles. O nome Sumário Eudemiano se deve a esse trabalho anterior. (EVES, 2004, p.
97).
15
Barbosa (1985) define círculo: sendo A um ponto do plano e r um número real positivo. O Círculo de
centro A e raio r é o conjunto constituído por todos os pontos B do plano, tais AB = r.
52
Dolce e Pompeo (2001), quando tratam da perpendicularidade, definem
mediatriz de um segmento como a reta perpendicular ao segmento que passa pelo
seu ponto médio apresentando a figura 3.
Figura 3: Mediatriz do segmento AB
Os autores apresentam uma propriedade relativa aos pontos da mediatriz: todo
ponto da mediatriz de um segmento é eqüidistante das extremidades do segmento, e
sugerem a demonstração utilizando o caso LAL (lado, ângulo, lado) de congruência
de triângulos. E ainda utilizam o ponto de intersecção das mediatrizes dos lados de
um triângulo para definir o circuncentro, destacando em uma nota que este ponto é o
centro da circunferência circunscrita ao triângulo.
Rezende e Queiroz (2000) definem mediatriz de um segmento, como a reta
perpendicular ao segmento que contém o seu ponto médio. Ressaltamos que essas
autoras destacam a unicidade da mediatriz de um segmento, enunciando e
demonstrando o teorema: a mediatriz de um segmento é o conjunto dos pontos que
eqüidistam das extremidades do segmento. Quando tratam de construções
geométricas elementares, as autoras apresentam a seguinte construção:
Para traçarmos a mediatriz do segmento AB, isto é, para traçarmos a
reta perpendicular a
A
B pelo seu ponto médio, traçamos duas
circunferências (na prática, traçamos apenas dois arcos convenientes
contidos nelas, respectivamente) C(A, r) e C(B, r), com r = AB e
arbitrários, as quais, pelo Teorema das Duas circunferências,
encontram-se em dois pontos, que chamamos P e Q.
(REZENDE e QUEIROZ, 2000, p. 124)
Para justificarem matematicamente a construção, as autoras se apóiam no fato
do quadrilátero AQBP ser um losango e sendo assim, suas diagonais
PQeAB
são
53
perpendiculares e encontram-se em seus pontos médios. Logo a reta m = PQ é a
mediatriz de
A
B . Essas autoras, ainda observam que na construção da mediatriz de
A
B basta tomar arbitrariamente
2
AB
r >
.
Já para Wagner (1993), a mediatriz de um segmento
A
B é a reta perpendicular
a
A
B que contém o seu ponto médio, sugerindo a construção no mesmo molde que
Rezende e Queiroz (2000), ou seja, por meio do processo do losango, relatando
também que é importante lembrar a seguinte propriedade: “a mediatriz de um
segmento é o conjunto de todos os pontos que eqüidistam dos extremos do
segmento” (Ibid, p. 4).
Percebemos que os autores Barbosa (1985), Wagner (1993), Dolce e Pompeo
(2001) e Rezende e Queiroz (2000) definem, a priori, a mediatriz de um segmento
como a reta que passa pelo ponto médio desse segmento e é perpendicular a ele.
Notamos que Barbosa (1985) usa, de maneira implícita, a propriedade: um ponto
pertence a mediatriz de um segmento se, e somente se, é eqüidistante das
extremidades do segmento, deixando a cargo do leitor as justificativas matemáticas,
já Dolce e Pompeo (2001), enunciam e demonstram a propriedade : Se um ponto
pertence a mediatriz de um segmento, então ele eqüidista das extremidades do
segmento, não deixando indicação alguma sobre a veracidade do recíproco desse
teorema.
Por outro lado, Wagner (1993) faz uma apresentação sucinta e lembra a
propriedade: a mediatriz de um segmento é o conjunto de todos os pontos que
eqüidistam dos extremos do segmento, sem apresentar qualquer discussão para a
resolução de futuros problemas de construção geométrica e nem destacar como
sendo uma outra forma equivalente de definir mediatriz de um segmento. Já Rezende
e Queiroz (2000), apresentaram a definição de mediatriz sob “pontos de vista”
diferentes, apesar de não deixarem explicito quando demonstram o teorema: a
mediatriz de um segmento é o conjunto dos pontos que eqüidistam das extremidades
do segmento.
Com relação à construção com régua e compasso, tanto Wagner (1993), como
Rezende e Queiroz (2000) apresentam a construção da mediatriz, porém justificaram
matematicamente, pelo losango, isto é, as diagonais de um losango são
54
perpendiculares e interceptam-se em seus pontos médios, a sugestão de encontrar
dois pontos eqüidistantes quaisquer para construir a mediatriz de um segmento fica
implícita.
Sendo a justificativa pelo losango um caso particular de encontrar dois pontos
eqüidistantes, porque essa solução é a que aparece como a primeira para esses
autores? Uma vez que esses livros são recomendados para alunos de graduação em
Matemática, porque não apresentar o método mais geral? Será que um trabalho no
qual se desenvolve outro tipo de visão seria recomendado em um grupo de
professores em formação continuada?
2.2 A DEMONSTRAÇÃO
Segundo Putnam (1988), os não-matemáticos vêem a matemática como uma
disciplina não-problemática, pois a entendem como um conjunto de métodos seguros
e infalíveis. Dessa forma, restringir o conceito de demonstração ao campo da
matemática garantiria uma resposta objetiva à pergunta: o que é uma demonstração?
Em nossa busca por uma resposta, nos deparamos com a subjetividade do
tema demonstração mesmo no contexto da própria matemática, e encontramos
pesquisas em Educação Matemática que nos conduziram a uma noção de
demonstração para o trabalho que desenvolvemos.
Com base em (SILVA, 2002; DOMINGUES, 2002; BICUDO, 2002; GARNICA,
2002), caracterizamos a demonstração como a essência do fazer matemática
funcionando como uma “marca” que a distingue de outras ciências. Para Davis e
Hersh (1985, p. 178), “a matemática fica caracterizada, de maneira única, por algo
conhecido como demonstração”. Já para MacLane (1981), as afirmações
matemáticas podem ser checadas e entendidas sem que se precise recorrer a
exemplos ou significados reais dos axiomas; é esse caráter formal da matemática que
a distingue de todas as outras ciências.
Davis e Hersh (1985), ao escreverem um diálogo fictício entre um professor
(matemático puro) e um aluno – em que este pergunta ao professor: o que é uma
demonstração?, e o professor responde com um exemplo, dizendo que demonstrar é
tudo o que ele tem feito nas aulas de Matemática. Porém, o aluno continua querendo
saber: o que é uma demonstração? O diálogo segue, e após a explicação pelo
55
professor do que é uma demonstração, o aluno conclui que professor algum nunca
fez uma demonstração para ele. O matemático puro justifica, dizendo que se mostra
apenas o que é possível e isso chega. O aluno rebate afirmando: “portanto, os
matemáticos não fazem demonstrações.” Isso nos levou a considerar a subjetividade
que existe acerca da demonstração em matemática e nos motivou a buscar
referências sobre o assunto, para que, só assim, pudéssemos fazer nossas
considerações.
Com relação ao processo histórico, foi a busca pela validação de proposições
que levou ao método axiomático-dedutivo, no qual se apóia a demonstração,
diferentemente do aplicado nas ciências empíricas. Com relação a métodos gerais de
comprovar a verdade matemática, alguns historiadores indicam Tales como o primeiro
a usá-los. Acredita-se, também, que os pitagóricos são os responsáveis pela criação
da matemática pura, daí se pensar que, em algum momento, eles tenham dado um
caráter dedutivo à matemática.
Porém, das obras que chegaram até os dias atuais, são “Os Elementos”, de
Euclides (300 a.C.) que propõem uma estrutura composta de noções básicas,
postulados, definições, proposições e teoremas. Segundo Boyer (1996), esta obra
apresenta uma exposição em ordem lógica dos assuntos básicos da matemática
elementar, constituindo o primeiro grande testemunho do poder do método dedutivo
na matemática. Esta obra sofreu muitas análises e críticas, sendo apontadas algumas
falhas. Porém, a demonstração ainda tinha um aspecto material, é o que relata
Domingues (2002):
No final do século XIX, a demonstração em matemática tinha um
caráter grandemente material. A demonstração de uma proposição era
uma atividade intelectual que visava a nos convencer e a convencer
os outros, racional, mas também psicologicamente, da veracidade
dessa proposição (Ibid, p. 62).
Todavia, com o desenvolvimento da própria matemática, a intuição e/ou
raciocínios heurístico-geométricos não conseguiram explicar alguns resultados
matemáticos e, sendo assim, essa idéia de demonstração não resistiu, levando a
conceito de demonstração mais formal. Este conceito é apresentado por Domingues
(2002) com base em Tarski (1969) como sendo:
56
uma construção de uma seqüência de proposições tais que:(i) a
primeira proposição é um axioma; (ii) cada uma das outras ou é um
axioma ou é dedutível diretamente das que a precedem na seqüência;
(iii) a última proposição é aquilo que se pretende demonstrar (Ibid, p.
62).
Vale destacar que, no final do século XIX, Os Elementos de Euclides foi revisto
por David Hilbert (1852 – 1943), que, ao publicar sua obra “Fundamentos da
Geometria”, em 1899, não definiu conceitos iniciais como fez Euclides, desvinculando
a Geometria de conceitos físicos. Ele aceitou três conceitos primitivos – ponto, reta e
plano – e definiu relações entre esses objetos por meio de axiomas, sem usar
nenhuma intuição geométrica; nesse contexto as demonstrações tornaram-se puras.
Por outro lado, o processo de construção de uma demonstração deve ser considerado
e um dos autores que contribuiu nesse sentido foi Lakatos (1978), que ao propor um
cenário da lógica da descoberta matemática, retrata um diálogo imaginário entre um
professor e seus alunos. O tema deste diálogo é a demonstração da relação de Euler
para poliedros: V – A + F = 2, onde V representa o número de vértices, A o número de
arestas e F o número de faces do poliedro. Nesse diálogo, o professor é interpelado
pelos alunos com contra-exemplos, o impacto destes contra-exemplos, leva a uma
modificação do enunciado do teorema e a ajustes na demonstração, o que gera novos
contra-exemplos e novos ajustes. Este desenvolvimento, apresentado por ele, é dado
como modelo do desenvolvimento da matemática em geral. Com argumentos
parecidos, Steen (1979) afirma que:
O fato de certos métodos levarem a contradições, quando usados
indiscriminadamente, não significa que devam ser abandonados; tal
situação apenas aponta para a necessidade de determinar as áreas
nas quais esses métodos se mostrem seguros (apud Domingues,
2002, p. 66).
Também podemos citar (Truesdell, III, 1919 – 2000):
Os erros cometidos por um grande matemático são de dois tipos:
primeiramente, enganos triviais, que qualquer um pode corrigir; em
segundo lugar, falhas titânicas, refletindo a escala do combate travado
pelo grande matemático. Falhas desse último tipo são,
freqüentemente, tão importantes como o sucesso, pois dão lugar a
grandes descobertas por outros matemáticos (TRUESDELL apud,
BICUDO, 2002, p. 80).
57
Em nosso entendimento, Lakatos (1978) criticou o método dedutivista imposto
pela matemática pura e passou a valorizar o estilo heurístico para se construir a
demonstração de um teorema. Segundo este autor, o estilo dedutivista é aquele que:
[...] começa com uma lista laboriosamente feita de axiomas, lemas
e/ou definições. Os axiomas e definições freqüentemente parecem
artificiais e mistificadoramente complicados. Nunca se fica sabendo
como essas complicações surgiram. A lista de axiomas e definições é
seguida de teoremas cuidadosamente redigidos. Estes, por sua vez,
estão carregados de pesadas condições; parece impossível que
alguém jamais os tivesse suposto. O teorema é seguido da prova
(LAKATOS, 1978, p. 185).
Para este autor, o estudante de matemática é obrigado a assistir a esse ritual
sem fazer perguntas sobre o que está ocorrendo. Lembrando também que muito do
que se construiu em matemática: definições, teoremas, provas, passaram por um
processo nada dedutivista. Dessa forma, Lakatos (1978) critica o estilo dedutivista,
que não mostra a evolução de um conceito, e sim os apresenta de forma pronta e
acabada. Propõe, então, o estilo heurístico, pois entende que as “verdades”
matemáticas não são construídas de forma autoritária e sim por um caminho que
mostra contradições, refutações e descobertas. Para ele:
o estilo dedutivista rompe as definições geradas pela prova dos
antepassados, apresenta-as no vazio, de modo artificial e autoritário.
Ele oculta os contra-exemplos globais que levaram ao seu
descobrimento. Pelo contrário, o estilo heurístico acentua esses
fatores. Dá ênfase à situação problemática: acentua a “lógica” que deu
nascimento ao novo conceito (LAKATOS, 1978, p. 188).
Este autor, ainda salienta a importância das hipóteses na construção de
provas, pois, caso contrário, grandes refutações podem aparecer. Percebemos em
sua obra que as demonstrações eram concebidas com o viés do estilo heurístico, o
que levava à construção de verdades locais e possibilitava a descoberta de novos
teoremas, ou seja, uma demonstração que dava margens à inserção de contra-
exemplos, podendo induzir a descobertas.
Já Silva (2002), destaca três aspectos da demonstração em matemática:
Retórico: destinado a convencer às teses.
Lógico-epistemológico: como um encadeamento lógico conduzindo à
verdade e ao conhecimento.
Heurístico: catalisador de descoberta matemática.
58
O aspecto heurístico das demonstrações não é, a rigor, um aspecto
das demonstrações, se entendermos por isso algo intrínseco a elas.
Ao contrário, uma demonstração só pode desempenhar esse papel
com a explícita participação do sujeito. Uma demonstração só
desempenha sua função heurística se move o sujeito a reagir a ela,
aceitando seu desafio (SILVA, 2002 p. 74).
Ao estudar a gênese da demonstração, Arsac (1987) explica a transformação
inicial da matemática, justificando o aparecimento da demonstração. Afirma que foi
levado a estudar o assunto em face da constatação de que tudo, em matemática,
provém da resolução de problemas, destacando que “é para resolver problemas, que
foram criados os conceitos e os métodos, e o encadeamento de sucessivos
problemas explica a evolução da matemática” (Ibid, p. 267).
Segundo esse autor, a demonstração interpretada como uma seqüência de
enunciados organizados, de acordo com regras determinadas, surgiu na Grécia no
século V a.C. com o problema da irracionalidade e incomensurabilidade na escola
Pitagórica. Ele destaca, ainda, dois pontos de vista para o surgimento da
demonstração, o externalista, em que a demonstração surge de fora para dentro da
matemática, como conseqüência do desenvolvimento das cidades, da necessidade de
regras precisas e convincentes na política; e o internalista, em que a demonstração
surge dentro da própria matemática na tentativa de resolver problemas como o da
irracionalidade.
Buscando esclarecer o que é uma demonstração, Bicudo (2002, p. 83)
apresenta uma definição rigorosa:
Seja, agora, F um sistema formal
16
em que todas as regras sejam
finitas. Então, uma DEMONSTRAÇÃO em F é uma seqüência finita de
fórmulas, em que cada uma seja ou um axioma, ou seja, conclusão de
uma regra cujas hipóteses precedam essa fórmula na seqüência dada.
Se A for a última fórmula em uma demonstração P, diremos que P é
uma DEMONSTRAÇÃO de A. Uma fórmula A de F será um teorema
de F se existir uma demonstração de A.
Com respeito ao rigor MacLane (1981), nos revela que a maioria das
demonstrações matemáticas, apresentadas oralmente ou por escrito, são
simplesmente esquemas que fornecem detalhes suficientes para se construir uma
demonstração absolutamente rigorosa. Por outro lado, este pesquisador afirma,
________________
16
Um sistema formal é a parte sintática de um sistema axiomático, ou seja, linguagem, símbolos,
fórmulas, axiomas, regras de inferência, hipóteses e conclusão.
59
ainda, que muitos matemáticos acreditam que a matemática não precisa do rigor
absoluto e que a efetiva compreensão por meio do rigor não é alcançada.
A esse respeito, Davis e Hersh (1985) destacam que:
As linguagens formais foram introduzidas pela primeira vez por Peano
e Frege no fim do século dezenove, com o intuito de tornar as
demonstrações matemáticas mais rigorosas, isto é, de aumentar a
certeza da conclusão de um raciocínio matemático. No entanto, este
objetivo não podia ser atingido enquanto o raciocínio fosse destinado a
um leitor humano (p. 167-168).
Segundo os autores, os textos matemáticos do tipo usual nunca são
completamente formalizados. São escritos em língua natural, pois são destinados a
serem lidos por seres humanos. No entanto, acredita-se que qualquer texto
matemático pode ser formalizado. E relatam que:
[...] uma aula típica de matemática avançada, especialmente uma aula
dada por um professor com interesses “puros”, consiste inteiramente
em definição, teorema, demonstração, definição, teorema,
demonstração, [...] numa concatenação solene e sem interrupções.
Por que isso? Se, como afirmado, uma demonstração é confirmação e
certificação, então poder-se-ia pensar que, uma vez que uma
demonstração tivesse sido aceita por um grupo competente de
estudiosos, o restante deles acreditaria em sua palavra, e prosseguiria
suas atividades. Por que os matemáticos e seus alunos acham que
vale a pena demonstrar repetidamente o teorema de Pitágoras?
(DAVIS e HERSH, 1985, p. 182).
Percebemos, no questionamento acima, que a função da demonstração não é
única, ou seja, não serve apenas para verificar a validade de um teorema, mas,
sobretudo, para explicar, descobrir novas propriedades, como nos sugere De Villiers
(2001; 2002).
2.3 AS CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS
As construções geométricas já se faziam presentes desde a época de Euclides,
nos três primeiros postulados de Os Elementos, ele enuncia as três “construções”
permitidas em Geometria:
(1) Traçar uma reta por dois pontos;
(2) Prolongar uma reta limitada continuadamente segundo uma reta;
(3) Descrever um círculo com qualquer centro e qualquer distância.
60
Porém, a palavra “compasso” e a expressão “construção com régua e
compasso” só passaram a ser utilizadas a posteriori, é o que nos relata Eves (2001, p.
29):
Ressaltamos que Euclides não usava a palavra “compasso” nos
Elementos, como não descreve como as construções devem ser
feitas. A terminologia “construções com régua e compasso” (nota:
régua sem escalas) tem sido atribuída a Platão (C. 390 a. C.).
Por outro lado, os gregos, apesar de terem resolvido muitos problemas de
construções geométricas – construções com régua e compasso –, tinham ciência da
impossibilidade de solução com essas ferramentas dos problemas clássicos:
(1) Inscrever um polígono regular qualquer numa circunferência;
(2) Trisseccionar qualquer ângulo dado
17
;
(3) Determinar o lado de um cubo cujo volume fosse o dobro do volume de um
cubo dado;
(4) Construir um quadrado de área igual à de um círculo dado.
A busca da solução para esses problemas, inclusive por outros meios que não
fossem por régua e compasso, contribuiu para muitas descobertas em Geometria e
outras áreas da matemática. Esta faceta é revelada em Carvalho (2004):
É indubitável que, na História da Matemática, alguns problemas têm
significação especial: agindo como “catalisadores” eles influenciam
muito o desenvolvimento da ciência. Tais problemas atraem devido à
simplicidade e lucidez de seus enunciados, fascinando muitos
especialistas que trabalham na área relevante da Matemática. Como
resultados, vários novos métodos e mesmo novas teorias são
elaboradas e novas perguntas, profundas e abrangentes, são
formuladas (CARVALHO, 2004, p. 1).
Na resolução de problemas de construções geométricas, segundo Carvalho
(2004), os gregos antigos, exatamente como os matemáticos de hoje, usavam todas
as ferramentas disponíveis ou criavam novas. Na tentativa de achar soluções para os
problemas clássicos, surgiram várias curvas e métodos que enriqueceram a
Matemática, porém, sempre que fosse possível construir apenas com régua e
compasso, métodos avançados não deveriam ser usados. Esse pesquisador relata
________________
17
Existem ângulos, a exemplo o ângulo de 90º e 180º, que podem ser divididos em três partes
congruentes utilizando apenas a régua e o compasso.
61
que uma figura construída com precisão auxilia na descoberta de propriedades e
relações entre os entes geométricos.
Não se pode negar a importância da Geometria e, com ela, as construções
geométricas que, desde a Grécia antiga, são apresentadas em conjunto; é o que
relata Putnoki (1988, p. 14): “quando Euclides elaborou sua Geometria, não era sua
proposta a execução dos traçados com régua e compasso, mas o estudo da
possibilidade de construir figuras com aqueles instrumentos”.
Já Zuin (2001) destaca que, em “Os Elementos” de Euclides, a teoria da
Geometria vinha acompanhada de construções geométricas e os livros didáticos de
matemática se fundamentam nessa obra. Sendo assim, as construções geométricas
deveriam estar presentes nos livros didáticos até os dias atuais. Inferindo que tal fato
não vem ocorrendo.
No próximo capítulo, faremos algumas considerações a respeito do ensino e da
aprendizagem dos tópicos: Geometria, demonstrações e construções geométricas, e
nesse contexto, trataremos das definições em matemática e das recomendações
fornecidas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais.
62
CAPÍTULO 3
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEM
Neste capítulo faremos considerações a respeito do ensino e aprendizagem de:
Geometria, definição, demonstração e construções geométricas, além das sugestões
dadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática.
3.1 GEOMETRIA
A Geometria constitui uma parte importante da matemática, ela estuda o
espaço, as formas nele existentes e suas relações. Sua importância pode ser
percebida tanto do ponto de vista prático, quanto na organização do pensamento
lógico dedutivo.
Pavanello (1993) discorre sobre razões históricas que justificam o não ensino
de Geometria no Brasil, afirmando que, com a reforma de 1951 (proposta pelo
ministro Simões Filho), o ensino de Geometria, nas primeiras séries do curso ginasial
era essencialmente prático e intuitivo. O método dedutivo deveria ser introduzido nas
séries finais, aos poucos, à medida que o aluno fosse percebendo ser necessário
justificar, provar e demonstrar certas afirmações. Recomendava-se que se apelasse
mais para a intuição e que não se exagerasse no rigor.
De acordo com a autora, a Geometria, na abordagem tradicional, já era um
problema enfrentado pelos professores (pouco conhecimento) e com o Movimento da
Matemática Moderna (o seu ensino via transformações geométricas) esse problema
só foi ampliado. Por não dominar o enfoque dado pela Geometria das transformações,
muitos professores deixaram de ensinar esse conteúdo sobre qualquer enfoque.
A pesquisadora ainda acrescenta que a Lei nº. 5692/71de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, ao permitir que cada escola montasse seu programa de
acordo com a necessidade da clientela, só veio a contribuir para esse abandono. O
problema ficou ainda maior quando algumas escolas substituíram a disciplina
63
Desenho Geométrico por Educação Artística, pois os alunos só passaram a ver
Geometria no 2º grau
18
, tornando-se fator de muitas dificuldades. A autora sugere a
retomada do ensino de Geometria quando indica que:
o trabalho com álgebra pode acostumar o indivíduo a operar sem
questionamentos sobre regras pré-estabelecidas, a fazer isto ou
aquilo, sem questionar o que faz. O efetuado com geometria, por sua
vez, pode proporcionar o desenvolvimento de um pensamento crítico e
autônomo.
O fato de que nem todo ensino de geometria produz os resultados
acima mencionados não justifica o seu abandono. Implica, isto sim, a
necessidade de investimentos em pesquisas sobre metodologias mais
apropriadas para a abordagem desse conteúdo e em ações
destinadas a proporcionar aos professores condições para a melhoria
da qualidade desse ensino (PAVANELLO, 1993, p. 16).
Para Lorenzato (1995) são inúmeras as causas do abandono do ensino de
Geometria e ressalta duas:
A primeira é que muitos professores não detêm os conhecimentos
geométricos necessários para a realização de suas práticas
pedagógicas. [...] A segunda causa da omissão geométrica deve-se à
exagerada importância que, entre nós, representa o livro didático, quer
devido à má formação de nossos professores, quer devido à estafante
jornada de trabalho a que estão submetidos (Ibid, p. 3-4).
Este autor, ao discorrer sobre a não formação de professores em conteúdos
geométricos destaca: “Ora, como ninguém pode ensinar bem aquilo que não conhece,
está aí mais uma razão para o atual esquecimento geométrico” (Ibid, p. 4). E atribui
também – corroborando com Pavanello (1993) – ao Movimento da Matemática
Moderna uma parcela de contribuição, ao caos do ensino da Geometria, ao escrever
que:
[...] antes de sua chegada ao Brasil, nosso ensino geométrico era
marcadamente lógico-dedutivo, com demonstrações, e nossos alunos
detestavam. A proposta da Matemática Moderna de algebrizar a
Geometria não vingou no Brasil, mas conseguiu eliminar o modelo
anterior, criando assim uma lacuna nas nossas práticas pedagógicas,
que perdura até hoje (Ibid, p. 4).
________________
18
Atualmente Ensino Médio.
64
Da mesma forma, Kalef (1994, p. 20) destaca:
[...] o chamado movimento da “Matemática Moderna” levou os
matemáticos a desprezarem a abrangência conceitual e filosófica da
Geometria Euclidiana, reduzindo-a a um exemplo de aplicação da
Teoria dos Conjuntos e da Álgebra Vetorial. Desta forma, a Geometria
Euclidiana foi praticamente excluída dos programas escolares e
também dos cursos de formação de professores de primeiro e
segundo graus, com conseqüências que se fazem sentir até hoje.
Já Barrantes e Blanco (2004, p. 37), ao constatarem que o Movimento da
Matemática Moderna fez com que a Geometria passasse a ser uma matéria escolar
de segundo plano, destacam:
Essa circunstância deu origem a que os futuros professores
chegassem aos centros de formação com conhecimentos quase nulos
da Geometria e quase sem referências sobre o seu ensino-
aprendizagem. Além disso, nesses centros, a formação que
receberam estava mais relacionada com outros temas, como o de
número, do que com a Geometria e o seu ensino-aprendizagem.
Ainda a esse respeito, Lorenzato (1995, p. 4) discorre: “Presentemente, está
estabelecido um círculo vicioso: a geração que não estudou Geometria não sabe
como ensiná-la”. Para reverter o quadro desse abandono do ensino de Geometria,
acredita serem necessárias mudanças nos currículos de formação inicial do professor
de Matemática, bem como investir no aperfeiçoamento dos professores que estão em
exercício, além de lançar novas publicações tanto para alunos quanto para
professores.
Ao realizar uma pesquisa sobre o ensino de Geometria no Ensino Básico, no
estado de São Paulo, Perez (1995, p. 57) relata que os professores: “Afirmaram
também que para o Ensino de Geometria, lhes faltava conteúdos e metodologia
adequada sobre como desenvolver esse ensino”.
Por outro lado, o uso de desenhos para representar objetos geométricos é um
recurso muito utilizado no ensino e aprendizagem da Geometria. A sua presença
pode ser observada tanto nas aulas como nos livros didáticos. Contudo, certas
representações são sempre realizadas na mesma posição (segmento de reta na
65
horizontal e a sua mediatriz uma reta vertical). Segundo Pais (2001, p. 3-4), “há uma
espécie de tradição, influenciada tanto pelo senso comum, como pelos saberes
escolares de preservação dessa forma particular de representação” e exemplifica com
o caso do retângulo, que isso normalmente aparece representado por uma figura não
quadrada, na qual os lados são sempre paralelos às bordas do papel e a base
horizontal ligeiramente maior que sua altura.
Entendemos que, uma possível saída para o ensino de Geometria seria a
compreensão de representações. Para Duval (2003), o acesso aos objetos
matemáticos, nesse caso os geométricos, só é possível via algum registro de
representação semiótica deste objeto, mais ainda que a apreensão conceitual desse
objeto só é possível com a manipulação de, ao menos, dois registros de
representação. Este é um dos focos abordados nesta pesquisa, ao trabalhar com
objetos geométricos – via construções geométricas –, justificativas e demonstrações
com os professores em formação continuada.
Associado a essa temática, uma abordagem com materiais manipulativos é
sugerida como a saída para o aprendizado com mais significado. Porém, Pais (2001)
chama nossa atenção para o cuidado de não incorrer no uso do recurso como fim do
processo, acarretando falta de reflexão e uma aprendizagem sem significado para o
aluno.
Nesse contexto, Almouloud (2007), de acordo com a Teoria das Situações
Didáticas, afirma ser necessário a institucionalização do conteúdo em questão, isto é,
após as fases de ação, formulação e validação, em que o registro figural é
fundamental, é preciso que o professor fixe convencionalmente e explicitamente o
estatuto cognitivo do saber. Este pesquisador defende que, só após a
institucionalização o saber se torna oficial, e os alunos podem incorporá-lo a seus
esquemas mentais, tornando-o assim disponível para utilização na resolução de
futuros problemas matemáticos.
No que diz respeito à teoria dos registros de representação semiótica,
Almouloud e Manrique (2001), relatam que a coordenação de diferentes registros de
representação (a escrita algébrica, as figuras geométricas, o discurso da língua
natural) deve estar ligada ao tratamento dos conhecimentos, bem como as figuras são
um suporte intuitivo importante na resolução de problemas de Geometria, pois elas
66
possibilitam uma visão maior do que o enunciado, e permitem explorar, antecipar e
conjecturar.
Dessa forma, se faz necessário focar a formação de professores de
Matemática. Pavanello e Andrade (2002), ao observarem as dificuldades que os
licenciandos e/ou recém graduados em matemática apresentam com relação aos
conhecimentos geométricos, deixam a seguinte questão: “Se durante os cursos de
formação os futuros professores apresentam essas dificuldades em relação à
geometria, o que esperar de seu trabalho pedagógico com esse conteúdo?” (Ibid, p.
80).
Essas pesquisadoras revelam ainda que:
Apesar de muitos dos professores entrevistados considerarem
importante o trabalho com esse ramo da matemática nos níveis
fundamental e médio, afirmam não terem condições de realizá-lo por
terem aprendido muito pouco de geometria enquanto alunos, mesmo
durante a licenciatura. Afirmaram que nesta, a abordagem desse
conteúdo, quando realizada, tinha sido deficiente, as aulas se
voltavam preferencialmente para temas mais complexos. Quanto aos
conteúdos que deveriam posteriormente desenvolver em sala de aula,
ou não eram abordados, ou essa abordagem era muito superficial.
[...]
As dificuldades dos professores da escola básica em situações-
problema que envolvem noções geométricas têm sido exaustivamente
observadas em cursos de capacitação ou aperfeiçoamento e
manifestam-se em questões desde as mais simples até as mais
complexas.
[...]
Uma outra crença extremamente arraigada nos meios acadêmicos e
que merece uma boa avaliação é a de que fazer os estudantes
trabalharem temas mais complexos lhes possibilita compreender os
mais elementares. Será que não é exatamente o desconhecimento
desses conceitos elementares que impede ou pelo menos dificulta a
compreensão dos demais? (PAVANELLO e ANDRADE, 2002, p. 80-
82).
Conforme podemos perceber, o problema do ensino de Geometria vem sendo
discutido no seio da comunidade dos educadores matemáticos. Um dos estudos que
se destaca é o de Andrade e Nacarato (2004), realizado com base nos sete primeiros
anais dos Encontros Nacionais de Educação Matemática e que nos revela uma
tendência emergente para o ensino de Geometria, apontando que esse ensino:
[...] vem se pautando em abordagens mais exploratórias, em que os
aspectos experimental e teórico do pensamento geométrico são
considerados, quer na utilização de diferentes mídias, quer em
contextos de aulas mais dialogadas, com produção e negociação de
67
significados, quer na utilização de softwares de geometria dinâmica.
[...] Mas, esses contextos não prescindem da importância do processo
de validação matemática, visto ser significativo o número de trabalhos
que vêm discutindo o papel das provas e argumentações no ensino da
Geometria, além de uma preocupação mais recente com discussões
de aspectos epistemológicos, como visualização e a representação
em Geometria (ANDRADE e NACARATO, 2004, p. 69).
No entanto, estes autores indicam a existência de estudos revelando que a
Geometria ainda está bastante ausente das salas de aula. Neste sentido, acreditamos
que uma das formas de fazer as pesquisas chegarem às salas de aula é desenvolvê-
las com professores em um processo de formação continuada, em que os
participantes se envolvem diretamente, oportunizando a si próprios um
aprimoramento e/ou aquisição de conhecimentos geométricos, sobretudo com ênfase
em demonstrações. Assim, estaremos contribuindo para que as aulas de Geometria
desses professores possam mudar.
3.2 DEFINIÇÃO
Nesse trabalho, caracterizaremos a mediatriz de um segmento por meio da
construção da definição desse objeto. Para Demo (2002, p. 14), definir é colocar
limites, ou seja, quanto mais algo está fechado entre limites, mais claro se torna. E
destaca: “[...] ao definir termos, usamos termos ainda não definidos. Toda definição
inclui regressão ao infinito, razão pela qual nunca é completa, cabendo-lhe constante
revisão”.
Entenderemos a definição de acordo com Sant’Anna (2005, p. 2):
Uma definição deve ser a caracterização de uma espécie, ou seja,
dada uma classe de objetos, uma definição deve, de algum modo,
destacar uma subclasse por meio de características especiais.
O autor exemplifica com o caso do triângulo retângulo, ao destacar que na
classe dos triângulos, há uma espécie que se refere àqueles que admitem um ângulo
interno reto. “A característica especial ‘ter ângulo interno reto’, na classe dos
triângulos, define o que comumente se chama triângulo retângulo” (SANT’ANNA,
2005, p. 2). O autor reforça que, em uma definição destacam-se, ao menos, duas
partes: aquilo que se deseja definir (triângulo retângulo) e expressão que será
efetivamente empregada para definir (triângulo que tem ângulo interno reto).
68
Para o autor, uma definição deve favorecer a essência daquilo que se define e
não deve ser circular, apontando que em matemática é mais usual definir um novo
objeto matemático a partir de outros já conhecidos. Podemos exemplificar com a
definição de triângulo como sendo um polígono de três lados, na qual polígono é um
objeto geométrico definido a priori. Em nossa experiência, notamos que este é um
caso muito comum em matemática, logo, o cuidado de todos os objetos precedentes
estarem bem definidos é fundamental para que não se reporte ao senso comum.
A esse respeito, Pavanello e Andrade (2002), ao sugerirem uma construção
axiomática da Geometria, numa formação inicial de professores, salientam que essa
deve acontecer ligada ao desenvolvimento de oficinas que contemplem um trabalho
de construção de conceitos por meio de atividades variadas, onde se discutam os
recursos didático-metodológicos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem
desses conceitos geométricos. Destacam ainda que:
as atividades desenvolvidas nas oficinas teriam também como objetivo
proporcionar aos futuros professores a oportunidade de discutir o que
é uma definição
19
, levando-os à produção das mesmas, de forma a
não gerar interpretações dúbias. Isso é essencial, porque uma das
grandes dificuldades dos professores – e não só em relação à
geometria – reside exatamente nisso (PAVANELLO e ANDRADE,
2002, p. 83-84).
Maioli (2002, p. 42) também apresenta uma preocupação com definições em
Geometria:
[...] propusemos uma atividade que tem por objetivo inicial, verificar
como os autores dos livros adotados pelos professores participantes
da pesquisa definem quadrilátero. A nossa intenção era provocar uma
discussão sobre o papel da definição
20
de um objeto matemático no
sentido de verificar suas características; como escrever; identificar se
um objeto satisfaz ou não uma determinada definição, e finalmente,
determinarmos o que definiríamos como quadrilátero.
Ainda com relação à importância das definições em matemática, Buffet (2003),
afirma que construir definições é muito importante ao se trabalhar com matemática,
pois tal processo corrobora com a formação do conceito
21
. Propõe que as situações
de construção de definição devam ser consideradas como ponto primordial ao se
________________
19
Grifo nosso.
20
Grifo nosso.
69
trabalhar pela primeira vez com um objeto matemático novo, ou seja, tal situação é
crucial na formação do conceito. Essa pesquisadora também destaca que a fase de
pesquisa (busca) de uma definição é distinta da fase de elaboração (escrita) de uma
definição e que um aspecto fundamental, que deve contemplar toda definição, é a
existência e a unicidade do objeto matemático, isto é, a definição deve identificar um
objeto matemático e apenas esse objeto.
A preocupação com as definições não é tão recente, quando nos deparamos
com o que Benchara Blandford escreveu, em 1908, a respeito da definição em
matemática:
A mim parece-me um método radicalmente corrupto, em geometria
com certeza, se não noutras matérias, apresentar às crianças
definições prontas a usar para serem memorizadas de seguida, depois
de serem explicadas com maior ou menor cuidado. Fazer isto é
certamente deixar fora deliberadamente um dos mais valiosos factores
de disciplina intelectual. Actividade da própria criança, de desenvolver
uma definição operacional, estimulando por questões apropriadas, é
simultaneamente interessante e altamente educativa (apud DE
VILLIERS, 2002, p. 13).
Essa preocupação é constatada também em Lakatos (1978), ao revelar que
definições mal redigidas – recorrência ao senso comum matemático ou não – geram
problemas de consistência em uma demonstração.
Mediante o exposto, optamos em não apresentar definições prontas e
acabadas, na seqüência de atividades que propomos aos professores, em formação
continuada, pelo contrário, decidimos construir a definição de mediatriz de um
segmento de duas maneiras equivalentes, sob “pontos de vista” diferentes.
3.3 DEMONSTRAÇÃO
Alguns pesquisadores têm se preocupado com a demonstração, tanto na
formação de professores quanto com alunos do Ensino Básico. Encontramos nos
trabalhos de Garnica (1995, 1996) indícios do que vem ocorrendo na formação inicial
de professores de Matemática.
21
Segundo Pais (2002), o conceito é algo em permanente estado de devir, ou seja, estamos sempre no
aproximando de sua objetividade, generalidade e universalidade, sem considerá-lo uma entidade
acabada, tal como concebido por uma visão platônica.
70
Garnica (1996), ao analisar depoimentos de professores de Matemática que
atuam em cursos de Licenciatura em Matemática, afirma que a prova rigorosa –
demonstração – é elemento fundamental para a formação de professores, embora
existam duas maneiras distintas de ler tal importância:
[A leitura técnica] debruça-se sobre o viés sintático da demonstração,
descontextualizando-a de outra região que não seja a produção do
conhecimento matemático feito profissionalmente. Partem do
pressuposto de que a função de uma prova é a de meramente validar
o conhecimento.
[A leitura crítica] Nas situações de ensino e de aprendizagem, a prova
rigorosa deve ser integrada por meio de motivações que levantem
abordagens históricas e filosóficas de modo a permitir um
esclarecimento quanto ao modo de criação e divulgação das
concepções que permeiam o fazer matemático [...], é uma das
grandes responsáveis por essa procura consciente do “saber sobre o
que se fala” (GARNICA, 1996, p. 18-19).
A técnica foi associada à produção científica em matemática e a crítica, à
produção em Educação Matemática e, estes campos, apresentam concepções
divergentes sobre verdade matemática. Concordamos com Garnica (1996) quando
afirma que a prova rigorosa no contexto da matemática se justifica com o objetivo de
convencer, validar e verificar. Também defendemos, como ele, que:
A prova rigorosa, sendo elemento fundamental para entender a prática
científica da Matemática, seria também fundamental nos cursos de
formação de professores, não como mero recurso técnico, mas numa
abordagem crítica, que possibilitasse uma visão panorâmica nos
modos de produção e manutenção da “ideologia da certeza” para que,
a partir disso, pudessem ser produzidas formas alternativas de
tratamento às argumentações sobre os objetos matemáticos em sala
de aula (GARNICA, 1995, p. 94).
Da mesma forma, Thom (1971) relata que o rigor total em uma demonstração
pode incorrer na ausência de significado do que se está demonstrando:
A meu ver, não se aprendeu da Axiomática de Hilbert a verdadeira
lição que tem o seguinte teor: consegue-se rigor absoluto somente por
meio da completa eliminação de significado. [...] Mas se for preciso
escolher entre Rigor e Significado relativo ao conteúdo, escolho sem
hesitação o último. Isso sempre se fez em Matemática, onde se
trabalha quase sempre em uma forma semiformalística, com a não
formalizada linguagem cotidiana como Metalinguagem. A comunidade
matemática está satisfeita e não exige nenhum aperfeiçoamento (apud
WITTMANN e MÜLLER, 2006, p.14).
71
Por outro lado, entendemos que o ensino da demonstração é fortemente
caracterizado pela repetição de demonstrações contidas em livros textos, ou pela
imitação do trabalho de um professor, com um elevado rigor, que as apresentam
como um produto final, acabado e verdadeiro. A esse respeito, Gouvêa (1998, p. 37)
relata que professores e alunos:
Afirmavam também que a demonstração de teoremas era ensinada
com rigor e cabia aos alunos, muitas vezes, a obrigação de memorizá-
la sem entender o seu significado. Decoravam mais por respeito à
autoridade do professor e por temor de notas baixas.
Diante disso, a aprendizagem da demonstração tem sido fator de insucessos
para muitos alunos e, seu ensino, frustração para muitos professores. Acreditamos
que uma das causas está na exigência durante a formação de certo rigor na escrita
das demonstrações, que é própria para matemáticos profissionais. Assim sendo,
neste trabalho adotamos a noção de demonstração que Rolkouski (2002, p. 20) usou
em sua pesquisa, mais flexível e inspirada em Lakatos:
[...] em que se parte de um problema, e procura-se, num ir e vir
constante entre conjeturas e contra-exemplos, chegar a uma
conclusão em que todos os passos sejam coerentes e verificados de
acordo com a teoria subjacente adotada, neste caso a geometria
plana.
Por outro lado, se apresenta a discussão da necessidade do ensino da
demonstração e ainda, de se entender sua função nesse ensino. Para De Villiers
(2002), a dificuldade de compreender o papel da demonstração no ensino é um dos
entraves para que tal ensino seja posto em prática. O autor, com base em Kline
(1973) e Alibert (1988), afirma que, tradicionalmente, a função da demonstração é de
fazer verificação de afirmações matemáticas. Da mesma forma, Nasser e Tinoco
(2001) reforçam essa idéia, ao discutirem as funções da demonstração, nos revelando
que a mais usada é a que desempenha a função de validação de um resultado,
comprovando sua veracidade. Destacam que, essa função raramente é motivadora
para os alunos da Educação Básica, uma vez que eles não vêem a necessidade de
comprovar a veracidade de algo que já consideram óbvio ou estão convencidos.
Já para Rolkouski (2002), a demonstração tem outra função que acreditamos
poder ser utilizada no ensino:
72
a demonstração para o matemático desempenha primordialmente o
papel de descoberta. Saliento que esta descoberta se dá por um
processo social, em que o trabalho é constantemente reavaliado. Não
se dá, pois, linearmente, de hipótese a tese, e sim em constante
interação com a comunidade interessada (ROLKOUSKI, 2002, p. 25).
Healy e Hoyles (2000) também apresentam preocupação com a função da
demonstração, ao destacarem as funções de verificação da validade de uma
evidência, explicação, comunicação e descoberta, nas respostas dadas pelos alunos
em uma pesquisa realizada na Inglaterra envolvendo muitos sujeitos. As autoras
destacam, ainda, que as provas são acessíveis aos alunos e podem ser um ponto de
partida para o trabalho com a argumentação.
Pietropaolo (2005), afirma que uma outra função para a demonstração é
construir conhecimentos. Para o autor, a comunicação do saber matemático segue a
via da dedução lógica, em um sistema axiomático, que apresenta o produto e não o
processo, que são distintos de acordo com Polya e Lakatos.
Sem nomear as funções da demonstração, Rolkouski (2002, p. 30) destaca as
funções de explicação e sistematização, quando afirma:
Enfim, para o aluno, o ensino das demonstrações deve trazer mais do
que a “prova”, deverá trazer fundamentalmente o convencimento pelo
entendimento. Assim, ao ser levado a demonstrar teoremas, o aluno
constrói explicações para si próprio e as reelabora na escrita,
processo que deverá levar à compreensão e ao esclarecimento.
Percebemos nas pesquisas de De Villiers (2001; 2002), que o trabalho com a
demonstração apenas como verificação de uma proposição não é suficiente.
Acreditamos que devemos possibilitar aos professores um trabalho que trate das
diversas funções da demonstração, nessa perspectiva.
Relacionando as funções da demonstração à Geometria, Arsac (1988), revela
que a busca pela solução de um problema é que justifica a demonstração, e destaca
que, em Geometria, a demonstração só irá avançar se considerarmos o obstáculo
epistemológico
22
constituído pela evidência da figura. Percebemos tal evidência em
Gouvêa (1998), quando relata que no início das atividades, quando na exibição de
________________
22
Os obstáculos de origem epistemológica são inerentes ao saber e identificáveis pelas dificuldades
encontradas pelos matemáticos para os superar na história. Eles são verdadeiramente constitutivos do
conhecimento, são aqueles aos quais “não se pode nem se deve fugir” (BROUSSEAU, 1983, apud
ALMOULOUD, 1997, p. 43)
73
uma figura, os professores se deixavam levar por evidências falsas e não apelavam
para a validação via uma demonstração.
Balacheff (1982), chama atenção para um nível mais elementar de uma
demonstração – a prova. Ao considerar essa nova vertente no trabalho com as
demonstrações, esse pesquisador abriu novas opções para o trabalho com as
demonstrações no contexto da Educação Matemática. Quando nos referimos à
matemática pura, a distinção entre as palavras prova e demonstração não se faz
necessário, porém, ao se tratar do ensino da matemática, este autor apresenta
diferenças para essas denominações.
Para este autor, os termos explicação, prova e demonstração, são
apresentados como:
Explicação é um discurso que visa tornar inteligível o caráter de
verdade adquirido pelo locutor de uma proposição ou de um resultado,
os quais podem ser discutidos.
Prova é uma explicação aceita por uma dada comunidade num dado
momento, ou seja, é um discurso aceito por uma certa comunidade
que tem por objetivo dar o caráter de verdade a uma proposição.
Demonstração é uma prova aceita pela comunidade matemática, ou
seja, é um discurso aceito pela comunidade matemática e constituído
a partir de uma seqüência de enunciados organizados com certas
regras, que tem como objetivo dar caráter de verdade a uma
proposição (apud Mello, 1999, p. 5).
Logo, a “explicação” está associada a um locutor, que tem como fim comunicar
a um receptor o caráter de verdade de uma afirmação matemática. Se esta explicação
tem o poder de convencer uma dada comunidade, ela constitui o que se chama de
“prova”. Quando essa prova se refere a um enunciado matemático e convence a
comunidade específica dos matemáticos puros, ela recebe o “status” de
demonstração. Desta forma, para Balacheff (1982), a demonstração é, em
matemática, um tipo particular de prova, poderíamos até dizer privilegiado, pois é esta
que permite uma comunicação dentro da comunidade dos matemáticos.
Diante do que relatamos e do que percebemos em nossas leituras, a
demonstração em matemática não aparece como um objeto de ensino e sim permeia
os diversos objetos matemáticos a serem ensinados. Chevallard (2005), em seus
trabalhos desenvolvidos sobre transposição didática, apresenta esclarecimentos
acerca da noção de demonstração. Ao nos depararmos com o que este pesquisador
denomina noção matemática e noção paramatemática percebemos que “as noções
74
paramatemáticas são idéias que se caracterizam como ‘ferramentas’ auxiliares à
atividade matemática, mas normalmente não se constituem em objetos de um estudo
específico” (CHEVALLARD, 2005, p. 58).
Em conformidade com o autor, as noções paramatemáticas em contradição
com as noções matemáticas não são, em geral, ensinadas de forma explícita. Tais
noções são concebidas como idéias possíveis de serem aprendidas durante a própria
aprendizagem. No entanto, são tão necessárias ao ensino quanto a aprendizagem de
noções matemáticas. O autor destaca a demonstração como um exemplo de noção
paramatemática.
Desta forma, ao entendermos a demonstração como uma noção
paramatemática, nesta pesquisa proporemos atividades de construções geométricas
que solicitem: explicar, justificar e demonstrar, isto é, a demonstração aparecerá
permeando o processo de aprendizagem do objeto geométrico mediatriz de um
segmento, em particular, nas atividades de construções geométricas em que a
mediatriz será a principal ferramenta para solucionar os problemas propostos.
3.4 CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS
Consideramos as construções geométricas como uma ferramenta valiosa que
funcionará como grande aliada no processo de ensino e aprendizagem da Geometria,
mais particularmente de demonstrações. Ao se resolver problemas de construções
geométricas juntamente com suas justificativas matemáticas, desenvolvem-se,
também, a coordenação motora fina e o hábito de limpeza, rigor e precisão. Assim
sendo, consideramos as construções geométricas como aquelas que fazem uso
apenas da régua não graduada e compasso e o Desenho Geométrico como uma
disciplina escolar que tem por objetivo ensinar essas construções.
Desta forma, é oportuno esclarecer como concebemos a construção
geométrica nesse trabalho. Entendemos essa construção no mesmo sentido de
Petersen (1967), quando diz:
Como a solução dos problemas de construções geométricas deve se
traduzir por um desenho, é necessário recorrer ao emprego de alguns
instrumentos. Habitualmente só usamos a régua, com auxílio da qual
podemos traçar uma reta passando por dois pontos dados, e o
compasso que permite descrever em torno de um centro dado uma
75
circunferência de raio dado. Uma solução qualquer se comporá,
portanto, para nós, dessas duas operações uma ou mais vezes
repetidas. É exatamente essa restrição que faz que muitos problemas
de aparência simples se tornem complexos ou até mesmo sem
solução, como podemos citar: trisecção do ângulo, quadratura do
círculo e duplicação do cubo (PETERSEN, 1967, p. 7)
Neste sentido, um ponto ficará determinado pela intersecção de duas retas,
intersecção de dois arcos de circunferência e intersecção de uma reta e um arco de
circunferência. Quanto à exatidão de algumas construções, Petersen (1967, p. 8)
pontua: “Em alguns casos, é preciso demonstrar que a solução é exata e discuti-la,
isto é, indicar os limites entre os quais os dados devem estar compreendidos para que
o problema admita, uma, duas, ou mais soluções”.
Segundo Wagner (1993), as construções geométricas estão cada vez mais
ausentes dos currículos escolares, embora sejam importantes para auxiliar no
aprendizado da Geometria. Nessa perspectiva, concordamos com esse autor ao
afirmar que:
As construções geométricas devem, em nossa opinião, acompanhar
qualquer curso de Geometria na escola secundária. Os problemas são
motivadores, às vezes intrigantes e frequentemente conduzem à
descoberta de novas propriedades (Ibid, p. 18).
Por outro lado, Putnoki (1988) destaca que em países como França, Espanha e
Suíça, o Desenho Geométrico é naturalmente incorporado à Geometria plana, pelo
próprio professor de Matemática. Afirma, ainda, que: “desde Os Elementos, de
Euclides, o Desenho Geométrico se apresenta ligado à Geometria de forma
indissolúvel, não com esse título, mas, com a denominação de Construções
Geométricas” (Ibid, p. 13).
O autor considera de grande importância o ensino das construções
geométricas com as justificativas matemáticas que as fundamentam, ou seja, com
recursos à Geometria plana. Acrescenta, ainda, que “o aprendizado das construções
amplia as fronteiras do aluno e facilita muito a compreensão das propriedades
geométricas, pois permite uma espécie de ‘concretização’” (PUTNOKI apud ZUIN,
2001, p. 9).
É freqüente conduzir os alunos para desenvolverem atividades com régua e
compasso por meio dos passos de construção. Para Zuin (2001):
76
A forma de apresentar as construções geométricas fica quase sempre
na execução dos traçados através dos “passos de construção” que se
constituem em um roteiro a ser seguido. Segundo a nossa avaliação,
no Brasil é apenas com Putnoki, a partir de 1990, que existe,
realmente, um rompimento com a metodologia apresentada nas
décadas anteriores, quando o autor valoriza a teoria da geometria
plana, trabalha com dobraduras e introduz tópicos com abordagem
histórica. Este autor incorpora as tendências da educação matemática
que retomam a História da Matemática e propõe trabalhos com
material concreto (ZUIN, 2001, p. 184).
Quanto à retomada do ensino das construções geométricas a autora destaca
que apesar de os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática indicarem um
retorno ao ensino de Geometria com tópicos de construções geométricas e de
coleções de livros didáticos de matemática atenderem, de alguma forma, a esta
recomendação, não se tem a garantia de tal retorno nas salas de aula, pois:
Nem todos os professores estão habilitados para adotar a metodologia
proposta;
As escolas que mantêm o Desenho Geométrico (como disciplina),
provavelmente não exigirão que os professores de Matemática introduzam
tópicos de construções geométricas em suas aulas;
Uma vez que nem todos os professores em exercício tiveram em sua
formação cursos de Geometria e/ou Construções Geométricas, é necessário
investir na formação continuada (ZUIN, 2001).
Ao defender as construções geométricas no ensino, Putnoki (1988) sugere
alguns conteúdos e como trabalhá-los com os alunos, acrescentando que assuntos
aparentemente desinteressantes para os alunos, como ângulo inscrito ou potência de
um ponto em relação a uma circunferência, têm vastas aplicações nas construções
geométricas. O ângulo inscrito gera o arco capaz e a potência de ponto resolve
problemas de tangência. Destacando: “[...] discutir como construir, e, em seguida,
construir, são etapas que se completam, sendo a segunda a própria materialização
das idéias da primeira” (Ibid, p. 15).
Nesse contexto, Marmo (1964) indica que os problemas de desenho
geométrico devem seguir a seguinte apresentação:
Mostra-se o que se faz, isto é, realiza-se a construção geométrica;
Explica-se porque se fez, isto é, justifica-se (demonstração pela
Geometria que a resposta obtida, é de fato, a resposta procurada);
77
Discussão da solução, isto é, verifica-se o número de soluções do
problema, analisando se é realmente compatível, apresenta uma única
solução, admite mais de uma solução e sobre quais condições poderia
ampliar ou reduzir o número de soluções.
Com relação a aprendizagem de um teorema, o autor diz que existem três
modos de “decorar” um teorema de Geometria Plana:
Decorar as palavras do enunciado. “Num triângulo retângulo o
quadrado da altura relativa à hipotenusa é igual ao produto das
projeções dos catetos sobre a hipotenusa”.
Decorar as letras da expressão. “h
2
= m . n”.
Decorar a figura; gravar a “linguagem gráfica”.
(MARMO, 1964, p. 49)
Pode-se perceber nessa citação que, de forma intuitiva, Marmo (1964) se
refere aos três registros de representação semiótica que são abordados neste
trabalho: o registro da língua natural, o registro simbólico e o registro figural, embora
utilize a palavra “decorar”, vista nas literaturas recentes como sinônimo de memorizar.
De acordo com Duval (2003), no caso desse teorema, se uma pessoa é capaz de
mobilizar simultaneamente dois ou mais desses registros e/ou mudar de um para
outro, terá ocorrido a compreensão do teorema em questão.
Dessa forma, se faz necessário discutir a formação de professores. Zuin (2002)
destaca que eles devem conhecer construções geométricas, e pondera:
Atualmente, constata-se que alguns livros já trazem a geometria
relacionada com cada conteúdo matemático, exigindo assim que o
professor, além do conhecimento específico em geometria, tenha um
conhecimento mais profundo de Desenho Geométrico, de modo que
possa contribuir mais e melhor para a compreensão dos
conhecimentos matemáticos (ZUIN, 2002, p. 3).
Já Pavanello e Andrade (2002), sugerem que o trabalho com Geometria nas
licenciaturas deve contemplar, também, a formação didática inerente a esse
conteúdo, e afirmam que:
Nessa abordagem não poderia faltar também um trabalho com
construções geométricas, não pelas próprias construções, mas como
78
uma possibilidade de se estabelecerem relações entre a geometria
axiomática euclidiana. Isso se concretiza a partir da busca de
validação da construção efetuada ou da prova de que o objeto por
meio dela obtido era aquele desejado. Além disso, as construções
geométricas poderiam servir também como instrumentalização para o
ensino de outros conteúdos (álgebra, etc.) (PAVANELLO e
ANDRADE, 2002, p. 84).
Com base no que apresentamos, tentaremos proporcionar aos professores, em
formação continuada, o desenvolvimento de conceitos geométricos por meio de
problemas de construções.
3.5 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (PCN)
23
(BRASIL, 1998)
– 3° e 4° ciclos do Ensino Fundamental – recomendam uma abordagem de conceitos
na perspectiva da resolução de problemas, partindo da idéia que em um problema
matemático a solução não está posta de início, isto é, é possível construí-la a partir de
uma seqüência de ações e/ou operações para obter um resultado. Neste sentido, “a
situação problema é o ponto de partida da atividade matemática não a definição”
(BRASIL, 1998, p. 40). Na verdade, a resolução de problemas funciona como uma
orientação para a aprendizagem. Segundo Maioli (2002, p. 31):
Resolver um problema pressupõe que o aluno venha a elaborar vários
procedimentos de resolução (realizando simulações, fazendo
tentativas, formulando hipóteses); comparar seus resultados com os
de outros companheiros e validar seus procedimentos.
Para o ensino de Geometria, os PCN sugerem que, no quarto ciclo, a análise
de figuras pela observação, manuseio e construção deva ser o primeiro ponto a ser
abordado com o objetivo de que o aluno possa fazer conjecturas e identificar
propriedades. O documento salienta, também, que os problemas de Geometria são
um campo fértil para o trabalho com as primeiras demonstrações. Além disso,
destacam que o professor deve criar condições para que o aluno utilize diferentes
representações matemáticas com o objetivo de facilitar a compreensão e análise de
uma dada situação-problema. Explicitam, ainda, que o trabalho com Espaço e Forma
pressupõe que o professor de Matemática explore situações em que sejam
________________
23
Parâmetros Curriculares Nacionais usados no Brasil, ou seja, é uma recomendação para o trabalho a
ser desenvolvido na sala de aula.
79
necessárias algumas construções geométricas com régua e compasso, como
visualização e aplicação de propriedades das figuras, além da construção de outras
relações.
Quanto a demonstração em matemática, esse documento sugere que uma
argumentação não é, contudo, uma demonstração. Assim, a argumentação está mais
próxima das práticas discursivas espontâneas e é regida mais pelas leis de coerência
da língua materna do que pelas leis da lógica formal que, por sua vez, sustentam a
demonstração. Sugere, ainda, que no terceiro ciclo
24
se trabalhe para desenvolver a
argumentação de modo que os alunos não se satisfaçam apenas com a produção de
respostas a afirmações, mas assumam a atitude de sempre tentar justificá-las. Tendo
por base esse trabalho, pode-se avançar no quarto ciclo
25
para que o aluno
reconheça a importância das demonstrações em Matemática, compreendendo
provas de alguns teoremas.
No que diz respeito às construções geométricas, ao propor conteúdos para o
ensino de matemática no quarto ciclo, os PCN destacam a importância de que:
o aluno identifique o número irracional como um número de infinitas
“casas” decimais não-periódicas, identifique esse número com um
ponto na reta, situado entre dois racionais apropriados, reconheça que
esse número não pode ser expresso por uma razão de inteiros;
conheça números irracionais obtidos por raízes quadradas e localize
alguns na reta numérica, fazendo uso, inclusive, de construções
geométricas com régua e compasso
26
. Esse trabalho inicial com os
irracionais tem por finalidade, sobretudo, proporcionar contra-
exemplos para ampliar a compreensão dos números (BRASIL, 1998,
p. 83).
Ao tratar da seleção de conteúdos, destacam a importância do aluno dominar
os conceitos e, retomam as construções geométricas quando tratam de
procedimentos, sugerindo que estes:
não devem ser encarados apenas como aproximação metodológica
para aquisição de um dado conceito, mas como conteúdos que
possibilitem o desenvolvimento de capacidades relacionadas com o
saber fazer, aplicáveis a distintas situações. Esse “saber fazer” implica
construir estratégias e os procedimentos, compreendendo os
conceitos e processos neles envolvidos. Nesse sentido, os
procedimentos não são esquecidos facilmente. Exemplos de
24
Terceiro ciclo é equivalente a 5ª e 6ª séries do Ensino Fundamental, atualmente 6º e 7º anos.
25
Quarto ciclo é equivalente a 7ª e 8ª séries do Ensino Fundamental, atualmente 8º e 9º anos.
26
Grifo nosso.
80
procedimentos: resolução de uma equação, traçar a mediatriz de um
segmento com régua e compasso
27
, porcentagens, etc. (BRASIL,
1998, p. 50).
Quanto aos objetivos do ensino de matemática específicos para o 3° ciclo – 5ª
e 6ª séries do Ensino Fundamental – os PCN apontam para a importância do
desenvolvimento do pensamento geométrico e propõem claramente, a utilização de
instrumentos de desenho, ao afirmar que neste ciclo merece atenção:
o ensino de procedimentos de construção com régua e compasso e o
uso de outros instrumentos, como esquadros, transferidor,
estabelecendo-se a relação entre tais procedimentos e as
propriedades geométricas que neles estão presentes (BRASIL, 1998,
p. 68).
Todavia, para o 4° ciclo – 7ª e 8ª séries do Ensino Fundamental – os PCN
sugerem que sejam realizadas:
Resoluções de situações-problema que envolvam a obtenção de
mediatriz de um segmento, da bissetriz de um ângulo, de retas
paralelas e perpendiculares e de alguns ângulos notáveis, fazendo uso
de instrumentos como régua, compasso, esquadro e transferidor.
[...]
Identificação de construção de alturas, bissetrizes, medianas e
mediatrizes de um triângulo utilizando régua e compasso.
[...]
Verificações experimentais e aplicações e demonstração do teorema
de Pitágoras (BRASIL, 1998, p. 89).
Percebemos que o Desenho Geométrico não aparece como disciplina
obrigatória nesse documento, porém, de forma implícita, notamos considerações a
respeito de construções geométricas com régua e compasso. Para o 3° ciclo, é
recomendado o ensino de construções pautado nos aspectos procedimentais e, para
o 4° ciclo, as situações propostas envolvem construções que devem ser
fundamentadas na Geometria.
Em nosso entender, situações que envolvem construções geométricas
fundamentais poderiam ser trabalhadas a partir da quinta série, dentro do estudo da
Geometria e, progressivamente trabalhar com construções geométricas mais
elaboradas – que exigem um grau maior de complexidade – que permitam uma
ampliação do pensamento geométrico do aluno. Acreditamos, ainda, que o trabalho
________________
27
Grifo nosso.
81
com essas construções pode auxiliar o aluno visualizar – induzindo de forma
experimental à descoberta –, conjecturar e justificar matematicamente suas
construções através das propriedades geométricas envolvidas. Percebemos, também,
que essa é uma preocupação dos PCN, quando indica que:
[...] é indispensável que as pessoas desenvolvam a capacidade de
observar o espaço tridimensional e de elaborar modos de comunicar-
se a respeito dele, pois a imagem é um instrumento de informação
essencial no mundo moderno. [...] é fato que as questões geométricas
costumam despertar interesse dos adolescentes e jovens de modo
natural e espontâneo. Além disso, é um campo fértil de situações-
problema que favorece o desenvolvimento da capacidade para
argumentar e construir demonstrações (BRASIL, 1998, p. 122).
No próximo capítulo, apresentaremos as atividades realizadas na oficina,
juntamente com as suas análises prévias, confrontando-as com os dados coletados,
ou seja, apresentaremos também uma análise a posteriori das atividades aplicadas.
82
CAPÍTULO 4
AS ATIVIDADES E SUAS ANÁLISES
Neste capítulo, descrevemos os procedimentos metodológicos utilizados na
pesquisa, a seqüência de atividades elaborada, bem como as análises prévias e as
análises a posteriori realizadas durante a formação continuada de professores.
Nossa finalidade é confrontar as análises prévias com as informações oriundas
das observações e gravações em áudio, entrelaçando-as com o nosso referencial
teórico. Assim, pretendemos responder nossa questão de pesquisa: Uma seqüência
de ensino com enfoque em construções geométricas pode contribuir para o
desenvolvimento de conhecimentos acerca da demonstração em Geometria em uma
formação continuada de professores?
4.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O projeto “O raciocínio dedutivo no processo de ensino-aprendizagem da
matemática nas séries finais do Ensino Fundamental”, era composto por duas turmas,
A e B, de professores em formação continuada, das quais A tinha seus encontros nas
quintas-feiras (das 14 às 17 horas) e B nas sextas-feiras (das 8 às 11 horas), ou seja,
os encontros tinham três horas de duração. Os encontros ocorriam no laboratório de
Educação Matemática da PUC/SP.
Como as turmas possuíam quantidades distintas de participantes (A com 8
participantes, e, a turma B, com 3 participantes), a ação desenvolvida nas turmas
ocorreu de maneira diferenciada, totalizando 9 encontros na turma A e 6 encontros na
turma B. Assim, apesar da seqüência de atividades propostas ter sido a mesma,
existiam momentos em que as turmas desejavam explorar mais uma determinada
atividade e, até mesmo, uma maior troca de informações entre os participantes na
turma A. Dessa forma, na turma A existia sempre um momento de socialização entre
todos os participantes (que participavam sempre em dois grupos distintos), enquanto
que, na turma B, esse momento nem sempre ocorria, uma vez que a discussão já se
83
dava em grupo e estes socializavam entre si. Daí a explicação para ter sido possível
um número menor de encontros.
Como as turmas possuíam formadoras diferentes, em um primeiro momento,
decidimos situar tais formadoras a respeito das intenções da seqüência de atividades,
além de deixá-las a par dos nossos objetivos com relação à pesquisa. No entanto,
optamos por atuar conjuntamente com as formadoras, nesse trabalho e, ao nos
referimos à equipe de formação, vamos identificar como o formador
28
. Contamos
também com a colaboração de observadores (mestrandos e mestres integrantes do
projeto).
O papel desses observadores era de registrar por escrito as ações ocorridas
durante o processo de formação, gravar as falas em áudio e redigir as informações
obtidas e nos enviar semanalmente. Foram 8 observadores, dos quais 2 já
participavam dessa tarefa há, pelo menos, um ano. Desta forma, os participantes já
estavam familiarizados com a observação e também já se colocavam à vontade com
relação a expressar suas idéias, dificuldades, conclusões e etc.
Ao todo, tivemos 15 encontros (9 na turma A e 6 na turma B), perfazendo um
total de 45 horas de formação. No primeiro encontro, além de apresentarmos, em
linhas gerais, o trabalho que seria desenvolvido com a nossa seqüência de atividades,
fizemos também um levantamento do perfil dos professores
29
participantes, com a
finalidade de conhecermos melhor os sujeitos da nossa pesquisa.
Nesse trabalho, entendemos a observação como um meio de obtenção de
informações que possibilita um contato mais direto e pessoal com os objetos
investigados. Na maioria dos encontros, tivemos a presença de três observadores na
turma A e de dois observadores na turma B, cujos momentos foram gravados em
áudio.
Durante os encontros, percebemos que, muitas vezes, os observadores
conversavam com os participantes, se identificando quanto às aspirações e ao
cotidiano da sala de aula, talvez, por serem, também, professores de Matemática. Isto
fez com que as observações ficassem mais naturais, favorecendo a interação entre
observadores e observados (os professores), mesmo quando não falavam
________________
28
Neste estudo adotamos o termo Formador para designar as pessoas responsáveis pela condução
das oficinas de formação.
29
A ficha do perfil dos professores encontra-se no APÊNDICE A.
84
absolutamente nada. Queremos deixar claro os limites dessas interações, ou seja, os
observadores não interferiam no desenvolvimento das atividades em que eles não
eram os participantes (sujeitos).
4.2 OS PROFESSORES
Como já foi dito anteriormente, tivemos a participação de onze professores,
com poucas faltas, o que não acarretou prejuízos de qualquer ordem aos resultados
da pesquisa. Vale ressaltar que todos os professores, sujeitos dessa pesquisa, já
estavam em formação nesse projeto, ou seja, já apresentavam alguma familiaridade
com o tema demonstração, e, nesse sentido, a seqüência de atividades foi mais um
trabalho desenvolvido com eles. A seguir, traçaremos um perfil destes sujeitos
30
.
Professora Angélica
Tem idade de 21 a 30 anos, e leciona Matemática no Ensino Médio em um
período de 2 a 5 anos. Possui licenciatura plena em matemática e especialização em
tecnologias aplicada à educação. Na ocasião da pesquisa, ministrava aulas em
apenas uma escola da rede pública com carga horária de 30 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
oitavas séries e destacou não gostar de ministrar aulas para quintas e sextas séries
por não se identificar com a faixa etária. Vem participando do projeto há dez meses e
o procurou com o objetivo de melhorar a sua formação.
Professor José
Tem idade de 31 a 40 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e
Médio em um período de 10 a 20 anos. Possui licenciatura plena em matemática e
especialização em matemática aplicada. Na ocasião da pesquisa, ministrava aulas em
apenas uma escola da rede pública com carga horária de 32 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma ensinar com mais
freqüência quintas e sextas séries, porém, julga indiferente a série para a qual
ministra aulas nesse nível. Vem participando do projeto há dois anos, o procurou com
o objetivo de adquirir novos conhecimentos e por acreditar ser um curso de grande
________________
30
Os nomes atribuídos aos professores são fictícios, para evitar identificação dos mesmos.
85
valia para os profissionais na área de educação, dizendo contribuir muito para a sua
prática docente e para modificar a sua postura em suas aulas.
Professora Mirtes
Tem mais de 50 anos, e leciona matemática no Ensino Médio em um período
de 2 a 5 anos. Possui graduação em processamento de dados e fez complementação
pedagógica para obter a licenciatura plena em matemática. Na ocasião da pesquisa,
ministrava aulas em apenas uma escola da rede pública com carga horária de 25
horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
oitavas séries e destacou não ter preferência por nenhuma série em especial nesse
nível de ensino. Vem participando do projeto há dois anos, o procurou por ser gratuito,
objetivando adquirir conhecimentos e por ter bons formadores.
Professora Eva
Tem mais de 50 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e Médio
em um período de 5 a 10 anos. Possui licenciatura plena em matemática, curso de
aperfeiçoamento em matemática e destacou ter concluído primeiro a licenciatura
curta. Na ocasião da pesquisa, ministrava aulas em apenas uma escola da rede
pública com carga horária de 30 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
sétimas e oitavas séries e destacou não gostar de ministrar aulas para quintas e
sextas séries por não possuir didática adequada para trabalhar com crianças. Vem
participando do projeto há 8 anos e o procurou com o objetivo de melhorar a
qualidade do seu trabalho em sala de aula.
Professora Maria
Tem idade de 31 a 40 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental em
um período de 5 a 10 anos. Possui bacharelado e licenciatura plena em matemática.
É especialista em gestão de Recursos Humanos. Na ocasião da pesquisa, ministrava
aulas em apenas uma escola da rede particular com carga horária de 20 horas-aula
semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
quintas, sextas, sétimas e oitavas séries, destacando não ter preferência por uma
86
série em especial. Vem participando do projeto há oito meses e o procurou
objetivando aprimoramento profissional.
Professora Sueli
Tem mais de 50 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e Médio
em um período superior a 20 anos. Possui bacharelado e licenciatura plena em
matemática. É especialista em Educação Matemática e matemática aplicada à
computação. Na ocasião da pesquisa, ministrava aulas em apenas uma escola da
rede pública com carga horária de 23 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
oitavas séries e destacou gostar de ministrar aulas para qualquer série, porém
gostaria de começar em uma turma de quinta série e acompanhar essa turma até a
terceira série do Ensino Médio, relatando ser uma pena tal situação não ocorrer nos
tempos atuais. Vem participando do projeto há um ano, o procurou com o objetivo de
conviver com colegas da área e ter a oportunidade de discutir matemática.
Professora Rute
Tem idade de 41 a 50 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e
Médio em um período de 10 a 20 anos. Possui licenciatura plena em matemática. Na
ocasião da pesquisa, ministrava aulas em apenas uma escola da rede pública com
carga horária de 30 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
quintas séries e destacou não gostar de ministrar aulas para esse nível, por não ter
paciência. Vem participando do projeto há um ano e começou a freqüentá-lo após o
convite de uma professora, o considera muito bom e, por esse motivo, resolveu se
aprimorar.
Professora Paula
Tem idade de 31 a 40 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e
Médio em um período de 10 a 20 anos. Possui bacharelado e licenciatura plena em
matemática. Cursou também comunicação social. Na ocasião da pesquisa, ministrava
aulas em apenas uma escola da rede pública com carga horária de 28 horas-aula
semanais.
87
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
sétimas e oitavas séries e destacou gostar de trabalhar com todas as séries desse
nível. Vem participando do projeto há cinco meses, o procurou com o objetivo de
aprofundar conhecimentos em matemática e diz estar adorando.
Professor Renato
Tem mais de 50 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e Médio
em um período de 5 a 10 anos. Possui licenciatura plena em matemática e está
cursando uma especialização em educação a distância. Na ocasião da pesquisa,
ministrava aulas em duas escolas – redes pública e particular – com carga horária de
25 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental não tem preferência por série.
Vem participando do projeto há oito anos e o procurou por ter interesse em se
atualizar e aperfeiçoar-se.
Professora Joana
Tem mais de 50 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e Médio
em um período superior a 20 anos. Possui licenciatura plena em matemática e
especialização em Educação Matemática. Na ocasião da pesquisa, ministrava aulas
em apenas uma escola da rede pública com carga horária de 25 horas-aula
semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
quintas, sextas, sétimas e oitavas séries e destacou não gostar de ministrar aulas
para as sétimas séries por ter que trabalhar longo tempo com álgebra. Vem
participando do projeto há 7 anos com 2 anos de interrupção e o procurou para se
aprimorar e motivar-se.
Professor Carlos
Tem idade de 31 a 40 anos, e leciona Matemática no Ensino Fundamental e
Médio em um período de 2 a 5 anos. Possui licenciatura plena em matemática. Na
ocasião da pesquisa, ministrava aulas em apenas uma escola da rede pública com
carga horária de 32 horas-aula semanais.
Quando ministra aulas no Ensino Fundamental, costuma dar aulas para as
sextas e sétimas séries e destacou não ter restrição de lecionar série alguma nesse
88
nível. Relatou ser importante o professor ter contato com todas as séries para
exercitar conteúdos diferentes. Vem participando do projeto há dois anos, o conheceu
através de um convite, gostou dos métodos e participa objetivando aprimorar seus
conhecimentos.
Apresentamos a seguir um quadro resumo com o perfil dos professores
participantes.
PROFESSOR
IDADE
(anos)
TEMPO
DE
ENSINO
NÍVEL EM
QUE
LECIONA
N°. DE
AULAS
SEMANAIS
N°. DE
ESCOLAS
E REDE
TEMPO
DE
PROJETO
FORMAÇÃO
ESPECIA-
LISTA
ANGÉLICA
21 a
30
2 a 5
anos
Médio 30 aulas
Uma /
pública
Dez
meses
Licenciada em
Matemática
Sim
JOSÉ
31 a
40
10 a 20
anos
Fundamental
e Médio
32 aulas
Uma /
pública
Dois anos
Licenciado em
Matemática
Sim
MIRTES
Mais
de 50
2 a 5
anos
Médio 25 aulas
Uma /
pública
Dois anos
Processamento
de Dados
Sim
EVA
Mais
de 50
5 a 10
anos
Fundamental
e Médio
30 aulas
Uma /
pública
Oito anos
Licenciada em
Matemática
Sim
MARIA
31 a
40
5 a 10
anos
Fundamental 20 aulas
Uma /
particular
Oito
meses
Bacharel e
licenciada em
Matemática
Sim
SUELI
Mais
de 50
Mais de
20 anos
Fundamental
e Médio
23 aulas
Uma /
pública
Um ano
Bacharel e
licenciada em
Matemática
Sim
RUTE
41 a
50
10 a 20
anos
Fundamental
e Médio
30 aulas
Uma /
pública
Um ano
Licenciada em
Matemática
Não
PAULA
31 a
40
10 a 20
anos
Fundamental
e Médio
28 aulas
Uma /
pública
Cinco
meses
Licenciada em
Matemática
Sim
RENATO
Mais
de 50
5 a 10
anos
Fundamental
e Médio
25 aulas
Duas /
pública e
particular
Oito anos
Licenciado em
Matemática
Sim
JOANA
Mais
de 50
Mais de
20 anos
Fundamental
e Médio
25 aulas
Uma /
pública
Cinco
anos
Licenciada em
Matemática
Sim
CARLOS
31 a
40
2 a 5
anos
Fundamental
e Médio
32 aulas
Uma /
pública
Dois anos
Licenciado em
Matemática
Não
Quadro 4: Perfil dos professores
89
4.3 DESCRIÇÃO DA APLICAÇÃO DA SEQÜÊNCIA
Durante a experimentação, desenvolvemos uma seqüência de 12 atividades,
aplicadas nas turmas A e B, em encontros denominados de oficinas de formação,
conforme já informado anteriormente. Durante as oficinas ocorreram várias
discussões em cada grupo de professores sempre tendo como foco a seqüência de
atividades. Nessas ações, o formador mediou vários momentos de socialização das
respostas dos grupos, instituindo o que era necessário para todos os participantes.
A seqüência de atividades objetivou fazer os professores vivenciarem as fases
de ação, formulação e validação (fases adidáticas) propostas por Brousseau (1986),
além de propiciar-lhes vários momentos de institucionalização (fase didática) que
foram propostos pelo formador.
No primeiro momento das oficinas, os participantes trabalharam em grupos,
resolvendo as atividades propostas, seguindo com a socialização das atividades entre
os grupos, mediada pelo formador, debatendo e fazendo algumas
institucionalizações. Em certos momentos, algumas atividades foram deixadas para
serem finalizadas em casa (lição de casa). No encontro seguinte pedia-se que os
participantes socializassem as respostas dadas e, posteriormente, se fazia uma
discussão geral da atividade. Destacamos que, na turma B, nem sempre
realizávamos tais socializações, pois, como já destacamos, o grupo era formado por
apenas três professores que já trabalhavam em grupo não cabendo, em muitos
momentos, esta dinâmica.
Durante as oficinas, ficou evidente a importância das análises prévias das
atividades, ou seja, o destaque antecipado dos possíveis conhecimentos a serem
mobilizados para resolvê-las, as possíveis respostas que poderiam ser dadas pelos
professores, os objetivos que se pretendia atingir e os comentários didáticos sobre
elas, destacando possíveis dificuldades e alternativas de devolução para amenizá-las.
4.4 AS ATIVIDADES E SUAS ANÁLISES PRÉVIAS E A POSTERIORI
É importante ressaltar que não temos a pretensão de oferecer um guia de
como ensinar melhor ou com mais significado a demonstração em Geometria.
Todavia, objetivamos que as atividades propostas contribuam para que os
professores de Matemática do Ensino Fundamental desenvolvam suas habilidades de
90
argumentação matemática e, desta forma, ampliem seus conhecimentos acerca da
demonstração em Geometria.
Buscamos, nessas atividades, desenvolver, principalmente, as funções de
explicação e sistematização da demonstração sugeridas por De Villiers (2001;
2002) e esperávamos que algumas descobertas pudessem ser sinalizadas pelos
professores, fomentando a função de descoberta sugerida por este pesquisador.
Acreditamos que um trabalho com professores, no que diz respeito às funções
da demonstração, poderá contribuir na superação da problemática apresentada. É
importante, entretanto, que os professores percebam que, por meio da demonstração,
eles podem explicar o porquê de determinada afirmação ser verdadeira e, perceber
também, que, através dela, pode descobrir novas propriedades, novos conceitos ou
novas características relacionadas à afirmação em questão. Neste contexto,
consideramos o obstáculo epistemológico destacado por Arsac (1988), ou seja, que a
evidência da figura não é uma validação matemática.
Nesse sentido, acreditamos que o caminho, aquele que não vai das hipóteses
à tese, não linear deverá ser o mais natural a ser seguido pelos professores em
formação continuada, visto que parece estar mais próximo do trabalho do matemático
ao se propor a descobrir e/ou validar novos resultados. Esses aspectos foram
considerados na formação continuada que desenvolvemos, pois o objetivo não é
repetir o curso que eles tiveram (se o tiveram) e esperamos, com isso, ampliar a
autonomia do professor participante, contribuindo para minimizar suas angústias com
relação ao trabalho com demonstrações e sua implementação na sala de aula de
Matemática.
Com base nos trabalhos de Duval (2003), a conversão de registros de
representação semiótica: linguagem natural, linguagem simbólica e linguagem figural
serão focadas na seqüência de atividades; desta forma, esperamos que os
professores utilizem e incorporem esse recurso na compreensão e demonstração de
propriedades matemáticas.
A opção por construir a definição de mediatriz de formas equivalentes teve
duas intenções: a primeira diz respeito à ruptura (com esses professores) de que um
mesmo objeto matemático pode ser caracterizado de formas equivalentes,
promovendo um debate sobre esse tema, discutindo inclusive que existem formas não
91
equivalentes de definir o mesmo objeto. Esta foi uma variável didática
31
importante
nesse trabalho. A segunda intenção é a de perceber como esses professores
trabalharão com hipóteses e teses dentro desse contexto, ou seja, o que os
professores usarão como justificativas. Nossa hipótese é que demonstrações
circulares (uso da tese para demonstrar a tese) ocorrerão.
Tal escolha pode possibilitar aos professores a vivência do papel das
definições dentro da matemática, inclusive de poder estabelecer diferença entre
definição e propriedade. Em momento posterior estes professores poderão eleger
uma delas, ou, até mesmo, optar por trabalhar com as duas, deixando clara sua
opção, para que fique muito bem colocada no estatuto das definições e teoremas o
uso do objeto geométrico mediatriz de um segmento.
Após a construção da definição e eleição da propriedade, será possível
perceber a disponibilidade do objeto geométrico na solução de problemas de
construção geométrica ao terem que justificar matematicamente as construções
realizadas usando a definição ou a propriedade inerente a ele.
Fazendo referência a Duval e Egret (1989), ao defender que a aprendizagem
da demonstração trata de um discurso diferente do que é praticado pelo pensamento
natural, propusemos tarefas de organização dedutiva e posterior redação da
demonstração, algumas delas no registro da língua natural. Nesse momento,
focamos, também, a função de sistematização proposta por De Villiers (2001; 2002).
Além disso, como nossos sujeitos são docentes, privilegiamos, em grande medida, as
tarefas heurísticas
32
por acreditarmos, sobretudo, em um trabalho que pode
desenvolver a autonomia dos professores participantes dessa formação.
Apresentamos, a seguir, a seqüência das 12 atividades que foram elaboradas e
aplicadas, juntamente com as análises prévias que contemplam os objetivos, as
respostas esperadas, os comentários didáticos, e as respectivas análises a posteriori.
________________
31
A variável didática mencionada é “forma de definir”, que consiste em definir de formas diferentes
(nesse caso diferente e equivalente) o mesmo objeto matemático; o valor dessa variável é que existe
mais de uma forma de definir e que nossa escolha foi por uma definição equivalente.
32
Segundo Duval e Egret (1989).
92
ATIVIDADE 1: CONSTRUINDO UMA DEFINIÇÃO
a) Trace um segmento
A
B
33
qualquer no papel que recebeu.
b) Faça uma dobradura, de modo que A e B coincidam.
c) Chame de “m” a reta representada pelo vinco deixado no papel e trace esta
reta.
d) Que relações você pode fazer entre o segmento
A
B e a reta m?
e) A partir dessas relações como você definiria a reta m?
Análises prévias
Essa atividade tem como objetivo obter uma definição de mediatriz de um
segmento, ou seja, que os professores participantes definissem a reta “m”, como a
reta que passa pelo ponto médio de um segmento e é perpendicular a ele,
reconhecendo-a como a mediatriz do segmento.
Nossas previsões eram que os professores, após a realização do solicitado nos
itens “a”, “b” e “c”, respondessem:
d) A reta “m” intercepta o segmento
A
B no seu ponto médio e é perpendicular
a esse segmento.
e) A reta “m” é a reta que passa pelo ponto médio de um segmento e é
perpendicular a ele, tal reta é chamada mediatriz do segmento.
Esperávamos que as verificações fossem realizadas de forma empírica (por
exemplo: usando os instrumentos de Desenho Geométrico e/ou dobraduras).
Destacamos que, a nossa experiência como professor da disciplina Desenho
Geométrico nos ajudou a conceber essa atividade. A idéia de usar dobradura poderia
permitir um maior envolvimento dos professores com a atividade e possibilitar que
eles destacassem pontos importantes da definição do objeto matemático em questão,
além de construir a definição de mediatriz.
Se entendermos esse processo de manipulação – fazer dobraduras – como um
registro de representação semiótica, o qual chamaremos de registro material
34
,
________________
33
Neste trabalho, ao nos referirmos ao segmento de extremidades A e B, usaremos
AB
,
segmento AB
ou segmento
AB
.
E a sua medida será denotada apenas por AB.
34
Não encontramos nos trabalhos de Duval, que consultamos, informações sobre a existência de tal
registro de representação semiótica, porém notamos que este possui as características que um registro
de representação semiótica exige (ver p. 29).
93
percebemos que, nesse registro, identificamos o objeto matemático mediatriz, por
meio do tratamento dobrar – verificando que a reta passa pelo ponto médio e é
perpendicular ao segmento –, que só é possível nesse registro material, os
professores fariam a conversão para o registro em língua natural da definição de
mediatriz. Notamos que, apesar de termos uma figura – registro figural –, esse
registro de representação semiótica, possui outras potencialidades, nos revelando
mais, ao vislumbrarmos tratamentos por meio de dobraduras.
Optamos por não dar a definição de mediatriz, mas de construí-la, de modo a
resgatar seu papel e suas características (existência e unicidade). As definições
dadas pelos grupos seriam colocadas na lousa para provocar, nesse momento, algum
tipo de debate. Assim, o formador coordenaria as discussões e institucionalizaria a
definição de mediatriz com o grupo.
Análise a posteriori
Todos os participantes se envolveram na atividade e relataram com os seus
pares as suas observações. Em um primeiro momento, foi pedido para trabalharem
em grupo, e, em seguida, fez-se uma discussão, socializando as respostas. Notamos
que os participantes não estavam acostumados a construir definições e apresentavam
antecipações relativas a seus conhecimentos prévios, embora apenas dois
participantes tenham desenhado o segmento AB na posição não vertical. Os relatos
que seguem servem de ilustração.
Maria: Ela é a mediatriz (ao se referir à reta m).
Angélica: m é a mediatriz.
Outros participantes seguiam as orientações da atividade sem fazer
antecipações.
Mirtes: É perpendicular e passa pelo meio.
José: m
A
B
.
Eva:
m divide o segmento AB em duas partes iguais formando um ângulo de 90°.
José: Não seriam quatro ângulos de 90°?
Essa discussão de formar um ou quatro ângulos retos também ocorreu em
outro grupo. Nesse momento o formador interrompeu e perguntou: O que são retas
perpendiculares?
Carlos: Formam pelo menos um ângulo reto.
94
Renato: Um?
Carlos: Se forma um então formam quatro.
Formador: Não precisava justificar, já está implícito na definição e escreve:
A
B é
perpendicular à reta m é equivalente a ângulo formado por
A
B e m mede 90°.
Os grupos chamam o ponto de intersecção entre a reta m e o segmento AB de
M, e iniciam a busca de relações solicitadas no item “d”.
Mirtes e José: MBM
A
= .
Rute: Posso dizer que A é imagem de B.
Maria: A é simétrico de B em relação à reta m.
Notamos que houve alguma discussão nos grupos quanto a própria palavra
“relação” que constava no item “d”, ficando a dúvida se dizer que m era mediatriz
fosse a relação que o formador esperava.
Todos realizaram as atividades propostas nos três primeiros itens e
desenharam a figura esperada.
Conhecimentos prévios aparecem no trabalho em grupo durante a realização
do item “e” da atividade, como por exemplo:.
Maria: Todos os pontos da mediatriz são eqüidistantes das extremidades.
Joana: A reta m é o lugar geométrico de todos os pontos eqüidistantes a dois
pontos fixos que são as extremidades do segmento.
Após todos encontrarem uma definição para a reta m, em seus grupos, o
formador interrompe para fazer a socialização das respostas apresentadas na
atividade, perguntando: Como vocês podem justificar as relações que fizeram?
Eva: Dobrei o papel, ficou um em cima do outro, logo é ponto médio e o ângulo é
de 90°, logo é perpendicular.
Joana: A dobradura justifica o ponto médio e o perpendicularismo. Como já sabia
que a reta é a mediatriz, posso afirmar que os pontos são eqüidistantes das
extremidades.
Sueli: Poderia definir por lugar geométrico (essa professora chegou atrasada
nesse encontro e não tinha participado da construção).
Pelas falas das professoras Eva e Joana foi possível notar a potencialidade do
registro de representação material, pois elas fizeram os tratamentos possíveis
nesse registro, ou seja, dobrar o papel para verificar a existência do ponto médio e a
perpendicularidade que não seria possível ser construída apenas no registro figural.
Em seguida, os grupos apresentaram as suas definições:
95
Grupo 1: m é uma reta perpendicular ao segmento AB que divide em duas partes
iguais e denominamos m mediatriz de
A
B.
Grupo 1: m é uma reta perpendicular ao segmento AB que passa por M (ponto
médio de
A
B ), denominamos essa reta de mediatriz de
A
B.
Grupo 2: m é o eixo de simetria de todos os pontos do segmento AB, isto é, cada
ponto de
A
B terá um simétrico em relação a m. Chamamos m de mediatriz do
segmento AB.
Grupo 3: Dado o segmento AB, traçamos uma reta perpendicular a
A
B,
passando pelo ponto médio de
A
B , define-se o lugar geométrico de todos os
pontos eqüidistantes às extremidades do segmento dado.
A professora Paula questionou a definição apresentada pelo grupo 2 dizendo:
Será que não é necessário explicar o que é eixo de simetria?
O formador deixou a questão em aberto, explicando que, no futuro, eles é que
fariam a escolha pela definição mais adequada.
Sabemos, entretanto, que o eixo de simetria é definido a partir da mediatriz de
um segmento e, sendo assim, a definição apresentada pelo grupo 2 seria circular.
Esse aspecto não foi discutido com o grupo de professores nesse momento.
Com relação à definição apresentada pelo grupo 3, o formador foi construindo
passo a passo na lousa:
Dado o segmento AB.
A
B
M
A
B
Marcando o ponto médio M.
A
B
M
Construindo a reta perpendicular por M
(Figura 4).
Figura 4: Mediatriz de um segmento
E perguntou: Será que eu preciso de tudo isso para definir a reta m? Para
definir o que precisa?
Carlos: O necessário, não precisa ficar repetindo e nem falar a mais.
Embora não se tenha decidido qual definição seria adotada, podemos perceber
o quanto foi importante para os professores essa atividade de construção de
definição, para que, no futuro, ela possa ser utilizada de forma consistente. A
atividade contribuiu, também, para que os professores se tornassem mais autônomos,
96
de modo a perceber que as definições em matemática podem ser construídas e, até
mesmo, questionadas.
O formador ainda comentou que esse tipo de trabalho poderia ser realizado
com os alunos para que eles pudessem decidir, também, que definição adotar.
Percebemos que os conhecimentos prévios dos professores, a respeito de
mediatriz de um segmento, não representaram obstáculo para a construção da
definição. Eles perceberam que não podiam definir a mediatriz como lugar geométrico
baseados nas relações que eles fizeram a partir da dobradura.
Concordando com Buffet (2003), podemos concluir que foi importante construir
as definições em matemática, pois os professores realizaram inferências e
destacaram o que seria fundamental para caracterizar o objeto matemático mediatriz
de um segmento. Nesse sentido, esperamos que o conceito de mediatriz de um
segmento tenha sido ampliado e, como uma ferramenta, seja utilizada para resolver
problemas futuros. E afirmamos que esta atividade contribuiu significativamente para
a construção de uma definição em matemática.
ATIVIDADE 2: FORMULANDO UMA CONJECTURA
a) Marque um ponto P (P diferente do ponto médio do segmento
A
B ) sobre a
reta “m” da atividade 1.
b) Trace os segmentos P
A
e PB .
c) Volte a dobrar sobre a reta “m”. O que você observou?
d) Marque outros pontos sobre a reta “m” e proceda da mesma forma anterior.
e) O que você observou?
f) Nessa atividade, você observou uma propriedade da mediatriz. Escreva seu
enunciado.
Análises prévias
O objetivo dessa atividade é enunciar a propriedade que diz: todo ponto que
pertence à mediatriz de um segmento é eqüidistante das extremidades desse
segmento.
Dentre as possíveis soluções que poderiam aparecer, após os professores
terem realizado o que foi solicitado nos itens “a”, “b” e “d”, destacamos:
c) Os segmentos
P
A
e PB têm a mesma medida, isto é, são congruentes.
97
e) Os pontos da mediatriz de um segmento eqüidistam das extremidades desse
segmento.
f) Todo ponto da mediatriz de um segmento eqüidista das extremidades desse
segmento.
A atividade sugere que as verificações sejam feitas de forma empírica –
tratamento no registro material – e possam despertar nos professores a formulação
da conjectura que diz que todo ponto da mediatriz eqüidista das extremidades do
segmento e que a possam escrever em linguagem natural. Com a conjectura
formulada, esperávamos que os professores buscassem uma justificativa para validá-
la, indo além da convicção, ou seja, não ficassem só convencidos, mas procurassem
saber por que tal fato ocorre, fomentando, dessa forma, a função de explicação
proposta por De Villiers (2001; 2002). Acreditávamos que a troca de informações
entre os professores constituía-se um momento rico, que os levasse a refutar
conjecturas não precisas e a buscarem uma justificativa matemática com base na
Geometria plana. O formador poderia socializar as idéias e propor (instigar) a busca
de uma demonstração, a partir do debate, por meio de devolução
35
dos problemas
que surgirem ao grupo.
Análise a posteriori
Todos participaram ativamente da atividade e seguiram as orientações dadas
na atividade.
A professora Maria antecipa, falando: “Agora vai aparecer que são
eqüidistantes”.
Mirtes: Eles têm a mesma medida, são congruentes. (ao se referir aos segmentos
PA e PB).
Mirtes concluiu que os segmentos PA e PB são coincidentes, porém a
professora Maria chamou atenção que não, pois eles não estão no mesmo lugar, eles
possuem a mesma medida. O formador intervém dizendo que, nesse caso, é melhor
usar a palavra sobrepõe, em vez de coincidente.
Mirtes após verificar – registro material – que os segmentos possuem a
mesma medida, já se preocupa em justificar (função de explicação segundo De
________________
35
Segundo Brousseau (1986).
98
Villiers) e pergunta a Maria: Tenho dúvida em explicar a congruência LAL, não sei
qual lado posso usar. Maria explicou.
Notamos também que a função de explicação aparece na fala da professora
Angélica, após ter feito o seguinte registro figural (figura 5):
Figura 5: Solução da atividade 02
Angélica: Os triângulos AMP e BMP são congruentes pelo caso LAL.
Paula: Não é preciso citar o caso de congruência uma vez que os triângulos já
são congruentes.
José: Os segmentos MB e PB são congruentes?
Angélica: Não. Pois o segmento PB é hipotenusa e, portanto, maior que o cateto
MB.
Percebemos, nesse momento, certa incompreensão em relação às
congruências garantidas e aquelas que precisam ser verificadas. E Angélica explica
aos professores: Paula, José e Eva, escrevendo:
comum é PM
PM
ˆ
BPM
ˆ
A
MBAM
, então os triângulos são congruentes pelo caso LAL.
Em outro grupo, percebemos a professora motivada a aplicar as atividades
com seus alunos. Será que temos uma possível mudança de prática? Não podemos
afirmar, porém acreditamos que as atividades estão remetendo os professores a sua
sala de aula.
Joana: Imagina se não vou brincar com meus alunos com isso aqui.
Renato: Vamos fazer no Cabri, e depois é só deslizar. Ao se referir aos vários
pontos.
Joana: Aí não vai dar para dobrar.
Carlos: Vai dobrar a tela?
Joana: E ainda mais que não temos um computador nem para cada dupla de
alunos.
99
Para o item “e” da atividade, os professores enunciam em seus grupos a
conjectura esperada.
Mirtes: Todos os pontos estão assim, ou seja, estão a igual distância das
extremidades do segmento AB.
Maria: Eqüidistam do segmento AB.
A professora Eva apresentou a construção da figura 6.
Figura 6: Solução da professora Eva
Angélica:
Os pontos P’, P’’ e P’’’ são eqüidistantes das extremidades.
Paula: P m d
PA
= d
PB
.
Rute, Sueli e Mirtes conversam sobre qual deverá ser a propriedade. E
escrevem: Todos os pontos da reta m eqüidistam dos extremos A e B do segmento
AB.
A professora Maria insiste que não são dos extremos, pontuando que a
eqüidistância é em relação ao segmento, e fala: “Todo ponto do segmento AB é
eqüidistante da mediatriz”, voltando à definição por simetria apresentada na atividade
1.
Realizado o item “f” da atividade, o formador inicia a socialização dos trabalhos
destacando as conclusões dos grupos. Para alguns professores a sobreposição era
suficiente, enquanto para outros houve a necessidade de justificar matematicamente
a conjectura elaborada.
O formador inicia a discussão desenhando na lousa a figura 7 a pedido dos
professores e destaca a propriedade que cada grupo elaborou, mostrando que a
propriedade decorre da definição.
100
Embora a propriedade apresentada pela maioria dos participantes fosse a
esperada, os que estavam relacionando a definição de mediatriz ao eixo de simetria
tiveram dificuldade de abandoná-la:
Figura 7: Representação da conjectura
Maria e Sueli: Os pontos da reta m são eqüidistantes de qualquer par simétrico
de
A
B em relação a m, ou seja, dado um segmento qualquer e sua mediatriz,
qualquer ponto desse segmento e o seu simétrico em relação a ela eqüidistarão
de qualquer ponto dessa mediatriz.
O formador propõe a discussão dessa propriedade e o grupo se manifesta:
Eva: Nesse caso, percorrem-se os pontos de m e também os do segmento AB.
Sueli: A eqüidistância deveria se referir não à mediatriz, mas a qualquer ponto
dela.
Sueli comenta que, ao trabalhar com seus alunos, costuma enunciar as
propriedades, o mais geral possível, pois acredita que devem abranger todos os
casos. A seguir, o formador comenta que existem propriedades específicas que são
enunciadas, em geral, para facilitar aplicações futuras e que, às vezes, uma
propriedade muito geral pode não dar margem a resolver problemas.
Sueli: No caso desse enunciado, os pontos A e B seriam casos particulares, um
caso de um par simétrico em relação à reta m.
Maria e Sueli ainda comentam que o uso das extremidades do segmento pode
fazer o aluno não entender situações em que os pontos considerados sejam outros e
exemplificam com C e C’ (figura 8).
Figura 8: Representação do par simétrico
101
O formador comenta que, nesse caso, m é mediatriz do segmento CC’ e, para
mencionar simetria, nas condições propostas por elas, seria mais adequado falar da
simetria central em vez de axial, uma vez que, a reta m não interfere nas simetrias
observadas. A partir dessa discussão, as professoras não mais apresentam essa
definição e assumem a definição do grupo.
O formador conclui a atividade dizendo que qualquer um dos enunciados pode
ser considerado propriedade, mas o que vai tornar tais propriedades válidas são as
demonstrações. Porém, o que garantirá a propriedade ser mais adequada ou não
será sua aplicação na resolução de problemas.
Acreditamos que o trabalho desenvolvido nessa atividade contribuiu em grande
medida na formação dos professores participantes acerca dos conteúdos
geométricos, visto que eles tiveram a oportunidade não só de formular a propriedade,
mas vislumbrar uma explicação de sua validade. Além disso, puderam perceber a
importância da definição, pois uma das perguntas da professora Joana foi: Qual a
diferença entre definição e propriedade?
Ressaltamos, ainda, que, durante essa atividade, os professores vivenciaram
as fases de ação e formulação propostas pela TSD, destacando que alguns
avançaram para uma validação, mesmo que de forma localizada, quando mostraram
a congruência de triângulos e validaram que os segmentos PA e PB eram
congruentes.
ATIVIDADE 3: DEMONSTRAÇÃO DA PROPRIEDADE
a) Podemos escrever uma mesma propriedade matemática em linguagens
diferentes. Em matemática, em geral, utilizamos a linguagem natural, a
linguagem simbólica e a linguagem figural. Escreva a propriedade da atividade
2 nessas linguagens.
Linguagem natural.
Linguagem simbólica.
Linguagem figural.
b) Como sabemos, no enunciado de uma propriedade ou teorema constam as
hipóteses e a tese. Em geral, consideramos hipótese os dados que o
enunciado nos oferece e como tese o que se quer demonstrar. Identifique a
hipótese e a tese da propriedade acima.
c) Demonstre essa propriedade.
102
Análises Prévias
Nosso objetivo é que os professores demonstrem a propriedade que diz: todo
ponto que pertence à mediatriz de um segmento é eqüidistante das extremidades
deste segmento.
Analisando matematicamente essa atividade, consideramos provável que os
professores chegassem, com sucesso, às seguintes respostas:
a) Linguagem natural: Todo ponto que pertence a mediatriz “m” de um
segmento
A
B é eqüidistante das extremidades desse segmento.
Linguagem simbólica: P m PBP
A
, onde “m” é a mediatriz do
segmento
A
B .
Linguagem figural (figura 9):
Figura 9: Linguagem figural - atividade 3
b) Hipótese: P pertence a mediatriz “m” de um segmento
A
B .
Tese: P é eqüidistante de A e B.
c) Seja P um ponto qualquer da mediatriz de um segmento
A
B e M o ponto
médio deste segmento.
MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B .
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P 90º, pois a reta “m” é perpendicular ao segmento
A
B .
PMPM , pois é lado comum.
ΔAPM ΔBPM, pelo caso LAL.
PBP
A
, pois são lados congruentes em triângulos congruentes.
P é eqüidistante de A e B, pois
PBP
A
.
Esperávamos que, nesse momento, os professores validassem a propriedade
em questão, por meio da demonstração. No entanto, algumas dificuldades poderiam
aparecer, ou até, ausência de ação para começar tal demonstração. Caso isso
103
acontecesse, apoiados em Duval e Egret (1989), que sugerem o uso de tarefas de
organização dedutiva, poderíamos propor aos professores a seguinte atividade:
I) São dadas abaixo, 7 afirmações. Numere-as de 1 a 7 em uma seqüência
lógica para obter a redação da demonstração da propriedade que diz: todo ponto que
pertence a mediatriz de um segmento é eqüidistante das extremidades deste
segmento.
_____ ΔAPM ΔBPM, pelo caso LAL.
_____ MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B .
_____ PBP
A
, lados congruentes em triângulos congruentes.
_____ P é eqüidistante de A e B, pois PBP
A
.
_____ Seja P um ponto qualquer da mediatriz de um segmento
A
B e M o
ponto médio deste segmento.o
_____ =BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P
90º, pois a reta “m” é perpendicular ao segmento
A
B .
_____ PMPM , pois é lado comum.
II) Faça a redação da demonstração na ordem que você enumerou.
Caso fosse necessário, poder-se-ia aproveitar a oportunidade para (re)discutir
que LLA
36
não seria caso de congruência, trazendo o contra-exemplo como uma
técnica de demonstração.
Esperávamos que, dessa forma, os professores pudessem validar a
propriedade e que a escrita da demonstração permitiria eliminar inconsistências
(raciocínios equivocados), como sugere De Villiers (2001; 2002) na função de
sistematização. Destacamos, também, segundo Duval (2003), que a escrita da
propriedade em vários registros de representação semiótica fazendo conversões,
permitiria que os professores a compreendessem melhor.
Algumas dificuldades como: escrita na linguagem simbólica, os casos de
congruência não estarem disponíveis, poderiam aparecer. Para minimizar tais
dificuldades destacaríamos os elementos teóricos necessários e as novas conclusões
________________
36
Caso apareça LLA como caso de congruência, proporemos aos professores a construção geométrica
de um triângulo dados dois lados e um ângulo não compreendido por esses lados. Tal construção, em
geral, gera duas soluções diferentes, garantindo dessa forma (por meio de um contra-exemplo) que
não é caso de congruência.
104
(propriedades, teoremas, definições e axiomas) que deviam ser mobilizados pelos
professores e estar disponíveis para uso em justificativas, e íamos socializar as
respostas e discutir com o grupo em formação. Um outro ponto de possível
dificuldade referia-se aos três tipos de registros de representação semiótica
abordados nessa atividade; o formador poderia “dar um salto informacional”, ou seja,
ilustrar com exemplos, o uso das linguagens natural, simbólica e figural, presentes
nesse contexto.
Até este momento, esperávamos que os professores em formação pudessem
agir, falar, conjecturar, validar, trocar idéias e que o formador apenas coordenasse as
atividades por meio de devoluções e/ou algumas institucionalizações locais,
permitindo aos professores vivenciarem as fases de ação, formulação e validação
propostas por Brousseau (1986). Nesse momento, uma intervenção direta do
formador se faria necessária, destacando a definição de mediatriz e a propriedade
demonstrada, garantindo dessa forma que tais conhecimentos fossem incorporados
ao repertório cognitivo desses professores e fossem utilizados para resolver novas
situações-problema.
Análise a posteriori
O formador retoma o que foi feito nas atividades anteriores e a professora
Angélica diz: Construímos a definição de mediatriz e formulamos uma conjectura.
Como era esperado, os professores mostraram não conhecer as
denominações: linguagem natural, simbólica e figural. Porém, os esclarecimentos
dados ao grupo pelo formador, bem como a intuição dos participantes com relação às
denominações foram suficientes para que eles realizassem a atividade. No entanto,
ficou o impasse: será que se pode usar palavras em língua natural juntamente com a
linguagem simbólica? Alguns professores acharam que podiam e outros que não. O
formador disse que podia e esclareceu que “rigor matemático” não pode ser
confundido com excesso de formalismo simbólico; que se pode ter o mesmo rigor
trabalhando apenas na linguagem natural. Inferimos que a mudança de registros
solicitada, nessa atividade, contribuiu de maneira singular, de acordo com Duval
(2003), para a compreensão da propriedade que seria validada por meio da
demonstração.
105
Apesar de escrever no registro simbólico, a professora Angélica se mostra
preocupada a respeito de precisar ou não definir m e P, já que esses elementos
tinham sido definidos anteriormente.
A professora Joana, após tirar algumas dúvidas com os colegas e o formador,
escreve a propriedade na linguagem simbólica: Dado
A
B , m
A
B ,
A
B m = {M} se
BM
A
M temos que P m então BP
A
P
.
As professoras Maria e Sueli escrevem a sentença:
B)d(P,A)d(P,mPB); , d(M A), d(M{M}m)AB(ABm ===
E mostram insegurança com relação ao símbolo de equivalência.
Notamos que, nesse registro simbólico, as professoras explicitaram a definição
de mediatriz, uma vez que não existe um símbolo específico para representar a
mediatriz, pois pensavam que não podiam escrever palavra alguma no simbólico.
Essas professoras ainda se perguntam: Como que se escreve “dado” e “seja”
em linguagem simbólica, não se dando conta que existem implícitos que não são
escritos.
As professoras Eva e Rute escrevem: P m, m mediatriz de
A
B , temos
A
P
BP .
Durante as realizações dos itens “b” e “c” da atividade algumas questões
aparecem:
Maria: Será que posso colocar só mediatriz ou tenho que explicar o que é
mediatriz?
Sueli: Quando usa a palavra mediatriz, já está dizendo que intercepta no ponto
médio e é perpendicular.
Maria: A demonstração vai ser por congruência de triângulos. Os casos de
congruência são postulados ou são demonstráveis?
O formador responde que, em geral, se toma um dos casos como postulado e
demonstram-se os outros. Mas, em alguns contextos, podem-se tomar todos os casos
como postulados, dependendo dos objetivos do curso, e isto deve ser esclarecido
para os alunos.
A representação figural foi feita corretamente por todos os professores. Apenas
a professora Rute achou necessário colocar outros pontos para dar a idéia de que é
106
ponto qualquer sugerindo a figura 10, na qual é destacada as reticências vertical entre
P
2
e P
n
para ilustrar que o ponto P é qualquer.
Figura 10: Representação da professora Rute
Maria: Não precisa, pois o ponto P já é qualquer.
Rute: Para os alunos seria necessário colocar outros pontos para dar a idéia que
é qualquer.
Acreditamos que esse tipo de implícito não está muito claro para alguns
professores, ou seja, se foi dado um P, sem nenhuma especificidade, o P já é
qualquer, indo ao encontro do princípio 3 proposto por Dreyfus e Hadas (1994),
quando nos indica que uma demonstração deve ser geral.
Observamos, também, que a professora Rute usa o aluno para justificar sua
escolha, isto é, ela apresenta vários pontos, inclusive com reticências, acreditando
que o aluno não entenderia de outra forma. Tal observação vai ao encontro de
Hershkowitz et al. (1994) quando nos revela que os professores apresentam padrões
e concepções incorretas, semelhantes aos seus alunos.
O formador diz que é necessário trabalhar com os alunos, em sala de aula,
esses implícitos da linguagem matemática.
A demonstração da propriedade solicitada no item “c” foi realizada por todos os
grupos com êxito. O formador fez pequenas observações, em geral, de linguagem na
escrita dessas. A única discussão necessária nessa demonstração foi para esclarecer
o professor Carlos, que tinha dúvidas para identificar os casos de congruência, pois,
em geral, colocava as letras em qualquer ordem (LLA, ALL). O formador solicitou que
ele construísse um triângulo dados dois lados e o ângulo oposto a um dos lados. O
referido professor percebeu que tinha duas soluções e, assim, não poderia ser caso
de congruência o LLA.
107
Além disso, surgiu uma dúvida com relação aos símbolos: e , que foi
esclarecida. O formador retomou que o primeiro significa condicional e o segundo
implicação e que a diferença entre eles é que a implicação é verdade sempre, ou
seja, é uma tautologia; em outras palavras é um condicional que foi provado que é
verdadeiro sempre.
É importante destacar a expectativa dos professores de que os três registros
de representação teriam sempre o mesmo conteúdo. Entretanto, Duval (2003) garante
que quando mudamos de registro de representação semiótica, podemos ter
elementos em um, não explicitado no outro e vice-versa, o que permite alguns
tratamentos ou facilitações. Nesse sentido, os registros em língua natural, simbólico e
figural, contribuíram, de maneira singular, para a compreensão da propriedade bem
como para validação da mesma com a demonstração.
O formador questionou os professores a respeito da representação do
segmento sempre na horizontal, e comentou que isso pode acarretar a perpendicular
ser sempre na vertical e que tal postura pode tornar-se um obstáculo didático
37
para o
aluno, pois eles podem pensar que a perpendicular é sempre vertical. Tal situação,
também é relatada por Pais (2001), sobre o costume dos livros didáticos e dos
professores sempre representarem os objetos geométricos na mesma posição.
Era previsto, na análise a priori, que caso os professores não conseguissem
realizar a validação com a demonstração seria dada uma tarefa de organização
dedutiva – Duval e Egret (1989) – para que os professores tivessem um ponto de
partida. Mesmo com o sucesso dos professores na demonstração distribuímos, essa
parte da atividade, que também foi realizada sem problemas. A discussão e a
validação de várias seqüências numéricas mostram certa autonomia dos professores
ao tratar e avaliar questões desse tipo.
________________
37
Segundo Almouloud (2007), os obstáculos didáticos nascem das escolhas de estratégias de ensino
que permitem a construção, no momento da aprendizagem, de conhecimentos cujo domínio de
validade é questionável ou incompletos que, mais tarde, revelar-se-ão como obstáculos à formação de
conceitos.
108
ATIVIDADE 4: UM OUTRO PONTO DE VISTA
a) Você acabou de demonstrar uma propriedade que diz que: todo ponto da
mediatriz de um segmento eqüidista das extremidades desse segmento.
Suponha agora que você pudesse marcar todos os pontos que são
eqüidistantes das extremidades de um segmento
A
B (se desejar faça uma
figura de apoio). Todos esses pontos formariam uma reta que intercepta o
segmento
A
B em M. O que representa esta reta para este segmento?
Justifique sua afirmação.
b) Na atividade 3 você demonstrou que: se P pertence a mediatriz do segmento
A
B , então P é eqüidistante de A e B. A nova caracterização que você construiu
no item (a) sugere uma outra propriedade. Escreva essa propriedade na:
linguagem natural, linguagem simbólica e linguagem figural.
c) Identifique a hipótese e a tese dessa propriedade.
d) Demonstre essa propriedade.
e) As afirmações abaixo foram retiradas das atividades realizadas por alguns
alunos quando redigiram a demonstração da propriedade que diz que: se P é
eqüidistante de A e B, então P pertence a mediatriz do segmento
A
B . Escolha
aquelas que julgar necessárias para demonstrar essa propriedade e numere-as
de 1 a ... em uma seqüência lógica, ou seja, que mostre a redação da
demonstração.
_____ M é ponto médio de
A
B , pois a mediatriz passa pelo ponto médio de
qualquer segmento.
_____ PBP
A
, por hipótese.
_____ Seja M o ponto médio do segmento
A
B , P M tal que PBP
A
e m a
reta que passa por P e M.
_____ BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P , pois ΔPMA ΔPMB.
_____ PBP
A
, pois o triângulo APB é isósceles.
_____ BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P = 90º, pelas duas afirmativas anteriores.
_____ MBM
A
, pois M pertence a mediatriz.
______ PMPM , pois é lado comum.
_____ Logo, P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
_____ M é ponto médio de
A
B , pois MBM
A
e M
A
B .
_____ ΔPMA ΔPMB pelo caso LLL.
_____ Temos que m
A
B
, pois P m, M m e
A
BPM
.
_____ MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B .
_____ =BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P + 180º, pois são ângulos suplementares adjacentes.
_____
A
M
ˆ
P = 90º e 90º, pois são ângulos suplementares adjacentes e BM
ˆ
P =
congruentes (ΔPMA ΔPMB).
_____ m é a mediatriz do segmento
A
B , pois m
A
B
e m passa pelo ponto
médio de
A
B .
f) Em linguagem natural, faça a redação da demonstração na ordem que você
enumerou.
109
Análises Prévias
Essa atividade objetiva explicitar uma outra forma de definir mediatriz de um
segmento, ou seja, a mediatriz de um segmento é o conjunto de todos os pontos que
eqüidistam das extremidades deste segmento, bem como demonstrar a propriedade
que diz: Se P é eqüidistante de A e B, então P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
Além disso, pretendíamos instigar, o debate entre formas diferentes de caracterizar o
mesmo objeto matemático, ou seja, discutir que existem maneiras equivalentes de
caracterizar (definir) um mesmo objeto matemático.
Dentre as respostas esperadas, considerávamos:
a) Essa reta é a mediatriz do segmento
A
B , pois ela passa pelo seu ponto
médio, uma vez que este ponto é eqüidistante das extremidades A e B e com o
esquadro ou uma dobradura, percebemos que ela é perpendicular ao segmento.
b) Linguagem natural: Se P é eqüidistante de A e B, então P pertence a
mediatriz (m) do segmento
A
B .
Linguagem simbólica: PBP
A
P m, onde “m” é a mediatriz do segmento
A
B .
Linguagem figural (figura 11):
Figura 11: Linguagem figural - atividade 4
c) Hipótese: P é eqüidistante de A e B.
Tese: P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
d) Seja M o ponto médio do segmento
A
B , P M tal que PBP
A
e m a reta
que passa por P e M.
PBP
A
, por hipótese.
MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B .
110
PMPM , pois é lado comum.
ΔPMA ΔPMB pelo caso LLL.
BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P , pois ΔPMA ΔPMB.
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P + 180º, pois são ângulos suplementares adjacentes.
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P 90º, pelas duas afirmativas anteriores.
Temos que m
A
B
, pois P m, M m e
A
BPM
.
m é a mediatriz do segmento
A
B , pois m
A
B
e m passa pelo ponto médio
de
A
B .
Logo, P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
e) (não) M é ponto médio de
A
B , pois a mediatriz passa pelo ponto médio de
qualquer segmento.
(2) PBP
A
, por hipótese.
(1) Seja M o ponto médio do segmento
A
B , P M tal que PBP
A
e m a reta
que passa por P e M.
(6) BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P , pois ΔPMA ΔPMB.
(não) PBP
A
, pois o triângulo APB é isósceles.
(8)
A
M
ˆ
P = 90º e 90º, pelas duas afirmativas anteriores. BM
ˆ
P =
(não)
MBM
A
, pois M pertence a mediatriz.
(4)
PMPM , pois é lado comum.
(11) Logo, P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
(não) M é ponto médio de
A
B , pois MBM
A
e M
A
B .
(5) ΔPMA ΔPMB pelo caso LLL.
(9) Temos que m
A
B
, pois P m, M m e
A
BPM
.
(3) MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B .
(7) =BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P + 180º, pois são ângulos suplementares adjacentes.
(não)
A
M
ˆ
P = 90º e 90º, pois são ângulos suplementares adjacentes e
congruentes (ΔPMA ΔPMB).
BM
ˆ
P =
(10) m é a mediatriz do segmento
A
B , pois m
A
B
e m passa pelo ponto
médio de
A
B .
111
f) (1) Seja M o ponto médio de um segmento de extremidades A e B, o ponto P
distinto de M tal que o segmento de extremidades P e A seja congruente ao
segmento de extremidades P e B e m a reta determinada pelos pontos P e M.
(2) Os segmentos P
A
e PB são congruentes por hipótese.
(3) Os segmentos M
A
e MB são congruentes, pois M é ponto médio do
segmento
A
B .
(4) PM é congruente com PM , pois é lado comum.
(5) Triângulo PMA é congruente com o triângulo PMB pelo caso LLL (as
afirmações 2, 3 e 4).
(6) Os ângulos são congruentes, pois são ângulos
correspondentes em triângulos congruentes.
BM
ˆ
PeAM
ˆ
P
(7) Os ângulos são suplementares adjacentes, logo a soma deles
vale 180°. E sendo assim as medidas é 90° cada um.
BM
ˆ
PeAM
ˆ
P
BM
ˆ
PeAM
ˆ
P
(8) A reta m é a mediatriz do segmento
A
B , pois a reta m é perpendicular ao
segmento e a reta m passa pelo ponto médio do segmento
A
B .
(9) Logo, o ponto P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
Esperávamos que ocorresse um debate sobre as duas caracterizações
(definições) de mediatriz e que os professores percebessem que elas são
equivalentes. Na verdade, esperávamos por esta descoberta, fomentando a função de
descoberta proposta por De Villiers (2001; 2002); caso tal descoberta não se
consolidasse, o formador faria devoluções de forma que os professores participantes
pudessem explicitar a nova caracterização de que a mediatriz de um segmento é o
conjunto de todos os pontos que eqüidistam das extremidades desse segmento.
Ao fazer uso de três registros de representação semiótica, acreditávamos que
a propriedade destacada seria mais bem entendida pelos professores e que os
elementos hipótese e tese ficassem mais evidentes, evitando, desta forma,
demonstrações circulares. Deixaríamos livre a validação por parte dos professores e,
logo depois, faríamos uma proposta de ordenação por meio de uma tarefa de
organização dedutiva (nem todas as afirmativas seriam utilizadas). Isso nos permitiria
ter indícios da segurança com a qual poderiam fazer a demonstração e se iriam
retornar à escrita deles (ressaltamos que existe mais de uma ordem que leva a
demonstração). A escrita em linguagem natural, não só resgataria a função de
112
sistematização proposta por De Villiers (2001; 2002), como também a importância dos
vários registros de representação semiótica, nesse caso, o registro simbólico
garantiria uma economia na escrita.
Dificuldades como: demonstrações circulares, os professores não se
“libertarem” da definição mais usual, encadeamento lógico da demonstração; que
porventura aparecessem, seriam discutidos quando socializássemos as respostas e
colocássemos na lousa as “ordens” encontradas para posterior discussão. Na
socialização das respostas, seria válido debater todas as ordens (numeração)
encontradas, pois, como já destacamos, poderia ter mais de uma ordem correta e,
mesmo o debate levando o erro em consideração, é importante na construção do
conhecimento.
Um debate sobre o teorema recíproco era esperado. Tal questão poderia
aparecer espontaneamente ou caso contrário poderia ser instigada pelo formador ao
lembrar aos participantes as duas propriedades (teoremas) relativas à mediatriz de
um segmento que seriam demonstradas e escrevendo na lousa essas propriedades.
P
1
: Se P pertence a mediatriz do segmento
A
B , então P é eqüidistante de A e
B.
P
2
: Se P é eqüidistante de A e B, então P pertence a mediatriz do segmento
A
B .
O formador poderia perguntar para os professores o que eles observaram nas
propriedades, o que elas têm em comum, o que se pode notar. Após debater e tratar
de outros exemplos, seria institucionalizado que teoremas desse tipo são chamados
de TEOREMAS RECÍPROCOS e podem ser enunciado como: P pertence à mediatriz
de um segmento
A
B se, e somente se, P é eqüidistante de A e B. Poder-se-ia trazer
outros teoremas e pedir para que os participantes enunciassem o recíproco. A
discussão sobre a veracidade da proposição recíproca de um teorema seria
fomentada, uma vez que, somente após ser julgada verdadeira, tal proposição
poderia ser batizada de teorema e permitiria uma escrita na forma “se, e somente se”,
sendo também mais uma oportunidade para debater sobre o contra-exemplo como
técnica de demonstração. Seria, também, oportuno discutir um pouco da simbologia
da lógica: pq, (rs) (rs sr).
113
Análise a posteriori
Salientamos que a discussão dessa atividade foi realizada em dois encontros,
primeiramente pelo fato de termos uma freqüência inferior a 50% dos participantes no
primeiro encontro e segundo, porque ficaram dúvidas para serem esclarecidas e,
além disso, os professores participantes tiveram a oportunidade de amadurecerem
sobre o que foi desenvolvido na atividade durante essa semana. Nesse sentido, na
segunda sessão, na qual foi retomada essa atividade, começamos perguntando aos
professores, que estavam presentes na sessão anterior, sobre o que tinha sido feito
no encontro anterior. E a partir daí, foi desencadeada outra discussão.
Destacamos, também, que a demonstração envolvida nessa atividade
apresentava alguns implícitos, até mesmo para nós, pois, em geral, demonstrar a
pertinência de um ponto a uma reta não é elementar. Assim, nos colocamos a refletir
sobre a abordagem dos livros que usamos para construir o nosso objeto matemático,
o porquê da falta da demonstração do recíproco do teorema da atividade 3.
Nosso objetivo principal era caracterizar a mediatriz de um segmento sobre um
outro “ponto de vista”. Percebemos, então, que a atividade em questão contribuiu
nesse sentido. Vejamos como os professores enfrentaram inicialmente as situações
propostas:
Maria: Fala de mediatriz, não é? Não é Rute? É a própria mediatriz!
Rute: É.
Maria: Ah! É uma recíproca, não é? Mostrando a seguinte representação da figura
12.
Rute: Mas, como justificar? Realmente é a volta do que a gente tinha feito.
Figura 12: Mudando de ponto de vista
O diálogo exposto nos mostra a confirmação da construção da mediatriz sob
outro “ponto de vista” e a presença do teorema recíproco.
Rute: Como vou demonstrar?
Sueli: Está pedindo para justificar e não demonstrar.
114
Sueli: É a mesma coisa do que a gente já tinha falado! Não é recíproco!
Maria: É ao contrário! Eu acho!
Sueli: Ah tá! Tenho que marcar todos os pontos! Tá certo! Isso mesmo, é ao
contrário! Como é que vou justificar? É por demonstração?
Destacamos que o professor Carlos dobrou a folha, para verificar a
perpendicularidade, o que nos levou, mais uma vez, a perceber a potencialidade do
registro de representação material.
Com a conjectura formulada, ou seja, que a reta determinada pela união de
todos os pontos que são eqüidistantes das extremidades de um segmento é a
mediatriz desse segmento, os professores começaram a buscar uma validação por
meio da demonstração. A função de explicação fomentada por De Villiers (2001;
2002) estava presente, pois notamos que os professores não estavam satisfeitos
apenas por saber que aquela reta era a mediatriz, mas, sobretudo o porquê daquela
reta ser a mediatriz do segmento. Isso ficou evidente na fala da professora Sueli,
destacada anteriormente.
Ao se referir ao ponto médio do segmento, Sueli diz: M já é ponto médio por
hipótese. Em seguida, juntamente com Rute, destaca que MBM
A
. E fazem a
seguinte representação da figura 13. Sueli diz: A gente tem que provar que isso aqui é
perpendicular, pois se M é eqüidistante das extremidades, então M é ponto médio
(mostrando o que está apontado com a seta na figura 13).
Figura 13: Pontos eqüidistantes pertencem à mediatriz
Sueli: Tá na cara que o ângulo é reto, porém tem que provar.
Formador: Onde está o nó?
Rute: Quando nós começamos a fazer usamos dobradura, será que posso usar?
Formador: Para justificar pode!
Mais uma vez é destacada a potencialidade do registro de representação
material.
115
Sueli e Rute, após tentarem a demonstração sem sucesso, perguntam para
outro grupo: Vocês conseguiram provar a perpendicularidade.
Maria: Sim. Pela congruência LLL.
Sueli: Só dizer LLL você não está provando que é 90º.
Formador: Na verdade vocês já estão na demonstração, a justificativa poderia até
ser empírica.
Na tentativa de explicar o porquê da veracidade da afirmação (função de
explicação), Sueli e Rute fazem uma justificativa matemática para o
perpendicularismo por meio da propriedade do triângulo isósceles (figura 14).
Vejamos:
Sueli: Ah, tá aí! Se tenho um triângulo isósceles essa reta só pode ser a altura e
ela é perpendicular a base.
P
Figura 14: Demonstração via triângulo isósceles
Formador:
Essa é uma saída, quero outra.
Sueli: Ah! Espera um pouco!
Sueli foi à lousa desenhou a figura 15 e falou: Nós já descobrimos que os
triângulos APM e BPM são congruentes e como
PM é lado comum, temos que:
Figura 15: Demonstração sem uso do triângulo isósceles
Sueli aponta o ângulo destacado na figura 15, comentando que a soma é 180º
e como são dois ângulos iguais só pode ser 90º.
Formador: Agora vocês podem organizar a demonstração, já tem hipótese, tese,
já escreveram nas três linguagens.
Reafirmamos que o uso da propriedade enunciada nos três registros de
representação semiótica, ajudou os professores a compreenderem melhor a
116
propriedade destacada. Os registros em língua natural e o figural foram usados com
sucesso. Porém, o uso correto do registro simbólico precisou da intervenção do
formador. Vejamos:
Maria: Todos os pontos que eqüidistam das extremidades de um segmento
formam a mediatriz do mesmo.
Formador: E o simbólico?
Sueli: Podemos trocar o todo por P m.
Maria: Se PBP
A
, então P m.
Maria: Qual o símbolo para a palavra “então”?
O formador responde e Maria escreve: PBP
A
P m, m mediatriz de
A
B .
Maria vai à lousa e escreve a demonstração, com base na figura 15.
Hipótese: PBP
A
Tese: P
m
L:
PB
A
P (por hipótese)
L:
MB
A
M (por hipótese)
L:
PM lado comum
Caso LLL de congruência, logo, podemos concluir que:
(1)
PM
ˆ
BPM
ˆ
A
BP
ˆ
MMP
ˆ
A
PB
ˆ
MPA
ˆ
M
Se m( PM
ˆ
A
) + m( ) = 180
o
(por construção) e por (1) m(PM
ˆ
B PM
ˆ
A
) =
m( ) = 90
o
, então PM
ˆ
B
A
BPM
e, se MB
A
M
, PM é mediatriz de
A
B.
O formador faz uma correção na última afirmação, ficando assim:
Se m( PM
ˆ
A
) + m( ) = 180
o
(por construção) e por (1) m(PM
ˆ
B PM
ˆ
A
) = m( =
90
o
, então
PM
ˆ
B)
A
BPM e como M é ponto médio de
A
B , logo PM é mediatriz de
A
B.
Notamos que as construções e discussões realizadas pelos professores
contribuíram para uma nova forma, porém equivalentes, de caracterizar a mediatriz de
um segmento. Nesse momento, o formador conduz a discussão de forma que os
professores explicitem esse fato, propondo uma reflexão sobre a atividade.
Formador: O nome da atividade é: “Um outro ponto de vista”, o que vocês tem a
falar a respeito disso?
Como não obtém resposta, continua:
117
Formador: Como definimos mediatriz na atividade passada?
Rute: É a reta perpendicular ao segmento que o intercepta no seu ponto médio.
Formador: Qual a propriedade demonstrada?
Angélica: Qualquer ponto da mediatriz é eqüidistante dos extremos do segmento.
Formador: O que a gente fez hoje?
Maria: A recíproca.
Formador: Seria possível considerar a propriedade formulada hoje como uma
definição de mediatriz?
Os professores respondem que sim.
Formador: E aí a definição formulada anteriormente na atividade 3, passaria a ser
uma propriedade. Logo, mediatriz de um segmento pode ser definida como:
É o
conjunto de todos os pontos que são eqüidistantes das extremidades do
segmento
.
Notamos que a noção de “ponto de vista” foi fomentada nessa atividade e que
os professores perceberam que um mesmo objeto matemático pode ser caracterizado
de outra forma, nesse caso, equivalente. Na verdade, trabalhou-se no mesmo quadro
(Geometria) e no mesmo registro (escrita das definições em linguagem natural), o que
mudou foi o “ponto de vista”. Outro ponto a destacar é a possibilidade de construir a
definição em matemática, que, para nós, é de suma importância para construção e
ampliação de conceitos. Nesse sentido, estamos de acordo com Buffet (2003),
quando diz que construir definições é muito importante ao trabalhar com matemática,
pois esse processo contribui fortemente para a formação do conceito. Logo, ao
possibilitar que os professores vivenciassem tal situação, em geral, não presente no
ensino, contribuímos para formação do conceito de mediatriz de um segmento e para
a possibilidade deste ser usado em atividades futuras de forma mais autônoma pelos
professores.
O item “e” (organização dedutiva) foi pedido para ser respondido em casa. A
partir desse encontro, sempre tínhamos alguma atividade para realizar em casa e
quando não o fazíamos, os professores cobravam a lição. Ao chegarem ao encontro
solicitávamos que trocassem informações entre eles e socializassem as suas
respostas, esse momento era muito rico e será mostrado nas próximas atividades.
A professora Joana, ao receber a atividade (organização dedutiva) para realizar
em casa, comentou que esse tipo questão é muito importante para a sala de aula,
pois orienta os alunos, lhes dando um ponto de partida, como prevista por Duval e
Egret (1989).
118
Ao retomarmos essa atividade em outro encontro, o formador pede aos
participantes que estiveram presentes no encontro anterior, que contem aos seus
pares o que realizaram.
Formador: Vamos retomar a demonstração do encontro passado.
Os professores Carlos e Joana tinham realizado a demonstração tomando
como referência o ponto médio (como nas análises prévias), porém, queriam refazer a
demonstração tomando dois pontos quaisquer diferentes do médio (ver figura 16).
Carlos: Seja Q, Q P, tal que
QBQA
,
mQP =
, temos que provar que m é a
mediatriz do segmento AB.
Formador: Será que por esse caminho dá para demonstrar?
Joana: Basta provar que é perpendicular.
Formador: Qual a definição de mediatriz?
Joana: Reta que é perpendicular ao segmento passando pelo ponto médio.
Carlos: Será que essa reta passa pelo ponto médio?
Carlos: Seja M o ponto de intersecção de
A
B com m.
A demonstração foi realizada com base na figura.
Joana: Temos que usar os casos de congruência.
Joana: Os triângulos QAM e QMB são congruentes pelo caso LLA.
Carlos: LLA? O correto é LAL, pois já realizamos a construção e vimos LLA não é
caso de congruência, acho que agora não esqueço mais, pois vi na prática.
A
B
M
P
Q
Figura 16: Uma outra demonstração
Esta fala do professor Carlos é referente à construção que foi pedida para ser
realizada, na qual dois lados e um ângulo não compreendido por esses lados podem
gerar dois triângulos não congruentes. Nesse sentido, inferimos que a nossa decisão
foi acertada, uma vez que sempre que apareciam os casos de congruência, os
professores trocavam a ordem das letras. Pensamos que o cuidado ficou maior a
partir desse momento e eles puderam perceber que a exigência da ordem nas letras é
fundamental.
119
Joana: Estou vendo outros triângulos.
Carlos: ΔAPQ Δ BPQ, caso LLL.
Formador: O que acontece se os triângulos são congruentes?
Joana: Se dois triângulos são congruentes, então os lados e os ângulos são
congruentes.
O formador passa a escrever na lousa o que o professor Carlos fala.
ΔAPQ ΔPQB (LLL) MP
ˆ
BMP
ˆ
A
ΔAPM ΔBPM (LAL)
MB
A
M M é ponto médio
Joana: Se duas retas são concorrentes e os ângulos consecutivos são
congruentes (90º), então as retas são perpendiculares.
O formador pergunta se todos entenderam a idéia e registra na lousa o que os
professores vão dizendo:
Temos ΔAPM ΔBPM (LAL), logo, PM
ˆ
BPM
ˆ
A
e 180º,
daí
=+ PM
ˆ
BPM
ˆ
A
=
= PM
ˆ
BPM
ˆ
A
90º Logo a reta
mPQ =
é perpendicular.
Se M
m e m
A
B então m é mediatriz de
A
B.
Após o momento de socialização entre os grupos, o formador pergunta aos
professores Mirtes e José, que tinham faltado o encontro anterior, quais foram as
propriedades demonstradas. Eles respondem e o formador registra na lousa as suas
respostas.
Se P pertence a mediatriz m de um segmento AB, então P é
eqüidistante de A e B.
Se P é eqüidistante de A e B então P pertence a mediatriz m do
segmento AB.
Maria: São teoremas recíprocos.
Formador: O que quer dizer teoremas recíprocos?
Maria: Um da origem ao outro.
Formador: O que eles tem em comum? E escreve na lousa os teoremas no
registro simbólico.
Hipótese: P m e Tese: PA = PB
Hipótese: PA = PB e Tese: P m
Formador: Por que são recíprocos Mirtes?
Mirtes: Eu acho assim, o que é hipótese de um é tese do outro e vice-versa.
Maria: Teorema é o mesmo que propriedade?
Formador: Responde que sim, se a propriedade for demonstrável.
120
O formador pergunta se a afirmação: Se dois ângulos são opostos pelo vértice
então eles são congruentes, é um teorema. Todos respondem que sim, ele pergunta
qual a proposição recíproca desse teorema.
Mirtes: Se dois ângulos são congruentes então são opostos pelo vértice.
José: Eu concordo com ela.
Formador: Eles são teoremas recíprocos?
A professora Maria escreve na lousa a hipótese e a tese:
Hipótese: AÔB e CÔD são o.p.v. e Tese: AÔB CÔD.
Hipótese: AÔB CÔD e Tese: AÔB e CÔD são o.p.v.
Formador: Qual a condição para ser um teorema?
Mirtes: Se eu tiver um ângulo de 90º um ao lado do outro, não são o.p.v.
E desenhou a figura 17:
..
Figura 17: Ângulos congruentes que não são o.p.v.
Formador: Como vimos, nem todo teorema tem recíproco.
Maria: Mas não é teorema?
Formador: É teorema, mas a proposição recíproca não é um teorema.
O formador ainda comenta que este é um erro comum, cometido por muitos
alunos. Que usam o recíproco de um teorema quando esse não é válido. Esse erro
também é cometido por nós professores. Nesse sentido, temos presente os princípios
de Dreyfus e Hadas (1994), ou seja, um teorema não tem exceções e a recíproca de
uma afirmação verdadeira nem sempre é verdadeira.
Formador: Se A B e B A, podemos escrever A B.
Angélica: P pertence a mediatriz de um segmento AB se, e somente se, P é
eqüidistante de A e B.
O formador pergunta: como ficaria na linguagem simbólica? Passando a
escrever na lousa a resposta dada pelos professores:
Seja m a mediatriz de
A
B, P m PBP
A
, ou
P
m PBP
A
PBP
A
P m.
Formador: Na minha experiência, isso é muito forte, os alunos pensarem que, se
vale a ida, vale a volta, será que não somos nós que impomos esse obstáculo
didático?
121
Outra discussão que ocorreu foi levantada pela professora Sueli, que, por
representar triângulos congruentes sempre na ordem de correspondência dos
vértices, acreditava que isso fosse uma obrigatoriedade, e o formador respondeu:
Formador: As letras não precisam ser na ordem da correspondência de cada
elemento. Podemos falar que o segmento AP é congruente ao segmento PB e a
ordem triângulo BMP ou triângulo BPM não faz diferença, pois se trata do mesmo
triângulo. É bom até quebrar isso em sala de aula, pois podemos, sem querer,
construir algum tipo de obstáculo.
Com relação à atividade que ficou para casa, a professora Maria comentou que
é melhor recortar, pois assim fica melhor para ordenar. Acreditamos que essas tarefas
de organização dedutiva não tiveram o sucesso que esperávamos nas análises
prévias, talvez pelos professores já estarem em formação no projeto de demonstração
há um tempo maior ou até mesmo por serem professores. Possivelmente esse tipo de
tarefa deva ser proposto, com mais eficácia, para alunos.
No que diz respeito à formação matemática dos professores, percebemos que
essa atividade contribuiu bastante, pois a discussão sobre teoremas recíprocos e
proposição recíproca, mostrou que há um cuidado nem sempre tomado pelos
professores, podendo gerar, por essa falta de discussão, obstáculos didáticos, nesse
sentido, contribuímos para a formação matemática do professor como proposto por
Ponte (2001) e Shulman (2001).
Ao rediscutirmos essa atividade, possibilitando os professores socializarem
com seus pares, acreditamos que contribuímos para ampliação do conceito do objeto
mediatriz de um segmento, bem como em todas as discussões geométricas que se
fizeram presentes. Os professores tiveram a oportunidade de expor como tinham
realizado a atividade e, os que ouviam, podiam questionar. Dessa forma, a discussão
contribuiu para que os professores se tornassem mais autônomos, pois eles
conseguiram ampliar suas idéias ao demonstrarem por outros caminhos, se
posicionando na extremidade da andragogia do contínuo pedagógico-andragógico.
122
ATIVIDADE 5: FAZENDO ESCOLHAS
Nas atividades anteriores, você caracterizou a mediatriz de um segmento de
duas formas diferentes, ou seja, definiu mediatriz a partir de características
próprias desse objeto matemático. Observe o quadro abaixo e responda:
PROPRIEDADE 1: Um ponto
pertence à mediatriz de um segmento
se, e somente se, eqüidista das
extremidades desse segmento.
DEFINIÇÃO 1: A mediatriz de um
segmento é a reta que passa pelo
ponto médio desse segmento e é
perpendicular a ele.
a) Comparando as definições e as propriedades acima o que você pode
afirmar?
b) As definições 1 e 2 são equivalentes? Justifique.
c) Para garantir a consistência das justificativas em questões de demonstração
matemática, é preciso ter claro o que é definição e o que é uma propriedade de
um objeto matemático. Para evitar escritas circulares, elegeremos a definição
de mediatriz e conseqüentemente a propriedade que serão usadas em
atividades futuras.
Definição: ______________________________________________________
Propriedade: ___________________________________________________
Análises Prévias:
Com essa atividade, objetivávamos institucionalizar que em matemática
existem formas equivalentes de caracterizar o mesmo objeto matemático. Nesse caso
particular, temos duas caracterizações diferentes e equivalentes para mediatriz de um
segmento. Pretendíamos, ainda, desenvolver a questão da formalidade em
matemática, ou seja, qual a definição e qual propriedade os professores usariam em
demonstrações futuras.
Dentre as prováveis respostas, que poderiam ser dadas para o item “a”,
acreditamos que os professores diriam que a definição é a propriedade 2 e a definição
2 é a propriedade 1. Já para o item “b”, inferimos que eles diriam que são
equivalentes e que justificariam remetendo-se às demonstrações realizadas. Com
relação ao item “c”, esperávamos que a definição mais usual (definição 1) fosse a
DEFINIÇÃO 2: A mediatriz de um
segmento é o conjunto de todos os
pontos que eqüidistam das
extremidades desse segmento.
PROPRIEDADE 2: A mediatriz de um
segmento passa pelo ponto médio
desse segmento e é perpendicular a
ele.
123
eleita por eles e sendo assim fariam a escolha pela propriedade 1. Porém, o debate
acerca de definições equivalentes e o fato de os professores terem construído as
definições que aparecem, poderia proporcionar-lhes, a escolha pela definição 2 e a
propriedade 2.
O formador institucionalizaria que as caracterizações (definições) apresentadas
são equivalentes e o que estava em jogo era a definição do objeto matemático,
mediatriz de um segmento, sob “pontos de vistas” diferentes. Reforçaria, ainda, que,
em matemática, várias são as situações nas quais se usam caracterizações
equivalentes para se definir um mesmo objeto matemático, destacando o cuidado
necessário para se eleger uma definição e destacar o que é propriedade. Esperava-se
que o debate acerca dessa temática fosse grande e pudesse trazer como ilustração
uma das questões da parte discursiva da prova de matemática do concurso de 2006
para professores da rede estadual de São Paulo: a questão versava sobre formas
equivalentes de definir um mesmo objeto matemático e pedia a respectiva
demonstração
38
.
O debate sobre a formalidade em matemática seria fomentado, ou seja, o
porquê dessas escolhas. Grupos diferentes poderiam fazer escolhas distintas e
assim, enriquecer a discussão em atividades futuras. Relatos sobre qual decisão
tomar na sala de aula também seria esperado, por parte dos professores
participantes. Esperávamos, ainda, que a função de descoberta proposta por De
Villiers (2001; 2002) fosse contemplada.
Ao final dessa atividade, o formador deixaria explícito o objetivo geral das
atividades realizadas, ou seja, a institucionalização da definição e da propriedade
referente ao objeto matemático mediatriz de um segmento e como, de maneira
________________
38
Um livro de matemática definiu paralelogramo como sendo um quadrilátero cujos lados opostos são
paralelos. Um professor questiona seus alunos a darem outras possíveis definições de paralelogramo e
obtém deles as seguintes respostas:
1. É um quadrilátero convexo cujos lados opostos são congruentes.
2. É um quadrilátero convexo cujos ângulos opostos são congruentes.
3. É um quadrilátero cujas diagonais se cortam no ponto médio de ambas.
4. É um quadrilátero que possui um par de lados opostos paralelos e congruentes.
5. É um quadrilátero que possui um par de lados opostos paralelos e um par de ângulos opostos
congruentes.
6. É um quadrilátero que possui um par de lados opostos paralelos e outro par de lados opostos
congruentes.
a) Demonstre que as quatro primeiras respostas são equivalentes à definição dada no livro.
b) As afirmações (5) e (6) estão corretas? Justifique.
124
“formal”, poder-se-ia usar a definição e propriedade inerentes a este objeto em uma
demonstração.
Análise a posteriori
Na tentativa de responder às questões propostas, o debate entre os
professores foi intenso, desde a escolha da definição e da propriedade que julgavam
mais adequadas para justificar questões futuras e até mesmo para aceitarem
trabalhar com as duas definições e propriedades. Vejamos:
Maria: Dependendo do contexto uma definição é melhor que a outra.
Sueli: As definições 1 e 2 são equivalentes?
Sueli: A definição 2 é com a propriedade 1 e a definição 1 é com a propriedade 2.
E as duas propriedades você demonstra.
Rute: Definição 1 gera a propriedade 2 e a definição 2 gera a propriedade 1.
Sueli: A gente sabe que são equivalentes, mas justificar! Nós fizemos as
demonstrações. Será que é porque elas são ida e volta? Da propriedade 1 eu
chego na definição 2. E da 2 eu chego na 1.
Mirtes: A definição 2 é a propriedade 1 .
Angélica: Discordo, pois na definição 2 não se fala em reta.
Mirtes: O que é equivalência?
Angélica: Duas definições são equivalentes quando são iguais.
Com relação a essa discussão, temos respostas semelhantes dadas por outros
professores.
Joana: O que é definição em um é propriedade no outro e vice-versa.
Renato: Não entendi.
Joana: É assim Renato: Se usa a definição 1 temos a propriedade 1 e se usa a
definição 2 temos a propriedade 2.
Joana: Se eu considerar que a reta é um conjunto de pontos então são equivalentes.
Esse nome equivalente me traz um pouco de medo, nunca sei quando é equivalente.
O formador começa a institucionalizar as respostas e diz que a atividade 5
propõe uma institucionalização das discussões realizadas. Os professores concordam
que as definições eram equivalentes e, após muita discussão, o formador chegou à
seguinte representação na lousa:
Definição 1 Propriedade 1
Propriedade 2
Definição 2
c c
Maria: Quando se determina uma definição, têm uma propriedade associada. Se toma
a propriedade como definição a outra definição passa a ser propriedade.
125
Sueli: As duas definem mediatriz.
Maria: Se elas definem o mesmo objeto matemático então elas são equivalentes.
Formador: Temos que escolher entre a definição 1 ou a 2 e a sua propriedade.
Os grupos não chegam a um consenso, como havia sido previsto nas análises
prévias. Alguns professores preferiram trabalhar com a definição 1 e a propriedade 1
e outros com a definição 2 e a propriedade 2.
Maria: Então, vai ser assim: Se usar a definição 2 tenho que usar a propriedade 2, que
é o que decorre dela.
Formador: Qual a importância de se eleger uma definição e uma propriedade nesse
momento?
Joana: Vai facilitar a escrita da demonstração na hora de fazer as justificativas.
O formador comenta que existem formas não equivalentes de definir os objetos
em matemática e exemplifica, relatando que o mais importante é a coerência dentro
da definição escolhida. E destaca que, no caso da atividade 5, as definições eram
equivalentes, porém tinham sido enunciadas sob “pontos de vista” diferentes. Como
percebemos na fala do observador.
Formador: Já que não temos um consenso das definições e propriedades, vamos
buscar ser coerente na resolução das atividades.
As atividades propostas estavam fundamentadas na TSD, ou seja, os
professores participantes sempre vivenciaram momentos de ação (ao aceitarem os
problemas), formulação (ao formularem conjecturas e anteciparem resultados) e
validação (justificando e demonstrando propriedades), nas quais sempre tínhamos o
formador fazendo a institucionalização ao final de cada atividade. O formador deixava
explicito e destacava o que se pretendia ao final de cada atividade, garantindo dessa
forma que os objetos institucionalizados fossem retomados nas atividades que vinham
na seqüência.
Porém, nessa atividade, desejávamos institucionalizar duas caracterizações de
mediatriz de um segmento, ou seja, que os professores pudessem construir a
definição de mediatriz sob “pontos de vista” diferentes, como destacamos nas
análises prévias. Nesse sentido, as atividades anteriores a essa, funcionaram como
fases de ação, formulação e validação para este fim, pois os professores, em
momento algum, tiveram a clareza da intenção didática dessa atividade 5 e puderam
agir ao construírem as definições, por meio do registro de representação material,
formularem que as definições eram equivalentes, ao trabalharem com o recíproco de
126
um teorema e validarem por meio das demonstrações, cabendo ao formador nesse
momento fazer a institucionalização.
Percebemos, nas respostas dadas, uma preocupação dos professores com as
justificativas matemáticas. Ao final dessa atividade, acreditamos que os professores
estavam mais seguros para resolver problemas com o uso do objeto mediatriz de um
segmento como principal ferramenta. Sendo assim, poderão justificar as construções
geométricas fazendo uso da propriedade e da definição que escolheram. Inferimos
que a atividade contribuiu para que os professores ampliassem a sua autonomia, ao
não fazer juízo de qual a resposta correta ou qual a resposta esperada pelo formador.
De forma segura, respeitaram as decisões de seus pares por uma ou outra definição,
explicitando que tomariam o devido cuidado de destacar qual a definição juntamente
com a sua propriedade iriam usar para resolver problemas futuros.
Notamos, também, que, durante a institucionalização, alguns professores
compreenderam (descobriram) que um mesmo objeto matemático pode ser definido
sob “pontos de vista” diferentes, enfatizando, assim, a função de descoberta de De
Villiers (2001; 2002), nos levando a concluir que, na busca pelas demonstrações
sugeridas nas atividades, os professores descobriram idéias novas a respeito do
objeto estudado.
Na verdade, os professores situaram-se na extremidade do contínuo
pedagógico-andragógico, na andragogia, pois assumiram a postura de seguir a
definição e a propriedade que lhes chamou mais atenção, não acreditando que todos
deveriam seguir a mesma definição e propriedade. Os professores não se portaram
como aprendizes (sugerido pela pedagogia), mas, sobretudo, como construtores de
seu conhecimento, construindo assim, a sua autonomia.
ATIVIDADE 6: CONSTRUÇÃO GEOMÉTRICA DA MEDIATRIZ
a) Dado o segmento
A
B , construa a sua mediatriz.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique com argumentos geométricos essa construção.
127
Análises prévias
Com essa atividade, objetivamos fazer a construção geométrica da mediatriz
de um segmento tomando como base a propriedade de mediatriz que diz: um ponto
pertence a mediatriz de um segmento se, e somente se, eqüidista das extremidades
desse segmento, discutida anteriormente.
Dentre as várias soluções possíveis, elegemos a da figura 18.
a)
Figura 18: Construção da mediatriz
b) Temos que encontrar dois pontos da mediatriz, que é o bastante para
determiná-la.
1º. passo: com centro em A e raio “r” conveniente (mais que a metade do
segmento), traçamos uma circunferência
39
.
2º. passo: com centro em B e mesmo raio “r”, traçamos uma segunda
circunferência.
3º. passo: Traçamos a reta que passa pelos pontos P e Q de intersecção das
circunferências. Essa reta é a mediatriz de
A
B.
c)
PBP
A
, por construção, logo P é eqüidistante de A e B.
QBQA
, por construção, logo Q é eqüidistante de A e B.
P e Q pertencem a mediatriz, pois são eqüidistantes das extremidades do
segmento
A
B.
A reta
PQ
é a mediatriz de
A
B , pois P e Q pertencem à mediatriz e dois pontos
determinam uma única reta.
________________
39
Uma vez que só nos interessam os pontos P e Q de intersecção das duas circunferências, não
precisamos traçar a circunferência por inteiro. Essa construção é também a construção do ponto
médio, ou seja, o ponto médio é o ponto de intersecção da mediatriz com o segmento.
128
Esperávamos que o objeto matemático mediatriz de um segmento estivesse
institucionalizado e que as várias abordagens (duas caracterizações, propriedades e
demonstrações) tivessem contribuído para ampliação do conceito de mediatriz e que
esse estivesse disponível para justificar matematicamente a construção da mediatriz
de um segmento. Considerando que nesse problema estaria implícita a construção do
ponto médio, decidimos não chamar atenção para esse tópico. Porém, os professores
poderiam usar em construções futuras. Acreditávamos que o processo de construção
da mediatriz fosse conhecido pelos participantes, mas o hábito de justificá-lo não.
Análise a posteriori
Inicialmente distribuímos régua e compasso para os professores e constatamos
que todos fizeram a construção geométrica solicitada. Todavia, notamos que alguns
ainda não tinham refletido sobre o porquê dessa construção, como suposto nas
análises prévias. Percebemos esse fato quando pedimos para justificarem a
construção realizada, por meio de argumentos geométricos. Destacamos, ainda, que
alguns professores demonstraram preocupação com relação às atividades terem sido
pensadas para alunos ou professores, o que ficou evidente na fala da professora
Maria.
Maria: A minha dúvida é se essa atividade foi pensada para alunos ou para
professor, pois poderia me comportar diferente. Agora mesmo, fiz a construção
como acho que o aluno faria. Eu, professora Maria, não faria assim.
O formador explica que, embora as atividades tenham sido pensadas para
professores, elas são adequadas para os alunos, podendo ser levadas para a sala de
aula com pequenas modificações. Esclarece, ainda, os participantes sobre o que
significa construção geométrica no contexto dessa formação.
Formador: O que se entende por construção geométrica é a construção com
régua e compasso de Euclides, isto é, régua não graduada – só para traçar e não
para medir – e o compasso para traçar circunferências de raio qualquer. Em todas
as atividades que desenvolveremos, quando aparecer construção
está
subentendido construção com régua e compasso
.
Maria: O aluno não poderia saber disso, eu não deveria deixar claro?
Formador: Com certeza. Em um trabalho com alunos teria que deixar este acordo
explícito, para que eles não fizessem uso de outros instrumentos.
Os professores, Mirtes e José, fazem a construção solicitada, abrindo o
compasso com a medida do segmento AB e depois testam se a abertura do
compasso poderia ser outra (ver a figura 19).
129
Figura 19: Construção da mediatriz - professores Mirtes e José
Mirtes apresenta a seguinte redação da descrição do processo de construção:
1
o
) Ponta seca do compasso em A
2
o
) Tracei uma circunferência de raio AB
3
o
) Ponta seca em B
4
o
) Tracei uma outra circunferência de raio AB
5
o
) As intersecções das circunferências definem dois pontos P e P’
6
o
) Tracei a reta m passando por P e P’
E o professor José apresenta a seguinte:
A ponta seca do compasso em A com abertura do mesmo maior que a metade do
segmento tracei um arco e com a ponta seca do compasso em B com a mesma
medida tracei outro arco determinando o ponto P. Repeti o processo na parte
inferior do segmento determinando o ponto P’.
Na justificativa matemática (com base na figura 19), as professoras Angélica e
Mirtes dialogam:
Angélica: Por construção, BM
A
M
.
Mirtes: Discordo,
A
P e BP é que são congruentes por construção.
Angélica: A congruência entre
A
P e BP é o que se quer provar.
As professoras chamam o formador, explicam o que estão discutindo e
esperam por uma afirmativa ou negativa dele para as suas idéias. Essa atitude
caracteriza que estão no extremo do contínuo pedagógico-andragógico da
pedagogia, precisando de um ensinamento do professor, que, segundo o nosso
estudo teórico, deve ser considerado em um trabalho com adultos. E o formador faz o
papel daquele que ensina respondendo para as professoras:
Formador: Mirtes está certa, porque a mediatriz foi construída pelos pontos cujas
distâncias às extremidades do segmento são dadas pelo raio.
A seguir, relataremos o episódio em que a professora Joana descobriu a
importância de se destacar propriedades na matemática. Após fazer a construção da
130
mediatriz por dois pontos eqüidistantes das extremidades, ela afirma: Vou tentar
construir de outra forma; apresentando a construção da figura 20.
A
B
M
P
Q
Figura 20: Construção da mediatriz - professora Joana
Formador: Qual a diferença entre as construções?
Joana: Na primeira usei dois pontos eqüidistantes. Na segunda usei a
propriedade do triângulo isósceles.
Formador: E aí? Como é que justifica?
Joana: Pelo triângulo isósceles. A altura passa pelo ponto médio da base e é
perpendicular.
Formador: E você já tem o ponto médio? Será que pode ser essa propriedade?
Formador: O que são os pontos P e Q em relação aos pontos A e B?
Joana: São eqüidistantes. Então eu construi dois pontos eqüidistantes e a reta
que passa por dois pontos eqüidistantes das extremidades de um segmento é a
mediatriz. Mas eu estava tentando construir pela definição 1 e não pela
propriedade 1.
Joana: Então, eu só poderia fazer pela propriedade, eu tinha que conhecer a
propriedade.
Formador: Por que será que levantamos propriedades a partir de definições?
A professora Joana fica pensando e revela nunca ter pensado qual o papel das
propriedades na matemática.
Formador: Esta é justamente a importância de levantarmos propriedades a partir
de definições, para facilitar a resolução de problemas. Não elegemos
propriedades apenas por eleger.
Acreditamos que, nesse momento, a professora Joana se deu conta da
importância de se destacar propriedades na matemática e em seu ensino. Nesse
sentido, a formação contribui com conhecimentos matemáticos e que, segundo Ponte
(2001) e Shulman (2001), devem permear a formação de professores.
Os vários registros de representação semiótica foram destacados na
socialização das respostas, pois, a professora Maria tinha realizado a descrição em
linguagem simbólica. Já os professores José, Angélica, Rute e Mirtes o tinham feito
na linguagem natural. Esse grupo comentou a respeito da economia na escrita e na
escolha da professora Maria e mostraram interesse em escrever suas respostas no
131
registro simbólico, destacando as vantagens de um registro em relação ao outro,
levando a melhor compreensão do que se faz, segundo Duval (2003). Vejamos a
descrição do processo de construção apresentado pela professora Maria:
Construção C
1
(A , r
1
) e C
2
(B , r
1
), com r
1
>
2
AB
.
C
1
C
2
= { P
1
, P
2
}.
21
PP é a mediatriz de
A
B.
Formador: Tentem fazer a construção com base na descrição da professora
Maria.
Os professores apresentaram dúvidas quanto ao significado dos símbolos
usados por essa professora. O formador realiza a construção sugerida pela
professora Maria e explica o significado de cada símbolo, pontuando a importância de
conhecer os símbolos para poder utilizar o registro em linguagem simbólica.
Formador: Quando vocês realizaram as demonstrações das propriedades nas
atividades passadas, usaram linguagem natural e simbólica.
Maria: A linguagem simbólica é mais prática, eu acho mais trabalhosa a
linguagem natural. Tenho preguiça de escrever muito.
Acreditamos que o uso dos vários registros de representação semiótica,
contribuiu para uma compreensão maior da construção em jogo. Com relação a
justificativa matemática, destacamos a formação em conhecimentos geométricos –
losango e quadrado – para justificar a construção da mediatriz. Vejamos o que
aconteceu com a professora Rute ao expor a sua justificativa matemática com base
na figura 21.
Rute: Como APAPBPBP
1221
e P
1
BP
2
A é um quadrado e, portanto, as
diagonais formam mediatrizes.
Formador: Disse que é um quadrado? Vou realizar a construção (figura 21) que
você sugere em sua justificativa.
P
1
P
2
Figura 21: Construção da mediatriz – método do losango
Formador: A figura é um losango. Em algum momento será um quadrado. Você
tem que usar a propriedade de losango que diz: As diagonais de um losango se
interceptam no ponto médio e são perpendiculares e isso basta. Logo, a reta que
passa pelos pontos P
1
e P
2
é a mediatriz do segmento AB.
132
A professora Rute retoma a sua redação e troca a palavra quadrado por
losango. E a professora Mirtes comenta:
Mirtes: Então usou a definição 1.
Formador: Isso mesmo, e a reta suporte da diagonal AB é a mediatriz do
segmento P
1
P
2
e isso é válido para losango. Temos que tomar cuidado, pois
visualmente pode parecer um quadrado. Que é losango não temos dúvida.
Percebemos, nesse relato, que a construção realizada por Rute a induziu (pela
abertura do compasso que pegou), visualmente, a pensar que o quadrilátero era um
quadrado, o que vai ao encontro do obstáculo epistemológico citado por Arsac (1988),
constituído pela evidência da figura. Porém, o uso do contra-exemplo pelo formador
esclareceu a professora.
Ressaltamos, ainda, que o fato de os professores não estarem habituados a
justificar as construções realizadas, e a atividade pedir esta justificativa, contribuiu
para ampliação do conceito de mediatriz, por esses professores, podendo
potencializar a utilização para resolver problemas.
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
Essa atividade foi composta de sete problemas que foram resolvidos
separadamente, ou seja, os professores receberam um problema de cada vez, com
exceção dos problemas III e IV, que ficaram como lição de casa. Optamos por
apresentar o objetivo geral dessa atividade, juntamente com uma análise didática,
com o mesmo fim. Para facilitar a leitura e o acompanhamento das discussões,
apresentamos as análises prévias e a posteriori após cada problema proposto.
Análises Prévias
Os sete problemas que compunham essa atividade envolviam a definição de
mediatriz de um segmento, bem como a sua propriedade, assim objetivávamos
verificar se os elementos institucionalizados, nas atividades anteriores, estariam
disponíveis para resolver novas situações-problema.
Esperávamos que os professores pudessem avançar nas justificativas
geométricas das construções pedidas. A nossa hipótese era que os professores
avançariam nos argumentos matemáticos e poderiam adquirir o “hábito” de justificar
133
sempre as afirmações que fazem em matemática. Além disso, as situações
desenvolvidas nessa atividade serviriam de ferramentas para resolver novos
problemas em atividades posteriores.
Apresentamos a seguir cada um desses problemas e suas análises prévias e a
posteriori.
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA I
a) Dados os pontos A e B e a reta r abaixo, construa a circunferência que
passa pelos pontos A e B, sabendo que seu centro pertence à reta r.
b)Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
a) Nesse problema, uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 22.
Figura 22: Construção - problema I
b)
Temos que encontrar o centro “O” da circunferência, tal centro pertence à reta “r”.
1º. passo: Construímos a mediatriz do segmento
A
B.
134
2º. passo: Chamamos de “O” o ponto de intersecção entre a mediatriz do
segmento
A
B e a reta “r”.
3º. passo: Com centro em “O” e raio
OA
ou
OB
construímos a circunferência
pedida.
c)
“O” pertence a mediatriz “m” do segmento
A
B , pois o centro é eqüidistante dos
pontos que pertencem à circunferência, neste caso os pontos A e B.
“O” pertence à reta “r”, por hipótese (exigência do problema).
Como “O” pertence a “m” e “O” pertence a “r” então “O” é ponto de intersecção
entre “m” e “r”.
Utilizando a definição de circunferência, construímos a circunferência de centro
“O” que passa por A e B.
Nesse problema, outro “ponto de vista” era esperado, quando solicitamos que
encontrassem o conjunto de todos os pontos eqüidistantes de dois pontos A e B e não
do segmento de extremidades A e B. Nesse sentido, esperávamos que os
professores construíssem o segmento AB e, em seguida, a sua mediatriz. A partir
desse problema, o “ponto de vista” seria utilizado na resolução de outras situações-
problema desse trabalho, além do usual, ou seja, todo ponto da mediatriz de um
segmento eqüidista das extremidades de um segmento.
Análise a posteriori
Com exceção do professor José, todos os outros professores conseguiram
fazer a construção com sucesso. Como era esperado, alguns determinaram primeiro
o segmento – unem os pontos A e B – para, em seguida, fazer a construção da
mediatriz, o que nos leva inferir que o “ponto de vista”, a mediatriz de um segmento
como o conjunto de pontos que são eqüidistantes das extremidades de um segmento
(que são eqüidistantes de dois pontos), ainda está em construção. O registro em
linguagem simbólica foi potencializado pelos professores, pois alguns deles tinham
como desafio descrever o processo de construção em linguagem natural para, em
seguida, passar para à linguagem simbólica (conversão entre registros).
Como todos os outros participantes haviam conseguido fazer a construção com
sucesso, destacaremos a intervenção do formador com o professor José e traremos a
discussão das respostas dadas pelos outros professores durante a socialização das
respostas.
Formador: O que você quer construir nesse problema José?
135
José: Eu quero achar uma circunferência.
Formador: O que você precisa para construir uma circunferência?
José: Um segmento e um ponto.
Formador: O que seria o segmento?
José: Acho que com um ponto eu consigo traçar uma circunferência.
Formador: Dado um ponto, todos construiriam a mesma circunferência?
José: Ah! Vou precisar do raio.
Relatamos, ainda, a preocupação de alguns participantes em escrever na
linguagem simbólica, a descrição do processo de construção. O comentário do
professor Renato sobre a determinação do segmento para encontrar a mediatriz,
também corroborou com a construção do “ponto de vista” que esperávamos nas
análises prévias.
Mirtes: Vou tentar escrever em linguagem simbólica, vou imitar a Maria.
Mirtes, juntamente com Sueli escrevem em linguagem simbólica:
Construção de
A
B.
Construção de C1 (A, r1) e C2 (B, r1) sendo r1 >
2
AB
.
C1
C2 = {P1, P2}.
21
PP
é a mediatriz de
A
B.
21
PP
r = {O}.
Construção de C3 (O, AO).
Renato: Não precisa ligar (unir) os pontos A e B é só traçar a mediatriz.
O formador começa a socializar as respostas perguntando aos participantes
como fizeram.
Mirtes: Eu construí usando a definição 2; procurei pontos eqüidistantes.
Rute: Pela definição 2, fiz a mediatriz dos pontos A e B interceptando a reta r,
encontrando o centro da circunferência que passa pelos pontos A e B.
Percebemos que os professores descrevem todo o processo de construção da
mediatriz de um segmento e o formador destaca que não é preciso mais descrever
todo esse processo, pois essa construção já foi formalizada na atividade anterior, ou
seja, que os professores poderiam apenas relatar, traçamos a mediatriz do segmento.
Corrige a redação da professora Rute, complementando que não é mediatriz dos
pontos A e B e sim do segmento AB.
136
Ainda na resposta da professora Rute, notamos que, ao se referir à definição 2,
ela está, de alguma forma, utilizando outro “ponto de vista” da mediatriz, o que
constata que alguns professores estão avançando nesse conceito.
O professor José pede para expor a sua descrição do processo de construção.
Valorizamos esse momento, posto que, de um modo geral, esse professor não vinha
socializando as suas respostas com todos a não ser quando lhe era solicitado. O
formador aproveitou o momento, e levantou a auto-estima do referido professor e
escreveu na lousa a descrição enunciada por ele:
Tracei o segmento AB, em seguida, com o compasso com abertura maior que a
metade do segmento ponta seca em A tracei um arco, analogamente com a ponta
seca em B. A intersecção dos arcos encontrei os pontos P e P
1
e a reta m =
1
PP
a qual determina o ponto O na reta r, centro da circunferência C. Com a ponta
seca em O e abertura AO tracei a circunferência C.
Formador: O José fez toda a descrição da mediatriz. O que achei interessante
em sua resposta foi o caráter pessoal “tracei”. E se olharmos para as outras
resposta estão bem impessoais. A linguagem matemática é impessoal.
Com relação à justificativa geométrica, travou-se uma grande discussão em
torno desta.
Mirtes: O é o centro da circunferência C3 e
OBOA
pela definição 2.
Sueli: O é centro da circunferência C3 porque pertence à mediatriz do segmento
AB. Pela definição 2,
OBOA
.
Formador: É esquisito dizer que O é centro, pois pertence a mediatriz. Dizer que
OA = OB não já garante que O é centro da circunferência que passa por A e B?
Sueli: Ainda concordo com o que escrevi.
Maria: Eu fiz assim: Sendo m a mediatriz de
A
B, O m e O r, como O m,
então
OBOA
(pela definição 2) O é o centro de C com raio OA ou OB.
Formador: Penso que faltou explicitar porque O pertence a m.
Joana:
A
B é corda. Se m é mediatriz de
A
B e r m = { O } então
OBAO
. O é
o centro da circunferência que passa pelos pontos A e B.
O PROBLEMA I foi concluído sem explicitar maiores detalhes e sem
estabelecer juízo sobre o que estava realmente correto. Nesse sentido,
potencializamos o contínuo pedagógico-andragógico no extremo da andragogia,
pois alguns professores se posicionaram, não só concordando com a resposta do
formador, mas, sobretudo, acreditando nas suas convicções. Em verdade, destaca-se
a construção da autonomia por parte dos professores participantes.
137
Inferimos, assim, que tal discussão foi fomentada, devido ao fato de geralmente
não definirmos “centro de circunferência”. É comum apenas destacarmos esse
elemento após a definição de circunferência. Acreditamos que, a partir desse
episódio, poderemos retomar essa discussão em outro momento.
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA II
a) Construa a circunferência circunscrita ao triângulo ABC dado.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises prévias
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 23.
Figura 23: Construção - problema II
b)
Temos que encontrar o centro “O” da circunferência que passa por A, B e C, ou
seja, pela definição de centro da circunferência encontrar um ponto que está a
igual distância de A, B e C.
1º. passo: Construímos a mediatriz de dois lados quaisquer do triângulo ABC.
2º. passo: Chamamos de “O” o ponto de intersecção das mediatrizes traçadas
anteriormente.
3º. passo: Com centro em “O” e raio
OA
, por exemplo, construímos a
circunferência circunscrita no triângulo ABC dado.
c)
O centro “O” que vamos determinar é eqüidistante de A, B e C, pela definição de
centro de circunferência.
138
Ao encontrarmos as mediatrizes dos lados
A
B e
BC
, por exemplo, estamos
encontrando todos os pontos que são eqüidistantes de A e B e eqüidistantes de B
e C respectivamente.
Sendo assim, o ponto de intersecção “O” das mediatrizes dos lados
A
B e
BC
é
eqüidistante de A, B e C. Logo, “O” é centro da circunferência que passa por A, B
e C.
Com relação a este problema, poderia ser suscitado pelos professores em
formação que o centro da circunferência encontrado é chamado de circuncentro do
triângulo. Poderia, também, aparecer, por solicitação do próprio grupo, os casos do
triângulo obtusângulo e do triângulo retângulo. Outra situação esperada, seria que os
professores poderiam construir as três mediatrizes para determinação do centro.
Nesse caso, o formador poderia retomar que em construções geométricas um ponto
fica determinado de três formas: intersecção de duas retas, intersecção de dois arcos
de circunferência e intersecção de uma reta com um arco de circunferência. Nesse
caso, temos a intersecção de duas retas. Inferimos que o fato de o professor construir
a terceira mediatriz para determinar o ponto já determinado, demonstraria algum tipo
de insegurança, ou, até mesmo, credibilidade da propriedade já demonstrada
(precisar dessa convicção).
Análise a posteriori
De um modo geral, todos os professores conseguiram resolvê-lo, embora, José
e Mirtes tenham apresentado dificuldades. A professora Mirtes, ainda ousou fazer
conjecturas, tentativas e, ao final, justificou, como mostraremos a seguir. A referida
professora continuou tentando descrever o processo de construção no registro
simbólico. Destacamos que esse recurso é fundamental para compreensão geral do
que se faz, uma vez que o registro figural está posto na construção.
O professor José, com a ajuda da professora Maria, conseguiu chegar na
construção solicitada e apresentou a seguinte descrição do processo de construção
em linguagem natural:
Construir a mediatriz do segmento AC encontrando a reta m. Em seguida a
mediatriz do segmento AB encontrando a reta r. A intersecção de m com r,
aparece o ponto D. Com a ponta seca do compasso em D e abertura AD constrói
a circunferência circunscrita no triângulo ABC.
Todavia, a professora Mirtes, fez várias tentativas e realizou a construção,
traçando as três mediatrizes dos lados do triângulo, encontrando o ponto de
intersecção e examinou se o ponto de intersecção era centro da circunferência que
139
passava pelos pontos A, B e C, ou seja, se é centro da circunferência circunscrita.
Inferimos que existe algum tipo de contrato didático que diz que a ferramenta
mediatriz de um segmento servirá para resolver os problemas propostos. Ainda
assim, vislumbramos, na justificativa geométrica dessa professora, um
amadurecimento com relação ao uso do objeto institucionalizado. Na verdade,
conforme De Villiers (2001; 2002), a professora está passando pela função de
descoberta, pois, na busca de resolver uma situação problema e justificá-la
matematicamente, descobriu (para ela) a propriedade inerente às mediatrizes dos
lados de um triângulo. E ressaltamos que a professora Mirtes tentou sempre fazer uso
da linguagem simbólica, realizando conversões entre os registros figural, língua
natural e simbólico, o que, segundo Duval (2003) contribui para um maior
entendimento da justificativa da questão.
Mirtes: a, b e c são as mediatrizes de
BC
,
AC
e
A
B respectivamente. a b c
= { O }, sendo O centro da circunferência circunscrita.
Sueli: Vamos modificar um pouco.
Mirtes: Construção das mediatrizes de
BC
,
AC
e
A
B que são as retas a, b e c.
a b c = { O }
OB = OC = AO, pela definição 2, então O é centro da circunferência.
As professoras Mirtes e Sueli passaram a fazer a justificativa geométrica da
construção e o seguinte diálogo aconteceu:
Mirtes: Não consigo entender aonde acaba a descrição e começa a justificativa.
Vamos justificar assim.
Mirtes: Sendo a, b, c mediatrizes de
BC
,
AC
,
A
B e O a, b, c, então
OAOCOB
, pela definição 2. Então O é o centro da circunferência C.
Ao elaborarmos as atividades da oficina, em um primeiro momento, pensamos
que a descrição do processo de construção seria uma tarefa pouco aceita pelos
participantes, pois teriam que escrever muito e poderiam se desestimular. Entretanto,
percebemos que essa proposta funcionou como um potencializador da aprendizagem,
visto que permitiu a mudança de registros de representação semiótica – figural,
simbólico e natural – e, ainda assim, os professores justificaram suas construções,
mesmo quando não estávamos solicitando. Isso nos leva a inferir que esse tipo de
postura pode se tornar hábito, como nos revelou a professora Mirtes, que de início
não sabia o que fazer; fez experimentos – com base no contrato didático –, descobriu
140
a propriedade e justificou matematicamente por escrito, passando pelas funções de
explicação, descoberta e sistematização propostas por De Villiers (2001; 2002).
Após todos terem realizado a construção solicitada, o formador fez uma
discussão desse problema, pois, apesar de todos terem justificado, precisava-se de
alguns ajustes na escrita da demonstração. Assim, acreditamos que todos
compreenderam porque usaram mediatriz nessa construção. No entanto, a discussão
sobre a necessidade de se traçar, ou não, as três mediatrizes ou apenas duas, para
encontrar o circuncentro do triângulo apareceu. Nesse sentido, a formação em
conteúdos geométricos foi potencializada.
Formador: O que está sendo procurado?
Os professores respondem que é o centro da circunferência que tem que ser
eqüidistante dos vértices do triângulo.
Formador: Como vocês construíram?
O professor José descreve o seu processo de construção e o formador vai
construindo na lousa com base na descrição apresentada. A professora Maria
também apresentou a sua descrição em linguagem simbólica e os participantes
aprovaram.
Formador: Qual o nome do ponto D?
Maria: Circuncentro do triângulo ABC.
Formador: D é o circuncentro do triângulo ABC, encontro das mediatrizes dos
lados de um triângulo.
Rute: Precisaria ter as três mediatrizes para ser circuncentro?
Formador: Como o circuncentro é o ponto de encontro das mediatrizes, isso dá a
possibilidade de traçarmos apenas duas, pois um ponto fica determinado, nesse
caso pela intersecção de duas retas.
Percebemos o mesmo amadurecimento na outra turma.
Joana: Se m é mediatriz de
AC
, n é mediatriz de
A
B e O é a intersecção de m e
n, então O é eqüidistante aos pontos A, B e C, logo centro da circunferência que
passa pelos pontos A, B e C.
Renato: Pela propriedade 1 o ponto O é eqüidistante das extremidades dos
segmentos
ACeBC,AB e sendo assim o centro da circunferência circunscrita
no triângulo ABC.
O formador pergunta ao professor Renato se havia necessidade de construir as
três mediatrizes e ele respondeu prontamente que não, pois um ponto fica
determinado pela intersecção de duas retas.
141
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA III
a) Dada a reta r e o ponto P, construa a reta s que passa por P e é
perpendicular a r.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
Q
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 24.
Figura 24: Construção - problema III
b)
Temos que determinar outro ponto da reta procurada, e assim determinarmos a
reta que passa por dois pontos.
1º. passo: Com centro em P e raio “t” conveniente (maior que a distância de P a r),
traçamos um arco de circunferência que corta a reta “r” em dois pontos A e B.
2º. passo: Com centro nos pontos A e B, determinados anteriormente,
construímos um ponto “Q” eqüidistante de A e B.
3º. passo: Traçamos a reta
PQ
que é a reta “s” pedida.
c)
Já foi dado no problema que o ponto P pertence a reta “s”, para determinar essa
reta basta encontrarmos um outro ponto dela.
PBP
A
, por construção (raio da circunferência de centro P que passa por A e B).
142
QBQA
, por construção.
P e Q pertencem a mediatriz do segmento
A
B , pois são eqüidistantes de A e B.
A reta
PQ
é a mediatriz do segmento
A
B , logo é perpendicular a este segmento
e conseqüentemente perpendicular à reta
A
B . Como as retas
A
B e r são
coincidentes então a reta “s” pedida é a reta
PQ
.
Com relação a esse problema, acreditávamos que essa construção seria uma
ferramenta para uso futuro. Imaginávamos, também, que serviria para visualizar que
P e Q podem pertencer a circunferências distintas, quebrando a construção que, em
geral, encontramos nos livros didáticos, nos quais os pontos determinados para a
construção da mediatriz do segmento e os extremos desse segmento são vértices de
um losango. Na verdade pretendíamos ampliar o campo de conceitos inerentes a
mediatriz de um segmento.
Análise a posteriori
Esse problema tinha ficado de lição de casa e o formador começou pedindo
aos professores para socializarem as suas respostas. Notamos que tinham
conseguido realizar as construções. A professora Eva havia faltado os dois últimos
encontros (problemas pessoais), mas tinha pedido para um colega lhe enviar a tarefa
por e-mail, e trouxe uma solução sem usar o “ponto de vista” de enxergar a mediatriz
como um conjunto de pontos que eqüidistam das extremidades de um segmento.
Relataremos a solução da professora nessa seqüência.
A professora Rute apresentou a seguinte justificativa para a sua construção:
sPPBPA
(mediatriz)
s'PB'PA'P
(mediatriz)
Logo
'PP é mediatriz.
A justificativa da professora Rute, deixa implícito a construção do segmento AB
com A e B eqüidistantes de P, logo P pertence a mediatriz do segmento AB, e
determina o ponto P’ eqüidistante de A e B. Desse modo, a reta PP’ é a mediatriz do
segmento AB. Notamos que a sua explicação está muito bem fundamentada, mas a
sua escrita precisava ser melhorada. Nesse sentido, acreditamos que a função de
explicação foi alcançada por essa professora, embora precise avançar na função de
sistematização, proposta por De Villiers (2001; 2002).
143
A professora Mirtes apresentou a construção da figura 25 e com a seguinte
descrição do processo construção:
Figura 25: Construção da professora Mirtes - problema III
Ponta seca do compasso em P.
Traçar a circunferência passando por r, encontrando os pontos a e b.
Ponta seca em a e em b.
Encontrei o P’ (simétrico de P).
Tracei a reta s passando por P e P’, sendo s à reta r.
Notamos algumas pequenas falhas de notação como letras minúsculas para
notação de ponto (já tínhamos essa convenção no grupo). O formador sempre fazia
as correções, mas sabemos que o fato de não estarmos construindo axiomaticamente
a Geometria, os professores poderiam cometer falhas desse tipo. No entanto,
percebemos claramente na descrição dessa construção que está implícita a
explicação do porquê se faz assim, é que estamos valorizando, as várias funções da
demonstração, em especial a função de explicação como propõe De Villiers (2001;
2002).
Com uma construção similar a essa, a professora Joana relatou que, para
determinar o ponto P’, usou uma abertura menor que PA, pois não queria riscar sobre
o texto, e verbalizou que nunca tinha pensado nessa hipótese antes. Acreditamos que
essa professora vem adquirindo autonomia no sentido de usar idéias novas em
contextos apropriados, pois o fato de trabalhar o objeto geométrico mediatriz sob
“pontos de vista” diferentes contribuiu para tal postura.
Na descrição do processo de construção apresentada pelo professor Renato,
aparece implicitamente a noção de distância, embora ele não parecesse ter essa
consciência. O formador fez as considerações e institucionalizou a definição de
distância de ponto a reta para os participantes. A seguir, relatamos esse episódio.
144
Renato: Com a ponta seca em P e abertura maior que P perpendicular a r,
construímos o segmento AB em r. A mediatriz do segmento AB passa por P
s.
Formador: Abertura maior que P perpendicular a r! Como chama?
Renato: Não me lembro.
Joana: Distância.
Carlos: Distância de ponto a reta.
Formador: Como definir distância de ponto a reta?
Carlos: Não sei. É a menor distância, logo é perpendicular.
Formador: O ponto de intersecção da perpendicular com a reta, chamamos de pé
da perpendicular. Logo, distância de ponto a reta é a distância do ponto ao pé da
perpendicular à reta que passa por esse ponto.
Ao começar a discussão geral desse problema, o formador propôs que a
professora Eva relatasse o que fez, já que fazia algum tempo que não participava. A
seguir temos a descrição da professora e a sua construção representada na figura 26.
Marcar um ponto A na reta r.
Com a ponta seca no ponto P, traçar uma circunferência C de raio PA.
Nomear de A e B os pontos de intersecção da circunferência C com a reta r.
Com a ponta seca no ponto A, traçar a circunferência C1 de raio AP.
Com a ponta seca no ponto B, traçar uma circunferência C2 de raio BP.
Nomear de P’ o ponto de intersecção das circunferências C1 e C2.
Traçar uma reta s pelos pontos P e P’.
P
A
B
P'
Figura 26: Construção da professora Eva - problema III
Formador: Eva marcou o ponto A em r e só depois construiu a circunferência. O
raio precisa ser AP?
Paula: O raio pode ter qualquer medida maior que a metade de AB.
Formador: Por quê?
Rute: A construção do arco AB parte de P e é eqüidistante de A e B e não é
preciso tocar no ponto P. Como o arco garante que P é eqüidistante de A e de B,
então P está na mediatriz. Então, basta achar outro ponto da mediatriz, que é com
uma abertura qualquer maior que a metade.
O formador concordou com as colocações das professoras e pediu para Eva
expor a sua justificativa matemática.
145
Eva: PA = PB porque é raio das circunferências C, C
1
e C
2
. A, B r e ainda AP’ =
BP’ porque são raios de C
1
e C
2
. Logo P, P’ s. Como PA = PB = P’A = P’B são
lados do losango APBP’ e
'PP e
A
B são diagonais desse losango, portanto r e s
são perpendiculares.
Os professores participantes comentaram que, provavelmente, Eva fez dessa
forma, pois não estava “contaminada” com as discussões de eqüidistantes, que é
outro “ponto de vista”. Sendo assim, essa atitude só reforça a idéia que os vários
pontos de vista” devem ser abordados em discussões matemáticas, visto que,
geralmente não é construído aleatoriamente.
O formador ainda discutiu que, apesar de se poder usar uma outra abertura do
compasso, no caso da justificativa matemática que a professora Eva utilizou, está
coerente com a descrição da construção apresentada, relatando que todos estão um
tanto influenciados com esse novo “ponto de vista”.
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA IV
a) Dada a reta r e o ponto P, construa a reta s que passa por P e é
perpendicular a r.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 27.
Figura 27: Construção - problema IV
146
b)
Temos que determinar um outro ponto da reta procurada, e assim construirmos a
reta determinada por dois pontos.
1º. passo: Com centro em P e raio “t” qualquer, traçamos a circunferência que
intercepta a reta “r” nos pontos A e B.
2º. passo: Com centro nos pontos A e B construímos um ponto Q
P que é
eqüidistante dos pontos A e B, determinados anteriormente.
3º. passo: Traçamos a reta
PQ
que é a reta “s” pedida.
c)
Já foi dado no problema o ponto P que pertence à reta “s”, para determiná-la
basta encontrarmos outro ponto de “s”.
PBP
A
, por construção (raio da circunferência de centro P que passa por A e B).
QBQA
, por construção.
P e Q pertencem a mediatriz do segmento
A
B , pois são eqüidistantes de A e B.
A reta
PQ
é a mediatriz do segmento
A
B , logo é perpendicular a este segmento
e conseqüentemente perpendicular à reta
A
B . Como as retas
A
B e r são
coincidentes então a reta “s” pedida é a reta
PQ
.
Outro tipo de justificativa que poderia aparecer para esse problema seria que P
é ponto médio do segmento
A
B , pois o segmento
A
B é diâmetro e P é centro. Sendo
assim, a reta “s” passa pelo ponto médio e pelo ponto Q eqüidistante de A e B. A
construção solicitada nesse problema também serviria de ferramenta a ser usada na
solução de problemas posteriores.
Análise a posteriori
Os professores socializaram as suas respostas, destacamos a resposta da
professora Mirtes, que vem pondo como desafio próprio a escrita em linguagem
simbólica. Essa professora apresentou a construção da figura 28, juntamente com a
descrição do processo de construção. Percebemos a justificativa na última linha da
descrição do processo.
Figura 28: Construção da professora Mirtes - problema IV
147
Construção de C
1
(P,r
1
)
C
1
r = {A, B}
Construção de C
2
(A, r
2
) com r
2
> r
1
Construção de C
3
(B, r
2
)
C
2
C
3
= {X, Y}
s = X
Y
AX
B
X
e BY
A
Y s é mediatriz de
A
B pela definição 1.
Na resposta da professora Mirtes, faltou apenas concluir que a reta
XY
é a
perpendicular solicitada no problema, deixando isso implícito.
A professora Maria foi a lousa e colocou a descrição do processo de
construção e a justificativa matemática, sendo questionada pela professora Mirtes.
Processo de construção:
X r, X P
C
1
(P , PX)
C
1
r = {X, Y}
C
2
(Y , r
2
), r
2
> PY
C
3
(X , r
2
)
C
2
C
3
= {A , B}
A
B
r (
A
B
= s )
Justificativa matemática:
Se C
1
(P , PX) e C
1
r = {X, Y}, então P é ponto médio de X
Y
(1)
Se C
2
C
3
= {A , B} então BXBYeAXAY (2)
De (1) e (2) pela definição 2 de mediatriz s r.
Mirtes: Tenho dúvida na justificativa. Não entendi porque Maria colocou os pontos
A e B se apenas o A bastava. Eu fiz assim: Por construção, A, B
r, B
X
AX
e P
ponto médio de
A
B . Portanto s é mediatriz de
A
B , pela definição 2.
Notamos o quanto a professora Mirtes vem agindo de maneira autônoma, ou
seja, na extremidade do contínuo pedagógico-andragógico da andragogia. Se nos
reportarmos, inicialmente, à sua postura, percebíamos que ela apresentava muito
mais aprendizagem pautada na pedagogia. Sendo assim, podemos inferir que as
atividades desenvolvidas vêm cumprindo um dos seus objetivos, que é contribuir para
o desenvolvimento da autonomia dos professores participantes. Ainda destacamos
que, com relação aos registros de representação semiótica, o professor José pediu
apoio aos participantes para o ajudarem a converter da linguagem natural para a
simbólica, demonstrando interesse em potencializar essa mudança de registro.
Acreditamos que, dessa forma, ele poderá compreender mais as construções
realizadas e refletir sobre os objetos geométricos envolvidos.
148
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA V
a) Dada a circunferência de centro O e o segmento M
N
, construa o triângulo
isósceles MNP sabendo que M
N
é a base e que o vértice P pertence à
circunferência dada.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 29.
Figura 29: Construção - problema V
b)
Temos que encontrar o ponto P que pertence a circunferência de tal modo que
PNPM .
1º. passo: Construímos a mediatriz “m” do segmento
MN .
2º. passo: Chamamos de P
1
e P
2
os pontos de intersecção entre a reta m e a
circunferência de centro “O”.
3º. passo: Construímos os triângulos P
1
MN e P
2
MN, que são os triângulos
isósceles procurados.
c)
Já foi dado no problema a base MN do triângulo isósceles MNP. Portanto, o
problema se resume a encontrarmos o ponto P, que pertence à circunferência de
centro “O”.
Como o triângulo PMN é isósceles e de base
MN , temos que PNPM , ou seja,
P é eqüidistante de M e N.
149
P pertence a mediatriz m do segmento MN , pois P é eqüidistante de M e N. E P
pertence à circunferência de centro “O”. Logo, P é ponto de intersecção entre a
mediatriz m e a circunferência de centro O.
Sejam P
1
e P
2
os pontos de intersecção destacados acima, temos que os
triângulos P
1
MN e P
2
MN são os triângulos pedidos.
Nesse problema, acreditávamos que os professores em formação não tinham
vivenciado o trabalho com triângulo isósceles sob outro “ponto de vista”, ou seja, é o
triângulo que possui um vértice que é eqüidistante dos outros dois e que nesse
triângulo tal vértice determina o ângulo do vértice e os outros dois vértices,
determinam a base. Na verdade, encontramos, em livros didáticos, usualmente como
definição de triângulo isósceles: o triângulo que possui dois lados congruentes,
deixando sem discutir que um de seus vértices está a igual distância dos outros dois.
Esperávamos que tal faceta aparecesse na socialização das respostas ou que o
formador na discussão fomentasse tal questão, pois conhecimentos geométricos
sobre triângulo isósceles, tais como o que é base e o que é ângulo do vértice desse
triângulo, deveriam estar disponíveis para serem usados pelos professores. Um outro
foco que deveria ser considerado na discussão desse problema era a possibilidade de
uma, duas ou nenhuma solução para ele, a depender do posicionamento da base MN
dada.
Análise a posteriori
A maioria dos professores resolveu a situação, porém, alguns tinham
encontrado apenas uma solução e, somente após a discussão, complementaram e
entenderam que o problema poderia ter uma, duas ou nenhuma solução. Outro ponto
a destacar é o contrato didático, explicitado pela professora Paula, quando disse que
já sabia que teria que construir a mediatriz, uma vez que o trabalho é sobre esse
tema. O formador concordou com a professora e fez a ponderação de que a
justificativa não era tão imediata e que, em sala de aula, só saberemos se o aluno
aprendeu mediatriz se ele consegue identificá-la em várias situações. A constatação
pelos professores de outra forma, porém equivalente, para definir triângulo isósceles
foi um ponto alto da discussão.
As professoras Mirtes e Angélica construíram a mediatriz do segmento MN
determinando apenas uma solução e, em seguida, fizeram a descrição do processo
de construção. Notamos o uso do registro simbólico na descrição, ou seja, a
conversão do registro figural para o registro simbólico:
150
C1 (N, R), R >
2
MN
C2 (M, R).
C1
C2 = {A, B}
s =
A
B , mediatriz de MN .
s
C (O, r) = {P}
ΔPMN é isósceles.
E apresentaram a seguinte justificativa matemática: Por construção, P C e P
s (s é mediatriz de MN pela definição 2), logo PNPM
.
As professoras Eva e Rute também encontraram apenas uma solução. A
professora Joana, por sua vez, fez a construção com êxito e verbalizou: Eu travo
quando vou escrever a justificativa.
Formador: Será que você não quer formalizar muito? Você quer achar o que? O
que o problema pede para construir?
Joana: Um triângulo isósceles.
Formador: Qual foi a sua escolha?
Joana: Construir a mediatriz.
Formador: Justifique a sua escolha.
Joana, então, passou a escrever a justificativa e concordou que, muitas vezes,
fica querendo formalizar em excesso e acaba se perdendo.
Na discussão geral do problema, a professora Mirtes descreveu o processo de
construção que tinha escrito com a professora Angélica e o formador foi desenhando
na lousa segundo o processo descrito, obtendo a figura 30.
Figura 30: Construção do formador - problema V
O formador chamou a atenção que existem duas soluções, ou seja, existem
dois pontos distintos que obedecem aos dados desse problema. São soluções
distintas, pois os triângulos encontrados não são congruentes. Em seguida a
professora Mirtes apresentou a justificativa matemática acrescentando a segunda
151
solução do problema: Por construção, P, P’ C e P, P’ s, sendo s a mediatriz de
MN pela definição 2. Portanto, PNPM
e N'PM'P
, logo ΔPMN e ΔP’MN são
isósceles.
Na discussão do número de soluções que o problema apresenta, o formador
comentou que esse problema poderia ter uma única solução, caso a mediatriz fosse
tangente à circunferência ou nenhuma solução caso a mediatriz fosse uma reta
exterior à circunferência.
Formador: O que o triângulo isósceles tem a ver com a mediatriz? O que levou
vocês a pensarem em construir a mediatriz?
Eva: O ponto P é eqüidistante dos vértices M e N. Pois triângulo isósceles tem
dois lados iguais.
Formador: Poderíamos definir triângulo isósceles a partir dessa observação, ou
seja, triângulo isósceles é aquele que tem um vértice que eqüidista dos outros
dois.
Eva: Legal!
O formador comentou, ainda, que se essa definição fosse conhecida à priori o
problema seria imediato, uma vez que já se utiliza a mediatriz sob o “ponto de vista”
que diz: mediatriz é o conjunto de todos os pontos que eqüidistam das extremidades
de um segmento. E acrescentou que, em geral, os livros apresentam a definição via
medidas, ou seja, é o triângulo que possui dois lados congruentes (mesma medida).
Na verdade, o que estava em jogo era outra definição de triângulo isósceles,
equivalente a usual, porém sob outro “ponto de vista”.
Os professores participantes assimilaram bem os comentários do formador, ou
seja, não questionaram o fato de se apresentar definições sob perspectivas
diferentes. Acreditamos que a autonomia dos professores participantes se ampliava a
cada encontro. Ainda durante esse encontro a professora Rute revelou para o
formador, que tinha um caderno no qual ela vinha refazendo todas as atividades, pois
gostaria de “aprender melhor os exercícios” (fala dela). Quando o formador perguntou
o que representava aqueles balões em lápis (que estavam nas suas soluções), ela
respondeu: “aqui sou eu pensando”. A referida professora não disponibilizou o
caderno para que pudéssemos analisar suas anotações, mesmo quando garantimos
que só nos interessava a parte matemática, pois ela revelou que tinha muita coisa
pessoal e que não ficava à vontade, dizendo “aqui tem meus segredos”. Pelo que
notamos, esse caderno representa muito para essa professora e a formação realizada
é uma das partes que o compõe.
152
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA VI
a) Em um triângulo ABC qualquer, construa a mediana relativa ao vértice B.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 31.
Figura 31: Construção - problema VI
b)
Construímos um triângulo ABC qualquer.
1º. passo: Construímos a mediatriz do segmento
AC
determinado o ponto M
(ponto médio do segmento
AC
).
2º. passo: Construímos o segmento
BM que é a mediana pedida.
c)
Por definição, a mediana é o segmento de extremidades em um vértice do
triângulo e no ponto médio do lado oposto a esse vértice. Como M é ponto médio
do lado
AC
, então, por definição, o segmento BM é a mediana relativa ao vértice
B.
Com esse problema, queríamos perceber se o processo de construção da
mediatriz de um segmento seria tomado como processo de construção do ponto
médio desse segmento, uma vez que não havíamos discutido esse aspecto, isto é,
uma mesma construção serviria para determinação de outro objeto geométrico.
Esperávamos que tal visão ocorresse naturalmente, porém, para qualquer dificuldade
apresentada, o formador perguntaria aos participantes o que eles sabiam sobre a
mediatriz de um segmento, e o que garantiria a construção da mesma.
Outro ponto, que talvez precisasse de esclarecimento, era a definição de
mediana de um triângulo, pois esta poderia não estar disponível, se perguntaria entre
153
os presentes quem lembrava a definição ou que pesquisassem em um livro didático
da 7ª série que estivesse à disposição nos materiais da oficina. Esse seria um ponto
de institucionalização local, pois sem conhecer o que é mediana, os professores não
teriam sucesso nessa atividade.
Análise a posteriori
Tínhamos a intenção de verificar se os professores associavam a construção
do ponto médio à construção da mediatriz. Como foi pedido para construir a mediana,
notamos que alguns professores tinham dúvidas sobre a definição desse objeto
geométrico, conforme podemos acompanhar nos relatos a seguir.
Carlos: Mediana é relativa a triângulo. São três medianas.
Joana: Mediana é segmento ou reta?
Carlos: Reta.
Formador: Qual a definição de mediana?
Joana: Liga o vértice de um triângulo ao ponto médio do lado oposto a esse
vértice.
O formador percebeu que devia fazer a institucionalização local do que é
mediana para que os professores pudessem fazer a construção pedida.
Formador: Mediana é o segmento que une o vértice de um triângulo ao ponto
médio do lado oposto a esse vértice.
O professor Renato descreveu o processo de construção escrevendo: Construí
um triângulo ABC e o ponto médio do lado
AC
(M), traça-se a mediana unindo o
vértice B ao ponto M.
O formador observou a construção do professor Renato e perguntou: como
encontrou o ponto médio M?
O professor Renato tinha encontrado o ponto médio M, com um único ponto
eqüidistante de A e C e ligou B a determinado M, sem refletir que esse M não seria o
ponto médio. Porém, o triângulo qualquer que havia escolhido dava a falsa impressão
de que era médio e a evidência da figura constituía um obstáculo epistemológico no
campo da Geometria, conforme Arsac (1988). O formador lhe entregou um papel com
um triângulo “bem escaleno” e pediu-lhe para construir a mediana relativa ao vértice
B. O professor Renato logo percebeu que a sua construção não era do ponto médio.
Ele havia feito a construção da figura 32.
154
Figura 32: Construção do professor Renato - problema VI
Em outro grupo, as professoras Eva, Rute e Paula discutem.
Eva: como você fez o PROBLEMA VI?
Rute: Achei o ponto M e tracei a mediana.
A construção da professora Rute é a da figura 29.
Figura 33: Construção da professora Rute - problema VI
Eva: Traçou a mediatriz?
Rute: Não cheguei a traçar a mediatriz, determinei só o ponto M.
Paula: A gente precisa saber o que é mediana.
Formador: O que é mediana?
Rute: BM é a mediana relativa ao vértice B.
Paula: Estou na dúvida com relação à justificativa, estou achando que fiz muito
pouco. Acho que preciso explicar melhor o que é mediana.
A professora Paula demonstra insegurança com relação a justificativa
matemática, achando que essas devem ser longas e complexas e pede confirmação
ao formador, portando-se na extremidade da pedagogia do contínuo pedagógico-
andragógico.
A professora Eva apresenta a seguinte justificativa:
CM = MA
M é ponto médio de
AC
Logo MB é mediana do ΔABC em relação ao vértice B.
Formador: Por que MB é a mediana do triângulo ABC relativa ao vértice B?
Alguns professores respondem que é por definição.
C
A
B
M
155
O professor José tinha feito a sua descrição do processo de construção pela
primeira vez na linguagem simbólica e a professora Mirtes estava revendo com ele
algumas notações e chamando atenção para alguns equívocos. Destacamos que a
professora Mirtes, que vinha utilizando o registro simbólico em suas escritas, ampliou
os seus conhecimentos com relação a essa representação a cada encontro e, nesse
momento, já auxilia o colega. Nesse sentido, acreditamos ter contribuído para ampliar
a autonomia dessa professora e percebemos o professor José trilhando no mesmo
caminho.
Afirmamos, também, que a formação contribuiu no resgate, ampliação e até
mesmo aquisição do conteúdo geométrico mediana de um triângulo.
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA VII
a) Trace uma reta d, e marque um ponto M pertencente à d e um ponto A não
pertencente à d. Construa a circunferência tangente à d em M passando por A.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
Análises Prévias
a) Nesse problema uma das possibilidades de construção é apresentada na
figura 34.
Figura 34: Construção - problema VII
b)
São dados no problema um ponto A, que pertence à circunferência procurada, e
um ponto M, que é ponto de tangência da circunferência com a reta d. Temos que
determinar o centro “O” da circunferência que passa por A.
1º. passo: Traçamos uma reta d e marcamos M nessa reta e um ponto A que não
pertence à reta d.
2º. passo: Construímos a mediatriz m do segmento
A
M.
3º. passo: Construímos a reta “s” perpendicular à reta “d” passando por M.
4º. passo: Chamamos de “O” o ponto de intersecção entre “m” e “s”.
156
5°. passo: Construímos a circunferência de centro “O” e raio
OA
ou
OM
.
c)
São dados no problema a reta d, um ponto M pertencente a d e um ponto A não
pertencente a d, M é ponto de tangência. Temos que construir a circunferência de
centro “O” que passa por A e é tangente à reta d em M.
A e M pertencem à circunferência de centro “O”, pois, por hipótese, a
circunferência passa por A e M, sendo M ponto de tangência.
A e M são eqüidistantes de “O”, por definição de circunferência, logo “O” pertence
à mediatriz do segmento
A
M.
Como M é ponto de tangência, então o raio
OM
é perpendicular à reta “d” em M,
e sendo assim “O” pertence à reta “s” perpendicular à reta “d” que passa por M.
“O” é ponto de intersecção entre “m” e “s”, pelas duas afirmativas anteriores.
A circunferência procurada, é a circunferência de centro “O” que passa por A (raio
OA
).
A figura de apoio e a discussão sobre a mesma era fundamental para realizar a
construção, com êxito, nesse problema, em especial a discussão sobre ponto de
tangência. Esperávamos pela descoberta da propriedade que diz: o raio da
circunferência é perpendicular à reta tangente no ponto de tangência, pois
acreditávamos que nem todos os professores em formação continuada a conheciam.
O formador institucionalizaria tal propriedade garantindo que ela ficasse disponível
para uso em outras situações-problema, ou, até mesmo, para justificar passos de
demonstração.
Análise a posteriori
Com relação a esse problema, tínhamos como hipótese que nem todos os
professores conheciam a propriedade que dizia: o raio da circunferência é
perpendicular à reta tangente no ponto de tangência, em verdade, esperávamos por
esta descoberta na busca da solução do problema. Esta hipótese foi constatada no
decorrer da atividade pela fala e anotações de alguns professores. Constatamos
também, que o objeto geométrico mediatriz de um segmento estava cada vez mais
disponível para solucionar novas questões. Os professores participantes utilizavam a
definição 1 ou 2 e a propriedade 1 ou 2 em seus argumentos e justificativas.
O professor José tinha resolvido o problema sem levar em consideração a
propriedade, pois, na verdade, a desconhecia. Vejamos, a seguir, a sua construção
representada pela figura 35.
157
Figura 35: Construção do professor José - problema VII
Percebemos que a “reta tangente” do professor José está secante. A
professora Maria pergunta se ele sabe o que é reta tangente, e ele explica partindo da
definição de reta que toca a circunferência em um único ponto. A professora Maria lhe
fala da propriedade sobre reta tangente (perpendicularismo entre a reta e o raio).
Todavia, como constatamos em sua fala, o professor José diz não conhecer esta
propriedade.
José: Eu não conhecia essa propriedade, fui aplicando o que conhecia sobre
mediatriz, e que aprendi aqui. Tracei o segmento AM e achei o ponto O, seu ponto
médio. E construí a circunferência de centro O e raio OM.
Maria: Você percebeu que não ficou tangente?
A professora Maria diz aos professores José e Mirtes que eles têm que saber o
que é tangente, e fala sobre posição relativa de reta e circunferência (tangente,
secante e exterior) e explicita mais uma vez a propriedade que relaciona a reta
tangente e o raio no ponto de tangência.
Mirtes: Então, José, para ser tangente M deve ter 90°. Como é que faz a
construção Maria?
ˆ
Formador: Tentem refazer a figura a partir do que vocês discutiram.
Mirtes: Eu preciso traçar uma reta perpendicular por M.
Maria: Isso mesmo.
A professora Mirtes inicia a construção e o professor José vai descrevendo o
processo de construção, obtendo a figura 36.
Figura 36: Construção dos professores José e Mirtes - problema VII
158
Os professores José e Mirtes fazem a seguinte descrição em linguagem figural
e, em seguida, convertem para a linguagem simbólica. A professora Maria não
intervém nesse processo.
Com a ponta seca em M, construí a circunferência C de raio qualquer
encontrando os pontos B e C na reta d.
Ponta seca em C e ponta seca em B, tracei duas circunferências encontrando
o ponto de intersecção E.
Por E e M, determinei a reta s, que é perpendicular à reta d.
Em seguida, tracei o segmento MA.
Ponta seca em A, tracei a circunferência C
1
. Analogamente, ponta seca em M,
tracei a circunferência C
2
.
Encontrei os pontos F e G.
Tracei a reta r que passa por F e G a qual é mediatriz do segmento AM.
A intersecção das retas r e s é o ponto O.
Ponta seca do compasso em O, construí a circunferência tangente a d em M
passando por A.
A professora Mirtes, juntamente com o professor José, limpa as descrições
redundantes de mediatriz e perpendiculares, trocando por: “construir a perpendicular”
e “construir a mediatriz”. Assim passam a fazer a descrição em linguagem simbólica.
Construção de s d em M.
Construção de M
A
.
Construção da mediatriz r de M
A
.
s r = O
O é o centro da circunferência procurada.
Maria: Tem que colocar O entre chaves.
Mirtes: Tem que colocar as chaves?
Formador: A intersecção de dois conjuntos é um conjunto e não um elemento do
conjunto, como a reta é um conjunto de pontos tem que colocar chaves.
Mirtes: Jamais ia imaginar que a tangente era perpendicular ao raio.
A fala da professora Mirtes deixa evidente o quanto a justificativa matemática
da construção desse problema contribuiu para essa descoberta, função de descoberta
proposta por De Villiers (2001; 2002), ou seja, que, na busca para encontrar a solução
de um problema, se descobre resultados novos.
No grupo formado pelos professores Carlos, Joana e Renato, dois deles (Joana
e Renato) conheciam a propriedade e ajudaram o professor Carlos a descobri-la. A
professora Joana comentou, ao final de toda a discussão: “Na faculdade deveriam
ensinar assim”.
Uma discussão similar a essa também ocorreu no grupo formado pelas
professoras Eva, Paula e Rute. Nesse grupo, a professora Eva conhecia a
159
propriedade em questão e as professoras Rute e Paula passaram por essa
descoberta.
No momento da discussão geral, o formador fez o registro figural da descrição
da professora Eva, cujo comentário aponta que, sem descobrir ou conhecer a
propriedade, não seria possível ter sucesso no problema. Por fim, o formador
institucionalizou com o grupo, a propriedade escrevendo na lousa: a reta tangente a
uma circunferência é perpendicular à reta que passa pelo centro dessa circunferência
e pelo ponto de tangência.
Outro ponto observado, durante a resolução desse problema, foi que os
professores usaram uma figura de apoio na tentativa de compreender melhor o
problema e discutir o caminho (matemático) a seguir.
Acreditamos que essa atividade como um todo (do PROBLEMA I ao
PROBLEMA VII) atendeu às suas expectativas, pois, além de tornar o objeto
geométrico mediatriz de um segmento disponível para resolver novas situações-
problema, retomou a discussão de “ponto de vista”. Além disso, percebemos que os
professores participantes desenvolveram sua autonomia, ao dar respostas às novas
situações que lhes foram apresentadas, ao fazer uso de objetos institucionalizados
em novas situações e, sobretudo, ao demonstrar segurança no que faziam,
questionando as suas respostas, bem como as dos seus pares, sendo capazes de
construírem conhecimentos com estes. Por fim, avançaram na representação em
linguagem simbólica fazendo conversões do registro figural, passando pela língua
natural e para o simbólico.
ATIVIDADE 8: UM DESAFIO
Muitas são as situações nas quais precisamos fazer uma construção e temos
um limite de espaço para os traçados. O desafio que segue é um exemplo de
tal situação.
a) Construa o ponto médio do segmento AB dado. Não é permitido construir
no exterior do retângulo.
b) Justifique matematicamente essa construção.
160
Análises prévias
Essa atividade objetivou perceber como os professores em formação se
comportariam diante de uma situação-problema desafiadora, que usasse uma
propriedade vista anteriormente na formação ou pudesse suscitar essa descoberta.
a) Nessa atividade, uma das possibilidades de construção era apresentada na
figura 37.
Figura 37: Lei do ponto médio
b)
(1)
ADBC
, por construção.
(2) M é ponto médio do segmento
CD
, pois m é a mediatriz do segmento
CD
.
(3)
MDMC
, pois M é ponto médio do segmento
CD
.
(4) Temos que MB = MC + BC e MA = MD + AD.
(5)
M
A
MB , por (1), (2) e (4).
(6) Como
ABCD
e
CDM
, então
A
BM
.
(7) M é ponto médio do segmento
A
B por (5) e (6).
O desafio envolvia uma propriedade geométrica que já havia sido trabalhada
anteriormente – a lei do ponto médio. Nesse desafio os participantes poderiam usar a
lei do ponto médio
40
, já discutida em encontros anteriores (antes das atividades dessa
pesquisa), ou seja, fariam uso de um resultado já demonstrado. No entanto, como
tínhamos participantes novos, ou até mesmo que esta ferramenta não estivesse
disponível, esperávamos pela descoberta dessa lei.
________________
40
A LEI DO PONTO MÉDIO
Sejam quatro pontos A, B, C e D alinhados nesta ordem e tal que AB = CD.
Demonstre que o ponto médio do segmento BC é também o ponto médio do segmento AD.
161
Análise a posteriori
Todos os participantes conseguiram resolver a atividade com êxito, mas
nenhum deles remeteu-se a lei do ponto médio, já trabalhada anteriormente
41
em
uma oficina que não fez parte dessa pesquisa. Acreditamos que o tipo de trabalho
desenvolvido nas oficinas de formação até o presente momento, possibilitou-lhes agir
de maneira independente, ou seja, com mais autonomia, uma vez que eles
conseguiram dar respostas inesperadas e bem fundamentadas geometricamente.
Pelos critérios de Gardner (1993 apud GRZEGORCZYK e STYLIANOU, 2006), os
professores conseguiram dar novas respostas e enfrentar novas situações-problema.
Nesse sentido ampliaram a sua autonomia.
A professora Eva faz a construção da figura 38.
Figura 38: Construção 1 da professora Eva - atividade 8
Porém, comenta com as professoras Rute e Paula, que não pode ser assim,
pois fez uso do Teorema de Tales, e não pode traçar paralelas com o par de
esquadros, deve apenas fazer uso da régua e do compasso.
Eva: Eu me lembrei disso, porque em uma formação que tive em Geometria foi
pedido para dividirmos um segmento em três partes congruentes e era uma
aplicação de Tales.
As professoras voltam a pensar sobre o problema e a professora Eva
apresenta a construção da figura 39 com a sua justificativa:
________________
41
Destacamos que o encontro no qual foi trabalhada esta lei, que os dados coletados serviram de base
para um artigo que foi publicado no III SIPEM – Seminário Internacional de Pesquisa em Educação
Matemática ALMOULOUD, S. A.; FUSCO, C. A. S. Discutindo algumas dificuldades de professores dos
ensinos fundamental e médio a respeito do conceito de demonstração em matemática. Recife: SBEM,
2006. v. 1. p. 1-10. O artigo revela que os professores não tiveram autonomia para enfrentarem tal
situação.
162
Figura 39: Construção 2 da professora Eva - atividade 8
Justificativa:
AA
1
= BB
1
, A
1
M = MB
1
e M é ponto médio de
11
BA , logo é ponto médio de
A
B.
A professora Rute, que estava trabalhando independente, solucionou o
problema apresentando a construção da figura 40.
Figura 40: Construção da professora Rute - atividade 8
Todavia, essa professora não apresentou a justificativa matemática. Tal
justificativa poderia ser dada, por exemplo, por meio da propriedade da altura do
triângulo isósceles, a qual também passa pelo ponto médio da base.
Outro ponto observado foi que essa questão não pedia para descrever o
processo de construção, mas que alguns professores o apresentaram junto com a
justificativa. Foi o que aconteceu com os professores Mirtes e José.
A professora Mirtes realizou a construção obtendo a figura 41 e apresentou a
justificativa.
Figura 41: Construção da professora Mirtes - atividade 8
Justificativa:
'BB'
AA
, por construção (1)
C
1
(A’, r)
C
2
(B’, r)
163
C
1
C
2
= {C, D}
ABCD
= {P}
P é o ponto médio de
'B'
A
P'BP'
A
(2)
Por (1) e (2),
PB
A
P .
Percebemos também na construção do professor Carlos (figura 42) e
justificativa (começando com segmentos maiores que a metade), uma total autonomia
no que faz.
C
D
Figura 42: Construção do professor Carlos - atividade 8
Justificativa:
BCAD
como AD + DB = AB e BC + CA = BA, temos AD + BD =
BC + CA = BA
CADB
traçando a mediatriz de
CD
encontramos M ponto
médio de
CD
(propriedade 1), logo
MDCM
assim,
+AC CM
MD +BD ,
portanto M, também é ponto médio de
A
B.
No grupo formado pelos professores Carlos, Renato e Joana, a solução foi
apresentada e justificada. Ocorreu, no entanto, um debate a respeito do retângulo no
qual se encontrava o segmento AB. Eles perguntaram se tal segmento estava no
meio do retângulo, pois, se assim fosse, bastava traçar a diagonal e encontrar o ponto
médio. O formador respondeu que não, e o professor Renato comentou que se
poderia construir um retângulo nas extremidades A e B e traçar a diagonal. O
professor Carlos o fez e conferiu com o retângulo original, destacando que o erro
seria mínimo.
A professora Joana também encontrou pontos eqüidistantes sem pensar na
construção da mediatriz (construiu dois triângulos isósceles), apresentando a
construção da figura 43.
164
Figura 43: Construção da professora Joana - atividade 8
Em virtude de todos os professores presentes terem conseguido solucionar
com êxito a situação dessa atividade e, até mesmo, conseguirem buscar novas
alternativas de soluções, inferimos que eles estão se apropriando do objeto
geométrico mediatriz de um segmento, pois têm conseguido dar solução a novas
situações que antes não conseguiam. Acreditamos, ainda, que o fato de termos
construído esse objeto geométrico sob “pontos de vista” diferentes, só veio a
contribuir para a autonomia desses professores, lhes possibilitando trabalhar no
extremo do contínuo pedagógico-andragógico da andragogia, ou seja, eles
assumiram total responsabilidade na realização da atividade aceitando o problema
para si.
Outro aspecto a ser levado em conta é que alguns professores consideraram o
quadro no qual se encontrava a questão como um retângulo que poderia ser usado na
solução. Não levantamos tal possibilidade nas análises prévias e, sem intenção
alguma, posicionamos o segmento AB no “meio” do retângulo, possibilitando que os
professores sugerissem essa solução, em formações futuras, se formos utilizar essa
atividade, pensaremos nessa variável didática importante (posição do segmento no
interior do retângulo), pois a nossa intenção era o uso da lei do ponto médio.
Além disso, devemos considerar que o quadro escolhido (retângulo) permitia a
solução trivial, pois bastava pegar a abertura “um pouco maior” que a metade do
segmento AB e seria possível construir o ponto médio deste segmento sem fazer uso
de nenhum recurso novo. Para os professores que perceberam esse fato, revelamos
que a nossa intenção era de que o fizessem supondo que não seria possível essa
solução. Mais uma vez, temos que tomar cuidado com as variáveis didáticas
escolhidas, pois poderíamos não ter o sucesso esperado na atividade, apenas por
dimensionar mal essa variável, ou seja, fazer uma escolha incorreta.
165
ATIVIDADE 9: ANALISANDO RESPOSTAS DADAS POR ALUNOS
Um professor de Matemática após trabalhar com seus alunos os conceitos
referentes a mediatriz de um segmento, pediu a eles que construíssem a
reta “d” mediatriz do segmento
A
B dado. As respostas dadas por três
alunos foram:
ALUNO 1 ALUNO 2 ALUNO 3
Comente cada uma dessas respostas.
Análises prévias
Nesta atividade, resolvemos não inferir sobre as respostas dadas pelos
professores. Todavia, os objetivos e intenções serão destacados a seguir.
Objetivamos com essa atividade perceber se os professores em formação
estariam realmente prontos para analisar caminhos diferentes que podem ser
percorridos pelos alunos, bem como quebrar o contrato imposto pelos livros didáticos,
ao colocarem sempre arcos de mesmo raio para encontrar pontos eqüidistantes das
extremidades dos segmentos na construção da mediatriz deste (construção pelo
método do losango). Estávamos buscando perceber se o objeto matemático
institucionalizado e a ampliação do campo de conceitos ligados a ele, estavam
disponíveis para ser usados em situações de sala de aula.
Esperávamos que os professores participantes já tivessem ampliado o conceito
de mediatriz de um segmento, ao terem resolvido todas as atividades propostas
anteriormente. Acreditávamos que a propriedade que diz: “Um ponto pertence a
mediatriz de um segmento se, e somente se, eqüidista das extremidades desse
166
segmento” estivesse disponível no repertório cognitivo desses professores e fosse
utilizada para avaliar que os três alunos construíram com êxito a mediatriz “d” do
segmento
A
B . No entanto, se tal fato não ocorresse, esperávamos que a discussão
entre grupos e o formador fizesse com que os professores pudessem se refletir
acerca do êxito desses alunos. Acreditávamos que alguns poderiam se remeter à sala
de aula e avaliar os momentos em que “respostas diferentes” foram dadas e não
foram avaliadas de modo a verificar sua validade, bem como indagar a forma de fazer
do seu aluno, pedindo-lhe explicação do processo utilizado.
Análise a posteriori
Essa atividade ocorreu de modo aproximado ao esperado nas análises prévias.
No entanto, alguns professores se preocuparam em fazer juízo de valor a respeito de
qual estratégia seria melhor ou pior. Todos os professores concordaram que as
soluções dos três alunos estavam corretas, o que demonstra autonomia na
capacidade de avaliar respostas ou caminhos diferentes que podem ser percorridos
pelos alunos.
No entanto, destacamos que alguns professores apontaram a resposta três
como a mais usual, a mais comum, a que eles esperavam que os alunos fossem dar.
Na intervenção, o formador indagou se os alunos estavam realmente usando pontos
eqüidistantes para construir a mediatriz ou se teriam decorado. Vejamos o que os
professores revelaram.
Rute e Paula: Os três estão corretos.
Paula: Me incomoda um pouco a situação 1 e 2, geralmente a gente traça igual
ao aluno 3.
Eva: Eu acho o aluno 3 o mais esperto e mais prático.
Renato: O terceiro não tem dúvida, é o mais usual, é o mais fácil, é o mais
comum.
Rute: O aluno 3 é o mais prático, mas será que ele teria condições de fazer de
outra forma?
Maria: Teríamos que conhecer o aluno para fazer algum juízo. Me parece que o
aluno 2 seria o mais autônomo, porém para saber se realmente está usando o
conceito de eqüidistância teríamos que conhecer o aluno.
O formador perguntou: como faria o aluno 3 se o segmento AB estivesse
localizado no canto inferior da folha de papel? Será que ele daria a resposta do aluno
2? E comenta que a escolha feita a priori para “testar“ algum tipo de estratégia é o
que se chama de variável didática. E destaca que se o aluno conseguir construir a
167
mediatriz nessa situação (canto inferior da folha de papel), está mostrando que
conhece realmente a propriedade que diz: dois pontos quaisquer eqüidistantes das
extremidades de um segmento pertencerem a mediatriz deste segmento.
As professoras Paula e Rute disseram que iram testar com seus alunos já que
eles sabem fazer a construção da mediatriz como o aluno 3, mas não trouxeram os
dados obtidos. Pensamos que não chegaram a propor tal situação com os seus
alunos.
O professor Carlos comentou que achou “muito legal” propor situações que
façam os alunos realmente demonstrarem os conhecimentos que adquiriram, pois tais
situações, geralmente, são desafiadoras.
Pela postura dos professores, acreditamos que eles teriam condições de fazer
uma avaliação individual das respostas dos alunos de modo a aceitarem as
estratégias apresentadas. No entanto, inferimos que muitos desses professores
trabalhariam a construção da mediatriz sempre tomando arcos com o mesmo raio
para construir pontos eqüidistantes das extremidades do segmento, como fez o aluno
3.
ATIVIDADE 10: DESCOBRINDO NOVAS PROPRIEDADES
SITUAÇÃO 01: Espaço aéreo
Dois países vizinhos, Nenhum e Nada, de uma galáxia distante, não têm boas
relações, por isso eles vigiam muito bem seus espaços aéreos.
Na tela do radar de um avião de caça aparecem dois indicadores de torre de
rádio, denotados por A e B, do país Nenhum e um indicador de torre rádio,
denotado por C, do país Nada.
Um avião de Nada deve voar mais próximo de C que de A, e mais próximo de
C que de B.
A figura a seguir representa a tela do radar. Qual a parte da tela que representa
o espaço aéreo do país Nada?
168
SITUAÇÃO 02: Zona de construção em uma fazenda
Uma casa será construída em uma fazenda, representada a seguir pelo
quadrilátero ABCD. A construção será feita em uma região mais distante de A
que de B, mais próxima de B que de C, mais distante de C que de D e mais
próxima de D que de A. Pinte a parte da fazenda na qual será construída a
casa.
Análises prévias
Propusemos aos professores em formação a situação-problema espaço aéreo,
objetivando discutir a propriedade segundo a qual: a mediatriz de um segmento
A
B
divide o plano em três regiões a saber (ver figura 44):
Uma região na qual todos os pontos são eqüidistantes de A e B.
Uma região na qual todos os pontos estão mais próximos de A que de B.
Uma região na qual todos os pontos estão mais próximos de B que de A.
169
A
B
Região do plano cujo os pontos estão
mais próximos de A que de B.
Região do plano cujo os pontos estão
mais próximos de B que de A.
Região do plano cujos pontos são
eqüidistantes de A e B.
Figura 44: Uma nova propriedade
As construções esperadas nas SITUAÇÕES 01 e 02 são dadas
respectivamente pelas figuras 45 e 46.
Figura 45: Espaço aéreo
Figura 46: Região em uma fazenda
170
Acreditávamos que tal situação era realmente nova para os participantes. Na
verdade inferimos que era nova para a grande maioria dos professores, pois, em
nossa experiência, ainda não havíamos nos deparado com situações dessa natureza
nos livros didáticos, tidos por muitas pesquisas e pelos PCN
42
como fonte de
informação para a grande maioria dos professores.
Esperávamos algum tipo de dificuldade, mas, nesse momento, já estava
disponível a propriedade que diz que “os pontos que estão a igual distância das
extremidades do segmento pertencem à mediatriz desse segmento”. O formador
poderia fazer devoluções e sugerir que eles pintassem a região quando eles já
tivessem identificado. Por exemplo, falando: “Traçaram a mediatriz do segmento
AC
?
E aí? Vocês podem pintar de azul os pontos mais próximos de C que de A”. E
continuaria a fazer devoluções, com o cuidado de não fazer efeito topaze
43
.
Esperávamos que, após terem solucionado essa situação problema, os
professores também formulariam a conjectura sobre a propriedade que queríamos
institucionalizar. Com a formulação pronta, eles poderiam usá-la para resolver a
SITUAÇÃO 02, sobre a zona de construção em uma fazenda, ou seja, fariam a
validação usando a conjectura levantada para resolver um novo problema, cuja
ferramenta a ser utilizada seria a propriedade que iríamos institucionalizar.
Após análise e discussão das situações, o formador institucionalizaria a
propriedade em questão, garantindo que a mesma poderia ser usada em outras
situações fora desse contexto na qual emergiu e, dessa forma, estaria disponível no
repertório cognitivo dos professores em formação.
Análise a posteriori
Como havíamos previsto nas análises prévias, a situação apresentada foi
realmente uma novidade para os professores participantes e durante a atividade eles
vislumbraram a descoberta desse novo fato referente à mediatriz de um segmento.
________________
42
Segundo os PCN de Matemática, “[...] os professores apóiam-se quase exclusivamente nos livros
didáticos, que, muitas vezes, são de qualidade insatisfatórias” (BRASIL, 1998, p. 22).
43
Quando um aluno encontra uma dificuldade, o professor pode criar condições para que o aluno
supere essa dificuldade sem um verdadeiro engajamento pessoal do discente. Tal procedimento
docente é chamado efeito “topaze”. Esse fenômeno aparece nas situações didáticas em que o
professor se encarrega de uma parte substantiva, essencial do trabalho, que deveria ser de
responsabilidade do aluno (ALMOULOUD, 2007, p. 94).
171
Alguns deles apresentaram dificuldades, mas que foram “sanadas” no próprio grupo
em que eles estavam. Destacamos que os professores que tinham uma experiência
menor com este objeto geométrico demonstraram mais autonomia ao resolver o
problema. Atribuímos tal postura aos vícios que, muitas vezes, ocorrem quando se
trabalha durante muito tempo com o mesmo objeto sob uma única ótica e/ou “ponto
de vista”.
Ao final da atividade, o formador fez a institucionalização do objeto que estava
implícito na atividade, segundo a TSD, pois em momento algum foi revelado aos
professores o que se queria institucionalizar e eles tiveram a oportunidade de agir e
formular durante a SITUAÇÃO 01 e validar a conjectura levantada na SITUAÇÃO 02,
ao conseguir com sucesso sua solução.
Ressaltamos que alguns professores tiveram dificuldade com a interpretação
do enunciado da SITUAÇÃO 01, pois a idéia do radar, que era associado a ondas
circulares se fazia muito presente e alguns professores pensaram em circunferência,
ou seja, alguns participantes não se prendiam ao espaço aéreo pedido pela situação.
Outros professores não perceberam que se pedia a delimitação do espaço aéreo, na
suposta tela e acharam que estava se pedindo a representação do radar e que este
apenas detectava aviões.
Percebemos alguns momentos de ação e levantamento de conjecturas durante
a SITUAÇÃO 01. Os professores realmente tomaram o problema para si e foram em
busca da solução. Em nenhum momento, ficou revelado qual era a intenção didática
das situações, que, segundo Brousseau (1986), caracteriza uma atividade
desenvolvida com base na TSD. A professora Sueli tinha feito um esboço a mão livre
e mostrou seu resultado para as professoras Paula e Rute, o que caracterizou a
passagem pela fase de ação pelo qual passou a referida professora, só depois
realizou a construção com régua e compasso.
Percebemos que a professora Paula tentou, com os seus pares, levantar a
conjectura de que a mediatriz de um segmento divide o plano em três regiões.
Vejamos a fala dessa professora e a confirmação da professora Sueli.
Paula: As mediatrizes vão delimitar mesmo? Vamos escrever o que fizemos para
não esquecer.
Sueli: A solução que fizemos garante os pontos mais próximos, os iguais e os
mais distantes.
172
As professoras Paula, Rute e Sueli realizam com sucesso a SITUAÇÃO 02
(esta situação envolvia as expressões mais próximos e mais distantes, valorizando a
construção da propriedade a ser institucionalizada), nos levando a afirmar que a
conjectura levantada foi posta a prova para resolver esse novo exercício, ou seja, as
professoras realizaram a validação, que segundo Brousseau (1986) é fase prevista na
TSD. Constatamos esse fato quando a professora Sueli fez a construção da
SITUAÇÃO 02.
Sueli: Aqui nessa região (semi-plano) são os pontos mais distantes de A que de
B.
Em outro subgrupo, as professoras Eva, Maria e Mirtes, discutem as situações.
Salientamos que Mirtes sempre se colocava no grupo com um respeito aos
conhecimentos matemáticos de Maria, isto é, se Maria afirmava alguma coisa, Mirtes,
em geral, mudava de idéia e tentava concordar com ela. No entanto, nessa atividade
ficou claro o grau de independência que Mirtes atingiu, demonstrando autonomia ao
afirmar que a solução proposta por Maria não estava correta e argumentando
matematicamente para convencê-la.
Destacamos o cuidado que Mirtes teve com a auto estima de Maria, ao apontar
o erro na sua solução. Acreditamos que esse momento foi de grande riqueza, nos
levando a afirmar que essa formação contribuiu para o desenvolvimento da autonomia
dos professores, uma vez que, de acordo com nosso referencial teórico, a autonomia
é algo que pode ser motivada, desenvolvida e construída.
Eva sugeriu que Mirtes refizesse a construção passo a passo e fosse
explicando para ela e para a professora Maria. Mirtes foi falando e fazendo:
“Construção da mediatriz m
1
do segmento AC fica essa região aqui (os mais próximos
C que de A). Construção da mediatriz m
2
do segmento BC fica essa região aqui (os
mais próximos de C que de B)” e mostra que a intersecção das regiões é o que
atende a solicitação da SITUAÇÃO 01. E apresenta a figura 47.
Figura 47: Espaço aéreo - construção da professora Mirtes
173
A professora Maria revela que não tinha entendido o enunciado e a professora
Mirtes explica, relatando que o espaço aéreo deve ser meio a meio para as cidades,
não importando o raio de alcance do radar porque todos os aviões serão detectados,
mas alguns estarão fora do espaço aéreo.
Na SITUAÇÃO 02 Mirtes diz a Maria que é preciso fazer as mediatrizes dos
segmentos AB, BC, CD e AD e Maria garante que não precisa fazer a mediatriz do
segmento AD. Mais uma vez Mirtes, com todo o cuidado, convence Maria, lhe
explicando o objetivo da questão, ou seja, chamando atenção para o que é mais
próximo e o mais distante.
No subgrupo formado pelos professores Carlos, Joana e Renato, os dois
primeiros realizaram a atividade sem apresentar dificuldades, enquanto Renato
apresentou e, por isso, o formador teve que fazer uma intervenção maior.
Acreditamos que efeitos topaze de contrato didático ocorreram nessa intervenção. Dái
inferimos, então, que o professor compreendeu a situação em questão. Vejamos:
Renato: Venezuela e Colômbia. Qual a lógica desse espaço aéreo?
Renato: Eqüidista daqui e dali. O “C” ficar longe de “A” é moleza, o problema é
ficar também longe de “B”.
Formador: Por que? O “C” longe de “A”, e se não tivesse “B” como você faria?
O professor Renato não responde e o formador volta a intervir, pedindo que
Renato coloque a ponta do lápis na região em que ele pode voar. Renato assim o faz
e o formador volta a intervir.
Formador: Como você delimita o espaço que C pode voar?
Renato: Menor que a metade entre A e C.
Formador: Como você acha essa metade?
Renato: Fazendo a mediatriz.
Formador: Fazendo a mediatriz, o que é que ela é?
Renato: O limite.
E o professor Renato demonstra ter entendido o objetivo e destaca que tem
que ser menor, não pode voar quando estiver igual. E ainda diz que essa era a
dificuldade dele, como representar o que não pode e o formador diz que ele pode
fazer a reta tracejada, que em geral é a convenção utilizada quando o limite não faz
parte da resposta. Renato conclui a construção com sucesso.
174
O formador começa a institucionalização da propriedade perguntando se algum
professor quer fazer algum comentário sobre a atividade.
Paula: Se eu não tivesse trabalhado com as atividades anteriores eu não
conseguiria fazer. Não teria esse conhecimento.
A fala da professora revela, nas entrelinhas, que o trabalho desenvolvido com a
mediatriz sob dois “pontos de vista”, e a utilização desse objeto para resolver várias
situações-problema, contribuiu para que o objeto geométrico mediatriz de um
segmento estivesse no seu repertório cognitivo à disposição para ser usado em uma
situação de ampliação do campo de conceitos ligados a este objeto.
Formador: E porque construir a mediatriz?
Rute: Pensei em mediatriz porque ela é o que dá igual distância.
Sueli: Para saber o que está mais próximo e mais distante o que precisamos é
determinar o que está igual.
Formador: O avião pode voar na mediatriz?
Rute: Não, por isso fiz as retas tracejadas.
O formador percebeu que nem todos os participantes tinham se dado conta
desse detalhe e falou sobre a convenção de deixar os limites tracejados quando
esses não fazem parte da solução. O formador ainda comentou que os dois
problemas tratam de intersecções de semiplanos sem levar em consideração a
origem destes.
O formador comentou com os professores, que até aquele momento a
mediatriz de um segmento AB havia sido estudada como um conjunto de pontos que
estão a igual distância de A e B, porém diz que as situações que acabaram de
vivenciar permitiam afirmar que a mediatriz de um segmento AB, divide o plano em
três regiões a saber: uma formada pelos pontos que estão a igual distância de A e B,
outra pelos pontos que estão mais próximos de A que de B e uma terceira formada
pelos pontos que estão mais próximos B que de A. Fazendo na lousa a figura e
apontando as regiões mencionadas.
Figura 48: Institucionalização da nova propriedade
175
Paula: Excelente exercício.
Acreditamos que a TSD foi proposta com êxito, objetivando institucionalizar
essa propriedade.
ATIVIDADE 11: FAZENDO DEMONSTRAÇÕES
Essa atividade não foi discutida na integra com os professores em formação
continuada. Sendo assim, optamos em apresentar as análises prévias juntamente
com a análise a posteriori, apenas das questões discutidas com os participantes. Nos
apêndices desse trabalho encontram-se na integra, todas as atividades que foram
pensadas para essa formação.
Destacamos que todas as atividades foram distribuídas com os professores e
possivelmente alguns deles concluíram todas elas. Todavia, não houve tempo de
socializar e discutir nas oficinas de formação.
O objetivo dessa atividade foi possibilitar ao professor fazer demonstrações,
em especial partindo de conjecturas levantadas a priori, bem como propiciar a eles a
descoberta de novas propriedades ao realizarem as demonstrações.
Esperávamos que os professores fossem capazes de desenvolver, de maneira
autônoma, as demonstrações sugeridas e que, no futuro, ao observarem algum tipo
de regularidade, ou quando fizerem uma conjectura, tivessem a preocupação de
buscar justificativas matemáticas para as mesmas. Além de que, após todas as
atividades realizadas, que os elementos hipótese (o que é dado no problema) e tese
(o que se deseja provar) ficassem bem determinados por esses professores.
176
ATIVIDADE 11: FAZENDO DEMONSTRAÇÕES
QUESTÃO 01
Construa uma circunferência C de centro O e raio r, marque três pontos A, B e
C nessa circunferência, tais que AB = BC = r. Trace a corda
AC
e o raio
OB
, o
que se pode conjecturar sobre a reta AC em relação ao raio
OB
? O esquema
abaixo é a demonstração dessa conjectura. Complete o esquema da
demonstração e enuncie a definição D, a propriedades P e o axioma A, que
justificam os passos dessa demonstração.
Por hipótese
.....................
OA = r
D
D
__________________________________________________________
P __________________________________________________________
A __________________________________________________________
Redija a demonstração.
Análises prévias
Após fazermos a análise matemática da questão, propomos como possível
construção a figura 49.
Figura 49: Construção - questão 01.
Por hipótese
A
B = ..........
........ pertence à
mediatriz de
P
OB .
AC .....................
.....................
OB
A
Por hipótese
......................
OC = r
Por hipótese
BC = ..........
........ pertence à
m
ed
i
at
riz
de
O
B.
D
P
Por hipótese
A
C.
OA = r
D
Por hipótese
A
B = r.
A pertence à
mediatriz de
P
OB .
AC é a media-
triz de
OB .
A
Por hipótese
C
C.
OC = r
Por hipótese
BC = r.
C pertence à
mediatriz de
OB .
D
P
177
D
Raio é qualquer segmento cujas extremidades são o centro da
circunferência e qualquer ponto que pertence a essa circunferência.
P Todo ponto que eqüidista das extremidades de um segmento, pertence a
mediatriz desse segmento.
A Dois pontos determinam uma única reta que passa por eles.
Redação:
(1) Seja uma circunferência C de centro O.
(2) Por hipótese, A
C, logo o segmento
OA
é raio, por definição de raio.
(3) Por hipótese, temos que a medida do segmento
A
B é igual ao raio.
(4) A é eqüidistante de O e B, por (2) e (3).
(5) De maneira análoga, temos que C também é eqüidistante de O e B.
(6) A e C pertencem à mediatriz do segmento
OB
, pois são eqüidistantes de O e
B.
(7) Pelo axioma de determinação de uma reta que passa por dois pontos, a reta
AC
é a mediatriz do segmento
OB
.
Propomos uma questão de organização dedutiva, porém, algumas justificativas
e informações ainda precisavam ser completadas. Apoiamos-nos em Duval e Egret
(1989), que afirmam que a aprendizagem da demonstração requer tarefas
específicas.
Análise a posteriori
Tínhamos a intenção de começar as questões de demonstração propriamente
dita com uma tarefa de organização dedutiva, pois, de acordo com Duval e Egret
(1989), o trabalho de iniciação a demonstração requer tarefas próprias que devem,
por isso, ser propostas. No entanto, acreditamos que, pelo fato de os professores em
formação já estarem envolvidos no projeto sobre demonstração, ou seja, já terem
realizado demonstrações, essa tarefa, assim como a da atividade 04, motivaram
algum desconforto por parte dos professores participantes.
Em muitos momentos, percebemos os professores com argumentos prontos e
a demonstração quase acabada (no verbal) – a função de explicação proposta por
De Villiers (2001; 2002) volta a ser constatada, pois notamos os professores não só
preocupados em dar a resposta, mas, sobretudo, em justificar, esclarecer o porquê
dessa resposta – e com dificuldade em preencher o esquema dado. Sugerimos,
portanto, que tarefas desse tipo devem ser propostas na formação de professores,
pois acreditamos que em muitas situações como essa eles deverão entender um
178
dado esquema referente a uma demonstração, buscando interpretar o que está sendo
comunicado. Na verdade, estamos visando que o professor se porte de maneira
autônoma, e procure entender uma demonstração proposta.
Outro ponto que nos chamou atenção, até mesmo na nossa experiência, diz
respeito à definição de raio de uma circunferência, em geral destacado quando se
define circunferência, deixando implícito se é mediada do segmento ou se é
segmento. Inferimos que o fato de não se trabalhar formalmente com essa definição,
causou impacto nos professores ao não conseguirem usar o argumento: pela
definição de raio, que era a definição pedida nessa questão. Constatamos esse fato
nas falas:
Paula: Para que duas hipóteses?
Sueli: Precisamos interpretar o esquema. Mostrar que AO é raio também.
Rute: Mas aqui já está falando.
Sueli: Qualquer ponto do centro ao ponto é raio (se referindo a ponto sobre a
circunferência).
Paula: AO e AB também são raios.
Sueli: AO = OB = raio, então A pertence a mediatriz de OB. Qualquer ponto da
mediatriz eqüidista dos extremos.
Sueli: O axioma é a reta OC é mediatriz do segmento OB. Parece evidente, por
isso chama axioma. Se fosse isso seria repetir o que já é. Então tem alguma coisa
errada.
Notamos que as professoras estavam discutindo a demonstração de uma
conjectura sem, no entanto, terem levantado a conjectura. Sendo assim ficaria difícil
saber o que queriam demonstrar e completar o esquema. A noção de axioma aparece
mal formulada, como algo evidente que não precisa demonstrar, não é que não
precise demonstrar; não é possível demonstrar.
No outro subgrupo, as professoras Eva, Mirtes e Maria discutem a questão.
Mirtes constrói a circunferência de centro O, marca os pontos A, B e C, mas diz não
saber continuar. O formador faz uma devolução pedindo para que leiam o enunciado
e procurem atender ao que está sendo solicitado. As professoras lêem e Mirtes,
prolonga o segmento AC (reta AC) e escreve a seguinte conjectura:
AC é mediatriz
de
OB
. Obtendo a figura 50.
179
Figura 50: Construção da professora Mirtes - questão 01.
As professoras Eva, Mirtes e Maria conseguem escrever a definição, a
propriedade e o axioma, após muito debate. Eva ainda apresentava dúvidas com
relação à propriedade e a definição, pois acreditava que a definição solicitada era a
definição de mediatriz.
O subgrupo formado pelos professores Carlos, Joana e Renato, apresentaram
dificuldades similares, mas destacaram bem a conjectura e o debate sobre a definição
pedida também ocorreu, não conseguindo explicitar.
O formador vai a lousa e escreve o esquema dado e convida o grupo para uma
discussão da questão, perguntando se existe alguma crítica ao esquema.
Maria: De início eu não havia entendido direito.
Mirtes: Achei difícil.
Joana: O esquema atrapalhou um pouco, tentei fazer sem o esquema.
Eva: Eu não tenho hábito de definir raio, daí a definição pra mim ficou complicado.
Formador: Qual a definição de raio?
Mirtes: É a distância de todo ponto pertencente à circunferência até o centro é
igual ao raio.
Sueli: O conjunto de pontos que eqüidistam de um ponto fixo é circunferência.
Essa distância do centro até qualquer um desses pontos é igual ao raio.
Carlos: A distância do centro a um ponto qualquer na circunferência é um raio.
O formador observou que os dois grupos definiram raio como distância. E
desenha na lousa a figura 51 e escreve a seguinte pergunta:
OA
é raio da
circunferência de centro O?
Figura 51: Representação do raio.
180
Todos os participantes responderam que sim. E o formador destacou o cuidado
com a definição, pois todos tinham definido raio como medida, logo deveria ser um
número. Entretanto, o que se tinha na lousa era um segmento. E evidenciou que não
importa qual definição se vai utilizar, mas o que se precisa é ter coerência com a
definição que se está utilizando. Em seguida perguntou como ficaria a definição de
raio por segmento.
Joana: É um segmento que tem como extremidades o centro e um ponto
qualquer na circunferência.
Discutindo sobre a definição de raio, o formador fez alguns comentários sobre
o axioma: dois pontos determinam uma única reta. E retomou o que seria um axioma
na Geometria.
Na análise a priori os objetivos da questão eram outros, no entanto, durante a
formação, formador e professores perceberam o quanto é forte a apresentação da
definição de circunferência e em seguida “mostra-se” o que é raio, não se fazendo
uma definição cuidadosa. Inferimos também que esse hábito é usual nos livros
didáticos. Nesse sentido, o debate acerca dessa questão, contribuiu para uma
formação em Geometria para todos os presentes.
A presente questão ainda nos leva a sugerir um trabalho com interpretações de
questões resolvidas, pois notamos que alguns professores queriam abandonar o
esquema e construir a sua própria demonstração, o que valorizamos. Todavia, após
essa iniciativa, não vimos um esforço para se compreender o que estava escrito. O
que será que ocorre quando os professores vão preparar suas aulas; quando se
deparam com questões que não entenderam a justificativa? Será que procuram se
debruçar e entender ou simplesmente desistem? Uma investigação mais aprofundada
nesse sentido se faz necessário.
ATIVIDADE 11: FAZENDO DEMONSTRAÇÕES
QUESTÃO 02
Construa duas circunferências secantes de centros A e B. Sabendo que E e F
são os pontos de intersecção entre essas circunferências, construa a mediatriz
do segmento EF . O que você pode conjecturar? Demonstre a sua conjectura.
181
Análises prévias
Uma possível construção é apresentada na figura 52.
Figura 52: Construção - questão 02.
Podemos conjecturar que a mediatriz do segmento EF , passa pelos centros A
e B das circunferências.
De fato:
Temos que A é eqüidistante de E e F, pois
AFeAE
são raios da
circunferência de centro A e B é eqüidistante de E e F, pois
BFeBE
são raios da
circunferência de centro B.
Como A e B são eqüidistantes de E e F, então A e B pertencem a mediatriz do
segmento EF , pois todo ponto que eqüidista das extremidades de um segmento
pertence a mediatriz desse segmento.
Com relação a essa questão, acreditávamos que os professores em formação
a realizariam com sucesso. Possíveis problemas de linguagem que por ventura
aparecessem seriam discutidos no momento da socialização das respostas entre os
participantes. Quanto a algum participante não lembrar o que são circunferências
secantes, o formador devolveria a pergunta para o grupo e caso fosse necessário
faria uma institucionalização local para garantir o sucesso da questão.
Esperávamos pela seguinte descoberta: o segmento de extremidades no
centro da circunferência e no ponto médio da corda é perpendicular à corda.
Análise a posteriori
Essa questão foi realizada com sucesso por todos os subgrupos.
Destacaremos o nível de linguagem simbólica atingido pela professora Mirtes, que
desde o início das oficinas tinha o interesse em aprender e aperfeiçoar o registro
simbólico de representação. Segundo Duval (2003), a conversão entre registros é o
que garante o acesso ao objeto matemático, nesse sentido, inferimos que a
182
professora Mirtes tem adquirido uma compreensão maior das propriedades e
teoremas em questão ao efetuar conversões entre registros figural, língua natural e
simbólico.
A professora Mirtes, assim como o professor Renato, fez uma representação
particular (construíram circunferências com o mesmo raio), mas conseguiram justificar
sem maiores problemas. A figura 53 é a construção apresentada pela professora.
Figura 53: Construção da professora Mirtes - questão 02.
Mirtes levanta a conjectura:
A
B
é mediatriz de EF . E apresenta as hipóteses:
C
1
(A, r
1
), C
2
(B, r
2
), C
1
C
2
= {E, F},
A
B
= m.
Porém, a professora Maria chama atenção que
A
B
= m é a tese. A professora
corrige e apresenta: C
1
(A, r
1
), C
2
(B, r
2
), C
1
C
2
= {E, F}, m mediatriz de EF e T:
A
B
= m.
Mirtes comenta que a construção já parece uma demonstração. E o formador
pergunta para ela: “porque você acha que a reta AB é a mediatriz?”
Mirtes: FB é igual a EB.
Eva: São raios.
Eva: FB é igual a EB porque são raios da circunferência C
2
.
Mirtes:
1
rAEAF e
2
rBEFB , por dois pontos passa uma única reta.
Maria: Logo,
A
B = m.
Os professores Carlos e Joana tinham realizado basicamente a mesma
representação figural, porém destacamos a construção da mediatriz feita por Joana,
com dois pontos eqüidistantes de maneira não usual (figura 54).
183
Figura 54: Construção da professora Joana - questão 02.
Os professores Carlos e Joana apresentaram a seguinte justificativa:
Como E e F são formados pelas intersecções entre as circunferências temos EB
=
FB (raios da circunferência de centro B) e E
A
= F
A
(raios da circunferência de
centro A), como B e A eqüidistam de E e de F, pela propriedade 1, pertencem à
mediatriz de
EF .
O formador comentou com esses professores sobre o cuidado na notação de
igualdade e/ou congruência, sugerindo que eles ou usem EB = FB (medidas) ou usem
FBEB (segmentos).
Percebemos o quanto os professores estavam independentes ao realizarem as
suas demonstrações, trabalhando na extremidade do contínuo pedagógico-
andragógico da andragogia e nesse sentido tornando-se cada vez mais autônomos
ao fazerem demonstrações, aceitando a responsabilidade pela construção do seu
conhecimento. Notamos que eles questionam os colegas e procuram convencer seus
pares, bem como mudam de opinião se forem convencidos por esses. A propriedade
que esperávamos como descoberta foi apenas suscitada pela professora Sueli
quando verbalizou: A mediatriz de qualquer corda passa pelo centro da
circunferência.
Ao final desse encontro, sugerimos que os professores fizessem a atividade 12
como lição de casa, pois no início do próximo encontro faríamos a socialização e a
discussão. O tempo que sobrasse usaríamos para finalizar a atividade 11 (ainda
faltavam quatro questões dessa atividade). O fato foi que, no início do encontro
seguinte, discutimos a atividade 12 e a questão 03 da atividade 11.
Sendo assim, a discussão que apresentamos da questão 03 da atividade 11,
ocorreu no último encontro após a discussão da atividade 12. Porém, como nossa
opção foi de relatar por atividades, a colocamos nesse momento.
184
ATIVIDADE 11: FAZENDO DEMONSTRAÇÕES
QUESTÃO 03
Construa uma circunferência de centro O; seja A um ponto interior a essa
circunferência, distinto de O. Construa a mediatriz do segmento
OA
. Sabendo
que B e C são os pontos de intersecção da mediatriz com a circunferência, o
que se pode conjecturar sobre os triângulos OAB e OAC. Demonstre sua
conjectura. E se o ponto A pertencesse à circunferência? E se o ponto A
estivesse na região exterior à circunferência?
Análises prévias
Apresentamos na figura 55 uma possível construção para essa questão.
Figura 55: Construção - questão 03
Podemos conjecturar que os triângulos OAB e OAC são isósceles.
De fato:
(1) Como B e C pertencem à mediatriz do segmento
OA
, então B e C são
eqüidistantes de O e A.
(2)
ABOB
, por (1).
(3)
ACOC
, por (1).
(4) Triângulo OAB é isósceles, por (2).
(5) Triângulo OAC é isósceles, por (3).
Ou poderiam escrever:
Os triângulos OAB e OAC são isósceles, pois como B e C pertencem à
mediatriz do segmento
OA
, então os vértices B e C estão a igual distância das
extremidades do segmento
OA
, ou seja, o triângulo possui dois lados congruentes,
isto é,
ABOB
e
ACOC
, que particularmente têm a mesma medida do raio da
circunferência.
185
No caso do ponto A estar sobre a circunferência, temos o caso particular do
triângulo isósceles, ou seja, os triângulos OAB e OAC são eqüiláteros e a medida do
lado é igual ao raio.
No caso do ponto A estar no exterior da circunferência, temos que considerar a
possibilidade do problema ter duas ou nenhuma solução (a mediatriz não intercepta a
circunferência ou é tangente a esta). O formador faria devoluções, de modo que os
professores exibissem a condição necessária e suficiente para o problema ter duas,
ou nenhuma solução.
Em termos de conseqüências matemáticas, a demonstração de que os
triângulos OAB e OAC são isósceles, poderia ser feita considerando o “ponto de vista”
já discutido em atividades anteriores: Triângulo isósceles é o triângulo que possui um
vértice que é eqüidistante dos outros dois, e a demonstração ficaria: Os triângulos
OAB e OAC são isósceles, pois como B e C pertencem à mediatriz do segmento
OA
,
então os vértices B e C estão a igual distância das extremidades do segmento
OA
.
Nessa questão, poderia também ser suscitado que o quadrilátero OBAC é um
losango e levantar propriedades, por exemplo, de que as diagonais de um losango
são perpendiculares. E, ao perceberem que os lados congruentes têm a mesma
medida do raio, poderiam perceber outros triângulos isósceles, como os triângulos
OBC e ABC.
Análise a posteriori
Nem todos os professores chegaram a explicitar as várias conclusões em
relação ao ponto A, mas o professor Carlos trouxe a questão totalmente destrinchada.
Como previsto na análise a priori a professora Angélica usou o “ponto de vista”
discutido para justificar que o triângulo era isósceles. Foram apresentadas várias
conjecturas, o que demonstra que questões abertas não possuem respostas únicas.
Nesse sentido, acreditamos que os professores passarão a ouvir mais os alunos e
respeitar as suas respostas. Não houve tempo para a discussão nos subgrupos e o
formador discutiu as respostas que os participantes trouxeram de casa. Destacamos,
entretanto, o pensamento em voz alta da professora Sueli.
Sueli: O triângulo é isósceles, se estiver sobre a circunferência, temos um
triângulo eqüilátero.
Formador: Qual é a conjectura?
186
Mirtes, José e Renato: Os triângulos são congruentes.
Angélica: Os triângulos são isósceles.
Rute e Maria: OBAC é um losango.
Eva: ΔCOA é simétrico ao ΔOAB em relação à reta AO.
O formador pediu as justificativas e cada professor justificou a sua conjectura.
Mirtes: Hipótese: C
1
(O, R
1
), A é interior a C
1
e A O, m é mediatriz de
OA
, m
C
1
= {B, C}. Tese: ΔOAB ΔOAC. Demonstração: Por LLL, os triângulos OAB e
OAC são congruentes pois OC = OB = r,
OA
é comum. C m, B m
eqüidistam dos extremos do segmento OA, CA = AB.
Angélica: Como C m e B m, B é eqüidistante de O e A, então ΔOBA é
isósceles. Analogamente para
ΔOAC.
Fica claro o uso do “ponto de vista” sugerido na análise a priori. Acreditamos
que o uso de novos “pontos de vista” possam ser incorporados às futuras atividades
de formação de professores, uma vez que o vemos como um elemento
potencializador para ampliar o campo de conceitos ligados a um determinado objeto
matemático.
As professoras Rute e Maria disseram não ser necessário apresentar a
demonstração delas, pois se juntassem as justificativas de Mirtes e da Angélica teriam
a delas. E a professora Eva fez uma justificativa de simetria utilizando congruência de
triângulos.
Apresentamos a resposta do professor Carlos (figura 56), e suas inferências, a
partir das representações figurais:
Figura 56: Construções do professor Carlos - questão 03
Se A é interno, então ΔAOB é isósceles pois
BAOB
(propriedade 1),
análogo ao
ΔAOC.
Se A pertence, então ΔAOB é eqüilátero pois
rOABAOB ===
(propriedade 1), análogo ao
ΔAOC.
187
Se A externo, então
OA
< 2r ΔAOB é isósceles,
OA
= 2r a mediatriz é
tangente e não forma triângulo ou
OA
> 2r não há intersecção.
A solução apresentada pelo professor Carlos nos leva a inferir que a função de
explicação e sistematização foi alcançada nessa formação, pois percebemos que
este professor não apenas se preocupou em fazer a construção pedida, mas buscou
o porquê se constrói dessa forma. Apresentando de forma consistente o seu relato
por escrito – função de sistematização, ainda ampliou a sua autonomia, ao trabalhar
na extremidade do contínuo pedagógico-andragógico da andragogia, dando novas
resposta a problemas não conhecidos e fazendo uso de objetos matemáticos
institucionalizados em situações-problema novas.
ATIVIDADE 12: MAIS DESAFIOS
Como já discutimos, muitas são as situações nas quais precisamos fazer uma
construção e temos um limite de espaço para os traçados. Os desafios que
seguem são mais exemplos de tais situações.
a) Construa a reta s perpendicular a reta r passando por P nos casos
seguintes. Não é permitido construir no exterior do retângulo.
a
1
) P r
a
2
) P r
b) Justifique matematicamente essas construções.
188
Análises prévias
Esperávamos que os professores realizassem as construções das figura 57 e
figura 58.
a
1
)
Figura 57: Construção a
1
- atividade 12
a
2
)
Figura 58: Construção a
2
- atividade 12
b) Justificativa de a
1
:
Sejam A e B dois pontos distintos quaisquer da reta “r”.
Com centro em A e raio
A
P , traçamos um arco de circunferência e com centro
em B e raio
BP , traçamos outro arco de circunferência. Esses dois arcos se
interceptam em P e Q.
Como temos
AQAP
e
BQBP
por construção, então A e B pertencem a
mediatriz do segmento
PQ , pois são eqüidistantes de P e Q.
Como a reta
A
B
é coincidente com a reta “r”, temos que “r” é a mediatriz do
segmento
PQ
, logo r é perpendicular ao segmento
PQ
. Sendo “s” a reta determinada
pelos pontos P e Q, temos que “s” é perpendicular a “r”.
Justificativa de a
2
:
189
Seja “O” um ponto qualquer não pertencente à reta “r”. Vamos construir uma
circunferência de centro “O” e raio
OP
. Seja A P o ponto de intersecção entre a
circunferência e a reta “r”. Tracemos o diâmetro
A
B . Temos que o triângulo PAB é
retângulo em P, pois está inscrito numa semicircunferência, logo a reta “s” que passa
pelos pontos P e B é perpendicular à reta r.
Essa atividade tinha como objetivo perceber como os professores em formação
se comportariam em situações-problema desafiadoras. Tais situações poderiam
suscitar descobertas, de novas construções.
A atividade era composta por dois desafios que envolviam duas situações de
quebra de contrato didático: na primeira era pedido para construir o segmento, dada a
mediatriz a partir do simétrico de um ponto dado e a segunda envolvia uma
construção na qual a mediatriz não aparecia como ferramenta explícita e nem
implícita. Acreditamos que, até o momento, existia um contrato didático que dizia que
os problemas seriam solucionados pela construção da mediatriz de um segmento
explicitamente e/ou implicitamente.
Na situação a
1
, esperávamos que os participantes partissem da mediatriz para
construir o segmento a partir do simétrico do ponto P em relação à reta “r” (simetria
axial). Caso os professores não conseguissem resolver este problema, daríamos na
lousa os passos de construção, como em geral ocorre nos livros didáticos e
pediríamos para construírem e justificarem matematicamente essa construção.
PASSOS:
1º. passo: Marque dois pontos distintos A e B quaisquer na reta r.
2º. passo: Com centro em A e raio
A
P , trace o arco de circunferência.
3º. passo: Com centro em B e raio
BP , trace o arco de circunferência.
4º. passo: Denomine de Q
P a intersecção entre os arcos traçados nos passos 2
e 3.
5º. passo: A reta que passa pelos pontos P e Q é a reta “s” pedida.
Esperávamos, nesse momento, que comentários do tipo: “em sala de aula
devemos dar os passos e pedir que justifiquem”, ou “devemos sempre propor as
questões abertas”, possam aparecer e, desta forma, enriqueça o debate sobre as
construções geométricas na aula de Matemática.
Na situação a
2
, nem a definição e nem a propriedade inerente a mediatriz de
um segmento seria usada. Temos aí uma ruptura do contrato didático que vinha
190
regendo as atividades até o momento, ou seja, que a definição e a propriedade
inerente a mediatriz de um segmento seria a ferramenta a ser usada para resolver os
problemas geométricos propostos. Caso os professores não avançassem, seriam
dados na lousa os passos da construção e pediríamos que construíssem e
justificassem os passos dados.
PASSOS:
1º. passo: Marque um ponto “O” qualquer não pertencente à reta r.
2º. passo: Construa a circunferência de centro “O” e raio
OP
.
3º. passo: trace o diâmetro
A
B.
4º. passo: Trace a reta que passa por B e P.
5º. passo: A reta
BP é a reta “s” pedida.
Acreditávamos que a postura de justificar passos de construção devia ser
incorporada pelos professores ao se debaterem com soluções prontas, ou seja, que
questionassem a validade da construção e só a aceitassem quando conseguissem
justificar e que pudessem incentivar os seus alunos a adotarem tal postura, ou seja, a
procurarem entender o porquê se faz dessa maneira. Poder-se-ia, ainda, levantar a
discussão: e se por acaso ao tomarmos ao acaso o ponto “O”, coincidir de “O” já está
sobre a reta “s”? Teríamos que P seria ponto de tangência, ou seja, não teríamos o
ponto A e nem o diâmetro
A
B , em verdade a reta OP nesse caso, seria a reta “s”
procurada.
Análise a posteriori
Os professores aceitaram o desafio e assumiram a responsabilidade pela
construção do seu próprio conhecimento. As nossas previsões na análise a priori só
foram confirmadas na questão a
1
. Porém os professores conseguiram resolver a
situação a
2
com o uso da mediatriz de um segmento, que pelas nossas previsões não
seria possível. Destacamos, também, que os professores potencializaram ao máximo
esse objeto geométrico, superando as nossas expectativas. Será que o contrato
didático vigente possibilitou tal postura? Com relação à função de explicação,
descoberta e sistematização proposta por De Villiers (2001; 2002) a atividade cumpriu
o seu papel, pois além de buscarem o porquê (justificativa matemática da
construção), os professores fizeram um relato por escrito com a função de comunicar
191
a justificativa e, sobretudo, vislumbraram a descoberta, ou seja, na busca de uma
solução que tínhamos a priori a resposta, se descobriu que a mediatriz de um
segmento poderia dar solução à questão a
2
. Os relatos que seguem comprovam o
que destacamos.
Rute: Fiz através de um quadrado (ao se referir a questão a
2
).
Formador: Como?
E a professora Rute mostrou a sua construção (figura 59).
Figura 59: Construção da professora Rute - atividade 12
Formador: Como você achou esse ponto? (seta indicada na figura anterior)
A professora Rute deu uma explicação dizendo que abriu o compasso até
chegar à reta. No entanto, a professora Angélica argumentou que abrindo um
compasso mais ou menos tangente não garante que o ponto fique bem determinado.
Rute, diz saber que seria questionada a esse respeito e que tinha pensado em um
argumento em casa, porém não estava lembrando nesse momento.
Formador: O que garante que você está pegando exatamente o pé da
perpendicular?
O formador comentou que a construção realizada por Rute garantiu quatro
lados iguais e não um ângulo reto. E reforça que ela construiu um losango e não um
quadrado e que o fato de ter tomado um ponto próximo ao pé da perpendicular, fez
com que a figura ficasse parecida com um quadrado. Como Rute já havia passado
por essa experiência anteriormente (confundir losango com quadrado), foi pegar seu
caderno para rever suas anotações e concordou com o formador.
O relato anterior nos leva a afirmar que o obstáculo epistemológico causado
pela evidência da figura, Arsac (1988), é realmente um aspecto a ser levado em
consideração ao se preparar atividades de demonstração em Geometria e que se
deve propor tais situações e posterior discussão, pois nesse sentido, os professores
poderão avançar e justificar o que lhes parece óbvio.
192
As professoras Paula e Angélica revelando terem usado a dica de Rute
(quadrado) e, trabalhando em conjunto, apresentam a figura 60 como solução para a
questão a
2
.
Figura 60: Construção das professoras Angélica e Paula - atividade 12
A professora Mirtes apresentou a solução da figura 61 para a questão a
1
com
seguinte justificativa matemática:
Figura 61: Construção da professora Mirtes - atividade 12
O r
C
1
(O, r
1
) e r
1
=
OP
C
1
r = {X}
Por construção, o simétrico de P em relação a r é P’ = C
1
C
2
(X, r
2
) sendo r
2
=
XP
A reta PP’ é perpendicular a r.
Percebemos o quanto a representação no registro simbólico ficou forte para a
professora Mirtes, bem como foi se tornando cada vez mais autônoma ao abordar os
problemas de construções geométricas, juntamente com as justificativas matemáticas.
Nesse sentido, a formação cumpriu o seu papel, pois contribuiu para ampliar e/ou
construir a autonomia de alguns professores.
Passaremos a apresentar todo o caminho percorrido pela professora Joana.
Inicialmente pensou em construir a questão a
2
utilizando o ângulo de 90°, porém
percebeu que teria que traçar em um local não permitido, ver figura 62.
193
Figura 62: Construção 01 da professora Joana - atividade 12.
E apresenta a solução da figura 63 para a questão a
2
.
Figura 63: Construção 02 da professora Joana - atividade 12
Em seguida volta para a questão a
1
e apresenta a construção da figura 64.
Figura 64: Construção 03 da professora Joana - atividade 12
E após ter conseguido resolver as questões, Joana pergunta ao professor
Renato como ele tinha conseguido fazer a questão a
1
. Renato tinha realizado a
construção como proposto na análise a priori e Joana, apenas observando a
construção tece o seguinte comentário:
Joana: Ele considerou que “r” é a mediatriz, depois fez o arco. Ficou “bonitinho”.
Inferimos sobre o grau de amadurecimento ao qual Joana chegou, rapidamente
ao observar uma construção na qual estava implícito o uso da mediatriz, prontamente
fez a justificativa matemática.
A professora Joana aproveitando o tempo que lhe restava ainda apresenta
outra solução para a questão a
2
(figura 65).
194
Figura 65: Construção 04 da professora Joana - atividade 12
Joana:
Fiz de outra forma, através do ângulo de 60°, fiz a bissetriz achei o ângulo
de 30° e transportei. Dessa forma não preciso riscar fora do retângulo.
Formador: Porque esse ângulo mede 60°?
Joana: Não sei. Nunca pensei.
Carlos: Tem um triângulo eqüilátero, logo o ângulo é de 60°.
Joana: Não estou enxergando.
O professor Carlos faz a construção da figura 66 e explicou que os lados são
raios, logo três lados iguais, triângulo eqüilátero e sendo assim os ângulos medem
60°.
Figura 66: Ângulo de 60º e triângulo eqüilátero.
Destacamos que as soluções apresentadas pelos professores apresentam o
argumento matemático da figura construída ser um quadrado. Nesse sentido,
inferimos que esses professores pensaram geometricamente na figura e a
construíram com base neste argumento. Podemos afirmar que o hábito de justificar as
construções está sendo incorporado por esses professores e, mais, que estes
aceitaram o desafio de trabalhar na extremidade do contínuo pedagógico-
andragógico da andragogia, se tornando dessa forma, mais autônomos. Por outro
lado, percebemos uma construção via ângulos e bissetrizes.
Ao longo deste capítulo, descrevemos e analisamos as experiências de
formação continuada com os professores envolvidos na pesquisa, tomando como
ponto de referência as atividades aplicadas, as análises prévias, as falas desses
195
professores, os seus registros, relacionando com as referências teóricas que deram
validade às situações vivenciadas em todo esse processo formativo e investigatório.
Durante as etapas de descrição e análise, foi possível lançarmos indagações
acerca do alcance dos nossos objetivos, bem como da obtenção de respostas às
questões surgidas ao longo do estudo e as inferências por nós estabelecidas.
Considerando que as conclusões apresentadas em pesquisas, são sempre
inacabadas e que, segundo Popper (1963 apud Lakatos, 1978), uma investigação
científica começa e termina com problemas. A seguir apresentaremos nossas
considerações finais acerca do estudo, destacando alguns dos pontos conclusivos
detectados no trabalho.
196
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa se propôs a contribuir como mais um caminho para a formação
continuada de professores de Matemática. Para tanto, tomamos como eixo de ação, a
elaboração e aplicação de uma seqüência de atividades que pudesse permitir que os
professores construíssem a definição de mediatriz de um segmento e demonstrassem
propriedades inerentes a esse objeto matemático. Além disso, consideramos
importante a necessidade de justificar matematicamente, com base na Geometria
plana, algumas construções geométricas em que esse objeto aparecia como
ferramenta para resolver o problema.
Nesse sentido, os aspectos metodológicos escolhidos contribuíram para que a
experiência com os professores se desenvolvesse de maneira efetiva e atendesse de
forma satisfatória aos nossos anseios. Materialmente, os pressupostos da Engenharia
Didática contribuíram para a elaboração, aplicação e análise da seqüência de
atividades. Para tal, utilizamos a Teoria das Situações Didáticas de Brousseau (1986)
e a Teoria dos Registros de Representação Semiótica (DUVAL, 2003).
Vale ressaltar que o ambiente da pesquisa evidenciou características de uma
pesquisa-ação, visto que a interação formador, observador e professores em
formação contribuiu para o alcance dos objetivos da pesquisa. Além disso, a
metodologia adotada norteou a realização de um breve estudo histórico-
epistemológico, bem como nas reflexões acerca do ensino e aprendizagem dos temas
abordados, posto que a pesquisa centrou-se na aquisição e/ou aprimoramento do
campo de conceitos referentes à mediatriz de um segmento, na formação de
professores, podendo implicar nas ações docentes em sala de aula.
Destacamos, ainda, a importância de construir a definição de mediatriz de um
segmento sob dois “pontos de vista” diferentes, com base em Rogalski (1995 apud
Almouloud, 2007). No que diz respeito às demonstrações, De Villiers (2001; 2002) nos
propiciou focar outras funções da demonstração e Duval e Egret (1989) nos
chamaram atenção de que a escrita de uma demonstração é específica e requer
tarefas próprias para a sua implementação.
197
Outro aspecto importante, abordado neste trabalho centrou-se nos estudos de
alguns autores que pesquisam sobre a formação de professores, o que justificou a
nossa escolha de uma formação centrada em conteúdo matemático, de acordo com
Ponte (2001) e Shulman (2001) e na aprendizagem de adultos, conforme DeAquino
(2007) como forma de subsidiar a formação continuada e a análise a posteriori.
Tais análises nos levaram a estabelecer inferências e reflexões sobre as
imagens conceitos (HERSHKOWITZ et al., 1994), inicialmente incorretas ou parciais,
que foram explicitadas pelos professores, e as imagens conceitos construídas ao
longo da formação continuada.
Entendendo a demonstração como uma atividade intrínseca ao matemático e
que deve constituir uma parte fundamental na formação do professor de Matemática,
nessa pesquisa a concebemos como uma noção paramatemática (CHEVALLARD,
2005) que nos permitiu utilizá-la como um elemento transversal a todas as atividades
realizadas. A experiência na formação nos fez constatar que a demonstração pode
sim permear de maneira natural, o processo de construção dos conceitos
matemáticos.
Com relação às funções da demonstração que focamos neste estudo,
identificamos em vários momentos das análises que os professores não estavam
apenas satisfeitos em dar uma resposta ou apresentar uma construção, mas,
sobretudo, preocupados em entender o porquê de cada resposta e/ou construção,
fomentando desta forma a função de explicação proposta por De Villiers (2001; 2002).
Além disso, muitos foram os momentos nos quais os professores descobriram fatos
novos para eles, ao resolverem situações-problema (função de descoberta) e, nas
escritas de suas demonstrações, os professores percebiam algumas inconsistências
matemáticas nas suas elaborações e retomavam para reescrevê-las (função de
sistematização).
Em se tratando das tarefas de organização dedutiva propostas por Duval e
Egret (1989), constatamos que elas não foram bem aceitas pelos professores em
formação continuada, pois nas ocasiões em que as utilizamos, notamos que eles
tendiam a realizar suas demonstrações de maneira independente, sem seguir o
esquema dado. Por um lado, consideramos que esta atitude dos professores foi um
sinal de autonomia adquirida na formação continuada, mas, por outro, entendemos
que várias são as situações, como em alguns livros didáticos, em que os professores
198
precisarão compreender um esquema ou demonstração apresentada. Dessa forma,
as tarefas heurísticas tiveram maior aceitação pelo grupo participante da pesquisa.
Surgem, entretanto, dois questionamentos a esse respeito: será que a
participação desses professores em um projeto como esse, já há algum tempo, gerou
este nível de autonomia? Se estivéssemos começando o trabalho com esse mesmo
grupo pela primeira vez, será que as atividades de organização dedutiva teriam sido
aceitas pelo grupo? Como essas questões não se constituem na prioridade de nosso
estudo, não as investigamos.
Outro ponto de destaque se deu ao trabalharmos com a construção da
definição de mediatriz de um segmento sob “pontos de vista” diferentes, o que
contribuiu significativamente para ampliação e/ou construção do conceito desse
objeto matemático. Notamos, também, que essa construção sólida permitiu que os
professores justificassem com mais segurança as construções realizadas, bem como
ampliassem sua compreensão de que em matemática os objetos são definidos a priori
e que não existe uma única forma de definir um objeto matemático.
Com relação aos registros de representação semiótica, constatamos a sua
potencialidade durante todo o trabalho, pois a todo momento trabalhamos com, pelo
menos, dois registros de representação, nos quais os professores efetuaram
conversões. Entendemos que quando os professores escreveram a propriedade
usando dois ou mais registros de representação, além de compreenderem melhor a
propriedade em questão, puderam, também, perceber que um registro tem vantagens
em relação ao outro, quer seja na economia da escrita, como é o caso do registro
simbólico, ou no que diz respeito a explicitar informações não presentes em outro.
Nas atividades referentes à construção e descrição do processo de construção,
foi possível constatarmos que, com o passar do tempo os professores incorporavam
cada vez mais o registro simbólico e que tal processo de descrição já vinha carregado
de justificativas matemáticas, o que possibilitava uma compreensão maior da
construção realizada e contribuía para que eles avançassem nessas justificativas.
Nesse contexto, destacamos que o registro material de representação
semiótica identificado por nós, além de contribuir para a realização desse trabalho, no
que diz respeito à ampliação do conceito de mediatriz de um segmento, que este
pode ser testado em outras pesquisas. A partir de nossas análises, constatamos que,
199
em nosso trabalho, ele se mostrou como um elemento potencializador ao permitir
tratamentos específicos e, com isso, gerar a possibilidade de justificar e formular
conjecturas.
Certamente, podemos afirmar que os professores participantes dessa pesquisa
avançaram na construção de sua autonomia, ao trabalharem, na maioria das vezes,
na extremidade da andragogia do contínuo pedagógico-andragógico (DEAQUINO,
2007), usando idéias em contextos apropriados, aplicando idéias a novas situações e
explicando e estendendo idéias e encontrando novos exemplos, pois como Linard
(2000 apud Silva, 2005), concordamos que a autonomia se constrói. Constatamos,
assim, que todos os professores sujeitos dessa pesquisa, avançaram nesse processo.
Porém, destacamos o grande salto dado pela professora Mirtes em todos os
momentos da análise.
Enfatizamos que a possibilidade de os professores participantes construírem
definições, formularem conjecturas e demonstrarem, tomando para si a
responsabilidade de construir seu conhecimento e, nesse sentido, ampliar a sua
autonomia, foi potencializada, provavelmente, por termos concebido e aplicado a
seqüência de atividades tomando por base a Teoria das Situações Didáticas.
Inferimos que foi a base dessa teoria que parece ter permitido aos professores em
formação continuada agir, formular e validar, construindo conceitos referentes à
Geometria plana e demonstrações matemáticas, ao realizarem construções
geométricas. É importante mencionar que o formador, ao fazer a institucionalização,
parece ter possibilitado que os objetos institucionalizados passassem a fazer parte do
repertório cognitivo desses professores.
Evidenciamos, ainda, que, apesar de não termos focado a formação em
construções de outros conceitos matemáticos, esta formação parece ter contribuído
para um melhor entendimento por parte dos professores participantes a respeito do
que seja uma definição e uma propriedade em matemática, bem como sobre o que é
um teorema recíproco e que nem todo teorema possui recíproco, conforme os
princípios defendidos por Dreyfus e Hadas (1994) ao analisarem as dificuldades dos
alunos em matemática. Favoreceu também para as descobertas de algumas
propriedades geométricas que seriam o elemento chave para a resolução de algumas
situações-problema. Mesmo quando enveredaram por construções que não estavam
200
previstas, tivemos que interferir e permitir que construíssem justificativas matemáticas
consistentes, como foi o caso da construção da mediatriz pelo método do losango.
Neste momento, é possível retomarmos nossa questão de pesquisa – uma
seqüência de ensino com enfoque em construções geométricas pode contribuir para o
desenvolvimento de conhecimentos acerca da demonstração em Geometria em uma
formação continuada de professores? – considerando as reflexões apresentadas nas
análises e nesta etapa de nosso trabalho. Diante de tudo que foi apresentado,
podemos enfatizar que a seqüência de atividades elaborada, aplicada e analisada por
nós, parece ter contribuído de fato para a formação dos professores envolvidos, no
que diz respeito aos conhecimentos de demonstração em Geometria, no caso
específico da mediatriz de um segmento, visto que todas as evidências mencionadas
no capítulo 4 deste trabalho nos fazem admitir que a resposta obtida no estudo foi
satisfatória para inferirmos a validação dos resultados da pesquisa.
Entretanto, como já mencionamos, no final do capítulo anterior, as informações
resultantes da pesquisa fornecem novos questionamentos que, certamente poderão
se constituir em novas questões de estudo, visto que não estavam definidas como
questões postas inicialmente por nós, mas que emergiram ao longo do trabalho,
apontadas aqui como questões para futuros estudos.
Dentre essas questões, uma delas refere-se aos aspectos didáticos
evidenciados durante o processo de formação continuada realizado. Inicialmente
tínhamos previsto abordar algum aspecto relacionado à formação didática do
professor. Todavia, o andamento da pesquisa não nos possibilitou abordar a
formação didática. Sendo assim, esse não foi o foco principal para obtermos
respostas a nossa questão de pesquisa. Optamos, então, por deixar tal questão para
um estudo futuro.
Um fato emergente durante a pesquisa nos levou, também, a eleger uma nova
pergunta, que pode se constituir em um foco para futuras pesquisas. Uma vez que na
atividade 12 os professores apresentaram diversas soluções cujo foco era a mediatriz
de um segmento (não previstas nas análises prévias). Não foi possível, entretanto,
abordar todas essas soluções, no momento em que realizamos a análise a posteriori.
Será que o contrato didático vigente possibilitou aos professores a busca por essas
soluções? Poderíamos afirmar que sim, porém o que os fez buscar a solução via
bissetriz? Neste caso, estaríamos fora do contrato didático. Uma investigação sobre
201
as rupturas e a influência do contrato didático em uma seqüência com foco nas
construções geométricas pode ser suscitada em pesquisas futuras.
Outro aspecto, surgido em nossas reflexões, diz respeito às possibilidades de
incorporação desse tipo de abordagem para a mediatriz de um segmento, em
disciplinas do curso de Licenciatura em Matemática, posto que o exercício
matemático formativo, experimentado de forma didática durante a pesquisa, apontou
para uma direção extremamente construtiva para a formação conceitual e profissional
do professor de Matemática.
Além das questões em aberto, apresentadas até agora, a pesquisa evidenciou
outra questão para um trabalho futuro: a formação continuada de professores
centrada nas construções geométricas pode contribuir para a construção de
conhecimentos acerca da Geometria plana, desses professores?
Acreditamos que será possível proporcionarmos aos professores em formação
continuada o desenvolvimento de conceitos geométricos quando propusermos
problemas de construções geométricas, pois a busca da solução desses problemas
será realizada pelo viés da Geometria plana e, dessa forma, poderá se perceber quais
são as ligações existentes entre os elementos dados no problema e aqueles que
estão sendo procurados.
202
REFERÊNCIAS
ALMOULOUD, S. A.. Fundamentos da didática da matemática. Curitiba: Ed. UFPR,
2007.
ALMOULOUD, S. A.. Registros de representação semiótica e compreensão de
conceitos geométricos. In: MACHADO, S. D. A. (Org.) Aprendizagem em
Matemática: registros de representação semiótica. São Paulo: Papirus, 2003.
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207
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO PERFIL
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Programa de Mestrado em Educação Matemática
Mestrando: Gilson Bispo de Jesus
Orientador: Prof. Dr. Saddo Ag Almouloud
Prezado professor (a):
O objetivo deste questionário é recolher dados para traçar o perfil dos
professores participantes desta pesquisa.
1) Sexo:
( ) masculino ( ) feminino
2) Idade:
( ) de 21 a 30 anos ( ) de 31 a 40 anos
( ) de 41 a 50 anos ( ) mais de 50 anos
3) Há quanto tempo leciona Matemática?
( ) até 2 anos
( ) de 2 a 5 anos
( ) de 5 a 10 anos
( ) de 10 a 20 anos
( ) mais de 20 anos
4) Em que grau(s) de ensino leciona?
( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( ) Ensino Superior
5) Você leciona quantas aulas por semana? ___________________________
6) Em quantas escolas você leciona atualmente?
( ) uma ( ) duas ( ) três ( ) quatro ou mais
208
7) Você trabalha, atualmente, em escolas:
( ) públicas ( ) particulares
8) Qual a sua formação acadêmica/profissional?
( ) Bacharel em Matemática
( ) Licenciado em Matemática – ( ) curta ( ) plena
( ) Licenciado em Ciências – ( ) curta ( ) plena
( ) Graduado em outro curso. Qual? _______________________________
( ) Pós Graduado. Qual curso? __________________________________
( ) Complementação pedagógica.
09) No Ensino Fundamental, quais séries costuma ensinar com mais
freqüência? ____________________________________________________
10) No Ensino Fundamental, qual(is) série(s) você prefere não lecionar?
__________________________ Porque? ____________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
____________________________________________________________
11) Há quanto tempo participa do projeto? ____________________________
12) Qual o motivo que o levou a participar deste projeto? ________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
209
APÊNDICE B - ATIVIDADES PROPOSTAS
ATIVIDADE 1: CONSTRUINDO UMA DEFINIÇÃO
a) Trace um segmento
A
B
qualquer no papel que recebeu.
b) Faça uma dobradura, de modo que A e B coincidam.
c) Chame de “m” a reta representada pelo vinco deixado no papel e trace esta reta.
d) Que relações você pode fazer entre o segmento
A
B
e a reta m? ______________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
e) A partir dessas relações como você definiria a reta m? _______________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
210
ATIVIDADE 2: FORMULANDO UMA CONJECTURA
a) Marque um ponto P diferente do ponto médio sobre a reta “m” da atividade 1.
b) Trace os segmentos
P
A
e
PB
.
c) Volte a dobrar sobre a reta “m”. O que você observou? ______________________________
_______________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
d) Marque outros pontos sobre a reta “m” e proceda da mesma forma anterior.
e) O que você observou? ________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
f) Nessa atividade, você observou uma propriedade da mediatriz. Escreva seu enunciado.
______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
211
ATIVIDADE 3: DEMONSTRAÇÃO DA PROPRIEDADE
a) Podemos escrever uma mesma propriedade matemática em linguagens diferentes. Em
matemática, em geral, utilizamos a linguagem natural, a linguagem simbólica e a linguagem
figural. Escreva a propriedade da atividade 2 nessas linguagens.
Linguagem natural.
Linguagem simbólica.
Linguagem figural.
b) Como sabemos, no enunciado de uma propriedade ou teorema constam as hipóteses e a tese.
Em geral, consideramos hipótese os dados que o enunciado nos oferece e como tese o que se
quer demonstrar. Identifique a hipótese e a tese da propriedade acima.
c) Demonstre essa propriedade.
212
I) São dadas abaixo, 7 afirmações. Numere-as de 1 a 7 numa seqüência lógica para obter a
redação da demonstração da propriedade que diz: todo ponto que pertence a mediatriz de um
segmento é eqüidistante das extremidades deste segmento.
_____ ΔAPM ΔBPM, pelo caso LAL.
_____
MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B
.
_____
PBP
A
, lados congruentes em triângulos congruentes.
_____ P é eqüidistante de A e B, pois
PBP
A
.
_____ Seja P um ponto qualquer da mediatriz de um segmento
A
B
e M o ponto médio deste
segmento.
_____
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P
90º, pois a reta “m” é perpendicular ao segmento
A
B
.
_____
PMPM
, pois é lado comum.
II) Faça a redação da demonstração na ordem que você enumerou.
213
ATIVIDADE 4: UM OUTRO PONTO DE VISTA
a) Você acabou de demonstrar uma propriedade que diz que: todo ponto da mediatriz de um
segmento eqüidista das extremidades desse segmento. Suponha agora que você pudesse
marcar todos os pontos que são eqüidistantes das extremidades de um segmento
A
B
(se
desejar faça uma figura de apoio). Todos esses pontos formariam uma reta que intercepta
o segmento
A
B
em M. O que representa esta reta para este segmento? Justifique sua
afirmação.
b) Na atividade 3 você demonstrou que: se P pertence a mediatriz do segmento
A
B
, então P
é eqüidistante de A e B. A nova caracterização que você construiu no item (a) sugere uma
outra propriedade. Escreva essa propriedade na:
Linguagem natural.
Linguagem simbólica.
Linguagem figural.
c) Identifique a hipótese e a tese dessa propriedade.
d) Demonstre essa propriedade.
214
e) As afirmações abaixo foram retiradas das atividades realizadas por alguns alunos quando
redigiram a demonstração da propriedade que diz que: se P é eqüidistante de A e B, então
P pertence a mediatriz do segmento
A
B
. Escolha aquelas que julgar necessárias para
demonstrar essa propriedade e numere-as de 1 a ... em uma seqüência lógica que mostre
a demonstração.
_____ M é ponto médio de
A
B
, pois a mediatriz passa pelo ponto médio de qualquer
segmento.
_____
PBP
A
, por hipótese.
_____ Seja o ponto médio do segmento
A
B
, P M tal que
PBP
A
e m a reta que passa por
P e M.
_____
BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P , pois ΔPMA ΔPMB.
_____
PBP
A
, pois o triângulo APB é isósceles.
_____
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P
90º, pelas duas afirmativas anteriores.
_____
MBM
A
, pois M pertence a mediatriz.
_____
PMPM
, pois é lado comum.
_____ Logo, P pertence a mediatriz do segmento
A
B
.
_____ M é ponto médio de
A
B
, pois
MBM
A
e M
A
B
.
_____ ΔPMA ΔPMB pelo caso LLL.
_____ Temos que m
A
B , pois P m, M m e
A
BPM
.
_____
MBM
A
, pois M é ponto médio do segmento
A
B
.
_____
=BM
ˆ
P
A
M
ˆ
P +
180º, pois são ângulos suplementares adjacentes.
_____
=
A
M
ˆ
P
90º e 90º, pois são ângulos suplementares adjacentes e congruentes
(ΔPMA ΔPMB).
=BM
ˆ
P
_____ m é a mediatriz do segmento
A
B
, pois m
A
B
e m passa pelo ponto médio de
A
B
.
f) Em linguagem natural, faça a redação da demonstração na ordem que você enumerou.
215
ATIVIDADE 5: FAZENDO ESCOLHAS
Nas atividades anteriores, você caracterizou a mediatriz de um segmento de duas formas
diferentes, ou seja, definiu mediatriz a partir de características próprias desse objeto matemático.
Observe o quadro abaixo e responda:
DEFINIÇÃO 1: A mediatriz de um
segmento é a reta que passa pelo ponto
médio desse segmento e é perpendicular
a ele.
PROPRIEDADE 1: Um ponto pertence a
mediatriz de um segmento se, e somente
se, eqüidista das extremidades desse
segmento.
PROPRIEDADE 2: A mediatriz de um
segmento passa pelo ponto médio desse
segmento e é perpendicular a ele.
DEFINIÇÃO 2: A mediatriz de um
segmento é o conjunto de todos os pontos
que eqüidistam das extremidades desse
segmento.
a) Comparando as definições e as propriedades acima o que você pode afirmar? __________
___________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________
b) As definições 1 e 2 são equivalentes? Justifique. __________________________________
_____________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
c) Para garantir a consistência das justificativas em questões de demonstração matemática, é
preciso ter claro o que é definição e o que é uma propriedade de um objeto matemático. Para
evitar escritas circulares, nesse momento elegeremos a definição de mediatriz e
conseqüentemente a propriedade que usaremos em atividades futuras.
Definição: ____________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
Propriedade: _________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
216
ATIVIDADE 6: CONSTRUÇÃO GEOMÉTRICA DA MEDIATRIZ
a) Dado o segmento
A
B , construa a sua mediatriz.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
217
ATIVIDADE 7: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS GEOMÉTRICOS
PROBLEMA I
a) Dados os pontos A e B e a reta r abaixo, construa a circunferência que passa pelos pontos A e
B, sabendo que seu centro pertence à reta r.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
218
PROBLEMA II
a) Construa a circunferência circunscrita ao triângulo ABC dado.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
219
PROBLEMA III
a) Dada a reta r e o ponto P, construa com régua e compasso a reta s que passa por P e é
perpendicular a r.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
220
PROBLEMA IV
a) Dada a reta r e o ponto P, construa a reta s que passa por P e é perpendicular a r.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
221
PROBLEMA V
a) Dada a circunferência de centro O e o segmento
MN
, construa o triângulo isósceles MNP
sabendo que
MN
é a base e que o vértice P pertence à circunferência dada.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
222
PROBLEMA VI
a) Em um triângulo ABC qualquer, construa a mediana relativa ao vértice B.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
223
PROBLEMA VII
a) Trace uma reta d, e marque um ponto M pertencente à d e um ponto A não pertencente à
d. Construa a circunferência tangente à d em M passando por A.
b) Descreva o processo de construção que você utilizou.
c) Justifique matematicamente essa construção.
224
ATIVIDADE 8:UM DESAFIO
Muitas são as situações nas quais precisamos fazer uma construção e temos um limite de espaço
para os traçados. O desafio que segue é um exemplo de tal situação.
a) Construa o ponto médio do segmento
A
B
dado. Não é permitido construir no exterior do
retângulo.
b) Justifique matematicamente essa construção.
225
ATIVIDADE 9: ANALISANDO RESPOSTAS DADAS POR ALUNOS
Um professor de Matemática após trabalhar com seus alunos os conceitos referentes a mediatriz
de um segmento, pediu a seus alunos que construíssem a reta “d” mediatriz do segmento
A
B
dado. As
respostas dadas por três alunos foram:
ALUNO 1
ALUNO 2 ALUNO 3
Comente cada uma dessas respostas.
226
ATIVIDADE 10: DESCOBRINDO NOVAS PROPRIEDADES
SITUAÇÃO 01
: Espaço aéreo
Dois países vizinhos, Nenhum e Nada, de uma galáxia distante, não têm boas relações, por isso
eles vigiam muito bem seus espaços aéreos.
Na tela do radar de um avião de caça aparecem dois indicadores de torre de rádio, denotados por
A e B, do país Nenhum e um indicador de torre rádio, denotado por C, do país Nada.
Um avião de Nada deve voar mais próximo de C que de A, e mais próximo de C que de B.
A figura abaixo representa a tela do radar. Qual a parte da tela que representa o espaço aéreo do
país Nada?
227
SITUAÇÃO 02: Zona de construção em uma fazenda
Uma casa será construída numa fazenda, representada a seguir pelo quadrilátero ABCD. A
construção será feita numa região mais distante de A que de B, mais próxima de B que de C, mais
distante de C que de D e mais próxima de D que de A. Pinte a parte da fazenda na qual será
construída a casa.
228
ATIVIDADE 11: FAZENDO DEMONSTRAÇÕES
QUESTÃO 01
Construa uma circunferência C de centro O e raio r, marque três pontos A, B e C nessa
circunferência, tais que AB = BC = r. Trace a corda
AC e o raio OB , o que se pode conjecturar sobre
a reta
AC
em relação ao raio OB ? O esquema abaixo é a demonstração dessa conjectura. Complete
o esquema da demonstração e enuncie a definição D, a propriedade P e o axioma A, que justificam os
passos dessa demonstração.
Por h
.......
ipótese
..............
OA = r
Por hipótese
A
B = ..........
........ pertence à
mediatriz de
OB .
AC .....................
.....................
OB
D
P
A
Por hi
.......
pótese
...............
OC = r
Por hipótese
BC = ..........
........ pertence à
mediatriz de
OB .
D
P
D
________________________________________________________
_______________________________________________________
P ________________________________________________________
_______________________________________________________
A ________________________________________________________
_______________________________________________________
Redija a demonstração.
229
QUESTÃO 02
Construa duas circunferências secantes de centros A e B. Sabendo que E e F são os pontos de
intersecção entre essas circunferências, construa a mediatriz do segmento
EF
. O que você pode
conjecturar? Demonstre a sua conjectura.
230
QUESTÃO 03
Construa uma circunferência de centro O seja A um ponto interior a essa circunferência, distinto de
O. Construa a mediatriz do segmento
OA . Sabendo que B e C são os pontos de intersecção da
mediatriz com a circunferência, o que se pode conjecturar sobre os triângulos OAB e OAC. Demonstre
sua conjectura. E se o ponto A pertencesse à circunferência? E se o ponto A estivesse na região
exterior à circunferência?
231
QUESTÃO 04
Construa dois segmentos
A
B
e CD que possuam a mesma mediatriz. O que se pode dizer sobre
as retas
A
B e
CD
? Demonstre.
QUESTÃO 05
Construa um quadrilátero CUBA tal que CU = UB e BA = AC. Construa o ponto médio S da
diagonal
BC . O que dizer sobre os pontos U, S e A? Demonstre.
232
QUESTÃO 06
Construa um quadrilátero PARC qualquer. Construa também as mediatrizes dos seus lados.
Denote por I o ponto de intersecção das mediatrizes dos lados
P
A
e
A
R
, por J o dos lados
A
R
e
RC , por K o dos lados RC e CP e por L o dos lados CP e
P
A
. Construa a mediatriz do segmento
PR
. O que você pode conjecturar. Demonstre a sua conjectura.
233
ATIVIDADE 12: MAIS DESAFIOS
Como já discutimos, muitas são as situações nas quais precisamos fazer uma construção e
temos um limite de espaço para os traçados. Os desafios que seguem são mais exemplos de tais
situações.
a) Construa a reta s perpendicular a reta r passando por P nos casos seguintes. Não é construir no
exterior do retângulo.
a
1
) P r
a
2
) P r
b) Justifique matematicamente essas construções.
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